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produtividade do trabalho não depende de investimentos em capital constante, mas única e
exclusivamente do esforço físico do trabalhador rural.
Este tipo de pagamento torna ainda mais invisível a divisão entre trabalho necessário e
trabalho excedente, este último apropriado pelo capitalista e aquele pago sob a forma de
salário ao trabalhador. Traz ainda um princípio ilusório de igualdade: quem trabalha mais,
recebe mais, mistificando a exploração aí existente.
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Adicionado ao salário por produção há a propagação de valores morais formatadores
do perfil do bom trabalhador: produtivo, assíduo e respeitador das normas; características
moldadas e controladas por outros sujeitos presentes na complexa trama das relações de
trabalho assalariado na agricultura: agenciadores, empreiteiros, fiscais e escritórios.
Os assalariados rurais consolidaram-se ao longo do processo de modernização da
agricultura como grande ofertantes de força de trabalho, localizados geograficamente nas
periferias das cidades e disponíveis para qualquer tipo de trabalho: rural ou urbano. Assim,
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Francisco Alves no artigo “Por que morrem os cortadores de cana” relaciona o pagamento por produção com
aquilo que Marx, (O capital – livro I, tomo I e II – salário por peça) no século XIX caracterizava como uma das
formas mais desumanas e perversas formas de trabalho. Porém, quando Marx denunciou este tipo de trabalho,
fazia referência a situações em que o trabalhador controlava o seu processo de trabalho e tinha, ao final do dia,
pleno conhecimento do valor gasto, pois conhecia o valor do trabalho executado. Já o pagamento por produção
no corte da cana é diferente, pois os trabalhadores têm conhecimento de quantos metros de cana cortaram em um
dia, mas não sabem, a priori, o valor do metro de cana. Este desconhecimento acontece porque o valor do metro
de cana depende do peso da cana, que varia em função da qualidade da cana e a qualidade da cana depende, por
sua vez de uma série de variáveis (variedade da cana, fertilidade do solo, sombreamento, etc.), processos estes
controlados pelas usinas. Disponível em <http://www.pastoraldomigrante.org.br/texto01.html
> acessado em
jun.2006).
O pagamento do salário dos trabalhadores da colheita de café não se diferencia dos da cana. Na colheita do café,
o ritmo em que a atividade é realizada depende de características pessoais do trabalhador, como: destreza,
velocidade em realizar as diferentes atividades e resistência física. O fiscal supervisiona a atividade do colhedor,
para não permitir que ele colha de qualquer jeito, o que pode danificar os pés, e para que ele não misture
impurezas no saco. Porém, quanto maiores os cuidados na colheita, determinados pelo fiscal, maior é o trabalho
do colhedor e menor será a quantidade de café colhida no dia de trabalho, portanto, menor o pagamento. Nestes
casos, quanto mais baixos os salários, maior o incentivo ao aumento da produtividade. E, assim como na cana, o
trabalhador não tem controle de seu processo de trabalho, uma vez que, a quantidade de café colhido – medida
em sacos de 60kg – não é por ele supervisionada. Quem controla esta atividade são os terrereiros, que verificam
se os sacos dos colhedores estão com a quantidade de frutos esperada e se não há outros componentes além do
café, como pedras, terra, folha e galhos. Embora os trabalhadores contem a quantidade de sacos colhidos, esta
quantidade é sancionada pelo terrereiro, e o pagamento é feito pela quantidade de sacos indicada por estes, e não
pela quantidade indicada pelo trabalhador.
(COALIZÃO CAFÉ et al. Café: vida, produção e trabalho – agricultores familiares e assalariados rurais).