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UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA
“Júlio de Mesquita Filho”
Instituto de Geociências e Ciências Exatas
Campus de Rio Claro
A
C
ONSTITUIÇÃO DO
C
ÍRCULO DE
C
OOPERAÇÃO DE
P
ESQUISA
A
GRÍCOLA NO
B
RASIL
:
NOVA FACE DO USO CORPORATIVO DO TERRITÓRIO BRASILEIRO NO
PERÍODO TÉCNICO-CIENTÍFICO-INFORMACIONAL
Francisco das Chagas do Nascimento Júnior
Orientadora: Profa. Dra. Samira Peduti Kahil
Dissertação de Mestrado elaborada junto ao
Programa de Pós-graduação em Geografia
Área de Concentração em Organização do
Espaço, para a obtenção do Título de Mestre
em Geografia
.
RIO CLARO (SP)
2007
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ii
G330.91 Nascimento Júnior, Francisco das Chagas do
N244c A constituição do círculo de cooperação de pesquisa
agrícola no Brasil: nova face do uso corporativo do território
brasileiro no período técnico-científico-informacional /
Francisco das Chagas do Nascimento Júnior. -- Rio Claro :
[s.n.], 2007
147 f. : il., gráfs., tabs., quadros, mapas
Dissertação (mestrado) -- Universidade Estadual Paulista,
Instituto de Geociências e Ciências Exatas
Orientador: Samira Peduti Kahil
1. Geografia agrícola. 2. Dinâmica territorial. 3. Moderni-
zação territorial. 4. Agricultura científica. 5. Pesquisa cien-
tífica. 6. Desenvolvimento tecnológico. I. Título.
Ficha Catalográfica elaborada pela STATI - Biblioteca da UNESP
Campus de Rio Claro/SP
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iii
COMISSÃO EXAMINADORA
Profa. Dra. Samira Peduti Kahil
(Orientadora)
Prof. Dr. Márcio Cataia
Profa. Dra. Lúcia Gerardi
Francisco das Chagas do Nascimento Júnior
- Aluno -
Rio Claro, 02 de Outubro de 2007.
Resultado: Aprovado
iv
AGRADECIMENTOS
Confesso que me deparo agora com um dos momentos mais especiais destes
últimos anos em que me dediquei ao curso de mestrado. Agradecer aqueles que de
alguma forma fizeram parte da construção desta dissertação é mais que uma mera
formalidade é, na verdade, a oportunidade de prestar o devido reconhecimento
àquelas instituições e, especialmente, às pessoas que contribuíram diretamente para
a feitura desse trabalho.
Assim é que agradeço:
- Ao Programa de Pós-graduação em Geografia por toda infra-estrutura
disponibilizada;
- Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pelo
apoio financeiro;
- Ao Prof. Dr. Márcio Cataia e a Profa. Dra. Lúcia Gerardi pelas valiosas
contribuições dadas, especialmente, no momento do exame de qualificação;
- Aos parceiros do Núcleo de Estudos Territoriais (NET): Mirlei Pereira, Jorge
Chiapetti, Sérgio Negri, Márcio Toledo, Carlos Eduardo e Maurício Santos, pelos
debates sempre enriquecedores ocasionados em nossos encontros;
- Aos grandes amigos: Pedro Henrique Ferreira Costa, Diego Maia, Dante Reis Jr.,
Érico Soriano, Lincoln Gonçalves, Fernando Pena, Inajara Ferguson e Maria
Benedita, meus mais sinceros agradecimentos por toda força, presteza e
companheirismo diários durante toda a jornada;
- A Profa. Dra. Samira Peduti Kahil pelos ensinamentos, paciência e dedicação na
orientação. Todo o meu reconhecimento e gratidão;
- Aos meus pais Rosemary Batista e Izael Vaszatte pelo apoio incondicional;
- A Priscila Salvaia pela força, carinho e cumplicidade tão decisivos para a
concretização deste meu projeto pessoal.
v
Arrumo melhor a mala com os olhos de pensar em arrumar
Que com arrumação das mãos factícias (e creio que digo bem)
Acendo o cigarro para adiar a viagem,
Para adiar todas as viagens.
Para adiar o universo inteiro.
[...]
Mas tenho que arrumar a mala,
Tenho que por força arrumar a mala,
A mala.
Não posso levar as camisas na hipótese e a mala na razão.
Fernando Pessoa
[Grandes são os Desertos]
4-10-1930
vi
SUMÁRIO
ÍNDICE...........................................................................................................................
vii
INDICE
DE
TABELA...................................................................................................
xi
ÍNDICE
DE
GRÁFICOS...............................................................................................
x
ÍNDICE
DE
MAPAS.....................................................................................................
xi
ÍNDICE DE QUADROS...............................................................................................
xii
QUADRO
DE
SIGLAS..................................................................................................
xiii
RESUMO.......................................................................................................................
xiv
ABSTRACT...................................................................................................................
xv
INTRODUÇÃO.............................................................................................................
1
I - GÊNESE DA ESTRUTURA TERRITORIAL DE PESQUISA AGRÍCOLA NO
BRASIL.........................................................................................................................
10
II – DINÂMICA TERRITORIAL DA PRODUÇÃO E A CONSTITUIÇÃO DO
CÍRCULO DE COOPERAÇÃO DE PESQUISA DA SOJA NO BRASIL.................
23
III - CONSTITUIÇÃO POLÍTICA DO CÍRCULO COOPERAÇÃO DE PESQUISA
DA SOJA. .....................................................................................................................
40
IV HIERARQUIA TERRITORIAL DA PRODUÇÃO CIENTÍFICA E A
MORFOLOGIA ESPACIAL DA DIFUSÃO DAS INOVAÇÕES
BIOTECNOLÓGICAS NO TERRITÓRIO BRASILEIRO..........................................
99
V - A GUISA DE CONCLUSÃO. ................................................................................
122
VI – BIBLIOGRAFIA....................................................................................................
127
vii
Í
NDICE
I
NTRODUÇÃO
....................................................................................................................
1
I - G
ÊNESE DA
E
STRUTURA
T
ERRITORIAL DE
P
ESQUISA
A
GRÍCOLA NO
B
RASIL
............
10
1.
1
P
ERÍODO
T
ÉCNICO
-C
IENTÍFICO E
I
NCIPIÊNCIA DA
P
ESQUISA
A
GRÍCOLA
.......................
11
1.
2
I
NTEGRAÇÃO
T
ERRITORIAL E
C
ONSTITUIÇÃO DO
S
ISTEMA
N
ACIONAL DE
P
ESQUISA
A
GROPECUÁRIA
........................................................................................................................
13
1.
3
G
LOBALIZAÇÃO
E
CONÔMICA E
T
RANSNACIONALIZAÇÃO DA
P
ESQUISA
A
GRÍCOLA
NO
B
RASIL
................................................................................................................................
17
II
D
INÂMICA
T
ERRITORIAL DA
P
RODUÇÃO E A
C
ONSTITUIÇÃO DO
C
ÍRCULO DE
C
OOPERAÇÃO DE
P
ESQUISA DA
S
OJA NO
B
RASIL
..........................................................
23
III
-
C
ONSTITUIÇÃO
P
OLÍTICA DO
C
ÍRCULO
C
OOPERAÇÃO DE
P
ESQUISA DA
S
OJA
.....
40
3.
1
O
P
ROTAGONISMO DO
ESTADO
....................................................................................
41
3.
1.
1
-
S
OLIDARIEDADE
I
NSTITUCIONAL
:
A
CENTRALIDADE DA
E
MPRESA
B
RASILEIRA
DE
P
ESQUISA
A
GROPECUÁRIA
(E
MBRAPA
)
E O
S
ISTEMA
N
ACIONAL DE
P
ESQUISA
A
GROPECUÁRIA
(SNPA)...................................................................................................
41
A
E
MBRAPA
........................................................................................................................
47
3.
2
A
P
RIMAZIA DO
MERCADO
..........................................................................................
59
3.
2.
1
A
G
ÊNESE
T
ERRITORIAL E AS
E
STRATÉGIAS DAS
E
MPRESAS
P
RIVADAS DE
P
ESQUISA DA
S
OJA NO
B
RASIL
..........................................................................................
73
A
M
ONSANTO
...................................................................................................................
74
A
F
UNDAÇÃO
MT.............................................................................................................
82
3.
3
-
O
S
A
GENTES
“S
ECUNDÁRIOS
”..............................................................................................
90
3.
3.
1
-
O
C
ONDICIONANTE
T
ERRITORIAL DA
A
TUAL
O
RGANIZAÇÃO DO
C
ÍRCULO
DE
C
OOPERAÇÃO DE
P
ESQUISA
A
GRÍCOLA NO
B
RASIL
.....................................................
90
IV
H
IERARQUIA
T
ERRITORIAL DA
P
RODUÇÃO
C
IENTÍFICA E A
M
ORFOLOGIA
E
SPACIAL DA
D
IFUSÃO DAS
I
NOVAÇÕES
B
IOTECNOLÓGICAS NO
T
ERRITÓRIO
B
RASILEIRO
.....................................................................................................................
99
4.
1
-
O
S
S
UBESPAÇOS DE
C
OMANDO DO
D
ESENVOLVIMENTO
T
ECNOLÓGICO PARA A
P
RODUÇÃO DE
S
OJA NO
T
ERRITÓRIO
B
RASILEIRO
..................................................................
100
4.
2
M
ORFOLOGIA
E
SPACIAL DA
D
IFUSÃO DAS
I
NOVAÇÕES
T
ÉCNICAS
................................
110
4.
2.
1
-
D
O
T
RABALHO
I
NTELECTUAL À
P
RODUÇÃO
M
ATERIAL
:
A
DEMARCAÇÃO E A
C
ONEXÃO ENTRE O
C
ÍRCULO DE
C
OOPERAÇÃO E O
C
IRCUITO DE
P
RODUÇÃO DA
S
OJA
..
110
viii
4.
2.
2
E
STRATÉGIAS DE
D
IFUSÃO
E
SPACIAL DAS
I
NOVAÇÕES
T
ÉCNICAS E
I
MPOSIÇÃO
DE
F
ORMAS DE
P
RODUÇÃO NO
T
ERRITÓRIO
......................................................................
115
V
-
A
G
UISA DE
C
ONCLUSÃO
..........................................................................................
122
5.1
-
A
S
OLIDARIEDADE
O
RGANIZACIONAL
C
ONSTRUÍDA E AS
D
ESARTICULAÇÕES
T
ERRITORIAIS
P
RODUZIDAS
...........................................................................................
123
VI
B
IBLIOGRAFIA
.........................................................................................................
127
6.1
R
EFERÊNCIAS
...................................................................................................................
128
6.2
O
BRAS CONSULTADAS
.....................................................................................................
133
.
ix
INDICE
DE
TABELA
Tabela 1: Investimentos em Pesquisa Científica e Desenvolvimento Tecnológico no
Mundo – 1999................................................................................................................
4
Tabela 2: Maiores Empresas Obtentoras de Variedades de Soja no Brasil e sua
Participação no Mercado – 2005..................................................................................
38
Tabela 3: Unidades de Pesquisa da Embrapa com Atividades científicas envolvendo
a soja – 2005..................................................................................................................
54
Tabela 4: Cultivares lançados em 2005 pela Embrapa: características e regiões de
adaptação.......................................................................................................................
58
Tabela 5: Concentração da Produção Científica para a agropecuária no Mundo -
1999...............................................................................................................................
70
Tabela 6: Uso de semente legal nos principais Estados sojicultores Brasileiros -
2006..............................................................................................................................
71
Tabela 7: Cultivares monsoy safra 2005/2006: características e regiões de adaptação. 79
Tabela 8: Lançamentos futuros de cultivares Monsoy: características e regiões de
adaptação.......................................................................................................................
80
Tabela 9: Cultivares Fundação MT (TMG): Características e Regiões de adaptação... 86
Tabela 10: Unidades de serviços da Embrapa, Região de Atuação e Instituições
Parceiras. .......................................................................................................................
113
x
ÍNDICE
DE
GRÁFICOS
Gráfico 1: Evolução dos principais países produtores de soja no mundo 1935-2003..... 27
Gráfico 2: Evolução da área cultivada dos principais gêneros agrícolas brasileiros 1970
– 2004...............................................................................................................................
28
Gráfico 3: Evolução da Produção de Soja no Brasil por Regiões 1976/77-2006/07....... 31
Gráfico 4
: Natureza das Instituições de Pesquisa Obtentoras de Cultivares de Soja no
Brasil...............................................................................................................................
36
Gráfico 5: Dez Maiores Instituições de Pesquisa Obtentoras de Cultivares de Soja no
Brasil ................................................................................................................................
37
Gráfico 6 Número de lançamentos de variedades de soja de 1985 a 2001 por natureza
Pública e Privada. ...........................................................................................................
65
Gráfico 7
: Participação no volume total de sementes de soja certificadas no Brasil por
natureza Pública e Privada – 1996/97-1999/00................................................................
67
Gráfico 8: Localização (sede) das Instituições de Pesquisas que Comandam as Ações
de Pesquisa Biotecnológica para a Produção de Soja no Brasil – 2007...........................
103
Gráfico 9: Estados com maior número de inovações biotecnológicas para a soja...........
104
Gráfico 10: Crescimento da safra de grãos em milhões de toneladas (1990/91 –
2003/04) e da população de famintos em milhões de pessoas (1994-2001)...................
125
xi
ÍNDICE
DE
MAPAS
Mapa 1: Comparação da área de produção de soja no território brasileiro em 1970 e
2003................................................................................................................................
30
Mapa 2: Distribuição das Unidades de Pesquisa da Embrapa no Território Brasileiro
– 2006............................................................................................................................
48
Mapa 3: Distribuição dos Centros de pesquisa da Monsanto no Território Brasileiro
– 2006............................................................................................................................
77
xii
ÍNDICE
DE
QUADROS
Quadro 1: Síntese da Formação da Estrutura Territorial de Pesquisa Agrícola no
Brasil .............................................................................................................................
22
xiii
QUADRO
DE
SIGLAS
CNPA - Centro Nacional de Pesquisas Agropecuárias
CNPSO – Centro Nacional de Pesquisa da Soja
COODETEC - Cooperativa de Desenvolvimento Tecnológico
DPEA - Departamento de Pesquisas e Experimentação Agropecuária
EMBRAPA - Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
EMBRATER - Empresa Brasileira de Assistência Técnica e Extensão Rural
EMGOPA - Empresa Goiana de Pesquisa Agropecuária
EPAMIG - Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais
FUNDAÇÃO MT - Fundação de Apoio à Pesquisa Agropecuária do Mato Grosso
IAC - Instituto Agronômico de Campinas
IAPAR - Instituto Agronômico do Paraná
MAPA – Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento
SNPC - Serviço Nacional de Proteção de Cultivares
TMG – Tropical Melhoramento Genético
xiv
RESUMO
Esta dissertação tem como objetivo compreender as especificidades da constituição do
círculo de cooperação de pesquisa agrícola no território brasileiro. Parte-se do pressuposto
de que o processo de racionalização das atividades produtivas nos países periféricos dá-se
de forma seletiva, privilegiando aquelas atividades e aqueles lugares incorporados aos
circuitos produtivos hegemônicos, diretamente subordinados à lógica do mercado mundial.
Enfatiza-se a importância da ciência e da tecnologia como determinantes das
possibilidades de uso dos territórios no período atual e destaca-se o papel da tecnociência
como fator de dinamização dos subespaços incorporados àquela lógica. Toma-se como
exemplo a atividade produtiva da soja no território brasileiro e busca-se analisar o processo
de constituição do círculo de cooperação de pesquisa vinculado a essa produção agrícola.
Avalia-se, especialmente, a constituição política do círculo de cooperação de pesquisa da
soja e, destacando-se a atividade de pesquisa biotecnológica, discute-se a hierarquia
territorial da produção científica no país.
Palavras-chave: Uso do Território; Círculo de Cooperação; Agricultura Científica;
Pesquisa Científica e Desenvolvimento Tecnológico.
xv
ABSTRACT
This dissertation aims at understanding the specificities of the cooperation
constitution circle of agricultural research in Brazilian territory. It started from the
presumption that the rationalization process of the productive activities in peripheral
countries is given through a selective way, privileging activities and places
incorporated to the hegemonic productive circuits directly subordinated to the world
trade logic. It is emphasized the importance of the science and technology as
possible land use determining factors in the current period and pointed out the
technoscience role as the dynamizing factor of subspaces incorporated at that logic.
It takes as example the soy production activity in Brazilian territory and tries to
analyze the constitution process of the cooperation circle of research linked to this
agricultural production. Particularly, it assesses the constitution policy of the
cooperation circle of soy research and stands out the biotechnological research
activity discussing the territorial hierarchy of scientific production in the country.
Keywords: Territory Use; Cooperation Circle; Scientific Agriculture; Scientific
Research and Technologic Development.
1
INTRODUÇÃO
2
I
NTRODUÇÃO
As transformações intensas do modo de produção capitalista ao longo do século
XX foram convertendo o “projeto da modernidade”, originalmente fundado na busca do
progresso para emancipação do homem (HABERMAS, 2002) em um “projeto de
modernização”, como processo de racionalização e instrumentalização dos territórios e
das atividades produtivas, tudo com finalidade única de tornar o sistema econômico mais
eficiente.
Este projeto de modernização, estritamente orientado para o aprimoramento da
produção, está fundado na racionalização instrumental do espaço geográfico. Como um
sistema de objetos indissociável de um sistema de ações (SANTOS, 2002) instrumentais,
o espaço geográfico, ao longo do processo de planetarização do modo de produção
capitalista (CHESNAUX, 1996) foi se tornando cada vez mais produto da ciência e da
técnica, e deste modo foi se tornando cada vez mais operacional às finalidades e ao uso
corporativo dos territórios pelos agentes hegemônicos da economia e da política.
Contudo, como nos lembra Santos (1977; 1985), Ribeiro (2000) e Elias (2003),
este novo processo civilizatório defronta-se com as condições econômicas, sociais e
culturais de cada país, região ou lugar, adequando-se, em parte, a essas formações
socioespaciais, ao passo que aqueles mesmos subespaços se vêem, igualmente,
modificados pelos novos conteúdos de abrangência universal que passam a integrar e
influir em sua dinâmica interna. Os vetores da modernização promovem impactos
distintos quando se territorializam num país ou numa região que se impõem sobre uma
determinada formação socioespacial preexistente, cujas características determinam a
maior ou a menor facilidade para a introdução das novidades do período (SANTOS,
1977). Assim, o novo processo civilizatório, regido pela globalização do sistema
econômico, guarda em si um caráter contraditório, na medida em que o arranjo entre as
varáveis novas e as preexistentes assumem uma feição específica em cada território
nacional.
3
Nos países subdesenvolvidos o processo de modernização territorial assume
feições particulares, muito atreladas à estrutura de subordinação e dependência dessas
formações socioespaciais frente à ordenação do sistema econômico e político
internacional (RIBEIRO, 2000; FURTADO, 1974). Conforme Darcy Ribeiro (2000) nos
países da periferia do sistema capitalista o processo de modernização dar-se-ia de
maneira reflexa, através de atualizações históricas, isto é promovendo inovações tecno-
econômicas s vezes com defasagens) exigidas para a incorporação parcial desses
territórios aos modernos sistemas produtivos; enquanto, por outro lado, nos países
cêntricos, o desenvolvimento econômico auto-centrado e a indução ao progresso
tecnológico contínuo, possibilitariam que estes presenciassem uma aceleração evolutiva,
permitindo aos mesmos comandar o processo geral de modernização e impor uma divisão
internacional do trabalho a seu favor
1
.
Todavia, como o processo de racionalização do mundo é um processo de
instrumentalização dos territórios, fundado numa lógica técnico-científica e, portanto,
numa pragmática, a análise daqueles agentes que realizam a produção ou apenas
consomem tecnologia nos oferece uma situação privilegiada para o entendimento da atual
divisão interna e internacional do trabalho, haja vista a própria produção científica e sua
aplicação nos mais diversos domínios da vida, constituir-se na variável-chave do período
contemporâneo.
No atual estágio do desenvolvimento do capitalismo mundial, a crescente
segmentação das etapas do trabalho impõe uma intensificação das trocas e relações entre
os lugares, o que exige uma base territorial também instrumentalizada, que viabilize a
funcionalidade e eficácia do circuito espacial da produção - agora mais estendido - e a
possibilidade de comando das atividades - agora mais centralizado.
1
A respeito do processo de aceleração evolutiva promovido pelos países cêntricos do sistema capitalista e
o processo de modernização reflexa ao qual os países periféricos estariam submetidos, ver especificamente
o capitulo 7 – A Revolução Industrial, do livro de Darcy Ribeiro (2000).
4
De modo simultâneo e combinado ao alargamento da escala de abrangência do
circuito espacial da produção, verdadeiros rculos de cooperação vão se constituindo
para viabilizar e aprimorar aquele projeto de modernização.
Enquanto os circuitos espaciais de produção são definidos pela circulação de
bens e produtos no encadeamento de instâncias de produção geograficamente separadas
(produção, circulação, distribuição e consumo); os círculos de cooperação da produção
associam aos fluxos de bens materiais, outros fluxos de bens imateriais, isto é, capitais,
informações, conhecimentos e ordens, o que melhor permite determinarmos o lugar do
comando do processo de produção em geral (SANTOS, 1988; SANTOS, 1994; SANTOS;
SILVEIRA, 2001; ARROYO, 2003; ELIAS, 2003; FREDERICO e CASTILLO, 2003).
Entre os círculos de cooperação, a produção de ciência e tecnologia se torna,
como tudo no capitalismo, uma mercadoria. Das mais importantes forças produtivas
diretas e como pilar de poder de comando dos países desenvolvidos e das grandes
corporações multinacionais, a ciência e a tecnologia são variáveis que nos permitem
compreender a hierarquia entre os lugares, desde a escala regional até a escala mundial.
Hoje os investimentos na produção científica e tecnológica no mundo se
apresentam bastante concentrados nos países desenvolvidos, responsáveis por 68,7% do
total de investimentos (Tabela 1).
Tabela 1: Investimentos em Pesquisa Científica e Desenvolvimento Tecnológico no
Mundo - 1999
Região/País Estados Unidos
União Européia
Japão
Outros
Países
Concentração dos investimentos
em Pesquisa e Desenvolvimento
(em % do total mundial)
34%
21,3%
13,3%
31,3%
Adaptado de Contini; Reifshneider; Savidan (2004)
Tal concentração vem, de maneira geral, evidenciar a distância” entre aqueles
países e empresas que detém a capacidade de produzir e sistematizar o saber, e assim
comandam a evolução das bases técnicas da produção, e os outros que, sem capacidade de
5
produzir ciência e tecnologia tendem apenas a ocupar funções de execução da produção
na divisão internacional do trabalho.
A lógica e a dinâmica que dão ritmo à produção da tecnociência no mundo hoje
leva à constituição de uma hierarquia entre os lugares, dada de forma simultânea e
conjugada à desigual distribuição da riqueza e assimétrica concentração do poder de
comando do processo produtivo. Na atual divisão territorial do trabalho a distinção entre
lugares que hoje conduzem a produção de ciência e tecnologia e aqueles que somente
consomem ou a reproduzem, cria uma nova forma de dependência e domínio entre os
países e regiões (LOPES, 1969, 1998; SANTOS; SILVEIRA, 2001).
Essa forma de dominação via racionalização técnico-científica das atividades,
portanto uma racionalização pragmática dos territórios é uma nova forma de legitimação
da dominação, agora constituída por baixo” isto é, a partir das próprias estruturas de
funcionamento técnico das sociedades, diferentes da forma tradicional de dominação
realizada “por cima” - a partir das estruturas de poder dos Estados (HABERMAS, 1975).
Hoje, a própria constituição técnico-racional dos sistemas de objetos e de ações,
essencialmente intencionais, impõe um modo de funcionamento e controle das atividades,
seguindo aquele mesmo projeto técnico-econômico de modernização cujos fins únicos
são, atualmente, a busca pelo crescimento e a competitividade econômica. Assim
essencialmente técnico-instrumental, a lógica de organização do mundo segue os mesmos,
únicos e determinados interesses técnico-econômicos dos agentes hegemônicos da
sociedade. São nessas circunstâncias que Marcuse nos lembra que não é então apenas de
maneira acessória “[...] a partir do exterior, que são impostos à própria técnica fins e
interesses determinados eles intervêm na própria construção do aparato técnico: a
técnica é sempre um projeto (Projekt) histório-social; nela é projetado (Projekt-tiert)
aquilo que a sociedade e os interesses que a dominam tencionam fazer com o homem e
com as coisas. Tal objetivo da dominação é ‘material’ e, nessa medida, pertence à própria
forma da razão técnica” (apud HABERMAS, 1975, p. 304).
No desenvolvimento desta ciência utilitária, ou melhor, desta tecnociência que
tende a conceber e fundamentar a realização das atividades produtivas em todo lugar, se
6
imprime, concomitantemente, um verdadeiro projeto de mundo – aquele fundado na
racionalidade técnico-econômica e que concretiza, nos territórios nacionais, os projetos e
os interesses dos agentes hegemônicos da economia e da política.
Contudo, a produção técnico-científica, como fator que precede e concebe a
própria produção e organização territorial da produção recebe, neste nosso trabalho, um
tratamento analítico distinto da produção de outras tantas mercadorias. Esta distinção se
pelo próprio tempo que cada etapa do trabalho intelectual requer, na maioria dos casos
exigente de um “tempo” mais longo do que aquele necessário para a realização da
produção de outra qualquer mercadoria, mas também, e principalmente pelo poder que a
tecnociência possui de comandar a dinâmica territorial das atividades produtivas
modernas.
Com a intensificação do processo de cientifização e tecnificação do meio
geográfico a produção de tecnociência é, ela mesma, o meio que comanda a organização e
o funcionamento das atividades produtivas nos lugares e, ao mesmo tempo, é fator
determinante das possibilidades de uso e domínio dos territórios.
Num primeiro momento, a realização desse projeto de modernização da
produção via cientificização e instrumentalização dos territórios nacionais, se deu via
desenvolvimento de pesquisa científica por instituições públicas, sendo os Estados nações
responsáveis por garantir essa produção na maior parte dos países (BAIARDI, 1995;
LOPES, 1969, 1998)
Hoje, cada vez mais, são as próprias empresas, sobretudo as grandes corporações
multinacionais instaladas em diferentes territórios nacionais, que tendem a comandar as
atividades de pesquisa científica e desenvolvimento tecnológico
2
, concebendo
engenhosamente a própria atividade produtiva e o ritmo de produção de cada país
(LOPES, 1969, 1998; FURTADO, 1974; CONTINI; REIFSCHNEIDER; SAVIDAN,
2004). Através da criação de seus próprios centros de pesquisa e contando com parcerias
2
Nos Estados Unidos, por exemplo, 75,2% do total dos investimentos realizados em pesquisa científica e
desenvolvimento tecnológico advêm de empresas privadas, enquanto no Japão este índice alcança 72,7% e
na União Européia 61,7% (CONTINI; REIFSCHNEIDER; SAVIDAN, 2004).
7
estabelecidas com as instituições públicas de pesquisa, tais empresas usam
corporativamente os recursos territoriais dos países onde se instalam para a concretização
de seus projetos.
Nos países periféricos esse processo de modernização técnico-territorial
historicamente vem privilegiando as atividades produtivas e os circuitos de produção mais
vinculados ao mercado internacional (RIBEIRO, 2000; FURTADO, 1974; SANTOS,
1985; SANTOS; SILVEIRA, 2001). Tais transformações se o com o objetivo de tornar
o território mais eficiente, estreitamente alinhado aos novos imperativos e às novas
lógicas que regulam a dinâmica da organização e da realização da produção no período
atual.
No Brasil, a constituição do círculo de cooperação de pesquisa agrícola tem
seguido historicamente essa mesma orientação, dada pelo projeto de modernização
técnico-econômica do território, assumindo características semelhantes ao processo geral
de instrumentalização dos territórios que se consolida nos demais países periféricos. Isto
é, um processo de instrumentalização do território que tende a privilegiar aquelas
atividades e setores da economia muito ligados aos circuitos produtivos hegemônicos, o
que, por sua vez, trata também de reafirmar e aprofundar a função do país na divisão
internacional do trabalho.
O que vamos tratar aqui em nossa dissertação é das especificidades desse
processo de modernização em território brasileiro, tendo em vista a formação dos círculos
de cooperação da pesquisa científica, voltados para a modernização do processo de
produção agrícola. Esta nossa escolha se dá em decorrência da importância histórica que a
atividade agrícola possui no processo de formação do território nacional, constituindo-se
mesmo num dos mais importantes vetores da formação regional do país. Nosso objetivo
específico, todavia, será o de estudar, mais de perto, a constituição do círculo de
cooperação de pesquisa agrícola para a produção de soja, atividade produtiva que ao
longo da segunda metade do século XX se expandiu sobremaneira no território brasileiro,
firmando-se como principal commoditie agrícola produzida no país. A expansão e a
consolidação da produção da soja no Brasil constitui-se num importante vetor, talvez o
8
mais representativo, da orientação do processo de cientifização da atividade agrícola
nacional. A racionalidade técnico-científica que predomina nessa atividade agrícola levou
o Brasil a figurar como um dos maiores produtores da oleaginosa no mundo
3
, estando esta
atividade agrícola diretamente alinhada às demandas e às lógicas do mercado mundial de
commodities.
Com o propósito então de dissertar sobre o processo de constituição do círculo
de cooperação de pesquisa agrícola no Brasil, a partir da dinâmica da produção agrícola
no atual período da globalização, realizamos, num primeiro momento, uma periodização
como esforço para apreender a formação daquilo que estamos chamando de base
geográfica do círculo de cooperação da pesquisa agrícola: a estrutura territorial de
pesquisa. Por estrutura territorial de pesquisa compreendemos o conjunto de lugares e
instituições que individualmente, ou articulados através de redes corporativas, realizam
trabalhos técnico-científicos (pesquisa, desenvolvimento tecnológico, experimentos
científicos de campo, etc.) com a finalidade de viabilizar e/ou aprimorar a produção
agrícola desenvolvida no país. Com esta definição acreditamos ser possível apreender a
complexa organização socioespacial que envolve as atividades de pesquisa científica
agrícola no território brasileiro. Entendendo estrutura como uma realidade mista e
contraditória de sistemas de objetos e sistemas de ações, a estrutura territorial de pesquisa
compreenderá as redes de investigação corporativas, assim como as possíveis interações
que elas estabelecem entre si para efeito da produção de inovações tecnológicas.
Assim é que buscando encontrar um conjunto de variáveis que mantém certo
equilíbrio e coerência (SANTOS, 1985), e que nos permita identificar secções de tempo
que caracterizam uma dada forma da promoção e desenvolvimento da pesquisa agrícola
3
Não poderíamos deixar de mencionar outros fatores que facilitaram a consolidação da moderna produção
da soja no Brasil, tais como a existência de áreas disponíveis para a expansão dessa atividade agrícola no
território nacional; a presença de condições topográficas favoráveis à prática de uma atividade agrícola
mecanizada, especialmente no centro-oeste; a conjuntura favorável à produção e comercialização da
oleaginosa junto ao mercado mundial de commoditie, etc. Entretanto, sem os progressos técnico-
científicos para a viabilização dessa produção agrícola no território brasileiro, o alcance da máxima
eficiência na execução do processo produtivo e a incorporação de alguns subespaços nacionais aos
circuitos produtivos internacionalizados, a partir do atual imperativo da competitividade econômica, não
seriam possíveis.
9
no território brasileiro, sugerimos três momentos da formação da estrutura territorial de
pesquisa no Brasil - apresentados no primeiro capítulo.
No segundo capítulo voltamos nossa análise buscando entender a dinâmica
territorial da produção da soja e a constituição do círculo de cooperação de pesquisa que
se arquiteta no país, no mais das vezes com o propósito de viabilizar a expansão e o
aprimoramento daquela atividade produtiva no território brasileiro.
No terceiro capítulo de nossa dissertação buscamos analisar a constituição
política do círculo de cooperação de pesquisa da soja, tomando como ponto de partida as
ações e as estratégias do Estado e do Mercado.
No quarto capítulo, tomando a pesquisa biotecnológica como principal sistema
de atividade que norteia toda a nossa investigação, buscamos estabelecer a hierarquia
territorial da produção científica e a morfologia espacial da difusão das inovações
biotecnológicas no território brasileiro.
Por fim, à guisa de conclusão, discorremos sobre o caráter contraditório que a
constituição desse denso círculo de cooperação de pesquisa agrícola evidencia, resultado
do próprio uso corporativo do território brasileiro aprimorado sob os auspícios da
tecnociência no atual período técnico-científico-informacional da história.
10
I
GÊNESE DA ESTRUTURA
TERRITORIAL DE PESQUISA
AGRÍCOLA NO BRASIL
11
1.
1
P
ERÍODO
T
ÉCNICO
-C
IENTÍFICO E
I
NCIPIÊNCIA DA
P
ESQUISA
A
GRÍCOLA
As atividades agrícolas sempre tiveram grande importância para a formação
socioespacial brasileira. Toda a economia nacional, desde o início de sua constituição,
sempre esteve muito subordinada às demandas externas por produtos agrícolas. O
desenvolvimento de uma economia primário-exportadora foi responsável por comandar o
processo de formação de regiões especializadas na produção de cana-de-açúcar, cacau,
café, borracha, algodão, etc. no interior do país (PRADO JR, 1980). Nestas circunstâncias,
porções do território nacional caracterizaram-se, desde o início, por ter suas atividades
produtivas diretamente ritmadas e reguladas pelas dinâmicas e exigências do mercado
internacional.
Assim, quando o modo de desenvolvimento do capitalismo mundial passa a
depender das possibilidades de realização e otimização da produção, propiciado pelo
progresso técnico-científico, o investimento em ciência e tecnologia passa a ser
preocupação do Estado, responsável então por criar os primeiros institutos e centros de
pesquisas que comporiam os atuais círculos de cooperação da pesquisa científica.
Os esforços iniciais para a promoção e o desenvolvimento da pesquisa agrícola
no Brasil foram realizados pelo Estado brasileiro, a partir da criação no país das primeiras
escolas superiores de agronomia e primeiros institutos de pesquisa agropecuária, no final
do século XIX.
Até este momento, a atividade agrícola brasileira dependia muito mais das
condições do meio natural das regiões onde se desenvolvia a produção, do que da
disponibilidade de capital que possibilitasse equipar tecnicamente a produção. A escassez
de instrumentos artificiais que possibilitassem maior eficiência e operacionalização da
produção tornavam os fatores naturais (clima, solo, relevo) variáveis-chave do
desenvolvimento e expansão da atividade agrícola no território brasileiro.
Os primeiros investimentos do Estado brasileiro para acompanhar o movimento
mundial de desenvolvimento técnico-científico do capitalismo, que aqui dinamiza
12
principalmente as atividades agrícolas, se deram através da criação da primeira escola de
agronomia do Brasil, em Cruz das Almas-BA, no ano de 1877, seguida da fundação, em
1883, da Escola Superior de Agricultura de Pelotas no Rio Grande do Sul e em seguida
pela fundação da Estação Agronômica de Campinas (1887), que passou em 1892 do
estatuto de Estação, para o estatuto de Instituto Agronômico (IAC), culminando este
primeiro período de criação de um sistema de produção tecno-científico brasileiro, com a
fundação da Escola Superior de Agronomia Luis de Queiroz (ESALQ) em Piracicaba-SP,
no ano de 1901; além de outras universidades e centros de pesquisa que se instalam no
território brasileiro a partir de então (RAMOS, 2001; RIVALDO, 1986; FREITAS
FILHO, 1986).
Estas medidas governamentais vão reforçar ainda mais a função agrícola do país
na divisão internacional do trabalho, continuando a criar, durante as primeiras décadas do
século XX, outras instituições de serviços cnicos para o auxílio tanto na produção do
algodão (1915), defesa animal (1920), café (1933) e, a partir dos anos 40, institutos de
investigação orientados ao desenvolvimento da agropecuária regional (Amazônia, Centro-
Oeste, Bahia, Recife) (SANTOS; SILVEIRA, 2001). Assim, o Estado brasileiro
promoveu, paulatinamente, a criação de um conjunto de institutos de pesquisas
agropecuárias no território nacional, que seriam os embriões de uma rede nacional de
pesquisa agrícola que viria a se consolidar no território somente na década de 1970
(SANTOS; SILVEIRA 2001).
Neste momento a dinâmica da institucionalização da pesquisa agropecuária
subordinava-se ao ritmo acelerado das demandas urbanas, quer pela força do processo de
agro-industrialização que se iniciava, quer pelas possibilidades de alcance de novos
mercados para os produtos agropecuários. Neste momento o modelo de desenvolvimento
da pesquisa agropecuária já se caracterizava pelo padrão produtivista, cuja finalidade era o
aumento da produtividade e da produção em escala, o que levou ao desenvolvimento de
pesquisas que buscassem a adaptação ótima de gêneros agrícolas à diversidade natural das
regiões produtoras.
13
Essas instituições de pesquisa regionais desenvolveram seus trabalhos voltados
principalmente ao aprimorando da produção de gêneros agrícolas de relevância regional e
também no sentido de adaptar lavouras e tecnologias estrangeiras às condições regionais
de produção. Essas primeiras investidas científicas, realizadas por instituições públicas,
eram ainda incipientes, no sentido de que eram experiências científicas isoladas que,
mesmo configurando um círculo de cooperação de pesquisa agrícola, eram atividades
regionalmente circunscritas; não havia ainda no país uma rede mais consolidada de troca
de informação e conhecimento. o exemplos da constituição destes primeiros círculos de
cooperação da pesquisa agrícola regional, as atividades desenvolvidas para a produção do
café e da cana de açúcar no Estado de São Paulo, as atividades de pesquisa da soja no Rio
Grande do Sul e as atividades de desenvolvimento da produção do cacau no sul da Bahia.
As investidas do Estado brasileiro em constituir uma rede nacional de pesquisa
agropecuária passariam ainda pela criação em 1938, do Centro Nacional de Pesquisas
Agropecuárias (CNPA), vinculado ao ministério da agricultura, seguido, na década de 60,
da criação do Departamento de Pesquisas e Experimentação Agropecuária (DPEA) que
substituiu o CNPA. Apesar dessas tentativas do Estado de prover o território brasileiro de
uma estrutura de pesquisa, estas políticas não conseguiram integrar um sistema nacional
de pesquisa e, somente na década de 1970, durante o regime militar, foi que uma política
de integração nacional do sistema de pesquisa viria viabilizar o projeto de modernização
da atividade agrícola no território brasileiro.
1.
2
I
NTEGRAÇÃO
T
ERRITORIAL E
C
ONSTITUIÇÃO DO
S
ISTEMA
N
ACIONAL DE
P
ESQUISA
A
GROPECUÁRIA
.
É somente a partir da segunda metade do século XX, que começam a se esboçar
no Brasil as transformações nas bases territoriais que possibilitariam a economia nacional
integrar-se como um sistema produtivo nacional, ao mesmo tempo em que, possibilitariam
estreitar ainda mais as relações com o mercado internacional.
14
O projeto de integração do território brasileiro a partir das décadas de 1960 e
1970 se realizou, principalmente, através da constituição de uma base técnico-científico
informacional que viabilizaria os projetos de modernização das atividades produtivas no
território nacional. Uma verdadeira revolução tecnológica nos sistemas de transportes e
dos sistemas de informação e comunicação possibilitou o aprofundamento da divisão
territorial do trabalho, a ampliação da área de produção e o aumento da vida de relações
entre os lugares no território brasileiro.
Esses sistemas de engenharia instalados no território possibilitaram que novas
interdependências e novas complementaridades fossem se estabelecendo entre as diversas
atividades e regiões no país. Esta fluidez do território permitiu um adensamento das
relações e das conexões entre os lugares, isto quer dizer, permitiu uma maior solidariedade
organizacional entre os eventos. Estas novas relações solidárias são essencialmente
funcionais, porque são ordens estabelecidas verticalmente, determinações exógenas ao
lugar e que articulam mecanicamente os pontos onde se realizam as atividades que
integram etapas do circuito espacial de produção e do círculo de cooperação da produção.
A difusão seletiva dos sistemas de engenharia e dos sistemas de informação no
território nacional foi, portanto, responsável também por viabilizar a constituição dos
círculos de cooperação da pesquisa no Brasil.
Assim é que durante a década de 1970 intensificaram-se também os esforços do
poder público para a transformação das bases técnicas que viabilizariam segmentos da
produção agrícola nacional. A partir da elaboração de uma política tecnológica, proposta
como pilar do projeto de modernização das atividades econômicas, o Estado brasileiro
fundou instituições responsáveis por conduzir as pesquisas de inovações técnico-
científicas que tornassem a atividade agrícola do país mais adequada ao modelo de
desenvolvimento do capitalismo, naquele momento.
Pautadas por essa mesma perspectiva, as políticas de modernização da
agricultura nacional, organizam a atividade agrícola de forma integrada às atividades
industriais, tanto à montante quanto à jusante da produção agrícola propriamente dita.
Incorporada àquele modelo de modernização técnico-econômica, as atividades agrícolas,
15
principalmente aquelas atividades de produção de commodities sofrem profundas
mudanças na sua estrutura produtiva, passando a se integrar de forma muito dependente e
subordinada a outros setores da economia (indústria química e mecânica, serviços,
indústria de processamento e aos setores de atividade de pesquisa e desenvolvimento
tecnológico) (MÜLLER, 1989; DELGADO, 1985; GRAZIANO DA SILVA, 1981).
A nova organização da estrutura produtiva em complexos agroindustriais exigia
investimentos territoriais para que o projeto de integração agricultura-indústria se
concretizasse e para que a atividade de produção agrícola respondesse positivamente à
nova dinâmica econômica que impunha o modelo empresarial de desenvolvimento do
capitalismo no campo, naquele momento (MÜLLER, 1989; DELGADO, 1985;
GRAZIANO DA SILVA, 1981).
É nestas circunstâncias que o Estado brasileiro cria, no início da década de 1970,
a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) responsável por realizar
pesquisas com culturas selecionadas, desenvolver novos procedimentos e métodos de
produção, tudo para garantir maior eficiência produtiva à agricultura. Na mesma época o
governo federal cria a Empresa Brasileira de Assistência Técnica e Extensão Rural
(EMBRATER) responsável por difundir regionalmente as inovações tecnológicas. Essa
nova estrutura organizativa do rculo de cooperação da pesquisa agrícola, fundamentava
o novo padrão técnico-científico da produção agrícola que, no entanto, se instalava
seletivamente no território brasileiro.
Com a criação da Embrapa, o círculo de cooperação da pesquisa agrícola
nacional sofre uma profunda mudança de ordem estrutural. Aquelas pesquisas até então
realizadas, sobretudo a partir de iniciativas particulares e isoladas, passariam a contar com
uma coordenação central de âmbito nacional, realizada pela Embrapa. Da mesma maneira,
a constituição de uma rede nacional de instituições de pesquisa e estações de
experimentação no país deu origem a uma estrutura nacional de pesquisa, que permitiria a
criação de inovações técnico-científicas, cuja difusão poderia abranger todo o território
brasileiro. A partir de uma extensa estrutura territorial de pesquisa e da produção de uma
tecnociência eficiente e utilitária, baseada tanto na introdução de tecnologias estrangeiras
16
no país, como na promoção de iniciativas e inovações técnicas próprias, novas
possibilidades de uso do território brasileiro são oferecidas aos agentes hegemônicos da
economia agrícola, sobretudo estimulados pelas novas possibilidades de aumento da
exploração da renda fundiária.
A fundação da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e os
planos de integração governamentais que equiparam o território nacional com sistemas de
informação e sistemas de transporte tornaram o território mais fluido, o que possibilitou
também que se desenvolvessem programas nacionais de pesquisa, agora mais integrados.
A maior fluidez do território viabilizou a integração articulada das atividades de
desenvolvimento de pesquisas técnico-científicas entre universidades, fundações e centros
de pesquisas instalados em diferentes pontos do território nacional, formando uma extensa
e complexa organização coordenada pela Embrapa. Deste modo, de maneira efetiva,
constitui-se pela primeira vez no país, uma rede solidária de pesquisas, funcionalmente
articulada em escala nacional para a realização de grandes programas de pesquisa
agrícola.
Além dos esforços do governo federal, outras iniciativas também se somaram e
se articularam a essa política nacional de desenvolvimento tecnológico. Para além das
pesquisas integradas pela Embrapa, algumas instituições estaduais de pesquisa
agropecuária promoveram seus próprios programas de pesquisa agrícola, como, por
exemplo, aqueles liderados pelo Instituto Agronômico de Campinas (IAC), o Instituto
Agronômico do Paraná (IAPAR), a Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais
(EPAMIG), a Empresa Goiana de Pesquisa Agropecuária (EMGOPA), entre outras, sem
esquecer das ações de igual natureza realizadas por Universidades Federais e Estaduais
localizadas, especialmente, nas regiões sul e sudeste do Brasil. Durante este período, de
forma aparentemente tímida, a iniciativa privada investe no desenvolvimento de pesquisas
tecnológicas para o aprimoramento de suas atividades produtivas. Centros de pesquisas
ligados a cooperativas, fundações e pequenas empresas contam com o investimento direto
do setor produtivo privado para o desenvolvimento de pesquisas voltadas para atender
seus próprios interesses.
17
Toda essa estrutura nacional da rede de produção das pesquisas agrícolas, com a
instalação de 37 unidades da Embrapa em diversas regiões do país, resultou na
interiorização e expansão do meio técnico-científico, criando novas e modernas regiões de
produção agropecuária, contribuindo para a integração do território nacional segundo
aquele modelo de desenvolvimento econômico hegemônico.
1.
3
G
LOBALIZAÇÃO
E
CONÔMICA E
T
RANSNACIONALIZAÇÃO DA
P
ESQUISA
A
GRÍCOLA NO
B
RASIL
O modo de desenvolvimento do capitalismo no atual período, a que chamamos
de globalização, impõe um ritmo acelerado às transformações nas formas de produção,
tudo movido pela ideologia da competitividade. Desse modo o conhecimento técnico-
científico se tornou uma mercadoria-chave do período atual, porque “o conhecimento da
última técnica, do mais novo produto, da mais recente descoberta científica implicam a
possibilidade de alcançar uma importante vantagem competitiva”, tornando mais dinâmica
a economia de mercado (HARVEY, 1992).
Os anos 90 representaram uma nova fase na dinâmica, organização e
normatização da atividade de pesquisa científica, especialmente, para a moderna produção
agrícola no Brasil. Esta nova dinâmica da produção agrícola brasileira resultou de um
esforço e investimento pesado em desenvolvimento de pesquisas e tecnologias. Tal
investimento, que é também territorial, vem ocorrendo, no entanto, de forma seletiva em
subespaços ligados aos modernos e internacionalizados circuitos espaciais de produção de
commodities.
O “fator de competitividade territorial” entre os subespaços da moderna
produção agrícola, se relaciona ao processo de aprimoramento constante dos sistemas
técnico-científicos que cada lugar adota para tornar-se mais eficiente e afinado com as
novas lógicas e exigências do mercado. Daí, o esforço e investimento do Estado e das
18
empresas em renovar as forças produtivas no campo, através do investimento em
desenvolvimento das inovações técnicas como estratégia para acelerar o giro do capital e
para o controle do uso sobre essas mesmas bases técnicas e territoriais da moderna
atividade de produção agrícola no território brasileiro.
Os esforços para o desenvolvimento técnico-científico para modernizar a
atividade agrícola passaram a se concentrar, especialmente no período atual, na área de
desenvolvimento de biotecnologia. As novas técnicas e procedimentos adotados pela
engenharia genética (como por exemplo, o melhoramento genético de espécies vegetais)
tornam possível um aumento ainda maior da produtividade, a expansão do cultivo em
outras áreas do território brasileiro e a criação de cultivares cuja diversidade e qualidade
tornam a atividade de pesquisa, uma atividade ainda mais estratégica, para que a atividade
de produção agrícola seja mais e mais eficiente e competitiva.
Neste período de aceleração das transformações, de criação e expansão dos
mercados, tanto as empresas de capital nacional quanto as grandes corporações
transnacionais que aqui se instalam ampliam pesadamente seus investimentos nas
pesquisas de inovação e comercialização das novas biotecnologias.
O Estado brasileiro como principal agente cooperador do desenvolvimento da
pesquisa, neste momento em que a ideologia neoliberal também se globaliza, promove
políticas que estimulam a iniciativa privada a participar da expansão da atividade de
pesquisa e desenvolvimento; expansão esta que acaba sendo seletiva, na medida em que
tais atividades contribuem com os propósitos e interesses de produzir commodities para a
exportação. Nesse sentido, o Estado brasileiro institui normas de comercialização das
inovações biotecnológicas, e tais normas garantem às empresas de biotecnologia o
recebimento de royaltys através da promulgação da lei de proteção de cultivares em
1997. Com o conjunto dessas novas normas de uso das tecnologias, definitivamente, a
atividade de pesquisa voltada para a agricultura científica torna-se um dos mais rentáveis
negócios do mercado de inovações.
É nestas circunstâncias que, nos anos 1990, grandes corporações estrangeiras
ligadas ao setor de agroquímicos e de biotecnologia, tais como as estadunidenses Dow
19
Agroscience, Du Pont e Monsanto; a suíça Syngenta; a alemã Bayer, e a holandesa Nidera
expandiram suas atividades no território brasileiro, muitas vezes através de aquisição de
empresas nacionais, sempre com o objetivo de explorar esse mercado de pesquisa
tecnológica. Com estratégias territoriais seletivas e vultosos investimentos em grandes
programas de pesquisa, essas grandes corporações integraram-se ao círculo de cooperação
de pesquisa agrícola nacional, tornando-se mesmo, alguns dos principais agentes
promotores das inovações técnico-científicas para o desenvolvimento da moderna
agricultura no Brasil. De forma clara, esses grandes empreendedores usam o território
nacional a seu talante, selecionando as regiões e a produção de gêneros agrícolas que
tenham maior inserção no mercado mundial de commodities.
Esses são os “pontos luminosos” de que nos falam Milton Santos e Maria Laura
Silveira (2001), lugares onde a moderna atividade agrícola se caracteriza como “zona de
mercado” das grandes empresas de biotecnologia. Configurando-se de modo descontínuo
no território brasileiro as regiões especializadas na produção de commodities constituem-
se nas áreas privilegiadas pelas empresas privadas para a criação de novas tecnologias.
Desse modo, tais agentes operam uma “segmentação vertical do território nacional”, haja
vista seus interesses o integrarem o território como um todo e de forma contígua, mas
sim, incorporarem pedaços do território nacional às estratégias transnacionais de
acumulação. Neste sentido, pode-se dizer que essas estratégias de ação das empresas que
usam o território como mercado, promovem uma verdadeira fragmentação do território
nacional (SANTOS; SILVEIRA, 2001, SANTOS, 1989). Assim também empresas
privadas nacionais, como a Fundação Apoio à Pesquisa Agropecuária do Mato Grosso
(Fundação MT), a Cooperativa de Desenvolvimento Tecnológico (COODETEC) e a
Tropical Melhoramento Genético (TMG), entre outras do segmento de pesquisa em
biotecnologia para a agricultura científica, foram criadas e/ou ampliaram seus programas
de pesquisa também de maneira seletiva e desigual no território brasileiro.
A maior participação das empresas transnacionais e empresas privadas nacionais
no mercado de biotecnologia para a agricultura científica, ampliou sobremaneira o poder
20
de comando desses agentes na determinação das possibilidades de uso agrícola do
território, segmentando seletivamente o mercado, o território nacional.
O maior interesse da iniciativa privada no desenvolvimento de pesquisas para o
aprimoramento da produção de commodities se justifica pelo “êxito econômico” do
desenvolvimento da agricultura científica em alguns subespaços do território nacional,
aqueles incorporados ao circuito hegemônico do agronegócio.
É exemplo da seletividade e concentração dos esforços de pesquisa e
desenvolvimento biotecnológico, o volume total de sementes de soja, criadas e
certificadas no Brasil, em 2005. Cerca de 60% das sementes certificadas o de soja,
enquanto que, somente 15% das sementes certificadas o de trigo, 13% de milho, 8% de
arroz e 4% de outros gêneros (EXAME, 2005). Outro exemplo da seletividade e
centralidade das iniciativas e investimentos para inovação agroquímica da lavoura da soja
é o consumo de defensivos, haja vista esta lavoura ter sido responsável por 50% do
volume total de consumo em 2005, enquanto o algodão foi responsável por 10% do
volume de consumo, o milho 7% e a cana-de-açúcar 7%. (EXAME, 2005). A atividade de
criação de cultivares de soja figura como um importante e rentável negócio o que, por sua
vez, vem também atraindo a iniciativa privada para promover maiores esforços na criação
de novas variedades, atividade esta estratégica e que precede a realização do circuito
produtivo propriamente dito, ou seja, antecede o segmento sementeiro do agronegócio da
soja.
Constituído, então, por instituições públicas e privadas, nacionais e internacionais
o círculo de cooperação de pesquisa agrícola no Brasil vem se redefinindo e ganhando
uma nova extensão no período atual. As redes de pesquisa que geram as inovações
biotecnológicas empregadas na moderna produção agrícola nacional ganham uma
dimensão transnacional. Com o ingresso de grandes empresas transnacionais no mercado
brasileiro”, determinadas biotecnologias criadas em países desenvolvidos passaram a ser
introduzidas e difundidas amplamente no território brasileiro, como é o caso das
variedades transgênicas produzidas pelas multinacionais Monsanto e Bayer.
21
Deste modo, os lugares onde se usam as tecnologias criadas pelas grandes
corporações transnacionais, definitivamente, não mais coincidem com o lugar de criação
dessas tecnologias, o que nos permite afirmar que hoje a produção de ciência e tecnologia
define a atual divisão internacional do trabalho e da riqueza.
Assim, as redes de pesquisas ganham uma nova dimensão, passando agora a
integrar instituições (empresas, universidades, centros de pesquisa) nacionais e
estrangeiras, dadas exatamente as novas possibilidades de fluidez das informações e da
conexão possível entre diferentes e distantes lugares no planeta. Neste sentido, o rculo
brasileiro de cooperação de pesquisa agrícola, que no início do século XX era
predominantemente regional, hoje transcende as fronteiras nacionais, dadas as condições
contemporâneas de instantaneidade e simultaneidade dos eventos, o que possibilita de
outra parte, maior densidade do feixe de relações entre o lugar e o mundo (SANTOS,
2002).
A seguir apresentamos um quadro que busca sintetizar o processo de constituição
do círculo brasileiro de cooperação de pesquisa agrícola. Nele apresentam-se, grosso
modo, tanto os agentes (Universidades, Institutos, Empresas) que se tornam
predominantes na cooperação científica para a atividade agrícola como também, levam-se
em consideração as transformações e as dinâmicas socioespaciais que animam o território
brasileiro no contexto de cada um dos momentos (Quadro 1).
22
Quadro 1: Síntese da Formação da Estrutura Territorial de Pesquisa Agrícola no Brasil
Org.: Francisco das Chagas do Nascimento Júnior
Agentes predominantes Escala da cooperação Características das
atividades de pesquisa
científica e tecnológica
Características da
atividade agrícola
Contexto
Geográfico
Primeiro Período
(1870 ~ 1960)
Universidades e Institutos
Regionais de Pesquisa
Agropecuária.
Local/Regional
(ações isoladas,
circunscritas
regionalmente).
Adaptação de tecnologias
estrangeiras e início de ações
sistemáticas de pesquisa no
país.
Baixo conteúdo técnico-
científico. Dependência
dos condicionantes
naturais.
Produção Primário-
exportadora.
Segundo Período
(1970 ~ 1980)
Embrapa, Empresas
Estaduais de Pesquisa
Agropecuária,
Universidades e Institutos
Regionais de Pesquisa
Agropecuária.
Regional/Nacional
(criação de uma rede
nacional de pesquisa
agropecuária).
Elaboração dos Programas
Nacionais de Pesquisa
Agropecuária.
Desenvolvimento da pesquisa
agrícola nacional (através da
criação de tecnologias e
métodos de cultivo próprios)
e consolidação da Embrapa
como principal instituições de
pesquisa em agricultura
tropical do mundo.
Cientifização seletiva da
agricultura brasileira.
Redefinição do espaço
agrícola nacional com a
expansão e a
intensificação territorial
da produção de
commodities.
Política de
integração e
desenvolvimento
nacional e
modernização da
agricultura.
Constituição dos
Complexos
Agroindustriais.
Terceiro Período
(1990 ~ ...)
Embrapa, Empresas
Privadas Nacionais e
Empresas Multinacionais
de Pesquisa
Biotecnológica.
Nacional/Internacional
(Constituição de redes
nacionais e
internacionais de
pesquisa).
Mercantilização das
atividades de pesquisa
agrícola com a criação de
normas que asseguram a
exploração comercial aos
inventores de cultivares.
Ascende a produção de
lavouras transgênicas no país.
Atividade
essencialmente
instrumental, baseada na
racionalidade técnico-
científica para o alcance
da competitividade
econômica da produção
nos subespaços
especializados.
Globalização dos
circuitos
produtivos e dos
círculos de
cooperação da
produção.
Constituição do
modelo da
Agricultura em
rede.
23
II
DINÂMICA TERRITORIAL DA PRODUÇÃO
E A CONSTITUIÇÃO DO CÍRCULO DE
COOPERAÇÃO DE PESQUISA DA SOJA
NO BRASIL
24
II
D
INÂMICA
T
ERRITORIAL DA
P
RODUÇÃO E A
C
ONSTITUIÇÃO DO
C
ÍRCULO DE
C
OOPERAÇÃO DE
P
ESQUISA DA
S
OJA NO
B
RASIL
Como havíamos dito anteriormente, as atividades de pesquisa científica e
desenvolvimento tecnológico para a agricultura vem, historicamente, privilegiando alguns
gêneros agrícolas e alguns subespaços nacionais, especialmente aqueles funcionais aos
circuitos espaciais de produção internacionalizados. Neste sentido, as principais
commodities exportadas pelo Brasil vem reunindo um denso círculo de cooperação de
pesquisa científica, o qual garante a eficiência da produção e a viabilização do território
nacional para integrar o sistema econômico internacional. Da “vocação” eminentemente
“agroexportadora” que tanto caracteriza a função do Brasil na divisão internacional do
trabalho, a produção de soja durante a segunda metade do século XX, é aquela produção
que melhor representa a orientação do projeto de cientifização da agricultura nacional.
Lavoura estranha ao território brasileiro até o final do culo XIX, a produção de
soja surge como atividade agrícola fundada na pesquisa científica, fruto das primeiras
tentativas de adaptação desse gênero agrícola às regiões tropicais. Num primeiro instante
(1882) é no estado da Bahia que se introduz o cultivo da oleaginosa como espécie
forrageira através de testes e experimentos realizados pela Universidade de Cruz das
Almas BA (EMBRAPA, 2004). Entretanto é somente nos anos 40 do século XX, que o
cultivo de soja ganha importância econômica, passando a constar do anuário agrícola do
Rio Grande do Sul (EMBRAPA, 2004; TOLEDO, 2005; MIYASAKA; MEDINA, 1981).
Daí em diante as atividades técnico-científicas para a produção de soja se ampliam e se
intensificam através da constituição de um complexo círculo de cooperação de pesquisa
científica responsável por viabilizar e aprimorar a produção de soja no território brasileiro.
Até meados da década de 1960, a produção da oleaginosa era praticamente restrita
à região sul do Brasil, onde as condições naturais eram favoráveis para iniciar produção
em escala. Nesse momento esforços de pesquisa aí também se concentravam, realizados de
maneira ainda incipiente, por iniciativas isoladas de escolas de agronomia, órgãos
25
estaduais de pesquisa e algumas cooperativas que tratavam de adaptar tecnologias
estrangeiras ao sul do país (EMBRAPA, 2004; MIYASAKA; MEDINA, 1981). Todavia,
nos anos 1950, por conta da gradativa relevância econômica que a soja passa a adquirir no
mercado internacional de commoditie, surge, no Brasil, o primeiro programa de pesquisa
de monta voltado ao desenvolvimento da produção de soja, conduzido pelo Instituto
Agronômico de Campinas (IAC) no estado de São Paulo.
Com a elevação da demanda interna e externa da soja e seus derivados
(GIORDANO, 1999), com a constituição de um complexo agroindustrial da soja nas
regiões sul e sudeste, com os projetos de modernização da agricultura nacional
(
MÜLLER,
1989, DELGADO, 1985) e com a execução de programas governamentais de
desenvolvimento e colonização do território brasileiro (
SHIKI; GRAZIANO DA SILVA;
ORTEGA, 1998)
no final dos anos 60 e início dos anos 70, investiu-se pesadamente no
aperfeiçoamento das pesquisas técnico-científicas buscando o aumento da produção e da
produtividade da soja no Brasil. É neste contexto de indução às transformações das bases
técnicas no campo e busca pelo o aumento da produção da oleaginosa, que o Estado
brasileiro cria no Paraná, o Centro Nacional de Pesquisa da Soja CNPSO (Embrapa
Soja), vinculado à Embrapa e responsável pelo desenvolvimento das pesquisas
tecnológicas e pelo aprimoramento da lavoura, agora em escala nacional.
No decorrer dos anos 70 e 80, a constituição de um meio técnico-científico e
informacional tornou mais fluído o território brasileiro, possibilitando a circulação de bens
e informações e, conseqüentemente, a ocupação periférica do território dando origem ao
fenômeno que Milton Santos chama de “fábrica moderna dispersa (SANTOS, 1989).
Esse processo de redefinição das regiões agrícolas especializadas no interior do país
caminhou conjuntamente com a expansão e a intensificação da produção de soja em
diversas regiões brasileiras. Despontando, no final da década de 1970, como um dos
principais produtores mundiais de soja, o Brasil amplia e investe ainda mais nas atividades
de pesquisa e desenvolvimento tecnológico com a finalidade de garantir a eficiência na
produção da soja nos subespaços incorporados aos circuitos produtivos hegemônicos da
agroindústria.
26
Neste momento de expansão e interiorização da produção da soja foi fundamental
o desenvolvimento técnico-científico resultante dos programas nacionais de pesquisas
desenvolvidos e coordenados pela Embrapa, mas também, os programas desenvolvidos
pela iniciativa de outros agentes públicos e privados, para promover inovações técnicas
necessárias à viabilização regional da produção. Foram os casos dos programas
conduzidos pela Empresa Goiana de Pesquisa Agropecuária (EMGOPA) em Goiás, a
Universidade Federal de Viçosa (UFV) em Minas Gerais, a Organização de Cooperativas
Agrícolas do Paraná (OCEPAR) e a FT-Sementes no Paraná e a Fundação Centro de
Experimentação e Pesquisa (FUNDACEP) no Rio Grande do Sul (EMBRAPA, 2004).
De acordo com Ivo Carraro, diretor presidente da Associação Brasileira de
Obtentores Vegetais (BRASPOV) apesar da participação do Estado ser majoritária na
realização das pesquisas agronômicas no período anterior à aprovação da Lei de Proteção
de Cultivares, em 1997, a iniciativa privada também participou do processo de
aprimoramento tecnológico e modernização da produção brasileira de soja.
Através da organização dos produtores em cooperativas, como também de
pesquisadores independentes que conseguiram obter o apoio necessário
através de parcerias com o setor produtivo, formaram-se empresas com
equipes de pesquisa que foram geradores de produtos alternativos
competitivos, num trabalho perfeitamente integrado com as entidades
oficiais. Neste período houve um efeito somatório importante, criando-se
um ambiente de saudável competição entre as diferentes equipes que
promoviam o melhoramento genético da soja, e que catalisavam as demais
áreas do conhecimento, num processo extremamente eficiente. Sob a
liderança e a coordenação da Embrapa, após sua fundação em 1974, todas
as empresas contribuíram para definir a trajetória da soja, consolidando o
Brasil como o segundo mais importante produtor mundial desta
leguminosa (CARRARO, 2002).
Esta nova forma de associação das instituições públicas e privadas de pesquisa
durante os anos 70 e 80 possibilitou saltos qualitativos significativos na pesquisa
agronômica, especialmente, na criação de novas técnicas de manejo de lavouras, correção
da acidez e fertilidade dos solos, controle de pragas e doenças e, especialmente, na criação
27
de cultivares adaptados a cada uma das principais regiões produtoras do país. Rompendo
com os obstáculos de ordem ambiental que dificultavam a expansão da produção de soja
no país, foram despendidos volumosos esforços (financeiros e cnico-científicos),
sobretudo pelo Estado, na busca pelo aumento da produção, através da consolidação de
novas regiões sojicultoras e através dos ganhos de produtividade.
O desenvolvimento técnico-científico permitiu o aumento vertiginoso da
produção de soja no país, que passou de 12.145 milhões/ton. na safra 1976/77, para 57.960
milhões/ton., estimativa de recorde para a safra 2006/2007 (MAPA, 2007a). É este
aumento da produção na ordem de 477%, que permitiu ao Brasil, ao longo dos últimos
trinta anos, consolidar o lugar de segundo produtor de soja do mundo (Gráfico 1).
Gráfico 1: Evolução dos principais países produtores de soja no mundo 1935-2003
Fonte: EMBRAPA, 2004.
Com as novas bases técnico-territoriais de realização da produção agrícola,
sobretudo a partir dos anos 70, ocorreu uma expansão crescente da área cultivada de soja
28
no país. Na década de 1990, a produção da soja passa a ocupar uma área de 21.5
milhões/ha, enquanto o milho ocupa 12.8 milhões/ha, a cana-de-açúcar 5.5 mil./ha, o feijão
4.3 mil./ha, o arroz 3.7 mil./ha, o trigo 2.7 mil./ha, o café 2.4 mil./ha, a mandioca 1.7
mil./ha e o algodão 1.1 mil./ha (Gráfico 2) (EMBRAPA, 2004). Todavia, especialmente
durante a década de 1990, não é somente esse aumento na área (um acréscimo de 2,1%)
responsável pelo crescimento da produção de soja, da ordem de 8,6% ao ano, mas,
sobretudo, em função dos ganhos de produtividade, da ordem de 4,9% ao ano. (TOLEDO,
2005).
Gráfico 2: Evolução da área cultivada dos principais gêneros agrícolas brasileiros 1970 -
2004
Fonte: EMBRAPA, 2004.
29
Concomitantemente, ocorreram mudanças profundas na distribuição territorial da
produção de soja no Brasil (Mapa 1). Na década de 1970, a região Sul era responsável por
88,3% de toda a produção nacional de soja, enquanto as regiões Sudeste e Centro-Oeste
participavam em menor proporção (7,2% e 4,5% respectivamente) e de maneira ainda
incipiente no caso da segunda (Gráfico 3). Durante os anos 80 e início dos anos 90, o
Centro-oeste passou a despontar na produção nacional da oleaginosa, ampliando sua
participação para 34% e 37% nas safras 1986/87 e 1992/93, à medida que o Sul, mesmo
permanecendo como a principal região produtora do país na época, diminuiu
proporcionalmente sua representatividade no período considerado (55% e 50%) e a região
Sudeste manteve-se como terceira maior produtora realizando 10% do total, em ambos os
períodos (MAPA, 2007a).
30
Mapa 1: Comparação da área de produção de soja no território brasileiro em 1970 e
2003.
Fonte: Adaptado de EDWARD (2003).
No final da década de 1990, consolida-se uma nova organização regional da
produção de soja no Brasil. O Centro-oeste torna-se a região que concentra a maior parte
da produção nacional, posição esta que tende a prevalecer nas safras 2000/01 e 2006/07
quando a atividade sojicultora nesse subespaço nacional passa a representar 44,2% e 46%
do total produzido no país (MAPA, 2007a). O Sul permanece como a outra importante
região sojicultora do país participando com 42,4% e 38,1% do total produzido no país nos
anos de 2001 e 2007. Por sua vez, o Sudeste sofre sutil redução na sua participação
31
passando de 7,5% em 2001 para 7%, em 2007. a região Nordeste equivale ao sudeste
(5,4% e 6,8%), e a região Norte, ainda de maneira tímida, passa a integrar o conjunto de
regiões sojicultoras do país (MAPA, 2007a).
Gráfico 3: Evolução da Produção de Soja no Brasil por Regiões 1976/77-2006/07
0
5000
10000
15000
20000
25000
30000
1976/77 1986/87 1992/93 2000/01 2006/07*
safras
Kg
Norte Nordeste Sudeste Sul Centro-oeste
* Dados estimados - Levantamento: Abr./2007.
Fonte: MAPA, 2007a.
Organização: Francisco C. Nascimento Jr.
Hoje, dos 16 estados brasileiros produtores de soja, cinco se destacam por
concentrarem 82% da produção nacional, são eles: Mato Grosso, Paraná, Rio Grande do
Sul, Goiás e Mato Grosso do Sul. Somente a produção Mato-grossense representa 26,3%
do total nacional na safra 2006/07, seguindo-se o Paraná e o Rio Grande do Sul que se
encarregam por 20,8% e 15,5% respectivamente (MAPA, 2007a).
Com a modernização das forças produtivas empregadas no campo, alguns
subespaços puderam aprimorar suas especialidades produtivas, tornando o trabalho e a
produção mais eficientes, e outros, alcançados pela expansão territorial dessa agricultura
32
capitalista se especializaram sob os auspícios de uma atividade agrícola racional,
extremamente tecnificada.
Trata-se, assim, da produção de uma nova geografia feita de
belts
modernos e de novos
fronts
no Brasil. Esses
belt
s são, por vezes, heranças
e cristalizações de
fronts
próprios de uma divisão do trabalho anterior;
áreas que ocupadas em outro momento, hoje se densificam e se tecnificam.
Neles amadurecem inovações de ontem e chegam outras, próprias do
período, para criar novos arranjos [...] (SANTOS; SILVEIRA, 2001, p.
119).
A expansão da produção de soja no interior do Brasil e a incorporação seletiva de
determinados subespaços aos circuitos produtivos do agronegócio internacionalizado
evidenciam o processo de reorganização do espaço agrícola brasileiro, onde porções do
território nacional passaram a ocupar importante função produtiva na atual divisão interna
e internacional do trabalho. Trata-se dos novos fronts que já nascem tecnificados,
cientificizados, informatizados.
Eles encarnam uma situação própria do atual período
histórico, o da difusão de inovações em meio “vaziocomo destacam Santos e Silveira
(2001). A incorporação desses subespaços à atual divisão territorial do trabalho torna-se
bem sucedida porque é resultado do trabalho científico que lhe precede e engenhosamente
concebe a atividade produtiva numa dada porção do território.
Submetidos a investimentos públicos e privados (infra-estrutura, linhas de crédito,
apoios técnico-científicos, etc.) e a um adensamento técnico-científico informacional, dado
sob a gica e o comando de grandes empresas nacionais e estrangeiras como a Cargill, a
Bunge, a ADM, o Grupo AMaggi, etc., determinados subespaços do Brasil central são
convocados a participar passivamente do processo geral de globalização da produção
(ELIAS, 2003; FREDERICO, 2004; TOLEDO, 2005). Neste movimento de apropriação
do território pelo mercado internacional, a tecnociência assume papel preponderante como
instrumento responsável por viabilizar as estratégias de localizações da moderna
agricultura da soja no território brasileiro. Se a expansão do agronegócio da soja no Brasil
é resultado da difusão da agricultura científica e a incorporação seletiva de “lugares de
33
reserva” aos circuitos produtivos hegemônicos, a pesquisa tecnológica agrícola teve e tem
função dorsal neste processo.
O mundo oferece as possibilidades e o lugar oferece as ocasiões. Não se
trata aqui de um exercito de reserva” de lugares, senão da produção
raciocinada de um espaço, no qual cada fração do território é chamada a
revestir características específicas em função dos atores hegemônicos, cuja
eficácia depende doravante de uma produtividade espacial, fruto de um
ordenamento intencional e específico (SANTOS, 1994, p. 50).
Concebida sob bases essencialmente técnico-científicas a maior especialização da
produção de soja no Brasil constitui-se num vetor da expansão do meio técnico-científico-
informacional, configurando subespaços intensamente especializados, onde se
desenvolvem atividades produtivas orientadas pela racionalidade instrumental e científica
a serviço da mais moderna produção capitalista. Neste sentido, as atividades de pesquisa
científica e desenvolvimento tecnológico passam a atuar em conformidade com as lógicas
de mercado, que verdadeiramente regem o processo de modernização da atividade agrícola
no país. Desta forma, a tecnificação e a cientifização da atividade agrícola a partir da
produção de uma tecnociência que busca atender aos imperativos da competitividade
econômica m, diretamente, contribuir para a consolidação da função agroexportadora do
Brasil na atual divisão internacional do trabalho. Encabeçando a pauta de exportações do
país, o circuito produtivo da soja coloca o Brasil numa posição de destaque no comércio
mundial de commodities. O país ocupa a posição de segundo maior exportador de soja em
grãos no mundo, com um volume exportado de 20.650 mil/ton. na safra 2003/04, atrás
apenas dos Estados Unidos (24.494 mil/ton.) e bem à frente da Argentina (8.232 mil/ton.)
terceira no ranking (TOLEDO, 2005). Quando considerado o complexo soja (grãos, farelo,
óleo), em 2003, o Brasil assumiu a liderança do mercado internacional, com exportações
de U$ 8,1 bilhões, segundo o Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (MAPA,
2004).
Os avanços da biotecnologia nos anos 70 e 80 permitiram a criação de variedades
de soja mais produtivas, resistentes a pragas e doenças, adaptadas a baixas latitudes, sendo
34
possível o desenvolvimento eficiente da produção em condições agroecológicas
inicialmente inadequados para o cultivo da oleaginosa, que tem nos ambientes subtropicais
e temperados condições ideais de cultivo. Fundado nas possibilidades de manipulação,
fornecida pelos progressos da engenharia genética, o intensivo trabalho de melhoramento
genético realizado pelas instituições de pesquisa aumentou a produtividade territorial da
atividade sojicultora, maximizando os efeitos dos demais instrumentos técnicos aplicados
ao processo produtivo (inovações químicas e mecânicas), além de reduzir o ciclo
vegetativo da soja, permitindo a produção de mais safras num intervalo regular de tempo,
como o caso da produção da chamada “safrinha”.
Inovações técnicas e organizacionais na agricultura concorrem para criar
um novo uso do tempo e um novo uso da terra. O aproveitamento de
momentos vagos no calendário agrícola ou o encurtamento dos ciclos
vegetais, a velocidade da circulação de produtos e de informações, a
disponibilidade de crédito e a preeminência dada à exportação constituem,
certamente, dados que vão permitir reinventar a natureza, modificando
solos, criando sementes e até buscando, embora pontualmente, impor leis
ao clima. Eis o novo uso agrícola do território no período técnico-
científico-informacional (SANTOS, SILVEIRA, 2001, p. 118).
Assim, foram fornecidas também as condições para a produção ampliada da
mais-valia na agricultura, favorecendo especialmente os grandes produtores e as tradings
do setor que puderam adquirir as modernas bases técnicas de produção e se beneficiar
economicamente dos ganhos de produção e produtividade possibilitados pelo uso da
ciência como força produtiva. Desse modo, as pesquisas em biotecnologia tornaram-se
crescentemente estratégicas para a realização eficiente da produção de soja no território
nacional, atraindo as empresas privadas interessadas em exercer um domínio, o mais
amplo possível, sobre os processos de mudança e inovação biotecnológica, adaptando as
atividades de pesquisa e desenvolvimento às necessidades e às finalidades que regem as
ações numa economia diversificada e altamente competitiva (SANTOS, 1983).
Ao longo das últimas duas décadas, a consolidação do Brasil como segundo
maior produtor mundial de soja vem sendo acompanhada de perto pelo interesse crescente
35
de participação dos agentes privados na pesquisa biotecnológica. Além da permanência e o
fortalecimento de alguns programas de pesquisa públicos e privados já existentes no
Brasil, a partir da década de 1990 outras instituições de pesquisa passam a atuar na
cooperação científica para a produção de soja, no qual destacamos as nacionais, Fundação
Mato Grosso (Fundação MT) e Tropical Melhoramento Genético (TMG) e as
multinacionais Monsanto/Monsoy, Pioneer, Syngenta, Milênia e Nidera; estas cinco
últimas responsáveis pelo claro processo de transnacionalização da pesquisa
biotecnológica no país.
Hoje, o trabalho de pesquisa biotecnológica para a produção de soja no Brasil
mostra-se bastante concentrado nas mãos de Empresas, sejam elas públicas ou privadas,
nacionais ou multinacionais (Gráfico 4). Somados, estes agentes do círculo de cooperação
de pesquisa, são responsáveis por 92% do total de inovações biotecnológicas criadas e
registradas no país. São, sobretudo, as empresas públicas de pesquisa (39,3%), seguidas de
empresas privadas nacionais (29%) e das empresas multinacionais (23,9%) que possuem o
maior volume de registros de criação de variedades melhoradas de soja no país.
As Universidades e os Institutos de Pesquisa Agropecuária participam em
menor proporção, representando 7,8% do total. Esta constatação pode levar a uma
conclusão precipitada de que as “pesquisas de ponta” para a agricultura estão “fora” das
universidades e dos institutos estaduais de pesquisa. Contudo, ao se tratar especialmente
das instituições públicas, veremos mais adiante, que as funções assumidas por estes
agentes na estrutura territorial de pesquisa agrícola brasileira o sim importantes e
imprescindíveis para o desenvolvimento dos programas de pesquisa, em parceria com as
grandes empresas.
36
Gráfico 4: Natureza das Instituições de Pesquisa Obtentoras de Cultivares de Soja no
Brasil*
0
50
100
150
200
250
Empresas Públicas
Nacionais
Empresas Privadas
Nacionais
Empresas
Multinacionais
Universidades
Federais e Institutos
Estaduais de
Pesquisa
Natureza das Instituões
Número de cultivares registrados
*Considerando-se as inclusões no Serviço Nacional de Proteção de Cultivares e as patentes já concedidas
(1998-2007).
Fonte: MAPA, 2007b.
Organização: Francisco C. Nascimento Jr.
Individualmente, a Embrapa se destaca como a empresa que obtém o maior
número de registros de cultivares de soja no país (36,2% do total), demonstrando, de modo
geral, os grandes esforços despendidos pelo poder público para o aprimoramento da
produção desse gênero agrícola no território brasileiro (Gráfico 5). Além da empresa
pública, outras instituições de igual natureza figuram entre os dez agentes com o maior
número de cultivares registrados no país. Estes são os casos da Universidade Federal de
Viçosa (quinta posição) e do Instituto Agronômico de Campinas (sétima posição),
contudo, a participação dos mesmos é proporcionalmente inferior àquela da Embrapa,
considerando o quadro geral apresentado a seguir.
37
Além das empresas públicas, as empresas privadas nacionais ou multinacionais
se destacam no desenvolvimento da pesquisa para a soja. Este é o caso da multinacional
Monsanto/Monsoy, e das nacionais Coodetec e Fundação MT, que possuem grande
representatividade no conjunto de ações para a criação de sementes melhoradas de soja no
país.
Gráfico 5: Dez Maiores Instituições de Pesquisa Obtentoras de Cultivares de Soja no
Brasil *
Embrapa
Monsoy
Fundação MT
Coodetec
UFV
Du Pont/Pioneer
IAC
FT Pesquisas e
Sementes
Naturale
Nidera
0 50 100 150 200 250
Instituições
Número de Cultivares Registrados
* - Considerando-se as inclusões no Serviço Nacional de Proteção de Cultivares e as patentes já concedidas
(1998-2007);
- No caso das criações oriundas das atividades de pesquisa realizadas através do Sistema Nacional de
Pesquisa Agropecuário, a titularidade sobre a invenção é computada à Embrapa conforme a legislação em
vigor;
- Deve-se considerar no caso da Embrapa a soma das criações realizadas pelos diversos centros de
pesquisa da Empresa;
- Foram considerados para a soma da Fundação MT os cultivares produzidos em parceria com a Embrapa
e explorados comercialmente pela Fundação bem como as variedades, cuja titularidade sobre as invenções
é dividida com a UNISOJA/SA.
Fonte: MAPA, 2007b.
Organização: Francisco C. Nascimento Jr.
38
O desenvolvimento da agricultura científica da soja nos permite estabelecer uma
relação direta entre mercado e território, haja vista o consumo produtivo (SANTOS, 1993;
ELIAS, 2003) de tecnologias, constitui-se no condicionante para a realização eficiente da
atividade agrícola em determinados subespaços do território nacional. Hoje, cerca de 90%
da área plantada com soja no Brasil usa inovações biotecnológicas criadas por apenas
quatro empresas (Tabela 2). A Embrapa lidera o mercado nacional de cultivares de soja,
seguida da Coodetec, da Monsanto/Monsoy, e da Fundação MT, ainda que, como veremos,
a participação dessas instituições no mercado vem sofrendo alterações nos últimos anos,
mudanças estas dadas pela própria gênese territorial das empresas; suas estratégias de
ação no território brasileiro e a criação de normas que permitiram a algumas empresas
obterem vantagens e ampliar seu mercado no país.
Tabela 2: Maiores Empresas Obtentoras de Variedades de Soja no Brasil e sua
Participação no Mercado - 2005
Posição Empresa Porcentagem
1 EMBRAPA 34%
2 COODETEC 20%
3 MONSANTO 18%
4 FUNDAÇÃO MT 17%
5 Demais Instituições 11%
Fonte: EXAME, 2005.
Através de toda infraestrutura de que dispõem (laboratórios, especialistas, aporte
financeiro, etc.), das amplas redes de pesquisa que coordenam e da capacidade de
comandar o desenvolvimento biotecnológico no campo, pode-se dizer que Embrapa,
Coodetec, Monsanto, Fundação MT compõem, hoje, o núcleo principal do círculo de
cooperação de pesquisa para a produção de soja, tornando concentrado e ampliado esse
mercado no Brasil, enquanto as demais instituições m menor participação nessa
produção e uma escala territorial de ação menos abrangente, levando-nos a designá-las
como pertencentes ao círculo marginal de cooperação da pesquisa. A constituição do
círculo de cooperação da pesquisa da soja no país, os sistemas de atividades das
39
instituições hegemônicas que coordenam a pesquisa científica e o desenvolvimento
tecnológico confidenciam tanto a organização como a dinâmica do território brasileiro no
atual estágio de desenvolvimento do capitalismo, qualificado como capitalismo
tecnológico por Karpik (1972).
40
III
CONSTITUIÇÃO POLÍTICA DO
CÍRCULO COOPERAÇÃO DE PESQUISA
DA SOJA
41
3.
1
O
P
ROTAGONISMO DO
ESTADO
3.
1.
1
-
S
OLIDARIEDADE
I
NSTITUCIONAL
:
A
CENTRALIDADE DA
E
MPRESA
B
RASILEIRA DE
P
ESQUISA
A
GROPECUÁRIA
(E
MBRAPA
)
E O
S
ISTEMA
N
ACIONAL DE
P
ESQUISA
A
GROPECUÁRIA
(SNPA)
O Estado brasileiro, ao longo do século XX, firmou-se como o principal agente
promotor, regulador e incentivador do processo de modernização da agricultura nacional
através da criação de políticas específicas para o aprimoramento dessa atividade
produtiva. Especialmente no que diz respeito aos esforços para a renovação das bases
técnicas da produção no campo, suas ações mostraram-se fundamentais, sendo mesmo
responsáveis por conduzir a formação de um consistente círculo de cooperação de
pesquisa agrícola no país. Dispondo de serviços técnicos, escolas de agronomia e centros
de pesquisa que ora precedem, ora acompanham, ora sucedem as ações das empresas no
território nacional, o poder público mostrou-se ativo no apoio técnico-científico para a
constituição de regiões especializadas na moderna produção agrícola (SANTOS;
SILVEIRA, 2001).
Coube às instituições públicas de pesquisa (Universidades, Empresas, Institutos
Estaduais), a maioria delas concentradas no sul e sudeste, o encargo de conduzir,
inicialmente, os processos de inovação tecnológica para a agricultura brasileira.
Realizando considerável parcela das pesquisas básicas e, sendo também acentuada sua
participação na realização das pesquisas aplicadas
4
, o Estado brasileiro, sobretudo a partir
de meados do século XX vem, intensamente, fomentando as pesquisas agropecuárias
4
Indicamos como pesquisa básica a atividade de produção do conhecimento científico realizada sem o
objetivo explicito de utilizá-la de forma imediata para fins práticos. Por sua vez, a pesquisa aplicada
define-se pela realização da produção científica orientada para a geração de novos produtos e novos
processos de produção possuindo, o resultado do conhecimento produzido um explícito interesse
econômico (LOPES, 1969; SCHWARTZMAN, 1979; SANTOS, 1983). que se destacar que a
classificação aqui apresentada é adotada por nós para fins de facilitação das discussões que estaremos
realizando neste trabalho, não desconsidera a complexidade do tema e, nem mesmo exclui as outras
classificações possíveis de serem tomadas para análise da produção científica e tecnológica.
42
desenvolvidas no país, ainda que, nos últimos anos se possa constatar o aumento das
atividades de pesquisa financiada por grandes empresas privadas nacionais e estrangeiras
instaladas no país. Estima-se, que ainda hoje, o poder público, através dos governos
estaduais e federal desenvolva 93% dos projetos de pesquisa para a agricultura no Brasil,
sendo que somente a Embrapa contribui com 52%, os governos estaduais com 20% e as
universidades realizam 21% dos projetos (MAPA, 2004).
De maneira geral, as políticas de Estado tiveram a finalidade de tornar viável a
atividade agrícola capitalista no território brasileiro. A criação de órgãos e instituições
públicas de pesquisa agrícola no país orientou-se pela idéia de tornar alguns subespaços
nacionais funcionais aos modernos e internacionalizados circuitos produtivos do
agronegócio. A concentração dos esforços de pesquisa científica para desenvolver
determinados produtos agrícolas teve o intuito de tornar eficiente as atividades produtivas
- aquelas requeridas pela indústria processadora e pelo mercado mundial de commoditie,
respondendo, assim, ao imperativo da competitividade econômica, imposição do
paradigma que rege o atual modo de desenvolvimento do capitalismo no campo moderno.
Neste sentido, as ações estatais para prover o país de uma estrutura territorial de pesquisa
agrícola colaboraram, também, com as estratégias de uso corporativo do território
brasileiro pelas grandes empresas que comandam atualmente o processo de modernização
da atividade agrícola. Assim, de um lado o Estado propicia as condições sicas para o
desenvolvimento capitalista e, de outro lado acentua as contradições no território
(GRAZIANO DA SILVA, 1981).
A empreitada modernizadora da agricultura brasileira deu-se, inicialmente, sob a
responsabilidade e o ônus assumido pelo poder público. Foi o Estado quem liderou as
ações e as estratégias pioneiras para a transformação das bases técnicas da atividade
agrícola, especialmente, no que diz respeito à realização das pesquisas e ao
desenvolvimento técnico-científico, visando conferir eficiência econômica à agricultura
brasileira. Tomado como “política nacional de desenvolvimento” a partir dos anos 70, o
Estado elaborou e fomentou os principais programas de pesquisa responsáveis pelas
transformações do meio técnico-científico, possibilitando a expansão da fronteira agrícola
43
e a especialização regional da produção. A constituição de uma agricultura científica,
essencialmente instrumental, fundada em moldes empresariais, pautou-se especialmente
pela produção de uma tecnociência responsável por alterar seletivamente a estrutura
territorial produtiva, do campo brasileiro.
A criação da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) pelo
governo federal, em 1973, se constituiu num dos principais instrumentos desse projeto de
modernização agrícola. Concentrando suas ões na geração, desenvolvimento e difusão
(transferência) de tecnologias com vistas ao aprimoramento de algumas atividades
agrícolas, a Embrapa se consolidou como o principal agente do círculo de cooperação de
pesquisa científica e tecnológica, especialmente, aquele da produção de commodities. As
atividades técnico-científicas da Embrapa permitiram, nas últimas décadas, a
reorganização do espaço agrícola brasileiro. Neste sentido, pode-se afirmar que os
projetos de incentivo ao desenvolvimento das pesquisas para uso agrícola no território
brasileiro, elaborados pelos agentes hegemônicos da sociedade (Estado e empresas)
definem-se por serem projetos tecno-políticos, haja vista a produção induzida de
tecnologias constituir-se em fator determinante da concretização das estratégias de
incorporação de partes do território nacional aos circuitos produtivos globalizados. A
produção dessa tecnociência pela Embrapa vem servindo de ferramenta para a otimização
dos sistemas de atividades agroexportadoras no Brasil, viabilizando sobretudo as
estratégias territoriais das grandes empresas do agronegócio da soja.
Além das atividades de pesquisa e desenvolvimento tecnológico realizadas pela
Embrapa, também que se destacar as ações promovidas por outras empresas públicas e
institutos estaduais de pesquisa agropecuária. Atuando em escala regional, instituições
como o Instituto Agronômico do Paraná (IAPAR), o Instituto Agronômico de Campinas
(IAC), a Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (EPAMIG), a Empresa
Goiana de Pesquisa Agropecuária (EMGOPA), entre outras, cooperaram regionalmente
para a expansão e a especialização territorial da produção de soja, ao conduzir projetos de
pesquisas e/ou participar de programas comandados pela própria Embrapa.
44
Ao longo das primeiras décadas da marcha modernizadora da agricultura nacional
a Embrapa assumiu a função de elaborar e conduzir as iniciativas internas de pesquisa
para a criação de novas técnicas e tecnologias de produção adaptadas a cada região do
país, possibilitando, deste modo, a efetivação dos projetos de governo. As ações da
instituição, alinharam-se aos Planos Nacionais de Desenvolvimento (PNDs) e aos
programas regionais de desenvolvimento agropecuário, tais como o Polocentro (Programa
de Desenvolvimento dos Cerrados), o Polonordeste (Programa de Desenvolvimento de
Áreas Integradas do Nordeste) e o Prodecer (Programa de Cooperação Nipo-Brasileira de
Desenvolvimento dos Cerrados) formulados como política de Estado e executados,
sobretudo, a partir da décadas de 70 (
SHIKI; GRAZIANO DA SILVA; ORTEGA, 1998
;
DELGADO, 1985). Neste sentido, as ações da Embrapa viriam viabilizar os projetos de
expansão da moderna agricultura empresarial no território brasileiro, promovendo a
integração de determinados subespaços aos circuitos produtivos agroindustriais voltados
em parte ao mercado interno, mas em grande medida à exportação de commodities.
A incorporação de determinados “lugares de reserva”, inicialmente do Centro-
Oeste e mais recentemente do Norte e do Nordeste brasileiros ao processo produtivo
hegemônico, figurava nos programas federais de desenvolvimento e integração
econômica do território brasileiro. A política de “ocupação” do território brasileiro e a
criação, no Brasil central, de uma vasta região especializada na produção agropecuária
que constituir-se-ia num verdadeiro “celeiro de alimentos do mundo”, centralizava o
discurso do governo militar nas décadas de 1970 e 1980. Assim é que o Estado, enquanto
dimensão político-normativa e reguladora (em escala nacional, estadual e municipal),
através de instituições públicas exerce um importante papel na definição da divisão
territorial do trabalho, criando o que também podemos chamar de solidariedade
institucional (CASTILLO; MENDES; ANDRADE, 1997).
Através da Embrapa o poder público fomentou a realização dos principais
programas nacionais de pesquisa responsáveis por viabilizar a reorganização e a
intensificação da moderna produção de commodities agrícolas, no Brasil. Para tanto o
Estado financiou pesadamente as atividades de pesquisa tecnológica, a ponto de no final
45
dos anos 80, a Embrapa figurar entre as cem maiores empresas do país (DELGADO,
1985). Com a função de realizar as pesquisas científicas e as inovações tecnológicas
necessárias para a expansão e consolidação da agricultura em subespaços seletivamente
escolhidos do território nacional, a Embrapa acaba por conduzir um intenso processo de
desenvolvimento científico e tecnológico agrícola no país, a ponto de no final dos anos 80
a empresa figurar como uma das principais instituições de pesquisa em agricultura
tropical do mundo.
Deste modo, a Embrapa, empresa pública, passa também a ter controle sobre as
bases cnico-territoriais da moderna produção agrícola, resultado do amplo uso de suas
criações tecnológicas (novos cultivares, técnicas de manejo da lavoura, etc.) e o Brasil
inicia uma caminhada rumo a uma relativa autonomia na produção de algumas inovações
que compõem o sistema técnico-científico agrícola. Um claro exemplo do protagonismo e
supremacia da Embrapa no comando da produção de tecnologia para a agricultura é a
participação da empresa pública no mercado nacional de sementes de soja”. Em 1998,
75% da área cultivada com soja em todo o território brasileiro fazia uso das inovações
biotecnológicas (cultivares) desenvolvidas pela empresa
5
.
A centralidade exercida pela Embrapa na cooperação técnico-científica para a
atividade agrícola moderna está associada a sua função de coordenação do Sistema
Nacional de Pesquisa Agropecuária (SNPA) - arranjo institucional e organizacional que
articula as unidades de pesquisa da Embrapa às instituições públicas (federais e
estaduais), universidades, fundações e empresas privadas de pesquisa localizadas nas
diversas regiões do país. A solidariedade organizacional (SANTOS, 2002; CASTILLO;
MENDES; ANDRADE, 1997) construída a partir deste sistema normativo, o SNPA,
assenta-se sob o princípio da convergência de esforços para a realização de pesquisas nas
mais diversas áreas do conhecimento científico de modo a tornar mais eficaz a produção
5
A Embrapa se apresenta como uma das principais instituições nacionais depositárias de patentes de
inovação junto ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI). Conforme Albuquerque (2003)
durante o período de 1990 a 2000 a empresa pública ocupou a décima quarta posição na lista das vinte
maiores depositárias de patentes no país.
46
agropecuária, mais valorizada pelo mercado e possibilitar a realização da moderna
produção agrícola em todo o território nacional.
Instituído em linhas gerais a partir da Embrapa, no início da década de 1970, o
sistema nacional de pesquisa procura compatibilizar as diretrizes de pesquisa agropecuária
com as estratégias territoriais estabelecidas em escala nacional e regional pelos agentes
hegemônicos do agronegócio (Estado e empresas). Para isso, a Embrapa promove uma
solidariedade organizacional, reunindo, organizando e sistematizando o trabalho das
instituições de pesquisa de inovação técnico-científica para a agricultura, tudo para
atender às demandas tecnológicas específicas de cada região do país. Esta unificação das
atividades das instituições de pesquisa, públicas e privadas se estabelece através de uma
centralização do comando exercida pela Embrapa. Assim, a partir da constituição desta
estrutura organizacional, institucional e territorial de pesquisa, a Embrapa se consolidou
como um dos pilares responsáveis pela condução das transformações das bases técnicas
do campo brasileiro.
Do mesmo modo, pode-se dizer que essa solidariedade institucional promovida
pelo Estado se constituiu no sistema responsável pela formação de coeso círculo de
cooperação de pesquisa agrícola nacional. O sistema nacional de pesquisa ao racionalizar
as atividades científicas na configuração do território, planejou e organizou o processo de
inovação técnico-científica para a agropecuária em escala nacional, evitando por fim,
ações dispersas, sobrepostas ou a existência de “lacunas” na realização de programas de
aprimoramento tecnológico para a moderna produção agropecuária brasileira.
Com as novas possibilidades de fluidez da informação no território, a unificação e
a sincronia do trabalho científico, realizado até então dispersamente pelas diferentes
instituições de pesquisa no país, consolida o círculo de cooperação de pesquisa agrícola,
resultado das ações e políticas de Estado. A coordenação territorial do trabalho científico,
papel este exercido de forma centralizada pela Embrapa, propiciou que as exigências
criadas pelo mercado (quantidade e qualidade) para a execução de uma produção eficiente
no campo pudessem ser supridas com a articulação do trabalho realizado pelos agentes
integrados ao sistema nacional de pesquisa.
47
De modo geral, as ações de criação e adaptação de tecnologias promovidas pelo
SNPA para a produção agrícola, foram responsáveis pelo avanço e consolidação da
produção de grãos no centro-oeste brasileiro de modo a assegurar, hoje, àquela região o
status de maior produtora nacional de soja. Este desempenho obtido pela região centro-
oeste está intrinsecamente relacionado à difusão e implantação de tecnologias oriundas
das redes de pesquisa lideradas pela Embrapa e direcionadas para a viabilização e
aprimoramento da produção de soja em cada região do país. Não obstante, os sistemas
técnicos engenhosamente criados com o objetivo de apoiar o avanço da fronteira agrícola
e a especialização territorial da produção de soja no Brasil central, as inovações e o
aprimoramento da produção de commodities pela Embrapa, são desenvolvidos também
para aquelas regiões do sul do país, pioneiras na produção da soja.
A partir desse “empreendedorismo” do Estado intensificaram-se, então, as
atividades de pesquisa com vistas à modernização das forças produtivas do campo. A
criação da Embrapa e a instituição de uma rede nacional de pesquisa agrícola forneceram
as condições operacionais, a base territorial para o aprimoramento da produção de soja e a
redefinição das regiões sojicultoras brasileiras. Com ações sistemáticas promovidas
diferentemente e integradamente pelos seus centros de pesquisa, a Embrapa liderou os
esforços para a expansão da produção de soja no Brasil e a consolidação de regiões
especializadas no cultivo da oleaginosa.
A EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISA AGROPECUÁRIA - EMBRAPA
A configuração territorial da Embrapa é constituída por trinta e sete unidades de
pesquisa e três unidades de serviços que se encontram distribuídas por vinte e uma
unidades da federação, abrangendo todas as regiões brasileiras como podemos verificar
no mapa a seguir (Mapa 2). Com o comando geral das ações administrativas situado em
Brasília-DF, os trabalhos propriamente de pesquisa se encontram descentralizados
(SANTOS; SILVEIRA, 2001).
48
Mapa 2: Distribuição das Unidades de Pesquisa da Embrapa no Território Brasileiro -
2006
Fonte: EMBRAPA, 2006. Adaptado de Santos e Silveira (2001)
A atividade de pesquisa científica da Embrapa encontra-se descentralizada, em
função das demandas e/ou das “vocações produtivas” das regiões onde se desenvolvem.
49
Isto quer dizer que são, em grande parte, as especificidades da formação territorial que
condicionam a especialização da pesquisa cnico-científica das unidades da empresa.
Deste modo é que se poderia, por exemplo, justificar o perfil agroflorestal das Embrapas
de Belém-PA, Boa Vista-RR, Porto Velho-RO, Manaus-AM, Rio Branco-AC e Macapá-
AP, e a predominância das pesquisas agropecuárias nas unidades de Londrina-PR, Sete
Lagoas-MG, Coronel Pacheco-MG, Cruz das Almas-BA, Petrolina-PE, Passo Fundo-RS,
Campo Grande-MS, Dourados-MS, Bento Golçanves-RS, Concórdia-SC, Sobral-CE,
Campina Grande-PB, Juiz de Fora – MG, etc.
Além do mais, alguns importantes centros urbanos com forte tendência ao
desenvolvimento de pesquisas de alta tecnologia, participam do sistema Embrapa
desenvolvendo atividades técnico-científicas para a agropecuária. São exemplos desses
centros de pesquisa Campinas - SP, Jaguariúna - SP, São Carlos - SP, Brasília - DF, e Rio
de Janeiro – RJ, centros que acolhem unidades de pesquisa da empresa (SANTOS;
SILVEIRA, 2001). A Embrapa conta ainda com diversas unidades de execução de
pesquisas (UEPs) distribuídas estrategicamente pelo território brasileiro, cujas atividades
estão diretamente vinculadas aos programas de investigação desenvolvidos pelas suas
diversas unidades.
As unidades de pesquisa da Embrapa atuam de diferentes formas, de modo que é
possível agrupá-las em três grandes classes (de acordo com a própria empresa),
responsáveis por nos oferecer uma tipologia organizacional e territorial do sistema de
pesquisa da instituição. De maneira geral, os centros de pesquisa da Embrapa podem ser
classificados como:
Unidade de Pesquisa de Produtos: cuja proposta de ação está orientada,
prioritariamente, ao aprimoramento tecnológico de uma determinada atividade
agropecuária desenvolvida no território brasileiro;
Unidade de Pesquisa de Temas Básicos: onde as atividades científicas correspondem
ao maior conhecimento e aprimoramento de técnicas e procedimentos que constituem a
moderna produção agropecuária;
50
Unidade de Pesquisa nas Ecorregiões Brasileiras: caracterizada por atuar de maneira
ampla no desenvolvimento agroflorestal e agropecuário da região em que está fixada,
tendo, portanto, suas ações regionalmente circunscritas.
A estrutura territorial de pesquisa da Embrapa se define como uma ampla e
complexa rede de cooperação técnico-científica para o aprimoramento e a expansão da
moderna atividade agrícola no país, privilegiando os gêneros agrícolas mais rentáveis
economicamente e viabilizando a intensa especialização territorial da produção agrícola
no Brasil. A cada programa de pesquisa instituído para o aprimoramento de uma
determinada lavoura (soja, milho, algodão, uva, fruticultura, arroz, trigo, sorgo, etc.)
repartem-se funções entre diferentes unidades de pesquisa da empresa (Produtos, Temas
Básicos e Ecorregiões Brasileiras) firmando-se, por conseguinte, relações funcionais
entre as ações promovidas em cada unidade.
Contudo, esta divisão territorial do trabalho científico é possível pela
subordinação do conjunto dos centros de pesquisa envolvidos, a um programa de
pesquisa sob comando centralizado, desempenhado pela unidade incumbida por
coordenar e liderar o trabalho de pesquisa de forma integrada. Assim, se desenha uma
organização hierárquica do trabalho científico no território brasileiro, em que as
atividades desenvolvidas pelas unidades de pesquisa se caracterizam por serem atividades
conexas, sincrônicas, interdependentes e complementares entre si.
A existência desse conjunto de unidades de pesquisa especializadas,
tipologicamente distintas, impõe uma fina articulação das pesquisas conforme os
programas de pesquisa e as demandas regionais para garantir a operacionalização
eficiente da moderna produção agropecuária.
Especialmente para o aprimoramento tecnológico da produção de soja no
território brasileiro a Embrapa mobiliza um grande número de instituições no país e
também no exterior. Daí, o processo de concepção dos sistemas técnicos aplicados à
agricultura científica, apesar de ser realizado com o objetivo de contemplar uma
determinada região é, em muitos casos, fruto de um trabalho de pesquisa coordenado e
51
executado solidariamente por instituições que se encontram, não raramente, distantes de
sua região de aplicação. Os espaços agrícolas modernos, funcionais aos circuitos
produtivos hegemônicos, se constituem em pontos articulados às atividades
desenvolvidas em inúmeras outras localidades que integram o círculo de cooperação da
agricultura científica.
Os esforços da empresa pública para desenvolver a pesquisa científica e
tecnologias para produção de soja no território nacional estão concentrados, sobretudo,
mas não exclusivamente no Centro Nacional de Pesquisa da Soja (CNPSO), em Londrina,
Estado do Paraná. Criado em 1975, numa das mais importantes regiões sojicultoras do
país o CNPSO, conhecido também como Embrapa Soja, é a unidade de pesquisa
responsável por promover e coordenar o trabalho científico necessário para o
aprimoramento e a expansão territorial da produção da oleaginosa no país, função esta
diretamente alinhada com as políticas de modernização da agricultura nacional e
“ocupação” do território, elaboradas pelo Estado, naquela época.
Ao longo dos seus mais de 30 anos de existência, a Embrapa Soja se consolidou
como principal centro de pesquisa do país especializado nas atividades de natureza
técnico-científica envolvendo o cultivo da soja. Reunindo cerca de 60 especialistas
altamente qualificados (especialistas, mestres, doutores, Phds.) que atuam nas diversas
áreas e sub-áreas do conhecimento (tais como: melhoramento genético, controle de
pragas, manejo de cultura, nutrição e adubação, fisiologia e patologia de sementes, etc.) a
atuação da Embrapa soja promove uma intensa divisão técnica e social do trabalho e
aprofunda a especialização local
6
do trabalho intelectual.
Assim é que a Embrapa Soja, em parceria com as demais unidades de pesquisa
realizou, desde meados da cada de 70, significativos progressos tecnológicos na busca
pela maior eficácia na produção da commoditie naquelas regiões alcançadas pelo circuito
produtivo da soja. Tais progressos tecnológicos podem ser exemplificados pelo aumento
contínuo da produção e da produtividade da soja, alcançando respectivamente médias de
6
Estima-se que Londrina reúna o maior número de pesquisadores trabalhando na pesquisa do cultivo de
soja em regiões tropicais do mundo, sobretudo, pela presença da Embrapa Soja.
52
5% e 2% ao ano, pela expansão da área passível de cultivo da oleaginosa em regiões de
baixa latitude; pela geração de variedades minuciosamente adaptadas a cada domínio
agroecológico brasileiro (alcançando um total de 206 cultivares criadas pela empresa);
pela criação de técnicas de correção da acidez e da fertilidade dos solos dos cerrados, pela
elaboração do zoneamento agroclimático nacional para a produção de soja, entre outros
avanços técnicos responsáveis por criar as possibilidades instrumentais de expansão e
especialização regional da produção de soja no Brasil.
Além de toda infraestrutura para realização do trabalho científico (duas fazendas,
laboratórios de fitopatologia, de genética e melhoramento, de entomologia, de tecnologia
de sementes, laboratório de manejo do solo e da cultura, plantas daninhas, ecofisiologia,
fertilidade e microbiologia dos solos, etc., num total de 15 laboratórios) em Londrina, a
Embrapa Soja conta com um campo experimental em Balsas, no sul do Maranhão, onde
são promovidas pesquisas para o aprimoramento genético de cultivares e pesquisas em
fertilidade e fitopatologia dos solos com o objetivo de criar tecnologias adaptadas às
condições agroecológicas das regiões Nordeste e Norte (EMBRAPA, 2006). Desde 1980
a região de Balsas vem se consolidando como uma das mais importantes regiões
produtoras de soja da região Nordeste, juntamente com o oeste da Bahia (região de
Barreiras) (GIORDANO, 1999) e o sudoeste do Piauí (região de Uruçuí) (MORAES,
2006). Com a especialização da agricultura científica da soja nestes subespaços definem-
se novas funções para a região Nordeste brasileira na divisão interna e internacional do
trabalho fruto, todavia, de uma cooperação cnico-científica realizada majoritariamente
pela Embrapa com o objetivo de viabilizar o moderno empreendimento capitalista em
subespaços do Nordeste brasileiro.
No âmbito do Sistema Nacional de Pesquisa Agropecuário a Embrapa Soja
ocupa, no mais das vezes, papel de coordenação dos programas de pesquisa. A função de
agente líder dos programas de investigação atribui à Embrapa Soja papel de regulação e
comando frente o conjunto de ações realizadas pelas demais unidades integradas à rede.
53
Esta organização das unidades e centros de pesquisa no território brasileiro é que
nos permitirá discutirmos a existência de uma hierarquia entre os lugares de realização
das atividades técnico-científicas no Brasil.
No ano de 2005, somente a Embrapa Soja aparecia como instituição responsável
por comandar 29 projetos de pesquisa e 6 planos de ação, estando ainda integrada em
outros 56 projetos liderados por outras unidades da empresa. Analisando a atual
programação técnica da Embrapa Soja pode-se constatar um grande número de parcerias
estabelecidas por esse centro de pesquisa com diversas outras instituições; entre elas,
unidades de pesquisa da própria Embrapa, universidades e empresas públicas ou privadas
e institutos de pesquisa nacionais e internacionais (EMBRAPA, 2005).
Esse feixe de relações entre unidades, centros, empresas e programas de
pesquisas, está a nos mostrar a fluidez e a densidade cnico-científica e informacional do
meio geográfico no período atual.
Ainda que outras unidades de pesquisa da Embrapa comandem programas de
pesquisa para o aprimoramento regional da produção de soja estas, comumente contam
com a cooperação da Embrapa Soja/Londrina para a otimização de seus esforços técnico-
científicos. Considerando a profunda divisão técnica do trabalho de todas as unidades de
pesquisa da Embrapa pôde-se contar mais de cem pesquisadores que atuam direta ou
indiretamente nas pesquisas envolvendo a produção da oleaginosa no país
7
. Dentre as
trinta e sete unidades de pesquisa da empresa pública pudemos averiguar a participação
efetiva de dezoito destas em projetos de pesquisa voltadas à produção de soja, sem que
tenhamos aqui realizado a exata distinção das funções e atividades que cada uma tenha
desempenhado nestes projetos (Tabela 3).
7
De acordo com nosso levantamento no “guia de fontes sobre pesquisadores da Embrapa”
(www.embrapa.gov.br, acessado em 7/11/2006) contamos cerca de 140 pesquisadores que trabalham assuntos
ou temas envolvendo o cultivo de soja.
54
Tabela 3: Unidades de Pesquisa da Embrapa com Atividades científicas envolvendo a
soja – 2005
UNIDADE DE PESQUISA ESTADO
1-Emb. Clima Temperado Rio Grande do Sul
2-Emb. Trigo Rio Grande do Sul
3-Emb. Soja Paraná
4-Emb. Meio Ambiente São Paulo
5-Emb. Informática Agropecuária São Paulo
6-Emb. Solos Rio de Janeiro
7-Emb. Agrobiologia Rio de Janeiro
8-Emb. Milho e Sorgo Minas Gerais
9-Emb. Agropecuária Oeste Mato Grosso do Sul
10-Emb. Cerrados Distrito Federal
11-Emb. Informação Tecnológica Distrito Federal
12-Emb. Recursos Genéticos e Biotecnologia Distrito Federal
13-Emb. Meio-Norte Piauí
14-Emb. Amazônia Oriental Para
15-Emb. Roraima Roraima
16-Emb. Amapá Amapá
17-Emb. Amazônia Ocidental Amazonas
18-Emb. Rondônia Rondônia
Fonte: EMBRAPA, 2005
Organização: Francisco C. Nascimento Jr.
Da configuração e estrutura territorial de pesquisa instituída principalmente pelo
sistema Embrapa cria-se a possibilidade de integração de subespaços ao modelo de
desenvolvimento agrícola hegemônico. Com uma densa e complexa solidariedade
organizacional e institucional estabelecida entre diversos e distantes lugares do país e do
mundo, a Embrapa arquiteta uma ampla rede de pesquisa, que acaba por promover uma
“racional” atividade sojicultora no Brasil racionalidade científica diretamente
subordinada às exigências do mercado e orientada para atender às demandas técnicas
regionais para a operacionalização eficiente da produção.
Assim, por exemplo, objetivando a identificação dos genes que podem conferir
tolerância de quatro leguminosas a situações de estiagem, vem sendo desenvolvido um
programa de pesquisa que envolve parcerias entre a Embrapa Soja, a Embrapa Recursos
Genéticos e a Embrapa Arroz e Feijão, juntamente com a Universidade da Califórnia -
EUA, a Universidade Católica de Brasília, a Universidade Federal de Pernambuco e o
Centro de Energia Nuclear CENA/USP. Essa parceria técnica surge com a finalidade de
55
minorar o problema da estiagem que, em muitos episódios proporciona altas perdas nas
safras, como a ocorrida no Rio Grande do Sul, em 2005, quando a seca prolongada
provocou a perda de 70% da safra de soja naquele estado (EMBRAPA, 2006b).
Desenvolvendo programas representativos da mais moderna atividade científica
voltada à inovação biotecnológica, a Embrapa vem também atuando na criação de
variedades transgênicas de soja. Já com treze cultivares transgênicas lançadas no mercado
(cultivares Roundup Ready - RR), a empresa vem despendendo esforços para a geração
de cultivares mais nutritivos (com vitaminas, ácidos graxos, Ômega 3) e mais resistentes
a doenças, de maneira a atender tanto às novas demandas da indústria de alimentos como
reduzir os custos da produção de grãos. Atuando através das unidades da Embrapa Soja e
da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, a empresa blica se associou às
multinacionais do segmento de agroquímicos, como a BASF e a Monsanto, para
pesquisar novas gerações de sojas transgênicas mais resistentes a determinados tipos de
herbicidas existentes no mercado (EMBRAPA, 2006b).
Detendo um amplo programa de pesquisa, a Embrapa Soja vem também atuando,
juntamente com instituições parceiras, no desenvolvendo de programas de pesquisa que
buscam alterar o sabor da soja tornando-a mais atrativa e nutritiva para a alimentação
humana. Desse modo, passam a estabelecer vínculos de interesses com a indústria de
alimentos, criando novas variedades de soja. Esta linha de pesquisa voltada estritamente
para manipulação das características qualitativas da soja demarca uma nova tendência das
pesquisas em biotecnologia na agricultura, que até então se concentrava especialmente no
melhoramento quantitativo da produção. com a atual elaboração de políticas de
mudança das fontes energéticas e de ampliação do consumo de biocombustíveis, as
pesquisas para aumentar o teor de oleosidade da soja tendem a estabelecer um novo
vínculo, agora com as empresas do setor energético.
Em 2001, com a inauguração do Laboratório de Genoma Funcional, em Brasília
(Laboratório da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia - CENARGEN) a Embrapa
elaborou um programa de pesquisa com o objetivo de realizar o seqüenciamento do
genoma da soja, instrumento este que permite um maior conhecimento, ou “controle”
56
sobre a estrutura genética dessa oleaginosa, de modo a possibilitar sua melhor
manipulação para os fins requeridos de aumento de produtividade e alteração de outras
características (qualitativas) da oleaginosa. Desde 2005, a empreitada da Embrapa para a
constituição de um amplo banco de dados sobre o material genético dessa oleaginosa
conta com a cooperação científica da Academia Chinesa de Ciências Agrárias, parceria
esta firmada através de convênio técnico, ratificado pelos governos dos dois países,
naquele mesmo ano (EMBRAPA, 2006b).
Com referência ainda ao conhecimento de seqüenciamento genômico de
importância para o cultivo da soja, em 2003 chega-se ao genoma do Baculovírus da
lagarta da soja, praga responsável por infectar anualmente dois milhões de hectares de
soja em todas as regiões produtoras do Brasil. Esta pesquisa foi realizada pela Embrapa
Soja em parceria com a Embrapa Recursos Genéticos, a Universidade de São Paulo, a
Universidade de Brasília, a Universidade de Mogi das Cruzes e a Universidade da Flórida
- EUA constituindo uma rede de pesquisa em escala internacional (EMBRAPA, 2006b).
Agindo também numa nova direção, porque voltada mais estritamente para a
agricultura em pequena escala de produção, a Embrapa Soja e a Embrapa Cerrados, em
parceria com a Fundação Cerrados (Anápolis-GO), lançou uma nova variedade de soja, a
BRS Nina, destinada ao desenvolvimento da chamada “agricultura orgânicaque alcança
somente um nicho de mercado. De ciclo precoce, esse cultivar foi aprovado para cultivo
no Brasil central, especialmente nos estados de Goiás e Mato Grosso e no Distrito Federal
(EMBRAPA, 2006b).
A Embrapa Soja coordena um importante grupo de parceiros formado por
instituições de ensino, institutos de pesquisa, fundações de apoio à ciência e tecnologia e
empresas privadas. Essa rede forma um sistema de relações que amplia a capacidade
tanto de geração de novos cultivares, como agiliza a transferência das tecnologias
(comercialização) de acordo com as demandas de mercado identificadas em cada
subespaço sojicultor. No que diz respeito especialmente ao melhoramento genético da
soja, a constituição do Programa Nacional de Melhoramento Genético, coordenado pela
Embrapa Soja, permite a esta contar com mais de 100 pontos de testes de cultivares
57
distribuídos de forma estratégica por todas as principais regiões produtoras de soja do
Brasil e avaliar mais de 250 mil progênies e algo em torno de 50 mil linhagens de soja
por ano (EMBRAPA, 2004). Tal base territorial para realização das pesquisas permite à
Embrapa ampliar sua área de atuação, projetando seu mercado em escala nacional. Em
contrapartida a empresa pública fornece às instituições parceiras o privilégio de explorar
comercialmente suas inovações biotecnológicas, nas regiões em que desenvolvem suas
atividades produtivas.
As pesquisas da Embrapa estão orientadas no sentido de criar tecnologias para o
cultivo da soja em regiões de clima subtropical, onde tradicionalmente se produz soja,
bem como criar tecnologias para regiões a princípio inapropriadas para esse tipo de
cultivo (baixas latitudes, altas temperaturas, solos ácidos), como é o caso das regiões
tropicais e equatoriais do país. Com o melhoramento genético da soja vêm se
desenvolvendo cultivares mais produtivos, porque tendem a se tornar mais resistentes às
principais doenças e pragas que atingem essa lavoura (nematóide de cisto, ferrugem
asiática) e mais adaptados às condições agroecológicas da região em que se pretende
cultivá-los (tipo de solo, regime hídrico, etc.). Ainda, as pesquisas da Embrapa se
orientam na geração de técnicas para o preparo, correção da acidez e adubação do solo,
criando também métodos para o tratamento de sementes e diagnóstico da qualidade antes
do plantio, minorando o risco de perdas na colheita.
No ano de 2001, calculou-se que 53% de toda área brasileira cultivada com soja
fazia uso de cultivares desenvolvidos pela Embrapa, sendo também atribuída a esta a
responsabilidade pela oferta de 60% das sementes de soja disponíveis no mercado
distribuidor de sementes (EMBRAPA, 2006a). Somente para a safra 2005/2006 a
Embrapa lançou 20 cultivares, entre eles a soja convencional, a orgânica e a transgênica,
de modo a atender às diversas regiões de adaptação, proporcionando um ganho de
produtividade médio entre 1,5% e 2% em relação às demais variedades disponíveis no
mercado. Com a aprovação da lei de biossegurança em 2003 (Lei n. 2.401) e a garantia da
legalidade na produção e comercialização da soja transgênica, a Embrapa lançou seus
primeiros cultivares RR buscando atender a uma demanda criada em escala nacional.
58
Assim, os cultivares transgênicos lançados em 2005 atendem às demandas das principais
regiões sojicultoras brasileiras, como o Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São
Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Goiás, e Bahia (Tabela 4).
Tabela 4: Cultivares lançados em 2005 pela Embrapa: características e regiões de
adaptação
Cultivar Característica Região de Adaptação
BRS 213 Convencional / Agricultura Orgânica SC, PR, SP.
BRS 257 Convencional/ Agricultura Orgânica SC, PR, SP.
BRS 258 Convencional/ Agricultura Orgânica SC, PR, SP.
BRS 259 Convencional SC, PR.
BRS 260 Convencional SC, PR, SP.
BRS 261 Convencional SC, PR, SP.
BRS 262 Convencional SC, PR, SP.
BRS 242 (RR) Transgênica SC, PR, SP.
BRS 243 (RR) Transgênica RS, SC, PR, SP.
BRS 244 (RR) Transgênica RS, SC, PR, SP.
BRS 245 (RR) Transgênica SC, PR, SP.
BRS 246 (RR) Transgênica RS, SC, PR, SP.
BRS 247(RR) Transgênica SC, PR, SP.
BRS 255 (RR) Transgênica SC, PR, SP.
BRS 256 (RR) Transgênica SC, PR, SP.
BRS Charrua (RR) Transgênica RS.
BRS Pampa (RR) Transgênica RS.
BRS Valiosa (RR) Transgênica MG, GO, DF.
BRS Baliza (RR) Transgênica MG, GO, DF, BA.
BRS Silvânia (RR) Transgênica MG, GO, DF.
Fonte: EMBRAPA, 2006a.
Organização: Francisco C. Nascimento Jr.
Pode-se notar que o maior volume dos cultivares transgênicos lançados pela
Embrapa na safra 2005/2006, se destinam, sobretudo para a região sul do Brasil (75% do
total de cultivares transgênicos), região cujo cultivo de soja transgênica era realizado
antes mesmo de ser permitido por lei no país.
A capacidade de captação e a disponibilidade de recursos públicos para o
financiamento das pesquisas da Embrapa sempre foi um dos principais alicerces para o
aprimoramento da atividade agrícola da soja no país. Avalia-se que nos últimos vinte e
cinco anos foram investidos em torno de R$ 392, 5 milhões de reais para o
59
desenvolvimento de projetos de pesquisa envolvendo a soja, o que corresponde, em
média, R$ 15,7 milhões de reais gastos anualmente. Somente para os projetos de
melhoramento genético da soja investiu-se R$ 5,4 milhões anuais, o que corresponde a
um total de R$ 135 milhões de reais nos mesmos vinte e cinco anos (EMBRAPA, 2006b).
Todavia, desde os anos 90, o volume de recursos públicos disponibilizados para a
empresa foi reduzido sobremaneira, levando a instituição a buscar fontes externas de
financiamento para a realização de suas pesquisas, destacando-se as crescentes parcerias
estabelecidas pela empresa pública com a iniciativa privada, cujos investimentos
financeiros comumente dirigem-se àquelas linhas de pesquisas estritamente vinculadas a
seus próprios interesses, aos interesses de mercado (
PESQUISA FAPESP, 2003
).
Por isso é necessário destacar a importância do poder público no comando da
promoção e do desenvolvimento da pesquisa agrícola no país. Isto porque é
especialmente pela atuação do Estado que poderá ser garantido o acesso à tecnologia a
uma maior parte da sociedade, segundo suas reais carências, bem como a manutenção do
controle público sobre a criação de novas tecnologias (RAMOS, 2001), fator este que se
torna essencial para a própria autonomia política e econômica dos países no atual estágio
tecnológico do desenvolvimento do capitalismo.
3.
2
A
P
RIMAZIA DO
MERCADO
Ao longo dos anos 90, a intensificação do processo de globalização do sistema
econômico caminhou conjuntamente com o predomínio da lógica do mercado sobre o
desenvolvimento das mais diversas esferas da vida da nação (a criação de normas, a
estrutura das profissões, o desenvolvimento das pesquisas, a instalação de infra-estruturas
no território, etc.). Todavia, como nos lembra Santos e Silveira (2001) tal processo não se
faz sem uma regulação política do território e sem uma regulação do território exercida,
60
diretamente, pelo próprio mercado e ritmada, especialmente, pelo imperativo da
competitividade.
É a partir de uma psicoesfera
8
, fundada na ideologia do crescimento econômico,
que se transformam os contextos de evolução das bases técnicas do território nacional e
também as formas de regulação, no período atual (SANTOS; SILVEIRA, 2001). Neste
sentido, autores como Celso Furtado (1999), Milton Santos (2001), Francisco Oliveira
(2003), denunciam o fato da política estar sendo feita pelo e para o mercado.
Entretanto, como nos lembram esses autores, o mercado existe apenas como um símbolo,
uma ideologia e não como ator. Na verdade, trata-se de uma regulação do território
nacional conduzida por grandes empresas e grandes grupos de interesses, os quais são
responsáveis pelo uso privilegiado e corporativo do território, fazendo da Política uma
“política” fundada na busca dos seus próprios objetivos e do território apenas um recurso
(SANTOS; SILVEIRA, 2001; SANTOS, 2000).
A ideologia neoliberal que fundamenta as ações políticas no território brasileiro
vem sendo responsável por redefinir o papel do Estado e do mercado (as empresas) na
promoção, organização e regulação das atividades econômicas no país. No que diz
respeito ao desenvolvimento das pesquisas técnico-científicas para a agricultura,
importantes mudanças vêm também se sucedendo, demonstrando o dinamismo da
constituição do círculo de cooperação de pesquisa agrícola brasileiro e as novas formas
de regulação do território, próprias do atual período técnico-científico-informacional.
Como vimos, durante as duas primeiras décadas do projeto de modernização da
agricultura, o Estado brasileiro conduziu e financiou a maior parte dos esforços para o
aprimoramento técnico-científico da produção agrícola hegemônica. Sob a liderança da
Embrapa e contando com uma difusa estrutura territorial de pesquisa capaz de realizar,
regionalmente, grande parte das inovações técnico-científicas necessárias para conferir
eficiência à atividade agrícola, o poder público criou as condições operacionais
8
Por psicoesfera estamos considerando, a partir das leituras de Milton Santos e Ana Clara Torres Ribeiro,
a analogia que fazem esses autores entre psicoesfera e tecnoesfera com os conceitos de infraestrutura e
superestrutura de Karl Marx (SANTOS, 2002; RIBEIRO, 1991).
61
responsáveis pela modernização seletiva do campo brasileiro. Assim é que o espaço
agrícola brasileiro foi reorganizado e regiões se especializaram na produção de algumas
commodities, passando então a integrar, passivamente, circuitos produtivos do
agronegócio internacionalizado.
Contudo, aquela presença predominante do Estado nas pesquisas agrícolas
aplicadas (o desenvolvimento tecnológico) vem sendo, gradativamente, alterada a favor
de uma maior participação das empresas privadas, sobretudo no desenvolvimento das
pesquisas em biotecnologia no Brasil. Trata-se de uma nova ordem, uma ideologia
neoliberal que se difunde e redefine o papel do Estado e das empresas na produção da
tecnociência no atual período de desenvolvimento do capitalismo tecnológico.
As atividades de pesquisa na área de biotecnologia para a agricultura científica da
soja, assumem uma função dorsal e estratégica para a manutenção e a elevação da
“competitividade econômica” da produção brasileira e, de maneira geral, para a expansão
do meio técnico-científico informacional e da atividade do agronegócio no território
brasileiro. Os progressos da engenharia genética (como a criação de variedades
transgênicas) permitem diminuir o uso de insumos e reduzir os custos da produção a
partir da invenção de cultivares mais produtivos e mais resistentes a produtos químicos,
pragas, doenças, além de mais adaptadas a ambientes agroecológicos específicos. Em
conformidade com outros sistemas técnicos, a pesquisa em biotecnologia permite o
avanço das manchas de modernização agrícola e a constituição de regiões essencialmente
monofuncionais, estreitamente subordinadas às exigências de produção do mercado
mundial. Tais conquistas colocaram as atividades de pesquisa agrícola numa posição
central frente ao conjunto de inovações tecnológicas que estruturam a agricultura
científica no Brasil.
Num primeiro momento os avanços técnico-científicos obtidos, sobretudo pelas
instituições públicas de pesquisa agropecuária, possibilitaram a consolidação da
agricultura científica em algumas regiões do território brasileiro, fornecendo assim as
condições geográficas e de consolidação de um mercado para que as empresas privadas,
agora, viessem participar com maior intensidade das atividades de pesquisa de inovação
62
biotecnológica. Tal participação só foi vantajosamente possível, agora, depois que o
Estado como empreendedor assumiu os “riscos” de tais investimentos, que são de monta
e de longo prazo, criando as tecnologias necessárias para a expansão e a especialização
seletiva da moderna atividade agrícola no território nacional.
Na medida em que algumas atividades agrícolas hegemônicas, como a produção
de soja, tornam-se cada vez mais exigentes da racionalidade técnico-científica para a
realização eficiente e competitiva da produção, estabelece-se um consumo produtivo
naqueles subespaços de desenvolvimento da agricultura científica (SANTOS, 1993;
ELIAS, 2003) e, concomitantemente, aprofunda-se a dependência destes subespaços em
relação àqueles centros de desenvolvimento de novas tecnologias e de atividades de
pesquisa científica. Tal dependência dá-se tanto operacionalmente, para fins de
viabilização da produção numa dada região, como também, relaciona-se à necessidade
intrínseca da agricultura capitalista de buscar constantemente o aumento da produtividade
espacial, ampliação dos rendimentos com a lavoura e a redução dos custos. Ao tornar-se o
insumo fundamental para a realização da moderna agricultura o uso da tecnociência no
campo cria novas oportunidades de negócio para as empresas privadas.
Deste modo a iniciativa privada, nos últimos tempos, passa a expandir
seletivamente suas atividades no país, aumentando sobretudo seus investimentos em
pesquisa na inovação biotecnológica. É em forma de “pontos” e “manchas” que se
configuram as áreas alvo das estratégias de ão desses agentes no território brasileiro.
Estima-se que o mercado nacional de cultivares de soja, cacau, laranja e cana-de-açúcar,
todas estas commodities nacionais voltadas para o mercado internacional, movimenta
cerca de R$ 650 milhões ao ano, sendo um segmento do agronegócio que desperta assim
grande interesse das empresas privadas de pesquisa tecnológica (TOLEDO, 2005;
BNDES, 2005).
Especialmente ao longo da década de 1990, as atividades de pesquisa das
empresas privadas para a produção de soja foram, sensivelmente, estimuladas e
viabilizadas a partir da criação de normas de regulamentação das atividades de criação e
comercialização de sementes e cultivares no Brasil. Em que pese a pressão política
63
exercida por associações de classe, grandes empresas de pesquisa e grandes produtores,
quando da elaboração do marco regulatório
9
, a aprovação da Lei de Proteção de
Cultivares em 1997 (Lei n. 9456 de 25 de abril de 1997) pelo governo federal, forneceu
“segurança” necessária para que as empresas privadas viessem atuar com maior pujança
nas atividades de pesquisa para a moderna agricultura no território brasileiro. Tal
regulamentação obrigava o pagamento de royalties pela comercialização (difusão) e uso
dos cultivares gerados pelas empresas, o que assegura o retorno econômico dos
investimentos em pesquisa realizados por aqueles agentes. Neste sentido, pode-se dizer
que o Estado, enquanto agente regulador e normatizador por excelência torna-se
imprescindível para a concretização das estratégias privadas de uso do território
(PEREIRA, 2007).
Desde meados da década de 1990, empresas privadas de pesquisa criadas por
grandes produtores do empresariado rural e empresas multinacionais do segmento de
insumos agrícolas expandiram suas atividades no território brasileiro, ampliando o círculo
de cooperação de pesquisa agrícola responsável, verdadeiramente, por viabilizar o
desenvolvimento eficiente da moderna produção de soja nas regiões especializadas do
território nacional.
Então, a partir da constituição de um sistema normativo estavam dadas as
condições para a efetiva mercantilização das atividades de pesquisa biotecnológica no
país e a incorporação definitiva dessa atividade ao circuito superior da economia
agrícola. As inovações biotecnológicas empregadas no campo moderno, antes
conseqüência, predominantemente, das ações do poder público tornam-se, na última
9
Conforme Paschoal (1987), nos anos 70 intensificaram-se as pressões, especialmente da Sociedade
Brasileira de Produtores de Sementes (ABRASEM) junto ao governo brasileiro e, mais especificamente
ao congresso nacional, para a aprovação da “lei de proteção de cultivares” no Brasil. Desde o início desse
movimento tornavam-se claros os interesses particulares que estavam envolvidos na criação de tal marco
regulatório. Os beneficiários destas medidas seriam, principalmente, as empresas patenteadoras dos
cultivares e os grandes produtores de sementes, com visíveis prejuízos aos agricultores que passariam
então a estar à mercê, tanto da propriedade sobre determinadas espécies detida por algumas empresas,
como da política de fixação de preços estabelecida para o uso das sementes. Contudo, a mobilização de
segmentos da sociedade contrários à lei de patenteamento proporcionaram o seu revés, ao menos num
primeiro momento do debate sobre tal questão que se instalara na época no país. A respeito deste
importante episódio, consultar Mooney (1987), especificamente o prefácio do livro.
64
década e meia, cada vez mais resultado das estratégias de uso do território brasileiro por
empresas privadas nacionais e estrangeiras e, portanto, a atividade de pesquisa técnico-
científica para a moderna agricultura torna-se, crescentemente, submetida às mesmas leis
e às mesmas lógicas que regem o desenvolvimento das atividades econômicas realizadas
num ambiente de competição e disputa por mercado.
Após a promulgação da Lei de Proteção de Cultivares o panorama das
empresas privadas de pesquisa de soja tendeu a se modificar
principalmente em função do ingresso nesta atividade das empresas de
capital estrangeiro. Em alguns casos, através da aquisição de empresas
nacionais, principalmente em função do seu germoplasma adaptado às
condições brasileiras, e em outras situações, trazendo para o Brasil o seu
germoplasma de outros países. Empresas nacionais puderam se fortificar
mais financeiramente com a proteção de suas cultivares, passando a
buscar mais rapidamente a sua auto-suficiência financeira através do
direito de exploração comercial de seus resultados [...] Em relação aos
resultados, é indiscutível que houve uma maior oferta de cultivares e,
junto com elas, uma maior transferência de outras tecnologias de forma
muito mais regionalizada e específica [...] Os efeitos destes investimentos
serão sentidos de forma gradual nos próximos anos através de maior
competitividade entre programas e, por conseqüência, o aparecimento de
tecnologias muito mais avançadas [...]. (CARRARO, 2002).
As empresas privadas têm ampliado sua participação na promoção de pesquisas
de inovação biotecnológica da soja, isto é, tem buscado ampliar a capacidade de controle
sobre as bases técnico-produtivas naqueles subespaços luminosos”, lugares em que o
meio técnico-científico e informacional é eficiente ao desenvolvimento da moderna
agricultura. Para tanto, ao longo dos últimos anos, as empresas vêm aumentando
significativamente o ritmo de desenvolvimento de novas tecnologias (Gráfico 6). A partir
da criação de cultivares mais produtivos, adaptados às diversas regiões sojicultoras
brasileiras, resistentes às principais doenças e pragas que prejudicam a realização da
produção, etc., tais empresas privadas buscam, cada vez mais, difundir suas inovações
biotecnológicas no território nacional. A maior participação da iniciativa privada na
criação de biotecnologias significa, igualmente, sua maior capacidade de controle dos
65
sistemas técnicos empregados na moderna produção agrícola desenvolvida de maneira
desigual e seletiva no país.
Gráfico 6: Número de lançamentos de variedades de soja de 1985 a 2001 por natureza
Pública e Privada.
Fonte: CARRARO, 2002.
Sem embargo, a mercantilização das pesquisas em biotecnologia e a integração
dessa atividade ao circuito superior da economia agrícola proporcionaram um
acirramento na disputa entre as empresas de pesquisa no país. A busca por vantagens
competitivas que permitam às empresas de pesquisa ampliar seu mercado no território
brasileiro e arrebatar maiores lucros levaram-nas a criar, incessantemente, variedades
muito mais produtivas, porque dirigidas para atender às demandas cnico-produtivas de
cada região do país. Assim, o trabalho sistemático para a obtenção de novas cultivares,
promovido a partir dos programas corporativos de pesquisa dessas instituições, orientam-
se pela busca em criar a última e melhor novidade tecnológica e, posteriormente, induzir
a sua difusão no território brasileiro. Não obstante, ao longo desses últimos anos pode-se
falar numa evolução vertiginosa no número de cultivares lançados pelas instituições
66
públicas e privadas de pesquisa como resposta a esta verdadeira competição que se
estabelece entre as empresas.
Deste modo, aquele caráter unicamente colaborativo instituído inicialmente pelo
Estado para efeito da expansão e viabilização da produção de soja no território brasileiro,
hoje guarda também certa tensão, oriunda da disputa entre as instituições e empresas que
compõem o círculo de cooperação de pesquisa agrícola no Brasil. Este fenômeno de
tensão na cooperação faz com que, cada vez mais, constituam-se estruturas territoriais
corporativas de pesquisa, vinculadas aos interesses econômicos e às estratégias
territoriais de cada empresa.
A criação de normas de regulamentação da produção e uso das tecnologias foi um
importante fator responsável por redefinir a participação do Estado e das empresas
privadas no círculo de cooperação de pesquisa agrícola para a produção brasileira de soja.
nas últimas safras (99/2000) pôde-se constatar uma tendência ao aumento da
participação da iniciativa privada no volume total de sementes de soja certificada no
Brasil (Gráfico 7). Numa perspectiva de mercado e considerando o período de 98/2005, a
redefinição do papel do Estado e das empresas privadas no círculo de cooperação da
pesquisa pode ser vista pela sensível redução da participação das instituições públicas. A
Embrapa - principal obtentora de cultivares de soja do país reduziu sua participação no
mercado nacional de cultivares de 75%, em meados dos anos 90, para 35%, em 2005.
67
Gráfico 7: Participação no volume total de sementes de soja certificadas no Brasil por natureza
Pública e Privada – 1996/97-1999/00.
Safras
Fonte: CARRARO, 2002.
Além da criação da Lei de Proteção de Cultivares, outras normas contribuíram
para viabilizar (e dar segurança financeira) à expansão das ações das empresas privadas
na promoção das pesquisas biotecnológicas no país. A aprovação, em 1995, da Lei de
Biossegurança (lei n. 8.974/95) constituiu, por exemplo, um importante marco para a
dinamização das pesquisas com Organismos Geneticamente Modificados (OGM),
também denominados transgênicos. Contudo, o passo definitivo para a regulamentação da
produção de soja transgênica no território brasileiro deu-se, em 2005 com a promulgação
da Lei 11.105/05, que legalizou tanto a produção como a comercialização de soja
transgênica em nosso país
10
. Sob forte pressão dos grandes produtores e das empresas
10
no ano de 2003, através de medida provisória, o governo brasileiro havia liberado o plantio de soja
transgênica no país, até então proibida. Sob forte pressão dos grandes produtores e transgredindo o
68
detentoras da tecnologia, pressão principalmente exercida pela multinacional Monsanto, o
governo brasileiro regulamenta o uso de transgênicos, até então utilizados ilegalmente,
mas bastante difundido em determinadas regiões do país
11
. Por sua vez, com a
regulamentação dos transgênicos difunde-se, amplamente no território brasileiro, um
sistema técnico de produção, que garante ganhos econômicos ao produtor que reduz a
quantidade de insumos químicos empregados no manejo da lavoura. De outro lado,
calcula-se que a venda de defensivos deva cair entre 16% e 20% nos próximos anos com
a adoção, em grande escala, da soja transgênica (BOUÇAS, 2006a). Como num efeito
“cascata” da disseminação desse sistema técnico de produção, o movimento de aquisição
de empresas de biotecnologia por grandes indústrias agroquímicas, segundo analistas de
mercado, tende a se consolidar como um movimento geral neste segmento do
agronegócio (BOUÇAS, 2006a).
Para a safra 2006/2007 estima-se que a produção de soja transgênica represente
entre 50% e 60% da área total cultivada no país, prevista para ocupar pouco mais de 20
milhões de hectares. A região que concentra este tipo de produção é o sul do Brasil, com
o estado do Rio Grande do Sul destinando 97% da área para o cultivo de soja transgênica,
seguido do estado do Paraná, alcançando 50% da área prevista para cultivo da oleaginosa.
Além destes, os estados de Goiás e Mato Grosso do Sul têm um índice de produção de
soja transgênica estimado em 60% e 70% respectivamente (BOUÇAS, 2006b). A
produção de soja transgênica tende assim a se tornar predominante no território brasileiro,
substituindo, gradativamente, a chamada produção convencional.
Assim é que a criação de normas constituiu-se num importante mecanismo de
viabilização e favorecimento das estratégias territoriais de algumas empresas no país.
Deste modo, através da lei de propriedade intelectual (patente) que concede a
princípio da precaução, que restringia a legalização deste tipo de produção em face da inexistência de um
conhecimento mais apurado sobre as conseqüências que os organismos geneticamente modificados
poderiam trazer ao ser humano e ao sistema ecológico de maneira deliberada, à revelia de um debate
público que anos se realizava a este respeito, o governo cedeu claramente aos interesses econômicos
que envolvem o cultivo dos produtos transgênicos no país.
11
No Brasil, o Rio Grande do Sul era o estado com o maior volume de produção de soja transgênica.
Estima-se que antes da liberação da produção de transgênicos, 80% da produção de soja naquele estado
usava esse tipo de tecnologia.
69
exclusividade sobre a exploração comercial da tecnologia a seu inventor
12
institui-se uma
nova forma de controle e regulação sobre a atividade produtiva e também sobre os
lugares da produção.
Mas a mercantilização da pesquisa agrícola e a construção de um aparato
normativo responsável por beneficiar as ações das grandes empresas privadas na
produção da pesquisa técnico-científica constitui-se, pode-se assim dizer, numa situação a
princípio pouco vantajosa para países subdesenvolvidos, como o Brasil. Isto porque a
maior capacidade dos países ricos de realizar vultosos investimentos no desenvolvimento
de pesquisas científicas permite aos mesmos comandar o processo de inovação
tecnológica e, ao mesmo tempo, impor uma divisão internacional do trabalho a seu
favor
13
. Na medida em que a produção da pesquisa de “alta tecnologia” se caracteriza
como restrita a algumas empresas e alguns países desenvolvidos, as nações pobres têm
aprofundada sua dependência tecnológica e o desenvolvimento desigual e combinado
inerente ao modo de produção capitalista tende a se agravar e se intensificar nesta nova
divisão internacional do trabalho, fundamentada na produção e no uso da tecnologia. A
12
A questão das patentes, bastante controversa, levanta uma outra discussão acerca da “criação” de seres
vivos pelas empresas. De acordo com Benjamin (2003) “As variedades agrícolas em uso decorrem da
domesticação e da seleção milenar de espécies ancestrais, num processo que nunca foi patenteado por
ninguém e, por isso, difundiu-se livremente. Ao longo das últimas décadas, em muitos países, inclusive o
Brasil, ele foi impulsionado por instituições públicas de pesquisa. Agora, três ou quatro grandes empresas
apropriam-se de tudo o que se fez antes delas, introduzem modificações mínimas nessas espécies e
declaram-se suas proprietárias”.
“Patentear estruturas biológicas é uma contradição em termos, pois os sistemas de patentes protegem
apenas invenções (ou seja, criações humanas), nunca descobertas (ou seja, coisas e processos que existem
na própria natureza, cuja existência apenas descrevemos e, eventualmente modificamos). Nenhum ser
vivo – planta ou animal é invenção humana. Todos resultam de processos seletivos que operam durante
incontáveis gerações, gerando seqüências gênicas muito complexas e até hoje precariamente
compreendidas. Justamente por isso, os pesquisadores não tentam inventar um organismo novo, pois
sabem que não daria certo. Ao contrário tentam introduzir um
mínimo
de variações nas espécies
existentes, de modo a interferir o menos possível em seu equilíbrio. Por meio de técnicas bioquímicas de
corte-e-cola, reorganizam umas poucas seqüências gênicas que estão disponíveis na natureza e observam
o resultado.”
13
De acordo com Leta e Cruz (2003) apesar da produção científica brasileira na área de ciências agrárias
se destaca, por representar 3,07% do total mundial em 2000, nas áreas estratégicas para a agricultura, tais
como biologia molecular e genética (áreas chave para o desenvolvimento das biotecnologias) a
participação brasileira é bem inferior, representando apenas 1,31% do total mundial.
70
pesquisa científica relacionada à agropecuária apresenta-se bastante concentrada nos
países desenvolvidos como se pode observar na tabela a seguir (Tabela 5).
Tabela 5: Concentração da Produção Científica para a Agropecuária no Mundo - 1999
Região/País
União Européia
Estados Unidos
Japão Demais Países
Distribuição da produção
científica para a agropecuária
em % do total mundial
33,87%
32,41%
7,44%
26,36%
Adaptado de Contini; Reifshneider; Savidan (2004)
No período de 2003 a 2006 o registro de cultivares transgênicas no sistema
nacional de proteção de cultivares (SNPC) passou de 31% para 66% do total de cultivares
protegidas, face a um índice quase nulo de registros no período anterior a 2003 (MAPA,
2007b). Nota-se, desta forma, um novo direcionamento das atividades de pesquisa
biotecnológica para a soja, orientada pela difusão e normatização de um novo sistema
técnico-produtivo, de domínio estrangeiro, e que prevalece nas modernas regiões
sojicultoras do Brasil.
A fuga de parte dos produtores brasileiros de soja do pagamento de royalties
levou a uma prática ilegal de uso de sementes de soja contrabandeadas (oriundas
especialmente da Argentina) e/ou pirateadas (produzidas ilegalmente, fora do sistema
nacional de certificação), constituindo um mercado ilegal, que tem até nome: “bolsa
branca” (mercado que negocia cultivares convencionais ou transgênicas) (Tabela 6). Ao
mesmo tempo, a predominância do uso de sementes pirateadas nas principais regiões
sojicultoras brasileiras cria nexos territoriais “clandestinos” na constituição dos rculos
de cooperação e circuitos de produção da soja no território brasileiro. Este tipo de
cooperação ilegal caracteriza-se por uma afronta dos produtores ao controle exercido
pelas quatro instituições de pesquisa (Embrapa, Coodetec, Monsanto, Fundação MT)
sobre tecnologias, e que, portanto, oligopolizam o mercado de biotecnologia
14
. Uma das
14
O uso de sementes ilegais na atividade sojicultora está levando as empresas e associações ligadas as
instituições obtentoras de cultivares a realizar uma verdadeira campanha para combater essa prática
bastante difundida no país. O discurso realizado por esses agentes baseia-se: nos possíveis riscos de
71
principais desvantagens apontadas pelos especialistas no uso de cultivares pirateadas,
seria a produtividade inferior que estas possuem.
Tabela 6: Uso de semente legal nos principais Estados sojicultores Brasileiros - 2006
Estado % de Uso de Semente Legal Produtividade Média Sc/Ha*
MT 85 44, 91
PR 60 39, 83
GO 68 42, 83
SP 85 39, 83
MG 40 39, 00
SC 25 40
MS 42 38
RS 10 32, 25
* que se destacar que outros fatores como clima e fertilidade em cada estado têm influência no
potencial produtivo.
Fonte: ALMEIDA, 2006
.
A produção de um conjunto de normas e a consolidação da agricultura científica
no país, tão exigente de inovação tecnológica para o crescente aprimoramento da
eficiência territorial da produção, são fatores fundamentais para o entendimento da
reorganização do círculo de cooperação de pesquisa agrícola no Brasil, no período atual.
Se aa bem pouco tempo, o Estado controlava” os rumos das “pesquisas de ponta” da
moderna agricultura, numa autonomia que então se consolidava através da produção
técnico-científica aplicada ao campo realizada pela Embrapa, hoje, aquele controle não é
mais prerrogativa do poder público. Gradativamente, as empresas privadas nacionais e
estrangeiras ampliam sua participação no mercado nacional de biotecnologia, passando a
reger, segundo sua própria lógica, os principais programas de pesquisa responsáveis
diretamente pelo aprimoramento e viabilização territorial da produção agrícola, enquanto
ao Estado fica reservada, principalmente, a produção das pesquisas básicas.
De outra forma, pode-se dizer que vem se configurando uma nova regulação
política da pesquisa agrícola baseada, exclusivamente, no imperativo do mercado e na
contaminação das lavouras pela não certificação dessas sementes; a baixa produtividade das lavouras que
as utilizam, além da própria inviabilização do sistema de pesquisa nacional diante dos investimentos
realizados pelas empresas para a promoção de inovações tecnológicas.
72
busca incessante pela competitividade econômica na atividade agrícola. Com a
predominância da iniciativa privada no círculo de cooperação das pesquisas
biotecnológicas para a agricultura científica, podemos dizer agora que desde sua
concepção, o controle sobre a estrutura técnico-produtiva do campo moderno dá-se
integralmente a partir dos interesses de mercado, completando o sistema técnico das
inovações mecânicas e físico-químicas que já, muito tempo, eram também promovidas
por empresas privadas
15
.
Não obstante, alianças, articulações e parcerias entre empresas privadas de
pesquisa, empresas de agroquímicos e tradings, estabelecidas ao longo de todo o processo
de produção e difusão territorial das inovações tecnológicas, constituem-se numa outra
importante variável que revela as estratégias e a convergência dos interesses das grandes
empresas que comandam esse novo modo de organização da atividade agrícola, cujo
paradigma estrutura-se em rede (MAZZALI, 2000; TOLEDO, 2005).
Com a possibilidade de manipulação engenhosa das plantas, criam-se variedades
cada vez mais alinhadas aos interesses das empresas que as concebem. Assim, são
inventadas sementes estéreis (de germinação única), cultivares que demandam o uso de
tecnologias específicas, variedades resistentes a determinados produtos químicos, etc.
Trata-se da conformação de pacotes tecnológicos, às vezes produzidos pela mesma
empresa, que somente conferem eficiência territorial à produção agrícola se utilizados em
conjunto e integralmente. Assim, a partir do comando da produção tecnológica, são
estabelecidas as novas bases da regulação e controle do território nacional no período
técnico-científico-informacional.
Com o adensamento e a articulação das ações das empresas privadas na criação e
desenvolvimento de biotecnologias, a lógica do mercado passa, exclusivamente, a
15
Na década de 1950, a gama de insumos e bens de produção, que ainda de forma restrita se aplicava ao
campo brasileiro advinha integralmente do exterior. É somente em 1959 que se a instalação no país da
primeira grande indústria de bens de produção para a agropecuária, uma multinacional fabricante de
tratores (ELIAS, 2003; AMATO NETO, 1985). Durante a década de 1960 a política governamental de
substituição das importações
viabilizou e intensificou o processo de
industrialização da agricultura
(GRAZIANO, 1996; LLER, 1989). A partir dessa política iniciou-se a constituição de um parque
industrial produtor de insumos agropecuários como fertilizantes, herbicidas, pesticidas e maquinários.
73
orientar a concepção e a execução dos grandes programas de pesquisa para a agricultura
científica no país. Sob a gica do mercado a forma de concepção das bases técnico-
produtivas empregadas nos modernos subespaços sojicultores se traduz numa nova forma
de apropriação do território brasileiro, haja vista a produção dessa tecnociência constituir-
se na própria base do funcionamento e da utilização daqueles subespaços luminosos. O
controle de algumas empresas sobre os rumos das pesquisas científicas e o
desenvolvimento tecnológico - sua propriedade intelectual sobre as biotecnologias criadas
e amplamente difundidas no campo moderno, levam ao domínio corporativo do território,
ou como desde os anos 70 já alertava Mooney (1987), ao escandaloso domínio de
algumas grandes empresas privadas sobre a própria produção de alimentos produção da
qual depende a vida.
3.
2.
1
A
G
ÊNESE
T
ERRITORIAL E AS
E
STRATÉGIAS DAS
E
MPRESAS
P
RIVADAS DE
P
ESQUISA DA
S
OJA NO
B
RASIL
.
No Brasil, ao longo dos últimos anos, as empresas privadas vêm, crescentemente,
conduzindo o desenvolvimento biotecnológico empregado no campo moderno.
Entretanto, a dinâmica da constituição do círculo de cooperação de pesquisa agrícola
apresenta-se de forma distinta em cada região produtora. Essa conformação específica do
círculo de cooperação está associada tanto à gênese territorial de cada empresa, isto é aos
processos político-econômicos que levaram à criação e ao início de suas atividades de
pesquisa numa dada região produtora, como também se relaciona às estratégias
elaboradas pelas empresas para expandir seu mercado nas principais regiões sojicultoras
do país. Integrando o núcleo do círculo de cooperação técnico-científico para a produção
de soja em escala nacional analisa-se, a seguir, mais diretamente as atividades da
Monsanto e da Fundação MT e o uso que fazem do território brasileiro.
74
A MONSANTO
Uma das maiores empresas do mundo no setor de agroquímicos, a multinacional
Monsanto surgiu em 1901 nos EUA e está hoje presente em dezenas de países
16
, gerando
inovações tecnológicas dirigidas ao cultivo de variados gêneros agrícolas, com destaques
para a soja, o milho, o algodão e o sorgo. No Brasil, a Monsanto iniciou suas atividades
em 1951 e as expandiu progressivamente nas décadas seguintes. Nos anos 90 sua
capacidade de atuação foi ampliada especialmente com a aquisição, entre 1995 e 1997,
das empresas Calgene, Asgrow, Agroceres, Dekalb e Monsoy, esta última, voltada mais
diretamente à produção de insumos para a produção de soja.
Há três décadas a Monsanto vem promovendo pesquisas na área de biotecnologia,
sendo uma das empresas pioneiras na manipulação genética de diversos gêneros agrícolas
em todo o mundo. Desde 1975, quando a Monsanto estabeleceu nos EUA seu programa
de pesquisa biológica de células e, mais acentuadamente durante os anos 80, quando
abertamente dirigiu seus investimentos para a área de biotecnologia, a empresa convergiu
suas ações, prioritariamente, para a promoção de pesquisas e experimentos que visaram o
melhoramento genético de plantas e a criação de cultivares transgênicas. Segundo a
Monsanto, nos últimos cinco anos foi investido um montante em torno de quatro bilhões
de dólares em pesquisas de biotecnologia nos países em que a empresa se encontra
instalada. Somente no Brasil o valor estimado dos investimentos em pesquisa foi de U$
7,5 milhões em 2003 (MONSANTO, 2006).
Um dos resultados mais bem sucedidos da empreitada iniciada na década de 1980
pela empresa estadunidense foi a criação da tecnologia Roundup Ready (RR). A
importância do uso desta tecnologia para a realização competitiva da produção agrícola se
16
Canadá, Estados Unidos, México, Colômbia, Venezuela, Brasil, Argentina, Chile, Senegal, Uganda,
Quênia, Tanzânia, Malawi, África do Sul, Rússia, China, Índia, Paquistão, Turquia, Austrália, Japão,
Coréia do Sul, Taiwan, Filipinas, Indonésia, Malásia, Tailândia, Vietnam, Ucrânia, Romênia, Bulgária,
Grécia, Itália, Croácia, Suíça, Hungria, Eslováquia, Polônia, República Tcheca, Alemanha, Dinamarca,
Bélgica, Inglaterra, França e Espanha.
75
mostrou fundamental, sobretudo por possibilitar a prática do plantio direto
17
e,
consequentemente proporcionar um maior ganho de produtividade na lavoura com a
diminuição (relativa) dos custos da produção, haja vista as variedades transgênicas
portadoras da tecnologia RR serem resistentes aos herbicidas com base no princípio
químico do glifosato, criado pela própria Monsanto e responsável por aniquilar plantas
daninhas da lavoura.
Deste modo, incorporada às vantagens econômicas e técnicas proporcionadas
pelo método do plantio direto e somando-se a busca constante pela obtenção de crescente
produtividade nas lavouras, a adoção das cultivares transgênicas RR tornou-se de suma
relevância para a realização da agricultura competitiva e em grande escala, especialmente
a produção de soja voltada ao mercado internacional. Hoje estima-se que da área total
ocupada com os principais produtos transgênicos (milho, soja, canola, algodão), a soja
RR represente 60% desta área, ou seja, ocupa 48,4 milhões de hectares em todo o mundo
(FUNDAÇÃO MT, 2006). No Brasil o sistema de plantio direto também predomina nas
principais regiões sojicultoras. Estima-se que na safra 2006, mais da metade da área
plantada com soja no Paraná, tenha sido cultivada neste sistema, enquanto nos cerrados,
dos seis milhões de hectares plantados com soja, mais de cinco milhões sejam de plantio
direto, proporcionando ganhos de produtividade entre dez e vinte por cento nestas regiões
(EMBRAPA, 2006b).
Desta maneira, gradativamente, promoveu-se a universalização de uma
determinada e eficaz forma de produção (o plantio direto) de maneira estreitamente
conjugada ao uso de uma tecnologia de propriedade intelectual detida pela empresa que o
concebeu. Calcula-se, atualmente, que a Monsanto responda por valores acima de 70%,
podendo alcançar 100% das variedades transgênicas criadas e comercializadas em todo o
mundo. De maneira geral, considerável parcela da produção agrícola no mercado
17
O plantio direto constitui-se por um conjunto de técnicas que minimizam a movimentação do solo
(gradagens e arações), admitindo a permanência de uma cobertura vegetal morta sobre a área plantada, o
que acaba por proporcionar a preservação dos nutrientes do solo. Deste modo, trata-se de evitar sua
degradação (erosão e compactação), além de poupar o emprego de força de trabalho no sistema de plantio
(mão-de-obra, maquinário) reduzindo assim, os custos da produção.
76
internacional de commodities dá-se sob uma única base tecnológica que, conjugada a um
modelo eficiente de realização da produção evidencia a unicidade técnica, característica
marcante do período atual (SANTOS, 2002).
Assim, a partir da gica da competitividade, como uma psicoesfera que cria a
necessidade de uso de novas tecnologias, os grandes produtores de soja do mundo todo se
tornam dependentes de uma empresa, a Monsanto, que detém a patente da transgenia
Roundup Ready cujo uso tornou-se em pouco tempo massificado.
A Monsanto vem, nos últimos anos, ampliando gradativamente sua capacidade de
atuação no Brasil. Sua estratégia territorial vem sendo pautada pela aquisição de
empresas brasileiras de sementes, como a incorporação da Agroceres e da FT Sementes
no ano de 1999 e pela criação de centros próprios de pesquisas principalmente nas regiões
em que a produção da soja se destaca. Sob esta perspectiva, no ano de 2003 a empresa
inaugurou, em Sorriso, no estado do Mato Grosso, o seu mais novo centro de pesquisa de
soja no país. Uma ação em consonância com a estratégia da empresa de expandir sua
participação nesta principal região produtora de soja do Brasil. Em 2000, após o conflito
entre a Embrapa e a Fundação MT a Monsanto rapidamente firma parceria com a
empresa pública para o desenvolvimento dos seus programas de pesquisa na região.
Em território brasileiro a Monsanto arquiteta uma rede privada de pesquisa com a
finalidade de atender às demandas regionais por inovações biotecnológicas para a soja. A
empresa possui duas unidades de pesquisa voltadas exclusivamente à pesquisa da soja,
localizadas respectivamente em Sorriso MT e Morrinhos GO e outros cinco centros
de pesquisa em biotecnologia e desenvolvimento de sementes em Sta. Helena de Goiás
GO, Uberlândia MG, Sta. Cruz das Palmeiras SP, Rolândia PR e Não-Me-Toque -
RS unidades responsáveis por também integrar os programas elaborados pela empresa
para atender às principais regiões sojicultoras brasileiras (Mapa 3).
A organização territorial do trabalho científico da Monsanto no Brasil se realiza a
partir da produção de informações sobre a viabilidade econômica e o comportamento
agronômico das tecnologias criadas pela empresa para as principais regiões sojicultoras
do país. Assim realizam-se pesquisas com o objetivo de avaliar o desempenho regional
77
dos sistemas de produção que utilizam as tecnologias da empresa; busca-se adaptar suas
biotecnologias, minuciosamente, às condições de cada região. A partir dos centros de
pesquisa localizados estrategicamente no território brasileiro desenvolvem-se os
programas corporativos de pesquisa da empresa, instituindo articulações territoriais
eficientes, essencialmente funcionais. Por sua vez, o comando geral das atividades da
Monsanto no Brasil encontra-se centralizado em São Paulo.
Mapa 3: Distribuição dos Centros de Pesquisa da Monsanto no Território Brasileiro -
2006
Fonte: MONSANTO, 2006.
78
Além dos programas de pesquisa desenvolvidos pela própria empresa, a
Monsanto participa, em regime de parceria institucional e organizacional, de pesquisas
com universidades públicas, institutos e outras empresas de modo a usufruir também dos
resultados, informações e os conhecimentos obtidos por essas instituições. São exemplo
dessa prática os casos em que a Monsanto juntamente com a Universidade Estadual de
Londrina - UEL (PR), a Universidade Estadual de Ponta Grossa - UEPG (PR) e a Spray
Drop (PR) desenvolveram pesquisas que comprovaram a eficácia agronômica do
herbicida glifosato, quando aplicado em situação de pós-emergência para o controle de
plantas daninhas na cultura da soja Roundup Ready; outro exemplo é o da parceria com a
Feagri Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP (SP) em que se realizaram
experimentos para a comprovação da eficiência do herbicida MON 14445 para plantas
daninhas em solos do cerrado aplicado sobre a soja Roundup Ready em plantio direto;
além de outros estudos relacionados à aplicação do herbicida glifosato, realizados em
parceria com a Escola Superior de Agronomia Luiz de Queiroz - ESALQ (SP) e
divulgado, juntamente com as pesquisas anteriores, no XXIII Congresso Brasileiro de
Plantas Daninhas.
O trabalho científico desenvolvido pela própria Monsanto, a divisão do trabalho
científico que ela promove e toda a rede de pesquisa que se organiza em torno dela,
corrobora a tese da existência de um conjunto de lugares funcionalmente organizados
para a realização complementar e solidária do trabalho intelectual que fundamenta a
moderna atividade agrícola no território brasileiro. A estrutura de pesquisa da empresa e a
divisão territorial do trabalho científico instituída por ela, conta com a colaboração de
outras instituições (universidades e empresas blicas e privadas), uma solidariedade
organizacional criada para viabilizar os programas de pesquisa da multinacional
Monsanto no Brasil. Uma verdadeira organização territorial corporativa que se institui
com a finalidade única de geração de novidades tecnológicas que garantam maior
participação da empresa no mercado nacional de insumos para a produção de soja.
Para a geração de biotecnologias para produção de soja no Brasil a Monsanto
atua especialmente através da Monsoy, empresa do grupo responsável pela geração de
79
cultivares convencionais e transgênicos adaptados às condições agroecológicas
brasileiras. Dada a atuação em escala global da Monsanto e o caráter universal de
algumas das suas inovações biotecnológicas, a empresa detém um importante poder de
difusão mundial de variedades e linhagens de soja. Neste sentido, os programas
internacionais de pesquisa desenvolvidos pela Monsanto para a manipulação genética da
soja, sobretudo nos laboratórios americanos da empresa, tratam também de estabelecer
nexos territoriais com os programas de pesquisa e tecnologias geradas pela empresa para
o mercado brasileiro.
Com a Lei 11.105, de 24 de março de 2005 aprovada pelo governo federal e a
conseqüente liberação da produção e da comercialização dos produtos transgênicos no
território nacional, a Monsoy lançou para a safra 2005/2006 seis cultivares de soja com a
tecnologia RR adaptada às principais regiões produtoras brasileiras (Tabela 7). Essa
normatização da produção de variedades transgênicas vem, num primeiro momento,
privilegiar especialmente a Monsanto, haja vista o pioneirismo dessa empresa nas
pesquisas em biotecnologia e a propriedade intelectual sobre uma das tecnologias mais
eficientes para a viabilização competitiva da atividade produtiva agrícola: a tecnologia
RR.
Tabela 7: Cultivares Monsoy safra 2005/2006: características e regiões de adaptação
Cultivar Característica Região de Adaptação
M-SOY 7878RR Transgênica SP (Norte), GO (Norte e Sul), MS (Norte)
e MG (Norte e Triângulo)
M-SOY 8000RR Transgênica SP (Norte), GO (Sul e Norte), MS (Norte)
e MG (Norte e Triângulo)
M-SOY 8008RR Transgênica SP (Norte), GO (Sul e Norte), MS (Norte)
e MG (Norte e Triângulo)
M-SOY 8585RR Transgênica GO (Sul e Norte), MS (Norte) MT (Sul e
Norte), MG (Norte e Triângulo) e BA (Oeste)
M-SOY 8787RR Transgênica GO (Sul e Norte), MS (Norte), MG (Norte
e Triângulo) BA (Oeste), MT (Norte e Sul) PI (Sul)
e MA (Sul)
M-SOY 7979RR Transgênica PR, SP (Sul), MS (Sul), SC e RS.
Fonte: www.monsanto.com.br.
Org: Francisco C. Nascimento Jr.
80
Além dos seis cultivares lançados para a safra 2005/2006, a Monsoy já possui dez
outros cultivares, todos transgênicos, previstos para serem lançados e ofertados no
mercado brasileiro nas safras futuras (tabela 8). A geração de cultivares com qualidades
adicionais, com maior resistência ao ficit hídrico e à seca, maior nutritividade dos
grãos, adaptados a regiões de baixa latitude, etc. é, aliás, uma tendência que vem
caracterizando os esforços recentes dos centros de pesquisa em geral e vem definindo os
objetivos atuais que conduzem o processo de inovação biotecnológica.
Tabela 8: Lançamentos futuros de cultivares Monsoy: características e regiões de
adaptação
Cultivar Característica Região de Adaptação
M-SOY 7908RR Transgênica SP (Norte), GO (Norte e Sul), MS (Norte),
MT (Sul) e MG (Norte e Triângulo)
M-SOY 8045RR Transgênica SP (Norte), GO (Sul e Norte), MS (Norte)
e MG (Norte e Triângulo)
M-SOY 8199RR Transgênica SP (Norte), GO (Sul e Norte), MS (Norte),
MT (Sul), MG (Norte e Triângulo) e BA (Oeste)
M-SOY 8248RR Transgênica MT (Sul e Norte)
M-SOY 8252RR Transgênica SP (Norte), GO (Sul e Norte), MS (Norte),
MG (Norte e Triângulo), MT (Sul).
M-SOY 8287RR Transgênica GO (Sul e Norte), MS (Norte), MT (Sul),
MG (Norte e Triângulo) e BA (Oeste).
M-SOY 8360RR Transgênica GO (Sul e Norte), MS (Norte), MT (Sul),
MG (Norte e Triângulo) e BA (Oeste).
M-SOY 8925RR Transgênica MT (Sul e Norte) e BA (Oeste)
M-SOY 9056RR Transgênica MT (Sul e Norte) e BA (Oeste)
M-SOY 9144RR Transgênica MT (Sul e Norte) e BA (Oeste)
Fonte: www.monsanto.com.br
Org: Francisco C. Nascimento Jr.
O maior volume das inovações, como se pode perceber, está dirigido ao Brasil
central, potencial mercado para o consumo dos cultivares transgênicos com a liberação
recente do seu plantio pelo governo federal. Esta orientação territorial do trabalho
científico da empresa com o objetivo de aprimorar e maximizar ainda mais a produção de
soja no Centro-Oeste indica a tendência ao aprofundamento da especialização regional e a
intensificação da cientifização do meio geográfico. Assim, constitui-se um meio cnico-
científico informacional extremamente funcional ao circuito espacial do agronegócio.
81
A Monsanto mantém uma forma peculiar de parceria com os principais centros de
pesquisa de soja do Brasil a Embrapa, a Coodetec e a Fundação MT para a difusão da
tecnologia RR
18
. A empresa forneceu licença para que estas instituições pudessem criar
seus próprios cultivares valendo-se também da tecnologia Roundup Ready. Desta
maneira, produzem-se variedades específicas por um determinado centro de pesquisa,
contudo baseada numa tecnologia criada e fornecida legalmente pela Monsanto. Assim, a
Monsanto ampliado o mercado de consumo de sua própria tecnologia, garantindo
lucros com a comercialização das variedades transgênicas. Institui-se, assim, uma outra
relação de dependência, agora dos centros de pesquisa para com a Monsanto na criação
dos cultivares RR. Essa estratégia de licenciamento do uso de sua tecnologia é
extremamente vantajosa para a Monsanto, que os demais centros de pesquisa passaram
a produzir a tecnologia RR, garantindo assim sua oferta diante das crescentes demandas
pelo uso em larga escala da soja transgênica no Brasil
19
.
Constatados os fundamentos do projeto tecno-ideológico que se consolida e se
difunde mundialmente pela empresa Monsanto, como base para uma concretização
eficiente da produção da soja, confirma-se a unicidade técnica contemporânea para a
agricultura, na qual os fundamentos ideológicos da tecnologia produzida (RR) se
sustentam numa relação de dependência entre a empresa que concebe e detém a
tecnologia e os produtores de soja. Um vínculo verdadeiramente radical de dependência
se estabelece sustentado no próprio princípio fundador do modelo tecnológico de
produção, qual seja o princípio da máxima eficiência e competitividade no mercado.
18
que se destacar que outros centros de pesquisa, de menor porte também estabeleceram tal parceria
com a Multinacional. Este é, por exemplo, o caso da Fundacep, no Rio Grande do Sul, que em 2006
recebeu a licença da Monsanto para desenvolver cultivares com tecnologia RR.
19
Estima-se que na safra 2005/2006 somente a Coodetec foi responsável por 70% da oferta total de
semente legal de soja geneticamente modificada e comercializada no país (GAZETA MERCANTIL,
2005). O licenciamento fornecido pela Monsanto à Coodetec para a geração de soja transgênica, pode-se
notar, se deu de maneira estratégica haja vista a cooperativa se constituir numa instituição de destaque no
círculo de cooperação de pesquisa da soja no Brasil. Na safra 2004/2005, por exemplo, os cultivares da
Coodetec responderam por 66% da área plantada com soja no estado do Paraná, 57,2% em Santa Catarina,
26,3% no Rio Grande do Sul, 29,9% em São Paulo e 21,9% no Mato Grosso do Sul.
82
Assim é que a relação de poder que se estabelece a partir da racionalização
técnico-científica da produção e do território, acaba por consolidar aquele processo que
Hebert Marcuse definiu como um movimento de dominação por baixo (HABERMAS,
1975). O consentimento coletivo da difusão e uso de uma determinada tecnologia,
legitimada pela lógica mercantil, acaba por ocultar o poder de alguns agentes sobre o
funcionamento da sociedade e do território como um todo. É assim também que se
processa, no período atual, a racionalização do território brasileiro: através da
cientifização da produção agrícola fundada na lógica da competitividade e promovida por
alguns agentes hegemônicos responsáveis por controlar o modo de desenvolvimento da
produção no campo. Esse modo de desenvolvimento está fundado na produção de
tecnociência, o que também nos revela os fins para os quais a produção científica vem
servindo, ao poder e às grandes corporações econômicas tudo articulado com a
ideologia neoliberal. No território instrumentalizado técnica e cientificamente, o poder de
alguns agentes hegemônicos da economia se revela tanto nos sistemas técnicos utilizados
quanto no conjunto das ações que concebem e regulam o funcionamento do território.
A FUNDAÇÃO MATO GROSSO – FUNDAÇÃO MT
Relativamente recente, a Fundação de Apoio à Pesquisa Agropecuária do Mato
Grosso (Fundação MT) surge no ano de 1993, pela iniciativa de grandes produtores mato-
grossenses de grãos e sementes, com o objetivo de aprimorar a produtividade do cultivo
de soja na região e combater as pragas e doenças (nematóide, cancro da haste) que então
vinham prejudicando a produção.
no ano seguinte à criação da Fundação iniciaram-se as pesquisas na área de
melhoramento genético da soja, com a finalidade de gerar cultivares mais resistentes a
pragas e doenças, e especialmente adaptados às condições agroecológicas dos cerrados
mato-grossenses. Para isso a instituição contou com o financiamento das pesquisas
83
promovido por algumas dezenas de produtores de sementes do estado; a manutenção do
centro de pesquisa da fundação sob a responsabilidade da Associação de Produtores de
Sementes do Mato Grosso (APROSMAT) e com a parceria técnico-científica firmada
com a Embrapa Soja para a realização de testes e experimentos das cultivares criadas
especificamente para a região (SILVA, 2003).
A criação da Fundação MT foi realizada sob a justificativa dos sojicultores de
suprir a carência por maiores dispêndios em pesquisas biotecnológicas para o estado do
Mato Grosso, intensificando a fabricação regionalizada de tecnologias para o cultivo da
soja, elemento este tão necessário para a obtenção de máxima eficácia na atividade
agrícola em ambiente de cerrados, onde os solos pouco férteis, a diferença de foto-
período e o clima com temperaturas elevadas são, a priori, pouco propícios para o cultivo
deste gênero agrícola. Para tanto, buscou-se essa fonte alternativa de investimentos em
pesquisas biotecnológicas, até então feita no estado em larga medida pelo poder público
(governo federal) através, sobretudo, dos programas desenvolvidos pela Embrapa e das
ações promovidas por algumas universidades públicas lá presentes.
Ademais, a parceria da fundação com instituições financeiras, empresas
sementeiras, empresas de fertilizantes, empresas de equipamentos e maquinários, dentre
outras possibilitou um maior controle e direcionamento por esses agentes sobre os
produtos gerados a partir do trabalho de pesquisa realizado pela fundação, conformando o
chamado pacote tecnológico adequado à pratica agrícola dos subespaços sojicultores do
Brasil central. Assim, buscou-se, em suma, obter um maior domínio sobre o conjunto das
bases técnicas empregadas na produção agrícola ali realizada, além de orientar as
pesquisas da fundação de acordo com as demandas dos grandes produtores de grãos da
região.
A Fundação MT tem como característica uma ação espacial essencialmente
regionalizada. Esta característica advém da sua própria gênese territorial, vinculada aos
atores econômicos e políticos da moderna agricultura e do agronegócio mato-grossense.
As pesquisas e as inovações tecnológicas da instituição estão dirigidas, desde o início de
suas atividades, à racionalização da atividade agrícola daquele estado, atribuindo à
84
Fundação uma evidente especialização territorial na orientação do trabalho científico por
ela desenvolvido.
Todavia, nos últimos anos, com a expansão e consolidação do front da soja nos
estados do Centro-Oeste, alcançando ainda o sul da região Norte, o oeste da Bahia e o sul
do Maranhão, conformando um subespaço que se convencionou chamar de cinturão (belt)
da moderna agricultura, a Fundação MT vem ampliando suas estratégias territoriais de
ação, de modo, agora, a abranger o Brasil central como um todo. Ainda, com a aprovação
da Lei de proteção de cultivares, novas estratégias passaram a compor o quadro de
projetos da instituição, levando-a a programar a expansão territorial de seu mercado.
A organização territorial do trabalho científico promovido pela Fundação MT
está estruturada a partir de sua sede, localizada em Rondonópolis MT e envolve
diversas outras localidades (Sorriso MT, Campo Verde MT, Campo Novo do Parecis
MT, Alto Garças MT, Costa Rica - MS) que compõem a estrutura territorial
corporativa de pesquisa da Fundação. A divisão territorial do trabalho científico
promovido pela Fundação MT é realizada conforme cada uma das etapas e fases de
pesquisa que compõem seu programa de melhoramento genético e desenvolvimento de
novas cultivares. De maneira articulada e sincrônica repartem-se as funções construindo-
se, concomitantemente, uma interdependência entre as localidades, na medida em que as
atividades desenvolvidas em cada localidade se vinculam ao trabalho executado pelas
demais.
Por sua vez, o trabalho científico realizado naquelas localidades integrantes da
estrutura territorial de pesquisa da Fundação encontra-se estreitamente subordinado a
Rondonópolis MT, centro de comando dos programas de pesquisa da fundação e local
de onde se monitoram as atividades desenvolvidas pelas unidades executoras de pesquisa
da instituição. Em Rondonópolis o armazenadas todas as informações sobre a evolução
diária das pesquisas e dos testes que o realizados dispersamente no território brasileiro.
Assim, constitui-se uma hierarquia territorial do fazer, juntamente com um comando
centralizado das ações, estabelecido remotamente. Desta maneira são alicerçados os
nexos de solidariedade organizacional entre as localidades.
85
Uma importante fase da pesquisa de melhoramento de cultivares da Fundação
MT encontra-se localizada em Cambé, no estado do Paraná, onde essituada a Tropical
Melhoramento Genético (TMG), empresa que tem sua origem vinculada à fundação e
que, hoje se constitui formalmente numa empresa autônoma. Atualmente a TMG,
parceira exclusiva da Fundação MT no Mato Grosso, vem conduzindo testes em sete
estados brasileiros além de também fazê-lo na Argentina, totalizando uma rede de
experimentos com testes realizados em mais de 50 localidades. A TMG conta também
com parcerias firmadas com empresas nacionais e internacionais, como a GMS, Relmó
(Argentina), entre outras. O programa de melhoramento genético da TMG se apresenta
como um dos maiores do mundo, testando, na safra 2005/2006 cerca de 450.000
progênies oriundas de mais de 5.000 combinações genéticas. Assim, através de suas
parcerias com empresas nacionais e internacionais e a consolidação de seu próprio
programa de melhoramento genético, a TMG vem aumentando sua capacidade de
inovação tecnológica ao passo que também amplia seu campo de atuação. Para a safra
2006, variedades TMG foram recomendadas para São Paulo, Mato Grosso do Sul,
Paraná e Rio Grande do Sul (FUNDAÇÃO MT, 2006).
Em Cambé, funcionam os laboratórios de nematologia, fitopatologia,
biotecnologia e melhoramento de germoplasma. É a partir das atividades desenvolvidas
pela TMG que se realiza uma das mais importantes etapas do programa de melhoramento
genético da soja da Fundação MT, que é o cruzamento de variedades, promovido a partir
de material biológico encaminhado pelo centro de pesquisa da Fundação em
Rondonópolis, mesmo local onde depois são encaminhados os materiais resultantes dos
cruzamentos. De acordo com Silva (2003), a construção do Centro de Pesquisa de Cambé
no ano de 2001 pela Fundação MT se deu com o fim de ampliar sua escala de atuação. “A
escolha de Cambé para sediar o centro de pesquisa envolveu questões técnicas, visto a
região possibilitar o desenvolvimento de novos cultivares, tanto para a região Sul quanto
para a Amazônia” (SILVA, 2003, p. 165-166). Com a instalação deste centro de pesquisa
no Paraná, a Fundação torna clara sua estratégia de ampliar sua escala de ação, de modo a
86
estender às regiões sojicultoras meridionais a possibilidade de difusão de suas inovações
tecnológicas.
Objetivando ampliar sua rede de pesquisa e experimentos no Mato Grosso, a
Fundação MT firmou convênios com os principais municípios sojicultores do estado para
a viabilização e o desenvolvimento dos seus trabalhos de experimentação. Desta maneira,
são conduzidos estudos pela Fundação com o objetivo de obter um maior conhecimento
sobre o comportamento de suas cultivares nas regiões denominadas de unidades-pólo da
produção de soja nos cerrados. Os municípios integrantes desta rede de experimentos são:
Sapezal MT, Sorriso MT, Rondonópolis MT, Campo Novo dos Parecis - MT, Serra
da Petrovina - MT, Campo Verde MT e Costa Rica - MS. Além das regiões
denominadas unidades-pólos a fundação conta também com pontos de teste em outros
estados como a Bahia, Tocantins, Goiás e Paraná. Ao todo o mais de setenta áreas de
instituições associadas à fundação utilizadas para a realização de pesquisas e
experimentos.
Ao longo dos seus treze anos de existência o trabalho de pesquisa da Fundação
MT, realizado em parceria com outras instituições, como a Embrapa (nos primeiros anos)
e sua atual parceria íntima com a TMG, resultou na geração de dezenas de cultivares. Os
esforços tecnológicos da fundação ganharam ainda mais vigor nos últimos anos com a
liberação da produção e comercialização de soja transgênica. Deste modo, além das
variedades convencionais geradas para os cerrados, a Fundação MT em parceria com a
TMG e a Monsanto tratou de lançar cultivares transgênicas para a safra 2005/2006
(Tabela 9).
Tabela 9: Cultivares Fundação MT (TMG): Características e Regiões de adaptação
Cultivar Característica Região de Adaptação
MG/BR-46 Conquista Convencional MT, MG, MS, GO, BA e DF.
FMT Tucunaré Convencional MT, MS, MG e GO.
BRS MT Pintado Convencional MT, MS, MG e GO.
MT/BR-51 Xingu Convencional MT, MS, BA e RO.
FMT Tabarana Convencional MT
MT/BR-53 Tucano Convencional MT, MS, BA e RO.
87
BRS MT Uirapuru Convencional MT, MS, GO, MG, BA e RO.
FMT Kaiabi Convencional MT
FMT Perdiz Convencional MT
FMT Arara Azul Convencional MT
TMG-103 RR Transgênica MT, MS e GO.
TMG-106 RR Transgênica MT, MS e GO.
TMG-108 RR Transgênica MT, MS e GO.
TMG-113 RR Transgênica MT, MS e GO.
TMG-115 RR Transgênica MT, MS e GO.
TMG-117 RR Transgênica MT, MS e GO.
Fonte: FUDAÇÃO MT, 2006.
Org: Francisco C. Nascimento Jr.
Em comunhão com o melhoramento genético da soja a Fundação realiza
pesquisas em manejo de solos, adubação, ecofisiologia, fenologia, controle de pragas e
plantas daninhas, no mais das vezes a partir de sua própria estrutura territorial de
pesquisa, de modo a fornecer ao produtor um apoio técnico especializado e integral para a
concretização de uma eficiente agricultura empresarial. A partir de uma relevante infra-
estrutura disponível para a realização das pesquisas (laboratórios, campos de
experimentação, etc.), recursos financeiros oriundos de fundos privados (empresas
associadas, royaltes) e públicos (Finep, Fapemat, Prefeituras) que interam um orçamento
anual de cerca de R$ 20 milhões, além de um vasto quadro de pesquisadores altamente
qualificados (vinte e seis pesquisadores com pós-graduação) atuantes nas várias áreas de
conhecimento que compõem o know-how científico da soja, a Fundação MT promove
uma intensa especialização local do trabalho científico de modo a oferecer aos produtores
de grãos e sementes, sobretudo do estado mato-grossense, o aporte tecnológico que
demandam para a realização competitiva da produção de soja.
As pesquisas científicas desenvolvidas pela fundação contribuíram em muito para
a alta eficiência da produção de soja no Mato Grosso. Com seus esforços voltados à
geração de tecnologias que possibilitam uma maior resistência das cultivares a doenças e
pragas, a adaptação das variedades a ambientes agroecológicos especiais, assim como a
adaptação à colheita mecanizada e o aumento da sua produtividade final, o Mato Grosso
se consolidou nos últimos anos como o principal estado sojicultor brasileiro, alcançando
os maiores índices nacionais de produção e produtividade, além da própria auto-
88
suficiência na produção de sementes de soja. Hoje, mais da metade das sementes de soja
produzidas no Mato Grosso é criada e desenvolvida pela Fundação MT principal
protagonista na realização desta atividade no estado (FUNDAÇÃO MT, 2006).
As parcerias técnico-científicas e os nexos espaciais firmados pela Fundação MT
são amplos e diversos. Estes convênios são responsáveis por conformar a solidariedade
institucional estabelecida pela fundação com o objetivo de otimizar suas pesquisas para a
obtenção de avanços no combate às pragas; no aprimoramento das técnicas de nutrição e
adubação do solo; no aperfeiçoamento do manejo das lavouras e na melhoria das
características genéticas, fisiológicas e anatômicas das cultivares. Dentre as instituições
de pesquisa parceiras da fundação e que integram a rede geográfica por ela construída,
estão a Universidade Estadual Paulista (FCA), a Escola Superior de Agronomia Luiz de
Queiroz (ESALQ/USP), a Universidade Federal do Mato Grosso, a Universidade Federal
do Mato Grosso do Sul, o Instituto Agronômico de Campinas (IAC), o Instituto
Agronômico do Paraná (IAPAR), a Monsanto, entre outras. Através de sua própria
estrutura territorial de pesquisa e dos convênios firmados com estas outras instituições, a
Fundação MT promove uma rede verdadeiramente corporativa, de modo a viabilizar com
eficiência o desenvolvimento dos seus próprios programas de pesquisa.
A parceria Fundação MT Embrapa, instituída desde o surgimento da primeira,
se mostrou bastante fecunda durante os anos iniciais, com a criação em co-titularidade de
diversos cultivares de soja (Uirapuru, Crixás e Pintado) adaptados aos cerrados e com
uma produtividade normalmente superior à média nacional. Contudo, esta sociedade
começou a sofrer desgaste e, no ano de 2000 foi encerrada quando a Embrapa resolveu
pôr fim ao sistema de co-titularidade, passando a ser proprietária exclusiva de todas as
tecnologias geradas a partir de então e, a Fundação MT optou definitivamente por criar
seu próprio programa de melhoramento genético, ferindo assim, a norma editada pela
Embrapa que estabelece que os parceiros da empresa não poderiam ter programas
particulares de tal natureza, ou ainda, pudessem participar de outros programas de
pesquisa com igual finalidade.
89
De acordo com a Embrapa, essa exigência é justificada pela preocupação da
empresa em evitar a mistura dos resultados dos programas de pesquisa e a conseqüente
perda do controle das informações conquistadas através de investimentos públicos
(recursos financeiros, equipamentos e profissionais) realizados ao longo de décadas.
Além disso, uma das principais preocupações seria a de que empresas transnacionais de
biotecnologia pudessem assumir o controle do germoplasma, que atualmente se encontra
em empresas públicas como a Embrapa, através da aquisição de empresas nacionais de
sementes que m acesso ao programa de melhoramento genético dessa instituição
pública (EMBRAPA, 2006b). Como forma de dar continuidade ao seu programa de
melhoramento genético da soja para o estado do Mato Grosso a Embrapa firmou então
parceria técnica com a Monsanto a partir dos marcos regulatórios estabelecidos pela
empresa pública.
Para a Fundação MT, a continuidade da parceria com a Embrapa a partir dos
termos impostos pela empresa não viabilizaria a perpetuação do acordo, haja vista a
fundação atestar um grande investimento financeiro e em pessoal para a concretização
desses convênios de pesquisa. Assim, com a parceria rompida, a fundação tratou de
consolidar seus próprios convênios com universidades, empresas multinacionais e outras
instituições de pesquisa como forma de garantir a continuidade do seu programa de
melhoramento genético e consolidar seu banco de germoplasma (SILVA, 2003).
O fenômeno de tensão na cooperação, característico da atual fase da constituição
do círculo de cooperação da pesquisa agrícola brasileira mostrou-se explícito neste caso,
chegando, no limite, à fissura da parceria técnica entre dois dos principais agentes
territoriais do círculo de cooperação de ciência e tecnologia da produção de soja, a
Embrapa e a Fundação MT. Uma parceria que chegou a representar 83% do mercado de
sementes de soja naquele estado no final da década de 90 (SILVA, 2003). Os interesses
corporativos da Fundação MT se chocaram com os preceitos normativos estabelecidos
pela Embrapa, virtualmente comprometidos com o patrimônio estratégico da sociedade
brasileira que representaria o controle sobre o material genético da soja, como afirmado
pela empresa pública.
90
3.
3
-
O
S
A
GENTES
“S
ECUNDÁRIOS
3.
3.
1
-
O
C
ONDICIONANTE
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ERRITORIAL DA
A
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O
RGANIZAÇÃO DO
C
ÍRCULO DE
C
OOPERAÇÃO DE
P
ESQUISA
A
GRÍCOLA NO
B
RASIL
.
A constituição do círculo de cooperação de pesquisa agrícola no Brasil caminhou,
nas últimas três décadas, com a gradativa concentração das principais ações de
desenvolvimento tecnológico nas “mãos” de grandes empresas e, concomitantemente,
com a redefinição da função das Universidades e das Instituições Estaduais de Pesquisa
no desenvolvimento técnico-científico para a moderna atividade agrícola. Se, num
primeiro momento, coube às Universidades e às Instituições Estaduais a responsabilidade
de elaborar e conduzir as atividades científicas pioneiras para a transformação das bases
técnicas do campo no Brasil, hoje, com a incorporação definitiva da atividade de pesquisa
tecnológica ao circuito superior da economia, tais agentes m profundamente alterada
aquela sua posição.
A criação da Embrapa, nos anos 70, constituiu-se num primeiro marco do
processo de definição dos agentes responsáveis por conduzir o desenvolvimento
tecnológico para a agricultura científica no país. A concentração das principais atividades
de pesquisa agrícola pela Embrapa deu-se com o objetivo de viabilizar e operacionalizar
os projetos Estatais de modernização da agricultura e reorganização do espaço agrícola
brasileiro, responsáveis por atribuir novos usos e funções produtivas a frações do
território nacional.
Neste momento da constituição do círculo de cooperação de pesquisa agrícola,
uma nova estrutura hierárquica dos agentes promotores da pesquisa técnico-científica é
estabelecida, e as principais Universidades e Instituições Estaduais de Pesquisa são
incorporadas aos programas nacionais de investigação, coordenados pela Embrapa e
voltados para a expansão e a especialização seletiva da produção agrícola no território
brasileiro. Assim é que a Embrapa se firma como instituição responsável por comandar o
desenvolvimento tecnológico para a moderna agricultura, e as atividades técnico-
91
científicas desenvolvidas por Universidades e Instituições Estaduais tornaram-se,
crescentemente, alinhadas e subordinadas àquele projeto, e especialmente, ao comando da
empresa pública.
Todavia, ao longo dos anos 90, com a mercantilização das pesquisas agrícolas
viabilizada normativamente pelo Estado brasileiro, e a conseqüente ampliação e
adensamento das ações das empresas privadas, sobretudo na estratégica atividade de
pesquisa biotecnológica, consolida-se uma nova hierarquia entre os agentes promotores
da pesquisa tecnológica para a moderna agricultura. Grandes empresas privadas nacionais
e estrangeiras, amparadas em volumosos investimentos passam a atuar no
desenvolvimento de pesquisas aplicadas com o objetivo de, cada vez mais, ampliar sua
participação no mercado nacional de biotecnologias, enquanto Universidades e
Instituições Estaduais de Pesquisa, sem dispor de mesma capacidade de investimento
assumem papel “secundário” na hierarquia de comando do desenvolvimento científico e
tecnológico para aquela atividade produtiva.
A incorporação da atividade de pesquisa biotecnológica ao circuito superior da
economia agrícola caminhou juntamente com o aprofundamento da hegemonia das
Empresas no comando do processo de inovação biotecnológica no Brasil. Sem
capacidade de competir com as grandes empresas no verdadeiro ambiente de mercado
criado para a realização das pesquisas biotecnológicas, Universidades e Instituições
Estaduais de Pesquisa vêm, cada vez mais, ocupando uma função de coadjuvante nos
programas de pesquisa e desenvolvimento tecnológico coordenados pelas grandes
empresas de pesquisa.
Como pudemos verificar as principais redes de pesquisa arquitetadas para o
aprimoramento da produção de soja no Brasil não estão amparadas apenas nas atividades
desenvolvidas por aqueles agentes que compõem o denominado núcleo do círculo de
cooperação de pesquisa agrícola. Integradas às redes corporativas de pesquisa elaboradas
e conduzidas por Embrapa, Coodetec, Monsanto e Fundação MT somam-se, com
freqüência, a participação de outras instituições. Cumprindo atividades técnico-científicas
que integram importantes fases da execução desses grandes programas de pesquisa,
92
universidades, fundações e instituições de pesquisa públicas apóiam, auxiliam e
viabilizam, tecnicamente e regionalmente, o processo de inovação tecnológica para a
produção de soja no território brasileiro. Entretanto, como agentes articulados a uma rede
de pesquisa maior, cuja elaboração e coordenação desses programas fogem do seu
controle e regulação, estas instituições caracterizam-se por ocuparem uma posição
subordinada dentro da hierarquia territorial do trabalho científico. Enquanto Embrapa,
Coodetec, Monsanto e Fundação MT desempenham o papel de elaboração, coordenação e
comando dos principais programas de pesquisa em biotecnologia no país, universidades,
fundações e demais instituições de pesquisa públicas ocupam um papel “secundário”,
porém não menos importante nas redes corporativas de pesquisa para a soja.
Tais agentes “secundários”, paradoxalmente, caracterizam-se por serem
essenciais para a execução ótima dos programas de pesquisa de modo que, sem a
participação destes, as possibilidades de obtenção de grandes avanços na produção
regionalizada de tecnologias seria bastante limitada em decorrência dos esforços, ainda
maiores, que as grandes empresas de pesquisa precisariam despender para:
Edificar e disseminar por um número ainda maior de localidades todo um conjunto de
infra-estruturas (laboratórios, edifícios, campos de experimentos, equipamentos, etc.)
para proceder de maneira eficiente e regionalizada as atividades de pesquisa;
Contar com uma ampla gama de profissionais, altamente qualificados (técnicos,
mestres, doutores, Phds) para operacionalizar os programas de pesquisa e realizar as
distintas atividades técnico-científicas que os constituem;
Investir, de maneira geral, um volume ainda maior de recursos financeiros para
operacionalizar seus programas de pesquisas tecnológicas.
No mais, historicamente, universidades e institutos de pesquisa federais e
estaduais, concentrados especialmente nas regiões sul e sudeste, são os principais agentes
responsáveis pela produção científica e tecnológica no Brasil. Estima-se que a região
sudeste concentre 59% do montante total investido em pesquisa no país
(HEBMÜLLER,
93
2006). De acordo com Leta e Cruz (2003) em 1999, 80% da produção científica brasileira
foi realizada por universidades públicas, sendo que 72,57% dessa produção concentrava-
se nas regiões sul e sudeste, com destaque especial para o estado de São Paulo que
respondeu por 48,29 % desse total
20
.
Caracterizadas de maneira geral por sua excelência também na promoção das
pesquisas científicas para a agricultura, a presença das instituições públicas nas redes de
pesquisa elaboradas pelas grandes empresas tornam-se, em muitos casos, essenciais para
a conquista do aprimoramento da produção agrícola no território brasileiro.
Com um know-how historicamente adquirido e conhecimentos regionalmente
produzidos, a presença das universidades e instituições estaduais de pesquisa torna-se,
frequentemente, necessária ao próprio sucesso na execução dos programas de
investigação científica, elaborados pelas grandes empresas privadas, com a finalidade de
aprimorar especialmente a produção de soja realizada em regiões diversas do país e muito
exigente da criação engenhosa de sistemas cnicos para seu eficiente desenvolvimento
21
.
Com um vasto e qualificado conhecimento sobre o território brasileiro, algumas
universidades e instituições de pesquisa apresentam reconhecida competência no
desenvolvimento de pesquisas técnico-científicas dirigidas à viabilização da produção
agrícola no país.
20
Conforme Albuquerque (2003), a concentração da atividade tecnológica pode também ser vista
analisando os registros de patentes no país. Entre 1990 e 2000 pode-se verificar que seis estados das
regiões sul e sudeste (São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Paraná e Santa
Catarina) concentraram 87,54% do total de patentes registrados no país, sendo que somente o estado de
São Paulo foi responsável por quase metade (48,69% do total) das patentes registradas naquele mesmo
período.
21
O Instituto Agronômico de Campinas (IAC), na década de 1950 foi a instituição que primeiro
estabeleceu um programa consistente de pesquisa da soja no Brasil. Na ESALQ/USP pudemos verificar,
pesquisas sobre a soja, desenvolvidas nos seus programas de pós-graduação em agronomia também na
década de 1950. Já nos anos 70 a Universidade Federal de Viçosa, institui um programa de pesquisa da
soja dando maior corpo aos esforços de instituições públicas. A Universidade Federal do Mato Grosso
(UFMT), com a criação do seu programa de pós-graduação em Agricultura Tropical no início da década
de 1990, também corpo aos esforços públicos para o aprimoramento técnico-científico da moderna
produção agrícola na região central do Brasil, onde o cultivo da soja é atividade de destaque. Além destas,
outras universidades e instituições de pesquisa há décadas vieram realizando pesquisas sobre a oleaginosa
no Brasil.
94
A presença de um conjunto de instituições de reconhecida excelência na
produção de pesquisas agronômicas, constitui-se em fator de suma relevância para as
grandes empresas arquitetarem uma organização corporativa do trabalho científico. As
Universidades e Instituições Estaduais de Pesquisa, enquanto elementos e fatores
representativos da configuração territorial tornaram-se condição da territorialização dos
programas de pesquisa das grandes empresas que comandam a criação de inovações
tecnológicas para a soja.
Das universidades e institutos de pesquisa nacionais que possuem destaque no
desenvolvimento de pesquisas científicas, muito úteis para o aprimoramento técnico e a
viabilização territorial da atividade agrícola hegemônica no Brasil, destacam-se, no
estado de São Paulo, a Escola Superior de Agronomia Luiz de Queiroz” (ESALQ/USP),
a Universidade Estadual Paulista (UNESP), a Universidade Estadual de Campinas
(UNICAMP), e o Instituto Agronômico de Campinas (IAC); em Minas Gerais, a
Universidade Federal de Viçosa (UFV), a Universidade Federal de Lavras (UFLA), a
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e a Universidade Federal de Uberlândia
(UFU); no Paraná, a Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), a Universidade
Estadual de Londrina (UEL), a Universidade Federal do Para(UFPR), e o Instituto
Agronômico do Paraná (IAPAR); no Rio Grande do Sul, a Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (UFRGS) e no Mato Grosso a Universidade Federal do Mato Grosso
(UFMT), todas estas, exemplos de instituições que hoje se encontram frequentemente
articuladas aos programas de pesquisa comandados pelas grandes empresas de pesquisa
da soja no Brasil.
A partir dos especiais dotes e das competências específicas adquiridas por essas
instituições públicas, as grandes empresas de pesquisa para a soja, através do
estabelecimento de convênios e parcerias, as incorporam às suas redes corporativas de
pesquisa, conforme os objetivos dos seus programas de investigação e suas estratégias de
conquista de mercado no território brasileiro. Assim constituídas, as redes de pesquisa
criadas pelas empresas hegemônicas tratam de unificar e articular agentes privados e
públicos com o intento de maximizar os esforços técnico-científicos e obter proveito das
95
competências historicamente adquiridas pelas universidades e instituições de pesquisa
mais notáveis do Brasil. A integração funcional entre esses agentes da pesquisa acaba,
por sua vez, tornando corporativo o uso de parcela das atividades científicas
desenvolvidas pelas instituições públicas.
Através desta forma de constituição das redes de pesquisa, fundem-se e
confundem-se, o público e o privado, o Estado e o mercado para efeito da concretização
de programas de pesquisa verdadeiramente privados tanto em sua natureza ideológica
como nos benefícios econômicos angariados com as invenções técnicas alcançadas. É
neste sentido que podemos dizer que toda a sociedade brasileira é convocada a unir
esforços e despender recursos para a conquista do progresso técnico-científico e da
“competitividade” da produção de soja no Brasil.
O intenso trabalho técnico-científico realizado por essas universidades e institutos
estaduais de pesquisa ao longo da relativamente breve história da pesquisa agronômica
brasileira, proporcionou que as mesmas se consolidassem como referência nacional e
internacional na busca pela maior eficiência da produção agrícola no território brasileiro.
A excelência na produção científica conquistada por elas, se deu através de atividades
elaboradas e executadas sistematicamente em linhas de pesquisa como: genética e
melhoramento de plantas, ecofisiologia, fitopatologia, análise de solos, agrometeorologia,
entre muitas outras áreas e sub-áreas do conhecimento científico que concebem e
estruturam o desenvolvimento de uma prática agrícola racional no campo.
A partir, então, do atual feitio do trabalho técnico-científico que trata de conceber
e planejar a realização da moderna produção agrícola, universidades e institutos estaduais
de pesquisa agrícola tornam-se importantes recursos territoriais para que as grandes
empresas de pesquisa, a partir do estabelecimento de convênios e parcerias
22
, possam
22
Ao longo das últimas décadas as parcerias entre as instituições públicas de pesquisa e as empresas
privadas vêm se firmando como tendência no Brasil. Alguns são os fatores que contribuem para essa
maior articulação. De um lado, com a importância crescente da atividade de inovação tecnológica no
desenvolvimento do processo produtivo, cada vez mais vêm se cobrando resultados “práticos” e
“produtivos” das atividades científicas desenvolvidas por aquelas instituições públicas. Difunde-se,
especialmente junto às universidades brasileiras, a idéia da necessidade do “espírito empreendedor” no
desenvolvimento do conjunto de suas atividades. O estabelecimento de parcerias com a iniciativa privada
96
promover seus projetos de inovação técnico-científica para a produção de soja e viabilizar
suas estratégias de mercado no território brasileiro.
Assim é que: das atividades científicas desenvolvidas pelas grandes empresas, ao
círculo de colaborações que se redesenha a partir dos esforços das universidades,
fundações e institutos estaduais públicos de pesquisa, fazendo-se este imprescindível para
a concretização das inovações tecnológicas na agricultura, eis a estrutura territorial de
pesquisa que se conforma no país com o objetivo de realizar a expansão territorial e o
aprimoramento técnico da produção de soja no Brasil. As universidades, fundações e
outras instituições públicas de excelência nas pesquisas agronômicas constituem-se em
importante condicionante territorial para a conformação das redes de investigação
elaboradas pelas atuais empresas hegemônicas da pesquisa biotecnológica. É neste
sentido que poderíamos também falar de uma dialética entre o velho e o novo no atual
processo de organização do círculo de cooperação de pesquisa agrícola no território
brasileiro (SANTOS, 1985).
Hoje, com a primazia de algumas grandes empresas no desenvolvimento das
pesquisas biotecnológicas pode-se dizer que as ações promovidas por universidades e
demais institutos de pesquisa blicos possuem como característica serem
complementares aos programas arquitetados pelos agentes hegemônicos do círculo de
cooperação de pesquisa da soja, salvo algumas poucas exceções
23
. As inovações técnicas
produzidas particularmente pelos agentes “secundários” ocorrem continuamente, no
entanto, quando desarticuladas dos grandes programas de pesquisa, tais inovações
promovidas pela iniciativa particular dos laboratórios e pesquisadores, desprovidos de
grandes investimentos possuem, no mais das vezes, um “impacto” inferior que aquelas
ações elaboradas pelo denominado núcleo da produção de pesquisas biotecnológicas para
a soja, composta por Embrapa, Coodetec, Monsanto e Fundação MT.
é então apontado como a forma mais rápida de se atribuir utilidade prática às pesquisas científicas e, ao
mesmo tempo, proporcionar virtuais “benefícios” à sociedade como um todo.
23
Nos referimos, aqui, aos programas de pesquisa da soja da Universidade Federal de Viçosa que está em
operação desde a década de 70, e ao programa de pesquisa do Instituto Agronômico de Campinas que
possui um volume grande de cultivares registrados no sistema nacional de proteção de cultivares,
(alcançando um total de 35 cultivares) ainda que o ritmo de seus trabalhos tenha diminuído.
97
A integração das atividades de pesquisa tecnológica ao circuito superior da
economia agrícola é o principal fator responsável pela definição das novas funções
assumidas por empresas e Universidades no círculo de cooperação de pesquisa agrícola
da soja
24
. Desde os anos 70, mas sobretudo a partir dos anos 90, vem se consolidando e se
aprofundando, de maneira geral, uma nova divisão do trabalho técnico-científico entre
empresas e universidades na realização das pesquisas agrícolas no Brasil. Enquanto as
primeiras dispondo de grande capacidade de investimento vem, cada vez mais,
comandando o desenvolvimento das pesquisas aplicadas com o objetivo de criar novas
biotecnologias para disponibilizar ao mercado, as segundas concentram ainda mais suas
atividades na realização das chamadas pesquisas de base
25
.
Assim é que ao se analisar o círculo de cooperação de pesquisa pode-se dizer que
em cada período dá-se uma peculiar hierarquia entre as instituições e os lugares que
regem as pesquisas técnico-científicas para a moderna atividade agrícola. A cada período,
novos agentes passam a integrar o círculo de cooperação de pesquisa e uma outra
organização do trabalho científico é estabelecida, a qual trata de evidenciar não apenas as
atividades encabeçadas pelos agentes ingressantes no círculo de cooperação de pesquisa,
como também os novos papéis assumidos pelos agentes pré-existentes.
24
Uma medida que pode ser tomada para o entendimento da supremacia das empresas nas pesquisas
biotecnológicas diz respeito à infra-estrutura necessária para a geração de tecnologias. Além da
necessidade de possuir laboratórios totalmente equipados e pesquisadores de alta competência para o
desenvolvimento das pesquisas, as empresas em média possuem entre 30 e 40 pontos de testes de
linhagens (no caso da Embrapa alcança mais de 100 pontos) distribuídos estrategicamente por diversas
regiões do país para, assim, realizar os experimentos de seleção e de adaptações de cultivares em cada
subespaço sojicultor. Por sua vez, a ESALQ/USP, instituição de reconhecida excelência na pesquisa
agrícola, conta apenas com 3 pontos de testes próprios para realizar seus experimentos de campo,
considerando-se aqui apenas a infraestrutura para testes, para efeito de comparação do volume de
investimentos das empresas e das Universidades para o desenvolvimento das pesquisas com novos
cultivares de soja.
25
Segundo o Prof. da ESALQ/USP Natal Vello, em entrevista concedida a nós em 11/07/2007, essa
divisão do trabalho pode, por exemplo, ser vista no tipo de atividade de pesquisa realizada pelas empresas.
Estas se concentram, majoritariamente na fase final do melhoramento de plantas, fase esta responsável
diretamente pela obtenção de novos cultivares e, também demandante de grande capacidade de
investimentos para realização das pesquisas de laboratório e dos testes em campos de experimentação
distribuídos por diversos pontos do país. Por sua vez, as Universidades vêm concentrando suas atividades
na fase “pré-melhoramento”, pesquisando, sobretudo a criação de novos métodos e novas técnicas de
manipulação.
98
Contudo, ainda é de domínio principalmente das universidades públicas a
responsabilidade pela formação da força de trabalho altamente qualificada (especialistas,
mestres e doutores) exigida para a operacionalização do trabalho científico. Essa forma de
cooperação exercida pelas universidades públicas faz das mesmas agentes primordiais na
sustentação da pesquisa agronômica nacional, haja vista a necessidade da capacitação e
especialização da força de trabalho para atuar nos projetos promovidos tanto pelas
empresas públicas como pelas empresas privadas atuantes no desenvolvimento de
tecnologias para a moderna agricultura.
99
IV
HIERARQUIA TERRITORIAL DA
PRODUÇÃO CIENTÍFICA E A
MORFOLOGIA ESPACIAL DA DIFUSÃO
DAS INOVAÇÕES BIOTECNOLÓGICAS NO
TERRITÓRIO BRASILEIRO
100
4.
1
-
O
S
S
UBESPAÇOS DE
C
OMANDO DO
D
ESENVOLVIMENTO
T
ECNOLÓGICO PARA A
P
RODUÇÃO DE
S
OJA NO
T
ERRITÓRIO
B
RASILEIRO
Enquanto a realização da moderna produção agrícola da soja se difunde de
maneira acelerada no território brasileiro, estendendo-se por diversas regiões, o mesmo
não se pode dizer dos centros responsáveis por comandar o desenvolvimento tecnológico,
estes sempre em menor número e cada vez mais importantes na medida em que se
intensifica o processo de cientifização da atividade agrícola.
No atual período histórico, em que o desenvolvimento das inovações tecnológicas
ganha um ritmo acelerado em função do caráter mercantil que a própria tecnologia
recebe, acentua-se a dicotomia entre aqueles que detêm o saber, isto é, a capacidade de
induzir a inovação tecnológica, e aqueles que somente usam os novos sistemas técnicos e
executam as funções de realização da produção propriamente dita (RATTNER, 1985).
Tal divisão entre conceptores e utilizadores das tecnologias estabelece uma hierarquia
entre os lugares dada desde a escala nacional até a internacional, tratando igualmente de
aprofundar a relação de dependência tecnológica entre os lugares. Assim é que aqueles
países e regiões que não têm capacidade de produzir ciência e tecnologia tendem a
aparecer como o elo mais fraco desta divisão territorial do trabalho que se institui,
agravando assim o desenvolvimento desigual e combinado inerente ao modo de produção
capitalista (SMITH, 1988; ELIAS, 2003).
O círculo de cooperação de pesquisa agrícola para a produção de soja no Brasil
está, atualmente, amparado por uma ampla e complexa estrutura territorial de pesquisa
científica constituída ao longo de décadas - inicialmente pelo “empreendedorismo
modernizador” do Estado brasileiro (governo federal e estadual) e, mais recentemente,
reforçada pelas espessas estratégias territoriais promovidas por empresas privadas
nacionais e estrangeiras de pesquisa. Todavia, as redes de pesquisa criadas de forma
corporativa revelam também a existência de papéis e funções distintas exercidas entre os
lugares que a constituem. Trata-se de uma divisão territorial do trabalho científico
associada ao estabelecimento de um comando centralizado das atividades, dado a partir
101
de lugares que coordenam cada uma das fases do trabalho de pesquisa e desenvolvimento
tecnológico, realizados dispersamente no território brasileiro.
Em outros termos, podemos dizer que enquanto algumas instituições são
responsáveis por coordenar as atividades de pesquisa, realizando também fases
importantes dos programas de investigação, outras instituições integrantes das redes de
pesquisa exercem a função exclusiva de execução do trabalho técnico-científico,
constituindo, deste modo, uma hierarquia territorial do trabalho científico. Tal
organização dá-se tanto internamente às empresas, a partir de sua própria estrutura de
pesquisa, como também nos casos dos programas de pesquisa que transcendem este
limite institucional, fundando redes que unem empresas, centros de pesquisa e
universidades públicas e privadas de diversas regiões do país e até do exterior.
A medida que se pode hoje constatar que os programas de pesquisa responsáveis
por causar maior impacto técnico na produção e na produtividade de soja estão sob a
liderança e comando de algumas poucas empresas, podemos de maneira geral dizer que a
elas se atribui o papel de controle sobre o desenvolvimento tecnológico para a produção
de soja, o que, de outro lado, implica também o controle sobre as possibilidades de uso
agrícola do território brasileiro.
Valendo-se de uma linguagem metafórica Milton Santos e Maria Laura Silveira
(2001) falam de espaços que mandam” e espaços que “obedecem” como uma forma de
se referirem às relações de comando e subordinação entre os lugares. Entretanto, segundo
os mesmos autores, o acúmulo de funções diretoras em certos lugares e a sua falta na
maioria dos demais pode levar a uma visão superficial do funcionamento do território.
Assim, tal metáfora requer cautela e necessita da apreensão de um conjunto de outras
condições para sua aplicação.
Pode-se, entretanto atribuir ao lugar, em si mesmo, esse poder? Ou o
poder de comando e de regulação são deferidos a entidades públicas e
privadas, dotadas de força? Sem dúvida, o exercício do poder regulatório
por empresas e pelo poder público não é independente dos sistemas de
engenharia e dos sistemas normativos presentes em cada lugar, mas este,
102
em si mesmo, não dispõe de nenhuma força de comando. Retomamos
assim a definição do espaço como um conjunto indissociável de sistemas
de objetos e de sistemas de ações, consideração indispensável para não se
atribuir valor absoluto à metáfora. Tomando essa cautela, pode-se dizer
que espaços que comandam e espaços que obedecem, mas o comando
e a obediência resultam de um conjunto de condições, e não de uma delas
isoladamente (SANTOS; SILVEIRA, p. 265, 2001).
Deste modo torna-se então possível identificar regiões técnica e
normativamente densas que, por acumularem funções diretoras, possuem o poder de
comando e regulação dos circuitos espaciais de produção e dos círculos de cooperação
que dão dinamismo e movimento ao território.
Com diferentes graus de participação no comando do desenvolvimento
tecnológico para a soja pode-se, de maneira geral, falar da existência no país, de um
núcleo do círculo de cooperação de pesquisa técnico-científica, composto por algumas
grandes empresas que têm uma escala de atuação maior e regem os principais esforços de
inovação, tal qual é a posição da Embrapa, da Coodetec, da Monsanto e da Fundação MT
e, poder-se-ia falar num outro grupo, que conformaria o círculo de cooperação marginal
de pesquisa, onde se encontra o maior número de instituições, entretanto, estas teriam
como características uma menor capacidade de comandar o processo de inovação técnico-
científica agrícola no território nacional.
Hoje, no Brasil, são quase 30 as instituições, entre Empresas, Universidades,
Fundações, Cooperativas e Institutos Agropecuários, responsáveis por elaborar e conduzir
especialmente as atividades de pesquisa biotecnológica para a produção de soja. Tais
instituições de pesquisa encontram-se distribuídos pelos estados de São Paulo, Minas
Gerais, Paraná, Rio Grande do Sul, Mato Grosso do Sul, Goiás, Distrito Federal e Mato
Grosso, coincidindo, relativamente, com o conjunto de regiões sojicultoras do Brasil. Os
estados do Paraná e Minas Gerais são aqueles que reúnem a maior quantidade de sedes de
instituições, cada um com seis, sendo acompanhados de Goiás e Rio Grande do Sul
ambos com quatro, São Paulo conta com três, Mato Grosso com dois e, Distrito Federal e
Mato Grosso do Sul com uma sede cada. De modo geral, a região concentrada - área
103
core do meio técnico-científico-informacional
26
no Brasil e região com nítida função
diretora na hierarquia territorial do trabalho (SANTOS; SILVEIRA, 2001), reúne o maior
número de sedes de instituições que comandam as atividades de inovação biotecnológica
para a soja, ao agrupar 70% do total, enquanto os estados do Brasil central (Distrito
Federal, Mato Grosso do Sul, Goiás e Mato Grosso), representantes do principal
subespaço sojicultor do país, sediam os outros 30% (Gráfico 8).
Gráfico 8: Localização (sede) das Instituições de Pesquisas que Comandam as Ações de
Pesquisa Biotecnológica para a Produção de Soja no Brasil - 2007*
0
1
2
3
4
5
6
7
MS DF MT GO RS PR MG SP
Estados
Número de Instituições
* Considerando-se tanto as instituições titulares das cultivares registradas no SNPC como as co-autoras
nos casos em que tal situação é verificada.
Fonte: MAPA, 2007
Organização: Francisco C. Nascimento Jr.
26
Região constituída pelos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Minas Gerais, Espírito
Santos, Rio de Janeiro e, polarizado, sobretudo por São Paulo. Esta região se caracterizaria pela sua
densidade em informação, sistemas técnico-científicos, homens, capitais etc. (SANTOS; SILVEIRA,
2001).
104
A maior ou a menor concentração dessas instituições em determinados estados
não demonstra de forma absoluta o peso, ou melhor, a liderança de alguns estados na
condução das ações de inovação tecnológica para a moderna agricultura no território
brasileiro. Isto porque o controle sobre a produção da biotecnologia utilizada nas regiões
sojicultoras é relativo à escala de atuação de cada instituição e sua capacidade de inserção
territorial no amplo, segmentado e, agora, sobretudo disputado, mercado nacional de
inovações biotecnológicas.
A origem das inovações biotecnológicas registradas no país nos oferece uma
situação mais favorável para a identificação dos subespaços nacionais que conduzem o
trabalho científico para o aprimoramento da produção de soja. Os estados com o maior
número de registros obtidos de cultivares segundo a localização da sede das instituições
que os criaram são: o Distrito Federal com 36,6% do total, São Paulo com 23%, Minas
Gerais com 12,2%, Paraná com 11,4%, Rio Grande do Sul com 8,5%, Mato Grosso com
6,7% e Goiás com 2,1% (Gráfico 9).
Gráfico 9: Estados com maior número de inovações biotecnológicas para a soja*
0
50
100
150
200
250
RS PR MG SP DF MT GO
Estados**
Número de inovões biológicas
105
* - Considerando-se inclusões no SNPC e patentes já concedidas - 1998-2007
- No caso das criações oriundas das atividades de pesquisa realizadas através do SNPA, a titularidade
sobre a invenção é computada à Embrapa conforme a legislação em vigor.
Fonte: MAPA, 2007
Organização: Francisco C. Nascimento Jr.
No entanto, que se ponderar a liderança do Distrito Federal nesse quesito, sob
o risco de cometermos equívocos em relação à identificação daqueles lugares que
efetivamente comandam o desenvolvimento tecnológico, considerando-se a posição que
os mesmos ocupam na divisão territorial do trabalho agrícola. A Embrapa - maior
obtentora de cultivares de soja do país, ao estar administrativamente sediada em Brasília,
acaba por designar o Distrito Federal como a unidade da federação de origem dos
registros de suas inovações biotecnológicas. No entanto, o trabalho de pesquisa da
empresa pública realiza-se de forma descentralizada em suas unidades de pesquisa - o
desenvolvimento técnico-científico da Embrapa para a produção da soja, por exemplo,
encontra-se, sobretudo, centralizada pela Embrapa Soja, em Londrina, no Paraná
27
.
Sendo assim, o estado do Paraná pode ser indicado como um importante
subespaço que “comanda” o desenvolvimento tecnológico para a produção da soja no
Brasil, configurando-se, ademais, num centro gerador de parcela considerável das
inovações biotecnológicas utilizadas nas lavouras de soja em todo o território nacional.
Sua centralidade resulta, em grande medida, da densidade de instituições que se
encontram e que coordenam programas de pesquisa, ou executam etapas importantes da
pesquisa e do desenvolvimento tecnológico para o aprimoramento técnico-territorial da
atividade sojicultora no Brasil.
A superioridade do Paraná na hierarquia territorial do trabalho científico da soja
se dá, especialmente, pela função de coordenação de programas nacionais de pesquisa da
soja (com destaque ao Programa Nacional de Melhoramento Genético da Soja vinculado
27
Do mais, como a Embrapa aparece como única empresa de pesquisa da soja sediada no Distrito Federal
poderíamos, grosso modo, atribuir aqueles valores alcançados pela empresa pública às atividades
conduzidas, sobretudo pela Embrapa Soja, ainda que se possa constatar a participação de outras unidades
da Embrapa nas pesquisas para soja e na criação de cultivares.
106
ao SNPA) exercida, a partir de Londrina, pela Embrapa Soja. Esta centralidade é também
reforçada pela presença, em Cascavel, da Coodetec - segunda maior empresa obtentora de
cultivares de soja do país, além da instalação mais recentemente, da TMG em Cambé,
empresa que possui um dos maiores programas de melhoramento genético da soja do país
e integra ainda, a rede de pesquisa da Fundação MT.
Uma forma de explicar esta posição central de comando do desenvolvimento
técnico-científico, exercida pelo estado paranaense, encontra-se vinculada, num primeiro
momento, ao contexto histórico que levou à criação e à instalação da Embrapa Soja pelo
governo federal em Londrina, dada juntamente com o início das atividades de pesquisa
conduzidas pela OCEPAR (órgão que deu origem à Coodetec) e às atividades de igual
natureza desenvolvidas pelo Instituto Agropecuário de Pesquisa do Paraná (IAPAR).
Todos estes agentes iniciaram seus trabalhos de pesquisa para a soja na década de 70,
época em que se intensificaram os esforços públicos para a modernização da agricultura,
ampliaram-se as demandas externas e internas pela produção de soja e, especialmente, o
Paraná se consolidava como principal estado sojicultor do país. Tal situação favoreceu
então, a concentração neste estado das principais atividades de pesquisa e
desenvolvimento tecnológico dirigidos à produção da soja no Brasil.
No mais, a presença de um grande mero de instituições de pesquisa da soja no
Paraná, poderia ser justificada tanto pela posição estratégica que o estado ocupa para a
geração de biotecnologias voltadas tanto para o sul do Brasil como orientadas às áreas de
menor latitude, mas, sobretudo, pelo fator de atração” que a especialização local na
pesquisa da soja, constituída historicamente, possa ter exercido para a criação e/ou
instalação de novas empresas. São, portanto as condições do lugar, um conjunto de
sistemas de ações altamente especializadas e de objetos historicamente instituídos que
permite considerarmos o Paraná como subespaço do mandar ocupando função
importante na hierarquia territorial do círculo de cooperação
28
.
28
Para um melhor entendimento da concentração de empresas de pesquisa da soja no estado do Paraná
acreditamos que sejam necessários estudos mais específicos para a elucidação desta questão. Entretanto,
em pesquisa qualitativa realizada por nós, pôde-se perceber que algumas das empresas privadas criadas no
Paraná, contam com ex-pesquisadores da Embrapa Soja, muitos dos quais aposentados ou contratados
107
Deste modo, nos valendo de forma análoga a uma noção bastante difundida nos
estudos de geografia econômica, mas talvez, não completamente apropriada para o
entendimento da especialização local da produção tecnológica para a agricultura diríamos
que, sobretudo no norte do Paraná (municípios de Londrina, Cascavel e Cambé) se
conforma numa espécie de “pólo tecnológico” vinculado à agricultura científica da soja
29
.
A especialização territorial do trabalho científico constituído ao longo das últimas três
décadas levou especialmente a cidade de Londrina a ser denominada “capital tecnológica
da soja no Brasil”, destacando assim a função desse subespaço na divisão territorial do
trabalho vinculada ao desenvolvimento da agricultura científica da soja no Brasil
30
.
Num segundo nível, São Paulo figura como outro importante estado responsável
pelo desenvolvimento tecnológico para a produção de soja, possuindo o segundo maior
número de registros de inovações biotecnológicas do país. Tal posição está relacionada,
num primeiro momento, às atividades de pesquisa desenvolvidas pelo Instituto
Agronômico de Campinas, desde os anos 50, mas principalmente e nos dias atuais, pela
presença da sede da multinacional Monsanto na capital paulista. Entretanto, os centros de
pesquisa da empresa multinacional, dedicados especialmente à pesquisa da soja estão no
Brasil central, em Sorriso – MT e Morrinhos – GO.
ainda em serviço, o que nos fornece pistas para o entendimento dessa maior presença de empresas
privadas de pesquisa da soja naquele Estado.
29
A noção de pólo tecnológico, bastante difundida na literatura geográfica, normalmente está vinculada à
atividade de inovação tecnológica na indústria. Tal noção refere-se a arranjos de empresas que atuam de
forma especializada e, às vezes de maneira complementar na produção da indústria de alta tecnologia. A
articulação e a complementaridade entre as empresas num dado setor da economia, bem como sua
coexistência numa dada localidade ou região são os preceitos básicos da constituição dos pólos.
Entretanto, como pudemos ver a articulação entre as empresas, universidades e institutos na pesquisa para
a agricultura sustenta-se numa organização em rede, mediada pelo Sistema Nacional de Pesquisa
Agropecuário que une organizacionalmente e institucionalmente instituições de pesquisa de diversas
regiões do país. No mais, como são as empresas individualmente, através de suas redes corporativas de
pesquisa, e não de fato uma articulação local das instituições que caracteriza a atividade de inovação
tecnológica para a agricultura, a noção de pólo tecnológico num primeiro momento nos parece servir
apenas como analogia. Neste caso, também pensamos que apenas um estudo mais específico que busque
investigar as articulações entre as empresas numa dada região possa dar respostas mais precisas sobre esta
outra questão.
30
Durante a VII Conferência Mundial de Pesquisa da Soja, a IV Conferência Internacional sobre
Processamento e Utilização da Soja e o III Congresso Brasileiro de Soja, eventos realizados em Foz do
Iguaçu, no Paraná, em 2004, Londrina foi intitulada a
Capital Tecnológica da Soja
no Brasil.
108
que se considerar que o estado paulista reúne um conjunto de universidades
públicas estaduais de excelência na pesquisa agrícola, que participam com freqüência das
redes de pesquisa das grandes empresas, atribuindo assim ao estado função de destaque
no desenvolvimento técnico-científico para a soja no Brasil.
Na última década e meia, o centro-oeste, passa a se destacar com a criação da
Fundação MT e a centralidade que esta instituição adquire nas pesquisas dirigidas para a
produção de soja naquela região. Sobretudo, a partir da criação da Fundação MT e a
instalação de sua sede em Rondonópolis-MT, se estabeleceu um importante subespaço de
comando das redes de pesquisa da soja voltadas, principalmente, para o aprimoramento
da atividade sojicultora no estado do Mato Grosso - principal produtor de soja do país.
Uma centralidade construída pelos produtores de grãos, empresas agroquímicas, entre
outros agentes que atuam no agronegócio mato-grossense e estreitamente vinculada aos
interesses econômicos dos mesmos para deter maior controle sobre o processo de
inovação biotecnológica para a região.
Desse modo, nas últimas décadas se ampliaram os centros e sub-centros de
comando do desenvolvimento tecnológico para a soja no Brasil, tornando-se, por
conseguinte mais densos e diversificados os feixes de relações que cada subespaço
sojicultor passa a manter com os lugares de concepção das bases técnico-produtivas
empregadas no moderno campo nacional.
Nem sempre instalados nos próprios subespaços onde se realizam a produção
propriamente dita, tais centros que comandam o desenvolvimento tecnológico são
exemplos da expansão da área de produção e a crescente extroversão dos modernos
subespaços sojicultores. Daí, cada vez mais se ver reduzida a capacidade de controle de
alguns subespaços sobre o processo de concepção das bases cnico-produtivas utilizadas
no campo, porquanto o que se é a crescente dependência destes em relação ao trabalho
de inovação tecnológica que se realiza remotamente, a depender da região produtora.
Segundo Sá (2003), hoje, especificamente na agricultura, só a atividade produtiva
propriamente dita atrela-se mais estreitamente aos condicionantes normativos e materiais
locais, enquanto as outras instâncias da produção e da cooperação se estabelecem em
109
escala nacional e mesmo internacional. A partir das possibilidades de interconexão e
divisão do trabalho oferecidos pela atual constituição do território se reafirmam e se
aprofundam as “distâncias” entre aqueles lugares que controlam os rumos do
desenvolvimento tecnológico e os demais que fazem apenas uso desses meios. Assim,
pode-se dizer que de um lado lugares que se especializam na produção agrícola e de
outro, há lugares que se especializam na cooperação cnico-científica que viabiliza e
aperfeiçoa o desenvolvimento da agricultura da soja no Brasil.
A existência de uma hierarquia territorial do trabalho científico revela um
comando centralizado das ações de desenvolvimento tecnológico juntamente com a
subordinação do conjunto de outros lugares alcançados pela difusão espacial das
inovações. Este controle centralizado permite uma execução eficiente dos programas de
pesquisa, desenvolvidos dispersamente no território brasileiro, juntamente com o
comando sobre a própria indução do processo de desenvolvimento tecnológico, base da
realização dessa moderna produção agrícola.
que se ressaltar a maior ou a menor dependência que cada região sojicultora
possui em relação aos principais subespaços responsáveis por conduzir o processo de
inovação biotecnológica para a soja no Brasil. Tal vínculo está fundado na intensidade da
participação de cada instituição de pesquisa na cooperação técnico-científica. Neste
sentido, com a liberação da produção de soja transgênica e sua ampla difusão no país,
aprofunda-se uma regulação externa sobre as bases técnicas das regiões sojicultoras
concentrando-se, especificamente, nas mãos da multinacional estadunidense Monsanto.
110
4.
2
M
ORFOLOGIA
E
SPACIAL DA
D
IFUSÃO DAS
I
NOVAÇÕES
T
ÉCNICAS
4.
2.
1
-
D
O
T
RABALHO
I
NTELECTUAL À
P
RODUÇÃO
M
ATERIAL
:
A
DEMARCAÇÃO E A
C
ONEXÃO ENTRE O
C
ÍRCULO DE
C
OOPERAÇÃO E O
C
IRCUITO DE
P
RODUÇÃO DA
S
OJA
.
A cooperação científica realizada pelas empresas, universidades e institutos de
pesquisa se concretiza, plenamente, com a produção de inovações tecnológicas para o
desenvolvimento da atividade agrícola. O lento e intenso trabalho de pesquisa e criação
de novas biotecnologias empreendidos por essas instituições constitui a fase dorsal do
sistema de ações que hoje concebem e estruturam cientificamente a prática da moderna
produção agrícola no Brasil.
Tal fase se caracteriza pela realização de pesquisas, cruzamentos, ensaios, testes e
experimentos de campo, tudo com o propósito de produzir biotecnologias (cultivares)
com as características técnicas (produtividade, ambiente de adaptação, resistência a
doenças, arquitetura da planta, precocidade, etc.) almejadas pelas empresas e demandadas
pelo mercado. De modo geral, especificamente na atividade de pesquisa biotecnológica,
um centro de pesquisa leva cerca de oito anos para criar um cultivar eficiente, com
potencial de comercialização. Ao longo desse período, são pesquisadas e testadas
milhares de linhagens e populações de um dado gênero agrícola (como a soja) em
dezenas de campos de experimentação instalados, estrategicamente, naquelas regiões para
onde se busca destinar uma dada tecnologia. Este, paradoxalmente, é o tempo “lento” do
trabalho intelectual o necessário para a busca do progresso técnico no campo, lentidão
esta que, em certa medida, trata de se antepor ao atual tempo da produção e do consumo
globalizados, cada vez mais acelerado, instantâneo, just-in-time e just-in-place
(HARVEY, 1992).
Deste modo, é o trabalho intelectual e o tempo “lento” próprio da atividade de
produção de novas tecnologias que vêm demarcar a “fronteira” entre o círculo de
cooperação de pesquisa científica e o circuito espacial de produção.
111
O processo de difusão espacial das biotecnologias ocorre no momento posterior à
produção em escala das variedades criadas, que passam então a se constituírem
propriamente em insumos agrícolas. Esse processo se com a multiplicação das
sementes em áreas de produção, por vezes sob a responsabilidade dos próprios centros de
pesquisa e, por vezes delegada às empresas sementeiras, conforme a morfologia da rede
de difusão das inovações de cada empresa e o tipo de parceria mantida entre as
instituições de pesquisa e a iniciativa privada.
A estreita relação técnica, política e econômica estabelecida entre as instituições
de pesquisa e as empresas do circuito de produção do agronegócio são relações que
definem o tempo da difusão, da rápida introdução das novidades tecnológicas no campo e
o igualmente acelerado aprimoramento e expansão da moderna atividade produtiva
agrícola constatada nas últimas décadas no território brasileiro. Vamos a seguir tomar os
exemplos da Embrapa e da Monsanto buscando mostrar a morfologia espacial da difusão
das inovações criadas pelas empresas.
A Embrapa, por exemplo, para difundir suas inovações biotecnológicas conta
com uma estrutura territorial própria, organizada em unidades de produção e escritórios
de negócios. Distribuídas seletivamente pelo território nacional, essas unidades são
encarregadas de produzir, comercializar e distribuir regionalmente as sementes e mudas
básicas dos cultivares gerados pela empresa. Entretanto, se de um lado as unidades e
escritórios da empresa pública garantem a difusão das inovações em diversas regiões
brasileiras, de outro lado, impõe-se um comando centralizado dessas ações tarefa essa
exercida pela Embrapa Transferência de Tecnologia, uma unidade de serviço da empresa
pública situada em Brasília - DF. A Embrapa Transferência de Tecnologia, é responsável
exclusivamente por coordenar as estratégias e as ações de difusão das tecnologias geradas
pelos diversos centros de pesquisa da instituição.
Tanto as unidades de produção como os escritórios de negócios da Embrapa
orientam seus serviços técnicos e suas atividades produtivas de acordo com as demandas
agropecuárias das regiões em que se encontram instaladas. Dentre aquelas unidades que
desenvolvem atividades técnicas alinhadas à produção de soja, estão os escritórios de
112
negócios da Embrapa de Passo Fundo-RS, Londrina-PR, Ponta Grossa-PR, Dourados-
MS, Goiânia-GO, Triângulo Mineiro-MG, Imperatriz-MA e a unidade de produção de
Rondonópolis-MT, todos localizados, estrategicamente, em importantes regiões
sojicultoras do Brasil.
As unidades de produção e os escritórios de negócios se encarregam de produzir,
beneficiar e comercializar sementes básicas, sendo também responsáveis pelo
fornecimento de auxílio técnico às instituições aparceiradas à Embrapa e o
estabelecimento de contratos para a produção de sementes por terceiros. Para a realização
dessas atividades, tais unidades contam normalmente com uma relevante infraestrutura
composta por campos de produção, logística de secagem e armazenamento de sementes,
maquinário, silos, armazéns, etc. além de um conciso e especializado corpo de
funcionários (cerca de 10 técnicos por escritório) responsáveis por operacionalizar as
atividades promovidas em cada uma dessas unidades.
Sem capacidade de ofertar todo o volume de cultivares e sementes demandadas
pelos agricultores, a Embrapa estabelece parcerias (contratos de negócio) com fundações
de pesquisa e produtores de sementes das regiões sojicultoras em que se encontra
presente. São muitas as parcerias com fundações, centros, institutos de pesquisa e as
empresas tecnicamente aptas e licenciadas pela Embrapa para realizar a multiplicação, a
produção e a comercialização de suas sementes básicas por todo o país. Assim, através do
estabelecimento dessas parcerias, a Embrapa tem ampliada sua escala de ação e permitido
a maior difusão espacial das inovações técnicas geradas pela empresa.
A Embrapa possui uma estratégia territorial de ação previamente estabelecida
para difundir suas inovações técnicas. As atividades promovidas por cada uma das
unidades de serviço da empresa pública, ou seja, a disponibilização de produtos e a
firmação de parcerias buscam abranger uma determinada região brasileira produtora de
soja. A tabela a seguir apresenta as regiões de atuação e exemplifica algumas parcerias
estabelecidas pelas unidades de serviço da Embrapa com outros agentes regionais do
circuito de produção e do círculo de cooperação da soja (tabela 10):
113
Tabela 10: Unidades de serviços da Embrapa, Região de Atuação e Instituições Parceiras.
Unidade Região de Atuação Instituições Parceiras
Rondonópolis-MT Mato Grosso, Goiás e Mato Grosso
do Sul.
Embrapa Soja, Embrapa Cerrados,
Fundação Centro-Oeste; Produtores de
sementes.
Imperatriz-MA Maranhão, Piauí, Pará, Tocantins,
Goiás, Minas Gerais, Roraima, Rio
Grande do Norte, Bahia e Mato
Grosso.
Embrapa Soja (campus experimental de
Balsas); Fundação de Apoio à Pesquisa no
Corredor Norte de Exportação; Produtores
de sementes.
Triângulo Mineiro-
MG
Minas Gerais, Centro-Oeste e São
Paulo (Norte)
Embrapa Soja, Fundação Triângulo,
Produtores de sementes e Agricultores.
Goiânia-GO Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do
Sul, Minas Gerais, Bahia e
Tocantins.
Embrapa Soja, Embrapa Cerrados, Centro
Tecnológico para Pesquisa Agropecuária
e Produtores de soja.
Dourados-MS Mato Grosso do Sul Embrapa Soja, Fundação Meridional,
Fundação Vegetal, Embrapa Agropecuária
e Produtores de sementes.
Passo Fundo-RS Rio Grande do Sul Embrapa Soja e Produtores locais de
sementes.
Londrina-PR São Paulo, Paraná, Santa Catarina,
Mato Grosso do Sul.
Embrapa Soja, Fundação Meridional e
Produtores de sementes.
Ponta Grossa-PR São Paulo, Paraná e Santa Catarina. Embrapa Soja, Fundação Meridional e
Produtores de sementes.
Fonte: http://snt.sede.embrapa.br/hotsite/index.htm
Organização: Francisco Nascimento Jr.
Por sua vez, a Multinacional Monsanto apresenta também uma ampla rede para
comercializar suas inovações biotecnológicas aos produtores de soja nas diversas regiões
sojicultoras do Brasil. A partir da produção de sementes básicas, realizada pelos seus
centros de pesquisa, e os de contratos de negócios firmados em seus escritórios regionais
de vendas, são estabelecidas as bases organizacionais e territoriais para a distribuição e
venda das cultivares convencionais e transgênicas de soja criadas pela sua subsidiária
brasileira, a Monsoy.
A Multinacional conta com uma vasta rede de multiplicadores regionais das
cultivares Monsoy, sendo estes multiplicadores responsáveis, verdadeiramente, por
difundir regionalmente as inovações biológicas da empresa. Esta estrutura territorial se
estende pelos estados do Maranhão, Bahia, Mato Grosso, Goiás, Mato Grosso do Sul,
Minas Gerais, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, estando instalada,
no mais das vezes, nos subespaços especializados da moderna produção de soja, o que
torna ágil o fornecimento deste insumo agrícola aos produtores locais da oleaginosa.
114
As empresas sementeiras licenciadas pela Monsanto seguem normas e padrões
pré-estabelecidos para a produção e a comercialização dos seus cultivares. Estas normas
têm o objetivo de preservar o potencial genético e resguardar a qualidade das variedades
geradas pela multinacional no decorrer do processo de transferência de tecnologia. Deste
modo, associando-se a produtores independentes, tecnicamente aptos a seguir os padrões
estabelecidos pela empresa, a Monsanto tem ampliada sua capacidade de ação e
consolidada sua presença no território brasileiro. Hoje, a rede de difusão das cultivares
Monsoy conta com cerca de cem empresas sementeiras licenciadas no país.
Estes exemplos estão a nos indicar que tanto os avanços das pesquisas para a
agricultura como a rede de difusão das inovações técnicas no campo brasileiro resultam
de estratégias políticas tecidas entre o Estado e as Empresas.
Enquanto nos anos iniciais do processo de modernização da agricultura brasileira
o poder público assumiu a responsabilidade e o ônus por conduzir os esforços para a
transformação das bases técnico-científicas do campo, nas últimas décadas, o Estado
brasileiro, diante da aceleração das transformações produtivas e diante da ideologia
neoliberal que se difundiu, foi cedendo à iniciativa privada poder de comando sobre a
modera agricultura.
A função de conduzir o desenvolvimento tecnológico e a difusão das inovações
técnicas no campo vem sendo atribuição, quase que exclusiva, das grandes empresas
privadas que atuam no agronegócio brasileiro. De acordo com Silva (2003 p.160), “(...) o
paradigma da biorrevolução redefine a divisão do trabalho entre o setor público e a
iniciativa privada, bem como integra vários setores e ramos da indústria, sobretudo as
empresas produtoras de sementes e de insumos químicos”. Se inicialmente tínhamos as
ações da iniciativa privada, de maneira geral, restritas às inovações mecânicas e físico-
químicas, hoje seu domínio se estende, inclusive, à determinação dos programas de
pesquisas agronômicas, antes conduzidos majoritariamente pelo poder público através de
suas empresas e institutos estaduais e federais de pesquisa.
No mais, dado o controle exercido pelas corporações sobre o progresso técnico-
científico na agricultura e a organização em rede que é característica da forma de atuação
115
das mesmas (o que lhes confere um domínio amplo sobre o circuito produtivo e o círculo
de cooperação de pesquisa agrícola) o processo de difusão das inovações cnicas acaba
também por se constituir numa fase privilegiada de controle e regulação do mercado
(empresas) sobre o processo de modernização técnico-produtivo e o desenvolvimento da
agricultura científica no Brasil.
4.
2.
2
E
STRATÉGIAS DE
D
IFUSÃO
E
SPACIAL DAS
I
NOVAÇÕES
T
ÉCNICAS E
I
MPOSIÇÃO DE
F
ORMAS DE
P
RODUÇÃO NO
T
ERRITÓRIO
.
A difusão espacial de novas tecnologias no Brasil possui uma base territorial e
organizacional muito favorável aos agentes hegemônicos do agronegócio. Aliás, a difusão
especialmente de novas biotecnologias não se faz sem o uso daquele conjunto de sistemas
técnicos, isto é, de um pacote tecnológico que viabilize integralmente a racionalização da
produção agrícola numa dada região. Esta condição faz da parceria técnica e política entre
indústrias químicas, indústrias mecânicas, empresas de biotecnologia, entre outras, uma
exigência para a criação e o emprego de sistemas técnicos de produção cada vez mais
eficientes. Neste sentido, podemos dizer que a constituição de um meio técnico e
científico no campo deriva de um projeto forjado a partir de interesses comuns das
empresas responsáveis pelas invenções tecnológicas empregadas na agricultura. Junto à
racionalidade instrumental dos próprios sistemas técnico-científicos que são utilizados em
porções do território, uma outra razão de ordem política e ideológica, própria dos que as
concebem, vai transformando o meio geográfico de forma vantajosa aos agentes
hegemônicos da economia e da política.
A própria difusão das inovações técnicas acaba por ser o resultado deste projeto
comum. Para disseminar as invenções tecnológicas nas regiões sojicultoras do país,
centros de pesquisa, empresas de fertilizantes, empresas de equipamentos, associação de
produtores de sementes, cooperativas, prefeituras, entre outras instituições articulam-se
firmando acordos e parcerias estratégicas. Através da promoção de reuniões técnicas,
116
feiras e outros eventos realizados em localidades de destaque na produção agrícola, tais
instituições disponibilizam para comercialização os diversos produtos tecnológicos
(máquinas, cultivares, implementos, insumos, etc.) que integram os modernos sistemas
agrícolas destinados ao cultivo da soja, respeitando estritamente as especificidades
técnicas para a produção da oleaginosa em cada subespaço nacional.
Neste processo de difusão espacial das inovações, as cidades do agronegócio
(ELIAS, 2006) assumem função importante no atendimento das demandas de consumo de
tecnologias do campo moderno. Conforme Elias (2003, p. 188) “a cada sopro de
modernização das forças produtivas agrícolas, as cidades se tornam responsáveis por
responder às demandas crescentes de uma série de novos produtos e serviços, dos
híbridos à mão-de-obra especializada, o que faz crescer a urbanização, assim como o
tamanho e o número das cidades [do agronegócio]”.
Numa tipologia possível de ser estabelecida para a análise do processo de difusão
espacial das inovações técnicas na agricultura, os eventos comerciais e técnicos
constituem-se num importante elo entre a produção em escala comercial dos instrumentos
técnicos e sua efetiva implantação no campo. No agronegócio da soja são inúmeras as
feiras e diversos os congressos e reuniões técnicas que cumprem essa função de divulgar
os avanços tecnológicos alcançados pelos institutos de pesquisas e demais empresas
privadas atuantes no segmento de agroquímicos, implementos e equipamentos utilizados
na prática da moderna agricultura. São exemplos evidentes, feiras como a Agrishow
Cerrados, ExpoSul, a Feira de Exposição de Tecnologias Agrícolas (Tecnocampo), Festa
da Soja, entre outros eventos que contam, em muitos casos com o patrocínio e a
participação de grandes empresas como a Basf, Massey Ferguson, Syngenta, FMC, além
do apoio de governos estaduais, municipais e federal e de associações de produtores.
Algumas reuniões promovidas pelas instituições hegemônicas de pesquisa da soja
cumprem também, uma importante função no processo de instalação e operacionalização
dos sistemas técnicos agrícolas recém criados. Os eventos conhecidos como Dia de
Campo e Treino & Visita da Embrapa, É Hora de Plantar e É Hora de Cuidar da
Fundação MT, e Dia de Campo e Tardes de Campo da Coodetec, por exemplo, divulgam
117
diretamente aos produtores de regiões sojicultoras as “virtudes” das novas tecnologias
disponíveis no mercado (cultivares, herbicidas, máquinas, etc.), fornecendo ainda
informações sobre o manejo correto da lavoura, as melhores épocas de semeadura, o
combate a doenças e pragas, o uso dos sistemas técnicos agrícolas mais adequados a cada
região produtora, etc
31
.
São inúmeros os eventos de Dia de Campo promovidos anualmente pelos
diversos centros de pesquisa da Embrapa em parceria com outras instituições, como
Fundações Regionais de Apoio à Pesquisa Agropecuária, Universidades Federais e
Estaduais e empresas privadas
32
. Somente durante a safra 2004/2005 foram realizados um
total de 74 eventos em diversos municípios e regiões sojicultoras dos estados de Mato
Grosso do Sul, Paraná, Mato Grosso, Goiás, Minas Gerais, Tocantins, Rondônia, Roraima
São Paulo e Santa Catarina. Nos dias de hoje, a capacidade de articular a produção de
conhecimento científico agrícola e a divulgação desta informação se apresenta como de
suma importância para a eficácia do processo produtivo no campo (SILVA, 2003).
A assistência técnica promovida por tais instituições, assim como as ões de
igual natureza realizadas por outras encarregadas por amparar diretamente o produtor
rural, tais como a Emater
33
e os serviços de auxílio cnico fornecido por tradings e
cooperativas estimulam, ou mesmo impõem aos sojicultores o uso das novidades técnicas
na lavoura. Ao se conjugar com as feiras, congressos e outras reuniões técnicas
responsáveis, verdadeiramente, por difundir a idéia da necessidade de consumo de novos
31
Estas palestras contam com especialistas oriundos das próprias instituições promotoras desses eventos,
bem como com a participação de técnicos de outras instituições, universidades, empresas, fundações de
pesquisa blicas e privadas escolhidos para proferir palestras e fornecer informações sobre
procedimentos específicos da atividade agrícola aos produtores.
32
Pode-se citar como exemplos de instituições parceiras da Embrapa na realização dessas reuniões
técnicas objetivando especialmente o aprimoramento da lavoura da soja: a Fundação Meridional, a
Fundação Centro Oeste, a Fundação Vegetal, a Universidade Federal de Roraima, a Universidade Federal
de Pelotas, a Bayer, a Alfamaq, a Agricase, a Monsoy, a Coodetec, associação de produtores rurais, etc.
Dentre os centros de pesquisa da Embrapa que podem ser individualmente indicados como promotores
dos
Dias de Campo
estão: a Embrapa Soja, a Embrapa Agropecuária Oeste, a Embrapa Roraima,
Embrapa Rondônia e a Embrapa Meio-Norte.
33
A Empresa Brasileira de Assistência Técnica Rural (EMATER) atua através de suas unidades estaduais
presentes em todo o Brasil.
118
e mais eficientes instrumentos de produção, acaba-se, assim, por se configurar uma
estrutura organizacional que induz à racionalização da atividade agrícola no país.
Neste processo de difusão espacial das inovações técnicas, a participação do
poder público municipal também se faz presente, sobretudo no caso dos municípios
sojicultores que atraem e viabilizam a realização de tais eventos em seu território. Um
exemplo representativo do acima referido são as parcerias firmadas entre a Fundação MT
e alguns municípios do centro-oeste para a realização das atividades de pesquisa e dos
eventos técnicos denominados É Hora de Plantar e É hora de cuidar. Somados, somente
no ano de 2005 foram realizados cerca de 40 eventos distribuídos pelos municípios
matogrossenses de Campo Novo dos Parecis, Nova Mutum, Sorriso, Sinop, Sapezal,
Rondonópolis, Primavera do Leste, Lucas do Rio Verde, Mineiros e Rio Verde em Goiás,
São Gabriel do Oeste no Mato Grosso do Sul, dentre outros municípios matogrossenses,
também sede de tais reuniões técnicas.
A realização freqüente desses eventos nas regiões sojicultoras do país permite a
“difusão das tecnologias em tempo real” (SILVA, 2003), visto que a disponibilização
constante de instrumentos mais avançados e mais eficientes para a operacionalização da
produção local incita o seu uso pelos produtores rurais, sob a pena da sua permanência
neste mercado altamente disputado, voraz. O espaço agrícola moderno (modernizado)
resulta da difusão e instalação da última e mais eficaz tecnologia, possibilitando um novo
uso agrícola do território e um novo ritmo de realização das atividades produtivas no
campo.
No campo modernizado, a natureza ali presente é uma natureza
cientificamente conhecida, domada, codificada, comandada, sobre a qual,
mediante as biotecnologias e o influxo do mercado, se impõe um
calendário agrícola cada vez menos diretamente dependente das
condições naturais e mais dependente do progresso cnico e das
demandas do mercado (SANTOS; SILVEIRA, 2001, p. 306).
As maiores empresas do agronegócio mantêm vínculos estreitos de financiamento
com instituições de pesquisa, oferecendo ainda serviços de assistência técnica aos
produtores de soja. O Grupo AMAGGI e a Fundação MT são dois desses muitos casos no
119
estado do Mato Grosso, bem como a parceria mantida entre COMIGO (Cooperativa
Agroindustrial dos Produtores Rurais do Sudoeste Goiano) e a Coodetec no estado de
Goiás, além de muitos outros exemplos existentes envolvendo as grandes tradings da soja
que atuam no território brasileiro
34
. Tal articulação das ações na produção e difusão das
inovações permite às empresas um maior poder de regulação sobre a atividade produtiva,
ao passo que, a assistência técnica fornecida aos produtores com quem realiza seus
negócios garante uma maior eficiência da produção nas regiões sojicultoras onde atua e, o
consumo das biotecnologias criadas pelas instituições de pesquisa com quem mantém
parcerias garante o retorno dos investimentos realizados em pesquisa.
Assim é que a moderna atividade agrícola torna-se integralmente subordinada aos
mandamentos das empresas: na escolha das sementes e das espécies para lavoura; na
realização da assistência técnica ao produtor; no controle sobre os padrões técnicos de
produção; na forma de manejo da lavoura; na colheita, etc. (SANTOS, SILVEIRA,
2001). Esta organização e articulação das ações para a produção e difusão das inovações é
bastante vantajosa para as corporações, na medida em que se constitui num importante
mecanismo para a concretização de seus projetos de uso econômico e corporativo do
território. Daí, acreditarmos que a imposição de formas de produção pelas empresas
constitui-se num novo e fundamental componente que vem caracterizar o atual processo
de difusão das inovações técnicas no campo moderno
35
.
No atual estágio de desenvolvimento do capitalismo tecnológico a busca das
empresas de exercer um domínio, o mais amplo possível, sobre as bases técnicas
empregadas na produção constitui-se numa de suas estratégias para garantir o máximo
controle e a máxima eficácia das atividades produtivas. A funcionalização dos lugares
34
Em trabalho de campo realizado pelo Núcleo de Estudos Territoriais (NET) em Rio Verde-GO pudemos
constatar junto à cooperativa agropecuária Comigo o seu interesse em firmar parceria com a Coodetec. Os
principais motivos alegados seriam os ganhos na produção de grãos proporcionados por tecnologias
geradas especificamente para aquela região, além do retorno econômico que a cooperativa obteria,
resultado da comercialização das cultivares criadas pela Coodetec, cuja pesquisa contou com o
financiamento parcial da Comigo.
35
Tal abordagem do processo de difusão das inovações, a nosso ver, constitui-se num elemento pouco
ainda explorado nos estudos desse tema, tomando aqui como parâmetros os trabalhos de Hägerstrand
mencionados por Claval (2001).
120
junto aos circuitos hegemônicos de produção do agronegócio caminha com a imposição
de formas de produção, tendencialmente racionalizantes, e estreitamente afinadas com a
própria lógica de competitividade que impera no desenvolvimento dessa agricultura
científica.
A convergência de interesses e a concentração de poder nas mãos das grandes
empresas na realização das pesquisas e no desenvolvimento tecnológico para a agricultura
culminam, em outros termos, na subordinação do produtor aos caminhos e descaminhos
do progresso técnico-científico conduzido por aqueles agentes hegemônicos da pesquisa
agrícola. O resultado do desenvolvimento dessa atividade produtiva pode ser apreendido
através dessa nova forma de apropriação técnica do território que se revela no período
atual, conseqüência da própria dependência de alguns subespaços nacionais do uso de um
conjunto de tecnologias projetadas para funcionar otimamente em cada subespaço
sojicultor e responder exclusivamente aos imperativos da competitividade econômica. De
outra maneira, pode-se dizer que tal mecanismo conduz a um crescimento econômico,
mas à custa da perda de controle do seu destino pelas regiões assim modernizadas
(SANTOS; SILVEIRA, 2001).
É a partir de toda essa complexa organização arquitetada para a difusão das
tecnológicas que se realiza, em certos lugares do território brasileiro, uma adequação
técnica e política que permite às grandes empresas privadas do agronegócio uma
produtividade e lucros maiores. Todavia, há que se destacar a restrição deste processo de
difusão espacial das inovações face aos condicionantes para a aquisição das tecnologias.
De acordo com estudo do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) relatado pelo
Ministério da Agricultura, o potencial brasileiro para a produção de grãos é bastante
superior aos cerca de 125 milhões de toneladas alcançados em 2004. Apenas com a maior
difusão das tecnologias existentes, utilizadas hoje por apenas uma parcela dos
produtores, a produção de grãos no país poderia alcançar 295 milhões de toneladas
(MAPA, 2004). Embora a modernização da agricultura e do território tenha alcançado as
diversas regiões do país, através da difusão e a instalação seletiva das inovações técnicas
ao campo, esta também tratou de evidenciar o aprofundamento das disparidades
121
existentes entre os produtores e as desigualdades entre os lugares no espaço agrícola
brasileiro (GRAZIANO DA SILVA, 1982; DELGADO, 1985; ELIAS, 2003).
A cada movimento de difusão das inovações técnicas no campo brasileiro, novas
bases para realização da produção são instauradas e um novo círculo de colaborações é
estabelecido de acordo com os sistemas técnicos agrícolas que se tornam preponderantes
em cada subespaço do território. Os nexos espaciais entre a região de concretização da
produção propriamente dita e as localidades que cooperam com sua realização são
redefinidos. Este processo se conforme as novas descobertas e as inovações
tecnológicas promovidas pelos subespaços nacionais e estrangeiros que comandam os
esforços técnico-científicos para o aprimoramento da moderna atividade agrícola em cada
região sojicultora do território brasileiro.
122
V
A GUISA DE CONCLUSÃO
123
5.1-A
S
OLIDARIEDADE
O
RGANIZACIONAL
C
ONSTRUÍDA E AS
D
ESARTICULAÇÕES
T
ERRITORIAIS
P
RODUZIDAS
.
A construção/imposição de solidariedades organizacionais que buscam instituir
uma racionalidade ao território produz nexos, essencialmente artificiais e funcionais entre
os lugares. O estabelecimento de redes que buscam cumprir determinadas finalidades
permite uma eficiência produtiva de parcelas do território nacional e um uso corporativo
do território pelos agentes hegemônicos da economia e da política.
Conforme Santos e Silveira (2001) a prosperidade dos agentes promotores das
solidariedades organizacionais é dada, em muitos casos, à custa de uma solidariedade
interna, de modo que racionalidade técnica e instrumental construída não se faz em
benefício da maior parte da população. Neste sentido, a solidariedade organizacional
estabelecida pode, também, produzir desarticulações internas no território nacional, na
medida em que se constituem nexos espaciais essencialmente funcionais, presididos por
interesses mercantis e responsáveis por um uso privilegiado dos recursos do território. É
sob a invenção da necessidade de viabilização do território aos circuitos produtivos
hegemônicos que se organiza e se instrumentaliza o território nacional, promovendo-se,
racionalmente, uma verdadeira fragmentação do território nacional.
A produção de uma atividade científica utilitária, de caráter mercadológico
realizada por empresas, universidades e outras instituições públicas e privadas de
pesquisa revela, igualmente, a construção de solidariedades organizacionais que, ao
proporcionar um uso seletivo do território por alguns circuitos produtivos do agronegócio
contribui, concomitantemente, para o rompimento da coesão social e política do país.
Este processo se dá em decorrência da internalização de um projeto de modernização das
atividades e do próprio território regida por interesses corporativos, muito ligados aos
projetos e estratégias de mercado das grandes empresas que (do exterior) comandam as
atividades produtivas hegemônicas do país.
A constituição do círculo de cooperação de pesquisa agrícola no Brasil vem,
igualmente, evidenciar o caráter contraditório das solidariedades organizacionais e
124
institucionais construídas no território nacional. O aumento vertiginoso da capacidade de
produção agrícola brasileira, resultado dos progressos técnico-científicos promovidos,
sobretudo, por empresas, institutos e universidades públicas nacionais ao longo das
últimas décadas, se defronta com a escassez de alimentos que aflige considerável parcela
do povo brasileiro, evidenciando assim, a lógica perversa presente neste projeto
hegemônico de instrumentalização do território brasileiro que se perpetua e se aprimora
ao longo de todo o processo de formação do país.
Esse paradoxo de abundância e de escassez de alimentos no território brasileiro
pode ser visto pelo aumento constante de pessoas famintas no país, dado em ritmo e
intensidade semelhantes àqueles índices alcançados pelo aumento da produção de grãos
(Gráfico 10), em que somente a produção soja, corresponde a cerca de cinqüenta por
cento das safras. Diferentemente do fenômeno da fome em outros países, cuja baixa
densidade técnico-científica do meio geográfico inviabiliza a realização da produção de
alimentos em escala, o Brasil atende e até supera os parâmetros internacionais que
estipulam que um país, deva produzir 500 quilos de grãos por habitante/ano para poder
suprir as necessidades nutricionais de seus habitantes (EMBRAPA, 2004b).
Diante da crescente produção de grãos no Brasil, como vimos nesta dissertação,
tudo nos leva a crer que a escassez de alimentos em nosso país é uma escassez produzida
intencionalmente, e o problema da fome que atinge milhões de brasileiros é um problema
político e ético que, como vimos as possibilidades técnico-científicas estão dadas, se
quisermos superar esta mazela social.
125
Gráfico 10: Crescimento da safra de grãos em milhões de toneladas (1990/91 – 2003/04)
e da população de famintos em milhões de pessoas (1994-2001)
Fonte: CARNEIRO; PEREIRA, 2005.
O discurso sobre a necessidade de expansão da produção de alimentos para a
população brasileira, criado nos anos 60/70 para respaldar as políticas de Estado
orientadas para o aprimoramento das bases técnicas do campo e a maior especialização
territorial na produção agrícola, mostrou-se falacioso diante dos resultados alcançados. A
orientação para o mercado internacional que os circuitos produtivos contemplados pelo
processo de modernização assumiram demonstra, outra vez, a extroversão da organização
de parcela das atividades desenvolvidas no país. A constituição do círculo de cooperação
de pesquisa para a moderna agricultura no Brasil pode ser interpretada como um processo
cujo objetivo foi o atendimento de demandas externas de mercado e não das necessidades
e demandas da sociedade brasileira. Assim, o círculo de cooperação de pesquisa agrícola,
ao mesmo tempo em que evidencia uma organização solidária do território, revela
também, as contradições do uso desigual que se faz do território brasileiro.
A construção dos nexos territoriais corporativos promove assim a
desarticulação interna do território nacional, na medida em que as atividades
desenvolvidas pelas instituições integrantes das redes de pesquisa tornam-se alheias às
126
carências da sociedade e, portanto, descoladas da solidariedade orgânica que, afinal,
cimenta o território nacional.
O uso privado e privilegiado do conjunto de instituições públicas de pesquisa
(empresas, universidades e institutos) é exemplo desse uso corporativo do território
nacional que resulta no processo de fragmentação do território. Trata-se aqui, de um
projeto tecno-político de modernização das atividades produtivas afinado, às lógicas e aos
interesses exclusivos do mercado de commodities, como nos mostrou o caso do
agronegócio da soja.
O distanciamento entre as finalidades do desenvolvimento tecnológico
promovido pelo círculo de cooperação pesquisa e a necessidade de superação dos
problemas sociais do país, tal como é o problema da fome, constitui-se num dos
principais paradoxos brasileiros, tratando por um lado, de viabilizar a inserção de
subespaços nacionais à divisão interna e internacional do trabalho e, por outro lado,
inviabilizar a construção de uma nação politicamente forte, socialmente justa e coesa.
De acordo com Japiassu:
A produção científica se faz numa sociedade determinada que condiciona
seus objetivos, seus agentes e seu modo de funcionamento. É
profundamente marcada pela cultura em que se insere. Carrega em si os
traços da sociedade que a engendra, reflete suas contradições, tanto em
sua organização interna quanto em suas aplicações (JAPIASSU, 1975, p.
11).
Por sua vez, a construção de solidariedades organizacionais corporativas, dadas
com a incorporação de instituições públicas aos programas verdadeiramente privados de
pesquisa, promove concomitantemente, a alienação do território nacional, haja vista a
finalidade mercadológica que impera no desenvolvimento técnico-científico agrícola -
muito orientada para a competitividade econômica de alguns circuitos produtivos
voltados à exportação, estes no mais das vezes, comandados por grandes empresas do
chamado agronegócio internacional, como no caso da soja.
127
VI
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