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UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA ‘Júlio de Mesquita Filho’
Instituto de Geociências e Ciências Exatas
Campus de Rio Claro
A DINÂMICA DE USO DA TERRA E SUA INTERFERÊNCIA NA
MORFOHIDROGRAFIA DA BACIA DO ARROIO SANTA BÁRBARA - PELOTAS (RS).
ADRIANO LUÍS HECK SIMON
Dissertação de Mestrado elaborada junto ao
Programa de Pós-Graduação em Geografia, Área de
Organização do Espaço, para a obtenção do título de
Mestre em Geografia.
Rio Claro (SP)
2007
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UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA ‘Júlio de Mesquita Filho’
Instituto de Geociências e Ciências Exatas
Campus de Rio Claro
A DINÂMICA DO USO DA TERRA E SUA INTERFERÊNCIA NA
MORFOHIDROGRAFIA DA BACIA DO ARROIO SANTA BÁRBARA - PELOTAS (RS).
ADRIANO LUÍS HECK SIMON
Orientadora: Profa. Dra. Cenira Maria Lupinacci da Cunha
Co-orientadora: Profa. Dra. Rosa Elena Noal
Dissertação de Mestrado elaborada junto ao
Programa de Pós-Graduação em Geografia, Área de
Organização do Espaço, para a obtenção do título de
Mestre em Geografia.
Rio Claro (SP)
2007
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551.46 Simon, Adriano Luís Heck
S594d A dinâmica de uso da terra e sua interferência na
morfohidrografia da bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas
(RS) / Adriano Luís Heck Simon. - Rio Claro: [s.n.], 2007
185 f. : il., gráfs., quadros, fots., mapas
Dissertação (mestrado) – Universidade Estadual Paulista,
Instituto de Geociências e Ciências Exatas
Orientador: Cenira Maria Lupinacci da Cunha
Co-orientador: Rosa Elena Noal
1. Hidrografia. 2. Bacia hidrográfica. 3. Dinâmica do uso
da terra. 4. Alterações morfohidrográficas. 5. Análise
sistêmica. 6. Cartografia geomorfológica. I. Título.
Ficha Catalográfica elaborada pela STATI - Biblioteca da UNESP
Campus de Rio Claro/SP
Comissão Examinadora
Profa. Dra. Cenira Maria Lupinacci da Cunha – Orientadora – (IGCE/UNESP/Rio Claro)
Prof. Dr. Archimedes Perez Filho (IGE/UNICAMP)
Profa. Dra. Regina Célia de Oliveira (IGE/UNICAMP)
Adriano Luís Heck Simon
(Aluno)
Rio Claro, 11 de Outubro de 2007.
Resultado: APROVADO
Dedico este trabalho a duas pessoas muito especiais:
meu pai Mauri e minha mãe Marta;
Sem todos os seus ensinamentos, amizade, diálogo e compreensão, certamente
eu não seria ninguém. Amo muito vocês!
AGRADECIMENTOS
Muitas pessoas foram importantes para mim durante a realização do curso de
Mestrado no Programa de Pós-Graduação em Geografia da UNESP de Rio Claro. Algumas
delas me acompanham desde outras caminhadas, procurando estar sempre em contato para
compartilhar dos meus momentos. Outras pessoas, que conheci durante estes anos de Rio
Claro, foram fundamentais para que pudessem ocorrer ocasiões de troca, descontração,
fortalecimento pessoal e principalmente aprendizado.
Desta forma eu agradeço a Deus, em primeiro lugar, por se fazer presente diante
de questionamentos pessoais e profissionais em que a minha racionalidade não foi
suficiente.
Ao meu pai Mauri, minha mãe Marta e minha irmã Patrícia, minha família, que
sempre apoiou meu trabalho, compreendendo meus ideais e meu esforço, superando as
saudades durante estes sete anos longe de casa, mantendo-se unida acima de tudo.
À Fernanda Ludwig, minha companheira, que me compreende e me faz ser uma
pessoa feliz e serena. Agradeço por compartilhar todos os momentos, bons em sua quase
totalidade.
A Profa. Dra. Rosa Elena Noal, por revelar a Geografia para mim, contribuindo
para a base de meu conhecimento geográfico e por sempre estimular a continuidade dos
meus estudos de forma amiga e profissional.
A Profa. Dra. Iandara Alves Mendes pelo voto de confiança depositado em mim
ao aceitar as idéias inicias do projeto de mestrado e propiciar minha entrada no Programa
de Pós-Graduação em Geografia. Aproveito também para agradecer as importantes
contribuições prestadas no exame de qualificação.
Manifesto minha gratidão especial a Profa. Dra. Cenira Maria Lupinacci Cunha,
pelo seu profissionalismo, rigor, dedicação e confiança enquanto Orientadora,
proporcionando, sem dúvida, um grande crescimento profissional e também pessoal.
À Profa. Dra. Lucia Helena de Oliveira Gerardi, pelas importantes considerações
durante o exame de qualificação.
À Universidade Estadual Paulista ‘Júlio de Mesquita filho’, especialmente ao
Programa de Pós-Graduação em Geografia de Rio Claro, pela oportunidade concedida.
Aproveito para agradecer também aos funcionários e professores do programa,
principalmente a Inajara e a Maíca.
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), pela
concessão da bolsa de estudos.
Ao Departamento de Planejamento Territorial e Geoprocessamento pela estrutura
disponibilizada para a realização deste trabalho.
À Prefeitura Municipal de Pelotas, a Agencia de Desenvolvimento da Lagoa
Mirim (Pelotas) e à Secretaria Estadual da Agricultura (Porto Alegre), pela disponibilidade
dos materiais cartográficos e bibliográficos.
À equipe do Laboratório de Cartografia e Estudos Ambientais (LACEA) do curso
de Geografia da Universidade Federal de Pelotas, pelo auxílio estrutural e pessoal prestado
durante as atividades de campo em Pelotas.
À Lucimari Rossetti, por auxiliar em cada dúvida sobre o AutoCAD.
À Rosane Balsan, pela ajuda na minha chegada em Rio Claro e pela grande
amizade.
À Bruna Arenare, pela amizade que ajudou a reduzir o tempo dos fins de semana
e pelas discussões profissionais e pessoais que sempre acalmavam e davam ânimo para
seguir.
Aos amigos, Gracieli Trentin, Leila Limberger, Flávia Madruga, Paulo Nobokuni,
Jorge e Rita Jaqueline Chiapetti, Amanda Vasques, Amanda Gonçalves, Silvia Venturini,
Márcia Zabotto, Cecília Hauresko, Eracilda Fontanella, Marcelo Werner, Valdir Herrmann,
Marisa Ruckhaber e Rúbia C. Rambo por toda a ajuda, presença, companheirismo,
incentivo, dicas e críticas, obrigado!.
Ao Leandro Aquino, à Glória Cubas, à Ana Maria Gonçalves e ao Rafael Ludwig
pelo auxílio prestado durante a realização dos trabalhos de campo em Pelotas.
As funcionárias da biblioteca da Unesp de Rio Claro, em especial a Mônica, a
Nilza e a Maria Aparecida.
A todas as pessoas que de alguma forma colaboraram para a realização deste
trabalho, meus agradecimentos.
Adriano Luís Heck Simon.
RESUMO
A evolução das atividades antrópicas, a partir do aperfeiçoamento das técnicas utilizadas
na exploração dos recursos naturais, ocasionou a gradual alteração dos elementos do
sistema ambiental mediante a imposição de mecanismos de controle que determinaram
transformações na estrutura e nos fluxos de matéria e energia. Por meio desta perspectiva o
presente estudo teve como objetivo identificar e analisar as alterações e as condições de
controle que a dinâmica do uso da terra impôs ao sistema ambiental da bacia hidrográfica
do Arroio Santa Bárbara ao longo de 53 anos (1953-2006), procurando enfatizar as
transformações nas formas do relevo, na rede hidrográfica e na cobertura vegetal original.
A área situa-se na porção sudoeste do município de Pelotas, Estado do Rio Grande do Sul,
inserindo-se no conjunto de bacias do sistema lacustre Patos-Mirim. Com base na Teoria
Geral dos Sistemas aplicada à Geografia, que possibilitou a compreensão das relações
existentes entre os sistemas ambiental e socioeconômico na estruturação das organizações
espaciais, foram realizados mapeamentos da área em estudo, destacando o uso da terra e as
feições geomorfológicas de forma multitemporal. A análise dos resultados obtidos
constatou que a dinâmica do sistema socioeconômico impôs mecanismos de controle
diretos e indiretos sobre o sistema ambiental, desencadeando alterações na hidrografia, a
partir de intervenções na dinâmica fluvial; no relevo, diante das transformações impostas
às feições geomorfológicas pela ação antropogênica e do conseqüente desequilíbrio dos
processos erosivos; e na cobertura vegetal original, por meio de mudanças nos padrões de
uso da terra que desencadearam a redução de zonas de terras úmidas cobertas por
vegetação rasteira.
Palavras-chave: Dinâmica de Uso da Terra; Bacia Hidrográfica Santa Bárbara; Alterações
Morfohidrográficas; Análise Sistêmica e Cartografia Geomorfológica.
THE LAND USE DYNAMICS AND ITS INTERFERENCE IN SANTA BÁRBARA
STREAM WATERSHED MORPHOHYDROGRAPHY - PELOTAS (RS).
SUMMARY
The evolution of the human activities made possible the optimization of techniques used in
the exploration of natural resources, causing the gradual alteration of the environmental
system elements through the imposition of control mechanisms that had determined
transformations in the structure and the flows of substance and energy. In this context, the
present study had as objective to identify and to analyze the alterations and the control
conditions that the land use dynamics imposed to the environmental system of the Santa
Bárbara Stream watershed during 53 years (1953-2006), trying to emphasize the
transformations in landforms, hydrographic net and in the original covering. The area lies
in the southwestern part of Pelotas Municipal District, State of Rio Grande do Sul,
composing the set basins of Patos-Mirim lacustrine system. According to the General
Systems Theory applied to Geography, witch provided the understanding of relationships
between the environmental and socioeconomics systems in the spatial organizations
structuring, mappings of the study area had been accomplished, detaching the land's use
and the geomorphological features of multitemporal form. The gotten results analysis
evidenced that the dynamics of the socioeconomics system imposed direct and indirect
control mechanisms on the environmental system, unchaining alterations on hydrography,
through interventions on the fluvial dynamics; on landforms, with the transformations
imposed to the geomorphological features by the anthropogenic action and the consequent
erosive processes disequilibrium; and the original vegetal covering, through changes in the
standards of land use that had unchained the reduction of humid land zones covered by
creeping vegetation.
Keywords: Land Use Dynamics; Santa Bárbara Watershed; Morphohydrographyc
Alterations; System Approach and Geomorphological Cartography.
LISTA DE FIGURAS.
Páginas
Figura 1: Características geomorfológicas e da cobertura vegetal original do
Estado do Rio Grande do Sul...................................................................................
37
Figura 2: Localização do Município de Pelotas no Estado do Rio Grande do Sul
..................................................................................................................................
43
Figura 3: Localização da Bacia do Arroio Santa Bárbara no Município de
Pelotas......................................................................................................................
47
Figura 4: Bacia Hidrografia do Arroio Santa Bárbara............................................
48
Figura 5: Unidades Geomorfológicas e de Solos na Bacia do Arroio Santa
Bárbara.....................................................................................................................
57
Figura 6: Interconexão dos grandes conjuntos do Sistema Ambiental...................
69
Figura 7: Reação do Sistema Ambiental perante um esforço ou tensão que lhe é
imposto.....................................................................................................................
70
Figura 8: Origem e seleção da simbologia utilizada no mapeamento
geomorfológico da bacia do Arroio Santa Bárbara: a) Simbologia proposta por
Tricart (1965); b) Simbologia proposta Verstappen; Zuidan (1975).......................
88
Figura 9: Adaptação das simbologias de Tricart (1965) e Verstappen; Zuidan
(1975) aplicadas ao mapeamento geomorfológico na bacia do Arroio Santa
Bárbara.....................................................................................................................
89
Figura 10: Mapa do Uso da Terra na Bacia do Arroio Santa Bárbara – RS –
1953..........................................................................................................................
99
Figura 11: Mapa Geomorfológico da Bacia do Arroio Santa Bárbara – RS –
1953..........................................................................................................................
100
Figura 12: Mapa do Uso da Terra na Bacia do Arroio Santa Bárbara – RS –
1965..........................................................................................................................
101
Figura 13: Mapa Geomorfológico da Bacia do Arroio Santa Bárbara – RS –
1965..........................................................................................................................
102
Figura 14: Mapa do Uso da Terra na Bacia do Arroio Santa Bárbara – RS –
1995..........................................................................................................................
103
Figura 15: Mapa Geomorfológico da Bacia do Arroio Santa Bárbara – RS –
1995..........................................................................................................................
104
Figura 16: Representação Cartográfica do Uso da Terra na Bacia do Arroio
Santa Bárbara – RS – 2006......................................................................................
105
Figura 17: Setores de análise dos dados na bacia do Arroio Santa Bárbara...........
106
Figura 18: Representação Cartográfica das Principais Alterações
Morfohidrográficas no Setor de Várzea da Bacia do Arroio Santa Bárbara – RS –
2006..........................................................................................................................
124
Figura 19: Evolução espacial do uso da terra urbano e das terras úmidas
cobertas por vegetação rasteira na bacia do Arroio Santa Bárbara, Pelotas – RS
(1953-2006)..............................................................................................................
125
Figura 20: Representação Cartográfica das Principais Alterações
Morfohidrográficas no Setor dos Patamares de Expansão Urbana Leste e Oeste
da Bacia do Arroio Santa Bárbara – RS – 2006.......................................................
137
Figura 21: Evolução espacial das áreas de pastagem e das terras de culturas na
bacia do Arroio Santa Bárbara, Pelotas – RS (1953-2006)......................................
141
Figura 22: Características das alterações morfohidrográficas desencadeadas
pelas lavouras de arroz na bacia Santa Bárbara, Pelotas – RS.................................
143
Figura 23: Representação Cartográfica das Principais Alterações
Morfohidrográficas no Setor de Transição de Litologias da Bacia do Arroio
Santa Bárbara – RS – 2006......................................................................................
146
Figura 24: Evolução espacial das áreas de mata nativa, minas a céu aberto e
lagos e reservatórios na bacia do Arroio Santa Bárbara, Pelotas – RS (2006)........
148
Figura 25: Representação Cartográfica das Principais Alterações
Morfohidrográficas no Setor de Nascentes da Bacia do Arroio Santa Bárbara –
RS – 2006.................................................................................................................
160
LISTA DE GRÁFICOS
Páginas
Grafico1: a) Médias anuais de Temperatura e Precipitação no Município de
Pelotas/RS, 1971 – 2000; b) Média Anuais de Umidade no Município de
Pelotas/RS, 1971 – 2000..........................................................................................
52
Gráfico 2: a) Médias Mensais de Precipitação e Temperatura no Município de
Pelotas/RS, 1971 – 2000; b) Médias Mensais de Umidade no Município de
Pelotas/RS, 1971 – 2000..........................................................................................
53
Gráfico 3: Evolução espacial das classes de uso da terra na bacia do Arroio
Santa Bárbara, Pelotas (RS).....................................................................................
108
LISTA DE QUADROS
Páginas
Quadro 1: Caracterização esquemática dos aspectos geográficos do território
gaúcho......................................................................................................................
38
Quadro 2: Organização da Paisagem Natural na Bacia Hidrográfica do Arroio
Santa Bárbara...........................................................................................................
55
Quadro 3: Critérios de classificação e tipologia dos sistemas.........................................
64
Quadro 4: Níveis de detalhamento dos dados de sensores remotos.......................
81
Quadro 5: Sistema de uso da terra e revestimento do solo para utilização com
dados de sensoriamento remoto...............................................................................
82
Quadro 6: Sistema de Classificação do Uso da Terra e Revestimento do Solo
para a Bacia Hidrográfica do Arroio Santa Bárbara, Pelotas – RS..........................
84
SUMÁRIO
Página
1 INTRODUÇÃO.............................................................................................................. 112
2 DINÂMICA DE USO DA TERRA E PLANEJAMENTO AMBIENTAL EM BACIAS
HIDROGRÁFICAS: Algumas Questões Teóricas.............................................................. 20
3 PROCESSO DE OCUPAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO GEOGRÁFICA DA BACIA
DO ARROIO SANTA BÁRBARA .................................................................................... 35
3.1 O contexto regional ................................................................................................... 35
3.2 A bacia hidrográfica do Arroio Santa Bárbara .......................................................... 46
4 MÉTODO E TÉCNICAS ................................................................................................. 60
4.1 Método....................................................................................................................... 60
4.1.1 A Abordagem Sistêmica na Geografia............................................................... 60
4.1.2 O Sistema Ambiental: conceitos, características e dinâmica evolutiva.............. 67
4.2 Técnicas..................................................................................................................... 77
4.2.1 Revisão bibliográfica e seleção do material cartográfico................................... 77
4.2.2 Técnicas cartográficas ........................................................................................ 79
4.2.2.1 Elaboração do mapa base ............................................................................ 79
4.2.2.2 Elaboração dos mapas de uso da terra dos anos de 1953, 1965 1995 e da
representação cartográfica do uso da terra do ano de 2006..................................... 79
4.2.2.3 Elaboração dos mapas geomorfológicos dos anos de 1953, 1965 e 1995 e
organização do esboço cartográfico correspondente às características
geomorfológicas do ano de 2006............................................................................. 87
4.2.2.4 Trabalhos de campo e pesquisa documental................................................ 95
5 ANÁLISE DOS RESULTADOS ..................................................................................... 97
5.1 O Setor de várzea e as alterações morfohidrográficas vinculadas às obras de
engenharia...................................................................................................................... 109
5.1.1 Fase inicial das transformações: 1953 e 1965 .................................................. 114
5.1.2 Intervenções em maior escala no cenário de 1995 e nas representações
cartográficas de 2006................................................................................................. 119
5.2 Evolução da estrutura urbana nos patamares leste e oeste ...................................... 128
5.3 A evolução das atividades agrícolas no setor de transição de litologias e as
transformações na dinâmica fluvial e na morfologia original ....................................... 140
5.4 Setor de Nascentes: transformações derivadas das atividades agropastoris e de
mineração....................................................................................................................... 153
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................... 167
7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................... 174
1 INTRODUÇÃO
A evolução da espécie humana, desde o período das comunidades nômades até o
advento das sociedades modernas, demonstra o paulatino esforço do homem em garantir
seu bem estar social, econômico e estrutural a partir da adequação e controle dos elementos
do sistema ambiental. A necessidade de alimentos, moradia, comunicação, bem como a
realização de trocas comerciais para a conseqüente obtenção de lucros, entre outros,
fizeram com que as técnicas utilizadas pelos grupos sociais na consolidação dessas ações e
relações fossem aperfeiçoadas, tornando-se complexas e dinâmicas, possibilitando um
(re)conhecimento mais aprofundado das potencialidades do sistema ambiental que foi
submetido a intervenções intensas e de diferentes magnitudes ao longo da história.
Casseti (1991) explica que o meio natural é o substrato no qual atuam as
atividades humanas, que por sua vez consolidam a organização espacial, obedecendo a
padrões culturais e econômicos. Assim, quanto maior for o avanço técnico-científico de
uma sociedade, maiores serão as imposições ao meio natural e as transformações
decorrentes. O aperfeiçoamento e a especialização das atividades rurais e urbano-
industriais, praticadas pelos grupos sociais, resultaram em organizações espaciais
complexas, derivando em múltiplos usos da terra. A alteração dos elementos do sistema
ambiental ocorreu de forma inerente a esse processo, para que a natureza possa suprir as
necessidades do sistema socioeconômico, a partir de matérias primas que mantém a
estrutura e funcionamento daquele.
Nos últimos séculos, sobretudo após o avanço tecnológico promovido pela
Revolução Industrial em meados do século XVIII, os procedimentos utilizados pelo
sistema socioeconômico na apropriação dos elementos naturais vêm extrapolando a
INTRODUÇÃO
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência da Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
13
capacidade de resiliência do sistema ambiental e desencadeando uma série de impactos
ambientais de diversas proporções espaciais e graus de intensidade. Essa característica de
apropriação muitas vezes não planejada, assumida pelas sociedades modernas, vincula-se
não apenas às intervenções diretas e não-comedidas sobre elementos naturais, mas
relaciona-se também às intervenções indiretas, caracterizadas pelas estruturas criadas para
que esse processo pudesse se tornar dinâmico, como no caso dos distintos usos da terra.
Dentro desse contexto destacam-se: o adensamento e o inchaço urbano, o
aprimoramento dos meios de transporte e o incremento de vias de circulação terrestres
aéreas e marítimas, bem como o dinamismo das relações comerciais, econômicas e
sobretudo sociais, que conduziram o sistema socioeconômico a patamares de consumo que
exigem ciclos de produção cada vez mais dinâmicos e, conseqüentemente, maior demanda
de matérias-primas. No meio rural, as atividades agropastoris também acompanharam esse
conjunto de transformações, a partir da modernização das técnicas utilizadas no preparo e
uso do solo, na implantação das lavouras, no melhoramento dos gêneros agrícolas e no
controle fitossanitário das lavouras.
De forma geral, a introdução de mecanismos de controle antrópico sobre os fluxos
de matéria e energia nos sistemas ambientais proporcionou o aumento na exploração e na
produção de bens de consumo, conduzindo ao bem-estar de alguns grupos sociais. Assim, é
preciso compreender que as mudanças tecnológicas não beneficiaram a todos, deflagrando
o surgimento de classes menos favorecidas que vivem à margem desse progresso. Essa
situação de degradação também se estendeu sobre o equilíbrio dinâmico do sistema
ambiental, uma vez que as alterações e as intervenções antrópicas demonstraram-se cada
vez mais intensas, visando à manutenção desse metabolismo social e provocando assim
uma série de impactos ambientais.
De modo geral, o ponto de partida das transformações derivadas do controle
antrópico exercido sobre o sistema ambiental decorre da remoção e substituição da
cobertura vegetal original para a implantação das atividades humanas – em especial
aquelas vinculadas a agricultura e pecuária – relacionando-se também com a evolução de
estruturas urbanas que promoveram a impermeabilização das superfícies e o grande
acúmulo de resíduos derivados das atividades realizadas nessas aglomerações
populacionais.
Como efeito desses processos, os elementos do sistema ambiental procuraram
adequar seus atributos às novas condições impostas, reajustando-se às características que
INTRODUÇÃO
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência da Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
14
regulam a entrada e a saída de matéria e energia. Muitas vezes, as alterações tornam-se tão
profundas que a capacidade de resistência e resiliência dos atributos dos elementos pode
ser comprometida, ocasionando impactos ambientais que levam a estruturação de um novo
equilíbrio dinâmico no sistema, condicionado, sobretudo, pelos mecanismos de controle
exercidos pelas atividades antrópicas.
Nesse contexto, as formas do relevo também se manifestam como elementos do
sistema ambiental, onde incidem as interferências diretas do processo de ocupação e
apropriação dos recursos naturais, pois caracterizam a base de ocorrência de tais ações,
compartimentando-se em zonas de acesso onde as alterações são mais brandas, porém não
deixando de ser impactantes, além de superfícies que oferecem resistência às atividades
antrópicas, nas quais as transformações são intensas e repercutem em maiores implicações
na morfodinâmica. Christofoletti (1999, p. 416) afirma que
as feições topográficas e os processos morfogenéticos atuantes em uma
determinada área possuem papel relevante para as categorias de uso do
solo, tanto nas atividades agrícolas como nas urbano-industriais.
Acrescenta-se também a importância que assumem para as obras viárias,
para a exploração dos recursos naturais, para o lazer e para o turismo.
Assim, a interferência antrópica sobre as formas de relevo manifesta-se
principalmente pela alteração na morfodinâmica, por meio do desequilíbrio dos processos
que atuam na morfogênese. Os distintos usos da terra atuam diretamente nesse sentindo,
pois conduzem a apropriações por vezes adequadas e, em outras situações, inadequadas,
diante das características do relevo em suportar alterações na cobertura vegetal original e
exposições mais severas aos eventos climáticos responsáveis pelo intemperismo.
Ainda inserido no grupo dos principais elementos do sistema ambiental que
sofrem significativa interferência a partir da intervenção antrópica, encontra-se o ciclo
hidrológico em sua fase terrestre. A utilização dos recursos hídricos em prol da
manutenção dos distintos usos da terra rurais e urbano-industriais tem ocasionado
interferências nos sistemas hidrográficos, mediante as alterações na rede de drenagem que
modificam, barram ou extinguem cursos de água, acarretando implicações nos processos
erosivos e na dinâmica fluvial.
De acordo com Park (1977), as transformações oriundas de modificações na rede
de drenagem ocorrem de forma direta e indireta sobre a dinâmica fluvial. As ações diretas
caracterizam-se como aquelas que ocorrem nos canais fluviais, com a efetivação de obras
INTRODUÇÃO
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência da Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
15
de engenharia que têm por objetivo aliviar os efeitos de fluxo, erosão ou deposição,
ocasionando mudanças na estrutura e nos processos fluviais.
Park (1977) ressalta ainda que o segundo grupo de mudanças, inserido nas ações
indiretas, refere-se às alterações que ocorrem no uso da terra, como remoção da cobertura
vegetal, reflorestamento, mudanças nas práticas agrícolas, construção de
edificações/impermeabilização do solo e mineração. Essas transformações deflagram
disfunções na dinâmica fluvial, por meio de deturpações na drenagem e na direção do
escoamento superficial e subsuperficial, acelerando, retardando ou barrando os processos
erosivos.
Verifica-se assim que a apropriação e a alteração dos elementos do sistema
ambiental, entre eles de forma mais expressiva a cobertura vegetal original, o relevo e a
hidrografia, possuem aspectos favoráveis geralmente ao sistema socioeconômico – embora
de forma parcial – como a ampliação de áreas agropastoris, aglomerações urbanas e
parques industriais, tendo a conseqüente geração de lucros e circulação de bens de
consumo. Porém, derivações decorrentes de usos intensivos e desorientados, além de
apropriações que vão além da capacidade de regeneração espontânea dos recursos naturais,
têm causado inúmeros desequilíbrios aos ciclos, processos e às características dos sistemas
ambientais a partir da transformação dos elementos citados.
A Geografia possui um papel de suma importância ao desvendar o que acontece
nesse contexto, justamente por se preocupar com o estudo das relações do sistema
ambiental com o sistema socioeconômico, as quais levam à produção das organizações
espaciais (CHRISTOFOLETTI, 1999). De acordo com Mendonça (1998, p. 27), “a
Geografia, ao lado de algumas outras ciências, desde a sua origem, tem tratado de perto a
temática ambiental, elegendo-a de maneira geral, como uma de suas principais
preocupações”. Ainda nesse sentido, temos a colaboração de Ross (1995) que expõe o
“interesse da Geografia em apreender como cada sociedade humana estrutura e organiza o
espaço físico-territorial em face das imposições do meio natural, de um lado, e da
capacidade técnica, do poder econômico e dos valores sócio culturais de outro”.
As transformações na organização espacial traduzem um processo paulatino de
ocupação, controle e uso dos recursos do sistema ambiental pelo homem. Sua compreensão
é possível por meio de identificação e análise da dinâmica do uso da terra, que demonstram
os aspectos sociais e econômicos envolvidos na substituição do revestimento original da
superfície.
INTRODUÇÃO
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência da Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
16
Lambim et al. (2001) entendem que a dinâmica no uso da terra e as conseqüentes
transformações na cobertura original são os agentes primários das mudanças na
morfodinâmica e na morfogênese, dos processos de degradação dos solos, da alteração da
dinâmica fluvial e da descaracterização de muitos ecossistemas. Dessa forma, torna-se
importante compreender que as informações adquiridas por meio da análise da evolução e
dinâmica do uso da terra possuem elementos-chave para a identificação da gênese das
intervenções no sistema ambiental que desencadearam a ocorrência de algumas situações
impactantes.
Assim, dentro da perspectiva das alterações nos elementos do sistema ambiental
desencadeadas pela dinâmica de uso da terra, a presente pesquisa, de cunho geográfico,
teve como objetivo principal identificar e analisar as alterações e as condições de controle
que a dinâmica do uso da terra impôs aos elementos do sistema ambiental da bacia
hidrográfica do Arroio Santa Bárbara, localizada no município de Pelotas, Estado do Rio
Grande do Sul. A análise enfatizou, em especial, a hidrografia, a partir das alterações
impostas à bacia de drenagem; o relevo, com ênfase nos processos erosivos ocasionados
pelas práticas agropastoris, obras de engenharia e evolução do aglomerado urbano; e a
vegetação, em particular a substituição da cobertura vegetal original pelas atividades
agropastoris e urbano-industriais.
Para que o objetivo principal da pesquisa pudesse ser atingido, foram propostos
ainda alguns objetivos específicos:
* Descrever e analisar o processo de ocupação da área em estudo, mediante
revisão de literatura e análise documental;
* Obter dados sobre a dinâmica de uso da terra ocorrida na bacia do Arroio Santa
Bárbara por meio do mapeamento georreferenciado dessa nos anos de 1953, 1965, 1980,
1995 e 2006.
* Identificar as principais formas do relevo local, com ênfase aos condicionantes
dos processos erosivos, por meio do mapeamento geomorfológico dos anos de 1953, 1965,
1995 e pela representação cartográfica atual das áreas onde foram identificadas as
alterações morfohidrográficas mais significativas.
* Analisar comparativamente os mapeamentos realizados nos diferentes cenários
a fim de identificar a dinâmica de uso da terra e sua interferência na morfohidrografia.
Tais objetivos foram traçados levando-se em consideração a hipótese inicial da
pesquisa, de que a dinâmica de uso da terra ocorrida na bacia do Arroio Santa Bárbara, ao
INTRODUÇÃO
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência da Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
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longo dos 53 anos, poderia ter desencadeado alterações nos elementos do sistema
ambiental a partir da imposição de mecanismos de controle diretos e indiretos. Tais
mecanismos possivelmente efetivaram alterações na cobertura vegetal, transformações na
morfologia e a implantação de feições geomorfológicas de origem antrópica, além de
modificações na dinâmica fluvial, a partir de intervenções na morfologia dos canais. Todas
essas intervenções, ao longo do período analisado, podem ter contribuído de forma
expressiva na perturbação dos fluxos de matéria e energia pelo sistema, acelerando ou
retardando os processos erosivos e de sedimentação, bem como influenciando uma série de
transformações espaciais na rede de drenagem que tiveram efeitos sobre a dinâmica fluvial.
A área de estudo escolhida para o desenvolvimento desta pesquisa é uma das
principais bacias de drenagem do extremo sul Gaúcho, integrante da Macrobacia
Hidrográfica da Lagoa Mirim. Apresenta em sua configuração espacial um mosaico
ambiental já alterado pelo intenso processo de apropriação do sistema ambiental, que
pouco está sendo trabalhado sob a ótica do planejamento e gestão ambiental, salvo estudos
de uso da terra, limnológicos e de morfologia de fundo efetuados no Reservatório Santa
Bárbara (CANEZ, 2003; De LEON, 1983; KORB, 2006 respectivamente), além de
pesquisas vinculadas aos impactos ambientais ao longo do Arroio Santa Bárbara em área
urbana (VIGNOLO, 2003; SIMON et al 2003 e SIMON, 2005).
Estudos realizados por Simon et al (2003) apontam para as alterações impostas ao
Arroio Santa Bárbara em seu curso inferior, na área que compreende a zona urbana de
Pelotas, confirmando o elevado índice de degradação ambiental e a necessidade de planos
de contenção do avanço das moradias nas margens do mesmo. Na zona rural, as atividades
agrícolas delinearam um novo perfil ao espaço geográfico, avançando sobre áreas de
relevo acentuado e de proteção ambiental, como no caso das matas de galeria.
A opção pela bacia hidrográfica do Arroio Santa Bárbara também ocorre pela sua
funcionalidade enquanto objeto de pesquisa. Assim, podemos classificar o sistema em
estudo como uma Bacia Estratégica, que de acordo com as definições de Borges; Bordas
(citados BOTELHO; SILVA, 2004, p. 160):
é selecionada a partir de condições específicas, não encontradas no
restante da região ou porção do território considerado, ou ainda, mais
freqüentemente, selecionada em função da existência de problemas
críticos que requerem compreensão e/ou ações urgentes, tornando-a
prioritária.
INTRODUÇÃO
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência da Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
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Dentro dessa concepção, podemos afirmar que a importância da Bacia, enquanto
Área de Estudos Estratégicos, advém principalmente do fato de que sua rede hidrográfica é
responsável pela drenagem que abastece o Reservatório Santa Bárbara, o qual possui
aproximadamente 2,72 km² e foi inaugurado na década de 1960, visando a captação e
tratamento de água para o atendimento a uma demanda populacional e a um parque
industrial crescente, além da contenção de enchentes que assolavam freqüentemente as
áreas mais baixas da cidade de Pelotas.
O problema central, entretanto, não se restringe apenas a oferta e demanda de
água para a população pelotense, mas volta-se principalmente a questão da apropriação do
sistema ambiental, sobretudo nas vertentes da bacia que abastecem o reservatório e nas
margens do mesmo. Nas últimas décadas, as atividades agrícolas e urbano-industriais
pelotenses condicionaram um incremento gradativo de energia no sistema, por meio da
mecanização da agricultura e da expansão de bairros, vilas e favelas, ocasionando um
processo de degradação de ecossistemas locais como nos banhados e nas áreas de mata
atlântica da região lagunar interna gaúcha (SIMON, 2005).
Considerando essas circunstâncias e visando contribuir para futuras ações de
planejamento ambiental da área, estima-se necessária uma análise integrada da bacia
hidrográfica por meio do mapeamento do uso da terra que forneça subsídios para a
compreensão da dinâmica de uso ocorrida na área, bem como sua relação com as
alterações temporais na cobertura vegetal original, nas feições do relevo e na dinâmica
fluvial local. Entende-se assim que uma análise integrada pode auxiliar na identificação de
elementos-chave importantes para a compreensão da gênese dos principais impactos e
fenômenos de degradação que ocorrem sobre os elementos do sistema ambiental na bacia.
Para a apresentação dessa análise, a dissertação foi estruturada em seis capítulos:
o 1° Capítulo realiza uma introdução à temática proposta, enquanto o 2° Capítulo propõe
algumas questões teóricas que envolvem os conceitos de uso da terra, uso do solo, bacias
hidrográficas e planejamento ambiental, tomando como referência as definições propostas
por pesquisadores vinculados à Geografia, Geologia, Ecologia, Biologia e Economia.
No 3° Capítulo é realizada uma caracterização geral da bacia do Arroio Santa
Bárbara, que ocorre em duas perspectivas. A primeira procura situar a área em estudo
dentro de um contexto regional, na qual é descrito o processo de ocupação do espaço
gaúcho e pelotense. A segunda atenta para as particularidades da bacia Santa Bárbara,
destacando as características do sistema ambiental e socioeconômico.
INTRODUÇÃO
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência da Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
19
A orientação metodológica adotada para a realização da presente pesquisa é
discutida no 4° Capítulo, em que são analisados os diferentes pontos de vista e conceitos
que abrangem a Teoria Geral dos Sistemas. Ainda nesse capítulo é apresentado o conjunto
de técnicas aplicadas para a realização dos mapeamentos de uso da terra e
geomorfológicos, que concederam dados e respaldo às discussões sobre as alterações
morfohidrográficas na bacia Santa Bárbara.
O 5° Capítulo apresenta a análise dos resultados obtidos a partir da aplicação das
técnicas, procurando estabelecer a relação entre a dinâmica de uso da terra e as alterações
morfohidrográficas verificadas, a partir de uma concepção sistêmica. Por fim, o 6°
Capítulo engloba as considerações finais acerca da temática abordada e do arcabouço
teórico-metodológico utilizado, procurando estabelecer breves relações e conclusões com a
análise dos resultados realizada.
2 DINÂMICA DE USO DA TERRA E PLANEJAMENTO AMBIENTAL EM
BACIAS HIDROGRÁFICAS: Algumas Questões Teóricas
A pesquisa bibliográfica ocorre durante a realização de uma investigação
científica para que inúmeros termos sejam elucidados e conceituados. Dessa forma, o
esclarecimento e a interpretação de conceitos e vocábulos utilizados por diversos autores
nos distintos campos do conhecimento científico tornam-se relevantes, haja vista que, por
vezes, vários são os termos utilizados para mencionar o mesmo fenômeno.
Nesse capítulo serão abordados termos que se relacionam à dinâmica do uso da
terra, considerando as bacias hidrográficas como unidades geográficas de análise das
alterações no sistema ambiental e de implementação de ações de planejamento ambiental.
Assim sendo, serão conceituados e explicados termos como: Uso, Utilização, Ocupação,
Apropriação, Terra, Solo, Cobertura, Revestimento, Dinâmica e Evolução, além das
referidas locuções derivadas dessas palavras. O texto apresenta ainda outros termos que
serão interpretados, como Planejamento Ambiental, Bacias Hidrográficas, Bacias de
Drenagem e Microbacias Hidrográficas.
O processo toma como referência as definições dadas a essas expressões por
autores pertencentes a determinadas áreas do conhecimento – Geografia, Geologia,
Ecologia, Biologia, Economia. Abarca também o sentido denotativo das mesmas,
procurando estabelecer uma acepção geográfica a palavras e termos que são utilizados no
decorrer da investigação
DINÂMICA DE USO DA TERRA E PLAN. AMBIENTAL EM BACIAS HIDROGRÁFICAS: Algumas Questões Teóricas
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
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As expressões Uso e Utilização designam o mesmo ato: empregar, aproveitar,
consumir (BORBA, 2004, p. 1408/1409). Silva et al. (1999, p. 233) apontam para o
sentido do termo Utilização Sustentável como sendo “a utilização dos componentes da
diversidade biológica, mantendo assim seu potencial para atender as necessidades e
aspirações das gerações futuras”.
Já a palavra Ocupação qualifica o ato de preencher determinado espaço,
aproximando-se do conceito anterior por poder ser interpretada como o fato de “utilizar-se
ou servir-se de algo” (Borba 2004, p. 984). Para a Geografia, esse “algo” pode ser
compreendido como o espaço e seus recursos naturais, nos quais interagem as
organizações espaciais. De acordo com Christofoletti (1999),
O conceito de recursos naturais é sensível ao contexto no qual é utilizado.
Os componentes existentes na superfície terrestre não surgem como
recursos naturais apenas porque se encontram no sistema da natureza.
Passam a essa categoria quando ganham relevância em função da
intervenção humana, pelo conhecimento de sua existência, pelo
conhecimento de como pode ser tecnicamente utilizado e pela sua
integração a determinada necessidade da sociedade. Em conseqüência, o
mesmo recurso natural não é perene em sua importância ao longo dos
tempos nem possui a mesma relevância em todas as regiões. (p. 158).
Dessa forma, a ocupação ocorre para o uso, ou seja, a utilização de algum bem
material é somente efetivada a partir do momento em que a ocupação é processada. Isso se
aplica tanto nas sociedades nômades – nas quais a ocupação ocorre por um período
determinado – quanto nas sociedades sedentárias, que organizam estruturas voltadas para a
manutenção de sua ocupação e o aprimoramento no uso dos recursos naturais.
As sociedades sedentárias modernas, porém, parecem superar o sentido proposto
pela palavra Apropriação, que designa a “utilização como se fosse próprio” (BORBA,
2004, p. 99). A apropriação ocorre simultaneamente à ocupação, desencadeando diferentes
usos do espaço e podendo ocorrer de forma agressiva ou não ao sistema ambiental e
também ao sistema socioeconômico.
Diferentes estudos, identificados abaixo, tratam das formas de ocupação e
apropriação do espaço. Entretanto, parece não existir um consenso a respeito de uma
correta expressão, ou então da distinção entre uso da terra e uso do solo, que sejam
empregadas por pesquisadores. Diante de tal situação, o presente trabalho considera
relevante colaborar com as discussões a respeito.
DINÂMICA DE USO DA TERRA E PLAN. AMBIENTAL EM BACIAS HIDROGRÁFICAS: Algumas Questões Teóricas
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
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Fato é que a palavra Solo possui seu significado voltado para a pedologia,
caracterizando-se como a “camada superficial da terra arável, possuidora de vida
microbiana” (GUERRA & GUERRA, 1999, P. 583); é também concebida como a “parte
superior do regolito que sustenta a vida [...] modificado por processos físicos, químicos e
biológicos” (ART, 1998, p. 492); ou então como a “terra considerada nas suas qualidades
produtivas” (BORBA, 2004, p. 1302); e, por fim, como “uma superfície inconsolidada que
recobre as rochas e mantém, em partes, a vida animal e vegetal na terra” (SILVA et al.,
1999, p. 217).
Os termos Terra/terra, por sua vez, em várias definições são considerados por sua
condição planetária, como astro integrante do Sistema Solar (BORBA, 2004;
SUERTEGARAY, 2003; SILVA et al. 1999; ART, 1998). Parker et al. (2003, p. 314)
apontam para uma definição mais simples, dizendo que “o sentido geográfico para a
palavra terra, seria o de um espaço dinâmico onde os sistemas social e ambiental
encontram-se em interação”. Porém Silva et al. (1999) ultrapassam essa concepção ao
definirem de forma abrangente e sistêmica o significado da palavra. Para os autores a Terra
(planeta) ou terra:
É um meio ambiente total (natural e cultural), dentro do qual a produção
tem lugar. Designa-se como um termo mais amplo que solo. Seus
atributos incluem condições adicionais às dos solos, como depósitos
minerais, clima e suprimento de água. Trata-se do sistema bio-produtivo
terrestre que compreende o solo, a vegetação, outros componentes da
biota e os processos ecológicos e hidrológicos, que se desenvolvem
dentro do sistema. (p. 225).
Dessa forma, torna-se possível identificar certas diferenças no sentido das
palavras solo e terra, bem como compreender seu emprego em situações e pontos de vista
distintos. Pesquisas que abarcam o termo Uso do Solo são geralmente desenvolvidas nas
Ciências Agrárias (CAMPOS, 1993; FILADELFO JÚNIOR, 1999), indicando classes e
diferenciações no uso agrícola do solo, estimativas de produção, potencialidades,
capacidades do uso e relações entre solo-planta-água, além dos impactos provocados por
usos incorretos.
O termo também está presente em pesquisas vinculadas a Geociências e nos
estudos das Ciências Humanas, podendo ser identificado em investigações geográficas
(FORESTI & HAMBURGER, 1991). Em alguns casos, trabalhos que utilizam o termo uso
do solo podem apresentar uma abordagem que se aproxima ou confunde-se com termo uso
da terra (TAGLIANI & VICENS, 2003).
DINÂMICA DE USO DA TERRA E PLAN. AMBIENTAL EM BACIAS HIDROGRÁFICAS: Algumas Questões Teóricas
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
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O Uso da Terra, por sua vez, abrange a estrutura das organizações espaciais, em
face da complexa dinâmica dos sistemas ambiental e socioeconômico, possuindo um maior
campo de interpretação para a Ciência Geográfica (OLIVEIRA, 2000; DAINESE, 2001;
SIMON, 2005; RODRIGUES; LUCHIARI, 2005). Lambim et al. (2001, p. 262) são
esclarecedores ao explicarem que “o uso da terra constitui-se nas propostas ou nas
intenções humanas aplicadas aos atributos biofísicos da superfície da terra”.
Marques (1971) e Lepsch (1983), citados por Oliveira (2000) esclarecem que o
conceito solo é mais restrito, sendo considerado como um conjunto de corpos
tridimensionais na superfície terrestre contendo matéria viva com capacidade de suportar
plantas. Já a palavra terra é mais abrangente, pois inclui em seu significado o solo e os
vários atributos de uma área, como o substrato geológico, a hidrologia e os resultados da
atividade antrópica.
Segundo Ross (1995), o Uso da Terra pode significar um retrato estático das
manifestações dinâmicas desencadeadas pelas relações socioeconômicas de um território
com as características ambientais. Apesar do caráter estático, a interpretação desse retrato –
em um único período ou em séries cronológicas – revela inúmeros eventos que reproduzem
a evolução histórico-temporal do fragmento espacial em estudo, possibilitando também
uma visão futura e a estruturação de estudos geográficos que visam analisar a gênese de
alterações ambientais derivadas de usos não planejados da terra.
Anderson (1979, p. 20) aponta para a considerável diversidade de opiniões
quanto ao que vem a ser o uso da terra. Para esse autor, um dos conceitos que possuem
maior mérito é o de que esse vocábulo refere-se à atividade do homem na terra, a qual se
acha diretamente relacionada com a terra enquanto integradora dos elementos que
compõem a paisagem.
O esclarecimento dos conceitos não pretende julgar a validade de pesquisas em
andamento ou finalizadas que adotam uma ou outra expressão. Pelo contrário, espera-se
colaborar para que dúvidas na escolha da abordagem possam ser amenizadas e também
para que a Geografia possa direcionar seu objeto de estudo para análises que confluam na
integralidade dos aspectos naturais, sociais e econômicos durante a efetivação de pesquisas
sobre ocupação, apropriação dos sistemas ambientais e utilização dos recursos naturais.
Dessa forma, a presente investigação científica adota o conceito de Uso da Terra
para identificar as transformações ocorridas em um determinado espaço, em um dado
período de tempo. A opção ocorre porque, diante da explicitação dos conceitos e perante o
DINÂMICA DE USO DA TERRA E PLAN. AMBIENTAL EM BACIAS HIDROGRÁFICAS: Algumas Questões Teóricas
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
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direcionamento da pesquisa, acredita-se que o termo encontra-se ligado aos objetivos da
ciência geográfica, que se preocupa em estudar os fenômenos pertinentes à relação do
sistema socioeconômico com o sistema ambiental.
Demais conceitos que também se sobressaem na análise das literaturas são:
Cobertura e Revestimento, da terra ou do solo. A Cobertura é sinônimo de Revestimento,
sendo compreendidos os dois vocábulos como “alguma parte ou material que reveste ou
cobre determinada superfície” (BORBA, 2004, p. 1222); “atributos biofísicos da superfície
da terra” (LAMBIN, et al., 2001, p. 262); ou ainda como “parte da superfície que encontra-
se protegida pelas copas das árvores” (ART, 1998, p. 107). Seu sentido, portanto, invoca a
proteção de determinada superfície, que em termos de solo/terra indica-se a existência de
uma camada pioneira, representada pela vegetação original, que abriga o terreno da ação
natural e das ações antrópicas que ainda não ocorreram.
Para Boada; Toledo (2003, p. 48) a cobertura do solo/terra refere-se às
“características originais de parte da superfície terrestre que incluem a biota, o solo, a
topografia e as águas. A mesma pode estar classificada segundo numerosos critérios,
dependendo das propostas científicas para as quais é desenvolvida a classificação”.
Exemplos de algumas categorias de cobertura do solo/terra podem ser: florestas tropicais,
cerrado, pradarias temperadas, banhados, entre outras.
Os autores citados consideram que a intensidade da ocupação do espaço e do uso
dos recursos naturais pode ocasionar alterações nessa cobertura primária. Dessa forma,
usos da terra comuns como agricultura, pastagens, silvicultura, mineração e atividades
urbano-industriais podem efetivar Transformações ou Modificações na cobertura original.
Assim, os autores classificam o revestimento da terra transformado como aquele
onde ocorre a substituição completa de uma paisagem por outra, como por exemplo, uma
floresta tropical por uma área de pastagem, ou então, áreas alagadas (como os banhados)
pelo aglomerado urbano. Essas conversões normalmente têm grandes impactos nos ciclos
biogeoquímicos e nos balanços energéticos.
O revestimento da terra modificado, em contraste com o anterior, refere-se às
mudanças paulatinas que afetam o caráter da cobertura do solo/terra sem mudar sua
constituição e classificação geral. Mesmo ocorrendo um processo de ocupação e alteração
de suas características originais, esse revestimento continua presente, podendo ser
classificado em mapeamentos ou em observações de campo. “A modificação resultante
provoca a degradação e descaracterização dos ecossistemas, como se dá no caso da
DINÂMICA DE USO DA TERRA E PLAN. AMBIENTAL EM BACIAS HIDROGRÁFICAS: Algumas Questões Teóricas
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
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superexploração de pastos e o empobrecimento florestal” (BOADA; TOLEDO, 2003, p.
48).
Tanto a transformação como a modificação do revestimento ou da cobertura
original de determinado fragmento espacial derivam da Dinâmica e Evolução do uso da
terra, impostas pelas atividades antrópicas. Essas alterações espaço-temporais podem
ocorrer de forma brusca ou lenta, dependendo da intensidade da apropriação e da ocupação
por parte das atividades humanas sobre sistemas que mantinham suas características
naturais.
Como dinâmica, podemos compreender o(os) “movimento(os) produzido(os) por
meio de força(as)” (BORBA, 2004, p. 441). Em seu sentido geográfico, a força encontra-se
ligada ao aprimoramento da exploração, da produção e do trabalho aplicados sobre o
sistema ambiental. A ação dessas forças conflui na complexidade das organizações
espaciais, com capacidade de evolução de sua estrutura areal e de seus mecanismos
produtores.
A evolução dessa estrutura dinâmica compreende a superação e a modernização
das tecnologias (forças) por meio do alcance de um novo patamar técnico, científico e
cultural. Tomado o seu sentido denotativo, o termo evolução pode ser considerado
sinônimo de aperfeiçoamento e progresso, desenvolvimento e transformações (BORBA,
2004).
Em Ecologia, a evolução é compreendida como o “processo pelo qual todos os
organismos existentes se desenvolvem a partir dos primeiros, através de características
herdadas por muitas gerações” (ART, 1998, p. 221).
Em se tratando das organizações espaciais – objeto de estudo da Geografia – a
evolução abrange, além do conceito da Ecologia, os novos arranjos do espaço geográfico,
possuidores de características espaciais e temporais, sendo fruto do aperfeiçoamento das
técnicas que condicionam novas formas, estruturas e funções. Tudo isso sem descartar as
estruturas herdadas dessa evolução e que ficam impressas espacialmente, tendo dimensões
física, social, econômica e, principalmente, ambiental.
Ao longo do tempo, intensifica-se no espaço geográfico uma organização voltada
para diversas atividades e prioridades que determinam novas características ao meio
natural. Essa dinâmica evolutiva do uso da terra é fruto de diversos estágios tecnológicos
que atuam para o aperfeiçoamento da exploração dos recursos naturais, a fim de
possibilitar o desenvolvimento socioeconômico, mas desencadeando também
DINÂMICA DE USO DA TERRA E PLAN. AMBIENTAL EM BACIAS HIDROGRÁFICAS: Algumas Questões Teóricas
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
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desequilíbrios no sistema ambiental, cuja capacidade de regeneração de seus elementos,
em muitos casos, não acompanha os níveis de apropriação empregados pela ação antrópica.
Verifica-se, assim, que a ocupação do espaço possui aspectos geralmente
favoráveis ao sistema socioeconômico, ainda que de forma parcial – como a ampliação de
áreas agropastoris, aglomerações urbanas e parques industriais, tendo como conseqüência a
geração de lucros e a circulação de bens de consumo. Porém, derivações decorrentes de
usos intensivos e desorientados, além de apropriações distantes da capacidade de
regeneração natural dos elementos dos sistemas naturais, têm causado inúmeros impactos
ambientais.
De acordo com a visão sistêmica, segundo Christofoletti (1979), o impacto
ambiental ocorre quando a entrada de matéria ou energia ultrapassa o limite de tolerância
compatível da organização do sistema, ocorrendo desequilíbrio e alterações entre seus
elementos. Em seguida, o sistema tende a buscar novamente seu estado de equilíbrio,
reajustando-se a nova condição ou retornando ao estado inicial, quando não ultrapassar seu
grau de resiliência, que de acordo com Christofoletti (1999, p. 114) consiste na
“capacidade do sistema em retornar as condições originais após ser afetado pela ação de
distúrbios externos”.
Atualmente, existe um consenso de que as alterações no uso da terra são as
maiores condutoras de mudanças ambientais locais, regionais e globais, justamente pela
sua intervenção direta nas condições climáticas, nos processos dos ecossistemas, nos ciclos
biogeoquímicos, na biodiversidade e, o mais importante, sobre as atividades humanas.
(LAMBIN et al., 1999, p.11).
Cada período histórico possui uma representação espacial das formas de uso da
terra, que atenderam, em outras ocasiões, e respondem, atualmente, a um ideal econômico
dominante. O estudo de sua evolução e a compreensão de sua dinâmica destacam várias
informações que ficaram “impressas” cronologicamente no espaço geográfico.
O levantamento do uso da terra tem sua importância também por permitir a
identificação de conflitos no processo de ocupação. Esses são evidenciados pela expansão
de áreas urbanas e agrícolas sobre zonas de proteção permanente (como no caso das matas
ciliares ou reservas florestais), bem como pelo processo de poluição dos corpos de água, do
ar, sonora e pela ocupação de zonas cujas características do relevo não são adequadas à
apropriação. Dessa forma,
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SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
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trabalhos adicionais são necessários na identificação de regiões onde
ocorrem mudanças críticas no uso e cobertura da terra, além da dinâmica
que dá origem a estes processos. Esta ênfase examina a vulnerabilidade e
resiliência da sociedade, infra-estrutura, sistemas de produção ou
biodiversidade apontando “hot spots” em face de tendências oriundas
dessa dinâmica de uso da terra, como elevação do nível do mar, aumento
da freqüência das variações climáticas e degradação crônica das terras.
(Lambin et al. 1999, p. 22, tradução nossa).
Para compreender as mudanças que se sucedem no uso da terra, a comunidade
científica internacional passou a ter maior necessidade em quantificar e representar
espacialmente dados que indicam como a cobertura da terra foi sendo transformada e
mudada nos últimos 300 anos e como esse comportamento dar-se-á por no mínimo 50 ou
100 anos (LAMBIN, et al. 1999).
Nesse sentido insere-se o projeto Land Use/Cover Change (LUCC). Trata-se de
uma pesquisa internacional de longo prazo juntamente desenvolvida sobre os auspícios do
International Geosphere-Biosphere Programme (IGBP) com sede na Suíça e do
International Human Diomensions Programme on Global Environmental Change (IHDP),
com sede na Alemanha. O projeto possui apoio financeiro do International Council for
Science (ICSU), do International Social Science Council (ISSC), do National Science
Fundation (USA), do German Ministry for Science, Research and Technology e do
Governo Holandês (LAMBIN et al 1999).
Existem hoje pesquisadores vinculados a esse projeto que atuam nos mais
diversos campos do conhecimento científico em distintas instituições de pesquisa
congregadas pela ação internacional de identificação das mudanças ambientais globais. O
projeto chama atenção por incentivar os pesquisadores a trabalhar com questões atreladas à
mudança e à transformação da cobertura e usos da terra sob o enfoque sistêmico, tratando
de problemáticas que transcorrem em nível global por meio de pesquisas que integram
realidades locais e regionais das mais diversas partes do globo.
O LUCC possui suas raízes arraigadas a vários objetivos da Ciência Geográfica.
Constitui-se em um ponto de referência para pesquisadores que voltam seus estudos aos
problemas ambientais decorrentes da evolução e da dinâmica do uso da terra e sobre como
as organizações espaciais procedem a ocupação do espaço geográfico, constituindo seu
sistema socioeconômico. A gama de pesquisadores ligados à Geografia e integrantes do
projeto abre novas oportunidades para que essa ciência participe ativamente das pesquisas
que se inserem nessa conjuntura.
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Boada; Toledo (2003) reservam em seus estudos sobre ambientalismo e crise da
modernidade um destaque especial ao projeto LUCC. Apontam-no como uma das
propostas metodológicas mais interessantes lançadas em nível global, justamente pelo seu
caráter inovador, interdisciplinar, sistêmico e pela dimensão científica no estudo da
denominada “Mudança Ambiental Global”.
Dentro da perspectiva das rápidas mudanças ambientais globais, decorrentes das
transformações na cobertura e uso da terra, uma equipe de pesquisadores do Millennium
Ecossystem Assessment – instituto de pesquisa ligado ao programa LUCC – produziu um
documento síntese das principais alterações na cobertura e uso da terra em nível global
intitulado “A Síntesis of Information on Rapid Land-cover Change for the Period 1981-
2000”. O estudo baseou-se em uma compilação de informações espaciais de nível regional
e local, provenientes, por sua vez, de dados de sensoriamento remoto e de outros dados
georreferenciados de diversas instituições de pesquisa mundiais, inclusive do Brasil
(LAMBIN et al. 2001).
Apesar de apresentar algumas conclusões já conhecidas, o estudo propôs uma
síntese em nível global, identificando em documentos cartográficos as mudanças ocorridas
na cobertura ou no revestimento da terra. Esses estudos são imprescindíveis para
posteriores comparações advindas de novas pesquisas regionais agregadas aos objetivos do
programa.
Resultados positivos já puderam ser extraídos desse primeiro documento, bem
como várias propostas também foram instituídas para a elaboração do próximo. Entre tais
sugestões encontram-se a resolução e a escala a serem adotadas nos mapeamentos, além da
classificação e temporalidade dos dados, que virão a facilitar a compilação e a análise das
informações obtidas.
No Brasil, contribuições não recentes, porém relevantes, como a de Keller (1969),
destacam a importância dada ao levantamento do uso da terra em nível mundial pela
Comissão de Utilização da Terra da União Geográfica Internacional, uma vez que são
pouco conhecidos os verdadeiros usos da superfície terrestre. A autora citada argumenta
também sobre a grande diferença existente entre países desenvolvidos e os ditos
subdesenvolvidos, no que tange à quantidade e à qualidade de dados a respeito dessa
temática.
Em seu texto, a autora evidencia que a interpretação dos dados de uso da terra é
de fundamental interesse aos planejadores e aos programas de desenvolvimento, em face
DINÂMICA DE USO DA TERRA E PLAN. AMBIENTAL EM BACIAS HIDROGRÁFICAS: Algumas Questões Teóricas
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da discriminação de áreas propícias à expansão e à exploração – agrícola ou
urbano/industrial – bem como de áreas subutilizadas que denunciam problemas e requerem
uma investigação minuciosa.
Nesse sentido, a análise da dinâmica de uso da terra tem o papel de identificar
áreas cuja ocupação e apropriação dos recursos naturais estão ocorrendo de forma
indiferente a sua capacidade de regeneração, auxiliando assim as ações de planejamento.
Baldwin (1981, p. 162) explica que o planejamento e o manejo ambiental podem ser
definidos como o iniciar e a execução de atividades para dirigir e controlar a coleta, a
transformação, a distribuição e a disposição dos recursos de uma maneira capaz de
sustentar as atividades humanas com um mínimo de distúrbios nos processos físicos,
ecológicos e sociais.
O desenvolvimento técnico-científico e informacional atingido pela sociedade
capitalista nas últimas décadas foi decisivo para que os hábitos de vida da população
fossem alterados e para que houvesse avanços em diversos campos, principalmente na
biomedicina, nas comunicações, nos transportes, na prestação de serviços e na área
industrial – com a informatização dos parques fabris e o aumento na capacidade de
processamento. Tudo isso intensificou a exploração das matérias-primas.
Esse progresso multifacetário demonstrou à sociedade, num primeiro momento, o
lado mais confortável de sua evolução tecnológica, conduzindo à comodidade em inúmeras
situações diárias. Entretanto, desvelou suas características negativas ao hegemonizar
potências mundiais controladoras de economias e detentoras das decisões socioambientais,
bem como de um mundo subdesenvolvido em caótico estado social, econômico e
estrutural.
A percepção da insustentabilidade dessa situação ampliou a concepção de que
atitudes mais coerentes nas práticas econômicas, culturais, sociais e, sobretudo, nas
ambientais deveriam ser tomadas. A preocupação com as ações atuais e futuras – evitando
que as atividades humanas tenham conseqüências drásticas em períodos relativamente
curtos – fez com que vários compromissos de planejamento fossem instituídos, desde
planejamentos econômicos, passando por planejamentos urbanos e rurais, até o
planejamento ambiental, como forma de gerir os sistemas ambientais.
Ross; Del Prette (1998) afirmam que a adoção do planejamento como instrumento
de governo consolidou-se tanto nos países comunistas, quanto nos países de economia de
mercado, sobretudo após a Segunda Guerra Mundial. Tal inquietação partiu, por um lado,
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SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
30
das autoridades políticas, em súbita demonstração de preocupação com a instabilidade dos
acontecimentos mas, ao mesmo tempo, revelando interesses de ordem econômica, visto
que novos rumos, guiados por estratégias desenvolvimentistas, prenunciavam o surgimento
de economias proeminentes; e, por outro lado, sociedade e grupos ambientalistas
demonstravam apreensão com a condição extrema de colapso socioambiental que se
desenvolvia em diversas áreas do Globo.
Floriano (2002) expressa algumas considerações a respeito do planejamento
enquanto ferramenta de gestão. Em sua essência, comenta o autor, o planejamento é um
processo de organização de tarefas para se chegar a um fim, possuindo fases características
e seqüenciais que, em geral, estão na seguinte ordem: identificar o objeto do planejamento;
determinar uma missão ou compromisso para se atingir o objetivo desejado; definir
políticas e critérios de trabalho; estabelecer metas; desenvolver um plano de ações
necessárias para se atingir as metas; estabelecer um sistema de monitoramento, controle e
análise das ações planejadas; definir um sistema de ação sobre os dados controlados e,
finalmente, prever a tomada de medidas para prevenção e correção quanto aos desvios que
poderão ocorrer em relação ao plano.
Existem características comuns entre o planejamento tradicional e o
planejamento ambiental. Entretanto, a despeito das similaridades, diferenças na postura e
na abordagem dessas duas ferramentas de gestão são de possível identificação, pois
ocorrem divergências no que tange aos objetivos, à temporalidade, à organização e à
concepção de desenvolvimento.
De acordo com Mauro (1997) e Marinho (1999), o planejamento tradicional
privilegia o crescimento, assumindo critérios de máxima eficiência econômica por meio da
utilização de tecnologias limitativas. Sua concepção de desenvolvimento é considerada
setorial, parcial e linear. O planejamento tradicional apresenta sua produção centrada em
formas de organização empresarial mercantil, possuindo interesses nos aspectos
econômicos, mas não reconhecendo a existência de conflitos justamente por não promover
ações para superá-los.
O planejamento ambiental, por sua vez, orienta a produção para a satisfação das
necessidades básicas da população, adotando critérios de desenvolvimento regional
harmônico, privilegiando, dessa forma, a qualidade de vida. Confere preferências a
critérios de longo prazo, buscando coerência para as ações que demandam curtos e médios
intervalos de tempo (MAURO, 1997; MARINHO, 1997).
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31
A tecnologia utilizada procura respeitar a auto-regeneração do sistema ambiental,
possuindo uma concepção de desenvolvimento integral e sistêmico. Sua organização
produtiva ramifica-se, possuindo interesses tanto no aspecto econômico como nos aspectos
natural e social. O planejamento ambiental reconhece ainda a ocorrência de conflitos
paralelos à busca do desenvolvimento integral, almejando elementos institucionais que
provenham da discussão e do consenso das partes interessadas, (MAURO, 1997;
MARINHO, 1997).
Percebe-se que o planejamento tradicional encontra-se arraigado a uma visão
linear e racional de desenvolvimento. De acordo com Capra (1982), esse paradigma tem
exercido uma influência poderosa sobre o conhecimento científico, tornando nossa cultura
fragmentada e desenvolvendo tecnologias, instituições e estilos de vida profundamente
doentios.
Sua aplicação consolidou-se como base exclusiva no processo de
desenvolvimento econômico de algumas nações, mas revelou deficiências à medida que
demonstrou não estar em sintonia com a noção de equilíbrio, de integração e de
sustentabilidade dos sistemas ambiental e socioeconômico.
O planejamento ambiental, de forma antagônica, busca fundamentar suas ações
numa visão holística, estabelecendo trabalhos que respeitem a inter-relação dos elementos
sociais e naturais que compõem um sistema em constante atividade.
Simultaneamente à busca do desenvolvimento estrutural, social e econômico –
necessário a qualquer sociedade moderna que procura inserção no mercado globalizado – o
planejamento ambiental empenha-se no estabelecimento de diretrizes que sirvam como
aparatos instituidores de limites. Tais marcos concedem ao espaço em que estão sendo
aplicados possibilidades de crescimento por um período prolongado, com o mínimo de
agressões ao meio natural e social.
As ações de planejamento ambiental caracterizam-se, dessa forma, como medidas
para o desenvolvimento de determinadas áreas com mínimo impacto sobre os sistemas
ambiental e socioeconômico, podendo ocorrer em estágios de acelerado processo de
degradação, ou como forma de prevenir e controlar a ampliação de ações antrópicas sobre
os recursos naturais.
O planejamento ambiental, que em sua essência possui um caráter integrador e
sustentável, demonstra cada vez mais inserção em áreas cuja fragmentação espacial entre
os atributos do sistema ambiental ocorre em menor intensidade, primando por unidades
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32
geográficas sistêmicas. Nesse sentido, as bacias hidrográficas apresentam-se como âncoras
para o planejamento e gestão ambiental (ROSS. Del PRETTE, 1998).
Ab’ Saber (1987) afirma que o uso dessa unidade natural ecogeofisiográfica
possibilita uma visão sistêmica e integrada devido, principalmente, à clara delimitação e à
natural interdependência de processos climatológicos, hidrológicos, geológicos e
ecológicos. Sobre esses sistemas atuam as forças antropogênicas, em que atividades e
sistemas econômicos, sociais e biogeofísicos interagem-se.
Ross; Del Prette (1998, p. 101) afirmam que a bacia hidrográfica, embora se
constitua num sistema natural cujo referencial é a água, torna-se automaticamente um
único sistema ambiental, seja do ponto de vista natural, quando se levam em conta os
demais componentes da natureza, como relevo, solos, subsolo, flora e fauna, seja do ponto
de vista social, quando se consideram as atividades econômicas.
Do ponto de vista socioeconômico ainda existem divergências sobre a adoção das
bacias hidrográficas como áreas de pesquisa, visto que os fenômenos sociais apresentam
continuidade espacial que muitas vezes ultrapassam os limites dessas unidades de análise
naturais. Por essa razão, muitas ações de planejamento urbano e rural pautam-se, ainda, em
unidades político-administrativas, como os municípios, as microrregiões e os setores
censitários.
Sendo assim, a bacia hidrográfica constitui-se numa região propícia para a
execução de análises que confluem em ações de planejamento ambiental e gestão dos
recursos naturais, exatamente porque todos os processos físicos de qualquer natureza
atuam no interior de uma bacia hidrográfica e qualquer espaço pode ser dividido em redes
hidrográficas de múltiplas dimensões, facultando a regionalização e a adoção de uma área
como unidade de estudos e monitoramento ambiental.
De acordo com Art (1998, p. 50), a bacia hidrográfica é a área total de superfície
de determinado terreno, na qual um aqüífero ou um sistema fluvial recolhe sua água para
um canal principal. O termo bacia de drenagem também é lembrado como sendo a forma
do terreno ou da superfície de uma vertente, a área que contribui para o escoamento de um
curso de água. O autor estabelece uma diferença na concepção dos dois termos, inferindo
que o primeiro resulta das características paisagísticas, enquanto o segundo deriva da
atuação dos processos hidrogeomorfológicos que atuam na morfodinâmica.
Destacando-se a diferenciação proposta por esse autor, grande parte da
bibliografia pesquisada aborda os termos bacia hidrográfica e bacia de drenagem como
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33
sinônimos. Bacia de drenagem, bacia hidrográfica e bacia fluvial possuem o mesmo
significado para Guerra & Guerra (1997, p. 76), que as caracterizam como um conjunto de
terras drenadas por um rio principal e seus afluentes. Ainda de acordo com os autores
citados, a noção de bacia hidrográfica obriga a existência de cabeceiras, divisores, cursos
de água principais, afluentes e subafluentes. Seu conceito é dinâmico, haja vista a atuação
dos seus atributos nos processos morfogenéticos.
Suguio (1998, p. 73), em consonância com Guerra & Guerra (1997), compreende
os termos bacia hidrográfica e bacia de drenagem sob o mesmo conceito. De acordo com o
autor, essas correspondem à parte da superfície terrestre que é ocupada por um sistema de
drenagem, ou que contribui com água superficial para aquele sistema.
Jackson (1997, p. 191), por sua vez, concebe o termo bacia de drenagem
(drainage basin) como uma região ou área limitada por um divisor de águas, ocupada por
um sistema de drenagem. O autor citado continua, descrevendo que esse sistema configura-
se como a área de um território que reúne água originada das precipitações, contribuindo
com o canal ou com o sistema de canais principal. Na literatura americana, o termo aparece
como sinônimo das palavras watershed, drainage area, catchment, catchment area, river
basin e hidrographic basin.
Uma das definições de bacia hidrográfica que a estabelece de fato como unidade
sistêmica é a de Ferreira & Ferreira (2003, p. 122) que explicitam seu conceito afirmando
que
a bacia hidrográfica é entendida como um sistema aberto e complexo,
cujo fluxo aparece como uma resposta aos fatores que a controlam e se
faz constituir-se, portanto, em um sistema aberto, por estar
constantemente trocando matéria e energia com outros sistemas que
compõe o seu ambiente. Sendo assim, uma bacia hidrográfica é
controlada principalmente pelo fornecimento de matéria e energia dos
sistemas externos do seu ambiente, quais sejam: o abiótico, o biótico e o
antrópico.
Existe ainda o termo microbacia hidrográfica que, ao lado da expressão bacia
hidrográfica, é muito utilizado em trabalhos de cunho geográfico e institucional. Para
Loenert (1993), a microbacia hidrográfica tem o mesmo conceito de bacia hidrográfica,
porém a dimensão superficial da microbacia é menor que 20.000 ha. Em consenso com
Loenert, Rocha (1991) expõe que o conceito de microbacia é o mesmo empregado às
bacias hidrográficas, tendo como diferença a extensão que não pode superar os 10.000 ha.
DINÂMICA DE USO DA TERRA E PLAN. AMBIENTAL EM BACIAS HIDROGRÁFICAS: Algumas Questões Teóricas
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
34
Botelho; Silva (2004), analisando as expressões e dimensões espaciais das bacias
hidrográficas, evidenciam o fato de que entre os trabalhos acadêmicos por eles analisados,
em geral, foram consideradas microbacias aquelas unidades que apresentam dimensão
entre 20 e 50 km². As bacias hidrográficas, por sua vez, são compreendidas como áreas
possuidoras de dimensões superiores, que variam desde 50 Km² chegando a 10.000 Km²
ou mais, podendo esse número ser superior a 100. 000 km² como em estudos realizados na
bacia do Rio Amazonas.
Ryff et al. (1995), por sua vez, definem a microbacia hidrográfica como uma
unidade natural de planejamento agrícola e ambiental, adequada à implantação de novos
padrões de desenvolvimento rural, que representa uma etapa no processo de aproximações
sucessivas rumo ao ideal de um desenvolvimento sustentável. De acordo com a visão dos
autores citados, evidencia-se a proposta de utilização das microbacias hidrográficas para a
implantação de programas de desenvolvimento, sobretudo em pequenas comunidades
rurais, pelo fato de sua aproximação com o tamanho das propriedades agrícolas.
As definições de tamanho envolvidas na escolha do termo, além dos propósitos da
presente pesquisa em analisar um sistema que abrange usos de terra agrícola e urbano-
industrial, fazem com que se utilize o termo bacia hidrográfica ao se estudar a superfície
drenada pelo Arroio Santa Bárbara e seus afluentes. Isso porque sua área, 83 Km
2
,
além de
sua importância enquanto fomentadora do Reservatório Santa Bárbara e superfície onde se
desenvolvem significativas atividades econômicas municipais e regionais, determinam sua
inserção na categoria de bacia hidrográfica.
Dessa forma, as ações de planejamento ambiental em bacias hidrográficas
encontram respaldo fundamental nas análises sobre a dinâmica de uso da terra. A união
dessas informações com demais dados do meio físico e socioeconômico possibilita uma
visão integrada dos fenômenos processados no interior dessa unidade de pesquisa, além
das conseqüências desses processos. Assim, a caracterização do sistema em estudo, desde
seu contexto regional até suas características peculiares, possibilita o agrupamento e a
correlação das informações objetivando analisar alterações ocorridas durante um
determinado período de tempo.
A caracterização geográfica do sistema concede uma visão da conjuntura do local
onde se desencadeia a dinâmica das organizações espaciais. Neste contexto, a seguir são
descritos o processo de ocupação da bacia do Arroio Santa Bárbara e a caracterização
geográfica, englobando aspectos dos sistemas ambiental e socioeconômico.
3 PROCESSO DE OCUPAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO GEOGRÁFICA DA
BACIA DO ARROIO SANTA BÁRBARA
3.1 O contexto regional
A descrição do processo de ocupação e a caracterização geral da área em estudo
ocorrem em consonância com a abordagem teórico-metodológica proposta pela pesquisa.
Dessa forma, uma análise integrada dos fatos permite a compreensão dos aspectos gerais
dos sistemas ambiental e socioeconômico, que originam características específicas de
organização do espaço geográfico.
Para compreender o processo de ocupação da bacia do Arroio Santa Bárbara é
preciso, primeiramente, remontar ao processo de ocupação ocorrido no Rio Grande do Sul.
A dualidade do povoamento do território Sulriograndense, ocorrido em dois domínios
naturais – campos e matas –, é visível tanto no município de Pelotas como na bacia
hidrográfica em questão. A caracterização dos sistema ambiental gaúcho torna-se, diante
desse aspecto, necessária para a compreensão do processo de ocupação da área em estudo,
nas duas áreas-chave supracitadas.
De acordo com Bernardes (1962), as características naturais do espaço gaúcho
influenciaram na organização das atividades socioeconômicas e na conseqüente
distribuição da população pelo Estado. A bacia do Arroio Santa Bárbara insere-se nessas
particularidades, visto que seus limites abrangem tanto as zonas de campo nativo
localizadas na Planície Costeira, bem como as porções de mata situadas nas Serras do
Sudeste, acarretando em diferenciações no desenvolvimento das atividades econômicas, no
povoamento e nos usos da terra.
PROCESSO DE OCUPAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO GEOGRÁFICA DA BACIA DO ARROIO SANTA BÁRBARA
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
36
Bernardes (1962) afirma ainda que as regiões morfológicas do Rio Grande do Sul
atuam na articulação de diferentes unidades climáticas e de vegetação original,
configurando diferentes unidades de paisagem. Em seus estudos sobre o povoamento do
território gaúcho, são discriminadas seis unidades distintas no que tange às características
do relevo: Planalto, Encosta, Serras do Sudeste, Depressão Central, Campanha e Litoral.
A abordagem dessas regiões morfológicas associadas às condições climáticas e de
cobertura vegetal, apontadas por Bernardes (1962), aproxima-se dos registros do projeto
RADAMBRASIL (1986), que define os grandes domínios morfoestruturais gaúchos além
de suas regiões e unidades geomorfológicas. A caracterização natural e a dos aspectos
geográficos do território gaúcho pautaram-se na união dessas duas propostas, procurando
evidenciar características importantes do sistema ambiental sulriograndese que tiveram
papel fundamental no processo de ocupação estadual e regional.
Assim, a Figura 1 representa as características morfológicas e de cobertura vegetal
original apontadas por Bernardes (1962), enquanto o Quadro 1 reúne, esquematicamente,
aspectos geomorfológicas do Projeto RADAMBRASIL (1986) associados às regiões
geomorfológicas e climáticas de Bernardes (1962), além de características geográficas
gerais, possibilitando assim a compreensão geral da configuração do espaço gaúcho.
PROCESSO DE OCUPAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO GEOGRÁFICA DA BACIA DO ARROIO SANTA BÁRBARA
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
37
Figura 1: Características geomorfológicas e da cobertura vegetal original do Estado do Rio Grande
do Sul.
Fonte: Organizado por Adriano L. H Simon, Adaptado de Bernardes (1962).
Domínios
Morfoestruturais
1
Regiões
Geomorfológicas
1
Unidades
Geomorfológicas
1
Regiões Morfológicas e
Condições Climáticas
Associadas
2, 3
Características Gerais
Planície Costeira
Externa (influência
marítima)
Planície Marinha
Planície Lagunar
Depósitos
Sedimentares
Planície Costeira
Interna (influência do
sistema lagunar
Patos/Mirim)
Planície Alúvio-
Coluvionar
Litoral
Clima de
Verões Quentes
(Temperatura
média anual
variando de 16°
ao sul e 20° ao
norte)
* estende-se desde a Barra do Chuí até a divisa com Santa
Catarina;
* apresenta uma linha de costa linear interrompida apenas pela
Barra do Rio Grande onde ocorre o encontro da Laguna dos
Patos com o Oceano Atlântico;
* estágios vegetacionais variando desde vegetação de dunas e
restingas, passando por zonas úmidas de banhado, até
coberturas vegetais arbustivas e arbóreas (LINDMAN, 1906).
* o litoral gaúcho, ao contrário do restante do litoral brasileiro,
não propiciou a instalação de núcleos de povoamento devido a
suas condições ambientais hostis, além de não existirem
pontos de refúgio contra eventuais ataques inimigos
(BERNARDES, 1962).
Planaltos Residuais
Canguçu - Caçapava
do Sul
Clima de
Verões Frescos
Embasamentos em
Estilos Complexos
Planalto Sul-
riograndense
(Escudo Cristalino
Sul-riograndense)
Planalto Rebaixado
Marginal
Serras do
Sudeste
Clima de
Verões
Quentes
* região “constituída por grande variedade de rochas
cristalinas, entre as quais predominam os granitos”
(BERNARDES, 1962, p. 593);
* a dissecação do relevo no Escudo produziu uma fisionomia
colinosa de baixa altitude, vertentes suaves e grande
concentração de material meteorizado que se desloca para os
fundos de vale, impulsionado por mecanismos de remoção
(VIEIRA, 1984);
* A vegetação nativa é representada por mataria que se adensa
mais fortemente nos fundos de vales, onde, naturalmente, há
maior concentração de umidade. (VIEIRA, 1984, p. 64). Nas
colinas ocorrem campos cobertos por gramíneas de boa a
baixa qualidade;
* temperatura média anual entre 16°C e 20°C precipitações
esparsas entre 1500 e 1600 mm (Atlas Socioeconômico do Rio
Grande do Sul, 2003).
Quadro 1: Caracterização esquemática dos aspectos geográficos do território gaúcho.
Fonte: Organizado por Adriano L. H. Simon, adaptado de:
1
RADAMBRASIL (1986);
2
Bernardes (1962);
3
Atlas Socioeconômico do Rio Grande do Sul (2003).
38
Domínios
Morfoestruturai
s
1
Regiões
Geomorfológicas
1
Unidades
Geomorfológicas
1
Regiões Morfológicas e
Condições Climáticas
Associadas
2, 3
Características Gerais
Planalto da
Campanha
Planalto de Uruguaiana
Campanha
Gaúcha
Clima de
Verões
Quentes
(temperatura
média anual
entre 20° e
23°)
* a vegetação compreende formações adaptadas a um clima mais
seco e quente com períodos de escassez de água;
* as gramíneas são características na Campanha, espalhando-se
sobre as coxilhas dômicas da região;
* fragmentada em municípios de grande dimensão territorial, com
zonas urbanas populosas e distantes umas das outras, além de zonas
rurais onde predomina a atividade pecuária em grandes
propriedades;
Planalto das
Missões
Planalto de Santo
Ângelo
Clima de
Verões
Quentes
Planalto dos Campos
Gerais
Planalto
Clima de
Verões Frescos
* encontra-se assentado sob espessos lençóis de efusivas básicas,
derivadas de vulcanismo fissural, alternados (RADAMBRASIL,
1986);
* maiores altitudes do território gaúcho, decrescendo no sentido
leste (>1000 m)-oeste (<100 m), respeitando a estrutura geral da
Bacia do Paraná;
* articulam-se em seus domínios zonas de mata e campo que são
função da movimentação do relevo e irrigação dos solos;
Planalto Dissecado do
Rio Uruguai
Serra Geral
Planalto das
Araucárias
Patamares da Serra
Geral
Encosta
Clima de
Verões
Quentes
(médias anuais
de temperatura
entre 10° e
14°)
* relevo ondulado, coberto por matas, extremamente dissecado com
desníveis altimétricos maiores de 1000 m;
* o profundo entalhamento fluvial produzido sobre os vários
derrames de rochas efusivas deixou nas vertentes abruptas um
sucessivo escalonamento de patamares estruturais
(RADAMBRASIL, 1986);
* zona de concentração das primeiras colônias de imigração alemã
(1824) e italiana (1875), onde se instalaram pequenas propriedades
de agricultura familiar.
Depressão do Rio Jacuí
Bacias e
Coberturas
Sedimentares
Depressão Central
Gaúcha
Depressão do Rio Ibicuí-
Rio Negro
Depressão
Central
Clima de
Verões
Quentes
(temperaturas
anuais entre
16° e 20°);
precipitação
média 1500 e
1700 mm.
* altitudes <100 m até pouco mais de 200 m;
* campos, áreas pantanosas e matas de galeria mesclam-se por um
relevo composto de coxilhas elevadas, por vezes tabulares, além de
vales úmidos ricos em matéria orgânica, onde se desenvolve uma
vegetação rasteira;
* Rio Jacuí e Rio Ibicuí são os principais rio que drenam a
Depressão Central;
* o atual uso da terra encontra-se ligado à intensa exploração do
arroz irrigado, áreas de pecuária e exploração de areia (IBGE,
1977).
39
PROCESSO DE OCUPAÇÃO E CARACTERIZAÇÀO GEOGRÁFICA DA BACIA DO ARROIO SANTA BÁRBARA
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
40
As características naturais e os aspectos geográficos apresentados influenciaram
duas categorias de ocupação do espaço gaúcho, determinadas pela viabilidade no
desenvolvimento das atividades econômicas em períodos históricos distintos. Assim, a
primeira fase de ascensão econômica e populacional do Rio Grande do Sul ocorreu nas
áreas de Campo – destinadas, em princípio, à intensa atividade pecuária.
Os campos gaúchos localizam-se principalmente na região da Campanha Gaúcha,
na Depressão Central e em algumas áreas do Planalto. Estendem-se também pelas Serras
do Sudeste e na região da Planície Costeira Interna, que margeia o sistema lagunar gaúcho
Patos-Mirim (Figura 1).
A segunda fase do processo de organização do espaço gaúcho ocorreu nas zonas
de mata – ocupadas pelos colonizadores europeus, não-portugueses e espanhóis, a partir de
1824. Adentrar as matas surgiu como única alternativa de ocupação do território sul-
riograndense pelos colonizadores, em face da intensa organização socioeconômica que
ocorria nas zonas de campo.
As zonas florestadas aparecem nas regiões acidentadas limítrofes das faixas de
relevo mais suave. Tais áreas correspondem à zona de Encosta e aos vales que drenam o
sistema hidrográfico do Rio Jacuí, bem como àqueles que contribuem para a drenagem da
bacia hidrográfica do Rio Uruguai, no norte do Estado. Podemos considerar ainda as
porções de mata que ocorrem na borda atlântica das Serras do Sudeste, em contato com a
Planície Costeira Interna, onde se situam o município de Pelotas e a bacia Santa Bárbara
(Figura 1).
No estado do Rio Grande do Sul os processos de ocupação, povoamento e
integração com o restante do Brasil Colônia ocorreram de forma tardia, se comparados
com as regiões Nordeste e Sudeste do Brasil. “A região permaneceu inexplorada por mais
de um século, enquanto que no restante da América portuguesa se desenvolviam os
engenhos de açúcar” (PESAVENTO, 1997, p. 7).
O bloqueio da vinda de escravos para o Brasil no século XVII, efetivado pelo
domínio holandês na região Nordeste, foi um dos fatos históricos que marcaram o início da
ocupação do espaço gaúcho. A ação tomada pelo governo da Holanda incitou as bandeiras
paulistas a invadirem reduções indígenas situadas à margem esquerda do Rio Paraná,
objetivando a captura de índios aprendizes de técnicas agrícolas para o trabalho nas regiões
açucareiras brasileiras (PESAVENTO, 1997).
PROCESSO DE OCUPAÇÃO E CARACTERIZAÇÀO GEOGRÁFICA DA BACIA DO ARROIO SANTA BÁRBARA
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
41
Os constantes ataques a essas reduções fizeram com que os padres abandonassem
essas zonas de tensão, cruzassem o Rio Uruguai e avançassem sobre território gaúcho em
1626. Entretanto, a ação dos bandeirantes não tardou a reiniciar, e esses continuaram seus
ataques às missões gaúchas em busca de mão-de-obra aborígine (PESAVENTO, 1997).
Por volta de 1640, registrou-se o combate final nas reduções gaúchas, que
resultou no abandono jesuíta da área e no apresamento de muitos índios.
A partir desta data, os paulistas não mais desceram ao Rio Grande [...]
porque com o fim do domínio Espanhol os portugueses conseguiram
expulsar os holandeses da África, restabelecendo a normalidade do
tráfico negreiro. [...] os jesuítas retiraram-se para a outra margem do Rio
Uruguai, levando os índios, mas deixando o gado. (PESAVENTO, 1997,
p. 9).
A liberdade dos rebanhos bovinos nas áreas de campo desencadeou a reprodução
em larga escala desses animais. “Os rebanhos tornaram-se bravios e formaram uma imensa
reserva de gado. [...] Estava lançado o fundamento econômico básico de apropriação da
terra gaúcha: a preia do gado xucro” (PESAVENTO, 1997, p. 9), ou seja, a captura e
aproveitamento da matéria prima oriunda do gado não-domesticado.
Tal atividade, desenvolvida por vários grupos sociais, consolidou-se e
demonstrou-se rentável. Das estâncias onde era desenvolvido esse trabalho originaram-se
as Sesmarias: propriedades concedidas pela Coroa aos homens que possuíam funções
superiores no Império, como militares ou homens de posse que pagavam pela parcela de
terra. As Sesmarias também surgiram como possibilidade vislumbrada pela Coroa em
manter as divisas e ocupar o território – que se encontrava em constantes disputas com os
espanhóis, principalmente após a criação da Colônia de Sacramento, atual Uruguai.
A distribuição desses grandes lotes foi, lentamente, fragmentando as áreas de
campo do território gaúcho em direção à fronteira com o domínio espanhol, fixando a
população em pequenas comunidades, distantes umas das outras. As Sesmarias e seus
núcleos de povoamento consolidaram-se principalmente na Campanha Gaúcha, nas zonas
marginais e internas das Serras do Sudeste e por último, no Planalto de Santo Ângelo, já no
século XIX, quando, de acordo com Bernardes (1962, p. 612), “os riograndenses haviam se
assenhoreado de todos os campos do interior de seu atual território”.
Até o início do século XIX, as áreas de mata do atual território gaúcho
permaneciam anecúmenas incitando receio à Coroa, que temia possíveis invasões e
preocupava-se em garantir seus domínios. Criadores de gado, que possuíam estâncias
PROCESSO DE OCUPAÇÃO E CARACTERIZAÇÀO GEOGRÁFICA DA BACIA DO ARROIO SANTA BÁRBARA
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
42
próximas às zonas de mata, praticavam atividades agrícolas insignificantes, voltadas
apenas ao próprio consumo.
Com uma produção agrícola pouco diversificada e espacialmente restrita, havia a
necessidade de um novo perfil de homem do campo, voltado ao trabalho familiar, centrado
na produção de gêneros alimentícios que sustentassem o mercado interno, estimulando
dessa forma o comércio com os pecuaristas e a economia. Esse cenário viabilizou a entrada
dos colonos europeus no Brasil. Eram trabalhadores oriundos, especialmente, da Europa
Central e constituíam uma massa de “soldados desengajados de Napoleão e de camponeses
pobres e oprimidos que estavam prontos para emigrar para qualquer lugar do mundo”
(BERNARDES, 1962, p. 614).
Havia uma série de interesses em fomentar a ocupação das zonas de matas
gaúchas, além do fato de promover a pluralidade agrícola e populacional. A ocupação de
áreas suscetíveis à invasão foi uma alternativa, mas, sobretudo, os agricultores tiveram a
função de desbravar a mata, dinamizando as relações entre as áreas de campo que se
encontravam estancadas pela floresta fechada e eram transitadas por pequenos e insalubres
caminhos.
Além do mais, os vínculos entre as áreas de campo eram de maior importância
naquele momento histórico, haja vista sua contribuição à economia periférica nacional por
meio da gradual ascensão da indústria do charque que viria a impulsionar o
desenvolvimento de Pelotas.
O município de Pelotas possui suas raízes históricas inseridas nas duas fases de
povoamento do espaço gaúcho. Localizado ao sul do estado do Rio Grande do Sul (Figura
2), Pelotas possui seu território espraiado pela encosta inferior da Serra dos Tapes – porção
oriental do Escudo Cristalino Sulriograndense – e pela Planície Costeira Interna, às
margens do Canal São Gonçalo.
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SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
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Figura 2: Localização do Município de Pelotas no Estado do Rio Grande do Sul.
Fonte: Organizado por Adriano L. H. Simon.
Pelotas é um dos mais importantes municípios gaúchos pois congrega a função de
pólo geo-econômico, administrativo e cultural da região Sul e exerce influência sobre um
universo de 1,2 milhões de pessoas, em 19 municípios, com um potencial de consumo que
supera algumas capitais brasileiras. Destaca-se também pela prestação de serviços e pelas
atividades agrícolas voltadas para a exportação, possuindo uma população estimada de
342.513 habitantes (IBGE, 2005).
O processo de ocupação e consolidação dos limites territoriais do atual município
de Pelotas ocorreu a partir da divisão do território gaúcho em Sesmarias, por meio da
concessão de uma grande extensão de terras efetivada por Gomes Freire de Andrade
(Conde de Bobadela) a um homem de grande prestígio na região.
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O território onde se encontra o município de Pelotas teve sua ocupação
inicialmente assinada pela outorga de carta de sesmaria ao Coronel
Thomaz Luiz Osório [...] em 1758. [...] Os limites desta sesmaria vão
desde o rio Santa Bárbara, passando pelo rio Pelotas até o ponto de
Canguçu, limitando-se a oeste pelo Canal de São Gonçalo. (VIEIRA,
1994, p. 25).
De acordo com Vieira (1994), a ocupação inicial dessa imensa parcela de terra foi
realizada por portugueses ilhéus, fugitivos das ameaças espanholas que ocorriam na vila de
Rio Grande. As atividades iniciais eram rarefeitas e pautavam-se nos gêneros agrícolas –
trigo em especial – que serviam basicamente ao autoconsumo. Em um segundo momento
ocorreu a ascensão da atividade pecuária com o surgimento das charqueadas e a produção
do charque.
O charque é a carne salgada e seca originada do abate do gado. A safra era sazonal
e durava de novembro a abril nos meses mais quentes. O produto era utilizado como
alimento dos escravos em todo o Brasil e em países que adotavam o sistema escravista
(PREFEITURA MUNICIPAL DE PELOTAS, 2006). Pelotas é considerada o berço das
primeiras charqueadas gaúchas, que foram se disseminando pelas margens do Arroio
Pelotas e do Canal São Gonçalo.
Em 1780, o português José Pinto Martins, que abandonara o Ceará em
conseqüência da seca, funda às margens do Arroio Pelotas a primeira
charqueada. A prosperidade do estabelecimento, favorecida pela
localização, estimulou a criação de outras charqueadas e o crescimento da
região, dando origem à povoação que demarcaria o início da cidade de
Pelotas (PREFEITURA MUNICIPAL DE PELOTAS, 2006).
Primeiramente, a atividade saladeiril – como também era denominado o processo
de produção do charque – teve um caráter artesanal e rústico, aproveitando-se apenas da
carne e do couro dos animais abatidos. Os produtos serviam em grande parte para o
autoconsumo e os pequenos excedentes movimentavam o comércio local. Em um segundo
momento, as charqueadas atingiram um estágio técnico-industrial significativo, vindo a
consolidar um complexo industrial voltado ao aproveitamento total do gado e à exportação
do charque para outros estados como Rio de Janeiro, Bahia e Pernambuco (ARRIADA,
1994).
A atividade saladeiril condicionou o desenvolvimento de vários outros setores da
economia pelotense. Uma rede de transportes fluvial, lacustre, marítima e terrestre
organizou-se para a sustentação dos negócios locais, regionais e nacionais. O comércio
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acompanhou esse desenvolvimento, aprimorando-se à crescente demanda de consumidores
pertencentes às classes econômicas distintas.
“À sombra das charqueadas, Pelotas desenvolveu-se, de incipiente povoação, a
cidade que seria, durante quase todo o século passado, a mais rica e adiantada da
província” (MAGALHÃES, 1981, p.14). “A indústria do charque foi o fator fundamental
de fixação de homens e o gerador de certo acúmulo de capitais, condições essenciais para
um início de urbanização” (ARRIADA, 1994, p. 79).
Os proprietários das estâncias constituíam a classe econômica dominante, com
poderes políticos e financeiros. Desde 1810, o povoado pertencente a Rio Grande havia
iniciado um movimento reivindicando a criação de uma freguesia, o que veio a ocorrer no
dia 07 de julho de 1812 (VIEIRA, 1994, p. 26), quando se instituiu a Freguesia de São
Francisco de Paula. Em 1932, o presidente da Província, Antônio Rodrigues Fernandes
Braga, outorgou à vila o título de cidade, com o nome de Pelotas.
A sede desse povoado instalou-se em um amplo patamar existente entre o Canal
São Gonçalo, o Arroio Santa Bárbara e o Arroio Pelotas. O traçado quadriculado da malha
urbana seguia o sentido leste/oeste, norte/sul. A localização do sítio urbano ocorreu
distante dos locais onde se praticava a atividade saladeiril, pois o mau cheiro e a paisagem
peculiar, característicos das etapas de fabricação do charque, desagradavam a incipiente
população pelotense.
Entre a consolidação e o apogeu da atividade saladeiril e a conseqüente evolução
do núcleo urbano pelotense, ocorre o processo de colonização na região serrana do
município, até então pouco explorada devido à falta de interesse dos investidores.
A colonização européia não-portuguesa e espanhola – retomada a partir de 1848
nas áreas serranas e florestadas de Pelotas – também ocorreu tardiamente se comparada à
ocupação das áreas de campo da Planície Lagunar. De acordo com Salamoni (1992, p. 33),
a região de serras e matas do interior pelotense “[..] foi por muito tempo desprezada pelos
luso-brasileiros. Sua valorização econômica só aconteceu quando a iniciativa privada
passou a interessar-se pela aquisição de terras e pela organização de colônias de imigrantes
europeus”.
A exploração das zonas de mata pelos colonizadores acarretou em mudanças
significativas na paisagem local, fazendo com que os lotes fossem tomados por parcelas de
terras cultivadas com os mais variados tipos de gêneros agrícolas: alfafa, batatas,
mandioca, abóbora e outras olerículas. Em algumas propriedades praticava-se a agricultura
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associada à criação de animais como vacas, porcos e galinhas para o consumo dos
derivados pela família. A criação dos bois voltava-se para o auxílio desses no preparo da
terra.
O dinamismo das colônias na região serrana de Pelotas estabeleceu uma
comunicação expressiva com as zonas de campo situadas na Planície Lagunar. Pebayle
(1975) explica que os contatos existentes entre essas duas sociedades rurais ocorreram
principalmente por parte dos criadores das terras baixas do sudeste e dos agricultores das
serras do sudeste meridional.
As relações baseavam-se na troca de gêneros agrícolas - arroz, ervilha, batata
inglesa, cebola, pêssego – por animais que auxiliavam nos trabalhos agrícolas. Tais trocas,
aperfeiçoadas ao longo do tempo, deflagraram um comércio rentável, que abrangeu
também os moradores da área urbana por meio da venda de gêneros e derivados agrícolas
aos habitantes da cidade de Pelotas.
3.2 A bacia hidrográfica do Arroio Santa Bárbara
A bacia hidrográfica do Arroio Santa Bárbara encontra-se inserida no contexto de
ocupação territorial, apropriação dos recursos naturais e organização espacial pelotense.
Localiza-se na porção sudoeste do município de Pelotas e ocupa uma área de
aproximadamente 83 km² (Figuras 3 e 4).
Na área urbana o sistema abrange atualmente parte dos bairros Fragata, Simões
Lopes e Três Vendas, além de uma porção considerável da zona central e do Distrito
Industrial de Pelotas. Em área rural, onde predominam as atividades agropastoris em
pequenas, médias e grandes propriedades, seus limites atingem a interface entre a Planície
Alúvio-Coluvionar e as Serras do Sudeste, sendo que nessa última situam-se as principais
nascentes da bacia.
A estrutura litológica na qual estão assentados os domínios da bacia hidrográfica
do Arroio Santa Bárbara segue, em termos gerais, as características geológicas do
município de Pelotas, bem como de toda a região situada na área de transição do Escudo
Cristalino Sul Rio-grandense (Pré-cambriano) com a Planície Costeira (Quaternário).
Os segmentos norte e noroeste da área em estudo estão localizados na borda leste
de formações rochosas antigas, pertencentes ao Escudo Cristalino Sul-Riograndense. Essa
parcela oriental do Escudo é denominada de Cinturão Dom Feliciano e nesse bloco
ocorrem litologias pertencentes ao Batólito Pelotas (PHILIPP, 1991).
Figura 3: Localização da Bacia do Arroio Santa Bárbara no Município de Pelotas.Fonte: Organizado por Adriano L. H.
Simon, adaptado da Secretaria de Planejamento Urbano de Pelotas (2002).
47
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Figura 4: Bacia Hidrografia do Arroio Santa Bárbara.
Fonte: Organizado por Adriano L. H. Simon.
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De acordo com Philipp; Machado (2001, p. 257), o “Batólito Pelotas é um
complexo plutônico, multi-intrusivo e polifásico, resultante de uma longa evolução,
conseqüente da adição de distintos processos tectônicos”. Philipp et al.(2002, p. 278)
explicam que “o Batólito é constituído de várias suítes, cujo magmatismo teve duração de
cerca de 70 milhões de anos (entre 630 Ma e 570 Ma)”, durante o Ciclo Brasiliano,
ocorrido entre o final do Proterozóico Superior e o início do período Paleozóico da era
Fanerozóica (MENEGAT et al. 1998).
Dentre as suítes localizadas no Batólito Pelotas, a Suíte Pinheiro Machado
concentra maior parte das litologias que ocorrem no município de Pelotas e na bacia
hidrográfica em evidência. As litologias predominantes na Suíte Pinheiro Machado são
caracterizadas por Granitóides, dentre eles dioritos e enclaves máficos, granito porfirítico e
granodioritos equigranulares. Esse último granitóide – de acordo com os estudos de Philipp
(1991), na região de Monte Bonito, em Pelotas – sobressai-se como litologia predominante
no setor serrano da bacia Santa Bárbara.
As porções leste, sudoeste, central e sul da bacia Santa Bárbara possuem um tipo
de embasamento geológico conhecido como Formação Graxaim, derivado dos processos
de intemperismo das rochas mais resistentes do Escudo Cristalino Sul-Riograndense.
Nesses terrenos ocorrem depósitos de um sistema de leques aluviais que se acumularam a
partir do Terciário e foram retrabalhados nas porções distais, em ambiente marinho e
lagunar, no decorrer do Quaternário (VILLWOCK; TOMAZELLI, 1995).
A Formação Graxaim ocorre, em geral, a oeste da Laguna dos Patos, na Planície
Costeira Lagunar Gaúcha, entre Arroio Grande e Guaíba. Delaney (1965) explica que em
Pelotas, nas proximidades com o Canal São Gonçalo, a espessura dessa formação alcança
os 62 metros, enquanto que no limite oeste, já na zona de transição com o Escudo
Cristalino, a profundidade situa-se em torno de 10 metros.
Trata-se de uma formação sedimentar mal consolidada, depositada na interface do
Terciário com o Quaternário entre os períodos Neógeno e Holoceno, transcorrendo essa
deposição do Mioceno Superior ou do Plioceno até o Pleistoceno Superior
(RADAMBRASIL, 1986, p. 244). De acordo com Delaney (1965), a Formação Graxaim é
“composta de areia, silte, cascalho e argila. Foi derivada de rochas graníticas e unida
mecanicamente numa massa de sedimentos inconsolidados, não classificados, diferindo
muito pouco da rocha-mãe”.
PROCESSO DE OCUPAÇÃO E CARACTERIZAÇÀO GEOGRÁFICA DA BACIA DO ARROIO SANTA BÁRBARA
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A referida formação abrange o conjunto de arcózios que se apresentam como
principal litologia da Planície Lagunar, inclusive a litologia de fundo da Laguna dos Patos.
O arcózio é uma rocha sedimentar alóctone e epiclástica, ou seja, composta por fragmentos
minerais provenientes de fora da bacia de sedimentação, transportados pela ação de vários
meios, como água, vento ou gelo. Possui maior concentração de sedimentos grosseiros –
seixos e calhaus – em relação à matriz, sendo por isso classificada como um
ortoconglomerado (SUGUIO, 2003).
A Formação Graxaim apresenta vestígios fósseis de mamíferos em suas camadas,
fato esse que fez com que Delaney (1965) sugerisse que a deposição dessa formação
tivesse ocorrido em um ambiente de estepe frio semi-árido.
A área fonte dos sedimentos da Formação Graxaim, teria sido submetida
a condições climáticas cíclicas, de natureza úmida, alternadas com semi-
áridas quentes, as primeiras com índices pluviométricos acentuados,
tendo em vista a natureza química e mineralógica dos paleossolos
ferralíticos que ocorrem nesta unidade. A sedimentação dos depósitos
desta unidade como produto do crescimento de leques aluviais, teria
condicionado um avanço da sedimentação em direção a leste, de forma
que cada leito ou camada da Formação Graxaim teria recoberto os
anteriores [...]. Intercalações de sedimentos marinhos nessa seqüência
continental poderiam ter sido produzidas por ingressões marinhas rápidas,
responsáveis por um afogamento do nível de base. (RADAMBRASIL, p.
244).
Os distintos embasamentos geológicos presentes na bacia encontram-se
suscetíveis a ações diferenciadas dos elementos climáticos, dando suporte à organização de
duas paisagens naturais e geográficas, que se distinguem no que tange às formas do relevo,
aos solos e à cobertura vegetal. Todos esses fatores, por conseguinte, refletem na
organização socioeconômica da bacia hidrogfica, diferenciando o processo de ocupação
e uso dos recursos naturais.
As características climatológicas da bacia do Arroio Santa Bárbara encontram-se
atreladas ao conjunto de condições atmosféricas do município de Pelotas. Predomina o
clima subtropical úmido, que abrange todo o Brasil meridional na porção localizada ao sul
do Trópico de Capricórnio (PREFEITURA MUNICIPAL DE PELOTAS, 2006). Segundo
a classificação de Köeppen, Pelotas possui um clima temperado (C), com chuvas bem
distribuídas (f) e verões suaves (a), caracterizando o clima Cfa (Estação Agroclimatológica
de Pelotas – Embrapa/UFPEL/INMET).
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Por meio dos gráficos das Normais Climatológicas de Pelotas, (Gráficos 1a e 1b),
entre os anos de 1971 e 2000, constata-se que a média total anual das precipitações é de
1.366 mm, estabelecendo-se, portanto, entre o mínimo de 823mm (1989) e o máximo de
1893mm (1997). A temperatura média anual é de 17, 8°C, concentrando-se entre a mínima
média anual de 17° (1988) e a máxima média anual de 18,6°C (1977).
A distribuição das chuvas é eqüitativa durante o ano, conforme evidenciam os
gráficos (Gráficos 2a e 2b), havendo dois períodos com maior intensidade de chuva e
outros dois de menor vigor. A média mensal das precipitações em Pelotas é de 113, 9 mm,
sendo os meses mais chuvosos fevereiro (153,3mm) e julho (146mm), e os menos
chuvosos março (97,4mm) e novembro (99,5mm).
O Gráfico 1b evidencia ainda que as estações do ano são bem definidas. O mês de
janeiro é o mais quente, apresentando média de 23,2°C. Por outro lado, o mês de julho se
apresenta como o mais frio, com média de 12,3°C. Duas estações intermediárias intercalam
os picos máximos e mínimos de temperatura, uma delas com médias decrescentes
(março/junho) e outra com médias de temperatura crescentes (setembro/dezembro).
O município de Pelotas sofre forte influência marítima e lagunar, devido à
proximidade com o Oceano Atlântico, a Laguna dos Patos e a Lagoa Mirim. Essa
característica acarreta temperaturas amenas e elevada umidade atmosférica – média de
80,6% - com formação de nuvens e densos nevoeiros de maio a agosto (PREFEITURA
MUNICIPAL DE PELOTAS, 2006).
Durante o ano, as médias mais elevadas de umidade relativa do ar ocorrem nos
meses de junho (84%) e julho (84,9%), convergindo com os meses de elevada precipitação
e de menores temperaturas. A formação de geada é comum no inverno, com maior
intensidade na zona de transição da Planície Lagunar com a borda do Escudo Cristalino. O
mês de junho apresenta, em média, 6,5 dias com formação de geada.
A ênfase dada às condições climáticas locais reside na importância do fator clima
enquanto agente externo e, portanto, modificador das características morfológicas, que
agindo por meio do intemperismo nas rochas, atua de forma decisiva no desgaste das
vertentes, transporte dos sedimentos e sua deposição em áreas mais baixas.
Fonte: Organizado por Adriano L. H. Simon.
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Fonte: Organizado por Adriano L. H. Simon.
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PROCESSO DE OCUPAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO GEOGRAFICA DA BACIA DO ARROIO SANTA BÁRBARA
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
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A relação entre geologia e clima define o predomínio do intemperismo químico,
esculturando formas de relevo distintas tanto sobre as rochas resistentes da região serrana
da bacia, quanto nas áreas de formação sedimentar. A pedogênese também se encontra
inserida nesse processo, visto que é fruto da transformação do manto intempérico
desencadeada por elementos climáticos.
O Quadro 2 procura realizar uma síntese da organização da paisagem natural na
Bacia Hidrográfica do Arroio Santa Bárbara, evidenciando as propostas das bibliografias
utilizadas na presente caracterização.
Embasamento
Geológico
1
Domínio
Morfoestrutural
2
Região
Geomorfológic
a
2
Unidade
Geomorfológica
2
Unidades
Fisiográficas
Locais
3
Denominações
Geomorfológicas
Locais
3
Solos
3, 4
Suítes Intrusivas
do Batólito
Pelotas.
Granodioritos
Equigranulares
(litologia
predominante).
Embasamentos em
Estilos Complexos
(Escudo Cristalino
Sul-riograndense)
Planalto Sul-
riograndense
Planalto Rebaixado
Marginal
Zona Alta Colinas Cristalinas
Argissolo
Vermelho-
amarelo
Lombadas
Planície Alta
Planície Alúvio-
Coluvionar
Zona de
Lombadas e
de Planície
Planície Alta
Atacada
Planossolo
Eutrófico
Banhados de
Riachos
Gleissolo
Húmico
Eutrófico
Planície do São
Gonçalo
Gleissolo
Húmico
Solódico
Formação
Graxaim.
Arcózio
(litologia
predominante).
Depósitos
Sedimentares
(Planície Costeira)
Planície
Costeira Interna
Planície Lagunar
Zona
Inundável
Banhados
Lacustres
Organossolo
de caráter
salino
Quadro 2: Organização da Paisagem Natural na Bacia Hidrográfica do Arroio Santa Bárbara.
Fonte:
1
Philipp (1991), Philipp; Machado (2001), Jost; Soliani Jr. (1971), Delaney, (1965), Villwock; Tomazelli (1995);
2
Radambrasil (1986);
3
Cunha;
Siveira (1997);
4
EMBRAPA (1999).
55
PROCESSO DE OCUPAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO GEOGRÁFICA DA BACIA DO ARROIO SANTA BÁRBARA
SIMON, A.L.H, A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
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A caracterização dos solos da bacia hidrográfica do Arroio Santa Bárbara baseia-
se nas descrições de campo e análises de laboratório realizadas por Cunha; Silveira (1997).
No entanto, procurou-se adaptá-la a nova classificação dos solos do Brasil proposta pela
EMBRAPA (1999).
De acordo com Cunha; Silveira (1997), o município de Pelotas pode ser dividido
em unidades fisiográficas, nas quais são associadas as características pedológicas e
geomorfológicas (Figura 5). Dessa forma, de acordo com a classificação proposta pelos
autores citados, na bacia hidrográfica do Arroio Santa Bárbara podem ser identificadas três
regiões fisiográficas: A Zona Alta, a Zona de Lombadas e Planície, além da Zona
Inundável.
A Zona Alta, localizada nas porções N, NE e NW da bacia (Figura 5), é assinalada
por morfologias que possuem a denominação regional de Colinas Cristalinas (CUNHA;
SILVEIRA, 1997, p. 15). O projeto RADAMBRASIL (1986), por sua vez, denomina de
Planalto Rebaixado Marginal essa unidade pertencente à Região Geomorfológica das
Serras do Sudeste Gaúcho, inseridas no Domínio Morfoestrutural dos Embasamentos em
Estilos Complexos.
Trata-se de um relevo ondulado, com altitudes que variam entre 60 e 140 metros e
declividades médias de 15%. Possui uma drenagem dendrítica, com rios escavando em
vales de seção em V, fruto do entalhamento fluvial em rochas resistentes.
Ocorrem rupturas de declive suave dentro dessa unidade, ocasionando a formação
de patamares levemente inclinados. Já em seu limite com a Zona de Lombadas e no setor
onde as altitudes são menores, essas rupturas são mais abruptas possuindo de 5 a 10 metros
(De LEON, 1983). As linhas de cumeada são, esporadicamente, interrompidas por colos
perpendiculares ou oblíquos (RADAMBRASIL, 1986).
Predominam nessa zona solos profundos, de textura argilosa, bem a
moderadamente drenados, do tipo Argissolo Vermelho-Amarelado (De LEON, 1983). A
fertilidade química desse solo é variável, sendo os mais antigos menos férteis. A camada
superior do solo (A) apresenta espessura geral de 30 cm, com textura média, estrutura fraca
e acidez forte (CUNHA; SILVEIRA, 1997).
PROCESSO DE OCUPAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO GEOGRÁFICA DA BACIA DO ARROIO SANTA BÁRBARA
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Figura 5: Unidades geomorfológicas e de solos na bacia do Arroio Santa Bárbara.
Fonte: Organizado por Adriano L. H.Simon.
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Assentadas na zona central da bacia Santa Bárbara, na transição entre as litologias
resistentes das Serras do Sudeste e os terrenos de relevo suave do quaternário, encontram-
se a Zona de Lombadas e Planície (Figura 5). As principais unidades geomorfológicas de
denominação regional inseridas nessa zona são: as Lombadas, a Planície Alta e a Planície
Alta Atacada.
De acordo com o projeto RADAMBRASIL (1986), tais unidades regionais
inserem-se nos limites da Unidade Geomorfológica da Planície Alúvio-Coluvionar. Essa
última pertence à Região Geomorfológica da Planície Costeira Interna, abrangida, por sua
vez, pelo Domínio Morfoestrutural dos Depósitos Sedimentares (Figura 5).
O relevo desse setor apresenta morfologias com ondulações mais suaves a planas,
em seu limite com as denominadas zonas inundáveis. A altitude varia de 15, 20 até 60
metros (De LEON, 1983). Cunha; Silveira (1997) explicam que essa superfície é muito
extensa, tanto no município de Pelotas como na Bacia Santa Bárbara, compreendendo as
terras dos sedimentos mais antigos do Pleistoceno.
As vertentes são alongadas e em sua maioria retilíneas, com declividades variando
entre 2% e 10%. Os divisores suaves confundem-se com topos planos. As rupturas
topográficas são suaves em sua totalidade, porém mais abruptas do que aquelas
encontradas na Zona Alta e possuem de 1 a 5 metros. Ocorrem com freqüência na divisa
com os depósitos aluviais (De LEON, 1983).
O solo predominante nessa região é o Planossolo Eutrófico que, de acordo com o
RADAMBRASIL (1986), é típico de áreas baixas onde o relevo permite excesso de água
permanente ou temporário. Em geral, são solos mal ou imperfeitamente drenados com
acentuada concentração de argila, permeabilidade lenta ou muito lenta (CUNHA;
SILVEIRA, 1997).
Por fim, situada na porção centro-sul da bacia Santa Bárbara, encontra-se a Zona
Inundável, formada pelas unidades geomorfológicas de denominação regional: Banhados
de Riachos, Planície do São Gonçalo e Banhados Lacustres (Figura 5). A denominação
“Zona Inundável” é aplicada às terras situadas sobre sedimentos holocênicos que estão
temporária ou permanentemente inundadas por água de arroios ou lagoas.
O Projeto RADAMBRASIL (1986) integra essas denominações geomorfológicas
regionais na Unidade Geomorfológica da Planície Lagunar. Tal unidade, por sua vez, é
agregada à Região Geomorfológica da Planície Costeira Interna que pertence ao Domínio
Morfoestrutural dos Depósitos Sedimentares.
PROCESSO DE OCUPAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO GEOGRÁFICA DA BACIA DO ARROIO SANTA BÁRBARA
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A morfologia dessa zona é caracterizada por superfícies aplainadas e homogêneas,
pouco inclinadas, com altitudes que não ultrapassam os 10m (De LEON, 1986). A rede
hidrográfica é encaixada na zona de terraços, dissecando a mesma e formando reentrâncias
características de processos erosivos.
Nos depósitos areno-argilosos mal drenados, localizados na porção central da
Zona Inundável, é comum a existência de áreas de banhado que vêm sofrendo gradual
aterramento devido à expansão urbana. A porção extremo sul da bacia Santa Bárbara é
constituída por depósitos flúvio-lacustres oriundos do processo de colmatagem da Lagoa
Mirim que originaram o Canal São Gonçalo.
Os solos característicos dessa zona são: o Gleissolo Húmico Eutrófico, nos
Banhados de Riachos; o Gleissolo Húmico Solódico, na Planície do São Gonçalo; e o
Organossolo de caráter Salino, nos Banhados Lacustres Inundados (CUNHA; SILVEIRA,
1997).
A cobertura vegetal, intensamente descaracterizada pelo processo de ocupação,
resulta da localização da bacia em uma área de transição entre a serra e o litoral, podendo-
se encontrar áreas de banhado, campos e pastagens, além da mata subtropical arbustiva. De
acordo com TAGLIANI (2003, p. 1464), dentre as regiões fitoecológicas identificadas no
projeto RADAMBRASIL (1986) para o estado do Rio Grande do Sul, estão presentes na
área de estudo porções da Região de Savana e da Região da Floresta Estacional
Semidecidual, que ocupam áreas da vertente leste do Escudo Cristalino, além da área das
formações pioneiras na Planície Costeira.
A caracterização geográfica do sistema em estudo possibilita a compreensão da
organização espacial desencadeada, uma vez que revela aspectos do sistema
socioeconômico, a partir das características do processos de ocupação, dentro de um
contexto regional e local, bem como suas relações de apropriação e intervenção nos
elementos do sistema ambiental. Uma vez reconhecidas as características geográficas da
área de pesquisa, torna-se importante assumir um posicionamento teórico-metodológico
que permita uma visão de integração dos elementos do sistema e que conceda, juntamente
com a aplicação de técnicas de pesquisa, respaldo para a análise conjunta dos dados que
indicam as alterações derivadas do controle antrópico sobre o sistema ambiental.
Desta forma, a seguir são apresentados a orientação metodológica adotada e as
técnicas aplicadas para obtenção e análise das informações que permitiram verificar as
alterações no sistema caracterizado neste capítulo.
4 MÉTODO E TÉCNICAS
4.1 Método
4.1.1 A Abordagem Sistêmica na Geografia
Para atender aos objetivos propostos na presente pesquisa foram realizadas as
abordagens direta e indireta da bacia do Arroio Santa Bárbara. A primeira abordagem diz
respeito ao reconhecimento das características locais por meio da realização de atividades
de campo, essenciais para a compreensão dos processos que desencadeiam perturbações na
circulação de energia e matéria no sistema em questão, contribuindo assim para alterações
em sua estrutura. A segunda abordagem caracteriza-se pelo levantamento de documentos
bibliográficos e cartográficos da área, que possibilitaram a elaboração dos mapas
necessários a identificação e análise da dinâmica do uso da terra, além das alterações
impostas à morfohidrografia da bacia do Arroio Santa Bárbara. A pesquisa bibliográfica
também concede respaldo às discussões sobre o método científico que permeia a
investigação.
De acordo com Tricart (1977, p.19),
MÉTODO E TÉCNICAS
SIMON, A.L.H, A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
61
[...] o conceito de sistema é o melhor instrumento lógico de que dispomos
para estudar os problemas do meio ambiente. Ele permite adotar uma
atitude dialética entre a necessidade da análise – que resulta do próprio
progresso da ciência e das técnicas de investigação – e a necessidade
contrária, de uma visão de conjunto, capaz de ensejar uma atuação eficaz
sobre esse meio ambiente. Ainda mais, o conceito de sistema é, por
natureza, dinâmico, e por isso adequado a fornecer os conhecimentos
básicos para uma atuação – o que não é o caso de um inventário, por
natureza estático.
Existem diversos conceitos que procuram explicar o sentido e o significado da
palavra sistema. Todas essas tentativas encontram-se atreladas a períodos históricos
distintos e possuem importância na consolidação desse paradigma. Souza (2001) explica
que, apesar das generalizações e especificidades, todas as definições apresentam a inter-
relação como essência que norteia a concepção de sistema.
Assim, algumas definições podem ser evidenciadas, como a de Seassure (1931,
citado por Morin, 1977, p. 99), que conceitua os sistemas como uma “totalidade
organizada feita de elementos solidários, que só podem definir-se uns em relação aos
outros em função do lugar que ocupam nessa totalidade”. Chorley; Kennedy (1971, p. 1)
explicam que um “sistema é um conjunto estruturado de objetos e atributos”. Esses objetos
e atributos são constituídos de componentes ou variáveis, ou seja, fenômenos passíveis de
assumir magnitudes variáveis, de acordo com determinado padrão, e que exibem relações
discerníveis uns com os outros e operam conjuntamente como um todo complexo.
Christofoletti (1979, 1999) conceitua o termo sistema como uma unidade integradora,
representada pelo conjunto organizado de elementos com inúmeras relações de diversos
níveis hierárquicos entre seus atributos.
Gregory (1992) explica que o conceito de sistema não é novo, visto que Newton,
no século XV, já havia efetuado descrições sobre o Sistema Solar, e a ciência biológica
vem, há tempos, demonstrando sua preocupação com o estudo dos sistemas vivos
(organismos). Vicente; Perez Filho (2003, p. 329) apontam para o fato de que “diversos
pensadores utilizaram-se do pensamento sistêmico diante de questões não respondidas pela
ordem científica estabelecida pelo paradigma cartesiano”, destacando Leibiniz, Nicolau de
Cusa, Vico e Ibn-Kaldum como exemplos de filósofos que procuraram explicações
sistêmicas diante do nível de complexidade assumido por determinadas observações ou
constatações efetuadas em seus estudos.
A Teoria Geral dos Sistemas teve seus princípios desenvolvidos em 1929 por R.
Defay, os quais foram aplicados primeiramente à Termodinâmica. Posteriormente, a partir
MÉTODO E TÉCNICAS
SIMON, A.L.H, A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
62
de 1936, essa base filosófica foi empregada à Biologia pelo húngaro Ludwig Von
Bertalanfy que em 1973, em sua obra Teoria Geral dos Sistemas, definiu-os como sendo
“um conjunto de elementos em interação”. Bertalanfy (1973, citado por Gregory, 1992)
destacou ainda três aspectos básicos envolvidos no estudo dos sistemas: o primeiro estaria
ligado à ciência dos sistemas, que se aplica ao estudo da inserção da investigação sistêmica
nas demais ciências; o segundo envolve a tecnologia de sistemas, voltada para as
operações computacionais; e o terceiro ponto, de fundamental importância, está atrelado à
filosofia dos sistemas que
Envolve a reorientação do pensamento científico e da visão de mundo
como resultado do advento dos sistemas como um novo paradigma
científico, geralmente definido como: (1) um conjunto de elementos com
características variáveis; (2) as relações entre as características dos
elementos; (3) as relações entre o meio ambiente e as características dos
elementos (GREGORY, 1992, p. 229).
O eixo norteador dessa concepção seria o de desenvolver uma teoria de caráter
geral, de modo que pudesse ser aplicada a fenômenos que ocorrem em uma diversidade de
campos específicos do conhecimento. Da mesma forma, como sua aplicação é passível de
percorrer os diversos ramos do conhecimento científico, as análises sob a égide dessa
teoria possibilitariam a união de informações oriundas de várias especialidades, uma vez
que a abordagem sistêmica agrega, por meio de seu vocabulário universal, distintos ramos
do conhecimento.
Na Geografia, Christofoletti (1978) ressalta que a aplicação dessa teoria já era
encontrada em trabalhos publicados nos anos de 1950 e 1952 por Strahler e Richard J.
Chorley, respectivamente. O autor citado foi um dos grandes responsáveis pela difusão da
abordagem sistêmica na geografia brasileira, discutindo temas que envolvem a aplicação
dessa teoria na Geografia (CHRISTOFOLETTI, 1971, 1978, 1979, 1983), além de sua
inserção em estudos da geografia física, sobretudo em geomorfologia
(CHRISTOFOLETTI, 1986-1987, 1990, 1999).
Stoddart (1967, citado por Gregory, 1992, p. 217) é enfático ao expor que “a
análise sistêmica ofereceu à Geografia uma metodologia unificadora, e, utilizando-a, esta
ciência não mais permaneceria à margem do fluxo do progresso científico”. Christofoletti
(1979) afirma que a aplicação da teoria sistêmica aos estudos geográficos serviu para
melhor focalizar as pesquisas e delinear com maior exatidão o setor de estudo dessa
MÉTODO E TÉCNICAS
SIMON, A.L.H, A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
63
ciência, além de propiciar oportunidade para reconsiderações críticas de muitos dos seus
conceitos.De acordo com Vicente; Perez Filho,
o Pensamento Sistêmico na Geografia insere-se na própria necessidade de
reflexão sobre a apreensão analítica do complexo ambiental, através da
evolução e interação de seus componentes sócio-econômicos e naturais
no conjunto de sua organização espaço-temporal, sendo que nesse
contexto surgem as propostas de cunho sistêmico e sua fundamentação
integrada de abordagem do objeto de estudo, e do entendimento do todo
(sistema) e de sua inerente complexidade. (VICENTE; PEREZ FILHO,
2003, p. 335).
Gregory (1992, p. 218) explica que a abordagem sistêmica foi adotada
sucessivamente pela Biogeografia, Geografia dos Solos, Climatologia e Geomorfologia,
possuindo, portanto, maior inserção em estudos da Geografia Física, e abrangendo,
posteriormente, investigações atreladas às perspectivas da Geografia Humana. O autor
citado explica ainda que esse processo de adoção estendeu-se por 35 anos, entre 1935 e
1970, quando Chorley; Kennedy (1971) publicam a primeira versão de Physical
Geography: a systems approach. Essa publicação oportunizou a maior divulgação da
aplicação da abordagem sistêmica na Geografia Física, possibilitando a adoção desse
referencial teórico por muitos pesquisadores.
A abordagem sistêmica aplicada à Geografia Física congregou estudos que até
então mantinham certa distância no que tange a relação dos elementos do sistema
ambiental, confluindo para investigações que buscaram a análise dos processos na unidade
do meio físico. “A perspectiva sistêmica certamente retardou ou talvez reverteu a tendência
para a especialização e separação nos ramos da geografia física, uns dos outros, e da
geografia humana” (GREGORY, 1992, p. 237).
Existem diferentes tipos de sistemas compreensíveis e passíveis de análise na
ciência. Chorley; Kennedy (1971), Gregory (1992) e Christofoletti (1979 e 1999) explicam
que os sistemas podem ser estudados de acordo com vários critérios, entretanto, a
complexidade estrutural e funcional sobressaem-se nos estudos geográficos por permitirem
maiores aproximações com as organizações espaciais que se colocam como objeto de
estudo da Ciência Geográfica. Assim, o Quadro 3 propõe a esquematização explicativa dos
dois critérios de análise dos sistemas de maior importância para a Geografia, ressaltando
seus conceitos e características.
MÉTODO E TÉCNICAS
SIMON, A.L.H, A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
64
Critério de
Classificação
Tipos e subtipos Características
Morfológico
“complexo primário das estruturas ambientais” (CHORLEY
& KENNEDY, 1971, p. 23); (CHRISTOFOLETTI, 1999, p.
6); parte operacional reconhecível da realidade física
(GREGORY, 1992, p. 225)
Relações
estáticas entre os
elementos.
Caixa preta
sistema único, sem conhecimento de
seus mecanismos internos, a análise
volta-se apenas para as entradas e saídas
desse sistema.
Caixa cinza
"Envolve o conhecimento parcial do
funcionamento do sistema, focalizando
número limitado de sub-sistemas e sem
considerar as operações internas”
(CHRISTOFOLETTI, 1999, p. 6).
Em cascata
análise dos fluxos
de matéria e
energia,
“identificam as
relações entre
formas e
processos,
caracterizando a
globalização do
sistema” (SOUZA,
2001, p. 24)
Caixa branca
“conhecimento claro e detalhado de
como a organização interna do sistema
funciona a fim de transformar um input
em output” (CHRISTOFOLETTI, 1999,
p. 6)
Contém ligações
ao longo das
quais a energia
passa de um
elemento para
outro.
De ação simples
(ou unidirecionais)
Negativo
Processo-resposta
“formados pela
inter-relação de
sistemas
morfológicos e em
cascata,
envolvendo a seção
sobre os processos
e sobre as formas
resultantes”
(GREGORY,
1992, p. 226).
De feed back
Positivo
Complexidade
estrutural
Sistemas controlados
Sistema em que “a inteligência, controlada por forças
antrópicas, pode intervir para produzir mudanças
operacionais na distribuição da energia e massa” (GREGORY,
1992, p. 226, grifo nosso).
São
caracterizados
pelos estudos
dos efeitos dos
elementos
interligados uns
aos outros, e
pelos (re) ajustes
decorrentes de
mecanismos de
controle e
retroalimentação
.
Isolado
“não comporta trocas materiais e energéticas com o exterior”
(SOUZA, 2001, p. 24).
Fechado
“quando há permuta (recebimento e
perda) de energia, mas não de matéria”
(CHRISTOFOLETTI, 1979, p. 14)
Funcional
Não-isolado
“mantém ralações
com os demais
sistemas do
universo no qual
funcionam”
(CHRISTOFOLET
TI, 1979, p. 14).
Aberto
“sistemas mais comuns, nos quais
ocorrem constantes trocas de energia e
matéria, recebimentos e perdas”
(CHRISTOFOLETTI, 1979, p. 15).
Referem-se às
quantidades e
características
dos sistemas no
que tange sua
relação com o
universo onde
estão inseridos.
Quadro 3: Critérios de classificação e tipologia dos sistemas.
Fonte: Adaptado de Souza (2001).
MÉTODO E TÉCNICAS
SIMON, A.L.H, A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
65
Diante das propriedades funcionais, evidenciadas pelo Quadro 3, é possível
constatar que os sistemas abertos apresentam maior aproximação com os objetivos das
investigações geográficas, pois abrangem grande parte dos sistemas existentes na natureza
e também os desenvolvidos e mantidos pelas atividades socioeconômicas. A partir da
análise das transformações operadas sobre as entradas e saídas de energia e matéria dos
sistemas abertos, torna-se possível evidenciar características de seu funcionamento.
Christofoletti (1979) considera as bacias hidrográficas como um dos sistemas
abertos básicos em que ocorre a inter-relação dos elementos por meio da entrada de energia
e matéria, que condiciona transformações, gerando assim um produto. Os atributos de cada
um dos elementos desse sistema responsabilizam-se pela transformação das entradas – em
atividades distintas e/ou conjuntas – encontrando-se em ocasiões de equilíbrio e em
momentos extremos quando o fluxo de energia varia para mais ou para menos,
condicionando as unidades a modificações em sua combinação e organização.
Chorley (1971) evidencia o valor dos sistemas abertos em análises geográficas,
principalmente na Geomorfologia, explicando que os mesmos acentuam a ênfase no
reconhecimento do ajustamento entre as formas e os processos. O autor citado afirma ainda
que o pensamento em sistema aberto “permite uma visão mais liberal das mudanças das
formas com o tempo [...] e dirige a atenção para a heterogeneidade das organizações
espaciais” (p. 18,19).
Hanwell; Newson (1973) explicam que a abordagem em sistemas abertos
representa uma atenção especial para as relações ambientais do sistema em estudo,
principalmente sob o ponto de vista dos fluxos de matéria e energia pelos elementos. Os
autores citados expressam ainda que “a abordagem em sistemas abertos possui valor
demonstrável na resolução de problemas ligados à população, recursos naturais e poluição”
(HANWELL; NEWSON, 1973, p. 2).
No que tange às características estruturais dos sistemas, demonstradas no Quadro
3, pode-se conferir aos sistemas processo-resposta a viabilidade potencial para a análise
sistêmica geográfica, pois esses, enquanto sistemas abertos, encontram-se continuamente
recebendo, articulando, armazenando e eliminando/compartilhando matéria e energia. Os
diversos níveis de força aplicados e comportados pelo sistema conduzem a organização dos
atributos dos elementos do mesmo, condicionando transformações na sua estrutura, que se
(re)ajustam ao longo do tempo, e determinando as variações que vão ocorrer em sistemas
adjacentes, de escala hierárquica equivalente ou inferior.
MÉTODO E TÉCNICAS
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66
Não se trata de subtrair a importância dos outros dois tipos de sistema -
morfológico e em cascata - que são minuciosamente descritos e instigados à aplicação nos
estudos de Chorley; Kennedy (1971) e Christofoletti (1979, 1999); entretanto, os sistemas
processo-resposta possuem maior aproximação com as análises ambientais que presumem
a interação das formas e processos, ambientais ou antrópicos.
Chorley; Kennedy (1971) explicam que a principal característica do sistema
processo-resposta que o sobrepõe aos outros tipos de sistema diz respeito aos circuitos de
retroalimentação negativa (negative feedback) apresentados por ele. Christofoletti (1979, p.
21,22) explica que a retroalimentação pode ser caracterizada como um “desencadeamento
de ações que assinalam a dependência dos fatos, de forma que o evento desencadeado por
um acontecimento gera uma seqüência de fenômenos cujas conseqüências voltam a atuar
no objeto ou fato inicial”.
Os sistemas envolvidos por circuitos de retroalimentação negativa, ainda de
acordo com Christofoletti (1979), podem ser considerados homeostáticos, ou seja, mantêm
um equilíbrio constante, porém não estável, pois modificam continuamente suas
características após impulsos que alteram a posição de seus elementos. Dessa forma, no
sistema processo-resposta, as mudanças ocorridas na entrada de matéria e energia do
sistema em cascata originam transformações no sistema morfológico, criando, por sua vez,
variações diferenciadas no sistema em cascata e produzindo, conseqüentemente, um novo
estado de equilíbrio dinâmico.
Chorley; Kennedy (1971) destacam também que os sistemas processo-resposta
englobam três importantes princípios: (1) as operações do sistema são controladas pela
magnitude e freqüência dos inputs sobre as cascatas; (2) os ciclos de retroalimentação
operam tanto na criação de um equilíbrio entre as variáveis do sistema morfológico quanto
no estado de equilíbrio dos processos no sistema em cascata; e (3) mudanças progressivas
podem ocorrer na estrutura e na operação dos sistemas se ocorrerem transformações nas
entradas, ou se algumas degradações internas do sistema surgirem como resultado da
operação continuada de seus elementos perante eventos não usuais.
Os sistemas processo-resposta obedecem a flutuações de ordem natural na
entrada, na armazenagem e na saída de matéria e energia que estabelecem o equilíbrio dos
processos na manutenção e nas alterações em sua estrutura. A ação antrópica sobre os
sistemas processo-resposta desencadeia uma série de alterações nesse equilíbrio, passando
MÉTODO E TÉCNICAS
SIMON, A.L.H, A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
67
a regular e a alterar os ciclos naturais, originando os sistemas controlados
(CHRISTOFOLETTI, 1979).
De acordo com Chorley; Kennedy (1971) e Christofoletti (1999), os sistemas
controlados possuem a particularidade de conter “válvulas” ou “chaves”, que
desempenham um papel inteligente a partir de intervenções efetivas sobre os sistemas
processo-resposta, as quais causam mudanças operacionais na distribuição de matéria e
energia no sistema por meio de seu funcionamento, dependendo da graduação de sua
aplicação na condução desses processos. Essas válvulas ocupam pontos estratégicos dentro
dos sistemas, sendo capazes de desencadear mudanças funcionais nos atributos e nos
elementos, demonstrando assim seu caráter de importância na análise das relações entre o
sistema ambiental e o socioeconômico.
Dessa forma, de acordo com Chorley; Kennedy (1971, p. 309), “áreas
agropastoris e grandes complexos urbanos exercem consideráveis modificações sobre os
sistemas atmosféricos, geomorfológicos, hidrográficos e sobre a cobertura vegetal
original”. Christofoletti (1999, p. 131) explica que as atividades socioeconômicas
ocasionam mudanças na morfologia e nos processos dos sistemas ambientais e que as
repercussões dessas atividades “incidem em modificações na superfície da terra, que se
processam em ritmos variados ao longo dos tempos históricos, estando atreladas aos vários
estágios de desenvolvimento técnico e científico das atividades humanas”.
4.1.2 O Sistema Ambiental: conceitos, características e dinâmica evolutiva
O geógrafo Antônio Christofoletti, em suas investigações e publicações sobre a
utilização da abordagem sistêmica em Geografia, enfatizou as organizações espaciais como
objeto de estudo da referida ciência (CHRISTOFOLETTI, 1978, 1983, 1986-1987,1990 e
1999). Abler et al. (1971) também evidenciaram uma série de preocupações com o
tratamento dos dados espaciais por parte dos geógrafos, destacando questões filosóficas
que apontam as organizações espaciais como a realidade pertinente das investigações
geográficas. Além dos autores citados, Chorley; Kennedy (1971), Chorley (1971) e
Gregory (1992) também compactuaram com esse paradigma.
As organizações espaciais pressupõem um arranjo de formas e articulações que
possuem uma herança histórica e assumem um comportamento dinâmico diante de sua
característica principal, que é o entrosamento e a ordem dos elementos que a compõem.
Sua expressão é areal, materializável em panoramas paisagísticos que são perceptíveis na
MÉTODO E TÉCNICAS
SIMON, A.L.H, A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
68
superfície terrestre, sendo passíveis de mapeamento, análise e descrição
(CHRISTOFOLETTI, 1990). A análise das organizações espaciais, no escopo da ciência
geográfica, engloba os elementos biofísicos, sociais e econômicos, que se articulam e
organizam-se, constituindo estruturas complexas.
Christofoletti (1999) explica que, sob a ótica sistêmica, as organizações espaciais
podem ser compreendidas como a inter-relação do sistema ambiental e do sistema
socioeconômico. O autor citado explica ainda que o estudo do primeiro encontra-se
atrelado à Geografia Física, enquanto o segundo participa das análises da Geografia
Humana. Ressalta-se que essas distinções nos estudos ocorrem com o intuito de agregar
funções aos diferentes ramos da ciência geográfica, e que a relação entre os dois sistemas é
sempre vista como fundamental.
Christofoletti (1999) explica que os sistemas ambientais abrangem as
características biogeofísicas das organizações espaciais, compreendendo as formas do
relevo, os tipos de solo, a cobertura vegetal e os recursos hídricos, todos espacialmente
materializáveis. O clima também é elemento do sistema ambiental e, embora não
materializável, sua atuação é de suma importância, pois contribui, por intermédio da
dinâmica atmosférica, no fornecimento de matéria e energia que dão vigor ao sistema
ambiental. A geodinâmica, correspondente à estrutura geológica, participa igualmente no
fornecimento de energia e matéria ao sistema, uma vez que condiciona as características
topográficas e edáficas por meio de seus mecanismos morfogenéticos. A Figura 6,
adaptada de Drew (1986), apresenta a interconexão dos grandes conjuntos do sistema
ambiental.
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Figura 6: Interconexão dos grandes conjuntos do Sistema
Ambiental.
Fonte: Adaptado de Drew (1986).
Dessa forma, entende-se, para esta pesquisa, que os sistemas ambientais
correspondem a sistemas abertos de processo-resposta, ajustados por forças
impulsionadoras de ordem natural, que mantêm as flutuações na entrada e na saída de
matéria e energia, promovendo manutenção e alterações temporais na estrutura do sistema
a partir de transformações nos processos, seguindo ritmos naturais. A intervenção
antrópica sobre o sistema ambiental, a partir do avanço das técnicas de apropriação dos
elementos naturais, efetivou a imposição de mecanismos externos (não-naturais) ao
sistema ambiental. Essas regras são capazes de atuar nos funcionamentos da estrutura e dos
processos do sistema ambiental, por meio da imposição de dispositivos que determinam o
fluxo de matéria e energia, regulando as relações dos atributos dos elementos e,
conseqüentemente, sua morfologia.
Os mecanismos de controle abrangem as características de uso da terra rural e
urbano-industrial, bem como as técnicas aplicadas no aperfeiçoamento dessas atividades.
Tais forças, atuando sobre as entradas de matéria e energia no sistema, interferem nas
características de equilíbrio dinâmico no qual se encontram todos os sistemas abertos de
processo-resposta e, logicamente, o sistema ambiental, contribuindo desse modo para
MÉTODO E TÉCNICAS
SIMON, A.L.H, A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
70
transformações nos fluxos e nas formas. Nesse contexto, torna-se possível compreender as
alterações na morfohidrografia da bacia Santa Bárbara, pois ao longo do tempo foram
sendo introduzidos mecanismos de controle antrópico cada vez mais sofisticados e intensos
sobre os elementos do sistema ambiental. Esses mecanismos aceleraram, retardaram ou
anularam certos processos naturais, determinando regras artificiais que desencadearam
uma série de alterações sobre a morfologia original do sistema.
A Figura 7 esquematiza a característica de equilíbrio dinâmico assumido pelos
sistemas abertos e pode ser comparada ao sistema ambiental. A partir dessa figura, é
possível analisar vários condicionantes que interferem na dinâmica evolutiva desses
sistemas, evidenciando as repercussões de interferências naturais e/ou antrópicas nos
fluxos de matéria e energia pelo sistema através do tempo.
Figura 7: Reação do Sistema Ambiental perante um esforço ou tensão que lhe é imposto.
Fonte: Adaptado de DREW (1986, p. 20).
MÉTODO E TÉCNICAS
SIMON, A.L.H, A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
71
O recebimento de matéria e energia pelo sistema é denominado de Input
(CHRISTOFOLETTI, 1979). Essa entrada é responsável pelo estado do sistema durante o
tempo (Figura 7), uma vez que percorre os elementos do mesmo, sendo processada pelos
seus atributos que se relacionam entre si no compartilhamento dos fluxos. Como em todo
sistema aberto, as cargas de energia e matéria recebidas são eliminadas após serem
transformadas pelos atributos dos elementos, sendo que uma parte desses fluxos também
permanece armazenada. A eliminação desse produto pelo sistema é denominada de Output.
A quantidade de energia recebida pelo sistema determina o seu grau de entropia.
De acordo com Christofoletti (1979, p. 12) “a entropia pode ser considerada como medida
do grau de desordenação que permanece no sistema, ou do grau de energia disponível para
o trabalho, estando em relação inversa a ela: quanto maior a entropia, menor a quantidade
de energia disponível”.
Nos sistemas isolados existe uma tendência para o aumento da entropia, ou seja,
para a ordenação máxima da energia e matéria que circulam pelo sistema, diante de sua
característica de não receber mais fluxos externos contínuos que estimulem seu trabalho –
a não ser por um período de tempo. Assim, um equilíbrio estático é assumido por esse tipo
de sistema, sendo que as forças apresentam um caráter de inércia com o tempo, devido ao
máximo grau de ordenação alcançado.
Já nos sistemas não-isolados abertos, como os sistemas ambientais, os Inputs são
constantes e apresentam magnitudes que variam de acordo com a intensidade dos
fenômenos responsáveis pelo fornecimento de matéria e energia. O equilíbrio estático,
característico da fase final de ordenação dos sistemas isolados, não ocorre em sistemas que
possuem entradas contínuas. Dessa forma, o sistema ambiental tende a organizar-se em um
estado de equilíbrio estacionário, ou equilíbrio dinâmico (Figura 7), que permite o
ajustamento dos atributos de seus elementos a determinados níveis de entrada de matéria e
energia (CHORLEY; KENNEDY, 1971; CHORLEY, 1971; CHRISTOFOLETTI, 1979,
1999; GREGORY, 1992).
Qualquer esforço aplicado sobre esse sistema (Figura 7), resultante do aumento ou
diminuição na magnitude dos Inputs, provoca o reajustamento de seus elementos e de seus
atributos, a fim de equilibrar-se às novas características impostas, sempre permanecendo
dentro dos limites de seu equilíbrio dinâmico. Porém, a aplicação intensa de certa força
pode aproximar-se da capacidade de manutenção das características iniciais do sistema,
podendo atingir e/ou ultrapassar seu limiar de recuperação. Esse limiar (Figura 7)
MÉTODO E TÉCNICAS
SIMON, A.L.H, A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
72
corresponde ao ajustamento dos atributos e dos elementos a partir do qual o sistema tende
a estabelecer um equilíbrio dinâmico imediatamente superior ou inferior, sendo regido por
outras propriedades atreladas a disfunções na entrada de matéria e energia, condicionada,
por sua vez, por interferências naturais e/ou antrópicas (DREW, 1986).
O rompimento desse limiar encontra-se ligado à resistência e à resiliência do
sistema diante das forças aplicadas na modificação de sua estabilidade. A resistência
refere-se à capacidade do sistema em permanecer no seu estado de equilíbrio dinâmico sem
sofrer os efeitos das forças modificadoras. Quando as forças aplicadas promovem o
rompimento da resistência, o sistema aproxima-se de seu limiar de recuperação. Se antes
de atingir esse ponto as forças forem cessadas, o sistema tenderá a voltar ao seu estado de
equilíbrio dinâmico, restaurando suas características originais e demonstrando assim sua
resiliência, ou seja, sua capacidade de recuperação diante de eventos extremos (DREW,
1986) (Figura 7).
Quando o esforço aplicado é contínuo, rompendo a capacidade de resistência e
ultrapassando o limiar de recuperação, o sistema tende a ajustar-se diante das novas
características impostas, atingindo um novo estado de equilíbrio dinâmico, no qual
comporta todas as variáveis da Figura 7, porém, adaptadas a outras condições. De acordo
com Christofoletti (1999), os conceitos de resistência e resiliência são muito importantes
para os cientistas e para os planejadores e responsáveis pelo manejo de sistemas
ambientais, a fim de analisar e avaliar a estabilidade dos sistemas em termos de sua
manutenção ou de sua rápida recuperação após a implantação dos efeitos perturbadores,
assinalando o caráter temporário e reversível do impacto ambiental ou antropogênico.
O autor citado destaca ainda que nos sistemas ambientais as alterações que afetam
a resistência e a resiliência são ocasionadas por fatores físicos e também antropogênicos,
esses últimos caracterizados pelos mecanismos de controle impostos aos elementos e aos
atributos do sistema ambiental ao longo do tempo histórico, a partir da sofisticação das
técnicas aplicadas sobre eles.
As mudanças no equilíbrio dinâmico dos sistemas ambientais ocasionadas por
fatores físicos encontram-se vinculadas especialmente às alterações nos condicionantes
climáticos e geodinâmicos. A escala temporal desses eventos pode situar-se entre
intervalos muito pequenos - catástrofes naturais extremamente rápidas - e alcançar também
a escala de décadas, séculos e milênios, sendo que dentro de cada uma dessas séries
MÉTODO E TÉCNICAS
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temporais ocorrem (re)ajustamentos dos elementos naturais que confluem em mudanças
ambientais com diferentes dimensões espaciais.
Por outro lado, “a ação antrópica também é responsável por mudanças nas formas
e processos do sistema ambiental, e suas repercussões apresentam ritmos variados ao longo
dos tempos históricos” (CHRISTOFOLETTI, 1999, p. 131). As transformações
ocasionadas pela interferência das atividades humanas são responsáveis pela aceleração,
retardamento e extinção de alguns processos naturais, ocorrendo sobre os elementos
climáticos, geomorfológicos, hidrológicos e sobre os ecossistemas (fauna e flora).
Pouca atenção foi destinada, por parte dos geógrafos físicos, à interferência
antrópica sobre o sistema ambiental até meados do século XX. Na verdade, a ação humana
sobre os elementos e os atributos do sistema ambiental é tão antiga quanto sua história na
Terra, iniciando-se a partir do momento em que ocorre o aperfeiçoamento das atividades
de caça e pesca, que deram origem à domesticação dos animais e plantas e às sociedades
sedentárias, as quais passaram a controlar de forma mais efetiva os recursos naturais.
“[...] o significado da atividade humana não despertava muito a atenção
dos geógrafos físicos que, pelo contrário, optavam pelo estudo da
mudança ambiental antes do homem para conhecer processos não
modificados por ele ou, quando muito, incluir o homem como elemento
secundário ou apêndice”(GREGORY, 1992, p. 181).
Chorley (1973, citado por GREGORY, 1992) destacou a importância da
Geografia Física incorporar o homem aos seus estudos, pois, segundo o autor citado, o
homem social estaria assumindo o controle de seu meio e qualquer metodologia geográfica
que não reconhecesse esse fato poderia cair na obsolescência. Entretanto, Gregory (1992)
explica que apesar das evidências da atuação humana sobre o sistema ambiental tornarem-
se cada vez maiores e que estudos no sentido de compreender essa relação deveriam ser
abrangidos pela geografia, isto veio a acontecer apenas na década de 1960 com as
advertências dos impactos derivados das atividades antrópicas e com o advento da
denominada Geografia Ambiental.
Christofoletti (1999, p. 37) atenta para o fato de que, no universo sistêmico, o
meio ambiente é constituído pelos sistemas que interferem e condicionam as atividades
sociais e econômicas, isto é, pelas organizações espaciais dos elementos físicos e
biogeográficos. Dessa forma, “os sistemas ambientais são responsáveis pelo fornecimento
de materiais e energia aos sistemas socioeconômicos e deles recebem os seus produtos
(edificações, insumos, lavouras, emissões e dejetos)”. Assim, não há, diante de tal
MÉTODO E TÉCNICAS
SIMON, A.L.H, A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
74
perspectiva, como situar-se alheio às interferências antrópicas sobre o sistema ambiental,
seja pelo viés da apropriação dos recursos naturais, seja pelas conseqüências dessa
exploração que se caracterizam pelos impactos ambientais.
Goudie (1986) procurou evidenciar as raízes e as características dos impactos
causados pelas atividades humanas no sistema ambiental. O autor citado reserva um
capítulo de sua obra para destacar de que forma os mecanismos de controle impostos pelo
homem ao ambiente foram sendo aperfeiçoados em seus diversos estágios de evolução.
Assim, a agricultura é tida como a atividade humana responsável pelas primeiras
transformações no sistema ambiental, pois, a partir da domesticação de animais e plantas, o
espaço necessário para a sobrevivência humana teve significativa redução de seus limites,
passando, entretanto, a ser explorado de forma mais intensa. “O controle inicial das plantas
e animais possibilitou, sem dúvida, o desenvolvimento de uma base sólida e segura para o
desenvolvimento cultural e o avanço da civilização” (GOUDIE, 1986, p. 14) e essa
característica marcou o desenrolar de relações mais complexas entre o sistema
socioeconômico e o sistema ambiental.
Os estudos de Goudie (1986) apresentam ainda a ascensão das modernas
civilizações industriais, evidenciando-as como centro da tomada das decisões de controle e
gerenciamento dos elementos e atributos naturais que compõem os sistemas ambientais. As
atividades industriais desenvolvidas nas zonas urbanas, juntamente com as relações de
comércio estabelecidas, tornaram-se essenciais para a geração de lucro, promovendo a
dinamização do sistema socioeconômico e colaborando para a apropriação intensa dos
recursos por meio do aperfeiçoamento das técnicas de controle das formas e dos processos
naturais.
Ao longo de sua obra, Goudie (1986) atenta minuciosamente para as
características de intervenção humana sobre os elementos do sistema ambiental,
reconstituindo historicamente a aplicação de algumas técnicas empregadas pelo homem
sobre o ambiente físico e apresentando exemplos de mecanismos de controle aplicados
sobre as formas do relevo, sobre as águas, os solos, a vegetação e a atmosfera.
Chorley; Kennedy (1971) empenharam-se na análise e na descrição dos sistemas
controlados, indicando os mecanismos de controle atuantes nos sistemas atmosféricos,
terrestres e ecossistêmicos. Os autores citados evidenciam, por meio de exemplos reais e
hipotéticos, de que forma as intervenções humanas aplicadas ao sistema ambiental
influenciam os ciclos naturais, ressaltando também as potencialidades na aplicação desses
MÉTODO E TÉCNICAS
SIMON, A.L.H, A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
75
mecanismos de controle, bem como suas conseqüências negativas sobre os sistemas
processo-resposta.
O controle antrópico exercido sobre os elementos e atributos dos sistemas
ambientais pode atuar de maneira direta ou indireta sobre as formas e os processos
naturais, alterando o seu equilíbrio dinâmico. Os mecanismos de controle direto seriam
aqueles que se processam de forma localizada sobre os elementos dos sistemas ambientais,
como a construção de reservatórios, a interferência em canais fluviais – por meio de
retilinizações ou canalizações – as atividades de mineração, a construção de estradas, de
pontes e dutos, a exploração de aqüíferos, a irrigação das lavouras, entre outros.
Os mecanismos de controle indireto possuem maior dimensão areal e estão
vinculados às alterações na cobertura vegetal e na dinâmica de uso da terra, que expõe as
formas à ação mais efetiva dos processos, alterando os ciclos naturais e levando ao
reajustamento dos elementos e atributos do sistema ambiental. Insere-se também nesse
grupo o controle sobre as condições climáticas, oriundo do adensamento populacional e da
evolução industrial que condicionaram alterações na composição natural atmosférica e,
conseqüentemente, nos processos desencadeados pelos fatores climáticos.
Esse conjunto de técnicas artificiais aplicadas pelo homem sobre o sistema
ambiental possui literalmente a função de válvulas ou de chaves que comandam os fluxos
de matéria e energia, tornando-as passíveis de regulagens e estocagens que possibilitam a
manutenção e o aperfeiçoamento das atividades urbano-industriais e agropastoris.
Entretanto, diante do grau de desenvolvimento tecnológico e científico alcançado pelas
sociedades, a estrutura e as propriedades desses mecanismos de controle assumiram um
caráter cada vez mais agressivo sobre os elementos do sistema ambiental, gerando uma
série de eventos negativos, resultantes da modificação e do desequilíbrio de ciclos,
processos e formas originais.
Drew (1986) explica que existe uma tendência inerente ao pensamento ocidental
em considerar que o mundo e os recursos naturais nele existentes encontram-se em
benefício dos homens, devendo esses, dentro dessa perspectiva, trabalhar no sentido da
apropriação e domínio dos elementos do sistema ambiental, a fim de manter e desenvolver
os padrões culturais e seu sistema socioeconômico. O autor citado evidencia que essa visão
de mundo, influenciada pelo sistema capitalista, é a responsável pela imposição de
mecanismos de controle cada vez mais aperfeiçoados e versáteis às intenções humanas
MÉTODO E TÉCNICAS
SIMON, A.L.H, A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
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sobre os elementos do sistema ambiental, gerando assim distintos gradientes de
manipulação.
Esses gradientes apresentam diferenças estabelecidas a partir da intensidade do
fenômeno e da extensão que a alteração pode repercutir, e estão atrelados aos mecanismos
de controle direto e indireto supracitados. Desse modo, a manipulação pode assumir um
caráter local, porém possuir intensidade capaz de alterar de forma significativa os
processos naturais de determinada área, como no caso das atividades de mineração. Por
outro lado, a extensão de algumas atividades pode abranger escalas globais, influenciando
e alterando os processos naturais (DREW, 1986, p. 14).
Tomando como base as características de concentração populacional, intensidade
das alterações e extensão das transformações efetivadas a partir do controle antrópico,
Drew (1986) identificou três gradientes de manipulação/controle antrópico. Os ambientes
com grau de controle esparso são aqueles em que as interferências antrópicas ocorrem em
menor intensidade e extensão, como em aldeias indígenas remanescentes e anecúmenos
populacionais; os ambientes parcialmente controlados, que consistem na transição entre o
controle extremo sobre os elementos naturais e as áreas de manipulação pouco expressivas;
e os ambientes com alto grau de controle, referentes aos ecúmenos populacionais, onde as
atividades urbano-industriais e agrícolas são responsáveis pela regulação dos fluxos de
matéria e energia pelo sistema ambiental, controlando os processos em prol do sistema
socioeconômico.
Torna-se importante ressaltar que não existem sistemas ambientais livres de
alguma derivação direta ou indireta do controle antrópico, uma vez que a extensividade dos
fenômenos, mesmo que se processando de forma local e regional, distribui-se em escala
global, como no caso das alterações nas correntes marinhas, nas condições atmosféricas e
nas mudanças morfológicas, pedológicas e de cobertura vegetal, originadas a partir de
alterações climáticas que, por sua vez, desencadeiam alterações nos elementos dos
sistemas ambientais, mesmo quando a intervenção humana não ocorre de forma direta.
As idéias expostas permitem identificar a importância de análises ambientais sob
a perspectiva da abordagem sistêmica, por meio do estudo dos mecanismos de controle
impostos pelo sistema socioeconômico sobre o ambiental, a fim de diagnosticar as
conseqüências dessas ações sobre os elementos naturais, primando pelo mínimo impacto
sobre os mesmos e garantindo a dinâmica da estrutura social e econômica. Dessa forma, a
presente investigação lançou mão de técnicas para a análise das características de controle
MÉTODO E TÉCNICAS
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antrópico direto e indireto sobre a morfohidrografia da bacia do Arroio Santa Bárbara,
condicionado pela dinâmica de uso da terra ao longo de 53 anos, possibilitando a
identificação espacial dos mesmos e concedendo respaldo às discussões sobre a relação
entre o sistema socioeconômico e o sistema ambiental na estruturação de uma complexa
organização espacial.
4.2 Técnicas
4.2.1 Revisão bibliográfica e seleção do material cartográfico
Esta etapa do trabalho procurou analisar literaturas selecionadas, que
compreendem os conceitos de uso da terra, uso do solo, cobertura e revestimento do solo e
dinâmica evolutiva do uso da terra. Também pautou sua análise nos conceitos de bacias e
microbacias hidrográficas e sua utilização como sistemas geográficos de pesquisa,
demonstrando sua característica integradora dos fenômenos socioeconômicos e eventos de
ordem natural e enfatizando sua adoção como unidade geográfica para a efetivação de
ações de planejamento ambiental.
A revisão bibliográfica também buscou auxilio de literaturas que fomentam
maiores interpretações a respeito da abordagem teórico-metodológica adotada. Ao mesmo
tempo, procurou reunir documentos que contribuíssem para uma consistente caracterização
geral do sistema em estudo, partindo do entendimento de seu contexto regional para sua
conjuntura local. As literaturas selecionadas também subsidiaram a análise dos resultados,
uma vez que foram escolhidas aquelas que se aproximassem da problemática identificada
na área em estudo, a fim de contribuir nas discussões e proposições finais.
A seleção do material cartográfico, por sua vez, foi efetuada a partir do objetivo
principal do trabalho em analisar cenários de diferentes épocas, destacando alterações que
a dinâmica de uso da terra desencadeou nos elementos do sistema ambiental da bacia Santa
Bárbara, em especial à morfologia original, à hidrografia e à cobertura vegetal original.
Dessa forma, cartas topográficas, pares estereoscópicos de fotografias aéreas e imagens de
satélite foram selecionadas de acordo com sua disponibilidade e adquiridos durante a
realização da pesquisa documental.
A adoção de mosaicos de fotografias aéreas (pancromáticas e coloridas) para a
interpretação dos cenários referentes aos anos de 1953, 1965 e 1995 possui suas
justificativas pautadas na concepção de Novo (1989, p. 70), o qual afirma que
MÉTODO E TÉCNICAS
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apesar de todos os fatores que contribuem para degradar a resolução final
do produto fotográfico – iluminação da cena, reflectância dos alvos,
espalhamento e o ângulo de elevação do sol – a fotografia aérea ainda é o
sistema que provê melhor de informação espacial sobre a superfície,
permitindo a produção de mapas em escalas grandes.
Dessa forma, a escala adotada para o desenvolvimento da pesquisa (1:50.000)
apresenta resultados positivos no que diz respeito a identificação, classificação e análise
das classes de uso da terra e sua evolução, tanto em área rural como em área urbana.
Além disso, a constatação das principais alterações no meio físico da bacia Santa
Bárbara, resultantes da evolução do uso da terra, com ênfase ao relevo, hidrografia e
cobertura vegetal, é passível de melhor identificação por meio da visão estereoscópica em
fotografias aéreas do que em imagens de satélite, pois permitem a melhor verificação e
interpretação dos detalhes das classes de uso da terra, das feições do relevo e da rede de
drenagem. Além do mais, as fotografias aéreas, enquanto representação do momento ou do
fato geográfico, possibilitam a constatação dos mecanismos de controle impostos aos
elementos do sistema ambiental derivados de intervenções antrópicas diretas e indiretas,
dando, portanto, respaldo à análise dos resultados.
O município de Pelotas possui informações aerofotográficas temporais que de
certa forma constitui-se em privilégio de poucos municípios gaúchos e brasileiros. Essa
disponibilidade de dados vincula-se aos amplos levantamentos efetuados na região sul do
Rio Grande do Sul, principalmente na Planície Costeira Lagunar – área de interesse para a
exploração de recursos naturais – no período da ditadura militar. As informações espaciais
recentes derivam de projetos realizados pela Prefeitura Municipal em parceria com
algumas agências e empresas locais de desenvolvimento além de universidades. Dessa
forma, obstáculos como gastos vultosos com a aquisição das informações puderam ser
evitados.
Para avaliar o cenário mais atual, ou seja, 2006, utilizaram-se ainda informações
espaciais do software GOOGLE EARTH a partir da aquisição de imagens orbitais do
mês de janeiro do ano de 2006, valendo-se de informações espaciais de livre utilização,
que possuem resolução suficiente para a identificação e a análise dos fenômenos em meio
digital a uma escala aproximada e que abrange toda a extensão da bacia Santa Bárbara.
Essa escolha ocorreu pelo fato de não existirem aerofotolevantamentos na área em questão
no período atual. Além disso, o software citado vem ganhando espaço em estudos
geográficos devido a sua precisão nas informações espaciais e na qualidade dos dados.
MÉTODO E TÉCNICAS
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79
A revisão bibliográfica e a seleção do material cartográfico embasaram ainda as
técnicas cartográficas utilizadas na pesquisa.
4.2.2 Técnicas cartográficas
4.2.2.1 Elaboração do mapa base
A base cartográfica foi elaborada no programa AutoCAD MAP 2000 a partir da
digitalização das seguintes cartas topográficas:
* Folha Monte Bonito (SH.22-Y-D-IV-1) MI-3020/1, baseada em fotografias
aéreas do ano de 1975 do SACS, primeira impressão 1980, escala 1:50.000, projeção
UTM, Datum Horizontal: Córrego Alegre (MG), Datum Vertical: Marégrafo de Torres
(RS);
* Folha Pelotas (SH.22-Y-D-IV-3) MI-3020/3, baseada em fotografias aéreas do
ano de 1975 do SACS, primeira impressão 1979, escala 1:50.000, projeção UTM, Datum
Horizontal: Córrego Alegre (MG), Datum Vertical: Marégrafo de Torres (RS).
Depois de digitalizadas, as imagens foram georreferenciadas em coordenadas
UTM para que os demais mapas derivados da utilização da base cartográfica pudessem
estar espacialmente referenciados. As imagens, então georreferenciadas, foram editadas
afim de abranger somente a área da bacia do Arroio Santa Bárbara.
As informações da base cartográfica representam a delimitação da bacia Santa
Bárbara, a rede de drenagem, as curvas de nível, as cotas topográficas, a malha rodoviária
(principal e secundária), a malha ferroviária, além da extensão do aglomerado urbano na
área da bacia do Arroio Santa Bárbara. A base cartográfica serviu de apoio aos demais
mapas confeccionados, visto que, a partir de suas informações espaciais, dados de uso da
terra e geomorfológicos foram georreferenciados à delimitação da bacia.
4.2.2.2 Elaboração dos mapas de uso da terra dos anos de 1953, 1965 1995 e
da representação cartográfica do uso da terra do ano de 2006
A identificação do uso da terra nos cenários de 1953, 1965 e 1995 foi efetuada por
meio da fotointerpretação de pares estereoscópicos de fotografias aéreas. Foram utilizados
os seguintes aerolevantamentos:
* Dez fotografias aéreas do ano de 1953 (Superintendência do Desenvolvimento
da Região Sul), em escala aproximada de 1:40.000, concedidas pela Agência para o
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80
Desenvolvimento da Lagoa Mirim com sede em Pelotas. Documentos sem maiores
informações devido a falta de catalogação e organização do acervo.
* Seis fotografias aéreas do ano de 1965 (Serviço Geográfico do Exército),
pertencentes ao projeto AF 63-32, em escala aproximada de 1:60.000 (escala do fotoíndice
1:180.000). Linhas: 229 A/21489/21490; 230 A/21423/21424/21425/21426. Concedidas
pela Secretaria da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul, com sede em Porto Alegre.
* Vinte e duas fotografias aéreas do ano de 1995 (Prefeitura Municipal de
Pelotas). Data do vôo 08/95, escala aproximada de 1:25.000. Linhas 06/105, 106, 107, 108,
109, 110, 111; 07/ 129, 130, 131, 132, 133, 134, 135; 08/ 153, 154, 155, 156, 157, 158,
159, 160. Concedidas pela Secretaria Municipal de Planejamento Urbano de Pelotas.
A concessão do material por órgãos públicos exigiu que as fotografias originais
fossem escaneadas e impressas novamente. A impressão ocorreu em papel Couchet, sendo
que esse procedimento não veio a acarretar maiores implicações nas informações contidas
nos documentos, a não ser em fotografias que já apresentavam certa deterioração pelo
intenso uso ou então pelo tempo.
Os dados foram repassados para layers em papel Poliéster, que se assemelha ao
papel vegetal quanto a sua transparência, porém não sofre dilatações, evitando distorções
dos resultados levantados por meio das fotografias aéreas. Nesse layer foram destacadas as
parcelas dos distintos usos da terra, a rede hidrográfica, a malha rodoviária e ferroviária.
As classes de uso da terra de cada período foram demarcadas sobre os layers de
acordo com os princípios de fotointerpretação lançados por Ceron; Diniz (1966). Para
esses autores, a geometria das parcelas, além de características como textura, cor, altura e
forma da área destinada às diversas atividades antrópicas, auxiliam na identificação das
classes de uso da terra. Os autores citados discorrem a respeito da identificação das formas
agrícolas de uso da terra, entretanto, suas explicações também dão respaldo à identificação
das atividades em áreas urbano-industriais.
As classes de uso da terra, aplicadas aos mapas dos períodos distintos, foram
reconhecidas e classificadas de acordo com a metodologia proposta por Anderson et al.
(1979). Tal metodologia foi sugerida para a identificação das classes de uso da terra por
meio de dados de sensoriamento remoto, possuindo, segundo os autores citados, resultados
de boa qualidade em se tratando de informações provenientes de fotografias aéreas.
MÉTODO E TÉCNICAS
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Dessa forma, Anderson et al. (1979) propõem o detalhamento das classes de uso
da terra em quatro níveis, dependendo do tipo de sensor utilizado e da escala do material
cartográfico. O Quadro 4 apresenta a proposta dos níveis de detalhamento.
Nível de
Classificação
Características típicas dos dados
I Tipo de dados LANDSAT (anteriormente ERTS)
II Dados de grande altitude, a 12.400 m ou mais (escala menor que
1:80.000)
III Dados de altitude média tomados entre 3.100 e 12.400 m (escala
1:20.000 a 1:80.000)
IV Dados de baixa altitude tomados a menos de 3.100 m (escala mais que
1:20.000)
Quadro 4: Níveis de detalhamento dos dados de sensores remotos.
Fonte: Anderson et al. (1979, p. 26)
Entretanto, para atender aos objetivos da presente pesquisa, decidiu-se aplicar as
classes de uso da terra I e II durante o processo de fotointerpretação, levando-se em
consideração a escala aproximada dos mosaicos de fotografias aéreas utilizadas. Anderson
et al. (1979, p 28) excluíram os níveis III e IV de suas discussões exatamente porque sua
utilização requer um aparato de informações suplementares muito elevado, além de dados
de sensoriamento remoto em maior quantidade.
A partir dessas considerações, os autores citados estabelecem um sistema de
classificação do uso da terra e revestimento do solo para dados de sensoreamento remoto,
baseados nos níveis I e II. O Quadro 5 apresenta tal classificação.
MÉTODO E TÉCNICAS
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NÍVEL I
NÍVEL II (classes englobadas pelo nível I)
1 Terra urbana ou construída
11 residencial;
12 comercial e serviços;
13 industrial;
14 transportes, comunicação e utilidades;
15 complexos industriais e comerciais;
16 terra urbana ou construída mista;
17 terra urbana diversas ou construída.
2 Terra agrícola
21 terra de cultura ou pastagens implantadas;
22 pomares, bosques, vinhedos, viveiros e áreas de
horticultura ornamental;
23 atividades de criação confinada
24 outros tipos de terra agrícola.
3 Pastagem
31 pastagem herbácea;
32 pastagem com arbustos e carrascos;
33 pastagem mista.
4 Terra florestal
41 terra de floresta decídua;
42 terra de floresta sempre verde;
43 terra de floresta mista.
5 Água
51 cursos de água e canais;
52 lagos;
53 reservatórios;
54 baías e estuários.
6 Terra úmida
61 terra úmida florestada;
62 terra úmida não-florestada.
7 Terra árida
71 planícies salgadas secas;
72 praias;
73 outras áreas de areia que não praias;
74 rocha nua exposta;
75 minas a céu aberto, pedreiras e minas de cascalho;
76 áreas de transição;
77 terra árida mista.
8 Tundra
81 tundra de arbustos e macega;
82 tundra herbácea;
83 tundra de solo nu;
84 tundra úmida;
85 tundra mista.
9 Neve ou gelo
91 campos de neve perene;
92 geleiras.
Quadro 5: Sistema de uso da terra e revestimento do solo para utilização com dados de
sensoriamento remoto.
Fonte: Anderson et al. (1979, p. 32)
A metodologia possui maleabilidade e flexibilidade em sua aplicação,
possibilitando a exclusão de classes inexistentes e a implementação de outras classes que
podem vir a surgir devido, principalmente, às características naturais e socioeconômicas
peculiares da área em estudo. Além do mais, possibilita a inserção de classes de uso da
terra mais recentes, não presumíveis ou existentes no período de sua implementação.
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Dessa forma, algumas classes do nível II que não possuíam relevância para a
presente pesquisa ou foram dissolvidas no nível I, ou sofreram modificações que
adequassem sua representação à conjuntura local, adaptando-se à proposta da classificação
de Anderson et al. (1979). O Quadro 6 apresenta as classes de uso da terra e as de
revestimento do solo aplicadas à bacia do Arroio Santa Bárbara.
1.1
Residencial, comercial e
serviços;
Terra Urbana ou
Construída
1.2 Área Industrial;
As Terras Urbanas ou Construídas compreendem áreas de uso intensivo, com grande parte da terra coberta por estruturas (ANDERSON, 1979, p.38).
“O Uso Residencial da terra varia de alta densidade, representada pelas estruturas de uso múltiplo dos núcleos urbanos, até baixa densidade, onde as casas se
encontram em lotes de mais de um acre, na periferia da expansão urbana” (ANDEROSN, 1979, p.38).
“As Áreas Industriais compreendem uma ampla variedade de usos da terra, desde indústrias leves até usinas e indústrias pesadas”. (ANDERSON, 1979, p.41).
2.1 Terra de Culturas;
“Terra utilizada para a produção de alimentos e fibras. [...] são os desenhos geométricos característicos dos campos e estradas na paisagem. [...] podem não
apresentar formas tão definidas como outras áreas”. (ANDERSON, 1979, p.45).
Os diferentes componentes de Terra de Culturas incluem: terra de cultura colhida, incluindo frutíferas arbustivas, terra de cultura estival e terra de cultivo
improdutiva, terras onde houve fracasso na cultura, terra de cultura de gramíneas e leguminosas para melhoramento do solo e terra de cultivo utilizada para
pastagem em rotação de culturas (ANDERSON, 1979, p. 46). Também foram incluídas nesta classe, as terras de solo exposto que foram consideradas como áreas
de pousio ou recém colheita dos gêneros agrícolas, justamente por estarem abrangidas pela delimitação da respectiva classe de uso da terra.
Terra Agrícola
2.2
Silvicultura;
As áreas destinadas ao cultivo de árvores exóticas foram incluídas na categoria de uso da terra agrícola por apresentarem características de ordem econômica e
espacial que conferem sua inserção em tal classe. São desenvolvidas em grandes parcelas na área rural, além de pequenas glebas nas pequenas e médias
propriedades, incrementando lucros para pequenos, médios e grandes agricultores.
Pastagens 3 Pastagens;
“Terra na qual a vegetação natural potencial é predominante de gramíneas, plantas graminóides, outras ervas, pastagens ou arbustos e nas quais o pastoreio natural
teve uma influência importante no seu estágio de pré-civilização”. (ANDERSON, 1979, p. 49). Além disso, considerou-se também pastagens que possivelmente
foram estabelecidas pela ação antrópica.
Mata ou Floresta
Nativa
4
Matas Ciliares e Florestas de
Encosta;
O autor destaca que as florestas são de fácil identificação nas fotografias aéreas devido a sua textura, coloração e irregularidades na composição do dossel.
Água 5
Cursos de água, Lagos,
Reservatórios;
Engloba as categorias cursos de água, lagos e reservatórios. Quanto aos Reservatórios, os autores explicam que eles são represamentos artificiais de água, utilizada
para irrigação, controle de enchentes, fornecimentos de água, geração de energia hidrelétrica. As represas, diques, outras estruturas de controle de água, ou a
própria escavação geralmente aparecerão de forma a auxiliar na identificação (ANDERSON, 1979, p. 55).
6.1
Terras úmidas recobertas por
vegetação rasteira;
6.2
Terras úmidas recobertas por
higrófitas e higrófilas;
“Terras úmidas são aquelas áreas onde o lençol freático se encontra na superfície ou esta próximo, ou acima da superfície da terra durante uma boa parte da maioria
dos anos. As terras úmidas, com freqüência, encontram-se associadas com as depressões topográficas. Os exemplos de terras úmidas compreendem brejos, lodaçais
e pântanos, situados nas margens rasas de baías, lagos , lagoas, cursos de água e represamentos feitos pelo homem, como os reservatórios. Elas incluem Campinas
úmidas ou charcos em vales de altas montanhas, e bacias estacionalmente úmidas ou alagadas”. (ANDERSON, 1979, p. 56). Na Bacia Hidrográfica do Arroio
Santa Bárbara, as Terras Úmidas cobertas por vegetação rasteira, correspondem às áreas mais baixas, de depósitos areno-argilosos, que encontram-se encharcadas
durante o período de chuvas de inverno, predominando uma vegetação rasteira, do tipo campo, com gradual intercalação de uma vegetação típica de ambiente
totalmente encharcado. As Terras úmidas recobertas por higrófitas e higrófilas são aquelas onde existe um constante encharcamento devido a alteração no nível dos
cursos d’água ou pela permanência do lençol freático próximo a superfície, nestas zonas é comum a vegetação de banhado.
Terras Úmidas
6.3
Alagados;
Superfícies alagadas em determinadas épocas do ano pelo maior ou menos nível de açudes e reservatórios com maior capacidade de armazenamento de água. Nas
épocas secas predomina uma vegetação rasteira, durante períodos chuvosos uma lamina d’água pouco espessa cobre essa área.
Terras Áridas 7
Minas a céu aberto, pedreiras
e minas de cascalho;
Terra árida é terra com capacidade limitada para manter a vida e na qual menos de um terço da área apresenta vegetação ou outra cobertura. Em geral, é uma área
de solo raso, areia ou pedras”. (ANDERSON, 1979, p. 59).A cobertura vegetal e o material de recobrimento são removidos a fim de expor os depósitos minerais
[...] A mineração de pedra para construção, e decoração e a extração de depósitos de areia e cascalho, também resultam em grandes minas a céu aberto. A atividade
comum de mineração não é sempre distinguível, e minas a céu aberto inativas, abandonadas, e ativas, pedreiras, minas de perfuração e minerações de cascalho se
incluem nesta categoria até que se estabeleça outra cobertura ou utilização”. (ANDERSON, 1979, p. 60-61).
Áreas de Transição 8 Áreas de Transição.
Aquelas que não encaixarem-se nas características das outras classes de uso da terra e possuírem, em pequenas parcelas, inúmeros tipos de uso, e cuja delimitação
na atual escala de análise poderia colocar em xeque a boa leitura dos resultados justamente pelo excessivo número de dados e, “ àquelas áreas que se encontram em
transição de uma atividade de uso da terra para outra. Elas se caracterizam pela falta de qualquer informação de sensoriamento remoto que torne possível ao
intérprete predizer, com segurança, o uso futuro ou discernir o uso passado. Tudo que pode ser realmente determinado, em tais situações, é que uma transição se
acha em processo, devendo-se evitar deduções sobre o uso passado ou futuro”. (ANDERSON, 1979, p. 61).
Figura 17: Sistema de Classificação do Uso da Terra e Revestimento do Solo para a Bacia Hidrográfica do Arroio Santa Bárbara, Pelotas – RS e sua aplicação na área em estudo.
Fonte: Adaptado de ANDERSON et al. (1979)
MÉTODO E TÉCNICAS
SIMON, A.L.H, A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
85
Durante as atividades de fotointerpretação que identificaram o uso da terra em
cada um dos cenários, primou-se por destacar também pontos estratégicos, ou seja, ‘nós’
que pudessem auxiliar no ajuste das imagens digitalizadas à base cartográfica no ambiente
do programa AutoCAD MAP 2000. Estes ‘nós’ caracterizam-se principalmente pelos
cruzamentos de estradas e ferrovias além de confluências da rede hidrográfica.
Concluídas as atividades de fotointerpretação, os layers com as informações sobre
o uso da terra em meio analógico foram escaneados e transferidos para o software
AutoCAD MAP 2000 no formato raster. Depois de alinhadas e georreferenciadas, as
imagens foram posicionadas em segundo plano para que a vetorização dos nós, das linhas e
dos polígonos pudessem ocorrer, levando em consideração a base cartográfica que já se
encontrava em formato vetor. Para que a vetorização transcorresse, foi necessária a criação
de layers (camadas) que estabelecessem uma base de dados primária sobre o uso da terra,
em que posteriormente foram delimitados os polígonos referentes às parcelas de cada
classe de uso.
Quando um novo layer é criado, existe a possibilidade de definir um tipo de cor,
tamanho e característica de linha. Essa camada pode, a qualquer momento, ser acionada,
desativada ou travada para que não atue na poluição das informações e no processo de
vetorização.
Os dois primeiros layers criados em cada novo mapa foram: Hidrografia e Base.
O layer hidrografia possui cor azul e é destinado à vetorização da rede de drenagem e de
corpos de água, enquanto o layer base possui a cor cinza e é destinado à vetorização das
linhas referentes à delimitação das parcelas distintas de uso da terra.
Definidos os limites das classes de uso e a rede hidrográfica, iniciou-se o
agrupamento dos distintos polígonos gerados, nas referidas classes de uso da terra
pertencentes. Esse procedimento ocorreu por meio da utilização do comando Boundary
Creation, que auxilia na criação de limites entre polígonos que não possuem relações
diretas, facilitando a compreensão das dimensões areais, seu preenchimento durante a
edição final do documento, além de conceder informações sobre a área ocupada por esse
polígono na bacia hidrográfica, possibilitando desse modo a análise de dados quantitativos.
Assim, depois de criados os polígonos de cada uma das classes de uso da terra, foi
possível desativar a base criada inicialmente para efetivar a vetorização primária dos
dados. Cada polígono possui as cores definidas de acordo com a classe de uso da terra
MÉTODO E TÉCNICAS
SIMON, A.L.H, A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
86
adaptada da proposta de Anderson (et al. 1979), sendo possível desativá-los a qualquer
momento para observações particulares de cada tipo de uso da terra.
A representação cartográfica do uso da terra no ano de 2006 foi realizada a partir
da utilização de imagens orbitais do software GOOGLE EARTH . O procedimento
adotado para a identificação das classes de uso da terra no cenário mais atual seguiu o
mesmo roteiro da elaboração dos mapas dos anos de 1953, 1965 e 1995, no que se refere à
metodologia empregada para a classificação dos tipos de uso da terra e às técnicas de
cartografia digital. Entretanto, a interpretação das imagens do software GOOGLE EARTH
ocorreu diretamente na tela do computador, uma vez que as imagens não apresentam
estereoscopia. Trabalhos de campo foram realizados posteriormente, a fim de conferir
fidelidade aos dados mapeados.
No ambiente do software GOOGLE EARTH é disponibilizada a ferramenta
que possibilita a conversão das coordenadas geográficas para coordenadas U.T.M.. Dessa
forma, juntamente às imagens selecionadas foram atribuídos dois pontos referentes a duas
coordenadas U.T.M.s, geralmente posicionadas em nós como cruzamentos de estradas e
vias férreas, além de avenidas principais na área urbana.
As imagens selecionadas foram inseridas no ambiente do software AutoCAD
MAP 2000, no qual já se encontravam no formato vetor a delimitação da bacia
hidrográfica, a malha hidrográfica do ano de 1995, as principais rodovias, avenidas e ruas,
além das estradas de ferro. A preferência pela permanência da rede hidrográfica de 1995
ocorreu pela dificuldade em mapear a hidrografia atual diante da ausência de
estereoscopia. Porém, novos corpos de água, bem como aqueles que não foram mais
encontrados, foram atualizados no cenário de 2006.
As imagens em formato raster, provenientes do software GOOGLE EARTH ,
foram alinhadas às coordenadas U.T.M. originais. Após o alinhamento de todas as
imagens, prosseguiu-se com a digitalização das classes de uso da terra com o layer base,
sendo posteriormente atribuídos os polígonos referentes às classes de uso da terra.
A parte final da elaboração dos mapas de uso da terra dos anos de 1953, 1965,
1995 e da representação cartográfica do cenário de 2006 diz respeito à edição dos
documentos. Cada polígono recebeu preenchimento com a cor da classe de uso da terra por
esse representada. Foram instituídas legendas e convenções cartográficas e, por fim, foi
efetuada a impressão.
MÉTODO E TÉCNICAS
SIMON, A.L.H, A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
87
4.2.2.3 Elaboração dos mapas geomorfológicos dos anos de 1953, 1965 e 1995
e organização do esboço cartográfico correspondente às características
geomorfológicas do ano de 2006
A elaboração dos mapas geomorfológicos dos anos de 1953, 1965 e 1995 seguiu
os mesmos procedimentos referentes à aquisição dos materiais e à preparação dos mesmos
para fotointerpretação utilizados na confecção dos mapas de uso da terra dos anos de 1953,
1965 e 1995.
O mapeamento das feições do relevo da bacia hidrográfica do Arroio Santa
Bárbara foi desenvolvido considerando a concepção de Cunha (2001, p. 109), que explica
que “é impossível estabelecer um mapeamento geomorfológico visando a gestão ambiental
que seja universal e dogmático”. Dessa forma, é necessário levar em consideração os
diferentes sistemas geomorfológicos existentes, além dos problemas ambientais que são
encontrados na área em estudo. Isso faz com que possam ocorrer adaptações que permeiem
os objetivos do trabalho, podendo ser dada maior ênfase a determinadas feições e
processos.
Assim, considerando a proposta da autora citada, o mapeamento geomorfológico
realizado enfatizou a morfografia, representada pela simbologia, com destaque para as
feições de relevo que indicam maior dinâmica erosiva. Foi dada atenção também ao
mapeamento do modelado antrópico, ressaltando as intervenções que atuam como
mecanismos de controle da morfodinâmica da bacia Santa Bárbara e que desencadearam
alterações nos elementos do sistema ambiental, sobretudo na morfologia original e na
hidrografia.
Dessa forma, a simbologia utilizada pautou-se em uma adaptação das propostas de
Tricart (1965) e Verstappen; Zuidan (1975), por meio da seleção de símbolos adequados à
representação das feições na área, em uma única legenda. Esse procedimento encontrou
respaldo nas análises sobre o mapeamento geomorfológico realizados por Cunha (2001).
A Figura 8 (a e b) demonstra a simbologia proposta pelos autores citados e que se
adapta às feições geomorfológicas da área. Já a Figura 9 mostra a simbologia adotada para
o mapeamento geomorfológico na bacia Santa Bárbara a partir da adaptação das duas
metodologias.
MÉTODO E TÉCNICAS
SIMON, A.L.H, A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
88
Figura 8: Origem e seleção da simbologia utilizada no mapeamento geomorfológico da bacia do
Arroio Santa Bárbara: a) Simbologia proposta por Tricart (1965); b) Simbologia proposta
Verstappen; Zuidan (1975).
Fonte: Organizado por Adriano L. H. Simon, adaptado de Tricart (1965); Verstappen; Zuidan
(1975).
Figura 9: Adaptação das simbologias de Tricart (1965) e Verstappen; Zuidan (1975) aplicadas ao mapeamento geomorfológico na bacia do Arroio Santa
Bárbara.
Fonte: Organizado por Adriano L. H. Simon.
89
MÉTODO E TÉCNICAS
SIMON, A.L.H, A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
90
Tricart (1965) evidencia que o mapa geomorfológico nada mais é do que a
tradução gráfica dos resultados e das concepções obtidas por meio de materiais
cartográficos e trabalhos de campo. O autor explica que esse documento é complexo em
sua essência pelo fato de ser constituído por várias informações que fornecem subsídios a
análise do relevo. A interpretação de tal documento cartográfico pode, em alguns casos, ser
limitada justamente pela gama de símbolos e cores nele representados.
Para o autor citado, os mapas geomorfológicos devem abranger quatro tipos de
informação, a saber:
A Morfometria, que pode ser representada por um fundo topográfico contendo as
curvas de nível e a rede de drenagem. De acordo com Tricart (1965), outras características
da morfometria podem ser inseridas no mapa geomorfológico, porém possuem maior
interesse para outras especialidades e objetivos que vão além deste mapeamento. Além
disso, demais informações morfométricas podem contribuir para a poluição cartográfica,
dificultando a análise e a interpretação do documento. Na presente investigação, optou-se
por apresentar a malha hidrográfica, as curvas de nível e os pontos cotados da base
cartográfica digital como símbolos principais da morfometria.
A Morfografia caracteriza-se pela representação espacial e areal das formas do
relevo. Tricart (1965) explica que os aspectos morfográficos estão estritamente ligados às
características morfogenéticas, sendo que as formas devem ser identificadas também por
sua gênese.
A Morfogênese é explicitada por meio do agrupamento das formas do relevo
(Figura 8a) de acordo com os processos que deram origem a elas. Dos grandes grupos
assinalados por Tricart (1965) na área de pesquisa, de acordo com os objetivos dessa,
utilizou-se: as Formas de vertentes e interflúvios, as Formas originadas pela ação das
águas correntes e o Modelado antrópico.
Por fim, a Cronologia dos fatos geomorfológicos, a qual evidencia o momento da
história geológica em que as formas e o conjunto dessas se desenvolveram. Tricart (1965)
indica a utilização de tramas de cores para a representação dos períodos da história
morfogenética. O autor citado explica também que esses dados são de difícil aquisição e
muitas vezes acabam sendo suprimidos devido à falta de informações. Por esse motivo, os
dados sobre a cronologia das formas do relevo da bacia Santa Bárbara não foram
representados.
MÉTODO E TÉCNICAS
SIMON, A.L.H, A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
91
Tricart (1965) recomenda ainda que os dados condizentes ao arcabouço estrutural
devam ser mapeados, indicando sua divisão em dois níveis: as Feições Estruturais,
identificadas por falhas, linhas de cuesta, entre outras (não mapeadas na área em estudo por
não possuírem expressão areal na escala de trabalho); e os Dados Litológicos,
representados por meio de tramas coloridas de fundo na carta, que indicam a existência de
rochas com maior grau de compactação, bem como litologias menos compactadas, sendo
que a cor das tramas alterna gradativamente de cores mais fortes para as mais brandas.
Verstappen; Zuidan (1975), por sua vez, afirmam que a finalidade de um
mapeamento geomorfológico é a de “oferecer uma imagem concisa e sistemática do relevo
e dos fenômenos que estão ligados a ele” (p. 15). Explicam ainda que esses documentos
constituem-se em ferramentas de grande valor na avaliação dos recursos naturais devido às
relações existentes entre as características geomorfológicas e os demais fatores do meio
ambiente.
Os autores citados propõem um sistema de elaboração de mapas geomorfológicos
que identifique, além das unidades principais, as feições menores do relevo, que devem ser
delimitadas de acordo com sua morfogênese, haja vista que as formas são inerentes aos
processos nelas estabelecidos. A elaboração desses documentos deve procurar ressaltar
também a litologia da área, com ênfase nas propriedades e nos tipos de rochas, pelo fato de
que nela se desenvolvem os processos geomorfológicos e as características de maior ou
menor resistência estrutural que acarretarão na característica do modelado.
Para Verstappen; Zuidan (1975) a elaboração de mapas que representam com
fidelidade os fenômenos geomorfológicos deve pautar-se na utilização de fotografias
aéreas e na realização de trabalhos de campo. As fotografias aéreas, de acordo com os
autores citados, são registros detalhados da superfície da terra, visto que os fenômenos
aparecem em sua forma e desenho exatos. Os aerofotogramas constituem-se como base
para a realização do mapeamento geomorfológico e ponto de partida para a articulação dos
trabalhos de campo que, por sua vez, permitem avaliar e reambular dados que ficaram
pendentes durante a fotointerpretação.
O método proposto pelos autores citados compreende os aspectos morfométricos,
morfográficos e morfogenéticos, buscando também a representação da litologia e dos
processos morfológicos por meio de legendas que são flexíveis à adaptação para diferentes
cenários e propostas de trabalho.
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SIMON, A.L.H, A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
92
Com as legendas, guarda-se certa flexibilidade para poder adaptá-las às
necessidades dos geomorfólogos que trabalham em diversos tipos de
terreno. Nunca se deverá forçar o geomorfólogo a ‘normas’
demasiadamente rígidas para as condições que prevalecem na região de
trabalho (VERSTAPPEN; ZUIDAN, 1975, p. 16).
Em sua proposta, os autores citados explicitam três tipos de mapas
geomorfológicos:
Os Mapas Preliminares são aqueles onde se identifica toda a informação possível
de se obter por meio das fotografias aéreas. Eles devem incluir os dados topográficos para
localizar com maior precisão em campo os fenômenos geomorfológicos. Podem ainda
constar de informações provisórias sobre a litologia, provindas de observações nas
fotografias aéreas ou de outros documentos.
Os Mapas com Fins Gerais são resultados das investigações geomorfológicas
puras, sem fins específicos. Nesses documentos, identificam-se as unidades genéticas do
relevo por meio de cores uniformes agrupadas em símbolos correspondentes à origem das
feições do relevo. Os autores citados trazem separadamente a morfometria e a topografia.
Para a presente pesquisa utilizou-se a simbologia correspondente às formas de origem
denudativa, às formas de origem fluvial, à morfometria e topografia, além dos dados sobre
a litologia local (Figura 8b).
E finalmente, os Mapas com Fins Especiais representam uma complementação
das informações dos mapas com fins gerais, incluindo sempre a litologia e a topografia. Na
metodologia proposta por Verstappen; Zuidan (1975), os mapas com fins especiais
dividem-se em dois tipos: os de morfoconservação e os hidromorfológicos, “que visam
orientar ou resolver problemas específicos” (CUNHA, 2001, p. 68). Torna-se importante
ressaltar que alguns símbolos dos mapas com fins específicos estão presentes nos mapas
com fins gerais, ao mesmo tempo em que se torna imprescindível, a fim de atingir aos
objetivos propostos, inserir em mapas com fins gerais alguns símbolos de mapas com fins
específicos.
Com base nessas duas importantes contribuições ao mapeamento geomorfológico
foi elaborada a legenda que serviu como orientação ao mapeamento geomorfológico da
bacia Santa Bárbara. Sua esquematização comporta: as Feições Litológicas, as Formas de
Origem Denudativa, a Ação das Águas Correntes e as Formas de Origem Fluvial, a
Morfometria e o Modelado Antrópico e as Alterações na Topografia (Figura 9).
MÉTODO E TÉCNICAS
SIMON, A.L.H, A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
93
Cunha (2001), explicando as principais diferenças nos mapeamentos propostos
por Tricart (1965) e Verstappen; Zuidan (1975), aponta para a distinção no agrupamento
dos símbolos utilizados na representação das feições do relevo. De acordo com a autora
citada, Tricart (1965) agrupa a maioria de seus símbolos em consonância aos tipos de
formas, sendo os grandes grupos de sua classificação: as formas de vertentes e interflúvios,
ação das águas correntes e o modelado antrópico, além das feições litológicas.
Para Verstappen; Zuidan (1975) as feições são agrupadas de acordo com sua
origem destacando as formas de origem denudativa e as formas de origem fluvial. Os
autores citados também incluem em sua classificação a morfometria e a topografia.
Torna-se importante ressaltar que muitas das formas que na proposta de Tricart
(1965) são pertencentes ao modelado antrópico, na proposta de Verstappen; Zuidan (1975)
encontram-se inseridas no grupo topografia. Por esse motivo, tendo em vista a contribuição
das duas metodologias na identificação das formas de origem antrópica, que representam
os pontos de controle na morfodinâmica do sistema em estudo, foram agrupadas em uma
classe denominada Modelado Antrópico e Alterações na Topografia, e mapeadas nos
distintos cenários.
Os tipos de vertentes, na simbologia de Verstappen; Zuidan (1975), figuram-se
como símbolos para mapas de morfoconservação. Para Tricart (1965) as formas das
vertentes não devem ser representadas em mapas geomorfológicos. De acordo com o autor
referido, esses dados, por mais interessantes que sejam, têm maior identificação com os
mapas morfométricos do que com os mapas geomorfológicos.
Assim, o grupo Morfometria, existente na classificação de Verstappen; Zuidan
(1975), foi adotado no mapeamento da presente pesquisa para caracterizar as curvas de
nível, os topos cotados, as linhas de cumeada suaves e agudas e as formas de vertentes. A
identificação da forma das vertentes possui grande importância, pois tal caracterização
possibilita a análise do escoamento superficial, bem como as alterações impostas pela ação
antrópica sobre a morfologia original ao longo do tempo histórico. Em virtude da escala de
trabalho adotada, optou-se pela não representação de linhas de cumeada agudas e
arredondadas maiores e menores, como indicam os autores acima, preferindo-se a
orientação de Tricart (1965) em utilizar apenas linhas de cumeada suaves e agudas.
A Ação das Águas Correntes (TRICART, 1965) e as Formas de Origem Fluvial
(VERSTAPPEN; ZUIDAN, 1975) foram agrupadas em um único grupo: Ação da Água
Correntes e Formas de Origem Fluvial, abrangendo as feições hidrográficas, as formas de
MÉTODO E TÉCNICAS
SIMON, A.L.H, A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
94
acumulação e a natureza dos depósitos, além do modelado de entalhe. Essa opção ocorreu
pela proximidade das propostas em estabelecer o agrupamento de feições provenientes do
processo de acumulação e de trabalho da drenagem sobre as formas do relevo.
As Formas de Origem Denudativa incluem as feições erosivas localizadas,
representadas por símbolos que evidenciam a ocorrência de erosão em sulcos, ravinas e
voçorocas, além das rupturas topográficas. A representação das rupturas topográficas na
proposta de Tricart (1965) proporciona uma gama muito maior de símbolos para
mapeamento em escalas de mais detalhe, porém, na escala de trabalho adotada para a
presente pesquisa, as rupturas foram agrupadas em dois tipos: abruptas e suaves.
As Feições Litológicas foram agrupadas de forma que pudessem ser representadas
por tramas, ao fundo, destacando o tipo de rocha predominante e a resistência dessas
feições litológicas. Essa aglutinação foi possível devido ao fato de que ocorrem na bacia
Santa Bárbara duas litologias distintas quanto a resistência e formação: o Granodiorito
Equigranular (Gr+) e a Formação sedimentar Graxaim, que possui o arcózio como litologia
predominante.
A organização dos esboços cartográficos correspondentes às características
geomorfológicas e da rede hidrográfica no ano de 2006 ocorreu a partir da seleção das
áreas onde os mecanismos de controle impostos pelas atividades antrópicas resultaram em
maiores alterações na morfohidrografia da bacia Santa Bárbara. As áreas foram
selecionadas de acordo com os dados obtidos nos mapeamentos anteriores que apontaram
para zonas de maior e menor alteração provocadas pela ação antrópica.
Após a escolha dos fragmentos espaciais a serem analisados, foram obtidas as
imagens orbitais do software GOOGLE EARTH referentes a tais áreas. As imagens
foram alinhadas às formas do relevo mapeadas no cenário de 1995 no ambiente do
software AutoCAD MAP 2000, de forma a adequar as coordenadas dos nós representados
no mapa geomorfológico de 1995 (em formato vetor) aos nós existentes na imagem orbital
(formato raster). Torna-se importante ressaltar que a elaboração do esboço cartográfico não
representa o mapeamento das feições geomorfológicas atuais, mas sim a aproximação com
as mesmas, uma vez que a ausência de estereoscopia nas imagens orbitais impossibilita a
avaliação da morfologia e seu mapeamento por meio de símbolos como nos cenários de
1953, 1965 e 1995.
Entretanto, após a finalização dessa primeira etapa, foram realizados trabalhos de
campo a fim de evidenciar e ratificar alguns pontos que apresentavam discordância após o
MÉTODO E TÉCNICAS
SIMON, A.L.H, A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
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alinhamento dos dados. A qualidade das imagens orbitais do software GOOGLE EARTH
também contribuiu para que essas alterações atreladas ao alinhamentos dos dados
pudessem ser efetivadas, demonstrando, assim, que transformações nas formas do relevo e
na hidrografia foram passíveis de constatação entre os anos de 1995 e 2006.
A organização desses esboços cartográficos permitiu ainda a análise espacial mais
detalhada das relações entre a morfohidrografia e a conjuntura atual de uso da terra, uma
vez que a morfografia pôde ser acompanhada da imagem real ao fundo, possibilitando a
compreensão da localização das feições geomorfológicas e da organização da estrutura
socioeconômica. A apresentação das feições geomorfológicas sobre as imagens orbitais
concede também uma interpretação mais didática da correlação dos dados apresentados
pelos mapas de uso da terra e geomorfológicos dos anos de 1953, 1965 e 1995.
4.2.2.4 Trabalhos de campo e pesquisa documental
Os trabalhos de campo consistem em etapas fundamentais para a compreensão da
dinâmica de uso da terra no sistema ambiental em estudo e da alteração que essa dinâmica
vem provocando nos elementos relevo, hidrografia e vegetação. Aqueles contemplam
atividades de observação, descrição e fotografia, que podem ser comparadas com imagens
anteriores de arquivos ou documentos pessoais, garantindo maior riqueza à análise espacial
pretendida. Durante sua efetivação, emerge a oportunidade prática da reconstrução de
cenários de épocas passadas, visto que esse fato em várias ocasiões pode ser dificultado
devido à inexistência de material cartográfico, fato comum em décadas pretéritas e até em
períodos recentes.
Os trabalhos de campo na bacia Santa Bárbara foram orientados pelas
informações verificadas durante as atividades de fotointerpretação (nos anos de 1953, 1965
e 1995) e organização dos esboços cartográficos do uso da terra e das características
geomorfológicas atuais. Dessa forma, sua operacionalização deu-se no sentido de constatar
as principais alterações morfohidrográficas ocasionadas pela imposição de mecanismos de
controle antrópico sobre o sistema ambiental, possibilitando também sua relação com a
conjuntura atual de uso da terra.
As atividades de campo também abrangeram a pesquisa documental, referente aos
materiais cartográficos e bibliográficos que concederam a base para a estruturação da
pesquisa. As visitas e os diálogos com profissionais de instituições privadas e públicas
MÉTODO E TÉCNICAS
SIMON, A.L.H, A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
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possibilitaram a obtenção dos materiais e também auxiliaram na reconstrução dos fatos que
marcaram a dinâmica de uso da terra na bacia Santa Bárbara.
5 ANÁLISE DOS RESULTADOS
Os mapeamentos geomorfológico e de uso da terra nos distintos cenários, 1953
(Figuras 10 e 11), 1965 (Figuras 12 e 13), 1995 (Figuras 14 e 15), além da representação
cartográfica do uso da terra para o ano de 2006 (Figura 16), foram organizados para que a
análise dos resultados pudesse ocorrer de forma a contemplar as características de evolução
das classes de uso da terra e sua relação com as alterações morfohidrográficas, atentando
para as condições de controle impostas pelas atividades antrópicas sobre os elementos e
atributos do sistema ambiental, derivadas da dinâmica de uso da terra.
Assim, foram delimitados setores de análise na bacia Santa Bárbara, a fim de
facilitar a localização dos fenômenos, auxiliando a interpretação dos documentos
cartográficos. A compartimentação da bacia hidrográfica em setores teve caráter
puramente analítico e levou em consideração as características do sistema ambiental – em
especial a geologia, a geomorfologia e os solos (CUNHA; SILVEIRA, 1997;
RADAMBRASIL, 1986) (Figura 5), além do comportamento do uso da terra observado
durante as atividades de fotointerpretação, uma vez que a dinâmica do uso da terra na bacia
Santa Bárbara esteve, em grande parte, atrelada às condições do sistema ambiental e
também porque as atividades antrópicas apresentaram características distintas dentro da
área em estudo, possibilitando análises de acordo com sua ocorrência, intensidade e
intervenções na morfohidrografia.
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H, A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
98
Dessa forma, a área em estudo foi agrupada em cinco setores que conduziram à
análise dos dados: Setor de várzea, Patamar de expansão urbana leste, Patamar de
expansão urbana oeste, Setor de transição de litologias e Setor de nascentes (Figura 17).
A denominação dos setores pautou-se nas características naturais - em especial a
geomorfologia - bem como sua relação, em alguns casos, com os aspectos
socioeconômicos locais - características de uso da terra - e possui caráter meramente
representativo. A delimitação dos setores encontra-se representada sobre os mapas
geomorfológicos e de uso da terra, facilitando a leitura e a interpretação das informações.
Figura 10: Mapa do Uso da Terra na Bacia do Arroio Santa Bárbara – RS – 1953.
P
ág. 99
Figura 11: Mapa Geomorfológico da Bacia do Arroio Santa Bárbara – RS – 1953.
Pág. 100
Figura 12: Mapa do Uso da Terra na Bacia do Arroio Santa Bárbara – RS – 1965.
Pág. 101
Figura 13: Mapa Geomorfológico da Bacia do Arroio Santa Bárbara – RS – 1965.
Pág. 102
Figura 14: Mapa do Uso da Terra na Bacia do Arroio Santa Bárbara – RS – 1995.
Pág. 103
Figura 15: Mapa Geomorfológico da Bacia do Arroio Santa Bárbara – RS – 1995.
Pág. 104
Figura 16: Representação Cartográfica do Uso da Terra na Bacia do Arroio Santa Bárbara – RS – 2006.
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ANÁLISE DOS RESULTADOS
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Figura 17: Setores de análise dos dados na bacia do Arroio Santa Bárbara.
Fonte: Organizado por Adriano L. H. Simon.
A análise do setor de várzea e dos patamares de expansão urbana leste e oeste
ocorreu sob a perspectiva das intervenções ocasionadas pela evolução da estrutura urbano-
industrial sobre a morfohidrografia. No entanto, o setor de várzea apresentou
transformações vinculadas principalmente às obras de engenharia, voltadas para a
drenagem de terras úmidas, que por sua vez tiveram caráter decisivo na evolução do
aglomerado urbano para além dos limites dos patamares leste e oeste – onde ocorreu a
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germinação do núcleo urbano pelotense – ocasionando o aumento das superfícies
impermeabilizadas nesse segundo setor considerado. Apesar de distinções verificadas nos
mecanismos de controle, conexões intrínsecas puderam ser realizadas sob o ponto de vista
das alterações na estrutura e dos processos naturais na baixa bacia Santa Bárbara, que
engloba o setor de várzea e os patamares de expansão urbana leste e oeste.
Os patamares de expansão urbana leste e oeste, embora caracterizados como
setores diferentes, foram analisados em conjunto, todavia, respeitando as distinções na
dinâmica de uso da terra e nas alterações na morfohidrografia. Essa condição possibilitou
interpretações singulares diante das peculiaridades de cada setor, bem como sua relação
com aspectos gerais de alteração no uso da terra e na morfohidrografia da bacia Santa
Bárbara.
Os setores de transição de litologias e de nascentes, por sua vez, foram analisados
sob a perspectiva da evolução do uso da terra em zonas rurais e das diferentes derivações
geradas pelas técnicas utilizadas no trato de cultivos agrícolas e na silvicultura. Apesar de
diferenciações na característica e na intensidade das alterações morfohidrográficas terem
sido constatadas nesses dois setores, procurou-se estabelecer vínculos que permitiram
compreender a relação dos fenômenos derivados de mecanismos de retroalimentação entre
os elementos e os atributos do sistema ambiental transformados pela ação antrópica.
Torna-se importante ressaltar que a compartimentação da bacia Santa Bárbara em
setores não vem estabelecer uma abordagem reducionista na efetivação da análise dos
dados. Isso porque, de acordo com Morin (2002, p. 103), é preciso haver uma redução
consciente, ou seja, aquela que sabe que é necessário dividir, hierarquizar e selecionar para
que a simplicidade possa reunir-se à complexidade do objeto de estudo, por meio de
contra-processos, que são a comunicação e a articulação daquilo que foi dissociado em um
primeiro momento.
De forma geral, a dinâmica de uso da terra ocorrida na bacia do Arroio Santa
Bárbara – comparada a partir de dados que demonstram o aumento e a diminuição das
classes de uso da terra em km² (Gráfico 3) - destaca a evolução espacial de cinco classes
em especial: (1) residencial, comercial e serviços – identificadas em vários momentos ao
longo do texto como área urbana ou estrutura urbana; (2) as terras de cultura; (3) áreas de
pastagem; (4) cursos de água, lagos e reservatórios e (5) terras úmidas cobertas por
vegetação rasteira.
Fonte: Organizado por Adriano L. H. Simon.
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Os demais usos da terra apresentaram-se coadjuvantes sob o ponto de vista da
dinâmica espacial ocorrida na bacia Santa Bárbara, porém com mesmo grau de interesse e
relevância diante das alterações morfohidrográficas sucedidas. O Gráfico 3 atenta para uma
análise prévia do comportamento do uso da terra que conduz o leitor a um entendimento
primário da dinâmica espaço-temporal ocorrida na bacia Santa Bárbara. Durante a análise
dos setores, primou-se pela contextualização dos padrões de uso da terra por meio de
mapas comparativos e gráficos de evolução espacial, que indicam a porcentagem em
relação ao total de área da bacia e a evolução areal (em km²) de algumas classes mais
representativas.
5.1 O setor de várzea e as alterações morfohidrográficas vinculadas às obras
de engenharia
O desenrolar das alterações morfohidrográficas ocorridas no setor de várzea da
bacia do Arroio Santa Bárbara pode ser compreendido a partir de uma perspectiva
histórico-narrativa, que engloba períodos em que ocorre a implementação dos mecanismos
de controle e a fase das intervenções efetivas destes sobre os elementos e os atributos
naturais, além dos processos derivados, considerando as conseqüências das transformações
impostas ao longo do tempo e sua dimensão espacial. Dessa forma, a análise das alterações
ocorridas no setor de várzea procura constituir uma linha do tempo, lançando mão de
conjugações pretéritas, presentes e, em alguns momentos, futuras, haja vista a necessidade
de predizer prováveis conseqüências advindas das ações atuais.
O setor de várzea localiza-se na porção centro-sul da bacia do Arroio Santa
Bárbara (Figura 17). Encontra-se assentado, predominantemente, sobre depósitos
sedimentares holocênicos, pertencentes à unidade geomorfológica da Planície Lagunar,
que estão temporário ou permanentemente inundados por água de arroios ou lagoas
(RADAMBRASIL, 1986). A morfologia original dessa zona é constituída por superfícies
aplainadas e homogêneas, pouco inclinadas, com altitudes que não ultrapassam os 10m nos
limites com o setor de transição de litologias (De LEON, 1986).
Nessa porção da bacia, a característica estrutural aliada à atuação dos processos
geomorfológicos e hidrológicos foi responsável pela consolidação de uma ampla zona de
terras úmidas, localizada sobre depósitos areno-argilosos e drenada por uma complexa rede
fluvial composta por inúmeros canais de drenagem. Durante as atividades de
fotointerpretação realizadas sobre as aerofotografias do ano de 1953, foi possível constatar
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a existência desses inúmeros canais de drenagem nas terras úmidas do setor de várzea. No
entanto, diante da escala de análise adotada para a presente pesquisa, foram mapeados
apenas os mais representativos.
A superfície de terras úmidas localizada no setor de várzea encontra-se delimitada
por rebordos erosivos que indicam a ação das águas correntes no desgaste dos patamares
leste e oeste, formando zonas de sedimentação e concentração de água. A cobertura vegetal
original predominante nessa porção do setor em questão insere-se na classe de uso das
terras úmidas cobertas por vegetação rasteira (Quadro 6, Figuras 11, 13, 15 e 16) e
corresponde às formações arbustivas e rasteiras adaptadas a variações no nível do lençol
freático e a solos mal ou muito mal drenados. O mapeamento geomorfológico do ano de
1953 (Figura 10) apresenta várias características da morfologia original dessa área, situada
na porção central do setor de várzea, que foi significativamente alterada a partir da
intervenção humana por meio de obras de engenharia.
Acreman; Miller (2006) ressaltam que a maioria das terras úmidas encontra-se
hidrologicamente conectada com outros corpos de água, incluindo rios, lagos, estuários,
lençóis subterrâneos e o mar. O sistema de concentração de água existente na porção
central do setor de várzea da bacia Santa Bárbara apresentava conexão com a rede de
drenagem oriunda dos setores de nascentes, de transição de litologias e dos patamares de
expansão urbana leste e oeste, concentrando a maior parte do escoamento da bacia de
captação do Arroio Santa Bárbara (Figura 10). Além do mais, a interferência das
oscilações do lençol freático exercia aspecto relevante sobre o sistema hidrológico dessa
zona de terras úmidas, controlando o regime de escoamento dos canais e as fases de
desenvolvimento da vegetação rasteira.
O escoamento oriundo dos demais setores da bacia Santa Bárbara era drenado
lentamente pela complexa rede de canais até sua confluência com o curso final do Arroio
Santa Bárbara. Essa conexão ocorria a partir do estreitamento da superfície de terras
úmidas, por meio da aproximação de dois patamares mais elevados existentes na porção
sul do setor de várzea (Figura 10). Tal situação gerava a concentração e o afunilamento do
escoamento superficial para o curso final do Arroio Santa Bárbara até sua foz no Canal São
Gonçalo.
No limite sul do setor de várzea, às margens do Canal São Gonçalo, ocorrem
depósitos flúvio-lacustres, originados do processo de colmatagem da Lagoa Mirim, a partir
da deposição de sedimentos oriundos da dinâmica lagunar Patos-Mirim e da dinâmica
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fluvial de diversos arroios, que têm seu deságüe no Canal São Gonçalo. Essa última porção
do setor de várzea encontra-se coberta por vegetação de banhado que, de acordo com
Menegat (2001, p. 59), “apresenta diferentes fases sucessionais de passagem dos vegetais
de áreas mais úmidas para terrenos um pouco mais secos”.
As espécies herbáceas, que predominam nesse complexo, são fixas ou flutuantes e
se organizam em zonas sucessionais junto às margens de pequenos corpos de água. Esse
tipo de cobertura vegetal foi inserido na classe de uso das terras úmidas cobertas por
higrófitas e higrófilas (Quadro 6, Figuras 11, 13, 15 e 16).
Coates (1976) e Bullock; Acreman (2003) compactuam com o fato de que as
terras úmidas, apesar das inúmeras características e distinções - banhados, várzeas, zonas
de vegetação rasteira, pântanos, brejos, lamaçais e charcos -, possuem funções especiais na
dinâmica fluvial e no aporte de sedimentos em bacias hidrográficas, atuando como
“esponjas” que absorvem a água em períodos chuvosos e úmidos, cedendo quantidades
significativas durante períodos de estiagem a partir da atuação do lençol freático. Os
autores citados apontam também que a manutenção dessas terras de forma integral, ou
mesmo parcial, auxilia no equilíbrio dos processos hidrológicos, principalmente nas
porções mais baixas das bacias hidrográficas.
As terras úmidas cobertas por vegetação rasteira e as zonas de banhado, inseridas
no setor de várzea da bacia do Arroio Santa Bárbara, foram palco de grandes
transformações nos elementos naturais, sobretudo na morfologia original e na rede
hidrográfica. Tais alterações vinculam-se principalmente à efetivação de obras de
engenharia, consolidadas no intuito de proporcionar o crescimento urbano e o
desenvolvimento econômico do município de Pelotas por meio do controle da estrutura e
dos processos naturais da área.
As alterações morfológicas e hidrográficas resultantes das técnicas de apropriação
espacial que propiciam a expansão da estrutura urbana são identificadas em vários estudos,
sob diferentes perspectivas. Rodrigues (2005) procurou reconhecer os sistemas
geomorfológicos em seus diversos estágios de intervenção antrópica na metrópole paulista,
distinguindo os estágios de pré-perturbação, perturbação ativa e pós-perturbação, oriundos
de mecanismos de controle antrópico, identificando fases em que a morfologia apresenta
características originais e antrópicas. Peloggia (2005), em estudos realizados no município
de São Paulo, analisou a ação do homem sobre as formas do relevo, constatando a
modificação e a criação dos processos geomórficos e das formas de relevo pelo homem.
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Estudos recentes, realizados por Oliveira et al. (2006), procuraram constatar e
analisar as modificações impostas à rede de drenagem do Arroio Cadena, no estado do Rio
Grande do Sul, decorrentes da expansão urbana de Santa Maria. Os autores consideraram
três tipos de intervenções nos canais fluviais: Canais Abertos, escoando abertamente, com
modificações nas margens; Canais Fechados, percorrendo a área urbana controlados por
galerias de concreto; Canais Mistos, abertos em alguns trechos e fechados em outros por
galerias setorizadas; além dos Barramentos, realizados em canais fluviais visando ao
controle da vazão. Alterações em planícies de inundação, aceleração dos processos
erosivos e feições erosivas localizadas puderam ser identificadas e foram consideradas
como derivadas das alterações morfohidrográficas resultantes de obras de engenharia
citadas.
Kentula et al. (2004) avaliaram as conseqüências da evolução urbana de Portland
(USA) durante 16 anos (1982-1998) sobre zonas de terras úmidas, uma vez que a expansão
urbana dessa cidade efetivou a modificação e a destruição de muitas áreas temporariamente
alagadas, desencadeando alterações nos processos geomorfológicos e hidrológicos. Os
autores constataram a expressiva redução das zonas de terras úmidas, evidenciando a
destruição e a diminuição areal de algumas dessas áreas destinadas à construção civil, à
ampliação de aeroportos, à construção de estacionamentos, shopping centers, além de
zonas de expansão agrícola.
Os estudos supracitados possibilitam relacionar e, por vezes, compreender como
são instituídas e quais são as conseqüências de muitas alterações morfohidrográficas
identificadas a partir dos mapeamentos geomorfológicos na bacia Santa Bárbara. De
acordo com Peter (2004), o Arroio Santa Bárbara teve uma posição importante na história
da cidade de Pelotas, já que o povoamento inicial estabeleceu-se, em função das
charqueadas, nas várzeas do Canal São Gonçalo, do Arroio Pelotas e do Arroio Santa
Bárbara pelo vínculo com o transporte hidrográfico.
Entretanto, essa mesma posição, fundamental ao fortalecimento da estrutura
urbana pelotense, também foi o vetor das grandes transformações desencadeadas, uma vez
que a malha urbana pelotense, ao extrapolar os limites do patamar onde fora inicialmente
consolidada – a leste do curso –, passou a ocupar as zonas marginais do Arroio Santa
Bárbara. Peter (2004) destaca também que em 1845, 1847 e 1850 foram construídas as
primeiras pontes sobre o arroio, na porção sul do setor de várzea, onde a evolução do
núcleo urbano atingiu primeiramente as margens do curso. Esses acontecimentos indicam
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as primeiras intervenções efetivas sobre o Arroio Santa Bárbara e permitiram a
comunicação com outros municípios vizinhos, além da dinamização da ocupação urbana
nos patamares localizados a oeste do arroio.
A cidade foi se aproximando cada vez mais da várzea do Arroio Santa
Bárbara, que em 1921, já estava completamente envolvido pela malha
urbana na porção sul do setor de várzea. Com a urbanização veio
também a retirada da vegetação original [...]. Ruas foram abertas e
pavimentadas, impermeabilizando ainda mais o solo. Edificaram-se
prédios que dificultavam ainda mais o escoamento natural das águas.
(PETER, 2004, p. 14, grifo nosso).
Simon (2005) explica que as precárias condições sanitárias dos imóveis urbanos
situados às margens do Arroio Santa Bárbara, aliadas ao despejo de dejetos orgânicos por
parte de hospitais e indústrias (essas últimas em incipiente desenvolvimento), acarretaram
no gradual processo de poluição do curso em seu segmento final, tornando o mesmo um
constrangimento para a população local. Aliadas a essa situação, as cheias dos anos de
1914 e 1941, além de outros transbordamentos após precipitações intensas, evidenciavam
as conseqüências do descaso do poder público e da população pelotense com o Arroio
Santa Bárbara.
Diante dessa situação e no anseio pelo desenvolvimento econômico de Pelotas, no
início da década de 1950 foram arquitetados e firmados projetos que propunham a
intervenção nas terras úmidas do setor de várzea, por meio de obras de engenharia que
incluiriam a transposição, a canalização e a retilinização do Arroio Santa Bárbara, além da
construção do Reservatório Santa Bárbara (próximo ao limite norte do setor de várzea),
haja vista que a demanda de água não atendia mais a crescente população pelotense. Tais
ações tinham como objetivo suprir prioridades do poder público municipal como:
(1) a amenização das enchentes que atingiam a área urbana marginal ao Arroio
Santa Bárbara na porção sul do setor de várzea. Uma vez transposto da área central para
um local distante da estrutura urbana, o leito original do arroio poderia ser aterrado,
viabilizando a ocupação urbana;
(2) a drenagem das terras úmidas cobertas por vegetação rasteira na porção central
do setor de várzea, para promover a interligação das zonas de patamares leste e oeste -
predominantemente urbanizadas - e possibilitar a expansão da estrutura urbana e,
(3) como conseqüência das ações anteriores, a consolidação de um vertedouro
para o reservatório Santa Bárbara – cuja construção inicia-se no período de conclusão das
obras de drenagem e canalização do arroio no setor de várzea (SIMON, 2005).
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Scheidleder et al. (1996) destacam que as obras de drenagem sobre terras úmidas
causam a degradação de importantes áreas de retenção de água, onde se concentra grande
biodiversidade que auxilia nas trocas e retenções de nutrientes. Por causa da remoção de
água dessas áreas de inundação efêmeras, aumentam os níveis de escoamento superficial
como também o risco de inundações a jusante. Os autores citados inferem também sobre as
alterações no nível do lençol freático, que tende à diminuição em porções da bacia
hidrográfica atingidas por mecanismos de controle que visam à drenagem de terras úmidas,
desencadeando o desequilíbrio das espécies vegetais e da dinâmica fluvial.
Dessa forma, a partir dos mapeamentos de uso da terra e geomorfológicos
realizados, foi possível definir duas fases que englobam distintos níveis de implantação e
intervenção dos mecanismos de controle no setor de várzea da bacia Santa Bárbara. A fase
inicial ocorre nos dois primeiros cenários analisados, demonstrando as etapas primárias das
obras de canalização e drenagem das terras úmidas. O segundo período se refere as
intervenções em maior escala, evidenciando as derivações da ação humana sobre os
elementos do sistema ambiental no setor de várzea. Apesar da análise dos períodos
distintos, é preciso considerar que os processos decorrentes de intervenções em uma ou em
outra fase mantêm relação direta, em face dos desequilíbrios desencadeados ao longo do
tempo histórico sobre os elementos do sistema ambiental da bacia Santa Bárbara.
5.1.1 Fase inicial das transformações: 1953 e 1965
O mapeamento geomorfológico realizado sobre o cenário de 1953 (Figura 11)
evidencia os primeiros estágios de intervenção antrópica na dinâmica fluvial do setor de
várzea. Verifica-se o início das atividades de canalização do Arroio Santa Bárbara ao longo
desse setor, por meio da construção de um canal retilíneo que efetivou a captação do
escoamento na junção do Arroio Santa Bárbara e Arroio do Meio, ao norte do setor de
várzea – responsáveis pela drenagem dos setores da alta bacia e de transição de litologias –
com o segmento final do Arroio Santa Bárbara – ao sul do setor de várzea – receptor do
escoamento da extensa área de terras úmidas cobertas por vegetação rasteira drenada por
canais de pequeno porte.
Essa etapa das atividades concentrou o escoamento dos cursos à montante em um
único canal artificial, alterando a dinâmica fluvial da área de terras úmidas, pois, estando a
maior parte do fluxo da bacia de drenagem controlada pelo canal em construção, o
escoamento de água e o carreamento de sedimentos pela rede de canais existente sobre os
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depósitos areno-argilosos de superfície sofreriam decréscimos. Tendo sua capacidade de
concentração e escoamento de água diminuída, essa zona estaria suscetível à gradual
ocupação, tanto por avenidas como por lotes urbanos, uma vez que mudanças no regime de
concentração de água e formação de terrenos menos encharcados passariam a ocorrer.
As intervenções iniciais descritas proporcionariam a introdução de outras obras de
engenharia nos anos seguintes, que dariam cabo à drenagem das terras úmidas cobertas por
vegetação rasteira, pois, à medida que a área urbana desenvolvia-se para além das
topografias mais elevadas dos patamares leste e oeste, era necessário o aprimoramento do
sistema viário para interligar os bairros. Tal situação demonstra a intenção do sistema
socioeconômico sobre o sistema ambiental, na aplicação de técnicas que alteram as
características naturais dos elementos e processos físicos, a fim de possibilitar a ocupação e
a utilização dos recursos naturais a favor da manutenção da dinâmica socioeconômica.
O mapa de uso da terra do ano de 1953 (Figura 10) permite verificar a área
ocupada pelas terras úmidas cobertas por vegetação rasteira no setor de várzea. Nele é
possível constatar que a estrutura urbana pelotense envolve os terrenos marginais ao curso
final do Arroio Santa Bárbara – ao sul do setor de várzea – sendo esse o único elo entre as
porções leste e oeste da área urbanizada onde ocorre a maior aproximação dos patamares
mais elevados (Figura 10). Verifica-se também o processo de ocupação urbana às margens
das terras úmidas na porção centro-oeste do setor de várzea, indicando uma tendência a
possível evolução da cidade de Pelotas sobre as superfícies temporariamente inundadas.
A ocorrência de áreas de transição no setor de várzea (Figura 10) também sugere a
evolução das atividades antrópicas sobre as terras úmidas. Apesar de denotarem a
mudança, não passível de identificação, de um tipo de uso da terra para outro, as áreas de
transição identificadas no setor de várzea no ano de 1953 – a partir das atividades de
fotointerpretação – apontam para a pressão da estrutura urbana, principalmente sobre áreas
de campo nativo e zonas de vegetação rasteira.
O mapa geomorfológico de 1953 (Figura 11) apresenta, de forma geral, poucas
alterações na morfologia original do setor de várzea, em comparação aos cenários
posteriores. Ele evidencia, pelo contrário, aspectos do relevo desse setor que contribuíram
para o reconhecimento de suas características naturais e da dinâmica fluvial existente sobre
os depósitos areno-argilosos.
Entretanto, feições antropogênicas derivadas das atividades de canalização
puderam ser constatadas durante as atividades de fotointerpretação. Essas se referem
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principalmente aos pré-aterramentos realizados em alguns pontos, para o início das obras
de construção das BR’s 116 e 392 – na porção norte do setor de várzea – além de
escavações e acúmulo de materiais para a construção de diques marginais ao canal
edificado para a drenagem das terras úmidas cobertas por vegetação rasteira.
No cenário de 1965, a partir da interpretação do mapa geomorfológico (Figura 13)
é possível constatar alterações mais expressivas sobre a morfologia original do setor de
várzea. Comparações realizadas com o mapeamento geomorfológico do cenário de 1953
(Figura 11), para esse setor, evidenciaram a gradual redução das terras úmidas situadas
sobre depósitos areno-argilosos de superfície, possivelmente resultantes das obras de
canalização do Arroio Santa Bárbara.
A análise das aerofotografias do ano de 1965 constatou a diminuição da complexa
rede de canais que drenava essa área, bem como a permanência, apenas, dos cursos de
maior expressão. A coloração heterogênea na cobertura vegetal, verificada durante as
atividades de fotointerpretação, também pode estar relacionada à concentração irregular de
água na superfície das terras úmidas, dando origem a áreas mais encharcadas e outras mais
secas, onde a cobertura vegetal tende a adaptar-se às novas condições impostas.
Com a progressiva redução do nível de água nas terras úmidas, grande parte dos
pequenos canais fluviais componentes da complexa rede hidrográfica do setor de várzea foi
extinta. Como conseqüência desse processo, vários cursos com nascentes nos patamares de
expansão urbana leste e oeste – e que deságuam diretamente na zona inundada – tiveram
seu nível de base local alterado para o canal de drenagem principal, situado em cotas
topográficas inferiores.
Essa situação de alteração no nível de base pode ter contribuído efetivamente para
o desencadeamento de retomadas erosivas dos arroios que deságuam nos terrenos
inundados, provocando o aumento de superfícies erodidas pela ação do escoamento
superficial. Tal característica é verificada no mapeamento geomorfológico de 1965 (Figura
13), sobretudo nas porções oeste e nordeste do setor de várzea, onde o avanço das rupturas
de declive em direção aos patamares leste e oeste demonstra a atuação das águas correntes
sobre terrenos sedimentares que possuem maior suscetibilidade aos processos erosivos.
Tais mudanças nas rupturas de declive podem refletir o ajustamento das vertentes a uma
nova dinâmica de fundo de vale ocasionada pela mudança do nível de base local.
Estudos realizados na cidade de Portland (USA) por Kentula et al. (2004),
procurando constatar a interferência da expansão urbana sobre terras úmidas, indicaram
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que as alterações derivadas das ações antrópicas, diretas e indiretas, sobre as superfícies
temporariamente alagadas ocasionaram a transformação das mesmas em terrenos
hidrogeomorfologicamente atípicos. Essas superfícies atípicas apresentam potencial
ecológico, hidrológico e geomorfológico negativo, devido ao aumento da estabilidade dos
solos – menor permeabilidade e alterações da camada orgânica – e à diminuição no nível
de água superficial e aprofundamento dos terrenos, uma vez que camadas flutuantes de
matéria orgânica e sedimentos tiveram sua sustentação decrescida em virtude da
diminuição da lâmina de água. Esse último fator, assinalado pelos autores, pode estar
vinculado às alterações verificadas nos canais fluviais do setor de várzea e também nos
patamares de expansão leste e oeste da bacia Santa Bárbara, já que o aprofundamento do
vale alterou o nível de base local, levando ao ajustamento dos arroios.
O entalhamento fluvial produzido pelos arroios e o paulatino recuo das rupturas
de declive ocasionaram a deposição do material erodido nas bordas da superfície das terras
úmidas. Esse processo originou o gradual aterramento e diminuição dos depósitos areno-
argilosos de superfície mais antigos, evidenciados na Figura 13, ao longo de todo o setor
de várzea, formando depósitos recentes, derivados da aceleração dos processos erosivos a
partir dos mecanismos de controle antrópico impostos aos processos naturais do sistema
ambiental.
Fica evidente, dessa forma, que a atuação dos mecanismos de controle sobre os
elementos do sistema ambiental pode alterar alguns processos em prol da dinâmica
socioeconômica, sendo que a interferência drástica sobre esses processos condiciona a
ajustes diante das novas características impostas, buscando um novo equilíbrio dinâmico,
que pode muitas vezes confluir em efeitos negativos, como no caso da erosão acelerada
ocorrida sobre os rebordos situados nos limites do setor de várzea.
No mapa de uso da terra do ano de 1965 (Figura 12), a análise voltada ao setor de
várzea aponta para a diminuição das terras úmidas cobertas por vegetação rasteira,
principalmente na porção norte desse setor. Nesse ponto, ocorre a conexão do Arroio Santa
Bárbara como o Arroio do Meio – responsáveis pelo escoamento dos setores de nascentes e
de transição de litologias – e que desaguavam nas terras úmidas cobertas por vegetação
rasteira.
As obras de canalização no setor de várzea iniciam exatamente na junção desses
arroios, fazendo com que o escoamento, que antes se distribuía pela complexa rede de
canais, fosse drenado pelo canal artificial, desencadeando, gradualmente, a drenagem das
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terras úmidas que tornaram-se menos encharcadas, sendo substituídas por zonas de
pastagem e agricultura.
No que tange à ocupação urbana e à progressão espacial das áreas de transição, o
mapa de uso da terra do ano de 1965 (Figura 12) aponta para evoluções pouco
significativas dessas duas classes de uso sobre as terras úmidas localizadas na porção
central do setor de várzea. Essa conjuntura, porém, possui exceções, como no caso do
avanço da área urbana na porção sul do setor em questão, derivado do gradual processo de
aterramento do antigo leito do Arroio Santa Bárbara e do avanço da malha urbana no
sentido dos patamares para o setor de várzea, que nos anos conseguintes tornar-se-ia mais
expressivo.
A análise do mapa geomorfológico do ano de 1965 (Figura 13) evidencia ainda a
evolução das obras de canalização do Arroio Santa Bárbara, iniciadas na década de 1950 e
constatadas no mapeamento geomorfológico do ano de 1953 (Figura 11). A transposição
do curso final do arroio para um local distante do adensamento urbano foi efetivada a partir
da ampliação do canal artificial até a foz, no Canal São Gonçalo. Para isso, cortes na
topografia – localizada à margem oeste do curso final do Arroio Santa Bárbara – foram
realizados (Figura 13, sul do setor de várzea), possibilitando a passagem do curso
retilinizado e seu escoamento até o São Gonçalo.
Durante as atividades de fotointerpretação sobre o cenário de 1965, constatou-se
que as obras de canalização encontravam-se parcialmente concluídas e o curso final do
Arroio Santa Bárbara, interceptado pela transposição, teve sua contribuição ao escoamento
final da bacia Santa Bárbara significativamente reduzido, passando a drenar apenas o
escoamento pluvial urbano, tornando-se assim um canal abandonado. Essas afirmações
sustentam-se na constatação de mecanismos de controle impostos ao curso final do Santa
Bárbara, como a construção de diques – marginais ao curso retilinizado – que desviaram o
escoamento, subtraindo-o do segmento final do Arroio Santa Bárbara.
Nos anos seguintes, galerias subterrâneas foram construídas para realizar o
escoamento pluvial, possibilitando a ocupação do leito aterrado, na porção sul do setor de
várzea. Tais alterações na dinâmica fluvial, porém, não foram suficientes para evitar a
continuidade das enchentes, uma vez que as condições morfológicas naturais continuaram
a conduzir o escoamento superficial para o fundo de vale então aterrado, causando
alagamentos após períodos de precipitação intensa (PETER, 2004).
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
119
Obras de canalização como as efetivadas no setor de várzea da bacia Santa
Bárbara são consideradas inadequadas por vários profissionais, pois podem confluir em
efeitos prejudiciais ao sistema ambiental, como degradação estética da paisagem,
retomadas erosivas e deposição acelerada de sedimentos, além de impactos em
ecossistemas aquáticos e subaquáticos existentes na planície de inundação (Cunha, 2001;
Coates, 1976, Christofoletti, 1980). O controle exercido sobre a dinâmica fluvial, por
intermédio dessas obras de engenharia, desencadeia alterações nos fluxos de matéria e
energia pelo sistema, alterando as características dos processos naturais por meio da
transformação dos mecanismos de transporte e deposição dos sedimentos.
Simultaneamente à finalização das ações de canalização e de retilinização do
Arroio Santa Bárbara (no final da década de 1960), são iniciadas e concluídas as obras do
reservatório homônimo, arquitetado para prover água à crescente população urbana e à
iminente evolução industrial pelotense. Sua construção ocorreu no limite norte do setor de
várzea, sobre terrenos temporariamente alagados, onde se dá a confluência de dois arroios
– Santa Bárbara e Arroio do Meio (Figura 13) – que respondem pelo escoamento
proveniente dos setores de transição de litologias e de nascentes.
As obras de estruturação do reservatório puderam ser identificadas durante as
atividades de fotointerpretação no cenário de 1965, mediante aterramentos efetivados para
a construção de estradas, além do aprofundamento do leito do Arroio Santa Bárbara e da
construção da barragem. O término das obras de edificação do reservatório viria a
completar os planos de drenagem das terras úmidas do setor de várzea, pois todo o
escoamento superficial à montante desse setor seria captado pelo reservatório e conduzido
pelo canal principal até a foz, no Canal São Gonçalo, sem conexões diretas com as terras
úmidas cobertas por vegetação rasteira, controlando o escoamento superficial por meio de
válvulas (reservatório e canal), que alterariam a dinâmica dos elementos e atributos do
sistema ambiental em prol da evolução dos elementos do sistema socioeconômico.
5.1.2 Intervenções em maior escala no cenário de 1995 e nas representações
cartográficas de 2006
A conclusão do Reservatório Santa Bárbara ocorreu no dia sete de novembro do
ano de 1968 (PETER, 2004) e sua área de inundação corresponde a aproximadamente 2,76
km
2
. Os mapas de uso da terra e geomorfológico do ano de 1995 (Figura 14 e 15)
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
120
apresentam a localização do Reservatório Santa Bárbara na porção norte do setor de
várzea.
O lago formado a partir da interceptação do escoamento do Arroio Santa Bárbara
alterou o nível de base local dos cursos situados à montante, regulando também os fluxos
de água e sedimentos liberados para o Canal Santa Bárbara, localizado à jusante do
reservatório em direção ao canal São Gonçalo – foz da bacia em questão. Retomadas
erosivas nos cursos que deságuam no reservatório, oriundas de mecanismos de
retroalimentação, condicionaram a modificação de alguns vales com fundo plano
(identificados nas figuras 11 e 13) para vales com seção transversal em “V” (Figura 15),
demonstrando o aumento do potencial erosivo e o conseqüente aprofundamento do leito
dos arroios após a construção do reservatório. Essa situação convergiu no aumento das
rupturas de declive nas circunvizinhanças do reservatório, além do desgaste e do recuo de
rebordos erosivos já existentes e identificados nos mapeamentos geomorfológicos
anteriores, indicando a aceleração dos processos erosivos (Figura 15).
A retomada erosiva de muitos dos arroios após a alteração do nível de base –
principalmente em terrenos sedimentares que apresentam maior suscetibilidade aos
processos denudacionais – pode diminuir o tempo de vida de reservatórios. Procurando
identificar os depósitos tecnogênicos do reservatório Santa Bárbara, Korb (2006) realizou a
análise de testemunhos geológicos na área em questão.
A autora citada optou pela coleta de amostras subsuperfíciais, cobertas pela
lâmina de água, abaixo da interface sedimento/água, que “apresentam características que
foram determinadas pelos processos deposicionais que atuaram e atuam” (KORB, 2006, p.
98). A desembocadura dos afluentes teve escolha primordial para a realização das
testemunhagens, diante do aporte de sedimentos provindos dos arroios e, também, por
representarem os locais onde alterações na dinâmica erosiva podem ser identificados com
maior ênfase, a partir da análise das características dos testemunhos que destacam a
intensidade da interferência das atividades antrópicas sobre os processos erosivos.
A partir da análise da coloração dos grãos, granulométrica, da identificação dos
artefatos tecnogênicos, do teor de matéria orgânica e de metais pesados, Korb (2006) pôde
demonstrar a existência um passado recente de intervenções em menor escala na bacia
Santa Bárbara, com presença esparsa de materiais de origem antrópica em níveis mais
profundos dos estratos coletados (abaixo de 0,32 cm).
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
121
Nos estratos mais superficiais coletados, localizados acima daquilo que Korb
(2006) denomina de “limite da fase menos antropizada” (acima de 0,32 cm), entretanto,
foram encontrados sedimentos com texturas e constituições que indicam aumento dos
processos erosivos, possivelmente efetivados pela dinamização do uso da terra pelas
atividades agrícolas e de silvicultura e também pela reativação fluvial dos arroios da bacia
Santa Bárbara.
Nesses estratos superiores, a autora citada pôde indicar também a presença de
artefatos e estruturas que comprovam a influência direta das atividades humanas sobre a
formação dos depósitos sedimentares no reservatório, como fragmentos plásticos,
fragmentos de madeira, fibras vegetais, matéria orgânica, entre outros. Essa situação
expressa a interferência dos padrões de uso e de ocupação da terra – enquanto mecanismos
de controle humano – sobre a morfologia original e a dinâmica fluvial, confluindo em
considerações que demonstram que a rápida dinâmica de uso da terra ocorrida na bacia
Santa Bárbara, durante o período analisado pelos mapeamentos, teve significativa
influência na aceleração dos processos erosivos da área, evidenciando que as camadas
depositadas no reservatório comprovam a aceleração dos processos de controle e
degradação ambiental.
A conjuntura verificada por Korb (2006) encontra-se vinculada também às
características de uso da terra no setor de várzea em 1995 (Figura 14). Nesse cenário o
comportamento do uso da terra apresenta-se mais fragmentado em comparação aos
cenários de 1953 e 1965 (Figuras 10 e 12). Na porção norte do setor citado, houve uma
evolução significativa das áreas de silvicultura sobre áreas de pastagens, condição
decorrente da diminuição da contribuição da atividade pecuária na economia pelotense.
Áreas de transição persistem, sobretudo, na margem leste do setor de várzea e nas
proximidades do reservatório. As atividades de fotointerpretação realizadas sobre o cenário
de 1995 indicaram que essas áreas de transição englobam características rurais e urbanas,
ou então glebas de silvicultura com pequenas áreas de cultivo agrícola, porém não se
caracterizando em uma única atividade de uso da terra passível de classificação dentro da
proposta de Anderson et al. (1979).
O mapa de uso da terra do ano de 1995 (Figura 14) também evidencia a esparsa
cobertura vegetal nas margens do reservatório Santa Bárbara, restringindo-se às margens
de alguns cursos que deságuam no lago artificial. A fragilidade dos terrenos desprovidos de
cobertura vegetal, diante dos processos erosivos, pode ter contribuído para o aumento das
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
122
rupturas de declive identificadas no mapa geomorfológico de 1995 (Figura 15). Aliada a
quase ausência de uma cobertura vegetal que garanta a proteção do manto intempérico, a
evolução das áreas de silvicultura também pode estar contribuindo para a dinamização dos
processos erosivos nas proximidades do reservatório Santa Bárbara.
As características das glebas de silvicultura nessa porção do setor de várzea,
constatadas durante os trabalhos de campo, demonstram o plantio das árvores em linhas, na
direção dos caimentos topográficos, fato que promove a aceleração dos processos erosivos
por meio da formação de sulcos erosivos e ravinamentos. Embora a declividade dos
terrenos não seja pronunciada, a estrutura dos solos – arenosos e com baixa constituição
argilosa e material orgânico – contribui para a remoção efetiva do manto intempérico,
sobretudo quando esse se encontra desprovido de uma cobertura vegetal desejável ou então
de um manto de serrapilheira que atue contra a ação dos processos erosivos.
A Figura 18 corresponde à representação atual das alterações na morfohidrografia
do setor de várzea, mesclando dados orbitais com a simbologia aplicada aos mapeamentos
geomorfológicos e as informações obtidas durante os trabalhos de campo. A Figura 18 (1)
demonstra as características da porção norte do setor de várzea no ano de 2006, apontando
para processos de desbarrancamento nas margens do reservatório Santa Bárbara.
Essas formas erosivas ocorrem devido à união de dois aspectos do reservatório:
(1) as variações na lâmina de água – decorrentes de períodos de estiagem ou de
precipitações intensas – e as pequenas ondas formadas no reservatório – causadas pela
variação na intensidade dos ventos; e (2) a escassez de vegetação marginal capaz de conter
o solapamento basal das margens do reservatório e o conseqüente desmoronamento do
material sobrejacente que contribui para o assoreamento do lago. Maiores análises dessa
representação cartográfica confirmam ainda as áreas esparsas de cobertura vegetal, bem
como a proximidade de atividades de mineração para a extração de areia nas margens do
reservatório.
Porém, modificações mais expressivas no uso da terra, identificadas nos
mapeamentos dos anos de 1995 (Figura 14) e 2006 (Figura 16), ocorreram na porção
central do setor de várzea, onde nos cenários anteriores predominavam as terras úmidas
cobertas por vegetação rasteira. A diminuição da área de vegetação rasteira é inversamente
proporcional ao aumento da área urbana e das condições de controle impostas sobre o
sistema morfohidrográfico para que essa característica de evolução espacial pudesse
ocorrer.
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
123
A Figura 19 apresenta a evolução espacial das terras úmidas cobertas por
vegetação rasteira e da área urbana (residencial, comercial e serviços) na bacia do Arroio
Santa Bárbara. Apesar de abranger toda a bacia Santa Bárbara, a figura torna possível a
constatação da dinâmica de uso da terra ocorrida nas porções que contemplam o setor de
várzea, diagnosticando o expressivo aumento da área urbana e a drástica redução dos
depósitos recentes de superfície, que foram encobertos por aterramentos para a
consolidação de lotes urbanos e vias de circulação. Esse processo é resultante dos
mecanismos de controle que efetivaram a drenagem das terras úmidas e propiciaram a
expansão urbana no setor de várzea. Em 1953, a superfície ocupada pela estrutura urbana
na bacia Santa Bárbara correspondia a 13,02 Km², sendo que em 2006 a área total ocupada
por instalações urbanas é de 17,74 Km² (Figura 19).
Figura 18: Representação Cartográfica das Principais Alterações Morfohidrográficas no Setor de Várzea da Bacia do Arroio Santa Bárbara –
RS – 2006.
Pág. 124
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
125
Figura 19: Evolução espacial do uso da terra urbano e das terras úmidas cobertas por vegetação
rasteira na bacia do Arroio Santa Bárbara, Pelotas – RS (1953-2006).
Fonte: Organizado por Adriano L. H. Simon.
O mapa geomorfológico do ano de 1995 (Figura 15) demonstra, além das feições
antrópicas derivadas do processo de canalização do arroio Santa Bárbara, outras formas
artificiais oriundas das intervenções humanas sobre o sistema ambiental na porção central
do setor de várzea e que contribuíram para a alteração da dinâmica fluvial e das
características da morfologia original.
A drenagem das terras úmidas cobertas por vegetação rasteira obteve êxito sob o
ponto de vista das intenções do poder público, a partir da canalização do Arroio Santa
Bárbara e da construção do reservatório homônimo. Entretanto, o escoamento pluvial e o
escoamento de pequenos cursos fluviais com nascentes no setor dos patamares leste e oeste
continuaram a ocorrer sobre resquícios de terras úmidas situadas sobre formações areno-
argilosas de superfície.
Dessa forma, canais de pequeno porte foram construídos para drenar as porções
de terras úmidas ainda existentes até o canal principal. A Figura 15 evidencia alguns desses
canais enquanto a Figura 18 (2) apresenta de forma mais detalhada a gama de cursos
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
126
artificiais construídos e que muitas vezes não foram passíveis de identificação durante as
atividades de fotointerpretação.
Sobre essas superfícies drenadas foram sendo constituídas, ao longo do processo
de evolução da estrutura urbana pelotense, ruas e avenidas que consolidaram a interligação
de bairros, que até então possuíam ligação apenas pelas pontes que cortavam o antigo
curso do Arroio Santa Bárbara, na porção sul do setor de várzea. A construção dessas vias
de circulação – como as Avenidas Getúlio Vargas e Theodoro Müller – lançou mão de
aterramentos que permitiram sua retilinidade além de sua construção em níveis altimétricos
superiores ao da zona inundável. Porém, seccionaram ainda mais a zona de terras úmidas,
condicionando o escoamento dos canais à interceptação por pontes e dutos.
De acordo com Coates (1976), os aterramentos e cortes decorrentes da construção
de estradas e também das redes ferroviárias alteram a rota do escoamento superficial e
subsuperficial, afetando a estabilidade das vertentes e as características da rede de
drenagem. O autor citado ressalta ainda que processos erosivos concentrados podem
ocorrer quando sistemas de drenagem artificiais e naturais não são resistentes à contenção
de excessos de água.
A consolidação dessas vias de circulação abriu espaço para a efetivação de
aterramentos destinados a expansão dos lotes urbanos sobre as áreas antes ocupadas pelas
terras úmidas. O mapa geomorfológico de 1995 (Figura 15) evidencia, a partir da
simbologia própria, as características impostas a essa zona em virtude dos aterramentos
processados. Relacionando as características geomorfológicas representadas na Figura 15
àquelas representadas nas Figuras 11 e 13, constata-se a gradual diminuição em superfície
dos depósitos arenosos, os quais foram recobertos por aterramentos que destruíram a
vegetação rasteira típica desse setor.
A forma quase retilínea das superfícies aterradas comprova a interferência direta
dos mecanismos de controle antrópico sobre essa área. A Figura 18 (2) utiliza a simbologia
empregada nos mapeamentos geomorfológicos para representar as feições geomorfológicas
originais e o modelado de origem antrópica, caracterizado tanto pelos aterramentos para a
expansão da área urbana, como pelas elevações e cortes efetivados durante a construção
das vias de circulação.
Fujimoto (2005) ressalta que os arruamentos, mesmo quando respeitando a
topografia, cortam e direcionam os fluxos de água, gerando padrões de drenagem
artificiais. As ruas transformam-se em leitos pluviais direcionando fluxos que, em sua
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
127
morfologia original, possuíam um sistema de drenagem diferente. A autora citada explica
ainda que os aterros recobrem a vegetação e os materiais de cobertura superficial de
formação natural, criando áreas de descontinuidades entre materiais heterogêneos, além de
elevarem altimetricamente a superfície original, alterando sua declividade e drenagem
superficial. Todas essas características de interferência atuam diretamente na
morfodinâmica do sistema, reduzindo ou aumentando as taxas de erosão e deposição de
materiais, que vão, em conseqüência, influenciar na dinâmica fluvial.
De acordo com Peloggia (2005), a ocupação urbana e sua expansão periférica,
especificamente, introduzem elementos perturbadores da topografia ao desenvolver formas
de erosão e modelados específicos, decorrentes das formas de ocupação de encostas
(favorecendo o desequilíbrio das vertentes) e das várzeas, a partir da retificação dos canais
fluviais e o aterramento “em lençol” das planícies. Para o autor citado, as planícies fluviais
quaternárias são transformadas em verdadeiras “planícies tecnogênicas” e encontram-se,
normalmente, soterradas por terraços antrópicos derivados de aterramentos generalizados,
que destruíram os níveis dos terraços originais, os diques marginais e os brejos inundáveis,
além da estrutura pedológica local, alterando a dinâmica fluvial.
A Figura 18 (3), por sua vez, representa o segmento final da bacia Santa Bárbara,
na porção sul do setor de várzea, onde ocorrem terras úmidas cobertas por higrófitas e
hidrófitas – denominados regionalmente de banhados. Nessa porção do setor de várzea, a
evolução do aglomerado urbano não possuiu extensão areal significativa, entretanto,
consolidou-se de forma extremamente agressiva, por meio de aterramentos não planejados
que ameaçam esse ecossistema sensível a pequenos desequilíbrios (Figuras 11, 12, 13 14,
15 e 16, ao sul do setor de várzea). Com o desenvolvimento da urbanização precária, todo
o sistema de esgoto e lixo é direcionado para os banhados, provocando uma série de
impactos ambientais como a poluição das águas, a quebra na cadeia alimentar e a
proliferação de roedores, conforme constatados em diálogos com os moradores locais.
A realização dos trabalhos de campo possibilitou a verificação da precariedade
das ocupações irregulares nessa porção do setor de várzea. Aterramentos inconsistentes,
realizados com o auxílio de materiais heterogêneos como lixo, restos de construção e
troncos de árvores, formam um aglomerado que sustenta as construções sobre terrenos
úmidos onde prevaleciam áreas de banhado.
A construção de rodovias de grande importância regional, como a BR 392,
responsável pela ligação com o Porto de Rio Grande, além dos aterramentos consolidados
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
128
para a construção de vias férreas causaram o seccionamento das zonas de banhado,
conforme evidenciam as Figuras 15 e 18 (3). Essas obras de engenharia acarretaram em
desequilíbrios na dinâmica fluvial dessa área, uma vez que a deposição de sedimentos e
matéria orgânica oriunda desse processo sofreu interferência dos aterramentos efetivados,
levando a diminuição do encharcamento de algumas dessas superfícies e também a
degradação estética da paisagem de banhado.
O setor de várzea da bacia Santa Bárbara passou por grandes transformações que
alteraram as características dos elementos do sistema ambiental. A interferência antrópica
pelos mecanismos de controle, ao longo do período analisado, provocou a modificação dos
atributos desses elementos, que eram responsáveis pelos processos naturais e que
mantinham o equilíbrio da dinâmica erosiva e fluvial dessa área, além da manutenção de
uma estrutura que respondia a essa estabilidade, adaptando-se a pequenas variações de
ordem natural. O controle antrópico, porém, reajustou os elementos naturais aos novos
processos, acelerados ou retardados pelos mecanismos implantados (aterramentos,
barragens e canalização), criando dinâmicas diferenciadas que se estabeleceram em prol da
evolução do sistema socioeconômico, definidas pelas atividades de uso da terra.
Essa evolução, porém, foi vetor de desequilíbrios decorrentes da busca dos
elementos naturais e seus atributos ao novo perfil de equilíbrio que foi sendo moldado
pelas intervenções humanas. Esse novo perfil pode ser caracterizado pelas taxas de erosão
aceleradas nas margens do reservatório – devido à ausência de cobertura vegetal
satisfatória -, pela resposta dos cursos de água ao novo nível de base local demarcado, pelo
recuo e aumento no número de rupturas topográficas não somente no setor de várzea e
também pela alteração na dinâmica fluvial em todo o setor de várzea. Essa situação ocorre
em conseqüência da implantação de mecanismos de controle, como as obras de
retilinização, canalização e interceptação de cursos de água, que foram, progressivamente,
transformando os fluxos de escoamento de água e sedimentos pelo setor de várzea, bem
como pela bacia Santa Bárbara, enquanto sistema inerente a ação de mecanismos de
retroalimentação.
5.2 Evolução da estrutura urbana nos patamares leste e oeste
Os setores dos patamares leste e oeste (Figura 17), embora considerados de forma
distinta devido a suas segmentação espacial, possuem características comuns que
possibilitam uma análise integrada, porém, respeitando suas particularidades. A área
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
129
delimitada pelos setores em questão encontra-se assentada sobre litologias sedimentares
pleistocênicas, pertencentes à unidade geomorfológica da Planície Alúvio-Coluvionar,
inserida, por sua vez, na região geomorfológica da Planície Costeira Interna
(RADAMBRASIL, 1986).
A morfologia dessas áreas é caracterizada por ondulações mais suaves e planas,
com vertentes retilíneas alongadas, conectadas a vales com fundo em V nas nascentes –
evidenciando entalhamentos fluviais – e com fundo plano nas zonas de contato com o setor
de várzea, onde ocorre deposição de materiais. As linhas de cumeada, quando
representativas, se apresentam suaves, indicando, de forma pouco precisa, a divisão da
direção do escoamento superficial. O contanto das superfícies planas dos patamares de
expansão urbana leste e oeste com as terras úmidas do setor de várzea ocorre por meio de
rupturas de declive suaves – 3 a 5m – que em alguns pontos adquirem características mais
abruptas (> 5m), (De LEON, 1986).
A consolidação do núcleo urbano pelotense e sua expansão ocorreram
primeiramente nas zonas de patamar leste e oeste, cuja característica plana dos terrenos
propiciou a estruturação dos arruamentos que definiram o traçado urbano de Pelotas. A
evolução dessa estrutura urbana foi viabilizada a partir da década de 1950, quando
iniciaram-se as obras de drenagem do setor de várzea e a construção de avenidas
conectando os patamares leste e oeste, possibilitando o avanço de loteamentos regulares, e
também clandestinos, sobre as terras úmidas cobertas por vegetação rasteira.
Os mapas de uso da terra dos anos de 1953, 1965 e 1995 (Figuras 10, 12, 14) além
da representação cartográfica do uso da terra no ano de 2006 (Figura 16) evidenciam o
processo de expansão da área urbana pelotense na bacia do Arroio Santa Bárbara,
sobretudo nos patamares leste e oeste. A Figura 19 apresenta esse fenômeno por meio da
comparação da evolução espacial da área urbana em 53 anos, discriminando uma evolução
areal de 4,72 Km².
No patamar leste (Figura 17) as áreas ocupadas pela estrutura urbana estiveram,
em todos os cenários avaliados, freqüentemente acompanhadas por áreas de transição, que
indicam a passagem de uma classe de uso da terra para outra. Essas áreas de transição
apresentaram um comportamento espacial variável durante o período analisado pelos
mapeamentos, possuindo dimensão areal e concentração espacial consideráveis nos
cenários de 1953 e 1965 (Figuras 10 e 12), sugerindo que transformações no uso da terra
encontravam-se em andamento, definindo novos padrões de ocupação espacial. Já nos
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
130
mapeamentos de 1995 e 2006 (Figura 14 e 16), nota-se a gradual fragmentação dessas
áreas, bem como a sua substituição, especialmente pela estrutura urbana pelotense.
Essa situação permite diagnosticar que as áreas de transição no patamar leste
cedem espaço à expansão urbana, fato que já vinha sendo constatado durante as atividades
de fotointerpretação dos cenários de 1953 e 1965, quando se observou que as superfícies
qualificadas como áreas de transição possuíam uma interação entre qualidades campestres
e aspectos urbanos. Ressalta-se aqui que essa é a área de ocupação mais recente da cidade
de Pelotas – correspondente ao bairro Três Vendas – onde, sobretudo a partir da década de
1970, desenvolveram-se vilas e condomínios, conjuntos habitacionais e zonas de comércio
que fortaleceram a expansão urbana sobre áreas de pastagem e silvicultura, ocupando
também zonas antes destinadas às atividades agrícolas. A realização de trabalhos de campo
no patamar leste permitiu constatar que as áreas de transição presentes atualmente nessa
porção da bacia continuam caracterizadas pela mescla da estrutura urbana com aspectos
rurais, sobressaindo-se o gradual avanço da estrutura urbana.
No patamar oeste (Figura 17) os mapeamentos de uso da terra indicam, pelo
contrário, reduzida predominância de áreas de transição, apontando para uma estrutura
urbana cristalizada que manteve, em geral, as mesmas formas e dimensões areais nos
quatro cenários de uso da terra analisados (Figuras 10, 12, 14 e 16). Tal característica
decorre do fato de que nesse setor a ocupação urbana é mais antiga – correspondente ao
bairro Fragata – tendo ocorrido já nos primeiros anos da formação da cidade de Pelotas ao
longo das rotas estabelecidas entre o município com outras regiões do estado e que, aos
poucos, foram concentrando aglomerações em suas circunvizinhanças. Entretanto, a
evolução urbana no patamar oeste também pôde ser constatada, sucedendo-se,
principalmente sobre o setor de várzea, onde predominavam terras úmidas cobertas por
vegetação rasteira.
A análise dos mapeamentos de uso da terra no patamar oeste demonstra ainda a
ocorrência de áreas industriais no cenário de 1995 (Figura 14), apontando para sua
evolução no ano de 2006 (Figura 16). As terras ocupadas por atividades industriais tiveram
seu desenvolvimento impulsionado a partir da década de 1970 (VIEIRA, 1994) quando
áreas residenciais, comerciais e de serviços foram, paulatinamente, cedendo espaço à
evolução de estruturas industriais que, em Pelotas, encontram-se vinculadas ao
processamento de frutas e outros gêneros alimentícios, tendo surgido de pequenas
manufaturas que se desenvolveram e assumiram a condição de pólo industrial regional.
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
131
A construção de importantes corredores rodoviários (BRs 392 e 116) também
impulsionou a evolução das áreas industriais, que ocorreu ao longo dessas vias de
circulação devido à facilidade de escoamento de produtos e à maior inserção dessas
indústrias no cenário estadual, decorrente de sua ligação estratégica com o Porto da cidade
do Rio Grande e com a capital do estado, Porto Alegre.
A expansão urbano-industrial pelotense, verificada nos mapeamentos de uso da
terra, condicionou a gradual impermeabilização das superfícies dos patamares leste e oeste,
irradiando-se também para o setor de várzea. Essa dinâmica no uso da terra ocasionou
intensas transformações na morfologia original e na dinâmica fluvial desses setores,
caracterizando-se como principal mecanismo de controle antrópico que desencadeou
alterações nos elementos e nos atributos do sistema ambiental dessa porção da bacia do
Arroio Santa Bárbara.
Araújo et al. (2005) explicam que as alterações hidrológicas na bacia hidrográfica
são intensificadas após a consolidação de aglomerações urbanas. As superfícies
impermeáveis diminuem a capacidade de infiltração do solo e resultam em um grande
aumento no volume do escoamento superficial. Drew (1986) evidencia que os processos
hidrológicos que contribuem para retardar os fluxos de água para o rio, tais como
infiltração e deslocamento do fluxo subsuperficial, são minimizados com a
impermeabilização efetivada pela expansão da malha urbana.
Fujimoto (2002) destaca que o primeiro nível de intervenção do processo de
urbanização sobre os elementos do sistema ambiental corresponde à retirada da cobertura
vegetal original. O segundo nível de intervenção ocorre por meio da criação de uma nova
morfologia, ligada ao meio urbano e, por vezes, às atividades de mineração. A autora
citada explica ainda que, nessa fase, são elaborados grandes cortes e/ou aterros no terreno
para a instalação do sistema viário e posterior instalação das construções. Durante a
instalação das construções, os materiais superficiais são modificados mediante uma nova
distribuição, estruturação dos depósitos e de uma modificação na resistência dos
agregados.
O aumento das edificações provoca uma alteração mais profunda através de
cortes e/ou aterros na morfologia original. Áreas de superfície expostas
aumentam de forma significativa. Ocorrem nos arruamentos e nos próprios lotes
em consideráveis proporções. Dentro das unidades construídas ocorre uma
mescla de unidades habitacionais, superfícies expostas dos quintais e ruas e
cobertura vegetal de gramíneas e áreas verdes (vegetação arbórea e/ou arbustiva
preservada e/ou introduzida), corroborando para distúrbios na
morfodinâmica (FUJIMOTO, 2002, p. 22, grifo nosso).
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
132
Nesse sentido, as principais alterações na morfologia original e na dinâmica
fluvial no setor de patamares de expansão urbana leste e oeste ocorreram a partir da
impermeabilização do solo – que ocasionou transformações na drenagem e no escoamento
superficial e sub-superficial; das modificações impostas aos caimentos topográficos e à
geometria das vertentes, a partir de transformações geomorfológicas derivadas da
estruturação de lotes, ruas e avenidas, que se valeram de aterramentos e cortes na
morfologia original; além da retilinização de cursos de água em alguns pontos ou na sua
integralidade, devido a demasiada aproximação da malha urbana com os canais fluviais.
No patamar leste, as transformações na morfohidrografia foram mais intensas em
face da significativa evolução espacial do aglomerado urbano (Figura 19) que desencadeou
a substituição da cobertura vegetal (campos), áreas de transição e glebas de silvicultura,
por superfícies impermeabilizadas. As alterações têm início de forma pontual a partir do
nivelamento de terrenos e da abertura das vias de acesso, que desconfiguram os caimentos
topográficos originais, procurando manter a regularidade dos lotes diante do aspecto da
morfologia original, conforme constatado durante as atividades de fotointerpretação. A
concentração destas atividades, no entanto, atua diretamente na morfohidrodinâmica em
áreas significativas dentro da bacia hidrográfica.
Piacente (1996) destaca que as atividades humanas em áreas urbanas determinam
a interrupção dos processos naturais, governando também a formação dos solos e
promovendo a introdução de um “solo antrópico” constituído por áreas asfaltadas e outros
tipos de construção. Origina-se, dessa forma, um ambiente artificial, impermeabilizado e
controlado por inúmeros canais que conduzem a drenagem superficial. A morfodinâmica
passa a ser submetida a esses mecanismos de controle, que retardam ou aceleram processos
erosivos condicionando maior movimentação e, ao mesmo tempo, o aumento da
concentração de materiais dentro do sistema.
A impermeabilização da superfície conduz o escoamento superficial por vias
artificiais (arruamentos, valas e canais pluviais), fazendo com que a água das precipitações
percorra em menor tempo o caminho existente entre o ponto de queda da gota e o fundo de
vale que concentra a drenagem. A velocidade do escoamento superficial é elevada nas
superfícies impermeabilizadas e a infiltração é praticamente nula. Ao atingir o limiar com
as zonas não impermeabilizadas, a energia acumulada pelo escoamento superficial torna-se
responsável pela aceleração da dinâmica erosiva nessas superfícies, culminando no
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
133
aumento do número de canais, podendo transformar-se em feições erosivas localizadas
como sulcos e ravinamentos.
Resultados associados a esse processo podem ser verificados a partir da análise
dos três mapeamentos geomorfológicos (Figuras 11, 13 e 15), para o patamar leste,
mediante constatação do aumento da descontinuidade em superfícies, as quais, no
mapeamento geomorfológico de 1953 (Figura 11), apresentavam-se relativamente planas,
com pouca rugosidade. O incremento de superfícies descontínuas pôde ser evidenciado nos
mapeamentos geomorfológicos, a partir das linhas de cumeada e pela identificação de
concavidades nas vertentes, durante a realização das atividades de fotointerpretação.
O cenário de 1965 (Figura 11) aponta para o aumento da rede de drenagem no
patamar leste e para a característica dos fundos de vale que, em sua maioria, apresentam
seção transversal em “V”, evidenciando o trabalho das águas correntes no entalhamento
das superfícies e na aceleração dos processos erosivos. O resultado do processo de
esculturação do relevo realizado pela ação das águas correntes pôde ser constatado no
cenário de 1995 (Figura 15), no qual verifica-se o aumento das rupturas de declive e o
recuo daquelas já existentes, estando esse processo possivelmente relacionado ao
acréscimo das superfícies impermeabilizadas e à aceleração dos processos erosivos
derivados de alterações na dinâmica fluvial.
Torna-se importante ressaltar que as atividades de fotointerpretação revelaram
detalhes da evolução urbana que muitas vezes não puderam ser representados por meio de
mapeamento do uso da terra, mas que possuem destaque na análise das alterações na
morfohidrodinâmica dos setores dos patamares leste e oeste. Essas informações referem-se
principalmente ao aspecto do adensamento urbano que nos anos de 1953 e 1965
apresentava-se de forma menos compacta, com lotes ocupados por poucas residências e
impermeabilização parca das superfícies, sendo constatados resquícios de áreas verdes
entre os lotes e uma estruturação da malha urbana que ainda respeitava os limites com os
fundos de vale.
Nos cenários de 1995 e 2006, entretanto, a interpretação das aerofotografias e das
imagens orbitais evidenciou o adensamento da área urbana pelotense. Foram encontradas
poucas áreas verdes e lotes sem a presença de construções.
A impermeabilização das superfícies e o revestimento dos arruamentos – em sua
maioria asfaltados ou cobertos por paralelepípedos – aumentaram, colaborando para a
intensificação dos processos erosivos nas zonas de contado com as superfícies não-
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
134
impermeabilizadas, uma vez que essa conjuntura propiciou o incremento na velocidade do
escoamento superficial e a diminuição da infiltração no solo. Nos trabalhos de campo
constatou-se que a ocupação urbana ocorreu com maior intensidade nas concavidades de
vertentes que abrigam cursos intermitentes, ou ainda nas margens de canais fluviais de
menor porte, sendo que muitos desses encontram-se controlados por galerias pluviais.
Fujimoto (2002), em estudos que procuraram evidenciar as alterações
geomorfológicas e as transformações na dinâmica fluvial derivadas da expansão e do
adensamento urbano de Porto Alegre, utilizou o esquema dos níveis de intervenção
antrópica sobre a morfologia original para compreender as transformações ocorridas em
sua área de estudo. Dessa forma, a autora citada constatou três possíveis fases de
intervenção antrópica sobre a morfodinâmica, a partir da evolução da estrutura urbano-
industrial:
A Morfologia Original Preservada caracteriza as superfícies que possuem formas
muito semelhantes às originais, cujas intervenções morfológicas não foram de caráter
direto. Trata-se de áreas onde se estende uma cobertura vegetal com significativo nível de
preservação; a Morfologia Original Semi-Preservada corresponde às superfícies que
sofreram intervenções humanas, principalmente lineares (arruamento), e/ou intervenções
por elementos pontuais esparsos, sobre os quais ainda é possível obter informações
relevantes da morfologia original; e a Morfologia Antropogênica, que corresponde às
superfícies que sofreram intervenções antrópicas de forma total ou generalizada. Essas
últimas apresentam esparsa cobertura vegetal e áreas verdes introduzidas no interior dos
lotes urbanos, agregando superfícies com formas de processos atuais criadas pelas
atividades humanas como degraus de corte, superfícies planas e rampas de aterros de
representação areolar significativa (FUJIMOTO, 2002).
Rodrigues (2005), em estudos realizados na região metropolitana de São Paulo,
destaca que a interferência antrópica como ação geomorfológica pode modificar as
propriedades e a localização dos materiais superficiais, interferindo de forma significativa
nos vetores, taxas e balanços dos processos, gerando outra morfologia, concebida como
Morfologia Antropogênica. Tais feições são derivadas da ação direta e indireta dos
mecanismos de controle impostos pelo homem, compreendendo também os processos
derivados a partir da efetivação dessas intervenções.
Dentro de uma análise que buscou a evolução temporal e espacial das alterações
geomorfológicas e hidrográficas decorrentes da expansão da metrópole paulista, a autora
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
135
citada compreende a existência de uma Morfologia Original que, apesar de sofrer
interferências importantes sob o aspecto dos processos, não passou por situações de
controle diretas, como remanejamento de materiais, cortes, aterramentos e substituição por
materiais tecnogênicos. Essa morfologia, interpretada como original, foi reconhecida a
partir da análise do material cartográfico mais antigo que, de acordo com a autora,
apresenta “janelas” ou “chaves” para a caracterização das feições originais.
As intervenções antrópicas, à medida que evoluíam com a expansão da estrutura
urbana, geraram o que Rodrigues (2005) assinalou de Morfologia Antropogênica. A autora
citada destaca que foi possível identificar uma apropriação urbana inicial, ocorrida de
forma seletiva em compartimentos geomorfológicos até a década de 1920, sendo que as
fases posteriores dessa urbanização avançaram sobre áreas menos propícias à expansão
urbana, como no caso das planícies de inundação, desencadeando maiores intervenções
diretas no sentido de propiciar o avanço da estrutura urbano-industrial e confluindo em
formas não-naturais, derivadas do controle antrópico sobre a estrutura e os processos
morfohidrográficos.
De maneira geral, o esquema utilizado por Fujimoto (2002) e a proposta de
Rodrigues (2005) possibilitam o estabelecimento de algumas relações com os resultados
obtidos a partir dos mapeamentos geomorfológicos realizados na área em estudo, e
possuem forte aproximação com os aspectos da expansão urbana ocorrida nos setores dos
patamares leste e oeste, além das transformações derivadas da evolução da cidade de
Pelotas sobre o setor de várzea.
Assim, é possível relacionar o cenário de 1953 (Figura 11) com o nível de
Morfologia Original Preservada de Fujimoto (2002), conectando-se também com as
intenções de Rodrigues (2005) no que tange a Morfologia Original. Muito embora
alterações oriundas das atividades antrópicas possam ser verificadas no ano de 1953, esse
cenário, conforme já assinalado, auxiliou de forma significativa na compreensão das
características originais da área em estudo, principalmente a partir das atividades de
fotointerpretação, concedendo “janelas” e “chaves” para a análise das alterações
morfohidrográficas oriundas dos mecanismos de controle antrópico.
Já os cenários de 1965 (Figura 13) e 1995 (Figura 15) possuem, respectivamente,
ampla relação com os níveis de Morfologia Original Semi-Preservada e os de Morfologia
Antropogênica, evidenciados no trabalho de Fujimoto (2002), enquadrando-se, outrossim,
nas características da Morfologia Antropogênica propostos por Rodrigues (2005),
ANÁLISE DOS RESULTADOS
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136
principalmente nos patamares leste e oeste e no setor de várzea. Isso porque o cenário de
1965 (Figura 13) apresenta a implantação e a evolução das obras de engenharia e da
estrutura urbana, evidenciando mecanismos de controle antrópico que já atuam na
morfohidrodinâmica, inserindo características artificiais nos processos naturais. O segundo
cenário (1995, Figura 15), por sua vez, representa o resultado dos mecanismos de controle
e intervenção antrópica impostos às feições geomorfológicas originais e às características
da dinâmica fluvial, aproximando-se, ou quiçá representando, aquilo que Fujimoto (2002)
e Rodrigues (2005) caracterizam como Morfologia Antropogênica.
A representação cartográfica das alterações morfohidrográficas nos patamares
leste e oeste para o ano de 2006 (Figura 20) caracteriza a situação de controle
antropogênico por meio da inserção da morfografia sobre imagens orbitais que indicam o
uso da terra atual. A Figura 20 (2) expõe de forma mais específica as características do
fundo de vale de um curso de maior porte localizado no patamar leste.
Nela é possível identificar as características do espaço urbano, no que tange ao
seu adensamento, bem como a significativa rede de canais de drenagem derivada da
impermeabilização do solo e que, por sua vez, foi responsável pela aceleração dos
processos erosivos, determinando o aumento do entalhamento produzido pelas águas
correntes sobre as vertentes. Como conseqüência desse processo, ocorrem escalonamentos
nas vertentes (visíveis na figura) formando rupturas de declive suaves que demonstram
desequilíbrios na morfodinâmica resultantes do reajustamento fluvial decorrente das atuais
características de escoamento superficial e subsuperficial, determinados pelo controle
antrópico a partir da evolução da estrutura urbano-industrial.
Figura 20: Representação Cartográfica das Principais Alterações Morfohidrográficas no Setor dos Patamares de Expansão Urbana Leste e
Oeste da Bacia do Arroio Santa Bárbara – RS – 2006.
Pág. 137
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
138
A canalização evidenciada pela Figura 20 (2) insere-se nos planos de drenagem do
setor de várzea, uma vez que o canal fluvial representado contribuía diretamente com a
superfície das terras úmidas, conectando-se, atualmente, com o Canal Santa Bárbara.
Apesar das obras de engenharia que procuraram interferir na drenagem da área, terrenos
úmidos de formação recente ainda persistem e foram identificados durante as atividades de
campo. Nessas superfícies, parte da vegetação original ainda é mantida até o limite do
fundo de vale com as vertentes, apesar das diferentes atividades presentes nessa área, entre
as quais a agricultura, a mineração e o reflorestamento.
No patamar oeste, as alterações verificadas também estão atreladas à expansão
urbana e industrial no sentido dos patamares para o setor de várzea, diferenciando pouco
das mudanças constatadas e descritas para o patamar leste. Tais transformações vinculam-
se, sobretudo, ao aumento no número de canais de drenagem, conforme é possível
constatar nos mapeamentos geomorfológicos dos anos de 1953, 1965 e 1995 (Figuras 11,
13 e 15).
O progressivo acréscimo na rede hidrográfica efetivou a aceleração dos processos
erosivos derivados do entalhamento fluvial, causando o desequilíbrio das vertentes,
acelerando o processo denudativo sobre essas e o conseqüente recuo das rupturas de
declive que demarcam a transição com as terras úmidas cobertas por vegetação rasteira. A
característica desses canais fluviais, que em sua maioria possuem vales com seção
transversal em “V” indicando seu potencial sobre a morfodinâmica, possibilita
compreender os mecanismos que atuaram nos processos erosivos efetivando o
escalonamento das vertentes.
O adensamento urbano nos patamares leste e oeste contribuiu ainda para o
aumento da velocidade no escoamento superficial que, ao atingir as superfícies não
impermeabilizadas, promove a dinamização dos processos erosivos e o aumento no
número das linhas de escoamento perenes e intermitentes que, conseqüentemente, irão
colaborar para a dinamização do desgaste das rupturas topográficas existentes e também
para o surgimento de novos escalonamentos. Cooke; Doorkamp (1974) explicam que a
diminuição na infiltração é a responsável pelo surgimento dessas linhas de drenagem
artificiais e que sua influência na dinâmica fluvial ocorre por meio de enchentes súbitas e
solapamento das margens dos cursos que dão início ao processo de escalonamento das
vertentes, contribuindo para a formação e recuo das rupturas topográficas.
ANÁLISE DOS RESULTADOS
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139
A Figura 20 (1) representa as características da área situada no patamar oeste, em
que a ação das águas correntes condicionou o aumento e o recuo das rupturas de declive.
Nela é possível constatar a significativa rede de canais fluviais e as características da malha
urbana no que tange a sua aproximação com as rupturas de declive que demarcam o limite
com os fundos de vale, não ultrapassando esse limiar.
A atuação dos processos erosivos condicionou a formação de áreas de deposição
de sedimentos na zona de contato com o setor de várzea, no qual prevalece a vegetação
rasteira adaptada a terrenos úmidos. Obras de canalização também são representadas e
compõem os planos de drenagem do setor de várzea, visto que o curso canalizado contribui
de forma expressiva ao escoamento do patamar oeste e desaguava, antes das obras de
canalização, nas superfícies alagadas do setor de várzea, onde se conectava à complexa
rede de canais.
Como se pôde observar, o setor dos patamares de expansão urbana leste e oeste
passou por alterações na morfohidrografia derivadas do controle exercido pelos
mecanismos que compõem a estrutura urbana e sua evolução ao longo de 53 anos. Esses
mecanismos funcionam como dispositivos que comandam a circulação de matéria e
energia pelo sistema, como no caso do controle do escoamento superficial e subsuperficial
por arruamentos, valas e galerias de drenagem, que modificam as condições naturais de
infiltração e atuam diretamente na alteração da dinâmica fluvial. Como conseqüência desse
processo, novas linhas de drenagem surgem como resposta dos elementos naturais e seus
atributos ao excesso de escoamento derivado da impermeabilização das superfícies,
contribuindo para dinamização dos processos erosivos e desgaste de superfícies que, em
cenários pretéritos, possuíam feições morfológicas planas e suaves, com pouca rugosidade.
A interpretação dos cenários geomorfológicos, aliada à compreensão da evolução
areal da estrutura urbana por meio dos mapeamentos de uso da terra, possibilitou
compreender que o controle antrópico sobre os patamares levou a reajustes
morfohidrográficos, que também se vinculam às obras de engenharia e às intervenções
efetivadas no setor de várzea, a partir da drenagem das terras úmidas para a expansão da
área urbana. Em termos de processos conectados a esses reajustes, muitos deles contribuem
para a degradação da paisagem e para o desequilíbrio ambiental, uma vez que ciclos
naturais foram interrompidos e condicionados por forças artificiais que, muitas vezes, não
respondem de forma esperada aos mecanismos impostos, como no caso de enchentes,
assoreamentos em canais artificiais e deterioração das terras.
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
140
5.3 A evolução das atividades agrícolas no setor de transição de litologias e as
transformações na dinâmica fluvial e na morfologia original
O setor de transição de litologias (Figura 17) localiza-se na interface das
estruturas mais resistentes do Pré-Cambriano – inseridas no domínio morfoestrutural dos
Embasamentos em Estilos Complexos – e das litologias sedimentares da Planície Lagunar
(RADAMBRASIL, 1986). A transição dessas estruturas geológicas é caracterizada por
formas medianamente dissecadas, representadas por vertentes convexas e retilíneas mais
alongadas, conectadas a vales com seção transversal plana na maioria dos casos e a topos
com divisores suaves, por vezes formando patamares. O mapa geomorfológico do ano de
1953 (Figura 11) representa características do relevo que se aproximam da morfologia
original da área, apesar das intervenções antrópicas identificadas.
Nesse setor, as alterações morfohidrográficas constatadas encontram-se
vinculadas, sobretudo, à evolução do uso da terra agrícola sobre zonas de pastagem,
conforme apontam os mapas de uso da terra dos anos de 1953 (Figura 10), 1965 (Figura
12), 1995 (Figura 14), bem como a representação cartográfica do uso da terra do ano de
2006 (Figura 16) para o setor de transição de litologias.
Essa situação, especificada pela Figura 21, revela uma mudança no perfil
econômico ocorrida no município de Pelotas a partir da decadência da atividade pecuária –
mantenedora da indústria e do comércio do charque – e do desenvolvimento das atividades
agrícolas, que englobou a inserção de uma série de técnicas de preparo do solo necessárias
à implantação das culturas. A diminuição da área ocupada pelas pastagens na bacia Santa
Bárbara de 19,65 Km² em 1953 para 3,55Km² em 2006 (Figura 21) é uma característica
não somente local, tendo ocorrido ao longo de toda a faixa situada entre o Escudo
Cristalino Sul-Riograndense e a Planície Lagunar como reflexo da crise ocorrida no ciclo
do charque que originou e fortaleceu a sociedade pelotense por mais de um século.
O aumento das terras de culturas – 8,22 Km² em 1953 para 25, 66 Km² em 2006
(Figura 21) – foi acompanhado, sobretudo no setor de transição de litologias, pela
implantação de lavouras de arroz irrigado. Simon (2005) destaca que as características
pedológicas – solos mal drenados a úmidos – além das feições geomorfológicas do setor de
transição de litologias favoreceram a ampliação de extensas lavouras de arroz que
alavancaram o desenvolvimento da indústria de alimentos em Pelotas, com distinção ao
beneficiamento do arroz.
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
141
Figura 21: Evolução espacial das áreas de pastagem e das terras de culturas na bacia do Arroio
Santa Bárbara, Pelotas – RS (1953-2006).
Fonte: Organizado por Adriano L. H. Simon.
Entretanto, a introdução da atividade orizícola foi efetivada por meio de técnicas
de preparo do solo que corromperam as características do relevo e da rede de drenagem,
confluindo em alterações na morfohidrodinâmica da bacia do Arroio Santa Bárbara. A
análise dos mapas geomorfológicos dos anos de 1953, 1965 e 1995 (Figuras 11, 13 e 15,
respectivamente), para o setor de transição de litologias, permite constatar significativas
alterações sobre a morfologia original, sobretudo nas porções leste e oeste do mesmo,
originadas a partir da implementação das lavouras de arroz.
De acordo com Althoff; Kleveston (1996), o preparo da terra para o plantio do
arroz irrigado é realizado em superfícies rasas cobertas por uma lâmina de água, operação
essa conhecida como “lameiro”, que consiste no “alisamento” do solo. Essa atividade é
realizada a partir da utilização de maquinário agrícola para a retirada das irregularidades
topográficas e para o aplainamento das superfícies.
Após a construção dos quadros de cultivo, a água é espalhada pelas superfícies
aplainadas. Como as lavouras de arroz irrigado geralmente ocorrem sobre terras úmidas, a
água que encharca os terrenos mantém-se por um período determinado, em face das baixas
taxas de infiltração decorrentes da proximidade do lençol freático com a superfície.
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
142
Neuman; Loch (2004) explicam que o cultivo do arroz caracteriza-se como um sistema
altamente mecanizado, ocorrendo, na maioria dos estabelecimentos, em quadros
sistematizados denominados de “canchas” ou “níveis”.
Os autores citados explicam ainda que esses quadros correspondem a áreas com
formatos geométricos variados de terra nivelada (com um mínimo de desnível em seu
interior), cercadas por elevações de terras denominadas regionalmente de “taipas” ou
“marrachas”, que têm a função de reter a água no interior dos quadros. As marrachas foram
incluídas na simbologia empregada para o mapeamento geomorfológico, constando no
Modelado antrópico e alterações na topografia, sendo consideradas como terraços de
cultivos. O tamanho dos quadros, delimitados pelas marrachas, está relacionado às
características do terreno, principalmente a desnível e geometria da vertente além do
aspecto da topografia local (Figura 22 (B) e 22 (C)).
Torna-se importante destacar aqui que pesquisas bibliográficas em busca de
estudos que tratassem de alterações morfohidrográficas vinculadas ao cultivo de arroz
irrigado foram efetivadas em diferentes bases de dados nacionais e internacionais, com o
intuito de obter informações que pudessem ser relacionadas com os dados identificados nos
mapeamentos realizados na bacia do Arroio Santa Bárbara. Entretanto, as pesquisas
confluíram em resultados esparsos que, na maioria dos casos, relacionavam-se a poluição
das águas e dos solos, porém sem atentar-se para dados de alterações no relevo e na rede
hidrográfica. Desse modo, esforços foram realizados no sentido de contextualizar as
informações provenientes de fotografias aéreas com as observações de campo e contatos
com profissionais que atuam junto a lavouras de arroz na região de Pelotas, a fim de que as
alterações constatadas no setor de transição de litologias da bacia Santa Bárbara pudessem
colaborar para estudos futuros.
Na bacia do Arroio Santa Bárbara, as áreas destinadas ao cultivo de arroz
possuem duas características distintas (Figura 22 A, B e C). Em alguns casos, a superfície
destinada ao cultivo desse gênero agrícola sofre alterações menos intensas, pois os
caimentos topográficos e a drenagem natural são aproveitados (Figura 22 A). As canchas
de cultivo aparecem em menor número e, quando existentes, apresentam desnivelamentos,
demonstrando a interferência em menor grau nas características topográficas.
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
143
Figura 22: Características das alterações morfohidrográficas desencadeadas pelas lavouras de
arroz na bacia Santa Bárbara, Pelotas – RS.
Fonte: Organizado por Adriano L. H. Simon.
A área de cultivo restringe-se às superfícies inconsolidadas situadas às margens
dos canais, em vales com seção transversal plana, onde ocorrem terras úmidas situadas
sobre depósitos recentes. Lavouras de arroz apresentando esse aspecto possuem menor
ocorrência na bacia Santa Bárbara e foram mapeadas no cenário de 1995 (Figura 15) em
porções isoladas do setor de transição de litologias, no qual foi possível identificar as
irregularidades topográficas formadas pelas marrachas, de acordo com a simbologia
empregada.
As atividades de fotointerpretação evidenciaram que essa modalidade de cultivo
de arroz, um tanto rústica, é praticada geralmente em pequenas e médias propriedades, cujo
maquinário agrícola e investimentos financeiros não possibilitam uma intervenção
morfológica em maior escala. Durante a realização dos trabalhos de campo, buscando
evidenciar as características dessas lavouras, constatou-se que a característica heterogênea
das marrachas – descontinuidades na altura e rompimentos freqüentes – além do aspecto
das canchas de cultivo – desnível interno e maior permeabilidade dos solos – são derivados
de técnicas que não utilizam mecanização intensa e que afetam de forma menos intensa a
morfohidrodinâmica se comparados com os sistemas de cultivo mecanizados.
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
144
O segundo tipo de sistema de cultivo de arroz ocupa extensões maiores e menos
fragmentadas dentro do setor de transição de litologias da bacia do Arroio Santa Bárbara
(Figura 22 B e C). As áreas abrangidas por esse segundo tipo de lavouras de arroz irrigado
encontram-se, predominantemente, sobre depósitos areno-argilosos de superfície onde
havia terras úmidas cobertas por vegetação rasteira (Figuras 11, 13, 15 e 16). As
características das terras úmidas – exposição freqüente do lençol freático e declividade
pouco pronunciada – foram fatores importantes na localização desse cultivo agrícola.
As técnicas agrícolas envolvidas nesse segundo tipo de lavouras de arroz contam
com a utilização de maquinário pesado na preparação das canchas de cultivo e na
construção das marrachas. Os conjuntos de canchas localizam-se geralmente em grandes
propriedades rurais que contam com alta tecnologia para sua implantação e manutenção.
As intervenções na morfologia original ocorrem no sentido de reduzir ao máximo o
desnível entre as canchas, segmentando o terreno em quantas partes forem necessárias,
dependendo da inclinação e da irregularidade da vertente (Figura 22 C).
Coates (1976) afirma que as atividades agrícolas realizadas em terraços, a partir
da segmentação das vertentes, situam-se entre os mecanismos de controle antrópico mais
representativos sob o ponto de vista das alterações nos processos geomorfológicos e na
hidrodinâmica. A manutenção dos terraços de cultivo agrícola requer cuidados constantes e
técnicas aperfeiçoadas. O autor citado identifica dois tipos básicos de terraços agrícolas
durante suas explanações: os bench-type, compreendidos como aqueles realizados em
zonas planas situadas também em terras úmidas, em formato de bancos que circundam
canchas de cultivo; e os ridge-type, realizados em declives acentuados, semelhantes a
sulcos abertos em níveis diferentes devido à reduzida superfície de cultivo.
Durante a realização das atividades de fotointerpretação e dos trabalhos de campo,
verificou-se que os caimentos topográficos originais do terreno são anulados e,
conseqüentemente, o escoamento superficial e subsuperficial sofrem alterações a partir do
momento em que se inicia a contenção da água nas canchas de cultivo e o retardamento de
sua chegada ao leito dos arroios. O reconhecimento das características das marrachas em
lavouras de arroz irrigado, realizadas em campo, constatou sua homogeneidade,
nivelamento e compactação – evitando perdas de água nas canchas – comprovando assim a
eficiência de técnicas mecanizadas na consolidação de feições antrópicas que controlam a
morfohidrodinâmica.
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
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A análise dos três mapeamentos geomorfológicos realizados (Figuras 11, 13 e 15)
permite a identificação das alterações já referidas anteriormente com destaque às porções
do extremo leste e extremo oeste do setor de transição de litologias, no qual superfícies
relativamente planas e com declividade pouco pronunciada (Figuras 11 e 13) foram
ocupadas por canchas de cultivo de arroz. A representação cartográfica das alterações
morfohidrográficas para o cenário de 2006 (Figura 23 (1)) possibilita uma visão mais
detalhada dos quadros onde é praticada a atividade orizícola inserida na segunda categoria
citada. A partir dessa, constata-se a característica de parcelamento das canhas de cultivo,
efetivada pela construção de estradas (por meio de aterramentos) e pela abertura de canais
artificiais que possibilitam a irrigação homogênea das parcelas.
A digitalização das linhas correspondentes aos terraços de cultivo (ou marrachas),
na Figura 23 (1), foi efetuada apenas em alguns quadros para que fosse possível a
compreensão das características dos mesmos a partir da visualização da imagem ao fundo.
A interpretação da Figura 23 (1) evidencia ainda que a área ocupada por lavouras de arroz
varia de acordo com a topografia local, uma vez que o trabalho para a construção das
canchas e a manutenção da irrigação das lavouras em declividades mais acentuadas passam
a apresentar maiores riscos e gastos, além de baixos rendimentos para o produtor. Tal
situação indica que os mecanismos de controle antrópico, por mais interferências que
possam causar à morfohidrografia, ainda encontram-se subordinados por determinantes
naturais.
As alterações na morfologia original, derivadas da atividade orizícola, atuam
conseqüentemente sobre a dinâmica fluvial do setor de transição de litologias. Isso porque,
uma vez que a morfodinâmica sofre interferência antrópica – por meio da transformação de
sua estrutura e dos processos erosivos – o transporte dos materiais pela ação das águas
correntes também é modificado, confluindo na maior concentração de material erodido ou
então na aceleração de sua eliminação para fora do sistema.
A rede de drenagem procura se ajustar às pequenas e grandes transformações,
buscando equilibrar os fluxos oriundos de sua dinâmica sobre as feições do relevo, em face
das transformações realizadas. Essa readaptação aos mecanismos de controle impostos
pelas atividades humanas transmite-se para vários pontos da bacia hidrográfica, uma vez
que a dinâmica fluvial sofre incremento de energia e matéria, atuando de forma mais
intensa nos processos erosivos.
Figura 23: Representação Cartográfica das Principais Alterações Morfohidrográficas no Setor de Transição de Litologias da Bacia do Arroio
Santa Bárbara – RS – 2006.
Pág. 146
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
147
A necessidade de irrigação constante das lavouras de arroz, bem como a oferta
contínua de água para esse procedimento, estimulou a construção de reservatórios
artificiais de água (regionalmente denominados de açudes) para contar com reservas
hídricas em períodos de escassa precipitação (Figura 23 (1 e 3)). A construção dos açudes
utiliza-se das características naturais do setor em questão, no qual ocorrem transições
geológicas, geomorfológicas e pedológicas que permitem a formação de olhos de água
devido à aproximação do lençol freático com a superfície. A intervenção para a construção
de açudes também ocorre diretamente nos arroios de pequeno, médio e até grande porte.
Os mapeamentos geomorfológico e de uso da terra realizados em todos os
cenários avaliados evidenciaram o aumento no número de corpos de água artificiais em
todos os setores de análise, especialmente no setor de transição de litologias, cujo vínculo
com a estrutura constituída pelas lavouras de arroz confluiu no maior controle da rede de
drenagem para a construção de pequenos e médios reservatórios. Em 1953, a área ocupada
por lagos e reservatórios na bacia Santa Bárbara era de 0,30 Km². Nos cenários seguintes
houve um aumento dessa classe de uso:em 1965 ocupava 0,93 Km² e nos cenários de 1995
e 2006 passou a abranger 3,58 Km² e 3,53 Km², respectivamente (Figura 24).
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
148
Figura 24: Evolução espacial das áreas de mata nativa, minas a céu aberto e lagos e reservatórios
na bacia do Arroio Santa Bárbara, Pelotas – RS (2006).
Fonte: Organizado por Adriano L. H. Simon.
Deve-se, obviamente, considerar a construção do Reservatório Santa Bárbara que
ocupa uma área de 2,76 Km². Porém, o restante dos cursos mapeados, mesmo apresentando
ínfimas dimensões areais, apresenta significativos mecanismos de controle impostos à
dinâmica morfológica e fluvial da bacia Santa Bárbara, especialmente àqueles que foram
efetivados de modo a interceptar os arroios para a captação de água. De acordo com Cunha
(2001) e Suguio (2003), a construção de açudes e reservatórios atua diretamente sobre o
ambiente fluvial, acarretando em processos que se desencadeiam tanto na fonte de
interceptação, quanto à jusante e à montante da obra, por meio do reajustamento das
atividades fluviais.
Cunha (2001) destaca que nas porções situadas à montante do barramento ocorre a
elevação do nível de base local, confluindo em alterações na forma dos canais e na
capacidade de transporte de sedimentos. A autora citada complementa afirmando que os
impactos transmitem-se para além do ponto de interceptação, transformando a estrutura das
vertentes. Essa situação pode explicar alterações no comportamento espacial de alguns
cursos da bacia Santa Bárbara, constatados nos mapeamentos geomorfológicos de 1953,
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
149
1965 e 1995 (Figuras 11, 13 e 15), estando vinculados aos barramentos efetivados sobre os
arroios do setor de transição de litologias e principalmente com o reservatório Santa
Bárbara (no setor de várzea), o que atesta a ação dos mecanismos de retroalimentação.
Esses corpos de água sofreram reajustamentos fluviais decorrentes do aumento do
potencial erosivo dos arroios, diante da alteração do nível de base em vários pontos da
bacia hidrográfica, desarticulando, assim, a dinâmica fluvial que procurou seu novo
equilíbrio dinâmico diante das características impostas e que transmitiu os efeitos de
reajustes fluviais para as vertentes por meio de escalonamentos que demonstram o
desequilíbrio nos processos erosivos. A ocorrência desse processo é ainda mais intensa em
litologias sedimentares e em zonas onde ocorrem depósitos recentes, como as encontradas
no setor de transição de litologias, de várzea e de expansão urbana leste e oeste, que
impõem pouca resistência às variações no comportamento espacial dos canais fluviais, uma
vez que o perfil longitudinal desses cursos encontra-se menos subordinado ao controle
estrutural.
A Figura 23 (3) evidencia a alteração na estrutura das vertentes, as quais
vinculam-se indiretamente com a nova dinâmica fluvial dos cursos de água interceptados
por açudagens e que tiveram seu nível de base local alterado. A acentuação da dinâmica
fluvial causa desequilíbrios no fundo de vale que são transmitidos para as vertentes,
dinamizando o recuo de rupturas de declive, que possivelmente já ocorriam nessa zona, e
apresentam-se em sua maioria suaves, mas que, por vezes, possuem caráter mais abrupto,
relacionando-se à resistência do manto de alteração e da litologia local aos processos
erosivos atuantes.
Ainda de acordo com as proposições de Cunha (2001), à jusante do curso
interceptado pelo barramento também ocorrem alterações significativas no que tange aos
fluxos de água e de material erodido. Estudos realizados por Grimshaw; Lewin (1980,
citados por CUNHA, 2001) apontam que, à jusante do curso abordado, a carga de
sedimentos pode ser reduzida em até 90%. Cunha (2001) indica ainda que processos de
entalhe podem ocorrer no segmento inferior a açudagem; entretanto, as características
topográficas e geológicas, além do tamanho e da capacidade de eliminação de água pelo
vertedouro dos açudes mapeados na bacia Santa Bárbara – sobretudo no setor de transição
de litologias – não evidenciam o entalhamento dos arroios à jusante. Essa afirmação
orienta-se pela análise do perfil transversal dos segmentos dos arroios localizados após os
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
150
barramentos e a partir da constatação da permanência, na maioria dos casos, das
características originais dos fundos de vale (Figuras 11, 13 e 15).
Ainda inseridas no conjunto de transformações impostas à morfohidrografia do
setor de transição de litologia, estão as obras de transposição e de retilinização dos arroios
existentes, bem como a construção de demais leitos artificiais. Maiores atenções foram
dispensadas às obras de retilinização e de canalização durante a análise das alterações
morfohidrográficas no setor de várzea.
Entretanto, as características dos canais artificiais verificados no setor de transição
de litologias vinculam-se às atividades agrícolas, complementando a estrutura das lavouras
de arroz, uma vez que a alteração da topografia e das feições geomorfológicas originais
permite a adequação do terreno para o plantio; a construção de açudes garante as reservas
de água, enquanto os canais – articulados de maneira geométrica acompanhando as
canchas de arroz – atuam como “veias” na distribuição de água pelos quadros de cultivo.
Os canais artificiais percorrendo lavouras de arroz são verificados no mapeamento
geomorfológico do ano de 1995 (Figura 15), onde é possível identificá-los integrando as
canchas de cultivo orizícola situadas nas porções extremo leste e extremo oeste do setor de
transição de litologias. A Figura 23 (1) representa de forma mais específica a estruturação
dos canais artificiais pelas lavouras de arroz, apresentando as características geométricas
que favorecem o controle do escoamento de água e de sedimentos, além de sua função no
abastecimento das canchas de cultivo. Na mesma figura, percebe-se ainda a lâmina de água
formada nos quadros de cultivo inundados como resultado das transformações impostas a
partir das intervenções antrópicas.
A canalização dos cursos que participam do sistema de irrigação das canchas de
arroz induz a intensas transformações na dinâmica fluvial, tanto da área submetida
diretamente às modificações, como nas porções à jusante, na qual os cursos artificiais
conectam-se aos arroios que não sofreram intervenção direta. A canalização e a
retilinização conduzem ao aumento da velocidade do escoamento pelos canais, acentuando
seu potencial erosivo em períodos de liberação da água das canchas de cultivo.
Dessa forma, quando a água escoa pelos canais presentes nas lavouras de arroz e é
liberada para fora desses, sua conexão com os cursos não alterados se dá de forma muito
brusca, uma vez que os fluxos de água e sedimento apresentam velocidades superiores às
apresentadas em situações normais. Torna-se importante destacar que o aumento do
potencial erosivo dos cursos fluviais canalizados ocorre apenas quando a água é liberada
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
151
das lavouras de arroz, sendo que, em períodos de concentração de água nas canchas de
cultivo, o escoamento pelos canais artificiais é pouco representativo.
A ação das águas correntes dá-se no sentido do entalhamento do vale não-
transformado – conforme explica Cunha (2001) para os segmentos dos cursos à jusante de
barramentos – e na formação de processos erosivos localizados como sulcos e ravinas,
passíveis de identificação nas Figuras 15 e 23 (1) ao longo do Arroio Santa Bárbara no
setor de transição de litologias. Todas essas constatações, aliadas à ausência de cobertura
vegetal desejável, confluem no aumento dos fluxos de sedimentos transportados pelos
arroios e sua conseqüente deposição no reservatório Santa Bárbara, contribuindo para o
assoreamento do maior corpo de água artificial da bacia – ponto de captação de água para a
população pelotense – e inserindo-se nas constatações de Korb (2006) sobre as rápidas
transformações no uso da terra que resultaram em maiores níveis de sedimentação do
reservatório Santa Bárbara.
Além das feições antrópicas originadas a partir da atividade orizícola –
constatadas no setor de transição de litologias – ocorrem também alterações na topografia
derivadas da construção de estradas de rodagem, principais e secundárias, bem como de
estradas de ferro. A comparação dos mapas geomorfológicos dos anos de 1953, 1965 e
1995 (Figuras 11, 13 e 15), para o setor de transição de litologias, aponta para o aumento
no número de intervenções efetivadas a partir da construção de rodovias federais e de
estradas secundárias que realizam a ligação da área urbana a comunidades interioranas.
Os cortes e os aterramentos realizados para a construção de estradas são
efetivados no sentido de amenizar os efeitos da topografia original, procurando manter um
padrão de retilinidade e ângulos de declividade da pista pouco variáveis. Essa característica
é mais evidente em rodovias pavimentadas (Figura 15, BR 392) e em ferrovias (Figuras 11,
13 e 15, R.F.F.S.A), uma vez que o transporte de cargas e o fluxo de veículos é maior,
implicando, portanto, em maiores intervenções sobre as características morfológicas
originais, bem como sobre a rede de drenagem.
Seppälä (1999) explica que a inserção de grandes rodovias, além de estradas de
acesso internas, deve ser realizada por meio da construção de estruturas que comportem as
cargas que sobre elas circulam. Torna-se complicado, entretanto, acompanhar as formas do
relevo no traçado dessas estradas, uma vez que cortes e aterramentos são necessários para
que ocorram menores gastos e perda de tempo na construção, além de mais agilidade nos
corredores formados para o transporte terrestre. Além disso, de acordo com o autor citado,
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
152
a estrutura dessas estradas não se adequaria às condições topográficas originais, haja vista
que essas requerem bases estáveis e fundamentos que resistam às condições climáticas e
aos processos morfológicos e hidrológicos derivados das variações dos eventos climáticos.
Os aterramentos efetivados para a construção de estradas ocorrem geralmente em
fundos de vale e atuam diretamente sobre a dinâmica fluvial, interceptando os canais
fluviais a partir de dutos e pontes – esses, apenas, no caso de cursos com grande extensão.
Os dutos atuam como soleiras nos cursos interceptados no segmento posterior à
interceptação, podendo ocasionar o aprofundamento do leito, pois, condicionam o
escoamento por passagens mais estreitas, aumentando a energia e a velocidade do fluxo
que, ao vencer esse obstáculo, deságua no segmento inferior com força suficiente para
causar o aprofundamento do leito, acelerando assim os processos erosivos.
Os cortes, por sua vez, realizados na morfologia original para a construção de
estradas atuam no sentido de possibilitar a mínima ondulação das vias de acesso,
conectando-se aos aterramentos produzidos em superfícies deprimidas, como fundos de
vale e planícies de inundação. Essas formas descaracterizam a estrutura das vertentes,
alterando os processos erosivos e a dinâmica fluvial. A Figura 23 (2) aponta para as
características de um fragmento espacial localizado no setor de transição de litologias, em
que os aterramentos e os cortes na topografia confluíram em transformações na rede de
drenagem e na morfodinâmica, interferindo nos processos de transporte e deposição dos
materiais.
Nessa figura são destacados dois segmentos das rupturas de declive que
constituíam o limite entre patamares mais elevados (Figura 23 (2), acima e abaixo), bem
como o fundo de vale com seção transversal plana. Aterramentos e cortes foram efetivados
para a construção da estrada secundária que liga a cidade de Pelotas ao distrito de Monte
Bonito e também para a consolidação da ferrovia Canguçu-Rio Grande, atualmente
desativada. Essas ações exigiram o nivelamento do terreno, gerando cortes sobre os
patamares citados e aterramentos no fundo de vale, além da construção de duas pontes sob
as quais escoa o canal fluvial.
A implantação dessas obras ocasionou a alteração dos caimentos topográficos e
conseqüentes mudanças no escoamento superficial, que se ajustou ao novo perfil da
topografia, originando cursos intermitentes antes não existentes, derivados do controle
imposto pelas feições antrópicas sobre a morfohidrodinâmica local. Os trabalhos de campo
na área possibilitaram a constatação da ação desses mecanismos de controle sobre o
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
153
escoamento nos canais fluviais. As fotografias (D e E), pertencentes à Figura 23 (2),
evidenciam o aspecto de um dos dutos construídos para a passagem da linha férrea
Canguçu – Rio Grande, apresentando também a concentração do escoamento promovida a
partir da redução do seu fluxo no ponto de interceptação, provocando a formação de zonas
de inundação, propícias à deposição de materiais finos a grosseiros.
As alterações morfohidrográficas verificadas no setor de transição de litologias
demonstram o alto grau de controle sobre os elementos do sistema ambiental e também
sobre os atributos desses elementos que se encontram subordinados a mecanismos de
regulação dos fluxos de matéria e energia. A alteração dos processos naturais nesse setor
corresponde às propostas e aos anseios do sistema socioeconômico, porém, demonstra
aspectos de desequilíbrio, inerentes às condições artificiais impostas.
5.4 Setor de nascentes: transformações derivadas das atividades agropastoris
e de mineração
O setor de nascentes localiza-se nas porções noroeste e norte da bacia do Arroio
Santa Bárbara (Figura 17). Encontra-se assentado sobre litologias cristalinas do Pré-
Cambriano, possuindo características geomorfológicas distintas dos demais setores, com
superfícies medianamente dissecadas, típicas da borda oriental do Escudo Sul-
Riograndense (RADAMBRASIL, 1986).
As atividades de fotointerpretação, aliadas aos trabalhos de campo, demonstraram
que nesse setor predominam topos aplainados, formando patamares por vezes
interrompidos por colos – que indicam a existência de seções, nos quais a litologia
encontra-se mais suscetível a ação dos processos erosivos que atuam na formação do
manto intempérico e na sua gradual remoção mediante a ação dos processos denudativos.
A conexão desses patamares com as vertentes ocorre por meio de rupturas de
declive suaves, em sua maioria, podendo-se evidenciar também rupturas abruptas em
alguns pontos onde a resistência litológica se sobressai diante da ação dos processos
erosivos. As rupturas de declive derivam também do ajuste dos canais fluviais às alterações
impostas no nível de base local, por meio de açudes ou barragens de maior porte, ou
encontram-se vinculadas às atividades de mineração. Prevalecem nesse setor vertentes
convexas conectadas a vales encaixados, sobretudo nas nascentes dos principais arroios.
As características litológicas locais tiveram e possuem caráter decisivo diante das
transformações superficiais e das situações de controle antrópico impostas sobre os
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
154
elementos do sistema ambiental no setor de nascentes. Isso porque muitos desses
mecanismos, constatados em maior intensidade nos setores anteriormente analisados,
encontram maiores obstáculos a sua implementação no setor de nascentes no que tange ao
grau de dissecação das superfícies e às propriedades da estrutura litológica – que limita a
intervenção antrópica – atuando de forma relevante na conservação das características
morfohidrográficas originais.
Nas nascentes da bacia do Arroio Santa Bárbara, as alterações morfohidrográficas
foram consideradas menos pronunciadas e arealmente reduzidas, se comparadas às outras
áreas da bacia, vinculando-se principalmente às atividades de mineração de granito (ativas
ou inativas), saibro e argila e à expansão das áreas de agricultura sobre as zonas de
pastagem e vegetação ciliar – causando a diminuição da cobertura responsável pela
proteção dos cursos de água de primeira ordem e o risco de desaparecimento de alguns
desses; além da expansão da estrutura urbana na vila de Monte Bonito, condicionando a
impermeabilização parcial e a degradação da área de nascentes no extremo leste do setor
da alta bacia, a partir da ocupação das vizinhanças de cavas de mineração abandonadas.
A análise comparativa dos mapas de uso da terra dos anos de 1953, 1965 e 1995
(Figuras 10, 12 e 14), além da representação cartográfica do uso da terra no cenário de
2006 (Figura 16), permitiu a compreensão de uma dinâmica de uso da terra que ressalta a
gradual diminuição e a segmentação de áreas de pastagem, bem como a expansão das
terras de culturas. Essa situação, que também pôde ser verificada no setor de transição de
litologias, encontra-se especificada na Figura 21, onde se constata o gradual avanço das
atividades agrícolas sobre zonas de pastagem na bacia Santa Bárbara, que aponta para
dados de evolução dessas classes de uso da terra em termos de Km², destacando, assim, o
aumento das áreas destinadas às práticas agrícolas de 8,22 km² (1953) para 25,66 km²
(2006), além da diminuição das zonas de pastagens de 19,65 km² (1953) para 3,55 km²
(2006).
De acordo com Goudie (1986) as atividades agrícolas pertencem ao grupo de
operações indiretas do homem sobre as feições do relevo. Os processos antropogênicos
indiretos são de difícil reconhecimento, não porque envolvem a inserção de novos
processos, mas porque induzem a aceleração dos processos naturais, provocando alterações
ambientais por meio do controle dos ciclos naturais. Não obstante, esse grupo de processos
efetiva as alterações mais cruciais sobre os elementos do relevo mediante eliminação da
cobertura vegetal, acelerando as taxas de erosão e de sedimentação.
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
155
Outrossim, o avanço das terras de culturas no setor de nascentes também ocorreu
sobre matas ciliares e florestas de encosta (embora essas últimas possuam menor
ocorrência na área em estudo). A característica agrícola das propriedades rurais do setor
em questão, constatadas durante as observações em campo, é de pequenos e médios
estabelecimentos, onde se cultivam diversos gêneros agrícolas (batata, milho, feijão,
mandioca, trigo, soja, frutíferas e hortaliças), com baixa mecanização das lavouras e
utilização de técnicas agrícolas manuais, com auxílio de mão-de-obra animal. Tais
características propiciaram a gradual, porém não drástica remoção da vegetação nativa
situada às margens dos principais arroios para a ampliação das lavouras.
A Figura 24 representa a evolução espacial das áreas de mata ciliar e florestas de
encosta na bacia Santa Bárbara e permite a visualização das diferenças entre os cenários
analisados. Torna-se importante destacar que as atividades de fotointerpretação procuraram
estabelecer da forma mais precisa possível o limite das áreas de vegetação ciliar e de
encosta na bacia Santa Bárbara. No entanto, as características do material aerofotográfico
(fotografias pancromáticas, material antigo e diferenciações na escala dos
aerofotolevantamentos) geraram, por vezes, hesitação na delimitação dessas áreas, devido
a dificuldades de distinção quando as glebas de silvicultura eram limítrofes às faixas de
vegetação de galeria.
Embora os gráficos de evolução das áreas de vegetação nativa (Figura 24)
demonstrem sua diminuição espacial ao longo de 53 anos (1,87 Km² em 1953 para 1,50
Km² em 2006), no setor de nascentes, a permanência de grande parte das zonas de mata
ciliar faz perceber que as agressões derivadas das atividades antrópicas não afetaram de
forma tão intensa a cobertura vegetal original se comparado a outros setores da bacia.
Durante as atividades de campo procurou-se constatar a permanência de faixas de
mata ciliar ao longo dos arroios do setor de nascentes. Em muitos dos locais vistoriados foi
possível identificar faixas de mata nativa que se enquadram nos limites propostos pela
legislação. Entretanto, as atividades de campo também permitiram constatar a existência de
corredores ínfimos de vegetação de galeria com extensão menor do que a proposta pela
legislação e de difícil identificação nas atividades de fotointerpretação, mas que possuem
fundamental importância para o equilíbrio da dinâmica erosiva e fluvial. Essas áreas, em
que ocorrem pequenas linhas de mata nativa ao longo dos arroios, localizam-se,
principalmente, onde as atividades agrícolas e de silvicultura avançaram significativamente
sobre os fundos de vale.
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
156
A manutenção da mata nativa, em qualquer conjuntura, é de grande importância
para a preservação das propriedades básicas da morfohidrodinâmica nesse setor, uma vez
que a cobertura vegetal atua na interceptação e na amenização das precipitações intensas e
no retardamento da chegada do escoamento superficial ao canal fluvial, evitando enchentes
súbitas e assoreamentos. O manto de serrapilheira formado sob as árvores também é
indispensável para que ocorra a quebra da velocidade do escoamento e a gradual infiltração
para camadas inferiores do solo.
Os mapas de uso da terra, referentes aos quatro cenários (Figura 10, 12, 14 e 16),
também tornaram possível a constatação da existência de glebas de silvicultura, com
predominância da espécie Eucalyptus ssp., as quais ocupam consideráveis parcelas do setor
de nascentes nos anos de 1953, 1965, 1995 e 2006. A dinâmica de uso da terra aponta para
a permanência das áreas de reflorestamento em alguns pontos do setor de nascentes,
sobretudo na porção norte e leste, e também para características semelhantes às
encontradas no setor de transição de litologias, ou seja, glebas que não demonstraram
significativa redução ou ampliação de sua área durante 53 anos. Tal situação permite
inferir algumas considerações a respeito da atuação do uso da terra na alteração das
características morfohidrográficas do setor de nascentes.
O eucalipto é uma espécie considerada alheia às condições naturais por inúmeros
motivos: trata-se de uma espécie não-nativa (natural da Austrália), cujo desenvolvimento
vegetativo envolve a absorção significativa de água e também de nutrientes, podendo
provocar o esgotamento do solo diante da não reposição por meio de adubações periódicas
(LIMA, 1996). Além do mais, seu tempo de vida é limitado – dependendo da sua
finalidade: indústria madeireira, celulose, etc. – envolvendo práticas de revolvimento das
camadas do solo e períodos de solo exposto nas áreas destinadas à silvicultura.
No entanto, apesar dos aspectos desfavoráveis, as áreas de silvicultura podem ser
consideradas como zonas de cobertura vegetal arbórea capazes de atuar na proteção do
solo contra a ação dos eventos erosivos acelerados. Lima (1996) destaca resultados de
experimentos realizados e que procuraram relacionar as taxas de erosão entre parcelas
testemunhas (desprovidas de qualquer tipo de cobertura vegetal e ocupadas por cultivos
agrícolas) e glebas de silvicultura, sob as mesmas condições topográficas e edáficas,
demonstrando resultados satisfatórios no que tange à proteção do solo, ao controle do
escoamento superficial acelerado e aos processos de remoção e carreamento de material
para o canal fluvial.
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
157
O autor citado esclarece, no entanto, que é preciso levar em consideração o
período de crescimento das áreas de silvicultura, bem como o espaço de tempo destinado
ao corte, pois quando a proteção do solo diminui, conseqüentemente, aumenta sua
propensão aos processos erosivos acelerados. Não obstante, técnicas de cultivo e preparo
do solo também devem estar associadas à atividade silvicultora, reforçando a proteção
contra os mecanismos de desgaste e remoção do solo.
Em busca de resultados semelhantes aos de Lima (1996), Pires et al. (2006)
conduziram experimento em uma bacia hidrográfica, a fim de avaliar as perdas de solo, sob
chuva natural, em diferentes sistemas de manejo de eucalipto (eucalipto plantado na
direção do declive, na direção do declive com queima de restos culturais, e eucalipto
plantado em nível). A esses sistemas foram relacionadas as perdas de solo ocorridas em
parcelas de mata nativa, pastagem plantada e solos descobertos (parcela testemunha), sob
as mesmas condições pedológicas – Latossolo Vermelho-amarelo (LVA).
Os autores citados constataram que as perdas de solo na parcela de eucalipto
plantado em nível (0,260 t ha
-1
por ano) aproximavam-se relativamente às ocorridas em
matas nativas (0,137 t ha
-1
por ano), indicando menor impacto desse sistema. Áreas de
pastagem plantada (0,209 t ha
-1
por ano) e mata nativa apresentaram, de acordo com os
resultados obtidos, os menores índices de perda de solo, enquanto a parcela testemunha
sofreu perdas de 13,179 t ha
-1
por ano. As demais parcelas conduzidas durante o
experimento – eucalipto plantado na direção do declive e eucalipto plantado na direção do
declive com queima de restos culturais – apresentaram 0,368 t ha
-1
e 0,815 t ha
-1
por ano de
perdas do solo, respectivamente.
Bigarela (2003) afirma que a proteção desejável das vertentes contra os processos
erosivos acelerados ocorre, principalmente, em superfícies florestadas, que contribuem
efetivamente na manutenção do equilíbrio do ciclo hidrológico em sua fase terrestre. O
autor citado apresenta ainda blocos diagramas baseados em Strahler & Strahler (1973), que
destacam vários tipos de uso da terra (áreas cultivadas, pastagens, campos abandonados,
florestas exploradas e plantações de pinheiros) na região norte do Mississipi (EUA),
ilustrando valores de precipitação (todos acima de 1200 mm), de escoamento superficial e
de erosão equivalente.
Os resultados demonstram significativas diferenças entre os diversos usos,
apontando para taxas de escoamento superficial e erosão em kg de: 400 mm e 50.000 kg
para terras de cultivo; 380 mm e 36.000 kg para terras de pastagens; 180 mm e 290 kg para
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SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
158
campos abandonados; 130 mm e 220 kg para solos com floresta explorada e 25 mm e 45
kg para áreas onde ocorrem plantações de pinheiros, levando-se em consideração os
pinheiros como espécies nativas de zonas temperadas.
Após as comparações realizadas pelos diferentes pesquisadores, no que tange à
perda de solos sob distintos usos da terra, atenta-se para que, dentre as práticas de uso que
ocorrem no setor de nascentes e diante das características geomorfológicas descritas e da
dinâmica fluvial encontrada, seja preferível a opção por aquelas que acarretarão em
menores impactos à morfohidrodinâmica da bacia hidrográfica, a partir da manutenção do
equilíbrio na formação e na remoção do manto de alteração e das características edáficas
satisfatórias.
Nesse caso, uma breve comparação entre as terras de culturas e as áreas de
silvicultura leva a crer que, mesmo diante de todos os fatores negativos associados a essas
duas práticas de uso da terra, a segunda ainda atua de forma mais efetiva na proteção do
solo, devido ao seu período de permanência, à formação (embora parca) de um manto de
serrapilheira, e à proteção contra o efeito splash pela copa das árvores, amenizando a
desagregação e a remoção das partículas do solo.
As atividades de campo na bacia Santa Bárbara indicaram que a maior parte das
glebas de silvicultura encontrada é realizada em curvas de nível, sobretudo no setor de
nascentes, cuja declividade dos terrenos é maior. Não se trata de uma apologia à
silvicultura, mas sim, de uma comparação prática que almeja demonstrar o maior impacto
das atividades agrícolas sobre os processos erosivos, conforme anteriormente descrito por
Goudie (1986).
As terras de cultura, por outro lado, embora praticadas com o auxílio de técnicas
como o plantio direto e em curvas de nível – constatados durante os trabalhos de campo –
contribuem para a ação mais efetiva dos agentes denudativos. Isso porque o tempo de
permanência das lavouras é menor, o revolvimento da terra ocorre mais vezes ao ano em
decorrência das colheitas e da rotação de culturas, e a característica fisionômica dos
gêneros agrícolas encontrados, em geral, possui baixa resistência à ação das precipitações
intensas, que tendem a maior acumulação superficial e aumento da velocidade de
escoamento, possibilitando a remoção de material e sua deposição nos canais fluviais.
A análise dos mapeamentos geomorfológicos dos anos de 1953, 1965 e 1995
(Figuras 11, 13 e 15) aponta para o desgaste de alguns patamares do setor de nascentes da
bacia Santa Bárbara, principalmente na sua porção leste, nas imediações da vila de Monte
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
159
Bonito. A ocorrência desse fenômeno se dá, em geral, nas áreas onde zonas de pastagem
foram substituídas por terras agrícolas e também ocorrem em superfícies caracterizadas
pelo uso da terra para fins de reflorestamento.
A Figura 25 (1) representa de forma mais específica as características
morfohidrográficas no setor de nascentes, destacando o aspecto da rede de drenagem,
fundos de vale com seção transversal em “V”, além da predominância de vertentes
convexas. Ainda na mesma figura, é possível identificar os patamares formados nos topos,
onde são indicadas as linhas de cumeada e a direção do escoamento superficial. Atenta-se
para a ocorrência de colos entre zonas de desgaste dos patamares e para o uso da terra
voltado à agricultura nos pontos próximos à ocorrência dessas formas de origem
denudativa.
Figura 25: Representação Cartográfica das Principais Alterações Morfohidrográficas no Setor de Nascentes da Bacia do Arroio Santa
Bárbara – RS – 2006.
Pág. 160
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
161
Acredita-se que o desgaste dos patamares no setor de nascentes vincula-se,
possivelmente, às técnicas agrícolas utilizadas no preparo das lavouras e também no
manejo das terras destinadas a silvicultura. Dessa forma, o emprego de técnicas como a
aragem e a própria construção de curvas de nível para evitar o desgaste do solo podem ter
contribuído para o desenvolvimento desse processo, uma vez que tais técnicas requerem o
revolvimento do solo, diminuindo sua agregação e efetivando sua exposição por
determinado período aos agentes intempéricos.
Piacente (1996) destaca que as forças animal e mecanizada, utilizadas durante a
aragem do solo, intensificam a exploração das vertentes gerando conseqüências que
dependem do ângulo existente entre o sulco aberto pelos implementos agrícolas - animal
ou mecânico - durante a aragem e a declividade da rampa. A autora citada destaca que
cortes verticais - do topo à base - podem concentrar o escoamento superficial, enquanto
sulcos abertos transversalmente à direção da vertente auxiliam na contenção do
escoamento superficial, mas podem atuar como mecanismos de concentração de água,
absorção demasiada e de percolação em solos com maior concentração de argila. Essas
situações ocorrem tanto em superfícies onde existe a permanência de material decomposto
oriundo das colheitas, como em superfícies “limpas” após o plantio, acentuando-se, porém,
no segundo caso.
Os processos erosivos que desencadeiam o desgaste dos patamares, no setor de
nascentes, atuam também no sentido de conduzir o material removido para as partes mais
baixas da topografia. Como os mapas de uso da terra e os geomorfológicos,
correspondentes aos cenários analisados, indicaram o aumento no número de açudes e
reservatórios de maior porte, é provável a ocorrência de sedimentação desses corpos de
água, uma vez que eles promovem a permanência do material erodido no sistema.
Tal situação atua na diminuição do período útil desses reservatórios e açudes,
fazendo com que muitas vezes os mesmos sejam aprofundados com o auxílio de
maquinário para poder continuar provendo reservas de água. As conseqüências desse
processo também se difundem para outros setores da bacia, podendo atingir o Reservatório
Santa Bárbara. Korb (2006), ao analisar os depósitos recentes no reservatório em questão,
constatou que são oriundos de processos erosivos acelerados, deflagrados em um período
relativamente curto – quando consideramos a idade do reservatório de 38 anos – no qual,
certamente, alterações no uso da terra tiveram papel significativo.
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
162
A deposição do material erodido também propicia a formação de depósitos areno-
argilosos nos fundos de vale, sobretudo na zona limítrofe do setor de nascentes com o setor
de transição de litologias (Figuras 11, 13 e 15). Nessa porção da bacia do Arroio Santa
Bárbara, o perfil transversal sofre mudanças, passando de vales com seção em “V” para
vales com características planas. Essa mudança deve-se tanto a deposição do material
erodido nos setores à jusante, como a fatores litológicos e a feições geomorfológicas mais
suaves que ocorrem no setor de transição de litologias. Essa alteração conflui na
diminuição da capacidade de entalhe e de transporte de sedimentos por parte dos canais
fluviais, predispondo a acumulação desses em terrenos planos, marginais aos arroios,
formando depósitos recentes.
Tais depósitos puderam ser verificados em todos os mapeamentos
geomorfológicos, apresentando gradual aumento em suas áreas do primeiro (1953, Figura
11) ao último cenário (1995, Figura 15), corroborando para deduções que inferem sobre a
ação do uso da terra na aceleração dos processos erosivos e na significativa permanência
do material erodido dentro do sistema, a partir da formação de depósitos recentes. Nos
mapas de uso da terra, essas zonas foram classificadas como terras úmidas cobertas por
vegetação rasteira (figuras 10, 12, 14 e 16).
Configura-se assim uma situação em que os mecanismos de controle impostos
pela ação antrópica atuam tanto na aceleração da morfodinâmica e da morfogênese – por
meio das atividades agrícolas que propiciam a remoção do material – como no
desequilíbrio da circulação do material erodido e sua eliminação do sistema, causando
efeitos negativos que interferem no funcionamento dos atributos e elementos do sistema
ambiental e na estrutura do sistema socioeconômico. Fica constatada que a ação antrópica
no controle dos elementos naturais, sobretudo nos aspectos da morfologia e na dinâmica
fluvial, acarreta em reações que podem não surtir resultados benéficos aos interesses
socioeconômicos, a partir do momento em que ocorre a degradação das terras cultiváveis
por meio da diminuição de sua camada fértil e o decréscimo do tempo de vida útil de
reservatórios utilizados para a irrigação de lavouras e para o consumo humano.
Os mapeamentos geomorfológicos dos anos de 1953, 1965 e 1995 (Figuras 11, 13
e 15) bem como os mapas de uso da terra (Figura 10, 12 e 14) e a representação
cartográfica do usa da terra em 2006 (Figura 16) permitiram ainda a identificação de outro
tipo de intervenção antrópica no setor de nascentes, que, ao contrário das atividades
agrícolas e das zonas de silvicultura, apresentam-se de forma pontual, porém não menos
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
163
impactante: o aumento das áreas de mineração tanto no setor de nascentes como em toda a
área da bacia Santa Bárbara.
A Figura 24 representa a evolução espacial das áreas de mineração na bacia Santa
Bárbara, indicando o aumento de 0,36 Km² para 0,55 Km² em 1953 e 2006
respectivamente. No setor de nascentes, as atividades de mineração vinculam-se
especialmente à exploração de granito, valendo-se de infra-estrutura pesada para a extração
desse mineral. No setor de transição de litologias e no setor de várzea, por sua vez, as
atividades de mineração encontram-se atreladas à extração de argila para fabricação de
artefatos de cerâmica e tijolos, além de saibro, utilizado na pavimentação das ruas na
cidade de Pelotas.
De acordo com Goudie (1986), os impactos ambientais decorrentes de escavações
para a realização de atividades de mineração excedem vários outros tipos de ação humana
no processo de intervenção e de controle das paisagens naturais, alterando as taxas de
erosão mediante quebra do equilíbrio na estrutura das vertentes e alteração dos processos
de formação do manto intempérico.
Bacci et al. (2006) afirmam que os efeitos ambientais das atividades de mineração
estão associados, de modo geral, às diversas fases de exploração dos bens minerais como a
abertura da cava (retirada da vegetação, escavações, movimentação de terra e modificação
da paisagem local) e o uso de explosivos no desmonte de rocha (sobrepressão atmosférica,
vibração do terreno, ultralançamento de fragmentos), afetando os meios como água, solo e
ar, além da população local.
As áreas de mineração de granito existentes no setor de nascentes, situadas nas
proximidades do distrito de Monte Bonito (hoje inativas) e no extremo norte da bacia do
Arroio Santa Bárbara (em atividade), foram e são responsáveis por alterações na estrutura
das vertentes, em virtude das cavas que causam rupturas abruptas no declive, efetivando
modificações na drenagem superficial. A Figura 25 (2) representa a área de mineração
ativa, no extremo norte do setor de nascentes, e diagnostica as alterações na morfologia
original, derivadas da abertura das cavas para exploração do granito. Constatam-se a
interferência na estrutura da vertente e a transformação do escoamento superficial
decorrente dos escalonamentos oriundos dos diversos níveis de escavação, formando
rupturas abruptas que, de acordo com os levantamentos realizados durante os trabalhos de
campo, apresentam, em alguns pontos, mais de 15 metros de altura.
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
164
Bacci et al. (2006), durante estudos realizados em área de mineração de diabásio
no município de Campinas – SP, evidenciaram as problemáticas envolvidas na exploração
desse mineral em cavas a céu aberto. Dentre os principais aspectos e impactos ambientais
envolvidos nessa atividade, e que se relacionam com as transformações morfohidrográficas
evidenciadas no setor de nascentes da bacia Santa Bárbara, os autores destacam o
descapamento do solo, que envolve a retirada da cobertura vegetal e a formação de pilhas
de solo escavado.
As práticas envolvidas na atividade de mineração desencadeiam eventos erosivos
acelerados, atuando no assoreamento de córregos próximos e na alteração da paisagem. Os
autores citados constataram ainda que a drenagem artificial oriunda das cavas de
exploração mineral promove a geração de efluentes e o aporte de sedimentos para os
cursos de água, contaminando e comprometendo os recursos naturais superficiais e
também subsuperficiais.
Piacente (1996) esclarece que, mesmo localizada – como no caso das cavas do
setor de nascentes – a retirada intensa de rochas e solo, originada das atividades de
mineração, promove um grande impacto sobre as formas originais do relevo, implicando
em alterações na morfologia por meio da retirada do material escavado e sua deposição em
outro ponto. O acúmulo de resíduos, bem como o abandono das cavas de mineração, deixa
ainda a impressão de um “relevo fabricado” pela ação antrópica.
Na porção leste do setor de nascentes, nas proximidades com a vila de Monte
Bonito, são encontradas cavas de mineração abandonadas que, de acordo com os
mapeamentos geomorfológicos e com as atividades de fotointerpretação, ainda
apresentavam-se ativas nos cenários de 1953 e 1965 (Figuras 11 e 13). O mapeamento
geomorfológico de 1995 (Figura 15) já representa essas áreas como zonas de mineração
inativas.
O abandono das cavas de mineração ocorreu sem nenhuma preocupação maior em
providenciar sua recuperação ambiental, vindo a confluir com as explicações de Pacciente
(1996), já que durante os trabalhos de campo pôde-se verificar a existência de formas
artificiais, fabricadas pela ação humana no controle dos elementos do sistema ambiental,
que aos poucos vão sendo incorporadas às características originais da área, uma vez que a
cobertura vegetal expande-se sobre o manto superficial formado a partir das rochas
degradadas, conforme representa a Fotografia G pertencente à Figura 25 (3).
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
165
Essa característica aproxima-se com a noção de equilíbrio dinâmico dos
elementos e dos atributos do sistema ambiental, uma vez que as atividades de mineração
provocaram alterações, por meio de esforços aplicados, que excederam a capacidade de
resiliência dos elementos, ultrapassando seu limiar de recuperação. O abandono das cavas
de mineração deixou cicatrizes, ou seja, uma nova configuração espacial que induziu os
elementos e os atributos do sistema ambiental a outro patamar de equilíbrio dinâmico, no
qual os ciclos naturais, agora influenciados por mecanismos antrópicos, ajustaram-se as
novas características impostas, embora apresentando configuração diferente da original.
A figura 25 (3) representa ainda, de forma específica, a porção do setor de
nascentes onde se encontram as cavas de mineração abandonadas, ressaltando também a
ocupação das proximidades dessa área pela expansão da vila de Monte Bonito. A evolução
desse aglomerado pode ser verificada em todos os cenários mapeados, principalmente a
partir de 1965 (Figura 13). As observações de campo no setor da alta bacia revelaram que a
evolução espacial dessa comunidade rural vem ocorrendo sem planejamento nas
proximidades dos cursos de primeira ordem, ameaçando a qualidade e o provimento de
água à bacia do Arroio Santa Bárbara.
Em termos de alterações morfohidrográficas, a expansão da vila de Monte Bonito
pode não ter grande significado, porém, a constatação de seu aumento espacial e também
populacional deve despertar maiores preocupações por parte do poder público para que
intervenções na morfohidrografia, semelhantes às encontradas em áreas de adensamento
urbano, não venham a ocorrer, como no caso do surgimento de processos erosivos
localizados e do aumento na densidade de canais, derivados da impermeabilização da
superfície e da alteração das propriedades do escoamento superficial e subsuperficial
constatadas na área urbana de Pelotas.
De modo geral, verificou-se um menor grau de controle antrópico sobre os
elementos do sistema ambiental no setor de nascentes, especialmente sobre a morfologia
original e a dinâmica fluvial. Feições antropogênicas, derivadas de mecanismos de controle
diretos sobre a estrutura e processos morfohidrográficos, tiveram pouca expressão areal
nesse setor se comparado com os demais, restringindo-se às áreas de mineração, aos cortes
e aos aterramentos efetivados para a expansão da vila de Monte Bonito e em corpos de
água artificiais construídos para viabilizar a irrigação agrícola. Entretanto, as atividades
agrícolas, enquanto mecanismos de controle antrópico indiretos, tiveram grande
ANÁLISE DOS RESULTADOS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
166
contribuição às alterações geomorfológicas no setor de nascentes, irradiando as
conseqüências dos processos para outros setores da bacia Santa Bárbara.
Diante dessa situação, acredita-se que o setor de nascentes deva receber maiores
atenções por parte dos órgãos competentes e também por parte da população local,
justamente por apresentar problemáticas ambientais passíveis de recuperação, mantendo-se
as intervenções antrópicas com o mínimo impacto sobre essa zona onde se encontra a
maior parte das nascentes da bacia Santa Bárbara. Da mesma forma que se deve respeitar a
ação de sinergia que rege os sistemas ambientais, controlados ou não, é necessária também
que essa ação se expanda para os outros setores, na medida em que houver a possibilidade
de estagnação ou reversão de alterações morfohidrográficas que repercutem em
desequilíbrios nos ciclos erosivos e acarretam em derivações negativas, tanto sobre os
elementos naturais como sobre as atividades socioeconômicas.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
As atividades humanas, inseridas no contexto urbano-industrial ou rural, foram
aperfeiçoadas ao longo do tempo histórico, sendo incrementadas por técnicas de
apropriação dos recursos naturais cada vez mais sofisticadas e dinâmicas. A ação do
homem sobre o meio onde vive possibilita a manutenção da estrutura e das propostas do
sistema econômico vigente, resultando em organizações espaciais com características
próprias, simbolizadas principalmente pelos diversos usos da terra. Em contrapartida,
alterações significativas são oriundas desse processo, promovendo o desequilíbrio dos
fluxos e ciclos naturais, além de uma série de impactos ambientais.
A Geografia procura analisar de que forma ocorrem essas alterações,
compreendendo que as mesmas são frutos da interação do sistema ambiental com o sistema
socioeconômico confluindo na formação das organizações espaciais. Nessa perspectiva,
estudos voltados para a análise das transformações temporais ocorridas sobre elementos e
atributos do sistema ambiental, como resultado da articulação com o sistema
socioeconômico, podem evidenciar inúmeros mecanismos de controle antrópico que
levaram a situações de impacto ambiental, ressaltando que os resultados oriundos de
estudos dessa categoria podem possibilitar ações de planejamento e conservação dessas
áreas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
168
A adoção de áreas de pesquisa que apresentam delimitação natural colabora para
que os estudos geográficos possam apresentar resultados mais expressivos no que tange a
análise temporal da dinâmica das organizações espaciais, que envolvem tanto a evolução
da estrutura do sistema socioeconômico como as alterações nos elementos do sistema
ambiental. Dentro desse contexto, as bacias hidrográficas antecipam-se como células de
estudo, naturalmente delimitadas, em que ocorre a conexão dos elementos que as
compõem, bem como sua relação com outras unidades de maior ou menor ordem
hierárquica, confluindo em estudos que permitem a identificação da transmissão dos
impactos para outros pontos da bacia ou então para outros sistemas adjacentes.
Assim, o presente estudo, realizado na bacia do Arroio Santa Bárbara – RS,
procurou analisar as alterações morfohidrográficas resultantes da dinâmica de uso da terra
em um período de 53 anos. A análise dos resultados, obtidos a partir da interpretação das
informações espaciais e da aplicação das técnicas de mapeamento geomorfológico e do uso
da terra, constatou que a dinâmica do sistema socioeconômico impôs mecanismos de
controle diretos e indiretos sobre o sistema ambiental da bacia ao longo dos cenários
analisados.
Tais mecanismos de controle desencadearam alterações nos elementos e nos
atributos do sistema ambiental, sobretudo à hidrografia, a partir de modificações impostas
à dinâmica fluvial; ao relevo, diante da aceleração dos processos erosivos e das
transformações impostas às feições geomorfológicas pela ação antropogênica; e à
cobertura vegetal original, a partir das mudanças nos padrões de uso da terra que
desencadearam a redução de zonas de terras úmidas cobertas por vegetação rasteira e
banhados.
Os dados resultantes das técnicas aplicadas mostraram-se qualitativamente
satisfatórios no que se refere à constatação de alterações sobre as feições geomorfológicas
e sobre a dinâmica fluvial da bacia do Arroio Santa Bárbara, pois possibilitaram a
identificação das principais formas do relevo local nos cenários mapeados, facultando uma
análise comparativa das transformações ocorridas. Os mesmos dados também
corresponderam de forma qualiquantitativa diante das evidentes modificações no uso da
terra desencadeadas em 53 anos, uma vez que possibilitaram a determinação espacial
(aumento e diminuição) das classes mapeadas, permitindo a relação e a comparação dessas
variações entre si e com as transformações nos elementos do sistema ambiental.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
169
A utilização de uma metodologia híbrida para a realização do mapeamento
geomorfológico, seguindo as orientações de Tricart (1965), Verstappen; Zuidan (1975) e
Cunha (2001), possibilitou a identificação das feições geomorfológicas originais e também
as derivadas da interferência antrópica. Dessa forma, foram verificadas alterações
ocorridas sobre a morfologia original e sobre a dinâmica fluvial, a partir da constatação de
mudanças espaciais nas formas do relevo e na rede de drenagem ocorridas ao longo do
período analisado, oriundas de intervenções antrópicas diretas e indiretas.
As propostas de Anderson (1971) e Ceron; Diniz (1962) aplicadas ao mapeamento
do uso da terra e para a interpretação de sua dinâmica mostraram-se passíveis a adaptações,
as quais se referem, sobretudo, às especificidades da área em estudo, onde localizam-se
estruturas urbano-industriais e rurais, compreendendo uma gama de classes de uso da terra.
A utilização dessas propostas obteve êxito tanto na interpretação analógica das classes de
uso da terra, processo no qual foi realizada a estereoscopia, quanto na interpretação digital
das imagens do GOOGLE EARTH. Essa última técnica, por sua vez, mostrou resultados
interessantes no que se refere à possibilidade de sobrepor a semiologia cartográfica
empregada nos mapeamentos geomorfológicos sobre os padrões de uso da terra
representados nas imagens orbitais, tornando a representação cartográfica mais didática
diante da capacidade de relação direta das características socioeconômicas com os
elementos do sistema ambiental.
O aparato técnico utilizado para a identificação das alterações morfohidrográficas
e na cobertura vegetal original, derivadas da dinâmica de uso da terra na bacia Santa
Bárbara, entretanto, somente se mostrou capaz de atender de forma efetiva aos objetivos
propostos pela pesquisa a partir de sua combinação com um arcabouço teórico-
metodológico que possibilitou a visão conjunta das transformações ocorridas. A
perspectiva sistêmica proporcionou uma análise da totalidade das alterações sobre os
elementos do sistema ambiental como conseqüência da interferência dos mecanismos de
controle antrópico. A imposição de “válvulas” ou “chaves” em pontos estratégicos do
sistema ambiental da bacia Santa Bárbara irradiou, a partir de forças de sinergia e
retroalimentação, suas transformações para toda a bacia, desequilibrando os ciclos naturais
e conduzindo assim os elementos e os atributos do sistema ambiental a um novo equilíbrio
dinâmico submetido à interferência antrópica efetiva, a qual determinou a circulação dos
fluxos de matéria e energia em prol das atividades socioeconômicas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
170
A harmonização desses pilares da pesquisa fundamentou uma análise dos
resultados, que partiu do grau de intensidade das alterações verificadas e das relações que a
magnitude dessas transformações possuem dentro de um sistema aberto, caracterizado pela
bacia Santa Bárbara. Assim, a área em estudo foi compartimentada em setores, levando-se
em consideração as características do sistema ambiental e socioeconômico. Tal divisão
mostrou-se eficaz na análise dos resultados obtidos, possibilitando o reconhecimento das
alterações em grande, média e pequena escala que se relacionam umas com as outras a
partir dos mecanismos de retroalimentação.
As áreas em que foram verificadas as maiores alterações morfohidrográficas
derivadas de mecanismos de controle antrópico sobre o sistema ambiental da bacia Santa
Bárbara localizam-se nos setores de várzea, os patamares leste e oeste e a transição de
litologias. As transformações, nesses setores, originam-se de mecanismos de controle
atrelados, sobretudo, a elementos urbano-industriais como a impermeabilização do solo por
áreas urbanizadas, a canalização e a retilinização dos cursos de água, a efetivação de
aterramentos para a construção de vias de circulação e a ampliação dos lotes urbanos. A
evolução das atividades agropastoris também originou uma série de alterações nas áreas
mais baixas da bacia, sobretudo no setor de transição de litologias, onde foram constatadas
interceptações diretas nos canais fluviais – formando barragens ou açudes que
transformaram o nível de base local – e alterações da morfologia original desencadeadas
pela intensidade das atividades agrícolas.
Entretanto, o maior impacto decorrente da evolução do uso da terra na bacia Santa
Bárbara foi a construção do Reservatório Santa Bárbara, que provocou o reajuste da
morfodinâmica na área, atuando assim na transformação dos canais de drenagem e na
conseqüente alteração da morfologia original a partir da aceleração dos processos erosivos
e do desequilíbrio das vertentes. As alterações nos elementos do sistema ambiental
verificadas nesses setores localizados nas porções mais baixas da bacia irradiaram-se para
montante da área em estudo, a partir das leis que regem a dinâmica fluvial, desencadeando
alterações na bacia de drenagem a partir da retomada erosiva dos canais fluviais.
As alterações na dinâmica fluvial desencadeadas a partir da construção do
Reservatório Santa Bárbara possuem efeito direto sobre as nascentes e, a partir de
mecanismos de retroalimentação, podem provocar mudanças nos cursos à jusante. Isso
significa admitir um aumento substancial nos processos erosivos a partir da crescente
energia de entalhamento dos arroios que, agindo sobre vertentes desprovidas de cobertura
CONSIDERAÇÕES FINAIS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
171
vegetal adequada, onde permanecem usos da terra inapropriados, podem conduzir a taxas
de deposição mais elevadas, tanto nos fundos de vale como em reservatórios de pequeno,
médio e grande porte que podem ter seu tempo de vida diminuído.
Por outro lado, no setor de nascentes localizado nos compartimentos mais
elevados da bacia Santa Bárbara, foram identificadas alterações morfohidrográficas
vinculadas sobretudo ao controle indireto dos elementos do sistema ambiental e
relacionadas a uma dinâmica de uso da terra que evidenciou o avanço de áreas agrícolas
sobre zonas de pastagens. Transformações morfohidrográficas diretas também foram
constatadas, porém em intensidades menores as que ocorrem nos setores de várzea, nos
patamares leste e oeste e na transição de litologias, permitindo inferir, em um primeiro
momento, que a incidência de impactos ambientais no setor de nascentes ocorre em menor
escala.
Entretanto, é exatamente a característica de relação dos elementos e dos atributos
do sistema ambiental e seu ajuste aos mecanismos de controle antrópico que condicionou
algumas alterações na dinâmica fluvial e nos processos erosivos identificados no setor de
nascentes. Tal conjuntura ocorre porque a partir dos mecanismos de retroalimentação, o
sistema adapta-se às alterações e propaga as conseqüências dessa transformação tanto à
jusante quanto à montante, interferindo até mesmo no equilíbrio dinâmico de áreas menos
impactadas, como no caso do setor de nascentes.
Assim, as áreas onde foram identificadas as alterações morfohidrográficas mais
significativas, situadas nas porções mais baixas da bacia em questão, convergem os efeitos
derivados dos mecanismos de controle antrópico à montante, a partir de mecanismos de
retroalimentação que interferem de modo negativo no equilíbrio dinâmico do setor de
nascentes, incitando o aumento de desequilíbrios ambientais.
Por outro lado, a colaboração da zona de nascentes na degradação e no impacto
dos setores localizados nos compartimentos mais baixos da bacia ocorre em menor
intensidade, pois, como as alterações morfohidrográficas diretas e indiretas apresentam
menor magnitude nesse setor, a irradiação dos efeitos desses mecanismos antrópicos à
jusante é conseqüentemente menor no que se refere ao reajuste de canais fluviais, à
aceleração dos processos erosivos e ao desequilíbrio das vertentes.
Porém, a interdependência dos atributos dos elementos que compõem o sistema
ambiental faz com que essas duas zonas, onde ocorrem alterações morfohidrográficas de
distintas magnitudes, dependam de ações de planejamento paralelas. Essas ações atuariam
CONSIDERAÇÕES FINAIS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
172
no sentido de evitar que as transformações nos setores de várzea, patamares leste e oeste e
transição de litologias, propaguem seus efeitos sobre o equilíbrio dinâmico das áreas
menos alteradas e que, por outro lado, a conseqüente irradiação dessas transformações
sobre o setor de nascente não estimule a evolução dos impactos ambientais derivados de
transformações em grande escala e localizados nas porções mais baixas da bacia.
Acredita-se, diante dessa situação, que ações de planejamento ambiental, pautadas
nos resultados apresentados pelo presente estudo, devam procurar atuar tanto no sentido de
garantir a conservação das áreas ainda preservadas do setor de nascentes, bem como
atentar para a capacidade que os mecanismos de controle antrópico – verificados em maior
intensidade nos setores de várzea, patamares leste e oeste e transição de litologias –
possuem em alterar o equilíbrio dinâmico das áreas ainda preservadas, por meio dos
mecanismos de retroalimentação que regem os sistemas ambientais.
Isso significa que para haver um planejamento ambiental na área em estudo é
necessário considerar as alterações que já se encontram em curso – procurando minimizar
a intensidade de seus impactos – bem como considerar a necessidade que existe em manter
preservadas as áreas de nascente da bacia hidrográfica, já que essas, a partir dos
mecanismos de sinergia e retroalimentação, contribuem de forma menos efetiva na
transmissão dos impactos ambientais para a jusante e também se caracterizam como parte
principal da bacia hidrográfica, uma vez que essa é a zona onde nascem os arroios que
contribuem para os fluxos de matéria e energia da mesma. Assim, estima-se que
possibilidades de aplicabilidade dos resultados da presente pesquisa ocorrem desde que se
considere a integração dos atributos dos elementos do sistema ambiental e sua relação com
a estrutura e a dinâmica do sistema socioeconômico.
Por fim, torna-se necessário compreender que os resultados da presente pesquisa
não são únicos e possuem conexões que possibilitam a inserção de outros trabalhos que
pretendam aprofundar a temática abordada, tanto na bacia Santa Bárbara como em zonas
adjacentes ou, ainda, tomando a área como objeto de relação com outra unidade de estudo.
Por se tratar de uma bacia hidrográfica estratégica para o município de Pelotas, uma vez
que nela situa-se o Reservatório Santa Bárbara, é de suma importância que estudos
vinculados às alterações ocorridas na área e que apresentam também a conjuntura de
impactos no sistema ambiental sejam levados em consideração para a implantação de ações
de planejamento ambiental, aliando os dados verificados em pesquisas acadêmicas às ações
CONSIDERAÇÕES FINAIS
SIMON, A.L.H. A Dinâmica de Uso da Terra e sua Interferência na Morfohidrografia da Bacia do Arroio Santa Bárbara – Pelotas (RS)
173
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