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Centro de Ciências Agrárias
Departamento de Ciência e Tecnologia de Alimentos
Programa de Mestrado e Doutorado em Ciência de Alimentos
Caracterização e Aplicação de Fibra de
Borra de Café Modificada por Tratamento
com Peróxido de Hidrogênio Alcalino
Alexandre Santa Barbara Azevedo
Londrina - PR
2007
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Centro de Ciências Agrárias
Departamento de Ciência e Tecnologia de Alimentos
Programa de Mestrado e Doutorado em Ciência de Alimentos
Caracterização e Aplicação de Fibra de
Borra de Café Modificada por Tratamento
com Peróxido de Hidrogênio Alcalino
Dissertação apresentada ao Programa de
Mestrado e Doutorado em Ciência de
Alimentos da Universidade Estadual de
Londrina, como requisito parcial à obtenção
do título de Mestre em Ciência de
Alimentos.
Mestrando: Alexandre Santa Barbara Azevedo
Orientador: Prof
a
. Dr
a
. Maria Victoria Eiras Grossmann
Londrina - PR
2007
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Catalogação na Publicação Elaborada pela Divisão de Processos Técnicos da
Biblioteca Central da Universidade Estadual de Londrina
Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)
A994c Azevedo, Alexandre Santa Barbara.
Caracterização e aplicação de fibra de borra de café modificada
por tratamento com peróxido de hidrogênio alcalino / Alexandre
Santa Barbara Azevedo. – Londrina, 2007.
41f. : il.
Orientador: Maria Victoria Eiras Grossmann.
Dissertação (Mestrado em Ciência de Alimentos) – Universidade
Estadual de Londrina, Centro de Ciência e Tecnologia de Alimentos,
Programa de Pós-Graduação em Ciência de Alimentos, 2007.
Bibliografia: f.38-41
1. Fibra alimentar – Borra de café – Teses. 2. Borra de café –
Modificação química – Ciência de Alimentos – Teses. 3. Biscoitos -
Fibra de borra de café – Teses. I. Grossmann, Maria Victoria Eiras.
II. Universidade Estadual de Londrina. Centro de Ciência e Tecnologia
de Alimentos. Programa de Pós-Graduação em Ciência de Alimentos.
III. Titulo.
CDU 664.6/.7
COMISSÃO EXAMINADORA
______________________________________
Prof
a
. Dr
a
. Maria Victoria Eiras Grossmann
Universidade Estadual de Londrina
Presidente / Orientador
_______________________________________
Prof
a
. Dr
a
. Adelaide Del Pino Beléia
Universidade Estadual de Londrina
________________________________________
Prof
a
. Dr
a
. Neusa Fátima Seibel
Universidade Estadual de Ponta Grossa
Londrina, 09 de novembro de 2007.
Aos meus pais, Paulo Roberto e Teresinha.
Por transcenderem o papel de pais e serem acima de tudo, meus amigos.
Pela educação proporcionada. Por entenderem minhas ausências e a nossa distância física.
Vocês são minha maior inspiração e meu maior incentivo nesta caminhada.
O meu porto seguro, aqueles que acreditam em mim e me ajudam a levantar nas horas de
angústia e nos tropeços.
Acima de tudo, obrigado pelo amor incondicional.
À vocês dedico.
AGRADECIMENTOS
De modo muito especial, à Prof
a
. Dr
a
. Maria Victoria Eiras Grossmann pela
orientação segura, pelo conhecimento transmitido, pelo incentivo e sabedoria. Por
acreditar em mim e pela serenidade transmitida frente aos momentos de dúvida.
À Prof
a
. Dr
a
. Marta de Toledo Benassi, pela correção e valiosas sugestões no exame
de qualificação e pelo auxílio na análise sensorial.
À minha irmã Andréa. Pelo exemplo de dedicação ao trabalho e à família. Por ser
mais que uma irmã. “Vai por mim, somos corpo e alma. Meu irmão, meu par”. À
Renata, minha sobrinha, por entender a distância que nos separa e ser tão amorosa.
À futura Dr
a
. Josiane Vignolli, grande incentivadora e amiga, pelo exemplo de
profissionalismo e dedicação à pesquisa.
À Luciana Yoshiara, que muito me ensinou nesses últimos anos, pelo prazer da
amizade, pelos muitos momentos alegres e por ser um “ombro terapêutico” nos
momentos de angústia. À Renata Dinnies, pelo conhecimento compartilhado e pelas
tantas vezes em que foi só bater na porta do apartamento ao lado e encontrar uma
amiga.
À Ana Augusta pela amizade sincera, pelo exemplo de dedicação ao trabalho, pela
companhia nas manhãs frias de inverno nos corredores entre os laboratórios, até
mesmo nos finais de semana. À Caroline Calliari, cuja inteligência e carisma me
cativaram; uma pessoa sábia, iluminada e agregadora. À Daryne, pelo auxílio nas
análises de textura, pelo companheirismo de todas as manhãs rumo ao trabalho e
pelo riso solto e alegre que tanto me divertiram. À Nádia, pela doçura de suas
palavras em longas conversas entre um café e outro.
Aos muitos colegas/amigos que nesse tempo de convivência somaram um pouco
mais em mim através de gestos, conversas, trocas de idéias, divergências, silêncios
e muito trabalho: Denis, Fabrício, Melícia, Bete, Mirian, Lu Lobato, Tom, Amanda,
Cláudio, Lu Hayashi, Aniê, Michelle, Norma, Suellen, Joice, Luiz, Cristina, Fernanda.
– Vocês fizeram a diferença.
Ao Aislan, pelo companheirismo e presença na minha vida e à Margarete, pelo
grande apoio nesses últimos meses deste trabalho.
À Sandra Rezende pela eficiência e simpatia.
À Célia Bueno Bicudo Primo e Alessandra Cristina da Silva, pelo auxílio valioso nas
análises de fibra e nos trabalhos práticos.
Ao Nelson Heitor Fuzinato, pelo exemplo de profissional que trabalha com alegria e
por ser sempre tão disponível para ajudar.
À Geisa, Rodrigo e João, grandes amigos que encontrei logo que aqui cheguei,
obrigado pela torcida e pelo carinho.
À Deus, sem o qual nada disso seria possível.
AZEVEDO, Alexandre S. B. Caracterização e Aplicação de Fibra de Borra de
Café Modificada por Tratamento com Peróxido de Hidrogênio Alcalino. 2007.
Dissertação (Mestrado em Ciência de Alimentos) – Universidade Estadual de
Londrina.
RESUMO
As fibras alimentares são um grupo heterogêneo de polissacarídeos cujos efeitos
benéficos ocorrem na fisiologia gastrintestinal, nas funções imunes e no
metabolismo dos lipídios. Os alimentos funcionais são aqueles que, além dos
aspectos nutricionais e sensoriais, possuem componentes ou substâncias que
melhoram funções biológicas ou diminuem o risco de doenças e promovem a saúde
dos consumidores, sendo as fibras alimentares um dos ingredientes utilizados
nesses alimentos. A borra de café é um material insolúvel resultante do processo
industrial de fabricação de café solúvel constituída principalmente de polissacarídeos
estruturais de parede celular e não apresenta aplicação tecnológica na indústria. Por
suas características de composição química este material pode ser utilizado como
uma fonte de fibra alimentar. O uso de fibras alimentares é muitas vezes limitado
pelas características sensoriais que conferem aos alimentos, como textura arenosa,
e pela perda de volume do produto final, sendo necessário modificar as
características funcionais desses materiais antes da incorporação em alimentos
através de tratamentos físicos ou químicos, e assim aumentar a capacidade de
hidratação e melhorar as características sensoriais do produto final. O objetivo deste
trabalho foi modificar as propriedades de hidratação da borra de café com peróxido
de hidrogênio alcalino, caracterizar esta fibra alimentar e utilizar essa fibra na
produção de biscoitos. O tratamento com peróxido de hidrogênio alcalino (1%) foi
realizado de acordo com um planejamento fatorial incompleto 3
3
. As variáveis
independentes controladas foram a temperatura do tratamento, o tempo de reação e
concentração de borra de café, avaliando como respostas a capacidade de retenção
de água, o volume de intumescimento e a luminosidade da borra de café. Através da
análise dos resultados foi escolhida a condição de menores temperaturas (30 ºC) e
maiores concentrações de borra (8%) como mais adequada para produzir as
modificações desejadas. Nestas condições, obteve-se um aumento de 49,2% na
capacidade de retenção de água e um clareamento significativo na cor da borra. A
borra de café tratada nestas condições foi caracterizada pelo seu conteúdo em
celulose (43,40%), hemicelulose (27,26%) e lignina (23,30%) e utilizada na
fabricação de biscoitos sabor café que foram avaliados fisicamente (espessura,
diâmetro, volume específico, dureza) e sensorialmente. Os biscoitos produzidos com
a borra modificada apresentaram maior diâmetro e volume específico e menor
dureza que os produzidos com a borra não modificada. O teste triangular indicou
diferença global entre os biscoitos com borra modificada e os com borra não
modificada. O teste de aceitação utilizando a escala hedônica híbrida de 10 pontos
não indicou diferença entre os dois tipos de biscoito.
Palavras-chave: borra de café, fibra alimentar, modificação química, propriedades
funcionais, biscoitos.
AZEVEDO, Alexandre S. B. Characterization and Use of Spent Coffee Grounds
Dietary Fiber Modified by Treatment with Alkaline Hydrogen Peroxide. 2007.
Dissertação (Mestrado em Ciência de Alimentos) – Universidade Estadual de
Londrina.
ABSTRACT
Dietary fibers are a heterogeneous group of polissacharides whose benefical effects
occur at the gastrintestinal physiology, the immune functions and the metabolism of
the lipids. Functional foods are those that, beyond the nutricional and sensorial
aspects, contain substances with biological functions, decreasing risk of illnesses and
promoting a good health to consumers. Dietary fibers are used as ingredients in
these foods. Spent coffee ground is an insoluble material resulting from the industrial
process of soluble coffee consisting mainly of structural cellular wall polissacharides
and is used to generate steam, having no other technological application in the
industry. Its chemical composition indicates this material can be used as a dietary
fiber source to produce functional food. Dietary fiber use is many times restricted by
its negative sensorial characteristics such as gritty texture, and poor appereance,
being necessary physical or chemical modifications of these materials before adding
to foods, in order to improve physical properties and sensorial characteristics. This
work aimed to modify spent coffee grounds with alkaline hydrogen peroxide,
characterize its dietary fiber and use it as an ingredient in biscuits. Treatment with
alkaline hydrogen peroxide (1%) was carried out according to an incomplete 3
3
factorial design, being the independent variables: treatment temperature, reaction
time and spent coffee grounds level. Dependent variables were water retention
capacity, swollen volume and color. Through the analysis of results it was chosen the
condition of lower temperatures (30 ºC) and higher spent coffee ground level (8%) as
more indicated to produce desired modifications. In these conditions, water retention
capacity increased 49.2% and a significant lighter spent coffee ground dietary fiber
was obtained. Modified spent coffee ground dietary fiber was characterized by its
content in cellulose (43.40%), hemicellulose (27.26%) and lignin (23.30%) and used
to produce coffee biscuits which were evaluated due to its sensorial and physical
characteristics (thickness, diameter, specific volume and hardness). Biscuits
produced with modified spent coffee grouds had greater diameter and specific
volume and less hardness than the ones with non-modified spent coffee grounds. A
sensorial triangle test indicated a significant difference between biscuits formulated
with the two types of fiber. An affective test using an hybrid hedonic scale of 10
points did not indicate difference between the samples.
Key words: spent coffee grounds, dietary fiber, chemical modification, functional
properties, biscuits.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Capacidade de retenção de água (mL água/g amostra seca) da
borra de café após tratamento em função da temperatura e
concentração de borra, com 6 horas de reação...............................
23
Figura 2 - Volume de intumescimento (mL/g amostra seca) da borra de café
após tratamento, em função da temperatura e da concentração de
borra, com 6 horas de reação...........................................................
25
Figura 3 - Luminosidade (L*) da borra de café após tratamento em função da
temperatura e tempo, com concentração de borra de 6%...............
26
Figura 4 - Aparência dos biscoitos produzidos com borra de café modificada e
sem modificação............................................................................
35
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Valores de ingestão diária recomendada para fibras totais.........
5
Tabela 2 - Exportações brasileiras de café solúvel.......................................
11
Tabela 3 - Níveis das variáveis independentes estudadas no tratamento
da borra de café...........................................................................
15
Tabela 4 - Planejamento estatístico dos experimentos com os níveis
codificados das variáveis..............................................................
16
Tabela 5 - Formulação dos biscoitos de café................................................
17
Tabela 6 - Composição centesimal da borra de café não modificada (base
seca).............................................................................................
19
Tabela 7 - Médias dos resultados para as propriedades de hidratação e
cor da borra de café segundo o planejamento fatorial 3
3
incompleto empregado no experimento.......................................
21
Tabela 8 - Coeficientes de Regressão e Análise de Variância (ANOVA)
dos modelos matemáticos
das variáveis resposta.......................
22
Tabela 9 - Efeito do tratamento com peróxido de hidrogênio alcalino na
capacidade de retenção de água e volume de intumescimento
em 4 e 5 horas de reação.............................................................
27
Tabela 10 - Efeito do tratamento com peróxido de hidrogênio alcalino na
capacidade de retenção de água, volume de intumescimento e
cor da borra de café.....................................................................
28
Tabela 11 - Composição da fibra de café........................................................
29
Tabela 12 - Composição centesimal da borra de café tratada com peróxido
de hidrogênio alcalino (base seca)...............................................
31
Tabela 13 - Classificação granulométrica da fibra de café bruta e
modificada....................................................................................
32
Tabela 14 - Composição centesimal dos biscoitos formulados com borra de
café modificada e biscoitos comercias (base seca).....................
33
Tabela 15 - Médias das características físicas dos biscoitos elaborados
com borra modificada e com a borra natural................................
33
Tabela 16 - Dureza dos biscoitos produzidos com fibra bruta e fibra
modificada....................................................................................
34
Tabela 17 - Valores de aceitação para as duas formulações de biscoitos de
café...............................................................................................
36
SUMARIO
1 INTRODUÇÃO................................................................................................
1
2 OBJETIVOS.................................................................................................... 3
2.1 Objetivo geral................................................................................................ 3
2.2 Objetivos específicos....................................................................................
3
3 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA........................................................................... 4
3.1 Fibra alimentar.............................................................................................. 4
3.1.1 Fibras insolúveis........................................................................................ 6
3.1.2 Fibras solúveis........................................................................................... 7
3.2 Modificação de fibras.................................................................................... 8
3.3 Café..............................................................................................................
10
4 MATERIAL E MÉTODOS................................................................................ 13
4.1 Material......................................................................................................... 13
4.2 Métodos........................................................................................................ 13
4.2.1 Caracterização da fibra de café................................................................. 13
4.2.2 Propriedades das fibras............................................................................. 14
4.2.3 Tratamento com peróxido de hidrogênio alcalino...................................... 14
4.2.3.1 Planejamento experimental.................................................................... 15
4.2.4 Produção de biscoitos com fibra de café................................................... 16
4.2.4.1 Caracterização dos biscoitos.................................................................. 17
4.2.4.2 Dureza instrumental................................................................................ 18
4.2.4.3 Avaliação sensorial.................................................................................
18
5 RESULTADOS E DISCUSSÃO...................................................................... 19
5.1 Caracterização da borra de café sem tratamento........................................ 19
5.2 Tratamento alcalino: propriedades das fibras............................................... 20
5.2.1 Capacidade de retenção de água.............................................................. 22
5.2.2 Volume de intumescimento....................................................................... 24
5.2.3 Cor – Luminosidade (*L)............................................................................ 26
5.2.4 Escolha da melhor condição de tratamento.............................................. 27
5.3 Avaliação comparativa do efeito do tratamento nas propriedades da borra
de café................................................................................................................
28
5.4 Composição da fibra alimentar da borra de café.......................................... 29
5.5 Caracterização da borra de café após tratamento....................................... 30
5.5.1 Granulometria da borra de café após tratamento...................................... 31
5.6 Caracterização dos biscoitos produzidos com borra de café modificada..... 32
5.6.1 Composição centesimal............................................................................. 32
5.6.2 Caracterização física dos biscoitos........................................................... 33
5.7 Análise sensorial.......................................................................................... 35
6 CONCLUSÕES...............................................................................................
37
7 REFERÊNCIAS............................................................................................... 38
1 INTRODUÇÃO
Fibra alimentar é um termo genérico que engloba uma ampla
variedade de substâncias que não são digeridas pelo trato digestivo humano. A AACC
(American Association of Cereal Chemists), uma organização que agrupa profissionais
do setor de cereais, estabeleceu, em 1
o
de junho de 2000, uma definição consensual
que a fibra alimentar é a parte remanescente da porção comestível de plantas ou de
carboidratos análogos que são resistentes à digestão e à absorção no intestino
delgado humano com fermentação completa ou parcial no intestino grosso. A fibra
alimentar inclui polissacarídeos, oligossacarídeos, lignina e substâncias associadas
das plantas. As fibras alimentares promovem, no ser humano, efeitos fisiológicos
benéficos tais como os laxativos e atenuação do colesterol do sangue e da glicose
sanguínea (AACC, 2000).
Os benefícios potenciais para a saúde humana situam-se na
estimulação da imunidade, na melhoria da biodisponibilidade dos nutrientes, no auxílio
à redução dos riscos das doenças infecciosas, dos efeitos tóxicos, das doenças
cardiovasculares, do diabetes mellitus não insulino-dependente, da obesidade, da
osteosporose e do câncer (GIBSON, 1999).
Atualmente, observa-se o interesse de pesquisadores e da indústria de
alimentos no estudo e desenvolvimento de alimentos que, além dos aspectos
nutricionais e sensoriais, possuam componentes ou substâncias que exerçam funções
biológicas, com o intuito de diminuírem o risco de doenças e promover a saúde dos
consumidores. Os alimentos que apresentam tais componentes são denominados
alimentos funcionais e as fibras são um dos ingredientes utilizados nesses alimentos
(CHO e JENAB, 1999).
As razões para o interesse no desenvolvimento de alimentos
funcionais vêm do consumidor propriamente dito que, através do conhecimento cada
vez mais acessível sobre nutrição e saúde, exige produtos mais saudáveis; dos
governos, que se preocupam com os elevados custos para manter os sistemas de
saúde das populações que vêm aumentando gradativamente a expectativa de vida; e
da indústria de alimentos, que, com maior conhecimento dos aspectos benéficos
2
destes alimentos, busca novas oportunidades de ganho de mercado (CHO e JENAB,
1999).
Borra de café, que é o material insolúvel resultante da etapa de
extração no processo industrial de fabricação de café solúvel, é constituído
principalmente de polissacarídeos estruturais de parede celular e, atualmente, não
apresenta aplicação tecnológica na indústria, sendo queimado nas caldeiras, para
geração de vapor, ou repassado para a agricultura, que a utiliza como adubo orgânico.
Entretanto, por suas características de composição química, este material poderia ser
utilizado como uma fonte de fibra alimentar, na produção de alimentos funcionais.
3
2 OBJETIVOS
2.1 Objetivo geral
Fracionar, caracterizar e avaliar as propriedades das fibras presentes
na borra de café; modificar estas fibras através de um tratamento químico com
peróxido de hidrogênio alcalino e utilizar essa fibra na produção de biscoitos.
2.2 Objetivos específicos
a) Caracterizar a fibra em termos de seu conteúdo de celulose,
hemicelulose e lignina;
b) Modificar a fibra por tratamento com peróxido de hidrogênio alcalino;
c) Avaliar as propriedades de capacidade de retenção de água, volume
de intumescimento e cor da fibra bruta e modificada;
d) Verificar a aplicabilidade da fibra de café modificada na elaboração
de biscoitos, através de testes instrumentais e sensoriais.
4
3 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
3.1 Fibra alimentar
O termo fibra alimentar foi citado pela primeira vez por Hipsley em
1953, que assim chamou os “resíduos de células vegetais resistentes à hidrólise pelas
enzimas alimentares do homem. É composta de celulose, hemicelulose e lignina”. Em
1976, Hugh Trowell e Denis Burkitt adotaram a definição de Hipsley e incluíram como
componentes os polissacarídeos não digeridos pelas enzimas, tais como gomas,
mucilagens, oligossacarídeos e pectinas (DEVRIES; PROSKY e CHO, 1999).
No final de 1998, a AACC (American Association of Cereal Chemists)
iniciou consultas científicas no intuito de atualizar a definição de fibra alimentar. Em
junho de 1999, numa série de encontros e workshops entre a AACC e a ILSI
(International Life Science Institute), complementados por discussões no congresso do
IFT (Institute of Food Technologists) o assunto foi tratado. Em 1
o
de junho de 2000 a
definição consensual das fibras alimentares foi aprovada pelo Comitê de Direção da
AACC.
“A fibra alimentar é a parte remanescente da porção
comestível de plantas, ou de carboidratos análogos, que são
resistentes à digestão e à absorção no intestino delgado humano
com fermentação completa ou parcial no intestino grosso. A fibra
alimentar inclui polissacarídeos, oligossacarídeos, lignina e
substâncias associadas das plantas. As fibras alimentares
promovem, no ser humano, efeitos fisiológicos benéficos, tais
como os laxativos e atenuação do colesterol e da glicose
sanguínea”. (AACC, 2000).
O método analítico universalmente indicado para a determinação do
teor de fibras nos alimentos, inclusive para dizeres de rotulagem, é o método
enzimático-gravimétrico AOAC 985.29 (CHO, DEVRIES e PROSKY, 1997).
As recomendações de ingestão diária baseiam-se em estudos que
demonstraram o aumento do risco de doenças cardíacas associado ao baixo consumo
de fibras (SLAVIN, 2003) e são apresentadas em recomendações de consumo diário
para crianças, adolescentes, adultos, gestantes e lactantes. A Tabela 1 apresenta os
valores da última atualização, feita em 03/05/2005.
5
Tabela 1: Valores de ingestão diária recomendada para fibras totais
Ingestão diária recomendada
de Fibras Totais (g/dia)
Estágio da vida
HOMENS MULHERES
1 – 3 anos 19 19
4 – 8 anos 25 25
9 – 13 anos 31 26
14 – 18 anos 38 26
19 – 30 anos 38 25
31 – 50 anos 38 25
51 – 70 anos 30 21
Acima de 70 anos 30 21
Gravidez 28
Lactação 29
Fonte: Dietary Reference Intakes Table -- The Complete Set.
Food and Nutrition Board
Recentemente, em 2004, outros países e a Comissão do Codex
Alimentarius, através de uma comissão intitulada “Codex Committee on Nutrition and
Foods for Specialty Dietary Uses” propôs a seguinte definição: Fibra alimentar consiste
de material comestível não digestível composto por polímeros de carboidratos com
grau de polimerização (GP) não inferior a 3 ou de polímeros de carboidratos (GP > 3)
processados (via física, enzimática ou química) ou sintéticos. Fibra alimentar não é
digerida nem absorvida no intestino delgado e tem pelo menos uma das seguintes
propriedades: aumenta a freqüência das evacuações; estimula a modulação colônica;
reduz níveis de colesterol; reduz glicemia pós-prandial e/ou níveis de insulina
(DUXBURY, 2004).
A ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) apresenta a
seguinte alegação para fibras alimentares: “As fibras alimentares auxiliam o
funcionamento do intestino. Seu consumo deve estar associado a uma dieta
equilibrada e hábitos de vida saudáveis”.
Esta alegação pode ser utilizada para as fibras solúveis e insolúveis,
desde que a porção diária do produto pronto para consumo atenda, pelo menos, ao
atributo fonte de fibras alimentares (mínimo 3% de fibras) estabelecido pela Portaria
SVS/MS nº 27/98 (BRASIL, 1998).
A definição deixa claro que a passagem das fibras alimentares pelo
trato digestivo resulta em diversos efeitos fisiológicos importantes para a saúde do ser
6
humano. No entanto, nem todas as fibras atuam da mesma forma e uma importante
divisão consiste em distinguir as fibras que são solúveis das que são insolúveis.
A distinção entre esses dois tipos de fibras é baseada na solubilidade
em solução enzimática de pH controlado, como é o caso no sistema alimentar
humano. Apesar da maioria das fibras não ser 100% solúvel ou insolúvel, de uma
maneira geral, a proporção de solubilidade auxilia no entendimento das propriedades
fisiológicas.
Os benefícios fisiológicos da fibra estão relacionados às suas
propriedades físico-químicas (ROBERTSON et al., 2000). A propriedade mais
apreciada é a capacidade de retenção de água. Do ponto de vista fisiológico, maiores
valores de retenção de água propiciam maior volume e umidade do bolo fecal,
aumentando a sensação de saciedade e regulando o trânsito intestinal. Do ponto de
vista tecnológico, possibilita que os produtos enriquecidos com fibra mantenham suas
características de textura durante maior tempo (SAURA-CALIXTO, 1993).
3.1.1 Fibras insolúveis
As fibras insolúveis, insolúveis em soluções enzimáticas aquosas,
atuam de maneira mais intensa com uma ação mecânica durante o trânsito digestivo.
Devido à sua hidrofobicidade, as fibras insolúveis também absorvem carcinogênicos
hidrofóbicos, como derivados de pirenos e aminas aromáticas heterocíclicas,
auxiliando na diminuição de riscos de câncer de cólon e reto. O farelo de cereais e os
grãos de cereais propriamente ditos são as principais fontes de fibras insolúveis.
Outras fontes de fibra insolúvel são cereais secos, vegetais e nozes (DREHER, 1999).
As fibras insolúveis são fermentadas pela flora intestinal de maneira
muito precária e são excretadas, geralmente, intactas, dando consistência ao bolo
fecal, estimulando o peristaltismo intestinal e diminuindo o tempo de trânsito.
Os principais componentes das fibras insolúveis são: celulose,
hemicelulose e lignina. Estes componentes têm um papel estrutural nas plantas. No
grão de café, esses polissacarídeos formam a matriz da parede celular secundária, isto
é, são uma reserva de energia para a germinação e conferem dureza à semente
(DREHER, 1999).
7
A celulose é um homopolissacarídeo linear formado de unidades de
glicose unidas por ligação glicosídica do tipo β(1-4). As cadeias da celulose agregam-
se para formar fibrilas e, considerando a disposição espacial destas cadeias lineares,
há formação de pontes de hidrogênio entre os grupamentos hidroxilas intra e
intercadeias, o que resulta na cristalinidade da celulose. Estas regiões cristalinas, nas
quais as cadeias estão ordenadas paralelamente, são separadas por regiões menos
ordenadas, conhecidas como amorfas (NING; VILLOTA e ARTZ, 1991; THEANDER;
WESTERLUND e AMAN, 1993).
As hemiceluloses compreendem um grupo heterogêneo de
polissacarídeos ramificados. Suas moléculas estão enroladas e dispostas em volta das
fibras de celulose e, freqüentemente, associadas às moléculas de lignina.
Quimicamente, são formadas por vários resíduos de açúcares tais como D-xilose, D-
manose, D-arabinose e D-galactose, dentre outros, e por seus ácidos urônicos, ligados
entre si por ligações β(1-4), formando uma estrutura principal composta por um tipo
específico de monossacarídeo, a partir da qual surgem ramificações laterais de
cadeias curtas de outros açúcares. São classificadas de acordo com o açúcar
predominante na cadeia principal e na ramificação (DA-SILVA; FRANCO e GOMES,
1997).
A lignina constitui um polímero, não carboidrato, aromático, composto
de resíduos de fenilpropano, distribuídos ao acaso, formando uma estrutura
tridimensional. A lignina é o resultado da desidratação de três álcoois monoméricos:
trans-p-coumaril, trans-coniferil e trans-sinapil. É, possivelmente, a substância mais
resistente encontrada na natureza (THEANDER; WESTERLUND e AMAN, 1993).
3.1.2 Fibras solúveis
As fibras solúveis consistem em polissacarídeos não celulósicos, tais
como pectinas, gomas e mucilagens. Sua solubilidade não está necessariamente
relacionada à solubilidade em água, mas em soluções enzimáticas aquosas de pH
controlado, como é o caso das do intestino humano. São caracterizadas pelo fato de
serem degradadas pelas bactérias presentes no intestino grosso, resultando em
diversas modificações metabólicas: pH do trato intestinal, estimulação da flora
endógena, isto é, a do próprio homem, e produção de ácidos graxos de cadeia curta,
8
os SCFA (Short Chain Fatty Acids), que inibem uma enzima envolvida nas primeiras
etapas da síntese do colesterol, reduzindo, portanto, os níveis do mesmo (DREHER,
1999).
Fibras alimentares solúveis são, em geral, viscosas e gomosas, com
alta capacidade de absorção de água.
A maioria dos concentrados de fibra possui uma parte solúvel e outra,
geralmente bem menor, insolúvel. Ao lado destes, existem os polissacarídeos e
oligossacarídeos resistentes à digestão e não precipitáveis, porém com propriedades
fisiológicas semelhantes às das fibras solúveis, entre os quais se destacam a inulina, a
oligofrutose e a goma acácia (CHO, DEVRIES e PROSKY, 1997).
3.2 Modificação de fibras
A aplicação tecnológica, quando se pretende formular um produto com
alto teor de fibras, apresenta alguns problemas que muitas vezes limitam seu uso. A
baixa funcionalidade da fibra e seus efeitos deletérios sobre a funcionalidade de outros
componentes do alimento, a textura arenosa e perda do volume do produto são alguns
deles (ARTZ; WARREN e VILLOTA, 1990).
Desta forma, muitas vezes há necessidade de modificação das
características funcionais desses materiais antes da incorporação em alimentos. Em
materiais lignocelulósicos, os efeitos negativos podem ser minimizados com a
aplicação de tratamentos, físicos ou químicos, para, simultaneamente, solubilizar parte
da lignina e reduzir a cristalinidade da celulose. Isto aumenta a capacidade de
hidratação destes materiais, melhorando, conseqüentemente, as características
sensoriais do produto final onde será utilizada a fibra, principalmente em relação à
sensação tátil na boca (GOULD et al., 1989).
O peróxido de hidrogênio e o hidróxido de sódio apresentam
participação importante no aumento das propriedades de hidratação das fibras. O
primeiro atua na degradação da lignina, através de sua remoção por solubilização e/ou
modificação estrutural, promovendo também um aumento no grau de hidratação da
celulose e quebra da sua cristalinidade. Já o segundo altera a estrutura da fibra,
9
aumentando sua porosidade, facilitando a penetração e retenção de água na matriz
fibrosa (NING; VILLOTA e ARTZ, 1991).
Durante o processamento, o peróxido de hidrogênio decompõe-se
naturalmente em oxigênio e água, não deixando resíduo. Em processos onde etapas
de secagem não são utilizadas, resíduos indesejáveis podem ser removidos com
pequenas quantidades de catalase (McNEILLIE; BIESER, 1993).
INGLETT (1997) produziu uma modificação pronunciada em
subprodutos lignocelulósicos, através de multiestágios de cisalhamento combinado
com soluções de peróxido de hidrogênio alcalino em temperaturas elevadas, obtendo
produtos capazes de reter grandes quantidades de água, os quais podem ser usados
como ingredientes em panificação, sem afetar a qualidade sensorial do produto final.
O peróxido de hidrogênio tem sido amplamente usado como agente
branqueador nesse processo. Segundo INGLETT (1995), o peróxido de hidrogênio
deve ser incorporado em cerca de 1-25% por peso de sólidos. No entanto, na maioria
dos trabalhos publicados (RAMASWAMY, 1988; GOULD et al., 1989; LARREA et al.,
1997), o nível de reagente usado foi de 1% e apenas INGLETT (1995) faz referência a
esta faixa mais ampla.
A extensão da modificação causada pelo tratamento pode ser avaliada
pelas propriedades funcionais da fibra: a capacidade de retenção de água e o volume
de intumescimento.
LARREA et al. (1997) aperfeiçoou processos de pré-tratamento com
solução de peróxido de hidrogênio alcalino seguido de extrusão para modificação da
fibra da casca de arroz, visando melhorar as propriedades funcionais dessa fibra,
obtendo um aumento de 95% na capacidade de retenção de água e 138% no volume
de intumescimento.
GALDEANO e GROSSMANN (2005) avaliaram o efeito do tratamento
com peróxido de hidrogênio alcalino a 7%, associado à extrusão, nas propriedades de
hidratação de casca de aveia, e obtiveram um aumento de 70% na capacidade de
retenção de água e de 55% no volume de intumescimento.
10
3.3 Café
A planta do café faz parte da família das rubiáceas, com o nome
científico de coffea. Segundo SCHENKER (2000) existem mais de setenta espécies já
classificadas de coffea. As duas espécies de café economicamente mais importantes
são Coffea arábica Linnaeus (café arábica), que representa 65% da produção mundial,
e Coffea canephora Pierre (café robusta). Outras duas espécies cultivadas em escala
muito menor são Coffea liberica (café libérica) e Coffea dewevrei (café excelsa)
(BRAND, 1999; VIDAL, 2001).
O café é cultivado na região chamada de cinturão tropical, localizado
entre os Trópicos de Câncer e de Capricórnio, caracterizada por temperaturas médias
de 20 ºC, índice pluviométrico entre 1500 e 1600 mm ao ano e solo fértil (TAKASAGO,
1999).
No Brasil, o café arábica é abundante em Minas Gerais, Goiás,
Paraná, Bahia e São Paulo. O conilon, por sua vez, é encontrado principalmente no
Espírito Santo, Mato Grosso e Rondônia.
Os frutos do café assemelham-se quanto ao tamanho e forma e
quanto às variedades de seus arbustos; entretanto, as únicas divergências
consideravelmente acentuadas são de ordem sensorial, ou seja, o aroma, paladar e
corpo, que são desenvolvidos com a torração de seus grãos e avaliados pela
degustação.
O café possui uma grande importância na economia global e é a
matéria-prima de uma das bebidas mais aceitas no mundo, a mais popular depois do
chá. Os negócios relacionados ao café são dos mais importantes para o comércio
mundial, perdendo em valor somente para a commodity petróleo (NOGUEIRA et al.,
2000). Seu cultivo mundial compreende diretamente pelo menos vinte milhões de
pessoas, sem falar em processamento, comercialização e distribuição, sendo crucial
às economias e à política de muitos países em desenvolvimento para os quais as
exportações do café constituem parte substancial da balança econômica de
exportação, em alguns países representando acima de oitenta por cento do total
(SCHENKER, 2000). Constitui importante fonte de divisas para o Brasil, com
investimentos anuais de aproximadamente 4,5 milhões de reais no campo. Do total da
11
colheita nacional, menos da metade é absorvido pelo mercado interno, sendo o
restante exportado principalmente para o Japão, Estados Unidos e Europa.
A expectativa de produção mundial para a safra 2006/07 é de 120
milhões de sacas de 60 kg, considerando os cinqüenta países membros da
International Coffee Organization (ICO). Destes, em torno de doze tem capacidade de
produzir café solúvel, volume relativamente inferior, mas de elevado valor agregado,
estimando-se atualmente a produção mundial de café solúvel ao redor de 500 mil
toneladas por ano, em suas várias formas de apresentação: pó, aglomerado,
liofilizado, extratos concentrados, como ingredientes em misturas para preparo de
bebidas lácteas e outras aplicações (ICO, 2007).
No cenário mundial, o Brasil ocupa posição de destaque na exportação
de café solúvel, com uma estimativa de volume de mais de 2 milhões em sacas de 60
kg para o ano de 2007, conforme a Tabela 2.
Tabela 2: Exportações brasileiras de café solúvel
Ano Volume* Receita* Preço***
2007
a
2.030.388 285.257 140,49
2006 2.939.733 383.147 130,33
2005 3.338.963 362.638 108,61
2004 3.087.111 275.153 89,13
Fonte: ABIC (2007)
* Volume em sacas de 60 kg (conversão: peso líquido*1000*2,6/60),
** Receita em mil US$
*** Preço médio em US$ por saca
a
Dados referentes até agosto de 2007
A bibliografia científica disponível não cita a utilização específica da
borra de café como fonte de fibra alimentar, entretanto, trabalhos como os de
BORRELLI et al. (2004) e DÍAZ-RUBIO e SAURA-CALIXTO (2007) indicam o possível
potencial de uso deste material como fibra alimentar a ser utilizada no
desenvolvimento de produtos com apelo funcional.
BORRELLI et al. (2004) avaliaram o conteúdo de fibra alimentar na
casca (película) proveniente do processo de torra de amostras de café arábica e
encontraram elevados teores de fibra alimentar total (64,2%), sendo 53,7% de fibra
12
alimentar solúvel e 8,8% de fibra alimentar insolúvel. A película também apresenta
atividade antioxidante, devido à composição da fibra que contém compostos fenólicos
resultantes da reação de Maillard, e sugere seu uso como ingrediente funcional no
desenvolvimento de alimentos funcionais ricos em fibra.
DÍAZ-RUBIO & SAURA-CALIXTO (2007) avaliaram o conteúdo de fibra
alimentar em bebidas de café preparadas de diferentes formas (café espresso, filtrado
e solúvel), e os resultados mostraram que as bebidas de café contêm um teor
significativamente maior de fibra alimentar solúvel do que outras bebidas. O café
espresso apresentou 3,08% de fibra alimentar solúvel expresso em percentual de café
em pó. O café filtrado e o café liofilizado apresentaram respectivamente 2,54 e 20,20%
de fibra alimentar solúvel em percentual de café em pó, valores estes mais elevados
do que em outras bebidas, tais como vinho (0,14%) e suco de laranja (0,19%).
13
4 MATERIAL E MÉTODOS
4.1 Material
A matéria prima utilizada foi a borra de café, fornecida pela Cia. Iguaçu
de Café Solúvel (Cornélio Procópio – PR).
Para o tratamento da borra foi utilizado peróxido de hidrogênio 30%
(Synth) e hidróxido de sódio (97% de pureza – Biotec).
Para a produção dos biscoitos foram utilizados farinha de trigo, açúcar,
margarina, café solúvel, chocolate em pó e bicarbonato de sódio adquiridos no
comércio local, e ovo integral pasteurizado e desidratado da Salto’s Alimentos LTDA.
(Salto – SP).
4.2 Métodos
4.2.1 Caracterização da fibra de café
As análises realizadas para caracterização da fibra de café, antes e
depois da modificação com peróxido de hidrogênio alcalino, compreenderam:
composição química (umidade, proteína, cinza e lipídeo) segundo as técnicas descritas
pela Association of Official Analytical Chemists (AOAC, 2006); fibra alimentar total,
solúvel e insolúvel de acordo com o método oficial enzimático-gravimétrico, tampão
MES-TRIS, 991.43 da AOAC (2006); carboidratos por diferença; fracionamento da fibra
modificada em celulose, hemicelulose e lignina segundo CLAYE; IDOURAINE e
WEBER (1996), e granulometria, determinada pela passagem de 100 gramas de
amostra por um conjunto de tamises (abertura de 840 µm a 74 µm), com agitação
constante por 30 minutos (expressa em porcentual de material retido em cada
peneira).
14
4.2.2 Propriedades das fibras
A Capacidade de Retenção de Água (CRA) e o Volume de
Intumescimento foram determinados conforme ROBERTSON et al. (2000). Um grama
de amostra (b.s.) foi hidratada com 30 mL de água destilada em tubo de centrífuga.
Após equilíbrio por 18h à temperatura ambiente, centrifugou-se a 6.000 rpm por 20
minutos e descartou-se o sobrenadante invertendo o tubo cuidadosamente em peneira
fina, até não haver mais separação de água. Registrou-se o peso da amostra úmida e
também depois de seca a 105 ºC, até peso constante. A CRA (g de água absorvida/g
de peso seco) foi calculada como CRA (g/g) = (peso úmido – peso seco)/peso seco.
O volume de intumescimento foi determinado pela mistura de 2 g de
amostra com 15 mL de água destilada em uma proveta de 50 mL à temperatura
ambiente. Após equilíbrio (18h), o volume de fibra intumescida foi registrado e
expresso como mL/g de material seco.
A cor da fibra tratada foi medida em colorímetro Minolta (CR-400)
empregando iluminante CIE D65 (luz natural do dia) em um ângulo de 8/d e
observador padrão CIE 10º. O colorímetro forneceu diretamente os valores de L*
(luminosidade), a* (componente vermelho-verde) e b* (componente amarelo-azul).
4.2.3 Tratamento com peróxido de hidrogênio alcalino
A borra de café foi tratada com solução de peróxido de hidrogênio
alcalino para modificação das propriedades funcionais e físicas.
O tratamento foi realizado em frascos erlenmeyer de 1 litro de
capacidade, contendo 500 mL de solução de peróxido de hidrogênio 1% (p/v),
alcalinizado com solução de hidróxido de sódio 50% (p/v), até atingir um pH de 11,5 ±
0,1. A seguir, foi adicionada a borra de café e os frascos tampados e colocados em
banho térmico Dubnoff TE-053 da TECNAL (Piracicaba - SP), com agitação de 120
rpm. Após o tempo requerido de reação, conforme planejamento experimental, as
misturas foram neutralizadas com solução de HCl 5N; o resíduo insolúvel foi
recuperado por filtração, lavado repetidamente, até um pH menor que 8,0 e,
15
posteriormente, seco em estufa à 60º C por 12 horas. Após a secagem, o material foi
acondicionado em frascos plásticos.
4.2.3.1 Planejamento experimental
Foi empregado o planejamento fatorial incompleto 3
3
(BOX e
BEHNKEN, 1960) para investigar o efeito de três variáveis independentes, com três
níveis de variação, nas propriedades funcionais e cor da fibra tratada. As variáveis
estudadas foram: temperatura do tratamento (X
1
), tempo de tratamento (X
2
) e a
concentração de borra (X
3
). Os níveis das variáveis foram determinados a partir do
trabalho feito por LARREA et al. (1997) que utilizou peróxido de hidrogênio alcalino
para modificação da fibra da casca de arroz. Os valores reais dos níveis utilizados
estão apresentados na Tabela 3. O planejamento é composto por um grupo de 12
ensaios mais 3 repetições no ponto central (Tabela 4), e representa 48% das
combinações teóricas de um fatorial 3
3
completo (27 experimentos), possibilitando uma
representação bastante precisa da realidade. As repetições tornam possível a
estimativa do erro puro nas análises, utilizando o cálculo da falta de ajuste dos
modelos.
Tabela 3: Níveis das variáveis independentes estudadas no tratamento da borra de
café.
Variáveis Níveis
-1 0 +1
X
1
= temperatura (ºC) 30 40 50
X
2
= tempo (h) 6 9 12
X
3
= concentração de sólidos (% p/v) 4 6 8
Para cada experimento foram avaliadas as seguintes variáveis
dependentes: capacidade de retenção de água, volume de intumescimento e cor. O
modelo matemático para a estimativa de cada uma das propriedades avaliadas foi
obtido utilizando o programa Statistica 7.0 (Statsoft, Tulsa-OK, USA). A significância
dos coeficientes de regressão em nível de 5%, o coeficiente de variação (CV), o
16
coeficiente de determinação (R
2
), a estimativa do erro padrão e a significância da falta
de ajuste (p) foram determinados através da análise de variância (ANOVA). A
influência das variáveis foi visualizada através de gráficos de superfície de resposta,
elaborados a partir dos modelos simplificados, pelo mesmo programa.
Tabela 4: Planejamento estatístico dos experimentos com os níveis codificados das
variáveis.
Níveis codificados das variáveis
Experimento X
1
X
2
X
3
1 -1 -1 0
2 +1 -1 0
3 -1 +1 0
4 +1 +1 0
5 -1 0 -1
6 +1 0 -1
7 -1 0 +1
8 +1 0 +1
9 0 -1 -1
10 0 +1 -1
11 0 -1 +1
12 0 +1 +1
13 0 0 0
14 0 0 0
15 0 0 0
4.2.4 Produção de biscoitos com fibra de café
Biscoitos foram produzidos com a borra natural e a que continha a
fibra modificada, obtida na condição em que o tratamento foi mais eficiente. Os
biscoitos foram formulados com farinha de trigo, açúcar, margarina, chocolate em pó,
ovo em pó, bicarbonato de sódio, café solúvel dissolvido em 25 mL de água e a borra
de café (Tabela 5).
A quantidade de borra de café adicionada à formulação foi
determinada de forma que o produto final atendesse à exigência estabelecida pela
ANVISA, na Portaria SVS/MS nº 27/98, que diz que para que um produto pronto para o
consumo tenha o atributo alto teor de fibras, deve conter no mínimo 6g de fibras / 100g
de sólidos.
17
Tabela 5: Formulação dos biscoitos de café
Ingredientes Peso (g)
Farinha de trigo 300
Açúcar 150
Margarina 90
Borra de café 50
Café solúvel 20
Chocolate em pó 10
Ovo em pó 5
Bicarbonato de sódio 5
Os ingredientes foram pesados seguindo a formulação estipulada. A
margarina e o açúcar foram misturados inicialmente em batedeira planetária. À seguir,
adicionou-se o ovo em pó, o chocolate, o bicarbonato, o café solúvel preparado em 25
mL de água quente, a farinha de trigo e a borra de café. A massa foi então dividida em
pequenas porções, estendida com um rolo para ficar com 3mm de espessura e
moldada com auxílio de uma forma circular de 31mm. Os biscoitos foram assados a
200 ºC por 17 minutos.
4.2.4.1 Caracterização dos biscoitos
Os biscoitos produzidos com a borra de café contendo a fibra natural e
a modificada foram caracterizados pela sua composição química (umidade, proteína,
cinza e lipídeo) segundo as técnicas da AOAC (2006); fibra alimentar total, solúvel e
insolúvel, de acordo com o método oficial enzimático-gravimétrico, tampão MES-TRIS,
991.43 da AOAC (2006) e carboidratos por diferença.
As características físicas dos biscoitos produzidos foram determinadas
em 8 unidades de cada uma das formulações, escolhidas aleatoriamente. A espessura
e o diâmetro dos biscoitos foram medidas com paquímetro; o volume foi determinado
por deslocamento de sementes de painço e o volume específico foi determinado pela
razão entre volume e peso.
18
4.2.4.2 Dureza instrumental
A dureza (N) dos biscoitos foi determinada em texturômetro TA-XT2i
(Stable Micro Systems) e os registros feitos através do Software XTRAD.
Cada amostra foi disposta horizontalmente em uma plataforma e
cortada por um probe tipo faca, com velocidade pré-teste, teste e pós-teste de 5,00
mm/s, uma distância de 8,0 mm e força do triguer de 0,2N.
4.2.4.3 Avaliação sensorial
Para verificar se havia diferença entre as amostras contendo a fibra
modificada e a não modificada, a fim de confirmar ou não a eficiência do tratamento
em nível sensorial, foi realizado um teste triangular com 54 provadores. Estes
avaliaram os biscoitos dispostos em prato de fundo branco, codificados com números
aleatórios de três dígitos. Os testes foram realizados em cabines individuais, com uso
de luz controlada, vermelha e verde simultaneamente. Os resultados foram analisados
utilizando a tabela de significância própria do teste (MEILGAARD, CIVILLE e CARR,
1999).
A aceitabilidade dos biscoitos formulados com os dois tipos de fibra foi
avaliada por um teste de aceitação. Foi utilizada uma escala hedônica híbrida de 10
pontos ancorada com expressões verbais nas extremidades e no meio da escala, para
que cada provador pudesse indicar o quanto gostou ou desgostou de cada amostra,
para posterior análise estatística dos resultados (VILLANUEVA; PETENATE e DA
SILVA, 2005). Os provadores não treinados, em número de 50, receberam as
amostras codificadas, uma por vez, e foram solicitados a indicar o quanto gostaram ou
desgostaram, segundo a escala. Estes provadores receberam um questionário afim de
indicarem se tinham o hábito de consumir biscoitos e com que freqüência, e se
gostavam ou não do sabor café, com a finalidade de identificar a familiaridade destes
provadores com o tipo de amostra apresentada.
19
5 RESULTADOS E DISCUSSÃO
5.1 Caracterização da borra de café sem tratamento
A composição centesimal da borra de café não modificada pode ser
observada na Tabela 6.
Tabela 6: Composição centesimal da borra de café não modificada (base seca)
%
Proteína
10,69 ± 0,16
Cinzas
0,49 ± 0,11
Lipídeos
17,91 ± 0,13
Fibra Alimentar Total
65,20 ± 0,51
- Fibra Alimentar Solúvel
0,16 ± 0,01
- Fibra Alimentar Insolúvel
65,04 ± 0,52
Carboidratos
a
5,71
TOTAL 100
a
calculados por diferença
LAGO e ANTONIASSI (2001) avaliaram a composição centesimal da
borra de café de três indústrias nacionais de café solúvel e encontraram um teor de
proteína de 6,70 a 9,89%. ADANS e DOUGAN (1985) citam valores de 10 a 12% de
proteína para a borra de café, enquanto RAVINDRANATH et al. (1972) analisando
borras de café de variedades de robusta e arábica, encontraram teores de proteína de
14 a 14,8%.
O processo de extração aquosa do café solúvel resulta em uma borra
com elevado teor de lipídeos. A borra utilizada neste trabalho apresentou um teor de
17,91%. LAGO e ANTONIASSI (2001) reportaram valores de 19,9 a 27,83% em seu
trabalho enquanto ADANS e DOUGAM (1985) citam valores de 22 a 27%.
LAGO e ANTONIASSI (2001) avaliaram o teor de fibra bruta e
encontraram valores de 48,23 a 67,22% para a borra desengordurada. Estes autores
não utilizaram o método enzimático-gravimétrico de determinação de fibras e não
20
apresentaram a proporção entre os teores de fibra insolúvel e solúvel; entretanto, os
resultados são semelhantes ao determinado para fibra alimentar total (65,20%) com o
método enzimático-gravimétrico.
As possibilidades de empregar a borra de café como matéria-prima
para uso industrial estão relacionadas, basicamente, com o seu elevado teor de fibra
alimentar, o que constitui seu potencial como fonte de fibras.
As variações observadas por diferentes autores colocam em evidência
que nem sempre há concordância entre os pesquisadores com relação à composição
química das matérias-primas. As principais fontes destas variações são a espécie da
matéria-prima e o método de análise.
5.2 Tratamento alcalino: propriedades das fibras
As médias dos resultados experimentais dos 15 ensaios do
planejamento experimental estão apresentadas na Tabela 7 e, na Tabela 8, os
coeficientes dos modelos de regressão elaborados a partir destes resultados,
juntamente com as respectivas análises de variância (ANOVA).
Os modelos de regressão elaborados a partir dos dados experimentais
foram simplificados conservando os fatores significativos e aqueles que apesar de não
significativos contribuíram para aumentar o R
2
dos modelos.
De acordo com a ANOVA (Tabela 8), os modelos para a CRA e a cor
apresentaram valores de R
2
ajustado maiores que 0,90. Isto indica que as variáveis
estudadas explicam boa parte das diferenças, nas propriedades analisadas,
provocadas pelas condições experimentais. Os modelos também apresentaram falta
de ajuste não significativo, indicando que se ajustam bem aos dados experimentais,
podendo ser usados para fins preditivos. O modelo de regressão da luminosidade
apresentou o menor coeficiente de variação (6,66%), enquanto que os da CRA e do
volume de intumescimento foram de 14,25 e 12,73%, respectivamente.
21
Tabela 7: Médias dos resultados para as propriedades de hidratação e cor da borra de
café segundo o planejamento fatorial 3
3
incompleto empregado no experimento.
Variáveis independentes Respostas
Ensaios
a
Temperatura
(º C)
Tempo
(h)
% borra
(p/v)
CRA
b
Volume de
intumescimento
c
Luminosidade
(L*)
1 30 6 6 3,43 4,49 25,45
2 50 6 6 2,73 3,98 26,81
3 30 12 6 3,16 4,24 31,82
4 50 12 6 3,17 4,24 31,26
5 30 9 4 3,98 5,57 28,46
6 50 9 4 3,80 4,98 29,37
7 30 9 8 3,52 4,72 29,45
8 50 9 8 3,35 4,74 29,44
9 40 6 4 3,00 3,75 25,66
10 40 12 4 2,90 4,24 30,58
11 40 6 8 2,54 3,75 26,74
12 40 12 8 3,10 4,48 30,64
13 40 9 6 2,61 3,47 29,12
14 40 9 6 2,73 3,95 30,15
15 40 9 6 2,46 3,66 30,46
a
=realizados em ordem aleatória;
b
=Capacidade de Retenção de Água (g água/g de amostra seca);
c
=mL/g de amostra seca
O modelo para o volume de intumescimento apresentou um R
2
próximo de 0,90, o que poderia ser considerado satisfatório, entretanto, seu R
2
ajustado foi de 0,72 e o modelo não representa de forma satisfatória as diferenças
causadas pelo experimento nesta propriedade, mesmo apresentando falta de ajuste
não significativo.
A CRA foi influenciada pelos efeitos quadráticos da temperatura e da
concentração de borra. Estes mesmos efeitos também influenciaram significativamente
o volume de intumescimento. A luminosidade foi influenciada pelo efeito linear do
tempo de reação.
22
Tabela 8: Coeficientes de Regressão e Análise de Variância (ANOVA) dos modelos
matemáticos
a
das variáveis resposta.
Variáveis Resposta
Coeficientes CRA
b
Volume de
Intumescimento
c
Luminosidade
(L*)
β
0
3,224* 4,432* 28,807*
Linear
β
1
-0,131
d
-0,135
d
0,211
d
β
2
0,081
d
0,154
d
2,454*
β
3
-0,147
d
-0,106
d
0,274
d
Quadrático
β
11
-0,325* -0,374* 0,075
d
β
22
0,065
d
0,101
d
0,462
d
β
33
-0,207* -0,281* 0,290
d
Interação
β
12
0,179
d
0,128
d
-0,480
d
β
13
- 0,154
d
-0,231
d
β
23
0,163
d
- -0,254
d
R
2
0,9606 0,8806 0,9734
R
2
ajustado 0,9081 0,7213 0,9256
Desvio Padrão 0,4571 0,5458 1,9352
Coeficiente de Variação (%) 14,2501 12,7381 6,6668
Significância da falta de ajuste (P) 0,5341 0,3767 0,8038
a
= modelo completo: Y= β
0
+ β
1
X
1
+ β
2
X
2
+ β
3
X
3
+ β
11
X
1
2
+ β
22
X
2
2
+ β
33
X
3
2
+ β
12
X
1
X
2
+ β
13
X
1
X
3
+ β
23
X
2
X
3
+
ε, no qual X
1
= Temperatura (ºC), X
2
= Tempo (h), X
3
= concentração de borra (% p/v),
b
= Capacidade de
retenção de água (g água/g amostra seca),
c
= mL/g amostra seca,
d
= embora não significativo em nível
de 5%, este termo contribui para aumentar o R
2
do modelo, * significativo a p<0,05.
5.2.1 Capacidade de retenção de água
A capacidade de retenção de água é uma expressão empregada para
descrever a capacidade de uma matriz de moléculas, normalmente macromoléculas,
de reter grandes quantidades de água de maneira que se evite a exsudação (CHOU;
MORR, apud MARTINS, 1995).
No caso das fibras, tal capacidade está relacionada com as
propriedades hidrofílicas dos grupos hidroxilas livres dos polissacarídeos. Por outro
lado, ligações inter e intra moleculares apresentam um efeito contrário. Desta forma, a
estrutura física da fibra é o determinante de maior importância para essa propriedade.
23
A fibra, quando em contato com a água, tem suas macromoléculas dispersas e
expandidas. Sua hidratação ocorre por adsorção na superfície das macromoléculas e
por incorporação às regiões intersticiais da matriz fibrosa (KAY, 1982).
Pela análise da Figura 1, correspondente ao modelo de regressão
(Tabela 8), observa-se que os maiores valores de CRA (4g água/g amostra seca) se
localizam na região de menor temperatura (30 ºC) e menor concentração de borra
(4%). Entretanto, há uma tendência a aumento nos valores de CRA na região da
maior concentração de borra (8%).
4
3,6
3,2
2,8
2,4
Figura 1: Capacidade de retenção de água (mL água/g amostra seca) da borra de
café após tratamento em função da temperatura e concentração de borra, com 6 horas
de reação.
Na região próxima à maior temperatura (50 ºC) e menor concentração
de borra (4%) também são observados maiores valores de CRA. Esta região, contudo,
não é tão interessante para ser explorada com a extrapolação para além da área
experimental devido ao maior gasto energético necessário para obter resultados
semelhantes. A diminuição da CRA com o aumento da temperatura pode ser
decorrente do rompimento da estrutura da fibra, uma vez que a fragmentação da
24
matriz fibrosa reduz o espaço intersticial, além de destruir as estruturas responsáveis
pela interação com a água, diminuindo a capacidade de retenção de água. Quando a
temperatura continua sendo aumentada pode ocorrer que espaços intersticiais antes
não disponíveis comecem a ser expostos pela desestruturação da fibra, e nestes
espaços comece a ocorrer novamente uma interação com a água e um novo aumento
da capacidade de retenção de água nestas fibras.
5.2.2 Volume de intumescimento
O intumescimento é um fenômeno decorrente da difusão induzido pela
afinidade das moléculas do material pelas moléculas pertencentes ao fluido. À medida
que o líquido interativo entra em contato com a molécula, ocorre um mecanismo do
tipo “abertura das fibrilas” onde é produzida uma forma porosa. Quando o
intumescimento inicia, mais grupos hidroxilas tornam-se acessíveis para acomodar
mais líquido, os quais abrem ainda mais a estrutura e causam mais intumescimento.
Quando o líquido interativo é somente água, os grupos hidroxilas presentes na região
amorfa tornam-se disponíveis enquanto os das regiões cristalinas permanecem
inacessíveis durante todo o processo (QIAN e DING, 1996).
O intumescimento é normalmente causado por uma fixação
espontânea da água através da matriz fibrosa. O grau de intumescimento pode ser
controlado por forças intermoleculares e ligações dentro da matriz. CHOU e MORR
apud MARTINS (1995) afirmaram que o intumescimento tem um efeito direto na
quantidade de água que o sistema pode absorver, e dá forma e textura ao produto
final.
A maioria das áreas disponíveis para a água encontra-se na região
não cristalina. As regiões cristalinas funcionam como um tipo de pseudoligações
cruzadas, agindo como obstáculos e limitando o processo de intumescimento (QIAN e
DING, 1996).
Através da superfície de resposta (Figura 2) gerada a partir do modelo
ajustado para o volume de intumescimento (Tabela 8), observa-se que houve um
aumento neste volume na faixa da temperatura mais baixa tanto para as menores
25
concentrações de borra assim como para as maiores concentrações. Entretanto, como
dito anteriormente, o modelo para o volume de intumescimento não representou de
forma satisfatória as diferenças causadas pelo experimento nesta propriedade e os
resultados para as condições estudadas podem ser decorrentes da execução do
método de determinação, que em geral apresenta um alto coeficiente de variação; ou
pela faixa de variação estudada que não causou modificações significativas no volume
de intumescimento.
5
4,8
4,6
4,4
4,2
4
3,8
3,6
3,4
Figura 2: Volume de intumescimento (mL/g amostra seca) da borra de café após
tratamento, em função da temperatura e da concentração de borra, com 6 horas de
reação.
Em todos os experimentos a concentração de peróxido de hidrogênio
alcalino foi de 1%. Segundo GOULD (1985) e NING; VILLOTA e ARTZ (1991), o
peróxido de hidrogênio alcalino degrada a lignina através de sua remoção por
solubilização e/ou modificação estrutural, ao mesmo tempo em que modifica a
cristalinidade da celulose, aumentando a capacidade da fibra intumescer. Portanto, o
intumescimento de matérias lignocelulósicos tratados com álcali está associado a
mudanças na flexibilidade da cadeia molecular e interações intermoleculares. Neste
26
trabalho, talvez a concentração de reagente fixada (1%) tenha sido baixa demais para
permitir modificações na capacidade de intumescimento da fibra. Outra possibilidade é
a de que as características de composição e estrutura das fibras não possibilitem
maiores modificações.
5.2.3 Cor – Luminosidade (*L)
A cor é considerada um atributo de qualidade de um produto.
Fisicamente, é uma característica da luz, a qual pode ser quantificada em termos de
intensidade e comprimento de onda e, baseada nas características dos produtos, pode
ser quantificada pela transmissão ou reflectância. Desta forma, a luminosidade, ou
porcentagem de reflectância, foi a característica determinada neste experimento, uma
vez que o tratamento com peróxido de hidrogênio atua também como agente
branqueador nesse processo.
31
30
29
28
27
Figura 3: Luminosidade (L*) da borra de café após tratamento em função da
temperatura e tempo, com concentração de borra de 6%.
27
Pela análise da Figura 3 podemos verificar que a luminosidade da
borra de café aumentou com o tempo de reação para toda a faixa de temperatura. A
coloração escura da borra de café sem tratamento é uma limitação para sua aplicação
em alimentos, pois restringe os níveis de adição, por conferir tonalidades e pontos
escuros não característicos aos alimentos nos quais teria um uso potencial.
O branqueamento com peróxido de hidrogênio não elimina a cor
escura da borra de café, apenas a tornou um pouco mais clara, o que representa um
fator interessante para ampliar suas aplicações, tornando-o mais aceito.
5.2.4 Escolha da melhor condição de tratamento
Os modelos de regressão obtidos do planejamento experimental
indicaram que os maiores valores para as propriedades de hidratação e luminosidade
da borra de café tratada com 1% de peróxido de hidrogênio podem ser obtidos com
temperaturas mais baixas (30 ºC), visando uma economia de energia, e com uma
maior concentração de borra de café (8%) dentro da faixa estudada, permitindo assim
uma maior relação sólidos/reagente.
Haja visto que os efeitos do tempo de reação não foram significativos,
foram realizados outros testes abaixo do tempo de 6 horas afim de explorar esta área,
com as demais condições fixadas em 30 ºC e 8% de borra. Foram testados os tempos
de 4 e 5 horas. A Tabela 9 apresenta a média dos resultados destes testes.
Tabela 9: Efeito do tratamento com peróxido de hidrogênio alcalino na capacidade de
retenção de água e volume de intumescimento em 4 e 5 horas de reação
1
.
Tempo de reação CRA*
(g água/g de amostra)
Volume de Intumescimento*
(mL/g amostra)
4 horas
3,04 ± 0,00
b
4,72 ± 0,03
b
5 horas
3,63 ± 0,03
a
4,96 ± 0,04
a
* Valores médios obtidos de duplicatas.
1
= tratamento a 30 ºC, com 8% de borra. Médias seguidas por
letras diferentes, na mesma coluna, apresentam diferença (Teste T-Sudent, p<0,05).
Os resultados apresentaram diferença (p<0,05). Os maiores valores
para as propriedades de hidratação foram obtidos com 5 horas de reação (3,63g
28
água/g amostra para CRA e 4,96 mL/g amostra seca para volume de intumescimento),
além de uma luminosidade (*L) de 30,58 para a cor, sendo, portanto, esta a condição
escolhida para produzir a borra de café modificada para uso em biscoitos.
5.3 Avaliação comparativa do efeito do tratamento nas propriedades da borra de
café
Na Tabela 10 é possível comparar os resultados das propriedades de
hidratação e luminosidade da borra de café, antes e após tratamento, nas condições
estabelecidas anteriormente.
Tabela 10: Efeito do tratamento com peróxido de hidrogênio alcalino na capacidade de
retenção de água, volume de intumescimento e cor da borra de café.
CRA*
(g água/g de amostra)
Volume de Intumescimento*
(mL/g amostra)
Luminosidade*
(L*)
Sem tratamento
2,43 ± 0,15
b
4,88 ± 0,05
a
25,32 ± 0,02
b
Com tratamento
1
3,63 ± 0,03
a
4,96 ± 0,04
a
30,58 ± 0,06
a
* Valores médios obtidos de triplicatas. Médias seguidas pela mesma letra, na mesma coluna, não
apresentam diferença significativa (Teste T-Student, p<0,05).
1
= tratamento a 30 ºC, por 5 horas com
8% de borra.
O tratamento melhorou em 49,2% a CRA da borra de café em
comparação com a borra sem tratamento. O aumento no volume de intumescimento
da borra modificada foi de apenas 1,64% e não foi significativo. O aumento na CRA
está de acordo com a idéia de que estes materiais tratados apresentam estrutura mais
aberta, com porosidade aumentada, o que facilita a retenção da água (GOULD;
JASBERG e DEXTER, 1990; NING; VILLOTA e ARTZ, 1991).
DOUGHERTY; SOMBKE e IRVINE (1988) verificaram um aumento de
68% na CRA de cascas de aveia após tratamento alcalino. A modificação das
propriedades de hidratação das fibras por tratamentos físicos são geralmente
aumentadas quando associadas a algum tipo de modificação física, sendo o processo
de extrusão o mais estudado. LARREA et al. (1997) obteve um aumento de 95% na
capacidade de retenção de água e 138% no volume de intumescimento quando
29
aperfeiçoaram processos de pré-tratamento com solução de peróxido de hidrogênio
alcalino seguido de extrusão para modificação da fibra da casca de arroz, visando
melhorar as propriedades funcionais dessa fibra. GALDEANO e GROSSMANN (2005)
associaram o tratamento alcalino com a extrusão e obtiveram 70% de aumento na
capacidade de retenção de água e 55% no volume de intumescimento nas
propriedades de hidratação de casca de aveia.
A opção pelo uso exclusivo do tratamento químico na borra de café,
sem associação com nenhum outro processo, deve-se ao caráter exploratório deste
trabalho, uma vez que não foram encontradas na bibliografia informações sobre as
propriedades de hidratação deste material, nem sobre seu uso como fibra alimentar.
A borra de café modificada pelo tratamento alcalino apresentou
coloração mais clara que a borra não modificada e, portanto, mais adequada para o
uso mais amplo em biscoitos.
5.4 Composição da fibra alimentar da borra de café
O resultado do fracionamento da fibra alimentar da borra de café
modificada, realizado conforme método descrito por CLAYE; IDOURAINE e WEBER
(1996) é apresentado na Tabela 11.
Tabela 11: Composição da Fibra de café
Componentes %
a
Celulose
43,40 ± 0,46
Hemicelulose
27,26 ± 1,21
- hemicelulose A (insolúvel)
25,01 ± 0,36
- hemicelulose B (solúvel)
2,25 ± 0,84
Lignina
23,30 ± 0,21
Substâncias pécticas insolúveis
6,03 ± 0,14
a
= média de triplicatas
30
Não foram encontrados na revisão bibliográfica artigos que
apresentassem dados da composição da borra de café em termos de seu conteúdo em
celulose, hemicelulose e lignina.
SOUZA et al. (2001) determinaram estes componentes na casca do
café e encontraram 22,72% de celulose, 14,69% de hemicelulose e 12,38% de lignina;
porém, a casca do café não é utilizada na fabricação de café solúvel e, portanto, estes
valores não podem ser comparados diretamente com o conteúdo dos mesmos na
borra de café.
Da mesma forma BARCELOS; PAIVA e PEREZ (2001) verificaram o
conteúdo de celulose e hemicelulose na casca e polpa desidratada de café. A casca
apresentou teores de 37% de celulose e 36% de hemicelulose. Na polpa, estes teores
foram de 24% para a celulose e 23% para a hemicelulose.
DREHER (1999) cita que os principais açúcares totais do café solúvel
são arabino-galactanos e mananos, ou seja, hemiceluloses solúveis ou de menor
solubilidade, como é o caso dos mananos. No grão de café esses polissacarídeos,
mais a celulose e a lignina têm um papel estrutural e formam a matriz da parede
celular secundária, isto é, são uma reserva de energia para a germinação e conferem
dureza à semente. As condições de preparo do café solúvel são excepcionais para
estes polissacarídeos e muitos deles são solubilizados ou arrastados pelo processo de
extração e, assim, incorporados ao café solúvel.
A principal vantagem do fracionamento é a informação adicional
acerca dos componentes da fibra, facilitando o entendimento da variabilidade na
resposta fisiológica e nas propriedades físico-químicas de alimentos induzida por
diferentes fontes de fibra, uma vez que os valores de fibra alimentar sozinhos não
podem predizer a verdadeira propriedade funcional da fibra.
5.5 Caracterização da borra de café após tratamento
A composição centesimal da borra de café, após o tratamento com
peróxido de hidrogênio alcalino, pode ser observada na Tabela 12.
31
Tabela 12: Composição centesimal da borra de café tratada com peróxido de
hidrogênio alcalino (base seca)
1
.
%
Proteína
9,48 ± 0,22
Cinzas
1,12 ± 0,04
Lipídeos
18,34 ± 1,11
Fibra Alimentar Total
64,26 ± 0,89
- Fibra Alimentar Solúvel
0,59 ± 0,07
- Fibra Alimentar Insolúvel
63,67 ± 0,86
Carboidratos
a
6,80
TOTAL 100
a
calculado por diferença,
1
= tratamento a 30 ºC, por 5 horas com 8% de borra.
De acordo com a Tabela 12, comparada com a Tabela 6, houve
redução nos teores de proteína e fibra alimentar total e aumento nos teores de cinzas,
lipídeos e carboidratos, mas estas alterações podem ser relativas, causadas
unicamente pelo balanço centesimal entre os componentes.
É importante lembrar que o material foi lavado após o tratamento, o
que resulta na remoção de proteínas e outros materiais solúveis, inclusive a fração
solúvel das fibras. Não foram encontrados na literatura valores de composição da
borra de café tratada com peróxido de hidrogênio e, portanto, não há dados para
comparação.
A redução no teor de fibra alimentar deve-se ao próprio tratamento
alcalino cuja finalidade é solubilizar parte da lignina e reduzir a cristalinidade da
celulose e assim aumentar a capacidade de hidratação da fibra.
5.5.1 Granulometria da borra de café após tratamento
A classificação granulométrica da borra de café antes e após ser
tratada com peróxido de hidrogênio pode ser vista na Tabela 13. A maior parte das
partículas da borra sem tratamento (72%) ficou retida entre as peneiras com abertura
entre 0,600 e 0,180 mm. Entre essas mesmas peneiras foram retidas 62,6% das
32
partículas da borra tratada. Na produção dos biscoitos com fibra foi utilizada a fibra em
todos os tamanhos de partícula a fim de aproveitar integralmente a matéria prima.
Tabela 13: Classificação granulométrica da fibra de café bruta e modificada
Tyler Abertura em mm Fibra Bruta Fibra Modificada
Material retido (%) Material retido (%)
20 0,840 22.0 17.9
28 0,600 18.0 18.0
48 0,300 35.4 32.7
80 0,180 18.7 12.0
100 0,150 2.0 3.5
200 0,075 3.9 12.6
Fundo < 0,075 0.1 3.4
TOTAL 100,0 100,0
A modificação na granulometria da borra é atribuída ao tratamento
com peróxido de hidrogênio e sua ação na estrutura física do material, além da
agitação à que o material é submetido durante o tratamento.
5.6 Caracterização dos biscoitos produzidos com borra de café modificada
5.6.1 Composição centesimal
A composição centesimal dos biscoitos elaborados com a borra de
café modificada está apresentada na Tabela 14. Na mesma Tabela pode-se comparar
a formulação elaborada com a de uma formulação comercial de cookies integrais
sabor café, onde os dados de composição foram extraídos da embalagem do produto.
33
TABELA 14: Composição centesimal dos biscoitos formulados com borra de café
modificada e biscoitos comercias (base seca).
Biscoito com borra de café
%
1
Biscoito comercial
%
2
Proteína
9,09 ± 0,19
7,7
Cinzas
1,02 ± 0,13
-
Lipídeos
7,93 ± 0,07
15,7
Fibra Alimentar Total
9,72 ± 0,33
6,7
- Fibra Alimentar Solúvel
0,50 ± 1,31
-
- Fibra Alimentar Insolúvel
9,22 ± 1,40
-
Carboidratos
a
72,25 63,3
1
= média de triplicatas,
2
= dados fornecidos pelo fabricante,
a
calculados por diferença.
De acordo com a legislação brasileira, para que um produto sólido seja
considerado como fonte de fibra, deve ter no mínimo 3% de fibras e, para ser
considerado como de alto teor, no mínimo 6% (BRASIL, 2001). Portanto, os biscoitos
preparados neste trabalho podem ser considerados como de alto teor de fibras.
5.6.2 Caracterização física dos biscoitos
A Tabela 15 apresenta as características físicas dos biscoitos
preparados com a borra modificada e com a borra natural.
Tabela 15: Médias das características físicas dos biscoitos elaborados com borra
modificada e com a borra natural
Parâmetros Físicos Avaliados Biscoito*
Fibra Modificada Fibra Bruta
Diâmetro (mm)
40,75 ± 0,89
a
39,00 ± 1,10
b
Espessura (mm)
6,63 ± 0,91
c
6,31 ± 1,53
c
Volume Específico (mL/g)
1,85 ± 0,25
d
1,50 ± 0,28
e
* Valores médios obtidos de 8 amostras aleatórias. Médias seguidas por letras diferentes, na mesma
linha, apresentam diferença (Teste T-Student, p<0,05).
34
O diâmetro e o volume específico dos biscoitos preparados com a
borra tratada e a não tratada apresentaram diferença (p<0,05). Embora não haja
diferença entre as espessuras dos biscoitos (p<0,05) observa-se uma tendência a
maiores espessuras nos biscoitos formulados com a borra modificada.
Pode-se dizer que estas diferenças nas características físicas dos
biscoitos estão associadas à maior capacidade de retenção de água da fibra
modificada, resultando em biscoitos com maior expansão.
GALDEANO e GROSSMANN (2005) produziram cookies com casca
de aveia modificada por tratamento alcalino associado à extrusão e não encontraram
diferença nas propriedades físicas dos cookies produzidos com a fibra tratada e a não
tratada.
A dureza dos biscoitos foi determinada em texturômetro e, de acordo
com a Tabela 16, houve diferença (p<0,05) entre as duas formulações.
Tabela 16: Dureza* dos biscoitos produzidos com fibra bruta e fibra modificada
Amostra Dureza (N)
Biscoito com fibra modificada
99,04 ± 8,17
b
Biscoito com fibra bruta
141,85 ± 14,95
a
* Valores médios obtidos de 8 amostras aleatórias. Médias seguidas por letras diferentes, na mesma
coluna, apresentam diferença (Teste T-Student, p<0,05).
Os biscoitos formulados com a fibra modificada apresentaram menor
dureza que os formulados com a fibra sem o tratamento. Como visto anteriormente,
estes biscoitos também apresentaram características de expansão maiores que do que
aqueles com borra natural e tal fato está associado com a maior capacidade de
retenção de água destas fibras, que resultam em produtos mais macios e menos
resistentes. Esta característica, entretanto deve ser considerada de forma adequada,
uma vez que, sensorialmente, a dureza, associada à crocância, pode ser um atributo
desejado neste tipo de produto.
A diferença de cor detectada entre a borra de café sem tratamento
(menor luminosidade) e após tratada (maior luminosidade) refletiu-se na cor final dos
biscoitos, como pode ser observado na Figura 4.
35
Figura 4. Aparência dos biscoitos produzidos com borra de café modificada e sem
modificação.
Os biscoitos produzidos com a borra de café modificada apresentaram
cor mais clara que aqueles com a borra sem modificação apesar do baixo nível de
incorporação deste ingrediente à massa (8%).
5.7 Análise sensorial
O teste triangular foi utilizado para verificação da diferença global entre
as amostras, que apresentaram diferença com p < 0,05 entre 54 provadores, sendo
que 34 provadores detectaram diferença entre as amostras. O aspecto visual dos
biscoitos não interferiu na resposta, uma vez que o teste foi realizado em cabines
individuais com uso de luz controlada, vermelha e verde simultaneamente, dificultando
a observação das diferenças existentes entre eles. A diferença encontrada, de acordo
com os provadores, situa-se principalmente na sensação arenosa ao paladar que a
borra de café sem tratamento proporciona e a doçura da amostra, mais acentuada nos
biscoitos com a borra modificada.
Uma vez detectada a diferença perceptível entre as amostras foi
realizado o teste de aceitação utilizando a escala hedônica híbrida de 10 pontos
ancorada com expressões verbais nas extremidades e no meio da escala, conforme
Biscoito com borra de café
modificada
Biscoito com borra de café
sem modificação
36
VILLANUEVA; PETENATE e DA SILVA (2005). Dos 50 provadores, 64% afirmaram ter
o hábito de consumir biscoitos e 94% disseram gostar do sabor café.
Os valores médios das notas dadas pelos provadores às amostras das
duas diferentes formulações dos biscoitos de café estão apresentados na Tabela 17.
Tabela 17: Valores de aceitação para as duas formulações de biscoitos de café.
Amostra Nota
Biscoito com borra de café não modificada 6,24
a
Biscoito com borra de café modificada 6,62
a
Médias seguidas por letras iguais, na mesma coluna, não apresentam diferença (Teste T-Student,
p<0,05).
A média das notas obtidas pelas duas formulações não apresenta
diferença (p<0,05), porém indicam uma tendência a maiores notas para os biscoitos
com a borra de café modificada.
De acordo com os provadores, os biscoitos com a borra de café não
modificada apresentaram sabor mais amargo e característica arenosa na sensação
tátil. Contudo, alguns provadores afirmaram que esta amostra apresentava melhores
características de crocância do que o biscoito com a borra modificada, o que pode ser
associado com a característica de dureza apresentada anteriormente.
Entretanto, os biscoitos com a borra de café modificada foram ditos
como mais saborosos e mais doces do que os com a borra não modificada, sendo
estes os comentários mais freqüentes relatados pelos provadores, além de outras
características como a aparência e sensação tátil mais agradável, assim como a
maciez dos biscoitos, que nem sempre constitui uma propriedade negativa, uma vez
que alguns provadores citam este atributo como justificativa ao avaliarem os biscoitos
com borra tratada com uma nota mais elevada.
37
6 CONCLUSÕES
O tratamento com peróxido de hidrogênio alcalino promoveu
modificação na borra de café. O processamento nas condições de 1% de peróxido de
hidrogênio à 30 ºC utilizando 8% de borra de café durante 5 horas ocasionou um
aumento de 49,2% na capacidade de retenção de água em relação à borra de café
não tratada.
Este tratamento possibilitou a obtenção de um produto com alto teor
de fibra alimentar (64%), e capacidade de retenção de água superior ao material não
tratado, além de uma coloração mais clara, possibilitando o seu uso como ingrediente
não-calórico em alimentos. A fibra da borra de café modificada apresenta 43,40% de
celulose, 27,26% de hemicelulose e 23,30% de lignina.
A borra de café modificada pelo tratamento alcalino pode ser utilizada
na formulação de biscoitos mesmo não tendo ocorrido grandes aumentos as
propriedades de hidratação, uma vez que a desestruturação da fibra melhorou as
características sensoriais, ainda que sejam necessários ajustes na formulação para
que o produto tenha maior aceitação.
38
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