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ANA ELISA SPAOLONZI QUEIROZ ASSIS
ESPECIALISTAS, PROFESSORES E PEDAGOGOS:
AFINAL, QUE PROFISSIONAL É FORMADO NA
PEDAGOGIA?
PUC- Campinas
2007
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ANA ELISA SPAOLONZI QUEIROZ ASSIS
ESPECIALISTAS, PROFESSORES E PEDAGOGOS:
AFINAL, QUE PROFISSIONAL É FORMADO NA
PEDAGOGIA?
PUC- Campinas
2007
Dissertação apresentada como
exigência parcial para obtenção do
título de Mestre em Educação junto
ao Programa de Pós-
Graduação
em Educação na área de Ensino
Superior do Centro de Ciências
Sociais Aplic
adas da Pontifícia
Universidade Católica de
Campinas, sob orientação da
Profa. Dra. Maria Eugênia de Lima
e Montes Castanho.
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE CAMPINAS
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
Autor: ASSIS, Ana Elisa Spaolonzi Queiroz
Título: Especialistas, Professores e Pedagogos: afinal, que profissional é formado na
Pedagogia?
Orientadora: Profa. Dra. Maria Eugênia de Lima e Montes Castanho
Este exemplar corresponde à redação final da Dissertação de Mestrado em
Educação da PUC-Campinas, e aprovado pela Banca examinadora
Data: 12/02/2006
BANCA EXAMINADORA
Prof (a). Dra. Orientador (a)
Prof (a). Dr. (a) Primeiro Membro
_________________________________________________
Prof (a). Dr. (a) Segundo Membro
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Á Márcia Spaolonzi (in memorian)
Á Rômulo Rodrigues Jarcem Junior (in memorian)
“Eu sei que vou sofrer, a eterna desventura de viver
a espera de viver (novamente) ao lado teu, por toda minha vida...”.
Mãe e amiga carinhosa, padrinho e amigo carinhoso, os quais
sempre exaltaram meu potencial intelectual.
5
AGRADECIMENTOS
Que a lembrança de teus nomes seja capaz de demonstrar meus sinceros e
profundos agradecimentos pela possibilidade de tornar, de diversas maneiras,
possível a realização desta dissertação.
Minha orientadora, Profa. Dra. Maria Eugênia de Lima e Montes Castanho.
Meus ilustres respondentes, Professores Doutores Maria Rosa Marafon,
Helena de Freitas, Dermeval Saviani, José Carlos Libâneo, e Lea Anastasiou.
Meus professores do Mestrado, Dulce, Vera, Kátia, Jairo, Beth e Balzan.
Às secretárias Regina, Kelly e Alessandra.
Aos bibliotecários Cidinha, Tuca e Sérgio, responsáveis pelos meus encontros
com cada bibliografia.
Aos meus professores do Curso de Direito da Pontifícia Universidade Católica
de Campinas, que colaboram com a expansão de meus saberes.
Aos meus amigos do mestrado, e em especial Adriana, Oscar, Regina, Sérgio,
Antônio Carlos e Warlen que me ensinaram a conviver com as diferenças.
Aos meus amigos de longuíssima data, Camille, Gustavo, Victor Hugo, Marcos
e David que me acompanham desde a minha mais tenra idade, em especial, meu
companheiro Gabriel.
Aos meus pais, todos, Olney Queiroz Assis, Márcia Aparecida de Freitas, Luis
Valter Tristão e Márcia Spaolonzi (in memorian), que me deram não apenas suporte
financeiro, como também emocional.
Aos meus irmãos queridos, Giulia Soledad Spaolonzi Tristão, Luis Antônio
Spaolonzi Tristão, Victor Emmanuel de Freitas Assis e Luiz Henrique de Freitas
Assis.
Aos meus amigos Graziela, Maria Lívia, Alessandra, Nunes, André Werner e
Rafael (Gordo), que me ensinaram a ver as outras possibilidades do mundo.
Aos meus mais novos amigos do curso de Direito, Michele, Renato, Luiz,
Tiago e Bruno que constroem comigo uma nova perspectiva de vida.
A todos que contribuíram, de alguma forma, para a conclusão do trabalho.
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Ao final em nós moram muitos deuses, cada um deles à espera de que lhe
concedamos o tempo de nossas vidas. Sem calendários amarrados, sem
ponteiros cravados. Apenas o tempo de um pouco do nosso olhar, daquela
atenção que descobre caminhos, produz brilho nos olhos e faz a vida.
Regina (de) Brito
Sobre livros, sobre o tempo, sobre a vida. In: À margem das horas.
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RESUMO
ASSIS, Ana Elisa Spaolonzi Queiroz. Especialistas, professores e pedagogos:
afinal, que profissional é formado na Pedagogia? Texto de defesa de
Mestrado em Educação. PUC-Campinas, 2007, 219 p. Orientador: Profa.Dra.
Maria Eugênia de Lima e Montes Castanho.
O presente texto, inserido na linha de pesquisa “Universidade, docência e formação
de professores”, tem como objetivo principal reconhecer o papel do curso de
Pedagogia no Brasil, que profissional forma e qual a sua identidade, considerando os
segmentos formativos pouco articulados de profissionais da gestão educacional e
professores das séries iniciais do ensino fundamental e educação infantil. Realizando
co-relações através de resgate histórico-legislativo e estudo de dados obtidos
através de aplicação de questionário em teóricos conhecidos na área. Os resultados
obtidos colaboram com a construção de um perfil identitário próprio do pedagogo,
profissional com rol de saberes que envolvem conhecimentos de gestão,
organização e funcionamento escolar, assim como de ações formativas
desenvolvidas em sala de aula, os quais puderam ser contrapostos com o perfil de
profissional apresentado pelo CNE Conselho Nacional de Educação, através das
diretrizes do curso, publicadas no início de 2006.
Palavras-chave: Pedagogia, Identidade, Formação.
8
ABSTRACT
ASSIS, Ana Elisa Spaolonzi Queiroz. Specialists, professors and educators:
after all, which professional do Education graduate? PUC-Campinas, 2007,
218 p. Mentor: Maria Eugênia de Lima e Montes Castanho. Phd.
The present paper, insert in the line of research “University, teaching and professor’s
formation”, aims in recognizing the role of educational background of educators in
Brazil, what kind of professional it graduates and what is his identity, considering the
low articulated formative segments of educational management and the ones in
charge of the first and second cycles of Elementary school. There are, also, co-
relations through a legislative-historical recall and data study obtained through
inquiries over well-known theoreticians. The gotten results collaborate with the
construction of a singular education professional identity profile, a professional with
knowledge that involves management, organization, and school functioning, as well
as formative actions developed in classroom, which could have been counter-posted
with the education professional profile presented by the CNE Conselho Nacional de
Educação (National Education Council), through course’s drivers, issued by the year
of 2006.
Keywords: Education, Identity, Formation.
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SUMÁRIO
Introdução.............................................................................................................10
Capítulo I
Formação de Pedagogos: um resgate histórico-legislativo.............................13
1.1 Primeiros Passos..............................................................................................13
1.2 Momento de consolidação?..............................................................................40
Capítulo II
LDBEN 9394/06: A realidade mais próxima de nós...........................................71
2.1 Reconhecendo a Lei.........................................................................................71
2.2 Tecendo relações: nossas necessidades.........................................................91
Capítulo III
Velhos Olhares, novas perspectivas................................................................116
3.1 O caminho se faz ao caminhar: opções metodológicas ................................116
3.2 A categoria profissional fala de si mesma......................................................126
3.3 Identidade? Qual?...........................................................................................160
Capítulo IV
O Curso de Pedagogia hoje...............................................................................167
4.1 As Diretrizes do Curso de Pedagogia: uma reflexão......................................167
4.2 O que tínhamos, o que deveríamos ter e o que temos...................................175
Considerações Finais.........................................................................................179
Referências..........................................................................................................183
Anexos.................................................................................................................192
10
INTRODUÇÃO
Toda pesquisa é resultado de inquietação particular com relevância coletiva,
pois, ainda que a idealização de seu desenvolvimento tenha se dado pelas ações de
apenas uma pessoa, ou ainda, um grupo de pessoas, a problemática observada
atinge a sociedade em geral. Logo, diz respeito à mesma. trava-se um
compromisso de persistência, lealdade e seriedade entre pesquisador (es) e
comunidade social, seja ela de nível macro ou micro, que espera-se retorno de
alguma natureza, positivo ou negativo e respeito com os pares e os participantes,
diretos e indiretos.
Assim também se iniciou esta pesquisa, inquietação particular da
pesquisadora, mas com dimensões que atingem diretamente toda a categoria de
profissionais pedagogos e/ou docentes e indiretamente a sociedade, que espera, por
retorno constante do segmento social “Educação”.
O problema veio da percepção de diversidade que envolve a formação do
professor, dissociada da formação do especialista e do gestor educacional, o que
promove extenso leque de discussão, ora orientada por questões legislativas, ora por
práticas universitárias e vivências particulares, resumindo-se numa aparentemente
simples indagação: Se existem e quais seriam as conseqüências em dicotomizar a
formação do pedagogo entre especialistas/administradores e professores de séries
iniciais?
11
Com essa indagação três objetivos essenciais se pretende atingir: buscar se
há a divisão e a forma que a mesma ocorre; reconhecer a opinião de teóricos
estudiosos da área; por fim, delimitar a identidade do pedagogo diante desta
dicotomia, e contribuir para a continuidade de pesquisa sobre o assunto debatido.
Como é possível notar, recorrer apenas às fontes que até então foram
utilizadas bibliográficas, históricas, legislações...-, em nada inovaria o rumo que se
pretende dar à discussão apresentada. Por conta disso fez-se a escolha de recorrer
ao posicionamento de teóricos estudiosos da área problematizada, procurando
consenso dentro da categoria que pudesse colaborar com a reorganização da
mesma.
Cinco professores doutores autores foram escolhidos para que lhes fossem
encaminhadas as questões, via e-mail. O questionário esteve composto por cinco
questões, quatro comuns, isto é, enviadas a todos eles; e uma específica, voltada
para algum posicionamento particular que o teórico tenha apresentado em trabalho
voltado para o tema com o qual se está trabalhando.
A organização do texto da dissertação conta com quatro capítulos. O primeiro
capítulo tem como objetivo realizar resgate histórico-legislativo, observando,
principalmente as ações realizadas no Brasil com relação à formação de professores,
atendo-se mais à região sudeste, desde a colonização do país ao período anterior
à promulgação da LDBEN 9394/96.
12
O segundo capítulo problematiza a nova LDBEN 9394/96 e realiza algumas
reflexões sobre o momento atual da formação da categoria profissional em questão.
o terceiro capítulo apresenta os dados empíricos, debatendo-os e
relacionando-os com as questões apresentadas nos capítulos anteriores, e
aprofunda a discussão sobre a proposta metodológica utilizada na realização da
pesquisa, assim como o caminho percorrido em sua elaboração.
O quarto capítulo concentra todas as reflexões feitas nos capítulos anteriores,
procurando relacioná-las diretamente com as Diretrizes do Curso de Pedagogia,
atendo-se para um estudo da letra da lei e de sua lógica. A pretensão é obter no
final, um quadro detalhado da situação atual da formação e suas conseqüências,
preparando o terreno para novas contribuições sobre o assunto.
13
CAPÍTULO I
FORMAÇÃO DE PEDAGOGOS:
UM RESGATE HISTÓRICO-LEGISLATIVO
Quando se trata de física ou de química, a história destas ciências
no passado, não é mais do que um assunto de erudição e de
curiosidade...Na ciência da educação, pelo contrário, como em
todas as ciências filosóficas, a história é a introdução necessária
à preparação para a própria ciência.
(BUISSON apud NÓVOA apud CAMBI, 1999:11).
1.1 Primeiros Passos:
Se neste trabalho vamos procurar compreender qual deve ser, de fato, a real
identidade do Pedagogo e, portanto, qual o viés de sua formação, nada mais justo do
que recorrermos às suas raízes históricas e epistemológicas:
A História da Educação fornece aos educadores um conhecimento do
passado coletivo da profissão, que serve para formar a sua cultura
profissional. Possuir um conhecimento histórico não implica ter uma ação
mais eficaz, mas estimula uma atitude crítica e reflexiva. (NÓVOA apud
CAMBI, 1999:13)
A palavra “pedagogia” tem origem grega, derivada de paidagogía”,
influenciando o surgimento da palavra “pedagogo” em sua forma grega paidagogos”,
ambas flexões do acúmulo de duas outras palavras gregas, paidós (criança) e
agodé (condução). Mas está claro que a Pedagogia abrange, atualmente, um
espaço muito maior do que apenas a condução do infante, nosso atual desafio é
identificar suas fronteiras e procurar delinear a função de seu profissional dentro de
uma ciência, a Ciência Educação.
14
Para dar continuidade à discussão acerca dos fatores históricos que
influenciaram e influenciam a atividade profissional do pedagogo, é necessário deixar
claro que há a convicção da existência de uma Ciência da Educação que é a
Pedagogia, constituída por saberes autônomos e específicos; uma transformação
ocorrida na segunda metade do século XX, portanto, recente, que colaborou para a
expansão do conhecimento na área, compreendendo a amplitude e o pluralismo
educacional. (CAMBI, 1999):
Este (saber), porém, é agora um setor (e um) ainda que fundamental,
talvez o mais fundamental do saber pedagógico e não pode competir ou
invadir o terreno das ciências da educação: tem um âmbito próprio,
métodos próprios e objetivos próprios. Assim, a pedagogia está hoje
transcrita em grande parte nas ciências da educação e só partindo delas é
que se pode enfrentar a problemática educativa...(pg. 596).
Diante disto é possível notar que a busca pela identidade do pedagogo é um
dos importantes vieses da problemática educativa pois trata-se de conhecer aquilo
que é responsável pelo próprio conhecimento da área, sua construção e reflexão
constantes. Aplicar em si seus próprios saberes com o objetivo de identificar-se no
meio deles é tarefa desafiadora e complexa:
O que muda e profundamente é a imagem do saber pedagógico: este
vem se configurando, como foi dito, como um saber hipercomplexo,
constituído de muitos elementos, a ser submetido a uma coordenação
reflexiva e capaz de desenvolver também uma radical auto-reflexão, que
controle seus estatutos e finalidades. A hipercomplexidade é dada pelo
pluralismo dos setores que o compõem, pelo dinamismo de suas relações,
pelo metacontrole que deve ser ativado sobre aquele discurso plural e
dinâmico. (CAMBI,1999:598).
Identificando que o profissional direto da Ciência Educação é o pedagogo,
teremos que considerar, sempre, sua responsabilidade diante do conjunto complexo
15
de saberes que a ele se apresenta. Tais saberes influenciam a existência de diversas
ramificações formativas. A discussão aqui proposta, é sua identidade profissional,
seja ela docente, não docente, ou uma combinação de ambas, mas sempre sob um
olhar científico, plural e emancipador, exatamente como configura sua área de
atuação: com propósito dialógico.
A figura do Pedagogo enquanto professor/tutor existe desde os tempos mais
remotos, importante nas grandes civilizações antigas romana, grega, egípcia, inca,
maia, indígena, chinesa...- sempre cuidando para que houvesse um acúmulo de
cultura considerável por parte dos dominantes e uma certa constância e estabilidade
nas atitudes dos dominados (MANACORDA, 2004).
Sendo assim, durante muitos culos é possível notar que o Pedagogo
restringiu-se à atitude do fazer e manter, enquanto que pensar ficaria por conta de
seus senhores, o que o caracterizava como escravo e dicotomizava as ações entre
intelectuais e manuais algo muito importante para um dos planos de
desenvolvimento de nosso estudo.
Para falar da perspectiva histórico-legislativa da formação docente no Brasil é
necessário recorrermos a acontecimentos do século XVI, pois o quadro atual não foi
algo construído apenas cinqüenta anos, ou ainda resultado da última LDBEN
9394/96 que completa uma cada, mas sim de ações sucessivas desde a
implantação do sistema educativo brasileiro.
16
No Brasil, um país colonizado pela política da exploração para enriquecimento
de Portugal e fortalecimento da Igreja Católica que perdia fiéis por conta do levante
protestante, o sistema educativo o poderia ser de outra forma senão nos moldes
jesuíticos.
Durante muito tempo o Brasil permaneceu com uma educação clériga forte, a
qual atendia apenas aos filhos de nobres, objetivando manter o controle sobre a
disseminação do conhecimento, o qual poderia libertar as pessoas (PONCE, 2001).
O marquês de Pombal acreditou que com as Reformas Pombalinas - as quais
visavam substituir o ensino jesuítico - estaria melhorando a educação no país.
Alegava que os sacerdotes haviam enriquecido com o monopólio educacional
utilizando uma metodologia inútil de ensino para aqueles tempos (RIBEIRO, 2000).
No entanto, esqueceu-se da dificuldade de transição de um modelo fixo de mais de
300 anos para algumas novas organizações que atendiam mais a interesses políticos
– dissociação do Estado com a Igreja – do que a interesses educacionais:
A uniformidade da ação pedagógica, a perfeita transição de um nível
escolar para outro, a graduação, foram substituídas pela diversificação das
disciplinas isoladas. Leigos começaram a ser introduzidos no ensino e o
Estado assumiu, pela primeira vez, os encargos da educação
(ROMANELLI, 2001:36).
Desta forma percebemos que se antes a formação docente era realizada
dentro de um contexto religioso, agora nem organização possuía. Mas não foram as
reformas que impediram de continuarmos a ter a participação dos sacerdotes em
17
salas de aula, que muitos deles foram recrutados para assumirem as aulas régias
1
devido à falta de mão de obra qualificada.
Essa falta de mão de obra fez com que Cursos Superiores fossem instalados
no país, atendendo não apenas às novas propostas da Reforma, mas também às
necessidades da família real e sua corte que haviam pouco chegado ao Brasil.
Estes Cursos Superiores estavam longe de serem caracterizados como Centros
Universitários ou Universidades, pois possuíam características marcantes de centros
de estudos superiores isolados, que o previam a real integração dos saberes,
preocupando-se com a profissionalização imediata dos estudantes. Nenhuma delas
era voltada para a formação docente, predominavam o ensino jurídico, a medicina e
a engenharia.
Com as Revoluções Francesa e Industrial ocorreu uma nova organização
mundial, que previa o surgimento do Estado de Direito tendo como finalidade o bem
comum, através da reiteração e adequação da ordem sob um poder social legítimo o
qual atrairia o poder político que proporciona o controle do Estado (DALLARI, 2003).
Neste ambiente, categorias de trabalho começaram a aparecer e a se firmar, de
forma que a escola se tornasse cada vez mais legítima e presente, iniciando uma
aventura além das mãos de entidades religiosas, as quais se incumbiram de cuidar
para que o estudo não fosse difundido, por compreenderem, junto aos seus
monarcas, que o saber pode libertar, o que fez com que o pedagogo, depois de
escravo, ficasse restrito às escolas clérigas.
1
Aulas criadas pelo Marquês de Pombal, oferecidas por leigos “ad hoc” no Brasil colônia, onde se
ensinava latim, retórica, francês e filosofia.
18
É claro que o fato de a escola ter se tornado uma entidade “governamental”,
que serviria ao Estado de Direito, voltada, em tese, para a população, não foi mero
acidente. Naquele novo momento, era preciso abrir um pouco as portas do
conhecimento para as classes trabalhadoras, e da mesma forma que se iludia
estudantes com o discurso de uma “escola de todos e para todos”, a categoria
profissional (pedagogos – docentes e não docentes) também era iludida:
O exercício da docência enquanto construção histórica, tem em seus
primórdios relações intrínsecas com a Igreja, uma vez que, inicialmente,
cabia aos religiosos (especialmente aos jesuítas) a responsabilidade pela
educação. Mais tarde com a estatização do ensino, processo em que
professores religiosos passaram a ser substituídos por leigos, sob a tutela
do Estado, os professores foram integrando-se ao funcionalismo público.
Os salários eram pagos pelo Estado, o qual ditava, inclusive, as normas
para o trabalho docente que, aos poucos, perdia autonomia e criava
dependências dos órgãos administrativos. (PAPI, 2005:20).
Nota-se, portanto, que no período de transição entre o ensino clérigo e o
ensino laico, havia uma sensação de autonomia profissional, que teve curto período
de duração, devido à rápida retomada de controle por parte do Estado.
Entretanto, os princípios e valores o eram diversos daqueles pregados pela
Igreja Católica:
Mesmo sob a tutela do Estado, o trabalho dos professores continuou
relacionado, no imaginário social e no dos próprios professores, às
virtudes de benevolência, tolerância, abnegação, compreensão,
sacerdócio e altruísmo heranças da origem religiosa, configurando
claras referências do processo inicial da profissionalização do
magistério, que “[...] vieram se construindo historicamente, mas,
sobretudo, construindo a figura do profissional da educação” (PAPI,
2005:21).
19
Embora seja consenso que a ruptura do ensino clérigo com o ensino leigo
tenha ocorrido nas Reformas Pombalinas, muito se passou no Império em paralelo
com as atuações dos jesuítas através de leis publicadas por Portugal.
Tais leis poderiam ser utilizadas em nosso país. Um exemplo específico é o
que ocorreu no ano de 1772, com o Alvará português acerca dos exames para
exercício da docência no ensino elementar que professores deveriam prestar. Eram
realizados, preferencialmente, em Lisboa, mas com a possibilidade de que, nos
reinos Ultramar, também o fossem, desde que atendendo a todas as exigências
declaradas no documento (TANURI, 2000).
Interessante ressaltar que, apesar de em 1820 instalarem-se as primeiras
escolas de mútuo
2
, não apenas pretendendo aplicar o Método Lancaster para o
ensino de primeiras letras, mas também como auxiliar do processo de aceleração da
formação docente, sendo considerada como a primeira forma de preparação de
professores no país, preocupada mais com questões práticas do que teóricas;
apenas com a Reforma Constitucional de 1834, seriam estabelecidas as primeiras
escolas normais brasileiras por iniciativas isoladas das Províncias (TANURI, 2000;
MATOS, 2006):
O Governo Central passou a ocupar-se apenas do ensino de todos os graus
na Capital do Império e do superior em todo país, ficando as províncias
responsáveis pela instrução primária e secundária nos respectivos
territórios. Entretanto, o Poder Central, detendo o monopólio do ensino
2
Lancaster foi o criador do método de ensino mútuo, na Inglaterra no século XVIII, apresentando como
vantagem a possibilidade de instruir um grande número de pessoas simultaneamente em uma sociedade com
escassez de mestres, como era o caso atual do Brasil.
20
superior, manteve durante o regime imperial (...) uma superintendência
indireta sobre os estudos secundários, que procuraram conformar-se aos
requisitos exigidos para o ingresso nos cursos superiores. (TANURI,
2000:63).
Percebemos, então, que além de a categoria profissional não ser reconhecida
como tal, deixando de ocupar seu lugar no ensino superior, haveria diferença
formativa de uma província para outra, e a profissão docente estava sendo mantida
sob as rédeas das necessidades dominantes e mercantis, pois seu trabalho limitava-
se à sustentação de uma falsa idéia de possível alastramento educativo.
Em 1835, através da Lei 10, na Província do Rio de Janeiro, cria-se a
primeira escola normal pública do Brasil e da América Latina, obviamente sem
respaldo pedagógico algum, limitando-se à formação de professores para o ensino
primário, de forma a contemplar em seu currículo, muito mais questões voltadas para
os conhecimentos gerais, do que específicos da área de professores do ensino
primário.
Seguiu o modelo francês e teve vida curta, pois suas atividades se encerraram
em 1849. Uma cada foi necessária para que fosse determinada a criação de outra
escola normal, fazendo com que a experiência se alastrasse por todas as províncias.
Apesar de um período curto de vida, a primeira escola normal foi importante:
(...) em nível primário realizou-se o primeiro ensaio de uma instituição
destinada especificamente à formação do pessoal docente para as escolas
primárias no Brasil. (...) marcou o início do desenvolvimento das escolas
normais em outros países e estava presente na organização imprimida às
primeiras instituições congêneres aqui instaladas. (TANURI, 2000:64).
21
Todas as províncias tiveram de uma a três experiências com a implantação de
escolas normais. Seu constante fechamento ocorria devido à baixa freqüência, pois
não era – e continua não sendo – uma profissão financeiramente atrativa, com
inúmeros problemas administrativos e estruturais, seja voltado para questões
organizacionais com relação à didática ou ao currículo - que a dificuldade em se
compreender que havia a necessidade de uma formação exclusiva para o ensino das
primeiras letras, era grande - (TANURI, 2000):
O insucesso das primeiras escolas normais e os parcos resultados por elas
produzidos granjearam-lhes tal desprestígio que alguns presidentes de
Província e inspetores de Instrução chegaram a rejeitá-las como instrumento
para a qualificação de pessoal docente, indicando como mais econômico e
mais aconselhável o sistema de inspiração austríaca e holandesa dos
“professores adjuntos” (TANURI, 2000:65).
Sendo assim, auxiliares de professores em atuação seriam aprendizes da
profissão docente, sem aprofundamento teórico e inspirado numa cultura prática do
refazer, reproduzir existente até hoje, principalmente quando se fala da categoria
de professores do ensino superior que o possuem qualquer preparo docente para
o exercício da profissão (ASSIS e CASTANHO, 2006) -, legitimando esta atuação
através dos exames e concursos.
Como apontado anteriormente, com relação ao surgimento do Estado de
Direito e a imigração dos ideais europeus para o nosso país, o que ocorreu
tardiamente em nosso continente que a situação de desenvolvimento é diversa da
do velho mundo, não apenas clamava-se por uma escola pública, e libertava-se do
domínio católico, mas também “as escolas normais passam a ser reclamadas com
maior constância e coroadas de algum êxito” (TANURI, 2000:66), o que se fortaleceu
22
com o suporte legislativo proporcionado por reformas, como a de Leôncio de
Carvalho (1879), Rui Barbosa (1882) e Cunha Leitão (1886).
Com o suporte legal e a aclamação da população pela existência de escolas
normais, inúmeras modificações foram ocorrendo, como a melhora de currículos, a
fixação do curso por matérias, o empenho do Estado com relação à qualidade e
quantidade destes cursos e, principalmente a abertura da profissão para as
mulheres.
Não é objetivo deste trabalho tratar da presença do gênero feminino na
categoria docente, fortemente presente na atividade do professor responsável pelas
séries iniciais, mas não podemos deixar de mencionar esta característica marcante
da categoria profissional.
Desta forma, vale ressaltar que o currículo era diferenciado para as mulheres,
pois se aproximava mais das tarefas domésticas, já que o papel de mãe se confundia
com a docência característica muito bem discutida por Paulo Freire (1997) e
colaborava com a escassez da mão de obra docente, nas séries iniciais, que os
homens dificilmente se aventuravam neste setor, continuando assim durante um bom
tempo, nos acompanhando até hoje, por um ponto específico tratado por Romanelli:
(...) um fator importante: o baixo nível de salário do magistério, em geral, no
Brasil. Para essa carreira têm sido atraídos salvo honrosas e brilhantes
exceções, sobretudo dois tipos de clientela aquele cujo ingresso é
barrado em escolas de cursos mais disputados (Medicina e Engenharia, por
exemplo), ou que realmente não tem condições pessoais de concorrer às
carreiras técnicas e científicas, e aquele tipo que não necessita adquirir
status, mas deseja apenas ou dar mais brilho ao status adquirido, ou titular-
23
se para um mais vantajoso casamento, como é o caso de parte da clientela
feminina. (ROMANELLI, 2001:121)
Até os dias de hoje o curso de formação de professores é freqüentado em sua
maioria pelo blico feminino; piadas constantes acerca do “curso caça marido”
continuam sendo realizadas. A história deixa marcas profundas, sejam elas positivas,
ou negativas.
A Constituição da República , em 1891 previu, pela primeira vez, a criação de
instituições de ensino superior e secundário nos estados brasileiros, dando-lhes
maior importância devido à influência de oligarquias latifundiárias na execução do
texto da Carta Magna. Também é neste momento que, oficialmente, a Igreja Católica
deixa de ser adendo do Estado, o qual passa a ser figura laica.
Dentro do novo regime presidencialista, à União cabia a manutenção do
ensino superior, e aos Estados, antigas províncias e que estavam submetidos ao
poder do Estado-União, perdendo, portanto, um pouco de sua autonomia, além de
organizarem em sua totalidade o ensino primário, lhes cabia controlar, também, o
ensino secundário, o qual era voltado, principalmente, para as escolas normais, de
onde sairiam as professores do ensino primário (ROMANELLI, 2001).
Se pensarmos em coerência educacional, o fato de os Estados poderem
legislar tanto sobre a formação das professoras de ensino primário e o próprio ensino
primário, faz com que seja possível obter um continuum no sistema educativo,
realizando um movimento dialógico entre o que se tinha e onde era preciso chegar,
24
atuando nas atividades formativas de ambos professores e alunos -, mas
reconhecer que o ensino superior ficava a cargo da União é perceber que existe uma
dicotomia acirrada entre as classes sociais e um controle sobre o saber.
O quadro nos confirma, portanto, que a modificação de um sistema clérigo
para um sistema leigo só visava atender às novas demandas econômicas e políticas,
e isso significa, também, e principalmente, formação profissional do docente,
que ele era o centro da atividade pedagógica e poderia instigar a população a
reivindicar seus direitos; direitos os quais em sua grande maioria haviam sido
suprimidos da Constituição, que fora realizada nos moldes da Carta norte-americana
reconhecida por sua alusão aos direitos individuais e coletivos em larga escala para
a época.
Ao longo da história é possível notar a modificação das ações no uso dos
aparatos sociais, quando estes podem colaborar no âmbito do desenvolvimento da
nação, principalmente quando voltado para interesses econômicos.
Um exemplo forte é o que ocorreu na Europa durante o Renascimento até o
século XVIII, com o surgimento da Companhia de Jesus a educação foi utilizada
para reerguer a Igreja e controlar o crescimento econômico das famílias;
percepção de Lutero, representante do Protestantismo, pairava sobre a relação do
ensino com a economia e a restrição de ambos aos burgueses abonados, e de que
forma isto seria interessante para fortalecer a religião e os grupos sociais que queria
atingir (PONCE, 2001).
25
O objetivo da época era demonstrar que o governo estava mudandoImpério
substituído pela República -, que os ideais e compreensão de justiça também eram
outros – abolição da escravatura -.
Assim era possível armar o terreno com um objetivo econômico muito maior,
pois há que se considerar a chegada dos ideais da Revolução Francesa – os
declarados: igualdade, liberdade e fraternidade; e os o declarados: propriedade
privada e do avanço tecnológico com a Revolução Industrial, os quais precisavam
de consumidores futuros e empregados para a manutenção do novo sistema
capitalista liberal.
Recorremos, então, à justificativa de Saviani (2003), os objetivos reais estão,
durante toda a história, encobertos pelos objetivos proclamados.
Desta forma, é possível notar que a má formação de professores não é mero
acidente, descuido, ou falta de preparo daqueles que governam, mas sim uma
maneira de manter a desordem social em favor da ordem econômica capitalista
liberal.
O objetivo maior sempre foi a interferência mínima do Estado nas tomadas de
decisões que envolvessem questões econômicas, o que em primeira instância, soa
desconexo de questões educativas, sociais e políticas, quando na verdade, abdicar-
se desta participação significa, também, perder espaço nos outros âmbitos da
26
sociedade, que esta inicia seu regimento econômico liberal aqui, neste período, o
qual perdura por todo o século XX com perspectiva de extender-se e aprimorar-se no
século corrente (MÉSZÁROS, 2003b).
Se temos, de um lado, os Estados responsáveis pelo ensino profissionalizante
na formação de professores e, por outro, a União cuidando do ensino superior, de
onde viriam, então, os professores que lecionariam no curso profissionalizante de
formação docente?
É claro que a União não se preocupou em organizar curricular e formalmente
um curso de Pedagogia – o qual permaneceu sem diretrizes 114 anos após a
regularização do ensino superior no Brasil sendo, sem dúvida, um dos cursos mais
importantes para organização de um sistema educacional de qualidade -.
A formação para execução do magistério secundário ficaria a critério da
Faculdade de Filosofia.
Antes que o governo se organizasse para manter e instaurar uma Faculdade
voltada para as questões educacionais, a Igreja Católica, aproveitando de sua
história e excelência com relação à educação e em resposta aos debates feitos no
fim do século XIX, início do XX, abre, em 1901, através da Ordem dos Beneditinos, a
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, contando com uma área específica para a
Educação, na cidade de São Paulo.
27
A manobra foi realizada com o intuito de reafirmar, depois de um período
crítico, sua presença na área educacional e iniciando um legado que persiste até
hoje de presença no Ensino Superior com as Pontifícias Universidades Católicas.
(BRZEZINSKI,1996).
No período transitório de pré-república, algumas medidas foram tomadas,
isoladamente, já que os Estados possuíam autonomia para traçar determinadas
metas e alcançar seus objetivos, desde que estivessem de acordo com os propósitos
da União; o Estado de São Paulo, por exemplo, foi o primeiro a preocupar-se com a
questão da formação de professores em nível superior:
Os reformadores paulistas reconheciam, à época, a incumbência do
governo de “no atual estado da sociedade dar ao povo mais do que a
instrução primária” (...). Como afirmei, a utopia brasileira de elevar os
estudos de formação de professores ao nível superior não se tornou
realidade nas primeiras décadas republicanas. A utopia ainda permaneceu
como projeto simbólico do vir-a-ser. (BRZEZINSKI, 1996: 22-3).
discutimos, porém, que universalizar o conhecimento estava – e ainda o é –
diretamente atrelado ao desenvolvimento de um plano econômico e social;
reconhecer que o Estado de o Paulo, depois do domínio do café e de outras
atividades agrícolas e pecuárias no Brasil, tornou-se forte econômica e politicamente,
e, portanto, clamava por uma colaboração dos aparatos sociais a fim de manter sua
emancipação num ritmo acelerado e lucrativo, nos ajuda a compreender melhor a
citação acima.
28
Após a reorganização governamental de nosso país, a década de 20 trouxe
consigo outras mudanças importantes que interfeririam nas organizações
educacionais:
A partir da primeira Guerra Mundial o País atravessou um período de
mudanças em seu modelo econômico, iniciando um processo de
industrialização e conseqüentemente de urbanização. Aos poucos a
sociedade brasileira passou do modelo agrário-comercial-exportador
dependente para o modelo capitalista-urbano-industrial. (BRZEZINSKI,
1996:25).
Nada diferente do que havíamos comentado sobre o que ocorria na Europa
alguns séculos atrás, mas que, desta vez, chegava ao Brasil de forma a ocupar
definitivamente seu espaço, dispensando possíveis interlocutores que tratariam de
apresentar o sistema à sua nova casa.
Sendo a década de 20 aquela considerada como o período entre guerras, o
surgimento e acirramento de atividades emancipatórias da nação o haveriam de
ter melhor justificativa.
Momento em que o Estado de São Paulo apresentava maior número de
população, empresas e funcionários, contando com um movimento cultural de
extrema significância como a Semana de Arte Moderna, e recebendo até meados de
1925, um contingente significativo de imigrantes europeus.
O quadro apresentado era de um Estado em grande ritmo de desenvolvimento
que, aos olhos da União, deveria puxar o ritmo das demais entidades federativas
29
através de planos de desenvolvimento compartilhados e visões educacionais
compatíveis.
Diante disso, mais uma vez era necessário recorrer aos aparatos
governamentais, pois atingiriam a todos, com o objetivo de organizar o terreno para o
cumprimento de novas regras que nos levariam a novos objetivos de
desenvolvimento nacional, entre eles, a educação:
A educação passou a ser fator de reconstrução social e à escola foi
atribuído um novo papel em decorrência das novas condições de vida e de
trabalho dos centros urbanizados, com repercussões sobre a política de
formação para o magistério.
Nesse cenário, uma reforma educacional tornou-se evidente. Emergiu nas
regiões mais populosas do País um movimento reformador apoiado nos
princípios liberais da Pedagogia Nova em defesa do indivíduo, da liberdade
de iniciativa e de igualdade perante a lei.(BRZEZINSK, 1996:26)
É neste momento que a educação recebe, pela primeira vez, a
responsabilidade por modificar a sociedade através da conscientização de seus
indivíduos, que a escola começa a ser vista como um aparato importante não
apenas para o desenvolvimento, mas para um desenvolvimento acelerado.
(BRZEZINSKI, 1996).
Também é a primeira vez que a sociedade deposita no compromisso
acadêmico a possibilidade de ascensão social que persistirá durante todo o culo
XX, porém as novas perspectivas que se apresentavam com a valorização da escola
correspondiam às expectativas sociais, havia espaço para todos os profissionais,
30
que era o início da emancipação de uma nova proposta econômica com novas
perspectivas políticas-sociais.
Hoje, esse discurso, apesar de ainda se manter, baseado em questões de
meritocracia e promoção individual, não consegue mais demonstrar seu poder em
grande mero, fazendo das poucas vitórias a regra geral. (BRZEZINSKI, 1996;
PONCE, 2001; MANACORDA, 2004; OLIVEIRA, 2000; ENGUITA,1989; BOURDIEU
2001).
Ambas as colocações feitas anteriormente construção de uma sociedade
desenvolvida e possibilidade de ascensão social através da educação - convergem
para um mesmo ponto: professores formadores.
Imaginava-se que com um bom tutor/professor, seria possível obter cidadãos
conscientes e que firmassem um objetivo de vida, diferente daquele vivenciado pela
maioria da população: trabalhadores braçais imigrantes, ou possuidores de
pequenos estabelecimentos comerciais; as novas propostas eram voltadas para as
áreas administrativas de grandes empresas ou até mesmo do Estado, enquanto
servidores públicos.
Diante deste quadro faz-se necessário questionarmos as condições e
responsabilidades de um profissional da educação como este desejado pela
população, e se de fato o seu papel e a sua identidade a assumir no movimento
31
social estariam atreladas à transformação do ser humano em favor de uma
emancipação econômica social baseada em princípios capitalistas liberais.
Pensar no nível e tipo de consciência desejado, também é preciso, pois isso
influenciaria diretamente no tipo de formação do professor em questão, fosse ela
limitada ou não, e no trabalho que ele desenvolveria com os seus pares a respeito da
organização escolar e aqueles que ela atinge.
Neste período a Associação Brasileira de Educação (ABE), se fortalecia junto
à categoria de professores, não apenas por ter encabeçado inúmeros dos
movimentos por eles realizados, mas também por ter recebido a tarefa de
desenvolver uma proposta pedagógica educacional que visasse unidade educacional
nacional, a qual serviria de base para o encaminhamento de outros projetos
governamentais. (BRZEZINSKI,1996).
Em resposta a esse pedido, compreendeu-se que a forma de se obter unidade
educacional seria através de um profissional em comum que pudesse lidar com as
diversas questões que envolvem o processo educativo: o pedagogo.
Ainda que não houvesse clareza sobre o seu papel e se havia ou não
diferença entre um pedagogo e um professor, duas medidas importantes foram
traçadas: aperfeiçoamento de professores em ensino superior e um curso de preparo
técnico para profissionais não docentes.
32
O primeiro objetivo “aperfeiçoamento de professores em nível superior”
apresentou duas etapas: inicialmente aprovou-se os Decretos 1.750/1920 e
3.356/1921 versando sobre a Faculdade de Educação, mas foi em verdade o
Decreto 5.846/1933 que instituía a transformação da Escola Normal da Capital em
Instituto Pedagógico de São Paulo, o qual mais tarde passou a chamar-se Instituto
de Educação Caetano de Campos, que permaneceu com a tarefa de formar
professores em nível superior.
Ainda que fosse consenso geral concentrar a formação de professores de
séries iniciais em nível secundário, a Universidade de São Paulo, também aventurou-
se na organização de um curso em nível superior parar formação de professores:
Entre as reformas empreendidas nesse período situam-se as que abrangem o
aperfeiçoamento de professores vislumbrando a elevação dos estudos
pedagógicos ao nível superior por iniciativa do poder público. (BRZEZINSKI,
1996:27).
Desta forma a formação de professores se dava em dois níveis diferentes:
superior e secundário; considerando, ainda, que as seções de Educação, atreladas
às Faculdades de Filosofia, eram tidas como inferiores diante dos demais cursos
superiores existentes no país, e este quadro vai de encontro com aquilo que se
esperava da Educação Nacional: o desenvolvimento da nação:
(...) era tida como responsável pela realização do “milagre de reconstrução
política e cultural, senão da nação, pelo menos no Estado de São Paulo”
(FÉTIZON apud BRZEZINSK, 1986:449).
33
Foi através do Decreto-lei n. 1.190 de 4 de abril de 1939, que o Estado se
manifesta sobre a formação de professores, transformando em realidade o sonho
republicano ao reconhecer a existência da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras,
a qual possuía duas formas de ser cursada: rumo às carreiras ligadas às pesquisas
(bacharelado) ou magistério (licenciatura). O famoso esquema “3+1” (BRZEZINSKI,
1996; SILVA, 2003).
Frise-se que o reconhecimento, tardio, da existência da Faculdade de
Filosofia, Ciências e Letras, por parte do Estado, pode ter ocorrido devido ao período
político pelo qual o país passava, com o início da Revolução Constitucionalista
organizada pelo Estado de São Paulo.
A Revolução Constitucionalista deu origem à Constituição de 1934, que tinha
como objetivo maior garantir um Estado Democrático que pudesse oferecer à nação
liberdade, justiça e bem estar social e econômico, mas logo foi substituída pela
Constituição de 1937 outorgada por Getúlio Vargas implementando o Estado Novo,
resguardando-lhe poderes diante do Estado Nação que seu conteúdo era
fortemente centralizador.
Diante destes acontecimentos, nada mais compreensível do que uma pausa
na organização das demais esferas sociais dependentes do fortalecimento e
posicionamento do Estado.
34
Retomando nosso ponto de discussão, no “esquema 3+1”, era possível obter
dois tipos de diploma: aqueles que optassem pelo bacharelado teriam diploma de
bacharel em pedagogia; aqueles que desejassem cursar mais um ano – não
necessariamente apenas bacharéis em pedagogia, mas de qualquer outra área -,
chamado de “curso de didática”, teriam um diploma de licenciados, ressaltando que,
os bacharéis em pedagogia fariam apenas duas das seis disciplinas, pois as demais
poderiam ser eliminadas por equivalência.
Fica claro, portanto, que o “curso de didática” era voltado para bacharéis de
outras áreas que poderiam buscar a licenciatura:
O curso de Pedagogia também foi padronizado com a utilização da simetria
artificial adotada para cursos de bacharelado. O bacharel em pedagogia se
formava técnico em educação, cuja função no mercado de trabalho nunca
foi precisamente definida. A falta de identidade do curso de pedagogia
refletia-se no exercício profissional do pedagogo. (BRZEZINSKI, 1996:44).
Vê-se que durante a história a dificuldade em reconhecer na docência
diversas categorias (professores de séries iniciais, professores de graduação,
professores dos outros níveis escolares, hoje, denominados segunda fase do ensino
fundamental, ensino médio e ensino técnico e profissionalizante), assim como um
outro tipo de ação, também voltada para a docência, mas não necessariamente a
sua prática, e sim, sua supervisão, organização e/ou compreensão das diversas
esferas unidas pela prática docente (professor, aluno, escola, comunidade e
sociedade).
35
Naquele momento, em específico, originava-se um profissional sem área de
atuação específica, por mais que este espaço estivesse garantido, não era preciso,
não era compreendido.
Silva (2003) reforça:
Em sua própria gênese, o curso de pedagogia já revela muito dos
problemas que o acompanharão ao longo do tempo. Criou um bacharel em
pedagogia sem apresentar elementos que pudessem auxiliar na
caracterização desse novo profissional. (p.12)
Aqui nasce a adoção do brocardo jurídico “in eo quod plus est semper inest et
minus” - quem pode o mais, pode o menos (VENOSA, 2005; BRZEZINSKI, 1996),
que qualquer licenciado poderia adotar salas de aula da educação básica, em
específico, as séries iniciais.
Tal premissa perdurará até a organização da LDB 9394/96, com suporte da
ANFOPE (ASSIS e CASTANHO, 2006), por conta da falta das diretrizes para o curso
de Pedagogia que deveriam delimitar estas áreas de trabalho do profissional, o que
veremos num outro momento.
Para o curso dos bacharéis restara um aglomerado de visões gerais de outras
ciências:
Na ausência de conteúdo específico, o Curso de Pedagogia abrangia
generalidades de ciências auxiliares, como a Psicologia, a Sociologia e a
Filosofia. Formava o bacharel em Pedagogia, técnico em Educação, que
não possuía identidade definida e que, em seguida, fazia o curso de
36
Didática, no qual encontrava certa especificidade, tornando-se licenciado
em Pedagogia. (PAPI, 2005:75).
Silva (2003), recorrendo ao texto do Decreto Lei n. 1190/39 coloca que a
tarefa do bacharel:
É a que se refere ao preparo de “trabalhadores intelectuais para o exercício
das altas atividades culturais de ordem desinteressada ou técnica” (artigo 1º
alínea a). Mais adiante, (...) refere-se especialmente ao bacharel em
pedagogia, determinando que, a partir de de janeiro de 1943, houvesse
exigência dessa diplomação para preenchimento dos cargos de técnicos de
educação do Ministério da Educação (artigo 51, alínea c).(p.13)
E continua fazendo um comentário pertinente:
(...) a referência é muito vaga para a identificação de um profissional criado
naquele momento e que não possuía ainda suas funções definidas na
medida em que não dispunha de um campo profissional que o
demandasse. (p.13)
Os professores/pedagogos usamos como sinônimos porque ainda não havia
uma conceituação diferenciada para cada um, eles se confundiam em muitas
atribuições, até hoje se confundem, e nosso trabalho é reconhecer o limiar que os
separa – formavam-se nos cursos pós-normais regularizados apenas em 1939, pelos
possíveis motivos já apontados anteriormente.
E aqui, 65 anos atrás, se inicia a dicotomização entre o
estudioso/cientista/especialista da área de estudo em questão
Pedagogia/Educação - e o professor:
Outro foco de tensão é o relativo à separação bacharelado-licenciatura,
refletindo a nítida concepção dicotômica que orientava o tratamento de dois
componentes do processo pedagógico: o conteúdo e o método.(SILVA,
2003:13).
37
Guardemos esta informação para quando formos tratar da LDB 9394/96, pois
a organização formativa do profissional pedagogo sofre, dentre outras questões
sobre a formação de sua identidade, conflito relacionado com a diferenciação do
trabalho intelectual e de orientação e do trabalho prático exercido em sala de aula.
O não diálogo destas vertentes que, neste momento começam a divergir,
quando em verdade deveriam somar, contribui para um não entendimento entre
profissionais e propostas formativas importantíssimas, pois influenciam diretamente
na forma como a própria categoria se vê e se apresenta.
É na Segunda metade da década de 40, mais especificamente em 1946, com
o Decreto Lei 8.530 de dois de janeiro, que haverá o acirramento da dicotomização
com a nova oficialização das atividades das Escolas Normais, responsáveis por:
1. Promover a formação do pessoal docente necessário às escolas
primárias;
2. Habilitar administradores escolares destinados às mesmas escolas;
3. Desenvolver e propagar os conhecimentos e técnicas relativas à
educação da infância. (ROMANELLI, 2001:164).
Ainda que de forma rudimentar, nota-se entre os itens 1 e 2 acima descritos, a
existência de duas vertentes dentro da área educacional: o profissional responsável
pelo trabalho em sala de aula, mais especificamente voltado para atuação junto a
educação Infantil e primeira fase do ensino fundamental ; e o profissional colaborador
destes outros e da atividade formativa no espaço escolar.
Isto significa que a dicotomia não se restringia ao nível superior, mas também
alcançava o nível secundário criando distinção o apenas dos níveis de formação
38
possíveis na categoria, mas dentro dos próprios níveis, pois apesar de a formação
ser conjunta, dentro do nível secundário, as abordagens eram completamente
distintas professor/administrador- e aquele que exercesse um, não exerceria o
outro e tomaria pra si uma identidade particularizada de seu trabalho e o coletiva
como deve ser a da categoria profissional.
Não bastasse essa diferenciação, ainda que fosse “obrigatória a formação de
pedagogos em quatro anos, incluídos o bacharelado e a licenciatura” onde o quarto
ano destinava-se ao aprimoramento do exercício da docência (MARAFON e
MACHADO, 2005:18), continuaram existindo os cursos normais com duração de três
anos, o que demonstra que a decisão legal adotada o colaborou com a
reorganização, não apenas do sistema educacional e os profissionais responsáveis
por ele, como também com a definição – ou início desta- da categoria em questão:
O ensino normal ficou subdividido em cursos de dois níveis. Como cursos
de ciclo, passava a funcionar o curso de formação de regentes de ensino
primário, com a duração de 4 anos, que funcionaria em escolas com o
nome de Escolas Normais Regionais. Como cursos de ciclo,
continuavam a existir os cursos de formação de professor primário, com a
duração de 3 anos, que funcionariam em estabelecimentos chamados
Escolas Normais. (ROMANELLI, 2001:164)
Estas duas formas de formação, davam conta da necessidade apontada no
item 1 da Lei 8.530/46, indicados anteriormente. Para os itens 2 e 3 da mesma Lei,
havia os Institutos de Educação, que possuíam o mesmo propósito das Escolas
Normais e Escolas Normais Regionais, acrescidos de uma especialização voltada
para Jardim de Infância, Escola Primária os quais ainda não eram reconhecidos
como parte da educação básica - e Administração Escolar (ROMANELLI,2001).
39
Ainda que seja item a ser tratado num próximo capítulo, vê-se a necessidade
de ressaltar que apesar de ter sido feita uma opção por um resgate histórico-
legislativo, não se credita toda a possibilidade de modificação da realidade apenas a
um texto de Lei bem feito e condizente com as necessidades reais da sociedade.
Em verdade acredita-se no diálogo que disponibiliza a obtenção de uma Lei
com a qual a categoria profissional e a educação se identificam, num momento de
busca por melhorias em uma sociedade regida pela sistema jurídico-normativo
(positivo). A existência de normas jurídicas com as quais nos identificamos, é o início
do desenvolvimento de práticas com as quais também nos identificamos. Legitimar
uma prática diante de normas contrárias à ela, torna o caminho ainda mais
complicado e laborioso.
Apenas com o intuito de organizar as diversas formas de obter um certificado
que caracterizava o indivíduo como pedagogo/professor, até aqui, tínhamos:
Bacharel (técnico em educação)
Nível Superior
(4 anos) Licenciado (professor)
Profissional
Escolas Normais Regionais (3 anos)
Nível Secundário Escolas Normais (4 anos)
Institutos de Educação Administradores
Educação Infantil
40
Ainda sobre a Lei colocada anteriormente, vale ressaltar que se antes houve a
necessidade de superar barreiras com relação ao gênero envolvido na atividade
docente, onde as mulheres foram, aos poucos, conquistando seu espaço,
inicialmente de forma pejorativa, que professoras se confundiam com mães; aqui,
na Lei em questão, havia uma colocação em seu artigo 21 sobre a idade do
ingressante no curso, o qual não poderia ser maior de 25 anos:
Esse dispositivo estava, ao nosso ver, em flagrante contradição com o que
criava o curso normal de ciclo e que, segundo cremos, tinha muito mais
razão de existir como curso de habilitação para professores leigos do que
como curso de habilitação para adolescentes de 14 a 15 anos.
(ROMANELLI, 2001:165).
Essa lei, embora fosse rapidamente derrubada por outras tantas que haveriam
de aparecer, deixou inúmeros resquícios sustentados pelas demais, pois atualmente,
os cursos normais, os quais permanecem num limbo, pois sua extinção ou não,
ainda sofre diversos problemas, formou e forma docentes para atuação nas séries
iniciais sem grandes preparos, e o que é pior, sem que reconheçam em seu trabalho
a importância, identidade e característica do profissional que são.
1.2 Momento de consolidação?
Mesmo podendo formar o profissional de educação em pelo menos quatro
âmbitos Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras; Escola Normal; Escola Normal
Regional e Institutos de Educação -, há que se reconhecer:
41
Os cursos de Pedagogia das Faculdades de Filosofia se multiplicaram de
forma bem rápida, absorvendo parte crescente da clientela do ensino
superior, visto que não se exigiam dispendiosas instalações. Entretanto
esse tipo de organização era bastante limitada e problemática tanto no que
se refere à formação quanto à separação entre bacharelado e licenciatura.
(MARAFON e MACHADO, 2005:18).
Se na década de 30 havia 100 matriculados nas Faculdades de Filosofia,
Ciências e Letras, em 1964 este número chegou a 54.908, pelo menos 45.000
matrículas a mais do que o segundo curso mais procurado, que era o de Ciências
Econômicas (ROMANELLI, 2001), Brzezinski acrescenta:
Desde os anos 30 até os anos 60, no Brasil, os estudos pedagógicos em nível
superior, públicos e privados, tiveram uma evolução, via de regra, lenta e
irregular, pois a educação é um dos setores da sociedade no qual os
mecanismos sociais de resistência à mudança atuam com mais intensidade. A
essa resistência acrescenta-se o desprestígio dessa área do saber. (1996:30)
Aparentemente são dados que não se completam, mas em verdade, enquanto
Romanelli nos apresenta uma situação real, numérica, portanto observada através
de pontos quantitativos, Brzezinski nos mostra questões qualitativas.
Para uni-las e entendê-las dentro do mesmo contexto é preciso considerar o
momento histórico, onde o início da década de 60 guardou consigo mudanças no
seio econômico da sociedade que havia conquistado espaço democrático com o
término da Segunda Guerra Mundial, mas que o perdera facilmente para uma nova
organização autoritária desenvolvimentista, o que pedia gama diversificada de
profissionais, enfatizando a predominância da técnica por querer e precisar afastar a
população de atividades questionadoras como as tarefas intelectuais.
42
Instaurava-se o regime militar no Brasil, com o objetivo de fortalecer a
educação pública de acordo com os objetivos da nova governança, e,
consequentemente, interferir na forma de organização educacional formativa.
Período no qual depositar-se-á grande confiança nas legislações emitidas como uma
das formas de controle e justificativa do abuso de poder de coerção do Estado.
Relembrando os números anteriormente apontados, imagina-se que o mesmo
número de matriculados, será o de formados, não exatamente o mesmo pois
que se considerar desistentes, aqueles que foram em busca de tulos e todas as
variáveis possíveis - mas o número seria próximo disso, o que nos leva a crer que, a
partir de então a necessidade de se ter professores de séries iniciais seria,
rapidamente, sanada de forma que todos os professores fossem formados e
estariam, de uma certa forma, aptos para o desenvolvimento de um trabalho
educativo de qualidade.
Porém trata-se apenas de uma avaliação quantitativa do assunto, pois quando
partimos para uma avaliação também qualitativa, Florestam Fernandes (apud
ROMANELLI, 2001:124) demonstra que “sobre 4.149 professores registrados no
Ministério da Educação para o exercício do magistério secundário, somente 724
eram portadores de diplomas da Faculdade de Filosofia”. Onde é que estavam os
professores formados, então? De onde surgiram estes professores sem formação
acadêmica para tal atividade?
43
Romanelli apontou, como já referimos, que o público feminino na categoria, os
portadores do diploma não ligavam para o exercício da carreira docente.
Assim o Brasil, mais uma vez, se apóia em mão de obra desqualificada,
causando um ciclo de destruição da educação; pois se os formadores de formadores
não tinham know how para estarem ali, que tipo de professores formavam? E são
estes professores despreparados, por conta de sua formação inicial, que assumem
as salas de aula, e acompanham seus alunos no ensino primário de forma a fazer
com que eles também não saiam dali devidamente preparados para seguir adiante.
A desqualificação da mão de obra docente não se dava apenas no âmbito
profissional, pois sua ignorância acerca do processo formativo, colaborava com o
novo sistema de governo, alastrando a ignorância para as outras vertentes sociais,
considerando todas as ações do Estado como saudáveis, necessárias e
emancipadoras, que a escola ainda carregava consigo o dever de instruir a
população proporcionando-lhe ascensão social objetivando o desenvolvimento da
nação.
Ter uma escola com corpo docente alienado, é utilizar aparato governamental
forte para alastrar a alienação e reproduzir uma sociedade alienada.
Depois destes acontecimentos surgiram ainda seis grandes legislações
modificadoras dos direcionamentos de formação de professores: A primeira LDBEN
4024/61; os Pareceres do CFE (Conselho Federal de Educação) 251/62 e 252/69; a
44
Lei 5692/71, a última LDBEN 9394/96 e o Parecer do CNE/CP Nº1/06 que institui as
Diretrizes Curriculares para o Curso de Pedagogia, licenciatura.
A primeira LDBEN Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 4.024,
promulgada em 20 de dezembro de 1961, causou tantos impactos quantos possíveis
nas categorias envolvidas, desde ser encarada como uma carta de libertação até o
reconhecimento de que não passava de um instrumento legal mal formalizado.
Essa legislação cooperou com alguns avanços gerais educacionais, sem
muitas modificações diante do que as reformas anteriores tinham proposto, mas
procurando organizar administrativamente, dentro do contexto governamental que se
fortalecia, a possibilidade de existir flexibilidade curricular de acordo com recursos
humanos e materiais de cada localidade, o que impedia a possibilidade de implantar,
ou até mesmo idealizar, um sistema nacional educacional unificado:
A lei de Diretrizes e Bases que acabava de ser votada refletia
exatamente essa situação. Foi uma oportunidade com que contou a
sociedade brasileira para organizar seu sistema de ensino, pelo
menos em aspecto formal, de acordo com o que reivindicava o
momento, em termos de desenvolvimento. Foi a oportunidade que a
nação perdeu de criar um modelo de sistema educacional que
pudesse inserir-se no sistema geral de produção do país, em
consonância com os progressos sociais alcançados. Ocorreu,
porém, que as heranças não cultural, como também a das formas
de ação política foram suficientemente fortes para impedir que se
criasse o sistema de que carecíamos. O horizonte cultural do nosso
homem médio, sobretudo do nosso político, ainda limitava a sua
compreensão da educação, como um fator de desenvolvimento e
como requisito básico para a vigência do regime
democrático.(ROMANELLI, 2001:183).
45
Atentando-nos para a frase final da citação de Romanelli e adiantando um
pouco a nossa discussão sobre a identidade do pedagogo, como percebemos,
perdida, sem espaço e sem suporte algum (recursos humanos, culturais,
financeiros...), poderíamos nos questionar quem seria o responsável por essa
amarração entre a necessidade do país, a situação atual do mesmo e as
possibilidades de trabalho num âmbito educacional que alcance a todos de maneira
a colaborar em todos os níveis com o desenvolvimento de um raciocínio coerente e
alerta sobre o crescimento de uma nação.
como certeza, de que o responsável, é o pedagogo munido de todas as
outras informações e colaborações das outras tantas ciências que existem, pois
enquanto estudioso da Ciência Educação estaria apto para compreender, não
apenas, a amplitude do processo de ensinagem (ANASTASIOU,2004), como
também das inúmeras relações complexas envolvidas no/com o mesmo, já que
existe uma rede dialógica dinâmica envolvendo sociedade e indivíduos, onde a
educação é responsável por “promover a ‘inteligência geral’ apta a referir-se ao
complexo, ao contexto, de modo multidimensional e dentro da concepção global”
(MORIN, 2003:39).
Desta forma, não apenas questões culturais e ações ou omissões políticas
seriam responsáveis pela perda da oportunidade de se organizar um sistema
educacional singular que respeitasse as particularidades de cada região e que,
dentro destas particularidades tratasse de um conhecimento universal válido em todo
e qualquer lugar, como aponta Romanelli, mas também e principalmente a falta de
46
profissionais que compreendessem como dar este primeiro passo e criar um
momento de reflexão e planejamento considerando todas as questões acima
apontadas (situação atual, necessidades futuras e recursos disponíveis).
A primeira LDB, foi um marco educacional que não correspondeu às
expectativas práticas da época, preocupou-se mais em conciliar duas grandes
correntes educacionais a de pensamento liberal
3
e a de proprietários de escola -
mas colaborou com o surgimento de outros suportes que poderiam, podem e devem
ser usados no futuro, como os Conselhos de Educação.
Com relação à formação de professores e pedagogos, a Lei propôs, portanto,
nada além das ações amplas universalmente adotadas, mantendo-a, principalmente,
no Ensino Médio que englobava o ginásio, não modificando em nada, o que vinha
ocorrendo há 30 anos, apenas regularizando dentro de uma ordem jurídica como era
o objetivo do novo regime de governo; ordem, a qual, legitimava tanto a atuação de
professores formados e não formados:
Acontece que, nas Disposições Transitórias, os artigos 115 e 116 faziam
concessões a professores não-formados em razão do insuficiente número
de habilitados para atuar na escola primária e de nível médio. Isso confirma
que o órgão competente aludido, no Art. 61, concedia o registro do
profissional formado e não formado, oficializando a descaracterização
profissional do professor. Assim, o próprio Estado promovia a
desvalorização dos profissionais e propugnava a permanência de leigos na
escola. Ademais, o legislador ultrapassou os limites de concessão e
desvalorizou o preparo do professor em cursos formais, regulares e
especializados, ao instituir a habilitação para o exercício do magistério por
meio de exames de suficiência. (BRZEZINSKI, 1996:53).
3
Na época, os conhecidos e chamados “liberais” eram aqueles que, hoje, conhecemos como progressistas,
defendendo o fortalecimento da escola pública. (ROMANELLI, 2001).
47
A prática e compreensão acerca da docência trinta anos antes da
promulgação da primeira LDBEN, reafirmava uma ação de um século, como vimos
no texto corrente, que a Corte Real encontrou como solução a autorização da
realização de exames de suficiência para admissão de professores para as escolas,
haja vista que existiam as vagas mas não quem as preenchesse.
Desta forma fica nítido que o problema, após aproximadamente 150 anos,
ainda não havia sido resolvido: necessidade de professores somado à criação de
espaço de formação sem resultar em mão de obra, fosse ela qualificada ou não, pois
não se encontravam estes profissionais em lugar algum.
Ainda que pareça um pensamento linear, que se reconhecer a existência
de um embate político existente desde a cada de 30 estendendo-se à cada de
60, passando por processo de construção social complicado e conturbado, haja vista
as disputas de Estado e manobras da União.
Onde estavam, então, estes profissionais? Uma das respostas continua ainda
no comentário feito por Romanelli e transcrito aqui, sobre a procura do curso sem
objetivo de exercer a profissão, mas sim abrilhantar o status social daquele que
recorreu à faculdade de Pedagogia, os demais comentários seriam apenas
especulações sobre questões mui particulares que não cabem e nem colaboram com
a nossa reflexão.
48
que se frisar também a interferência que estes procedimentos legais
causam na construção da identidade do profissional, pois descaracterizar o espaço
do mesmo aceitando qualquer tipo de indivíduo oriundo das mais diversas áreas de
trabalho cria um espaço multifuncional e multicultural sem utilização da riqueza de
saberes para um fim específico.
Está claro que o objetivo é lecionar, mas “o que”, “como”, “por que” e “para
quem” serão perguntas respondidas de formas diferentes, sem diálogo entre si e
compreensão do alicerce que deveria conduzir as reflexões acerca das mesmas,
pois a organização do trabalho docente será falho, já que não existe espaço para ele
(LÜDKE, 2001).
Note-se, portanto, que a falta de clareza sobre o trabalho do pedagogo não
afeta apenas a categoria profissional, sua manutenção e questões exclusivas do
profissional discutido, a incerteza sobre ele vai além, recai, diretamente, no sistema
educacional por dois viéses: mau preparo dos alunos na primeira fase do ensino
fundamental, o que acarreta dificuldades de formação no processo educativo até o
Ensino Superior; má orientação estrutural e organizacional do sistema educacional.
Não saber quem é e o que faz um pedagogo, é não saber quem é e para que
serve a educação, de maneira que ela fique, sempre, nas mãos daqueles que usam
deste poder para dominar um grupo a serviço da reprodução de um sistema
desumano e autodestrutivo (MÉSZÁROS, 2003a).
49
Interpretando o livro de Silva (2003) e concordando com sua organização e
apresentação, mais importante que a primeira LDBEN para o curso de Pedagogia,
que ali foi criado, é o parecer do Conselho Federal de Educação (CFE) n.251/62,
escrito por Valnir Chagas que, aliás, foi responsável pela organização e escrita de
muitas legislações voltadas para a educação -, pois manteve a graduação com
inúmeras ressalvas, inclusive a possibilidade de extinção do curso:
Explica que a idéia da extinção provinha da acusação de que faltava ao
curso conteúdo próprio, na medida em que a formação do professor
primário deveria se dar ao nível superior e a de técnicos em educação em
estudos posteriores ao da graduação. Considerando a validade de tal idéia
apenas para o futuro, uma vez que a formação de professores primários em
curso secundário era uma solução avançada para a época, Valnir
Chagas trata então de fixar currículo mínimo e a duração do curso de
pedagogia. (SILVA, 2003:15).
O curso de Pedagogia era visto, portanto, como algo provisório, a que se
pudesse transferir a formação de professores para o Ensino Superior e não mais se
desse no Ensino Médio. Mantinha-se o esquema “3+1” porém indicando o fim de sua
existência.
Sendo assim, continuávamos sem delineamento claro do profissional, não
fosse pela nomenclatura utilizada no parecer referindo-se à categoria como “técnico”
e “especialista” em educação, onde a característica marcante do pedagogo seria sua
responsabilidade acerca da administração escolar.
Podemos afirmar que esta ênfase dada ao bacharel tratou de criar uma
atmosfera sob sua possível identidade profissional, possibilitando clarear a diferença
50
entre as atividades docentes professor, fosse ele responsável pelas ries iniciais
ou pela formação em nível de Ensino Médio - e não docentes técnico/especialista
em educação o que influenciaria a reorganização do curso no parecer 252/69 do
CFE. Lembrando, ainda, que a denominação “técnico” veio com as novas propostas
de desenvolvimento social no início da década de 60, sobrepondo-se à ela a
denominação “especialista” que fora obra da Reforma Universitária. (BRZEZINSKI,
1996).
Ainda que valesse pela possibilidade de proporcionar momento de reflexão
sobre a categoria é preciso considerar que:
(...) o interessante é apontar que os legisladores trataram a questão do
curso de pedagogia começando por onde, muito provavelmente, deveriam
ter terminado, ou seja, fixaram um currículo mínimo visando a formação de
um profissional ao qual se referem vagamente e sem considerar a
existência ou não de um campo de trabalho que o demandasse. (SILVA,
2003:15).
Duas questões que se comentar sobre a citação anterior; a primeira delas
diz respeito ao fato de que, perder-se com relação à função de uma determinada
profissão e legislar sobre a mesma originam dissabores nos mais diversos âmbitos,
e, durante sete anos, promovendo a formação de inúmeras turmas, o parecer 251/62
foi executado, oferecendo para a educação, profissionais, os quais, além de não
terem espaço delimitado para sua atuação, também o faziam idéia sobre a
mesma, mas nem por isso deixaram de reivindicar, constantemente, seu espaço
junto aos órgãos competentes, pressionando-os para regulamentar cargos e
promover concursos públicos. Período que inflamou a existência de fóruns estudantis
que debatessem o assunto.(BRZEZINSK, 1996).
51
A dificuldade de estabelecer diálogo com os órgãos competentes era algo
muito presente na época, ainda que o golpe não tivesse se efetivado, a troca de
governantes (Juscelino Kubstischek nio Quadros João Goulart ) originava
ambiente de incertezas e tensão. A manifestação estudantil encontrava muitos
obstáculos que haveriam de se multiplicar com o passar do tempo.
A segunda, porém não menos importante, é com relação ao currículo, assunto
que se fez presente em outros momentos deste trabalho e que merece uma
atenção especial, que é através dele que se passam, ou deveriam ser passadas,
as questões que permeiam ou permeariam, a formação da identidade profissional do
pedagogo.
É em sala de aula em contato com seus professores/formadores e vivenciando
problemáticas de estágios supervisionados que se abre a possibilidade de discussão
acerca do papel do pedagogo nos mais diversos âmbitos.
Marafon (2001), em obra, fruto de sua pesquisa para obtenção do título de
mestre, nos demonstra a importância desses estágios na formação do profissional,
onde a construção de conhecimento sobre uma pedagogia crítica é o foco principal,
levando os alunos a compreenderem o papel da educação e, assim, encontrarem o
seu lugar de atuação de maneira consciente, reconhecendo no processo do trabalho
pedagógico a dialética da práxis formativa e de atuação.
52
Bondia (2001) também nos chama a atenção para a experiência, não apenas
a valorização do saber dela, mas a vivência da mesma, importante para o conhecer
sobre determinado assunto.
Por conta disso a montagem de um currículo consciente que preveja a gama
de variações de atuação, é importante inclusive para que não se pense que a criação
de um curso de pedagogia voltado para determinada área recreação, indústria,
EJA (Educação de Jovens e Adultos),... possa contornar certos impasses, quando,
na verdade, deixa de prover o aluno com um saber amplo que poderia auxiliar,
futuramente, na escolha de uma pós-graduação para aprofundar-se sobre um tema
qualquer voltado para a área.
Um currículo que zelasse pela construção de uma consciência da necessidade
de uma visão consistente do processo formativo, seria o ideal e estaria de acordo
com as reivindicações dos estudantes.
Infelizmente fica nítido que a legislação veio, somente, para dizer ter tratado
do assunto pendente, não que fosse, caso de acordo com as necessidades reais,
sanar os problemas existentes, mas pelo menos daria respaldo para estas ações.
Está claro que não é possível reconhecer o profissional formado sem avaliar
sobre quais aspectos ele se formou, mas nosso objetivo neste trabalho não é discutir
o currículo de formação do pedagogo, mas sim delinear questões que devem estar
presentes no momento de construção do curso, por tanto, estamos num momento
53
anterior, e deixamos como possibilidade a idéia de que alguém pense e pesquise
sobre que tipo de currículo contemplaria aquilo que aqui foi discutido.
Ainda assim não poderíamos deixar de relevar o assunto pois, como é
possível notar, a questão identitária da profissão é não apenas externa fatores
históricos que atingem a categoria -, mas também endógena, o que nos leva direto à
construção do curso e suas opções curriculares, construindo, dependendo das
tendências do momento vivido, uma imagem para o pedagogo. Imagens importantes,
pois nos demonstram a evolução do pensamento acerca desse profissional e sua
área de trabalho.
Frisa-se, então, que o parecer 251/62, além de reafirmar a LDBEN/61,
fazendo com que permaneça o currículo mínimo de formação de bacharéis,
regulamenta as licenciaturas em geral, as quais passam a ter, dentro de seus
currículos, disciplinas voltadas para atuação docente.
Pouco tempo depois, como se sabe, veio o Golpe Militar em 1964, e a
proposta de governo que tal grupo trazia consigo visava inúmeras modificações e
regulamentações, especialmente na parte educacional.
Apresentando para a sociedade a Lei 5540/68 Lei da Reforma Universitária,
fez-se um movimento de entrelace direto das carreiras profissionais com os cursos
de ensino superior a serem oferecidos:
54
(...) críticos passaram a chamar de universidade tecnocrática, ainda que
mesclada com nuanças do pensamento liberal. Daí a subordinação dos
cursos superiores às exigências da sociedade, (...) acentuando então a
relação entre os cursos superiores e as profissões. (SILVA, 2003:25).
Além disso, pesquisa e ensino começaram a dividir o mesmo espaço, pois um
dos novos princípios diz respeito à eficiência e produtividade, seguindo o exemplo
dos avanços tecnológicos no exterior, baseados em uma política de investimento na
área da pesquisa.
É no parecer 252/69 do Conselho Federal de Educação que a Lei da Reforma
Universitária se faz presente no curso de Pedagogia, não apenas delimitando a
profissão e o tipo de profissional que se terá formado no curso, como também se
baseando nas necessidades do presente momento para indicar quais habilitações
deveriam ser apresentadas, que o esquema “3+1” onde era possível ter tanto
bacharel como licenciado formado – é extinto dando espaço para, a princípio, formar-
se o bacharel em Faculdade própria:
A Reforma Universitária institui algumas alterações, sendo talvez a mais
importante a extinção da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, modelo
da década de 1930, passando a responsabilidade do Curso de Pedagogia
para a recém criada Faculdade de Educação. (MARAFON e MACHADO,
2005:19)
Como colocado anteriormente, a visão do pedagogo como um
especialista/técnico em educação permanece e dita a organização da formação,
que a nova proposta é a formulação de um curso com dois momentos distintos: um
que apresente uma base comum de estudos, pois se considera o setor educacional
como um todo; e um segundo momento que visa atender as habilitações específicas,
55
oriundas de ramificações a partir da base comum citada; são elas: orientação
escolar, administração escolar, supervisão escolar e inspeção escolar, considerando,
ainda, que independentemente da habilitação escolhida existia a possibilidade e o
consentimento de que esses profissionais também fossem professores dos cursos
normais.
Desta forma, é possível notar que o curso de Pedagogia voltou-se para
questões administrativas, funcionais e teórico-metodológicas, um pouco distantes da
docência a o ser pela possível prática do magistério nos cursos normais - local
onde ainda eram formados os professores das primeira e segunda fase do ensino
fundamental –, o que forçava a presença da disciplina “didática” em todas as grades
das habilitações, apresentando três argumentos para tal ação:
Três argumentos são utilizados para justificar a inclusão da didática como
matéria da parte comum: ela se identifica com o ato de ensinar para o qual
as outras matérias convergem; todos poderão lecionar, nos cursos normais,
as disciplinas de suas habilitações específicas e, por fim, considerou-se
que, invariavelmente, as universidades e escolas isoladas a vinham
incluindo em seus currículos plenos. (SILVA, 2003:27).
Nota-se que a tendência de considerar a docência como base da Pedagogia
se mantém, ainda que tenha sido banida de sua área de origem - no ensino das
primeiras letras se faz presente, de maneira que num determinado momento o
mesmo relator do parecer 252/69 Valnir Chagas -, atendendo a pedidos da
comunidade da categoria, encaminha pedido para que se obtenha, não apenas o
diploma de licenciado, mas peça-se, como requisito, o exercício do magistério para
exercer a orientação escolar.
56
Todas estas novas colocações saíram em Diário Oficial, no Parecer do
Conselho Federal de Educação número 867/72.
A existência de estágio supervisionado obrigatório surgiu no Parecer 252/69,
exigindo vivência da especialidade que se buscava com determinada habilitação, o
que influenciou na existência de estágio até hoje em todas as licenciaturas, e, como
apontamos anteriormente, é uma prática essencial para colaboração da reflexão do
trabalho pedagógico, seja ele docente ou não.
Finalizando este olhar sobre o Parecer 252/69, há que se considerar que havia
uma preocupação com relação à emissão de diploma do curso, que apesar de
apresentar várias habilitações, emitia apenas um certificado, inicialmente de
bacharel.
Mas com a aprovação do plenário e reforço do parecer 867/72, passou a ser
de licenciatura atendendo mais às questões legais, pois antes que isso fosse
oficializado recorriam, novamente, ao uso do brocardo jurídico “in eo quod plus est
semper inest et minus” - quem pode o mais, pode o menos (VENOSA, 2005;
BRZEZINSKI, 1996; SILVA, 2003):
Entretanto, do ponto de vista técnico, reconhece pertinência da questão,
pois nem todos dos que se diplomam em pedagogia recebem a formação
indispensável ao exercício do magistério primário. Considerando parecer
prematura a criação de uma habilitação especial para esse fim, fixa alguns
estudos para a aquisição desse direito. (...) Assim sendo, essa nova
credencial poderá ser obtida automaticamente pelos que se preparam ao
ensino de tais disciplinas em cursos normais, ou por acréscimos aos que se
57
habilitaram nas demais modalidades que não essa; podem ser incluídos,
neste último caso, os diplomados em cursos de menor duração, os quais
passam a ser considerados os candidatos ideais para iniciar essa nova
fase. (SILVA, 2003:32).
Diante disso que se pensar em duas questões: recorrer ao brocardo ainda
que haja legislação clara sobre o assunto; minimizar a educação das séries iniciais a
um par de semestres com disciplinas específicas voltadas para um grupo em
especial, apesar de abranger-se para todos.
Pela segunda vez, e veremos que não será a última, a categoria em questão
recorreu ao brocardo jurídico para manter vínculo direto com a docência, não apenas
em nível normal, mas também e principalmente nas séries iniciais – já que não havia
tal prática prevista nas possíveis habilitações -.
Ainda que estivesse claro que a identidade assumida pelos legisladores fosse
voltada para o trabalho técnico relacionado com a estrutura educacional e não o
exercício da educação em sua origem primeira (docência), nota-se certo
descompasso com a visão que os profissionais tinham de si mesmos e com relação
à organização lógica do processo formativo.
Ora, se um profissional, Pedagogo, poderia lecionar em cursos normais,
orientando os futuros formadores das séries iniciais, como não poderiam eles –
pedagogos - realizarem prática a qual ensinavam?
58
Sem dúvida que o uso do brocardo tornava-se legítimo e pertinente, pois é de
consenso que apenas ensinamos o que sabemos, ou ainda, na troca da experiência
no processo de ensinagem, professor e aluno construam, juntos, um saber sobre
determinado objeto, e ainda assim, não apenas o aluno, mas também o professor,
estariam aptos a realizar a tarefa, o apenas um ou outro. Veremos, mais adiante,
que esta incoerência persistirá.
O segundo ponto, em verdade é um apontamento, não apenas voltado para a
forma como se encontrou de inserir a docência nas séries iniciais nos currículos
universitários, mas com relação ao tratamento das habilitações em geral, acerca da
idéia de ramificação da Pedagogia em áreas diversas com conteúdos específicos e
estágios supervisionados que garantissem vivências voltadas para um determinado
fim.
Mesmo que o parecer 252/69 tenha mencionado a possibilidade de se obter
as habilitações em nível de pós-graduação (SILVA, 2003), assumir a ramificação em
nível de graduação foi consenso não apenas legislativo, mas também social, o que
sabemos, não sofre influência apenas de um raciocínio e preocupações sobre o bem
estar do profissional, mas principalmente do retorno lucrativo financeiro e temporal
que as universidades teriam, ainda que o montante de IESs Instituições de Ensino
Superior – fosse baixo se comparado com o que temos hoje.
4
4
O fim da década de 70 e início da década de 80 ficam marcados pela decadência do ensino público
e fortalecimento da educação privada, que atinge, diretamente, a organização do Ensino Superior e o
surgimento de universidades e faculdades particulares. (ROMANELLI, 2001).
59
Considerando, como foi exposto no início desse trabalho, que a Pedagogia é a
Ciência Educação, é fato que existe um cleo em comum de trabalho, básico,
inerente a qualquer especialidade que se queira obter na pedagogia, porém deveria
ser considerado dentro deste contexto comum a generalidade das especialidades,
isto é, possibilitar na graduação espaço de diálogo entre as inúmeras habilitações.
Desta forma procuraríamos garantir a permanência do conhecimento global
que envolve a ciência, possibilitando ter um aluno apto para realizar uma escolha
consciente e dialógica com a dos demais pares.
É claro que usamos de novas tecnologias para construir esse raciocínio, as
quais ainda estavam avançando na época, porém a colocação é pertinente, a partir
do momento em que mais de trinta anos depois, quando vigorará a LDBEN 9394/96,
e período no qual manteve-se o Parecer 252/69, o raciocínio permanece o mesmo,
reproduzindo os mesmos problemas de antes.
Qualquer área do conhecimento que envolva a Ciência da Educação, clamará
por estudo constante, e por isso, modificações constantes.
Isso não significa que devamos emitir um parecer ou portaria a cada maneira
nova de entender o processo formativo do pedagogo ou de qualquer outro
profissional.
60
Além de haver controvérsias sobre o papel que ele deve desempenhar ou
desempenha o que trataremos com maior propriedade num outro momento –, e
ser,a legislação, uma forma de conquistar espaço para transformações pertinentes,
tal atitude seria impossível de se controlar, mas chama a atenção para o cuidado ao
minimizar uma infinidade de estudos, em um par de semestres, trazendo a falsa idéia
de que se está pronto, acabado.
A situação do momento em questão era a seguinte: Extinguiu-se a Faculdade
de Filosofia, Ciências e Letras, dando espaço para a Faculdade de Educação que,
entre outras funções, englobava e cuidava do curso de Pedagogia, responsável por
formar, inicialmente, o bacharel e o professor dos cursos normais – que continuavam
na mesma organização apontada anteriormente -, mas que através de uso de
brocardo jurídico e legislação pertinente, habilitava também para a licenciatura,
acrescentando algumas disciplinas específicas.
Encerrando a discussão sobre esse momento, cabe a colocação de Papi
(2005):
(...) Parecer do CFE 251/1962 e Parecer do CFE 252/1969, pode-se
observar uma certa indefinição sobre a função do curso, que ora foi
destinado a formar bacharéis, ora licenciados, ora especialistas e
professores para a etapa inicial da escolarização. (PAPI, 2005:77).
A Lei 5692/71 que alguns, erroneamente denominam “segunda LDBEN”,
formada por onze artigos, procura desestabelecer a organização formativa
61
estruturada nas leis anteriores, com o objetivo de garantir a boa educação em
qualquer parte do país, superando as diferenças regionais adequando-se a elas.
Quanto àqueles que pretendem seguir a carreira de magistério temos, ainda,
inúmeras maneiras de fazê-lo:
Art. 30. Exigir-se-á como formação mínima para o exercício do magistério:
a) no ensino de grau, da à séries, habilitação específica de 2ºgrau;
b) no ensino de grau, da à séries, habilitação específica de grau
superior, ao nível de graduação, representada por licenciatura de 1o grau,
obtida em curso de curta duração;
c) em todo o ensino de 1º e 2º graus, habilitação específica obtida em curso
superior de graduação correspondente a licenciatura plena.
§ Os professores a que se refere a letra "a" poderão lecionar na e
séries do ensino de grau se a sua habilitação houver sido obtida em
quatro séries ou, quando em três, mediante estudos adicionais
correspondentes a um ano letivo que incluirão, quando for o caso, formação
pedagógica.
§ Os professores a que se refere a letra "b" poderão alcançar, no
exercício do magistério, a série do ensino de grau mediante estudos
adicionais correspondentes no mínimo a um ano letivo.
§ Os estudos adicionais referidos aos parágrafos anteriores poderão ser
objeto de aproveitamento em cursos ulteriores.
(...) Art. 33 A formação de administradores, planejadores, orientadores
inspetores, supervisores e demais especialistas de educação será feita em
curso superior de graduação, com duração plena ou curta, ou de pós-
graduação. (BRASIL, Lei 5.692/71).
Sendo assim, agora, não apenas a graduação e os cursos normais tratarão da
formação do pedagogo, como também a pós-graduação e anos acrescidos nas
demais formações adquiridas durante a vida acadêmica, prejudicando, desta forma,
o processo de formação de professores, pois além de dicotomizar seu trabalho com
o do especialista manutenção da proposta da LDB anterior -, permite que pessoas
de outras áreas possam realizar os cursos de curta duração para docência sem
compreender o processo formativo – educação enquanto ciência -.
62
Ainda que não fosse uma legislação específica para a formação de
professores, interfere diretamente neste assunto pois visa melhorar a educação
básica nacional e entende que os assuntos estão interligados, dedicando, assim, um
capítulo exclusivo para a categoria profissional em questão.
Analisando o Capítulo V que trata dos professores e especialistas, é possível
reconhecer que a redação é um tanto quanto confusa, pois mescla assuntos
formativos com Direito do Trabalho; talvez seja por isso, também, que pouco material
é encontrado que tenha se prendido à discussão desta Lei, pois os autores
costumam ignorá-la, ou apenas citá-la, sem muito aprofundamento.
A interpretação da Lei pode ser realizada de diversas formas: gramática (ipisis
literis); histórica; teleológica interpretação político-jurídica, observando a finalidade
da norma - e lógico-sistemática – método mais completo de interpretação, pois
analisa a norma dentro do ordenamento jurídico – (SILVA, 2002).
Está claro que a interpretação gramatical da Lei 5.692/71 é insuficiente para
compreender seu propósito, pois como comentamos anteriormente, seu texto é
confuso e mal organizado, logo é preciso recorrer à interpretação histórica e,
conseqüentemente procurar compreender sua teleologia.
A Lei da Reforma de Ensino (5.692/71), vem com o propósito de reorganizar
os, na época, chamados e graus, colocando o curso de Pedagogia e seus
profissionais a serviço destas necessidades e objetivos apontados na legislação
63
(SILVA, 2003; ROMANELLI, 2001) os quais influenciaram a promulgação de vários
outros pareceres do Conselho Federal de Educação organizando os profissionais
oriundos deste curso:
Do conjunto de documentos legais então elaborados, a indicação CFE n.
22/73 é a que justifica a iniciativa e traça as normas gerais a serem
seguidas em todos os cursos de licenciatura. Das três ordens de
licenciatura previstas por ela, a referente às áreas pedagógicas é a que diz
respeito ao que possa ser de interesse para os propósitos deste estudo. É a
indicação CFE n. 67/75 que prescreve a orientação básica a ser seguida
nessas áreas, as quais deveriam ter se consubstanciado em quatro outras
indicações: a indicação CFE n. 68/75, que redefine a formação pedagógica
das licenciaturas; a indicação CFE n. 70/76, que regulamenta o preparo de
especialistas e professores de educação; a indicação CFE n. 71/76, que
regulamenta a formação superior de professores para a educação especial;
a indicação prevista, mas não encaminhada, que deveria regulamentar a
formação, em nível superior, do professor dos anos iniciais da
escolarização, compreendendo aí, também, a pré-escola. (SILVA, 2003:58).
Desta forma, percebemos que, se a Lei da Reforma de Ensino não tratou com
propriedade da categoria professor/pedagogo, influenciou diretamente na orientação
de legislações que assim o fizessem, de maneira que atingisse também as
licenciaturas, revisse a organização do curso de pedagogia e o que se destinava a
formar e trata, pela primeira vez, da categoria de professores da educação especial
que também faz parte da discussão sobre a identidade do Pedagogo.
Helena de Freitas assim justifica a gama de legislações que interferem na
organização da formação de professores e pedagogos:
As reformas educativas levadas a efeito em nosso país e nos outros países
da América Latina desde o final da década de 1970, com o objetivo de
adequar o sistema educacional ao processo de reestruturação produtiva e
aos novos rumos do Estado, vêm reafirmando a centralidade da formão
dos profissionais da educação. Nesse contexto, debatem-se diferentes
propostas para a formação, fundadas em projetos políticos e perspectivas
históricas diferenciadas, o que faz com que a formação desses profissionais
64
seja tratada ou como elemento impulsionador e realizador dessas reformas,
ou como elemento que cria condições para a transformação da própria
escola, da educação e da sociedade. (FREITAS, 1999: 17-8).
Se a LDBEN 4.024/61 tratou de eliminar o esquema “3+1”, onde algumas
habilitações distintas poderiam ser realizadas neste um ano de acréscimo, o parecer
do CFE n. 70/76 trouxe a possibilidade da diversidade de habilitações direção,
coordenação, orientação, professor do normal e supervisão -, dentre elas um
profissional que estudasse fundamentos e questões metodológicas da Educação.
Silva (2003), sobre esse período, aponta dois fatores interessantes, um deles
com relação aos propósitos iniciais de Valnir Chagas em 1962 e sua atuação diante
da Lei 5.692/71, colaborando com a execução dos outros pareceres citados aqui,
nos mostrando ações que convergem e divergem nos mais diversos pontos.
Convergências e divergências as quais se relacionam, principalmente, com
relação à extinção ou não do curso de pedagogia, segundo fator levantado pela
autora que, se observado de ângulos diferentes poderia apresentar tanto uma
resposta positiva, quanto uma resposta negativa.
Compreender que o administrador é uma profissão diferente da do
coordenador, que são diferentes das do supervisor, do professor de séries iniciais, do
professor de normal e do estudioso da educação e organizar os cursos da Faculdade
de Educação desta maneira, chamando de curso de Pedagogia aquele voltado para
profissionais com, no mínimo, dois anos de atuação no magistério e que se interesse
65
pelos estudos da Ciência da Educação, fez com que se extinguisse o propósito inicial
do curso de Pedagogia –docência e orientação –.
Cria-se uma atmosfera de dúvida com relação ao curso e a categoria. Desta
forma a identidade do profissional em questão começa a ser discutida:
Foi assim que o professor Valnir fez aflorar o impasse até então subjacente
ao desenvolvimento do curso de pedagogia no Brasil: o da identidade do
pedagogo e do próprio curso de pedagogia. Esse impasse emergiu
justamente pelo impacto que suas idéias provocaram no ambiente
universitário, na medida em que, contraditoriamente, define a identidade do
pedagogo a partir da extinção do curso de pedagogia enquanto tal. E pode-
se adicionar a isso a idéia de em termos de futuro remeter a
possibilidade de formão do pedagogo apenas na pós-graduação. (SILVA,
2003:61).
Notamos, então, que a finalidade da lei, dentro do contexto histórico colocar
a formação de professores/pedagogos a serviço da própria Educação - acabou
saindo do controle de certa forma, pois desencadeou ações que visavam
possibilidade de melhoria, mas numa perspectiva diferente da dos diretamente
atingidos por ela, afastando-nos cada vez mais do propósito inicial: busca da
identidade do pedagogo e consolidação do curso de Pedagogia.
Falar numa possível interpretação lógico–sistemática seria extremamente
ousado, que apesar de as legislações educacionais fazerem parte de um ramo do
ordenamento jurídico, não estão organizadas desta forma, é um conglomerado de
leis, pareceres e portarias que se completam e se repelem, constantemente, - como
vimos no estudo desenvolvido até então -.
66
Sem dúvida é um dos fatores que contribuem para a permanência da não
caracterização da categoria aqui discutida, pois a organização social, dentro de uma
sociedade regida pelo sistema positivado de legislação, deve esperar as
coordenadas legais para atuar frente à sociedade; logo, se temos um sistema
legislativo do ramo, desorganizado, consequentemente atingirá, profundamente, a
matéria prática sobre a qual versam.
Fazendo essa leitura sobre o momento, e compreendendo que a legislação
não estava de acordo com a realidade, tampouco considerava o interesse da classe
que atingia, Marafon e Machado (2005) concluem:
No final da década de 1970, como resposta às várias tentativas oficiais de
reformulação do curso de Pedagogia, os educadores organizaram-se,
nacionalmente, para fazer frente às ameaças de extinção do curso de
Pedagogia proposta pelos Pareceres 67/75 e 68/75 e 70/76 e 71/76 de
autoria do Prof. Valnir Chagas, reafirmando-o como espaço necessário para
o estudo dos problemas educacionais brasileiros e debatendo alternativas
para torna-lo mais adequado às necessidades da maioria da população, em
sua luta pela educação e pela escola pública. Essas movimentações foram
de suma importância, de tal sorte que perduram até os dias de hoje.
(pg.19).
Neste momento, a categoria profissional se faz mais presente do que até
então se mostrou, pois se organiza de forma a acompanhar todas as construções
legislativas, incentivando a produção do debate e do conhecimento também sobre
esses assuntos acerca da identidade e espaço profissionais.
A intensidade foi tamanha que Silva (apud Papi, 2005:79) se dirige a ele
como “período das propostas”. Aqui surge o hábito que educadores têm de realizar,
67
com constância, congressos e encontros de qualidade, que mantêm em contato
grandes pensadores da área com novos participantes, haja vista a ANPED
Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação -, que com seus
grupos de trabalho (GTs), possui freqüentadores fiéis, presentes desde a primeira
reunião até os dias de hoje, onde o encontro realiza sua 30ª edição.
Com relação ao debate da identidade do pedagogo e sua categoria de
trabalho, no contexto nacional, temos a ANFOPE Associação Nacional pela
Formação dos Profissionais da Educação -, inicialmente denominada CONARCFE
Comissão Nacional de Reformulação dos Cursos de Formação dos Educadores -,
que o propósito inicial era a movimentação contrária sobre a possível extinção do
curso de Pedagogia. (BRZEZINSKI, 1996)
O trabalho se organizou ao longo do tempo de maneira que a Comissão se
tornasse uma Associação, presente ahoje nos debates sobre o assunto, e a qual
resgataremos pois teve participação efetiva na cobrança e realização da proposta
das Diretrizes para o curso de Pedagogia. (MARAFON e MACHADO, 2005; PAPI,
2005; BRZEZINSKI, 1996):
As concepções que orientam tais mudanças vêm sendo questionadas ao
serem confrontadas com a produção teórica e prática da área educacional e
do movimento dos educadores que, desde o final dos anos 70, com o
processo de democratização da sociedade, passa a colocar novas
exigências para a melhoria da escola básica e para a formação de
professores. A Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da
Educação (Anfope) que se organiza a partir de 1983 como Comissão
Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação (Conarcfe) –, no
movimento de reformulação dos cursos de formação do educador, vem
contribuindo com essa discussão, construindo coletivamente uma
concepção sócio-histórica de educador em contraposição ao caráter
tecnicista e conteudista que tem caracterizado as políticas de formação de
professores para a escola básica em nosso país. Ela tem, na concepção de
68
base comum nacional, em oposição à concepção de currículo mínimo, o
instrumento que marca a resistência às políticas de aligeiramento,
fragilização e degradação da formação e da profissão do
magistério.(FREITAS, 1999:18-9).
Vale ressaltar, também, que Brzezinski (1996) dedicou um capítulo inteiro de
seu livro “Pedagogia, Pedagogos e Formação de Professores”, para tratar do
“movimento social de educadores e o curso de pedagogia” (BREZEZINSKI, 1996:81),
relatando os encontros realizados pela ANFOPE e outras tantas comissões e
associações montadas para assuntos e debates específicos, os quais giravam em
torno da identidade e formação do profissional apontado, demonstrando, ao longo do
texto, que, apesar de poucas vitórias, num espaço extenso de tempo, a significação
delas é grandiosa.
Interessante notar e apontar, também, que o percurso realizado para
demonstrar a trajetória, envolve muito os âmbitos legislativos, como os Conselhos
Federal e Estaduais de Educação, o MEC –Ministério da Educação e da Cultura -,
atual ME Ministério da Educação -, e o diálogo que se estabelecia ou se tentava
estabelecer com eles, configurando, ou não, uma direção legislativa pertinente e
condizente com a realidade.
Retomando a frase dita no parágrafo anterior: “a significação delas é
grandiosa”, pode ser melhor explicada por Silva (2003):
A documentação daí resultante constitui importante fonte de referência a
respeito da questão da identidade do pedagogo e do curso de pedagogia. É
necessário, porém, que tais documentos sejam reconhecidos na dinâmica
ocorrida no interior do próprio movimento.
69
(...)
Na verdade, se foi no contexto dos debates realizados no interior do
movimento das entidades acadêmicas que importantes indicações para
revisão dos cursos puderam ser construídas coletivamente, foi também no
interior desse moroso processo que a consciência quanto à complexidade
do trato da área pedagógica emergiu com maior nitidez. E, mais uma vez, o
impasse sobre a questão da identidade do pedagogo e do próprio curso de
pedagogia pode ser identificado como o ponto nevrálgico da questão. Os
documentos gerados no interior do movimento não deixam dúvida sobre a
questão.(pgs. 62 e 65).
Não que o problema da identidade do pedagogo começasse a ser resolvido a
partir do momento em que as discussões se fizeram mais presentes, muito pelo
contrário, quanto mais se debatia o assunto, outras tantas questões pertinentes e
com pensamentos divergentes surgiam, o que exigia amadurecimento por parte de
todos sobre a questão levantada, levando-os a mais encontros, e mais pesquisas, e
mais congressos e mais debates.
A categoria compreendeu que delimitar a identidade do profissional iria além
da assunção de uma gama de características próprias, isso influenciaria diretamente
no sistema educacional como um todo, na maneira como seria pensado o currículo
de formação e na postura adotada diante de questões teórico-epistemológicas
pertinentes à pedagogia e à formação de professores.
Infelizmente, paralelamente aos debates, nada acontecia no âmbito legal, e
desta forma, durante aproximadamente 25 anos, até a promulgação da Lei 9394/96,
prevaleceram as legislações apontadas anteriormente que procuravam convergir o
curso da Pedagogia e a Faculdade de Educação para os propósitos do
desenvolvimento da educação pública básica, que se encontrava num período de
70
decadência no início da década de 80, pois acompanhou o processo de deterioração
do regime militar, legalizado pela Constituição de 1967. (ROMANELLI, 2001).
71
CAPÍTULO II
LDBEN 9394/96:
A REALIDADE MAIS PRÓXIMA DE NÓS.
Título II: Dos princípios e Fins da Educação Nacional: (...)
II- liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura,
o pensamento, a arte e o saber;III- pluralismo de idéias e de concepções
pedagógicas; (...) VII: valorização dos profissionais da educação.
(LDBEN 9394/96 apud SAVIANI, 2003:163-64).
2.1 Reconhecendo a Lei.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9.394 de 20 de dezembro
de 1996, não é diretamente voltada para a categoria de professores e pedagogos,
assim como as demais.
Reserva, sim, um Título da Lei, o IV, para tratar “Dos profissionais da
Educação”, procurando reorganizar o que ora não parecia muito bem delimitado,
como vimos anteriormente, mas que também acabou não colaborando com o
impasse identitário existente como veremos a seguir.
Mas, além disso, se torna muito importante por ter sido fruto da iniciativa de
todos aqueles movimentos que afloraram no início da década de 70, acompanhado
de luta constante para a promulgação da Lei, embora pouco do que os educadores
produziram tenha sido, de fato, utilizado no texto da legislação, que sofreu, pelo
menos, três grandes modificações antes de ser publicada em D.O. - Diário Oficial -.
(SAVIANI, 2003).
72
Desta forma, parafraseando Helena de Freitas: “A aprovação da nova LDB,
em dezembro de 1996, representou o marco da institucionalização de políticas
educacionais que vinham sendo gestadas e implantadas pelo MEC” (FREITAS,
1999: 19-20).
Surgindo a LDBEN 9394/96, ocorreu uma “limpeza” legislativa com a
revogação de todas as outras leis que a ela fossem contrárias. Obedeceu a Lei de
Introdução ao Código Civil (LICC), mais especificamente seu artigo 2º, parágrafo 1º:
Art. Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que
outra a modifique ou revogue.
§ A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare,
quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria
de que tratava a lei anterior.(LICC apud ACQUAVIVA, 2005:111)
No caso da Educação, dificilmente se prorrogaria uma lei com vigência
temporária. Normalmente portarias, pareceres e decretos é que delimitam seu
próprio tempo.
Sendo assim, apenas o § 1º do artigo da LICC é que nos interessa e, que,
durante todo o processo histórico, como verificamos, ocorreu com grande freqüência,
prejudicando, em demasia, o trabalho, não apenas ligado à formação de formadores
e especialistas, mas do circuito educacional como um todo.
73
A nova LDBEN é organizada de acordo com a lógica normativa, característica
que comentamos não ter a Lei da Reforma de Ensino 5692/71, tampouco as
anteriores; porém, constantes adendos a ela foram feitos, não obedecem tal
raciocínio, o que nos faz pensar sobre a forma como esses documentos são
elaborados, questionando se há, de fato, preocupação com a ordem normativa,
necessária para garantir a tão falada “base comum nacional”.
Em primeiro lugar, antes que qualquer adendo ou revogação fosse feito à
qualquer parte que nos interesse, no momento, da Lei 9394/96, os artigos mais
importantes são os seguintes:
Art. 62 - A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á
em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em
universidades e institutos superiores de educação, admitida, como
formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nas
quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio,
na modalidade Normal.
Art. 63 - Os institutos superiores de educação manterão:
I cursos formadores de profissionais para a educação básica, inclusive o
curso normal superior, destinado à formação de docentes para a educação
infantil e para as primeiras séries do ensino fundamental;
II programas de formação pedagógica para portadores de diplomas de
educação superior que queiram se dedicar à educação básica;
III programas de educação continuada para os profissionais de educação
dos diversos níveis.
Art. 64- A formação de profissionais de educação para administração,
planejamento, inspeção, supervisão e orientação educacional para a
educação básica, será feita em cursos de graduação em pedagogia ou em
nível de pós-graduação, a critério da instituição de ensino, garantida, nesta
formação a base comum nacional.(LDBEN 9394/96 apud SAVIANI, 2003:181-
2).
74
Realizando uma análise do texto anteriormente exposto, temos que no 62º
artigo, apesar de não eliminar as possibilidades de formação em três níveis –
superior, normal e normal superior numa pluralidade institucional universidades,
institutos superiores e ensino dio -, acaba cedendo à idéia de que a docência
enquanto trabalho direcionado para a educação básica, especificamente a educação
infantil e as séries iniciais do ensino fundamental, é uma licenciatura, porém não a
denomina ramo de trabalho do pedagogo, tampouco a declara segmento do curso de
Pedagogia, mas por motivos óbvios a atrelamos à Faculdade de Educação.
Se a formação docente para o nível acima explicitado, fosse restrita àqueles
que procurassem cursar a graduação plena, como coloca o artigo 62, haveríamos de
ter eliminado a possibilidade de formação combinada, como delibera o artigo 63 em
seus incisos II e III, possibilitando programas de formação pedagógica ou formação
continuada para aqueles que tiverem envolvimento com a área de educação em
qualquer nível ou ramificação, outras licenciaturas, por exemplo.
Desta forma, não apenas resgatou-se a idéia da Lei 4.024/61, de proporcionar
formas de obter habilitação para a docência para aqueles que não haviam cursado,
originalmente, o curso de Pedagogia, como se ignorou toda a discussão feita acerca
da existência de uma categoria responsável pela formação da criança no contexto
educacional.
Ora, poderia não ser consenso a base da formação do pedagogo e sua
identidade, mas está claro que a atribuição da atividade formativa pertence aos
75
professores das séries iniciais. Não vemos um enfermeiro realizando um programa
de formação diferenciado para tornar-se médico; caso assim o deseje, deve recorrer
ao curso todo, desde o processo seletivo, até a conclusão do mesmo, obtendo
registro no CRM - Conselho Regional de Medicina - de seu estado.
Porém, é no artigo 64 que a Lei procura especificar quem é o pedagogo, que
tipo de profissionais são formados nos cursos de Pedagogia, mas com uma
dubiedade textual, que indica serem os profissionais da educação voltados para a
administração, o planejamento, a inspeção e a supervisão da educação básica os
formados nesta faculdade em nível de graduação ou de pós-graduação, ficando a
critério da instituição de ensino, em que nível colocará estas habilitações; logo,
infere-se que, o curso de Pedagogia - graduação - pode formar, também, outro
profissional, como o docente das séries iniciais e educação infantil.
Diante deste cenário, que se parece muito com os anteriores, mas apresenta
legislação um pouco mais clara e sem compilações, alguns questionamentos a
serem feitos.
O primeiro deles diz respeito à garantia da “base comum nacional” a que o
legislador se refere no final da frase que compõe o artigo 64.
Como garantir tal base se as possibilidades de formação dos profissionais da
educação são extremamente amplas e diversas, considerando, também, o fato de as
diretrizes para a organização curricular do curso, terem surgido apenas em 2006; e a
76
questão da diversidade regional, conseqüentemente, cultural, social e econômica
em nosso país?
O conteúdo da formulação da base comum nacional é um instrumento de
luta e resistência contra a degradação da profissão do magistério,
permitindo a organizão e reivindicação de políticas de profissionalização
que garantam a igualdade de condições de formação. É ainda um elemento
unificador da profissão, ao defender que a docência é a base da formação
de todos os profissionais da educação, pois permite assumir com
radicalidade, ainda hoje, nas condições postas para a formação de
professores (...) (FREITAS, 1999: 31).
Helena Freitas tem o cuidado de tratar cada um dos seis princípios que
compõem a justificativa da necessidade e riqueza da existência e defesa de uma
base comum nacional, que são: proporcionar sólida formação teórica e
interdisciplinar; unidade entre teoria e prática, acabando com a dicotomia do
educador tarefeiro e educador pensador; visão de gestão democrática; assunção de
compromisso social e político; visão de trabalho coletivo e interdisciplinar; formação
inicial articulada com a formação continuada. (FREITAS, 1999).
Sem clareza acerca da identidade do profissional, não se faz diretriz coerente,
não se tem grade curricular bem definida, logo, não se alcança “base comum
nacional”, pois para que assim seja, é preciso ter um ponto em comum, para dele
saírem propostas específicas para os campos isolados (MOREIRA e SILVA, 2002).
A diversidade, para ser respeitada, deve guardar contato com a igualdade;
para que ações específicas sejam desenvolvidas procurando alcançar um objetivo
comum, o lugar de onde saem, o núcleo, deve ser comum também.
77
Outra questão que o é novidade, e permaneceu por todo o processo
histórico percorrido pela categoria dos pedagogos/professores, é: Como formar um
orientador, supervisor, inspetor, planejador, administrador ou diretor educacionais,
atividades que orientam e decidem sobre a docência, sem que eles passem pela
experiência docente?
Ora, como ensinar e nortear o trabalho de um professor, se o orientador desse
trabalho, não compreende o processo formativo que permeia o trabalho docente?
Isso fez com que o uso do brocardo, exaustivamente falado por nós nesse
trabalho, continuasse sendo pertinente; claro, é óbvio que aquele que supervisiona o
trabalho de alguém, deve poder realizar esse trabalho, o ordenamento jurídico cuida
desta lacuna com a aplicação do princípio, mas a formação de tal profissional
permanece falha.
O formado passou pela conclusão do curso, recebeu a titulação e a
habilitação, mas o seu currículo contemplou, apenas, questões administrativas e
teórico-metodológicas não específicas, mas que tratassem da Ciência da Educação,
o que quando e se tratada, dificilmente com olhar apurado para a docência a qual
fora, erroneamente, desmembrada da formação do profissional.
Hoje, quando falamos em professores de séries iniciais nos referimos a duas
áreas de atuação docente: aquela ligada à Educação Infantil e a outra relativa ao
primeiro e segundo ciclos do Ensino Fundamental (1ª a séries Ensino
78
Fundamental dependerá da nomenclatura utilizada por cada escola). A formação
destes profissionais, como vimos, se através do Magistério Normal -, do Normal
Superior, de cursos Universitários, ou ainda por programas de formação pedagógica
em casos especiais. (SAVIANI, 2003; MARAFON e MACHADO, 2005).
Os cursos de Magistério ou Normal, modalidade educacional a ser oferecida
em nível Médio, estão apenas terminando de formar suas últimas turmas para então
serem dados como extintos, devido à resolução CNE/CP 1/2002 do então Ministro
da Educação e da Cultura, Cristóvam Buarque, que dispõe sobre a reformulação e,
portanto, revogação como explicitado anteriormente, do artigo 62, do Título VI da
LDBEN 9394/96, pois instituiu novas Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Formação de Professores da Educação Básica, esta sendo exclusivamente obtida
em nível superior, nos cursos de licenciatura ou de graduação plena, retirando a
possibilidade de ser oferecida em nível médio, na modalidade Normal ou
Magistério -.
Sendo assim, a primeira iniciativa de finalizar com a formação precoce do
professor, foi realizada, procurando concentrar toda ela em nível Superior.
Por conta desta resolução as Instituições de Ensino Superior (IES) e
Universidades, as últimas, as quais anteriormente optavam por oferecer o curso de
Pedagogia, com duração de, no mínimo, quatro anos, e com habilitações variadas
o que trataremos a seguir - , começaram a promover os cursos Normais Superiores,
com duração de três anos divididos em duas modalidades: Formação de Professores
79
para as séries iniciais do Ensino Fundamental e Formação de Professores para
Educação Infantil.
Tais cursos, em alguns institutos e universidades, acrescidos de uma
especialização na área de administração escolar, proporcionam habilitação para
coordenação, orientação, supervisão e/ou direção educacionais; ou ainda o caso dos
programas de formação pedagógica, voltados para aqueles que têm diploma de
Ensino Superior e gostariam de se dedicar à Educação Básica (Art. 63, inciso II,
LDBEN 9394/96).
Os programas normalmente são oferecidos pelas Universidades públicas, pois
se trata de manobra governamental com o intuito de suprir a carência de operadores
da educação (diretores e coordenadores apenas, quando falamos do Estado de São
Paulo, pois a existência do cargo de orientador educacional não é exigida no estado)
os quais devem ter, por lei (Art. 67, § único da LDBEN 9394/96) algumas horas de
trabalho dentro de sala de aula para se candidatarem aos cargos administrativos
existentes no sistema estadual e municipal de ensino.
Reconhecendo a importância do assunto e do fato de nos dispormos a discutir
um pouco mais sobre esta postura não apenas normativa, mas também estrutural,
recorremos ao que está disposto, na LDBEN, ainda no título VI quando trata do artigo
67º:
80
Art. 67 Os sistemas de ensino promoverão a valorização dos profissionais da
educação, assegurando-lhes, inclusive nos termos dos estatutos e dos
planos de carreira do magistério público:
I – ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos;
II – aperfeiçoamento profissional continuado, inclusive com licenciamento
periódico remunerado para esse fim;
III – piso salarial profissional;
IV – progressão funcional baseada na titulação ou habilitação, e na avaliação
do desempenho;
V – período reservado a estudos, planejamento e avaliação, incluído na
carga horária de trabalho;
VI – condições adequadas de trabalho.
Parágrafo único A experiência docente é pré-requisito para o exercício
profissional de quaisquer outras funções de magistério, nos termos das
normas de cada sistema de ensino.(LDBEN 9394/96 apud
SAVIANI,2003:182)
O que nos interessa deste artigo é o texto inicial , o inciso IV e o parágrafo
único, pois são eles que delimitam a necessidade de se ter a docência como pré-
requisito para atuar profissionalmente em qualquer outra área pedagógica
administrativa seja ela por concurso (parágrafo único) ou ainda por progressão
funcional (inciso IV).
Ora, soa-nos um tanto quanto contraditório exigir um certo período de
experiência docente para ocupar um cargo pedagógico administrativo se, em
concomitância, é possível formar o especialista em educação aquele que tem
habilitação para dirigir, coordenar, supervisionar e orientar sem licença para
lecionar.
Um dos aspectos a serem levantados por conta desta contradição é resgatar o
que foi colocado acima sobre a carência de profissionais da área administrativa na
rede, pois os formados em Pedagogia sem habilitação para docência jamais terão a
81
possibilidade de ingressar na carreira pública, a não ser que se proponham a realizar
outro curso, no caso, o normal superior, um reverso dentro da categoria; ou ainda
travem uma batalha legislativa munindo-se do brocardo jurídico para atuar.
Desta forma, licenciados em outras áreas, que não apenas as de docência em
séries iniciais, acabam participando de especializações ou programas pedagógicos
para ganharem a habilitação para trabalhar com as áreas administrativas do
especialista em educação e poderem concorrer às vagas do Estado.
Os cursos de Pedagogia, ficam, então, como última instância, tanto para a
formação de docentes para ries iniciais e educação infantil, quanto para formação
do profissional de educação, já que os ISEs tentam dar conta da formação do
especialista e do docente com cursos e programas de formação rápida.
As Instituições Universitárias, diante de todas estas emendas normativas
institucionais, começam a sofrer, com constância, reformulações curriculares e
estruturais, com o objetivo de atender a pouca parcela de alunos que,
desinformados, buscam a formação plena do pedagogo (docente e especialista), ou
então apenas a formação docente, mas se decepcionam ao saber que poderiam
concluí-la não em quatro, mas em três anos nos ISEs.
Cada Universidade montou o curso de Pedagogia que melhor lhe aprouve e
esta atitude, causada pelo próprio Estado, vai contra uma de suas propostas no final
82
do artigo 64 da LDBEN, questionada e discutida por nós, que é manter uma “base
comum nacional” de formação. (KUENZER, 2001).
Desta forma, o curso de Pedagogia, apenas oferecido por Universidades e
não por Institutos Superiores de Ensino, por se tratar, historicamente, de uma
licenciatura, acaba sendo reduzido a um curso de bacharelado, sem sucesso, pois
não procura por um curso de quatro anos, que habilita para tratar de questões
administrativas pedagógicas sem práticas docentes.
Competências administrativas as quais poderiam ser obtidas em uma
especialização ou num programa pedagógico, caso o/a interessada houvesse
concluído o Curso Normal Superior, em qualquer uma das áreas de docência
séries iniciais ou educação infantil - ou ainda tivesse um curso superior qualquer.
Em agosto de 2004 a ANFOPE (Associação Nacional pela Formação dos
Profissionais da Educação), lançou um documento final de seu XII Encontro
Nacional, que trata das Políticas Públicas de Formação dos Profissionais da
Educação questionando exatamente esta descaracterização do Curso de Pedagogia:
O que se questiona é a descaracterização do Curso de Pedagogia enquanto
licenciatura, tentando colocá-lo como um bacharelado, uma vez que a atual
legislação determina que todos os professores para a Educação Básica sejam
formados nos ISEs. (ANFOPE, 2004:25).
83
Desta forma temos uma dicotomização da formação do profissional da
educação - e aqui entende-se por profissional da educação aquele que tem
formação docente e administrativa na área em questão - a qual acaba dando vazão
para a existência de três, como coloca a ANFOPE, modalidades formativas
desconexas: Licenciaturas (ISEs e Universidades que optaram por oferecê-las),
Bacharelado Profissionalizante (complementação em Cursos de Especialização e
Programas de Formação Pedagógica para aqueles concluintes dos Normais nos
ISEs e Universidades), e o Bacharelado Acadêmico (Curso de Pedagogia).
Além da compartimentalização formativa do pedagogo, vemos que uma área,
citada na LDBEN no artigo 62, não se faz presente no meio destas vertentes, que
seria a graduação plena, a qual daria subsídios para formar o pedagogo enquanto
docente e administrador escolar.
Esta formação plena acaba desaparecendo do meio acadêmico por inúmeros
fatores envolvidos na dinâmica da formação retalhada do profissional da educação
diretamente relacionada às novas exigências do mercado de trabalho e às
orientações do Ministério da Educação. (KUENZER, 2001)
Uma delas seria pelo fator “tempo”. Não procura por um curso pleno já que
o aluno pode cursar um Normal Superior, obter um diploma de graduação e seguir
adiante procurando uma especialização na área de administração escolar, obtendo
assim, em quatro anos, um diploma universitário mais um título de especialista;
84
enquanto que, num curso de graduação plena ele obteria apenas o diploma com, no
mínimo, quatro anos de estudo.
Outra seria com relação à lucratividade das universidades e instituições
superiores de ensino particulares, responsáveis por grande parte da oferta de Cursos
Normais Superiores e especializações nas áreas de administração escolar.
Os ISEs ficam encarregados de oferecer o Normal Superior com duração de
três anos e podem abrir um curso de especialização na área de administração
escolar. Isto lhes proporciona uma vantagem financeira sobre as universidades, pois
oferecem em menos tempo, pelo mesmo, ou amenor preço, o diploma de docente
para o aluno interessado, devido às mudanças no mundo do trabalho, em se formar
cada vez mais rápido ( KUENZER: 2001). Voltando-se para a área de formação de
professores, Freitas salienta:
A recente regulamentação dos Institutos Superiores de Educação, pelo
Parecer n
o
115/99 da Câmara de Ensino Superior do CNE, deixa clara a
concepção de formação de professores que permeia as propostas atuais,
ao estabelecer que a preparação dos profissionais para atuar na educação
básica se dará fundamentalmente em uma instituição de ensino de caráter
técnico-profissional. (FREITAS, 1999: 20-1).
Sendo assim, as universidades podem optar por oferecer, também, o Normal
Superior ao invés do curso de Pedagogia, pois estariam aptos a competir com os
ISEs em questões financeiras, sem grandes preocupações formativas. Esta ação é
também regularizada pelo Estado, através do Decreto 2.032/97:
85
O decreto estabelece que as Instituições de Ensino Superior podem
assumir diferentes formatos: universidades, centros universitários,
faculdades integradas, faculdades e institutos superiores ou escolas
superiores. Com essas distinções, e mantendo-se a exigência da pesquisa
apenas nas universidades, institucionaliza-se a distinção entre
universidades de ensino e universidades de pesquisa, mantida no Plano
Nacional de Educação elaborado pelo relator da Comissão de Educação e
Cultura, reservando para os Institutos Superiores de Educação, uma
instituição de quinta categoria, segundo a própria hierarquização formulada
pelo MEC para as IES, a formação dos quadros do magistério. (FREITAS,
1999: 20)
Os alunos vivem a necessidade de enfrentar o mercado de trabalho o quanto
antes, o qual exige agora, não mais uma formação padronizada, mas sim uma
dinamicidade e pluralidade de conteúdos e habilidades.(KUENZER, 2001).
Desta forma, sem muito o que refletir, tomam a decisão por cursar os normais
e realizar, depois, uma especialização, seja ela na área de psicopedagogia,
administração escolar, educação infantil caso tenha optado por séries iniciais na
graduação -, alfabetização, educação de jovens e adultos,... sendo condizente com
a necessidade de formação a curto prazo e diferenciada – com a especialização.
Estas manobras financeiras e temporais é claro, não se dão apenas ao bel
prazer das instituições, mas têm apoio do Estado que a cada momento, usa de seu
poder normativo legislativo para confundir a formação. Percebemos isto com mais
clareza quando Kuenzer nos coloca:
O Edital 04/97 da Secretaria de Ensino Superior do MEC, que convocou as
instituições de ensino superior (IES) a apresentarem propostas para as
Diretrizes Curriculares que seriam sistematizadas pelas Comissões de
Especialistas, contempla estas e outras dimensões, estimulando a formação
86
geral como estratégia para enfrentar a dinamicidade das mudanças no
mundo do trabalho; ao mesmo tempo propôs a flexibilização dos percursos
com estratégias de empregabilidade, defendendo, no limite, a possibilidade
de ‘cada curso ser um percurso’, ou seja, nenhuma uniformidade. Essa
flexibilização livra as instituições de ensino superior do engessamento
decorrente dos currículos mínimos, de modo a assegurar ‘ampla
liberdade’na composição da carga horária a ser cumprida para a
integralização de cada curso. Ou seja, a fixação de conteúdos e carga
horária é evitada ao máximo. Se ainda assim a carga horária tiver que ser
fixada, ela não poderá exceder a 50% da carga horária total. Ao mesmo
tempo, a orientação do MEC contempla um enxugamento dos cursos,
devendo-se evitar o seu ‘prolongamento desnecessário’.(KUENZER,
2001:20)
Desta citação tiramos quatro pontos relevantes para abordar a precariedade
da formação do profissional de educação em específico.
O primeiro deles diz respeito à “formação geral como estratégia para enfrentar
a dinamicidade das mudanças no mundo do trabalho (KUENZER, 2001:20). Não
seria esta “formação geral” algo completamente contrário ao que se faz com a
fragmentação das áreas de atuação do pedagogo?
Seria muito mais vantajoso, em se tratando de questões educacionais, termos
profissionais com formação plena em que o docente compreenderia o trabalho do
especialista e vice versa, que se fala tanto em organização de Projeto Político
Pedagógico em conjunto, incluindo toda a comunidade escolar.
Neste caso, falar em formação geral é equivocado, pois trata-se de pincelar
assuntos e não recorrer às questões epistemológicas que os envolvem, como deve
ser a formação do formador.
87
Em segundo lugar: “‘cada curso ser um percurso’, ou seja, nenhuma
uniformidade” (KUENZER, 2001:20), e o que demanda o artigo 64 quando chama a
atenção para uma “base comum nacional” de formação?
Se a possibilidade de cada curso organizar, da maneira que acredita ser
melhor lembrando que este “melhor” inclui pensar em recursos financeiros,
materiais e humanos, dificilmente será atingida uma base comum nacional. Na
verdade, dependendo do local de formação de cada aluno, este secompreendido
com um tipo de profissional determinado, o que está ocorrendo quando se fala em
dois tipos de bacharelado e uma licenciatura descontextualizada.
Num resgate histórico acerca do surgimento da “base comum nacional”,
vemos que a idéia veio justamente para contrapor a formação do pedagogo como
especialista sem habilitação docente e também para criticar a idéia de um currículo
mínimo. Isso ocorreu em 1983, em Belo Horizonte, no I Encontro da Comissão
Nacional dos Cursos de Formação do Educador:
A base Comum Nacional dos Cursos de Formação de Educadores não deve
ser concebida como um currículo mínimo ou um elenco de disciplinas, e sim
como uma concepção básica de formão do educador e a definição de um
corpo de conhecimento fundamental e (...) a docência constitui a base da
identidade profissional de todo educador. (Documento Final do I Encontro
Nacional apud BRZEZINSKI,1996:172)
Considerando que vinte e dois anos se passaram, ainda continuamos lutando
pelos mesmos motivos, pois apesar de muitas vitórias terem sido conquistadas,
ainda assim aqueles que são responsáveis pelo ordenamento nacional, portanto,
88
com poder político e jurídico de decisão, continuam criando artifícios para cercear a
possibilidade de construirmos uma educação forte, com formadores de qualidade.
Ter o conhecimento é ter também poder e não interessa para um governo de
minorias, com bases neoliberais, ter um povo consciente, informado.
Além da fragmentação formativa, das características muito particulares de
cada curso não para a originalidade emancipatória, mas para a diversidade
negativa, isto é, cada curso enfatiza o que acredita ser mais importante em
detrimento da universalidade do conhecimento –há ainda uma flexibilidade
exagerada na carga horária fixada (“a fixação de conteúdos e carga horária é evitada
ao máximo. Se ainda assim a carga horária tiver que ser fixada, ela não poderá
exceder a 50% da carga horária total” - KUENZER,2001:20), a qual poderá ser
reposta por atividades extra-curriculares nem sempre de qualidade e realmente
relevantes para a formação do aluno em questão.
E como seo bastasse, considerar que, numa era onde o conhecimento tem
avançado de forma descontrolada, dinâmica, veloz, acumulando-se nas estantes de
bibliotecas e mega-bookstores, é necessário evitar “prolongamento desnecessário”
da formação profissional, se, hoje em dia, um dos maiores desafios dos professores
universitários é dar conta de uma imensidade de conteúdos em um tempo
curtíssimo, fazendo com que informação transforme-se em conteúdo formativo de
qualidade (BONDIA, 2001).
89
Os Cursos de Pedagogia estão correndo o risco de exclusão, fragmentação,
descaracterização e até de extinção, por conta desta banalização dos cursos de
formação do pedagogo em Instituições de Ensino Superior, que a Lei permite sua
redução:
Esse rebaixamento das exigências em vários níveis corpo docente, carga
horária –, aliado às pressões dos sistemas de ensino estaduais e
municipais para a qualificação de seus docentes até 2007, em cumprimento
à LDB e na ausência de política de expansão qualificada do Ensino
Superior público, que demandaria maior volume de recursos financeiros,
tem causado a proliferação de cursos de 1.600 horas e a criação de
numerosas instituições privadas que se beneficiam dessas condições
"ideais" para seu crescimento e expansão, nem sempre com a qualidade
necessária. (FREITAS, 1999: 22).
Percebe-se, também, que não apenas um descaso com a formação do
profissional em questão, mas com a Educação em si.
Ora, priorizar questões econômicas e de celeridade, voltadas para o mercado
de trabalho, e só ele, é renegar todos os princípios que permeiam a Educação.
Priorizar, a obtenção de capital cultural institucionalizado em detrimento de
capital cultural incorporado (BOURDIEU, 2001), é uma das medidas de manutenção
do sistema capitalista neo-liberal pra se fazer presente dentro, não só da escola, mas
das salas de aula e em cada um dos participantes do processo educativo,
procurando sustentar sua lógica de alienação desumanizante (BOURDIEU, 2001;
MÉSZÁROS, 2003a).
90
Formar, a partir de uma estrutura deformada resulta em deformação dos
demais envolvidos alunos, em especial -, logo, reprodução do sistema, o que
significa reprodução da impotência humana diante do capital; da pobreza cultural e
econômica; da autodestruição...(MÉSZÁROS, 2003a e 2003b).
Por fim, é preciso reconhecer, no meio acadêmico e, principalmente, em meio
às políticas públicas voltadas para a organização das Diretrizes do Curso de
Pedagogia assunto que será, também, discutido neste trabalho que, a formação
do pedagogo envolve todas as três dimensões citadas durante o texto educação
infantil; educação de 1ª a 4ª série; administração escolar -, e que cabe ao profissional
decidir-se, após formação na graduação, por qual área pretende dar maior relevância
em sua vida profissional, pois assim teria maturidade suficiente para fazer sua
escolha e compreender o contexto no qual se encontra.
A ANFOPE sempre defendeu que:
para se tornar pedagogo, este profissional deve ter a docência como eixo
de sua formação, tendo claro, porém que a pedagogia não se esgota na
formação docente. Vai além em termos de referencial e profundidade
teórica.
(...)
Cabe-nos, portanto, ressaltar que, se o Curso Normal Superior também
forma professores para atuar na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do
Ensino Fundamental, o Curso de Pedagogia forma o pedagogo, profissional
da Educação que entende do fenômeno educativo de maneira profunda e
que poderá atuar também para além dessa docência em outros espaços e
funções educativas” (ANFOPE,2004:25).
E, mais uma vez, o que o documento da ANFOPE realiza nada mais é do que
recorrer ao brocardo jurídico, isto é, a uma verdade jurídica evidente: “in eo quod
91
plus est semper inest et minus” (quem pode o mais, pode o menos VENOSA,
2005).
Logo, se é permitido à Universidade oferecer o Curso de Pedagogia que
forma, no entendimento atual, coordenadores, diretores, supervisores e orientadores
de professores de ries iniciais e educação infantil, pode também e deve, habilitá-
los para a docência nos mesmos níveis educacionais, descaracterizando-o como um
curso de Bacharelado.
Agora, ficaremos, até quando, solucionando as lacunas legislativas com
brocardos? Como podemos direcionar a organização legislativa de forma que não
sane, apenas, necessidades organizacionais, mas também formativas?
2.2 Tecendo relações: Nossas necessidades.
Falar de formação de pedagogos implica falar em formação de professores,
mesmo que a idéia que se tem de pedagogo o seja aquela diretamente vinculada
com a docência, pois tal profissional estará, sempre, atrelado à categoria de
professores, seja colaborando com a organização e coordenação dos trabalhos dos
demais profissionais, seja assumindo-se enquanto docente.
Desta forma faremos, a partir de então, durante o decorrer do trabalho, distinção
entre professor e pedagogo, pois o objetivo principal é identificar as vertentes
existentes problematizando-as, de forma que possamos compreender a
92
dicotomização existente, como demonstrado nos itens anteriores deste capítulo, e a
qual não é apenas de cunho gráfico, mas envolve todos os segmentos da sociedade
atrelados à educação.
Apesar de muitos anos se falar em formação de professores e pedagogos, o
que se intensificou desde a elaboração da última LDBEN (Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional) 9394/96, e da necessidade de reconhecer a identidade
destas duas figuras tão importantes no processo formativo, é possível dizer que não
houve inovação nas falas registradas até agora, tendo como conceito de inovação,
aquele utilizado por Maria Eugênia Castanho (2000):
Inovação é a ação de mudar. Alterar as coisas, pela introdução de algo
novo. Não se deve confundi-la com invenção (criação de algo que não
existia) ou com descoberta (ato de encontrar o que existia e não era
conhecido). A inovação consiste na aplicação de conhecimentos
existentes (...). Inovar consiste em introduzir novos modos de atuar em face
de práticas pedagógicas que aparecem como inadequadas ou ineficazes
(p.76).
Sendo assim, se considerarmos que inovar é modificar, o que modificamos, de
fato, até então com relação à formação de professores e pedagogos?
É claro que não estamos nos esquecendo da dificuldade de formulação da
LDBEN 9394/96, tampouco das outras questões por ela abordadas e das reuniões
para elaboração das Diretrizes do Curso de Pedagogia, tão importantes quanto esta,
mas sim afunilando nosso objeto de estudo e observando que existem ações e
entidades maiores do que a vontade daqueles que se envolveram com o segmento
“Educação” por sua excelência.
93
Quando falamos do envolvimento do segmento educativo por sua excelência,
procuramos excluir aqueles que vieram por reconhecer na educação uma maneira de
reproduzir e manter o sistema capitalista o que é diferente de manter-se nele,
que todos assim o fazemos, pois hoje é uma condição de sobrevivência – de maneira
a, não apenas precarizar o ensino como um todo, mas também os seus profissionais:
No Capitalismo, é produtivo o trabalhador que produz mais-valia para o
capitalista, servindo assim, a auto-expansão do capital. Utilizando um
exemplo fora da esfera da produção material: um mestre-escola é um
trabalhador produtivo quando trabalha não para desenvolver a mente
das crianças, mas também para enriquecer o dono da escola.Que este
invista seu capital numa fábrica de ensinar em vez de numa de fazer
salsicha, em nada modifica a situação. (MARX apud SOUZA e FERREIRA,
epígrafe, 2000:5)
Na nossa discussão, falamos em específico dos cursos oferecidos pelos IESs
(Instituições de Ensino Superior):
O CNE, ao regulamentar os Institutos Superiores de Educação, ignorou
essa trajetória e regulamentou a formação de professores de educação
infantil e de 1
a
a 4
a
série no Curso Normal Superior, criando o clima propício
para que, posteriormente, fosse regulamentada a formação de professores
para esses níveis de ensino exclusivamente no Curso Normal Superior, tal
como estabelece o Parecer 970/99, da Câmara de Educação Superior,
aprovado em 10/11/1999, com apenas sete (dos doze) conselheiros
presentes e um voto em contrário, declarado em separado pelo conselheiro
Jacques Velloso. Sua aprovação foi antecedida de muita mobilização em
nível nacional, de amplos setores da área educacional. Centenas de
instituições, entidades, conselhos de cursos e educadores enviaram
manifestação ao Conselho Nacional, entre a reunião de outubro e a reunião
de novembro do CNE, rejeitando o parecer e solicitando audiência pública
para o trato dessa questão. A constatação de que não foi introduzida
qualquer modificação na minuta originalmente apresentada à Câmara de
Ensino Superior e a insensibilidade diante das centenas de manifestações
de todo o país são dados reveladores da força dos interesses que orientam
a definição das políticas educacionais em nosso país e das concepções que
informam as propostas de formação de professores. (FREITAS, 1999: 26).
94
Institutos os quais, além de minimizar a carga horária do curso, antes
oferecido em quatro anos, hoje em três, e o qual além do titulo de docente das séries
iniciais ou da educação infantil, acrescido de um quarto ano, possibilita a graduação
enquanto pedagogo cargos administrativos (orientação, supervisão, direção e
coordenação) -, não se apóia no tripé universitário (ensino-pesquisa-extensão).
Um avanço conquistado na década de 30 pela ABE (Associação Brasileira de
Educação) quando compreendeu a existência de uma tridimensionalidade de
funções da Universidade, que colaborariam para caracterizar a universalidade do
saber atingindo o apenas as Faculdades que ela englobava, mas também as
comunidades civil e científica (BRZEZINSKI,1996:30-1) e, desta forma, realizando
um elo interdisciplinar que possibilita o diálogo entre todos os segmentos formando
um complexo dialógico (MORIN,2003).
A partir da amostra do que ocorre hoje com relação à formação de
professores e pedagogos, realizada no item anterior, e resgatada neste, notamos
que os estudos até então realizados não foram utilizados; há o pensar, a socialização
deste pensamento, mas paramos por ai, que a realidade nos demonstra ações
contrárias àquelas por nós os compromissados com a educação por excelência
idealizadas, defendidas.
Estamos deixando de fazer exatamente aquilo que Castanho citada
anteriormente - colocou como ponto principal da inovação que seria atuar
diferentemente frente às ações pedagógicas ineficazes, incoerentes.
95
que se considerar então se aqueles que estão compromissados com a
educação são os únicos responsáveis por esta omissão – aqui entendida como a não
possibilidade de agir -. Seríamos nós os responsáveis?
Obviamente que a resposta é negativa, caso contrário estaríamos indo contra
a existência de um processo histórico dialético, provocado pelas diversas vertentes
sociais as quais atuam à sua maneira em cada um dos problemas enfrentados pela
sociedade, e o reconhecimento da existência deste movimento é importantíssimo
para tratar a questão aqui discutida.
Considerando todas estas colocações entramos, de fato, no campo das
políticas educacionais, presentes até então na nossa discussão, mas agora de forma
declarada. Castanho (2005:130) coloca dentre tantas outras crises que:
A formação docente também está em crise: a LDB exige formação em nível
superior para o exercício do magistério, mas ainda persistem os cursos de
nível médio e muita indefinição legal quanto aos vários locais de
formação. As experiências válidas em nível médio estão se desarticulando,
como é o caso dos CEFAMs. Quanto ao ensino superior, a qualidade dos
cursos está ligada à qualidade da pós-graduação. A política de
aligeiramento da pós-graduação coloca em risco o ensino superior que é
que se formam os professores para o ensino superior. A pesquisa e o
ensino devem correr juntos, o que nem sempre ocorre. Em resumo, falta
uma definição política clara quanto à formação. (grifo nosso).
Desmembremos o parágrafo, pois quatro pontos importantes a se tratar
aqui: a crise em si; incoerência legislativa; ciclo vicioso da formação e, por fim, a
demora para a elaboração das diretrizes do curso de Pedagogia.
96
Note-se que, neste caso, as políticas públicas, vão além das questões
trabalhistas que envolvem o professor não menos importantes, é claro -,
procurando a raiz do problema o qual está, sem dúvida, atrelado ao Estado e sua
forma de gestão. Gestão que se rende às questões administrativas econômicas
ditadas pelo Banco Mundial que prevê, para otimização da educação básica, um
resgate de atuação tecnicista na área de formação de professores. (FREITAS, 1999).
Em primeiro lugar é preciso reconhecer o momento histórico pelo qual
estamos passando, caracterizando, assim, a crise da formação docente que, como
vimos, é fruto de um caminhar histórico que deixou marcas profundas em nosso
sistema educacional.
Comesaña-Santalices e Galué, dizem a respeito da crise com suporte teórico
de Hannah Arendt (1982:51):
Una situación de crisis, es una ocasión única de volver a pensar problemas
que ya ni siqueira planteamos correctamente, porque han quedado
envueltos en prejuicios y aparências. Es possibile superar la crisis (...) sólo
a través de la capacidad que tengamos los individuos de establecer juicios
originários y no prejuiciados en relación con las situaciones a las que nos
enfrentamos. Estas situaciones de crisis, le parecen pues especialmente
propicias para volver a ‘ver’ claramente la esencia.
Desta forma, se um momento de crise é aquele em que se tem problemas não
muito bem definidos, então vivemos constantemente uma crise, que o sistema
capitalista neoliberal tem, como característica principal, declarar ações diferentes das
que realmente se quer atingir (COVRE,1990; MÉSZÁROS,2003b), fazendo, desta
forma com que sejamos envolvidos pelo cenário apresentado sem possibilidade de
97
compreendê-lo por inteiro, que as partes que o formam estão omissas e
compartimentadas.
Por outro lado, como Comensaña-Santalices e Galué colocam, é um momento
único de se rever, de atingir a essência do problema, problematizando as situações
apresentadas procurando desenvolver juízos reais acerca dos mesmos. O que nos
falta é a clareza da utilização deste momento: onde podemos atuar diretamente?
Freitas ressalta:
O que está em jogo, hoje, para o conjunto dos educadores e para a
sociedade brasileira é a defesa do campo educacional e, nele, do curso de
pedagogia e das faculdades/centros de educação, como espaços de
formação do profissional da educação básica estudioso da educação, em
condições de exercer sua prática em ambientes formais e não-formais,
escolares e não-escolares, e em todos os espaços em que se desenvolva o
trabalho educativo. (1999: 28).
Atualmente existe uma política social de incentivo à criação de ONGs
(Organizações Não Governamentais) e OSCIPs (Organização da Sociedade Civil de
Interesse Público), apenas pela nomenclatura é possível identificar que tratam-se
de atuações isoladas sem a devida colaboração direta do Estado, para atuarem nas
mais diversas áreas através do terceiro setor, dentre elas, e uma das mais
populares, a educação.
Desta forma, excusa-se o Estado do dever previsto em lei, mais precisamente
na Constituição da República Federativa do Brasil em seu artigo e naqueles que
98
compõe a Seção I (Da Educação) de seu Capítulo III (Da Educação, da Cultura e do
Desporto), que falam, basicamente, do direito igualitário de acesso ao ensino.
E o que teria a formação de professores e pedagogos a ver com isto? Ora,
tudo! Considerando que o Estado incentiva a realização de atividades isoladas,
principalmente na área de Educação deixando de cumprir com aquilo que previu na
Constituição do país, facilita-se a compreensão acerca da incoerência legislativa e de
ação segundo item a ser tratado, e a resposta da última questão feita
anteriormente sendo vista como uma atitude constante que permeia as políticas
gestionárias do país.
Assim como reafirma o momento de acobertar os objetivos reais – tirar o dever
do Estado de prover educação, saúde, saneamento básico...- com os objetivos
proclamados, que acreditamos na benevolência direta das ONGs e OSCIPs, esta
política de atividades isoladas atinge, também de forma direta, a organização de
cursos superiores e universitários realizados de forma isolada, devido à uma
inconstância e demora na organização dos mesmos, fazendo com que o “campo
educacional” , citado por Freitas, fique cada vez mais distante da categoria e de seus
propósitos primeiros.
Deixemos claro que não é uma crítica sobre a existência de órgãos como
ONGs e OSCIPs, mas sim uma crítica voltada para um dos seus muitos trabalhos:
envolvimento e responsabilidade direta com a educação; o qual deve ser diretamente
tutelado pelo Estado-Nação, seja na figura do Governo Federal, do Governo
99
Estadual ou do Governo Municipal, apenas com o intuito de demonstrar
incompatibilidade de objetivos e ações.
Não apenas Organizações Não Governamentais e da Sociedade Civil de
Interesse Público são responsabilizadas por parte da iniciativa de provimento
originalmente governamental, como também as Universidades, no final da década de
80 início da década de 90, juntamente com a implantação do Mercosul, tinham o
dever de resgatar sua presença social junto à comunidade através de projetos de
Extensão (SGUISSARDI e SILVA, 1998), contribuindo para que a “ética da
solidariedade” não fosse deixada de lado. (MOROSINI, 1997:226).
Pensar sobre o momento que vivemos de forma crítica é voltar às raízes do
problema e perceber que não é uma característica isolada, mas geral. Todas estas
necessidades de ação eram designadas pelo próprio governo, legitimadas
normativamente e cobradas quando acreditava – o poder – ser necessário.
Partindo, então, para o cerne da discussão do nosso segundo ponto,
incoerência legislativa e, aqui neste estudo, o mais importante é preciso saber
que nos remetemos não apenas à letra da lei que traduz para a sociedade civil a
norma, mas também à maneira como é conduzida a escolha da mesma e a sua
utilização na sociedade. Propondo um diálogo construtivo entre Direito e Educação.
Assis (2004) coloca que:
100
Com a intensificação do desenvolvimento das forças produtivas a partir da
instauração do modo de produção capitalista, a complexidade da vida social
aumenta de forma considerável e com ela a contingência das relações
humanas. Em outras palavras, com o modo de produção capitalista o
mundo torna-se mais problemático pela ampliação do horizonte de
possibilidades e pelo aparecimento de um universo mais amplo em
alternativas. No âmbito do Direito isso significa que um número maior de
relações ou comportamentos mais variados torna-se juridicamente possível.
O aumento da complexidade social reflete diretamente no direito positivo
tornando-o também mais complexo, não só pela ampliação do ordenamento
jurídico em decorrência da produção ininterrupta de diversos conjuntos
normativos, mas também pelo processo de contínua mudança no conteúdo
das normas jurídicas. (p.24)
Sendo assim, se no âmbito do Direito temos um mero maior de relações o
que causa maior complexidade do ordenamento jurídico organização formal das
leis -, também a Educação sofrerá tais mudanças de forma a aumentar seu grau de
complexidade, que é regida pelo direito positivo normas- em todos os seus
segmentos.
Apontamos aqui, portanto, que se antes a LDBEN era suficiente para delimitar
as atividades educacionais, hoje já não consegue dar conta, precisa de outros
conjuntos normativos que à ela venham somar: a criação de leis complementares;
tomemos por exemplo a reclamação da categoria profissional para a organização de
uma diretriz acerca do curso de Pedagogia, trabalho realizado pela ANFOPE
(Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação) desde sua
instituição, que nos custou décadas e inúmeros documentos.
O interessante, no momento é, além de compreender o perfil profissional do
pedagogo, reconhecer a lei como um instrumento para o auxílio na gestão dos
101
problemas formativos e todos aqueles aos quais precisamos recorrer ao direito
positivo.
Existem, no Direito, dois tipos de normas: as típicas, que o aquelas
responsáveis por regularizar um comportamento, isto é, dizem como a sociedade
civil deve agir; e as atípicas, responsáveis por criar, estruturar, modificar e/ou
organizar a sociedade civil e seus segmentos, as quais ainda podem ser divididas
em atípicas de organização, pois estruturam e criam uma realidade para o Direito, e
atípicas de interpretação, trazendo consigo o estabelecimento de um conceito ou a
fixação de uma interpretação dentro do ordenamento jurídico. (BOBBIO, 1999).
A Educação seria regida, basicamente, por leis atípicas de organização, pois
muitas delas, como os decretos e portarias, são atos normativos do Poder Executivo
de cada instância (Federal, Estadual e Municipal), que dialogam entre si; não são
leis, mas valem como tal, pois cuidam da regulamentação da Lei na prática.
Já a LDBEN, apesar de ser também uma lei atípica de organização, é uma Lei
Ordinária, vinda do Poder Legislativo (Congresso Nacional), e que está acima dos
atos normativos que devem estar de acordo com ela.
O histórico da organização da LDBEN 9394/96 mostra que esta voltou às
mãos de seus elaboradores e trocou de autor pelo menos três vezes, publicada, no
final, com muitas modificações em seu texto original, as quais eram consideradas
pelos participantes da categoria, importantes (SAVIANI, 2003)
102
Poderíamos nos questionar então: Organizando as questões legislativas
acerca da educação, principalmente, no que diz respeito à formação dos
professores, sanaríamos o nosso problema?
muito mais além disto e é claro também que este trabalho o conseguirá
tratar de todos os aspectos, mas se propõe a somar com os demais, trazendo dois
pontos pouco considerados até então que é o exercício de dialogar com outras áreas
do saber, no caso, o Direito e considerar, num momento de extrema importância
como este em que temos as diretrizes para o curso de Pedagogia organizadas, o que
teóricos educacionais pensam sobre o perfil do pedagogo, resgatando a
possibilidade de verificar se o valor atrelado por nós ao fato, atribuído para a escolha
de uma proposição normativa que rege as atuações do Pedagogo, condiz com
aquelas que o Estado imaginou serem as melhores e de acordo com a realidade em
que vivemos:
Em decorrência da velocidade sem precedentes das mudanças em nosso
tempo, e por causa do desafio que significam para a ordem legal, alguns
sustentam que a mudança pode ser efetuada pela lei. A lei, quando muito,
pode estabilizar, legalizar e coordenar uma mudança, mas a mudança em si
é sempre resultado da ação extralegal, depende de fatores objetivos (o
estágio de desenvolvimento das forças produtivas) e subjetivos (o estágio
de organização de determinados setores da vida social) (ASSIS, 2004:28).
E o apenas um jurista reconhece que a mudança não é oriunda das
legislações, como também sumidades no campo educacional:
Uma coisa, porém, é certa: nenhuma lei é capaz, por si só, de operar
transformações profundas, por mais avançada que seja, nem tampouco de
retardar, também por si só, o ritmo do progresso de uma dada sociedade,
103
por mais retrógrada que seja. Sua aplicação depende de uma série de
fatores. Em primeiro lugar, a eficácia de uma lei está subordinada à sua
situação no corpo geral das reformas por acaso levadas a efeito,
paralelamente a outros setores da vida social, e, o que é mais importante,
sua eficácia decorre de sua integração e de suas relações com todo esse
corpo. Os efeitos de uma lei de educação, como de qualquer outra lei,
serão diferentes, conforme pertença ela ou não a um plano geral de
reformas. Em segundo lugar, a aplicação de uma lei depende das
condições de infra-estrutura existentes.Em terceiro lugar está a adequação
dos objetivos e do conteúdo da lei às necessidades reais do contexto social
a que se destina. Enfim, a eficácia de uma lei depende dos homens que a
aplicam (ROMANELLI, 2001:179).
Abordando, agora, o terceiro ponto, que aponta o ciclo vicioso da formação,
temos, além de um problema educacional, também um problema legal formativo.
Com relação ao problema educacional, pensando nas palavras diretas de
Castanho (2005), a graduação depende da pós-graduação para ter qualidade, mas
com o aligeiramento e o descaso que a pós vem sofrendo, a queda da mesma
qualidade - é fato, que interfere diretamente na graduação.
A pós-graduação em Educação no Brasil tem fortes vínculos com a pesquisa,
que contribui com a produção de conhecimento a ser aplicada na graduação,
procurando, através dos alunos graduandos e graduados -, modificar e movimentar
as estruturas de base da Educação Nacional.
Permitindo, o Governo Federal, juntamente com o M.E. Ministério da
Educação- a abertura e manutenção de cursos de s-graduação desvinculados da
prática de pesquisa, mas com preocupação na aquisição de títulos e horas de estudo
em sala de aula, um prejuízo da possível melhora alcançada com o entrelace
destes dois níveis de ensino. (ANPED,2005).
104
Atendo-nos ao caso concreto de formação de pedagogos e professores, sem
a pós-graduação e sua excelência em pesquisa, talvez a situação atual diante da
indefinição da identidade destes profissionais fosse ainda pior, pois a discussão
acerca da Ciência da Educação, das possibilidades e níveis de formação, se dá,
especialmente, na pós, que inclusive é citada como responsável por uma parte da
formação do profissional aqui discutido, como vimos no artigo 62 da LDBEN
9.394/96.
Esse problema educacional está diretamente ligado ao problema legal
formativo, e ai entraremos na questão do professor universitário, que merece ser
contemplada aqui, que ele será responsável pela construção do conhecimento
junto aos Pedagogos e/u professores, assim como pela assunção da identidade que
lhes cabe, e pela colaboração na articulação de uma proposta curricular formativa
voltada para esta ou aquela atividade educacional.
Discutir essa formação do formador do Pedagogo é extremamente pertinente,
pois se sua formação é deformada, como exigir que o profissional discutido, seja
consciente do processo no qual está inserido? Vê-se que voltamos à questão do
ciclo vicioso da formação envolvendo todo o processo formativo, desde as séries
iniciais até a pós-graduação, seja com profissionais em sala de aula, seja com
profissionais em cargos administrativos escolares.
105
Recorrendo, mais uma vez, à LDBEN 9394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional) quando esta se refere aos professores das IESs (Instituições de
Ensino Superior), mais especificamente nos Títulos V “Dos níveis e das Modalidades
de Educação e Ensino”, Capítulo IV “Da Educação Superior”, e VI “Dos profissionais
da Educação”, temos:
Título V
“Dos níveis e das Modalidades de Educação e Ensino”
(...)
Capítulo IV
“Da Educação Superior”
(...)
Art. 52 – (...)
II um terço do corpo docente, pelo menos, com titulação acadêmica
de mestrado ou doutorado.
(...)
Título VI
“Dos profissionais da Educação”
(...)
Art. 65 A formação docente, exceto para a educação superior, incluirá
prática de ensino de, no mínimo, trezentas horas.
Art. 66 A preparação para o exercício do magistério superior far-se-á em
nível de pós-graduação, prioritariamente em programas de mestrado e
doutorado.
(...)
Art. 67 – (...)
Parágrafo único: A experiência docente é pré-requisito para o exercício
profissional de quaisquer outras funções de magistério, nos termos das
normas de cada sistema de ensino.
(LDBEN 9394/96 apud SAVIANI, 2003, p. 182) (grifo nosso).
106
Analisando os artigos que tratam da formação do professor universitário em
geral, é possível notar que, na verdade, não tratam desta formação - algo muito
semelhante ao que ocorre com os pedagogos e professores.
Ainda que se aponte diversos níveis formativos, a formação, em si, não é
tratada - apenas delimitam alguns espaços onde ela pode ocorrer; espaços, que,
pelo fato de serem de níveis de pós-graduação (stricto e/ou lato sensu) não
significam que darão conta de abordar temas pertinentes às práticas educativas,
muito pelo contrário, quando se fala em especialização, mestrado e/ou doutorado
mesmo os demais níveis de formação acadêmica acima destes a tendência é
especializar-se cada vez mais sobre determinado aspecto:
Na ciência moderna o conhecimento avança pela especialização. O
conhecimento é tanto mais rigoroso quanto mais restrito é o objeto sobre o
que incide. Nisso reside, aliás, o que hoje se reconhece ser o dilema básico
da ciência moderna: o seu rigor aumenta na proporção direta da
arbitrariedade com que espartilha o real. Sendo um conhecimento
disciplinar, tende a ser um conhecimento disciplinado, isto é, segrega uma
organização do saber orientada para policiar as fronteiras entre as
disciplinas e reprimir os que as quiserem transpor. É hoje reconhecido que
a excessiva parcelização e disciplinarização do saber científico faz do
cientista um ignorante especializado e que isso acarreta efeitos negativos.
(SANTOS,1988, p.64).
E continua:
Os objetos têm fronteiras cada vez menos definidas; são constituídos por
anéis que se entrecruzam em teias complexas com os dos restantes
objetos, a tal ponto que os objetos em si são menos reais que as relações
entre eles.(SANTOS, 1988, p.59).
Sendo possível reconhecer, portanto, a existência de um complexo que
engloba inúmeras partes em contato constante (MORIN, 2003).
107
A característica maior que a educação tem priorizado hoje em dia, que é a do
diálogo entre as várias áreas do conhecimento, não condiz com a exigência
formativa especializada, aliás, vai de encontro com ela, pois como cobrar o
reconhecimento da existência e possibilidade de se trabalhar com
trans/inter/multidisciplinaridade, se a própria formação do professor ainda é
compartimentada, cartesiana?
Desta forma, acreditar que o professor universitário, quando com um curso de
pós-graduação em seu curriculum, está habilitado para compreender o sistema
educacional, as relações de ensino-aprendizagem, as características da práxis
educativa, as relações professor-aluno-instituição de ensino, a identidade que
envolve o curso de Pedagogia e suas escolhas, e tantos outros aspectos que
envolvem a educação, é ignorar a realidade.
É claro que não podemos nos esquecer de dois fatores importantes, um deles
diz respeito àqueles que buscam a área da Educação, que apresenta diversas
possibilidades curriculares com disciplinas relativas às práticas docentes, mas nem
sempre, quando com um vasto leque de opções, os professores/pesquisadores
optam por estas disciplinas.E o outro com relação à existência de disciplinas a
serem, obrigatoriamente, cursadas pelos ingressantes das pós, que acabam
contemplando, apenas, a área a que estão atreladas, nunca entrando em outro
campo, onde a Física, a Arqueologia, a Citologia e tantas outras se restringem a si
mesmas.
108
Talvez porque apesar de “Universidade” dever ser compreendida como um
complexo de faculdades que dialogam entre si, acaba sendo uma simples alocadora
de faculdades fechadas em si mesmas, algo que foi, historicamente, construído
(BRZEZINSKI,1996 e CASTANHO, 2000).
Fica nítido, portanto, que o fato de se ter uma especialização, seja ela qual for,
em qualquer área, inclusive Educação, não significa, necessariamente, estar apto
para lecionar nas instituições de ensino superior (artigo 67, parágrafo único da
LDBEN 9394/96); da mesma forma que tanto o contrário não é verdadeiro estar
apto a lecionar por ter realizado atividades relacionadas às práticas educativas -,
quanto o oposto – não estar apto a lecionar devido ao fato de não ter contato com as
disciplinas de práticas educativas no ensino superior. Brzezinski (1996), em seus
estudos acerca da história da formação de professores, ressaltou tais aspectos.
Seria, pois, contraditório não considerar a existência de ensinos não
institucionalizados e estudos feitos pelo próprio professor a fim de melhorar sua
prática, que se tem, aqui, uma visão global acerca de “Educação”. O fato é que, a
especialização não garante, de maneira alguma, uma boa atuação em sala de aula.
Atentemo-nos, agora, para o artigo 65 da Lei em questão, especificando que,
para todos os outros níveis de ensino (infantil, fundamental, médio, profissionalizante
e EJA Educação de Jovens e Adultos), exceto superior, secobrada a prática de
ensino de, no mínimo, trezentas horas, na formação docente. À primeira leitura,
109
parece que um certo desmerecimento e despreocupação com a formação do
professor universitário. Seria mesmo esta a intenção?
Considerando toda a trajetória, por nós conhecida da LDBEN de 1996, que
não contemplou grande parte das reivindicações da classe docente envolvida no
processo de reestruturação legislativa (SAVIANI, 2003), é possível dizer que não.
Agora, atendo-se às questões históricas, que nos levam a compreender que o
surgimento da Universidade no país é demasiado recente, da maneira como o
conhecemos, e que, especialmente na última década, as universidades têm surgido
desenfreadamente sem o propósito de formação, mas de profissionalização superior
(KUENZER, 2001) não é de admirar a compreensão que a necessidade de se
criar uma parcela de mão de obra docente, para o nível superior o que nos leva a
pensar, também, sobre a redução de anos para se completar um estudo em um
stricto sensu -, o mais rápido possível, com o intuito de, não apenas atender à
demanda, mas também às questões econômicas, pois quanto maior a procura,
menor o salário a ser oferecido. Por este lado, é possível dizer que sim.
A pergunta que nos fica é a seguinte: Consegue, qualquer curso universitário,
habilitar o profissional para lecionar no nível superior, especialmente àqueles
voltados para a formação do Pedagogo e do professor? Temos, então duas grandes
vertentes para abordar em relação à questão colocada: os cursos de bacharelado e
os cursos de licenciaturas.
110
Com relação aos cursos de bacharelado, nenhum deles apresenta em sua
grade curricular, qualquer disciplina que se reporte às práticas pedagógicas que o
indivíduo ingressa na universidade a fim de exercer uma profissão, seja ela qual for –
advogado, arqueólogo, ator, engenheiro, biólogo...- e, apenas depois de conhecer o
mundo universitário é que acaba considerando a docência como uma alternativa de
exercer, de certa forma, a sua profissão.
Antes disso, dificilmente alguém ingressa em qualquer curso pensando “quero
fazer o curso X pra ser professor universitário”, tampouco se ouve “quero fazer o
curso que forma professores universitários”, mas muito se ouve “após terminar a
faculdade farei uma pós para dar aula na universidade”, mas entramos, ai, no mérito
do problema formativo trabalhado anteriormente.
Poder-se-ia então, questionar sobre os estágios. Nos cursos de bacharelado,
os estágios o o, em sua maioria, obrigatórios. Contemplam, quando existem, a
atuação do profissional que, como foi considerado, jamais será voltada para a
prática docente.
Por outro lado, nos cursos de licenciatura, onde os estágios são obrigatórios,
pois, teoricamente, é onde se formam formadores, ainda assim temos dois impasses.
O primeiro deles diz respeito ao estágio voltado para a educação sica, a qual
contempla primeira e segundas etapas do ensino fundamental e o ensino dio –,
com a aprovação da Lei n.º 4.735/2001, apresentado por Ivan Valente, a educação
infantil começa a fazer parte da educação básica.
111
Sendo assim o fica contemplado o ensino superior nos cursos que formam
formadores, pois estes se preocupam com outros níveis de ensino que não o
superior, e deles sim, são cobradas as trezentas horas mínimas de práticas de
ensino.
Não se contempla, na lei, inclusive os responsáveis pela docência em nível
médio, ou normal, os quais, percebemos, estão se extinguindo, aos poucos, mas
ainda assim persistem e estão tomando lugar nas IESs.
Vejamos: como podem formadores de formadores, cobrar, orientar, avaliar
estágios de práticas de ensino se eles mesmos não passaram por tais práticas? E
que, mesmo tendo passado, é de se reconhecer, sem dúvida, que cada nível de
ensino pede uma metodologia diferenciada. É o mesmo questionamento que
realizamos algumas páginas atrás sobre o exercício da profissão pedagógica
administrativa sobreposta à profissão pedagógica docente.
As ações pedagógicas possíveis com crianças entre 7 (sete) e 8 (oito) anos
não são as mesmas com adultos acima de 17 (dezessete). O fato de existir a EJA
(Educação de Jovens e Adultos) já confirma esta afirmação.
O segundo impasse seria, portanto, o fato de que os professores universitários
cobram e supervisionam ações necessárias para as práticas educativas que
112
redundem em sucesso de seus alunos em sala de aula, sendo que deles não foram
cobradas.
Desta forma acabamos por iniciar um ciclo de falhas constantes, pois, se
exigimos dos professores de educação básica qualidade e inovação no ensino, como
podem reconhecer isto se o formados por pessoas das quais também se cobram
as mesmas coisas porém não se delimitam os critérios necessários para assumir sua
posição profissional? O que começa errado, tende a prosseguir da mesma maneira.
É o ciclo que estamos analisando, apontado por Castanho (2005).
Tal discussão nos leva, portanto, a reconhecer a letra da Lei no parágrafo
único do artigo 67 exposto anteriormente, onde, em união com o artigo 65 temos que
o professor universitário não precisa de nenhum tipo de estágio docente, tampouco
ter como pré-requisito a experiência docente, o que faz o problema ficar um pouco
maior.
É possível resumir nossa análise em algumas palavras de Anastasiou (2004):
No caso da profissão universitária, para a maioria dos professores que
atuam nas instituições de ensino superior, os cursos efetivados na
universidade não funcionaram como preparação para a docência, com
exceção dos professores oriundos da área da Educação ou
Licenciaturas, que tiveram oportunidades de discutir elementos
teóricos e práticos relativos à questão do ensino e da aprendizagem,
porém para outra faixa de idade dos alunos.
Poder-se-ia até dizer que, a maioria dos que atuam na docência
universitária, tornou-se professor da noite para o dia: dormiram
profissionais e pesquisadores de diferentes áreas e acordaram
professores (Conforme Selma Pimenta, em palestra proferida aos
professores de educação superior da Universidade Tiradentes,
Aracaju, em fevereiro de 2002). Por mais excelência que tragam das
diferentes áreas de atuação não garantia de que a mesma tenha
113
igual peso na construção do significado, dos saberes, das
competências, dos compromissos e das habilidades referentes a
docência. Por maior autonomia que tenham em sua profissão de
origem, tomando a autonomia como a “capacidade profissional em
conceber e implementar novas alternativas, diante da crise e dos
problemas da sociedade” (Cavallet, 1999), não garantias de que
estejam preparados para conceber e implementar alternativas e
soluções pedagógicas adequadas, diante dos problemas que surgem
na aprendizagem de seus alunos, nas salas de aula da
universidade.(p.174).
Retomando nossa linha de raciocínio, quando a norma permite que haja pelo
menos um terço dos professores com titulação acadêmica (artigo 52, II, LDBEN) e
que a preparação para o exercício do magistério no ensino superior deve ser feita em
nível de pós-graduação, prioritariamente stricto sensu (artigo 66, LDBEN),
margem para a existência de professores com pouca qualificação –ainda que esta
qualificação, como abordado, o garantia alguma de boa atuação em sala de
aula.
Quando o legislador utiliza a palavra “prioritariamente”, quer dizer que, numa
ordem ou rie, esta titulo de doutor ou mestre é a que vem em primeiro lugar,
existindo outra além dela, que é a especialização. Está claro também que nada
menos do que a pós será aceito para contratação de professores universitários,
porém sabemos que em IESs e Universidades existem professores sem qualquer
titulação:
(...)exigência de qualificação do corpo docente 10% de mestres e
doutores –, que contrasta com a exigência de qualificação nas
universidades 30% de mestres e doutores –, caracterizando uma
desqualificação dos formadores de professores, com sérias implicações no
ensino e nos estudos desenvolvidos nessas instituições. (FREITAS,
1999:21).
114
É importante ressaltar que nosso objetivo não é, de maneira alguma, criticar a
atuação dos professores universitários, tampouco generalizar, ou ainda esgotar o
assunto, mas polemizar a necessidade de organização da categoria “professor
universitário”, visando todo o sistema educativo, inclusive e, principalmente, os
alunos que são por eles, avaliados, direcionados, orientados, coordenados desde as
áreas onde a questão identitária esteja totalmente superada, até áreas como a de
formação de professores, onde, vimos, existem grandes dificuldades e pontos a
serem discutidos.
Esse ciclo falho de formação, ora apresentado, guarda relação direta com o
quarto e último ponto a ser discutido, levantado por Castanho (2005): a indefinição
de uma política pública clara, assertiva, direcionada.
É possível afirmar, diante de todo o quadro atual e histórico exposto até então,
que a falta de direcionamentos objetivos contribuiu e contribui com a manutenção de
ações desorganizadas na área que diz respeito à formação de professores e
pedagogos; uma delas relacionada às diretrizes curriculares do Curso de Pedagogia.
Insistir na justificativa de demora da promulgação da mesma com relação à
crise da categoria é apelar para ingenuidade e falta de bom senso, pois se a própria
categoria ainda não reconheceu a sua identidade de curso, como é possível lançar
diretrizes para o mesmo? Obviamente que essa discussão não escusa a Lei, isto é, o
Estado, a direcionar a formação docente e de pedagogo para um determinado nível,
115
sem a possibilidade de inúmeras ações flexíveis que proporcionem à qualquer
pessoa, o título de pedagogo ou docente das séries iniciais.
Como comentado no decorrer deste trabalho existe, ainda, muita divergência
com relação à base da formação do Pedagogo, que, resolvida, ou pelo menos pré-
estabelecida, já contribuiria com a organização das diretrizes.
Nosso objetivo, nas seguintes páginas será, num primeiro momento, discutir
com teóricos estudiosos sobre o assunto, a questão identitária aqui levantada, para,
em seguida, analisar as diretrizes promulgadas no início de 2006, com o objetivo de
compreender o caminho que tomará a formação docente e do pedagogo, portanto, o
rumo que se pretende dar à educação.
116
CAPÍTULO III
VELHOS OLHARES, NOVAS PERSPECTIVAS
Mas, então, de repente, Miguilim parou em frente do doutor. Todo tremia,
quase sem coragem de dizer o que tinha vontade. Por fim, disse. Pediu.
O doutor entendeu e achou graça. Tirou os óculos, pôs na cara de Miguilim.
E Miguilim olhou para todos, com tanta força. Saiu lá fora. Olhou os matos
escuros de cima do morro, aqui a casa, a cerca de feijão-bravo e são-caetano;
O céu, o curral, o quintal; os olhos redondos e os vidros altos da manhã.
Olhou mais longe, o gado pastando perto do brejo, florido de são-josés,
como um algodão. O verde dos buritis na primavera vereda.
O Mutum era bonito! Agora ele sabia.
(ROSA, 1984:142)
3.1 O Caminho se faz ao caminhar: opções metodológicas.
Assim como Miguilim, às vezes é necessário recorrer a determinados
acessórios para melhor ver a realidade. Até aqui, clareamos nossa compreensão
com a colaboração da história sob uma perspectiva legislativa, diretamente ligada às
tomadas de decisão governamental criando impasses dialógicos com a categoria
profissional pesquisada. Reafirmando o que Minayo chama de “consciência
histórica”:
Noutras palavras, não é apenas o investigador que sentido a seu
trabalho intelectual, mas os seres humanos, os grupos e as sociedades dão
significado e intencionalidade a suas ações e suas construções, na medida
em que as estruturas sociais nada mais são que ações objetivadas.
(1994:14).
Situando os acontecimentos atuais e suas origens, identificando que não
existe identidade definida até então, propomos a realização de contraposições entre
as opiniões de teóricos estudiosos da área, e a promulgação das Diretrizes do Curso
117
de Pedagogia procurando identificar relação entre a compreensão que a área tem de
si mesma e o elenco de proposições normativas valoradas pelo Estado-União.
Antes de realizarmos esta análise, faz-se necessário ressaltar aspectos da
pesquisa desenvolvida e de princípios que a permearam, pois lançar olhar sobre o
objeto pesquisado é responsabilizar-se por conclusões particulares oriundas de uma
investigação que fora, a todo instante, influenciada por convicções construídas
através do tempo e que são próprias do pesquisador:
Outro aspecto distintivo das Ciências Sociais é o fato de que ela é
intrínseca e extrínsecamente ideológica. Ninguém hoje ousa negar que toda
ciência é comprometida. Ela veicula interesses e visões de mundo
historicamente construídas, embora suas contribuições e seus efeitos
teóricos e técnicos ultrapassem as intenções de seu desenvolvimento. No
entanto, as ciências físicas e biológicas participam de forma diferente do
comprometimento social, pela natureza mesma do objeto que coloca ao
investigador. Na investigação social, a relação entre o pesquisador e seu
campo de estudo se estabelecem definitivamente. A visão de mundo de
ambos está implicada em todo o processo de conhecimento, desde a
concepção do objeto, aos resultados do trabalho e à sua aplicação.
(MINAYO, 1994:14-5).
Desta forma o olhar do pesquisador é algo que influencia os caminhos por ele
traçados, nas escolhas feitas e na maneira de reconhecer a realidade e suas
necessidades, e seu objeto está sujeito à mudanças, ou pelo mesmo pesquisador
que retorna ao objeto após outras caminhadas; ou por um novo pesquisador que
debruça-se sobre o problema por um ângulo diferente, com convicções distintas
daquele.
Lewis em seu livro “As crônicas de Nárnia” (2005), apresenta para o leitor um
conto intitulado “O cavalo e seu menino”; normalmente pensaríamos em algo como
118
“O Menino e seu cavalo”, afinal de contas, o homem é detentor do meio de produção,
e dos aparatos auxiliadores na conquista dele, no caso, animais domésticos.
Mas esta consideração é feita diante das convicções de nossa sociedade
sobre a história, de um olhar social próprio, pois “O nível de consciência histórica das
Ciências Sociais está referenciado ao nível do consciência histórica social”
(MINAYO, 1994:14). Lewis tendo criado um mundo fantasioso, Nárnia, onde os
animais são seres dotados da mesma inteligência que os homens, é possível aceitar
que um cavalo seja “dono”, ou melhor, “responsável” por um menino:
(...) – Mas é claro – respondeu Shasta. – Pelo menos já montei o burro.
- Montou o quê?! fungou o cavalo com enorme desprezo. (Nem mesmo
chegou a falar, pois os cavalos falantes ficam com o sotaque ainda mais
cavalar quando sentem raiva.) E continuou: - Em outras palavras, você
sabe montar coisa nenhuma. Isso é ponto contra. Tenho de ensinar-lhe pelo
caminho. Já que não sabe montar, pelo menos sabe cair?
- Bem, todo mundo sabe cair.
- Estou dizendo o seguinte: sabe cair e montar de novo, sem chorar, e cair
de novo e montar de novo, sem ficar com medo de voltar a cair?
- Vou tentar, posso tentar – respondeu Shasta.
- Coitado do bichinho!- falou o cavalo num tom mais bondoso. Esqueci
que você é ainda um potro. Vamos fazer de você um excelente cavaleiro.
(...) (grifo nosso.) (LEWIS, 2005:197).
Assim, a relação que se estabelece é uma que conhecemos - mais
experientes cuidando dos menos experientes, pois na fábula homens e animais
estão no mesmo nível -, porém sob uma perspectiva diferente para nós, que
envolve um animal e um ser humano ocupando lugares diferentes daqueles por nós
conhecidos.
119
Sendo assim, cada pesquisador, observador, escritor, faz a sua opção. Traça
seu próprio caminho, diante de suas aspirações, convicções e pesquisas pessoais
que podem somar ou desagregar, contribuindo com a manutenção do sistema
dialético da construção do conhecimento.
O olhar utilizado pela pesquisadora deste trabalho tem ênfase na proposta
materialista histórico-dialética, pois reconhece a importância da prática social como
critério para alcançar a verdade, reconhecendo esta prática dentro do movimento das
ações humanas construídas através de consciências particulares e gerais que
contribuem, inclusive, para a formação da cultura de determinado lugar. (TRIVIÑOS,
1987).
Aceita-se que é possível conhecer o mundo, pois tem-se a matéria como algo
anterior à consciência construída acerca da mesma, dando origem a uma
“consciência social” (TRIVIÑOS, 1987:52) do próprio pesquisador.
Além disso, reconhece-se também, o movimento dialético da realidade, isto
significa aceitar as leis da Unidade, da Luta dos Contrários e da Contradição, ou
seja, crer na existência de uma relação permanente entre entes contraditórios que
ocasionam um problema e que possuem dois pontos em comum: suas diferenças e a
identidade que os une como pontos de um mesmo assunto a chamada unidade
dos contrários -. “O materialismo dialético reconhece que a contradição é uma forma
universal do ser”. (TRIVIÑOS, 1987:71).
120
Diante destas questões tem-se o objeto de estudo, pois suas diferenças e
semelhanças serão trabalhadas de forma que a contradição seja, num determinado
momento, superada.
Existem pelo menos três procedimentos gerais que orientam o conhecimento
do objeto dentro desta linha de pensamento (TRIVIÑOS, 1987). O primeiro deles diz
respeito à “contemplação viva do fenômeno” (TRIVIÑOS, 1987:73), isto é,
reconhecimento do estado da arte e mapeamento através de estudo documental,
preocupando-se com a delimitação do objeto. Praticamente o trabalho realizado
anteriormente à construção deste texto, e que pode ser constatado, especialmente,
nos primeiro e segundo capítulos desta dissertação.
O segundo é a elaboração da análise do objeto, construção de conceitos,
juízos e raciocínios sobre o mesmo, ação que acaba permeando todo o trabalho,
pois a cada nova informação, outras relações teóricas e práticas são estabelecidas
de forma a enriquecer o processo de reconhecimento do objeto.
A pesquisa prática acaba se inserindo aqui, pois ela se responsável pela
articulação entre as teorias trabalhadas até então e construção dos novos conceitos.
Por fim, apresentam-se as inferências indutivas e dedutivas resultantes do
processo de conhecimento do objeto, que tendem a propor solução para o problema.
As duas últimas etapas serão construídas neste e no próximo capítulo.
121
Para que este caminho se faça de maneira agradável e emancipadora, é
preciso que o pesquisador se identifique com o problema a ser pesquisado, pois
conviverão durante muito tempo, e o olhar do pólo, inicialmente, ativo - pois na
construção de relações pesquisador e objeto tornam-se concomitantemente, pólos
ativos e passivos da pesquisa -, deve voltar-se, constantemente, para o objeto:
(...) é preciso ressaltar que nas Ciências Sociais existe uma identidade
entre sujeito e objeto. A pesquisa nessa área lida com seres humanos que,
por razões culturais, de classe, de faixa etária, ou por qualquer outro
motivo, têm um substrato comum de identidade com o investigador,
tornando-os solidariamente imbricados e comprometidos, como lembra
Lévi-Strauss (1975): “Numa ciência, onde o observador é da mesma
natureza que o objeto, o observador, ele mesmo, é uma parte de sua
observação” (p.215). (MINAYO, 1994:14).
Nesta pesquisa, o “substrato comum de identidade” existente entre
pesquisadora e o objeto da pesquisa, é relacionada à categoria aqui discutida, pois
formada em Pedagogia, tendo cursado currículo que contemplava as áreas
administrativas orientação, coordenação, supervisão, direção e docência no
ensino médio normal ou magistério - , prevendo possível apostilamento de
habilitação para docências nas ries iniciais, perguntava-se: que formação é essa?
Qual a minha real identidade profissional?
Diante disso a legitimidade da proposta pessoal de realizar a pesquisa torna-
se cada vez mais pertinente e presente, pois como disse Bondia (2001), o saber da
experiência supera o saber da informação, o que tem se tornado cada vez mais raro
por excesso de trabalho que não venha a somar ao longo do tempo, mas que faz
122
termos a impressão de que não podemos parar e por causa disso, nada nos
acontece.
Experenciar é expor-se, é construir algo do momento vivido:
Esse é o saber da experiência: o que se adquire no modo como alguém vai
respondendo ao que vai lhe acontecendo ao largo da vida e no modo como
vamos dando sentido ao acontecer do que nos acontece. (...) O saber da
experiência é um saber que não pode separar-se do indivíduo concreto em
quem encarna. (BONDIA, 2001: 8).
A resposta, aos acontecimentos durante a vida acadêmica da pesquisadora
enquanto estudante de Pedagogia, e a forma de dar sentido às experiências por ela
vividas é a construção desta dissertação e a realização da pesquisa proposta.
Sabendo qual a origem da idéia para identificar o problema a ser discutido, e
tendo delimitado que convicções filosóficas acompanham o desenvolvimento do
trabalho, basta-nos falar da pesquisa em si. Daquilo que aqui foi desenvolvido. Da
metodologia utilizada. Do caminho percorrido para a organização daquilo que dará
sentido às experiências da pesquisadora na área.
Compreendendo que o assunto discutido neste trabalho envolve relações
sociais, econômicas, políticas, históricas, pessoais, coletivas, normativas e muitas
outras, fez-se pesquisa do estado da arte, optando pelo resgate e ênfase nas
questões histórico-legislativas.
123
Tal opção foi realizada por entender que além de existirem inúmeros
trabalhos de qualidade abordando o tema de forma a aprofundar-se em discussões
políticas e, consequentemente, sócio-econômicas, o objetivo pretendido seria
conquistado através deste caminho.
Criou-se, inclusive, a consciência de que o tempo existente para a conclusão
do trabalho não permitira desenvolvimento de texto de qualidade com
aprofundamento em todas as vertentes que englobam o objeto.
No início, ocorreu como bem colocou Severino (1992):
No caso da educação, há uma forte tendência de os alunos quererem
retomar e resgatar toda a experiência histórica de educação brasileira, todo
o contexto histórico-social, todo o acervo de explicação teórica elaborada
nos diversos âmbitos! (p. 34)
Mas depois entende-se que somos responsáveis apenas por uma parte, por
uma contribuição:
(...)o que cabe, de fato, a cada um de nós é simplesmente colocar um tijolo,
se eu tiver me compenetrado da intencionalidade do projeto do prédio,
desse projeto coletivo que dirige a construção do edifício do saber.
(SAVERINO,1992:34).
Ainda que de antemão pareça uma pequena contribuição e que um grande
recorte naquilo que se pretendia abordar, foi realizado, as relações entre as leituras e
as reflexões começam a acontecer, e percebemos que novos problemas, dentro da
problemática inicial, surgem com grande facilidade.
124
Desta forma buscou-se apenas o necessário para articulação dos resultados e
objetivos pretendidos, os quais influenciaram na busca bibliográfica e na delimitação
da pesquisa a ser feita sobre o objeto de estudo.
Sendo assim, reconhecendo a existência de inúmeros trabalhos, apoiados na
pesquisa de campo, envolvendo professores, alunos, formandos e formados, na área
de formação de professores e pedagogos, optou-se por resgatar as falas de teóricos
estudiosos da área, confrontando-as de maneira que fosse possível identificar pontos
em comum sobre a identidade do pedagogo e aquilo que o diferencia do docente das
séries iniciais, obtendo um esboço de um perfil que contemplasse as correntes mais
fortes que discutem a categoria.
Muitos autores foram selecionados, apenas cinco deles retornaram a
pesquisa, realizada por correio eletrônico, e das quais, uma foi perdida por
problemas tecnológicos.
Embora muitos pesquisadores questionem a legitimidade e o tipo de
relacionamento que se constrói através do correio eletrônico, sem dúvida para
determinados objetivos de pesquisa, ele é o melhor meio de executá-la.
No caso desta pesquisa, o objetivo era obter respostas diretas e simples,
contando com a capacidade de escrita daqueles que foram procurados, os quais
125
possuem inúmeros trabalhos publicados na área, e que, portanto, não teriam maiores
problemas em fazê-lo.
Assim, não tomaria muito o tempo de cada um deles, pois seriam capazes de
responder ao questionário em qualquer lugar que desejassem e de onde tivessem
acesso à Internet – casa, escritório, universidade,...-.
Antônio Joaquim Severino assim vê o correio eletrônico:
muito conhecido e utilizado, o Correio Eletrônico é um sistema de
comunicação via Internet, por meio do qual podemos trocar mensagens
escritas com interlocutores espalhados pelo mundo inteiro. O nosso
endereço pessoal funciona como uma espécie de caixa postal, que vai
recebendo e guardando as mensagens que recebemos e que ficam
arquivadas a nossa disposição para consulta oportuna. (2002:139).
Muitos dos respondentes escolhidos situavam-se em outros estados, cidades
e, num determinado caso, em outro continente. Logo, o correio eletrônico além de
ser o meio suficiente para a realização da pesquisa, torna-se, também, o mais viável
economicamente.
Embora Severino (2002) também recomende que as informações obtidas
sejam salvas em disquete ou dispositivos semelhantes, às vezes, no momento em
que se trabalha com os dados e nos deparamos com o impulso do labor intelectual,
nos esquecemos de tomar certos cuidados para a manutenção dos mesmos.
126
Por se tratar de cinco questões abertas, onde quatro são iguais para todos os
pesquisados, e a última foi elaborada especialmente para cada respondente,
considerando alguma produção que tenha feito sobre o assunto, não haverá
tabulação de dados, mas uma análise diretiva sobre cada resposta, confrontando-as
quando se tratarem de um mesmo tema, e trabalhando-as isoladamente quando
forem específicas.
3.2 A categoria profissional fala de si mesma.
Por conta de perda pro problemas tecnológicos de uma das entrevistas,
trabalharemos, diretamente, com quatro respondentes, e procuraremos as respostas
do quinto, em trabalhos por ele publicados.
Os respondentes são: Prof. Dr. Dermeval Saviani (anexo 1); Prof. Dra. Léa
das Graças Camargos Anastasiou (anexo 2); Prof. Dra. Maria Rosa Cavalheiro
Marafon (anexo 3); Profa. Dra. Helena Costa Lopes de Freitas (anexo 4) e Prof. Dr.
José Carlos Libâneo do qual não se tem as respostas diretas, mas que serão
retiradas do livro “Pedagogia e Pedagogos, para quê?” (2005) (anexo 5)- .
A primeira questão direcionada aos professores doutores foi a seguinte: O que
você entende por “professor”?. Destacando a palavra final para que o labor da
resposta se voltasse para a mesma.
127
Para compreender a primeira questão é preciso que trabalhemos em conjunto
com a segunda pergunta: “O que você entende por “pedagogo”?. Utilizando do
mesmo artifício de destaque de um dos vernáculos mais importantes da pesquisa.
Ora, ainda que no corpo das perguntas não se tenha feito qualquer menção
sobre a dicotomia existente entre estas duas categorias de trabalho, o fato de existir
duas questões, onde cada uma volta-se para um determinado profissional,
demonstra que a pesquisadora acredita haver diferença de espaço de trabalho e de
atividades a serem desenvolvidas por ambos. As respostas podem confirmar sutil ou
declaradamente estas divisões; Ou ainda invalidar a possibilidade de dicotomia.
O que ocorreu é que quatro respondentes acreditam que uma distinção
entre professores e pedagogos, o que nos leva a delimitar, inicialmente, que existe
uma identidade própria do pedagogo, que irá, desta forma, delimitar também, o seu
espaço de atuação.
O Prof. Dermeval Saviani entende que “O professor, nas condições atuais de
funcionamento de ensino, é um educador que trabalha diretamente com os
alunos(...).” (grifo nosso), ressaltando, ainda, a existência de professores primários –
responsáveis pelas ries iniciais e professores oriundos de outras licenciaturas. E
que o Pedagogo seria “o especialista em pedagogia”, pois a pedagogia é a teoria da
educação, logo, uma teoria da prática educativa, fazendo com que o profissional
delimite-se à garantia da eficácia do ato de educar, considerando, finalmente, que o
128
pedagogo será “um especialista na forma de organização e no modo de
funcionamento da educação escolar” (grifo nosso).
Estes dados postos, compreendemos que para este respondente existe uma
correlação entre o trabalho do professor, que está diretamente ligado aos alunos, e
do pedagogo, que deve “buscar equacionar, de alguma maneira, o problema da
relação educador-educando, de modo geral, e, no caso específico da escola, a
relação professor-aluno, orientando o processo de ensino aprendizagem”, nas
palavras do próprio Saviani.
Sendo assim, o trabalho do pedagogo deve restringir-se às questões
educativas, sejam elas acerca da própria ação exercida pelo professor, dentro da
organização escolar formal, sejam num ambiente não formal ou informal educativo; já
que aponta as relações “educador-educando”, no modo geral e “professor-aluno”,
para o espaço escolar.
Seria, então, o pedagogo, um profissional que estudaria a teoria da prática
educativa com o propósito de colaborar com o trabalho do professor em sala de aula,
e do educador nos outros diversos espaços, fazendo jus, então, à área de
coordenação e direção escolar que lhe cabem, as quais abrangem, também, a
gestão educativa, que acaba atingindo os espaços não-formais de educação.
A professora Léa Anastasiou, também entende que o professor é o
profissional que “trabalha com a formação do estudante através do processo de
129
ensinagem” (grifo nosso), aquele que está em constante contato com os alunos,
assim como colocou o Prof. Dermeval Saviani.
Embora haja, entre eles, um reconhecimento distinto da atividade exercida em
sala de aula – processo de ensino-aprendizagem para um, e processo de ensinagem
para a outra -, o que nos interessa é o olhar que se tem sobre o trabalho do
professor, independente de nomenclaturas diretas sobre o trabalho em sala de aula.
tivemos a oportunidade de, neste trabalho, explicitar o que envolve
reconhecer um processo de “ensinagem” em lugar do processo de “ensino-
aprendizagem”, e isto será uma variável entre os autores pois envolve não apenas a
área de aprofundamento teórico de cada um, que pode ou o ser sobre este
assunto específico, como é o caso de Anastasiou, como também sua compreensão
acerca do próprio processo.
Como se disse na introdução deste capítulo, a pesquisa social é permeada por
convicções muito particulares de cada pesquisador, e aqui, trabalhamos com
teóricos, logo, pesquisadores da educação.
Resolvido este ponto, podemos afirmar que ambos têm o mesmo olhar sobre
o trabalho do docente, e que também compartilham da mesma opinião sobre as
ações do pedagogo, que Anastasiou entende que a “ação do pedagogo abrange o
estudo do processo de formação do estudante (...) abrange também o sistema de
ensino, a legislação, a gestão, a informação, e do saber escolar, as relações entre
130
os sujeitos que constituem os sistemas educacionais e em especial, processo de
formação inicial e continuada dos docentes, parceiros institucionais” (grifo nosso).
É consenso, entre os dois respondentes, que o trabalho do pedagogo é
preocupar-se com a organização e funcionamento da escola, como declaradamente
colocou Saviani; logo, seus olhares dos pedagogos deveriam ser apurados para
a compreensão de todo o contexto educativo, embora a segunda respondente
apegue-se mais ao contexto escolar e o primeiro considere, também, os contextos
não-formal e informal.
Importante apontar, também, na resposta de Anastasiou, a preocupação que o
pedagogo deve ter com os processos de formação inicial e continuada dos docentes,
assim como com as relações dos sujeitos e dos parceiros institucionais envolvidos
nos sistemas educacionais, uma atividade que envolve um labor voltado para a
gestão escolar, logo, característico de um profissional da educação e não de um
docente formado para o trabalho em sala de aula, ainda que ele reconheça as
questões globais do processo educativo e da organização escolar.
A Profa. Maria Rosa Cavalheiro Marafon também entende que o professor é
um educador e que “o seu trabalho (...) deve objetivar a formação do aluno como
um todo”.(grifo nosso). Logo, concorda com os respondentes anteriores neste ponto,
mas com relação ao trabalho do pedagogo, procura ir além.
131
Marafon entende que “O pedagogo é o educador por excelência, uma vez que
tem a educação como objeto de estudo/pesquisa e de atuação profissional. Assim
deve estar apto a exercer tanto a docência, como outras funções que têm a
educação como objetivo e/ou preocupação.” (grifo nosso).
O que une Marafon aos respondentes anteriores é a compreensão de que o
objeto de estudo e pesquisa do pedagogo é a educação; aproximando-se mais de
Saviani que entende ser a pedagogia “uma teoria que se estrutura em função da
ação, ou seja, ela é elaborada em função de exigências práticas, interessadas na
execução da ação e seus resultados” (grifo nosso), que Marafon procurou discutir
em seu livro “Pedagogia Crítica: uma metodologia na construção do conhecimento
(2001) a educação como práxis que ocorre dentro e fora da escola, onde o foco do
desenvolvimento de uma formação consciente é a reflexão sobre a ação.
Mas aquilo que faz com que Marafon vá além de Saviani e Anastasiou em sua
compreensão sobre o papel a ser desenvolvido pelo profissional “pedagogo” são dois
pontos: quando ela menciona a necessidade de o pedagogo estar apto para exercer
a docência e outras funções que visem a educação.
Ainda que Saviani e Anastasiou não tenham mencionado de forma aberta a
função docente como parte do trabalho do pedagogo, acredito que vejam essa
possibilidade, mas o como ação principal, tampouco como uma vertente de
atuação, mas apenas como parte de seu repertório de saberes e ações, que
132
proporcionam base para o bom desenvolvimento de suas atividades primeiras de
gestão educacional.
Conclui-se assim pois voltamos ao mesmo questionamento que permeou o
trabalho do segundo capítulo acerca da LDBEN 9394/96: Como coordenar e dirigir
ações desconhecidas? Se o pedagogo é o estudioso das ações práticas
educacionais, logo, ele está apto para exercê-las, mas esta não é sua função
principal.
Marafon, entende que a ação prática faz parte, naturalmente, do processo
de saber e pesquisar sobre, logo, a docência, declaradamente, faz parte do trabalho
do pedagogo. Essa colocação está de acordo com aquilo que defende a ANFOPE
sobre o profissional em questão, o qual deve ter a docência como base do trabalho
que desenvolverá.
Além dessa diferença, Marafon compreende que o pedagogo é um profissional
que pode contribuir não apenas no espaço escolar, mas também em todos os
âmbitos que objetivem a educação, ou a tenham como vertente de preocupação,
enfatizando os espaços informais e indo além deles, ainda que Saviani tenha feito
menção sobre os mesmos.
Este pensamento de Marafon traz uma compreensão mais aberta sobre o
espaço a ser ocupado pelo profissional em questão, dando-lhe créditos por dominar
133
questões de organização funcional e planejamento educativo, para outras áreas que
não as educacionais formais.
A Profa. Helena de Freitas aproxima-se dos demais, principalmente de
Marafon, por reconhecer relação entre docência e saberes universais que envolvem
a educação como um todo, declara acreditar ser a “compreensão da totalidade do
processo de formação humana, na escola, e outros ambientes educativos
(grifo nosso) condição para o desenvolvimento da docência, que é a mediação no
processo de conhecimento dos alunos, cria as condições necessárias nos
espaços educativos - planejamento, organização e seleção dos conteúdos,
desenvolvimento e avaliação dos processos formativos –“, logo o docente e o
pedagogo seriam profissões diretamente ligadas compartilhando da mesma
identidade voltada para o desenvolvimento do processo formativo como um todo,
seja ele dentro ou fora da sala de aula.
A respondente, diferentemente de Saviani, considerou o vernáculo “professor”
apenas referindo-se à categoria que cuida da formação inicial do aluno, que a
pesquisa é voltada para este grupo profissional; desta forma é coerente observar
identidade única para o professor e o pedagogo.
Helena de Freitas também concebe a prática dos profissionais em outros
ambientes que não apenas os escolares, concordando com os espaços de atuação
defendidos por Saviani e Marafon, permitindo-nos declarar Anastasiou como uma
pesquisadora com olhares voltados diretamente para a escola, o que é sustentável
134
por sua área de trabalho que se preocupa com os processos formativos entre
professor e aluno.
Posiciona-se, ainda, Helena de Freitas, na primeira questão, de forma a deixar
claro que sua concepção assemelha-se à da ANFOPE, eximindo-se, inclusive, de
responder a segunda questão, que uma profissão é dependente da outra. Ponto
em que diverge de Marafon, pois a terceira respondente atribuiu ao pedagogo outras
funções que vão além da docência, reconhecendo-o como “educador por excelência”
e responsável por atividades as quais não cabem ao docente.
O posicionamento da penúltima respondente é uma introdução para o
pensamento de José Carlos Libâneo acerca do trabalho do pedagogo:
O curso de Pedagogia deve formar o pedagogo stricto sensu, isto é, um
profissional qualificado para atuar em vários campos educativos para
atender demandas socio-educativas de tipo formal e não-formal e informal,
decorrentes de novas realidades (...) não apenas na gestão, supervisão e
coordenação pedagógica de escolas, como também na pesquisa, na
administração dos sistemas de ensino, no planejamento educacional, na
definição de políticas educacionais, nos movimentos sociais, nas empresas,
nas várias instâncias de educação de adultos, nos serviços de
pscicopedagogia e orientação educacional, nos programas sociais, nos
serviços para a terceira idade, nos serviços de lazer e animação cultural, na
televisão, no rádio, na produção de vídeos, filmes, brinquedos, na
requalificação profissional etc. (LIBÂNEO, 2005:39).
Mas, diferentemente dos demais, e principalmente, das colocações de Helena
de Freitas, afasta-se da possibilidade de todo trabalho pedagógico servir-se da base
docente, do estudo do ato de educar, mas sim do estudo da teoria e da prática
voltadas para os saberes pedagógicos. (LIBÂNEO, 2005:39).
135
Desta forma, Libâneo é, entre todos os respondentes, aquele que mais afasta
as categorias profissionais: professores e pedagogos. Para ele, devido à
complexidade que abarca o sistema de ensino, os professores seriam profissionais
responsáveis pela compreensão da ação educativa em si, em torno do âmbito
específico da matéria das disciplinas (LIBÂNEO, 2005).
Nem todos estão de acordo com o fato de haver uma diferença entre o espaço
de trabalho do professor e do pedagogo, que Helena de Freitas os de forma
associada; por outro lado, estão de acordo na existência de uma conexão entre as
áreas de atuação destes profissionais, que se complementam, ainda que para alguns
sejam, em determinado momento, divergentes.
O principal é a aceitação dos quaro primeiros respondentes sobre o contato
direto que o pedagogo tem com a docência, e o qual, por conta de necessidade de
delimitação clara de trabalho e de áreas de ação distintas, Libâneo, compreende não
poder ser abordado num curso que deva visar a formação de profissionais da
educação “não diretamente docentes” (2005:61).
Para sustentar seu pensamento, Libâneo se apóia no histórico construído
sobre o curso de Pedagogia, como algo que foi se desmembrando da base docente,
e para o qual não deve retornar, e no discurso com vistas a questões curriculares
onde nas Licenciaturas em geral não se tem a possibilidade de aprofundar-se em
teorias sobre a organização e o funcionamento escolar por conta do objeto das
mesmas: a docência.
136
Sabemos que a ANFOPE apóia-se também no histórico construído para
afirmar a base docente do pedagogo, logo, o que se percebe é a diferença de
olhares direcionados para um mesmo objeto, o que acontece em demasia nas
ciências sociais, e que já foi discutido no início deste capítulo.
Por fim, Marafon e Libâneo compreendem que existam duas figuras: o
pedagogo escolar e o pedagogo especialista, isto é, a possibilidade de um
profissional o pedagogo - atuar em qualquer área que envolva a educação,
diferentemente do que pensa Anastasiou que reconhece o pedagogo como um
profissional legitimamente escolar, e distinção não apontada por Demerval e Freitas.
Diante disto, que identidade adotar? Ora, sabíamos que a própria categoria
enfrentava divergências ao compreender sua área de trabalho, logo, cabe-nos
organizar linha de pensamento que procure pontos de convergência para delimitar
algumas questões identitárias deste profissional: o pedagogo.
Nosso próximo ponto de trabalho será a tentativa da construção de um esboço
acerca da identidade do pedagogo. Por ora, apenas constatemos os dados
fornecidos, relacionando-os e deixando para que os juízos de valor sejam inseridos
mais adiante, quando o quadro geral da pesquisa tiver sido montado neste
trabalho.
137
A terceira questão apresentada aos respondes foi: Em sua opinião, o curso de
Pedagogia deveria contemplar que tipo de formação? Lembrando que hoje os cursos
de Pedagogia formam, dependendo da instituição em que são ministrados:
professores das séries iniciais; profissionais da área de administração escolar
(orientação, supervisão, coordenação e direção); e ainda outros que dão ambas as
habilitações, sem esquecer dos Normais Superiores.
O objetivo desta pergunta é, além de resgatar as respostas anteriores,
identificar a base de formação do profissional – pedagogo - verificando se o curso de
Pedagogia ainda é o responsável principal por ela, lembrando, propositadamente, ao
respondente, da existência de inúmeras possibilidades de cursá-lo, em diferentes
níveis e ênfases, os quais, na maioria das vezes, mesclam a formação do pedagogo
com a do professor (Considerando a perspectiva constatada anteriormente de que
existe uma diferença entre ambos os profissionais para alguns dos respondentes e,
inicialmente, para a pesquisadora).
Diante do questionamento, Saviani entende que o “Curso de Pedagogia
deveria contemplar todos os aspectos constitutivos da educação, tendo como eixo a
organização e o funcionamento das escolas. Tendo claro esse eixo, penso que
será viável formar, simultaneamente, o professor das quatro primeiras séries do
ensino fundamental, o especialista nos vários aspectos ligados à gestão da
escola, tais como administração e direção, coordenação curricular e supervisão
pedagógica, orientação educacional e escolar, assim como o professor dos
professores de ensino fundamental, isto, é, o professor das escolas normais e dos
138
Institutos Superiores de Educação. Tratar-se-ia de formação ampla e
aprofundada” (grifo nosso).
Logo, na compreensão do primeiro respondente, apesar de professor e
pedagogo terem funções e identidades distintas, é possível que no curso de
Pedagogia forme-se um profissional capaz de lidar com questões administrativas e
questões docentes diretas, isto é, o exercício da docência, considerando que no
Curso de Pedagogia o eixo, a base, seria voltada para a organização e o
funcionamentos das escolas. A docência seria um outro aspecto, não tão relevante,
deste eixo, e a formação se daria de forma simultânea como ele mesmo coloca.
Anastasiou, também não cita a docência como base do curso, e segue o
raciocínio da amplitude administrativa da atividade do pedagogo, defendida em sua
segunda resposta, pois acredita que o curso deveria oferecer “Uma formação
direcionada para a complexidade do fenômeno educacional. As diversas áreas
do conhecimento que compõem o curso deveriam estar voltadas para o foco
‘educação’, portanto, servirem de instrumentos de conhecimento e compreensão da
realidade educacional”.(grifo nosso).
Sendo assim, Anastasiou e Saviani identificam uma legitimidade própria do
Curso de Pedagogia e do currículo que ele deve contemplar, voltado para a
reafirmação das diversas atividades do pedagogo que colocam a docência em
segundo plano, para contribuição de seu trabalho e não no mesmo patamar.
139
Pode-se afirmar que a autora assim compreende porque ratifica dizendo “(...)
uma formação onde a relação teoria e prática fosse uma constante e base da
progressiva caminhada dos estudantes pedagogos” (grifo nosso).
Assumindo a relação entre teoria e prática como base para o desenvolvimento
da construção dos saberes que compõem o rol de conhecimentos do profissional
“pedagogo”, vê-se na docência uma vertente de contribuição para execução do
trabalho pedagógico, e não exclusiva e diretamente, docente.
Freitas, coloca que “É nosso entendimento que as Diretrizes Curriculares
para o curso de Pedagogia recentemente aprovadas, contemplam a formação
do pedagogo para a docência na educação básica, na formação das crianças de 0 a
10, e a gestão, bem como para as demais funções do magistério, sem a
fragmentação das habilitações como vinham sendo até o momento estruturados os
cursos. De nosso ponto de vista, este é um grande avanço , de significado histórico,
na medida em que contempla as reivindicações dos educadores ao longo dos
últimos 25 anos de luta pela formação.” (grifo nosso) .
Desta forma fica claro que para Freitas a base é docente, assim como
especificou em sua resposta anterior, a gestão seria acidente da compreensão do
processo formativo, seria parte dele. Pensamento contrário ao de Saviani e
Anastasiou.
140
A visão de Marafon aproxima-se mais daquela apresentada por Saviani e
Anastasiou, pois por compreender, como exposto nas respostas anteriores, que o
pedagogo é um profissional que deve estar apto para exercer a docência e outras
funções administrativas pedagógicas escolares e não escolares, entende que “(...) no
Curso de Pedagogia, para formar o profissional, deve-se estudar e pesquisar a
educação no sentido amplo e aprofundado, inclusive a educação formal deve ser
tratada de forma abrangente”.(grifo nosso).
Marafon não deixa clara uma base a ser seguida pelos cursos, pois afirma
que: “Isso pode ser feito por meio das propostas curriculares desenvolvidas nos
Projetos Pedagógicos dos cursos que devem apresentar claramente suas opções
de formação”.
Ainda que a resposta de Marafon tenha sido obtida antes da publicação das
Diretrizes do Curso de Pedagogia, diferentemente de Freitas, sua colocação é válida
por um motivo: a própria categoria.
Como vemos, a categoria profissional aqui trabalhada ainda não tem
homogeneidade identitária, logo, os docentes e coordenadores destes cursos, hão
de enfatizar a formação que acreditam ser pertinente, ainda que a decisão legislativa
seja por uma base fortemente docente, mas que proporciona atividade de gestão,
pois se trata de movimento e posicionamento político-social, passivo de discussão
em sala de aula e no meio Acadêmico. A possibilidade de ênfase subjetiva, isto é,
141
ainda que não declarada, é possível, por conta dos posicionamentos particulares dos
grupos.
Além disto, podemos notar que não apenas compartilham, Marafon e Saviani,
da mesma idéia, como também utilizam os mesmos adjetivos para qualificar um
Curso de Pedagogia “amplo e aprofundado”.
A questão da amplitude do curso ainda deixa a possibilidade de ênfase que
fora apontada acima, pois ainda que tenha sido ou não decidida uma base comum
de desenvolvimento da formação, atingindo o objetivo de “base comum nacional” da
LDBEN 9394/96 abordado no segundo capítulo, a opção por trabalhar gestão e
docência num mesmo curso, sempre tenderá a aprofundar mais uma do que outra,
faz parte do movimento de formação e influência dos envolvidos no processo.
Agora, para abordarmos a questão do tempo e da forma como deve se dar o
curso para atingir aos objetivos que Saviani e Marafon acreditam que deva, é preciso
apresentar a compreensão de Libâneo sobre o assunto, pois divergem, os
respondentes, em ponto importantíssimo:
(...) convém firmar, de início, meu entendimento de que um curso de
licenciatura para formar o professor das séries iniciais de grau e do curso
de magistério não deveria substituir o curso de Pedagogia. Ou seja, o
curso de Pedagogia deve ser distinto do de Licenciatura, ainda que o
pedagogo possa ser também um licenciado, no sentido de que se
pode formar um docente no pedagogo. Meu ponto de vista é de que o
curso de Pedagogia é o que forma o pedagogo stricto sensu, isto é, um
profissional não diretamente docente que lida com fatos, estruturas,
processos, contextos, situações, referentes à prática educativa em suas
várias modalidades e manifestações. A caracterização do pedagogo stricto
142
sensu torna-se necessária, uma vez que, lato sensu, todos os professores
são pedagogos. (LIBÂNEO, 2005:45). (grifo nosso).
Dermeval, Marafon e Anastasiou acreditam num curso que vise a
complexidade da educação, com base na Ciência da Educação, algo para além da
docência; Freitas está de acordo com as Diretrizes do Curso de Pedagogia que
também prevê formação ampla, mas com base docente; Libâneo entende que todo
professor é pedagogo, mas nem todo pedagogo é professor, logo, um curso com
base docente e outro com base na Ciência da Educação.
Diante deste quadro, surgem colocações sobre questões funcionais dos
cursos, declaradamente expostas por Marafon ao dizer que “Referindo-se à
educação formal, considero necessária e possível a formação articulada de
professor e de coordenador das atividades pedagógico - educacionais e
administrativas, dada durante 4 ou 5 anos.”; e Saviani quando aponta que “É claro,
pois, que esse tipo de formação poderá se dar em cursos de longa duração,
incompatíveis, portanto, com a idéia que levou à criação dos Institutos
Superiores de Educação.” (grifo nosso).
Libâneo (2005), apresenta não apenas a diferença de área de atuação como
justificativa para não legitimar um curso de formação ampla (docência e atividades
administrativo-pedagógicas), mas também a quantidade de saberes a serem
abordados num espaço curto de tempo.
143
Sendo assim, para aqueles que aceitam a formação de docentes e pedagogos
num mesmo curso, a duração do mesmo deve se dar num período maior do que
aquele oferecido pelos ISEs, e os quais deverão se reorganizar diante das Diretrizes
do Curso de Pedagogia que dirigem, também à eles, a reelaboração dos cursos de
formação de professores para a educação infantil ou séries iniciais dentro dos novos
parâmetros.
Ainda assim, Libâneo não acredita que o tempo disponível de 4 ou 5 anos seja
suficiente, pois propõe a existência de cursos superiores distintos, logo, cada um
deles (um com base docente, outro com base na Ciência da Educação) com duração
de 4 ou 5 anos.
Trabalharemos as comparações das falas dos respondentes com as
colocações legislativas no próximo capítulo, com o objetivo de reconhecer se o
esboço que temos da identidade profissional está relacionado com aquele que o
Estado-União defende.
A quarta, e última questão direcionada para o coletivo, dizia o seguinte: “O que
pensa sobre a proposta de diretriz para o curso de Pedagogia apresentado pela
ANFOPE?” procurando relacionar o posicionamento pessoal de cada teórico, com
aquilo que foi, ou estava para ser, aprovado diante das Diretrizes do Curso de
Pedagogia, e fortalecendo a idéia que cada um dos respondentes têm sobre o
profissional pedagogo.
144
Antes de apresentar as respostas, uma correção a ser feita. A elaboração
da questão que agora se trabalhada, fora incompleta, logo, causou o
esclarecimento da mesma por parte de Freitas que diz “Não uma proposta de
diretrizes apresentada pela ANFOPE; a proposta de Diretrizes de 99, foi construída
amplamente, com a participação de todos os Cursos de Pedagogia do país, com os
estudantes, as entidades ANFOPE, FORUMDIR, ANPEd e ANPAE, de nível
nacional. Estas diretrizes , foram sendo modificadas e grande parte de suas
formulações, contempladas na proposta aprovada pelo CNE em dezembro de 2005 e
homologada em maio de 2006.” .
Saviani também apontou em sua resposta que a proposta foi realizada em
conjunto com outras entidades como o FORUNDIR e a ANPEd; e Marafon considera
ter sido a organização da proposta “fruto de muitos estudos e debates dos
profissionais da área de educação”.
Esta pesquisadora deu ênfase à militância da ANFOPE, o por
desconhecimento ou desmerecimento do envolvimento de outras instituições, e da
própria categoria profissional, mas porque a ANFOPE é a instituição que está mais
fortemente presente nesta discussão.
Isto exposto, afirmamos que Freitas concorda com a proposta feita pela
ANFOPE e demais colaboradores, pois havia assim declarado na resposta da
primeira pergunta deste questionário, e apenas se dispôs a corrigir a quarta questão
na resposta da mesma.
145
Considerando todas as citações de Libâneo, e seu posicionamento no livro
“Pedagogia e Pedagogos, para quê?” (2005), sem dúvida que discorda da proposta
apresentada:
Presentemente, ante novas realidades econômicas e sociais,
especialmente os avanços tecnológicos na comunicação e informação,
novos sistemas produtivos e novos paradigmas do conhecimento, impõem-
se novas exigências no debate sobre a qualidade da educação e, por
conseqüência, sobre a formação de educadores. Não cabe mais uma
visão empobrecida dos estudos pedagógicos, restringindo-os aos
ingredientes de formação de licenciados. Não se trata de desvalorização
da docência, mas da valorização da atividade pedagógica em sentido mais
amplo, no qual a docente está incluída. (LIBÂNEO, 2005:40).( grifo nosso)
Desta forma, a proposta de curso aproxima-se das colocações de Dermeval,
Marafon e Anastasiou sobre a formação do pedagogo, não fosse por defender, como
vimos, uma formação distinta para cada um destes profissionais (pedagogo e
professor). Mas ainda assim fica nítida a discordância com relação à proposta da
ANFOPE e demais colaboradores.
Anastasiou não respondeu.
Sendo assim nos restam Marafon e Saviani para analisar.
Saviani coloca que as diretrizes aprovadas “vão na direção por mim
apontadas. No entanto, penso que seria necessário assumir de modo claro e
explícito o eixo da organização e funcionamento das escolas pois, sem isso, a
proposta tende a ficar genérica e, dando margem a que se introduzam os mais
diferentes tipos de elementos, resultará numa formação dispersa, dificultando o
146
preparo de agentes (pedagogos) competentes para atuar de forma eficaz na
elevação e garantia da educação escolar.” (grifo nosso).
Voltamos então a uma discussão realizada na questão anterior, a base a ser
utilizada na organização do curso. Saviani insiste que a mesma deva ser voltada
para a gestão, pois assim haverá um controle dos elementos que farão parte da
formação sem que ela se reduza à docência, mas mantendo o olhar voltado para a
instituição escolar, evitando, também, a entrada de conteúdos que podem dispersar
o objetivo de formação;
Marafon defende uma base formativa para além da docência, como Saviani, e
demonstra empatia com a proposta apresentada pela Anfope e demais
colaboradores pois entende que “reflete a preocupação de rejeitar a fragmentação
e o enfoque tecnicista na formação do pedagogo. (...) propõe sua formação
baseada na relação teoria e prática, salientando a importância da pesquisa
(...).”, ressaltando, ainda, que esta proposta é mais atraente do que aquela
apresentada pelo CNE Conselho Nacional de Educação -, citando o artigo
5
do
documento que não foi contemplado na legislação que hoje vige.
Desta forma, ainda que tenha sido um avanço a conquista que se obteve com
a aprovação das diretrizes, como salientou Freitas, veremos, no estudo da Lei
5
Art. - O curso de Pedagogia responsável pela formação do profissional de educação para atuar
no ensino, na organização e gestão de sistemas, unidades e projetos educacionais e na
produção e difusão do conhecimento, em diversas áreas da educação, é, ao mesmo tempo, uma
Licenciatura e um Bacharelado. (grifo nosso).
147
aprovada que a base voltou-se, totalmente, para a docência, e pouco contempla as
outras atividades educacionais que frisaram Marafon e Saviani.
Devemos pensar no tipo de relação estabelecida entre a tríade “categoria
profissional/Estado/necessidade social”, pois significa compreender o envolvimento
legítimo das ações realizadas para proposta de mudança da formação e da
educação nacional pela população interessada. “Como”, “quando” e “de que forma”
consideraram os estudos realizados?
As quintas e últimas questões serão tratadas isoladamente para cada
respondente, pois o específicas dos mesmos e vieram com o intuito de abranger a
compreensão que têm sobre conceitos e ações próprias direcionadas para a
categoria profissional que aqui se estuda, obtendo, também, mais elementos para
análise dos dados e construção de uma possível identidade do pedagogo.
Seguindo a ordem dos anexos, apresentada no início desta análise, a primeira
pergunta a ser discutida será aquela apresentada para Saviani: “Em seu livro ‘A
nova Lei da Educação (LDB): Trajetória, limites e perspectivas’, é feita uma
retrospectiva histórica acerca da organização das LDBs, assim como uma
contextualização e problematização da 9394/96. V. identifica algum tipo de
incoerência na letra da Lei em seu Título VI “Dos profissionais da Educação”, mais
especificamente aquele voltado para a formação do pedagogo? Se sim, qual?
Acredita que isto prejudica a organização das diretrizes do curso de Pedagogia?Por
quê?”
148
Novamente a pergunta direcionada ao respondente é tendenciosa,
propositadamente, que, como trabalhado no segundo capítulo desta dissertação,
acreditamos haver incoerência na determinação de possibilidade de assunção de
cargos administrativos escolares blicos contando com pré-requisito uma
determinada quantidade de horas na atividade docente, uma vez que também eram
permitidos os cursos de Pedagogia sem habilitação para a docência (art. 67º, LDBEN
9394/96).
Apesar de termos tratado o artigo 62, também no segundo capítulo, e a
concentração da atividade formativa em instituições superiores, Saviani vai além e
expõe que “O artigo 62 da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(LDB) estabelece que a formação dos docentes para atuar na educação básica
(...) passaria a ser feita em nível superior. Portanto, o espírito da nova LDB era
considerar o nível superior como exigência para a formação de professores de todos
os tipos.(...) Na letra da lei houve, porém, duas falhas: uma de redação e outra de
técnica legislativa.”(grifo nosso).
A falha de redação apontada por Saviani está presente no “parágrafo quarto
do artigo 87 das Disposições Transitórias. Ali está escrito: ‘Até o fim da Década da
Educação somente serão admitidos professores habilitados em nível superior ou
formados por treinamento em serviço’ Ora, literalmente isso significa que até o final
da década da educação, que a lei definiu como se iniciando ‘um ano a partir’ de sua
publicação, portanto, de 23 de dezembro de 1997 a 22 de dezembro de 2007,
149
somente seriam admitidos professores formados em nível superior. Então, depois
de 22 de dezembro de 2007, não haveria essa exigência, o que significaria que
seria possível admitir professores sem formação superior. É evidente que há, aí,
um erro de redação”. (grifo nosso)
Segundo o respondente, tal falha não causou conseqüências, pois “ao que
parece, ninguém a notou”. Em compensação, a falha técnica, acabou causando certo
transtorno, e ela está diretamente atrelada à interpretação correta da falha de
redação acima apontada.
A falha técnica a ser apontada fora reparada pelo Parecer do CNE/CP 1/2002,
também citado neste trabalho, mas é interessante discutí-la da forma como fez o
respondente que inclusive coloca “Finalmente, o próprio Ministério e o Conselho
Nacional de Educação acabaram chancelando essa interpretação. Ora, o gico
seria que fosse aprovada uma emenda a LDB, corrigindo a falha apontada”.
Saviani aponta que o artigo 62 da LDBEN 9394/96 declara, em seu texto, a
imprescindibilidade de formação em nível superior, mas também permite a formação
em nível médio e que o esclarecimento desta possibilidade se faz no artigo 87 em
seu quarto parágrafo já que declara a permissão como parte de uma necessidade do
período transitório que se dará dentro do prazo de dez anos.
Mas este esclarecimento é via de interpretação, pois nada está
declaradamente presente, segundo o respondente “caberia fixar, no corpo da lei, a
150
regra e, nas disposições transitórias, admitir-se a exceção no período de
transição. Assim, o artigo 62 deveria, simplesmente, estabelecer que a formação de
docentes para a educação básica seria feita em nível superior. E, nas disposições
transitórias, registrar que, até o fim da década da educação se admitiria, como
formação mínima, a oferecida em nível médio. Nesse caso, sim, caberia na
redação a expressão ‘até o fim da década’, referida à formação em nível médio,
que deveria cessar, dando lugar à norma fixada pela lei que exige a formação
em nível superior.” (grifo nosso)
Saviani aponta que, justamente por depender de interpretações, um grupo de
empresários mantenedores de cursos de formação de professores no ensino médio,
alegavam que “as disposições transitórias não poderiam prevalecer sobre o
corpo da lei. E como a formação mínima em nível médio estava no corpo da lei, isso
significava que se tratava de uma disposição permanente. Portanto, as escolas de
formação do magistério em nível dio poderiam continuar existindo, sem
problema algum.” (grifo nosso).
Mas, como dito acima, o Ministério e o Conselho sanaram o problema com a
emissão de um parecer que exigia a formação em nível superior.
Corrigido isso, Saviani demonstra que ainda outra questão a ser discutida
no mesmo artigo 62 da nova LDB, também apontada por nós no segundo capítulo: a
existência de uma nova instância formativa denominada Institutos Superiores de
Educação.
151
Assim justifica o respondente a existência desta nova instância: “É provável
que a introdução dos institutos superiores de educação no texto da lei tenha se
originado do ‘Programa de Valorização do Magistério’, de iniciativa da Secretaria
do Ensino Fundamental do MEC na gestão de Murílio Hingel, nos anos de 1992 e
1993. Essa iniciativa buscou, com base no Programa de Cooperação Educativa
Brasil-França, implantar Institutos Superiores de Formação de Professores no Brasil,
inspirados na experiência francesa dos Institutos Universitários de Formação
de Mestres.” (grifo nosso).
Para esclarecer não apenas o que cabe aos Institutos Superiores de
Educação, mas também para demonstrar o motivo pelo qual estes institutos se
transformaram em uma alternativa aos Cursos de Pedagogia e Licenciatura, Saviani
resgata o texto do artigo 63
6
e coloca o seguinte: “Se no inciso I estivesse escrito
cursos formadores de professores para a educação básica’, nós poderíamos
concluir que os Institutos Superiores de Educação formariam os professores
para a educação infantil e as quatro primeiras séries do ensino fundamental por
meio da escola normal superior e, além disso, poderiam formar, também, os
professores para as 4 últimas do fundamental e para o ensino dio. E os
profissionais especificados no artigo 64 poderiam ser formados nos cursos
6
Art. 63 - Os Institutos Superiores de Educação manterão: I – cursos formadores de profissionais para
a educação básica, inclusive o curso normal superior, destinado à formação de docentes para a
educação infantil e para as primeiras séries do ensino fundamental; II programas de formação
pedagógica para portadores de diplomas de educação superior que queiram se dedicar à educação
básica; III – programas de educação continuada para os profissionais de educação dos diversos
níveis. (LDBEN 9394/96 apud SAVIANI, 2003:181).
152
de pedagogia ou em pós-graduação, conforme reza o referido artigo
7
.” (grifo
nosso).
E continua: “Ocorre que, em lugar de ‘cursos formadores de professores’, está
escrito ‘cursos formadores de profissionais’, o que conduz à interpretação de que,
além de professores, os Institutos podem formar profissionais da educação
básica, ou seja, os administradores, planejadores, inspetores, supervisores e
orientadores educacionais mencionados no artigo 64.” (grifo nosso).
Assim como apontamos anteriormente, o espaço para a organização de um
trabalho alternativo na formação de professores, estava aberto, era preciso, apenas,
explorá-lo como tem sido feito nestes últimos tempos resultando o que Kuenzer
(2001) chama de “cada curso um percurso”. Como bem frisa Saviani: “Por esse
caminho os Institutos Superiores de Educação se constituiriam como
alternativa aos Cursos de Pedagogia e Licenciatura, podendo fazer tudo o que
estes fazem, porém, de forma mais aligeirada, mais barata, com cursos de curta
duração. E isso também não deixa de corresponder ao espírito da LDB, pois esta
participa da mesma lógica que vinha presidindo a política educacional que tinha
como uma de suas características a diversificação de modelos. Assim, onde
fosse possível e houvesse recursos para tanto, seriam instalados os cursos de
graduação de longa duração, leia-se, pedagogia e licenciaturas. Mas como uma
7
Art. 64 - A formação de profissionais de educação para administração, planejamento, inspeção,
supervisão e orientação educacional para a educação básica, será feita em cursos de graduação em
pedagogia ou em nível de pós-graduação, a critério da instituição de ensino, garantida, nesta
formação, a base comum nacional. (LDBEN 9394/96 apud SAVIANI, 2003:181).
153
alternativa a esse modelo haveria os Institutos Superiores de Educação”. (grifo
nosso).
A conclusão que Saviani apresenta diante disto é a demonstração de
insatisfação diante da consolidação da 9394/96 que não enfrentou, como havia se
proposto, com êxito, o problema da formação de professores, já que com a presença
dos ISEs “representa um forte risco de nivelamento por baixo”. Ressalta ainda, que
com certeza as imprecisões e incertezas interferiram na organização das Diretrizes
do Curso de Pedagogia, que, até o momento de sua resposta, o haviam sido
equacionadas.
Como é possível perceber, Saviani apenas enriqueceu uma discussão aqui
iniciada, trazendo mais elementos para a sua compreensão, e inclusive colaborando
com a organização da visão a ser construída sobre o profissional estudado, os
cursos que se dizem legítimos de sua formação, e a situação instalada.
A segunda respondente é Anastasiou para quem foi dirigida a seguinte
pergunta: “Há dois trabalhos seus, um livro ‘Processos de Ensinagem na
Universidade’, e um capítulo intitulado ‘Construindo a docência no ensino superior:
relação entre saberes pedagógicos e saberes científicos’, no livro ‘Didática e Práticas
de ensino: interfaces com diferentes saberes e lugares formativos’, nos quais v.
demonstra certa preocupação com a relação teoria e prática, objetivando trabalhos
de qualidade em sala de aula. Trazendo esta visão plena de educação, como você
concebe, então, a dicotomização da formação do pedagogo administrador do
154
pedagogo professor? divisão entre teoria e prática, trabalho ‘manual’ e trabalho
intelectual? Por quê?”.
A pergunta além de provocar o início de uma discussão importante quando se
fala em licenciatura e bacharelado dentro da relação professor X pedagogo, estende
a preocupação acima apontada por Saviani, sobre o aceleramento empobrecido da
formação, e contribui com a reflexão acerca da existência de identidades diferentes
entre professores de séries iniciais e pedagogos e qual a relação estabelecida para a
manutenção da cadeia formativa na e da escola.
Anastasiou recorre à sua vivência particular para afirmar que “a legislação e a
estrutura, tão fortemente presentes na formação do administrador, são
igualmente importantes para a formação do professor docente; e os saberes da
docência são essenciais para o desempenho de um bom administrador.” (grifo
nosso).
Ressalta ainda que Deve ser extremamente difícil efetivar a gestão de
uma escola sem ter vivido a sala de aula. Existe uma especificidade própria à
teoria e à prática, mas a formação que integre estes dois âmbitos de estudo e
compreensão da realidade é que seria o ideal e o necessário, do meu ponto de
vista.” (grifo nosso).
Finaliza chamando a atenção para o fato de que a dicotomia existente é algo
mantido por s, e que na essência inexiste, que conceber a formação plena é o
155
ideal para a formação de profissionais competentes: A dicotomia se efetiva por
ser este o principio educativo do ensino tradicional que permanece vigente
entre nos, ainda hoje. Para a preparação para atuar na educação formal, é
necessário o entrelaçamento dos elementos tanto da teoria, existente em nossa
herança cultural, quanto da vivência, analise e compreensão da prática
educativa. O ponto nodal esta no como fazer isto, uma vez que muitos dos docentes
que atuam na formação de pedagogos desconhecem a instituição ‘escola brasileira’,
por não haver ali atuado e por não fazer dela seu locus de pesquisa.” (grifo nosso).
Sendo assim, a pergunta que nos fizemos no segundo capítulo, repetida
algumas páginas atrás quando da colocação de Saviani sobre a incoerência
legislativa, acerca da necessidade de a docência ser requisito para exercer cargo
administrativo quando a possibilidade de obter formação sem habilitação para
docência, é aqui esclarecida pela respondente.
Sabemos que na visão de Libâneo não a necessidade de se saber da sala
de aula para trabalhar com os atores que lidam diretamente com ela, mas a maioria
dos respondentes acredita que a relação professor X pedagogo, é necessária para o
bom desempenho de ambas as funções. Baseando-nos em Anastasiou, de fato, não
como coordenar um trabalho que se desconhece, sobre o qual, nada ou muito
pouco se sabe.
O curso de pedagogia, agora, com as diretrizes, possui base fortemente
docente, mas pouco fala das outras atividades educativas; segundo a, que
156
haver um equilíbrio na relação ai estabelecida, a qual, aparentemente, não ocorre
mas que teremos a possibilidade de aprofundar mais adiante.
Desta forma, não temos mais o curso de bacharel em pedagogia, apenas o
licenciado, mas o que implica voltar a maioria dos olhares para a docência? Seria,
como aponta Freitas, um ganho na formação de professores e pedagogos que a
gestão seria “acidente” da formação?
Acreditamos que a maior contribuição de Anastasiou é a reafirmação da
necessidade de equilíbrio, já que existem identidades distintas.
Interessante que a pergunta dirigida à Marafon trata da importância do
questionamento do papel da pesquisa dentro do curso de pedagogia, baseado
naquilo que a pesquisadora defende em seu livro “Pedagogia crítica: uma
metodologia na construção do conhecimento” (2001), o que vai ao encontro do que
fora exposto anteriormente por Anastasiou, que diz ser a dicotomização uma
conseqüência do desconhecimento da escola brasileira por não fazer dela locus de
pesquisa.
Logo, a pergunta direcionada a Marafon, procura compreender qual o lugar
ocupado pela pesquisa dentro do curso e sua importância, contribuindo não apenas
com o amadurecimento do tipo de formação adequada a ser oferecida na Pedagogia,
mas também considerando a pesquisa como uma forma de reconhecimento da
própria identidade da categoria profissional do pedagogo, e do pedagogo, enquanto
157
ser humano único (identidade individual), que desenvolve suas atividades de
diversas formas, compartilhando de uma mesma identidade coletiva.
Sabemos que Marafon defende a possibilidade de uma formação “completa e
aprofundada no curso de Pedagogia que contemple tanto as atividades docentes
como as atividades de gestão escolar, que esteja “para além da docência”, diante
disto crê no uso da pesquisa como diretriz e não momento a ser tratado,
isoladamente, no processo de formação, pois seria metodologia a ser utilizada para
a conquista de uma formação dentro dos parâmetros que a encara.
E complementa a sua resposta da seguinte maneira: “Penso um projeto de
formação assumido por todos os docentes e que ofereça ao aluno oportunidades
de vivenciar os diferentes veis de um processo científico de formação. Para
que o processo não seja fragmentado, o aluno aprende no desenvolvimento de uma
investigação todos os procedimentos necessários e que o ensinados por vários
professores e o em uma única disciplina. O curso deve oferecer oportunidades
diversificadas de desenvolvimento de pesquisas e, se todas elas forem
socializadas e debatidas, penso que desaparecea barreira que se coloca na
formação do pedagogo entre ser professor e ser especialista. É sabido que na
educação formal as questões e os desafios da sala de aula estão imbricados com os
da escola e os do sistema de ensino.”(grifo nosso).
A respondente além de justificar o motivo pelo qual aposta no uso da pesquisa
como diretriz da organização de um curso de Pedagogia, o qual pode ser utilizado
158
independentemente de proposta legislativa, pois trata-se de escolha sócio-política de
condução do processo formativo, também reforça a idéia passada por Anastasiou
sobre a manutenção da dicotomia ser um problema criado, que pode ser facilmente
superado caso se transpasse as barreiras da educação tradicional.
Lançar novo olhar sobre o processo formativo, na visão de Marafon e
Anastasiou, contribuiria com o encerramento do pensamento binário que separa a
atividade intelectual para os bacharéis estudiosos da educação-, e a atividade de
trabalho “manual” para os licenciados atividades em sala de aula -, pois a
compreensão da Ciência Educação atingiria a todos, e cada um a utilizaria da
maneira mais adequada dentro de sua área de trabalho no sistema escolar formal,
ou em outros locais que tenham a educação como preocupação primeira.
Para Freitas, última respondente direta, foi apresentada a seguinte pergunta:
“Diante de sua vasta experiência na área de formação de professores, como
interpreta o atual momento da formação deste profissional?”, procurando especular
sobre a nova maneira que os cursos de Pedagogia deverão se organizar diante da
publicação das Diretrizes. E possibilitando construir relação com tudo o que foi
analisado e colocado até então.
Interessante que a resposta da professora Helena vazão para a
consideração do que Marafon, Anastasiou e Saviani colocaram até então, pois a
seguinte resposta: “Acredito que estamos iniciando uma etapa de construir
currículos de formação dos pedagogos que, tendo como base a docência,
159
possam tratar da formação de forma articulada - docência, gestão e pesquisa -
contribuindo para fortalecer a formação de profissionais para a educação básica que
tenham pleno domínio das condições objetivas da escola pública e possam
contribuir para as transformações necessárias no campo do trabalho
pedagógico, da organização da escola, dos processos formativos das crianças,
jovens e adultos em nosso país.”
Freitas o entende a formulação das Diretrizes como algo que possa
engessar o curso de Pedagogia de maneira que ele não contemple todas as
diversidades que, naturalmente, abarca, mas que diante de algo consistente e real, é
possível fazer reflexão acerca do processo formativo do pedagogo e otimizar um
curso que há muito se encontra perdido, desarticulado, fraco.
Podemos notar que a opção por uma metodologia de pesquisa na realização
de questionários para os teóricos estudiosos da área, contando com uma pergunta
individual mais ampla do que as quatro primeiras voltadas para um determinado
propósito, colaboram com o melhor entendimento das respostas das perguntas em
comum e, inclusive, para encontrar os pontos de convergência existentes entre o
pensamento dos envolvidos, a fim de apontar para uma identidade coletiva real da
categoria profissional do pedagogo.
Acreditamos não caber a resposta indireta da pergunta direcionada ao
professor Libâneo, que o intuito da questão era esclarecer uma idéia do autor
acerca de uma situação real sobre a qual nada havia escrito. Desta forma
160
encerramos nossa análise sobre os dados fornecidos pelos respondentes para
elencar, em seguida, categorias de trabalho e delinear alguma possível identidade do
pedagogo.
3.3 Identidade? Qual?
A análise dos dados obtidos nos a possibilidade de trabalhar com duas
categorias que delineariam algumas diretrizes para a compreensão da identidade
que acompanha o pedagogo: distinção sutil e formação.
A primeira delas “distinção sutil” é categoria com a qual deve se ter muito
cuidado, pois a partir dela assume-se que existe uma diferença entre o professor das
séries iniciais e da educação infantil e aquele profissional que se dedica à
coordenação, orientação, supervisão e direção destas e outras atividades escolares
ou voltadas para a educação em geral.
É a assunção da existência de enfoques diferenciados no ramo de trabalho do
pedagogo com a educação, o qual já não se dicotomiza com as mais variadas
formações, por conta da existência das diretrizes do curso de pedagogia com base
docente, mas que se faz presente no direcionamento individual daquele que se
envolve com a área, e na possibilidade de se obter habilitação para as áreas
administrativas em cursos de pós-graduação para aqueles que se dedicaram a
qualquer outro curso de graduação.
161
É consenso que o trabalho do profissional da educação com as áreas
administrativas está diretamente ligado ao trabalho do profissional da educação que
se dedica ao desenvolvimento de atividades em sala de aula; mas é preciso
considerar que um te seu olhar voltado para a organização e o funcionamento
escolar que envolve o processo formativo, enquanto que o outro, envolvido com o
próprio processo de formação, o compreenderá dentro da organização e
funcionamento escolar.
Ainda assim é preciso relembrar a existência de outros espaços, onde a
educação se faz presente, porém não obedecendo à estrutura da escola, mas uma
própria, a qual também se preocupa com a vertente social “educação”.
Desta forma, estas outras áreas onde acontece a educação, que o no
espaço escolar, devem ser consideradas pelos profissionais envolvidos com
questões de gestão com o reconhecimento do fenômeno educativo; assim como
aqueles que trabalham com o processo formativo em sala de aula, devem considerar
a existência de outros espaços educativos que, em inúmeros momentos, se fazem
presentes em sala de aula.
Nota-se que é impossível um profissional fechar os olhos para a atividade do
outro, mas que ambos, embora envolvidos num mesmo processo, realizam trabalhos
diferentes.
162
Seria um o professor e o outro o pedagogo? Não. Por dois motivos. Em
primeiro lugar voltaríamos a pregar a dicotomia sustentada pela visão tradicional que
temos do processo de formação; em segundo lugar, está definido que o curso de
pedagogia tem a base docente, mas contempla os saberes administrativos durante o
curso.
Seriam, todos, pedagogos, então? Não também. Pois desta forma estaríamos
ignorando a existência de uma “distinção sutil” entre as atividades desenvolvidas, e
ignoraríamos também, as respostas da maioria dos pesquisados que vêm diferença
entre o trabalho de um e de outro. que se considerar, ainda e novamente, a
possibilidade da obtenção de título de pedagogo por aqueles que recorrem aos
cursos de pós-graduação; são professores em outras instâncias, pois assim
conheceram o ambiente escolar e se mostraram interessados em seus outros
âmbitos.
Como é possível notar, existe uma categoria coletiva “pedagogo” que
dependendo de uma escolha individual, voltar-se-á para o desenvolvimento de um
determinado trabalho dentro do ramo “educação”. Sendo assim, conseguimos ver
a necessidade de declarar qualquer estudante de pedagogia como pedagogo, mas
que cada um deles após realizar opção de trabalho declare-se ou pedagogo
professor de séries iniciais e educação infantil, ou pedagogo gestor.
Desta forma podemos reconhecer no pedagogo professor de séries iniciais e
educação infantil a existência de saberes para além da docência; e no pedagogo
163
gestor, a existência de saberes que compreendem o processo formativo dentro de
sala de aula.
Não queremos ignorar a diferenciação feita por Anastasiou, Marafon e Saviani
acerca do professor e do pedagogo, mas considerá-las como ênfases diante da
escolha individual dentro da categoria coletiva.
O desenvolvimento do trabalho de qualquer um dos dois profissionais da
educação formados na Pedagogia, aprofundar-se-á naquilo que lhe for mais
interessante para o crescimento e a emancipação de seu trabalho, mas sem ignorar
que houve uma base comum de saberes.
É esta base comum de saberes que nos leva à próxima categoria “formação”.
Qual a formação ideal para a consolidação da idéia primeira apresentada sobre a
existência de uma “distinção sutil” ?
É claro que obtivemos propostas diferenciadas acerca da base a ser adotada
para a organização do currículo formativo do curso de Pedagogia, mas é preciso
tratar do ideal sem perder de vista o real. Logo, o que temos é a base docente.
Diante disto recorrer à proposta de Marafon em utilizar a pesquisa como metodologia
de condução do curso, colabora com a garantia da realização e planejamento de
uma organização curricular preocupada em contemplar o apenas o âmbito da sala
de aula, mas também a organização e o funcionamento escolar e os espaços onde a
educação é tratada como vertente social que merece atenção diferenciada.
164
Apostar na pesquisa como metodologia, além de contribuir com um
desenvolvimento diferenciado do aluno, pois a utilização de sua vivência nas
cadeiras universitárias colaborará com a construção de uma consciência profissional
mais madura (ANASTASIOU, 2004), também põe em prática o tripé universitário
(ensino-pesquisa-extensão), falado por nós no primeiro capítulo desta dissertação
(BREZEZINSK,1996).
Realizar e praticar o ensino através da pesquisa que se constrói e reconstrói
através da extensão é inserir o aluno no cotidiano da escola, no cotidiano da
sociedade, e no cotidiano da academia, incentivando o aprimoramento de ações e
pensamentos sobre as atividades educacionais próprias e outras.
A vivência, e o estudo desta vivência, promoveria a práxis (teoria praticante
prática teorizante) que colaboraria com a escolha futura do pedagogo: se for gestor;
se for professor das séries iniciais; mas nem por isso, pela escolha realizada, teria os
olhos fechados para o outro lado de seu curso, pois ali, na formação, ele fora
contemplado, estudado e pesquisado, e desta forma, contribuído com o
amadurecimento dos saberes que, no exercício de sua função, são essenciais, pois
ele é aquele que dialoga com todos: alunos, outros professores, outros gestores.
A reflexão crítica sobre a prática se torna uma exigência da relação
Teoria/Prática sem a qual a teoria pode ir virando blablab e a prática,
ativismo.(FREIRE, 1996:24).
165
Consideremos, ainda, para fortalecer esta proposta, a aposta dos educadores
no poder do diálogo constante. O diálogo tão fortemente defendido por Paulo Freire
(1996), e também por nossos respondentes (SAVIANI, 2003; MARAFON, 2001;
ANASTASIOU, 2004), se faz mais presente e se torna mais fácil, quando um
pedagogo sabe do trabalho do outro; quando o professor das séries iniciais entende,
de forma clara e aprofundada, o trabalho do gestor, e vice-versa, o caminhar da
instituição escolar e da educação como um processo social necessário e
extraordinário, é mais fácil, mais claro, emancipador, construtivo.
Lembremo-nos, também, de outras colocações importantes de nossos
respondentes, como o zelo por uma formação sem fragmentação e sem redução de
carga horária para atender questões financeiras, de crescimento institucional
baseado no enriquecimento, na obtenção de capital com facilidade. A má distribuição
de renda é um problema social, mas não deve, em momento algum, anular ou
controlar o crescimento e o desenvolvimento da educação em geral.
A educação deve estar a serviço de si mesma, o que significa estar a serviço
do homem, independentemente de raça, sexo, cor, origem, créditos, poder de capital,
e, inclusive, de nação. A educação é para e pelo homem, onde quer que ele esteja, e
o pedagogo, seja ele professor de séries iniciais ou gestor, é responsável pelo
estabelecimento do diálogo entre este homem e o processo formativo que eles,
juntos, podem e devem construir.
166
Agora, se isto é possível de ocorrer dentro do formato proposto pelas
diretrizes, discutiremos no próximo capítulo.
167
CAPÍTULO IV
O CURSO DE PEDAGOGIA HOJE
O mundo não é. O mundo está sendo,
(FREIRE, 1996:85).
4.1 As Diretrizes do Curso de Pedagogia: uma reflexão
Mais um elemento nos falta para completarmos nossa análise sobre “afinal,
que profissional é formado na pedagogia?” que é a discussão acerca das Diretrizes
do Curso de Pedagogia, que possuímos elementos sobre o processo histórico, e o
idealizado para a consolidação do curso com base nas colocações da categoria
profissional.
Segundo o Ministério da Educação, as diretrizes curriculares possuem como
princípios, objetivos e metas dar aos institutos de educação superior maior liberdade
na formatação da grade curricular do curso que oferecerem, cuidando para que haja
uma base de conhecimentos e habilidades específicas da área de conhecimento em
questão e comuns à todos os cursos daquela área, os quais poderão ser trabalhados
da maneira que for mais conveniente para a instituição que as implanta.
Notamos, então, que o questionamento que fizemos no segundo capítulo
acerca da base comum nacional, e a afirmação de que esta apenas seria possível
com a publicação das diretrizes e solucionando o que caberia ao curso de Pedagogia
formar, apenas é retificado por aquilo que o Estado entende ser as diretrizes, logo,
168
um objeto legislativo importante para direcionar o curso e, conseqüentemente, a
identidade do profissional que forma.
Em 16 de maio de 2006, na Seção 1, página 11 do Diário Oficial da União,
publicou-se em Brasília a Resolução 1/2006 do Conselho Nacional de Educação,
contando com o Conselho Pleno, que instituiu Diretrizes Curriculares Nacionais para
o Curso de Graduação em Pedagogia, licenciatura. (anexo 6)
O Artigo primeiro do documento acaba sendo uma reafirmação daquilo que o
Ministério da Educação e o Conselho Nacional de Educação, entendem sobre a
promulgação de diretrizes para os cursos de graduação, que apontamos
anteriormente, pois assim colocam:
(...) definindo princípios, condições de ensino e de aprendizagem,
procedimentos a serem observados em seu planejamento e avaliação,
pelos órgãos dos sistemas de ensino e pelas instituições de educação
superior do país, (...) (BRASIL, 2006a:1).
Aqui notamos a possibilidade de reflexão sobre a organização curricular dos
cursos de Pedagogia a qual se referiu Freitas no capítulo anterior, que o objetivo
primeiro e único é oferecer um quadro geral que garanta a base comum nacional – a
qual também discutimos, no segundo capítulo necessária para colaborar com a
consolidação do curso e, conseqüentemente, da identidade do profissional que
forma.
169
O segundo artigo fica responsável por delinear que profissional é formado na
pedagogia, e aqui se inicia análise mais próxima do tema que estamos tratando. Diz
o artigo segundo da referida resolução:
Art. As Diretrizes Curriculares para o curso de Pedagogia aplicam-se à
formação inicial para o exercício da docência na Educação Infantil e nos
anos iniciais do Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino Médio, na
modalidade Normal, e em cursos de Educação Profissional na área de
serviços e apoio escolar, bem como em outras áreas nas quais sejam
previstos conhecimentos pedagógicos. (BRASIL, 2006a:1). (grifo nosso).
Como é possível depois de tantos encontros e desencontros, discussões,
homologações de pareceres e resoluções, aparecer a presença da possibilidade da
existência de cursos Normais em nível de Ensino Médio para a formação de
professores das séries iniciais do ensino fundamental e educação infantil, se era
consenso e lei parecer CNE/CP 1/2002, tratado no segundo capítulo desta
dissertação – que a formação de tais profissionais seria concentrada no ensino
superior, permitindo, apenas no período de transição, que se encerra em 2007, como
apontou Saviani no capítulo anterior, a manutenção de tais cursos?
Ora, se a manutenção dos mesmos é temporária, transitória, não motivos
para formar profissionais aptos a trabalharem nos mesmos.
Além desta contradição legislativa, a própria redação acaba acirrando tal
contradição quando aponta, no artigo que estamos discutindo, que as diretrizes são
para a formação inicial, logo, não nada, ou não deveria haver, nada, que a
antecedesse.
170
O que sustenta o Normal é o parecer 1/99 do Conselho Nacional de Educação
e Conselho de Educação sica, mas o qual realiza reflexão aprofundada de que
não apenas a categoria profissional como o Estado-Nação, pretendem que a
formação se no ensino superior, e ainda que assim não fosse, não apenas o
parecer CNE/CP 1/2002 o teria revogado, como também as diretrizes.
Como pode, então, um artigo definir que a formação inicial se nos cursos
de ensino superior, mas mesmo assim vazão para a formação de profissionais
que lecionem em nível normal e sejam responsáveis pela formação de outros
profissionais da mesma categoria, porém num nível diferenciado?
A discussão realizada no capítulo anterior demonstrou que não apenas um
tempo maior para o desenvolvimento da formação do profissional é necessário, como
também o entrelace dos saberes de gestão e de atividade formativa, para que se
atinja o objetivo de uma formação plena e aprofundada, o que dificilmente ocorrerá
num curso com duração de três anos, com enfoque totalmente docente, voltado para
a organização técnica profissional, quando o exercício da pedagogia, da ciência da
educação, vai muito além.
Desta forma apenas vemos que o propósito das diretrizes, que é a
concentração e organização da formação do pedagogo em nível superior, não se
concretiza por completo.
171
A possibilidade de formação em nível superior e médio, mantém a desordem
que até então foi criticada, e contribui com a dificuldade em delinear qual a
identidade do pedagogo, que os profissionais que a Pedagogia forma, também
podem ser formados em outros níveis – ensino médio: professores das séries iniciais
e educação infantil; pós-graduação: gestores escolares.
Mais uma vez o curso de Pedagogia aparenta estar perdendo espaço de
atuação, principalmente pelo fato de adotar uma base docente
8
, isto é, tornando-se,
declaradamente um curso de licenciatura, disputa interessados com o ensino médio
que fica responsabilizado pelo nivelamento por baixo do qual falou Saviani, e que
não deveríamos deixar ocorrer.
Por outro lado, voltando o olhar para a graduação especificamente, os incisos
do parágrafo único do artigo terceiro preocupam-se em garantir que as grades
curriculares dos cursos de Pedagogia realizem articulação dos saberes sobre
organização e funcionamento escolar com os saberes de docência, assim expondo:
Parágrafo único. Para a formação do licenciado em Pedagogia é central:
I - o conhecimento da escola como organização complexa que tem a função
de promover a educação para e na cidadania;
II - a pesquisa, a análise e a aplicação dos resultados de investigações de
interesse da área educacional;
III - a participação na gestão de processos educativos e na organização e
funcionamento de sistemas e instituições de ensino. (BRASIL, 2006a:1)
8
O parágrafo primeiro do segundo artigo da resolução 1/2006 intensifica a presença desta base docente e sua
importância no desenvolvimento do curso.
172
E também se lembra de abordar os espaços não formais e informais de
educação nos incisos do parágrafo único do artigo quarto, que possui o caput como
cópia ipsis literis do artigo segundo do mesmo documento:
Parágrafo único. As atividades docentes também compreendem
participação na organização e gestão de sistemas e instituições de ensino,
englobando:
I - planejamento, execução, coordenação, acompanhamento e avaliação de
tarefas próprias do setor da Educação;
II - planejamento, execução, coordenação, acompanhamento e avaliação
de projetos e experiências educativas não-escolares;
III - produção e difusão do conhecimento científico-tecnológico do campo
educacional, em contextos escolares e não-escolares. (BRASIL, 2006a:2)
Estes e outros saberes são reforçados no artigo quinto, que possui dezesseis
incisos e dois parágrafos, o primeiro deles voltado para a educação indígena, e o
segundo para a educação de quilombolas.
De fato são muitos os saberes e as articulações a serem realizadas por este
profissional formado na Pedagogia, seja qual for a sua escolha de atuação gestão
ou docência -; diante disto é preciso considerar a ressalva feita por Libâneo (2005)
sobre a aquisição de tantas informações, e o processo pelo qual se deram.
Ainda é possível apostar no uso da pesquisa como metodologia para driblar
este problema, de forma que a valorização do exercício da profissão enquanto
estudante, subsídios para a reflexão consciente na aquisição do conhecimento.
Interessante notar que palavras como “vivência”, “participação” e “construção” se
fazem inúmeras vezes presentes no corpo da lei.
173
O artigo sexto trata da organização curricular sica que deve estar presente
no planejamento dos cursos, e sustenta a necessidade de articulação de saberes
docentes e gestionários. Traz informações interessantes para, futuramente,
desenvolver pesquisa sobre a organização curricular dos cursos de pedagogia com
base nas diretrizes publicadas e aprofundar a discussão acerca do tempo e da
qualidade de organização do curso.
O artigo sétimo complementa o sexto, trazendo a carga horária mínima para a
implementação e funcionamento do curso.
o oitavo artigo fortalece a possibilidade de adotar a pesquisa como
metodologia de desenvolvimento do curso como havíamos apontado anteriormente,
pois trata dos estágios supervisionados e sua importância assunto também
rapidamente explorado por s no segundo capítulo -, lembrando tanto das
atividades docentes quanto das de gestão.
Consideram também, no texto da lei, a importância da participação do aluno
nas atividades acadêmicas, como programas de extensão, iniciação científica,
monitoria e outros tipos de atividade que a instituição possa oferecer; demonstrando,
assim, preocupação com a organização de um curso baseado no tripé universitário
ensino-pesquisa-extensão.
O artigo nono nos traz de volta a discussão dos níveis em que a formação
pode ser oferecida, pois seu texto apresenta a seguinte redação:
174
Art. Os cursos a serem criados em instituições de educação superior,
com ou sem autonomia universitária e que visem à Licenciatura para a
docência na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental,
nos cursos de Ensino Médio, na modalidade Normal, de Educação
Profissional na área de serviços e apoio escolar e em outras áreas nas
quais sejam previstos conhecimentos pedagógicos, deverão ser
estruturados com base nesta Resolução. (BRASIL, 2006a:5).
Pedir para que os cursos de Ensino Médio, na modalidade normal, sigam as
mesmas orientações voltadas para um curso universitário, iguala a educação básica
ao ensino superior e sabemos que são níveis diferentes de trabalho educativo, se
assim não fosse, não haveria motivos para desta forma denominá-los.
Além do mais toda a preocupação com o tripé universitário e a proposta de
estágio e reflexões fica prejudicada, que as Instituições de Educação sem
autonomia universitária e os cursos de ensino médio na modalidade normal, não
poderão atender a estas demandas, importantíssimas para o bom desenvolvimento
de um curso que vise a formação de profissionais da educação competentes e
conscientes.
O que notamos é a perda de mais da metade do texto legislativo que, com
relação ao embasamento teórico e às propostas principais se mostra
interessantíssimo, fica impossibilitado de ser desenvolvido devido às estruturas a que
se dirige e a vazão dada à possibilidade de execução do curso por outros níveis
educacionais e instituições.
175
O problema, que deveria ser resolvido, não foi. Apenas reduziu a quantidade
de ênfases possíveis na formação, mas não atingiu seu cerne principal: organizar o
curso de pedagogia e identificar para que serve e quem ele forma.
Por fim, o parágrafo primeiro do artigo décimo quarto, ratifica a possibilidade
de obter a formação profissional idealizada pelo parecer nos cursos de s-
graduação.
Estas são as diretrizes para o curso de pedagogia, que existe mais de um
século no país, mas que até então o teve sua identidade delimitada, ainda divide
palco com outros cursos que podem e formam os mesmos (?) profissionais.
4.2 O que tínhamos, o que deveríamos ter e o que temos.
Até então realizamos um estudo histórico-legislativo sobre a organização do
curso de pedagogia, que durante todo o tempo procurou se consolidar de forma a
encontrar o seu espaço, a sua identidade, o seu propósito. Ainda que muitas coisas
não estivessem claras, a categoria foi fortalecendo e amadurecendo seu pensamento
sobre o contexto social que abarcava a vertente educação e a consolidação da
mesma diante das ações de seus profissionais.
Não podemos dizer que a má organização do curso não formou boas cabeças,
bons professores, bons gestores, pois são estes que pensam, hoje, a educação, que
lutam por um diálogo mais coletivo e menos impositivo em nossa sociedade.
176
É como Freire nos disse: O mundo não é. O mundo está sendo. (1996:85), o
curso de pedagogia foi, é e está sendo discutido. Não é pelo fato de terem publicado
as diretrizes do curso de pedagogia, que, como vimos, trazem muitos problemas em
sua redação, coerência legislativa e de assunção de identidade por parte da
categoria a qual forma, que pararemos de requerer e lutar por uma organização
educacional coerente.
O importante é que o pedagogo se reconheça como parte de uma coletividade
que luta pela educação, e que na sua individualidade assuma as falhas de seu
processo formativo e construa, numa ação reflexiva consigo e com seus pares,
formas de superar lacunas deixadas pela formação desarticulada que está posta.
A identidade do pedagogo é clara. É profissional responsável pelo
desenvolvimento das atividades formativas dentro e fora da sala de aula, pois isto é
também trabalho de gestão. É profissional responsável pela emancipação
educacional onde quer que a educação seja discutida, pois ele é o estudioso da
ciência educação. É profissional responsável pela articulação de crescimento e
emancipação social, pois a sociedade se desenvolve pelos seres humanos que
passam por processos diversos de formação, idealizados e estruturados, nos mais
diversos níveis, por pedagogos.
A identidade é clara porque é o profissional que vemos primeiro séries
iniciais -, durante auxiliando o corpo docente na estruturação escolar -, e no final
177
se responsabilizando por certificar a conclusão de todo e qualquer estudante da
vida escolar e acadêmica.
É profissional que merece respeito na organização de suas diretrizes já que é,
em parte, responsável pela formação social. Sua identidade jamais deveria ser
confundida ou dividida com qualquer outra, pois é única, consistente, necessária.
Hoje, o que temos, é um passo a mais diante de tudo aquilo que tínhamos na
legislação. Conforme o Estado-Nação amadurece sua relação com a sociedade
que em verdade deveria estar amadurecida que a serve -, uma estrutura é
construída, mas não se torna imutável, tampouco paralisa-se.
O que deveríamos ter são diretrizes que assumam a responsabilidade de
concentrar a formação do pedagogo no curso de Pedagogia em nível superior, pois
a contemplação das atividades docentes e de gestão e a possibilidade de
serem feitas através da pesquisa como metodologia de trabalho.
“Especialistas, professores ou pedagogos: afinal, que profissional é formado
na Pedagogia?” Estamos caminhando para a construção de um curso de Pedagogia
que forme um profissional: o Pedagogo professor de séries iniciais consciente do
trabalho do gestor administrativo e habilitado para exercer o cargo caso assim
deseje; e o Pedagogo, gestor escolar, consciente do trabalho dos professores das
séries iniciais e habilitado para exercer a docência se assim desejar, onde o
178
profissional formado no curso de Pedagogia reconheça a existência de uma
pluralidade de saberes e pessoas a serem contempladas.
Mas, infelizmente, não se prevê esta formação apenas no curso de
Pedagogia, como já, exaustivamente discutimos. Agora, a pergunta que fazemos é:
quem são os profissionais formados no ensino médio modalidade normal, e os
licenciados inscritos em pós-graduação para obtenção de habilitação para a gestão
escolar? Pedagogos, não são.
179
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Eis Germa, eis a sua vez agora e o tempo de traduzir a voz
de sua sibila. Talvez, porém, o seu tempo seja improdutivo
e nefasto, e ela fique de facto mais silenciosa, porque – quem
é ela para ser um pouco mais do que Quina e esperar que os
tempos novos sejam mais aptos a esclarecer o homem e a
trazer-lhe a solução de si próprio? Talvez ela fique de facto
imóvel no seu constante, e a sua história fique hermeticamente
fechada no círculo de aspirações que não conseguiu detalhar
e cumprir, porque aconteceu ser cedo ou ser tarde, porque não se
compreende ou não se crê o bastante, porque se deseja demasiado e
isto é todo o destino, porque...porque...
(BESSA-LUÍS, 2000:252).
Realizamos, no curso deste trabalho, um resgate histórico-legislativo que
procurou abarcar desde as primeiras ações educacionais voltadas para atividades
pedagógicas acompanhando a evolução da categoria, do curso e da identidade
profissional do pedagogo de forma que centrássemos a discussão nos parâmetros
hoje existentes: LDBEN 9394/96 e Diretrizes do Curso de Pedagogia.
Ao tratar da LDBEN 9394/96 notamos inúmeros desencontros legislativos que
prejudicavam a organização da categoria e, conseqüentemente, do sistema escolar.
Não havia homogeneidade nos cursos de formação de pedagogos e professores de
séries iniciais e/ou educação infantil.
Diante disto, consultamos estudiosos da área para construir um esboço das
características profissionais do pedagogo procurando reconhecer seu espaço de
atuação e sua identidade profissional, com o intuito de reencontrá-lo em meio a
tantas possibilidades formativas, dando significância à existência do curso de
Pedagogia e seus frutos.
180
Por fim, nos aventuramos na realização de uma reflexão acerca das diretrizes,
as quais foram promulgadas com o intuito de reorganizar as indicações legislativas
propostas pela LDBEN 9394/96 e pareceres subseqüentes.
Nesta reflexão percebemos que as diretrizes ressignificaram o curso de
Pedagogia, mas ainda deixaram perdidas as identidades profissionais dos alunos
que optam pela gestão educacional e dos que optam pela atuação docente nas
séries iniciais e educação infantil, pois a base fortemente docente com diálogo
gestionário, perde significado diante das possibilidades de formação em nível médio
na modalidade normal para docentes das séries iniciais e educação infantil, e em
nível superior na pós-graduação para gestor educacional.
Ressaltamos, ainda, que nossa escolha por enfatizar o exercício da docência
nas séries iniciais e educação infantil, justifica-se pela influência e presença histórica
desta parte da docência na vida profissional e formativa do Pedagogo, o que não
deve nos cegar para o reconhecimento de possibilidades de exercer a docência em
outros níveis previstos, inclusive, no artigo das Diretrizes do curso de Pedagogia;
assim como não deve cegar a prática do gestor, que formado em congruência com o
docente para as séries iniciais e para outras atividades que envolvam saberes
pedagógicos, precisa compreender a totalidade escolar que se dá, diariamente, nos
mais diversos níveis e modalidades.
Assumir a formação de um profissional completo como é a proposta das
Diretrizes para o curso de Pedagogia, é assumir tratar em 3.200 horas todo o
181
complexo educacional habilitando o Pedagogo para trabalhar em todo âmbito que o
envolve.
No nosso entender o curso de Pedagogia não é bacharelado, tampouco
licenciatura, uma dicotomia que, depois de décadas, retornou desnecessariamente,
pois a formação do Pedagogo é a formação plena, isso significa poder ser bacharel e
licenciado; significa ser Pedagogo, porque é característica de sua identidade
profissional poder exercer tanto a docência quanto a gestão conscientes.
Embora dificuldades tenham sido apontadas em nosso trabalho,
diferentemente de Germa, não acreditamos que nosso tempo tenha sido improdutivo,
mas pode vir a ser quando e se a categoria profissional ignorar a discussão a ser
realizada. É preciso continuar lutando, discutindo, cobrando ações dos pares, da
sociedade, e do Estado.
O Pedagogo é um profissional com espaço muito bem delimitado, como
percebemos em nossa análise de dados, logo, merece o mesmo cuidado com sua
formação.
Nosso intuito foi o de registrar as inúmeras faces que o curso teve durante a
história e investigar, junto àqueles que discutem conosco, os propósitos da categoria
profissional. A idéia sobre a identidade do pedagogo e a formação mais adequada
para obtê-la, está lançada. Fica a possibilidade de discussão prática desta idéia e
sua implementação para futuras pesquisas.
182
Por fim, é preciso registrar que a não anuência de outros respondentes à esta
pesquisa, nos impossibilitou de trabalhar com questões próprias de regiões e
realidades nacionais como a problemática de professores de séries inicias leigos no
nordeste; do professor de EJA Educação de Jovens e Adultos -; do professor que
deve estar pronto para receber pessoas com necessidades especiais dentro e fora
da sala de aula; das formas de contratação de diretores, orientadores, supervisores e
coordenadores nos Estados, bem como a existência de todos estes cargos ou não
nos mesmos, enfim... uma gama de questões que estão relacionadas com o nosso
tema, mas que não puderam ser trabalhadas aqui.
Sem dúvida, estas questões ficam como indicação de futuros temas a serem
discutidos junto à nossa categoria profissional, enriquecendo o debate e contribuindo
com a evolução do profissional.
183
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192
ANEXOS
193
ANEXO 1
QUESTIONÁRIO DIRIGIDO AO PROFESSOR DERMEVAL SAVIANI
1- O que V. entende por “professor”?
R. O professor, nas condições atuais de funcionamento dos sistemas de
ensino, é um educador que trabalha diretamente com os alunos, sendo responsável
por um segmento específico do processo formativo, seja esse segmento um nível de
ensino ou uma de suas ries, como ocorre com o “professor primário” (na
nomenclatura atual “professor das quatro primeiras séries do ensino fundamental”)
ou uma ou mais disciplinas que integram os currículos das escolas (professor de
matemática, de ciências, de história e geografia, de física, de filosofia, de direito
constitucional, de biologia molecular, de sociologia das profissões etc.).
2- O que V. entende por “pedagogo”?
O pedagogo, literalmente, é o especialista em pedagogia. E o que é
pedagogia? É teoria da educação. Ora, educação é uma atividade prática. Portanto,
a pedagogia é uma teoria da prática: a teoria da prática educativa. De fato, a palavra
pedagogia e, mais particularmente, o adjetivo pedagógico tem marcadamente
ressonância metodológica denotando o modo de operar, de realizar o ato educativo.
A pedagogia é, pois, uma teoria que se estrutura em função da ação, ou seja, é
elaborada em função de exigências práticas, interessada na execução da ação e nos
seus resultados. Em suma, a pedagogia, como teoria da educação, busca
equacionar, de alguma maneira, o problema da relação educador-educando, de
modo geral, e, no caso específico da escola, a relação professor-aluno, orientando o
processo de ensino e aprendizagem. Mas, se toda pedagogia é teoria da educação,
194
nem toda teoria da educação é pedagogia. Com efeito, encontramos determinados
tipos de teorias da educação cuja preocupação é explicar o fenômeno educativo sem
se preocupar com a questão da realização do ato educativo. Assim, o se
constituem como pedagogia aquelas teorias que analisam a educação pelo aspecto
de sua relação com a sociedade o tendo como objetivo formular diretrizes que
orientem a atividade educativa, como é o caso das teorias que chamei de “crítico-
reprodutivistas”. O pedagogo é, então, um profissional que busca compreender a
educação em suas várias determinações, nos diversos aspectos que a constituem,
tendo em vista organizar o processo educativo da maneira considerada a mais
adequada para garantir a eficácia do ato de educar. Considerando que, nas
condições atuais, a escola foi erigida em forma principal e dominante de educação, o
pedagogo será, precipuamente, ainda que não exclusivamente, um especialista na
forma de organização e no modo de funcionamento da educação escolar.
3- Em sua opinião, o curso de Pedagogia deveria contemplar que tipo de formação?
Lembrando que hoje os cursos de pedagogia formam, dependendo da instituição
em que são ministrados: professores das ries iniciais; profissionais da área de
administração escolar (orientação, supervisão, coordenação e direção); e ainda
outros que dão ambas as habilitações, sem esquecer dos normais superiores.
R. À vista do exposto na questão anterior, a formação a ser propiciada pelo
Curso de Pedagogia deveria contemplar todos os aspectos constitutivos da
educação, tendo como eixo a organização e o funcionamento das escolas. Tendo
claro esse eixo, penso que será viável formar, simultaneamente, o professor das
quatro primeiras séries do ensino fundamental, o especialista nos vários aspectos
195
ligados à gestão da escola, tais como administração e direção, coordenação
curricular e supervisão pedagógica, orientação educacional e escolar, assim como o
professor dos professores do ensino fundamental, isto é, o professor das escolas
normais e dos Institutos Superiores de Educação. Tratar-se-ia de uma formação
ampla e aprofundada, centradas nos fundamentos da educação a partir dos quais
seriam estudados os aspectos pedagógicos, didáticos, curriculares e organizacionais
das escolas tendo em vista a distribuição, no espaço e tempo destinados ao trabalho
pedagógico, dos ingredientes culturais necessários à formação das novas gerações.
É claro, pois, que esse tipo de formação poderá se dar em cursos de longa
duração, incompatíveis, portanto, com a idéia que levou à criação dos Institutos
Superiores de Educação.
4- O que pensa sobre a proposta de diretriz para o curso de Pedagogia apresentada
pela Anfope?
R. De modo geral, as considerações da ANFOPE e a proposta de diretrizes
curriculares para o Curso de Pedagogia por ela elaborada em conjunto com o
FORUNDIR e a ANPEd vão na direção das exigências por mim apontadas. No
entanto, penso que seria necessário assumir de modo claro e explícito o eixo da
organização e funcionamento das escolas pois, sem isso, a proposta tende a ficar
genérica e, dando margem a que se introduzam os mais diferentes tipos de
elementos, resultará numa formação dispersa, dificultando o preparo de agentes
(pedagogos) competentes para atuar de forma eficaz na elevação e garantia da
qualidade da educação escolar.
196
5- Em seu livro “A nova Lei da Educação (LDB): Trajetória, limites e perspectivas”, é
feita uma retrospectiva histórica acerca da organização das LDBs, assim como uma
contextualização e problematização da 9394/96. V. identifica algum tipo de
incoerência na letra da Lei em seu Título VI “Dos profissionais da Educação”, mais
especificamente aquele voltado para a formação do pedagogo?Se sim, qual?Acredita
que isto prejudica a organização das diretrizes do curso de Pedagogia?Por quê?
R. O artigo 62 da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB)
estabelece que a formação dos docentes para atuar na educação básica, que
abrange a educação infantil, o ensino fundamental e o ensino dio, passaria a ser
feita em nível superior. Portanto, o espírito da nova LDB era considerar o nível
superior como exigência para a formação de professores de todos os tipos. Na
prática isso significava passar ao nível superior a formação dos professores da
educação infantil e das quatro primeiras séries do ensino fundamental, até então
realizada predominantemente em nível médio. Na letra da lei houve, porém, duas
falhas: uma de redação e a outra de técnica legislativa.
A falha de redação ocorreu no parágrafo quarto do Artigo 87 das Disposições
Transitórias. Ali está escrito: "Até o fim da Década da Educação somente serão
admitidos professores habilitados em nível superior ou formados por treinamento em
serviço". Ora, literalmente isso significa que até o final da década da educação, que a
lei definiu como se iniciando "um ano a partir" de sua publicação, portanto, de 23 de
dezembro de 1997 a 22 de dezembro de 2007, somente seriam admitidos
professores formados em nível superior. Então, depois de 22 de dezembro de 2007,
não haveria essa exigência, o que significaria que seria possível admitir professores
sem formação superior. É evidente que há, aí, um erro de redação. O que se queria
197
dizer, e todos assim entenderam, é que a partir do fim da década da educação
somente seriam admitidos professores habilitados em nível superior. Assim, os dez
anos seriam um período de transição, após o que a regra não admitiria mais
exceção. Mas essa falha não chegou a ter conseqüência porque, ao que parece,
ninguém a notou. Já a falha de técnica legislativa, esta provocou conseqüências.
A referida falha consiste em que, no artigo 62, fixa-se a regra de que a
formação de docentes para a educação básica será feita em nível superior. Mas, no
mesmo artigo, se introduz a exceção, admitindo-se como formação mínima o nível
médio, sem estabelecimento de prazo. E somente nas "Disposições Transitórias", no
mencionado parágrafo do artigo 87, se fixa um prazo de dez anos para que a regra
passe a valer plenamente. Ora, em termos de cnica legislativa caberia fixar, no
corpo da lei, a regra e, nas disposições transitórias, admitir-se a exceção no período
de transição. Assim, o artigo 62 deveria, simplesmente, estabelecer que a formação
de docentes para a educação básica seria feita em nível superior. E, nas disposições
transitórias, registrar que, até o fim da década da educação se admitiria, como
formação mínima, a oferecida em nível dio. Nesse caso, sim, caberia na redação
a expressão "até o fim da década", referida à formação em nível médio, que deveria
cessar, dando lugar à norma fixada pela lei que exige a formação em nível superior.
Diante dessa situação, mal a lei foi aprovada começaram a surgir
interpretações, provindas geralmente dos empresários do ensino que mantinham
cursos de magistério de nível médio, dando conta que, juridicamente, as disposições
transitórias não poderiam prevalecer sobre o corpo da lei. E como a formação
mínima em nível médio estava no corpo da lei, isso significava que se tratava de uma
198
disposição permanente. Portanto, as escolas de formação do magistério em nível
médio poderiam continuar existindo, sem problema algum.
Finalmente, o próprio Ministério e o Conselho Nacional de Educação
acabaram chancelando essa interpretação. Ora, o lógico seria que fosse aprovada
uma emenda à LDB, corrigindo a falha apontada. Cabe lembrar que, por pressões da
CNBB, em relação ao ensino religioso, apenas seis meses após a aprovação da LDB
aprovou-se uma lei excluindo do texto da LDB a expressão "sem ônus para os cofres
públicos", o que veio a tornar possível que o Estado arque com os custos da oferta
de ensino religioso nas escolas públicas. Nesse caso, para atender a um segmento
da iniciativa privada, a Igreja, mudou-se o texto da lei. Em relação à formação de
professores atendeu-se à iniciativa privada evitando-se mudar o texto da lei,
sacrificando, porém, o seu espírito.
O mesmo artigo 62, que pretendia elevar a formação de todos os docentes
para o nível superior, introduziu uma outra instância formativa: os Institutos
Superiores de Educação, como está explícito no teor completo do enunciado do
artigo:
A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível
superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e
institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o
exercício do magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries
do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade Normal”
(BRASIL, 1996).
É provável que a introdução dos institutos superiores de educação no texto da
lei tenha se originado do “Programa de Valorização do Magistério”, de iniciativa da
Secretaria do Ensino Fundamental do MEC na gestão de Murílio Hingel, nos anos de
199
1992 e 1993. Essa iniciativa buscou, com base no Programa de Cooperação
Educativa Brasil-França, implantar Institutos Superiores de Formação de Professores
no Brasil, inspirados na experiência francesa dos Institutos Universitários de
Formação de Mestres.
O artigo 63 da LDB dispõe que "os Institutos Superiores de Educação
manterão”:
I cursos formadores de profissionais para a educação básica, inclusive o
curso normal superior, destinado à formação de docentes para a educação
infantil e para as primeiras séries do ensino fundamental;
II programas de formação pedagógica para portadores de diplomas de
educação superior que queiram se dedicar à educação básica;
III programas de educação continuada para os profissionais de educação
dos diversos níveis (BRASIL, 1996).
Se no inciso I estivesse escrito "cursos formadores de professores para a
educação básica", nós poderíamos concluir que os Institutos Superiores de
Educação formariam os professores para a educação infantil e as quatro primeiras
séries do ensino fundamental por meio da escola normal superior e, além disso,
poderiam formar, também, os professores para as 4 últimas do fundamental e para o
ensino médio. E os profissionais especificados no artigo 64 poderiam ser
formados nos cursos de pedagogia ou em pós-graduação, conforme reza o referido
artigo:
A formação de profissionais de educação para administração,
planejamento, inspeção, supervisão e orientação educacional para a
educação básica, será feita em cursos de graduação em pedagogia ou em
nível de pós-graduação, a critério da instituição de ensino, garantida, nesta
formação, a base comum nacional (IBIDEM).
200
Ocorre que, em lugar de "cursos formadores de professores", está escrito
"cursos formadores de profissionais", o que conduz à interpretação de que, além de
professores, os Institutos podem formar profissionais da educação básica, ou seja,
os administradores, planejadores, inspetores, supervisores e orientadores
educacionais mencionados no artigo 64.
Por esse caminho os Institutos Superiores de Educação se constituiriam
como alternativa aos Cursos de Pedagogia e Licenciatura, podendo fazer tudo o que
estes fazem, porém, de forma mais aligeirada, mais barata, com cursos de curta
duração. E isso também o deixa de corresponder ao espírito da LDB, pois esta
participa da mesma lógica que vinha presidindo a política educacional que tinha
como uma de suas características a diversificação de modelos. Assim, onde fosse
possível e houvesse recursos para tanto, seriam instalados os cursos de graduação
de longa duração, leia-se, pedagogia e licenciaturas. Mas como uma alternativa a
esse modelo haveria os Institutos Superiores de Educação.
Podemos, pois, concluir que as esperanças depositadas na nova Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional, consubstanciadas na Lei n. 9.394 de 20
de dezembro de 1996, no sentido de que ela viesse a enfrentar com êxito o problema
da formação de professores, resultaram frustradas: abortou-se o dispositivo legal que
elevaria o preparo de todos os professores ao nível superior e a inovação dos
institutos superiores de educação representa um forte risco de nivelamento por
baixo.
Com certeza essas questões, imprecisões e incertezas interferiram no
problema da definição das diretrizes curriculares do Curso de Pedagogia que, por
sinal, até agora não foi equacionada.
201
ANEXO 2
QUESTIONÁRIO DIRIGO A PROFESSORA LÉA ANASTASIOU
1- O que V. entende por "professor"?
Professor é o profissional que,na sua lida cotidiana, trabalhar com a formação
do estudante através do processo de ensinagem. Um ser humano que tem a
interação na base de sua ação profissional, portanto, lida com escolhas e tem a ética
humana como base da ação entre os homens.
2- O que V. entende por "pedagogo"?
Etimologicamente, é aquele que conduz a criança. No caso da educação, a
ação do pedagogo abrange o estudo dos processo de formação do estudante, seja
de que faixa etária for,. mas abrange tb o sistema de ensino, a legislação, a gestão a
informação e do saber escolar, as relações entre os sujeitos que constituem os
sistemas educacionais e em especial, processo de formação inicial e continuada dos
docentes, parceiros institucionais
3- Em sua opinião, o curso de Pedagogia deveria contemplar que tipo de formação?
Lembrando que hoje os cursos de pedagogia formam, dependendo da instituição em
que são ministrados: professores das séries iniciais; profissionais da área de
administração escolar (orientação, supervisão, coordenação e direção); e ainda
outros que dão ambas as habilitações, sem esquecer dos normais superiores.
Uma formação direcionada para a complexidade do fenômeno educacional. As
diversas áreas de conhecimento que compõem o curso deveriam estar voltadas para
202
o foco "educação", portanto, servirem de instrumentos de conhecimento e
compreensão da realidade educacional. Portanto, uma formação onde a relação
teoria e prática fosse uma constante e a base da progressiva caminhada dos
estudantes pedagogos.
4- O que pensa sobre a proposta de diretriz para o curso de Pedagogia
apresentado pela Anfope?
SEM RESPOSTA
5- dois trabalhos seus, um livro "Processos de Ensinagem na Universidade",
e um capítulo intitulado "Construindo a docência no ensino superior: relação entre
saberes pedagógicos e saberes científicos", no livro "Didática e Práticas de ensino:
interfaces com diferentes saberes e lugares formativos", nos quais v. demonstra
certa preocupação com a relação teoria e prática, objetivando trabalhos de qualidade
em sala de aula. Trazendo esta visão plena de educação, como você concebe,
então, a dicotomização da formação do pedagogo administrador do pedagogo
professor? divisão entre teoria e prática, trabalho "manual" e trabalho
intelectual?Por quê?
Atuei nos sistemas de ensino da rede publica e privada, nas series iniciais,
intermediarias como docente, supervisora, diretora e inspetora escolar ( cargos
existente na década de 80) e no ensino superior como docente.. Em todos , senti
como elemento essencial a compreensão de vários determinantes: a legislação e a
estrutura, tão fortemente presentes na formação do administrador, são igualmente
importantes para a formação do professor docente; e os saberes da docência são
203
essenciais para o desempenho de um bom administrador. Deve ser extremamente
difícil efetivar a gestão de uma escola sem ter vivido a sala de aula. Existe uma
especificidade própria a teoria e à prática, mas a formação que integre estes dois
âmbitos de estudo e compreensão da realidade é que seria o ideal e o necessário,
do meu ponto de vista. A dicotomia se efetiva por ser este o principio educativo do
ensino tradicional que permanece vigente entre nos, ainda hoje. Para a preparação
para atuar na educação formal, é necessário o entrelaçamento dos elementos tanto
da teoria, existente em nossa herança cultural, quanto da vivência, analise e
compreensão da prática educativa. O ponto nodal esta no como fazer isto, uma vez
que muitos dos docentes que atuam na formação de pedagogos desconhecem a
instituição "escola brasileira", por não haver ali atuado e por não fazer dela seu locus
de pesquisa.
204
ANEXO 3
QUESTIONÁRIO DIRIGIDO A PROFESSORA MARIA ROSA MARAFON
1- O que V. entende por "professor"?
No meu ponto de vista o professor é um educador. Portanto, o seu trabalho no
ensino de conhecimentos programáticos e sistematizados deve objetivar a formação
do aluno como um todo. Assim sendo, a seleção dos conteúdos e das metodologias
se faz fundamentada em princípios e valores que se referem ao homem/mulher em
todas as suas dimensões vitais e numa perspectiva histórica.
2- O que V. entende por "pedagogo"?
O pedagogo é o educador por excelência, uma vez que tem a educação como
objeto de estudo/pesquisa e de atuação profissional. Assim, deve estar apto a
exercer tanto a docência, como outras funções que têm a educação como objetivo
e/ou preocupação.
3- Em sua opinião, o curso de Pedagogia deveria contemplar que tipo de formação?
Lembrando que hoje os cursos de pedagogia formam, dependendo da instituição em
que são ministrados: professores das séries iniciais; profissionais da área de
administração escolar (orientação, supervisão, coordenação e direção); e ainda
outros que dão ambas as habilitações, sem esquecer dos normais superiores.
205
Tendo em vista que não concebo o pedagogo somente como professor, penso
que no Curso de Pedagogia, para formar o profissional, deve-se estudar e pesquisar
a educação no sentido amplo e aprofundado, inclusive a educação formal deve ser
tratada de forma abrangente. Deve oferecer oportunidades aos alunos de
aprofundar-se nos estudos e preparar-se profissionalmente para as áreas de atuação
existentes na sociedade. Isso pode ser feito por meio das propostas curriculares
desenvolvidas nos Projetos Pedagógicos dos cursos que devem apresentar
claramente suas opções de formação.Referindo-se à educação formal, considero
necessária e possível a formação articulada de professor e de coordenador das
atividades pedagógico –educacionais e administrativas, dada durante 4 ou 5 anos.
4- O que pensa sobre a proposta de diretriz para o curso de Pedagogia
apresentado pela Anfope?
A proposta da Anfope sobre diretrizes curriculares nacionais para o Curso de
Pedagogia é fruto de muitos estudos e debates dos profissionais da área de
educação e reflete a preocupação de rejeitar a fragmentação e o enfoque tecnicista
na formação do pedagogo. Considero a proposta melhor do que a do Conselho
Nacional uma vez que concebe o pedagogo como profissional que deve ter uma
visão abrangente e aprofundada da educação, propõe sua formação baseada na
relação teoria e prática, salientando a importância da pesquisa e destaca sua
atuação “...no ensino, na organização e gestão de sistemas, unidades e projetos
educacionais e na produção e difusão do conhecimento em diversas áreas da
educação...” (art. 9°}.
206
5- Como vê o uso da pesquisa no campo de formação do Pedagogo?
No meu entender a pesquisa, na formação do pedagogo, não é um momento
mas uma diretriz, uma vez que se constitui caminho metodológico para os
professores do curso. Penso um projeto de formação assumido por todos os
docentes e que ofereça ao aluno oportunidades de vivenciar os diferentes níveis de
um processo científico de formação. Para que o processo não seja fragmentado, o
aluno aprende no desenvolvimento de uma investigação todos os procedimentos
necessários e que são ensinados por vários professores e não em uma única
disciplina. O curso deve oferecer oportunidades diversificadas de desenvolvimento
de pesquisas e, se todas elas forem socializadas e debatidas, penso que
desaparecerá a barreira que se coloca na formação do pedagogo entre ser professor
e ser especialista. É sabido que na educação formal as questões e os desafios da
sala de aula estão imbricados com os da escola e os do sistema de ensino.
207
ANEXO 4
QUESTIONÁRIO DIRECIONADO A PROFESSORA HELENA DE FREITAS
1- O que V. entende por "professor"?
Professor é o profissional da educação que exerce mediação no processo de
conhecimento dos alunos, cria as condições necessárias nos espaços educativos -
planejamento, organização e seleção dos conteúdos, desenvolvimento e avaliação
dos processos formativos - a partir da compreensão da totalidade do processo de
formação humana, na escola, e outros ambientes educativos. Nesse sentido
aproxima-se da concepção do pedagogo que o movimento dos educadores defende
historicamente, no âmbito da ANFOPE.
2- O que V. entende por "pedagogo"?
SEM RESPOSTA
3- Em sua opinião, o curso de Pedagogia deveria contemplar que tipo de formação? -
Lembrando que hoje os cursos de pedagogia formam, dependendo da instituição em
que são ministrados: professores das séries iniciais; profissionais da área de
administração escolar (orientação, supervisão, coordenação e direção); e ainda
outros que dão ambas as habilitações, sem esquecer dos normais superiores.
É nosso entendimento que as Diretrizes Curriculares para o curso de
Pedagogia recentemente aprovadas, contemplam a formação do pedagogo para a
docência na educação básica, na formação das crianças de 0 a 10, e a gestão, bem
como para as demais funções do magistério, sem a fragmentação das habilitações
como vinham sendo até o momento estruturados os cursos. De nosso pointo de
208
vista, este é um grande avanço , de significado histórico, na medida em que
contempla as reivindicações dos educadores ao longo dos últimos 25 anos de luta
pela formação.
4- O que pensa sobre a proposta de diretriz para o curso de Pedagogia apresentado
pela Anfope?
Não uma proposta de diretrizes apresentada pela ANFOPE, A proposta de
Diretrizes de 99, foi construída amplamente, com a participação de todos os Cursos
de Pedagogia do país, com os estudantes, as entidades ANFOPE, FORUMDIR,
ANPEd e ANPAE, de nível nacional. Estas diretrizes, foram, sendo modificadas e
grande parte de suas formulações, contempladas na proposta aprovada pelo CNE
em dezembro de 2005 e homologada em maio de 2006.
5- Diante de sua vasta experiência na área de formação de professores, como
interpreta o atual momento da formação deste profissional?
Acredito que estamos iniciando uma etapa de construir currículos de formação
dos pedagogos que, tendo como base a docência, possam tratar da formação de
forma articulada - docência, gestão e pesquisa - contribuindo para fortalecer a
formação de profissionais para a educação básica que tenham pleno domínio das
condições objetivas da escola blica e possam contribuir para as transformações
necessárias no campo do trabalho pedagógico, da organização da escola, dos
processos formativos das crianças, jovens e adultos em nosso país.
209
ANEXO 5
CONSENTIMENTO DO PROFESSOR JOSÉ CARLOS LIBÂNEO EM
PARTICIPAR DA PESQUISA
De:
libaneojc <libaneojc@uol.com.br>
Data:
21/09/2005 (05:39:01)
Assunto:
Re:Pesquisa de mestrado - PUCCAMP
Prioridade:
Normal
Para:
'f.spaolonzi' <f.spao[email protected]>
[ ver cabeçalho da mensagem ]
Ana Elisa, estou atualmente n a Espanha em pos-doutorado, ficarei ate janeiro, mas se
valer respostas por e-email posso colaorar com vc,
um abraço
Libaneo
> Caro Prof. Dr. José Carlos Libâneo,
>
> Meu nome é Ana Elisa Spaolonzi Queiroz Assis. Sou aluna do Programa de
210
> Pós-Graduação em Educação da Pontifícia Universidade Católica de Campinas e
> estou sendo orientada pela professora Dra. Maria Eugênia Castanho.(Estive no
> congresso de Educação no Chile em 2004 e chegamos a conversar um pouco por
> lá.) Optamos por alguns nomes, dentre eles o de VSª, para colaborarem com a
> minha pesquisa, a qual se destina a problematizar as várias vertentes que
> envolvem a formação dos professores-pedagogos e suas dimensões, promovendo
> discussões e procurando compreendê-las sob a ótica da LDBEN e demais
> documentos e legislações pertinentes, assim como opiniões de teóricos da
> área.
> Em primeiro lugar gostaríamos de saber se VSª concorda em colaborar com a
> pesquisa realizando, via e-mail, uma pequena entrevista e permitindo que
> suas respostas sejam utilizadas como material (segue o teor das questões em
> anexo, se quiser, de imediato retornar com as questões já respondidas,
> agradecemos.).
> Em segundo lugar será possível nos conhecermos na Anped, já que estarei
> participando do evento juntamente com a Profa. Maria Eugênia, desta forma
> VSª saberá com quem está colaborando.
> Sem mais e aguardando, ansiosamente, a resposta de VSª,
>
> Ana Elisa Spaolonzi Q. Assis.
> Fone: (19)97928516
> e-mail: f.spaolonzi@ig.com.br
>
>
>
>
> Perguntas:
>
> 1- O que V. entende por “professor”?
> 2- O que V. entende por “pedagogo”?
> 3- Em sua opinião, o curso de Pedagogia deveria contemplar que tipo de
> formação? –Lembrando que hoje os cursos de pedagogia formam, dependendo da
> instituição em que são ministrados: professores das séries iniciais;
> profissionais da área de administração escolar (orientação, supervisão,
> coordenação e direção); e ainda outros que dão ambas as habilitações, sem
> esquecer dos normais superiores.
> 4- O que pensa sobre a proposta de diretriz para o curso de Pedagogia
> apresentado pela Anfope?
> 5- Em seu livro “Pedagogia e Pedagogos, para quê?” é possível compreender
> que defende a necessidade de várias vertentes de formação do pedagogo,
> inclusive e principalmente a do profissional especialista; sendo assim,
> acredita ser este sistema formativo pluralizado que temos atualmente, o
> ideal?Por que?(Normais superiores dos mais variados tipos; cursos de
> Pedagogia com as mais variadas vertentes).
211
ANEXO 6
DIRETRIZES CURRICULARES PARA O CURSO DE PEDAGOGIA
CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO
CONSELHO PLENO
RESOLUÇÃO CNE/CP Nº 1, DE 16 DE MAIO DE 2006.
Institui Diretrizes Curriculares Nacionais para o
Curso de Graduação em Pedagogia, licenciatura.
O Presidente do Conselho Nacional de Educação, no uso de suas
atribuições legais e tendo em vista o disposto no art. 9º, § , alínea “e” da Lei
4.024, de 20 de dezembro de 1961, com a redação dada pela Lei 9.131, de 25 de
novembro de 1995, no art. 62 da Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996, e com
fundamento no Parecer CNE/CP 5/2005, incluindo a emenda retificativa constante
do Parecer CNE/CP 3/2006, homologados pelo Senhor Ministro de Estado da
Educação, respectivamente, conforme despachos publicados no
DOU de 15 de maio de 2006 e no DOU de 11 de abril de 2006, resolve:
Art. A presente Resolução institui Diretrizes Curriculares Nacionais para o
Curso de Graduação em Pedagogia, licenciatura, definindo princípios, condições de
212
ensino e de aprendizagem, procedimentos a serem observados em seu
planejamento e avaliação, pelos órgãos dos sistemas de ensino e pelas instituições
de educação superior do país, nos termos explicitados nos Pareceres CNE/CP nos
5/2005 e 3/2006.
Art. As Diretrizes Curriculares para o curso de Pedagogia aplicam-se à
formação inicial para o exercício da docência na Educação Infantil e nos anos iniciais
do Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino Médio, na modalidade Normal, e em
cursos de Educação Profissional na área de serviços e apoio escolar, bem como em
outras áreas nas quais sejam previstos conhecimentos pedagógicos.
§ Compreende-se a docência como ação educativa e processo pedagógico
metódico e intencional, construído em relações sociais, étnico-raciais e produtivas,
as quais influenciam conceitos, princípios e objetivos da Pedagogia, desenvolvendo-
se na articulação entre conhecimentos científicos e culturais, valores éticos e
estéticos inerentes a processos de aprendizagem, de socialização e de construção
do conhecimento, no âmbito do diálogo entre diferentes visões de mundo.
§ 2º O curso de Pedagogia, por meio de estudos teórico-práticos, investigação
e reflexão crítica, propiciará:
I - o planejamento, execução e avaliação de atividades educativas;
II - a aplicação ao campo da educação, de contribuições, entre outras, de
conhecimentos como o filosófico, o histórico, o antropológico, o ambiental-ecológico,
o psicológico, o lingüístico, o sociológico, o político, o econômico, o cultural.
Art. O estudante de Pedagogia trabalhará com um repertório de
informações e habilidades composto por pluralidade de conhecimentos teóricos e
práticos, cuja consolidação será proporcionada no exercício da profissão,
213
fundamentando-se em princípios de interdisciplinaridade, contextualização,
democratização, pertinência e relevância social, ética e sensibilidade afetiva e
estética.
Parágrafo único. Para a formação do licenciado em Pedagogia é central:
I - o conhecimento da escola como organização complexa que tem a função
de promover a educação para e na cidadania;
II - a pesquisa, a análise e a aplicação dos resultados de investigações de
interesse da área educacional;
III - a participação na gestão de processos educativos e na organização e
funcionamento de sistemas e instituições de ensino.
Art. 4º O curso de Licenciatura em Pedagogia destina-se à formação de
professores para exercer funções de magistério na Educação Infantil e nos anos
iniciais do Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino Médio, na modalidade Normal,
de Educação Profissional na área de serviços e apoio escolar e em outras áreas nas
quais sejam previstos conhecimentos pedagógicos.
Parágrafo único. As atividades docentes também compreendem participação
na organização e gestão de sistemas e instituições de ensino, englobando:
I - planejamento, execução, coordenação, acompanhamento e avaliação de
tarefas próprias do setor da Educação;
II - planejamento, execução, coordenação, acompanhamento e avaliação de
projetos e experiências educativas não-escolares;
III - produção e difusão do conhecimento científico-tecnológico do campo
educacional, em contextos escolares e não-escolares.
214
Art. 5º O egresso do curso de Pedagogia deverá estar apto a:
I - atuar com ética e compromisso com vistas à construção de uma sociedade
justa, equânime, igualitária;
II - compreender, cuidar e educar crianças de zero a cinco anos, de forma a
contribuir, para o seu desenvolvimento nas dimensões, entre outras, física,
psicológica, intelectual, social;
III - fortalecer o desenvolvimento e as aprendizagens de crianças do Ensino
Fundamental, assim como daqueles que não tiveram oportunidade de escolarização
na idade própria;
IV - trabalhar, em espaços escolares e não-escolares, na promoção da
aprendizagem de sujeitos em diferentes fases do desenvolvimento humano, em
diversos níveis e modalidades do processo educativo;
V - reconhecer e respeitar as manifestações e necessidades físicas,
cognitivas, emocionais, afetivas dos educandos nas suas relações individuais e
coletivas;
VI - ensinar Língua Portuguesa, Matemática, Ciências, História, Geografia,
Artes, Educação Física, de forma interdisciplinar e adequada às diferentes fases do
desenvolvimento humano;
VII - relacionar as linguagens dos meios de comunicação à educação, nos
processos didático-pedagógicos, demonstrando domínio das tecnologias de
informação e comunicação adequadas ao desenvolvimento de aprendizagens
significativas;
VIII - promover e facilitar relações de cooperação entre a instituição educativa,
a família e a comunidade;
215
IX - identificar problemas socioculturais e educacionais com postura
investigativa, integrativa e propositiva em face de realidades complexas, com vistas a
contribuir para superação de exclusões sociais, étnico-raciais, econômicas, culturais,
religiosas, políticas e outras;
X - demonstrar consciência da diversidade, respeitando as diferenças de
natureza ambiental-ecológica, étnico-racial, de gêneros, faixas geracionais, classes
sociais, religiões, necessidades especiais, escolhas sexuais, entre outras;
XI - desenvolver trabalho em equipe, estabelecendo diálogo entre a área
educacional e as demais áreas do conhecimento;
XII - participar da gestão das instituições contribuindo para elaboração,
implementação, coordenação, acompanhamento e avaliação do projeto pedagógico;
XIII - participar da gestão das instituições planejando, executando,
acompanhando e avaliando projetos e programas educacionais, em ambientes
escolares e não-escolares;
XIV - realizar pesquisas que proporcionem conhecimentos, entre outros: sobre
alunos e alunas e a realidade sociocultural em que estes desenvolvem suas
experiências não escolares; sobre processos de ensinar e de aprender, em
diferentes meios ambiental-. ecológicos; sobre propostas curriculares; e sobre
organização do trabalho educativo e práticas pedagógicas;
XV - utilizar, com propriedade, instrumentos próprios para construção de
conhecimentos pedagógicos e científicos;
XVI - estudar, aplicar criticamente as diretrizes curriculares e outras
determinações legais que lhe caiba implantar, executar, avaliar e encaminhar o
resultado de sua avaliação às instâncias competentes.
216
§ No caso dos professores indígenas e de professores que venham a atuar
em escolas indígenas, dada a particularidade das populações com que trabalham e
das situações em que atuam, sem excluir o acima explicitado, deverão:
I - promover diálogo entre conhecimentos, valores, modos de vida, orientações
filosóficas, políticas e religiosas próprias à cultura do povo indígena junto a quem
atuam e os provenientes da sociedade majoritária;
II - atuar como agentes interculturais, com vistas à valorização e o estudo de
temas indígenas relevantes.
§ As mesmas determinações se aplicam à formação de professores para
escolas de remanescentes de quilombos ou que se caracterizem por receber
populações de etnias e culturas específicas.
Art. A estrutura do curso de Pedagogia, respeitadas a diversidade nacional
e a autonomia pedagógica das instituições constituir-se-á de:
I - um núcleo de estudos básicos que, sem perder de vista a diversidade e a
multiculturalidade da sociedade brasileira, por meio do estudo acurado da literatura
pertinente e de realidades educacionais, assim como por meio de reflexão e ações
críticas, articulará:
a) aplicação de princípios, concepções e critérios oriundos de diferentes áreas
do conhecimento, com pertinência ao campo da Pedagogia, que contribuam para o
desenvolvimento das pessoas, das organizações e da sociedade;
b) aplicação de princípios da gestão democrática em espaços escolares e
não-escolares;
217
c) observação, análise, planejamento, implementação e avaliação de
processos educativos e de experiências educacionais, em ambientes escolares e
não-escolares;
d) utilização de conhecimento multidimensional sobre o ser humano, em
situações de aprendizagem;
e) aplicação, em práticas educativas, de conhecimentos de processos de
desenvolvimento de crianças, adolescentes, jovens e adultos, nas dimensões física,
cognitiva, afetiva, estética, cultural, lúdica, artística, ética e biossocial;
f) realização de diagnóstico sobre necessidades e aspirações dos diferentes
segmentos da sociedade, relativamente à educação, sendo capaz de identificar
diferentes forças e interesses, de captar contradições e de considerá-lo nos planos
pedagógico e de ensino-aprendizagem, no planejamento e na realização de
atividades educativas;
g) planejamento, execução e avaliação de experiências que considerem o
contexto histórico e sociocultural do sistema educacional brasileiro, particularmente,
no que diz respeito à Educação Infantil, aos anos iniciais do Ensino Fundamental e à
formação de professores e de profissionais na área de serviço e apoio escolar;
h) estudo da Didática, de teorias e metodologias pedagógicas, de processos
de organização do trabalho docente;
i) decodificação e utilização de códigos de diferentes linguagens utilizadas por
crianças, além do trabalho didático com conteúdos, pertinentes aos primeiros anos
de escolarização, relativos à Língua Portuguesa, Matemática, Ciências, História e
Geografia, Artes, Educação Física;
218
j) estudo das relações entre educação e trabalho, diversidade cultural,
cidadania, sustentabilidade, entre outras problemáticas centrais da sociedade
contemporânea;
k) atenção às questões atinentes à ética, à estética e à ludicidade, no contexto
do exercício profissional, em âmbitos escolares e não-escolares, articulando o saber
acadêmico, a pesquisa, a extensão e a prática educativa;
l) estudo, aplicação e avaliação dos textos legais relativos à organização da
educação nacional;
II - um núcleo de aprofundamento e diversificação de estudos voltado às
áreas de atuação profissional priorizadas pelo projeto pedagógico das instituições e
que, atendendo a diferentes demandas sociais, oportunizará, entre outras
possibilidades:
a) investigações sobre processos educativos e gestoriais, em diferentes
situações institucionais: escolares, comunitárias, assistenciais, empresariais e outras;
b) avaliação, criação e uso de textos, materiais didáticos, procedimentos e
processos de aprendizagem que contemplem a diversidade social e cultural da
sociedade brasileira;
c) estudo, análise e avaliação de teorias da educação, a fim de elaborar
propostas educacionais consistentes e inovadoras;
III - um núcleo de estudos integradores que proporcionará enriquecimento
curricular e compreende participação em:
a) seminários e estudos curriculares, em projetos de iniciação científica,
monitoria e extensão, diretamente orientados pelo corpo docente da instituição de
educação superior;
219
b) atividades práticas, de modo a propiciar vivências, nas mais diferentes
áreas do campo educacional, assegurando aprofundamentos e diversificação de
estudos, experiências e utilização de recursos pedagógicos;
c) atividades de comunicação e expressão cultural.
Art. O curso de Licenciatura em Pedagogia terá a carga horária mínima de
3.200 horas de efetivo trabalho acadêmico, assim distribuídas:
I - 2.800 horas dedicadas às atividades formativas como assistência a aulas,
realização de seminários, participação na realização de pesquisas, consultas a
bibliotecas e centros de documentação, visitas a instituições educacionais e culturais,
atividades práticas de diferente natureza, participação em grupos cooperativos de
estudos;
II - 300 horas dedicadas ao Estágio Supervisionado prioritariamente em
Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, contemplando também
outras áreas específicas, se for o caso, conforme o projeto pedagógico da instituição;
III - 100 horas de atividades teórico-práticas de aprofundamento em áreas
específicas de interesse dos alunos, por meio, da iniciação científica, da extensão e
da monitoria.
Art. 8º Nos termos do projeto pedagógico da instituição, a integralização de
estudos será efetivada por meio de:
I - disciplinas, seminários e atividades de natureza predominantemente teórica
que farão a introdução e o aprofundamento de estudos, entre outros, sobre teorias
educacionais, situando processos de aprender e ensinar historicamente e em
diferentes realidades socioculturais e institucionais que proporcionem fundamentos
220
para a prática pedagógica, a orientação e apoio a estudantes, gestão e avaliação de
projetos educacionais, de instituições e de políticas públicas de Educação;
II - práticas de docência e gestão educacional que ensejem aos licenciandos a
observação e acompanhamento, a participação no planejamento, na execução e na
avaliação de aprendizagens, do ensino ou de projetos pedagógicos, tanto em
escolas como em outros ambientes educativos;
III - atividades complementares envolvendo o planejamento e o
desenvolvimento progressivo do Trabalho de Curso, atividades de monitoria, de
iniciação científica e de extensão, diretamente orientadas por membro do corpo
docente da instituição de educação superior decorrentes ou articuladas às
disciplinas, áreas de conhecimentos, seminários, eventos científico-culturais, estudos
curriculares, de modo a propiciar vivências em algumas modalidades e experiências,
entre outras, e opcionalmente, a educação de pessoas com necessidades especiais,
a educação do campo, a educação indígena, a educação em remanescentes de
quilombos, em organizações não-governamentais, escolares e não-escolares
públicas e privadas;
IV - estágio curricular a ser realizado, ao longo do curso, de modo a assegurar
aos graduandos experiência de exercício profissional, em ambientes escolares e
não-escolares que ampliem e fortaleçam atitudes éticas, conhecimentos e
competências:
a) na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental,
prioritariamente;
b) nas disciplinas pedagógicas dos cursos de Ensino Médio, na modalidade
Normal;
221
c) na Educação Profissional na área de serviços e de apoio escolar;
d) na Educação de Jovens e Adultos;
e) na participação em atividades da gestão de processos educativos, no
planejamento, implementação, coordenação, acompanhamento e avaliação de
atividades e projetos educativos;
f) em reuniões de formação pedagógica.
Art. Os cursos a serem criados em instituições de educação superior, com
ou sem autonomia universitária e que visem à Licenciatura para a docência na
Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino
Médio, na modalidade Normal, de Educação Profissional na área de serviços e apoio
escolar e em outras áreas nas quais sejam previstos conhecimentos pedagógicos,
deverão ser estruturados com base nesta Resolução.
Art. 10. As habilitações em cursos de Pedagogia atualmente existentes
entrarão em regime de extinção, a partir do período letivo seguinte à publicação
desta Resolução.
Art. 11. As instituições de educação superior que mantêm cursos autorizados
como Normal Superior e que pretenderem a transformação em curso de Pedagogia e
as instituições que oferecem cursos de Pedagogia deverão elaborar novo projeto
pedagógico, obedecendo ao contido nesta Resolução.
§ 1º O novo projeto pedagógico deverá ser protocolado no órgão competente
do respectivo sistema ensino, no prazo máximo de 1 (um) ano, a contar da data da
publicação desta Resolução.
§ 2º O novo projeto pedagógico alcançará todos os alunos que iniciarem seu
curso a partir do processo seletivo seguinte ao período letivo em que for implantado.
222
§ As instituições poderão optar por introduzir alterações decorrentes do
novo projeto pedagógico para as turmas em andamento, respeitando-se o interesse
e direitos dos alunos matriculados.
§ As instituições poderão optar por manter inalterado seu projeto
pedagógico para as turmas em andamento, mantendo-se todas as características
correspondentes ao estabelecido.
Art. 12. Concluintes do curso de Pedagogia ou Normal Superior que, no
regime das normas anteriores a esta Resolução, tenham cursado uma das
habilitações, a saber, Educação Infantil ou anos iniciais do Ensino Fundamental, e
que pretendam complementar seus estudos na área não cursada poderão fazê-lo.
§ Os licenciados deverão procurar preferencialmente a instituição na qual
cursaram sua primeira formação.
§ As instituições que vierem a receber alunos na situação prevista neste
artigo serão responsáveis pela análise da vida escolar dos interessados e pelo
estabelecimento dos planos de estudos complementares, que abrangerão, no
mínimo, 400 horas.
Art. 13. A implantação e a execução destas diretrizes curriculares deverão ser
sistematicamente acompanhadas e avaliadas pelos órgãos competentes.
Art. 14. A Licenciatura em Pedagogia, nos termos dos Pareceres CNE/CP nos
5/2005 e 3/2006 e desta Resolução, assegura a formação de profissionais da
educação prevista no art. 64, em conformidade com o inciso VIII do art. da Lei
9.394/96.
223
§ Esta formação profissional também poderá ser realizada em cursos de
pós-graduação, especialmente estruturados para este fim e abertos a todos os
licenciados.
§ 2º Os cursos de pós-graduação indicados no § 1º deste artigo poderão ser
complementarmente disciplinados pelos respectivos sistemas de ensino, nos termos
do parágrafo único do art. 67 da Lei nº 9.394/96.
Art. 15. Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação, ficando
revogadas a Resolução CFE 2, de 12 de maio de 1969, e demais disposições em
contrário.
EDSON DE OLIVEIRA NUNES
Presidente do Conselho Nacional de Educação
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