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ESCOLA SUPERIOR DE TEOLOGIA
INSTITUTO ECUMÊNICO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM TEOLOGIA
ISABEL CRISTINA VETTER LIZAKOSKI
“UM OLHAR PARA O OUTRO”
SENSIBILIDADE E CIDADANIA
São Leopoldo
2007
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ISABEL CRISTINA VETTER LIZAKOSKI
“UM OLHAR PARA O OUTRO”
SENSIBILIDADE E CIDADANIA
Dissertação de Mestrado Profissionalizante
Para obtenção do Grau de Mestre em Teologia
Escola Superior de Teologia
Instituto Ecumênico de Pós-Graduação
Área de concentração: Religião e Educação
Orientador: Prof. Dr. Rudolf von Sinner
São Leopoldo
2007
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ISABEL CRISTINA VETTER LIZAKOSKI
“UM OLHAR PARA O OUTRO”
SENSIBILIDADE E CIDADANIA
Dissertação de Mestrado Profissionalizante
Para obtenção do Grau de Mestre em Teologia
Escola Superior de Teologia
Instituto Ecumênico de Pós-Graduação
Área de concentração: Religião e Educação
Data: 28 de setembro de 2007
Rudolf von Sinner – Doutor em teologia - EST
___________________________________________________________________________
AGRADECIMENTO
Senhor, Tu me sondas e me conheces.
Sabes quando me assento e quando me levanto;
de longe penetras os meus pensamentos.
Esquadrinhas o meu andar e o meu deitar,
e conheces todos os meus caminhos.
Ainda a palavra me não chegou à língua,
e Tu, Senhor já a conheces toda.
Tu me cercas por trás e por diante,
e sobre mim pões tua mão.
Tal conhecimento é maravilhoso demais para mim:
é sobremodo elevado, não o posso atingir.
Para onde me ausentarei do teu Espírito?
Para onde fugirei da tua face?
Se subo aos céus lá estás;
se faço a minha cama no mais profundo abismo,
lá estás também;
se tomo as asas da alvorada
e me detenho nos confins dos mares;
ainda lá me haverá de guiar a tua mão
e a tua destra me sustentará.
Se eu digo: As trevas, com efeito, me encobrirão,
e a luz ao redor de mim se fará noite,
até as próprias trevas e a luz são a mesma cousa.
Pois Tu formaste o meu interior,
Tu me teceste no seio da minha mãe.
Graças Te dou, visto que por modo assombrosamente maravilhoso me formaste;
As tuas obras são admiráveis,
e a minha alma o sabe muito bem;
4
os meus ossos não te foram encobertos,
quando no oculto fui formado,
e entretecido como nas profundezas da terra.
Os teus olhos me viram a substância ainda informe,
e no teu livro foram escritos todos os meus dias,
cada um deles escrito e determinado,
quando nenhum deles havia ainda.
Que preciosos para mim, Senhor são os teus pensamentos!
E como é grande a soma deles! (Sl 139:1-17)
Agradeço a Deus pela vida e por todas as bênçãos; entre elas, aos meus pais pelo
primeiro espaço de significação na minha vida e por todo amor que eles têm por seus filhos.
Agradeço ao Lelei pela compreensão, paciência e grande amor; aos filhos Ismael e
Rafael, porque deles aprendi a ser mãe e entender que o milagre é a preciosa possibilidade de
partilhar a vida como presente de Deus.
Agradeço a todas as pessoas da escola, Direção, Núcleo Pedagógico, professores/as,
funcionários/as, porque, lá, o programa de solidariedade germinou no coração de todos/as e
permitiu que cada palavra escrita tivesse a essência do amor, como ponte para a
transformação social pelo bem comum.
Aos adolescentes que partilharam seus sentimentos mais profundos, engajados com a
vivência dos projetos e deram vida para um sonho, que se transformou em realidade.
Muitas pessoas especiais fizeram parte de cada idéia, transformada em palavra.
Agradeço a todos e todas por acreditarem que a escola pode contribuir na educação dos
adolescentes, tornando-os protagonistas de ações solidárias e, na esperança de um mundo
mais justo, com sentido de vida para todos/as.
Aos professores/as e funcionários/as da EST agradeço pela atenção e carinho e à
Profª Drª. Gisela, Coordenadora do curso, minha admiração e apreço.
Ao Prof. Dr. Rudolf, como orientador, meu agradecimento e admiração pelo
pesquisador, educador e pelos ensinamentos, que guiaram minha pesquisa com segurança e,
por seus incansáveis incentivos para os momentos de dúvidas.
RESUMO
O espaço de vivência da solidariedade é possível na medida em que existirem corpos
e mentes consagrados e também os saberes procurando vincular-se na busca do bem comum.
Esse espaço de amor existe no desejo do ser humano, que compreende a presença do outro
com significado na sua existência e com o universo que o circunda. Assim, o presente estudo
norteia suas reflexões em alguns questionamentos. Qual é a contribuição do programa social
na construção da identidade do adolescente? Ele fornece referenciais que permitem a
estruturação nessa etapa de vida, convivendo com as diferenças sociais e seu aprimoramento
para a fase adulta? Até onde a subjetividade expressa pelo adolescente, com suas
vulnerabilidades, é escutada e validada, assim como a das pessoas assistidas em situação de
vulnerabilidade, podendo contribuir mutuamente para o crescimento? O programa social
desenvolvido na escola é o espaço que oportuniza a vivência dos projetos e práticas de
atividades de cunho social. O presente trabalho está dividido em três capítulos. No primeiro
capítulo, apresenta-se o Programa Social – Um olhar para o outro, com as vivências das
ações solidárias, envolvendo os 120 jovens adolescentes do Ensino Médio e seus
desdobramentos. No segundo capítulo, o adolescente e as peculiaridades do seu
desenvolvimento é o objeto de estudo, com os aportes teóricos para esclarecimento e
compreensão dos jovens da escola, no contexto atual e sua contribuição em ações voltadas à
solidariedade. No terceiro capítulo, o relato das vivências dos jovens adolescentes no
programa social funde-se com demais vivências, entre elas, filmes, questionários e demais
atividades de aula, para teorizar e problematizar as questões que envolvem o presente estudo.
Concomitantemente, visa contribuir significativamente para o processo de mudanças na área
social, com o incentivo ao protagonismo do adolescente, bem como oportunizar o
desenvolvimento de significados para o sentido de vida, com fundamentos na fé e, dessa
maneira, contribuir na transformação da sociedade, tornando-a mais justa e fraterna.
Palavras-chave: Adolescência. Projetos sociais. Transformação. Sentido de vida.
ABSTRACT
The solidarity experience space is possible wherever consecrated bodies and minds
exist, as well as the knowledge linked by the common good. This space of love exists in the
wish of the human being that understands the presence of the other with a meaning in his own
existence and with the surrounding world. Thus, the present study leads the reflections in
some questions. Which is the contribution of the social program in the construction of the
adolescent identity? Does it provide references that allow structuring in this stage of life,
living together with social differences and his improving for the adult stage? How far the
subjectivity stated by the adolescent, with his vulnerabilities is listened to and validated, so as
the one from the people attended in vulnerability situation, mutually contributing for the
growth? The social program developed in the school is the space that gives the opportunity for
living the projects and the practices of social activities. The present study is divided into three
chapters. In the first chapter, the Social Program – Recognizing the other, is introduced, with
the experience of the solidarity actions, involving 120 High School students and their
implications. In the second chapter, the adolescent and his development peculiarities are the
object of study with the theoretical support for explanation and comprehension of the students
from school, in the current context and their contribution to actions concerning solidarity. In
the third chapter, the report of the young adolescents’ experiences in the social program mixes
with the other experiences, among them, movies, questionnaires, and other classroom
activities, for theorizing and problemizing the questions that involve the present study. At the
same time, it aims to significantly contribute for the changing processes in the social area,
with the incentive to the adolescent protagonism, as well as, give the opportunity for
developing meanings for the meaning of life, based on faith and, this way, contributing for the
transformation of society, making it more just and fraternal.
Key-words: Adolescence. Social Projects. Transformation. Meaning of Life.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 8
1 O PROGRAMA SOCIAL “UM OLHAR PARA O OUTRO” ....................................... 14
1.1 Dados sobre a Escola ........................................................................................................ 14
1.2 Descrição do Programa .................................................................................................... 18
1.3 Metas do Programa .......................................................................................................... 22
1.4 Administração do Programa ........................................................................................... 25
1.5 Beneficiados pelo Programa ............................................................................................ 25
1.5.1 Propostas dos Projetos dos Alunos .......................................................................................................... 27
1.6 Avaliação do Programa .................................................................................................... 28
2 ADOLESCÊNCIA ............................................................................................................... 33
2.1 A Adolescência e os Referenciais na Contemporaneidade ........................................... 33
2.2 Adolescência e a Inserção no Mundo .............................................................................. 42
2.3 Preocupações e Aspectos Sociais Importantes para o Adolescente .............................. 45
3 EDUCAÇÃO E SOLIDARIEDADE .................................................................................. 58
3.1 Adolescentes protagonistas no entrelace social .............................................................. 58
3.2 A invisibilidade do outro .................................................................................................. 59
3.3 Transformar realidades...quando se reconhece o outro................................................ 62
3.4 Reconhecer o outro na dimensão da esperança ............................................................. 68
CONCLUSÃO ......................................................................................................................... 74
REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 81
ANEXO - Atividades desenvolvidas pelos grupos de alunos nas entidades ...................... 84
INTRODUÇÃO
O presente estudo tem como tema central a escola e seu espaço para
desenvolvimento da educação solidária com crianças e jovens. O foco está voltado para
jovens adolescentes
1
e as suas práticas de ações sociais no período do Ensino Médio. Nessa
representação, é necessário que se compreenda o adolescente enquanto sujeito no momento
de vida diante do seu desenvolvimento e as possibilidades de inserção, com maior
sensibilidade e comprometimento, na realidade contextual com a qual convive. Esse sujeito,
enquanto construtor da sua identidade, em busca de referenciais, encontra na escola os
elementos para contribuir nessa dimensão da sua vida. A geração de significados através da
ação educacional, na constituição desse sujeito como interpretante com vivências
significativas para a construção da responsabilidade social e cidadania, é o objeto da
dissertação.
Um Olhar para o Outro – Sensibilidade e Cidadania é um programa que visa à
reflexão e à prática solidária com jovens adolescentes e
baseia-se no estudo do programa de
solidariedade em andamento na escola
2
, buscando a geração de significados na constituição
do adolescente enquanto sujeito atuante no âmbito social. A escola, como espaço
educacional, permite que se estabeleça a relação entre o significante (programa) e o
significado (particular), que são as variáveis do estudo quanto à interpretação do tema.
Dentro disso, estabelece-se a análise dos dados coletados através das entrevistas com os
jovens (individual e em grupo), acompanhamento dos projetos nos locais escolhidos pelos
jovens, assim como a manifestação de sentimentos, desafios e comprometimentos
vinculados às vivências.
Entre os principais objetivos, evidenciam-se a identificação e a análise, junto aos
adolescentes, com apoio no referencial teórico, dos conteúdos temáticos que caracterizam a
subjetividade própria do jovem na relação com as ações desenvolvidas com o programa
social, e também a análise da relação do jovem com as diversas dificuldades e manifestações
1
Os adolescentes que estudam na escola, na sua maioria, pertencem à classe média e média alta das cidades de
Novo Hamburgo, Campo Bom, Sapiranga, Dois Irmãos e Montenegro, no Rio Grande do Sul.
2
Instituição Evangélica de Novo Hamburgo – Unidade de Ensino Fundação Evangélica, localizada na cidade
de Novo Hamburgo. Escola vinculada à Rede Sinodal de Ensino, ligada à IECLB – Igreja Evangélica de
Confissão Luterana no Brasil.
9
sociais expressas no contato da realidade social (significantes) e seus significados. Entre
outros pontos de análise, tem-se o acompanhamento dos adolescentes, alunos do Ensino
Médio, na prática de atividades de cunho social e atuação na realidade local, no intuito de
verificar o desenvolvimento de posturas mais críticas e atuantes nos jovens, observáveis em
diversos momentos, desde a discussão do projeto com o grupo de adolescentes, em 2004,
com a presença do Pastor Escolar, da mestranda e professores, até o apoio da Mantenedora,
da Direção da Escola e do Núcleo Pedagógico. Isso perpassa pelo trabalho de base em 2005,
com a fundamentação da metodologia científica, realizada pela professora de Pesquisa e
Iniciação Científica
3
, pela Feira das Entidades
4
e, no ano de 2006, tem seu ápice com as
atividades dos projetos, diretamente desenvolvidos nas entidades.
Todas essas ações contribuem para o fortalecimento do espírito de liderança dos
jovens em favor do bem comum da sociedade em seu entorno, pois, além do desempenho
desses jovens, com o desenvolvimento das ações propostas nos locais, há também o amparo,
pelo diálogo e por outros procedimentos concretos, na solução de situações desafiadoras, no
intuito de lhes dar o suporte necessário para que suas atividades planejadas (e executadas
nas entidades) revertam em prol da rede de organizações comprometidas com as ações
solidárias. Busca-se, assim, contribuir para o encaminhamento dos projetos nos diversos
níveis do processo, bem como auxiliar a divulgação destes para a promoção da cidadania
nos programas desenvolvidos na escola, dando-lhes visibilidade, e segurança ao jovem
atuante no programa.
No presente estudo, o enfoque é voltado tanto ao projeto em andamento na Escola,
que visa a contribuir para o desenvolvimento do protagonismo dos adolescentes, sua
autonomia enquanto jovens, quanto a uma visão mais crítica do entorno social através da
vivência com ações solidárias, na construção da própria identidade. Diante do momento do
desenvolvimento do adolescente, uma das questões para refletir diz respeito aos conteúdos
que auxiliam nessa construção, assim como os referenciais que permitem a estruturação da
identidade nessa etapa de vida. A vivência no cenário contemporâneo e a realidade político-
social com perspectivas de futuro instável remetem para a reflexão sobre como se estabelece
o acesso ao conteúdo informacional e ao outro. Nesse sentido, a reflexão acerca dos
conteúdos das questões trazidas pela sociedade em relação à subjetividade expressa pelo
adolescente balizam o estudo nas seguintes questões:
3
Componente curricular do primeiro ano do Ensino Médio, que desenvolve conhecimentos sobre metodologia
científica para elaboração de projetos.
4
Atividade desenvolvida com a presença de diversas entidades, entre elas: ABEFI, Lar da Menina, Lar João e
Maria, Núcleo Primavera, Projeto Vida Semeando Esperança, Horta Comunitária.
10
- Qual é a contribuição do programa social na construção da identidade do
adolescente? Ele fornece referenciais que permitem a estruturação nessa etapa de vida,
convivendo com as diferenças sociais e seu aprimoramento para a fase adulta?
- Até onde a subjetividade expressa pelo adolescente, com suas vulnerabilidades, é
escutada e valorizada, assim como a das pessoas assistidas em situação de vulnerabilidade,
podendo contribuir mutuamente para o crescimento?
Nas questões acima referidas, cabe esclarecer que as transformações propostas
como foco da pesquisa dizem respeito aos jovens adolescentes da escola, jovens de classe
média e média alta, proponentes dos projetos solidários, cujas vulnerabilidades são próprias
do seu contexto de vida. Assim, também, a transformação das pessoas assistidas, que,
devido ao seu contexto de carência, apresentam aspectos de vulnerabilidade próprios do seu
espaço de vida e relação, necessitando reconhecimento e reforço da auto-estima, com a
promoção do protagonismo, pelas ações de valorização do ser humano.
O método em questão para realizar a pesquisa será o qualitativo
5
. Esse método
favorecerá a compreensão dos recursos utilizados com as pessoas envolvidas. Em um
primeiro momento, na apresentação do programa com os locais beneficiados, e, após, o
acompanhamento dos projetos dos alunos, observações e visitas aos locais dos projetos,
onde a avaliação, no primeiro semestre, acontecerá apenas com a opinião dos responsáveis
pelas entidades envolvidas no programa. No segundo momento, os referenciais teóricos,
com a apresentação dos estudiosos de referência, constituem o embasamento dos estudos
realizados sobre a adolescência e a manifestação dessa etapa do desenvolvimento com
vivências de grupo, dados de questionários, observações e informações sobre os jovens e a
teoria possibilitarão o terceiro momento, com a reflexão sobre o cruzamento dos dados da
vivência do programa e o significado para o adolescente nas ações solidárias de seus
projetos, com a análise de filmes, questionários e manifestações em aulas, que
fundamentarão o desenvolvimento e constituição da fé e do sentido de vida.
A pesquisa de campo terá dois momentos, entre eles o envolvimento de 120
adolescentes de 14 a 16 anos, estudantes do Ensino Médio, participantes do Programa Social
Um Olhar para o Outro, da IENH
6
. Em alguns momentos, a pesquisadora entrevistará todos
os grupos e selecionará alguns deles para acompanhar o seu processo de trabalho com o
projeto. Também envolverá os locais beneficiados com os projetos, permitindo a análise da
proposta de estudo. Por fim, será feita a análise de todos os dados, à luz dos referenciais
5
KUDE, Vera Maria Moreira. Textos de metodologia de pesquisa em psicologia. Porto Alegre: PUC, 2000.
6
IENH – Instituição Evangélica de Novo Hamburgo.
11
teóricos, e estabelecidas as relações para fundamentar os questionamentos do presente
estudo, onde contribuo com a elaboração, aplicação e execução do Programa Social.
Através das observações e envolvimento com o Programa Social um Olhar para o
Outro, do depoimento de jovens com a liderança protagonizada por meio dos projetos, como
também da participação dos (as) professores (as) da Escola, em diálogo com a literatura
pertinente à adolescência e demais conteúdos de estudo referentes à solidariedade,
obteremos a descrição das vivências realizadas por meio dos projetos dos alunos e dos
significados que o meio favorece aos envolvidos no processo, ou seja, os adolescentes
envolvidos na pesquisa e as pessoas das entidades, com condições sociais, culturais e
econômicas diferenciadas. Também através da vivência do programa em cada uma das suas
etapas, poderemos observar o comportamento humano e sua influência no contexto em que
estão envolvidos. Para tanto, é necessário distanciamento da pesquisadora, quanto aos seus
valores e interesses pessoais, permitindo atingir um nível mais profundo de compreensão do
grupo a partir dos significados internos deste.
Serão levados em conta os métodos que as pessoas usam socialmente na sua vida
diária, colaborando na construção do real social. Nessa relação, a expressão através da
entrevista e visita aos locais tem espaço importante e será a base para análise dos dados ali
inseridos. Nas entrevistas e contatos com os locais, também entrarão todos os detalhes e
manifestações mais variadas, entre elas atos falhos, hesitações, pausas e demais expressões
dos jovens e demais pessoas vinculadas aos projetos. Esses dados coletados estarão
registrados descritivamente, com consentimento da direção da escola, juntamente com as
observações pessoais que serão registradas à parte pela pesquisadora e dialogados nos
momentos seguintes com os entrevistados, em forma de novas perguntas. Pela profundidade
e subjetividade dos dados, novamente o aspecto ético, enquanto pesquisadora, será relevante
a cada etapa do processo.
Para análise dos dados brutos em resultado de estudo, será necessária a aplicação do
método interpretativo, com base nos subsídios teóricos estabelecidos pelos autores de
referência, entre eles no Capítulo II, voltado para a adolescência em seu desenvolvimento de
autonomia, com Contardo Calligaris, José Ottoni Outeiral, Roberto Daunis, James Fowler e,
no Capítulo III, acrescentando estudos sobre os contextos atuais com a Filosofia e
Sociologia, além de estudos sobre os trabalhos até hoje realizados na área social estarão
como viés para chegar à construção de significados, as reflexões de Zygmunt Bauman, Hugo
Assmann e Jung Mo Sung e, complementando, a socióloga e psicanalista Maria Rita Kehl.
As contribuições sobre o desenvolvimento da fé e sentido de vida constituem elementos
12
importantes para a construção da identidade e estão fundamentados nos estudos de James
Fowler, Gottfried Brakemeier, Leonardo Boff, como as pesquisas de Rudolf von Sinner
sobre a contribuição da(s) igreja(s) na transformação social e na visão de Marcelo Rezende
Guimarães sobre a educação para a paz, em que a análise do discurso e a dialética
fundamentarão as conclusões finais das etapas do trabalho. Para o desfecho, alguns teóricos
embasam a proposta de educação, como as contribuições filosóficas de Michel Foucault e de
Silvio Gallo, com o tema da transversalidade.
No primeiro capítulo, apresenta-se o Programa Social – Um olhar para o outro
7
,
com as vivências das ações solidárias, envolvendo os 120 jovens adolescentes do Ensino
Médio. Ao detalhar o programa - cujas ações iniciais aconteceram já em 2005, nas aulas de
Pesquisa e Iniciação Científica com orientações aos grupos, coleta de informações sobre as
primeiras impressões dos jovens adolescentes e constituição dos 21 grupos, totalizando 120
alunos - com suas decisões e repercussões, estabelecem-se perspectivas com a finalização do
programa, em 2007, quando os alunos vivenciarão a construção do portfólio de vivências em
cidadania e solidariedade e a participação no Fórum Social, previsto para agosto de 2007.
No segundo capítulo, o adolescente é o objeto de estudo. A busca por autonomia e
as peculiaridades do adolescente na contemporaneidade são mostradas através da
experiência da pesquisadora, com jovens adolescentes, ao longo de 30 anos de trabalho e
com a fundamentação teórica de estudiosos, que contribuem com valiosos aportes teóricos
para esclarecimento e compreensão desses jovens adolescentes da escola, no contexto atual e
sua contribuição em ações voltadas à solidariedade.
No terceiro capítulo, o relato das vivências dos jovens adolescentes no Programa
Social Um olhar para o outro funde-se com demais vivências, entre elas, filmes,
questionários e demais atividades de aula, para teorizar e problematizar as questões que
envolvem sentido de vida no contexto contemporâneo.
Meu interesse pessoal, enquanto pesquisadora e educadora, é a busca de
fundamentação para compreensão e implementação do trabalho desenvolvido ao longo da
minha vida com adolescentes e suas ações sociais, e o questionamento sobre a estruturação
nessa etapa de vida, convivendo com as diferenças sociais e seu aprimoramento para a fase
adulta. Também questiono, a partir da minha vivência, sobre a subjetividade expressa pelo
adolescente, com suas vulnerabilidades, assim como a das pessoas assistidas em situação de
7
O desenvolvimento do Programa Um olhar para o outro: Sensibilidade e cidadania está no Capítulo I.
13
vulnerabilidade
8
e a contribuição mútua para o crescimento de ambos, que estão amparados
por lei como referência sobre a vulnerabilidade. Nesse viés, busco referências teológicas que
fundamentam as questões do sentido de vida, as transformações pessoais e sociais de
aceitação na fé luterana
9
. Como educadora, entendo que a escola é promotora de
transformações e constitui-se no espaço entre a construção da solidariedade e cidadania,
como também da religiosidade, base da esperança para um mundo transformador pelo bem
comum.
8
Cf. Norma Operacional Básica – NOB do Sistema Único de Assistência Social – SUAS, de julho de 2005, no
item 1.Justificativa da Norma Operacional Básica do SUAS, na alínea b, que trata da Funções da política
pública de Assistência Social para extensão da proteção social brasileira, fala sobre os princípios, entre eles
da territorialização, que diz: “O princípio da territorialização significa o reconhecimento da presença de
múltiplos fatores sociais e econômicos, que levam o indivíduo e a família a uma situação de vulnerabilidade,
risco pessoal e social. O princípio da territorialização possibilita orientar a proteção social de Assistência
Social: na perspectiva do alcance de universalidade de cobertura entre indivíduos e famílias, sob situações
similares de risco e vulnerabilidade; na aplicação de princípios de prevenção e proteção pró-ativa, nas ações
de Assistência Social; no planejamento da localização da rede de serviços, a partir dos territórios de maior
incidência de vulnerabilidade e riscos. “O princípio de proteção pró-ativa se dá principalmente no campo de
proteção social básica na condição de conjunto de ações capazes de reduzir a ocorrência de riscos e a
ocorrência de danos sociais”. BRASIL. Conselho Nacional de Assistência Social – CNAS. Norma
Operacional Básica de Assistência Social – NOB/SUAS. Brasília, DF, 2005.
9
Por isso, para compreender a ‘nova santidade’ de Lutero, hoje precisamos inseri-lo no contexto da
identificação pela cruz e entender a justificação pela fé como libertação para assumi-la. Isso significa passar
o lugar de ‘vocação’ e ‘santidade’ da profissão secular para o âmbito mais abrangente, onde hoje se faz
história, ou seja, para o contexto dos movimentos e organizações populares. Aí é o lugar onde se decide hoje
se vivemos em liberdade e na cruz de Cristo e, portanto, se renunciamos a valer diante de Deus pelo que
temos ou alcançamos, estando dispostos a viver somente pela graça. ALTMANN, Walter. Lutero e
Libertação: releitura de Lutero em perspectiva. São Leopoldo: Sinodal; São Paulo: Ática, 1994, p. 289.
1 O PROGRAMA SOCIAL “UM OLHAR PARA O OUTRO”
1.1 Dados sobre a Escola
10
O mundo que nos espera não está para ser conquistado, mas para ser construído.
(Jean-Claude Guillebaud )
11
A Instituição Evangélica de Novo Hamburgo – IENH - é mantenedora do Centro
Sinodal de Ensino Médio de Novo Hamburgo. São três instituições de ensino que integram o
Centro Sinodal de Ensino Médio de Novo Hamburgo. A origem dessas instituições escolares
está ligada à colonização alemã no Rio Grande do Sul; os imigrantes, juntamente com a
edificação de sua igreja, logo criavam a sua escola que, até as décadas 1940 e 1950,
continuava sendo a única oportunidade de educação das crianças naquele local, pois as
escolas governamentais não existiam antes disso. Nesse contexto, o marco inicial para o
surgimento da IENH é a criação da Escola da Comunidade Evangélica de Hamburgo Velho,
em 1832, no bairro Hamburgo Velho de Novo Hamburgo, hoje denominada Unidade
Pindorama.
Assim também, em 1896, a Comunidade Evangélica de Novo Hamburgo, situada no
bairro Centro de Novo Hamburgo, criou a sua escola, dentro do mesmo princípio de oferecer
educação para as crianças, pois o Estado não possuía condições de atender esta demanda.
Atualmente, é denominada Unidade Oswaldo Cruz. Já em 1886, as irmãs Engel fundavam
uma escola para a educação do público feminino, sendo que sua administração e patrimônio,
em 1895, foram destinados ao Sínodo Riograndense (órgão coordenador das igrejas e
comunidades evangélicas no Estado do RS), dando início à “Fundação Evangélica”. Iniciou
com o nome de "Evangelisches Stift". Ficou assim denominada por 66 anos, até 1961.
Nos documentos e livros de atas, apresentam-se alguns dados importantes sobre a
história da escola. Em 25/06/1945, aconteceu a criação da Instituição Evangélica de Novo
Hamburgo, sucessora do "Evangelischer Stiftsverein", entidade mantenedora da “Fundação
10
KANNENBERG, Hilmar. Fundação Evangélica: um século a serviço da educação, 1886-1986. São
Leopoldo: Rotermund, 1987 (Coleção ‘Pastor D. Dr. Wilhelm Rotermund’). Referências sobre a escola no
livro do Centenário da Fundação Evangélica, com extratos do cap. I a XI, p. 19-209.
11
VIVER com sabedoria: mensagem para a busca de felicidade eterna. Rio de Janeiro: Reader’s Digest, 2004, p.
171.
15
Evangélica”. Em 31/03/1961, ocorreu a fusão das duas entidades, a “Fundação Evangélica” e
o Ginásio Pindorama. Em 24/11/1975, houve a reformulação dos estatutos da Instituição
Evangélica de Novo Hamburgo, constituindo em escolas integradas o Colégio Normal da
“Fundação Evangélica”, a Escola Evangélica Oswaldo Cruz e a Escola da Comunidade
Evangélica de Hamburgo Velho (Escola Pindorama).
A Instituição Evangélica de Novo Hamburgo funciona hoje em três unidades físicas,
localizadas na cidade de Novo Hamburgo, denominadas Unidade Pindorama, fundada em
1832, Unidade Oswaldo Cruz, fundada em 1896 e a Unidade “Fundação Evangélica”, fundada
em 1886. Hoje, todas as unidades estão unificadas num centro educacional, denominado
Centro Sinodal de Ensino Médio de Novo Hamburgo, conforme regulamentado pelo
Conselho Estadual de Educação do Estado do Rio Grande do Sul. As Unidades físicas são
consideradas departamentos da Instituição Evangélica de Novo Hamburgo, sendo todas as
operações e registros centralizados na sede da Entidade. A Instituição é filiada a um
organismo comum das escolas evangélico-luteranas, denominado Rede Sinodal de Educação,
da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB), o qual tem sua existência
fundada e coordenada em atividades conjuntas das Instituições que compõem a Rede.
Na sua visão, a IENH
12
expressa seu desejo ser um pólo educacional de referência no
Rio Grande do Sul pela qualidade, responsabilidade social e inovação. Na missão, estabelece
a crença de promover educação de qualidade através da construção, produção e socialização
do saber, com base nos princípios cristãos
13
, para atuar numa sociedade em transformação. A
Instituição se propõe a promover valores como amor, dignidade, justiça, respeito, verdade, e
os princípios que fundamentam sua ação, são autonomia, cooperação, ética, inovação,
responsabilidade social, referencial luterano, pluralidade e qualidade de ensino.
12
Dados do PLANO de Ação Social da Escola, Secretaria da Escola, 2006, p. 3.
13
Os princípios acima citados têm como base diversos documentos de estudo, mas cito um estudo em especial,
promovido pelo Departamento de Educação da IECLB, com base nas discussões de diversos grupos das
Escolas da Rede Sinodal de Educação sobre a ‘Política Educacional da IECLB’, no qual expressa os
princípios, que dizem: ‘A concepção evangélico-luterana é compreendida a partir da intersecção dialógica
entre a teologia e a pedagogia. Como ciências autônomas, tendo concepções teóricas próprias, ambas
elaboram uma nova teoria e prática teológico-pedagógica, em que cada uma delas contribui expressivamente
na reconfiguração da sua perspectiva práxis. Ambas, com seus paradigmas, interferem umas nas outras,
estabelecendo uma correlação teórica e prática. A percepção da correlação teologia-pedagogia é fundamental
para a elaboração de uma Política Educacional na IECLB, pois não se pode compreender a teologia luterana
somente como referencial de conteúdo, nem pedagogia somente como instrumental metodológico. Portanto,
uma Política Educacional na IECLB deve ser entendida na interação dialógica entre o teológico e o
pedagógico, onde se constrói uma teologia-pedagógica e uma pedagogia-teológica. A partir dos conceitos
acima enunciados, elaboram-se os princípios da Política Educacional da IECLB’. IECLB. Rede Sinodal de
Educação. Textos Orientadores para a Educação Evangélico-Luterana. São Leopoldo: Sinodal, 2005, p.
11.
16
Os objetivos das ações sociais da IENH
14
estão em promover o exercício da
cidadania e o compromisso de responsabilidade social da instituição, de aplicar políticas e
ações afirmativas na promoção da igualdade de condições, por critérios universais de renda ou
específicos de etnia, com vista à inclusão social, bem como atender as necessidades definidas
como de interesse público, especialmente, com vistas à redução de desigualdades sociais e
regionais; além disso, o incentivo ao desenvolvimento sustentável, em termos ambientais e
econômicos, visando à integração soberana e cooperativa do país na economia mundial.
A escola está inserida no contexto da cidade de Novo Hamburgo, que apresenta os
seguintes dados estatísticos:
O município de Novo Hamburgo, situado no Estado do Rio Grande do Sul, possui,
segundo dados do censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de
2000, uma população de 236.037 habitantes, dos quais 99.904 são jovens com idade
entre zero e 19 anos. O município convive com o drama típico dos grandes centros
urbanos, como falta de saneamento básico, sub habitação, transporte etc. A este
quadro associa-se uma mão-de-obra não especializada e uma enorme concentração
de renda: enquanto 1% da população economicamente ativa ganha mais de 20
salários mínimos, outros 50% ganham até 3 salários mínimos. O município também
se caracteriza por enorme fluxo migratório, registrado nas décadas de 70 e 80, onde
a grande oferta de postos de trabalho associado a dificuldades do meio rural fez com
que um grande número de trabalhadores migrasse de diferentes zonas rurais do
Estado para Novo Hamburgo.
15
Em vista dos dados acima citados, a Instituição Evangélica de Novo Hamburgo
busca de diversas formas canalizar recursos para atendimento das famílias com suas crianças
e jovens em situação de vulnerabilidade. Entre elas, encontra-se a prática de concessão de
bolsas de estudo
16
, que está vinculada à atividade assistencial em sentido amplo, oferecida
pela Escola, considerando-a como política social destinada a prover o atendimento das
necessidades básicas traduzidas na proteção à família, à maternidade, à infância, à
adolescência e a promoção da integração ao mercado de trabalho, somente para citar alguns
objetivos específicos.
Considerando esse enfoque de crescimento a partir do aprendizado e das
oportunidades que a escola oferece, qualquer atividade de educação representa a
materialização de política pública socialmente relevante. Essa atuação da escola se dá em
colaboração com as políticas públicas, estando plenamente incluída da esfera da assistência
social toda a concessão de redução que represente a oportunidade de crescimento pessoal e
14
ESTATUTO da IENH. Documento do setor administrativo da escola. Novo Hamburgo: Instituição
Evangélica de Novo Hamburgo, 2005, p. 1.
15
Dados fornecidos pelo site http://www.risolidaria.org.br. Acesso em 10 de março de 2007.
16
Dados do Plano de Ação Social da Escola, 2006, p. 53-54.
17
social do aluno. O resultado prático se verifica pelos índices de aprovação e pelas
oportunidades de empregabilidade aos alunos em curso ou egressos da Instituição Evangélica
de Novo Hamburgo.
Em 2006, 700 alunos, do universo de 1824 alunos, da Educação Infantil ao Ensino
Fundamental e Médio, como também dos Cursos Técnicos receberam entre 10 a 95% de
gratuidade por meio das bolsas de estudos.
As demais ações da IENH
17
, voltadas à Assistência Social, com projetos voltados
especificamente às necessidades da cidade de Novo Hamburgo, focalizam diversos públicos e
bairros, entre eles atendimento de 70 alunos (PNEE) Portadores de Necessidades Especiais –
Surdez, de 4 a 18 anos, da Escola Estadual Especial Keli Meise, com a contratação de um
professor de Informática por 18 horas semanais; atividades educativas na Creche Raio de Sol
com a contratação de uma narradora de histórias infantis com 4 horas semanais,
psicomotricista com 4 horas semanais, atendimento pedagógicos às educadoras em 8 horas
semanais, doação de 35 kg de farinha de trigo e 40 litros de leite, para 43 crianças de 4 meses
a 3 anos e 8 meses; curso de Comércio e Serviços, durante 70 horas, para 5 gestantes do
Centro Cristão Feminino, visando a melhorai da qualidade de vida para as mulheres e seus
bebês; o investimento em lãs para as atividade das Mulheres Voluntárias – Grupo Ellos, para
tricotar agasalhos, favorecendo as crianças da ABEFI – Associação Beneficente Evangélica
da Floresta Imperial e demais ações que demonstram a preocupação da Escola com a
comunidade desassistida.
Nesse contexto, a escola pode ser a referência para o desenvolvimento de interações
que fortaleçam a teia social. Nesse lugar, o jovem passa a ser protagonista da sua história,
propondo mudanças e transformações, tanto da sua vida como de inúmeras pessoas que lutam
à margem da sociedade, sem reconhecimento. Também pode, com a mesma visão respeitosa,
através de projetos que consagrem a vida como centro de sua idéia, propor modificações nas
áreas da cultura, do meio ambiente e da saúde.
É nesse espaço que a escola contribui com seu processo educacional, viabilizando,
através da ação de professores, funcionários e familiares junto ao aluno, a vivência integrada
do currículo, para fortalecer a caminhada com as transformações sociais, culturais,
ambientais. É através da ação solidária com seus iguais que o adolescente torna-se o
construtor de si próprio, enquanto sujeito viabilizado por seu projeto, envolvendo-se com o
“outro”, e rompe os padrões até então constituídos socialmente. Cabe, então, à escola,
17
RELATÓRIO social da IENH, 2006, p. 2, 3, 6, 7.
18
oferecer conteúdos para o jovem na sua adolescência, ressignificando suas vivências com Um
Olhar para o Outro, bem como gerando significados na construção de sua subjetividade.
1.2 Descrição do Programa
Cada homem tem seu lugar no mundo e no tempo que lhe é concedido. Sua tarefa
nunca é maior que sua capacidade para cumpri-la. Ela consiste em preencher seu
lugar, em servir à verdade e aos homens. (J. Guimarães Rosa)
18
A abordagem sobre a atividade de educação comunitária em questão baseia-se no
programa desenvolvido na Fundação Evangélica, chamado “Um Olhar para o Outro”, que
tem como principal objetivo a sensibilização dos adolescentes para as atividades de cunho
social. As atividades solidárias na escola aconteciam anualmente, de forma não sistemática,
envolvendo alguns grupos. As ações desenvolvidas ficavam ao encargo das lideranças do
Grêmio Estudantil Castro Alves (GECA) e de campanhas lideradas por professores, em sala
de aula, que desencadeavam ações direcionadas a entidades ou pessoas em situação de
vulnerabilidade. Percebia-se que os resultados dessas ações eram positivos, mas não deixavam
de ser ações estanques, de cunho assistencialista, sem impacto positivo e efetivo para as
pessoas em situação de vulnerabilidade, e nem mesmo surtiam mudanças de postura frente à
realidade social, por parte dos alunos e professores envolvidos.
Nas discussões entre professores, manifestava-se constantemente a preocupação com
a sensibilização dos jovens na área social. Muitos jovens também manifestavam o desejo de
auxiliar em projetos sociais, mas não sabiam como encaminhar suas idéias. Diante de tais
desafios, a mestranda, juntamente com o Pastor Escolar, escreveram uma proposta de projeto,
com embasamento científico, sistemático e com certificação de participação no Programa
Social com as horas dedicadas no projeto, no final do Ensino Médio, encaminhado pela
Escola.
O Programa Social da Fundação Evangélica visa contemplar essa busca por ações
sociais que realmente modifiquem mentes e corações. A proposta de pesquisa no Curso de
Mestrado Profissionalizante em Teologia – Educação Comunitária com Infância e Juventude,
na ênfase Adolescência e Juventude em Contextos Educativos, vincula-se a essa prática,
dividida em três etapas, que seguem no relato.
A sensibilização dos jovens adolescentes para o programa social acontece no final da
oitava série do Ensino Fundamental, quando conhecem a estrutura e principais idéias do
18
VIVER..., 2004, p. 379.
19
programa. A apresentação conta com PowerPoint explicativo do processo e relato de jovens
adolescentes do Ensino Médio e suas práticas solidárias. Participam do encontro as
coordenações do Programa Social, professores de oitava série, alunos do Ensino Médio
convidados para partilhar suas vivências solidárias. Nesse momento, os alunos das oitavas
séries participam com sugestões, idéias e partilham as suas vivências de solidariedade,
enquanto jovens, e também dos seus familiares. Existe espaço para questionamentos, dúvidas
e possíveis dificuldades na execução do programa.
No primeiro ano do Ensino Médio, os alunos aprenderam a estrutura da metodologia
científica. A professora responsável pelo Componente Curricular de Pesquisa e Iniciação
Científica introduziu o conhecimento sobre a metodologia científica, e, com base nesses
conhecimentos, os estudantes receberam orientação para estruturar o seu projeto. Os alunos
refletiram sobre suas habilidades e possibilidades de atuação solidária, a seguir, formaram
grupos com focos comuns para a atuação e escreveram seu projeto. Ao longo do ano, durante
a produção científica, os alunos foram assessorados pela professora e coordenadores do
programa social. As dúvidas e possibilidades de encaminhamentos constituíram-se focos do
diálogo e conduziram para alternativas de estruturação do projeto de cada grupo. Ademais, os
alunos também puderam definir sua área de atuação com a visita aos locais de maior carência
na cidade de Novo Hamburgo.
Em julho de 2005, aconteceu na escola a “Feira das Entidades Sociais”, cujo objetivo
era permitir aos alunos um diálogo mais direto com a entidade previamente escolhida,
verificando se as atividades programadas atenderiam os interesses e necessidades do local.
Assim, foi possível um momento de intercâmbio entre alunos e entidades, de forma a
sensibilizar os alunos dos primeiros anos, para a atuação em uma realidade diferente daquela
que vivenciam no cotidiano das suas vidas. Ao escolherem seu foco de atuação, iniciou-se a
elaboração do projeto, propriamente dito. Ao finalizar o primeiro ano do Ensino Médio, os
estudantes convidaram o professor orientador para acompanhar o seu projeto. Nessa etapa,
também receberam um arquivo, para simbolicamente inscreverem suas vivências solidárias,
entrevistas, contatos, impressões e manifestações, base para inserção da sua história pessoal e
de grupo no programa Um Olhar para o Outro.
No segundo ano, as ações de cada projeto aconteceram diretamente nas áreas
estabelecidas como foco de atuação dos grupos. Os momentos de aula do Componente
20
Curricular Fundamentos de Vida
19
possibilitaram o diálogo direto com as vivências de campo
dos grupos na aplicação do cada projeto. O professor fundamentou suas aulas com conceitos e
conhecimentos filosóficos, base para a reflexão e discussão da realidade social
contemporânea. Os alunos deslocavam-se às entidades, individualmente ou em grupo, para
colocarem em prática os seus projetos durante todo o ano. Durante esse tempo, os professores
não só os assessoravam em aula, destinando um tempo de diálogo e preparação, como
também acompanhavam as práticas nas entidades, atuando com os alunos no local de
trabalho.
As atividades desenvolvidas no segundo ano do Ensino Médio aconteceram no turno
oposto às aulas. A proposta, além da aula curricular de Fundamentos de Vida, também
consistia na participação das reuniões de planejamento com o professor orientador, no mínimo
de quatro horas, fora do horário escolar. Cada grupo tem seu professor orientador, perfazendo
o total de 21 professores envolvidos com o Programa Social. Para a atuação do projeto, cada
aluno cumpriu, no mínimo, dezesseis horas anuais, para encaminhamento das atividades
previstas pelo grupo. Entretanto, na grande maioria dos grupos, esse número mínimo de horas
foi excedido. Essas horas ocorriam fora do horário escolar. Os alunos cumpriam algumas
orientações com registros das atividades realizadas na entidade. Esse registro consistia no
relato da atividade desenvolvida em cada encontro, nome dos participantes no dia, data,
horário e assinaturas do professor orientador e da pessoa responsável pela entidade.
O deslocamento para a entidade de todos os alunos, professores, durante todo o ano,
era realizado pela escola, com organização orientada nas turmas. Cada grupo que desejava se
deslocar à tarde para a entidade necessitava inscrever-se na Central de Atendimento da escola
e preencher uma planilha específica para o programa social. Nessa planilha, constavam os
nomes dos estudantes, a série, o local de deslocamento, com horário de saída e retorno. A
planilha era recolhida todos os dias, após o recreio, pelas pessoas responsáveis, para realizar o
deslocamento dos grupos da escola para as entidades. Também foram combinados
previamente o local para encontro e a postura de respeito e sensibilidade dos estudantes
durante as atividades na entidade. Os alunos, ao longo do ano, recebiam apoio da escola, com
materiais e espaços de apresentação para as suas produções previstas no projeto. Ao longo do
segundo ano do Ensino Médio, os espaços de avaliação, tanto para cada grupo como as
19
O componente curricular Fundamentos de Vida faz parte do currículo do segundo ano do Ensino Médio e
abre espaço de reflexão para questões da realidade dos jovens como: convivência com as diferenças, respeito,
amizade, problemáticas sociais, entre outros conteúdos.
21
entidades e as crianças, jovens e idosos assistidos, aconteceu na forma de entrevista oral e
escrita.
No terceiro ano, a culminância fica com a elaboração do Portfólio de Vivências
Sociais de cada grupo, novamente assessorada pelos professores que os acompanharam ao
longo do segundo ano do Ensino Médio. Esse espaço acontecerá nas aulas de Língua
Portuguesa, quando a professora orientará a estruturação do Portfólio. Os alunos constroem o
documento, que deverá conter, de forma criativa, as vivências significativas do processo,
através de fotos, entrevistas, pesquisas, filmes, relatos pessoais ou de grupo, complementando
com músicas, poesias e toda espécie de recursos que viabilizem a expressão dos significados
para os jovens e suas vivências solidárias.
No segundo semestre de 2007, temos a possibilidade de assistir, em espaço especial,
às apresentações dos projetos de cada grupo e à divulgação dos Portfólios para a comunidade,
no I Fórum Social da Fundação Evangélica. O evento deve acontecer com a presença dos pais,
familiares e convidados especiais, entre eles autoridades e promotores de ações sociais, ONGs
(Organizações não Governamentais). Esse momento de culminância contribuirá para a
reflexão sobre a proposta de estudo da pesquisadora. Os depoimentos, que hoje já ocorrem, de
transformação dos jovens adolescentes com seus projetos, assim como do público atendido
nas entidades, ou mesmo na proposta ambiental, materializam-se e expressam o vir a ser
através da sensibilidade como aporte central na vida das pessoas, como seres tocados pela
solidariedade. No momento final do Ensino Médio, com a formatura, os alunos recebem
certificação, com o tempo de atuação e seu foco de trabalho nas entidades. Em 2007, esse
grupo de alunos será o primeiro a ter vivenciado todo o processo. Então será possível avaliar a
seqüência de investimento solidário de cada aluno.
A riqueza de todo esse processo reside na transformação das pessoas, através da
educação com relação à cidadania
20
e à responsabilidade social, e seu processo curricular
20
O conceito de cidadania, muitas vezes, empregado em diversas situações do cotidiano, não fica claro na sua
dimensão, para todas as pessoas. Neste sentido, Gilberto Dimenstein (2005), faz a seguinte conceituação: ‘É
muito importante entender bem o que é cidadania. Trata-se de uma palavra usada todos os dias, com vários
sentidos. Mas hoje significa, em essência, o direito de viver decentemente. Cidadania é o direito de ter uma
idéia e poder expressá-la. É poder votar em quem quiser sem constrangimento, processar um médico que
tenha agido com negligência. É devolver um produto estragado e receber o dinheiro de volta. É o direito de
ser negro, índio, homossexual, mulher, sem ser discriminado. De praticar uma religião sem ser perseguido.
[...] O direito de ter direitos é uma conquista da humanidade. Da mesma forma que a anestesia, as vacinas, o
computador, o telefone celular, a máquina de lavar, a pasta de dente, o transplante de coração. Foi uma
conquista dura. Muita gente lutou e morreu para que tivéssemos o direito de votar. E outros batalharam para
que você possa votar aos 16 anos. Muito sangue foi derramado pela idéia de que todos os homens (mulheres)
merecem a liberdade e de que todos são iguais perante a lei’. DIMENSTEIN, Gilberto. O cidadão de papel:
a infância, a adolescência e os direitos humanos no Brasil. São Paulo: Ática, 2005, p.12-13.
22
permite a integração entre os componentes curriculares
21
. Atualmente, esses jovens estão na
sua terceira fase do programa. São 120 adolescentes do segundo ano do Ensino Médio,
organizados em 21 grupos distribuídos, que, durante o ano de 2006, atuaram em 11 entidades
pelos diversos bairros da cidade de Novo Hamburgo.
1.3 Metas do Programa
“Para aqueles que crêem, nenhuma explicação é necessária; e para aqueles que não
crêem, nenhuma explicação é possível”. (Santo Inácio de Loiola
)
22
Outro entendimento sobre a cidadania, descrito de forma contextualizada, é abordado por Sílvio Gallo
(2003), quando explica: Ao trazer à tona o fato da marginalização política, podemos perceber que ela se volta
contra o próprio ser humano. Quando os indivíduos se recusam a participar das decisões sociais, estão se
recusando a decidir sobre suas próprias vidas. Estão aceitando que os problemas que dizem respeito a suas
vidas sejam pensados e resolvidos por outras pessoas. Estamos, então cara a cara com uma sociedade servil.
Atestado o problema, é imperativo que se encontre a solução. Essa solução é a participação dos cidadãos nas
questões públicas. Entenda-se aqui cidadão como uma categoria de mobilização e não de localização. Para os
gregos antigos, o político era aquele que participava dos negócios da pólis. Quando a cultura grega foi
assumida e difundida pelos romanos, que falavam latim, a polis, virou a cive em sua língua. É da palavra
latina cive que se origina a palavra cidade, no português, e é também dela que vem a palavra cidadão.
Portanto, cidadania é sinônimo de política no sentido grego, assim como cidadão e política são a mesma
coisa. O cidadão não espera que o outro lhe dê as condições necessárias para participar, pois essas condições
brotam de si mesmo. É a autodeterminação. O cidadão sabe que é preciso buscar; é preciso conquistar. É uma
ação que não se acaba. O cidadão é sobretudo o participante. Para ter uma participação política efetiva, os
cidadãos devem se organizar para a defesa de interesses comuns, adquirindo vez e voz. Estamos nos
referindo à passagem do servilismo para o exercício da autêntica destinação da vida. Pela associação de todos
os cidadãos, manter-se-á viva a noção de que o ser humano con-vive e far-se-á a defesa da democracia como
a forma de governo que permite essa efetiva participação. E, com ela, os membros da sociedade não
esperarão o chamamento, pois estarão participando por livre e espontânea vontade. GALLO, Sílvio (Coord).
Ética e cidadania: caminhos da filosofia. São Paulo: Papirus, 2003, p. 26.
Ainda para complementar, apresento os estudos sobre cidadania de Maria de Lourdes Manzini Covre (1991),
que diz: “Só existe cidadania se houver a prática da reivindicação, da apropriação de espaços, da pugna para
fazer valer os direitos do cidadão. Neste sentido, a prática da cidadania pode ser a estratégia por excelência,
para a construção de uma sociedade melhor. Mas o primeiro pressuposto dessa prática é que esteja
assegurado o direito de reivindicar os direitos, e que o conhecimento deste se estenda cada vez mais a toda a
população. As pessoas tendem a pensar a cidadania apenas em termos dos direitos a receber, negligenciando
o fato de que elas próprias podem ser o agente da existência desses direitos. Acabam por revelar os deveres
que lhes cabem, omitindo-se no sentido de serem também, de alguma forma, parte do governo, ou seja, é
preciso trabalhar para conquistar esses direitos. Em vez de meros receptores, são acima de tudo sujeitos
daquilo que podem conquistar. Se existe um problema em seu bairro ou em sua rua, por exemplo, não se deve
esperar que a solução venha espontaneamente. É preciso que os moradores se organizem e busquem uma
solução capaz de atingir vários níveis, entre eles o de pressionar os órgãos governamentais competentes.
Desse modo, penso que a cidadania é o próprio direito à vida no sentido pleno. Trata-se de um direito que
precisa ser construído coletivamente, não só em termos do atendimento às necessidades básicas, mas de
acesso a todos os níveis de existência, incluindo o mais abrangente, o papel do(os) homem(s) do Universo.”
COVRE, Maria de Lourdes Manzini. O que é cidadania. São Paulo:Brasiliense, 1991, p. 10-11.
21
No capítulo III, as contribuições teóricas as reflexões da socióloga e psicanalista Maria Rita Kehl, Leonardo
Boff, estudos sobre Lutero na visão de Gottfried Brakemeier e Marcelo Rezende Guimarães sobre a educação
para a paz.
22
VIVER..., 2004, p. 176.
23
O programa, por seu caráter acadêmico com ações sociais, tem como foco dois
públicos como beneficiários. De um lado, jovens adolescentes de 14 a 18 anos do Ensino
Médio, de classe social A e B, aprendem, na escola, de forma curricular e extraclasse, a
formular os seus projetos com embasamento científico. O outro público beneficiado é aquele
vinculado aos projetos de cada grupo de adolescentes, que, nesse caso, perfazem 21 grupos,
beneficiando 11 entidades. São crianças, jovens e idosos em situação de vulnerabilidade
social, em situação econômica pobre, de ambos os sexos, de idade de berçário a 16 anos e, em
algumas entidades, até 18 anos, além dos idosos de 65 a 95 anos.
Nesse contexto que envolve crianças e jovens, a grande maioria é composta de filhos
de operários de indústrias calçadistas, de pais desempregados, de envolvidos em atividades
informais, de emigrantes de outras regiões do país, em situação de abandono e marginalidade
na família. Além desse público, as crianças portadoras de câncer estão vinculadas pelas
entidades que prestam esse atendimento. No atendimento dedicado às pessoas em idade
avançada, o principal foco a ser trabalhado com os idosos que vivem em lares assistenciais é a
auto-estima, pois muitos se encontram em abandono nesses locais. Outro aspecto voltado à
solidariedade remete para a preocupação com o meio ambiente, sendo que projetos organizam
espaços privados e públicos, contribuindo, assim, com a preservação da natureza. Cada ação
dos grupos reverte em trocas que contribuem mutuamente para escrever esse espaço tão rico
da solidariedade.
Diante do cenário em que vivemos, a conscientização de crianças e jovens constitui
um legado para perpetuar a vida no planeta, mas, acima de tudo, da vida com respeito e
dignidade, na obra de Deus. Sendo assim, o programa possibilitará que os adolescentes,
alunos do Ensino Médio, com embasamento científico para a prática de atividades de cunho
social e atuação na realidade local, aprendam a sistematizar ações de voluntariado,
colaborando para a formação de jovens mais críticos e atuantes na sociedade em que vivem.
Também, engajados em seus projetos, os adolescentes aprenderão a gerenciar os conteúdos
temáticos que constituem sua identidade no processo de desenvolvimento, refletindo sobre as
contribuições das ações no programa social nessa construção. Por outra via, a relação do
jovem com as diversas dificuldades e manifestações sociais expressas no contato da realidade
social (significantes) e seus significados oportunizará seu crescimento e aprimoramento como
cidadão.
Com isso, através do desenvolvimento de projetos nas áreas sociais, ambientais,
culturais, entre outras, a promoção da prática de ações solidárias fortalecerá o entendimento
para a cidadania e a construção de uma nação socialmente mais justa. A construção de
24
espaços de planejamento que revertam em prol da rede de organizações comprometidas com
as ações solidárias consolidará o engajamento entre educadores, familiares e jovens
adolescentes, com estímulo para a inserção dos projetos sociais nos programas escolares e o
reconhecimento das iniciativas eficazes de projetos de ação social dos jovens e da escola,
dando-lhes visibilidade. Nesse aspecto, cabe apresentar alguns dados referentes ao
atendimento de crianças e adolescentes na cidade de Novo Hamburgo:
Na rede de atendimento à criança e ao adolescente destaca-se o número de escolas
existentes: um total de 108, sendo 74 da rede municipal, 22 da rede estadual e 12
escolas particulares. No entanto, este número não se traduz em grau de instrução,
pois estima-se que apenas 9,3% da população possuem ensino médio completo. Os
indicadores de educação formal do município apontam para a importância de ações
integradas - de uma rede - que dê sustentabilidade a esta concepção de sociedade,
onde a criança e o adolescente devam ser tratados como sujeitos de direitos, pessoas
em condição peculiar de desenvolvimento. O Conselho Municipal de Direitos da
Criança e do Adolescente (CMDCA/NH) aparece, nesse caso, como instância
articuladora desse modelo, e possui atualmente 61 entidades/programas cadastrados;
sendo que 43 são entidades não-governamentais, e 18 são entidades/programas
governamentais com o seguinte perfil: Entidades voltadas para atendimento sócio-
educativo em turno inverso ao da escola: 15 entidades sendo 11 governamentais e 3
não governamentais (ONGs); Abrigos para criança e adolescente vítimas de algum
tipo de violência: 6 entidades, 3 governamentais e 3 ONGs; Casa de Passagem
(abrigos temporários) também para criança e adolescente vítimas de violência: 2
entidades, 1 municipal e outra ONG; Iniciação Profissional: O CMDCA possui 2
entidades (ONGs) voltadas para a iniciação profissional de jovens e adolescentes;
Entidades para criança e adolescente portadores de necessidades especiais: 2
entidades (ONGs), uma de apoio a deficientes visuais e outra de atendimento direto
a portadores de deficiência leve; Abordagem de Rua: uma ONG dedica-se à
educação de meninas e meninos em situação de rua; Escola: existe uma escola
voltada ao atendimento de jovens com defasagem entre série/idade ou com
dificuldade de inserção na rede de ensino tradicional. Além dessa rede básica, Novo
Hamburgo conta com um Conselho Tutelar formado por cinco conselheiros, eleitos
de forma direta; um Juizado da Infância da Juventude, somando 45 entidades
prestadoras de serviços, que juntamente com o CMDCA, estão preocupadas em
atingir uma maior eficácia na política de atendimento à infância e à juventude deste
município. Semelhante ao que ocorre em outros municípios, Novo Hamburgo possui
um grande déficit na área de saúde e depende dos serviços existentes em Porto
Alegre, capital do estado, para realização de diversos atendimentos. A preocupação
hoje é no sentido de desenvolver e ampliar ações preventivas de saúde,
principalmente com crianças e adolescentes, promovendo uma articulação constante
de todos os atores.
23
Com a apresentação de dados sobre o contexto de atendimento das crianças e
adolescentes, a escola, ao propor o programa social, oportunizará espaço de inter-relação entre
prática e teoria, dando, assim, mais vida ao fazer acadêmico, consolidando com as autoridades
do poder público o apoio necessário para o desenvolvimento de projetos sociais nas escolas.
Acima de tudo, o exercício da espiritualidade engajada pela vida e pelo mundo constituirá a
transformação do meio social, indo ao encontro da base filosófica da Escola: o amor. A
23
Disponível em: <http://www.risolidaria.org.br>. Acesso em: 10 mar. 2007.
25
preocupação com ações educacionais mais efetivas sobre a responsabilidade com o mundo
que nos cerca mostra a necessidade de encaminhamento para conquistar o entrelace solidário
no entorno social.
1.4 Administração do Programa
“A verdadeira viagem de descobrimento não consiste em procurar novas paisagens,
e sim em ter novos olhos”. (Marcel Proust)
24
O programa é administrado pela escola, com apoio da mantenedora, direção geral e
de unidade, núcleo pedagógico, professores, funcionários, alunos e pais. Os custos do
programa foram aprovados em 2004 pela mantenedora, que liberou um valor mensal para
sustentação do programa. Também nessa liberação aconteceu a aprovação financeira para
custeio das reuniões do grupo de liderança do programa, formado por coordenação, assessoria
pedagógica, professores e funcionária administrativa. Os custos com aprimoramento dos
professores, participação em seminários, congressos, simpósios, ou mesmo a contribuição da
escola, com parcela no mestrado profissionalizante, são investimentos para as atividades em
programas sociais. O deslocamento dos alunos para as entidades e os materiais utilizados para
desenvolvimento dos projetos fazem parte do investimento de escola. Todas as decisões são
tomadas em grupo e, se houver a necessidade, ampliam-se as consultas e os
compartilhamentos. O grupo de liderança tem autonomia para as decisões que necessita
encaminhar. A avaliação de cada decisão é retomada na próxima reunião e registrada em ata.
Os alunos estão constantemente refletindo sobre o processo, e suas contribuições são
consideradas a cada etapa de desenvolvimento do programa. Devido ao caráter inovador e à
existência de dois anos do programa, ainda estão sendo consolidadas algumas etapas.
1.5 Beneficiados pelo Programa
“Vede, não desprezeis algum destes pequeninos: porque eu vos declaro que os seus
anjos nos céus incessantemente estão vendo a face do meu Pai que está nos céus”.
(Mateus 18:10)
25
Em 2005, os projetos dos 21 grupos focalizaram as necessidades das entidades
cadastradas e as áreas de interesse dos alunos, de modo que foram efetivamente implantados
24
VIVER..., 2004, p. 147.
25
Ibid. , p. 435.
26
em 2006. Os alunos do Ensino Médio, envolvidos nos projetos, estão subdivididos em grupos
com a orientação de professores das mais diversas áreas de ensino. Os alunos e professores
participam de atividades, de forma sistemática, dedicando horas para viabilizar as ações,
incluindo diagnósticos, planejamento e execução. As ações do programa atendem onze
entidades.
Entre as instituições beneficiadas, encontra-se o Lar de Menina, no qual são
atendidas 32 meninas de 4 a 14 anos, encaminhadas pelo Conselho Tutelar e/ou Juizado da
Infância e Juventude, que se encontram em situação de risco, abandono ou negligência
familiar.
Com o trabalho voltado aos idosos, o Lar São Vicente atende 38 idosos dos 65 aos 96
anos, em regime integral. O lar oferece serviços de abrigo, alimentação, vestuário e toda
assistência na área da saúde.
O trabalho desenvolvido pela AMO – Assistência ao Menor de Oncologia atende 43
crianças até os 14 anos, com câncer. A entidade presta serviço gratuito de consultas médicas,
exames, internação hospitalar, acompanhamento terapêutico, apoio psicossocial, atendimento
odontológico, fornecimento dos medicamentos, procedimento de aplicação de quimioterapia,
acompanhamento pós-quimioterapia e manutenção e fornecimento de passagens para os
pacientes e familiares que os acompanham.
No espaço do Projeto Vida Semeando Esperança, são atendidas 42 crianças e
adolescentes, em turno contrário ao escolar, com atividades de reforço de aprendizagem,
recreação, música, dança, atividades físicas, artesanato. A entidade tem a colaboração de
voluntários.
Na Horta Comunitária, são atendidas crianças, adolescentes e jovens através de
oficinas, formação de floricultores e artesãos, informática básica e pré-vestibular comunitário.
As atividades serão mantidas através de uma rede de amigos e parcerias com empresas e
instituições públicas e particulares, contando também com trabalho voluntário.
No Núcleo Primavera, 110 crianças e jovens são atendidos em turno contrário ao
escolar, com atividades como teatro de bonecos, danças diversas, hip-hop, oficina de reforço e
artesanato. A entidade oferece almoço diariamente e tem apoio de voluntários.
O Centro de Vivência Redentora atende 340 crianças e adolescentes, através de
“Espaços” denominados: espaço Vivência Cultural – conta com oficinas de pintura,
artesanato, ballet, dança contemporânea, informática, inglês e espanhol e arte literária; espaço
Vivência Social – conta com sala de recursos atendimento médico, internet comunitária,
27
biblioteca comunitária, reiki; espaço Vivência Esportiva (conta com capoeira e recreação; e
espaço de Profissionalização – com apoio do Projeto Vencer);
No Lar João e Maria, as crianças e adolescentes são encaminhadas pelo Conselho
Tutelar e/ou Juizado da Infância e Juventude, as quais se encontram em situação de risco,
abandono ou negligência familiar.
A ABEFI - Associação Beneficente Evangélica da Floresta Imperial atende 180
crianças e adolescentes, em turno integral, com a colaboração de professores, psicólogo,
pedagogo e estagiários em atividades de recreação, centros de interesse e demais projetos
pedagógicos.
No espaço escolar da Fundação Evangélica, os alunos têm uma para proposta
ecológica, com materiais recicláveis. O chamado “morrinho” da escola tem preservação
ambiental. A proposta de construção de um anfiteatro (com material reciclável) para espaço
de convívio desafia os jovens e o professor de Biologia.
1.5.1 Propostas dos Projetos dos Alunos
Mesmo que soubesse que o mundo se desintegraria amanhã, ainda assim plantaria a
minha macieira. (Martin Lutero)
26
Os projetos propostos pelos alunos nas entidades e o professor orientador estão
especificados no quadro
27
abaixo:
ENTIDADE GRUPO SÉRIE ORIENTADOR ATIVIDADE
CANIL
MUNICIPAL
AMO
Grupo 1 1ªA-C Profª. de História Atividades com o
Canil Público e
AMO com notas
CENTRO
REDENTORA
Grupo 2 1ªB Prof. de Informática Informática
1ªC Profª. de Biologia Teatro, música,
fantoches,
brincadeiras
NÚCLEO
PRIMAVERA
Grupo 3 1ªA Profª. de Dança Dança
Grupo 4. 1ªC Prof. de Educação
Física
Aulas de Vôlei e
recreação
HORTA
COMUNITÁRIA
Grupo 5 1ªA Prof. de Educação
Física
Futebol
Grupo 6 1ªB Prof. de História Regras de jogos e
esportes
Grupo 7 1ªC Prof. de Educação
Física
Futebol
Grupo 8 1ªC Profª. de Inglês Aulas de inglês
26
VIVER..., 2004, p. 171.
27
Os desdobramentos das atividades, números de pessoas atendidas estão em anexo.
28
PROJETO VIDA –
SEMEANDO
ESPERANÇA
Grupo 9 1ªB Profª. de Língua
Portuguesa
Reforço escolar e
recreação
LAR JOÃO E
MARIA
Grupo 10 1ªB Bibliotecária Teatro, dança,
artesanato
Grupo 11 1ªB Profª. de Inglês Jogos, aulas de
reforço, recreação
ABEFI Grupo 12 1ªB Profª. de Física Recreação
Grupo 13 1ªC Prof. de Informática Informática
Grupo 14 1ªB Profª. de Química Recreação
Grupo 15 1ªB Profª. de Inglês Recreação
AMO Grupo 16 1ªC Prof. de Educação
Física
Digitação de notas
fiscais e
participação nas
campanhas
LAR DA MENINA Grupo 17 1ªD Prof. de Física Teatro
Grupo (parte do grupo 10) 1ªB Bibliotecária
28
Dança e Origami
HORTA
COMUNITÁRIA
Grupo 18 1ªC Campanhas, internet
ABEFI Grupo 19 1ªD Profª. de Língua
Portuguesa
Recreação e música.
LAR SÃO
VICENTE
Grupo 20 1ªD Profª. de
Matemática
Jogos, recreação,
música.
MORRINHO DA
FUNDAÇÃO
EVANGÉLICA
Grupo 21 1ªD Prof. de Biologia Anfiteatro com
material reciclado
Quadro 1: Os projetos de cada grupos de alunos – prévia. Organizado pela pesquisadora.
1.6 Avaliação do Programa
Em lugar de um homem de êxito, procura ser um homem valioso: o restante chegará
naturalmente. (Albert Einstein)
29
Existem dois tipos de beneficiários no programa proposto: os alunos, que estão
criando os seus projetos através da metodologia científica e vivenciando sua ação solidária, e
as entidades. Para o primeiro grupo, a avaliação é realizada sistematicamente em três
trimestres. Os alunos do Ensino Médio têm o acompanhamento semanal de professores
orientadores e equipe de liderança do programa. Do processo de avaliação fazem parte
questionários, análise de filmes, debates sobre a realidade atual, discussões sobre a
problemática social, montagem de material explicativo sobre o projeto de cada grupo,
relatórios escritos, análise dos documentos na pasta, entre outros. As notas de zero a dez e
orientações a cada um dos grupos com suas peculiaridades são referência de acompanhamento
e avaliação, na execução de cada projeto. As entidades beneficiadas são cadastradas na
Fundação Semear, uma organização do terceiro setor, que atua em Novo Hamburgo e presta
28
Este grupo se dividiu, mas a professora-orientadora continuou a mesma.
29
VIVER..., 2004, p. 157.
29
assessoria a entidades diversificadas, além de oferecer cursos de interesses específicos. Os
professores e o grupo coordenador do Projeto “Um olhar para o Outro” realizam formação
específica, em locais promotores de estudos sobre programas sociais, entre eles, a Fundação
Semear, SINEPE – Sindicato das Escolas Particulares, EST - Escola Superior de Teologia e
outros.
No presente contexto da Escola, com a proposta de atividades para os alunos do
Ensino Médio, as repercussões das ações repercutem na comunidade em geral, necessitando
de encaminhamentos que gerem informações para avaliar e ressignificar o fazer pedagógico,
tanto da Escola para a comunidade e também vice-versa.
Portanto, a comunidade local e também regional recebe informações através dos
jornais, revistas, programas de televisão e demais meios de informação. Também os encontros
com grupos de entidades, famílias e ONGs (Organizações não Governamentais) interessadas
pelo trabalho desenvolvido pelos alunos marcam a importância e relevância do programa.
No ano de 2006, a Feira das Entidades aconteceu em forma de painel, no qual cada
entidade trouxe sua realidade e evidenciou suas necessidades. Os alunos esclareceram suas
dúvidas e manifestaram no contato com os representantes das entidades, o seu interesse pelas
causas do local. Nesse momento de apresentação, os alunos do segundo ano, que já atuam nas
diversas áreas do programa social, relataram seus objetivos e vivências para os alunos do
primeiro ano do Ensino Médio. As trocas de experiências possibilitaram a compreensão da
dimensão dos projetos dos alunos. Esses, vinculados no amor ao próximo, apresentaram a
importância da atenção pelo olhar com sensibilidade, a possibilidade de um sentido de vida
para todos envolvidos nas ações sociais.
Um momento de avaliação aconteceu no mês de julho de 2006, quando as entidades
foram visitadas pela mestranda e manifestaram suas opiniões e sugestões sobre os projetos
dos alunos. A abordagem realizada pelas entidades evidenciou os aspectos positivos e os
aspectos a melhorar de cada grupo, auxiliando no processo de diálogo com os jovens e
aperfeiçoamento dos projetos, que está descrito abaixo.
Entidade Projeto Aspectos positivos Aspectos a melhorar
Centro de
Vivência
Redentora
Teatro
-Grupo integrado, com ótimo relacionamento com as
crianças, independentes nas propostas e ações;
preparados engajados; oferecem algo sempre
diferente para as crianças; organizados; dialogam
com as pessoas da entidade e compareceram fora do
-Nenhum
-Cumprimento do
30
Informática
período de aulas, inclusive vieram nas férias;
-Os alunos da informática estão mais acanhados,
com vergonha, as crianças gostam da informática e
estabeleceram vínculo com os alunos.
cronograma de dias na
entidade (faltas devido às
demais atividades
escolares).
Núcleo
Primavera
Dança
Vôlei
-Crianças estão encantadas com a dança, as alunas
passam valores; são alegres e as crianças ouvem as
alunas do projeto, sendo que, uma adolescente do
núcleo pediu para dançar junto com as crianças;
- A proposta de ensinar vôlei trouxe incentivo para o
esporte, e as crianças participaram com alegria.
-O projeto escrito e a
freqüência das alunas.
-Cronograma com horário
e dias grupo.
Lar São
Vicente
Atividades
lúdicas e
música
-Alunas integradas trazem alegria aos idosos e idosas
com músicas, jogos e escutando suas histórias.
-Mais horas dedicadas à
entidade.
Horta
Comunitária
Inglês
Esporte
-Alunas empenhadas e preparadas, têm muito afeto e
são espontâneas, apresentando proposta diferenciada
com atividades estimuladoras;
-Grupo se evidencia boa vontade, na proposta das
brincadeiras com as crianças/ que esperam por eles;
professores auxiliam e apóiam o grupo na superação
de dificuldades.
-Nenhum.
-Nenhum.
-Nenhum. AMO
Associação
de
Assistência
ao Menor
em
Oncologia
Digitação de
notas fiscais e
participação
em
promoções
- Os alunos entregaram as cautelas; fizeram
recolhimento e doação de agasalhos e jornal e em
agosto, quando iniciou a nova etapa do registro de
notas fiscais, o empenho dos alunos no contato com
a entidade foi muito positivo. Também a participação
no Mac Dia Feliz, atividade de venda de camisetas,
réguas, bonés e canecas, em favor da AMO foi um
sucesso, com a melhor arrecadação dos postos de
venda. O total arrecadado chegou a R$ 2.700,00. O
ponto de venda da Fundação aconteceu na rua Bento
Gonçalves com a rua Marcílio Dias.
Lar da
Menina
Teatro
Dança
Origami
- Grupo organizado e afetivo, com liderança positiva,
demonstrando preocupação no encaminhamento das
tarefas com as meninas, cuja culminância das
atividades aconteceu com a apresentação do teatro e
a dança, para os familiares, professores e pessoas
mantenedoras da associação. No teatro chamado
“Uns quinze anos depois...”, as meninas e
adolescentes revelaram a importância do Lar nas
suas vidas, como oportunidade de encaminhamentos
para os seus sonhos de vida;
-Atividade de ensinar as dobraduras motivou um
grupo de meninas para a aprendizagem.
-Nenhum.
- Nenhum.
ABEFI
Associação
de
Assistência
Beneficente
da Floresta
Imperial
Música
Recreação e
atividades
lúdicas
Informática
- As crianças que aprendem flauta e violão estão
encantadas e demonstram vontade de aprender e
esperam ansiosos pelo seu momento de
aprendizagem;
-as crianças esperam pelos adolescentes nos dias
marcados e participam espontaneamente, brincando e
correndo durante toda tarde; algumas jovens deste
grupo auxiliam no berçário, com comprometimento
nos cuidados necessários com os bebês, carinho e
preocupação;
-Os alunos contribuem com os conhecimentos
básicos de informática para um grupo de crianças e
auxiliaram com a manutenção dos computadores.
- Dificuldades nos dias de
prova, quando os
adolescentes necessitam
faltar e as crianças
esperam por eles nos dias
previstos.
31
Lar João e
Maria
Recreação
Dança
- O trabalho realizado pelos adolescentes traz
satisfação; comparecem com regularidade e sempre
têm proposta organizada, muita boa vontade,
liderança, agindo com cordialidade e educação;
trabalharam com filmes, tinta, esporte.
-crianças aprendem dança e o grupo propõe atividade
festiva como culminância;
-Nenhum.
-Nenhum.
Projeto Vida
Semeando
Esperança
Reforço
Escolar e
recreação
-As atividades diversificadas propostas pelas alunas
são criativas e envolvem as crianças. No início, as
alunas estavam mais tímidas, mas com o passar do
tempo houve maior integração com as crianças;
algumas atividades como criação de bandeira durante
a copa; ensino de inglês; de plantar feijão como
atividade prática, as crianças adoraram todos os
momentos.
-Maior número de dias na
entidade.
Canil
Municipal
Campanhas
de adoção de
animais, de
jornais, de
medicamentos
.
-Os alunos são valorizados por sua iniciativa,
demonstrando carinho e afeto com a causa dos
animais abandonados.
- Nenhum.
Projeto
ecológico
Construção de
anfiteatro com
material de
sucata
-Os alunos estudaram o espaço e buscaram materiais
descartáveis na construção de um anfiteatro.
-Atividade será concluída
em 2007.
Quadro 2: Síntese das avaliações das entidades. Elaborado pela pesquisadora.
Na avaliação
30
realizada com as entidades, percebe-se o envolvimento dos
adolescentes com as atividades propostas nos projetos. Também por parte das coordenações
existe a valorização com a participação dos jovens, visto que expressam a importância do
desenvolvimento das ações solidárias e verificam que as contribuições para as crianças,
jovens e os idosos são significativas para ambas as partes. Nos relatos de cada entidade,
através das coordenações, fica expresso o desejo de continuidade do trabalho solidário
desenvolvido pelos adolescentes. A preocupação das entidades, no item que pergunta sobre os
aspectos a melhorar, revela a necessidade de maior organização dos adolescentes
31
quanto à
freqüência, entrega de cronogramas, planejamentos, entre outros. Mesmo assim, a grande
maioria das entidades não evidencia preocupação inicial, declarando nenhum ponto a
melhorar.
Como coordenadora do programa, a satisfação das entidades revela a manifestação e
valorização das pessoas assistidas, como também dos adolescentes, que investem seu tempo e
conhecimento, compreendendo a importância do seu trabalho, tanto para valorização do ser
30
Cabe ressaltar que a avaliação tem como base a opinião dos assistidos e, nesse caso, as coordenações
representaram a voz das crianças, jovens, idosos, responsáveis pelos animais no canil e projeto ambiental.
31
Questões sobre adolescência e sua organização, desenvolvidas no capítulo II.
32
humano em situação de carência e pobreza, como na relação de dignidade mútua que se
estabelece no viés da solidariedade.
No próximo capítulo, a adolescência é foco do estudo, inicialmente com
apresentação dos teóricos, logo após, a adolescência e a inserção no mundo, as preocupações
e aspectos importantes na vida dos adolescentes, fundamentando a busca dos jovens por
reconhecimento e sentido de vida.
O progresso de uma civilização se mede pelo aumento da sensibilidade para o outro.
(Teilhard de Chardin)
32
32
ASSMANN ; MO SUNG, 2000, p. 304.
2 ADOLESCÊNCIA
2.1 A Adolescência e os Referenciais na Contemporaneidade
“Todos os pais foram filhos, muitos filhos vêm a ser pais, mas uns esqueceram-se
daquilo que foram, e aos outros não há ninguém que possa explicar-lhes o que
serão...” (José Saramago)
33
Para dialogar sobre a adolescência
34
, os teóricos que fundamentam o estudo sobre o
assunto possibilitam o entendimento das diversas dimensões implicadas no contexto da
educação solidária. Também para analisar o contexto atual, faz-se referência às perspectivas
sociais em que o jovem se encontra atualmente, remetidas para a solidariedade como base
teológica e sentido de vida.
Entre os estudiosos citados para fundamentar com suas abordagens a questão da
adolescência, cito Contardo Calligaris
35
, psicanalista, doutor em psicologia clínica pela
Universidade de Provence. Sua abordagem evidencia a adolescência como mito, inventado no
começo do século 20, que se sobressai essencialmente a partir da Segunda Guerra Mundial.
Também entende que “a adolescência é o prisma pelas quais os adultos olham os adolescentes
e pelo quais os próprios adolescentes se contemplam”.
36
Expressa que, em nossa época, a
adolescência tem poder na formação cultural.
Da infância idealizada à idealização da adolescência, existem questões analisadas
pelo autor, um aspecto evidenciado nos pós-guerras do século XX. A criança, ao crescer,
parece-se com um adulto, seu corpo está pronto para despertar desejos. Mas, em vez de
assumir responsabilidades, iniciando-se diretamente na vida adulta, os insatisfeitos adultos
modernos resolvem que o melhor é manter para essas crianças recém-crescidas o mesmo
33
VIVER..., 2004, p. 236.
34
Os teóricos escolhidos têm sua base de estudo na adolescência, onde os jovens têm acesso às suas necessidades
básicas, com boa estrutura financeira, possibilitando diversas oportunidades de vida. Nesse sentido, o único
teórico que descreve aspectos da carência é DAUNIS (2000), mas sem muita expressividade. Preocupa a
abordagem seletiva desses teóricos, uma vez que, a universalidade dos dados favoreceria uma leitura mais
profunda das representações de pessoas envolvidas no programa.
35
CALLIGARIS, Contardo, entre suas obras, conta: Terra de Ninguém, 2004; Livros, 2003 (obra com mais
autores); Cartas a um Jovem Terapeuta, 2004, Adolescência, 2000, escreve suas crônicas na Folha de São
Paulo.
36
CALLIGARIS, Contardo. A adolescência. São Paulo: Publifolha, 2000, p. 9.
34
estatuto que as marcaram na infância, ou seja: deverão continuar como “crianças felizes”.
37
Criou-se aquilo que o psicanalista Contardo Calligaris chamou de “adultos de férias”.
38
Essa idealização da adolescência pelos adultos coloca-se no ponto de referência da
função que o mercado adolescente ostenta na mídia. Assistimos, atualmente, à mídia
estabelecendo na adolescência e nas suas questões a possibilidade de um excelente negócio.
De acordo com Calligaris, na idealização comercial e para maior proveito dos empresários da
adolescência, praticamente todos os estilos adolescentes são vendidos aos adultos. Por meio
do consumo de produtos vinculados aos adolescentes, constitui-se uma identificação comum
no estilo de linguagem, pela qual os adultos buscam realizar a felicidade que supõem ser
plena nos adolescentes.
39
O autor define os adolescentes com uma imensa capacidade de assimilar a nossa
cultura
40
, pois, ao longo de mais ou menos 12 anos, as crianças e púberes interagem e
aprendem aspectos importantes para chegar à felicidade e serem reconhecidas em
comunidade, nos aspectos amorosos, sexuais, financeiros e sociais. Para fazer parte do meio
social, buscam, para suas vidas, o sucesso e o destaque em todas as dimensões aprendidas
anteriormente. Além disso, seu amadurecimento corporal, juntamente com os valores
adquiridos, permite-lhes competir, de igual para igual, com todos ao seu redor. Mesmo assim,
o adolescente se encontra em período de moratória, como diz Calligaris
41
.
Ele se torna um adolescente quando, apesar de seu corpo e seu espírito estarem
prontos para a competição, não é reconhecido como adulto. Logo, aprende que, por volta de
mais dez anos, ficará sob a tutela dos adultos, preparando-se para o sexo, o amor e o trabalho,
sem produzir, ganhar ou amar; ou então produzindo, ganhando e amando, só que
marginalmente. Uma vez transmitidos os valores sociais mais básicos, há um tempo de
suspensão entre a chegada à maturação dos corpos e a autorização de realizar os ditos valores.
Essa autorização é postergada. É um tempo de suspensão é a adolescência. Esse fenômeno é
novo, quase especificamente contemporâneo. É com a modernidade tardia (como o século que
mal acabou) que essa moratória se instaura, prolonga-se e torna-se, enfim, mais uma idade de
vida.
42
O autor também entende que situações antagônicas apresentam-se aos adultos, os
quais ora protegem e assistem os adolescentes, mantendo-os no “mundo encantado da
37
CALLIGARIS, 2000, p. 69.
38
Ibid. , p. 74.
39
Ibid. , p. 59.
40
Ibid. , p. 14.
41
Ibid. , p. 16.
42
Ibid. , p. 15 - 16.
35
infância, sem obrigações e responsabilidade”, e, por outro lado, o desenvolvimento e
amadurecimento corporal, parecendo adultos, realizando desejos e prazeres.
43
Esse espaço
ocupado pelo adolescente traz para o adulto um desejo subjetivo de felicidade e evidencia-se
na fala do autor:
Os adolescentes ideais têm corpos que reconhecemos como parecidos com os nossos
em suas formas e seus gozos, prazeres iguais aos nossos e, ao mesmo tempo, graça à
mágica da infância estendida até eles, são ou deveriam ser felizes numa hipotética
suspensão das obrigações, das dificuldades e das responsabilidades da vida adulta.
Eles são adultos de férias, sem lei.
44
Nessa busca por se tornar adulto, Calligaris explica que o adolescente necessita do
reconhecimento deste adulto, para fazer parte do meio social. Nesse sentido, ele busca a
transgressão como meio para ser reconhecido. O autor cita que, “para ser amado, para
preencher as expectativas do desejo dos adultos, é necessário, paradoxalmente, não se
conformar ao que os mesmo adultos explicitamente pedem”.
45
Com provocação, o autor salienta questões como, “Porque desejar ser adulto quando
os adultos querem ser adolescentes?”
46
“E por que desejar o reconhecimento dos adultos, se
na verdade são estes que parecem pedir que os adolescentes os reconheçam como pares?”
47
Questões como essas, e tantas outras que envolvem o conteúdo das relações na
contemporaneidade, refletem na vida de jovens em busca do sentido de vida e sua relação
com a sociedade.
Na questão voltada à adolescência, referencio José Outeiral
48
, médico psiquiatra e
psicanalista, membro titular da International Psycho-Analytical Association. Sua abordagem
evidencia a adolescência em contexto da modernidade e pós-modernidade, considerando a
necessidade de reflexão mais profunda sobre os conflitos desse período, a necessidade de
limites, a função materna e paterna e a proposta curricular nas escolas para construir relações
mais significativas entre professor e aluno e o conteúdo que permeia nas salas de aula.
49
A tarefa de educar crianças e adolescentes para a realidade do século XXI denota
claramente as necessidades emergentes da nossa época, na relevância de rever conceitos que
43
CALLIGARIS, 2000, p. 69.
44
Ibid. , p. 69.
45
Ibid. , p. 32.
46
Ibid. , p. 74.
47
Ibid. , p. 74.
48
OUTEIRAL, José, entre as suas obras: O mal-estar na escola, 2003, Desamparo e Trauma – Transferência e
Contratransferência, 2003, Adolescer, 2003, Drogas: Uma Conversa Necessária e Urgente, 2002, Paixão e
Criatividade – Frida Kahlo, Camille Claudel e Coco Chanel, 2001, Winnicott: Seminários Paulistas, 2001, A
clínica da Transicionalidade – Fragmentos da Análise de um Adolescente, 2000, entre outras.
49
OUTEIRAL, José ; CEREZER, Cleon. O mal-estar na escola. Rio de Janeiro: Revinter Ltda., 2003, p. 2-3.
36
estabeleçam valores e metas norteadoras, significando a vida das famílias e comunidade no
geral.
50
Os autores expressam sua visão sobre a modernidade e as questões educacionais em
contraponto às mudanças, quando cita:
A pós-modernidade é um conceito multifacetado que chama a nossa atenção para
um conjunto de mudanças sociais e culturais profundas que estão acontecendo desde
o século XX em muitas sociedades ‘avançadas’. Tudo está englobado: uma mudança
tecnológica acelerada, envolvendo as telecomunicações e o poder da informática,
alterações nas relações políticas e o surgimento de movimentos sociais,
especialmente os relacionados com aspectos étnicos e raciais, ecológicos e de
competição entre os sexos. Mas a questão ainda mais abrangente: estará a
modernidade em si, como uma entidade sociocultural, desintegrando-se e levando
consigo todo o suntuoso edifício da cosmovisão iluminista?
51
Outeiral referencia a adolescência como um momento muito “criativo”, devido às
transformações próprias dessa faixa etária.
52
A conquista do pensamento formal estabelece
uma série de oportunidades, criadas através de hipóteses e possíveis conclusões. Esse
pensamento formal leva o adolescente, conforme o autor, para a “solução de problemas da
humanidade, muito embora a maioria delas não seja exeqüível na prática”.
53
Na visão do
adulto, esse caráter “mágico” do adolescente entre o “pensamento” e o “exeqüível” mostra-se
difuso e caótico, mas é perfeitamente normal como espaço criador. O autor explica essa
transição como:
Aos poucos a atividade criativa vai assumindo um perfil mais definido, mais
integrado e produtivo. O período de transição, entretanto, necessita de um ambiente
propício capaz de suportar as tensões dos momentos iniciais desse processo criativo
peculiar, tanto na família como na escola. A criatividade na adolescência articula-se
necessariamente com a noção de limite. Limite é uma palavra que tem, muitas vezes,
uma conotação negativa, ligada erroneamente a ‘repressão’, ‘proibição’, ‘interdição’
etc., inclusive lembrando ‘repressão política’. No entanto, limite é algo muito além
disso: significa a criação de um espaço protegido dentro do qual o adolescente
poderá exercer sua espontaneidade e criatividade sem receios e riscos. Precisamos
lembrar que não existe conteúdo organizado sem um continente que lhe dê forma.
54
Os psicanalistas contribuem com reflexões sobre a escola e os currículos, observando
que as manifestações dos adolescentes são reveladoras de seus desconfortos e buscam por
respostas para situações singulares da vida de cada ser humano com suas necessidades e
inserções culturais.
55
50
OUTEIRAL ; CEREZER, 2003, p. 4-5.
51
David Lyo apud OUTEIRAL, José e CEREZER, Cleon. O mal-estar na escola. Rio de Janeiro: Revinter
Ltda., 2003, p. 65
52
OUTEIRAL ; CEREZER, 2003, p. 2.
53
Ibid. , p. 2.
54
Ibid. , p. 2.
55
Ibid. , p. 4.
37
Outro pesquisador é o sociólogo polonês Zygmunt Bauman (2001). Na obra
Modernidade Líquida,
56
fala das profundas mudanças da modernidade “pesada” para a
modernidade “líquida”, “fluida”.
57
Compreende que necessitamos assumir a responsabilidade
individual, a fim de promover a autonomia e a liberdade. O autor cita as questões da fluidez
dos nossos dias com as seguintes observações:
Anthony Flew cita uma dos personagens de Woody Allen: ‘Eu não quero a
imortalidade por minha obra, eu quero alcançar a imortalidade não morrendo.’ Mas
o sentido da imortalidade deriva do sentido atribuído à vida sabidamente mortal; a
preferência por ‘não morrer’ não é tanto uma escolha de outra forma de imortalidade
(uma alternativa à ‘imortalidade pela obra’), mas uma declaração de despreocupação
com a eterna duração em favor do carpe diem. A indiferença entre à duração
transforma a imortalidade de uma idéia numa experiência e faz dela um objeto de
consumo imediato: é o modo como se vive o momento que faz desse momento uma
‘experiência imortal’. Se a ‘infinitude’ sobrevive à transmutação, é apenas como
medida da profundidade ou intensidade da Erlebnis. O ilimitado das sensações
possíveis ocupa lugar que era ocupado nos sonhos pela duração infinita. A
instantaneidade (anulação da resistência do espaço e liquefação da materialidade dos
objetos) faz com que cada momento pareça ter capacidade infinita; e a capacidade
infinita significa que não há limites ao que possa ser extraído de qualquer momento
– por mais breve e ‘fugaz’ que seja.
58
Em sua análise sobre a modernidade, o autor fala sobre “a ligação entre a
comunidade explosiva
59
em sua encarnação moderna especificamente líquida e a
territorialidade não é, porém, necessária, nem, certamente, universal”.
60
Fala, também, sobre
“cloakroom community”
61
, considerando que nos tempos atuais os indivíduos “precisam de
56
BAUMAN, Zygmunt, entre suas obras, cito: Amor líquido, 2004, Em busca da Política, 2000, Globalização:
as conseqüências humanas, 1999, Modernidade e holocausto, 1998, O mal-estar da pós-modernidade, 1999,
Modernidade e ambivalência, 1999, entre outras.
57
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2001, p. 7.
58
BAUMAN, 2001, p. 144.
59
Explica como comunidade explosiva: “A maioria das comunidades explosivas contemporâneas são feitas sob
medida para os tempos líquidos modernos mesmo sua disseminação possa ser projetada territorialmente; elas
são extraterritoriais (e tendem a obter sucesso mais espetacular quanto mais livres forem de limitações
territoriais) – precisamente como as identidades que invocam e mantêm precariamente vivas no breve
intervalo entre a explosão e a extinção. Sua natureza "explosiva” combina bem com as identidades da era
moderna líquida: de modo semelhante a tais identidades, as comunidades em questão tendem a ser voláteis,
transitórias e voltadas ao “aspecto único” ou propósito único”. Sua duração é curta, embora cheia de som e
fúria. Extraem poder não de sua possível duração mas, paradoxalmente, de sua precariedade e de seu futuro
incerto, da vigilância e investimento emocional que sua frágil existência demanda a gritos (BAUMAN, 2001,
p. 227-8). Como exemplo de comunidade explosiva na atual sociedade, encontramos os mega espetáculos,
entre eles o futebol e demais esportes, shows de bandas e demais expressões artísiticas, políticos com suas
mega estruturas financeiras, grupos de religiões e seus espetáculos de fé, entre outros. Nesse aspecto, Daunis
(2000), fala sobre a busca das pessoas no sentido de pertença, quando expressa: “Participar e/ou pertencer, de
forma mais ou menos ativas e/ou passivas, ajuda a superar possíveis sentimentos de isolamento e medo de
exclusão do grupo ou da sociedade. [...] O aumento da cultura dos espetáculos coincide com o neotribalismo e
a perda de identidade pessoal. A busca de contínuas situações de carga e descarga adrenalínica tem a ver com
o vazio interior, decorrente de estresse da vida pós-moderna”. (DAUNIS, 2000, p. 158)
60
Ibid. , p. 227.
61
O autor explica o termo como: “Literalmente, “comunidades de guarda-casacos”, em alusão aos locais onde,
38
um espetáculo que apele a interesses semelhantes em indivíduos diferentes e que reúna
durante um certo tempo em que outros interesses – que os separam em vez de uni-los - são
temporariamente postos de lado [...].”
62
Dessa maneira, o autor entende que tais comunidades
contribuem para a desordem social, quando diz: “espalham em vez de condensar a energia dos
impulsos de sociabilidade, e assim contribuem para a perpetuação da solidão que busca
desesperadamente redenção nas raras e intermitentes realizações coletivas orquestradas e
harmoniosas”.
63
Ainda para compreender a necessidade da sociedade na educação para “a inclusão da
sensibilidade solidária na dinâmica do desejo das pessoas”, Hugo Assmann e Jung Mo Sung,
na obra Competência e Sensibilidade Solidária
64
, falam da importância do sentido de vida,
como aporte da esperança de um mundo melhor, impregnado pelo encontro das pessoas com
suas diferenças e valores.
Os autores entendem que, no mundo dos valores e dos sentimentos, a concretização
se estabelece no vínculo, no encontro com o outro e se materializa na ação de projetos
solidários e de tantas outras manifestações de fraternidade. Sua proposta está na renovação de
“linguagens pedagógicas e sociopolíticas”, na necessidade de rever linguagens que até hoje
dominam o pensamento das pessoas, impedindo competências voltadas para a solidariedade.
Os fatores diretamente ligados à educação, ao aprender a “saber cuidar”
65
são temáticas do
conteúdo de estudo dos autores.
66
em museus e teatros, deixam-se capas e casacos, que são retirados à saída” (BAUMAN, 2001, p. 227).
Simbolicamente o autor utiliza o termo, dizendo: “ O termo ‘cloakroom community’ capta bem alguns de seus
traços característicos. Os freqüentadores de um espetáculo se vestem para a ocasião, obedecendo a um código
distinto do que seguem diariamente – o ato que simultaneamente separa a visita como uma “ocasião especial” e
faz com que os freqüentadores pareçam, enquanto durar o evento, mais uniformes do que na vida fora do
teatro. É a apresentação noturna que leva todos ao lugar – por diferentes que sejam seus interesses e
passatempos durante o dia. Antes de entrar no auditório, deixam os sobretudos ou capas que vestiram nas ruas
no cloakroom da casa de espetáculos (contando o número de cabides usados pode-se julgar quão cheia está a
casa e quão garantido está o futuro imediato da produção). Durante a apresentação, todos os olhos estão no
palco; e também a atenção de todos. Alegria e tristeza, risos e silêncios, ondas de aplauso, gritos de aprovação
e exclamações de surpresa são sincronizados – como se cuidadosamente planejados e dirigidos. Depois que as
cortinas se fecham, porém, os espectadores recolhem seus pertences do cloakroom e, ao vestirem suas roupas
de rua outra vez, retornam a seus papéis mundanos, ordinários e diferentes, dissolvendo-se em poucos
momentos depois na variada multidão que enche as ruas da cidade e da qual haviam emergido algumas horas
antes” (Ibid., p. 228).
62
Ibid. , p. 228.
63
Ibid. , p. 230.
64
Entre as obras de ASSMANN, encontram-se: Curiosidade e prazer de aprender: o papel da curiosidade na
aprendizagem criativa, 2005, Redes digitais e metamorfose do aprender, 2005, Metáforas novas para
reencantar a educação, 2003, Reencantar a educação – Rumo à sociedade aprendente, 2000, entre outras. E
sobre as obras de MO SUNG, encontram-se: Educar para reencantar a vida, 2006, Sementes de esperança – a
fé em um mundo de crise, 2005, Conversando sobre ética e sociedade, 2003, Sujeito e sociedade complexas:
Para repensar os horizontes utópicos, 2002, entre outras.
65
BOFF, Leonardo. Saber Cuidar: ética do humano: compaixão pela terra. Rio de Janeiro: Vozes, 1999.
66
ASSMANN ; MO SUNG. Competência e sensibilidade solidária : educar para a esperança. Rio de Janeiro:
39
Nos questionamentos dos autores, também se evidenciam as referências de teóricos
como Kohlberg, Habermas, Rorty, Durkheim, Hegel, entre outros, apresentando a diversidade
de entendimentos que permeia a solidariedade ao longo dos tempos. Além disso, expressam as
dificuldades e a crise atual da sociedade frente à dignidade humana e as decorrências com a
falta de oportunidades iguais para todos os seres humanos. Essa questão se expressa com a
manifestação da fragilidade humana e a dificuldade da sociedade atual com esses aspectos.
67
Os autores propõem a transformação social, desenvolvendo o amor e a humanização,
no pluralismo teórico, no entendimento da sociedade ampla e complexa com suas
implicações, na compreensão mais profunda da solidariedade como necessidade vital.
68
Evidenciam tal posição quando expressam:
A solidariedade deve enraizar-se na predisposição de nossa forma de pensar – de
nossa forma mentis – à admissão e aceitação tolerante das diferenças no interior do
próprio mundo das idéias, posto que chegamos definitivamente à era do pluralismo
teórico, do pluralismo ético e inevitavelmente das preferências individuais. Ser
solidário significa, portanto, estar constantemente aberto a negociar consensos
possíveis dentro de estruturas do sentido muitas vezes discrepantes em relação a um
mesmo assunto.
69
Os autores entendem que a educação é o caminho para mudanças importantes na
sociedade atual quando expressam:
Hoje educar significa salvar vidas. Mas vale a pena salvar vidas para que se
mantenham nos níveis mínimos de sobrevivência? A educação certamente pretende
mais do que isso, embora muitas vezes sua função se limite quase a isso. Os sentidos
e limites da educação se transformaram em questão ético-política, que adquiriu
ressonâncias imediatas para dentro da questão mais radical de nosso tempo: a virada
imperiosa para uma civilização solidária que assegure não apenas a preservação da
espécie humana e do planeta Terra, mas amplie as possibilidades de uma vida feliz
para todos os seres humanos.
70
Entre os autores que fundamentam os estudos sobre a adolescência, encontra-se
Roberto Daunis
71
, que tem sua formação na filosofia, na psicologia e na teologia. É doutor em
teologia e atuou como professor na Escola Superior de Teologia, entre outras atividades. A
opção pelo autor caracteriza-se por sua preocupação pela autonomia do adolescente. As ações
com projetos sociais, foco da pesquisa, têm esses aspectos educacionais como relevantes.
Vozes, 2000, abas do livro.
67
ASSMANN ; MO SUNG, 2000, capítulo 1, p. 35 a 73.
68
Ibid. , p. 262.
69
Ibid. , p. 262.
70
Ibid. , p. 245.
71
DAUNIS, Roberto. Jovens: desenvolvimento e identidade: trocas de perspectiva na psicologia da educação,
2000.
40
O estudo sobre o tema da adolescência e solidariedade fala do sentido de vida, da
razão pela qual o ser humano encontra-se inserido no contexto atual e as referências
sociológicas, filosóficas e teológicas para leituras de cenário e práticas mais humanas.
72
A
preocupação com ações educacionais mais efetivas sobre a responsabilidade com o mundo
que nos cerca mostra a necessidade de encaminhamento para conquistar o entrelace solidário
no entorno social. Roberto Daunis revela, nos seus estudos
73
, a riqueza de vivências,
certamente inestimáveis e também aporte teórico com abordagens relevantes sobre cada
assunto do livro. Aborda o tema identidade pessoal, sob a ótica dialética, questões que
envolvem o eu, formação da personalidade, do self, da individuação e do eu corporal.
74
O autor evidencia a responsabilidade com a tarefa de educar crianças e adolescentes
na sociedade atual e expõe claramente as necessidades emergentes da nossa época, na
relevância de rever conceitos que estabeleçam valores e metas norteadoras, significando a
vida das famílias e comunidade no geral. Percebe que “a perda de um sistema tradicional
único traz a necessidade de buscar e definir novos parâmetros e valores”.
75
Compreende que,
“na sociedade pluralista e liberalizada, porém, não é possível estabelecer sistemas uniformes
de valores e normas morais”.
76
Essas questões são expressas pelo autor, quando diz:
Nas sociedades surgem várias subculturas diferentes. Algumas parecem como novas.
Outras afloram na vida pública de ter sobrevivido na marginalidade imposta pela
cultura dominante.
A tarefa de enculturação apresenta, então, exigências maiores para o adolescente.
Um comportamento, p.ex., pode ser julgado como ‘certo’ ou ‘errado’ apenas a partir
de uma escolha responsável e pessoal de alvos, normas e valores. Por um lado, o
sistema legal de direitos e deveres cívicos, o código civil e o código penal, também
mudam. Além disso, e por outro lado, as leis não podem nem devem regulamentar o
foro pessoal ou particular. Diante dessa situação, cresce a necessidade da
responsabilidade pessoal nas tarefas da enculturação e individualização.
77
O autor ainda expressa sua preocupação com a carência educacional, impedindo a
“socialização e enculturação”
78
, visto que jovens, na atual sociedade, diante de tendências
preocupantes da injustiça social, discriminação das minorias, mídia centrada na preservação
72
DAUNIS, 2000, p. 279, 280 e 281.
73
Ibid. , p. 11 - 16.
74
Ibid. , p. 56.
75
Ibid. , p. 71.
76
Ibid. , p. 71.
77
Ibid. , p. 71, 72.
78
DAUNIS entende por enculturação (em inglês: enculturation, em alemão: Enkulturation) o termo que se refere
aos processos especificamente ligados à integração, à educação e à formação cultural. Embora tenha, em
português, aparência de neologismo, a apalavra “enculturação” é a expressão exata (e não inculturação!), por
tratar-se aqui da formação cultural. Enculturação se refere ao assumir pessoal e próprio do sujeito ativo capaz
de avaliar, julgar, analisar e escolher. Inculturação, pelo contrário, denota uma passividade maior, semelhante
à da socialização. Ibid. , p. 65.
41
do domínio econômico, valores que estimulam o consumo, valorização do ter em detrimento
do ser e tantos outros enfoques, que desestruturam a relação das pessoas, configura muitos
dos desafios para os educadores da atualidade.
79
Contudo, a educação responsável estabelece-
se através do bem-estar integral aos adolescentes e promove o processo de individuação
80
,
apoiando seu desenvolvimento físico, psicossocial, intelectual, profissional, afetivo e
espiritual.
Os pais, como pontos de referência para os filhos, devem cultivar, cada vez mais, o
relacionamento autêntico, sincero, de respeito mútuo e muita confiança. A parceria para
crescimento de adultos, crianças e jovens requer habilidade com desigualdades, da assimetria
entre deveres e direitos diante de responsabilidades e tarefas.
81
O autor reforça a necessidade
e a importância da cultura de diálogo e explica:
No diálogo, é necessário que cada lado apresente argumentos bem fundados que
expliquem as razões dos vários pontos de vista. Cada um deve posicionar-se, formar
um juízo de valor sobre os assuntos ou fundamentar os seus interesses. Pessoas
capazes de relacionar-se mutuamente e que pretendem entender a(s) outra(s) e
chegar a um acordo usam os seus contra-argumentos para explicar a sua posição
(posicionar-se claramente), contestam e resistem, para poder esclarecer assuntos.
Ninguém deve usar os contra argumentos pretendendo ‘aniquilar’ um inimigo.
Pessoas que dialogam ou discutem não são inimigas. Inimigos não dialogam nem
discutem. Eles só se agridem.
82
Na escola, as perspectivas educacionais focadas na democracia, no sentido de
responsabilidade social e de conscientização para a cidadania, qualificam o processo de
convivência em âmbito universal. São conteúdos de ordem significativa, que perpassam e dão
sentido existencial para os jovens. Para alcançar objetivos educacionais democráticos, é
necessário investimento pessoal para atividades que signifiquem o processo de aprendizagem
cooperativo e incentivo à autonomia, tanto para professores quanto para alunos. O papel
transformador da realidade em que vivemos fundamenta-se na responsabilidade e na justiça
79
Ibid. , p. 85.
80
DAUNIS explica que a individualização não pode ser confundida com a individualização. A individualização,
por sua vez, ocorre como fenômeno de isolamento na luta competitiva da sociedade pós-moderna. O termo
“individualização” conota o fato de cada um poder contar apenas consigo mesmo para solucionar as tarefas da
identidade profissional, da sua integração e sobrevivência no mercado de trabalho (2000, p. 71).
Por outro lado, o autor afirma que individualização é um conceito introduzido na psicologia por Carl Gustav
Jung, psicólogo suíço. A individuação pode ser descrita como o processo ou o caminho pelo qual o indivíduo
tenta tornar-se cada vez mais o “quem” individual (o self) que ele sempre já é. A tarefa da individuação
consiste em ampliar, integrar, organizar e estruturar o próprio self, a personalidade (ibid., p. 70).
81
Ibid. , p. 202-205.
82
Ibid. , p. 197-8.
42
social para todos, liberdade com respeito mútuo, postura crítica sobre a realidade, consciência
cidadã, base para a educação democrática.
83
2.2 Adolescência e a Inserção no Mundo
Desconheço limites para a minha liberdade de pensar. (Baruch Spinoza)
84
Em cada época histórica, o ser humano marca sua passagem trazendo seu próprio
sistema de representações. Ao olharmos essa pessoa inserida no processo civilizatório, “cada
cultura e cada civilização desenvolveu seu próprio imaginário coletivo”.
85
Para Calligaris (2000), a cultura encontra maneiras de idealizar os objetos, as marcas,
os personagens, a fim de transformá-los em comportamentos aceitos ou até desejáveis. Assim
como o adulto está à mercê de todas essas pressões sociais, também o adolescente fica no
lugar do ideal social. No mundo adulto, a convivência com as proposições culturais estabelece
uma série de entendimentos quanto a regras, valores, procedimentos aceitáveis e desejáveis
socialmente.
86
Na adolescência, devido ao período estruturante em que o jovem se encontra, a
adequação a essas exigências tem profunda significação na sua vida, estabelecendo atitudes e
procedimentos previamente formatados, sobre como ele deve agir, pensar, vestir-se de
maneira consoante com as proposições pré-estabelecidas.
87
Essas questões também se
colocam como base para as futuras abordagens com demais teóricos, pois caracterizam o
entendimento e as relações da nossa época entre as pessoas, os objetos e o meio e,
principalmente, com o adolescente inserido nesse contexto contemporâneo.
88
A busca de
reconhecimento nos acompanha ao longo da vida. Desde muito cedo, estabelecemos vínculos
que nos permitem crescer e buscar espaço de aceitação entre os adultos.
O adolescente, além da maturação do corpo, tem como finalidade tornar-se adulto.
Para tanto, ele busca constantemente a permissão para fazer parte desse grupo. Nessa busca
pela identidade, o adolescente estabelece para si uma série de investimentos pessoais, os quais
não está pronto para assumir, tornando sua vida, em muitas situações, um desafio constante,
sem limites e abrindo possibilidades para riscos difíceis de suportar.
83
Ibid. , p. 245.
84
VIVER..., 2004, p. 240.
85
SIBOLDI, Giorgio ; SALVO, Mariella di. In: PELUSO, Ângelo. Informática e afetividade. São Paulo:
EDUSC, 1998, p. 20 Deve-se ter presente, porém, que cada época, cada cultura e cada civilização desenvolveu
seu próprio imaginário coletivo, seu próprio sistema de representações dotadas de uma particular maneira de
tratar os símbolos e os relativos níveis de convencionalidade e ilusoriedade, pelo que se pode dizer que cada
sociedade histórica das imagens.
86
CALLIGARIS, 2000, p. 72 -73.
87
Ibid. , p. 73.
88
Ibid. , p. 57.
43
No entendimento de Calligaris (2000), em nossa cultura, o reconhecimento do sujeito
como adulto acontece à medida que se vive e se afirma como independente, com sua
autonomia financeira, profissional, emocional e de toda ordem, de acordo com a visão dos
adultos. É nessa medida que o adolescente faz suas tentativas e, com isso, força sua
integração, justamente se opondo às regras da comunidade. Pode transformar-se, assim, em
“um problema” e, de certa maneira, refletir a patologia dos desejos reprimidos pelos adultos.
O autor coloca que esse período caracteriza-se por uma das formações culturais mais
poderosas da nossa época e acredita que é um mito criado no século XX, pois, muitas vezes, o
adolescente se vê refletido no adulto. Em suas intervenções sobre o tema, ainda afirma:
A transgressão tenta encenar o que os adolescentes acreditam ser um desejo
recalcado dos adultos. Há o projeto de entregar como presente para os adultos um
comportamento, um gesto, do qual eles teriam sido frustrados e, assim, de merecer
uma medalha. Quanto mais a interpretação do desejo dos adultos for certeira, mais
esse projeto fracassará. Nesse caso, a transgressão adolescente presenteia os adultos
com uma imagem que justamente eles querem reprimir. O erro dos adolescentes
(erro em relação a sua própria estratégia) é pensar que para os adultos possa ser
agradável encontrar uma encenação de seu próprio recalque.
89
Nessa perspectiva, a nova imagem projetada de seu corpo não vale naturalmente para
o adolescente o lugar de adulto, o que o restringe a agir, agrupando-se com seus iguais, para
ser reconhecido pelos seus pares e, automaticamente, excluído do mundo dos adultos. Esse
tempo de espera para tornar-se adulto faz com que o adolescente reúna-se em grupos, com
regras e normas de acordo com peculiaridades e estilo de grupo.
90
Nesse momento, minhas
reflexões me permitem dizer que toda a subjetividade vivida pelo adolescente é evidenciada
pelo modo como o relacionamento acontece em cada um dos espaços vivenciados pelo jovem,
por isso auxilia na construção do sentido pessoal e dos outros que estão ali interagindo.
No meu entendimento, também é importante analisar a gama de sentimentos que
povoam os espaços de trocas entre os jovens e a sua contribuição na construção da
subjetividade adolescente. Isso porque os adolescentes revelam sentimentos ambíguos, pois,
muitas vezes, não compreendem os significados suscitados na relação com o outro. Vêem-se,
assim, entrelaçados apenas com seu entendimento, sendo difícil entender o quanto, além
deles, fluem verdades com muitas nuances.
89
Ibid. , p. 41.
90
Ibid. , p. 57.
44
O cenário de inseguranças vividas pelo adolescente no grupo, nesse momento da sua
vida, mostra-se quando se sente em conflito com a dependência e a independência. Na
abordagem desse aspecto, Pichon-Rivière
91
, considera:
A idéia do papel reparatório torna-se útil para entender o sentido de chamamento
exterior do grupo familiar. Na verdade, trata-se de dois grupos familiares: o grupo
externo e o grupo interno; e as exigências de um e outro podem ser contraditórias,
estar dissociadas ou integradas.
92
Nas relações de grupo, nas quais os adolescentes se afirmam, acredito que os
conflitos e dificuldades se evidenciam por toda vivência que denota a entrada para espaços
desconhecidos, próprios de quem está crescendo e necessita experienciar o que não foi visto,
sentido, digerido na inteireza do seu ser. Isso acontece à medida que o grupo vai
compartilhando seus sentimentos, colaborando entre si com opiniões, formulando alternativas
uns para os outros, apoiando-se, permitindo que sua vivência sobre o momento se vincule,
entrelaçando os significados mais íntimos e despertando em seus integrantes a possibilidade
de trocas devido ao vínculo que foi possível ser construído.
Segundo Pichon-Rivière,
93
o vínculo é conceito instrumental em psicologia social
que assume determinada estrutura e que é manejável operacionalmente através da relação
íntima que possui com a noção de papéis. Conforme o autor, papel e vínculo são dois
conceitos que se misturam muito, isto é, na situação do vínculo sempre se inclui o papel. A
compreensão do outro em termos de papel nos proporciona uma possibilidade para poder
entrar na situação e compreendê-la. A troca de experiências do grupo oportuniza condições
para que se conheçam melhor como pessoas e como grupo. O fortalecimento dos vínculos
permite “dar” e “receber” feedbacks
94
muito valiosos.
91
PICHON-RIVIÈRE, Enrique, (1907 – 1977) psicanalista argentino de origem suíça, que contribuiu com o
estudo de grupos operativos, na Psicologia Social.
92
PICHON-RIVIÈRE apud BOHOSLAVSKY, Rodolfo. Orientação vocacional: a estratégia clínica. São
Paulo: Martins Fontes, 1993, p. 83.
93
BOHOSLAVSKY, 1993, p. 54 - 55.
94
MOSCOVICI, Felá. Desenvolvimento interpessoal: treinamento em grupo. Rio de Janeiro, José Olympio,
1996, p. 45 – A autora usa a terminologia na comunicação interpessoal e considera um espaço importante,
quando diz que os principais processos que regulam o fluxo interpessoal eu-outros, determinando o tamanho
de cada área as Janela (dinâmica Janela Johari), são os seguintes: a) Busca de feedback: consiste em solicitar e
receber reações dos outros, em termos verbais ou não verbais, para conhecer como o seu comportamento está
afetando ou outros, isto é, ver-se com os olhos dos outros. b) Auto-exposição: consiste em dar feedback aos
outros, revelando seus próprios pensamentos, percepções e sentimentos de como o comportamento dos outros
o está afetando. “Na dinâmica de grupo Janela Johari encontramos quatro janelas, que são representações de
áreas da personalidade idealizadas por Joseph Luft e Harry Ingham (1961)”. “O modelo gráfico Janela Johari
permite apreciar o fluxo de informações decorrentes de duas informações – eu e outros – bem como as
tendências individuais que facilitam e dificultam a direção e a extensão deste fluxo” (1996, p. 43-45).
45
Os adolescentes necessitam do apoio dos amigos, do suporte da família, refletindo
sobre os instantes de rebeldia, dos amores e desamores, das combinações burladas que
marcam o desejo de independência. Quantos sonhos e desejos, quantos hormônios
movimentando os sentimentos, quanta esperança de fazer o mundo melhor.
2.3 Preocupações e Aspectos Sociais Importantes para o Adolescente
Demora muito tempo para que nos tornemos jovens. (Pablo Picasso)
95
Os jovens percebem de forma singular o mundo e, nele inseridos, expressam sua
preocupação com contextos de extrema complexidade. Diante de tal desafio, colocam-se
confusos e amedrontados, muitas vezes, sentindo-se incapacitados frente à dimensão do todo
que circunda suas vidas.
Em junho de 2005, na Unidade de Ensino da Fundação Evangélica de Novo
Hamburgo, foi realizada uma enquete com adolescentes com idade entre 12 anos e 17 anos,
estudantes do Ensino Fundamental e Médio, evidenciando algumas opiniões sobre o que
preocupa o jovem adolescente e qual é a sua expectativa para o futuro. A pesquisa
inicialmente foi aplicada em cada turma pelos professores e discutida entre os jovens em
duplas, para então responder os questionamentos. Após as atividades em sala de aula, o
Serviço de Orientação fez o levantamento das repostas que se repetiam, evidenciando
preocupação e pontos importantes de mais jovens. Esses dados foram trabalhados em uma
meditação (momentos oferecidos aos alunos para refletir sobre temáticas atuais e a
espiritualidade) com a Pastoral da Escola, com o Serviço de Orientação e o Professor de
Biologia, convidado para falar sobre a prevenção e cuidados com a vida.
Naquele período, percebia-se, entre os jovens, diversas ações de violência, traduzidas
na falta de cuidado pessoal, com os demais colegas, na relação com o professor e até mesmo
com o patrimônio da escola. O entendimento para fazer tal pesquisa evidenciava a
preocupação com os motivos de vida dos adolescentes, suas crenças, medos, expectativas e
esperanças para o futuro. As questões serviram como norteadoras para pensar sobre as
necessidades dos jovens naquele momento das suas vidas. Talvez, de forma nada
surpreendente, vimos que as questões dos jovens adolescentes indicam os caminhos que a
humanidade, no seu contexto contemporâneo, produz em todos os seres humanos.
95
VIVER..., 2004, p. 206.
46
Passo, então, a apresentar o levantamento realizado com os adolescentes e, dessa
forma oportunizar algumas referências sobre o assunto pesquisado, no caso a adolescência,
com suporte dos teóricos para fundamentar as reflexões dos pesquisadores sobre as seguintes
questões:
- O que é importante para o adolescente?
- O que preocupa o adolescente, hoje?
Os jovens, em duplas, responderam as questões e, após, foi feito o levantamento por
série, desde a sexta série do Ensino Fundamental até o segundo ano do Ensino Médio. O
material selecionado para a dissertação reúne apenas as informações dos alunos do Ensino
Médio, perfazendo um número de 250 jovens, com idades 14 a 17 anos. No quadro-síntese
elaborado, existe uma divisão, estabelecida pela mestranda, que expressa os assuntos sobre a
relação consigo mesmo, com o outro e com relação à sociedade; dessa maneira, já há um
esboço da fundamentação das idéias contidas ao longo das abordagens da dissertação.
Segue abaixo o quadro sobre o assunto, no qual aparece o que é considerado
importante pelo jovem:
O que é importante para o adolescente?
O adolescente consigo O adolescente e o outro O adolescente e a sociedade
Ser aceito, amado
Ser considerado importante
Ser alguém na vida
Família companheira que apóia e
compreende
Curtir a vida sem tanto medo
Ser responsável, conciliar os deveres com
as coisas boas da vida
Ter amigos Estar ciente da sociedade em
que vivemos
Ter opinião própria / Nos firmarmos como
seres humanos
Ter alguém com quem
compartilhar os bons e maus
momentos
Informações sobre drogas,
violência, entre outros
Tomar a melhor decisão
Escolher o caminho certo
Ter noção do que é certo e errado / Não
utilizar a inteligência para coisas estúpidas
Receber carinho e afeto Conhecer o mundo por si só
Sobre o futuro / Como estaremos
equipados para os próximos anos?
Ter sua opinião respeitada pelo
adulto
Viagens
Saber que a gente tem limites
Saber ouvir críticas
Não se preocupar tanto com as
tarefas dos adultos
Conhecer coisas novas
Deus / Sentimentos difíceis de explicar Maior compreensão dos adultos
por esta fase
Descobrir que o mundo não
gira em torno de nós
Ter estudo Distância das pessoas Desigualdades sociais
Ser feliz / Qualidade de vida Auto-afirmação com colegas e
amigos
A insegurança em que
vivemos
Ter seu próprio dinheiro Namorar
Praticar esporte para uma vida saudável Atitudes de alguns adolescentes
Ter sonhos / Estabelecer metas / Fazer
coisas diferentes
Falta de valores e ética das
pessoas
47
Valorização pelas boas ações, bons
exemplos
Achar pessoas confiáveis
Liberdade de expressão para ser o que
quiser
Não se envolver em crimes
Ter celular e outras tecnologias
Quadro 3: Resultado da enquete realizada com adolescentes de 12 a 17 anos. Elaboração da
pesquisadora.
O presente levantamento remete para muitas questões de reflexão com relação às
preocupações e desejos dos jovens. A busca por aceitação e relação afetiva com as pessoas
adultas e mesmo entre os jovens é marcante nas colocações da pesquisa. Muitos colocam seus
questionamentos com relação ao futuro e a dúvida de como enfrentar tais circunstâncias.
Nessa perspectiva, Maria Rita Kehl
96
aborda o entendimento do sentido de vida na
modernidade, descrevendo na seguinte ótica:
Na modernidade, o sentido não é dado por nenhuma verdade transcendental que
preceda a existência individual; entretanto, é ilusório pensar que a criação de sentido
para a existência possa ser um ato individual. É uma tarefa coletiva, uma tarefa da
cultura, da qual cada sujeito participa com seu grão de invenção. É uma tarefa
simbólica, que se dá por meio da produção de discursos narrativos sobre ‘o que é’ ou
‘o que a vida deva ser’.
97
A autora considera os discursos dominantes da atualidade como “empobrecidos”, na
medida em que se afastam das razões filosóficas e se apóiam em razões do mercado. Entende
que as razões filosóficas, como também as religiosas e políticas, mobilizam para
transformações além do cotidiano banalizado, ultrapassando nosso limite corpóreo. Contrapõe
com as razões de mercado, que apenas se repete na sua “própria trivialidade, revestida das
aparências de um “saber viver”, que só funciona se conseguimos reduzir a vida à sua
dimensão mais achatada: o circuito da satisfação de necessidades”.
98
Nesse contexto, o adolescente se vê com necessidades de aceitação e cita que precisa
das tecnologias e demais objetos da vida moderna, “para ser alguém na vida” ou mesmo na
“popularidade” entre seus iguais, como diz a pesquisa com os jovens. Por outro lado,
preocupa-se com a dimensão do desconhecido quando comenta: “Como estaremos equipados
para os próximos anos?” Essa expressão do equipado fica tomada de diversos significados,
tanto materiais como na perspectiva emocional consigo e com as circunstâncias de vida
futura.
96
KEHL, Maria Rita. Sobre ética e psicanálise. São Paulo: Companhia da Letras, 2002. Maria Rita Kehl é
psicanalista, doutora em psicanálise e escritora. É autora de: A mínima diferença; O masculino e o feminino na
cultura (1996), Deslocamentos do feminino (1998), Função fraterna (org. 2000) e Processos primários (poesia,
1996).
97
KEHL, 2002, p. 10.
98
Ibid. , p. 10.
48
Quando os jovens citam “tomar a melhor decisão”, “escolher o caminho certo” e se
perguntam “como estaremos equipados para os próximos anos?”, revelam suas angústias
sobre cenários que provocam desconforto e insegurança e também ressaltam a preocupação
sobre o futuro.
Com extrema profundidade, Roberto Daunis
99
descreve as questões que envolvem “o
fenômeno de desarranjo estrutural do quotidiano da sociedade pós-moderna”, em que revela
que o viver das pessoas jovens está em referência na forma como o mundo estabelece as
imposições de mercado. Estudantes de nível universitário enfrentam a massificação na sua
formação e, com isso, saem despreparados e com pouca qualidade para a competitividade
existente na área profissional e nas demais áreas do cotidiano das suas vidas. O autor também
entende que as perspectivas de futuro dos jovens, com a pluralidade e globalizações do
mundo, trazem riscos inevitáveis. Também revela a situação difusa e contraditória dos
adultos, contribuindo para a desorientação das crianças e jovens. Nesse sentido, descreve a
relação da sociedade como:
A sociedade plural, hoje, se assemelha muitas vezes a uma imensa estação
ferroviária superlotada de pessoas desorientadas. É como se a maioria tentasse
procurar o trem certo, indo e voltando, todos afanando-se em direções contrárias. As
multidões transformam-se, involuntariamente, em obstáculo mútuo, com as pessoas
se atrapalhando umas às outras. Cada um dentro da multidão parece, no entanto, ter
enorme dificuldade para achar o trem certo, i. é, dificuldade para organizar o próprio
cotidiano de forma satisfatória, por não existirem horários nem metas claras.
100
Diante de tal perspectiva, o jovem expressa seu desejo de “estabelecer metas” e
também quando busca por um espaço em que o desejo de segurança se expressa, dizendo:
“nos firmarmos como seres humanos”. Também ao revelar a necessidade de ser reconhecido
quando coloca: “ser considerado importante”, ou mesmo “ser alguém na vida”, “ser aceito,
amado”.
Existem, nas manifestações dos jovens, algumas considerações sobre as condições
financeiras, quando dizem: “ter seu próprio dinheiro”. Na busca pela autonomia, a
sustentabilidade financeira é um dos requisitos para chegar à vida adulta e constituir-se como
sujeito autônomo, sem a dependência dos pais.
Ao olhar o adolescente no seu momento de vida, Outeiral reflete sobre a
adolescência como um momento criativo e de mudanças significativas. Relata também a
importância do pensamento formal, como possibilidade de elaborar hipóteses e conclusões,
99
DAUNIS, 2000, p. 138.
100
Ibid. , p. 138.
49
abrindo espaços com o mundo adulto. Cita também que nem sempre o adolescente tem a
dimensão do possível e o real. Sobre esse assunto, comenta ainda: “Para o adolescente é fácil
encontrar soluções para os problemas da humanidade, muito embora a maioria delas não seja
exeqüível na prática.”
101
Os adolescentes expressam o que foi acima citado por Outeiral
102
quando, na relação
deles com a sociedade, dizem: “estamos cientes da sociedade em que vivemos”, ou ainda,
“descobrir que o mundo não gira em torno de nós”. Na riqueza dessas manifestações, existe o
olhar do adolescente para o mundo que está aqui e sua própria posição diante dos fatos e
acontecimentos históricos. Nesse sentido, ao refletir sobre o entendimento dos adolescentes,
Outeiral
103
(2003) colabora, através de seus estudos, falando do caráter “mágico” que se
estabelece para o jovem nos momentos de encaminhamento de situações existenciais, o que
realmente é “exeqüível” diante do que é pensado. Nesse momento, o jovem usa da
criatividade para lidar com situações totalmente inusitadas e que, na visão do adulto, nem
sempre são compreendidas, pois parecem confusas e caóticas. Mesmo assim, o jovem segue
em busca de caminhos que favoreçam e definam seu perfil pessoal, com tentativas de
integração e crescimento.
As citações de alguns jovens, no espaço que remete para as colocações do
adolescente e o outro, refletem toda a problemática na busca de autonomia e da necessidade
do apoio familiar, quando dizem: “família companheira que apóia e compreende”, “receber
carinho e afeto” e, ao mesmo tempo, o contraponto com: “maior compreensão dos adultos por
esta fase”, “ter opinião respeitada pelos adultos”.
Os adolescentes necessitam de espaços, tanto na família como na escola, que
oportunizem esses ensaios tão importantes para a experimentação da independência e com
certa liberdade para responder por suas iniciativas. Outeiral
104
alerta, no entanto, sobre os
riscos próprios desse período e expressa o seguinte ponto de vista:
A criatividade na adolescência articula-se necessariamente com a noção de limite.
Limite é uma palavra que tem, muitas vezes, uma conotação negativa, ligada
erroneamente à ‘repressão’, ‘proibição’, ‘interdição’ etc., inclusive lembrando
‘repressão política’. No entanto, limite é algo muito além disso: significa a criação
de um espaço protegido dentro do qual o adolescente poderá exercer sua
espontaneidade e criatividade sem receios e riscos. Precisamos lembrar que não
existe conteúdo organizado sem um continente que lhe dê forma.
105
101
OUTEIRAL ; CEREZER, 2003, p. 2.
102
Ibid. , p. 2.
103
Ibid. , p. 2.
104
Ibid. , p. 3.
105
Ibid. , p. 2.
50
A clareza, por parte dos adolescentes, quanto aos limites fica expressa na relação
com o outro quando dizem: “não se envolver com crimes” ou até “achar pessoas confiáveis”.
Nesse mesmo aspecto, na relação com a sociedade, contribui com questões como
“informações sobre as drogas, violência entre outras” e também “a insegurança em que
vivemos”. Sobre as transgressões na adolescência, Outeiral (2003) afirma o seguinte:
Na construção da sua identidade, a criança (e particularmente, o adolescente tem a
necessidade de ‘ser único’). A única possibilidade de alguém ser, então, um
indivíduo, diferente assim de todos os demais, é pela transgressão das normas da
família, da escola e da sociedade onde vive.
106
Nesse aspecto, os adolescentes ponderam sobre suas vivências com amigos, quando
dizem: “auto-afirmação com colegas e amigos” e ainda: “conhecer o mundo por si só”. Nem
sempre o adolescente tem espaço para falar sobre os momentos de angústia ou mesmo de
vivências, que os adultos, entre eles família e sociedade, compreendem como busca de
autonomia através da transgressão. Fruto de uma sociedade distante e consumista, o
adolescente revela, na pesquisa, algumas expressões como “distância das pessoas”, “ter
alguém para compartilhar os bons e maus momentos”.
Na seqüência, apresento o outro questionamento realizado com esses mesmos
adolescentes, que revela as preocupações do adolescente hoje. O material selecionado para a
dissertação reúne os mesmos jovens da apresentação anterior, ou seja, alunos do Ensino
Médio, perfazendo um número de 250 jovens, entre as idades de 14 anos a 17 anos. Na
planilha, os dados expressos pelos adolescentes contêm o que preocupa o adolescente hoje.
Existe uma divisão dos assuntos no quadro, no qual estão agrupadas as preocupações quanto à
relação consigo mesmo, com o outro e em relação à sociedade. Dessa maneira, no presente
capítulo, a planilha esboça a fundamentação das idéias contidas ao longo das abordagens da
dissertação, quanto ao desenvolvimento da solidariedade no jovem; neste caso, o adolescente
vulnerável pelo período de transição e o meio, nas entidades, também vulnerável por todas as
circunstâncias de pobreza, carência e invisibilidade social.
Ao analisar o conteúdo das planilhas, utilizo os conhecimentos teóricos de James
Fowler, Hugo Assmann e Jung Mo Sung.
106
Ibid. , p. 44.
51
Os estudos de Fowler
107
referenciam as etapas de vida do ser humano desde o
nascimento e a importância em cada período com suas múltiplas oportunidades para vivenciar
a si próprio e, com isso, constituir-se enquanto sujeito. Todas as vivências contraditórias
permitem a riqueza de valores que permeiam os significados e sentido de vida para sustentar-
se como sujeito neste mundo. Nesse aspecto, a trajetória da fé entrelaça sua vida, como busca
constante para compreender a si mesmo neste mundo, com toda sua dinamicidade e
significados. Fowler estabelece referenciais teóricos profundos para fundamentar seu estudo
sobre a fé na trajetória de vida do ser humano, e evidencio, na dissertação, o foco na
adolescência, quanto à busca e sentido na vida.
Também a conexão entre o crescimento do ser humano e o vínculo para constituir-se
enquanto sujeito demonstrou sua importância para a aquisição da abstração, construto próprio
da adolescência, projetando o idealismo através da fé.
Nos estudos de Assmann e Mo Sung
108
, existe a profunda preocupação com o
sentido de vida e a sensibilidade como fator propulsor da esperança no coração do ser
humano. O desenvolvimento da sensibilidade solidária é competência educacional, conforme
os estudos de Assmann e Mo Sung. Nosso processo civilizatório necessita de novos
referenciais, valores educacionais, que constituam uma epistemologia solidária, bases da
esperança. A solidariedade nos oportuniza a vivência da essência fundamental do convívio do
outro que está presente nas nossas vidas.
Com base nesses autores, a tabela abaixo, dividida em três eixos temáticos,
demonstra os aspectos que preocupam o jovem nos dias de hoje.
O que preocupa o adolescente hoje?
109
O adolescente consigo O adolescente e o outro O adolescente e a sociedade
Preocupado com seus
pensamentos e angústias
Ser aceito no grupo de amigos Violência
Apanhar e ser roubado
Preocupa-se com ele mesmo Amizade verdadeira Excesso de liberdade trazendo
riscos
Ir mal na escola
Reprovação
Confiar em alguém de verdade Envolvimento com drogas
Respeitado como pessoa Sua popularidade Preocupação com o preconceito
Sua identidade pessoal Cuidado com a vida sexual Dúvidas de como será a
existência no futuro
107
FOWLER, James. Estágios da fé: a psicologia do desenvolvimento e a busca de sentido. São Leopoldo:
Sinodal, 1992, p. 92.
108
ASSMANN ; MO SUNG, 2000, p. 35-73.
109
As preocupações dos adolescentes, na presente tabela (quadro 4), estão interligadas com as questões que são
importantes para o adolescente, propostas na análise da tabela anterior (quadro 3) e permitiram o
entendimento de muitas evidências, para compreender a vulnerabilidade dos jovens e onde existe espaço para
valores que fundamentem o sentido de vida, assim como dos projetos sociais e sua ação transformadora, no
capítulo III.
52
Escolha profissional Namoro Entrar na universidade
Com o futuro Risco com a gravidez O mundo em que vivemos
Com o vestibular Doenças sexualmente
transmissíveis
Medo de não alcançar as suas
metas
Perder os pais ou pessoas
queridas
Desilusão Preocupação com a imagem e o
que os outros pensam dele
Medo de perder e ser derrotado Medo de acabar sozinho e
alguém para confiar
Quadro 4: Síntese das respostas à enquete sobre preocupações dos jovens hoje. Elaboração da
pesquisadora.
Nas questões que envolvem as preocupações do adolescente de hoje, no que diz
respeito à relação consigo, os jovens mostram-se “preocupados com seus pensamentos e
angústias” e afirmam que “preocupa-se com eles mesmos”. Nesse aspecto, as considerações
dos adolescentes revelam, no momento transitório que estão vivendo, o dilema com seu
momento de vida, o inusitado, o enigma diante do novo, dos pensamentos que angustiam e
descortinam toda preocupação consigo mesmo, único e, portanto, singular.
Na sua tese de doutorado, Miranda
110
(2003) traz as contribuições de Fowler (1992)
sobre as perspectivas da fé e seus estágios. Fowler concebe a fé com as seguintes palavras:
“Significa dizer que o viver humano é um viver pautado e referenciado por perguntas de fé
que emergem do pensar, questionar, experenciar, refletir, viver, buscar na vida e com a vida
respostas, caminhos, algum sentido no estar vivo, vivendo”.
111
Fowler tem seu entendimento no sentido de vida e a vida centrada no significado, o
que torna o ser humano, a cada etapa, um caminhante que reflete no seu cotidiano os seus
passos pessoais junto com a humanidade. A perspectiva de Fowler baseia-se nas contribuições
de Piaget, quanto ao desenvolvimento cognitivo, e de Kohlberg, quanto ao desenvolvimento
moral, associado aos estudos de Erikson, quanto à dinâmica dos desafios e crises ao longo dos
ciclos de vida.
112
Ao falar de futuro, o adolescente revela seus temores como: “ir mal na escola”,
“reprovação”, “com o futuro”, “com o vestibular”, “de não alcançar suas metas”, “medo de
perder e ser derrotado”, “com a desilusão”. Olhar para frente, para o desconhecido torna o
adolescente vulnerável. Ao lançar suas preocupações, seus temores, fala ao mundo adulto do
seu despreparo, da necessidade de espaço para ser ouvido com suas inquietudes. Suas
110
MIRANDA, Ana Maria Vieira. Fé enquanto busca do sentido da vida na adolescência: perspectiva
psicológica. São Bernardo do Campo: Universidade Metodista de São Paulo, 2003.
111
FOWLER, 1992 apud MIRANDA, 2003, p. 81.
112
Ibid. , p. 82.
53
perguntas estão repletas do desejo de esperança; sua fé, ainda em construção, necessita de
suporte para organizar sua vida presente e futura.
Nos seus estudos, Fowler (1992) entende a fé como “a nossa maneira de discernir e
nos comprometer com centros de valor e poder que exercem força ordenadora em nossa
vida”.
113
Diante do exposto, cada pessoa, em particular, encontra na sua relação com as
situações da vida, o sentido que, através do significado por ela construído, movimenta e
vincula sua fé. Quando o assunto é adolescência, percebe-se que o jovem está constantemente
em busca de superação dos estágios anteriores e constituindo nesta fase a sua identidade,
assim como o afastamento dos seus pais, como forma de assumir sua independência. Por isso,
quando expressa preocupação com “sua identidade pessoal” e ser “respeitado como pessoa”,
evidencia toda problemática da transição na adolescência.
114
Os estudos de Miranda (2003) citam Winnicott (1977), que reforça a relação mãe-
bebê como “o alicerce e o referencial que consolidará a base autêntica para as relações da
criança com a mãe e o pai e, finalmente, com a sociedade”.
115
Sobre o vínculo, Pichon-
Rivière (1982) também contribui, afirmando: “o vínculo como uma estrutura dinâmica em
contínuo movimento interpretada como uma gestalt, em constante processo de evolução”.
116
Todas essas questões levam o jovem à busca de relacionamentos com confiança e
que possibilitem caminhos norteadores para a sua vida. No íntimo do adolescente, nas suas
imagens de infância, estão acalentadas suas primeiras experiências de fé, base para as
respostas aos desafios, aos temores, ao mundo que se descortina na sua perplexidade, que
segue na análise da relação com o outro.
117
Quanto ao adolescente nas questões que envolvem o outro, o prisma amplia-se e
mostra como o adolescente se espelha no mundo e tamm o mundo refletido no adolescente.
Os jovens falam de “ser aceito no grupo de amigos”, “confiar em alguém de verdade”,
“preocupação com a imagem e o que os outros pensam dele”, “medo de acabar sozinho” e “ter
alguém para confiar”. Todas essas reflexões estão vinculadas não só à confiança, mas
também à fé.
Nos estudos FOWLER (1992), a vida interpessoal e social dos jovens tem
significado através das suas histórias de vida e, dessa forma, constituem-se enquanto sujeitos.
113
Ibid. , p. 94.
114
Ibid. , p. 94.
115
WINNICOTT 1977 apud MIRANDA, 2003, p. 92.
116
Ibid. , p. 93.
117
RIZZUTO, Ana Maria. O nascimento do Deus vivo: um estudo psicanalítico. São Leopoldo: Sinodal; EST,
2006, p. 242-244.
54
São as suas narrativas que “relembram e representam as suas experiências significativas".
118
Para fundamentar essas reflexões sobre o estágio de vida na adolescência e suas referências de
fé, cito Fowler, quando diz:
O jovem começa a projetar o mito em formação do próprio eu para papéis e
relacionamentos futuros. Por um lado, esta projeção representa a fé no eu que a
pessoa está se tornando e confiança de esse eu será recebido e ratificado pelo futuro.
Por outro lado, traz o medo de que o eu possa errar de foco, possa não encontrar
lugar junto a outras pessoas e possa ser ignorado, não descoberto ou relegado à
insignificância pelo futuro.
119
Essas vivências fundamentais da “Fé sintético-convencional”
120
, pesquisadas por
Fowler, têm como base os estudos da psicologia do desenvolvimento de Erikson
121
. Nessa
construção hipotética do adolescente, ele compõe imagens dele próprio, em que, de forma
resumida, o autor diz: “Você se vê conforme eu o vejo: eu vejo o eu que acho que você vê”.
122
Toda complexidade do mundo, nas manifestações humanas, apresenta-se no novo
cenário vivido pelo adolescente. Muitas inquietudes com “namoro”, “risco com gravidez”,
“doenças sexualmente transmissíveis”, “cuidado com a vida sexual”, “sua popularidade”, ou
mesmo, “perder os pais ou pessoas queridas”, denotam a fragilidade com assuntos e vivências
118
FOWLER, 1992, p. 130.
119
Ibid. , p. 131.
120
Para compreender os estudos de James Fowler sobre a fé, Miranda (2003), explica que ele ‘organizou e
sistematizou a dinâmica desenvolvimental da fé, através do que ele chama de estágios da fé. Esses estágios
abarcam várias dimensões inter-relacionadas do conhecimento, valoração, comprometimento e ação humana,
as quais devem ser consideradas em conjunto para o entendimento, a criação e manutenção da busca de
sentido humano. A fé, na concepção desse autor, é compreendida/entendida como fé humana. Significa dizer
que o viver humano é viver pautado e referenciado por perguntas de fé que emergem do pensar, questionar,
experenciar, refletir, viver, buscar na vida e com a vida respostas, caminhos, algum sentido no estar vivo,
vivendo’. [...] Na seqüência, a autora ainda comenta que Fowler (1992) amplia seus estudos com ‘importante
escola da psicologia do desenvolvimento, a dos teóricos psicossociais, na figura de Erikson, destaca o
entendimento da dinâmica envolvida nos demais desafios/crises previsíveis no decorrer do ciclo da vida,
relacionados aos estágios estruturais da fé’. FOWLER, 1992 apud Miranda 2003, p. 81 – 82.
Portanto, entre os diversos estágios, a adolescência se denomina como: Fé sintético-convencional, consiste
no Estágio 3 dos estudos do Desenvolvimento Psicossocial e a Fé, com base em Erikson. “Para o estágio 3,
com seu início na adolescência, a autoridade está localizada externamente à própria pessoa. Ela reside nos
‘eles’ interpessoalmente disponíveis ou em pessoas legalmente incumbidas de papéis de liderança em
instituições. Isto não significa negar que os adolescentes façam escolhas ou que manifestem fortes
sentimentos e compromissos referentes aos seus valores e normas de comportamento. Significa, porém, que,
a despeito de seu genuíno sentimento de ter feito escolhas e assumido compromissos, uma leitura mais
verdadeira nos mostra que seus valores e auto-imagens, mediados pelos outros significativos em suas vidas, é
que, em grande parte, escolheram aos adolescentes. E em suas (dos jovens) escolhas, em geral esclarecem e
ratificam aquelas imagens e valores que os escolheram. FOWLER, 1992, p.132.
FOWLER (1992) ainda explica que ‘no estágio 3, fé sintético-convencional, a experiência de mundo da
pessoa amplia-se além da família. Várias esferas exigem atenção: família, escola ou trabalho, companheiros,
sociedade e mídia, e talvez religião. A fé precisa proporcionar uma orientação coerente em meio a essa gama
mais complexa e diversificada de envolvimentos. Ela precisa sintetizar valores e informações; precisa
fornecer uma base para a identidade e a perspectiva da pessoa’. FOWLER, 1992, p.146.
121
FOWLER, 1992 apud ERIKSON, p. 44.
122
FOWLER, 1992, p. 131.
55
significativas para os jovens. Todos os assuntos citados pelos adolescentes falam de suas
primeiras experiências, de introduzir-se em momento novo e também das perdas, inerentes ao
crescimento nesse estágio de vida.
Nesse aspecto, Fowler (1992) entende que, nesse estágio, os perigos são permanentes
pelo comprometimento com valores e sentimentos presentes com a tensão que estes geram,
também com as modificações corporais, assim como com os relacionamentos sociais.
Os estudos de Miranda (2003), citando Fowler
123
, expressam algumas reflexões
sobre o assunto quando diz: “(...) nesse período o adolescente necessita de espelhos, tanto
para controlar e checar seu crescimento e modificações corporais como também partilhar,
dividir e comparar suas vivências com as de outros iguais”. Continua sua reflexão quando diz:
O adolescente vai descobrindo e vivenciando o que Fowler denomina de ‘outros
significativos’. São aquelas pessoas significativas, importantes para o adolescente,
que têm o poder de contribuir, positiva ou negativamente, na composição das
imagens do próprio eu, para a identidade e a fé em formação, que lhe permitem
resgatar/restaurar uma ordem de sentido e valor – um ambiente último.
124
A ampliação de entendimentos do mundo que cerca o adolescente evidencia também
algumas preocupações dele com a sociedade, na seqüência da pesquisa com os jovens. Nesse
aspecto, os jovens falam da “violência” dos dias atuais, de “apanhar e ser roubado”, do
“envolvimento com drogas”, do “excesso de liberdade, trazendo riscos”. O conteúdo das
manifestações dos adolescentes vincula o nosso mundo contemporâneo e as decorrências com
a centralização de poder através do monopólio econômico, do desrespeito com as classes
menos favorecidas e uma série de outras circunstâncias que envolvem os dias atuais com suas
indiferenças.
Na leitura realizada sobre solidariedade e a necessidade da sensibilidade como
competência para um mundo com relações de respeito, Assmann e Mo Sung (2000)
expressam o seguinte entendimento, quando dizem:
Se a pessoa que percebe o sofrimento alheio tem muita dificuldade em perceber e
conviver com os seus próprios limites, medos e sofrimentos, também terá muita
dificuldade em perceber empaticamente o sofrimento do/a outro/a. Assim sendo,
tenderá a assumir uma postura de indiferença ou de agressividade como forma de
defesa frente à sua dificuldade em perceber o seu próprio sofrimento. E não cabe
dúvida que a nossa cultura oferece muitas formas ‘civilizadas’ de justificar esta
insensibilidade social.
125
123
FOWLER, 1992 apud MIRANDA, 2003, p. 105.
124
Ibid. , p. 107.
125
ASSMANN ; MO SUNG, 2000, p. 100.
56
Os autores revelam a triste situação em que vivemos ao longo dos séculos, na qual a
indiferença gera agressividade. As pessoas sem espaço de valorização e reconhecimento
sentem-se agredidas e ameaçadas na sua integridade enquanto seres humanos. Essas
proporções aumentam à medida que a realidade valida a vivência na indiferença e no descaso
com o outro. Nesse caso, o medo gerado institucionaliza-se, fazendo parte do imaginário da
sociedade.
Na expressão dos adolescentes, existe o receio com “o mundo em que vivemos”, a
“preocupação com o preconceito”, com a possibilidade de “entrar na universidade”, assim
como as “dúvidas de como será a existência no futuro”. Todas as questões apontadas pelos
jovens falam de esperança e, ao mesmo tempo, de saber lidar com as dificuldades.
Os autores de Competência e Sensibilidade Solidária, Assmann e Mo Sung (2000),
explicam sobre as nossas dificuldades de conviver com as ambigüidades na vida. Nos seus
relatos, dizem:
A nossa civilização ocidental moderna não nos educou para aceitar e convivermos
com as ambigüidades da vida, como por exemplo, a tensão e convivência entre a
vida e a morte, o amor e a insegurança frente à possibilidade de perder a pessoa
amada, o desejo de felicidade plena e a inevitável frustração desse desejo. Assim nós
tendemos a projetar para fora dos ‘muros’ da sociedade estas ambigüidades das
nossas vidas e para fora da nossa sociedade. Os nossos ‘demônios interiores’
naqueles que ‘sitiam’ os nossos muros e nossas vidas, os/as excluídos/as sociais. A
presença deles/as nos recorda os nossos medos e ambigüidades que queremos não
ver.
126
Os autores ainda revelam que existem dois encaminhamentos: entre eles, usarmos a
agressividade contra aqueles que nos fazem recordar dos nossos medos, ou enfrentarmos
nossos medos e sofrimentos, entendendo que nossa condição humana compartilhada coloca-
nos na mesma condição. Acrescentam ainda que a educação, que auxilia no processo de
reconhecimento das fragilidades humanas, trabalhando as competências com sensibilidade e
solidariedade, favorece a dignidade humana.
O adolescente, hoje, passa grande parte da sua vida na escola. Esse adolescente,
frente aos diversos estímulos materiais da sociedade contemporânea, busca, na ascensão
escolar, a possibilidade de perpetuação do seu modo de vida. Portanto, o entorno social não
caracteriza preocupação para a maioria desses jovens. Na verdade, grande parte das famílias,
preocupada com a subsistência, não desenvolve a crítica com significados que permitam o
comprometimento com sensibilidade e conscientização de uma vida mais digna, tanto para as
pessoas como em qualquer dimensão no mundo em que vivem. Devido ao momento
126
Ibid. , p. 100.
57
estruturante pelo qual o adolescente passa na construção da sua identidade, é relevante que se
questione o seu papel no meio social, na cultura, no meio ambiente e seu compromisso
enquanto cidadãos.
Portanto, a escola pode ser a referência para o desenvolvimento de interações que
fortaleçam a teia social. Nesse lugar, o jovem passa a ser protagonista da sua história,
propondo mudanças e transformações, tanto da sua vida como de inúmeras pessoas que lutam
à margem da sociedade sem reconhecimento. Também podem, com a mesma visão respeitosa
com projetos que consagrem a vida como centro de sua idéia, propor modificações nas áreas
da cultura, do meio ambiente e da saúde. Com profunda consistência, Assmann e Mo Sung
expressam seu entendimento sobre solidariedade, quando escrevem:
Solidariedade não é somente uma questão temática a ser tratada por algumas
disciplinas da área de humanas ou sociais ou então por temas transversais.
Solidariedade tem a ver com o modo de ver o mundo e a vida. Solidariedade é uma
relação inter-humana fundamentada na alteridade, que pressupõe reconhecimento
do/a outro/a na diferença e singularidade, atributos da alteridade. Reconhecer o/a
outro/a na diferença pressupõe relativizar a si mesmo, as nossas certezas, enfim,
todas as mesmices.
127
Nosso processo de humanização depende do espaço que o ‘outro’ tem na nossa vida,
como sujeito na convivência cósmica que estabelece a rede de significados. A diferença
consiste no entrelace afetivo, no qual o ser humano, como espécie, torna-se mais humano,
menos selvagem.
A abordagem sobre a adolescência com suas características, desenvolvida neste
capítulo, remete para a continuidade da reflexão, com um olhar de contexto, onde as
realidades e cenários se mesclam e, exigem dos jovens, posturas de sensibilidade e
investimento para significar as suas vidas. A oportunidade dos espaços para o exercício do
protagonismo, caminho complexo, mas repleto de possibilidades no desenvolvimento da
consciência voltada à cidadania é referência para a expressão do trabalho da Escola com ações
solidárias.
No terceiro capítulo, serão abordadas as questões que envolvem a escola com
educação solidária, com o adolescente como protagonista no entrelace social, no
entendimento desse outro e sua invisibilidade, enquanto desconhecido na relação das
vivências do cotidiano dos nossos jovens adolescentes, como também, da transformação da
realidade, quando se reconhece o outro; e, para finalizar o capítulo, o reconhecimento dos
jovens adolescentes através da solidariedade como sinal de esperança.
127
Ibid. , p. 97.
3 EDUCAÇÃO E SOLIDARIEDADE
3.1 Adolescentes protagonistas no entrelace social
Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados.
(Mateus 5:6)
128
O Programa Social Um Olhar para o Outro
129
tem focado suas ações para
sensibilizar jovens adolescentes sobre o entorno social. Essas ações podem envolver crianças,
jovens adolescentes, jovens adultos, idosos, ecologia, cultura, enfim todas as possibilidades
solidárias de investimento por um mundo mais humano e sensível às necessidades que nele
existem. Cada grupo tem seu foco e, ao longo de três anos, a Escola junto com os jovens
articulam as vivências solidárias com a participação dos professores, familiares e pessoas
responsáveis pela entidade ou local de atuação social.
Os jovens envolvidos no projeto são adolescentes que vivem, de certa forma, o
período de moratória
130
estabelecida e idealizada pelos adultos e que acarreta a privação de
reconhecimento e independência para se tornarem adultos. Esses mesmos jovens também
percebem, na sua grande maioria, que “na sociedade pós-moderna, há necessidade de grandes
esforços para se preparar e qualificar possibilite uma inserção bem-sucedida no mundo da
vida dos adultos”.
131
Também se sabe que “a adolescência é uma fase de transição na nossa
vida que não podemos evitar. É uma fase rica em experiências, mas também difícil, de
inseguranças e de necessidade de reordenamento e de readaptação”.
132
No contexto da nossa sociedade na atualidade, as políticas voltadas para o bem-estar
das pessoas baseiam-se na “hegemonia da ideologia neoliberal no processo de globalização
econômico”
133
e, na opinião de Assmann e Mo Sung, “esse modelo de Estado de bem-estar-
social foi sendo deslegitimizado e substituído por Estados preocupados fundamentalmente
com processos de ajustes econômicos em vista da dinâmica do mercado mundial, em
128
VIVER..., 2004, p. 253.
129
Descrição detalhada no capítulo I.
130
CALLIGARIS, 2000, p. 18.
131
DAUNIS, 2000, p. 139.
132
ASSMANN ; MO SUNG, 2000, p. 93.
133
Ibid. , p. 92.
59
particular do mercado financeiro”.
134
A exclusão social é uma realidade desses contextos
políticos de Estado e, nesse sentido, “esta apatia e insensibilidade, que leva as pessoas a
verem os problemas dos pobres e problemas estruturais da sociedade como problemas dos/as
outros/as, têm a ver com a incapacidade de ver relações de interdependência entre todas as
pessoas e grupos”.
135
É no processo educacional que podemos fortalecer ações mais conscientes para
auxiliar nossos jovens na transição para a fase adulta, verificando alternativas nas quais seja
possível o desenvolvimento da consciência social, “principalmente, em aportes que
fortaleçam a autonomia e autodeterminação do eu, mostrando necessidade da
interdependência no convívio íntimo da alteridade familiar e na convivência grupal, social e
mundial”
136
, “assim como, da liberdade pessoal limitada pela liberdade dos outros e exercida
dentro da responsabilidade perante si mesmo, os outros e na perspectiva ecológica”.
137
Nesse
sentido, ainda necessitamos a correlação e profunda reflexão do aspecto pelo qual “evidencia-
se o fato de cada um existir como ser-em-relação; toda ética de cuidado de si (segundo o amor
próprio básico) precisa, simultaneamente, considerar a necessidade de uma ética de solicitude
e justiça para com o próximo”.
138
3.2 A invisibilidade do outro
Amo aquele cuja alma é repleta, de modo que ele se esquece de si próprio, e todas as
coisas estão nele... (Friedrich Nietzsche)
139
O espaço solidário, que viabiliza o encontro com o outro, só é possível quando a vida
das pessoas for sensibilizada pelo desconhecido, pelo invisível, que está presente no mundo,
mas ainda não povoa o nosso ser. No diário, convivemos com toda espécie de experiências,
pessoas, culturas, mas não significa que essas nos tocaram ou nos sensibilizaram para fazer
parte da nossa vida. Fazer parte é estar incluído e incluir o outro, que circunda a vida na sua
dimensão mais ampla, que é indivisível, que é diferente e igual e, é de vital importância para a
existência com significado e sentido de vida.
No livro Modernidade Líquida, Bauman (2001) aborda sobre o tempo/espaço na
modernidade, que apresenta verdades constituídas com entendimentos particulares, de acordo
134
Ibid. , p. 92.
135
Ibid. , p. 93.
136
DAUNIS, 2000, p. 115.
137
Ibid. , p. 115.
138
Ibid. , p. 115.
139
VIVER..., 2004, p. 286.
60
com nossas vivências, criando os espaços vazios. Cita Jerzy Kociatkiewicz e Monika Kostera,
que cunharam o termo, explicando:
Espaços vazios são lugares a que não se atribui significado. Não precisam ser
delimitadas fisicamente por cercas ou barreiras. Não são lugares proibidos, mas
espaços vazios, inacessíveis porque invisíveis. Se... o fazer sentido é um ato de
padronização, compreensão, superação da surpresa e criação de significado, nossa
experiência dos espaços vazios não inclui o fazer sentido.
140
Bauman (2001) comenta ainda que esses espaços vazios são, antes de tudo, vazios de
significado. Não que sejam sem significado porque são vazios. Nesse aspecto, coloca:
[...] é porque não têm significado, nem se acredita que possam tê-lo, que são vistos
como vazios (melhor seria dizer não-vistos). Nesses lugares que resistem ao
significado, a questão de negociar diferenças nunca surge: não há com quem
negociá-la. O modo como os espaços vazios lidam com a diferença é radical numa
medida que outros tipos de lugares projetados para repelir ou atenuar o impacto de
estranhos não podem acompanhar.
141
O adolescente, que busca sua identificação na construção da sua individualidade,
questiona as relações de seus iguais, dos sentimentos que compõem sua vida em relação ao
outro que o rodeia e permeia seu ser, enquanto sujeito. Nesse sentido, o espaço vazio,
invisível, está presente na vinculação do adolescente com o projeto social, quando muitos
jovens não conhecem o suficiente a realidade no seu entorno social e não compreendem o
modo de vida das pessoas em situação de precariedade social. Por sua idade de reconstrução
interior, não têm constituído o entendimento do outro, pois seu próprio entendimento está em
aberto.
A escola, como promotora da veiculação do espaço solidário, tem consigo a
possibilidade incalculável de germinar a educação para a sensibilidade de jovens, que, uma
vez “tocados”, podem “enxergar” o que para muitos, ainda está invisível: a necessidade de
reconhecer a si e o outro. Muitas vezes, essa necessidade está agregada ao jovem, mas ainda
confusa, uma vez que ele se encontra na “tarefa central da adolescência”, que consiste em
começar, de forma consciente, a achar uma identidade própria, no sentido de “agora eu sou
este”.
142
Na demanda educacional da escola, oferecer espaços que constituam a interação do
jovem com o meio social é preponderante “a conscientização que cria formas humanas e
140
BAUMAN, 2001, p. 120.
141
Ibid. , p. 121.
142
DAUNIS, 2000, p. 56.
61
participativas. Uma escola humanizada não pode ser estabelecida por decretos. Ela cresce a
partir do cotidiano na sala de aula”.
143
Nesse aspecto, entre as atividades desenvolvidas pela escola, com o Programa Social
Um olhar para o outro, o professor de Filosofia
144
da segunda série do Ensino Médio utiliza o
filme Cidade dos homens
145
para trabalhar os contextos de pobreza, da diferença identificada
com preconceito, do desconhecido, da ambigüidade
146
que o mundo contemporâneo coloca à
parte para não sofrer. Os alunos assistiram ao filme e, após, refletiram em grupo sobre o
episódio 4, chamado Uólace e João Victor.
147
As colocações feitas pelos jovens viabilizam a
leitura de diversos sentimentos sobre o relacionamento com o outro e o vínculo com o
desconhecido, com o invisível, com a sensibilidade para a educação solidária. As quatro
questões propostas pelo professor de filosofia foram:
a) Que conflitos de convivência, apresentados pelo filme, o grupo consegue perceber
na entidade em que está trabalhando com o Projeto Social?
b) Como o grupo pode auxiliar com seu trabalho na diminuição destes conflitos?
c) Por que as diferenças incomodam tanto as pessoas? Reflitam a partir do filme.
143
Ibid. , p. 115.
144
O professor propôs a atividade no mês de maio de 2006, para os 120 alunos da segunda série do Ensino
Médio, envolvidos na presente dissertação e no projeto. O propósito de sensibilizar os jovens, com a
realidade do entorno social, evidenciava o principal objetivo do professor.
145
Interpretados por Douglas Silva e Darlan Cunha, Laranjinha e Acerola, são dois garotos de 13 anos moradores
de um morro no Rio de Janeiro. Cidade dos Homens é um desdobramento do filme Cidade de Deus. Mesmos
criadores, mesma equipe, mesmos atores. Mas podemos dizer também que esse projeto é o avesso do outro:
Cidade de Deus é um drama com um toque de comédia sobre traficantes no Rio, a comunidade aparece
apenas como pano de fundo. Cidade dos Homens é uma comédia, com um toque de drama sobre uma
comunidade no Rio de Janeiro, os traficantes aparecem só como pano de fundo. Um projeto complementa o
outro. Em ambos, a eficiência da narrativa e o talento dos atores do grupo Nós do Cinema impressionam.
Cidade dos Homens foi exibido na Rede Globo, com audiência surpreendente, entre 15 e 18 de outubro de
2002. Os 4 Episódios da série da TV:1) A Coroa do Imperador, 2) O Cunhado do Cara 3) Correio 4) Uólace
e João Victor. Com 150 min. e produção em 2002.
146
ASSMANN ; MO SUNG, 2000, p. 101, em que dizem: “Sem uma educação que nos ajude a convivermos
com os limites e as ambigüidades da condição humana, como a morte e a vida, a dor e o prazer, sofrimentos e
alegria, medos e coragem, egoísmos e gestos de solidariedade, necessidades e desejos, etc., termos muita
dificuldade em percebermos com empatia e compaixão (sentir a mesma paixão/dor) os sofrimentos dos/as
excluídos/as pela sociedade. E, para isso, é também importante que no processo de educação se reconheça
que as teorias e ciências que se ensinam são sempre provisórias e parciais”.
147
Esses dois personagens, moradores de uma mesma cidade, apenas em bairros diferentes, caracterizam, no
filme, que o desconhecimento entre eles favorece o preconceito e a discriminação. Os dois garotos vivem em
uma grande cidade à procura de um caminho para as suas vidas. Se depender das suas mães, João Victor terá
um futuro glorioso. Uólace, por sua vez, vive nas ruas, à mercê de toda a sorte de imprevistos. Nunca foi à
escola e sua mãe, desde que perdeu o emprego, tornou-se uma mendiga e passa maior parte do tempo
embriagada. João Victor tem muitas dúvidas sobre seu futuro glorioso, mas não quer decepcionar a mãe. Ele
acalenta seus próprios sonhos, suas fantasias... Uólace não pode contar com sua mãe e sabe que sua vida
corre risco permanente. Também Uólace tem seus sonhos, suas fantasias... Dois meninos, duas vidas. Por
vezes, eles se esbarram, mas não se encontram. Uma mesma cidade e dois mundos opostos. No cenário
comum em que circulam, suas vidas se cruzam, quase se entrelaçam. (texto da contracapa do livro:
STRAUSZ, Rosa Amanda. Uólace e João Victor. Rio de Janeiro: Salamandra, 1990.
62
d) Quais são as diferenças que mais incomodam vocês neste trabalho solidário com
as pessoas da entidade?
Entre alguns questionários respondidos pelos alunos em grupos
148
, foram
selecionadas algumas respostas, para fundamentar o diálogo sobre o Programa Social, a
adolescência
149
e a educação solidária. Esses objetos de estudo estão vinculados aos aportes
teóricos, já estabelecidos anteriormente na introdução e contribuem na reflexão dos
questionamentos
150
realizados pela mestranda, para fundamentar os estudos na presente
dissertação.
3.3 Transformar realidades:quando se reconhece o outro.
Tudo o que fiz foi com plena consciência de um ser humano que busca relatar sua
identidade. Preciso indagar que diabos estou fazendo aqui na vida, na sociedade e na
história. (José Saramago)
151
A aprendizagem passa a constituir o sujeito quando o sentido de vida estiver
alicerçado no bem coletivo, na ética que contribua nas narrativas que representam a história
de cada sujeito no seu meio cultural. Nessa dimensão, Kehl coloca:
Na modernidade, o sentido de vida não é dado por nenhuma verdade transcendental
que preceda a existência individual; entretanto, é ilusório pensar que a criação de
sentido para a existência possa ser um ato individual. É uma tarefa coletiva, uma
tarefa da cultura, da qual cada sujeito participa com seu grão de invenção. É uma
tarefa simbólica, que se dá por meio da produção de discursos e narrativas sobre
‘que a vida é’ ou ‘o que a vida deve ser’.
152
148
São 19 grupos de quatro segundas séries do Ensino Médio, totalizando 120 alunos. Questionários dos grupos
estão em anexo. Nessa atividade, alguns alunos se colocaram por entidade, pois no todo são 21 grupos.
149
A adolescência recebe destaque no capítulo II.
150
No presente estudo, as questões enfocadas estão voltadas ao potencial educacional da escola e da contribuição
para a formação de lideranças, incentivo à autonomia de jovens, visão mais crítica do entorno social através
da vivência com ações solidárias, na construção da identidade do adolescente. Diante do momento do
desenvolvimento do adolescente, uma das questões para refletir diz respeito aos conteúdos que auxiliam
nessa construção, assim como os referenciais que permitem a estruturação da identidade nessa etapa de vida.
A vivência no cenário contemporâneo e a realidade político-social com perspectivas de futuro instável
remetem para a reflexão sobre como se estabelece o acesso ao conteúdo informacional e ao outro. Talvez
possa se dizer que exista particularmente uma dúvida sobre os momentos em que há escuta e reflexão acerca
dos conteúdos das questões trazidas pela sociedade em relação às subjetividades expressas pelo adolescente.
Dessa forma, o estudo baliza-se nas seguintes questões:
Qual é a contribuição do programa social na construção da identidade do adolescente? Ele fornece
referenciais que permitam a estruturação nessa etapa de vida, convivendo com as diferenças sociais e seu
aprimoramento para a fase adulta? Até onde a subjetividade expressa pelo adolescente, com suas
vulnerabilidades, é escutada e validada, assim como a das pessoas assistidas em situação de vulnerabilidade,
podendo contribuir mutuamente para o crescimento?
151
ASSMANN ; MO SUNG, 2000, p. 236.
152
KEHL, 2002, p 10.
63
Um grupo de adolescentes respondeu à pergunta sobre as diferenças que mais
incomodam no trabalho solidário com as pessoas da entidade, com base no filme
153
já citado,
“o ‘medo’ que elas têm da gente antes de saberem como realmente nós somos”. Outro grupo
destaca: “a maneira que as crianças mais velhas nos olham, parece que a gente é ‘playboy’ e
arrogante, que só pensa em si”. Ou ainda, como outro grupo expressa: “o ser humano tende a
se unir, ou subdividir, em grupos com características que se identificam e, julgar o diferente,
sendo mais fácil condenar, do que tentar entender e respeitar. As diferenças incomodam tanto
as pessoas por falta de informação e preconceito, o que é retratado na cena em que os
personagens se xingam em pensamento”.
154
Tanto na condição do filme como na vivência com adolescentes nas entidades com
seus projetos de solidariedade, a leitura de cenário nos encaminha ao fortalecimento de ações
que viabilizem o diálogo e o conhecimento mútuo das realidades e das pessoas no contexto
em que vivem. Alia-se a isso a sensibilidade para contribuir no reconhecimento das
potencialidades de cada realidade, com vistas a transformações nas quais o respeito e a
dignidade sejam valorizados. No entanto, a fala dos jovens revela a insegurança vigente no
meio contemporâneo, sobre a qual, no entendimento de Bauman, tem-se a seguinte reflexão:
Esforços para manter à distância o ‘outro’, o diferente, o estranho e o estrangeiro, e a
decisão de evitar a necessidade de comunicação, negociação e compromisso mútuo,
não são a única resposta concebível à incerteza existencial enraizada na nova
fragilidade ou fluidez dos laços sociais. [...] Esses desejos convergem, aliam-se e
condensam-se na política da separação étnica, e particularmente na defesa contra a
vinda dos ‘estrangeiros’ Como diz Georges Benko, há Outros que são mais Outros
que os Outros, os estrangeiros. Excluir pessoas como estrangeiras porque não somos
mais capazes de conceber o Outro indica uma patologia social.
155
Alguns jovens adolescentes escreveram, na análise do filme, questionando: “por que
as diferenças incomodam tanto as pessoas?”. Nesse aspecto, os jovens dizem: “acho que é
153
UÓLACE e João Victor. In: Cidade dos Homens. Central Globo de Produções, 2003.
154
O grupo se refere à cena do filme em que João Victor não consegue dormir e vai até a janela, quando as
reflexões do jovem de 13 anos fluem da seguinte maneira: “Abro, respiro o cheiro de rua dormida e escura.
Não passa ninguém. Quase nenhum carro. A rua parece cenário em quadrinhos de terror. De repente, vejo
dobrar a esquina uma figurinha conhecida. Parece o pivetinho do hambúrguer. Mas agora não parece
assustador. Talvez porque a rua escura seja tão mais amedrontadora. E ele caminhe com passos arrastados, a
cabeça baixa, os braços enfiados por dentro da camiseta velha pra esquentar. Tem muito corajoso pra andar
pela rua a essa hora. Mas ele também parece corajoso. Só ... perdido. Igual a mim. Igual a mim - repito
baixinho”. Uólace, nesse mesmo momento, da rua olha para a janela e pensa: “Tudo fechado a esta hora.
Todas as janelas apagadas. Só no céu tem umas luzinhas estreladas. Vou andando e olhando pra cima. De
repente, vejo uma janela acesa. É um menino do meu tamanho. Que será que faz um menino acordado no
meio da noite? Olho melhor pra ele e reconheço o carinha que come hambúrguer no café da manhã. Mesmo
de longe, posso ver que está com a cara nojenta de todo o dia. Parece tão perdido. Igual a mim. Igual a mim,
repito baixinho”. STRAUSZ, 1990, p. 69 e 71.
155
BAUMAN, 2001, p. 126.
64
medo. As pessoas têm medo do desconhecido e o evitam. É justamente por ser desconhecido
não têm noção de como é, estar do outro lado”. Outro grupo expressou: “porque o ser humano
é muito individualista e preconceituoso; também tem medo do diferente, assim cria um rótulo
para um determinado grupo de pessoas e pensa que todos são iguais”. Ainda como reflexão,
outro grupo afirmou: “porque todos querem ter as melhores condições, as melhores coisas e
assim muitos se sentem inferiores”.
Na leitura sobre a sociedade moderna, Maria Rita Kehl descreve que cada pessoa
diariamente convive com inúmeras outras “pessoas estranhas a ele, pelas quais não tem a
menor condição de sentir amor, muito menos um amor imposto pela lei. Já seria suficiente se
um novo imperativo conseguisse produzir, no laço social, valores de respeito e tolerância”.
156
A autora cita o filósofo Lèvinas, que escreve: “a relação ética com o outro implica uma
dimensão de responsabilidade mediada pela palavra”.
157
Na perspectiva que envolve a
alteridade, Kehl cita que, para esse filósofo, essencialmente preocupado com a questão da
alteridade, “o sujeito é responsável por convocar o outro como interlocutor, pois nada garante
que o outro, aquele a quem se fala, seja por isso ‘previamente compreendido no seu ser’”.
158
Completa com as reflexões do filósofo, que diz:
O outro não é objeto de compreensão, mas pode tornar-se interlocutor; compreender
uma pessoa já é falar-lhe, escreve Lévinas, acrescentando que ‘o homem é o único
ser que não posso encontrar sem lhe exprimir este encontro mesmo’. (...) Para
Lévinas, o rosto representa a dimensão sagrada da alteridade. O rosto
159
não é
apenas imagem; é a própria presentificação do outro diante de mim, em sua
diferença irrecusável.
160
156
KEHL, 2002, p. 22.
157
LÉVINAS, Emmanuel apud KEHL, 2002, p. 23.
158
LÉVINAS apud KEHL, 2002, p. 23.
159
Assim como o filósofo Emmanuel Lévinas escreve sobre a imagem do rosto, KEHL (2002) faz a releitura
quando questiona: “o conceito de rosto como presentificação do outro em sua diferença, para além do que
pode se reduzir a uma imagem, nos convida a pensar sobre o que acontece numa sociedade como a nossa, na
qual o laço social é quase exclusivamente mediado pela mídia eletrônica, que reduz a subjetividade
justamente à dimensão da imagem. Como se dá a relação com o semelhante num campo dominado por
formações imaginárias?” KEHL, 2002, p. 23-24. Assim também Ana Maria Rizzuto, no livro O nascimento
do Deus vivo (2006), escreve sobre seus estudos: “Do ponto de vista do nosso estudo, essa é a primeira
experiência direta que a criança tem – muito cedo na vida – que é usada na formação da representação de
Deus. Sugiro que a primeira experiência integrada de si mesmo precede a primeira experiência - e
representação – integrada da mãe. A mãe esta aí para dar à criança uma representação de si mesma, para
dizer a ela com que se parece, chamá-la pelo nome e lhe dizer os nomes das partes de seu rosto e então de seu
corpo. [...] Em resumo, a importância do rosto materno, que começa com o contato visual, expande-se,
durante o primeiro mês de vida, para abranger seqüencialmente o rosto da mãe, o manejo integral da criança,
as fantasias e desejos da mãe, sua elaboração mitológica da identidade da criança, seus desejos manifestos ou
ocultos e suas exigências de que a criança, por sua vez, espelhe os desejos dela. Tudo isso, acontece no
contexto mais amplo de romances e mitos familiares entre pais, avós, outras crianças, o background religioso
e político – em síntese, mitologização familiar inteira da vida cotidiana”. RIZZUTO, 2006, p. 242 - 244.
160
Ibid. , p. 23.
65
É nesse papel de construir simbolicamente a vida dos adolescentes, oferecendo-lhes
oportunidades para desnudar questões importantes para a vida adulta, que a família e a escola
podem auxiliar no processo de desenvolvimento dos jovens. No convívio humano,
estabelecem-se situações nas quais as relações necessitam de espaço de reflexão sobre a ética,
contribuindo para ações mais solidárias entre as pessoas. Ao longo dos tempos, percebemos a
ênfase para as relações que empobrecem os laços sociais e não colocam os sujeitos para
mediações nas relações com suas diferenças. Essa situação potencializa-se com a pessoa, na
contemporaneidade, quando a violência conduz para sofrimentos que inviabilizam encontros
efetivos entre as pessoas, com medo de encarar os seus conflitos.
O medo de sofrer instaura a ordem que destrói as relações de esperança para a
mudança e a transformação da vida. Na análise do filme com os jovens, na questão sobre
conflitos de convivência, em contraponto com a vivência na entidade e o projeto social
propostos pelos grupos, os jovens citaram: “elas incomodam as pessoas, pois são elas que
geram a violência social. Se as diferenças fossem menos acentuadas, certamente haveria
menos assaltos”. Assim como outro grupo enumerou: “ausência da família, valores, fome,
falta de base”. Também outro disse: “quando chegamos na entidade, as meninas estavam
conversando, e ao nos ver, ficaram em silêncio, com vergonha”.
O espaço democrático na escola e de processos de participação das pessoas está
fundamentado nos estudos de Kehl (2002) sobre algumas abordagens do ponto de vista da
Reforma e a crise provocada no século XVI. A autora coloca que a quebra do monopólio da
igreja católica, detentora da palavra do Pai, forçou o entendimento para a multiplicidade de
saberes, vinculando as pessoas às suas questões simbólicas. Acredita que Lutero fez emergir
no mundo cristão um processo de democratização da Igreja, revendo as posturas nos
processos hierárquicos e dos interesses materiais, tão fortemente impregnados nesse período.
Percebe que se abre para o cristão a possibilidade de cada devoto decidir sobre sua fé, além de
poder fazer a interpretação dos textos sagrados, oportunizando escolhas, sendo que a verdade
não é apenas uma. Diante do exposto, o cristão fica vinculado a uma mescla de
responsabilidade e culpabilidade diante das suas escolhas.
161
Nesse aspecto, reforça seu
estudo, quando diz:
Se existem duas maneiras de interpretar como deve agir um bom cristão, se institui a
possibilidade de cada devoto decidir, consigo mesmo, sobre a natureza de sua alma,
161
KEHL, 2002, p. 54.
66
a sinceridade de sua fé, e mesmo sobre sua interpretação pessoal dos textos
sagrados, a dúvida e a escolha estão definitivamente implantadas onde até então o
dogma e a palavra de autoridade decidiam as questões. Onde existe a escolha, a
verdade já não é UMA.
162
Como podemos perceber, a mudança caracteriza um processo de individualização
que permite a representação pessoal do sagrado na vida das pessoas. Nesse aspecto, o público
e privado colocam-se separados, ocupando espaços distintos. Martin Lutero compõe o
importante processo de conscientização das pessoas sobre a necessidade de rever práticas que
escravizavam o entendimento da relação com Deus e a dominação, que impede a liberdade
para amar, independente de hierarquia ou mesmo do poder de compra para aceitação social.
O teólogo Walter Altmann (1994) coloca sobre o aspecto revolucionário de Lutero,
quando explica: “[...] nele encontramos a ênfase comunitária, a libertação da tutela
institucional, a compreensão da estrutura eclesiástica como reformável e de serviço, a
preferência pelo fraco, a marca da cruz, a primazia da palavra de Deus”.
163
A proposta de
Lutero representa a possibilidade de um novo olhar, de enxergar o que era impossibilitado
pelo poder instituído na época. As teses contribuem com o processo transformador, com a
inclusão de novas reflexões, com a ousadia de romper com a dependência ao poder vigente,
de ler, reler e interpretar o que de mais precioso as pessoas expressam ao viver a esperança de
reconhecimento como sujeito nos seus processos de vida. Lutero, através da Reforma,
estabelece parâmetro educacional inovador, com propósitos transformadores, inquietando o
olhar daqueles que necessitam rever seus conceitos existenciais com relação aos
desamparados e desfavorecidos.
Nesse sentido, Leonardo Boff reflete sobre a ética da solidariedade com visão
ampliada na interdependência de todos os seres e expressa que “carregamos ferida comuns e
alimentamos esperanças e utopias comuns”.
164
Também entende que somos solidários em
tudo que nos cerca, tanto na vida quanto na sobrevivência e na morte. Ainda expressa que a
solidariedade, sozinha, não é o suficiente. “Ela precisa ganhar corpo político, jurídico e
pedagógico numa dimensão transespacial e transtemporal”. Entende que a ética do diálogo
entre os povos como construção coletiva é o recurso que universaliza esse processo.
165
Ao relacionar proposta da Reforma de Lutero com os pensamentos sobre o ethos de
Leonardo Boff, descreve a seguinte passagem, que diz:
162
Ibid. , p. 55.
163
ALTMANN, Walter. Lutero e libertação. São Leopoldo, RS: Sinodal, 1994, p. 133.
164
BOFF, Leonardo. Ethos mundial : um consenso mínimo entre os humanos. Rio de Janeiro: Sextante, 2003,
p. 87.
165
BOFF, 2003, p. 93.
67
Essa linha ética, predominante na reflexão filosófico-social, vem acompanhada por
uma teoria da evolução humana, pedagógica e social: o ser humano aprende
moralmente, à medida que convive, relaciona-se e intercambia continuamente com
os diferentes. Essa ética invalida o pretenso caráter ético das ações dos poderosos do
mundo.
166
A preocupação com ações educacionais mais efetivas sobre a responsabilidade com o
contexto mostra a necessidade de encaminhamento para conquistar o entrelace solidário no
entorno social. A prática escolar voltada para as questões da solidariedade remete para
reflexões de profundas mudanças, não somente na ação educacional com os jovens, mas
também com a comunidade toda. Com autoridade, Altmann (1994) coloca:
Entre irmãos e irmãs – Mt. 18:20: onde dois ou três estiverem reunidos no nome de
Jesus – que ouvem o chamado para uma nova vida, vivenciam o perdão de Cristo,
seguem no discipulado, se colocam na história do amor de Deus, assistem os aflitos,
apóiam os oprimidos, combatem o mal, o pecado e a injustiça, aí os sacramentos
quase que por si se transformam em sinais altamente significativos e serão berço da
comunidade cristã.
167
A comunidade escolar precisa contribuir nessa caminhada realizada pelos
adolescentes, para que se valide o entendimento sobre a solidariedade com todos aqueles que
estão marginalizados na sociedade. Altmann segue sua reflexão fazendo um paralelo com o
período da Reforma, dizendo que “as grandes transformações ocorridas na época da Reforma,
pelo veículo da palavra, que era ela mesma ação concreta, nos podem ser um exemplo
animador”.
168
Percebo, na preocupação do teólogo com as comunidades religiosas, uma
possibilidade de vincular a vivência da escola e demais espaços da comunidade. Os desafios,
no sentido de mudanças transformadoras da sociedade predominantemente excludente, podem
ser viabilizados com a participação das pessoas nas discussões e ações para melhorias de
todos na comunidade.
Essa situação acima citada evidencia-se em algumas reflexões dos alunos sobre a
questão que envolve a análise do filme quando é questionado “como o grupo pode auxiliar
com seu trabalho na diminuição dos conflitos (gerados pela exclusão social)?” Um grupo
relatou o seguinte: “tratando elas pelo que são e não pelo que têm e dando atenção necessária,
que irá suprir a falta de atenção”. Outro grupo sugere que “para resolver o problema da
higiene, deve-se resolver primeiro a falta de recursos e, para isso, tentaremos conseguir com
166
Ibid. , p. 94.
167
ALTMANN, 1994, p. 153.
168
Ibid. , p. 154.
68
que a comunidade doe ou ajude, fazendo campanhas e rifas. O problema com as crianças se
resolverá com o convívio, as crianças verão que queremos ajudar”. Outro grupo manifestou a
seguinte questão: “abrir horizontes e mostrar diferentes parâmetros para que aumentem suas
capacidades de pelo menos viverem por si sós de uma forma adequada”. E ainda outro grupo
disse: “mostrando que há muitas portas na vida, muito mais do que elas imaginam, que o
mundo vai mais além da entidade”.
Muitas das palavras dos alunos estão vinculadas à fé e à esperança, caracterizando
sua vivência educacional na família. Niebuhr, citado por Fowler (1992), afirma que
“moldamos nossas ações e respostas na vida de acordo com as nossas interpretações dos
padrões mais amplos de ação que incidem sobre nós. Comunidades de fé são comunidades de
interpretações partilhadas”.
169
De acordo com o autor, a adolescência com “o pensamento
formal, com sua capacidade de reflexão sobre o pensamento e as formas de experimentar da
própria pessoa, convida-a mentalmente para sair do fluxo do rio da vida”
170
. Completa
dizendo:
De um ponto de observação na margem do rio, por assim dizer, a pessoa pode
examinar o fluxo d’água como um todo. Pode ver e nomear certos padrões de
sentido que surgem de sua coleção de estórias. Um mito ou mitos de passado pessoal
pode ser composto; isto representa um novo nível de estória, um nível que
poderíamos chamar de estórias de nossas estórias. E, com isto, vêm a possibilidade e
o encargo de compor mitos de possíveis futuros.
171
A partir da análise do filme, esses dois personagens, adolescentes de 13 anos, João
Victor e Uólace, auxiliam nossos jovens adolescentes do Programa Social Um olhar para o
outro a compreender a dimensão de realidades que habitam o mesmo espaço, mas estão
fechados para o convívio. Nas argumentações seguintes, passo a estabelecer alguns caminhos
para compreender a importância do trabalho solidário na escola, como fio condutor de
mudanças para seres humanos mais engajados pela paz.
3.4 Reconhecer o outro na dimensão da esperança
As pequenas coisas parecem não ser nada, mas elas trazem a paz; assim são as flores
dos campos que acreditamos não terem perfume, mas que, juntas, perfumam.
(Mahatma Gandhi)
172
169
FOWLER, 1992, p 88.
170
Ibid. , p 130.
171
Ibid. p 131.
172
VIVER..., 2004, p. 296.
69
No capítulo II, que fala sobre a adolescência, o levantamento realizado com os
jovens, expresso por meio da tabela (quadro 3), revela o que é importante nas suas vidas e, de
certa forma, revelaram preocupações como “ser alguém na vida”, “ser amado”, “ser aceito”,
“escolher o caminho certo”, “saber que a gente tem limites”, “ser feliz”, “ter sonhos”.
Quando falam da relação com o outro, expressam a importância sobre os seguintes aspectos:
“ter amigos”, “ter alguém com quem partilhar os momentos bons e maus”, “receber carinho e
afeto”, “ter sua opinião respeitada pelo adulto”, “falta de valores e ética das pessoas”, entre
outros. Nas questões que envolvem a relação do adolescente e a sociedade, comentam as
seguintes questões: “curtir a vida sem tanto medo”, “descobrir que o mundo não gira em torno
de nós”, “desigualdades sociais”, “a insegurança em que vivemos”.
Esses entendimentos e desejos dos jovens estão além das suas condições de vida,
posses e facilidades materiais e de afeto, pois representam conteúdo humano, independente de
classe social, gênero, etnia. No entanto, o entorno social, com sua realidade de exclusão,
agrava a busca e realização de sonhos importantes, como, por exemplo, ter escola, ter
identidade, ter data de nascimento, ter lugar para morar, ter uma mãe e uma família que
ampare e não apenas em sonho. O sentido de vida é objeto de estudo por Brakemeier (2002),
que escreve:
Não menos grave é a perda de sentido. O mundo moderno, secularizado e plasmado
pela ciência, brindou as pessoas com enormes facilidades. Mas privou-as do esteio
da fé. Já não mais há parâmetros seguros a orientar a existência e conduta humana.
Surge o fantasma do absurdo, do relativismo, do vazio. Tenta-se bani-lo mediante
recursos anestesiantes, a exemplo de consumo, ativismo, aventura. Para enormes
contingentes da humanidade, o problema fundamental resume-se no deus
absconditus , ou seja, no sumiço de Deus e, conseqüentemente, da sustentação moral
e existencial da vida.
173
Com propriedade, Brakemeier entende que “O reino de Deus é esperança, não
projeto”.
174
No entanto, compreende que, “é preciso recuperar a utopia social, sem a qual, a
médio e longo prazo, a do indivíduo se há de revelar fictícia”.
175
Ainda complementa:
Mesmo que a perfeição seja inatingível ao ser humano enquanto pecador, a fantasia
utópica, projetando o desejável e humanamente exeqüível, é condição da
recuperação do “sentido de vida”. Sociedade sem visões estagna e se entrega à
dinâmica da autodestruição.
176
173
BRAKEMEIER, Gottfried. O ser humano em busca de identidade: contribuições para uma antropologia
teológica. São Leopoldo: Sinodal; São Paulo: Paulus, 2002, p. 103.
174
BRAKEMEIER, 2002, p. 216.
175
Ibid. , p. 217.
176
Ibid. , p. 217.
70
As utopias contêm a esperança de espaços mais solidários, em que o conhecimento
pode transformar a vida das pessoas. Assmann e Mo Sung expressam seu entendimento sobre
a esperança quando colocam:
A esperança, como experiência pessoal, tem uma relação com a capacidade de
aprender e com as formas que o conhecimento assume na vida de cada pessoa.
Quem perde a esperança perde também potencial cognitivo. A esperança é, entre
outras coisas, uma invasão benéfica dos outros em nossa identidade. Esperança
inclui reconhecimento do diferente sob dois aspectos: o diferente enquanto possível
e o diferente que já existe. O diferente enquanto possível, é o diferente ainda inédito.
É a esperança que o institui como possível. A esperança inova realidades. No cerne
da esperança sempre palpita o desejo. Muitas vezes chamamos de esperança aquilo
que queremos inovar. Mas será que o diferente inovador pode surgir para mim
quando depende inevitavelmente de tantas coisas fora de mim? Para mim só será um
diferente novo na medida em que despontar dentro de mim. Quem espera é
inevitavelmente um ser criador dos ‘objetos’ do seu desejo.
177
É nesse sentido que o Programa Social Um Olhar para o Outro cumpre sua função
transformadora e de sentido de vida para adolescentes e para todos aqueles que entendem a
importância do reconhecimento como espaço de esperança. Por um lado, a manifestação dos
adolescentes, quanto ao reconhecimento, quando relatam sua vivência com o projeto e a
possibilidade de transformações na vida das pessoas assistidas, como também reconhecem a
sua transformação e fazem relatos das mudanças pessoais. Escrevem sentimentos importantes
e avaliam positivamente a possibilidade de aprendizagem nas entidades, tanto nos acertos,
como nos limites e frustrações. Para exemplificar com as palavras dos alunos, apresento parte
do relato que cada grupo realizou em 2006, expressando seus sentimentos, sobre a atuação no
projeto social. Um dos grupos escreveu:
Nos reunimos em minha casa, elaboramos o roteiro. Na próxima aula, as coisas
seriam diferentes, eles iriam colaborar, a peça estaria encaminhada. Isso era o que
queríamos, mas foi muito diferente, uma confusão, falta de domínio da nossa parte?
Talvez... Mas, agora, o que nos preenchia era um sentimento de completa frustração
com as crianças por terem recebido o que preparamos com dedicação daquela
maneira, e com nós mesmo, por sentirmos incapazes de contornar a situação.
Ficamos confusos, pensamos em desistir. O número de horas estipulado estava
cumprido a um longo tempo, mas não era apenas cumpri-lo, o nosso objetivo, ou o
que iria acrescentar em nossos currículos nossa maior motivação. Queríamos levar
coisas boas para a vida dessas crianças, será que estávamos realmente fazendo isso?
E se saíssemos dessa maneira o que estaríamos deixando para elas, além do
sentimento de mais uma perda? (...) Além de estar feliz de juntos termos feito essa
escolha, de continuar, o que nós sentíamos mais uma vez, talvez de forma mais
intensa, e seguimos sentindo, é a responsabilidade pelo que a nossa oficina
representa na vida dessas crianças. E ainda, pelo caminho a ser trilhado para o nosso
sonho, que seja um sonho capaz de transformar, que ao ser uma lembrança viva na
177
ASSMANN ; MO SUNG, 2000, p. 265.
71
vida de todos os envolvidos, abrindo portas e janelas para novos sonhos e
atitudes.
178
O relato dos jovens declara o resgate entre os jovens adolescentes do projeto e as
crianças da entidade. As palavras estão permeadas de esperança, de confiança, que, no
entendimento de Sinner, “Não seria possível viver nossa vida se não pudéssemos confiar sem
nos preocupar, sempre especificamente, com cada aspecto da nossa vida. Sem confiança não
existe vida”.
179
O relato dos jovens também evidencia os conteúdos que representam a
transformação através da vulnerabilidade a que as diferenças nos remetem. Assmann e Mo
Sung, ao falarem sobre o outro e a diferença que esse estabelece nas nossas vidas, escrevem:
O/a outro/a é inevitavelmente inatingível para nós. Mal e mal conseguimos roçar a
‘outridade’ (o ser-outro diferente) com nossa experiência, posto que ela sempre
preserva uma espécie de misteriosa identidade intocável. Este aspecto de não plena
fusão faz parte da contingência dos relacionamentos humanos. É importante que não
se faça disso, no plano da experiência pessoal, um pretexto para distanciar-nos dos
demais por serem eles, em última instância, mistérios inatingíveis. É fundamental
entender que não existe identidade pessoal que não tenha sido construída através de
relacionamentos com outros/as. A identidade pessoal só é possível nesse
relacionamento. A identidade de cada um de nós se constitui através dos múltiplos
acolhimentos de outros em relação a nós e nossos em relação a eles. O que era
diferente distinto de mim, passou a ser o diferente em mim, e já é o diferente ‘fora’
de mim ou separável de mim. A diferença da outridade que entrou em mim foi
determinante para que surgisse a minha identidade diferente.
180
Em cada projeto, os jovens evidenciaram a necessidade de olhar as suas
vulnerabilidades enquanto adolescentes e buscar, dentro de si mesmos, os caminhos de
superação, pois o outro que estava a sua frente, na entidade, convocou esse jovem com a sua
vulnerabilidade, como excluído socialmente. A fragilidade foi o grande elo. Nesse sentido,
Brakemeier coloca:
A vida humana é frágil. Precisa de proteção contra as forças da natureza e a agressão
de seus semelhantes. Sofre sob a finitude, a vulnerabilidade, a imperfeição. Deve
resistir a golpes e a dúvidas. O ser humano não é Deus. Tem necessidade de ser
colocado a salvo do que lhe diminui a vida e aniquila. É este um dos mais profundos
anseios humanos.
181
O caminho da solidariedade passa pelo reconhecimento das nossas limitações e da
valorização dos conteúdos de amor, impregnado pela mãe que olha seu filho, acalentando-o
178
Relato do grupo de alunos da 2ªC, que trabalhou a oficina de teatro no Centro Redentora.
179
SINNER, Rudolf von. Confiança e convivência: aportes para uma hermenêutica da confiança na convivência
humana. Estudos Teológicos, São Leopoldo, v. 44, n. 1, p. 127 – 143, 2004, p. 130.
180
ASSMANN ; MO SUNG, 2000, p. 258.
181
BRAKEMEIER, 2002, p. 191.
72
nos braços. Esse olhar de quem acredita porque ama, estabelece a esperança e lá germina a fé,
que promove e sustenta a mudança, a transformação. Fowler auxilia com seu estudo sobre a
fé, quando coloca:
O que importa é: a fé afeta o modo, a forma que damos a nossas iniciativas e
respostas, nossos relacionamentos e aspirações na vida daria, ao nos capacitar a vê-
la contra o pano de fundo de uma imagem mais abrangente daquilo que constitui
verdadeiro poder, verdadeiro valor e o sentido de vida.
182
Nas propostas dos projetos, seja com crianças, adolescentes, idosos, ou mesmo na
atividade ambiental ou com os animais do canil, juntamente com seus professores
orientadores, familiares e demais pessoas envolvidas, estabeleceu-se a aprendizagem mútua.
Sobre isso, as palavras de Sinner pontuam: “É o caminhar junto que importa, e este é não é
possível sem confiança. Onde não há confiança, não haverá convivência neste sentido
conceituado”.
183
Segue suas reflexões no entendimento sobre a confiança, com a afirmativa
que: “A fé como confiança é baseada na promessa de Deus. A promessa é a primeira, e a
resposta humana é a fé-confiança”.
184
Neste sentido da fé, as pessoas tornam-se livres para testemunharem sua compaixão
por meio do amor, representada em Jesus. No relacionamento humano, as possibilidades
concretizam-se, quando a esperança se faz presente em nossas vidas. Sobre esperança, Sinner
reflete: “Portanto, a confiança também chega a dar-se além de determinados grupos e procura
superar as desigualdades, criando uma nova convivência entre iguais”.
185
É neste relato de uma jovem adolescente do projeto que se revela a escola, como
espaço de esperança e fé, como promotora da solidariedade.
Desde a primeira vez que eu cheguei na sala de aula para termos o primeiro contato,
fui muito bem recebida. Apesar de alguns olhinhos desconfiados ou então de uma
timidez estampada na cara deles, todas elas levantavam a mão, gritavam, falavam,
pediam, enfim, tinham vontade de aprender comigo. O tempo foi passando, e a cada
semana que iria na ABEFI era uma descoberta. Descobertas essas, que me fizeram
crescer e perceber a necessidade que estas crianças possuem. As minhas aulas de
flauta para eles não é só tocar. Mas sim, aconselhar, conversar e principalmente
ouvir. Ouvir o que elas têm para me contar e muitas vezes, me surpreender com
algumas histórias ou atitudes que acontecem com eles e que são fora da minha
realidade. Fico feliz em saber que toda a quarta-feira posso ensinar o pouco que sei a
eles. Saber que posso dar carinho ou simplesmente que conversar já é uma grande
ajuda para elas me satisfaz. Foi a escola que oportunizou essa ação ou projeto social,
182
FOWLER, 1992, p. 35.
183
SINNER, 2004, p. 137-138.
184
Ibid. , p. 139.
185
Ibid. , p. 139.
73
mas agora, se depender de mim, pelo menos, um pouquinho do meu tempo de todos
os anos, usarei para ajudar quem precisa e, com isso crescer cada vez mais.
186
É na dimensão do amor que se constrói a vida de adolescentes, protagonizados pela
necessidade do outro e a sua própria. Quando se fala de sentido de vida, busca-se recurso no
interior do nosso desejo, impulso para estreitar as diferenças e alargar a compreensão. O
grande desafio de conviver com as diferenças consiste, primeiramente, em vislumbrar a
ilimitada possibilidade de amar. Nesse aspecto, o ser humano, capacitado com a inteligência,
necessita rever aspectos importantes na educação para a sensibilidade. Acerca disso, temos as
palavras de Assmann e Mo Sung:
Portanto, educação para a sensibilidade social significa, ao mesmo tempo, aquisição
de hábitos comportamentais pró-sociais e desenvolvimento da capacidade de prestar
atenção na alteridade que nos interpela desde nossos contextos (nossos nichos vitais)
e até, como vimos, desde o próprio interior de nossas vibrações neuronais.
187
Ao longo dos tempos, o ser humano conta a história da sua trajetória, marcada por
inúmeros exemplos em busca da significação da sua existência. Em cada página, a história de
cada ser humano mostra-se desejosa de amor, de reconhecimento, de sentido de vida. Essa
condição humana ainda necessita de aperfeiçoamento, e, nas palavras de Assmann e Mo
Sung, ao concluir este capítulo, seguem as seguintes reflexões:
Talvez precisemos ainda de palavras novas e conceitos novos para expressar –
holograficamente – como é que acontecem nossas ‘conversões ao sentido’ dentro de
processos de construção do sentido. Não podemos esquecer que essa imersão em
águas cristalinas, posto que – em meio à construção de mundos de sentido –
sobrevivem também – e quanto! – os mundos do sem-sentido. Mas é fundamental
que reconheçamos, em nós e nos outros, a nossa fome comum do sentido e que
lutemos para que ela seja reconhecida como um desejo que virou necessidade.
188
O espaço de vivência da solidariedade é possível na medida em que existirem corpos
e mentes consagradas, assim como os saberes vinculados pelo bem comum. Esse espaço de
amor existe no desejo do ser humano, que compreende a presença do outro com significado
na sua existência e co-existência e com o universo que o circunda.
O sonho dos que estão acordados é a esperança. (Carlos Magno)
189
186
Relato da aluna da 2ª D, que ensinou flauta para crianças da ABEFI.
187
ASSMANN ; MO SUNG, 2000, p. 323
188
Ibid. , p. 323.
189
VIVER..., 2004, p. 170.
74
CONCLUSÃO
Educar é acreditar na perfectibilidade humana, na capacidade inata de aprender e no
desejo de saber que anima os seres humanos; ...acreditar que os seres humanos nós
podemos melhorar uns aos outros através do conhecimento...(Fernando Savater)
190
A reflexão sobre a adolescência com suas peculiaridades, a necessidade da busca de
sentido de vida e a vinculação de um espaço educacional mais solidário, com propostas
transversais e integradoras, são aspectos de análise nas discussões finais desta dissertação.
Também fazem parte dessa análise o contexto de vulnerabilidade de pessoas que vivem na
miséria ou mesmo em contextos ambientais e culturais com necessidades específicas,
necessitando o olhar de sensibilidade e solidariedade, para também serem reconhecidos e
encontrarem sentido de vida.
O Programa Social Um olhar para o outro, com suas ações no âmbito curricular, ao
longo do Ensino Médio, contribui de forma significativa para a transformação dos jovens
adolescentes da escola. Essa afirmação passa pela análise dos resultados obtidos com as
entrevistas nas entidades, com as pessoas beneficiadas com os projetos e também pelos relatos
dos adolescentes, protagonistas das ações solidárias, expressos no segundo e no terceiro
capítulos. As evidências mostram um caminho, que necessariamente não é o único, mas se
traduz em possibilidade. O programa social, que reverte nas ações dos jovens em projetos de
solidariedade, promove o encontro de realidades antagônicas, de “mundos desconhecidos”, de
descobertas e a construção de promoção da vida, com caráter transformador. A respeito disso,
o estudo de Wondracek
191
sobre Loder enfatiza:
Viver na relacionalidade entre duas dimensões é, para Loder, compreender que cada
evento será multiplicado por dois: ‘desenvolvimento humano no tempo e a ação do
Deus eterno que abraça todo o tempo, e que esta dualidade inevitavelmente carrega
um potencial transformador’.
192
190
ASSMANN ; MO SUNG, 2000, p. 297.
191
WONDRACEK, Karin Hellen Kepler. A lógica do espírito : um estudo teórico-prático de James E. Loder.
Tese de doutorado em elaboração, sob orientação do Prof. Dr. Enio R. Mueller. São Leopoldo: Escola
Superior de Teologia, 2005, cap. II.
192
LODER. In: WONDRACEK. 2005, p. 22.
75
Esse diálogo, que o Programa Social promove entre realidades tão diferentes do
ponto de vista social, econômico e cultural, é o grande elo para falar sobre hermenêutica
193
,
abordado por Sinner
194
, sob o ponto de vista do diálogo inter-religioso, quando relata:
É uma hermenêutica ‘diatópica’ que visa construir pontes de compreensão entre dois
topoi, ‘lugares de compreensão e autocompreensão, entre duas – ou mais – culturas
que não têm desenvolvido seus pressupostos básicos de uma tradição histórica
comum ou através de influência mútua’.
195
Mesmo que o contexto de análise não seja de caráter inter-religioso, cabe pensar as
diferenças do âmbito humano e que permeiam tanto os adolescentes, como os assistidos, com
necessidades de “construir pontes”, para a busca de sentido de vida, com partilhamento de
conteúdos mais libertadores e transformadores e, por que não dizer, fundamentando a
espiritualidade
196
das pessoas.
Nesse momento, é necessário pensar de que maneira a escola produz os seus
processos de aprendizagem, em que podemos estimular a interação das pessoas, para que se
estabeleça a confiança, o que Sinner contextualiza, dizendo:
Portanto, repito, não basta a confiança em si, mas esta confiança precisa ser inserida
num sistema maior de valores que visam ao bem-estar de todas as pessoas. Estes
valores precisam ser reconhecidos pela sociedade para que se possa garantir a
confiança das pessoas.
197
193
PALMER, Richard E. Hermenêutica. Rio de Janeiro: Edições 70, 1969, p. 23 “As raízes da palavra
hermenêutica residem no verbo grego hermeneuein, usualmente traduzido por ‘interpretar’, e no substantivo
hermeneia, ‘interpretação’”.
194
SINNER, Rudolf von. Diálogo inter-religioso: Dos “cristãos anônimos” às teologias das religiões. Cadernos
Teologia Pública. v. 2, n. 9. São Leopoldo: Instituto Humanitas, UNISINOS, 2005.
195
PANIKKAR, Raimon apud SINNER, 2005, p. 18.
196
FOUCAULT, Michel. A hermenêutica do sujeito. São Paulo: Martins Fontes, 2004, p. 17 - 18, em que
descreve sobre a espiritualidade: “A espiritualidade postula que a verdade jamais é dada de pleno direito ao
sujeito. A espiritualidade postula que o sujeito enquanto tal não tem direito, não possui capacidade de ter
acesso à verdade. Postula que a verdade jamais é dada ao sujeito por um simples ato de conhecimento, ato
que seria fundamentado e legitimado por ser ele o sujeito e por ter tal e qual estrutura de sujeito. Postula a
necessidade de que o sujeito se modifique, se transforme, se desloque, torne-se, em certa medida e até certo
ponto, outro que não ele mesmo, para ter direito a [o] acesso à verdade. A verdade só é dada ao sujeito a um
preço que põe em jogo o ser mesmo do sujeito. Pois, tal como ele é, não é capaz de verdade. Acho que esta é
a fórmula mais simples porém mais fundamental para definir a espiritualidade. Isso acarreta, como
conseqüência, que deste ponto de vista não pode haver verdade sem uma conversão ou sem uma
transformação do sujeito. Esta conversão, esta transformação – e aí estará o segundo grande aspecto da
espiritualidade – pode fazer-se sob diferentes formas. Digamos muito grosseiramente (trata-se aqui também
de um sobrevôo muito esquemático) que esta conversão pode ser feita sob a forma de um movimento que
arranca o sujeito de seu status e de sua condição atual (movimento de ascensão do próprio sujeito,
movimento pelo qual, ao contrário, a verdade vem até ele e o ilumina). Chamemos este movimento, também
muito convencionalmente, em qualquer que seja seu sentido, de movimento de éros (amor)”.
197 SINNER, 2004, p. 137.
76
A escola é lugar da produção de saberes e um espaço no qual nossas crianças e
jovens passam a maior parte do seu tempo. Cabe a ela refletir sobre o quanto colabora para
repensar processos que revertam em favor da inclusão de todas as novas dimensões de
relacionamentos, gerando novos conhecimentos, principalmente na construção da paz. Essa
proposta necessita permear os saberes desenvolvidos nas escolas e pode definir o rumo da
humanidade. Com consistência, Guimarães (2005) referencia:
A paz somente surgirá se a humanidade concordar em viver em paz. É preciso,
então, operar um consenso humanitário para a paz, tal como acontece, por exemplo,
com a Declaração Universal de Direitos Humanos. A humanidade não nasceu com
essa noção, e ela foi construída através de um intenso e conflitivo processo social até
estabelecer um consenso através dos documentos que foram sendo proclamados. Da
mesma forma, a paz, como construção coletiva, não virá por decreto dos poderosos,
nem mesmo virá apenas como conseqüência da audácia dos militantes pacifistas,
mas será fruto do estabelecimento de um consenso discutido, conversado, e
negociado entre as pessoas.
198
Também é necessário abrir espaços de discussão, favorecendo, assim, a compreensão
com significados mais profundos de conteúdos de um tempo que remete a processos mais
humanizantes. A criação e o desenvolvimento de projetos e ações que evidenciem tal
dimensão devem acompanhar nossa busca constante.
De igual maneira, o professor tem seu lugar significante enquanto profissional. Busca
ser reconhecido na dignidade como ser humano que, através da profissão, se realiza nos seus
ideais mais profundos de educação. Falamos, aqui, de educadores que permitem ser semente,
terra e adubo, assim como também permitem aos educandos serem sementes, terra e adubo.
Nesse espaço de interação, existe a participação de muitas pessoas sensibilizadas, em favor do
bem-estar comum, contribuindo para o desenvolvimento de sujeitos capazes de criar,
produzir, inventar e reinventar e, dessa forma, criar novos saberes.
Com projetos de valorização da vida, com viés solidário, torna-se possível a busca da
utopia, de um contexto melhor em um mundo com inúmeras mudanças e repleto de
diversidade. Nesse espaço, a aprendizagem passa a ter um novo significado: é lugar de
esperança, pois articula a transformação e torna-se o desafio constante, oferecendo, assim,
sentido de vida. Nesse novo processo de construção, o educador tem papel de articulador de
possibilidades com os diversos saberes.
198
GUIMARÃES, Marcelo Rezende. Educação para a paz: sentidos e dilemas. Rio Grande do Sul: Educs,
2005, p. 264.
77
Nessa perspectiva, realizei uma entrevista na escola com um grupo de professores
coordenadores das diversas áreas de estudo, perguntando sobre a possibilidade da
solidariedade como articuladora dos saberes. As reflexões estão expressas no quadro abaixo.
Nº. Componente
Curricular
Solidariedade como base na reflexão dos saberes que
circulam na escola
Os saberes que não têm o
viés da solidariedade
1. Língua
Portuguesa e
Literatura
Favorece o estudo na literatura com a diversidade de
situações, com análise de personagens e contextos.
Todo conteúdo pode colaborar para a solidariedade.
É possível refletir sobre os
saberes com base na
solidariedade.
2. Educação
Artística
Favorece o relacionamento e respeito, o
reaproveitamento de materiais, o crescimento, em que
cada um pode melhorar, evoluir.
É possível refletir sobre os
saberes com base na
solidariedade.
3. Educação
Física
Favorece por meio dos jogos cooperativos, integração
entre as pessoas; quando as habilidades estão
disponíveis para ensinar, ajudar; cooperação até para
competir.
É possível refletir sobre os
saberes com base na
solidariedade.
4. Língua
Estrangeira
Favorece o entendimento das diferentes línguas e a
comunicação. Também o estudo de movimentos
mundiais, como Greenpeace.
É possível refletir sobre os
saberes com base na
solidariedade.
5. História Favorece a compreensão dos fatos históricos com a
dimensão crítica, para rever ações de desrespeito com a
humanidade e o meio.
É possível refletir sobre os
saberes com base na
solidariedade.
6. Geografia Favorece a posição crítica diante de mudanças sem
respeito provocadas pelo homem nos diversos
ambientes e contextos.
É possível refletir sobre os
saberes com base na
solidariedade.
7. Matemática Favorece pelo bem da vida, colaborando com
estatísticas e levantamentos para situações de
mudanças.
É possível refletir sobre os
saberes com base na
solidariedade.
8. Ciências Favorece o cuidado com a vida, com o ambiente;
trabalho pelo bem comum; para preservar a vida.
É possível refletir sobre os
saberes com base na
solidariedade.
Quadro 5: pesquisa com professores coordenadores de disciplinas. Elaborado pela
pesquisadora.
O levantamento expresso na tabela, após entrevista com os coordenadores, demonstra
inúmeras possibilidades de articular os saberes trabalhados na escola. Para isso, é preciso que
tenhamos um novo olhar sobre o sistema educativo, essencialmente seletivo, para um sistema
mais reflexivo, em que simultaneamente se ensina e se aprende, no qual professores
promovem ações educativas e constroem, com os educandos, os pressupostos das tendências
do amanhã, aprendendo conjuntamente a olhar os cenários que se abrem nos seus diálogos da
realidade e do imaginário, construindo um social mais participativo, mais solidário. Talvez
tenhamos que pensar com certa urgência os conceitos e pré-conceitos, os quais impedem que
a escola construa adequadamente a aprendizagem no sentido mais amplo. É nesse sentido que
Assmann e Mo Sung (2000) refletem a importância de escolas solidárias, expressando:
Escolas e educadores que, por diversos motivos, não colaboram para preparar
alunos/as para esta nova sociedade e novo tipo de trabalho, estão, de um modo ou
78
outro, conscientemente ou não, contribuindo para o aumento ou manutenção da
exclusão social. Por isso a renovação profunda da educação é hoje tarefa social
extremamente prioritária. Escolas atrasadas significam aumento da exclusão.
Escolas que se renovam e atualizam significam salvar vidas humanas.
199
Nas palavras profundas sobre “salvar vidas”, imagino um lugar de aprendizagem
onde o conhecimento humano esteja mais entrelaçado, com conteúdos mais integrados, como
nos estudos de Sílvio Gallo
200
, com o modelo de rizoma proposto por Deleuze e Guattari,
falando sobre a transversalidade, que “implica uma nova atitude frente aos saberes, tanto na
sua produção quanto na sua comunicação e aprendizado”, quando propõe:
Uma educação rizomática, por sua vez, abre-se para a multiplicidade, para uma
realidade fragmentada e múltipla, sem necessidade mítica de recuperar uma ligação,
uma unidade perdida. Os campos de saberes são tomados como absolutamente
abertos; com horizontes, mas sem fronteiras, permitindo trânsitos inusitados e
insuspeitos. Pensar uma educação e um currículo não disciplinares, articulados em
torno de um paradigma transversal e rizomático do conhecimento soa hoje como
uma utopia. Nossa escola é de tal maneira disciplinar que nos parece impossível
pensar currículo tão caótico, anárquico e singular. Mas já houve momentos na
história da humanidade em que parecia loucura lançar-se aos mares, em busca de
terra firme para além do continente europeu, ou então se lançar ao espaço,
almejando a lua e as estrela...
201
Talvez na proposta do rizoma entenda-se o ser humano mais inteiro, com tudo que o
rodeia e o produz, enquanto pessoa e talvez até compreendendo melhor a relação com o outro
que constitui a sua vida, assim como a expressão da fé, da esperança e por que não dizer, com
Deus.
Nas palavras finais desta dissertação, expresso a certeza da transformação com
projetos sociais para adolescentes na escola. A convicção de que os jovens que viveram seus
projetos demonstraram mudanças significativas nas suas vidas, de tal maneira que se
evidencia em 2007, num diálogo na aula de Língua Portuguesa, sobre o dinheiro que
gastariam para a formatura, relatado pela professora, que escreve o seguinte texto por e-mail:
Oi, Isabel!Lembrei de um fato que ocorreu na 3B na sexta que queria te contar... O
projeto social está fazendo efeito mesmo... Pois bem, começou já o papinho de
199
ASSMANN ; MO SUNG, 2000, p. 92.
200
GALLO, Silvio Donizetti de Oliveira, possui graduação em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica de
Campinas (1986), mestrado em Educação pela Universidade Estadual de Campinas (1990) e doutorado em
Educação pela Universidade Estadual de Campinas (1993). Atualmente é professor assistente doutor da
Universidade Estadual de Campinas. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Filosofia da
Educação, atuando principalmente nos seguintes temas: educação, ensino de filosofia, ensino médio, filosofia
e transversalidade. (Texto informado pelo autor) http://buscatextual.cnpq.br Acesso em 20 de março de 2007.
201
GALLO, Sílvio. Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino, sob o tema: Linguagens, espaços e
tempos no ensinar e aprender. In: CAUDURO, Vera Maria. (Org.) Disciplinaridade e transversalidade.2.
ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2001, p. 177.
79
formatura, já há comissão formada e tudo! Daí, a tal da comissão fez um
levantamento p/ ver se os colegas concordavam em pagar R$ 20,00 por mês. Os
questionamentos de alguns foram lindos: em que mundo eles acham que vivem?
Gastar 24 mil em uma festa, num país em que crianças morrem de fome? ‘Nem é
pela quantia, mas pela má aplicação, frente à pobreza do país’. ‘Cada um vai torrar
200 reais em uma noite apenas quando muitos não têm isso em um mês.’ Olha, esse
tipo de questionamento é inédito nesses anos todos que trabalho c/ os terceiros...
Fiquei profundamente admirada, no sentido positivíssimo do termo...
202
Além do testemunho da professora e tantos outros relatos emocionantes de alunos,
busco também a utopia, no meu desejo de uma escola com propostas curriculares mais
significativas para as pessoas. Entendo que Deus, na sua imensa sabedoria, oportunizou-nos
abrir espaços de descobertas, através do conhecimento, mas também estabeleceu, nos
sentimentos das pessoas, nosso grande desafio de lidar com o que a inteligência consegue
mostrar: a diferença do outro, que nos toca intimamente, como espelho da nossa própria alma.
A caminhada com os projetos sociais dos adolescentes, na etapa de 2005 a 2007,
ainda terá sua conclusão com a elaboração do Portfólio, no período de abril a junho do
presente ano e, do Fórum Social, no dia 08 de agosto de 2007, no Auditório da Fundação
Evangélica, no qual os jovens apresentarão seus projetos para a comunidade. Nesse momento,
a visibilidade das ações sociais e as contribuições dos jovens adolescentes, juntamente com a
presença e participação das entidades, com as crianças, adolescentes e idosos beneficiados,
viabilizará o partilhamento das vivências da relação entre as partes implicadas.
Como contribuição para refletir sobre o papel da educação pela fé, na vida dos
adolescentes e suas ações solidárias por intermédio dos projetos sociais, faço referência ao
texto bíblico em Efésios 4.1-4, citado por Sinner (2004), que diz: “Há um só corpo e um só
Espírito, do mesmo modo que a vossa vocação vos chamou a uma só esperança; um
Senhor, uma só fé, um só batismo; um só Deus e Pai de todos, que reina sobre todos, age por
meio de todos e permanece em todos”.
203
Na conclusão da dissertação, entendendo que a esperança de muitos, entre eles os
adolescentes do programa social da escola, assim como das pessoas e locais assistidos,
consiste no desejo do reconhecimento e de significação por um sentido de vida.
Também fica evidente, ao longo desta dissertação, que os valores de cada família, da
escola e demais locais da comunidade determinam alguns procedimentos e suas repercussões
no meio social. A crença que o desenvolvimento da fé tem papel preponderante na vida das
pessoas evidencia-se em cada capítulo, no relato dos jovens, na escolha dos teóricos, na
202
Professora de Língua Portuguesa dos alunos em 2007, participantes do programa social.
203
SINNER, 2004, p. 139.
80
escolha do próprio tema da dissertação. Ainda para refletir sobre importância da fé, tanto para
as pessoas na sua singularidade, como na relação com a comunidade, a conceituação nas
palavras de Fowler (1992), expressam o seguinte:
A fé é o modo em que uma pessoa ou um grupo penetra no campo de força da vida.
É o nosso modo de achar coerência nas múltiplas forças e relações que constituem a
nossa vida e de dar sentido a elas. A fé é o modo pelo qual uma pessoa vê a si
mesma em relação aos outros, sobre um pano de fundo de significados e propósitos
partilhados.
204
É na dimensão da comunhão pela fé que o Programa Um olhar para o outro se
vincula, estabelecendo o compromisso com a solidariedade, a relação com a sensibilidade e o
papel de resgatar o que de especial o ser humano possui: o amor.
O Espírito do Senhor está sobre mim, pelo que ungiu para evangelizar aos pobres;
enviou-me para proclamar libertação aos cativos e restauração de vista aos cegos,
para pôr em liberdade os oprimidos. (Lc. 4:18)
205
204
FOWLER, 1992, p. 15.
205
BÍBLIA, 2000, p. 76.
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ALVES, Rubem. Estórias de quem gosta de ensinar. São Paulo: Cortez, 1990.
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esperança. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000.
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001.
BÍBLIA Sagrada. Tradução de João Ferreira de Almeida. São Paulo: Sociedade Bíblica do
Brasil, 2000.
BOFF, Leonardo. Ethos Mundial : um Consenso Mínimo entre os Humanos. Rio de Janeiro:
Sextante, 2003.
BOFF, Leonardo. Saber cuidar: ética do humano – compaixão pela terra. Rio de Janeiro:
Vozes, 1999.
BOHOSLAVSKY, Rodolfo. Orientação vocacional: a estratégia clínica. 10. ed. São Paulo:
Martins Fontes, 1993.
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antropologia teológica. São Leopoldo: Sinodal: São Paulo: Paulus, 2002
BRASIL. Conselho Nacional de Assistência Social – CNAS. Norma Operacional Básica de
Assistência Social – NOB/SUAS. Brasília, DF, 2005.
CALLIGARIS, Contardo. A Adolescência. São Paulo: Publifolha, 2000.
COVRE, Maria de Lourdes Manzini. O que é cidadania. São Paulo: Brasiliense, 1991.
DAUNIS, Roberto. Jovens: Desenvolvimento e Identidade – Troca de perspectiva na
psicologia da educação. São Leopoldo: Sinodal, 2000.
DIMENSTEIN, Gilberto. O cidadão de papel: a infância, a adolescência e os direitos
humanos no Brasil. São Paulo: Ática, 2005.
ESTATUTO da IENH. Documento do setor administrativo da escola. Novo Hamburgo:
Instituição Evangélica de Novo Hamburgo, 2005.
82
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Salma Tannus Muchail. São Paulo: Martins Fontes, 2004.
FOWLER, James. Estágios da Fé: a psicologia do desenvolvimento e a busca de sentido. São
Leopoldo: Sinodal, 1992.
GALLO, Sílvio. Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino, sob o tema: Linguagens,
espaços e tempos no ensinar e aprender. In: CAUDURO, Vera Maria. (Org.)
Disciplinaridade e transversalidade. 2. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2001.
GALLO, Sílvio (Coord.). Ética e cidadania: caminhos da filosofia. São Paulo: Papirus, 2003.
GUIMARÃES, Marcelo Rezende. Educação para a paz: sentidos e dilemas. Caxias do Sul,
RS: Educa, 2005.
IECLB. REDE SINODAL DE EDUCAÇÃO. Textos Orientadores para a Educação
Evangélico-Luterana. São Leopoldo: Sinodal, 2005.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA - IBGE. Dados
Estatísticos. Rio Grande do Sul: Novo Hamburgo, 2000. Disponível em:
<http://www.risolidaria.org.br>. Acesso em março de 2007.
KANNENBERG, Hilmar. Fundação Evangélica: um século a serviço da educação: 1886-
1986. São Leopoldo: Rotermund, 1987.
KUDE, Vera Maria Moreira. Textos de metodologia de pesquisa em psicologia. Porto
Alegre: PUC, 2000.
KEHL, M. R. Sobre ética e psicanálise. São Paulo: Companhia das Letras, 2002.
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José Olympio, 1996.
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Geraldo Korndörfer. São Leopoldo: Sinodal; EST, 2006.
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indivíduo. In: PELUSO, Ângelo (Org.). Informática e afetividade. São Paulo: EDUSC,
1998, p 13.
SINNER, Rudolf von. Diálogo inter-religioso: Dos “cristãos anônimos” às teologias das
religiões. Cadernos Teologia Pública, São Leopoldo: UNISINOS, a. 2, n. 9, p. 1 – 22, 2005.
SINNER, Rudolf von. Confiança e convivência: aportes para uma hermenêutica da confiança
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2004.
STRAUSZ, Rosa Amanda. Uólace e João Victor. Rio de Janeiro: Salamandra, 1999.
UÓLACE e João Victor. In: Cidade dos homens. Direção de Eduardo Figueira. Produzido
pela Central Globo de Produção, 2003. 1 DVD (150 min.), episódio 4.
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Digest, 2004.
WONDRACEK, Karin Hellen Kepler. A lógica do espírito : um estudo teórico-prático de
James E. Loder. Tese de doutorado em elaboração sob orientação do Prof. Dr. Enio R.
Rodrigues. São Leopoldo: Escola Superior de Teologia, 2005.
ANEXO - Atividades desenvolvidas pelos grupos de alunos nas entidades
ABEFI - Associação Beneficente Evangélica da Floresta Imperial (Grupo 1)
- Atividades: Filmes, desenhos e brincadeiras com cordas, arcos, bolas
- Assistidas: 50 crianças
- Faixa etária: 5 e 6 anos
- Objetivo: Proporcionar momento de atividades de recreação.
ABEFI - Associação Beneficente Evangélica da Floresta Imperial (Grupo 2)
- Atividades: Noções básicas sobre informática
- Assistidas: 18 crianças
- Faixa etária: 7 a 10 anos de idade
- Objetivo: Oportunizar espaço de aprendizagem para manusear o teclado e o mouse, aprender
a navegar na internet e escrever em editores de texto.
ABEFI - Associação Beneficente Evangélica da Floresta Imperial (Grupo 3)
- Atividades: ajudar as crianças a utilizarem e aplicarem nos programas básicos do
computador, como fazer desenhos no paint, ou jogar jogos educativos, como memória.
- Assistidas: 18 crianças
- Faixa etária: 5-6 anos
- Objetivos: Auxiliar as crianças a terem uma pequena noção de como manusear o
computador.
ABEFI - Associação Beneficente Evangélica da Floresta Imperial (Grupo 4)
- Atividades: recreação e aulas de flauta; recreação com crianças e aulas de flauta para
crianças de seis a doze anos;
- Faixas etárias: berçário;1 ano a 2 anos; 3 a 4 anos; 6 a 12 anos.
- Assistidas: 30 crianças
- Objetivos: Dar carinho e atenção para as crianças carentes através de jogos e brincadeiras;
auxiliar as professoras do berçário, cuidando e dando atenção às crianças; incentivar a música
através das aulas de flauta.
85
ABEFI - Associação Beneficente Evangélica da Floresta Imperial (Grupo 5)
- Atividade: Brincar no pátio com bolas, pega-pega, leitura e atividade com massinhas de
modelar.
- Assistidas: duas turmas – 18 e 15 crianças
- Faixa etária: 3 a 5 anos
- Objetivo: Proporcionar espaço de atividades recreativas; proporcionar espaço de
aprendizagem; alegrar as crianças com brincadeiras divertidas; proporcionar atividades
dinâmicas, envolvendo conhecimentos gerais.
AMO – Associação de Assistência ao Menor em Oncologia (4 grupos)
- Atividade: Programa de cadastro de Notas Fiscais
- Faixa etária: Crianças com câncer que são ajudadas pela AMO
- Assistidas: Todas as crianças que são beneficiadas pela AMO de Novo Hamburgo
- Objetivo: Angariar fundos para a AMO de Novo Hamburgo, canalizando recursos para
ajudar as crianças com câncer.
Canil Municipal
- Atividades: Coleta de jornal e papelão; aquisição de luvas cirúrgicas e remédios em falta,
recomendados pelos veterinários do canil; auxílio na adoção dos cachorros e gatos;
- Assistidos: cães e gatos do Canil Municipal
- Objetivo: Auxiliar na divulgação para adoção dos animais e na coleta de materiais de
suporte para o Canil.
Centro de Vivências Redentora
- Atividade: Oficina de teatro
- Assistidas: 15 crianças
- Faixa etária: 7 a 12 anos
- Objetivo: Auxiliar no desenvolvimento das capacidades de expressão, como espontaneidade,
imaginação, observação, percepção e relacionamento social.
Centro de Vivências Redentora
- Atividade: Informática
- Assistidos: 15 crianças
- Faixa etária: 7 a 12 anos
86
- Objetivo: Auxiliar no desenvolvimento das capacidades básicas dos conhecimentos de
informática.
Horta Comunitária: (Grupo 1)
- Atividade de recreação, com brincadeiras e esporte.
- Assistidas: 20 crianças
- Faixa etária: 9 a 12 anos
- Objetivos: Proporcionar momentos agradáveis para as crianças carentes.
Horta Comunitária: (Grupo 2)
- Atividade: ensinar inglês
- Assistidas: 20 crianças
- Faixa etária: 9 a 12 anos.
- Objetivo: Oportunizar a aprendizagem da língua inglesa de uma forma simples, básica e
divertida para que as crianças, além de conhecimento, criassem um interesse pela língua.
Horta Comunitária: (Grupo 3)
- Atividade: aula de futebol
- Assistidos: 15 crianças
- Faixa etária: 11 e 12 anos
- Objetivo: Proporcionar momentos agradáveis para as crianças carentes.
Horta Comunitária: (Grupo 4)
- Atividades: ensinar os fundamentos do esporte para elas aperfeiçoarem o esporte ou apenas
se divertirem jogando.
- Assistidos: aproximadamente 30 crianças
- Faixa etária: entre 8 e 12 anos
- Objetivos: promover a inclusão social através do esporte.
Lar da Menina: (Grupo 1)
Atividades: dança e desenhos
Assistidas: 4 jovens
Faixa etária: 14 e 15 anos
Outro grupo no mesmo projeto:
87
Assistidas: 4 crianças
Faixa etária: 8 aos 12 anos
Assistidas: 8 jovens
Faixa Etária: 12 a 14 anos
Objetivos: Oportunizar espaço de expressão através da dança.
Lar da Menina: (Grupo 2)
Atividade: Trabalhamos teatro com as meninas, desenvolvendo sua capacidade para o
improviso e interpretação.
Assistidas: 6 meninas
Faixa etária: 11 a 14 anos
Objetivo: aprimorar a forma de expressão e desinibição das meninas dentro da sociedade, para
que elas consigam sempre se destacar dentro de suas potencialidades e conquistar seus
espaços.
Lar João e Maria
Atividade: Leitura de histórias infantis, futebol, filmes educativos, pinturas com giz de cera e
tinta plástica.
Assistidos: 8 crianças
Faixa etária: 3 a 6 anos
Objetivos: Desenvolver atividades com as crianças para auxiliar no desenvolvimento motor e
também ajudar no desenvolvimento da criatividade.
Lar São Vicente
Atividades: jogos de cartas; pinturas e desenhos com tintas, canetinhas, lápis de cor, entre
outros; conversas sobre as histórias vividas por eles na infância, adolescência, trabalho,
família, casamento, etc; momento musical, onde as integrantes do grupo tocam instrumentos
(flauta soprano, contralto, tenor e cello).
Assistidos: 40 idosos
Faixa etária: idosos a partir de 60 anos.
Objetivos: Dar atenção a eles fazendo com que se sintam amados e valorizados; entreter e
fazer atividades para que eles passem melhor o seu tempo; troca de vivências; aprender a
respeitar essa fase da vida;
88
Morrinho – projeto ambiental
Atividade: Elaboração do projeto, com escolha da área para construção do espaço.
Objetivo: Criar um ambiente de estudo no morrinho, utilizando matérias recicláveis (Garrafas,
tampinhas,...)
Núcleo Primavera (Grupo 1)
Atividade: Coreografias de dança, alongamento, brincadeiras motoras, atividades recreativas
Assistidas: 15 meninas
Faixa etária: 8 a 14 anos
Objetivo: Desenvolver a área física das meninas trabalhando com sua coordenação motora ,
além de dar a oportunidade de praticar a dança e apresentar.
Núcleo Primavera (Grupo 2)
Atividade: jogos recreativos em geral, vôlei.
Assistidas: 7 crianças
Faixa etária: de 11 a 12 anos
Objetivos: Desenvolver o espírito de equipe nas crianças, melhorando seu convívio social
umas com as outras e trabalhar de uma forma divertida a parte física das mesmas.
Projeto Vida Semeando Esperança
Atividades: Brincadeiras, hora do filme, hora da historinha, folhas com atividades
diversificadas, apresentação em Power Point sobre higiene bucal, atividade envolvendo
inglês, atividades ligadas à copa .
Assistidas: 18 crianças
Faixa etária: Crianças carentes de 06 anos a 13 anos, que moram às margens do Arroio Pampa
do bairro Canudos.
Objetivos: demonstrar preocupação comas crianças e desenvolver atividades diferentes
daquelas que elas fazem na rotina.
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