Download PDF
ads:
8
ESCOLA SUPERIOR DE TEOLOGIA
INSTITUTO ECUMÊNICO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM TEOLOGIA
ANA SUZIENE BRAZ LALOR MOTTA
ADOLESCÊNCIA E OS ESTADOS DE ABANDONO
.
São Leopoldo
2007
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
9
ANA SUZIENE BRAZ LALOR MOTTA
ADOLESCÊNCIA E OS ESTADOS DE ABANDONO:
“AS FERIDAS DA ALMA.”
Dissertação apresentada ao programa
de Mestrado em Teologia da Escola
Superior de Teologia EST, como
requisito para a obtenção do título de
Mestre em Teologia.
Orientadora: Profa. Drª. Valburga Streck
ads:
10
________________________________________
Drª Valburga Streck
11
Ficha catalográfica por Rita Maria L. Bahia
CRB-5 / 831
M921 Motta, Ana Suziene Braz Lalor.
Adolescência e os estados de abandono : “as feridas da alma” / Ana Suziene Braz Lalor
Motta. - 2007.
81 f.
Inclui apêndices.
Orientadora : Profª Drª Valburga Streck.
Dissertação (mestrado) - Escola Superior de Teologia, 2007.
1. Adolescência. 2. Juventude. 3. Conflito (Psicologia). 4. Auto - estima. 5. Resiliência
(Traço da personalidade). I. Streck, Valburga. II. Escola Superior de Teologia. III. Título.
CDD - 305.235
12
DEDICO
Ao Meu Deus, Senhor absoluto de minha vida, aos meus filhos Pedro e Hanna e ao
meu querido Esposo Pedrinho.
GRATIDÃO ESPECIAL
Ao Programa de Pós-Graduação da EST, que oportunizou este estudo;
À Profa. Valburga Streck, pela orientação e apoio.
13
A criança é o que fui em mim e em meus filhos,
Enquanto eu e humanidade.
Ela, como princípio é a promessa de tudo.
É minha obra livre de mim.
Se não vejo na criança uma criança, é porque alguém a violentou antes.
E o que vejo é o que sobrou de tudo que lhe foi tirado.
Mas essa que vejo na rua sem pai, sem mãe, sem casa, cama e comida,
Essa que vive a solidão das noites sem gente por perto,
é um grito de espanto.
Diante dela, o mundo deveria parar para começar um novo encontro,
porque a criança é o princípio sem fim
E o seu fim é o fim de todos nós.
Herbert de Souza (Betinho).
14
RESUMO
De que maneira pode-se identificar o abandono familiar, educacional e religioso,
como processo emocional do ser humano?
Buscar responder a essas perguntas de forma reflexiva e crítica é a meta perseguida
durante esta pesquisa. Nessa caminhada, dialoga-se com importantes teóricos do
campo da educação, da psicologia e da teologia; enquanto o resgatadas
memórias da infância, a importância da família na formação da auto-imagem na
criança e sua influência até a adolescência, considerando as diferentes formas que a
família apresenta e o processo de transformação e adaptações mediante desafios e
crises que se instalam. As necessidades das crianças e seu desenvolvimento são
analisados a partir dos estudos de alguns teóricos até atingirem a adolescência. A
pesquisa de campo ocorreu com uma turma de crianças de 10 a 12 anos,
estudantes do Ensino Fundamental II do COLÉGIO BATISTA BRASILEIRO em
Salvador, sendo realizadas observações e entrevistas semi-estruturadas com as
crianças, com as famílias do Colégio Batista Brasileiro e com os profissionais que ali
interagem.
São resgatados através de pesquisa bibliográfica aspectos relevantes da história da
formação da família no Brasil e no mundo. Neste processo reflexivo, articulam-se os
conceitos de abandono e de conflitos pessoais, elaborados por autores consagrados
com as idéias e os sentimentos expressos pelos adolescentes através de suas falas.
Palavras-chave: Desenvolvimento; Contexto Familiar; Adolescência e juventude,
Conflitos; auto estima e resiliência.
15
ABSTRACT
How to identify the familiar, educational and religious abandonment, as emotional
process of the human being? How can it be done?
To find the answer to these questions of reflexive and critical form is the goal
pursued during this research. In this way, it is dialogued with important theoreticians
in the field of the education, psychology and the theology; while
memories are rescued of the childhood . The importance of the family in the
formation of the auto-image in the child and its influences until the adolescence,
considering the different forms that the family presents, and the process of
transformation and adaptations by means of challenges and crises that they install.
The necessities of the children and their development are analyzed from some
theories of the development until reaching the adolescence. The research in this field
occurred with a group of 10 to 12- year-old children that attended to the basic
education II of the COLÉGIO BATISTA BRASILEIRO - in Salvador being carried
through comments and half-structuralized interviews with the children from the
families of the IBCA ( IGREJA BATISTA CAMINHO DAS ÁRVORES) and together
with the professionals who interact there.
Relevant aspects of the history of the family formation are rescued by the
bibliography researches in Brazil and around the world. In this reflexive process there
are concepts of abandon and personal conflicts, by consagrated authors with ideas
and speaking of the adolescents.
KEYWORDS: Development, Familiar Context; Family, Adolescence and Youth,
Conflicts; Auto Esteem, Resilience.
16
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ---------------------------------------------------------------------------------------8
1 O CONTEXTO FAMILIAR, INTRODUÇÃO DO ABANDONO ------------------13
1.1 CONCEITUALIZANDOA CRIANÇA --------------------------------------------------- 23
1.2 DEIXANDOA A INFÂNCIA E CONHECENDO A ADOLESCÊNCIA -----------26
1.2.1 Mudanças Físicas ------------------------------------------------------------------------ 31
1.2.2 Mudanças Emocionais ----------------------------------------------------------------- 34
1.2.3 Mudanças e Rebeldia ------------------------------------------------------------------- 37
2 NECESSIDADES DA ADOLESCÊNCIA: PROTEÇÃO E AFETIVIDADE --40
2.1 REJEIÇÃO E CUIDADOS ----------------------------------------------------------------45
2.1.1 Lugar de Fuga ------------------------------------------------------------------------------46
3 O LUGAR DE REFÚGIO: A FORMAÇÃO DOS GRUPOS ----------------------47
3.1 PROBLEMÁTICA DOS GRUPOS -----------------------------------------------------53
3.1.1 História dos Emos:: “ Emotional Hadcore”----------------------------------------55
3.1.2 Característica de um Emocore ---------------------------------------------------------62
4 A IGREJA E SEU PAPEL COM A ADOLESCÊNCIA E JUVENTUDE --------65
4.1 O EDUCADOR E SUAS CONCEPÇÕES DE CRIANÇA E ADOLESCENTE---66
4.2 DOR E SOFRIMENTO - ISMAEL E AGAR -------------------------------------------- 69
5 CONCLUSÃO ---------------------------------------------------------------------------------71
REFERÊNCIAS -------------------------------------------------------------------------------75
APÊNDICES -----------------------------------------------------------------------------------81
.
17
INTRODUÇÃO
A problemática relacionada ao contexto dos menores em estados de
abandono, expostos a situações de risco e toda a sorte de perigos, tem na
sociedade atual uma dimensão e um impacto a que ninguém pode nem deve ficar
indiferente.
Esta realidade, que assume contornos e implicações por demais graves, pode
comprometer todo o futuro de uma sociedade, uma vez que são as gerações mais
jovens que irão determinar a evolução e o caminho a traçar por essas mesmas
sociedades.
Sendo assim, as crianças contemporâneas merecem especial atenção, e cada
vez mais é importante a sua proteção e guarda, bem como o investimento em
políticas públicas no sentido de assegurar o cumprimento da lei e a aplicabilidade
dos procedimentos e intervenções estabelecidas.
Na abordagem proposta, será feita a análise progressiva do conceito de
criança e adolescente, o contexto familiar e as relações parentais, bem como os
escapes para grupos ou culturas próprias da juventude, quer religiosos ou não, e o
acolhimento religioso dados aos participantes desses grupos ou culturas.
O objeto deste estudo consiste em crianças e jovens em situação de
abandono, ou seja, vítimas e objeto de intervenção do Estatuto da Criança e do
Adolescente.
Trata-se do exercício acadêmico, motivado pelo interesse no aprofundamento
da matéria em causa, a que como Educadora e Teóloga não me posso subtrair e
que considero fundamental, como forma de consolidar o conhecimento adquirido
empiricamente, visando uma intervenção mais qualificada e metodologicamente
mais consistente, junto aos menores e suas famílias.
Como produto final, espera-se que os resultados deste trabalho reflitam uma
preocupação, comprometida com a necessidade de se sensibilizar para a realização
de intervenções preventivas, articuladas e multifacetadas, capazes de preencher as
18
lacunas que recorrentemente são referidas como existentes, nos diversos sistemas
chamados a participar no âmbito desta problemática.
Na atualidade, é possível observar famílias vitimas da pobreza, da violência,
da discriminação e que vivenciam momentos delicados, difíceis até, passíveis de
riscos capazes de comprometer suas vidas e levar à morte. Essas famílias têm
enfrentado sérios desafios na educação de seus filhos.
O abandono a que são submetidas estas crianças encontra-se na falta de
amparo ou de assistência. De acordo com o ECA (Estatuto da Criança e do
Adolescente), pratica o abandono os pais que deixam, sem justa causa, de prover o
sustento, a guarda e a educação dos filhos menores (art. 22). Segundo o ECA (art.
23), a falta ou carência de recursos não caracteriza, por si só, abandono de uma
criança ou de um adolescente e não pode servir de base para a decretação da perda
ou suspensão do poder familiar. O Código Penal tipifica o abandono como crime de
duas formas, a saber: abandono material (art. 244) e abandono intelectual (art. 246).
O abandono material ocorre quando alguém deixa, sem justa causa, de prover a
subsistência do cônjuge, filho menor de 18 anos ou inapto para o trabalho ou de
ascendente inválido. O abandono intelectual ocorre quando alguém deixa, sem justa
causa, de prover a instrução primária de filho em idade escolar.
Mas para efeito de esclarecimento do enfoque que se pretende dar a esta
abordagem, será utilizado o conceito de “abandonada" para a criança ou
adolescente não assistidos pela família, que não têm uma relação de continuidade
com a família, mesmo que estejam em uma instituição de abrigo.
O Estatuto da Criança e do Adolescente dispõe sobre a proteção integral à
criança e ao adolescente, e em seu artigo 5º preconiza: “Nenhuma criança ou
adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação e
exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei de qualquer
atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais”.
Seria pertinente salientar outros artigos abordando também o direito da
criança de ser criada e educada no seio da sua família e do seu direito à convivência
familiar e comunitária (art. 19), ou ainda discorrer sobre o princípio VI da Declaração
Universal dos Direitos da Criança, que dentre outras coisas, chama a atenção para
que, salvo em circunstâncias excepcionais, não se separe a criança de tenra idade
de sua e, ou seja, sua família. Esse papel caberia ao Estado, uma vez que seria
o responsável legal na provisão da estabilidade financeira da família, suprindo-lhe as
19
necessidades básicas para que fosse gerado, então, o cuidado emocional dos pais,
proporcionando assim um convívio mais seguro entre pais e filhos.
Ora, o que infelizmente ainda podemos constatar é que as ações e políticas de
atendimento à família são fragmentadas e praticamente inexistentes. Os parcos
recursos das políticas compensatórias são aplicados em programas isolados para o
idoso, o deficiente, a criança, dentre outros carentes. A proteção à família, inscrita
na Constituição, é algo ainda a ser concretizado.
Assistem-se, cada vez com maior freqüência, noticiários de abandono de
recém-nascidos no cemitério, no shopping, nas esquinas. E por quê? Onde estão as
ações de proteção à gestante e ao neonato? Que acesso estas mulheres têm à
informação, atendimento e à proteção? Em diversos casos atendidos no Juizado, o
que se perdeu foi que estas mães, mesmo com uma atitude desesperada, ainda
tentaram preservar a vida do filho (fazendo furos na caixinha onde a criança estava
para que respirasse, deixando em lugar onde seria logo encontrada...). O abandono
pela abandonada. Em muitos casos, é uma antecipação à ação do Estado, ou seja,
antes que o Estado as destitua do trio poder, abandonam ou entregam os filhos
sob a responsabilidade do mesmo.
Embora a falta de condições materiais não constitua motivo para a destruição
do pátrio poder, o que ocorre na realidade é bem diferente, pois se mesmo na
miséria os pais têm direito ao pátrio poder e os filhos o direito de permanecer com
eles, em contrapartida, a criança e o adolescente gozam de todos os direitos
inerentes à pessoa humana - direitos estes violados pela miséria e pela omissão da
sociedade e do Estado.
Assim, constata-se que nos dias de hoje, exercer plenamente o pátrio poder é
um grande ato de heroísmo. A começar pelas relações familiares, bastante
modificadas pela busca da sobrevivência, o processo de exclusão da cidadania
perpassa a vida da família em todos os aspectos.
Não se pretende com isso afirmar que não existam pais negligentes,
irresponsáveis e que realmente devam ser destituídos do pátrio poder, mas deve-se
ampliar o olhar e desenvolver uma ação especial para a manutenção de vínculos
entre crianças, adolescentes e suas famílias como medidas de prevenção do
abandono e medidas de reintegração familiar.
20
Piaget, em seu livro Biologie ET Connaissance, escreveu que: “a inteligência
humana somente se desenvolve no indivíduo em função de interações sociais que
são, em geral, demasiadamente negligenciadas.”
i1
Talvez nos cause “estranheza” tomar como base os escritos de Piaget sobre
a interação social e o desenvolvimento humano ele, que sempre foi tão criticado
por “desprezar” esses papéis. No entanto, é possível analisar tal função quando se
pensa o ser humano como um ser de relações, um ser gregário por natureza. Para
introduzir tal questão, faz-se necessário a análise da seguinte afirmação:
O homem é um ser essencialmente social, impossível, portanto, de ser
pensado fora do contexto da sociedade em que nasce e vive. Em outras
palavras, o homem não-social, o homem considerado como molécula isolada
do resto de seus semelhantes, o homem visto como independente das
influências dos diversos grupos que freqüenta, o homem visto como imune
aos legados da história e da tradição, este homem simplesmente não
existe.
2
Nietzsche
3
, freqüentemente caracterizado como ateu , foi sobretudo um crítico
da religião organizada e das doutrinas de seu tempo. Ele acreditou que a religião
organizada, especialmente a Igreja Catolica , era contra qualquer poder de ganho ou
autoconfiança sem consentimento. Nietzsche usou o termo rebanho para descrever
a população que segue a Igreja de boa vontade. Ele argumentou que provar a
existência de um criador não era possível nem importante.
Na verdade, Nietzsche valorizava e exaltava a vida como única entidade que
necessitava de louvor. Prova disso é o eterno retorno em que ele afirmava que o
homem deveria viver a vida como se tivesse que vivê-la novamente e eternamente.
A implicação disso é uma extrema valorização da vida; imaginemos cada segundo,
cada minuto vivido igualmente e eternamente? E quanto à Igreja, Nietzsche a
condenava pois é um traço das influências de Paulo de Tarso na sociedade
contemporânea: ele era sim ateu, e para ele, dentre os inteligentes o pior era o
padre, pois conseguia incutir nos pensamentos do rebanho, fundamentos falsos,
1
Piaget, J. Biologie ET Connaissance. Paris, 1967. p.314 (em português, Biologia e conhecimento:ensaio sobre
as relações entre as regulações orgânicas e os processos cognitivos. Petrópolis, Vozes,1973)
2
IDEM
3
Coleção os Pensadores.
21
exteriores e metafísicos demais, que contribuíam para o afastamento da vida .
Percebe-se que a ausência de autonomia de um ser impossibilita-o de viver em
sociedade. Não foi essa sociedade quem colocou sob suspeita e até difamou,
inserindo-se como obstáculo ao conhecimento objetivo, o cuidado, a sensibilidade e
o enternecimento, realidades tão necessárias sem as quais ninguém vive nem
sobrevive com sentido? Na medida em que se avança tecnologicamente, afastam-se
as relações humanas, excluem-se assim as possibilidades de uma vida mais
integral, mais completa.
Também deve se levar em conta o fato de que o “como relacionar-se” difere
de indivíduo para indivíduo (ou de grupo para grupo). aqueles que percebem a
onda antes que ela se forme no oceano. São como aqueles surfistas que percebem
a onda antes de ela se insinuar na superfície do oceano. Mais tarde, essas pessoas
são chamadas de intuitivas, inovadoras, criativas, pioneiras ou visionárias, pois
“pegam as ondas” antes que a maioria possa vê-las.” (Toffler)
4
Como ser gregário, depender do outro é necessitar ser reconhecido nesse
outro, para sentir-se ser integral, completo e feliz. Seria então a família esse espaço
primordial, onde as relações sociais e humanas re-significariam a identidade do
SER?
Este trabalho propõe caminhos para respostas às perguntas formuladas por
mim e pelos indivíduos com os quais convivi. È possível atenuar a dor dos que se
sentem abandonados. chances para a vida: O cuidado! E é esse cuidado que
tem servido de crítica à nossa civilização agonizante, que é também o princípio
inspirador de um novo paradigma de convivência, cura e resgate da essência do
amor numa percepção maior e familiar. Vale então perguntar: É ausência de família
que desencadeia os estados de abandono e, conseqüentemente, as feridas na
alma?
4
TOFFLER, Alvin. O choque do futuro (1970)
22
1 O CONTEXTO FAMILIAR, INTRODUÇÃO DO ABANDONO
A família tem constituído desde sempre o núcleo fundamental da sociedade,
sendo através dela que a criança recebe os modelos de comportamento e se
prepara a convivência sócio-relacional. A família deve, por conseguinte, satisfazer as
necessidades biológicas do indivíduo e as exigências da sociedade, preparando a
descendência para a continuidade dos ciclos vitais que lhes asseguram a existência.
Para Lacan
5
, a família surge como:
Um grupo natural de indivíduos, unidos por uma relação biológica dupla: a
geração que permite que o grupo tenha vários componentes e as
condições do meio que possibilitam o desenvolvimento dos jovens e que
mantêm o grupo.
Um breve olhar sobre a evolução da família ao longo da história, mostra-nos
que esta não se encontra num processo estático, sendo significativas as
modificações operadas, quer ao nível da sua estrutura, funções e papéis, os quais
têm variado, de acordo com a cultura onde se insere.
A família de comunidade alargada surge como forma de se proteger das
incertezas da época. Nestes grupos, a comunidade nasceu das necessidades
humanas de existência, em que as diversas famílias se agrupavam e participavam
muito de perto dos três acontecimentos principais da vida humana: o nascimento, o
casamento e a morte. Isto significava que um membro de uma família pertencia a
uma comunidade mais vasta, havendo relações de solidariedade e de controle, entre
esta e os demais membros da coletividade.
Nestas sociedades o grupo familiar alargado era uma unidade social por
excelência que exercia um grande número de funções, verificando-se que
acrescidas às funções de socialização e de reprodução, se encontram as funções
produtivas, econômicas, políticas e religiosas. Aqui a criança era confiada ao
conjunto da comunidade familiar, que a apoiava na sua aprendizagem e a
5
LACAN, J. A Família. 2.ed. [S.l.]: Assírio e Alvim, 1981. (Coleção Pelas Bandas da Psicanálise)
23
estimulava na iniciação à vida, determinando igualmente o seu destino, como forma
de manter as relações de coesão entre família e todos os seus membros.
Com a crescente especialização das sociedades modernas, introduziram-se
novas formas de urbanização que deram origem a múltiplas transformações
familiares e que implicaram a necessidade de adaptações múltiplas, de reavaliações
penosas, individuais e interpessoais.
Os efeitos da industrialização provocaram igualmente um grande êxodo rural,
as condições familiares alteram-se, arrastando consigo a separação dos elementos
familiares e as famílias extensas, alargadas ou de consangüinidade, foram
progressivamente dando lugar às famílias nucleares. O grupo familiar alargado
cessou as suas funções de agente de produção econômica, transferindo ou
partilhando a responsabilidade financeira e educativa da família com outros agentes
sociais.
As primeiras intervenções do Estado surgem na segunda metade do século
XIX, emergindo uma diversidade de Instituições que procuram substituir o papel
deixado vago pelos pais biológicos, ausentes ou incapazes de prover as
necessidades do seu agregado familiar.
Hoje em dia, nas estruturas e organizações familiares são bem visíveis estas
variações, uma vez que o modelo de referência da família nuclear ou conjugal,
constituída por pais e filhos do casal, não é o mesmo. Ou seja, encontramos
atualmente muitas formas de família, designadamente a família monoparental,
constituída por um progenitor a quem compete a responsabilidade de todos os
cuidados familiares, ocasionada, na maioria das vezes, por situações de viuvez,
abandono, separação ou divórcio de um dos elementos do casal.
Estes novos modelos familiares são reconhecidos pela Constituição Federal
de 1988, e denominados da seguinte maneira: família reconstruída - composta pelo
casal e filhos, bem como filhos de casamentos ou ligações anteriores; família
celibatária - modelo em que indivíduos, de sexo feminino ou masculino, assumem
viver sozinhos; família em coabitação: quando pessoas solteiras de sexo oposto
partilham, de forma não legal, a casa e a gestão doméstica, dentre outras. Percebe-
se assim que a estrutura familiar está se diversificando.
24
Para Alvin Toffler
6
:
No auge da segunda onda, cerca de 90% das famílias eram nucleares,
consistindo de quatro pessoas, o marido, a mulher e dois filhos. O marido
geralmente trabalhava fora e a mulher cuidava da casa. Hoje, além da
família nuclear, que diminui de importância, muitas famílias em que os
dois cônjuges trabalham fora, pessoas solteiras morando sozinhas, há
pessoas solteiras, divorciadas ou viúvas, de ambos os sexos, que têm filhos,
famílias expandidas, que incluem os filhos de casamentos anteriores de
um dos cônjuges ou de ambos, famílias de homossexuais, que às vezes
incluem filhos de casamentos anteriores, etc. A estrutura familiar se
diversificou quase ao extremo.
Torna-se assim evidente que cada um destes tipos de família é detentora de
várias funções, as quais estão intimamente ligadas à forma de existir da família e do
grau de desenvolvimento das instituições sociais. Entretanto, as mudanças operadas
são patentes não só ao nível da sua estrutura, como também do seu funcionamento
e comunicação.
Verifica-se um novo redimensionamento das relações e das expectativas e
uma alteração nos papéis de cada elemento que constitui o casal, bem como o seu
posicionamento na relação com os filhos e na própria relação do grupo familiar com
a sociedade. A família tradicional era essencialmente uma unidade produtiva e
reprodutora, enquanto que as famílias atuais desenvolvem-se mais na autonomia e
individualidade dos seus elementos.
Muitas são as teorias que se têm formulado acerca da natureza e do
desenvolvimento afetivo e intelectual do ser humano e, de algum modo, todas elas
convergem para a importância das relações familiares, estabelecidas no seio do
núcleo familiar.
Strech
7
refere-se, a propósito do desenvolvimento da criança, que:
A
necessidade de uma prestação de cuidados suficientemente boa implica
a existência de um meio capaz de produzir e manter relações estáveis e de
boa qualidade (...) se este processo for ameaçado, as dificuldades
emocionais das crianças surgirão seguramente.
6
TOFFLER. Alvin. A terceira onda. São Paulo: Record, 1980.
7
STRECH,P. Crescer Vazio. [S.l]: Assírio e Alvim- 1997 p.
25
A família não é uma ilha, nem é uma abstração. Não é um conceito, é uma
realidade humana. As instituições sociais estão interligadas, daí a razão pela qual
somente condições econômicas e sociais favoráveis podem permitir que a família
cumpra seu papel como lar, “escola”, teto no desabrigo, socorro no desamparo,
estrela e caminho. Ter família o pode ser privilégio de alguns: ter família, amar,
partilhar, usufruir de segurança e carinho é direito de todas as pessoas.
Sampaio
8
alerta para a importância das primeiras interações nas relações
mãe e filho:
O bebê vive experiências boas e más, de frio ou de calor, de fome ou de
satisfação, de dor ou prazer, de companhia ou abandono, etc, reage de
acordo com o que sente, expressando-se através de gestos, engasgues e
expressões mínimas, dirigidas à mãe [...] se este jogo correr
satisfatoriamente para os dois e não houver incidentes graves, verifica-se
um princípio, uma boa harmonia na evolução.
Como dizem alguns autores, o vínculo estabelecido entre mãe e filho é um
dos aspectos decisivos para que ele cresça seguro e fortaleça sua auto-estima, e
influencia também no estabelecimento de sua saúde mental enquanto jovem e
adulto que futuramente virá a ser. Esse vínculo deve se estreitar o mais
precocemente possível, e os laços formados nestes momentos devem ser
progressivos e sólidos, evitando assim situações de rompimentos e traumas para o
desenvolvimento normal da criança.
Isto não significa que todas as crianças com ausência de pai ou mãe estão
fadadas ao comportamento violento ou se sintam abandonadas. Porém, tal situação
pode facilitar uma série de situações que estão ligadas diretamente ao
comportamento das crianças, alimentando o ego dos futuros adolescentes e se
estabelecendo como atitude rebelde na juventude. Ou seja, a qualidade de vida da
criança não é garantida pela manutenção do núcleo familiar original, mas pode ser
otimizada em função da estrutura saudável deste núcleo.
A psicanalista Soraya Lopes
9
acredita que as mudanças estruturais por onde
passa a família hoje não são nocivas para os filhos. Segundo ela, as famílias
saudáveis são aquelas que têm a capacidade de lidar com suas dificuldades.
8
SAMPAIO.D. Inventem-se novos pais. 2.ed. [S.l]: Caminhos, 1994.
9
Soraya Lopes, Especialista em Terapia Infantil do Centro de Psicanálise de Grupo Familiar-SP
26
Ela ainda acrescenta que uma situação condenável é quando o pai ou a mãe
começa a reagir contra o ex-parceiro através dos filhos, deixando de lado a função
de assegurar a saúde física e psíquica da criança. Esta atitude pode levar à
Síndrome de Alienação Parental, uma influência negativa exercida por um dos
genitores com o intuito de levar a criança a odiar o outro genitor sem justificativa; a
criança vira “arma” na mão de um pai ou mãe mal-intencionado ou vingativo, que
como conseqüência, pode induzir a prole a um comportamento hostil, depressivo e
vulnerável.
Pais sofridos com as “perdas” familiares, quer sejam separações, mortes ou
afastamentos por doenças, agem de maneiras diferentes. Excluem de suas práticas
o cuidado e a concessão dos limites, deixando, muitas vezes, de corrigir os filhos, de
dar atenção quando necessária, como forma de compensar o sofrimento pela nova
situação ou mesmo excluí-la de seu foco de atenção. A falta de limite, atenção e
inclusão nas situações, em muitos momentos, pode produzir no filho o sentimento de
ser menos cuidado e menos amado, chegando ao extremo do sentimento de
abandono.
Percebe-se aqui o início da busca da criança pelo seu espaço, reforçando a
idéia de que desde a sua mais tenra idade necessita de pais presentes,
significativos, dialogantes, para a formação de sua base de segurança.
Comprova-se que os primeiros instantes de existência do ser humano, até o
final dela, acontecem em total dependência. Este ser está ligado a um outro ser e
dele se alimenta, nutre-se; com ele se movimenta e através dele vem ao mundo.
Piaget
10
diz:
Se tomarmos a noção do social nos diferentes sentidos do termo, isto é,
englobando tanto as tendências hereditárias que nos levam à vida em
comum e à imitação, como as relações “exteriores” (no sentido de Durkheim)
dos indivíduos entre eles, não se pode negar que, desde o nascimento, o
desenvolvimento intelectual é, simultaneamente, obra da sociedade e do
indivíduo.
Se o primeiro universo da vida humana é o útero materno, tanto as relações
sociais, intelectuais como as intra-familiares serão completas de esse indivíduo
sentir-se seguro. O útero como espaço pequeno e aconchegante, quente e elástico,
produz ao feto a primeira sensação de segurança. É nesse espaço que a vida
10
Piaget,J. Ètudes Sociologiques. Genebra-Paris, Droz, 1977 p.242 ( em português Estudos Sociológicos. Rio
de Janeiro: Forense, 1973.
27
esboça seus primeiros movimentos e permanece o tempo necessário para
elaborar as células, órgãos e sistemas que vão garantir a autonomia, individualidade
e independência.
O útero, como canteiro de vidas, recebe, nutre, mas jamais a guarda para si,
jamais toma-a como posse - no momento certo, quando a vida dispõe de meios
que garantam sua autonomia, num trabalho de parto, empurra-a para uma nova e
radiante experiência: a Vida!
O parto é um momento crítico. A saída do mundo intra-uterino é a entrada
para o mundo novo das interações. Nele, o recém-nascido deve ensaiar seus
primeiros gestos de autonomia pela respiração e amamentação e desta forma
garantir sua própria sobrevivência. Alguns meses depois, procura caminhar com
seus próprios pés e movimentar-se pelos seus próprios meios. É a nova vida que se
ergue, apoiando-se nos dois pés e procurando o seu equilíbrio entre esse dois
pontos móveis que procuram fixar o homem na terra e fazê-lo caminhar num
constante movimento, que oscila entre o equilíbrio e o desequilíbrio, que se
expressa na forma de caminhar humano.
Mover-se com seus passos é, sobretudo, um ato que expressa a natureza da
nova vida sob a forma humana, que chega ao mundo. Caminhar para conviver num
mundo de muitas relações, sem perder de vista seus desejos, suas aptidões e sua
identidade.
Com o nascimento, o indivíduo ascende ao mundo marcado pelas interações
comandadas por exigências e regras de um sistema que garante a harmonia do
conjunto, numa convivência em alteridade. Este é o universo familiar. Nele a criança
espera encontrar sempre o que dispunha no seu mundo intra-uterino: a segurança
para se desenvolver, flexibilidade para se mover e exercitar sua liberdade. Tudo isso
pode ser materializado numa relação de comunicação com os outros, no sentido
amplo, onde cada ser procura a confirmação da sua própria existência.
Esta criança no seio da sua família necessita de clareza para descobrir-se
como pessoa pertencente a um grupo e desenvolver suas aptidões, nortear suas
interações e participar da construção do mundo.
A família, este útero social, é quem fornecerá ao indivíduo elementos que
farão dele um ser realizado ou frustrado. Este mundo será um espaço constante de
prazer ou de sofrimentos.
28
As relações nos espaços útero/mundo, promovidas pelo nascimento,
possibilita à criança a construção dos significados que nortearão sua existência.
Mesmo não garantindo ainda todas as condições cognitivas, essa criança vai se
estruturando como ser afetivo ou carente de afetividade.
Os movimentos de interação com a vida só ocorrerão se ao alcance da
criança estiver um ambiente totalmente acolhedor, afetuoso e cheio do ingrediente
motriz da vida, que é o amor. Pais que desde a concepção do feto, vivem em
constante batalha conflitual, mostrando-se instáveis e inseguros em relação ao
futuro, podem prejudicar e passam a promover os mesmos sentimentos nas
crianças. Nesta instância se originam as infindáveis doenças mentais e de cunho
emocionais infantis, indícios de dificuldades cognitivas, dificuldades de
relacionamentos familiares e sociais, o indesejável sentimento de abandono, os
quais resultarão na ausência de reconhecimento dela como um SER capaz de
gerenciar suas atitudes e posições.
Jonh Bowlby afirmava em 1951, que o amor materno na infância e
juventude é tão importante para a saúde mental quanto as vitaminas e proteínas o
são para a saúde física”.
11
Os pais transmitem seus pontos de vistas, sua religião, seu estilo de vida
aos filhos. A criança aprende através da imitação, identificação e instrução.
Do nascimento até os cinco anos, a personalidade e o temperamento da
criança são basicamente formados. O que a criança absorve do seu
contexto nos primeiros cinco anos de sua vida ficará para vida inteira.
12
A família desempenha sua influência na formação e no desenvolvimento
infantil por causa de sua relação de proximidade com o afeto. Nela é que os
primeiros movimentos fetais são comemorados, anunciados para a celebração de
uma nova vida que chegará. Por isso, cabe à família valorizar e estimular todas as
ações de afetividade, reconhecimento e carinho para a sua chegada. Quando isso
não ocorre, as relações não são saudáveis, e as conseqüências desses atos para a
vivência e formação do caráter dessa criança estarão comprometidas.
11
BOWLBY, 1951 Apud VICENTE, 2000 ,p.48
12
GEORGE, Sherron K. Igreja Ensinadora: fundamentos bíblico-teológico e pedagógicos da educação cristã.
Campinas: Luz para o Caminho, 1993. p.104.
29
O grande desafio da família é receber um ser dependente, frágil, necessitado
de proteção, e transformá-lo, na escalada da vida, em um ser seguro, materializando
seus próprios projetos - ainda que estes não estejam de acordo com as expectativas
de seus pais. A família, em plena consciência, deve perceber que receber um filho
significa renunciar ou incrementar novos sonhos para si e para todos os entes deste
meio em comum. Conscientes do seu papel, os pais compreendem que a família é
apenas mais um espaço de nutrição e formação, onde a criança deve viver de forma
segura, tornando-se um adulto capaz de amar e ser amado e de estabelecer uma
comunicação satisfatória com seus parceiros. Os pais inseguros e imaturos tenderão
a fazer do filho um substituto, tornando-o um ser “ausente”, réplica, muitas vezes,
deles mesmos, que não vão exercer seu papel integral como indivíduo e cidadão de
sua sociedade.
O Dicionário Aurélio traz a seguinte definição para a família: “pessoas
aparentadas, que vivem, em geral, na mesma casa, particularmente o pai, a mãe e
os filhos; pessoas unidas por laços de parentesco, pelo sangue ou por aliança;
ascendência, linhagem, estirpe
13
Percebe-se que esta definição não abrange a realidade da família nos dias de
hoje. Nem o mesmo espaço, nem mesmo o sangue idêntico, configura a família. A
realidade é que este termo tem variados significados.
Existem várias sociedades onde união de duas ou mais famílias nucleares
que moram juntas e mantém entre si laços mais fortes do que com os demais
membros da comunidade.
Segundo Cerveny a família pode ser formada por laços consangüíneos, de
relação não formalizada por parentesco, de relação conjugal extensa, de núcleo
doméstico, dentre outras
14
. Pode-se dizer que a família é um sistema de relações
que atua conforme certos princípios básicos e que se desenvolve de um modo
característico e complexo, de acordo com um grande número de fatores que a
influencia.
Começa-se a busca novas soluções para assegurar o antigo funcionamento
do sistema familiar, objetivando um estado de conforto e estabilidade. Nem sempre
é possível retomar o molde anterior de “decantação” ou “calmaria”. Quando essa
13
DICIONÁRIO Aurélio eletrônico. Século XXI. Rio de Janeiro, 1999.
14
CERVENY, Ceneide M. de O;BERTHOUD, Cristiana Mercadante Esper. Visitando a família ao longo do
ciclo vital. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2002. p.19-20.
30
busca em torno da calma falha, a tensão aumenta e é desencadeada uma crise
familiar. A crise traz contenda familiar e exige dos seus participantes a busca por
uma nova forma de integração
15
.
Conforme Andolfi:
A família é um sistema ativo em constante transformação, ou seja, um
organismo complexo que se altera com o tempo para assegurar a
continuidade e o crescimento psicossocial de seus membros e
componentes. Esse processo dual de continuidade e crescimento permite o
desenvolvimento da família como unidade e, ao mesmo tempo, assegura a
diferenciação de seus membros [...]
16
Levando-se em consideração que não só a família vive um processo de
mudança, o filho e a filha também evoluem e vivenciam processos de mudanças
permanentes, representando assim toda atividade de desenvolvimento humano, que
tão fortemente nos leciona.
Erik Erikson
17
enfatiza em seus estudos a relatividade psicossocial do
indivíduo e para ele é impossível a compreensão do ciclo de vida do individual
separado do contexto onde o indivíduo está inserido.
É, portanto, na família que todas as imagens e aprendizados vão se
delineando, exercendo assim papel fundamental no desenvolvimento do caráter e
das frustrações do indivíduo. A família, como organização social, tem uma história.
De acordo com esta história, as relações vão sendo estabelecidas e ocorre muitas
vezes que o espaço familiar vai se tornando um peso muito forte, provocando assim
um misto de amor e ódio.
Estas visões de família revelam-na muitas vezes como um sistema integrado,
que busca manter a estabilidade e o senso de equilíbrio em seus relacionamentos
internos e externos, no decorrer de sua história. No entanto, também contemplam a
possibilidade de que tal estabilidade possa ser ameaçada por mudanças e por
períodos de desequilíbrio (crises imprevisíveis). Uma crise prevista, no decorrer do
ciclo vital de desenvolvimento, pode ser exemplificada pela troca de funções e
responsabilidade exercidas pelos pais em relação aos seus filhos.
15
HOFFMAN, 1995 Apud STRECK;SCHNEIDER-HARPPRECHT, 1996 p.65.
16
ANDOLFI Apud CERVENY;BERTHOUD, 2002 ,p.17
17
ERIKSON, Erik .Identidade, juventude e crise. .Rio de Janeiro: Zahar, 1976. p.92.
31
No Brasil, é muito freqüente o escasso contato entre pais e filhos. Quando pai
e mãe trabalham o dia inteiro para sustentar a família, os filhos acabam sendo
cuidados por terceiros e assim são carentes de atenção. Nos primeiros meses de
vida a criança necessita de super-proteção, cuidados que os pais podem
desenvolver com elas.
que é a família o ponto crucial da vida do ser humano, como tantos
filhos sentindo-se sozinhos? Qual deve ser a atuação da família para que seus
filhos, ao entrarem na adolescência, não se sintam em estado de abandono?
A família é quem vai disponibilizar o bem estar de seus membros. Seu papel é
decisivo na formação intelectual. É no convívio familiar que são absorvidos os
valores éticos e humanos e o aprofundamento dos laços sociais e afetivos. É
também na família que se desenvolve o vínculo com as gerações e a conservação
dos valores destes vínculos. É sempre na família que respostas são dadas e
encontradas de forma sutil, pelo processo de troca e desenvolvidos os hábitos,
costumes e sentimentos de pertencer a algo ou a alguém. Isso permeará sua
existência para sempre. Afeto é algo que se constrói no cotidiano familiar. Olhar e
ser olhado, perceber e ser percebido são relações construídas na família.
É possível perceber que a família é fundamental para a vida de qualquer ser
humano. Sob sua responsabilidade encontram-se crianças, adolescentes e jovens,
oriundas destes espaços, que precisam ser educadas, tratadas, amadas e
respeitadas. Pesquisas revelam que em torno de 22,5% de crianças sentem-se
abandonadas pelos pais. Alguns casos se destacam: 12,1% por morarem com a
mãe ou com o pai e 10,4% não moravam nem com mãe nem com pai, fatores
preponderantes na justificativa de abandono.
A família deveria ser ambiente no qual desabrochasse a cidadania. Relações
de fraternidade, de cooperação, de respeito recíproco, de acolhimento ao outro
constituem condições para a positiva formação da personalidade. Lamentavelmente,
condições econômicas extremamente negativas têm impedido a vida em família.
Orçamentos nos quais a receita nunca pode atender a despesa, desemprego,
desequilíbrio entre salários insuficientes e custo de vida elevado, tudo isso dificulta
muito a felicidade das pessoas e a vida em família. Caberia então nos perguntar: se
a família é considerada aqui como “útero” da vida humana, como entender o alto
índice de crianças infelizes e em estados de abandono? Onde começa sua
historicidade no abandono?
32
1.1 CONCEITUALIZANDO A CRIANÇA
Durante muito tempo, a concepção da criança como um adulto em miniatura
estabeleceu as diretrizes para os estudos acerca do desenvolvimento infantil.
Segundo Hart e Pavlovic (1988 apud AZEVEDO, 2006, p. 143), antes do século XVI,
as crianças eram consideradas socialmente como servidoras e, a partir dos sete
anos, passavam a ser tratadas como adultos; suas competências eram
determinadas pelo que se esperava delas. Sofriam abusos, negligências, abandonos
e chegavam a ser escravizadas, mutiladas e mortas.
A visão negativa da mesma como um ser inacabado, sem nada específico e
original foi sustentada a o século XVIII, quando Rousseau, na sua obra Emílio,
reivindicou a especificidade infantil, defendendo a criança como portadora de uma
natureza própria que deveria ser desenvolvida (KISHIMOTO, 1997).
no século XX começam a adquirir visibilidade os estudos sobre criança,
uma vez que a então elas não eram valorizadas enquanto seres autônomos e
interativos, estando subordinadas ao poder da família. Esta nova construção social
vem alertar para a importância do seu desenvolvimento, uma vez que as diversas
etapas do seu desenvolvimento e as suas vivências irão influenciar todo o
comportamento futuro.
Sendo recente esta abordagem, não deixa, contudo, de fazer sentido a
compreensão das diversas perspectivas teóricas que ao longo dos tempos
marcaram a história do conhecimento da criança.
Na Antigüidade, filósofos como Platão procuraram compreender, ainda que
intuitivamente, a importância deste período. No entanto, os relatos que chegam
mostram a aceitação e prática social do infanticídio como uma realidade, nas
culturas da Grécia, em Esparta, e na Europa em geral, sendo igualmente conhecidas
as referências bíblicas relativas aos sacrifícios de crianças.
Na arte medieval as crianças eram representadas como adultos imaturos e
nos séculos XV e XVI aparecem nas pinturas profanas junto de adultos, em grupos
33
de trabalhos ou lazer, com vestes idênticas às dos homens e mulheres da sua
classe social.
O século XVII introduz uma viagem às atitudes e pensamentos da época, por
razões que se pensa estarem relacionadas com as correntes da Reforma e Conta-
Reforma, aos clérigos e Humanistas, e que começam a fomentar a separação entre
crianças, adolescentes e adultos.
A mudança de atitude na moral de então conduziu à aceitação do conceito de
inocência de infância, período que Mussen
18
, designa por primitivismo, irracional e
pré-logismo. Ao conceito tradicional, no qual a criança era retratada como adulto em
miniatura, vem contrapor-se a chamada teoria do homúnculo, que considerava a
criança tão diferente do adulto, que seria impossível a sua compreensão.
Entre os diversos teóricos de então, que se debruçaram sobre estudos da
criança, destacam-se os que escreveram sobre a sua depravação inata, enquanto
que outros a retratam como o bom selvagem.
No século XIX Charles Darwin, com a teoria da evolução das espécies e
principalmente com a busca de sinais humanos na vida animal, inicia uma extensa
coleta de documentação sobre a criança e a sua evolução física, desde o
nascimento à adolescência e idade adulta.
No contexto histórico sobre as Políticas de Proteção à Infância e
Adolescência, até o século XIX, destacam-se as estratégias utilizadas pelo
Iluminismo e Higienismo para acabar com a Roda dos Expostos esta
caracterizava-se por disponibilizar aleatoriamente as crianças em uma roda, em
conventos, sob gerenciamento das freiras, a fim de que as crianças fossem
“escolhidas” ou “descartadas” em função do que pudessem oferecer. As de sexo
feminino ainda podiam contar com a esperança de adquirir algum dote, que
minimizava a situação de abandono e descaso a qual eram, literalmente, expostas.
O estado apoiava e oferecia algum subsídio às amas de leite e voluntários
que tiravam as crianças da Roda dos Expostos, até porque este mecanismo
favorecia o anonimato. Este intento filantrópico era, na verdade, uma tentativa de
controlar as desigualdades sociais e minimizar o acesso das crianças à prostituição.
No âmbito científico, foi no decurso do século passado que se verificaram
as verdadeiras abordagens com caráter mais elaborado, sendo os primeiros trinta
18
MUSSEN, Coger, Kagan. Desenvolvimento e Personalidade da Criança. 4.ed. São Paulo: Haper e Row.
34
anos marcados pela descoberta e descrição das tendências psíquicas de cada
idade, bem como das características comportamentais, cognitivas e físicas,
apoiadas no estudo empírico das mesmas.
Na segunda metade do século passado, diversos autores apontam para as
explicações que levam em consideração os processos e mecanismos subjacentes
ao desenvolvimento humano, buscando relações de antecedente-conseqüente. Jean
Piaget (1896-1980) assumiu importante papel na história da psicologia infantil, ao
elaborar uma teoria do desenvolvimento na qual acreditava que a criança caminhava
numa única direção, passando por várias etapas, adquirindo diferentes classes de
operações até atingir a etapa mais amadurecida da adolescência.
Para ele, as estruturas humanas seriam o resultado de uma gênese, e era
através dela que se progredia de uma fase mais simples para as mais complexas, a
chamada “coordenação geral das ações”.
19
Segundo Henri Wallon
20
, a criança deve ser encarada como “um ser dinâmico
caracterizado pelo polimorfismo das suas manifestações psíquicas e das suas
condutas, passando assim a ser essencial para a sua compreensão o estudo das
fases que vão fazer dela um adulto.”. Para ele, a “criança tende para o adulto, tal
como um sistema para o seu estado de equilíbrio”.
Assim, a história do indivíduo implica em um processo evolutivo, visto que
“toda a ação é um papel que nós desempenhamos em conjunto”.
Ultrapassada a contraposição entre criança e adulto, Andreoli
21
sublinha que
se trata de:
U
ma verdadeira revolução copernicana: de ser sem identidade e sem uma
precisa colocação social, a criança passa a ser o indivíduo com mais direitos
do que qualquer outro, e tira-se do adulto o direito de dispor dela ao seu belo
prazer (...) para lhe confiar o dever de tutelar estes direitos.
19
CORDEIRO.JD. Saúde Mental e a Vida :Pessoas e Populações em riscos psiquiátrico. Coleção Psicologia e
Pedagogia. [S.l]: Moraes Editora.
20
WALLON.H. A Evolução Psicológica da Criança. [S1]: Edições 70-Editora Persona, 1968.
21
ANDREOLI. V. Do Lado das Crianças. [S.l.]: Editora Âmbar, 2003.
35
Este novo desenho social da infância, enquanto grupo social autônomo,
corresponde a uma nova construção social que adquiriu visibilidade nos finais do
século XX, segundo Canha:
22
A evolução científica, sobretudo o conhecimento das necessidades básicas
das crianças, o seu reconhecimento como ser autônomo e interativo desde o
nascimento, a importância da vinculação mãe e filho e da estimulação do
meio para o seu desenvolvimento, bem como a necessidade de sua
proteção, modificaram decisivamente a postura e as atitudes face à criança.
Considerando que todas estas mudanças conceituais operadas são, ainda,
muito recentes e que os direitos da criança e do adolescente estão longe de ser
entendidos como um patrimônio comum, não é de se estranhar a persistência de
comportamentos e códigos de conduta que colocam em risco, ainda na atualidade
do nosso país, crianças e adolescentes.
1.2 DEIXANDO A INFÂNCIA E CONHECENDO A ADOLESCÊNCIA: QUAL O
PAPEL DA FAMÍLIA?
Para que se possa compreender de forma correta qual o papel da família no
processo de abandono, faz-se necessário entender como se processa a
adolescência, todas as sua nuances e os ritos que cercam este período.
A princípio, é preciso perceber as transformações que cercam a adolescência
e os indícios que permeiam a sua chegada. É importante perceber que a
adolescência é um momento de conflitos e, ao mesmo tempo, um processo de
aprendizagem - aprendizagem esta referente à vida. Então, é a família quem vai se
responsabilizar pelo processo de reconhecimento do adolescente como ser
importante e vai também exercer a responsabilidade na transição dos processos de
mudanças pertinentes à adolescência de forma saudável e representativa.
Analisar os processos de transformações, necessidades e anseios da
adolescência ajudará a família a compreender e auxiliar seus membros
adolescentes na superação das inquietações próprias da fase mais significativa do
ser humano.
22
CANHA, Jeni. A criança maltratada. [S.l]: Edições Quarteto.
36
Variados rituais marcam a chegada da adolescência, que implica na transição
da criança à “maioridade” biológica. Ritos de passagem podem incluir bênçãos
religiosas, separação familiar, testes etno-culturais de força e resistências. Tais
rituais são realizados em determinada idade, como por exemplo, as cerimônias de
bar mitzvah, que marcam o momento do menino e menina judia de 13 anos
assumirem a responsabilidade de seguir a observância religiosa tradicional.
O Mazan-tov é feito com o(a) menino(a) sobre uma cadeira e ele(a) é
levantado várias vezes, e assim fazem com toda a família do Barmitzvano. Deste
modo é realizado uma parte do Bar Mitzvah.
Nas tribos Apache, um evento significativo para a “mocinha adolescente”, que
é a chegada da menarca - primeira menstruação - é celebrado com um ritual de
cântico durante quatro dias, do amanhecer até o por do sol.
Os jovens católicos de ambos os sexos recebem o sacramento da Crisma.
Crisma, juntamente com o Batismo e a Eucaristia, são considerados pela Igreja
Católica como sendo "sacramentos da iniciação cristã". A imposição das mãos é
reconhecida pela tradição católica como a origem do sacramento da Confirmação
(Ezequiel 36,25-27 e Hebreus 6,2)
23
. Este sacramento tem também o seu
fundamento teológico no Pentecostes (Atos 2,1-4 e em Atos 8, 14-17)
24
.
No Oriente este sacramento é chamado de Crismação, o que significa unção
com crisma ou mýron.
No Ocidente usa-se a palavra Confirmação para designar este sacramento,
pois este termo sugere ao mesmo tempo a confirmação do Batismo e a
consolidação da graça deste sacramento.
No Japão a passagem para a idade adulta é celebrada pelo Seijin Shiki (ou
“cerimônia adulta” em tradução literal).
Nas sociedades industriais modernas, a passagem para a idade adulta
geralmente é menos abrupta e menos marcada.
23
BÍBLIA. Português. blia de Jerusalém. Tradução de Samuel Martins Barbosa et al. São Paulo: Paulinas,
1981. 1663p
24
IBDEM
37
Papalia e Olds reconhecem o período da adolescência como uma transição
no desenvolvimento entre a infância e a idade adulta, que envolve grandes
mudanças físicas, cognitivas e psicossociais inter-relacionados.
25
A adolescência dura aproximadamente 10 anos - dos 11 ou 12 anos até
pouco antes e depois dos 18 anos. Seu ponto de início ou de término não é
claramente definido. Em geral, considera-se que a adolescência começa com a
puberdade
26
, o processo que conduz à maturidade sexual ou fertilidade, ou seja, a
capacidade de reprodução.
Antes do século XX, as crianças das culturas ocidentais entravam no mundo
dos adultos quando amadureciam fisicamente ou quando iniciavam um aprendizado
vocacional. Hoje, o ingresso na idade adulta leva mais tempo e é menos definido. A
puberdade, com suas implicações sexuais, começa bem mais cedo, e o ingresso na
profissão tende a ocorrer mais tarde, pois as sociedades complexas exigem
períodos mais longos de educação ou de formação específica profissional para que
o jovem assuma responsabilidades de adulto.
Com o advento da adolescência e a transição de saída da infância, surgem
oportunidades de crescimento não apenas em dimensões físicas, mas no tocante às
competências e habilidades cognitivas e sociais, autonomia, auto-estima e
intimidade. É um período de muitos perigos e crises graves na formação da
capacidade de abstração dos problemas e aceitação dos adultos, necessitando de
ajuda para superar os perigos ao longo do caminho.
Algumas pesquisas apontam a exacerbação das emoções e a instabilidade de
humor na adolescência inicial, além das mudanças no aspecto hormonal.
Streck e Schneider-Harpprecht
27
afirmam que a família, atingida pelas
mudanças rápidas na sociedade pós-moderna, tem sofrido muitas transformações,
principalmente no que diz respeito ao papel do homem e da mulher, nas convicções
básicas sobre o sentido do casamento, no comportamento sexual e na educação
dos filhos e filhas.
25
PAPALIA,Diane E.; OLDS, Sally Wendkos; FELDMAN,Ruth Duskin. Desenvolvimento humano. .8.ed.
Porto Alegre:Artmed, 2006. 888p.
26
N.de T.: Alguns utilizam o termo puberdade como referente ao ponto final da maturação sexual, e referem-se
ao processo como pubescência, mas nossa utilização conforma-se à maioria dos psicólogos da atualidade.
27
STRECK,Valburga Schmiedt. Imagens da família : dinâmica, conflitos e terapia do processo familiar. São
Leopoldo: Sinodal, 1996.
38
Para os povos primitivos, o homem não tinha qualquer participação no
processo de reprodução, inclusive acreditava-se que a mulher era fertilizada pelos
raios lunares.
Segundo o folclore da civilização ocidental, o pai tem no nascimento
basicamente três funções: fecundar o óvulo, esperar ansiosamente no corredor da
maternidade enquanto ocorre o parto e prover as necessidades materiais da família.
Características como estas conceituam-no como “pai tradicional”: é ele quem sai de
casa para trabalhar todas as manhãs, geralmente almoça fora e retorna a noite,
exausto, querendo “chinelos” e o jantar. Hoje em dia isso quase não se processa
mais desta maneira. Novos modelos de pais, homens mais presentes e assumindo
tarefas que antes eram exclusivamente delegadas às mulheres.
Na modernidade já é possível observar pais que o se deixam conduzir pelo
velho estereótipo machista e “curtem” os filhos desde a gestação, participando de
cursos para casais grávidos, lêem revistas e livros especializados e buscam sites
que falam sobre bebês. Sentem prazer em acompanhar todo o desenvolvimento dos
seus filhos e filhas.
Os pais da modernidade, mesmo fragilizados pelo fato de terem suas
mulheres no mercado de trabalho, não se desprendem de suas funções de pai e vão
se revelando no cotidiano como cuidadores de sua prole.
Quando caem os tabus, é maior a liberdade social e cultural de improvisar o
papel de pai. Se ele quiser, poderá ficar muito mais próximo do seu filho,
estabelecendo assim uma relação mais direta e imediata com ele. É muito mais cil
ser pai quando disponibilidade, quando não se tem medos, quando se permite
aproximação e quando a emoção existe. O ensino que se estabelece nesse
processo perpassa o respeito e a afetividade. Permanecer sempre perto dos filhos
permitirá uma vida muito mais feliz e realizada.
Estudos realizados no Tennessee e Indiana comprovam que adolescentes
com pais presentes, envolvidos e participantes de forma afetuosa em seu processo
de desenvolvimento da puberdade apresentavam desenvolvimento mais saudável
do que os que em relacionamentos com pais frios e distantes. Os que têm a figura
paterna presente desenvolvem uma dependência maior do aqueles que, não tendo,
buscam sozinhos o amadurecimento.
Adolescência é uma das etapas do desenvolvimento humano caracterizada
por alterações fisicas, psíquicas e socias, sendo que estas duas últimas recebem
39
interpretações e significados diferentes, dependendo da época e da cultura na qual
está inserida.
Segundo a Organização Mundial de Saude
28
, adolescente é o indivíduo que
se encontra entre dez e vinte anos de idade. No Brasil, o Estatuto da Criança e do
Adolescente
29
estabelece outra faixa etária: dos doze aos dezoito anos. A
adolescência é, portanto, uma etapa do desenvolvimento que ocorre desde a
puberdade à idade adulta, ou seja, desde o período em que as alterações
psicobiológicas se iniciam até a idade em que um sistema de valores e crenças se
enquadra numa identidade estabelecida.
A adolescência é caracterizada por maior demanda de autonomia e
independência, e a legislação de cada país prevê a idade formal de maioridade dos
jovens, quando adolescentes passam a ser tratados como adultos.
Freqüentemente se precipitam mudanças nos relacionamentos da família em
várias gerações. Famílias com filhos adolescentes são palco de uma série de
conflitos, na maioria das vezes, provenientes da própria maturação natural do/a
adolescente. Esta fase é marcada também por freqüentes conflitos interiores,
dúvidas e anseios, além de caracterizar-se como o momento de tomada de decisões
importantíssimas.
Muitos destes conflitos poderiam ser extirpados se a família se preparasse
para crescer junto com seu adolescente. O diálogo como ponto mediador nestes
conflitos promove uma abertura importante, que produzirá significado para toda a
sua história.
Outro fator marcante no contexto em questão foi a abertura do mercado de
trabalho para as mulheres. Isto contribuiu de forma definitiva para que essas
mudanças atingissem em cheio o aumento de nascimentos indesejados de crianças,
bem como a falta de tempo para educar e cuidar de forma “eficaz” dos filhos e da
própria casa.
As adaptações necessárias à estrutura e organização familiar no trato com as
demandas da adolescência são tão importantes e básicas que a própria família é
28
Organização Mundial da Saúde (OMS) é uma agência especializada em saúde, fundada em 7 de abril de 1948
e subordinada à Organização das Nações Unidas. Sua sede é em Genebra, na Suíça. O director-geral é, desde
2006, o sueco Anders Nordström
29
O Estatuto da Criança e do Adolescente foi promulgado pelo presidente Collor de Melo com o objetivo de
estipular os direitos e responsabilidades de crianças e adolescentes.
40
transformada: de uma unidade que protege crianças, passa a ser um centro de
preparo para a entrada do adolescente no mundo de responsabilidade adulta.
Até a adolescência, o filho vai estabelecendo proximidade com as
experiências do funcionamento independente. É preciso esclarecer que, como um
processo contínuo, o desenvolvimento e as múltiplas fases da vida humana são
períodos de vivência para as próximas, e que não limites definidos entre elas.
Para melhor compreensão, será utilizada uma maneira sistemática para pontuar este
desenvolvimento e as mudanças por ele desencadeadas.
1.2.1 Mudanças Físicas
Na tabela 1
30
é possível observar como se desenvolvem os
adolescentes e as mudanças que ocorrem durante todo o processo. Somadas à
velocidade destas mudanças, existem muitas inquietações e perguntas que são
geradas e não podem, necessariamente, ser respondidas nesta fase.
Características Femininas Idades de Aparecimento
Crescimento dos seios 06 - 13
Crescimentos dos pêlos pubianos 06 – 14
Crescimento Corporal 09,5 – 14, 5
Menarca 10 – 16,5
Pêlos axilares Cerca de 2 anos após o
aparecimento de pêlos
pubianos
Aumento na produção das glândulas sebáceas e
sudoríparas (o que pode causas acnes)
Aproximadamente na mesma
época que o aparecimento
de pêlos axilares.
Características Masculinas Idades de Aparecimento
Crescimentos dos testículos, escrotos 10 – 13,5
30
* PAPALIA,Diane E. Desenvolvimento Humano. 8. ed. São Paulo: .Artmed, 2006. p445.
41
Crescimento dos pêlos pubianos 12 -16
Crescimento Corporal 10,5 – 16
Crescimento do pênis, da próstata, das vesículas
seminais
11- 14,5
Alteração da voz Aproximadamente na mesma
época que o crescimento do
pênis.
Primeira ejaculação do sêmen
Aproximadamente um ano
depois do crescimento do
pênis.
Pêlos faciais e axilares Aproximadamente dois anos
após do aparecimento de
pêlos pubianos.
Aumento da produção das glândulas sebáceas e
sudoríparas.
Na mesma época que os
pêlos axilares.
Tabela 1. Seqüência usual de mudanças fisiológicas na Adolescência
Peso, altura, pêlos. As mudanças que ocorrem em seus corpos são fruto do
amadurecimento ao qual precisam se submeter e constituem-se, em muitos casos,
um severo problema, tanto de ordem física quanto emocional.
Papalia e Olds
31
analisam que os efeitos do amadurecimento precoce ou
tardio não são bem-definidos em moças e rapazes. Rapazes e moças desenvolvem-
se de forma diferenciada. Os meninos amadurecem mais cedo e são mais
equilibrados, tranqüilos, afáveis e populares entre os amigos, inclinados à liderança,
além de menos impulsivos do que os que amadurecem tardiamente. Estudos ainda
constataram que eles se preocupam mais em ser estimados e são mais cautelosos,
mais dependentes dos outros e mais limitados por regras e rotinas. Os que
amadurecem mais tardiamente sentem-se mais incompetentes, inibidos, rejeitados e
dominados, são mais dependentes, inseguros ou deprimidos, agressivos, possuem
habilidades sociais e de enfrentamento inferiores e tem pior opinião a seu próprio
31
PAPALIA,Diane E; OLDS,Sally Wendkos; FELDMAN, Ruth Duskin; Desenvolvimento humano. .8.ed.
Porto Alegre:Artmed, 2006. p.447.
42
respeito (Graber et al., 1997; Musseun e Jones 1057; Peskin, 1967, 1973; Siegel,
1982).
32
As meninas sentem-se, normalmente, muito mais infelizes do que os rapazes,
pois irão refletir maior ênfase cultural sobre os seus atributos físicos. Tendem
também a “não gostar” de amadurecer mais cedo como os meninos e geralmente se
satisfazem quando não amadurecem nem mais cedo e nem mais tarde do que suas
amigas.
Aquelas com maturação precoce tendem a ser menos sociáveis, menos
expressivas e menos equilibradas; mais introvertidas e tímidas; mais negativas em
relação à menarca. Talvez por se sentirem forçadas à confrontar-se com os
problemas da adolescência sem estarem ainda preparadas para tal, são mais
vulneráveis ao sofrimento psicológico e permanecem assim até os 15 ou 16 anos.
Em relação ao esquema corporal e auto-estima, as meninas que amadurecem
antes têm uma imagem mais depreciativa de si do que as meninas com maturação
mais tardia.
Observa-se que meninos e meninas crescem e se desenvolvem de maneiras
diferentes. O surto do crescimento adolescente afeta todas as dimensões do corpo
físico, muscular e, certamente, emocional também.
De modo geral, é muito difícil generalizar os efeitos que essas mudanças
provocam no psicológico de cada adolescente, pois dependede como este e as
pessoas envolvidas com sua educação e formação interpretam as mudanças que os
acompanham. Algumas dessas mudanças podem provocar um comportamento de
risco em ambos os sexos. Todas estas questões deverão ser respeitadas pelos pais,
para assegurar ao adolescente o amor e o deslumbramento necessários a fim de
que transcendam esta fase da vida de forma positiva.
Segundo Papalia, essas rápidas modificações possuem ramificações
psicológicas. Na sua maioria, os adolescentes e jovens preocupam-se muito mais
com sua aparência do que com qualquer outra coisa de sua vida.
Se a afetividade dos pais não for constante neste momento, problemas
graves, a nível físico e emocional, podem ser ocasionados, dentre eles a bulimia e a
anorexia, doenças que têm levado muitos adolescentes à morte. Embora os
registros sejam notadamente mais comuns em meninas, os meninos não ficam fora
32
PAPALIA, Diane E. Desenvolvimento humano, 2006.
43
deste quadro. Não sendo acometidos por estes transtornos, passam por situações
semelhantes, que comprometem significativamente o seu desenvolvimento,
cercados pela ansiedade do amadurecimento tardio ou precoce.
A figura do pai é singular para a maturação saudável de meninos e meninas,
principalmente no que concerne ao desenvolvimento sexual. É o pai que vai
promover a identificação correta do tempo e do desenvolvimento no período em que
ocorre a puberdade. Cada uma dessas mudanças segue seu próprio “calendário”, e
quase sempre a vida dos adolescentes torna-se uma grande confusão.
O recém-nascido humano nasce com o cérebro menos amadurecido do que
os outros mamíferos, a sua infância é a mais longa e o bebê, depois a criança e o
adolescente, permanecem por muito mais tempo dependentes dos cuidados de seus
genitores para que se relacionem de maneira positiva com o ambiente no qual estão
inseridos. Além disso, na espécie humana, ao amadurecimento físico logo sobrevém
outros elementos: educação, cultura e tradição, cuja continuidade deve ser
assegurada pela família. Assim, conforme a cultura e o nível social, os filhos
permanecem em casa após a maturidade física.
1.2.2 Mudanças Emocionais
Erik Erikson
33
diz que no primeiro ano de vida, quando a criança é bem
cuidada, alimentada com regularidade e tem a presença da mãe de forma contínua,
desenvolve um sentimento de “confiança básica na existência”. Sente-se segura e
amada, protegida, pois confia na assertividade da presença de sua mãe,
transformando esta convicção em uma certeza interior. O primeiro sinal desta
segurança em seu ambiente é a completa diminuição da tonicidade muscular dos
seus intestinos, a facilidade de sua alimentação e a profundeza do seu sono.
Qualquer distúrbio em uma destas áreas indica uma incerteza, uma insegurança,
geralmente em relação à mãe. Erikson ainda diz que os primeiros anos de vida da
criança, da mesma forma que a vida intra-uterina, são vitais para o desenvolvimento
da personalidade.
33
Erikson, Erik. Infância e Sociedade. Rio de Janeiro: Zahar Editora, 1971.
44
Apesar disso, é comum saber de pais que, com os filhos no colo, promovem
discussões, desferindo ofensas contra outras pessoas, ou mesmo queixando-se da
criança para outros, ignorando que a mesma tudo percebe, tudo entende, mesmo
que inconscientemente. Este ser respira profundamente a atmosfera psíquica de
sua casa, recebendo a influência direta e imediata dos estados de ânimo dos pais.
O tom de voz empregado pela e, a maneira como o pai trata sua genitora, os
carinhos que trocam ou os gestos de paciência ou impaciência vão sendo
arquivados, gradativamente, pela criança, e incorporados ao seu acervo mental, que
servirá como base para seus futuros comportamentos quando adulta.
A maneira como o pai as trata - no caso das meninas - o carinho ou a
rejeição que recebem, influenciarão diretamente seus relacionamentos na vida
adulta, onde irão prevalecer as experiências vivenciadas sob a forma de confiança
para amar ou medo de amar e ser amada. Estes sentimentos podem se transformar
em dúvidas e receios injustificáveis. Com os meninos o mesmo acontece, mas com
relação à figura materna.
Nesse período da tenra infância, a criança precisa muito do elemento amor,
para que venha a se tornar uma pessoa segura, com um ego forte e capaz de
enfrentar a vida e suas dificuldades, sem receios. Quando o investimento afetivo é
insuficiente, quando os pais são negligentes ou não participam da vida da criança
como deveriam, entregando seus cuidados a profissionais pagos, a criança pode
crescer com uma lacuna emocional, que se não for preenchida pode torná-la
insegura, triste, com limitações no que diz respeito a sua auto-afirmação perante o
mundo e os outros que a cercam.
Quando adulta, acaba por ser vítima de patologias das quais não consegue
se ver livre com facilidade como citado anteriormente, a Bulimia Nervosa é uma
delas. A pessoa ingere alimento em medidas desproporcionais ao necessário, a fim
de sentir-se completa, totalmente preenchida. Inconscientemente, este é um desejo
de preencher-se com o amor que nunca recebeu, com o carinho que faltou, com o
que não lhe foi dado em períodos fundamentais do seu desenvolvimento. Estando
preenchida, porém, logo vem uma ânsia que a faz expelir tudo o que ingeriu, pois
identifica o alimento com a mãe que a não amou, e de quem sente raiva e
ressentimento.
Não raro, o grupo familiar se surpreende, não reconhecendo como fruto de
sua educação algumas características que o adolescente passa a apresentar, ora
45
como talentos e vocações, ora como malícia, atitudes temperamentais e
comportamento cínico de alguns, constituídos em longo prazo.
Nesta fase, o psiquismo passa por um processo de adaptação entre a infância
e a adultez que virá. A mente do adolescente é uma mente essencialmente
ideológica, e passa então a revisar tudo o que aprendeu dos pais, no intuito de
definir a sua identidade (Erikson, 1971)
34
. Observa cada ato e gesto dos adultos,
comparando-os com suas filosofias, com os sermões que lhes são aplicados,
procurando verificar se o que os pais verbalizam é autêntico ou falso. As imagens
“falam mais que mil palavras”.
No que diz respeito à independência, todos os filhos a desejam, mas se os
pais não favorecem o desenvolvimento saudável da mesma, é provável que os
filhos se tornem eternamente dependentes de seus pais, e nunca assumam suas
responsabilidades como adultos.
Durante a adolescência esse ser terá que atuar com independência em
muitas áreas. Se essa criança não aprendeu a assumir responsabilidades tais como
vestir-se, comer e executar tarefas domésticas, inevitavelmente terá dificuldades em
cumprir responsavelmente atividades escolares e sociais.
Os acontecimentos e os exemplos vistos pelos adolescentes fortalecerão ou
não os laços de afetividade com o mundo. Se não estiverem completos, realizados e
em um ambiente que promova a felicidade, dificilmente sentir-se-ão capazes e
prontos a oferecer felicidade a outrem, e nisto incluem-se também seus pais.
Erik Erikson estudou muito sobre o desenvolvimento da personalidade e
afirma que:
A personalidade se desenvolve conforme uma escala pré-determinada “na
prontidão” do organismo humano para ser impelido na direção de um círculo
cada vez mais amplo de indivíduos e instituições significantes, ao mesmo
tempo em que está cônscio da existência deste círculo e pronto para a
interação com ele.
35
34
Erikson, Erik. Infância e Sociedade. Rio de Janeiro, RJ: Zahar Editora, 1971.
35
ERIKSON, Erik. Identidade, Juventude e crise. Rio de Janeiro: Zahar, 1976. p.92.
46
1.2.3 Mudanças e Rebeldia
Os movimentos de juventude, ao questionarem a “civilização do consumo”; ao
denunciarem as “burocracias” de todos os matizes, ao exigirem a transformação
das universidades, para que resultem, de um lado, o desaparecimento da rigidez
nas relações professor-aluno e de outro, a inserção deles na realidade (...),
buscaram a afirmação dos homens como sujeitos de decisão (cf. FREIRE, 1987, p.
29)
36
.
Para muitos, a experiência do vivido mostra que é hora de tomar decisões
vitais em relação à família, trabalho, igreja, política etc. Embora se prefira postergar
as decisões, elas são tomadas, como nos ensina Paulo Freire: sempre opta-se a
favor ou contra as mudanças. São decisões que marcam profundamente, muitas
vezes caracterizadas pelas correntezas da vida: ser de família muito pobre, do
interior ou dos centros urbanos, ser do um grupo de jovens, dentre outras. As
idades da vida (criança, jovem e adulto), embora ancoradas no desenvolvimento
bio-psíquico dos indivíduos, não são um fenômeno puramente natural, mas
construídos social e historicamente; inseparáveis do processo de constituição da
modernidade, implicam em termos de ação voluntária sobre os costumes e os
comportamentos, ou seja, daquilo que seja essencialmente educativo e
significativo.
Neste sentido, é possível dizer que a juventude surge com as transformações
provocadas pela industrialização e o desenvolvimento do sistema escolar na
modernidade e se universaliza no século XX, quando os operários e as mulheres
começam a fazer parte deste grupo.
Para que todas as mudanças tornem-se algo benéfico para a vida da criança,
do adolescente e do jovem, faz-se necessário um olhar cuidadoso. Boff
37
nos diz:
O que se opõe ao descuido é o descuidado.Cuidar é mais que um ato; é
uma atitude. Portanto, abrange mais que um momento de atenção, de zelo
36
FREIRE
, Paulo. Pedagogia do Oprimido, Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987. p.29.
37
BOFF. Leonardo. Saber cuidar. Petrópolis , RJ: Vozes, 1999 p.33.
47
e de desvelo. Representa uma atitude de ocupão, preocupação, de
responsabilização e desenvolvimento afetivo com o outro.
Todo o ser humano tem necessidades afetivas. Rocha-Coutinho (1994)
38
pontua que, a partir do século XVIII, foi-se consolidando ideologicamente como
prioridade do indivíduo a busca da felicidade pessoal, e o ideal de família passou a
ser pautado no amor entre seus membros.
Tierno
39
apresenta as principais necessidades afetivas dos seres humanos:
1. Necessidade de ser amado e estimado por seus pais e irmãos e de
viver num ambiente de aceitação e amor entre as pessoas que o
rodeiam.
2. Ser aceito como é, com suas possíveis limitações e defeitos, e ter a
sensação de ser importante para os outros, de que é alguém entre os
seus.
3. Estar seguro de que aceitar algumas normas e cumprí-las
proporciona tranqüilidade, pois o fundamental não muda. Sentir a
serenidade, a ordem e o equilíbrio internos.
Quando o adolescente tem estas necessidades supridas desde o berço,
“também desenvolverá sua afetividade e ternura, propiciando seu amadurecimento
psicológico, afetivo e integral”
40
.
A figura dos pais representará um elo forte de segurança e confiança.
Segundo Erikson, a confiança é a segurança íntima na conduta dos outros, assim
como um sentido fundamental de boa conduta própria”
41
.
Percebe-se também que muitas são as marcas de uma adolescência mal
compreendida. As “impressões de ter sido dividido, privado de algo e de ter sido
abandonado” deixam uma cicatriz profunda de desconfiança e dor, e é neste
momento que a confiança básica em si e no outro deve ser estabelecida e mantida.
Por ser o eixo principal do desenvolvimento e bem-estar de todos os seus
membros, cabe a família o papel não somente da educação e do suprimento de
suas necessidade físicas, mas essencialmente afetivas e morais.
38
ROCHA-COUTINHO, 1994.
39
TIERNO, Barnabé. Os filhos e o ambiente. São Paulo: paulinas,1995.p.109.
40
TIERNO, 1995 ,p.109-110
41
ERIKSON, 1976 ,p.96
48
A Declaração Mundial sobre a sobrevivência, a proteção e o desenvolvimento da
criança nos anos 90 diz:
A família é a principal responsável pela alimentação e pela proteção da
criança, da infância à adolescência. A iniciação das crianças na cultura,
nos valores e nas normas de sua sociedade começa na família. Para um
desenvolvimento completo e harmonioso de sua personalidade, a criança
deve crescer num ambiente familiar, numa atmosfera de felicidade, amor e
compreensão. Portanto todas as instituições da sociedade devem respeitar
e apoiar os esforços dos pais e de todos os demais responsáveis para
alimentar e cuidar da criança em um ambiente familiar.
42
Como se pode observar, a família é considerada como lugar adequado para o
desenvolvimento da criança e do adolescente, lugar este de aprendizados, de
formação da personalidade e de preparação para a vida. A criança tem o direito de
viver em um ambiente que lhe conceda conforto e suprimento de necessidades,
sejam elas físicas, emocionais ou sociais. Por ser um lugar onde o afeto está
presente, a criança e/ou adolescente não devem ser tirados de lá, a não ser por
motivos extremos.
Quando os filhos atingem a adolescência, a tarefa da família é procurar se
preparar para as mudanças qualitativas nos seus relacionamentos, e não excluí-los
de seu convívio, uma vez que os filhos não são mais tão dependentes e
apresentam um certo grau de maturidade.
É nesse período que se estabelecem os triângulos envolvendo os
adolescentes, seus iguais e seus pais, ou os adolescentes, seus pais e seus avós.
Surgem também os interesses fora da família, tanto na escola quanto com os
amigos. A família continua tendo o seu papel fundamental na formação do caráter
do adolescente, por que então o adolescente procura ajuda externa para a solução
de seus questionamentos? Por que os espaços no lar não representam segurança?
O isolamento do adolescente em sua família traduz a insegurança em
compartilhar problemas com os seus pares íntimos, e isso constitui um descrédito
pelas pessoas referenciais. Isso muitas vezes ocorre pela ausência de diálogo, e
dialogar é conversar com a idéia do outro.
42
KALOUSTIAN Silvio.(Org.), Família Brasileira – a base de tudo. 7.ed. Brasília,DF :Cortez; 2000. ,p.5.
49
A ausência de abertura em assuntos familiares e também o distanciamento
que os pais vão elaborando ao longo de sua vida conjugal, tornando-se impossível
abrir-se com os filhos, gera o escasso contato entre pais e filhos adolescentes. Se
esta for uma prática constante, os adolescentes acabam se isolando, relacionando-
se exclusivamente com elementos externos, como os computadores. Estes
elementos externos, considerados eficazes distrações e a guarda dos filhos, em
muitos casos têm substituído o afeto, o conselho dos pais.
São públicos os males ocasionados por tais elementos externos.
probabilidade de crises existenciais, depressões, envolvimento com drogas, rebeldia
dos filhos com os pais e ausência de respeito por si mesmo.
Bowlby e Spitz
43
destacam ainda que existem diferenças entre as relações
familiares com adolescentes nas classes média e adolescentes que vivem na
miséria, pois as condições sociais interferem na relação e nas transformações dos
pais com seus filhos.
2 NECESSIDADES DA ADOLESCENCIA: PROTEÇÃO E AFETIVIDADE
Quando a família o cumpre seu papel e a comunidade também se mostra
falha na garantia da vida plena e digna em relação ao respeito e afetividade - pois
dependendo da estrutura familiar, conforme a Constituição Federal, “estende-se,
também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e
seus dependentes”.
44
- cabe ao Estado assegurar aos cidadãos tais direitos, para
que o sujeito desfrute de bens que somente a proteção emocional pode oferecer.
45
Na era Moderna, temos a emergência do Estado Protetor, impulsionado pelo
crescimento demográfico, pelos movimentos sociais e pela criação do PNABEM
(Programa Nacional de Bem-Estar do Menor). Em certos casos, pode ocorrer a
perda do poder pátrio (ECA, artigos 22 e 24) que acontece quando a família o
cumpre seus deveres, maltrata e/ou abusa da criança e do adolescente.
43
BOWLBY,1981;SPLITZ,1986 APUD STRECK;SCHNEIDER-HARPRECHT, 1996,. p.73.
44
BRASIL, 1988, art.226.
45
VICENTE, 2000. ,p.51.
50
Nestas circunstâncias, a criança pode ser encaminhada para um abrigo
social, e os princípios legais que norteiam a situação do abrigamento são
respaldados na Constituição, que garante o valor jurídico desta modalidade de
cuidado. A título de informação, destacam-se as seguintes condições para os
cuidadores de crianças e adolescentes:
Tutela existe um tutor, mas o tutorado apresenta condições de responder por suas
ações;
Curatela existe um responsável e o curatelado não apresenta condições mentais
de responder;
Guarda – posse dos pais em relação ao menor.
Vale ressaltar que a tutela e a guarda são vigentes até os 18 anos, e para a
curatela, não há limite de idade, mas pode ser feito um pedido de interdição. De
acordo com o artigo 98 do ECA, as medidas de proteção se fazem aplicáveis a
partir da violação de direitos, ou seja, todo abrigamento deve ser motivado como
uma medida provisória excepcional, uma vez que deve ser constatada a
transgressão de direitos para que se instaure uma ação protetora judicial.
Salienta o artigo 23 da ECA
46
, que “a falta de recursos não implica em perda
de poder pátrio, mas, neste caso, a criança e o adolescente devem ser mantidos em
sua família e ser incluídos em programas de auxílios.”
47
.
Um olhar atento e persistente sobre crianças que nos rodeiam e com as quais
convivemos, sejam elas do nosso agregado familiar, ou não, facilmente nos faculta
um leque variado de informações acerca da sua situação escolar, saúde, higiene,
conforto bem-estar, auto-estima e afetos.
São estes apenas indicadores que podem balizar a orientação em termos de
percepção, capazes de alertar para fatores adversos que se encontram
acondicionados ao desenvolvimento normal e equilibrado das criança/jovens e suas
famílias.
Para que se possa compreender de forma correta qual é o papel da família no
desenvolvimento do adolescente, é necessário entender quais o as necessidades
físicas e emocionais neste processo. A princípio, é preciso enfatizar que,
emocionalmente, o adolescente precisa de companhia e suporte, mesmo que seja
tão somente da família.
46
Estatuto da Criança e do Adolescente. Artigos 22. P.
47
Estatuto da Criança e do Adolescentes. Artigos 22 e 24p.
51
Do ponto de vista psicológico, o ser humano necessita da companhia de seus
semelhantes. Se o gregarismo é uma condição típica, a afetividade e a necessidade
de carinho são essências biológicas básicas, cuja carência pode produzir as mais
variadas reações: desde um simples problema de conduta até as mais sérias
doenças no organismo.
A teoria do apego de Bowlby
48
nos fornece um meio de definir a tendência
dos seres humanos para estabelecer fortes laços afetivos com outros, e uma forma
de compreender a forte reação emocional que ocorre quando esses laços ficam
ameaçados ou são rompidos.
Para desenvolver suas teorias, Bowlby
49
ampliou seu campo de interesse e
incluiu dados da etiologia, teoria do controle, Psicologia Cognitiva, Neurofisiologia e
Biologia do Desenvolvimento. Ele critica aqueles que acreditam que os laços entre
os indivíduos se desenvolvem apenas para satisfazer a certos instintos biológicos,
como o de alimentação e o sexual.
A tese dele é de que tais laços surgem de uma necessidade de segurança e
proteção; têm início cedo na vida, são dirigidos à pessoas específicas e tendem a
durar por uma grande parte do ciclo da vida. Formar laços com pessoas
significativas é considerado um comportamento normal não entre crianças, mas
também entre os adultos. Argumenta ainda que o comportamento de apego é algo
distinto do comportamento alimentar e do comportamento sexual.
Ainda para Bowlby,
50
Buscar cuidado é traço de um indivíduo mais fraco e menos experiente em
relação a outro considerado mais forte e/ou mais sábio. Uma criança ou
pessoa mais velha, no papel de quem busca cuidado, mantém, em relação
ao protetor, um grau de proximidade ou de rápido acesso de acordo com as
circunstâncias.
O cuidar dos pais caracteriza-se como uma ação fundamental para a
constituição da natureza do filho/a. Quando o indivíduo de qualquer idade está se
sentindo seguro, ele tende a explorar para longe a sua figura de apego. Ele vai além
do que se é esperado. Uma criança saudável sente-se suficientemente segura para
48
BOWLBY,John Uma base segura:aplicações clinicas da teoria do apego. .Porto Alegre: Artes Medicas,
1989.
49
BOWLBY, 1989.
50
IDEM
52
explorar, quando sabe que seus pais estão acessíveis e serão receptivos quando
requisitados.
Inicialmente, essas explorações são limitadas tanto em tempo quanto em
espaço. Por volta da metade dos terceiro ano, uma criança segura começa a torna-
se suficientemente confiante para aumentar tanto o tempo quanto a distância
primeiro pela metade de um dia, depois para dias inteiros.
Quando entra na adolescência suas excursões se estendem para semanas e
meses, porém, um lar considerado base segura continua sendo indispensável para
um ótimo funcionamento, bem como para a saúde mental de todos.
Quando a figura de ligação desaparece ou está ameaçada, a resposta é
intensa ansiedade e forte protesto emocional.
Bowlby sugere que os pais forneçam a base segura da ação a partir da qual
possa ser explorada. Esta relação determina a capacidade da criança ou do
adolescente de estabelecer relações afetivas mais tarde na vida. Isto é similar ao
conceito de Erik Erikson
51
de confiança básica: por meio de um bom cuidado por
parte dos pais, o indivíduo a si próprio como sendo capaz tanto de se ajudar
quanto merecedor de ajuda, se surgirem dificuldades.
52
Se o objetivo do comportamento de apego é manter um laço afetivo, situações
que colocam em perigo estes laços dão origem a determinadas reações muito
específicas. Quanto maior for o potencial para a perda, mais intensas serão estas
reações.
Bowlby diz:
Nestas circunstâncias, todas as formas mais poderosas de ligação são
ativadas - agarrar-se, chorar e talvez coerção raivosa [...]; quando estas
atitudes são bem sucedidas, a ligação é restaurada, cessam as ações e o
estado de estresse e ansiedade são aliviadas.
53
As situações de perigos para crianças e adolescentes se apresentam quando
os estímulos processados ao longo de sua vida familiar tornaram-se negativos. Isso
poderá afetar seu rebro e o desenvolvimento da área das emoções, provocando
idéias negativas sobre si e sobre os outros, colocando-se sempre como “coitada” e
vítima, pois acha que as pessoas não gostam dela.
51
BOWLBY,Jonh Apego, São Paulo: Martins Fontes . 1977. p.42.
52
ERIKSON, Erik,1950.
53
BOWLBY, 1977.
53
Quando as crianças e adolescentes sentem-se ameaçados em sua relação
com os pais, podem desenvolver um modo arrogante de ver a vida, tornando-se
perseguidores de outras pessoas e, certamente, trilharão o caminho da
autodestruição. Ter na família a segurança essencial para o ser humano estimula o
desejo para superação das dificuldades e estabelecimento das ações do indivíduo.
É na família que todos os sentimentos são determinados. Quantos o os
pais que, havendo padecido de escassez ou miséria na infância ou sentiram-se
inseguros na família, promovem para os filhos um verdadeiro mundo de fantasia,
cheio de brinquedos caros, deliciosos manjares e comodidades inimagináveis,
pensando eles que estão tendo uma boa conduta em relação ao bem-estar
emocional de sua prole.
Conforme Knobel
54
os sentimentos positivos ou negativos adquiridos na
família podem gerar uma personalidade marginalizada ou não pela sociedade. Estes
exteriorizam-se e é suficiente o estímulo para que eles se manifestem.
É assim que se estabelece a base para a construção da identidade de muitos
marginais. Quase sempre às voltas com o perigo, a delinqüência tem dado lugar a
toda a sorte de atos de heroísmo e asacrifícios mais sublimes para poupar a vida
ou a dor de uma criança. Isso demonstra que é a infância a fonte de experiências
mais importantes da vida. São as crianças que sempre vão encarnar esse “algo”
bom e nobre que todos foram um dia. Os pais deveriam sempre validar os seus
filhos, sejam eles negativos do ponto de vista psicológico, moral ou social.
A afetividade e o apego poderão se manifestar em família de forma não muito
compreensível. Em determinados lares, ela será amplamente manifesta pelo mais
novo ou mais velho. Em outros, será pela menina da casa, que gozará das
preferências, e infelizmente, a modalidade doentia e tremendamente cruel, que é
“o filho rejeitado”. Acontece que nem sempre um filho é esperado, às vezes ele
chega “sem querer”; muitos são fruto do meio ambiente, da esperança familiar, mas
não da decisão madura do matrimônio.
54
KNOBEL. Mauricio. Orientação Familiar. São Paulo: Papirus. p.108.
54
2.1 REJEIÇÃO E CUIDADOS
Martin Heidegger (1889-1976)
55
em seu famoso SER e TEMPO diz-nos:“ Do
ponto de vista existencial, o cuidado se acha a priori, antes de toda a atitude e
situação do ser humano, o que sempre significa dizer que ele se acha em toda
atitude e situação de fato”.
Informa-nos que o cuidado se encontra na raiz primeira do ser humano, antes
que ele faça alguma coisa. Se fizer, deve ser imbuída de cuidados, reconhecendo
assim o cuidado como “ESSENCIAL PARA O SER HUMANO”.
A criança rejeitada é vitima de um sem fim de injustiças. É um receptáculo de
todos os conflitos do lar e sua vida vai se configurando como que para receber todo
o mal do ambiente. Isso comumente registra-se como algo sem pretensões. Os pais
agem muitas vezes sem ter qualquer noção do mal que estão construindo.
Se a criança cresce em ambiente familiar sem o reconhecimento do ser que
ela representa, pode torna-se um indivíduo sem estrutura emocional para enfrentar
os mais diversos problemas da vida. Quando se torna adolescente, essa mesma
estrutura emocional frágil, aliada às mudanças da adolescência, são fatores de
riscos para que buscar um escape - muitas vezes nas drogas, na agressividade,
nas diversas “tribos” existentes na atualidade.
É da família a responsabilidade de criar um ser completo não fisicamente,
mas em especial no que concerne ao emocional. Cabe a família não abrir mão de
nutrir seus filhos com seus valores e afetividade.
De modo consciente, a família não deve se limitar a dar educação aos seus
filhos, mas ensiná-los a serem pessoas. Ou seja, o mais importante é não se afastar
emocionalmente dos filhos, e desta forma, estes não precisarão buscar em fontes
alheias o carinho, a atenção e os cuidados de que necessitam.
Caberia perguntar: como enfrentar as situações de abandono? Existe, então,
um lugar para seguir adiante?
55
HEIDEGGER. Martin. O ser e o tempo. Coleção os Pensadores.
55
2.1.1 Fuga e Proteção
O que é a complexidade? Somos seres complexos?
Para Pierre Levy
56
, em primeiro lugar, essa idéia implica uma multidão
incontável de circuitos causais entremeados a uma profusão de acontecimentos.
Pensemos, por exemplo, na interação das moléculas de ar que respiramos, no
metabolismo de nosso próprio corpo, na vida da biosfera ou na história da cultura
humana. Os sistemas complexos o interligados por uma rede causal, cujos anéis
exploram as ordens de grandeza a uma interdependência definitiva e não
conhecida.
A complexidade implica a noção de transformação ontológica, de mudança
radical. Ela abrange não apenas o surgimento e o desaparecimento de indivíduos,
mas também o aparecimento de novos tipos de seres e a aniquilação de espécies
inteiras. Essa impermanência radical conduz a diferenças de duração. Ela permite
que subsistam, em meio ao domínio geral, pequenas ilhotas mais ou menos
estáveis, memórias mais ou menos longas. Hoje atribuímos o nome de evolução a
esse acúmulo do durável, ou a essa reiteração do reproduzível, que nossos
ancestrais chamavam de criação.
No processo de desenvolvimento da adolescência, onde se busca a auto-
afirmação do ser, que vem cercada pela necessidade de identidade e identificação
com o mundo, evidenciam-se perguntas, as mais variadas possíveis, no sentido de
como se adaptar à sociedade sem infringir os conceitos e os valores familiares.
Na busca da afirmação da sua identidade, as dificuldades de relacionamento
com a família tornam-se poderosos agentes de ligações na adolescência. Os
adolescentes passam mais tempo com seus amigos que com sua família. No
entanto, os valores fundamentais da maioria dos adolescentes permanecem
parecidos com os dos seus pais. Mesmo quando eles buscam a companhia e a
intimidade com seus pares, procuram nos pais sua base segura, na qual podem
fundamentar sua própria liberdade.
56
Pierre Lévy, 47, é titular da cadeira de pesquisa em inteligência coletiva da Universidade de
Ottawa e membro da Sociedade Real do Canadá (Academia Canadense de Ciências e
Humanidades)
56
A rebeldia, envolvendo turbulência emocional, alienação da sociedade adulta,
comportamento imprudente e rejeição dos valores sócio-morais, dentre outros
fatores, constitui um “quadro caótico e favorável à manifestação da conduta
transgressora do adolescente. Os conflitos com a família neste período podem ser
atenuados se estiver assegurado o direito do adolescente em se relacionar com um
grupo que interfira positivamente em suas decisões. Surge, então, como opção
positiva, os grupos juvenis, seja no contexto escolar, como os “Grêmios Estudantis”,
ou no contexto religioso, como “Grupos Jovens”, ou mesmo os grupos de Culturas
Juvenis, próprios de uma época. A análise desses grupos oferecerá uma alternativa
para as famílias se adaptarem à adolescência e fará a diferença na relação dos
adolescentes com seus familiares.
3 LUGAR DE REFÚGIO: FORMAÇÃO DE GRUPOS
Os grupos juvenis, conforme Mead
57
(1968), têm papel central na socialização
dos jovens, sendo os primeiros espaços em que as pessoas participam como iguais,
pois “antes de atingir a idade de seis ou sete anos, a criança se associa muito pouco
a outras da mesma geração”.
A partir dessa idade, começa a formar grupos dirigidos de acordo com as
categorias de sexo, abrindo-se aos outros e constituindo sua própria identidade. E,
conforme René Fau
58
(1968, p. 44-46), “é na procura de sua autonomia interior,
independente das circunstâncias, que o adolescente percebe a necessidade
imperiosa de se agregar a um grupo”.
57
MEAD, Margaret. A jovem de Samoa e seu grupo de idade. Trad. de Esperança Lourdes de Franco Netto. In:
BRITO, Sulamita (org.). Sociologia da juventude . Rio de Janeiro: Zahar, 1968. p. 31-41. V.3.
58
FAU, René. Características gerais do grupo durante a adolescência. Trad. de Narciso José de Melo Teixeira e
Luís Cláudio Figueiredo. In: BRITO, Sulamita (org.). Sociologia da juventude. Rio de Janeiro: Zahar, 1968, p.
43-46. V..
57
Mas este grupo é essencialmente transitório, fragmentário e limitativo, porque
responde à exigência fundamental da adolescência: individualização e autonomia.
Os grupos juvenis são referência para canalizar a agressividade, através
dos quais muitos adolescentes se expressam. René Fau afirma que o
grupo “absorve a força viva do adolescente, deriva durante um tempo e
neutraliza o impulso sexual; com os anos, esse impulso torna-se o mais
forte e, quando se fixa e se exterioriza, destrói o grupo, abandonado por
seus membros”. Um amigo casado é um amigo perdido. (FAU, 1968, p.44-
46)
Normalmente os grupos se formam a partir de objetivos comuns como jogar
futebol, vôlei, praticar skate, trocar figurinhas, entrar em comunidades eletrônicas, e
tem por função assegurar uma relativa independência em relação à família e ao
mundo dos adultos, criar condições para uma “aprovação dos pares”. A sua
precariedade (grupo informal) não lhe permite ser referência mais estável.
Contudo, ao fechar-se em si mesmos, constituem-se como gangues, galeras
ou tribos. Waiselfisz
59
(1998), fazendo uma distinção entre gangs e galeras, afirma:
[Gangues são grupos] constituídos nas quadras, e seus integrantes se
conhecem desde a infância. Bebida e drogas são correntemente utilizadas.
Bater nas pessoas e guerrear por território são práticas que fazem parte de
sua rotina (...) A galera, por sua vez, é entendida como um grupo de jovens
que se reúne para sair, para se divertir e, eventualmente, “para consumir e
mexer com droga”. Muitas vezes serve de proteção aos moradores das
quadras, fazendo justiça com as próprias mãos e não admitindo intrusos
nos arredores (p. 41)
Essas atitudes também são referidas pela pesquisadora Kelma Socorro Lopes
de Matos (2003), na sua tese sobre Juventude, professores e escola, ao apontar os
amigos como “influência” na iniciação ao fumo e à bebida.
Nesse caso, embora continuem convivendo, dizem que a amizade não é algo
tão bom assim. Põem a responsabilidade dos seus atos sobre os seus pares,
justificando-se: “os jovens não pensam muito...” O amigo é também cúmplice,
principalmente nos erros (MATOS, 2003, p. 52)
60
.
Ainda que os jovens indiquem influência negativa do grupinho de amigos,
segundo Matos (2003, p. 53), ele procura preservar o grupo, chamando atenção que
59
WAISELFISZ, Júlio Jacobo (Coord.). Juventude, violência e cidadania: os jovens de Brasília. São Paulo:
Cortez, 1998.
60
MATOS, 2003.
58
a “grande maioria dos pesquisadores diverge dessas opiniões e assegura que ter
amigos é algo muito bom”
61
.
Para Eisenstadt (1976, p. 75)
62
os grupos juvenis informais geralmente
organizam-se dentro da vizinhança, dentro das escolas ou em espaços religiosos,
entre rapazes ou moças de um certa faixa etária e podem desenvolver uma forte,
embora informal, organização, com ritos secretos e responsabilidades de cada um
dos membros. Segundo o autor, essas organizações juvenis ampliaram-se com o
desenvolvimento da industrialização, sistemas políticos modernos e com a crescente
limitação da ação da família. Além disso, “ficaram muito mais solidárias e
conscientes de si mesmas; tornaram-se cada vez mais importantes na vida de seus
membros e da comunidade como um todo” (EISENSTADT, 1976, p. 154)
63
.
Expressões como galera, turma ou tribos designam grupos de relativa
organização interna, estruturados em torno de suas áreas de residência (bairro,
morro, rua, esquina, comunidade de interior) ou de interesse (grupo de leitura, galera
da pizza, do skate, comunidades etc.).
Sandoval (2002, p. 112)
64
se refere aos grupos juvenis informais como
espaços onde é possível vislumbrar sinais da cultura jovem, possibilitando a
formação das relações sociais, sem chegar a construir associações cidadãs, senão
grupos destinados a expressar suas idéias, inquietudes, interesses, desejos e
descrenças com o mundo institucional. As ações destes grupos se o por um
interesse situacional e muitas vezes contra a ética estabelecida. Segundo ele,
Son los grupos de amigos que se juntan en las esquinas, beben alcohol,
fuman marihuana o pasta-base, se emborrachan, "se expresan". Son los
amigos que van juntos al Estadio y ritualizan su expresión en las Barras
Bravas. Es la expresión que adopta su forma perversa en las pandillas
juveniles y en las sectas satánicas (SANDOVAL, 2002, p. 287).
Essas atitudes levam a outras que são tão comuns no cotidiano das famílias:
“os pais devem ter muito cuidado com quem anda com seus filhos”; “A escola deve
61
MATOS, 2003.
62
EISENSTADT, S. N. De geração a geração. São Paulo: Perspectiva, 1956/1976. p. 75.
63
IBDEM, p.154
64
SANDOVAL, Mario APUD HAMMES, Lúcio Jorge. Os grupos juvenis e os aprendizados de convivência.
Seminário de Pesquisa em Educação da Região Sul. Curitiba: Pontifícia Universidade Católica do Paraná,
2004. p. 149.
59
evitar a formação de grupinhos...”; “A igreja deve ficar de olho no que fazem esses
grupos”, em especial, se não estão tramando contra os seus lideres.
A imprensa, no afã de ganhar popularidade, afirma: “achamos que este crime
tem a ver com gangues” ou, “crimes envolvendo gangues” (SÁNCHEZ-JANKOWSKI,
1997, p. 182)
65
. Essas são as versões negativas dos “adultos” em relação às ações
das juventudes e dos grupos jovens. Muitas são as situações que envolvem esses
grupos. Não são observadas a relação que é travada a partir do agrupamento
desses jovens.
Nesse sentido, a juventude aparece estereotipada como delinqüente, que
permanece necessitada de vigilância e supervisão, inclusive em relação à
afetividade e sexualidade
66
. Surgem dessa fase várias publicações sobre
adolescentes, como Adolescence, do psicólogo G. Stanley Hall, “concebendo uma
apologia do treinamento militar como a atividade que melhor poderia realizar as
potencialidades dos jovens americanos e respeitar as especificidades deles” (DICK
2003, p. 227)
67
. O entorno das necessidades dos jovens não está apenas em
transgredir, mas somar conteúdos de formação e força de laços afetivos.
Com a industrialização, surge também a “crise de aprendizagem” e o
desenvolvimento do sistema educacional, especialmente por causa das mutações
tecnológicas e o surgimento de ofícios diversos. Torna-se difícil para os jovens
assumir trabalhos, porque as empresas não oferecem espaço para aprender. Só nas
pequenas indústrias ainda “podem ser aproveitados pelo patrão que vigia ele próprio
o trabalho” (PERROT, 1996, p. 106)
68
. A autora descreve a universalização do
sistema escolar, a partir de um relatório do movimento operário francês de 1877:
A aprendizagem está em vias de decadência. O remédio? Uma rede de
escolas profissionais sustentadas pelo Estado, pois “a pobreza dos pais é grande e
não lhes permitiria sequer pagar uma pensão suficiente para cobrir as simples
65
SÁNCHEZ-JANKOWSKI, Martín. As Ganges e a imprensa: a produção de um mito nacional. Juventude e
Contemporaneidade. Revista Brasileira de Educação, São Paulo: ANPED, n. 5 e 6, p. 180-198, 1997.
66
As expressões como “delinqüência juvenil” e “cultura jovem” aparecem nos Estados Unidos, principalmente
depois da revolta na Universidade de Berkley, em 1964. Dick (2003, p. 227) descreve a preocupação da
psicologia com os adolescentes que giravam em dois pólos: “ou a exigência de liberdade e possibilidades de auto
governo a eles ou a uniformizar, coletivizar e restituir ao social os impulsos criativos juvenis”.
67
DICK, Hilário. Gritos silenciados, mas evidentes: jovens construindo juventude na história. São Paulo:
Loyola, 2003.
68
PERROT, Michelle. A juventude operária. da oficina à fábrica. In: LEVI, Giovanni e SCHMITT, Jean-Claude
(org.). História dos jovens. (trad.: Cláudio Marcondes, Nilson Moulin e Paulo Neves). São Paulo: Companhia
das Letras, 1996.p. 106-107. V.l 2.
60
despesas com o ensino”. O movimento operário não diz outra coisa, desenvolvendo,
de congresso em congresso, um verdadeiro “pensamento sobre a educação”. Ele
reivindica, sobretudo, um “ensino integral” que não sacrifique nem a cultura geral
que faz o cidadão, o operário completo; um ensino que jamais dissocie a teoria e a
prática. O adolescente que experimenta no mesmo dia um fenômeno cuja teoria
estudou, honra em sua justa medida o labor do operário, suas mãos (PERROT,
1996, p. 106 e 107).
Surge o século XX, que é marcado pela extrema valorização da cultura juvenil
provocada, especialmente pelos movimentos juvenis da Alemanha (Wandervogel,
depois hitlerista), da Inglaterra (scouts), Itália (fascismo) e Rússia (juventudes
comunistas). Ser jovem passou a ser símbolo de novidade e a juventude adquiria
força de transformação social. Talvez as barricadas do maio parisiense de 1968
sejam o melhor ícone da juventude, que se instituía como força de transformação
social.
O Brasil acompanha este fenômeno com a ampliação do acesso às escolas e
universidade; a organização inicial da “Juventude Brasileira”, ao molde da
“Juventude Hitlerista” (MARTINS NUNES, 1992), como instrumento do Estado
(1937-1945) na era Vargas; a organização dos clubes 4-S nas décadas de 1960 e
1970 com inspiração nos 4-H norte-americanos patrocinados pelo governo brasileiro
(AZEVEDO, 2002, p. 20); a organização da Ação Católica, com o impulso do papa
Pio XI para a “formação de leigos que se organizavam como homens, mulheres,
rapazes e moças, preparando-se para salvar a humanidade do ateísmo” (DICK,
2003, p. 238)
69
nos anos de 1930. Este ato evoluiu na sua articulação para uma
“Ação Católica Especializada”, trabalhando com jovens nos seus meios sociais
específicos (escolas, universidade, fábrica e campo), na perspectiva do
protagonismo juvenil até 1966, quando perde o apoio da Igreja e sofre dura
perseguição da ditadura militar que se implantou no país.
Isso supõe a possibilidade de observar a juventude como etapa da vida que
tem suas próprias oportunidades, limitações e empoderamento, entendendo-a não
somente como um período de moratória e preparação para a vida adulta e o
desempenho de papéis pré-estabelecidos, mas essencialmente como etapa de
desenvolvimento do poder que exerce essa juventude.
69
DICK,2003
61
Considerando todos os eventos que envolvem os jovens, pode-se assinalar
que o processo que conduz à construção de identidade se configura como um dos
elementos característicos e nucleares do período juvenil. Esse processo se associa
a condicionantes individuais, familiares, sociais, culturais e históricos determinadas.
também uma busca constante de reconhecimento de si mesmo num coletivo
maior, em grupo social que define e que determina, por sua vez, ao compartilhar
uma situação comum de convivência.
A convivência em grupos, afiliada ou não a uma organização formal (escola,
ONG, organização religiosa ou esportiva), possibilita o desenvolvimento de
aprendizados de convivência através da partilha de idéias, estudos e assumindo
juntos os conflitos, as vitórias e derrotas, reconhecendo sua individualidade e
colocando o grupo como referência e apoio para a afirmação pessoal e a construção
da utopia possível.
70
Tais grupos, tendo a convivência como base para o
desenvolvimento de aprendizados com objetivos comuns e uma metodologia que
valoriza o processo histórico, a situação de cada um dos participantes e o
desenvolvimento pessoal e comunitário – podem tornar-se referência importante
para a participação social de modo mais amplo.
Os grupos passam a ser espaço de pertencimento e representação de seu
ser jovem. Em muitas situações são alternativas de ação ou canal de participação na
sociedade. Nesse sentido, também os grupos se adaptam para acolher as
aspirações dos jovens, pois os motivos pelos quais os indivíduos participam são os
mais variados, e o fazem conscientes de suas diferenças, próximos ou mesmo
intimamente ligados. O que os une são justamente as relações próximas e
significativas.
70
BOURDIEU, Pierre. Escritos de educação. Petrópolis: Vozes, 1998.
62
3.1 A PROBLEMÁTICA DOS GRUPOS
Considerando que, de modo geral, as pesquisas apontam o grupo como
referência importante para assumir atitudes coletivas, e sabendo que a proposta de
formação da Juventude a partir dos grupos está perdendo vigor em ambientes que
historicamente valorizavam estas organizações como experiência básica de
formação (igreja católica, sindicatos, cooperativas, etc.), o houve,
paradoxalmente, o acolhimento nos âmbitos da academia ou das instituições de
ensino.
No entanto, levando-se em consideração a história dos grupos juvenis e a
visão do jovem como sujeito em formação, existe um desejo de aprofundar a
interlocução com uma cultura juvenil, em especial a que tem utilizado a Internet
como difusora dos seus conceitos e tem atraído, desta forma, uma parcela
significativa da população jovem, produzindo socialização. Pretende-se conhecer
melhor esse jovem participante da comunidade Emocore, identificando a
contribuição (ou não) desse grupo na construção de capital social das comunidades,
e as sua relações familiares e religiosas.
A pergunta que se impõe é: “O que leva a participação nos grupos de
jovens?” Essa questão, muitas vezes feita aos responsáveis
71
pelos grupos juvenis,
já foi tema de pesquisa para pesquisadores como Eisenstadt (1968) e Sousa (1999),
que revelaram importantes aprendizados produzidos para a convivência nos grupos.
Os aprendizados podem ser qualificados? Sabe-se que os aprendizados
“oficialmente escolarizados” são valorizados com boletins, notas e títulos, mas e os
aprendizados realizados nos grupos juvenis de convivência?
A pergunta persiste: A que leva este processo? Como sente um emocore?
Como as famílias lidam com seu jeito diferente de ver a vida?
Estudos como os de Kliksberg (1999), Eisenstadt (1968), Fau (1968), Sousa
(1999) e Putnam (1995 e 2003) revelam que no grupo, além de aprender a conviver,
o jovem adquire capacidades que contribuem para o desenvolvimento pessoal e
comunitário.
71
Nesta pesquisa usamos a categoria “responsáveis” para designar as pessoas que têm como função (pela opção
pessoal e oficializada pelas organizações) trabalhar em prol dos grupos juvenis: lideres coordenadores,etc.
63
É possível perceber a dependência gerada num grupo. Muitos adolescentes
passam a viver em função do grupo, agindo de acordo com as regras deste para se
sentir parte integrante do todo. É preocupante essa relação de total dependência no
grupo. É importante viver em comunidade, respeitando suas regras, mas não se
pode anular outros conceitos e valores em detrimento do grupo. Alguns assumem
totalmente a identidade do grupo e passam a defender sua postura e seus valores,
transgredindo inclusive toda uma formação anterior, oferecida pela família. O apoio e
a presença da família é extremamente importante para a construção permanente da
afetividade, pois influencia diretamente no desenvolvimento integral do adolescente,
na formação do seu caráter, preparando-o para enfrentar as solicitudes da vida e
oferecendo-lhe segurança para permanecer ao lado dos pais, sem a necessidade de
interferências de outrem.
Além disso, fala-se tanto em proteção da família, dos seus direitos, mas será
que a família é sempre um lugar gostoso, seguro, confortável para se estar? Esta
pergunta nos remete a uma pesquisa sobre cultura juvenil, em especial, a cultura
EMOCORE, que observaremos a seguir. É possível descobrir as necessidades do
adolescente em permanecer na comunidade EMO? Como vivem, o que passam,
como passam e o que sofrem na comunidade?
64
3.1.1 HISTÓRIA DOS EMOS: “EMOTIONAL HADCORE”
O estar em grupos representa, em muitos casos, a segurança não encontrada
na família. As análises aqui apresentadas justificam significativas ausências de
afetividade por parte da família e relata a ação dos grupos juvenis na atualidade.
As tribos estão se formando e pasmem - dentro dos espaços religiosos. É
fácil se perguntar: Como é possível? Como nasceu esse grupo e que influência
exerce na adolescência e juventude? Como se apresentam e quais são as suas
necessidades?
A história dos emos e como vivem serão relatadas no trabalho e pesquisa
feita com um pequeno grupo, ainda sem grandes respostas devido ao pouco tempo
de existência e às limitações.
Limitações quanto ao sigilo e ausência de aceitação pela sociedade. Eles
estão cada dia mais fortalecidos no grupo, mas o são aceitos pela sociedade.
Passo a relatar um pouco da história dos EMOS.
Essa nova tribo que está tomando conta das ruas das grandes cidades
brasileiras o os emos. O nome vem de emotional hardcore, vertente do punk que
mescla som pesado com letras românticas. Mas o que distingue os emos não é a
música, e sim as atitudes. Eles têm entre 11 e 18 anos e, nas roupas, são capazes
de misturar as botas do punk, o colar de Wilma, a mulher de Fred Flintstone, e uma
camiseta com a gatinha Hello Kitty. Não escondem os sentimentos, expressam
abertamente suas emoções, preconizam e praticam a tolerância sexual. A apologia à
tristeza pode esconder traços depressivos dos participantes.
Com um tom dos góticos e darks da cada de 80, os Emos o a mais
recente tribo dos centros urbanos. Batizado a partir da abreviação da palavra inglesa
emotional, o movimento ganhou força entre os jovens brasileiros em 2003, em São
Paulo, e depois se espalhou por todo o País. "Podemos reconhecer um integrante
pelas roupas exóticas, sempre em cores escuras como preto e roxo. também um
estilo próprio de cabelo e maquiagem", descreve a hebeatra Mônica Mulatinho, da
CIA do Adolescente em Brasilia-DF.
O gênero emocore nasceu em Washington, na década de 80, para designar
bandas que tocavam letras introspectivas, com batida pesada. Hoje, as principais
65
são Good Charlotte, The Used e My Chemical Romance. uma vertente do
hardcore, por sua vez fruto do punk. Mas os punks têm letras políticas, enquanto as
composições emos falam do que os adolescentes sentem', diz Marco Badin, dono da
casa noturna Hangar 110. Essa é a chave do sucesso do emocore. Emos são
expansivos. Gostam de trocar elogios, abraços e beijos em público. Ainda que não
tenham um relacionamento, amigas emos se chamam de 'maridas'. Segundo o
grupo EMO entrevistado na Instituição Confessional observada, o Colégio Batista
Brasileiro em Salvador: “As pessoas precisam cada vez mais dizer e ouvir um ‘eu te
amo’”.
Esse tipo de comportamento tem alarmado muitos pais, assustado
educadores e líderes religiosos. “Estranhei quando ele começou a pintar os olhos e
as unhas', 'Fiquei deprimida quando ele me contou. Mas, mesmo sem aceitar,
respeito a opção dele’ - relata uma professora da Instituição.
Também um enorme preconceito contra a tribo. Não é incomum que os
emos sejam insultados ou até agredidos por outros jovens. Na Galeria do Rock, em
São Paulo, onde se reúnem às sextas-feiras, são freqüentes arrastões em que a
garotada, perplexa, é expulsa do local a tapas por punks mais velhos .
Avessa a qualquer tipo de rotulação, especialmente no trato com jovens, que
estão em plena transformação, a médica não pôde deixar de notar um traço forte
entre os adeptos do movimento. "Há uma apologia à tristeza no discurso dos emos,
a melancolia é quase um estilo de vida para eles. Tudo bem, quando se trata apenas
de uma atitude de contestação. Mas a questão preocupa quando isso esconde
alterações de ordem psíquica", esclarece a médica.
Os próprios donos das lojas desconfiam da presença infanto-juvenil, dizem
que os emos espantam fregueses. Na escola, a discriminação também é forte. Um
adolescente emo de um tradicional colégio paulista foi alvo de agressão dentro da
escola depois de publicar no Orkut uma foto em que beijava um colega. Teve de sair
da escola e hoje está em intercâmbio na Europa. 'Na rua, tem gente que me chama
de sapatão', diz a emo Laura Battaglia, de 14 anos. Os comentários mais maldosos
ficam para os meninos. 'Já disseram que eu era gay e me chamaram de emocinha',
diz Bruno Tonel, de 17 anos, de o Paulo. Ele diz namorar uma garota emo e
afirma não se importar em ter amigos sexualmente flexíveis.
O estudo da cultura “Emo” traz um importante dado, no que se refere às
ações desses grupos dentro das comunidades religiosas, e apresenta uma estrutura
66
de atividades mais atrativas do que as igrejas vêm propondo, apesar de todas as
“diversões” presentes no espaço religioso.
É significativo o número de jovens membros dessa comunidade religiosa.
Seus membros, na sua maioria jovens da própria Igreja, não sentem por parte dos
seus líderes religiosos a manifestação dos sentimentos que brotam naturalmente, e
se ocorre de vez em quando, logo é tratado como algo a se observar. Cuidado com
os abraços exagerados, as trocas de carinho o vistas como algo “feio”, e muitos
encaram isso como coisa do “demo”, descaracterizando assim a filosofia do próprio
Cristo, que ensinava o Amor e a aproximação entre as pessoas, independentes de
sua classe social, cor ou ideal. Por outro lado, a ausência de pais afetuosos é outro
ponto em comum nos relatos dos participantes da comunidade religiosa observada.
Muitos adolescentes sentem a ausência dos pais nas atividades religiosas.
Comentam que a solidão e a ausência dos pais na vida deles, seja por excesso de
trabalho ou simplesmente por não querer participar das atividades dos filhos,
provocam uma sensação de tristeza e abandono dos seus desejos.
Nos relatos dos emocores entrevistados foi possível identificar essa mesma
descaracterização da afetividade em seus pais e parentes. Observemos os relatos e
a historicidade do grupo que se auto denomina “EMO Gospel”: eles se encontram
nos shoppings de Salvador. O grupo é composto por adolescentes com históricos
severos de perdas familiares, tais como separação dos pais, ausência da mãe e a
não aceitação dos outros grupos ou tribos por conta de sua aparência.
Uma questão básica orientou a pesquisa, através da qual buscamos conhecer
as motivações que levam os jovens a participar do grupo: “Por que você participa
(ou participou) do grupo EMOCORE?”. As respostas das entrevistas permitiram
distinguir diferentes motivos que levavam os jovens à participação nos grupos: a)
razões pessoais, de cunho individual; b) razões familiares, relacionados a uma
ausência sentida de pai ou mãe e c) razões sociais, relacionadas ao compromisso
com a coletividade.
67
A Tabela 2 permite visualizar o conjunto das respostas dos Adolescentes.
Fonte: Entrevistas em profundidade, 2007.1 Colégio Batista Brasileiro, e IBCA-
Salvador
.
Nota: As diferenças entre soma de parcelas e respectivos totais são provenientes do
critério de arredondamento.
Sinal convencional utilizado: - Dado numérico igual a zero não resultante de
arredondamento.
Motivações que levam ao engajamento nos grupos EMOCORES
Chamam atenção no conjunto das respostas as diferentes motivações que
levam os jovens a entrar no grupo EMOCORE, com especial destaque para as
motivações familiares, citadas por 63% dos entrevistados. Para 29,6% dos
entrevistados, o social aparece como motivação importante e apenas 7,4% dos
jovens destacam motivações pessoais, de cunho individual, que os levaram a entrar
no grupo.
Uma análise referendada a cada um desses grupos revela que os mesmos
não demonstram a mesma sensibilidade ao entrar no grupo. Os resultados parecem
indicar que os jovens participantes do grupo vinculado ao EMOCORE têm uma
consciência de sua necessidade afetiva, desenvolvida no relacionamento ou na
ausência dele, algo que não acontece antes de entrar no grupo.
Tabela 2 – Razões de engajamento nos grupos EMOCORE
Organização
Motivos
IBCA CBB
Total
Sociais 22,2% 22,2% 29,6%
Familiares 66,7% 77,8% 63,0%
Pessoais 11,1% - 7,4%
Total da coluna 100,0% 100,0%
100,0% 100,0%
Número de respostas 9 9 9 27
68
Em relação às razões sociais, os entrevistados indicam como justificativas de
sua motivação principal para entrar no grupo de jovens, o interesse de “ajudar outras
pessoas” a sentir o que eles sentem:
Eu gosto de abraçar e ser abraçado. Beijar e ser beijado. Quero que todos
tenham o que passei a ter. Gosto de ajudar as outras pessoas e mostrar
que o jovem tem condições de mudar e transformar, de agir e fazer as
coisas diferentes e interessantes (EMO baiano).
Para outros 30% dos entrevistados, razões familiares, pela ausência de
reservas acumuladas, aparecem como motivação principal. Participar do grupo de
jovens é normal em algumas famílias ou em alguns ambientes, ou círculos de
amizade.
Estas razões pessoais, de cunho individual, embora o citadas com tanta
freqüência, necessitam de um olhar especial, por causa da crescente valorização da
individualidade e subjetividade na sociedade contemporânea, especialmente entre
os mais jovens. Bajoit (2003) destaca profundas mudanças, referindo-se a elas com
a expressão “Todo cambia”. Em relação à gestão da integração, o autor afirma:
Los indivíduos forjan sus expectativas identitarias escuchando los llamados
del indivíduo hedonista, realizado y feliz. Pero en la práctica de las
relaciones sociales viven otra realidad: los padres se divorcian, la escuela es
selectiva y deben aferrarse a ella, la televisión los manipula y la publicidad
los lleva al endeudamiento, los lazos afectivos son frágiles y obedecen al
mercado del sexo, el mundo del trabajo es una jungla donde deben combatir
por sobrevivir, las distracciones son alienantes. Es la otra visión del Indivíduo
la que están llamados a realizarse: la del competidor y del consumidor
(BAJOIT, 2003, p. 275
).
72
72
BAJOIT, Guy. Todo cambia: análisis sociológico del cambio social y cultural en las sociedades
contemporáneas. Santiago: LOM Ediciones, 2003. (Colección Escafandra)
69
Sandoval (2002), ao estudar os jovens do século XXI, constata que eles se
fecham em si mesmos, com um discurso de desesperança e sequer pedem ajuda.
Segundo este autor:
Dentro de éste hermetismo juvenil, la resolución de problemas se da
también de manera individual, donde los jóvenes encuentran por solos la
salida a su encrucijada. Resuelven sus problemas tras gestionar con
independencia las formas viables para lograr sus objetivos (SANDOVAL,
2002, p. 301)
73
.
As respostas à categoria “razões porque os jovens participam do grupo”
podem ser consideradas como fatores que impulsionam a reflexão dos jovens na
busca de si mesmos. Têm a ver com as experiências de vida, formação e com as
opões cotidianas dos jovens e das organizações às quais se vinculam.
Possivelmente trazem esta sensibilidade de outras convivências, mas as motivações
são diferentes algumas bem pessoais exigindo uma reorganização pessoal e a
mobilização do grupo para acolher a todos. “A gente se abraça porque é disso que
mais precisamos nesta fase da vida. “E não recebemos isso dos outros”, diz Laura
74
,
de 14 anos.
Já que essa comunidade é parte integrante da sociedade religiosa de Salvador,
as perguntas giraram em torno da música emo e a aceitação do grupo na própria
Igreja. Como a adolescência evangélica tem visto a música e a presença EMOCORE
em sua comunidade?
73
SANDOVAL M., Mario. Jóvenes del siglo XXI: sujetos y Actores en una sociedad en cambio: Ediciones
UCSH, 2002.
74
“Laura” como todos os nomes das pesquisa dos EMOS são fictícios.
70
A tabela 3 nos oferece um olhar para as igreja evangélicas e sua perspectivas
juvenil dos EMOCORES.
Gosto muito, é meu tipo de música favorita.
5%
[6]
Apenas gosto
13%
[14]
É mais uma modinha.
24%
[26]
Não gosto.
7%
[8]
Não gosto e não gosto de quem gosta.
1%
[2]
Detesto e odeio quem gosta, se precisar bater em quem gosta, eu bato.
7%
[8]
Não sei o que é EMO, pretendo descobrir aqui nessa entrevista
21%
[23]
Não sei o que é EMO e nem quero saber
1%
[12]
EMO é do DEMOOO!!!
15%
[26]
Dados de grupos de adolescentes de Salvador, estudantes do Colégio Batista e
freqüentadores da Igreja local.
Esse tipo de comportamento tem alarmado muitos pais, educadores e
pessoas em geral dentro da instituição religiosa. Muitos abraços em suas reuniões,
exclusiva de adolescentes, têm chamado a atenção dos pais, educadores e líderes
religiosos. Muitos têm retirado os seus filhos desses grupos à força, o que tem
provocado revolta entre os outros adolescentes, emos ou não. A forma como se
vestem e pintam os olhos de preto, dentro da comunidade religiosa, tem assustado e
muitos pais estão perplexos com a maneira que seus filhos vêm se comportando.
Também um enorme preconceito contra a tribo. É perceptível com muita
clareza este fato nos shoppings e também quando se dirigem em blico para se
expressar. uma crítica muito forte em sua maneira de ser e de falar. Não é
incomum que os emos sejam insultados ou até agredidos por outros adolescentes e
jovens.
Em Salvador não muitos registros de ocorrências destes acontecimentos.
É evidente que a discriminação existe e que muitos são constrangidos diariamente,
especialmente em locais públicos, escolas e comunidades religiosas.
Muitos dizem que a presença destes estereótipos da cultura infanto-juvenil
agride a sociedade mais abastada, como se só os pobres fizessem parte da
comunidade Emocore. Fica claro que os adolescentes da classe economicamente
71
mais favorecida são mais vulneráveis à inclusão nestas comunidades por não terem
seus pais preocupados, atentos e afetivamente ligados a eles.
Para Regina de Assis
75
, Doutora em Educação pela Universidade de
Columbia, a tolerância é o traço de comportamento que distingue os emos de outros
jovens. 'A atitude dos emos irrita outros jovens porque eles o temem os
sentimentos, enquanto a maioria dos adolescentes busca afeto optando pela
agressividade', diz. várias comunidades no Orkut dedicadas a atacar os emos.
Os nomes de algumas beiram o bizarro, como “Hitler também era emo”. Alguns fãs
de música emocore afirmam que existem muitos 'paraguaios' - gíria usada pela
turma para caracterizar aqueles que se fazem passar por emos sem entender nada
da cultura. Muitos nem gostam da música, mas adotam as roupas.
3.1.2 CARACTERÍSTICAS DE UM EMOCORE
1.Gostar de música emocore. O estilo mescla a batida hardcore com letras
românticas.
2.Viver na internet e no Orkut. Todas as bandas emo brasileiras colocam suas
composições em sites.
3.Ser emotivo. Os emos choram ouvindo músicas que falam de amores
perdidos e rejeição dos pais.
4.Manifestarem demonstrações explícitas de carinho. Meninos e meninas se beijam,
se abraçam em público, seja com pessoas do sexo oposto, seja com as do mesmo
sexo.
5 Aceitar a opção sexual do outro, sem preconceitos.
6.Criticar pessoas violentas. Bater é altamente reprovável entre os emos
7.Escrever diários, poesias e músicas. Isso vale para meninas e meninos.
8.Usar roupas que mesclam a rebeldia punk com os ícones infantis. Meninas e
meninos usam rosa.
9.Usar cabelos lisos com enormes franjas no rosto. Usadas somente de um lado,
denotam certa ambigüidade sexual.
75
Doutora em educação infantil pela Universidade de Columbia e ex-secretária municipal de Educação do Rio
de Janeiro.
72
10.Não curtir drogas.
11.Lutar por um mundo sem violência, em que um dia todos se abracem sem parar.
12.Como outras tribos adolescentes, os emos têm linguagem própria.
13.Diminutivos - Trocam amor por amorzinho, lindo por lindinho, cão por
cãozinho, e por aí vai.
14.Internetês - Conversam trocando letras e assassinando a gramática.
"Sabia que eu te amo?" Se transforma em "Xabia q eu ti amu?".
Paraguaios - Ou emos "posers", que não gostam da música, mas se vestem com as
mesmas roupas da tribo.
Expressões EMOCORE:
"Oi, lindo!", "Oi, linda!" e "Que meeeigo!" ou "Que fooófis!!!", "Ela é minha marida"
são os termos mais usados pelos emos.
É relativamente fácil identificar um emo, mesmo que nunca se tenha ouvido
falar neles. A marca registrada está no cabelo, com franja usada em cima dos olhos,
somente de um lado do rosto. O visual é a própria contradição da adolescência.
Ao mesmo tempo em que demonstram rebeldia, que aparece nas roupas
pretas que usam, têm também uma vontade de se manter na infância, daí o uso dos
ícones infantis.
Cria-se uma expectativa em torno da vivência nestes grupos adolescentes: O
que os leva a identificar-se com esses grupos dentro das instituições religiosas se, a
priori, a Igreja deveria muni-los de formação espiritual satisfatoriamente? O que
passa é que as funções básicas da Igreja não atuam de modo eficaz, criando a
necessidade de buscar em outros grupos a realização plena. Quais seriam esses
conflitos causais entre igreja e adolescência? Seria uma questão de ou de
ausências?
Papalia
76
afirma que os jovens vivenciam mais conflitos com seus familiares
durante a adolescência por não verem manifestas as relações de afeto e
compreensão por parte de seus pais. Percebe-se ainda que em função das rápidas
transformações pelas quais passam nesse período, a adesão à cultura
transgressora pode servir como estímulo para a dissociação dos ideais dos pais. A
76
PAPALIA, Diane E; OLDS,Sally Wendkos; FELDMAN, Ruth Duskin. Desenvolvimento humano. 8.ed.
Porto Alegre:Artmed, 2006. 888p.
73
criação dada pela família ajudará a formar um comportamento pró ou anti-social por
atender ou deixar de atender às necessidades emocionais básicas da criança e do
adolescente. Os resultados de uma educação ineficaz tende a se perpetuar por toda
a vida. O adolescente não costuma “cair” em um grupo, é sua a prática de escolher
seus iguais. Quanto menor for a atuação dos pais na formação do caráter do
adolescente, maior seseu envolvimento com grupos diferentes do desejado pela
família.
A autora apresenta dados estatísticos que em famílias afro-americanas, a
religiosidade influencia os níveis de coesão e de conflitos familiares durante a
adolescência. É a que vai mediar os conceitos familiares e a razão do
adolescente, pois é na infância que as pré-imagens de Deus vão se formando e se
estabelecendo como fundamento sólido. Essas imagens se compõem de nossas
primeiras experiências de mutualidade. Para Fowler, essas pré-imagens são, na sua
maioria, formas de linguagens, que antes dos conceitos, surgem como forma de
consciência
77
. É na infância que os sentimentos de coragem, afeto, amor, esperança
e autonomia se juntam e fortalecem a adolescência. É a qualidade de todas essas
emoções organizadas na infância que determinarão na adolescência o
desenvolvimento da fé do adolescente.
E a fé entra como fator preponderante para debelar crises, regular emoções,
reconhecer e lidar com nossos próprios sentimentos e com os sentimentos dos
outros. James Fowler (1981,1989) define acomo um modo de ver ou de conhecer
o mundo. A para ele pode ser religiosa ou não: as pessoas podem ter fé em um
deus, na ciência, na humanidade ou em uma causa à qual dão valor máximo e que
sentido a sua vida. Ainda, a fé se desenvolve na interação com pessoas que
amadurecem e também no elo do ambiente em que vivem.
As experiências, crises e problemas que nos desafiam ou perturbam o
equilíbrio podem favorecer um salto para um estágio maior, ou melhor, para o ser
humano. Aquele ser de relações necessita, para se sentir completo, da crença em
algo que lhe impulsione a ir além, e é a que dará o “empurrão" para responder
questões da finitude do homem e da mulher.
Após compreender o papel dos grupos juvenis, e em especial como os
EMOCORES se apresentam e atuam na juventude de modo exponencial entre
77
FOWLER James, 1992. ,p.106.
74
adolescentes, fica a ansiedade de descobrir as respostas bíblicas acerca do
abandono na juventude. Assim, passa-se a verificar, sob diferentes óticas, qual é a
resposta que dará a Bíblia, como Escrito Sagrado, a estas e outras questões
pertinentes.
4. A IGREJA SEU PAPEL COM A ADOLESCÊNCIA E A JUVENTUDE
Na conferência do Setor Juventude CNBB dos Bispos do Brasil de 2006, foi
definido o seguinte objetivo: Intensificar e fortalecer a ação evangelizadora da Igreja
no mundo juvenil. A realidade da juventude clama por vida. “Conhecer os/as jovens
é condição prévia para evangelizá-los/as. Não se pode amar nem evangelizar a
quem não se conhece”. Precisamos aprender a considerar o jovem como “lugar
teológico”. A cultura juvenil apresenta à Igreja uma novidade teologal. Com suas
utopias, desafios e questionamentos, a juventude pós-moderna nos leva a crer em
um novo lugar teológico onde Deus se revela. De fato, Deus nos fala pelos jovens.
Precisamos aprender a considerar a juventude herdeira da epifania de Deus e
testemunha dessa tradição. A igreja tem assumido realmente seu papel
transformador?
A Igreja convida todos/as, nesta missão específica, a olhar a juventude com
“olhar divino” e nos convoca para a defesa da vida, sendo sinais de Cristo, cuja
missão Ele resumiu nestas palavras: “Eu vim para que todos tenham vida e vida em
abundância”. (João 10.10). Não somente daqueles/as que estão em nossas
comunidades, dioceses, movimentos eclesiais, pastorais, congregações, colégios,
Universidades, dentre outros. Faz-se urgente que toda a Igreja renove a opção
afetiva e efetiva pela juventude, na busca conjunta de propostas concretas, de modo
que ela possa alegrar-se com a Boa Notícia do Evangelho.
É evidente, mais uma vez, a necessidade de reconhecer e renovar o
compromisso histórico-identitário da proposta de evangelização, a partir das
pastorais de juventude, assumidos pela Igreja Latino-Americana e brasileira, nestes
últimos 30 anos, com atenção ao protagonismo juvenil, conforme recomendou Paulo
VI e o Concílio Vaticano II: “O jovem é o melhor apóstolo do jovem”. Também os
75
bispos do Brasil - retomando a Conferência de Medellín - afirmaram que a Igreja
quer “[...] dentro da pastoral de conjunto, uma autêntica pastoral de juventude,
educando os jovens a partir de sua vida, permitindo-lhes plena participação na
comunidade eclesial”.
nas concepções cristãs-evangélicas, a não identificação desses grupos e
em especial dos “EMOs” em seu reduto, tem provocado para eles um “escandaloso
comportamento”. É reconhecido que ficar fora dessa discussão tem produzido um
afastamento de muitos jovens dos espaços religiosos.
4.1 O EDUCADOR E SUAS CONCEPÇÕES DE CRIANÇA E ADOLESCENTE.
No processo de formação para os educadores sociais deve estar contido um
movimento de construção e desconstrução das suas concepções de criança e
adolescente, que pode favorecer a manutenção ou transformação do pensamento
dominante que classifica criança e adolescente pobres como “em perigo” ou
“perigosos”.
Essa interpretação que os educadores fazem das crianças e dos
adolescentes atendidos provavelmente não representa o que de fato eles sentem,
percebem como prioridade e como forma de dar conta dessas necessidades.
Portanto, é necessário um aprofundamento no conhecimento destes grupos de
crianças e adolescentes de rua, uma vez que estes são heterogêneos e vão
continuamente se modificando. Sabe-se, por exemplo, que distinções entre os
diversos grupos que moram em mocós de crianças e adolescentes e os que
circulam sozinhos pelas ruas.
Para que um indivíduo seja um educador, é necessário que na sua formação
possa tornar conhecido o que pensam esses grupos, ampliando e qualificando as
vozes das pessoas atendidas e como explicam sua forma de conduzir a própria vida.
Os educadores devem buscar compreender o que fazem, para que serve ou a
quem serve o seu fazer. Como afirma Paulo Freire (1987), o educador se constitui
como tal quando trabalha com o educando, e a sua tarefa termina convertendo-se
76
também na tarefa através da qual ele se reeduca com o educando que ele educa. O
educando educa mesmo que não esteja consciente deste ato. Dialeticamente, o ato
específico de educar adolescentes comporta uma diferença importante de ser
reconhecida e igualmente importante para que não seja antagonizada.
Apesar de perceberem que o processo educacional ocorre na vida, nas
relações familiares, em grupos de amigos, nas relações profissionais, e que esses
diferentes espaços foram construindo suas concepções de criança e de adolescente,
é, portanto, na Educação que se encontram os diversos espaços nos quais
acontecem as trocas no processo de ensino/aprendizagem. O educador que não
valoriza o que sabe fazer e as formas de conhecimento que se produzem fora dos
espaços considerados formais precisa, doravante, rever os seus conceitos acerca do
ato educativo em si, bem como a promoção deste educar.
Nos depoimentos dos entrevistados, participantes ou egressos dos grupos de
cultura juvenil sobre o processo de educação formal da juventude, os mesmos
enfatizam a importância desta ação porque “aprendem coisas importantes”.
Destacam também que a escola continua sendo um ambiente muito formal e que o
grupo é informal e tem um jeito de educar e de aprender mais próximo. Segundo
Freire
78
: ”Em lugar de professor, com tradições fortemente “doadoras”, o
coordenador de debates. Em lugar de aula discursiva, o diálogo. Em lugar de aluno,
com tradições passivas, o participante do grupo”. (FREIRE, 1969, p. 111).
A melhor maneira de conhecer os jovens é fora do seu contexto escolar, e é
no grupo alternativo que se tem maior afinidade e, conseqüentemente, uma maior
aproximação de amizade. Não seria o caso de transformar as salas de aulas em
espaços criativos, de aproximação e ou mesmo num grupo juvenil? Sem contar que
os professores, por desconhecerem a real situação de vida de seus alunos, mantém
dos mesmos uma distância aterrorizante, provocando assim uma lacuna entre os
processos de formação desenvolvidos no grupo e na educação como um todo. Mais
uma vez Freire
79
adverte: “Não posso ser professor se não percebo cada vez
melhor que, por não poder ser neutra, minha prática exige de mim uma definição”.
78
FREIRE, Paulo. Educação como prática da liberdade. 2. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1969.
79
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à pratica educativa, 35 ed. São Paulo: Paz e
Terra, 1996 p.102.
77
No entanto, é possível vislumbrar um ‘fio’ de esperança e reconhecimento,
traçado a partir das novas relações que estão se estabelecendo também nas
escolas.
Os entrevistados vinculados às três organizações pontuam com bastante
ênfase que tanto na escola como no grupo, aprendem coisas importantes. Destacam
que aprendizados fundamentais que se desenvolvem nos dois ambientes
grupos e escola que são de naturezas diferentes, mas complementares e
significativos.
Observa-se que a escola caminha de forma tímida, mas significativa,
transformando seus saberes e agregando valores aos grupos. A adolescência, por
sua vez, trabalha com sua individualidade transformadora, enquanto que os espaços
religiosos ainda buscam encontrar-se no que diz respeito ao abandono. Como
identificar, então, as soluções para os abandonos e a cura para a alma ferida? Seria
a Bíblia o norte para a elucidação destas questões? Ao analisar o Texto Sagrado, é
possível perceber diversos casos de abandono e suas conseqüências para a vida,
mas é possível também identificar o caminho da cura para a alma.
78
4.2 DOR E O SOFRIMENTO: FERIDAS ABERTAS, FERIDAS CURADAS:
ISMAEL E AGAR
O abandono de crianças é um fenômeno verificado em todos os tempos, pelo
menos no Ocidente. Histórias de abandono podem ser encontradas praticamente em
todas as grandes civilizações da Antigüidade. A primeira regulamentação sobre
abandono que se tem conhecimento data do II milênio a C., no código babilônico de
Hamurábi.
No Antigo Testamento existem pelo menos duas histórias de abandono.
Ismael, filho de Abraão, foi abandonado pela mãe Agar sob um arbusto no deserto,
após terem sido expulsos. A história bíblica está em Gênesis 28.8-20. Num
momento muito difícil, quando Agar sentiu-se abandonada, Deus apareceu e
prometeu-lhe que ela e seu filho seriam protegidos por Ele. Não era simplesmente
uma mãe que chorava no deserto por sobrevivência para o seu filho, mas uma serva
de um homem que tinha sobre si a responsabilidade de gerar uma grande nação: a
descendência de Abraão. Agar representava, naquele momento, todas as mulheres
feridas e abandonadas o da nação Israel, mas em todas as nações do mundo.
Ali estava explícita a dor de quem não sabe como curar-se da dor mais penosa do
ser humano: a rejeição. Quando tudo parecia morte ela busca, como último fio de
esperança, a fé. Busca no Deus de seu senhor Abraão o “Ungüento“ para minimizar
sua dor e encontra nELE cura, prosperidade e acolhimento.
Moisés foi colocado em um cesto pela mãe, no rio Nilo, e acolhido pela filha
do faraó. Para ambos, a história de abandono tornou possível que seus destinos de
líderes do povo se cumprissem.
A mitologia, na Grécia clássica, descreve inúmeros casos de crianças
abandonadas. Um dos mais conhecidos é o de Édipo, filho de Jocasta e Laio,
abandonado a mando do pai no monte Citeron.
Na Grécia, assim como em Roma, o poder do pai sobre os filhos era
supremo, sendo permitido vender, matar ou expor os filhos. O aborto era legítimo e o
infanticídio, admitido.
79
Por lei, as crianças abandonadas não podiam ser tomadas como escravas,
mas sim como servas. Outras eram submetidas a abusos ou estropiadas (furavam-
lhe os olhos e quebravam-lhe os membros) para servirem como mendigos. Algumas
eram transformadas em prostitutas ou eunucos.
O abandono não tinha, necessariamente, relação com a condição econômica.
Muitas famílias abastadas expunham os filhos para não diluir a herança ou por
desconfiar da fidelidade da esposa. O abandono dos filhos não era visto como crime,
uma vez que o filho era propriedade do pai e este poderia dispor da prole conforme
sua necessidade.
Os relatos da Toráh revelavam que a obediência a Deus, os preceitos morais
e a conduta que o povo deveria ter significariam muito nas ações de benevolência
de Deus para com o povo.
Fica a certeza de que para o abandonado, rejeitado, excluído ou mesmo o
esquecido, esperança. O Deus de Israel continua atuando através do Seu Filho
Amado: Jesus Cristo. Ele que se fez carne e habitou entre pecadores, curando suas
feridas psicossomáticas e espirituais. Levou consigo os cativos e deu vida aos
excluídos de todas as sociedades, até os dias atuais.
80
5 CONCLUSÃO
Do que foi exposto, pode-se concluir que o abandono na infância e na
adolescência tem causas diversas e conseqüências múltiplas. As causa variam
desde o abandono da criança que não foi planejada, e por isso rejeitada e fadada às
ruas, em sua grande maioria por es adolescentes, que também sofreram ou
sofrem algum tipo de abandono. Geralmente mães oriundas de famílias
abandonadas desde o abandono dos poderes públicos até o abandono psicológico
mesmo a criança estando dentro do núcleo familiar, encontra-se só, pela falta de
diálogo com os pais, que pode ser por negligência ou por oportunidades perdidas
em função da luta pela sobrevivência.
Como se vê, na exclusão social, a pobreza é um fator determinante no
abandono da criança, que crescendo, será o adolescente abandonado, e que se
sobreviver às drogas, à violência, à marginalização e a tantos outros estados de
abandono, constituirá uma família abandonada, com potencial muito alto para gerar
novos seres abandonados.
As conseqüências o jovens rebeldes, que fogem de casa no sentido literal
da palavra, ou se isolam do grupo familiar e formam outros grupos sociais para se
defender das agressões produzidas pelo distúrbio social, e em muitas das vezes
tornam-se também agressores, chamando atenção para si, como os emos:
“emotional hardcore”.
“A pátria é a família amplificada”, disse Rui Barbosa, portanto a família tem
um papel fundamental na construção da sociedade. Se o útero materno gera um ser
e o coloca na família, esta gera um ser e o coloca na sociedade. Assim, a família é o
útero social, que poderá colocar bons indivíduos na sociedade, se for planejada
assistida, educada, alimentada, empregada, dotada de momentos de lazer, de culto,
dentre outras necessidades funcionais. uma interação entre seus membros e
estes trocam experiências com outros grupos familiares, como a Igreja, o Estado e a
Sociedade como um todo. Se a família é abandonada nos seus aspectos mais
81
básicos de sobrevivência, ela é um potencial de alto risco para ampliar uma
sociedade doentia, conflituosa e desequilibrada.
Na adolescência, o indivíduo se depara com dificuldades, precisa tomar
decisões e ser agente de maneira efetiva; se na infância aprendeu a caminhar
fisicamente, agora chegou a vez do caminhar social, psicológica, política e
economicamente, sobretudo nas famílias carentes, onde o adolescente tem que
participar também na subsistência familiar.
Os obstáculos não superados geram conflitos de dimensões imprevisíveis, tão
complexos quanto o tamanho do desequilíbrio familiar. O adolescente tem
comportamento próprio distinto dos pais, vive em época diferente, é dotado de
aptidões diferentes e possui costumes diferentes; nesta era globalizada, com a mídia
interagindo diuturnamente, a influência dos meios de comunicação tem um papel
decisivo, e muitos aderem às novas ondas como forma de pertencer a um grupo,
identificando-se com ele, mas as sua raízes são a família, que às vezes o aceita
este comportamento.
Tem-se um abismo, que pode resultar na solidão do adolescente, mesmo
que este seja partícipe deste grupo familiar, haja vista que os diálogos são reduzidos
pela incompatibilidade de ações. A fuga é inevitável, ou seja, física - propriamente
dita - ou psicológica, daí a necessidade de agrupar-se entre os iguais, fazer as
mesmas coisas, ter valor, ser reconhecido, ser ouvido, poder falar, ser influenciado e
influenciar.
Contudo, se no lar estruturado condição de diálogo, família interativa,
os membros têm seu papel específico e são respeitados nas suas condições,
socializando-se com os demais componentes do grupo nos momentos oportunos,
com aceitação recíproca, via de regra se estabelece um ambiente propício para a
convivência.
Na família o indivíduo precisa encontrar condições de amar e ser amado,
experimentar as primeiras relações sociais, amadurecer e harmonizar as mudanças
decorrentes deste crescimento. Neste processo, as ações negativas promovem o
escape do adolescente, que virá com manifestações sempre contrárias ao grupo
familiar, ao ambiente que freqüenta e transgredindo os padrões convencionalmente
estabelecidos, como demonstrados no curso desta dissertação.
Uma destas manifestações se processa através da formação de grupos
juvenis, como os emocores, grupo de adolescentes, com perfil próprio - agressivos
82
no estereótipo, mas emotivos no interior - confrontando os padrões estabelecidos na
família, na igreja, na sociedade.
Na pesquisada realizada em Salvador, na IBCA e no CBB, a formação do
grupo se deu em 63,0% dos casos por problemas de disfunção na família, segundo
os adolescentes entrevistados. Este percentual confirma as teorias e reforça o papel
preponderante do cleo familiar na prevenção destes casos, no sentido de evitar a
evasão dos jovens docleo familiar e procurar, de certa forma, responder aos seus
anseios juvenis.
A caracterização do grupo é a necessidade afetiva, e neste, o pertencer é
demonstrado pela exacerbada manifestação de carinho entre seus membros,
independente de gênero, cor, raça ou classe social. Embora nas suas relações mais
intimistas prefiram pessoas do mesmo gênero, o que também é outra característica
do grupo, querem ajudar os outros a sentirem-se como eles mesmos se sentem:
amados, cuidados e queridos. Na realidade não querem crescer, querem
permanecer infantis, e demonstram isso na revolta com os pais, na ostensividade de
suas roupas e pinturas pretas no rosto, nos ambientes que freqüentam em grupos,
como shoppings e igrejas também.
Sendo a igreja uma extensão da sociedade, que reúne famílias e destas
famílias os seus membros, deve considerá-os individualmente, praticando o
exercício do acolhimento a fim de buscar uma alternativa para esta situação, que
passa, em primeiro plano, pela família.
A base para ser cuidada, alimentada e amparada em primeiro plano é a
família, e os indivíduos devem ser aceitos na igreja, quer nesta condição, quer nos
grupos juvenis emos, sendo acompanhados e instruídos na Palavra Transformadora
que é o Evangelho de Cristo. E neste caso, não se trata dos membros do grupo
social “Igreja”, mas dos membros do corpo de Cristo, em um patamar espiritual.
A igreja tem que se renovar, assim como a palavra de Deus se renova a cada
dia; apesar dos modismos, da globalização e do tecnicismo, a palavra de Deus
continua viva e transformadora. Deve-se haver um esforço para minimizar a situação
distorcida de abandono no âmbito da organização social eclesiástica como grupo
constituído, para que se cumpra a Palavra do Mestre, que disse: Eu vim para que
todos tenham vida e vida em abundância” (Jo 10. 10).
Esta afirmação nos faz olhar para todos sem discriminação alguma, quer de
etnia, quer de gênero, quer de preferências sexuais, quer de costumes. “Vim para
83
todos”, em outras palavras, quer dizer: Emos, aqui estou para suprir sua carências,
para entender seu medo do crescimento, suas angústias, seu abandono, sua
rejeição, sua história. E “tenham vida”, vida física, de participação na sociedade, de
aceitação no seio da família, de composição do corpo de Cristo com qualidade. A
expressão “vida em abundância” transpõe o entendimento de vida secular e
transcende o nosso entendimento, é um convite para a vida eterna, abundante,
completa, plena. A igreja enquanto instituição tem o papel de afirmar, através da
comunhão, que é amor, compreensão e aceitação às peculiaridades do indivíduo,
mesmo que suas manifestações sejam aparentemente “contrárias” ao Reino de
Deus.
O outro papel importante é o da escola. O educador pode ser resumido na
assertiva de Paulo Freire, que diz que educar são duas vias, porque na medida que
o educador estabelece contato com o educando, este sujeito nos seus aspectos
sócio-psicológicos, e os detalhes não podem ficar para trás: a história do educando,
seus hábitos atuais, a sua interação com o grupo e a influência recíproca que
entre estes. O educador precisa aprender com seu educando a sua linguagem, os
seus costumes, a sua cultura. Deve entrar no mundo do educando, segurar em sua
mão e percorrer ruas e avenidas, descortinar horizontes, atravessar rios e
montanhas, visitar lugares sombrios e voltar à realidade, resgatando-o fortalecido
com mais uma experiência de vida, mais um aprendizado, porque houve a
identificação não do problema apresentado por seu pupilo, mas sobretudo a
identificação com este, recuperando a sua confiança e integrando-o no processo de
aprendizagem social e escolar.
Por fim, se a sociedade é a soma das instituições definidas e organizadas,
nas suas formas tradicionais e aceitas sem contestação, paralelamente não se pode
duvidar de grupos que o criados, aqueles denominados de o tradicionais.
Muitos destes são temporários, mas de grande influência na sociedade, quer
interagindo com esta, quer rejeitando-a. De qualquer forma, compõem o cenário das
mudanças sociais, resistindo ou promovendo conflitos. A família, a escola, a igreja,
toda a sociedade, ao invés do antagonismo, deve buscar aproximação, o
conhecimento e o aprendizado, pois a cura se processa de forma efetiva a partir
do contato com próximo, no uso do “remédio” que é o amor.
84
REFERÊNCIAS
ALVES, Rubem. Dogmatismo e tolerância. São Paulo: Paulinas, 2002.
BOFF, Leonardo. Igreja, carisma e poder. São Paulo: Record , 2005.
BOURDIEU, Pierre. Escritos de educação. Petrópolis: Vozes, 1998.
BOWLBY, John. Uma base segura: aplicações clínicas da teoria do apego. Porto
Alegre: Artes Médicas, 1989.
CARVALHO, Maria C. Brant.(Org). A família Contemporânea em debate, 7.ed. São
Paulo: Cortez; 2006.
DANTAS, Giscarla P. Infância e abrigamento: proteção integral ou desnatada?
2006. Relato de aula apresentado no Programa de Pós-Graduação do Mestrado em
Psicologia da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFBA Salvador,
2006.
DANTAS, Giscarla P. Possibilidades e limites da brinquedoteca sua utilização
no contexto do desenvolvimento infantil. 2006. 15 f. Artigo apresentado no
Programa de s-Graduação do Mestrado em Psicologia da Faculdade de Filosofia
e Ciências Humanas da UFBA – Salvador, 2006.
DICK, Hilário.Gritos Silenciados, mas evidentes, São Paulo: Loyola, 2003.
______. O Divino no jovem: elementos teologais para a evangelização da cultura
juvenil. Porto Alegre: Instituto de Pastoral de Juventude, [S.l.], 2004.
DOWLING, Colette. Complexo de Cinderela. São Paulo: Melhoramentos, 2002.
EISENSTADT, S. N. De geração a geração. São Paulo: Perspectiva, 1956/1976
(col. Estudos /41).
FRANCO, Vera Lúcia. A psicologia da família. Planeta. São Paulo, n.360, set.2002
FREIRE, Paulo. Educação como prática da liberdade. 2. ed. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1969.
85
______. Pedagogia da Autonomia: Saberes necessários à pratica educativa 35.ed.
São Paulo: Paz e Terra,1996.
______. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.
HAMMES, Lúcio Jorge. Os grupos juvenis e os aprendizados de convivência.
Seminário de Pesquisa em Educação da Região Sul. Curitiba: Pontifícia
Universidade Católica do Paraná, 2004.
KALOUTIAN, Silvio (Org). Família Brasileira: a base de tudo. 7. ed. São Paulo:
Cortez; Brasília,DF: Unicef, 2005.
MORIN, E. Jesus e as estruturas de seu tempo. São Paulo: Paulinas,1982.
PAPALIA, Diane; FELDMAN, Ruth Duskin. Desenvolvimento humano. 8.ed. Porto
Alegre: Artmed, 2006. 888p.
PERROT, Michelle. A juventude operária da oficina à fábrica. In: LEVI, Giovanni e
SCHMITT, Jean-Claude (org.). História dos jovens. (trad.: Cláudio Marcondes,
Nilson Moulin e Paulo Neves). o Paulo: Companhia das Letras, 1996. V. 2 ( A
época Contemporânea), p. 82-136.
RIZZO, Sergio. E a família, como vai? Educação. São Paulo: [S.n.], 1998.
STRECK, Valburga; SCHMIEDT, H.; SCHNEIDE, Christoph. Imagens da Família:
dinâmica, conflitos e terapia do processo familiar. São Leopoldo: Sinodal, 1996.
86
APÊNDICE- A
QUESTIONÁRIO
Dados de identificação
1 - Sexo:
Masc.
Fem.
2 – Faixa etária: _____________________________________________
3 – Qual seu nível de escolaridade? _____________________________
Caracterização de grupo
1 – Participa de algum grupo?
Sim
Não
2 - Há quanto tempo? _________________________________________
3 – Desenvolve alguma liderança no grupo?
Sim
Não
87
4 – Quais as razões que o levaram a participar do grupo?
Problemas familiares
Influência de amigos
Outros Motivos
5 – Você se sente acolhido no grupo?
Sim
Não
6 – Você se relaciona bem com as pessoas que não fazem parte do seu grupo?
Sim
Não
7 – Como você caracteriza sua relação com sua família?
Excelente
Boa
Razoável
Ruim
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo