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Quando lhe peço para me escutar e você começa a me dar conselhos, sinto que não sou
escutado. Quando lhe peço para me escutar e você me coloca questões, apresenta seus
argumentos, tenta explicar-me o que estou sentindo ou não deveria sentir, tenho a impressão
de ser agredido. Quando você se apodera do que lhe digo para tentar resolver o que julga ser
meu problema, por mais estranho que isso possa parecer, sinto-me ainda perdido. Estou
pedindo-lhe para estar presente, neste instante tão frágil em que estou à minha procura através
de uma palavra por vezes, desajeitada inquietante, injusta ou caótica. Tenho necessidade de
ser ouvido, tolerância e paciência para exprimir o que me parece ser o mais difícil, assim
como o mais acessível. Sim, simplesmente me escutar... Sem escusas nem acusações, sem me
desapossar de minha palavra. Fique à minha escuta. Tudo o que lhe peço é que você me
escute. O mais pertinho de mim. Simplesmente acolher o que tenho a lhe dizer, o que procuro
me dizer. Não interrompa meu murmúrio, não tenha medo de meus tateios ou imprecações.
Minhas contradições, assim como minhas acusações, por mais injustas que pareçam, são
importantes para mim. Através de sua escuta, tento exprimir minha diferença; procuro
sobretudo, escutar a mim mesmo. Assim, tenho acesso a uma palavra própria: aquele de que,
durante muito tempo, fui desapossado. Oh! Não, não tenho necessidade de conselhos. Posso
agir por minha iniciativa e também me enganar. Não sou incapaz; por vezes, fico desarmado,
desencorajado, hesitante, o que não significa impotência. Se você pretender agir por mim,
estará contribuindo para conservar meu medo, acentuando minha inadequação e, talvez,
reforçando minha dependência. Quando me sinto escutado, posso, enfim, me escutar. Posso
entrar em comunhão. Construir pontes, passarelas incertas entre minha história e minhas
estórias. Religar acontecimentos, situações, encontros ou emoções para que tudo isso venha
a tornar-se a trama de minhas interrogações. Para tecer, assim, a escuta de minha vida. Por
favor, escute-me e entenda-me, sua escuta é apaixonante. E se, por sua vez, você quiser falar,
espere um instante para que eu possa terminar e ficarei, então, à sua escuta em melhores
condições, sobretudo, porque me senti escutado.
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SALOMÉ, Jacques. Cativando a Ternura. Porto Alegre, Editora Vozes, 1997. p.42 s. Apud. NOÉ, Sidnei
Vilmar. Elementos de Psicologia Pastoral. Concepções de Aconselhamento II, EST.