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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Liliam de Oliveira Mendes
A leitura de metáforas como evento social: a construção de sentidos em
crônica de Arnaldo Jabor
MESTRADO EM LÍNGUA PORTUGUESA
SÃO PAULO
2007
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Liliam de Oliveira Mendes
A leitura de metáforas como evento social: a construção de sentidos em
crônica de Arnaldo Jabor
MESTRADO EM LÍNGUA PORTUGUESA
Dissertação apresentada à banca
examinadora da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, como exigência
parcial para obtenção do título de MESTRE
em Língua Portuguesa, sob a orientação da
Profª. Dra. Dieli Vesaro Palma.
SÃO PAULO
2007
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BANCA EXAMINADORA
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_____________________________________________
_____________________________________________
DEDICATÓRIA
A Deus, pela minha vida.
_________________________________________________
Agradecimentos
Enfim, terminei. Ou melhor, terminamos...
Sem o apoio incondicional do meu marido, família, amigos e orientadora, seria impossível
continuar nessa jornada. Portanto, agradeço a:
Minha mamãe Vera, meu papai Josias que me deram não apenas carinho, amor atenção e
apoio, mas um susto tremendo e fizeram-me ver que a vida tem que ser vivida mais
intensamente;
Meu esposo Marcus Vinícius pelo amor, companheirismo e admiração dispensados durante
todos esse processo. Por todos os chás levados diante do computador e pelos jantares
preparados em comemoração a cada etapa vencida e todo o resto que daria um livro se
fosse totalmente relatado;
Meus irmãos Viviam, Felipe e Matheus que me deram a possibilidade de ter com quem
brigar e brincar, não me deixando esquecer da minha porção criança;
Meu tio Roberto que sempre esteve presente nos momentos importantes da minha vida e
minha madrasta que tem cuidado com amor e carinho do meu pai;
Minha sogrinha querida Tereza pelo entusiasmo e meus cunhados pela paciência.
Meus tios, tias, primos e primas que mesmo em diferentes partes do país mandaram orações
e apoio afetivo;
Minha avó por ela existir e me dar a inesquecível oportunidade de conhecê-la;
Meus amigos queridos e amados que me suportaram nas noites intermináveis diante do
computador, pelo MSN. Por aqueles que me tiraram um pouco da realidade e me
mostraram que ainda sou uma pessoa normal de vinte e poucos anos;
Minha amada orientadora Profª Drª Dieli Vesaro Palma que me suportou e acreditou que a
conclusão desse trabalho seria possível;
Minha orientadora adotiva Profª Drª Neusa Maria Oliveira Barbosa Bastos que me ensinou
a enveredar por caminhos diferentes;
Meus colegas de mestrado que torceram e sofreram junto durante todo o curso e são
personificados nas figuras da Soninha, Elisa Mendes, Dani, Penha, entre tantos outros;
Por fim e o mais importante: Deus – pai, Deus – filho e Deus – Espírito Santo que na minha
fé auxiliaram no meu equilíbrio espiritual.
_________________________________________________
MENDES, L. de O. (2007). A Leitura de Metáforas como Evento Social: a construção de
sentidos em crônica de Arnaldo Jabor. (Mestrado em Língua Portuguesa) Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo
RESUMO
Este trabalho é uma pesquisa empírica sobre a leitura de metáforas contidas em
uma crônica jornalística, objetivando verificar quais tipos de relações se estabelecem entre
a metáfora e as manifestações dos leitores no processo de interpretação. Esta investigação
insere-se na área de Língua Portuguesa. Apresenta a leitura de uma crônica de Arnaldo
Jabor, realizada por professores, durante um evento de leitura, tendo por pressupostos a
indeterminação dos sentidos e a leitura como um processo de co-construção social no
enfoque interacionista. Destaca-se assim, na coleta de dados, o uso do protocolo verbal em
grupo. O estudo centrou-se nos tipos de relações que se estabelecem entre as metáforas
contidas na crônica e as vozes dos leitores tentando fazer sentido.
Os leitores que participaram da pesquisa são professores do ensino médio de
uma escola pública do Estado de São Paulo. O material empírico foi coletado e analisado
em uma perspectiva etnográfica.
Os resultados mostraram que a leitura de metáforas construiu-se no processo de
interação com base em relações estabelecidas nos conhecimentos adquiridos anteriormente
pelos leitores, por meio da experiência com outras fontes de conhecimento previamente
estruturado pela linguagem. Portanto, esta pesquisa apresentou, por meio da co-construção
negociada dos sentidos do texto, a leitura como um processo ativo em que a competência
comunicativa é utilizada, pelos participantes da pesquisa, na interpretação do texto.
Palavras-chave: Metáfora; Evento de Leitura; Conceito Metafórico; Crônica.
_________________________________________________
MENDES, L. de O. (2007). The Metaphors Reading like Social Event: the construction of
meanings in Arnaldo Jabor’s chronicle (Master's Degree in Portuguese Language)
Pontifical Catholic University of São Paulo
ABSTRACT
This work, which takes part of Portuguese Language area, is an empirical
research about metaphors reading found in a journalistic chronicle, and has as main purpose
to verify what kinds of relations are established between the metaphor and readers’
expression in the comprehension process. It presents the reading - made by teachers during
a reading event - of an Arnaldo Jabor’s chronicle, which pressuposts were the
indetermination of feelings and reading as a social co-construction process at
interactionism. Therefore, the use of verbal protocol in group was detached at data
collection. The study focused itself of which kinds of relations are established between the
metaphors found in the chronicle and the readers’ voices trying to make sense.
The readers that take part of this research are teachers that work at high school
of a public school in the state of São Paulo. The empirical material was collected and
analyzed in an ethnographic projection.
The results shown that the metaphors reading were constructed into the
interaction process with basis in relations established in knowledge acquired previously by
readers, through the experience with other sources of knowledge structured in language.
Thus, this study presented, by means of co-construction transacted in text meanings, the
reading as an active process in which the communicative competence is used for the
participants of this research, at the text comprehension.
Key-words: Metaphor; Reading event; Metaphorical concept; Chronicle.
_________________________________________________
Sumário
Introdução.............................................................................................................................1
Capítulo I – Leitura.............................................................................................................6
1.1. Concepções de leitura...............................................................................................7
1.2. Modelos teóricos de leitura......................................................................................10
1.2.1 Os modelos de processamento..........................................................................11
1.2.2 Os modelos psicolingüísticos............................................................................13
1.2.3 Os modelos interativos......................................................................................16
1.2.4 O modelo cognitivo a partir de van Dijk...........................................................19
1.3. Estratégias utilizadas pelo leitor durante o processo de leitura................................23
1.4. A leitura como evento social....................................................................................27
Capítulo II – Metáfora........................................................................................................30
2.1. A perspectiva tradicional da metáfora......................................................................31
2.2. A metáfora como ferramenta cognitiva....................................................................34
2.3. A metáfora conceptual a partir de Lakoff e Johnson...............................................37
2.4. As metáforas novas e a criação da similaridade.......................................................43
Capítulo III – Metodologia.................................................................................................49
3.1. Gêneros: breves considerações................................................................................51
3.2. Caracterização do gênero crônica através da história..............................................51
3.2.1 Conceito, estrutura e características da crônica jornalística..............................53
3.3. Estruturas participativas e revozeamento.................................................................54
3.4. O protocolo verbal em grupo...................................................................................56
3.5. A pesquisa qualitativa..............................................................................................57
3.6. A coleta de dados e seus procedimentos..................................................................59
3.6.1 Os sujeitos da pesquisa......................................................................................61
Capítulo IV – Análise dos eventos sociais de leitura........................................................70
4.1. A verdade está na cara, mas não se impõe...............................................................72
4.2. Análise dos dados da coleta A.................................................................................75
4.3. Análise dos dados da coleta B..................................................................................80
4.4. Discussão dos resultados........................................................................................104
Conclusão...........................................................................................................................108
Bibliografia........................................................................................................................112
Anexos................................................................................................................................117
1
_________________________________________________
Introdução
“Um público comprometido com a leitura é crítico,
rebelde, inquieto, pouco manipulável e não crê em
lemas que alguns fazem passar por idéias”.
Mário Vargas Llosa, escritor peruano.
(Fonte: PublishNews, 22/02/2006) [02.46]
2
O tema desta dissertação é a leitura de metáforas presentes em uma crônica
jornalística. Este trabalho insere-se na área de Língua Portuguesa. Ele consiste em uma
pesquisa empírica sobre a leitura, realizado com professores. Assim, procurou-se verificar
como esses profissionais, a partir da co-construção negociada de sentidos, em um evento de
leitura, construíram a compreensão global do texto.
Mas, por que escolher professores como participantes de um evento de leitura,
enquanto outros trabalhos focam suas pesquisas nos alunos? Que contribuições traz a
observação de como os professores constroem sentidos? Como a visão que cada um faz de
si como leitor influencia na sua prática docente? Como esta pesquisa pode contribuir para a
melhora da qualidade das aulas desses professores? Como justificar a escolha por focar a
pesquisa naquele que forma o aluno e não no aluno em formação? Por que escolher
professores que não lecionam a disciplina de Língua Portuguesa? Esses questionamentos
foram determinantes para a realização desta pesquisa.
dez anos que atuamos como professora e, nesse período, temos passado por
muitos problemas, acertos e erros até aprimorar a nossa prática docente. Mesmo sendo
formada em Letras, não fomos ensinadas a trabalhar a leitura em sala de aula de forma
produtiva. Vemos, que muitos dos nossos colegas de profissão, também passam pelas
mesmas angústias porque não sabem como melhorar sua atuação em sala de aula. Assim,
propusemos realizar nossa pesquisa com professores a fim de levantar respostas para esses
anseios que por tanto tempo nos atormentaram.
Com efeito, escolhemos verificar a compreensão metáforas contidas em
crônicas em uma situação de interação. Assim, a base teórica que fundamenta essa pesquisa
surge a partir dos estudos de enfoque cognitivista que questionaram a forma como a
metáfora era vista até então. Esse novo paradigma ampliou o campo de abrangência dessa
figura e, com isso, possibilitou que as pesquisas sobre a metáfora rompessem a barreira dos
textos poéticos e se aventurassem em outros gêneros textuais.
Nessa nova concepção, Zanotto (1996) acrescenta que a metáfora é um
processo cognitivo que tem um papel heurístico nas mudanças conceituais. Assim, a
metáfora deixa de ser vista como uma figura de linguagem e passa a ser considerada
3
presente não somente na linguagem da vida cotidiana, mas também no pensamento e na
ação.
Essa nova visão da metáfora se situa na mudança paradigmática que vem
ocorrendo desde a década de 70, provocando uma ruptura com o mito objetivista. De
acordo com Nunan (1992), na perspectiva objetivista, para que uma pesquisa seja confiável,
o pesquisador deve utilizar uma análise quantitativa dos dados, que consiste em uma
pesquisa objetiva, controlada, sujeita a generalizações, com resultados orientados e que
reconhece a existência de fatos que são externos ao pesquisador ou independentes do
observador. Essa perspectiva vem sendo contestada por vários estudiosos de diferentes
áreas.
Como o foco da pesquisa é a co-construção negociada de sentidos durante um
evento de leitura de uma crônica em que há metáforas, verificou-se a necessidade de
observar as ações mentais que os leitores utilizam para compreender o texto proposto. Por
isso, utilizamos o paradigma interpretativista proposto por Erickson (1986) que usa o termo
interpretativista para as diversas abordagens de estudos de observação-participante. Para
ele, o pesquisador é parte integrante da realidade social.
Nessa perspectiva, a análise dos dados coletados acontece por meio de
processos qualitativos. De acordo com Queiroz (2002:62), nesse paradigma, os processos
qualitativos caracterizam-se basicamente por admitir que todo o conhecimento é relativo,
que um elemento subjetivo em toda a pesquisa, cujos resultados podem ser não
generalizáveis.
Como a interação é relevante nesse tipo de trabalho, recorremos a Bloome
(1993) que ressalta ser essencial que haja a interação entre autor e leitor, além do
relacionamento entre as pessoas durante o evento de leitura. Para a coleta de dados do
evento de leitura, o pesquisador pode dispor de rias ferramentas, entre elas as gravações
em áudio, em vídeo, a reflexão, a observação-participante, as entrevistas, além da
possibilidade de rever as gravações efetuadas.
4
Assim, procuramos responder quais foram os sentidos construídos pelos leitores
e quais conceitos metafóricos serviram de base para a construção dos sentidos. Dessa
forma, este trabalho teve como objetivos verificar como a metáfora contribuiu para a
construção de sentidos dos participantes em um evento de leitura e quais tipos de relações
se estabeleceram entre a metáfora e as manifestações dos leitores no processo de
interpretação.
A leitura é compreendida numa perspectiva sócio-cognitiva, como um processo
de descobertas, em que o leitor interage com o texto. Ela é vista como um processo ativo
em que a competência comunicativa é utilizada na interpretação do texto. Assim, temos por
objetivo específico verificar o processo de co-construção negociada dos sentidos de
metáforas em uma crônica jornalística, por leitores num evento social de leitura.
Dessa forma, os participantes da pesquisa foram escolhidos entre professores do
ensino médio regular no período noturno, da rede estadual de ensino que participaram de
um evento coletivo de leitura. A escolha de professores nasceu da inquietação frente à
pouca utilização de textos paradidáticos, mais especificamente crônicas jornalísticas em
sala de aula e da pouca atenção dada às metáforas contidas nesses textos em discussão em
sala de aula. Ao chamar a atenção para a relevância da leitura de crônicas e da verificação
das metáforas contidas nelas, esperamos contribuir com a formação de professores que
privilegiem a reflexão e a discussão em sala de aula.
Este trabalho soma-se aos já realizados por teóricos como Canolla, (2001),
Lakoff, & Johnson (2002), Nardi (1993/1999), Palma (1998), Zanotto (1995/1996/1998) e
por grupos de estudo como o GEIM, que tanto contribuíram para o enriquecimento das
questões teóricas sobre esse assunto, focalizando a metáfora como ferramenta cognitiva
Na consecução de seus objetivos, essa dissertação organiza-se em quatro
capítulos, além da introdução, da conclusão e dos anexos. No primeiro capítulo,
apresentamos a leitura e os seus modelos teóricos. No segundo capítulo, apresentamos a
metáfora na sua perspectiva tradicional e focalizamos a metáfora como ferramenta
cognitiva.
5
O terceiro capítulo trata da metodologia utilizada nessa pesquisa, como as
estruturas participativas e revozeamento, o protocolo verbal em grupo e a pesquisa
qualitativa. Antes, porém, breves considerações a respeito da definição de gênero textual
utilizado nessa pesquisa, a caracterização do gênero crônica através da história, o conceito,
estrutura e características da crônica jornalística. o quarto capítulo apresenta a análise
dos dados coletados nos eventos sociais de leitura.
Essa dissertação encerra-se com as considerações finais em que retomamos a
pesquisa e discutimos os resultados obtidos por meio da análise dos dados coletados,
seguida da bibliografia e dos anexos.
6
_________________________________________________
Capítulo I
Leitura
“A leitura não é uma atividade elitizada, mas uma
ferramenta de transformação social dos
indivíduos”.
Julían Correa, Dirigente do CERLALC.
(Fonte: PublishNews, 31/10/2005) [02.42]
7
Na busca de definir o processo de leitura, vários modelos teóricos foram
desenvolvidos. Eles procuram explicar, abarcando enfoques diversos, como ocorre o ato de
leitura. Dessa forma, consideramos relevante fazer uma breve apresentação desses modelos
de leitura para contextualizar o nosso trabalho. No presente capítulo, conceituamos leitura,
em seguida, apresentamos os modelos teóricos, iniciando com os modelos de
processamento, passando pelos modelos psicolingüísticos e finalizando com os modelos
cognitivos de leitura. Em seguida, tratamos da leitura como evento social, além das
estratégias utilizadas pelo leitor durante o processo de leitura.
1.1 Concepções de leitura
O ato de ler, tradicionalmente, é relacionado com a escrita. Nessa perspectiva, o
leitor é visto como mero decodificador de letras e números, ou seja, ler é relacionado a um
ato mecânico destituído de sentido. De acordo com Kleiman (2002:20), essa é uma prática
muito empobrecedora e está baseada numa concepção da atividade como equivalente à
atividade de decodificação. Para a autora, o processo de ler é complexo. É necessário o
engajamento de muitos fatores tais como a percepção, a atenção e a memória para que o
leitor atribua sentido ao texto. (KLEIMAN 2004a:13)
Solé (1998:22) ressalta que a leitura é um processo de interação entre o
leitor e o texto, neste processo tenta-se satisfazer os objetivos que guiam sua leitura. Ao
propor essa afirmação, Solé reflete sobre a figura de leitor ativo que não só processa o texto
como também interpreta-o. Durante esse processo, deve haver um objetivo que conduza a
leitura a uma finalidade predeterminada.
Para Van Dijk (2002), a leitura é um processo da memória, que, por meio dos
elementos textuais, forma sentidos e possibilita ao leitor refletir sobre a realidade e criticá–
la. Ler é atribuir sentidos, seja em textos escritos, seja em orais, seja em qualquer interação
social, levando-se em conta os fatores ideológicos, sociais e históricos.
Por sua vez, Martins (2005:31) apresenta duas caracterizações a respeito das
concepções de leitura vigentes:
8
1) como decodificação mecânica de signos lingüísticos, por meio de
aprendizado estabelecido a partir do condicionamento estímulo-
resposta (perspectiva behaviorista-skinneriana)
2) como processo de compreensão abrangente, cuja dinâmica envolve
componentes sensoriais, emocionais, intelectuais, fisiológicos,
neurológicos, tanto quanto culturais, econômicos e políticos
(perspectiva cognitivo sociológica)
Para essa autora, (2005:31-32), o debate entre decodificação e compreensão não
tem fundamento já que, para ela, ambas são essenciais à leitura. Ela conclui que
decodificar sem compreender é inútil; compreender sem decodificar, impossível. Há que se
pensar na questão dialeticamente.
Ainda de acordo com Martins (2005:12), para que a leitura ocorra, não é
necessário apenas o conhecimento da língua, e sim de todo o sistema de relações
interpessoais e entre as várias áreas do conhecimento e da expressão do homem e das suas
circunstâncias de vida e a autora finaliza dizendo que aprendemos a ler vivendo.
Antes de tratarmos dos modelos teóricos de leitura, Kleiman (2004a:17-18)
convida-nos à reflexão sobre o quanto a leitura é complexa. Para que ocorra a coerência, é
essencial que sejam abarcados fatores como percepção, atenção e memória. Para ela, apesar
de haver modelos que propõem a linearidade e a serialidade, é difícil o sucesso de uma
leitura linear e serial, passo a passo, desde o olho até a memória que
estaria aguardando a chegada do material para começar a processá-lo. Não
é isso que acontece. O leitor está engajado, antecipando o material até a
formulação de uma imagem, pois a decisão sobre a pausa ou fixação está
determinada não pelo que ele acaba de ler na página, mas também por
seu conhecimento dos padrões ortográficos, da estrutura da língua, do
assunto etc. É por isso que a leitura é considerada um processo interativo,
no sentido de que os diversos conhecimentos do leitor interagem em todo
9
o momento com o que vem da página para chegar a compreensão. A
leitura não é apenas a análise das unidades que são percebidas para, a
partir daí, chegar a uma síntese. Também a partir da síntese ele procede à
análise para verificar suas hipóteses, num processo em que, repetimos,
tanto os dados da página como o conhecimento do leitor interagem como
fontes de dados necessários à compreensão.
Já para Solé (1998:23) a leitura é percebida como a construção de novos
conhecimentos a partir da relação estabelecida entre a nova informação e as informações
adquiridas anteriormente pelo leitor, como resultado de sua experiência pessoal e social.
Assim, nesse trabalho, a leitura é compreendida numa perspectiva sócio-
cognitiva, como um processo de descobertas, em que o leitor interage com o texto. Dessa
forma, a leitura é entendida não apenas como uma decodificação de sinais e símbolos, mas
como a utilização de conhecimentos adquiridos por cada leitor e externalizados durante a
compreensão do que se está lendo.
Somada à experiência pessoal de cada leitor, temos ainda a experiência social.
Isso faz com que os conhecimentos do leitor produzam diferentes trajetos de leitura,
possibilitando que um texto seja lido pelo mesmo leitor com diferentes significados. Isso
pode ocorrer, para citar algumas situações, quando mais de uma leitura do texto, ou
quando a leitura ocorre em idades diferentes, ou ainda quando a questão da leitura do
texto em graus de instrução diferentes.
Assim, Pereira (2002:30-31) ressalta que podem ocorrer, em um mesmo
momento, leituras diferenciadas entre leitores diferentes, decorrente do conhecimento
prévio de cada um; podemos destacar os seguintes fatores explicativos de tal fenômeno:
leitores pertencentes a sociedades diferentes; a leitura do texto por leitores que possuam
graus de instrução diferentes. A partir dessa perspectiva, percebemos que o leitor pode
realizar quantas leituras quiser, desde que elas estejam inscritas no texto como
possibilidades.
10
São relevantes, portanto, para uma leitura madura, a capacidade de estabelecer
metas bem definidas e de monitorar a compreensão textual. Diante disso, a complexidade
inerente ao processo de leitura tem provocado o desenvolvimento de múltiplos modelos
teóricos destinados à sua explicação como vemos a seguir.
1.2 Modelos teóricos de leitura
Atualmente, as pesquisas na área de leitura postulam que o ato de ler não é algo
passivo, que o leitor interage com o texto além de acrescentar sua experiência de vida ao
que lê. Convém ressaltar que, nem sempre, a leitura foi definida dessa maneira.
A leitura passou a ser estudada como processo em 1908, no entanto, até os anos
sessenta, não existiam estudos aprofundados sobre o processo de leitura. De acordo com
Nardi (1993:10), foi em 1965 que os estudos psicológicos sobre os processos mentais
determinaram uma mudança do foco das pesquisas lingüísticas para processos. E
começaram a surgir modelos de compreensão do texto escrito. Surgem nessa época, os
modelos denominados por Kleiman (2004a) de pré-interativos.
Para a autora, os modelos pré-interativos são divididos em modelos de
processamento também conhecidos como modelos de leitura ascendente (bottom-up) e
modelos psicolingüísticos também conhecidos como modelos de leitura descendente (top-
down). O primeiro não tem a pretensão de caracterizar cada estágio envolvido na leitura,
enquanto o segundo é altamente específico. Percebemos, assim, que nem todos os modelos
pretendem inter-relacionar o funcionamento de sistemas lingüísticos do sujeito para a
apreensão do objeto no momento da leitura. (cf. KLEIMAN 2004a:23)
No modelo de leitura ascendente a informação parte do texto para o leitor.
Para Jünger (2002: 25), esse modelo postula que o conteúdo está no texto, a melhor leitura
é aquela que extrai mais informação, toma o texto em sua totalidade sem admitir qualquer
grau de negociação de significado. Em contraposição, surge a proposta da leitura como
processo descendente. Esse modelo se diferencia do citado anteriormente porque ocorre
uma mudança de foco que passa a ser, a partir de então, do leitor para o texto. Nesse
11
modelo, as experiências de vida do leitor são mais importantes que os dados contidos no
texto. Dessa forma, o leitor desempenha um papel ativo, pois ele próprio atribui significado
ao texto utilizando para isso uma gama de informações e idéias, ou seja, seu conhecimento
prévio.
Os modelos psicolingüísticos trouxeram importantes contribuições ao estudo de
leitura. A partir deles, ocorreram avanços significativos em relação ao conceito de leitura,
visto que tanto o conhecimento prévio quanto as inferências passaram a serem
considerados; mas, nesses modelos, devido à ênfase dada ao conhecimento prévio, o texto
em si acabou tornando-se um elemento secundário.
Como pudemos perceber, tanto os modelos de processamento (ascendentes)
quanto os modelos psicolingüísticos (descendentes), apesar das falhas apresentadas por
cada um, contribuíram para as pesquisas em leitura. Os pontos positivos de cada modelo
foram aproveitados num modelo conhecido como interacional, desenvolvido
posteriormente nos anos oitenta.
No modelo interativo, o processamento da informação flui de forma ascendente
e descendente. Assim, o leitor, nesse modelo, faz previsões acerca do texto baseando-se em
seus conhecimentos prévios e verifica as informações contidas nele, confirmando ou
rejeitando suas previsões. O significado, no modelo interativo, não se encontra nem no
texto, nem na mente do leitor, como nos modelos anteriores. Ele é alcançado na interação
entre o leitor e o autor por meio do texto lido. (cf. RIO & LEITE, 2004:62). Nos itens a
seguir, aprofundamos-nos um pouco mais nos modelos de processamento, em seguida nos
modelos psicolingüísticos e, por fim, nos modelos interativos.
1.2.1 Os modelos de processamento
O modelo de processamento serial do código lingüístico proposto por Gough
(apud Kleiman, 2004a:23-24), também conhecido como modelo ascendente (bottom-up), de
base cognitiva, caracteriza a leitura como um processo seqüencial, linear e indutivo de
12
processamento do input visual, indo da palavra para a sentença, das partes menores para as
maiores a partir da fixação ocular sobre o estímulo visual.
Gough preocupa-se em descrever os eventos que ocorrem em um segundo de
leitura. Para tanto, focaliza a fixação ocular e o movimento sacádico, a representação
icônica do percepto visual, a identificação da letra, o mapeamento das letras com a
representação fonêmica abstrata da palavra e a busca da entrada lexical. (cf. KLEIMAN,
2004a: 23)
Assim como o modelo proposto por Gough, o modelo de processamento
automático, proposto por LeBerge & Samuels (apud KLEIMAN 2004a: 25), descreve o
processo de leitura, desde o momento em que a atenção do leitor é colocada sobre a palavra
impressa, até a sua compreensão. Nele, o processamento da informação é visto linear e
serialmente, em estágios, não havendo a interação entre os veis mais baixos e os mais
altos do processo. (PALMA 1998:35)
Ao referir-se ao modelo de LeBerge & Samuels, Nardi (1993:11) ressalta que
a memória visual processa o estímulo visual que pode variar desde um
traço distintivo ou uma letra, até a palavra inteira, dependendo do foco da
atenção. A Memória Fonológica liga a Memória Visual à memória
Semântica (que inclui a Memória Episódica), em que se dá a compreensão
por meio de associações.
De acordo com esse modelo, a apreensão do significado apóia-se nos dados
lingüísticos do texto em que o leitor realiza operações de análise e síntese do significado
das partes, obedecendo a um processo composicional. (cf. KLEIMAN, 2004a:31-34)
À medida que as informações são processadas, elas são registradas
cumulativamente na memória até compor o sentido. O enfoque se dá no texto e não leva em
13
consideração a participação ativa do leitor que se torna um mero decodificador de
informações visuais. (cf. FERLING, 2005:8)
É relevante ressaltar que esse modelo desconsidera o papel do conhecimento de
mundo do leitor como mecanismo não cognitivo, mas também metacognitivo. Nesse
enfoque o nível de proficiência lingüística do leitor é fundamental que, quanto mais
proficiente for o leitor, mais eficiente será a leitura visto que o processamento das partes
ocorre até a compreensão do texto no seu todo.
Segundo Kato (1999:51), o leitor que privilegia o tipo de leitura ascendente
não tira conclusões apressadas, porém é vagaroso e pouco fluente e tem dificuldade de
sintetizar e distinguir as idéias centrais de aspectos ilustrativos do texto. No entanto, a
autora ressalta a contribuição do processamento ascendente para a pesquisa em leitura, no
que se refere ao posicionamento inequívoco com respeito à necessidade de adquirir o
código.
Kleiman (2004a:27) critica esse modelo de processamento pela sua
autolimitação porque, nesse modelo, o objetivo é apenas explicar os processos de
organização em níveis inferiores e a investigação empírica que parte das predições limita-se
a micro-unidades. Assim, a importância dada aos problemas aplicados é restrita, fato que
não ocorre nos modelos psicolingüísticos tratados a seguir.
1.2.2 Os modelos psicolingüísticos
No modelo de sistemas de comunicação proposto por Ruddell (apud
KLEIMAN, 2004a:27) a leitura é um desempenho psicolingüístico complexo que consiste
na decodificação de unidades lingüísticas descritas no processamento das unidades
lingüísticas ao longo de dimensões estruturais e semânticas, e na interpretação dos dados
semânticos segundo os objetivos do leitor.
Nele, o input visual inicia a decodificação de símbolos gráficos, fonéticos e
mórficos. O objeto de análise agrupado em constituintes fica, durante esse processo,
14
armazenado no que Ruddell chama de memória imediata. Logo após, ocorre a ativação do
sistema semântico que obtém uma leitura lexical e em conjunto com o significado
estrutural. Ambos produzem o significado do constituinte que será posteriormente
armazenado na memória de longo prazo. (KLEIMAN, 2004a:27-28)
De acordo com Kleiman (2004a:28), os
níveis de processamento interagem entre si; o modelo estipula o retorno a
níveis já utilizados no processamento quando os elementos são difíceis ou
ambíguos; ele estipula também a utilização de informação armazenada
na memória a longo prazo para o processamento de novas unidades. O
modelo também comporta um componente afetivo (“affective
mobilizers”), constituído pelos interesses e objetivos do leitor, que
influencia todos os níveis de processamento, a maneira em que o leitor
avalia, organiza e sintetiza a informação; retesta hipóteses preditivas, e
determina as estratégias metacognitivas do leitor durante o processo.
Esse modelo recebe a crítica de Kleiman pela circunstância histórica em que ele
foi criado. O autor tentar fundamentar sua teoria no modelo gerativo-trasformacional, o
que, para a pesquisadora, não contribui em nada para a compreensão de unidades maiores.
(KLEIMAN, 2004a:28)
no modelo de testagem de hipóteses de Goodman (apud KLEIMAN,
2004a:29), a leitura é considerada uma atividade de interação entre o pensamento e a
linguagem. Um processo complexo através do qual o leitor reconstrói até certo ponto, uma
mensagem encodificada por um escritor. Assim, a leitura é um jogo psicolingüístico de
adivinhação, um processo seletivo em que o leitor escolhe pistas no texto que produzem
predições e promovem a interação entre pensamento e linguagem.
Esse processo também conhecido como descendente (top-down) ou
psicolingüístico propõe caracterizar a dimensão preditiva da leitura em que três tipos de
informação são utilizados no processo: a grafo-fônica, a sintática e a semântica, ou seja, no
15
processo psicolingüístico, o ato de ler não é um processo preciso, mas sim um conjunto de
fatores que permitem ao leitor antecipar o que está por ser lido. Nesse processo
descendente, isso não ocorre por meio das informações gráficas, mas também por meio
das predições (expectativas do leitor) sintáticas e semânticas.
Cavalcanti (1989:22), por sua vez, salienta que o modelo de Goodman, apesar
de focalizar a seleção, a hipótese e a predição em leitura de modo descendente (top-down),
descreve o processo de leitura de modo seqüencial, primordialmente ascendente (bottom-
up), isto é, com base na aproximação linear das informações lingüísticas e visuais.
Para Kato (1999:50), no modelo de Goodman, a leitura é preditiva, um processo
não-linear, que faz uso intensivo e dedutivo de informações não visuais e cuja direção é da
macro para micro estrutura e da função para forma, em que leitor utiliza minimamente as
informações visuais disponíveis, apoiando-se basicamente no seu conhecimento de mundo
para formular hipóteses sobre o sentido do texto.
Ferling (2005:11) ressalta que o leitor utiliza mecanismos, durante todo o
processo de leitura, que funcionam no processamento do texto. Esses mecanismos são as
estratégias cognitivas, organizadas por Goodman de modo a formar uma cadeia de
operações mentais que operam simultaneamente durante a leitura. De acordo com
Goodman (apud FERLING 2005:11-12), as estratégias são:
1. Reconhecimento da tarefa / inicialização: reconhecimento visual de algo que se
possa ler;
2. Amostragem / seleção
: busca de informações relevantes, significativas,
produtivas, úteis;
3. Predição
: antecipação do que virá (caso contrário a leitura seria sempre
retrospectiva) – faz com que o processo flua suavemente e está baseada tanto nas
informações explícitas, quanto nas implícitas;
4. Inferência
: estratégia geral de adivinhação (baseado no que é sabido). Nossos
esquemas (schemata) e estruturas de conhecimento tornam possível tomar
16
decisões confiáveis com base em informações parciais por meio da inferência de
informações ausentes. Inferências podem ser feitas em todos os níveis de
conhecimento (lexical, sintático, semântico);
5. Confirmação de hipóteses ou rejeição
: automonitoração durante o processo de
leitura o leitor espera consistência das informações novas durante o processo
de leitura;
6. Correção
: dois tipos: a) reavaliar as informações processadas do texto e
fazer inferências alternativas, predições e interpretações; b) regressar ao texto
para obter mais informações;
7. Finalização
(do ato de ler).
Solé (1998:23-24) explica que, no modelo top down, o leitor não procede letra
por letra , e sim utiliza o seu conhecimento prévio e seus recursos cognitivos para
estabelecer antecipações sobre o conteúdo do texto fixando-se nele para verificá-las. Dessa
forma, quanto mais informação um leitor possuir a respeito do texto que vai ler, mas ele
precisará se fixar no texto para construir uma interpretação. Deste modo, o processo de
leitura também é seqüencial e hierárquico, mas, neste caso, descendente: a partir das
hipóteses e antecipações prévias, o texto é processado para sua verificação.
O modelo de Goodman contribui para a compreensão do processo de leitura ao
inserir a predição, e as regressõe. Para ele, o leitor lê atentando para o significado do que
está lendo. Kleiman (2004a) afirma que o modelo psicolingüístico de Goodman partilha de
algumas características dos modelos interativos os quais abordamos a seguir.
1.2.3 Os modelos interativos
Os modelos teóricos de leitura ascendente (bottom up) e descendente (top
down) apresentam enfoques distintos do que seja relevante no processamento das
informações pelo leitor. Nenhum deles apresenta de forma completa o processo de leitura,
uma vez que o modelo ascendente prioriza o texto, e o descendente, o conhecimento prévio
do leitor. Somente com o desenvolvimento do modelo interativo não foi apenas possível
17
compreender, mas também explicar de forma empírica como se processa a atividade de
leitura ainda que parcialmente. (KLEIMAN, 2004a:31-34)
É relevante ressaltar que Solé (1998:24) declara que o modelo interativo não se
centra exclusivamente no texto nem no leitor, embora atribua grande importância ao uso
que ele faz dos seus conhecimentos prévios para a compreensão do texto, ou seja, durante a
leitura, o leitor recorre ao mesmo tempo tanto ao seu conhecimento de mundo quanto ao
seu conhecimento do texto para construir uma compreensão sobre o texto lido.
Kleiman (2004a: 39) ressalta que o conceito de interação que provém de teorias
pragmáticas mostra-se mais rico na descrição ato de leitura. Por meio da relação locutor
interlocutor no texto e no contexto no processo instituído na leitura ocorrem as condições
de produção nas quais o texto recupera seu caráter aberto.
No que diz respeito à relação da interação entre conhecimento lingüístico e
conhecimento de mundo, Cavalcanti (1989:45) relata que a interação leitor texto tem por
base não apenas a competência comunicativa dos leitores como também seus sistemas de
crenças que influenciam e são influenciados por variáveis de desempenho.
Com efeito, no modelo interativo proposto por Rumelhart (apud TREVISAN,
1992:39-40) durante o ato de leitura, o leitor promove a interação dos diferentes níveis de
conhecimento por meio do uso de esquemas. Trevisan (1992) ressalta que para Rumelhart,
esquema é um grupo de informações que representam conceitos genéricos que estão
armazenados na memória, sendo que existem esquemas representando nosso conhecimento
a respeito de todos os conceitos relacionados a objetos, situações, eventos.
Para Beaugrande (1980), a leitura de um texto ativa conhecimentos na mente do
leitor, que, por sua vez, integram os conhecimentos contidos no texto com os
conhecimentos prévios armazenados pelo leitor. Esses conhecimentos armazenados atuam
na construção do mundo textual
1
. Ele trata da construção de modelo do mundo textual a
1
Correlato cognitivo do texto na mente de um usuário em vista da configuração de conceitos ativados
relativamente a esse texto. (TREVISAN, 1992:32)
18
partir de uma tipologia de conceitos. Nele, os conceitos dividem-se em primários (objetos,
situações, eventos, ações) que são os centros de controle do mundo textual; e secundários
que definem objetos, situações, eventos, ações, experiência humana, inclusão de classe,
relações e contingência de comunicação simbólica.
Beaugrande (1980) enfoca a ativação dos modelos cognitivos globais que
dependem do co-texto e do contexto que são desencadeados a partir de pistas contidas no
texto. Para ele, alguns textos são mais bem tratados por esquemas do que por frames. Eles
podem ser aplicados em algumas partes do texto, mas o esquema acaba predominando no
texto.
Ao retomar sua pesquisa com Dressler, Beaugrande (1981) apresenta alguns
dos conceitos propostos em seu trabalho anterior. Nele, ele se detém na noção de coerência
e reflete sobre a interação do conhecimento veiculado no texto e o conhecimento de mundo
armazenado pelos usuários da linguagem. Conseqüentemente, ele se atém mais à recepção
do que à produção de textos. Dressler e Beaugrande revelam uma maior preocupação com o
processo da coerência no ato de leitura. É relevante ressaltar que as noções de modelos
cognitivos aparecem em seus trabalhos no que concerne ao estudo da tipologia textual.
Van Dijk (2002) afirma que, a partir da leitura, que é um processo de ativação
da memória por meio de elementos textuais que fazem sentido ao leitor, ocorre a
possibilidade do leitor atribuir sentidos tanto aos textos orais quanto aos textos escritos.
Isso promove a reflexão em qualquer nível de interação social entre enunciador
enunciatário, sejam eles fatores sociais, históricos, sejam ideológicos.
Para o autor, a construção da coerência está intimamente ligada à recuperação
do modelo correspondente de modo satisfatório. Esses modelos cognitivos são descritos por
Van Djik (2002) como conhecimentos pessoais armazenados na memória episódica e
19
conhecimentos armazenados na memória social
2
. Trevisan (1992: 45) ressalta que Van Djik
ainda destaca
a questão contextual, ao constatar que os usuários da linguagem
enquanto falam, ouvem ou lêem também têm uma representação da
situação de que estão participando. Por isso, distingue um tipo específico
de modelo de situação, o modelo contextual, que contém parâmetros
relevantes da interação comunicativa e do contexto social e é dinâmica e
permanentemente atualizado com informações novas e feed back.
Diante de todos os modelos que foram apresentados aaqui devemos salientar
que o conceito de leitura que será abordado nesse trabalho seo modelo desenvolvido a
partir dos estudos de Van Dijk. A seguir, apresentamos o modelo cognitivo a partir de Van
Dijk.
1.2.4 O modelo cognitivo a partir de Van Dijk
Em 1983, Van Dijk & Kintsch (apud VAN DIJK, 2002: 23) introduziram a
noção de modelos mentais, ou seja, assumem que, além da representação mental do texto,
os usuários da língua constroem um modelo de situação sobre o qual o discurso versa.
Diante disso, se os usuários da língua forem capazes de construir ou recuperar um modelo
satisfatório de um discurso, pode-se concluir que eles entenderam o texto. (VAN DIJK,
2002:158-160).
2
1.Conhecimentos pessoais armazenados na memória episódica que constituem representações de experiência
pessoais:
– Modelos particulares, resultantes do processo de lembrar ocasiões particulares anteriores, que vão constituir
modelos de situação mais ad hoc, mais singulares.
– Modelos generalizados, resultantes de operações cognitivas de lembrar ou de tornar presentes
conhecimentos a respeito de eventos que ocorrem com freqüência e, por isso, tendem a se generalizar na
memória episódica, abstraindo, por exemplo, tempo, lugar ou circunstâncias específicas.
2. Conhecimentos armazenados na memória social:
– Modelos comuns a toda uma comunidade, consistindo no conhecimento prototípico, compartilhado
socialmente, que é constituído pelos scripts sociais ou culturais. (TREVISAN, 1992: 44-45)
20
As estruturas de modelos cognitivos, por sua vez, são definidas por Van Dijk
(2002:168) em termos de esquemas recursivos, hierárquicos, de categorias de situação que
dominam seqüências de proposições que podem ser organizadas por macroproposições.
Ao conceber a linguagem como atividade interindividual, o processamento
textual seja em termos de produção, seja de compreensão, deve ser visualizado também
como uma atividade tanto de cunho lingüístico, quanto sociocognitivo. Nessa perspectiva, o
texto é considerado uma manifestação verbal em que os parceiros da comunicação ativam
diversos sistemas de conhecimentos que têm representado na memória, por meio de um
conjunto de estratégias de processamento de cunho sociocognitivo e textual. (KOCH,
2003:31)
Durante o processamento de um texto, é necessário acionarem–se três
diferentes tipos de memórias: a memória de curto prazo, com capacidade limitada; a
memória de trabalho ou de médio prazo, que tem a função de manter informações num
estado de ciência os conhecimentos pertinentes para a compreensão do texto em questão;
por fim, a memória de longo prazo onde estão armazenados três grandes sistemas de
conhecimento que são ativados no ato de leitura e que são chamados de conhecimentos
prévios: o lingüístico, o enciclopédico e o interacional. Deve-se ressaltar que esses
conhecimentos, descritos por Maingueneau (2004:45) como competências, interagem para
produzir a interpretação textual.
O conhecimento lingüístico compreende o conhecimento gramatical e o lexical.
Sem o conhecimento lingüístico, a compreensão textual por parte do leitor torna-se
impossível, como é o caso de um texto escrito em uma língua estrangeira.
Assim, Pereira (2002:47) destaca que
sem o conhecimento lingüístico, não é possível a compreensão de um
texto escrito em um idioma desconhecido por parte do leitor, ou até
mesmo um nível em que o leitor não tenha alcance no seu próprio idioma
21
como no caso das variantes lingüísticas. Da mesma forma que se um
texto for escrito em seu idioma, mas apresente uma certa quantidade de
palavras de outra língua desconhecida por parte do leitor, comprometerá a
compreensão.
o conhecimento enciclopédico ou de mundo é o conhecimento que se
encontra armazenado na memória de cada indivíduo, seja do tipo declarativo, seja do tipo
episódico
3
. É o conhecimento adquirido durante a vivência do leitor, como resultado de
suas experiências tanto pessoais como sociais. Ele é ativado durante o ato de leitura, tanto
formal quanto informalmente, por meio de modelos cognitivos globais.
Com esse conhecimento, o leitor consegue, de acordo com Trevisan (1992: 24),
construir o mundo textual,
o qual consiste na configuração de conceitos e relações subjacentes ao
texto, mas, especialmente, constitui uma representação do mundo pelo
texto. Essa representação, no entanto, dificilmente corresponderá ao
mundo real, uma vez que depende da visão pessoal, das crenças, dos
interesses dos usuários.
Por sua vez, o conhecimento sociointeracional é aquele sobre as formas de
interação por meio da linguagem e abarca os conhecimentos dos tipos: ilocucional,
comunicacional, metacomunicativo e superestrutural. (KOCH, 2003:32)
Por meio do conhecimento ilocucional, é possível perceber os objetivos ou
propósito que um falante em determinada situação de interação, pretende atingir. É o
conhecimento sobre tipos de atos de fala. Já o conhecimento comunicacional diz respeito às
3
Para Koch (2003:32) o conhecimento do tipo declarativo consiste em proposições a respeito dos fatos do
mundo, enquanto o conhecimento episódico é formado por “modelos cognitivos” socioculturalmente
determinados e adquiridos por meio da experiência.
22
normas comunicativas gerais. É o que Van Dijk (2002:80-84) denomina de modelos
cognitivos de contexto.
O conhecimento metacomunicativo abarca os vários tipos de ações lingüísticas
que permitem assegurar ao leitor a compreensão do texto e conseguir a aceitação, pelo
parceiro, dos objetivos com que é produzido, monitorando com elas o fluxo verbal.
(KOCH, 2003:33)
O conhecimento superestrutural global permite reconhecer textos como
exemplares de determinado gênero ou tipo. Ele abrange os conhecimentos sobre as
macrocategorias ou unidades globais que distinguem os vários tipos de textos. (KOCH,
2003:33)
É fundamental que o leitor tenha um conjunto de conhecimentos prévios, sem
os quais ele não poderia inferir o implícito no texto, o qual seria então ilegível. Entre os
tipos de fontes de conhecimento que devem ser ativados durante o processo de leitura,
distinguem-se os seguintes: conhecimento lingüístico, elementos de coesão; conhecimento
textual, estrutura de texto; conhecimento de mundo ou enciclopédico. (CANOLLA,
2001:28-29).
Assim sendo, a ativação dos conhecimentos prévios do leitor é fundamental,
visto que é o conhecimento que ele tem sobre o assunto que lhe permite fazer as inferências
necessárias para a compreensão do texto. (KLEIMAN, 2002:25)
Em vista disso, um fator importante durante o processo de leitura é a
formulação de hipóteses, que será determinada, de certa forma, pelos objetivos
estabelecidos pelo leitor e por suas expectativas em relação ao texto. Para Kleiman (2004b),
quando o leitor formula hipóteses, está fazendo previsões que podem ser confirmadas,
reformuladas ou rejeitadas posteriormente. Para Eco (apud CANOLLA 2001: 48), todo
texto possui uma organização interna que permite validar ou rejeitar hipóteses
interpretativas. Van Dijk (2002:123) postula ainda que essa organização está compreendida
23
em esquemas que, de acordo com ele são utilizados para descrever a forma global de um
discurso. O autor utiliza o termo superestrutura para definir tais esquemas.
Saliente-se que as hipóteses do leitor permitem que certos aspectos do
processamento, fundamentais à compreensão, tornem-se possíveis, a saber: o
reconhecimento global e instantâneo de palavras e frases relacionadas ao tópico, bem como
inferências sobre palavras não percebidas durante a leitura.
A partir dos conceitos abordados até aqui verificamos, a seguir, como o leitor
utiliza as estratégias de leitura para a construção do sentido no texto lido. Além disso,
verificamos também como ele se vale desses recursos para solucionar os problemas de
compreensão textual durante o ato de leitura.
1.4 Estratégias utilizadas pelo leitor durante o processo de leitura
De acordo com Solé (1998:70), estratégias de leitura são procedimentos de
ordem elevada que envolvem o cognitivo e o metacognitivo. Ela prossegue afirmando que o
que caracteriza a mentalidade estratégica é sua capacidade de representar e analisar os
problemas e a flexibilidade para encontrar soluções. A partir disso, abordamos os
processos que o leitor utiliza para chegar à compreensão leitora que, de acordo com
Giasson (1993), são divididos em microprocessos, processos de integração,
macroprocessos, processos de elaboração e processos metacognitivos.
Os microprocessos abarcam o reconhecimento de palavras, a leitura de palavras
e a microsseleção, visto que eles auxiliam a compreender a informação presente numa
frase. De acordo com Giasson (1993:33) os microprocessos servem para compreender uma
informação contida na frase. Já o processo de integração utiliza dois recursos denominados
por Giasson como identificação dos elos coesivos, que ajudam na apreensão de relações
explícitas, e as inferências, que ajudam nas conexões explícitas. Para a autora, (1993:33) os
processos de integração têm como função efetuar ligações entre as proposições ou as
frases.
Nesse sentido, Palma (1998:58) afirma que
24
do ponto de vista da coesão, o usuário deve ser capaz de reconhecer os
elementos lingüísticos que recuperam tanto informações do mundo
textual, articulando a coesão denominada por Koch (1989) de referencial,
quanto as unidades lingüísticas que conectam orações períodos ou
parágrafos, estabelecendo relações lógicas e/ou argumentativas entre eles.
A inferência, para Giasson, consiste em o leitor atravessar o campo da
compreensão literal e ir além da compreensão dos conhecimentos lingüísticos. O leitor deve
valer-se de seus conhecimentos de mundo armazenados em sua memória de longo prazo.
Trevisan (1992) ressalta que esses processos interferem na compreensão e que a construção
tanto do sentido quanto da coerência, por parte do leitor, depende da sua interação com
texto lido. Dell’Isola (2001:43) salienta ainda, que as inferências ocorrem na mente do
leitor.
Já para Frederiksen (apud DELL’ ISOLA, 2001:43), a inferência
ocorre sempre que uma pessoa opera uma informação semântica, isto é,
conceitos, estruturas proposicionais ou componentes de proposições, para
gerar uma nova informação semântica, isto é, novos conceitos de
estruturas proposicionais. Qualquer conhecimento semântico que é gerado
desse modo é inferido.
Em relação a esse tema, Palma (1998:60) aprofunda a definição de inferência
ao afirmar que inferir é buscar as intenções objetivadas pelo leitor, sendo o conhecimento
partilhado uma fonte rica tanto para a percepção dessas intenções como para o
aproveitamento das informações contidas no texto.
Ao tratar da questão dos macroprocessos, Giasson (1993:33) explica que eles
orientam-se para a compreensão global do texto, para as conexões que permitem fazer do
texto um todo coerente. A autora (1993:108) ressalta que um leitor hábil é capaz de decidir
o que é mais relevante e importante num texto e equilibrar essas ligações com suas
intenções leitoras.
25
Assim, ao ler, o leitor, por meio de relações que ele estabelece, faz algumas
inferências sobre o texto lido que não são necessariamente previstas pelo autor. A
pesquisadora (1993) chama esse recurso de processo de elaboração. Para a autora esse
processo, subdivide–se em previsões, construção de imagem mental, reação emotiva,
reflexão sobre o texto
4
e integração de informação nova aos conhecimentos prévios.
As previsões estão no nível da estrutura textual, visto que o leitor faz
suposições a respeito das personagens e suas características. Ele elabora hipóteses,
interpretações, previsões e conclusões acerca dos acontecimentos que se desenvolvem
durante o ato de leitura. De acordo com Palma (1998:69), as previsões têm como função
aumentar a motivação e o envolvimento frente ao texto.
Durante o processo de compreensão textual, o leitor vale-se de imagens
mentais. A partir dessas imagens, ele desenvolve a compreensão do texto por meio de
sensações táteis, gustativas, olfativas, visuais e quinestésicas. Palma (1998:70) ressalta que
essas imagens auxiliam o leitor ao gerarem o aumento da capacidade da memória de
trabalho, facilitadoras da criação de analogias ou comparações, auxiliares na
estruturação e conservação da informação da memória e responsáveis pelo aumento do
envolvimento com o texto e do interesse e do prazer de ler.
As respostas afetivas, segundo Giasson (1993:189-190), consistem nas reações
emocionais apresentadas pelo leitor frente ao texto, sejam elas de agrado, desagrado, sejam
de indiferença. Assim, o ato de ler torna-se mais ativo e ocasiona uma maior compreensão e
retenção da informação lida.
Palma (1998:70-71) destaca como fundamental para o entendimento do texto o
uso adequado de habilidades mentais superiores, como análise, síntese, crítica ou resumo.
Elas revelam um processo de reflexão sobre o texto não do ponto de vista de conteúdo,
mas também de sua estrutura, ou seja, o leitor reflete sobre o texto e, a partir dele, toma
posições acerca do que foi lido. Ele avalia os dados coletados no texto, como sua fonte e
suas informações para então, decidir qual a relevância que será dada aos fatos apresentados
4
Palma (1998: 69) explica que “esse processo foi chamado por Giasson de discorrer sobre o texto. Dada a
inexistência de substantivo relativo a esse verbo no Português, optou-se pela forma reflexão.”
26
pelo autor, na hora de formular a compreensão a respeito do que foi lido. Esse processo
reflexivo é verbalizado na forma de um metacomentário
5
.
Muitas vezes o leitor proficiente
6
relaciona seus conhecimentos de mundo com
as informações contidas no texto. Giasson afirma que esse relacionamento, por vezes, é
processado levando-se em consideração as experiências pessoais do leitor, que não são
necessárias para a compreensão do texto lido. Essa integração pode tirar o leitor do objetivo
central do texto. (cf. PALMA, 1998:71)
A metacognição diz respeito, entre outras coisas, ao conhecimento do próprio
conhecimento, à avaliação, à regulação e à organização dos próprios processos cognitivos.
Dessa forma para Dembo (1988/1994), os processos metacognitivos são processos
conscientes que o leitor utiliza para controlar o seu próprio pensamento.
Para Davis, Nunes & Nunes (2005:212) os conhecimentos metacognitivos
dizem respeito:
ao produto cognitivo, ou seja, ao conhecimento de que determinados
conceitos, práticas e habilidades são dominados, enquanto outros ainda
não o foram, reconhecendo o que se é (ou não) capaz de alcançar; à
compreensão dos processos cognitivos, ou seja, da maneira pela qual o
pensamento e as funções superiores atenção, memória, raciocínio,
compreensão - atuam na resolução de um problema. As experiências
metacognitivas designam: os processos pelos quais se é capaz de exercer
controle e auto-regulação durante a tarefa de resolução de um problema,
permitindo ao sujeito tomar consciência do desenrolar da sua própria
atividade.
Giasson prefere empregar o termo metacompreensão que abarca não somente o
conhecimento do leitor sobre o seu nível de compreensão durante a leitura, mas também,
quanto a sua capacidade de exercer controle consciente sobre ações cognitivas durante a
5
Para Palma (1998: 65) “caracteriza-se como observações/ declarações sobre o processo de compreensão.
Geralmente são introduzidos por verbos ou nomes relacionados à atividade cognitiva, como eu penso, eu
acho, eu imagino, eu não entendi nada disso, eu não seu etc”.
6
De acordo com Palma (1998:74), “um leitor proficiente implica saber reagir à complexidade da leitura,
interagindo com o autor por meio do texto, realizando, portanto, uma atividade social; implica o indivíduo
saber extrair do texto as informações implícitas, transitando pelos diferentes tipos de inferências, num
movimento da apreensão das intenções do autor”.
27
leitura, recorrendo a estratégias compensatórias apropriadas para facilitar a compreensão
de acordo com o objetivo da leitura. (ROCHA, 2001:26)
Após apresentarmos as estratégias utilizadas pelo leitor durante o processo de
leitura, abordamos a seguir, a questão da leitura como processo social, já que nesse trabalho
é relevante a verificação da construção negociada de sentidos durante um evento de leitura.
1.4 A leitura como evento social
Em concordância com Bloome (1993) consideramos leitura como processo
social o ato de leitura em que as pessoas negociam umas com as outras enquanto constroem
juntas o significado do texto lido. Assim, a leitura é muito mais do que um mero veículo de
comunicação entre autor e leitor. Nela, muito mais significado do que somente as idéias
do autor na folha impressa, além do fato de que os objetivos que alguém tem ao ler podem
ter muito pouco a ver com o significado do autor.
Dessa forma, ao pensar em leitura, é preciso pensar a respeito de que tipo de
texto será lido, por quem, sob quais condições, com base em qual teoria da interpretação e
com quais objetivos, ou seja, o evento de leitura deve ser observado com as restrições que
impõe aos leitores envolvidos na atividade de construir e reconstruir sentidos plausíveis
para um determinado texto. (CANOLLA, 2001: 49)
Conseqüentemente, a questão dos limites para a interpretação de textos e da
plausibilidade dos sentidos construídos na leitura não pode ser fechada de modo absoluto,
pois muitas são as variantes a serem consideradas. É possível estabelecer alguns parâmetros
e definir algumas fronteiras, mas o mais importante é não limitar excessivamente a
atividade dos leitores, principalmente quando se trata da leitura de textos que contém
metáforas, material puramente rico para leituras plurais. (CANOLLA, 2001: 49).
O leitor pode lançar mão durante um evento de leitura de três tipos de fonte de
conhecimento: estruturado profundamente em forma de conceitos adquiridos; estruturado a
partir de conceitos aprendidos e incorporados; lingüístico, que os leitores já adquiriram por
28
meio de sua compreensão anterior com comunidades discursivas. (CANOLLA, 2001: 38-
42)
Um evento de leitura que envolva um grupo de leitores e permita sua livre
manifestação a respeito do texto possibilita a integração de aspectos socioculturais e
cognitivos durante a compreensão do texto, pois coloca em confronto indivíduos que
apresentam "estilos" cognitivos próprios de abordagem dos problemas de interpretação.
Lemos (2005:22), ao apresentar seu ponto de vista a respeito da leitura e
construção de sentidos, atesta que eles devem ser vistos como processo interacional entre
qual o leitor emprega seu conhecimento prévio, sua visão de mundo, sua memória
discursiva, sua subjetividade, enfim, que poderão ser negociados no grupo, num contexto
situado. Assim, tanto o conflito quanto o consenso podem ocorrer na construção social de
sentidos.
Como a leitura é uma prática social e nesse trabalho utilizamos como leitores
profissionais da educação e, segundo Lemos (2005:22) uma das diretrizes da educação
atual é educar para viver com os outros, optamos pela concepção de leitura como processo
social em conjunto com a metodologia do protocolo verbal em grupo. A sala de aula
apresenta-se como um local adequado para o exercício da leitura, por meio do esforço
colaborativos entre os pares, estimulados pelo professor.
Essa concepção, ou seja, a concepção de pensar alto em grupo permite aos
alunos que aprendam e pratiquem o ato de ouvir, a argumentação, o levantamento de
hipóteses, além de discordar, concordar, aceitar ou rejeitar, durante o processo, permitindo
a percepção de que não respostas definitivas. Por conseqüência, cria-se um ambiente
mais dinâmico em que, durante a leitura, ocorre a valorização da voz dos leitores, que
trocam experiências e trazem à discussão suas dificuldades para o grupo com o qual
interagem. A construção de sentidos ocorre nesse processo de interação, enquanto discutem
sobre o texto. (cf. LEMOS,2005: 23)
29
Para Kleiman, (2002:10), a leitura como construção social ocorre na interação.
Afinal, é na prática comunicativa em pequenos grupos, com o professor ou seus pares, que
é criado o contexto para que aquela criança que não entendeu o texto o entenda. Ela
(2002:24), afirma que
é durante a interação que o leitor mais experiente compreende o texto: não
é durante a leitura silenciosa, nem durante a leitura em voz alta, mas
durante a conversa sobre aspectos relevantes do texto. Muitos aspectos
que o aluno nem sequer percebeu ficam salientes nessa conversa, muitos
pontos que ficaram obscuros são iluminados na construção conjunta da
compreensão.
Apesar de a autora abordar as questões de leitura dando enfoque à pesquisa com
crianças, suas ponderações podem ser aplicadas a qualquer tipo de público, no caso deste
trabalho, professores. Durante o processo, pela mediação da pesquisadora, eles passam
pelos mesmos estágios abordados, como conflitos, negociação e acordos em relação à
tarefa proposta.
Neste trabalho, a leitura é compreendida numa perspectiva sócio-cognitiva,
como um processo de descobertas, em que o leitor interage com o texto. Ela é vista como
um processo ativo em que a competência comunicativa é utilizada na interpretação do
texto.
Dessa forma, temos por pressuposto a leitura como um processo de co-
construção negociada de sentidos, durante um evento de leitura de uma crônica em que as
metáforas estão presentes. Assim, no capítulo a seguir, abordamos as perspectivas teóricas
que fundamentam a metáfora tradicional e a metáfora cognitiva.
30
_________________________________________________
Capítulo II
Metáfora
“A metáfora é a guardiã da realidade”.
Adélia Prado.
(Fonte: Projeto Releituras)
31
Tradicionalmente, a metáfora é percebida como uma figura de linguagem, um
recurso retórico, estilístico, ou ainda, uma simples questão de linguagem e não de
pensamento. Zanotto (1996) aponta que, na teoria aristotélica, a metáfora é considerada um
simples ornamento. Dessa forma, na visão do racionalismo aristotélico e cartesiano, a
oposição literal/ metafórico é muito forte.
A partir da segunda metade do século XX, e mais incisivamente nas décadas de
1970 e 1980, estudos de cunho cognitivista questionaram a posição na metáfora como era
vista até então. Nessa nova concepção, Zanotto (1996) acrescenta que a metáfora é um
processo cognitivo que tem um papel heurístico nas mudanças conceituais. Assim, a
metáfora deixa de ser vista como uma figura de linguagem e passa a ser considerada
presente não somente na linguagem da vida cotidiana, mas também no pensamento e na
ação. Neste capítulo, apresentamos, resumidamente, a metáfora e sua visão tradicional e
mostramos ainda a metáfora como processo conceptual.
2.1 A perspectiva retórica da metáfora
Desde a Antigüidade Clássica, a metáfora é considerada como uma figura de
linguagem, um recurso estilístico que tem por finalidade o embelezamento de textos e
discursos. De acordo com Fernández (1996:48), antes mesmo de Aristóteles, tanto Sócrates
quanto Platão haviam mencionado a metáfora. Sócrates afirma que a metáfora é parte
integrante da Retórica e que ela era útil para se ganhar discussões, convencer,
raciocinar
7
. Já Platão, por sua vez, reconhece o poder desta figura para persuadir, no
entanto critica os filósofos que fazem jogos verbais para afastar os outros da verdade
8
.
Fernández (1996:48) afirma que, no mundo grego, a
9
metáfora era um poderoso método de
argumentação vista com suspeita por sua suscetibilidade em ser utilizada em prejuízo da
sabedoria.
7
parte integrante de la Retórica, y era útil para ganar discusiones, convencer, razonar.
8
reconoce el poder de esta figura para persuadir, pero critica a los filósofos que hacen uso de juegos
verbales para alejar a otros de la verdad.
9
la metáfora era um poderoso método de argumentación al que se miraba com sospecha por su
susceptibilidad a ser utilizado em perjuicio de la sabiduría.
32
A visão clássica da metáfora, dada por Aristóteles em seus escritos sobre a arte
da poética, apresenta a metáfora como um desvio da linguagem literal, já que transfere o
nome de um objeto para outro. Essas transferências ocorrem tanto do gênero para a espécie
quanto da espécie para o gênero, ou ainda no plano da analogia. Assim, a metáfora está
baseada nas similaridades entre coisas que, aparentemente, não se assemelham. (QUEIROZ
2002:42)
De acordo com Almeida (2005), a metáfora era um recurso de estilo.
Considerava-se indesejável o seu uso nos discursos científico e filosófico, que apenas a
linguagem literal seria adequada à sua busca por verdades objetivas. Fairclough (apud
ALMEIDA 2005) postula que, nessa visão tradicional, objetiva e racional, a linguagem não
passa de uma mera representação da realidade. Nessa perspectiva, o objetivo é desvendar e
relatar nos estudos científicos as descobertas, de forma objetiva. Para que a pesquisa o
seja invalidada pelo uso da linguagem figurada, incluindo a metáfora, ela deve ser evitada
por possuir características imaginativas e pela sua ligação com a subjetividade.
(ALMEIDA, 2005)
Nessa visão tradicional da metáfora, Zanotto (1996:211) acrescenta que a
metáfora, além de ser contemplada como um mero ornamento, não apresenta nenhuma
nova informação. Ela é considerada um desvio da linguagem usual e própria de linguagens
especiais, como a poética e persuasiva, enquanto o literal é próprio da linguagem da
ciência, porque não é ambíguo: é claro, distinto e preciso.
Entre as visões tradicionais, que se originam na visão aristotélica de figuras de
linguagem, temos a de Oswaldino Marques (1956:33) no livro A Teoria da Metáfora, que,
além de tratar a metáfora como o mais complexo e plástico dos tropos, apresenta a posição
de alguns outros teóricos a respeito desse assunto que nos auxiliam na compreensão dessa
visão da metáfora
Consideramos relevante apresentar breves definições dadas por alguns autores
para a metáfora tradicional que ela foi por muito tempo a única perspectiva aceita entre
os estudiosos. Assim, novos teóricos passaram a perceber que ela poderia ser expandida e
33
formularam a teoria da metáfora vista como um processo conceptual, que utilizamos neste
trabalho.
Iniciamos com a visão de Hedwig Konrad (apud MARQUES 1956:34-35) que
atribui uma quase que completa autonomia à metáfora estética em contraposição à metáfora
lingüística, ou seja, uma dupla configuração da metáfora como fator constitucional da
linguagem e como recurso superior de expressão poética. Já Warren e Wellek (apud
MARQUES 1956:35-36) ressaltam, como ingredientes básicos da metáfora, a analogia, a
dupla visão, a imagem sensorial e a projeção animística, categorizando as metáforas por
critérios culturais, que variam de nação para nação.
Para Michel LeGuern (1974:142), a metáfora é definida como um recurso
estilístico e a passagem dela ao símbolo é muitas vezes imperceptível. Isso intervém no
momento em que a analogia não é sentida pela intuição, mas percebida pela inteligência.
Ele acrescenta ainda que a metáfora, figura de linguagem tradicionalmente usada no
discurso poético e no discurso oral, possui algumas características próprias, como o fato de
não possuir regras e de, principalmente, ser percebida por meio do contexto em que se
insere.
Vereza (1998:115), por sua vez, ressalta que a metáfora é concebida, na
perspectiva tradicional, como aquela que representa o que há de mais básico em um
processo tropológico, que estabelece uma comparação elíptica entre dois elementos
através da similaridade ou analogia. Para a autora, essa conceituação de metáfora reflete
como a maioria das pessoas compreende e se refere ao termo linguagem ordinária.
Assim, esses teóricos apresentam a metáfora sob a perspectiva tradicional como
sendo um recurso estilístico, processo de analogia ou de similaridade. Essa visão tradicional
da metáfora passa a ser questionada no século XX, com a publicação dos trabalhos de
Richards (1936), Bearsdley (1958) e Black (1962). Antes deles, porém, Jean Baptista Vico,
em trabalho publicado em 1725 questiona a visão tradicional da metáfora. Ele
(1725/1999) apresenta, pela primeira vez, a metáfora como um instrumento de ordem
cognitiva.
34
Palma (1998:145) destaca que Vico, em sua obra denominada “A ciência
nova”, ao tratar das origens da linguagem humana, destaca sua natureza concreta, suas
analogias com a linguagem poética em épocas distintas na história. Em sua teoria,
ênfase à metáfora e ao pensamento concreto. Por sua vez, Fiker (apud OLIVEIRA,
2005:73) afirma que, para Vico,
o homem moderno não deveria negligenciar o fato de que o processo de
formação das palavras deve ser rastreado nas metáforas, as quais formam,
na verdade, o grande corpo da linguagem entre todas as nações.
De acordo com Almeida (2005), a partir da década 1970, com a ruptura da
idéia de que as realidades objetivas possam ser acessadas sem a mediação da linguagem e
do sujeito sócio-historicamente situado que a investiga, a metáfora começou, de forma
mais incisiva, a ser pesquisada como um fenômeno cognitivo, conforme abordamos a
seguir.
2.2 A metáfora como ferramenta cognitiva
Como mencionamos no item anterior, a partir da década de 1970, com o
questionamento da postura objetivista
10
nas pesquisas, por meio de estudos na área da
Filosofia, da Lingüística, e da Psicologia Cognitiva, não se considera mais possível
existir uma linguagem objetiva que possa representar fielmente a realidade. Assim, a
linguagem passou a ser vista não somente como uma simples representação, mas também
como uma construção da realidade. Por conseqüência, o pensamento de que a linguagem
literal e a linguagem metafórica são opostas perde o sentido.
Para Almeida (2005:14) nem a linguagem figurada é vista como
10
Nesse trabalho utilizamos o conceito de objetivismo dado por Lakoff e Johnson que o consideram um termo
genérico que abrangem todas as correntes da filosofia ocidental que assumem ser possível o acesso a
verdades absolutas e incondicionais sobre o mundo objetivo e que entendem a linguagem como mero espelho
da realidade objetiva. (Zanotto et alii, 2002:11)
35
mero ornamento, que as imagens evocadas por ela fazem parte dos
conceitos verbalizados. Em outras palavras, se uma metáfora apresenta
um determinado domínio em termos de outro, não temos uma mera
comparação, mas sim a criação de uma maneira de compreender o
primeiro, que transfere para ele características do segundo, as quais
passam a ser elementos constitutivos de nossa visão sobre aquele assunto.
A visão da metáfora como um ornamento lingüístico, sem nenhum valor
cognitivo, é questionada por Lakoff e Johnson na década de 1980 quando publicam a obra
Metaphors We Live By (Metáforas da Vida Cotidiana). Nessa obra, os autores postularam o
conceito da metáfora como ferramenta cognitiva. Antes deles, porém, Michael Reddy, em
1979 apresentou um novo enfoque para a metáfora. Surge com seus estudos, o conceito da
metáfora do canal
11
(conduit metaphor), a qual expressa a idéia de que a linguagem
funciona como um conduto que transfere pensamentos de forma corpórea de uma pessoa
para outra.
Para Reddy (1979:170), o ato da transmissão da mensagem se em quatro
momentos:
(...) (1) a língua funciona como um canal que transfere pensamentos
completos de uma pessoa para outra; (2) escrevendo ou falando, as
pessoas inserem seus pensamentos ou sentimentos nas palavras; (3) as
palavras realizam a transferência, porque contém os pensamentos ou
sentimentos carregando-os para outros, e (4) no ler ou no ouvir as
pessoas extraem os pensamentos e sentimentos mais uma vez das
palavras.
12
11
Seguimos a tradução apresentada pelo GEIM (Grupo de Estudos da Indeterminação da Metáfora) na
tradução do livro Metáforas da Vida Cotidiana, 2002.
12
(1) language functions like a conduit, transferring thoughts bodily from one person to another, (2) in
writing and speaking, people insert heir thoughts or feelings and covering them to others, and (4) in listening
or reading, people extract the thoughts once again from the words.
36
Assim sendo, na sua teoria da metáfora do canal, descoberta por Reddy que as
expressões lingüísticas são recipientes de significados. Palavras e sentenças têm
significados em si mesmas, independentemente de qualquer contexto ou falantes. os
significados são objetos, têm uma existência independente de pessoas e contextos.
Ademais, as expressões lingüísticas são recipientes de significados e palavras (e sentenças)
têm significados também independentes de contextos e falantes. (LAKOFF E JOHNSON,
2002:55)
Pela metáfora do canal, em suma, o falante retira idéias da sua mente, coloca-as
em palavras, e envia-as para um ouvinte, por meio de um canal. Esse ouvinte extrai os
sentidos-objetos das palavras-recipientes. Lakoff (1985:64-65) explica que a metáfora do
canal é uma entidade conceptual complexa, que define em grandes linhas nossa idéias do
que é comunicação. A estrutura conceptual proporcionada pela metáfora do CANAL nos
dá uma compreensão coerente do próprio conceito de comunicação.
Os estudos de Reddy são aprofundados por Lakoff e Johnson que aprofundam
as concepções levantadas por Reddy e propõem os conceitos metafóricos, a partir da
descoberta de que a metáfora está infiltrada na vida cotidiana, não somente na linguagem,
mas também no pensamento e na ação. (LAKOFF E JOHNSON, 2002:45)
No trabalho publicado em 1980, Lakoff e Johnson afirmam que as metáforas
constroem o cotidiano. Eles postulam que as metáforas convencionais possibilitam aos
indivíduos organizar certos conceitos por meio da analogia e da transferência de
características de um domínio mais estabilizado pela experiência para um domínio menos
estável. Haveria então palavras operando no vel conceptual e funcionando como base
para a compreensão de conceitos complexos e abstratos. Para eles, o conceito é
metaforicamente estruturado, a atividade é metaforicamente estruturada e,
conseqüentemente, a linguagem é metaforicamente estruturada. Em vista disso, as
metáforas originam-se de nossas experiências concretas e permitem-nos construir conceitos
especialmente abstratos e elaborados. (CANOLLA, 2001:68)
Para Lakoff e Johnson (2002), as metáforas permeiam todo o nosso sistema
conceitual. Muitos conceitos são tão abstratos que necessitamos de algo concreto para
37
defini-los. Surge, então, a necessidade da utilização das definições metafóricas. Lakoff e
Johnson propõem que
os conceitos individuais não são definidos de uma forma isolada, mas, ao
contrário, eles são definidos em termos de seus papéis nos tipos naturais
de experiências. Os conceitos não são definidos exclusivamente em
termos de propriedades inerentes; ao invés disso, eles são definidos
basicamente em termos de propriedades interacionais. (...) Em lugar de
serem rigidamente definidos, os conceitos são instrumentos sistemáticos
para definir melhor um conceito e para modificar seu âmbito de
aplicabilidade. (
LAKOFF E JOHNSON, 2002:217-218)
A partir da teoria de Lakoff e Johnson, a metáfora tem seu aspecto cognitivo
ressaltado e é vista como um fenômeno conceptual que permite a organização de conceitos
mais complexos, por meio de uma rede de analogias e de correspondências.
Assim, a metáfora vem sendo estudada há trinta anos como ferramenta
cognitiva. No Brasil, formou-se um grupo no início dos anos 1990 denominado GEIM
(Grupo de Estudos da Indeterminação e da Metáfora), coordenado pela professora doutora
Mara Sophia Zanotto, vinculado à PUCSP, que se preocupa em pesquisar a metáfora
cognitiva, seu aspecto indeterminado, e sua compreensão tanto na linguagem escrita quanto
na linguagem oral. No item a seguir, explicamos a metáfora conceptual e os três tipos de
conceitos metafóricos apresentados por Lakoff e Johnson: o estrutural, o orientacional e o
ontológico.
2.3 A metáfora conceptual
13
a partir de Lakoff e Johnson
Lakoff e Johnson na obra Metáforas da vida cotidiana de 1980 utilizam o termo
metáfora para se referir ao conceito metafórico, que consiste em experienciar uma coisa em
termos da outra. Nessa obra, os autores apresentam três tipos de conceito metafórico: o
13
O termo “conceptual” utilizado nesse trabalho está de acordo com a nomenclatura utilizada na tradução do
livro Metaphors We Live By (Metáforas da Vida Cotidiana) de Lakoff e Johnson (2002).
38
estrutural, o orientacional e o ontológico. Para eles, as metáforas estruturais são as que
definem a nossa forma de representar a realidade. Elas permitem-nos fazer mais do que
simplesmente orientarmos conceitos, referirmos-nos a eles, quantificá-los etc. Diante disso,
podemos estruturar uma concepção em termos de outra. Nós a utilizamos para pensar certos
conceitos abstratos. Um exemplo de metáfora estrutural dada por Lakoff e Johnson
(2002:136) é DISCUSSÃO É GUERRA porque, para eles, tal metáfora faz parte do nosso
sistema conceptual da cultura na qual você vive. Alguns exemplos que fundamentam as
afirmações dadas pelos autores seriam Vou bombardeá-lo
com perguntas, ou ainda Ela
destruiu
todos os seus argumentos.
As metáforas orientacionais, por sua vez, são aquelas ligadas à orientação
espacial: para cima - para baixo, dentro-fora, frente-trás, em cima de - fora de (on-off),
fundo - raso, central - periférico. Elas são baseadas em conceitos físicos simples, surgem do
fato de que temos um corpo e de que ele funciona obedecendo a nossa relação com o nosso
ambiente físico e cultural. Um dos exemplos dados pelos autores é FELIZ É PARA CIMA;
TRISTE É PARA BAIXO (Você está de alto
astral). Eles fundamentam o exemplo com a
base física: postura caída corresponde à tristeza e depressão, postura ereta corresponde a
um estado emocional positivo. (LAKOFF E JOHNSON, 2002:59, 60)
Tomando como ponto de partida esse tipo de organização sistematizada na
orientação espacial, Lakoff e Johnson (2002:60-64) apresentam outras metáforas que se
fundamentam nos mesmos parâmetros, como:
CONSCIENTE É PARA CIMA; INCONSCIENTE É PARA BAIXO
Levante-se
.
Ele caiu
no sono.
Ele está sob
o efeito da hipnose.
SAÚDE E VIDA SÃO PARA CIMA; DOENÇA E MORTE SÃO PARA
BAIXO
Ele está no auge
da sua forma física.
39
Lázaro levantou-se dos mortos.
A gripe o derrubou
.
TER CONTROLE ou FORÇA É PARA CIMA; ESTAR SUJEITO A
CONTROLE ou FORÇA É PARA BAIXO
Estou por cima
nessa situação.
Ele está no alto
escalão.
Ele está na base
da pirâmide social.
MAIS É PARA CIMA; MENOS É PARA BAIXO
O número de livros publicados a cada ano continua subindo
.
Minha renda subiu
no ano passado.
O número de erros que ele cometeu é incrivelmente baixo
.
STATUS SUPERIOR É PARA CIMA; STATUS INFERIOR É PARA
BAIXO
Ela alcançará o topo
.
Ele tem poucas chances de ascensão
social.
Ela baixou
de status.
BOM É PARA CIMA; MAU É PARA BAIXO
Chegamos ao topo
no ano passado, mas desde então estamos em declínio.
As coisas estão indo o tempo todo para baixo
.
Ele faz um trabalho de alta
qualidade
VIRTUDE É PARA CIMA; DEPREVAÇÃO É PARA BAIXO
Ele é um homem de espírito elevado
.
Esse foi um truque baixo
.
Ele caiu
no abismo da depravação.
RACIONAL É PARA CIMA; EMOCIONAL É PARA BAIXO
A discussão desceu para o plano emocional
, mas eu a fiz atingir de novo
o nível da racionalidade
.
Nós pusemos de lado
nossas emoções e tivemos uma discussão de alto
nível intelectual sobre o assunto.
Ele não conseguiu ficar acima das emoções
.
40
Nos exemplos acima, podemos notar que os sentimentos e atitudes positivas são
colocados em um patamar elevado, enquanto os sentimentos e atitudes negativos ficam
num patamar inferior. Essas metáforas refletem o modo como percebemos o mundo a nossa
volta. Essa percepção da nossa vida cotidiana, por meio de conceitos metafóricos que estão
enraizados em nossa cultura, explicita a maneira como tratamos de assuntos emocionais,
físicos ou mesmo econômicos.
nas metáforas ontológicas, os conceitos abstratos são transformados em
entidades coisas ou seres (animais ou pessoas).Usamos metáforas ontológicas para
compreender os eventos, ações, atividades e estados. A personificação desempenha um
papel importante nesse processo. (LAKOFF E JOHNSON, 2002:75-85). Para exemplificar
suas reflexões sobre as metáforas ontológicas, eles citam frases em que INFLAÇÃO É
UMA ENTIDADE:
A inflação está abaixando nosso padrão de vida.
Se houver muito mais inflação
, nós nunca sobreviveremos.
Precisamos combater a inflação
.
A inflação está nos colocando
em um beco sem saída.
A inflação está fazendo estragos
nos preços de mercadorias e de gasolina.
A inflação me deixa doente (do estômago)
.
Para eles, o fato de a inflação ser vista como uma entidade possibilita-nos
referirmo-nos a ela, quantificá-la, identificar um aspecto particular dela, vê-la como uma
causa, agir em relação a ela e, talvez, até mesmo, acreditar que nós a compreendemos.
(LAKOFF E JOHNSON, 2002:75-85).
Para os autores (2002:79), a maioria das metáforas ontológicas, assim como as
orientacionais, muitas vezes não é nem reconhecida como sendo metáfora. Uma das razões
é o fato de elas servirem a uma variedade limitada de objetivos como referir-se, quantificar
etc. Meramente conceber alguma coisa não física como uma entidade ou substância não
41
nos permite compreendê-la muito. Mas as metáforas ontológicas podem ser ainda mais
elaboradas. Para explicar essa afirmação, Lakoff e Johnson (2002:79) apresentam dois
exemplos de como a metáfora ontológica MENTE É UMA ENTIDADE é desenvolvida na
nossa cultura.
MENTE É UMA MÁQUINA
Ainda estamos remoendo
a solução para essa equação.
Estou um pouco enferrujado
hoje
MENTE É UM OBJETO QUEBRADIÇO
O seu ego é muito frágil
Eu estou em pedaços
Ainda no campo das metáforas ontológicas, temos as metáforas de recipientes,
que surgem do fato de percebemos o mundo exterior como algo fora de nós. Lakoff e
Johnson (2002:81) explicam que cada um de nós é um recipiente com uma superfície
demarcadora e uma orientação dentro-fora. A partir dessa afirmação, os autores
apresentam o conceito metafórico CAMPOS VISUAIS SÃO RECIPIENTES (O navio está
entrando no meu campo
de visão /Não há nada à vista).
Outros conceitos metafóricos ligados às metáforas de recipiente são aqueles
que descrevem eventos, ações, atividades e estados. Segundo os autores (2002:83-84), os
eventos e ações são metaforicamente conceptualizados como objetos, atividades como
substâncias, estados como recipientes. No caso dos eventos, eles usam a idéia de que uma
corrida é vista como um OBJETO RECIPIENTE (Você está na
corrida no domingo?). Já as
atividades são percebidas como SUBSTÂNCIAS e, conseqüentemente, como
RECIPIENTES (Fora
lavar as janelas, o que mais você fez?). Por fim, muitos tipos de
estados são vistos como RECIPIENTES (Ele finalmente emergiu
do estado catatônico em
que se encontrava desde o fim da última semana)
42
O conceito apresentado pelos autores em 1980, porém, sofre transformações.
Lakoff, em trabalhos publicados em 1986 e 1993, transforma o conceito metafórico em
metáfora conceptual. Adota essa terminologia pelo fato de a metáfora ser, para ele, um
fenômeno que envolve tanto os mapeamentos conceptuais quanto as expressões lingüísticas
individuais. (LAKOFF, 1993:209)
Lakoff, em artigo publicado em 1986, aprofunda a explicação do conceito
metafórico, baseado na similaridade. Como exemplo, o autor utiliza o conceito AMOR É
UMA VIAGEM (Veja a que ponto nós chegamos /Nossa relação não vai chegar a lugar
nenhum). Dessa forma, a metáfora conceptual é explicada por Lakoff como um
mapeamento de um domínio de origem a um domínio alvo. Nesse caso, viagem é a origem
e amor é o alvo. Ele ressalta que o que constitui a metáfora AMOR É UMA VIAGEM não
é uma palavra ou uma expressão em particular. O que ocorre é o mapeamento ontológico e
epistêmico em que um domínio conceptual estabelece correspondência com um outro,
nesse caso, o domínio de origem (viagem) com o domínio alvo (amor). A metáfora passa a
ser não apenas uma questão de linguagem, mas de pensamento e de razão. Assim, a
linguagem é o reflexo do mapeamento. Esse mapeamento é um dos nossos modos
convencionais de entender o amor. (LAKOFF, 1986:216)
Dessa forma, nosso sistema conceptual é baseado em nossas experiências de
mundo visto que as metáforas permeiam todo o nosso sistema conceptual. Muitos desses
conceitos são tão abstratos que necessitamos de algo concreto para defini-los. Sentimos,
então, a necessidade de utilizarmos as definições metafóricas. (LAKOFF E JOHNSON,
2002: 205-207)
Assim, propõem que os conceitos que ocorrem em definições metafóricas são
aqueles correspondentes aos tipos naturais de experiência, que proporcionam a forma certa
de estrutura que nos permite lidar com aqueles tipos naturais de experiência que são menos
concretas ou menos claramente definidas em seus próprios termos. Nesse sentido,
consideram (2002:218) que as metáforas e os delimitadores são instrumentos sistemáticos
para definir melhor um conceito e para modificar seu âmbito de aplicabilidade, ou seja, os
43
conceitos são criados a partir da nossa experiência e, por isso, não podem ser rigidamente
definidos.
Esses conceitos dependem não da nossa experiência de mundo para serem
criados, mas também de fatores sociais e culturais, além do ambiente sico (montanha,
selva, cidades etc.) em que a sociedade está inserida. Lakoff (1985:59) ressalta que da
experiência física e cultural nascem naturalmente conceitos de todos os
tipos. Por exemplo, a metáfora orientacional MAIS É PARA CIMA
aparenta ser baseada na correlação observada entre juntar uma sustância
ou acrescentar objetos a um monte e ver subir o nível da substância ou do
monte. Essas metáforas são boas candidatas a conceitos universais, já que
tem uma base física tão forte. A maioria dos conceitos metafóricos,
porém, são evidentemente dependentes de atividades e experiências
relativas a determinadas culturas. Não é de esperar que se encontrem as
mesmas metáforas para as idéias ou a mente em culturas fortemente
distintas, e a mesma metáfora, (por exemplo, AS IDÉIAS SÃO MODAS)
não tem o mesmo significado de cultura para cultura, já que MODAS
poderia ser compreendido diferentemente.
Lakoff e Johnson (2002:235) abordam a questão das metáforas novas e as
diferenciam das metáforas convencionais, que estruturam o sistema conceptual ordinário
de nossa cultura, o qual reflete em nossa linguagem do dia-a-dia. Para os autores, as
metáforas novas (imaginativas, criativas), dão uma nova compreensão da nossa
experiência, que elas podem dar sentido novo ao nosso passado, às nossas atividades
diárias, ao nosso saber e às nossas crenças. A seguir, explicamos de que forma as
metáforas novas diferenciam-se das convencionais, além dos modos pelos quais as
metáforas criam similaridades.
2.3 As metáforas novas e a criação da similaridade
Se, de um lado, as metáforas convencionais estruturam o sistema conceptual da
nossa cultura que se reflete em nossa linguagem cotidiana, por outro lado, as metáforas
novas recriam nossas experiências e elas oferecem-nos uma nova compreensão dessas
44
experiências. É relevante ressaltar que tanto as metáforas convencionais quanto as
metáforas novas favorecem estruturas coerentes. As duas possuem implicações que podem
incluir outras metáforas ou mesmo afirmações literais. (LAKOFF E JOHNSON: 2002, 235-
236)
Lakoff e Johnson (2002:236) apresentam o exemplo AMOR É UMA OBRA
DE ARTE COLABORATIVA para explicar a questão das metáforas novas. Para eles, as
implicações surgem a partir de nossas crenças e de nossas experiências a respeito do que
vem a ser uma obra de arte colaborativa. Eles destacam as implicações para essa metáfora,
partindo da nossa visão pessoal do que vem a ser “obra” e do que vem a ser “arte” como:
O amor é trabalho.
O amor é ativo.
O amor exige cooperação.
O amor exige dedicação.
O amor exige compromisso.
O amor exige disciplina.
O amor envolve responsabilidade partilhada.
O amor exige paciência.
O amor exige valores e objetivos partilhados.
O amor exige sacrifício.
O amor regularmente traz frustração.
O amor exige comunicação instintiva.
O amor é uma experiência estética.
O amor é primordialmente avaliado por si mesmo
O amor envolve criatividade.
O amor exige uma estética partilhada
O amor não é obtido por meio de fórmulas.
O amor é único em cada instância.
O amor é a expressão mais profunda do indivíduo.
O amor cria uma realidade.
O amor reflete o modo como se vê o mundo.
O amor exige a maior honestidade.
O amor pode ser passageiro ou permanente.
O amor produz uma satisfação estática partilhada devida a esforços
conjuntos.
45
Para os autores, algumas dessas implicações são metafóricas (Amor é uma
experiência estética) e outras não (Amor envolve responsabilidade partilhada). Cada uma
dessas implicações pode apresentar outras implicações. Isso resulta numa vasta e coerente
rede de implicações que pode ou não coincidir com nossas experiências de amor.
É relevante ressaltar que a metáfora destaca alguns traços de experiências
enquanto encobre outros. Na metáfora AMOR É UMA OBRA DE ARTE
COLABORATIVA, uma reverberação que permeia a rede de implicações que traz à
tona lembranças de experiências amorosas passadas e que serve de guia para experiências
futuras. Nessa metáfora, o lado ativo do amor aparece em primeiro plano e, por
conseqüência, os aspectos passivos do amor são encobertos. na metáfora AMOR É
SAÚDE, a passividade da saúde é atribuída ao amor e, por isso, os aspectos ativos do amor
são suprimidos. (LAKOFF E JOHNSON: 2002, 237-238)
Assim como percebemos a ocorrência da similaridade entre as metáforas
convencionais, também verificamos a ocorrência dessa similaridade nas metáforas novas.
Na metáfora estrutural IDÉIAS SÃO ALIMENTO, a similaridade acontece porque ambos-
idéias e alimentos - podem ser engolidos, digeridos etc. Lakoff e Johnson (2002:246)
explicam que o conceito de engolir comida independe da metáfora, no entanto, o contrário
não acontece, ou seja, o conceito de engolir idéias surge somente em virtude da metáfora.
Dessa forma, essa metáfora é associada à nossa experiência por causa dessa similaridade
que é metaforicamente induzida. Eles (2002:246-247) acrescentam que a
metáfora IDÉIAS O ALIMENTO é apropriada à nossa experiência
por causa dessa similaridade que é metaforicamente induzida. A metáfora
IDÉIAS SÃO ALIMENTO é, portanto, parcialmente fundamentada nas
metáforas MENTE É UM RECIPIENTE e do CANAL.(...)Esses
conceitos sobre alimento fornecem-nos um modo de entender os
processos psicológicos para os quais não temos meios diretos nem bem
definidos de conceptualização.
46
Os autores (2002:248) afirmam que o mesmo acontece com a metáfora nova
AMOR É UMA OBRA DE ARTE COLABORATIVA que induz a um conjunto de
similaridades entre as experiências amorosas que são iluminadas pela metáfora e as
experiências reais ou imaginadas de colaborar em uma obra de arte. Isso se dá, por
exemplo, pelo fato de uma experiência amorosa frustrante ser compreendida como uma
experiência artística frustrante, ou seja, compreender uma experiência em termos de outra,
somente acontece com o uso da metáfora conceptual, nesse caso AMOR É UMA OBRA
DE ARTE COLABORATIVA. (LAKOFF E JOHNSON, 2002:250)
Lakoff e Johnson (2002:250-252) resumem as formas pelas quais as metáforas
criam similaridades:
1. As metáforas convencionais (orientacionais, ontológicas e
estruturais) são freqüentemente baseadas em correlações que
percebemos em nossa experiência.
2. As metáforas convencionais de tipo estrutural (por exemplo, IDÉIAS
SÃO ALIMENTO) podem ser baseadas em similaridades que se
originam de metáforas orientacionais e ontológicas.
3. As metáforas novas são principalmente estruturais. Elas podem criar
similaridades do mesmo modo que as metáforas estruturais.
4. As metáforas novas, em virtude de suas implicações, selecionam um
domínio de experiências, iluminando-as, atenuando-as, escondendo-
as. A metáfora caracteriza uma similaridade entre um domínio inteiro
das experiências iluminadas e alguns outros domínios de
experiências.
5. As similaridades podem ser similaridades em relação a uma
metáfora.
47
Steen (1994:14) ressalta que algumas metáforas criam similaridades em vez de
formular metáforas pré-existentes
14
. Em seu texto, o autor cita Black (1993), a quem
recorremos para exemplificar a questão da similaridade com a frase “Pobreza é um crime”.
Nela, Black (1993:30) ressalta que
“crime” e pobreza” são os nós de redes isomórficas, em que afirmações
sobre crimes estão correlacionados um a um com as declarações
correspondentes sobre pobreza. Assim, cada metáfora pode ser dita para
mediar uma analogia ou correspondência estrutural. (Que é a
compreensão correta subjacente à visão clássica de comparação de
metáforas como comparação elíptica ou símile). Portanto, também, cada
afirmação metafórica pode ser dita para implicar uma afirmação
comparativa e uma afirmação similar, cada uma mais fraca que a
afirmação metafórica original. (...) Chamar “Pobreza é um crime” tanto
de similaridade quanto de comparação poder ser um exagero ou não. Em
um dado contexto de elocução, “Pobreza é como um crime” pode ainda
ser figurativo, e muito mais forte que uma variante estilística em relação
à afirmação metafórica original.
15
A explicitação de como as metáforas criam similaridades e de como isso
contribui para a nossa compreensão de fatos que são verbalizados metaforicamente são
relevantes neste trabalho. Propomos analisar de que modo os leitores participantes de um
evento de leitura constroem sentidos para metáforas presentes em uma crônica jornalística
de Arnaldo Jabor, de que forma acontece a interação entre esses participantes e como eles
trocam e “negociam” seus conhecimentos durante esse evento de leitura.
Assim, no próximo capítulo apresentamos resumidamente, a definição de
gênero que permeia essa pesquisa, abordamos as transformações sofridas pela crônica
14
some metaphors create similarities rather than formulate pre-existing ones (STEEN, 1994:14)
15
“crime” and “ poverty” are nodes of isomorphic net-works, in which assertions about crime are correlated
one-to-one with corresponding statements about poverty. Hence, every metaphor may be said to mediate an
analogy or structural correspondence. (That is the correct insight behind the classical comparison view of
metaphor as elliptical or truncated simile.) Hence, also, every metaphorical statement may be said to
implicate a likeness-statement and a comparison-statement, each weaker than the original metaphorical
statement. (…) To call, “Poverty is a crime”, a simile or comparison is either to say too little or too much. In
a given context of utterance, “Poverty is like a crime” may still be figurative and hardly more than stylistic
variant upon the original metaphorical statement. (BLACK, 1993:30)
48
através da história, além do conceito, estrutura e características da crônica jornalística e da
conceituação das estruturas participativas e do revozeamento. Em seguida, apresentamos o
protocolo verbal em grupo, o contexto da pesquisa, a coleta de dados e seus procedimentos,
além de descrever os participantes da pesquisa.
49
_________________________________________________
Capítulo III
Metodologia
“Há uma coisa mais importante que as mais belas descobertas:
é o conhecimento do método pelo qual são feitas”.
Leibniz.
50
Na pesquisa objetivista, de acordo com Nunan (1992), para que uma pesquisa
seja confiável, o pesquisador deve utilizar uma análise quantitativa dos dados, que consiste
em uma pesquisa objetiva, controlada, sujeita a generalizações, com resultados orientados e
que reconhece a existência de fatos que são externos ao pesquisador ou independentes do
observador. Essa perspectiva vem sendo contestada por vários estudiosos de diferentes
áreas. Por isso, este trabalho não se insere nesse paradigma.
Como o foco da pesquisa é a co-construção negociada de sentidos durante um
evento de leitura de uma crônica em que há metáforas, verificou-se a necessidade de
observar as ações mentais que os leitores utilizam para compreender o texto proposto. Por
isso, neste trabalho, enfocamos a abordagem interpretativista. Erickson (1986) usa o termo
interpretativista para as diversas abordagens de estudos de observação-participante.
A interação é relevante nesse tipo de trabalho e Bloome (1993) ressalta ser
essencial que haja a interação entre autor e leitor, além do relacionamento entre as pessoas
durante o evento de leitura. Para a análise do evento de leitura, o pesquisador pode dispor
de várias ferramentas, entre elas as gravações em áudio, em vídeo, a reflexão, a observação-
participante, as entrevistas, além da possibilidade de rever as gravações efetuadas.
Neste trabalho, utilizamos o paradigma interpretativista proposto por Erickson,
no qual Moita Lopes (1994) se baseia, ressalta que o pesquisador é parte integrante da
realidade social. Nessa perspectiva, a análise dos dados coletados acontece por meio de
processos qualitativos. De acordo com Queiroz (2002:62), nesse paradigma, os processos
qualitativos caracterizam-se basicamente por admitir que todo o conhecimento é relativo,
que um elemento subjetivo em toda a pesquisa, cujos resultados podem ser não
generalizáveis.
No presente capítulo, apresentamos resumidamente a definição de gênero que
permeia essa pesquisa; abordamos as transformações sofridas pela crônica através da
história, o conceito, a estrutura e características da crônica jornalística, além conceituação
das estruturas participativas e do revozeamento. Em seguida, apresentamos o protocolo
51
verbal em grupo, o contexto da pesquisa, a coleta de dados e seus procedimentos, além de
descrever os participantes da pesquisa.
3.1 Gêneros: breves considerações
Antes de abordarmos o gênero crônica, faz-se necessário apresentar alguns
enfoques dados ao que Bakhtin denomina de gêneros discursivos. O gênero do discurso, de
acordo com esse autor (2001), é um tipo relativamente estável de enunciado. A concepção
de gênero postulada por ele contempla os aspectos concernentes à interação e às condições
sócio-históricas de produção da linguagem.
Marcuschi (2001:219) postula que a noção de gênero textual é um fenômeno
histórico, extremamente ligado à realidade social e cultural. Surge com as necessidades e
atividades sócio-culturais, além de estar presente na relação com o progresso tecnológico.
A discussão em torno da noção de gênero, a partir da década de 1980, gerou
conceitos importantes como os de seqüência textual de Adam (1987) e o de gênero textual
de Swales (1990), que são relevantes instrumentos teóricos para se refletir sobre a
identidade textual sob o ponto de vista da cognição. (BONINI, 2002: 15-17)
Em razão das diferentes terminologias utilizadas para se definir gênero, neste
trabalho, é adotada a noção de gênero textual apresentada por Marcuschi (2001) que
concebe o texto como uma forma de linguagem estruturada sócio-historicamente ao se
inserir num determinado ambiente social. No item a seguir, abordamos como a crônica se
transformou através dos tempos e chegou à forma como hoje a conhecemos.
3.2 Caracterização do gênero crônica através da história
Se formos consultar a etimologia da palavra crônica, veremos que ela se origina
de Chronos, o Senhor do Tempo. O que é, de fato, bastante coerente se tomarmos o dia-a-
dia como a ferramenta de trabalho dos cronistas. Talvez seja por essa relação com o tempo
e com a atualidade que as crônicas estejam tão associadas ao jornalismo, que, por sua vez (e
não por acaso), vem de jour (dia).
52
De acordo com Moisés (1987:245), o vocábulo crônica designava, no início da
era cristã, uma lista ou relação de acontecimentos ordenados segundo a marcha do tempo,
isto é, em seqüência cronológica. Situada entre os anais e a História, limitava-se a registrar
eventos sem aprofundar-lhes as causas ou tentar interpretá-los. Em tal acepção, a crônica
atingiu o ápice depois do século XII. A partir da Renascença, o termo crônica cedeu a vez a
História, finalizando, por conseguinte, o seu milenar sincretismo. Porém, o vocábulo ainda
continuou a ser utilizado, no sentido histórico, ao longo do século XVI.
Sob a perspectiva moderna, a partir do século XIX, o vocábulo crônica, liberto
de sua conotação historicista, começou a revestir-se de sentido estritamente literário.
Beneficiando-se da ampla difusão da imprensa, nessa época, a crônica adere ao jornal. Ela
surge em 1799 nos “feuilletons” escrita por Julien-Louis Geoffroy no Journal de Débats,
que se publicava em Paris. Fazendo uma crítica diária da atividade dramática, esse
professor de Retórica cultivava uma forma ainda embrionária de crônica, evidente no fato
de reunir os seus artigos em seis volumes, sob o título de Cours de Littérature Dramatique
(1819 – 1820).
No Brasil, encontrou numerosos imitadores, surgidos após 1836 que, a priori,
traduziam o termo francês por “folhetim” e que, a partir da metade do culo, passaram a
utilizar o vocábulo crônica. Nomes como os de José de Alencar, Joaquim Manuel de
Macedo, Raul Pompéia, Júlia Lopes de Almeida, João do Rio, Lima Barreto, entre outros,
figuram na lista daqueles escritores que passaram a desenvolver o exercício da crônica,
cada vez mais preocupados em alcançar uma dimensão poética quanto ao registro
jornalístico dos fatos que marcaram sua época.
No entanto, a essa fase sucedeu a de esplendor na produção de crônicas,
iniciada por João do Rio (entre 1900 e 1920). A nova etapa alcança difusão e aceitação com
Rubem Braga, nos anos de 1930, e depois com escritores como Raquel de Queirós,
Fernando Sabino, Carlos Drummond de Andrade, Henrique Pongetti, Paulo Mendes
Campos e outros.
Embora originada na França, a crônica assumiu um caráter sui generis no
Brasil. Hoje, para nós, a crônica é, na maioria dos casos, prosa poemática, humor lírico,
53
fantasia etc., afastando-se do sentido de história, de documentário que lhe emprestaram os
franceses.(MOISÉS, 1987: 246)
Por conseguinte, a crônica, se gaulesa na origem, aclimatou-se no Brasil, mais
especificamente, no Rio de Janeiro. Tal naturalização não se concretizou sem profunda
transformação que explica o entusiasmo com que alguns estudiosos defendem a cidadania
brasileira da crônica, ao menos em relação à crônica tal como a conhecemos hoje, que
parece não haver igual em outras literaturas, salvo por influências de nossos
escritores.(MOISÉS, 1987: 246)
3.2.1 Conceito, estrutura e características da crônica jornalística
Dotada de uma ambigüidade ímpar, a crônica move-se entre ser no jornal e para
o jornal, uma vez que se destina, inicialmente, a ser lida na mídia impressa. Difere, porém
da matéria substancialmente jornalística naquilo em que, apesar de fazer do cotidiano o seu
húmus permanente, não visa à mera informação: o seu objetivo, confesso ou não, reside em
transcender o dia-a-dia pela universalização de suas virtualidades latentes. “O cronista
pretende-se não o repórter, mas o poeta ou o ficcionista do cotidiano, desentranhar do
acontecimento sua porção imanente de fantasia”.(MOISÉS, 1987: 247)
A crônica caminha, pois, entre a reportagem e a literatura, entre o relato
impessoal, frio e descolorido de um acontecimento trivial e a recriação do cotidiano por
meio da fantasia. Por conseguinte, brevidade é a primeira característica da crônica que, no
geral, é um texto curto de meia coluna de jornal ou de página de revista. Por ser um texto
publicado no jornal ou revista e ter a brevidade como característica fundamental, é a partir
do fato de ser breve que se refletem as outras características.(MOISÉS, 1987: 247; 245)
Outra marca da crônica é a subjetividade. Nela, o foco narrativo situa-se
invariavelmente na primeira pessoa do singular e a impessoalidade não é desconhecida
como rejeitada pelos cronistas: é sua perspectiva das coisas que lhes importa e ao leitor; a
veracidade positiva dos acontecimentos dá lugar à veracidade emotiva com que os cronistas
divisam o mundo.(MOISÉS, 1987: 255)
54
Com efeito, ela faz com que o diálogo com o leitor seja seu processo natural e,
por ser ao mesmo tempo voltado para o cotidiano e para a ressonância do “eu”, o cronista
estabelece um diálogo virtual com seu interlocutor mudo, mas sem o qual, sua incursão se
torna impossível. (MOISÉS, 1987: 256)
Uma vez que a crônica nasce em volta de muito pouco ou quase nada, podemos
dizer que é o estilo que a sustenta. Cronista sem estilo parece incongruência e é aqui que ele
se distancia mais uma vez do repórter. Entendido estilo como a linguagem, o idioleto; estilo
não como mero arranjo sintático, mas como instrumento de certa visão de mundo.
(MOISÉS, 1987: 256-57)
A crônica jornalística é a junção de literatura e texto jornalístico. Ela é dirigida
a um público específico que tem preferência pelo jornal em que é publicada. Centra-se em
retratar as notícias cotidianas relatadas em outras seções do jornal, mas de forma mais solta,
próxima da conversa entre dois amigos do que propriamente um texto escrito.
Neste trabalho, focalizamos a leitura de metáforas por meio da co-construção
negociada de sentidos num evento de leitura. Abordamos no item a seguir, resumidamente,
os construtos que nos auxiliam na análise dos eventos de leitura.
3.3 Estruturas participativas e revozeamento
Goffman (1984) estabeleceu aspectos interacionais que auxiliaram na
compreensão das relações sociais ocorridas nos eventos de leitura. Ele apresenta a
desconstrução da noção tradicional de falante/ ouvinte, mais especificamente do falante.
Para o autor, existem quatro posições diferentes ou status de participação (animador, autor,
figura e o principal), que são nódulos funcionais num sistema de comunicação e não papéis
sociais. (LEMOS, 2005:41)
Essas posições podem ser tanto ocupadas por pessoas diferentes, quanto por um
único indivíduo. Goffman ressalta que, numa conversa, aquele que se coloca no papel de
produtor de elocuções, é um animador. Esse animador, nesse caso, é também um autor e
responsável. situações, no entanto, em que ocorre a desconstrução do falante, ou seja,
55
ele pode não ser o autor. Se, por exemplo, leio uma crônica escrita por outrem, sou o
animador (o que fala), mas não o autor (criador), nem o principal (responsável).
Assim, os papéis interlocutivos que os interactantes podem ou não assumir nas
interações compõem os participant frameworks numa situação de interação social que pode
ou não ser ratificados pelo grupo social. A construção social dos sentidos em grupo se
estabelece nessas interações, em que ocorrem as influências dos participantes ao realizarem
trocas comunicativas.
O uso do construto de participant frameworks traz a possibilidade aos
participantes do evento de leitura do uso do conhecimento prévio de cada um, o que
promove uma maior interação entre eles, a partir da proposta de pensar alto em grupo. Já a
técnica discursiva do revoicing (revozeamento) proposta por O´Connor & Michaels,
(1996), que é outro construto de análise que vamos abordar, compreende uma técnica
discursiva que busca adequar os participantes do evento de leitura a determinados papéis
nos grupos de discussão dentro dos participant frameworks.
O revozeamento tem como função promover a reformulação, a criação de
alinhamentos e as oposições na argumentação. De acordo com o’Connor e Michaels (1996
apud LEMOS, 2005:44) esse construto é um tipo especial de reelaboração expressiva (oral
ou escrita) da contribuição do aluno realizada por outro participante da discussão. Assim,
o pesquisador, pode no grupo de discussão esclarecer, dar relevância, introduzir novas
terminologias para idéias familiares.
Ao utilizar a reformulação, o pesquisador pode reestruturar a frase do
participante que poderá ou não concordar com o revozeamento do pesquisador. Caso ele
concorde, o pesquisador poderá utilizar resumos, paráfrases ou expansões de enunciados
para que ele possa apresentar o aspecto mais significativo do que foi abordado. Isso pode
acontecer por meio de marcadores discursivos como então, por exemplo. Assim, de acordo
com Lemos (2005:46), o falante liga seu enunciado (utterance) ao do falante anterior a ele
e faz uma inferência autorizada com base no que ouviu desse falante (que tem a
oportunidade de concordar ou não com a inferência).
56
O uso do revozeamento legitima a voz do participante e permite ao pesquisador
adicionar ou reestruturar o material da fala do participante. Não nos esquecendo de que os
participantes desta pesquisa são professores, é relevante ressaltar que essa teoria é abordada
a partir da relação entre professor e alunos em sala de aula. Nesse enfoque, o uso dessa
técnica auxilia o desenvolvimento do senso crítico do aluno na leitura, ensinando-os a
negociar sentidos, a ouvir o outro e a argumentar. Ao utilizarmos essa técnica com
professores, podemos refletir sobre os modos como cada um se posiciona em relação aos
enunciados abordados no evento de leitura e como os participantes se relacionam entre si
(participant framework). A seguir, apresentamos o protocolo verbal em grupo.
3.4 O protocolo verbal em grupo
Entre as técnicas introspectivas que utilizamos neste trabalho estão os
questionários e o protocolo verbal. Na cnica do protocolo verbal, o informante deve
verbalizar seus pensamentos enquanto elabora os sentidos e revisa interpretações durante a
leitura de um determinado texto.
Canolla (2001:96) ressalta que o protocolo verbal, apesar ser um método de
introspecção que recebeu algumas críticas, trouxe também a possibilidade de lançar luzes
sobre alguns aspectos do processo de leitura que não haviam ainda sido investigados.
No protocolo verbal ou pensar alto, os sujeitos são instigados a dizer o que
pensam ao executar uma tarefa. Os sujeitos são solicitados a dizer tudo o que se passa em
sua cabeça, por mais trivial ou importante que isso lhes pareça. (cf. PALMA, 1998: 169)
Ao realizar a dupla tarefa (leitura e verbalização do pensamento) o sujeito pode
inferir processos em lugar de relatar a atividade realizada, omitir informações importantes
ou distorcê-las motivado por uma atitude cooperativa exacerbada. O sujeito pode ainda
relatar comportamentos que não foram vivenciados, com o objetivo de colaborar com o
pesquisador. Além disso, pode ocorrer também a interferência na qualidade dos dados
obtidos pela não adequação do instrumento de coleta pelo grau de interação e/ou
afetividade existente entre o pesquisador e o sujeito da pesquisa, ou ainda, a insuficiência
57
dos coletados como conseqüência de limitações cognitivas ou lingüísticas do informante ou
de ambas concomitantemente. (PALMA, 1998: 170)
O protocolo verbal individual, de acordo com Zanotto (1998), apresenta
limitações porque não propicia condições adequadas para que ocorra uma produção mais
rica de significação. Por esse motivo, essa autora propõe o protocolo verbal em grupo.
Assim, no sentido de superar as limitações apresentadas no protocolo verbal
individual, o GEIM (Grupo de Estudos da Indeterminação e da Metáfora) vem utilizando
uma modalidade do protocolo em grupo, no qual um pensar alto e colaborativo. Esse
protocolo caracteriza-se como um evento social de leitura, tendo como traço identificador a
ação e a reação de indivíduos por meio da linguagem, possibilitando a construção de
múltiplos sentidos para o texto, num processo altamente interativo e fruto de negociação,
ou seja, nessa técnica, os participantes do evento social de leitura trocam, negociam,
compartilham, constroem e avaliam diferentes leituras, por meio da interação. Neste
trabalho, optamos por utilizar o protocolo em grupo.
3.5 A pesquisa qualitativa
Além dos instrumentos apresentados, outros foram utilizados para
complementar os levantamentos dos dados a serem analisados: os sujeitos da pesquisa
responderam a questionário estruturado, objetivando caracterizá-los como leitores e a uma
auto-avaliação, visando a que se auto-apresentassem como leitores. (PALMA, 1998: 164).
Para Nunan (1992), a pesquisa qualitativa pressupõe a relatividade de todo
conhecimento, a existência da subjetividade no conhecimento e nos trabalhos de
investigação, cujas descobertas e resultados são aplicáveis somente nas situações e nos
contextos em que os dados foram coletados. Para Palma (1998:164), essa visão está de
acordo com Grotjahn no que diz respeito à
58
limitação da oposição quantitativa/qualitativa; reconhece-a, porém como
real, apontando que esses dois paradigmas sustentam-se em diferentes
concepções da natureza e do status do conhecimento, ou seja, evidenciam
a visão que se tem da realidade. Embora esse seja um aspecto filosófico,
é função da pesquisa ampliar o conhecimento do mundo demonstrando a
“verdade” do senso comum ao julgar a realidade.
Dentro desse enfoque, essa autora (1998:184) ressalta que, numa pesquisa
qualitativa, cujos dados são também qualitativos e a análise deles é interpretativa, há dois
procedimentos básicos na avaliação dos dados, a confiabilidade e a validade. O primeiro, a
confiabilidade, diz respeito à precisão dos instrumentos de medida, independentemente de
medir aquilo que se supõe medir. O segundo, a validade, diz respeito à extensão do que
medem os procedimentos de coleta de dados e do que eles pretendem ou supõem medir.
Para Nunan (1992), a validade tem a ver com o alcance do trabalho no sentido
de uma parte do estudo caracterizar o que seinvestigado no todo. Assim, para o autor
(1992:62-63), a validade pode ser interna ou externa. A validade interna refere-se à
interpretatividade da pesquisa, visto que ela diz respeito a elementos que podem afetar
diretamente os resultados da pesquisa. a validade externa trata do grau de generalização
dos resultados. Ela se relaciona à possibilidade desses resultados serem utilizados em
contextos diversos ao do estudo.
Como traço identificador da análise qualitativa, podem ser apresentados os
diversos estágios nos quais o observador identifica, delimita e classifica os segmentos
significativos do texto, segundo um esquema de organização (PALMA, 1998:190).
Esta pesquisa enfatiza aspectos como: a relevância do contexto em que se
realiza a tarefa; a relevância do significado que os sujeitos atribuem a si mesmos, ao grupo,
ao mundo e às experiências que vivenciam; a ênfase ao processo e não ao produto; a
importância da interação não dos sujeitos entre si, mas também do pesquisador com os
sujeitos; o uso da observação participante por estar o pesquisador, por meio da mediação,
interagindo na situação observada; o papel do pesquisador como instrumento fundamental
59
na coleta de dados; e o uso de dados descritivos em quantidade (situações, depoimentos,
diálogos etc, transcritos literalmente), além do uso da indução. (PALMA, 1998: 174-175).
Abordaremos a seguir a coleta de dados bem como seus procedimentos.
3.6 A coleta de dados e seus procedimentos
A coleta de dados desta pesquisa ocorreu durante os meses de agosto e
setembro de 2006. Eles foram coletados por meio de gravações em áudio e VHS e,
posteriormente transcritos, (vide anexo I) durante a realização do protocolo verbal em
grupo realizado com cinco professores do ensino médio no período noturno de uma escola
estadual localizada na zona sul da cidade de São Paulo–SP.
Antes de iniciarmos o protocolo verbal em grupo, foi entregue a cada professor
um questionário para que pudesse ser construído o perfil dos participantes (vide anexo III)
dessa pesquisa. Os professores responderam ao questionário juntos no dia 29 de agosto de
2006 na própria escola durante o HTPC (horário de trabalho pedagógico coletivo).
No dia 08 de setembro, a pesquisadora se reuniu com o grupo de professores
convidados em uma sala de aula vazia no período noturno para a realização do protocolo. A
crônica selecionada foi A verdade está na cara, mas não se impõe de Arnaldo Jabor
publicada no jornal O Povo em 25 de abril de 2006. Foi entregue a cada professor uma
cópia da referida crônica e a pesquisadora solicitou que, após a leitura, os professores
iniciassem uma discussão a respeito do texto lido. Essa primeira leitura foi silenciosa e
individual.
Os professores foram informados que, caso julgassem necessário, poderiam
anotar observações durante esse primeiro contato com o texto. A gravação foi iniciada
quando a pesquisadora percebeu que todos haviam lido o texto. Apesar do grupo restrito,
a pesquisadora verificou que nem todos participaram da discussão de forma ativa, ainda
assim a discussão ocorreu de forma bastante cooperativa. Ela foi gravada com o
conhecimento e o consentimento dos professores participantes.
60
Na transcrição dos dados, todas as vezes que não foi possível identificar a voz
que se manifestava na discussão, foi registrado o sinal (?) para indicar (leitor não
identificado), que, por vezes, a discussão se acalorava e muitos falavam ao mesmo
tempo.
Ao fazer a transcrição do protocolo verbal em grupo, decidimos não utilizar os
símbolos usuais na transcrição para deixá-la mais “limpa” e legível. Para isso,
fundamentamo-nos em Marcuschi (2003:9) que afirma que a transcrição deve ser limpa e
legível, sem sobrecarga de mbolos complicados e que não uma melhor forma de
transcrição, todas são mais ou menos boas. Assim, cabe a quem analisa os dados coletados,
definir, de acordo com seus objetivos, o que lhe for conveniente.
No dia 01 de dezembro de 2006, ou seja, após a realização do protocolo verbal
em grupo, foi entregue aos professores participantes um questionário (vide anexo IV)
estruturado para que respondessem antes do início das aulas do período noturno. Esse
questionário verificou a opinião de cada participante sobre o uso de jornal, de crônicas, de
textos paradidáticos e de textos em que ocorrem metáforas, em suas aulas.
Como a primeira coleta foi realizada sem o uso do revozeamento, em 07 de
julho de 2007, realizamos outra coleta de dados por meio da realização do protocolo verbal
em grupo. O texto utilizado foi o mesmo da coleta anterior e os procedimentos de
transcrição seguiram o mesmo padrão usado anteriormente. Nessa segunda coleta não
tivemos a participação de C., que não concordou em participar novamente da pesquisa. Em
seu lugar, tivemos a participação de Ly. que respondeu o perfil e o questionário no mesmo
dia da coleta. Novamente, a discussão foi gravada com o conhecimento e o consentimento
dos professores participantes.
Apesar de esta pesquisa estar focada na co-construção negociada de sentidos
durante um evento de leitura, não podemos negar o fato de que tanto os participantes
quanto a pesquisadora estão inseridos num ambiente educacional. Nesse caso, nosso
objetivo maior sempre será a melhoria da qualidade das nossas aulas. No item a seguir,
descrevemos os sujeitos da pesquisa.
61
3.6.1 Os sujeitos da pesquisa
Os professores selecionados ministram as disciplinas de Inglês, Matemática,
Biologia, Química, Geografia e Física para o ensino médio. Todos os participantes
trabalham em mais de um emprego. Quatro deles estudaram em escolas particulares e dois
estudaram em escolas públicas durante o ensino fundamental e médio na cidade de São
Paulo. Todos estudaram em faculdades particulares da Grande São Paulo e apenas dois
participantes possuem apenas o grau superior completo. Segue abaixo um quadro com as
características da formação escolar dos participantes da pesquisa:
Participante Disciplina
Cursou Ensino
Fundamental
Cursou
Ensino Médio
Cursou
Faculdade
Grau de
Instrução
C. Química Público Público Particular Especialização
G. Biologia Particular Particular Particular Especialização
H. Matemática Particular Particular Particular Especialização
L. Geografia Público Público Particular Especialização
Ly. Física Particular Particular Particular Graduação
M. Inglês Particular Particular Particular Graduação
Quadro 1.1 Formação escolar dos professores participantes da pesquisa
Uma das perguntas do questionário que os professores responderam estava
relacionada à forma como a leitura foi trabalhada durante o tempo em que freqüentaram o
ensino fundamental, o ensino médio e o ensino superior. As respostas permitiram-nos
perceber que, em todos os casos, a leitura foi abordada de forma semelhante. Tanto no
ensino fundamental, quanto no ensino médio, de um modo ou de outro, a leitura foi sempre
acompanhada de uma avaliação. Já a leitura referente ao ensino superior estava voltada para
a literatura específica da área de cada um. No quadro a seguir temos as respostas de cada
professor:
Como foi trabalhada a leitura nessa etapa escolar?
Participante
Ensino Fundamental Ensino Médio Ensino Superior
62
C. Leitura e Prova Leitura e Prova Livros
específicos
G. Leitura individual com
avaliação individual (livros
determinados pelo
professor).
Leitura individual com
avaliação individual
(vestibular).
Livros técnicos
com gráficos,
tabelas e
figuras.
H. Semanalmente Leitura e
prova
Leitura + prova Leitura técnica/
Jornais/
Revistas
L. Leitura e resumo dos
clássicos da literatura
mundial.
Literatura específica do
curso profissionalizante.
Literatura
específica da
Geografia/
História
Ly. Tinha aulas de gramática e
redação. Não lembro de
durante as aulas termos feito
ou destinado algum tempo
para a leitura. Fazíamos
prova de livros paradidáticos,
que líamos, o prof° pedia
para que respondêssemos ao
questionário que o livro
continha.
Da mesma forma (quase)
que no Ensino
Fundamental, sendo que
tivemos a inserção da
Literatura o que fez com
que tivéssemos a
oportunidades de lermos
um pouco mais.
foi que
piorou. Não
líamos textos, a
menos que
fossem os
textos que
precedem novos
conteúdos.
M. A leitura era feita por
bimestre e a avaliação era
dada em forma de teste.
A leitura foi trabalhada
com trabalhos e provas
orais.
Leitura feita
com seminários.
Quadro 1.2 Como foi trabalhada a leitura em cada etapa escolar dos
participantes da pesquisa
Ao serem questionados a respeito dos seus hábitos de leitura, todos os
entrevistados afirmam que gostam de ler crônicas. Eles se julgam bons leitores e encaram a
63
leitura com satisfação, para eles a leitura é presença constante no dia-a-dia, com exceção de
Ly. que tem a leitura como um ato esporádico e não se julga um bom leitor. O participante
justifica que primeiro não tenho o costume de ler todos os dias e depois porque não dou
sempre “atenção” ao texto lido. Quando perguntados a respeito do lugar preferido para ler,
a casa foi citada por todos. O quadro abaixo mostra os hábitos de leitura dos participantes
da pesquisa:
Participante
Gosta de
Ler?
Gosta de
Ler
crônicas?
Como
você
encara a
leitura?
Na rotina,
a leitura é
um ato:
Onde
costuma
ler?
Você se
julga
um bom
leitor?
C. Sim Sim
Com
satisfação
Constante Casa Sim
G. Sim Sim
Com
satisfação
Constante Casa, na
cama
Sim
H. Sim Sim
Com
satisfação
Constante Casa Sim
L. Sim Sim
Com
satisfação
Constante Casa/
Biblioteca
Sim
Ly. Sim Sim
Com
satisfação
Esporádico
Casa Não
M. Sim Sim
Com
satisfação
Constante Casa Sim
Quadro 1.3 Os hábitos de leitura dos participantes da pesquisa
Por fim, foi perguntado aos participantes da pesquisa quais eram, para eles, as
características de um bom leitor. A definição dada por cada professor está transcrita no
quadro abaixo:
Participante
Quais são as características de um bom leitor?
C. Ler e compreender um texto.
G. Compreender o texto, relacionar com fatos e analisar o conteúdo (filtrar
64
idéias, “conversar” com o texto).
H. Aquela pessoa que diferentes livros, jornais, revistas de diferentes
gêneros.
L. Atenção, concentração, gosto pela leitura, curiosidade.
Ly.
- Assiduidade (freqüência na leitura);
- Fazer análise posterior do que foi lido;
- Fazer Anotação ou grifar as partes a serem analisadas.
M. Um bom leitor tem de saber ler, interpretar o que para poder opinar,
discutir e debater.
Quadro 1.4 As características de um bom leitor de acordo com os participantes da pesquisa
Ao apresentarmos os dados acima, objetivamos delinear o perfil dos sujeitos
desta pesquisa no que diz respeito ao histórico e aos seus hábitos de leitura. Pudemos
perceber que a leitura está presente no cotidiano de cada um. Eles gostam de ler e têm o
hábito de fazê-lo com freqüência. Todos têm a imagem de um leitor ideal, do bom leitor.
Em concordância com a imagem que cada um tem do que é ser um bom leitor, com a
exceção de Ly., todos se consideram bons leitores.
No dia 01 de setembro de 2006, foi entregue aos participantes da pesquisa um
questionário que perguntava como cada um abordava a questão da leitura e do uso da
crônica em sala de aula. Ly. respondeu a esse questionário em 07 de julho de 2007. Nos
quadros a seguir, apresentamos as respostas dadas por cada participante e, no capítulo de
análise, apontamos as contradições existentes entre a fala e a prática pedagógica de cada
participante.
Participante Qual a sua opinião sobre o uso do jornal em sala de aula?
C. Na minha área, não vejo necessidade.
G. Importante. O jornal tem uma linguagem própria, bastante diferente do livro
didático. È possível contextualizar todas as áreas de conhecimento.
H. Importante, pois deixa os alunos atualizados nos assuntos do dia-a-dia,
fazendo com que eles usem o senso crítico e reflitam sobre os
65
acontecimentos do seu cotidiano.
L. No meu caso, Geografia, é ótimo, pois além de manter os alunos
informados, eles têm contato com várias opiniões, de vários profissionais e
de entidades diferentes.
Ly. É um meio de inserir conteúdos do cotidiano em sua disciplina. Ajuda o
aluno a fazer conexão entre o que acontece no dia-a-dia com o que ele está
estudando.
M. Acredito que jornal em sala de aula seja uma ferramenta muito importante
para aulas de língua e estrutura gramatical.
Quadro 1.5 A opinião dos participantes da pesquisa sobre o uso do jornal em sala de aula
Participante
Na sua opinião, qual o melhor tipo de texto para ser trabalhado na sua
disciplina?
C. Tabelas e gráficos.
G. Na área de Ciências/Biologia gosto de usar infográficos, notícias científicas
e textos científicos.
H. Gráficos, textos de economia, tabelas, textos que façam pensar e concluir
idéias além de extrair dados para a realização de uma atividade teórica-
prática
L. Artigos de opinião, editoriais e charges.
Ly. Textos que tratem de economia, pois geralmente trazem assuntos que tenham
cálculos como porcentagem e estatística.
M. Na minha disciplina o melhor texto a ser trabalhado é a propaganda.
Quadro 1.6 A opinião dos participantes sobre o melhor tipo de texto para ser trabalhado na
sua disciplina
Participante O que você acha do uso da crônica em sala de aula?
C. Acho bom, mas não se aplica na minha disciplina.
G. Não utilizo porque não acho textos que possam estar fazendo ganchos (os
temas são limitados).
66
H. Um bom meio para a maior interação dos alunos, desde que eles saibam o
que é crônica.
L. Para mim, para trabalhar se a crônica for direcionada para a
Geografia, pois caso contrário, eu não faço a ponte entre português e
geografia.
Ly. Ainda não consegui enxergar” uma relação entre crônicas e minha
disciplina, por isso não utilizo.
M. Muito importante, mas não utilizo em Inglês, pois em minhas aulas não
ainda como trabalhar crônicas com os alunos.
Quadro 1.7 O uso da crônica em sala de aula
Participante Para você, qual a importância da leitura de textos paradidáticos em
sala de aula?
C. Muito importante.
G. Fundamental. Aumenta o vocabulário, o conhecimento geral e dá
oportunidades de conhecer novas estruturas de frases.
H. É muito bom, pois mostra aos alunos na prática, a teoria que eles aprendem.
L. Enorme, pois auxiliam na discussão sobre os vários temas que trabalho e
mostram outros ângulos de um mesmo assunto.
Ly. De extrema importância, pois é um método diferenciado de ensino que foge
da rotina e faz com que os alunos vejam o mundo que o cerca por outro
ângulo.
M. Leitura paradidática é extremamente necessária.
Quadro 1.7 A importância da leitura de textos paradidáticos em sala de aula
Participante Você utiliza textos paradidáticos em suas aulas? Quais?
C. Não.
G. Sim. Seleciono na Internet e, se for necessário, faço pequenas autorizações.
H. Sim, jogos matemáticos, história da matemática.
L. Sim, jornais, revistas, letras de música, poemas, artigos de opinião e, às
67
vezes, de outras matérias afins.
Ly. Sim. Geralmente, textos tirados da Internet.
M. Às vezes.
Quadro 1.8 Utilização de textos paradidáticos em sala de aula
Participante Descreva a metodologia utilizada por você, em sala de aula, para
trabalhar textos paradidáticos.
C. Não trabalho textos paradidáticos.
G. Primeiramente os alunos fazem leitura silenciosa, retiram palavras
desconhecidas e procuram no dicionário. É feito então, outra leitura,
coletiva, parando a cada parágrafo, para discutir o texto.
H. Utilizo jogos matemáticos para fazer os alunos compreenderem melhor a
teoria, deixando a aula mais dinâmica e saindo da rotina.
L. Leitura individual, leitura em grupo, discussão, formação de opinião, debate
para avaliar.
Ly. Entrego os textos, peço que os alunos leiam, isso antes de dizer sobre qual
assunto da matéria estaremos discutindo. Depois, fazemos uma análise e
eles chegam a conclusão se estavam certos ou não sobre suas suposições.
Depois direciono-os para tirar as informações que gostariam que tirassem.
M. Levantamento do vocabulário inglês e habilidade da escrita.
Quadro 1.9 Metodologia utilizada pelos participantes da pesquisa para trabalhar textos
paradidáticos em sala de aula
Participante Você acha que o uso de textos em que haja metáforas auxilia no
processo de leitura? Porquê? Explique.
C. (Não respondeu)
G. Acho que se a metáfora estiver de acordo com a faixa etária e fizer parte da
realidade do aluno, sim.
68
H. Sim, desde que as metáforas estejam embutidas no seu cotidiano, deixando
a leitura mais clara e um texto mais limpo e conciso.
L. Gosto, mas nem sempre funciona devido às dificuldades dos alunos.
Dificuldades essas, de abstração.
Ly. Sim. Porque “faz” o aluno estabelecer relações. E é de extrema importância
que o aluno leia, reflita e faça conexões entre o que está lendo, com algo
que já foi lido e com o conhecimento que ele já possui.
M. Acho importante, pois textos com metáforas podem resultar em uma maior
compreensão e um melhor desempenho da habilidade escrita.
Quadro 1.10 Opinião dos participantes as pesquisa sobre se o uso de textos em que haja
metáforas auxilia no processo de leitura
Participante Qual é o papel da leitura na formação do aluno?
C. (Não respondeu)
G. Fundamental. Aumenta o vocabulário, a possibilidade de conhecer novos
gêneros de linguagem, expandir horizontes. Tudo isso favorece a
compreensão do conteúdo e assimilação do mesmo porque contextualiza e
torna-se relevante.
H. Fundamental, pois o aluno que não perde muito no processo de
aprendizagem, a leitura ajuda muito o aluno a adquirir o senso crítico e a
ganhar mais cultura.
L. Importantíssimo. O Aluno que lê, escreve melhor, se expressa melhor e
compreende o conteúdo da minha matéria com mais facilidade.
Ly. A leitura é fundamental na formação do CIDADÃO. O homem tem que ser
capaz de ler e compreender o que leu para exercer sua cidadania. Ler e
compreender são atos que vão muito além do que as pessoas acham que é.
Ler não é juntar sílabas e compreender é mais que conhecer o significado
das palavras. Se a leitura abrange a capacidade de compreensão; logo é algo
que conduz o aluno a se tornar um cidadão com capacidade de desenvolver
o senso crítico e “tentar” melhorar a sociedade em que vive.
69
M. A leitura gera ao aluno a possibilidade de argumentação, discussão e
melhor desenvolvimento da escrita.
Quadro 1.11 Opinião dos participantes sobre o papel da leitura na formação do aluno
Nesta pesquisa, por tratar da leitura com professores, não podemos deixar de
lado a visão de cada participante sobre o que é ser um bom leitor, a auto-imagem que têm
como leitores e a prática pedagógica de cada um em sala de aula, pois são fatores
interligados que interferem no desempenho desses professores em formar bons leitores.
Assim, não podemos também deixar de verificar que a formação que cada um teve durante
toda a sua vida escolar influencia sua visão de como utilizar estratégias para a formação de
alunos leitores. Dessa forma, no capítulo a seguir analisaremos os dados coletados nessa
pesquisa.
70
_________________________________________________
Capítulo IV
Análise dos eventos sociais de leitura
“Essa modalidade de protocolo em grupo, é, na
verdade, um evento social de leitura, no qual os
leitores, numa interação face-a-face, partilham,
negociam, constroem e avaliam as diferentes
leituras. É uma prática leitura aparentemente
muito simples, mas que pode ter implicações
muito complexas e relevantes”.
(Mara Sophia Zanotto)
71
Com vistas a analisar a leitura de metáforas em crônicas jornalísticas,
escolhemos uma crônica de Arnaldo Jabor. Como, nesse trabalho, baseamo-nos na
perspectiva de que o conhecimento é ativado por uma teia de proposições que são ativadas
durante o processo de leitura, assim, optamos por utilizar o protocolo verbal em grupo. Essa
técnica foi aplicada com o objetivo de coletar as impressões e considerações dos
professores a respeito do texto lido, além de observar como eles, em conjunto, construíram
a compreensão durante a leitura e discussão do texto.
Na primeira coleta de dados (A), a participação da pesquisadora foi nima.
Sua atuação como mediadora ocorreu por meio de perguntas e inferências que não foram
bem sucedidas. Assim, na busca de resolver esse problema, foi realizada uma segunda
coleta (B), nela, foi aplicada a técnica do revozeamento e a pesquisadora participou mais
ativamente do protocolo.
Assim, durante a análise de ambas as coletas, com o objetivo de descobrir quais
tipos de relações se estabelecem entre a metáfora e as manifestações dos leitores no
processo de interpretação, procuramos responder às seguintes perguntas:
Quais foram os sentidos construídos pelos leitores?
Quais conceitos metafóricos serviram de base para a construção dos
sentidos?
Destacamos que desde o início da coleta A, os participantes apresentaram suas
posições políticas. Não era nosso objetivo apresentar a posição político-partidária dos
participantes, mas, após a transcrição dos dados, percebemos que esse posicionamento
influenciou na atuação de cada um. Inclusive, devido a divergências ideológicas, a
participante C., recusou-se a participar da coleta B e foi substituída. Assim, consideramos
relevante ressaltar que, enquanto M., G. e H. posicionaram-se contra o governo, C. e L.
posicionaram-se a favor.
Esse fato não aconteceu, de forma tão incisiva, na coleta B, na qual a
pesquisadora participou de forma ativa. Esse fato suscitou mais algumas perguntas que
72
procuramos responder ao final da análise das duas coletas, quando as confrontamos junto
com o questionário e o perfil dos informantes:
O posicionamento político de cada participante influenciou na atuação
de cada um? De que forma isso ocorreu?
divergência entre as respostas dadas no questionário e no perfil dos
informantes e o desempenho de cada um nos eventos de leitura?
O abrandamento dos ânimos na coleta B deveu-se ao fato da
participação ativa da pesquisadora que direcionou por vezes a discussão,
ou pela ausência de C.?
A seguir, transcrevemos a crônica utilizada para o evento de leitura. logo após,
apresentamos a análise dos dados da primeira coleta e, em seguida, a análise dos dados da
segunda coleta, além de apresentar o resultados das duas coletas e confrontá-los com as
respostas dadas no questionário e no perfil dos informantes.
4.1 A verdade está na cara, mas não se impõe.
Arnaldo Jabor
Disponível em <http://www.opovo.com.br/opovo/colunas/arnaldojabor/588240.html>
acesso em 28 ago 2006.
O que foi que nos aconteceu? No Brasil, estamos diante de acontecimentos
inexplicáveis, ou melhor, “explicáveis” demais. Toda a verdade foi descoberta, todos os
crimes provados, todas as mentiras percebidas. Tudo aconteceu e nada acontece. Os
culpados estão catalogados, fichados, e nada rola. A verdade está na cara, mas a verdade
não se impõe. Isto é uma situação inédita na História brasileira.
Claro que a mentira sempre foi a base do sistema político, infiltrada no labirinto
das oligarquias, claro que não esquecemos a supressão, a proibição da verdade durante a
ditadura, mas nunca a verdade foi tão límpida à nossa frente e, no entanto, tão inútil,
impotente, desfigurada, broxa.
73
Os fatos reais: com a eleição de Lula, uma quadrilha se enfiou no governo e
desviou bilhões de dinheiro público para tomar o Estado e ficar no poder 20 anos. Os
culpados são todos conhecidos, tudo está decifrado, os cheques assinados, as contas no
estrangeiro, os tapes, as provas irrefutáveis, mas o governo psicopata de Lula nega e ignora
tudo. Questionado ou flagrado, o psicopata não se responsabiliza por suas ações. Sempre se
acha inocente ou vítima do mundo, do qual tem de se vingar. O outro não existe para ele e
não sente nem remorso nem vergonha do que faz. Mente compulsivamente, acreditando na
própria mentira, para conseguir poder. Este governo é psicopata.
Seus membros riem da verdade, viram-lhe as costas, passam-lhe a mão na
bunda. A verdade se encolhe, humilhada, num canto.
E o pior é que o Lula, amparado em sua imagem de “povo”, consegue
transformar a Razão em vilã, as provas contra ele em acusações “falsas”, sua condição de
cúmplice e comandante em “vítima”. E a população ignorante engole tudo.
Como é possível isso? Simples: o Judiciário paralítico entoca todos os crimes
na fortaleza da lentidão e da impunidade. daqui a dois anos serão julgados os indiciados
— nos comunica o STF. Os delitos são esquecidos, empacotados, prescrevem. A Lei
protege os crimes e regulamenta a própria desmoralização. Jornalistas e formadores de
opinião sentem-se inúteis, pois a indignação ficou supérflua. O que dizemos não se escreve,
o que escrevemos não se finca, tudo quebra diante do poder da mentira desse governo. Sei
que este é um artigo óbvio, repetitivo, inútil, mas tem de ser escrito...
Está havendo uma desmoralização do pensamento. Deprimo-me: “Denunciar
para quê, se indignar com quê? Fazer o quê?”. A existência dessa estirpe de mentirosos está
dissolvendo a nossa língua. Este neocinismo está a desmoralizar as palavras, os raciocínios.
A língua portuguesa, os textos nos jornais, nos blogs, na TV, rádio, tudo fica ridículo diante
da ditadura do lulo-petismo. A cada cassado perdoado, a cada negação do óbvio, a cada
testemunha, muda, aumenta a sensação de que as idéias não correspondem mais aos fatos!
Pior: que os fatos não são nada — só valem as versões, as manipulações.
74
No último ano, tivemos um único momento de verdade, louca, operística,
grotesca mas maravilhosa, quando o Roberto Jefferson abriu a cortina do país e deixou-nos
ver os intestinos de nossa política.
Depois surgiram dois grandes documentos históricos: o relatório da CPI dos
Correios e o parecer do procurador-geral da República. São verdades cristalinas, com sol a
pino. E, no entanto, chegam a ter um sabor quase de “gafe”. Lulo-petistas clamam: “Como
é que a Procuradoria Geral, nomeada pelo Lula, tem o desplante de ser tão clara! Como que
o Osmar Serraglio pode ser tão explícito, e como o Delcídio Amaral não mentiu em nome
do PT? Como ousaram ser honestos?”.
Sempre que a verdade eclode, reagem. Quando um juiz condena rápido, é
chamado de “exibicionista”. Quando apareceu aquela grana toda no Maranhão (lembram,
filhinhos?), a família Sarney reagiu ofendida com a falta de “finesse” do governo de FH,
que não teve a delicadeza de avisar que a polícia estava chegando...
Mas agora é diferente. As palavras estão sendo esvaziadas de sentido. Assim
como o stalinismo apagava fotos, reescrevia textos para coonestar seus crimes, o governo
do Lula está criando uma língua nova, uma novi-língua empobrecedora da ciência política,
uma língua esquemática, dualista, maniqueísta, nos preparando para o futuro político
simplista que está se consolidando no horizonte. Toda a complexidade rica do país será
transformada em uma massa de palavras de ordem, de preconceitos ideológicos movidos a
dualismos e oposições, como tendem a fazer o populismo e o simplismo. Lula será eleito
por uma oposição mecânica entre ricos e pobres, dividindo o país em “a favor” do povo e
“contra”, recauchutando significados que não dão mais conta da circularidade do mundo
atual. Teremos o “sim” e o “não”, teremos a depressão da razão de um lado e a psicopatia
política de outro, teremos a volta da oposição mundo x Brasil, nacional x internacional. A
esquematização dos conceitos, o empobrecimento da linguagem visa à formação de um
novo ethos político no país, que favoreça o voluntarismo e legitime o governo de um Lula 2
e um Garotinho depois.
Assim como vivemos (por sorte...) três anos sem governo algum, apenas
vogando ao vento da bonança financeira mundial, espero que a consolidação da
75
economia brasileira resista ao cerco político-ideológico de dogmas boçais e impeça a
desconstrução antidemocrática. As coisas são mais democráticas que os homens.
Alguns otimistas dizem: “Não... este maremoto de mentiras nos dará uma fome
de verdades!”. Não creio. Vamos ficar viciados na mentira corrente, vamos falar por
antônimos. Ficaremos mais cínicos, mais egoístas, mais burros.
O Lula reeleito será a prova de que os delitos compensaram. A mentira será
verdade, e a novi-língua estará consagrada.
4.2 Análise dos dados da coleta A
A partir do pressuposto de que o conhecimento é visto como uma teia de
proposições que são ativadas durante o processo de leitura, optamos por coletar os dados
desta pesquisa em um evento coletivo. Assim, procuramos observar como ocorreu a co-
construção negociada de sentidos entre os participantes da pesquisa.
Para realizar essa coleta, optamos por realizar o protocolo verbal em grupo
que essa técnica permite que os participantes do evento social de leitura troquem,
negociem, compartilhem, construam e avaliem diferentes leituras, por meio da interação.
Assim, neste item apresentaremos a análise do material empírico coletado por
meio de gravações em áudio e VHS de interações entre professores, lendo a crônica: A
verdade está na cara, mas não se impõe de Arnaldo Jabor.
Durante a realização dessa primeira coleta, a discussão, por vezes, manteve-se
no campo ideológico e, em muitos momentos, os ânimos se exaltaram. Por esse motivo, a
pesquisadora teve que apontar alguns pontos (poucos) da crônica para que fossem
discutidas pelo grupo. Ainda assim, os participantes, muitas vezes, não discutiram os
pontos apontados, mas utilizaram-nos para fundamentar suas visões ideológicas.
Após alguns minutos de leitura silenciosa e individual, a pesquisadora iniciou,
com o consentimento de todos, a gravação. Os participantes, então, iniciaram uma conversa
sobre o texto. Sem a efetiva participação da pesquisadora nessa primeira coleta, os
76
participantes utilizaram o texto para uma discussão político-ideológica, visto que na época,
estávamos em plena campanha eleitoral para cargos importantes nos Poderes Legislativo e
Executivo.
M. inicia a conversa apresentando sua visão do autor e a partir daí desenrola-se
a discussão:
RECORTE 1
2. M.: O Arnaldo Jabor é: Eu estou trabalhando para olhar os podres dos outros,
principalmente da política, para mostrar para vocês Eu enxergo o Arnaldo Jabor assim,
qualquer crônica ou crítica que ele fazer, tanto para criticar ou para elogiar, vai ser
sempre cutucando a onça com vara curta...
3. G.: Ele fala sobre o governo Lula, sobre os fatos que ocorreram, os podres do
governo...
4. C.: Na verdade, do que eu entendi, ele não fala do que ocorre no governo Lula,
como ele coloca aqui. Ele sempre tem alguma coisa para dizer de ruim e ele vai criticar
todos os governos. Ele não disse coisas ruins do governo Lula. Nessa crítica aqui ele
foi mais contundente por causa do escândalo, foi essa roubalheira toda...Isso é normal.
Ocorreram em todos os governos brasileiros.
Nesse trecho, percebemos que M. utiliza a narrativa em primeira pessoa como
forma de preservação da própria face, retomando a voz do locutor. Nesse trecho, ela faz
uma apresentação geral do texto indicando que esse autor tem como característica, escrever
textos polêmicos. G., em seguida, atesta que o texto apresenta e critica o governo Lula”,
tese que é contestada por C. argumentando que ele não fala do que ocorre no governo
Lula”, ele vai criticar todos os governos”. Aqui, foi ativado o conceito metafórico O
GOVERNO É UMA ENTIDADE metáfora ontológica que se especifica em O
GOVERNO É UMA ENTIDADE PESSOA (personificação que é um tipo de metáfora
ontológica), nesse caso, o próprio presidente Lula.
77
Esse mesmo conceito é retomado quando a pesquisadora interfere e aponta para
o enunciado Este governo é psicopata:
RECORTE 2
32. P: Como você me explica essa analogia que o Jabor faz com esse governo
psicopata?
33. G.: Que não se entende nada... Eu não vi nada, não sei de nada. Ele se coloca em
uma situação de coitado. Não fez nada...Coitado...foge do assunto, por isso ele diz que é
um psicopata...Aconteceu tudo isso e eu não sei de nada...Não foi comigo...
34. H.: Eu não matei, não roubei...
35. L.: O Debate, ele não foi em nenhum debate com outros candidatos, ele não vai
mais. Ele não responde...
Nesse trecho, G. explica porque o autor compara o governo a um psicopata.
Aqui ocorre novamente a ativação do conceito metafórico O GOVERNO É UMA
ENTIDADE, por meio da personificação o governo é homem. Nesse caso, G. utiliza
negativas para representar a fala de Lula, que ele é “coitado” ele “não
nada”, não
“sabe de nada”, “foge do assunto”. Assim, G. apresenta, por meio da ironia criada pela
negação, uma forte crítica ao presidente. Em concordância, H. complementa com “Eu não
matei, não
roubei”. Ambos utilizam o recurso da narrativa em primeira pessoa para destacar
a fala do presidente e acentuar o tom de ironia na crítica que fazem. L. finaliza,
empregando o mesmo recurso do uso da negação para complementar o que foi dito por G. e
H.: “ele não
foi em nenhum debate com outros candidatos, ele não vai mais. Ele não
responde”. Nesse caso, percebemos, que, ao contrário de G. e H., L. usa o pronome ele,
distancia-se do foco narrativo e destaca pontos em que o presidente, de acordo com ela,
tomou atitudes das quais ela discorda.
Após um período de silêncio, a pesquisadora intervém novamente e apresenta
outro enunciado Seus membros riem da verdade, viram-lhe as costas, passam-lhe a mão na
bunda. A verdade se encolhe, humilhada, num canto. Ele, no entanto, foi ignorado pelos
participantes que discutiram o enunciado São verdades cristalinas, com sol a pino. E, no
entanto, chegam a ter um sabor quase de gafe”. Lulo-petistas clamam: “Como é que a
78
Procuradoria Geral, nomeada pelo Lula, tem o desplante de ser tão clara! Como que o
Osmar Serraglio pode ser tão explícito, e como o Delcídio Amaral não mentiu em nome do
PT? Como ousaram ser honestos?” e voltaram para o enunciado Este governo é psicopata.
Assim, evidencia-se, pela rejeição da intervenção da pesquisadora, que a
mediação não se concretiza.
RECORTE 3
M.: O Lula teve o desplante de dizer...como é que pode o Delcídio não mentiu. Como
ousar ser honesto? Ser honesto vai ser contra o que ele diz, vou ser honesto, vou deixar
de ser um psicopata. Vou deixar de ser aquela pessoa que não vê, ou que deu amnésia.
Eu não posso ser honesta, a partir do momento que eu sou honesta, eu digo é verdade,
eu roubei, eu tirei de vocês para ficarmos mais no poder, seja lá qual for o motivo...eu
vou deixar de ser aquela pessoa que não sabia de nada, que não tinha noção do que
aconteceu, igual qualquer criminoso, ele fala, mas eu não fiz isso.
L.: Você imagina, cria um mundo de mentira e começa a acreditar naquilo. Eu não fiz...
M.: Sou psicopata. Você cria uma situação e passa a acreditar naquilo.
Nesse recorte, M. utiliza novamente a narrativa em primeira pessoa, com base
na pressuposição eu não posso ser honesta, a partir do momento que eu sou honesta, eu
digo é verdade, eu roubei, eu tirei de vocês para ficarmos mais no poder”. Por meio da
preservação da face, ela assume a voz do locutor e assim ironiza a indignação do presidente
pelo fato de um dos acusados ter dito a verdade. A distorção do que seria socialmente
aceito, ou seja, a verdade é aceitável e a mentira é condenável, torna-se mais clara.
L. retoma o assunto e acrescenta que a relação entre o governo e um psicopata
está no fato de que ambos criam uma mentira e passam a acreditar nela como uma verdade.
Essa citação é confirmada na seqüência por M.: “Sou psicopata. Você cria uma situação e
passa a acreditar naquilo”.
Ao analisar os recortes 2 e 3, percebemos que, no que diz respeito ao que é
aceito na sociedade ocidental, a verdade é positiva e a mentira é negativa, ocorre
aparentemente o contrário. Assim, o que em nosso meio é aceito MAIS É MELHOR (mais
79
verdade é melhor), acaba sofrendo uma inversão MENOS É MELHOR (menos verdade é
melhor). Como podemos perceber as implicações construídas nesses dois trechos pelos
participantes, levam ao conceito metafórico MENOS É MELHOR, o que pode ser
justificado pela presença da ironia na fala da participante.
O enunciado No último ano, tivemos um único momento de verdade, louca,
operística, grotesca mas maravilhosa, quando o Roberto Jefferson abriu a cortina do país
e deixou-nos ver os intestinos de nossa política, foi o único a ser discutido, ainda que
superficialmente, sem a intervenção da pesquisadora:
RECORTE 5
48. L.: Não sei se é impressão minha, mas assim::: o Jabor diz que isso tudo é graças ao
Roberto Jefferson né, porque ele que colocou, abriu a cortina da:::, como é que ele
coloca...do destino...
49. H.: como se a política fosse de enxergar
50. M.: Ele coloca que graças a ele começou-se a enxergar tudo... Nos outros governos
havia a mesma coisa e a gente não sabia. Achava que... supunha, mas não sabia. ele
fala da democracia. Que falsa democracia que é essa? Que país democrático é esse, que
tanto se fala em democracia e não tem...
Tanto no turno 48 quanto no 50, ocorre o uso do pronome ele para referir-se à
duas pessoas. L. faz referência ao Roberto Jefferson em “porque ele que colocou, abriu a
cortina da:::”, e ao Jabor em “como é que ele coloca...do destino.” Assim como M. que
também utiliza o pronome ele para fazer referência aos dois: “Ele (Jabor) coloca que graças
a ele (Roberto Jefferson) começou-se a enxergar tudo”. Isso ocorreu porque os participantes
se apoiaram no texto e a diferenciação entre ele (Jabor) e ele (Roberto Jefferson) ficou clara
para o grupo.
Nesse trecho temos o início da definição da verdade escondida sob uma cortina
de mentiras, no entanto, essa discussão é deixada de lado e a conversa volta para o campo
ideológico. Somente no turno 70, G. retoma esse assunto, mas ele é ignorado e L. muda de
assunto com uma pergunta:
80
RECORTE 6:
70. G.: Essa frestinha da cortina que é suficiente para eles enxergarem.
71. L.: Você acha esse governo competente?
Em nenhum outro ponto dessa coleta, houve a retomada dos enunciados
apresentados, ou a discussão de novos enunciados contidos na crônica. Notamos que os
participantes pouco se detiveram no texto ou tentaram compreender o próprio texto. Ele
apenas serviu de pretexto para que cada um colocasse suas opiniões a respeito da
conjuntura política do país na época.
Inicialmente, os participantes apresentaram seus posicionamentos sociopolíticos
em relação à crítica apresentada por Arnaldo Jabor na crônica em questão. Enquanto três
deles mostram-se contrários aos fatos protagonizados pelo governo, dois deles tentaram
justificar as ações ocorridas comparando o governo atual com os governos passados.
Os posicionamentos iniciais mantiveram-se até o final do protocolo, o que
acendeu os ânimos muitas vezes durante a discussão. Essas posições contribuíram para a
construção do sentido, pois a rede de implicações que foram construídas no decorrer do
evento de leitura trouxe à tona questões ideológicas. Essa questão ideológica será retomada
na última parte da análise.
Essa coleta não foi muito produtiva, do ponto de vista da construção de
sentidos, que o papel da pesquisadora como mediadora ou participante do evento de
leitura não ocorreu efetivamente. Na busca de corrigir esses pontos, realizamos uma
segunda coleta que apresentamos a seguir.
4.2 Análise dos dados da coleta B
Esta segunda coleta, ao contrário da coleta A, teve a participação efetiva e
intencional da pesquisadora, por meio de perguntas, interferências, com a aplicação da
técnica do revozeamento. O seu objetivo foi verificar como ocorre a co-construção
negociada de sentidos entre os participantes da pesquisa, na busca de interpretarem o texto
proposto.
81
Para realizar essa coleta, também optamos pelo protocolo verbal em grupo
que essa técnica permite que os participantes do evento social de leitura troquem,
negociem, compartilhem, construam e avaliem diferentes leituras, por meio da interação.
Assim, neste item apresentamos a análise do material empírico coletado por
meio de gravações em áudio e VHS de interações entre professores, lendo a mesma crônica
apresentada na coleta A: A verdade está na cara, mas não se impõe de Arnaldo Jabor.
Após alguns minutos de leitura silenciosa e individual, a pesquisadora iniciou,
com o consentimento de todos, a gravação. Os participantes, então, iniciaram uma conversa
sobre o texto, partilhando as interpretações. Logo no início da conversa, a partir de um
direcionamento da pesquisadora por meio de uma pergunta, eles deram início à discussão
do enunciado A verdade está na cara, mas a verdade não se impõe.
RECORTE 7:
3. G.: O que eu acho é assim olha, a verdade está na cara, porque é assim, escrito, na
tv, tá no rádio, na mídia impressa, porém é::: como se ela não como se ela fosse escondida.
4. L.: Tão manipulando ela.
5. P.: Então o que vocês estão dizendo que a verdade apesar de estar cristalina pra todos
verem, ela acaba sendo manipulada é isso?
6. L.: Manipulada.
7. G. Hã, hã.
Nesse recorte, temos as participantes G. e L que apresentam a verdade como
um objeto manipulável e que pode ser escondido. Por meio do revozeamento, a
pesquisadora sintetizou essa idéia que foi confirmada por ambas. O conceito metafórico
que serviu de base para a construção desse sentido foi A VERDADE É UM OBJETO. E
como um objeto pode ser manipulado. Essa interpretação é confirmada pelos outros
participantes, como vemos no trecho a seguir:
RECORTE 8:
8. H. Tornando-se uma mentira, na verdade.
82
9. L.: É, você acredita no que eu quero que você acredite, então eu quero que você acredite
que eu sou um santo. Da forma com que passam isso você acaba acreditando.
10. M. Eu acho que isso mostra a inércia do povo brasileiro mesmo.
11. Ly.: Eu também. Acho que a gente não faz nada pra mudar.
12. M.: Ninguém acredita que fazendo alguma coisa vai mudar.
13. Ly.: Como assim?
14. M.: Eu sei que não vai ter nenhum resultado porque isso vai ser camuflado. Eu posso
estar mexendo na poeira que está aqui, começando a fazer alguma coisa, saindo da inércia,
posso começar a mexer na poeira, mas ela vai continuar ali.
15. Ly.: Ah tá.
A construção do sentido da verdade como um objeto manipulável, que pode ser
escondido, e até transformado em outro, nesse caso, a mentira, como vemos no turno 8
“Tornando-se uma mentira”. Na seqüência, L. que apresenta a narrativa em primeira
pessoa, assumindo o papel da personagem que manipula a verdade, aproveita a
interpretação feita por H. e transforma a mentira em verdade. Assim, com base no conceito
metafórico já construído, o turno 9 apresenta um novo conceito metafórico A MENTIRA É
UM OBJETO e pode ser transformada em verdade.
No turno 10 M. apresenta a interpretação e que “isso mostra a inércia do povo
brasileiro mesmo”. Essa idéia de manipulação da verdade e da mentira para ela é
conseqüência da “inércia do povo brasileiro”. Ly., concorda e acrescenta “Acho que a gente
não faz nada pra mudar”. Insere os participantes como povo brasileiro colocado por M, e
por conseqüência, inerte. Após essa colocação, M. reformula sua afirmação e declara que
“Ninguém acredita que fazendo alguma coisa vai mudar”. Ly., no entanto, não compreende
e pede para que M. explique melhor sua colocação. M. retira a idéia de inércia e apresenta,
por meio da narrativa em primeira pessoa, a idéia de que não vê eficácia em tomar alguma
atitude: “Eu sei que não vai ter nenhum resultado porque isso vai ser camuflado”. Assim,
ela retoma a construção de sentidos que apresentam a verdade como um objeto que pode
ser “camuflado”. A rede de implicações construídas até aqui apresenta, tanto a mentira,
quanto a verdade como objetos parecidos, feitos de material semelhante, que podem ser
transformados, manipulados e escondidos.
83
Ela prossegue argumentando a respeito da ineficácia em se tomar uma atitude
porque a mentira continua no mesmo lugar. Nesse ponto, ela utiliza a comparação, por
analogia, entre a mentira e a poeira: “Eu posso estar mexendo na poeira que está aqui,
começando a fazer alguma coisa, saindo da inércia, posso começar a mexer na poeira, mas
ela vai continuar ali”. Na fala dela a metáfora MENTIRA É SUJEIRA. De acordo com
Ferreira (2001:541), poeira significa: muito fino eleve, em suspensão no ar ou
depositado em diferentes superfícies. A partir dessa definição, percebemos que para M., a
mentira é algo que se encontra em vários lugares, e mesmo que se tente “limpá-la” não
conseguimos. Percebemos também que M. utiliza o recurso da narrativa em primeira pessoa
e se apresenta como aquele que tenta limpar a poeira, nesse caso, a mentira, mas falha.
Assim, ela aceita a idéia de Ly. e assume o papel de “povo brasileiro”. Os
outros participantes também assumem esse papel. Algumas vezes, somente, eles deixam
esse papel, no entanto, mostramos esses casos mais adiante. No recorte a seguir,
apresentamos a seqüência da discussão em torno do enunciado A verdade está na cara, mas
a verdade não se impõe:
RECORTE 9:
16. H.: Isso é interessante, porque a mentira é tão grande que, apesar de se ter uma verdade,
ninguém se manifesta e mesmo assim os que se manifestam são calados, tesourados ou seja,
são subornados, apagados, nessa parte é isso.
17. G.: Concordo.
18. P.: Ou seja, a questão da verdade estar na cara, de acordo com o que vocês estão
falando, é a questão da apatia do povo. Apesar de estar na cara de todo mundo, ninguém vê
função prática em lutar por essa verdade, é isso? Uma apatia?
19. Ly.: o acho que é não querer lutar. Querer até quer, que não possibilidade de,
mais ou menos assim: De que adianta só eu querer mudar? Só eu querer fazer?
Os conceitos metafóricos A MENTIRA É MAIOR e A VERDADE É MENOR
contribuíram para a construção dos sentidos nesse recorte, como vemos no turno 16. Nele,
H. apresenta a idéia de que a mentira, por ser maior que a verdade, intimida quem luta
contra ela: “os que se manifestam são calados, tesourados, ou seja, são subornados,
84
apagados”. Assim, H. conclui que não adianta lutar contra algo que é maior, no caso, a
mentira. G. concorda com essa reflexão e a pesquisadora reformula o que foi dito até então
e questiona que, apesar da verdade “estar na cara de todo mundo, ninguém função
prática em lutar por essa verdade, é isso? Uma apatia?”. Por sua vez, Ly.: Não concorda
com a idéia de não lutar, que ela se como aquele que não luta. Isso fica claro quando,
ao encerrar seu turno, ela faz duas perguntas e se coloca utilizando o pronome eu. Por
conseguinte, ela justifica essa apatia retomando o sentido co-construído no grupo de que é
inútil lutar contra algo maior que você.
RECORTE 10:
20. H.: O brasileiro é um povo pacífico, comparado aos povos estrangeiros. Lá fora,
qualquer coisinha o povo sai na rua, reclama seus direitos. Aqui, se acontece qualquer coisa
na parte política ninguém vai na rua, tirando o Collor que foi uma coisa planejada pela
Globo, brasileiro não tem garra pra ir cobrar os direitos dele.
21. G.: Não acho que o povo não tenha garra, o povo tem garra sim. Pra sobreviver nesse
país tem que ter garra.
22. M.: Concordo, o povo tem garra sim. Ele precisa de uma motivação pra fazer essa
mudança, achando que um começando o outro vai fazer e assim por diante.
23. G.: que se sabe que nunca vai se ter retorno. legal está tudo escrito lá. Eu vejo
programas, sacanagens rolaram, roubaram, esconderam, mentiram. você fala: Quem é
que quis fazer alguma coisa? Por que se a gente fizer, o que vai ter de retorno? O vai
acontecer com os culpados? Nunca acontece nada. Porque para nós, ser uma verdade ou ter
uma verdade não tem diferença prática nenhuma.
Nesse recorte, H. retoma a questão do povo não lutar e justifica com o fato de
que o “brasileiro é um povo pacífico, comparado aos povos estrangeiros.” De acordo com
seus argumentos, H. conclui que “o brasileiro não tem garra pra ir cobrar os direitos dele”.
Como todos os participantes assimilaram sua posição na conversa como povo, G., logo
discorda dessa afirmação e é seguida por M. que justifica o povo “só precisa de uma
motivação pra fazer essa mudança, achando que um começando o outro vai fazer e assim
por diante”.
85
Com efeito, G. retoma o turno e atenta para o fato que não punição contra os
culpados. Por meio de perguntas, que ela mesma responde, conclui que ser uma verdade ou
ter uma verdade não tem diferença prática nenhuma. Como o grupo não respondeu e nem
questionou as perguntas feitas por G., concluímos que a definição dada por ela foi
satisfatória para os outros integrantes e, por esse motivo, a pesquisadora optou por não
revozear essas perguntas.
O recorte a seguir é um pouco longo, mas optamos por não desmembrá-lo,
que ele apresenta as impressões finais dos participantes acerca do enunciado A verdade está
na cara, mas não se impõe.
RECORTE 11:
24. L.: Além disso pra quê? O Brasil ganha a copa e tudo se resolve. Agora a gente tem o
PAN.
25. P.: Então, a verdade está na cara, isso a gente já deixou claro aqui né.
26. G.: Sim, concordo.
27. M.: Claro.
28. P.: Mas ela não se impõe. Quer dizer, essa atitude de não se impor é causada pela apatia
Você não vê resultado, não vê punição, você não vê a lei sendo aplicada para eles.
29. L.: Isso mesmo. Isso é uma raiz, vem da colonização desse país. Ele foi colonizado
dessa forma. Ele já veio com um modelo de governo de fora pra dentro, então nós nunca
lutamos por nada. Se você pegar os grandes acontecimentos da história deste país, você não
o povo participando de nada, então, o que nós queremos? Fica difícil lutar, poucas
pessoas que têm consciência. Até porque o leve-leite cala a boca de meio mundo. Você
chega na frente, você tenta chamar a atenção, você fala: olha está acontecendo isso, isso
e isso. Ah, mas o leitinho das crianças está em casa, ele está garantido. Olha, eu tenho o
bolsa isso, eu tenho o bolsa aquilo. Fica difícil lutar contra tanto cala-boca. Eu penso dessa
forma.
30. M.: Como no império romano: pão e circo.
31. L.: É.
86
32. G.: Então a verdade não tem a menor força por conta desse descrédito que temos nas
instituições, no poder legislativo, no executivo e no judiciário.
33. L.: Por que eu vou arranjar para a minha cabeça?
34. G.: Claro, para se ter respeito tem que ser dar respeito não é mesmo? Alguém respeita
político brasileiro?
35. L.: É por isso que eu falo, de que adianta eu me expor? Que nem aquele caseiro lá,
daquele escândalo.
36. H.: Aquilo foi boi de piranha.
37. L.: Coitado esse está ferrado para o resto da vida dele. Nunca recebeu nada, não vai
receber e ainda nem emprego ele vai ter mais, enquanto que os outros continuam numa boa.
Para vocês verem, no último escândalo, da confusão no aeroporto, todo mundo esperando e
o Palocci passou na frente. foram entrevistar o povo que estava lá: Vocês acharam certo
ele passar na frente? Não, porque ele passou na frente? Ele não é melhor que ninguém. Ele
tinha que esperar como todos nós esperamos. E ele foi lá, passou na frente e pegou o vôo. É
aquela coisa de que nesse país político é “dotô”.
38. M.: Doutor?
39. L.: “Dotô” mesmo. Sabe o seu dotô? Acontece que eles não entendem que pra ser
doutor tem que ter um título. Não é assim, não, doutor tem que ter doutorado, mas aqui no
Brasil, todo político é doutor. Entrou para a política, virou doutor. Eu acho que isso impera
muito forte na sociedade brasileira. Sempre foi assim. Eu tenho o poder, eu faço o que eu
quero e acabou. Você não gostou? Problema seu. Eu vejo dessa forma.
40. M.: É isso mesmo, quer reclamar, quer pôr os bofes para fora, pode pôr, mas não vai
adiantar nada.
41. P.: Isso volta na questão de que a verdade está na cara, mas não se impõe. Não se impõe
porque ela não resolve, não adianta, é isso?
42. L.: Sim. É gastar vela boa com mau defunto.
43. Ly.: L. resumiu tudo.
Por meio da reflexão crítica dos participantes, essa rede de sentidos vai sendo
construída nesse recorte a partir da idéia de que para se encobrir as mentiras, o povo deve
ser distraído, ou seja, os participantes concordam que a verdade é manipulável, pode ser
escondida e maquiada por aqueles que não querem que ela apareça e se imponha. Isso fica
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claro nos turnos 24 em que L. cita a copa do mundo e o PAN no Rio de Janeiro como
fatores que desviam a atenção do brasileiro e no 29, em que ela menciona os auxílios
sociais dados pelo governo como forma de um “cala-boca”. Nesse momento, M. faz
referência ao império romano, por meio da expressão idiomática “pão e circo”, e
comparando-o assim, à realidade do povo brasileiro.
É relevante ressaltar que, nesse recorte, L. separa o povo brasileiro em duas
categorias: as pessoas que têm consciência e as que são beneficiadas pelos programas
sociais do governo, ou seja, os mais pobres. Essa diferenciação parece ser aceita pelos
outros participantes e, assim, o sentido construído por M. para comparar o povo brasileiro
ao povo do império romano que se contentava com “pão e circo”, não foi contestado.
Assim, G. atesta, por meio do conceito metafórico A VERDADE É UMA
ENTIDADE que “a verdade não tem a menor força
por conta desse descrédito que temos
nas instituições, no poder legislativo, no executivo e no judiciário”. Nesse turno, finalmente
aparece quem são aqueles que escondem a verdade e ela justifica que isso se deve ao
“descrédito” que a parcela “consciente” do povo brasileiro tem nessas instituições. Ela
segue no turno 34, justificando que “para se ter respeito tem que ser dar respeito não é
mesmo?”. G. conclui deixando a pergunta: “Alguém respeita político brasileiro?”.
Ressaltamos que o fato dessa pergunta, carregada de ironia, não ser respondida pelo grupo,
do ponto de vista de construção de sentidos, significa que os participantes concordam e
partilham da mesma idéia: eles não respeitam os políticos brasileiros.
Com efeito, nos turnos 33 e 35 L. retoma a idéia apresentada por H. no turno 16
para justificar que lutar contra a mentira é algo que não apresenta resultado efetivo. No
turno 34 H. acrescenta que o caseiro foi usado como “boi de piranha”. Esse termo tem
origem na necessidade dos peões boiadeiros atravessarem uma boiada em um rio em que
haja piranhas. Assim, escolhe-se um boi doente ou fraco para ir à frente, então, enquanto as
piranhas o devoram, os peões passam o restante da boiada em segurança. Nesse caso, H.,
utiliza a expressão idiomática “boi de piranha” como estratégia para construir a idéia de que
o caseiro foi usado para desviar a atenção do povo para o que se estava acontecendo.
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no turno 37, L. retoma a idéia de que o político tem regalias que não são
dadas ao povo em geral. Isso se evidencia no trecho “todo mundo esperando e o Palocci
passou na frente”. Apesar da discordância das pessoas presentes, em relação a esse fato,
“ele foi lá, passou na frente e pegou o vôo”. L. justifica que isso ocorre porque no Brasil,
por ser o detentor do poder, o político pode fazer o que quiser. Esse poder, para ela, é
legitimado pela parcela do mais pobre do povo. Para comprovar sua tese ela apresenta o
termo “dotô”. M. a questiona: “doutor?e L. explica: “Dotô” mesmo. Sabe o seu dotô?.
Aqui fica evidente a percepção de que o poder o político é legitimado por aquele que não
tem acesso ao estudo, e por conseqüência, não domina a norma culta da língua.
Assim, L. complementa seu raciocínio definindo o político brasileiro como o
detentor do poder, enquanto o povo deve assistir passivamente, às decisões por ele
tomadas: “Eu tenho o poder, eu faço o que eu quero e acabou. Você não gostou? Problema
seu”.M. no turno 40 concorda e retoma a noção de que reclamar contra os que mandam não
adianta.
Nesse ponto, a pesquisadora, por meio do revozeamento, sintetiza a discussão
feita até esse ponto: “Isso volta na questão de que a verdade está na cara, mas não se impõe.
Não se impõe porque ela não resolve, não adianta, é isso?”. L. concorda e utiliza a
expressão idiomática “gastar vela boa com mau defunto”, para construir a idéia de que
preocupar-se com a verdade não vale a pena.
Os participantes, no decorrer do evento de leitura em que discutiram o
enunciado A verdade está na cara, mas não se impõe, construíram, uma rede de
implicações que permitiu a co-construção negociada de significados. Assim, na leitura
desse enunciado foram ativados os conceitos metafóricos: A VERDADE É UM OBJETO,
A MENTIRA É UM OBJETO, A MENTIRA É MAIOR, A VERDADE É MENOR e A
VERDADE É UMA ENTIDADE. Ressaltamos que, nesses recortes, para expressar sua
interpretação, os participantes recorreram a expressões idiomáticas como pão e circo, boi de
piranha, que têm valor metafórico e fazem parte, como os provérbios do conhecimento
popular. Assim, a interpretação do enunciado foi construída no processo de interação com
base em relações estabelecidas nos conhecimentos adquiridos anteriormente pelos leitores,
89
por meio da experiência com outras fontes de conhecimento previamente estruturado pela
linguagem, como verificamos, principalmente no recorte 11.
Os participantes deram seqüência à discussão, logo após a leitura do enunciado
Claro que a mentira sempre foi a base do sistema político, infiltrada no labirinto das
oligarquias feita pela pesquisadora. Ela interfere no começo da para orientar os
participantes, para se mantivesse a discussão em torno do enunciado:
RECORTE 12
48. H.: Os poderosos como sempre.
49. P.: Então, esse labirinto de oligarquias? Os poderosos?
50. L.: Sim. Eles sempre mandaram nesse país, sempre fizeram e aconteceram.
51. P.: Tá, mas qual o sentido para você da palavra labirinto nesse caso?
52. L.: Porque são caminhos tortuosos.
53. G.: Porque quem não está dentro não tem noção de qual é o caminho. Hoje você me
interessa então sou seu amigo, amanhã, dependendo dos meus interesses particulares...
54. L.: E da confusão que você se meteu...
55. G.: Então, aí a gente muda.
56. L.: Pois é, se você meter o pé na jaca, aí o problema é seu.
Nesse recorte, H. interpreta oligarquia como “os poderosos”. De acordo com
Ferreira (2001:498), oligarquia significa 1. Governo de poucas pessoas, pertencentes ao
mesmo partido, classe ou família. 2. Predomínio de pequeno grupo na direção de negócios
públicos. Essa idéia de que o país é governado por poucos é corroborada por L. que
acrescenta que “Eles sempre mandaram nesse país, sempre fizeram e aconteceram”. Nesse
ponto, a pesquisadora interfere e chama a atenção do grupo para a palavra labirinto e L.
define que “são caminhos tortuosos”. G. complementa dizendo que “quem não está
dentro não tem noção de qual é o caminho”. Ela utiliza, na seqüência, a narrativa em
primeira pessoa e assume o papel da personagem que pertence ao grupo de “poderosos”,
para explicar como eles agem: “Hoje você me interessa então sou seu amigo, amanhã,
dependendo dos meus interesses particulares”. Essa explicação é apoiada por L. nos turnos
54: “E da confusão que você se meteu” e 56: “Pois é, se você meter o na jaca, o
90
problema é seu”. Aqui L. recorre à expressão idiomática de caráter metafórico “pé na jaca”
para concluir sua interpretação da metáfora labirinto de oligarquias, retirada da crônica de
Jabor.
Assim, no recorte 12 temos a co-construção negociada dos seguintes
significados para os termos “oligarquia” e “labirinto” destacados pela pesquisadora. De
acordo com os participantes, oligarquia refere-se aos poderosos (termo que remonta ao
sentido definido no recorte 11: detentores do poder) ou ainda um grupo com os mesmos
interesses que se ajudam para manterem o poder. Já a palavra labirinto refere-se à caminhos
tortuosos, secretos.
No recorte a seguir, a participante Ly. a partir da idéia construída por G. e L.
apresenta outro enfoque:
RECORTE 13
57. Ly.: Tem também a questão do seguinte: O sujeito pode até ter boa intenção, mas uma
laranja podre no cesto acaba contaminando as outras.
58. L.: Com certeza.
59. Ly.: Quando você não sabe para onde vai, acaba se corrompendo.
60. L.: Sim, ou você entra ou te puxam o tapete. E aí? Você quer amanhecer com a boca
cheia de formiga? Não. Você entrar, afinal, eu vou ganhar também. Olha só: não tem
cobrança, eu estou no meio, eu vou ganhar também. O poder corrompe, me desculpe,
isso é em qualquer sociedade. O poder corrompe mesmo. E aqui parece corromper assim,
muito mais.
61. G.: Mas aqui é o nosso país, aqui a gente se interessa em saber.
62. L.: Não.
63. G.: É lógico, no tempo em que fiquei na Alemanha todos lá sabiam o que acontecia com
o Kohl quando era primeiro ministro primeiro ministro.
64. L.: que tem uma coisa G., o povo brasileiro está treinado para ver o mal que as
grandes nações fazem para nós. E isso com essa desculpa de que o Estados Unidos está
cobrando, o FMI e outros organismos internacionais os quais nós devemos realmente. Você
tira a atenção da elite brasileira. É como se eles fossem uns anjos. Eles não são anjos, eles
91
são responsáveis sim. Na hora que o povo cortar as garras dessas elites, sim, vai sobrar
dinheiro para melhorar a distribuição de renda.
65. G.: Mas quem disse que eu concordo com essa visão de inocência da política?
66. M.: O povo não é tão ingênuo e não é tão alienado a ponto de achar isso.
67. L.: Eu acho que sim. Nada que o leve-leite não resolva.
68. Ly.: É capaz de eu chegar e falar assim: vota em fulano porque ele prometeu que se ele
ganhar, ele vai arrumar emprego para o primo, do empregado, do meu amigo.
69. P.: Mas então não é uma questão de ingenuidade. Será que não é essa visão de
permissividade do próprio povo brasileiro?
70. M. É lógico.
71. L. Era isso que eu estava dizendo.
72. Ly.: Isso. O cara vota porque sabe que vai ter um ganho pessoal, alguma vantagem.
73. L.: É a lei de Gérson. Viu G.? Não é ingenuidade
74. G. Mas eu não disse isso, a M. falou ingênuo.
75. M.: Não, mas eu disse alienado no sentido de ser tão ingênuo ao ponto de ser tão
alienado que não perceba.
76. G.: Não, isso não.
77. L.: Também não concordo.
78. P.: Não é por isso que a verdade acaba não se impondo?
79. M.: É lógico.
80. P.: Então o que vocês estão dizendo que a verdade não se impõe nesse país, as pessoas
não tomam uma atitude, porque o próprio povo é corrupto? Ele tem suas pequenas
corrupções. É isso?
81. H.: O povo acaba se permitindo algumas coisas.
82. L.: Claro, ele vê um monte de gente roubando e levando vantagem.
83. Ly.: Farinha pouca, meu pirão primeiro.
84. L.: É, dá licença que eu estou com o meu pratinho.
85. H.: Qual é a vantagem? Eu vou levar alguma vantagem nisso? Assim, eu fazer
campanha política para fulano, mas qual é a vantagem? Que eu vou ser assessor dele.
86. Ly.: Até por camiseta, boné.
92
87. G.: Eu já fui para cada canto do Brasil de mochila e a gente continua vendo as mesmas
coisas. Lá onde eu dou aula na prefeitura, se trocou o voto do povo com um candidato que
todo mundo sabe que ele é bandido, que ele está ligado com o narcotráfico. E porque?
Para o povo ganhar no bairro uma pracinha. Pegaram um terreno e fizeram uma pracinha.
Ele foi eleito naquela região. Isso é fato. Eu fui para o Mato Grosso numa fazenda e tive
que tomar banho no rio, lavar a louça e a roupa no rio. Banheiro, você tem uma enxada ali
do lado e você sabe muito bem o que fazer com a enxada se quiser ir ao banheiro, porém, o
prefeito da cidade tinha a sua própria caixa d’água e o seu gerador ganho na época da
eleição para convencer meia dúzia de casinhas a votarem em quem ele queria que era o
prefeito da outra cidade. O povo toma banho frio, mas o povo vota.
88. Ly.: Toma banho frio, mas eles têm camiseta.
A participante Ly., nos turnos 57 e 59 chama a atenção para o fato de que o
grupo formado pelos poderosos corrompe quem adentra a ele, mesmo que esse recém-
chegado ao grupo tenha “boa intenção”. Ela retoma o conceito proposto por G. na definição
labirinto e justifica que a corrupção desse novo integrante do grupo deve-se ao fato de que
ele desconhece o caminho “não sabe para onde vai, acaba se corrompendo”. No turno 60
L., por sua vez, concorda e complementa justificando que quem não segue as regras
propostas pela oligarquia sofre punições. Assim, diante desse fato aquele que chega ao
poder prefere se corromper.
Logo que L., ao justifica que o poder corrompe “em qualquer sociedade”, G.
ressalta que como aqui é o nosso país, aqui a gente se interessa em saber”. L. discorda e,
no turno 64, justifica sua posição dizendo que “o povo brasileiro está treinado para ver o
mal que as grandes nações fazem para nós”. Ela atesta que o povo é treinado pelos
poderosos, que desviam a atenção do povo, retomando a argumentação por ela apresentada
no turno 24. A participante define esses poderosos como a “elite brasileira”, responsável
pela má distribuição de renda no país.
Na seqüência, G., no turno 65 discorda do argumento apresentado por L. Por
sua vez, M. acrescenta que o “povo não é tão ingênuo e não é tão alienado a ponto de achar
isso”. L. defende sua posição e volta na argumentação por ela apresentada no turno 29 e
93
diz: “Nada que o leve-leite não resolva”. Ly., complementa dizendo: “É capaz de eu chegar
e falar assim: vota em fulano porque ele prometeu que se ele ganhar, ele vai arrumar
emprego para o primo, do empregado, do meu amigo”. Percebemos nesse trecho a
indignação de G. e M. que contestam a afirmação feita por L. de que são treinadas e
manipuladas pela elite, já que se colocam como integrantes desse povo. L., no entanto,
define, no turno 67, a que categoria de povo ela se refere.
Com efeito, Ly., no turno 68, usa a narrativa em primeira pessoa para mostrar
que, de acordo com ela, o povo não é ingênuo. A pesquisadora interfere e questiona: “Mas
então não é uma questão de ingenuidade. Será que não é essa visão de permissividade do
próprio povo brasileiro?”. Os participantes concordam e Ly., prossegue: “O cara vota
porque sabe que vai ter um ganho pessoal, alguma vantagem”. L. define essa afirmação
como a “Lei de Gérson”. Essa expressão originou-se em uma propaganda, de 1976, para os
cigarros Vila Rica, na qual o meia armador Gérson da Seleção Brasileira de Futebol era o
protagonista. A propaganda dizia que esta marca de cigarro era vantajosa por ser melhor e
mais barata que as outras, e Gérson dizia no final: “Você também gosta de levar vantagem
em tudo, certo?”
Assim, L. conclui que esse povo gosta de levar vantagem em tudo, no sentido
negativo. Ele se aproveita das situações em benefício próprio, sem se importar com a ética,
portanto, não pode ser ingênuo. L. atribui a idéia de povo ingênuo a G., que imediatamente
discorda e apresenta M. como a responsável pela fala. M., por sua vez, tentar justificar sua
fala no turno 75, mas não obtém a aprovação dos outros participantes. Nesse ponto a
pesquisadora, interfere novamente e reformula a fala de M. que concorda. Isso ocorreu
porque M. não estava conseguindo sustentar sua argumentação diante do grupo e estava
ficando cada vez mais nervosa. Por esse motivo, não estava conseguindo estruturar sua
argumentação. M. sentiu-se satisfeita com o revozeamento realizado pela mediadora por
entender que a sua argumentação foi corretamente apresentada.
A pesquisadora então, a partir do revozeamento, no turno 80, sintetiza a idéia
apresentada pelos participantes e, novamente obtém a aprovação de todos. Percebemos,
então, que os participantes, apesar de serem colegas de trabalho da pesquisadora, conferem-
94
lhe o status de mediadora e tendem a concordar com suas interferências. Isso se deve ao
fato de eles estarem presos ao conceito tradicional de leitura em que uma autoridade
interpretativa que apresenta “o sentido correto” do texto. Ressaltamos que esse não é o
objetivo de se utilizar o revozeamento em um evento de leitura, mas não pudemos deixar de
observar que o conceito tradicional de leitura está arraigado nos participantes da pesquisa.
Com efeito, H. continuidade e apresenta a idéia de que o povo se permite
“algumas coisas”. L. concorda e justifica que “ele vê um monte de gente roubando e
levando vantagem”. Os participantes concordam com essas colocações e do turno 83 ao 88,
contribuem com suas interpretações a respeito da idéia de que o povo é corrupto.
Na discussão do enunciado Claro que a mentira sempre foi a base do sistema
político, infiltrada no labirinto das oligarquias, os participantes apresentaram a
justificativa para a verdade não se impor. Para eles, o povo não é inocente e se corrompe.
Assim, verdade não se impõe porque o povo é corrupto e por isso, permite que seus
representantes também sejam.
Para a construção da interpretação desse enunciado em que há uma metáfora, os
participantes não utilizaram conceitos metafóricos que servissem de base para a construção
do sentido do texto. Eles recorreram a expressões idiomáticas de caráter metafórico, como
na jaca, laranja podre, puxar o tapete, boca cheia de formiga, farinha pouca, meu pirão
primeiro, estou com o meu pratinho e lei de Gérson. Ressaltamos que a mediadora utilizou,
no turno 80 a metáfora a verdade não se impõe, a partir do conceito metafórico A
VERDADE É UMA ENTIDADE que fora estabelecido anteriormente no próprio texto de
Arnaldo Jabor “A verdade está na cara, mas não se impõe” na construção de sentidos dos
participantes.
A pesquisadora seqüência à discussão e lê o enunciado seguinte: Claro que
não esquecemos a supressão, a proibição da verdade durante a ditadura, mas nunca a
verdade foi tão límpida à nossa frente e, no entanto, tão inútil, impotente, desfigurada,
broxa:
95
RECORTE 14
90. G.: É broxa com certeza. O Jabor chama a verdade de inútil. É isso.
91. L.: Isso o quê?
92. G.: O que é que foi feita com essa verdade? Quando uma verdade aparece e não é inútil,
ela tem como função gerar uma conseqüência. E o que aconteceu?
93. L.: Nada. Quando votinha o governo militar tudo era escondido. Depois que deixou
de ser governo militar não abriu, escancarou. É que nem a história do cachorro que corre
atrás do carro. Ele late, late, late, quando o carro pára, ele não sabe o que fazer com o pneu.
Nós nunca tivemos a verdade, agora temos e não sabemos o que fazer com ela.
94. P.: Então a verdade acaba ficando broxa, impotente, no sentido de impotência não?
95. L.: Sim, é igual àqueles caras marombados. Adianta ter a verdade e não saber fazer
funcionar?
96. H.: Você está sabendo da verdade, mas não faz nada. Por quê? Porque você acredita que
isso não vai adiantar nada.
97. G.: Você tem uma geração mais velha com medo de uma ditadura e a outra mais
jovem é a geração do laissez-faire. A mais velha deixa a coisa do jeito que está e essa
geração que a gente tem em sala de aula não está nem aí.
98. L.: Estão mais preocupados com mp3. Têm alunos que me disse que tem candidato
dando mp3 e que vai votar nele para ganhar um.
99. Ly.: Aí a gente volta para a questão do ganho pessoal. É isso.
No recorte 14, G. inicia suas colocações aceitando a definição de verdade
apresentada pelo autor no enunciado destacado. Ela explica, no turno 92, que essa verdade
é inútil porque não gera uma conseqüência. Essa afirmação é corroborada, no turno 96, por
H. que esclarece que o povo não toma uma atitude quando a verdade é mostrada, porque
“não vai adiantar nada”.
No turno 93, L. segue o mesmo raciocínio e explica que a verdade era
escondida pelo governo militar e que, ao final dele, toda a verdade escondida veio à tona só
que o povo não sabe o que fazer com essa verdade. Nesse turno, L. retoma a o conceito
metafórico VERDADE É UM OBJETO que, de acordo com ela, pode ser escondida, aberta
e escancarada.
96
Nesse ponto, a pesquisadora interfere, por meio do marcador discursivo “então”
e faz o resumo do que G. e L. apresentaram aentão. L. concorda com o revozeamento da
pesquisadora e faz analogia, comparando a verdade ao pênis de caras marombados”, que
para ela, não sabem fazê-lo funcionar. O conceito metafórico que norteou essa interpretação
foi A VERDADE É UM ÓRGÃO, nesse caso o pênis.
Já no turno 97, G. retorna para o que foi dito por L. no turno 93 e justifica que a
verdade não funciona porque a ditadura gera medo na geração que nela viveu. Porém, a
geração mais nova “que a gente tem em sala de aula” é a geração do laissez-faire” que, de
acordo com ela, por não ter vivido na época do governo militar, não se preocupa com essa
verdade, não lhes interessa.
Com efeito, L. aprofunda essa idéia e apresenta a preocupação dessa geração
mais nova: “Estão mais preocupados com mp3. Tem alunos que me disse que tem
candidato dando mp3 e que vai votar nele para ganhar um”. Ly, conclui que esses jovens
também se corrompem: “Aí a gente volta para a questão do ganho pessoal”.
No recorte a seguir, a pesquisadora interfere na discussão e retoma o conceito
de verdade abandonado pelos participantes e questiona-os para que eles aprofundem esse
conceito:
RECORTE 15
100. P. Então, voltando para a questão do broxa é uma representação do falo mesmo?
101. G.: É
102. M.: Sim.
103. Ly.: Você tem, mas não sabe usar. Não funciona. Você tem o pênis, mas não sabe
usar. Essa verdade é impotente, é broxa mesmo.
104. L.: Pior, eu não sei o que fazer com ela. Ela está aí. Eu tenho essa consciência, mas eu
não ???o que fazer com ela.
105. M.: O não sei como usar, não sei para o que ela serve. Eu tenho a faca e o queijo na
mão.
106. L.: É verdade.
97
A partir da discussão do recorte 15, temos a confirmação da idéia de que a
verdade é um pênis que não funciona ou que seu dono, no caso o povo, não sabe o que
fazer com ele, portanto, não “resolve o problema”. Assim, os participantes criam a
percepção de que uma das razões para que a verdade “não funcione” é causada pelo povo
que não sabe usá-la.
Após um breve silêncio, H., no turno 107 ao dizer “Acho que nessa parte é
isso”, considera que a interpretação do enunciado proposto está encerrada. Como todos
concordam, a pesquisadora segue lendo o próximo enunciado: Este governo é psicopata.
RECORTE 16
109. H.: É psicopata.
110. M.: É psicopata.
111. G.: É psicopata.
112. Ly.: É psicopata.
113. L.: Pergunta: Só esse governo?
114. H.: Não, esse é o mais psicopata.
115. M.: Esse é o mais psicopata.
116. G.: Esse é o mais psicopata de todos. A gente nunca teve um governo...
117. M.: Tão psicopata quanto esse.
118. G.: Isso mesmo. A gente tinha o Maluf que era completamente insano, mas era só um.
Mas era uma figura. Agora não, a gente tem todo mundo explicitamente. A culpa do Renan
Calheiros é uma, a culpa do outro, do outro, do outro. Todo mundo tem a sua parcela de
culpa, explícita. Todo mundo anda com a sua plaquinha “minha culpa é...”. É uma
quadrilha que está lá.
119. H.: É um bando mesmo.
120. G.: Eles são um bando, eles entraram com essa intenção.
121. L.: Meu pai, quando vivo, dizia que ele jamais votaria no PT, porque o problema do
PT é que, se entrasse um, entrava a corja toda.
122. G.: Qualquer um que estivesse ligado com política sabia que o PT é um dos piores
partidos que nós temos, senão o pior.
98
123. L.: A esquerda, ou a rotulada esquerda, quando entra no poder, ela consegue ser pior.
Mais radical que a mais radical das direitas.
124. H.: E tem outra, a Regina Duarte falava que tinha medo. Se o Lula ganhasse, o que
iria acontecer com esse país? Afundar, e é o que a gente está vendo. Tem mais sujeira do
que outros políticos.
125. M.: Eu acho que tem muita gente que acha, inclusive, que a sujeira agora está mais
visível do que estava antes.
126. L.: E daí?
127. M.: Mas não se limpa? Então dá na mesma? É pior.
128. H.: É pior.
129. M.: Porque antes, pelo menos, talvez a gente tinha a desculpa de: eu não estou vendo.
130. H.: É lógico.
131. M.: Agora eu estou vendo.
132. H.: Os próprios assessores do Lula. Vocês viram, todos, todos com o rabo preso.
No recorte 16, G. H. Ly e M. repetem a palavra psicopata concordando com a
afirmação feita no enunciado que diz que Este governo é psicopata. L., no entanto, discorda
da posição dos outros participantes ao questionar: esse governo?” Essa pergunta gera a
argumentação de H. que afirma que os outros governos também foram psicopatas, no
entanto, “esse é o mais psicopata”. G. e M., nos turnos 115,116 e 117, concordam com essa
idéia e afirmam que “A gente nunca teve um governo” Tão psicopata quanto esse”.
Percebemos nesse ponto da discussão que as opiniões parecem convergir para essa idéia,
tanto que L., nos turnos seguintes, passa a seguir a mesma idéia proposta pelo grupo.
No turno 118, G. compara as pessoas que se encontram no governo a uma
“quadrilha” e H. completa que se trata de um “bando”. De acordo com Ferreira (2001:571),
quadrilha significa um “bando de ladrões ou malfeitores”. Na seqüência, L. diz que o PT é
essa quadrilha e a chama de “corja”, que significa “multidão de pessoas desprezíveis ou de
malfeitores” (FERREIRA, 2001:187). Assim, pelo uso dos sinônimos “quadrilha”, “bando”
e “corja”, os participantes buscaram ressaltar a características negativas daqueles que
governam o país.
99
Em vista disso, G. afirma que “Qualquer um que estivesse ligado com política
sabia que o PT é um dos piores partidos que nós temos, senão o pior”. Em concordância, L.
ressalta que “A esquerda, ou a rotulada esquerda, quando entra no poder, ela consegue ser
pior. Mais radical que a mais radical das direitas”. Assim, H., por sua vez, no turno 124,
relembra a fala da atriz Regina Duarte na campanha presidencial de 2002 que afirmava que
tinha medo do que poderia acontecer caso o presidente Lula ganhasse as eleições. Nesse
ponto, ela faz a analogia entre o país e um navio: “o que iria acontecer com esse país?
Afundar, e é o que a gente está vendo”. O conceito metafórico que norteou essa relação foi
O PAÍS É UM OBJETO RECIPIENTE, especificada na metáfora O PAÍS É UMA
EMBARCAÇÃO e que por isso, pode afundar.
Em seguida, no mesmo turno, ela compara a corrupção à sujeira. E, para ela, os
políticos da atual administração pública possuem “mais sujeira do que outros políticos”. M.
ressalta “que a sujeira agora está mais visível do que estava antes”. L. a questiona e M.
explica que a sujeira está visível e “não se limpa? Então dá na mesma? É pior”. H.
concorda e ela segue sua argumentação: “Porque antes, pelo menos, talvez a gente tinha a
desculpa de: eu não estou vendo”. Com o uso do pronome eu, ela se coloca no papel de
quem não fazia nada porque não via, agora que está vendo, deve tomar uma atitude para
eliminar essa “sujeira”, esse lixo. H. encerra dizendo que todas as pessoas ligadas ao
presidente Lula têm “o rabo preso”.
De acordo com Ferreira (2001:652) sujeira significa: “1. Imundície, porcaria,
sujidade. 2. Ação incorreta ou indecente”. Essas duas definições são usadas pelos
participantes para definir a corrupção que se encontra infiltrada no poder. Temos, portanto,
a construção do sentido de que as pessoas que se encontram no governo fazem parte de uma
“quadrilha”, um “bando”, uma “corja”. Assim, suas ações são “sujeiras”, que ora são
escondidas, ou são reveladas. O conceito metafórico que serviu de base para essa
interpretação foi A CORRUPÇÃO É UMA SUBSTÂNCIA, especificada na metáfora
CORRUPÇÃO É SUJEIRA no caso, sujeira e que, portanto, deve ser eliminada.
Portanto, ao se entender o país como uma embarcação, temos a idéia que os
governantes dirigem essa embarcação e o povo é a tripulação e deve, de acordo com os
100
participantes, mantê-la limpa da corrupção. No próximo enunciado, retomamos a discussão
em torno da palavra verdade:
Enunciado: Seus membros riem da verdade, viram-lhe as costas, passam-lhe a mão na
bunda. A verdade se encolhe, humilhada, num canto.
RECORTE 17
133. P.: A seqüência, acho que chega nisso que você está falando. (lendo) “Seus membros
riem da verdade, viram-lhe as costas, passam-lhe a mão na bunda. A verdade se encolhe,
humilhada, num canto”.
134. M.: É, porque ela não sabe o que fazer.
135. Ly.: Ela acaba se recolhendo porque ela foi apresentada e de nada adiantou. Então eu
vou embora.
136. M.: Magoou, entristeceu, deprimiu.
A pesquisadora, ao perceber que os participantes ficaram em silêncio, decidiu
inserir o próximo enunciado. Nele, somente os participantes Ly. e M. tecem comentários,
no entanto, uma nova analogia é apresentada para definir a palavra verdade. M. inicia
dizendo que a verdade “não sabe o que fazer” e Ly. complementa que “Ela acaba se
recolhendo” que “ela foi apresentada” e ignorada: “de nada adiantou”. Por conseguinte,
Ly. assume o papel da verdade e declara “Então eu vou embora”. M., por sua vez, completa
que a verdade “Magoou, entristeceu, deprimiu”. Aqui temos a idéia de verdade como uma
pessoa que é ignorada, que se magoa, entristece, deprime e por isso vai embora. Essa
interpretação se apóia no conceito metafórico A VERDADE É UMA ENTIDADE e se
especifica em A VERDADE É UMA PESSOA, temos aqui, a personificação, que é um tipo
de metáfora ontológica.
No último recorte, temos a discussão do enunciado proposto E o pior é que o
Lula, amparado em sua imagem de “povo”, consegue transformar a Razão em vilã, as
provas contra ele em acusações falsas”, sua condição de cúmplice e comandante em
“vítima”. E a população ignorante engole tudo.
RECORTE 18
101
139. G.: O pior é que tem gente que não é ignorante e engole. Isso eu não admito. Tem
professor que ainda hoje, depois de tudo, que ainda gosta do Lula. Que fala: Não gente, não
é bem assim. Nos outros governos também tinha. Não me interessa, não pode ter em
nenhum.
140. Ly.: O ignorante, nesse caso, é a ignorância de visão política mesmo.
141. G.: Mas nesse caso não é falta de conhecimento político. Eu acho que é essa
necessidade de acreditar que um governo do povo não ia fazer isso com o próprio povo.
142. Ly.: Mas só porque o cara não tem estudo ele é do povo?
143. G.: Não isso é o marketing dele.
144. M.: É o marketing dele. Ele nunca foi, ele nunca foi do povo.
145. Ly.: Então, ele não é do povo.
146. G.: E nunca mais vai ser, porque metade de São Caetano é dele. Santo André, sei lá.
147. L.: São Bernardo.
148. G.: São Bernardo. Metade das áreas nobres de São Bernardo são todas dele. Mas não é
bem uma ignorância. Não sei, é uma certa ingenuidade, um medo de ter sido traído, então
eu prefiro acreditar que tudo isso que está acontecendo é mentira. Entendeu? Que aquela
pessoa em quem eu confiei, que eu achei que fosse mudar, não me traiu. Ele não quer se
sentir traído, então ele continua acreditando naquilo.
149. P.: Então o que voestá querendo dizer é que o governo é psicopata e esse povo que
tem esse conhecimento, ele se torna ignorante por opção. Ele prefere ignorar.
150. G.: Sabe a dor da traição? É melhor eu não ver, porque se eu aceitar a realidade ela vai
doer.
151. P.: É como se fosse um marido traído, é isso?
152. G.: É, é isso. O professor é uma classe muito típica disso. A gente é contra a
desigualdade social, a gente quer resolver uma série de problemas, então você pega um
discurso do PT onde isso era o mote desse discurso, não era?
153. L.: É a filosofia do PT.
154. G.: E o que acontece? Eles assumem. Aí você pensa: bom, agora vai dar jeito e quando
você vai ver, a coisa está pior do que nunca. Então ele se sente traído.
155. L.: É o marido traído.
156. G.: É o marido traído.
102
157. M.: Eu não tenho culpa da traição, então eu prefiro não ver. Sei o que está
acontecendo, prefiro não ver, não dói.
158. G.: A classe culta, o culto que consegue enxergar que ele votou em algo que está pior
do que nunca. É um mecanismo de defesa dele para não se sentir traído. Porque eu não
consigo admitir que uma pessoa culta continue defendendo um governo, depois de tudo o
que aconteceu. Simplesmente eu não admito.
159. P.: Então, nesse caso a tem uma diferenciação. A ignorância deste povo, dessa
população mais culta do país que prefere não enxergar esse tipo de situação e se torna um
marido traído e se esconde atrás dessa vergonha ter sido traído e prefere não enxergar essa
verdade. E a verdade não se impõe para o povo mais carente porque ela tem uma certa
permissividade, porque ela tem vontade própria e ela acaba como Ly. falou “farinha pouca
meu pirão primeiro”, então ele que tem o direito a algo mais e ele acaba abrindo mão,
será porque ele está muito longe dessa realidade? Ele prefere ganhar o leite dele do que
ficar discutindo uma coisa maior, é isso?
160. H.: Você resumiu tudo.
161. L.: Com certeza.
162. M.: Concordo.
163. G.: É verdade.
Nesse recorte, G. inicia sua participação dizendo que existem pessoas que não
são ignorantes, como professores e “engolem” as corrupções do atual governo. Aqui, ela
estabelece que a corrupção é algo que deve ser engolido, nesse caso, temos a ativação do
conceito metafórico A CORRUPÇÃO É UMA SUBSTÂNCIA.
A definição de ignorante apresentada por G. é questionada por Ly., que
argumenta que se trata de uma caso de “ignorância de visão política”. G. retoma o turno e
justifica que “um governo do povo não ia fazer isso com o próprio povo”. G. reafirma,
assim, sua interpretação inicial para o termo ignorante: aquele que não tem estudo. Ela usa
o fato do presidente não possuir estudo para justificar sua posição.
Por sua vez, Ly. discorda e questiona: “Mas porque o cara não tem estudo
ele é do povo?”. No turno 143, G. responde argumentando que se trata de marketing e
103
recebe o apoio de M. que complementa: “ele nunca foi do povo”. Ly. finalmente concorda
e conclui: “ Então, ele não é do povo”.
No turno 148, G.tenta explicar seu ponto de vista e muda o termo ignorância
para “certa ingenuidade, um medo de ter sido traído”. Nesse trecho, ela tece uma analogia
entre povo e a figura de um marido traído que prefere negar a traição. Do turno 149 ao 158,
o debate gira em torno da construção dessa analogia pelo resto do grupo. Ao final, eles
afirmam “é o marido traído”. Aqui, temos o conceito metafórico O POVO É UMA
ENTIDADE, por meio da personificação POVO É UMA PESSOA, nesse caso o marido
traído.
A pesquisadora, por meio do revozeamento, sintetiza a discussão feita pelo
grupo apresentando as definições dadas pelos participantes para o fato da verdade, apesar
de estar na cara do povo, não se impor. Ao final, ela faz uma pergunta, que responde em
seguida, mas não obtém resposta do grupo. Isso nos permite concluir que a resposta dada
por ela agradou os participantes, que aceitaram o revozeamento.
Durante essa coleta, a discussão girou em torno da busca pela resposta ao
enunciado a verdade está na cara, mas não se impõe. Todos os debates, as negociações,
reformulações e retomadas feitas pelos participantes sempre apontavam no sentido de
definir esse tema, que, por acordo do grupo, mesmo que de forma implícita, foi eleito para a
interpretação nesse evento de leitura.
Assim, temos o sentido construído pelo grupo que definiu que a verdade o se
impõe porque o povo, que elegeu o atual governo, não cobra atitudes que levem ao cessar
das mentiras. O povo, para os participantes, divide-se em dois grupos: O primeiro é aquele
que se beneficia dos programas sociais do governo. Ele não tem acesso ao estudo, nem a
uma distribuição de renda mais justa. Com efeito, ele se corrompe, e, por isso, permite que
o governo também se corrompa. Esse povo tem prioridades mais concretas, como garantir a
sua subsistência. Já o segundo grupo é composto pela população mais culta do país que
prefere não enxergar essa verdade por vergonha de ter sido enganado.
104
Durante a análise do evento de leitura percebemos que as metáforas contidas no
texto de Jabor, por vezes, foram explicadas com outras metáforas e expressões idiomáticas
de caráter metafórico. Diante disso, optamos por analisar não somente as metáforas
contidas na crônica, mas também as metáforas utilizadas pelos participantes da pesquisa em
seus discursos de interpretação.
Ressaltamos que a crônica selecionada contém mais enunciados para serem
discutidos e analisados, no entanto, a pesquisadora decidiu encerrar a coleta, pois os
participantes davam indícios de que não queriam continuar a discussão. Nesse caso, seria
necessária nova coleta, o que não foi possível, que os participantes, alegando
compromissos, negaram-se a participar de um novo evento de leitura. A seguir, discutimos
resultados das duas coletas e os confrontamos com o questionário e o perfil respondido
pelos participantes.
4.4. Discussão dos resultados
Ao analisarmos a coleta A, verificamos que ela não foi muito produtiva, do
ponto de vista da construção de sentidos. Os participantes não discutiram o texto, mas
utilizaram-no como ponto de partida para um embate ideológico em que o grupo dividiu-se
em dois. Assim, enquanto três dos participantes mostraram-se contrários aos fatos
protagonizados pelo governo, dois deles tentaram justificar as ações ocorridas comparando
o governo atual com os governos passados.
Com os ânimos, muitas vezes exaltados, os participantes defendiam seus
posicionamentos sócio-políticos em relação à crítica apresentada por Arnaldo Jabor na
crônica em questão. As questões ideológicas foram defendidas por cada grupo até o final do
protocolo. Nenhum dos grupos cedeu e nem mesmo tentou chegar a um consenso.
Como os participantes dessa coleta eram professores, achamos que o papel da
pesquisadora não seria necessário, pois eles conseguiriam discutir o texto de forma
estruturada e aprofundada, encontrando sozinhos caminhos para a compreensão e co-
construindo o sentido para o texto. Como isso não aconteceu, decidimos realizar nova
105
coleta e nela a pesquisadora assumiu o papel de mediadora e participou ativamente do
evento de leitura.
Na coleta A, a participante C. integrou, junto com L., o grupo que se posicionou
a favor do atual governo. Ela recusou-se a participar da segunda coleta e o apresentou os
motivos para a recusa. Em seu lugar, tivemos a participação de Ly. que aderiu ao grupo que
se posicionou contra o governo. Assim, L. ficou sozinha na segunda coleta e, durante o
evento de leitura, cedeu muitas vezes. Isso ocorreu, no entanto, porque o grupo da coleta B
preocupou-se em discutir os enunciados apresentados pela pesquisadora, deixando de lado a
discussão ideológica e partindo para a discussão do texto na busca de uma co-construção
negociada de sentidos.
Percebemos, então, que a participação da pesquisadora como mediadora do
evento de leitura, utilizando-se do revozeamento, possibilitou que o grupo discutisse os
enunciados por ela apresentados e proporcionou uma coleta mais produtiva. Assim,
concluímos que mesmo em um grupo de professores, houve a necessidade de uma
mediação efetiva para que se chegasse à construção coletiva do sentido do texto.
Com efeito, verificamos também que para construir o sentido do texto, o leitor
utiliza-se de metáforas ou de expressões idiomáticas de caráter metafórico. Esse uso
favorece na argumentação do participante que, por meio delas, se faz entender perante o
grupo.
Já, ao analisarmos o perfil dos participantes e o questionário, percebemos que
divergências entre a visão de leitor de cada participante e o uso que ele faz desse
instrumento pedagógico em sala de aula. Ressaltamos que, com exceção de Ly., que
respondeu a ambos no mesmo dia, todos os outros participantes responderam em datas
diferentes para que a resposta do perfil não interferisse na resposta do questionário.
Assim, a partir das respostas dadas por eles no perfil, verificamos que a maioria
se considera um bom leitor. Todos afirmaram que gostam de ler, no entanto, ao analisarmos
as respostas dadas no questionário, verificamos que o uso da leitura de diferentes tipos de
textos, nesse caso a crônica, quase não ocorre.
106
Sabendo das dificuldades que enfrentamos, ao trabalhar com leitura em sala de
aula, mesmo sendo professora de Português, surgiu a inquietação de descobrir como
professores de outras disciplinas realizavam os momentos de leitura em suas aulas. Na
busca por responder essa questão, foi elaborado um questionário para que os participantes
respondessem como trabalhavam a leitura de textos paradidáticos em suas aulas.
É relevante ressaltar que as respostas dadas foram conflitantes. Nas perguntas
sobre a importância da leitura de textos paradidáticos em sala de aula e o papel da leitura na
formação do aluno, todos responderam que era “muito importante”, “fundamental”,
“enorme”, “extremamente necessária”. quando perguntados se eles utilizavam textos
paradidáticos em suas aulas, as respostas não foram tão animadoras. C., professora de
Química, por exemplo, respondeu que não utilizava e M., de Inglês, que utilizava “às
vezes”.
Com efeito, esses mesmos professores apresentaram respostas semelhantes
quando perguntados sobre o uso da crônica em sala de aula. Eles achavam bom, “muito
importante”, mas enquanto C. acredita que a crônica “não se aplica” à sua disciplina, M.
não utiliza porque, para ela, nas suas “aulas não ainda como trabalhar crônicas com os
alunos”. Os outros também restringiram ou descartaram o uso da crônica em suas
disciplinas, seja porque “os temas são limitados”, ou não faz “a ponte entre Português e
Geografia”, porque não consegue “enxergar” uma relação entre crônicas e sua disciplina,
ou ainda espera que primeiro os alunos “saibam o que é crônica”.
Isso se deve, a partir das respostas obtidas, ao fato de que esses professores
buscam trabalhar em sala de aula, apenas textos que se relacionem diretamente com a
disciplina de cada um, embora considerem que a leitura de textos paradidáticos em sala de
aula é muito importante.
Percebemos pelas respostas dadas até aqui que esses profissionais têm
dificuldades de utilizar a leitura como ferramenta eficiente no processo de aprendizagem.
Esse problema fica mais evidente quando é pedido para eles que descrevam a metodologia
utilizada para se trabalhar textos paradidáticos em sala de aula. (vide quadro 1.9: 68). Dessa
forma, verificamos que as estratégias por eles utilizadas para se trabalhar com leitura em
107
sala de aula não abarcam a leitura de forma que instiguem os alunos a criarem sentidos para
o texto lido.
Assim, ao realizarmos o evento de leitura, procuramos verificar como esses
professores se portaram como leitores. Devemos ressaltar que na mínima participação da
pesquisadora como mediadora do evento coletivo leitura não foi proposital. Mas, a partir da
constatação de que o resultado dessa coleta não foi satisfatório, pudemos questionar a causa
que motivou esse fracasso. A discussão dessas razões será apresentada no capítulo a seguir.
108
_________________________________________________
Conclusão
“Nada lhe posso dar que já não existam em
você mesmo. Não posso abrir-lhe outro mundo
de imagens, além daquele que há em sua
própria alma. Nada lhe posso dar a não ser a
oportunidade, o impulso, a chave. Eu o
ajudarei a tornar visível o seu próprio mundo,
e isso é tudo”.
(Hermann Hesse)
109
Tendo por tema, a leitura de metáforas contidas em uma crônica jornalística
durante um evento de leitura em que participaram professores, procurou-se verificar como
eles, a partir da co-construção negociada de sentidos, construíram a compreensão global do
texto.
Dessa forma, retomamos as questões que estiveram presentes durante todo o
processo de construção deste trabalho: Por que escolher professores como participantes de
um evento de leitura, enquanto outros trabalhos focam suas pesquisas nos alunos? Que
contribuições traz a observação de como os professores constroem sentidos? Como a visão
que cada um faz de si como leitor influencia na sua prática docente? Como essa pesquisa
pode contribuir para a melhora da qualidade das aulas desses professores? Como justificar a
escolha por focar a pesquisa naquele que forma o aluno e não no aluno em formação?
Porque escolher professores que não lecionassem a disciplina de Língua Portuguesa?
Assim, este trabalho procurou responder quais foram os sentidos construídos
pelos leitores e quais conceitos metafóricos serviram de base para a construção dos
sentidos. Com efeito, teve como objetivos verificar como a metáfora contribuiu para a
construção de sentidos dos participantes em um evento de leitura e quais tipos de relações
se estabeleceram entre a metáfora e as manifestações dos leitores no processo de
interpretação.
É relevante ressaltar que escolhemos trabalhar com professores, que são eles
que contribuem e exercem enorme influência na formação do aluno. Assim, ao realizarmos
um evento de leitura com esses profissionais, pudemos perceber como eles co-construíram
sentidos para o texto proposto. No processo, verificamos ainda que, para construir o sentido
do texto, os participantes utilizaram tanto metáforas quanto expressões idiomáticas de
caráter metafórico. Assim, por meio da negociação de sentidos, eles construíram, com a
mediação da pesquisadora, a compreensão global do texto.
no evento de leitura anterior percebemos que a ausência de mediação
dificultou a construção de sentidos e resultou no fracasso da coleta. Nesse ponto, pudemos
refletir que, se mesmo professores, com tantos anos de profissão e experiência têm
dificuldades para, sem mediação, interpretarem coletivamente um texto, os alunos em sala
110
de aula, sem uma orientação adequada, têm resultados insatisfatórios nas atividades de
leitura.
Com efeito, a realização desses eventos de leitura contribuiu para repensarmos
nossa prática docente e, por conseguinte, melhorarmos a qualidade de nossas aulas,
permitindo, dessa forma, que nossos alunos sejam beneficiados com a ação do professor
como mediador de um evento social de leitura em que o aluno tenha voz e participação
ativa. Esperamos, assim, que a leitura deixe de ser abordada em sala de aula na visão
tradicional em que uma autoridade interpretativa que apresenta “o sentido correto” do
texto.
Ressaltamos, que não é nossa intenção culpar o professor pelo fracasso dos
alunos no campo da leitura, mas não podemos deixar de nos questionar sobre qual seria a
razão para que tal fato ocorra. A partir das respostas dadas pelos professores no perfil dos
informantes, no questionário e do desempenho de cada um nos eventos de leitura, podemos
constatar onde se encontra a falha.
O discurso do profissional que sabe da importância do uso de textos
paradidáticos em sala de aula e que acha relevante que a leitura seja priorizada no processo
de aprendizagem está muito distante da sua prática docente diária. Esse fato ocorre porque
esse profissional tem dificuldades para utilizar textos paradidáticos em sala de aula porque,
simplesmente, não sabe como fazê-lo. E não o faz porque não sabe como. Não lhe foi
ensinado.
Temos consciência de que iniciativas, com o objetivo de sanar esse problema,
vem sendo apresentadas pela Secretaria Estadual da Educação no sentido de atualizar esses
profissionais. Entre elas estão o EMR (Ensino Médio em Rede) e a Teia do Saber. Essas
iniciativas, no entanto, apresentam a falha de não atingir todos os profissionais. Não
podemos esquecer que temos professores atuando no ensino particular e no ensino público
municipal. Além disso, temos outros tantos profissionais que lecionam Brasil afora e que
nem sempre têm acesso a cursos de capacitação.
111
Ousamos, portanto, propor uma transformação na forma como os cursos de
licenciatura são estruturados. Sugerimos que seja criada, em todos os cursos de licenciatura,
uma disciplina que capacite o futuro professor a trabalhar de forma eficiente a leitura dos
diferentes tipos de textos, como crônicas, em suas aulas, independente das disciplinas que
lecionem, porque, para transformarmos o aluno em formação, temos que formar o
transformador, o professor.
113
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118
_________________________________________________
Anexos
119
__________Anexo I_______________________________________________
DADOS REGISTRADOS EM ÁUDIO E TRANSCRITOS PARA ANÁLISE
COLETA A
TRANSCRIÇÃO DA COLETA DE DADOS REALIZADA EM 08 DE SETEMBRO DE
2006.
TEXTO: A VERDADE ESTÁ NA CARA, MAS NÃO SE IMPÕE, de Arnaldo Jabor.
Duração 40 minutos.
Participantes: professores do ensino médio no período noturno
C. M.
G. L.
H.
1. P: Podem, comentar, o que acharam de interessante no texto...
2. M.: O Arnaldo Jabor é: Eu estou trabalhando para olhar os podres dos outros,
principalmente da política, para mostrar para vocês Eu enxergo o Arnaldo Jabor assim,
qualquer crônica ou crítica que ele fazer, tanto para criticar ou para elogiar, vai ser
sempre cutucando a onça com vara curta...
3. G.: Ele fala sobre o governo Lula, sobre os fatos que ocorreram, os podres do
governo...
4. C.: Na verdade, do que eu entendi, ele não fala do que ocorre no governo Lula,
como ele coloca aqui. Ele sempre tem alguma coisa para dizer de ruim e ele vai criticar
todos os governos. Ele não disse coisas ruins do governo Lula. Nessa crítica aqui ele foi
mais contundente por causa do escândalo, foi essa roubalheira toda...Isso é normal.
Ocorreram em todos os governos brasileiros.
5. L.: O que acontece? Hoje está aberto, está se falando a verdade, mostrando... Fulano
fez, sem provas...Isso é notícia, isso é mentira, isso é faz de conta. Daqui a pouco aquilo era
verdade. Você pode ficar num mundo de mentira que ninguém vai brigar com você.
120
6. H.: Em todos governos acontecia, sempre houve, as provas não existem...Eles
costumam fazer do mesmo jeito, até pior...
7. G.: Imagina, isso que vocês estão vendo, não é o que vocês estão vendo. Isso se torna
uma coisa tão ridícula, as pessoas começam a acreditar...Está se acreditando em uma
mentira...
8. M.: E aí que temos uma eleição. Está critico.
9. C.: Ele está ganhando no Nordeste
10. G.: Só no Nordeste
11. L.: Acho que não é no Nordeste não. Porque aqui tem bastante gente que está
votando nele por causa do bolsa família, isso é importante. O dinheiro, esmolinha, sem
ofender ninguém... isso é importante.
12. M.: A bolsa família atinge que classe? Aquela classe que não tem acesso à cultura,
não tem acesso à informação... no Nordeste não tem.
13. C.: é a mesma coisa.. a mesma população...
14. P: Hum
15. H.: Independente da região...é a classe... o pobre vota com a barriga?
16. G.: Não com a barriga, uma coisa que me incomodou muito e eu acho que com a
facilidade, muita gente, conheço pessoas que deixaram de trabalhar porque tem o sei
quantos filhos, agora tem a bolsa família, não precisa trabalhar, é aquela coisa de dinheiro
que vem fácil...
17. C.: É tão pouco dinheiro
18. L.: Mas se o cara está passando fome, no fundo da periferia... poxa, uma cesta
básica é uma perspectiva de vida, não tem o que comer...Para ela, tendo o que comer, está
bom. Não é aquela pessoa que almeja alguma coisa, vai em busca...Não, é aquilo, tem para
hoje? Tá bom, amanhã eu vejo
19. C.: E não tem controle...É uma coisa grande. Um pai de aluno que não tem direito
recebe... Eles sabem que não tem direito, mas eles vão atrás...
20. G.: ... devido à ignorância da população...O que o governo está fazendo? estão
legitimando a bandidagem ...O roubo está acontecendo, o desvio está acontecendo, e ser
bandido está dando certo, está valendo a pena...
21. H.: O povo pode ser ignorante, é uma coisa, mas burro ele não é.
121
22. M.: Eu acho assim, Arnaldo Jabor não fala para esse tipo de povo. Por mais que a
gente vire e fale assim: meu Deus do céu é incrível que esse povo não veja o que está
acontecendo, não é possível que não vejam que o Lula montou uma quadrilha no governo,
que desviou milhões...
23. C.: Ele não teve acesso a isso...
24. M.: Agora, quem é que mostrou isso para nós. Nós que temos uma capacidade de
entendimento, nós que não somos o povo que precisa, esse povo que acredita nesse político
que está aí e que bate no peito e diz que é igual a esse povo simples, por isso que ele está lá,
e ele acha maravilhoso isso, foi uma conquista dele, mas nós sabemos que não só dele, mas
desse povo que também ele compartilhava, ele também era de uma classe sofrida, não tem
como... Esse pessoal que apóia, esse pessoal que gosta, não tem como você chegar e dizer
olha, está aqui, olha, esse governo que você quer pôr para governar de novo, roubou o seu
dinheiro. Está aqui. Eles não vão acreditar. Eles não vão acreditar em jornalista, em
Arnaldo Jabor, eles não vão acreditar nas pessoas que mostraram isso para nós, Arnaldo
Jabor, foram os jornalistas. Até que ponto a dia mostra essa situação da forma que
realmente é para nós. Porque para eles não vai mostrar. Para nós, para eles não vai mostrar.
Por mais que escreva o dossiê foi comprado... Você foi roubado por aquela pessoa. Eles
não vão acreditar.
25. G.: Não porque eles pensam na barriga....
26. M.: Mas não só com a barriga. Eu dei aula em Paraisópolis, eu sei de famílias de avô,
avós, de tio, tia de terceiro grau, que adotou criança, adota cinco criança, chega na escola,
eles iam buscar a bolsa família na escola, chegam com cinco crianças adotadas, sendo que
você mora num chiqueiro. Essa família, junto com essas oito crianças. São cinco crianças
que não são filhos deles. Como se a adoção de cinco crianças para o cidadão?
Justamente para ele ir lá buscar oito bolsas famílias. Isso é o que eles conseguem enxergar.
Para eles, esse cidadão me deu a bolsa família, e pronto, esse cidadão me deu o salário
mínimo em R$350, 00, para mim basta.
27. L.: A Marta fez o bilhete único. Não foi reeleita. O que o Serra fez?pode usar três
ônibus, antes era liberado. Eu ouvi, devia ter votado na Marta porque o Serra diminuiu.
Serra queria diminuir o horário. Diminuir o número de ônibus. Eles se sentiram ameaçados,
voltaram...Eles vão querer mudar? Não vão querer mudar.
122
28. H.: Tipo de governo...governar para esse povo?
29. G.: Veja na escola. O que os alunos fizeram com material que a gente deu no começo
do ano? O que eles fizeram? Dois dias depois, cadê seu caderno? Preciso comprar, não
tenho. Não precisa comprar caderno. A escola deu faz dois dias. O pessoal entregou para
você . Nem levaram embora....
30. C.: Tudo que é dado, eles não valorizam. Essa geração tem muito disso.
31. M.: Está dando...Estamos mostrando para eles. Olha isso daqui. Veja o que está
acontecendo, até com o seu dinheiro. Aumentou seu salário para 350 reais, no governo
Lula, ótimo...e daí? Ele vai continuar aumentando meu salário.
32. P: Como você me explica essa analogia que o Jabor faz com esse governo psicopata?
33. G.: Que não se entende nada... Eu não vi nada, não sei de nada. Ele se coloca em uma
situação de coitado. o fez nada...Coitado...foge do assunto, por isso ele diz que é um
psicopata...Aconteceu tudo isso e eu não sei de nada...Não foi comigo...
34. H.: Eu não matei, não roubei...
35. L.: O Debate, ele não foi em nenhum debate com outros candidatos, ele não vai mais.
Ele não responde...
36. P: E quanto ao trecho “Seus membros riem da verdade, viram-lhe as costas, passam-
lhe a mão na bunda. A verdade se encolhe, humilhada, num canto” e esse pedaço?
37. M.: Que está sendo ridículo...
38. G.: Você roubou, está errado, está errado...ele não está nem aí...
39. C.: No começo foi... ele mesmo...(???)
40. L.: O Lula ... você brigar pelo certo...
41. M.: O Lula teve o desplante de dizer...como é que pode o Delcídio não mentiu. Como
ousar ser honesto? Ser honesto vai ser contra o que ele diz, vou ser honesto, vou deixar de
ser um psicopata. Vou deixar de ser aquela pessoa que não , ou que deu amnésia. Eu não
posso ser honesto, a partir do momento que eu sou honesto, eu digo é verdade, eu roubei,
eu tirei de vocês para ficarmos mais no poder, seja qual for o motivo...eu vou deixar de
ser aquela pessoa que não sabia de nada, que não tinha noção do que aconteceu, igual
qualquer criminoso, ele fala, mas eu não fiz isso.
42. L.: Voimagina, cria um mundo de mentira e começa a acreditar naquilo. Eu não
fiz...
123
43. M.: Sou psicopata. Você cria uma situação e passa a acreditar naquilo.
44. C.: Mas eu não acredito que seja...
45. G.: (...) fiquei sabendo que uma pessoa que está com licença saúde, quando vai fazer
dois anos, passam dois anos eles são obrigados a dar alta, então o que eles estão fazendo? é
norma, não importa como a pessoa está . Você pode estar morrendo, tem que entrar com
outro pedido... não pode entrar com benefício, você tem que entrar com novo processo.
46. C.: Por que ele está fazendo isso?
47. G.: Porque tem que cobrir alguma coisa de errado
48. C.: Não sei se é impressão minha, mas assim::: o Jabor diz que isso tudo é graças ao
Roberto Jefferson né, porque ele que colocou, abriu a cortina da:::, como é que ele
coloca...do destino...
49. H.: como se a política fosse de enxergar
50. M.: Ele coloca que graças a ele começou-se a enxergar tudo... Nos outros governos
havia a mesma coisa e a gente não sabia. Achava que... supunha, mas não sabia. Aí ele fala
da democracia. Que falsa democracia que é essa? Que país democrático é esse, que tanto se
fala em democracia e não tem...
51. L.: E o governo fala do povo, primeiro o povo...é menos do povo e mais da elite....
52. G.: quando você vê uma cena na rua... e vê de novo na televisão...Estava passando um
monte de bandeira e depois é editado no jornal, tinha o pessoal do partido mandando tirar
as bandeiras do sindicato...
53. H.: Para mostrar que é um governo do povo...
54. M.: Isso sempre teve, mas a diferença maior, inclusive foram buscar, abriram as
contas, fizeram um reboliço na conta do FHC, na conta dos ministros que eram
responsáveis pelos oito anos de governo, não encontraram nada. Quer dizer, por mais que
isso tenha acontecido, nos oito anos de PSDB, ou nos outros anos que foram...nunca foi
assim...
55. H.: Nunca foi mostrado
56. C.: Nunca foi provado
57. M.: Foi provado que não existia o roubo como esse daqui, porque mexeram na conta
de pessoas e não encontraram nada. Inclusive na dele, na da mulher, fizeram para mostrar
124
que, olha, vocês estão reclamando que no meu governo roubou, vou mostrar que nos outros
também roubavam...Não acharam isso...No PT houve, mostrou-se isso...
58. G.: Você ouve falar antes, se a gente pára, para voltar um pouquinho antes, você vai
relembrar o que era dito no PT, o que era dito pelo pessoal do PT quando tinha debates nos
outros governos, o que eles falavam? Não, a coisa não vai funcionar assim, nós vamos fazer
diferente. Vai todo mundo provar por a mais b que vai ser tudo diferente se a gente ganhar
e eles acreditavam nisso e já tinham deixado um pouco claro, que eles iam fazer esse
caminho, caso ganhassem. Eu ouvi várias vezes, inclusive, em rádios, jornalistas falavam
isso. Quando mostraram as votações no plenário, na Câmara, estava explícito, mas eles não
deixaram assim... esta faltando alguém chegar, ou o Lula ou um representante, chegar e
falar para todo mundo, mas nós avisamos que íamos fazer isso, vocês que não acreditaram.
Nós avisamos, deixamos claro, porque está todo mundo tão abismado, porque está todo
mundo tão assustado? A idéia era essa. É lembrar como eles conversavam, como eles
discutiam, é que ninguém presta atenção...O povo não quer saber... Não importa quem
ganhe, o que importa é que eu continue bem...
59. H.: Meu churrasquinho, cerveja...
60. M.: Eles não têm ambição...Eu tenho seguro desemprego, então eu sei lá...no emprego
não ganha tão bem assim...
61. L.: Não importa que roube, eu sou roubado o tempo todo. Então...
62. P: Chega no que o Jabor fala, denunciar para que? Se indignar para que? Fazer o que?
63. G.: Não acontece nada...
64. M.: Eu fico indignada com o jornal nacional, e ver lá, em cadeia nacional, e vem o
pessoal dizendo que não aprovou o aumento do salário mínimo, porque não teve
dinheiro...E coitado do aposentado que está gastando em remédio uma fortuna, daí vem o
intervalo e volta e vem o judiciário e diz que subiu o salário 300%. Eu penso, até dois
minutos atrás o governo não tinha dinheiro para nada e agora está subindo...Quer dizer, o
cara ganha 20.000 reais e o aposentado, coitado, e eu fico revoltada na frente da televisão. .
Eu tenho dois empregos, tenho minha faculdade... tudo bem...mas e o cara que tem que
sustentar a família com um mínimo...
65. L.: Não cai a ficha....
66. C.: Aí passa revolta na Febem...coitado
125
67. M.: Aí o preso custa quanto? Mil reais por mês...
68. G: Ele, o bandido, não trabalha...para sustentar aquele cara lá?
69. M.: E o povo não pode comprar o arroz feijão...nesse país...Para que vou denunciar.
Faz vinte anos, nesse país, acabou com a saúde...e acabou com a educação. O que eles
fizeram com a imagem do professor? Faz vinte anos que escuto, professor está em greve,
acabou com professor...então...o pai não respeita, o aluno também não, cada vez que você
resolve ficar em greve, o que eles falam? Professor ganha muito, tem carro...Mas eles não
sabem quantos empregos você tem...
70. G.: Essa frestinha da cortina que é suficiente para eles enxergarem.
71. L.: Você acha esse governo competente?
72. C.: Eu acho
73. L.: Por que?
74. M.: Uma eficiência total. Nenhum conseguiu fazer o que ele fez em 4 anos.
75. H.: Meia boca
76. C.: Se você for bom funcionário, e tiver um aumento, o que eu fiz como funcionário?
Eu vou ser obrigada a... mas com razão. (???)
77. G.: Discurso populista
78. M.: Por isso que ele fala, ditadura virou o petismo
79. G.: E não é uma ditadura, o que ele está fazendo? Uma ditadura branca...
80. M.: É conveniente...Muda só aquilo que está incomodando. Tá incomodando. muda...
o resto deixa...
81. L.: Brasileiro é muito acomodado...
82. H.: Qualquer outro lugar aí já teria...
83. G.: Por muito menos, o Tony Blair falou que daqui um ano ele vai falar em
renúncia...A Inglaterra inteira já falou para ele renunciar... e ele vai cair... capaz de não sair
agora, mas ele cai...
84. C.: Acho que depende também do tamanho do país. Facilita.
85. H.: Difícil controlar...
86. C.: Acho que não importa o tamanho do país, desde que você consiga fazer com que
quase tudo funcione.
126
87. L.: Você perde o controle, mas sempre alguém vai controlar para você, para ver
que vai controlar...se você tem uma equipe que consegue...
88. C.: Mas é mais difícil...
89. M.: Agora, ele coloca na última frase, que uma tristeza, que ele fala assim, se o
Lula reeleito, é a prova que é a mentira pela verdade e... dá uma tristeza, porque?
90. G.: E é proposital...é para você se mexer...
91. L.: Porque está comprovado que ele vai ganhar...a mentira vai ganhar de novo...
92. G.: O mundo todo, a revolta toda das pessoas, a gente fica no meio, entre o que tem
muita grana e o pobre, como é que nós ficamos?
93. M.: Significa o que? Que vai continuar esse tumulto, essas rebeliões, para o povo ficar
mais revoltado? Nós estamos caminhando para isso? Para essa guerra? Porque é isso que
ele está falando aqui...
94. P: Hum...
95. L.: A massa, a segurança... São mais 4 anos...A previsão do orçamento para o
próximo ano é bem maior, se ele conseguir se reeleger, vai...Não...
96. M.: Entendeu? Eu vejo isso, a rebelião, é troca de valores, inversão de valores, são os
próprios valores...
97. P: ((lendo)) Ficaremos mais cínicos, mais egoístas e mais burros.
98. Carmem: Burro eu não diria.
99. M.: Ficaremos mais cínicos, talvez, mais egoístas, talvez, mais céticos... se é possível
ficar mais cético do que se está. Eu achava que para tudo de ruim como está aqui, tinha
um limite, mas estou vendo que sempre você pode ultrapassar esse limite.
100. G.: Ele vai ganhar em cima de quem, agora? Em cima do povo, dos pobres. A
pesquisa da Globo, por região do país? Onde ele vai ganhar?
101. H.: O povo nunca vai...
102. L.: Nordeste. Sul e Sudeste, ele está perdendo, mas lá para cima ele ganha....
103. M.: E estão, inclusive, fazendo campanha para que as pessoas não votem nulo.
chegaram a dizer o absurdo, eu não entendo muito disso, mas ouvi em rádios o absurdo
de fazer conta matemática, de que se você votar nulo é a mesma coisa de você dar voto para
ele. Não vote nulo, porque se você votar nulo não vai contar como voto nulo. Gente, voto
nulo é voto nulo, não vai para ninguém.
127
104. C.: Voto em branco é diferente. Mas voto nulo? Dizer que está contando voto nulo?
Por que?
105. G.: A quantidade de gente que está fazendo entrevista e está dizendo que vai votar
nulo é muito grande. De fato, está ficando exposto contra o governo e assustando. Então
tem que dar um jeito. Vamos mostrar que esse voto nulo é para alguém, mas não é para
ninguém, não pode transferir voto nulo para ninguém. Como pode fazer uma pesquisa de
opinião, uma pesquisa de porcentagem de voto de um candidato e contar com voto nulo?
106. M.: Eu estava falando com um petista e a gente cutuca com vara curta mesmo, e aí, o
que você tem para falar? ele falou um monte de coisa, começou a falar que o governo
fez uma campanha para o voto consciente. É lógico que eles estão fazendo campanha para
voto consciente, porque eles estão morrendo de medo porque as pessoas não querem mais
votar. As pessoas estão desestimuladas para votar, estão se articulando para não votar nessa
eleição. Então tem que fazer mesmo.
107. H.: Ou justificar.
108. C.: Precisa conscientizar, em quem você votou na outra eleição? O que ele fez...
109. H.: Você vai correr atrás do cidadão?
110. M.: Eu fico triste porque eu penso em anular meu voto... eu penso nisso, mas não sei
se vou fazer...em algum tempo atrás eu jamais poderia imaginar... eu não posso, eu tenho
que exercer o meu direito... hoje eu penso votar para que? para quem? não é? Do jeito que
está? Vai fazer diferença?
111. C.: É triste. Você ver tudo isso...
112. M.: Você começa a ver, pega a história política brasileira para ver, você tem as
mesmas pessoas brigando por um cargo no mesmo partido, hoje é senado, amanhã é
congresso, depois é vereador, sempre a mesma elite política, que estão sempre mudando,
não resolvem nada, só vão mudando de posição... não estão fazendo nada...
113. G.: Só muda o sapato, a roupa e o riso.
114. H.: E a cara de pau.
115. L.: È Waldemar da Costa Neto, é Maluf, Delfim Neto..
116. M.: Vou perder a boquinha?
117. G.: E tem Clodovil, Enéas... E o Collor, Do jeito que ele saiu....
118. C.: Mas o Maluf?
128
119. M.: Uma boa parte...Eu conheço pessoas que votam nele, rouba mais faz...
120. G.: Genoíno, todo mundo...
121. H.: é uma religião...
122. G.: É, uma seita...
123. M.: Teve um professor que virou para nós e falou: eu acho muito bom e eu vou
discutir isso com meus alunos, sobre a propaganda que o TRE está fazendo para
conscientizar as pessoas a votar. Qual é o mote? Qual é a propaganda? Você é o patrão.
Dia primeiro de outubro, quem escolhe é você. O seu funcionário. Você é o patrão, você
que emprega, voque escolhe, você que contrata. eu falei, vou discutir isso com meus
alunos porque eles precisam ter a consciência que quem vai mandar dia primeiro, são eles.
Eu pensei, porque falar não adianta. Achei muito louvável, e as pessoas tem mesmo que ter
a consciência de quem manda no dia primeiro de outubro somos nós. E depois, o que vai
acontecer? Nós vamos continuar mandando? Eu vou ser o patrão? Eu vou poder exigir
coisas que o patrão exige? Eu vou poder exigir coisas boas, atitudes boas para a empresa?
Se eu sou patrão, estou escolhendo o candidato para a empresa. Na minha opinião. Eu vou
poder mandar embora se eles forem maus funcionários? Eu vou poder continuar sendo?
Então que consciência é essa que o professor ia passar para os alunos? Só para eles
votarem? Se sentirem patrões no dia primeiro de outubro? Ele pode cansar de falar isso,
pode cansar de conscientizar os alunos. Os alunos não estão nem aí. Nem da vida deles
sabem, a maioria. Como pode uma pessoa instruída, uma pessoa que está a par de tudo isso,
achar que uma propaganda de você é o patrão vai resolver. Opinião, dele acho louvável,
mas vamos pensar um bocadinho nisso? Pára para interpretar. Não é isso que queremos
passar para nossos alunos? Que passem a interpretar, que passem a entender?
124. C.: Mas eu acho que é válido na propaganda...
125. M.: Não, é válido porque as pessoas...Qual é o objetivo dessa propaganda?
126. Ca.: Fazer com que eles votem...
127. H.: Você como cidadão, você escolhe quem trabalha para você e para seu país.
128. L.: Mas isso não vale porque a gente não tomou ainda nas mãos o nosso poder de
cidadão.
129. M.: Mas ir na Câmara, na Assembléia, a gente não faz isso não é porque não temos
instrução, mas porque somos acomodados...se nós somos os patrões deles, nós somos
129
mesmos... É o outro lado da moeda, mas e depois? que depois a gente se acomoda.
Então, acho que ela é correta sim, mas não pode parar pela metade.
130. L.: Até que ponto esse professor quer trabalhar com esses alunos?
131. C.: Eu acho que tem que trabalhar.
132. M.: Não tem noção, tem que fazer uma nova escola, pegar desde criancinha, o que foi,
foi, o vai conseguir mudar, mas começar com os pequenininhos, pegar os maiores e
mostrar para eles, que eles podem mudar os filhos deles...
133. G.: Existe uma coisa bem ridícula...uma colega da prefeitura, teve festinha de
formatura. Quarta série primária. Então a avó gravou a fita da festinha, e enquanto a criança
estava se apresentando, cantando e vestida de Lincoln E a musiquinha era assim: nós somos
os melhores, então vem com aquela entonação, pensem num americano falando...a avó
explicando na festa de formatura de Quarta série, e a musiquinha era... a música é toda
assim...Então, você ensina para a criança o que você quer. Você é bom ou mal...
134. M.: E doutrina porque a criança não tem noção do que ela está escolhendo
135. Gisele: No momento que ela percebe que pode perceber, a maioria está... não a
ser cidadã...
136. G.: É assim que funciona...
137. P: ((lendo)) Toda a complexidade nesse país estará transformada numa massa de
palavras de ordem, preconceitos ideológicos e oposições...
138. L.: Ou você é meu amigo ou meu inimigo. Ou você concorda comigo ou é contra
mim. Não tem uma terceira opinião. Está do meu lado ou é contra mim.
139. G.: Essa parte do Nacional, internacional, vou nacionalizar, não vou pagar a vida,
não ao Banco Mundial, é bem a fala dele... Nós contra eles...
140. L.: E aquela outra dissidente do PT?
141. G.: A Heloísa Helena
142. M.: Acho que na Carta Capital do mês passado, tem um cara, que há dez anos atrás...e
hoje ele dá aula de marketing, na playboy, mas ele trabalhou...(???)
143. G.: Mas vem de cultura...Eles pegam essa noção de que as pessoas que tem dinheiro é
roubado, que foi herdado. Mas herdado de alguém que um dia trabalhou para ter esse
dinheiro...
144. H.: O pobre só se ferra...e trabalha e não ganha dinheiro
130
145. C.: Pobre trabalha para o que? não ganha nada...
146. G.: Tem a bolsa...Quando cheguei do serviço, estou cansado... Três e quatro horas...
uma diversão...Já pensou o cansaço. Ele não está preocupado, com o cansaço eu não vou
mais. Não, vou descansar para recuperar. Agora, o povo quer isso? Não quer. Para que vou
discutir?
147. M.: Quer TV a cabo...
148. R: (???)
149. L.: Mas se eu quero falar, eu não posso...
150. G.: (???) foram investigar, era da Caixa... (???) era um casal de velhinhos que morava
lá... é ridículo, não é?
151. H.: Não vamos nos aposentar mesmo...(???) Aposentadoria...
152. G.: Eles pensam que é primeiro mundo, que o resto esqueceram de acompanhar,
salário, Qualidade de vida...oferta de serviço público...
153. R: (???)
154. G.: Eu não sei se o Arnaldo Jabor faz parte disso, se está no meio, ou se ele pega...ou
se ele estuda essa parte de política para estar colocando essa informação.
155. C.: É claro que ele sabe o que fala, senão não estaria escrevendo.
156. M.: Ele tem uma capacidade de se expressar como poucos. Estar dando informação
muito rica...Ele é um dos poucos, que fala exatamente o que gente vê, que a gente talvez
interprete, mas nós não estamos lá, não se preocupa em saber, tem uma campanha que diz,
você lembra em qual deputado federal você votou na última eleição? Ah, não sei, você
lembra? Quem é? Por que a pessoa faz isso? Porque a princípio, teoricamente, devia votar e
depois ir lá, ver o que a pessoa está fazendo, que lei está fazendo, se interessa para ele, mas
o objetivo do brasileiro não é ir no congresso ver se esse deputado está correto... é saber
se ele lembra do nome ou não é o de menos. Tem gente para fazer isso. Muita coisa que ele
fala, o Jabor, é isso, e muita coisa que a gente acontecer é isso, brasileiro tem essa
mentalidade, não, tem alguém que fala...Eu não preciso saber em quem eu votei. Não
preciso lembrar, sei que votou em alguém. Se essa pessoa está fazendo alguma coisa por
mim ou não, alguém tem que me dizer... agora, até que ponto esse comodismo é bom para
esse cidadão ou é perigoso, entende? Eu não acredito que uma pessoa seja tão acomodada,
mas tão acomodada, ao ponto de virar aquela cobra, que você vai lá, cutuca e ela não se
131
mexe, e você vai lá e ela não se mexe e quando você menos espera ela o bote...Não é
possível que o comodismo seja tão grande a ponto de acontecer alguma coisa com esse
cidadão e ele não se mexer.
157. H.: O que precisava ter? A união...
158. C.: Aconteceu isso com o impeachment do Collor, foi assim
159. G.: Não, foi porque o PT e a CUT foram impulsionando...
160. H.: Não, mas quem foi lá na frente foram...
161. C.: Eu só vi que o Collor estava errado.
162. M.: Bom...alguma coisa precisava ser feita, e nós fomos lá e ajudamos...
163. L.: Com certeza eles... alguém vai falar, alguma coisa precisava ser feita, e nós fomos
lá e ajudamos. Alguém tem idéia completa do que aconteceu?
164. M.: O Collor mexeu com a poupança do povo...
165. G.: Alguma coisa que quer dar o troco...é mexer no bolso....
166. M.: Tem um momento que tem que deixar de ser comodista...Se o momento de deixar
de ser comodista é quando mexer no bolso...
167. H.: Todos fizeram...
168. R: ???
169. R: ???
170. G.: Eu ainda acho que em algum momento... Eu ainda acredito, porque no dia que eu
não acreditar mais eu saio daqui, não tem porque continuar. Eu acredito, que de alguma
forma, essa acomodação, tem que acabar... nem se for por cinco minutos, uma tarde, saindo
na Paulista, quebrando tudo, fazendo passeata, mas eu tenho certeza que uma boa parcela
sabia o que estava fazendo...é só nisso que eu acredito, que em algum momento essa
acomodação acaba Quando essa acomodação acabar para todos, isso aqui não acontece
mais. Esse governo acaba.
171. M.: Acho que aquilo também foi um show
172. L.: A gente acaba dando nome... show. Eu acho isso porque conheço uma pessoa que
estava no meio, e foi fazer aquilo sabendo, porque queria, e era petista...A pessoa que eu
conheço não era muito...risos
173. G.: (???)R: Mas era para fazer uma propagandazinha...
132
174. M.: Os adolescentes todos, ...você vai começar a ver o que você tem na sua mão para
fazer alguma coisa...mexer para começar a fazer alguma coisa...mas se você não tiver uma
cadeia, a outra pessoa, a outra pessoa... você não tem...Se indignar sozinho? Eu, Arnaldo
Jabor, vou me indignar para que? O que eu posso fazer é isso...
175. C.: Eu vou votar nele de novo porque está fazendo tudo isso para a população. Olha
lá...
176. M.: Eu posso dizer que alguma coisa ele fez. O Arnaldo Jabor se indignou? O
máximo que ele pode ter conseguido é ter publicado isso num jornal. Não sei de onde você
tirou
177. P: Da Internet
178. M.: Então ele fez alguma coisa. Parou por aqui? Parou por aqui.
179. G.: Ou não.. Dependendo da pessoa que lê...fala para outra..assim vai...
180. L.: Alguma coisa vai acontecer, alguém vai sair... eu talvez não, por uma série de
razões...mas a gente faz, só que é uma coisa isolada
181. M.: Eu acho que é isolado...
182. H.: Nós somos a maioria...já que somos as pessoas que vamos eleger, escolher...Eles
precisam de nós. Nós somos a maioria...
183. G.: Nós somos a minoria da maioria...
184. H.: não, o contrário, nós somos a maioria...Eu penso assim.
185. M.: Acho que é isso...
186. P: Obrigada...
133
__________Anexo II_______________________________________________
DADOS REGISTRADOS EM ÁUDIO E TRANSCRITOS PARA ANÁLISE
COLETA B
TRANSCRIÇÃO DA COLETA DE DADOS REALIZADA EM 07 DE JULHO DE 2007.
TEXTO: A VERDADE ESTÁ NA CARA, MAS NÃO SE IMPÕE, de Arnaldo Jabor.
Duração 33 minutos.
Participantes: professores do ensino médio no período noturno
G. Ly.
H. M.
L.
1. P.: Bem, o texto: “A verdade está na cara, mas não se impõe”, começa assim: “O que foi
que nos aconteceu? No Brasil, estamos diante de acontecimentos inexplicáveis, ou melhor,
“explicáveis” demais. Toda a verdade foi descoberta, todos os crimes provados, todas as
mentiras percebidas. Tudo aconteceu e nada acontece. Os culpados estão catalogados,
fichados, e nada rola. A verdade está na cara, mas a verdade não se impõe. Isto é uma
situação inédita no Brasil”. Queria que vocês começassem comentando esta frase: “A
verdade está na cara, mas a verdade não se impõe”.
2. Ly.: Todo mundo o que acontece, mas ninguém toma uma atitude? Todo mundo o
que tá acontecendo?
3. G.: O que eu acho é assim olha, a verdade está na cara, porque é assim, escrito, na
tv, tá no rádio, na mídia impressa, porém é::: como se ela não como se ela fosse escondida.
4. L.: Tão manipulando ela.
5. P.: Então o que vocês estão dizendo que a verdade apesar de estar cristalina pra todos
verem, ela acaba sendo manipulada é isso?
6. L.: Manipulada.
7. G. Hã, hã.
134
8. H. Tornando-se uma mentira, na verdade.
9. L.: É, você acredita no que eu quero que você acredite, então eu quero que você acredite
que eu sou um santo. Da forma com que passam isso você acaba acreditando.
10. M. Eu acho que isso mostra a inércia do povo brasileiro mesmo.
11. Ly.: Eu também. Acho que a gente não faz nada pra mudar.
12. M.: Ninguém acredita que fazendo alguma coisa vai mudar.
13. Ly.: Como assim?
14. M.: Eu sei que não vai ter nenhum resultado porque isso vai ser camuflado. Eu posso
estar mexendo na poeira que está aqui, começando a fazer alguma coisa, saindo da inércia,
posso começar a mexer na poeira, mas ela vai continuar ali.
15. Ly.: Ah tá.
16. H.: Isso é interessante, porque a mentira é tão grande que apesar de se ter uma verdade,
ninguém se manifesta e mesmo assim os que se manifestam são calados, tesourados ou seja,
são subornados, apagados, nessa parte é isso.
17. G.: Concordo.
18. P.: Ou seja, a questão da verdade estar na cara, de acordo com o que vocês estão
falando, é a questão da apatia do povo. Apesar de estar na cara de todo mundo, ninguém vê
função prática em lutar por essa verdade, é isso? Uma apatia?
19. Ly.: o acho que é não querer lutar. Querer até quer, que não possibilidade de,
mais ou menos assim: De que adianta só eu querer mudar? Só eu querer fazer?
20. H.: O brasileiro é um povo pacífico, comparado aos povos estrangeiros. Lá fora,
qualquer coisinha o povo sai na rua, reclama seus direitos. Aqui, se acontece qualquer coisa
na parte política ninguém vai na rua, tirando o Collor que foi uma coisa planejada pela
Globo, brasileiro não tem garra pra ir cobrar os direitos dele.
21. G.: Não acho que o povo não tenha garra, o povo tem garra sim. Pra sobreviver nesse
país tem que ter garra.
22. M.: Concordo, o povo tem garra sim. Ele precisa de uma motivação pra fazer essa
mudança, achando que um começando o outro vai fazer e assim por diante.
23. G.: que se sabe que nunca vai se ter retorno. legal, está tudo escrito lá. Eu vejo
programas, sacanagens rolaram, roubaram, esconderam, mentiram. você fala: Quem é
que quis fazer alguma coisa? Porque se a gente fizer, o que vai ter de retorno? O vai
135
acontecer com os culpados? Nunca acontece nada. Porque para nós, ser uma verdade ou ter
uma verdade não tem diferença prática nenhuma
24. L.: Além disso pra quê? O Brasil ganha a copa e tudo se resolve. Agora a gente tem o
PAN.
25. P.: Então, a verdade está na cara, isso a gente já deixou claro aqui né.
26. G.: Sim, concordo.
27. M.: Claro.
28. P.: Mas ela não se impõe. Quer dizer, essa atitude de não se impor é causada pela apatia
Você não vê resultado, não vê punição, você não vê a lei sendo aplicada para eles.
29. L.: Isso mesmo. Isso é uma raiz, vem da colonização desse país. Ele foi colonizado
dessa forma. Ele já veio com um modelo de governo de fora pra dentro, então nós nunca
lutamos por nada. Se você pegar os grandes acontecimentos da história deste país, você não
o povo participando de nada, então, o que nós queremos? Fica difícil lutar, poucas
pessoas que têm consciência. Até porque o leve-leite cala a boca de meio mundo. Você
chega na frente, você tenta chamar a atenção, você fala: olha está acontecendo isso, isso
e isso. Ah, mas o leitinho das crianças está em casa, ele está garantido. Olha, eu tenho o
bolsa isso, eu tenho o bolsa aquilo. Fica difícil lutar contra tanto cala-boca. Eu penso dessa
forma.
30. M.: Como no império romano: pão e circo.
31. L.: É.
32. G.: Então a verdade não tem a menor força por conta desse descrédito que temos nas
instituições, no poder legislativo, no executivo e no judiciário.
33. L.: Porque eu vou arranjar para a minha cabeça?
34. G.: Claro, para se ter respeito tem que ser dar respeito não é mesmo? Alguém respeita
político brasileiro?
35. L.: É por isso que eu falo, de que adianta eu me expor? Que nem aquele caseiro lá,
daquele escândalo.
36. H.: Aquilo foi boi de piranha.
37. L.: Coitado esse está ferrado para o resto da vida dele. Nunca recebeu nada, não vai
receber e ainda nem emprego ele vai ter mais, enquanto que os outros continuam numa boa.
Para vocês verem, no último escândalo, da confusão no aeroporto, todo mundo esperando e
136
o Palocci passou na frente. foram entrevistar o povo que estava lá: Vocês acharam certo
ele passar na frente? Não, porque ele passou na frente? Ele não é melhor que ninguém. Ele
tinha que esperar como todos nós esperamos. E ele foi lá, passou na frente e pegou o vôo. É
aquela coisa de que nesse país político é “dotô”.
38. M.: Doutor?
39. L.: “Dotô” mesmo. Sabe o seu dotô? Acontece que eles não entendem que pra ser
doutor tem que ter um título. Não é assim, não, doutor tem que ter doutorado, mas aqui no
Brasil, todo político é doutor. Entrou para a política, virou doutor. Eu acho que isso impera
muito forte na sociedade brasileira. Sempre foi assim. Eu tenho o poder, eu faço o que eu
quero e acabou. Você não gostou? Problema seu. Eu vejo dessa forma.
40. M.: É isso mesmo, quer reclamar, quer pôr os bofes para fora, pode pôr, mas não vai
adiantar nada.
41. P.: Isso volta na questão de que a verdade está na cara, mas não se impõe. Não se impõe
porque ela não resolve, não adianta, é isso?
42. L.: Sim. É gastar vela boa com mau defunto.
43. Ly.: L. resumiu tudo.
44. P.: Mais alguém quer colocar mais alguma coisa?
45. H.: Não.
46. L.: Acho que é isso.
47. P.: Vou continuar então. (lendo) “Claro que a mentira sempre foi a base do sistema
político, infiltrada no labirinto das oligarquias”. E aí?
48. H.: Os poderosos como sempre.
49. P.: Então, esse labirinto de oligarquias? Os poderosos?
50. L.: Sim. Eles sempre mandaram nesse país, sempre fizeram e aconteceram.
51. P.: Tá, mas qual o sentido para você da palavra labirinto nesse caso?
52. L.: Porque são caminhos tortuosos.
53. G.: Porque quem não está dentro não tem noção de qual é o caminho. Hoje você me
interessa então sou seu amigo, amanhã, dependendo dos meus interesses particulares...
54. L.: E da confusão que você se meteu...
55. G.: Então, aí a gente muda.
56. L.: Pois é, se você meter o pé na jaca, aí o problema é seu.
137
57. Ly.: Tem também a questão do seguinte: O sujeito pode até ter boa intenção, mas uma
laranja podre no cesto acaba contaminando as outras.
58. L.: Com certeza.
59. Ly.: Quando você não sabe para onde vai, acaba se corrompendo.
60. L.: Sim, ou você entra ou te puxam o tapete. E aí? Você quer amanhecer com a boca
cheia de formiga? Não. Você entrar, afinal, eu vou ganhar também. Olha só: não tem
cobrança, eu estou no meio, eu vou ganhar também. O poder corrompe, me desculpe,
isso é em qualquer sociedade. O poder corrompe mesmo. E aqui parece corromper assim,
muito mais.
61. G.: Mas aqui é o nosso país, aqui a gente se interessa em saber.
62. L.: Não.
63. G.: É lógico, no tempo em que fiquei na Alemanha todos lá sabiam o que acontecia com
o Kohl quando era primeiro ministro primeiro ministro.
64. L.: que tem uma coisa G., o povo brasileiro está treinado para ver o mal que as
grandes nações fazem para nós. E isso com essa desculpa de que o Estados Unidos está
cobrando, o FMI e outros organismos internacionais os quais nós devemos realmente.Você
tira a atenção da elite brasileira. É como se eles fossem uns anjos. Eles não são anjos, eles
são responsáveis sim. Na hora que o povo cortar as garras dessas elites, sim, vai sobrar
dinheiro para melhorar a distribuição de renda.
65. G.: Mas quem disse que eu concordo com essa visão de inocência da política?
66. M.: O povo não é tão ingênuo e não é tão alienado a ponto de achar isso.
67. L.: Eu acho que sim. Nada que o leve-leite não resolva.
68. Ly.: É capaz de eu chegar e falar assim: vota em fulano porque ele prometeu que se ele
ganhar, ele vai arrumar emprego para o primo, do empregado, do meu amigo.
69. P.: Mas então não é uma questão de ingenuidade. Será que não é essa visão de
permissividade do próprio povo brasileiro?
70. M. É lógico.
71. L. Era isso que eu estava dizendo.
72. Ly.: Isso. O cara vota porque sabe que vai ter um ganho pessoal, alguma vantagem.
73. L.: É a lei de Gérson. Viu G.? Não é ingenuidade
74. G. Mas eu não disse isso, a M. falou ingênuo.
138
75. M.: Não, mas eu disse alienado no sentido de ser tão ingênuo ao ponto de ser tão
alienado que não perceba.
76. G.: Não, isso não.
77. L.: Também não concordo.
78. P.: Não é por isso que a verdade acaba não se impondo?
79. M.: É lógico.
80. P.: Então o que vocês estão dizendo que a verdade não se impõe nesse país, as pessoas
não tomam uma atitude, porque o próprio povo é corrupto? Ele tem suas pequenas
corrupções. É isso?
81. H.: O povo acaba se permitindo algumas coisas.
82. L.: Claro, ele vê um monte de gente roubando e levando vantagem.
83. Ly.: Farinha pouca, meu pirão primeiro.
84. L.: É, dá licença que eu estou com o meu pratinho.
85. H.: Qual é a vantagem? Eu vou levar alguma vantagem nisso? Assim, eu fazer
campanha política para fulano, mas qual é a vantagem? Que eu vou ser assessor dele.
86. Ly.: Até por camiseta, boné.
87. G.: Eu já fui para cada canto do Brasil de mochila e a gente continua vendo as mesmas
coisas. Lá onde eu dou aula na prefeitura, se trocou o voto do povo com um candidato que
todo mundo sabe que ele é bandido, que ele está ligado com o narcotráfico. E porque?
Para o povo ganhar no bairro uma pracinha. Pegaram um terreno e fizeram uma pracinha.
Ele foi eleito naquela região. Isso é fato. Eu fui para o Mato Grosso numa fazenda e tive
que tomar banho no rio, lavar a louça e a roupa no rio. Banheiro, você tem uma enxada ali
do lado e você sabe muito bem o que fazer com a enxada se quiser ir ao banheiro, porém, o
prefeito da cidade tinha a sua própria caixa d’água e o seu gerador ganho na época da
eleição para convencer meia dúzia de casinhas a votarem em quem ele queria que era o
prefeito da outra cidade. O povo toma banho frio, mas o povo vota.
88. Ly.: Toma banho frio, mas eles têm camiseta.
88. G.: Acho que é isso.
89. P.: (lendo) claro que não esquecemos a supressão, a proibição da verdade durante a
ditadura, mas nunca a verdade foi tão límpida à nossa frente e, no entanto, tão inútil,
impotente, desfigurada, broxa.
139
90. G.: É broxa com certeza. O Jabor chama a verdade de inútil. É isso.
91. L.: Isso o que?
92. G.: O que é que foi feita com essa verdade? Quando uma verdade aparece e não é inútil,
ela tem como função gerar uma conseqüência. E o que aconteceu?
93. L.: Nada. Quando votinha o governo militar tudo era escondido. Depois que deixou
de ser governo militar não abriu, escancarou. É que nem a história do cachorro que corre
atrás do carro. Ele late, late, late, quando o carro pára, ele não sabe o que fazer com o pneu.
Nós nunca tivemos a verdade, agora temos e não sabemos o que fazer com ela.
94. P.: Então a verdade acaba ficando broxa, impotente, no sentido de impotência não?
95. L.: Sim, é igual àqueles caras marombados. Adianta ter a verdade e não saber fazer
funcionar?
96. H.: Você está sabendo da verdade, mas não faz nada. Porquê? Porque você acredita que
isso não vai adiantar nada.
97. G.: Você tem uma geração mais velha com medo de uma ditadura e a outra mais
jovem é a geração do laissez-faire. A mais velha deixa a coisa do jeito que está e essa
geração que a gente tem em sala de aula não está nem aí.
98. L.: Estão mais preocupados com mp3. Tem alunos que me disse que tem candidato
dando mp3 e que vai votar nele para ganhar um.
99. Ly.: Aí a gente volta para a questão do ganho pessoal. É isso.
100. P. Então, voltando para a questão do broxa é uma representação do falo mesmo?
101. G.: É
102. M.: Sim.
103. Ly.: Você tem, mas não sabe usar. Não funciona. Você tem o pênis, mas não sabe
usar. Essa verdade é impotente, é broxa mesmo.
104. L.: Pior, eu não sei o que fazer com ela. Ela está aí. Eu tenho essa consciência, mas eu
não o que fazer com ela.
105. M.: O não sei como usar, não sei para o que ela serve. Eu tenho a faca e o queijo na
mão.
106. L.: É verdade.
107. H.: Acho que nessa parte é isso.
140
108. P.: Pois bem, (lendo) “Os fatos reais: com a eleição de Lula, uma quadrilha se enfiou
no governo e desviou bilhões de dinheiro público para tomar o Estado e ficar no poder 20
anos. Os culpados o todos conhecidos, tudo está decifrado, os cheques assinados, as
contas no estrangeiro, os tapes, as provas irrefutáveis, mas o governo psicopata de Lula
nega e ignora tudo. Questionado ou flagrado, o psicopata não se responsabiliza por suas
ações. Sempre se acha inocente ou vítima do mundo, do qual tem de se vingar. O outro não
existe para ele e não sente nem remorso nem vergonha do que faz. Mente
compulsivamente, acreditando na própria mentira, para conseguir poder. Este governo é
psicopata.”
109. H.: É psicopata.
110. M.: É psicopata.
111. G.: É psicopata.
112. Ly.: É psicopata.
113. L.: Pergunta: Só esse governo?
114. H.: Não, esse é o mais psicopata.
115. M.: Esse é o mais psicopata.
116. G.: Esse é o mais psicopata de todos. A gente nunca teve um governo...
117. M.: Tão psicopata quanto esse.
118. G.: Isso mesmo. A gente tinha o Maluf que era completamente insano, mas era só um.
Mas era uma figura. Agora não, a gente tem todo mundo explicitamente. A culpa do Renan
Calheiros é uma, a culpa do outro, do outro, do outro. Todo mundo tem a sua parcela de
culpa, explícita. Todo mundo anda com a sua plaquinha “minha culpa é...”. É uma
quadrilha que está lá.
119. H.: É um bando mesmo.
120. G.: Eles são um bando, eles entraram com essa intenção.
121. L.: Meu pai, quando vivo, dizia que ele jamais votaria no PT, porque, o problema do
PT é que se entrasse um, entrava a corja toda.
122. G.: Qualquer um que estivesse ligado com política sabia que o PT é um dos piores
partidos que nós temos, senão o pior.
123. L.: A esquerda, ou a rotulada esquerda, quando entra no poder, ela consegue ser pior.
Mais radical que a mais radical das direitas.
141
124. H.: E tem outra, a Regina Duarte falava que tinha medo. Se o Lula ganhasse, o que
iria acontecer com esse país? Afundar, e é o que a gente está vendo. Tem mais sujeira do
que outros políticos.
125. M.: Eu acho que, tem muita gente que acha, inclusive, que a sujeira agora está mais
visível do que estava antes.
126. L.: E daí?
127. M.: Mas não se limpa? Então dá na mesma? É pior.
128. H.: É pior.
129. M.: Porque antes, pelo menos, talvez a gente tinha a desculpa de: eu não estou vendo.
130. H.: É lógico.
131. M.: Agora eu estou vendo.
132. H.: Os próprios assessores do Lula. Vocês viram, todos, todos com o rabo preso.
133. P.: A seqüência, acho que chega nisso que você está falando. (lendo) “Seus membros
riem da verdade, viram-lhe as costas, passam-lhe a mão na bunda. A verdade se encolhe,
humilhada, num canto”.
134. M.: É, porque ela não sabe o que fazer.
135. Ly.: Ela acaba se recolhendo porque ela foi apresentada e de nada adiantou. Então eu
vou embora.
136. M.: Magoou, entristeceu, deprimiu.
137. H.: É, com certeza.
138. P.: (lendo) “E o pior é que o Lula, amparado em sua imagem de “povo”, consegue
transformar a Razão em vilã, as provas contra ele em acusações “falsas”, sua condição de
cúmplice e comandante em “vítima”. E a população ignorante engole tudo”.
139. G.: O pior é que tem gente que não é ignorante e engole. Isso eu não admito. Tem
professor que ainda hoje, depois de tudo, que ainda gosta do Lula. Que fala: Não gente, não
é bem assim. Nos outros governos também tinha. Não me interessa, não pode ter em
nenhum.
140. Ly.: O ignorante, nesse caso é a ignorância de visão política mesmo.
141. G.: Mas nesse caso não é falta de conhecimento político. Eu acho que é essa
necessidade de acreditar que um governo do povo não ia fazer isso com o próprio povo.
142. Ly.: Mas só porque o cara não tem estudo ele é do povo?
142
143. G.: Não isso é o marketing dele.
144. M.: É o marketing dele. Ele nunca foi, ele nunca foi do povo.
145. Ly.: Então, ele não é do povo.
146. G.: E nunca mais vai ser, porque metade de São Caetano é dele. Santo André, sei lá.
147. L.: São Bernardo.
148. G.: São Bernardo. Metade das áreas nobres de São Bernardo são todas dele. Mas não é
bem uma ignorância. Não sei, é uma certa ingenuidade, um medo de ter sido traído, então
eu prefiro acreditar que tudo isso que está acontecendo é mentira. Entendeu? Que aquela
pessoa em quem eu confiei, que eu achei que fosse mudar, não me traiu. Ele não quer se
sentir traído, então ele continua acreditando naquilo.
149. P.: Então o que voestá querendo dizer é que o governo é psicopata e esse povo que
tem esse conhecimento, ele se torna ignorante por opção. Ele prefere ignorar.
150. G.: Sabe a dor da traição? É melhor eu não ver, porque se eu aceitar a realidade ela vai
doer.
151. P.: É como se fosse um marido traído, é isso?
152. G.: É, é isso. O professor é uma classe muito típica disso. A gente é contra a
desigualdade social, a gente quer resolver uma série de problemas, então você pega um
discurso do PT onde isso era o mote desse discurso, não era?
153. L.: É a filosofia do PT.
154. G.: E o que acontece? Eles assumem. Aí você pensa: bom, agora vai dar jeito e quando
você vai ver, a coisa está pior do que nunca. Então ele se sente traído.
155. L.: É o marido traído.
156. G.: É o marido traído.
157. M.: Eu não tenho culpa da traição, então eu prefiro não ver. Sei o que está
acontecendo, prefiro não ver, não dói.
158. G.: A classe culta, o culto que consegue enxergar que ele votou em algo que está pior
do que nunca. É um mecanismo de defesa dele para não se sentir traído. Porque eu não
consigo admitir que uma pessoa culta continue defendendo um governo, depois de tudo o
que aconteceu. Simplesmente eu não admito.
159. P.: Então, nesse caso a tem uma diferenciação. A ignorância deste povo, dessa
população mais culta do país que prefere não enxergar esse tipo de situação e se torna um
143
marido traído e se esconde atrás dessa vergonha ter sido traído e prefere não enxergar essa
verdade. E a verdade não se impõe para o povo mais carente porque ela tem uma certa
permissividade, porque ela tem vontade própria e ela acaba como Ly. falou farinha pouca
meu pirão primeiro”, então ele que tem o direito a algo mais e ele acaba abrindo mão,
será porque ele está muito longe dessa realidade? Ele prefere ganhar o leite dele do que
ficar discutindo uma coisa maior, é isso?
160. H.: Você resumiu tudo.
161. L.: Com certeza.
162. M.: Concordo.
163. G.: É verdade.
164. Ly.: Então é isso.
165. P.: Então, muito obrigada.
144
_________Anexo III_______________________________________________
PERFIL DOS PARTICIPANTES
Nome ____________________________________________________________________
Data ____________________________ Horário __________________________________
1.
Entrevista estruturada
I- Formação Escolar
A- Ensino Fundamental
a) Onde cursou o ensino fundamental? (Cidade)
______________________________________________________________________
Escola Pública ( ) Escola Particular ( )
b) Como você se classificaria, como aluno, em função do seu desempenho?
ótimo ( ) bom ( ) regular ( ) mau ( ) péssimo ( )
c) Como foi trabalhada a leitura nessa etapa escolar?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
B- Ensino Médio
a) Onde cursou o ensino médio? (Cidade)
______________________________________________________________________
Escola Pública ( ) Escola Particular ( )
b) Como você se classificaria, como aluno, em função do seu desempenho?
ótimo ( ) bom ( ) regular ( ) mau ( ) péssimo ( )
c) Você freqüentou que tipo de ensino médio?
ensino médio regular ( ) profissionalizante ( ) qual? _________________________
outro ( ) qual?________________________________
d) Como foi trabalhada a leitura nessa etapa escolar?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
C- Ensino Superior
a) Onde cursou o ensino superior? (Cidade)
______________________________________________________________________
Instituição Pública ( ) Instituição Particular ( )
Nome da Instituição______________________________________________________
Nome do Curso _________________________________________________________
b) Como você se classificaria, como aluno, em função do seu desempenho?
ótimo ( ) bom ( ) regular ( ) mau ( ) péssimo ( )
c) Como foi trabalhada a leitura nessa etapa escolar?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
145
D- Qual o seu grau de instrução?
Superior Completo ( ) Pós-graduação ( ) Lato Sensu ( )
Stricto Sensu Mestrado ( ) Doutorado ( )
Outros ________________________________________________________________
II- Perfil Profissional
a) Escola em que leciona_________________________________________________
Escola Pública ( ) Municipal ( ) Estadual ( ) Federal ( )
Escola Particular ( )
Escola em que leciona_________________________________________________
Escola Pública ( ) Municipal ( ) Estadual ( ) Federal ( )
Escola Particular ( )
Escola em que leciona_________________________________________________
Escola Pública ( ) Municipal ( ) Estadual ( ) Federal ( )
Escola Particular ( )
b) Além de lecionar exerce outra profissão? Sim ( ) Não ( )
Qual? _________________________________________________________________
c) Disciplina(s) que ministra ______________________________________________
d) Você atua no: ensino fundamental ( ) ensino médio ( ) ambos ( )
III – Hábitos de Leitura
a) Gosta de ler? Sim ( ) Não ( )
b) Gosta de ler crônicas? Sim ( ) Não ( )
c) Como você lê?
devagar e com anotações ( ) superficialmente os textos de estudo e de lazer ( )
com compreensão global e posterior detalhamento (análise) ( )
profundamente os textos de estudo e superficialmente os textos de lazer ( )
todos os textos da mesma forma ( ) qual?
______________________________________
d) Como você encara a leitura?
com satisfação ( ) como obrigação ( )
e) Na rotina, a leitura é um ato:
esporádico ( ) constante ( )
f) Onde você costuma ler?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
g) Você se julga um bom leitor? Sim ( ) Não ( ) Por quê?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
h) Quais são as características de um bom leitor?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
146
__________Anexo IV______________________________________________
QUESTIONÁRIO
Nome ____________________________________________________________________
Data ____________________________ Horário __________________________________
1. Qual a sua opinião sobre do uso do jornal em sala de aula?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
2. Na sua opinião, qual o melhor tipo de texto para ser trabalhado na sua disciplina?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
3. O que você acha do uso da crônica em sala de aula? Você utiliza crônicas em suas
aulas? Porquê? Explique.
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
4. Para você, qual a importância da leitura de textos paradidáticos em sala de aula?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
147
5. Você utiliza textos paradidáticos em suas aulas? Quais?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
6. Descreva a metodologia utilizada por você, em sala de aula, para trabalhar textos
paradidáticos.
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
7. Você acha que o uso de textos em que haja metáforas auxilia no processo de leitura?
Porquê? Explique.
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
8. Qual é o papel da leitura na formação do aluno?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
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