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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
FACULDADE DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO RURAL
NORMA KIYOTA
A REPRESENTAÇÃO DOS AGRICULTORES FAMILIARES EM ESPAÇOS
INSTITUCIONAIS DE PARTICIPAÇÃO SOCIAL NO SUDOESTE DO PARANÁ
PORTO ALEGRE
2007
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NORMA KIYOTA
A REPRESENTAÇÃO DOS AGRICULTORES FAMILIARES EM ESPAÇOS
INSTITUCIONAIS DE PARTICIPAÇÃO SOCIAL NO SUDOESTE DO PARANÁ
Tese de doutorado apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em
Desenvolvimento Rural da Faculdade de
Ciências Econômicas da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul como
requisito parcial para a obtenção do título
de Doutor em Desenvolvimento Rural.
Orientador: Prof. Dr. Marcelo Kunrath Silva
Série PGDR – Tese Nº 004
PORTO ALEGRE
2007
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DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (CIP)
Responsável: Biblioteca Gládis W. do Amaral, Faculdade de Ciências Econômicas
da UFRGS
NORMA KIYOTA
K62r Kiyota, Norma
A representação dos agricultores familiares em espaços institucionais de
participação social no Sudoeste do Paraná / Norma Kiyota. – Porto Alegre, 2007.
204 f. : il.
Orientador: Marcelo Kunrath Silva.
Tese (Doutorado em Desenvolvimento Rural) - Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, Faculdade de Ciências Econômicas, Programa de Pós-Graduação em
Desenvolvimento Rural, Porto Alegre, 2007.
1. Agricultores : Representação política. 2. Agricultores : Participação social. 3.
Associação rural : Associativismo : Paraná. 4. Conselhos municipais :
Desenvolvimento rural. 5. Desenvolvimento rural : Paraná. I. Silva, Marcelo Kunrath.
II. Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Faculdade de Ciências Econômicas.
Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural. III. Título.
CDU 631.152
A REPRESENTAÇÃO DOS AGRICULTORES FAMILIARES EM ESPAÇOS
INSTITUCIONAIS DE PARTICIPAÇÃO SOCIAL NO SUDOESTE DO PARANÁ
Tese de doutorado apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em
Desenvolvimento Rural da Faculdade de
Ciências Econômicas da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul como
requisito parcial para a obtenção do título
de Doutor em Desenvolvimento Rural.
Aprovada em: Porto Alegre, 17 de agosto de 2007.
Prof. Dr. Marcelo Kunrath Silva - orientador
UFRGS
Prof. Dr. Julian Borba
UFSC
Prof. Dr. Luciano Joel Fedozzi
UFRGS
Prof. Dr. Ivaldo Gehlen
UFRGS
AGRADECIMENTOS
Agradeço ao Instituto Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural
(EMATER) pela liberação para a realização deste curso. Especialmente, aos amigos
da região de Pato Branco e dos municípios de Itapejara d'Oeste e Vitorino que me
ajudaram a viabilizar esta pesquisa.
À Universidade Federal do Rio Grande do SUL (UFRGS), através do
Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural, por me oportunizar a
realização deste curso de doutorado.
Ao Institute of Development Studies at University of Sussex - IDS, Inglaterra,
pela oportunidade de estágio como pesquisador visitante, que permitiu interlocuções
com outros pesquisadores e acesso a bibliografias que foram determinantes para a
qualidade do produto final deste trabalho
Ao Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq), pelo suporte financeiro.
Ao professor Dr. Marcelo Kunrath Silva pela orientação, sugestões e apoio no
decorrer desta longa jornada e aos demais membros da banca, professores Dr.
Julian Borba, Dr. Luciano Joel Fedozzi e Dr. Ivaldo Gehlen pelas contribuições para
o enriquecimento deste estudo.
Ao Professor Dr. Zander Navarro pela motivação, apoio e amizade em todos
os momentos.
À Dr. Andrea Cornwall pela orientação e apoio em meu estágio no IDS. Assim
como, a Alex Shankland e Dr. Peter Houtzager pelas indicações de alguns caminhos
possíveis para a minha incursão ao tema da representação.
A todos os professores e funcionários do Programa de Pós-Graduação em
Desenvolvimento Rural da UFRGS.
Aos colegas do curso de doutorado e mestrado em Desenvolvimento Rural e
Sociologia, pela amizade e convivência que proporcionou tantos momentos de
trocas de conhecimentos e experiências.
A todos os representantes e conselheiros do Grupo Gestor do Território
Sudoeste do Paraná e dos Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural de
Itapejara d'Oeste e Vitorino que permitirarm o acompanhamento de suas atividades
em seus respectivos espaços de participação social, especialmente, àqueles
representantes agricultores familiares e técnicos que nos dedicaram momentos
preciosos de seu tempo às minhas entrevistas.
A todos os amigos que ajudaram a tornar a estada em Porto Alegre um
grande prazer, especialmente à Júlia, Cassol, Magdalena, Antonio, Pilar, Andres,
Luciane, Flávio, Chayane, Mariana, Gil, Pricila, entre outros.
Aos amigos que encontrei ou reencontrei em nossa experiência no exterior,
por tornar esta experiência única e inesquecível: Effie e David Linssen, Kathie
Murphy e Marcer Hall, Sharon e Giles, Virginia e David Shankland, Merete e Petter
Hattesen, Claudie e Sine Kulmback, Míriam e Hervé Girardot e às crianças que
alegraram o meu coração recebendo tão carinhosamente o meu filho.
À minha família, meu pai Tsutomu, irmãs, cunhados e sobrinhos que sempre
me incentivaram e apoiaram em todos os sentidos.
Aos amigos de sempre, que mesmo distantes torceram para que todas as
nossas aventuras dessem certo.
Finalmente, um agradecimento especial ao meu esposo Miguel e nosso filho
Eduardo, que estiveram comigo em todos os momentos, acompanharam todas as
dificuldades e me fizeram acreditar que juntos poderíamos chegar a este produto.
Assim, dedico este trabalho à vocês que foram cúmplices de todos os momentos da
caminhada que originou cada linha desta tese.
RESUMO
Este estudo visa apresentar uma proposta de compreensão do processo de
representação dos agricultores familiares em espaços institucionais de
participação social, realizada através de uma pesquisa desenvolvida junto aos
Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural de Itapejara d’Oeste e Vitorino e,
também, junto ao Grupo Gestor do Território Sudoeste do Paraná. Esses espaços,
oriundos do processo de descentralização das instituições do Estado e da aposta
na aproximação da sociedade civil da gestão estatal, determinam o surgimento de
um processo diferenciado de representação, protagonizados pelos representantes
dos diferentes grupos sociais nesses espaços institucionais. A representação é
analisada a partir de duas dimensões: a representatividade dos representantes
perante os seus representados e a capacidade de intervenção destes
representantes nos diferentes espaços. A pesquisa demonstra que diferentes
configurações dos espaços, especialmente a escala espacial, alteram o processo
de representação a partir da distinção dos perfis dos representantes, das formas
de relacionamento dos representantes com os representados e na forma como os
próprios espaços institucionais de participação social se identificam com as
conformações associativas dos agricultores familiares no território. A diversificação
das trajetórias dos representantes, considerando a formação educacional, a
trajetória associativa e como os representantes vivenciam as suas comunidades
rurais, também condiciona o processo de representação. A trajetória associativa
do município ou território interfere no processo de representação dos agricultores
familiares. A existência de um tecido associativo denso e enraizado num local,
significa que representantes com maior capacidade de intervenção nas
deliberações do espaço de participação e possibilita a ocorrência de um processo
de responsabilização social mais efetivo. Assim, o processo de representação dos
agricultores familiares não é condicionada pela escala destes espaços
institucionais de participação social, mas pela relação entre a escala e a forma
como se estruturam as práticas associativas no território observado.
Palavras-chaves: Representação, espaços institucionais de participação social,
agricultores familiares.
ABSTRACT
This study aims to present a research on the family farmers’ representation
process at institutional social participation spaces. Data were obtained from City
Council for Rural Development of Itapejara d’Oeste and Vitorino and also from
Management Group of Southwest Territory of Paraná, which are institutional
spaces originated from decentralization process in an effort to develop civil society
participation in state management. Such spaces determine an unusual
representation process where protagonists represent several social groups.
Representation is analysed considering two dimensions: the representatives
representativeness and the representatives ability to intervene in the several
spaces. This study has demonstrated that different configurations of space change
the representation process related to the following topics: 1) profile distinction
among representatives; 2) forms of relationship among the representatives and the
represented people; and 3) the way that occur identification between institutional
spaces and local family farmer associative conformity. The diversity related to
representatives histories, also change the representation process, according their
formation; 5) associative local history; and 6) the way the representatives
experience their rural communities. Finally, the local associative history has
influence on family farmers’ representation process, emphasizing this
representation. The existence of a dense associative tissue means that there is
more hability to intervene in the institutional participation spaces deliberations
besides the opportunity for more accountability process. Therefore the family
farmers’ representation process is not determined by the ratio of these institutional
spaces at social relationship but it is determined by the correlation between this
ratio and the local associative arrangements.
Keywords: Representation, institutional social participation spaces, family farms.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1. Esquema das dimensões do processo de participação. ........................ 30
Figura 2. Matriz sistematizadora da relação entre as dimensões e os fatores
condicionantes do processo de representação. .................................................... 31
Figura 3: Matriz sistematizadora da dimensão representatividade e os fatores
condicionantes configuração do espaço, trajetória do representante e trajetória
associativa do município ou território. ................................................................... 89
Figura 4: Matriz sistematizadora da dimensão capacidade de intervenção do
representante frente aos seus fatores condicionantes. ......................................... 97
Figura 5. Mapa demontrativo dos municípios do Território Sudoeste do Paraná
abrangidos pela atuação da Assesoar, 2007. ..................................................... 106
Figura 6. Mapa demonstrativo da abrangência da atuação da Fetraf-Sul nos
municípios do território Sudoeste do Paraná, 2007............................................. 108
Figura 7. Abrangência da atuação da Crapa/Coopafi no território Sudoeste do
Paraná, 2007....................................................................................................... 110
Figura 8. A abrangência da atuação da Cresol nos municípios do território
Sudoeste do Paraná, 2007.................................................................................. 112
Figura 9. A abrangência do Sisclaf nos municípios do território Sudoeste do
Paraná, 2007....................................................................................................... 113
Tabela 1. Nível educacional dos representantes dos agricultores familiares dos
diferentes espaços institucionais de participação social. 2006. .......................... 150
Tabela 2. Distribuição da fala dos representantes na reunião do GGETESPA... 174
Tabela 3. Distribuição da fala dos representantes na reunião do GGETESPA... 175
LISTA DE SIGLAS
ACAMSOP: Associação das Câmaras Municipais do Sudoeste do Paraná
ACESI: Associação do Centro de Educação Sindical
AFASP: Associação das Agroindústrias Familiares do Sudoeste do Paraná
AMPA: Associação Municipal dos Profissionais ligados à Agricultura
AMSOP: Associação dos Municípios do Sudoeste do Paraná
ARCAFAR: Associação das Casas Familiares
ASSEC: Associação dos Secretários Municipais de Agricultura da Região de Pato
Branco
ASSEMA: Associação dos Secretários Municipais de Agricultura e Meio Ambiente
da Micro-região de Francisco Beltrão
ASSESOAR: Associação de Estudos, Orientação e Assistência Rural
ASSINTRAF: Associação Sindical dos Agricultores Familiares
ASSMAM: Associação dos Secretários Municipais de Agricultura e Meio Ambiente
da Região de Francisco Beltrão
CANGO: Colônia Agrícola Nacional General Osório
CAPA: Centro de Apoio ao Pequeno Agricultor
CITLA: Clevelândia Industrial Territorial Ltda.
CLAF: Cooperativa de Leite da Agricultura Familiar
CMDR: Conselho MunicipaL de Desenvolvimento Rura
COASUL: Cooperativa Agropecuária Sudoeste Ltda
COOPERIGUAÇU: Cooperativa Iguaçu de Prestação de Serviços
CPT: Comissão Pastoral da Terra
CRAPA: Coordenação Regional das Associações de Pequenos Agricultores
CRESOL: Cooperativa de Crédito com Interação Solidária
DESER: Departamento de Estudos Sócio-econômicos Rurais
EMATER: Instituto Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural
FAEP: Federação da Agricultura do Estado do Paraná
FETAEP: Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado do Paraná
FETRAF-SUL: Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar da Região
Sul
GETSOP: Grupo Executivo para as Terras do Sudoeste do Paraná
GGETESPA: Grupo Gestor do Território Sudoeste do Paraná
IAP: Instituto Ambiental do Paraná – IAP
IAPAR: Instituto Agronômico do Paraná
IBASE: Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas
IBGE: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IDS: Institute of Development Studies at the University of Sussex
INCRA: Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
IPARDES: Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social
MAB: Movimento dos Atingidos por Barragens
MASTES: Movimento dos Agricultores Sem Terra do Sudoeste
MDA: Ministério do Desenvolvimento Agrário
MST: Movimento dos Trabalhadores Sem Terra
PMDR: Plano Municipal de Desenvolvimento Rural
PRONAF: Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar
PRONAT: Programa Nacional de Desenvolvimento Sustentável de Territórios
Rurais
PROVAF: Programa de Valorização da Agricultura Familiar
PTDRS: Plano Territorial de Desenvolvimento Rural Sustentável
SAF: Secretaria da Agricultura Familiar
SDT: Secretaria de Desenvolvimento Territorial
SEAB: Secretaria Estadual de Agricultura e Abastecimento
SISCLAF: Sistema de Cooperativas de Leite da Agricultura Familia
STR: Sindicatos dos Trabalhadores Rurais
UNIOESTE: Universidade Estadual do Oeste do Paraná
UTFPR: Universidade Tecnológica Federal do Paraná
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ............................................................................................... 12
2 O CONTEXTO E A APRESENTAÇÃO DO ESTUDO .................................... 15
2.1
D
EMOCRATIZAÇÃO
,
DESCENTRALIZAÇÃO E REPRESENTAÇÃO
:
O CONTEXTO DOS ESPAÇOS
INSTITUCIONAIS DE PARTICIPAÇÃO SOCIAL
................................................................................................... 15
2.2
O
S
C
ONSELHOS
M
UNICIPAIS DE
D
ESENVOLVIMENTO
R
URAL
........................................................ 21
2.3
T
ERRITÓRIO
:
A NOVA PROPOSTA DO
M
INISTÉRIO DE
D
ESENVOLVIMENTO
A
GRÁRIO
..................... 26
2.4
A
PRESENTAÇÃO DO ESTUDO
................................................................................................................. 28
2.5
H
IPÓTESES
..................................................................................................................................... 32
2.6
O
BJETIVOS
..................................................................................................................................... 33
3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS...................................................... 35
3.1
E
STUDO COMPARATIVO DE CASOS
.................................................................................................. 35
3.2
O
S FATORES QUE CONDICIONAM A REPRESENTAÇÃO E OS SEUS INSTRUMENTOS DE ANÁLISE
......... 37
3.3
O
S INSTRUMENTOS DE COLETA DE DADOS
...................................................................................... 41
3.4
O
RGANIZAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS
........................................................................................... 45
4 OS CAMINHOS DA PARTICIPAÇÃO ATRAVÉS DA REPRESENTAÇÃO.... 48
4.1
A
CONSOLIDAÇÃO DO TERMO
REPRESENTAÇÃO
.......................................................................... 49
4.2
O
SIGNIFICADO DA REPRESENTAÇÃO
:
DIFERENTES CONCEPÇÕES
................................................... 54
4.3
A
REPRESENTAÇÃO NOS ESPAÇOS INSTITUCIONAIS DE PARTICIPAÇÃO SOCIAL
............................... 74
4.4
A
REPRESENTAÇÃO DOS AGRICULTORES FAMILIARES NOS ESPAÇOS INSTITUCIONAIS DE
PARTICIPAÇÃO SOCIAL
.................................................................................................................................. 98
5 OS FATORES CONDICIONANTES DA REPRESENTAÇÃO DOS
AGRICULTORES FAMILIARES.......................................................................... 103
5.1
A
S TRAJETÓRIAS ASSOCIATIVAS DO
T
ERRITÓRIO
S
UDOESTE E DOS MUNICÍPIOS
.......................... 103
5.2
A
CONFIGURAÇÃO DOS ESPAÇOS INSTITUCIONAIS DE PARTICIPAÇÃO SOCIAL
............................... 125
5.3
T
RAJETÓRIAS DOS REPRESENTANTES DOS AGRICULTORES FAMILIARES EM DIFERENTES ESPAÇOS
148
6 AS DIMENSÕES DA REPRESENTAÇÃO DOS AGRICULTORES
FAMILIARES FRENTE AOS SEUS FATORES CONDICIONANTES ................. 156
6.1
A
REPRESENTATIVIDADE DOS AGRICULTORES FAMILIARES NOS ESPAÇOS INSTITUCIONAIS DE
PARTICIPAÇÃO SOCIAL
................................................................................................................................ 156
6.2
A
CAPACIDADE DE INTERVENÇÃO DOS REPRESENTANTES NOS DIFERENTES ESPAÇOS
.................. 166
9
7 A REPRESENTAÇÃO DOS AGRICULTORES FAMILIARES EM ESPAÇOS
DE PARTICIPAÇÃO SOCIAL DO SUDOESTE DO PARANÁ............................. 181
REFERÊNCIAS................................................................................................... 187
APÊNDICE A: Roteiro das entrevistas sobre as trajetórias dos
representantes e o processo de representação. ................................................. 200
APÊNDICE B: Roteiro das entrevistas sobre as configurações dos espaços
institucionais de participação social. ................................................................... 202
APÊNDICE C: Roteiro das entrevistas sobre as
trajetórias
associativas dos município ou regiões ................................................................ 203
12
1 INTRODUÇÃO
A criação dos espaços institucionais de participação social como os
conselhos e fóruns, potencializada pela Constituição Federal de 1988, fez com
que surgisse uma nova forma de representação política, na qual o representante
tem uma relação com o representado bastante distinta daqueles que foram eleitos
para atuar no Executivo ou Legislativo municipal, estadual ou nacional.
Os representantes que atuam nesses espaços institucionais de participação
social falam em nome de um determinado grupo social
1
, que necessita de um
porta-voz para expor seus interesses e demandas para a formulação de políticas
públicas e/ou destinação dos recursos destas. Este estudo visa compreender o
processo de representação dos agricultores familiares nesses espaços.
A opção desse estudo pelos agricultores familiares é devida,
principalmente, à diversidade de espaços institucionalizados que demandam a
participação destes através de seus representantes e à relevância dos
movimentos organizativos desse grupo social, que são protagonizados por atores
de trajetórias distintas que trazem bases diferenciadas para a construção de um
processo de representação nos espaços institucionais de participação social. Além
disso, esses atores são muito importante na reprodução da vida rural dos
municípios, sendo responsáveis pela revitalização das relações comunitárias e de
1
Grupo social é um coletivo de pessoas diferenciado de pelo menos um outro grupo por formas
culturais, práticas ou modo de vida. Membros de um grupo têm uma afinidade específica uns com
os outros devido às suas experiências ou modos de vida similares, as quais os incita a associar-se
com esses atores mais do que com aqueles não identificados com o grupo. Grupos são uma
expressão das relações sociais. Um grupo existe somente em relação a pelo menos um outro
grupo. Identificação de grupos surgem no encontro e interação entre coletividades sociais que
experienciam algumas diferenças em seus modos de vidas e formas de associação, mesmo se
eles também se considerem como pertencentes à mesma sociedade. Grupos constituem
indivíduos. O senso particular de história, afinidade e individualidade de uma pessoa, mesmo o
modo pessoal de argumentação, de avaliação e de expressar sentimentos são parcialmente
constituídas pelo seu grupo de afinidade. Isso não significa que uma pessoa não tenha estilo
individual ou seja incapaz de transcender ou rejeitar uma identidade de grupo. Nem exclui pessoas
de ter muitos aspectos que são independentes das identidades de seu grupo (YOUNG, 1990).
Utilizando a definição de Hochstetler (1997, p. 195) que, segundo ela, é propositalmente tão
inclusiva quanto possível para ser uma forma substantiva da definicão similarmente geral de ação
13
conhecimentos, da preservação do patrimônio cultural, da conservação da
biodiversidade e dos recursos naturais, isto é, por muito mais do que
simplesmente pela produção agropecuária e pela dinamização das economias
locais.
Assim, o território Sudoeste do Paraná foi selecionada como área de estudo
pelo fato da agricultura familiar representar 94,9% de seus estabelecimentos
2
e
por ser composta predominantemente por municípios rurais, isto é, municípios que
apresentam populações abaixo de cinqüenta mil habitantes, com densidade
demográfica menor que 80 habitantes por Km
2
(VEIGA, 2002), nos quais a
população rural é determinante para o sucesso de um projeto de desenvolvimento.
Isto é, um território na qual a agricultura familiar tem grande importância no seu
desenvolvimento.
Além disso, o processo histórico de constituição das organizações
populares no território Sudoeste mostra uma rica trajetória de experiências
organizativas dos agricultores familiares. Esse acúmulo de vivências se reflete
diretamente na dinâmica de organização e intervenção sócio-política dos
diferentes agentes sociais que se entrecruzam no cenário das lutas sociais
desenvolvidas no território, tornando-a um espaço significativo para compreender
as dinâmicas da participação dos agricultores familiares, e consequentemente, de
sua representação.
A partir disso, esse estudo será apresentado em seis segmentos. O
primeiro, esclarece o contexto, isto é, como surgem e o que são os espaços
institucionais de participação social, o que motivou a realização deste estudo e,
finalmente, os objetivos e as hipóteses deste.
No segundo segmento serão detalhados os procedimentos metodológicos
utilizados para alcançar os dados que são objeto de análise, assim como, a forma
como estes foram organizados e analisados.
coletiva”, grupos sociais podem ser entendidos como “grupos de cidadãos reunidos para buscar
objetivos mais ou menos compartilhados”.
2
Dados do IBGE (1998) reagrupados pelo Departamento Sindical de Estudos Rurais – Deser.
14
O terceiro segmento será uma imersão teórica sobre o conceito de
representação. Essa trajetória teórica será utilizada para perceber as nuances
existente no processo de representação, auxiliando no esclarecimento das duas
dimensões da representação dos agricultores familiares a serem trabalhadas
neste estudo e na compreensão deste processo nos espaços institucionais de
participação social.
O quarto segmento tratará da análise dos fatores condicionantes da
representação dos agricultores familiares nos diferentes espaços. No quinto, serão
analisadas as dimensões da representação frente a estes fatores condicionantes.
Finalmente, no sexto segmento, haverá a síntese sobre a representação dos
agricultores familiares nos espaços institucionais de participação social no
Sudoeste do Paraná.
15
2 O CONTEXTO E A APRESENTAÇÃO DO ESTUDO
Estudos recentes sobre o aprofundamento da democracia estão buscando
o entendimento do processo de participação da população e da sociedade civil na
última geração de inovações institucionais, que visam diversas formas de
participação dos cidadãos no desenho e implementação de políticas públicas.
No caso brasileiro é necessário compreender o processo de
descentralização ocorrido no final dos anos 1980, que deu origem aos espaços
institucionais de participação social e ao processo de representação que serão
enfocados neste estudo.
2.1 Democratização, descentralização e representação: o contexto dos
espaços institucionais de participação social
No Brasil, a resistência a um governo autoritário, instalado em 1964 com o
regime militar, fez com que a sociedade civil se organizasse de forma bastante
unificada, possibilitando que esta desempenhasse papel fundamental no processo
de transição democrática e, também, que se aguçassem as percepções sobre a
própria noção de democracia e sobre a necessidade de aprofundar o controle do
Estado por parte da sociedade. Assim, o contexto desse estudo é consolidado no
final da década de 1980, num cenário de democratização, com a revitalização da
sociedade civil, aumento do associativismo, emergência de movimentos sociais
organizados, reorganização partidária, etc., enfim, caracterizado por um intenso
debate sobre a natureza da democratização. Isso tem como consequência, a
própria democratização do Estado que, ao restabelecer vários dos procedimentos
democráticos formais, acesso às novas forças políticas constituídas na luta
contra o regime autoritário (DAGNINO, 2002).
16
Paralelamente a isso, em várias partes do mundo, os governos nacionais
perceberam que os governos locais e regionais apresentaram uma maior
capacidade de intervenção por ter uma relação mais próxima com seus cidadãos.
Podendo assim, expressar melhor as identidades culturais de um território,
estabelecer mais facilmente mecanismos de participação e informação e gerar
mobilizações simbólicas comunitárias. Assim como, os próprios cidadãos se
sentiram mais seguros no acompanhamento de como os seus representantes
estavam defendendo seus valores e interesses. Com isso, observou-se um
movimento de descentralização das instituições do Estado, em parte,
respondendo às reivindicações locais e regionais e às expressões coletivas
identitárias, mas em parte também, por um esforço consciente do Estado de
encontrar fórmulas alternativas à rigidez da centralização e à crise de legitimidade
que emanava da desconfiança dos cidadãos (CASTELLS, 1999).
No caso brasileiro, essa postura de negociação, que apostou na
possibilidade da ação conjunta entre governo e sociedade civil, se deu de forma
diferenciada tanto no interior do Estado, uma vez rompida a relativa
homogeneidade do período autoritário, como no interior da sociedade civil, devido
à disputa pela construção democrática e uma crescente diversificação de atores,
interesses e posições políticas. Entretanto, no início dos anos 1990, percebeu-se a
evolução de uma aposta generalizada na possibilidade de uma atuação conjunta
entre o governo e a sociedade civil (DAGNINO, 2002).
Nesse contexto, no momento em que os movimentos sociais e outros
setores sociais buscaram a redefinição da noção de cidadania, "[...] baseada no
reconhecimento dos seus membros como sujeitos portadores de direitos, inclusive
aquele de participar efetivamente na gestão da sociedade." (DAGNINO, 2002, p.
10), foi promulgada a nova Constituição de 1988, que preveu inovações
institucionais que favoreceram a descentralização e a aproximação da sociedade
civil da gestão estatal.
Assim, no Brasil, o quadro de proliferação destes espaços de participação
foi impulsionado, principalmente, pela pressão por maior participação social
desenvolvida por movimentos e organizações da sociedade civil ao longo dos
17
anos 1980 e 1990 e consequente movimento de descentralização das políticas
públicas iniciado em meados da década de 1980, principalmente na área da
saúde, e disseminado no período posterior à Constituição de 1988. Entretanto,
também houve outros fatores como o agravamento dos problemas sociais, a crise
do setor público e o incentivo oriundo das agências internacionais de
financiamento, que começaram a perceber as vantagens da participação das
populações-alvo no planejamento, execução e, também, na fiscalização dos
recursos recebidos. Isto é, pelo questionamento, tanto do padrão centralizador,
autoritário e excludente que tinha caracterizado a relação entre as agências
estatais e os beneficiários das políticas públicas, quanto da capacidade do Estado
de responder às demandas sociais. Assim, os espaços institucionais de
participação têm como objetivo "[...] a democratização do processo para atingir a
eficácia dos resultados." (TATAGIBA, 2002, p. 47).
Alguns destes espaços institucionais de participação social foram criados
visando a promoção de um debate amplo no interior da sociedade civil sobre
temas até então excluídos de uma agenda pública e, outros, buscando a
constituição de espaços de ampliação e democratização da gestão estatal. Como
era esperado, este processo de construção de espaços institucionais não teve um
desenvolvimento linear, muito pelo contrário, apresentou uma dinâmica complexa
resultante da disputa de distintos projetos políticos, confrontando diferentes
concepções sobre a natureza e os limites deste processo (DAGNINO, 2002).
Mesmo assim, este processo representou um avanço na construção de espaços
institucionais de participação social que hoje estão espalhados pelo país.
Muitos estudos têm mostrado que o surgimento de espaços institucionais
de participação social não é um fenômeno localizado, mas, uma experiência
vivenciada em democracias do mundo todo, mesmo que ainda suscitando grandes
questionamentos. Estes espaços recebem diferentes denominações em estudos
variados que podem determinar diferentes origens ou configurações ou englobar
também outras experiências diferenciadas do objetivado por este estudo, como
“arranjos participativos” ou “inovações institucionais” (AVRITZER; SANTOS,
2003), “redes associativas” (CHALMERS; MARTIN; PIESTER, 1997), “Estado-
18
rede” (CASTELLS, 1999), “invicted espaces” (CORNWALL, 2004), “espaços
públicos” (DAGNINO, 2002), entre outros, mas todos estes estudos são muito
importantes para a construção do entendimento das origens e funcionamento
destes espaços.
Chalmers, Martin e Piester (1997), por exemplo, apontam que mudanças
fundamentais nas condições globais e domésticas e consequentes alterações nas
estratégias das elites e dos atores populares, especialmente a dispersão da
tomada de decisão em múltiplos centros diferentes do existente originalmente
onde este era concentrado no Estado centralizado, determinaram o
desenvolvimento de diferentes e relevantes estruturas de representação que
conectam os setores populares a este Estado policêntrico. Tais estruturas são
denominadas por eles de redes associativas (associative networks), que são
grupos de atores relacionados aos centros de tomada de decisão através de um
conjunto de procedimentos e organizações no qual ocorre acordos e trocas
cognitivas, influenciando as políticas adotadas por tal centro
1
. Essas estruturas de
representação não são apenas canais para expor as demandas da população,
mas significam também, procedimentos e organizações relacionadas para resolver
conflitos entre interesses concorrentes, nas quais debates ou discussões têm
lugar, levando à clarificação de preferências, análise das condições que podem
afetar qualquer posição política que pode surgir e interpretação dos significados
das ações a serem efetuadas. Assim processos cognitivos relevantes às
políticas, que incluem percepção, aprendizado social e comunicação.
Andrea Cornwall aponta outra faceta destes espaços, ao destacar que
estes foram e continuam sendo criados, principalmente, pela demanda de políticas
públicas, isto é, são invicted spaces”, denominação dada aos “[...] espaços
criados através da intervenção do Estado ou de outros atores poderosos do
desenvolvimento, nos quais os cidadãos são convidados a participar.”
(CORNWALL, 2004, p. 1-2; CORNWALL; COELHO, 2004, p. 1, tradução nossa).
Essa noção de espaço político evoca locais nos quais diferentes atores,
1
Similar ao que Castells (1999) denomina de “Estado-rede”.
19
conhecimentos e interesses interagem, e nos quais podem surgir alternativas,
entretanto, são espaços dos quais algumas pessoas e idéias permanecem
excluídas, isto é, [...] não são convidadas a participar e/ou suas idéias não são
contempladas por seus representantes” (CORNWALL, 2002
a, p. 51, tradução
nossa).
Apesar disso, Chalmers, Martin e Piester (1997) apontam que mesmos
esses espaços institucionais que chegam a ser criados sem a participação dos
setores populares, estão presenciando o crescimento desta participação. Assim,
essas novas estruturas de representação estão transformando a representação,
apesar disto, estar ocorrendo de forma parcial e desigual através dos países,
regiões e arenas políticas. Isso resulta do fato desses espaços serem diferentes
das estruturas existentes anteriormente, por serem menos atados a uma única
estrutura de poder e por colocarem mais ênfase em amarrações resultantes de
decisões que são oriundas de ações associativas, permitindo assim, um controle
social mais transparente, a ampliação das oportunidades de participação política
da população e a relegitimação do Estado (CASTELLS, 1999)
2
.
Entretanto, as questões como a responsabilização social, a legitimidade, a
natureza da representação por mediadores e a participação dos cidadãos ainda
são críticas nestes espaços. A inclusão de representantes dos cidadãos em vez
dos próprios cidadãos comuns, ocorrida devido ao tempo e aos recursos escassos
das agências responsáveis pela elaboração de políticas e aos custos da
participação direta dos cidadãos individualmente, compromete a efetiva
participação destes atores sociais (HOLMES; SCOONES, 2000). Isso ocorre
porque o processo de implantação de espaços institucionais de participação social
tem sido conduzido sem uma significativa mudança nas relações de poder entre o
governo e a sociedade civil. Em muitos casos, a participação tem sido percebida
como um meio de garantir a maior eficiência na implementação de planos
2
Castells (1999) aponta que as evidências empíricas demonstram isso, apesar da experiência
apontar que os governos locais e estaduais, em todo o mundo, são frequentemente o vel mais
corrupto da administração, entre outras razões porque as redes pessoais são mais fortes do que
no nível federal e porque assumem atribuições em setores de atividades mais propensos à
corrupção da administração em razão dos interesses privados envolvidos.
20
preconcebidos e, freqüentemente, através de estruturas governamentais já
existentes. Apesar do discurso sobre a necessidade de buscar as propostas e os
conhecimentos dos beneficiários, envolvendo-os na definição e/ou implementação
das políticas públicas, o fato é que grande parte das autoridades receia a
participação da população. Em muitas experiências, elas até buscam o
entendimento e o suporte dos diversos grupos da sociedade, mas isto é feito
timidamente, pois o temor de que este grande envolvimento seja menos
controlável, menos previsível e, além disso, deixar o processo de planejamento
muito lento (DALAL-CLAYTON; DENT; DUBOIS, 2003).
Com isso, os diversos espaços participativos, muitas vezes, não
conseguem refletir a realidade da sociedade que deveria ser representada por
eles. Apesar de, em alguns casos, haver a garantia formal da representação dos
beneficiários, esta não garante que estes representantes consigam interferir nas
deliberações e/ou representar efetivamente os segmentos representados.
Assim, as propostas que surgiram como alternativa à baixa
representatividade dos atores políticos e ao elitismo do sistema em termos dos
atores/interesses politicamente incorporados, em muitos casos, não estão
conseguindo atingir o seu intento. A tentativa de resolver o problema da
representatividade, através da inclusão de organizações sociais que melhor
representariam os interesses da sociedade, especialmente dos setores mais
subordinados, permitindo uma participação mais igualitária dos diversos atores,
incorporando-os aos processos de discussão e deliberação sobre as políticas
públicas, não foi bem sucedida. Assim, percebe-se a necessidade de repensar o
processo de representação que está ocorrendo nestes espaços de participação
social e para isso é necessário que a análise seja diferenciada da representação
política burocrática e elitista ou daquela existente no poder Executivo e Legislativo.
Este novo processo coloca a necessidade de problematizar a noção de
“representação”, verificando, nestes espaços institucionais de participação social,
três questões de forma simultânea: quem participa, no que e como. Tal
perspectiva exige, assim, que se analise quem são esses representantes, a
configuração dos espaços nos quais estes participam e, como funcionam estes
21
espaços para compreender as possibilidades da representação dos atores sociais
nestas arenas. Assim, este estudo se propõe a analisar a representação dos
agricultores familiares nos Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural
(CMDRs) de Itapejara D’Oeste e Vitorino e no Grupo Gestor do Território
Sudoeste do Paraná (GGETESPA).
2.2 Os Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural
A discussão sobre a representação política dos atores rurais no Brasil tem
como principais protagonistas os movimentos sociais e, nos últimos anos, os
Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural, que estão presentes em
aproximadamente 1800 municípios do Brasil, representando em torno de 30% do
total de municípios do país (CAMPOS; NUNES; CORONA, 2003).
Apesar desse aparente quadro de virtuosidade do processo de formação de
conselhos, este se torna mais modesto se for considerado que o Programa
Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) definia a existência
desta instância como condição para os municípios participarem do processo de
seleção para o recebimento de recursos através da Linha Infraestrutura e
Serviços, que foi implantada em 1996 e aprovada para 1500 municípios. A relação
entre a instituição dos conselhos e as exigências do Pronaf pode ser verificada no
estudo realizado por Favareto e Demarco (2002), que destaca que 73,4% dos
conselhos pesquisados assumem o acesso aos recursos do Pronaf como principal
motivação para a sua formação.
A forma abrupta como estes conselhos foram criados favorece a instituição
de espaços de participação que não tiveram um processo de informação e
sensibilização da sociedade sobre a sua função, constituição e funcionamento.
Assim, a criação de muitos destes conselhos foi realizada como uma formalidade
burocrática para os municípios poderem se credenciar a serem beneficiados por
22
políticas públicas, prejudicando um pouco o intuito inicial deste processo de
inovação institucional da busca de maior democratização.
O reconhecimento do fator indutivo proporcionado pelos recursos de
programas governamentais, como aqueles oriundos do Pronaf ou de outros
programas estaduais, à expansão dos Conselhos Municipais de Desenvolvimento
Rural, não significa assumir a tese de que este fato impediria, inevitavelmente, que
tais espaços pudessem apresentar um sentido democratizante. Ou seja, o mero
fato da formação de um conselho ter sido induzida por fatores externos, não
implica, evidentemente, que este não alcançaria os objetivos democratizantes
citados anteriormente
3
.
Nesse sentido é preciso destacar que alguns CMDRs são resultantes de
processos institucionais anteriores, fazendo com que houvesse apenas uma
reorganização na sua configuração para este se adequar às normas do programa.
Além disto, situações em que municípios, mesmo não sendo selecionados pelo
Pronaf, mantiveram seus conselhos e estes estão assumindo um papel importante
nas iniciativas dos municípios, além de deliberarem sobre as prioridades e ações
das instituições e programas do governo estadual.
Nas normas do Pronaf a exigência de que pelo menos 50% dos
membros que compõem o conselho sejam agricultores familiares. Tal definição
formal, no entanto, por si só não garante a representatividade desta participação,
pois, em muitos casos, os representantes dos agricultores familiares são indicados
pelo próprio poder público local ou pelos técnicos das instituições oficiais de
extensão rural
4
.
Nos casos em que as comunidades rurais fazem a sua indicação,
geralmente é escolhido o presidente da associação ou outro membro da diretoria
desta. Outras organizações, como sindicatos, centrais de associações,
3
Esta pesquisa relativiza tal perspectiva, na medida em que assume que outros fatores têm um
papel explicativo no entendimento do funcionamento destes Conselhos.
4
Segundo IPARDES (2001), na pesquisa realizada em 20 dos 57 municípios do Paraná
beneficiados pelo Pronaf na modalidade Infra-estrutura e Serviços, 39,7% dos conselheiros
entrevistados responderam que foram indicados pela prefeitura ou pela instituição oficial de
extensão rural.
23
cooperativas de crédito, etc., também fazem o mesmo, escolhendo entre os
membros de sua coordenação ou diretoria. Isso poderia significar que esses
membros escolhidos sejam representativos por sua inserção associativa ou
institucional. Nesse caso, a relação dos representantes com os representados se
através da mediação das organizações nas quais os representantes se
inserem. Assim, a representatividade torna-se dependente das relações entre
representantes e representados, a qual, por sua vez, depende da relação entre os
segmentos organizados e a população em geral.
Os componentes dos Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural
podem ser divididos em três grandes grupos: a) os representantes do poder
público, geralmente, técnicos das instituições de extensão rural ou das prefeituras
e os agentes políticos, como os membros do executivo municipal ou os secretários
municipais de agricultura; b) as “lideranças” dos agricultores que possuem
experiência na direção de sindicatos, cooperativas de crédito ou de produção,
centrais de associações de produtores, associações por cadeia produtiva, etc.,
geralmente, vinculadas às organizações supra-municipais e; c) os representantes
das associações das comunidades rurais.
O primeiro grupo, formado pelos representantes do poder público, traz
consigo a autoridade emanada de suas instituições, que representam o poder do
Estado. Atuam no espaço como os agentes das políticas públicas, representantes
dos interesses da burocracia estatal e/ou das forças políticas no governo. Em
muitos casos, a partir desses interesses, estes atores procuram assumir o controle
do conselho. Isso pode ser demonstrado com a pesquisa realizada por Plural
Cooperativa de Consultoria, Pesquisa e Serviços - Plural (2002), na qual 72,3%
dos conselhos o presididos por representantes do executivo municipal
5
e,
5
Dos 32 CMDRs de 5 estados situado em cada uma das grandes regiões do país, 3,2% são
presididos pelos próprios prefeitos, 31,9% por outros membros do executivo municipal e 37,2%
pelos secretários municipais da agricultura (PLURAL, 2002).
24
segundo IBASE (2002), a secretaria executiva é ocupada pelo representante da
extensão rural em 46% dos casos
6
.
Mesmo nos casos em que essas funções são assumidas pelos agricultores,
os representantes do poder público, detentores de informações privilegiadas e
ainda no papel de agentes das políticas do Estado, tendem a subordinar os
agricultores a um processo conduzido por eles. Isso ocorre porque, apesar de
serem representantes de sua instituição, como qualquer outro membro do CMDR,
os representantes do poder público, pelos seus recursos e “competências”
diferenciadas, reproduzem uma relação de poder, em geral, bastante assimétrica
(NEVES, 1998).
O segundo grupo, constituído por representantes de entidades que,
geralmente, fazem parte de organizações supra-municipais, reúne aqueles que
têm uma trajetória nos movimentos e organizações sociais, são reconhecidos
como lideranças pelos agricultores, bastante competentes na argumentação e
capazes de se movimentar nos espaços organizados a partir do ponto de vista do
Estado, conseguindo intervir com maior facilidade nestes espaços (OLIVEIRA,
2000; NAVARRO, 2003).
O último grupo, formado por representantes das associações das
comunidades, reúne aqueles que ainda mantém uma inserção significativa nas
comunidades rurais. Apesar de terem assumido a presidência ou a diretoria da
associação de sua comunidade, esses representantes ainda não estabeleceram
muitas relações externas e, conseqüentemente, estão mais próximos da realidade
das famílias de agricultores do município.
Então, percebe-se que entre os representantes dos agricultores familiares
diferentes tipos de representação, pois mesmo fazendo parte do mesmo grupo
social, as diferentes trajetórias estabelecidas por estes atores determinam
distintas relações entre representantes e representados e, assim, diferentes
formas de intervenção nos espaços de participação.
6
Este estudo do IBASE foi realizado em 185 municípios situados em quatro estados de quatro
regiões do país: Espírito Santo (Sudeste), Mato Grosso do Sul (Centro Oeste), Pernambuco
(Nordeste) e Santa Catarina (Sul).
25
Teoricamente, o principal objetivo do Conselho Municipal de
Desenvolvimento Rural seria a construção de um projeto de desenvolvimento
pensado por atores representativos de todo o meio rural do município. Esse
objetivo exigiria que o conselho fosse um espaço no qual se privilegiasse o
reconhecimento dos saberes constituídos sob as mais variadas perspectivas, de
forma que se viabilizasse a efetiva participação.
Para isso, seria necessária a produção de certas equivalências
fundamentais à produção de determinados consensos, códigos e regras
procedimentais comuns, os quais, apesar de não anularem os conflitos gerados
pelas diferenças entre os participantes, pudessem viabilizar a busca de um
objetivo comum (MOUFFE, 2003). Entretanto, essa é uma situação difícil de ser
encontrada, pois as relações entre os membros são marcadas por uma certa
hierarquia de poder, que é concedida àqueles que têm maior domínio das
informações, do conhecimento sobre a máquina pública, enfim, um maior controle
sobre as ações destes espaços. Isso é agravado pelo fato de que as regras
institucionalizadas no discurso hegemônico do Estado o permeadas pela
burocracia e pelo tecnicismo, que podem comprometer o diálogo com os
participantes que não têm o domínio da linguagem dos representantes
governamentais (NEVES, 1998).
Assim, esses espaços apresentam uma grande heterogeneidade na sua
composição, reunindo membros que apresentam trajetórias pessoais e
associativas bastante diferenciadas. Será que esta heterogenidade se aprofunda
em espaços com escalas maiores? Como será que isto se reflete na
representação dos agricultores familiares nos diferentes espaços?
A seguir, expor-se-á o novo arranjo espacial proposto pelo Ministério de
Desenvolvimento Agrário (MDA) para os projetos da Linha Infraestrutura e
Serviços.
26
2.3 Território: a nova proposta do Ministério de Desenvolvimento Agrário
Muitos estudos existentes sobre os Conselhos Municipais de
Desenvolvimento Rural questionam se estes representaram realmente um efetivo
processo de democratização da elaboração e gestão das políticas locais de
desenvolvimento rural, levantando uma série de questões que deveriam ser
aprofundadas para se atingir este objetivo
7
. Apesar disto e, segundo a Secretaria
de Desenvolvimento Territorial - SDT, “considerando” estas interpretações críticas,
a partir de 2003, o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) reformulou a
Linha Infraestrutura e Serviços do Pronaf, com a criação do Programa Nacional de
Desenvolvimento Sustentável de Territórios Rurais (Pronat). Assim, através da
SDT, foi proposto algo ainda mais ambicioso para os agricultores familiares: apoiar
processos de desenvolvimento territorial, nos quais o território é composto por
vários municípios com características sócio-culturais, ambientais, político-
institucionais e econômicas peculiares (BRASIL, 2003a). Na perspectiva que
fundamenta o novo Programa,
[...] o território seria um espaço físico, geograficamente definido,
geralmente contínuo, compreendendo cidades e campos,
caracterizado por critérios multidimensionais, tais como o
ambiente, a economia, a sociedade, a cultura, a política e as
instituições, e uma população, com grupos sociais relativamente
distintos, que se relacionam interna e externamente por meio de
processos específicos, onde se pode distinguir um ou mais
elementos que indicam a coesão social, cultural e territorial.
(BRASIL, 2003b, p. 34).
Segundo BRASIL (2003b, p. 28)
[...] a articulação de políticas públicas desde a base e a ampliação
dos espaços da gestão e da participação social a os territórios
poderá resultar em alguns efeitos práticos bastante relevantes: (i)
poderá ocorrer a fusão de alguns conselhos, cujos temas têm tudo
a ver com a perspectiva territorial, passando os temas específicos
a serem tratados nas comissões setoriais que os comporiam; (ii) o
capital humano ganharia em qualificação para participar nesses
conselhos, pois o conjunto formado por diversos municípios
7
Ver Silva; Marques, 2004; Marques, 2004; Abramovay, 2000; Castilhos, 2002; Denardi, 2000;
Ipardes, 2001; entre outros.
27
permitiria ampliar o universo de representados e de instituições
civis, contribuindo para que se revelassem mediadores sociais
ainda mais comprometidos, representativos e qualificados; (iii) o
capital social alcançaria níveis mais elevados de articulações
horizontais e verticais, ampliando as possibilidades de
entendimentos entre grupos sociais distintos e habitantes de
regiões diversas, formando novas institucionalidades mais
autênticas, com maior capacidade para participar da formulação e
controle social das políticas públicas.
Para que estes efeitos ocorram, o programa prevê a participação popular a
partir de uma ou mais instâncias de abrangência regional.
A SDT afirma que “[...] a gestão social do território implica em que os atores
tenham espaço para expressar opiniões e sugestões, que participem diretamente
das diversas iniciativas e que recebam as informações pertinentes quanto aos
resultados e avanços obtidos” (BRASIL, 2003a, p. 12). A proposta inicial de
organização institucional para esta gestão previa a existência de três instâncias:
a) Fórum territorial: uma instância de participação popular de
caráter consultivo, que abrigaria representantes dos diversos
grupos sociais, com poder para acompanhar, analisar, avaliar e
encaminhar recomendações sobre os fatos mais relevantes de
interesse do desenvolvimento do território; b) Conselho Territorial:
instância de caráter deliberativo, que congregaria atores dos
grupos sociais e profissionais mais representativos e os poderes
públicos do território (representantes das prefeituras, câmaras
municipais, entidades de representação social, local e movimentos
de organização da sociedade), a qual caberia dirigir a gestão do
Plano Territorial de Desenvolvimento Rural Sustentável PTDRS
e; c) Comissão executiva ou agência de desenvolvimento ou
Consórcio: instância extraída da anterior, da qual participariam,
equilibradamente, os atores sociais envolvidos na gestão do
PTDRS. (BRASIL, 2003a, p. 13).
A proposta destas instâncias de gestão ainda está em discussão nos
estados e territórios, que na sua maioria têm institucionalizado apenas um grupo
que administra o PTDRS.
O território Sudoeste do Paraná tem um território homologado pela SDT
desde 10 de setembro de 2003. Inicialmente, este era composto por 17
municípios
8
, sendo que parte destes municípios recebeu recursos da SDT em
8
Território do Sudoeste composto por Ampére, Barracão, Bela Vista da Caroba, Bom Jesus do Sul,
Capanema, Flor da Serra do Sul, Manfrinópolis, Marmeleiro, Pérola d’Oeste, Pinhal de São Bento,
28
2003
9
. Em 2005, o território do Sudoeste era constituído por 27 municípios
10
e
havia um segundo grupo de 6 municípios que haviam sido encaminhados para
fazerem parte da ampliação do Território do Sudoeste (pré-território)
11
. Entretanto,
após uma mobilização destes 6 municípios em conjunto com outros e a
concordância do Grupo Gestor existente naquele momento, o Território Sudoeste
do Paraná ficou composto pelos 42 municípios que compõem a Associação dos
Municípios do Sudoeste do Paraná – AMSOP
12
.
Este território instituiu o Grupo Gestor do Território Sudoeste do Paraná
GGETESPA para articular e organizar as atividades voltadas para o
desenvolvimento deste território, sendo este composto por vinte e quatro
entidades: doze representando o poder público e as outras doze representando a
sociedade civil.
A composição e funcionamento do GGETESPA serão detalhados
posteriormente. A seguir, será feita a apresentação deste estudo.
2.4 Apresentação do estudo
Este estudo tenta compreender como se a representação dos
agricultores familiares em diferentes espaços institucionais de participação social.
Distintamente da maioria dos estudos sobre representação, que se preocupam
mais em discutir a composição destes espaços do que a atividade de
Planalto, Pranchita, Realeza, Renascença, Salgado Filho, Santa Izabel do Oeste e Santo Antônio
do Sudoeste.
9
Os municípios de Barracão, Bom Jesus do Sul, Flor da Serra do Sul, Manfrinópolis , Marmeleiro e
Realeza receberam o total de R$ 249.999,99 do MDA em 2003.
10
Foram incluídos mais 10 municípios: Boa Esperança do Iguaçu, Cruzeiro do Iguaçu, Dois
Vizinhos, Enéas Marques, Francisco Beltrão, Nova Esperança do Sudoeste, Nova Prata do Iguaçu,
Salto do Lontra, São Jorge e Verê.
11
Pré-território composto por Chopinzinho, Coronel Vivida, Itapejara do Oeste, São João,
Saudades do Iguaçu e Sulina.
12
Incluindo os municípios: Bom Sucesso do Sul, Clevelândia, Coronel Domingos Soares, Honório
Serpa, Mangueirinha, Mariópolis, Palmas, Pato Branco e Vitorino
29
representação propriamente dita, como apontam Pitkin (1967) e Phillips (1995), a
principal preocupação deste estudo é buscar compreender como os
representantes atuam e o que os leva a atuar desta forma. Esta opção não se
deve ao fato de acreditar que a discussão sobre a composição não seja
importante, mas por este estudo ser direcionado a estes dois tipos determinados
de espaços, no qual a presença dos agricultores familiares está garantida, mas
esta não é condição suficiente para o exercício da representação
13
.
A discussão da representação nos novos espaços institucionais acabou
ficando oculta sobre um discurso que contrapunha democracia participativa e
representativa. Assim esta temática surge, principalmente, a partir de dois fatos: a
quase ausência de estudos sobre a representação em espaços institucionais de
participação social e a recente política adotada pelo Programa Nacional de
Fortalecimento da Agricultura Familiar vinculado ao Ministério de Desenvolvimento
Agrário do Governo Federal, que assume a priorização de uma nova noção de
espacialidade para a formulação das políticas públicas, na qual o território
substituiu o município.
Conforme salientado anteriormente, a instituição dos espaços de
participação e a definição legal da presença da representação dos agricultores
familiares nestes fóruns não têm sido fatores que, por si próprios, garantam um
efetivo exercício da representação. Em vista disto, surge a necessidade de
analisar os fatores que condicionam esta representação. É a partir desta
necessidade, então, que se coloca o seguinte problema de pesquisa:
Como os fatores configuração dos espaços, trajetória associativa dos
representantes e trajetória associativa do município ou território condicionam o
processo de representação dos agricultores familiares nos espaços
institucionais de participação social?
13
Entretanto, a temática da composição será feita neste estudo para refletir sobre a quase total
ausência de mulheres, jovens e idosos na composição destes espaços.
30
Este processo de representação será analisado através de duas
dimensões: a capacidade de intervenção dos representantes nestes espaços de
participação social e a representatividade destes atores perante seus
representados.
Capacidade de intervenção
dos representantes
Representação dos
agricultores familiares
Representatividade dos
representantes
Figura 1. Esquema das dimensões do processo de participação.
Ao pensar nos fatores que poderiam influenciar estas dimensões,
destacamos três: as configurações dos espaços, as trajetórias dos representantes
e as trajetórias associativas dos municípios ou território. O cruzamento destas
noções pode ser observada na Figura 2.
31
Figura 2. Matriz sistematizadora da relação entre as dimensões e os fatores
condicionantes do processo de representação.
Considerando esta matriz de dimensões e condicionantes da
representação, a pesquisa foi planejada e delimitada a partir das seguintes
hipóteses e objetivos:
Dimensões da Representação
Capacidade de intervenção
Representatividade
Configurações
institucionais
Condiciona os recursos
necessários à intervenção devido
às diferenças de: natureza,
amplitude e complexidade dos
temas tratados; abrangência
territorial; qualificação dos atores
que intervêm; regras e formatos
dos espaços; etc.
Condiciona a representatividade
devido às diferenças de: tipo de
organizações sociais envolvidas;
familiaridade dos agricultores com
os temas tratados;
heterogeneidade dos perfis dos
representados, custos da
participação, condições para a
responsabilização social, etc.
Trajetória dos
representantes
Condiciona a capacidade de
intervenção devido às diferenças
de: recursos e competências
(educação, sociabilidade,
experiências vivenciadas, etc.)
acumulados ao longo da trajetória.
Condiciona a representatividade
devido às diferenças de: nculos
estabelecidos localmente; inserção
em redes de sociabilidade e/ou
associativismo; capacidade de
captar e representar interesses dos
agricultores familiares; etc.
Fatores
Condicionantes
Trajetória associativa
Condiciona a capacidade de
intervenção devido às diferenças
de: acúmulo de experiência e/ou
conhecimento sobre as questões
tratadas nos espaços de
participação; capacidade de
formulação e proposição;
capacidade de articulação e
mobilização.
Condiciona a representatividade
devido às diferenças de:
capacidade de cobrança dos
representantes (accountability);
envolvimento e organicidade dos
representantes com as
organizações e com as bases.
32
2.5 Hipóteses
a) Distintas configurações dos espaços institucionais de participação
apresentam processos de representação dos agricultores familiares
diferenciados.
A alteração na escala de abrangência espacial do espaço de participação
modifica o perfil dos atores nela envolvidos, isto é, altera a representação
dos agricultores familiares participantes, pois os espaços supra locais
tendem a envolver pessoas de organizações e instituições setoriais com
bases geográficas menos definidas e não as organizações de base destes
agricultores.
A ampliação da escala de abrangência espacial tende a distanciar os
representados em relação aos seus representantes, isto é, dificulta a
discussão e a responsabilização social destes com aqueles que eles
representam.
Quanto mais próxima à conformação das práticas associativas dos
agricultores familiares, maior a probabilidade de que a configuração dos
espaços institucionais viabilize vínculos de representação mais sólidos;
quanto mais próximos dos interesses, discursos, linguagem, enfim, da
“cultura” dos representantes dos agricultores familiares, maior a tendência
dos espaços institucionais oferecerem oportunidades de participação
àqueles representantes.
b) A diversidade das trajetórias dos representantes e das formas de inserção
destes junto aos representados estabelece diferentes processos de
representação dos agricultores familiares nos distintos espaços institucionais
de participação.
Atores com maior formação educacional e/ou participação em organizações
associativas apresentam maior competência para interferir nas deliberações
destes espaços de participação.
33
A experiência associativa desvinculada à manutenção das relações dos
representantes com as redes de sociabilidade e o universo cultural local
resulta no distanciamento dos representantes de seus representados.
c) A trajetória associativa local/regional dos agricultores familiares estabelece
diferenças nos processos de representação dos agricultores familiares.
A existência de um tecido associativo denso e enraizado entre a população
do município e/ou território tende a ampliar a capacidade de representação
dos agricultores familiares.
A existência de um tecido associativo denso e enraizado entre a população
do município e/ou território tende a forjar vínculos mais fortes entre os
agricultores familiares e seus representantes, ampliando a
representatividade do processo de representação.
2.6 Objetivos
Os objetivos foram classificados em objetivo geral e objetivos específicos.
Como pode ser visto a seguir:
2.6.1 Objetivo geral
Analisar como a configuração dos espaços, as trajetórias dos
representantes e a trajetória associativa do território/município interferem no
processo de representação dos agricultores familiares em espaços institucionais
de participação social como os Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural
(CMDRs) e o Grupo Gestor do Território Sudoeste do Paraná - GGETESPA.
34
2.6.2 Objetivos específicos
Identificar e analisar as diferentes configurações destes espaços institucionais
de participação social.
Analisar como a abrangência espacial interfere na conformação destas
configurações.
Analisar como estas diferentes configurações influenciam na representação
dos agricultores familiares nestes espaços de participação social.
Identificar e analisar a trajetória dos diferentes agricultores familiares que
atuam nos CMDRs e no Conselho Gestor, analisando como estes se
constituem em representantes.
Analisar a participação de mulheres, jovens e idosos como representantes dos
agricultores familiares nestes espaços.
Identificar e analisar a influência da participação em outros espaços paralelos
(sindicatos, associações, grupos da Igreja, movimentos sociais, etc) na
capacidade de intervenção e na representatividade dos agricultores familiares
nestes espaços.
Identificar e analisar as diferentes formas de atuação dos representantes que
compõem estes diferentes espaços.
Analisar como o as relações entre representantes e representados nos
diferentes espaços.
Analisar a trajetória associativa local/regional e sua relação com os espaços
institucionais de participação social.
A partir desses objetivos, no próximo segmento, apresentar-se-á os
procedimentos metodológicos utilizados para atingí-los.
35
3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A elaboração do projeto foi realizada após algumas incursões exploratórias,
através de visitas e entrevistas com atores das organizações sociais e instituições
governamentais que atuam no território Sudoeste do Paraná, na busca de um
maior discernimento sobre os elementos necessários para qualificar o projeto de
pesquisa e obter os resultados esperados. Assim, com o auxílio deste estudo
exploratório definiu-se os espaços institucionais de participação social a serem
pesquisados, os recursos necessários e a metodologia de pesquisa de campo,
além de precisar o problema de pesquisa.
No sentido de compreender o processo de representação dos agricultores
familiares em espaços institucionais de participação social existentes no Sudoeste
do Paraná, recorreu-se à pesquisa qualitativa. Um tipo de pesquisa que considera
o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, que
corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos
fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis
(MINAYO, 1995). A categoria de pesquisa selecionada foi o estudo de caso, ou
melhor, o estudo comparativo de casos.
O estudo comparativo de casos segue os passos do método comparativo,
descrevendo, explicando e comparando os fenômenos por justaposição e
comparação propriamente dita (TRIVIÑOS, 1995).
3.1 Estudo comparativo de casos
A metodologia denominada estudo comparativo de casos foi escolhida
porque o estudo aprofundado de um caso permite a descoberta de relações que
não seriam encontradas de outra forma, tendo “as análises e inferências feitas por
36
analogia de situações, respondendo principalmente as questões: por que e como”.
(TRIVIÑOS, 1995, p. 136).
O estudo comparativo de casos nos auxiliou a identificar os diversos fatores
que interferiram e/ou estão interferindo no processo de representação por permitir
a investigação de um fenômeno atual dentro de um contexto de vida real, no qual
as fronteiras entre o fenômeno e o contexto não são claramente definidas e na
situação em que múltiplas fontes de evidências são usadas (YIN, 1990 citado por
CAMPOMAR, 1991).
Neste estudo foi realizada a comparação de três espaços institucionais de
participação social: a) o Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural de
Vitorino; b) o Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural de Itapejara d’Oeste
e; c) o Grupo Gestor do Território Sudoeste do Para- GGETESPA, que é um
espaço de participação social que congrega os 42 municípios do território
Sudoeste do Paraná, conforme descrito anteriormente.
A escolha dos CMDRs dos dois municípios se deu por ambos
apresentarem uma certa consolidação na sua estrutura e dinâmica, terem na sua
composição membros de trajetórias diversas e por apresentarem duas distinções
que auxiliam no momento de proceder as análises comparativas: o CMDR de
Vitorino tem um diferecial no seu funcionamento, isto é, na forma como este
organiza as suas atividades no município, trazendo elementos importantes para a
análise da configuração do espaço institucional como fator condicionante do
processo de representação e o CMDR de Itapejara d’Oeste tem um diferencial na
sua relação com organizações supra-municipais, que é interessante,
principalmente, na análise das trajetórias associativas dos municípios. Os dois
CMDRs iniciaram sua participação na Linha Infra-estrutura e Serviços do Pronaf
após o início da proposta territorial, não tendo participado do período em que esta
objetivava os municípios, mas ambos deliberam sobre o Programa Paraná 12
Meses
1
.
1
Programa do Governo do Estado do Paraná, que exige a existência de um conselho municipal
para deliberar sobre as suasões em cada município. Apesar deste programa exigir um conselho
específico, os municípios utilizaram a mesma composição e estrutura dos CMDRs, assim as
deliberações ocorriam no mesmo conselho.
37
Quanto ao GGETESPA, a escolha se deve à esta experiência ser o produto
desta nova política territoral, possibilitando que se trace um paralelo com os
CMDRs. Além disso, apresenta a participação efetiva tanto das organizações
governamentais como das não governamentais e, especialmente, por que
possibilita analisar o efeito de diferentes configurações institucionais
particularmente a escala – sobre o processo de representação.
A primeira aproximação com estes espaços foi realizada de forma
semelhante. Após um primeiro contato com alguns componentes conhecidos
anteriormente pela pesquisadora, estes viabilizaram a participação desta numa
reunião do espaço. Nesta reunião foram expostos os objetivos da pesquisa
suscintamente e depois solicitado a concordância e apoio de todos os membros
para a execução da pesquisa, deixando claro que suas reuniões seriam gravadas
e que alguns componentes seriam convidados a serem entrevistados.
Naturalmente, houve o comprometimento de que todo o material gravado seria
utilizado apenas para fins acadêmicos. Nos três espaços a aceitação do estudo foi
unânime.
As entrevistas foram marcadas com antecedência e realizadas nas
propriedades ou sede das organizações de cada representante.
Assim, passar-se-á a descrever os instrumentos utilizados para destacar os
fatores condicionantes e as dimensões da representação analisadas por este
estudo.
3.2 Os fatores que condicionam a representação e os seus instrumentos
de análise
Neste segmento será apresentado como os fatores que condicionam a
representação configuração do espaço, trajetória do representante e trajetória
associativa do município ou território – e a representação propriamente dita,
38
foram operacionalizados no processo de pesquisa empírica, incluindo os
instrumentos utilizados para a obtenção dos dados.
3.2.1 Os espaços institucionais de participação social
As configurações dos espaços institucionais de participação social foram
identificadas a partir da análise de seus documentos e dados secundários.
Paralelamente, este material coletado foi complementado, através das entrevistas
com seus membros e a observação livre das reuniões, para a verificação de
questões que não constam nos documentos ou que na prática estão ocorrendo de
forma diferenciada.
A respeito destes espaços foram questionados: seus objetivos, abrangência
espacial, composição, forma de nomeação de seus membros, tempo de mandato,
tempo de existência, forma como foi constituído, como se elege a coordenação,
periodicidade de reuniões, como os membros são informados das reuniões, como
são tomadas as decisões, como se definem as pautas de reuniões, a estrutura
organizacional, como são viabilizados os custos operacionais e da participação de
seus membros, local de reuniões e arquivamento de documentos.
3.2.2 As trajetórias dos representantes dos agricultores familiares e do
associativismo local/regional
As trajetórias dos representantes dos agricultores familiares foram
estudadas a partir das entrevistas semi-estruturadas e estruturadas com os
próprios representantes dos agricultores familiares. A escolha dos entrevistados
dos CMDRs foi realizada priorizando a diversidade de origens por comunidade e
por organização, de idade e também, pela forma como estes se portavam nas
39
reuniões, buscando alguns que participavam mais ativamente, outros com
participações mais pontuais, outros que praticamente não se expunham, etc. No
caso do GGETESPA foram entrevistados todos os representantes que eram
agricultores familiares.
Nesta temática foram destacadas as seguintes questões: nível educacional,
idade, participação em atividades grupais na infância e/ou adolescência (igreja,
esportes, etc), trajetória das participações em organizações associativas no
município e território, participação em processos de formação de conselheiros ou
outros similares, a quanto tempo é representante, como organiza seu trabalho no
estabelecimento rural nas ausências ocasionadas pela função de representação,
como ele se enquanto representante, por que ele se considera um
representante competente ou o que falta para ser um representante competente,
perspectivas futuras de participação nestes ou em outros espaços.
Além disso, levantou-se a trajetória do processo associativo local/regional,
através da análise de documentos e bibliografias e, também, entrevistas com
determinados atores que participaram deste processo.
3.2.3 A representação dos agricultores familiares
A representação dos agricultores familiares foi analisada através das
entrevistas semi-estruturadas e da observação livre das reuniões e eventos dos
espaços institucionais de participação social, procurando comparar os dois
instrumentos para verificar as complementações e as contradições entre a fala dos
entrevistados e a ação dos representantes nos espaços institucionais de
participação social.
As entrevistas foram realizadas com os representantes dos espaços de
participação (os mesmos selecionados para relatar as suas trajetórias) acrescidos
de outros membros não agricultores. Além destes foram entrevistados os
40
representados das comunidades rurais e das organizações participantes destes
espaços.
Nas entrevistas com os representantes dos espaços de participação,
procurou-se identificar: como foi o seu processo de seleção para representante, a
quem ele representa, como as questões discutidas no espaço de participação são
compartilhadas com os representados (antes e/ou depois das reuniões), como
este se prepara para participar das reuniões, quais os fatores que ele considera no
momento de opinar, a existência ou não de propostas conjuntas com outros
representantes, quais temas ele já inseriu na pauta de reuniões, quais temas ele
acha mais importante, quais temas ele acha “perda de tempo”, qual a
contribuição/importância do espaço de participação, o que poderia ser mudado
para melhorar a atuação deste espaço.
A observação foi utilizada no acompanhamento das reuniões destes
espaços institucionais de participação social, buscando identificar a forma como
estas são organizadas, a freqüência da presença dos membros e o
comportamento dos representantes. Durante a reunião foi observado, quantas
vezes cada um se expõe, qual a duração de suas falas, qual o tipo de intervenção
é feita (concordância, discordância, procurando esclarecimentos, contribuindo com
a temática, procurando a abreviação da discussão, observando apenas as
necessidades próprias ou de um grupo, buscando uma melhor proposta para
todos, “ideologizadas”, qualidade da intervenção), qual a postura perante às
discussões (de expectador, participante, impaciente, desligado, preocupado com
outros pontos da pauta), como estes se posicionam em relação aos outros
representantes de agricultores familiares, etc.
A partir da variedade de informações requisitadas por este estudo, foi
necessário que os instrumentos fossem utilizados com cuidado para que se
pudesse obter as informações em condições que possibilitassem análises mais
precisas.
41
3.3 Os instrumentos de coleta de dados
A partir das necessidades de dados apontadas anteriormente, a coleta
destes foi possibilitada através dos seguintes instrumentos: estudos exploratórios,
análise de documentos, entrevista semi-estruturada (ou semi-diretiva) e
estruturada (ou diretiva), observação livre e dados secundários
Os estudos exploratórios foram realizados antes e durante o período de
elaboração do projeto.
A pesquisa de campo, propriamente dita, na qual foram realizadas as
entrevistas, coleta e análise de documentos e a observação das reuniões e
oficinas, foi realizada entre os meses de maio e setembro de 2005.
As reuniões e oficinas do GGETESPA continuram a ser acompanhadas
posteriormente, por ser um espaço ainda em estruturação e com alterações
contínuas em sua composição e funcionamento. Entretanto, houve uma
interrupção neste acompanhamento entre o período de outubro de 2005 e
setembro de 2006, devido ao estágio sanduíche realizado no Institute of
Development Studies at the University of Sussex IDS, na Inglaterra. Assim, a
continuidade do acompanhamento das atividades desse espaço, perdurou de
outubro de 2006 a março de 2007.
3.3.1 Entrevistas semi-estruturadas e estruturadas
No momento da escolha das entrevistas como a principal cnica de
pesquisa, foram observadas questões levantadas por vários autores. Michelat
(1980, p.193-196) levanta que a entrevista é favorecida por permitir a emergência
de um conteúdo sócio-afetivo, pois “[...] o que é apenas intelectualizado, o que não
é assumido afetivamente pela personalidade tem apenas uma significação fraca e
42
uma relação reduzida com os comportamentos dos indivíduos.” (p.194). Assim,
segundo o autor:
[...] a partir do discurso das pessoas entrevistadas que exprime a
relação delas com o objeto social do qual lhes pedem que fale, o
objetivo é passar pelo que de mais psicológico, de mais
individual, de mais afetivo, para atingir o que é sociológico, o que é
cultural. (p.196).
Segundo Selltiz et al. (1971, p. 265), a entrevista e o questionário foram
criados para dar conta sobre “[...] as percepções, sentimentos, crenças,
motivações, previsões, planos ou comportamento passado ou íntimo da pessoa
que, por sua natureza, dificultam ou impedem a sua apreensão apenas pela
observação [...]”. Isto é, utiliza-se a resposta do indivíduo para, a partir de seu
comportamento individual, interpretar o comportamento social.
Robert Farr (1982), citado por Gaskell (2002, p. 65), afirma que a entrevista
qualitativa é “[...] essencialmente uma técnica, ou método, para estabelecer ou
descobrir que existem perspectivas, ou pontos de vista sobre os fatos, além
daqueles da pessoa que inicia a entrevista.”
Gaskell (2002, p. 65) complementa, afirmando que toda pesquisa com
entrevistas é um processo social, uma interação ou um empreendimento
cooperativo, em que as palavras são o meio principal de troca. Não é apenas um
processo de informação de mão única passando do entrevistado para o
entrevistador. Ao contrário, ela “[...] é uma interação, uma troca de idéias e de
significados, em que várias realidades e percepções são exploradas e
desenvolvidas.” Com respeito a isso, tanto o entrevistado como o entrevistador
estão, de maneiras diferentes, envolvidos na produção de conhecimento. Quando
nós lidamos com sentidos e sentimentos sobre o mundo e sobre os
acontecimentos, existem diferentes realidades possíveis, dependendo da situação
e da natureza da interação. Deste modo, “A entrevista é uma tarefa comum, uma
partilha, uma negociação de realidades.”
Segundo Richardson et al. (1985, p. 161, grifo do autor) o termo entrevista é
construído a partir de duas palavras, entre e vista.
Vista refere-se ao ato de ver, ter preocupação de algo. Entre
indica a relação de lugar ou estado no espaço que separa duas
43
pessoas ou coisas. Portanto, o termo entrevista refere-se ao ato de
perceber realizado entre duas pessoas.”
Assim, através das entrevistas, buscou-se obter informações contidas nas
respostas dos atores sociais, enquanto sujeitos-objeto da pesquisa por
vivenciarem a realidade que está sendo focalizada.
Segundo Cruz Neto (1995), num primeiro nível, essa técnica se caracteriza
por uma comunicação verbal que reforça a importância da linguagem e do
significado da fala. num outro nível, serve como um meio de coleta de
informações sobre um determinado tema científico. Através desse procedimento,
podemos obter dados objetivos e subjetivos, estes últimos relacionados aos
valores, às atitudes e às opiniões dos sujeitos entrevistados.
Assim, o emprego da entrevista para mapear e compreender o mundo da
vida dos entrevistados é o ponto de entrada para se introduzir esquemas
interpretativos para compreender as narrativas dos atores em termos mais
conceituais e abstratos, muitas vezes em relação a outras observações. A
entrevista fornecerá os dados básicos para o desenvolvimento e a análise das
relações entre os atores sociais e sua situação. O objetivo é uma compreensão
detalhada das crenças, atitudes, valores e motivações, em relação aos distintos
comportamentos dos representantes nos espaços institucionais de participação
social. Além de desempenhar um papel vital na combinação com os outros
instrumentos de pesquisa.
O estudo se apoiou principalmente na entrevista semi-estruturada ou semi-
diretiva, aquela que parte de certos questionamentos básicos, apoiados em teorias
e hipóteses, que interessam à pesquisa, e que, em seguida, oferece amplo campo
de interrogativas, fruto de novas hipóteses que vão surgindo à medida que se
recebem as respostas dos informantes (TRIVIÑOS, 1995). Mas, também contou
com algumas informações objetivas conseguidas através da entrevista estruturada
ou diretiva.
A entrevista semi-estruturada ou semi-diretiva é descrita por Ghiglione e
Matalon (1997, p. 83-84) como um tipo de entrevista em que existe um esquema
de temas. Porém, a ordem e a forma pela qual os temas podem ser abordados é
44
livre e, caso o entrevistado não aborde alguns destes espontaneamente, o
entrevistador deve propor-lhe o tema faltante.
As entrevistas sobre as trajetórias dos representantes e o processo de
representação foram realizadas com 7 representantes dos agricultores familiares
do CMDR de Itapejara d’Oeste, 7 representantes do CMDR de Vitorino e 5
representantes do GGETESPA, sendo que um destes últimos também foi
entrevistado sobre a sua atuação em um dos CMDR, pois este é componente dos
dois espaços. O roteiro destas entrevistas pode ser observado no Apêndice A.
Sobre as trajetórias associativas dos municípios e território e sobre os
espaços institucionais de participação social foram entrevistados 3 pessoas em
Itapejara d’Oeste, 2 pessoas em Vitorino e 3 pessoas que explanaram sobre o
território Sudoeste. Os entrevistados foram lideranças dos agricultores familiares e
técnicos que acompanharam estas trajetórias por atuarem nos municípios e
território por muitos anos. Estas entrevistas foram realizadas a partir dos roteiros
apresentados no Apêndice B e C.
A seleção das instituições e pessoas a serem entrevistadas foi realizada
após a reunião de várias indicações de pessoas que conhecem este público
(inclusive os próprios agricultores), obedecendo ao critério de diversificação de
atividades e concepções.
Ao utilizar as entrevistas, as iniciais dos nomes dos entrevistados serão
alterados para garantir o sigilo assegurado a estes no momento da entrevista.
A pesquisa empírica foi realizada com a clareza de que é preciso ter a
noção exata dos objetivos do estudo para a definição de quantos e quem seriam
os entrevistados. De qualquer forma, foi necessário tomar algumas decisões entre
os benefícios de se entrevistar determinados indivíduos ou segmentos e os custos
de ignorar outros. Segundo Gaskell (2002, p.70) “[...] para tais escolhas, é
indispensável uma imaginação social científica, pois não existem respostas
corretas.”
45
3.3.2 Observação livre
A observação foi utilizada para colocar em relevo a existência de algum ou
alguns traços específicos do fenômeno que está em estudo. Para tal foram
utilizadas as anotações de campo, com as observações e reflexões que
realizamos sobre expressões verbais e ações dos sujeitos, descrevendo-as,
primeiro, e fazendo comentários críticos, em seguida, sobre as mesmas.
Em todos os momentos, a observação foi um instrumento presente: durante
as entrevistas, nas reuniões, eventos, oficinas, enfim, no decorrer de toda a
pesquisa.
Além disso, foram utilizados registros através de fotografias, pois o registro
visual amplia o conhecimento do estudo porque nos proporciona documentar
momentos ou situações que ilustram o cotidiano vivenciado.
3.3.3 Análise dos documentos
Os dados também foram obtidos através da pesquisa em bibliografias e
documentos das instituições presentes no território, entre outros.
3.4 Organização e análise dos dados
A análise dos dados foi operacionalizada através dos passos propostos por
Minayo (1992) citado por Gomes (1995, p.78-79):
46
3.4.1 Ordenação dos dados
Nesta fase foi feito um mapeamento de todos os dados obtidos no trabalho
de campo, como a minuta e transcrição de gravações, releitura do material,
organização dos relatos, dos dados obtidos através da observação e dos dados
secundários.
3.4.2 Classificação dos dados
Neste momento é importante ter em mente que o dado não existe por si só.
Ele é construído a partir de um questionamento que fazemos sobre eles, com
base numa fundamentação teórica. Através de uma leitura exaustiva e repetida
dos textos, foi estabelecido interrogações para se identificar o que surge de
relevante. Com base no que é relevante nos textos, foram elaboradas as
categorias específicas e a montagem das matrizes de análise.
A geração de matrizes de análise foi realizada para se identificar e analisar:
a) a capacidade de intervenção dos representantes, na qual se verificará as
diferenças em termos de participação tanto quantitativa (por exemplo: freqüência,
uso da palavra) quanto qualitativa (por exemplo: argumentação, proposição,
articulação) e; b) a representatividade dos representantes, verificando as
diferenças nas relações entre representantes e representados, tanto em termos da
escolha dos representantes quanto ao acompanhamento da sua atuação.
47
3.4.3 Análise final
Nesta fase, procurou-se estabelecer articulações entre os dados e os
referenciais teóricos da pesquisa, respondendo às questões da pesquisa com
base em seus objetivos.
A análise será centrada nos três componentes da representação: os
representantes, os representados e os espaços institucionais de participação
social.
48
4 OS CAMINHOS DA PARTICIPAÇÃO ATRAVÉS DA REPRESENTAÇÃO
Os espaços institucionais de participação social são oriundos do
reconhecimento de que a concepção tradicional de gestão burocrática advoga
uma solução homogeneizante, sem a busca da criatividade e do conhecimento do
conjunto de informações envolvidos na gestão para todos os problemas
encontrados em qualquer nivel da jurisdição. Assim, a necessidade de buscar
alternativas que propiciem soluções plurais oriundas de gestões descentralizadas
que consigam agregar a participação dos atores sociais no planejamento e
execução de políticas (SANTOS; AVRITZER, 2002). Na busca dessas
alternativas, surgem novos arranjos institucionais como os espaços institucionais
de participação social, entretanto os teóricos e propositores destes espaços têm
prestado pouca atenção às transformações da representação, não dando atenção
aos atores da sociedade civil que estão realizando funções de representação
política, mesmo quando os espaços determinam juridicamente o papel de
representante a estes atores (LAVALLE; HOUTZAGER; CASTELLO, 2006).
Isto proporciona uma lacuna de análises sobre a representação política
nestes novos espaços institucionais, pois um acúmulo sobre a representação
política eleitoral e sobre a participação direta, mas pouco existe em termos de
instrumentos teóricos para lidar com uma forma de representação distinta da
eleitoral e que, ao mesmo tempo, não é uma democracia direta.
Assim, a discussão sobre a representação nos espaços institucionais de
participação social é diferenciada da forma original, elitista ou schumpteriana do
debate sobre democracia representativa, na qual o cidadão comum não tinha
capacidade ou interesse político para tomar decisões por si próprios, tendo
condições apenas para eleger líderes para fazê-lo por eles, ou de outras vertentes
que estudam a representação política eleitoral, pois as informações oriundas
destas visões são dissonantes ou insuficientes para este caso. Para tal, haverá a
necessidade de buscar outras referências para dar consistência à análise do tema
49
deste estudo, seguindo próxima à democracia participativa
1
(PATEMAN, 1970),
democracia deliberativa (BOHMAN; REHG, 1997), democracia associativa
(COHEN; ROGERS, 1995) e outras contribuições, isto é, utilizando a democracia
representativa como proposto por Pereira (2005, p. 89), “[...] num sentido mais
amplo, como alternativa à democracia direta.”
Assim para a discussão sobre o processo de representação em espaços
institucionais de participação social serão utilizados as contribuições da
democracia representativa e outras oriundas de diferentes fontes, quando estas
forem aplicáveis e importantes para a temática deste estudo.
Para dar a base de sustentação a esta construcão teórica e analítica sobre
o tema da representação em espaços intitucionais de participação social, iniciar-
se-á pela construção do conceito de representação que é estruturado a partir da
inestimável contribuição de Hanna Fenichel Pitkin. Com isto, iniciar-se-á
discorrendo sobre a visão desta autora sobre o processo de consolidação deste
termo, da qual destacar-se-á algumas concepções sobre a representação, que
serão muito úteis para este estudo.
4.1 A consolidação do termo “representação”
Apesar da tendência de muitos de imaginar que o conceito de
representação teria o seu berço na Grecia, isto não é real, pois, embora os gregos
tivessem várias instituições e práticas as quais se poderia aplicar a palavra
“representação”, eles não tinham uma palavra ou conceito correspondente. Isto se
deve ao modo grego de pensar sobre estas atividades, que não as englobava sob
um único conceito. Assim, as palavras com as quais estes designavam estas
1
Mesmo tendo claro, que participação é auto-apresentação, enquanto representação remete ao
ato de tornar presente por intermédio de outro, algo ou alguém ausente (PITKIN, 1967; LAVALLE;
HOUTZAGER; CASTELLO, 2006).
50
atividades não se traduzem pelo conceito de representacão (PITKIN, 2006, 1979,
1967).
O termo é de origem latina, embora também em latim o seu significado
original não tivesse a ver com qualquer instituição da vida romana que se poderia
considerar como exemplo próximo ao significado atual de “representação”. No
latim clássico, representare significava “fazer presente, manifestar ou apresentar
pela segunda vez e, se referia, quase que exclusivamente, a objetos inanimados”
(PITKIN, 1979, p. 8). Assim, esta palavra significava tornar algo literalmente
presente, trazê-lo à presença de alguém. O que poderia descrever a apresentação
de alguém à corte em resposta a uma convocação. Significava, também, uma
idéia manifesta em um objeto ou a substituição de um objeto por outro ou a
antecipação de um evento, trazendo-o para o presente. Mas, a palavra
representare não tinha a menor relação com a idéia de pessoas representarem
outras pessoas ou o Estado romano, assim esta idéia não correspondia a nada
parecido com o atual conceito de representação (PITKIN, 2006, 1979, 1967).
Na Idade Média, a palavra representare estendeu-se gradualmente pela
literatura religiosa cris para se referir a um tipo de encarnação mística “[...]
aplicada à comunidade cristã em seus aspectos mais incorpóreos.” (LAGARDE,
1937, p.429 citado por PITKIN, 2006, p. 18). No século XIII e no início do século
XIV, o papa e os cardeais eram considerados os representantes de Cristo e dos
Apóstolos, não como seus agentes, mas como sua imagem e encarnação, sua
reincorporação mística. Neste mesmo período, os juristas começaram a utilizar o
termo para personificar coletividades: uma comunidade deveria ser vista como
uma pessoa, apesar de não ser um ser humano. Resultando, no uso da noção de
que o porta-voz de uma comunidade era sua corporificação, o portador de sua
condição de pessoa representativa. Os príncipes e imperadores passaram a ser
considerados como aqueles que atuam pelo povo, ocupam seu lugar, cuidam de
seu bem estar, enfim, representam o seu reino (PITKIN, 2006, 1979, 1967).
Nesse período ocorreu o surgimento das primeiras instituições de
representação política em muitas partes da Europa. Os reis e papas começaram a
aumentar os seus conselhos consultivos, incluindo pessoas enviadas das diversas
51
regiões de seus domínios. Entretanto, nesse período, essa prática não tinha um
sentido democrático, a presença nos conselhos não era um direito, era um dever
que convinha aos reis e aos mandatários da Igreja. Na Inglaterra, onde a
convocação dos burgueses e cavaleiros para se reunirem com o rei e o Conselho
dos Lordes começou por uma questão de conveniência e necessidade do rei,
longe de ser um privilégio ou direito, atender ao Parlamento era uma tarefa e uma
obrigação relutantemente aceita. O Parlamento não era visto como um espaço
para fazer leis, funcionando meramente como um tribunal supremo que descobria
e aplicava a lei tradicional aos casos particulares. Os membros da Câmara dos
Comuns, que eram convocados a comparecer no Parlamento, não só tinham que
levar o relatório dos casos locais à Corte Suprema, como tinham que ratificar a
imposição real de impostos especiais e, além disso, levavam os proclamas de
volta às suas comunidades. O “consentimento” comunitário aos impostos era uma
formalidade administrativa bastante conveniente politicamente (PITKIN,1979,
1967).
Entretanto, com a passagem do tempo, tanto as idéias como a práticas
começaram a evoluir. O consentimento comunal aos impostos estabeleceu
relações com a doutrina do Direito romano de que todos os grupos que têm algum
interesse numa demanda civil têm o direito de participar ou, pelo menos, de estar
presente no julgamento desta. Sendo assim, os cavaleiros e burgueses
começaram a serem usados pelas comunidades como um meio de apresentar
queixas ao rei, no qual estes utilizavam-se da ameaça de não consentir com os
impostos para obrigar o rei a considerar estas petições. Gradualmente,
reconheceu-se que este membro poderia promover o interesse de sua
comunidade, assim, os cavaleiros e burgueses começaram a ser considerados
como servidores ou agentes de suas comunidades e como eram pagos pela
população destas comunidades, podiam ser solicitados a prestar contas. Assim,
eles tinham autoridade para comprometer suas comunidades, mas
frequentemente, havia limites específicos para esta autoridade (PITKIN, 1967).
A partir do século XIV foi se desenvolvendo cada vez mais a atuação
unificada de cavaleiros e burgueses, que após a descoberta de que eles tinham
52
muitas reivindicações em comum, começaram a apresentar petições em conjunto.
Eles passaram a ser considerados “membros” do parlamento. Assim, como os
parlamentos duravam mais e os membros podiam ser reeleitos, estes passaram a
conhecer melhor uns aos outros e trabalharem cada vez mais como uma
corporação com forças para se oporem ao rei. Este processo culminou, no século
XVII, na guerra civil inglesa, quando, pela primeira vez, o Parlamento afastou e
executou um rei e passou a governar sem ele (PITKIN, 1967).
Durante o período entre os séculos XIV e XVII gradualmente foi surgindo a
idéia de que cada membro do parlamento, apesar de ter sido eleito por seu
condado ou comunidade, deveria atuar para a nação como um todo. Esta visão
uniu-se a duas outras tradições de pensamento. A primeira, citada
anteriormente, segundo a qual as partes que têm direitos legais em jogo numa
ação judicial têm direito a estar presentes ou ao menos serem consultadas na
decisão da ação. A segunda, era a de que toda a nação estava, de alguma forma,
encarnada em seu governante, assim como a Igreja estava encarnada em Cristo
ou no papa, depois dEle. Segundo Gierke (1913, parte 2, cap. 4 citado por PITKIN,
2006, p. 25) “[...] esta é uma concepção medieval e mística: o rei não é apenas a
cabeça do corpo da nação, nem apenas o proprietário de todo o reino; ele é a
coroa, o reino, a nação.”
Assim, a noção da palavra latina representare passou gradualmente a
incorporar este conjunto de significados. O parlamento era visto como a
encarnação de todo o reino e todos os que viviam no reino deveriam ser
considerados presentes no parlamento. Os lordes, os bispos e o próprio rei
estavam presentes em pessoa; os “comuns” como um todo estavam presentes por
meio de seu grupo de procuradores. Desta forma, a concepção era de que todo
cavaleiro ou burguês atuava em nome de todas as pessoas comuns e tendo como
objetivo todo o reino (PITKIN, 2006).
Uma das primeiras obras que utilizou a palavra inglesa represent aplicada
ao parlamento, foi o livro “De Republica Anglorum” de Sir Thomas Smith concluído
em 1564, mas publicado apenas em 1583. O autor utilizou a palavra apenas uma
vez, mas o fez num ponto crucial, quando escreve:
53
[...] o parlamento da Inglaterra representa e tem o poder de todo o
reino, tanto a cabeça quanto o corpo. Pois entende-se que o inglês
está presente ali, seja em pessoa, seja por procuração ou por meio
de delegados […] e o consentimento do parlamento é considerado
como o consentimento de todos os homens. (SMITH, 1906, p. 49
citado por PITKIN, 2006, p.26).
Smith não aplicou a palavra aos membros do parlamento em particular,
como outros autores, ele a utilizou apenas quando se refere ao parlamento como
um todo, pois é este que representa todo o reino.
Durante o período que antecedeu, acompanhou e sucedeu à guerra civil
inglesa, marcado por amplo debate e panfletagem, “[...] houve um súbito
florescimento de termos cognatos de ‘representar’, os quais se tornaram conceitos
políticos [...](PITKIN, 1979, p. 10), mas não ficaram confinados à política. Depois
da obra de Smith até a Revolução Gloriosa, em 1688, a família “represent-“ foi
enriquecida com novos termos e novos significados para palavras que já existiam.
Segundo a autora, muitos destes termos e significados não foram mantidos no
inglês moderno, sendo que alguns não chegaram a perdurar até o final do século
XVII. Entretanto, “[...] a politização da idéia de representação parece ter ocorrido
contra o pano de fundo da expansão geral e da fluidez desta região conceitual.”
(PITKIN, 2006, p. 27).
Nesse período ocorreu a transição do significado “pôr-se em lugar de outro”
para “atuar para outros”. Aparentemente, os termos eram utilizados como uma
expressão ou demanda de autoridade, poder e prestígio. Em nenhum escrito deste
período as palavras da família “represent-“ eram usadas para expressar o sentido
da relação de um membro do parlamento com sua base, mesmo existindo a idéia
de que os membros do parlamento o agentes de sua comunidade, esta não era
expressa pelo termo “representação”.
A mais antiga aplicação encontrada por Pitkin para o substantivo
“representante“ a um membro do parlamento foi de Isaac Pennington em 1651,
quando este escreveu: “O direito fundamental, segurança e liberdade do Povo;
que radica no próprio Povo, e de forma derivada no parlamento, nos substitutos ou
nos representantes do povo.” (CHISHOLM, 1910-11, p.109 citado por PITKIN,
2006, p.28). Segundo a autora, nesse período o termo foi utilizado com este
54
sentido com frequência crescente até que finalmente este se tornou o principal
significado do substantivo e vários termos alternativos se tornaram obsoletos.
Entretanto, até esse momento não havia nenhuma citação que introduzisse
alguma preocupação com os representados, isto é, se os representados
legitimavam esta representação.
A partir do momento em que a palavra “representação” assumiu esse
significado aplicado por Sir Thomas Smith e Isaac Pennigton, começaram a surgir
as nuances do entendimento do processo nomeado por este termo, isto é, as
diferentes concepções do termo. Estas diferentes concepções auxiliarão na
análise das dimensões representatividade e capacidade de representação dos
agricultores familiares, pois nos apresentam as diversas facetas da representação.
4.2 O significado da representação: diferentes concepções
No mesmo ano em que Pennington descreveu os membros do parlamento
como representantes, em 1651, o filósofo inglês Thomas Hobbes publicou seu
livro “O Leviatã”. Este foi o último de seu três livros sobre teoria política com
temáticas bastante próximas, mas apenas neste, ele introduziu a representação. A
análise sobre representação de Hobbes iniciou com a noção de pessoa, passou
pela distinção entre pessoas naturais e artificiais e, finalmente, classificou o
representante como um tipo de pessoa artificial.
Para Hobbes,
“[...] uma pessoa é aquela, cujas palavras e ações são
consideradas como suas próprias ou como representativas das
palavras e ações de uma outra pessoa, ou de qualquer outra
coisa, para quem elas são atribuídas, quer elas sejam verdadeiras
ou ficção.” (PITKIN, 1967, p. 15, tradução nossa).
Assim, o autor apontou uma pessoa natural como aquela cuja palavras e ações
são consideradas dela mesma e pessoa artificial como aquela cuja palavras e
ações são consideradas como de outras. Estas pessoas artificiais eram os
representantes.
55
Assim, um representante era uma pessoa que agia em nome de outra,
alguém a quem foi dada autoridade para agir pelo outro, de modo que qualquer
coisa que esta fizesse era considerada ação do representado. O primeiro agia e o
segundo assumia a responsabilidade pelas conseqüências, como se ele próprio
tivesse agido. A representação podia ser “limitada” tanto no tempo como no
alcance, na qual eram autorizadas apenas determinadas ações sob restrições
específicas. Ou podia ser “ilimitada”, como aquela possuída pelos soberanos, com
a qual eles podiam agir por outros para sempre e em todas as circunstâncias.
Hobbes não questionava os diferentes tipos de governo, apenas explicava a
natureza da soberania, pois para ele “todo governo é um governo representativo”
(PITKIN, 1979, p. 13). Assim, constantemente, ele sugeria que o soberano faria o
que se esperava que os representantes fizessem, não apenas o que o
satisfizesse, desta forma, o autor não deixava abertura para a crítica ou
resistência ao soberano por ele não representar os seus súditos como ele deveria.
Na concepção de Hobbes “não existia o não representar como se deveria”, isto é,
não se questionava a representatividade do soberano perante os seus
representados.
Esta forma de ver a representação, na qual o representante é alguém que
tem autorização para atuar, enquanto o representado se torna responsável pelas
conseqüências desta ação como se ele tivesse agido pessoalmente, recebe de
Pitkin (1967) o nome de “concepção da autorização”. Esta concepção é fortemente
distorcida em favor do representante, que tem os seus direitos ampliados e suas
responsabilidades decrescidas, enquanto, os representados adquirem novas
responsabilidades e perdem muitos de seus direitos. A concepção da autorização
se sustenta sobre as formalidades de suas relações, assim, a autora também a
denomina de “concepção formalística”, que define a representação em termos de
uma transação que tem lugar antes da atual representação começar.
56
4.2.1 A concepção formalística: atuando por você
A “concepção formalística” é compartilhada por três versões de teóricos
políticos: uma desenvolvida por uma sucessão de teóricos alemães, geralmente,
centrado no conceito de Organschaft; uma segunda que leva em conta um
governo democrático representativo e uma terceira articulada no trabalho de Eric
Voegelin (PITKIN, 1967).
Considerando a primeira versão, a doutrina do Organschaf tem suas raízes
na Revolução Francesa e aparece em alguns estudos do século XIX e XX. O
autor mais conhecido destes teóricos alemães é Max Weber, apesar deste não
utilizar o termo Organschaft. Weber entende a representação “[...] como uma
conjuntura na qual a ação de certos membros de um grupo é atribuído ao restante;
ou que o restante estão supostamente, e de fato o fazem, considerando a ação
como legitimada por eles mesmos e obrigatoriamente deles.” (PITKIN, 1967, p. 39,
tradução nossa). Para Weber a verdadeira representação somente existe onde
certos membros selecionados tem autoridade para atuar para o grupo, mas outros
membros não podem, pois para ele, quando as ações de cada membro são
atribuídas a todos, isto não é representação, é solidariedade
2
.
Os argumentos de Weber são muito próximos dos outros teóricos deste
grupo, para os quais Organschaft é a forma mais desenvolvida de representação,
quando somente certos membros podem atuar pelo grupo. Gierke e Jellinek
argumentam que um representante é o orgão especializado de um grupo. A
preocupação destes autores com a soberania e as posições legais dos agentes
governamentais, faz com que, nesta concepção, todos os funcionários públicos e
todos os órgãos do Estado sejam considerados representantes. Desta forma, a
representação é necessária em qualquer sociedade complexa, pois um grupo
precisa de serviços realizados para ele, que só pode ser feito pela ação de
indivíduos. Não é preciso ser um teórico da Organschaf para ver que “[...] alguma
2
Pitkin retira estas contribuições de Weber, principalmente da obra Wirtschaft und Gesellschaft
(Tübingen: J.C.B. Mohr, 1956), que foi escrito entre 1911 e 1913.
57
forma de representação parece ser necessária em qualquer grupo social cuja
decisão precisa ser cumprida por indivíduos particulares.” (PITKIN,1967, p.40,
tradução nossa). Nesse sentido, qualquer pessoa que realiza uma função para o
grupo pode parecer ser seu representante, por suas ações poderem ser atribuídas
para o grupo e serem obrigatoriamente deste. Obviamente, os representantes
definidos desta maneira o precisam ser eleitos para atuarem. A forma como
eles são eleitos é irrelevante contanto que eles se tornem orgãos de um grupo.
Neste ponto, estes teóricos encontram um problema muito similar às
dificuldades encontradas no argumento de Hobbes. Todos os oficiais
governamentais são chamados de representantes, assim, dada a definição da
autorização e apesar de alguns autores tentarem alguma resposta, não como
fazer a distinção se os representantes eleitos são mais ou menos representativos
que outros oficiais (PITKIN, 1967).
Esta é a principal diferença destes com a segunda versão, pois para os
teóricos da democracia representativa que trabalham sob a perspectiva da
concepção da autorização, o critério crucial é a eleição, que garante a autorização
dos votantes para o eleito. Geralmente, esta concessão de autoridade é limitada
pelo tempo, assim, esta termina quando chega o momento de uma nova eleição,
mas, a definição de representação destes teóricos não requer que esta autoridade
seja dada somente por um limitado período de tempo ou que as eleições sejam
feitas regularmente. Segundo Pitkin (1967, p. 43-44, tradução nossa) “[...] nenhum
dos escritos objetivam esta questão, embora nenhum deles aceitassem uma
ditadura de uma vida como um governo representativo.”
A terceira versão da concepção de autorização ou formalística é dada por
Eric Voegelin em sua obra New Science of Politics”, o qual propõe três noções de
representação. A primeira é a representação descritiva, que é apresentada como
aquela representação elementar, de um legislador ou executivo eleito, semelhante
a aquela descrita como governo representativo.
Como ele considera que é necessário ir além deste nivel elementar, ele
apresenta um segundo tipo de representação, que ele chama de existencial. Neste
tipo de representação, a autoridade da liderança emerge apenas gradualmente,
58
quando a sociedade se diferencia e se organiza para a ação. Tal representação
não requer eleição e como a noção de Hobbes, esta é baseada na ação social. ”A
sociedade pode existir como sociedade apenas quando esta tem um
representante para atuar por ela.” (PITKIN, 1967, p. 45, tradução nossa). Assim,
numa discussão que se aproxima da argumentação de Bourdieu
3
sobre o porta-
voz, Vogelin aponta que quando o grupo não tem atuação, ele cessa de existir
enquanto grupo, então, este grupo não precisa de um representante. Isto é, um
representante que não pode atuar, não pode ser considerado como tal.
Entretanto, Voegelin sente a necessidade de ir além da concepção da
autorização, assim, ele aponta a existência de um tipo transcedental de
representação, na qual o representante autorizado de uma sociedade é efetivo no
seu papel somente se ele representa a verdade ou a ordem transcedente
apropriada para aquela sociedade, isto é, de acordo com a idéia básica diretiva
deste grupo (PITKIN, 1967).
Assim, percebe-se que Voegelin visualiza a validade da concepção da
autorização, mas também percebe algumas de suas deficiências,
complementando isto com um tipo de representação conformada com alguns
limites e padrões externos que não existe na concepção de Hobbes. Mas,
Voegelin não relaciona as várias definições uma com a outra, ele não explica
como um simples conceito pode ter várias definições aparentemente
incompatíveis, mesmo que corretas.
Para finalizar a apresentação da concepção formalística, Pitkin (1967)
apresenta uma concepção a qual ela nomeia como “concepção da
responsabilização social”
4
. Esta, apesar de não contribuir muito com a teoria da
representação por não ter nenhum estudo mais sistematizado teoricamente,
auxilia na análise do significado da representação. Para os teóricos deste grupo,
um representante é aquele que deve prestar contas, que terá que responder à
3
A argumentação de Bourdieu será detalhado mais a frente.
4
Termo encontrado em Pereira (2005), que será utilizado em português no mesmo sentido da
palvra em inglês “accountability”. Sendo que alguns autores preferem o termo “controle social”,
como Coelho, Andrade e Montoya (2002).
59
pessoa (ou pessoas) a quem ele representa, por aquilo que ele faz. Assim, ao
contrário da concepção de autorização, para estes teóricos o representante é que
deve ter responsabilidade com o representado.
Para Manin, Przeworski e Stokes (1999a) a concepção de representação
por responsabilização social ocorre quando os eleitores votam para a manutenção
dos representantes que agem em favor dos interesses daqueles que o elegeram
e, para isto ocorrer, o representante escolhe políticas que garantam a sua
reeleição. Entretanto, geralmente, a informação é assimétrica em ambos os
sentidos, isto é, a comunicação o garante todas as informações necessárias e
muitas vezes estas chegam aos representantes e representados bastante
distorcidas: os representados não se sentem seguros acerca das condições sob
as quais os representantes discutem e aprovam e/ou elaboram políticas e os
representantes não tem segurança sobre o que poderia satisfazer os
representados. Assim, isto faz com que a responsabilização social não seja
suficiente para induzir a um processo de representação mais legítimo.
Finalmente, pode-se dizer que a concepção formalística parece explicar
alguns usos dos termos “representação” e “representante”, mas não conta de
outros termos como representatividade ou como o processo de representação
ocorre durante a atuação do representante. As concepções da autorização e da
responsabilização social concentram-se fora da atividade propriamente dita, a
primeira antes dela começar e a segunda, após o seu término, pois o ato de
representar começa depois da autorização e antes da responsabilização social.
Segundo Pitkin (1967) para superar estas questões formais e penetrar no
significado da representação, pode-se tomar duas direções: perguntar o que um
representante faz, o que constitui a atividade de representação ou o que um
representante é, como ele deve ser para representar. Estas são questões que
serão discutidas nos próximos segmentos.
60
4.2.2 Representação descritiva: atuando como você
Na aproximação “descritiva” do conceito de representação, a representação
depende das características do representante, o que ele é ou ele se parece. Mais
no sentido de ser alguma coisa do que fazer alguma coisa. O representante não
atua pelos outros, ele os representa por virtude de uma correspondência ou
conexão entre eles, uma semelhança ou reflexão. Preocupa-se mais com como o
grupo de representantes é composto e menos com o que eles fazem, pois para
eles, a composição do grupo determina as suas atividades (PITKIN, 1967).
As maiores contribuições desta visão foram desenvolvidas pelos defensores
da “representação proporcional”. O princípio fundamental destes, é assegurar que
uma assembléia representantiva seja o reflexo mais ou menos exato das várias
divisões do eleitorado, para esta refletir a opinião geral dos representados
(PITKIN, 1967).
Thomas Hare argumenta que uma “[...] representação perfeita é
evidentemente inconsistente com a exclusão das minorias, por isso a
correspondência precisa ser acurada. (HARE, 1873, p. xxix citado por PITKIN,
1967, p. 63, tradução nossa). John Stuart Mill destaca que “Um corpo
representativo, é uma arena na qual cada opinião no todo pode trazer ela própria,
toda a luz, isto é, a total clareza de uma questão.” (MILL, 1947, p. 260 citado por
PITKIN, 1967, p. 63, tradução nossa). Assim para estes autores, embora as
decisões precisem ser tomadas pela regra da maioria, as minorias têm que ter o
direito da representação, o direto de ser ouvido.
Para os proporcionalistas, a representação é uma coisa e governo é outra.
O direito de representação não pode ser confundido com o direito de decisão. A
regra da maioria é aplicada como um instrumento de ação e não um instrumento
de representação. Os críticos dizem que os proporcionalistas estão tão
preocupados com a composição da legislatura, que esquecem a importância das
atividades dos governos, pois, a representação proporcional pode tornar as
atividades do governo impossíveis, na medida em que esta atomiza opiniões,
61
multiplica os grupos políticos, aumenta a violência das facções e impede a
formação de uma maioria estável e impede a legislatura de governar, tornando-a
passiva. Assim, como a legislatura também precisa dar suporte a um governo
estável, o proporcionalismo assegura uma representação adequada, mas somente
ao custo do enfraquecimento do governo (PITKIN, 1967).
Alguns autores apontam que uma forma de se obter uma legislatura que
seria uma amostra representativa da coletividade, seria a condução de um
processo de seleção aleatório, calculado para produzir o microcosmo do corpo
total de uma população. Esta idéia muito próxima à técnica de pesquisa científica,
referida como representação por amostra.
Pitkin (1967) apresenta a visão de Marie Collins Swabey, que ela mesma
diz ter dúvida se é uma interpretação da outra autora de como a democracia
eletiva funciona ou a visão desta de como o processo deveria ser pensado em
busca de uma representação por amostra. Segundo Swabey (1937 citado por
PITKIN, 1967) o princípio de amostragem é exposto em três níveis no governo
representativo. Primeiro, os votantes estão sendo considerados uma amostra de
toda a população. Segundo, a maioria dos votantes estão sendo tomados como
uma amostra de todos os votantes. Terceiro, os oficiais públicos que são eleitos
estão sendo considerados como uma amostra da nação.
Além do fato de que nem mesmo a mais perfeita réplica em miniatura não
consegue duplicar todas as características do original, isto é, nem mesmo uma
amostra matematicamente representativa pode resultar na representação de todas
as nuances de uma população, esta visão desconsidera algumas questões, tais
como, que nem todos os cidadãos são politicamente ativos e nem têm as mesmas
oportunidades de atuar. Além disso, Pitkin (1967) aponta que esta última
perspectiva o é um modelo para entender a representação política, porque ela
envolve apenas parte do que significa representar, no sentido restrito de dar
informações, assim, o representante precisa apenas refletir seus representados de
forma mais acuradamente possível. Não se espera que ele tenha liderança,
iniciativa ou ão criativa, pois não se espera que um representante dê novas
62
opiniões para os seus representados, mas apenas expresse as opiniões que ele já
tenha sobre determinados assuntos.
Manin, Przeworski e Stokes (1999a) concordam com a problematização de
Pitkin e complementam apontando que uma dificuldade desta visão, é que
enquanto a assembléia pode refletir os interesses proporcionalmente, muitas
decisões vinculadas ao governo não permitem distribuições proporcionais. Muitas
decisões refletem o prevalecimento da maioria, significando que uma minoria
perde. Assim, a proporcionalidade poderia permitir que todas as vozes fossem
ouvidas, mas isto não garantiria que todos os interesses seriam acomodados
proporcionalmente.
Williams (1998, p. 28, tradução nossa) complementa argumentando que
“Claramente, mais na representação política do que mera similaridade com os
seus representados.” As atividades de um representante vão além da visão
limitada dos propósitos do governo, o qual requer o exercício de julgamentos
firmes ou pelo menos, astúcia política e habilidade para compreender as
complexidades das políticas públicas. Além disso, “[...] a representação descritiva
parece absurda sem alguma especificação de quais atributos dos cidadãos são
relevantes para os propósitos da tomada de decisão política.” (WILLIAMS, 1998,
p. 28, tradução nossa). Finalizando, a autora argumenta que, se a representação
descritiva é levada literalmente, esta destrói o espaço de mediação entre
representante e representado, tornando sem sentido a distinção entre os dois
papéis e arruinando o merecimento de que a atuação do representante em nome
dos representados tenha o nome de representação (WILLIAMS, 1998).
Segundo Phillips (1996) a preocupação maior não deveria ser quem está
representando, mas quais são as idéias e políticas defendidas por este
representante. Neste sentido, Gould (1996) complementa criticando a idéia de que
os grupos diferenciados somente podem ser representados por aqueles que são
membros do grupo, assim como, afirma que ninguém pode afirmar que qualquer
membro de um grupo pode representar bem todos os membros do grupo.
Entretanto, ambas concordam que o reconhecimento da contribuição da
63
representação de diferentes grupos para o processo democrático seria benéfico
para o todo.
Assim, percebe-se que a preocupacão com “quem é o representante” não
supre as angústias de se buscar uma representação consistente, mas também,
não deixa de ser uma parte importante do processo de representação como um
todo. Neste estudo isto se aplica, quando se visualiza a quase ausência da
participação de jovens e mulheres nos espaços institucionais de participação
social, apesar da presença dos agricultores familiares como um todo, estar
garantida.
4.2.3 Representação simbólica
Os teóricos da simbolização visualizam toda a representação como um tipo
de símbolização, tanto que um representante político é para ser entendido como
um modelo de bandeira representando a nação ou um emblema representando
uma cultura (PITKIN, 1967).
O conceito de um líder político como essencialmente passivo,
representando outros simbolicamente, precisa então ser complementado pela
visão que ele é um fazedor de símbolo (“simbol-maker”), fazendo dele mesmo um
líder aceito através de sua atividade. Mas, esta atividade não é o que
ordinariamente é chamado de representação, e isto não é atuar pelos
representados. Nem é meramente atuação ritual. Antes, este é um tipo de
atividade para fomentar crença, lealdade, satisfação com seus líderes, entre a
população. Representação se torna identificado com liderança efetiva. Desde que
não pode haver justificativa racional da posição do representante simbólico como
líder, a ênfase (como com símbolos) precisa cair sobre os elementos não racionais
ou emotivos da crença e sobre as técnicas de liderança que exploram estes
elementos (PITKIN, 1967). O der cria a unidade de desejos entre seus
seguidores com seus próprios recursos e os faz quererem o que ele quer. Neste
64
sentido, os seguidores é que representam ou refletem os desejos do líder, sendo
assim, se representação, esta é uma representação inversa, na qual, os
seguidores expressam os objetivos e interesses do líder.
O poder simbólico tem sua base na posse do capital simbólico. O poder de
impor sobre outras mentes uma visão, existente ou nova, de divisões sociais
contando com a autoridade social adquirida anteriormente. Capital simbólico é um
crédito, este é o poder concedido para aqueles que obtêm reconhecimento
suficiente para estar em uma posição para impor reconhecimento. Deste modo, o
poder da constituição, o poder de fazer novos grupos por mobilização ou fazendo
este existir por procuração, por falar em nome deles como um orador autorizado,
pode ser obtido somente ao final de um longo processo de institucionalização, ao
final do qual um representante é escolhido e este recebe do grupo o poder de
formar o grupo. “O poder simbólico é o poder de criar coisas com palavras, é o
poder de consagração ou revelação, um poder de dissimular ou revelar coisas as
quais já estão lá.” (BOURDIEU, 1990, p. 137-8, tradução nossa).
Segundo Bourdieu (2004, p.185) a força das idéias do representante ou
porta-voz se mede, principalmente, pela força de mobilização que elas encerram,
quer dizer, pela força do grupo que as reconhece, nem que seja pelo seu silêncio
ou pela ausência de desmentido, o que pode ser manifestado “recolhendo as suas
vozes ou reunindo-as no espaço”. Assim, o capital político é uma forma de capital
simbólico, crédito firmado na crença e no reconhecimento ou, mais precisamente,
nas inúmeras operações de crédito pelas quais os agentes conferem a uma
pessoa os próprios poderes que eles lhes reconhecem. “O poder simbólico é um
poder que aquele que lhe está sujeito dá àquele que o exerce, um crédito com que
ele o credita. É um poder que existe porque aquele que lhe está sujeito crê que ele
existe.” (BOURDIEU, 2004, p. 188).
Além disso, o autor reconhece outro capital, denominado capital pessoal de
notoriedade e de popularidade, que é firmado no fato de ser conhecido e
reconhecido na sua pessoa e, também, no fato de possuir um certo número de
qualificações específicas que são as condições para a aquisição e conservação de
uma boa reputação. É, freqüentemente, produto da reconversão de um capital de
65
notoriedade acumulado em outros domínios
5
que permitem tempo livre e supõem
um certo capital cultural ou um domínio profissional da eloqüência (BOURDIEU,
2004).
O representante que consegue se manter com grande apoio é aquele que
consegue dominar o sentido prático das tomadas de posição possíveis e
impossíveis, prováveis e improváveis para os diferentes ocupantes das diferentes
posições. Isto lhe permite escolher as tomadas de posição convenientes e
convencionadas, e evitar as tomadas de posições comprometedoras que fariam
com que se encontrasse com os ocupantes de posições opostas no espaço do
campo político (BOURDIEU, 2004).
Por isso, alguns pequenos grupos de vanguarda, fundados sobre uma
renúncia à universalidade, capazes de manifestar o seu apego às tradições mais
puras e mais radicais, ficam desprovidos de base e, conseqüentemente, de força.
Assim, o grupo que não quer ver-se excluído do jogo político “[...] não pode
consagrar-se a virtudes tão exclusivas” (BOURDIEU, 2004, p. 184). Isto faz com
que muitos abram mão de algumas crenças, interesses e questionamentos,
construídos nas relações estabelecidas nos espaços sociais constituídos nos
âmbitos locais de moradia ou em outros ambientes, quando iniciam as suas
participações nestes espaços institucionais.
Considerando estas contribuições, utilizar-se-á a concepção simbólica para
fazer a análise da representação dos agricultores familiares nos espaços
institucionais de participação social.
Essa opção se deve ao fato de que muitos dos representantes
componentes destes espaços se consolidaram numa trajetória de construção de
sua liderança e de sua organização, que ocorreu juntamente com o processo de
construção da identidade de agricultor familiar no Brasil. Isto é, construindo
interesses e demandas de um grupo social que começa a tomar consciência
dessa nova identidade grupal, a partir das mobilizações organizadas por essas
5
Coradini (2001, p. 6) aponta esferas como o sindicalismo, redes de relações pessoais, trabalhos
comunitários, religião, relações de vizinhança, relações de identidade étnica, etc. e recursos
sociais como competência profissional, vinculação a sindicatos, exercício anterior de cargos
públicos, valores morais, recortes territoriais, etc.
66
lideranças. Além disso, essa perspectiva viabiliza a análise da representatividade
do processo a partir da legitimação oriuda dos representados.
Apesar da definição da simbolização, como a concepção central de
representação para a análise do processo de representação nos espaços
institucionais de participação social deste estudo, para compreendermos melhor
este processo é importante destacar uma controvérsia existente nos debates
sobre a representação entre os teóricos do “mandato” e da “independência”.
4.2.4 A controvérsia entre mandato e independência
A questão levantada por muitos teóricos é: um representante deveria fazer
o que seu constituinte quer e ser limitado pelos mandos ou instruções oriundas
deles ou ele deveria ser livre para atuar como lhe parecer melhor na busca do
bem estar deles? Esta controvérsia está diretamente relacionada com a nossa
discussão sobre representatividade e capacidade de representação, pois coloca
estas dimensões numa balança, na qual a ação de representar precisa achar o
seu equilíbrio.
Um teórico do mandato ou “mandato imperativo” (MANIN, 1997) extremista
sustentaria que a verdadeira representação ocorre somente quando o
representante atua sobre instruções explícitas de seus constituintes, que qualquer
exercício de discernimento é um desvio deste ideal. Uma posicão mais moderada
seria que ele pode exercer certos discernimentos, mas precisa consultar seus
constituintes antes de fazer alguma coisa nova ou controversa e então fazer o que
eles querem ou demitir-se de seu posto. Uma posição ainda menos extremista
poderia ser de que o representante pode atuar como ele pensa que seus
constituintes gostariam, a menos ou até que ele receba instruções deles, e então
ele possa atuar conforme essas instruções (PITKIN,1967).
Muito próximo à posição de independência seria o argumento de que o
representante precisa fazer o que pensa ser o melhor, exceto na medida que ele é
67
limitado pelas promessas de campanha ou uma plataforma eleitoral. No outro
extremo está a idéia de completa independência ou “representação absoluta”
(MANIN, 1997), na qual os constituintes não têm o direito de exigir nem as
promessas de campanha, pois uma vez que alguém é eleito, ele precisa ser
completamente livre para usar o seu próprio julgamento (PITKIN, 1967).
Os teóricos do mandato vêm o representante apenas como um mero
agente, um serviçal, um delegado, um substituto subordinado àqueles que o
enviaram. Os representados enviam o representante para fazer alguma coisa por
eles, o que eles poderiam ter escolhido fazer por eles mesmos, o que eles são
perfeitamente capazes de fazer e entender (PITKIN, 1967).
Por outro lado, os teóricos da independência vêm o representante como um
agente livre, um administrador, um perito que é melhor ser deixado sozinho para
fazer seu trabalho. Eles tendem a ver as questões políticas como difíceis e
complexas, além da capacidade de pessoas ordinárias. De qualquer forma, eles
argumentam, que um eleitorado não é uma unidade simples com um desejo ou
opinião pronta sobre todos os tópicos, um representante não pode simplesmente
refletir o que não existe para ser refletido. Além disso, se cada representante
estivesse comprometido e instruído pelos seus constituintes, qualquer acordo
político seria impossível. Isto é necessário para deixar espaço para as atividades
cruciais da representação propriamente dita a formulacão de questões, a
deliberação e acordos nos quais decisões poderiam ser baseados. Favorável a
esta posição, Burke (1949, p.115 citado por PITKIN 1967, p. 147, tradução nossa)
questiona os teóricos do mandato, perguntando, “que tipo de sistema é esse na
qual a determinação precede a discussão, na qual um grupo de homens delibera e
outro decide, e onde aqueles que formam a conclusão estão talvez a trezentos
milhas distantes daqueles que ouvem os argumentos?”
Arato (2002) segue a mesma linha afirmando que a democracia de
referendo e mandato imperativo teria o custo de criar um processo de tomada de
decisões incoerente e irracional e, ainda pior, com a impossibilidade de que
aqueles que tomam as decisões tenham a oportunidade e capacidade de interagir
68
e persuadir uns aos outros, pois todos chegariam com as decisões previamente
definidas.
Inserindo-se nesse debate, Manin, Przeworski e Stokes (1999a) apontam
que a concepção de representação por mandato ocorreria quando os
representantes informam sinceramente sobre as suas intenções e a
implementação destas intenções o as melhores para os representados sob as
circunstâncias dadas. Segundo os autores, esta ocorre nas seguintes condições:
quando os interesses dos representantes e dos representados coincidem, quando
os representantes acreditam que podem ser reeleitos por serem fiéis às sua
promessas iniciais e quando os representantes estão preocupados com a
credibilidade de suas promessas futuras. Assim, a representação por mandato
ocorre quando a vontade dos representantes e dos representados coincidem ou
quando os representantes se preocupam apenas em vencer a eleição.
Manin (1997) concorda com Burke e outros autores que defendem que a
representação requer debate para a construção de uma entidade coletiva, na qual
membros eleitos por populações diversas e que, inicialmente, parecem ter pontos
de vistas diferentes, produzem concordância e consentimento. Mas, deixa claro
que muitas vezes, este consentimento só é alcançado através da regra da maioria
aplicada após a discussão das propostas num nível de argumentação que possa
“justificá-las”. Isto quer dizer que o representante pode reconsiderar suas
proposições no processo de discussão independentemente de seus
representados. Nas eleições, os representados podem julgar as políticas
implementadas pelos seus representantes, mas o fato destas não terem sido
originadas no meio deles, mas no processo de discussão dos representantes,
acaba não tendo muita importância. Assim, para Manin, a democracia
representativa não é uma forma indireta de governo pelo povo, mas um sistema
no qual as políticas e decisões públicas são sujeitas ao veredito do povo.
Continuando esta argumentação, teóricos da independência apontam que o
representante, embora localmente eleito, precisa objetivar os interesses nacionais,
o que não emergiria automaticamente da soma dos desejos dos constituintes
locais. Ele precisaria ser deixado livre de instruções para alcançar este objetivo.
69
Além disso, eles argumentam que “permitir que um representante atue apenas sob
instruções é roubar dele toda a dignidade e então, minar o respeito pelo governo”
(PITKIN, 1967, p. 147, tradução nossa).
Esses são os dois lados da controvérsia em sua forma primitiva, mas,
frequentemente, eles se tornam mais complexos pela inclusão dos partidos
políticos na discussão. Um argumento é que o legislador do Estado moderno não
é limitado nem pelos desejos de seus constituintes e também, não é livre para
atuar nos interesses nacionais na sua própria perspectiva, mas que ele é limitado
para atuar de acordo com o programa de seu partido político. Uma segunda
possibilidade é considerar partidos como uma conexão entre os desejos locais e
os interesses nacionais. Os partidos presumivelmente têm um programa sobre
questões nacionais, elegendo o membro de um determinado partido, os votantes
de cada componente expressam seus desejos em relação a este programa. O
representante é então limitado por este programa porque este é o seu dever com
os desejos de seus representados e com o seu partido e, presumivelmente,
porque isto está de acordo com a sua visão sobre os interesses nacionais.
Terceiro, alguns autores da independência argumentam que os interesses dos
partidos são parciais e especiais e não equivalentes aos interesses nacionais,
então o representante tem que ser deixado livre das obrigações do partido para
atuar sobre as questões nacionais a partir de sua própria visão (PITKIN, 1967).
Esta discussão sobre os partidos está ausente neste estudo por este focar apenas
os espaços institucionais de representação, mas estes argumentos podem ser
úteis para se analisar a influência das respectivas organizações nas atuações dos
representantes.
Considerando a controvérsia entre mandato e independência, várias
posições têm sido levantadas. Alguns teóricos argumentam que ambos os
extremos são verdadeiros: o representante tem uma obrigação com os desejos de
seus representados e com a melhor política de como ele isso, mas eles não
contam como conciliar as duas. Alguns afirmam que o dever do representante com
os seus representados é defender as suas causas e falar por eles, entretanto, que
ele precisa votar de acordo com o seu próprio julgamento. Outros têm
70
argumentado que o tempo é o fator crucial: que o representante não deveria ser
limitado por todos os desejos temporários de seus constituintes, mas precisa
obedecer seu desejos deliberados de longo termo. Alguns têm a posição de que
um representante deve ignorar seus representados exceto quando chega o
período de eleições, quando os representados devem removê-lo se não estiverem
satisfeitos (PITKIN, 1967).
Assim, Pitkin (1967) aponta que, na medida que a controvérsia mandato-
independência contém uma disputa conceitual baseada no significado da
representação, ambos os lados estão corretos. O aparente significado paradoxal
de representação é perpetuado nos requerimentos para a atividade de
representar: o representado precisa estar das duas formas presente e não
presente. O representante precisa realmente atuar, ser independente, ainda o
representado precisa estar em algum sentido atuando através dele. Portanto, não
há conflitos sérios persistentes entre eles. Então, a essência da atividade de
representar parece consistir em promover o interesse do representado, num
contexto onde o último é considerado como capaz de ão e julgamento, mas de
tal forma que ele não tenha objeções ao que esteja sendo feito em seu nome. Ele
não precisa atuar de fato e literalmente em resposta aos desejos dos
representados, mas os desejos dos representados precisam estar potencialmente
presentes e relevantes.
Neste sentido, a receptividade parece ser um tipo de critério negativo:
conflito precisa ser possível e ainda no entanto não ocorrer. Assim, “representar
começa a parecer como uma instituição humana extraordinariamente frágil e
demandante. Independência insuficiente no representante destrói a ‘ilusão’,
conflito entre os dois julgamentos independentes também destrói a
‘ilusão’”(PITKIN, 1967, p. 156, tradução nossa). Mas, talvez estes requerimentos
não são, depois de tudo, tão extraordinários como eles parecem. Eles apóiam uma
suposição fundamental sobre os seres humanos e ações humanas, mas uma
suposição que não é restrita ao conceito de representação, mas difunde-se em
todo o vocabulario de ação. Isto é,
[...] nós assumimos que normalmente os desejos de uma pessoa e
o que é bom para ela coincidirá. Assim, se um representante de
71
fato consegue fazer o que é bom para os seus representados,
normalmente ele não deveria, nesse caso, se encontrar em conflito
com os desejos deles (PITKIN, 1967, p. 156, tradução nossa).
Esta discussão é a base da proposta de Pitkin de representação política,
com a seguinte síntese.
Representar significa atuar no interesse do representado, de um
modo receptivo a eles. O representante precisa atuar
independentemente, sua ação precisa envolver discernimento e
consciência, ele precisa ser aquele que atua. O representado
precisa ser concebido como capaz de ão e julgamento
independente, não sendo meramento cuidado por alguém. E,
apesar do resultado potencial por conflito entre representante e
representado sobre o que é para ser feito, o conflito normalmente
não precisa ocorrer. O representante precisa atuar de tal modo
que não haja conflito, ou se isto ocorrer uma explicação é
requerida. Ele precisa não ser achado persistentemente em
desentendimento com os desejos do representado sem uma boa
razão em termos de seus interesses, sem uma boa explicação do
porque seus desejos não estão de acordo com os seus interesses
(PITKIN, 1967, p. 209-210, tradução nossa).
Esta visão bastante complexa estabelece os limites externos do que
poderia ser aceitável como representar em essência. Dentro destes limites uma
gama imensa de posições é possível, dependendo da visão dos autores sobre o
qual este é representado, sobre a natureza dos interesses, bem-estar ou desejos,
sobre as capacidades relativas de representantes e constituintes e sobre a
natureza das questões com o qual o representante precisa tratar (PITKIN, 1967).
Esta gama de possibilidades é relacionada às concepções de habilidades e
capacidades de representantes e representados. Quanto mais um teórico o
representante como membro de uma elite superior de sabedoria e raciocínio, tal
como Burke faz, fará menos sentido para ele requerer que o representante
consulte a opinião ou mesmo os desejos daquele por quem ele atua. Se a
sabedoria e habilidade superior reside no representante, então ele não precisa
subordiná-los à opinião de seus constituintes ignorantes e inferiores. De outro
lado, quando um teórico representantes e constituintes como relativamente
iguais em capacidade, sabedoria e informação, ele provavelmente vai requerer
que as visões dos constituintes sejam considerados. Se o representante é uma
pessoa falível, sem conhecimentos ou habilidades especiais, parece ser despótico
e injustificável para ele ignorar seus constituintes.
72
Novamente os extremos são externos ao conceito completamente: um
verdadeiro expert que cuida de uma criança desprotegida não é representante, e
uma pessoa que meramente consulta e reflete sem atuar não representa no
sentido de estar essencialmente atuando por outros. Mas a variação intermediária
entre estes extremos é ampla (PITKIN, 1967). Assim, quanto maior for a diferença
de conhecimentos e habilidades entre os representantes e os representados,
maior a tendência dos primeiros tomarem as decisões sem se preocuparem com a
opinião dos últimos.
Estas considerações, também, são relacionadas ao modo no qual teóricos
pensam sobre o trabalho dos representantes, o tipo de questões e problemas com
o qual ele terá que lidar. Quanto mais um teórico as questões políticas como
questões de conhecimento, para as quais é possível achar respostas corretas e
objetivamente válidas, mais inclinado ele estará para considerar o representante
como um perito e achar a opinião dos constituintes irrelevantes. Se as questões
políticas são como problemas científicos ou matemáticos, é tolice tentar resolvê-
los com a participação dos representados. De outro lado, quanto mais um teórico
considera as questões políticas como sendo escolhas arbitrárias e irracionais,
questão de capricho ou gosto, menos sentido fará para um representante levar
isto adiante sozinho, ignorando os gostos daqueles por quem ele supostamente
está atuando. Se as escolhas políticas são como a escolha entre, como por
exemplo, dois tipos de comida, o representante pode somente contentar o seu
próprio gosto ou o gosto deles, e a última escolha parece ser a única justificável
(PITKIN, 1967).
Nos extremos, novamente a representação desaparece. O cientista perito
resolvendo um problema técnico não é representante, não está decidindo nada, e
não está considerando o interesse de ninguém. A pessoa escolhendo por outros
em questões de gostos arbitrários não está atuando por eles da mesma forma, ele
pode apenas substituir seu desejo por eles ou então consultá-los e agir como eles
desejam. Ele não pode decidir independentemente no interesse deles, pois, onde
a escolha é uma questão de gosto, o interesse não está envolvido (PITKIN, 1967).
73
Questões políticas, de forma ampla, são encontradas no escopo
intermediário, no qual a idéia de representar como uma atuação substancial por
outros é aplicada. Questões políticas não são arbitrárias como a escolha entre
dois tipos de comida, nem são questões de conhecimento sobre as quais um
perito pode responder corretamente. As questões políticas são sobre ação, sobre
o que deveria ser feito, consequentemente, eles envolvem fatos e
comprometimento de valor, os fins e os meios são intrinsicamente conectados na
vida política. Frequentemente, os comprometimentos de valor político são
profundos e significantes. Políticas são ricas em questões no qual as pessoas são
comprometidas de uma forma que não é facilmente acessível ao argumento
racional, que dá forma a percepção de argumentos, que pode permanecer o
mesmo por toda uma vida. Este é um campo no qual a racionalidade não é
garantia de acordo. Ao mesmo tempo, argumentos racionais são às vezes
relevantes e acordos podem ser alcançados (PITKIN, 1967).
Assim, a vida política não é meramente fazer escolhas arbitrárias, nem,
meramente o resultado de barganhas entre desejos privados. Esta é sempre uma
combinação de barganha e compromissos, na qual comprometimentos
irresolutos e conflitantes e a deliberação sobre políticas blicas, para a qual,
fatos e argumentos racionais são relevantes. Este é, precisamente, o tipo de
contexto no qual a representação, como uma atividade substancial, é relevante. A
representação é necessária quando o interesse está envolvido, que é, quando as
decisões não são meramente escolhas arbitrárias (PITKIN, 1967). Assim, o tipo de
questão ou problemática discutida nos espaços institucionais de representação
social tem uma relação direta com a atuação esperada do representante.
Outra dimensão da representação política é a distinção entre representação
privada e pública. Caso uma pessoa represente certo eleitorado, então de acordo
com a discussão sobre representação, sua obrigação é para os interesses destes
eleitores. Num sentido prático, é política e socialmente importante que interesses
locais e parciais não deveriam ser sacrificado em nome do todo. De outro lado,
alguém tem que governar e o governo nacional precisa perseguir o interesse
nacional. Se esta tarefa é dada a alguém ou a um grupo, estes terão que cuidar
74
também dos interesses nacionais. Neste caso, é política e socialmente importante
que os interesses locais e parciais não prevaleçam sobre os interesses e
necessidades da nação como um todo. Assim, uma das principais características
do governo representativo é sua capacidade de resolver as reivindicações
conflitantes das partes, sobre a base dos interesses comuns destas partes no bem
estar de um todo. A dificuldade de fazer isto se deve ao fato de que, apesar do
todo ser constituido de partes, o interesse do todo não é a soma dos interesses
locais, assim, muitas vezes, o bem estar de uma parte é sacrificado pelo bem
estar do todo. Além disso, o interesse do todo não pode simplesmente ignorar ou
sacrificar os interesses das partes do todo ou mesmo individuais (PITKIN, 1967).
Assim, essa controvérsia entre mandato e independência traz muitas
contribuições para analisar a representação nos espaços institucionais de
participação social.
4.3 A representação nos espaços institucionais de participação social
As experiências dos espaços de participação social partem da crítica às
noções elitistas que marcam parte importante do pensamento sobre
representação. Ou seja, elas propõem a participação dos próprios interessados
por meio de seus representantes como forma de superar a mediação da elite
política e/ou burocrática entre os cidadãos e os centros de deliberação e execução
das políticas públicas.
A multiplicação destes espaços, incumbidos da definição de prioridades
públicas e do desenho e supervisão de políticas, trouxe novos atores exercendo
funções de representação política, introduzindo a participação de representantes
da sociedade civil na formulação de políticas. Esta representação é realizada
principalmente junto aos órgãos executivos do Estado, ampliando
consideravelmente a capacidade de interlocução destes atores com os governos
75
dos diferentes níveis e também, com agências multilaterais e organizações
governamentais (LAVALLE; HOUTZAGER; CASTELLO, 2006).
Um sistema de mecanismo de agregação de representação carrega peso
normativo porque, implícita ou explicitamente, isto precisa distinguir as
comunidades de interesse entre aquelas que merecem ou não o reconhecimento
na arena política. Claramente, a decisão de definir a constituição de um grupo a
partir de uma linha antes que outra terá consequências significativas para a
agenda política e, consequentemente, para as perspectivas de diferentes cidadãos
de ter seus interesses representados (WILLIAMS, 1998).
Neste sentido, percebe-se que diferentes configurações dos espaços
institucionais de participação social e, consequentemente, a sua composição,
tende a ter influência direta no processo de representação dos atores sociais
nestes espaços.
A emergência destas formas de representação política é uma novidade por
ser exercida por organizações civis, formas constituídas de modo inexorável pela
dualidade entre representação e representatividade, entre representante e
representado. Contudo, esta modalidade de representação coletiva não se
encontra submetida aos limites estruturais das eleições e dos eleitos, impostos
pela sua dupla função de representação perante o poder, visando a regulá-lo
socialmente, e de representação no poder, comprometida com governar e impor
obediência sobre a população, se for preciso. Seus limites são outros, mas nesse
aspecto, a representação coletiva é fundamentalmente, pressão, controle,
supervisão, intervenção, assédio e reclamo perante o poder em instâncias
executivas de políticas e em espaços de interlocução. Além disso, por se tratar de
representação em relação a políticas públicas específicas, e em nome de públicos
e/ou comunidades também específicas - e não da nação ou de um eleitorado
disperso -, há condições mais favoráveis para a consonância entre a orientação de
decisões dos representantes e as preferências dos representados (LAVALLE;
HOUTZAGER; CASTELLO, 2006).
Estas entidades civis que compõem os espaços institucionais de participação
social possuem formatos organizacionais e públicos bastante variados e relações
76
com seus públicos nem sempre explícitas ou claras, por vezes, apenas simbólicas,
tornando a representação coletiva eminentemente heterogênea quanto aos
interesses representados, às formas organizacionais dos atores, ao lócus dentro
do Estado e às jurisdições, instâncias e formas de institucionalizá-la. A despeito da
pluralização e diversificação da representação virem acompanhadas de tal
heterogeneidade, os potenciais da representação coletiva localizam-se em
posição mais clara no espectro de possibilidades que vai do mandato imperativo
do direito privado à autonomia do representante e lassidão dos seus vínculos com
o representado, próprios da democracia representativa clássica. (LAVALLE;
HOUTZAGER; CASTELLO, 2006).
Porém, apesar de existirem diversos elementos que sugerem o potencial de
representatividade da representação coletiva como um expediente de reforma da
democracia, sua problematização teórica e sua defesa pública esbarram em
limites evidentes, como a ausência de mecanismos generalizados, formais e
estáveis de ordenação da relação entre atores da sociedade civil e seu público,
beneficiários ou comunidades - notadamente mecanismos de autorização,
prestação de contas, responsabilização e sanção.
Questões estas que nos levam à primeira dimensão da representação a ser
privilegiada neste estudo: a representatividade dos representantes perante o seu
público.
4.3.1 A representatividade dos representantes
Anteriormente, foi visto que a iniciativa de implantar os espaços
institucionais de participação social foi uma reivindicação da sociedade civil que
não se sentia representada pelos representantes políticos eleitos para os espaços
de representação clássicos, isto é, deixaram claro que estes representantes não
eram representativos de seus valores e interesses, mas, priorizavam os interesses
mais elitizados. Assim, a proposta destes novos espaços seria ter atores da
77
sociedade civil atuando como representantes, e como estes estariam mais
próximos do cotidiano da sociedade, eles teriam maior representatividade para
atuar em nome dos interesses desta, principalmente de seus setores mais
subordinados.
Entretanto, quando Lavalle, Houtzager e Castelo (2005, p. 13) afirmam que
esta representação política tem uma constitutiva dualidade em seu centro”, estes
autores chegam ao âmago do debate sobre a representação, pois como eles
mesmos afirmam:
[...] a simples existência da representação não garante a
representatividade ou necessariamente a sua correspondência àqueles
que estão sendo representados. Por sua vez, a força da
representatividade não pode ser realizada pela remoção da autonomia
dos representantes.
Assim, este debate, que é o combustível para a discussão sobre mandato
ou independência exposto anteriormente, mostra que a questão da
representatividade está longe de ser transposta nos espaços institucionais de
participação social. Ao concordar com o posicionamento de Pitkin (1967), no qual
tem que se buscar analiticamente o distanciamento destes pólos buscando um
certo equilíbrio entre eles, resta a árdua tarefa de buscar instrumentos para se
alcançar este objetivo e também como dimensioná-la analiticamente.
Lavalle, Houtzager e Castello (2005) apontam que há muitas reservas sobre
a representatividade das organizações civis, entretanto, alertam que
[...] é sensato não defender nenhuma conclusão baseado nestas
reservas, porque a maioria traz a tradicional configuração da
política de representação ou mandato representativo como seu
ponto de partida. As organizações civis não fazem e não podem
assumir um mandato representativo nestes termos, como se eles
fossem servidores públicos. Julgá-los de acordo com este padrão
não é um exercício muito produtivo, pois entre as organizações
civis uma diversidade de noções parcialmente construídas de
representação que são usados para defender publicamente sua
representatividade, sendo algumas com conteúdo compatível com
a democracia, mesmo que, outras não (LAVALLE; HOUTZAGER;
CASTELLO, 2005, p. 3).
Para este estudo, a representatividade de cada membro é o que faz uma
assembléia verdadeiramente representativa como um todo, é o que define a
representação (PITKIN, 1967). Um representante não é representativo se este
78
persegue um curso de acão discordante ao almejado por toda maioria de seus
representados, isto é, enquanto este atua no interesse de uma minoria, incluindo
ele próprio (MANIN; PRZEWORSKI; STOKES, 1999b), pois, mesmo considerando
a concepção da representação simbólica, os representados precisam legitimar
esses interesses, mesmo que estes tenham sido construídos por uma minoria.
Touraine (1996, p. 76) afirma que “[...] para que exista representatividade, é
preciso que exista uma forte agregação das demandas provenientes de indivíduos
e setores bastante diferentes da vida social.” Assim, quando se fala na
representatividade está se buscando compreender como está sendo representado
os interesses e projetos dos representados, que são muitos e diversificados.
Conforme foi visto na representação descritiva, alguns estudos sobre
representatividade tentaram correlacionar as características do representante com
aquelas de seus representados, onde representar significava ser representativo no
sentido de ter características tipicamente representativas. Felizmente, poucos
autores permaneceram neste nivel simplístico, a maioria percebeu as dificuldades
na simples identificação de representante e representatividade. Afinal de contas,
apenas “[...] poucas pessoas pensam seriamente que o melhor representante é
aquele que é típico e a média em todos os aspectos, incluindo inteligência, espírito
público e experiência.” (PITKIN, 1967, p. 76). Entretanto, é necessário lembrar que
para se constituir um grupo, alguma característica é compartilhada.
Young (2000) tem uma proposição semelhante, ao afirmar que se a
representação for entendida como um processo em que o representante age como
substituto do representado “falando como” - reproduzindo cada um e todos os
interesses, então a representação torna-se uma impossibilidade. Para as autoras
Young (2000) e Pinto (2004), a noção de representação deve ser entendida não
como identidade, mas como diferença, o quê implicaria reconhecer que existe a
diferença e a separação entre os representantes e representados, pois nenhuma
pessoa pode pretender ser ou falar como uma pluralidade de outras pessoas. A
função do representante de “falar por” não deveria ser confundida com o requisito
de identificação que o representante “fala como” os representados falariam,
tratando de estar presente por eles em suas ausências. Assim, a representação
79
seria como um processo diferenciado e mediado no espaço e no tempo provendo
um modo para considerar estes diferentes aspectos juntos. Pinto (2004, p. 106)
complementa que “[...] tal distância deve ser compreendida como a distância entre
interesses individuais (privados) e interesses coletivos (públicos), assim como a
distinção do espaço da política como um espaço distinto da sociedade.”
Este argumento está em consonância com Pitkin (1967), pois esta assume,
que se o representante atua de acordo com o interesse de seus representados,
eles irão querer o que é do interesse deles e consequentemente, aprovarão as
ações do representante. Este ponto também acha conformidade com Stokes
(1999), quando esta aponta que em situações nas quais as instruções dos
representados são baseadas em conclusões equivocadas, os representantes
podem estar traindo-os ao levar estas indicações adiante, mesmo que estejam
agindo com boas intenções.
Entretanto, se considerarmos a representação simbólica, isso tem um limite,
pois se os representantes não conseguirem manter a sua credibilidade e perder a
legitimidade oriunda de seus representados, eles também perdem a sua
representatividade.
Ao pensar na responsabilização social como critério na avaliação da
representatividade é necessário ter um certo cuidado, pois o seu principal
instrumento é a eleição e como Pitkin (1967, p. 164-5, tradução nossa) aponta, a
reeleição de um representante não é prova absoluta de que ele é um bom
representante, isto apenas prova que os votantes pensam que ele é”. Desta
forma, um representante que buscou sempre os interesses da população pode
deixar de ser eleito, por falta de votos, enquanto outros, que não fizeram tudo o
que eles podiam, são reeleitos.
Manin, Przeworski e Stokes (1999b) apontam que as eleições teriam duas
funções: escolher os melhores representantes e políticas e induzir os
representantes a comportarem-se bem enquanto estiverem no cargo, através da
responsabilização social. Mas, nenhum destes objetivos é atingido simplesmente
pelo fato de haver eleições, como os próprios autores afirmam “[...] as eleições
não são mecanismos suficientes para assegurar que os representantes farão tudo
80
o que puderem para maximizar o bem estar dos cidadãos.” (MANIN;
PRZEWORSKI; STOKES, 1999a, p. 50, tradução nossa). Mesmo se as
responsabilidades forem claramente especificadas, os maus representantes
puderem ser punidos e os bons eleitos, os representados forem bem informados e
o comportamento dos representantes estiver sujeito a escrutínio, a eleição não é
um instrumento suficiente para controlar a representação, pois com apenas o voto,
os representados não conseguem controlar as tantas variáveis existentes neste
processo.
Apesar deste perfil dos representados ser difícil de ser encontrado e de
Manin, Przeworski e Stokes (1999a; 1999b) apontarem que as eleições, por elas
mesmas, são deficientes para garantir representatividade e responsabilização
social. Lavalle, Houtzager e Castello (2005) enfatizam que apesar disto, as
eleições provêm um mecanismo de responsabilização social e tende a estimular
os representantes a buscar o conhecimento das demandas e necessidades do
eleitorado.
Existem outros autores que apostam nas eleições como uma avaliação
popular das ações passadas dos representantes, propiciando a ocorrência de
responsabilização social. Arato (2002, p. 89-92) afirma que, mesmo se
acreditando na idéia de que uma vontade geral genuína possa ser alcançada
apenas através da deliberação e persuasão mútuas, não como garantir
institucionalmente que os interesses públicos e as contribuições da opinião pública
sejam seriamente considerados. Para este autor, a única prestação de contas que
pode haver entre representante e representado é a responsabilização social
baseada na capacidade dos representados de exigir que os representantes
expliquem o que fazem e respondam por seus atos, podendo ser
responsabilizados com punições ou recompensas. O autor aponta que, apesar da
responsabilização social ser uma avaliação retrospectiva, formas dos
representantes responderem por seus atos e omissões posteriormente. Assim, se
os representados o podem e não devem obrigar os representantes a
implementarem políticas específicas, eles podem, no entanto, tornar tais atitudes
81
do interesse do próprio representante, principalmente se estes tiverem que passar
por eleições periódicas.
Considerando a posição destes autores sobre as eleições, fica claro que
este é um instrumento importante, mas, a participação ainda precária da
sociedade, resultando em muitos representados pouco cientes da conjuntura e
dos trâmites da discussão política, faz com que as eleições não sejam um
instrumento totalmente eficiente de responsabilização social.
A representação política é perfeitamente compatível com liderança e com
ações para encontrar situações novas ou emergentes. De outro lado, isto é
incompatível com manipulação ou coerção do público. A linha entre liderança e
manipulação é nue e difícil de definir claramente. Mas, indubitavelmente há uma
diferença e, esta diferença faz a liderança compatível com representação, mas
não com manipulação. Isto ocorre porque a liderança está, de certo modo, à
mercê de controle. Algo ocorre somente se os representados estiverem dispostos
a deixar isto acontecer. Assim, isto não é incompatível com o requerimento de que
os representados sejam capazes de obterem os seus caminhos quando eles
tiverem um desejo explícito. De outro lado, a manipulação é imposta sobre o
representado e ameaça a sua capacidade de rejeitar ou iniciar uma nova política.
Uma pessoa pode ser conduzida e ainda ir de acordo com o seu próprio desejo,
mas “[...] uma coisa que é manipulada não se move por si mesma.” (PITKIN, 1967,
p. 233, tradução nossa).
Entretanto, a partir da contribuição de Bourdieu (1990, 2004, 2005) poderia
se dizer que nos espaços institucionais de participação social estaria ocorrendo a
representação simbólica, que vai além da liderança, mas é diferente da
manipulação vista através de Pitkin (1967). Neste tipo de representação, os
interesses e desejos dos representados são construídos durante o processo de
representação, isto é, o representante individualmente ou um grupo constitui o
coletivo por ele representado, construindo desejos, vontades, interesses e/ou
demandas nas quais os representados se reconhecem. Assim, neste caso a
representatividade não é a adequação entre aquilo que o representante faz ou
propõe e os desejos, vontades, interesses e/ou demandas prévios dos
82
representados, mas sim, o reconhecimento, pelos representados, de que aquilo
que o representante faz ou propõe são seus desejos, vontades, interesses e/ou
demandas. Ou seja, a representatividade não é um dado objetivo, produzido pela
mensuração da congruência entre interesses dados de representados e ações de
representantes, mas sim “capital simbólico” que o representado atribui ao
representante por se reconhecer e, enquanto se reconhecer, naquilo que este
último faz (BOURDIEU, 2004).
Este processo de reconhecimento e legitimidade é complexo. A presença
de atores da sociedade civil dificulta o vínculo destes aos processos
comunicativos vividos na periferia dos núcleos decisórios, isto é, no ambiente em
que estes atores vivem com aqueles que ele representa, assim, os atores
mostram-se extremamente vulneráveis a uma institucionalização imobilizadora e
aos mecanismos de cooptação política, podendo ser reconhecidos pela população
como mero apêndice da administração estatal, um “poder exterior”
6
nutrido
administrativamente e não pelos processos comunicativos de formação de opinião
e da vontade. Nem mesmo um esforço publicitário consistente e duradouro das
administrações, consegue transferir legitimidade às organizações de constituição
induzida administrativamente. Assim, somente aqueles atores, que têm e
conseguem manter ou ampliar as suas estruturas internas de comunicação e
estão articulados com os seus pares através das organizações sociais anteriores à
implantação destas arenas, conseguem fazer com que sua participação tenha
maior consonância com os seus representados (COSTA, 2002). Essa visão é
particularmente interessante para analisar a representação nos Conselhos
Municipais de Desenvolvimento Rural, espaços que apresentam uma substancial
interferência por parte das administrações municipais e/ou instituições estaduais.
Manin, Przeworski e Stokes (1999a) discutem o porquê dos representados
não fazerem questão da existência de mecanismos institucionais para forçar os
representantes a serem fiéis às suas promessas. Apesar deste debate ser sobre
6
Costa (2002, p. 83 e 95) faz esta discussão citando Alvarenga (1991) em seu estudo sobre as
esferas públicas locais, denominando esta dinâmica de “poder exterior”, “[...] uma instância de
poder mais próxima deles, localizada no próprio bairro, mas sempre um poder exterior.”
83
os políticos eleitos para cargos governamentais, os argumentos parecem ter
sentido em relação aos representados em espaços institucionais de participação.
Historicamente, o primeiro argumento é que os representantes deveriam poder
deliberar, pois eles podem aprender uns com os outros ou consultar peritos
quando inseguros de seus julgamentos. Segundo, que os representados poderiam
desconfiar de seus próprios julgamentos, com medo se suas próprias paixões ou
por reconhecer sua ignorância sobre determinadas questões, preferindo assim,
dar alguma liberdade aos representantes e avaliar suas ações nas eleições.
Terceiro, as circunstâncias existentes podem mudar, exigindo que haja alguma
flexibilidade para enfrentá-las. Assim, os representados escolhem políticas que
representam seus interesses ou candidatos que os representam como pessoas,
mas querem que os representantes tenham capacidade própria de administrar a
sua representação ou como diria Bourdieu (2004), que estes tenham um projeto
que possa ser reconhecido por eles.
Ao pensar nos representados, Arato (2002) afirma que a história da
democracia representativa tem sido a história da inclusão política, entretanto, esta
inclusão abre novos hiatos, pois quanto maior for o número de indivíduos
econômico e socialmente frágeis incluídos nas eleições, maior será a diferença de
poder entre os eleitores e o corpo dos representantes. Segundo o autor,
[...] a questão não é simplesmente que a eleição enquanto tal é um
princípio de distinção, mas sim que um eleitorado sem educação
formal, relativamente pobre e trabalhador tem muito mais
dificuldades de observar, criticar e controlar os representantes
eleitos do que os estratos sociais mais privilegiados (ARATO,
2002, p. 87)
Sendo assim, os representados são muito mais susceptíveis ao processo
de cooptação ou de se reconhecer em interesses constituídos por outros, como se
estas fossem suas.
Outro aspecto a ser considerado é a magnitude do público a ser
representado pelos representantes, pois, quanto maior a escala, menor é a
possibilidade dos representantes terem um contato mais direto com os seus
representados. Dahl (2001) argumenta com um simples cálculo de tempo, isto é,
quanto tempo seria necessário para cada cidadão ter um rápido encontro com o
84
seu representante. Com o número reduzido de pessoas, o representante teria a
chance de encontrar uma porcentagem maior de representados em relação a uma
escala maior. Assim, a lacuna entre os representantes e os representados tende a
aumentar proporcionalmente ao aumento da abrangência do espaço de
participação.
Isso havia sido exposto em Dahl e Tufte (1974), onde os autores
argumentam que quando o número de cidadãos aumenta, surgem novos
problemas de comunicação. Pois, se os representantes são sensíveis aos desejos
dos cidadãos, eles precisam saber o que estes querem, e para isto, é preciso ter
alguma comunicação entre os cidadãos e os representantes. Além disso, para os
cidadãos serem capazes de fazer oposição e retirar os representantes que não
correspondem às suas expectativas, os cidadãos precisam saber como estes
estão respondendo a estas expectativas. Portanto, isto também indica a
necessidade de comunicação entre os representantes e os cidadãos, para estes
entenderem como e porquê os representantes estão assumindo determinada
posição em relação a alguns assuntos.
Os autores lembram que parte desta comunicação poderia ser feita pelos
meios disponibilizados pelas tecnologias de comunicação existente, mas,
geralmente, estas permitem apenas a comunicação oriunda dos representantes.
Os representados são tratados coletivamente, como uma audiência única, que não
têm como se expor. Assim, esta comunicação é assimétrica (DAHL; TUFTE,
1974).
Outra forma dos representantes buscarem o conhecimento dos desejos dos
constituintes seria através de estudos e pesquisas, sumarizando e condensando
algumas informações. Entretanto, este manuseio de informações resulta em
interpretações e, estas vão depender de quem as está fazendo, pois o que é
importante para uns, pode não ser tão importante para outros. Assim, é difícil
avaliar precisamente o quanto de informações relevantes são perdidas, mas,
provavelmente, esta perda é acrescida com o aumento do tamanho do público ao
qual o estudo é direcionado. Além disso, a autoridade de sumarizar ou condensar
informações, inevitavelmente, envolve outras autoridades e poderes.
85
Independente das intenções originais, os mediadores aos quais são dados esta
autoridade, dificilmente, permanecerão transmissores inertes de informações entre
representados e representantes (DAHL; TUFTE, 1974). Considerando os espaços
institucionais estudados, o GGETESPA utiliza freqüentemente o auxílio de
consultores em suas oficinas, que fazem os relatórios das temáticas discutidas
nestas.
Assim, quando as unidades políticas crescem, a comunicação se torna mais
assimétrica, lideranças se tornam mais profissionais, a representação é uma
ocupação de tempo integral, deres se tornam mais especializados, o número de
constituintes por representante aumenta, a comunicação é mais indireta e os
mediadores intervêm na comunicação, consequentemente, a representação se
torna menos representativa em vários sentidos do termo. Então, quanto maior a
escala da política, menos os cidadãos médios serão capazes de tratar diretamente
com os seus representantes. Além disso, escalas maiores geram uma crescente
assimetria na relação entre os cidadãos e os representantes, gerada pelo
crescimento da diferença de poder, conhecimento e capacidade de comunicação
existente entre eles (DAHL; TUFTE, 1974).
Pensando aritmeticamente, encontrar os interesses comuns entre os
membros de um grupo menor, aparentemente, é bem mais fácil que num grupo
maior. Mas, para dificultar ainda mais isso, características como etnia, linguagem,
religião e status socio-econômico são irregularmente distribuídos pelo mundo,
assim, qualquer unidade política pequena baseada geograficamente tenderá a
abarcar pessoas que são mais parecidas neste sentido que os membros de uma
grande unidade. A menos que os membros sejam baseados exclusivamente sobre
interesses comuns, um grupo menor é sempre mais propenso a ter interesses
comuns que um grupo maior (MANSBRIDGE, 1980). Além disso, quanto maior a
abrangência espacial de um grupo, mais saliente será os conflitos entre os seus
membros, pois, isto gera a proliferação de subunidades organizadas que estimula
o crescimento da diversidade, pois as subunidades se especializam e
desenvolvem os seus próprios interesses (MANSBRIDGE, 1980; DAHL; TUFTE,
86
1974). Isso é facilmente visualizado nos espaços institucionais analisados, quando
comparamos os conselhos municipais e o GGETESPA.
Nesse sentido, a evidência sobre participação parece sustentar que a
participação política é mais equitativamente distribuída em unidades menores que
nas grandes: a fala e as atividades de liderança são mais equitativamente
distribuídas em pequenas unidades do que nas maiores. Os representantes de
poucos constituintes são mais parecidos com seus constituintes, em
características sociais e em preferências políticas, que os representantes de
muitos constituintes (MANSBRIDGE, 1980).
Num processo de tomada de decisão, no qual a fala é importante, as
qualificações do representante consistem numa compreensão clara das
necessidades e preocupações distintas de seus constituintes, uma compreensão
que usualmente surge do fato que representante e seus representados serem
similarmente situados. Lembrando, que isso o quer dizer que um representante
precisa ser semelhante em tudo a respeito de seus representados, o qual seria um
requerimento absurdo que destruiria o espaço de mediação entre representante e
representado, eliminando o exercício dual de agência que é vital para a atividade
de representação (WILLIAMS, 1998; PITKIN, 1967; YOUNG, 2000).
A participação e a capacidade deste representante de se posicionar perante
seus iguais em espaços próprios é um dos determinantes de como será a sua
atuação nos espaços institucionais de participação social, pois um representante
que caracteristicamente se sente seguro de seu próprio conhecimento e
convicções é mais provável atuar a partir deles, pelo contrário, um que tende a se
sentir cético e mais cauteloso em relação a sua própria visão, é mais provável que
queira saber o que os seus constituintes pensam (PITKIN, 1967).
Os participantes entendem melhor os seus próprios interesses, quando eles
vivenciam uma variedade de diferentes arenas para deliberação, oscilando entre
grupos protegidos, no qual eles podem explorar suas idéias em um ambiente de
encorajamento mútuo e aqueles mais hostis, mas também ambientes amplos no
qual eles podem testar aquelas idéias contra a realidade reinante (MANSBRIDGE,
1996).
87
Uma rede de múltiplas formas de associações, redes e organizações, que
possibilita a interlocução e sobreposição de deliberações, contestações e
argumentações, faz com que todos, que participem desta pluralidade de modos de
associações, tenham os seus pontos de vista articulados no espaço de
participação social, ampliando o processo de comunicação entre os seus
membros (BENHABIB, 1996b).
Chalmers, Martin e Piester (1997) corroboram com este ponto de vista,
apontando que o desafio, para qualquer grupo ou indivíduo, é definir ou reformular
sua identidade e objetivos e, através da interação com outros, chegar a uma
decisão coletiva. Isto, porque a democracia envolve participação significativa,
tanto numa dimensão cognitiva, quanto na dimensão estratégica de barganha da
representação.
Touraine (1996) discute este tema, apontando a necessidade dos atores
sociais darem sentido à sua ação, caso contrário, estes se reduziriam ao estado
de massa e sendo assim, não passariam de um recurso político. Isto é, é
necessário haver uma relação entre interesses sociais construídos coletivamente,
os quais somente se produzem se existe uma sociedade civil ativa e socialmente
enraizada, e o processo de representação política. Assim, os atores sociais são
efetivamente representativos na medida em que expressam estes interesses
sociais.
Entretanto, Oliveira (2000) adverte que a capacidade de se relacionar com
outros grupos de alguns representantes já considerados lideranças consolidadas,
bastante competentes no uso da linguagem do grupo dominante, com capacidade
de se movimentar no interior das normas do discurso do Estado e conduzir uma
argumentação audível e inteligível com o pólo dominante, pode resultar no
distanciamento destes de seus representados, pois a grande maioria destes
permanece marginalizada desse diálogo.
Além disso, esta capacidade cognitiva e o trânsito em diferentes espaços
também não garantem a representatividade destes atores, por poder revelar outra
faceta, que é a emergência de novos atores oriundos da própria comunidade, mas
vulneráveis aos mecanismos de cooptação política, movidos por interesses
88
externos (COSTA, 2002). Assim, estes representantes têm maior facilidade de
transitar entre os diferentes espaços, muitas vezes se colocando como porta-
vozes dos agricultores, mas nem sempre considerando as necessidades e os
desejos destes. Pelo contrário, os interesses pessoais ou de seu grupo podem
suplantar os interesses das comunidades rurais (WOLF, 1971). Estes
representantes, geralmente, exercem o papel de porta-vozes dos outros cidadãos
com menos experiência e/ou habilidade, e, conseqüentemente, com menor
capacidade de atuação sócio-política.
Contudo, alguns grupos tendem a se subordinar a este porta-voz de tal
forma, que conseguem se expor através dele, mesmo podendo acabar
dependendo totalmente dele para existir. Muitos indivíduos atuam para a
manutenção desta subordinação, que para eles, significa o poder sobre um grupo
e uma forma de se fortalecerem perante os outros (GOLDMAN, 2001). Entretanto,
este poder permanece ativo, até o momento em que o próprio grupo legitima
este porta-voz.
Assim, considerando estas contribuições a respeito da representatividade,
percebe-se que muito a discutir sobre esta temática nos espaços institucionais
de participação social. Como apontam Lavalle, Houtzager e Castello (2005), a
contribuição da expansão das instituições da política de representação depende
em parte em como os dilemas da representatividade das organizações civis são
resolvidos, considerando que a maioria das organizações não têm mecanismos
eleitorais para ajudar a estabelecer sua representatividade e muitas não têm nem
uma base suficientemente consolidada para garantir isso. Além disso, não
proposições teóricas bem estabelecidas para auxiliar no estudo analítico desta
representatividade.
Finalizando, para facilitar a visualização da operacionalização da dimensão
representatividade frente aos fatores configuração do espaço, trajetória do
representante e trajetória associativa do município ou território, objetivados neste
estudo, pode se observar a Figura 3.
89
Figura 3: Matriz sistematizadora da dimensão representatividade e os fatores
condicionantes configuração do espaço, trajetória do representante e trajetória
associativa do município ou território.
Representatividade
Configurações institucionais
Espaços com abrangências maiores determinam um número maior de representados dificultando o
contato mais direto destes com os representantes (DAHL, 2001), fazendo com que a comunicação
destes seja dificultada e, quando esta ocorre, muitas vezes esta seja realizada através de
mediadores e assimétricamente (DAHL; TUFTE, 1974).
Escalas maiores geram uma crescente assimetria na relação entre os cidadãos e os representantes,
gerada pelo crescimento da diferença de poder, conhecimento e capacidade de comunição existente
entre eles (DAHL ; TUFTE, 1974)
A participação política é mais equitativamente distribuida em unidades menores que nas grandes,
pois a fala e as atividades de liderança são mais equitativamente distribuídas em pequenas
unidades do que nas maiores (MANSBRIDGE, 1980).
Os representantes de poucos constituintes são mais parecidos com seus constituintes, em
características sociais e em preferências políticas (MANSBRIDGE, 1980).
Os interesses comuns o mais facilmente encontrados em espaços com poucos membros, a não
ser que o grupo tenha sido determinado por um interesse comum (MANSBRIDGE, 1980).
Espaços com grupos maiores geram subunidades organizadas, gerando a diversificação de
interesses e provavelmente, os conflitos entre os seus membros (MANSBRIDGE, 1980; DAHL;
TUFTE, 1974).
A eleição é um instrumento importante (ARATO, 2002; LAVALLE; HOUTZAGER; CASTELLO, 2005),
mas, a participação de representados poucos cientes da conjuntura e dos trâmites da discussão
política, faz com que as eleições não sejam um instrumento eficiente de responsabilização social
(MANIN; PRZEWORSKI; STOKES,1999a; 1999b; PITKIN, 1967).
Trajetória dos
representantes
A compreensão clara das necessidades e preocupações distintas de seus constituintes surge do fato
que representante e seus representados são similarmente situados (WILLIAMS, 1998).
A capacidade de um representante de se posicionar perante seus iguais em espaços próprios é um
dos determinantes de como será a sua atuação em outros espaços, pois um representante que
caracteristicamente se sente seguro de seu próprio conhecimento e convicções é mais provável
atuar a partir deles e um que tende a ser mais cauteloso em relação a sua própria visão é mais
provável que queira saber o que os seus constituintes pensam (PITKIN, 1967). Entretanto, os
membros destes grupos protegidos podem tornar legítimos o interesse material e o interesse próprio
nestas e em outras deliberações, a partir do encorajamento à investigação das suas decisões,
sujeitando cada questão à contínua análise e possível reformulação (MANSBRIDGE, 1996).
F a t o r e s C o n d i c i o n a n t e s
Trajetória associativa do
município/território
Os participantes entendem melhor os seus próprios interesses, quando eles vivenciam uma
variedade de diferentes arenas para deliberação, oscilando entre grupos protegidos, nos quais eles
podem explorar suas idéias em um ambiente de encorajamento mútuo, e aqueles mais hostis, no
qual eles podem testar aquelas idéias contra a realidade reinante (MANSBRIDGE, 1996). Fazendo
com que estes tenham os seus pontos de vista articulados no espaço de participação social
(BENHABIB, 1996b).
Os atores sociais são realmente representativos, caso exista uma relação entre o representante e
interesses sociais produzidos numa sociedade civil ativa e socialmente enraizada (TOURAINE,
1996).
A capacidade de se relacionar com outros grupos de alguns atores, pode resultar no distanciamento
destes de seus representados, devido à grande maioria da população ainda permanecer
marginalizada desse diálogo (OLIVEIRA, 2000) ou por este representante se colocar como porta-voz
desta população, mesmo sem priorizar os interessses e desejos desta, mas o seu próprio ou de seu
grupo (WOLF, 1971; BOURDIEU, 2004; COSTA, 2002).
90
A partir deste ponto, iniciar-se-á a caracterização da outra dimensão da
representação que interessa a este estudo: a capacidade de intervenção dos
representantes.
4.3.2 A capacidade de intervenção dos representantes
Independentemente de sua representatividade, os representantes têm
capacidades diferenciadas de intervenção nos espaços institucionais de
participação social, isto é, sua capacidade de se fazer ouvir e influenciar os rumos
de uma discussão. Essa aptidão é determinada por recursos que, geralmente, são
adquiridas de forma heterogênea no transcorrer da trajetória de cada
representante e pode se apresentar de forma diferenciada dependendo do tipo de
temática, do espaço, de como são conduzidas as discussões, dos outros
representantes, etc.
A discussão política entre representantes é diferenciada, não pode ser
confundida com negociação, mas também não pode ser uma discussão
desinteressada. Assim, a discussão deve ser entendida como “[...] um tipo de
comunicação na qual pelo menos uma das partes busca uma mudança na posição
de outra parte e isto é feito usando proposições que são impessoais ou relativas
ao longo prazo.” (MANIN, 1997, p. 198, tradução nossa). A primeira característica
é o elemento persuasão que a discussão política precisa ter para dar conta de sua
função essencial de gerar consentimento, particularmente, o consentimento de
uma maioria. A segunda, corresponde à dimensão argumentativa e racional da
discussão. Esta distingue a discussão do que pode ser chamado de negociação,
na qual os participantes procuram mudar as posições uns dos outros através de
recompensas ou ameaças afetando os interesses imediatos uns dos outros
(MANIN, 1997).
Uma das principais características destes espaços é o contato face-a-face
que é possibilitado pelas reuniões periódicas para a discussão e tomada de
91
decisão dos assuntos. Mansbridge (1980) relata que a prática do contato face-a-
face aumenta a percepção de semelhança, encoraja a decisão tomada por
consenso e, talvez, realce o status de igualdade. Positivamente, isto parece
aumentar a congruência real de interesses pelo encorajamento da empatia pelo
qual o membro faz dos interesses de outros, o seu próprio. Isto, também, encoraja
o reconhecimento dos interesses em comum por permitir a expressão de detalhes
que podem ser pequenos, mas importantes na comunicação direta.
Negativamente, isto aumenta a possibilidade de conformidade através da
intimidação, resultando num consenso manipulado.
Num contexto, onde as partes objetivam ganhar o argumento e não
alcançar o entendimento mútuo e alguns ganham e outros perdem privilégios,
falas que são impositivas e confrontantes são mais valorizadas que falas que são
sugestivas, exploratórias ou conciliatórias. Isso privilegia o estilo de fala masculina
sobre a fala feminina, pois meninas e mulheres tendem a falar menos que
meninos e homens, em situações que valorizem imposição e competição de
argumentos. Quando as mulheres falam, em tais situações, elas tendem mais a
dar informações e fazer questionamentos do que expor opiniões ou iniciar
controvérsias (YOUNG, 1996).
As normas de deliberação também privilegiam falas que são formais e
gerais. Falas que provêm da premissa à conclusão de um modo ordenado,
assegurando uma posição em termos de generalidades e princípios que se
aplicam a instâncias particulares. Estas normas de articulação, entretanto,
precisam ser aprendidas, elas o culturalmente específicas, e em situações reais
de fala, a exibição de tal estilo de fala é um sinal de privilégio social. Assim, a
deliberação não é aberta igualmente para todos os modos de fazer reivindicações
ou discussões (YOUNG, 1996).
Além disso, as normas privilegiam as falas que são desapaixonadas e
desincorporadas, pois estas tendem a pressupor uma oposição entre mente e
corpo, razão e emoção. Elas tendem falsamente a identificar objetividade com
calma e ausência de expressão emocional. Assim, expressões de raiva, dor e
preocupação apaixonada fazem com que os argumentos e as razões que estas
92
acompanham percam parte de sua credibilidade. Similarmente, a entrada de
expressões corporais, como gestos largos, movimentos nervosos ou expressões
de emoção, são sinais de fraqueza que apagam algumas afirmações ou revelam a
falta de objetividade e controle. Estas normas também privilegiam a linguagem
literal sobre a linguagem figurativa, como hipérbole ou metáforas (YOUNG, 1996).
Nesses espaços as pessoas de classe média e com maiores níveis de
educação formal atuam como se elas tivessem o direito de falar e suas palavras
carregam autoridade, entretanto, freqüentemente, as pessoas de outros grupos se
sentem intimidadas pelo requerimento de argumentos e pelos procedimentos
formais e cheios de regras. Assim, esta situação se agrava onde grupos cultural e
socialmente diferenciados compartilham o mesmo espaço (YOUNG, 1996). Essa
posição é semelhante ao encontrado no estudo de Fedozzi (2002), no qual o nível
de escolaridade, e a sociabilidade possibilitada por este, é um fator relevante na
capacidade de participação sócio-política dos indivíduos.
Nesse sentido, as diferenças entre a escolaridade dos técnicos e dos
agricultores familiares deve ser considerada, quando se analisar a capacidade de
intervenção dos últimos nos espaços institucionais de participação social.
O envolvimento dos cidadãos em associações da sociedade civil de caráter
comunitário, cívico e político oportuniza aprendizagens favoráveis ao exercício da
cidadania e à formação de uma cultura democrática. Aprendizados como o da
tolerância para escutar e respeitar a opinião dos outros, da descentralização dos
pontos de vista individuais e dos grupos sociais, do reconhecimento de
identidades culturais específicas, da existência de interesses e motivações
distintas na sociedade, da construção de regras coletivas para o convívio e da
capacidade de questioná-las quando injustas, do reconhecimento dos outros como
iguais e dos valores normativos da ação social (justiça, solidariedade e dignidade),
enfim, questões relacionadas, direta ou indiretamente, com a noção ampla de
cultura democrática e com a consciência de cidadania (FEDOZZI, 2002).
Além disso, o engajamento ativo e as relações com outros espaços,
desenvolve a voz do cidadão, fortalecendo as condições para que este seja capaz
de falar e ser ouvido em espaços institucionais de participação social. Tais redes
93
permitem que estes ganhem acesso ao conhecimento técnico, que os capacita a
argumentar mais efetivamente nos espaços institucionais (CORNWALL, 2002).
Maia (2002, p. 63) defende que
[...] os atores dos movimentos sociais e associações voluntárias
são mais aptos do que os cidadãos comuns para organizar um
conhecimento próprio, derivado da experiência tanto da vivência
prática do problema quanto da convivência com outros que
partilham um interesse comum, possuindo uma atitude reflexiva
em relação à própria motivação para agir, desenvolvendo a
capacidade de examinar criticamente os próprios desejos e de
interpretar a própria situação na relação com os outros atores
sociais.
Assim, esses atores da sociedade civil nutrem a vontade de aprender,
buscando novas informações sobre as questões dos próprios interesses,
apropriando-se de um entendimento mais aprofundado e crítico de problemas com
os quais se deparam, podendo com isso, desenvolver maiores habilidades
cognitivas que promovem o conhecimento mais fácil dos elementos ponderáveis
dos eventos, possibilitando a construção de interpretações políticas relevantes e
produtivas.
Ao participar destas experiências coletivas, os membros acabam se
entendendo melhor, produzindo laços de solidariedade, preservando a memória
de injustiças passadas, interpretando e reinterpretando os significados daquelas
injustiças, elaborando concepções alternativas de pessoa, de comunidade, de
justiça e da universalidade, tentando dar sentido a todos os privilégios que eles
manejam e às opressões que eles encaram, compreendendo as configurações
estratégicas a favor e contra os seus objetivos desejados, decidindo quais
alianças fazer emocional e estrategicamente, deliberando sobre objetivos e meios
e decidindo como atuar individual e coletivamente (MANSBRIDGE, 1996).
Segundo Fraser (1997) onde apenas uma esfera pública, os grupos
dominantes terão vantagens sobre os outros, pois, neste caso, os membros de
grupos subordinados não terão arenas para deliberação, entre eles mesmos,
sobre suas necessidades, objetivos e estratégias. Eles não terão como trilhar
processos comunicativos onde não haja a presença dos grupos dominantes.
Nesta situação, eles têm menos oportunidade de achar a voz e as palavras
94
corretas para expressar os seus pensamentos. Isto proporciona uma menor
capacidade de articular e defender os seus interesses. Eles são menos hábeis
para expor modos de deliberação, que mascaram a dominação ao absorver a
força menor em um falso “nós”, que refletem um poder maior.
Entretanto, é importante transitar em espaços diferenciados, onde
posições diferenciadas daquelas reinantes no próprio grupo. O primeiro perigo que
cresce quando membros de qualquer grupo conversa apenas entre eles é que
eles não aprendem como colocar o que eles querem em palavras que outros
possam ouvir e entender, permitindo a produção de compreensões que espaços
menos protegidos teriam impedido, por nâo expor os seus posicionamentos a
críticas razoáveis. Para a maioria das pessoas, dispender tempo em um grupo
oposto e externo promove lições importantes de um espaço para o outro. Isto
permite o posicionamento individual para ganhar a confiança de outros apoios ou
moderar o apoio à oposição (MANSBRIDGE, 1996).
Para Chalmers, Martin e Piester (1997) o sucesso do setor popular nestes
espaços dependerá do desenvolvimento das habilidades dos vários participantes
populares potenciais, capacitando-os efetivamente a criar e explorar as
oportunidades destes espaços. Este meio não significa garantia de sucesso, mas
muito pode acontecer se os ativistas puderem construir organizações efetivas e
responsáveis, obter informações e análises acuradas e desenvolver meios de
utilizar contatos com os meios de comunicação, oficiais do governo e peritos sem
se tornar subordinados a eles. Enquanto esta tarefa parece intimidante, isto coloca
um prêmio sobre a resolução e experiência dos atores populares em imaginar e
criar novas estratégias e novas formas de organização social.
Segundo Cohen e Rogers (1995) as associações secundárias
7
m um
papel central nas sociedades democráticas modernas, ajudando a acertar a
agenda política, fazendo escolhas desta agenda, implementando estas escolhas e
formatando as crenças, preferências, entendimentos próprios e hábitos de
7
Cohen e Rogers (1995, p. 7-8) chamam as organizações de “associações secundárias”,
definindo-as como “[...] a ampla série de organizações não familiares intermediárias entre
indivíduos ou firma e as instituições do Estado e o sistema eleitoral formal.”
95
pensamento e ação que os indivíduos trazem para incluir nas arenas políticas. Em
alguns casos, estas associações são consideradas como problema por frustar
políticas justas e construtivas devido à força de atuação de certas facções, mas há
várias experiências em que estas organizações atuam com sucesso na resolução
de problemas dos governos, que melhoram a performance econômica e a
eficiência do Estado.
Nas redes de relações construídas nas comunidades algumas pessoas
que, por conseguirem transitar em diferentes espaços, promovem o intercâmbio
contínuo entre as diferentes iniciativas da sua comunidade e dos espaços
externos, transmitindo e reproduzindo as experiências dos diferentes contextos.
Estes atores constituem referências importantes para as organizações setoriais,
cuja ação não está vinculada a uma base geográfica definida (cooperativas de
crédito, cooperativas de comercialização, organizações dos produtores orgânicos,
apicultores, etc.), pois têm o papel de garantir a difusão dos temas e a adesão, no
âmbito das comunidades, às lutas desenvolvidas por tais organizações (COSTA,
2002).
Assim, as distintas trajetórias associativas dos representantes dos
agricultores familiares nos Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural e
GGETESPA podem determinar diferentes capacidades de intervenção.
Na formação dos espaços institucionais de participação uma
preocupação muito grande com a presença paritária ou majoritária dos
destinatários das políticas, mas não há um debate sobre a atuação e a capacidade
individual de intervenção destes e também, dos representantes das instituições do
governo. Segundo Holmes e Scoones (2000) os procedimentos usados em
processos deliberativos se preocupam apenas com os aspectos institucionais das
estruturas de poder, mas, não se atêm à existência de poder inerente ao indivíduo.
Primeiro, um ator dentro da arena de discursos pode empregar estratégias e
táticas para alcançar os objetivos desejados, mesmo se eles tenham concordado
em adotar um estilo de argumentação aberto, honesto e confiável. Alguns
participantes podem ser menos escrupulosos que outros no tipo de argumentos
que utiliza e no modo como estes são camuflados e outros podem,
96
deliberadamente, ofuscar fatos e julgamentos para o seu próprio benefício e para
o benefício de seus próprios argumentos. Segundo, participantes em processos
deliberativos costumam compartilhar agendas e valores comuns,
consequentemente, grupos de representantes irão formar pactos naturais para
assegurar que seus pontos de vista sejam bem sucedidos. Terceiro, alguns
representantes podem tentar apresentar uma imagem particular deles mesmos
para evocar uma imagem aceitável para os outros ou apresentar uma posição
totalmente falsa para minimizar a argumentação e o debate.
Hannah Arendt (1963, p. 174, tradução nossa) afirma que:
Diferente da força, que é um dom e a possessão de cada homem
isoladamente contra todos os outros homens, o poder vem à tona
somente se e quando os homens unem-se com o propósito de
ação e isto irá desaparecer quando, por qualquer razão, eles se
dispersem e abandonem uns aos outros. Portanto, unindo-se e
compromentendo-se, agrupando e convocando são os meios pelo
qual o poder é mantido; onde e quando os homens conseguem
manter intacto o poder que surge entre eles durante o transcurso
de qualquer ato ou ação, eles estão em processo de fundação,
de constituição de uma estrutura estável para acomodar seus
poderes combinados de ação.
O poder surge quando e onde as pessoas reunem-se e unem-se através de
promessas, pactos e comprometimentos mútuos. Isto é, como complementa
Habermas (1983, p.173, tradução nossa), quando “[...] as partes são orientadas
para o acordo e não somente aos seus próprios respectivos sucessos.”
Assim, percebe-se que o cidadão ordinário o é o principal protagonista
dos novos espaços participativos para a elaboração e monitoramento das políticas
públicas, mas as organizações civis legalmente investidas como representantes
de setores sociais pretendidos por estas políticas (LAVALLE; HOUTZAGER;
CASTELL, 2005). Isso ficará mais claro na análise do processo de representação
nos espaços institucionais de representação social, principalmente, quando o foco
recair sobre o GGETESPA.
Resumindo, veja a Figura 4, esta possibilita a visualização clara de que,
além da configuração dos espaços, a trajetória familiar, educacional e social dos
representantes e a trajetória associativa dos municípios ou território, também têm
97
consequências diretas na atuação destes representantes nos espaços
institucionais de participação social.
Capacidade de intervenção do representante
Configurações
institucionais
As reuniões periódicas permitem o contato face-a-face, que aumenta a percepção de
semelhança, encoraja a decisão tomada por consenso e pode realçar o status de igualdade.
Isto parece aumentar a congruência e o reconhecimento de interesses, mas, também
aumenta a possibilidade de conformidade através da intimação (MANSBRIDGE, 1980).
Espaços no qual grupos cultural e socialmente diferenciados compartilham o mesmo espaço,
as pessoas menos afortunadas nestes aspectos se sentem intimidadas pelo requerimento de
argumentos e procedimentos formais cheios de regras (YOUNG, 1996).
Trajetória dos
repesentantes
As normas de deliberação também privilegiam falas que são formais e gerais. Estas normas
de articulação, entretanto, precisam ser aprendidas, elas são culturalmente específicas, e em
situações reais de fala, a exibição de tal estilo de fala é um sinal de privilégio social (YOUNG,
1996).
O nível de escolaridade e a sociabilidade possibilitada por ele é um fator relevante na
capacidade de participação sócio-política dos indivíduos (FEDOZZI, 2002).
Os atores com engajamento ativo e relações com outros espaços são mais aptos do que os
cidadãos comuns para organizar um conhecimento próprio, derivado da experiência oriunda,
tanto da vivência prática do problema quanto da convivência com outros que partilham um
interesse comum (MAIA, 2002; MANSBRIDGE, 1996; FEDOZZI, 2002; CORNWALL, 2002a).
Fatores
Condicionantes
Trajetória associativa
É importante transitar em espaços diferenciados, onde posições diferenciadas daquelas
reinantes no próprio grupo. Para a maioria das pessoas, dispender tempo em um grupo
oposto e externo promove lições importantes de um espaço para o outro (MANSBRIDGE,
1996).
Algumas pessoas promovem o intercâmbio contínuo entre as diferentes iniciativas da sua
comunidade e dos espaços externos, transmitindo e reproduzindo as experiências dos
diferentes contextos, garantindo a difusão dos temas e a adesão, no âmbito das
comunidades, às lutas desenvolvidas pelas organizações (COSTA, 2002).
As organizações sociais têm um papel central nas sociedades democráticas modernas,
ajudando a acertar a agenda política, fazendo escolhas desta agenda, implementando estas
escolhas e formatando as crenças, preferências, entendimentos próprios e hábitos de
pensamento e ação que os indivíduos trazem para incluir nas arenas políticas (COHEN;
ARATO, 1992).
Figura 4: Matriz sistematizadora da dimensão capacidade de intervenção do
representante frente aos seus fatores condicionantes.
98
4.4 A representação dos agricultores familiares nos espaços
institucionais de participação social
Os Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural e os Grupos Gestores
dos Territórios são espaços institucionais de participação social que podem ser
concebidos pela via da democracia representativa, que, segundo Bobbio (2002),
significa genericamente que as deliberações coletivas, isto é, as deliberações que
dizem respeito à coletividade inteira, são tomadas não diretamente por aquelas
que dela fazem parte, mas, por pessoas eleitas para esta finalidade.
A representação é necessária porque a vida social moderna exige a ação
de algumas pessoas e instituições em um local com conseqüências em muitos
outros locais e instituições. Nenhuma pessoa pode estar presente em todas as
tomadas de decisões cuja ação afete a sua vida, porque estas o muitas e
dispersas. Assim, as pessoas esperam que outros pensem sobre as situações
como se fossem elas próprias e a representem (YOUNG, 2000).
Quando se fala em democracia representativa geralmente se aponta para
aquela em que todos os cidadãos maiores de idade, que estão no gozo de seus
direitos políticos, participam do processo elegendo representantes para os
poderes legislativos e chefes de executivos. Assim, seu direito de manifestação
não considera condições particulares como classe, raça, etnia, gênero, entre
outras (PINTO, 2004). Entretanto, na sociedade civil moderna, pluralística e
diferenciada, os indivíduos pertencem a muitos grupos distintos, atuam uma
variedade de diferentes papéis e tem identificações comuns que são operativas
em diferentes níveis da estrutura social. As fontes e os recursos da identidade
individual são múltiplos e heterogêneos (COHEN, 1996).
Os espaços institucionais de participação social objetivados neste estudo
privilegiam a participação dos agricultores familiares, reconhecendo a identidade
deste grupo de atores, mesmo ciente de que estes não são homogêneos, mas
conseguindo distinguí-los em relação a outros grupos e indivíduos.
99
Seyla Benhabib (1996a) aponta que a tendência global à democratização
ainda enfrenta muitas oposições e antagonismos em nome das várias formas de
diferença, como as étnicas, nacionais, linguísticas, religiosas e culturais. Assim,
surge uma nova política pelo reconhecimento de formas de identidades coletivas.
Considerando que a procura de identidade inclui a diferenciação de si próprio em
relação aos outros, a política de identidade é, sempre e necessariamente, a
política da criação da diferença.
Sempre o perigo de que as identidades sejam dogmatizadas dentro de
alguma essência naturalística ou imutável e a diferença gere ressentimentos
destrutivos e medos. O que mantém isso dentro de certos limites é a política de
desafio e problematização mútua que constantemente faz os membros lembrarem
da natureza contigente de suas identidades com o desafio do outro, a
problematização das certezas, o reconhecimento das ambiguidades dentro dele
mesmo, assim como, as diferenças deles com outros (PHILIPS, 1996).
Martin (2000, p. 583, tradução nossa) afirma que “[...] a identidade longe de
ser um estado que caracteriza um isolamento, é uma construção evolutiva que
vem dar o sentido e o valor (positivo ou negativo) a uma relação ou a um conjunto
de relações.” Assim, estas relações entre o representante e os representados,
entre os próprios representantes e entre estes e os atores externos, determinam
identidades em diferentes níveis de construção e, também, formas variadas de
mediação entre o mundo externo e a comunidade rural.
Nestes espaços de participação, se estabelece uma arena de concorrência
e relações de poder entre diversos modos de identificação
8
social. No decorrer
das discussões, os grupos vão se agrupando e se distanciando de acordo com os
diversos interesses. Assim, percebe-se que estas negociações e disputas estão
presentes no dia a dia destas arenas, pois segundo OLIVIER DE SARDAN (1995)
os atores sociais assumem três funções que são contraditórias e ambíguas:
A defesa de seus próprios interesses pessoais;
8
Goldman (2001, p.57) citando Michel Serres (1997) lembra que “[...] as 'identidades' são sempre o
resultado do empobrecimento de um número infinito de “pertencimentos” (a uma família, a um
gênero, a um país...) a que todos estamos submetidos.” Assim, os grupos que têm suas origens
nas comunidades rurais, em muitos momentos “pendem” para as influências externas.
100
A defesa dos interesses de sua instituição (ou de sua comunidade rural);
A mediação entre os diversos interesses de outros atores e facções
locais.
Verifica-se, então, que mesmo estando preocupados em justificar o seu
papel social, os representantes estão permeados por múltiplos interesses, o que,
muitas vezes, torna o processo de representação ambíguo e contraditório. Isso
pode ser verificado no caso da representação dos agricultores familiares.
Os espaços sociais constituídos no âmbito dos locais de moradia no meio
rural não são marcados por relações casuais e inconstantes; ao contrário,
conformam uma teia social complexa e ordenada. Constituem uma esfera
intermediária entre o doméstico e o público, apresentando um adensamento de
laços sociais, no qual o pertencimento a um local, onde as redes de relações
interpessoais são essenciais para manter as estratégias econômicas das famílias,
como também para outros âmbitos da vida humana, faz com que os integrantes do
meio rural compartilhem um sistema sociocultural próprio, em que as crenças e as
normas complementam as relações e instituições sociais (DURSTON, 2002).
Estas redes de relações se inserem na vida cotidiana dos agricultores
familiares desde os primeiros anos. Na infância e na juventude, o local no qual
tende a ocorrer uma sociabilidade mais intensa é a escola, onde, além de se dar a
formação educacional, expandem-se os laços de sociabilidade através de contatos
efetivos entre os próprios elementos da comunidade rural e entre estes e outros
atores externos.
Outro fator extraordinariamente impactante na formação política dos
agricultores familiares é a influência da Igreja Católica, que como pode ser visto
também nas organizações sociais urbanas, teve um papel deteminante na
construção simbólica e material dos atores sociais, através da intervenção social
protagonizada pelos seguidores inspirados pela Teologia da Libertação, na qual os
atores renunciando ao seu próprio protagonismo, buscando a empatia com a
população, trabalhavam silenciosamente ao lado da opressão vivenciada no
período militar (LAVALLE; HOUTZAGER; CASTELLO, 2005).
101
Entretanto, apesar de ter uma trajetória em que a vida em sociedade é
bastante presente, os estudos referentes a sua participação política nos espaços
de participação social mostram que os agricultores familiares ainda não
conseguiram exercer plenamente o seu papel como representante nestes
espaços.
As dificuldades de intervenção dos representantes dos agricultores
familiares podem ser observados em Silva e Marques (2004) quando estes
afirmam que a presença majoritária dos representantes dos agricultores familiares
nos CMDRs não tem garantido a esperada simetria entre os agricultores e os
outros membros destes Conselhos e isto pode ser compreendido analisando
fatores, como: a) os custos envolvidos na atuação destes conselheiros, que no
caso dos agricultores, precisam deixar o trabalho e arcar com os custos de
deslocamento e outras exigências que se colocam para a participação dos
agricultores (ao contrário dos representantes governamentais que de certa forma
são remunerados para participarem destes espaços); b) a menor disponibilidade
de renda e tempo dos agricultores em relação aos outros membros do conselho;
c) as competências necessárias para intervir de forma ativa e propositiva nestes
espaços, como a posse de conhecimentos técnicos, a compreensão do
funcionamento da máquina administrativa e o domínio e habilidade no uso da
capacidade argumentativa (que colocam os representantes do governo em
posição de superioridade por sua trajetória educacional e profissional, pelo acesso
à informações privilegiadas e pelo “poder simbólico” associado à sua posição) e;
d) a grande fragilidade dos próprios atores sociais (movimentos, associações,
cooperativas e/ou sindicatos de trabalhadores rurais) que não conseguem se
constituir em canais de absorção, processamento e expressão de interesses e
demandas difusas do “mundo da vida” dos agricultores familiares, não ganhando
assim, reconhecimento e sustentação social. Além disso, os autores apontam que
em alguns casos se observa um processo oposto, no qual encontram-se
organizações e movimentos mais autônomos e ativos, que se recusam a participar
de forma efetiva nos conselhos, exatamente em nome da manutenção desta
autonomia frente ao risco da cooptação.
102
Esta fragilidade dos representados e, consequentemente, dos
representantes tem suas conseqüências. Primeiramente, eles afirmam que esta
fragilidade repercute de forma negativa sobre o processo de representação, pois
muitos representantes tornam-se representantes de si próprios, por não terem o
respaldo e o controle das organizações a qual eles representam no conselho. Em
segundo lugar, tal vulnerabilidade torna difícil a possibilidade de expressão e
processamento público das demandas e propostas dos setores que
tradicionalmente são excluídos dos centros de decisão política. Finalmente, esta
vulnerabilidade faz com que não sejam expostos os conflitos e as relações de
poder existentes, passando apenas a reproduzir e legitimar, com o “aval da
participação”, as relações de dominação previamente existentes (SILVA;
MARQUES, 2004).
Assim, concluindo a trajetória pelos estudos de autores que abordaram a
temática da representação, passar-se-á ao estudo, propriamente dito, da
representação dos agricultores familiares em espaços institucionais de
participação social do Sudoeste do Paraná.
103
5 OS FATORES CONDICIONANTES DA REPRESENTAÇÃO DOS
AGRICULTORES FAMILIARES
Os fatores condicionantes da representação dos agricultores familiares
foram selecionados a partir da pesquisa exploratória teórica e empírica, nas quais
se evidenciou a importância dos fatores: configuração dos espaços, trajetória dos
representantes e trajetória associativa do município e território. Assim, estes
fatores foram selecionados por permitir a análise do processo da representação,
evidenciando as similaridades e os contrastes existentes nos espaços
institucionais de participação social do território Sudoeste.
A caracterização dos três fatores condicionantes da representação dos
agricultores será realizada a partir dos dados encontrados na pesquisa de campo
realizada nos espaços institucionais de participação social e no seu entorno.
5.1 As trajetórias associativas do Território Sudoeste e dos municípios
A primeira condicionante da representação que irá ser abordada neste
estudo, será a trajetória associativa do território Sudoeste e dos municípios de
Itapejara d’Oeste e Vitorino.
5.1.1 A trajetória associativa do Território Sudoeste
Os agricultores familiares do território Sudoeste do Paraná têm uma história
de organização e ação coletiva marcada pela introdução de experiências
participativas e pelo nascimento de inúmeras organizações oriundas do
protagonismo das próprias famílias de agricultores. Esta história começou a se
104
desenrolar logo na chegada dos “colonos” no território, exemplificado pela Revolta
dos Posseiros ocorrida em 1957, e chega aos dias de hoje, quando a cada dia
estes agricultores multiplicam o seu espaço de atuação a partir de novas
experiências organizativas. Este processo que será abordado nesta seção
influenciou a introdução de espaços participativos iniciado nos anos 1990 e, a
partir disto, também, sofre influência destes. Consequentemente, este processo
também interfere na representação dos agricultores familiares nos espaços
intitucionais de participação social enfocados nesta pesquisa. Assim, iniciar-se-á a
abordagem deste tema pela chegada destes agricultores ao território.
A partir da década de 1940, os colonos gaúchos e catarinenses começaram
a chegar, o que determinou a exclusão do caboclo do território, pois o seu sistema
agrícola de pousio florestal e suas formas sociais não conseguiram sobreviver à
lógica da posse da terra e da mercadoria que vieram com esses migrantes.
Estes colonos estabeleceram-se no território pela ocupação de terras
devolutas, pela compra da posse do caboclo e através da colonização dirigida,
principalmente a de iniciativa oficial através da Colônia Agrícola Nacional General
Osório Cango. Entretanto, por questões judiciais somada ao apoio de políticos
influentes, a Clevelândia Industrial Territorial Ltda. CITLA e outras companhias
receberam a titulação da Gleba Missões e Gleba Chopim, cuja área
representavam quase todo o atual Sudoeste do Paraná (LAZIER, 1986;
WACHOWICZ, 1987).
Assim, os agricultores se viram obrigados a pagar as terras para estas
companhias, que empregavam bandidos e jagunços para forçar os posseiros a
lhes entregar o dinheiro. Iniciando um período de muitos crimes, como, mortes,
desaparecimentos, espancamentos, extorsões, etc. Até que, em 1957, cansados
da passividade da polícia e do poder judiciário e, consequentemente, das
injustiças, os posseiros e o povo das cidades resolveram colocar um paradeiro na
situação pelas próprias mãos, organizando a tomada de várias cidades e a
expulsão das companhias, conhecida como a Revolta de 1957 ou Revolta dos
Posseiros.
105
Após o levante, a luta continuou objetivando a transformação dos posseiros
em proprietários. Mas, a ausência de estruturas organizativas de representação
dos interesses dos colonos abriu espaços para que segmentos sociais urbanos
(militantes políticos, profissionais liberais e comerciantes locais) pudessem se
configurar, no momento em que o conflito passou a ser travado no âmbito do
Estado, nos mediadores privilegiados dos agricultores em luta (DESER, 1993). Em
1961 as glebas foram declaradas de utilidade pública e, em 1962, foi criado o
Grupo Executivo para as Terras do Sudoeste do Paraná GETSOP, para
organizar a legalização da posse da terra no território. Essa forma de colonização
determinou uma distribuição fundiária caracterizada pelas pequenas áreas de terra
e o predomínio da agricultura familiar.
Em 1966, surgiu a Associação de Estudos, Orientação e Assistência Rural -
Assesoar, a partir do trabalho de um grupo de missionários belgas ligados à
Congregação dos Missionários do Sagrado Coração em conjunto com um grupo
de profissionais liberais de Francisco Beltrão, que desenvolveram um trabalho de
reflexão, para renovar a ação pastoral da Igreja, através da formação de grupos
de catequese e incentivando o sindicalismo e o cooperativismo, para fortalecer a
capacidade de intervenção junto ao poder público e às estruturas de poder
regional (DESER, 1993). Atualmente, a Assesoar atende 23 municípios no
território, como pode ser visto na Figura 5, a seguir.
106
Figura 5. Mapa demontrativo dos municípios do Território Sudoeste do Paraná abrangidos
pela atuação da Assesoar, 2007.
Fonte: Pesquisa de campo, 2007.
Em sua fase inicial, a Assesoar voltou-se fundamentalmente para a
capacitação e formação de lideranças comunitárias nas capelas e paróquias do
território. Gradativamente, esta associação vai redirecionando a sua atuação
passando a privilegiar um trabalho mais voltado para a organização dos
agricultores, tanto no plano econômico como no político, valorizando, de um lado,
a criação do laboratório de análises de solos (1970), a formação de monitores
agrícolas (1972) e o desenvolvimento da assistência técnica e, de outro lado,
incentivando a criação de grupos de oposição sindical e a realização de cursos de
capacitação política (ASSESOAR, 1998; DESER, 1993).
Realizou, em conjunto com a Comissão Pastoral da Terra - CPT, o trabalho
de discussão a respeito dos rumos do movimento sindical, do descontentamento
com a gestão das cooperativas, dos efeitos negativos, tanto da migração para as
regiões centro-oeste e norte do país, quanto do assalariamento nas cidades, do
descumprimento dos direitos sociais inscritos na legislação vigente, da dificuldade
de acesso à terra, enfim, da situação global dos trabalhadores no campo. A partir
107
disso, incentivou os colonos a se organizarem em oposições sindicais (DESER,
1993).
Em 1964 constituiu-se o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Francisco
Beltrão, tendo como principais preocupações as questões de saúde e previdência
social. Este sindicalismo, ligado à Federação dos Trabalhadores na Agricultura do
Estado do Paraná Fetaep, mais assistencialista e atrelado ao Estado, perdurou
neste município até 1978, quando um grupo de oposição ganhou as eleições
deste sindicato. Este grupo tinha como proposta, a discussão sobre o processo
organizativo e produtivo e o crédito, frente à conjuntura reinante devido ao
processo de modernização no campo.
Paralelamente, as agências do governo, principalmente a extensão rural
oficial, fomentaram a organização dos agricultores em associações a partir dos
programas e projetos de desenvolvimento comunitário, que previam a distribuição
de recursos através das associações organizadas nos municípios.
Durante a década de 1980, a proposta do sindicalismo de Francisco Beltrão
começou a se expandir por outros municípios do território, como Dois Vizinhos,
Marmeleiro e Capanema, consolidando um movimento sindical de representação
dos agricultores em diferentes instâncias, como, a organização nas cadeias e
processos produtivos e proposição de políticas para a produção e para a melhoria
da vida das famílias rurais
1
. Hoje, esta proposta coordenada pela Federação dos
Trabalhadores na Agricultura Familiar da Região Sul Fetraf-Sul, atinge 27
municípios do território, sendo que em três municípios, como no caso de Itapejara
d’Oeste, este grupo não conseguiu assumir o Sindicato dos Trabalhadores Rurais,
assim, organizou-se paralelamente através da Associação Sindical dos
Agricultores Familiares Assintraf. A abrangência desta ação coordenada pela
Fetraf-sul, pode ser verificada na Figura 6, a seguir.
1
O processo ocorrido na região Sudoeste do Paraná é muito semelhante ao relatado por Navarro
(1996) e Schmitt (1996) em relação ao movimento sindical dos trabalhadores rurais do Rio Grande
do Sul.
108
Figura 6. Mapa demonstrativo da abrangência da atuação da Fetraf-Sul nos municípios do
território Sudoeste do Paraná, 2007.
Fonte: Pesquisa de campo, 2007.
Nos anos de 1982 e 1983, começou a mobilização do Movimento dos
Agricultores Sem Terra do Sudoeste - MASTES, que reunido com os agricultores
mobilizados em outras regiões do Paraná e mais 11 estados principalmente Rio
Grande do Sul e Santa Catarina - realizou em 1984, o I Encontro Nacional dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra, que motivou a realização do I Congresso
Nacional dos Trabalhadores Rurais Sem Terra em 1985, no qual ocorreu a
fundação do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra MST (NAVARRO, 1996;
ASSESOAR, 1998).
Paralelamente, ocorrem várias manifestações dos agricultores. Os
suinocultores se mobilizam em 1983 devido à peste suína e aos baixos preços de
seu produto. Em 1987, numa conjuntura de endividamento e êxodo rural, os
agricultores se mobilizam para solicitar a anistia para as suas dívidas.
Além disso, os agricultores do território integraram os movimentos e as
mobilizações dos agricultores que participaram ativamente dos debates da
Constituição de 1988, alcançando algumas vitórias importantes como a
aposentadoria das mulheres agricultoras, a diminuição da idade para
109
aposentadoria dos agricultores homens e o aumento da aposentadoria mínima, de
meio, para um salário.
Em 1989, as organizações de agricultores começaram a rediscutir a sua
própria organização: a Assesoar acompanhava as questões mais técnicas da
produção e o movimento sindical as questões mais políticas. Então quem iria
coordenar o associativismo? Assim, criou-se a Crapa Coordenação Regional
das Associações de Pequenos Agricultores - para acompanhar o associativismo
no território.
A Crapa ficou alguns anos trabalhando, prioritariamente, o associativismo
em comunidades do território, estruturando as organizações e aprofundando a
formação dos agricultores neste aspecto. Este processo avançou, até o ponto em
que se percebeu que os agricultores queriam uma resposta mais concreta de suas
organizações. Assim, definiu-se, em 1995, que caberia aos sindicatos atuar sobre
as demandas político-educacionais, a Assesoar teria o papel de assessoria nas
áreas pedagógicas e de produção e a Crapa iria se dedicar à organização
econômica. A Crapa começou, então, a discutir, paralelamente ao associativismo,
a organização da agroindustrialização e a comercialização regional da produção
dos agricultores familiares (KIYOTA, 1999). Nos dias atuais, a Crapa que trocou
sua denominação para Cooperativas da Agricultura Familiar Integradas Coopafi,
atua através de cooperativas de comercialização, que abrangem 17 municípios do
território, como pode ser verificado na Figura 7.
110
Figura 7. Abrangência da atuação da Crapa/Coopafi no território Sudoeste do Paraná,
2007.
Fonte: Pesquisa de campo, 2007.
A crise da agricultura no território Sudoeste perdurou pela década de 1990,
motivando a realização de inúmeras mobilizações. Em 1991, ocorreu a
movimentação “Salve Agricultura”, delatando as dificuldades de acesso ao
financiamento, os baixos preços dos produtos e os altos juros. O movimento “SOS
Vida” ocorreu em 1992 denunciando o êxodo rural, queda de preços, etc.
Os agricultores do território Sudoeste participaram ativamente das
discussões sobre o tipo de agricultura e desenvolvimento desejado pelos
agricultores, que ocorreu no país. Isto culminou com a realização do “Primeiro
Grito da Terra Brasil”, em 1994, que consolidou o conceito de agricultura familiar e
avançou na elaboração de políticas para o desenvolvimento desta categoria.
Constituindo em 1995, o Programa de Valorização da Agricultura Familiar
Provaf. Seguido, logo depois, pelo Programa Nacional de Fortalecimento da
Agricultura Familiar – Pronaf que perdura até hoje.
Paralelamente, em alguns municípios ocorre a discussão da importância de
haver um plano de desenvolvimento que seja elaborado com a participação efetiva
da população rural. Assim, o município de São João elabora o “Plano de
111
Desenvolvimento Rural do Município de São João”, com a participação das
instituições municipais, Emater e as comunidades rurais. Como este processo foi
acompanhado pelo Ministério da Agricultura, São João foi o primeiro município a
ser selecionado para receber os benefícios da Linha Infra-estrutura e Serviços do
Pronaf.
Com a implementação do Pronaf e de outros programas federais e
estaduais, o corpo técnico da Emater e das prefeituras de todos os municípios do
território coordenaram a elaboração dos planos de desenvolvimento rural ou
agrícola e a formação dos conselhos municipais. A participação dos agricultores
familiares neste processo foi diferenciada em cada município, em alguns destes, o
processo foi um avanço para a ação dos agricultores familiares, mas, em outros, o
processo continuou nas mãos de poucos, além do executivo municipal.
Mesmo com o Pronaf, os agricultores continuaram a ter dificuldades para
acessar os recursos através do crédito, assim, em 1996, surgiu a primeira
Cooperativa de Crédito com Interação Solidária Cresol no território Sudoeste,
para superar os problemas decorrentes da burocratização e centralização dos
bancos que operacionalizavam o crédito para a população rural. No ano de 2007,
a Cresol atingiu a abrangência de 41 municípios no território
2
, como pode ser
visualizado na Figura 8.
2
Incluindo o município de Vitorino, que não era atendido em 2005, quando foi realizada a primeira
etapa da pesquisa de campo.
112
Figura 8. A abrangência da atuação da Cresol nos municípios do território Sudoeste do
Paraná, 2007.
Fonte: Pesquisa de campo, 2007.
Em 1999, começou a surgir a proposta do Fórum Intergovernamental e da
Sociedade do Sudoeste do Paraná, que foi formado por 83 instituições, sendo 41
instituições governamentais e não governamentais
3
de abrangência regional
4
e os
conselhos dos 42 municípios do território (HOLOWKA; KIYOTA; PAZ, 1999). O
Fórum elaborou o Plano de Desenvolvimento Sustentável da Região Sudoeste do
Paraná, a partir das demandas e prioridades levantadas a partir dos conselhos
municipais e cada etapa da elaboração e priorização do Plano, foi aprovada pela
assembléia deste espaço.
O Fórum Intergovernamental foi importante no processo da região,
porque conseguiu juntar a sociedade civil e governamentais para
discutir uma proposta de desenvolvimento regional e criou um
plano a partir das assembléias, debates, seminários... (M. R.,
agricultor familiar, representante no Fórum e no GGTESPA).
3
Não havia a exigência de paridade entre governamentais e não governamentais na composição
do Fórum, mas, a sua coordenação era paritária com a participação de 4 instituições
governamentais e 4 não governamentais.
4
Estas instituições tinham atuação na totalidade da região ou parte desta.
113
Até 2003, o Fórum conseguiu muitas conquistas a partir da demanda do
território: foi realizado um curso de pós-graduação em Desenvolvimento Rural
para os agentes do território; o Seminário Estadual de Juventude Rural: Educação,
Crédito e Desenvolvimento que resultou no PRONAF Jovem para todo o país; a
alimentação escolar foi tema de seminários e até mesmo de uma publicação do
próprio Fórum; algumas instituições governamentais e não governamentais
elaboraram alguns projetos em conjunto e; muitas instituições do território
utilizaram o Plano elaborado pelo Fórum para fazer o planejamento de suas
atividades. Entretanto, no momento de manter a integração das instituições na
execução das ões, este processo não foi suficiente para consolidar um projeto
conjunto de desenvolvimento para o território.
Em 2002 é criado o Sistema de Cooperativas de Leite da Agricultura
Familiar Sisclaf, para organizar a produção e comercialização do leite, um dos
principais produtos da agricultura familiar do território. Hoje, este sistema atua em
22 municípios do território, como pode ser observado na Figura 9.
Figura 9. A abrangência do Sisclaf nos municípios do território Sudoeste do Paraná, 2007.
Fonte: Pesquisa de campo, 2007.
114
No ano de 2002, também ocorreu o Seminário de Desenvolvimento Rural
Sustentável dos Municípios da Fronteira, com a participação de organizações
governamentais e não governamentais desta microrregião do Sudoeste, que
resultou na criação de um consórcio destes municípios visando a infra-estrutura de
comercialização da agroindústria familiar da cana-de-açúcar. Como este foi o
primeiro projeto supra-municipal do PRONAF - Infra-estrutura e Serviços, quando
surgiu a proposta do MDA de territórios, em 2003, esta foi a primeira composição
de municípios proposta para o Território Sudoeste do Paraná.
Entretanto, a experiência do Fórum Intergovernamental e da Sociedade do
Sudoeste do Paraná foi determinante para a formação final do Território Sudoeste,
que culminou com a participação dos mesmos 42 municípios. Como,
praticamente, todos aqueles que atuam ativamente das ações do território
participaram direta ou indiretamente do Fórum Intergovernamental, este continua
sendo um balizador para a formação e as atividades do território. Isto é visível nas
discussões das oficinas e reuniões do Território Sudoeste, onde o Fórum é
sempre citado como referência.
Na formação atual do GGETESPA, isto é, na composição existente
após a junção dos 42 municípios, estão inseridas todas as oito intituições que
compunham a coordenação do rum. A coordenação do Fórum era formada
pelas seguintes instituições: Associação dos Municípios do Sudoeste do Paraná -
Amsop, Associação dos Secretários Municipais de Agricultura da Região de Pato
Branco - Assec, Associação de Estudos, Orientação e Assistência Rural -
Assesoar, Associação dos Secretários Municipais de Agricultura e Meio Ambiente
da Região de Francisco Beltrão – Assmam (hoje, Assema), Coordenação Regional
das Associações de Pequenos Agricultores – Crapa (hoje Coopafi), Empresa
Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural Emater/PR (hoje, apenas
Emater e é Instituto em vez de Empresa), Núcleo Sindical dos Trabalhadores
Rurais do Sudoeste do Para (hoje, Acesi/Fetraf-Sul) e o Sistema de
Cooperativismo de Crédito Rural (hoje, Cresol). Como pode ser observado houve
a troca de algumas denominações, mas as organizações são as mesmas.
115
Quase todas as instituições presentes no GGETESPA faziam parte da
constituição do Fórum, com exceção da Maytenus. Considerando as organizaçoes
não governamentais que compõem o GGETESPA, percebe-se que aquelas que
estavam ausentes na coordenação do Fórum, são aquelas que no GGETESPA
não têm como representantes os próprios agricultores familiares
5
ou são muito
recentes, não estando em atividade ou com atuação restrita no período do Fórum,
como o Sistema de Cooperativa de Leite da Agricultura Familiar Sisclaf e a
Associação das Agroindústrias Familiares do Sudoeste do Para - Afasp. Isso
pode ser comprovado na fala de um dos representantes:
[...] E hoje nós estamos vivendo este processo de território, aonde
os atores são importantes e não muda, são as mesmas
organizações do Fórum Intergovernamental, talvez, um pouco
mais reduzido, porque na época do Fórum tinha 83 entidades, hoje
na coordenação do território são 24 organizações, Mas, o que eu
quero dizer é que uma vontade de construir um plano, não de
construir, de resgatar um pouco o plano, a história que foi feita
por rias organizações e o que precisa é trabalhar a
reorganização para o desenvolvimento a partir das prioridades
tiradas do Fórum e aquilo que hoje podemos trabalhar em termos
de território (M. R., representante do GGETESPA e Fórum).
Desta forma, percebe-se que, considerando a representação dos
agricultores familiares, as principais organizações estavam presentes na
coordenação do Fórum. Consequentemente, os agricultores familiares destas
organizações já vêm atuando em espaços institucionais de participação social com
a abrangência do Território Sudoeste desde 1999. Mesmo que seja considerado
algumas trocas de atores que representam determinadas organizações nestes
espaços, pode-se afirmar que estes atores atuais estiveram direta ou
indiretamente envolvidos neste processo, desde o início do Fórum. Isto, somado
ao período de atuação destes agricultores familiares em organizações supra-
municipais, propiciou uma trajetória bastante rica para estes representantes.
Na trajetória das organizações ocorrem vários momentos de ações
conjuntas e outras de conflitos, isso decorre das estratégias traçadas pelas
5
Centro de Apoio ao Pequeno Agricultor CAPA, Cooperativa Iguaçu de Prestação de Serviços
Cooperiguaçu, Instituto Maytenus, Movimento dos Atingidos por Barragens MAB, Movimento dos
Trabalhadores Sem Terra – MST e a Associação das Casas Familiares – Arcafar.
116
próprias organizações para estas atingirem os seus objetivos. uma tendência
destas organizações atuarem conjuntamente no avanço de sua abrangência pelo
território, como pode ser observado nos mapas mostrados anteriormente,
seguindo a evolução da organização dos próprios agricultores nos municípios.
Neste sentido, percebe-se apenas uma exceção, que é o rápido crescimento da
Cresol, que nos últimos anos teve uma evolução que não foi acompanhada pelas
outras organizações. Esta expansão é consequência de algumas mudanças de
estratégias e alianças, o que gerou alguns conflitos entre as organizações da
agricultura familiar do território e, consequentemente, para a atuação dos
representantes no GGETESPA.
Outro fato que mostra a organização dos agricultores familiares do território
é a existência de dois deputados do território, que iniciaram a sua vida política
dentro destas organizações e foram eleitos pela mobilização destas. Ambos estão
em seu segundo mandato, sendo estes, a deputada estadual Luciana Rafagnin e
o deputado federal Assis Miguel do Couto, ambos pertencentes ao Partido dos
Trabalhadores.
Desde o surgimento das primeiras experiências, as organizações dos
agricultores familiares foram se desenvolvendo a ampliando a sua abrangência
conjuntamente, isto é, quando havia um ambiente com agricultores favoráveis ao
estabelecimento de uma destas organizações, havia a tendência de, em pouco
tempo, ocorrer a discussão sobre a entrada de alguma outra. Nos últimos anos,
houve uma ampliação na abrangência e diversidade de experiências bastante
significativas no território. Isso é o resultado da potencialização do capital social
existente no território através das políticas públicas direcionadas para a agricultura
familiar.
Assim, desde a chegada dos colonos ao território houve a necessidade
destas famílias agirem em conjunto a favor de seus interesses individuais e
coletivos, este fato determinou um aprendizado para uma participação social e
política organizada mais horizontalmente, caracterizada por uma densa rede de
associações de famílias de agricultores e pela ativa participação nas ações
117
comunitárias. Entretanto, como pode ser visto, a seguir, este processo não ocorre
homogeneamente em todos os municípios do território.
5.1.2 A trajetória do Município de Vitorino
O município de Vitorino foi emancipado em 1960. Sua população atual tem
origem semelhante ao restante do território Sudoeste, isto é, gauchos e
catarinenses de origem predominantemente italiana, seguido, em proporções
menores, de alemães e eslavos (CELSO, 2004).
A sua população é de 6285 habitantes que ocupam a área do município de
307,95 km
2
(IBGE, 2000).
As primeiras atividades coletivas do município eram relacionadas às festas,
à religião e ao esporte. Em muitos momentos as atividades destas três
modalidades se confundiam, mas em outros não. Algumas comunidades tinham
até mais de um grupo de festas, algumas faziam bailes e outros tipos de festas
mensalmente para comemorar os aniversariantes de cada mês. A igreja tinha as
missas, os cultos, os casamentos, os velórios e a comemoração de datas
dedicadas aos santos. Os esportes praticados nas comunidades eram o futebol, a
bocha, o bolão, além dos jogos de cartas e outros em menor intensidade. Enfim,
todas estas atividades demandavam a organização coletiva para que estes
atingissem os seus fins, assim, estas foram as primeiras formas de organização
das famílias do município.
Posteriormente, o histórico associativo de Vitorino é marcado pela iniciativa
de terceiros, isto é, por instituições governamentais, políticos, etc. que fomentaram
o sindicalismo e as associações comunitárias.
O Sindicato de Trabalhadores Rurais de Vitorino foi criado em 1970, após a
criação do Sindicato dos Trabalhadores de Pato Branco. Ambos iniciados por
influência de um deputado, que discursava as vantagens do sindicalismo.
118
A partir desta data, esta organização foi presidida por três pessoas. O
primeiro presidente se manteve no cargo de 1970 a 1990, o segundo de 1990 a
1994, quando assumiu o terceiro (ZAGO; BERTOL, 2003), que permanece no
cargo até hoje. Sendo que este último, sempre teve atividades urbanas
relacionadas ao comércio e desde 1964 não atua mais como agricultor.
Hoje este sindicato, ligado à Federação dos Trabalhadores na Agricultura
do Estado do Paraná - FETAEP, tem atendimento odontológico, laboratório de
análises clínicas e diversos convênios médicos.
No final dos anos 1980 surgiu o Programa Paraná Rural que trabalhava,
principalmente, as questões de conservação e manejo dos solos objetivando as
microbacias hidrográficas. Este programa exigia a formação de uma Comissão
Municipal de Solos, que deliberava sobre os encaminhamentos e conflitos
existentes para a realização dos trabalhos relativos aos objetivos deste programa.
Esta comissão que contava com técnicos e representantes de agricultores foi a
precursora do atual CMDR.
Neste período, havia um trabalho da extensão rural para que as
comunidades rurais se organizassem em associações e muitos dos benefícios do
Programa só eram possíveis para aqueles organizados desta forma.
Nos meados dos anos 1990 o Programa Paraná Rural chegou ao fim e
projetou-se outro programa, o Paraná 12 Meses. Este novo programa exigiu a
constituição de um conselho para gerenciar as suas atividades. Paralelamente a
isto, houve uma discussão liderada pela Emater para que os municípios
discutissem a elaboração de um plano de desenvolvimento rural ou agrícola para
nortear as ões realizadas no município, que também necessitava de um
conselho para gerenciar a execução deste. Assim, como as ativididades do
Programa seriam baseadas neste Plano, em Vitorino ocorreu a junção destas
propostas em um único conselho, assim, surgiu o Conselho Municipal de
Desenvolvimento Rural de Vitorino, para gerenciar a execução do Plano Municipal
de Desenvolvimento Agrícola e consequentemente, as atividades do Programa
Paraná 12 Meses.
119
Este processo exigiu um trabalho mais intenso com as associações das
comunidades rurais, que eram a base deste conselho. Atualmente, 17
associações de agricultores familiares no município.
Apesar deste período ser lembrado como um período em que a gestão
municipal incentivou muito a organização dos agricultores, principalmente, na
pessoa do secretário municipal de agricultura, fica claro que a formação do
conselho ocorreu, estritamente, pela exigência dos programas governamentais.
Isto pode ser verificado na fala do extensionista que acompanhou este processo.
“Com certeza se não tivesse os Programas, o conselho não existiria” (D. C.,
extensionista da Emater).
Assim, neste município a dinâmica do processo organizativo é bastante
diferenciado daquele que será observado em Itapejara d’Oeste, não tendo reflexos
do ritmo e orientação das organizações existentes regionalmente.
5.1.3 A trajetória do Município de Itapejara d’Oeste
O município de Itapejara d’Oeste tem 9162 habitantes e uma área de
254,08 km
2
(IBGE, 2000).
As primeiras experiências organizativas do município ocorreram nas ões
da Igreja e da comunidade propriamente dita, através das festas, torneios
esportivos, velórios e também, nas atividades produtivas em que alguns vizinhos
se juntavam para ajudar uns aos outros. Assim, as comunidades iam se
organizando ao redor da igreja, da escola, da cancha de bocha, do campo de
futebol, do jogo de cartas, etc.
A partir de 1988, houve um trabalho intensificado da Prefeitura Municipal e
Emater em formar as associações nas comunidades para viabilizar o recebimento
dos recursos do Programa Paraná Rural do governo estadual. Itapejara d’Oeste foi
um dos municípios que sempre se destacou perante os outros do território, pelo
trabalho em conservação de solos que se apoiou fortemente nas associações das
120
comunidades. Apesar de algumas destas associações apresentarem muitas
dificuldades para se mobilizar, é deste período que resultam as associações que
compõem o conselho municipal atualmente. Além disso, o município tinha uma
Comissão Municipal de Solos, que ajudava a decidir questões técnicas sobre o
manejo de solos e águas, principalmente, quando estas causavam conflitos entre
proprietários de estabelecimentos vizinhos.
No início dos anos 1990, formou-se a Central das Associações que
congregava estas associações das comunidades e, também, as associações das
cadeias produtivas, como leite, suínos e peixes.
Em 1995, formou-se a Associação Municipal dos Profissionais ligados à
Agricultura - AMPA, composta por aproximadamente 12 profissionais da
Secretaria Municipal da Agricultura, Emater, Cooperativa e firmas de
planejamento. Estes profissionais atuavam na busca de práticas alternativas para
a produção dos agricultores do município.
O Sindicato de Trabalhadores Rurais sempre trabalhou no
acompanhamento dos impasses trabalhistas e também em questões mais
assistenciais, mantendo um laboratório de análises clínicas e até alguns anos
atrás, gerenciando o Plano de Saúde do hospital existente no município.
A partir de 2000 iniciou-se a discussão de trazer a Cooperativa de Crédito
com Interação Solidária - Cresol para o município, mas esta proposta esbarrou na
necessidade de que houvesse um grupo de agricultores familiares suficientemente
organizado para fazer a gestão deste processo no município. Como esta
discussão estava sendo liderada pela Câmara de Vereadores, esta proposta não
avançou para uma concretização nesta primeira tentativa.
Entretanto, em 2001, a Cresol foi proposta através do CMDR. Assim, foi
montada uma comissão com representantes da Câmara de Vereadores, STR,
Prefeitura, Emater e Central das Associações para coordenar os trabalhos. Foram
realizadas 19 reuniões nas comunidades e sede, com a participação de mais de
121
1000 agricultores
6
. Assim, a Cresol foi criada no município com 22 sócios
fundadores, tendo pelo menos um representante de cada associação.
Depois que a Cresol começou a dar resultados, indo nas comunidades
para discutir crédito, custeio, entre outros temas, cresceu o interesse por outras
experiências que estavam dando certo no território. Assim, iniciou-se a discussão
sobre a Cooperativa de Leite da Agricultura Familiar CLAF, pois o leite era uma
atividade importante para o município e havia uma associação daqueles que
produziam leite. Assim, esta associação, juntamente com a Cresol, Câmara de
Vereadores e CMDR, organizou a vinda de agricultores de outros municípios
vizinhos para relatarem a sua experiência com a CLAF em reuniões nas
comunidades. A partir disso, foi definida a implantação da CLAF no município.
Desta forma, a CLAF entrou em funcionamento no município, em março de 2004,
trabalhando, principalmente, na organização da comercialização do leite e na
compra coletiva de insumos. Neste ano, a CLAF está instalando uma plataforma
de recebimento de leite e uma unidade de transformação de leite no município
para atender o território.
Em 2004, também se iniciou a mobilização para a implantação da
Associação Sindical dos Agricultores Familiares Assintraf. Esta tem
implementado os programas viabilizados através da Federação dos Trabalhadores
da Agricultura Familiar na Região Sul – Fetraf-Sul
7
, organizado a formação política
dos agricultores familiares e mobilizado estes para outras questões considerados
relevantes no município e território.
Em 2005 começou-se a discutir a comercialização dos produtos da
agricultura familiar, assim, no ano seguinte a Crapa/Coopafi começou a atuar no
município e organizou um espaço, onde funciona um mercado para
comercializar os produtos dos agricultores do município e região.
6
Com repetição, pois alguns participaram na suas comunidades e na sede.
7
De fevereiro de 2004 a setembro de 2005, eles trabalharam com três programas: construção de
42 casas, num programa negociado com o Ministério das Cidades; proteção de 30 mananciais de
água e discussão de questões ambientais, programa viabilizado junto com a Petrobrás e estavam
iniciando um outro programa para reforma de casas.
122
As quatro organizações Cresol, Assintraf, CLAF e Crapa/Coopafi -
formam o Fórum Municipal dos Agricultores Familiares, que têm como convidados,
representantes da Câmara de Vereadores, Emater e Prefeitura. Esta organização
tem o objetivo de estabelecer as bases e ordenar as ações destas instituições em
relação à agricultura familiar do município, além de buscar minimizar as possíveis
diferenças de propostas e formas de condução existentes entre estas
organizações.
Estas organizações organizam as reuniões na sede ou nas comunidades,
em conjunto com as associações que participam do CMDR. Apenas no caso do
sindicalismo, isto é, Assintraf, que ocorre uma cisão mais clara entre os seus
participantes e aqueles que participam do STR.
Assim, como foi comentado na trajetória associativa regional, percebe-se
que quando os agricultores atingem um nível de organização suficiente para a
implantação de alguma destas entidades, geralmente, começam a manifestar o
interesse de buscar o estabelecimento de outras organizações que possam trazer
alternativas para minimizar os problemas encontrados por estes agricultores.
Consequentemente, este processo que ocorre no município, fortalece estas
organizações dos agricultores regionalmente.
5.1.4 As diferentes trajetórias do território e dos municípios
A trajetória das organizações no território tem origem nos problemas
enfrentados pelos posseiros no início da sua colonização, mas começa a ser
protagonizadas pelos agricultores, a partir da ação da Assesoar e da Comissão
Pastoral da Terra nas comunidades e nos sindicatos e, também, da Emater que
atuou no fomento das associações de agricultores nas comunidades rurais. A
ação da Assesoar e CPT era localizada em alguns municípios, mas a extensão
rural oficial envolveu todos os municípios do território. Assim, os municípios de
Itapejara d’Oeste e Vitorino iniciaram a sua discussão de organização rural com a
123
extensão rural oficial, através do trabalho de organização das associações nas
comunidades rurais.
Antes disso, houve a instalação dos sindicatos dos trabalhadores rurais,
mas este ocorreu mais pela iniciativa de lideranças políticas urbanas e, apenas,
posteriormente, que ocorre um envolvimento maior das famílias de agricultores.
Entretanto, no caso dos sindicatos destes dois municípios, estes atuaram mais em
questões assistenciais, não se envolvendo nas mobilizações dos agricultores
familiares ocorridas dos a partir dos anos 1980 até 2000. As oposições sindicais
fomentadas pela Igreja e Assesoar assumiram os sindicatos de alguns municípios
do território, que posteriormente formaram a Fetraf-Sul, mas isto não ocorreu nos
municípios de Vitorino e Itapejara d’Oeste.
Posteriormente, o território discutiu a formação de outras organizações para
suprir as diferentes necessidades dos agricultores, assim sugiram a
Crapa/Coopafi, a Cresol, Sisclaf, MST, etc. O município de Itapejara d’Oeste
acompanhou esta discussão à distância, e em 2000 começa a discutir a instalação
de uma unidade da Cresol, o que se torna realidade em 2001. Isso faz com que se
inicie o processo de discussão entre os agricultores em relação às outras
organizações, que começaram a ser instaladas no município, incluindo a Assintraf
que funciona paralelamente ao STR.
O município de Vitorino começa a ser envolvido por estas organizações
apenas em 2005, com o início da discussão sobre a Cresol. Mas, as outras
organizações ainda não estão sendo discutidas pelos agricultores do município,
pois, este município já faz parte da nova estratégia da Cresol, que desvinculou a
sua expansão à necessidade de mobilizacão dos agricultores familiares para que
isto ocorresse.
Assim, percebe-se que os municípios de Itapejara d’Oeste e Vitorino
tiveram o início de seu processo de organização bastante semelhante, sem a
atuação mais forte de uma Igreja com discursos próximos à Teologia da
Libertação, mas ainda, com um sentido bastante comunitário. Os dois municípios
tiveram uma forte atuação da extensão rural oficial na formação das associações
de pequenos agricultores nas comunidades e, como poderá ser visto,
124
posteriormente, na formação dos Conselhos Municipais. Ambos têm Sindicatos de
Trabalhadores Rurais orientados pela Fetaep, em que a discussão do
protagonismo da agricultura familiar ainda é uma questão secundária.
A partir do final dos anos 2000, o município de Itapejara d’Oeste começou a
pensar e buscou outras alternativas organizativas, inclusive levando esta
discussão para o CMDR e ampliando estas discussões para as comunidades.
Mas, Vitorino, permaneceu fora deste processo até 2005, quando inicia a
discussão sobre a Cresol. Entretanto, mesmo com a introdução da Cresol no
município, Vitorino permanece à margem das discussões regionalizadas, pois os
agricultores do município, ainda não demonstraram interesse em ampliar os seus
horizontes organizativos, visualizando a Cresol mais como um agente financeiro e
não como uma nova proposta de organização dos agricultores familiares.
Estas diferentes formas de pensar a organização dos agricultores
familiares, se reflete na representação destes nos espaços institucionais. Os
representantes de Itapejara d’Oeste tendem a trazer para dentro do CMDR as
discussões que estão sendo realizadas nas diferentes organizações
regionalmente. Os representantes de Vitorino, ainda, têm uma participação mais
passiva, se restringindo mais à pauta estabelecida pela Secretaria Municipal da
Agricultura e Emater. Esta diferença se deve às oportunidades que as
organizações municipais e regionais proporcionam aos agricultores familiares de
Itapejara d’Oeste, destes terem maior segurança para atuarem nos espaços
institucionais, por obterem maiores informações, maior capacidade de
compreender a conjuntura política e o funcionamento da “máquina” governamental
e, terem maior facilidade de participar das discussões, por já terem tido esta
experiência em outros espaços coletivos, onde seus argumentos foram
discutidos ou confirmados, gerando maior habilidade em como argumentar de
forma a obter resultados mais positivos, como foi visto nos estudos de outros
autores (FRASER, 1997; MANSBRIDGE, 1996; CHALMERS; MARTIN; PIESTER,
1997; FEDOZZI, 2002; CORNWALL, 2002a; MAIA, 2002).
125
5.2 A configuração dos espaços institucionais de participação social
Os espaços institucionais de participação social têm diferentes formas de
organização e funcionamento e isto é determinado por sua configuração. Neste
estudo verificou-se que, mesmo os espaços com origens e objetivos
aparentemente semelhantes, apresentam configurações diferenciadas como pode
ser verificado a seguir.
5.2.1 A configuração do CMDR de Itapejara d’Oeste
O Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural de Itapejara d’Oeste foi
constituído em 1997, porque havia a possibilidade deste município ser selecionado
para ser beneficiado pelo Pronaf Infra-estrutura e Serviços. O Programa acabou
não se tornando realidade no município, mas o CMDR permanece em
funcionamento até hoje
8
, “[...] para continuar a gerir o PMDR (Plano Municipal de
Desenvolvimento Rural) e todas as questões sobre os nossos trabalhos (Emater e
Departamento de Agricultura) no município passam pelo conselho.” (entrevista
conjunta do técnico da Emater e do técnico do departamento de agricultura, 2005).
Este espaço apresenta 29 membros e destes, 21 representam agricultores
familiares, isto é, é composto por representantes de 13 associações de
comunidades
9
(que congregam 19 comunidades rurais); 3 associações de cadeias
produtivas
10
; Central das Associações; Cresol; CLAF; Assintraf; STR;
Departamentos Municipais da Agricultura, Educação, Saúde e Esportes; Emater;
8
Apesar deste não ter sido legalizado por um decreto ou uma lei.
9
Associação dos Produtores Rurais da Barra do Vitorino, da Águas de Itapejara, da Volta Grande,
da Coxilha Rica, do Porto Velho, do Salto Grande, da Barra Grande, do São João, do Ipiranga, do
Rio Gavião, de Santa Bárbara, da Palmeirinha e de Lageado Bonito
10
Bovinocultura de leite, suinocultura e piscicultura.
126
Cooperativa Agropecuária Sudoeste Ltda Coasul; AMPA e das empresas de
planejamento agropecuário.
A Associação dos Piscicultores e a AMPA estão praticamente desativadas
e sem diretoria, assim, não estão participando das reuniões e, os diretores dos
departamentos de Educação, Saúde e Esportes participam apenas quando
algum assunto na pauta que diz respeito ao seu departamento. Entretanto, como
não há nenhuma menção sobre penalidades para ausências em reuniões no
regimento, estas organizações continuam a ter assento no conselho.
A pouca participação da chefe do Departamento de Educação determina a
quase inexistência da participação das mulheres neste espaço, pois esta é a única
representante feminina presente no CMDR.
O representante dos agricultores mais jovem tem 24 anos e o mais idoso
tem 65 anos, entretanto estes são exceções, pois os outros membros estão todos
entre a faixa de 34 a 54 anos.
No primeiro regimento não constava a duração dos mandatos dos
representantes, mas isto foi alterado em março de 2003, quando foi estipulado
eleições no final de junho de cada ano, determinando mandatos de um ano com
direito à reeleição. Entretanto, isto permanece sem controle, dependendo da
organização das associações e instituições, assim, estas é que determinam
quando há mudança de nomes de seus representantes.
Como estas não têm apresentado rotatividade em suas direções,
principalmente nas 13 associações de comunidades rurais, uma baixa
rotatividade dos representantes, sendo que alguns participam desde a sua criação
em 1997. Isto ocorre porque, nas comunidades, muitas associações não estão
conseguindo fazer o processo eleitoral por não haver candidatos para assumir a
diretoria destas, assim, muitos presidentes continuam no cargo por não conseguir
repassá-lo para outros.
Além da falta de motivação para trabalhar na organização das famílias da
comunidade, outros fatores que dificultam este processo. Como a associação
não possui fonte de recursos para a sua manutenção, todos os custos de
transporte, alimentação, materiais de consumo, telefone, etc., acabam sendo
127
pagos por aquele que o utiliza, onerando muito quem assume a presidência das
associações. Além disso, com a saída dos jovens do meio rural, as famílias estão
com menos força de trabalho disponível, dificultando a saída de um membro para
fazer o trabalho da associação, quando não há um grupo para dividir estas tarefas.
Estas dificuldades acabam tendo reflexos na representação das
comunidades nos espaços institucionais de participação social, pois como os
conselhos não têm recursos para remunerar, ou pelo menos pagar os custos da
participação de seus membros, estes têm que assumir os custos da participação
de sua comunidade por conta própria.
As novas organizações da agricultura familiar, como a Cresol, CLAF e
Assintraf, são bastante recentes e ainda estão se estruturando no município. Os
representantes dos agricultores familiares que estão inseridos nestas
organizações supra-municipais, isto é, que seguem uma coordenação regional e
apresentam trajetórias associativas mais abrangente, estão iniciando as suas
participação nas reuniões do CMDR em 2005, com isso, eles se dizem ainda sem
condições de uma maior intervenção neste espaço. Além disso, o chefe do
Departamento Municipal de Agricultura foi um dos grandes incentivadores para
que estas entidades se organizassem no município e a discussão da criação da
Cresol e CLAF passou pelo CMDR. Este fato uma certa segurança para estes
agricultores, em relação aos rumos deste espaço neste momento, pois acreditam
que algumas mudanças já estão acontecendo, inclusive citam a inclusão das
próprias entidades no Conselho, como um exemplo disso.
Regimentalmente, não existe a determinação de que o presidente da
associação deva ser o seu representante, mas é o que ocorre em todas as
associações de agricultores. Assim como, não há a obrigatoriedade da presidência
do conselho ser do diretor do departamento de agricultura, mas este cargo sempre
foi ocupado pela pessoa que assume esta função na prefeitura municipal. O
mesmo ocorre com a função de secretário executivo que sempre foi exercido pelo
técnico da Emater. Desta forma, a reunião é coordenada e secretariada pelos
técnicos do Departamento Municipal de Agricultura e Emater e a organização das
128
reuniões ocorre, quase, sem nenhuma interferência dos agricultores na
formulação de pautas ou na condução destas.
Além da hierarquia de poder, que é concedida àqueles que têm maior
domínio das informações, do conhecimento sobre a quina pública, enfim, um
maior controle sobre as ações destes espaços, conforme foi visto em outros
estudos (NEVES, 1998; YOUNG, 1990), um dos fatores determinantes desta
atitude é a confiança dos agricultores perante os três técnicos que conduzem as
reuniões, pois estes atuam no município há mais de dez anos e percebe-se
grande respeito dos agricultores pelo trabalho destes no meio rural. Além disso,
eles estão discutindo algumas alterações no funcionamento do CMDR dentro do
próprio Conselho e algumas, mesmo que lentamente, estão sendo colocadas em
prática.
As funções previstas no regimento, como vice-presidente, segundo
secretário, primeiro tesoureiro e segundo tesoureiro, até chegaram a ser
nomeados, mas nunca exerceram a suas funções.
No regimento consta também a existência de uma Comissão Técnica,
“formada por profissionais ligados ao setor agropecuário”, que tem as seguintes
atribuições:
i) Auxiliar nas informações cnicas necessárias para a montagem
do PMDR; ii) Executar, acompanhar e avaliar a execução do
PMDR, apresentando relatórios das atividades nas reuniões do
Conselho; iii) Executar as deliberações do Conselho; iv) Definir
estratégias para a operacionalização do PMDR, visando maior
eficiência na sua execução e; v) propor ao Conselho novos
projetos, que sejam de interesse dos produtores rurais
(CONSELHO MUNICIPAL DE DESENVOLVIMENTO RURAL DE
ITAPEJARA D'OESTE - CMDRIO, 1997, p. 5).
Essa Comissão Técnica que era formada pelos técnicos da Emater,
Departamento de Agricultura e firmas de planejamento, não tem se reunido
ultimamente, assim, os técnicos da Emater e Departamento de Agricultura
assumem parte das suas funções.
No passado houve um período em que havia reuniões ordinárias a cada
três meses, mas como sempre havia a necessidade de chamar os representantes
para reuniões extraordinárias, eles decidiram acabar com as reuniões ordinárias.
129
Assim, atualmente, as reuniões ocorrem quando há demanda de assuntos a
serem discutidos e nem sempre é cumprido o artigo que exige a antecedência
mínima de 48 horas nas convocações destas.
A pauta da reunião é organizada pelos técnicos do Departamento de
Agricultura e Emater e, quando é realizado o convite para a reunião, os outros
conselheiros são informados dos assuntos principais da pauta. Os convites são
realizados por telefone, bilhetes ou pessoalmente pelos técnicos da prefeitura ou
Emater.
As reuniões ocorrem na sede do município, geralmente na Câmara de
Vereadores ou no Anfiteatro do Departamento de Educação. As atas são escritas
durante a reunião, sendo assinada por todos os presentes no final desta.
Os representantes das comunidades apontam que têm muitas dificuldades
para reunir a sua comunidade antes ou depois de cada reunião do conselho,
muitos têm que aproveitar momentos como o final dos cultos da Igreja para
discutir algum assunto pertinente ao CMDR. Assim, essas discussões são
bastante esporádicas e pontuais nas comunidades.
Os documentos do Conselho como Regimento Interno, livro-ata,
correspondências, entre outros, permanece arquivado no Departamento de
Agricultura.
Apesar de constar no regimento do conselho, os seguintes objetivos:
i) Elaborar o Plano Municipal de Desenvolvimento Rural PMDR;
ii) Definir prioridades na área agrícola; iii) Estabelecer diretrizes a
serem observadas na elaboração do PMDR; iv) Congregar
esforços no sentido de acelerar o desenvolvimento sócio-
econômico do município; v) Aprovar o PMDR; vi) Avaliar o
desempenho do pessoal engajado na execução do PMDR e; vii)
Deliberar sobre assuntos inerentes ao setor rural do município
(CMDRIO, 1997, p. 2).
Os técnicos da prefeitura e Emater assumem que “[...] ultimamente as
reuniões estão se restringindo às demandas de programas, pois há a necessidade
de haver um trabalho de revitalização das associações, atualização do Plano de
Desenvolvimento Rural e legalização do CMDR” (H. D e M. N., entrevista conjunta
com os técnicos da Prefeitura e Emater).
130
O fato do conselho estar discutindo, quase que exclusivamente, as
questãos referente às demandas externas dos programas estaduais e federais
agrava a falta de uma maior intervenção dos agricultores nos rumos do CMDR,
pois, estes solicitam a deliberação do CMDR, apenas em assuntos pontuais,
desmotivando qualquer postura propositiva dos conselheiros. Além disso,
geralmente a demanda é que estes definam estas questões em pouquíssimo
tempo. Apesar das comunidades terem feito um levantamento de prioridades para
o município, este fato, faz com que as decisões sejam tomadas sem um
amadurecimento maior das discussões entre os representantes e inviabiliza a
participação efetiva dos representados no processo.
5.2.2 A configuração do CMDR de Vitorino
O Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural de Vitorino foi instituído
em 27 de março de 1997. Hoje, este é composto por 22 membros efetivos, sendo
que destes, 18 representam os agricultores familiares e o Sindicato Rural, que
geralmente é representado por agricultor patronal, mas que, neste caso, é
representado por um membro que se enquadra como agricultor familiar
11
. Assim,
este conselho é composto pelos representantes das associações das 16
comunidades existentes no município
12
, Sede, Emater, Secretaria Municipal da
Agricultura, Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR), Sindicato Rural (SR) e das
firmas de planejamento agropecuário.
11
Isto faz com que ele tenha um discurso diferenciado, no qual percebe-se algumas orientações da
FAEP
11
, organização estadual que rege o seu Sindicato, misturada com outras oriundas de sua
vivência enquanto agricultor familiar.
12
ACAV, Associação Novos Rumos, Associação Linha Alto Caçador, Associação Linha Bernardi,
Associação Linha Caravagio, Associação Linha Fartura, Associação Linha Lavezzo, Associação
Linha Forquilha, Associação Linha Santa Helena, Associação Linha Santo Antonio, Associação
Linha São Braz, Associação Linha São Donato, Associação Linha São Pedro, Associação Linha
São Valentin, Associação Linha Vila Maria e Associação Linha Vista Alegre.
131
O Sindicato de Trabalhadores Rurais e a Central de Associações de
Vitorino têm como presidentes, dois moradores do meio urbano que não são
agricultores familiares. o existem outros tipos de organizações dos agricultores
familiares no município, além das associações. A Cresol, que começou a atender
o município de Vitorino em 2006, tem sede em outro município.
Neste CMDR a única mulher que participa das reuniões é a suplente do
representante da Secretária Municipal de Agricultura, que é uma técnica desta
secretaria.
Apesar de ser um conselho de desenvolvimento rural, não membros
que representem outros setores, como a saúde, educação, transportes, etc., que
poderiam contribuir com os diferentes conhecimentos e experiências. O
extensionista da Emater, alega que isto se deve ao fato do município ter apenas o
plano de desenvolvimento agrícola e que provavelmente quando houver condições
de se elaborar um plano que envolva estes setores, estes deverão ser chamados.
Inicialmente, ocorreu a participação de membros da Igreja, da Indústria e
Comércio e da câmara de vereadores, no conselho, mas, estas instituições não
tiveram interesse em manter esta participação.
As reuniões são realizadas nas segundas sextas feiras de cada mês, com
exceção dos meses de janeiro e fevereiro, por estes meses apresentarem poucas
atividades nas instituições governamentais. Assim, não a necessidade de
enviar convites, pois todos os representantes sabem as datas das reuniões
antecipadamente. Este é um procedimento que facilita a organização dos
representantes nas suas comunidades e no seu cotidiano.
Desde o início do CMDR, os representantes foram orientados a terem uma
data fixa para as reuniões das associações, logo após às reuniões do conselho.
Assim, no final de semana ou na semana seguinte, ocorrem as reuniões nas
comunidades, para repassar as questões discutidas na reunião do conselho.
Infelizmente, segundo os representantes, como as associações das comunidades
estão bastante desgastadas, o número de participantes nestas reuniões não é
muito motivador.
132
Outra orientação que foi dada no início da formação do CMDR foi a de que
ocorresse a participação de representantes titulares e suplentes nas reuniões,
para ampliar o número de pessoas diretamente envolvidas com este espaço e
facilitar o envolvimento das comunidades nas discussões do conselho. Esta
orientação ainda é seguida por algumas associações, mas muitas não conseguem
manter este nível de participação.
Um dos representantes entrevistado, é suplente de sua associação, mas
demonstra total conhecimento do funcionamento e dos temas tratados nas
reuniões do CMDR. Segundo ele, na associação de sua comunidade sempre a
eleição para o vice-presidente, pois é este que irá substituir o presidente na
próxima gestão. Assim, nesta associação, o presidente é o representante titular e
o vice é o suplente. Quando ocorrer a mudança da gestão, este último assumirá
como titular, conhecendo bem os trâmites do conselho e um novo membro,
participará das reuniões com ele, sabendo que deverá dar continuidade ao
processo na próxima gestão.
Entretanto, há muitas associações em que a realidade é bastante
diferenciada, na qual um representante continua a participar das reuniões do
conselho e alega não conseguir trazer outros para participar junto e, muito menos,
assumir como representante, fazendo com que este permaneça no conselho por
vários anos, sem substituição. Este procedimento é facilitado pelo regimento do
CMDR, que não prevê a duração do mandato dos seus membros. Segundo o
técnico da Emater, esta ausência foi proposital, pois na elaboração do Regimento,
foi definido que a associação deveria ter a autonomia de decidir quem seria o seu
representante e por quanto tempo.
Segundo o extensionista, como um custo para a participação do
representante - com combustível, alimentação, dia de trabalho, etc. – que é
assumido pelo próprio representante, é preciso ser bastante flexível, quanto a esta
participação
13
. Assim, a associação pode indicar o seu representante para ter um
13
Na Lei Municipal 649/99 que instituiu o conselho, um artigo que diz “Fica o Poder Executivo
autorizado a ressarcir eventuais despesas (deslocamento, hospedagem, alimentação) que os
membros do Conselho fizerem no exercício de suas funções, desde que, previamente autorizadas
pelo Presidente do Conselho e pelo Prefeito Municipal.” . Mas, isto não é colocado em prática.
133
mandato mais curto ou mais longo e este representante, sendo membro da
associação, após a indicação desta, não sofre nenhum questionamento sobre a
forma como este foi escolhido. Apesar disto, percebe-se que na maioria dos
casos, os representantes são aqueles que foram escolhidos como presidente das
associações.
No início do Programa Paraná 12 Meses, houve uma orientação para que
os secretários municipais de agricultura assumissem a presidência e um
extensionista da Emater ocupasse o cargo de secretário executivo do conselho.
Em muitos conselhos esta instrução não tem mais validade, mas em Vitorino, isto
ainda consta no regimento e é cumprido pelo conselho. Quanto ao cargo de
secretário não questionamentos, pois eles preferem que o extensionista
assuma este papel para cumprir as burocracias dos programas governamentais,
mas quanto à presidência, percebe-se um certo desconforto, pois o atual
secretário trabalha apenas durante as manhãs na prefeitura, sendo que durante a
tarde ele tem outras funções profissionais, assim, como as reuniões são no
período da tarde, muitas vezes este não pode participar destas. Apesar de haver
sempre alguém de sua equipe nas reuniões, os agricultores apontam que esta
substituição não deveria ser válida quando se trata do presidente do conselho.
Segundo o extensionista, este questionamento não ocorria em outras gestões em
que o secretário exercia suas funções exclusivamente na prefeitura. Isto é, não
um questionamento, por exemplo, sobre a ausência de eleições ou porquê um
representante das associações não poderia assumir a presidência do conselho,
estes apenas questionam, a ausência do secretário em algumas reuniões.
A pauta das reuniões são elaboradas pela Emater e Secretaria Municipal da
Agricultura e exposto no início das reuniões, apesar de constar a necessidade
desta ser entregue com três dias de antecedência na lei de instituição do
Conselho. Caso alguma associação queira propor um ponto de pauta, o seu
representante pode solicitar a inclusão deste na semana que antecede a reunião
ou solicitar que seja incluído como “assuntos gerais” no início da reunião, caso
134
este seja um recado ou algo que leve pouco tempo para ser discutido. Desta
forma, os representantes apenas ficam cientes dos assuntos a serem discutidos
no início da reunião, ficando sem condições de fazer uma discussão prévia com as
suas associações ou organizações.
Nesta pauta, em todas as reuniões a inclusão de algum “assunto
técnico”, isto é, algum assunto que pode ser do interesse das comunidades,
apesar de geralmente, ser definido sem a consulta a estas. Este pode ser sobre
uma nova atividade produtiva, um programa governamental, assunto relacionado
aos outros departamentos da prefeitura, etc., que, geralmente, é exposto por
alguém externo ao conselho.
As reuniões ocorrem na Câmara de Vereadores, num ambiente onde as
cadeiras são fixas, não havendo um meio de fazer um círculo para que todos
possam ficar face-a-face. Assim, a reunião ocorre semelhantemente a uma “sala
de aula”: os técnicos na frente e os agricultores nas “carteiras”.
Os temas são expostos pelos técnicos da Emater e da secretaria municipal
de agricultura e depois colocados à discussão. Os pontos de pauta não são muito
diversificados, são pontuais, sendo quase totalmente restritos à encaminhamentos
de propostas da prefeitura ou Emater para as comunidades: destinação de
recursos de programas municipais e estaduais, organização de grupos para
participar de eventos e cursos, etc. Isto é, os conselheiros são o meio de
comunicação para as instituições governamentais, onde estes vão para as
comunidades e trazem o retorno para os técnicos, sendo raros os assuntos em
que a origem do processo ocorre inversamente.
Geralmente não assuntos que cheguem à votação e, no passado,
quando o número de participantes era maior, houve momentos em que estes
foram divididos em grupos para discutir determinado assunto. As atas das
reuniões são feitas e arquivadas pelo técnico da Emater. Como este também é um
dos responsáveis pela coordenação da reunião, a ata é feita após às reuniões e
aprovadas no início da reunião seguinte.
Este CMDR tem uma instância denominada “câmara técnica” composta
pelos representantes da Emater, Secretaria Municipal de Agricultura, STR, SR,
135
firma de planejamento e quatro representantes de comunidades, que é convocada
sempre que surge a necessidade de uma reunião extraordinária. A alegação para
a existência deste grupo é a dificuldade de reunir todo o conselho num curto
espaço de tempo, pela dificuldade de comunicação com as comunidades.
Esta câmara técnica e a composição do conselho, ainda guardam muitos
dos resquícios da Comissão de Solos, onde o principal objetivo era discutir as
questões de manejo e conservação de solos nas microbacias - os problemas de
vizinhos que jogavam as águas de chuva que caiam na sua propriedade nas
propriedades vizinhas ou nas estradas, organização do roteiro para o trabalho dos
tratores de esteiras para fazer terraceamento ou enleiramento de pedras, mata
ciliar, proteção de fontes, etc. – isto é, viabilizar a execução dos programas
estaduais e municipais nas questões técnicas. Assim, apesar de ter superado a
fase de discutir questões mais concernente aos assuntos relativo ao uso do solo,
os temas discutidos, agora, se dedicam quase que estritamente às áreas
produtivas dos estabelecimentos rurais.
Analisando os assuntos tratados dentro do CMDR, a partir de 2005,
considerando o período no qual se iniciou a gestão dos prefeitos municipais
atuais, até o final do mês de setembro, percebe-se que os temas discutidos são
estritamente técnicos e bastante pontuais. Desta forma, o CMDR se assemelha a
um braço dos órgãos públicos municipais e estaduais que o utilizam para se
comunicar com as comunidades rurais, numa relação de “troca de recados”, não
possibilitando o efetivo processo de representação e a interação para a formação,
mesmo que parcial, de um projeto de desenvolvimento para o município.
5.2.3 A configuração do GGETESPA
O Grupo Gestor do Território Sudoeste do Paraná abrange os 42
municípios do território compreendido pela Associação dos Municípios do
Sudoeste do Paraná AMSOP. As organizações que compõem este grupo são
136
supramunicipais, isto é, atuam além dos limites municipais, em parte dos
municípios deste território ou em sua totalidade.
A composição do GGETESPA é paritária, em relação à participação de
organizações governamentais e não governamentais. Entre as não
governamentais estão:
Associação das Agroindustrias Familiares do Sudoeste do Paraná – Afasp;
Associação das Casas Familiares Rurais – Arcafar.
Associação de Estudos, Orientação e Assistência Rural – Assesoar;
Associação do Centro de Educação Sindical/ Federação dos Trabalhadores
da Agricultura Familiar na Região Sul – Acesi/ Fetraf-Sul;
Centro de Apoio ao Pequeno Agricultor – CAPA;
Cooperativa Iguaçu de Prestação de Serviços Ltda. – Cooperiguaçu;
Coordenação Regional de Associações de Pequenos Agricultores Crapa
(hoje Coopafi);
Instituto Maytenus;
Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB;
Movimento dos Sem-Terras – MST;
Sistema de Cooperativas de Crédito Rural com Interação Solidária – Cresol;
Sistema de Coperativas de Leite da Agricultura Familiar – Sisclaf;
As organizações governamentais são as seguintes:
Associação das Câmaras Municipais do Sudoeste do Paraná – Acamsop;
Associação dos Municípios do Sudoeste do Paraná – Amsop;
Associação dos Secretários Municipais de Agricultura e Meio Ambiente -
Micro-região de Francisco Beltrão - Assema;
Associação dos Secretários Municipais de Agricultura do Sudoeste do
Paraná – Assec;
Escolas Agropecuárias;
Instituto Agronômico do Paraná – Iapar
Instituto Ambiental do Paraná – IAP;
Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – Incra;
137
Instituto Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural – Emater;
Secretaria Estadual de Agricultura e Abastecimento – SEAB;
Universidade Estadual do Oeste do Paraná – Unioeste;
Universidade Tecnológica Federal do Paraná – UTFPR.
Esta composição do grupo gestor tem sofrido uma série de modificações,
principalmente através da inclusão de novas instituições, consequência da
ampliação da abrangência espacial e do interesse suscitado no decorrer da
consolidação deste espaço.
Até 2005, o Grupo Gestor era formado por instituições titulares e suplentes,
isto é, cada organização titular tinha outra como sua suplente e não havia a
nomeação dos representantes de cada instituição, assim, a cada reunião a
instituição poderia enviar qualquer pessoa para representá-la. Caso, mesmo
assim, esta não se fizesse representar, a sua suplente poderia enviar qualquer
membro para a reunião e este teria direito a voto. Após perceber-se que esta
dinâmica prejudicava a continuidade e o aprofundamento das discussões,
começou se a reorganizar esta questão. No final de outubro de 2005, as
instituições titulares, praticamente, já haviam se organizado, pois a maioria
vinha mantendo representantes quase fixos, entretanto, as instituições suplentes
apresentavam problemas, pois algumas não estavam participando efetivamente
do processo e questionava-se a sua permanência no Grupo Gestor. Em 2006,
este processo foi organizado para que não houvesse instituições suplentes, assim,
quase todas passaram a ser titulares, com a substituição de algumas destas. A
partir disso, todas as organizações nomearam os seus representantes.
Apesar deste processo de reorganização, havendo até mesmo a troca de
algumas instituições, algumas ainda têm problemas para garantir a presença de
seus representantes nas reuniões. Assim, muitas organizações continuam se
ausentando e outras enviam indivíduos que o foram nomeados como seus
representantes para as reuniões, mesmo contrariando o regimento do GGETESPA
que não abre esta possibilidade.
Este fato não causou desavenças até o momento, porque não houve
nenhuma votação sobre algum assunto mais conflituoso e a reunião é aberta para
138
a participação de convidados
14
, sendo vetada apenas o direito de voto, mas, isto
não é garantia de que isto não vá causar problemas num momento mais crítico.
Considerando os membros titulares, havia apenas uma representante
agricultora
15
e duas técnicas e, entre os suplentes, duas agricultoras e quatro
não agricultoras. Assim, entre os seis representantes titulares dos agricultores
familiares havia apenas uma mulher, sendo que uma das suplentes, seria para
substituir esta representante, consequentemente, considerando que todas as
organizações estejam presentes nas reuniões, poderá haver apenas uma ou duas
agricultoras com direito a voto.
Os membros titulares e suplentes do GGETESPA devem ser indicados
anualmente pelas suas organizações e passar pela aprovação deste. No
Regimento não consta nenhuma restrição a mandatos consecutivos.
O GGETESPA tem um “grupo de apoio político” como consta no seu
regimento ou “coordenação do grupo gestor do território”, denominação utilizada
nos outros documentos do mesmo, que é formado por quatro membros, sendo
dois oriundos das organizações governamentais e dois das não governamentais,
discriminados como: coordenador geral do território, secretário executivo,
coordenador de gestão do Plano Territorial de Desenvolvimento Rural Sustentável
– PTDRS e coordenador de projetos. Este grupo tem as seguintes competências:
i) Planejar, organizar e coordenar as atividades administrativas do
GGETESPA; ii) Preparar em conjunto com o articulador territorial,
as reuniões do Plenário do GGETESPA, iii) Acompanhar as
reuniões do Plenário, assistindo ao GGETESPA; iv) Manter os
Conselheiros atualizados sobre o funcionamento de outros
Conselhos no âmbito estadual e Federal, como o CEDRAF e
CONDRAF; v) Dar publicidade às realizações do GGETESPA; vi)
Secretariar as reuniões do GGETESPA lavrando as respectivas
atas; vii) Prover suporte estrutural às atividades do Articulador
Territorial; viii) Elaborar, anualmente, o relatório de atividades do
GGETESPA, juntamente com o articulador territorial e; ix) Exercer
14
“Poderão participar das reuniões ordinárias e extraordinárias do GGETESPA pessoas ou
entidades convidadas, podendo contribuir nos debates referentes ao desenvolvimento territorial,
sem direito a voto” (GGETESPA, 2005, p. 3).
15
Esta agricultora permaneceu como representante até 2006, e foi substituída por um membro
homem, apenas a sua suplente permanece.
139
outras atribuições que lhe forem conferidas pelo plenário do
GGETESPA. (GGETESPA, 2005, p. 5).
Além disso, o GGETESPA tem um articulador do território contratado com
recursos da SAF/MDA para auxiliar nos encaminhamentos dos trabalhos do grupo.
Outra possibilidade de sub-grupo do Grupo Gestor são os grupos temáticos
[...] que podem ser permanentes ou provisórios, sendo formados
por membros das instituições que compõem o GGETESPA, com o
objetivo de, sob o ponto de vista de sua especialidade, analisar e
emitir pareceres sobre projetos e matérias enviadas pelo Plenário
e/ou articulador do território; acompanhar a execução e participar
da atualização do Plano Territorial de Desenvolvimento Rural
Sustentável e propor a elaboração de estudos e projetos.
(GGETESPA, 2005, p. 5).
As reuniões ordinárias do GGETESPA ocorrem a cada dois meses e,
extraordinariamente, quando convocado pelo Grupo de Apoio Político ou por 1/3
(um terço) de seus membros. Os convites são feitos através do correio eletrônico
pelo articulador regional.
Acompanhando as reuniões percebe-se que um certo padrão na
presença dos participantes. Alguns representantes e alguns técnicos não
representantes se fazem presentes em todas as reuniões. No caso dos
representantes, esta assiduidade é mais perceptível entre as organizações não
governamentais, mas ocorre entre as organizações governamentais também. Os
agricultores não representantes não têm o hábito de participar das reuniões,
exceto naquelas em que tenha algum ponto de pauta que tenha relação com ele
ou que esta ocorra no seu ambiente de trabalho, como a reunião organizada na
sede da cooperativa de um assentamento rural, por exemplo.
Segundo o seu Regimento, as deliberações do GGETESPA serão
aprovadas por maioria simples (50% mais um) dos membros presentes, exceto
quando corresponder a alterações do Regimento ou aquisição e alienação de
bens, em cujo caso será preciso a aprovação de 2/3 (dois terços) dos membros
presentes. Em caso de empate em alguma votação, esta deverá ser definida pelas
organizações não governamentais, mas pelo que consta, este recurso ainda não
foi necessário.
Regimentalmente, as atas deveriam ser redigidas pelo Grupo de Apoio
Político, aprovadas pelo Plenário e assinadas pelos presentes, mas, isto não
140
ocorre na prática, pois estas, em geral, não são assinadas pelos presentes, pois
são elaboradas posteriormente.
Os representantes assumem que não um repasse de informações sobre
as ações do Grupo Gestor com a sua base. Apenas os projetos são discutidos,
mas somente com a direção de sua organização ou até mesmo com apenas parte
desta. Entretanto, apontam que a sua participação e os projetos defendidos por
eles são delineados de acordo com os objetivos da organização, que por sua vez,
são discutidos mais amplamente.
O GGETESPA está sediado nas instalações da unidade local da Emater em
Francisco Beltrão, consequentemente, os seus documentos e o articulador,
também, deveriam permanecer neste local, mas, não é isto que ocorre. Parte dos
documentos estão com o articulador, mas, outros que não se sabe com quem
estão, pois, não há um arquivamento organizado destes documentos.
Os objetivos do GGETESPA constante no seu regimento são os seguintes:
i) Contribuir e articular na organização das ações voltadas para o
desenvolvimento territorial, considerando as suas diversas
dimensões e setores, buscando:
Geração de emprego e renda e redução das desigualdades
sociais;
Gestão participativa para o ordenamento territorial;
A erradicação da fome e a promoção da segurança alimentar;
acesso à educação e à cultura, valorizando a sabedoria
popular;
acesso à terra e a regularização fundiária;
Ações voltadas ao desenvolvimento urbano;
Diversificação das atividades econômicas;
Promoção da agroecologia na Agricultura Familiar;
Abertura de mercado institucional para os produtos da
agricultura familiar através de suas organizações e das micro e
pequenas empresas;
Desenvolvimento da produção agrícola, florestal, pesca e
pecuária;
Desenvolvimento efetivo da agroindústria familiar e do turismo
rural;
Ampla participação e controle social das políticas públicas;
Valorização do patrimônio cultural e dos recursos naturais;
Preservação ambiental e manejo sustentável dos ecossistemas
regionais;
Apoiar e promover a elaboração do diagnóstico e do
zoneamento ecológico e socioeconômico do território;
141
Promover a qualidade de vida garantindo o acesso à saúde,
educação, energia elétrica, habitação, lazer, cultura,
saneamento e comunicação.
ii) Articular as políticas públicas do Território, através da
interlocução das instituições governamentais e não
governamentais que representam o Território Sudoeste do Paraná;
iii) Estimular o aperfeiçoamento dos mecanismos de participação e
controle social de gastos públicos;
iv) Propor a adequação da legislação sanitária, ambiental,
tributaria e fiscal visando fortalecer a micro e pequena
agroindústria e o desenvolvimento sustentável da Agricultura
Familiar;
v) Promover o desenvolvimento e atualização do Plano territorial
de Desenvolvimento do Sudoeste do Paraná (PTDRS) e
acompanhar a implantação das ações, programas e projetos
previstos nele, sugerindo adequações necessárias;
vi) Articular-se com outros conselhos setoriais no âmbito estadual
e federal, como os Conselhos Estadual e Federal de
Desenvolvimento, buscando a cooperação mútua e o
estabelecimento de estratégias comuns para o fortalecimento da
participação e controle social das políticas públicas;
vii) Promover a realização de estudos, debates, pesquisas e
seminários sobre os temas de interesse para o desenvolvimento
territorial;
viii) Propor políticas estruturantes que favoreçam a autogestão do
território;
ix) Desenvolver, em parceria com organismos governamentais e
não governamentais mecanismos de acompanhamento e
avaliação das atividades relacionadas com o desenvolvimento
sustentável;
x) Promover a divulgação das potencialidades e oportunidades que
a região oferece, visando atrair novos empreendimentos e
investimentos, de acordo com as opções estratégicas definidas
para o território;
xi) Exercer outras atribuições que lhes forem conferidas
(GGETESPA, 2005, p. 1-2).
Como pode ser observado os objetivos do GGETESPA são bastante
ambiciosos e muito bem alinhados com o discurso das organizações que
representam os agricultores familiares do território. Estes objetivos também estão
em conformidade com o Plano Territorial de Desenvolvimento Sustentável do
Sudoeste do Paraná, que foi elaborado a partir de duas rodadas de oficinas em
cada uma das cinco microrregiões que compõem este território
16
, que está
centrado em seis eixos: desenvolvimento humano e qualidade de vida;
16
Fronteira, Frio, Marrecas, Pinhais e Vale do Iguaçu.
142
desenvolvimento econômico; recuperação e gestão ambiental; educação do
campo; serviços sociais e infra-estrutura e organização e desenvolvimento político
institucional (GRUPO GESTOR DO TERRITÓRIO SUDOESTE DO PARANÁ,
2006).
Entretanto, no Seminário de Avaliação do Território Sudoeste do Paraná, os
próprios integrantes avaliam que os projetos encaminhados à SDT, ainda não
refletiram estes eixos, e que apesar de terem avançado em alguns pontos como a
integração das instituições, ainda há um longo caminho a ser perseguido para que
estes sejam o reflexo destes eixos e dos objetivos que constam no regimento do
território.
5.2.4 Similaridades e diferenças entre as configurações destes espaços
Quando falamos na configuração dos espaços institucionais de participação
social, um dos aspectos levantados é a escala destes, isto é, qual a abrangência
espacial e, conseqüentemente, o número de pessoas que estes espaços de
participação congregam. Neste estudo esse aspecto é ainda mais importante para
a análise destes diferentes espaços, pois a proposta de implementar o Grupo
Gestor é oriunda da discussão de território, isto é, da discussão de uma nova
espacialidade para a discussão de políticas públicas.
Analisando apenas a escala não é difícil perceber que a lacuna entre os
representantes e os representados tende a aumentar proporcionalmente ao
aumento da abrangência do espaço de participação. Isto pode ser verificado com
a dificuldade de se encontrar agricultores familiares que saibam da existência do
GGETESPA ou pior, quem são os seus representantes neste espaço
17
. Afinal,
enquanto os CMDRs possuem um representante por comunidade, o GGETSPA
não tem a garantia de participação de um representante por município. Assim,
17
Apesar de ter que considerar que este espaço é bastante recente, principalmente, quando
comparado com os CMDRs.
143
este fato comunga com a afirmação de Dahl (2001) de que quanto maior a escala,
menor é a possibilidade dos representantes terem um contato mais direto com os
seus representados, utilizando como argumento, o cálculo de quanto tempo seria
necessário para cada cidadão ter um rápido encontro com o seu representante.
Assim, com o número reduzido de pessoas existente numa unidade menor, o
representante teria a chance de encontrar uma porcentagem maior de
representados, quando comparado a uma escala maior.
Algumas instituições têm atuação em todos os municípios - como a Emater
ou Amsop - e poderiam utilizam a sua estrutura para interligá-los ao Grupo Gestor.
Isto ocorre, mas de forma precária, lembrando que as organizações que têm esta
abrangência são todas governamentais, assim, a representação dos agricultores
familiares é realizada por instituições que atuam parcialmente no território,
havendo municípios no qual a atuação de várias destas e outros, onde estas
estão ausentes. Numa tentativa de diminuir este lapso, foi iniciada a realização de
oficinas microrregionais, mas como a mobilização dos participantes é realizada
pelas próprias organizações, alguns municípios continuam tendo participação
privilegiada.
Isto dificulta a identificação dos interesses comuns destes representados,
pois, apesar deste espaço de participação social não ter os seus membros
coletados aleatoriamente, muitas características como etnia, linguagem, religião,
nível educacional, cultural e socio-econômico, trajetória associativa, etc. não são
homogeneamente distribuídas pelo território. No município também ocorre esta
variação, mas, os conselhos municipais tendem, como é a tendência de qualquer
unidade política geograficamente menor, a abarcar membros que são mais
parecidos em seus interesses comuns (MANSBRIDGE, 1980).
A composição dos conselhos municipais tem uma grande predominância
numérica de representantes de agricultores familiares, superando em muito a
exigência de paridade que ocorre no GGETESPA, principalmente porque a
paridade deste não objetiva a representação dos agricultores familiares, mas em
relação a organizações governamentais e não governamentais. Mesmo
considerando que todas as organizações de forma direta ou indireta têm o seu
144
foco sobre os agricultores familiares, como foi visto antes, poucas são
representadas por estes atores.
A organização do CMDR de Vitorino apresenta algumas características que
o diferencia dos outros conselhos do território. Suas reuniões são ordinárias e
ocorrem numa data fixa e uma orientação para que todas as associações
façam suas reuniões ordinárias nas comunidades rurais logo após a esta data.
Além disso, algumas associações participam com seus dois representantes nas
reuniões do CMDR, o titular e o suplente, apesar do suplente não poder votar, ele
auxilia o titular nas decisões e também, no repasse de informações para a
comunidade posteriormente.
Este processo faz com que haja uma disseminação dos assuntos tratados
nas reuniões do CMDR. Apesar desta disseminação ocorrer apenas no âmbito
daqueles que participam das reuniões da associação dos agricultores, que não
abrange todas as famílias da comunidade, pode ser considerado um diferencial
em relação à configuração do CMDR de Itapejara D’Oeste onde as reuniões das
associações ocorrem esporadicamente e não momentos determinados para se
discutir as ações do Conselho.
Isto também facilita a tomada de decisões de alguns assuntos que dizem
respeito somente a determinadas comunidades, pois os representantes podem
levar o tema para a reunião da associação e levar a resposta posteriormente,
viabilizando a ampliação de opiniões a serem consideradas na tomada de decisão.
O CMDR de Itapejara d’Oeste está tentando superar esta dificuldade de
comunicação, a partir da inserção de outras organizações dos agricultores
familiares na composição do conselho. Assim, os agricultores de comunidades nas
quais não haja uma associação atuante, podem participar mais efetivamente das
discussões do conselho, através destas organizações.
A vinda de um convidado para aprofundar um determinado assunto técnico,
ou considerado interessante para as comunidades, em cada reunião, que ocorre
no CMDR de Vitorino, é interessante porque traz pessoas de fora do Conselho,
propiciando a troca de opiniões com pessoas de diferentes visões. Isto também
145
ocorria periodicamente no CMDR de Itapejara d’Oeste, mas agora isto se tornou
mais raro, embora ainda ocorra ocasionalmente.
Apesar disto ser algo positivo para os agricultores, o tema dificilmente é
proposto por eles. Geralmente, este é proposto pelos técnicos por ter proximidade
com alguma proposta do governo municipal ou estadual ou pela solicitação de
algum outro setor da prefeitura ou outras instituições, que requisitam um espaço
na reunião do conselho para expor alguma questão de sua área.
Tanto os membros dos conselhos como os do GGETESPA reclamam que
decisões solicitadas pelos programas governamentais que precisam ser
tomadas, mas não tempo suficiente para discutí-la dentro do espaço e com os
representados. Como é relatado por este representante:
Às vezes o assunto é colocado prá ontem. Chega ali prá ontem,
não é prá hoje. Chega ali muito rápido, as coisas, prá gente definir
estes assuntos que é colocado na reunião. Até a gente comentou
sobre isto aqui, é muito rápido, a gente não tem tempo de analisar
bem, tem que jogar meio a rumo. Então, eu falei: a gente não pode
tapar o sol com a peneira. Eu coloquei isso na reunião, que a
gente precisa de mais tempo. Mas, quando não vem com tempo, a
gente vai fazer o quê? Teve trabalho que a gente foi chamado ali
no conselho municipal para aprovar um projeto que veio de
manhã, tivemos que reunir de tarde e mandar. Se não ia dar
tudo errado. Se não fosse jogado aquele projeto pro governoi
naquela tarde, não vinha aquela verba. E isso eu achei muito
errado. Mas, a gente não tem culpa dentro do conselho, se veio de
manhã prá mandar, não tem jeito (H. T., representante no CMDR
de Itapejara d’Oeste).
Entretanto, percebe-se que mesmo nas discussões que não uma
exigência externa de urgência, a realização de reuniões com pautas que
comportam um número elevado de pontos e a participação de pessoas com
agendas bastante comprimidas, faz com que as discussões sejam realizadas de
forma rápida e superficial, fazendo com que as decisões sejam alcançadas sem
ter havido o aprofundamento necessário para tomar determinadas decisões, como
foi apontado no estudo de Mansbridge (1980). Isto é, sem considerar que o
tempo é uma necessidade para possibilitar aos representantes uma ampla
variedade de conhecimentos e habilidades para o processo de discussão e
deliberação (HOLMES; SCOONES, 2000).
146
Esta dificuldade de aprofundar os assuntos referentes ao espaço e ao seu
projeto de desenvolvimento é agravado pelo rodízio de participantes que ocorre
nas reuniões. Apesar de todos os espaços apresentarem um grupo de membros
que participam efetivamente da maioria das reuniões, em todos aqueles que
participam de forma bastante precária, alegando outras prioridades, ou que
participam apenas quando alguma discussão que interesse a sua organização,
ou que, simplesmente, não aparece, mas o admite a retirada da instituição ou a
troca de representante. Isto determina que sempre haja um pequeno grupo que
não está acompanhando a evolução das discussões do grupo como um todo.
Estes espaços foram criados, e continuam a existir, pela iniciativa do
governo, a partir de exigências existentes em diferentes programas de políticas
públicas. No caso dos CMDRs, a organização e a forma de funcionamento
continua tendo claramento a mão das agências governamentais, sendo o Emater
e a Secretaria Municipal da Agricultura as responsáveis pela condução deste
espaço e o GGETESPA continua sendo conduzido a partir do orquestração da
Secretaria de Desenvolvimento Territorial do MDA. Isto pode ser visto em outros
estudos como os de Holmes e Scoones (2000, p. 37) onde em seu estudo sobre
os processos deliberativos em políticas ambientais, eles apontam que são as
agências governamentais que geralmente determinam a natureza destes
processos. Pois quem convoca o processo, claramente tem implicações para a
definição de objetivos, na estruturação das questões, na escolha dos métodos e
ferramentas, na escolha da escala, na alocação dos recursos e nas relações com
os processos políticos mais amplos.
Isto se reflete quando perguntado aos representantes se alguma vez eles
propuseram algum ponto de pauta para as reuniões dos CMDRs e a resposta foi
negativa, com raríssimas exceções, onde os assuntos apontados eram mais
avisos ou questões pouco significativas para o grupo como um todo. No caso do
Grupo Gestor esta participação é mais equilibrada, percebe-se a participação
efetiva dos representantes dos agricultores familiares na coordenação das
reuniões, proposta de pauta, local para as reuniões, data e horário destas, etc.
147
Mesmo assim, as agências governamentais influenciam a agenda deste espaço,
através dos compromissos e atividades impostas ou propostas por estas.
Por mais que os espaços municipais tentem trazer os representantes de
todas as comunidades, buscando que com isso todas as famílias de agricultores
tenham condições de serem ouvidas, como Manin, Przeworski e Stokes (1999a;
2006) apontaram, os recursos sobre os quais eles deliberam nestes espaços
dificilmente possibilitam destinação proporcional. Além disso, sempre
comunidades ou famílias que têm maior necessidade de ser objeto de
determinado programa ou política. Apesar de, apenas um representante ter
deixado claro na sua entrevista, que acha importante que os representantes dos
agricultores familiares tenham a noção da realidade de todo o município e pensem
no bem estar de todas as famílias do município, mesmo que para isto, tenha que
deixar de priorizar as demandas de sua própria comunidade (PITKIN, 1967), ao
declarar que representa “todos os agricultores do município” (H. T, representante
do CMDR de Itapejara d’Oeste), nas reuniões dos CMDRs, percebe-se que
outros representantes que consideram a realidade de todo o município no
momento de definir a destinação de algum recurso.
Esta percepção, da importância de buscar o melhor para o território como
um todo, também ocorre no GGETESPA, mas este exercício é mais difícil neste
espaço, pois além dos membros terem maior dificuldade para conhecer a
realidade de todo o território, as disputas entre as organizações são muito mais
acirradas, prejudicando um pouco a busca de uma proposta que beneficie aqueles
que realmente estão necessitando de determinado recurso.
Geralmente, nos conselhos não temas que gerem votações, pois os
temas são apresentados pelos técnicos mais no sentido de buscar o
consentimento, do que para gerar discussão ou a troca de argumentos. Isto
mostra o quanto estes conselhos são hierarquizados, onde o grupo dominante dos
técnicos consegue com que os outros sigam a sua orientação facilmente,
conforme foi visto em estudos anteriores (OLIVEIRA, 2000; NEVES, 1998). No
GGETESPA, no qual as relações são mais horizontalizadas, com menor hierarquia
de poder, os representantes têm maior dificuldade de abrir mão das disputas,
148
porque cada representante é guiado fortemente por aqueles cujo interesses ele
representa (BAILEY, 1965). Entretanto, ambos os grupos, quando estão
preocupados com funções mais executivas, preocupados com prazos para as
ações, tendem a resolver os conflitos de um modo mais mecânico, por voto
majoritário, caso este seja necessário.
5.3 Trajetórias dos representantes dos agricultores familiares em
diferentes espaços
Os representantes dos agricultores familiares dos três espaços tiveram
infâncias muito semelhantes, encontrando-se em espaços de convivência
constituídos na “sede” da comunidade (tais como a igreja, o centro comunitário, as
canchas de bocha e, em alguns casos, um pequeno ponto de comércio, escola
e/ou centro de saúde), nos quais verifica-se a emergência de esferas de
sociabilidade vitalizadas, formando-se aí contextos de mediação entre, de um
lado, o mundo da intimidade e da família, e, de outro, o mundo que se estende
para além dos limites da comunidade.
Após a passagem da infância, na juventude e na vida adulta, a participação
nestes contextos de mediação na comunidade ocorrem através de estruturas
organizacionais mais elaboradas, a partir de grupos dotados de alguma
especificidade funcional e de certa institucionalidade (reuniões periódicas com
pautas pré-definidas) como os clubes de mães, grupos da igreja e outros,
culminando nas associações dos agricultores de cada comunidade.
Neste momento quando os atores começam a sair do âmbito das
comunidades rurais, a participação das mulheres se torna mais difícil, pois como
uma representante deixa claro, é imposto às mulheres o papel de “gerenciar” e, ao
mesmo tempo, atuar em busca do bem estar dos familiares em torno da casa.
A própria vida familiar impede a participação, a própria educação,
a própria cultura. A própria educação dos filhos é responsabilidade
da mulher. Eu mesmo consegui avançar nestes espaços,
149
quando meus meninos estavam com uma certa idade, que não
dependiam muito da mãe, se não fosse assim, eu não ia conseguir
(M. R., representante no GGETESPA)
Iniciando pela experiência escolar, nos três espaços institucionais de
participação social o nível educacional é bastante diferenciado entre técnicos e
agricultores, principalmente no GGETESPA, no qual participam, inclusive, vários
técnicos oriundos de organizações governamentais e não governamentais com
curso de doutorado. Como os agricultores percebem isto pode ser verificado na
fala de um representante:
Dificuldade? Mais no início, agora um pouco menos, pois o
território é uma discussão que a gente não tinha. Então, a gente se
sentiu um pouco perdido. Além da gente ter pessoas com
doutorado, com mestrado, com terceiro grau, que tem aquela
facilidade de comunicação, de colocar bem, de se expressar... (B.
D., representante no GGETESPA)
Entretanto, os representantes dos agricultores atuais, se for considerado
apenas os agricultores familiares que são representantes titulares, um têm o
primeiro grau completo, um têm o segundo grau e três estão concluindo o terceiro
grau. Isto demonstra uma formação educacional bastante superior àquela
encontrada nos conselhos municipais. No CMDR de Itapejara d’Oeste 60% dos
agricultores familiares cursaram até a 4
a
série, 10% da 5
a
até a 8
a
série e 30% do
1
o
ao 3
o
ano do segundo grau
18
. O CMDR de Vitorino apresentou índices
educacionais mais avançados que o de Itapejara d’Oeste, mas ainda bem
inferiores comparados ao GGETESPA, tendo 35% dos agricultores familiares que
cursaram até a 4
a
série, 22% da 5
a
até 8
a
série e 43% do 1
o
ano ao 2
o
ano do
segundo grau
19
. Estes índices podem ser observados na Tabela 1.
18
Foram desconsiderados dois agricultores neste levantamento, por estes nao poderem ser
considerados agricultores familiares. Um por ter a maior parte de seus rendimentos oriundos de
sua função de vereador e o outro por ter um grande número de força de trabalho contratada.
19
Na pesquisa realizada pelo Ipardes (2001) em 20 CMDRs do Paraná, constatou-se que poucos
representantes dos agricultores familiares tiveram esta convivência escolar de forma continuada e
por muito tempo. Neste estudo, revelou-se que 33% dos conselheiros municipais estudaram
apenas até a 4
a
série, 12% chegaram até a 5
a
ou 7
a
série e que 1% deles nunca estudou. Estes
números seriam proporcionalmente maiores se a pesquisa tivesse se restringido apenas aos
agricultores e não correspondesse ao total de membros dos conselhos pesquisados, mas com
17% com o segundo grau completo e 13% com o superior completo, encontram-se os
representantes da Emater e prefeituras. Esta disparidade do vel de escolaridade entre os
150
Tabela 1. Nível educacional dos representantes dos agricultores familiares dos diferentes
espaços institucionais de participação social. 2006.
Espaço institucional 1ª a 4ª série 5ª a 8ª série Segundo grau Terceiro grau
GGETESPA 20% 20% 60%
CMDR Itapejara d’Oeste 60% 10% 30%
CMDR Vitorino 35% 22% 43%
Fonte: Pesquisa de campo, 2006.
A escola, além do aspecto da educação propriamente dita, também propicia
um espaço de sociabilidade entre as crianças, jovens e adultos das comunidades
rurais, pois além da sala de aula, há outros espaços de convívio ao redor da
escola. A caminhada ou a viagem de ônibus escolar até a escola, os momentos
esportivos e de lazer, as festas, as reuniões e palestras, visitas, etc., que ocorrem
nas escolas é um espaço importante de convívio, no qual as criança, jovens e
adultos interagem com outros, que vivenciam algumas experiências semelhantes
e outras diferenciadas, propiciando contatos externos para o conhecimento da
realidade e a formação das opiniões e interesses dos representantes. Assim, além
do conhecimento específico adquirido na sala de aula, estas experiências
vivenciadas no ambiente escolar podem ser decisivas para a formação do
interesse em atuar coletivamente.
No processo de formação dos representantes entrevistados, outro ponto
em comum em sua trajetória: suas atividades com o coletivo iniciaram ou se
consolidaram a partir de experiências junto a Igreja. A influência dos mediadores
religiosos na formação destes representantes é claramente perceptível. Alguns
jovens participaram apenas das atividades usuais da Igreja nas comunidades
rurais, mas muitos deles participaram de cursos de formação política organizados
por estes mediadores que, conjugados com a crise enfrentada pelas famílias de
agricultores e o fato de vivenciar as mobilizações que ocorriam no meio rural,
fizeram com que estes se introduzissem nos movimentos que estavam em
agricultores e os representantes governamentais começa a dar a noção das diferenças nas
trajetórias percorridas por estes atores até chegarem aos espaços de participação.
151
emergência, resultando em muitas das lideranças rurais, que conhecemos hoje,
principalmente, aqueles que estão atuando nas organizações sindicais,
cooperativas de produção e crédito, associações, etc. Este processo é muito
semelhante ao relatado por Navarro (1996) no Rio Grande do Sul, no qual os
jovens rurais eram arregimentados e formados, passando a exercer o papel de
animadores de reuniões, de participantes ativos dos movimentos em seus
municípios até se articularem gradualmente em estruturas maiores, com âmbitos
regionais, estaduais e até mesmo nacionais.
O envolvimento da Igreja Católica, neste processo, está relacionado a um
amplo movimento social/religioso referido como “teologia da libertação” ou “Igreja
dos pobres” ou “cristianismo da libertação”, que surgiu na década de 1960 e
envolveu setores significativos da Igreja, movimentos religiosos laicos, redes
pastorais com base popular, comunidades eclesiais de base (CEBs), bem como
várias organizações populares criadas por ativistas das CEBs; clube de mulheres,
sindicatos de trabalhadores rurais e outros grupos organizados. Este movimento
assumiu uma posição bastante crítica ao modelo capitalista de desenvolvimento e
ao culto ao desenvolvimento econômico e à tecnologia moderna. Além disso, as
comunidades eclesiais de base e as atividades pastorais que - apesar de seus
membros apresentarem forte tendência basista, que levou ao localismo, a um
ritmo lento de organização, à desconfiança de estranhos e intelectuais e a um
baixo nível de politização - ajudaram a criar uma nova cultura política no Brasil, a
qual Löwi (2000) denominou de democracia das bases. Esta foi criada em
oposição não ao autoritarismo militar, como também, ao “clientelismo”,
praticado nas áreas rurais pelos proprietários de terra e nos centros urbanos por
políticos profissionais que distribuiam favores; ao “populismo”, que a partir de
Vargas e seus seguidores, permitiu que que o governo criasse de cima o
movimento sindical e popular e; ao “verticalismo”, muitas vezes utilizado pelas
forças da Esquerda, seguindo o exemplo soviético ou chinês. Entretanto, isto fez
152
com que a maioria mais conservadora da Igreja e o governo militar começasse a
se preocupar com a capacidade de mobilização deste movimento:
A gente começa no movimento da juventude, começa a sonhar, a
discutir sociedade, discutir socialismo, discutir a Igreja. Inclusive
criticava a Igreja. [...]. A gente fazia encontro com cem, cento e
poucos jovens e os padres começaram a ficar preocupados, se
quando a gente se mobilizava a gente ia xingar o prefeito, sei lá.
Então, no momento em que a Igreja começou a limitar isso, a
gente começou a ir para o sindicato, a gente criou outras
ramificações, tanto é que hoje, os movimentos da Igreja não têm
mais nada (D. G, representante do GGETESPA).
Assim, o movimento religioso foi perdendo as suas lideranças e,
consequentemente, a sua força, com a forte intervenção do Vaticano. Entretanto,
a cultura política permaneceu nos representantes, que formaram e consolidaram
os seus princípios, valores e práticas com os discursos e práticas deste
movimento. Isto faz com que os representantes dos agricultores familiares
apresentem traços peculiares. Primeiro, o discurso maniqueísta da Igreja faz com
que estes não confiem nos agentes considerados estranhos por eles, fazendo com
que muitos dos representantes tenham dificuldades de atuar em conjunto com
outros atores oriundos de outras organizações, principalmente aqueles que não
são agricultores, assim como foi visto no estudo de Leon (1993). Por outro lado, o
discurso basista e o estranhamento dos atores externos, constrói uma base de
confiança, isto é, capital simbólico, dos agricultores em relação ao representante,
na qual após a sua consolidação, os representados tendem a legitimar qualquer
ação deste (BOURDIEU, 2004, 2005).
Isto ajuda a explicar a diversidade de formas com as quais os agricultores
se envolveram com a Igreja e, como isto, se reflete nas trajetórias associativas
diversificadas destes atores, com algumas mais voltadas às questões
comunitárias até aquelas, mais atuantes politicamente, na crítica ao modelo de
desenvolvimento proposto.
Os representantes dos agricultores familiares nos CMDR pesquisados são,
predominantemente, aqueles que permaneceram nas atividades das comunidades
rurais. Atuam em várias organizações relacionadas à Igreja, esporte, produção,
mas, restringem se à sua comunidade rural ou, no máximo, ao município. A sua
153
condição como membro do conselho se deve à sua atuação na associação de
produtores, que foi organizada, em quase a totalidade das comunidades rurais dos
municípios, fomentada pela extensão rural oficial.
No CMDR de Vitorino os representantes dos agricultores apresentam esta
trajetória, com exceção do representante do Sindicato Rural, que participa de
algumas palestras organizadas pela FAEP, mas apenas como ouvinte e o
representante do STR
20
, que tem vínculo com a FETAEP. Apesar destes
representates não participarem da direção destas organizações, num âmbito
maior, estes recebem impressos, orientações e participam de eventos fora do
município. Isto a estes representantes a oportunidade de adquirir certos
conhecimentos e capacidades diferenciados dos outros membros, que não têm
esta oportunidade, como pode ser percebido pela fala de um deles, quando fala de
um evento que teve a oportunidade de participar fora do município:
A gente pouco opinava, mas foi bom viu! A gente reune tudo.
tantas pessoas falar. Um fala uma coisa, outro fala outra. A gente
vai aprendendo, vai se entrosando junto com eles, vai entrando
nos assuntos, conhecendo como é que é as coisas. Aprende! (M.
H., membro do CMDR de Vitorino).
A trajetória associativa dos agricultores familiares dos municípios de
Itapejara D’Oeste e Vitorino é bastante diferenciada, isto faz com que os
representantes do primeiro município consigam ampliar as discussões de seu
CMDR, por trazer temáticas que estão sendo discutidas em espaços supra-
municipais e por suas intervenções demonstrarem um maior acúmulo de
experiências e conhecimentos que potencializam suas proposições. Entretanto,
como o território Sudoeste do Paraná tem uma trajetória associativa muito rica,
seus municípios, alguns mais rápido e outros mais lentamente, tendem a assimilar
as diferentes experiências associativas. Isto pode ser verificado no CMDR de
Vitorino, no qual um agricultor convidou os representantes a participar de uma
reunião sobre as atividades da Cresol, no período da pesquisa de campo deste
estudo, e neste ano, isto é, em 2007, estes estão sendo atendidos por uma
20
Além disso, pode haver questionamentos sobre o fato deste membro ser considerado como um
representante dos agricultores familiares, pois, este tem moradia e atividades urbanas há muitos
anos
154
unidade desta cooperativa sediada num município vizinho. Isso deixa claro que as
experiências consolidadas em municípios vizinhos, começam a criar interesse
mesmo nos municípios mais distanciados das organizações regionais.
A participação dos agricultores de Itapejara d’Oeste em organizações
regionalizadas, começou pela busca de informações à respeito do funcionamento
da Cresol, pois estes perceberam que o acesso ao crédito, poderia ser facilitado
com a organização de uma cooperativa no município. Como havia uma exigência
de que houvesse um mínimo de organização entre os agricultores do município
para que se começasse a discussão da instalação da Cresol, a mobilização dos
agricultores do município e o contato destes com os dirigentes regionais se tornou
constante até a consolidação desta cooperativa no município. Como já ocorreu em
outros municípios, após a instalação de uma organização, os agricultores
começaram a ter contato com as discussões e participantes das outras
organizações, despertando o interesse em ampliar estas discussões e
experiências em seu município. Isto ocorre porque há uma movimentação de
atores entre estas organizações, fazendo com que muitos agricultores transitem
entre as várias organizações, alguns fazendo parte da direção de várias delas.
Os dirigentes destas organizações iniciam nos municípios, mas,
posteriormente, muitos assumem posições no território, estado e até mesmo em
abrangências maiores. Entretanto, isso exige muito esforço por parte do agricultor.
Eu fui preparado para trabalhar como agricultor e não para ser
dirigente. Eu aprendi na luta. Tem muita coisa que a gente
aprende na prática. Mas, tem dificuldades, tem debates que você
precisa ter conhecimento para você se expor, tem que aprender
muito prá conseguir seguir em frente (B. D, representante no
GGETESPA).
Diferente da maioria dos membros dos CMDRs
21
, os representantes dos
agricultores familiares do GGETESPA, passaram as suas responsabilidades no
estabelecimento rural para outros membros da família, contribuindo na renda
familiar com os vencimentos recebidos da organização pela qual atuam. Todos
viajam constantemente pelo território e fora dele também. Assim, o seu contato
21
Exceto os dirigentes do STR, Cresol, Assintraf e Sisclaf do CMDR de Itapejara d’Oeste.
155
com a sua comunidade rural se torna cada vez mais esporádica, inversamente, ao
seu contato cada vez mais íntimo com o mundo externo.
Isto faz com que estes consigam cada vez maior capacidade de
comunicação com este mundo, que é composto de atores como outros dirigentes,
técnicos, administradores públicos, políticos, etc., fazendo com que estes
consigam o domínio de outros discursos e o conhecimento das diferentes regras e
fluxos que regem as organizações públicas, os escritórios políticos, enfim,
daqueles espaços que antes eram distantes de seu cotidiano (OLIVEIRA, 2000).
No próximo capítulo, a partir das diferentes configurações dos espaços, as
trajetórias individuais e as trajetórias associativas dos municípios e território, serão
analisadas as dimensões: representatividade e capacidade de intervenção dos
representantes.
156
6 AS DIMENSÕES DA REPRESENTAÇÃO DOS AGRICULTORES
FAMILIARES FRENTE AOS SEUS FATORES CONDICIONANTES
A representatividade e a capacidade de intervenção são as duas dimensões
selecionadas para analisar a representação dos agricultores familiares nos
espaços institucionais de participação social no território Sudoeste do Paraná.
6.1 A representatividade dos agricultores familiares nos espaços
institucionais de participação social
Como foi visto na seção 3, muitos autores que discutem a
representatividade a partir do representante, isto é, verificando se este expressa
realmente as posições e interesses dos representados. Concorda-se que o
representante não precisa atuar de fato e literalmente de acordo com os
interesses e desejos dos representados, mas estes precisam estar potencialmente
presentes e ser relevantes na sua atuação, isto é, o representante precisa
realmente atuar, ser independente, mas o representado precisa estar em algum
sentido atuando através dele (PITKIN, 1967). Entretanto, percebe-se que esta
forma de pensar a representatividade dificulta a análise do processo de
representação, devido à heterogeneidade do grupo de representados e a
complexidade na definição da autonomia que este representante deve ter para se
posicionar perante alguma questão.
Assim, considerando que o poder consiste em uma relação entre aquele
que o exerce e os outros, através do qual ele ou ela comunica intenções e
encontra a aquiescência deles (YOUNG, 1990) e, diferenciando-o de dominação,
que significa fenômenos estruturais ou sistêmicos, os quais excluem pessoas de
157
participar na determinação de suas ações ou no controle de suas ações
1
(YOUNG, 1990), considera-se que o representante é aquele detentor do poder
simbólico, aquele que tem “[...] a palavra autorizada que deve sua autoridade ao
fato de que aquele que a fala tem a autorização do grupo que o autoriza a falar em
seu nome.” (BOURDIEU, 2005, p. 77). A partir disso, optou-se por analisar o
processo de representação dos agricultores familiares, a partir do que pode ser
observado sobre a relação entre representante e representado, isto é, analisando
se o representado legitima a atuação dos representantes, seja através do suporte
explícito ou seja pelo reconhecimento tácito da atuação do representante, muitas
vezes independentemente das posições que este expresse nos espaços
institucionais de participação social (BOURDIEU, 2004, 2005). Entretanto, as
contribuições dos outros autores serão utilizadas para o detalhamento da relação
entre representantes e representados nestes espaços.
Inicialmente é interessante observar que os representados não participam
diretamente da escolha dos seus representantes, tanto nos conselhos, como no
GGETESPA. No caso dos conselhos, estes são indicados por serem os
presidentes das associações dos agricultores das comunidades. Mesmo não
havendo nenhuma norma obrigando a este procedimento nos regimentos destes
espaços, este é um procedimento que parece estar cristalizado nas associações
participantes dos dois conselhos. No caso das organizações, este procedimento
se diferencia um pouco, com a indicação de algum membro da direção, não
necessariamente sendo o presidente desta. Existindo, também, organizações que
indicam algum técnico que trabalha para eles, como foi citado anteriormente.
Assim, em todos os casos, não há um processo eleitoral específico para a escolha
dos agricultores familiares membros destes espaços.
Mesmo que esta forma de indicação indireta possa, em alguns casos,
acabar expressando o consenso dos representados, sobre quais pessoas
deveriam representá-los, e que a eleição não seja um instrumento suficiente para
1
Pessoas vivem dentro de estruturas de dominação, se outras pessoas ou grupos podem
determinar, sem reciprocidade, as condições de sua ação diretamente ou em virtude das
consequências estruturais de suas ações (YOUNG, 1990).
158
que ocorra a responsabilização social, esta ausência de algum procedimento que
amplie a participação dos representados na seleção do representante, faz com
que se perca a oportunidade de se debater o espaço propriamente dito e a função
deste componente neste espaço, dificultando análises futuras, tanto do espaço de
participação, como da atuação deste ator como representante.
Assim, mesmo que processos mais próximos às práticas democráticas não
garantam, por si, que isto signifique a eleição do membro mais representativo
(FEDOZZI, 2002; MANIN; PRZEWORSKI; STOKES, 1999a, 1999b) ou que os
eleitos farão tudo o que puderem para maximizar o bem estar dos cidadãos
(MANIN; PRZEWORSKI; STOKES, 1999a), pois, representados pouco cientes da
conjuntura e dos trâmites da discussão política, muitas vezes, têm dificuldade de
fazer a escolha adequada e garantir a possibilidade de responsabilização social
(ARATO, 2002; MANIN; PRZEWORSKI; STOKES,1999a, 1999b; PITKIN, 1967), a
eleição é um instrumento importante, porque tende a estimular os representantes
a buscar o conhecimento das demandas e necessidades do eleitorado (LAVALLE;
HOUTZAGER; CASTELLO, 2005; ARATO, 2002). Além disso, práticas abertas a
toda comunidade possibilita maiores chances de aprendizagens individuais e
coletivas necessárias a uma cultura democrática (FEDOZZI, 2002).
A ausência destes momentos de reflexão sobre o espaço e o próprio
processo de representação, reforça a tendência de que as relações entre as
organizações destes espaços, sejam estas governamentais ou não
governamentais, tenham os vínculos entre indivíduos como a sua base e não as
instituições, conforme a tendência estudada por Marques (1999). Isto é
comprovado quando se analisa a trajetória das representações destas
organizações, nas quais os representantes tendem a ser os mesmos por longos
períodos de tempo
2
e, quando ocorre a troca de um número significativo de
indivíduos representantes no mesmo período, isso chega a ocasionar um
descompasso nas ações deste espaço.
2
Fazendo com que a norma do tempo de mandato, geralmente existente nos regimentos dos
espaços institucionais de participação social, quase nunca seja seguida.
159
Mesmo com essa ausência de discussão sobre o espaço e o processo de
representação, os agricultores dos municípios sabem que os conselhos existem,
mas tem uma visão bastante simplista de sua função, na qual este discute, quase
que exclusivamente, a destinação de recursos de determinados programas de
governo. Assim, estes representados não visualizam este espaço como um
instrumento para expor os seus descontentamentos, posicionamentos e
interesses. Isto é reforçado pela forma como as atividades dos conselhos são
conduzidos pelos membros das organizações governamentais e pela postura dos
próprios representantes dos agricultores, que não buscam a discussão de temas
menos pontuais com os seus representados.
No último ano, o CMDR de Itapejara d’Oeste organizou o levantamento de
demandas prioritárias para o município a partir das comunidades rurais. Isso está
ajudando a alterar esta visão dos representados e até motivando os
representantes, que se mostram mais seguros para opinar nas reuniões.
Agora nós fizemos as prioridades das comunidades, então, agora
eu sei as prioridades que a minha comuidade precisa. Se eu for
chamado lá, prá fazer tal trabalho. Se vier para calçamento eu
sei, se vier prá maquinário eu sei onde é necessário. Qualquer
investimento, qualquer prioridade que vier prá comunidade eu sei
onde trabalhar. Então, a gente tem mais esta visão agora, mas
antes a gente tava tudo cego. A gente não sabia o que fazer.
Agora não, a gente sabe mais os objetivos da comuidade. Agora a
gente não precisa consultar tanto a comunidade. Porque a gente já
sabe, foi feito reunião com a comunidade inteira, foi colocado,
então a gente está por dentro. Muita coisa, claro, a gente convoca
a comunidade. A gente coloca que tem um projeto assim, assim.
Onde vamos fazer? Como vamos fazer? Prá quem vamos fazer?
Se a gente tem um tempo e não está muito de apar, então a gente
procura a comunidade igual (H. T., representante no CMDR de
Itapejara d’Oeste).
Nas comunidades, estes representantes têm o diferencial de conviver
diariamente com os seus parentes e/ou vizinhos, o que lhes permite ter uma maior
sensibilidade em relação às necessidades das comunidades, assim, como receber
as cobranças, mesmo que informalmente, de suas participações como
representantes das comunidades. Geralmente, estes representantes têm uma
trajetória de participação nas atividades da Igreja, em atividades esportivas e nas
160
associações de agricultores, fazendo com que estes sejam reconhecidos como
atores que atuam de forma positiva pelas comunidades.
Entretanto, em alguns casos estes representantes parecem perder um
pouco este vínculo com as comunidades, por atuar em muitas atividades fora das
suas comunidades, estabelecendo muitas relações com atores externos a estas,
como os agentes das organizações governamentais ou de organizações dos
próprios agricultores que atuam regionalmente. Isto faz com que estes atores
comecem a se diferenciar dos outros agricultores, trazendo para as comunidades,
experiências e posicionamentos estranhos ao cotidiano destas, podendo
ocasionar a perda de legitimidade destes perante as famílas de agricultores das
suas próprias comunidades (BRANDÃO, 1986; OLIVEIRA, 2000).
Alguns atores permanecem em busca deste equilíbrio entre o núcleo de
suas comunidades e o meio externo, pois, são componentes importantes para as
organizações externas que necessitam de um porta-voz das comunidades
(COSTA, 2002; WOLF, 1971), e as comunidades, por sua vez, necessitam de um
porta-voz para conseguirem se expor externamente (GOLDMAN, 2001). Outros,
buscam a sua legitimidade nas organizações civis, isto é, começam a atuar em
ações menos localizadas, em nome de uma base de representados que nem
sempre comportam as suas comunidades especificamente, mas, uma parcela de
agricultores familiares que se organizaram a partir de interesses comuns.
A partir do envolvimento destes em uma das organizações civis do território,
como muitas mobilizações e projetos que são realizados em conjunto, estes
começam a se envolver nas outras organizações também. Assim, muitos dos
representantes de determinadas organizações já atuaram, também, em outras
existentes no território. Esta é a trajetória característica dos representantes dos
agricultores familiares que atuam no GGETESPA, atores que têm uma grande
experiência em diferentes organizações da sociedade civil. Isto significa que estes
representantes têm condições de conhecer os interesses das famílas que fazem
parte da base destas várias organizações, pois, apesar de ter escolhido a
estratégia de organização em diferentes entidades para alcançar diferentes
objetivos, praticamente, estas têm uma mesma proposta de desenvolvimento.
161
Quando consideramos como o GGETESPA é visto pelos agricultores
familiares do território, até por este ser bem mais recente que os outros, a maioria
nem sabem que este espaço existe. Como este apresenta escala ampliada,
impossibilitando um contato rotineiro entre representante e representados, estes
tomam conhecimento das deliberações do Grupo Gestor quando são
beneficiários de algum projeto e ainda assim, muitos não tomam conhecimento de
todo o processo ocorrido para se chegar a este objetivo. Geralmente, o
conhecimento mais ou menos aprofundado sobre o funcionamento do Grupo
Gestor se restringe às pessoas que fazem parte da direção das organizações que
participam deste, mesmo assim, este conhecimento muitas vezes se mostra
superficial. Nesse caso, o representante depende muito da forma de atuação de
sua organização, que pode ou não ter clareza dos anseios dos agricultores
familiares do território, porque ele, pessoalmente, se encontra mais distante
destes por deixar de participar cotidianamente da sociabilidade existente nas
comunidades rurais.
Além disso, segundo os representantes, a forma como estão sendo
conduzidas as discussões no grupo gestor não motiva ou facilita este processo de
comunicação com os representados.
Hoje não tem esta dinâmica de discutir (com os representados),
até porque não tem uma pauta, não orientação. Muitas vezes a
gente chega para discutir questões de ordem, como se
encaminha isto, como se encaminha aquilo. Não tem um debate
do território no sentido de construção, é um debate muito
operacional, então muitas vezes você vai para a reunião, sem
saber a pauta. [...]. Falando sério, não há uma discussão de
estratégia, de posicionamento, porque não como saber o que o
território está discutindo, não há uma agenda para se discutir
desenvolvimento (D. G., representante do GGETSPA).
Assim, segundo eles, não há como e nem porquê discutir com os
representados, pois a pauta é composta de encaminhamentos pontuais e
“momentâneos”. Desta forma, são poucos os representantes que repassam pelo
menos as deliberações do GGETESPA aos atores que atuam nas organizações
em nível municipal.
Como já havia sido exposto por Dahl e Tufte (1974), os representantes que
são sensíveis aos desejos dos cidadãos precisam saber o que estes querem, ou
162
pelo menos, que os representados saibam o que eles estão legitimando, mas para
isto, é preciso ter alguma forma de comunicação entre os cidadãos e os
representantes. Da mesma forma, para os cidadãos serem capazes de fazer
oposição e retirar os representantes que não correspondem às suas expectativas,
os cidadãos precisam saber como estes estão respondendo a estas expectativas.
Isto também indica a necessidade de comunicação entre os representantes e os
cidadãos, para estes entenderem como e porquê os representantes estão
assumindo determinada posição em relação a alguns assuntos. Entretanto,
quando o número de cidadãos aumenta, surgem novos problemas de
comunicação.
Parte desta comunicação está sendo feita pelos canais disponibilizados
pelos meios de comunicação existente, mas, geralmente, estes permitem apenas
a comunicação oriunda dos representantes. Nesta comunicação assimétrica, os
representados são tratados coletivamente, como uma única audiência onde estes
não têm como se expor (DAHL; TUFTE, 1974). No caso do GGETESPA está se
tentando levar ao conhecimento do território, os principais eixos do PTDRS
através da distribuição de folders e cópias do PTDRS pelas organizações, mas,
esta ainda é uma ação extremamente tímida, que não extrapola àqueles que
coordenam ou trabalham nas organizações, não atingindo os agricultores
familiares como um todo.
A busca do conhecimento dos desejos dos constituintes através de oficinas,
estudos e pesquisas, organizando eventos, sumarizando e condensando algumas
informações, exige a coordenação de programas e o manuseio de informações
que resulta em interpretações e estas vão depender de quem as está fazendo,
pois o que é importante para uns pode não ser tão importante para outros. Nas
oficinas do GGETESPA há a participação de técnicos das próprias organizações e
de apoio externo, mas o cuidado de escolher grupos que tenham uma visão do
processo semelhante às organizações do grupo, pois estes sabem que a
autoridade de sumarizar ou condensar informações, potencial e inevitavelmente,
envolve outras autoridades e poderes. Independente das intenções originais, os
mediadores aos quais são dados esta autoridade dificilmente permanecerão
163
transmissores inertes de informações entre representados e representantes
(DAHL; TUFTE, 1974). Isto faz com que os relatórios das oficinas tenham um
discurso muito próximo das utilizadas por algumas organizações componentes do
grupo gestor, que atuam na organização destas oficinas.
Isso é agravado pelo fato da participação nas oficinas serem distribuídas
entre as organizações que compõem o grupo gestor, isto é, cada organização tem
um determinado número de vagas em cada oficina, assim, geralmente o público
que participa destes eventos são aqueles mais próximos das direções destas
organizações. Além disso, os agricultores que estão mais inseridos nas direções
destas organizações sociais têm maior desenvolvura e experiência no momento
de se expor, fazendo com que os outros se sintam mais intimidados. Isto
determina uma maior hierarquização na utilização da fala.
Assim, é difícil avaliar precisamente o quanto de informações relevantes
são perdidas, ou até mesmo deixam de ser ouvidas, mas, provavelmente, esta
perda é acrescida com o aumento do tamanho do público ao qual a atividade é
direcionada, isto é, em abrangências maiores, a seleção do que é relevante do
produto das oficinas e a determinação do próprio blico se torna muito mais
complexa.
Então, esta ampliação da dificuldade de comunicação entre os
representantes e os agricultores familiares do território significa que os
representantes do GGETESPA tendem a ser menos representativos que os
representantes dos CMDRs? A resposta é: depende de quem eles estão
representando. Caso a proposta seja que os membros do GGETESPA
representem todas as famílias de agricultores familiares dos 42 municípios que
compõem o território, a resposta provavelmente seria “sim”. Isto seria evidente
pelo simples fato que os representantes não têm um canal de comunicação, nem
mesmo indireto, com todo este público e os interesses deste grupo serem
extremamente heterogêneos dificultando o processo de representação, como já foi
discutido nos estudos de outros autores (MANSBRIDGE, 1980; DAHL; TUFTE,
1974).
164
Entretanto, se a resposta for aquela dada por 100% dos representantes dos
agricultores familiares entrevistados, isto é, que eles representam os agricultores
familiares que fazem parte da base das suas organizações, então, eles
provavelmente são mais representativos, isto é, a sua atuação como
representante é legitimada pela maioria de seus representados, pois, quando
estes se inserem nestas organizações é porque seus interesses são condizentes
com as proposições destas. Considerando que os representados do GGETESPA,
sejam as famílias que fazem parte da base destas organizações, estas são muito
mais atuantes do que as famílias que estão nas comunidades representadas nos
CMDRs, assim, pode-se afirmar que uma tendência a que os representantes
do GGETESPA sejam mais representativos, pois a fidelidade dos membros
agricultores familiares do GGETESPA às suas organizações, pode ser percebida
ao compararmos os eixos que constam no PTDRS com as propostas destas
organizações. Além disso, os temas mais importantes ou que possam criar
possíveis tensões são discutidos antes das reuniões do GGETESPA entre os
dirigentes das organizações e algumas vezes, entre aquelas organizações que
fazem parte do Fórum das Entidades da Agricultura Familiar do território, assim,
estas comparecem às reuniões com algumas posições, nem sempre
consensadas, mas, pré-discutidas entre as direções destas entidades.
Apesar de haver uma maior facilidade de contato entre os representados e
representantes dos CMDRs, esta mesma análise pode ser feita em relação às
comunidades rurais, apenas um dos representantes entrevistados disse que ele
tenta representar o bem estar de todo o município no conselho, o restante dos
entrevistados se dividiram entre aqueles que assumem representar as suas
respectivas comunidades e alguns que admitem que representam apenas as
famílias que pertencem à associação desta. Entretanto, alguns destes assumem
que muitas vezes é necessário abrir mão dos interesses da sua comunidade ou
associação, por ter ciência de que outras que deveriam ser priorizadas em
determinados projetos.
Assim, no sentido de ser legitimado por todos os agricultores familiares do
município, o conselho acaba tendo condições de ser mais representativo, pois,
165
como afirma Dahl e Tufte (1974) quando as unidades políticas crescem, o número
de constituintes por representante aumenta, a comunicação é mais indireta,
consequentemente, os representados que não pertencem às organizações
regionais ficam alheios ao que está sendo discutido no GGETESPA. Além disso,
escalas maiores geram uma crescente assimetria na relação entre os cidadãos e
os representantes, gerada pelo crescimento da diferença de poder, conhecimento
e capacidade de comunicação existente entre eles (DAHL; TUFTE, 1974).
Além disso, os representantes legitimados pela sua base e com uma
trajetória muito mais diversificada como os representantes do GGETESPA tendem
a se sentir muito mais seguros de seu próprio conhecimento e convicções, assim
como, da confiabilidade de seus representados, desta forma, estes tendem a atuar
com mais autonomia. Os representantes menos experientes dos CMDRs tendem
a ser mais cautelosos em relação a sua própria visão, procurando saber mais o
que os seus constituintes pensam (PITKIN, 1967). Por outro lado, esta
inexperiência destes últimos, também, podem levá-los a ser mais facilmente
cooptados por outros agentes, como já foi comentado anteriormente.
Assim, no sentido da representatividade estas duas formas de
representação dos agricultores familiares têm a sua legitimidade, mas esta é
concedida ao representante por diferentes representados, isto é, os
representantes do GGETESPA são legitimados pelos agricultores familiares que
compõem a sociedade civil organizada e os representantes dos CMDRs, de uma
forma mais precária, mas ainda legítima, tentam representar as famílias das
comunidades rurais de seus respectivos municípios.
A partir destas diferenciações pode-se esboçar determinados tipos de
representação, considerando as interações entre esta dimensão e os fatores
condicionantes analisadas neste estudo. Assim, nos espaços institucionais de
participação social três tipos de representantes. Os representantes do primeiro
tipo são os “representantes das comunidades” que mantêm um vínculo muito
estreito com as famílias destas, tendo condições, assim, de trazer uma fotografia
fiel dos desejos e interesses destes agricultores para o espaço de participação
social. O segundo tipo é caracterizado por ser oriundo das comunidades, mas que
166
se movimentam com grande desenvoltura entre as organizações do Estado e das
normas de discurso existente com os agentes deste, resultando no distanciamento
destes do restante das comunidades, pois os representados continuam
marginalizados deste diálogo, isso torna esses representantes vulneráveis aos
mecanismos de cooptação política, movidos por interesses externos. O terceiro
grupo, é formado por aqueles agricultores que se inseriram em organizações que
têm projeto e linguagem própria e que ao assumir cargos de direção destas no
município ou território se afastam do cotidiano de seus estabelecimentos e, muitas
vezes das suas comunidades, tendendo a reproduzir apenas a visão das suas
organizações e, consequentemente, dos agricultores familiares que participam
destas organizações nos espaços de participação. Este terceiro grupo tende a
ocorrer com mais freqüência nos municípios e territórios que têm uma trajetória
associativa mais consolidada.
6.2 A capacidade de intervenção dos representantes nos diferentes
espaços
Todos os espaços institucionais de participação social têm os seus padrões
para a organização das questões procedimentais da participação na deliberação e
tomada de decisão. Contudo, nem todos os membros destes espaços, conseguem
ter uma participação efetiva nestes espaços, isto é, conseguem intervir nas
discussões e deliberações destes espaços. Assim, para compreender esta
dimensão do processo de representação, buscar-se-á acompanhar a capacidade
de intervenção dos representantes nos diferentes espaços institucionais
enfocados neste estudo.
A discussão política ocorrida nos espaços de participação social analisados
neste estudo é um tipo de comunicação, na qual se busca o consentimento de
uma maioria, a partir da persuasão. Esta persuasão é objetivada através de
argumentos, isto é, o convencimento para que outros mudem as suas posições
167
favorecendo a sua proposição, sem o uso de subterfúgios como recompensas ou
ameaças (MANIN, 1997). Assim, as normas não escritas, mas existentes nos
espaços de participação social privilegiam determinados tipos de falas que
geralmente são aquelas articuladas de modo formal e impessoal (YOUNG, 1996)
ou relativas ao longo prazo (MANIN, 1997).
Esses tipos de falas que são impositivas e confrontantes, nos quais os
argumentos são muito importantes, são aprendidos a partir do estudo e das
experiências adquiridas a partir da participação em discussões ocorridas com
diferentes grupos e espaços sociais. Assim, estes espaços privilegiam
determinados grupos, como a dos técnicos, aqueles que têm um nível educacional
superior e aqueles que têm uma experiência mais longa de atuação nas
organizações. Além disso, privilegiam as falas masculinas, pois as mulheres,
geralmente, se expõem menos e o menos enfáticas, apresentando falas mais
amenas, no sentido de buscar o entendimento e não, apenas, impor algum
argumento (YOUNG, 1996). Este é um dos fatos que ajuda a explicar a ausência
quase completa de representantes mulheres nestes espaços, como pode ser
verificado pela fala de uma representante feminina:
A gente tem muitas dificuldades por ser mulher. A última pessoa a
ser olhada no grupo é a mulher. É valorizado o que a gente fala,
mas nem sempre é dada a importância devida. Às vezes eu falo e
o outro fala a mesma coisa, mas é valorizado o que o outro falou.
Muitas vezes eu fico chateada por isso (M. R, representante no
GGETESPA).
Acompanhando as reuniões percebe-se que esta diferenciação na
valorização da fala femininas realmente ocorre, devido à entonação mais
sugestiva e exploratória da intervenção das representantes agricultoras, quando
comparada com as falas mais contundentes e impositivas de outros
representantes masculinos ou de técnicos presentes nestas reuniões.
Considerando o grupo dos técnicos, percebemos que esta diferença de fala
dependente do gênero, também ocorre, mas, esta é minimizada pelo acesso ao
estudos e por uma cultura, um pouco menos centrada na figura masculina,
diferente do que ocorre no meio rural do território.
168
Neste estudo a capacidade de intervenção foi analisada a partir da
observação da atuação dos representantes nos diferentes espaços institucionais
de participação social. Assim, observou-se o tipo de intervenção que estes
representantes utilizaram em diversas reuniões, analisando se estas refletiam
concordância ou discordância, buscavam esclarecimento ou esclareciam, se
contribuiam com a temática ou não, se estas procuravam apenas a abreviação da
discussão, eram ideologizadas, etc. Finalmente, analisou-se o interesse
despertado por estas intervenções e se este era geral ou parcial, isto é, se
interessava a todos ou apenas a determinados grupos. Assim, a qualidade desta
intervenção foi analisada a partir de sua capacidade de articulação, argumentação
e proposição.
Iniciando pelos CMDRs percebe-se que, apesar destes conselhos terem
sido formados em momentos semelhantes a partir de orientações externas
oriundas de instituições que precisavam da formação destes para a viabilização de
programas governamentais, as trajetórias destes foram se diferenciando em
alguns pontos pela atuação de atores que potencializaram um pouco mais a
participação dos agricultores. Os dois conselhos foram alvo do trabalho intensivo
da Emater e prefeitura no momento da mobilização das associações e na
constituição do conselho. Posteriormente, estes conselhos foram vitais para a
execucão dos programas estaduais, mas o trabalho junto às associações foi
diminuindo de intensidade.
O conselho de Itapejara d’Oeste está tomando um rumo um pouco
diferenciado por fazer a discussão de experiências que estão dando certo
regionalmente dentro do próprio conselho e com as comunidades, deixando de ser
um espaço de viabilização de programas e avançando para um que busca
alternativas para o desenvolvimento da agricultura familiar do município.
Entretanto, ainda muito a caminhar, pois esta iniciativa não partiu da
maturidade do próprio conselho, mas a partir de um grupo externo que trouxe esta
discussão para dentro deste.
Os representantes dos agricultores familiares deste conselho são oriundos
das associações das comunidades rurais, tendo sua experiência associativa
169
restrita a este grupo e aos grupos religiosos, esportivos e de lazer da própria
comunidade ou no máximo do município. Essa trajetória faz com que
caracteristicamente estes atores tenham a tendência de evitar o conflito, pois os
cidadãos oriundos de comunidades pequenas tendem a evitar conflito mesmo
quando estão fora delas, como se visualizassem os espaços de participação social
tendo a mesma harmonia que eles presenciam em suas relações de vizinhança
nas comunidades (BAILEY, 1965; MANSBRIDGE, 1980).
Mansbridge (1980) aponta que este espantoso desejo de acreditar em
harmonia pode ser oriundo do medo das sanções que eles aprenderam em suas
comunidades ou por haver maior possibilidade de um interesse comum nas
pequenas comunidades de onde eles são oriundos, fazendo com que fosse mais
fácil eles acreditarem na possibilidade de perseguir a harmonia e adotar tal
estratégia pessoal de interpretar os eventos como harmoniosos para torná-los
assim. Ou, como a própria autora admite, o fato de que residentes em pequenas
comunidades relatam poucos conflitos políticos pode, simplesmente, derivar de
que unidades políticas menores tomam menos decisões políticas (MANSBRIDGE,
1980).
No caso dos representantes dos espaços estudados, a resposta parece
estar na conjugação destes três fatos. Primeiro, percebe-se que os representantes
dos conselhos têm uma maior preocupação com a repercussão de seus
posicionamentos nas suas comunidades, pois as relações de parentesco e
vizinhança existentes nas comunidades rurais são baseadas em confiança e
reciprocidade
3
e os representantes não querem ser marginalizados desta rede de
relações. Segundo, as comunidades são bastante homogêneas em relação aos
interesses relacionados ao sistema produtivo e ao bem estar da família, fazendo
com que estes não queiram criar animosidades perseguindo questões que podem
não ser bem aceitas. Terceiro, os temas colocados em pauta nas reuniões dos
conselhos são bastantes pontuais e quando estes são colocados na reunião, já
3
Conceitos trabalhados anteriormente nos estudos de Arendt (1963), Putnam (1996) e Kiyota
(1999).
170
têm uma série de proposições de encaminhantos antecipados pelos técnicos,
assim, realmente não há muito o que discutir e criar conflitos.
Assim, as reuniões periódicas permitem o contato face-a-face, que aumenta
a percepção de semelhança, encoraja a decisão tomada por consenso e pode
realçar o status de igualdade. Isto aumenta a congruência e o reconhecimento de
interesses, mas, também aumenta a possibilidade de conformidade através da
intimidação, mesmo que esta ocorra de forma quase invisível, por uma espécie de
hierarquização que existe nestes espaços (MANSBRIDGE, 1980).
Nos conselhos municipais uma maior homogeneidade entre as
intervenções dos representantes, pois como os assuntos são pontuais e muitos
são apenas comunicados para estes levarem às comunidades, não muitas
possibilidades destes demonstrarem a sua capacidade de argumentação,
articulação ou proposição.
Além disso, abrangências espaciais menores permitem a cidadãos comuns
entenderem melhor os problemas que os confrontam, conhecer melhor seus
potenciais aliados e oponentes, ver o impacto de suas ações ou decisões e
exercer maior controle sobre os eventos que irão afetá-los (MANSBRIDGE, 1980).
Assim, o ambiente é bastante descontraído, no qual os representantes não
demonstram que estão intimidados ou inseguros para se expor, assim, quase
todos fazem uso da palavra durante as reuniões, mas, não há questionamentos
sobre como as questões são encaminhadas ou sobre a forma de funcionamento
destes espaços. Mesmo nas entrevistas individuais não há demonstrações de
descontentamento sobre o funcionamento do conselho. Estes apenas apontam a
dificuldade de motivar a participação dos representados e, no caso do conselho de
Vitorino, especificamente, alguns reclamaram da não participação do secretário
municipal da agricultura nas reuniões. Mesmo assim, neste último caso, nenhum
representante questionou o fato deste ter a função de presidência do conselho.
Nesses conselhos a distribuição de poder diferenciada entre os
representantes não é manifestada de forma explícita em conflitos expressos
publicamente, mas, é embutida em rotinas sociais, através da coordenação das
reuniões, domínio e repasse das informações, controle da pauta de reuniões, etc.
171
Assim, mesmo assumindo que as relações de colaboração e confiança podem
alterar as bases do poder num processo deliberativo, isto tem um impacto limitado
dado `a extensão do diferencial de poder existente potencialmente entre os
participantes (HOLMES; SCOONES, 2000).
Segundo Holmes e Scoones (2000), muitos casos pesquisados declaram
ter o objetivo de criar uma atmosfera de respeito, de promover o entendimento
mútuo e tentar produzir uma avaliação acurada ou decisões com implicações
políticas apropriadas. Entretanto, não é perfeitamente claro se os resultados
destes processos tenham sido produzidos através de um procedimento
deliberativo ideal, no qual todos os participantes entenderam todos os assuntos e
informações em discussão, tenham se engajado no debate efetivamente, tenham
atuado de maneira totalmente aberta e honesta e, em face do melhor argumento,
tenham chegado ao consenso. Pois, como afirma Young (1996), nestes espaços
as pessoas de classe média e melhor educadas atuam como se elas tivessem o
direito de falar e suas palavras carregam autoridade, entretanto, frequentemente
as pessoas de outros grupos se sentem intimidadas pelo requerimento de
argumentos e pelos procedimentos formais e cheios de regras, tendendo a
silenciar. Assim, esta situação se agrava onde grupos cultural e socialmente
diferenciados compartilham o mesmo espaço, como ocorre nestes conselhos.
O processo de entrada de alguns braços de entidades regionais em
Itapejara d’Oeste, está fazendo com que haja reuniões nas comunidades e alguns
representantes estejam participando das mobilizações, processos de formação,
reuniões e até mesmo, a ter funções na coordenacão regional da organização. Isto
faz com que estes agricultores adquiram conhecimentos e experiências bem
diferenciadas daqueles que atuam apenas como representantes de suas
comunidades ou associações. Além disso, eles começaram a perceber que numa
unidade menor, como o conselho municipal, a média de poder individual dentro de
seu grupo é maior, mas o poder do grupo de proteger e ampliar os seus interesses
é bastante reduzido, em relação ao resto do território, estado ou país, isto é, em
relação ao que está além dos limites do município (MANSBRIDGE, 1980). Isto faz
172
com que eles busquem um maior envolvimento do conselho em questões menos
pontuais e localizadas.
Assim, os poucos representantes que têm uma intervenção diferenciada
são aqueles que têm uma trajetória associativa mais ampla, ou seja, aqueles que
tiveram experiências em organizações que atuam em uma abrangência maior
do que a sua comunidade rural, transmitindo e reproduzindo as experiências dos
diferentes contextos (COSTA, 2002) ou aqueles que conseguiram avançar
bastante no nivel escolar, comparativamente aos outros, como já foi visto no
trabalho de Fedozzi (2002). Apesar deste último fator não ser determinante, pois
casos de atores que fizeram apenas até a quarta série, com uma participação
bastante contribuitiva e outros com o segundo grau completo, que se manifestam
muito pouco ou o fizeram de forma menos efetiva.
Este grupo diferenciado com nível educacional superior tem maior
capacidade de articulação e argumentação nas questões discutidas, mas ainda
demonstra dificuldade de proposição. De outro lado, o grupo mais experiente,
pode ter alguns representantes com maior dificuldade de articulação, mas, tende a
ser mais propositivo e ter maior domínio sobre determinados assuntos, o que
amplia a sua capacidade argumentativa.
Entretanto, como os assuntos discutidos nos CMDRs são mais pontuais e
direcionados para as áreas produtivas dos estabelecimentos, não conseguindo
atingir a fluência e continuidade suficiente para se obter uma proposta de
desenvolvimento para o município com a efetiva participação das comunidades
rurais, muitos representantes que atuam nas organizações regionais
desconsideram a contribuição que estes conselhos poderiam dar às discussões
sobre o território.
Quando consideramos o GGETESPA, o perfil dos representantes dos
agricultores familiares se modifica. Entre as doze organizações não
governamentais, cinco são representadas por agricultores familiares e sete por
técnicos que trabalham com a agricultura familiar do território. Excluindo a
Cooperiguaçu, Capa e a Maytenus que são formadas exclusivamente de técnicos,
as outras, como Arcafar, Cresol, MAB e MST têm agricultores na sua direção,
173
mesmo assim, a representação é feita pelos seus técnicos. Isto demonstra as
dificuldades encontradas pelos agricultores familiares de atuarem como
representantes, considerando tanto a falta de certos recursos de infra-estrutura
como dificuldades de transporte e de deixar as atividades em seus
estabelecimentos, por exemplo como a falta de confiança na sua capacidade de
atuar efetivamente num espaço como o GGETESPA, no qual os participantes têm
habilidades e experiências que determinam um maior desafio para a atuação de
representantes menos experientes e/ou preparados. Em algumas organizações, a
possibilidade do agricultor ser o representante nem chega a ser discutido, os
próprios técnicos assumem esta função sem haver o questionamento da
legitimidade disto por parte de agricultores ou de outros técnicos.
Dez das instituições governamentais, por suas características funcionais,
provavelmente sempre terá como representante um membro com formação
técnica
4
e muitos deles, na área de ciências agrárias
5
. Considerando os técnicos
que são representantes das organizações governamentais e não governamentais,
percebe-se que estes têm, com poucas exceções
6
, pleno domínio deste espaço,
isto é, do tipo de discurso que é utilizado para se comunicar nas discussões, pois
apesar de representarem instituições que apresentam projetos de
desenvolvimento diferenciados, a formação destes têm origens muito próximas
(OLIVEIRA, 2000; NEVES, 1998).
Além disso, Young (1990), semelhantemente a Bourdieu (2004), aponta que
os profissionais têm o aspecto da respeitabilidade, privilégio este que se estende
além do local do trabalho para todo o seu modo de vida. Segundo a autora, tratar
pessoas com respeito é estar preparado para ouvir o que eles têm a dizer ou fazer
o que eles pediram porque eles têm alguma autoridade, conhecimento
especializado ou influência. Assim, as normas da respeitabilidade em nossa
4
Incluindo os docentes da Unioeste e UTFPR.
5
Considerando como exceção a Amsop e Acamsop, apesar desta última, no momento da pesquisa
estar sendo representada por um técnico da área de ciências agrárias, que é vereador de seu
município.
6
As exceções são referentes a alguns técnicos menos experientes que mantêm um discurso
extremamente ideologizado, com falas longas, mal articuladas e raramente propositivas.
174
sociedade está associada especificamente com cultura profissional, isto é, as
roupas, fala, gostos e comportamento dos profissionais. Neste sentido, o domínio
dos técnicos vai muito além daquela alcançada pela maioria numérica nas
reuniões.
A preocupação com o domínio dos técnicos nas discussões destes
espaços, se deve ao fato de que espaços no qual grupos cultural e socialmente
diferenciados compartilham o mesmo espaço, as pessoas menos afortunadas
nestes aspectos se sentem intimidadas pelo requerimento de argumentos e
procedimentos formais cheios de regras (YOUNG, 1996). Esta preocupação se
agrava quando é considerado que numa reunião do grupo gestor
7
, os técnicos
ocuparam 57,06% do tempo de fala total da reunião, sendo este dividido em
24,08% na apresentação de informações solicitadas e 9,57% em temas incluídos
por eles na pauta no momento da reunião (assuntos gerais) e 66,35% durante a
discussão dos temas. Como pode ser visto nas Tabelas 2 e 3, a seguir.
Tabela 2. Distribuição da fala dos representantes na reunião do GGETESPA
Representantes
Nº de membros Tempo fala (em minutos)
Participantes
Presentes Com fala Total Apresentação Discussão
Técnicos não gov. 7 7 40 10 30
Técnicos gov. 7 5 21 6 15
Agricultores Fam. 5 3 26 26
Articuladores
Total 19 15 87 16 71
Fonte: Pesquisa de campo, 2006.
7
A seleção desta reunião específica, se deve por esta ocorrer após a consolidação da composição
do GGETESPA e esta apresentar uma pauta com assuntos que são considerados usuais, isto é,
não eram reuniões específicas para a discussão de um determinado projetos ou avaliação do
grupo, por exemplo.
175
Tabela 3. Distribuição da fala dos representantes na reunião do GGETESPA
Não representantes
Nº de membros Tempo fala (em minutos)
Participantes
Presentes Com fala Total Apresentação Discussão
Técnicos não gov. 3 1 24 16 8
Técnicos gov. 5 2 26 7 19
Agricultores Fam. 17 2 79 51 28
Articuladores 2 2 28 8 20
Total 27 7 157 82 75
Fonte: Pesquisa de campo, 2006.
Das falas dos técnicos, 45,91% do tempo de fala foram de técnicos
oriundos das organizações governamentais, 34,12% das organizações não
governamentais
8
e 19,97% dos articuladores regional e estadual
9
. Considerando
que 100% das organizações governamentais estavam sendo representadas pelos
técnicos, estas percentagens não caracterizam o domínio da reunião pelas
organizações governamentais.
Na fala dos agricultores, 48,76% foi utilizada para a coordenação da
reunião
10
que estava sendo feita por um agricultor, 10,08% para a apresentação
da instituição sede da reunião e 41,16% nas discussões. Assim, se considerarmos
apenas os tempos de fala nas discussões, os técnicos ocuparam 68,17% destas e
os agricultores, apenas 31,83%
11
. Estas falas foram proferidas por 5 agricultores
12
,
enquanto, na fala dos técnicos, 17 participantes fizeram o uso da palavra.
Esta ativa participação dos técnicos deve ser tratada cuidadosamente, pois
todos eles estão representando organizações governamentais e não
8
Neste cálculo foram considerados todos os técnicos presentes, sem considerarmos se estes são
realmente os representantes formais destas organizações.
9
Os representantes da Amsop e Acamsop não estavam presentes nesta reunião.
10
Na coordenação estão inserido as fala com o objetivo de organização dos temas, das falas e dos
encaminhamentos.
11
Tendo ciência de que as falas utilizadas na coordenação e apresentação de informações
também são impregnadas de posicionamentos e argumentações.
12
Lembrando que 12 dos 17 agricultores presentes na reunião eram do assentamento onde
ocorreu a reunião ou estudantes que estavam estagiando no MAB ou MST.
176
governamentais que atuam em prol dos agricultores familiares e que, apesar de
atuarem de forma diferenciada, conseguiram pactuar os eixos de um projeto de
desenvolvimento para o território com a participação de suas bases. Entretanto,
considerando que estas organizações, desde a sua origem, foram e são
intensamente influenciadas pelos técnicos e outros atores que atuam juntamente
com os agricultores, cabe a reflexão sobre o quanto dos valores e
posicionamentos, aparentemente, oriundos dos agricultores, foram e continuam
sendo construídos simbolicamente por estes atores externos (BOURDIEU, 2004,
2005).
Assim, mesmo que este projeto realmente seja importante para os
agricultores e tenha sido elaborado com a participação dos agricultores, este é o
reflexo de um processo anterior de construção de significados e valores por parte
das lideranças dos próprios agricultores familiares ou da relação destes com
alguns atores externos. Não questionamentos sobre a importância deste
projeto ou se esse foi construído com uma ampla participação de agricultores
familiares. O processo de construção desses interesses, a forma como esta
discussão foi amadurecendo na consciência dos agricultores, é que é
diferenciado, pois o fluxo inicia no representante (na liderança) para se consolidar
na base, isto é, nas famílias que participam dos movimentos sociais.
Analisando, a partir dos anos 1990, pode-se observar a construção do
conceito de agricultura familiar a partir dos acadêmicos e dos movimentos sociais.
No território Sudoeste do Paraná, mesmo antes disso, havia um processo de
construção de valores, significados, interesses e projetos por parte das
organizações dos agricultores que, atualmente, integrados a este conceito fazem
parte do discurso dos representantes da agricultura familiar. Entretanto, este
processo não foi protagonizado apenas pelos agricultores, mas também, por uma
série de outros atores como os técnicos, os mediadores religiosos, etc.
Assim, este processo poderia ser protagonizado apenas por lideranças dos
agricultores familiares, mas no caso das organizações do território Sudoeste, isto
teve uma influência muito forte dos seus técnicos e, mesmo com a consolidação
177
destas questões na sociedade civil, muitos técnicos continuam assumindo para si
a representação da agricultura familiar.
Os agricultores que têm uma trajetória mais inserida nos movimentos
sociais do território têm maior probabilidade de serem influenciados por esta
“construção simbólica”, pois ao iniciar a sua participação nestas organizações,
estes assumem o discurso vigente nelas.
Contudo, mesmo considerando-se que a construção do processo de
representação começou de forma inversa nestes casos, do representante ao
representado, isto não significa que esta representação simbólica não tenha sido
benéfica para os agricultores familiares. Isto pode ser evidenciado pelas inúmeras
conquistas alcançadas por estas organizações para as famílias dos agricultores e
pela densidade do tecido organizativo destas famílias existente no território.
Assim, a qualidade da intervenção dos representantes dos agricultores
familiares que participam do GGETSPA é incomparavelmente superior àqueles
dos conselheiros municipais. A intervenção é melhor articulada, com argumentos e
proposições baseadas em experiências e discussões já realizadas em outros
espaços, pois a participação destes em outros fóruns de discussão faz com que
estes sejam mais aptos a organizar um conhecimento próprio e tenham maior
segurança para fazer as suas intervenções, pois estas o oriundas da
experiência, tanto da vivência prática do problema, quanto da convivência com
outros que partilham de interesses comuns. Além disso, muitas destas
intervenções já foram testadas em alguns espaços próprios das organizações dos
agricultores familiares e muitas vezes, até mesmo em espaços mais externos e
conflituosos, originando intervenções mais qualificadas, como foi verificado em
outros estudos anteriores (MANSBRIDGE, 1996; MAIA, 2002; FEDOZZI, 2002;
CORNWALL, 2002b).
A partir dessa prática, os representantes mais experientes sabem como
organizar a sua fala nos diferentes espaços, como deixa claro este entrevistado:
O seu posicionamento depende do espaço político (...). Eu não
sonego a minha opinião. Eu vou emitir a minha opinião, mas eu
assumo formas diferentes de fazer a crítica ou formular um
posicionamento. Eu não vou formular um posicionamento, eu não
vou fazer um questionamento, assim, sem pensar que eu posso ter
178
uma reação. Mas eu vou questionar. Este espaço é importante e
eu tenho que usá-lo (D. G., representante no GGETESPA).
Assim, as organizações sociais têm um papel central nas sociedades
democráticas modernas, ajudando a definir a agenda política, fazendo escolhas a
partir desta agenda, implementando estas escolhas e formatando as crenças, as
preferências, os entendimentos próprios, os interesses e as ações que os
indivíduos trazem para os espaços institucionais de participação social (COHEN;
ARATO, 1992).
Entretanto, apesar dos movimentos sociais apresentarem atores melhores
preparados para intervir nos espaços institucionais de participação social, também
apresenta uma fragilidade a esta representação, pois as organizações são
particularistas e orientadas para questões específicas (YOUNG, 1990), muitas
vezes, utilizando a operacionalização da democracia como um instrumento para
alcançar certos objetivos e não como um fim. Assim, estes não promovem práticas
de participação e tomada de decisão que ampliem e solidifiquem uma cultura
política que rompa com a tradição autoritária existente (NAVARRO, 1996) e
consequentemente, que consolide a representatividade deste processo de
representação. A visão maniqueista e a pressão por resultados faz com que
muitas vezes, se esqueça a discussão sobre desenvolvimento e se apresente
projetos que busquem apenas a viabilização das organizações em detrimento de
projetos que objetivem o bem estar das famílias dos agricultores. O fato de haver
uma grande influência dos técnicos, que atuam e dependem destas organizações,
faz com que isto se torne ainda mais acentuado
Finalmente, visualizando apenas os representantes dos agricultores
familiares percebe-se que a alteração de escala do espaço realmente modifica o
perfil destes atores. A média de anos passados na escola formal dos membros do
Grupo Gestor não difere muito daqueles dos CMDRs, entretanto, a trajetória
associativa é muito diferenciada. Assim, no Grupo Gestor percebe-se claramente
uma maior equidade entre a capacidade de intervenção dos representantes
governamentais e dos agricultores familiares, quando comparados com os
membros dos CMDRs. Mostrando que a trajetória associativa mais diversificada
dos representantes e uma consequente seleção que ocorre neste processo, faz
179
com que aqueles que assumiram a direção de organizações mais complexas
espacial e tematicamente, tenham a capacidade de intervir mais efetivamente
nestes espaços de participação social.
Aqueles representantes de agricultores familiares que têm mais anos de
estudo, potencializam a sua trajetória, atingindo o “status” de liderança nas suas
organizações mais rapidamente. Entretanto, a trajetória diversificada é que
garante a sua capacidade de percepção do todo e o domínio e inserção em
ambientes e temas variados, resultando em maior capacidade de articulação,
argumentação e proposição. A participação tem um valor intrínseco, além da
proteção de interesses, em providenciar meios para o desenvolvimento e exercício
de capacidades. Exercitar a participação na tomada de decisões coletiva afeta a
própria ação dos representantes ou as condições que sua ação fornece ao
desenvolvimento de capacidades para pensar sobre as suas próprias
necessidades em relação às necessidades de outros, adquirindo interesse na
relação com outros para as instituições sociais, argumentando e sendo articulado
e persuasivo, etc. Tal participação aos representantes um senso de relação
ativa entre instituições e processos sociais, isto é, o senso que relações sociais
não são naturais, mas sujeitas à invenção e mudança. Neste sentido, as virtudes
da cidadania são melhores cultivadas através do exercício da cidadania (YOUNG,
1990).
Assim, quando comparadas com os processos ocorridos nos conselhos
municipais, no GGETESPA as disputas são muito mais acirradas entre os
membros das organizações, independente destas serem governamentais ou não-
governamentais. Isto se torna evidente na discussão sobre o montante de recurso
que é liberado anualmente pelo Ministério de Desenvolvimento Agrário e não
numa discussão de fundo sobre os diferentes projetos de desenvolvimento para o
território, apesar deste ser sempre o argumento utilizado para refutar o projeto do
outro. Isso ocorre por três razões. Primeiro, porque quanto maior a abrangência
espacial de um grupo, mais saliente serão os conflitos entre os seus membros,
pois isto gera a proliferação de subunidades organizadas que estimula o
crescimento da diversidade, pois as subunidades se especializam e desenvolvem
180
os seus próprios interesses (MANSBRIDGE, 1980, p. 282; DAHL; TUFTE, 1974,
p. 36-9). Segundo, porque os representantes dos agricultores familiares são
melhores preparados para atuar nesta discussão frente aos outros representantes,
principalmente frente aos representantes governamentais, comparados com
aqueles que atuam estritamente em suas comunidades e municípios. Terceiro,
porque as características do grupo pequeno que promove a conformidade,
também suprime o conflito, os membros de comunidades pequenas temem as
sanções que a vizinhança pode manejar, pois a intimidade de suas interações faz
com que cada membro seja mais vulnerável aos outros e mais ansioso para não
levantar fontes potenciais de conflito (MANSBRIDGE, 1980).
A existência deste conflito não é um fator negativo, pois demonstra que os
membros do GGETESPA estão discutindo e apresentando as suas posições e
não, simplesmente, aceitando o que é apresentado por um determinado grupo. As
discussões são bastante horizontalizadas, isto é, os representantes dos
agricultores familiares e os representantes governamentais tendem a expor as
contradições e questionamentos nas reuniões com a mesma intensidade, apesar
da diferença de escolaridade e social que entre os membros (MOUFFE, 1996).
Isto, apesar de gerar situações difíceis, também serve como estímulo para se
buscar argumentos mais fundamentados e, consequentemente, gerar projetos
mais negociados e articulados. O mesmo não ocorre nos CMDRs, pois uma
hierarquia clara entre técnicos e agricultores na qual os agricultores tendem a
aceitar as posições dos técnicos, não expondo as contradições que podem existir
entre os membros deste espaço. Afinal, não se pode acreditar na existência de um
espaço onde não haja conflitos, mesmo que os interesses dos representantes não
fossem tão multifacetados, isto é uma impossibilidade (BOBBIO, 2002).
181
7 A REPRESENTAÇÃO DOS AGRICULTORES FAMILIARES EM ESPAÇOS
DE PARTICIPAÇÃO SOCIAL DO SUDOESTE DO PARANÁ
A representação dos agricultores familiares no território Sudoeste do
Paraná é potencializada pelo rico tecido organizativo existente no território. O fato
do território fazer parte de um “maciço da agricultura familiar” (NAVARRO, 2002) -
juntamente com o Oeste de Santa Catarina e Noroeste do Rio Grande do Sul -
que é o berço de inúmeras experiências participativas
1
e associativas
2
, faz com
que o processo de representação dos agricultores familiares seja mais
representantivo e que seus atores tenham uma maior capacidade de intervenção
nas definições dos espaços institucionais de participação social. A partir disso, as
análises realizadas, anteriormente, permitem algumas conclusões que serão
explanadas nos próximos parágrafos.
Considerando os conselhos municipais de desenvolvimento rural dos
municípios de Itapejara d’Oeste e Vitorino e o Grupo Gestor do Território Sudoeste
do Paraná, pode-se afirmar que as suas distintas configurações interferem nos
processos de representação dos agricultores familiares. Estas diferenciações no
processo de representação, podem ser verificadas a partir da distinção dos perfis
dos representantes, das diferentes formas de relacionamento dos representantes
com os representados e na forma, como os próprios espaços institucionais de
participação social, se identificam com as conformações das organizações dos
agricultores familiares no território.
Os representantes dos agricultores familiares que participam dos CMDRs
são, na sua maioria, “representantes das comunidades” ou que são legitimados
por uma “representatividade comunitária”, isto é, aqueles que têm a sua base de
representados oriunda das associações de agricultores das comunidades rurais e
1
Diagnósticos e planos de desenvolvimento municipais e regionais, conselhos municipais de
desenvolvimento rural, etc.
2
Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, cooperativismo de crédito, comercialização e
habitação, etc.
182
que conseguem manter uma vivência direta com os representados, a partir de
vínculos familiares e/ou de vizinhança. Também há outros representantes que são
aqueles que participam de eventos e discussões conduzidas por organizações
supra-municipais. Estes, apesar de não fazerem parte da direção destas
organizações, participam nas dicussões e processos de formação destas, o que
permite a construção de outras referências, além daquelas adquiridas nas
relações internas do município.
Diferentemente dos membros dos conselhos, os representantes dos
agricultores familiares que participam do GGETESPA são aqueles que assumiram
cargos de direção nas organizações sociais supra-municipais, com bases
geográficas menos definidas. Estes representantes são considerados
“lideranças” regionais, aqueles que detêm o capital simbólico, isto é, aqueles aos
quais é concedido a legitimidade para atuar como representante, a partir de uma
“representatividade associativa” oriunda de sua trajetória nas organizações
sociais do território.
Essa legitimidade dos representantes do GGETESPA tem relação com os
agricultores familiares que fazem parte da base destas organizações sociais
regionais, que os próprios representantes deixam claro ser aqueles que eles
representam quando atuam neste espaço. Neste caso, mesmo não havendo um
processo de discussão sobre os temas discutidos no grupo gestor
especificamente, os representantes consideram os valores e interesses definidos
por sua organização e são legitimados por sua base.
Entretanto, se for considerado a totalidade dos agricultores familiares do
território Sudoeste, parte destes representados não consegue ser ouvida pelos
representantes do GGETESPA, sendo assim, não possibilidade de um
processo de discussão sobre os temas discutidos neste espaço, e muito menos de
ocorrer responsabilização social. Considerando este público marginal às
organizações sociais regionais, mesmo que não atue nas associações existentes
nas comunidades, pode se afirmar que este tende a ter uma comunicação
facilitada com os representantes dos conselhos municipais, pois estes espaços
183
abrangem um número muito menor de representados e estes estão mais próximos
dos vínculos estabelecidos nas comunidades rurais e nos municípios.
Nos dois casos, como em todo processo de representação, uma
dinâmica de inclusão/exclusão: no caso dos “representantes comunitários”, há
uma incorporação dos interesses dos membros da comunidade, enquanto são
excluídos aqueles que não são considerados membros, por suas relações
externas ou por qualquer outra razão; no caso dos “representantes das
“organizações”, uma incorporação dos interesses dos agricultores organizados,
enquanto os interesses dos não organizados são excluídos (informação verbal)
3
.
A diversificação das trajetórias dos representantes e das formas com que
estes se relacionam com os representados estabelece diferentes processos de
representação dos agricultores familiares nos CMDRs e GGETESPA. Isto pode
ser analisado considerando a formação educacional, a trajetória associativa e
como os representantes vivenciam cotidianamente as suas comunidades rurais.
Os representantes com maior formação educacional tendem a apresentar
trajetórias mais rápidas rumo às funções de direção de suas instituições.
Entretanto, considerando a atuação dos representantes dos agricultores
familiares, apesar destes terem a vantagem comparativa, isto o é garantia de
que este tenha maior capacidade de intervenção nos espaços, principalmente,
considerando a capacidade de argumentação e proposição. Nos três espaços
analisados, representantes com poucos anos de estudo que se destacam na
sua atuação, com proposições muito bem articuladas e argumentos convincentes
e adequados ao público presente, assim como, há representantes que alcançaram
níveis educacionais superiores, mas, que não conseguem ter o mesmo sucesso.
A trajetória associativa é um fator determinante para a capacidade de
intervenção dos representantes dos agricultores familiares. A participação destes
em diferentes organizações associativas e, a consequente vivência de múltiplas
experiências e discussões, inclusive, testando suas argumentações e proposições
em diferentes espaços, faz com que estes conheçam melhor a linguagem e as
3
Marcelo Kunrath Silva em seus comentários de orientação, em 2007.
184
normas do discurso dos outros grupos e, com isso, tenham maior segurança e
tranquilidade para expor as suas idéias. Além disso, o representante que tem uma
trajetória reconhecida tende a ser ouvido com maior deferência pelos outros
componentes do espaço.
Estes representantes oriundos das direções das organizações regionais
membros do GGETESPA são “liberados”, isto é, eles recebem apoio financeiro
para poderem se dedicar quase que integralmente às suas organizações. Este
fato, faz com que estes se tornem “agricultores de final-de-semana”
4
ou nem
mesmo isso, quando tantos compromissos, que estes continuam a atuar nas
organizações durante os finais de semana, permanecendo afastados de seus
estabelecimentos e comunidades por longos períodos. Como consequência, estes
representantes acabam se afastando do dia-a-dia e das redes de sociabilidade
das comunidades rurais, levando para os espaços de participação apenas a visão
de suas organizações e não aquela oriunda de sua vivência com os seus
familiares e vizinhos. Assim, os representantes continuam sendo representativos
em relação à base de suas organizações, mas se distanciam daqueles
agricultores familiares que estão marginais a este processo de organização.
Considerando todos estes fatos citados anteriormente, pode-se afirmar que
a trajetória associativa do município ou território, interfere no processo de
representação dos agricultores familiares, pois a existência de um tecido
associativo denso e enraizado num local, significa representantes com maior
capacidade de intervenção nas deliberações do espaço de participação e,
também, uma maior possibilidade de ocorrer um processo de responsabilização
social.
Neste sentido, os agricultores familiares de Itapejara D’Oeste tendem a ser
melhor representados que os agricultores de Vitorino no CMDR, pois, mesmo que
o CMDR de Vitorino tenha alguns trunfos na sua configuração - como as reuniões
ordinárias, a participação de suplentes e as orientações para as reuniões nas
comunidades - o fato de haver representantes de outras organizações, além
4
Expressão utilizada por um representante que vive esta situação, após ser liberado para atuar na
sua organização.
185
daquelas estabelecidas nas associações das comunidades, que têm como prática
a realização de reuniões nas comunidades, buscando a participação de sua base
no levantamento de suas demandas, e a participação de seus dirigentes em
discussões regionalizadas faz com que estes representantes complementem o
processo de representação dos agricultores. Além disso, estes representantes das
organizações fazem com que os representantes das comunidades também
comecem a se interessar por outras dicussões, além daquelas corriqueiramente
existentes nos CMDRs.
Entretanto, o município de Vitorino também já iniciou a dicussão em relação
a estas novas propostas organizativas e pelo menos a cooperativa de crédito já
está atuando no município. Assim, percebe-se que a riqueza da organização dos
agricultores familiares do território tende a potencializar esta organização nos seus
municípios, mesmo que alguns levem um período maior de tempo para
amadurecer esta discussão.
Assim, o processo de representação tem relação com a conformação do
associativismo no território. O associativismo dos agricultores familiares
estabelecido nos municípios, através das associações nas comunidades rurais, é
diferenciado do associativismo existente regionalmente. O associativismo na
escala municipal é mais “orgânica”, isto é, tem uma relação mais próxima com a
vivências das famílias de agricultores familiares em suas características sociais,
produtivas, etc. De outro lado, o associativismo dos agricultores familiares em
escala regional é baseado numa proposta diferenciada de desenvolvimento, na
qual os agricultores buscam a reconversão de seus meios de vida e de sua
organização social, através da protagonização deste processo. Assim, o problema
da representação dos agricultores familiares não é oriunda da escala destes
espaços institucionais de participação social, mas da relação entre a escala e a
forma como se estruturam as práticas associativas, isto é, como estas diferentes
formas de organização dos agricultores familiares e de pensar a agricultura
familiar possam estar representadas nestes espaços e buscar uma proposta
conjunta de desenvolvimento para os municípios e o território.
186
Considerando as organizações da agricultura familiar no território, as
organizações mais ativas e voltadas para a discussão que envolve uma proposta
de desenvolvimento são aquelas com a conformação regionalizada. Isto pode ser
afirmado ao verificar o seu vigor através da multiplicação destas em diferentes
instituições para suprir diferentes demandas dos agricultores familiares (como
crédito, comercialização, etc), da rápida ampliação de sua abrangência espacial e
da ampla rede de relações com organizações estaduais, nacionais e
internacionais. Assim, se considerarmos a parcela de agricultores familiares
organizados dos municípios e território, verifica-se que o GGETESPA, o espaço
institucional de participação social que mais se aproxima dos interesses, discursos
e linguagem destas organizações regionalizadas, tende a viabilizar vínculos de
representação mais lidos e, com isso, propiciar uma representação mais efetiva
considerando a representatividade e a capacidade de intervenção dos
representantes dos agricultores familiares no território.
Entretanto, considerando que estas organizações tem sua atuação centrada
nos agricultores que fazem parte de sua base de associados, é importante que
haja um processo que garanta a oportunidade aos outros agricultores, que não
estão na área de abrangência destas instituições ou, por alguma razão, não fazem
parte da base destas, de participarem e, no mínimo, serem informados dos
processos que ocorrem no território. Desta forma, estes podem ter a opção de
escolher como será a sua participação no processo de desenvolvimento do
território. Assim, a existência de espaços como os CMDRs são importantes para
garantir esta participação e, consequentemente, a representação destes
agricultores familiares.
187
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200
ANDICE A: ROTEIRO DAS ENTREVISTAS SOBRE AS TRAJETÓRIAS DOS
REPRESENTANTES E O PROCESSO DE REPRESENTAÇÃO.
1) Nome.
2) Idade.
3) Escolaridade.
4) A quem representa
5) Participação em atividade grupais da infância e/ou adolescência (igreja,
esportes, outros).
6) Trajetória de participações em organizações associativas no município e
região.
7) Participação em processos de formação de conselheiros ou outros
similares.
8) Quando e como se constituiu este espaço? Havia algum outro processo
anterior ou algum grupo que deu origem a este espaço?
9) Há quanto tempo é representante neste espaço?
10) Como foi o seu processo de seleção para representante?
11) Por que você quis ou aceitou ser o representante?
12) Quais as dificuldades encontradas para participar como representante
neste espaço?
13) Como organiza seu trabalho no estabelecimento rural nas ausências
ocasionadas pela função de representante?
14) Como você se prepara para participar das reuniões?
15) Como os temas são discutidos, deliberados e encaminhados nas
reuniões?
16) Geralmente, há propostas conjuntas com outros representantes?
17) Como as questões discutidas no espaço de participação são
compartilhadas com os representados (antes e depois das reuniões)?
18) um planejamento/plano de trabalho discutido anteriormente com as
comunidades ou com a base de sua organização?
19) Quais os fatores que você considera no momento de opinar?
201
20) Quais temas ele já inseriu na pauta de reuniões?
21) Por que ele se considera um bom representante ou o que falta para ele
ser um bom representante?
22) Qual a importância de ser representante? Quer continuar a participar
como representante futuramente neste ou em outro espaço?
23) Na sua opinião, qual a importância deste espaço de participação?
24) O que poderia ser mudado para melhorar a atuação deste espaço?
25) Como você vê a participação das mulheres neste espaço?
202
ANDICE B: ROTEIRO DAS ENTREVISTAS SOBRE AS CONFIGURAÇÕES
DOS ESPAÇOS INSTITUCIONAIS DE PARTICIPAÇÃO SOCIAL.
1) Quando e como se constituiu este espaço
1
? Havia algum outro processo
anterior ou algum grupo que deu origem a este espaço?
2) Quais os objetivos deste espaço? O que é discutido por ele?
3) Qual a composição deste espaço?
4) Como são escolhidos os representantes de cada instituição ou
comunidade?
5) Qual o tempo de mandato de cada membro?
6) Quais os cargos diferenciados que existem neste espaço (presidente,
secretário, coordenação, etc.)?
7) Como são definidos os nomes para esta funções?
8) Qual a periodicidade das reuniões?
9) Como é definida a pauta da reunião?
10) Como os membros são avisados das reuniões?
11) casos em que a urgência não permite o convite a todos e as decisões
foram tomadas por um número mais restritos de pessoas? Quem foram as
pessoas ouvidas?
12) Onde ocorrem as reuniões?
13) Onde os documentos do espaço são arquivados?
14) Como os temas são discutidos, deliberados e encaminhados nas
reuniões?
15) Como são viabilizados os custos operacionais e da participação de seus
membros?
16) Qual a origem dos recursos financeiros para os projetos aprovados neste
espaço?
1
Sempre se utilizará o nome do espaço durante a entrevista: conselho ou Fórum.
203
ANDICE C: ROTEIRO DAS ENTREVISTAS SOBRE AS TRAJETÓRIAS
ASSOCIATIVAS DOS MUNICÍPIO OU REGIÕES
Municípios:
1) Quais foram as primeiras formas de organização dos agricultores no
município?
2) Por que estas organizações surgiram (qual a motivação)?
3) Quem ou quais instituições/comunidades participaram deste processo?
4) Como este processo organizativo foi se desenvolvendo no município?
5) As comunidades rurais participavam efetivamente deste processo ou
apenas as suas lideranças?
6) Como os diferentes prefeitos interferiram neste processo? Apoiaram ou
não? Como foram as ações mais marcantes?
7) Quais as organizações dos agricultores existentes no município hoje?
8) Elas influenciaram no surgimento do CMDR? E hoje? Elas têm influência
no CMDR?
9) Como esta influência ocorre?
10) Tem alguma organização que não tem representação no CMDR? Por que?
11) Na sua opinião, alguma diferença na atuação dos representantes que
têm uma participação anterior em organizações fora das comunidades
rurais, em relação a aqueles que participam apenas das associações das
comunidades?
Território:
1) Quais as primeiras formas de organização dos agricultores que surgiram na
região?
2) Por que estas organizações surgiram (qual a motivação) ?
3) Quem ou quais instituições participaram deste processo?
204
4) Como foi a participação dos diferentes governos neste processo? Apoiaram
ou não? Quais foram as ações mais marcantes?
5) Como este processo organizativo foi se desenvolvendo na região? Quais os
fatos mais marcantes
6) As comunidades rurais participavam efetivamente deste processo ou
apenas as suas lideranças?
7) Quais as organizações dos agricultores existentes na região hoje?
8) Como surgiu o Fórum? Vocês participaram deste processo?
9) As organizações sociais se sentem representadas no Fórum?
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