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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS
Programa de Pós-Graduação em Educação
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Belo Horizonte
2007
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INEIRO
:
1950
1970
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação
em Educação da Pontifícia Universidade Católica de
Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção do
título de Mestre em Educação.
Orientadora: Leila de Alvarenga Mafra
Belo Horizonte
2007
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FICHA CATALOGRÁFICA
Elaborada pela Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
Pinto, Helder de Moraes
P659e A Escola Normal Regional D. Joaquim Silvério de Souza e a formação
de professores para o meio rural mineiro: 1950-1970/ Helder de Moraes
Pinto. – Belo Horizonte, 2007.
199f. il.
Orientadora: Profª. Leila de Alvarenga Mafra
Dissertação (Mestrado) Pontifícia Universidade Católica de Minas
Gerais, Programa de Pós-Graduação em Educação.
Bibliografia.
1. Professores Formação Minas Gerais. 2. Educação rural Minas
Gerais. I. Mafra, Leila de Alvarenga. II. Pontifícia Universidade Católica
de Minas Gerais. Programa de Pós-Graduação em Educação. III. Título.
CDU: 371.13
Bibliotecária : Mônica dos Santos Fernandes Rodrigues – CRB 6/1809
Helder de Moraes Pinto
A Escola Normal Regional Rural D. Joaquim Silvério de Souza e a Formação de
Professores para o Meio Rural Mineiro: 1950-1970.
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção
do título de Mestre em Educação.
Belo Horizonte, 2007.
_____________________________________________________
Profa. Dra.Leila de Alvarenga Mafra (Orientadora) - PUC Minas
_____________________________________________________
Prof. Dr. Carlos Roberto Jamil Cury - PUC Minas
_____________________________________________________
Prof. Dr. Écio Antônio Portes - FUNREI
A meus avós,
pela forma com que se dedicaram à arte de viver.
Agradecimentos
A minha orientadora, Profa. Leila de Alvarenga Mafra, que tornou possível a realização desse
trabalho.
Ao professor Olímpio Pimenta (UFOP) pelas dicas e estímulos oferecidos a esse estudo.
A minha família que me tolerou nos momentos de insatisfação e falta de recursos.
A minha namorada Simone que ouviu e leu centenas de vezes as coisas que eu tinha para
falar.
Ao professor Muniz, diretor da Escola Estadual D Joaquim Silvério de Souza, pela confiança.
À professora Olinda e à professora Lenita, pela presteza com que me receberam no CDPHA.
Aos funcionários da Secretaria do Mestrado pela paciência, disposição e disponibilidade com
que nos atenderam nesse período.
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), criada em 11 de
julho de 1951, pelo Decreto nº. 29.741, com o objetivo de "assegurar a existência de pessoal
especializado em quantidade e qualidade suficientes para atender às necessidades dos
empreendimentos públicos e privados que visam ao desenvolvimento do país", pelo auxílio
fundamental que prestou à materialização deste trabalho, através da bolsa
CAPES/MODADLIDADE
II.
À Fundação Educacional do Vale do Jequitinhonha (FEVALE), por meio da Faculdade de
Filosofia e Letras de Diamantina (FAFÍDIA), por ter me acolhido como aluno no ensino
superior do curso de História e, em seguida, ter me abrigado como profissional no mesmo
departamento em que me graduei.
“Não vivo no passado, é o passado que vive em mim”.
Paulinho da viola
Resumo
A pesquisa realizada teve como objeto de investigação a ESCOLA NORMAL REGIONAL
DOM JOAQUIM SILVÉRIO DE SOUZA (1950-1970), situada na zona rural de Diamantina,
Minas Gerais. A hipótese aqui analisada discute a suposta renovação teórica e instrumental na
formação do professor, regente de ensino, para o “meio rural”. Para tanto, buscou-se
descrever o processo de constituição dessa escola; as peculiaridades introduzidas na formação
especializada desse profissional; analisar o pensamento educacional que sustentou essa
formação, especialmente, a concepção de formação normal rural explicitada pela psicóloga
russa Helena Antipoff (1892-1974), responsável pedagógica do curso. A investigação
focalizou o contexto sócio-econômico do país entre as décadas de 50 e 70, as políticas
públicas defendidas em discursos sobre a educação rural em Minas Gerais, que antecederam e
publicaram a missão atribuída à Instituição Educativa estudada. A seguir, foram identificados
e analisados os dispositivos didático-pedagógicos de natureza material e simbólica utilizados
na formação das normalistas, priorizando-se, autores, obras e a teoria educacional neles
veiculados. Nessa formação das normalistas foi ainda avaliado o papel das Didáticas nas
práticas de ensino e do Clube Agrícola, no exercício científico de uma agricultura.
A pesquisa desenvolvida caracteriza-se por ser histórico-documental, sustentada por
pressupostos teórico-metodológicos da Historiografia contemporânea. Desta, foram utilizados
os conceito de “tempo histórico”, difundido por Jacques Le Goff (História e Memória, 2003),
José Carlos Reis (Tempo, História e Evasão, 1994) e Boaventura de Souza Santos (A
gramática do Tempo, 2006). Nesses textos, os autores apresentam a noção de “oposição entre
o passado e o presente” e entre “o campo de experiência e o horizonte de espera”; a contração
do tempo ou “extorsão,” ora do futuro, ora do passado, para o campo do planejamento do
presente. As fontes consultadas na pesquisa de campo foram: jornais, revistas, livros de atas
que descrevem rotinas do cotidiano escolar; livro de inventário de objetos e equipamentos
encontrados no Centro de Documentação e Pesquisa Helena Antipoff, no Acervo da Escola
Normal D.Joaquim Silvério de Souza e em bibliotecas universitárias onde se procedeu a
pesquisa bibliográfica sobre as questões aqui examinadas.
Palavras-chave: Formação de Professor, Políticas de Educação Rural, Escola Normal Rural.
Abstract
This research describes and analyses the historical e cultural influences which contributed to
the foundation of the ESCOLA NORMAL REGIONAL DOM JOAQUIM SILVERIO DE
SOUZA (1950-1970), in rural district of Conselheiro Mata, in the city of Diamantina, Minas
Gerais, Brazil. To enlarge the understanding of Brazilian Rural Education we have discussed
the social and economic contexts between the 50
th
and 70
th
as posed by government speeches
and documents. This rational allows us to describe the public mission, and the social goals
attributed to rural educational institutions.
The main hypothesis discussed in these documents is the “theoretical and technical renovation
in teachers’ education” for rural areas, as part of public policies efforts carry out in Minas
Gerais State. To test this hypothesis, several steps were taken in this research: a) an
investigation of the school social and historical development, focusing upon original aspects
introduced in teachers’ rural education; b) a search for the educational ideals and proposals
supporting the conception of education for normal rural schools developed by the Russian
psychologist, Helena Antipoff (1892-1974), who was responsible for planning these schools;
c) the characterization and analysis of the symbolic and concrete instructional devises used in
teachers’ rural education, given special attention to educational writers and theory transmitted
by them, in their works; d) the investigation of the importance given to the Didactic as
teaching resource and to Agricultural Club activities, oriented to introduce in the rural
population, modern and scientific agricultural practices.
This research is oriented by a documental and historical methodological perspective. It is
based on theoretical and methodological assumptions of the contemporary historiography, in
which the concept of “historical time”, as posed by Jacques Le Goff (History and Memory,
2003), by José Carlos Reis (Tempo, História e Evasão, 1994) and by Boaventura de Souza
Santos (A Gramática do Tempo, 2006), has been taken into the analysis. In planning the
present, these authors propose the concepts of, a) “the opposition between past and present;”
b) the opposition “between the field experience and an expected horizon, c) and “the
contraction or extortion of future or past time”.
The major sources for data collection were: the D. Helena Antipoff Documentation and
Research Center; the library and archive of the Normal School D. Joaquim Silvério de Souza,
the UFMG and PUC/MINAS universities libraries. In theses places were consulted rural
education journals, magazines, and references books, published during the 50
th
and 70,
th,
a
school life registration book, an inventory school book of equipments and objects used,
several documents enacted by educational authorities, and speeches made in different
occasions by schools planners, teachers and students. Besides these data, two interviews were
also made with a priest, who worked as a teacher, in the Normal School investigated.
Keywords: Teachers' Education; Rural Education Policies, Agricultural Normal School.
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 - Saldo migratório em três unidades da Federação entre 1950-1980.................... 32
Quadro 2 - População total, crescimento vegetativo e migração em três capitais, entre 1940 e
1950...................................................................................................................................... 33
Quadro 3 - População rural e urbana do Brasil da data dos recenseamentos de 1940, 1950,
1960, 1970.......................................................................................................................... 42
Quadro 4 - algumas cidades e localidades de onde vinham moças para estudar na Escola
Normal de Conselheiro Mata............................................................................................. 109
Quadro 5 - distribuição do tempo pedagógico da Escola Normal de Conselheiro Mata em
1951.................................................................................................................................... 114
Quadro 6 - distribuição do tempo das disciplinas da Escola Normal de Conselheiro Mata em
1951..................................................................................................................................... 120
Quadro 7 - Elementos básicos de Didática: Aluno, Mestre, Matéria, Método, Objetivo... 153
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Ilustração 1 - Comunidade escolar da Escola Normal D. Joaquim......................................... 45
Ilustração 2 - Capa do livro de Abgar Renault " A Palavra e a Ação................................... 49
Ilustração 3 - Ao meio, a professora Helena Antipoff recebe homenagens........................... 55
Ilustração 4 - Jornal “Folha de Minas” divulga investimentos do governo JK para conclusão
da obras da Escola Normal de Conselheiro Mata.................................................................. 56
Ilustração 5 - Capa do livro de Robert King Hall.................................................................... 62
Ilustração 6 - Capa dos "Anais do Oitavo Congresso Brasileiro de Educação".................... 65
Ilustração 7 - Normalistas organizadas em fila...................................................................... 67
Ilustração 8 - Página do livro de currículo e carga horária da Escola Normal, ano de 1956... 71
Ilustração 9 - Recorte de jornal divulga a inauguração da Escola Normal............................ 76
Ilustração 10 – No "livro de recortes de jornal" da Escola Normal, diz que “a vitória do
general Eisenhower fortalecerá os laços de amizade entre Brasil e Estados Unidos da
América”................................................................................................................................. 91
Ilustração 11 - Desfile das Normalistas pela comunidade...................................................... 95
Ilustração 12 - Normalista em posição de espera.................................................................... 99
Ilustração 13 - Nota fiscal da “livraria Francisco Alves” – à direita: página do livro de
controle diário de consultas de obras na biblioteca Dr. Abgar Renault................................ 122
Ilustração 14 - Capa do "Boletim Claparède”....................................................................... 137
Ilustração 15 - Folha de rosto do livro do pedagogo cubano A.M. Aguayo...................... . 139
Ilustração 16 - Normalistas em aula ..................................................................................... 147
Ilustração 17 - Capa do boletim ”Escola Rural”, impresso propagador de várias experiências
pedagógicas realizadas nas Escolas Normais Rurais ........................................................... 156
Ilustração 18 - Capa do livro de Antônio D’Ávila “Praticas Escolares ............................... 161
Ilustração 19 - Capa do livro de Roberval Cardoso “Grêmios para o Meio Rural............. . 163
Ilustração 20 - Cópia fotografada da primeira página de um diário, de 28-4-1962.............. 166
Ilustração 21 - Página do livro de atas do "Clube Pedagógico San Jean Batiste de La Salle",
1961- à direita: capa do livro de atas do “Clube Agrícola Dr. Roberval Cardoso”.............. 175
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
Abreviaturas:
Ed. - Editor
Org. - organizador
Doc. - documento
Siglas:
SEEMG. - Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais
RCNER. - Revista Nacional de Educação Rural
PREFP. - Plano de Recuperação Econômica e Fomento da Produção
AOCBE. - Anais do Oitavo Congresso Brasileiro e Educação
LRJ. - Livro de recortes de jornal da Escola Normal Regional D. Joaquim Silvério de Souza
CDPHA. - Centro de Documentação e Pesquisa Helena Antipoff
IOR. - Instituto de Organização Rural
INEP. - Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos
SSR. - Serviço Social Rural
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................. 16
1.1 Aportes Metodológicos: pesquisa histórico-documental................................................ 19
1.2 Fontes Pesquisadas........................................................................................................... 22
1.3 As etapas no percurso da pesquisa............................................................................................... 24
1.4 A organização da dissertação........................................................................................... 28
2 A ESCOLA NORMAL RURAL E O CONTEXTO DA CRISE SOCIAL E MATERIAL,
EM MINAS GERAIS ENTRE 1950 - 1970................................. ........................................ 29
2.1 Os limites da vida na roça: o empobrecimento das zonas rurais..................................... 31
2.2 A Força centrípeta das cidades e o Êxodo Rural............................................................. 38
2.3 O debate e as proposições para a Educação Rural no Estado.......................................... 44
2.4 O Ensino Rural em Minas............................................................................................... 47
2.5 Um Programa Geral de Educação Rural para Minas....................................................... 55
2.6 O Instituto de Organização do Meio Rural ..................................................................... 60
2.7 A “especialização” da Mestra Rural o Ensino Normal em Minas Gerais....................... 66
2.8 A Sede do Ensino Normal Rural: A Fazenda do Rosário................................................ 70
3 A ESCOLA NORMAL REGIONAL RURAL D. JOAQUIM SILVÉRIO DE
SOUZA DE CONSELHEIRO MATA
........................................................................ 75
3.1 O casarão da escola: entre suntuosidade e a singeleza...................................................... 76
3.2.. Estabelecimento Rural para a difusão de práticas da “escola ativa”............................... 80
3.3 A administração da Escola Normal de Conselheiro Mata............................................... 86
3.4 A Escola Normal de Rural de Conselheiro Mata: das reminiscências ao porvir............. 89
3.5 Dos primórdios da Escola Normal no Brasil à seleção das futuras regentes de ensino do
Meio Rural............................................................................................................................ 96
4 A FORMAÇÃO DAS REGENTES DE ENSINO NA ESCOLA NORMAL REGIONAL
RURAL D. JOAQUIM SILVÉRIO DE SOUZA................................................................ 111
4.1 A organização do tempo e do espaço de formação na Escola Normal.......................... 113
4.2 A formação pedagógica na Escola Normal Rural:
autores, obras e teoria educacional...................................................................................... 121
4.3 Da teoria às práticas de ensino: as Didáticas. ............................................................... 139
4.4 O Clube Agrícola:
uma formação científica para a prática de uma nova agricultura........................................ 154
4.4.1 As relações entre as Normalistas de Conselheiro Mata e o Clube Agrícola Escolar:
1940-1950........................................................................................................................... 170
5. Conclusões: A ruralização da normalista ou a normalista para o ruralismo?.................. 179
REFERÊNCIAS.................................................................................................................. 186
16
1 INTRODUÇÃO
Pensar o passado contra o presente, resistir ao presente, não para um retorno, mas
em favor, espero, de um tempo que virá.
Nietzsche, 1988
1
.
A racionalização da atividade comunitária não tem como conseqüência uma
universalização do conhecimento, com relação às condições e às relações desta
atividade, mas quase sempre produz efeito contrário. O “selvagem” conhece
infinitamente mais sobre as condições econômicas e sociais da sua própria
existência do que o civilizado; no sentido ordinário do termo, sabe sobre as suas.
Weber, 2003
2
.
Esta dissertação se propôs a investigar o curso de Regentes de Ensino para a zona
rural, constituído e implantado na Escola Normal Regional D. Joaquim Silvério de Souza
situada no distrito de Conselheiro Mata pertencente à Diamantina.
O curso foi motivado pela política de recuperação econômica implantada pelo governo
de Milton Campos (1946-1950) e apoiada pelo advogado e professor Abgar Renault. A
comunidade de Conselheiro Mata abrigou, juntamente com outras localidades do Estado,
cursos de Aperfeiçoamento para Professores Rurais que duravam aproximadamente três e, em
regime de internato, eram ofertados pela Secretaria de Educação. O Curso Normal, inserido
nessa instituição, integra um conjunto de políticas públicas que objetivavam fazer do
professor do meio rural um agente de transformação desse meio.
O interesse pelo estudo dessa Instituição veio à tona após a conclusão do curso de
especialização em filosofia, realizado na Universidade Federal de Ouro Preto, no período de
2002- 2004. Nesse curso, adquiri conhecimento sobre a obra do historiador Michel Foucault;
em destaque, seu pensamento sobre as “Instituições Disciplinares”. O autor, ao traçar e
identificar semelhanças entre prisões, escolas, fábricas, hospitais e quartéis, na sociedade
ocidental moderna, classificou-as como Instituições produtoras de “corpos dóceis”.
Considerou que essas organizações, incluindo a sala de aula, os pátios das fábricas e dos
quartéis, mais ou menos três séculos, utilizavam estratégias de controle e vigilância sutis,
com o objetivo de forjar pessoas assujeitadas a valores morais, econômicos e culturais.
1
DELEUZE, Gilles. Foucault. – São Paulo: Brasiliense, 1988, p. 127.
2
ARON, Raymond. As etapas do pensamento sociológico. - 6ª ed. - São Paulo: Martins Fontes, 2003, p. 725.
17
A fim de desenvolver a monografia deste curso, foram visitadas algumas Instituições
para melhor visualização dos ambientes categorizados por Foucault. Dentre elas, es
tava a Escola Normal Regional D. Joaquim Silvério de Souza. Ao término do curso de
especialização, foi-me sugerido o estudo de uma realidade empírica, para avaliar o valor
interpretativo dos pressupostos teóricos e das categorias foucaultianas.
O interesse pelo estudo da Escola Normal foi, também, reforçado pela constatação de
que ainda existe na região uma memória acerca dessa escola, a qual é elevada à qualidade de
estabelecimento de ensino exemplar, uma espécie de patrimônio histórico digno de ser
lembrado por aqueles que conviveram com essa estrutura cultural. Pode-se dizer que tal
patrimônio foi construído na década de 1950 e se integrou à memória local como uma
instituição social cujo valor e relevância educacional perdeu significação em 1971, após a
promulgação do Decreto Lei Nº. 5692/71, quando as características especiais dos Cursos
Normais foram modificadas.
No entanto, nota-se que o lugar de destaque e vanguarda da cultura pedagógica
regional, outrora assumido por essa instituição, escasseou-se significativamente após a
vigência do decreto, desencadeando um processo de esquecimento de suas práticas e
memórias, o que reforça a necessidade de se estudar essa Instituição.
Na busca de apreender e situar esse estabelecimento e curso, no contexto em que
foram criados, foram observadas as continuidades, persistências e rupturas no conjunto de
maneiras de processar a formação e a especialização da mestra rural. Em seguida, analisaram-
se os modelos pedagógicos que circularam no seu interior, que colaboraram nas lógicas de
representação e auto-representação do que seria o docente do ensino primário rural e os
argumentos de representação da população infantil da zona rural.
Procurou-se também compreender as condições que possibilitaram a materialização da
“Escola Normal Regional Rural D. Joaquim Silvério de Souza”. Para tanto, foram
identificadas as condições materiais e equipamentos postos em ação nesse estabelecimento
estudado; currículo idealizado e verificadas as práticas ou didáticas de ensino ligadas à
formação peculiar das futuras mestras-rurais, bem como o pensamento pedagógico que
fundamentava essa formação. Elegemos esses elementos do Curso Normal por considerar que
os mesmos propiciariam um estudo do significado da formação do professor rural para os
grupos sociais a que se destinavam.
O interesse por esse estudo ganhou nova dimensão dado que, nas últimas décadas,
principalmente no campo das ciências sociais e da história da educação, tem ocorrido uma
revisão do conhecimento acumulado nessas áreas, em razão da natureza prescritiva e
17
teleológica que esses campos de conhecimento vinham apresentando historicamente. O
movimento denominado por Buffa (2002) de “história cultural da formação docente e
instituições educacionais” é um meio fértil pelo qual se pode estudar a filosofia e a história da
educação brasileira, seus valores, e as políticas que estão subjacentes às instituições
educacionais. Essa perspectiva possibilita integrar o curso e as representações por ele
produzidas, em um contexto mais amplo o que, como argumentou Magalhães, nos permite
contextualizá-lo, (re)escrever-lhe o itinerário de vida, conferindo-lhe sentido histórico (Junior,
2002).
Acredita-se, com base nesses argumentos, que o conhecimento histórico dos cursos de
formação de professores e das instituições educacionais possa alargar e aprofundar a
compreensão do papel assumido pela educação escolar e pelo professor nos diferentes
contextos e regiões em que foram atuantes. Defende-se que o estudo das instituições
educacionais, como objeto de conhecimento do fenômeno da educação formal e da formação
docente especializada, numa abordagem histórico-sociológica, seja um acontecimento ainda
recente; portanto, digno de empreendimentos dessa monta (Mafra, 2003; Junior, 2002).
Nota-se que boa parte dos estudos, até então realizados, tem priorizado as instituições
e cursos normais situados em determinados períodos e espaços geográficos, a saber,
instituições que foram edificadas e instaladas pelo Movimento Republicano das primeiras
décadas do século XX, nas grandes cidades brasileiras. Estudos que remontam ao período
imperial e, em menor número, os que abordam temporalidades pós-1930. (Junior, 2002;
Souza, 2000). Pode-se constatar, segundo Tanuri (2000) e Werebe (1970), que dentre as
inúmeras Escolas Normais Regionais existentes em Estados do Nordeste e Minas Gerais entre
1940 e 1970, muitas não chegaram ainda a ser estudadas.
O interesse pelo tema da formação de professores para a zona rural e seus
estabelecimentos de formação ainda se mostra bastante tímido entre os pesquisadores. A título
de exemplo, vale citar o Banco de Teses da Capes, no qual é discriminado algo em torno de
dez estudos sobre o assunto história da formação de professores para o meio rural. Além
desses, vale ressaltar que, no início desta década, Faria Filho e Catani (2001) realizaram um
estudo sobre os trabalhos de História da Educação apresentados no GT de História da
Educação da ANPEd (1985 2000). Esse inventário mostrou dois momentos na história da
produção do GT: um primeiro, entre 1984 a 1989; e um segundo de 1990 a 2000. O estudo
revela que o aparecimento da categoria “formação de professores”, como objeto de
investigação histórica, ocorreu, pela primeira vez, na reunião da ANPEd, em 1996. Do
montante de 192 trabalhos examinados, os pesquisadores destacaram que 21 enquadraram-se
18
na categoria profissão docente, embora o texto não esclareça quais foram os aspectos
abordados.
De forma semelhante, André; Simões; Carvalho e Brzezinski (2002), ao examinarem
284 dissertações e teses que pesquisaram a formação de professores, defendidas entre 1990-
1996, apontaram que, 216 trataram do tema da formação inicial, 42 contemplaram a questão
da formação continuada e, 26 abordaram o tema da identidade e da profissionalização
docente. Dentre as temáticas menos abordadas pelos pesquisadores nestes trabalhos,
destacavam-se: a formação de professores para o ensino superior, a educação de jovens e
adultos, o ensino técnico, os movimentos sociais, as crianças em situação de risco e o ensino
rural.
A escassez de estudos nessa área, portanto, reforçam o interesse e a relevância desta
pesquisa, não por resgatar parte da memória desse curso e dessa instituição, mas,
sobretudo, por pesquisar sobre a história da formação de professor para o meio rural,
categoria de estudo que, segundo observou Andrade (2006), quando pesquisada, discute mais
especificamente a questão do professor leigo. Damasceno e Beserra citado por Andrade
(2006, p. 19) explicitam a raridade do uso de tal categoria. Para eles
a proporção média ao longo do período pesquisado (1981-1998) é de doze
trabalhos na área de Educação Rural para mil trabalhos nas demais áreas da
Educação. Uma porcentagem dezessete vezes inferior à do número de habitantes no
campo em relação ao da cidade, se tomarmos como referência os dados estatísticos
do IBGE do ano 2000, de acordo com os quais a população rural representa
18,75% da população brasileira. A porcentagem média de produção de dissertações
e teses cai de 2,1%, na década de 1980, para 0,9% na década de 1990, o que revela
o crescente desinteresse por esta área de estudos
3
.
A partir das questões e argumentos apontados acima, esta pesquisa articulou-se para
responder as seguintes perguntas:
1) Em meio às políticas públicas promulgadas para a educação do homem do campo,
que argumentos justificaram a proposta da Escola Normal Regional D. Joaquim Silvério de
Souza?
2) Como se constituiu e se concretizou o projeto de formação de professores nessa
escola em termos da organização material do curso e da elaboração de um currículo
“específico” para regentes de ensino de escolas rurais?
3
Assim mostraram “Damasceno e Beserra (2004) no artigo, “Estudos sobre Educação Rural no Brasil: Estado da Arte e
Perspectivas”, em que mapeiam e discutem o conhecimento produzido na área da Educação Rural, nas décadas de 1980 e
1990, com o objetivo de esboçar o “estado da arte” neste campo de investigação. Tendo como fontes a produção discente de
mestrado e doutorado do banco de resumos de dissertações e teses da Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em
Educação ANPED; os periódicos acadêmicos nacionais, e os principais livros enfocando a temática da Educação Rural
publicados no período, as autoras apresentam e discutem, neste artigo, as temáticas de estudo mais recorrentes, o “lócus” de
sua produção, as tendências atuais e as temáticas não exploradas. (ANDRADE, 2006, p.18).
19
3) Como se constituiu e que papel desempenhou o Clube Agrícola, no interior dessa
formação e dessa instituição?
Considerando as perguntas acima relacionadas, a investigação aqui desenvolvida
procurou alcançar os seguintes objetivos:
1)Analisar e compreender os argumentos que perfaziam a proposta de implantação da
Escola Normal Regional D. Joaquim Silvério de Souza em meio às políticas públicas para a
educação no meio rural.
2) Caracterizar a concepção de formação de professores da escola, como elemento de
mudança social e econômica, a partir de autores e obras difundidas entre as futuras mestras
rurais;
3) Apontar e avaliar os elementos constitutivos do Clube Agrícola, no interior dessa
formação, com vistas a identificar e caracterizar o papel social desempenhado pelo Clube na
formação da imagem profissional das mestras rurais e na representação que estas deteriam da
população a ser educada pelas mesmas.
1.1 Aportes Metodológicos: pesquisa histórico-documental
Acender a ciência é rejuvenescer espiritualmente, é aceitar uma brusca
mutação que contradiz o passado.
Gaston Bachelard, 1996.
Para responder as questões acima levantadas e atingir os objetivos mencionados,
optou-se pela realização de uma pesquisa qualitativa, histórico-documental que Bogdan e
Biklem (1994), assim defendem
a pesquisa qualitativa tem o contexto como sua fonte direta de dados e o
pesquisador como seu principal instrumento, de modo que pode favorecer ao
pesquisador a percepção das circunstâncias particulares em que um determinado
objeto se insere; os dados coletados permitem que o material possa se constituir
em uma descrição muito rica das situações observadas; a preocupação com o
processo é muito maior do que com os resultados, pois o pesquisador procura ver
como o problema se manifesta nas atividades dos sujeitos; a análise dos dados
tende a seguir um processo indutivo, assim o pesquisador não tenta confirmar
hipóteses pré-estabelecidas, pois as abstrações se confirmam a partir do exame dos
dados (p.48-50).
A pesquisa de natureza histórica, qualitativa e documental de acordo com Duby
(1988), exige do pesquisador exumar os sistemas ideológicos, de pensamento e/ou de
20
representação da poeira do passado” e “juntar e interpretar uma quantidade de sinais
esparsos”. Explicita ele que entre as fontes documentais mais acessíveis, figuram
destacadamente o vocabulário de narrativas, tais como:
das obras dramáticas, das correspondências, dos livros de razão científica, das
liturgias institucionais, das ordenações, das atas jurídicas e outras, é necessário
nesta massa descobrir os termos reveladores das qualidades, e mais que as
palavras, as apresentações, as metáforas e a maneira pela qual os vocábulos se
acham associados; aqui se reflete inconscientemente a imagem de tal grupo, num
dado momento, a qual tem de si próprio e dos outros.(p. 136)
.
Este tipo de pesquisa orienta ainda que a recolha de dados talvez possa ocorrer entre
os documentos não escritos, pois
a representação ideológica encontra uma expressão por vezes mais direta e mais
rica nas articulações de signos visíveis”. Os emblemas, os costumes, adornos,
insígnias, gestos, o quadro da ordem das festas e das cerimônias, a maneira de
organizar o espaço social trazem o testemunho de uma certa ordem imaginada do
universo, por um determinado agrupamento social (DUBY, 1988, p. 136).
Foi necessário, também, articular a essa abordagem algumas categorias conceituais
que, aparentemente, ofereciam uma eficiente capacidade interpretativa do objeto em questão.
Para isso, lançamos mão do livro organizado por Cunha (2000), no qual figuram as origens do
conceito de cultura escolar, que foi inventariado de forma exemplar por Souza (p. 3-27).
Nesse artigo, a pesquisadora esboçou as idéias de teóricos como Vinão Frago (1994),
Dominique Julià (1993), Chartier (1990), Chervel (1990), Herbrard (1990), Goodson (1988,
1997) entre outros, sobre a “cultura escolar”. Nesta pesquisa, essa categoria será parcialmente
abordada a partir das definições elaboradas por Vinão Frago e Dominique Julià,
respectivamente;
Práticas e condutas, modos de vida, hábitos e ritos, a história cotidiana do fazer
escolar-objetos materiais, função, uso, distribuição no espaço, materialidade
física, simbologia, introdução, transformação, desaparecimento... - e modos de
pensar, bem como significados e idéias compartilhadas (VINÃO FRAGO 1994,
p.4).
Um conjunto de normas que definem os saberes a ensinar e as condutas a inculcar
e um conjunto de práticas que permitem a transmissão desses saberes e a
incorporação desses comportamentos, saberes e práticas estão ordenados de
acordo com as finalidades que podem variar segundo as épocas, as finalidades
religiosas, sociopolíticas ou simplesmente de socialização. Normas e praticas não
podem ser analisadas sem se levar em conta o corpo profissional, os agentes que
são obrigados a obedecer a essas normas e, portanto, a pôr numa obra os
dispositivos pedagógicos encarregados de facilitar a sua aplicação, o saber, os
professores. (DOMINIQUE JULIÀ 1993, p.4).
21
A essa conceituação somamos a definição de instituições educacionais” apresentada
por Araújo e Junior (2002). Nessa obra, a categoria está inserida no campo de pesquisa que
recebeu a influência da historiografia francesa conhecida por Nova História” e do
“materialismo cultural” dos historiadores ingleses, do pós 1950. Dentre outros, o autor
salientou a contribuição de Justino Magalhães (1996), historiador da educação portuguesa que
ao pesquisar as Instituições Educativas defende que
a abordagem dos processos de formação e de evolução das instituições educativas
constitui um domínio do conhecimento historiográfico em renovação no quadro da
História da Educação. Uma renovação em que novas formas de questionar-se
cruzam com um alargamento das problemáticas e com uma sensibilidade acrescida
à diversidade dos contextos e à especificidade dos modelos e práticas educativas.
Uma abordagem que permita a construção de um processo histórico que confira
uma identidade às instituições educativas. [...] Compreender e explicar a
existência histórica de uma instituição educativa e sem deixar de integrá-la na
realidade mais ampla que é o sistema educativo, contextualizá-la, implicando-a no
quadro de evolução de uma comunidade e de uma região, e por fim sistematizar e
(re)escrever-lhe o itinerário de vida na sua multidimensionalidade, conferindo um
sentido histórico(199, p. 19-20)
Com essas leituras, percebeu-se que os conceitos de cultura escolar e de instituições
educativas, conforme explicitados acima, seriam fundamentais para a análise da Escola
Normal Regional Rural D. Joaquim Silvério de Souza. Consideraram-se ainda as idéias de
Monarcha (1999) sobre os diferentes sentidos” atribuídos a uma dada realidade escolar pelos
seus contemporâneos e ulteriores, a partir de urgências sociopolíticas geradas por seu
presente”. (p.15). Outro excerto desse autor que serviu de orientação diz que “o passado está
irremediavelmente perdido; o que resta do passado “verdadeiro/real” é um sistema de
representações que seleciona e retém aspectos do objeto representado, guardando, portanto,
relações de semelhança e diferença com esse mesmo objeto”. (p.15). Por essa influência foi
inserido o conceito de tempo histórico para apreciar os sentidos atribuídos ao objeto em
estudo, pelos sujeitos que, de uma forma ou de outra, ligavam-se a ele.
Portanto, as significações perspectivadas que foram atribuídas ao curso normal rural
serão aqui analisadas, atentando para as observações feitas por Le Goff (2003, p. 224).
Segundo ele, na segunda metade do século passado, passou-se a viver e a ver o mundo de
forma um tanto ambígua, ou seja, “entre a angustia atômica e a euforia do progresso
científico e técnico, voltava-se para o passado com nostalgia e, para o futuro, com temor ou
esperança”. Em outras palavras, conforme argumentou Koselleck citado por Reis (1994), o
conhecimento histórico de um determinado fenômeno implica a percepção, na documentação
em análise, de como os sujeitos que vivenciaram e registraram aquele presente, trataram, ao
mesmo tempo, a experiência (passado atual) e a espera (futuro atualizado no presente) como
22
instrumentos de orientação para nomear tal realidade. Assim, é a tensão entre experiência e
espera, conclui Koselleck, que suscita diferentes soluções e engendra o tempo histórico”.
(Reis, 1994, p. 83).
Segundo Reis (1999) deve-se considerar em cada presente, “a diferença entre passado
e futuro, entre campo de experiência e horizonte de esperaé posta em relação, no instante
em que se vai atribuir um determinado sentido à realidade em que se está interessado, a qual
reage-se contra ou a favor. Assim, torna-se possível apreender as noções de tempo que regia a
imaginação de uma determinada geração. O pesquisador afirma ainda que o presente exige
de seus indivíduos a reinterpretação do passado para se representar, se localizar e projetar
o seu futuro” (p. 9).
De certa forma, inspirado nesta caracterização de tempo histórico, Santos (2006)
argumenta sobre como se criou, no século XX, uma imaginação e uma engenharia de controle
do tempo, de forma a se elogiar a mudança, ao se argumentar de forma valorativa em defesa
de um dado futuro. Para ele, a convicção moderna de uma seqüência lógica da ignorância
para o saber é também a seqüência temporal do passado para o futuro”. A hegemonia de
concepções como progresso e civilização “fez com que o futuro [...] passasse a ser concebido
como um tipo de ordem”. (2006, p. 86). E, naturalmente, o passado como uma espécie de
caos.
1.2 Fontes Pesquisadas:
Com estas noções conceituais, partimos para identificar os documentos disponíveis e
os procedimentos que nos possibilitariam responder as indagações a que nos referimos
anteriormente. Para tanto, identificamos documentos e fizemos uso e dados coletados nos
seguintes arquivos:
A - Arquivo da Escola Normal Regional D.Joaquim Silvério de Souza, Diamantina, MG.
Neste arquivo foram pesquisados os seguintes documentos:
Inventário do Curso N. Regional “D. Joaquim Silvério de Souza”: C. Mata-1950;
Livro de atas das reuniões dos professores da Escola Normal ‘D. Joaquim Silvério de
Souza - 1951;
23
Livro de registro de currículo e carga horária da Escola Normal Rural! = D. Joaquim
Silvério de Souza - 1951-1965;
Livro de registro das aulas dadas pelos professores do Curso Normal Regional “D.
Joaquim Silvério de Souza” e demais atividades a que se ocupam as alunas sob a
assistência das professoras da Escola de Conselheiro Mata – 1951;
Livro de lançamento de atas das reuniões do Clube Pedagógico “San Jean Batiste de La
Salle” da Escola Normal Regional “D. Joaquim Silvério de Souza” de Conselheiro Mata-
1961;
Livros de atas do Clube Agrícola número “279” Dr. Roberval Cardoso – 1954 -1956;
Livro de Registros da Biblioteca Dr. Abgar Renault da Escola Normal Rural D. Joaquim
Silvério de Souza – 1953;
Diários manuscritos pelas normalistas -1952-1970;
Livro de recorte de jornais - [1954?]. (data aprox.);
B - Arquivo do Centro de Documentação e Pesquisa Helena Antipoff CDPHE, Ibirité,
MG. Documentos pesquisados:
Clube Agrícola: Aspectos legais. Lei Estadual . 2610, de 08/01/62; Lei Federal de .
5692/71; Resolução nº. 138/72 do CEE [pasta com vários documentos de diferentes
datas];
Criadas duas Escolas Normais: O Governo Milton Campos sancionou ontem a Lei n. 291,
criando dois cursos normais especializados, 1949;
Decreto-Lei. 3.112, de 3 de agosto de 1949;
Lei Orgânica do Ensino Normal (Decreto-lei n. 8.530, de 2 de janeiro de 1946);
Lei nº. 5.692: 11 de agosto de 1971;
Conferências Interamericanas de Educação: recomendações (1943-1963);
Seminário Inter-Americano de Educação Primária, 1950;
Questionário para candidatos ao Curso Normal Regional, 1949;
Ficha de Saúde - Curso Normal Regional, 1949;
Carta aos senhores Prefeitos - Serviço de Orientação Técnica do Ensino Primário e
Normal em zonas rurais. Belo Horizonte, julho de 1950;
C - Acervo da Biblioteca da Faculdade de Economia da UFMG.
Plano de Recuperação Econômica e Fomento de Produção: Exposição. - vol. 1, 1947;
24
Depoimentos colhidos:
Maria de Lourdes Moura, ex-aluna do curso de aperfeiçoamento e ex-professora da
Escola Normal D. Joaquim Silvério deSouza.
José Marques das Aleluias, padre e ex-professor da Escola Normal D. Joaquim
Silvério deSouza.
Professor Muniz, atual diretor da Escola Estadual D. Joaquim Silvério de Souza.
Senhora Zita: mãe de família nos anos de 1960 que planejava enviar suas filhas para a
Escola Normal de Conselheiro Mata.
Acervos bibliográficos e outros:
Biblioteca da Faculdade de Educação da UFMG;
Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais;
Biblioteca da Faculdade de Filosofia e Letras de Diamantina;
Bibliotecas particulares;
Acervos particulares;
1.3 As etapas no percurso da pesquisa
No desenvolvimento da pesquisa, inicialmente fez-se um levantamento bibliográfico e
seleção de obras que abordavam o tema da formação de professores para a escola primária e
que haviam sido publicadas entre os anos de 1930-1970. Foi considerado como princípio para
a seleção: características físicas e nomes de autores que constavam no “Livro de Registros da
Biblioteca” da Escola Normal Rural D. Joaquim Silvério de Souza.
Catalogaram-se, simultaneamente, os documentos do arquivo da Escola Normal em
Conselheiro Mata, para utilização posterior. A autenticidade física dos documentos e a
originalidade de suas informações foram averiguadas. Selecionaram-se para a pesquisa
reportagens jornalísticas que foram recortadas e colecionadas pela instituição
4
, juntamente
4
“Nesta perspectiva entende-se que a imprensa, ligada à educação, constitui-se em um corpus documental de
inúmeras dimensões, pois, consolida-se como testemunho de métodos e concepções pedagógicos de um
determinado período. Como também da própria ideologia moral, política e social, possibilitando aos
25
com outras peças do acervo como, por exemplo, livros de atas, livros de registros das
atividades pedagógicas e burocráticas referentes ao curso de formação de professor da
Instituição e diários escritos pelas normalistas. Esse colecionamento norteou-se pela
identificação de datas de redação e publicação dos documentos, local de sua construção de
acordo com as características de seus autores em relação à temática, isto é, se esses eram
membros efetivos do curso ou das Instituições envolvidas na implantação do mesmo. Vale
dizer que o acervo da Escola Normal em Conselheiro Mata ainda não passou por um
tratamento especializado para garantir sua preservação e condições eficientes de pesquisa.
A identificação da documentação foi auxiliada por ferramentas interpretativas que
mais recentemente disputavam as pesquisas sobre essa temática, a saber, as pesquisas sobre
cultura escolar, instituições educativas e formação de professores. Partimos de modelos
interpretativos disponibilizados por autores como Buffa; Pinto (2002); Buffa; Nosella (1996;
2002); Monarcha (1999); Muller (1999); Pereira (1963) e Vidal (2001).
As apreciações desse material mostraram as características dos aspectos subjetivos e
objetivos, daqueles que conceberam e distribuíram idéias acerca das necessidades do curso.
As informações contidas na documentação foram relacionadas com as coletadas na biblioteca
da Faculdade de Educação e Faculdade de Economia da Universidade Federal de Minas
Gerais, que esclareciam sobre políticas educacionais e econômicas para o Estado, na ocasião.
Procuram-se evidências que conduzissem aos problemas enfrentados pelo governo mineiro e
pelos teóricos da educação sobre a população rural.
Foi possível identificar o problema do êxodo rural, abordado no livro do Secretário de
Educação, Abgar Renault, intitulado “A Palavra e a Ação”, de 1952, no qual se reuniram
dezenas de discursos que estabeleciam relações entre falta de educação, baixo
desenvolvimento e abandono das zonas rurais e um registro amplo dos planos para educação
rural no Estado. Foi identificado outro livro com a mesma estrutura, que escrito pelo
governador Milton Campos (1951), intitulado “Compromisso Democrático”, no qual os
mesmos temas foram tratados. Além desses, pesquisamos o “Plano de Recuperação
Econômica e fomento da Produção”, de 1947, elaborado por uma equipe especializada e
organizada pelo governo de Milton Campos, que forneceu várias informações relacionando
desenvolvimento econômico e instituições educacionais ligadas à produção agrícola.
historiadores da educação análises mais ricas a respeito dos discursos educacionais, revelando-nos, ainda em que
medida eles eram recebidos e debatidos na esfera pública, ou seja, qual era sua ressonância no contexto social”
(Carvalho,
2002).
26
Pesquisou-se ainda o acervo da Fazenda do Rosário, atualmente organizado no Centro
de Documentação e Pesquisa Helena Antipoff - CDPHA, onde foi localizado um rico
material. Notadamente, uma publicação realizada pelo próprio Centro, na qual se reuniam os
escritos da educadora Helena Antipoff sobre educação rural e boa parte da bibliografia
pedagógica utilizada nas Escolas Normais, mencionadas no “Livro de Registros da
Biblioteca” da Escola Normal Rural D. Joaquim Silvério de Souza.
Através desse acervo encontrou-se um número expressivo de evidências que
permitiram conhecer melhor a feição das idéias propostas para o curso em estudo e suas
posições ideológicas entre outros aspectos.
Na segunda etapa, examinaram-se as idéias pedagógicas que orientaram o tipo de
formação ofertada pelo curso, a partir do estudo da bibliografia levantada no CDPHA, onde
foram identificados os principais veículos bibliográficos
5
, através dos quais as teorias sobre
práticas didáticas e conceitos pedagógicos foram comunicadas às normalistas. Ou seja,
Bibliografia sobre o método e a missão da escola elementar, o papel do professor e situação
da criança do meio rural. Em meio a essas obras, vale sublinhar a presença do “Boletim dos
cursos de aperfeiçoamento para professores rurais”, publicado a partir de 1948 e a “Revista da
Campanha Nacional de Educação Rural”, publicada a partir de 1954. Cumpre destacar
também as obras: “Didática da Escola Nova”, escrita por Aguayo, pedagogo cubano e
publicada no Brasil em 1935 e os três volumes escritos por R. D’Ávila intitulados “Práticas
Escolares: de acordo com o programa de prática de ensino do Curso Normal e com a
orientação do Ensino Primário”, de 1954. Foram relacionados os dados coletados nessa
bibliografia à noção Desenvolvimentismo” e mudança em voga na época, notadamente,
sobre o perfil da educação para o desenvolvimento econômico.
Na terceira etapa, examinaram-se as informações coletadas no arquivo da Escola
Normal D. Joaquim Silvério de Souza e cotejaram-se dados dos livros de ata e dos
documentos legislativos, de forma a associá-los ao contexto. Essa manobra apontou a
necessidade de compreender melhor as informações disponibilizadas por esses documentos.
Para isso, colhemos depoimentos de dois ex-professores do Curso Normal de Conselheiro
Mata: professor José Marques das Aleluias e professora Maria de Lourdes Moura. Eles
5
Sobre os impressos: “O uso destas estratégias demonstram que para os dirigentes da instrução pública e
consolidação efetiva das mudanças defendidas pelos idealizadores de reformas e programas de ensino fazia-se
presente na formação de professores. Os impressos (livros, boletins, jornais e revistas) entram como
dispositivos de formação de professores, veiculando novas teorias e métodos pedagógicos, experiências e
sugestões dos professores. Nesta perspectiva, os impressos destacam-se como importantes estratégias de
formação, e de conformação do campo e das práticas escolares”(B
ICCAS
,
2002).
27
relataram várias informações sobre o cotidiano do curso, o que colaborou na interpretação de
outras fontes. Nessa etapa, foram apurados os elementos necessários para compor as relações
entre a concepção pedagógica do curso, isto é, conteúdos e métodos pedagógicos e suas inter-
relações com a ação do Clube Agrícola. Reconstituiu-se parte do patrimônio material,
científico e simbólico utilizado pelas performances especializadas do Clube, no processo de
formação das mestras-rurais.
Na quarta fase, foram analisados os dados coletados das etapas anteriores; documentos
e bibliografia foram justapostos; relacionou-se corpus, teorias e contexto; as semelhanças e
diferenças entre as informações identificadas, juntamente com as características que
particularizavam e assemelhavam o curso a outros cursos normais estudados. As
interpretações basearam-se nos modelos teóricos acima relacionados, notoriamente naqueles
inspirados na historiografia contemporânea. É relevante lembrar que as publicações recentes
nesse campo têm chamado a atenção para o caráter interdisciplinar dessa modalidade de
pesquisa, sobretudo nas relações conceituais entre história e sociologia.
Segundo Magalhães (1998), as pesquisas sobre esse tipo de objeto científico devem
considerar que os processos de formação docente são relações históricas entre uma instituição
em debate e construção com suas especificidades, culturas, públicos e políticas, tomadas nas
suas acepções contextuais, mas também locais. Por outro lado, há, também, os sujeitos e os
agentes, suas práticas, expectativas, representações e apropriações. O mesmo autor ressalta
ainda as categorias fundamentais para essas análises: o espaço (local/lugar, edifício,
topografia); o tempo (calendários, horários - agenda antropológica); o currículo (conjunto de
matérias lecionadas e respectivos métodos, tempos); manuais escolares (construção
apropriação por outros); públicos; culturas; estimulação e resistência; dimensões (níveis de
apropriação e transferência da cultura escolar).
De acordo com Carvalho (1998), é necessário considerar os dispositivos pedagógicos
adotados por um curso no interior de uma instituição, pois podem ganhar vida própria, sendo
objeto de usos não prescritos pelas regras que presidiam sua produção. O que significa que
um mesmo instrumento pode comportar usos muito diferenciados em tempos e espaços
distintos.
28
1.4 A organização da dissertação
Esse percurso de pesquisa resultou num trabalho que se dividiu em introdução e três
capítulos. O primeiro deles dedicado à própria introdução, na qual se apresenta o objeto da
pesquisa, suas razões e o campo em que ela se matricula. Esclarece ainda como a mesma foi
realizada.
O segundo capítulo foi iniciado com a identificação e compreensão das representações
sobre o rurícola e suas condições de sobrevivência da terra, bem como as explicações sobre o
êxodo rural como razão para implantação do Curso Normal Regional Rural D. Joaquim
Silvério de Souza.
No terceiro capítulo, buscou-se entender aspectos da organização material do curso e
do seu corpo administrativo, além das visões de mudança que caracterizavam a “escola
normal renovada”, especializada no recrutamento e na formação de futuras regentes de ensino
para escolas primárias rurais.
O quarto capítulo destinou-se à caracterização da distribuição do tempo na Escola
Normal e a aspectos das idéias de teóricos da educação e de algumas concepções didáticas em
prática na época, especialmente, o Clube Agrícola e suas relações com a organização e a
missão do curso normal rural.
29
2 A ESCOLA NORMAL RURAL E O CONTEXTO DA CRISE SOCIAL E
MATERIAL EM MINAS GERAIS, ENTRE 1950 E 1970
Era Setembro. Era 1950. O dia era 21. O trem da Central do Brasil trazia a
Conselheiro Mata 2 professoras e três alunas para fundar uma nova escola.
Lourdes Moura, 1950.
Julgar as pessoas por seus atos não é julgá-las por suas ideologias; é, também, não
as julgar a partir de grandes noções eternas o Governo, o Estado, a Liberdade, a
essência da política que banalizam e tornam anacrônicas as originalidades das
práticas sucessivas.
Veyne, 1982.
Neste capítulo, procurou-se apreender o contexto histórico-social no qual emergiu,
como evento histórico, a Escola Normal Regional Dom Joaquim Silvério de Souza, entre os
anos de 1950 a 1970. Como parte desse momento, algumas caracterizações foram produzidas
sobre o rurícola, suas condições de vida e suas disposições culturais. Explicitavam,
sobretudo, as péssimas condições de vida em que estava mergulhada essa população em
Minas Gerais, em meados do século passado.
Vale lembrar, contudo, que as características aqui elencadas como explicação das
condições de vida na zona rural foram, em sua maioria, produzidas e colocadas em circulação
por intelectuais e órgãos governamentais do Estado, o que sugere uma determinada
perspectiva, ou ponto de vista acerca do fenômeno observado. Para compor uma imagem do
morador da roça, fez-se uso das descrições feitas por M. Campos (1951), o qual nos seus
discursos enquanto governador, identificou na zona rural mineira, uma crise que será tratada
como um problema de saúde social e econômica do Estado. Analisamos, também, as imagens
descritivas de A. Renault (1952) sobre a escola e as pessoas da roça, para o qual a situação,
em alguns casos, era precária. Além dessas imagens, utilizou-se literatura especializada sobre
o caipira, sobre o êxodo rural e sobre a cidade. Procurou-se, ainda, articular essas informações
às propostas de D.Helena Antipoff (1986; 1992[1947]) sobre escolas especializadas para o
espaço geográfico rural, interiorano. Aproximou-se ainda essa proposta a alguns argumentos
divulgados por técnicos do Governo Federal, por meio da Revista da Campanha nacional de
Educação Rural, publicada a partir de 1954, pelo Ministério da Educação.
Com base nessas informações, discorreu-se sobre as razões do êxodo rural no Estado
de Minas nesse período, o papel da cidade como espaço que, em tese, oferecia boas condições
30
de vida se comparado ao espaço rural e, por isso mesmo, tornou-se o centro das atenções e
pretensões da população rural inquieta.
Em meio a essas argumentações, a seguir, o processo de emergência das idéias que
orientaram o surgimento da Escola Normal Regional Rural D. Joaquim Silvério de Souza será
descrito. A missão a ela atribuída era desacelerar o ritmo do êxodo rural mineiro, a partir do
momento que os professores especialistas em ensino rural entrassem em ação nas escolas
primárias pelo interior do Estado de Minas. Esses novos professores vinham assim simbolizar
um dos principais alvos do esquema para a educação rural montado pelo Estado. Criticava-se,
simultaneamente, a antiga escola rural pela falta de ciência profícua, pelos múltiplos
instrumentos e métodos de ensino e as várias características e heranças de uma educação
escolar de inspiração urbana. Uma instituição, segundo a crítica, praticante de uma visão de
mundo que não admirava, ensinava ou estimulava o trabalho na terra e, portanto, criava
empecilhos para o ingresso da nação brasileira no bloco atualizado das civilizações.
Por fim, este estudo, no seu conjunto, fez uso do conceito de tempo histórico proposto
pela historiografia atual. Esse conceito, segundo o historiador alemão R. Koselleck (1990),
cujas teses têm sido difundidas e defendidas no Brasil pelo professor José Carlos Reis
(UFMG), propõe que o tempo histórico nada mais é que uma situação onde todos os homens,
atravessados por um contexto, naturalmente passam a conjugar simultaneamente duas
dimensões: campo de experiência e o horizonte de espera, na intenção de
encontrarem um sentido para a condição social, política, econômica e cultural em que estão
mergulhados.
Segundo esse princípio, uma geração humana situada historicamente tenderá a
diferenciar-se no seu presente, no passado e no futuro. Desta forma, passado e futuro o
reenviados um ao outro e essa operação tensa e relacional caracteriza e diferencia os fatos
históricos produzidos neste presente. Assim, os indícios deixados por tais fatos permitem
supor: a) que uma relação identitária e valorativa estabeleça-se com a escolha de determinado
passado, desenvolvendo sentidos reacionários e conservadores em relação a uma dada
realidade; b) ou, ao contrário, desenvolvem-se sentidos de ruptura, planejamento, aceleração
do tempo na busca de um outro futuro; c) ou ainda, uma contradição que produz indícios
cujos significados tendem, sincronicamente, para as permanências de modelos
tradicionalmente estabelecidos, e para mudanças e rupturas com os mesmos. Para Reis, então,
cabe ao estudo da história esclarecer como uma dada sociedade estabelece relações com seu
passado e o seu futuro (REIS, 1994; 2003).
31
2.1 Os limites da vida na roça: o empobrecimento das zonas rurais
Para alguns membros dos serviços públicos governamentais do pleito de 1946-1950,
e dentre eles, as professoras, que atuavam em escolas primárias rurais do Estado de Minas
Gerais, as condições de vida do rurícola, nos anos de 1940, estavam decadentes, ou seja, havia
uma dificuldade generalizada na produção de alimentos para a própria subsistência nesse
espaço sócio-econômico. Segundo Echevarria (1969, p. 23), enquanto as cidades cresceram
num ritmo acelerado, a vida rural se desenvolveu num quadro de atraso geral”. As mudanças
e inovações introduzidas na agricultura não alteraram substancialmente as características
tradicionais do sistema. Foi para atuar como aprendiz nesse programa que a professora
Lourdes Moura dirigiu-se para Conselheiro Mata, no ano de 1950.
Lourdes Moura era, na ocasião, professora normalista no meio rural, indicada pela
prefeitura de Santana de Pirapama, município em que trabalhava, para integrar a primeira
turma do Curso de Especialização para professoras primárias rurais, oferecido pela Secretaria
de Educação do Estado de Minas Gerais. Sua realização seria na comunidade de Conselheiro
Mata, zona rural do município de Diamantina, no primeiro semestre do ano de 1950. Segundo
a professora, o curso era parte de uma política mais ampla para a educação da população do
meio rural concretizado pelo governo, na Fazenda do Rosário. No entendimento de
Campos (2003, p. 16)
6
, a partir da escola para crianças excepcionais, em 1940, a Fazenda
do Rosário foi progressivamente enriquecida com novas iniciativas que visavam a integração
da escola à comunidade rural adjacente”. A filosofia educativa rosariana enfatizava, por um
lado, a necessidade de integração à comunidade das crianças recebidas pela Sociedade
Pestalozzi
7
- crianças abandonadas, com sérios problemas de ajustamento. Por outro lado,
buscava-se levar à comunidade rural de Ibirité os benefícios civilizatórios da escola.
Continuou Campos:
Nesse espírito, foram sendo criadas as diversas instituições educativas que vieram
a compor o Complexo Educacional do Rosário: Escolas Reunidas Dom Silvério
(para o ensino primário); Clube Agrícola João Pinheiro (ensino e experimentação
de técnicas agrícolas); Ginásio Normal Oficial Rural Sandoval Azevedo (com
internato para moças); Ginásio Normal Oficial Rural Caio Martins (com internato
para rapazes); Instituto Superior de Educação Rural (Iser), com cursos de
6
Cf. http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40142003000300013
7
Em 1932, Helena Antipoff criou a Sociedade Pestalozzi de Minas Gerais, na Fazenda do Rosário, em Belo Horizonte. Em
1945, a educadora abriu a Pestalozzi do Brasil, no Rio de Janeiro, e em 1948 ajudou a fundar a Pestalozzi de Niterói. Como
missão visava "Contribuir para a melhoria da qualidade de vida através de ações que valorizem o ser humano", por meio de
assistência médico-social, a assistência educacional aos portadores de deficiência e a formação de recursos humanos.
32
treinamento para professores rurais, incluindo a prática no cultivo de lavouras,
hortas, pomares, na criação de animais, e cursos de economia doméstica. Essas
obras, iniciadas pela Sociedade Pestalozzi, obtiveram o apoio do governo estadual,
especialmente a partir da integração do Rosário à Campanha Nacional de
Educação Rural, iniciada pelo governo federal em 1952. (2003, p.16).
Milton Soares Campos, em discurso pronunciado na solenidade de instalação do
programa de aperfeiçoamento profissional, na Fazenda do Rosário em julho de 1948,
anunciou que na “modéstia e na simplicidade desta Fazenda do Rosário, vai ter começo uma
experiência pedagógica e social que poderá, na sua corrente de conseqüências e com trato
do tempo, dar outro sentido à vida rural de Minas Gerais”.
(CAMPOS, 1951, p.137).
O governo de Minas havia planejado que parte desse programa de educação para o meio
rural ocorreria em Conselheiro Mata, às margens da estrada de ferro, a 35 km de Diamantina.
Foram implantados os cursos de aperfeiçoamento profissional para professoras primárias”
que atuavam em escolas rurais. Com tal iniciativa, o Executivo pretendia aproveitar um
edifício ocioso na comunidade, pertencente à Igreja$, a qual situava-se em local acessível aos
professores da região e possuía tamanho adequado ao funcionamento do curso
8
.
Se se considerar os argumentos de Charaudeau (2006) acerca do discurso político,
onde ele afirma que toda palavra pronunciada no campo da política deve ser tomada ao
mesmo tempo pelo que ela diz e não diz, imagina-se que essa palavra (do político) esta
carregada de sentidos submersos. Ao se aplicar essa noção aos comentários do governador
sobre a população rural, constatar-se-á, de certa forma, uma rejeição ao modelo de sociedade
rural existente em algumas áreas no Estado, naquele momento. Para o governo, a perda de
obreiros médios da nossa economia”, significava que a zona rural mineira espantava a mão-
de-obra existente no interior através do êxodo rural.
Essa observação pode ser constatada no quadro abaixo que mostra o saldo migratório em
três unidades da federação.
Ano São Paulo Rio de Janeiro Minas Gerais
1950 556.761 649.419 - 1.156.371
1960 853.364 1.106.12 - 1.652.291
1970 1.900.084 1.674.750 - 2.764.897
1980 4.554.130 2.025.518 - 3.335.148
Quadro 1 -
Saldo migratório em três unidades da Federação entre 1950-1980
Fonte: FIBGE/Fundação do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Anuário
Estatístico do Brasil. Rio de Janeiro, 1983 apud Dulci, 1999.p. 72.
8
. A professora Lourdes tornou-se professora-orientadora nos Cursos de Especialização e professora no Curso Normal
Regional que se instalou nesse local em 1951, permanecendo por dezesseis anos como professora. Essas informações
foram obtidas por meio de entrevista com a professora e texto-diário, no qual ela relata os primeiros dias de funcionamento
da escola.
33
Para A. Candido (1971), a urbanização veio propiciar ao rurícola, no plano
ecológico, novas manifestações da sua velha e aqui muito condenada tendência para o
nomadismo”. Não se tratava mais de uma agricultura itinerante, nem da busca de novas terras
para substituir as que se tornam inóspitas por cansaço ou expulsão. Segundo Candido:
Trata-se de uma modalidade de fuga à sujeição econômica total – seja mudando de lugar na
mesma área, seja buscando zonas pioneiras, seja rompendo com o passado e migrando para
a cidade”. (p. 222).
As mudanças nas formas de produção, sociabilidade e cultura, que ocorreram no Brasil
nas primeiras décadas do século XX, capitaneadas pela virada demográfica, favoreceram a
difusão na sociedade de novos sentidos, significados e valores. Notoriamente, estimularam
a noção de vida urbana e a valorização da cidade. As cidades foram reformadas, construídas,
como os casos do Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Brasília (SEVCENKO, 1992; SOUZA,
1998; COUTO, 2002).
Embora tais processos de mudanças fossem evidentes, personalidades intelectuais
ligadas a instituições públicas mineiras passaram a denunciar seus descontentamentos com o
que estava ocorrendo. Nessa posição estava, entre outras figuras de destaque, a professora
Helena Antipoff, que dizia: O escoamento de massas humanas para as cidades e o
desproporcional aumento das populações urbanas vem provocando nos grandes centros uma
congestão demográfica deveras assustadora” (ANTIPOFF CDPHA, 1986, p.71). Dizia ela
ainda: Faltam ali, cada vez mais, meios para suprir a população com teto, água, alimentos,
combustível, energia elétrica, transporte, assistência médica e escolar, empregos e meio de
ganha-pão honrado”. O quadro abaixo mostra o aumento populacional em três capitais, em
decorrência do êxodo rural.
Capitais População
1940
População
1950
Aumento
natural
% Aumento
Devido à
migração
%
Rio de
Janeiro
1.764.141 2.377.451 175.764 28,66 437.546 71,34
São Paulo 1.326.261 2.198.096 239.553 27,48 632,282 72,52
Belo
Horizonte
211.377 352.724 41.867 29,62 99.480 70,38
Quadro 2 -
População total, crescimento vegetativo e migração em três capitais, entre 1940 e 1950.
Fonte: Durhan, 1970, p. 29.
34
Os argumentos da professora sugerem que a cidade não garantia condições dignas de
vida para suas populações mais miseráveis e que aqueles declaradamente detentores de uma
cultura rural pouco tinham a contribuir em uma sociedade fundamentada em princípios
racionais e tecnológicos. Eram considerados, na sua maioria, analfabetos subalimentados.
Diante desse quadro, esboçava-se outro, como apontou Antipoff, num país onde 70%
da população se empenha, direta ou indiretamente, em atividades rurais, o melhoramento do
meio rural constitui um tema de interesse capital para todos os que desejam o bem-estar e a
prosperidade do seu povo. (ANTIPOFF, 1992, p.61).
O que se evidenciava aquele momento era crescente inchaço das cidades, numa
sociedade que ainda tinha a maioria da sua população dependente da produção agrícola,
população esta que havia sido afetada por uma possibilidade de “vida melhor”, emanada das
concepções de urbanização e maiores oportunidades de trabalho que as cidades pareciam
oferecer.
Na visão de Campos (1951), era preciso criar condições de resistência contra essa
força centrípeta que arrastava a população rural para as zonas urbanas. Esse fenômeno foi
constatado também por Camorano e Abramovay (1999), ao informar que desde 1950, a cada
10 anos, um em cada três brasileiros que vivem no meio rural, opta pela emigração.
“Ou o governo volta seus olhos para a zona rural, ou esta nação perecerá enquanto
organismo nacional” ressaltou Abgar Renault, em 1949, ao discursar em solenidade para
professorandas rurais, no segundo curso de aperfeiçoamento realizado na Fazenda do Rosário.
Nas suas palavras é notória uma concepção cataclismática das condições do brasileiro rural,
que compreendia, segundo Antipoff, dois terços da população total do Brasil. Isto, portanto,
permitiu-lhe dizer que a nação brasileira, ao desprezar a zona rural estava colocando em
risco sua própria condição de nação soberana. Destacou Renault, ainda, que o Brasil
alfabetizara 20,58% de sua população escolar e que o déficit na zona rural era tal que não se
atendia nem 30% da população. Com esses meros, o Secretário de Educação procurava
sensibilizar os ali presentes para as péssimas condições de funcionamento existentes na
educação do homem do campo.
O simbolismo presente nos números a respeito da escola, acima apontados, foi uma
das formas de explicitar quais eram, de fato, as características das escolas do interior do
Estado naquele momento. Uma nota no Jornal Estado de Minas, de 1949, descrevia os dados
colhidos em uma pesquisa feita pela Secretaria de Educação, com 2.690 unidades escolares do
interior do Estado de Minas e revelava os seguintes números: 20% possuíam luz elétrica, 27%
receberam material didático, 22% receberam visitas assistenciais, 20% receberam
35
assistência religiosa e das 3.791 escolas criadas em 168 municípios, apenas 3.616
funcionavam em 1948. (MINAS GERAIS, 1949). Essas informações mostram os esforços
necessários para que as escolas do interior fossem atendidas de modo satisfatório face as suas
necessidades.
Somadas à precariedade das condições escolares estavam as condições sócio-culturais
do rurícola mineiro. É surpreendente, ressaltou Durhan (1970), a uniformidade das condições
de vida e a permanência de elementos tradicionais na sociedade rural brasileira. A criação de
gado, uma das atividades econômicas preferidas, favorece sua tendência à moleza e a
alimentação contribui ainda mais para tirar-lhes a energia(SAINT HILAIRE, 1970, p.50).
Para Spix e Martius, a morada rural era caracterizada por:
Uma palhoça imunda, tendo em volta uns pés de banana maltratados, uma roça de
feijão e mandioca, umas cabeças de gado e alguns cavalos magros, que buscam eles
próprios a subsistência, eis a mais alta aspiração desses matutos. Alimentam-se
com ervas, carnes-de-vento, leite, requeijão e frutas. (apud DURHAN, 1970, p.50).
O lavrador que não tinha no seu horizonte o comércio e nem praticava hábitos
semelhantes aos praticados nas cidades, era visto como um indivíduo miserável. Antipoff, ao
analisar o estilo de vida dessa população, frisou que grande parte da mesma vivia em regime
crônico de subalimentação. Citando Josué de Castro, ressaltou que o Brasil era um dos
países de fome” no mundo, tanto em seus quadros regionais, como em seu conjunto unitário.
Completa a professora: o Brasil sofre as duras conseqüências dessa condição biológica
aviltante de sua raça e de sua organização social”. (CDPHA, 1992, p.61).
Diante desse quadro, conforme defendeu Campos (1951), não seria possível planejar e
implantar nenhum programa de recuperação econômica em Minas Gerais, sem antes baseá-lo
e articulá-lo intimamente com um plano geral de educação e saúde. Este homem que estava
sendo julgado como um “tipo patológico”, se considerada a saúde social e econômica do país,
em parte, era um produto da extensão geográfica e da falta de ligação entre os aglomerados
humanos. Num país praticamente despovoado”, diz Durhan, a possibilidade de
sobrevivência do lavrador depende apenas da força de trabalho dos pares e familiares e de um
ajustamento ao meio que lhe permita a produção rápida dos meios de subsistência. Segundo
ela, a adaptação do lavrador, desde a colônia, deu-se pelo abandono das técnicas originais
inadequadas às novas condições e a adoção do equipamento cultural indígena (DURHAN,
1970).
Não é diferente a avaliação de Echevarria acerca da situação a América Latina:
36
As condições de vida no campo, a julgar tanto pelas observações qualitativas de
diversos estudos e relatórios como pelas escassas informações quantitativas
disponíveis, oferecem um quadro desolador. Com efeito, a grande maioria dos 111
milhões de seres humanos que, em 1960, habitavam as zonas rurais, vivia sem
dúvida, em condições mínimas de sanitarismo, alimentação, educação e habitação
- infra-estrutura. Essas circunstâncias e o isolamento das zonas são fatores que
deixaram as massas camponesas à margem dos processos de modernização
alcançados pelos grandes centros urbanos, durante o período. (1969, p. 26).
A falta de uma orientação científica no setor agrícola concorria para a diminuição das
áreas de cultura. Poucas medidas para conservação do solo eram utilizadas e o uso da
queimada era ainda freqüente. Tudo isto convergia, conforme destacou a Revista Nacional de
Educação Rural (1955)
, para o depauperamento do solo que não era rtil. Um outro
quadro típico nos arredores dessas regiões agrícolas eram as crianças descalças, anêmicas e
raquíticas a brincarem com animais domésticos. Assim denuncia a Revista; promiscuidade
era regra geral, crianças e adultos dormem nos mesmos leitos, utilizam-se dos mesmos
objetos de higiene, bebem e comem em vasilhas comuns. O doente estava em contato direto
com as crianças, o sadio por pouco tempo continuava a sê-lo”
. (RCNER, 1955, p. 83).
Várias “imagens-modelo” escritas, fotografadas e difundidas pelo país, passaram a
povoar o ideário nacional sobre a miséria do rurícola. O fedor do pobre da roça resultava da
impregnação que ele sofria e, como revelou Corbin (1987), era semelhante à terra, às
madeiras, às paredes; agora era a pele do matuto e as suas roupas que ficavam umedecidas de
líquidos mal cheirosos, o que, por si só, bastava para sugerir aos outros, sua miséria.
“O homem do campo é antes de tudo um sujo”, assim escreveram os redatores da
RCNER (1955). Não necessariamente porque ele queira, mas porque não sabia viver limpo, e
não sabia porque não o ensinaram. Os pés do rurícola, conforme descrito na revista,
ostentavam a nudez conseqüente de sua ignorância. Desde pequeno, o rurícola habituou-se a
andar descalço. O banho cotidiano era muitas vezes luxo, sendo assim, uns poucos podiam
praticar. Na opinião dos redatores da RCNER, as conseqüências destes bitos para a saúde
são fáceis de imaginar. A verminose, para citar um exemplo, tornou-se problema comum
entre os moradores rurais.
Ao assinalar a baixa produtividade, a tecnologia rudimentar e a resposta insuficiente
da empresa agrícola, Echevarria destaca que os incentivos do mercado moderno e a miséria
endêmica não são meras circunstâncias isoladas, produto de desajustes ou ‘irracionalidade’,
mas aspectos inerentes a um tipo de estrutura social, que parece ter predominado nas zonas
rurais, durante o período de 1945-1960. (1969, p. 26)
Usaremos para designar Revista da Campanha Nacional de Educação Rural a sigla RCNER.
37
As condições das relações sociais no meio rural, no entendimento de Silva citada na
RCNER (1956, p. 130) constituíam um dos fatores que mais concorria para a degradação do
camponês e conferia sérias dificuldades ao desenvolvimento do meio. A falta de
comunicação, motivada pela distância que separa as famílias rurais tem sido a causa do
individualismo rural, isolava o homem, apagava dele o espírito de sociabilidade e tornava o
rurícola bisonho, desconfiado, intolerante, inacessível às formas de vida própria aos seres
humanos. A ausência de sociabilidade começava por despersonalizá-lo, transformando-o em
massa anônima perante a vida da nação. Assim, finaliza ela: o rurícola, dado o seu
isolamento, é um homem deformado.
Devido a esse isolamento, o homem rural sul-americano não sabia pensar para querer;
habituou-se de tal modo a depender de alguém distante, que parecia não ter capacidade para
pensar, para ansiar, por si mesmo, alguma coisa de interesse coletivo. Aliás, os distritos rurais
não tinham representação legal nas Câmaras de vereadores dos municípios (RCNER, 1954).
Isso, de certa forma, colaborava para aumentar a precariedade das condições de vida, uma vez
que o Estado se furtava, por falta de representação, a capitalizar o desenvolvimento humano e
econômico desses espaços.
A falta de agentes políticos nas comunidades rurais, bem como a representação da
cultura e do homem rural destas mesmas comunidades propiciou a criação de escolas
primárias e normais, de ginásios para alfabetização em massa, com o objetivo de romper com
o círculo vicioso de estagnação do meio rural e de contribuir para o desenvolvimento das
fundações do nosso sistema econômico. (CAMPOS, 1951).
Todavia, superar esses entraves em que a cultura rurista mineira estava inter-
relacionada, demandava uma estratégia que fizesse uma prospecção nas raízes da formação
desse ethos rural brasileiro. Sob essa perspectiva, como retratou Holanda (1995), toda
estrutura de nossa sociedade teve sua base fora dos meios urbanos. Portanto, a
consideração desse fato permitirá compreendermos as condições que, por via direta ou
indireta, prevaleceram até muito depois de proclamada a “República Independente”, sendo
notados, ainda hoje, aspectos remanescentes dessa base sócio-cultural. Segundo Holanda, não
foi uma civilização agrícola que os portugueses criaram no Brasil, mas, sim, uma civilização
de raízes rurais. As propriedades rústicas foram os locais onde a vida de boa parte da
população concentrou-se durante os séculos de ocupação do vasto território. Portanto, “as
cidades eram virtualmente e talvez, de fato, espaços dependentes deste universo rústico”.
(HOLANDA, 1995, p. 73).
38
2.2 A força centrípeta das Cidades e o Êxodo Rural
Belo Horizonte figura como a obra simbólica de maior envergadura da República
em Minas
Letícia Julião, 1996
...é a atração pelos altos salários pagos pela indústria, bem como a proteção
garantida pelas leis trabalhistas existentes no meio urbano.
Capitão de Polícia, 1949.
O “continente rústico” não atendia mais às demandas da população de modo geral,
uma vez que o ideal de civilização em curso na época apresentava de forma intrínseca e, às
vezes velada, um acentuado conceito de urbanização e de urbanidade. Esse modelo de
sociedade, de forma sutil, penetra no imaginário social da população e imprime um ritmo
acelerado de transformação nas formas de organização social antes estabelecida. No entanto,
as condições de possibilidade dessa infra-estrutura para efetivar tais mudanças ou a passagem
para uma sociedade eminentemente urbana não eram, naquele momento, reais.
A marcha da urbanização estava ligada ao progresso industrial e conseqüente abertura
dos mercados, explicita Cândido (1971). Continua ele:
Daí a penetração, em áreas rurais, de bens de consumo até então menos conhecidos
ou, na maioria, desconhecidos. Surgem assim, para o caipira, necessidades novas,
que contribuem para criar ou incentivar vínculos com as cidades, destruindo a sua
autonomia e ligando-o estreitamente ao ritmo da economia geral, isto é, da região,
do estado e do país, em contraste com a economia particular, centrada pela vida
de bairro e centrada na subsistência
.
(p. 165).
O reflexo do espírito de modernidade que chegava ao Brasil do exterior, sobretudo, em
São Paulo e no Rio de Janeiro, incomodou em 1891, como notou Julião (1996), os
constituintes mineiros cujos discursos apontavam o empreendimento da construção da capital
como crucial na definição dos rumos futuros do Estado. Os debates iniciados no campo
político ganharam as páginas dos jornais e mobilizaram intelectuais e população. Na
concepção dos defensores do projeto, a cidade de Belo Horizonte aparecia como signo de um
novo tempo, centro de desenvolvimento intelectual, de renovadas formas de riqueza, trabalho
e sociabilidade. Foco irradiador da civilização e progresso; um lugar moderno, higiênico e
elegante, capaz de consolidar uma vigorosa força e assegurar a ordem política do Estado”
(JULIÃO, 1996, p. 50).
As concepções de vida civilizada integravam assim, o imaginário das elites mineiras
desde o final do século XIX. No entanto, ao que tudo indica, tal noção ainda ocupava o
39
pensamento de eminentes políticos mineiros em meados do século XX. Mais que isso, o
modelo de civilização aqui defendido tinha na França seu estereótipo, como mostrou o
governador Milton Campos em discurso proferido por ocasião da recepção ao embaixador
francês a 27 de setembro de 1948:
Nossos livros de ciência foram a pouco predominantemente franceses.
Franceses ou formados no espírito francês muitos dos mestres de sucessivas
gerações mineiras; franceses, os primeiros romancistas e os primeiros poetas que
agitaram e ainda agitam a inquietude de nossa mocidade; franceses ainda, e talvez
principalmente, os ideais políticos para cuja efetividade morreu o primeiro mártir
de nossa emancipação.
(CAMPOS, 1951, p. 150).
Tais significações sugerem a existência de um modelo inspirador de cidade e
civilização para os mineiros – qual seja aqueles que a República Francesa materializou no seu
passado. Segundo Silveira (1996), havia na engenharia dos novos hábitos para a nova capital
mineira um sonho de uma Petite Paris, isto é, uma alusão comparativa que os cafés do centro
de Belo Horizonte permitiriam e deveriam produzir no cotidiano dos moradores da cidade à
semelhança dos franceses. Fica, portanto, explícito, que as cidades da França, notadamente
Paris, que passou por profundas reformas de natureza urbanística após a Revolução do século
XVIII, estimulavam as imagens de alguns “homens de bem” mineiros.
A influência do movimento das luzes, aplicado ao espaço urbano na França do século
XVIII, acarretou, como descreveu Corbin (1987), uma ação política no intuito de distribuir as
pessoas e proceder a um novo recorte no espaço dos equipamentos urbanos. Essas medidas
foram tomadas como recurso para contemplar o trabalho de ventilação, para dominar o fluxo
das exalações e para impedir o efeito mórbido das emanações sociais.
No imaginário da época, destacou Monarcha (1999), o futuro pertenceria à máquina
associada ao trabalho e ao nível de civilização: o advento do maquinismo assinala o fluir do
tempo, a quebra do isolamento geográfico e social e a aquisição de espírito cosmopolita.
Assim, as teses sobre a civilização urbana almejavam a racionalização do espaço urbano,
formulado como rede de conexões que viabilizassem a circulação: traçar as ruas, avenidas,
pontes, desenhar largos, jardins, praças públicas, interligar pontos nevrálgicos da cidade.
Segundo Monarcha (1999), esse reordenamento atraía novos habitantes para as
cidades do progresso. Concomitantemente e por analogia, construía-se um “ante espaço social
progressista” - a saber - o da roça, no qual o rurícola estava encerrado, isolado. Naturalmente,
o elemento rural tendia a se tornar um homem ambíguo, ou seja, o mesmo e o outro, ou o não
urbano-urbano. Esse novo tempo, como ressalta Cândido (1971), levou o rurícola a comprar
40
cada vez mais, desde roupas, utensílios e até alimentos e bugigangas de vários tipos; desse
modo diz o pesquisador: uma balança onde avultam receita e despesas (embora virtuais)
elementos que inexistiam na sua vida passada. Por outras palavras, surgem relações
compatíveis com a economia moderna, que o vai incorporando a sua esfera. (p. 165).
Não é por acaso, então, que o plano de tornar Belo Horizonte um espaço notável no
meio das grandes metrópoles nacionais através da transformação de seu caráter interiorano e
conservador, conforme apontado por Souza (1998), era um dos principais objetivos dos
políticos mineiros da década de 1940. A intenção do projeto da Pampulha era caracterizar
uma espécie de “modernidade tardia” de Minas, entendida como manifestação cultural
referente às realizações atrasadas no tempo, fora de um lugar previamente estipulado. Esse
projeto elucidou, de certa forma, qual era a sensibilidade dos mineiros em relação ao dueto
urbano e rural, na virada do século XX.
Em contrapartida, eram várias as argumentações que caracterizam o êxodo rural em
Minas e no país, em meados do século passado. Para os responsáveis pela RCNER (1955, p.
88), o êxodo rural apresentava-se como o principal problema da população campesina, e
decorria das condições econômicas e sócio-sanitárias, de uma agricultura deficiente, do baixo
nível de vida, da precariedade dos meios de subsistência, da falta de assistência e educação
sanitária e da estrutura social viciada e injusta. Problema esse que, somente uma reforma
agrária, uma ação renovadora e nova estrutura jurídica poderão corrigir. Entretanto, tal
situação tem transformado a vida do roceiro num flagelo, ou num herói anônimo.
A razão mais citada para caracterizar essa situação são as más condições de produção
dos alimentos básicos da dieta. Na primeira hipótese, aduz Cândido: é claro que a fertilidade
da terra decaiu, e as modernas condições econômicas levam a trabalhar para o mercado.
Nas palavras do rurícola, todavia, o ‘tempo de dante, ou dos antigos‘, era o próprio reino da
fartura. (1971, p. 194).
De qualquer maneira, não é muito difícil entender os baixos níveis de vida das
populações camponesas. A propósito dessa inferência comunicou Echevarria (1968, p. 34):
Os censos permitem estimar que mais de 80 por cento e, às vezes, mais de 90 por
cento da população rural ocupava posições de menos favorecidas, dentro das
hierarquias sociais rurais. Podemos deduzir daí que os baixos níveis de vida
parecem estreitamente associados à organização dos tipos de empresa agrícola
que atuaram pelo interior. A FAO avaliou que, no Brasil, a renda média anual dos
setores não agrícolas alcançava 440 dólares, enquanto que nos setores agrícolas
era apenas de 110 dólares.
41
Nesse ambiente, então, começa a tornar sugestiva uma estratégia de sobrevivência: a
migração para as promissoras cidades. Segundo nota publicada em jornal, em 1949, um
coronel da polícia descreve quais eram, em sua opinião, as causas do êxodo rural. Figuravam
entre elas: as leis trabalhistas, os salários pagos pela indústria e as férias de trabalho que
existiam na cidade. Destacava ele, além disso, que os métodos da agricultura tradicional não
mais garantiam a sobrevivência alimentar e material do camponês e muito menos uma vida
digna como autônomo ou assalariado de fazenda. Esses detalhes mostram como circulava nos
meios institucionais do Estado, a visão negativa de sobrevivência na roça. Corria-se o risco,
diz o coronel, de se “morrer a míngua”.
No intervalo de tempo que se estende de 1940 a 1970, verificou-se em Minas um forte
êxodo rural que na visão de Dulci (1999) era maior do que o registrado no Nordeste. Segundo
ele:
Não havendo postos de trabalho suficientes no meio urbano do Estado, um número
considerável dos retirantes do campo passaram a dirigir-se para outras partes do
país em busca de melhores condições de vida. A proximidade de áreas mais
desenvolvidas como Rio de Janeiro e São Paulo, estimulava a diáspora e tornava
mais aguda a sensação de atraso que causava
(DULCI, 1999, p. 72).
Em outras palavras, explicita Durhan (1970), as comunidades rurais, não eram
unidades independentes e auto-suficientes e, por isso mesmo, determinantes estruturais que
condicionavam sua existência e transformação deveriam ser buscadas na sociedade nacional
que era, em certo sentido, o exterior das próprias comunidades. A expansão do capitalismo,
segundo ela, acompanhada por uma urbanização crescente, pode ser apontada como alguns
desses determinantes. Neste sentido, em 1950, Minas Gerais ocupava o primeiro lugar no
número de emigrantes: analisando os estados de maior emigração verificados em 1950,
Minas Gerais ocupava o primeiro lugar, com total de 1.367.239 emigrantes. Seguem-se
surpreendentemente, São Paulo com 507. 239 e Rio de Janeiro com 504.130 emigrantes cada
um. Tal emigração corresponderia certamente ao abandono de um sistema econômico pouco
produtivo por uma população que procurava integrar-se ao sistema capitalista-industrial em
desenvolvimento em outras regiões do país. (DURHAN, 1970, p. 32). Os números abaixo
colaboram para a visualização dessa situação:
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POPULAÇÃO PRESENTE
DÉCADAS URBANO RURAL BRASIL
1940 12.880.182 % 31,24 28.354.133 % 68,76 41.236.315 % 100,00
1950 18.782.891 % 36,16 33.161.506 % 63,84 51.944.397 % 100,00
1960 31.990.938 % 45,08 38.976.247 % 54,92 70.937.185 % 100,00
1970 52.098.495 % 56,0 41.105.884 % 44,0 93.204.379 % 100,00
Quadro 3 - População rural e urbana do Brasil da data dos recenseamentos de 1940, 1950, 1960, 1970.
Fonte Durhan, 1970, p. 21.
Nota-se pelos números que a população urbana, em 1970, tornou-se maior que a rural.
Com efeito, foi colocado em prática no Brasil, desde o início do século XX, um ideário que
comunicava, entre outras coisas, a incapacidade de se produzir aqui equipamentos industriais
tão bons quanto os importados. Isso porque o Brasil era idealizado como um “país de vocação
agrícola”. Silva (1983) defendeu que essa ideologia interessava aos países industrializados,
exportadores de equipamentos. Em razão disso, constituiu-se uma política de incentivo ao
desenvolvimento agrícola com juros subsidiados para a compra de terras, equipamentos
agrícolas, fertilizantes, sementes, etc. Acreditava-se que com tais medidas de incentivo,
seriam atendidos os interesses do capital internacional, bem como se conteria a fuga de
pessoas do campo. No entanto, para que as empresas internacionais se interessassem, de fato,
pelos produtos brasileiros, o governo precisava se empenhar nisso. Surge, então, o interesse
em alguns investimentos no campo da educação aplicada ao manejo de recursos derivados da
terra.
Por esse caminho, então, em 1927, tiveram início as aulas na Escola Superior de
Viçosa. Para Campos (1951), essa iniciativa vinha socorrer a economia rural com sintomas
de decadência e que estava a exigir dos poderes públicos atenção especial. Entretanto,
esclarece Silva (1987) que as grandes empresas agropecuárias subsidiadas pelo Estado,
utilizavam defensivos fertilizantes químicos e tecnologia intensiva poupadora de mão-de-
obra, o que contribuiu para aumentar assustadoramente o movimento migratório no Brasil.
(p.46).
Para os partidários da UDN, agremiação política que ganhou as eleições para o
governo do Estado em 1947, a redução constante da população rural envolvia implicações
econômicas, sociais e políticas que não podiam ser ignoradas. No entendimento de Dulci
(1999), a perda de substância de uma região era assunto sempre presente no debate entre
governistas e oposição, tendo sido objeto de crítica ao governador BeneditoValadares, na
Constituinte de 1946. Na visão do governo de B. Valadares, acusado de negligenciar o êxodo
43
rural, a tese explicitada era outra o êxodo era fruto resultante do desequilíbrio entre uma
economia agrícola debilitada e uma economia industrial em expansão. Assim, via como
normal esses números, pois nesse contexto, o movimento migratório do interior para os
centros urbanos refletia uma fase do mercado nacional, em expansão. Para Dulci (1999, p.7):
era visivelmente incômoda a situação de Minas no circuito como fonte de mão-de-obra
excedente para os estados vizinhos.
A percepção negativa de que Minas Gerais, um Estado tradicionalmente em destaque
no cenário nacional, havia se tornado uma fábrica de emigrantes em busca de trabalho
colaborou para que a oposição, os udenistas, desqualificassem nos seus discursos o
comportamento político do Estado, no seu passado recente. Vale dizer que as condições de
vida e trabalho do homem da zona rural foram supervalorizadas nesses discursos.
Em 1950, ou seja, quatro anos depois que os getulistas foram afastados do Executivo,
Abgar Renault, nesse instante, cumprindo seu último ano como Secretário de Educação, ao
detalhar nuances do êxodo rural mineiro, disse:
Nem por ser um fenômeno peculiar no mundo de hoje, passa ele (o êxodo rural) a
ser menos assustador. De acordo com o recenseamento de 1940, a população
brasileira assim se discriminava: urbano, 10.900.000 habitantes; rural 30.300.000.
A estimativa de 1949, feita pelo IBGE, assim se traduzia: população urbana
14.900.000; rural, 33.800.000. As diferenças para mais entre as duas classes são,
respectivamente, de 4.000.000 e 3.300.000.(1952, p. 139).
Ao apresentar tais números a respeito da movimentação demográfica na década de 40,
diz ele, “fica patente o desequilíbrio demográfico do país nos últimos oito anos”. Nas suas
contas, a população rural, mesmo tendo a seu favor o fator natalidade, tinha sofrido redução
de 73%, se comparada aos 69% da população urbana (RENAULT, 1952, p.139). Nesse caso,
nota-se uma expressão de espanto, ou de se estar vivendo uma conjuntura de instabilidade
demográfica atípica e, por isso mesmo, necessária de ser entendida e, ao que tudo indica,
combatida.
Outro aspecto apontado referia-se aos prejuízos representados para a economia do
país, especialmente para Minas, e a falta de uma política para o campo. Segundo Renault,
46,7% das exportações de 1948 derivava da produção agropecuária que, segundo ele, era a
base de nossa riqueza. O secretário reforçou sua explicitação dizendo que essa fatia de
produtos exportados do setor urbano representava apenas 6,5% da produção no referido ano
(RENAULT, 1952). De acordo com essa perspectiva, a tese atribuída a um crescimento
44
econômico de base industrial-urbana defendida por B. Valadares era, pelo menos em parte,
falsa.
Tais concepções estavam ligadas à imagem de que a escola e a educação não
cumpriam seu papel de promotoras e estabilizadoras do desenvolvimento social e econômico
das áreas rurais. Pode-se supor, com um alto grau de certeza, conforme frisou Vera (1981),
que a escola inserida nesse meio tendia a ser tipicamente uma escola urbana tradicional, com
objetivos alheios à realidade camponesa. Segundo ele existia “em muitas zonas, uma radical
desvinculação entre a escola e o contexto em que se insere, questão que se reflete nos
crônicos problemas de absenteísmo, abandono de cursos e analfabetismo que, por sua vez,
perpetuam a situação de subdesenvolvimento econômico-social na qual se encontram”. (p.
32).
Dessa maneira, era preciso propor uma experiência educativa inovadora que
possibilitasse revelar e programar uma educação produtiva. Assevera o pesquisador que, nas
últimas décadas, vinham surgindo diferentes modelos de escola, cada um deles respondendo a
um tipo de realidade especifica, mas que tem como denominador comum a tendência a
alcançar uma estreita vinculação com a comunidade local e as atividades nela executadas,
bem como, procurar superar a divisão entre estudo e trabalho. (PETTY, 1981, p. 32).
2.3 O debate e as proposições para a Educação Rural no Estado
Em decorrência da necessidade teórica e prática de se construir uma nova
escolarização rural, abre-se uma perspectiva que começa a ressaltar a figura do intelectual, do
escritor, do homem de ciência, como sujeito capaz de solucionar os impasses sociais em que
estava mergulhado o Estado mineiro, no que tange à educação rural. Como bem disse o
governador do Estado: O homem que se exprime é, em dado momento, um homem feliz, e é,
além disso, um homem poderoso. (CAMPOS, 1951, p. 74)
Em 1947, ocorreu, em Minas Gerais, o segundo Congresso da Associação Brasileira
de Escritores. O governador saldou nomes importantes da intelectualidade mineira, inseridos,
segundo ele, nos problemas políticos postos para esse governo. Comentou o governador:
Sabemos que vos torturam o espírito, as aflições que acompanham os que vivem pelo
pensamento, sobretudo na hora presente. (CAMPOS, 1951, p. 74). Assim, parece lugar
comum, entre intelectuais mineiros, um elenco de problemas afligidores de suas emoções, em
45
termos da direção e eficácia
da coisa pública, ou como
dizia o próprio Campos,
sobre o “Governo da
República”.
A noção de que um
regime político deveria ser
orientado por homens de
letras não era nova no
Brasil. Ao longo do século
XIX,
prevaleceu entre a elite governante uma forte mentalidade iluminista, caracterizada
pela no poder da ciência e pela preocupação pragmática de aplicar os
conhecimentos científicos a bem da prosperidade do Estado e da felicidade dos
povos, no dizer de Azevedo Coutinho. (CARVALHO, 2002, p.34).
Entretanto, as mudanças no ensino que vão sendo engendradas desde o século XIX no
Brasil enfrentavam a oposição dos defensores de uma educação liberal ou de uma formação
humanista, que se opunham à inclusão da ciência na escola. Segundo Oliveira (2003), o
processo de cientificização da escola nada teve de linear e pacífico, embora, a maior parte das
resistências tenham caído no esquecimento.
Ao que tudo indica, parecia urgente articular o campo científico com o campo escolar,
como forma de recuperar, nesse último, sua função progressista. O sistema de educação que
havia conhecido na sua gestão como Secretário de Educação estava truncado, ou para dizer a
total verdade,
ele não existe por falta de articulação entre a Universidade de Minas Gerais e os
outros ramos e graus do ensino, não havendo, consequentemente uma política
educacional”. Em sua opinião, “na Universidade, é a falta de sua anima rectrix
uma Faculdade de Filosofia Ciências e Letras para a investigação científica, a falta
de órgão criador de uma tradição cultural. A missão de uma Universidade não pode
cifrar-se na expedição de diplomas profissionais
(R
ENAULT
, 1952, p.18),
Pode-se então dizer, que surge uma conjuntura de idéias políticas para a educação,
notadamente, sobre a educação do rurícola que pretende aproximar educação e conhecimento
científico. Para tanto, é preciso apontar, como notou Schwarcz (1993, p.24), que a data de
chegada da corte portuguesa ao Brasil, marca a instalação dos primeiros estabelecimentos de
Ilustração 1 - acima: comunidade escolar da Escola Normal D. Joaquim
(Acervo - Conselheiro Mata)
46
caráter cultural, como a Imprensa Régia, a biblioteca, o Real Horto e o Museu Real.
Segundo ela, essas instituições intuíam transformar a Colônia não apenas na sede provisória
da monarquia portuguesa, mas, sobretudo, no centro reprodutor de sua cultura e memória.
Foi nesse contexto, em última instância, que a escola passou a figurar como elemento
colaborador para a formação da nacionalidade. Contudo, antes mesmo da proclamação da
República, a disseminação do ensino primário passou a ser considerada retoricamente como
fator importante para a formação de um cidadão autenticamente nacional. Nesse momento,
ressaltou Muller (1999), não defendia a escola pública como a entrada das mulheres no
magistério primário. Informou ainda que desde os primeiros anos do século XX, emergiu um
fenômeno novo que poderia ser nomeado de A Civilização da Professora. Explicitava-se que
essa professora, recém ingressada na escola pública e cada vez mais se tornando maioria,
deveria ser civilizada e disciplinada. Para tanto, entre as normas e as exigências para o
ingresso no magistério público, figurava o diploma da Escola Normal, pois ele conferia
privilégios a seu portador, e principalmente vitalicidade. A modernização da sociedade
brasileira poderia ser obtida através da instrução. O ensino deveria ser oferecido
inclusive às mulheres, pois como cabia a elas educar seus filhos, eram elas construtoras da
nacionalidade. Por esse motivo deveriam sair do atraso e da ignorância. (Muller, 1999, p.
61). A comissão criada para tratar das mazelas da educação no Estado, cientes da tarefa de
mudar o rumo do comportamento da população, acabou por promover um discurso que
sugeria certo sentido de calamidade e emergência.. Neste trabalho inadiável da hora presente,
como sublinhou Antipoff, não nos esqueçamos de acender a chama viva do entusiasmo que
nos iluminará o caminho, longo, árido e de obstáculos. (Antipoff, 1986, p. 150). Acrescenta
ela ainda:
Lembremos que sem entusiasmo nada se realiza de verdadeiramente sólido, e é
provavelmente por isso que no vocabulário do grande Pasteur a palavra entusiasmo
era uma das mais freqüentemente empregadas. Sem ela a sua ciência não seria nem
tão perspicaz, nem tão útil à humanidade (CDPHA, 1986, p. 64).
Um dos pressupostos para a existência de instrumentos humanos sincrônicos à
sociedade daquele tempo era representado pelo “soldado cidadão” ou pelo estereotipo do
intelectual. Assim, fica claro o significado atribuído à professora intelectualizada (portadora
de diploma) e ao intelectual naquele momento da história do país.
47
2.4 O Ensino Rural em Minas Gerais
No renovado esforço de dar apoio ao setor agropecuário, ao longo dos governos,
homens e idéias confundiram-se, diz Viana (1979, p. 9), com as instituições a que serviram. É
o caso, por exemplo, no Estado de Minas Gerais, do político-poeta e educador Abgar Renault
que entre 1947-1950, notabilizou-se como defensor do desenvolvimento rural em Minas, pelo
caminho do incentivo à “educação técnica rural”.
Seu empreendimento foi reconhecido, igualmente, em 1952, quando o governo
desenvolvimentista de JK, “pressionado” pela necessidade de ligar substancialmente o interior
com os grandes centros comerciais do país, publicou os discursos de Renault, seu rival
político, feitos em defesa da educação rural, numa coleção de livros a ser utilizada como
recurso didático pela SEEMG. A Coleção Pedagógica impressa e distribuída pela Imprensa
Oficial de Belo Horizonte, trazia na contracapa: Coleção Pedagógica 9 Publicação da
Secretaria da Educação-Estado de Minas Gerais- “A Palavra e a Ação” ABGAR
RENAULT. (RENAULT, 1952). Vale dizer que foi na gestão de Renault à frente da SEEMG
que se tomaram medidas de natureza editorial em termos de publicações que amparassem a
educação rural em nível elementar e auxiliassem na formação de professores. Isto porque,
segundo foi constatado na época, não havia obras suficientes neste campo que propiciassem
uma cobertura razoável desse ramo de educação (HALL, 1971; RENAULT, 1952).
Para explicitar sua gratidão, diz Renault (1952, p. 62):
Quero deixar expresso ao eminente Governador de Estado, senhor Juscelino
Kubitschek de Oliveira, o meu grande reconhecimento pela generosidade nada
comum com que acolheu a proposta formulada, num gesto cordial e tão honroso
para mim, pelo então titular da secretaria da Educação, o ilustre senhor José
Maria Alkimim, para o efeito de incorporarem-se à “coleção Pedagógica” estas
páginas compostas ao serviço de Minas Gerais, da sua inteligência e da sua
cultura.
Diante de tal empenho e gratidão frente a publicação de uma brochura de discursos
sobre a educação no meio rural fica a dúvida o que se praticava em termos de educação
rural, em Minas, antes dos anos 40? Tal dúvida é pertinente na medida em que se percebe um
“tom” crítico quanto à forma que vinha historicamente se fazendo a “modernização rural”,
especialmente manifestada por Helena Antipoff, a respeito da Universidade de Viçosa, a qual,
segundo ela, não vinha respondendo adequadamente à atualização da sociedade rural mineira.
Portanto, no seu entendimento:
48
... haverá necessidade, parece-nos, da criação de uma espécie de Universidade
Rural, que, longe de confinar-se nos estudos agronômicos, veterinários, de
economia doméstica, como se tem observado na universidade do Quilometro 47,
como a de Viçosa, estenda seu programa a estudos pedagógicos de nível superior.
Seria, assim, o Instituto Normal Rural coroamento indispensável ao sistema do
ensino público para zonas rurais (ANTIPOFF, 1949, p. 2).
Nas palavras acima, evidencia-se, como ponderou Monarcha (1999), um movimento
discursivo que pretende atualizar a sociedade e marcar a identidade de uma geração, a partir
de um projeto que não poderia ser visto como infecundo por parte daqueles mais céticos. Vê-
se, então, a eminente psicóloga lançando dados comparativos para tornar visível sua proposta,
a partir da operação de “desqualificação” de aspectos da prática formativa desempenhada pela
Escola Superior de Viçosa. Assim, acabou Antipoff por atribuir a uma obra abstrata (Instituto
Normal Rural) uma qualidade escatológica”, ou a saída futura para elevação daquela
população.
A respeito dessa Escola, o Governador, para o qual Antipoff trabalhava, apresentará
uma opinião diversa à da professora em discurso proferido na “Escola Superior de Viçosa”,
em julho de 1949, estando presentes, os fazendeiros da região, para as comemorações da
“Semana do Fazendeiro”. Em vários trechos do mesmo, Campos elogia claramente a
iniciativa de criação da Escola e enumera os “bons frutos” produzidos peça mesma.
Pronunciou o governador da Tribuna: na Zona da Mata desde longa data se formou a
consciência de que da exploração da terra advém a riqueza para o homem do campo. Na sua
visão, o homem, ao desfrutar de tal consciência sobre os fins da terra, acaba, naturalmente,
por esgotar sua potencialidade produtiva mais imediata, restando ao agricultor, portanto,
desenvolver técnicas mais eficientes para extrair tais benefícios. A seu ver:
foi o que previu o Decreto nº 6.053, de 6 de janeiro de 1920, quando no governo do
Estado o insigne brasileiro Presidente Arthur Bernardes. Após entendimentos
sucessivos no estrangeiro para a vinda de técnico capaz de organizar uma escola
de agricultura modelar, a escolha recaiu no ilustre professor Peter Henry Rolfs,
então no exercício do cargo de deão da Escola Superior de Agricultura do Estado
da Flórida, o qual chegou ao Brasil em janeiro de 1921(CAMPOS, 1951, p.254).
Explica o governador que a escola fora fixada naquele município por se considerar a
localização adequada. Dessa forma, as primeiras construções da escola iniciaram-se e foram
seguidas por uma série de providências que perduraram por um período de sete anos.
Campos lembra aos presentes que as aulas dessa escola tiveram início nos idos 1927, no
governo do Presidente Antônio Carlos e que não tardaram os primeiros frutos, demonstrando
“o acerto da brilhante iniciativa”. Comentou ainda o governador que, na intenção de ampliar o
49
complexo educacional, foi criado, em 1932, o Curso Superior de Veterinária, anexo à Escola
Superior de Agricultura, revelando o ato de sentido de unidade e de maior extensão que se
pretendia dar ao ensino agrícola. (p.256).
Observa, ademais, o chefe do executivo mineiro em Compromisso Democrático que a
Escola Superior de Agricultura e Veterinária de Viçosa passou com o tempo a atrair aqueles
que desejavam conquistar conhecimentos no campo das ciências agrárias. Destaca Campos
que de todos os Estados e estrangeiros, começaram a afluir jovens estudantes. Mesmo
acumulando tais características de sucesso, no entanto, em 1942, por via do Decreto-lei nº.
824, de 20 de janeiro foram desmembrados os cursos e dessa divisão nasceu a “Escola
Superior de Veterinária de Minas, com sede em Belo Horizonte”. Ao que parece o governador
não aprovou a medida. Ao assumir o Governo pensei em reunir de novo as duas escolas que
haviam sido desmembradas. Estudando as condições dos meios escolares de ambas, não foi
sem surpresa que verifiquei um estado de alma e de vontade capaz de permitir a
recomposição desejada
.
(1951, p. 258).
Pondera ele que a Escola, mesmo depois de ter sofrido divisões, continuou
representando um pólo de atração intelectual no Estado de Minas Gerais. Com essas
observações, pretendia reforçar as medidas que o
governo havia planejado para a educação rural com o
objetivo de auferir avanços econômicos para Minas.
Em vista disso, Campos então anunciou aos ouvintes:
Foi essa a primeira idéia consubstanciada no Plano de
Recuperação Econômica e Fomento da Produção, no capítulo
referente à reorganização do ensino técnico e profissional. Não
decorrera ainda um ano, quando, em meados de 1948, se fixou o
pensamento de Governo na criação da Universidade Rural de
Minas Gerais. Foi com esse objetivo que enviei mensagens à
egrégia Assembléia Legislativa, pedindo-lhes a lei instituidora
(1951 p. 258-259).
Pode-se dizer, portanto, que estava nos planos
do governador e da sua equipe certo desejo de atacar o
universo rural em diversas frentes, ou seja, planejando
obras técnico-educacionais que se estendessem do
ensino elementar ao superior. Comentou ele que a Lei N.º 272, de 13 de novembro de 1948
previa a instalação da Universidade ainda naquele ano. E mais: dispunha sobre a transferência
da Escola de Veterinária para Viçosa no próximo ano, 1950.
Ilustração 2 - acima: capa do livro de Abgar
Renault “A Palavra e a Ação"(Acervo -
Biblioteca da UFMG).
50
Com essas informações, o Governador fornece elementos concretos sobre uma das
faces da educação rural em Minas Gerais, denotando otimismo quanto à perspectiva desta
escola. Em especial, reconhece uma vocação progressista à qual se poderia atribuir o sucesso
da Escola Superior Rural nessa região.
No dizer de Viana, Secretário da Agricultura (1979), esta Secretaria era um órgão
governamental indiretamente ligado às questões de educação rural e se caracterizava como
um órgão institucional de prática e ciência das “artes ruristas”. Lembra ele que seu trabalho
era feito com limitações impostas pelas fontes de consulta e da carência de dados e
informações que se perderam. Explica o Secretário que sua equipe buscou reconstituir a
história da Pasta e os fatos mais marcantes das suas respectivas administrações. Por essas
razões indagava sobre o lugar da educação rural.
Segundo a Secretaria de Agricultura, a chegada do núcleo pioneiro, em 1920, da
Universidade de Viçosa foi o acontecimento mais importante do governo Bernardes. Por
causa disso, para ministrar o ensino agrícola, foram contratados nos Estados Unidos dez
professores especialistas dos diversos ramos da agricultura e da veterinária.
Embora tenha se falado da criação da Universidade de Viçosa no sentido
“comemorativo”, vale sublinhar, como explicitam Ferreira e Pinto (2003) ao discorrerem
sobre os anos 20, que a sociedade brasileira vivia um período de grande efervescência e
profundas transformações. Ao que tudo indica, o país estava imerso num contínuo de
mudanças e crises em diversos setores. Em razão dessa fase, ressaltam os pesquisadores que
“o país experimentou uma fase de transição cujas rupturas mais drásticas se concretizariam
a partir do movimento de 1930” (p. 389).
Assim sendo, no que toca aos traços eminentemente econômicos desse momento,
pode-se dizer que a década de 20 foi marcada por altos e baixos. Nos primeiros anos, o
declínio dos preços internacionais do café gerou efeitos graves sobre o conjunto da economia
brasileira, notadamente a agrícola, pois o café era o produto-símbolo da modernização do
Brasil. Por outro lado, com a alta da inflação e a crise fiscal sem precedentes, como assinalam
Ferreira e Pinto (2003), houve um processo de crescimento expressivo que se manteve até a
grande depressão de 1929”. (p.389).
De acordo com os intelectuais da Secretaria de Agricultura, vinha sendo observado
nos últimos anos um surto agrícola no Brasil que se acentuou com a “Grande Guerra”, devido
à intensa procura dos nossos alimentos, estimulando, assim, investimentos em técnicas de
produção, bem como, fazendo crescer o interesse do produtor pelos preços remuneradores
oferecidos pelo mercado. Havia, dessa forma, uma tendência a elevar de modo sensível o
51
nível da nossa produção. Por conta disso, o governo vinha procurando estimular a
capacidade produtiva da lavoura mineira a fim de que esta conseguisse assegurar uma
posição permanente nos centros consumidores dentro do país”. (SECRETARIA DE
AGRICULTURA, 1979.p.37).
A diversificação da agricultura, um maior desenvolvimento das atividades
industriais, a expansão de empresas existentes e o surgimento de novos
estabelecimentos de indústrias de base foram importantes sinais do processo de
complexificação pelo qual passava a economia brasileira (FERREIRA e PINTO,
2003, p 389).
Um sinal desse grande interesse pela expansão da agricultura no país foi a criação de
condições para a chegada de máquinas agrícolas. Sua introdução foi facilitada pela
multiplicação das filiais e agências das grandes casas vendedoras que, além de colocá-las ao
alcance do homem do campo, garantiam seu conserto no caso de danos, mantendo oficinas
com as peças necessárias. Esse fato foi grande importância, que o receio de não poder
reparar os instrumentos agrários modernos era um dos maiores obstáculos à sua propagação.
Logo, as propostas vinculadas à criação da Universidade de Viçosa parecem constituir
o que se poderia chamar de princípios da educação rural no Estado. O que nos permite pensar,
entre outras coisas, que este tipo de gesto tendia a compor certa tradição da educação rural
moderna oriunda das empresas estatais, disciplinadas por uma dada situação temporal.
Tomado por tradição modernizaste acima mencionada, Campos (1951) destacou a
orientação da Carta Constitucional de 1946, cujas influências eram marcadamente liberais, ou
seja, atribuía á ordem econômica um sentido voltado para os princípios da justiça social,
conciliados à liberdade de iniciativa e a valorização do trabalho humano. Caracterizou sua
reação com a idéia de República Democrática e Liberal que emergia na letra da nova lei. Em
tais condições pondera o governo:
A justiça social representa a inspiração suprema, porque tende a eliminar as
desigualdades iníquas, a atenuar a diferença das condições e a criar um
nivelamento inicial capaz de oferecer a todos as mesmas oportunidades. A livre
iniciativa é um reflexo do princípio da liberdade, sem o qual o indivíduo, oprimido
nos seus movimentos legítimos, acaba por anular seus impulsos fecundos e reduzir-
se à unidade automática, vazia da divina essência que o enobrece. A valorização
do trabalho é o honesto reconhecimento de um dado mundo moderno, que,
retificando a idéia de propriedade como fonte exclusiva dos direitos, incluiu
também o trabalho no campo como base da ordem jurídica e título legítimo para a
conquista dos bens da vida
(CAMPOS, 1951, p.265-266).( o grifo é nosso)
52
Partindo do pressuposto de que as políticas públicas de educação defendidas
posteriormente para o campo tiveram nexos com os princípios estabelecidos pelo contexto dos
anos 20, pode-se notar, como relata Renault, que o Estado de Minas Gerais, com média de
13,36 habitantes por quilômetro quadrado, com uma população altamente rarefeita em vastos
latifúndios, composta substancialmente por pessoas apegadas à terra em forma de hábitos e
costumes enraizados, caracterizava-se por “uma vocação para o campo e para a vida
agreste”. (RENAULT, 1952).
Aponta o escritor que a produção agrícola no Estado em 1944, foi de 15,8% do total da
produção agrícola do país, comparativamente, a uma produção industrial de 5,0% do total no
campo industrial. Segundo ele, era imperioso que o governo investisse e atuasse no campo,
pois com uma população urbana de apenas 1.573.800 habitantes num total de 7.524.100
habitantes no Estado, era ineficaz qualquer ação política de cunho desenvolvimentista que não
considerasse esses números (RENAULT, 1952).
Pertencia ao governo, através de suas secretarias, a função de distribuir máquinas
agrícolas, sementes selecionadas e, como destacou Viana (1979), difundir o ensino prático
dos modernos métodos agrários, a completar-se com as atividades escolares em todos os
níveis”. No entendimento de Antipoff, isso só seria possível na medida em que se conseguisse
conquistar a simpatia do povo e dos dirigentes para as teses do ruralismo no Brasil.a
professora alertou que seria necessário preparar os jovens e despertar-lhes, desde cedo, o
interesse pelo país, pelas questões sociais e econômicas; suscitar sentimentos de solidariedade
em homens que, isolados labutam para nutrir suas famílias”, mas de forma ineficiente.
(Antipoff apud, CDPHA, 1986).
Diante dessas posições, é notório que as medidas adotadas pelo governo mineiro não
atingiram de forma significativa a população rural ficando restrita à elite agrária. A Secretaria
de Agricultura sublinhou que, nos anos 20, a regeneração agrária do Estado dependia do
ensino agrícola, pois assim seria possível alcançar uma solução para o problema. Segundo a
secretaria, nessa época, o Estado mantinha três institutos que produziam conhecimento sobre
o assunto: João Pinheiro, em Belo Horizonte; Dom Bosco, em Itajubá; Bueno Brandão, em
Mar de Espanha. Possuía, também, espaços de aprendizado agrícola: José Gonçalves, em
Ouro Fino; Borges Sampaio, em Uberaba; Barão de Camargos, em Ouro Preto; Carlos
Prates, em Itambacuri. Seriam, portanto, esses espaços os responsáveis pela transformação
das tradições agrícolas no Estado nos anos 20.
Com efeito, para os anos 30, segundo explicitou Casasanta (2003) acerca da estrutura
do ensino rural em Minas, a tônica recaiu sobre o processo de burocratização. Essas
53
“inovações” encontraram respaldo nas modernas teorias pedagógicas da Escola Nova que,
com seus argumentos científicos em favor da diferenciação”, no que se refere às capacidades
do aluno, bem como na localização da escola, conferiu ao projeto ‘forus’ de neutralidade. (p.
249). Nas palavras da historiadora:
O destaque à ciência como principal determinante na organização da nova escola,
voltada para a oferta ao aluno de um ‘ensino sob medida’, determina uma
profunda modificação nos métodos e processos de organização e trabalho na
escola. Nesse quadro, observa-se o empenho por parte do governo com o fito de
divulgar a nova concepção de ensino, veiculada pela Escola Nova, e de estabelecer
condições para que o trabalho acadêmico reflita essa nova mentalidade (p. 249-
50).
Por essas bases, fica explicitada a possibilidade de se praticar um ensino que pudesse
servir ao meio rural, de forma mais especializada, uma vez que a ordem pedagógica já
discriminava uma escola direcionada para os que a buscavam.
Como destaca Dulci (1999), o olhar que se lançava em direção ao rural, vindo dos
diferentes órgãos governamentais, orientava-se com o propósito de superar a tradição de
monoculturas hegemônicas como milho e feijão, pois se acreditava que os rendimentos para o
Estado, de modo geral, poderiam ser acrescidos pela prática desse princípio. Portanto, o
incremento da agroindústria parecia ter essa lógica. A função da escola rural, nesse ínterim,
ressaltada pelo Correio Mineiro em agosto de 1933, era criar condições para que o rurícola se
torne útil ao meio em que vive despertando e acoroçoando as vocações, mantendo tradições e
dando vida à economia local. (CASASANTA, 2004, p.278).
Ianni (1976) ressalta que a Revolução de 1930 assinalou o fim do Estado Oligárquico
no Brasil. Em sua opinião, foi nessa época que as burguesias agrária e comercial, ligadas ao
setor externo, perderam o controle exclusivo do poder político para as classes urbanas
emergentes. Dessa forma, a Revolução representou uma vitória da cidade sobre o campo ou
das classes urbanas sobre as classes rurais. (p. 149). Consequentemente, essa mudança seria
essencial para a criação de condições políticas que iriam favorecer a futura hegemonia do
setor industrial sobre o setor agrário, principalmente a partir da década de 1950. (IANNI,
1976, p. 149).
Antes de 1930, ressaltam Queda e Szmrecsanyi (1976), as únicas iniciativas concretas
que aconteceram no campo da educação rural ocorreram no ensino médio e superior,
especialmente neste último. Os autores firmam que o ensino de técnicas agrícolas de nível
médio fora instituído ainda no reinado de D. João VI com a criação, na Bahia, de um curso de
agricultura, transformado em 1875 no Instituto Imperial Baiano de Agricultura, que iria se
54
tornar a primeira Escola de Agronomia do País. Segundo eles, oito anos mais tarde foi
fundada a Escola de Agronomia de Pelotas, no Rio Grande do Sul e, em 1901, a de
Piracicaba, no Estado de São Paulo. Após a criação do Ministério da Agricultura, em 1906,
foi sancionada a legislação federal para o ensino agronômico, amparada pela modalidade de
assistência técnica, inspirada em teorias francesas.
Na percepção de Werebe, citada por Queda e Szmrecsanyi (1976), essa legislação
regulamentava a formação de técnicos agrícolas em diferentes graus, mas se continuou
investir em escolas de ensino superior. Para efeito de exemplo, em Minas, na década de 1940,
no governo de Francisco Campos, foram estipulados investimentos aproximados a quinze
milhões de cruzeiros (Cr$ 15.000.000,00) para atualização da Escola Superior de Viçosa;
enquanto que para a criação da Escola Normal Rural, com dois núcleos, foram destinados dois
milhões de cruzeiros (Cr$ 2.000.000,00) (CAMPOS, 1951).
Durante as primeiras décadas do século XX, criticava-se a organização da Escola
Normal, ao dizer que as providências relativas a implantação e expansão do ensino primário
e Normal no meio rural permaneceram confinadas no plano dos debates teóricos e dos
projetos legislativos. (LOURENÇO FILHO apud QUEDA E SZMRECSÁNYI, 1976, p. 222,
grifo nosso). Esse argumento reforça a idéia de que a educação no meio rural foi sendo
retardada. Assim,
São Paulo, de um lado, Minas Gerais, o Distrito federal, Bahia e Pernambuco do
outro, foram assumindo a liderança na reorganização do ensino primário e
normal. Algumas dessas reformas educacionais constituíram iniciativas pioneiras,
até certo ponto avançadas demais para a época. Elas não conseguiram, entretanto,
atingir o meio rural. [...] não eram estas escolas rurais numerosas, e com elas
ninguém se preocupava muito...”.( MOREIRA apud, QUEDA E SZMRECSÁNYI,
p. 223).
Com efeito, informam Buffa e Nosella (2002) que a (re) organização do ensino médio,
efetuada pelo Ministério, encabeçada por Francisco Campos, em 1931, acarretou mudanças
consideráveis no ensino normal. Segundo eles, a antiga Escola Normal passou a ser uma das
modalidades de ensino médio disponibilizadas pelo governo para a população. Com isso, a
Escola Normal perdeu boa parte de sua função primitiva que era a prioridade pelo ensino
primário, passando, a partir de então, a servir, também, de recurso propedêutico para muitos
estudantes. As mudanças na formação normal levaram os historiadores a concluírem que o
“clima era outro”. Apontava-se ainda, para a natureza populista das mudanças legislativas
propostas por F. Campos, que encontrou respaldo ideológico num certo discurso pedagógico
55
preocupado apenas com a quantidade por identificar equivocadamente quantidade com
elitismo. (p. 77).
2.5 Um Programa Geral de Educação Rural para Minas Gerais
Segundo Campos, rival partidário e ideológico e, também, astuto crítico do governo de
Benedito Valadares que havia se encerrado em 1945,
era necessário restaurar o setor econômico do Estado,
dando a entender que tal reestruturação seria a mola
mestra de um revigoramento “dístico” do Estado. A
idéia de recuperação econômica implicava, como
escreveu Campos, em duas noções básicas: educação e
saúde. Ademais, destacou: não haverá recuperação
econômica onde o homem, não o“homo economicus”,
mas o homem como ser social e biológico, não atingir
certo nível mínimo de educação e de rigidez.
(CAMPOS, 1952, p. 139).
Vale sublinhar que o universo rural, segundo
notou Antipoff, era menos servido em termos de
políticas públicas que o urbano, sobretudo, na busca de
soluções às duas variáveis, nas suas palavras: o conforto do homem da cidade mesmo
defeituoso, hoje, é feito numa ação coletiva de grande valia; o homem do campo luta por sua
própria conta, perdido na solidão dos espaços sem fim. Antipoff lembra ainda que milhões de
brasileiros não vivem propriamente, mas sim, denuncia ela , vegetam melancolicamente, em
humilde significação com seu destino de parias. (CDPHA, 1986, p. 63). A leitura desses
registros permite observar que havia, em tese, uma crítica aos modelos políticos de
atendimento aos menos privilegiados da sociedade - o habitante rural que mantinha uma
qualidade de vida de fato pauperizada. Tais condições, como defendeu a professora,
favoreceram o desenvolvimento de uma cultura cuja alegria havia adormecido como a Bela
do Bosque”, na rotina de cem anos passados. Na sua visão existia, naquele momento, uma
nuvem de decadência nas pequenas cidades, focalizada na ausência quase completa de
aldeias, elemento que em nações organizadas constituem as bases da civilização do interior”.
(1986).
Ilustração 3 - acima: ao meio, a professora
Helena Antipoff recebe homenagens
(Acervo - Conselheiro Mata).
56
Essa caracterização inscreve-se, portanto, num contexto de escrita da cultura rural,
como se não houvesse sofrido nenhuma alteração desde o tempo da colonização, isto é, um
tipo de vida rústica que, em quantidade majoritária, remanescia no espaço geo-social mineiro.
Couty, biólogo francês, residente no Brasil no final do século XIX, citado por
Carvalho (1987) afirma:
o Brasil não tem povo.
Segundo ele, “entre os índios e
escravos, de um lado,
calculados por ele em dois
milhões e meio, e os 500 mil
proprietários de escravos, do
outro, vegetam seis milhões de
pessoas. Entre estas, o via
aquelas massas fortemente
organizadas de produtores
livres agrícolas ou industriais
que, em povos civilizados,
compõem a base de toda
riqueza e que também
constituem a massa de
eleitores capazes de impor ao
governo uma direção definida.
(CARVALHO, 1987.p.67).
Portanto, como nota Carvalho, o
estrangeiro, pessimista e preconceituoso, julgou
que não seria possível o Brasil formar, de fato,
uma massa de cidadãos com elementos nativos.
Seria necessário buscá-los na Europa através do incentivo à imigração (Carvalho, 1987)
9
.
Dessa forma, se de um lado era percebida a necessidade de substituir o tipo biológico-
cultural-humano brasileiro do interior, de outro, os médicos do Brasil chegaram à conclusão
que era preciso cuidar da raça, o que significava zelar pela Nação. Segundo parte da teoria
médica da época, descreveu Schwarcz (1993), era privilégio necessário executar tal serviço
para a grandeza do país. Assim, enquanto na Bahia se proliferava o discurso baseado nas
noções de eugenia, pensamento segundo o qual raça brasileira teria solução na efetivação
futura da jovem República, desde que essa buscasse melhoras o tipo físico-moral do elemento
humano nacional. Por se turno, o comportamento era outro no sudeste, ou seja, o de uma
atuação cada vez mais agressiva dos órgãos responsáveis pela higienização e saúde do espaço
9
Não por acaso, o governo mineiro, nos anos 20, incentivou o ensino agrícola através de reaparelhamento dos
estabelecimentos existentes e da implantação de outros; celebrou acordo com a União, para a execução dos serviços de apoio
à lavoura do algodão; estimulou, sobretudo, e de maneira decisiva a colonização do Estado e foi intermediário da vinda de
mais de três mil novos imigrantes para o Estado. (Cf. SECRETARIA DE AGRICULTURA, 1979, p.38).
Ilustração 4 – O jornal “Folha de Minas”
divulga investimentos do governo JK para
conclusão da obras da Escola Normal de
Conselheiro Mata (Acervo - Conselheiro Mata).
57
da cidade. A título de exemplo, vale lembrar das campanhas compulsórias de vacinação
ocorridas no Rio de Janeiro, do início do século XX.
Ficam patentes, dessa forma, quais seriam as batalhas travadas por essa geração de homens,
políticos e civis, que refletiam sobre os “clamores” sociais em defesa dos interesses presentes
e futuros daquelas gerações. Questões que eram explicitadas através da comparação das
propostas de atualização da sociedade frente às questões mundiais, em relação ao estilo de
vida que levava a população rural e interiorana do país. Vale salientar, de certa forma, que a
população desvalida buscava por seus próprios meios suprir as faltas de alimentos e moradia.
Nesse quadro, a aprendizagem ou inculcação de técnicas de higiene na população revelava o
objetivo governo de controlar e racionalizar o modo de vida de determinados setores da
população.
No entanto, conforme acusou Renault, o ensino voltado para esses objetivos em
Minas Gerais atrofiou. Em outras palavras, ele comunicou a posterior intervenção do Estado
na assistência técnica às escolas rurais. A sua função era civilizar-educar o caipira, ou rurícola
para os hábitos da vida moderna que eram compostos, como foi dito, por um outro padrão
de higiene e por outras formas de adquirir alimentos. Para Brandão (1983), o homem caipira
era concebido em relação ao citadino, aquele livre do trabalho na terra, e para ele não era
difícil compreender as razões pelas quais as gerações de 1930-40-50 passaram a imaginar uma
forma de educar a população rural. Destacava-se que essa categoria social era vista como
dispersa, indigente, indolente e ignorante. Ou seja, de pobres expropriados, o caipira era
raramente apontado pelo seu trabalho na terra, são trabalhadores da terrae, por isso, alude
o pesquisador, são homens, não sobram tempo nem condições para cultivarem a si
próprios”. (p.20). Os cativos da terra, agora incorporados às teorias educativas, não eram
escravos mais, nem eram ainda senhores de terra”, estando, por isso mesmo, “mais afastados
da sua cultura civilizadora do que os próprios índios catequizados, ou do que os próprios
escravos civilizados”. (p.21-22).
Com efeito, o estereótipo pré-civilizado de homem por ser oriundo da roça, cujas
formas e gestos incomodavam boa parte dos citadinos e que recorriam às metrópoles e médias
cidades “cheios” de fome, sujeira e falta de aptidão e habilidade com as artes trabalhistas da
civilização do século XX. Em outras palavras e de forma antagônica, poder-se-ia denomina-
los como humano cujo sentimento pelo outro o levava a priorizar a “palavra dada, a
probidade, a respeitabilidade e a independência moral”. (BRANDÃO, 1983, p.24).
58
Embora haja contradição quanto aos conceitos ofertados entre observadores de
gerações diferentes e de postos de observação distintos sobre quem eram e como viviam os
rurícolas. O que fica claro é o fato de que a vida no campo não ia bem, ou seja, vinha se
tornando um perigo, tanto para seus próprios moradores quanto para os moradores das
cidades. Estes, por certo, acabavam por ter uma visão das más condições de vida, na medida
em que podiam assistir cotidianamente à chegada de dezenas de pessoas procedentes das áreas
rurais aos espaços urbanos do país, sem estarem, muitas vezes, preparadas para buscar ajuda,
seja por falta de condições materiais ou por falta de comunicação.
Por outro lado, vale ressaltar que a imagem-síntese que muitos detinham da figura
desfigurada do rurícola havia sido, num certo sentido, confeccionada por vários artistas no
início do século XX. É o caso, por exemplo, de Monteiro Lobato, segundo o qual o rurícola
era aquele que convivia com o atraso e que não era vítima, mas produtor ao cultivar a coivara,
a doença e a absoluta ignorância. Brandão (1983), ao analisar a caracterização feita por
Lobato, explicita que este doará contornos narrativos a um caipira que coexistia com um
rancho de sapé aos pedaços e, com uma estrutura de reprodução da miséria. Além disso,
ressaltou Lobato:
O rurícola é uma quantidade negativa. Tala cincoenta alqueires de terra para
extrair deles o com que passar fome e frio durante o ano. Calcula a sementeira
pelo máximo de sua resistência às privações, nem mais, nem menos. ‘Dando pra
passar fome’, sem virem morrer disso, ele, a mulher e o cachorro está tudo bem;
assim fez o pai, o avô, assim fará a prole empanzinada que naquele momento
brinca nua no terreiro
. (M. Lobato apud
BRANDÃO, 1983, p. 27, grifo nosso).
Sabe-se que M Lobato era um escritor lido e, certamente, ao publicar essas descrições
nos anos 20 sobre o caipira, marcava no imaginário de muitos esse modelo de retirante. Um
retirante que, ao penetrar nas cidades, causava espanto em muitos que, ora ou outra,
comunicavam suas impressões desses desvalidos aos poderes públicos constituídos. Talvez
em razão dessa imagem estilizada do homem do mato, tenha emergido no Brasil, nessa época,
como ratificou Antipoff (1986) a mentalidade ruralista ou, em outras palavras, uma atividade
militante de paladinos convictos da necessidade de se interferir de forma civilizadora no meio
rural brasileiro, tendo como figuras de relevo: Mariano Procópio, Alberto Torres, João
Pinheiro, Assis Brasil e outros como, por exemplo, Teixeira de Freitas, Sud Mennucci,
Alberto Torres Filho, dirigentes das Sociedades Agrícolas e propagandistas dos clubes
agrícolas que, segundo ela, naquele momento precisavam de uma cultura sistemática. Estes
seriam, juntamente com
59
artistas de grande talento filhos desta ou daquela região, que traçam com letras de
fogo depoimentos terríveis sobre a existência de milhares de homens, de mulheres e
de crianças brasileiras. Monteiro lobato, Jorge Amado, Graciliano Ramos e outros
na literatura; Portinari, Lula Cardoso; Tarsila, na pintura, unânimes nos seus
quadros de sofrimento, testemunham que um desperdício absurdo de valores
humanos, nesta terra tão despovoada. [...] não seria apelos que a arte lança aos
cidadãos adormecidos para acordá-los do sono despreocupado e sacudir para a
ação os mais sensíveis, pelo menos? (apud, CDPHA, 1986, p. 65).
Porta-vozes de uma imaginação social, de certa forma difusa, sobre as reais condições
de vida do matuto, indicaram porque ele merecia uma interferência civilizante por parte de
órgãos do Estado que, até então, poder-se-ia dizer, fizeram-se ausentes. No entanto, para se
fazer presente e confiável, era preciso ao Estado fabricar um sistema imaginário em que o
próprio rurícola acreditasse nele mesmo e o visse enquadrado naquela categorização de forma
que fosse dada a alguns chefes políticos a função de extirpadores daquelas más condições de
vida.
Como membro e mentor dessa nova imaginação ruralista, o Secretário de Educação
de Minas destacou, em 1947, que “as mentalidades urbanas que vêm vários anos
dominando a administração pública, têm de ceder lugar ao calado clamor que sobe dessas
dilatadas áreas de solidão, silêncio e isolamento”. (RENAULT, 1952.p. 19). Aqui, fica
latente a defesa feita pela Secretaria de Educação de Minas ao povo do interior e sua crítica
aos governos precedentes em relação a essa faixa da população. Em poucas palavras, como
aventou Charoudeau (2006), o discurso político procura obter a adesão do público a um
projeto ou a uma ação; insiste, mais particularmente, na desordem social da qual o rurícola era
vítima. Na origem do mal, encarna-se um adversário ou um inimigo (o pensamento urbano e
as formas urbanas de organização educacional), e na solução salvadora encarna a figura
daquele que fala. Por seu lado, frisa o autor, “a solução salvadora consiste em propor
medidas que deveriam reparar o mal existente”. (2006, p.91).
Mas, como lembra Buffa e Nosella (1997) vivia-se nesse momento a ressaca da
Segunda Guerra, bem como, o alvorecer da Guerra Fria a qual, segundo eles, teve como
estopim o lançamento do Plano Marshall, em 1947, na Universidade de Harvard e sua
assinatura pelo presidente Truman, em abril de 1948. Este Plano, pela ajuda à recuperação
econômica a Europa, visava consolidar o bloco ocidental sob a hegemonia dos EUA”. (p.
117). Aqui no Brasil estava em curso o debate político em torno da elaboração da Lei de
Diretrizes e Bases para a educação nacional. De fato, na visão dos pesquisadores, para os
60
políticos envolvidos na questão, figurava, por assim dizer, o princípio de que todo cuidado
era pouco, isto claro, considerando o cenário internacional.
...todo cuidado era pouco. O ex-ministro da Educação do Estado Novo, agora
deputado, Gustavo Capanema, nomeado relator do Projeto de Diretrizes e Bases,
redige um parecer concluindo pela necessidade de revisão desse Projeto, de vez
que era ele, afirmava Capanema, fruto não de determinações pedagógicas e, sim,
de intenções políticas antigetulistas. Recomendava, ainda, maior centralização
político-administrativa do ensino brasileiro, pois entendia que a educação é um
problema eminentemente nacional. [...] justamente devido esses limites, no final da
década de 50 e inicio da de 60, surgem outros movimentos sócio-educacionais fora
do espaço do Congresso e da própria instituição escolar, como por exemplo, o
Centro Popular de Cultura (CPC), O Movimento de Educação de Base (MEB).
(BUFFA E NOSELLA, 1997, p. 115-117).
Em Minas ocorreu o que se pode chamar de uma centralização negociada da escola
rural. O governo enfatizou que o problema do ensino rural estava sendo resolvido pelo que
em ciências experimentais se nomeia de “método de convergência”, isto é, com uma
simultaneidade de ações e com todos os meios ao alcance do mesmo. Ressaltava-se que
investiria neste setor da escola mineira, em 1949, previsto um orçamento de 8.424.640,00
cruzeiros. Ciente das dificuldades que essas despesas acarretariam para os cofres do Estado,
Renault destacou sua clareza quanto à necessidade daqueles investimentos. Sugeriu ele, ainda,
ao governador que lançasse mão de recursos de “parcela da arrecadação da taxa de
recuperação econômica”. Aduziu, portanto, o Secretário que:
a aplicação era legítima. O problema da recuperação econômica é visceralmente
inseparável do de educação geral, e não apenas o problema do ensino técnico.
Vossa excelência clarividentemente o reconheceu e proclamou mais de uma vez em
discurso público. Não é diversa, como não poderia deixar de ser, a opinião dos
ilustres Secretários de Finanças e da Agricultura. Apenas espíritos de uma só
dimensão pensariam em separar, tornando-as incomunicáveis entre si, cousas
radicalmente ligadas, que vivem e podem viver simbioticamente. (RENAULT,
1952, p.114-15).
2.6 O Instituto de Organização do Meio Rural.
Órgãos de influência cultural
Antipoff, 1947
Nesta articulação entre diferentes órgãos do governo que estavam, na ocasião, ligados
nas questões da recuperação econômica, criou-se um clima favorável à Escola Normal Rural.
Com efeito, não bastava a elaboração desse plano se o número de colaboradores não fosse
alargado. A proposta apresentada para reforçar o quadro de parceiros implicaria em alterar a
61
relação de poder que as prefeituras exerciam sobre a escola rural. Para tanto, comunicou-se
que o novo passo estimularia a assinatura de convênios com os municípios, os quais já haviam
sido previstos no decreto nº. 2.545, de 5 de dezembro de 1947. Tais convênios obedeceriam,
segundo Renault, alguns princípios básicos como: a) a orientação técnica das escolas rurais, a
partir da assinatura, caberia ao Estado; b) os novos professores seriam nomeados e
contratados pelo Estado e, os antigos, conforme o convênio, tornar-se-iam professores
estaduais, cujas aposentadorias correriam por conta dos municípios; c) os vencimentos dos
professores seriam completados pelo Estado até atingir o valor de 400 cruzeiros mensais, no
caso de professores leigas e 600 cruzeiros mensais, se se tratasse de normalistas, ou de leigas
que tivessem feito o curso de aperfeiçoamento na Fazenda do Rosário ou em outra instituição
que viesse a ser criada pelo governo; d) a importância de 200 cruzeiros seria considerada
vencimento mínimo, pago pelos municípios; e) os municípios deveriam contribuir para o
vencimento dos professores rurais, e este valor seria recolhido pela coletoria do Estado, com
três meses de antecedência; f) os municípios concorreriam entre si, com auxílio, para a
realização de cursos de aperfeiçoamento que o Estado viesse a programar; g) ficaria a cargo
do município a conservação e o conserto dos prédios escolares rurais; h) o Estado arcaria com
a metade da despesa para a aquisição de material didático e mobiliário. Em suma, pode-se
inferir que, com estas medidas, o governo concebeu uma gica estrutural para a educação
rural em Minas. Vale lembrar que, em 1949, foram firmados, com base nesse esboço,
convênios com oito prefeituras.
A criação do Instituto de Organização do Meio Rural, iniciativa necessária para se
concretizar os princípios acima defendidos, seria precedida por portaria que, segundo
comunicou Antipoff (1986), serviria para o beneficiamento de orientadores da educação no
meio rural e toda a população enraizada nos arredores. Deveriam ser procuradas, entre
outros, as administrações públicas municipais cujo trabalho, sublinhou a educadora, “se
ressente precisamente pela carência de auxiliares idôneos no campo cultural, atuantes junto
à população rural”. (Antipoff, 1986, p.69). A professora ponderou ainda que a sigla IOR foi
sugerida pelo Secretário de Geografia e Estatística ao qual foi submetido a idéia em questão.
Este órgão, o IOR, reger-se-ia ainda pela Lei Orgânica do Ensino Normal (Decreto
lei 8530, de 2 de janeiro de 1946). Julgavam-se necessários, segundo a Lei, dois níveis de
formação do pessoal docente para o ensino primário, bem como sua adaptação às vocações
econômicas regionais. Nesse, aduz a letra da lei:
62
Deve ser observado que, havendo sentido o problema dessa diferenciação
necessária na preparação do magistério, alguns educadores têm propugnado pelo
estabelecimento de escolas normais rurais. O projeto não repudia essa maneira de
ver, antes a amplia, admitindo o estabelecimento de cursos normais regionais, de
estrutura flexível, segundo as zonas a que devem servir, e que poderão ser tanto de
sentido nitidamente agrícola, como de economia extrativa, ou ainda de atividades
peculiares a zonas do litoral. Foi essa também uma das conclusões do recente IX
Congresso Brasileiro de Educação, reunido nesta capital, pela Associação
Brasileira de Educação (INEP, 1946, p. 22-3).
Essa passagem explica, de certa forma, qual era a percepção em voga por parte de
alguns educadores brasileiros a respeito da formação para o magistério. O plano do IOR, por
ter sido idealizado por Antipoff em 1947, tinha por meta concomitante praticar os desígnios
da lei, bem como criticar essa modalidade de formação de professores demarcada pela
legislação. Com base na recente lei, advogou Antipoff, não parece plausível que as Escolas
Normais atuais e os Institutos de Educação que ornam ao seu modo as capitais de Estados e
do Distrito Federal, praticando ainda um ensino marcadamente impregnado de academismo
artificial, possam formar guias esclarecidos e dinâmicos para as gerações “em broto”.
Ficamos, diz ela, deveras estarrecidos ao tomar contato com algumas escolas ditas de curso
normal regional, já funcionando sob o novo regime da Lei Orgânica de Ensino Normal de
1946”. Condena a professora esse tipo de escola
dizendo que seu trabalho pedagógico segue numa
rotina desesperadora, com métodos preguiçosos da
escola nada ativa, sem ciência, sem vida, sem alegria.
(CDPHA 1986, p. 66).
Na percepção de Hall (1971), para uma Escola
Normal Rural ganhar ares de eficiência era preciso entre
várias coisas: que o professor residisse na escola em
tempo integral; que conhecesse intimamente a área rural
e os problemas da mesma área; que fosse especialista
nas matérias ensinadas na Escola Rural e não simples
conhecedor de disciplinas gerais; de preferência,
pessoas que tiveram longa experiência de ensino em
escolas elementares, mas – diz ele: não devem ser professores servilmente escravos da
metodologia e do programa tradicional; devem ser, em primeiro lugar, professores, e não,
Ilustração 5 - acima: capa do livro de Robert
King Hall (Acervo CDPHA).
63
pesquisadores, pois não é tão importante possuir altos diplomas universitários, como seria o
caso das escolas urbanas. (Hall, 1971, p. 6)
10
.
Em outros termos, como caracterizou Antipoff, os Institutos de Educação Rural ou
Centros de Urbanização do Meio Rural teriam de fato como missão a formação de
indivíduos capazes de agir no meio rural como educadores e orientadores de atividades úteis
ao progresso econômico e social deste meio”. (CDPHA, 1986, p. 69-70).
Desse modo, deixava-se claro que os procedimentos que faltavam aos mineiros do
interior eram, principalmente, os adestramentos para o manejo adequado de utensílios
indispensáveis, método, organização do trabalho intelectual, planejamento, exatidão, sistema
e organicidade. Renault, que acreditava numa desordem quanto às técnicas de organização e
produção instaladas no interior do estado - diz - estamos perdidos na floresta de enganos dos
hábitos intelectuais errados, a mania do mais ou menos em tudo, a começar pela
administração pública. (RENAULT, 1952, p.38). Assim, o Secretário refere-se à ausência de
segurança que garantisse uma nova situação social e política no interior e que arrastava a
comunidade mineira para um eminente caos.
Com efeito, tais são as tarefas, ratificou Charaudeau (2006), que o discurso político, na
busca de persuasão, estabelece com a paixão, pois o campo político é, por excelência, o lugar
em que as relações de poder e de submissão são governadas por princípios passionais. Como a
educação rural foi politizada na condição de conteúdo de discursos, segundo o autor, esse
mesmo discurso deve propor ao cidadão um projeto de escola ideal, deve-se tornar fidedigna
e tentar persuadir da legitimidade de suas características. (p.58).
A proposta de uma renovação ampla da escola rural estava atrelada, como evidencia
Dulci (199), a um plano geral proposto para o Estado que procurava alcançar os diversos
setores produtivos, e a escola era, neste contexto, o instrumento de relevo para atingir as
metas do plano. Para o pesquisador, o PREFP proposto pela comissão de técnicos e políticos
composta por Campos em 1947, partiu de um diagnóstico técnico para justificar o quanto
10
Renomado mestre da Columbia University, onde lecionou Educação Comparada, e conhecedor das questões de educação
rural em vários países da América Latina e do Oriente, veio ao Brasil para examinar detidamente duas partes do programa de
organização do ensino primário, elaborado pelo INEP: o treinamento de professores provindos de zonas rurais de várias
unidades federadas e a construção de escolas primárias rurais. O resultado do trabalho realizado pelo professor Robert King
Hall deu origem aos boletins 47 e nº 64. A obra fornece informações sobre os cursos de formação de professores para os
vários tipos e ramos de ensino: primário, secundário, industrial, comercial, agrícola, enfermagem e serviço social, educação
física, música e canto, canto orfeônico, desenho, pintura, escultura e gravura e do ensino superior. Além de apresentar a
complexa estrutura que envolve a formação de professores, menciona a documentação pertinente a cada curso, a legislação
específica, os cursos de aperfeiçoamento, a relação dos estabelecimentos onde são ministrados os cursos e onde podem ser
obtidos os registros de professores de cada especialidade (Cf. http://www.inep.gov.br/download/cibec/obras_raras/XV.pdf)
64
Estado e povo estavam esgotados em conseqüência da atuação prolongada de fatores
negativos. Nos dizeres do Plano:
A situação geográfica de Minas em relação aos Estados irmãos, sua topografia
acidentada, a deficiência de meios de transporte, bem como uma progressiva e
alarmante diminuição da fertilidade das terras são as causas primárias do baixo
índice de nosso progresso material. Essas causas, entretanto, têm os seus efeitos
agravados no dia-a-dia e tendem a perdurar indefinidamente como fatores de
depressão, porque contra elas ainda não se erguem em Minas administrações
corajosas e obstinadamente decididas a vencê-las (apud, DULCI, 1999, p.81).
Ao seu modo, a Lei Orgânica do Ensino Normal, no seu tulo II, no capítulo I, no
parágrafo § 1. º estabeleceu que: o ensino de trabalhos manuais e das atividades econômicas
da região obedecerá a programas específicos que conduzam os alunos ao conhecimento das
técnicas regionais de produção e da organização do trabalho na região. (INEP, 1946.p. 27).
Presume-se conter no significado do enunciado legal um direcionamento da formação de
professores para que fossem capazes de abordar, de alguma forma, a cultura econômica dos
alunos onde estivessem atuando, como um item do seu plano de ação educativa. Com tais
atividades a escola, provavelmente, atenderia de alguma forma a relação economia-educação
que fora elaborada na época.
Sem dúvida, o tema do regionalismo estava presente como pressuposto para a
compreensão e, por conseguinte, para a tomada de decisões no sentido de alavancar a
democracia que se dizia em curso desde o fim do modelo varguista. Entretanto, destaca
Mennucci: a posição da zona rural é a da inferioridade total. (1944, p. 289)
11
. De acordo
com o professor, o aparelhamento escolar no Brasil estava organizado de tal forma que quatro
quintos das despesas do ensino eram feitos na cidade, que tinha apenas um quarto da
população nacional. Acrescenta ele:
Mandamos para a roça professores cuja formação intelectual e profissional e cuja
mentalidade estão inteiramente voltadas para a vida social urbana e que não
conhecem nem fazem a mínima idéia da organização rural em que vão viver e
atuar. Inspirou-nos um simplista e traiçoeiro critério de analogia: as escolas que
haviam provado bem na cidade, haviam de dar o mesmo bom resultado no campo.
(apud, AOCBE, 1944, p.290).
Observações como essas explicitam qual era o quadro das concepções acerca da escola
rural nos seus diferentes níveis. O mesmo professor aventou em outras palavras que:
11
Para maiores detalhes Cf. Anais do Oitavo Congresso Brasileiro e Educação, 1942, Goiânia, publicado pela Associação
Brasileira de Educação em 1944. Usaremos para citar daqui em diante a sigla AOCBE em vez de citar Anais do Oitavo
Congresso Brasileiro e Educação.
65
A escola rural não pode ser, portanto, o que tem sido hoje. Deve ser um aparelho
educativo organizado em função da produção. Se nós tolerarmos que se dispense
esse caráter às classes primárias da cidade e nisso há, a meu ver, um erro no
campo o é possível olvidar que o Brasil depende fundamentalmente do trabalho
agrícola para a obtenção do ouro nos mercados estrangeiros. E como o regime
internacional é o da concorrência, temos de fornecer artigos bons por preços
acessíveis, mais acessíveis do que os dos outros. E, logicamente, finaliza, o produto
de qualidade só o conseguirá o obreiro preparado e com conhecimento das tarefas
que empreende. (apud, AOCBE, 1944, p.290).
Esse ideário de diagnóstico e mudança nos padrões e formas dos ritos didáticos da
escola afetou, como ressaltou Casasanta (2003), o governo mineiro ao longo dos anos após a
Revolução de 30. Segundo ela, o governo não se preocupava em explicar o significado que os
novos métodos incorporavam no corpo das medidas que diziam renovar a escola, “mas em
garantir sua aplicação”. Revela Casasanta que o ”êxito da tarefa escolar dependia de um
ambiente escolar cientificamente organizado, capaz, diz ela, de proporcionar aos alunos e
professores condições adequadas de trabalho”.
(p.188).
Pelas sugestões do consultor internacional do
INEP, Hall, o espaço-tempo da escola deveria ser
distribuído entre: bibliotecas, museus, clubes
culturais, músicas, jornais, camaradagem intelectual,
conferências interessantes; elementos necessários
para a continuação do crescimento intelectual”.
(H
ALL
. 1971.p. 4). E, acima de tudo, Escolas Normais
e Secundárias Rurais deveriam funcionar no espaço-
tempo do internato, contando com professores de
tempo integral. (H
ALL
, 1971).
A Lei de 1946, ao tratar da estrutura o Ensino
Normal e, especificamente, o curso de regentes de
ensino primário, previa no seu artigo 7º:
O curso de regentes de ensino primário se fará em quatro séries anuais,
compreendendo, no mínimo, as seguintes disciplinas na Primeira série: Português,
Matemática, Geografia Geral, Ciências Naturais, Desenho e Caligrafia, Canto
Orfeônico, Trabalhos manuais e atividades econômicas da região, Educação Física.
Segunda série: Português, Matemática, Geografia do Brasil, Ciências Naturais,
Desenho e Caligrafia, Canto Orfeônico, Trabalhos manuais e atividades
econômicas da região, Educação Física. Terceira série
: Português, Matemática,
História Geral, Noções de anatomia e Fisiologia Humanas, Desenho, Canto
Orfeônico, Trabalhos manuais e atividades econômicas da região, Educação Física,
recreação e jogos. Quarta série: Português, História Geral, Noções de Higiene,
Ilustração 6 -
acima: capa dos "Anais do
Oitavo Congresso Brasileiro de
Educação" (Acervo - C DPHA).
66
Psicologia e Pedagogia, Didática e prática de ensino, Desenho, Canto Orfeônico,
Educação Física, recreação e jogos. (INEP. 1946, p.27).
Esse deveria ser então o roteiro a partir do qual o espaço-tempo do internato (e Escolas
Normais Rurais) estaria condicionado, pois acreditava-se que este era o caminho mais curto
para formar os professores atentos às perspectivas e problemáticas colocadas pela e para a
sociedade que os cercava.
2.7 A “especialização” da Mestra Rural e Ensino Normal em Minas Gerais.
Uma escola normal urbana nunca será capaz de produzir professores desse tipo.
Sud Mennucce, 1942
... é indefensável a idéia de que o professor primário rural constitui um tipo de
professor primário à parte, diverso e inferior.
Renault, 1952.
Tendo em vista a ampliação do campo de atuação da professora primária para o meio
rural, segundo Mennucci (1942), era preciso que sua formação fosse numa Escola Normal de
outro gênero. Isto é, uma escola especializada, que se preocupasse em preparar o mestre com
amplos e seguros conhecimentos de agricultura, de indústrias rurais, de economia rural e, ao
mesmo tempo, entendesse de profilaxia e higiene e de dietética, para que pudesse atuar como
um líder, “quase como um oráculo”. Nas suas palavras: “enquanto os núcleos campesinos
não sentirem a superioridade desse mestre, a ascendência de sua cultura e a verdade dos
métodos que apregoa, o rurícola não o respeitará e menos ainda o acompanhará”. (apud
AOCBE, 1942, p.291).
O curso normal rural teria seu currículo equiparado ao proposto pela lei Orgânica do
Ensino Normal de 1946, na qual se ressaltava, no entanto, o termo Regional. Conforme
explicitou Tanuri, essa Lei retomava a orientação descentralista e liberal da Constituição de
1934. Nesse aspecto, os Estados conservariam a liberdade de atuação para estruturar esta
modalidade de ensino de acordo com a demanda por ele identificada. Entretanto, ressalta ele,
“a grande maioria dos estados tomou a referida Lei Orgânica como modelo para (re)
organização de suas Escolas Normais”. (2000, p.22), ocorrendo, assim, uma padronização
desse nível de ensino, embora o mesmo fosse diversificado em dois níveis.
Mesmo assim, o currículo dos dois primeiros ciclos incorria nas “velhas falhas” que
estimularam críticas às Escolas Normais ao longo da história. Como explicou Tanuri (2000):
67
os cursos normais, em seus diferentes veis, contemplavam majoritariamente disciplinas de
cultura geral, restringindo a formação profissional à presença de duas disciplinas na série
final: Psicologia e Pedagogia, bem como Didática e Prática de Ensino”. (p. 76). De certa
forma, a literatura secundária sobre a Escola Normal Regional mostra que os futuros
professores não receberam a instrução suficiente para entrar em contato e atuar como
elemento integrador no meio rural, conhecendo superficialmente a inclinação dos meninos,
dos pequenos agricultores. Necessário seria, declara Teixeira (1944), sentir e compreender, no
decorrer do curso, as carências para o êxito da formação do professorado. Importante seria a
criação obrigatória, em todas as Escolas Normais, de uma cadeira de ensino rural, cuja
missão precípua seria a de
incutir no espírito dos
normalistas a compreensão
do ruralismo e do que ele
representa para a
nacionalidade”. (Cf.
AOCBE, 1944, p. 338).
Tabajara Pedroso, em
artigo de jornal, ressalta que,
em “Minas Gerais, a obra de
recuperação do homem do
campo por meio da escola
iniciou-se no governo passado (PEDROSO, 1951, p. 13). Em sua opinião, foi durante o
secretariado de Abgar Renault que tal obra teve início; e deixa claro que ela vinha sendo
regularmente seguida pelo governo posterior: “Corria o ano de 1948, no seu meado. Era
governador de Minas Gerais o Dr. Milton Campos, que, numa hora feliz, trouxe de volta ao
nosso estado a professora Helena Antipoff, que se achava no Rio de Janeiro, a serviço do
Departamento Nacional da Criança, desde 1945”. (FUNDAÇÃO HELENA ANTIPOFF,
1978.p.2).
As evidências analisadas mostram que o governo de Minas trabalhou no sentido de
produzir um espaço que atuasse na formação de profissionais especializados. Pedroso salienta
ainda que o êxito desse empreendimento educacional pode ser presumido, principalmente pela
escolha feliz da dirigente do serviço: “a incansável lutadora Helena Antipoff, cuja
personalidade impressiona pela justeza e segurança das ações, pela bondade cativante com
Ilustração 7 - acima: Normalistas organizadas em fila (Acervo -
Conselheiro
Mata)
68
que se irradia através de seus auxiliares e cooperadores, alertando neles especial capacidade
para as mais difíceis contendas da vida educacional”. (PEDROSO, 1951.p.13)
Claro fica que, havia certa confiança no papel que desempenharia a professora Helena
Antipoff nessa empreitada. Entre outras coisas, vale lembrar que ela era conhecida no meio
educacional mineiro. A professora, cuja data de nascimento era 1892, era natural da Rússia.
Segundo Campos (2003, p. 149), Antipoff cursou Psicologia em Paris, “no Laboratório
Binet-Simon, em 1911 e ainda, em Genebra, no Instituto Jean-Jacques Rousseau, entre 1912
e 1915.” Nas palavras do governador, “uma educadora de renome nacional, a quem Minas já
deve tantos serviços, a professora Helena Antipoff incumbiu-se da direção dos cursos.” (In:
ESCOLA RURAL, 1948.p.5) Assim, fica patente a relação entre o que essa professora
poderia oferecer ao programa de formação de professores para a escola rural e os planos de
governo para o campo do ensino. Renault, ao se referir à relação de Helena Antipoff com a
educação rural em Minas, destaca que, devido ao prestígio da professora, a quantidade de
alunos interessados nos cursos de formação e educação de professor especializado “dobrou e
irá triplicar o número dos cursos.” (In: ESCOLA RURAL, 1949.p.5)
12
.
Campos (2003) lembra que, em 1925, Antipoff era assistente” de E. Claparède no
Instituto Rousseau, na Suíça. Nessa época, estava em debate e sendo apontada como
necessidade a “eliminação das classes heterogêneas” que guardavam, no seu interior, uma
variedade de tipos mentais. De acordo com informações disponibilizadas por Amarante,
citado por Monarcha (1999), a teoria de Claparède preconizava, entre outras coisas, uma
psicologia polimorfa - isto é, para crianças distintas, é necessário, igualmente, um ensino com
tais características perfeitamente ajustável às necessidades individuais. Destaca ele que, na
visão de Claparède, esse era o único critério que permitia o desenvolvimento de uma classe
segundo seu ritmo, o único que poderia proporcionar a escola sob medida tão sonhada por
Claparède”. (MONARCHA, 1999.p.311)
Antipoff naturalizou-se brasileira e, como descreve em um artigo de jornal de 1954,
foi aluna do grande educador Eduard Claparède e, segundo a mesma declarou, com os
ensinamentos desse mestre resolveu dedicar-se às crianças anormais. Para se compreender a
sua inserção e seu pensamento na cultura científico-educacional mineira, faz-se necessário
apontar algumas características do contexto em que ela chegou ao Brasil na década de 1920.
12
Segundo Renault em mesmo discurso: “A tarefa da educação é semear frutos de tardia colheita”- diz que: o ponto focal
do ensino primário em zona rural foi atacado convergentemente e, ao cabo deste ano, Minas Gerais contará, se Deus nos
ajudar, com duzentos professores excelentemente preparados para a missão [...] a saber criar núcleos de condensação e
irradiação civilizadora nos campos mineiros [...] e, é de esperar que a ação das professoras diplomadas neste curso venha
a constituir-se em elemento rigor de criação e propagação de hábitos novos (RENAULT In:.ESCOLA RURAL, 1949.p.6)
69
Segundo Prates (2000), pode-se dizer que nesse período teve início o “fenômeno
econômico denominado substituição de importações”. Diante das dificuldades acarretadas
pela Primeira Guerra Mundial (1914 1918), ocorreu uma diminuição no ritmo das relações
econômicas em países desenvolvidos como a Inglaterra, com os países fornecedores de
matérias-primas e produtos agrícolas, como era o caso do Brasil. Minas Gerais, diz ela, que
havia tido seus principais produtos na área da agricultura e da pecuária, foi forçada a
mudar sua política econômica de modo a contemplar o mercado naquelas áreas em que a
importação havia se tornado incipiente” ( p.69.).
As novas realidades traziam expectativas para as populações, insegurança para os
governantes e foram muitas as demandas educacionais feitas pelos mais diversos
grupos. Dentre eles, os educadores buscavam uma nova forma de se fazer
educação e os governos buscaram saída para a questão de modernizar sem perder
o poder. (PRATES, 2000.p.70).
Foi nesse contexto de crise econômica e entusiasmo educacional que a professora
Helena Antipoff, nas palavras de Campos (2000), “à convite do governo mineiro, em 1929”,
transferiu-se para o Brasil, mais especificamente para Belo Horizonte, para dirigir o
Laboratório de Psicologia da Escola de Aperfeiçoamento de Professores de Minas Gerais e
colaborar na implantação de reforma educacional de 1927 1928”, proposta pelo governo
Antônio Carlos e de Francisco Campos. (p.150)
Na visão de Prates (2000, p. 68), tal reforma “levou Minas a desempenhar, por muitos
anos, o papel de estado centralizador do modelo educacional brasileiro em vel de escola
primária”. Segundo ela, buscava-se um novo modelo de escola capaz de liderar e
implementar, de acordo com as metas traçadas pelo governo da época, um determinado
processo de formação de um cidadão novo pretendido pelo estado. Emprestou-se à
professora primária papel primordial”.
Dessa maneira, caberia a essa professora primária, ao atuar no meio rural, tornar esse
lugar mais produtivo. Todavia, ao analisar idéias em torno desse ramo de ensino quatro anos
depois que a Escola de Aperfeiçoamento fora inaugurada, Casasanta (2004) destaca qual era a
leitura que um determinado jornal fazia do tema:
A escola rural será eficiente se combater em suas fontes o urbanismo e
promover, pelo trabalho racional, a permanência do homem no campo, em seu
habitat natural, garantindo-lhe mais conforto. Continua: a escola rural deve
adaptar o indivíduo à situação de cada região, é preciso que ela aja pelo lado
econômico e social, como elemento coordenador de energias. Que ela possa
tornar-se útil ao meio em que vive, despertando e acoroçoando vocações,
mantendo tradições e dando vida à economia social (Pelo ensino, 1933, apud
70
Casasanta, In: MANIFESTO DOS PIONEIROS DA EDUCAÇÃO: um legado
educacional em debate, 2004.p.278)
Com esse modelo de escola rural, com tais caracterizações, percebe-se, de certa forma,
o que se esperava dessa empresa pública em termos sócio-econômicos e culturais: um veículo
de potencialização econômica que, por desdobramento, afetaria possivelmente o rurícola
estimulando-o a ficar no campo.
2.8 A Sede do Ensino Normal Rural: a Fazenda do Rosário
Fazenda do Rosário, um centro de experiências educacionais.
Estado de Minas, 1949.
Ao que tudo indica, a Escola Normal Regional, que foi criada em 1949, de acordo com
a lei 291, de 24 de novembro de 1948, e instalada no interior de uma estrutura organizada
na primeira metade da década de 30, tinha por finalidade receber e educar crianças desvalidas.
Nas palavras da educadora Antipoff: a Fazenda do Rosário não tem o objetivo delimitado de
ajudar as crianças excepcionais. Ela frisa ainda que era “um pretexto para dar margem à
assistência à população rural que ficara atraída e, assim, talvez consigamos fixá-la na zona
rural
13
.
Na medida em que Antipoff tornava-se conhecida no meio intelectual mineiro, passou
a influenciar setores interessados em assistência social e pobreza humana na cidade de Belo
Horizonte. Dessa conjugação de interesses e interessados nasceu a Sociedade Pestalozzi de
Minas Gerais. No ano de 1940, conforme destaca Magalhães (1960), a sociedade fez registrar
o Sítio de Ibirité, para todos os efeitos, como Fazenda, na Secretaria de Agricultura. Constata
ele que:
A sociedade adquiriu gado leiteiro, fez pocilgas, aviários, estabeleceu posto
médico para atender crianças, organizou um gabinete dentário e conseguiu um
dentista para primeiros socorros odontológicos ao pessoal da Fazenda [...]
Estabeleceu também cursos (cerca de quinze) de várias naturezas: de puericultura,
discriminação e educação rural, orientação profissional, mendativo, estudo de
ensino primário, etc. (MAGALHÃES, 1960.p.45).
13
Entrevista dada por Antipoff a um jornal de Minas que se encontra recortada e colada no LRJ.
71
Antipoff entendia que se o rurícola encontrasse na zona rural assistência social e
escolar, cinema, divertimentos, sua população não se sentiria ficaria atraída pela cidade.
(LRJ.)
De uma maneira geral, sublinha Pedroso, o plano inicial constituiu em adaptar,
gradualmente, as escolas municipais às contingências da vida rural, predispondo-as a uma
atividade irradiante. Considera ele que o que estava em jogo era a transformação do
professor, para que este, imbuído de mentalidade rurista e de conhecimentos necessários,
fizesse ele mesmo, a adaptação de sua escola, com assistência não do poder municipal,
mas também da própria direção geral do serviço. (PEDROSO, 1951, p.14).
Foi então, para atender a tais designações, que o governador Milton Campos, através
de dispositivo legal criou, em
zona rural, dois cursos normais
regionais destinados a formar
regentes para escolas
primárias localizadas em zonas
rurais. Para funcionamento
desses estabelecimentos,
adotou-se o regime de internato
e a demanda de, pelo menos,
cinqüenta alunos por turma. O
governador ficou autorizado a
nomear o corpo docente e o
pessoal administrativo indispensáveis, cujos vencimentos serão iguais aos professores e
funcionários das Escolas Normais do interior do Estado. (SECRETARIA DE EDUCAÇÃO
DO ESTADO DE MINAS GERAIS, 1948).
Segundo o decreto Lei n° 291, de 24 de novembro de 1948, o governo poderia
despender “na construção ou compra e adaptação de prédios adequados e o aparelhamento,
instalação e custeio das duas escolas, a importância de Cr$ 2.000.000,00 (dois milhões de
cruzeiros)”.
A mesma lei prescrevia ainda:
A lei cria na Secretaria de Educação, subordinados ao respectivo titular, um lugar
de diretor técnico do ensino primário e normal em zonas rurais, três lugares de
assistentes e trezentos lugares de professor primário, com vencimento mensal de
Ilustração 8 – acima: página do livro de currículo e carga horária da Escola
Normal, ano de 1956 (Acervo da Escola Normal-Conselheiro Mata).
72
seiscentos cruzeiros cada um, e aberto à mesma repartição um crédito especial de
Cr$ 72.000,00 (setenta e dois mil cruzeiros) para treinamento intensivo de
professores destinados a localidades rurais. (SECRETARIA DE EDUCAÇÃO,
1948).
Na redação deste documento feito pela Secretaria de Educação, fica registrada a forma
como o governo estruturou o financiamento e o recrutamento para dar início às atividades
educacionais no Estado. A lei explicitava, especialmente, quais os valores salariais desses
servidores em relação aos servidores públicos urbanos, nesse mesmo nível de ensino.
Procurava-se, assim, diminuir as distâncias das relações materiais e pessoais (recurso
humano) da escola rural e amenizar os isolamentos simbólicos nos quais os campos de
atuação do profissional da educação estavam submetidos. Essa ação, com objetivo de
equiparar, pelo menos em termos de recursos materiais, a escola rural com a urbana foi
justificada, igualmente, por uma publicação da Fundação Helena Antipoff titulada Escola
Normal Renovada: uma experiência pioneira”, de 1978, cuja produção foi facilitada pela
Prefeitura Municipal de Ibirité.
Vale destacar que esse estudo de natureza memorialista iniciava-se com as seguintes
indagações: Por que a grande preocupação com uma Escola Normal Renovada? Por que se
fala tanto em crise na educação, na qualidade do ensino?”. Essas duas interrogações foram
os substratos sobre os quais a narrativa se desdobrou. Relata a publicação que o processo de
formação de professor na “Fazenda do Rosário” vinha suprir uma lacuna no campo de
formação de professores do Estado. “É a necessidade”, diz o documento da Fundação, de
uma reformulação completa das estruturas escolares a fim de se atender às aspirações
educacionais e às exigências econômicas e sociais do nosso povo” (FUNDAÇÃO HELENA
ANTIPOFF, 1978, p.1). Mas, como programar uma escola que fosse capaz de atender à
demanda de cunho social, educacional e econômico ao mesmo tempo? Mais que isso, o
modelo escolar que até então vigorava não atacava exatamente esses campos sociais?
Neste contexto, identificou-se a fundação da “Fazenda do Rosário” e seu complexo,
como resultado de uma crise teórica sobre a educação escolar brasileira que remontava,
certamente, ao movimento da Escola Nova nos seus primórdios. Conforme os argumentos
expostos pela Fundação Helena Antipoff, a Escola Normal Rural deveria se concretizar num
espaço onde as metamorfoses seriam parte íntima do seu cotidiano. Nas suas palavras:
Que a Escola se transforme em laboratório de revolução copernicana de Dewey,
dilatando-lhe a área de experimentação, acrescentando-lhe os utensílios de
trabalho, as oportunidades de pesquisas e de busca da exatidão e da verdade, pois
o conjunto de atividades a serem desenvolvidas terá o signo do que não é formal,
73
nem verbalista, nem convencional; ensinar-se-á e aprender-se-á em vivo, a Escola
tem de renovar-se, e renovar a escola é renovar o professor. (FUNDAÇÃO
HELENA ANTIPOFF, 1978, p.2).
Fica latente nesse trecho que a Escola Normal Rural que se estava preconizando para a
formação, romperia com modelos de formação de professor superados, como insinuava a
visão dos propositores da época.
Concretamente, o governo do Estado de Minas, ao se enquadrar como sujeito
responsável pela gestão desse momento, isto é, aquele que opera o conflito entre a
continuidade e as potenciais mudanças, optou por sancionar, através do decreto n.º 3.112, de 3
de agosto de 1949, uma autorização de despesa para que ele, na figura da Secretaria Estadual
de Educação, pudesse iniciar o regime de renovação do corpo docente atuante no meio rural
mineiro.
Sendo assim, declarou o governo:
Abre a Secretaria da Educação o crédito especial de CR$ 2.000.000.00 o
governador de Estado de Minas Gerais de conformidade com o artigo 3, da lei
291, de 24 de novembro de 1948, resolve abrir um crédito especial de CR$
2.000.000,00 (dois milhões de cruzeiros), para compra e adaptação de prédios
escolares, aparelhamento, instalação e custeio de duas escolas normais. O
Secretário de Estado dos Negócios da Educação e das Finanças assim o tenham
entendido e façam executar:
Dado no Palácio da Liberdade, em Belo Horizonte, aos 3 de agosto de 1949.
Milton Soares Campos
Abgar Renault
José de Magalhães Pinto (SECRETARIA DE EDUCAÇÃO DO ESTADO DE
MINAS GERAIS, 1949).
Com essa medida ficaram criadas as bases financeiras para a instalação das duas
Escolas Normais Rurais, a Escola Normal Sandoval de Azevedo e a Escola Normal D.
Joaquim Silvério de Souza. De acordo com o documento, o governo poderia depender na
construção ou compra e adaptação de prédios adequados, CR$ 1.000.000,00 (um milhão de
cruzeiros) para cada uma. Em seguida, deu-se início à construção do pavilhão, anexo à
Fazenda do Rosário, no qual funcionaria a Escola Normal Sandoval de Azevedo.
Segundo Pedroso, dos dezoito cursos de treinamento e aperfeiçoamento realizados
pela Fazenda do Rosário, três ocorreram em Conselheiro Mata, entre 1950 e 1951. Vale notar
que esses cursos, pelos números disponibilizados por Pedroso, especializaram entre 1948 e
1951, seis mil quinhentos e sessenta e oito professoras rurais (6.568). A que vem servir esse
batalhão de professores renovados e as novas escolas rurais enumeradas?
Segundo Moreira (1960)
74
a educação das crianças e dos jovens das áreas rurais é fundamental para que
possamos chegar, como povo integrado numa sociedade nacional, à compreensão
da estrutura e dos aspectos operacionais da economia nacional e do lugar que a
agricultura, a pecuária e a produção extrativa devem ocupar. Por isso todo
programa de educação rural – da escola elementar aos demais níveis – deve
procurar desenvolver na população do interior a noção mais exata e operacional
possível, dos caminhos a serem palmilhados pela evolução econômica, política e
social das áreas rurais dentro do contexto de relações de toda nossa sociedade, de
modo a que possa participar inteligentemente para o levantamento do nível de vida
dessa sociedade, o que significará o próprio progresso e desenvolvimento rurícola
(p. 422).
Nesse depoimento, Moreira deixa claro qual era o sentido atribuído à professora rural
no contexto que analisou. Isto é, a idéia de que o Brasil teria que ser um “país agricultor” e
que, para isso, apontava-se como urgente uma nova modalidade do professorado, rompendo
com o estilo em voga, de forma a recuperar o desenvolvimento desse importante e decisivo
setor da vida nacional.
As Escolas Normais Rurais deveriam ser localizadas em áreas rurais, cuja distância
das grandes cidades deveria ser levada como um dos princípios da instituição. Considerar-se-
ia ainda, a existência de boas acomodações residenciais para todos os professores. Estes, por
seu turno, seriam incorporados em tempo integral. Quanto ao prédio, segundo Hall (1971),
deveria reunir as seguintes características:
1) O custo de construção relativamente baixo;
2) Projeto funcional, despido de todos os ornatos dispendiosos e de efeitos decorativos
não funcionais;
3) Prédio de conservação barata e fácil (mão-de-obra não qualificada);
4) Prédios projetados para expansão no caso de crescimento, sem modificações
dispendiosas e antiestéticas na estrutura original;
5) Construção de um andar, com expansão horizontal (nas áreas rurais o terreno é mais
barato que a construção de muitos andares);
6) Construção com materiais do lugar se possível (p.9).
Essas sugestões foram disseminadas no Brasil pelo consultor Robert King Hall, vindo
dos Estados Unidos, a pedido do INEP, na época, gerido pelo professor Murilo Braga e
incluídas numa espécie de cartilha cujo título é Educação Rural: tópicos para Estudo e
Análise, que se encontra na coleção da biblioteca do CDPHA. Além dos princípios
norteadores das edificações para as escolas rurais, fossem elas elementares ou normais, o
consultor, que investigou várias escolas pelo Brasil, sugeriu ainda que as edificações
devem
ter grandes pátios e largas áreas para esportes e trabalho agrícola.
75
Entre as características principais recomendava:
1. deve haver instalações atléticas destinadas a jogos e recreação, e não a exercícios
atléticos sistemáticos, gênero ‘músculos fortes’, mais apropriados para organizações
militares;
2.deve haver grandes jardins e hortas, cuidados pelos alunos, como parte do trabalho
prático;
3.deve haver uma pequena fazenda para demonstrações das atividades e problemas
agrícolas locais, a cargo dos alunos sob fiscalização, como parte do trabalho
prático. Demonstrações indicadas: erosão do solo, rotação de colheitas, irrigação,
plantação de contorno, combate às pragas, controle de moléstias de plantas, aves e
animais, fecundação seletiva, preparação de sementes, inseminação artificial,
criação de gado e caça, cultura de colheitas típicas, métodos de colher, apicultura,
manutenção e manuseio de maquinaria agrícola simples e ferramentas, economia e
contabilidade agrícola, etc.” (1971, p. 9).
Em artigo publicado num jornal mineiro em 1951, Hall frizou que os edifícios das
escolas rurais deveriam se situar no topo de um morro que dominasse visualmente a vila e
seus arredores (FOLHA DE MINAS, p. 10-12). Deve-se considerar que as escolas normais
não seguiram à risca essas recomendações, pois não passavam de uma tipificação ideal que
servia de parâmetro. Assim, não se tornaram regra, uma vez que eram submetidas, no instante
da efetivação, às condições materiais e locais.
3 A ESCOLA NORMAL REGIONAL RURAL D. JOAQUIM SILVÉRIO DE SOUZA
DE CONSELHEIRO MATA
Eram 15 horas. Foi dado o início da sessão inaugural desta Escola pelo Dr. Edgar
da Mata Machado, que convidou a tomar lugar à mesa às autoridades presentes. A
sessão obedeceu ao seguinte programa: 1. Hino Nacional Brasileiro; 2. Saudação
por Ilca Pinto, candidato ao Curso Normal; 3. Professorinha rural - poesia por
Marlene Pinto; 4. Saudação
à
Escola por Lourdes Moura, aluna do C.R.T; 5
.Leitura do diário por Maria Rita Ferreira; 6. Discurso por Helena Antipoff,
chefe do Serviço de Ensino Rural; 7. Zum zum canção regional pelos alunos.
[...] Na segunda parte dessa sessão que registramos, foi apresentada às crianças
uma peça de fantoches, intitulada: O rato do campo e o rato da cidade. Os
fantoches foram fabricados por nós.
Lourdes Moura 1950.
Fiquei vivamente impressionado com tudo que pude ver ouvir e sentir durante os
poucos dias que vivi nesta escola. [...] Este educandário é um verdadeiro assombro
de organização e de eficiência! Lamento, de todo o coração, que o Brasil
desconheça o que são os estabelecimentos docentes do nosso interior! Os de
76
Conselheiro Mata, especialmente, impressionam de tal modo que desejo estampar
aqui uma cálida felicitação....
Livro de colheita de assinatura de visitas, 1958.
Neste capítulo, descreveu-se, inicialmente, o edifício onde a
escola foi instalada, discorrendo sobre parte dos equipamentos e
mobiliário nela utilizados e sobre as formas de administração
idealizadas para o seu funcionamento. Em seguida, analisaram-se as
relações entre o passado e o futuro incorporadas na proposta de
formação da Normalista, para, então, apresentar as formas de seleção
das futuras regentes de ensino rural.
Entre outras fontes, foi utilizado como referência o Livro de
Recorte de Jornais elaborado pela escola no qual se encontram
notícias sobre as características do edifício que o curso ocuparia
como, por exemplo, os escritos de Tabajara Pedroso (1951).
Explorou-se ainda um Diário escrito pela professora Lourdes Moura
(1950) sobre o edifício, juntamente com informações retiradas do
Livro de Inventário do curso, de 1950. Cotejaram-se essas
informações com alguns tópicos de obras da literatura especializada
sobre Escola Normal, com o intuito de explicitar indícios que apontassem para a
peculiaridade dessa Escola. Lançou-se mão ainda do boletim Escola Rural, publicado a partir
de 1948 e de documentos como fichas, cartas e questionários enviados às prefeituras para
orientação no recrutamento do candidato à vaga no Curso Normal e para esclarecer o perfil do
pretendente a esse curso.
3.1 O casarão da escola: entre a suntuosidade e a singeleza
..... Maravilhoso e estava desocupado...
L Moura, 2006
A professora Lourdes Moura relatou, em entrevista (2006), que a Escola Dom Joaquim
Silvério de Souza foi instalada na zona rural do município de Diamantina, às margens da
Estrada de Ferro Central do Brasil, na comunidade de Conselheiro Mata. Segundo ela, D.
Ilustração 9 - acima:
recorte de jornal divulga a
inauguração da Escola
Normal (Acervo -
Conselheiro Mata).
77
Helena viu uma foto de um prédio que a Igreja havia construído nesse local, na década de
1920, e que estava à venda.
D. Joaquim Silvério de Souza, patrono que nomeou a escola, foi um bispo falecido em
1933 e que nos idos anos 20 construiu o prédio para fins de repouso dos alunos do Seminário.
Um segundo prédio foi edificado no final da década de 1950, conforme relata em entrevista
(2004) o atual diretor da escola, o professor Muniz. Isso indica que as normalistas ocuparam,
inicialmente, o antigo edifício da Igreja e, posteriormente, o “pavilhão novo”.
Na visão da professora Lourdes Moura a “Escola crescia a cada ano”, o que sugere
uma procura por suas vagas entre a população regional. O padre R.J.M, em nota em um jornal
de Diamantina de 9/6/1955, ao descrever a rotina da Escola Normal Rural de Conselheiro
Mata diz: é um empreendimento feliz que vem de encontro às mais prementes necessidades
da nossa época: redimir o campo e elevar o nível de vida das populações rurais”(LRJ). O
padre observou, ainda, que a escola dava instrução a 150 normalistas e “aplicava
discretamente as diretrizes da Escola Nova”.
O edifício no qual a Escola Normal Regional Rural D. Joaquim Silvério foi
inicialmente instalada ocupava um lugar de destaque na topografia local. Certamente, o prédio
respondia a um estilo arquitetônico de influência neoclássica, nos moldes da arquitetura do
final do século XIX; portanto, apresentava características que fugiam da simplicidade
sugerida pela consultoria do INEP, pois, entre outras características, era um edifício vertical.
Embora um edifício mais simplificado tenha sido construído posteriormente, pode-se dizer
que, para efeito simbólico, prevalecia o prédio antigo.
A tradição de Curso Normal em prédios sofisticados era algo antigo no Brasil. Buffa e
Pinto (2002), em estudo sobre a arquitetura escolar no Estado de São Paulo, destacaram que o
elemento central do edifício destinado à Escola Normal (urbana) da capital, isto é, o da Praça
da República, foi solenemente construído na década 1890. Segundo eles, até 1919 foram
erguidos nove edifícios para Escolas Normais, sendo que o mais majestoso é o da Escola
Normal de São Carlos (1911) cujo edifício projetado por Carlos Resencrantz foi construído
entre 1913 e 1916. Consideraram esses autores que as escolas públicas nesse período tenham
tido como referência algum modelo europeu. De acordo com Buffa e Nosella (1996), a
criação de uma Escola Normal Secundária, no início de século XX, representava um projeto
político-cultural ousado que poucos políticos tinham espírito para implementar. No que diz
respeito ao prédio da Schola Mater, descreveram que o “prédio tinha dois pavimentos: o
térreo e o porão (...) observando-se os prédios mais importantes da cidade nessa época, nota-
78
se entre eles uma similaridade correspondente no estilo e na imponência a outros prédios da
época construídos pelos barões do café”. ( p. 42).
Desde então, dir-se-ia que São Paulo acabou por construir algumas referências no
campo educacional e entre elas afigurava os prédios escolares. Mais efetivamente, como
apontou Faria Filho (2000, p. 28).
foi realizada uma viagem ao Rio de Janeiro e a São Paulo por políticos mineiros
no início do século passado, entre eles o inspetor de ensino que ficaram - ressalta -
“deslumbrados com o espetáculo de ordem, civismo, disciplina, seriedade e
competência que disseram ver nas instituições de ensino do estado de São Paulo”.
Faria Filho destaca que a partir desse momento, a edificação dos prédios escolares era
defendida, sobretudo, como forma de reinventar a escola, ou seja, tornar mais presente sua
contribuição aos projetos de homogeneização cultural e política da sociedade pretendida pelas
elites mineiras (2000, p.31).
Por outras palavras, Foucault (1987) explicita que tais edifícios deveriam responder a
determinados princípios que remontam ao século XVIII. Diz:
A organização de um espaço serial foi uma das grandes modificações técnicas do
ensino elementar. Permitiu ultrapassar o sistema tradicional. Determinando
lugares individuais tornou possível o controle de cada um e o trabalho simultâneo
de todos. Organizou uma nova economia do tempo da aprendizagem. Fez funcionar
o espaço escolar como uma quina de ensinar, mas também de vigiar, de
hierarquizar, de recompensar. (p.126).
Assim, o filósofo incita a pensar que o edifício das escolas no ocidente moderno foi
racionalizado em função da busca de maior eficácia nos seus objetivos. Segundo
eleComunicou que “J. B. de La Salle” (patrono de clube Pedagógico da Escola Normal
Regional D. Joaquim Silvério de Souza) idealizava uma classe de forma que a distribuição
espacial dos alunos permitisse efetuar simultaneamente uma lógica de distinções: segundo o
nível de avanços dos alunos, segundo o valor de cada um, segundo seu temperamento melhor
ou pior, segundo sua maior ou menor aplicação, segundo sua limpeza”. (FOUCAULT, 1987,
p.126).
Anísio Teixeira, ao elaborar um plano de educação para o estado da Bahia, primou
pela construção de edifícios escolares para escolas primárias, secundárias e de formação de
professores. Cada unidade” descreveu Buffa e Pinto (2002) possuía uma sala de aula,
um recreio coberto e a residência da professora situada num terreno amplo destinado ao
desenvolvimento de práticas agrícolas. (p.105). Segundo os pesquisadores, Teixeira concebeu
79
esse modelo escolar após ter passado uma temporada na Europa entre 1946 48.
Acrescentaram ainda esses estudiosos que essa organização escolar no “centro de Educação”
visava, sobretudo, às classes populares”. A proposta tornou-se popular pela expressão
Escola-Parque”. Ao que parece, naquele momento almejava-se uma edificação mais
funcional comparada aos estilos priorizados anteriormente.
Em outros termos, como notou Monarcha (1999) acerca do edifício da Escola Normal
da Praça em São Paulo, esta foi a extremos de uma construção em ruínas, onde faltava prédio
ao outro extremo. Isto é, situar-se no lado oeste da acrópole, da então cidade nova, a Praça
da República antigo largo 7 de Abril, foi concebida, juntamente com o edifício da Escola
Normal, na expectativa de ambos exaltarem mutuamente, produzindo impressão de
grandiosidade e fulguração e se converterem em centro de comunhão cívica. (p.187).
As palavras desse historiador, de certa forma, revelam algumas semelhanças no
projeto espacial da Escola Normal da Praça e o da Escola Normal Regional D. Joaquim
Silvério. Esta se situou, igualmente, em local de destaque no conjunto arquitetônico da
comunidade, sendo que o antigo edifício onde funcionava a escola era o único a disputar, em
pompa e tamanho, com o prédio principal da região: a capela local. Dessa maneira, tal escola
parece confundir-se com antigos pressupostos que estruturavam as Escolas Normais no país e,
ao mesmo tempo e contraditoriamente, tinha que assumir uma cultura mais simplista, em
razão da missão a que se propunha executar, que era a de formar professoras oriundas do meio
rural, em que valores que insinuassem luxo e excesso deveriam ser descartados. Caso
contrário, a escola não desempenharia os princípios de renovação e mudanças embutidos na
sua filosofia de funcionamento.
Em 1950 relatou L. Moura:
O casarão de formas sombrias era imponente e se destacava entre os eucaliptos
sobre um belo tapete de gramas. Era para que dirigíamos (...) A casa vazia ... o
único sinal de moradia que encontraram foi a água que escorria em uma torneira
amarela, em um tanque forrado de lodo, em cujo canto nasceu um pé de avenca.
Nessas palavras, escritas em diário por uma das primeiras alunas do Curso de
aperfeiçoamento, pode-se notar que o local de instalação da escola tinha, de fato, um destaque
monumental o que, em certo sentido, oferece um primeiro distanciamento da proposta em
curso pelo conselheiro do INEP. Vale lembrar que se pretendia romper com o antigo, aqui
significado pela tradição que historicamente havia vigorado nos domínios educacionais.
Em suma, parece lugar comum o fato de novos projetos de institucionalização de
escolas ocuparem antigas construções. (cf. MONARCHA, 1999; CAMARGO, 2000). O que
80
nos permite fazer duas conjeturas: que sobrados ou grandes edifícios eram adequados e
existiam disponíveis para instalação das escolas; e que não havia recursos disponíveis para
construir escolas na sua totalidade, o que acabava por legitimar situações de improvisação no
que diz respeito à abertura de novos estabelecimentos de ensino.
Nas palavras de Vidal (2001), ao dissertar sobre o instituto de Educação do Distrito
Federal, nos anos de 1930, “a Escola Normal abandonava sua antiga sede, no largo do
Estácio, para instalar-se, confortavelmente, no edifício novo da Rua Matriz e Barros” (p. 26).
De acordo com ela o novo edifício fora marcado por estilo neocolonial, e se destacava
imponente sobre a paisagem do bairro da Praça da Bandeira, como “afirmam os moradores da
redondeza”. Mais uma vez foi possível constatar nos estudos sobre Escolas Normais o
destaque dado aos prédios em que estas foram instaladas em relação às edificações da
vizinhança. Isso permite entender porque a Escola Normal D. Joaquim Silvério de Souza foi
“contemplada” com um antigo, mas suntuoso edifício em plena zona rural mineira.
Segundo Ginzburg (1989), nenhuma categoria foi tão universal como a oposição
alto/baixo. “É significativo, diz ele, que digamos que algo é elevado ou superior – ou
inversamente baixo ou inferior, sem, no entanto, tomarmos consciência que aquilo a que
atribuímos maior valor deve ser colocado no alto” (p. 98). Pode-se supor que a geração de
político-educadores responsáveis pela escola rural renovada operou reflexões nas quais
elevavam alguns instrumentos, como ciência, laboratório, internato, aperfeiçoamento. Eles
eram anunciados com maior valor do que aqueles espaços educacionais rurais que não
explicitavam tais categorias como estruturais em suas atuações e ações. Era imperativo pensar
que uma casa mal estruturada e cheia de filhos desnutridos e desnudos” se dava, entre outras
razões, pelo fato, desses homens desconhecerem os recursos científicos que propiciavam a
fuga dessa situação, mas que eles, pelas condições culturais rústicos não partilhavam os
altos e atualizados valores. (MOURA, 2000).
3.2 Estabelecimento Rural para a difusão de práticas da “escola ativa”
150 cadeiras de cinema
100 guarda roupas menores
8 guarda roupas maiores com espelho
58 cadeiras menores
312 carteiras maiores
131 carteiras armadas (...)
Inventario dos moveis, dezembro de 1952.
81
Antônio D’Ávila (1954), em obra elogiada por professores da época, intitulada
“Práticas Escolares”, elaborava em três substantivos e detalhados volumes, os quais se
encontram ainda hoje preservados no CDPHA (2006), parte de sua reflexão sobre o
“mobiliário” e o equipamento “material” que as escolas comumente apresentavam de forma
semelhante. Na sua visão:
Fazem-se luxuosos edifícios, verdadeiros palácios escolares que custam fortunas.
Entretanto, as crianças que neles devem educar-se precisam estar rígidas durante
horas e horas em bancos-carteiras, construídos segundo toda a espécie de
requisitos antropométricos, mas que não deixam de ser instrumento de tortura, com
os quais se condenam à imobilidade. Fazem-se classes denominadas higiênicas,
cubicadas e iluminadas de acordo com as recomendações científicas, porém, o
podem as crianças respirar o ar livre, receber a luz direta, permanecendo sumidas
em ambiente inadequado, privadas das atividades verdadeiramente formadoras.
(D’ÁVILA, 1954a, p. 9)
14
.
Certamente, boa parte das normalistas foi educada nesse modelo. Vale sublinhar que
na citação acima, ao mesmo tempo, uma crítica a tal modelo, que, ao que tudo indica,
ainda era hegemônico na organização pedagógica das escolas brasileiras, fossem elas rurais
ou urbanas. Tal organização não ficava restrita à educação infantil, mas perpassava todos os
níveis da educação escolar no país. Assim, fica implícito que uma outra forma de organização
deveria surgir.
Segundo Kilpatrick (1971), o mundo havia caminhado para a democracia e para a
experimentação de influência científica, portanto, o povo precisa aprender a ser também
democrático e usuário de instrumentos científicos. E qualquer que seja o regime educativo,
este deverá ensinar isso, em qualquer lugar, de qualquer modo. Entretanto, sublinha o
estudioso que a escola ainda é, em boa medida, autocrática. Nesse modelo, os alunos
rigorosamente organizados praticavam a obediência, ou seja, diz Kilpatrick: aquilo que os
alunos deviam fazer ou pensar lhes era meticulosamente determinado. Seu papel, apenas o da
aceitação passiva. Deviam ser vistos, mas não ouvidos, até que, autoritariamente, se lhes
ordenassem que falassem. Sua principal, senão única responsabilidade, era obedecer. (1971,
p.55).
Para que os alunos fossem tratados dessa maneira é inegável o papel da sala-de-aula,
na qual o professor, pela gica da elaboração do espaço, bem como do mobiliário, tinha
“plenos poderes” sobre a gramática corporal do aluno. Visto de outra maneira, como ressaltou
14
Ver a esse respeito o primeiro capítulo deste trabalho.
82
Antipoff (1992 [1958]) tal organização escolar cativa e, indiferente “à realidade rotineira”,
atrofia a curiosidade infantil, faz amolecer o corpo e “paralisa” a mão instrumental do homo
saber, pois foi planejada de forma a supervalorizar o verbo, a linguagem em detrimento das
habilidades sensório-motoras e da inteligência prática. (p. 125). Considerados esses aspectos,
a forma da “escola verbal” necessariamente será distinta, em termos materiais, de uma escola
preconizada pela experimentação, pela ação pedagógica de perspectiva laboratorial.
Para fugir a essa forma de organização espacial, a Escola Normal Rural deveria conter
além do espaço convencional com salas de aula, biblioteca, refeitório e quadra de esportes,
uma porção de terra que, segundo Antipoff:
...será transformada numa fazendinha de produção com campos para lavoura,
pastagem, pomares e hortas, sob direção de um técnico competente, os alunos
internos e externos exercerão a aprendizagem de várias culturas agrícolas e
pequena criação de animais domésticos. Os trabalhos artesanais, nas pequenas
indústrias rurais serão ensinados de modo a produzir renda e dar ensejo para que
a parte comercial se faça através de uma cooperativa mista, servindo aos fins
educativos e econômicos a uma vez (1992, p.103).
Na proposta da educadora, fica evidente a crítica às tradições tanto escolares, quanto
populares, uma vez que num mesmo argumento ela anuncia a necessidade de transfigurar a
imagem física tradicional do espaço escolar, como também declara a necessidade de
diversificar os costumes em voga acerca da cultura agrícola.
Quanto à estrutura arquitetônica da Escola Normal de Conselheiro Mata, segundo
Queiroz (1942), deveria levar em conta as relações entre o prédio rural e os padrões culturais
do público a que ele servia, isto é, contabilizar a vida econômica, a vida social e a cultura das
populações do entorno, além dos recursos naturais da região e certas noções de higiene.
No entanto, conforme sublinhou Moreira (1960), a “organização da escola rural” no
Brasil era de uma sala só, embora se encontrassem escolas com mais de uma sala como era o
caso das “Escolas Reunidas” que tinham de “duas a quatro salas de aula”. Uma das
características principais dessas escolas pondera o autor, é o fato de funcionar com classes
heterogêneas, não dispor de corpo administrativo especial, ficando um dos professores
responsável pelos serviços administrativos, às vezes, mediante a uma gratificação especial.
Registrava-se, contudo, que as normalistas deveriam estar conscientes da diversidade das
realidades que a poderiam submeter-se, pois nem sempre a estrutura material das escolas
rurais primárias tinha como protótipo a da Escola Normal.
Contudo, a escola que as normalistas oriundas do Complexo do Rosário” deveriam
habitar e fazer funcionar apresentava-se pela metáfora da Escola Ativa” (Lourenço Filho,
83
1963, p.151). Para o autor, esse estilo de escola concebe a aprendizagem como um processo
de aquisição individual, mediante as características de cada indivíduo. Por conta disso:
Os alunos são levados a aprender observando, pesquisando, perguntando,
trabalhando, construindo, pensando e resolvendo situações problemáticas que lhes
sejam apresentadas, quer em relação a um ambiente de coisas, de objetos e ações
práticas, quer em situação de sentido moral, mediante ações simbólicas”. (p.151).
Segundo Lourenço Filho, a organização geral das escolas, bem como a Escola Normal
de Conselheiro Mata, apoiava-se nos pressupostos e princípios da “Escola Nova”; dentre os
quais se destacam:
A Escola Nova é um laboratório de pedagogia prática. Procura desempenhar
o papel de explorador ou iniciador das escolas oficiais, mantendo-se ao
corrente da psicologia moderna, a respeito dos meios que se utilize, e das
necessidades modernas da vida espiritual e material. A Escola Nova é um
internato, porque só o influxo total do meio em que se move a criança,
permite realizar uma educação eficaz. Isso não significa que preconize o
sistema de internato como ideal, que se deva aplicar sempre, e por toda
parte. O influxo natural da família, quando sadio, deve preferir-se ao melhor
dos internatos. A Escola Nova está situada no campo, porque este constitui o
meio natural da criança. O influxo da natureza, as possibilidades que oferece
para empreendimentos simples, os trabalhos rurais que permite realizar,
representam o melhor auxílio à cultura física e moral. Para o progresso
intelectual e artístico, é desejável, porém, que fique próxima a uma cidade
.
(1963, p.163).
Esses princípios permitem uma aproximação e visualização da Escola Normal de
Conselheiro Mata, uma vez que ressaltam a importância do laboratório na sua rotina
pedagógica, como também tinha à sua frente uma psicóloga de carreira internacional que foi a
professora Helena Antipoff. Além disso, a Escola ficou conhecida pelo seu caráter de
internato, embora as alunas da comunidade fossem tratadas num regime de semi-internato;
além de estar instalada na zona rural, numa pequena comunidade, aproximadamente 30 km da
cidade de Diamantina.
Lourenço Filho lembra ainda a importância que esse tipo de organização escolar
atribuiu aos trabalhos manuais. Segundo ele, a marcenaria ocupava primeiro lugar porque
desenvolvia a habilidade e a firmeza manual, o sentido da observação exata, a sinceridade e
o governo de si mesmo”. Destacou que a jardinagem e a criação de pequenos animais, que
entravam na categoria trabalhos ancestrais que toda criança deveria ter ocasião de
exercitar”. (p. 163). Em síntese, tais princípios definem qual deveria ser a caracterização da
estrutura física das escolas programadas sob essa influência, permitindo imaginar seu
arcabouço material, arquitetural e mobiliário. A exemplo das atividades de caráter prático a
84
serem desenvolvidas pelas normalistas, escreveu Antipoff, (1992, 1949, p.68): a)Serviços
domésticos (arrumação, limpeza, arranjo de dormitórios); b) Serviço de cozinha e copa;
c)Horta, jardim e pomar; d)Carpintaria; e)Construção; f)Cerâmica; g)Máquinas,
eletricidade, automóvel; h)Costuras; (1992 [1949], p.68).
Para a educadora, os métodos e processos usados valeriam prioritariamente da
intuição, da experimentação, da verificação, sempre que possível, individual, dos
resultados apurados e da meditação mais aprofundada de sua significação, para o
conhecimento do mundo físico e social”.[...] “Sempre que possível usar da
pesquisa, motivada por um interesse potente, ou uma necessidade premente de
resolver problemas de vida ou de ciência. Que todos os passos importantes da
pesquisa sejam registrados, a fim de constituir uma documentação pedagógica para
trabalhos posteriores e o controle de sua eficiência. (p.66).
Aqui se vêm emergir categorias de origem científica as quais deveriam compor as
características da formação oferecidas pela Escola Normal, tanto no que toca aos elementos
cognitivos propiciados por essas categorias, como também no conjunto de atitudes, ações e
equipamentos materiais cobrados pela mesma em razão de seu uso. Será uma recomendação
da educadora para as formandas de 1958, propositalmente, a criação, onde elas fossem atuar,
de um “cantinho para o laboratório”. Nas suas palavras, aclimatados nesses novos ambientes,
por vosso intermédio, os laboratórios-mirins Marques Lisboa tornar-se-ão, não duvido,
viveiros das vocações científicas entre meninos da roça”. (Antipoff, 1992 [1958], p. 126).
Dessa maneira, ao que parece, a Escola Nova, ou a “Escola Ativa”, teve nos ritos da
prática científica uma de suas formas de objetivação. Assim, o ideal científico cada vez mais
aplicado à vida cotidiana, tornou-se, conseqüentemente, a expressão-síntese de um tempo
distinto e elevado que virá.
Segundo o Livro de Inventário da Escola Normal D. Joaquim Silvério de Souza de
Conselheiro Mata 1950, o aparato material que iria possibilitar a abertura e funcionamento
da escola reunia diversas categorias, tais como: “vasilhames de cozinha, volumes da
Biblioteca, mobiliário (cama, mesa, sala de aula); móveis, material de limpeza, rouparia
(cama, mesa e cozinha); ambulatório, material didático; carpintaria, quarto de motor; outros
materiais; material de costura, clube artístico, filmes e discos”. Estes foram os objetos que
ocuparam os espaços do casarão nos seus primeiros momentos de existência. É curioso notar,
por exemplo, que o “vasilhame de cozinha” contava com noventa e três (93) peças como
máquina de moer carne (item 1) e espremedor de frutas (item 26). Pelas sugestões de Hall
(1971), seria benéfico à formação se as alunas tivessem: 1) “grande percentagem de tempo
em aulas práticas de laboratório; 2) grande percentagem de tempo em aulas práticas de
85
agricultura; 3) grande percentagem em aulas práticas de indústria doméstica”. Destaca,
ainda, o instrumental de carpintaria que, entre outros itens, discriminava “grosas” que,
segundo Ferreira (2001) seria uma “lima grossa para desbastar madeira, ferro ou casco de
cavalgaduras”. Esse exemplo serve para estimular a imaginação sobre que tipo de atividades
culturais eram desenvolvidas na escola no dia-a-dia. Certamente não se irá explorar de forma
profunda o inventário, mas, mesmo assim vale lembrar Burke (2005), ao dizer que
“tradicionalmente, os historiadores culturais atribuíram menos atenção à cultura material
que às idéias. As páginas que Norbert Elias dedicou à história do garfo e do lenço em seu
livro sobre o processo civilizatório eram incomuns naquele tempo” (p. 9).
A descrição dos equipamentos da escola, em princípio, reforça as evidências da
instalação da Escola Normal Rural em Conselheiro Mata. Aliás, sua instalação foi precedida
pelo curso de aperfeiçoamento que, na época, como já foi dito.
Ao que tudo indica tanto os cursos de treinamento quanto todo o curso de formação da
Escola Normal funcionariam em regime de internato, como ressaltou a professora Antipoff ao
discursar em 1949, ocasião da instalação do segundo curso de Aperfeiçoamento:
Outro ponto de valor pedagógico importante para o curso é o fato de ter
funcionado em regime de internato (...) um internato é um laboratório cheio de
problemas para o educador que nele deve agir no sentido normativo, sem lesar os
princípios da liberdade e do respeito ao indivíduo. Esta arte é bem delicada.
(Educação Rural, 1949, p. 11).
O regime de internato torna-se, pois, relevante, na medida em que colabora com a
noção de mudança de modelo referido por Renault, quando sugere a necessidade de
destruição de um estilo de educar decadente em que estavam mergulhados boa parte dos
educadores do Estado. Neste sentido, Antipoff introduz a temática do laboratório que
simbolizará o perfil da cultura que essas instituições e cursos deveriam seguir com fidelidade.
Segundo Antipoff, dominava nas escolas da época certa ciência de segunda mão,
mumificada”. Em outros termos, denunciava o uso de métodos artificiais na escola o que, para
ela, produzia “frutos de valor precário, senão nulos”. (1986, p.10).
A professora Helena Antipoff, uma educadora de renome nacional”, como apontou o
governador do Estado, em solenidade do curso de formação rural, na Fazenda do Rosário, no
ano de 1948, disseminou as bases filosóficas da educação rural para esse governo. Tornava-
se, então, responsável por contribuir tecnicamente com essa programação que, para o Estado,
era inédita. Com efeito, como a própria professora notou desde o início, não havia condições
materiais e didáticas para o empreendimento na velocidade que demandava. Assim, como
86
alternativa, propunha o aproveitamento de todas as atividades para fins pedagógicos, isto é,
a formação de bons hábitos de vida, visando saúde, desenvolvimento da inteligência”, como
forma de continuidade ao plano. (ANTIPOFF, 1992, p.53). Segundo a professora, o
desenvolvimento de uma prática refinada de observação fazia-se urgente por parte dos
educandos. Neste sentido, caberia a cada aluno normalista:
Fazer observações mais exatas e de melhor eficiência para o conhecimento do
clima da região (...) Refletirá cada vez melhor as mudanças que a natureza
apresente no mundo vegetal: na cor da folhas, no aparecimento de flores, no
amadurecimento dos frutos, no mundo animal: no vôo dos pássaros e insetos e
também as mudanças que a mão humana faz no aspecto das hortas e pomares, dos
campos, das pastagens, da lavoura, das capoeiras... (ANTIPOFF, 1992.p. 53).
Ao que as palavras acima indicam, é possível supor que os alunos que seriam ali
treinados-formados desconheciam ou ignoravam ferramentas intelectuais como, por exemplo,
a observação. Categorias como essas, servem para a educadora enfrentar os problemas do
campo educacional como também facilitar para o rurícola educado maior compreensão da
lógica de produção.
Fleury (1982), ao investigar grupos de agricultores em regime de produções marginais,
notou que técnicas modernas mecanizadas eram inexistentes. Apontou que eles, ao
enfrentarem problemas como o abastecimento de água, inventaram um sistema a partir da
observação do rio nomeado presa da vovó. Dividiam a água entre dois trechos do rio em que
uma parte era para abastecer a região do roçado e a outra para a sede da morada.
Comentou que recebiam água três dias da semana cada uma das partes. Além disso,
existem ainda umas 20 tapagens menores, ao longo do rio, que vão sendo abertas e fechadas
para permitir que as propriedades sejam molhadas. (Fleury, 1982, p. 176). Ocorre, porém,
que esse tipo de “racionalização” feito por pessoas sem escolarização não seria contabilizado,
pois não era oficial e não estava disponível para todos, uma vez que não havia passado por um
processo metodológico passível de universalização, como acreditava a escola.
3.3 A administração da Escola Normal de Conselheiro Mata
E é no grupo dessas discípulas da Escola, criada em 1929 pelo presidente Antônio
Carlos de Andrada, com objetivo de dar ao ensino primário de Minas o necessário
volume e qualidade, é que recorreu o governo de Milton Campos em 1949 para
renovar o ensino normal e dar ao meio rural escolas há muito desejadas.
Antipoff, 1949.
87
De acordo com D. Helena Antipoff, a Escola de Aperfeiçoamento deveria ser
lembrada como fornecedora do capital humano central da gestão do conhecimento e da gestão
administrativa da Escola Normal de Conselheiro Mata.
Propunha Antipoff que a Escola de Aperfeiçoamento deveria renascer das cinzas, para
se renovar através da implantação de um modelo de independência administrativa e de
autonomia científica e cátedra. Ela acreditava que essas mudanças poderiam evitar a
“estabilizar a rotina e burocratizar o meio escolar do ensino público de Minas”. ([1947],
1986, p. 67). O que se destaca, nesse argumento, para efeito de um possível conceito de
administração de Estabelecimentos de ensino Normal Rural, é a expressão “estilo de
independência”, o qual ela completa dizendo da necessidade de “autonomia científica”.
Em outras palavras, a educadora parece querer chamar a atenção para o fato de tal
característica não ter ainda se tornado um hábito no meio político administrativo dessas
instituições. Além disso, sublinha ela a liberdade de “cátedra”, permitindo notar, entre outras
coisas, a necessidade dos professores assumirem o controle de suas disciplinas à revelia de
sua formação e intuição profissional e que as escolas precisavam libertar-se, de certa forma,
de currículos pré-fabricados e verticalizados de cima para baixo, do Estado para a escola.
No mesmo documento, Antipoff fez referências ao “Diretor dos Educandários e
internatos” (p. 75), e expôs alguns elementos que julgava centrais para a atuação do diretor.
No caso da Escola Normal de Conselheiro Mata, esse espaço era ocupado pela professora
Lidimanha Augusta Maia, conforme escreveu em ata, Terezinha França, em 1960, na sessão
solene por ocasião da entrega dos certificados:
declarada franca a palavra, a Sra. Diretora Lidimanha Augusta Maia leu telegramas
de felicitações vindos das seguintes pessoas: Exmo. Sr. Governador do Estado de
Minas Gerais Sr. José Francisco Bias Fortes, Sr. Ciro Aguiar Maciell, Dr. Secretário
de Educação de Minas Gerais, Sr. Ferdinando Albrecht, ex-professor da Escola Nota
(Livro de Ata das solenidades da Entrega dos diplomas às Alunas que Concluíram o
curso na Escola Normal D. Joaquim Silvério deSouza, p. 28).
De modo sucinto, reservava-se à Diretora, no caso específico dessa solenidade citada,
a função, entre outras, de ler as congratulações dirigidas às diplomandas, ocasião na qual
foram priorizadas, mas se priorizou as palavras do Sr. Governador e não a de seus pais ou de
pessoas comuns. Assim, pode-se inferir o lugar de poder conferido à Diretoria. As atribuições
de um diretor, no entanto, eram variadas. Antipoff explica que caberia a ele (diretor), zelar
pelo bem-estar de toda a população residente. Em seguida, ressalta ela sobre a atenção que o
Diretor dedicava as
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Crianças e adultos assim como pela educação dos alunos dos internatos, orientando
ao mesmo tempo o pessoal nesta educação familiar; estudar os alunos para melhor
distribuí-los pelos núcleos residenciais, pelos cursos escolares, pelos trabalhos e
ocupações. Organizar a vida dos alunos nos lares fora das aulas e serviços,
ocupando-os nos seus lazeres e principalmente, durante o período de férias escolares,
em atividades recreativas e instrutivas ([1947] 1986, p. 75).
Sob a supervisão imediata do Diretor ficariam os internatos, as oficinas de trabalhos
manuais e de consertos. Superintenderá a Cozinha Central e o Restaurante, a lavanderia,
rouparia; fará o inventário, periódico dos móveis, roupas, vasilhas, etc.”. (ANTIPOFF 1986,
p. 75).
A título de exemplo sobre a rotina da Diretora da Escola Normal de Conselheiro Mata,
escreveu Terezinha Nogueira Souza em seu diário:
D. Lidimanha pede que as roupas que não nos servem mais não devemos jogá-las
fora, pois há muitas pessoas necessitadas. Que devemos também pagar as louças que
quebramos para não dar prejuízos para o Estado e assim poderá manter outras
Escolas. Disse-nos também que devemos chegar em casa e deixar nossas mães de
férias, descansarem (1967, p. 2).
Nesse trecho, evidências de algumas ocorrências rotineiras da Escola, bem como,
orientações da Diretora. Como as jovens chegavam à escola com idade aproximada de 13
anos, é possível dizer que ao longo do tempo (4 anos) suas roupas passavam a não servir-lhes
mais, o que, consequentemente, acarretaria um montante de roupa inutilizável. Outra tarefa
atribuída ao Diretor era a de fazer o “inventário diário dos bens” para informar, por exemplo,
as “louças” quebradas pelas alunas, que deveriam ser repostas pelas mesmas.
Para Antipoff caberia ainda ao Diretor tomar decisões de forma proeminente na
organização de Cursos de treinamento do pessoal do Educandárioe dirigir, além disso, a
Escola Doméstica”. ([1947] 1986, p. 75).
Utilizava-se a Escola de Aperfeiçoamento como modelo para definir a figura do
diretor das Escolas Rurais, conforme constatou Prates (2000), se a escolha para a direção da
Escola de Aperfeiçoamento fora um professor, antes mais nada, um intelectual e um líder
católico de destaque inquestionável” (p. 74). No entendimento da historiadora, a escolha de
um sujeito com essas características tinha por finalidade, entre várias outras, “reforçar os
compromissos do governo com os valores morais da doutrina católica (política importante
para manter a Igreja como aliada) e buscar amenizar as relações sociais negativas
desencadeadas pela criação voluntária do governo da “Escola de Aperfeiçoamento”. (p. 74).
89
Em suma, a diretoria deveria assumir padrões de simpatia, austeridade e religiosidade,
pois, precisava manter a ordem e o funcionamento do estabelecimento sem, contudo,
imobilizar seus internos e semi-internos, já que era uma escola “catolicamente ativa”.
3.4 A Escola Normal Rural de Conselheiro Mata: das reminiscências ao porvir
Apenas movido pelo instinto, o homem explorava a terra para o presente seu, sem
cogitar do futuro.
Helena Antipoff, 1958.
Operou-se, porém, a mudança. As velhas idéias o mais vigoram a respeito de
certas conveniências.
William Heard Kilpatrick, 1971.
Quem pretende fazer uma idéia exata do tempo histórico haverá de observar as
rugas de um ancião, ou suas cicatrizes, marcas presentes de um destino já passado.
Reinhart Koselleck, 1979.
No curso do desdobramento do cogito ergo sum cartesiano, a escatologia
transforma-se em utopia. Planejar a história torna-se tão importante quanto
dominar a natureza
.
Reinhart Koselleck, 1999.
Ao discursar como paraninfa dos formandos da Escola Normal de Conselheiro Mata,
1958, a professora Helena Antipoff aproveitou a ocasião para, de forma crítica, caracterizar o
modo pelo qual, tradicionalmente, praticava-se a agricultura. Segundo ela, desde os tempos
remotos, o homem, em particular aquele o qual as jovens professoras iriam educar,
“esbanjava as riquezas (naturais) e sem prever sequer a miséria para gerações vindouras, o
insensato agia na ignorância do dano que causava a sua pátria”. (1992, p. 123). Tal
observação feita por aquela que era a imagem-símbolo de valor e consciência do seu tempo,
parece explicitar sua visão acerca das tradicionais formas de cultura da terra que ainda se
faziam presentes. A educadora demonstra ao usar o termo “esbanjamento”, a face perigosa
dessa prática. Ela deixa claro ainda que a despreocupação com o planejamento do futuro,
implícita nessa cultura, fez por garantir a situação cataclísmica em que se encontrava a
população rural a qual ela se ligava em meados do século passado.
Ainda em sua exposição, Antipoff (1992) utiliza o seguinte exemplo: para destruir
uma camada de solo de 20 cm de espessura pelo efeito natural das águas a natureza levaria
174.000 anos”. Estando o solo submetido à ação humana, embasado em métodos antigos de
uso do mesmo a destruição aconteceria de forma bem mais rápida. Conclui Antipoff, “deixado
90
o solo em pastos ou trabalhos pelos processos rotineiros da cultura de milho, por exemplo,
essa destruição se realiza em 15 anos apenas” (1992, p.123). Fica evidente, portanto, sua
preocupação em relação aos métodos de produção ligados à terra e seus efeitos futuros.
Assim, ao citar os “processos rotineiros da cultura do milho”, esclarece-nos o quanto esse
método, um dos mais tradicionais da agricultura mineira, não servia mais como forma de
manutenção da sobrevivência daqueles que se organizavam em torno dessa produção,
considerando-as práticas de cultivo herdadas do passado.
Torna-se possível conjeturar, a partir da narrativa acima, que a noção de tempo
histórico que atravessará o empreendimento educacional conhecido por “Escola Normal de
Conselheiro Mata” carregará o sentido de passado no qual algumas heranças precisavam ser
superadas, esquecidas e substituídas. Em suma, outras práticas culturais deveriam emergir
para que se transfigurassem essas reminiscências que, parece, estavam muito mais a serviço
de um presente e de um futuro mortificante, do que a garantia de um presente e um futuro
mais vitalista que o passado.
Como operacionalizar essa reforma dos costumes? Responde Antipoff: “Somente a
educação, sistema organizado de influência social sobre novas gerações e num clima de
respeito e de amor, podetransfigurar a existência do homem rural e mudar sua vida onde
campeia hoje a miséria” (1992, p.122).
Desse modo, será da educação escolar de onde virão os elementos substanciais para
que se processe nas novas gerações uma outra visão em relação ao passado e à tradição na
qual estiveram mergulhados seus antepassados.
Segundo Magalhães (2004), a escola aparece como um conjunto de práticas exercidas
por sujeitos qualificados em espaços e tempos específicos, dispondo de materialidades
proporcionadoras da apropriação e desapropriação de saberes, crenças e atitudes, ou seja, da
cultura escolar. Presume-se, então, que a Escola Normal de Conselheiro Mata foi fundada,
entre outras coisas, com a missão de executar a apropriação de saberes e práticas culturais, as
quais permitissem a renovação da vida rural, na medida em que as “novidades” oferecidas
pela escola fossem inculcadas nas crianças as quais as normalistas estavam sendo preparadas
para escolarizar.
Vale lembrar que existia uma cultura escolar, que se apresentava fragilizada tanto
em termos quantitativos, como em termos qualitativos. Quanto a esse último, como bem
lembrou Kilpatrick (1971), cabia à educação escolar, em todos os seus níveis, mudar. Isso
porque, diz ele: Nossa época está mudando (...) pela simples razão de basear o pensamento
na experimentação, a ciência parece-nos apresentar a causa diferenciadora do mundo
91
moderno: ela nos o como e o porquê de nossa civilização. (1971, p.16). Pode-se
argumentar que a ciência, ao se inserir na vida material e simbólica da sociedade ocidental,
ressaltava, de forma considerável, a categoria temporal da mudança. Nesse sentido, ela se
tornaria uma demanda premente em rios campos da vivência humana, comportando
transformações que se estenderiam do campo material ao campo moral.
Entretanto, para que esse espírito de mudança fosse incorporado era necessário que as
concepções epistemológicas de
mundo fossem, desse momento
em diante, orquestradas pelo
instrumentai inventado pelo
campo científico. Ou seja, uma
cultura orientada para a mudança
só seria possível na medida em
que os pressupostos teórico-
metodológicos da ciência
passassem a fazer parte da
percepção comum da população.
Para tal, coube à geração adulta
do segundo e do terceiro quartel
do século XX, estrategicamente, inserir, por meio da educação escolarizada, as formas de
pensar, ver e fazer baseadas na racionalidade científica.
Kilpatrick (1971) defendia que, para se entender esse contexto de mudança que
marcava os anos de 1940, era preciso retornar a Galileu. Pois estava lá, no limiar da razão
ocidental moderna, a gênese da novidade. Diz ele, a substituição, em discussão, da prova
dialética formal pelas conseqüências observadas. (p.17).
Em outros termos, o que veio à tona com Galileu e que estava sendo incorporada pelas
instituições educativas, tardiamente, em meados do século XX, era uma forma de
“pensamento baseado na experimentação” (p.16). Diremos, pois, que as relações temporais:
passado, presente, futuro, no que toca à educação escolar imaginada por Antipoff, foram
articuladas pela noção de mudança introduzida na cultura ocidental moderna pelo nascimento
da ciência moderna.
Na época, Antipoff, de certa forma, sintetizava com suas propostas a difusão do
argumento de que o presente será, na figura da ação escolar, encarnado na pessoa da
normalista, o locus de significação do passado de forma a trazer à consciência suas faces
Ilustração 10 – abaixo: no "livro de recortes de jornal" da Escola
Normal, diz que “a vitória do general Eisenhower fortalecerá os
laços de amizade entre Brasil e Estados Unidos da América”
(Acervo – Conselheiro Mata).
92
negativas e positivas. Também, com base nos conhecimentos assimilados e produzidos acerca
dos métodos antigos, fossem eles escolares ou da cultura rurícola, dever-se -ia planejar e criar
novos métodos que permitissem vislumbrar um futuro outro, um novo tempo que se
diferenciasse do presente e do passado que se tinha experimentado.
Nessa perspectiva, a escola do presente era um espaço ambíguo. Pois diz Antipoff,
guardiã da tradição e estimuladora do progresso, a escola mantém o equilíbrio entre os dois
pólos vitais: conservando o passado e construindo o futuro. (1992, p. 122). Em seu
entendimento, a “escola rural moderna” era aquela em que o aluno necessitava, mais do que
na urbana, da educação científica (p.125).
Pode-se dizer, com pertinência, que a Escola Normal de Conselheiro Mata inserira-se
num quadro de expectativas de transformação social que, de acordo com Santos (2006),
pretendia uma racionalização da vida individual e coletiva, cuja emancipação social
pressupunha a desvalorização do passado e o hipostasiar do futuro. Assim, O passado foi visto
como consumado e, portanto, como incapaz de fazer a sua aparição, de irromper no presente.
Pelo contrário, o poder de revelação e de fulguração foi todo transposto para o futuro.
(p.52).
Não por acaso, a Fazenda do Rosário, Fundação Educacional da qual a Escola Normal
de Conselheiro Mata fazia parte, fora descrita por Antipoff em 1963, como um centro rural de
pesquisa, preparação, orientação, divulgação e especialização em assuntos educacionais em
zonas rurais. Considerava ainda a educadora que sua finalidade geral era contribuir para o
progresso do país pela educação integral do homem dentro do ambiente rural em via de
civilização e da emancipação de sua comunidade para formas mais evoluídas de vida social,
cultural e econômica
15
. (1992, p.153).
Desse ponto de vista, é possível imaginar que a metáfora das “formas mais evoluídas
de vida” certamente não se referia a uma reprodução ou conservação das formas tradicionais
de vida rurícola. Refere-se ao futuro como progresso dependente da razão científica que,
conforme explicita Santos (2006), foi transformada na última raiz da vida individual e
coletiva e não tinha outro fundamento senão criar opções. E é nisso que ela se distinguia das
raízes da cultura tradicional, marcadas pelo saber espontâneo e pelas superstições. A raiz
agora, diz Santos, é a lei da natureza pelo exercício da razão e da observação (p.56).
Ficam, portanto, explícitas quais deveriam ser as regras intelectuais com as quais, num
futuro próximo, orientar-se-iam os habitantes do meio rural. Isso seria possível na medida
15
Vale lembrar conforme registrou Magalhães (1960), que Fazenda do Rosário foi cadastrada como
estabelecimento no Ministério da Agricultura.
93
em que a escola rural assumisse outra postura frente ao lugar no qual estava inserida,
comportando-se diferentemente das escolas que não incorporavam aos seus instrumentos
pedagógicos a realidade natural exterior aos muros das escolas. Dessa forma para Antipoff: a
beleza do ambiente natural e suas maravilhas são fatores importantes na educação artística e
no despertar científico da juventude escolar, assim como o amor à terra e o gosto de ser
educado, desde a infância, na formação da sensibilidade e do civismo. (1992, p.171).
Esses elementos foram tradicionalmente “despercebidos” pela escola do passado.
Ignorados nos “programas acadêmicos do ensino oficial”, foram trazidos, agora, para o
funcionamento através de escolas “orientadas para o trabalho”. Tais pressupostos evidenciam
a falência da educação tradicional que, conforme notou Kilpatrick (1971), não tinha preparado
as crianças e os jovens para a vida adulta. Segundo ele:
Em vez de preparar para a vida de hoje, freqüentemente tem ensinado, ao
contrário, coisas antiquadas e matérias meramente convencionais. Em parte,
devido a pouca plasticidade de sua teoria educacional rotineira, difícil de ajustar-
se às exigências reais presentes (...), em parte ainda porque a sua perniciosa
teimosia preferiu manter o atraso moral e social, em relação à nova situação
social. (p. 46).
Nesse argumento, contido numa das obras comumente usadas populares pelas
normalistas, é possível vislumbrar como o autor caracterizou o “ensino convencional, isto é,
as formas como historicamente a educação escolar vinha sendo praticada”. Em sua opinião, a
escola usava um método anacrônico, em relação às reais necessidades das formas de vida
social, cultural e de trabalho atuais. Considerava-se, ainda, o futuro como uma dimensão
concreta das formas de pensar sincrônicas à vida contemporânea, dando a entender que o
passado educacional para o presente que vivia, tinha talvez pouco a oferecer, por isso a
necessidade de processar a substituição de algumas inspirações pedagógicas que esse ente
temporal oferecia.
Lembra-nos Reis (2003), com base no pensamento de Koselleck, que a sociedade
contemporânea, identificada aqui como a sociedade ocidental do século XIX em diante,
elaborou para si um tipo de concepção do tempo histórico “desnaturalizado” no qual a
liberdade de criação e a aceleração do tempo são relativizadas. Segundo Reis (2003, p. 192)
havia um controle científico e técnico da natureza, que permitia a política e o social, mas
não em total liberdade”. É possível presumir que tal controle científico refere-se, igualmente,
ao controle do próprio comportamento humano, por via de instrumentos pedagógicos
94
elaborados pelo campo psicológico. Dessa forma, o controle técnico-científico obriga a
atrasar ações e decisões, leva ao planejamento”. (p.192).
Pode-se dizer, como assinalou Lourenço Filho (1963), que as raízes da reforma escolar
de nosso tempo encontram-se, de fato, nessa dupla ordem de fundamentos. Primeiramente,
maior e melhor conhecimento do homem mediante a análise das condições de seu
crescimento, desenvolvimento ou expansão individual; depois, maior consciência das
possibilidades de integração das novas gerações em seus respectivos grupos culturais (p. 23).
Dir-se-ia com isso que a educação contemporânea preconizada por esquemas de feição
científica levaria a um conhecimento tal do ser humano (nesse caso específico, o
conhecimento da natureza da criança), que permitiria planejar, ao menos em teoria, quais
indivíduos a educação escolar estava “confeccionando” para um futuro próximo.
Em outras palavras, “somente a educação” levaria a esse futuro, como caracteriza
Antipoff (1958):
...
por intermédio da escola poderá o homem livrar-se dos males que ferem seu
corpo. Somente com seu auxílio emancipar-se-á do tremendo sentimento de
inferioridade que amarra sua vontade, atrofia sua ambição de ser alguém, de
produzir mais e de ver seus filhos subirem na escala de valores morais, sonhando
com um futuro realmente melhor (1992, p. 135).
Tais argumentos da educadora permite inferir que o ideário temporal com o qual ela
comungava tendia a priorizar o peso do futuro como dimensão elevada de tempo maior que o
passado, significado dito acima, como um período em que os homens rurais “feriam” seu
corpo, a partir também da inculcação de sentimentos de inferioridade social diante de outras
categorias sociais. Por isso, então, talvez coubesse a esses escolher para seus herdeiros uma
estrutura social, econômica e cultural que, em boa medida, os defendessem desse passado
“torturante”.
Como lembrou o professor Mennucci (1942), a Escola Normal para professores
primários da zona rural deveria se orientar, sobretudo, em termos da sua organização
pedagógica, em torno do e no ambiente rural. Talvez por isso e, acertadamente, atribuiu-se à
instituição responsável pela administração das Escolas Normais Regionais Rurais a metáfora-
nome “Fazenda do Rosário”. Segundo Ferreira (2001, p.340), Fazenda pode ser: 1- conjunto
de bens, haveres. 2 - Propriedade Rural, de lavoura ou de criação de gado. 3 - Pano, tecido. 4 -
Finanças públicas. Dessa forma, pode-se inferir que a organização pedagógica da Escola
Normal Regional D. Joaquim Silvério de Souza caracterizou-se por um conjunto de bens
(materiais e simbólicos) entrelaçados na forma de um tecido no qual cada “fio” do mesmo
95
deveria funcionar em harmonia com o outro, no interior/exterior de uma propriedade rural. O
fim preconizado seria racionalizar os métodos de lavoura e criação, concomitantemente, com
a elevação do nível de vida de pessoas que sobrevivem da propriedade rural, bem como
contribuir para a elevação dos “recursos econômicos e financeiros” do país (p.348).
Por seu lado, ainda, a Fazenda do Rosário sustentava-se em dois pilares simbólicos de
cunho religioso, a saber: o “Rosário” que, segundo sua etimologia pode significar: 1 - enfiada
(porção de objetos enfiados em linha ou fio) de 165 contas: 15 dezenas de ave-marias e 15
padre-nossos, para serem rezados como prática religiosa; 2 sucessão, série. (FERREIRA,
2001). Com efeito, fica caracterizado tanto o caráter religioso implícito em tal organização
pedagógica, como também
sua lógica serial, ou seja, do
mais jovem para o mais
velho, do menor para o
maior, da primeiranista para
a quartanista. Além disso, é
preciso sublinhar que D.
Joaquim Silvério de Souza
foi o Bispo responsável,
entre os anos de 1920-30,
pela construção do prédio
no qual o curso normal
instalou-se, na cidade de
Conceição do Mato Dentro de um Ginásio de Ensino Agrícola. Por esses motivos, fica
explícito, de certa forma, que a organização pedagógica da Escola Normal de Conselheiro
Mata efetivou-se, entre várias influências, através da visão que a Igreja Católica fazia da
educação escolar e da vida rural, assim como pelo campo pedagógico que se desenvolvia
naquele momento.
Ilustração 11 - acima: desfile das Normalistas (Acervo - Conselheiro
Mata)
96
3.5 Dos primórdios da Escola Normal no Brasil à seleção das futuras regentes de ensino
do Meio Rural
Em prosseguimento ao curso primário, e tendo o mínimo de 13 anos de idade, o
candidato ao curso normal regional fará um semestre, agora iniciado, para
ajustamentos escolares, e mais quatro séries de estudos seguidos. Com mais um ou
dois anos de estágio dirigido nesta Fazenda, achar-se-á o candidato no limiar de
sua maioridade civil, e bastante habilitado para reger uma escola rural, nos
moldes de uma granja-escolar, como esperamos que sejam no futuro todas as
escolas primárias da zona rural.
Antipoff, 1949.
Como explicitado acima, o candidato a uma vaga na escola D.Joaquim Silvério
deveria terminar o curso primário e se dirigir para lá seis meses antes do “Curso de admissão”
para se preparar ou, como disse a educadora para efetuar seus “ajustamentos escolares”.
Aprovado no “Concurso”, o candidato permaneceria nesse estabelecimento, por quatro anos,
nos quais incorporaria as técnicas suficientes para o manejo de uma escola rural. A esse aluno
seria oferecido mais um ano para efeito de “estágio”, momento no qual aluno-professor
experimentaria e aprofundaria suas técnicas. Pode-se dizer, com base na documentação
pesquisada que o momento do estágio admissional não aparece claramente registrado. Talvez
porque tenha sido, entre outros ajustamentos feitos para a efetivação da escola, eliminado,
uma vez que o espaço para alojamento e oferta de estágio não pareciam suficientes para todos
os anos escolares.
Outra questão tratada na configuração do modelo do candidato formado era que ele
futuramente dirigiria uma “escola-granja”. Por outro lado, tal tipo de escola se concretizaria a
partir do momento em que as escolas rurais substituíssem suas técnicas de ensino e seus
equipamentos materiais. Antipoff caracterizava com essa expressão uma idéia de que toda
escola rural seria uma “escola-fazenda-laboratório” em que a Escola Normal Rural prepararia
o corpo técnico. Sublinhava-se ainda que a origem do candidato a normalista daquela escola
necessitava ser um “filho autêntico deste meio (ANTIPOFF, 1949, p. 2), diferenciando,
portanto, os candidatos dos meios urbanos daqueles dos meios rurais, sendo que a prioridade
recairia sobre o último. De acordo com a educadora o candidato deveria ser
habituado desde a tenra idade, à paisagem, à sua gente, à vida no campo, oriundo de
família de lavradores, de fazendeiros, decididos a permanecer neste meio, onde
introduzirão, por intermédio de seu filho, formas eficientes de trabalho, dentro de
ambiente melhorado pela técnica moderna de economia rural (ANTIPOFF, 1949, p.
2).
97
Houve, porém, concorrência pelas vagas que eram disputadas por candidatos de
“pequenas cidades” com os filhos de agricultores de “boas famílias”. Instalou-se, então, uma
situação de disputa que oporia pretendentes melhores preparados, em termos de recursos
familiares, a outros menos favorecidos, o que erigiu do estabelecimento a necessidade de um
maior rigor na admissão. Isto acarretou a não aprovação de muitas candidatas rurais “fracas”,
no sentido estrito do termo, para o nível de conhecimento estabelecido pelo “concurso” e que
eram, economicamente, incapazes de reunir o enxoval necessário. Conseqüentemente, a
escola tornou-se um estabelecimento exclusivo para as moças da elite regional.
Antipoff (1949) tematizou, na época, acerca do debate que havia se instalado sobre a
questão de os candidatos serem indistintamente candidatos do sexo feminino ou masculino”.
De acordo com o entendimento da época, achava-se que os de sexo masculino não trariam
“vantagens para o desenvolvimento da escola” (p. 3). Segundo a visão de Antipoff (1949):
Não houve, é verdade, ou pouco em Minas professores primários do sexo masculino,
isso devido principalmente aos vencimentos irrisórios, incompatíveis com a norma
econômica do salário masculino. o Estado de São Paulo, onde os vencimentos são
mais elevados, a porcentagem de professores na escola primária atinge 30% e não
provoca desajuste profissional (p. 3).
A educadora intercedeu a favor de se garantir vagas para candidatos homens, expondo
que em países da Europa, o ensino era naturalmente repartido entre os sexos”; resguardando
aos homens tanto as classes masculinas como mistas”. O problema, confessou, era menos
de vocação que de remuneração (p.3). Contudo, ficou explícito que ela acreditava na
superação dessa tradição de má remuneração do professor primário rural, bem como, na
inclusão do elemento masculino como professor na escola do meio rural. Acrescentou dizendo
que “os centros propulsivos úteis, em que o gênio masculino será elemento de maior garantia
para o bom êxito”. (p. 3).
Visto de outra maneira, estava Antipoff reforçando sua crítica aos “costumes
educacionais mineiros, tanto na forma como o poder público tratava a questão, quanto à forma
de investimento de recursos humanos na escola existente, que não seria promotora de
atividades fundamentais. Sob essa perspectiva deve-se indagar sobre o processo originário e
remoto de emergência da figura social do (a) normalista no campo educacional brasileiro.
A esse respeito, Brasil (1961), ao escrever na Revista do Ensino a pesquisa “A
Carreira do Professor Primário Regente de Classe” (p. 71), assevera que no mundo, até onde
dava para verificar por fontes fidedignas, o aparecimento do regente normalista, enquanto um
98
elemento da cultura letrada, remontava a antiga e tradicional França, por volta de 1686,
com João Batista de La Salle”. (p.73).
Em contrapartida, sublinhou a pesquisadora, no Brasil, a figura da normalista nasceu
do “Ato Adicional à Constituição do Império”, em 1834, portanto, 148 anos depois da França.
Na ocasião, a organização e a administração do ensino primário e normalpassaram a ser
responsabilidade “dos Estados”. (Brasil, 1961, p. 73). A primeira Escola Normal do Brasil foi
criada em 1835, em Niterói, no Rio de Janeiro. Contudo, é necessário chamar a atenção para
um detalhe: a Escola Normal Brasileira surgiu como um objeto na cultura urbana,
diferentemente daquela preconizada por Salle, no século XVII, pois a formação ministrada
era de cunho teórico” (p. 73).
A Escola Normal brasileira e seus normalistas surgem em função da necessidade de
ampliação da instrução elementar, uma vez que o século XIX, o imaginário brasileiro foi
marcado pela noção de progresso, acrescido ainda da noção de liberalismo que, de certa
forma, considerava a escola elementar um fator preponderante para a efetivação de um projeto
nacional engajado nessas doutrinas (SEVCENKO, 2003).
Brasil (1961) infere que a falta de escolas normais fez com que ocorresse, “pela lei nº.
3.411, de 27 de julho de 1887, a aceitação de alunos vindos de outras escolas para prestarem
exames nas escolas normais”. (p. 78). Assim, eles obteriam os mesmos direitos daqueles que
cursavam efetivamente o Normal. Afirma ela que em Minas Gerais, a preocupação com esse
grau de ensino inquietou mais fortemente os dirigentes da Província. A pesquisadora ressalta
que
em Minas Gerais, desde muito tempo, os administradores se vêm preocupando como
ensino normal. O artigo da lei nº. 13, de 28 de março de 1835, determinava o
estabelecimento de uma Escola Normal para a instrução primária do artigo primeiro
e para o artigo 6º, pelo método mais expedito, e ultimamente descoberto e praticado
nos países civilizados – no caso, a França, sem dúvida (1961, p. 76).
Em 1840, foi criada a primeira Escola Normal da Província de Minas Gerais, sob a
direção do professor Francisco de Assis Peregrino, especializado na França. Em 1872, pelo
regulamento nº.62, criou-se entre outras coisas, uma escola normal na Capital da Província
de Minas e em mais duas localidades” (Brasil, 1961, p. 76).
A Lei nº. 2.438, de 14 de novembro de 1877, no artigo 2º, § 3º, criou uma escola
normal em São João Del Rei, que foi, logo depois, suprimida pela Lei nº. 2.476, de 9
de novembro de 1878. Em 1883 existiam, em Minas, Escolas Normais na Capital, em
Uberaba, Juiz de Fora, Montes Claros, Campanha, Diamantina, Sabará e Paracatu
(BRASIl, 1961, p. 77).
99
A Escola Normal, conforme caracterizaram Buffa e Nosella (2002), ocupou um lugar
de prestígio freqüentado por membros prestigiados da sociedade, especificamente, por moças
da sociedade paulistana. Afirmam eles que a importância da Escola Normal não decorreu da
formação de professores competentes, mas sim do rigor dos estudos de Cultura geral
necessária à formação e distinção das moças comerciantes que encontravam na Escola
Normal a única escolarização praticamente possível naquela época! (p. 74). A época a que se
referem os autores e a expressão empregada por eles para designá-la, demonstra tratar-se da
Escola Normal da Primeira República. (p. 73).
Os créditos maiores para a realização de tal formação estão depositados na hegemonia
“cultura humanista clássica”. Pelos termos dos historiadores
O Currículo da antiga Escola Normal tinha por função principal a distinção social do
grupo que possuía consagrado seu afastamento do trabalho mecânico e manual.
Afinal, era o mesmo grupo dominante do período imperial que, na República, ainda
no Centro do poder, apropriava-se da Escola Normal, secularizando o objetivo de
formação profissional e priorizando a produção e a reprodução de uma cultura geral
distinta para suas filhas (BUFFA e NOSELLA, p. 75).
Na visão acima construída, a Escola Normal das primeiras décadas do século XX, não
tinha como missão formar professoras para atuar somente no primário, mas sim funcionava
como um distintivo para as moças prestigiadas das cidades.
Em publicação importante sobre Escola
Normal no Brasil, Buffa e Nosella (1996),
informam, entre vários detalhes sobre esse micro-
universo, que suas alunas, no primeiro quartel do
século passado, eram, a grande maioria, filhas de
fazendeiros ou de grandes negociantes. (
BUFFA e
NOSELLA
, p. 60). Na ocasião, vários fazendeiros, ao
constatarem que suas filhas haviam atingido a
“idade” para cursar a Escola Normal, ou até mesmo
antes, mudavam-se para a cidade (São Carlos),
deixando a fazenda a cargo do administrador. (p.
62).
Destacam esses autores esses autores que a
transferência dos fazendeiros para a cidade tornou-
se um fato tão freqüente, a ponto de se constituir uma característica importante das relações
Ilustração 11 - N
ormalista em posição de espera,
(Acervo - Conselheiro Mata).
100
cidade e campo, no Estado (São Paulo) e no Brasil”, na primeira metade do século XX. Os
fazendeiros chegaram a ser acusados, por alguns estudiosos, de não terem amor à terra. No
modo de ver destes pesquisadores,
a mesma falta de amor à terra reflete-se, ainda, no desejo de todos os fazendeiros
de que os filhos não cuidassem diretamente da fazenda e sim estudassem, se
tornassem doutores para engressar na política, serem profissionais liberais ou
funcionários do Estado.(BUFFA e NOSELLA, 1997, p. 62).
Evidencia-se, nesse argumento, a idéia da educação como um instrumento de
desruralização dos herdeiros, ou seja, uma forma de recriar hábitos urbanos para que os
mesmos pudessem se adaptar com mais facilidade e ter sucesso nesse ambiente.
Sobre o público da Escola Normal, vê-se um quadro distinto desse acima, quando se
analisam os argumentos organizados por Tanuri (2000) acerca da “fabricação” de normalistas.
“As primeiras Escolas Normais”, de Niterói, São Paulo, Pernambuco, entre outras foram
destinadas ao sexo masculino, explicitando em seguida que, o magistério feminino
apresentava-se como solução para o problema da mão-de-obra para escola primária. (p. 66).
Com efeito, esclarece ela, que a escola primária não era vista pelo elemento masculino como
uma opção econômica atraente. Estrategicamente, como tudo indica, as autoridades viam nas
mulheres uma alternativa para aplacar o problema da educação elementar. Em várias
províncias, de outro lado, a destinação de órfãs institucionalizadas para o magistério visava
ao seu encaminhamento profissional como alternativa para o casamento ou para o serviço
doméstico bem como o preenchimento de cargos no ensino primário a custo de parcos
salários
. (TANURI, 2000, p. 67).
Segundo comentou Faria Filho (200I), as Escolas Normais passaram a ser criticadas
por alguns diretores de instituições educacionais, por utilizar instrumentos pouco
sistematizados no campo do ensino de práticas pedagógicas. De acordo com eles, a falta de
preparo das professoras e as conseqüências disso para os alunos tinham como uma de suas
causas a própria formação oferecida pela Escola Normal. Analisando os primeiros anos da
República, o historiador acabou por perceber que várias das candidatas à qualidade de
normalista não atingiram a competência necessária para o desempenho da profissão. O fator
preponderante a tal realidade da qualidade das normalistas, recaía sobre o processo de seleção
e formação oferecido pelos estabelecimentos da época, tão bem criticados por Antipoff.
Na obra de Damazio, citado por Muller (1999), em 1906, 50% do magistério do
Distrito Federal era composto por mulheres. (p. 104). O que se constatou daí por diante foi
101
que a presença das mulheres no magistério primário tornou-se majoritária (Muller, 1999;
Tanuri, 2000; Monarcha, 1999; Vidal, 2001). Essa característica do curso normal de ser um
“espaço feminino” foi consolidada em Minas Gerais. Muller (1999) notou que a presença
hegemônica de elementos femininos no magistério foi decisão do governo Silviano Brandão,
em Minas, no ano de 1911, ao limitar o ingresso à escola normal somente às mulheres. (p.
105). Assim, a relação professora, mulher, mãe, cuidado, criança, remuneração barata foram
categorias que se articularam na confecção dessa “paisagem” que alguns passaram a chamar
de feminização precoce do magistério. (Tanuri, 2000, p. 67).
Em São Paulo, para matricular-se o candidato deveria atender as seguintes
exigências, escreveu Monarcha, 1999, p. 96:
Ser maior de 16 anos, saber ler, escrever e contar, comprovar moralidade notória,
não sofrer de moléstia contagiosa nem ser portador de defeitos físicos que o
inabilitem para a profissão e pagar a taxa de 10$000 à Coletoria Provincial. Tal
quantia deverá ser paga por todos aqueles que não forem professores públicos ou
reconhecidamente pobres. (p. 97).
O pesquisador ressalta que essas normas de ingresso foram várias vezes alteradas, mas
resguardaram uma conotação “prática”, que a Escola Normal se destinava a formar
professores para instrução primária, sendo necessário a qualquer candidato saber o básico
“ler, escrever, contar”. Desse modo, por volta do ano de 1880, em São Paulo, para se efetuar a
matrícula, o candidato deveria ter 18 anos, saber ler, escrever, contar, executar as quatro
operações aritméticas e saber, ainda, caligrafia. (MONARCHA, 1999, p. 100).
A descrição acima revela a diferença de como a Escola Normal de Conselheiro Mata
se diferenciava ou se assemelhava aos processos de seleção de normalistas no período anterior
aos anos de 1930, a partir de dados oferecidos pela literatura sobre o tema. Conclui-se que as
transformações implementadas na estrutura estatal brasileira após a “Revolução de 1930”,
tinham reservado novidades também para os processos de recrutamento e formação de
normalistas. Além disso, segundo percebeu Vidal (2001), algumas novidades sutis podem ser
constatadas, também, nas reformas de ensino ocorridas em vários estados na segunda metade
dos anos de 1920.
Para garantir normalistas melhor preparadas para o ofício, argumenta Vidal (2001),
promoveram-se reformulações em currículos, adequando-os às novas finalidades estritamente
profissionalizantes e do ambiente laborial. (p. 105). Faz-se necessário registrar que a autora
referia-se ao Instituto de Educação do Rio de Janeiro, nos anos de 1930. Afirma ela que o
critério para o acesso ao Curso Complementar foi estabelecido no Regulamento de Ensino e
102
previa que as candidatas deveriam ter cumprido cinco anos de ensino primário, ser natural
do Distrito Federal e ser do sexo feminino. (p. 105). Além disso, teriam de satisfazer os
índices previstos para os testes de idade mental adulta, não podiam ser portadoras de
moléstias transmissíveis, ou defeitos físicos incompatíveis com a prática do magistério (p.
105).
No processo de recrutamento das normalistas depois de 1932, no Instituto de
Educação do Distrito Federal, ocorreram mudanças uma mudança para atender ao decreto de
3.810. Passou-se a exigir entre outras coisas:
Idade entre 18 e 28 anos, vocação individual e familiar, exame de saúde, seguido de
exames laboratoriais complementares e registro da impressão digital do polegar
direito; teste de inteligência, baseado nos testes usados pelo exército norte-
americano, na Primeira Guerra. Provas escritas sobre conteúdo de Aritmética e
Português (caligrafia e ortografia eram avaliadas); prova oral, versando sobre
Aritmética, Português, Ciência, Geografia e História Pátria e, finalmente, exame de
desenho, composto por cópia do natural (VIDAL, 2001, p. 107).
Isso mostra que o teste de admissão, no caso desse Instituto, ficou mais complexo,
mais rigoroso, com o objetivo de selecionar os melhores os candidatos. Corpo perfeito,
biológica e psicologicamente, era condição imprescindível para o ingresso, corpo saudável,
morada do saber racional e científica. (VIDAL, 2001, p. 107). Até então, não se discutiam
nos testes de seleção para a escola normal características dos candidatos que pressupunham
possuir vocações científicas. Nesse sentido, segundo Anísio Teixeira, entusiasta do
movimento “escolanovista” no Brasil, no segundo quartel do século passado,
ao lado da finalidade de educação geral para todos, se acentuou, nos países
civilizados, a necessidade de uma verdadeira pesquisa de talentos e de
inteligências privilegiadas e de educação o profunda, tão rica e tão
especializada, quanto possível, para dar oportunidades a que se revelem todos os
aspectos dessas inteligências (apud VIDAL, 2001, p. 109).
O que se nota a partir de 1930, contudo, foi a construção de categorias como, por
exemplo, “inteligência”, para auxiliar na definição do perfil de candidatas a estes e a outros
cursos. Para Teixeira, segundo frisou Vidal (2001), o que se procurava fazer era praticar
modelos dos países civilizados, como se o Brasil fosse um deles, porém esquecido de
atualizar instrumentos, ficando, portanto, atrasado. A inteligência passa a ser entendida como
a habilidade de realizar algumas operações mentais específicas de determinadas áreas de
conhecimento. Seguindo esse paradigma, funcionava o regulamento para admissão na Escola
Normal de Rio Claro, como constatou Camargo (2000), ao tratar da reforma desse nível de
ensino em tal escola. Segundo ela: a primeira exigência foi a obrigatoriedade do vestibular
103
para os que se dirigissem ao curso Normal e a segunda, a introdução do ensino de Português
na nova legislação do ensino Normal”. (p. 47).
Entendia-se por vestibular uma prova de seleção com testes escritos e orais, nos quais
se buscava perceber os elementos de semelhança a uma elite social e intelectual local que se
sentia “dona” do estabelecimento.
Uma vez reconhecida como um espaço capaz de promover a elevação social e
profissional daquelas que a freqüentavam, a Escola Normal passou a ser procurada depois de
1930, também para esse fim, conforme Buffa e Nosella (2002, p. 76), por jovens que, cada
vez menos, contentavam-se em ser esposas e mães e desejavam exercer uma profissão. Buffa
e Nosella (2002) observam que
Foi alterada a clientela da Escola Normal: da primeira clientela, constituída de filhas
de fazendeiros que buscavam na Escola complementação cultural do dote
matrimonial, passou-se a uma segunda que buscava na Escola Normal um diploma
para uma distinção social e uma realização profissional com o magistério [...] O
curso Normal e o magistério acabaram sendo o “destino escolar/profissional” das
mais pobres (p. 78).
Os autores constatam, portanto, a presença de uma clientela e uma Escola Normal
antes das reformas e a emergência de uma outra depois da reforma. Vale notar que as
informações são pertinentes, mas dizem respeito à realidade paulistana, o que, de certa forma,
sugere que não se deve considerar os mesmos processos na sua inteireza para outros espaços
da Federação. Isto porque, entre outras distinções, é preciso sublinhar que no caso de Minas
Gerais, a Escola Normal servirá ainda por muito tempo para formar as filhas da “pequena elite
interiorana”.
Sobre essa formação, vale ressaltar que a Escola Normal do interior de Minas, em boa
medida, funcionava em regime de internato. Portanto, cabia à aluna manter-se e uma das
exigências necessárias era o “enxoval” ou como detalhou Ferreira (2001, p. 297) conjunto de
roupas e certos complementos de quem se interna em colégio. Segundo a memória local,
muitas famílias tinham o desejo de enviar suas filhas para a Escola Normal de Conselheiro
Mata, porém não tinham condições financeiras de comprar enxoval da filha
16
. Com efeito, tal
drama incomodou vários pais que não puderam ter, por falta de recurso, uma normalista na
família.
Luis Pereira (1963) examinou o fenômeno do magistério primário entre os anos de
1940 e 60, em São Paulo, e explica que uma de suas características mais notáveis era o fato de
ele se consistir numa ocupação quase exclusivamente feminina: em 1957, eram 93,1% das
16
(comentários de D. Zita)
104
183.056 professores existentes na sociedade brasileira. (p. 21). Somou-se a isso o argumento
que a Escola Normal, ao lado da função técnico-profissional, funcionava também como
colégio para moças. (p. 75).
Outra questão explorada por Pereira (1963), foi a dificuldade em caracterizar as
atitudes, que na medida do possível, pudessem facilitar o ingresso de pessoas minimamente
vocacionadas para o magistério. Para isso,
dentre essas medidas está a introdução dos exames vestibulares, a fim de evitar que a
posse de certificados de estudos propedêuticos ou de outros dados equivalentes, não
importa em que condições feitos, continuasse a eximir de demonstrarem vocação,
aptidões e capacidade intelectual para estudos pedagógicos de exercício do
magistério, os candidatos a ingresso nos estabelecimentos de ensino normal
(PEREIRA, 1963, p. 79).
Como foi visto, o exame acabou tornando-se uma tática de ordenamento da população
da Escola Normal que havia se transfigurado, em seu passado recente, num “canal de
trabalho”. Fica assim constatado que o magistério, em última instância, deixou de formar
somente filhas de famílias bem nascidas. Essa tendência expansionista, segundo Pereira
(1963, p. 80), não poderia explicar-se somente pela ampliação real das oportunidades
profissionais aos possuidores de diploma do curso normal, mas, sobretudo, pela expansão das
vagas no ensino primário.
Tratando, sinteticamente, das mudanças pelas quais passava o estereótipo do
normalista-professor, ou seja, de um perfil tradicional para um “modelo moderno”, Oliveira
(1973) assim escreveu:
O professor de ontem é autoritário, dominador, distanciado dos alunos, importando-
se mais com o que vai transmitir do que com aqueles que vão aprender. Por isso
mesmo serve-se dos recursos impositivos e não motivadores. É mais afeito ao
monólogo do que ao diálogo (p. 5).
De outra parte, ficou a cargo dos exames de ingresso e, consequentemente, da
formação dos normalistas identificar e fabricar :
O professor de hoje orientador, compreensivo, cordial, colaborador. Preocupado
com a comunicação real entre ele e o aluno é, portanto, mais afeito ao diálogo, ponto
nevrálgico da tarefa docente; diálogo que permite o desenvolvimento das
potencialidades dos discentes, tanto no sentido da vida interior com no da integração
social (p. 5).
Mais próximo a esse segundo perfil, a Escola Normal de Conselheiro Mata procurava
recrutar seus candidatos através de um questionário enviado aos prefeitos que se
encarregavam das indicações dos respectivos aspirantes à vaga no curso normal. Isto porque,
segundo os princípios lançados por Antipoff ([1947], 1986; 1992 e 1949), não se tratava
105
apenas de formar professores elementares, mas, principalmente, cidadãos capazes de opinar e
planejar suas respectivas comunidades, por isso pré-selecionados por um órgão de natureza
pública a Prefeitura. Assim, a Secretaria de Educação do Estado de Minas Gerais, em Belo
Horizonte, através do Serviço de Orientação técnica do Ensino Primário e Normal em zonas
rurais, no mês de junho de 1949, envia um informe para os Senhores prefeitos.
Pretendia o Sr. Secretário de Educação Abgar Renault inteirar os prefeitos das novas
medidas que vinham sendo implementadas pelo governo no campo da formação de
professores para o meio rural. “Ao Senhor Prefeito Municipal”, escreveu o Secretário: Dentro
do plano de reforma do ensino rural em Minas Gerais inclui-se a instalação de Cursos
Normais Regionais, com um período letivo de quatro anos. Neles serão admitidos jovens de
13 a 18 anos, rigorosamente selecionados. (1949, p. 1).
Lembra o documento, também, que o governo do Estado pretendia instalar nos
próximos dois anos dois cursos normais previamente anunciados. Um no município de
Betim e outro em Diamantina. Por conta disso,
deliberou-se conceder uma bolsa de estudos a candidatos (5) desse município, os
quais deverão satisfazer as Condições requeridas para a admissão. Na seleção do
candidato, que será do sexo masculino ou feminino, recomenda-se observar o
seguinte:a) que tenha residência na zona rural;b) que seja de nível mental normal ou
superior;c) que possua hábitos de trabalho;d) que suas condições de saúde sejam
satisfatórias, não possuindo defeitos físicos e seus dentes estejam em bom estado;e)
que possua qualidade de direção; (RENAULT, 1949, p. 1).
O Senhor Secretário deixava claro que o esclarecimento dos dados referentes aos itens
“b, c, e”, deveria ser buscado junto à diretoria da escola local, pois acreditava que ela teria
informações mais seguras sobre o que se queria obter. A saber, a escolaridade do candidato,
sua capacidade de trabalho e seus hábitos de vida. Informava ainda que um médico, de
preferência do centro ou do ponto de saúde local deveria ser procurado. O mesmo pediria
parecer sobre o item d, bem como faria o preenchimento de ficha de saúde, conforme modelo
adotado nos serviços médicos escolares. O informe da Secretaria também explicitava que o
curso seria gratuito, incluindo a hospedagem, o fornecimento de material e o transporte por
via férrea (p. 1).
Vale lembrar que, não por acaso, no dia a inauguração do primeiro curso normal em
Betim, estava presente o Secretário de Transporte do Estado, o qual simbolizava a
disponibilidade de mais esse serviço à Escola, conforme registrou um jornal, na ocasião.
A liberação das bolsas de estudo para o representante de cada cidade notificada traria,
ponderou Renault,
106
vantagens indiretas para esse município, permitindo ao candidato, como os
conhecimentos adquiridos no curso normal Regional, ser útil a si mesmo e à
comunidade onde vive. Por isso, a contribuição que se esperava da prefeitura será
representada por um pequeno auxílio financeiro ao candidato, se este não dispuser de
recursos, para seu enxoval (relação anexa), indispensável para a vida no internato
(p.1).
É admirável a forma com que o Secretário informa ao prefeito da gica material e do
perfil do aspirante que a prefeitura deveria enviar a Escola como seu confiado. Ao que parece,
o governo entendia que cada normalista “pronto” retornaria na forma de “equipamento útil” a
“comunidadezinha”. Estaria assim realizando uma espécie de investimento que voltaria na
forma de capital cultural e econômico. De resto, finalizava o Senhor Secretário, afirmando
que guardaria o pronunciamento dos prefeitos, solicitando aos mesmos a devolução do
questionário e ficha anexos, devidamente preenchidos, apresento-vos atenciosas saudações.
(Abgar Renault, Secretário de Educação, Belo Horizonte, junho de 1949).
É interessante ler as fichas a que se referia o Secretário de Educação. Elas visavam
produzir um inventário detalhado do candidato, tanto em termos de suas características e
aptidões objetivas, bem como subjetivas. Optou-se, aqui, a descrevê-las na íntegra para que se
possa imaginar mais profundamente sobre seus objetivos. Ei-las:
Secretaria de Educação do Estado de Minas Gerais
Curso Normal Regional - Ficha de Saúde
1) Nome e idade:.
Natural de: Distrito de ...
Município de:.
2) Profissão dos Pais ...
Gozam de boa saúde? ...
De que sofrem? ...
3) O candidato apresenta algum defeito físico?
Qual?
É portador de bócio? ...Volumoso ou discreto? ...
Que doença já sofreu? ...
4) Quantas pulsações cardíacas por minuto? ...
Nota extra-sístoles? ...
As bulhas cardíacas são normais? ...
Nota sopro? ...
5) Nota alguma anormalidade à asculta dos pulmões? ...
6) Sofre de Asma? Rouquidão? ...
7) Sente dor na fossa eliada direita? ...
8) Tem boa visão? E audição? ...
9) Já sofreu ataques? ...
10) Há casos de tuberculose, lepra ou loucura na família? ...
107
11) Nota alguma normalidade que impeça o candidato cursar com proveito o Curso
Normal Regional? ...
12) Qual a impressão sobre o estado físico e mental do candidato?
Obs. Nas localidades onde não houver médico este questionário podendo ser
preenchido pelo farmacêutico ou pela diretora da escola ficando, neste caso,
prejudicados os itens 4, 5.
Essas observações demonstram que havia a possibilidade de vários distritos terem seus
candidatos recusados, em razão da impossibilidade de obter as informações requisitadas pelo
órgão de educação estadual.
A outra ficha mencionada pelo Secretário, assim se apresentava:
Secretaria de Educação do Estado de Minas Gerais
Questionário para candidatos ao Curso Normal Regional
1) Nome ...
2) Idade ... Data de nascimento ... Onde nasceu ...
3) Filiação: pai ... Profissão:
Mãe ... Profissão:
4) Endereço do Candidato:
5) Mora na cidade, no subúrbio, na vila, no arraial, na estação ou na fazenda?
6) Que escola e curso freqüentou e durante quantos anos? ....
7) Possui diploma do curso primário, de quantas séries completas (3, 4 ou 5 anos)?
8) Em que data terminou esse curso? ...
9) Qual foi a nota de aprovação no último ano de curso? ...
10) Porque não iniciou seus estudos secundários? ...
11) Trabalha? ... Onde Trabalha? ... A que espécie de trabalho se entrega? ...
12) Quanto ganha por mês? ...
13) Que profissão deseja abraçar na idade adulta? ...
14) De que gostaria mais: de trabalhar na cidade ou na roça? ... Cuidar de
plantação? ... Da criação? ... Qual? ... Ser agrônomo? ... Ter uma venda? ...
Trabalhar em casa? ... Cuidar da própria família? ... Costurar? ... Ensinar meninos
pobres? ... Ensinar crianças ricas? ... Trabalhar no correio? ... Na farmácia? ...
Cuidar dos doentes? ... Ser médico? ... Enfermeira? ... Ser aviador? ... Ser militar: ...
Ser jogador de futebol? ... Ser artista de cinema? ... Trabalhar em escritório? ...
Viver sem trabalhar? ...Ser motorista? ... Ser padre? ... Ser religiosa? ... Ser
professor? ...
15) Já cuidou de horta? ... Que hortaliças plantou? ...
16) Já plantou milho? ... Arroz? ... Cana? ... Café? ... Algodão? ... Feijão? ...
Mandioca? ... Fumo? ...
17) Já cuidou de jardins? ... Plantou flores? ... Quais? ...
18) Já plantou alguma árvore frutífera? ... Qual? ...
19) Já criou algum animal? ... Qual? ...
20) Sabe tirar leite de vaca? ... Sabe fazer manteiga? ...E queijo? ...
21) Conhece trabalhos domésticos? ... Costura? ... Corte? ... Crochê? ... Bordados? .
22) Sabe cozinhar? .Quantos minutos são necessários para obter um ovo quente? . E
para cozinhar um ovo? ...
23) Sabe tecer no tear? ... Que teceu? ...
24) Sabe tocar algum instrumento? ... Qual? ...
25) Sabe fazer balaios? ... Cestos? ... De que são feitos? ...
26) Gosta de desenhar? ... De pintar? ... Tem facilidade de modelar com argila? ...
O que fez? ...
27) Gosta de contar histórias a irmãos menores? ... A colegas? ...
28) Que histórias contou? ...
29) Gosta de ler? ... Que revista lê? ... Qual o último livro que leu? ...
108
30) Entende alguma coisa de mecânica? ... Sabe consertar uma fechadura? ... Uma
torneira que vasa? ...
31) Entende alguma coisa de carpintaria? ... Fez algum conserto em armário? ... Em
portas? ...
32) Gosta de observar a vida dos animais? ... Que inseto já observou? ...
33) Fez alguma coleção de plantas? ... Quais? ...
34) Gosta de jogos esportivos? ... Quais? ...
35) Sabe dirigir os jogos? ... Já organizou uma festa? ... Qual? ...
36) Já foi eleito para algum cargo de confiança por seus companheiros? ... Qual? ...
37) Pensa que poderia ser bom chefe de Clube? ... Por quê? ... De alguma
associação? ... Por quê? ...
38) Já ensinou alguém a ler? ... A escrever? ... Quem? ...
39) Se você fosse rico, que faria do seu dinheiro? ...
40) Se fosse um dia eleito deputado, que faria você em benefício do povo? ...
41) Se você tivesse todo o poder, que faria? ...
Município de.......Data.......
Logo após a análise dessas fichas, seriam selecionados os candidatos mais adequados
para o cargo, para assim realizarem o exame com o objetivo de se testar sua capacidade
intelectual.
Para a Secretaria, presume-se, que, no meio rural, fazia-se necessária tal argüição
que se imaginava uma grande quantidade de candidatos à vaga, com características não
desejadas como, por exemplo, ter alguém como a mãe ou o pai doente na família ou um
jovem que havia ensinado alguém a ler. Em suma, tendo atendido parte desses requisitos,
estava o candidato apto a realizar os testes de proficiência.
Ao tratar do problema da seleção das candidatas, D. Lidimanha, diretora da Escola
Normal D. Joaquim, em reunião de professores registrada no livro da ata do dia 27 de agosto
de 1954, com a presença da diretora do SOTER, Helena Antipoff, ressalta que
vêm submetendo as alunas desta Escola à observação vocacional, verificando se têm
as qualidades necessárias para arcarem com as responsabilidades que estão
assumindo fazendo o Curso Regional, porém, para que se consiga com mais
eficiência a escolha das candidatas, sugeriu que deve haver uma solução que seja
independente do Departamento do Ensino Secundário, para adotar ao selecionar as
candidatas, e mediante esta solução, será concedido o direito de ingresso ao Curso.
(LIVRO DE ATAS DE REUNIÕES DE PROFESSORES, 1954, p. 26).
A Diretora destaca, além disso, que para aquele ano não dispunha de outro
instrumento para “fazer o julgamento de seleção, a não ser as provas de conhecimento” (p.
26). Na ata do dia 12 de novembro de 1951, percebe-se como se organizavam, pelo menos
parcialmente, esses testes de conhecimento. Segundo o documento, formavam-se 2 bancas
por dia, funcionando ao mesmo tempo, tendo-se o cuidado de conjugar as matérias de modo
a não sobrecarregar as alunas. (p. 17) que ficavam por seis meses se preparando para o teste
final que indicaria sua aceitação ou não. Ainda sobre a seleção de candidatos, falou-se na
observação de elementos revoltados, devendo ser verificadas as causas. (p. 26).
109
Ao realizarem uma espécie de balanço a respeito do rendimento das alunas do
primeiro ano de vida do Estabelecimento, em novembro de 1951, constata-se a queixa da
direção pela falta de professores em quantidade suficientes para atender o número de cadeiras
que constituem o curriculum da Escola Normal Rural. Ao lado disso, tratou-se na mesma ata
das causas de fracasso relacionadas, em certos casos:
a) à falta de base de alguns elementos; b) ao nível intelectual baixo; c) a certos
distúrbios orgânicos de alguns elementos. Criticadas as falhas didáticas e
selecionadas as opiniões resolveu-se: a) promover um critério rigoroso na seleção
dos candidatos; b) subordinar esta seleção ao estado físico e intelectual de cada
candidato, tendo ainda em vista o critério do SOTER; solicitar do professorado de
modo a atender com mais regularidade o currículum. (LIVRO DE ATA DE
REUNIÃO DE PROFESSORES, 1951, p. 18).
A emergência de um maior rigor na seleção dos candidatos, destacando os aspectos
físico e intelectual, se assemelha às medidas tomadas neste Estabelecimento e aos argumentos
que sustentavam os mesmos. Paradoxalmente, é possível perceber, numa fala da diretora, uma
perspectiva, de certa forma, distinta quanto a tal rigor. Nas suas palavras: às candidatas que
demonstram pouco conhecimento primário no início de curso, porém com boas tendências e
bom comportamento, necessário seria a repetição do ano de estudo para a aquisição da
base para o curso. (LIVRO DE ATA DE REUNIÃO DE PROFESSORES, 1954, p. 26).
Diante das inúmeras questões sobre a seleção nas escolas, conforme as atas acima
referidas, pode-se inferir, entre outras coisas, que havia um padrão mais ou menos fixo para a
mesma, com variações na data do exame, na forma e no lugar. Sobre esse último aspecto,
Antipoff (1954) sugeriu que os exames ocorressem preferencialmente no “interior”, isto é, no
lugar de origem do candidato. O quadro abaixo oferece uma ilustração dos deslocamentos que
foram feitos na busca do diploma de normalista deste estabelecimento.
C
IDADE
N
UMERO DE ALUNAS
DATA
1-Conceição do Mato
Dentro
1 11/08/1959
2-Baldim 5 21/08/1954; 15/03/1954; 26/09/1966; 08/10/1963;
07/03/1964.
3-Datas 1 17/06/1958
4-Diamantina 1 05/09/1952
5-A Lima – Buenópolis 1 10/08/1954
6-Comunidade de Bonfim
– Água Boa
1 09/80/1954
7-Comunidade de
Rodeador - Diamantina
2 16/05/1954; 19/09/1952
110
8-Corinto 1 23/08/1954
9-Ouro Preto 1 14/08/1952
10-Água Boa 1 17/08/1954
11-Rio Vermelho 1 01/05/1954
12-Francisco Sá 1 10/09/1952
14-Itamarandiba 1 27/04/1954
15-Serro 1
28/04/1952
(cont.)
(cont.)
16-Itapanhoacanga –
Alvorada de Minas
1
12/10/1963
17-Marapuama -
Turmalina
1 09/08/1964
18-Araçuaí 1 18/03/1964
19-Veredinha - Turmalina
1 16/06/1967
20-São Pedro do Suaçuí 1 25/09/1966
21-Valo Fundo – Santo
Hipólito
1 08/03/1964
22-Santa Rita do Cedro -
Curvelo
1 17/05/1964
23-Turmalina 1 01/05/1965
24-Buritizinho -
Buenópolis
1 07/09/1966
25-Morro do Pilar 1 01/10/1963
26-Berilo 1 28/10/1963
27-Juramento 2 10/03/1964; 05/12/1965
28-Santo Antonio do
surubi – Água Boa
1 24/04/1964
29-Divinópolis 1 09/03/1964
30-Coronel Murta 1 10/09/1966
31-Dom Joaquim 1 13/05/1964
32-Santa Luiza de
Marilac
1 08/09/1966
33-Francisco Badaró 1 28/08/1966
34-Senador Mourão 1 01/09/1966
35-Três Marias 1 10/06/1963
36-Garça – Corinto 1 07/05/1964
36-Augusto de Lima 1 08/05/1964
36 origens 42 elementos Período: 1952 a 1967
Quadro 4 – algumas cidades e localidades de onde vinham moças para estudar na Escola Normal de
Conselheiro Mata.
Fonte: Diários manuscritos pelas normalistas matriculadas na Escola entre 1952 e1967.
111
Pelos dados geográficos dispostos no quadro acima, fica explicitado que a Escola Normal D
Joaquim Silvério de Souza se tornou um pólo atraente para aqueles que desejavam se
formarem profissionalmente no campo do magistério primário.
4. A FORMAÇÃO DAS REGENTES DE ENSINO NA ESCOLA NORMAL
REGIONAL RURAL D. JOAQUIM SILVÉRIO DE SOUZA
Que nós influímos na região.... Isto sem dúvida!
L. Moura, 2006
Neste capítulo, buscou-se apreender os sentidos atribuídos à distribuição do tempo no Curso
Normal de Conselheiro Mata, uma vez que foi concebido a partir do princípio do internato.
Para tanto, foram pesquisadas as formas e as dinâmicas desse tempo interno, em alguns
documentos manuscritos pela própria “burocracia” do curso, tais como: Livro de Registro das
Aulas dadas pelos Professores do Curso Normal Regional D. Joaquim Silvério de Souza e
demais Atividades a que se ocuparam as Alunas sob a Assistência das professoras de
Conselheiro Mata, de 1951, comparando-o com as propostas de Antipoff sobre o valor do
internato, publicadas pelo boletim Educação Rural, de 1949, disponível no CDPHA. Usou-se
também, para analisar essa forma integral de economia do tempo, o Livro de Currículo e
Carga Horária da Escola Normal Rural - D. Joaquim Silvério de Souza, de 1951-1965. Para
fortalecer a interpretação dos dados, fez-se uso de obras que abordaram de forma detalhada a
questão do tempo institucional, como instrumento para alteração dos comportamentos
intelectuais e corporais. Pode-se citar, entre outros, parte do pensamento de M. Foucault
(1987) e Andrade (2000), nos quais se discorre sobre a noção de tempo e educação, porém em
contextos diferentes e anteriores ao aqui tratado.
Em seguida, procurou-se delinear os aspectos do “campo pedagógico” da época, em
que se fundamentava a concepção pedagógica do Curso Normal, apontando indícios de sua
“filiação” a determinadas correntes de pensamento. Para isso, primeiramente, identificamos
no Livro de Registro da Biblioteca Dr. Abgar Renault da Escola Normal Regional D.
Joaquim Silvério de Souza, de 1953, escrito na própria Escola, alguns autores e obras que
poderiam conter informações sobre aspectos pedagógicos. Outro critério utilizado na escolha
foi a data da publicação, verificando se correspondia ao recorte temporal estabelecido pela
pesquisa. Em alguns casos, consideraram-se, ainda, obras publicadas anteriores e posteriores
ao período examinado, especialmente aquelas associadas à proposta do curso. Foram
112
utilizados também dados da biografia intelectual de H. Antipoff, objetivando identificar
traços incomuns entre as obras colecionadas sobre didática e pensamento pedagógico pelo
CDPHA e os estudos por ela realizados para se formar como “Psicóloga e Educadora”.
Imaginava-se que seria quase que natural uma transposição das idéias que a influenciaram
para o espaço da Escola Normal Rural.
Dessa maneira, foi possível contextualizar as obras e autores, relacionar os textos ao
contexto pedagógico da ocasião e compor uma descrição histórica de uma suposta concepção
pedagógica da escola, que não se define por uma unilateralidade de idéias. Compunha-se por
uma multiplicidade de influências, pois era ligada em uma perspectiva cronológica, de forma
que o discente poderia se sentir influenciado por um pensamento educacional antigo ou
contemporâneo. Considerando-se os pensadores examinados, percebe-se certa constância
entre as idéias, devido à semelhança na terminologia utilizada para explicitar sua
“pedagogia”. Destacaram-se entre eles: Aguayo (1935-1954); Kilpatrick (1971); Dewey
(1952-1963-1978); Claparède (1952-1976); Decroly (1954-1963); Montessori (1955-1963);
Pestalozzi (1955-1963-1969); Herbart (1963-1969); Rousseau (1936-1965); João Batista de
La Salle (1936-1969); R. D’Ávila (1954); Lourenço Filho (1953-1963) e, finalmente, Antipoff
(1947-1949-1986-1992). Essas datas citadas acima são as datas de publicação do próprio
autor ou do ano em que aparecem citados em obras de terceiros no acervo em questão.
Certamente, figuram dezenas de outros autores nesse contexto, mas os aqui citados
repercutiram de forma mais enfática na bibliografia selecionada.
Depois de se estabelecer os pontos de convergência entre as idéias desses autores,
sobretudo os esforços que empreenderam para dizer como era e como deveria ser o
desempenho didático das professoras, partiu-se para o levantamento de uma bibliografia que
abordasse de forma mais direta as práticas de ensino ou didáticas. Consideramos, então, o
pensamento dos autores acima a partir de uma seleção semelhante à exposta anteriormente.
Entre as propostas identificadas, pode-se mencionar: o valor atribuído a Trabalhos Práticos
na forma de pequenos projetos; a produção de guias para professor; a necessidade da
elaboração de planos de aula; o uso de materiais didáticos; o domínio e uso de métodos
como, por exemplo, a prática da ciência; o valor do interesse do educando; o uso de trabalho
em equipe; o papel do silêncio na aprendizagem; a eficácia do ensino por unidades didáticas.
Interessante é notar que havia um paralelismo entre métodos didáticos tidos por “tradicionais”
e outros tidos por “modernos”.
Essas informações foram interpretadas principalmente pela rememoração do conceito
de tempo explicitado na introdução e no primeiro capítulo. Assim, notam-se as divergências
113
entre o campo de experiência, ou das didáticas antigas, e o horizonte de expectativas
didáticas postas em evidências pelas teorias recentes.
Ao final do capítulo, tentou-se apreciar, como espaço de experimentação pedagógica e
de formação de uma mentalidade ruralista cientificizada, a instituição escolar denominada de
Clube Agrícola, neste particular, o “Clube Agrícola Dr. Roberval Cardoso”.
A hipótese que figurou desde o início da pesquisa entendia esse espaço como uma
síntese da proposta do curso. Para averiguá-la, utilizaram-se diários escritos pelas alunas do
curso entre 1951-1971, Livros de Ata do Clube Agrícola, bibliografia especializada na questão
publicada na época, especialmente o título Grêmio para o Meio Rural, de 1952. Além dessas
fontes, coletamos informações no Programa de Atividades agrícolas da Escola Normal
Sandoval de Azevedo como forma de produzir uma imagem de semelhança com o que ocorria
em Conselheiro Mata.
É importante ressaltar que usou-se da sobreposição como meio de interpretação,
relacionado a documentação sobre clubes agrícolas na legislação federal, disponível numa
pasta (sem data definida, de 1950-1980) no CDPHA, com alguns argumentos defendidos pelo
Governo de Minas no Plano de Recuperação Econômica e Fomento da Produção, de 1947.
Associaram-se ainda essas informações às idéias sobre educação rural registradas pela
Conferência Interamericana de Educação (1943-1963) e pelo Seminário Inter-Americano de
educação Primária, de 1950. O restante foi comparado com esse material e com alguns
argumentos defendidos pelo Serviço Social Rural, de 1961 e algumas idéias de Lourenço
Filho acerca da Escola Normal Rural Mineira, publicadas em âmbito internacional, em 1953.
Desses nexos, foi possível notar que o Clube Agrícola pretendia ser um espaço de treinamento
para formar uma mentalidade rural que se opusesse às antigas formar de se lidar com a terra e
com elas concorresse.
4.1 A organização do tempo e do espaço de formação na Escola Normal
O diretor não admitia como professor quem não tivesse condições de se
dedicar ao trabalho em tempo integral
.
José Murilo de Carvalho, 1978
.
Ao consultar o “Livro de Registro” das aulas dadas pelos professores do Curso
Normal Regional Rural D. Joaquim Silvério de Souza e demais atividades que se ocupavam
114
as alunas sob a assistência das professoras da escola, constata-se que o tempo de dedicação
girava em torno de quatorze horas diárias de exercícios pedagógicos práticos e teóricos.
Antônio D’Ávila (1954a) aventa que os programas das disciplinas não eram tratados
como “trilhos de via - férrea” sobre os quais correria, invariavelmente, a máquina de escola.
Lembra ele que os professores tinham apenas a função de direcionar as etapas superáveis em
determinados espaços de tempo, indicadas aos “viajantes livres e inteligentes” de acordo com
as experiências a serem executadas. Assim, frisa o autor que esses eram “meros orientadores”
dos processos didáticos, que deveriam ter ampla flexibilidade para articular as múltiplas
condições que os subordinavam.
Para o teórico, de acordo com as práticas escolares para o Ensino Normal, a
distribuição do horário respondia a determinadas finalidades, por ser uma das bases de
orientação para que os organizadores do espaço-tempo escolar pudessem distribuir as aulas.
Destaca D’Ávila que seu cumprimento deveria ser “mais aproximado possível”, mas não era
“necessário segui-lo minuto a minuto”. Na sua visão, os minutos reservados a cada aula
poderiam ser distribuídos entre seções A, B e C, de acordo com a necessidade de cada
uma”. (1954a, p. 104). Exemplifica ele essa flexibilidade mostrando que uma seção poderia
ocupar trinta minutos, enquanto outras gastariam quarenta minutos. Assim, tal variação
permitiria favorecer a seção de mais necessidade, o que poderia ocorrer com todas as matérias
do programa. Contudo, faz-se necessário observar que tais orientações propostas foram
produzidas com vistas a orientar as normalistas em formação quanto à lógica da ordem do
tempo na escola primária. Certamente, essa sugestão era seguida pela distribuição do tempo
na Escola Normal uma vez que essa era, como se gostava dizer, o espaço da
experimentação, do laboratório, ou em outros termos, o espaço do exercício, do "simulacro”.
Em conformidade de certa forma com tal concepção, verifica-se no livro de registro, a
distribuição do tempo de aulas dadas e de outras atividades. Para efeito de exemplo,
apresentamos a descrição da distribuição do tempo do dia 24 de setembro de 1951, segunda-
feira:
Horas
Ações
6:20 Levantar-se
6:55 Exercícios físicos dados por uma das alunas: Maria Cândida Adenalva de Oliveira
7:00 Café – limpeza geral da casa
7:30 às Agricultura prática irrigação da horta
9:00 Repicagem de algumas de tomates (Generosa?)
9:15 às 10:05 Português – aulas em grupo controladas pelas próprias alunas, tendo cada grupo uma líder
10:15 às 11:05 Matemática cálculo mental operações usando-se o complemento dos números Propriedade
115
dos números
11:30 Almoço durante o qual ouviu-se o diário da aluna Rute Proença
12:55 Repouso, tempo livre
13:00 às 15:00
D. Lidimanha
MªCândida
Moura
Reunião com a Diretora do Estado e corpo docente e discente
Trabalhos em equipe (5ºg - trabalhos de confecção de cestinha de capim manuais e tecelagem de
palha de milho).
(4ºg - carpintaria).
(3ºg - Economia Doméstica). Formação de um plano para a quinzena
(2ºg - Corte e Costura: formação de um plano de trabalho).
(1º - Clube artístico- Plano de trabalho-deliberação, idéias, etc.
15:00 Lanche
15:20 às 16:05
Mª Eremita
Ciências: Tensão superficial – experiência com fósforo e sabão e açúcar num prato com água
16:05 às 16:40
C.Cunha
Desenho e caligrafia: desenho tirado do natural. Motivo uma jarra e algumas flores
16:40 às 17:30 Estudo
17:30 às 18:00 Tempo livre
18:00 Jantar
18:30 Tempo livre – terço e novena na capela da localidade
19:30 às Estudo
20:30
20:45 Recolhimento
Quadro 5 – distribuição do tempo pedagógico da Escola Normal de Conselheiro Mata em 1951.
Fonte: Livro de registro de aulas dadas e outras atividades.
Buscou-se aqui, reproduzir, na íntegra, a distribuição dos afazeres de um dia da Escola
Normal de Conselheiro Mata. Ao analisar o livro, por exemplo, no dia 18 de novembro de
1951, um domingo, foi possível observar que as alunas se levantaram às 5 horas, fizeram a
limpeza; às 7:30 h foram para a capela, na qual participaram de uma missa “dialogada pelas
alunas”; às 8 h café; 8:30 h assistiram a uma outra missa celebrada pelo mesmo padre, porém
com explicações da cerimônia às crianças presentes pelas alunas do CRT; de 8:30 / 13:00
tiveram tempo livre; às 13horas fizeram o jantar, seguido da leitura do diário o que era
comum; das 13:00 às 15:00 tiveram tempo livre, momento no qual brincaram “em frente ao
prédio” e estudaram; das 15:00 às 17:00 horas dirigiram-se para o auditório, o qual foi
ocupado pelo curso normal e de treinamento com a seguinte programação: - A roupa velha
do Imperador, Conto de fada de Andersen cena muda; 2 Dança de fita e as ondas; 3
bonecas de pai, dançar CRT; 4 cenas bíblicas (mudo) o rei Salomão; A rainha de Sabá;
Eurico e Felipe; O Bom Samaritano; Os Capetas e os Anjos. (p. 34).
116
Às 17h30min horas, as alunas fizeram um lanche, seguido da leitura do diário,
acompanhado de tempo livre, terço e bênção do S. Sacramento na capela da localidade e, em
seguida, foram estudar. O horário de estudos estendeu-se das 18h30min até às 20h30min. As
20h45min ela se recolheram. Os registros desse livro, portanto, permitem constatar que os
espaços de tempo livre eram curtos e poucos, tais registros também demonstram que as aulas
teóricas não eram, como se tende a imaginar, a atividade que consumia maior parte do tempo
de formação.
Em um dos primeiros discursos feitos pela professora Antipoff, em 1949, acerca da
distribuição do tempo de estudo nos cursos para professores rurais, ela caracteriza de forma
positiva a estratégia do internato. Na visão de Ferreira (2001), o internato pode ser entendido
como uma instituição de ensino ou assistência onde os alunos ou socorridos residem de
forma permanente”. Assim esses internos são confiados aos cuidados e à assistência de
pessoas especializadas (p. 427). Nesse sentido, a “Escola Normal de Conselheiro Mata”
abrigava cada normalista de “forma permanente” por, pelo menos quatro anos, uma vez que
operava nesse regime. Quanto ao tempo, subtraindo o período de férias, cabia à Escola ocupar
as alunas da forma mais produtiva possível.
Conforme disse a professora Antipoff (1949) um “ponto de valor pedagógico
importante” para os cursos dos professores primários era o “fato” de funcionarem em regime
de internato. A educadora explicita que:
O contato estreito (durante todo o tempo) entre, alunos, mestras, professores
e auxiliares encontravam-se nas aulas, no refeitório, nas excursões, nos
campos de trabalho, em atividades múltiplas, dando assim, margem a
observações riquíssimas quanto aos hábitos sociais, características
individuais, formação espiritual, etc.
Afirma ainda ela que um internato é um laboratório cheio de problemas para um
educador que nele deve agir no sentido normativo, sem lesar os princípios de liberdade e do
respeito ao indivíduo. Esta arte é bem delicada. (Escola Rural, ano II, nº. I, 1949, p. 11).
Antipoff (1949) lembra que a maioria das pessoas estão acostumadas a colégios e
escolas que, geralmente, fazem uso das formas de disciplinas externas, o que, segundo ela,
acabou por gerar “sérias dificuldades para o curso” com relação a algumas discentes. A
professora frisa que a permanência da aluna em regime de internato apresenta-se como um
instrumento eficaz de educação moral. Isso porque as alunas têm a oportunidade de conviver
com colegas com padrões edificantes da mulher brasileira isto é, inteligente, viva,
117
corajosa, diligente, altruísta, cheia de entusiasmo para as coisas nobres e virtudes contra
qualquer atentado coletivo ou individual. (p.11).
Para a pesquisadora do comportamento humano, a convivência próxima e cotidiana no
internato garantiria às normalistas um “estreito conhecimento da natureza humana”, pois
nessa situação elas poderiam praticar uma apurada observação das outras internas na
intimidade do internato. Ressalta Antipoff que tais condições poderiam desencadear formas
de agir pelo “estímulo do melhor”. Assim, diz ela: esperamos colher nestas escolas um sólido
cabedal de ensinamentos pedagógicos, não em relação à criança, como o próprio adulto,
passível de educação. (p. 11).
Esperamos melhorar a qualidade do trabalho – afirma a professora Antipoff ao relatar
uma experiência pedagógica nas quais as condições-ambientes (clima) do internato foram
analisadas. Relata ela:
poucos dias, reuniu-se o corpo docente do curso de aperfeiçoamento para
professores rurais, juntamente com esse fim: a cada membro foi pedida a lista de
falhas que observou e medidas para melhorá-las. As críticas foram lidas e
ventiladas, recebendo-as a diretoria com profunda gratidão, pois nada pode ser
tão salutar como a sincera crítica, por mais amarga que possa parecer. Somente
ela é que pode permitir ter consciência exata de certos fatos, que não raras vezes
passam despercebidos, corrigir os erros e evitar conflitos (Escola Rural, ano II, nº.
I, 1949, p. 12).
Mais uma vez fica evidente o caráter científico do plano de ação dessa instituição, uma
vez que o internato, entre outras coisas, permite treinar e apurar a habilidade da observação
humana no que diz respeito aos traços e detalhes do comportamento humano.
Para Foucault (1987), esses métodos permitiam um controle detalhado dos indivíduos,
um controle minucioso das operações do corpo e da própria produção mental objetivada.
Assim, realizava-se a sujeição constante desses indivíduos e se lhes impunham exemplos e
formas de docilidade-utilidade que, segundo ele, poderiam se chamar as disciplinas. (p.118).
Destacou que vários processos disciplinares existiam longa data, nos conventos, nos
exércitos e nas oficinas (p.11). A disciplina propiciada pelo internato, conforme analisou
Foucault, permitia fabricar corpos submissos e exercitados, ou corpos dóceis. Ele defende
que a disciplina aumentaria a força do corpo em termos de utilidade econômica e,
simultaneamente, diminuiria sua força em termos “político e de desobediência”. Dessa
maneira, diz Foucault:
Encontramo-los em funcionamento nos colégios, muito cedo; mais tarde nas
escolas primárias; investiram lentamente o espaço hospitalar e em algumas
118
dezenas de anos reestruturaram a organização militar. Circularam às vezes muito
rapidamente de um ponto a outro, entre o exército e as escolas técnicas, e os
colégios e liceus... (p.119).
Embora os estudos feitos pelo historiador M. Foucault, tenham sido direcionados a
situações da Europa do século XVIII e XIX, essas interpretações são pertinentes para o
entendimento do internato descrito antes por Antipoff. Isso, sobretudo pelo fato de seus
argumentos serem compatíveis com a observação acurada que os processos disciplinares
demandam para que sejam, de fato, profícuos. Suas pesquisas ressaltam ainda uma das
finalidades da disciplina que, como queria Antipoff, permite “fabricar” indivíduos
programados para determinadas tarefas sociais, fossem elas manuais ou intelectuais.
Para Andrade (2000) em estudo feito sobre o internato masculino do Colégio Caraça, o
papel da disciplina é instaurar um ambiente educativo. Isto é, um universo exclusivamente
pedagógico, é assinalado por dois traços essenciais: separação do mundo e, dentro desse
recinto reservado, vigilância constante, ininterrupta do aluno, vigilância de todos os
instantes, que visa constituir um auxílio, um devotamento a todos os instantes. (ANDRADE,
2000, p. 132).
Tal concepção, de certa forma, fica clara num artigo publicado na Revista Escola
Rural de 1960, nº. II, cujo título era Governo da Escola. Segundo o texto, não seria possível
conceber a idéia de uma organização sem uma autoridade que a oriente, dirija e a controle. O
artigo considera que em todos os quadrantes da vida humana este conceito é fundamental; na
escola primária ele ocupa lugar proeminente. (p. 30). De forma distinta, diz Snyders, citado
por Andrade (2000):
... o internato, seus regulamentos, seus próprios edifícios representam
concretamente, significam concretamente um tipo de educação que se estabelece a
partir da desconfiança a respeito do mundo adulto e quer, de início, separar dele a
criança, para fazê-la viver num algures pedagógico purificado, esterilizado. (p.
133).
Vale lembrar que as alunas chegavam a Conselheiro Mata para se ingressarem no
Curso Normal em torno de 11 a 13 anos, idade ainda não considerada adulta. O que permite
inferir que o regime do internato como descrito, certamente, daria “bons frutos” nessas
Escolas.
De acordo com “O Governo da Escola”, esse regime é a esfera mais importante e séria
da escola, pois constituía um agente de crescimento, de realização e de progresso entre os
educandos. Esse seria o meio pelo qual o aluno assimilaria “hábitos e atitudes” que,
futuramente, caracterizariam o cidadão de amanhã. Essa forma escolar constituía-se por um
119
conjunto de normas e preceitos, “um verdadeiro código que deve reger a escola”. Entretanto,
o que o diferenciava da lógica do internato tradicional, era, talvez, o fato de ser preconizado
como sendo uma criação conjunta. Em outros termos, diz o texto: ... não deve ser implantado
e sim criado pelos próprios alunos, que serão levados a discernir o bem do mal, isto é, aquilo
que é conveniente que se faça e o que não se deve fazer. (p.30).
Em uma publicação da Fundação Helena Antipoff, (1978) indaga-se: Alguém poderia
imaginar um internato triste, severo, confinado, longe da civilização
?
Puro engano! Para
provar seu argumento, afirma o documento que a escola recebia visitantes ilustres do Estado,
do País e do Exterior. Lembra o texto ainda que as alunas estavam em contato constante com
a cultura, através de excursões, concertos e teatros nas cidades e na própria escola. A idéia
que vigorava, conforme esclarece o documento, era a de que a cultura poderá ser levada para
as comunidades rurais. A roça com conforto e arte seria o lugar ideal para se viver.
(FUNDAÇÃO HELENA ANTIPOFF, 1978, p.15).
Semelhante à argumentação de A. D’Ávila sobre a distribuição do tempo, naquela
publicação, ponderava-se que:
A flexibilidade inteligente dos programas e das atividades, a ausência da
malfadada carga horária que sufoca o amor ao ensino, liberdade sadia, inovações
positivas, professores dentro do espírito da escola, portanto perfeitamente
sincronizados com a natureza da escola foram os fatores de êxito do
trabalho”.(p.15).
Comparando tais argumentações, é possível conjeturar uma fase de transição no que
toca à regência do tempo escolar. No entanto, não se pode negar que a concepção criada pela
e para as escolas ligadas à Fazenda do Rosário estava especificamente atravessada por
aspectos da forma de pensar e usar o tempo, conforme os padrões da Igreja.
Se concordarmos com P. Ariès em que os estatutos dos colégios foram redigidos tanto
para limitar os pretextos de divertimento quanto os riscos do leito. (Andrade, 2000, p.118),
não para aceitar plenamente a noção de “liberdade” usada pelos redatores do descrito
acima.
No dizer de Foucault em “o controle da atividade”, o horário é uma velha herança.
Nas escolas elementares, a divisão do tempo torna-se cada vez mais esmiuçante; as
atividades são cercadas o mais possível por ordens a que se tem que responder
imediatamente [...] Mas procura-se também garantir a qualidade do tempo
empregado: controle ininterrupto, pressão dos fiscais, anulação de tudo o que
possa perturbar e distrair trata-se de construir um tempo integralmente útil (1987,
p. 128).
120
Nas palavras de Helena Antipoff (1986), os cursos orientados pela Fazenda do Rosário
trabalharam com o objetivo de sanar dois males que afligiam os estabelecimentos de ensino
para menores: de um lado estava a com que agia parte do pessoal que, muitas vezes,
considerava perdidas determinada crianças. Do outro, a ociosidade em que se permanece
grande parte do seu horário, notadamente nas férias. Ao que parece, portanto, caberia à
escola inculcar nas alunas, no período de formação, o hábito de se aproveitar integralmente o
tempo, o que tenderia a desenvolver certa repugnância pelo tempo inativo e aspiração pela
educação do uso produtivo e integral, do tempo de forma “útil”. Como notou Foucault, essa
percepção já se incorporava aos processos de educação escolarizada.
De acordo com o Livro do “Currículo e Carga Horária da Escola Normal Rural D.
Joaquim Silvério de Souza”, o tempo-espaço desse estabelecimento deveria atender à grade
disciplinar que, em 1951 assim se apresentava:
N º Disciplinas Séries Séries Séries Séries -
- - Total
1 Português 4 4 4 4 16
2 Matemática 4 4 4 2 14
3 Geografia 2 2 _ _ 4
4 História _ _ 2 2 4
5 Ciências
Naturais, Físicas
e Biológicas.
3 3 3 2 11
6 Desenho e
Caligrafia
2 2 2 2 8
7 Canto Orfeônico
1 1 1 1 4
8 Trabalhos M. e
Ecom.
Doméstica
6 6 6 _ 18
9 Educ. Física 3 3 2 2 10
10 Atividades
Agrícolas
5 5 4 2 16
11 Psicologia e
Pedagogia
_ _ 2 3 5
12 Prática de
Ensino
_ _ _ 10 10
Total 30 30 30 30 120
Quadro 6 – distribuição do tempo das matérias da Escola Normal de Conselheiro Mata em 1951.
Fonte: Livro de registro do currículo e carga horária da escola Normal Rural de Conselheiro Mata.
121
Nota-se que, no mesmo livro, no ano de 1963, aparecem discriminadas também as
disciplinas de Desenho e Caligrafia, Canto Orfeônico, Francês e muda-se a forma de
categorizar o item 5 do quadro acima destacando apenas ciências. No ano seguinte, 1964, a
disciplina de Francês é somada à de Inglês, que não aparecia antes e são incluídas ainda, a
“Educação Artística” e a “Educação Musical”.
Em 1965, as mudanças foram mais impactantes, isto é, foi introduzida no quadro de
horários a série, bem como as disciplinas: “Psicologia Educacional, Didática Prática e
Teórica, Filosofia da Educação, Sociologia Educacional e Estudos Sociais Brasileiros”.
Passou-se a uma carga horária de 120 aulas no primeiro quadro de 1951, para 151 aulas em
1966, números que se mantiveram até 1971.
Ainda se consideravam como parte do currículo”, os clubes e grêmios existentes no
estabelecimento. Eram pelo menos quatro: “O Clube Agrícola, O Clube Pedagógico, O
Grêmio Literário e O Grêmio Cívico”.
4.2 A formação pedagógica na Escola Normal Rural: autores, obras e teoria educacional
Dados biográficos de San Jean Baptiste de La Salle foram-nos trazidos por Maria
Francisca de Almeida. Nasceu nosso patrono em Rien, na França. Foi fundador do
ensino secundário moderno.
Hereditariedade e Ambiente foi o assunto trazido pela 3
ª
série. Graciola Freire é
quem fala primeiro. Diz ela da influência da Hereditariedade e Ambiente sobre o
indivíduo.
Maria Francisca de Mattos França, 1962
.
Percebe-se, nas citações acima, retiradas do “Livro de Atas do Clube Pedagógico”,
que fazia parte do cotidiano das normalistas discussões sobre idéias de autores e obras do
campo pedagógico e análises de categorias conceituais que buscavam revelar elementos
determinantes na formação do comportamento infantil.
De certo modo, essa constatação liga-se ao fato de que a instrução para as professoras
em formação dependia do esclarecimento que conseguiam alcançar sobre os pensadores do
campo educacional, bem como sobre conceitos e métodos por eles formulados e divulgados.
Isso é comprovado na observação da primeira página de “Didática da Escola Nova”. Escreveu
Aguayo:
A palavra didática significou de início a ciência e a arte de ensinar. Nesse sentido,
tem sido empregada desde o século XVII. Em 1629, Ratke ou Ratichius escreveu,
122
para os príncipes de Anhalt Koethen, suas famosas Aphorismi didactici precipeu
(Principais Aforismos Didáticos) e Comenius, em 1657, publicou sua obra capital,
Didáctia Magna ou Grande Didática.
(1935, p.1).
Aguayo cita dois nomes de
pensadores da educação e uma das
categorias conceituais do campo, a
“didática”. Lembra o autor que, entre os
séculos XVI e, principalmente, nos séculos
XVII e XVIII, tiveram início os estudos
sobre uma didática racionalista”(p.3).
Segundo essa teoria, a criança era um
“adulto em miniatura e que a realidade era
por demais complexa para ela, portanto, o
método deveria ser simples”. Por isso,
Neste tipo de didática não lugar para a
liberdade da criança. O professor deverá prever e
dirigir tudo. As matérias do plano de estudos devem
estar ordenadas de modo racional e lógico. Os
racionalistas não se preocupam com o interesse da
criança
. (
AGUAYO
, 1935, p.3).
Os educadores do século XIX
deram novos impulsos ao pensamento
educacional, sobretudo, a partir da
influência do positivismo e da civilização
industrial. Por seu lado, o estudo da psicologia infantil desacreditou o método racionalista.
Segundo observou Aguayo, ficou patente que a criança não era um adulto em miniatura. Além
disso, explicitou-se que a criança passava por diversos níveis de desenvolvimento e que cada
um representava uma elevação em direção à maturidade. (1935, p.3).
A discussão sobre as doutrinas modernas de educação introduziu novas perspectivas
ao ato de educar. Dentre as inovações estavam
o valor pedagógico do jogo claramente exposto por Froebel, em meados do século
XIX, Tolstói suprime os horários e leva a liberdade de ensino à sua escola de
Yasnaia Poliana, Robin pratica o método ativo no orfanato de Cempuis; Herbart
formula sua admirável teoria do interesse (...); Pestalozzi sistematiza o ensino
intuitivo; e Basedow e o próprio Pestalozzi aplicam o ensaio e a experimentação à
instrução elementar
.
(AGUAYO, 1935, p.4).
Ilustração 12 – acima: nota fiscal da “livraria Francisco
Alves” e
- página do livro de controle diário de consultas de
obras na biblioteca Dr. Abgar Renault (Acervo - Conselheiro
Mata).
123
O texto de Aguayo, então, preocupou-se em inventariar parte do debate sobre as idéias
ligadas à ação de educar na escola, como também evidenciou que a teoria racionalista, por não
valorizar o interesse do educando, foi sendo abandonada, pelo menos, no campo teórico.
No campo da História da Educação, o Instituto Normal da Bahia, em seu programa,
enumerava um conjunto de temas, o qual, certamente, considerava central na formação da
normalista. A relação temática era distribuída em oito pontos, entre os quais figuravam
Educação e a vida privada; Documentos pré-históricos do progresso intelectual;
Métodos de disciplina social entre primitivos e silvícolas; Educação na
Antigüidade Oriental; A formação cultural dos grandes impérios asiáticos; Egito;
Hebreus: A Grécia; Distinção entre a educação de Atenas e Esparta; Helenismo;
Roma; O cristianismo e sua influências; A Idade Média. (INSTITUTO NORMAL
DA BAHIA, 1943, p. 6-7).
Vale dizer que essa programação fazia parte do segundo ano, no seu primeiro período.
No 3
º
período (2
º
ano), estudava-se a influência árabe na cultura grega, o Renascimento e a
Reforma, destacando-se nomes como Montaigne, Rabelais, Bacon, Comenius, Erasmo e
Descartes, os filósofos do século XVIII, bem como as influências de Rousseau, Pestalozzi,
Froebel, Herbart e Tolstoi. Sobre os dois últimos pontos destacava o programa: Educação
Nova - Decroly, Montessory Miss Parkhust, John Dewey. Problemas psico-sociológicos da
escola contemporânea. Co-educação. Escola única. Socialização da escola. Ensino leigo e
educação religiosa. A Educação na América e no Brasil”. (INSTITUTO NORMAL DA
BAHIA, 1943, p.7).
Para o Instituto Normal da Bahia, havia ainda uma programação chamada “Pedagogia”
ligada à História da Educação. Entre as temáticas abordadas nessa parte do programa,
figuravam o “problema da seleção, homogeneização das classes, os supernormais, a
educação dos infranormais” (p.6)
Nessa perspectiva, fica explicitado que era necessária para a normalista uma formação
em História da Educação, pois essa mesclava fatos históricos e problemas educacionais
vivenciados pela escola ao longo do tempo. Além disso, a matéria introduzia os alunos em
uma espécie de história das idéias educacionais que tendia a misturar autores de conotação
filosófica e psicológica.
Araújo (1944), ao justificar a introdução das matérias de História da Educação e
Psicologia Aplicada à Educação no currículo das normalistas, escreveu: durante o curso, o
mestre procurará comentar o assunto de modo a dar aos futuros professores um
conhecimento geral dos problemas educacionais através das idades históricas. Por
conseguinte: ao professor, qualquer que seja a sua especialização técnica, é indispensável o
124
conhecimento psicológico do aluno, motivo pelo qual é esta matéria hoje enfeixada em todos
os programas pedagógicos. (apud OITAVO CONGRESSO BRASILEIRO DE EDUCAÇÃO,
1944, p. 315)
.
Nesses argumentos, fica novamente evidenciado que o ensino de História da
Educação era uma demanda, assim como, o de Psicologia, chamada aqui de “Psicologia
Aplicada”.
Uma obra que sob certos aspectos marcou a história da educação brasileira foi a
“Pedagogia de John Dewey” que se encontra num artigo escrito por Édouard Claparède e
publicado na revista “Educação”, n° 37, de 1952, traduzido pela professora Consuelo Pinheiro
(p.1). Segundo o texto, Dewey formou-se doutor em Filosofia em 1884 e lecionou Filosofia e
Pedagogia em três Universidades nos EUA. Na sua carreira universitária, tornou-se conhecido
internacionalmente, entre outras coisas, pelo pragmatismo, método do qual ele foi um dos
principais difusores. (p.2)
Dewey entendia que o pragmatismo media a verdade das concepções por sua eficácia
prática. Entre outros termos, disse Claparède:
Reagia (Dewey) contra o verbalismo e o dogmatismo das filosofias correntes e se
esforçava em fazer baixar as abstrações do mundo enevoado do pensamento puro
para trazê-los a esta terra, nesta vida humana para a qual elas, afinal de contas,
foram feitas. Uma teoria sem utilização prática, pode não ter nenhuma ação sobre
nossas condutas ou sobre novas pesquisas científicas, é considerada pelos
pragmáticos como nula, sem valor e sem interesse. (p.2)
Essa visão de Dewey sobre as teorias de seu tempo, somada a outros fatores, levou o
pragmatismo para o campo da psicologia, confundindo-o com o método experimental, o que
segundo Claparède, cabimento. (p.3). Para caracterizar o lugar da pedagogia de Dewey na
história da educação recente, poder-se dizer que ela, nas palavras de Claparède é:
essencialmente dinâmica. A ciência da educação é, para nosso autor, a “ciência da
formação do caráter”. Educar é, pois, antes de tudo, dar as forças interiores que
são o apanágio de todo ser vivo e que constituem a personalidade mesma, ocasião
de agirem, de se realizarem; é mesmo apelar para todas essas atividades inatas
para despertá-las e dirigi-las
. (p.4).
Pelo visto, essa concepção pedagógica enfrenta diretamente o método tradicional, cuja
tônica está na recepção passiva e sempre põe o centro de gravidade no mestre, no compêndio
ou em qualquer outra parte onde se queira menos na própria criança. Claparède Lembra
ainda que a pedagogia de Dewey era eminentemente funcional, ou seja:
125
a educação funcional[...] quer sempre lembrar-se de que a criança é um ser vivo
que deve ser levado ao trabalho e à ação pelos meios mais naturais que a vida
emprega quando esse trabalho e essa ação são necessidades [...] não se poderia
nunca separar brutalmente sua atividade e suas necessidades. (p.6).
Com esses argumentos, o filósofo mostra para os educadores em formação na Escola
Normal que a atividade pedagógica a que submeteriam os alunos deveria ser vinculada às
necessidades do educando ou, do contrário, incorreria em fracasso.
Lourenço Filho deixa claro esse aspecto da filosofia pedagógica de Dewey ao dizer, no
prefácio do livro “Vida e Educação” (1978):
Desses conceitos decorrem algumas conseqüências que são pontos basilares na
obra pedagógica de Dewey. A primeira é que não deve haver nenhuma separação
entre vida e educação. Vida, em condições integrais, e educação o o mesmo.
Depois que os fins da educação não podem ser senão mais e melhor educação, no
sentido de maior capacidade em compreender, projetar, experimentar e conferir os
resultados do que façam. A educação torna-se, desse modo, uma contínua
reconstrução da experiência. (p.7)
.
Lourenço Filho argumenta, portanto, a favor das teses de Dewey ao prefaciar sua obra
para publicá-la no Brasil, acreditando que influenciaria as novas e as velhas gerações de
educadores.
Além de Dewey, como um dos pontos mais altos da história da educação no culo
XX, D’Ávila (1954a, p. 366) entendeu que as normalistas mereciam conhecer as teses sobre
processos educacionais de Ovídio Decroly, formado em Medicina em 1896. Afirma ele que o
doutor Decroly realizou notável trabalho ao conceber sua pedagogia, que podemos chamar de
biológica e psicológica e que pode considerar-se nas fórmulas de: preparar a criança para a
vida na própria vida e organizar o meio de maneira que nele a criança possa ser estimulada
de forma favorável.
Desta forma, o pensador ressaltou que considerava relevante para a educação das
crianças os Centros de Interesse, que se apresentavam em torno de quatro temáticas:
alimento-me, tenho frio, defendo-me e trabalho, divirto-me. (p.366). O trabalho da professora
por meio dos Centros de Interesse deveria partir do preceito da associação, que poderia ser
dividido em duas partes: 1) Como foram satisfeitas as necessidades das crianças em outros
lugares da Terra, diversos daquele em que mora (Geografia); 2)Como foram satisfeitas as
necessidades das crianças em outro tempo na região em que ela habita e nas demais
(História) (D’Ávila, 1954a, p.366). Porém, Decroly advertiu que a partir de determinada
situação escolar não se deveria limitar o estudo do meio ambiente ao lugar em que a criança
126
vivia, mas que era vantajoso aproveitar as curiosidades momentâneas que nela emergissem,
alimentando-as com os fatos da vida familiar e social. (p.367). O pesquisador frisa que disso
decorreria um processo de linguagem de que participavam, efetivamente, o desenho,
trabalhos femininos, experiências, práticas de jardinagem e trabalhos manuais propriamente
ditos. (p.362). Ainda segundo D’Ávila, acerca da expressão abstrata, compreendia a leitura, a
exata compreensão da palavra e o aperfeiçoamento desta, a escrita. (p.367).
Segundo Lourenço Filho (1963) as propostas educacionais da pedagogia de Decroly
emergiram da observação de crianças anormais, elaboradas por um médico especializado em
estudos de educação. Lembra ele que a observação não esclarecia os aspectos dos estudos
descritivos das crianças, como também possibilitava a formulação de questionamentos de
“ordem explicativa ou causal. (p. 179).
Perguntamo-nos que condições estarão produzindo as anomalias observadas. A
comparação dos dados pode, por exemplo, fazer suspeitar de uma hipo função
endócrina, ou de certas circunstâncias na vida do lar, ou mesmo na escola, quanto à
interação do educando e outras pessoas (LOURENÇO FILHO, 1963, p. 179).
Baseado nessa observação era realizado o registro de numerosos casos similares o
citado acima e o emprego de convenientes métodos de análise, inclusive estatísticas, de modo
a facilitar conclusões objetivas, a respeito dos educandos observados. (p. 179). Portanto, vale
supor, que esse teórico era indicado na Escola Normal de Conselheiro Mata pelo fato dessas
idéias estarem ainda hoje preservadas no acervo do CDPHA, além de revelar-se um
instrumento da elaboração pedagógica da “observação,” ferramenta recorrentemente lembrada
por Antipoff em manifestações escritas (ANTIPOFF, 1949).
Lourenço Filho (1963), por outros argumentos concluiu que a renovação proposta por
Decroly era um sistema de transição entre a escola tradicional e a escola renovada:
Sua filosofia de educação apresenta grandes pontos de contato com as obras de
Dewey e Kilpatrick, como de outras como as de Claparède e Ferrière. Com relação
às idéias do primeiro, ele próprio afirma no prefácio do livro “Como Pensamos”,
que julgou necessário traduzir para o francês (1963, p. 187).
No rastro das concepções desses “filósofos-pedagogos”, o Ministério da educação
através do INEP, em 1955, publicou o título Introdução ao estudo do currículo da escola
primária”. Uma das questões apresentadas pelo Instituto dizia respeito aos teóricos: Dewey,
Decroly e Montessori. (p. 88). Segundo Dewey, para os pedagogos posteriores, o problema do
currículo se resolveria se as crianças fossem organizadas em grupos, imbricadas de
ferramentas para determinação de pequenas situações da vida que pudessem enfrentar para o
127
processamento dos estudos e para a avaliação e a ação baseada em seus próprios
julgamentos. (p. 88). A publicação explicitava, além disso, que as capacidades e habilidades
requeridas pelas conhecidas matérias de ensino da escola tradicional (ler, escrever, calcular,
etc.) deveriam ser introduzidas no corpo de projeto de atividades, pois assim, dotariam os
alunos dos instrumentos de que necessitavam. Por esse caminho os levaria a reconhecer as
estratégias demandadas para a solução das questões e problemas da vida real possíveis de
ocorrer dentro e fora da escola.
No entendimento dos intelectuais do INEP (1955), inspirados pelos teóricos
anteriormente citados, o professor deixaria de ser um distribuidor de tarefas, um monitor de
atividades: seria um conselheiro, um guia que coopera na solução de problemas. Por isso
mesmo:
em vez de material didático estereotipado, do tipo Decroly ou Montessori, material
de trabalho semelhante ou idêntico ao utilizado na vida real (martelo, tesoura, facas,
canivetes, etc.) e mais certa matéria-prima como madeira, argila, papel, tinta, pano,
etc. Em lugar do “Centro de interesse” que, em última análise, é um padrão
arbitrariamente estabelecido, porque independente da participação quer da criança,
quer do professor, o sistema de projeto que leva a um programa organizado em torno
da criança é em função da comunidade
(p. 88
).
Nesse contexto caracterizado pelo INEP, as idéias de Decroly e Montessori foram
questionadas por serem detentoras de elementos que inibiam a “criatividade e a liberdade” dos
principais personagens do processo educativo, professores e alunos, e limitavam a vontade
dos mesmos, uma vez que faziam algumas escolhas a priori, para que eles a executassem. A
reciclagem das idéias desses teóricos, proposta pelo INEP, pode ser vista no seguinte
argumento:
Não diremos que as idéias e diretrizes dos educacionistas americanos a que nos
estamos referindo, tenham sido plenamente concretizadas nos Estados Unidos, como
também não o foram as de Decroly e Montessori na Europa. O paralelo se impunha,
porém, porque, entre nós, quando se fizeram as primeiras tentativas de escola ativa,
aliás, quase desaparecidas já, se imitou principalmente à orientação européia, como
teremos oportunidades de ver, ao tratarmos do movimento renovador no Brasil,
iniciado pouco antes da Revolução de 1930 e por esta incentivada, até que, em 1937,
se deu a completa marcha à ré
(
1955, p. 89
).
A título de curiosidade, vale lembrar que o INEP opinou sobre a escola ativa um ano
após ser diplomada a primeira turma de normalistas em Conselheiro Mata. Segundo Antipoff
(1992), essa turma fora orientada desde o início, isto é, desde o ano de 1950, pelo método da
“escola ativa”, que não considerava a teoria o aspecto mais caro e em primeiro plano.
Ao refletir sobre a história dos modelos pedagógicos, Antipoff (1992) ressalta que a
preferência pelo aspecto verbal do ensino, (herdado talvez do intelectualismo herbartiano,
128
INEP, 1955, p. 95) é certamente mais prejudicial na escola rural que na urbana (p. 125). Em
outros termos, discutiu William James (citado pelo INEP, 1955, p. 96) em sua filosofia
pragmática que as novas práticas educativas não deveriam ser senão a organização dos hábitos
de conduta, com vistas a atingir “fins morais”. No entendimento do INEP, afeito a essa
filosofia;
John Dewey prosseguiu a obra renovadora e propôs mais decisivamente “a escola-
comunidade embrionária”, sob os mesmos princípios. A esse trabalho fizeram eco, na
Suécia, por convicções um pouco diversas, mas tendente ao mesmo plano, ou dessa
estranha figura que é Oto Salomão; na Bélgica, Decroly; Durkheim, na França; e, na
Suíça Claparède Ferrière. E, amadurecida e completa, a idéia frutificou, enfim,
esplendidamente com Wineckem, Paulson e Jorge Kerchensteiner, na Alemanha, onde
aparecem as primeiras escolas-comunidades, as escolas de trabalho e as escolas-
oficina
(
1955, p. 96).
A citação acima revela que tudo aceito no programa escolar precisa ser realmente
prático, capaz de influir sobre a existência social no sentido do aperfeiçoamento do homem.
Nesse sentido, para o órgão responsável pela difusão de idéias “necessárias à educação
brasileira”, ler, escrever e contar passaram a ser “simples meios,” diz o documento do INEP
(1955, p. 96), no que toca às bases de formação do caráter. Portanto, informa o documento: do
ponto de vista da forma, isso significa a criação, no indivíduo, de hábitos e conhecimentos
que influem diretamente no controle de tendências prejudiciais, que não podem ou não devem
ser sufocadas de todo pelo automatismo psíquico possível na infância. (1955, p. 96).
Por essa visão prática, entende-se que a escola, no contexto dessa filosofia pragmática,
deveria ser capaz de colocar o ler, o escrever e o contar no lugar de instrumentos para a
realização de outras coisas e não vê-los como um fim em si mesmo. De forma similar, pode-
se dizer que Antipoff, em 1947, ao escrever o projeto dos “Institutos de Orientação Rural ou
Centros de Urbanização dos Meios Rurais” mostrou que a educação do povo não precisava de
mestres-escolas confinados na suas tarefas de ensinar as primeiras letras e transmitir
conhecimentos escolares pelo grau de curso, mas sim de construtores de uma civilização”.
(1992 [1947], p. 14). Embalada por esse desejo, dissertou: é preciso que o slogan pedagógico
educar para a vida desça das cátedras de Filosofia de Educação à rua e se encarne em obras
de caráter imediato. servindo o futuro, o mestre formado em escolas pedagógicas.
(Antipoff [1947] 1992, p. 14).
Nota-se que tal depoimento evidencia, pelo menos, duas formas de se pensar a história
da educação: primeiramente, uma abordagem que encontraria nas idéias pedagógicas suas
fontes. Outra que vislumbraria tais fontes no comportamento cotidiano dos espaços escolares.
129
A professora explicita ainda que, embora as idéias de uma educação para a vida não fosse
algo tão recente assim, sua prática ainda parecia remota. Entretanto, acreditava que a escola
proposta pelo governo mineiro, naquele momento, seguiria o caminho traçado pelo
pragmatismo filósofo-pedagógico, oriundo do culo XIX, e cujas raízes se encontravam no
século XVII e XVIII.
Porque nos séculos XVII e XVIII? Qual sua relação com as idéias pedagógicas
defendidas por Helena Antipoff e a história do pensamento pedagógico desse outro tempo?
Peeters e Cooman (1936) dão a entender de forma relativamente clara o porquê de a
expressão Pestalozzi figurar como símbolo do modelo educacional praticado pela “Fazenda
do Rosário” e da “prática” de suas Escolas Normais. Antes de Pestalozzi é necessário
mencionar outro símbolo pedagógico da Escola Normal de Conselheiro Mata, a saber, São
João Batista de La Salle (1651-1719), patrono do Clube Pedagógico dessa Instituição,
pensador afeiçoado a refletir sobre a “escola elementar,” com conotação religiosa.
Na obra dessas pesquisadoras: “Pequena História da Educação”, a secularização das
escolas primárias, nos países ditos “reformados”, manifestou-se em primeira instância o
problema da incompetência dos mestres. Isso porque esses eram escolhidos, conforme
classificou o livro, entre coveiros, soldados inválidos, sapateiros de aldeias, ou outros de
mesmo calibre, os quais não possuíam a educação que deviam ministrar. (1965 [1936], p.
70). Historiaram esses autores que, no fim do século XVII, um “jovem Cônego de Remis”,
herdeiro de família nobre e de magistrado, abriu mão de seu status social e passou a dedicar-
se inteiramente a educação dos filhos dos pobres (p. 70). Como método, redigia e
publicava cartilhas, catecismos, livros elementares para as crianças do povo”. (p. 70).
Segundo a opinião de um professor universitário da época, foi esse doutor em teologia o
verdadeiro fundador da escola moderna” (p. 70).
No entendimento de Peeters e Coomam (1969), pesquisadoras cristãs, São João Batista
de La Salle
tinha o dom de encontrar os meninos e de os tirar, como que automaticamente das
ruas e becos para fazer deles bons cristãos e bons cidadãos [...] um psicólogo
eminente e em muitos pontos o nosso saber moderno ainda o sobrepujou, e talvez
até não o tenha atingido (p. 70).
Um dos dilemas enfrentados pelo mestre-escola, na visão de La Salle, era o fato dessa
profissão ser uma das que acumulavam várias funções na figura de um mesmo titular. Com
isso, o teólogo, no século XVII, despertava para uma “precariedade” na formação
130
especializada do professor elementar. La Salle, disse Peeters (1965, p.71) não admite esta
dispersão e esta acumulação de solicitudes. Escreveram os pesquisadores, além disso, que:
O santo fundador instituiu a primeira Escola Normal onde se admitem leigos de
confiança que darão o ensino no campo, enquanto os religiosos são reservados à
cidade. Com efeito, nunca foi permitido aos irmãos a vida isolada nas aldeias. Na
Escola Normal se ensinavam a leitura, a escrita, noções de gramática e de
composição literária, a aritmética, o cantochão, os exercícios e piedade, como
conferências, leitura espiritual, meditação e exame de consciência, alternavam-se
com os estudos, uma escola gratuita (escola de aplicação permitia aos normalistas a
aprendizagem prática do ensino, sob direção dum Irmão experimentado
(p. 71).
Atribuiu-se, não por acaso, a La Salle o título de “patrono” de uma das “instituições
escolares” da Escola Normal de Conselheiro Mata, pois na citação acima, fica claro ter sido
ele o fundador da primeira Escola Normal. Assim, a expressão Escola Normal, segundo
autores citados, pode ter sido uma “invenção” do santo.
Em 1710, já havia 27 casas desse tipo e algumas delas, eram internatos para jovens de
condição abastada, que não desejavam prosseguir o estudo das Humanidades, não se
contentando, porém, como curso primário. (PEETERS e COOMAM, 1969, p. 71).
Até meados do século XVIII, o “filosofismo” concentrou todos os seus ataques contra
a Igreja. Na outra metade do mesmo culo, a ação crítica direcionou-se para o “estudo
político e social”. Dentre os mais eminentes críticos estava, segundo Cooman (1965),
Rousseau que também rejeitava a religião revelada (p. 86). A autora explicita que o homem
explica a obra e ainda diz:
Rousseau era um singular amálgama de qualidades e de defeitos contraditórios.
Força e fraqueza moral, sinceridade e mentira, extraordinária facilidade para
expressar idéias e impotência para realizá-las; sobretudo completa carência de
disciplina moral. Sua imensa influência deve atribuir-se à sua mágica eloqüência,
acompanhada do dom de despertar emoções, mesmo as mais contraditórias (p.87).
Na pesquisa feita para “Pequena História da Educação” (1965) Peeters e Cooman
constataram que a educação de Rousseau fora completamente descurada, apenas soube ler,
devorava todos os romances que podia encontrar, e estes nele despertaram todos os instintos
sensuais e sentimentais. (p. 87). Aos 40 anos, começou a divulgar suas idéias. Nesse
momento tinha mentalidade de um revolucionário. Segundo elas, a idéia fundamental de
Rousseau é que todo homem, seja qual a sua situação, tem o direito imprescindível ao prazer,
que a sociedade existe para lho fornecer, e que a ciência, o governo, a educação deviam
ser inteiramente remodelados para atingirem esse fim
. (p. 87).
131
Rousseau, em “A Doutrina do Estado Natural”, idealizou um quadro no qual o homem
primitivo era o protagonista central e principal – simples, feliz, contente e honesto – e o opôs a
vida formal, superficial e desumana que corria na cena da sociedade parisiense. Vale
salientar aqui que era a concepção de escola desenvolvida em “Emílio” livro em que se
encontram, como em todas as obras de Rousseau, idéias felizes no meio de inúmeras utopias
perigosas ou simplesmente ingênuas. (Peeters e Cooman, 1965, p. 87). Em poucas palavras,
segunda as pesquisadoras, “Emílio” ou “Educação Segundo a Natureza”, dizia que
uma criança é afastada dos pais e do meio escolar e entregue a um preceptor que a
educará segundo a natureza, pondo-a em contato direto com ela. Mas o que se entende
por natureza? Rousseau a este termo dois sentidos diferentes. A natureza é
primeiramente um estado social em que os homens seriam governados por leis
exigidas por seus próprios interesses e direitos. [...] O segundo sentido que Rousseau
à palavra “natureza” é que a verdadeira base das ações não deve ser a reflexão
nem a experiência, e sim as emoções instintivas, os primeiros juízos. Rousseau
combate a formação de hábitos na infância (1965, p. 88).
O uso simbólico do nome Rousseau se ligava, de certa forma, à Escola Normal de
Conselheiro Mata por meio de Helena Antipoff que, segundo Campos (2003, p. 150) em
1925, ao retornar a Suíça, tornou-se assistente de Claparède no Instituto Rousseau e, em
seguida, transferiu-se para Belo Horizonte.
Conforme afirma Morales (1996), ao discorrer sobre o uso de elementos antigos como
recursos para estruturar e significar ações no presente, eles funcionam para ativar o tempo
todo a lembrança de que se é filiado àquele símbolo, o qual guarda aspectos que servem de
exemplo, de estereótipo para condutas contemporâneas. Lembra ela que esse destaque dado a
personagens passados tem por finalidade levar os indivíduos, num dado presente, a
permanecer em sintonia com aqueles atributos representadas por tais ídolos. (p. 285). A se
concordar com isso, presume-se que “São João Batista de La Salle, D. Joaquim Silvério de
Souza e Jean Jacques Rousseau”, entre vários outros, são alguns dos nomes acionados para
fazer acontecer e prevalecer de forma elevada uma representação da Escola Normal e da
normalista para os anos de 1950. Representação que deveria se instalar e estruturar na
imaginação e na memória dessas normalistas ao longo do tempo profissional e de vida.
Outro autor que orientava as alunas no sentido de se reconhecerem como pertencente
ao “lugar” de normalista, especialistas em assuntos rurais, era o símbolo-nome de “Heinrich
Pestalozzi” (1746 1826). Vale lembrar inicialmente que ele era depositário das teorias de
Rousseau.
132
Peeters e Cooman (1965, p. 95) ao explorarem Pestalozzi, explicitaram que esse,
depois de várias tentativas na escolha da carreira, fundou a primeira escola industrial para
pobres. Nas palavras das pesquisadoras:
pretendia instruir crianças de maneira a fazer delas bons lavradores, ensinar-lhes,
por exemplo, a criação do bicho-da-seda, a fiação, a tecelagem, etc., sem, todavia
deixá-las ignorantes das coisas essenciais: a leitura e o cálculo. Todavia,
Pestalozzi abarcou empreendimentos que excediam as suas capacidades e o seu
ensino falhou como aconteceu com os anteriores (p. 95).
Embalado por esse pressuposto, Pestalozzi dedicou-se à literatura de cunho social e
pedagógico, com a proposta de demonstrar que nas reformas políticas, pouco vale dirigir-se a
homens feitos, convindo, sim, dirigir-se às crianças, para desse modo formar a nova geração
que lhes deve suceder. (p. 95). Com efeito, tal argumento comprova para aqueles que
pretendiam enfraquecer forças oriundas do passado, como os ideólogos da Escola Normal
Rural Mineira dos anos de 1950, o engano de não perceberem nas crianças da roça um
potencial de “salvação à conturbada situação social a que estavam submetidos”.
O livro de Pestalozzi “Leonardo e Gerturdes,” como escreveu Peeters e Cooman
(1965) era um:
romance de costumes campestres. Uma mulher simples transforma, pelo tino,
paciência e dedicação com que educa seus filhos, o próprio marido entregue ao
vício de beber e exerce uma influência extraordinária sobre todos os vizinhos,
renovando e regenerando uma aldeia inteira. Pestolozzi conclui que o que se fez
numa povoaçãozinha se pode obter em qualquer lugar (p. 95).
E assim, Pestalozzi, segundo Peeters e Cooman (1965), aos 52 anos, iniciou sua vida
como “mestre-escola”. Afirmam elas que o ocorrido foi em Stans. Na época, a passagem do
exército francês na Suíça, tinha deixado órfãs muitas crianças. Pestalozzi reuniu os infelizes
em um orfanato, em que procurou aplicar as experiências de sua juventude. Infelizmente as
incertezas da época impediram que se prolongasse por mais de um ano essa obra de
caridade. (p. 95). Em Antipoff, a Fazenda do Rosário tinha por objetivo, atender a situação
de criança excepcional ou desajustada, do débil mental, da população rural, do pequeno
artesão, do artista popular, da jovem professora. (O Livro de Recorte de Jornal, Conselheiro
Mata, 2005). Para isso, utilizou-se a biografia e obra de Pestalozzi na busca de se “inaugurar”
uma tradição na qual um conjunto de novas práticas educacional-psicológicas e pedagógicas
fosse inculcado nos membros permanentes e temporários dessa instituição.
133
Esses valores de natureza ritual-simbólica e lógico-científico deveriam aparentar uma
continuidade com as experiências descritas acima, isto é, seguir uma proposta de rompimento
com os modelos estabelecidos historicamente, ao mesmo tempo em que, paradoxalmente, se
ligava a um outro passado um passado histórico no qual a nova tradição seria inserida
(HOBSBAWM e RANGER, 1997, p.10).
De certa forma, influenciado pelas idéias pestalozzianas, estava Frederico Froebel
(1782 – 1852) que propunha uma educação original que, na visão de Peeters e Cooman (1965,
p. 100) foi classificada como fragmentária e um tanto desordenada. (p. 100). Segundo elas
Herbart exaltava a importância do professor. Froebel enaltecia a importância do
educando, preparando assim o ensino ativo. Herbart assenta toda educação sobre
a instrução; Froebel sobre as atividades da criança, estimuladas e guiadas. Para
Herbart prevalece o aspecto intelectual da educação; para Froebel, o aspecto da
vontade (1965, p. 100).
Para Lourenço Filho (1963), Froebel relacionou a sua reflexão e compreensão, ao
papel educativo do brinquedo ou das atividades lúdicas. Assim, a exemplo de Pestalozzi, diz
Lourenço Filho (p. 147): um ponto comum é que ambos não encaram a educação como tarefa
que se possa realizar de fora para dentro. No seu entendimento, foi por isso que Froebel
adotou o termo “Jardim das Crianças”, no qual se dava a educação pré-escolar, que idealizou
e fez funcionar.
Com um jardim o podemos proceder como fazemos ao construir um objeto, uma
casa ou uma máquina. Um canteiro envolve qualidades da terra, umidade e calor,
para que as sementes brotem. Maiores relações do conjunto hão de ser assim
aprendidas ou, ao menos, sentidas como presentes atuantes (p. 147).
É possível dizer que a leitura desse teórico interessou às normalistas pelo fato de
sublinhar o papel da atividade, da participação do educando no processo pedagógico e,
notoriamente, por se refletir nas crianças que seriam introduzidas na escola primária. Destaca-
se, ainda, o papel desempenhado por João Frederico Herbart (1776-1841) o que, segundo
Carvalho (1969), contribuiu decisivamente para a elaboração de um método de ensino que
ficou conhecido por passos formais. (p. 30). Informa ela que, em termos práticos, significou
um método geral de ensino. Entretanto, destaca a pesquisadora, que tal concepção foi muito
criticada, sobretudo porque os pontos de vista psicológicos levados a efeito pelo educador
foram superados pela Psicologia Moderna. (p. 30). Uma das críticas mais contundentes veio
de “Gaundig”, o qual diz que o tempo dos passos formais na história da escola primária
alemã não é nenhuma página gloriosa. É uma triste verdade que o pensamento de inúmeros
134
mestres se deixou atar por essas traves e que tais esquemas paralisaram a força criadora de
muitos deles. (CARVALHO, 1969, p. 30).
A denominação “Passos Formais de Herbart” diz respeito a um esquema de ensino em
que “o trabalho docente tornar-se-á independente da matéria lecionada. De acordo com
Carvalho (1969) seriam apenas quatro: 1 Clareza; 2 Associação; 3 Sistematização ou
generalização; 4 Métodos”. Posteriormente, foram alterados e ficaram assim: 1
Preparação; 2 Apresentação ou exposição; 3 –Associação ou comparação; 4
Generalização; 5 Aplicação” . (p. 31).
Maria Montessori que se doutorou em medicina pela Universidade de Roma, em 1894,
53 anos após a morte de Herbart, posicionava-se contrária a ele. (LOURENÇO FILHO, 1963,
p. 181). Segundo esse autor, as idéias educativas de Montessori foram primeiramente
aplicadas às crianças de 4 a 6 anos. A concepção de educação de Montessori, portanto,
escreveu Lourenço Filho (p. 181) é de crescimento e desenvolvimento mais que de
ajuntamento ou integração social. Com efeito, o que se destacava para essa autora era o ser
biológico, cuja vontade era fator central, por isso, a liberdade deveria assumir conotação de
princípios fundamentais para a educação infantil (LOURENÇO FILHO, 1963).
Coloquemos a criança num ambiente adequado, dizia Montessori, e a atividade se
coordenapelos interesses naturais: “Nossa atenção não se dirige a todas as coisas
indiretamente, mas àquelas que sejam simpáticas às nossas preferências. As coisas
úteis à intimidade de nossa vida despertam em nós interesse. Nosso mundo anterior é
criado por uma seleção do mundo exterior, adquirida segundo nossa própria
atividade. As experiências pelos quais cada um de nós constrói seu “eu”, em relação
ao mundo exterior, não formam um caos, mas são dirigidas por essas capacidades
individuais” (MONTESSORI apud LOURENÇO FILHO, 1963, p. 183).
Assim sendo, D’Ávila (1954a) comenta que o Método Montessori tinha por finalidade
favorecer a auto-educação da criança. Lembra ele que às crianças deveria ser dada a liberdade
de escolher seus exercícios, segundo os reclamos íntimos de sua natureza e imperiosas
exigências de seu organismo. (p. 386). Embora a Escola Normal não estivesse diretamente
atuando sobre crianças, mas sobre jovens, vale a pena lembrar, para efeito de comparação
com os argumentos descritos, a seguinte frase: menos formalismo e mais espontaneidade
vital, menos informação e mais formação. (FUNDAÇÃO HELENA ANTIPOFF, 1978, p.2).
Como foi mencionado anteriormente, neste texto, tanto por Antipoff no “Boletim
Escola Rural” (1949) quanto pela revista “Educação” (1952), Éduoard Claparède (1873
1940), tornou-se também um dos personagens simbólicos da Fazenda do Rosário, chegando a
ter seu nome exaltado numa das publicações da Fazenda, Boletim Claparède”, dentre os
135
diversos que foram elaborados por essa Instituição em parceria com outras. Dessa maneira,
fica explícita que suas idéias serviam de elemento inspirador e orientador para a formação
normal praticada por esse estabelecimento.
Campos (2003) utilizou um documento fotográfico como argumento ilustrativo de sua
exposição sobre Antipoff e o laboratório de psicologia, em cuja legenda escreveu: Mário
Casasanta, Édouard Claparède e Manuel Bergstrom Lourenço Filho no laboratório de
Psicologia da Escola de Aperfeiçoamento de Professores de Belo Horizonte.(p. 139). Destaca
ela ainda que a fotografia foi feita durante a visita de Claparède e Lourenço Filho a Belo
Horizonte, em 1930. Certamente tal visita estava relacionada à criação da Escola de
Aperfeiçoamento que, em 1928, pode-se assistir às primeiras aulas de psicologia em Belo
Horizonte.
A instalação da Escola de Aperfeiçoamento de Professores, resultado da reforma de
ensino proposta por Francisco Campos. Essa escola dedicava-se
à
formação de
gestores para a implantação de reforma, através de um curso de dois anos oferecido
a normalistas trabalhando no sistema e indicadas por suas respectivas instituições.
(p. 134)
.
Destaca-se que a direção dessa Escola, conforme informou Campos (2003), foi
assumida por Helena Antipoff. (p. 135) o que caracterizou a sua relação com Claparède, bem
como a introdução de suas idéias no meio educacional mineiro.
Envolvido na Europa num movimento que emergia da psicologia em que o interesse
era aplicar os conhecimentos psicológicos à educação. (Campos, 2003, p. 130), pode-se dizer
que foi nesse período que Claparède ganhou notoriedade intelectual nesse campo de
conhecimento. Para Campos,
na França, a partir de 1905, Alfred Binet e Theodore Simon dois estudiosos do
desenvolvimento da inteligência e da Cognição atendem a demanda do Ministério
da Educação Francês no sentido de construir instrumentos de diagnósticos de
Crianças com dificuldades escolares que pudessem apontar formas de cuidado mais
eficientes, tendo em vista o grande número de atrasos de desenvolvimento observados
nos alunos das escalas primárias francesas da época. Desse trabalho resultaram as
famosas escolas de medida do desenvolvimento da inteligência e o conceito de “idade
mental”, que tantas polêmicas provocaram ao longo do século XX. (apud VEIGA E
FONSECA, 2003, p. 130).
De forma semelhante, para Sheehy (2006), Binet e Simon consideraram que essa
comissão precisava de um método psicológico experimental. Por isso, em 1905, com os dados
colhidos, depois analisados, constituíram aquilo que imediatamente foi reconhecido como a
136
primeira mensuração operacional da inteligência. (p. 40). Quanto ao método, escreveu
Sheehy:
A tarefa mais fácil exigia que uma criança seguisse uma luz com os olhos, algo que a
maioria das crianças pequenas poderia fazer, mas que algumas não conseguiam. A
dificuldade de cada tarefa crescia aos poucos até chegar a problemas de
completamento de sentenças que podiam ser resolvidos por crianças precoces de
11 anos. Tendo desenvolvido um teste para atender às necessidades da Comissão,
Binet se viu em um caminho que levaria a formulação de um instrumento de avaliação
que permitiria afirmar, com alguma precisão, se o desempenho de uma determinada
criança estava de acordo com o de uma criança média de sua idade (2006, p. 46).
Concomitantemente a essas ocorrências na França, em Genebra, Édouard Claparède e
Pierre Bovet
17
estabeleceram um Instituto de Ciências da Educação o Famoso Instituto
Jean-Jacques Rousseau e, anexa a ele, uma escola experimental. (CAMPOS, 2003, p. 130).
Explicitou que nessa escola (Maison des Petits) realizavam-se estudos sobre o
desenvolvimento infantil e a aplicação desse conhecimento no ensino era enfatizada. (p. 131).
Vale lembrar que a influência de Binet nos trabalhos de Claparède é um dado recorrente entre
os estudiosos de sua biografia intelectual.
Ao analisar o comportamento da criança, objeto das suas preocupações científicas,
Claparède passou a defender que a criança não imitava tudo. Enfatizou o pesquisador que a
possibilidade da imitação era limitada pela estrutura anatômica que predispunha o indivíduo
para reproduzir alguns acontecimentos e não outros. Ressalta Claparède, contudo, que a
criança operava uma seleção nos elementos objetivos dentre os quais poderia proceder a uma
imitação. Por conta disso, indagou-se: O que dita essa escolha? Como resposta, escreveu o
psicólogo:
As necessidades do desenvolvimento; numerosas virtualidades que trazemos ao
nascer não são suscetíveis de se desenvolverem sem o auxílio da imitação. Isto é,
essa escolha vai variar conforme idade, conforme a necessidade do momento. A
criança imitará aquilo que interessa imitar no interesse de seu aperfeiçoamento
(VALLI, 1976, p. 14).
Para Nassif e Campos (2005) três conceitos ocuparam as reflexões de Claparède
recorrentemente, a saber interesse, afetividade e inteligência. Sublinharam elas ainda que
tais conceitos ocuparam lugares consideráveis na educação funcional, bem como, na
maneira de se atrair o interesse da criança. (p. 91). No que diz respeito ao conceito de
necessidade, explicaram as estudiosas que, em Claparède, é definido a partir da ruptura do
equilíbrio do organismo. No entanto, era a própria ruptura que estimulava as reações ideais
17
Palestrante no Segundo Seminário de Educação Rural sediado na Fazenda do Rosário.
137
para satisfazê-la. Em diversas situações o equilíbrio perturbado se restabelece
automaticamente como é o caso da nossa vida fisiológica. (p. 93). Isto se dá, por exemplo,
nos casos de mecanismos reflexos que garantem as funções respiratórias. (p. 93). Apontam as
autoras que o mesmo o acontece com nossa vida mental, deixando-nos temporariamente
desadaptados. então que cabe à inteligência a tarefa de nos readaptar Claparède,
1938/1973, p. 14 apud NASSIF e CAMPOS, p. 93). O “interesse”, para Claparède, dizem as
autoras, equivale ao que importa e ao que tem valor de ação.
A palavra interesse, segundo a etimologia (inter = esse = estar = entre), expressa seu
papel intermediário entre as necessidades do organismo (sujeito) e o meio (objeto),
estabelecendo um acordo entre os dois. [...] Claparède utiliza-se da metáfora da
torneira para explicar a reação de interesse, isto é, o registro de cada torneira
poderá ser aberto pela chave (o excitante) que corresponde ao seu dispositivo (a
necessidade do momento). O conceito de reação de interesse equivale, então, ao
processo de liberação de energia, ou seja, ao processo de dinamogênese pela
excitação que são capazes de provocar a reação (p. 94).
A noção de inteligência está ligada diretamente à de necessidade. Essa última seria,
segundo Claparède, responsável pelo direcionamento da “atividade intelectual”, ao sugerir
problemas que “ela terá que resolver”, isto é,
a necessidade de readaptação provoca um movimento interno, o
movimento do pensamento, da pesquisa. Nesse sentido, “a
inteligência é um instrumento de adaptação, que entra em jogo
quando falham os outros instrumentos de adaptação, que são o
instinto e o hábito” (Claparède, 1931/1940, p. 137 apud NASSIF e
CAMPOS, p. 90).
No entendimento das pesquisadoras, o conceito
de afetividade nos trabalhos produzidos por Claparède
aparece muito fragmentado, o que não permite capturá-
lo de forma explicitamente clara. Entretanto,
possivelmente possui na sua concepção a influência de
Jean-Jacques Rousseau, a quem Claparède, muitas
vezes, reportou-se. (p. 97). Logo, entre as definições
explicitadas de afetividade figurava a de que a
Natureza não nos dotou com o conhecimento inato das coisas e efeitos dos fenômenos, mas
deu-nos o desejo e o meio de o procurarmos, o que é mil vezes mais precioso. (Claparède
1934 apud NASSIF e CAMPOS, p. 97). As autoras citam os possíveis teóricos com os quais
Claparède ligava-se de alguma maneira e em momentos distintos de sua biografia intelectual:
Ilustração 13 - acima: capa do "Boletim
Claparède” (Acervo - CDPHA)
138
Jonh Locke (1632 1704); Jean-Jacques Rousseau (1712 1778); Hebert Spencer (1820
1903); Willian James (1842 1920); Sigmund Freud (1856 1940); John Dewey (1859
1952) entre outros (p. 100 – 102).
Nassif e Campos procuraram explicar que, talvez, na “pedagogia claparediana”, o
interesse e a afetividade tinham na sua “educação funcional” lugar de destaque. Isto porque,
para ele, o saber nada mais é que um instrumento de adaptação, o qual deve ser adquirido
através de uma necessidade. Mas para que essa última seja satisfeita, ela mesma é quem faz
surgir o interesse e a afetividade, os quais conduzirão à ação adequada (p. 102). Diante disso,
questiona o teórico: Como estimular o interesse e fazer do trabalho, do aprendizado, algo
prazeroso? Como resposta pedagógica, diz ele: através da Educação Funcional, e utilizando-
nos do jogo, que é um recurso precioso para este fim. (p. 102).
O pensamento de Claparède foi uma das inspirações que fundamentaram a proposta de
Antipoff sobre a educação rural e a organização do “Instituto de Organização do Meio Rural.”
Integrados a esse Instituto, funcionariam, pelo menos, doze instituições escolares de natureza
diferenciadas e entre elas destaca-se a praça de jogos esportivos. (ANTIPOFF 1947 apud
CDPHA, 1986 p. 72). Embora a noção de jogo acima, explicitada por Claparède, não esteja
claramente especificada, pode-se inferir que os jogos esportivos estão aí incluídos.
No que se refere ao símbolo-nome Claparède, este foi condecorado com a criação do
“Boletim Claparède”, uma brochura produzida pela Fazenda do Rosário, na qual se publicava
estudos sobre psicologia-pedagogia infantil. Valer registrar que essa peça traz na sua capa:
uma paisagem emoldurada por uma palmeira e, próximo a ela, olhando em diagonal
ascendente, posiciona-se uma figura humana, de pé, com uma das mãos na cintura e a outra na
região da cabeça. O olhar era simbolizado por duas linhas pontilhadas saindo do olho com um
movimento paralelo, mas que se distancia, formando uma figura semelhante a um triângulo,
cuja base encontrava-se no alto, com as representações de uma enxada, um livro aberto (ou
caderno) e o símbolo da Psicologia.
Resumidamente, no alto (elevados) estavam esses objetos-símbolos e na parte de
baixo estava o homem (rural) a contemplá-los, talvez, por desejá-los e persegui-los. Isso
porque esses objetos “totemizados”, na ocasião, diziam respeito àquilo que transportaria e
transfiguraria o indivíduo para uma vida social mais elevada.
139
4.3 Da teoria às práticas de ensino: as Didáticas.
A 4ª série não teve aula de didática porque a professora Dona Maria da Conceição
Fonseca encontra-se em Belo Horizonte.
Teresinha Nogueira de Souza, 1967.
Constituiu-se, sem dúvida, em torno do ensino normal, um número considerável de
“Didáticas” que visava dar objetividade às perspectivas postas pela “escola ativa”, no que se
refere às performances dos professores junto aos alunos. Em poucas palavras, segundo a
etimologia contemporânea, o termo “didática” define-se por: “a técnica de dirigir e orientar a
aprendizagem” (FERREIRA, 2001, p. 254). Ao buscarmos, no cotidiano da Escola Normal
de Conselheiro Mata, um aspecto que caracterizasse uma dentre as diversas técnicas de
ensino-aprendizagem que a Escola utilizou, os trabalhos
práticos” sobressaem naturalmente. Estes eram executados
sob a forma de tarefas quinzenais que seriam feitas por
turma de 6 alunos ou 6 alunas, turmas estas estruturadas
através da função de monitor, de auxiliar, de zelador de
material, de escrita e diarista. (FUNDAÇÃO HELENA
ANTIPOFF, 1978, p. 4).
Assim, os alunos agiam com o corpo, pois o trabalho
foi incorporado com uma categoria analítico-concreta de
objetivação da prática do ensino na escola primária (ou
elementar) da localidade rural. Como se poderia ensinar pelo
“trabalho”? Essa era, por exemplo, uma questão a ser
desenvolvida no interior da aula de prática de ensino.
Aguayo (1935) buscou caracterizar uma “possível” diferença existente entre “didática e
metodologia pedagógica”. Segundo ele, de acordo com a pedagogia antiga, classificava-se por
metodologia pedagógica o estudo dos métodos de ensino, enquanto que “didática” era vista
como a própria doutrina ou ciência do ensino, considerada do ponto de vista da educação do
homem. (p. 2). Essa distinção é, de certa forma, incerta. A didática estuda também a doutrina
do método e tem, portanto, amplitude maior que a metodologia pedagógica. (p. 2). Por esse
ponto de vista, tal distinção não é necessária para a definição e compreensão dos métodos do
ensino.
Conforme explicitou Aguayo (1935), a didática compreende duas partes: uma geral ou
sistemática, que consistia na reflexão sobre aprendizagem, suas funções e os meios para
Ilustração 14 – folha de rosto do
livro do pedagogo cubano A.M.
Aguayo(Acervo
– CDPHA)
140
efetivá-la, o plano de estudos, da teoria geral do método, da motivação do trabalho escolar e
da concentração e globalização desse trabalho. (p. 9). A segunda parte tratava-se da ciência
do método, isto é, a teoria e a prática dos métodos de aprendizagem. Por seu lado, como
metodologia, estudava os métodos gerais e especiais de aprendizagem. (p. 9).
Em contrapartida no “Oitavo Congresso Brasileiro de Educação, em 1942”, chamou-se
“Prática de Ensino” a matéria que seria o espaço de reflexão e experimentação de métodos de
ensino. Nessa visão,
A metodologia de todas as disciplinas do Curso primário é o encéfalo do organismo
de uma escola que se destina a formar professores. Esta matéria deverá merecer toda
atenção para que não se queira trazer para a prática de uma escola da roça a
complicação de métodos e processos das metodologias de escolas de elite. (apud
ANAIS DO OITAVO CONGRESSO BRASILEIRO DE EDUCAÇÃO, 1944, p. 315).
Esse argumento evidencia que a professora deveria ter uma noção que era latente na
época: as técnicas de ensino, ao serem aplicadas nas escolas rurais, deveriam guardar algumas
peculiaridades que as diferenciassem do ensino praticado na cidade, cujas técnicas eram
familiares a quase todo educador.
Uma forma de diversificar, ou de se compreender diferentes técnicas de ensino, por
meio de observações, como sublinhou Collins e Simon (1953), dizia respeito à visitas a
aulas reais” como escreveram os professores:
Conceitos tendem a se tornar mais reais para o estudante (normalista), se ele os
transforma em experiência viva através de seus sentidos básicos. A oportunidade de
presenciar as atividades de um professor com seus alunos, de acompanhar a sua
conversação e de sentir a atmosfera criada por eles, trabalhando em conjunto,
proporciona essa experiência viva ao professor estudante, tanto em seus trabalhos
“ativos” como nos de preparação (p. 10).
Para os propositores, essa seria uma técnica realista para o treinamento de
professores, pois ao encontrarem situações em que os estudantes pudessem observar aulas
reais, eles se defrontariam com alguns problemas, cuja solução viria, sobretudo, se a iniciativa
fosse tomada por algumas das partes do campo escolar. Para esses teóricos, tal iniciativa
poderia partir de um dos membros do corpo docente de uma dada escola, da administração
ou, ainda, de um educador profissional que, por algum motivo, estivesse em condições de
disparar tal sugestão (p. 10). Por conseguinte, seria feito o uso da sessão de zum-zum”, na
qual se faria um debate com vistas a dar significação às “observações colhidas”. Para isso:
Logo após a visita, os professores concordam em realizar, em hora própria para
todos, uma reunião para concretizar as observações feitas, reunião essa que poderá
141
ter uma duração de até duas horas. O lugar do encontro deve ter de preferência
quadro-negro, portanto, a mesma sala de aula, provavelmente, será a melhor escolha,
tanto mais que ela parece aumentar as faculdades de recordação daqueles que
assistiram à aula (p. 11).
A análise feita das observações colhidas na aula forneceria, segundo esta “técnica
realista”, uma série considerável de “técnicas de ensino”. Ao usarem tal procedimento pela
primeira vez, as pessoas surpreendiam-se diante do grande número de idéias que
invariavelmente surgiam. (Collins Simon, 1952, p. 12). Para efeito de ilustração, os
pesquisadores citaram uma experiência a partir de uma aula teórica de Química dada aos
alunos do Curso Fundamental do ITA. Segundo o resultado do debate com base nas
observações, foi possível enumerar 23 “boas técnicas de ensino” as quais serviriam para
produzir um “Guia do Professor” (p. 13).
Assim, a elaboração de um guia para o professor, como proposto anteriormente,
focalizou, prioritariamente, o desempenho do educador na sala de aula. No entanto, a que se
refletir sobre o período da performance na sala de aula. Conforme denominou D’Ávila
(1954b) em “Planos de Aula, o planejamento do trabalho escolar” (p. 9), deve se discutir um
projeto definitivo a ser realizado na escola, podendo o mesmo ser alterado depois de sua
experimentação. (p. 9). O plano de aula, diz o autor:
é a expressão das idéias pedagógico-didáticas de seu autor, e serve para mostrar a
sua orientação docente e o conhecimento que tem da situação escolar. É o antestado
da capacidade de criar atividades de ensino, de provocar interesses, de despertar
iniciativas. Assim compreendido, todos os planos de aula soam projetos, que devem
sofrer modificações, de acordo com a experiência. É um traçado ideal de trabalho
(1954b, p. 10).
Vale dizer que existe uma diversidade de elementos que podem compor um plano de
aula. Entre os indispensáveis figuram-se: a classe, alunos, matérias, material, meios auxiliares,
objetivos do trabalho, métodos e processos, avaliação dos resultados, etc. (D’Ávila, 1954b, p.
10). Enquanto as habilidades dos procedimentos didáticos estavam em discussão e
desenvolvimento, surgiam, nessa época, as inovadoras idéias em torno do “material didático,
bem como, dos jogos”. Dominados por uma concepção metodologicamente sistematizada,
chegou-se ao uso dinamizado do material didático como citou D’Ávila (1954b).
Por influências do movimento pedagógico das “lições das coisas” no ensino, houve
nas escolas um acentuado interesse pela organização de material didático. Louvável
nos seus propósitos, esse movimento permitiu que se equipassem as classes com
material variado, oportuno e bem feito, o que deu ao trabalho docente maior
objetividade e rendimento (p. 11).
142
Os investimentos na formação geral e integral, por seu lado, consideravam a tendência
lúdica no homem, o qual vinha sendo estudado com maior interesse pelos que se dedicam a
problemas psicológicos ou pedagógicos. (D’Ávila, 1954b, p. 13). Constata ele, que crianças e
adolescentes de todos os pontos da terra brincavam e manifestavam instinto lúdico. Portanto,
o brinquedo seria um prazer e uma necessidade. (p. 13). O brinquedo e o brincar, conforme
denominou D’Ávila (p. 13) desenvolveriam na criança novas formas de comportamento,
atitudes e conhecimentos e, assim foi-lhes atribuído a qualidade de ocupação dominante e
veículo de educação.
Quanto aos jogos no plano de aula, explicitou o pedagogo: instrumento valioso de
aprendizagem, pode, contudo, ter sua utilização desvirtuada. Mister é, pois que estudados os
problemas apresentados pela classe, saibam os praticantes empregar o jogo com
oportunidade, habilidade e proveito. (D’Ávila, 1954b, p. 14).
Fica explicitado, segundo as observações acima, que o jogo, ao lado das brincadeiras,
constituíam-se técnicas que lançariam alunos em situações pedagógicas de caráter, às vezes,
físico-corporal e cognitivo ao mesmo tempo.
As fases definitivas do trabalho docente não eram apenas a elaboração e a
concretização da aula, mas também, como registrou D’Ávila (1954b), em “a Avaliação do
Rendimento Escolar”: o exame ou medida do trabalho escolar em sala de aula não era um
procedimento que interessava somente à escola. Ao contrário, esse processo ligava-se a
questões de ordem moral, intelectual, social e econômica. Segundo D’Ávila, examinar o aluno
não é somente apreciar o que ele aprende: é também, julgar a quantidade de sua aprendizagem
e o valor de seus mestres (1954b, p. 319). O pedagogo foi além disso:
É atribuir-lhe uma nota, uma classificação. É avaliar seu esforço, a sua capacidade,
o seu talento, a sua perseverança. É promovê-lo para graus superiores, na escola, ou
entregar-lhe o certificado de habilitação. É por vezes, quando inabilitado, um
julgamento que pode desanimá-lo, que pode cortar-lhe a carreria, prejudicar-lhe o
futuro. (p. 319).
Daí, portanto, a importância que o exame representava para a “economia e para a
segurança do meio social”. Ainda afirma D’Ávila: exames bem feitos, bem organizados e
realizados constituem garantia de bem - estar coletivo, de aproveitamento dos mais aptos,
dos melhores. (p. 319). Entretanto, era necessário sublinhar a “falibilidade dos exames” que,
apesar de sua importância “reconhecida universalmente” são provas que, ora ou outra, falham
às finalidades procuradas. (p. 319).
143
Segundo os pensadores do INEP (1955), a prática do ensino nas escolas públicas
brasileiras, de modo geral, era de uma pobreza generalizada. Escreveu-se nesse documento:
o que existe (nas escolas),porém, é de tipo único, padronizado: mapas geográficos
não adequados ao ensino primário, globos terrestres, gravuras para o ensino de
linguagem, o de cálculo e o de ciências e em outro equipamento mais moderno. Das
escolas urbanas que responderam até agora o inquérito, 80% dispunham de mapas
geográficos, 55% de um ou dois globos terrestres, 40% de gravuras murais para o
ensino de linguagem, cálculos e Ciências, 3% de aparelhos de rádio recepção, 30%
de vitrolas elétricas ou a corda, 8% de aparelhos de projeção de cinematografia (dos
quais mais da metade não é utilizada ou, por falta de filmes ou, por defeitos dos
aparelhos e 66% de pequenas bibliotecas escolares (INEP, 1955, p. 165).
Os conhecimentos indiciais da qualidade e quantidade dos equipamentos auxiliares na
prática de ensino nas escolas brasileiras permitiram que, os intelectuais do INEP (1955)
denunciassem: a nossa escola primária, mesmo a urbana, é, pois, paupérrima em
equipamento didático. (p.165). Essas informações, concretamente, fornecem dados para se
conjeturar sobre qual seria a rotina didática da escola rural, a qual, face ao argumento acima,
parecia ser detentora de uma situação de precariedade ainda maior que a cidade.
De certa forma, estava o projeto da Escola Normal Rural Mineira de 1949 atento a
essa realidade, pois dos oito milhões quatrocentos e vinte quatro mil e seiscentos e quarenta
(CR$ 8.424.640.00) cruzeiros a serem investidos na implantação das escolas rurais e em seus
respectivos cursos de aperfeiçoamento, quinhentos e oitenta e oito mil (CS$ 588.000.00)
cruzeiros destinavam-se à compra de livros e material didático, material de consumo e
utensílios. (RENAULT, 1952, p. 114)
18
.
Do ponto de vista teórico, as práticas de ensino necessariamente precisavam recorrer a
métodos sistemáticos para que se controlasse o processo e o progresso da aprendizagem em
direção aos objetivos determinados. “O método”, diz D’Ávila (1954a, p. 146) é uma palavra
de origem grega que significa proceder de certa maneira para alcançar um fim. Segundo ele,
o método é, na nova pedagogia, a arte de fazer compreender, fixar a atenção espontânea,
diferente da arte de transmitir. (Vitor Mercante apud D’Ávila, 1954a, p. 146).
Caberia à normalista então, atentar para a questão do método ou correria o risco de não
alcançar uma condição profissional sólida. Na visão de D’Ávila:
Assunto de grande interesse na formação profissional do mestre, seu
desconhecimento gera com freqüência no ensino desvios pedagógicos lastimáveis.
18
Vale lembrar a título de ilustração, uma nota de jornal preservada no Livro de Recortes de jornal na qual foi
dito que a Escola Normal de Conselheiro Mata, carente de recursos, estava a consumir 10 litros de querosene por
noite.
144
Por esse desconhecimento é o que assistimos nas aulas monótonas (falta de interesse
do aluno), nas aulas passivas (falta de atividade da classe, a aulas intermináveis ou
excessivas em matéria (falta de adequação do tempo à capacidade de aprender), nas
aulas em que o material pretende suprir a ausência de método). (1954a, p. 146).
Ao pensar que através do estudo de seu livro, as normalistas tomassem consciência da
questão do método, D’Ávila acabou por reunir em sua obra vinte e quatro formas de método,
entre os quais destacou nove, em que figuravam:
Método intuitivo – é o que leva a inteligência do aprendiz ao contato com a realidade.
O que provoca sempre, como fase inicial de qualquer conhecimento, o exame do
respectivo objeto por intermédio dos sentidos. Ou, é o emprego dos sentidos como
fonte de conhecimento. Método indutivo é o que faz partir de fatos, cujo
conhecimento é feito por meio de observação ou da experiência, levando o aluno a
induzir ou a descobrir as relações que existem entre esses fatos, para que se chegue
às leis que os regulam. É a marcha do particular para o geral. Método dedutivo o
que apresenta verdades ou princípios gerais, fazendo com que os alunos reconheçam
que os casos particulares estão compreendidos ou são conseqüências daqueles
princípios. É a marcha do espírito geral ao particular (D’ÁVILA, 1954a, p. 147).
Mais genericamente pode-se enumerar ainda: “O método expositivo, método
interrogativo, método da redescoberta, método analítico, método sintético e o método
experimental, ao qual D’Ávila também se dedicou a dar maiores detalhes. O Expositivo,
centrava-se na exposição oral e escrita do professor; o interrogativo, limitava a uma rotina
de pergunta e resposta, também conhecido por dialogal; o da redescoberta partia do
pressuposto de que cada aluno era um cientista em potencial bastando apenas que fosse bem
dirigido; quanto ao analítico, assentava-se na idéia de decomposição da atividade para que a
análise pudesse ser efetuada por comparação. No que toca ao método sintético, efetuava-se a
partir do estudo que a análise havia separado, organizado e sintetizado; por fim o método
experimental, que consistia em provocar o aparecimento de fenômenos determinados, de
acordo com o interesse do observador (1954a, p. 148).
Mas, ainda que o método atuasse como um instrumento de ordenamento do processo
didático, eram apresentadas à normalista algumas diretrizes sobre o uso das “lições”. Nesse
sentido, “aprender”, significava aceitar e fixar, na memória ou no hábito, um fato ou uma
habilidade. De outra parte, “ensinar” consistia em doutrinar tais fatos, conceitos e habilidades.
Portanto, conforme explicou D’Ávila (1954a) o ciclo era simples: o professor prelecionava,
marcava a lição e tomava no dia seguinte. Os livros eram feitos adrede, em lições. O
programa determinava o período de vencimento das lições (p. 153). Dentre as propostas
teórico-modelares de lições disponíveis na época, pode-se enumerar: os passos formais de
Herbart; os passos formais de Gaudig; processo de trabalho de Rude; os passos da lição de
145
Sallwurk; o tríplice processo de aprender de Lay. (p. 153 – 154). No entendimento de
Claparède, uma lição não deve ser mais que uma resposta que a criança formulará com maior
avidez na medida em que tenha sido estimulada a elaborar questões que lhe dizem respeito.
Dewey, por sua vez, esclarece que, talvez, a única forma de preparar a lição será quando o
objeto a ser aprendido suscita necessidade de uma explicação, apresenta uma particularidade
inesperada, perturbadora. (apud D’ÁVILA, 1954a, p. 157).
Outro método importante é o do ensino por projeto. A idéia do “método de projeto”,
conforme informou Aguayo (1935), era tão velha quanto o próprio homem, como por
exemplo, a idéia e efetivação de uma viagem. Mas a forma de ensinar uma matéria por meio
de projetos aplicados sistematicamente era relativamente nova, datava dos primeiros anos do
século XX e difundiu-se a partir dos Estados Unidos.
Quanto ao conceito de projeto didático – disse Aguayo (1935)
É o recente o uso do método que examinamos e é tão grande a rapidez com que se
tem desenvolvido e difundido nas escolas norte-americanas que seus partidários, hoje
muito numerosos, não chegaram a um acordo sobre a significação do termo que o
exprime. [...] Como diz o professor Kilpatrick, projeto é uma atividade de
preconcebido em que o desígnio dominante fixe o fim da ação girando o processo e
proporcionando a motivação (p. 88-89).
Muitos pensadores da pedagogia não aceitaram sem restrições, a noção dada por
Kilpatrick ao projeto. Na sua visão, as características que compõem um bom projeto seriam:
uma atividade intencional e bem motivada, que tenha alto valor educativo; que consista em
fazer algo; direcionamento para os próprios alunos e utilização de um ambiente natural.
D’Ávila (1954a) argumenta que essa metodologia esbarra-se na distribuição do tempo escolar
denominado por ele de tradicional. Protesta ele ao caracterizar o horário escolar de “mosaico”,
ou seja, de matérias discriminadas por dias e por minutos. (p.355). Essa cultura do tempo
escolar cultivada pelas escolas brasileiras e sustentada por um regime nutrido pelo Estado,
conforme destaca o autor, localizava o trabalho didático entre considerações econômicas e de
tempo. (p. 355).
Indagando-se acerca de conteúdos que a escola poderia colaborar para incutir na
sociedade, Moreira (1960) levantava questões ligadas a “valores humanos”. Na sua
perspectiva, através das práticas escolares como a execução de projetos, propagar-se-ia os
chamados “valores mais gerais” como, Justiça, Direito, Paz etc. A escola levaria os alunos a
compreender que, a cada momento, estamos sujeitos a contrariar os nossos próprios ideais, a
não cumprirmos com o que se tem por direito, a desobedecermos aos nossos próprios
146
critérios de justiça. (p. 335). Para o autor, entre as estratégias a serem adotadas como práticas
que difundiriam tais valores, destacavam-se “as assembléias e reuniões escolares”, isto é:
exercícios através dos quais, toda a escola, as classes agrupadas ou departamentos se
reúnem, para participar de atividades integradas, que são de interesse e de valor
para todos os que estão na escola, professores e alunos, e que o poderiam ser
realizadas com economias e eficiência, por grupos isolados em sala de aula. A
palavra integração, que diz respeito a este tipo de atividade global de escola,
significa principalmente a combinação de duas ou mais linhas de esforço, de modo tal
a fazer com que elas funcionem com uma simples e única ação para a realização de
objetivos mútuos (MOREIRA, 1960, p. 337).
Nesse contexto, quais poderiam ser os objetivos proposto em relação a essas práticas?
As assembléias ou reuniões envolvendo o corpo discente da escola, conforme dizia Moreira
(1960), permitiria uma relação melhor entre os diferentes grupos de idades, levando-os a uma
cooperação mais efetiva, mais compreensiva, evitando-se, assim, os possíveis e diferentes
conflitos que podem acontecer dentro da sociedade constituída pela escola. (p. 338). Além
disso, menciona ele que as festas e comemorações escolares, as quais ofereciam uma razoável
oportunidade para a execução de um projeto que colocaria em situação de colaboração
professores e alunos para, por exemplo, organizar todo o plano da festa escolar. (p. 339).
Seria considerável ponderar que a expressão “festa”, conforme denominou Ferreira (2001, p.
344) poderia significar “reunião alegre para fim de divertimento; solenidade; comemoração;
dia santo; regozijo, alegria; momento em que tudo está dando certo”. Assim, a escola
assegurava um leque amplo de possibilidades festivas.
Por outro lado, sem utilizar a dimensão da festa como estratégia para a prática do
ensino, situação na qual poderia ser explorada a capacidade de fala de todos envolvidos,
resultando num ambiente com elevado ruído, diz o “Caderno de Educação”: Porque a Escola
Moderna atenção ao ouvir? (1964, p. 6). Na opinião apresentada no impresso, produzido
pelo INEP, era fundamental que o professor, na sua lida diária com o ensino, sobretudo
quando praticado em escolas primárias, ressaltasse a importância de ouvir, pois, esta
habilidade sensorial humana, sempre foi grande através dos tempos, cresceu ainda mais no
mundo moderno, acompanhando o progresso da civilização, que exige ouvintes mais atentos
e analisadores. (p. 9). Conseqüentemente, o professor tinha a tarefa de ajudar a criança a
dar” o primeiro passo para se tornar um bom ouvinte, isto é, levá-la a adquirir consciência
dos sons ao seu redor. (p. 17). Como podemos ouvir melhor? Respondeu-se no caderno: 1.
Ficando em silêncio; 2. Falando um de cada vez; 3. Olhando para quem fala; 4. Prestando
147
atenção; 5. Pedindo licença para falar; 6. Não interrompendo; 7. Não fazendo outra coisa; 8.
Não perturbando a atenção do colega. (p. 19).
Outra maneira de se identificar um bom professor, ou melhor, aquele que dominava
eficientes métodos didáticos,
como detalhou o texto em
questão, seria:
Bons professores são bons
ouvintes também. Ouvem o que as
crianças têm a dizer, encorajam-
nas a falar sobre suas
experiências. Chegam, assim, a
conhecer e compreender melhor
as crianças – suas necessidades,
suas opiniões, seus interesses e
idéias. Descobrem em cada aluno
um ser humano diferente de todos
os demais e ganham recursos
valiosos para dirigir as conversas
de classe (p. 21)
Por essas razões,
tornavam-se importantes as considerações objetivadas pelo professor no que se referia às
manifestações orais dos alunos que, por assim dizer, explicitam suas idéias, pois, essas
deveriam ser comentadas e introduzidas no corpo da aula pelo professor (p. 21).
Difundiu-se, na época, a idéia de que uma maneira de se aplicar a técnica de “bem
ouvir” podia ocorrer a partir do momento em que as práticas de ensino assumissem o trabalho
em grupo como uma de suas faces econômicas e eficientes. Nesse sentido, conforme
justificou Moura e Lopes (1964) em bibliografia intitulada “Trabalhos com grupos na Escola
Primária”, o trabalho com grupos é uma das técnicas mais importantes (p. 8) na Escola
Primária moderna. Lembram essas educadoras, que eram basicamente incipientes obras em
português sobre tal prática; daí a necessidade de se escrever o livro para professores
primários. De início, cabia ao professor a identificação das diferenças individuais dos alunos
de sua classe para então tramar as estratégias mais apropriadas para as situações de ensino-
aprendizagem. (p.14). Seria comum a essa prática conversas, discussão, planejamento
cooperativo, trabalho de equipe e avaliação cooperativa como os tipos de processos de grupo
usado na Escola Primária” (p.59).
Ao invés de decidir sozinho na sala de aula, de acordo com Moura e Lopes (1964), o
professor deveria dar oportunidades (p. 61) para a turma trocar idéias e opiniões e fazer
escolhas. Com isso, ele criaria situações que exigiriam debates. Delas, portanto, poderiam
Ilustração 15 - acima: Normalistas em aula (Acervo - Conselheiro Mata)
148
participar todos os alunos ou então um pequeno grupo. Eis algumas dessas situações,
mencionadas pelas professoras:
a)
Estabelecimento de regras de conduta e normas de trabalho;b)Realização de
excursão, de entrevistas, de experimentação ou de reunião de auditório;
c)Organização de biblioteca, de jornalzinho de classe ou de uma exposição;
d)Decoração da sala para oportunidades especiais; e)Obtenção de algum material
para a turma; f)Estudo de assuntos surgidos de Unidades e Experiências e outras
atividades de classe; g)Apreciação de livro lido, de história narrada, de poesia ou
canção e de trabalhos realizados; h)Organização de dados coletados para estudo
(p. 61).
Assim, o professor, inicialmente, assumiria função destacada. Ou seja, nos primeiros
instantes da atividade, deveria ocupar o lugar de liderança e, com o tempo, transferí-la para os
próprios alunos. Segundo afirmam as autoras, as crianças, com o decorrer do tempo,
desenvolveriam habilidades de participação e quando essas já tiverem maturidade social
suficiente para dirigir uma discussão, o professor deve dar-lhes essa oportunidade,
estabelecendo, com antecedência, as regras que deverão guiá-la. (p. 62).
Idéias como as que foram discutidas acima estavam em alta nos anos de 1960. Isso
pode ser constatado, principalmente, pelas teses que vinham dos Estados Unidos, pois parte
considerável das referências utilizadas por educadores brasileiros era originária desse país.
Dentro dessa linha de estudos, a Missão Norte-Americana de Coordenação Econômica e
Técnica no Brasil USAID”, em 1964, fazendo uso do emblema “Aliança para o Progresso”,
publicou a obra de William B. Ragan, professor da Universidade de Oklahoma, cujo título era
– “Currículo Primário Moderno”. Para efeito de análise, Le Goff (2003) em “História e
Memória” escreveu que na segunda metade do século XX, generalizou-se no Ocidente a
noção de modernização que, conseqüentemente, difundiu-se no chamado “Terceiro Mundo”
incluindo a América do Sul. Passou-se a atribuir ao termo “moderno” o sentido de “coisa
elevada”. Essa idéia, segundo observou o autor, nasceu do contato com o ocidente. (p.173). A
modernização cobra a ação de modernizar. Quem modernizava o currículo primário? O
professor Norte-Americano, na quarta página do seu livro escreveu como subtítulo
“Necessidade de Aperfeiçoamento do Currículo” – em que dizia:
A escola, como outras instituições sociais, é influenciada de tal forma pela tradição e
pela rotina, que se faz necessário persistente esforço a fim de manter seu programa
em harmonia com a vida de uma sociedade que, rapidamente, vem se modificando. Os
restantes capítulos deste livro sugerem várias mudanças para o currículo da escola
primária, da maior parte das comunidades. A necessidade de fazer um melhor uso das
coisas que sabemos sobre as crianças, de fazer da sala de aula um laboratório para a
vida democrática... (
RAGAN, 1964, p. 5).
149
outras sugestões, na mesma página, que elucidam a necessidade de melhorar o
ambiente da classe, de prover materiais eficientes de aprendizagem, de desenvolver melhores
procedimentos para o trabalho com os pais. Além de dar maior ênfase à higiene mental nas
práticas educacionais, o autor propôs empregar mais adequadamente as conclusões de
pesquisas sobre o ensino das matérias escolares e desenvolver um programa de avaliação do
progresso do aluno. Portanto, na sua visão, seriam alguns dos caminhos para melhorar a
escola primária aqui explorada. (p. 5).
A problemática sobre a prática do ensino, nesse período, recaiu sobre o que se pactuou
chamar de “processos tradicionais de ensino”. Como se vê, a metáfora sugere uma
classificação das práticas de ensino que historicamente vinham sendo executadam no Brasil.
Ragan (1964) evidenciou que essas “práticas tradicionais” centravam-se basicamente no
conhecido método de recitação” o que, na sua teoria, constituía-se num recurso “mal
apropriado” para se atingir os “objetivos da cidadania democrática”. (p. 130). Aconselha
ele uma transformação, afirmando que se a escola primária deve cumprir sua missão como
linha avançada na democracia, deveria trazer os métodos democráticos para a sala de aula.
(p. 130)
A partir dessa tese, passou o professor a objetivar princípios dos quais que os
professores deveriam, ao menos, tomar conhecimento, uma vez que esses estavam afinados
com a “mais recente psicologia da aprendizagem” (p. 131). Em outras palavras, existia uma
psicologia não recente e que não era, em sua opinião, eficiente para as características daquele
momento histórico. Eis alguns dos ideais formulados pelo professor americano e defendidos
no Brasil pela “Aliança para o Progresso”:
1. o método deve utilizar os atuais interesses dos aluno e estimular o desenvolvimento
de interesses futuros;
2. o todo deve oferecer oportunidades para o desenvolvimento de habilidades
latentes nos alunos;
3. o método deve utilizar oportunidades para a aprendizagem através do uso de
materiais concretos;
4. o método dever oferecer condições para o desenvolvimento das habilidades básicas
mediante seu uso em situações significativas.
5. o método dever prover experiências intimamente ajustadas ao nível de maturidade
dos alunos;
6. o método deve refletir uma compreensão do amplo conceito de aprendizagem com
modificação da conduta (RAGAN, 1964, p. 131)
Por essas idéias, o professor esclarece que se tratava de uma prática de ensino que se
descolava da “instrução e do professor”, (no sentido herbartino do termo) para se focar no
aluno como “protagonista”, de certa forma, de sua própria educação.
150
Três anos depois que a Escola Normal conheceu as idéias do professor Norte-
Americano, foi a vez de se discutir a teoria pedagógica de outros dois norte-americanos. Em
1967, foi publicado o livro de John U. Michaelis e Enoch Dumas, da Universidade da
Califórnia, traduzido pela professora primária Leonice Bezerra Moura: “A Escola Primária:
princípios gerais e direção de classes”. A obra, já no seu prefácio, preconizava que as
características do nosso tempo davam lugar especial ao aperfeiçoamento da educação
primária. Tais características eram a luta por igualdade de oportunidades encetada no mundo
inteiro por milhões de pessoas de diversos grupos e a invenção, produção e distribuição de
uma enorme variedade de mercadorias e utilidades. (p. 3). No parágrafo seguinte, os autores
deixam claro que os programas de Prática de Ensino deveriam compartilhar a
responsabilidade de ajudar rapazes e moças a compreender as necessidades de todas as
pessoas e a aprender a usar, inteligentemente, o desenvolvimento técnico que se avançava
naquele momento.
Os professores americanos categorizavam ainda outros itens que julgavam de
importância para o professorado exercitar; tais como: estudar a comunidade, proporcionar
um programa bem dosado, fazer plano eficiente, tornar o conteúdo significativo,
proporcionar trabalho individual e de grupo, providenciar um bom ambiente para a
aprendizagem. (MICHAELIS e DUMAS, 1967, p.3-6). A psicologia moderna passou a
centralizar o interesse no aluno, o que tornou a atividade do professor mais complexa, pois
tais princípios não eram “cobrados” dos professores desde o tempo em que prevalecia o
chamado “ensino tradicional”.
Para Carvalho (1969) em “O Ensino por Unidades Didáticas” começava a haver uma
remodelação do ensino secundário, no nível de formação de boa parte dos professores no país.
Numa avaliação da obra, disse Teixeira, no prefácio:
Num
país em que pouco se soube de Herbart e em que ensinar o passou ainda da
situação de memorizar, para exame, fragmentos desconexos de conhecimentos,
experimentarem os recursos recomendados por Morrison para ensinar as “matérias”
do curso secundário, com ênfase em unidade, organização do conhecimento e
integração, é novidade tão grande, que me custa acreditar.
Segundo Carvalho (1969), o professor Morrison da Universidade de Chicago, que fez
carreira no final dos anos de 1920, defendia a necessidade de haver por parte daqueles que
gerenciam o ensino, a partir de técnicas distintas, uma lógica que denominou de uma
organização intrínseca do material. Em outras palavras, para que tal organicidade fosse
atingida de forma a caracterizar a unidade. (p. 6) seria necessário, portanto, que a experiência
151
a ser vivida e os assuntos a estudar fossem suficientemente amplos e ricos para serem
importantes na vida do aluno e bastantes homogêneos para constituírem uma totalidade
coerente. (CARVALHO, 1969, p. 6).
Segundo Miller, citado por Carvalho (1969), o professor, ao adotar o método, deveria
entender a unidade da seguinte maneira:
1) Fase de levantamento do problema, em que o professor apresenta aos alunos um
problema, que lhes deve despertar interesse e o desejo de resolvê-lo. Esse
problema, de preferência, deveria ser descoberto pelos próprios discípulos, sob a
orientação do mestre, mas raras são as ocasiões em que há essa situação;
2) Fase de direção do estudo, na qual os alunos se empenhariam em diferentes e
construtivas atividades, todas elas visando a solucionar o problema. Haveria
aqui predominância das atividades individuais em relação às de grupo.
(CARVALHO, 1969, p. 39).
Nessa segunda etapa, conforme caracterizou a autora, cumpria ao professor a tarefa de
manter os alunos por uma ou duas semanas dedicando-se a solução do problema de forma
estimulante. Ao final, ao professor reservava-se o dever de verificar a qualidade da
aprendizagem, que poderia ser feita por prova, tipo teste ou sob a forma de trabalhos
redigidos e ilustrados pelos alunos. (p. 39). Por essa prática, teria o professor informação
sobre a eficácia ou não do desempenho em relação ao problema proposto. Então, partia-se
para a fase de organização e unificação, em que os conhecimentos adquiridos na fase
anterior seriam discutidos em situações socializadas e através das quais os alunos
integrariam a aprendizagem relativa à unidade, enriquecendo-a com aplicações práticas. (p.
39).
Carvalho (1969) registrou que o plano Miller, um entre os vários possíveis no que diz
respeito à didática por unidades, dava condição de centralidade às unidades e às propostas que
se apresentavam sobre a forma de problemas, pois acreditava que a essência do ensino por
unidades era constituída por atividades criadoras. (p.39). Assim, o problema representava a
atitude mental mais adequada para desencadear um processo de prática de ensino, no qual a
criação funcionava como “combustível” para que todos os esforços materiais e técnicas
utilizadas convergissem na direção da solução do problema anteriormente posto.
Oliveira (1973) lembrou que a didática, desde o século XVIII, passou a se apresentar
de forma dualizada, isto é, houve a distinção entre didática nova e antiga. (p.3). Essa
diferença ganhou uma face mais clara quando se tentava inventariar entre as duas perspectivas
os conceitos de objetivos, professor, aluno, matéria, método, processos, técnicas e
procedimentos. (p. 3).
152
Concordando com o professor Luis Alves de Mattos citado por ela (OLIVEIRA, 1973,
p. 133), método didático seria a organização racional dos recursos e procedimentos do
professor, visando a conduzir a aprendizagem dos alunos aos resultados previstos e
desejados. (p. 133). Como princípio didático conceituou a professora:
Ordenação dos dados da matéria e dos meios auxiliares; de adequação à capacidade
dos alunos; de economia (atingir os resultados da maneira mais rápida e econômica
sem sacrificar a qualidade do ensino e da aprendizagem); de orientação dos alunos
nas atividades; de finalidade; ou seja, de colimação de objetivos definidos e mantidos
sempre em foco na consciência do professor e dos alunos (OLIVEIRA, 1973, p. 133).
Em síntese os “elementos básicos” do método didático são, conforme denominou
Oliveira: a) linguagem didática; b) meios auxiliares e material didático; c) ação didática
(p.133) Além disso, o método didático comportava algumas características fundamentais, na
opinião da pedagoga, a saber: a) deveria este ter simplicidade e naturalidade; b) ter
flexibilidade; c) ter praticidade e funcionalidade; d) permitir economia de tempo e esforço
para promoção do aprendizado; e) ser progressivo e acumulativo, de maneira que “cada etapa
do trabalho” completaria e consolidaria a anterior e confeccionaria o terreno para a etapa
seguinte; f) educativo, isto é, não institrui apenas os alunos, procura formar hábitos
proveitosos, atitudes, saídas, idéias superiores, ideais” (1973, p. 133).
Nesse trabalho, a autora defendeu a tese de que “o método didático psicologizado”
(do tipo defendido pela escola ativa) vinha “perdendo terreno para o método lógico” que o ia
substituindo (p. 133).
Com tal exposição, a professora levaria ao entendimento das normalistas as noções
básicas, a partir das quais deveriam se nortear a respeito da rotina prática do ensino. Além
disso, e o que é curioso, centrava-se no fato de a professora decretar, em sua publicação, a
crise do movimento pedagógico de influência psicológica, do qual a Escola Normal de
Conselheiro Mata, como também todo edifício teórico, metodológico e prático da Fazenda do
Rosário estavam fundamentados. O fato de essa obra habitar o acervo do CDPHA (2006)
estimula, no mínimo, a se imaginar que, no final dos anos de 1960, os “ventos” teórico-
práticos, vinham mudando de direção no interior desses estabelecimentos. Nas palavras de
Oliveira (1973): “a nova didática se oporia à didática da chamada escola antiga. Convém,
entretanto, que se entenda que as expressões nova e antiga não têm simplesmente, uma
implicação temporal, não representam especificamente a escola de hoje e a de ontem”. (p. 3).
Por tal argumento a professora sugere o aprofundamento do debate em torno dos
conceitos “novo” e “antigo” no campo educacional, bem como intuiu descobrir, de certa
153
forma, o “véu” de pré-conceito em torno do conceito de antigo que, entre outras
caracterizações, costuma assumir o significado de superado, em desuso, obsoleto, entre
outros.
Não foi, portanto, a partir das idéias de Oliveira que as práticas de ensino elaboradas
sobre influência da “Escola tradicional” (FUNDAÇÃO HELENA ANTIPOFF, 1984, p. 35)
passaram a orientar as técnicas de ensino aprendizagem nos anos de 1980.
A fundação Helena Antipoff em 1984, noutra perspectiva, publicou, na sua edição,
a obra “Didática Geral”, na qual figurava um quadro-paralelo cujo formato assim se
apresentava:
Na Escola Tradicional
Na Escola Moderna
Passiva aprendizagem automática
sem reflexão, com base na
memorização.
Aluno
Centro do trabalho escolar. Ativo;
aprendizagem reflexiva.
Autoridade Máxima que impunha
o ensino em função da matéria
programada.
Mestre
Personalidade de orientação da
aprendizagem; elemento
vitalizador do ensino.
Lista de assuntos de valor absoluto
e autonomia, a que os alunos
deveriam sujeitar-se.
Matéria
Organizado em função das
necessidades e da capacidade real
do aluno; matéria seleciona,
programada e dosada de acordo
com os objetivos propostos.
Ensino ministrado de acordo com a
preferência do professor
Método
Ensino orientado conforme as
necessidades e possibilidades do
aluno (Fundação Helena Antipoff,
1984, p. 35).
Teórico, sem relação com o
trabalho escolar, visando apenas o
conhecimento.
Objetivo
Diretriz segura à ação docente;
caracteriza os produtos da
aprendizagem.
Quadro 7 – Elementos básicos de Didática: Aluno, Mestre, Matéria, Método, Objetivo.
Fonte: Fundação Helena Antipoff, 1984, p. 35.
Pode-se inferir visualmente certa horizontalidade entre a educação tradicional e a
Escola Moderna. Entretanto, a se julgar pelas expressões que foram usadas para caracterizá-
las, é possível notar uma significação mais sugestiva em favor da Escola Moderna, sobretudo,
ao se observar que a primeira palavra do esquema comparativo, do lado da Escola Tradicional
é “Passivo”. Esse termo passou a conotar uma técnica de ensino no qual o aluno era tratado
154
como receptor, reagindo apenas como um “ser aderente” às matérias intelectuais a ele
oferecidas.
Por outro caminho, ao abordar o sentido de Moderno, Le Goff (2003) inferiu que os
antigos são os defensores das tradições, enquanto os modernos se pronunciam pela inovação.
(p.173). Portanto, os defensores da Escola Moderna, influenciados pela psicologia,
acreditavam que a inovação da didática passaria, dentre outras transfigurações, pela
substituição da categoria passiva. Provavelmente, esse termo era usado pelos psicólogos
educacionais para nomear a situação do aluno perante os métodos da escola dita tradicional.
Em contrapartida, preferiam utilizar a categoria ativo, na qual o aluno era descrito como uma
figura atuante no método e no processo de sua própria aprendizagem.
4.4 Clube Agrícola: uma formação científica para a prática de uma nova agricultura
Aqui nesta modestíssima chacrinha [...] Neste prédio terão os alunos a sua morada,
sua escola, sua cozinha, biblioteca, seus clubes, teatro, suas oficinas, hortas,
pomares, campo e sua capela.
Antipoff, 1949.
A finalidade do Clube Agrícola é fazer com que os meninos amem a terra e aprendam
a cultivá-la, obtendo a subsistência sua e de sua família.
Dr. Inar Fóscoro, 1954
19
.
Vê-se, pois, nas palavras acima, visões convergentes acerca da palavra “clube”
agrícola, como um instrumento de renovação da prática educativa. Um elemento considerado
necessário à escolarização rural na concepção das duas autoridades, conforme destacaram
D.Helena Antipoff, diretora técnica da Escola Normal Rural, e o Dr. Inar Fóscoro, membro da
Federação de Clubes Agrícolas. Ambos desejavam que essa instituição escolar cumprisse seu
papel. Suas figuras profissionais estavam envolvidas num plano ambicioso de gravidade
elevada que, no fundo, buscava concretizar ações que transfigurassem a forma e o volume
assumido pelo êxodo rural, de acordo com dados estatísticos do momento.
Ao argumentar sobre o problema da educação rural, o Dr. Inar debateu no seu
pronunciamento que somente a alfabetização do rurícola não era suficiente para a solução da
corrida do êxodo. Segundo suas análises, aqueles escolares que foram somente alfabetizados,
mais tarde, acabariam fugindo para a cidade. (FUNDAÇÃO HELENA ANTIPOFF, 1978, p.
11). Antipoff emitiu sua opinião sobre o Clube Agrícola, ao dizer que ele deveria ser
19
Membro da Federação dos Clubes Agrícolas citado pela Fundação Helena Antipoff, 1978, p. 10.
155
“desenvolvido” e conectado à cooperativa de consumo para artigos relacionados com
agricultura e criação de pequenos animais, etc. ([1947] 1986, p. 72). Fica então a pergunta:
como se organizou o Clube Agrícola na Escola Normal? Qual a sua relação com a formação e
especialização da professora rural?
De acordo com Aguayo (1935), essa idéia (ensino dos trabalhos manuais) aparece já
no século XVII, nos escritos pedagógicos de Lutero e Montaigne. Serviriam, entre outras
coisas, para
manter os numerosos orfanatos que se estabeleceram na Europa central ao terminar
a guerra dos Trinta anos, se explorou-se o trabalho das crianças. As ocupações
escolhidas para esse fim não tinham caráter pedagógico. Visavam somente a
conquista de fundos com que fazer face às despesas desses asilos (p. 383).
Destacou, além disso, que a “escola nova” acabou por somar na disciplina o princípio
do trabalho livre e produtivo (p. 383). Explicita ele que a categoria “livre” dizia respeito ao
fato dos alunos terem o direito de escolher dentro de certos limites o objeto de seu trabalho, o
material e a técnica aplicáveis a suas atividades. (AGUAYO, 1939, p. 384). Portanto, na
escola primária”, esclareceu Aguayo:
O trabalho manual é fonte de conhecimento e meio de expressão e deve estar unido
organicamente a todas às outras matérias escolares. Tem relações muito estreita com
o trabalho manual o ensino globalizado, a geometria, a física, a química, a história
natural e a geografia. Menos unidas a ele estão à história e a aritmética; e finalmente
têm poucas afinidades com o trabalho manual a literatura, a moral e outras matérias
de caráter normativo (AGUAYO, 1935, p. 384).
Com efeito, a teoria apresentada pelo teórico coloca a idéia de trabalho manual como
uma “matéria-meio”, “flexível”, que poderia ser introduzida juntamente com outras matérias,
pois funcionava como elemento auxiliar e estimulante da tão falada atividade do educando.
Em 1955, a “Fazenda do Rosário”, através de um documento nomeado “Ante-projeto
de Granjas Escolares”, propõe a criação de uma série de instituições escolares. A saber:
1. Clube Agrícola 7. Centro de Comemoração
Cívicas
2. Clube de Saúde 8. Corporação de Arte
Populares
3. Cantina Escolar 9. Teatro de Bonecos
4. Clubes de Donas de Casa 10. Grêmio Musical e Côro
Orfeônico
5. Museus e Grêmios de Amigos 11. Associação de pais e ex-
alunos
6. Bibliotecas e Hora de História 12. Clubes Esportivos e de
Excursões
20
20
Documento avulso, p. 6.
156
Embora esse documento não seja uma evidência da existência concreta desses espaços,
vale citá-lo apenas como uma indicação dos planos cogitados para a estruturação da escola
rural transformada, como queria Antipoff (1949), em “escolas-granjas” ou granjas escolares.
Não foi por acaso que a Fazenda do Rosário, por muito tempo, publicou o folhetim
pedagógico cujo nome curiosamente era “Granjinhas”. (CDPHA, 2006). No rol de instituições
escolares acima citadas, fica claro que o Clube e o Grêmio eram consideradas categorias
pedagógicas de destaque, no que diz respeito à prática de trabalhos manuais. Isto porque esse
trabalho tanto poderia ocorrer no “Clube Agrícola” como no “Teatro de Bonecos”. Como a
idéia era elevar o valor pedagógico do “pensar com as mãos”, segundo Antipoff, a todas estas
formas de atividade dar-se-á valor educativo máximo, com vistas a produzir habilidosos
artífices. (1949, p. 4).
Ao vasculhar o arquivo da Escola Normal D. Joaquim percebe-se que, uma das
reminiscências documentais existentes em maior quantidade são os livros de ata das reuniões
do Clube Agrícola que existiu nesse estabelecimento. Por conta disso, avolumou-se, por assim
dizer, a necessidade de se entender como ele se
constituiu e qual sua relação com a especialização da
professora rural.
Na investigação sobre sua organização,
descobriu-se que seu patrono “Roberval Cardoso” era
o autor do livro “O Ensino de Desenho na Escola
Rural” (1950), outrora citado. Na verdade, tratava-se
de Roberval Polípio Nogueira Cardoso, técnico de
Educação Rural, publicado pelo Ministério da
Agricultura em 1950. O Ministério da Agricultura
havia criado um setor chamado “Serviço de
Informação Agrícola”, que trabalhava com
publicações de livros, tendo criada uma série chamada
“Clubes Agrícolas”. Entre os títulos publicados até
1952 figuravam:
J. Pinto Lima. Clubes Agrícolas (1949); Dantes Costa. A criança as atividades
agrícolas e alimentação (1946). J. Pinto Lima. A educação primária nas zonas rurais
do Distrito Federal (1947); Luiz Gouvêa Laboriau. O Brasil precisa de cooperativas
escolares (1943); Guaraci Cabral de Lavor. Exposições escolares (1947); Joaquim
Amaral. Cooperativismo escolar (1948); Gaston Durval. Classificação das ciências
Ilustração 16 – acima: capa do boletim
”Escola Rural”, impresso propagador de
várias experiências pedagógicas realizadas
nas Escolas Normais Rurais (Acervo –
CDPHA).
157
agrícolas (1949); Leonam de Azevedo Pena. Jardins (1950), Hortas (1950)
(CARDOSO, 1952, p. capa).
Além dessa série, a Secretária de Agricultura havia publicado também a “Série
Didática” da qual foram postos em circulação 11 títulos. Destaca-se o fato de todos os títulos
terem sido publicados após 1946, o que sugere uma ruptura no comportamento da Secretaria
após a crise do Estado Novo. Com efeito, é necessário ponderar que essas informações foram
colhidas nas “orelhas” do livro “Grêmio para o Meio Rural” (1952), escrito pelo patrono do
Clube Agrícola da Escola Normal de Conselheiro Mata, o técnico Roberval Cardoso.
Outro ponto a ser apresentado é o fato de as alunas da Escola Normal terem tido
contatos pessoais com o professor Cardoso. Isso pode ser constatado a partir do diário, do dia
4 de novembro de 1950, no qual a “escriba” Maria Piedade Santos registrou, entre outras
coisas, que o fato mais agradável foi à chegada de Dr. Roberval [...], quando voltamos (da
aula de agricultura) tivemos a grande surpresa de encontrarmos o Dr. Roberval técnico de
educação rural. (p. 3). Observava ela no diário que o professor havia se encaminhado para a
escola a fim de dar algumas aulas de agricultura, desenho na escola rural, museus escolares,
etc. (p.3). Dr. Roberval descreveu a aluna: nos dirigiu algumas palavras animando-nos e
prometendo ficar aqui 7 dias. Achamos muito pouco. Mas ele disse que D. Helena quer que
ele vá ainda à Divinópolis e Araxá, onde deveria lecionar também. (DIÁRIO, 1950, p. 3).
Através desse depoimento pode-se perceber que o “Dr. Roberval” gozava de certo
prestígio junto à Escola Normal, sobretudo, da confiança da professora H. Antipoff. Mas,
enfim, o que esse técnico em educação rural tinha a dizer sobre clubes e grêmios para escolas
rurais?
O seu livro era dividido em duas partes, segundo o índice. A primeira chamada de
“Grêmios para menores” que se dividia nos seguintes temas:
I – Clube Agrícola: finalidades; Como organizar um clube agrícola; Início dos
trabalhos; Inscrição do Clube agrícola; Favores que concede o Serviço de
Informação Agrícola; Ampliação da diretoria; Boletim de inscrição e Literatura
aconselhada (CARDOSO, 1952, p. 5).
O texto sobre o Clube Agrícola, na primeira parte do livro, era dividido da seguinte
maneira: II – Cooperativo Escolar Agrícola; III – Grupo de Escoteiro e Companhia de
Bandeirantes; IV – Clubes de Saúde; V – Clube Recreativo-Desportivo; VI – Clube de
Reforma do Lar e VII Centro Social Escolar. (p. 5-6). Deve-se registrar que todos esses
tópicos foram subdivididos de forma semelhante ao texto sobre o Clube Agrícola.
158
Quanto à segunda parte, nomeada de “Grêmio para Adultos”, discorre o técnico sobre:
I – Grêmio do Interesse das Classes Rurais; II – Cooperativa Agrícola; III – Conselho Saúde;
IV Grêmio Cívico; V Grêmio Religioso; VI Clube de Caça e Pesca e Centro Social
Rural. (p. 6-7).
Ao atribuir toda essa importância aos Grêmios e Clubes escolares, fazia-se necessário
então definir pelo menos um conceito básico acerca dos mesmos. Isto foi feito, portanto, pelo
“Diretor do Serviço de Informação Agrícola, José Irinel Cabral”, num pequeno texto para a
introdução do Livro de Cardoso A função dos Grêmios no Meio Rural. Conceituou ele:
... são, realmente, instrumentos de que lança mão a educação rural democrática, ou
propriamente a educação fundamental, para cultivar o espírito de cooperação e,
conseqüentemente, contribuir para elevar o nível de vida do homem rural,
capacitando-o de seu valor e da contribuição que pode dar ao progresso de seu país.
Esses grêmios ou instituições podem ser criados com finalidades diversas:
econômicas, sanitárias, culturais, cívicas, recreativas, religiosas e também enfeixar,
em uma entidade, todos esses objetivos (CABRAL apud CARDOSO, 1952, p.
9).
Mas o fundamental nesse caso, evidentemente, era explicar às professorandas como
organizar o Clube Agrícola. No esforço e dever de empreender tal exigência da Escola
Normal em que seu nome fora elevado à qualidade de “ídolo,” Dr. Roberval disse que era
preciso, de início, explicar aos alunos o que era um clube agrícola e suas finalidades. Ele
pondera que tal palavra (clube) era vagamente conhecida no meio rural. Por isso:
a professora dirá que sua diretoria é composta por ela, professora, como orientadora
dos trabalhos e por três membros eleitos entre os alunos: Presidente, Secretário e
Tesoureiro e tantos Zeladores quantos necessários. Aproveitando o assunto será feito
um jogo: - a eleição; - chamando a atenção do “eleitorado” para as qualidades que
devem ter o presidente, o secretário e o tesoureiro e os zeladores, a fim de que haja
um critério na escola dos candidatos, em benefício da instituição. O voto será secreto,
obedecendo no cabível às normas da Lei Eleitoral do País, critério que deve ser
adotado nas eleições dos demais grêmios. A posse da diretoria deverá ser solene,
esclarecendo o coordenador, a função de cada membro e suas responsabilidades
(CARDOSO, 1952, p. 13).
Embora os autores falem de democracia, a peculiaridade desse “regime democrático”
residia no fato de a eleição ser realizada por meio do voto secreto. Assim, garantia a liberdade
dos “eleitores” em se manifestar, sem, no entanto, deixa-los constrangidos. Mas não era
essa a particularidade da “liberdade” no interior da instituição: a professora, membro eleito da
diretoria antes mesmo da eleição, teria liberdade de propor e reprovar idéias a serem
executadas pelo Clube, em consonância com as disposições demonstradas pelos demais
participantes. Dessa maneira, ficava a professora em posição privilegiada para observar seus
159
“colaboradores”. Assim, podia ela impor o olho do poder e do constrangimento, uma vez que
essa, antes de ser “colega de grêmio”, era professora das alunas.
O texto “Como organizar o Clube agrícola”, de certa forma, criava um mecanismo de
horizontalização dos elementos docentes e discentes envolvidos, pois posicionava a
professora dentro de uma organização na qual ela não deliberava unilateralmente, mas
conjugava seus interesses com os interesses dos seus alunos. Pode-se dizer que se instalava
um regime de trabalho em equipe. Ao se observar como as professoras se manifestavam nas
reuniões realizadas pelos Grêmios, nota-se que elas sempre faziam uso da “palavra aberta” ou
“palavra franca”, para fazer algum tipo de julgamento acerca de algum feito realizado
(CARDOSO, 1952, LIVROS DE ATAS DE REUNIÕES DO CLUBE AGRÍCOLA, 1956).
No ensaio sobre a primeira parte do texto, na qual Cardoso faz considerações sobre
“Grêmios para Menores”, merece destaque o que o autor chamou de Finalidades, pois ao
descrevê-las, acabou por explicitar qual seria a missão e a filosofia do, então, educador rural:
1 – Incutir na consciência de seus ofícios o amor à terra, o sentimento de nobreza das
atividades agrícolas e a idéia de seu valor econômico e patriótico;
2 Dignificar o trabalho manual, elevar e engrandecer a vocação e a profissão do
agricultor;
3 – Mostrar os perigos do urbanismo e do abandono dos campos;
4 – Desenvolver o espírito de cooperação na escola, na família e na coletividade;
5 Incentivar a policultura e proporcionar a aprendizagem de métodos agrícolas
racionais, pondo em prática os princípios da agricultura científica e demonstrando os
rendimentos das lavouras e criações bem tratadas;
6 Suscitar no espírito dos cios, especialmente meninas, a verdadeira significação
da palavra “lar”;
7 – Colaborar para o melhoramento permanente da vida rural, tornando-a mais
agradável e aperfeiçoando-a sob o ponto de vista da sociabilidade, da estética e da
cultura geral;
8 – Formar e cultivar bitos de economia e orientar os sócios sobre a melhor
aplicação de seu dinheiro;
9 Fazer a propaganda, na comunidade rural, da vivenda bonita, confortável, alegre
e higiênica, ensinando os sócios a achar belas a ordem e a limpeza;
10 – Proteger os animais e as plantas;
11 Trabalhar pelo reflorestamento, organizando o bosque do Clube em terreno que
deve ser dado pela Prefeitura ou proprietário local; preparando os viveiros que
forneçam mudas aos cios, aconselhando os lavradores a reflorestar para as áreas
de suas fazendas. Conseguido com que toda árvore derrubada seja substituída por
duas ou três que se plantam;
12 Florir as janelas das casas dos cios e realizar, todos os anos, o concurso das
janelas floridas;
13 Comemorar a 21 de setembro o “Dia da Árvore” e dedicar um dia à
comemoração anual da principal cultura ou criação local;
14 Conseguir das autoridades municipais e estaduais, bem como dos particulares,
que cooperem na extinção da saúva, e instituir, no último trimestre do ano, o “Dia da
Saúva”, para demonstração do combate à praga;
15 – Influir para que as praças, ruas e estradas da localidade sejam arborizadas;
16 Organizar uma cooperativa para a venda de produtos das plantações e criações
dos sócios;
160
17 Difundir as regras da alimentação sadia com base na boa saúde, ensinando a
apreciar o valor nutritivo dos alimentos e os processos racionais de prepará-los;
18 – Organizar uma biblioteca e um museu;
19 – Combater as queimadas, a erosão, as doenças e pragas das lavouras e criações;
20 – Enaltecer a vida e a obra dos grandes pensadores, naturalistas, cientistas,
sociólogos e homens de ação, cujas idéias e realizações tenham tido influência
decisiva nos domínios científicos, social técnico ou econômico da vida nacional
(CARDOSO, 1952, p. 12 – 13).
Pode-se destacar ainda a natureza extra-escolar que deveria assumir o Clube Agrícola.
É possível dizer que além de ser uma “peça” da engrenagem escolar, estava, ainda assim,
vinculado ao Ministério da Agricultura através das escolas rurais. Por conta disso, todo Clube
Agrícola organizado em escola rural deveria fazer uma “inscrição” no Ministério, para que
este último, como argumentou Cardoso:
tenha conhecimento do novo Clube, passando a auxiliá-lo, será pedido ao Serviço de
Informação Agrícola o seu registro, em fórmula especial, conforme modelo do qual
constarão as seguintes informações:
a) – nome do Clube;
b) – data de fundação;
c) endereço completo, inclusive o nome da Escola a que pertence ou da empresa
agrícola onde funciona;
d) – número de sócios;
e) – trabalhos já realizados;
f) elementos de que (terreno, qualidade e área; ferramentas, dinheiro, proteção
oficial ou particular);
g) nome do professor que orienta o Clube e dos sócios eleitos para Presidente,
Secretário e Tesoureiro (1952, p. 14).
Uma imagem que se criou acerca dessa proposta de Clube Agrícola diz respeito à
união de interesses entre os Ministérios de Agricultura e Educação em que o argumento
principal era elevar o nível de vida do homem rural. Para tanto, seria necessário ensinar aos
rurícolas técnicas científicas de cultivo da terra, bem como valores estéticos inspirados em
paisagens arquitetônicas antagônicas às formas das moradas rurais do elemento de pouca
posse. Uma vez feito isso, acreditava-se que estavam lançadas as bases para que o meio rural
alçasse vôo, ou seja, começasse a se deslocar para o alto, ou ainda, seria uma forma de tirar o
homem do campo, do mundo não cientificizado, supersticioso, sujo, instrumentalizando-o
para fazer uso de inteligência racional. Como diria Kant:
A ilustração é à saída do homem de sua auto-culpável minoridade. A minoridade
significa a incapacidade de servir-se de seu próprio entendimento sem a ajuda de
outro. Um sujeito é culpável desta minoridade quando a causa dela não reside na
falta de entendimento, mas na falta de decisão e valor para servir-se por si próprio
dele sem a ajuda de outro. (apud LARROSA, 2004, p. 84).
Aqui, a minoridade pode ser lida como a incapacidade do homem de dirigir-se a si
próprio com segurança e vitalidade. Ao alinhar essa idéia à interpretação que se fazia do
161
rurícola que se mudava para a grande cidade,
sem o mínimo de condições de lá se estabelecer,
entendia-se que ele não tomava decisões
acertadas por si só. Pois, segundo as opiniões
acima destacadas, a decisão mais razoável seria
mudar as formas da cultura material e manter-se
na zona rural. Assim, a “ilustração”
corresponderia aos ensinamentos a serem
inculcados pela escola através do Clube
Agrícola que levariam o rurícola a alterar sua
forma de ver o mundo. Mais esclarecido,
portanto, perceberia o valor da terra e escolheria
permanecer nela.
A ilustração da criança do meio rural
viria do serviço de “orientação técnica” que,
conforme garantiu Cardoso (1952, p. 13)
poderia ser pedida a qualquer profissional dos Serviços Agrícolas Federais, Estaduais ou
Municipais, se assim fosse necessário. Enfatizou que
logo após a posse, seriam iniciados os trabalhos de preparação do terreno destinado
à horta, pomar, aviário, etc. Ótima ocasião para o grande jogo do “puxirum,
mutirão,ou muxirão, como aula prática de nossas tradições e cultivo do espírito de
cooperação existente no nosso meio rural. As Escolas Agrícolas federais e estaduais,
bem como as de Agronomia e Veterinária, também prestarão dentro de suas
possibilidades orientação técnica e auxílios materiais (CARDOSO, 1952, p. 13).
Certos autores diziam que ao mestre do ensino na zona rural eram indispensáveis
conhecimentos de jardinagem, horticultura, pomicultura etc. Acreditava-se que o ensino da
matéria de Agricultura deveria ser confiado a agrônomos especializados e que tivessem
pendor pedagógico. (ARAÚJO, 1944, p. 315). Debatia-se também acerca do ensino de
“zootecnia”. Argumentava-se que conhecimentos elementares nesse campo eram
indispensáveis ao professor que se destinava à escola primária rural. Nessa ótica, Araújo
(1944) defendia que pelo menos um Clube de atividades rurais deveria funcionar como
instituição elementar de ensino, confiado, como disse, a um “agrônomo especializado” (p.
315).
No que concerne à Escola Normal de Conselheiro Mata, foi possível verificar a
contratação desse “agrônomo especializado” pela “Ata da Solenidade da entrega dos diplomas
à alunas que concluíram o Curso na Escola Normal D. Joaquim Silvério de Souza, de
Ilustração 17 – acima: capa do livro de Antônio
D’Ávila “Práticas Escolares” (Acervo – CDPHA).
162
Conselheiro Mata, aos cinco dias do mês de dezembro de 1954” (Livro de Registro de Atas da
Solenidade, p. 1). Segundo o texto da mesma Ata o
Dr. Ferdinando Albreclit usou a palavra e, também, volveu ao passado, lembrando-se
do convite que recebera de D. Helena para trabalhar nesta Escola e que achara
impossível ensinar Agricultura a moças. Logo, porém, às primeiras aulas, verificou o
entusiasmo das alunas e hoje pode mesmo dizer que elas foram as pioneiras.
Relembrou o trabalho desses quatro anos e falou da alegria que lhe invade o coração
pelo resultado de seus esforços. Falou também que todas partem aptas a trabalharem
mesmo pela realização de um mundo melhor.
Esse trecho informa sobre a contratação do técnico em agricultura que ministrou as
aulas vinculadas ao Clube Agrícola na Escola Normal de Conselheiro Mata, Dr. Ferdinando
Albreclit. O que ficou latente, segundo as posições do técnico, foi sua imperícia no ensino de
agricultura às mulheres, porém disse ao final que as formandas estavam tecnicamente
preparadas para ministrar aulas de Agricultura na escola primária. Foi o mesmo Dr. Albreclit
que, quatro meses antes, em 27 de agosto de 1954, ao participar de estudos e debates que
visavam elaborar um plano estratégico para a produção de mercadorias agropecuárias da
Escola Normal, a fim de levá-la a um estado de auto-suficiência, afirmou
ter a gleba das imediações do prédio grande porcentagem de areia na sua
composição e ainda, o excesso de ácido, de modo que uma grande cultura, aliás, toda
a cultura que nela se tem feito, não oferece margem de lucros (ATA DE REUNIÃO
DE PROFESSORES, 1954, p. 27).
Pode-se inferir que não houve uma pesquisa prévia sobre a qualidade da terra antes da
instalação da escola naquela região. O que sugere, entre outras coisas, pensar que a agricultura
não foi o critério mais importante para a escolha do local.
Assim, no que dependesse da produção agrícola para a auto-suficiência da escola, essa
continuaria condicionada as características da terra. Na busca de respostas à grave constatação
do técnico agrícola de uma escola que, em tese, se propusera ensinar agricultura por meio da
prática, mas que se via impotente para isso, em razão das características do solo, escreveu-se
em ata: D. Lidimanha propõe nesse caso a escolha de outra localidade, transferindo a
Escola. Logo, [...] o Pe Aleluia sugere levá-la para Couto de Magalhães, outro distrito de
Diamantina, de zona totalmente agrícola e servida de bons serviços de transporte.
(ATA DE
REUNIÃO DE PROFESSORES, 1954, p. 27).
Ao que tudo indica, houve uma crise quanto à continuidade da Escola naquela
comunidade, por conta da incongruência que emergiu do fato de não se conseguir experiência
agrícola suficiente naquela terra, segundo argumento do técnico. As sugestões de se levar a
Escola para outro lugar, reação explicitada pela diretora e pelo Padre-professor, deram-se pelo
163
“medo” de um possível fracasso da Instituição que deixaria de se tornar um espaço de
referência em “conhecimento agrícola”.
Para uma solução mais ponderada,
D. Helena e D. Cecília, entrando em acordo com D. Lidimanha, vêem a necessidade
de um estudo da gleba de Conselheiro Mata por Dr. Orlando Valverde para se ver
qual o tratamento que deverá sofrer nosso solo ou então buscar adquirir outras faixas
de terra em Conselheiro Mata (ATA DE REUNIÃO DE PROFESSORES, 1954, p.
27).
Vê-se, então, que o estudo do técnico foi importante, pois fez a diretoria decidir por
uma pesquisa mais aprofundada, realizada por um geógrafo e não por um técnico agrícola.
Essa preocupação com a qualidade da terra era considerável em virtude do programa
da matéria “Atividades Agrícolas”. De acordo com “O Programa de Atividades Agrícolas da
Escola Normal Sandoval de Azevedo” é possível inferir, por analogia, o que se ensinava nessa
matéria em Conselheiro Mata. Nas teses defendidas pelo “Programa da Agricultura Geral” era
elemento básico o “Ensino Agrícola”.
Portanto, aAgricultura Geral” deveria ser
ensinada no ano e era composta das
seguintes temáticas:
1º) Agricultura definição e objeto. Ligeiro histórico
da Agricultura. Sua importância no Brasil.
2º) Noções de clima: sua influência sobre os vegetais
– épocas de plantio.
3º) Noções de solos: formação, tipos, solo e sub-solo.
4º) Constituição, física – química e biologia do solo.
5º) Classificação prática dos solos. Padrões vegetais.
6º) A água e sua importância na Agricultura.
7º) Águas próprias e impróprias para irrigação.
8º) Irrigação: sistemas e quantidade de água
necessária.
9º) Drenagem: construção de drenos e sua
conservação.
10º) Adubação e adubos: principais causas do
esgotamento do solo. Principais adubos inorgânicos
sua aplicação. Lei do mínimo.
11º) Acidez cálcio calcário sua importância e
emprego.
12º) Adubos orgânicos: importância do húmus e da
matéria orgânica para os solos. Esterqueiras.
Curtimentos Materiais usados para produção de
adubos. Compostos orgânicos. Adubação verde.
13º) Rotação de Culturas.
14º) Preparo do solo – operação e máquinas usadas.
15º) Sistemas de plantio – máquinas e utensílios usados.
16º) Cultivar – máquinas usadas.
17º) Colheita.
Ilustração 18 – acima: capado livro de Roberval
Cardoso “Grêmios para o Meio Rural”(Acervo –
CDPHA).
164
18º) Poder germinativo das sementes (PROGRAMA DE ATIVIDADES
AGRÍCOLAS DA ESCOLA NORMAL SANDOVAL DE AZEVEDO NA
FAZENDO DO ROSÁRIO - documento avulso, sem data – Ibirité, [195?])
21
.
Pressupõe-se que o técnico agrícola Dr. Ferdinando descobriu as características do
solo de conselheiro Mata ao executar esse roteiro. O ensino de agricultura para o ano
chamava-se “Agricultura Especial” e ressaltava o cultivo de “Batata Doce e Mandioca”.
Considerava-se, ainda, importante o conhecimento da “oleicultura, sua importância e divisão
em oleicultura comercial doméstica e escolar”. No programa para o ano havia, também, os
elementos que compunham a organização de hortas. Sobre essas, mencionava o programa:
2 – Instalações da horta – escolha do terreno – Clima.
3 – Adaptação do terreno – Dimensões da horta – Drenagem.
4 – Divisão do terreno – Dimensão da horta – Preparo do terreno.
5 – Anexos da horta – Caixa de água e depósitos.
6 – Máquinas, ferramentas e utensílios empregados em oleicultura.
7 – Preparo do solo.
8 – Adubação.
9 – Sementes – A boa semente – Seleção empírica – Conservação das sementes.
10 Semeadura – desinfecção das sementes Preparo do canteiro e modo de semear
– Semeadura em caixas. Viveiros.
11 – Repicagem – transplantio e semeadura definitiva.
12 – Os tratos culturais no viveiro – Estiolamento.
13 – Classificação das hortaliças.
14 Estudos das principais hortaliças tuberosas: cenouras, nabo, rabanete, cebola,
beterraba, cará, mandioca, salsa, araruta, couve-rabano, couve-nabo, inhame,
taioba.
15 – Estudo das principais hortaliças foliáceas: repolho, acelga, alface.
16 Estudo das principais hortaliças frutos: tomates, pimentão, berinjela, vagens,
moranguinho, quiabo, abóbora, lentilha, grão de bico, jiló.
17 Estudo dos principais condimentos: coentro, manberona, erva-doce, pimenta,
salsa, alecrim, cebolinha. (PROGRAMA DE ATIVIDADES AGRÍCOLAS DA
ESCOLA NORMAL SANDOVAL DE AZEVEDO documento avulso, sem data
Ibirité [195?]).
Entre o e o ano de ensino agrícola na Escola Normal, verifica-se a mudança do
conhecimento das características do solo, no primeiro momento (1º ano) para o
aprofundamento do conhecimento de produtos cultiváveis em hortas (2º ano). Neste momento
do curso a normalista dominava informações e saberes práticos suficientes para iniciar a
organização de uma cultura de repolho, por exemplo. Nesse programa, a Fazenda do Rosário
citou “Fruticultura ou Pomicultura”, “Conservação do solo e Doenças e Pragas Vegetais”
como conteúdo temático para o ano. No que se relaciona à Fruticultura, a normalista
deveria saber:
1 – Definição de pomares.
21
Década provável.
165
2 – Formação de pomares.
3 – Pré-instalação de pomar (clima – condição do solo, topografia e fertilidade).
4 – Divisão das árvores frutíferas em relação ao clima.
5 – Fatores que influem na instalação do pomar.
6 – Obtenção de mudas – tipos de mudas.
7 – Tipos de sementes e viveiros.
8 – Canteiros de propagação – enraizamento de estacas.
9 – Multiplicação das plantas por estacas e por sementes.
10 – Sistemas de plantas. Marcação de pomares. Preparo.
11 – Enxertia. Suas vantagens. Processos gerais.
12 – Formação de muda.
13 – Arranquio e plantio da muda. Espaçamentos usados.
14 – Marcação –Abertura. Preparo e adubação de plantio.
15 – Época de plantio.
16 – Pratos racionais dos pomares (cultivos – adubações – podas – combate às
pragas e doenças – irrigação).
17 Colheita embalagem e conservação de frutos. (PROGRAMA DE
ATIVIDADES AGRÍCOLAS DA ESCOLA NORMAL SANDOVAL DE
AZEVEDO – documento avulso, sem data, ibirité, [195?]).
A Escola Normal que emergiu nos anos de 1950, aqui em questão, exigia que suas
alunas dominassem um amplo leque de conhecimento agrícola de fundamentação racional, ou
seja, um tipo de agricultura que seria possível a partir do domínio de certas técnicas e
conceitos específicos do campo da “ciência da agricultura”. Nota-se, pelo elenco de temas a
serem inculcados nas professorandas, a emergência de uma nomenclatura técnica acerca do
cultivo da horta e de frutas.
A partir dessa nova associação entre terminologia técnica e “coisas” da roça, a
população seria preparada para desenvolver com o tempo uma “nova agricultura” menos
natural e mais artificial; de subsistência, mas também de mercado, isto é, uma produtividade
em maior escala, que visasse um excedente possível de gerar divisas financeiras. O
acoplamento de “teorias agrícolas” ao ensino normal produziu uma situação nova para a
normalista, qual seja, de ter que trabalhar com a terra, de compreender a reação do solo diante
de fenômenos como desmatamento e reflorestamento e lidar com a produção de pastagem, por
exemplo.
À frente de tais novidades, a Fazenda do Rosário implementou, para o e último ano
do Curso Normal, uma programação temática dividida em duas partes, pois supunha que com
isso cobriria um rol de conhecimentos básicos sobre a agropecuária. Convém sublinhar que a
“zootecnia” era ensinada na penúltima parte do programa do ano, não aparecendo nas
séries anteriores. Na esteira desse movimento de racionalização da produção rural, a zootecnia
seria, segundo definição de Ferreira (2001), o estudo da criação e aperfeiçoamento de animais
domésticos. Segundo as palavras dos organizadores do programa das Atividades Agrícolas
para o 4º ano, este seria assim estruturado:
Silvicultura
166
1 – Definição – Finalidade – Importância.
2 – Solo.
3 – Produtos florestais naturais e cultivados.
4 – A árvore.
5 – Propagação.
6 – Sementeiras e viveiros.
7 – Alimentos.
8 – sistemas de reflorestamento.
9 – Tratamento e cuidados das florestas (naturais e artificiais).
10 – Florestas de proteção.
Parte especial: explanação ligeira das principais essências
florestais para reflorestamento.
Zootecnia
1 – Definição – Importância – Objeto.
2 – Leis gerais da Zootecnia.
3 Alimentação Forragens Relações balanceadas Fenos
e Ensilagens.
4 – Formação de pastagens e piquetes.
5 – Melhoramento de raças.
6 Fisiologia da Reprodução Puberdade Fecundação
Gestação – Parto cuidado com os recém-nascidos.
7 – Ordenha.
8 Abrigos (PROGRAMA DE ATIVIDADES AGRÍCOLAS
DA ESCOLA NORMAL SANDOVAL DE AZEVEDO
documento avulso, sem data, ibirité, [195?]).
Vê-se que o programa de ensino sobre
animais domésticos teve um foro restrito a criação de gado e, ao que parece, bovino. É
possível notar pela análise do documento, a descrição do ensino da criação de outros animais,
embora com orientações menos detalhadas sobre a criação de suíno e aves como galinha, por
exemplo. Já que a criação de animais constituia-se num valor positivo nesta Escola, noções de
“Higiene e Veterinária” também foram necessárias. Assim, o programa propunha ensinar
conhecimentos acerca de profilaxias, vacinações e noções sobre as principais moléstias dos
animais domésticos. Além disso, havia no 4º ano aulas de “jardinagem” nas quais se discorria,
entre outras coisas, sobre o comércio de flores e passavam-se informações sobre as principais
plantas ornamentais.
Na perspectiva da Fazenda do Rosário, a normalista deveria formar-se com um amplo
conhecimento da cultura da terra, seu aproveitamento e cuidado, tanto para a segurança
material daqueles que dela dependiam diretamente, como também para substituir, de certa
forma, o senso estético do rurícola pela introdução elaborada do que seria o jardim.
A. D’Ávila (1954b) trabalhou na elaboração do que chamou de “Ruralização do
Programa Mínimo para o Educandário D. Duarte”. Segundo ele, na introdução do programa,
os professores formados pelas “escolas normais comuns”, isto é, que não continham, no seu
currículo, foco em conhecimento agropecuário, como o descrito anteriormente, mas com
discussões sobre Durkheim, Koffka e a Gestalt, e outras preciosidades, estavam falhando na
Ilustração 19 - cópia fotografada da primeira
página de um diário, de 28
-4-1962. (Acervo –
CDPHA)
167
zona rural. (p. 275). Pondera que o professor era um ponto central para a ruralização e
destaca que um professor especializado no ensino para o rural ainda não existia. Ao se
vislumbrar uma “vida rural produtiva”, os internos do educandário, os internos do ano
aprenderiam sobre: a Galinha; a Vaca; o Leite; o Porco, a carne e as Gorduras; as Abelhas;
o Feijão; o Arroz e o Milho; a Batata; as Frutas; a Laranja; o Limão; a Banana; as Uvas;
(D’ÁVILA, 1954b, p. 279-285). As aulas deveriam ser no campo, onde se pudesse mostrar
aos alunos as características físicas destes produtos agrícolas. Ensinar-se-ia, ainda sobre o
preparo do Café; de Chás; do Vestuário do Algodão; da Seda; da Lã; da importância da
Água e do Sal de Cozinha. (p. 285-290).
O que se pode notar por este índice programático é que uma professora não
especializada em “Cultura rural racional”, não obteria êxito satisfatório frente às necessidades
postas pela e para escola rural. A concretização dessa aspiração por uma professora primária
especializada para o ruralismo foi descrito, portanto, num documento de mais de 160 páginas,
existente no CDPHA (2006) intitulado “Clube Agrícola”. A título de ilustração e como forma
de apontar o conteúdo do documento vale citar seu índice, que se distribui em 15 tópicos. Ei-
los:
01. Clubes agrícolas escolares.
02. Clubes agrícolas escolares rurais.
03. O Clube Agrícola.
04. Antiprojeto da granjinha escolar.
05. Horta escolar.
06. Campanha das árvores – MEC – Boletim nº. 05/58.
07. Clubes agrícolas escolares – A professora rural.
08. Setor dos Clubes agrícolas escolares rurais – Programa mensal agrícola de
janeiro, fevereiro, março, junho, agosto, setembro e novembro.
09. Ministério da Agricultura Normas para funcionamento e registro de Clubes
agrícolas.
10. Declaração da 1ª semana rural de Minas e do Espírito Santo.
11. Programa de ensino primário oficial do Estado de Minas Gerais adaptado para
aplicação através de um Clube agrícola escolar.
12. Granjinhas reunidas.
13. Curso popular de cooperativismo.
14. Projeto de Curso Complementar agrícola.
15. Relatório final
22
.
O curioso a se reparar nesta documentação, no caso do tópico 11 acima, onde se
trabalhou a adaptação do programa do ensino primário oficial para a perspectiva do Clube
Agrícola, são as peculiaridades que assumiria o ensino de aritmética. Conforme a adaptação
22
(
Clube Agrícola pasta/ relatório). Este material se encontra no CDPHA (2006), no qual foram reunidos e preservados
numa pasta, documentos que foram furados e anexados em ordem cronológica, de década de 1950-80.
168
feita, o Clube Agrícola deveria provocar na criança a necessidade de conhecimentos
aritméticos, como por exemplo: área, perímetro, porcentagem, formas geométricas,
problemas fracionários e, principalmente, as quatro operações fundamentais.
(CLUBE
AGRÍCOLA pasta-relatório
).
Dessa forma, o que evidentemente a professoranda deveria
aprender na Escola Normal especializada em ruralismo era aproveitar as oportunidades
oferecidas pelo Clube, para concretizar nas atividades do mesmo suas aulas de aritmética.
Destacava-se, na proposição que a professora deveria desenvolver, a “noção de
número até dezena; depois, até 50 e chegar a 100. “Para isso, ela deveria considerar como
referência, como apontou o documento, os “canteiros” nos quais as crianças contariam o
“número de ferramentas, o número de regadores, número de aves, produção de ovos, número
de caixotes, de abelhas, número de pés de hortaliças em cada canteiro”. Poderia a professora
sugerir que se inventariasse “o número de árvores frutíferas e tudo o mais que se pudesse
relacionar ao objetivo do ensino de aritmética na série”. “Tamanho, distância e forma”
também eram conceitos a serem desenvolvidos na série. A esse respeito deveria a
professora
aproveitar, principalmente, os canteiros, para a noção de tamanho largo, estreito,
grande, pequeno, comprido, curto. As ferramentas e outros materiais, bem como
instalações, poderão dar também estas noções e mais as de: grosso, fino, etc.
Relacionar as distâncias existentes entre as diversas instalações do Clube, dando
noções de: perto longe, etc. Focalizar os canteiros e instalações, entre as diversas do
Clube, dando noções de disposição: em frente, atrás, em cima, em baixo, à direita, à
esquerda, entre, etc. (CLUBE AGRÍCOLA – pasta-relatório).
A verdade é que, segundo a imaginação dos propositores do Clube Agrícola, esse
constituía um valioso recurso de “ação pedagógica”. Isso justificava sua “inclusão no
currículo escolar”. Entre as razões que justificavam sua existência na escola, destacava-se a
alegação de que ele atenderia ao “desenvolvimento do aluno nos aspectos físico, social e
intelectual”. Segundo Daura Estelita Marques Rodrigues, citada na “pasta-relatório”, não era
difícil apontar o que o Clube Agrícola oferecia em termos de desenvolvimento do educando.
Para ela, dentre outras possibilidades, destacam-se:
o exercício de atividades motoras, a vida ao ar livre e contato com a natureza; a
socialização no convívio, na participação e na responsabilidade de planejar e
executar cooperativamente as atividades, de trocar idéias e experiências trabalhando
em grupo e em colaboração com a comunidade; a vivência de situações concretas que
envolvam a aquisição de conhecimentos diversos e habilidades variadas, requerem
espírito de observação e de análise e resolução de problemas. Promover a melhoria
da assistência alimentar dada pela escola, contribuindo com os produtos cultivados
para o enriquecimento da merenda escolar; desenvolver o hábito de cultivar,
intensivamente e deliberadamente, recursos necessários à subsistência do homem;
169
favorecer a discriminação de aptidões e a iniciação em atividades produtivas
(CLUBE AGRÍCOLA – pasta-relatório).
Pode-se encontrar como potencialidades do Clube Agrícola algumas significações que
se assemelham, de certa forma, com o ideal da “escola ativa”, como foi dito anteriormente,
em que o fazer com a mão pode ser lido em expressões como exercitar cooperativamente as
atividades e em vivências de situações concretas; noções utilizadas pela autora que parecem
colaborar com a tese de que se aprende em ação, com o uso dos membros do corpo e do
sentidos. Portanto, as atividades do Clube faziam com que os educandos se opusessem à
ordem pedagógica vigente, ou melhor, à ordem tradicional da escola rural. A proposta do
Clube nas suas representações e esperanças conferia ao mesmo uma diversidade no seu
sistema de funcionamento e conteúdo, incluindo desde planos racionais para a vida social, até
noções de comportamento nas grandes cidades. Assim, o conteúdo do Clube mudava de
acordo com as necessidades da vida contemporânea, mas guardava sempre a mesma função
pedagógica que era “desenvolver o amor pela terra e o interesse pelo seu cultivo”.
A busca de vínculos entre escola e comunidade a partir das atividades-aula do Clube
Agrícola pode ser comprovada na “Ata do Clube Agrícola Dr. Roberval Cardoso”, de 16 de
maio de 1954, ano em que se formaria a turma de normalistas em Conselheiro Mata. Neste
dia, a aluna Maria Piedade apresentou o número intitulado Conservação do solo para uma
boa produção. (p.2). Na leitura feita, ela relatou que a conservação do solo correspondia à
adubação verde”. Terminada a leitura,
D.Lidimanha pediu licença à presidente e disse que como estavam presentes dois
moços da localidade (Conselheiro Mata) e dois de Valo Fundo que poderiam
interessar pelo referido assunto, pediu que a Maria Piedade explicasse a eles como
praticar a adubação verde e o valor da mesma (LIVRO DE ATA DE REUNIÃO DO
CLUBE AGRÍCOLA, 1954, p.3).
Maria Piedade, então, falou-lhes sobre a adubação verde e o processo de fixar o
azoto no solo”. (p.3). Essa reunião permite visualizar a forma como as alunas deveriam se
preparar para a exposição que iriam realizar, pois se encontravam à frente, tanto de colegas de
classe quanto de alunos de outras classes, sócios do Clube, professores e pessoas da região.
Desejosa em demonstrar as informações acumuladas sobre o assunto, disse em seguida a
normalista:
As plantas essenciais para esse fim são: o feijão, soja, feijão de porco, que têm
também o nome de leguminosas. Estas plantas são melhores por serem ricas de
bactérias nutrificadoras. É na época da florada e também em época chuvosa que se
faz esta incorporação. Esta plantação não é feita visando a colheita do feijão, mas
170
sim para que este deixe na terra o azoto que ele tem nas raízes, na terra (LIVRO DE
ATA DE REUNIÃO DO CLUBE AGRÍCOLA, 1954, p.3).
O mistério na apresentação da normalista estava no conteúdo oferecido que irradiava
entusiasmo pelas informações que permitiriam ao rurícola dominar conscientemente algumas
qualidades da terra. Dessa forma, a revelação de tal segredo pela “ciência escolar” tornou-se
uma estratégia que, conforme o imaginário da Escola continha a promessa de promover uma
vida nova, melhor, só que ainda desconhecida da maioria dos rurícolas. Em poucas palavras, é
possível dizer que a iniciação a uma agricultura racional que ali se processava “significava a
descoberta de um mundo novo, encoberto no interior do mundo antigo”. Vale lembrar que
noções como essas poderiam, entre outras coisas, estimular a construção de tradições novas na
paisagem agrícola regional.
4.4.1 As relações entre as Normalistas de Conselheiro Mata e o Clube Agrícola Escolar
(1940-1950)
O programa da Unesco condensa muitos dos propósitos gerais da educação
renovada: a democratização do ensino, o aperfeiçoamento das instituições por
organização racional e maior espírito técnico, a fundamentação dos objetivos gerais
da educação para a minoração de tensões entre grupos de cada povo e entre os
povos,
Lourenço Filho, 1963.
Na década de 1940, como desdobramento da Segunda Guerra Mundial, foi criado
junto à Organização das Nações Unidas (ONU), a “Organização para a Educação, Ciências e
Cultura (UNESCO)”. Inaugurada em 1946, para promover a cooperação internacional,
através do desenvolvimento tecnológico dos países, e para elevar os padrões educacionais do
mundo. (ABRIL, 1996, p.782). Portanto, pode-se ponderar que tal elevação de padrões
implicava, como fora dito no objetivo nº17 do Clube Agrícola, difundir as regras da
alimentação sadia, como base da boa saúde, ensinando a apreciar o valor nutritivo dos
alimentos e os processos racionais de prepará-los (CLUBE AGRÍCOLA; pasta-relatório).
Esse objetivo do Clube Agrícola foi publicado, também, em 1952, por Roberval
Cardoso em “Grêmios para o Meio Rural”. A tese defendida era a da racionalização do
preparo dos alimentos, conforme se acreditava na ocasião, levaria a um aliviamento das
tensões sociais, do empobrecimento e desumanização causada pela fome, pela falta de
instrumentos eficientes de produção agrícola. Assim, a baixa produção de alimentos para
171
subsistência era vista como uma “anomalia” a ser atacada pelo Clube Agrícola, por meio da
professora e da escola rural. Por isso, parte do texto objetivava difundir as regras, ou seja,
ensinar através de processos escolares medidas renovadas de lida com a produção
agropecuária que acarretassem a “minoração” dos prejuízos sociais e econômicos derivados
da subnutrição à época diagnosticada.
Devido às inter-relações notadas entre o Clube Agrícola, a Escola Normal Rural e a
Unesco, convém citar:
O artigo Preparação de pessoal para escolas primarias rurais, estudo preparado por
solicitação da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a
Cultura (Unesco), e por essa organização publicado em 1953, em francês e em inglês,
na série Problemas d’education, v.7. A edição em português foi feita em 1953,na
RBEP,Rio de Janeiro,V.20,n.52,p.61-104,out/dez.1953. (LOURENÇO FILHO, 2001,
p.6).
Esse escrito de Ruy Lourenço Filho, é parte da obra que organizou contendo textos de
Manuel Bergstrom Lourenço Filho, entre eles: A Formação de Professores: da Escola
Normal à Escola de Educação, reunião de artigos do educador, publicados entre 1920 a 1960.
Esses escritos explicitam sua relação com os princípios da Unesco e da escola Normal Rural
no Brasil, simultaneamente. Segundo Costa e Xavier (2004), Lourenço Filho era membro, no
início dos anos de 1950, do Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura da Unesco
(apud Boletim CDPHA, p.181-182). Xavier ressalta que ele havia sido um dos mentores do
Instituto Superior de Educação Rural (ISER), juntamente com Amaral Fontoura e Helena
Antipoff. (p.181). Cumpre assinalar que tal Instituto foi preconizado por Antipoff em 1949,
vindo a se concretizar em 1955.
As atividades teoricamente postas para o Clube Agrícola, em razão de uma “nova
filosofia e uma nova pedagogia de cunho acentuadamente social”, levou o educador a
considerar que entre os “problemas centrais” em torno dos quais giravam as atividades e
preocupações de estudo no ensino normal em Ibirité e Diamantina, sob a “tutela” da Fazenda
do Rosário, figuravam segundo Lourenço Filho:
1) Quais os fins práticos da educação e quais as funções da escola rural?
2) De que procedimento se poderá valer a escola rural de Minas Gerais para que
possa produzir mais, no sentido dos fins educativos que deve ter?
3) Como organizar a vida numa propriedade rural, a fim de torná-la mais propícia ao
bem-estar dos que nela vive e ainda dos vizinhos e o que poderá para isso, fazer a
escola?
4)Na vida do homem do campo, o que representam o clima, a água e o solo?[...]
6) Conhecidas às condições que impeçam maior progresso, que deve e que pode fazer
a escola rural para modificá-las.
172
7)Quais os caracteres distintivos do reino vegetal e do reino animal na região e de
que forma será possível aumentar o rendimento do trabalho em benefício da
população
23
: [...] ( LOURENÇO FILHO, 2001, p. 92-93).
Conforme seu entendimento, ensinavam-se nessas Escolas, entre outras coisas, as
diferentes formas de ocupaçãodo solo; espaços de aproveitamentos para as culturas e sua
relação com o relevo; principais atividades agrícolas segundo o trabalho desenvolvido, pelo
Clube Agrícola conjugado ao ensino de geografia. (LOURENÇO FILHO [1952], 2001).
Destacou ainda, como característica digna de ser divulgada internacionalmente sobre o ensino
de atividades agrícolas para normalistas de Conselheiro a seguinte programação:
estudo do calendário rural da região;observar se as datas correspondem ou não às
festas tradicionais, costumes folclóricos, deslocamento da mão-de-
obra,aparelhamento da lavoura;métodos de trabalho; custo da produção;rebanhos
da região; procurar dados sobre tipos de animais, raças, origens, alimentação,
doenças, produção e destino da produção;composição do pastos, produção animal
e indústria caseira(LOURENÇO FILHO[1952] ,2001,p.93)
Nesse ponto, convém analisar o enfoque descrito pelo membro da Unesco no Brasil
sobre as preocupações que norteavam o currículo da Escola Normal de Conselheiro Mata, se
se considerar como elementos de análise o aparelhamento da lavoura, mão-de-obra e
métodos de trabalho”, expressões utilizadas por Lourenço Filho para indicar o caráter
peculiar da formação de “mestras rurais” nessa Escola. Pode-se conjeturar que o Clube
Agrícola, por meio de seus espaços de práticas como horta, galinheiro, chiqueiro e pomar,
possibilitava um debate, uma crítica e um potencial de transmutação desses aspectos da
produção econômica e rural. Em outros termos, permitia observar peculiaridades das formas
passadas e presentes de produção no meio rural para impulsionar, conforme o pensamento da
época, a incorporação de outras particularidades de culturas da terra, concorrentes e mesmo
discordantes, substituindo as formas mais tradicionais.
A crítica feita a uma Escola Normal que não considerava a peculiaridade rural como
um elemento fundamental para a eficácia da educação na formação da subjetividade do
homem do campo, conforme os valores da época, passou a ser questionada nos anos de 1940-
50. Ademais, as “Conferências Interamericanas de Educação” (INEP/MEC, 1965), na
segunda Reunião Interamericana de Ministros de Educação, supostamente ocorrida na década
de 1940, discorreu-se sobre um outro problema que estaria afligindo a escola rural. Segundo o
documento publicado após a mesma, foi dito que na maioria dos países latino-americanos, a
escassez de professores dificultava a generalização do ensino primário. (INEP, 1965). Esse
23
173
problema, concluíram os Ministros reunidos na Conferência, assume maiores proporções nas
zonas rurais. (p.49). Assim, como estratégias, recomendaram os Governos dos Estados-
membros que:
no planejamento integral da educação procurem o incremento e a melhora dos
centros de formação do pessoal docente , que adotem as medidas destinadas a elevar
o nível profissional do magistério, que equiparem o nível de preparação e as
condições profissionais dos professores rurais e urbanos, que estabeleçam um
sistema de compensações para estimular o exercício da docência em zonas rurais,
que façam a revisão do plano de formação de professores para conseguir a
distribuição adequada dos centros normais, para fomentar a criação dos centros
necessários e para estimular a vocação para o magistério. (MEC-INEP,1965 p. 49-
50).
No que concerne as “condições profissionais dos professores rurais” expressa acima,
vale mencionar que, em 1950, o boletim do “Seminário Inter-Americano de Educação
Primária”, cuja sede foi à cidade de Montevidéu, destacou na capa: “Tema IV - Formação de
Professores”. No pensamento explicitado pelo documento; a cultura geral e profissional do
professor rural não deveria ser inferior à do professor urbano. (p.8). Os participantes do
seminário comungavam a idéia de que a escola rural ainda era um substantivo por demais
abstrato.
Portanto, como forma de concretizar uma escola genuinamente ruralista, propôs-se:
Formação de professores rurais na escola normal de 4 a 5 anos, depois do curso
primário; maior interesse dos estudos diretamente vinculados à vida rural, nas
escolas normais comuns, a fim de que os respectivos diplomados assumam uma
atitude de maior simpatia e compreensão para com essa vida; especialização do
magistério rural em cursos de pós-graduação oferecidos aos professores primários
recém-diplomados e aos que estão em exercício nas escolas rurais e; formação
completa em escolas normais rurais. (SEMINÁRIO ITER-AMERICANO de
EDUCAÇÃO PRIMÁRIA, 1950, p.8)
Pode-se, pois, exprimir de outro modo essa “formação completa em escolas normais
rurais”, ou seja, através da criação teórica e prática na escola normal, de instituições
especializadas em ensino e produção de conhecimento sobre o homem rural e sobre a
geografia rural. Entende-se que o Clube Agrícola exerceu um papel fundamental nesse
processo de especialização no qual, por quatro anos, a aluna-mestra haveria de desenvolver
uma compreensão da vida rural. A formação desse espaço (Clube Agrícola) foi subsidiada por
outros programas de interesses agropecuários oriundos de diferentes áreas da administração
pública federal, que disponibilizavam para as alunas bibliografia e sugestões técnicas para
prática educativa e instrucional no meio rural, como também recursos financeiros.
174
A “Revista da Campanha Nacional de Educação Rural”, numa publicação de 1959,
dizia que a premissa que vem justificando a razão de ser desta Campanha resume-se,
portanto, na reforma da mentalidade do homem, valorizando suas possibilidades e as do
meio ambiente para a elevação do nível e do padrão das comunidades rurais. (p.12).
Em outras palavras, de nada adiantaria instalar escolas em zonas rurais sem a
correspondente preparação e compreensão do professor para a tarefa lenta e segura que
deveria desempenhar de educador e de desbastador. (p.11). Isso significava o entendimento
da escola para o lar rural, para o sítio, para a colônia, para a vila e, principalmente, para o
futuro, vivificando o alfabeto para o meio e o próprio meio para a expansão daquele
(RCNER, 1959, p.12).
Nessas condições, conforme notou a RCNER (1959), antes de 1950, se debatia no
Brasil, embora vagamente, os primeiros estudos para a realização no país, de serviços de
Educação de Base ou Fundamental. (p.14). A publicação deixa claro em seguida que
a Educação de base nascera no mundo, menos da necessidade de alfabetizar
diretamente, e mais da necessidade de aculturar populações infensas à alfabetização,
isto é, que ainda não haviam encontrado no alfabeto o valor instrumental que possuía
para as populações urbanas e semi-urbanizadas (RCNER, 1959, p, 17).
Nesse curso de afirmação exemplar da característica-missão da Educação de Base
figurava, com efeito, a tese de que esse método educativo estava sendo utilizado em outros
países. A finalidade de seu uso era recuperar, em larga escala, a população de áreas
subdesenvolvidas, cujos problemas de carência, desnutrição, baixos níveis de vida, baixa
produtividade, rotina de trabalho, alta mortalidade infantil. (RCNER, 1959, p.17),
representavam as “faces” da vida rural a serem substituídas. O quadro da equipe que se
compôs naquela altura do debate e da efetivação da campanha, dispunha, entre outros, de um
sociólogo rural, médicos sanitaristas, agrônomos, veterinários, geógrafos, cinegrafistas,
rádios-técnico e motoristas. Essa equipe iniciou o trabalho e organizou o material que, mais
tarde, tornou-se conteúdo da Revista e conseqüentemente material didático para escolas rurais
em todo país. Para o Dr. J.Artur Rios, sociólogo rural da equipe, o objetivo da campanha era:
a renovação das técnicas de trabalho, permitindo o acesso a níveis de vida mais
consentâneos com a dignidade humana, a educação econômica que ampliasse ou
melhorasse o equipamento profissional e aumentasse o rendimento do trabalho, o
apelo às energias latentes da solidariedade humana e a capacidade de liderança, o
combate à apatia e à renovação das fontes de vida social pelo exemplo, pela
iniciativa, pela emulação criadora (RCNER, 1959, p.20).
175
Como diria a diretora técnica do ensino rural de Minas, a professora Helena Antipoff,
cabe-nos produzir os construtores de uma civilização; elementos de visão larga e preparo
sólido, ou seja,
agentes do progresso social que devem ser capazes de alterar o meio em que
trabalham, desde a hora presente sem deixar, na espera platônica, como geralmente o
faz o mestre, que as modificações se operem no futuro, pelos alunos seus, chegados à
idade madura
([ANTIPOFF 1947], CDPHA, 1986, P.66).
Ao que parece, o regulamento da CNER fixou como finalidade e objetivos do órgão:
levar a Educação de Base ao meio rural brasileiro. Vale sublinhar, segundo registrou a
RCNER (1959, p.21) que a Campanha aderiu ao conceito de Educação de Base formulado
pela Unesco. Ei-lo:
-o mínimo de educação geral que tem por objetivo:
1) ajudar as crianças, adolescentes e adultos a compreenderem os problemas
peculiares aos meios em que vivem,
2) a formarem uma idéia exata dos seus direitos e deveres individuais e cívicos.
3) a participarem eficazmente do progresso econômico e social da comunidade a que
pertencem. (UNESCO 1952 apud, RCNER, 1959, p.21).
De acordo
com esses princípios,
acreditava-se que o
rurícola esforçava-se
em alcançar o
objetivo geral da
educação de base que
podia ser traduzido,
em outros termos, na
assimilação da arte-
real de polir o
homem rude, uma
pedra bruta e elevar a
si e aos mais
próximos às regiões da luz. (KOSELLECK, 1999, p.64). Isto é, acreditava-se ser possível
formar uma comunidade rural socialmente desenvolvida e economicamente enriquecida.
Ilustração 20 – acima: página do livro de atas do "Clube Pedagógico San Jean
Batiste de La Salle", 1961- à direita: capa do livro de atas do “Clube Agrícola Dr.
Roberval Cardoso” (Acervo - Conselheiro Mata).
176
Além dessa Campanha pela educação rural, convém lembrar que o governo JK criou o
“Serviço Social Rural”. Nas palavras de Napoleão Fontenelle da Silveira (1961), então
presidente desse Serviço, competia a esse:
Promover a melhoria do meio rural brasileiro, num país de proporções continentais,
foi, em suma, a difícil atribuição conferida ao Serviço Social Rural pela Lei nº2. 613,
de 23 de setembro de 1955, que o criou. [...]. E só em julho de 1956 pode instalar-se o
órgão superior do serviço o Conselho Nacional (apud SERVIÇO SOCIAL RURAL,
1961, p.7).
O primeiro referencial conceitual, descrito por Silveira (1961), para caracterizar o SSR
foi que esse órgão tinha caráter eminentemente educativo, de modo a preparar as populações
rurais para agirem por si mesmas. (p.19). Caberia ao Serviço oferecer métodos e técnicas
adequadas que permitissem às comunidades rurais tomar consciências de seus problemas,
como primeiro passo para lhes estimular o desejo de melhoria. (p.15). “Sem educação”,
escreveu Silveira,
não se pode conseguir êxito em qualquer iniciativa para o melhoramento da
empresa agrícola e da família rural. Na verdade, seo tiverem as populações rurais
perspectivas de novos níveis de satisfação, a educação para um mais alto complexo
de necessidades terá pouco ou nenhum resultado (1961, p. 16).
O texto mostra, também, que o objetivo da educação, visto pelo SSR, era o de criar
uma situação em que a população rural aceitasse de bom grado as idéias, métodos, hábitos e
normas de conduta que lhes forem apontados e oferecidos. (SSR, 1961, p.16). Fica latente,
portanto, que o papel da educação era criar uma “mentalidade aberta na cultura rurícola na
qual” elementos estranhos “postos à sua disposição fossem assimilados sem maiores
resistências”.
Segundo Fazenda (1985), durante o governo JK (1956-1960), falava-se na necessidade
de adequação de uma educação ao propósito desenvolvimentista. (p.43). Assim, a escola
elementar deveria preparar o sujeito comum para que esse atingisse a produtividade requerida
pela moderna sociedade industrial. (FAZENDA, 1985, p.43). O reconhecimento dessa
finalidade atribuída à educação, qual seja, a de preparar o sujeito para a sociedade industrial,
pode ser alinhada à idéia de Antipoff segundo a qual, a normalista deveria saber lidar com
dinheiro. Conseqüentemente, deveria saber ensinar a lidar com números, quantidades,
mercado, compra, venda, horas de trabalho, remuneração, enfim, componentes da sociedade
industrial no qual o elemento humano brasileiro deveria ser inserido na sua totalidade, ou seja,
como produtor e consumidor. (FUNDAÇÃO HELENA ANTIPOFF, 1978).
177
A força nova que emergiu no Brasil pós-1945, como sugeriu Reis (1999, p.154), teve
como tema central de pensamento e debate a mudança da orientação política, econômica e
social, em direção de uma soberania nacional. O pensamento sobre a transição da sociedade
baseada no capitalismo agrário, para a sociedade baseada no capitalismo industrial.
Observa-se em suas pesquisas sobre o período que discutia-se então, as relações de produção
no campo e nas cidades, as relações de produção e a consciência nacional, o imperialismo e
as lutas de classes, as classes e o estado. (p.154).
Esse imaginário de mudança continha, ao mesmo tempo, uma origem de permanência,
ou seja, a burguesia brasileira, classe social de relevo nesse processo, havia nascido do ventre
do latifúndio e trazia as marcas da sua origem. (REIS, 1999, p.161). Dentre essas marcas
afigurava a questão do enriquecimento, da mobilidade social e da distribuição dos bens
nacionais. De modo geral, essa equação sustentaria uma mudança muito insignificante no
campo educacional, pois atraía a repetição de valores sociais de outrora.
Como medida de “revigoramento” e produção da dignidade do povo rural, o “governo
democrático” de Milton Campos, como dizia Antipoff, criou em 1947, o documento
conhecido por “Plano de Recuperação Econômica e Fomento da Produção”. Tal publicação
defendia ser de suma importância para Minas, a fixação do homem à terra. (p.31). Ressalta o
documento que, para manter e fazer crescer as populações existentes nas várias regiões
mineiras, seria necessário, levar-lhes a higiene, a instrução e conforto, dinamizando as fontes
de riqueza de cada uma delas. (p.31). Posicionando-se de forma oposta ao governo anterior e
identificando os setores de desenvolvimento do mesmo, informa o documento:
A disseminação de hospitais e escolas oferecerá a essas populações a assistência
social que elas, anteriormente só poderiam encontrar nos centros urbanos. O fomento
da produção garantirá remuneração compensadora para o trabalho elevao nível
de vida do trabalhador. (PREFP, 1947, p.31).
Acreditava-se que, com isso, se prenderia o homem na terra onde nasceu de forma a se
retomar uma estabilidade e um equilíbrio demográfico em todas as regiões do Estado. Uma
das estratégias vislumbradas pela equipe do governo para atingir esse objetivo, foi a
organização de estabelecimentos (diversos) de ensino agrícola a ser feita de maneira que eles
venham a abastecer-se com a própria produção diminuindo o ônus de sua manutenção pelos
cofres do Estado. (PREFP, 1947, p.37). A esse modelo de estabelecimento Antipoff chamava
de “órgãos autárquicos” isto é, autônomos por meio de associações e iniciativas particulares.
(ANTIPOFF [1947], 1986, p.70).
178
Procurava-se pelo meio da educação rural alcançar todos os habitantes do campo
adotando medidas que interessam mesmo à vida doméstica do trabalhador rural. (PREFP,
1947, P.40). Conforme a imaginação do governo e a dos educadores, as ações do Plano
através das escolas rurais deveriam:
criar uma mentalidade sanitária, difundindo noções de higiene e meios de prevenção
contra doenças; educar e instruir o produtor e seus filhos, preparando estes para o
trabalho mais eficiente; melhorar o ambiente social das fazendas possibilitando mais
conforto e melhores condições de vida. Elevar o índice de produtividade do
trabalhador aumentando e racionalizando a produção. Promover, enfim, a introdução
de novas culturas; levarem ao conhecimento dos agricultores, os mais recentes dados
experimentais, influindo beneficamente no rendimento das fazendas (PREFP, 1947,
P.40).
Instruir para render mais, ou “introduzir novas culturas agrícolas racionalizantes, por
isso mais eficientes”. No entanto, para o governo Campos, essas medidas tinham sido
oprimidas no passado recente pela ação política mineira, disse o governo Campos. Ao
evidenciar sua crítica à cultura política brasileira, influenciada pela perspectiva de Vargas em
1937, comunicaram os signatários do Manifesto de 1943.
nossas aspirações fundam-se no estabelecimento de garantias constitucionais que
traduzam em efetiva segurança econômica e bem-estar para todos os brasileiros, não
os das capitais, mas de todo território nacional. Queremos espaços realmente
abertos para os moços, oriundos de todos os horizontes sociais, a fim de que a nação
se enriqueça de homens experimentados e eficientes (CAVALCANTI, 1978, p.41).
Vale destacar que o Manifesto apontava para a existência de uma possível
centralização das instituições de interesse público nas áreas urbanas, ou, como disseram, nas
grandes cidades”. Segundo o documento, os Varguistas foram buscar inspiração no
passado”, do qual aproveitaram a idéia de um governo “monocrático, sem atentar para os
grandes males, de muito maior extensão”. (Ao Povo Mineiro 1943 apud, CAVALCANTI,
1978, p.35). Um desses males a ser combatido pelo governo democrático que entrava em
ação, dizia respeito, segundo argumentou Lourenço Filho (1953), à preocupação de obstar o
deslocamento de grandes grupos populacionais de Minas Gerais para os Estados vizinhos.
(apud LOURENÇO FILHO, 2001, p.98). Esse movimento ocorria por Minas não contar
naquele momento com uma situação socioeconômica estável e, simultaneamente a isso, os
Estados do Leste, Sul e centro-oeste reclamavam braços para a industrialização, nos quais a
ocupação econômica estava procedendo a uma mudança de fronteira.
179
5 Conclusões: A ruralização da normalista ou a normalista para o ruralismo?
O evento pode ser anódino no presente e ser decisivo no futuro: o que era
secundário e nem percebido pelo contemporâneo emerge no futuro com grande
importância.
Jose Carlos Reis, 1999.
A história é para uma sociedade uma certa maneira de dar status e elaboração à
massa documental de que ela não se separa.
Michel Foucault, 2004.
Esta dissertação procurou mostrar como se deu o surgimento de argumentos políticos e
técnicos, no segundo quartel do século XX, que defendiam a necessidade de se elevar a
qualidade da educação do morador do campo. De acordo com a pesquisa, percebe-se que se
defendeu a necessidade da criação de escolas e professoras especializadas para essa tarefa.
Para isso, houve a elaboração de dispositivos legais para que se pudesse empregar, nos
ajuizamentos feitos sobre educação rural, recursos públicos (financeiros e técnicos) para a
criação de escolas de formação de professores rurais.
Fizeram-se algumas considerações sobre as funções desses estabelecimentos de
formação docente, segundo a missão traçada para os mesmos, sobretudo, no que diz respeito a
alguns dos instrumentos de sua ação como, por exemplo, a organização material do curso e a
elaboração do currículo a partir de idéias pedagógicas disponíveis e em alta na época.
Discutiu-se como parte dessa transação a transferência para Diamantina a partir da
proposta e efetivação da Escola Normal Regional D. Joaquim Silvério de Souza e como ela
deveria negar os conhecimentos tradicionais da população a ser educada, bem como da
tradição escolar advinda do contato com os princípios pedagógicos não científicos de outrora.
Apresentaram-se algumas questões sobre a efetivação do currículo específico para a
habilitação de normalistas para o ruralismo, mas no desenvolvimento da pesquisa não foi
possível obter informações suficientes para que se checasse, com evidências empíricas, como
ocorreu a introdução dessas novidades curriculares (baseadas no ideário da Escola nova) na
prática. É possível dizer, no entanto, que o Curso Normal em Conselheiro Mata flertava
constantemente com esse movimento, dadas as evidências que foram coletadas nesta pesquisa.
Finalmente, teceram-se algumas considerações sobre as concepções de passado e futuro, em
voga na imaginação dos pensadores dessa Escola. Destacou-se a importância das noções de
passado e futuro na divulgação, na região e entre as mestras, de técnicas agrícolas e
comerciais menos tradicionais, isto é, exposição de expressão técnica para a manutenção da
coesão e do desenvolvimento social destas e daqueles que as mesmas educariam.
180
no final dos anos de 1950, a professora Helena Antipoff, “protagonista” do
empreendimento, manifestou sua frustração pela forma que foi tratada a Fazenda do Rosário
na “Enciclopédia Brasileira dos Municípios”, no volume dedicado a Minas Gerais. Segundo
observou, a Fazenda foi simplesmente ignorada (Boletim do CPDHA, 1992). Esse assombro
evidencia, de certa forma, as interrogações sobre a importância e significado dessa Instituição
e de seus estabelecimentos, na formação docente para o meio rural no Estado. Cabe indagar se
essa simbólica “invisibilidade” se relaciona com as razões de sua origem. Por origem entende-
se o momento mais remoto em que se ventilou a possibilidade de uma Escola Normal Rural
em Conselheiro Mata. Com efeito, “em 1939”, conforme lembrou o professor Otávio
Magalhães, em março, por uma emenda dos estatutos, falou-se pela primeira vez nos
relatórios da Sociedade Pestalozzi, sobre orientação Profissional, a Fundação de Escola de
Serviço Social e Granja de Repouso. (Minas Gerais, 1949). No entanto, ao aprofundarmos um
pouco mais na pesquisa sobre o assunto, nota-se que, em 1932, quando se debatia sua
fundação, a sociedade Pestolozzi era considerada como um órgão destinado a proteger o
ensino especial das classes anormais dos grupos escolares da capital, conforme proposta da
professora Helena Antipoff.
Assim, pode-se inferir que uma das origens do ensino normal rural advém da idéia de
proteger crianças abandonadas” pelo ensino oficial da capital. A essas crianças reunidas
chamaram-se classes anormais para as quais se ofertaria um ensino especial”, isto é,
distinto do ensino tradicional.
Uma segunda matriz para a concepção dessas Escolas Normais Rurais, acredita-se, foi
posta em circulação pelo “Manifesto ao Povo Mineiro”, de 1943, em que se menciona na
página sobre segurança econômica e bem-estar para todos os brasileiros, não os das
capitais. (CAVALCANTI, 1978). O documento não menciona nenhuma palavra sobre
educação, mas destaca o tratamento diferenciado dado às populações que se localizavam fora
do perímetro das grandes cidades. Portanto, pode-se dizer que o manifesto referia-se à
população rural sem bem-estar e insegura economicamente; por isso alvo central da educação.
Aqui, os rurais são equiparados aos anormais, deixados à sua própria sorte por uns no passado
e, agora, acalentados por outros.
Assim, a possibilidade de uma Escola Normal Rural legítima foi tratada em termos
legais pela legislação do ensino de 1946, na qual se criaram as “Escolas Normais Regionais”.
Enfim, foi através da junção dessa lei, das idéias da professora Antipoff, da substituição do
Governo de Minas e da publicação do Plano de Recuperação Econômica e Fomento da
Produção feito pelo novo governo em 1947, que a categoria rural ganhou vulto no campo
181
educacional. A partir de então, passou o rural a integrar tanto o discurso econômico, como o
discurso político e, por fim, o discurso educacional no Estado. Da assistência a desvalidos
sociais à mestra rural, esse foi o percurso realizado para se chegar a categorizar as “Escolas
Normais do Rosário”. Em outros termos, passou-se da organização filantrópica de assistência
social às Escolas Normais Regionais Estaduais incluídas no plano de recuperação econômica,
para a formação profissional da massa humana rural em Minas Gerais. Segundo registros da
época, reconhece-se a construção dessas articulações que culminaram na Escola Normal
Regional Rural D. Joaquim Silvério de Souza, a partir do momento em que se registrou um
“alarmante” êxodo rural no interior de Minas Gerais.
Associou-se, portanto, a esse fenômeno, o crescimento do número de desvalidos
sociais urbanos e o aprofundamento da crise econômica do Estado, o qual era eminentemente
agrícola. Registrou-se, além disso, que a motivação para abandonar a zona rural estava, em
boa medida, na obsolescência das formas de produção econômica, remanescentes das formas
de vida colonial. Considerava-se, então, que a vivência rural que o passado garantira por
muito tempo a esse povo, enfraquecera, tornara-se fórmula caída, defeituosa.
Diante disso, preconizou-se sob diversos aspectos a necessidade e a possibilidade de
transfiguração da cultura rural, pelo abandono das formas antigas, em função da assimilação
de métodos de produção do futuro, já disponíveis no presente, por algumas instituições
intelectuais. Foi nessa encruzilhada entre permanecer ou mudar as formas de vida do rurícola
que surgiu a Escola Normal Rural, um estabelecimento educativo que deveria ser capaz de
retirar o elemento humano de seu meio por um tempo, para depois devolvê-lo alterado.
Durante o período da formação, essa escola inculcaria outros conceitos e técnicas
sobre a realidade rural, os quais, pela futura atuação profissional da mestra rural, seriam
inoculados nas mentes e corpos das crianças rurais. Com isso, esperava-se um efeito em
cadeia, uma vez que a escolarização seria o instrumento de difusão das formulações de como
se deveria viver e produzir no rural. A saber, do Curso Normal à Normalista; da Normalista à
criança rural da escola elementar; da criança escolarizada à família de onde veio. Assim,
criaria uma espécie de sistema interligado que, ao final, elevaria o nível de vida do homem do
campo, aumentando os índices de produção agrícola do Estado e baixando os números do
êxodo rural.
Que método foi adotado para reger esse estabelecimento produtor de “normais”?
Certamente, negou-se, pelo menos retoricamente, a filiação ao método tradicionalmente
utilizado pelas escolas brasileiras o qual entendia a educação como memorização e o
conhecimento como algo transferível, ou seja, do conteúdo intelectual do professor, pela sua
182
atuação, para a mente do aluno. Essa lógica de difusão do conhecimento tanto aparecia de
forma sistematizada na escola, quanto de forma espontânea no meio social. Mas, no meio
social, havia também uma forma de aprender que era o “fazer junto com”. A idéia de se
aprender fazendo, em atividades com o uso de todos os sentidos e não apenas com os olhos e
ouvidos, tornou-se um princípio que deveria ser considerado como regente na Escola Normal
Rural. Principalmente, porque esperava-se que um dia ele fosse auto-suficiente ou se fartaria
assim mesmo, em termos humanos e materiais.
Por isso, o fazer era a palavra de ordem. Fazer, por exemplo, texto-diário que permite
lembrar do panoptismo de Foucault. Um aluno designado para estar em todos os lugares e ver
e registrar todos os lances. Fazer, de outra parte, ruído, som, música ou uma ação que se
ligava a atividade de cantar, a intenção de louvar ao Deus Católico, pois se cantava na capela
“anexa” à escola quase que diariamente. Assim, essa escola ativa era também espaço de
atividades católicas. Sendo uma escola ativa católica, as alunas faziam caridade, ou melhor,
higienizavam a população dos arredores, medicavam-na, extirpando a medicina popular”,
aqui significada por superstição; ou elementos remanescentes do passado, digno, nesse
momento, de exclusão.
Era, igualmente, um curso científico-psicológico, no qual se deveria praticar a
observação e a experimentação dos objetos e costumes do rurícola, bem como o próprio
comportamento do mesmo. Quanto à finalidade, devia-se criar a partir desses “inquéritos”,
métodos de aplicação de modelos de homem e vida rural produzido em institutos urbanos.
Derivado de categorias como “abandono e recuperação”, o curso normal rural pretendia
estimular o rurícola a abandonar sua forma “fossilizada” de viver de agricultura, caso
contrário, não recuperaria nem sequer sua condição alimentar. Elevar o standart da vida rural,
esse era um dos lemas proferidos por Antipoff. Para tanto, seria necessário pôr em prática os
saberes psicológicos e assim elevar a cultura rurícola existente superar a si própria.
Em que o Curso Normal de Conselheiro Mata afastou-se do planejado? Para
argumentar sobre esse problema, basta ressaltar um aspecto do imaginário da época, segundo
o qual se rememorava o passado com vistas a combatê-lo, estratégia que também propiciava o
combate de aspectos presentes que se assemelhavam a determinado passado recente. Portanto,
se buscava a escola rural não reproduzir passado, mas “trabalhar” a favor de outro futuro que
viria, entre outras coisas, pela profissionalização da moça rural e sua futura entrada no
trabalho docente.
Em última instância, o ingresso no mercado de trabalho marcava, muitas vezes, uma
nova cultura de trabalho na família. Dessa forma, como notaram ex-professores da escola,
183
essa situação estimulou o deslocamento dos ex-alunos de suas comunidades de origem para
espaços em que o diploma, de fato, poderia assegurar um futuro melhor.
Talvez seja possível identificar as condições de possibilidade dessa evasão de mão-de-
obra especializada em educação elementar rural do campo e das pequenas comunidades, do
fato de que a escola elementar rural não tenha passado, no mesmo período, por um processo
de renovação conceitual e técnica que permitisse a normalista uma atuação eficiente, segundo
os valores que havia apropriado durante a formação. Por seu lado, essa última continuava a
valorizar, de certa forma, a vida na cidade. Ou melhor, o argumento de um futuro mais
próspero na roça não se proliferou e isso podia ser visto nas escolas que não sofreram um
impacto material, nem metodológico como era esperado. Por isso, pode-se supor que a
atmosfera vivida pela normalista, em tempos de formação, pouco ou nada coincidia com a
situação de mestra-formada. Como a neutralidade e uma vida devotada a uma causa não são
atitudes generalizáveis, conclui-se que as normalistas, ou pelo menos boa parte delas,
buscaram a elevação de seu nível de vida a partir das ferramentas científicas táticas de que
dispunham. Enquanto normalista, possuíam o diploma, objeto não muito popular na época, e
como horizonte de elevação social, o destino preconizado era a cidade.
Assim, o significado simbólico que o diploma de “normalista rural” assumia para
governo de Minas ligava-se à solução de um problema que a própria população e a estatística
lhe comunicavam que existia, a saber, o êxodo rural. Portanto, partiu também do governo a
hipótese associar a diminuição do êxodo rural às inovações educacionais de procedência
escolar. Certamente, as populações rurais conheciam o valor da educação escolar, sobretudo
no campo, no entanto, entre escolarizar-se e não planejar “ir embora” não significava para
eles uma relação necessária. Isto porque, entre outros fatores, não existiam terras disponíveis,
ou melhor, embora a “Reforma Agrária” figurasse na pauta de debates acadêmicos, políticos e
religiosos, esta não se efetuou.
Todavia, avançava-se uma sociedade de consumo que era a representante simbólica do
progresso, mas que se apresentava como forma urbana de viver, na qual as invenções
tecnológicas “apagavam” as tradições precedentes. Com isso, pode-se dizer que os homens
eram afetados por uma espécie de futurismo, isto é, uma promessa de melhora para as massas
que passariam a ter acesso aos bens elementares pelo caminho das técnicas de consumo e de
lazer, salvaguardados pela civilização moderna.
Neste sentido, o significado da formação normal recebida pelas moças, em
Conselheiro Mata, arbitrava, entre outras coisas, um modelo de universalismo técnico. Ou
seja, estimulava, por meio de suas práticas de formação e pelos conceitos pedagógicos
184
adotados, a necessidade de se entrar numa sociedade cnica mundial a qual garantiria a
libertação daquela situação de miséria que era atribuída aos grupos rurais históricos. Em
última instância, os valores racionalizantes da Civilização Universal exerceriam sobre o
núcleo de cada grupo rural tradicional uma ação erosiva, uma sutil corrosão.
O pensamento que auxiliava o governo mineiro nessa empreitada, segundo menções
dos próprios membros da equipe responsável pela reforma da educação rural, era o
estrangeiro. Entre outros modelos, figuravam os norte-americanos, os franceses e suíços. Vale
destacar o americanismo em voga; conhecido como o melhor espelho para a modernidade.
Segundo o imaginário daquele tempo, lá, mais do que qualquer outro lugar do mundo
ocidental, estava sendo concretizada a esperança do “homem novo”, ou seja, “o homem
subjetivamente necessário à modernidade”.
Assim, a mestra-rural “modernizada” formada em Conselheiro Mata e fundamentada
pelas “teorias da ação” herdeira das idéias de Rousseau, Pestallozzi e Dewey, deveria inculcar
nas crianças da roça, valores atravessados por categorias como cidadãos”. Conforme se
esperava, elas promoveriam a substituição das convicções e conhecimentos provincianos das
crianças, por valores e noções “seculares de progresso” vinculadas aos destinos nacionais, ao
crescimento econômico e a uma moralidade de engajamento cívico e estabilidade social. Ao
que tudo indica, essa segurança aprioristicamente pregada para essa criança, a sua inclusão
num futuro incerto, dependeria da valorização de conceitos como “democracia e
desenvolvimento econômico”.
No horizonte para a efetivação desse procedimento foi que emergiu a categoria
“magistério da zona rural”. Ele ganhou dimensão pública no discurso do governo que
propunha à psicologia e áreas de conhecimento como a geografia, medicina, a técnica agrícola
entre outras, maneiras para manejar as crianças e famílias que se enquadravam na
classificação rural e pobre. Frisava-se o termo rural como terminologia do campo
educacional, para garantir o aumento da administração social deste outro (antropológico)
identificado e sinalizado por noções como “educação rural” e “escola rural”, entre outras.
Portanto, surgiu pela legitimação governamental, pela adesão de grupos da região, a
Escola Normal de Conselheiro Mata, cuja missão era criar condições necessárias para a
modernização da produção. Considerava-se que a mestre-rural modernizaria o rurícola,
preparando-o para as novas exigências do mundo do trabalho e da ordem econômica, social e
cultural. Para tanto, defendeu-se o uso de uma formação técno-científica, na qual, administrar
o resultado das performances à maneira dos cientistas, deveria substituir os saberes
tradicionais ou “revelados”. Passou-se a ponderar que o rurícola não praticavam técnicas ditas
185
modernas (no sentido amplo do tempo) e por isso, a decadência da cultura rural. Então,
concluiu-se que sem tais técnicas não haveria “riquezas”. Acredita-se que esse ponto de vista
criou uma lógica que associava o tradicional a ineficiente e o moderno (“recente”) a eficiente;
e isso valia tanto para a cultura escolar como para a cultura rural extra-escolar.
A cultura rural era assim identificada como um mecanismo que isolava os indivíduos.
Assim sendo, para combater essa tradição de isolamento, foi valorizado o trabalho em equipe,
a cooperação como princípio pedagógico e social. Por conta disso, o método trabalho em
equipe era visto como aquele que, aplicado ao ensino, asseguraria a reprodução das idéias e
das técnicas ensinadas, mas também seu progresso na difusão de valores instrumentais como
ações solidárias, cooperativistas e divisão de trabalho. Em outros termos, a lógica da equipe
permitia a otimização das performances de maneira a garantir resultados eficientes por menos
investimentos.
Enfim, considera-se que o Curso Normal de Conselheiro Mata, de certa forma, obteve
como resultado a confecção de elementos culturais significativos e, ao que se supõem,
distantes das concepções de atuação na realidade estruturada na subjetividade rurícola. Isto
acarretou uma assimilação parcial e reinterpretada desses mesmos valores que diziam
significar renovação, pois tais princípios trazidos pelo estabelecimento “repugnavam” e
contradiziam o patrimônio cultural desse grupo social.
Por outro lado, formou um pequeno “exército” de normalistas naquilo que havia de
contemporâneo em teoria pedagógica para a ocasião, mas torna-se arriscado defender a tese,
de que esse “exército” cumpriu sua missão. Talvez seja razoável dizer que ele se espalhou
pelo território estadual de forma a obscurecer as possibilidades de verificar seu efetivo
resultado. Fato é que, segundo números da época, o êxodo rural manteve-se crescente, dando
a entender que a “colheita tardia” dos “frutos”, resultantes da escola rural, não foram
coletados ou, se foram, não fizeram “fartura”.
Para concluir, se estas pesquisas fossem continuar imediatamente, as questões que se
proporia responder girariam em torno dos destinos assumidos pelas mestras rurais
especializadas fora do campo. Isso para compreender de forma explícita um “provérbio”
cifrado que é repetido por um ex-aluno da escola, residente em Conselheiro, que diz mais ou
menos assim: tem aluno daqui no mundo todo!
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