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FUNDAÇÃO EDSON QUEIROZ
UNIVERSIDADE DE FORTALEZA – UNIFOR
CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS (CCJ)
MESTRADO EM DIREITO CONSTITUCIONAL
CONSTITUIÇÃO FEDERAL E GARANTIA DEMOCRÁTICA:
CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DA COISA
JULGADA
MARIA FERNANDA BRITO DO AMARAL
FORTALEZA
2006
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MARIA FERNANDA BRITO DO AMARAL
CONSTITUIÇÃO FEDERAL E GARANTIA DEMOCRÁTICA:
CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DA COISA
JULGADA
Dissertação apresentada ao Curso de
Mestrado em Direito da Universidade de
Fortaleza UNIFOR, para obtenção do grau
de Mestre em Direito sob a orientação do
professor Martônio Mont’ Alverne Barreto
Lima.
Área de Concentração: Teoria da Democracia
FORTALEZA
2006
2
I
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UNIVERSIDADE DE FORTALEZA – UNIFOR
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO
MESTRADO EM DIREITO CONSTITUCIONAL
DISSERTAÇÃO
CONSTITUIÇÃO FEDERAL E GARANTIA DEMOCRATICA:
CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DA COISA
JULGADA
DE
MARIA FERNANDA BRITO DO AMARAL
Dissertação aprovada em___/___/______
Nota_______________________________
BANCA EXAMINADORA
__________________________________________________
Martônio Mont’ Alverne Barreto Lima (Orientador)
Professor Doutor, Universidade de Fortaleza
__________________________________________________
Professor Doutor, Universidade de Fortaleza
__________________________________________________
Professor Doutor, Universidade
3
II
A finalidade da justiça consiste em
estabelecer uma igualdade
fundamental nas relações entre os
homens. E exigir que essa igualdade
seja restabelecida, quando violada,
“Justo é o igual e injusto é o desigual”.
(São Tomás de Aquino).
4
III
À minha mãe, Iracema Feitosa de Brito
Fernandes, exemplo de mãe, pelo
amor incondicional que dedica á
família e por ter a sabedoria de sempre
me conduzir pelos melhores caminhos.
Ao meu pai, Francisco Fernandes da
Silva, (in memorian), com profundas
saudades.
Ao meu marido, João Pereira do
Amaral, presente de DEUS à minha
vida.
Aos meus filhos, Fernando, Fabrício,
Fábio, Fabíola e Fagner, pelo carinho,
dedicação e compreensão.
Aos meus irmãos, Ary, Vilma, Defrísio,
Deusimar, Margarete, Carlos Brito,
Paulo Júnio e Aglaídes, pelo carinho e
amizade incondicionais.
5
IV
AGRADECIMENTOS
Ao meu orientador, Dr. Martônio Mont’ Alverne Barreto Lima, por possuir o dom
de despertar nos alunos o interesse pelo estudo e pesquisa e pela excelente
orientação na elaboração deste trabalho.
Ao meu marido, João Pereira do Amaral, pela paciência, dedicação e compreensão
pelas horas de convívio roubadas.
Aos professores, Dr. José de Albuquerque Rocha, Dr. Arnaldo Vasconcelos, Dr.
Carlos Roberto Martins Rodrigues, Dr. Gunther Maluschke, Dr. José Filomeno de
Moraes Filho, Dr. Newton de Menezes Albuquerque e Dr. Paulo Antonio de Menezes
Albuquerque, pelos preciosos conhecimentos repassados.
Aos funcionários, da Secretaria do Curso de Mestrado, em Direito Constitucional,
Rosa Virgínia Batista Ximenes e Luiz Carlos Ribeiro Oliveira, pela colaboração
administrativa.
Ao meu grande amigo Nelson Nery Costa estudioso, pesquisador e doutrinador
pelas primeiras orientações na escolha do tema.
Ao meu lindo filho FABRÍCIO BRITO DO AMARAL, pelo auxílio nos trabalhos de
digitação.
E a Todos aqueles que, de alguma forma, contribuíram para a concretização deste
trabalho.
O MEU MUITO OBRIGADA!
6
V
RESUMO
AMARAL, Maria Fernanda Brito do. Constituição Federal e garantia democrática:
Controle de constitucionalidade da coisa julgada. Fortaleza, 2006. 158 p.
Dissertação ( Mestrado em Direito Constitucional) Universidade de Fortaleza,
2006.
A Coisa julgada pode ser observada sob dois aspectos: a coisa julgada material e a
coisa julgada formal ou preclusão. Para o novo Código de Processo Civil a coisa
julgada material é a eficácia que torna imutável e indiscutível a sentença, não mais
sujeita a recurso, ordinário, ou extraordinário. Coisa julgada formal é a imutabilidade,
no processo, do que foi decidido. A coisa julgada pode ser inconstitucional, ilegal ou
injusta desde que dissonante, respectivamente, da Constituição, de Lei
infraconstitucional ou dos Princípios Gerais do Direito. O judiciário, nas últimas
décadas, tem se deparado com soluções antagônicas em processos iguais, sem
nada poder fazer, dado o mito da coisa julgada irreformável. Assim, a presente
pesquisa objetiva analisar o instituto da coisa julgada inconstitucional, ilegal e ou
injusta, buscando subsídios na doutrina e na jurisprudência a fim de trazer, a lume,
o debate acerca destas questões tão importantes para a consolidação do Estado
Democrático de Direito. O Estudo se configura como revisão de literatura de caráter
evolutivo, indo da evolução histórica da coisa julgada, passando pelo controle de
constitucionalidade das leis e atos normativos do qual faz parte a coisa julgada,
pelos limites subjetivos e objetivos da coisa julgada, pela autoridade da coisa julgada
sob o ponto de vista de diversos doutrinadores, pelas teorias da coisa julgada, pela
sua impugnação e pela necessidade de relativizá-la, em casos, indubitavelmente
injustos, com propostas de novos dispositivos, contribuindo, assim, para o
aprimoramento do sistema jurídico e a vitória da paz e da justiça social.
Palavras-chave: Direito constitucional; coisa julgada; controle de
constitucionalidade
7
VI
ABSTRACT
AMARAL, Maria Fernanda Brito do. Constituição Federal e garantia democrática:
Controle de constitucionalidade da coisa julgada. Fortaleza, 2006. 158 p.
Dissertação ( Mestrado em Direito Constitucional) Universidade de Fortaleza,
2006.
The decided cases can be observed under two aspects: the material judged cases
and the formal judged cases or preclusion. For the new Civil Code action the material
judged cases is the effectiveness that becomes the sentence invariant and
unquestionable, no more subject of resource, ordinary, or extraordinary. Formal
judged cases is the immutability, in the process, of what has been decided. The
judged cases can be unconstitutional, illegal or unjust when incompatible,
respectively, with the Constitution, infraconstitutional Law or the General Principles of
the Law. The judiciary one, in the last decades, has faced some antagonistic
solutions in equal processes, not being able to do anything, because of the myth of
the invariant and unquestionable judged cases. Thus, the present research´s
objective is to analyze the institute of the unconstitutional, illegal and or unjust judged
cases, searching subsidies in the doctrine and the jurisprudence in order to bring up
the debate about these so important questions for the consolidation of the
Democratic State of Law. This study is configured as revision of literature in evolving
ways , going from the historical evolution of the judged cases, passing by the
constitutionality control of the laws and normative acts of which the judged cases are
part, the subjective and objective limits of the judged cases, the authority of the
judged cases under the point of view of diverse doctrine writers, to the theories of the
judged cases, for its impugnation and the necessity to relativize it, in unjust cases
with no doubt, with proposals of new devices, contributing, thus, for the improvement
of the legal system and the victory of the peace and social justice.
KEY-WORDS: Constitutional law; judged cases; constitutional control
8
VII
SUMÁRIO
RESUMO
ABSTRACT
INTRODUÇÃO ................................................................................. 12
CAPÍTULO 1
HISTÓRIA DA COISA JULGADA
1 INTRODUÇÃO .............................................................................. 19
2 DESENVOLVIMENTO ................................................................. 21
2.1 COISA JULGADA NO PERÍODO ANTERIOR ÁS NORMAS
POSITIVADAS ............................................................................................ 21
2.2 DIREITO CIVIL ROMANO .......................................................................... 22
2.3 DIREITO PROCESSUAL CIVIL ROMANO E COISA JULGADA ............. 24
2.3.1 O PROCESSO DAS LEGIS ACTIONES .................................................. 25
2.3.2 O PROCESSO FORMULAR ..................................................................... 28
2.3.3 O PROCESSO EXTRAORDINÁRIO ........................................................ 29
2.4 RECURSOS E COISA JULGADA NO PROCESSO CIVIL ROMANO ........ 31
2.5 DIREITO PROCESSUAL CIVIL BRASILEIRO .......................................... 32
2.6 COISA JULGADA E O NOVO CÓDIGO CIVIL ........................................... 36
3 CONCLUSÃO ............................................................................... 38
CAPÍTULO 2
CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE E COISA JULGADA
1 INTRODUÇÃO .............................................................................. 40
2 DESENVOLVIMENTO ............................................................................... 51
2.1 CONTROLE CONSTITUCIONAL SOBRE O ORDENAMENTO JURÍDICO
PREEXISTENTE ...................................................................................... 51
2.2 TEORIA DA REVOGAÇÂO ...................................................................... 52
2.3 TEORIA DA RECEPÇÃO ......................................................................... 52
2.4 TEORIA DA REPRISTINAÇÃO ............................................................. 53
9
VIII
2.5 TEORIA DA DESCONSTITUCIONALIZAÇÃO ......................................... 54
2.6 AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE GENÉRICA ................. 55
2.7 AÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO ......................... 60
2.8 MANDADO DE INJUNÇÃO ........................................................................ 63
2.9 REPRESENTAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE INTERVENTIVA ... 64
2.10 ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL 66
2.10.1 PRECEITO FUNDAMENTAL .................................................................. 67
2.10.2 COMPETÊNCIA ..................................................................................... 69
2.10.3 LEGITIMAÇÃO ...................................................................................... 69
2.10.4 MODALIDADE DE ARGUIÇÃO ............................................................. 70
2.10.5 PRINCÍPIO DA SUBSIDIARIEDADE .................................................... 70
2.10.6 PROCEDIMENTO .................................................................................. 72
2.11 CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DA COISA JULGADA NO
DIREITO PORTUGUÊS ........................................................................... 74
2.12 CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DA COISA JULGADA
NOS ESTADOS UNIDOS ....................................................................... 75
3 CONCLUSÃO .............................................................................................. 76
CAPÍTULO 3
LIMITES À COISA JULGADA
1 INTRODUÇÃO .............................................................................. 78
2 DESENVOLVIMENTO .................................................................. 79
2.1 COISA JULGADA MATERIAL .................................................................... 79
2.2 COISA JULGADA FORMAL ...................................................................... 80
2.3 LIMITES OBJETIVOS DA COISA JULGADA ............................................ 80
2.4 LIMITES SUBJETIVOS DA COISA JULGADA ........................................... 83
2.5 O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E A COISA JULGADA ...... 84
3 CONCLUSÃO ............................................................................... 87
CAPÍTULO 4
AUTORIDADE DA COISA JULGADA
1 INTRODUÇÃO .............................................................................. 89
2 DESENVOLVIMENTO .................................................................. 91
2.1 TEORIA DA VONTADE DO ESTADO ........................................................ 91
2.2 TEORIA DA PRESUNÇÃO DA VERDADE ................................................ 91
2.3 TEORIA DA FICÇÃO DA VERDADE .......................................................... 92
2.4 TEORIA DE CARNELUTTI ......................................................................... 92
2.5 TEORIA DE LIEBMAN ................................................................................ 93
2.6 TEORIA DA EFICÁCIA DA DECLARAÇÃO ............................................... 94
2.7 TEORIA DA EXTINÇÃO DA OBRIGAÇÃO JURISDICIONAL ................... 94
2.8 TEORIA DA FORÇA, LEGAL, SUBSTANCIAL DA SENTENÇA ............... 95
3 CONCLUSÃO ............................................................................... 96
10
IX
CAPÍTULO 5
IMPUGNAÇÃO DA COISA JULGADA INCONSTITUCIONAL E
INSTRUMENTOS DE CONTROLE
1 INTRODUÇÃO ............................................................................. 98
2 DESENVOLVIMENTO ................................................................. 101
2.1 INSTRUMENTOS DE IMPUGNAÇÃO DA COISA JULGADA PELO
PODER JUDICIÁRIO ................................................................................ 101
2.1.1 AÇÃO RESCISÓRIA ............................................................................... 101
2.1.2 QUERELA NULITTATIS ......................................................................... 102
2.1.3 EMBARGOS À EXECUÇÃO ................................................................... 104
2.1.4 OUTROS MEIOS DE IMPUGNAÇÃO PELO JUDICIÁRIO ..................... 106
2.2 INSTRUMENTOS DE IMPUGNAÇÃO DA COISA JULGADA PELO
PODER EXECUTIVO ................................................................................ 107
2.2.1 COMUTAÇÃO DE PENAS ..................................................................... 107
2.2.2 GRAÇA .................................................................................................. 107
2.2.3 INDULTO ................................................................................................ 108
2.3 INSTRUMENTOS DE IMPUGNAÇÃO DA COISA JULGADA PELO
PODER LEGISLATIVO ............................................................................. 109
2.3.1 RETROATIVIDADE DA LEI PENAL IN MELLIUS .................................. 109
2.3.2 ANISTIA .................................................................................................. 110
3 CONCLUSÃO .............................................................................. 112
CAPÍTULO 6
POSIÇÃO DOUTRINÁRIA QUANTO À RELATIVIZAÇÃO DA COISA
JULGADA
1 INTRODUÇÃO ............................................................................. 114
2 DESENVOLVIMENTO ................................................................. 118
2.1 DA INTERPRETAÇÃO DA DOUTRINA ................................................... 118
2.1.1 POSIÇÃO DE DELGADO ........................................................................ 118
2.1.2 POSIÇÃO DE THEODORO JÚNIOR E FARIA ...................................... 119
2.1.3 POSIÇÃO DE OTERO ............................................................................ 120
2.1.4 POSIÇÃO DE NASCIMENTO ................................................................ 120
2.1.5 POSIÇAO DE DINAMARCO ................................................................... 122
2.1.6 POSIÇÃO DE LIMA ................................................................................ 124
2.1.7 POSIÇÃO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E DO SUPREMO
TRIBUNAL FEDERAL ............................................................................. 125
2.2 PROPOSTA DE LEGE FERENDA ............................................................ 128
3 CONCLUSÃO ............................................................................. 132
CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................ 133
11
X
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................... 139
TEXTOS LEGAIS ........................................................................... 149
DOCUMENTOS .............................................................................. 150
ANEXOS ......................................................................................... 153
A – Proposta de alterações do texto do Código de Processo Civil –
Sugestão de lege ferenda de Paulo Roberto de Oliveira Lima. In:
Contribuição à teoria da coisa julgada. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais,1997. ............................................................................ 154
B – Instituição da Ação Revisional da Coisa Julgada –
Sugestão de lege ferenda, de Paulo Roberto de Oliveira Lima. In:
Contribuição à teoria da coisa julgada. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais,1997. ............................................................................ 157
12
XI
INTRODUÇÃO
Sempre me incomodou o fato de haver sentenças desiguais para casos
iguais. Conversando com pessoas simples que nada entendiam de Direito, mas,
entendiam o significado de justiça, verifiquei quão magoada as pessoas e seus
familiares ficavam quando amigos, vizinhos e ou conhecidos tinham direitos
reconhecidos pelo judiciário, enquanto eles, em situações iguais, com o mesmo tipo
de problema tinham seus direitos negados, simplesmente porque o juiz que julgou o
seu processo interpretou a lei diferentemente do outro juiz.
Quando tentavam entender e perguntavam ao advogado por que não tentar
novamente com um outro juiz, este lhes respondia que, como o processo havia
transitado por todas as instâncias, se fez coisa julgada, não havia mais
possibilidades de entrar com outro processo que tivesse o mesmo objeto, a mesma
causa de pedir, e as mesmas partes, pois a Constituição não permitia. Inúmeras
vezes, as pessoas respondiam: pois esta Constituição está errada. Como é que não
se permite corrigir uma injustiça? Esta Constituição tem que mudar!
Observei que muitos colegas do antigo INAMPS (Instituto Nacional de
Assistência Médica da Previdência Social), em situações idênticas aos do
INSS(Instituto Nacional de Seguro Social) tinham seus direitos preteridos e
amargavam a tristeza de ver os colegas oriundos da mesma repartição,
INPS(Instituto Nacional de Previdência Social) em situações idênticas de admissão
no Serviço Público, com o mesmo tempo de serviço e grau de instrução - eram todos
Agentes Administrativos, apenas alguns foram designados a atender na área de
saúde e outros ficaram na área de seguro social - receber o que a União lhes devia
enquanto eles se sentiam caloteados, sem nada poderem fazer. Ficavam descrentes
da justiça dos homens, desmotivados para o trabalho e, muitas vezes, a para a
vida.
Observei, inclusive, que colegas do próprio INSS com todos os pressupostos
processuais iguais, o mesmo advogado, mas para o processo não ficar muito
volumoso, com muita gente, dificultando os cálculos, foi dividido em dois, seguindo
13
rumos iguais, mas, com juízes diferentes. Uma parte ganhou em todas as instâncias,
o INSS recorreu, mas, eles saíram vencedores, recebendo as diferenças salariais e
tendo o seu salário corrigido enquanto os outros, do processo que tramitava em
paralelo tiveram sentença final negando as suas pretensões, ficando em total
desespero pela injustiça da derrota.
Para citar outras repartições Públicas, na Universidade Federal do Piauí,
processos com reivindicações iguais julgados por juízes diferentes, tiveram,
também, decisões contraditórias entre si. Colegas professores em idênticas
condições têm salários superiores em até 84% (oitenta e quatro por cento) a mais do
que os outros que perderam a demanda judicial, causando um enorme
constrangimento para estes e para o próprio judiciário que vem produzindo decisões
contraditórias entre si, que, entretanto, estão protegidas pelo dogma da coisa
julgada.
Dirigindo o INSS, no cargo de Superintendente Estadual, vi inúmeras
injustiças acontecerem com a própria Autarquia, condenando-a a pagar milhões de
reais de forma injusta, sem que a Procuradoria Jurídica do Órgão nada mais
pudesse fazer porque a sentença havia transitado em julgado, não cabendo nem
mesmo ação rescisória.
Através de notícias de rádios, jornais e televisões e, até mesmo bem próximo
de mim, na minha cidade, no meu bairro, e até mesmo na minha família vi exemplos
de sentenças, completamente injustas, onde pessoas ficavam completamente
desesperadas por terem que pagar por algo que não deviam. Uma das vezes, logo
após ser dada a sentença e, a juíza não ter aceito reconsiderar o pedido, tendo o
processo subido à instância superior, a mesma verificou que tinha incorrido num
profundo erro no seu julgado e, simplesmente falou: - Não se preocupe, é para isto
que existe o duplo grau de jurisdição. O processo tramitou em todas as instâncias
tendo passado 05(cinco) anos no Tribunal Regional Federal, sendo 05(cinco) anos
sofridos e mal dormidos, e voltou com a sentença inicial mantida.
A toda hora, veiculam-se casos de pessoas, pedindo milhões de indenização
para o Estado, por erro judiciário, o Estado tendo que, mais cedo ou mais tarde,
onerar os seus cofres para pagar por erro do Judiciário; inocentes que foram para a
14
prisão; condenados pelo o que nunca nem pensaram em fazer; famílias inteiras
destruídas, sem perspectivas de progresso porque foram terrivelmente injustiçadas.
E isso são apenas os casos dos quais se ouve falar, mas, com certeza outros
existem que ficam no anonimato, principalmente aqueles que envolvem pessoas
extremamente humildes sem dinheiro e sem um amigo influente, que totalizam cerca
de 95% da população brasileira. Tudo isso porque não existe um controle de
constitucionalidade dos atos do Judiciário.
No que se refere às relações privadas, muitas são as injustiças ocorridas,
principalmente nos casos de investigação de paternidade. Muitas eram as sentenças
com decisões negativas, por insuficiência de provas e, transitadas em julgado,
que não podiam mais ser rescindidas, eternizando, assim, a dúvida, a angústia e o
sofrimento moral da família e da criança quanto ao verdadeiro estado de filiação.
Com o progresso dos estudos científicos, os exames de DNA surgiram. Mas,
a extrema pobreza de alguns e o óbice da coisa julgada continuavam deixando à
mingua os filhos que desejavam ter a sua paternidade reconhecida. A doutrina,
baseada no princípio da verdade real, defendia uma nova investigação de
paternidade. A jurisprudência veio em seu socorro e hoje é admissível uma
segunda investigação, baseada em exames de DNA, para os casos, anteriormente,
negados.
Todavia, em muitos casos, a coisa julgada ofende, não somente o princípio da
verdade real, mas também, o valor justiça e aa própria Constituição. Assim, neste
panorama, é que surgiu a motivação para que eu estudasse a coisa julgada. Achei
extremamente relevante, para mim e para a sociedade, entender porque estas
coisas acontecem.
Achei que também era relevante atiçar a discussão sobre a inexistência de
mecanismos de controle de constitucionalidade dos atos do judiciário, principalmente
da coisa julgada injusta que fere de morte a Constituição do Brasil e os valores
supremos da igualdade e da justiça.
Queria conhecer por que aconteciam estes estados de injustiça, se havia ou
poderia haver algum remédio que curasse esta disfunção do organismo judiciário na
aplicação do direito aos casos concretos, por que estas injustiças tinham a tutela do
15
judiciário e do próprio Estado. O que se poderia fazer para corrigir tão graves
distorções que feriam a finalidade maior do direito que é a justiça.
Pensei em inicialmente estudar a história da coisa julgada, como surgiu,
para melhor compreender o seu presente e, quem sabe, até oferecer sugestões para
o futuro. Estudei, em seguida, os mecanismos de controle de constitucionalidade
para verificar se havia algum tipo de controle dos atos do judiciário.
Impressionada com a força da coisa julgada, resolvi investigar qual a origem
desta força e quais os seus limites. Seria o fato de o Inciso XXXVI, do art.5º, da
Constituição Federal/88, que diz que “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato
jurídico perfeito e a coisa julgada” estar sendo interpretado erroneamente ou visto
como um valor absoluto imodificável? Ou de estar sendo interpretado
extensivamente e tendo uma dimensão maior do que a que o legislador constituinte
quis dar? Estudei, então, os seus limites subjetivos e objetivos e as teorias que
falam sobre a sua autoridade.
A seguir resolvi verificar se havia algum instrumento de relativização a ser
aplicado pelos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário que pudesse impugnar a
coisa julgada e qual a opinião da doutrina sobre esta relativização.
Coisa julgada é o caso concreto submetido à apreciação do Estado Juiz,
julgado o rito, em estrita obediência as normas positivadas, tanto materiais
quanto processuais e da qual não caiba mais nenhum tipo de recurso por preclusão
ou por ter percorrido todas as instâncias processuais.
Várias são as controvérsias que envolvem a coisa julgada como:
a coisa julgada é intocável?
a coisa julgada inconstitucional deve prevalecer?
devem permanecer intocáveis as decisões que ferem os princípios
constitucionais da legalidade, da moralidade e até mesmo às atentatórias ao
texto constitucional?
como fica a questão primordial da aplicação da justiça ao caso concreto?
16
a segurança jurídica em face do poder do Estado deve ser imutável?
a coisa julgada intocável é um instrumento de pacificação social?
a coisa julgada deve ser eternizada sob pena de eternizar-se o conflito?
a coisa julgada deve ser relativizada?
É objetivo desta dissertação buscar subsídios na doutrina e na jurisprudência,
trazendo à lume o debate acerca destas questões, investigando os limites objetivos
e subjetivos da coisa julgada, os principais instrumentos de controle, o fenômeno da
coisa julgada inconstitucional e o descompasso com os princípios constitucionais e
com o Estado Democrático de Direito, as sentenças inconstitucionais, ilegais,
injustas e a proposta de alguns doutrinadores sobre a relativização da coisa julgada.
Estudar qual o alcance do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal com o fim
de descobrir se a coisa julgada é garantia individual imodificável ou Cláusula Pétrea,
por exemplo.
Pretendo, portanto, estudar a coisa julgada, no âmbito material e processual,
com a finalidade de mostrar, pari passu, a afronta ao direito constitucional de alguns
julgados. Pretendo, ainda, ativar a reflexão e o debate sobre a necessidade de
revisão das sentenças injustas, ilegais e, ou inconstitucionais e a necessidade de
controle de constitucionalidade dos atos do Judiciário.
O primeiro capítulo da presente exposição, versará sobre a história da coisa
julgada no âmbito material e processual, dos primórdios aos nossos dias, com a
intenção de mostrar, como se proliferou e solidificou-se, o dogma da coisa julgada.
O segundo capítulo aborda o controle de constitucionalidade no Brasil, os
tipos de inconstitucionalidades, o controle de constitucionalidade sobre o
ordenamento jurídico preexistente, as teorias da revogação, da recepção,
repristinação e desconstitucionalização, a ação direta de inconstitucionalidade
genérica, a ação de inconstitucionalidade por omissão, a representação de
inconstitucionalidade interventiva, a argüição de descumprimento de preceito
fundamental, fazendo sempre referência ao controle de constitucionalidade da coisa
17
julgada e, ainda, o controle de constitucionalidade em Portugal e nos Estados
Unidos, para termos uma visão deste instituto em outros ordenamentos jurídicos.
O terceiro capítulo versa sobre os limites da coisa julgada, mostrando que
esta não é absolutamente imune se não estiver conforme as regras contidas no
Código de Processo Civil. Os limites objetivos são fixados e formados na parte
dispositiva da sentença, nos limites do pedido. Os limites subjetivos da coisa
julgada estão definidos no art. 472, do Código de Processo Civil. Aborda também, o
estudo da coisa julgada sob a ótica do Código de Defesa do Consumidor.
O quarto capítulo discorre sobre a opinião de alguns doutrinadores acerca da
autoridade da coisa julgada, os fundamentos políticos e jurídicos que justificam essa
autoridade.
O quinto capítulo versa sobre a impugnação da coisa julgada inconstitucional
e instrumentos de controle como: a Medida Provisória 2.180-35/2001 incorporada ao
art.741, do CPC (Código de Processo Civil) que admite a argüição de
inconstitucionalidade, da sentença exeqüenda, em sede de embargos à execução,
através dos embargos do devedor na execução por título judicial. Versa, ainda,
sobre a admissibilidade da ação rescisória, da querela nulitatis e de outros meios de
impugnação do Executivo do Legislativo e do Judiciário.
O sexto capítulo mostra a posição doutrinária de José Augusto Delgado,
Humberto Teodoro Júnior, Juliana Cordeiro de Faria, Paulo Otero, Carlos Valder do
Nascimento, Cândido Rangel Dinamarco, Paulo Roberto de Oliveira Lima e a
posição do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal, além de
apresentar algumas propostas de lege ferenda sobre a relativização da coisa
julgada.
A seguir, e apesar de apresentar conclusões acerca de cada capítulo, faço
algumas considerações finais, fruto do estudo e análise de toda a problemática que
envolve o assunto e, dos aspectos jurídicos e políticos que envolvem a coisa
julgada.
A intenção foi contribuir para a reflexão da afronta ao direito constitucional de
alguns julgados, sobre a eternização dos estados de injustiça e, sobre a
18
necessidade de aplicação da justiça ao caso concreto, mostrando a minha opinião
sobre a importância da relativização de alguns julgados, e, a necessidade de
controle de constitucionalidade dos atos do Judiciário como condição essencial à
manutenção da justiça e do Estado Democrático de Direito. Mostrando, ainda, que a
impugnação da coisa julgada inconstitucional, ilegal, e, ou injusta, não ofende o
instituto da coisa julgada nem atenta contra o princípio da segurança jurídica.
19
CAPÍTULO 1
HISTÓRIA DA COISA JULGADA
1 INTRODUÇÃO
Tendo em vista a importância de conhecer-se o contexto onde as coisas
aconteceram para que se possa avaliar melhor o presente e oferecer sugestões para
o futuro, costuma-se estudar a história das coisas, como elas aconteceram, qual o
cenário e os fatores que interferiram para que as coisas acontecessem daquele
modo.
Com a coisa julgada não poderia ser diferente. Pretende-se estudar este
instituto, do seu surgimento aos nossos dias, para que se possa entender melhor
qual a sua força, que fatores podem influenciá-la e como se solidificou o dogma da
coisa julgada.
Para compreender o status da coisa julgada atualmente, é necessário
lembrar que a Constituição Federal em seu art. 5º, inciso XXXVI, afirma que “a lei
não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”,
colocando-a entre as cláusulas pétreas constitucionais. Todavia, o alcance deste
dispositivo, será discutido com mais profundidade e sob a ótica de vários
doutrinadores no capítulo sexto da presente obra.
Para melhor entendimento da história da coisa julgada, é necessário que se
discorra sobre a coisa julgada no período anterior às normas positivadas e, sobre o
direito processual civil romano por ter, o direito brasileiro, fortes raízes romanas e
base nas suas instituições jurídicas, tendo em vista que nenhum povo da
antiguidade teve um ordenamento jurídico tão completo e tão sistematizado,
constituindo-se num verdadeiro laboratório da ciência jurídica.
20
Discorre-se também sobre o direito processual civil brasileiro, que é básico
para a compreensão da coisa julgada. Todavia, a ênfase será dada sempre aos
aspectos constitucionais.
No período romano, o direito vigorou por 12 séculos, tinha caráter
basicamente privado e como base o corpus juris civilis. O direito público era
praticamente inexistente. E como o direito romano e o direito processual civil romano
têm íntima correlação com o direito brasileiro, com o processo civil brasileiro e em
particular, com a história da coisa julgada, resolvi discorrer sobre o assunto nesta
ordem.
21
2 DESENVOLVIMENTO
2.1 COISA JULGADA NO PERÍODO ANTERIOR ÀS NORMAS POSITIVADAS
Dos primórdios do regime monárquico, até a fase da implantação da
República, os julgamentos eram feitos pelos reis, que também eram magistrados e
juízes e aplicavam a justiça civil. A autoridade deles era legitimada pelo povo que os
considerava seres divinos, homens escolhidos por Deus para dirigirem os súditos.
Suas vontades e decisões eram obedecidas cegamente e tinham força de lei, pois a
sociedade e a cultura eram marcadas pela vigência de um credo religioso e pela fé.
O direito não era ainda positivado, mas era concebido como um conjunto de
normas costumeiras morais e imutáveis. O homem tinha como princípio maior, fazer
o bem e evitar o mal e tinha também deveres para consigo mesmo, para com a
família, com a busca da verdade e com a sociedade, no sentido de praticar justiça,
dando, a cada um, o que é seu. Os desvios de comportamento eram punidos de
acordo com as regras estabelecidas para aquele sistema de governo.
Para que os homens pudessem viver em comunidade, sem conflito, um
respeitando o direito do outro, foi necessário a criação de normas de comportamento
que deveriam ser obedecidas, evitando-se a justiça de mão própria e que o mais
forte ou o mais poderoso sufocasse o mais fraco, isto é, o hipossuficiente.
Acreditavam que as normas iniciais eram determinadas por um ser supremo,
misterioso onipotente e onipresente para punir os erros e desvios de conduta dos
seres humanos.
Acreditavam que os dirigentes escolhidos eram selecionados com a ajuda
divina, para dirigir os destinos daquele povo. Mesmo quando existiam desvios como
a tirania, muitos acreditavam que eram desígnios divinos e o povo submetia-se
muitas vezes, até mesmo à escravidão.
A forma de governo poderia ser livremente escolhida por eles, mas uma vez
escolhida, teriam que submeter-se a ela. Tendo em vista que o estado de natureza
era deficiente, necessário se fazia, instaurar um governo civil ou político estruturado
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em três poderes, cujas funções seriam gerenciar áreas específicas. No segundo
estágio, esta situação evoluiu para a criação de leis e de poderes que funcionassem
de forma harmônica e independente em prol do bem-estar comum.
Hobbes (2003), ao descrever a criação do Estado, compara-o ao Leviatã, em
referência a Jo. 41; ao super-poder do monstro marinho numa metáfora ao poder do
Estado soberano. Descreve também, o preço pago pelos seres humanos para que
possam viver em segurança e coexistir, em paz. Para ele, o acordo não é feito entre
o povo e o soberano, como nas teses de Rousseau e Locke, mas entre povo e povo.
Montesquieu (1998), na sua obra O Espírito das Leis, ensina como evitar a
concentração de poder, como dividi-lo para que haja lei de verdade, ajustada ao
espírito das leis e ao espírito nacional. Até porque toda concentração de poder pode
levar à tirania e o excesso de democracia levar à anarquia.
No direito privado, vários institutos prevalecem até hoje e fazem parte de
nosso ordenamento, com poucas e, às vezes, nenhuma alteração, como os
contratos de compra e venda, o comodato, o tuo, o depósito a hipoteca e o
penhor.
2.2 DIREITO CIVIL ROMANO
Direito Romano é o conjunto de regras que vigoraram em Roma desde a sua
fundação até a morte do imperador Justiniano. Disciplinava, na antiguidade, o
comportamento do povo romano nas suas relações interpessoais e nas suas
relações com outros povos. Este direito exerceu enorme influência na criação do
direito das nações civilizadas dos nossos dias principalmente na esfera civil.
Na Escócia e na África, o direito romano era aplicado até bem pouco tempo
na sua quase integralidade e o direito comparado, até hoje, tem como alicerce o
direito romano. Foram os romanos exímios técnicos na arte de interpretação do
direito, podendo ser considerados verdadeiros mestres. O direito romano é dividido
em períodos, de acordo com critérios como o político, o conteúdo das normas ou a
criação de institutos jurídicos em: Realeza, período Bizantino, República, Alto
Império e Baixo Império.
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Para os romanos, o direito dividia-se entre público e privado, tendo o primeiro
a função de organizar o Estado e o segundo a de regulamentar as relações do
interesse de particulares. Cretella Júnior (1971:18) diz que, colocando-se em um
ângulo objetivo e dentro do espírito do direito romano, chegou à seguinte definição:
“direito é o conjunto das regras de justiça ou de utilidade social relativas à
organização dos poderes públicos, da família e das relações econômicas dos
homens”.
A expressão, “Direito Romano”, era geralmente empregada para designar o
Corpus Juris Civilis, que era o conjunto sistematizado de regras e princípios jurídicos
impostos pelo imperador Justiniano de Constantinopla, no século VI do nosso
tempo, passando a ser estudado na Europa, no século XII, e oficializado na
Alemanha, no século XV. É considerado, até hoje, um monumento jurídico de
extrema importância para a formação do direito em nossos dias tendo, inclusive,
influenciado a redação dos modernos códigos.
O instituto do plebiscito se origina do plebiscito romano que era a consulta à
plebe, proposta por um magistrado plebeu e era considerado fonte do direito. As
leges também de populiscita eram decisões de todos os populus romanus, isto é, de
patrícios e plebeus.
A palavra jurisprudência designava o trabalho interpretativo dos
jurisprudentes ou prudentes que eram os jurisconsultos encarregados de, através da
interpretação, preencher as lacunas das leis, adequando os textos legais às
mudanças do direito vivo. Jurisprudência era sinônimo de Ciência do Direito. É o que
no nosso direito, aproxima-se do que chamamos doutrina. A palavra equidade vem
de aeqüitas e significava que, para casos iguais, devia-se aplicar decisões iguais. A
aeqüitas liga-se ao jus que, por definição é justitia. Quando havia discordância ou
mesmo conflito entre direito e equidade, os romanos se utilizavam de uma técnica
quase perfeita e de uma jurisprudência de extrema sensibilidade para recompor este
equilíbrio entre a rigidez e a impessoalidade do direito e a equidade, que é o
amoldamento ao caso concreto permitindo assim a vitória da aequitas. A lex
classificava-se de vários modos e, entre eles, como imperativas, proibitivas,
permissivas, punitivas, perfeitas, menos que perfeitas e imperfeitas, tal qual nos
nossos dias.
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2.3 DIREITO PROCESSUAL CIVIL ROMANO E COISA JULGADA
Após esta breve digressão sobre o direito romano discorre-se, agora sobre o
processo civil romano, que era o conjunto de regras e procedimentos que os
romanos deveriam seguir para ter o seu direito material aplicado. Era necessário que
se estabelecessem regras tendo em vista que, até aquele momento, os romanos,
bem como os demais povos da antiguidade, faziam justiça com as próprias mãos,
numa fase de vingança privada onde prevalecia a lei do mais forte. O provocador do
dano era punido com o mesmo tipo de agressão e muitas vezes, até com um grau
de maldade bem maior.
Os casos eram julgados pelos próprios envolvidos e o mais forte aplicava
arbitrariamente a sua lei, segundo o seu próprio julgamento. Não havia recurso e o
caso julgado era definitivo. Os distúrbios, as maldades, as injustiças, os abusos
chegaram a tal ponto que os romanos resolveram colocar a cargo do Estado a
resolução de litígios entre particulares.
O estudo do direito civil e do processo civil romano são de extrema
importância para que se entenda o nosso direito civil e processual civil, tendo em
vista a enorme influência exercida por estes no direito dos povos de línguas
neolatinas, como o português, francês, italiano e espanhol. Assim, o estudo dos três
períodos do processo civil romano é condição, sine qua non, para a real
compreensão do processo privado.
O processo civil romano pode ser dividia em 03 períodos: O processo das
ações da lei (legis actiones), o processo formular e o processo extraordinário
que aconteceram nesta mesma seqüência durante os doze séculos em que vigorou
o direito romano.
Durante todo o período clássico na organização judiciária prevalece o
“princípio da divisão da instância ou do processo em duas fases, conhecidas pelos
nomes de jus e judiciem”(CRETTELA JUNIOR, 1971:320). Os litígios eram
apresentados in jure no tribunal e depois apud judiciem, diante de um particular
escolhido por ambos, como uma pessoa idônea e imparcial que julgaria o caso de
acordo com o direito vigente à época. As sentenças deveriam ser obedecidas e
funcionavam a exemplo da arbitragem dos nossos dias, como uma forma de
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desafogar o judiciário. No procedimento legis actiones”, a formalidade era sua
principal característica, entre outras, como ser um processo judiciário e legal.
Todavia, o aspecto formal se ressaltava pelo ritual empregado na solução do
conflito: tanto o autor como o réu, eram obrigados a pronunciar palavras
predeterminadas e, a fazer os gestos adequados sob pena de perderem a causa se
cometessem o mais simples engano. A cada infração formal havia uma pena a ser
aplicada.
No sistema romano, direito e ação eram extremamente conexos. A actio é o
instrumento processual aplicado em defesa do direito. O romano enunciava o direito
muito mais sob o aspecto processual, que era o modo de aplicação do direito ao
caso concreto, do que sob o aspecto material, apresentando-se durante todo o
período clássico como “um sistema de actiones e de meios processuais do que de
direitos subjetivos”. Neste período havia o direito determinador, que era o direito
hoje chamado de material, e o direito sancionador que era o processo, o jus
actionum – formado pelo aparelho judiciário romano e um conjunto ordenado de atos
jurídicos que os particulares deveriam acionar para a efetivação da justiça.
2.3.1 O processo das “legis actiones
As ações da lei eram processos reservados aos cidadãos romanos, chefes de
família, para a execução de um direito ou para a realização de um julgamento.
O nome legis actiones ou ações da lei é questionado por alguns autores
como Cretella Júnior (1971:324) que diz:
“O nome legis actiones vem, segundo GAIO (IV, 2), do fato de serem organizados
pela lei (legis actiones legibus produtae sunt), o que o se entende, porque tais
processos já existiam numa época em que a única fonte do direito era o costume”.
Para Alves, (1983:234), a denominação de ações da lei decorreu do fato de
“as legis actiones se originarem da lei, ou então, da circunstância delas se
conformarem de forma escrita com as palavras da lei”. De haver todo um conjunto
de regras a ser seguido com procedimentos predeterminados, altamente
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formalizados. Apesar do direito ser baseado no costume, o que era acordado tinha
força de lei, devendo ser seguido, religiosamente sob pena de, no caso de qualquer
desvio, ter punições como perda do direito, castigos corporais, prisão e até mesmo a
escravização.
Havia cinco espécies diferentes de legis actiones. A legis actio per
sacramentum, a judicis postulatio e a condictio, que eram ações de conhecimento,
cujas funções eram reconhecer direitos. A manus injectio e a Pignoris capio eram
funções de execução. A legis actio sacramentum funcionava como uma ação geral,
utilizada sempre que o houvesse uma ação específica e poderia ser acionada
contra uma pessoa-sacramento in personam ou contra uma coisa-sacramentum in
rem. O nome sacramentum, segundo a corrente majoritária era devido à formalidade
deste tipo de processo que se iniciava com um juramento religioso, nos quais as
partes juravam que estavam dizendo a verdade, quanto ao seu direito.
Quem sucumbisse no processo daria animais, carneiros, vacas, bois que,
consagrados aos deuses, eram sacrificados publicamente. Também era exigido um
determinado valor, de acordo com o processo que era depositado pelas partes e
quem perdesse, a quantia seria destinado aos cofres do Estado, tipo preparo, para
pagamento das custas judiciais.
Pela Lei das XII Tábuas, o autor da ação devia procurar o réu e, utilizando-se
das palavras adequadas ´´verba certa`` incitá-lo a ir ao tribunal. Se este se
recusasse, o autor podia arranjar testemunhas e prendê-lo. Se este fugisse, sem
abandonar a coisa reivindicada, o autor podia, inclusive, usar a força bruta. Se o réu
fosse de idade avançada ou doente, tinha o direito de ser conduzido por conta do
autor para prestar conta à justiça.
Todo o processo era dirigido pelas partes, cabendo ao vencedor executar a
sentença do Juiz. Em nenhum momento, era admitida a interferência de
representantes. Se o réu negasse, a questão era entregue a um árbitro escolhido
pelas partes e a decisão era homologada pelo Juiz.
A Judicis postulátio era uma ação especial totalmente oposta a actio per
sacramentum, pois não comina pena para o litigante e o judex ou arbiter era
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imediatamente indicado, não necessitando o prazo de 30 dias previsto para a actio
sacramentum. A decisão tomada devia ser imediatamente cumprida.
A condictio era um modo de agir, e significava: aviso, intimação, citação,
notificação. Comporta o prazo de 30 dias e acarreta pena para o litigante, que a
pena era proporcional ao valor da causa e era devida à parte vencedora e não ao
fisco.
A manus injectio era uma função executiva que assegurava o cumprimento
da sentença. Era um apoderamento que consistia no agarramento do devedor para
levá-lo até o magistrado, onde o quantum devido era reclamado oralmente e, caso
não fosse pago em até 60 dias, a contar da manus injectio, o devedor podia ser
morto ou vendido como escravo.
A pignoris capio era também uma ação executiva que assegurava o
cumprimento da sentença, mas, neste caso, o credor apossava-se do penhor sem
autorização preliminar do magistrado e conservava o bem em seu poder a que a
dívida fosse paga.
Concluindo, verifica-se que o processo da legis actio era um processo
extremamente formalista e violento que jamais poderia prevalecer nos nossos dias
por utilizar-se de modus agendi extremamente primitivo com aplicação de penas a
simples infrações formais, mesmo aos mais leves enganos. O magistrado atuava de
forma secundária como um simples assistente do rito processual.
Neste tipo de processo havia preocupação com a coisa julgada. Os
romanos se preocupavam com a estabilidade da coisa julgada não admitindo uma
legis actio que houvesse sido proposta pelas mesmas partes. Era fixada a fase do
processo onde exauria a legis actio, não podendo ser submetido a novo juízo um
processo julgado, mesmo não tendo passado por um árbitro escolhido pelas
partes.
Com a decadência da legis actio, por já se julgar incompatível com o modo de
vida e os novos costumes da sociedade romana, surgiu um novo modus agendi de
dirimir os conflitos entre particulares, chamado de processo formular.
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2.3.2 O processo formular
Era um novo tipo de processo que surgiu no direito romano para diminuir o
rigorismo e a desumanidade do processo anterior. O pretor, usando da equidade,
passava a resolver os casos concretos. Era o Estado intervindo na solução dos
conflitos.
A fórmula era o escrito redigido pelo magistrado “in jure”, indicando a questão
a ser resolvida pelo juiz. As fases do processo formular eram as mesmas das legis
actio: jus e judicium.
Na fase jus as partes compareciam à presença do magistrado, pretor,
representante do Estado que discutia o problema com as partes. O autor expunha a
sua pretensão, provava o seu direito e requeria a fórmula. Era a fase de postulação
ou postulatio. Apresentada a fórmula, sem violência e sem as formalidades e
rigorosidades do processo anterior o réu era notificado. Era a Editio actionis. Se o
réu confessasse, tínhamos a confessio in jure. Se o réu negasse, tínhamos a
infitiatio. Ele podia defender-se, utilizando-se da exceptio, com prova testemunhal,
que influía no julgamento.
Um juiz popular era nomeado e a fórmula para a espécie era redigida. O juiz
ao julgar, ficava preso à fórmula, não podendo afastar-se dela. Celebrava-se assim a
letis contestatio, que era a concordância do autor e réu em submeter a lide nos
termos preconizados pela fórmula à apreciação de um juiz popular. Começava assim
a segunda fase, a apud iudicem na qual o juiz tinha o poder de absolver ou condenar
o réu. A sentença, desde que pronunciada nos moldes da fórmula consagrava a
coisa julgada, res iudicata porque representava a decisão do órgão estatal. Se o juiz
se sentisse inseguro para emitir a sentença, seria substituído.
A sentença condenatória era “em pecúnia”. Se o réu não pagasse, era
emitida uma ordem do pretor autorizando a imissão de posse nos bens do réu.
A coisa julgada, res in iudicium deducta era o estágio final, onde a res foi
indicata e reconhecida ou negada pelo Estado. Na fase in iure, a principal figura era
o pretor.
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Na segunda, in iudicio, a principal figura era o iudex, que aplicava a lei, isto
é, aplicava a fórmula ao caso concreto. Essa coisa julgada tinha autoridade, pois a
sociedade romana precisava estar tranqüila e segura do gozo de seus bens e para
isso era necessário que o Estado garantisse o resultado do processo.
A sentença tanto a condenatória quanto a absolutória tinha força obrigatória
cujo objetivo era consagrar a coisa julgada, a res iudicata. Valia a regra bis de
eadem re me sit actio” que não admitia a elaboração de uma nova fórmula sobre a
mesma lide. A autoridade da coisa julgada não era absoluta e sim relativa, valendo
apenas para a mesma causa e entre as pessoas envolvidas.
2.3.3 O processo extraordinário
O processo civil romano foi, aos poucos, perdendo o seu caráter arbitral. O
magistrado, nesta fase, julgava o processo, sem nenhum formalismo, na qualidade
de representante do Estado. Desapareceu a fase jus e judicium, cessou a justiça
gratuita devendo os litigantes arcar com a custa processual.
Durante o processo, os julgadores afastavam-se, totalmente, das regras
impostas pela antiga ordo e julgavam, livremente, desprezando por completo as
formas tradicionais. Era, pois, um processo extra ordinem, denominado cognitio
extra ordinem ou cognitio extraordinaria ou, ainda, processo extraordinário.
A influência do processo da administração imperial, a decadência dos
magistrados de origem republicana, que aplicavam a fórmula e o encorajamento dos
litigantes pelos imperadores, para a adoção do novo modelo processual, fizeram
com que o processo extraordinário tivesse plena acolhida, primeiro na província,
depois em Roma. Desapareceu a divisão da instância romana e a competência de
lugar e de dia. Uma pessoa acumulava os atributos de magistrado e juiz que, até
aquela época, eram papéis diferentes. O processo deixou de ser desenvolvido na
presença do público e passou a ser mais reservado, assistido apenas pelos,
diretamente interessados. Eram presididos por um juiz, no fórum, num edifício
especial chamado basílica, em quatro paredes, vedadas por uma cortina que se
abria na hora de prolatar a sentença.
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Os processos perdem a sua fase oral e passam a ser escritos, redigidos por
auxiliares da justiça ou por advogados que passam a ser uma classe extremamente
privilegiada, reunidos em corporações e com prerrogativas especiais.
O processo romano vai, paulatinamente, perdendo seu caráter arbitral e
privado pelo desaparecimento do jus e do judicium, ficando um mesmo titular com os
atributos de magistrado e juiz, representantes do Estado e dispostos numa escala
hierárquica.
O processo deixa de ser privatístico e gratuito para ser publicístico e pago
pelos litigantes. Era a fase da cognitio extra ordinem ou processo extraordinário,
porque os julgadores se afastavam das regras da antiga ordem e passavam a
decidir de acordo com uma nova sistemática.
Este tipo de processo teve origem no fato de que os imperadores, desde o
começo do Império, tinham o hábito de julgar, pessoalmente, os processos,
desprezando qualquer norma jurídica em vigor ou qualquer sistemática processual
existente, delegando aos funcionários imperiais o julgamento dos litígios, entre
particulares, que envolvesse a administração imperial. Os cônsules e pretores
especiais, ao aplicarem as reformas imperiais, deliberavam extra ordinem
desprezando, totalmente, as regras do processo formular.
As sentenças tinham força executória, mas delas cabia apelação ao
Imperador, que julgava em qualquer instância, surgindo, assim, os recursos. O
processo extraordinário caminha, assim, para a total estatização.
A coisa julgada, no direito romano, tal como hoje, tem presunção de verdade,
baseada na presunção de que os juízes não erram, ficando acima de qualquer
dúvida a controvérsia resolvida. A sentença tinha real força executória. A autoridade
da coisa julgada era assegurada pela exceptio rei judicatae, que permitia que se
houvesse um outro processo, fosse invocada a sentença anterior, impedindo a
continuidade do mesmo, pois a coisa julgada tinha força de lei.
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2.4 RECURSOS E COISA JULGADA NO PROCESSO CIVIL ROMANO
Apesar de nos primórdios do período republicano não se ter notícia de
recursos para o reexame das decisões proferidas, havia certos meios excepcionais
para atacar a sentença proferida como a intercessio, a revocatio in duplum e a
restitutio in integrum.
No primeiro caso, a intercessio, permitia-se que um magistrado da mesma
categoria vetasse a execução da sentença. No segundo caso, revocatio in duplum”,
o perdedor da ação podia tentar anular a sentença toda. Caso o pedido fosse
negado, teria que pagar o dobro do valor da primeira condenação. No terceiro caso,
restitutio in integrum, o perdedor requeria que as coisas voltassem ao estado
anterior ao processo.
O recurso de apelação com efeito suspensivo foi criado pelos romanos, ainda
no período imperial, para apelar-se da decisão do juiz ou magistrado superior que
redigiu a fórmula, passando-se por todos os níveis judiciários, até chegar ao
imperador que ocupava o ápice da pirâmide.
Alguns processos excepcionais eram fundamentados no imperium do
magistrado (pretor) e entre eles a restitutio in integrum, que colocava o processo in
statum quo ante conforme vimos acima, isto é, ao estado anterior ao julgamento da
lide, anulando todos os efeitos civis provenientes do processo.
A restitutio, pelo choque que podia causar à parte vencedora, era submetida
a regras especiais, podendo ser utilizada em casos de erro, violência, dolo, falta
de idade e perda da capacidade jurídica (capitis deminutio), podendo ser
concedida pelo pretor. O prazo era curtíssimo e era um remédio extremo, que só era
concedido, se não existisse outro meio e após a indagação da cognita causa.
O antigo processo desenvolvido na presença do público, no Tribunal, deu
lugar ao processo desenvolvido apenas entre as partes e os magistrados (juízes
superiores, ordinários e pedâneos). Permaneceu o recurso da apelação. Contra os
juízes superiores que, no início são os imperadores, não havia recurso, pois eles
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decidiam em última instância. Da decisão dos praefecti praetorio também não cabia
recurso, porque eles decidiam vici principis, isto é, em lugar do soberano.
Da decisão dos auxiliares do império, cabia recurso de apelação ao
Imperador. Da decisão dos juízes ordinários e dos pedâneos, encarregados de julgar
os processos menos importantes, também cabia o recurso da apelação às
autoridades superiores e, em última instância, ao Imperador, cuja sentença tinha
força executória.
A coisa julgada, res judicata, tema primordial desta dissertação, neste
período, encerrava uma presunção de verdade. Partia-se do princípio de que os
juízes não erravam e que o caso resolvido ficava acima de qualquer suspeita ou
discussão. A presunção pro veritate habetur dava ao ponto resolvido a autoridade de
coisa julgada, auctoritas rei judicandae. A exceptio rei judicatae era admitida em
seus dois aspectos, positivo e negativo. Sob o aspecto positivo, era permitido que
em um novo processo fosse invocada a sentença anterior. No segundo aspecto, o
negativo, era proibido que se desse início a um novo processo.
Encerra-se aqui o estudo do processo civil romano tão importante para o
entendimento dos sistemas jurídicos de base romanística, lembrando que o direito e
o processo, dos povos de línguas neolatinos como o português, francês, espanhol e
italiano, são enormemente influenciados pelo direito romano e processo civil
romano. Daí porque o estudo do processo romano em seus três períodos, legis
actiones, processo formular e processo extraordinário, o imprescindíveis para a
compreensão do processo civil brasileiro.
2.5 DIREITO PROCESSUAL CIVIL BRASILEIRO
Foi a partir do direito greco-romano que o direito processual civil desvinculou-
se dos preconceitos e superstições e passou a ter um desempenho mais científico.
Na Grécia, no período clássico, o processo era oral. O ônus da prova
testemunhal e documental pertencia às partes e somente em casos excepcionais
era permitida a iniciativa do juiz em matéria probatória. Não era permitido o
testemunho de mulheres e crianças. O juramento em princípio muito valorizado com
33
o tempo perdeu a importância, tendo em vista que o julgador passou a fazer uma
critica lógica e irracional da prova sem se prender a valorações legais prévias a
respeito de determinadas espécies de prova. Passou a ser um modo rígido de
fixação da própria sentença. O juiz apenas conhecia e aceitava a sua existência.
A finalidade do processo civil brasileiro era instituir meios para que a
legislação fosse aplicada ao caso concreto e a paz fosse mantida na sociedade.
Para evitar que os homens fizessem justiça com as próprias os, foi necessário
regulamentar as atividades de administração da justiça e estabelecer procedimentos
para aplicação do direito material.
No Brasil - Colônia, o Direito Processual Civil era regulamentado pelas
Ordenações Filipinas. A Revolução Restauradora do povo português não retirou o
Código filipino do cenário, pois D. João VI, através de lei de 24 de janeiro de 1643,
confirmava e revalidava as Ordenações Filipinas.
Para LIEBMAN (1951:588):
“muito especial, portanto, era a relação entre o direito particular e o direito comum:
porque o legislador português, ao formular o seu jus proprium territorial, o havia
extraído em sua maior parte, do mare magnum do direito comum, a que em seguida
remetia o intérprete supletivamente, em relação aos casos que não eram
especialmente contemplados”.
Quando as regras supletivas não contemplavam os problemas práticos a
serem resolvidos, era recomendado que se recorresse aos glosadores. Portanto, o
nosso modo de agir no processo é todo oriundo do direito canônico e dos
glosadores.
No campo processual civil, a submissão às formas do direito comum
permaneceu até a promulgação do Código de Processo Civil, de 1939, pois as leis e
códigos anteriormente existentes continuavam fieis às linhas básicas do direito
romano-canônico medieval conforme veremos a seguir.
O Decreto 737, de 25.11.1850, que regula os processos comerciais, com o
advento da república, estendeu-se às causas veis, infiltrando o direito comum na
nossa legislação processual anterior a 1939.
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O processo era escrito e separado em fases estanques, paralisando-se ao
final de cada fase, e dependendo da vontade das partes, para que tivesse novo
impulso. o que estivesse nos autos poderia ser considerado pelo juiz, ficando as
provas á cargo das partes. Autor e réu eram os donos do processo e a
movimentação era privilégio dos litigantes.
Conforme se observa, o processo moderno, ainda, tem muitas destas
características, inclusive a lentidão e o interesse de agir das partes que, se, por
acaso, descuidarem do processo, terão sua ação paralisada sob a acusação de
abandono da ação.
Como exemplo do passado, temos, ainda, os processos que correm em
segredo de justiça, à revelia se o réu não comparecer à audiência, o que é
colocado na inicial, pode ser considerado pelo juiz, já que esse não pode julgar extra
petita e, ao final do processo de conhecimento, o autor necessita pedir execução da
sentença sob pena de não receber o que ganhou nesta fase processual.
A Constituição Federal de 1891, que é a constituição do regime republicano,
estabeleceu a dicotomia entre a Justiça Federal e a Justiça Estadual, aboliu a
conciliação prévia como preliminar essencial e os Estados passaram a legislar sob a
organização judiciária e os direitos processuais, civil e penal e instituiu-se o controle
jurisdicional de constitucionalidade das leis e alguns códigos estaduais como os de
Mato Grosso, Minas Gerais e o próprio Distrito Federal adotaram e disciplinaram as
ações declaratórias.
A Constituição Federal de 1934, vendo o esfacelamento em que se
encontrava o direito processual, instituiu o processo unitário, estabelecendo em seu
artigo inciso XIX, alínea “a”, que “competia privativamente à União, legislar sobre
Direito Processual.”.
Esta Constituição, além de fazer a unificação legislativa do processo civil e
penal estabelecia, em seu artigo 11, das disposições transitórias, que se nomeasse
uma comissão para organizar o Código de Processo Civil CPC e outra para
organizar o Código de Processo Penal CPP e que, enquanto não fossem
decretados os novos códigos, continuariam vigentes os códigos dos Estados em
seus respectivos territórios. Todavia as comissões, formadas por três membros,
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sendo dois ministros da Suprema Corte e um advogado, não conseguiram ultimar os
seus trabalhos, tendo em vista divergências jurídicas.
Com a Constituição de 1937, houve uma nova tentativa de elaboração de um
Código Nacional de Processo Civil e, novas divergências de seus membros
aconteceram. Pedro Batista Martins, um dos membros, elaborou o projeto que foi
transformado em lei, pelo decreto-lei 1608, de 1939, que entrou em vigor a partir de
1° de março de 1940.
O código não era da melhor qualidade e inúmeras críticas aconteceram como
é comum em toda nova criação. Diziam que enquanto a parte geral era moderna,
impregnada de idéias novas, a parte especial era velha e totalmente ultrapassada,
não espelhava os anseios da sociedade tendo em vista que havia:
“Uma parte geral moderna, fortemente inspirada nas legislações, alemã, austríaca,
portuguesa e nos trabalhos de revisão legislativa da Itália, e uma parte especial
anacrônica, ora demasiadamente fiel ao velho processo lusitano, ora totalmente
assistemática” (BERMUDES: 1973:36).
A Constituição de 1946 não trouxe novidades no campo do Direito Processual
Civil, mantendo vigente o código de 1939 e o unitarismo legislativo. Entretanto, o
nosso procedimento processual se arrastava sofredoramente, carente de uma
injeção que lhe desse mais eficiência e eficácia, como instrumento de prestação da
tutela jurisdicional, como meio de efetivação do direito material.
O ato institucional 2 alterou profundamente a estrutura constitucional do
Poder Judiciário que, consequentemente, gerou acentuados reflexos no Direito
Processual Civil. A Emenda Constitucional 16 ampliou as reformas do judiciário e
inovou o controle jurisdicional de constitucionalidade das leis.
Mas, foi sob a égide da Constituição Federal de 1967, com a Emenda
Constitucional de 1969 e após uma década de estudos que, em 1973, aconteceu a
reforma do código de 1939, Lei nº. 5.869, de 11.01.1973, com alterações das Leis
nº. 5.925, de 01.10.1973 e outras leis posteriores.
O novo código trouxe uma forte atualização e marcou uma nova etapa na
evolução do direito processual civil, dividindo o processo civil brasileiro em processo
36
de conhecimento, processo de execução e processo cautelar, recomendado pela
melhor doutrina, eliminando a ultrapassada distinção entre a ação executiva e a
ação executória e criando a execução forçada, quer fosse o título judicial ou
extrajudicial.
A tutela antecipada, ainda no bojo do processo de conhecimento e a ação
monitória deram novo impulso ao processo civil tendo em vista que a atividade
executiva já não ficava restrita à execução forçada.
A regulamentação autônoma e completa do processo cautelar, a criação de
novos remédios de caráter social e coletivo como a ação civil pública, o mandado de
segurança coletivo, os juizados especiais de pequenas causas cíveis e criminais, a
redução do número de procedimentos especiais e a separação dos procedimentos
de jurisdição contenciosa dos de jurisdição voluntária, dando uma maior praticidade
aos últimos, através da aplicação do procedimento geral ou comum, foram medidas
que inovaram o processo civil brasileiro.
2.6 COISA JULGADA E O NOVO CÓDIGO CIVIL
Segundo Rezende Filho(1959:825), ampla corrente doutrinária ensinava que
o principal efeito da sentença era a formação da coisa julgada.
Para o Código de Processo Civil, o principal efeito da sentença de mérito é o
juiz cumprir e acabar o seu oficio jurisdicional, conforme podemos visualizar pelo
artigo 463 do CPC.
Art. 463- Ao publicar sentença de mérito, o juiz cumpre e acaba o oficio jurisdicional,
só podendo alterá-la:
I - para lhe corrigir, de oficio, ou a requerimento da parte, inexatidões materiais, ou lhe
retificar erros de cálculos;
II - por meio de embargo de declaração.
Assim a coisa julgada não é efeito da sentença, mas, a qualidade que torna
imutável o julgado e seus efeitos. É o que o código chama de coisa julgada material.
É a eficácia que torna imutável e indiscutível uma sentença, não mais sujeita a,
nenhum tipo, de recurso.
37
Segundo este artigo, a sentença se torna irretratável para o julgador que a
proferiu, podendo ser impugnada pelo vencido, devido ao duplo grau de
jurisdição, através de recurso. Ultrapassada esta fase, ela transita em julgado,
tornando-se coisa julgada.
As decisões proferidas na esfera administrativa são definitivas, mas não se
revestem da indiscutibilidade da coisa julgada, podendo, a qualquer tempo, ser
apreciadas pelo judiciário, que poderá decidir de forma diversa daquela decidida
pelo órgão administrativo. Portanto, por força o do artigo 5°, Inciso XXXV, da
Constituição Federal, inexiste coisa julgada administrativa, pois, segundo ele a lei
não excluirá da apreciação do poder judiciário nenhuma lesão ou ameaça a direito.
A Lei 11.232, de 22 de dezembro de 2005, altera a Lei 5.869, de 11 de
janeiro de 1973 - Código de Processo Civil, para estabelecer a fase de cumprimento
das sentenças no processo de conhecimento e revogar dispositivos relativos à
execução fundada em título judicial, além de outras providencias. Na parte referente
aos requisitos e, efeitos da sentença, ela acrescenta ao Código os seguintes
dispositivos:
Art. 466-A. Condenado o devedor a emitir declaração de vontade, a sentença, uma
vez transitada em julgado, produzirá todos os efeitos da declaração não emitida.
Art. 466-B. Se aquele que se comprometeu a concluir um contrato não cumprir a
obrigação, a outra parte, sendo isso possível e não excluído pelo título, poderá obter
uma sentença que produza o mesmo efeito do contrato a ser firmado.
Art. 466-C. Tratando-se de contrato que tenha por objeto a transferência da
propriedade de coisa determinada, ou de outro direito, a ação não será acolhida se a
parte que a intentou não cumprir a sua prestação, nem a oferecer, nos casos e
formas legais, salvo se ainda não exigível.
A lei considera, ainda, inexigível o título judicial, fundado em lei ou ato
normativo, declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado
em aplicação ou interpretação da lei ou ato normativo considerados pelo STF, como,
incompatíveis com a Constituição Federal.
38
3 CONCLUSÃO
Conforme se observa, a preocupação com a eficácia da coisa julgada dista
dos primórdios do tempo, desde o período anterior às normas positivadas,quando o
direito era um conjunto de regras costumeiras, morais e imutáveis e os julgamentos
eram feitos pelos reis que aplicavam a justiça civil.
No Direito Romano, a coisa julgada passava pela ineficácia do ato, mesmo
trânsita em julgado, se fosse constatada qualquer nulidade no processo. A sentença
não gozava da autoridade da coisa julgada, e era declarada nula, enquanto
perdurasse o vício . O rito processual era mais importante que o direito material. Era
muito mais um “sistema de actiones e de meios processuais do que de direitos
subjetivos.
No processo civil romano, especificamente, nas legis actiones”, apesar do
direito ser baseado no costume, a coisa julgada tinha força de lei e a sentença era,
religiosamente, cumprida sob pena de severas punições, em caso de desvios.
No processo formular, se a sentença fosse pronunciada, nos moldes da
fórmula, consagrava a coisa julgada, porque representava a decisão do Estado. Era
o estágio final, onde a “coisa” julgada era reconhecida ou negada pelo órgão estatal.
A sentença, tanto a absolutória quanto a condenatória, tinha autoridade de
coisa julgada definitiva e tinha como objetivo consagrar a coisa julgada, a res
iudicata. Valia a regra do bis de eadem re me sit actio, que não permitia a
elaboração de uma nova fórmula.
No processo extraordinário, a autoridade de coisa julgada é garantida pela
exceptio rei judicatae”, que permitia que, caso houvesse um outro processo sobre a
mesma lide e entre as mesmas partes, fosse invocada a sentença anterior,
impedindo que o processo continuasse, pois a coisa julgada tinha força de lei.
A coisa julgada, no processo civil romano, encerrava uma presunção de
verdade, partindo do princípio de que os juizes não erravam e o caso julgado devia
ficar acima de qualquer suspeita ou discussão. A autoridade da coisa julgada proibia
39
que se iniciasse um novo processo e, caso isso acontecesse, que se invocasse a
sentença anterior.
No processo civil brasileiro, a coisa julgada é a qualidade que torna imutável o
julgado e seus efeitos. É a coisa julgada material. É a eficácia que torna imutável e
indiscutível uma sentença, não mais sujeita a nenhum tipo de recurso.
As decisões administrativas o definitivas, mas, podem, a qualquer tempo,
serem apreciadas pelo judiciário, pois não se revestem da indiscutibilidade da coisa
julgada.
Atualmente, conforme previsto no inciso ll, do art. 741, do Código de Processo
Civil, é inexigível o título judicial fundado em lei ou ato normativo considerado
inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal ou em aplicação ou interpretação
tidas como incompatíveis com a Constituição Federal, o que desmistifica a
imutabilidade da coisa julgada.
É forte a corrente doutrinária que defende a relativização da coisa julgada
inconstitucional, ilegal, injusta como forma autêntica de convivência sadia num
estado democrático de direito.
40
CAPÍTULO 2
CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE E COISA JULGADA
1 INTRODUÇÃO
Não se pode falar de controle de constitucionalidade da coisa julgada sem
antes não se verificar como é feito o controle de constitucionalidade no Brasil,
quando surgiu, a finalidade, os tipos de inconstitucionalidades, o controle
constitucional sobre o ordenamento jurídico preexistente, as teorias da revogação,
recepção, repristinação e desconstitucionalização, a ação direta de
inconstitucionalidade genérica, a ação de inconstitucionalidade por omissão, o
mandado de injunção, a representação de inconstitucionalidade interventiva, e a
argüição de descumprimento de preceito fundamental, fazendo, sempre, referência
ao controle de constitucionalidade da coisa julgada.
Considerei importante, também, estudar o controle de constitucionalidade da
coisa julgada em outros ordenamentos jurídicos e escolhi o direito português e o
ordenamento americano, para que tivéssemos uma visão do instituto da coisa
julgada em outros países.
O controle de constitucionalidade nos diferentes ordenamentos jurídicos é
feito através das cortes constitucionais que são os intérpretes da constituição. No
Brasil o Supremo Tribunal Federal é o guardião da constituição fiscalizando o
cumprimento do previsto no bojo constitucional por parte dos poderes da República.
Lima (2003:204) questiona a legitimidade dos tribunais constitucionais, á luz
da teoria da democracia e, a necessidade de uma teoria política da democracia,
‘‘para uma adequada compreensão do controle de constitucionalidade’’. Afirma que
muitas vezes, ‘‘as cortes constitucionais ultrapassam o texto constitucional,
comprometendo o teor democrático da concepção de separação de poderes e, mais
grave, substituindo o poder constituinte’’. Observa que o controle de
constitucionalidade é um importante instrumento para a efetiva separação de
poderes, e que o STF não tem legitimidade popular para isto tendo em vista que os
41
ministros não são escolhidos pelo povo, mas diretamente pelos seus representantes.
Defende a tese de que uma invasão do poder legislativo, que seria o órgão mais
apropriado para a efetivação deste tipo de controle, por serem eles os verdadeiros
representantes do povo.
A supremacia do poder legislativo, como verdadeiro titular da soberania
popular, vem sendo defendida por rios estudiosos e entre eles Kant e Rousseau.
Entre os mais recentes, Bobbio, Ingeborg Maus, Lima entre outros estudiosos da
democracia. Este último, Lima, tomando por base os ensinamentos Kantianos afirma
que:
“a existência da jurisdição constitucional é incompatível com o princípio da
soberania popular. À medida que o poder que representa a vontade coletiva se
limitado pelas decisões de um tribunal constitucional, se constata a inversão da
superioridade da vontade coletiva. O poder legislativo comprova a invalidação de
suas decisões por uma corte que não enfrentou a vontade popular. Ainda que tais
cortes sejam formadas por membros indicados pelo poder legislativo, o vicio da
legitimidade não está sanado: estes membros irão controlar a constituição, e no
desempenho desta tarefa a possibilidade de ultrapassagem dos limites traçados pelo
constituinte é inevitável” (LIMA, 2003: 226).
Para reforçar a sua tese, Lima (2003: 227) mostra a leitura de Kant que
Ingeborg Maus realiza para mostrar a inversão da superioridade coletiva: “a nova
predominância da justiça constitucional sobre o parlamento representa para a
relação do exercício institucionalizado e não institucionalizado da soberania popular
uma inversão da função da constituição em si”.
A corrente contrária é favorável à manutenção das cortes constitucionais
afirmando que estas estão acima das disputas políticas garantindo o equilíbrio do
sistema político e o princípio universal da democracia da separação dos poderes.
Defendem que não prejuízo da soberania popular pela ação da jurisdição
constitucional uma vez que a soberania popular se encerra quando encerra a
constituinte. Ressaltam que os juízes constitucionais são escolhidos indiretamente
pelo povo uma vez que os órgãos que os escolhem são representantes escolhidos
diretamente pelo povo, daí decorrendo a legitimação dos tribunais constitucionais.
42
Miranda (2001: 121) entende que os Tribunais Constitucionais tem
legitimidade para agir tendo em vista que os seus integrantes são escolhidos por
órgãos democraticamente legitimados, conforme pode-se observar da citação
abaixo:
“é, justamente, por os juízes constitucionais serem escolhidos por órgãos
democraticamente legitimados em coerência, por todos quantos a Constituição
preveja, correspondentes ao sistema de governo consagrado que eles podem
invalidar actos com a força de lei. É por eles, embora por via indirecta, provirem da
mesma origem dos titulares dos órgãos políticos que por estes conseguem fazer-se
acatar” (MIRANDA, 2001: 121).
Em minha opinião, as cortes constitucionais têm legitimidade para agir, pois,
os membros desta corte são escolhidos indiretamente pelo povo, residindo à
presença da soberania popular. Todavia, concordo com Lima (2003), tendo em vista
que a corte constitucional brasileira, muitas vezes exorbita da sua função invadindo
a esfera do legislativo, comprometendo a democracia, legislando negativamente
sem nenhuma preocupação com o sistema de freios e contrapesos, tão necessário à
harmonia dos três poderes.
O Supremo Tribunal Federal, ás vezes peca, e usurpa o espaço político do
legislativo tornando-se o centro do embate político e de atenção de toda a
sociedade, transformando-se em verdadeiros deuses que devem ser, fielmente,
obedecidos não conformando-se em crescerem apenas, dentro de sua própria área
de competência institucional.
Lima (2003: 211/212) lembrando uma passagem do sermão da terceira
Dominga do advento do padre Antônio Vieira comenta que:
“se os tribunais constitucionais e seus juízes refletissem democraticamente sobre o
seu papel efetivo nos processos de democratização e se vissem como a serviço das
sociedades e da vontade constitucionalmente articulada, abandonassem eles talvez
a tentação de serem deuses como lembra Antônio Vieira: (...) porque nenhum se
contenta com crescer dentro da espécie: a andorinha que subir a águia; a rêmora
quer crescer a baleia; a formiga quer inchar a elefante;(...) desenganemo-nos que o
crescer fora da própria espécie, não é aumento, é monstruosidade; ao menos
benção não é”.
43
Urge, portanto, uma retomada de consciência democrática por parte do Poder
Judiciário no sentido de agir em harmonia com os demais poderes da República e
em total consonância com a Constituição Federal. Uma consciência de que deve
funcionar a serviço da democracia e não em benefício próprio ou de outros poderes
como foi o caso da ratificação dos planos econômicos e do silêncio quanto ao
confisco da poupança popular.
Retomando á necessidade de uma Corte Constitucional, não somente para
fazer o controle de constitucionalidade, como também para fazer uma interpretação
conforme a constituição zelando pela preservação dos direitos e garantias
fundamentais contra os abusos do Estado, considero o STF um órgão importante,
desde que esteja a serviço da sociedade.
A idéia de controle de constitucionalidade surge com a supremacia da
Constituição, com a idéia de que esta deve ser o ápice do ordenamento jurídico,
onde todas as demais normas devem conformar-se, com a idéia de que a Carta
Magna é o instrumento de organização do Estado e de proteção dos direitos e
garantias fundamentais. Para mudá-la, o processo deverá ser rígido e, não ofender
as cláusulas consideradas pela Constituição vigente.
A finalidade é a vigilância constante do ordenamento infraconstitucional em
seus aspectos materiais e formais, para que não ofenda a lei maior. Portanto, a
existência de uma hierarquia normativa é pressuposto fundamental para a existência
de uma supremacia constitucional. Assim, o fundamento do controle de
constitucionalidade é o de que nenhuma lei ou ato normativo deve destoar das
regras básicas impostas à sociedade e constantes do texto constitucional.
Nos estados democráticos de direito, a supremacia constitucional adquiriu
tamanha importância que Cappelletti (1984:599) afirmou que, “após a Guerra
Mundial, o surgimento e expansão dos sistemas de justiça constitucional foi um dos
fenômenos de maior relevância na evolução de inúmeros países europeus”.
Para Kelsen (2003: 227) em seu livro Teoria Pura do Direito, o controle de
constitucionalidade é a garantia da supremacia, da importância dos direitos e
garantias fundamentais, limitando e legitimando o poder do Estado e tornando
44
possível o processo democrático que deve haver num Estado Democrático de
Direito.
Como se observa, a manutenção de um sistema efetivo de controle de
constitucionalidade é condição sine qua non para a existência de um estado
democrático de direito de respeito à cidadania, à dignidade da pessoa humana, de
garantia dos direitos e garantias fundamentais, e de obediência aos princípios gerais
de direito e particularmente aos princípios constitucionais.
As normas, inicialmente podem ser divididas em normas constitucionais e
normas infraconstitucionais. As primeiras, constitucionais, podem ser originárias,
isto é, inseridas na constituição pelo poder constituinte originário, e derivadas
quando nascem da adequação das normas constitucionais à nova ordem social e
jurídica vigente, através de emendas constitucionais de revisão ou de simples
atualização.
As normas infraconstitucionais se dividem em atos normativos primários e
secundários. Os primeiros têm fundamento no próprio texto constitucional e criam,
modificam e revogam as relações jurídicas, mas, sempre, em consonância com os
princípios constitucionais, sob pena de ferirem a Constituição. São os casos das leis
complementares, ordinárias, delegadas, medidas provisórias, decretos legislativos,
resoluções legislativas, tratados internacionais e atos normativos dotados de
autonomia, que requerem um constante controle de constitucionalidade.
A segunda espécie, isto é, os secundários como os decretos, simplesmente
regulamentadores, as portarias, atos de infração, regulamentos e convenções
coletivas de trabalho não são objeto de fiscalização abstrata de constitucionalidade,
pois o direito brasileiro e a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal não admitem
inconstitucionalidade por derivação de atos normativos secundários. Se estes não se
conformarem ao texto constitucional, o correto é dizer que estão inquinados com o
vício da ilegalidade, pois somente as normas constitucionais derivadas e os atos
normativos primários, podem ser objetos de controle abstrato de constitucionalidade.
Para melhor entendimento do acima exposto, apresento o quadro a seguir:
45
Para verificar-se a constitucionalidade ou inconstitucionalidade de uma norma
é necessário um parâmetro de comparação. No direito brasileiro, quanto à forma,
servem de parâmetros os requisitos formais e materiais. Os primeiroso origem ao
que se chama de inconstitucionalidade formal, que pode ser formal objetiva, quando
desobediência ao processo legislativo previsto na Constituição nos artigos 60 a
69, e formal subjetiva, quando vício de competência, quando a iniciativa
legislativa é desrespeitada.
O requisito material é a verificação substancial da compatibilidade da lei ou
ato normativo com a Constituição Federal. Se o seu conteúdo contraria, no todo ou
46
Decreto Regulamentador
Portarias
Autos de Infração
Atos Normativos Estrangeiros
Regulamentos
Convenção Coletiva de Trabalho
Ordenamento
Positivo
Brasileiro
Normas
Constitucionais
ORIGINÁRIAS – o conteúdo da Constituição
Controle
principiológico
DERIVADAS
Controle
Abstrato
Emendas Constitucionais de Revisão
Emendas Constitucionais
Normas
Infraconstitucionais
ATOS NORMATIVOS
PRIMÁRIOS
Controle
Abstrato
Lei Complementar
Lei Ordinária
Lei Delegada
Medida Provisória
Decreto Legislativo
Resolução Legislativa
Tratados internacionais
Atos Normativos Autônomos
ATOS NORMATIVOS
SECUNDÁRIOS
Controle de
Legalidade
em parte um dispositivo constitucional, diz-se que o conteúdo da lei é materialmente
inconstitucional e o cio é insanável. Kelsen (2003:148) em seu livro Jurisdição
Constitucional diz que “a anulação do ato inconstitucional representa a principal e
mais eficaz garantia da Constituição’’ e, é uma medida que tem como objetivo
garantir a regularidade das funções estatais”.
Para Cléve (1999), ocorre inconstitucionalidade material quando a norma,
embora disciplinando matéria prevista constitucionalmente e deixada à livre vontade
do legislador, tenha sido editada não para realizar os fins concretos previstos
constitucionalmente, mas sim fins divergentes e contrários ou ainda quando o faz de
modo inapropriado, desnecessário, desproporcional, não razoável, com desvio ou
excesso, desobedecendo aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade dos
quais devem revestir-se os atos do poder público.
Os poderes da república, num estado democrático de direito, estão obrigados
a pautar seus atos pela estrita legalidade e constitucionalidade. Assim, o Chefe do
Poder Executivo em obediência ao previsto no art. 5
o
, Inciso II, princípio da
legalidade, não será obrigado a cumprir lei ou ato normativo que entenda
inconstitucional, podendo, ainda, determinar aos seus órgãos subordinados que
deixem de aplicar as leis ou atos normativos que considerar inconstitucional.
Todavia, cabe ressaltar que:
“Por se tratar de medida extremamente grave e com ampla repercussão nas relações
entre os poderes, cabe restringi-la apenas ao Chefe do Poder Executivo, negando-se
a possibilidade de qualquer funcionário administrativo subalterno descumprir a lei
sob a alegação de inconstitucionalidade” (RAMOS, 1994:238).
Um funcionário burocrata, ao vislumbrar uma inconstitucionalidade, não pode,
de prontidão, deixar de aplicar a lei, mas terá o dever de propor a matéria à análise
do chefe do poder, pois somente este pode determinar a não aplicação da lei.
O controle de constitucionalidade quanto ao momento de sua argüição, isto é,
quanto ao ingresso da lei ou ato normativo no ordenamento jurídico, pode ser
preventivo e repressivo. O controle preventivo é realizado em regra, pelo poderes
47
executivo e legislativo, durante o processo de elaboração da lei ou ato normativo,
para evitar que este passe a ter vigência e eficácia no mundo jurídico.
Para Slaib Filho (1989) este controle pode ser denominado de atípico, uma
vez que, é realizado durante a tramitação do projeto de lei pelas Comissões
Permanentes de Constituição e Justiça da Câmara e do Senado, pelos plenários das
duas casas ou ainda, através do veto total ou parcial do Presidente da República e
em conformidade com o art. 66, § 1
o
, da Constituição Federal de 1988. É um
controle profilático, que incide nos projetos de lei, e para evitar que leis
inconstitucionais passem a compor o ordenamento positivo.
Todavia, incidentalmente, o Judiciário também pode exercer este tipo de
controle, desde que provocado, através da análise de um caso concreto. Foi o que
aconteceu no Mandado de Segurança n
o
22.503-3, de 12 de abril de 1996, onde o
Supremo Tribunal Federal concedeu medida liminar contra a tramitação da proposta
de Emenda Constitucional de reforma da Previdência Social (EC-33-A/95), tendo em
vista o flagrante desrespeito ao processo legislativo, conforme o parágrafo 5
o
, do art.
60, da CF/88.
Ressaltou ainda, o STF que a Câmara havia destoado ainda do art. 122 e do
parágrafo único do art. 43, do seu próprio Regimento Interno. Observa-se assim o
uso de Mandado de Segurança na argüição de vício formal no processo legislativo.
Mota Filho e Santos (2003:580) pronunciam-se sobre o assunto da seguinte forma:
“entendemos, que devido à Constitucionalização quase minuciosa do processo
legislativo no Brasil, é possível a argüição de inconstitucionalidade preventiva
judicial, desde que seja exercida exclusivamente pelo método difuso,
incidentalmente. Repudiamos, igualmente, a possibilidade de fiscalização abstrata.
Se uma ação direta de inconstitucionalidade tivesse como objeto um projeto de lei,
todo o sistema de controle estaria subvertido, a começar por uma invasão indevida
do Poder Judiciário (porque não autorizada pela Carta Constitucional) na seara do
Poder Legislativo e, a terminar, por uma derrogação do princípio da presunção de
constitucionalidade de que se reveste a lei em tese.”
Os autores acima referenciados afirmam ainda que, segundo a jurisprudência
do Supremo Tribunal Federal o Tribunal de Contas da União, que doravante
chamarei de TCU tem competência para verificar se as leis são constitucionais e
para afastar a incidência das consideradas inconstitucionais.
48
O controle repressivo também chamado de típico é extremamente relevante
para a jurisdição constitucional. É feito pelo Poder Judiciário, sempre que não
houver êxito do sistema preventivo, isto é, após a vigência da norma
inconstitucional. Tem como objetivo expulsar do ordenamento positivado a norma
editada em desacordo com a Constituição, como forma de defender a supremacia
constitucional. Incide sobre leis e atos normativos que regulam relações jurídicas
de forma presumidamente constitucional (princípio da constitucionalidade das leis e
atos normativos).
três sistemas de controle de constitucionalidade que fazem o controle
repressivo: político, jurisdicional e misto. O sistema político predominou na Europa
no século passado e na vigente Constituição francesa. O jurisdicional, denominado
judicial review, surgiu nos Estados Unidos e, generalizado, hoje em dia, por toda a
América, consiste na faculdade atribuída ao Poder Judiciário de declarar a
inconstitucionalidade de leis e atos normativos que contrariarem formal ou
materialmente preceitos ou princípios constitucionais.
O controle misto ocorre quando a Constituição de um Estado submete
algumas categorias de leis ao controle político e outros ao controle jurisdicional,
como acontece na Suíça onde as leis federais ficam sob o controle da Assembléia
Nacional e as leis locais sob o controle do Poder Judiciário.
Bastos (1977:78) coloca como modalidades de controle de
constitucionalidade o controle político e o jurisdicional. Consideram político todo
controle exercido por órgão de natureza política. E jurisdicional o exercido por um,
alguns ou todos os órgãos do judiciário. Afirmam que o sistema político teve suas
raízes na França, quando o Abade Sieyes propôs a criação de um júri constitucional,
por ocasião da Constituição Federal do ano VIII, mas a idéia de um tribunal
constitucional não prosperou.
O sistema jurisdicional surgiu nos Estados Unidos por ocasião do julgamento
do caso Madison vs. Marbury, quando o Juiz Marshall, ao dar a sentença, trouxe
para o âmbito da atividade jurisdicional e da Suprema Corte Americana a novidade
da apreciação da constitucionalidade de uma lei na aplicação a um caso concreto. A
49
partir daí, o sistema espalhou-se para os demais países da América, inclusive o
Brasil.
Segundo Canotilho (1993:705), o Juiz Marshall explicou e justificou a sua
decisão naquele caso e, esta decisão inovadora e corajosa, para a época, tornou-se
clássica:
“O Juiz Marshall, no caso Madison vs. Marbury, explicou este pensamento da forma
que se tornou clássica: ‘É sem dúvida, da competência e dever do Poder Judiciário
interpretar a lei. Aqueles que a aplicam aos casos particulares devem,
necessariamente, explaná-la, interpretá-la. Se duas leis se contrariam, os tribunais
devem decidir sobre o seu âmbito de aplicação. Assim, se uma lei estiver em
contradição com a Constituição, e se tanto uma como outra forem aplicáveis ao
caso, de modo a que o tribunal tenha de decidir de acordo com a lei, desatendendo a
Constituição, ou de acordo com a Constituição, rejeitando a lei, ela terá,
inevitavelmente, de escolher entre os dois preceitos opostos aquele que regulará a
matéria. Isto é da essência do dever judicial. Se, portanto, os tribunais devem
observar a Constituição, e se esta é superior a qualquer lei ordinária do Poder
Legislativo, é a Constituição e não a lei ordinária que de regular o caso a que
ambos dizem respeito’.”
No direito Inglês a supremacia é do parlamento. A Constituição é costumeira
e o parlamento decide as controvérsias constitucionais. Inexiste um controle
jurisdicional. O que é uma acentuação do controle político, onde prevalece a
soberania do parlamento.
No México, na história das suas instituições jurídicas, encontramos também
um exemplo de controle de constitucionalidade de caráter não jurisdicional, mas
simplesmente político. Todavia, é a França, com alguns atenuantes na Constituição
atual, o país que oferece os mais típicos e numerosos exemplos de controle político,
não judicial de constitucionalidade.
No Brasil, o controle é misto, ou seja, é exercido tanto de forma concentrada
quanto difusa. Compete ao Supremo Tribunal Federal segundo a inteligência do art.
102, Inciso I, “a” da Constituição Federal, a guarda da Constituição cabendo-lhe
processar e julgar, originariamente a Ação Direta de Inconstitucionalidade de lei, ato
normativo federal ou estadual como também a Ação Declaratória de
Constitucionalidade de lei ou ato normativo federal. É o chamado controle
concentrado (via de ação).
50
também o controle difuso previsto no art. 97, da CF/88, feito pelos
tribunais pelos votos da maioria absoluta de seus membros. Este tipo de controle
instalou-se definitivamente no Brasil, com a Lei Federal 221/94, que dava
competência aos Juízes e Tribunais para verificarem a constituição, validade das leis
e regulamentos e deixarem de aplicá-los aos casos concretos, se tivessem vício de
inconstitucionalidade. O controle difuso ou aberto é realizado via de exceção ou
defesa.
Apesar do controle repressivo ser realizado pelo Poder Judiciário, a
Constituição Federal prevê, excepcionalmente, duas exceções: a do art. 49, Inciso V
e a do art. 62 em que o controle de constitucionalidade repressivo é realizado pelo
Poder Legislativo:
No primeiro caso, cabe ao Congresso Nacional editar um Decreto Legislativo
sustando os Atos Normativos o Decreto Presidencial ou a Lei Delegada que
desrespeitem a Constituição. A sustação não será retroativa ex tunc. Os seus efeitos
serão ex nunc, a partir da publicação do Decreto Legislativo, porque não é a lei que
está sendo nula, mas apenas os seus efeitos estão sendo suspensos pelo
legislativo. Todavia, uma posterior declaração de inconstitucionalidade por parte do
Judiciário, em caso da lei delegada, que não obedece aos requisitos formais
previstos no artigo 68, terá efeito ex tunc, isto é, retroativa à época da edição da lei.
No segundo caso, o art. 62 da Constituição estabeleceu garantias formais de
controle desta atividade presidencial, com a finalidade de prevenir abusos e ou
práticas arbitrárias, quais sejam: convocação extraordinária do congresso;
apresentação da Medida Provisória ao Congresso Nacional, pelo Executivo a fim de
que esta seja transformada em lei; perda da eficácia ex tunc quando não convertida
em lei; possibilidade de controle de constitucionalidade da Medida Provisória pela
via difusa ou concentrada.
51
2 DESENVOLVIMENTO
2.1 CONTROLE CONSTITUCIONAL SOBRE O ORDENAMENTO JURÍDICO
PREEXISTENTE
A Constituição de um Estado é a norma de organização e formação do novo
ente estatal. Ela estabelece uma nova ordem jurídica estatal tendo por titular o povo,
através de seus representantes legais, na assembléia nacional constituinte. Existe, a
partir daí, uma ruptura espaço-temporal com a ordem constitucional anterior,
passando a existir uma nova ordem jurídica vigente de formação do novo Estado e
que serve de base para todas as decisões do Poder Público.
O preâmbulo é o documento de intenções, é uma espécie de certidão da
origem e legitimidade do novo texto. É, ainda, uma proclamação de princípios da
nova ordem jurídica que demonstra a ruptura com o ordenamento anterior e o
surgimento jurídico do novo Estado.
A doutrina constitucional clássica tem a constituição como o marco, a partir
do qual surge a nova ordem jurídica, não admitindo a existência de leis anteriores a
ela. Todavia a experiência brasileira, sempre que é editada uma nova Constituição,
isto é, criado um novo Estado, demonstra que inúmeras leis pertencentes ao
ordenamento jurídico preexistente continuam a produzir efeitos válidos em todo o
território nacional, porque é impossível renovar-se imediatamente todo o
ordenamento infraconstitucional preexistente. Assim, costuma-se entender como
válidas todas as leis que não entrem em choque com o novo texto constitucional ou
que não sejam expressamente revogadas.
Para um melhor entendimento do problema, os doutrinadores se utilizam de
algumas teorias como: a teoria da revogação, teoria da recepção, teoria da
repristinação e, teoria da desconstitucionalização.
52
2.2 TEORIA DA REVOGAÇÃO
Segundo a teoria da revogação, quanto às normas de status constitucional,
toda a carta anterior é revogada no momento em que a nova carta é promulgada.
Com relação às normas de status infraconstitucional e segundo a inteligência do art.
2
o
da Lei de Introdução ao Código Civil, se a lei não se destinar à vigência
temporária, conservará sua vigência até ser revogada por outra lei.
A revogação terá que ser expressa quando se tratar de outra lei tratando do
mesmo assunto apenas de forma diversa; a lei anterior também, será considerada
revogada. Se houver uma coalizão apenas de parte do texto com a constituição,
com um princípio constitucional ou ainda com outra lei anterior, a revogação será
parcial, isto é, apenas da parte que entrar em choque. É o princípio do utille per
inutile non vitiatur, que significa que o útil não é viciado pelo inútil. Aproveita-se a
parte boa, em consonância com o novo modelo jurídico e rejeita-se a parte ruim, em
coalizão com o novo ordenamento.
Alguns autores, entre eles Sylvio Motta, justificam o procedimento, alegando
o princípio da economia legislativa, onde se evita que, ao surgir um novo modelo
jurídico de Estado, o legislativo tenha que refazer todo o ordenamento
infraconstitucional. O Supremo Tribunal Federal, adotou, em tese, o seguinte
procedimento: tendo em vista o princípio acima mencionado todos os atos
normativos infraconstitucionais primários pertencentes ao ordenamento anterior,
serão automaticamente recepcionados (teoria da recepção) e os que colidirem serão
automaticamente revogados.
2.3 TEORIA DA RECEPÇÃO
53
Teoria da recepção consiste em considerar integrado ao novo ordenamento
tudo que com ele não colidir. Todavia, deve-se observar que a recepção analisa
apenas os aspectos substanciais da lei, apenas verifica se a lei é materialmente
constitucional que o Direito Constitucional Brasileiro não admite
inconstitucionalidade formal superveniente. Um exemplo disto são os decretos-leis
que não existem mais no ordenamento atual, uma vez que, foram substituídos pelas
medidas provisórias, mas continuam valendo por não entrarem em choque com a
Constituição e porque, na recepção, não se analisa os aspectos formais.
Existem vários outros exemplos de leis que eram complementares e foram
recepcionadas como ordinárias, de leis ordinárias recepcionadas como
complementares e de leis estaduais recepcionadas como federais.
No primeiro caso temos a Lei Orgânica do Ministério Público, antes lei
complementar e hoje ordinária. No segundo caso temos o Código Tributário
Nacional, que era legislação ordinária e foi recepcionado como lei complementar. E
casos de leis estaduais que passaram a ser consideradas como federais porque a
nova carta, ao referir-se à matéria, determinou os assuntos que deveriam ser
tratados por lei complementar, lei ordinária ou lei de competência exclusiva da
União, sem que o legislativo elaborasse outra lei sobre o mesmo assunto em nível
federal e, a ordem constitucional vigente recepcionasse a lei estadual com status de
federal, tendo em vista o já retro mencionado, princípio de economia legislativa.
Conclui-se, portanto, que as leis produzidas a partir da promulgação da nova
carta constitucional devem ser compatíveis formal e materialmente com esta,
podendo a sua inconstitucionalidade repressiva ser argüida via ação principal
(controle abstrato) ou via ação incidental (controle concreto). as existentes
anteriormente a esta, isto é, o ordenamento infraconstitucional existente basta ser
materialmente compatível com esta, podendo sua constitucionalidade ser aferida
apenas via ação incidental (controle concreto) ou via argüição de descumprimento
de preceito fundamental, da qual discorrerei, posteriormente.
2.4 TEORIA DA REPRISTINAÇÃO
54
Quanto à Teoria da Repristinação, que consiste na recuperação do
pressuposto de validade de uma lei revogada, revogando a lei revogadora, apesar
de prevista no Direito pátrio, no art. 2
o
, §§ 3
o
, da Lei de Introdução ao Código Civil, é
um fenômeno raro no direito brasileiro, podendo-se dizer que a repristinação, em
sentido estrito, ainda não chegou a acontecer.
Quando se refere às normas constitucionais, a previsão expressa do texto é
condição sine qua non para que o fenômeno possa acontecer, o que é muito raro,
tendo em vista que, com a promulgação da Lei 9.868, a concessão de medida
liminar em ação direta de inconstitucionalidade torna possível a aplicação da
legislação, anteriormente existente. Neste caso, os efeitos repristinatórios são
presumidos e tácitos. Todavia a doutrina sustenta que ainda não uma
repristinação, em sentido estrito, pois como a norma inconstitucional está afetada
deste vício, a lei anterior não chegou a perder a sua vigência.
2.5 TEORIA DA DESCONSTITUCIONALIZAÇÃO
A teoria da desconstitucionalização consiste em recepcionar como lei
ordinária, dispositivos da Constituição anterior não repetidos pela nova Constituição.
Esse fenômeno divide os doutrinadores. Maria Helena Diniz e José Afonso da Silva
são favoráveis enquanto J. J. Gomes Canotilho, Celso Ribeiro Bastos, Motta Filho e
Santos são desfavoráveis. O Supremo Tribunal Federal tem decisões a favor e,
decisões contrárias não tendo, portanto, uma posição firmada.
Convém lembrar que comumente os noticiários têm utilizado o termo
desconstitucionalização, significando a retirada de matéria da Constituição através
de emendas supressivas e, dá a ela o status de legislação ordinária. Neste sentido o
fenômeno pode acontecer.
A partir de agora, estudarei o controle repressivo de constitucionalidade na
forma concentrada e difusa, para culminarmos com o controle de constitucionalidade
da coisa julgada inconstitucional.
O controle concentrado não exige a existência de um processo concreto, o
seu objetivo é a declaração de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo. São
espécies de controle concentrado: Ação Direta de Inconstitucionalidade Genérica,
55
Ação de Inconstitucionalidade por Omissão, Ação Direta de Inconstitucionalidade
Interventiva, Ação Declaratória de Constitucionalidade e Argüição de
Descumprimento de Preceito Fundamental.
2.6 AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE GENÉRICA
Ação proposta junto ao STF, com o objetivo de que seja declarada a
inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal, estadual ou distrital, quando do
exercício da competência equivalente à dos Estados federados (Súmula 642 do
STF). A competência engloba todas as espécies normativas previstas no art. 59, da
CF/88, bem como qualquer ato do Poder Público revestido de conteúdo normativo.
Esta ação tem fundamento no art. 102, Inciso I, alínea “a”, da CF/88, regulamentado
pela Lei 9.868, de 10-11-99.
No caso das leis ou atos distritais, é bom observar-se que, de acordo com a
Súmula 642, do STF, não tem cabimento propor-se junto ao STF a ação direta de
inconstitucionalidade de lei do Distrito Federal, no que se refere à sua competência
legislativa municipal. Compete aos Tribunais de Justiça dos Estados e Distrito
Federal exercer o controle de constitucionalidade de leis e atos normativos estaduais
e municipais em frente às respectivas constituições Estaduais e Leis Orgânicas
Municipais e do Distrito Federal. Inexiste, hoje, ADIN de lei municipal em face da
Constituição Federal, devendo o controle ser feito pela via de exceção, incidentur
tantum, ou por meio de ADPF (Argüição de Descumprimento de Preceito
Fundamental).
As normas constitucionais derivadas e o ordenamento infraconstitucional, de
efeito abstrato, podem ser objetos deste modo de controle concentrado. As normas
infralegais serão objetos de conflito de ilegalidade, devendo o Congresso, sustá-los
quando exorbitarem do poder regulamentar ou da delegação legislativa.
A legitimação ativa está prevista no art. 103, Inciso I a IX da Constituição
Federal com as alterações da Emenda Constitucional 45/2004 que incluiu no
56
Inciso IV a legitimação da Câmara Legislativa do Distrito Federal e no Inciso V a
legitimação do Governador do Distrito Federal. Consta, também no art. 2º da Lei
9.868/99. Entendo que todos eles devem fazer-se representar através de
advogados, exceto o Procurador Geral da República.
Para propositura desta ação, o basta estar relacionado entre os
legitimados ativos. É necessário também que haja pertinência temática entre o
interesse de agir do legitimado e o objeto da ação. Os legitimados, segundo Motta
Filho e Santos (2006:600), classificam-se em universais e especiais. São universais
aqueles que têm interesse em preservar a supremacia da constituição, em razão de
sua própria natureza jurídica, isto é, de suas atribuições institucionais. São
legitimados ativos universais, com presunção absoluta, o Presidente de República, o
Procurador Geral de República, as mesas da câmara dos deputados e do senado
federal, os partidos políticos com representação no congresso nacional e o Conselho
Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, por suas próprias atribuições
institucionais. Uma ação proposta por estes jamais será considerada inepta por falta
de interesse de agir ou por falta de pertinência temática.
No caso dos legitimados ativos especiais, como a Mesa da Assembléia
Legislativa ou da Câmara legislativa do Distrito Federal, do Governador do Estado
ou do Distrito Federal, das Confederações sindicais ou entidades de âmbito
nacional, a presunção é relativa, precisam mostrar de forma inequívoca, a relação
de interesse entre o objeto da ação direta e a classe que representa, não bastando o
interesse genérico, mas, sim o interesse específico. Concordo plenamente com esta
exigência pois, é a pertinência temática que legitima o interesse de agir. Se a
entidade de classe não for voltada, para o interesse de classe ou profissão
especifica, isto é, se for heterogênea não legitimidade para a propositura da
ação.
É possível a concessão de medida liminar nas ações diretas de
inconstitucionalidade, desde que seja provado o perigo de lesão irreparável. Martins
(2001) ressalta que é da natureza dessa medida garantir a definitividade dos efeitos
da ação, visto que no processo cautelar a liminar garante a utilidade do provimento
decorrente da prestação jurisdicional principal. O STF tem entendido que o efeito da
57
liminar é ex nunc, pois apenas suspendia a eficácia e vigência da norma não
desconstituindo ainda as relações jurídicas efetivadas.
Uma vez proposta a Ação Direta de Inconstitucionalidade, não pode haver
desistência, tendo em vista, o interesse público. Aplica-se assim o princípio da
indisponibilidade, não podendo o autor da ação decidir pela retirada da ação, pois o
interesse é do povo, ele apenas é legitimado para agir.
“STF- Pleno Adin 164/DF medida cautelar- Rel. Min. Moreira Alves, RTJ
139/396. No mesmo sentido, decidiu o Supremo Tribunal Federal: “Ação Direta de
Inconstitucionalidade. Pedido de desistência. Impossibilidade. Interesse público.
Princípio da indisponibilidade. Postulação indeferida. Instaurado o processo de
controle normativo abstrato perante o Supremo Tribunal Federal, não mais assiste
ao autor qualquer poder de disposição sobre a ação direta de inconstitucionalidade.
Em conseqüência não lhe será lícito requerer a desistência da ação direta
ajuizada” . (STF Pleno Adin nº 1.971-6/SP - medida liminar- Rel. Min. Celso de
Mello, Diário da Justiça, Seção I, 2 ago. 1999).
O procedimento para este tipo de ação está previsto na Emenda
Constitucional nº 45/2004, na Lei 9868/99 e, subsidiariamente, deve ser aplicado
o Regimento interno do Supremo Tribunal Federal. Se a petição inicial for
considerada inepta, caberá agravo ao plenário do Tribunal. A petição deverá ser
apresentada em duas vias devendo vir, anexada, cópia da lei ou ato normativo
impugnado e, dos documentos, necessários à comprovação da impugnação. A
seguir o relator pedirá informações à autoridade, ou, órgão responsável pela lei ou
ato impugnado que terá 30 dias para prestar as informações. Todavia, em caso de
urgência, poderão ser dispensadas pelo relator do processo, ad referendum, do
Tribunal. A seguir o Advogado Geral da União será citado para defender o ato
impugnado, com vistas ao Procurador Geral da República que deverá manifestar-se
sucessivamente no prazo de 15 dias.
A Lei 9868/99 com as alterações da Emenda Constitucional 45/2004
trouxe uma inovação ao controle de constitucionalidade que é a figura do amicus
curiae, que significa, “amigo da corte”. A função desta figura é juntar aos autos
opiniões, e, quaisquer tipos de subsídios que ajudem a esclarecer e a decidir, da
melhor forma, a matéria suscitada.
58
Apesar do Supremo Tribunal Federal não admitir litisconsórcio de terceiros
nem intervenção assistencial de terceiros interessados em defender seus direitos
subjetivos, após a Lei 9868/99 e, tendo em vista que artigo 7°,parágrafo 2°, da
supramencionada lei, passou a admitir a intervenção assistencial de entidade dotada
de representatividade no processo de controle abstrato de constitucionalidade.
de se ressaltar que a vedação da participação de terceiros como litisconsórcio ou em
caráter assistencial, prevista, inclusive no artigo 169, parágrafo 2°, do regimento
interno do Supremo Tribunal, não atinge os legitimados ativos relacionados no artigo
103, incisos I a IX, da Constituição Federal de, 1988.
Os efeitos desta ação devem ser ex tunc, tendo em vista que uma lei ou ato
normativo inconstitucional ab initio não pode gerar efeitos jurídicos válidos, sob pena
de estar-se admitindo um flagrante desrespeito à Constituição Federal. Como se
sabe, todos os atos que têm como suporte lei ou ato normativo, posteriormente,
declarados inconstitucionais, são nulos de pleno direito e não atos anuláveis. Se
nulos, são inexistentes, não podem gerar efeitos jurídicos, se nunca existiram.
Todavia, com a Emenda Constitucional 45/2004, foi incluido o artigo 103-A da
Constituição Federal que versa sobre o assunto. A Lei 9868/99, em seu artigo 27,
abranda os efeitos da declaração de inconstitucionalidade da lei ou ato normativo
quando determina que o Supremo Tribunal Federal, por maioria de 2/3 de seus
membros e, levando em conta o interesse social e a segurança jurídica, pode decidir
se os efeitos serão ex tunc ou ex nunc, decidindo o momento exato, a partir do qual
a declaração de inconstitucionalidade surtirá efeitos.
Segundo Motta Filho e Santos (2006:612), o direito brasileiro, na interpretação
do STF, sempre consagrou a idéia de que a lei inconstitucional é eivada de nulidade
absoluta ipso iure. É o que Gilmar Mendes chama de declaração de
inconstitucionalidade sem pronúncia de nulidade. Agindo assim o tribunal
reconhece que a norma é inconstitucional, mas, mantém válidos os seus efeitos
produzidos anteriormente. É o respeito à coisa julgada.
Ao analisar a coisa julgada inconstitucional, deve-se levar em conta que as
pessoas acreditam no princípio da presunção de constitucionalidade das leis e atos
normativos. Acham que estão protegidas por um direito objetivo amplamente
constitucional.
59
Na análise da coisa julgada inconstitucional, deve-se sempre analisar
também a natureza jurídica da decisão. Se esta é cível, penal, tributária ou mesmo
administrativa e, obedecendo ao princípio da razoabilidade, estabelecer se os efeitos
da decisão devem ser “ex tunc” ou ex nunc”, levando sempre os interesses jurídicos
e sociais.
Portanto, conforme se observa, o Supremo Tribunal Federal está autorizado
legalmente, pelo art. 27, da lei 9868/99, a regular os efeitos da declaração de
inconstitucionalidade, sempre levando em conta os princípios constitucionais.
Todavia, no caso de coalizão entre a sentença injusta e a segurança jurídica,
segundo a doutrina dominante, deve prevalecer a segurança jurídica, para que o
conflito não seja eternizado. A justiça seria abatida em nome da segurança jurídica,
que é sustentáculo do estado democrático de direito, assunto abordado em capítulo
posterior.
Quanto à coisa julgada inconstitucional ou ilegal também prevalecerá,
segundo a doutrina dominante, a sentença ilegal ou inconstitucional, em nome de
uma segurança jurídica que deve haver para a não eternização dos conflitos, o
podendo ser relativizada, exceto, nos casos expressamente taxados em lei, e
dispostos em numerus clausus, expostos a seguir:
a) ação rescisória, prevista no art. 485 do Código de Processo Civil;
b) embargos à execução de título judicial, que tem previsão no art. 741, do
código supramencionado;
c) coisa julgada segundo o resultado da lide, prevista no artigo 18, da Lei
nº4.717/65 ( Lei de Ação Popular), no artigo 16, da Lei nº7.347/85 (Lei de
Ação Civil Pública) e nos incisos I e II do artigo 103 da Lei nº8.078/90
(Código de Defesa do Consumidor) que determinam que quando a ação
for julgada improcedente por falta de prova, a sentença não fará coisa
julgada, podendo o cidadão, valendo-se de nova prova, intentar outra
ação com idêntico fundamento;
d) no parágrafo único, do artigo 622 do Código de Processo Penal que trata
da revisão criminal desde que fundada em novas provas.
60
Gustavo Binenbojm (2001:181) aponta que:
A flexibilização dos efeitos temporais da declaração de inconstitucionalidade
é uma dessas imposições da experiência à lógica jurídica”. Inobstante, como mitigação
do princípio da constitucionalidade, em determinado lapso de tempo, deve ser
encarada como medida excepcional - jamais como regra -, utilizável apenas para a
preservação de outros valores e princípios constitucionais, que seriam colocados em
risco pela pronúncia da nulidade da lei inconstitucional. A aplicação do novo dispositivo
está assim necessariamente condicionada pelo princípio da razoabilidade ou
proporcionalidade”.
Note-se ainda que a declaração de constitucionalidade ou
inconstitucionalidade, a declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução de
texto e a interpretação conforme a constituição tem efeitos vinculantes, em relação
aos órgãos do poder judiciário e aos três níveis da Administração Pública Federal,
Estadual e Municipal, conforme se observa com a leitura do art. 102, parágrafo 2°,
da Constituição Federal.
2.7 AÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO
A inconstitucionalidade por omissão está prevista no art. 103, parágrafo 2º, da
CF/88, que tem por objetivo dar eficácia às normas constitucionais que dependam
de complementação, através de legislação infraconstitucional e, que ainda não
tenham sido editadas, pelo poder público, quando uma omissão deste poder em
relação a:
a) normas constitucionais de eficácia limitada de princípio institutivo e caráter
impositivo e;
b) normas programáticas vinculadas ao principio da legalidade.
Normas de eficácia limitada são as que apresentam aplicabilidade mediata e
reduzida, isto é, somente quando legislação anterior é editada, conferindo-lhe
aplicabilidade.
Conforme Motta Filho e Santos (2006: 629), a norma de eficácia limitada
61
“mantém seu conteúdo na obscuridade jurídica, ou seja, na categoria de direito bruto
e incerto esperando que o órgão responsável pela sua efetivação tome do buril e
cinzel e, lapidando-o, estabeleça com a máxima precisão, seu quilate,
transformando-o em direito liquido e certo, onde o titular sabe, informado agora pela
norma regulamentadora, quais os seus parâmetros e se tem condições de exercê-
lo”.
Na norma de eficácia limitada quanto aos princípios institutivos, o legislador
constituinte estabelece atribuições de órgãos e entidades para que o legislador
ordinário elabore leis que dêem eficácia a estas espécies de dispositivos.
Nas normas de eficácia limitada, quanto aos princípios programáticos, o
legislador constituinte estabelece apenas os princípios a serem cumpridos pelos
poderes como programas de suas respectivas atividades, objetivando a efetivação
dos fins sociais do Estado.
Para Pontes de Miranda (1998: 218 v. 1), são
“mais do que comando-regra explicitam comandos-valores; conferem elasticidade ao
ordenamento constitucional; tem como destinatário primacial - embora não único o
legislador, a cuja opção fica a ponderação do tempo e dos meios em que vêm a ser
revestidas de plena eficácia (...), pelo que pode haver quem afirme que os direitos
que delas constam, máxime os direitos sociais, têm mais natureza de expectativas
que de verdadeiros direitos subjetivos”.
Convêm ressaltar que não são todas as normas programáticas que podem
ser objetos de ação por omissão. É necessário que estejam vinculadas ao princípio
da legalidade; que o legislador constituinte tenha estabelecido a necessidade de
elaboração de lei posterior para que o dispositivo tenha aplicabilidade. A
inconstitucionalidade por omissão não pode incidir sobre qualquer omissão do Poder
Público, mas somente nos casos supramencionados nos itens “a” e “b” da presente
exposição.
Os legitimados ativos estão previstos no art. 103, I a IX da CF/88. Os
legitimados passivos são os agentes políticos, administrativos ou as pessoas
jurídicas de direito publico responsáveis pela omissão da norma regulamentadora.
As normas programáticas ou principiológicas são preceitos constitucionais dirigidos
aos três poderes e não somente ao legislativo. A lei magna, na maioria das vezes,
62
oferece apenas parâmetros perante os quais o poder legislativo pode assumir
diferentes posições sem tornar a lei inconstitucional.
A competência é a mesma do sistema concentrado. A eficácia deixa muito a
desejar, tendo em vista que em face do princípio da independência e harmonia entre
os poderes, o judiciário não pode obrigar o legislativo a editar a norma faltante, nem
o Supremo Tribunal Federal pode funcionar como legislador atípico elaborando a
norma. Todavia, se a norma faltante é de natureza administrativa, a ação de
inconstitucionalidade por omissão é plenamente eficaz, pois o próprio dispositivo
afirma:
Art. 103 parágrafo - Declarada a inconstitucionalidade por omissão de medida
para tornar efetiva norma constitucional, será dada ciência ao Poder competente
para adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão
administrativo, para fazê-lo em 30 dias.
O comando constitucional deste artigo é claro e impositivo, não deixando
nenhuma margem a dúvidas quanto à sua aplicação prática.
Apesar de alguns pontos em comum, como o fato de ambos terem a mesma
preocupação quanto à demora na regulamentação do texto constitucional, a mesma
legitimação passiva, ambas serem procedimentos auto-aplicáveis, haver omissão do
poder público e, também, aplicar-se em relação a normas constitucionais de eficácia
limitada de princípio institutivo, de caráter impositivo e das normas programáticas
vinculadas ao princípio da legalidade, esta ação não se confunde com o mandado
de injunção tendo em vista que são independentes divergindo nos seguintes pontos:
a) A ação de inconstitucionalidade por omissão é um instrumento de controle
abstrato que defende o texto integral da constituição, enquanto o mandado de
injunção é um remédio constitucional que defende os direitos estabelecidos na
constituição, mas que não são auto-aplicáveis por falta de norma
regulamentadora;
b) A ação de inconstitucionalidade por omissão se aplica a qualquer norma
constitucional, seja originária ou derivada, contida em qualquer dos títulos
constitucionais, inclusive, no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias
63
que tenham sua eficácia limitada por falta de norma regulamentadora, enquanto
o mandado de injunção se aplica aos direitos constitucionais fundamentais
que estejam no título dos Direitos e Garantias Fundamentais, e espalhados pela
constituição;
c) A legitimidade ativa da ação de inconstitucionalidade por omissão está
contida em numerus clausus nos incisos de I a IX, do art. 103, da Constituição
Federal, enquanto a do mandado de injunção é personalíssima, pois somente
o indivíduo prejudicado por falta da norma regulamentadora, poderá impetra-
lo.
2.8 MANDADO DE INJUNÇÃO
O mandado de injunção é um instrumento de garantia constitucional previsto
no título 2 cap 1 art. 5 inciso LXXI da Constituição Federal. A sua origem é discutida
por duas correntes diferentes. A primeira delas afirma que tem origem no direito
norte-americano, baseado na jurisdição de equidade. A segunda afirma que é
oriundo do direito português e que tinha como finalidade chamar a atenção do Poder
omisso para a necessidade de elaboração da norma regulamentadora. No direito
comparado recebeu o nome de writ of injuction” . A palavra injunção vem do latim,
“injuctione” que em nossa língua significa imposição, ordem formal. A finalidade do
mandado de injunção é combater a inércia na elaboração de normas
regulamentadoras dos direitos e garantias constitucionais fundamentais garantindo
aos indivíduos o direito previsto no bojo constitucional.
A constituição é composta de normas de eficácia plena, contida e limitada.
Esta última necessita de lei posterior para regulamentar o dispositivo constitucional.
Enquanto o Congresso Nacional não regulamenta o artigo que faz a previsão de
direito, os indivíduos não podem usufruir dele. Todavia, como previsão
constitucional o indivíduo pode requerer este direito e o judiciário não poderá negá-
lo. Observe-se que a sentença terá efeito para aquele caso concreto. Tanto é
assim, que a constituição federal impõe as seguintes condições para a impetração
deste instrumento:
64
a) ausência de norma regulamentadora que prejudique a fruição dos direitos
constitucionais nelas assegurados;
b) existência concreta deste direito.
Não se presta, pois, o mandado de injunção, para discutir a aplicação de
norma existente, nem para deliberar acerca da constitucionalidade da norma
vigente.
O poder judiciário não pode suprir a omissão legislativa, editando a norma
faltante, pois estaríamos diante de uma usurpação de atribuições própria de outros
poderes, importando quebra da sistemática constitucional.
O STF, porem, decidiu, no mandado de injunção 283, de que foi relator o
ministro Sepúlveda Pertence, pelo deferimento de medida liminar para:
“a) declarar em mora o legislador com relação a ordem de legislar contida no art. 8 §
3° do ADCT, comunicando ao Congresso Nacional e a Presidência da República;
b) assinar no prazo de 45 dias, mais 15 dias para a função, a fim de que se ultime o
processo legislativo da lei reclamada;
c) se ultrapassado o prazo acima, sem que esteja promulgada a lei, reconhecer ao
impetrante a faculdade de obter contra a União pele via processual adequada,
sentença líquida de condenação à reparação constitucional devida, pela pelas
perdas e danos que se arbitrem”
Assim, na decisão que comunica ao impetrado a existência de lacuna
legislativa, deve enxertar-se a determinação da edição da norma com fixação de
prazo para sua conclusão, facultado ao impetrante, inclusive, como tem decidido o
STF o direito de acionar o judiciário, pelas vias comuns, a fim de obter a devida
reparação sofrida pelo não exercício do direito constitucional obstado.
O mandado de injunção é um instrumento, praticamente sem uso no direito
brasileiro, uma vez que o judiciário não pode obrigar o legislativo a criar a lei
regulamentadora. Isto é mais um exemplo da usurpação dos direitos do cidadão.
2.9 REPRESENTAÇÃO DE INCOSTITUCIONALIDADE INTERVENTIVA
65
Esta ação, também chamada de ”ação direta de inconstitucionalidade
interventiva”, foi instituída pela Constituição de 1934 e é o marco do controle de
constitucionalidade brasileiro, tendo como objetivo preservar os princípios sensíveis
ou federativos, contidos no art. 34, inciso VII, da Carta Magna.
Neste trabalho, eu não poderia deixar de discorrer sobre ela por ser marco do
controle de constitucionalidade e também porque, entre os princípios sensíveis que
esta ação busca preservar, estão os direitos da pessoa humana (julgamento justo)
extremamente importantes para a manutenção da paz social.
A inobservância dos princípios sensíveis ou federativos tem como
conseqüência a intervenção da União na autonomia política dos Estados ou também
intervenção do Estado na autonomia política dos Municípios, o que é extremamente
terrível para um ente federativo.
A legitimidade para a propositura da ação é do procurador-geral da república
ou do procurador-geral de justiça do estado membro desobediente, que ajuizará a
ação junto ao Supremo Tribunal Federal ou junto ao tribunal de justiça do estado
membro. Segundo o Regimento Interno do STF, julgada procedente a ação e após
trânsito em julgado será feita a comunicação à autoridade interessada e ao
presidente da República, o governador do estado, para que seja editado o decreto
de intervenção, se for achado oportuno pela autoridade federal ou estadual.
O decreto interventivo será submetido à apreciação do congresso nacional ou
da assembléia legislativa do estado no prazo de 24 horas, e nele deverá constar a
amplitude, o prazo e as condições de execução.
No caso da intervenção ser declarada, para garantir a execução de lei federal,
ordem ou decisão judicial; para garantir a observância dos princípios sensíveis
contidos no art. 34, inciso VII, alínea "a" e "e", da Constituição Federal e quando tiver
como objetivo assegurar a observância de princípios indicados na Constituição
Estadual e, promover a execução de lei, de ordem ou decisão judicial, não
necessidade de controle político, isto é, de encaminhar-se o decreto de intervenção
para apreciação do congresso nacional nem da assembléia legislativa. Nestes
casos, a ação terá apenas as seguintes fases: fase inicial, judicial e decreto
interventivo. Nos demais casos de intervenção, não haverá a fase judicial. Esta
66
acontecerá quando a iniciativa da intervenção for do Procurador-Geral da República.
Nos demais, haverá a fase inicial, o decreto interventivo e o controle político,
espécies estas, que não interessam ao nosso objeto de estudo.
Corroborando a afirmação acima, isto é, a desnecessidade de controle
político, Lewandowski (1994:102) preleciona: "tratando-se de requisição judicial, não
poderá o legislativo obstá-la, sob pena de vulnerar o princípio da separação dos
poderes”.
2.10 ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL
É um instrumento de controle abstrato de constitucionalidade, instituído pelo
art. 102, parágrafo I, da CF e regulamentado pela lei 9.882, de 03/12/89 e será
proposta perante o Supremo Tribunal Federal. O objetivo desta ação é evitar ou
reparar lesão a preceito fundamental resultante de ato do poder público ou, ainda,
quando houver controvérsia constitucional relevante sobre lei ou ato normativo
federal, estadual ou municipal, mesmo os anteriores à constituição.
A Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental foi inspirado no
recurso constitucional alemão (Verfassungsbeschwerde), previsto na Lei
Fundamental de Bonn e Lei Orgânica do Tribunal Constitucional Federal, como
também no Recurso de Amparo previsto na Constituição da Espanha. Na Alemanha,
o Tribunal Constitucional legitima o acesso de todos, independente de ter advogado
ou não, desde que o cidadão se sinta prejudicado pelo poder público, sendo por isso
chamado de "Tribunal do Cidadão".
. No Brasil, a argüição foi inserida no ordenamento jurídico pela Constituição de
1988. A Emenda Constitucional nº. 3 deslocou para o parágrafo I, do artigo 102,
este instituto, confirmando a necessidade de regulamentação.
Com o advento da Lei nº 9.882/99, foi estabelecido regras acerca do processo
e julgamento da ADPF. Esta lei trouxe importantes inovações no controle de
constitucionalidade, pois, unificava o entendimento jurisprudencial do STF que,
agora, passava a ter efeito vinculante e erga omnes. Passou, também, a ser cabível
quando relevante fosse o fundamento da controvérsia constitucional sobre lei ou ato
67
normativo federal, estadual ou municipal, incluídos os anteriores à Constituição,
reduzindo assim, o número de recursos extraordinários. Outra inovação é que
passou a admitir a possibilidade de declaração de inconstitucionalidade abstrata, do
direito ordinário, anteriores a Constituição atual.
2.10.1 Preceito fundamental
Muitas são as discussões a respeito do significado de um preceito
fundamental. Qual a intenção do legislador ao referir-se a preceito fundamental? Por
que é importante saber o significado que a lei deu ao termo preceito?
A intenção do legislador não deveria ser difícil de identificar, pois poderá ser
perguntado aos elaboradores da lei. É importante saber o real significado do termo,
na lei, para que os operadores do direito possam aplicá-lo corretamente, sem
desvios, e de forma plena. Todavia, ao ser concluído o processo legislativo e dentro
do contexto da lei, muitas vezes, os significados ficam alterados tendo em vista a
forma de redação de um ou outro dispositivo, dando margem a interpretações
diversas, e também porque o constituinte e o legislador ordinário não delimitaram o
conceito.
Por esta razão os doutrinadores defenderam diferentes acepções a respeito
da extensão da expressão e por que se tornou importante ficar definida a posição do
STF, por ser ele o órgão responsável pelo julgamento do novel instituto, definindo o
que realmente é preceito fundamental.
O conceito de preceito deve ter sentido amplo, abrangendo os direitos
inseridos no artigo 5º, da Constituição Federal, bem como os direitos e garantias
fundamentais inseridos em todo o corpo constitucional, os objetivos fundamentais da
república e a dignidade da pessoa humana, uma vez que a finalidade da argüição é
a proteção das normas básicas da Carta Magna. Se estes direitos forem
desrespeitados, comissiva ou omissivamente, darão margem à argüição de
descumprimento de preceito fundamental. Todavia ela não pode ser usada para a
defesa de terceiros ou mesmo para algum tipo de ameaça futura.
Em meu entendimento, quando a Constituição refere-se a preceitos
fundamentais, quer mostrar qual o papel a ser cumprido por este instituto que é a
68
proteção da nação contra toda e qualquer coisa que contrarie o que é de mais
valoroso e mais sagrado para o seu sistema jurídico. Não é qualquer lesão à norma
formalmente constitucional, mas sim aos preceitos maiores que como não estão
determinados na carta política requereu um maior trabalho doutrinário e
jurisprudencial.
Silva (1998:559), diz que preceito fundamental são os princípios fundamentais
e todas as prescrições que formarem a base do regime constitucional, referentes à
autonomia dos Estados, do Distrito Federal bem como as referentes aos direitos e
garantias fundamentais.
Tavares (2001:50) observa que é necessário verificar qual o parâmetro
constitucional admitido para que se possa propor argüição de descumprimento de
preceito fundamental, pois necessário se faz esclarecer o significado de “preceitos
fundamentais”. Para ele, o se pode considerar preceito como mero princípio ou
regra. Afirma que um preceito é uma norma, entretanto fundamental. O
"fundamental" é que leva à idéia de um conjunto normativo constitucional. É preciso
afastar, de imediato, a possibilidade de que “preceito fundamental” seja toda e
qualquer norma contida na lei fundamental.(...) de se considerar fundamental o
preceito quando o mesmo apresentar-se como imprescindível, basilar ou inafastável
(TAVARES, 2001:52).
Os preceitos fundamentais segundo Moraes (2001:17), englobam os direitos
e garantias fundamentais e os fundamentos e objetivos fundamentais da República
Federativa do Brasil.
Para Sarmento (2001:91), entre os preceitos fundamentais estão os “direitos
fundamentais, as demais cláusulas pétreas, inscritas no art. 60, parágrafo 4º, da
Constituição da República Federativa do Brasil, bem como, os princípios
fundamentais da República”.
Para Motta Filho e Santos (2006:664), preceito fundamental é "todo e
qualquer dispositivo constitucional que tem natureza principiológica servindo de
alicerces para qualquer uma das cadeiras de direito contempladas pelo texto
constitucional". Portanto, neste contexto, estão os princípios fundamentais, os
direitos e garantias fundamentais, embora não componentes do título II, os princípios
69
explícitos e sensíveis referentes ao pacto federativo, à repartição de competências
dos entes da federação, os princípios voltados à Administração Pública, as cláusulas
pétreas e os princípios norteadores do Sistema Tributário Nacional, Ordem
Econômica e Financeira, os relacionados com os limites do estado na intervenção
da propriedade e na atividade econômica e as regras de Finanças Públicas.
Um preceito fundamental é uma norma jurídica que deve ser observada e
respeitada, que se constitui em verdadeiro princípio de direito. Para a autora desta
dissertação, preceito fundamental não é sinônimo de princípio fundamental, escrito
ou explícito. E sim uma norma jurídica de maior importância, que deve ser
observada sob pena de sanção. A Argüição de Descumprimento de Preceito
Fundamental fiscaliza toda e qualquer norma inserida no bojo da constituição,
levando a reafirmar que preceito fundamental é o que é "decorrente da constituição".
Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental é uma ação
constitucional que deve ser utilizada quando não houver nenhum outro meio
jurídico possível para sanar a lesividade do ato atacado. É uma ação subsidiária cuja
exordial deve vir acompanhada do ato questionado, provas da violação e o pedido
com suas especificações. A petição inicial poderá ser indeferida se inepta ou se não
obedecer aos requisitos previstos na lei. Da decisão de indeferimento caberá
agravo no prazo de cinco dias.
2.10.2 Competência
O Supremo Tribunal Federal é o órgão competente para processar e julgar a
Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental, mas a própria Constituição
Federal confere poderes às Constituições estaduais para que, através de emendas
constitucionais, possam criar institutos semelhantes, a fim de que o julgamento fique
a cargo dos Tribunais de Justiça Estaduais. Entretanto nenhum estado da federação
se atreveu a fazê-lo, quem sabe até, devido à dificuldade de compreensão do
alcance do referido instituto.
2.10.3 Legitimação
70
A Constituição Federal, com as modificações da Emenda Constitucional nº. 45
e o art. 2º, da Lei nº 9.882/99, determinam quais os legitimados para propor a ADPF,
que são os mesmos aptos a propor a ação direta de inconstitucionalidade,
mencionados quando do estudo deste instrumento.
2.10.4 Modalidade de argüição
A Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental classifica-se em
dois diferentes tipos: ação autônoma ou direta, contida no artigo 1º, caput da lei nº.
9.882/99 e a incidental ou indireta contida no parágrafo único do artigo 1º.
É cabível, quando houver controvérsia constitucional relevante sobre lei ou
ato normativo federal, estadual e ou municipal, incluídos, os anteriores à
Constituição.
Mendes(2001:143), salienta que, “ao permitir que o apenas o direito
federal, como também, o direito estadual e ou municipal, possam ser objeto de
pedido de declaração de constitucionalidade”, a argüição de descumprimento de
preceito fundamental veio mesmo a completar o quadro das ações declaratórias.
A ADPF, segundo o parágrafo único da Lei 9.882/99, considerou também
como descumprimento de preceito fundamental “controvérsia constitucional
relevante sobre lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal, incluídos os
anteriores à Constituição”, num flagrante de inconstitucionalidade, uma vez que
ampliou a competência do STF prevista no art. 102, Inciso I, alínea a, da
Constituição Federal.
2.10.5 Princípio da subsidiariedade
A argüição de descumprimento de preceito fundamental, a exemplo do artigo
4º, parágrafo , da Lei nº9.882/99, tem natureza subsidiária. Sempre que a lide
puder ser resolvida através de outro remédio constitucional de controle abstrato, não
se utiliza a ADPF. disposições semelhantes na legislação estrangeira. A
71
Verfassungsbeshwerde alemã e o recurso de amparo espanhol também podem
ser interpostos após o exaurimento das vias judiciais.
O caráter subsidiário da argüição de descumprimento de preceito fundamental
fundamenta-se na necessidade de prévia utilização de todos os meios, juridicamente
possíveis e eficazes, para fazer cessar ameaça ou lesão a preceito fundamental.
Exige-se, assim, para a argüição de descumprimento de preceito
fundamental, que sejam esgotadas todas as vias judiciais a ordinárias.
Em primeiro plano, poderia se imaginar que a ADPF somente seria possível,
quando absolutamente ausente qualquer outro meio idôneo, para afastar uma
possível lesão a direitos. Entretanto, a simples possibilidade de utilização de outros
meios processuais não é suficiente, por si só, para justificar a invocação do princípio
da subsidiariedade. Faz-se necessário que os instrumentos disponíveis sejam
realmente capazes de solucionar a situação lesiva que se quer decidir com a
propositura da ação.
Uma interpretação extremamente literal do princípio da subsidiariedade
culminaria por retirar da ADPF qualquer resultado prático. A utilização indevida do
princípio da subsidiariedade representa a falência da ação constitucional, de valores
essenciais, de preceitos fundamentais e de direitos básicos, com grave
comprometimento da própria efetividade da Constituição.
Assim, faz-se necessário interpretá-lo no contexto da ordem constitucional
global, que sempre haverá, no controle difuso ou concentrado, a possibilidade de
se utilizar ação ou recurso a fim de sanar qualquer lesão a preceito constitucional
fundamental. Uma simples interpretação judicial poderá conter uma ou mais lesões a
preceitos, justificando, assim, a propositura da ADPF. Tendo em vista que o Controle
de Constitucionalidade no Brasil é bastante amplo, observa-se que, como ação
subsidiária supletiva, só poderá ser utilizada em casos raros, e, limitados.
São exemplos de possíveis objetos de ADPF o direito infraconstitucional pré-
existente à Constituição Federal de 1988, o direito municipal em face da Carta
Magna ou uma norma elaborada sob a égide da atual Constituição, que tenha
sido revogada ou cujos efeitos já se extinguiram.
72
Nestes casos, tendo em vista o não-cabimento da ação direta de
inconstitucionalidade ou de qualquer outro remédio, não como deixar de
reconhecer a admissibilidade da ADPF. Esta ação representa a inovação do sistema
de controle de constitucionalidade brasileiro, pois, até o seu surgimento, não havia
no STF, nenhuma possibilidade de controle abstrato do incidente sobre direito pré-
constitucional. Esta complementação do sistema brasileiro de controle de
constitucionalidade é uma medida extremamente aberta à correção dos atos
violadores da constituição.
Mendes (1999) observa que, diante do caráter objetivo da argüição de
descumprimento de preceito fundamental, o juízo de subsidiariedade de visar,
especialmente, os processos objetivos consolidados no sistema constitucional.
Observa-se ainda que, em face ao perfil objetivo da mesma, com legitimação
diversa, dificilmente poder-se-á visualizar uma verdadeira relação de
subsidiariedade entre a ADPF e as formas difusas de controle constitucional.
Todavia, o STF para julgar a ADPF nº03 decidiu que outro meio eficaz de
sanar a lesividade poderia ser encontrado, tanto no controle difuso como no controle
concentrado, pois a condição sine qua non é que o meio seja capaz de sanar a
lesividade. Este requisito poderá tratar-se de qualquer ação ou recurso, inclusive o
recurso extraordinário.
O princípio da subsidiariedade deve ser aplicado com bastante cuidado, de
modo a evitar a impossibilidade de propositura da ADPF, sob pena de violação do
artigo 102, parágrafo 1º, da CF/88. O STF conhecerá a argüição de descumprimento
sempre que o princípio da segurança jurídica estiver ameaçado, principalmente em
razão de interpretações diferentes, devido ao nosso modelo pluralista de jurisdição
constitucional.
O princípio da subsidiariedade da ADPF, que exige o exaurimento das instâncias,
ganha significado crescente na jurisprudência. O STF, de forma excepcional,
somente poderá afastar a exigência do prévio esgotamento judicial, quando a
demora para o exaurimento das vias judiciais puder gerar prejuízo grave e,
irreparável lesão para a efetividade dos preceitos fundamentais.
73
2.10.6 Procedimento
O procedimento da argüição de descumprimento de preceito fundamental,
tanto autônomo quanto incidental apresenta aspectos similares ao da Ação
Declaratória de Constitucionalidade e da Ação Direta de Inconstitucionalidade.
Inicia-se com uma petição que deve obedecer aos requisitos do artigo 3º, da
lei 9.882/99, entre eles, a indicação do preceito fundamental violado, o ato do poder
público que violou o preceito fundamental, a prova de violação do preceito, a
comprovação de existência de relevante controvérsia judicial sobre a aplicação do
preceito fundamental violado.
A exordial poderá ser considerada inepta, ou manifestamente improcedente,
quando não estiver bem fundamentada, cabendo ao relator interferir, liminarmente.
Desta decisão cabe agravo que deverá ser dirigido ao plenário do tribunal.
Entretanto, uma vez que a ação foi proposta e aceita, também não poderá haver
desistência. A juízo do relator, poderá haver sustentação oral juntada de memoriais,
desde que sejam requeridas pelos interessados no processo.
É cabível a concessão de liminar, por decisão tomada pela maioria absoluta
dos membros do tribunal. O relator poderá conceder a liminar ad referendum do
tribunal pleno se houver urgência, período de lesão grave ou ainda se o Tribunal
estiver em recesso.
A exemplo do parágrafo 3º, do artigo 5º, da referida lei, a liminar poderá
consistir na determinação de que juízes e tribunais suspendam o andamento de
processos ou os efeitos de decisões judiciais, ou de qualquer outra medida que
apresente relação com o preceito objeto da argüição de descumprimento, salvo se
decorrente da coisa julgada.
Apreciado o pedido de liminar, o relator dará 10(dez) dias para que o órgão ou
autoridades responsáveis pela prática do ato questionado, o Advogado-Geral da
União e o Procurador da República, pronunciem-se. Terminado o prazo dos dez
dias, será emitido um relatório a todos os ministros e marcado o dia do julgamento.
74
Pela cláusula de reserva de plenário contida no art. 97 da Constituição é necessário
a presença, de pelo menos 2/3, dos ministros para que a sessão possa ser aberta.
Julgada a ação, as autoridades ou órgãos responsáveis deverão ser
comunicados da decisão final, que poderá ainda estabelecer as condições e a forma
de aplicação e interpretação do preceito fundamental.
A decisão é auto-aplicável e tem efeito vinculante contra todos, valendo
mesmo, antes da lavratura do acórdão, o qual deverá ser publicado no Diário da
Justiça e no Diário Oficial da União.
Segundo Diniz (1992:158) “o juiz não tem direito de legislar”, assim o STF, ao
proferir decisões vinculantes, estará usurpando funções do poder legislativo e
retirando dos juízes a liberdade de apreciação do caso sub júdice e uso do livre-
convencimento. Os magistrados perderiam a independência para decidir, tão
necessária para a garantia dos direitos dos jurisdicionados. O efeito vinculante
compromete o princípio da separação dos poderes, do duplo grau de jurisdição, do
devido processo legal, da inafastabilidade do controle jurisdicional e da ampla
defesa entre outros.
Muitos são os doutrinários que defendem esta mesma tese e alegam que
houve violação ao princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, ao princípio
do juiz natural, como também, o efeito vinculante, viola a independência dos
magistrados que não são livres para julgar.
É importante ressaltar que não é possível se admitir que as decisões
emanadas do STF vinculem todos os Poderes e Órgãos Públicos, conforme prevê a
legislação vigente, que tais decisõeso irrecorríveis eo podem ser objetos de
ações rescisórias, por esta razão, alguns doutrinadores acham que as previsões
legais, ora estudadas, o claramente inconstitucionais. A Súmula Vinculante,
apesar de inúmeras discussões, está em pleno vigor, no direito pátrio.
2.11 CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DA COISA JULGADA NO
DIREITO PORTUGUÊS
75
Em Portugal, inicialmente, foram adotados pelas Ordenações Afonsinas,
Manuelinas e Filipinas todos os institutos vindos do Direito Romano. Neste período,
não se poderia falar em coisa julgada, pois não havia controle de constitucionalidade
dos atos administrativos ou legislativos podendo a sentença ser rescindida a
qualquer tempo que o interessado pretendesse, independente do remédio de revista,
sempre que se pudesse alegar algo contra ela.
Atualmente, no Direito Português, toda a atividade do poder público está
subordinada aos princípios constitucionais e, a um controle que implique na
declaração de inconstitucionalidade de seus atos. Segundo a Constituição
Portuguesa, a validade das leis e dos demais atos do Estado, das regiões
autônomas e do poder local depende de sua conformidade com a Constituição.
Paulo Otero (1993:123) critica dizendo que os atos políticos e os atos
jurisdicionais ficam excluídos de quaisquer mecanismos de fiscalização, porém os
primeiros encontram sempre, ou quase sempre, mecanismos políticos de controle,
enquanto os atos jurisdicionais são carentes de qualquer garantia de controle de
validade. O Poder Judiciário deve adequar-se ao modelo do Estado de Direito de tal
forma que ”esse regime pode ser a admissibilidade de controle das referidas
decisões com fundamento em inconstitucionalidade e a sua inerente
imodificabilidade...”.
2.12 CONTRÔLE DE CONSTITUCIONALIDADE DA COISA JULGADA NOS
ESTADOS UNIDOS
Nos Estados Unidos a coisa julgada é vista sob a concepção da common
law. A coisa julgada não adquiriu a mesma força que tem em outros sistemas
jurídicos, pois o que importa para a common law é a busca e aplicação da justiça.
Baseado na equity, que afirma que os poderes decisórios da corte não
terminam com a tomada da decisão, isto é, com a sentença, continuando até que se
alcance a justiça entre as partes, é que se pode, perfeitamente propor qualquer
espécie de motions que objetivem pedir reconsideração, mesmo depois de trânsita
em julgado.
76
É também possível utilizar o instituto do collateral attack que é um ataque
paralelo à sentença, perante outro juiz, sem a participação de todas as partes a fim
de anular uma decisão tomada por um juiz incompetente.
3 CONCLUSÃO
Controle de constitucionalidade é o modo pelo qual o judiciário garante a
supremacia da Constituição sobre as leis e atos do poder público, verificando os
seus requisitos formais e materiais, e a sua adequação e conformidade à
Constituição. É a garantia de supremacia dos direitos e garantias fundamentais
contidos na Carta Magna, impondo limites ao poder do Estado, e garantindo a
existência de um Estado Democrático de Direito.
A principal finalidade do controle de constitucionalidade é a proteção dos
direitos constitucionalmente protegidos. Para isto diversas formas de controle foram
criadas como: a Ação Direta de Inconstitucionalidade genérica, a Ação de
Inconstitucionalidade por Omissão, a Representação de Inconstitucionalidade
Interventiva, e, por último, a Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental.
A idéia de Controle de Constitucionalidade surgiu com a idéia de supremacia
da Constituição e de que ela deve ser o ápice do ordenamento jurídico, onde todos
os demais atos devem conformar-se a ela, e aos seus princípios, não podendo, os
atos jurisdicionais, ficarem imunes a tais controles. Com a idéia de que a Carta
Magna é o instrumento de organização do Estado e de proteção dos direitos e
garantias fundamentais.
Em 1999, foi criado mais um instrumento de controle de constitucionalidade:
a ADPF, Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental que em muito veio
contribuir para o aperfeiçoamento do sistema brasileiro.
77
Esta ação é extremamente importante, pois, veio com o objetivo de defender
os preceitos fundamentais, pilares importantes na vida política de uma nação,
permitindo que, qualquer cidadão possa solicitar ao Ministério Público a sua
propositura. Nunca, dentro do Controle de Constitucionalidade e das demais leis do
sistema jurídico positivado, viu-se instrumento mais simples e mais acessível aos
cidadãos que tenham os seus direitos desrespeitados por qualquer orgão
governamental.
Todavia, necessário se faz, inovar outra vez, criando uma espécie de controle
de constitucionalidade dos atos do judiciário, da coisa julgada injusta, sem ferir o
princípio da segurança jurídica, que este é um dos direitos subjetivos mais
fundamentais da pessoa humana, sem deixar de lado o princípio justiça, razão da
existência do direito e alicerce do Estado Democrático de Direito.
A Constituição Federal é o instrumento de organização do Estado e de
proteção dos direitos e garantias fundamentais devendo protegê-los no sentido mais
amplo da palavra, não permitindo que casos iguais tenham sentenças injustas, que
dão direitos a uns e negam direitos a outros, ferindo de morte os princípios
constitucionais da dignidade da pessoa humana, da razoabilidade, da prevalência
dos direitos humanos, da isonomia e a garantia de uma sociedade livre justa e
solidária, entre outros.
Assim é que se faz necessário repensar como proceder em casos de
sentenças injustas, desiguais para casos iguais e, também, como fica a coisa
julgada no caso de inovações científicas como o exame de DNA para determinação
da paternidade. Atualmente, com raras exceções, a posição dos tribunais é a de que
transitada em julgado, a sentença adquire a presunção de certeza e a qualidade de
coisa julgada.
Vários foram os tipos de controle de constitucionalidade estudados nesta
dissertação e todos muito importantes para a manutenção do Estado Democrático
de Direito e a garantia dos direitos e garantias individuais. Todavia, ainda precisa ser
feito muito mais. Necessário se faz, pensar num novo instrumento legal que corrija
os estados de injustiça. Faz-se urgente a criação de um novo modelo de controle de
constitucionalidade da coisa julgada pelo judiciário, principalmente no caso de
78
sentenças ilegais e injustas, sob pena de perpetuarmos os estados de injustiças e
negarmos o Estado Democrático de Direito.
Os Estados Unidos nos oferecem um bom exemplo do valor que deve ser
dado à justiça, pois o direito é baseado na common law, que prioriza a busca e a
aplicação da justiça. a coisa julgada não adquiriu a mesma força que tem em
outros sistemas jurídicos. A sua força é relativa em função do valor justiça, pois o
que importa para a common law é a busca e a aplicação da justiça ao caso
concreto.
CAPÍTULO 3
LIMITES À COISA JULGADA
1 INTRODUÇÃO
Conforme foi visto nos capítulos anteriores, a coisa julgada foi prevista desde
o ordenamento jurídico romano, proliferando-se pelo ordenamento jurídico de
inúmeros países que têm como base o sistema romanístico.
O ordenamento jurídico brasileiro tem base profundamente romanística e,
desde o início da formação do seu patrimônio jurídico, percebe-se a forte presença
da coisa julgada como algo não mais passível de discussão, decidido pelo
Estado, solucionado e encerrado.
Somente pouco tempo é que se vem discutindo os limites da coisa
julgada, a possibilidade de reforma das sentenças transitadas em julgado, até que
ponto ela deve ser absoluta e quais os casos passíveis de relativização.
No Brasil, a coisa julgada está presente na Constituição Federal de 1988 e
no Código de Processo Civil. É um fenômeno de natureza processual com reflexos
79
no direito material. Deve estar em estrita observância com o direito material e com
princípios constitucionais, sob pena de tornar-se inconstitucional, ilegal e injusta.
A coisa julgada pode ser classificada como, autêntica ou verdadeira, material
ou civil, traduzida pela proibição de se discutir o litígio no mesmo ou em outro
processo, e, aparente ou limitada, formal ou processual tendo em vista a
imutabilidade da sentença dentro do processo em que foi prolatada. Todavia, a
maioria dos autores, classifica a coisa julgada de forma mais simples, apenas como
material e formal.
2 DESENVOLVIMENTO
2.1 COISA JULGADA MATERIAL
É considerada coisa julgada material quando a eficácia, que torna imutável
a sentença, não está mais sujeita a recurso, ordinário, ou extraordinário, não se
podendo mais discutir a lide no mesmo processo ou em processo posterior entre as
mesmas partes. Observa-se assim que a autoridade e a eficácia da coisa julgada
são limitadas ao objeto (limite objetivo) e, às partes (limite subjetivo), que integram a
relação jurídica.
Segundo a inteligência do art. 467, do CPC, a coisa julgada não é um mero
efeito da sentença, mas a sua eficácia para produzir efeitos que lhe são peculiares e
que a tornam indiscutível, isto é, imutável.
Segundo a Teoria da Vontade do Estado, de Chiovenda, que explica e
justifica a autoridade da coisa julgada, In SANTOS (2001:49),– é a lei como ato de
soberania do Estado que à sentença a autoridade de coisa julgada. E isto pode
ser constatado quando se o art. 468, do CPC, que diz: “A sentença, que julgar
total ou parcialmente a lide, tem força de lei nos limites da lide e das questões
decididas”.
A Constituição Federal (1988), em seu art. 5
o
, inciso XXXVI, determina que “a
lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada (grifo
80
nosso)”. Portanto, se a coisa julgada é imutável em face da lei não podendo por esta
ser prejudicada, a conseqüência mais lógica é que a coisa julgada seja imutável por
força de lei. Que estas não podem retroagir interferindo nas decisões ou sentenças
definitivas.
Todavia a lei nº5.869/73, que institui o Código de Processo Civil, em seu art.
485, autoriza a rescindibilidade da sentença de mérito transitada em julgado,
elencando os casos cabíveis.
Conforme se observa, limites para a coisa julgada material. A proteção
constitucional não impede que a lei estabeleça regras para sua rescisão mediante
atividade jurisdicional, usando-se, para isso, o mecanismo da ação rescisória.
Todavia, a proteção constitucional da coisa julgada atinge apenas a coisa
julgada material ou também a coisa julgada formal?
A nossa Constituição em nenhum momento faz distinção entre a coisa
julgada formal e a coisa julgada material. Esta distinção é feita apenas pelos
processualistas. A Constituição fala apenas de coisa julgada, preservando a
integridade desta para evitar que lei posterior modifique o seu conteúdo. se pode
falar em coisa julgada quando a decisão for de mérito, caso contrário será preclusão.
2.2 COISA JULGADA FORMAL
Coisa julgada formal é aquela da qual não cabe mais nenhum tipo de recurso.
Quando os processualistas falam sobre coisa julgada formal, estão referindo-se ao
fato de que não mais direito de ação se esta tiver as mesmas partes, o mesmo
objeto e a mesma causa de pedir. Mudando um destes elementos, não por que
se falar em coisa julgada formal. Em ntese: coisa julgada material é a que impede
discutir-se noutro processo o que se decidiu e coisa julgada formal é a que não se
pode mais discutir no mesmo processo o que se decidiu.
Portanto, entendo que, quando o legislador pensou no artigo 467, do CPC, e
referiu-se apenas à coisa julgada material, não o fez à coisa julgada formal por
entender que são duas espécies inseparáveis do mesmo gênero “coisa julgada”,
81
uma vez que, uma contém a outra e nem toda decisão com eficácia de coisa julgada
formal produz coisa julgada material.
2.3 LIMITES OBJETIVOS DA COISA JULGADA
Os limites objetivos da coisa julgada estão estabelecidos na parte dispositiva
da sentença e abrangem todas as questões decididas pelo juiz, tanto as referidas na
parte dispositiva quanto as decididas na motivação, quando o juiz, ao fundamentar,
motiva-se e toma decisão baseado na letra da lei e em consonância com os
princípios gerais de Direito. Estes pontos, entende-se, estão submetidos à res
iudicata com exceção somente quanto às questões prejudiciais e as de ordem
pública, que não são submetidas à preclusão máxima. A coisa julgada, do ponto de
vista objetivo, forma-se nos limites e pontos do pedido, conforme se observa na
inteligência dos arts. 128 e 460, do CPC.
Analisando-se os dois artigos, supramencionados, observa-se que é proibido
ao juiz decidir sobre matéria não suscitada nos autos e condenar o réu em objeto ou
quantia diversa ou superior do pedido, isto é, não poderá julgar extra petita, sob
pena de invalidade da sentença. Assim, a coisa julgada é considerada nos limites do
pedido e dentro de preceitos e, de leis do ordenamento jurídico, protegidos pelo
manto da constitucionalidade, sob pena de ferir-se, mortalmente, o Estado
Democrático de Direito, sobre o qual discorrerei em capítulos posteriores. A coisa
julgada material deverá ter fundamentação também nos Princípios Constitucionais.
Segundo Chiovenda (2002), a sentença opera os seus efeitos principais
ou secundários após o trânsito em julgado, quando a composição da lide e o
Estado ultima sua obrigação de dar prestação jurisdicional. A partir daí, os efeitos da
sentença são indiscutíveis e imutáveis inter partes e erga omnes.
A coisa julgada é uma qualidade das decisões jurisdicionais. Ela é imutável e
tem força cogente proveniente da própria autoridade do Estado no exercício da
obrigação jurisdicional.
A coisa julgada acontece pelo transcurso in albis do prazo recursal ou porque
a via recursal esgotou-se, não cabendo mais nenhum recurso. A sentença, a partir
82
daí tem força coercitiva e, segundo a legislação e a doutrina, adquire imutabilidade,
chegando ao ponto, onde, o famoso, Pontes de Miranda chega a afirmar, de forma
chocante, que “a atribuição de coisa julgada põe acima da ordem jurídica, das
regras jurídicas, o interesse social da paz, de fim à discussão, mesmo se foi injusta
a decisão (PONTES DE MIRANDA 1977:127) (grifo nosso)”.
A autoridade da coisa julgada é considerada, segundo esta afirmativa, como
se fosse uma coisa absoluta e inconteste, sem levar em consideração a justiça que
deve ser a essência da decisão de qualquer litígio.
Não se deve perpetuar uma decisão injusta em nome da paz social ou da
própria segurança jurídica, em detrimento de um dos princípios constitucionais mais
importantes e essência da própria existência do direito, que é a justiça. Uma ordem
jurídica não pode garantir a paz se for cúmplice com decisões injustas.
Outro fundamento constitucional para tal afirmação é o artigo 3º, inciso I, da
Constituição Federal, que prevê que é objetivo fundamental da Republica Federativa
do Brasil, entre outros, “construir uma sociedade livre justa e solidária”.
A conclusão é obtida por meio da interpretação da palavra justa. É objetivo da
República Federativa do Brasil que as normas e atos do Poder Público tenham
conteúdo justo, razoável, proporcional. Tal norma reforça a existência do princípio do
devido processo legal no seu sentido substantivo e, como decorrência, a
razoabilidade e proporcionalidade das leis.
As sentenças injustas ferem a dignidade do ser humano, o Estado
Democrático de Direito, o devido processo legal e o princípio constitucional acima
citado de que a sociedade deve ser justa e solidária. O princípio da segurança
jurídica deve também ter limites e jamais poderá contrapor-se ao princípio de que a
sociedade deve ser “livre, justa e solidária”. “A segurança jurídica cede quando
princípios de maior hierarquia postos pelo ordenamento jurídico são violados pela
sentença”, tendo em vista que na estabilidade jurídica da coisa julgada “é necessário
prevalecer o sentimento do justo” (DELGADO 2002:21).
Segundo Delgado (2002:11) “o Estado, em sua dimensão ética, não protege a
sentença judicial, mesmo transitada em julgado, que bate de frente com os
83
princípios da moralidade e da legalidade”, se essa sentença for de encontro à
realidade dos fatos ou representar única e exclusivamente a vontade pessoal do
julgador. Assim, os efeitos da sentença “devem prestar homenagem absoluta aos
princípios da moralidade, da legalidade, da razoabilidade e do justo” (p.17). Em
suma, a sentença deverá conformar-se às leis contemporâneas, aos limites da
moralidade e aos princípios constitucionais como forma de corroborar o Estado
Democrático de Direito.
Atualmente, após a Medida Provisória 2.180-35/01 já incorporada ao art. 741,
do CPC, como rever a coisa julgada inconstitucional, mas nada pode ser feito
quanto à coisa julgada injusta.
Uma corrente doutrinária, com características conservadoras, justifica a
autoridade da coisa julgada. Uma segunda corrente, mais inovadora, defende a
idéia de que a coisa julgada deve ser flexibilizada e propõe a sua relativização.
2.4 LIMITES SUBJETIVOS DA COISA JULGADA
Observe-se que as teorias mencionadas m estreita ligação não somente
com os limites objetivos da coisa julgada, como também com os limites subjetivos.
Analisando-se o artigo 472, do CPC, que, refere-se aos limites subjetivos da
coisa julgada, observa-se que a sentença faz coisa julgada entre as partes
envolvidas no litígio, não beneficiando, nem prejudicando terceiros a não ser nas
causas relativas ao estado da pessoa, desde que citadas no processo, em
litisconsórcio, necessário.
Conforme se observa, a coisa julgada tem como limites subjetivos as partes
da relação jurídica processual, não atingindo terceiros, se estes não houverem sido
citados em litisconsórcio necessário; se não houverem sido devidamente citados e
não tiveram direito ao contraditório e à ampla defesa. Se estas condições tiverem
sido obedecidas, a sentença fará coisa julgada, também, em relação a terceiros.
A autoridade da coisa julgada é válida somente entre as partes, todavia, a
eficácia da sentença é válida para todos podendo, via reflexa, atingir credores,
84
fiadores, herdeiros e, demais pessoas com interesse na solução da relação jurídica
e ou patrimonial. Apesar de não serem atingidos pela autoridade da coisa julgada
sofrem os seus efeitos civis, via reflexa. A solução para estes casos é discutir os
seus direitos materiais em outra ação.
Segundo Silva(1998) na doutrina européia, o pensamento dominante é de
que a coisa julgada é o efeito ou, como quer Liebrman (1984), ‘a qualidade’ que
se agrega à declaração contida na sentença, sendo, os demais efeitos, totalmente
libertados da imutabilidade que ele pretendera atribuir-lhes. Assim, segundo ele, a
doutrina dominante na Europa e, ele também defende esta idéia, é a de que
somente o efeito ou, ainda, a qualidade, é que fazem coisa julgada. Os limites da
coisa julgada residem no efeito e ou qualidade da sentença, porém, os demais
efeitos não estão cobertos pela autoridade da coisa julgada.
2.5 O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E A COISA JULGADA
O Código de Defesa do Consumidor também se preocupou com o alcance da
coisa julgada nas ações coletivas. Quais os efeitos da coisa julgada? Quando o
legitimado pode intentar outra ação com idêntico fundamento? Quais os limites
objetivos e subjetivos da coisa julgada nas ações coletivas que envolvem relações
de consumo? Para tanto, necessário se faz, a análise do art. 103, do CDC, e seus
incisos que dizem que, neste tipo de ação, a sentença fará coisa julgada erga
omnes, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas.
Neste caso, com a apresentação de nova prova outra ação poderá ser intentada
com o mesmo fundamento.
Quando referir-se a interesses difusos, a sentença julgada procedente ou
improcedente, salvo por insuficiência de provas, fará coisa julgada contra todos
(erga omnes). No caso de insuficiência de provas, a ação, com o mesmo
fundamento, poderá ser intentada novamente, por qualquer legitimado, pois não fez
coisa julgada. É o que se chama coisa julgada secundum eventum litis”, isto é, de
acordo com o resultado do processo.
85
Quando referir-se a direitos coletivos, a sistemática é a mesma dos direitos
difusos, todavia a formação da coisa julgada será limitada apenas, ultra partes, isto
é, entre os sujeitos que possuem um vínculo jurídico com o grupo, classe ou
categoria.
Os efeitos da coisa julgada nos direitos difusos e coletivos não prejudicam os
direitos individuais dos participantes, não geram litispendência, podendo os
indivíduos intentar, a qualquer tempo, ações individuais pelos danos sofridos. Os
direitos individuais homogêneos de origem comum geram coisa julgada erga omnes
se o pedido for procedente, beneficiando a todas as vítimas que poderão habilitar-se
na liquidação, promovendo a execução pelos danos sofridos.
A sentença improcedente forma coisa julgada material entre as partes. Os
limites são as partes, o prejudicam os consumidores que não entraram como
litisconsortes.
Conforme se observa a 2ª parte do § 3
o
, do artigo 103 é uma novidade onde
o legislador deu uma feição própria ao objeto do pedido, determinando que, caso a
ação civil pública seja julgada procedente, os seus efeitos sejam transportados para
as ações individuais, podendo a vítima que não estava na inicial, ingressar no
processo na fase de liquidação, desde que prove o nexo de causalidade.
As ações individuais homogêneas podem correr paralelamente com as ações
individuais, pois, não há litispendência entre elas, é o que se observa a seguir:
“A propositura de ação civil pública pelo idec por danos provocados a interesses
individuais homogêneos não induz litispendência em relação à ação de cunho
individual. Aplicação do art. 104 do Código de Defesa do Consumidor (STJ), Resp
nº.
.
160288/SP, 4
o
T.; Rel Min. Barros Monteiro; J. 10.04.2001; DJU 13/08/2001”.
O autor individual, ao tomar ciência nos autos da ação coletiva, terá 30 (trinta)
dias para pedir a suspensão do seu processo individual e esperar pelo resultado da
ação coletiva. Caso não saia vencedor, poderá continuar com o seu processo
individual.
86
Concluindo o capítulo, percebe-se que a autoridade da coisa julgada reside,
num primeiro plano, no fato de não poder-se eternizar o conflito nas relações sociais.
O Estado precisa dar segurança jurídica às partes, na busca pelos seus direitos,
pondo um basta nas questões decididas pelo poder jurisdicional. Segurança esta de
um mesmo objeto, uma mesma causa de pedir e entre as mesmas partes, desde
que não surja nenhum fato novo. Uma vez decidida, jamais poderá ser discutida no
mesmo ou em outro processo.
Num segundo plano, esta autoridade da coisa julgada reside em vários
fatores analisados sob a ótica de rios processualistas e deram origem às teorias
supramencionadas.
Todavia, convém lembrar que esta autoridade tem limites objetivos e
subjetivos. Os primeiros, conforme o próprio nome explica, limitam-se ao objeto do
pedido e o segundo, encontra os seus limites, nos sujeitos do pedido.
87
3 CONCLUSÃO
A coisa julgada é um fenômeno de natureza constitucional e processual que
sofre limitações tanto de ordem material quanto de ordem formal. Ela sofre
limitações quanto ao objeto (limite objetivo) e quanto às partes que integram a
relação jurídica (limite subjetivo).
A doutrina e o código de processo civil, (Art. 468-CPC), consideram a coisa
julgada imutável nos limites da lei e das questões decididas. Várias teorias foram
criadas para explicar esta autoridade de imutabilidade que estudaremos no capítulo
seguinte.
O art.485, do Código de Processo Civil mostra as condições de
rescindibilidade da sentença transitada em julgado. Todavia, entre elas, não se
encontra, em nenhum momento, remédio para corrigir a coisa julgada injusta, que
fere a isonomia e, os princípios da coisa julgada justa. Indo de encontro, também
com o objetivo fundamental da República Federativa do Brasil que é a construção de
uma sociedade livre, justa e solidária.
Fere até mesmo o Preâmbulo Constitucional que, apesar de não ser lei, é um
documento de intenção de extremo valor que afirma:
“instituir um Estado Democrático destinado a assegurar, (...), a igualdade e a justiça
como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos,
fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional com a
solução pacífica das controvérsias” (grifo nosso).
88
A coisa julgada sofre pouquíssimas limitações. É necessário que se estude
mais e se analise estas limitações para que se possa encontrar uma forma de
expandi-las à coisa julgada injusta, ou ainda que seja criado um outro instrumento
de controle de constitucionalidade que possa dar um basta na coisa julgada injusta,
pois ela fere a dignidade do ser humano. As limitações supramencionadas, as
referentes às questões prejudiciais e as de ordem pública, que não transitam em
julgado, não são suficientes para corrigir tão grave distorção que é a permanência
de uma sentença injusta e a eternização do estado de injustiça.
Os novos limites propostos necessitam atender aos princípios da
razoabilidade, da justiça, da dignidade da pessoa humana e, ao mesmo tempo, ao
princípio da segurança jurídica que deve ser dada ao cidadão vencedor de uma lide,
julgada em consonância com a Constituição Federal, com as leis e com os valores
supremos da justiça que devem ser a essência básica no julgamento de qualquer
litígio.
É bom lembrar que não se deve perpetuar uma decisão injusta em nome da
paz social ou, até mesmo da segurança jurídica, em detrimento do mais importante
princípio constitucional e essência da própria existência do direito, que é a justiça.
Uma ordem jurídica não pode garantir a paz se for cúmplice de decisões injustas.
89
CAPITULO 4
AUTORIDADE DA COISA JULGADA
1 INTRODUÇÃO
A autoridade da coisa julgada virou dogma para alguns processualistas que
defendem a imutabilidade da coisa julgada, sob pena de estar-se ferindo o Estado
Democrático de Direito, que é fundamento da República Federativa do Brasil.
Afirmam que a coisa julgada tem a proteção constitucional prevista no art. 5º, inciso
XXXVI, da Constituição Federal, que é cláusula pétrea, imodificável e inabolível.
Uma segunda corrente acha que a proteção à coisa julgada prevista
constitucionalmente no supramencionado artigo não é absoluta e sim relativa. Que a
proteção é apenas à coisa julgada material não se referindo o supramencionado
artigo á coisa julgada formal.
Uma terceira corrente afirma que não existe coisa julgada formal, que esta é
uma expressão equivocada e,, que as hipóteses do artigo 267, do CPC, são de
preclusão e que a garantia constitucional é apenas à coisa julgada material, pois, a
90
coisa julgada formal é um fenômeno de natureza processual enquanto a coisa
julgada material é um fenômeno de natureza constitucional.
Várias o as teorias que justificam a autoridade da coisa julgada, explicam
como se formou, e, baseada em que a coisa julgada adquiriu tamanha dimensão!
Neste capítulo, discorre-se sobre as teorias que justificam a autoridade da coisa
julgada. Todavia, eles apenas mostram a fundamentação política e filosófica que,
levou muita gente, durante anos, a ter a coisa julgada como imutável e como
verdadeiro dogma.
Atualmente, após a Medida Provisória 2.180-35/01, incorporada ao art.
741, do CPC, como rever a coisa julgada inconstitucional, mas nada pode ser
feito quanto à coisa julgada injusta. Uma corrente doutrinária com características
conservadoras, justifica a autoridade da coisa julgada. Uma segunda corrente
inovadora, defende a idéia de que a coisa julgada deve ser flexibilizada e, propõe a
sua relativização.
A corrente doutrinária que defende a autoridade da coisa julgada afirma que
esta repousa em dois fundamentos. O primeiro, é de ordem política ou pragmática:
O objetivo principal do processo é ser um termo final, sob pena de se estar
perpetuando a insegurança jurídica das relações sociais. Segundo eles, o processo
é instrumento de acesso à justiça, todavia, não pode haver justiça sem segurança
jurídica. Deve haver sempre um equilíbrio entre estes dois valores.
O segundo fundamento é de ordem jurídica sobre o qual existem teorias da
lavra de vários processualistas e estudiosos do direito, dos primórdios aos nossos
dias como: a Teoria da Vontade do Estado de Chiovenda; a Teoria da Presunção da
Verdade, aplicada pelos juristas da Idade Média e adotada por juristas modernos,
como Pontes de Miranda; a Teoria da Ficção da Verdade de Savigny; a Teoria de
Carnelutti; a Teoria de Liebman; a Teoria da Eficácia da Declaração defendida por
Helwing, Binder e Stein; a Teoria da Extinção da Obrigação Jurisdicional de Ugo
Rocco, a Teoria da Força Legal, Substancial da Sentença de Pagenstecher; sobre
as quais discorreremos a seguir.
91
2 DESENVOLVIMENTO
2.1 TEORIA DA VONTADE DO ESTADO
Segundo Santos (2001:40) esta teoria foi criada por Chiovenda. Ela parte do
pressuposto de que a sentença tem força obrigatória tendo em vista que é a
manifestação da vontade do Estado, no exercício do poder jurisdicional.
Assim, a autoridade da coisa julgada é oriunda da autoridade inerente ao
Estado, na solução e pacificação dos conflitos. Julgado o caso e, uma vez precluso
o prazo para recurso, a sentença se torna imutável, tornando-se coisa julgada
formal. O Estado cumpriu o seu papel de decidir o conflito. A decisão transitou em
julgado e, agora, torna-se obrigatória e incontestável pelas partes bem como em
relação à jurisdição, tornando-se coisa julgada material.
A vontade do Estado, que é o tutor jurisdicional, deve ser respeitada, não
mais discutida e o conflito solucionado deve ser esquecido. Para ele, a coisa julgada
é a afirmação indiscutível, e obrigatória para os juizes de todos os futuros processos,
de uma vontade concreta de lei, que reconhece ou desconhece um bem da vida a
uma das partes.
2.2 TEORIA DA PRESUNÇÃO DA VERDADE
92
Segundo Santos (2001:41), esta teoria foi fundada em textos de Ulpiano e
tem como base a filosofia escolástica, que levou os juristas da Idade Média a
fundamentar a autoridade da coisa julgada na presunção da verdade do conteúdo da
sentença. Para os escolásticos, o processo tem por objetivo a busca da verdade e é
um silogismo onde a premissa menor é a matéria de fato, a fundamentação é a
premissa maior e a sentença é a conclusão (decisão).
Apesar da observação atenciosa dos fatos nem sempre estes são bem
conhecidos e analisados levando, conseqüentemente, as sentenças injustas por
error facti. Como nem sempre as sentenças traduzem a verdade, mas uma
presunção da verdade, tida como verdade absoluta, é que todas as nulidades e
injustiças que se praticarem contra o direito das partes, não são possíveis de
revogação.
2.3 TEORIA DA FICÇÃO DA VERDADE
Esta teoria de Savigny pressupõe que as sentenças injustas por erro de fato
e de direito transitam em julgado, tendo em vista que a verdade nelas contida é um
artifício, uma ficção da verdade. Assim, em conseqüência, o que a sentença declara
não pode deixar de ser reconhecido como verdade pelas partes e por qualquer juiz,
quer seja no mesmo ou em outro processo.
2.4 TEORIA DE CARNELUTTI
A teoria de Carnelutti se identifica com a teoria de Chiovenda, anteriormente
citada, quando ambas afirmam que a autoridade da coisa julgada é proveniente da
autoridade do Estado no exercício da jurisdição.
Elas se afastam quando analisam o momento de formação da coisa julgada.
Para Chiovenda, a sentença determina a lei a ser aplicada ao caso concreto, e o
comando da sentença força autônoma e paralela em relação à imperatividade da
lei.
93
Para Carnelutti, o comando da sentença, pressupondo o comando da lei, não
é paralelo ao desta, mas sim um comando suplementar, que declara uma certeza e,
impõe uma imperatividade oriunda do direito de Império do Estado, isto é, o
comando da sentença pressupõe o comando da lei sem com este (comando) se
identificar.
Não é a coisa julgada material que pressupõe a coisa julgada formal, mas
sim esta (coisa julgada formal) que pressupõe a coisa julgada material.
2.5 TEORIA DE LIEBMAN
Liebman é sem dúvida o principal estudioso da matéria. Para ele, a coisa
julgada é:
“a imutabilidade do comando emergente de uma sentença. Não se a identifica
simplesmente com a definitividade e intangibilidade do ato que pronuncia o
comando; é, pelo contrário, uma qualidade, mais intensa e mais profunda, que
reveste o ato também em seu conteúdo e torna assim imutáveis, além do ato em sua
existência formal, os efeitos, quaisquer que sejam, do próprio ato” ( LIEBMAN
1984:54 ).
Afirma, ainda, que o instituto da coisa julgada se justifica “por meio de
considerações práticas e de utilidade social” (LIEBMAN 1984:39).
A coisa julgada é uma qualidade especial da sentença que reforça a sua
eficácia quanto à sua imutabilidade, enquanto ato processual, fazendo coisa julgada
formal e com a imutabilidade dos seus efeitos, fazendo coisa julgada material.
Não basta, todavia, que a sentença seja proferida pelo Estado-Juiz, é
necessário que esteja em conformidade com o direito sob pena de ineficácia. Como
os atos do Estado têm presunção de legalidade até que se prove o contrário, as
sentenças são válidas e eficazes em todos os sentidos.
94
As sentenças, com efeito suspensivo, têm sua eficácia sobrestada até que
os recursos estejam preclusos. As sentenças, com efeito devolutivo, são eficazes ab
initio.
Em suma, quando todos os recursos estão preclusos é que nasce esta
qualidade especial da sentença que é a coisa julgada formal e material pela
imutabilidade da sentença e dos efeitos que produz, culminando com o que se
chama autoridade da coisa julgada.
2.6 TEORIA DA EFICÁCIA DA DECLARAÇÃO
Segundo Hellwing, Binder e Stein, citado por Santos (2001:47) a autoridade
da coisa julgada reside na eficácia da declaração de certeza contida na sentença.
Estas podem ser declaratórias de um direito afirmando-o ou negando-o, conforme
declarem a existência ou mesmo a inexistência de uma relação jurídica entre as
partes. Podem ser, também, constitutivas quando formam o direito.
Estas encerram sempre um provimento que constitui, extingue ou modifica
uma relação jurídica, condenando o indivíduo a dar, fazer ou não fazer alguma coisa
e tendo valor de título executivo.
Neste caso além de declararem o direito, criam um direito novo
oportunizando ao vencedor o direito de numa nova ação (de execução) forçar o
vencido a cumprir a obrigação. A certeza da declaração é que força e autoridade
à coisa julgada fazendo com que as partes e a jurisdição respeitem a sentença e lhe
dê eficácia.
2.7 TEORIA DA EXTINÇÃO DA OBRIGAÇÃO JURISDICIONAL
95
Segundo SANTOS (2001:49), esta teoria é da lavra de Ugo Rocco, que a
formulou com base nos conceitos de ação e jurisdição e preleciona que, uma vez
usado o direito de ação pelo indivíduo e cumprido o papel do Estado de dar a tutela
jurídica através da jurisdição, extingue-se o direito de ação que lhe é correlato e, a
relação de direito material decidida não poderá mais ser submetida à apreciação do
Estado-Juiz para discussão ou alteração. A obrigação do Estado de tutelar os
direitos individuais e resolver os conflitos, está devidamente extinta e o vencedor
com o direito de cobrar o seu prêmio.
A sentença, ao transitar em julgado, extingue tanto a obrigação jurisdicional
do Estado quanto o correspondente direito de ação, nada mais podendo ser
discutido se tiver o mesmo objeto e as mesmas partes.
2.8 TEORIA DA FORÇA LEGAL, SUBSTANCIAL, DA SENTENÇA
Segundo SANTOS (2001:46), esta teoria é da lavra de Pagenstecher. Para
ele todas as sentenças e até mesmo as declaratórias são constitutivas de direito e
produzem certeza jurídica, e que após transitarem em julgado firmam esta certeza
jurídica e criam um direito novo que deve prevalecer sobre o direito anterior por
força de lei.
96
3 CONCLUSÃO
A autoridade da coisa julgada repousa em fundamentos de ordem política ou
pragmática que afirmam que o objetivo principal do processo é por um termo final à
lide, sob pena de se estar perpetuando a insegurança jurídica das relações sociais.
Repousa, também, em fundamentos de ordem jurídica apresentados em teses de
doutrinadores como Chiovenda, Savigny, Carnelutti, Liebman, Helwing, Binder,
Stein, Ugo Rocco, Pargenstecher e adotada por juristas modernos do porte de
Pontes de Miranda, conforme observamos nas teorias supramencionadas.
Resta discutir apenas até que ponto deve prevalecer a autoridade da coisa
julgada. Nos nossos dias, com uma sociedade dinâmica, com os novos modelos
sociais vigentes, justifica-se ainda o dogma da coisa julgada intocável? O exagero
de afirmar-se que a coisa julgada seria capaz de transformar o preto em branco? A
sentença equivocada deve ser imutável e indiscutível? Lógico que não.
Modernamente, com o progresso da ciência, através dos estudos científicos, estas
idéias estão superadas. Um exemplo disto são os exames de DNA para dirimir
dúvidas sobre o estado de paternidade. Urge que nos debrucemos e discutamos até
aonde vai esta autoridade.
97
O dogma da coisa julgada intocável deve ser quebrado, porque, atualmente,
a autoridade da coisa julgada não é mais absoluta. temos instrumentos de
impugnação da coisa julgada inconstitucional sobre os quais discorremos no capítulo
seguinte.Todavia precisamos ampliar estes instrumentos, estendendo-os à coisa
julgada com erro evidente, ilegal e injusta levando-se sempre em conta a evolução
da sociedade com seu clima, sua cultura, seus valores e, suas reais necessidades.
Com todo respeito aos renomados processualistas supramencionados que
afirmam que o processo é instrumento de acesso à justiça e que não justiça sem
segurança jurídica, discordo deles, pois, o acesso à justiça deve ser recíproco, deve
haver a busca da verdade real, e mesmo a sentença trânsita em julgado, deve ser
revista a qualquer tempo desde que seja constatado, “a posteriori”, que ela foi ilegal,
inconstitucional ou injusta. deve haver segurança jurídica preservando a
autoridade das decisões do Estado, quando ela está conforme os princípios morais,
legais, constitucionais e com o objetivo fundamental do direito que é um meio cujo
fim é a busca da justiça e da paz social.
Assim é que no próximo capítulo discorrerei sobre a coisa julgada,
inconstitucional, ilegal e ou injusta e quais instrumentos de impugnação que
existem no direito processual brasileiro.
98
CAPITULO 5
IMPUGNAÇÃO DA COISA JULGADA INCONSTITUCIONAL E
INSTRUMENTOS DE CONTROLE
1 INTRODUÇÃO
O conflito entre a coisa julgada e a Constituição é uma constante nos julgados
brasileiros. O mito da coisa julgada imodificável está caindo por terra. A força da
coisa julgada é de natureza relativa. Sem dúvida nenhuma não se pode permitir que
a sentença em descompasso com o texto constitucional, permaneça imutável
Antes de transitar em julgado, a sentença que ofende à Constituição pode ser
submetida aos recursos ordinário e extraordinário. Todavia, após transitar em
julgado a coisa se complica. Poucos são os instrumentos que podem impugná-la.
Mesmo quando ferem os princípios e ou preceitos constitucionais, por não existir um
99
controle efetivo dos atos do judiciário, como se os mesmos não fossem espécies do
gênero, atos do poder público.
Observa-se ao longo dos anos que, quando se fala em controle de
constitucionalidade, a preocupação é sempre com os atos emanados do legislativo,
não uma maior preocupação com os atos emanados do judiciário, com as suas
decisões que, sem nenhuma dúvida, são passíveis de estar desconformes com a
Constituição, causando enormes prejuízos às pessoas físicas e jurídicas atingidas
por sentenças inconstitucionais, ilegais, imorais e injustas.
Teodoro Júnior e Faria (2004) relatam que tiveram as suas atenções
despertadas para o problema do conflito entre a coisa julgada e a Constituição,
quando emitiram parecer para a Procuradoria Geral do Estado de São Paulo, a
respeito da multiplicidade e superposição de sentenças transitadas em julgado,
condenando o poder público a indenizar a mesma área expropriada mais de uma
vez, ao mesmo proprietário, em casos que não cabia mais rescisória e defenderam o
cabimento de impugnação ordinária, para afastar o intolerável erro praticado pela
Justiça.
Wilson Leite Corrêa, (1999) Juiz de Direito no Mato Grosso do Sul diz que,
por demais tormentoso, em matéria de direito público, é resolver a prevalência do
direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada em confronto com a
Constituição. Relata que, ao chegar à extinta Procuradoria Regional do INSS, em
Jaú SP, encontrou inúmeras decisões com trânsito em julgado e sem prazo para
rescisória que eram flagrantemente inconstitucionais, por determinarem
reajustamentos milionários de benefícios em flagrante desrespeito ao art. 58, do
ADCT. Um processo com apenas 04(quatro) beneficiários, totalizava 1.800.000(um
milhão e oitocentos mil reais), passando o salário mensal de 06(seis) salários
mínimos para cerca de 60(sessenta), salários mínimos, sendo obrigado a opor
embargos, alegando a inexistência de coisa julgada em frente à Constituição para
coibir tão graves erros cometidos pelo judiciário e tão prejudiciais àquela Autarquia
Federal.
Ao ocupar o cargo de Superintendente Estadual do INSS no Piauí, encontrei
flagrantes exemplos de sentenças com trânsito em julgado, sem prazo para
100
rescisória, que eram, flagrantemente, inconstitucionais, ilegais e injustas o que me
chamou a atenção para o problema da coisa julgada em desacordo com os
princípios constitucionais e com o senso de justiça e a necessidade de um maior
controle dos atos do Poder Judiciário.
Otero (1993:9) fala do esquecimento do controle dos atos do judiciário em sua
excelente obra, Ensaio, sobre o caso julgado inconstitucional na seguinte passagem:
“As questões de validade constitucional dos atos do poder judicial foram objeto de
um esquecimento quase total, apenas justificado pela persistência do mito liberal que
configura o juiz como’a boca que pronuncia as palavras da lei’ e o poder judicial
como’invisível e nulo’(Montesquieu).”
Neste capítulo, estudarei, alguns instrumentos de impugnação da coisa
julgada, utilizados pelo Executivo, Legislativo e Judiciário. São instrumentos
existentes no direito positivo brasileiro, que se opõem à coisa julgada, contestam e
refutam as sentenças, com trânsito em julgado. São formas de rescindir ou amenizar
os efeitos de sentenças acobertadas pelo manto da coisa julgada.
101
2 DESENVOLVIMENTO
2.1 INSTRUMENTOS DE IMPUGNAÇÃO DA COISA JULGADA PELO PODER
JUDICIÁRIO
2.1.1 Ação rescisória
É uma ação autônoma de impugnação da coisa julgada, onde um
julgamento do julgamento, com o objetivo de desconstituir sentença de mérito,
inquinada de nulidade, desde que proposta dentro do prazo de 02(dois) anos.
Antes da Medida Provisória nº. 2.180/2001, o direito processual brasileiro não
previa um instrumento processual consentâneo à impugnação da coisa julgada
inconstitucional. A sistemática de controle, restringia-se à via recursal ordinária, à
ação rescisória e aos embargos à execução previstos nos artigos 485 a 495 e 741 a
744, todos do Código de Processo Civil. Todavia a ação rescisória se aplica
102
quando a sentença for dada por prevaricação, concussão ou corrupção do juiz; for
proferida por juiz impedido ou absolutamente incompetente; resultar de dolo da parte
vencedora em detrimento da parte vencida, ou de colusão entre as partes a fim de
fraudar a lei; ofender a coisa julgada; violar literal disposição de lei; fundar-se em
prova, cuja falsidade tenha sido apurada em processo criminal, ou seja, provada na
própria rescisória; quando depois da sentença, o autor obtiver documento novo, cuja
existência ignorava, ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de lhe
assegurar pronunciamento favorável; quando houver fundamento para invalidar
confissão, desistência ou transação, em que se baseou a sentença; ou, ainda,
quando fundada em erro de fato,resultante de atos ou de documentos da causa.
Entendo que a interpretação moderna do disposto acima quando diz literal
disposição de lei abrange, também, os princípios. Portanto, cabe rescisória, também
em caso de ofensa aos princípios.
2.1.2 Querela nullitatis
A querela nullitatis é uma expressão latina que significa litígio nulo. Ação
criada na Idade Média, com o objetivo de atacar a imutabilidade da sentença
convertida em res iudicata, sob o fundamento de achar-se inquinada de vícios que a
levaram á nulidade. Neste caso o querelante tinha direito a uma nova decisão de
mérito sobre o caso. É apontada como origem e marco das ações autônomas de
impugnação.
Havia à época dois tipos de querela nullitatis: a querela nullitatis sanábilis e a
querela nullitatis insanábilis. A primeira era aplicada à sentença que tinha vícios
sanáveis e a segunda para corrigir sentenças com vícios insanáveis, que
sobreviviam ao decurso do prazo e à formação da res iudicata.
Alguns doutrinadores acham que ela sobrevive até hoje no direito positivo
brasileiro, como uma forma de impugnar a coisa julgada, apesar de não ser
mencionada no atual Código de Processo Civil. Vejamos, então cópia do Acórdão do
103
Superior Tribunal de Justiça que teve como relator Waldemar Zveiter
(NASCIMENTO:2004:24/25).
“I. A tese da querela nullitatis persiste no direito positivo brasileiro, o que
implica em dizer que a nulidade da sentença pode ser declarada em ação
declaratória de nulidade, eis que, sem a citação, o processo, vale falar, a
relação jurídica processual, não se constitui, nem validamente se desenvolve.
Nem, por outro lado, a sentença transita em julgado, podendo, a qualquer
tempo, ser declarada nula, em ação com esse objetivo, ou em embargos à
execução, se for o caso”.
II. Recurso não conhecido”(Acórdão do STJ, no REsp nº12586-SP,Rel.Min.
Waldemar Zveiter,DJ de4.11.1991).
O Supremo Tribunal Federal também entende que a querela nullitatis
sobrevive no direito brasileiro, conforme pudemos constatar da ementa da decisão a
seguir:
“Ação declaratória, de nulidade de sentença, por ser nula a citação do réu, na
ação em que ela for proferida.
1. Para a hipótese prevista no artigo 741, I, do atual CPC, que é a falta de
nulidade de citação, havendo revelia persiste, no direito positivo brasileiro a
querela nullitatis, o que implica dizer que a nulidade da sentença, nesse caso,
pode ser declarada em ação declaratória de nulidade, independentemente do
prazo para a propositura da ação rescisória, que, em rigor, não é cabível para
essa hipótese.
2. Recurso extraordinário conhecido, negando-se-lhe, porém, provimento.”
(STE, Revista Trimestral de Jurisprudência, nº 107, p.778).
O direito brasileiro, segundo alguns doutrinadores, tem-se ressentido da falta
de um meio autônomo de impugnação perpétua da coisa julgada em
desconformidade com a Constituição. Pois, uma vez transcorridos os prazos da
ação rescisória e dos embargos à execução, os errores in iudicando et in
procedendo tornam-se, inimpugnáveis. Esta constatação levou alguns a ressuscitar
o instituto da querela nullitatis insanabilis conforme observamos a seguir:
104
”A querela, que foi uma criação dos legisladores estatutários de algumas
cidades italianas do início do período medieval e logo foi incorporada em
definitivo pelo direito canônico, deve ser apreendida como uma das mais
perfeitas sínteses proporcionadas pelo princípio germânico da força formal da
sentença e pela distinção romana entre a sententia nulla e a sententia iniusta.
Banida do nosso universo conceitual pela exacerbada pretensão cientificista
dos dois últimos séculos, ela encontrou meios de subsistir clandestinamente no
contexto de outros institutos de impugnação, inclusive de forma pouco velada
nos embargos à execução exigidos em lei para a postulação de nulidades
citatórias e inexigibilidade de títulos judiciais proferidos com ofensa à
Constituição (CPC, art. 741, inc. I e parágrafo único In BATISTA:20005,
p.XVIII)”.
As nulidades ipso iure, da coisa julgada, devem ser conhecidas e declaradas,
até mesmo de ofício, independentemente de procedimento especial para esse fim,
em qualquer juízo ou grau de jurisdição. Apesar de expulsa do nosso universo
conceitual, a querela nullitatis insanabilis se mantém implícita no ordenamento
positivo brasileiro, como “o meio mais adequado para o ataque de vícios extremos
da coisa julgada invalida, ainda que para tanto tivesse que assumir outras
roupagens jurídicas”. (BATISTA, 2005:29). O autor, com apoio em Piero
Calamandrei, acredita que, os embargos à execução, os quais são interponíveis, a
todo o tempo, contra os vícios citatórios e contra a coisa julgada
inconstitucional, conforme se pode observar do novo parágrafo único do art. 741,
do digo de Processo Civil, constituem a prova mais recente da existência
clandestina da querela nullitatis insanabilis.
Portanto, para desconstituir a sentença nula ipso iure que agrida a
Constituição, deve o querelante recorrer à ação de impugnação autônoma ou aos
incidentes de embargos à execução.
Batista (2005) comenta, ainda que, em muitos casos a querela nullitatis ainda
deixava muito a desejar, quando na aplicação aos casos concretos, principalmente
quando a coisa julgada inconstitucional havia ensejado a formação de um titulo
judicial “em execução”. Caso em que, nem mesmo a concessão de antecipação
de tutela ou de medida cautelar lograva eficácia, pois, não raro, o exeqüente se
tinha locupletado com o crédito indevido, restando ao credor pedir a repetição do
105
indébito, fato que se complicava quando o crédito era de natureza alimentícia, o que
dificultava sua devolução.
2.1.3 Embargos à execução
A Medida Provisória 2.180-35, em seu art. 10 determinou a inclusão de um
parágrafo único ao art. 741, do CPC, que veio permitir a discussão do vício do titulo
executivo judicial.
Teodoro Júnior e Faria (2004:100) comentam que a análise do parágrafo
único, do art. 741, permite inferir que a inexigibilidade da coisa julgada
inconstitucional não pressupõe, em todos os casos, a existência de julgamento
proferido pelo Supremo Tribunal Federal. Na segunda parte do dispositivo, a
inexeqüibilidade não se reporta, a prévio pronunciamento da Suprema Corte, mas
decorre da constatação feita diretamente pelo juiz dos embargos, sobre o teor
(incompatível) do título executivo judicial. Citam como exemplo o caso de uma lei,
claramente inconstitucional, que vem a ser revogada antes do julgamento da ação
de inconstitucionalidade e que por isso jamais vai ter a declaração de
inconstitucionalidade do STF, mas nem por isso deixou de ser aplicada e a sentença
nela fundada deixou de transitar em julgado:
“Seria absurdo recusar-se à parte o direito de excepcionar a nulidade do
decisório, nos moldes do parágrafo único do art. 741, somente porque o STF
não chegou a pronunciar-se sobre a inconstitucionalidade gritante na espécie.
A invalidade da lei e, consequentemente, da sentença que a aplicou, é
irrecusável, e não pode deixar de ser reconhecida sob pena de colocar-se
acima da Constituição um simples ato judicial.” (TEODORO JÚNIOR e FARIA,
2004:101)
Convém lembrar que, qualquer que seja o tipo de controle de
constitucionalidade adotado pelo STF, ao caso concreto, gera eficácia erga ommes
e ex tunc, conforme art. 28, parágrafo único, da Lei nº. 9.868-99, ressalvada, quanto
à retroatividade, disposição expressa em contrário, preservando situações
passadas.
106
Todavia o art. 27, da lei nº. 9.868, de 10 de novembro de 1999, diz que
declarada a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e por razões de segurança
jurídica ou de excepcional interesse social, o STF poderá restringir os efeitos,
daquela declaração ou decidir que ela tenha eficácia a partir de transitada em
julgado ou de outro momento que venha a ser fixado. Para isto se faz necessário a
aprovação por maioria de dois terços de seus membros.
Portanto, se o STF atribuir efeitos ex nunc, por razões de segurança que
visem a preservar os direitos adquiridos, sob a égide da lei inconstitucional,
nenhuma aplicação exibe o art. 741, parágrafo único, no que se refere às sentenças
transitadas em julgado. Assim, a alegação do julgado do STF, nos embargos,
atenderá aos limites temporais atribuídos à decisão, nos termos do art. 27, da
supramencionada lei.
2.1.4 Outros meios de impugnação pelo judiciário
O cabimento irrestrito de quaisquer outros meios como forma de impugnar a
coisa julgada inconstitucional é defendido por grande parte da doutrina e entre eles
Batista (2005:107) em seu livro Coisa Julgada Inconstitucional e a Prática Jurídica.
Tal posição teria sido, em princípio, inspirada por Liebman, para quem todo e
qualquer instrumento seria idôneo à obtenção de uma declaração de inexistência do
processo viciado. A nulidade podia também ser alegada em defesa, seja de forma
incidental ou em processo principal.
Todavia a jurisprudência é pacifica no sentido de que “não cabe mandado de
segurança contra decisão judicial com trânsito em julgado (STF, Súmula 268)”
como também “não cabe mandado de segurança contra ato judicial passível de
recurso ou correição (STF, Súmula nº 267)”.
107
As matérias de ordem pública podem sempre ser suscitadas, a qualquer
tempo, quer seja no bojo de uma petição incidental ao processo executivo, também
chamada, de, exceção de pré-executividade, quer seja por qualquer outro
instrumento capaz de corrigir a distorção. O Superior Tribunal de Justiça no agravo
292036-SP, T., Rel., Min. Barros Monteiro, DJU 04.06.2001, p.00160 diz:
“AGRAVO - a inexigibilidade do titulo pode ser argüida em exceção de pré-
executividade, independentemente da oposição de embargos do devedor [...]”.
A petição incidental deve ser instruída como prova pré-constituída, ensejando
o exame da condição da ação executiva de forma a se reconhecer, no próprio juízo
da execução e nos mesmos autos, a inexigibilidade da coisa julgada inconstitucional
ora alegada. O juízo de execução deve sempre verificar, de ofício, se a ação
executiva preenche todos os requisitos de exigibilidade, certeza e liquidez, conforme
determina o art. 586 do Código de Processo Civil, sem necessidade de provocação.
A exceção de pré-executividade faz provoca o conhecimento de uma matéria,
que já deveria ter sido analisada ex officio:
direito processual civil. Agravo de instrumento. Processo de execução.
exceção. Exceção de pré-executividade. Pressupostos processuais. Matéria de
ordem pública. Desnecessidade de instrução probatória. Possibilidade do
contraditório. Recurso parcialmente provido para que o juíz a quo enfrente o
merito da objeção i Se a matéria é de ordem pública e detectável de oficio
pelo juiz e, como tal, insuscetível de preclusão, não sentido para que não
seja, desde logo, apreciada nos próprios autos da execução
( TJDF, AGI
200100200009640,3ª T., Rel Juiz Wellington Medeiros, DJU 15.08.2001, p-54.)
Assim, são recursos específicos à impugnação da coisa julgada
inconstitucional os embargos à execução de pré-executividade ou a ação autônoma
declaratória (querela nullitatis). A exceção de pré-executividade e os embargos do
executado poderão ser usados se a coisa julgada tiver natureza condenatória,
admissível, em todo o caso, a querela nullitatis.
2.2 INSTRUMENTOS DE IMPUGNAÇÃO DA COISA JULGADA PELO PODER
EXECUTIVO
108
2.2.1 Comutação de penas
Ato do Presidente da República que tem por finalidade atenuar ou diminuir a
pena de um condenado em sentença transitada em julgado. É prerrogativa
exclusiva do Presidente a substituição de pena mais grave, imposta ao réu, por outra
mais branda. É também outra forma de impugnação da coisa julgada que faz parte
do Direito Constitucional, do Direito Penal e do Direito Processual Penal, que quebra
o dogma da coisa julgada, imutável.
2.2.2 Graça
Espécie de indulgência, também chamada pela Lei de Execução Penal (Lei nº
7210/84) de indulto individual, porque alcança determinada pessoa. É regulada
pelos artigos 188 a 193 da mencionada lei. É uma forma de clemência soberana
dirigida a uma pessoa e não a um fato. É também uma forma de impugnação da
coisa julgada que quebra a imutabilidade da coisa julgada, uma vez que, mesmo não
extinguindo o crime, extingue a punibilidade.
Distingue-se da anistia porque esta é aplicada, em regra, aos crimes políticos
e pode ser concedida pelo poder legislativo, enquanto a graça ou indulto individual
aplica-se aos crimes comuns e é da competência exclusiva do Presidente da
República podendo este, de acordo com o artigo 84, parágrafo único, da
Constituição Federal, delegar a atribuição a um Ministro de Estado, ao Procurador
Geral da República ou ao Advogado Geral da União, que observarão os limites
traçados nas respectivas delegações. Não é necessário requerimento, da parte
beneficiada.
2.2.3 Indulto
Ato de clemência do Presidente da República em favor de sentenciados de
bom comportamento e condições de merecer perdão da pena privativa de liberdade
109
aplicada pelo poder judiciário e de se integrarem e permanecerem no convívio
social.
O indulto o beneficia condenados que, deixam de reparar o dano causado
pelo crime; que cometem homicídio doloso qualificado mediante paga ou promessa
de recompensa; que praticou tráfico ilícito de entorpecentes ou drogas afins; e que
praticou crime hediondo ou delito relacionado com a prática de tortura e ou
terrorismo.
O indulto individual, conforme vimos no item anterior è a GRAÇA. Todavia
o indulto coletivo que abrange um grupo de sentenciados escolhidos segundo a
pena que lhes foi aplicada, exigindo requisitos individuais como a primariedade,
entre outros, e requisitos objetivos como cumprimento de parte da pena e exclusão
dos autores da prática de alguns tipos de crimes.
O Indulto e a graça podem ser plenos, e, parciais quando a pena é extinta por
completo ou quando é concedida a diminuição da pena ou sua comutação,
respectivamente. Se o indultado vier a cometer novo crime, é considerado
reincidente.
De qualquer forma, o indulto também é uma forma de impugnar a coisa
julgada, de quebrar o dogma de que a coisa julgada é imutável.
2.3 INSTRUMENTOS DE IMPUGNAÇÃO DA COISA JULGADA PELO PODER
LEGISLATIVO
O Poder Legislativo, de alguma forma, também impugna a coisa julgada. A
retroatividade da lei penal in mellius e a anistia são instrumentos que, de alguma
forma, modificam a coisa julgada, abrandando e ou até mesmo extinguindo a
penalidade conforme veremos a seguir.
110
2.3.1 Retroatividade da lei penal in mellius
Conforme o artigo 5º, Inciso XL da Constituição Federal, de 1988 “a lei penal
não retroagirá salvo para beneficiar o réu”. Isto significa que a própria Carta Magna
instituiu o princípio da irretroatividade das leis, mas, salvaguardou a hipótese de
retroação em benefício do réu, passando a lei a valer, mesmo no período em que
não existia. É o que é possível constatar com a leitura do parágrafo único do artigo
2º, do Código Penal, que determina a retroatividade da lex mitior, ou seja, da lei
penal mais benigna.
Ela deverá ser aplicada tanto ao réu que está sendo acusado em processo
penal quanto ao u submetido á execução de pena e ou a medidas de
segurança.
A Lei de Execução Penal em seu artigo 66, Inciso I, diz que a competência
para aplicar a Lei penal mais benéfica é do Juiz das execuções penais.
2.3.2 Anistia
Através da anistia também certa impugnação da coisa julgada. A sua
autoridade é quebrada, no momento em que a sentença aplicada ao caso concreto
como justa e certa para punir o ilícito cometido, foi desconstituída pelo Legislativo
com a sanção do Chefe do Estado, através da anistia. O ilícito é esquecido e o
indivíduo, caso pratique um outro delito, nem sequer será considerado reincidente,
pois, a anistia é o esquecimento de determinados fatos que resultaram em infrações
penais, que o Poder Público, através do Legislativo, achou conveniente não punir.
É aplicada, em regra, a crimes políticos (anistia especial). Todavia, tem
cabimento, também, nos crimes eleitorais, militares, contra a organização do
trabalho entre outros (anistia comum), sendo cabível, antes ou depois do processo e
mesmo após a condenação.
111
É causa de extinção da punibilidade, pois é o esquecimento do crime que, é
revogado pela lei da anistia. A aplicação da Lei fica a cargo do Poder Judiciário e os
interessados podem recorrer se houver problemas de interpretação. A Constituição
Federal disciplina a anistia no Art. 21, XVII, que fala da competência da União e Art.
48, VIII, que dispõe sobre a competência do Congresso Nacional com a sanção do
Presidente da República.
A anistia não pode ser recusada, visto que é norma de interesse público.
Todavia se for submetida a uma condição, pode o acusado recusá-la negando a
cumprir a exigência imposta. Tem efeito ex tunc e é irrevogável desde que seria
aceita, embora o condenado não cumpra as condições impostas, devendo, por isso,
responder pelo ilícito previsto no artigo 359, do Código Penal.
O art. 187, da Lei 7210/84 (Lei de Execução Penal), faz referência à
anistia, determinando que uma vez concedida a anistia, “o juiz, de ofício, a
requerimento do interessado ou do Ministério Público, por proposta da autoridade
administrativa ou do Conselho Penitenciário, declarará extinta a punibilidade.”
A anistia não abrange os efeitos civis da sentença, mas apenas os penais.
Conforme o parágrafo único do artigo 96, do Código Penal, não se impõe medida de
segurança nem subsiste a que tenha sido imposta anteriormente.
São formas de anistia: PRÓPRIA (concedida antes da condenação);
IMPRÓPRIA (concedida depois da condenação,após a sentença transitar em
julgado ou em grau de recurso recaindo sobre a pena); GERAL OU PLENA (cita
fatos e atinge todos os criminosos); PARCIAL OU RESTRITA (dirige-se a
determinados agentes, ou a determinados crimes com exclusão de outros quando se
trata de concurso de infrações penais, como é o caso da lei nº. 6.683/79, que
anistiava a tos os punidos por atos institucionais ou complementares, no período
entre 02.09.61 a 15.08.79); INCONDICIONADA (sem requisito para a sua
concessão. A lei nº. 7.170/83 apaga o passado, quando se trata de infrações
políticas e é concedida sem qualquer condição); CONDICIONADA (com requisitos
112
para a sua concessão, como nos casos de insubmissão e deserção, previstos
no CPPM nos artigos 183 e, 187 a 192, onde o benefício é concedido se houver
incorporação ou apresentação dos condenados).
CONCLUSÃO
Conforme observei, a autoridade da coisa julgada não é absoluta.
Demonstrei, neste capítulo, vários instrumentos que quebram o dogma da coisa
julgada. Expus instrumentos que desconstituem ou abrandam a coisa julgada
utilizados pelos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Sentenças que são
desconstituídas por serem inconstitucionais. Outras, porque o próprio Estado
responsável pela aplicação do direito, resolveu esquecer, indultando, ou concedendo
anistia, graça, comutação de penas ou mesmo elaborando novas leis penais que
retroagem beneficiando inúmeros condenados.
A coisa julgada tem força apenas relativa. Nenhuma sentença transitada em
julgado tem força absoluta. O dogma da coisa julgada intocável, imutável, que faz o
preto ficar branco e o quadrado ficar redondo, mudou com a transformação da
sociedade, com a evolução dos costumes e do comportamento social, com a
evolução da tecnologia e do progresso científico.
113
Alguns estudiosos e aplicadores do direito refletiram sobre a nova realidade
social e sobre a necessidade do direito, como ciência dinâmica, acompanhar,
regulamentar e se adequar às novas mutações sociais como condição sine qua non
à sua própria razão de ser, de existir, como ciência do “dever-ser”.
Outros estudiosos do direito continuam, numa interpretação errônea da nossa
Constituição, defendendo a coisa julgada imutável em nome de uma segurança
jurídica, mesmo em detrimento da justiça, alegando ser esta um conceito de difícil
apreensão, e que a imutabilidade da coisa julgada é cláusula pétrea constitucional.
Tendo em vista a polêmica sobre a relativização da coisa julgada, resolvi,
neste último capítulo do trabalho, mostrar a posição de doutrinadores do porte de
Theodoro Júnior, Faria, Delgado, Nascimento e Dinamarco, que num debate teórico-
doutrinário sobre o instituto da coisa julgada inconstitucional, defendem de forma
técnica e racional, a relativização da coisa julgada em casos excepcionais, como nas
hipóteses de sentenças abusivas e injustas (DIDIER JÚNIOR, Fredie (org.), 2004.).
114
CAPÍTULO 6
POSIÇÃO DOUTRINÁRIA QUANTO À RELATIVIZAÇÃO DA COISA
JULGADA
1 INTRODUÇÃO
A relativização da coisa julgada é um tema que vem causando bastante
polêmica entre os estudiosos do Direito. Alguns autores são favoráveis e outros,
contra. E alguns até defendem proposta de lei nova, isto é, lege ferenda”.
Os pontos mais conflitantes são entre os princípios da justiça e da segurança
jurídica das relações decididas pelo Estado. O confronto entre estes valores vem
dividindo a doutrina e a jurisprudência que, embora de forma tímida, provocam a
reflexão de todos quantos lêem suas teses.
115
Afinal de contas, qual o valor maior? Segurança jurídica ou justiça? Pode
haver justiça sem segurança jurídica? Como ficam os conflitos? Eternizados? E o
acesso à justiça, pode acontecer, sem o devido processo legal?O devido processo
legal prevê o contraditório, a ampla defesa e sentença justa. E quando isto o
acontece, deve o processo ser revisto?
Segundo a Constituição, é objetivo fundamental da República Federativa do
Brasil “construir uma sociedade livre, justa e, solidária”. Pode haver sociedade justa
com sentença injusta? Contrária ao Direito?
Segundo Kelsen (2003: 297) dizer:
“que uma decisão judicial ou uma resolução administrativa são contrários ao
direito, somente pode significar que o processo em que a norma individual foi
produzida, ou o seu conteúdo, não correspondem à norma geral criada por via
legislativa ou consuetudinária, que determina aquele processo ou fixa este
conteúdo.”
A Constituição afirma que “A lei não excluirá, da apreciação do Poder
Judiciário, lesão ou ameaça a direito” (Art.5º, Inciso XXXV da CF/88). Sentença
inconstitucional, ilegal e ou injusta, não é lesão de direitos?
Diz também a Carta Magna que a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato
jurídico perfeito e a coisa julgada (Art.5º, Inciso XXXVI). Este dispositivo protege a
coisa julgada inconstitucional, ilegal ou, injusta? Qual o alcance deste dispositivo?
Por estas e outras questões, bastantes polêmicas, juristas e doutrinadores
vêm se desdobrando na análise e discussão do tema da relativização da coisa
julgada, quando esta ofende a Constituição, as leis infraconstitucionais e valores
fundamentais, como a justiça.
Assim, o objetivo deste capítulo é discorrer sobre a opinião de estudiosos do
direito acerca das questões acima mencionadas, tendo em vista que o judiciário vem
116
passando por inúmeras situações constrangedoras, em virtude da produção de
decisões contraditórias entre si, que, no entanto, estão protegidas, pelo manto da
coisa julgada, fazendo-se necessário e urgente uma retomada de posição
doutrinária e jurisprudencial sobre a coisa julgada inconstitucional ilegal e injusta.
A situação fica mais complicada quando a coisa julgada inconstitucional se
formou sem que o processo chegasse ao STF, tendo em vista que, em qualquer
hipótese, após o trânsito em julgado, é ultrapassado o prazo para uma possível
rescisória.
Ultrapassado o exíguo prazo da ação rescisória e mesmo que o jurisdicionado
estivesse acobertado por essa espécie de ação, corre, fatalmente, o risco de não ser
aceita, sob o argumento de que no direito positivado brasileiro não está contemplada
a hipótese de ação rescisória contra decisão que contraria a Constituição Federal.
Este fato pode ser visto com tristeza, pois, não se concebe que, em tese,
caiba ação rescisória para corrigir uma ilegalidade da decisão, e não se possa
utilizar o mesmo instrumento para desmistificar uma sentença inconstitucional. O
Superior Tribunal de Justiça admite, para este caso, ação declaratória. A
rescisória, será possível se a norma, posteriormente, for declarada
inconstitucional.
Com a evolução das pesquisas científicas, os estudiosos do direito viram-se
consternados com os absurdos que a aplicação dogmática do direito processual civil
ocasionava, principalmente, no que se referia às ações de investigação de
paternidade, tendo em vista a evolução científica dos exames de DNA.
Inúmeras ações de investigação de paternidade foram julgadas
improcedentes por falta de provas, principalmente, quando se discutia relações
sexuais fortuitas, extremamente difíceis para a parte autora provar o estado de
filiação. A sentença, nestes casos, não produzia uma pacificação social, uma vez
que a falta de provas fazia eternizar a dúvida e a angústia da família quanto à
117
conduta da sua genitora, provocando um imenso sofrimento moral que se estendia a
todos os familiares.
Com a facilitação do acesso aos exames de DNA, ressurgiu o interesse dos
filhos de ter reconhecida a paternidade, principalmente nos casos julgados
improcedentes por falta de provas, sob a perspectiva de que agora era possível ter a
certeza do estado de filiação. Todavia segundo o processo civil tradicional, havia um
óbice: a coisa julgada.
A doutrina inquietou-se e alegava, com base no princípio da verdade real e
dos fins sociais da norma, que não enxergava nenhum óbice a uma nova ação
investigatória que pudesse definir, realmente, a verdade sobre filiação e paternidade.
Interveio, pois, o STJ em leading case, admitindo uma segunda ação, rompendo-se,
assim, o dogma da coisa julgada.
A doutrina brasileira e internacional são pródigas, em matéria de controle de
constitucionalidade, de leis e atos normativos em geral, mas são pobres, quanto ao
controle de constitucionalidade dos atos do judiciário. Theodoro Júnior e Faria
(2004:71) comentam o fato:
“Ao longo de mais de duzentos anos, o que se observa é que, em tema de
inconstitucionalidade, as atenções e preocupações jurídicas sempre se
detiveram no exame da desconformidade constitucional dos atos legislativos.
Verifica-se, assim, que grande parte dos estudos produzidos desde então se
centra na análise da constitucionalidade/inconstitucionalidade dos atos
legislativos, não havendo uma maior preocupação com os atos do poder
judiciário, em especial suas decisões que, sem a menor dúvida, são passíveis
de serem desconformes à Constituição”.
Entendo que a ausência de estudos sobre a inconstitucionalidade dos atos
judiciais deve-se, em parte, à idéia equivocada de que o notório saber jurídico,
oriundo da própria formação acadêmica em direito e da experiência jurídica do
magistrado, lhe imuniza da prática de inconstitucionalidade, que poderia ocorrer
no Legislativo e no Executivo, tendo em vista que, na maioria das vezes, estes
poderes são integrados por pessoas, sem nenhuma formação jurídica. Todavia, isto
118
não procede, pois, baseado na igualdade entre os poderes todos os atos estatais
são passíveis de desconstituição, se estiverem desconformes com a Constituição,
não havendo qualquer hierarquia entre os três Poderes da República.
2 DESENVOLVIMENTO
2.1 Interpretação da Doutrina
Na interpretação das normas de direito positivado e verificando os inúmeros
casos de erros em sentenças cometidos pelo judiciário, tanto a doutrina estrangeira
como a nacional defendem a relativização da coisa julgada.
Na doutrina uruguaia, Eduardo Couture citado por Dinamarco (2003:41)
admite a revisão pelo judiciário das sentenças acobertadas pelo manto da coisa
julgada, haja vista que "a consagração da fraude é o desprestígio máximo e a
negação do direito, fonte incessante de descontentamento do povo e burla à lei”.
Nos países com tradição jurídica romano-germânica, bem como no direito
norte-americano, que não são extremamente apegados à autoridade da coisa
julgada, são aceitas, embora de forma mais branda as restrições à coisa julgada.
2.1.1 Posição de Delgado
119
O Ministro do Superior Tribunal de Justiça se posiciona a favor da
relativização da coisa julgada em casos em que a imoralidade, o ataque à
Constituição, a transformação da realidade das coisas viciem a vontade jurisdicional
de modo absoluto, tornando a coisa julgada inexistente conforme pode-se observar:
(...) não posso conceber o reconhecimento de força absoluta da coisa julgada
quando ela atenta contra a moralidade, contra a legalidade, contra os
princípios maiores da Constituição Federal e contra a realidade imposta pela
natureza. Não posso aceitar, em consciência, que, em nome da segurança
jurídica, a sentença viole a Constituição Federal, seja veículo de injustiça,
desmorone ilegalmente patrimônios, obrigue o Estado a pagar indenizações
indevidas (...) (DELGADO, In NASCIMENTO, 2003:63).
Afirma que a decisão emitida pelo Judiciário deve transmitir confiança, boa-fé,
devendo consonância aos princípios da legalidade, justiça e moralidade, pois assim
deve ser a conduta estatal ou privada. Que a ciência do direito tem sentido se
buscar o justo. Que a sentença judicial, mesmo coberta com o manto da coisa
julgada, não pode ser veículo de injustiças, de apropriação indébita de valores
contra o particular ou contra o Estado, de desigualdades nas relações do
contribuinte com o fisco, dos servidores com o órgão que os acolhe, e de nenhum
tipo de desigualdade nas relações sociais.
Defende que a sentença transitada em julgado possa ser revista além do
prazo para rescisória, quando a injustiça nela contida afrontar a estrutura do regime
democrático de direito, os princípios da legalidade, moralidade e a Constituição
Federal.
Afirma que o princípio-força da coisa julgada é de natureza relativa e que a
segurança jurídica imposta pela coisa julgada está atrelada aos princípios da
razoabilidade e da proporcionalidade que devem estar implícitos em todo ato judicial.
2.1.2 Posição de Teodoro Júnior e Faria
120
Segundo NASCIMENTO (2004), Theodoro nior e Faria, afirmam que
tiveram as suas atenções despertadas para o conflito entre a coisa julgada e a
Constituição quando emitiram parecer para a Procuradoria do Estado de São Paulo
sobre a multiplicidade e superposição de sentenças com trânsito em julgado, que
condenavam o Poder Público a pagar indenizações milionárias, ao mesmo
proprietário, mais de uma vez, não sendo mais possível a interposição de rescisória.
A partir daí, começaram a estudar a doutrina estrangeira em busca de solução para
o caso, e participaram de estudos e debates sobre a necessidade de relativização
da coisa julgada.
Todavia estes doutrinadores defendem a tese de que a coisa julgada apenas
ofensiva à lei ordinária, sujeita-se a ter validados, definitivamente, os
seus efeitos desde que ultrapassado o prazo de impugnação. Assim, a coisa julgada
ilegal é tutelada para o fim de resguardar a segurança e a certeza que devem
conformar as relações jurídicas.
2.1.3 Posição de Otero
Otero (1993) afirma que a certeza e a segurança jurídica são valores
constitucionais passíveis de fundar a validade de efeitos de certas soluções
antijurídicas, desde que em consonância com a Constituição. Todavia se a coisa
julgada for contrária à Constituição, e não somente à lei ordinária, em nenhuma
hipótese os valores da segurança e certeza terão o poder de validar seus efeitos.
Para Otero, os atos do poder público, incluindo os atos jurisdicionais, são
inválidos se desconformes com a Constituição. Otero faz distinção entre decisão
inexistente e decisão inconstitucional, ressaltando que meras aparências de atos
judiciais não são reduzíveis ao conceito de inconstitucionalidade, mas, sim de casos
inexistentes, juridicamente. Apenas as decisões judiciais, com o mínimo de
identificabilidade, são passíveis de um juízo de inconstitucionalidade”. (OTERO In
NASCIMENTO 2003:16).
121
Otero, Theodoro Júnior e Faria, embora discriminem as principais
modalidades de inconstitucionalidade do caso julgado, centralizam seus estudos na
coisa julgada inconstitucional, isto é, na decisão judicial cujo comando viola
diretamente um preceito ou um princípio constitucional.
2.1.4 Da posição de Nascimento
Nascimento (2004) afirma que a coisa julgada que é contrária à Constituição,
por violar os seus preceitos, tem nulidade de natureza insanável, podendo ser
oposta por ação autônoma, tendo em vista não estar coberta pelo processo recursal.
Afirma ser essa ação de nulidade a querela nullitatis insanabilis, que, ainda hoje,
subsiste no direito brasileiro.
Concorda com a tese de Delgado, afirmando que o Estado não pode tolerar
sentenças judiciais que se contraponham à realidade dos fatos. Deveras, "os
princípios da moralidade, da justiça e da eqüidade devem ser realçados como
apanágio de uma sociedade civilizada, de modo a revelar seu degrau de
superioridade em confronto com os demais que povoam o universo jurídico”
(NASCIMENTO,2004:12).
Defende a chamada insubstancialidade da coisa julgada, tendo em vista que
esta representa apenas um artifício operacional do ordenamento jurídico, para
implantar a certeza sobre a existência ou não de um direito ou de qualquer outra
situação jurídica. Assim, somente a sentença teria conteúdo substancial, por
solucionar concretamente o litígio acatando ou rejeitando o pedido de direito
material.
No plano processual, a inconstitucionalidade não impede que a sentença
venha a transitar em julgado. Mesmo nesta situação, a sentença persiste enquanto
ato material, até que seja desconstituída, com a conseqüente cassação de seus
efeitos.
122
A inconstitucionalidade se verifica quando a coisa julgada é contrária às
prescrições constitucionais, quando, leva à consagração de um absurdo, ou, ainda,
quando serve de veículo para a perpetuação de injustiças, em detrimento da
dignidade humana e da cidadania.
A sentença pode subverter a realidade fático-jurídica ou por ação ou por
omissão. No primeiro caso, quando aplica, de maneira não eqüitativa, a regra ao
caso concreto. No segundo caso, quando nega aplicação à lei, impossibilitando que
se cumpra seu objetivo.
Assim, o objetivo dos estudiosos do direito que cuidam das sentenças
inconstitucionais e ou injustas, é promover uma melhor aplicação da ciência do
direito. O processo deve ser um mero instrumento de aplicação do direito material, e
não um instrumento perpetuador de injustiças em nome da coisa julgada formal e da
segurança jurídica.
Não existe pertinência entre as sentenças iníqua, injusta e inconstitucional e
a segurança jurídica, pois esta pressupõe que a decisão tenha sido tomada em
conformidade com a Constituição, e, em estrita consonância com os princípios da
moralidade, proporcionalidade e razoabilidade, pilares mestres de sua sustentação.
2.1.5 Dinamarco
Dinamarco (2001:13), também estudou a relativização da coisa julgada e
sua proposta objetiva atenuar os rigores da definitividade da coisa julgada contrária
à Constituição. Sua visão sistêmica e objetiva do tema tem por escopo mostrar a
prevalência de valores garantidos constitucionalmente, que devem prevalecer,
mesmo com algum prejuízo para a segurança das relações jurídicas
A sua posição não busca destruir a autoridade da coisa julgada nem
tampouco desconhecer a proteção que lhe é assegurada constitucionalmente, mas,
123
tão somente afastar os estados de injustiça conforme se pode observar da
afirmação, abaixo:
“Propõe-se, apenas, um trato extraordinário destinado a situações
extraordinárias com o objetivo de afastar absurdos, injustiças flagrantes,
fraudes e infrações à Constituição com a consciência de que providências,
destinadas a esse objetivo, devem ser tão excepcionais quanto é a ocorrência
desses graves inconvenientes. Não me move o intuito de propor uma
insensata inversão, para que a garantia da coisa julgada passasse a operar em
casos raros e a sua infringência se tornasse regra
geral”(DINAMARCO,2001:18).
Adotando uma análise casuística de situações, onde se constata insanável
contradição entre o princípio da justiça das decisões judiciais e o princípio da
segurança jurídica, Dinamarco defende a mitigação da autoridade da coisa julgada,
utilizando-se, para isso, do conceito técnico-jurídico da impossibilidade jurídica dos
efeitos da sentença.
Assim, afirma que a coisa julgada material não é efeito substancial da
sentença, mas sim uma qualidade especial que a lei a esta atribui, de forma a torná-
la estável. Verifica-se que, onde esses efeitos não existam, não haverá coisa julgada
material. Tanto é assim que as sentenças terminativas, que põem fim ao processo
sem julgamento do mérito, nada dispõem sobre as relações substanciais, por acaso
existentes entre os litigantes. Estas sentenças, sem dúvida, podem ficar cobertas
pela coisa julgada formal, mas jamais pela coisa julgada material.
Entretanto, não raro se está diante de sentenças de mérito que, ao tentarem
ditar um preceito juridicamente impossível, o conseguem subjugar as normas ou
princípios que as repudiam. Eis que a produção de efeitos substanciais não passa
de mera aparência, pois são repelidos por razões de ordem constitucional. Assim, a
impossibilidade jurídica seria:
124
(...) a inadmissibilidade do que o demandante pretende, em tese ou seja,
independentemente das circunstancias do caso. A impossibilidade jurídica do
pedido, ou sua inadmissibilidade a priori, constitui antecipação da
impossibilidade jurídica do resultado pretendido, ou seja, dos efeitos
sentenciais postulados (...). Uma sentença contendo o enunciado de efeitos
juridicamente impossíveis é, em verdade, uma sentença desprovida de efeitos
substanciais, porque os efeitos impossíveis não se produzem nunca e,
consequentemente, não existem na realidade do direito e na experiência da
vida dos litigantes... E, não havendo efeitos a serem imunizados pela coisa
julgada material, essa autoridade cai no vazio e não tem como efetivar-se. (...)
Repito, para clareza: sentença portadora de efeitos juridicamente impossíveis
não se reputa jamais coberta pela res judicata, porque não tem efeitos
suscetíveis de ficarem imunizados por essa autoridade. Pode-se até discutir,
em casos concretos, se os efeitos se produzem ou não, se são ou não
compatíveis com a ordem constitucional, etc., mas não se pode afirmar que,
sem ter efeitos substanciais, uma sentença possa obter a coisa julgada
material “(DINAMARCO, 2001:11)
Conforme observado, para ter-se coisa julgada material, é necessário que a
sentença tenha efeitos substanciais e uma sentença poderá ter estes efeitos se
preencher todas as condições exigidas, por lei, para sua proposição, como também
ser dada esta sentença de acordo com os preceitos legais e constitucionais. Caso
isto não ocorra, ela será inexistente e jamais produzirá efeitos. Nestes casos, a coisa
julgada sequer chegou a se formar porque segundo o autor, a autoridade desta
somente imuniza efeitos substanciais, cuja produção seja admissível perante o
ordenamento jurídico. Assim, segundo este teórico, não tem sentido falar-se em
imutabilidade de efeitos que inexistem, no mundo jurídico, que de impossível
realização.
A posição de Dinamarco não é destoante das opiniões doutrinárias,
anteriormente mencionadas. Muito pelo contrário, a sua contribuição é muito grande
para a reflexão sobre a coisa julgada e os casos de rescindibilidade, porque insiste
em deixar claro que a ordem constitucional não permite que se eternizem injustiças,
a pretexto de não se eternizar litígios e porque ressalta, também, que a teoria da
coisa julgada inconstitucional deve ser erigida para intervir em situações
excepcionais de corrupção do sentimento de justiça.
125
2.1.6 Posição de Lima
A Teoria da Coisa Julgada, segundo seu autor, tem como objetivos estudar o
instituto da coisa julgada, definindo-lhe os contornos, tal como aceito pela melhor
doutrina e pelo próprio Código, e, num segundo momento, fazer uma análise crítica
das ‘verdades’ estabelecidas, com o objetivo de identificar erros teóricos acerca do
instituto, com vista a contribuir para o aprimoramento do sistema jurídico.
Lima propõe algumas alterações legislativas que colocamos, em anexo, neste
trabalho, por considerarmos importante que todos aqueles que se dediquem ao
tema, e ou se preocupem com a evolução dos institutos jurídicos, tomem
conhecimento do assunto.
A sua proposta resume-se em que a ofensa à coisa julgada deixe de ser
causa de rescindibilidade porquanto a sentença é nula de pleno direito e, sendo
assim, ela nunca existiu, não devendo, portanto ser causa de ação rescisória e sim
de ação revisional. Para isto propõe a revogação dos incisos IV e V, do art. 485, do
CPP, e o acréscimo de um parágrafo único ao artigo 474, do CPP, com a seguinte
redação: “É nula a sentença que, fora dos casos expressamente previstos em lei,
reexaminar matéria submetida à eficácia da coisa julgada”. Justifica a inclusão do
parágrafo dizendo que se a sentença deixa de ser rescindível, é de bom alvitre que
seja declarada nula. Propõe, ainda, a alteração do artigo 469, que passa a ter a
seguinte redação:
Art. 469. Fazem coisa julgada:
I – a verdade dos fatos, estabelecida como fundamento da sentença;
II a apreciação de todas as questões decididas, relativas ao caso
concreto, que constituam premissa necessária da conclusão.
126
Justifica a alteração afirmando que o dispositivo rompe com os limites
objetivos da coisa julgada, dando-lhe nova dimensão mais compatível com a
evolução da sociedade e com suas atuais necessidades.
Este doutrinador apresenta também uma minuta de Ação Revisional da Coisa
Julgada que, segundo ele, serve para implantação da proposta, retro-mencionada e
que também faz parte dos anexos da presente dissertação.
2.1.7 Posição do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal
Durante muito tempo e, em face de omissão legislativa, muitos alimentavam a
idéia de que a coisa julgada inconstitucional estaria imune a qualquer meio de
impugnação. Todavia, este tipo de argumento era totalmente inaceitável, pois, se
era admitida a impugnação da legalidade, que era um vício menor, através da ação
rescisória, com maior razão se deveria atacar o gigantesco vício da
inconstitucionalidade.
Embora o STJ (Superior Tribunal de Justiça) se escusasse de enfrentar
diretamente essa lacuna processual, às vezes consentia na utilização da rescisória
no caso de coisa julgada, que tivesse como fundamento, norma posteriormente,
declarada inconstitucional, conforme observamos a seguir:
Processual civil. Ação rescisória. Art. 485, V, CPC. Declaração de
inconstitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal, de preceito legal no qual
se louvara a acórdão rescindendo. Cabível a desconstituição pela via
rescisória, de decisão com trânsito em julgado que deixa de aplicar uma lei por
considerá-la inconstitucional ou a aplica por tê-la como de acordo com a Carta
Magna. Ação procedente. (AR n.870/PE,3ª séc. Rel. Min. José Arnaldo da
Fonseca DJU 13.03.2000, p.123).
O Supremo Tribunal Federal também rejeitou a suposição de que a
declaração de inconstitucionalidade da coisa julgada se sujeitava ao prazo
decadencial de dois anos, estabelecido para efeito de impugnação da coisa julgada
ilegal. A desconstituição da coisa julgada nula não se daria via ação rescisória e sim
127
via ação declaratória de nulidade, para a qual não se imporia nem prazos
prescricionais nem decadenciais:
Rescisória. Sentença nula. Defeito da citação. Dispensa Rescisória. Não
prazo decadencial. Para a hipótese do art. 741, I, do atual CPC, que é a da
falta ou nulidade de citação, havendo revelia persiste, no Direito positivo
brasileiro, a querela nullitatis, o que implica dizer a nulidade
independentemente do prazo para a propositura da ação rescisória que, a
rigor, não é cabível para essa hipótese (STF, RE n.97.589, Pleno, Rel., Min.
Moreira Alves, DJU 13.03.2000, p.123).
São desfavoráveis ao uso da rescisória para este fim os doutrinadores
Wambier e Medina (2003), pois, para quem “seria rigorosamente desnecessária a
propositura da ação rescisória, que a decisão, que seria alvo de impugnação,
seria unicamente inexistente, pois que baseada em “lei” que não é lei (“lei”
inexistente)”.
São favoráveis ao uso da rescisória, os juristas Accioly Filho, Bittencout e
Buzaid, nas sentenças proferidas com base em lei que, posteriormente venha a ser
declarada inconstitucional
Humberto Theodoro Junior e Juliana Cordeiro de Faria chamam a atenção
para o fato de que a jurisprudência repelia o uso da rescisória quando, à data da
sentença rescindenda, a lei aplicada era de interpretação controvertida nos tribunais,
embora o entendimento pretoriano posteriormente tenha se pacificado com
orientação diferente da adotada pelo decisório impugnado.
Conforme a Súmula 343, “não cabe ação rescisória por ofensa a literal
dispositivo de lei quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de
interpretação controvertida nos tribunais”. Trata-se, portanto de proibição ao uso da
rescisória, na hipótese do inciso V, art. 485, do Código de Processo Civil, que diz: “A
sentença de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando violar literal
disposição de lei”.
128
Todavia, a supra mencionada súmula se refere à literal disposição de lei
ordinária, ou seja, lei infraconstitucional e não a dispositivo constitucional, situações
que não se confundem, pois quando uma lei inconstitucional é aplicada, a ofensa é à
Constituição mas, se a lei ordinária não é aplicada sob a acusação de suposta
inconstitucionalidade,na ótica interpretativa do aplicador, a ofensa é cometida contra
a própria lei que foi postergada e, não contra a Constituição.
Entende-se que como a inconstitucionalidade é matéria de ordem pública ela
pode ser alegada a qualquer tempo, e em qualquer grau de jurisdição, inclusive de
ofício. Observei que não celeuma quanto à declaração de inconstitucionalidade
antes do trânsito em julgado e antes de decorrido o prazo para propositura da
rescisória. O problema maior é quando precluiu todas as vias impugnativas
e
formou-se a coisa, chamada por alguns de soberanamente julgada. É sobre isto que
cita-se a decisão bastante elucidativa do TRF, da Região, cujo Relator é o Juiz
Souza Prudente:
I – judicium rescidiens: no estado de direito, a lei inconstitucional agride a alma
do povo, que a constituição materializa, em seus preceitos. não ato jurídico
perfeito nem coisa julgada em afronta à constituição, cuja inteligência última se
reserva, em termos absolutos, ao supremo tribunal federal (cf art. 102, caput).
se o julgado rescindendo amparou-se em texto legal absolutamente nulo por
violar a constituição federal, admite-se a ação rescisória, com base no artigo
485, inciso v, do cpc, sem interferência da mula n. 343/stf, na espécie...” (ar
nº. 0130169, 2ª turma, publicação: dj 19-06-95 pg:38285).
Segundo o STJ, tanto a sentença que deixa de aplicar lei ordinária, sob o
pretexto de inconstitucionalidade como a que acolhe lei ordinária inconstitucional,
são passíveis de ação rescisória, afastada, em ambos os casos, a ingerência da
Súmula 343, do Supremo Tribunal Federal.
Em contrapartida, para Theodoro Júnior (2004:101), estas duas situações
não se confundem. Decerto, quando um julgado aplica lei inconstitucional, a ofensa
é cometida diretamente contra a Constituição; mas se a hipótese é de recusa à
129
vigência da lei, sob a alegação de suposta inconstitucionalidade, a ofensa que a
sentença pratica não é contra o Texto Fundamental, mas tão somente contra a
própria lei que fora postergada. Com efeito:
“A recusa de aplicar lei constitucionalmente correta representa, quando muito,
um problema de inconstitucionalidade reflexa, o qual, porém, não é qualificado
pela jurisprudência reiterada do Supremo Tribunal Federal, como questão
constitucional. Disso decorre que a hipótese deva se submeter ao regime
comum das ações rescisórias por ofensa à lei ordinária e não ao regime
especial de invalidação ou rescisão das sentenças inconstitucionais”.
2.2 Proposta de Lege Ferenda
Durante a pesquisa teórica levada a efeito nesta dissertação, verifiquei que a
maioria dos estudiosos do assunto, está consciente de que é necessário que se faça
alguma coisa para equilibrar os valores segurança jurídica e justiça. Sugerem a
criação de normas novas, isto é, de lege ferenda sobre o que existe atualmente de
lege lata, a fim de que se possa garantir o equilíbrio entre estes valores
supramencionados. Todavia apenas dois deles fazem propostas mais concretas:
Lima e Câmara.
Lima (1999:163-166) propõe alterações no texto do Código de Processo Civil
e a instituição de uma Ação Revisional da Coisa Julgada .
No primeiro caso, propõe a revogação dos incisos IV e V, do art.485, do CPC,
sugerindo que a ofensa à coisa julgada deixe de ser causa de rescindibilidade,
porquanto a sentença ofensiva à coisa julgada passa a ser considerada nula.
Acrescentado parágrafo único ao art.474, do mesmo código, que sugere que seja
nula a sentença que reexamine matéria submetida á eficácia da coisa julgada,
fora dos casos, expressamente, previstos em lei. Sugere, ainda, que o art. 469
passe a ter nova redação, excluindo, o atual inciso I, do mencionado artigo do CPC,
a fim de que os limites objetivos da coisa julgada possam ser ampliados.
130
No segundo caso, sugere a instituição de uma Ação Revisional da Coisa
Julgada com 11(onze) artigos, que enseja a revisão da sentença com erro evidente,
caso em que a coisa julgada deve ser atacada, pois, segundo ele, os princípios da
legalidade e da isonomia não podem ser sacrificados em homenagem à coisa
julgada. A imutabilidade da sentença deve ceder passagem aos princípios basilares
do constitucionalismo nacional. Para uma melhor compreensão desta proposta
colocam-se, em anexo, as sugestões legislativas da lavra deste grande estudioso do
Direito.
Câmara, (2004:27) é advogado e professor de Direito Processual Civil da
EMERJ (Escola de Magistratura do Estado do Rio de Janeiro) e dos cursos de
graduação da Cândido Mendes e Estácio de Sá, além de Presidente da Comissão
Permanente de Direito Processual Civil do Instituto dos Advogados Brasileiros,
também, faz uma proposta de lege ferenda, que vale a pena ser analisada.
Como introdução à sua proposta, comenta que atualmente o ordenamento
jurídico vigente permite a relativização da coisa julgada por diversos mecanismos de
controle e entre eles alguns que permitem que uma decisão inconstitucional,
emanada de um órgão superior, seja desconsiderada por um órgão inferior, gerando
uma insegurança prejudicial à paz social. Por isso, é necessário um
aperfeiçoamento do sistema, o que o levou a apresentar a seguinte proposta: “deve-
se acrescentar um novo inciso ao art. 485 do Código de Processo Civil. Através
deste novo dispositivo, estabelecer-se-ia que a sentença de mérito transitada em
julgado poderia ser rescindida quando ofendesse norma constitucional”.
Não bastaria, porém, acrescentar este novo inciso ao art.485, do CPC, diz
ele, porque, a rigor, tal dispositivo sozinho, nada inovaria, uma vez que conforme
se viu a rescisão da sentença inconstitucional é possível, com base no
disposto no inciso V daquele artigo. A criação do novo inciso se justificaria se
este fosse a “pedra fundamental” de um novo regime que, para se completar,
dependeria de outras regras.
131
Então criado o novo inciso a que ele se refere, diz que seria preciso
acrescentar-se, em seguida, um novo parágrafo ao mesmo art. 485, do CPC, que
estabeleceria:
“a sentença de mérito transitada em julgado que ofende a Constituição
deixa de produzir efeitos, após rescindida na forma prevista neste capítulo,
permitida a concessão,pelo relator, de medida liminar que suspenda
temporariamente seus efeitos se houver o risco de que sua imediata eficácia
gere dano grave, de difícil ou impossível reparação, sendo relevante a
fundamentação da demanda rescisória”.(CAMARA, 2004:27).
Assim, a ”ação rescisória” passaria a ser o único meio adequado para a
desconstituição da sentença transitada em julgado, que ofende à Constituição.
Segundo ele, desta forma, alcançar-se-ia um ponto de equilíbrio entre os
dois valores que entram em conflito diante da sentença inconstitucional transitada
em julgado, a segurança e a justiça. Afinal, a se adotar este modelo, a coisa julgada
prevaleceria até o julgamento da “ação rescisória”, permitida a suspensão liminar da
eficácia da sentença nos casos em que se identificasse a presença do periculum in
mora e o fumus boni iuris.
Completando o sistema, porém, far-se-ia necessário acrescentar-se um
parágrafo ao art. 495 do CPC, determinando que “sendo a ação rescisória fundada
em violação de norma constitucional, o direito à rescisão pode ser exercido a
qualquer tempo, não ficando sujeito ao prazo decadencial previsto neste
artigo”.(CÂMARA, 2004:28).
A seguir comenta que as vantagens de sua proposta são:
a) evitar que um juízo de primeira instância possa desconstituir uma
decisão do Supremo Tribunal Federal , órgão hierarquicamente superior; e,
132
b) equilibrar o atual regime com o objetivo de balancear a segurança
jurídica e a justiça das decisões.
3 CONCLUSÃO
Durante muito tempo, a coisa julgada foi vista como algo completamente,
intocável, indiscutível, um verdadeiro tabu, tida como absolutamente verdadeira,
conforme se pôde observar no capítulo anterior que discorre sobre a opinião dos
doutrinadores acerca de suas teorias sobre a coisa julgada.
A coisa julgada era tida como um instrumento de pacificação social que, uma
vez discutida, deveria estar encerrada para evitar a eternização do conflito, mesmo
que a sentença estivesse equivocada. Partia-se do pressuposto de que transitada
em julgado deveria ter plena eficácia e a sentença, mesmo injusta, se o sucumbente
não recorreu ou perdeu o prazo, passaria a ser eficiente e eficazmente justa.
Hoje, estas idéias estão superadas, mas ainda servem de ponto de partida
para uma análise mais acurada da coisa julgada na atualidade, tendo em vista que
133
não houve qualquer abrandamento quanto à autoridade da coisa julgada, mas
apenas a relativização de alguns julgados é admitida pela doutrina e jurisprudência.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Após o longo estudo apresentado sobre o controle de constitucionalidade da
coisa julgada inconstitucional, que por ser inconstitucional è também injusta, imoral e
ilegal em referência à lei maior, apresento algumas considerações finais acerca de
tão relevante tema, cuja reflexão e correção das distorções se reveste da maior
importância para a sociedade, no sentido de “dar, a cada um o que é seu” e colocar
a justiça em primeiro plano, como um dos mais importantes princípios
constitucionais, que não conflita, em nenhum momento, com a segurança jurídica
que devem ter as decisões constitucionais, legais e morais, tomadas no nosso
Estado Democrático de Direito.
134
Defendida a tese de que é importante a relativização de alguns julgados e a
impugnação da coisa julgada inconstitucional, ilegal, imoral e ou injusta, pois esta
relativização e impugnação não ofendem o instituto da coisa julgada, nem tampouco
atenta contra o principio da segurança jurídica, passo a esboçar as seguintes
considerações finais:
1 - a preocupação com a eficácia da coisa julgada dista dos primórdios do tempo,
desde o período anterior às normas positivadas,quando o direito era um conjunto de
regras costumeiras, morais e imutáveis e os julgamentos eram feitos pelos reis que
aplicavam a justiça civil. Observa-se, assim, que os aplicadores do direito sempre se
preocuparam em aplicar uma justiça correta e eficaz.
2 - O processo civil romano era dividido em 03 períodos: O processo das ações da
lei (legis actiones), o processo formular e o processo extraordinário, que
aconteceram nesta mesma seqüência durante os doze séculos em que vigorou o
direito romano.
3 - Nas legis actiones, apesar do direito ser baseado no costume, a coisa julgada
tinha força de lei e a sentença era, religiosamente, cumprida sob pena de severas
punições, em caso de desvios. No processo formular, se a sentença fosse
pronunciada, nos moldes da fórmula, consagrava a coisa julgada porque
representava a decisão do Estado. A sentença, tanto a absolutória quanto a
condenatória, tinha autoridade de coisa julgada definitiva e tinha como objetivo
consagrar a coisa julgada, valendo a regra do bis de eadem re me sit actio, que não
permitia a elaboração de uma nova fórmula. No processo extraordinário, a
autoridade de coisa julgada é garantida pela exceptio rei judicatae”, pois a coisa
julgada tinha força de lei.
4) a coisa julgada, nos primórdios do processo civil romano, encerrava uma
presunção de verdade, partindo do princípio de que os juízes não erravam e o caso
julgado devia ficar acima de qualquer suspeita ou discussão. A autoridade da coisa
julgada proibia que se iniciasse um novo processo e, caso isso acontecesse, que se
invocasse a sentença anterior.
5) a coisa julgada passava pela ineficácia do ato, mesmo trânsita em julgado, se
fosse constatada qualquer nulidade no processo. A sentença não gozava da
135
autoridade da coisa julgada e era declarada nula enquanto perdurasse o vício. O rito
processual era mais importante que o direito material. Era muito mais um “sistema
de actiones” e de meios processuais do que de direitos subjetivos.
6) no direito brasileiro, apesar de termos um sério sistema de controle de
constitucionalidade, cuja principal finalidade é a proteção dos direitos
constitucionalmente protegidos, onde o controle das leis e atos públicos inicia-se
com o processo de elaboração das leis, no legislativo, até a sua aplicação aos casos
concretos, com diferentes ações, cujos abusos e desrespeitos à Carta Magna são
corrigidos pelo Supremo Tribunal Federal, somos, ainda, totalmente carentes quanto
ao controle de constitucionalidade dos atos do poder judiciário.
7) a ADPF, Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental, muito contribuiu,
para o aperfeiçoamento do controle de constitucionalidade brasileiro. É uma ação da
maior importância pois, veio com o objetivo de defender os preceitos fundamentais,
esteios importantes na vida política de uma nação, permitindo que qualquer cidadão
se dirija ao Ministério Público e solicite a sua propositura.
8) Nunca, dentro do Controle de Constitucionalidade e das demais leis do sistema
jurídico positivado, viu-se instrumento mais simples e mais acessível a qualquer
cidadão do povo, que tenha os seus direitos prejudicados por qualquer Órgão
Governamental.
9) é necessário que se crie uma espécie de controle de constitucionalidade dos atos
do judiciário, da coisa julgada injusta, sem ferir o princípio da segurança jurídica,
que este é um dos direitos subjetivos mais fundamentais da pessoa humana, e sem
deixar de lado o princípio justiça, razão da existência do direito e alicerce do Estado
Democrático de Direito.
10) a desconstituição da coisa julgada inconstitucional, ilegal e ou injusta não ofende
o instituto da coisa julgada nem atenta contra o princípio da segurança jurídica,
garante que inúmeras injustiças sejam evitadas.
11) a coisa julgada inconstitucional não deve prevalecer, deve ser inexistente ab
initio.
136
12) não devem prevalecer as decisões que ferem os princípios constitucionais da
legalidade,moralidade e as atentatórias ao texto constitucional.
13) a coisa julgada não é intocável, imodificável. A força da coisa julgada não deve
ser absoluta, e, sim relativizada, desde que se constate que houve erro na decisão.
14) a Constituição Federal é o instrumento de organização do Estado e de proteção
dos direitos e garantias fundamentais dos cidadãos, devendo protegê-los no sentido
mais amplo da palavra, não permitindo que casos iguais tenham sentenças
diferentes, que dão direitos a uns e negam a outros, ferindo de morte os princípios
constitucionais da dignidade da pessoa humana, da razoabilidade, da prevalência
dos direitos humanos, da isonomia e da garantia de uma sociedade livre justa e
solidária, entre outros.
15) faz-se necessário repensar como proceder em casos de sentenças injustas,
desiguais para casos iguais e também como fica a coisa julgada no caso de
inovações científicas como o exame de DNA, para determinação da paternidade.
Atualmente, com raras exceções, a posição dos tribunais é a de que transitada em
julgado, a sentença adquire a presunção de certeza, e a qualidade de coisa julgada.
16) a idéia de controle de constitucionalidade surgiu com a idéia de supremacia da
Constituição e de que esta deve ser o ápice do ordenamento jurídico, a que, todo ato
deve conformar-se, e aos seus princípios, não podendo, os atos jurisdicionais,
ficarem imunes a tais controles, com a idéia de que a Carta Magna é o instrumento
de organização do Estado e de proteção dos direitos e garantias fundamentais.
17) vários foram os tipos de controle de constitucionalidade estudados nesta
dissertação e todos muito importantes para a manutenção do Estado Democrático
de Direito e a garantia dos direitos e garantias individuais.
18) necessário que se pense em um novo instrumento legal que corrija os estados
de injustiça. Necessita-se urgentemente, de um controle de constitucionalidade da
coisa julgada pelo judiciário, principalmente no caso de sentenças ilegais e injustas,
sob pena de perpetuarmos os estados de injustiças e negarmos o Estado
Democrático de Direito.
137
19) os Estados Unidos oferecem um bom exemplo do valor que deve ser dado à
justiça, pois o direito é baseado na common law, que prioriza a busca e a
aplicação da justiça. a coisa julgada não adquiriu a mesma força que tem em
outros sistemas jurídicos. A sua força é relativa em função do valor justiça, pois, o
que importa, para a common law, é a busca e aplicação da justiça ao caso concreto.
20) a moralidade e a justiça são essências do direito; a violação destes princípios
pelo Estado ou pelo Indivíduo, no julgamento da lide, não gera qualquer tipo de
direito. É direito nulo inexistente, por mais perfeito que se apresente formalmente, se
for expresso de forma contrária à moralidade.
21) observou-se que a segurança das relações jurídicas não é um valor absoluto,
como não é também a garantia da coisa julgada, pois ambas devem conviver, tanto
na ciência do direito quanto na prática forense, com o princípio da justiça das
decisões judiciais, garantido, expressamente, pelo art. 5º, XXXVI, da Constituição
Federal.
22) na ausência de expressa habilitação constitucional, a segurança e a certeza
jurídicas inerentes ao Estado Democrático de Direito não são suficientes para
fundamentar a validade da coisa julgada inconstitucional.
23) observou-se que, sob a ótica do direito processual, o vício de
inconstitucionalidade não impede que a sentença transite em julgado; mesmo assim
a sentença persiste enquanto ato material, até que tenha seus efeitos cassados, isto
é que seja desconstituída, pois, não pode gerar efeitos além ou aquém dos
garantidos, constitucionalmente.
24) percebi que muitos doutrinadores interpretam extensivamente o art. 5º, inciso
XXXVI, da Constituição Federal, dando-lhes uma dimensão maior do que a que o
legislador constituinte lhe quis dar, pois, ao afirmar que “a lei não prejudicará a coisa
julgada”, quis proteger apenas a coisa julgada, de acordo com os preceitos
constitucionais de justiça e moralidade e não a coisa julgada viciada, ilegal imoral e
injusta. Tanto é assim que, no inciso imediatamente anterior, teve o cuidado de
mencionar que “a lei não excluirá da apreciação do judiciário, lesão ou ameaça a
direito”, querendo ressaltar que o indivíduo, prejudicado em seus direitos por uma
sentença inconstitucional, ilegal, injusta ou imoral, tem direito a uma nova
138
apreciação para correção das distorções, pois, enquanto estas persistirem a
sentença não estará conforme a Constituição.
25) a doutrina moderna incluiu, no ordenamento jurídico muitos instrumentos que
impugnam a coisa julgada no âmbito dos três Poderes, conforme descrevi no
capítulo quinto da presente dissertação.
26) a doutrina e a jurisprudência, diante do constitucionalismo moderno
influenciaram bastante o legislador, levando-o a incluir, no nosso ordenamento
jurídico, a inexigibilidade do título judicial desconforme com a Constituição, numa
clara sinalização de que os aplicadores do direito devem acabar com o excessivo
apego à letra das leis infraconstitucionais e passar a observar a prevalência do
princípio da supremacia da Constituição.
27) o princípio da legalidade não significa estar estritamente vinculado ao texto da
lei, mas, decidir também, com base em princípios que contribuam para uma decisão
mais justa e compatível com o sistema jurídico vigente.
28) no ordenamento jurídico brasileiro o STF está se transformando em uma
constituinte permanente invadindo a esfera do legislativo.
29) a coisa julgada não deve ser contrária à Constituição, à lei e à justiça. Todavia a
supremacia da Constituição não poderá se sobrepor à segurança jurídica, à certeza
que deve permear as relações jurídicas. Assim, faz-se necessário que, sempre que
possível, seja determinado efeito “ex nunc” às relações daí surgidas, a fim de que se
preservem a segurança, o patrimônio jurídico e os direitos e garantias fundamentais
dos indivíduos.
30) a coisa julgada intocável é um instrumento de pacificação social se o
julgamento não ferir direitos ou prerrogativas alheios, caso contrário é um
instrumento de injustiças.
31) A coisa julgada não deve ser eternizada se contiver vícios que firam os direitos e
garantias fundamentais principalmente o valor justiça, verdadeira causa da
existência do direito devendo, portanto ser relativizada.
139
Encerro este trabalho fazendo alguns questionamentos que considero
importante para o exercício da democracia e que possa servir de reflexão para
futuros estudos:
1) pode o judiciário restringir os direitos e garantias fundamentais consagrados
no texto constitucional?;
2) como é possível controlar a constitucionalidade das decisões das cortes
constitucionais?;
3) como é possível controlar o STF, órgão encarregado de controlar a
constitucionalidade das leis?
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DOCUMENTOS
152
Mandado de Segurança 22.503-3 de 12 de abril de 1996, contra proposta de
emenda constitucional de reforma da Previdência Social (EC-33-A/95).
STF Pleno Adin 164/DF medida cautelar Rel.Min. Moreira Alves, RTJ
139/396.
STF – Pleno Adin nº 1.971 - 6/SP – medida liminar – Rel. Min. Celso de Mello, Diário
da Justiça, Seção I, 2 ago. 1999.
STF, RE n.97.589, Pleno, Rel., Min. Moreira Alves, DJU 13.03.2000, p.123.
TRF ar nº. 0130169, 2ª turma, publicação: dj 19-06-95, pg: 38285.
Resp nº.
.
160288/SP, 4
o
T.; Rel Min. Barros Monteiro; J. 10.04.2001; DJU
13/08/2001”.
Acórdão do STJ, no Resp. nº. 12586-SP, Rel. Min. Waldemar Sveiter., D, de
04.11.1991.
STE, Revista trimestral de jurisprudência, nº 107, p. 778.
TJDF, AGI 20010020-0009640, 3ª T., Rel. Juiz Wellington Medeiros, DJU,
15.08.2001, p. 54.
AR nº. 870/PE, 3ª. Séc. Rel. Min, José Arnaldo da Fonseca. DJU 13.03.2000, p. 123.
153
154
ANEXOS
ANEXO A
SUGESTÕES LEGISLATIVAS
ALTERAÇÕES NO TEXTO DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
Lei ll. -, de -, de
Art. 1.° Ficam revogados os incisos IV e V, do art. 485, da Lei n. 5.869, de 11 de janeiro
de 1973.
Justificativa:
155
(quanto ao inciso IV)
A ofensa à coisa julgada deixa de ser causa de rescindibilidade, porquanto a sentença
ofensiva à coisa julgada passa a ser considerada nula. Ver Capítulo X, subtítulo: "Invalidade
ou rescindibilidade da sentença prolatada em desrespeito à coisa julgada".
(quanto ao inciso V)
A violação de literal disposição de lei deixa de desafiar o uso da ação rescisória,
passando a ensejar a ação revisional de coisa julgada. Ver Capítulo IX, subtítulos: "O erro
evidente da sentença como causa de sua revisão. Ataque necessário à coisa julgada" e
"Revisão necessária da coisa julgada ofensiva ao princípio isonômico".
Art.2º. Acrescenta parágrafo único ao art. 474, da Lei n. 5.869, de 11 de janeiro de
1973.
Parágrafo único. É nula a sentença que, fora dos casos expressamente previstos em lei,
reexaminar matéria já submetida à eficácia da coisa julgada.
Justificativa:
Deixando de ser meramente rescindível a sentença que ofende a coisa julgada, é de bom
alvitre lhe reste expressamente cominada a pena de nulidade. Ver Capítulo X, subtítulo:
"lnvalidade ou rescindibilidade da sentença prol atada em desrespeito à coisa julgada".
Art. 3.° Acrescenta o inciso VIII ao art. 741, da Lei n. 5.869/73:
VIII - nulidade da sentença, por ofensa à coisa julgada, salvo se tal alegação houver sido
objeto de exame no processo de conhecimento. .
Justificativa:
156
Em sendo nula a sentença ofensiva à coisa julgada, é de rigor se enseje ao interessado
argüir o fato através de embargos, na execução da sentença defeituosa, salvo se o assunto
foi agitado no processo de conhecimento, sem sucesso.
O dispositivo, em conjunto com os anteriores, consuma a nova definição jurídica da
conseqüência da ofensa à coisa julgada. Ver Capítulo X, subtítulo: "lnvalidade ou
rescindibilidade da sentença prolatada em desrespeito à coisa julgada".
Art. 4.° O art. 469, da Lei n. 5.869, de 11 de janeiro de 1973, passa a vigorar com a
seguinte redação:
Art. 469. Fazem coisa julgada:
I - a verdade dos fatos, estabelecida como fundamento da sentença;
II - a apreciação de todas as questões decididas, relativas ao caso concreto, que constituam
premissa necessária da conclusão.
(1) Ação Rescisória e Ação Revisional de Coisa Julgada.
157
Justificativa:
O dispositivo rompe com os limites objetivos da coisa julgada, tal como disciplinados
pelo Código de Processo Civil, emprestando ao instituto nova dimensão, compatível com o
estádio de evolução da sociedade e com suas atuais necessidades. Ver Capítulo X, subtítulo
"Ampliação dos limites objetivos da coisa julgada".
158
ANEXO B
INSTITUIÇÃO DA AÇÃO REVISIONAL DA COISA JULGADA
Lei nº. , de – de, dde-.
(Institui a ação ordinária de revisão da coisa julgada)
Art. 1.° A revisão da coisa julgada material, através da presente ação, poderá ser
requerida pelo interessado quando a decisão atacada:
I - violar literal disposição de lei;
II - contrariar a súmula dos tribunais superiores;
III - houver adotado no caso concreto interpretação de regra jurídica diversa da que haja sido
aplicada em outra oportunidade, a questão igual.
Art. 2.° A petição inicial será elaborada com a observância dos requisitos essenciais do
art. 282, devendo o autor:
I - cumular ao pedido de revisão o de novo julgamento da causa; 11 - depositar a importância
de 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, a título de multa, revertida em proveito do réu,
caso a ação seja julgada improcedente;
III - comprovar, se for o caso, a existência e vigência da súmula contrariada, ou a divergência
jurisprudencial argüida, demonstrando a identidade entre a questão a ser revista e o
paradigma;
§ 1.° Não se aplica o disposto no inciso 11 à União, ao Estado, ao Município e ao
Ministério Público.
§ 2.° Havendo mudança do valor da causa, por determinação do juiz, seja de ofício, seja
em face de incidente de impugnação intentado pelo réu,
o autor será intimado para complementar o valor do depósito, em 5 (cinco) dias, sob pena de
ser o feito extinto, sem julgamento do mérito.
Art. 3.° Tem legitimidade para propor a ação:
I - quem foi parte no processo ou seu sucessor;
II - o terceiro juridicamente interessado;
III - o Ministério Público.
159
Art. 4.° A ação revisional da coisa julgada deve ser proposta no primeiro grau de
jurisdição, ainda que o julgado a ser revisto tenha sido prolatado em instância superior, salvo
se se tratar de causa de conhecimento originário de tribunais, caso em que também a ação
revisional deve neles ser ajuizada.
Art. 5.° No julgamento do mérito da ação revisional, o juiz não fica vinculado à solução
adotada no paradigma.
Art. 6.° A ação revisional da coisa julgada não prescreve senão quando prescrito o direito
subjetivo objeto da decisão atacada.
Art. 7.° A ação revisional não suspende a execução da sentença.
Art. 8.° Não enseja ação revisional da coisa julgada mero
reexame da prova produzida.
Art. 9.° Julgada procedente a ação revisional da coisa julgada, a
sentença então protalada substitui integralmente o julgado revisto.
Art. 10. Aplica-se à ação revisional da coisa julgada o procedimento ordinário.
Art. 11. Esta lei entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições
contrárias.
Justificativa:
Ver Capítulo IX - "Revisão da Coisa Julgada" - em toda a sua extensão.
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