Download PDF
ads:
1
ALUÍZIO JOSÉ DE ALMEIDA CHERUBINI
Ação Rescisória
(art. 485, V, do CPC)
Mestrado em Direito
PUC/SP
São Paulo
2004
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
2
ALUÍZIO JOSÉ DE ALMEIDA CHERUBINI
Ação Rescisória
Mestrado em Direito
Dissertação apresentada à
Banca Examinadora da
Pontifícia Universidade Católica
de São Paulo, como exigência
parcial para obtenção do título
de MESTRE em Direito, área
de concentração processo civil,
sob a orientação do Prof.,
Doutor José Manoel de Arruda
Alvim Netto.
PUC/SP
São Paulo
2004
ads:
3
______________________________
______________________________
______________________________
4
RESUMO
O presente estudo visa examinar as hipóteses de cabimento
da ação rescisória, especialmente a hipótese prevista no artigo 485, V do CPC.
Procuramos, no limite do nosso estudo, contribuir com a análise dos aspectos
históricos e práticos do instituto. Isto porque, o Código de Processo Civil de
1973, ampliou consideravelmente as hipóteses de cabimento.
5
ABSTRACT
This essay addresses the topic of the hypothesis where the so
called rescissory lawsuit is allowed to be brought – specifically as to what
regards the possibility featured in Article 485, V, of the Brazilian Civil Procedure
Code. Within this essay, it is our aim to contribute with a historical perspective
as well as with an analysis of practical issues related to the theme, once the
Brazilian Civil Procedure Code – in effect since 1.973 – instituted new
possibilities of filing the rescissory lawsuit.
6
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO. pg. 9
2. ORIGEM HISTÓRICA. pg. 15
2.1. DIREITO COMPARADO. pg. 18
2.1.1. PORTUGAL. pg. 19
2.1.2. ITÁLIA. pg. 20
2.1.3. ESPANHA. pg. 21
2.1.4. FRANÇA. pg. 22
2.1.5. ALEMANHA. pg. 22
3. DO CONCEITO DE NULIDADE E INEXISTÊNCIA. pg. 23
3.1. DA INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE NA AÇÃO
RESCISÓRIA. pg. 27
3.2. CONCEITO DE RESCINDIBILIDADE E OBJETO DA RESCISÃO.
pg. 33
4. COISA JULGADA. pg. 34
5. PRONUNCIAMENTOS JUDICIAIS SUJEITOS À AÇÃO
RESCISÓRIA. pg. 38
5.1. DO CABIMENTO DA AÇÃO RESCISÓRIA DAS SENTENÇAS
TERMINATIVAS QUE IMPEÇAM A REPROPOSITURA DA
DEMANDA. pg. 44
5.1.1. SENTENÇAS TERMINATIVAS LASTREADAS EM PEREMPÇÃO,
LITISPENDÊNCIA E COISA JULGADA. pg. 45
7
5.1.2. DECISÕES QUEO CONHECEM DO RECURSO. pg. 47
6. DA ANÁLISE DO CABIMENTO OU NÃO DA AÇÃO RESCISÓRIA NOS
PROCESSOS DE CONHECIMENTO, EXECUÇÃO E CAUTELAR. pg. 54
6.1. DECISÕES PROFERIDAS NO PROCESSO DE CONHECIMENTO. pg. 58
6.1.1. DECISÕES PROFERIDAS NO PROCESSO DE CONHECIMENTO
DE JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA. pg. 59
6.1.2. DECISÕES PROFERIDAS NO PROCESSO EXECUÇÃO. pg. 61
6.2. DECISÕES PROFERIDAS NO PROCESSO CAUTELAR. pg. 64
7. ADMISSIBILIDADE E ETAPAS DE JULGAMENTO DA AÇÃO
RESCISÓRIA. pg. 68
7.1. CUMULAÇÃO DE JUÍZOS. pg. 71
7.2. JUÍZO RESCINDENTE. pg. 72
7.3. JUÍZO RESCISÓRIO. pg. 77
8. EFEITOS DO JUÍZO RESCINDENTE E DO JUÍZO RESCISÓRIO. pg. 79
8.1. DA NATUREZA DO JUÍZO RESCINDENTE E DO JUÍZO RESCISÓRIO. pg. 80
8.2. A PROCEDÊNCIA DA AÇÃO RESCISÓRIA E OS DIREITOS
ADQUIRIDOS POR TERCEIROS DE BOA FÉ. pg. 84
9. PARTES NA AÇÃO RESCISÓRIA. pg. 86
9.1. DA LEGITIMIDADE ATIVA. pg. 86
9.2. DA LEGITIMIDADE PASSIVA. pg. 91
10. DO PROCEDIMENTO DA AÇÃO RESCISÓRIA. pg. 99
11. COMPETÊNCIA PARA A AÇÃO RESCISÓRIA. pg. 106
12. PRAZO PARA O AJUIZAMENTO DA AÇÃO RESCISÓRI pg. 112
13. HIPÓTESES DE CAMBIMENTO. pg. 114
14. DA AÇÃO RESCISÓRIA COM BASE NO ART. 485, V, DO CPC. pg. 115
8
14.1. NORMA PROCESSUAL E AÇÃO RESCISÓRIA. pg. 119
14.2. NORMA CONSTITUCIONAL E AÇÃO RESCISÓRIA pg. 123
14.2.1. DA ANÁLISE DOS ARTS. 475-L, § 1º E 741, PARÁGRAFO ÚNICO
DO CPC À LUZ DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. pg. 125
14.2.2. DECISÃO TRANSITADA EM JULGADO (QUE ADOTE COMO
FUNDAMENTO A INCONSTITUCIONALIDADE DE UM
DISPOSITIVO) E A POSTERIOR DECLARAÇÃO DE
CONSTITUCIONALIDADE (DESSE MESMO DISPOSITIVO PERANTE
O STF). pg. 126
14.2.3. DECISÃO TRANSITADA EM JULGADO (QUE ADOTE COMO
FUNDAMENTO A CONSTITUCIONALIDADE DE UM DISPOSITIVO) E
A POSTERIOR DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE
(DESSE MESMO DISPOSITIVO PERANTE O STF). pg. 127
14.3. VIOLAÇÃO DECORRENTE DA QUALIFICAÇÃO JURÍDICA DOS
FATOS. pg. 129
14.4. SÚMULA VINCULANTE E A AÇÃO RESCISÓRIA. pg. 131
14.5. SÚMULA 243/STF. pg. 133
15. CONCLUSÃO. pg. 136
16. BIBLIOGRAFIA. pg. 137
9
1. INTRODUÇÃO.
O presente trabalho tem por escopo o estudo da ação
rescisória, notadamente quando a decisão rescindenda “violar literal disposição
de lei” (art. 485, V, do CPC), com uma abordagem de seus principais contornos
práticos.
Não obstante o “estreito” objeto deste trabalho, em alguns
pontos ousamos externar nossas opiniões pessoais, o que nos expõe à
possibilidade de incidir em erro. Isto, contudo, não desestimula o interesse na
defesa das posições aqui defendidas. Muito pelo contrário, nutre a forte
esperança de que críticas virão e, com elas, poderemos aperfeiçoar o estudo a que
nos propusemos, contribuindo, de alguma forma, com aqueles que lidam com o
direito.
O interesse em torno do instituto da ação rescisória surgiu
com as experiências da advocacia. Ou seja, os problemas com que nos
deparávamos e ainda nos deparamos no ambiente de trabalho, nos fez (e faz)
meditar em torno dos meios de contrastes das decisões judiciais; especialmente
10
das decisões judiciais que padecem de vícios, sejam eles de atividade ou de juízo
e que acabam por transitar em julgado.
A irresignação --- se é assim que se pode definir --- está
ligada à idéia de frustração. Isto é, o Poder Judiciário foi acionado para a
composição de um litígio e, desta atuação
1
, surge uma decisão desarmônica com
o que se esperava e --- o mais grave --- com o que determina o sistema jurídico
(lei, doutrina, jurisprudência e princípios de direito).
Essa irresignação ganha relevo quando a decisão --- mesmo
padecendo de vício ----, não mais pode ser modificada, por já pairar sobre ela a
imperatividade e a imutabilidade decorrente da atividade jurisdicional (é dizer:
por já ter transitado em julgado – art. 467, CPC).
Ora, se a imutabilidade da decisão é fator de equilíbrio
social
2
, como compatibilizar essa idéia com uma decisão que padeça de algum
vício ? É este o questionamento que incentiva a pesquisa em torno do cabimento
da ação rescisória como via excepcional de revisão da coisa julgada.
1
Não necessariamente por erro do Poder Judiciário.
2
Cf. Luiz Fux, Curso de Direito Processual Civil, Editora Forense, 2001, p. 694.
11
O Ministro Luiz Fux destaca que “o fundamento político da
coisa julgada não está comprometido nem com a verdade nem com a justiça da
decisão. Uma decisão judicial, malgrado solidificada, com alto grau de
imperfeição, pode perfeitamente resultar na última e imutável definição do
Judiciário, porquanto o que se depreende através dela é a estabilidade social”
3
.
Situações como essas não são desejáveis. Assim, faz-se
necessária uma abordagem da ação rescisória, notadamente a hipótese do inciso
V, do art. 485, forma típica de tirar do mundo jurídico as decisões transitadas em
julgado.
Neste trabalho, conforme já sinalizado acima, o foco de
abordagem será dirigido --- com maior carga e intensidade --- para a hipótese do
art. 485, V, do CPC.
Autorizada doutrina tem sustentado que a idéia de que a
sentença judicial decorre da norma codificada está superada, já que, atualmente,
não se pode negar que o juiz acaba atuando como criador do direito
4
. Ora, essa
constatação assume especial importância para fins de cabimento da ação
rescisória por violação a literal disposição de lei, pois, à luz desta nova
3
Ob. Cit., p. 695.
12
concepção, ter-se-á de reavaliar as balizas para a compreensão do que seja,
efetivamente, “violar literal disposição de lei”.
Ou seja, diante dessa nova concepção, que franqueia ao juiz
a criação do direito, não se pode cogitar --- para fins de cabimento da ação
rescisória --- que existam decisões (fruto dessa liberdade judicial de criar o
direito) que estejam imunes ao controle das partes.
Não se está, com isso, pretendendo fazer da ação rescisória
sucedâneo recursal. O que se almeja, isto sim, é analisar o instituto da ação
rescisória, estabelecendo critérios de controle das decisões, mormente à vista da
idéia de que o juiz atua como criador do direito.
De fato, mesmo diante dessa concepção (que autoriza o juiz,
em determinadas hipóteses, a criar o direito) não se deve (e não é permitido)
admitir a ação rescisória, por exemplo, para discutir a justiça da decisão ou,
ainda, a valoração de provas. Somente caberá a ação rescisória, segundo
pensamos e salvo situações especiais, se existentes uma das hipóteses do art. 485,
do CPC
5
.
4
Cf. Teresa Arruda Alvim Wambier, Questões de fato, conceito vago e sua
controlabilidade através de recurso especial, in Aspectos Polêmicos e Atuais do Recurso
Especial e do Recurso Extraordinário, Editora Revista dos Tribunais, 1997.
5
Eduardo Talamini, a este respeito, citando vasta doutrina, destaca que: “a doutrina
destaca o caráter exaustivo, e não meramente exemplificativo, do rol de fundamentos
13
Nelson Nery Junior explica a questão com perfeição:
“A sentença de mérito transitada em julgado que tiver sido prolatada
contra texto da CF e da lei pode ser desconstituída pela ação rescisória. A
sentença de mérito transitada em julgado que seja injusta faz,
inexoravelmente, coisa julgada material, sendo insuscetível de impugnação
por ação rescisória, por mais grave que possa ter sido a injustiça. Isto
porque, sendo a ação rescisória meio excepcional de impugnação das
decisões judiciais de mérito transitadas em julgado, e levando-se em
consideração preceito hermenêutico de que as hipóteses de exceção, isto é,
de cabimento da ação rescisória previstas pela lei devem ser interpretadas
de maneira estrita, doutrina e jurisprudência têm entendido, corretamente,
não ser possível rescindir-se sentença sob fundamento de injustiça. Somente
a sentença inconstitucional ou ilegal, tendo sido acobertada pela coisa
julgada material, pode ser desconstituída pela via da ação rescisória”
6
-
7
(destacou-se).
rescisórios. Afirma-se, por isso, não caber o emprego da analogia. Não há dúvidas do acerto
dessa constatação, em sua essência. A ação rescisória é um instrumento típico e excepcional em
face da garantia da coisa julgada; a norma geral é a da impossibilidade da desconstituição da
sentença revestida dessa autoridade” (in Coisa Julgada e sua Revisão, Editora Revista dos
Tribunais, 2005, p.142).
6
Nelson Nery Junior, in Teoria Geral dos Recursos, Editora Revista dos Tribunais, 6ª
edição, 2004, p.513/514.
7
Nesse mesmo sentido é a doutrina de Ovídio A. Baptista da Silva: “a ação rescisória,
assim como os recursos extraordinários e os juízos de cassação dos sistemas europeus, cuja
origem remonta à querela nullitatis do direito medieval, não têm por finalidade a reparação de
injustiças, porventura causadas aos litigantes pelo julgado que se busca desconstituir. São
14
A observação nos parece inteiramente correta, porquanto não
se pode condicionar a justiça ou não da decisão para o cabimento da rescisória.
Pelo contrário, caberá a ação rescisória das decisões de mérito, salvo situações
excepcionais que serão abordadas, se presentes os vícios do art. 485, do CPC. A
ação rescisória, porque distinta dos recursos, conforme se verá, tem requisitos e
finalidade diferentes daqueles, com eles não se confundindo, embora guarde
semelhanças
8
.
Realmente, para que a parte possa recorrer --- diferentemente
do que ocorre com a ação rescisória ---, não se faz necessária a existência de
vício (de atividade ou de juízo), podendo até mesmo não existir. O que se exige,
isto sim, é que a parte tenha sido sucumbente.
Entretanto, padecendo a sentença de algum vício (de
atividade ou de juízo), a questão que se coloca é qual seria o remédio cabível.
Nelson Nery Junior ensina que “... o vício da sentença pode ensejar tanto a sua
impugnação por meio de recurso, como também por intermédio de ação
instrumentos criados para proteção, primordialmente, do sistema legal globalmente considerado,
nos casos em que a sentença o tenha ferido com tal intensidade que, na visão do legislador, seja
aconselhável renunciar à segurança jurídica representada pela coisa julgada, para protegê-lo
contrajulgados (sic) que gravemente o vulnerem em pontos essenciais” (Sentença e Coisa
Julgada – Ensaios e Pareceres – Editora Forense, 4ª edição, 2003, p. 358.
8
José Carlos Barbora Moreira anota que “seria hoje anacronismo prolongar a
controvérsia , que em certa época lavrou na doutrina, sobre a assimilação da ação rescisória à
15
autônoma de impugnação, se for o caso. O traço característico evidenciador da
diferença que existe entre ambos os institutos não é, propriamente, a matéria que
enseja uma ou outra medida, mas sim o exercício e a época desse exercício”
9
.
No presente trabalho, procuraremos demonstrar, para efeito
de cabimento da ação rescisória por violação a literal disposição de lei (art. 485,
V, CPC), que a questão de direito, diferentemente do que ocorre nos recursos
especial e extraordinário, é inegavelmente mais ampla e abrangente
10
.
Procuraremos demonstrar, em linhas gerais, os principais contornos deste
mecanismo processual.
2. ORIGEM HISTÓRICA.
No direito romano antigo não havia meio de impugnação das
decisões judiciais equivalentes aos recursos. Neste período, entendia-se que a
sentença nula equivalia-se à sentença inexistente, sendo desnecessário qualquer
mecanismo de impugnação.
figura do recurso” (in Comentários ao Código de Processo Civil, Editora Forense, 11ª edição,
2003, Volume V, p. 100).
9
Idem, Ob. Cit., p. 220.
10
Esse entendimento é defendido por Teresa Arruda Alvim Wambier, in Controle das
decisões judiciais por meio de recursos de estrito direito e de ação rescisória, Editora Revista
dos Tribunais, 2001, p. 165.
16
A appellatio foi o primeiro mecanismo de impugnação
surgindo no direito romano, limitado, conduto, somente para a hipótese de
impugnação das sentenças injustas, ou seja, aquelas que padeciam de erro de
juízo (error in iudicando), não se prestando para aquelas sentenças que padeciam
de erro de atividade (error in procedendo). Em momento posterior, surgiu nos
estatutos italianos a querela nullitatis, esta sim vocacionada a impugnar as
sentenças que padeciam de erro de atividade (error in procedendo).
A querela nullitatis desdobrava-se em querela nullitatis
sanabilis (para os vícios menos graves) e querela nullitatis insanabilis (para os
vícios mais graves), sendo que a primeira delas acabou sendo absorvida pela
apelação, sendo que a segunda continuou sendo utilizada para a impugnação de
vícios da sentença que não se sanavam com a coisa julgada, sendo que em
diversos países a querella nullitais insanabilis desapareceu, o que não ocorreu no
direito português, sendo este --- inegavelmente --- um dos ascendentes da ação
rescisória.
O outro ascendente da rescisória é a restitutio in integrum,
de origem romana, vocacionada à desconstituição de contratos eivados de vício
de consentimento, mas que, na Idade Média, teve seu espectro de abrangência
bastante ampliado, passando a ser utilizada, também, para a desconstituição de
sentenças, “de forma a impedir a cristalização da iniqüidade. Trata-se, então, da
17
restitutio in integrum contra rem iudicatam, em que se desenvolviam dois juízos
distintos: um sobre o direito do postulante a obter a rescisão da sentença
(iudicium rescindens), outro sobre sua pretensão que havia sido objeto da
primeira decisão (iudicium rescissorium)”
11
.
A ação rescisória, segundo autorizada doutrina
12
, é o
resultado, no Brasil, da fusão da querella nulitatis e da restitutio in integrum,
sendo possível identificar no elenco do art. 485, do CPC hipóteses que se
identificam, claramente, a um ou outro destes institutos.
No direito brasileiro sempre se entendeu que a sentença nula
produz efeitos até que possa vir a ser desconstituída. Este modelo foi adotado
pelo Regulamento n.º 737, de 1850, o que foi mantido na época dos códigos
estaduais de processo. Com a unificação da legislação processual, passou a
vigorar o CPC de 1939, que previa, em seus artigos 798 a 801, a disciplina da
ação rescisória, no qual, conforme anota Alexandre Freitas Câmara, com apoio
em Lopes da Costa, “a ação rescisória tinha um conteúdo pura e exclusivamente
processual: a anulação da sentença”
13
.
11
Alexandre Freitas Câmara, Ação Rescisória, Editora Lumen Juris, pg. 6.
12
Barbosa Moreira, Comentários ao CPC, 13ª edição, pg. 103.
13
Ob. Cit., pg. 10.
18
Esse regime vigorou até 1973, quando passou a viger o CPC
atual. No novo sistema, houve a ampliação das hipóteses de rescisão,
restringindo-se as hipóteses de cabimento às sentenças de mérito; criou-se
disciplina para a legitimidade ativa (art. 487), matéria sobre a qual era silente o
Código de 1939; impôs-se o condicionamento da admissão da ação ao depósito
de 5 %, a título de multa (art. 488, II, CPC), criou-se a previsão, quando possível,
de cumulação de juízos; e, no tocante ao procedimento, permitiu-se a aplicação
das regras do rito ordinário.
A ação rescisória está disciplinada no CPC vigente. Todavia,
dadas as constantes reformas por que o CPC tem passado, e, ainda, em razão das
situações práticas vivenciadas, faz-se necessária uma análise do direito
comparado, até mesmo como forma de subsidiar e enriquecer a utilização deste
mecanismo.
2.1. DIREITO COMPARADO.
Em outros países é possível identificar mecanismos
processuais similares à ação rescisória, o que, sem dúvida alguma, enriquece a
análise da ação rescisória.
19
2.1.1. PORTUGAL.
No direito português, chegou-se afirmar --- em sede
legislativa
14
--- que a sentença nula não era apanhada pela coisa julgada.
Atualmente, anota a doutrina que “cabe revisão de qualquer sentença transitada
em julgado, de regra no prazo de trinta dias ...”
15
A ação rescisória assemelha-se ao que no direito português
denomina-se revisão, que é um recurso extraordinário, compreendido como
sendo aquele (recurso) cabível após o trânsito em julgado
16
. Os casos de revisão
estão catalogados no art. 771
17
, do CPC português
18
.
14
Veja-se, a propósito, Alexandre Freitas Câmara, Ação Rescisória, pg. 6/7.
15
José Janguiê Bezerra Diniz, Ação Rescisória dos Julgados, LTr, pg. 31.
16
Este regime será analisado em tópico específico.
17
“A decisão transitada em julgado só pode ser objecto de revisão nos seguintes casos:
a) Quando se mostre, por sentença criminal passada em julgado, que foi proferida por
prevaricação, concussão, peita, suborno ou corrupção do juiz ou de algum dos juízes
que na decisão intervieram;
b) Quando se verificarem a falsidade de documento ou acto judicial, de depoimento ou das
declarações de peritos, que possam em qualquer dos casos ter determinado a decisão a
rever. A falsidade de documento ou acto judicial não é, todavia, fundamento de revisão
se a matéria tiver sido discutida no processo em que foi proferida a decisão a rever;
c) Quando se apresente documento de que a parte não tivesse conhecimento, ou de que
não tivesse podido fazer uso, no processo em que foi proferida a decisão a rever e que,
por si só, seja suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável à parte
vencida;
d) Quando se verifique a nulidade ou a anulabilidade da confissão, desistência ou
trasacção em que a decisão se fundasse;
e) Quando, tendo ocorrido a acção e a execução à revelia, por falta absoluta de intervenção
do réu, se mostre que faltou a sua citação ou é nula a citação feita;
f) Quando seja contrária a outra que constitua caso julgado para as partes, formado
anteriormente”.
18
Alexandre Freitas Câmara, Ação Rescisória, pg. 17/19.
20
2.1.2. ITÁLIA.
No direito italiano não existe ação semelhante à ação
rescisória, correspondendo, em parte, aos casos de cabimento do recurso de
cassação, e, em parte, às hipóteses de cabimento da revocazione. O primeiro é
apto a obstar o trânsito em julgado da decisão
19
e será cabível nas hipóteses do
art. 360
20
do codice di procedura civili. O segundo tem previsão no art. 395
21
, do
aludido diploma.
19
E, portanto, neste ponto, bastante distante da ação rescisória.
20
“ Art. 360 (Sentenze impugnabili e motivi di ricorso)
Le sentenze pronunciate in grado di appello o in único grado, possono essere impugnate com
ricorso per cassazione:
1) per motivi attinenti alla giurisdizione;
2) per violazione delle norme sulla competenza, quando non é prescritto il regolamento di
competenza;
3) per violazione o falsa applicazione di norme di diritto;
4) per nullitá della sentenza o del procedimento;
5) per omessa, insufficiente o contraddittoria motivazione circa um punto decisivo della
controversia, prospettato delle parti o rilevabile d´ufficio. Può inoltre essere impugnata con
ricorso per cassazione una sentenza appellabile del tribunale, se le parti sono d`accordo per
omettere l´appello; ma in tal caso l`impugnazione può proporsi soltanto per violazione o falsa
applicazione di norme di diritto” (Alexandre Freitas Câmara, Ação Rescisória, pg. 13/14).
21
“Art. 395 (Casi di revocazione)
Le sentenze pronunciate in grado di appello o in unico grado possono essere impugnate per
revocazione:
1) se sono l`effetto del dolo di una delle parti in danno dell´altra;
2) se si é giudicato in base a prove riconosciute o comunque dichiarate false dopo la sentenza
oppure che la parte soccombente ignorava essere state riconosciute o dichiarate tali prima della
sentenza;
3) se dopo la sentenza sono stati trovati uno o più documenti decisivi che la parte non aveva
potuto produrre in giudizio per causa di forza maggiore o per fatto dell´avversario;
4) se la sentenza è l´effetto di un errorre di fatto risultante dagli atti o documenti della causa. Vi
è questo errore quantdo la decisione è fondata sulla suposizione di un fatto la cui verità è
supposta l`inesistenza di un fatto la cui verità è positivamente stabilita, e tanto nell´uno quanto
nell`altro caso se il fatto non costituì um punto controverso sul quale la sentenza ebbe a
pronunciare;
5) se la sentenza è contraria ad altra precedente avente fra le parti autorità di cosa giudicata,
purchè non abbia pronunciato sulla relativa eccezione;
6) se la sentenza è effetto del dollo del giudice, accertato con sentenza passata in giudicato”
(Alexandre Feitas Câmara, Idem, pg. 16/17).
21
A título de exemplo, calha destacar que o art. 360, 3, do
codice di procedura civile corresponde ao art. 485, inc. V, do CPC, objeto deste
estudo.
A análise dos dispositivos do código de processo civil
italiano demonstra grande semelhança com a ação rescisória brasileira, de forma
que a doutrina italiana é rica em subsídios para preencher eventuais lacunas do
nosso sistema.
2.1.3. ESPANHA.
O direito espanhol passou por grande reforma com a
aprovação da nova Ley de Enjuiciamiento Civil, a Lei n.º 1/2000). Esta lei retirou
a revisión
22
do rol dos recursos, tratando-na como ação autônoma, encontrando-
se disciplinada no art. 510
23
, havendo algumas coincidências com a ação
rescisória, p. ex., 510, 1 (= 485, VII).
22
Tinha natureza de recurso e era destinado contra a coisa julgada. Estava previsto no art.
1796, da Ley de Enjuiciamiento Civil, de 1881.
23
“Art. 510. Habrá lugar a la revisión de uma sentencia firme:
1) Si después de pronunciada, se recobraren u obtuvieren documentos decisivos, de los que no
se hubiere podido disponer por fuerza mayor o por obra de la parte em cuyo favor se hubiere
dictado;
2) Si hubiere recaído em virtud de documentos que al tiempo de dictarse ignoraba una de las
partes haber sido declarados falsos en un proceso penal, o cuya falsedad declarare después
penalmente;
22
2.1.4. FRANÇA.
Na França não existe instituto similar à ação rescisória (art.
485, do CPC), sendo que o instituto que mais se aproxima é la requête civile,
também denominado de recours em révision, que, diferentemente da ação
rescisória, deve ser apresentada em dois meses, suspendendo-se em benefício de
menores
24
.
2.1.5 ALEMANHA.
A dicotomia recursos / ação autônoma de impugnação, a
exemplo do nosso sistema, também subsistiu no ordenamento alemão e no
austríaco, que, além dos recursos (Rechtsmittel), possuem a Nichtigkeitsklage e a
Restitutionsklage ou Wiederaufnahmsklage, cabíveis contra decisão em processo
encerrado
25
3) Si hubiere recaído en virtud de prueba testifical o pericial, y los testigos o los peritos hubieren
sido condenados por falso testimonio dado em las declaraciones que servieron de fundamento a
la sentencia;
4) Si se hubiere ganado injustamente en virtud de cohecho, violencia o maquinación
fraudulenta” (Alexandre Feitas Câmara, Idem, pg. 16/17).
24
José Janguiê Bezerra Diniz, Ob. Cit., pg. 29.
23
3. DO CONCEITO DE NULIDADE E INEXISTÊNCIA.
Conforme será demonstrado, o que justifica a adoção da
ação rescisória, salvo as exceções que serão abordadas neste trabalho, é a
existência de uma sentença de mérito, com trânsito em julgado, e que padeça de
um dos vícios do art, 485, do CPC.
A sentença rescindível não se confunde com a sentença nula
nem com a sentença inexistente. A sentença inexistente carrega um vício que
jamais se convalida, não transitando em julgado. Isto é, ainda que produza
efeitos, estes não podem ser considerados jurídicos.
A rescindibilidade, por sua vez, não se confunde com
nulidade. A sentença pode existir e ser nula, não sendo suscetível de rescisão
antes do trânsito em julgado, podendo ser impugnada por meio de recurso,
sanando-se, com isso, a nulidade. Se, contudo, não for sanada a nulidade, a
sentença produz efeitos regulares até que seja desconstituída pelo ajuizamento (e
procedência) da ação rescisória.
A sentença inexistente não é ato processual. A sentença nula,
não obstante padeça de vício, é ato processual e produz efeitos jurídicos. Logo,
25
Barbosa Moreira, comentários ao CPC, pg. 102.
24
sentença inexistente, embora possa produzir efeitos (que não jurídicos), não
transita em julgado, não demandando o ajuizamento de ação rescisória, mas, sim,
declaratória de inexistência, que é imprescritível (não está sujeita ao prazo do art.
495, CPC)
26
-
27
.
A distinção afigura-se clara da análise de uma sentença
proferida por quem não está invocado de jurisdição
28
(= inexistente) daquela
sentença que padece de vício de fundamentação.
Na primeira hipótese, não se faz necessário o ajuizamento de
ação rescisória, pois, em verdade, não se trata de sentença, bastando, para tanto, o
ajuizamento de ação declaratória, que não está condicionada ao prazo
decadencial de 02 (dois) anos. Na segunda hipótese, a sentença existe e, a
despeito do vício que a macula, produz efeitos, que podem ser impugnados,
dentro da própria relação processual, por recurso ou, transitada em julgado, por
ação rescisória.
Na tese de dissertação sobre ação rescisória (art. 485, V, do
CPC), apresentada para a obtenção do título de mestre perante a PUC/SP,
26
O entendimento do STJ é firme nesse sentido. Veja-se, a respeito, dentre muitos outros,
Resp 599.505/MG, Min. Nancy Andrighi, j. 28.10.2004.
27
O que se observa da doutrina e da jurisprudência é que há referências à actio nullitatis e
à querela nullitatis para se referirem à ação declaratória , empregando-se o mesmo tratamento
jurídico.
25
Izabelle Albuquerque Costa Maia enfrentou a distinção entre as sentenças nulas e
inexistentes:
“(...)
Inexistente juridicamente é o ato que não é no mundo jurídico,
porque não preencheu condições essenciais para ser, mas existe
no mundo não jurídico. Podem coexistir existência fática e
inexistência jurídica. Diz-se que a inexistência é o vício mais
grave que pode acometer o ato jurídico, sendo, por isso,
insuscetível de convalidação. Na verdade, a inexistência não
chega a ser vício, pois o plano da existência é diverso e anterior
ao plano da validade da eficácia. Logo, o que não existe não
pode conter vício (...) A nulidade se situa no plano da validade.
Para alcançá-lo, presume-se que se preencheu o requisito
existência ...
As sentenças nulas sempre transitarão em julgado. Até porque o
trânsito em julgado é um pressuposto para a admissibilidade da
ação rescisória e as sentenças nulas são eficazes e produzem
efeitos até serem desconstituídas por meio da ação rescisória.
Agora, se o “vício” que acomete a decisão é a inexistência
(jurídica), a coisa julgada não se formará sobre tal decisão. Isso
28
Pressuposto processual de existência.
26
porque a coisa julgada consiste numa qualidade da sentença de
mérito transitada em julgado; se não há sentença de mérito, não
pode haver coisa julgada a conferir a imutabilidade a uma não
sentença ...”
29
.
Portanto, salvo as exceções que serão aqui abordadas,
somente são rescindíveis as sentenças de mérito, não havendo confundir-se com
as sentenças inexistentes ou nulas, já que as inexistentes não transitam em
julgado
30
, sendo que as nulas, com o trânsito em julgado, tornam-se rescindíveis.
29
Tese de mestrado defendida na PUC/SP, pg. 33/35.
30
Veja-se, a propósito, o entendimento do STJ: “(...) 1 - Se o móvel da ação rescisória é a
falta de citação de confrontante (ora autor), em ação de usucapião, a hipótese é de ação
anulatória (querella nulitatis) e não de pedido rescisório, porquanto falta a este último
pressuposto lógico, vale dizer, sentença com trânsito em julgado em relação a ele. Precedentes
deste STJ (...) Com efeito, como visto, o autor da rescisória, Espólio de Erotides França Berquó,
que deveria ter sido réu na ação de usucapião, não fez parte daquela relação jurídica processual
e, por conseguinte, a sentença transitada em julgado não lhe alcança. A existência da coisa
julgada é condição essencial para o exercício da rescisória, não podendo intentá-la, diz o
entendimento pretoriano, quem não foi parte na ação cuja sentença se pretende anular (STF - RE
78.538-SC). Confira-se, a propósito, a lição de Moacyr Amaral Santos, in Primeiras Linhas de
Direito Processual Civil, 3º volume, 15ª edição, 1995, pág. 76: "Reproduzindo, com outras
palavras, preceito das Ordenações (ver nº 754) e acompanhando a doutrina, particularmente a
teoria de LIEBMAN, o Código de Processo Civil, no art. 472, estabelece que a coisa julgada
não atinge terceiros, quer beneficiando-os, quer prejudicando-os: "A sentença faz coisa julgada
às partes entre as quais é dada, não beneficiando, nem prejudicando terceiros". A coisa julgada
opera, portanto, em relação às partes entre as quais é dada a sentença, e somente em relação a
elas." Nesse contexto, é flagrante a inexistência de pressuposto lógico (possibilidade jurídica do
pedido) para a presente demanda rescisória, ou seja, não há sentença de mérito, com trânsito em
julgado, para o autor, ora recorrido, falecendo-lhe, por conseguinte, legitimidade. A espécie é
mesmo, conforme ressaltado no parecer da Subprocuradoria-Geral da República, de ação de
nulidade (querella nulitatis) ...” (Resp 62.853, Relator: Ministro Fernando Gonçalves).
27
3.1. DA INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE NA AÇÃO
RESCISÓRIA.
Diante do que acima se expôs, poder-se-ia alegar que
constitui erro manifesto o manejo da ação rescisória de sentenças inexistentes.
No entanto, a questão não é tão simples, já que a doutrina e a jurisprudência não
são pacíficas quanto às sentenças inexistentes, ou seja, pode-se dizer que há
situações sobre as quais não há controvérsia
31
, em outras, contudo, longe está de
haver consenso.
Flávio Luiz Yarshell aponta esta dificuldade com
propriedade:
“ ... o tema está longe de ser singelo, porque envolve uma série de
problemas delicados, a saber: a) que vícios são esses que
configuram a inexistência ou uma “nulidade” tão grave a ponto
de à inexistência se equiparar; b) ainda que reconhecida a
inexistência (ou nulidade, a ela equiparável), não se pode
descartar que o ato --- que juridicamente se deve qualificar como
inexistente --- tenha produzindo e esteja produzido efeitos, razão
pela qual, ainda que sem a necessidade de se propor ação
28
rescisória, haverá aí uma forma de rescisão (tomando-se a
terminologia empregada para a ação rescisória) ou
desconstituição; c) suposto que haja algo a desconstituir, sem que
seja preciso ou adequado fazê-lo por ação rescisória, é preciso
determinar de que forma essa desconstituição há de se operar,
respeitando-se as garantias inerentes ao devido processo legal; d)
suposto que a decisão seja desconstituída, é preciso determinar de
que forma se há de operar o novo julgamento”
32
.
Ou seja, o que se constata da análise da doutrina e da
jurisprudência
33
é que não há uma certeza que permita distinguir, com segurança,
o que seria inexistente e nulo, o que, inevitavelmente, acaba por repercutir na
escolha da ação rescisória ou da ação declaratória.
Eduardo Talamini destaca que há na doutrina entendimentos
díspares. Para alguns, como Barbosa Moreira, haveria desnecessidade --- na
verdade inadmissibilidade --- da ação rescisória de sentenças inexistentes,
havendo, inclusive, precedente do STF nesse sentido
34
. Outros autores, dentre
31
Ausência dos pressupostos processuais de existência.
32
Ob. Cit., p. 240/241.
33
Veja-se, a propósito, Theotonio Negrão, CPC, notas 6 e 6ª ao art. 485, nota 5 ao art. 486
e 6. do art. 942.
34
Ação declaratória de nulidade de sentença por ser nula a citação de réu revel na ação em
que ela foi proferida. Para a hipótese prevista no art. 741, I do atual CPC – que é a da falta ou
nulidade de citação, havendo revelia – persiste, no direito positivo brasileiro, a “querela
nullitatis”, o que implica dizer que a nulidade de sentença, nesse caso, pode ser declarada em
29
eles Egas Moniz de Aragão, Bueno Vidigal e Roque Komatsu, entendem cabível
a ação rescisória de sentenças inexistentes, ressaltando que tais autores não
sustentam o simples aproveitamento da rescisória, vislumbrando-na como uma
via correta. Por fim, há os que entendem que o ajuizamento da ação rescisória de
sentenças inexistentes é inviável, consentindo, contudo, com o aproveitamento da
ação, reconhecendo-se incidentalmente a inexistência
35
.
Há precedente no STJ reconhecendo --- até mesmo --- a
possibilidade de declaração de inexistência de sentença no bojo de uma ação civil
pública, calhando transcrever a ementa do v. acórdão, o que, sem dúvida alguma,
reforça a fungibilidade entre ação rescisória e a ação declaratória de inexistência.
Veja-se:
“PROCESSO CIVIL – COISA JULGADA – AÇÃO CIVIL
PÚBLICA: ADEQUABILIDADE – LEGITIMIDADE DO
MINISTÉRIO PÚBLICO. 1. Os defeitos processuais das decisões
judiciais são corrigidos por via da ação rescisória, mas os defeitos
da base fática que retiram da sentença a sua sedimentação,
tornando-a nula de pleno direito ou inexistente, podem ser
corrigidos, como os demais atos jurídicos, pela relatividade da
ação declaratória, independentemente do prazo para a propositura da ação rescisória, que, em
rigor não é cabível para essa hipótese” (RE 97.589/SC, Min. Moreira Alves, DJU 03.06.1983).
35
Eduardo Talamini, Coisa Julgada e sua Revisão, Editora Revista dos Tribunais, pg.
364/367.
30
coisa julgada nula ou inexistente. 2. Se a sentença transitada em
julgado, sofre ataque em sua base fática por parte do Estado, que
se sente prejudicado com a coisa julgada, pode o Ministério
Público, em favor do interesse público, buscar afastar os efeitos
da coisa julgada. 3. O ataque à coisa julgada nula fez-se
incidenter tantun, por via de execução ou por ação de nulidade.
Mas só as partes no processo é que têm legitimidade para fazê-lo.
4. A ação civil pública, como ação política e instrumento maior
da cidadania, substitui com vantagem a ação de nulidade,
podendo ser intentada pelo Ministério Público. 5. Recurso
Especial conhecido e provido”
36
. (REsp 445.664, Relatora para o
acórdão, Ministra Eliana Calmon).
36
Colhem-se do corpo do v. acórdão as seguintes conclusões: “ ... A) Os pressupostos de
existência da relação processual, quando ausentes, acarretam a nulidade absoluta insanável do
processo, que poderá, por força de sua natureza imprescritível, ser reconhecida a qualquer
tempo, seja no processo, seja após o trânsito em julgado da sentença, por meio de ação
autônoma, de cunho declaratório, conhecida como querela nullitatis; B) os pressupostos de
desenvolvimento válido e regular do processo, quando ausentes, conduzem à nulidade absoluta,
reconhecível a qualquer tempo no processo, mas sujeita ao prazo decadencial de dois anos da
ação rescisória. Após esse prazo, o vício convalida-se em homenagem ao princípio da segurança
jurídica; C) já os pressupostos de regularidade, necessários à correção do procedimento, quando
ausentes, levam à nulidade relativa, sanável no curso do processo, sob pena de preclusão; D) na
hipótese dos autos, a CODISACRE, à época em que proposta a reivindicatória, já havia
retomado o imóvel, em razão do inadimplemento do contrato de compra e venda. Após o
parcelamento do bem, procedeu a alienação dos lotes a terceiros adquirentes. A ação, entretanto,
foi proposta somente contra o BANACRE, que havia adjudicado judicialmente o imóvel por
força de garantia hipotecária ofertada em contrato de mútuo; E) cuida-se, portanto, de nulidade
absoluta insanável por ausência de citação de litisconsorte passivo necessário, no caso, a
proprietária CODISACRE e terceiros adquirentes do bem em litígio. Esse vício poderá ser
reconhecido a qualquer tempo, mesmo após o decurso do prazo para a rescisória, por tratar-se
de pretensão meramente declaratória e imprescritível; F) A ação querela nullitatis por ausência
de citação pode ser requerida e proclamada em qualquer tipo de processo e procedimento de
cunho declaratório. A ação civil pública, por força do que dispõe o art. 25, IV, “b”, da Lei n.º
8.62593 (Lei Orgânica do Ministério Público), pode ser utilizada como instrumento para a
anulação ou declaração de nulidade de ato lesivo ao patrimônio público; G) a natureza de uma
ação independe de nomenclatura. Não é o título que se atribui à demanda que baliza a sua
31
Parece-nos que a indefinição encontrada --- na doutrina e na
jurisprudência --- em torno das sentenças inexistentes justifica a incidência do
princípio da fungibilidade em sede de ação rescisória, admitindo-se, em seu bojo,
a declaração de inexistência, afastando-se, com isso, formalismo rigoroso que
implicaria a extinção da ação, por falta de interesse. Ou seja, diante da situação
concreta, não se pode prestigiar o raciocínio de quem sustente que, se a sentença
é inexistente, não tem aptidão para a coisa julgada material, e, portanto, a
rescisória é descabida.
Este entendimento é defendido por abalizada doutrina
37
.
Flávio Yarshell e Eduardo Talamini, não obstante admitam a aplicação do
princípio da fungibilidade para tal hipótese, chamando a atenção, contudo, para o
problema relacionado a competência, argumentando que a ação rescisória é de
competência originária, e, a ação declaratória, via de regra, é de competência do
juízo de primeira instância, exceto se a ação primitiva era de competência
originária do tribunal.
condição. Apenas os fundamentos que a embasam e os pedidos formulados pelo autor é que
importam para definir-se a sua natureza específica. A demanda de que ora se cuida, embora
formulada com a roupagem de ação civil pública, revela pretensão querela nullitatis, vale dizer,
objetiva a declaração de nulidade da relação processual por ausência de citação; H) a ação civil
pública, na hipótese dos autos, constitui instrumento adequado à declaração de nulidade da
relação processual e, por conseguinte, da sentença.
32
Ou seja, os referidos autores sustentam que, se a
inadequação for detectada já no início, o correto é imprimir à ação rescisória o
regramento da ação declaratória (adaptando o que for necessário), remetendo-se,
conforme o caso, o processo para o juízo competente.
Por conta do complexo sistema de nulidades, e, ainda, da
inexistência de entendimento uniforme --- e definitivo --- na doutrina e na
jurisprudência, entendemos perfeitamente aplicável o princípio da fungibilidade,
aproveitando-se a ação rescisória, declarando-se, em seu bojo, a inexistência da
sentença.
Diferentemente dos autores acima citados, pensamos, sem
prejuízo de uma reflexão mais aprofundada, que, se a inexistência de uma
sentença pode ser reconhecida --- e declarada --- no bojo de qualquer processo, a
questão da competência não traz reflexo, sendo, pois, até mesmo desnecessária a
remessa dos autos para o juízo competente, já que, pela gravidade do vício,
parece-nos aplicável o art. 267, § 3º, do CPC, pois não há cogitar-se em sentença
de mérito, e, assim sendo, não há óbice para a declaração de nulidade pelo
próprio Tribunal.
37
Nesse sentido: Eduardo Talamini, Coisa Julgada e sua Revisão, pg. 366; Flávio
Yarshell, Ação Rescisória – Juízos rescindente e rescisório, pg. 267/270; Teresa Arruda Alvim
Wambier, Nulidades do Processo e da Sentença, pg. 492/498.
33
3.2. CONCEITO DE RESCINDIBILIDADE E OBJETO DA RESCISÃO.
A função rescindente, entendida como técnica de rescindir e
rejulgar, não é exclusiva da ação rescisória, podendo ocorrer, igualmente, em
outras ações autônomas e nos recursos em geral.
Na ação rescisória, a função rescindente, opera, como regra,
dois momentos distintos: o juízo rescindente, no qual, se procedente a ação, é
desconstituída a coisa julgada que pairava sobre a ação primitiva, e, o juízo
rescisório, quando a ação primitiva, dependendo do vício existente, é rejulgada
pelo próprio tribunal, ou, então, remetida para regular processamento perante o
juiz singular, hipótese em que não haverá juízo rescisório, mas, somente, o
rescindente. Há, ainda, a hipótese do provimento exauri-se no juízo rescindente
(IV).
O objeto da ação rescisória --- no tocante ao juízo
rescindente --- é a sentença de mérito, especificamente a sua parte dispositiva
(que é a parte apanhada pela coisa julgada e que produz efeitos para fora do
processo) e que padeça dos vícios do art. 485, do CPC. Os vícios a que alude o
art. 485, do CPC não são da parte dispositiva, mas, sim, da sentença, podendo
ocorrer, até mesmo, antes dela, ou no curso do processo, como, p. ex, quando há
34
cerceamento de defesa, e, este vício, reflete diretamente na sentença de mérito
(art. 269, CPC).
Essa observação afigura-se relevante, pois, no âmbito da
ação rescisória, incide o princípio da demanda, comumente denominado de
princípio dispositivo, e, no âmbito recursal, da voluntariedade. Ou seja, é o autor
da ação rescisória quem delimita o âmbito da rescisão, podendo haver, adiante-
se, rescisória total ou parcial (admitindo-se aqui a existência de sentença
objetivamente complexa), isto é, que impugne toda a parte dispositiva da
sentença ou parte dela.
O objeto de rescisão será analisado, com maior profundidade
e extensão, no tópico atinente ao juízo rescindente.
4. COISA JULGADA.
No CPC de 1939, admitia-se a ação rescisória para rescindir
sentenças de mérito e, também, sentenças meramente processuais. No CPC
vigente, a decisão de mérito com trânsito em julgado é requisito indispensável,
não sendo cabível, como regra, contra sentenças processuais, já que, tais
35
sentenças, não fazem coisa julgada material, podendo ser repropostas, o que
afasta o cabimento da ação rescisória.
No sistema vigente, sentença rescindível é a sentença de
mérito (art. 269, do CPC) transitada em julgado e que contenha um dos vícios
tipificados no art. 485, do CPC, ou, ainda, que padeça de nulidade absoluta
havida no curso do processo ou na própria sentença, encartando-se, aí, na
hipótese do inciso V, do art. 485, do CPC
38
.
É importante ressaltar, contudo, que muitas vezes as
sentenças são rotuladas de sentenças processuais, quando, na verdade, são típicas
sentenças de mérito, suscetíveis, portanto, de ação rescisória
39
, o que reflete
diretamente no cabimento da ação rescisória, já que, as sentenças processuais,
têm aptidão apenas para formar coisa julgada formal, ao passo que as de mérito
38
Esta posição alinha-se ao entendimento de Teresa Arruda Alvim Wambier, no sentido
de que “... a sentença será rescindível, , por causa de todos os incisos do 485, e somados a todas
as nulidades que são encartáveis, todas elas, nesse inciso V” (Repro 40, p.144).
39
Humberto Theodoro Júnior ensina que: “O que importa para uma sentença ser
qualificada como de mérito não é a linguagem usada pelo julgador, mas o conteúdo do ato
decisório, ou seja, a matéria enfrentada pelo juiz. É comum, na experiência do foro, o uso, por
exemplo, da expressão carência de ação em situações nas quais o autor não produz prova
alguma de seu pretenso direito. O que na verdade se está examinando, in casu, não é uma
condição de procedibilidade, mas o próprio pedido. Embora usado linguagem própria de decisão
de preliminar, o que faz oo magistrado é rejeitar o pedido. Logo, haverá sentença de mérito e
cabível será a ação rescisória, malgrado o emprego da expressão carência da ação. Por esse
mesmo motivo, não importa se ato decisório era atacável por apelação ou por agravo, se foi
decisão singular ou coletiva, nem se ocorreu em instância originária ou recursal. Se se enfrentou
matéria de mérito ... mesmo sob a forma de decisão incidental, terá havido, para efeito de ação
rescisória, sentença de mérito ...” (Curso de Direito Processual Civil, Editora Forense, Vol. I,
45ª edição, pg. 756/757).
36
têm aptidão não só para a coisa julgada formal, mas, também, para a coisa
julgada material.
Como se sabe, existem duas espécies de coisa julgada, a
formal e a material, que se distinguem apenas pela existência de um grau de um
mesmo fenômeno, sendo que ambas decorem da impossibilidade de alteração da
sentença
40
. A coisa julgada formal é, comumente, denominada de preclusão
máxima, acarretando a impossibilidade de revisão da sentença dentro do processo
(endoprocessualmente), seja porque a parte deixou de interpor os recursos
cabíveis, seja, enfim, porque estes recursos se esgotaram, não impedindo,
contudo, que a ação julgada possa vir a ser reproposta.
A coisa julgada material, por sua vez, contém algo a mais, já
que, a despeito de impedir a revisão dentro do processo, impede, também, a
discussão da matéria decidida em outros processos (produz efeitos para fora do
processo), podendo ser definida como sendo uma qualidade da sentença de
mérito de cognição exauriente transitada em julgado que torna imutável e
indiscutível o comando decorrente da parte dispositiva da sentença (art. 269,
CPC).
40
Humberto Theodoro Júnior, Curso de Direito Processual Civil, Vol. I, pg. 587.
37
Enrico Tullio Liebman ensina que, na verdade, coisa julgada
formal e material são duas expressões de um mesmo fenômeno
41
, ou seja,
implicam a imutabilidade do comando da sentença, sendo que, na coisa julgada
formal, a imutabilidade está vinculada ao próprio processo, ao passo que, na
coisa julgada material, a imutabilidade se opera no processo e, ainda, fora dele,
impendido que, as questões decididas, possam vir a ser rediscutidas, isto é, vai
além da relação processual, diz respeito à própria lide (=conflito de interesse
qualificado pela pretensão de interesses resistidos).
A coisa julgada formal pode existir sozinha, como nas
sentenças terminativas (art. 267, CPC). A coisa julgada material, por sua vez,
pressupõe a ocorrência da coisa julgada formal e que a sentença seja de mérito.
Todas as sentenças, mesmo que não sejam de mérito, são aptas a operar a coisa
julgada formal, mas somente as sentenças de mérito é que operam os efeitos da
coisa julgada material.
Não obstante o art. 485, do CPC condicione o cabimento da
ação rescisória à existência de sentença de mérito, existem situações, conforme
procuraremos sustentar neste trabalho, em que, mesmo sendo a sentença
terminativa, a doutrina e a jurisprudência têm admitido a ação rescisória (art.
485, CPC).
41
Enrico Túlio Liebma, Eficácia e Autoridade da Sentença e outros escritos sobre a coisa
38
5. PRONUNCIAMENTOS JUDICIAIS SUJEITOS À AÇÃO
RESCISÓRIA.
O art. 485, do CPC é claro ao estabelecer que a ação
rescisória é cabível contra a sentença de mérito transitada em julgado. No
entanto, não há dúvida de que referido dispositivo tem que ser interpretado de
forma mais abrangente, entendendo-se cabível a ação rescisória de todo
pronunciamento judicial que enfrente matéria de mérito
42
(e produza efeitos para
fora do processo).
Autorizada doutrina entende que a locução sentença de
mérito constante do art. 485, do CPC deve ser entendida como sendo provimento
judicial, concluindo ser perfeitamente cabível o ajuizamento de ação rescisória
contra decisões interlocutórias, desde que o provimento jurisdicional diga
respeito à matéria de mérito discutida
43
.
julgada, Editora Forense, 4ª edição, pg. 55/56.
42
Humberto Theodoro Junior destaca que “... não importa se ato decisório era atacável por
apelação ou por agravo, se foi decisão singular ou coletiva, nem se ocorreu em instância
originária ou recursal. Se enfrentou matéria de mérito (como, v.g., o saneador que decreta
prescrição parcial da dívida ajuizada, ou que nega o direito de evicção contra o denunciado à
lide), mesmo sob a forma de decisão incidental, terá havido, para efeito da ação rescisória,
sentença de mérito. Sob esse enfoque, o Supremo Tribunal Federal decidiu que “é cabível ação
rescisória contra despacho do relator que, no STF, nega seguimento a agravo de instrumento,
apreciando o mérito da causa discutido no recurso extraordinário” (Ob. Cit., Vol. I, pg. 757).
43
Alexandre Freitas Câmara, Ob. Cit., pg. 55/56.
39
Com efeito, não se pode negar, taxativamente, o cabimento
de ação rescisória de decisões interlocutórias, pois “o que atrai a autoridade da
coisa julgada é o fato de a decisão ser de mérito, não a circunstância de tratar-se
de sentença. Sendo assim, as decisões interlocutórias, desde que contenham
matéria de mérito, podem ser alvo de ação rescisória. Isso só acontece quando o
julgamento de mérito pode ser cindido, em decorrência do cúmulo subjetivo e
objetivo de demandas. Assim, o que importa, para a rescindibilidade do ato
judicial, é o seu conteúdo, não a sua forma ou denominação”
44
.
É certo que o julgamento de mérito, entendido como o
pedido formulado, fica reservado para a ocasião da prolação da sentença, por
força do princípio da concentração da defesa (art. 458 c/c 459, CPC). Cândido
Rangel Dinamarco afirma que “... é na sentença que se concentram o exame e o
pronunciamento do juiz acerca de todos os pontos relevantes par a procedência
ou improcedência da demanda. Assim é a estrutura lógica da sentença, na qual se
inclui não somente a decisão da causa como a solução de todas as questões
jurídico-substanciais capazes de influir sobre tal decisão. Tal é o princípio da
concentração da decisão, de que fala Liebman e que só comporta as exceções que
a lei estabelecer; e a lei brasileira não formula as exceções que se vêem na
italiana ... Aqui, a conclusão pela procedência ou improcedência vem
44
Izabelle Albuquerque Costa Maia, p. 104, da tese de mestrado já referida.
40
exclusivamente na parte decisória da sentença e a solução de todas as questões de
mérito, na motivação”
45
.
Não obstante a autoridade deste entendimento, afigura-se-
nos que existem situações que demandam melhor análise, notadamente quando
há cúmulo objetivo e/ou subjetivo de demandas. Com efeito, em situações como
essas, é aconselhável que todas sejam decididas em uma mesma oportunidade.
Todavia, há a possibilidade de cisão ou julgamento fracionado do mérito dessas
demandas, sendo, parte delas, apreciadas e decididas no curso do processo, ou
seja, por meio de decisões interlocutórias, de forma que, se abordarem o mérito,
terão aptidão para a coisa julgada material, sendo, portanto, perfeitamente
impugnável por meio da ação rescisória.
A regra do art. 543, § 2º do CPC atenua o problema, já que,
por essa sistemática, a decisão de mérito proferida no curso do processo será
apanhada pela coisa julgada material ao mesmo tempo da decisão final, mas,
contudo, não resolve, já que a decisão de mérito proferida no curso do processo
pode restar irrecorrida, quer, ainda, porque os tribunais podem excepcionar os
recursos excepcionais desta regra
46
.
45
Nova Era do Processo Civil, Editora Malheiros, pg. 282.
46
Flávio Luiz Yarshel, Ob. Cit., pg. 184/188.
41
Ou seja, se no curso do processo houve cisão do julgamento
de mérito e essa decisão é suscetível de formar a coisa julgada material, não há
óbice algum para o ajuizamento da ação rescisória de decisão interlocutória,
podendo-se citar --- a título de expemplo --- diversas situações desta natureza.
Flávio Luiz Yarshell enfrenta algumas delas. Para o autor, no
caso específico da reconvenção, quando liminarmente indeferida, a decisão tem
natureza de decisão interlocutória, mas, por exemplo, se a causa de extinção for
prescrição ou decadência, abrirá ensejo ao manejo da ação rescisória. O mesmo
ocorre no incidente de falsidade, que tem natureza de ação declaratória
incidental, quando decidido antes do processo principal, sendo que, não obstante
o art. 395, do CPC faça alusão à sentença, a jurisprudência entende tratar-se de
decisão interlocutória. Há, ainda, a antecipação de tutela de pedido
incontroverso
47
.
O conceito de sentença foi alterado pela Lei 11.232/2005
(art. 162, § 1º, CPC). O referido dispositivo leva à impressão de que todo
pronunciamento judicial que tenha por conteúdo uma das hipóteses nele previstas
será uma sentença. Não é bem assim, contudo. Os exemplos acima citados
ilustram bem o problema. Com efeito, nem toda decisão que tiver por conteúdo
47
Ob. Cit., pg. 188/192.
42
uma das hipóteses dos artigos 267 e 269, do CPC implicará a extinção do
procedimento.
A sentença, agora, se define pelo conteúdo. Todavia, é
importante se ter presente que o conteúdo que se diz definir a sentença não lhe é
próprio, já que pode estar contido em uma decisão interlocutória (de mérito), que,
se transitada em julgado, pode ser impugnada pela ação rescisória, o que reforça
o entendimento aqui sustentado.
Com base neste entendimento, parece-nos inegável a
possibilidade das decisões (de mérito) que encerram a fase de liquidação
(art.475-H, CPC) e a impugnação (art. 475, M, § 3º, CPC), se maculadas por um
dos vícios do art. 485, do CPC, serem impugnadas por meio da ação rescisória
(art. 485).
Alexandre Freitas Câmara, analisando esses dois
dispositivos, destaca que “ ... nunca houve qualquer dúvida acerca do cabimento
de ação rescisória para impugnar provimento judicial que julgada a liquidação de
sentença ou os embargos à execução fundada em sentença .... Penso que quanto
ao ponto nada mudou. A decisão que resolve o incidente de liquidação de
sentença julga o mérito deste incidente, que não se confunde com o mérito da
causa principal ...O incidente de liquidação de sentença tem um objeto próprio,
43
que é julgado, ainda que por decisão interlocutória. Tal provimento judicial, sem
qualquer dúvida, é proferido com base em cognição exauriente (...) O mesmo
modo de pensar, a meu juízo, pode ser aplicado à impugnação à execução de
sentença ...”
48
-
49
.
Conforme procuramos demonstrar, o que é decisivo para o
cabimento da ação rescisória não é o ato judicial (isto é: sentença, acórdão ou
decisão interlocutória), mas, sim, o conteúdo do pronunciamento judicial
(=mérito). Se for de mérito, e se estiver sujeito à coisa julgada material
50
, não há
dúvida de que a ação rescisória será cabível, mesmo que se trate de uma decisão
interlocutória.
48
Ob. Cit., pg. 59/60.
49
No mesmo sentido é o entendimento de Flávio Luiz Yarshell, conforme se observa do
artigo intitulado “Ação Rescisória e Decisões Proferidas no Processo de Execução: Novas
reflexões à luz das disposições da Lei n.º 11.232/05”, constante da obra coletiva Meios de
Impugnação ao Julgado Civil, Estudos em Homenagem a José Carlos Barbosa Moreira, Editora
Forense, pg. 233/249.
50
Este referencial é importante, pois a decisão interlocutória (de mérito) precisa ser apta a
produzir efeitos para fora do processo. Desta forma, pensamos que a decisão que concede
antecipação de tutela com base no art. 273, I e II, do CPC não é suscetível de ação rescisória, já
que o provimento pode ser revogado ou modificado a qualquer tempo (§ 4º, do art. 273, do
CPC). O mesmo entendimento parece-nos aplicável à hipótese anômala de deferimento de
antecipação de tutela de caráter irreversível (§ 2º, do art. 273, do CPC). Diferente, contudo,
parece-nos ser a antecipação de tutela de pedido incontroverso (§ 6º, do art. 273, do CPC), que,
a nosso ver, enseja o manejo de ação rescisória.
44
5.1. DO CABIMENTO DA AÇÃO RESCISÓRIA DAS SENTENÇAS
TERMINATIVAS QUE IMPEÇAM A REPROPOSITURA DA
DEMANDA.
As sentenças terminativas (art. 267, CPC) podem ser
analisadas sob dois enfoques: a-) as que não obstam a repropositura da ação após
a coisa julgada formal, e b-) as que obstam a repropositura da ação, o que decorre
da expressa redação do art. 268, do CPC.
Neste trabalho, somente a segunda espécie de sentenças
terminativas tem relevância, já que, na prática, não obstante não veicule matéria
de mérito, equivalem-se à coisa julgada material.
O art. 268, do CPC conduz à indagação se as sentenças
terminativas que impedem a repropositura da ação seriam suscetíveis de ação
rescisória. Há quem negue peremptoriamente essa possibilidade, argumentando
que, em havendo litispendência, coisa julgada ou perempção da ação, não poderá
o autor desconstituir a sentença, nem tampouco repropor a demanda,
reconhecendo não ser satisfatória a solução, argumentando que esta conclusão
decorre de lei
51
.
45
5.1.1. SENTENÇAS TERMINATIVAS LASTREADAS EM PEREMPÇÃO,
LITISPENDÊNCIA E COISA JULGADA.
Interpretação mais “larga” do art. 268, do CPC, segundo
sólida doutrina
52
, permite o manejo da ação rescisória das sentenças proferidas
com base em litispendência, coisa julgada e perempção, se houver, na sentença,
um dos vícios a que alude o art. 485, do CPC.
É pensar, por exemplo, na hitese de uma ação revocatória
ajuizada por “A” em face de “B”, sob o fundamento de que houve pagamento de
dívida não vencida realizado dentro do termo legal da falência, que tenha sido
julgada improcedente, com trânsito em julgado. “A” propõe nova ação
revocatória contra “B” e formula o mesmo pedido, mas, desta vez, atrelado à
51
Sérgio Rizzi, Ob. Cit., pg. 29/30.
52
“ ... não parece mesmo correto dizer que a sentença que extingue o processo sem
julgamento do mérito ao argumento de perempção, litispendência ou coisa julgada não projete
efeitos para fora do processo, se considerada a inafastabilidade do controle jurisdicional como
garantia que integra o patrimônio de todo cidadão, no quadro dos direitos e garantias
fundamentais. Nas hipótese mencionadas, ocorrendo vício arrolado no art. 485, do CPC, nem
mesmo seria possível cogitar de outra via processual que não a da ação rescisória. É que, ainda
que o autor --- desobedecendo à literalidade do citado art. 268, sob o fundamento de que a
decisão anterior estaria viciada na forma do art. 485, também invocado --- simplesmente
ajuizasse uma nova demanda, insistindo no julgamento do mérito, não caberia ao órgão
monocrático desconstituir a decisão anterior, porque isso, evidentemente, escaparia à sua
competência. Por outro lado, nem parece possível dizer que a alegação de ocorrência do vício
pudesse integrar a causa de pedir dessa nova demanda, a diferenciá-la da anterior. É certo que a
letra do art. 485 do CPC --- diversamente da redação empregada pelo art. 798 do Código
anterior, que não fazia qualquer distinção --- é peremptória no sentido de que somente
comportam ação rescisória as sentenças de mérito, e nas hipóteses acima tratadas, inclusive pelo
que dispõem os arts. 267 e 269 do mesmo estatuto, não há mesmo julgamento do pedido. Não se
trata, contudo, de afrontar a letra da lei, mas de lhe dar interpretação compatível com o sistema,
notadamente diante da mencionada garantia constitucional” (Flávio Luiz Yarshell, Ação
Rescisória, pg 165/166).
46
alegação de constituição de direito real de garantia dentro do termo legal da
falência, a qual é extinta sem resolução de mérito, sob o fundamento de haver
coisa julgada.
Parece-nos evidente o equívoco desta última sentença (erro
de atividade), já que não há falar-se em coisa julgada, porquanto as ações são
distintas, pois têm causas de pedir distintas. Ora, se se interpretar o art. 268, do
CPC literalmente, “A” terá negado --- claramente --- o direito de acesso ao Poder
Judiciário, já que a sentença de extinção impede --- de forma flagrantemente
equivocada --- o julgamento de mérito em outro processo, e, sendo assim,
pensamos estar correto o entendimento no sentido de que, nessas hipóteses, a
ação rescisória é cabível.
Este entendimento tem prevalecido perante o STJ:
“em alguns casos, pode-se admitir a ação rescisória em se
tratando de acórdão que, por equívoco, extingue o processo sob o
fundamento da coisa julgada (CPC, art. 267, V), uma vez que, em
47
tal hipótese, não há possibilidade de renovar-se a causa em
primeiro grau, por força do disposto no art. 268, do CPC”.
53
5.1.2. DECISÕES QUEO CONHECEM DO RECURSO.
Situação análoga ocorre nas hipóteses em que os recursos,
por equívoco, não são conhecidos e implicam a sedimentação da decisão de
mérito. Veja-se, p. ex., a hipótese de se entender --- equivocadamente ---
intempestiva a apelação interposta de uma sentença de mérito. Ora, a decisão que
não conheceu do recurso de apelação, ainda que equivocada, não pode ser objeto
de ação rescisória ? Somente a sentença de primeira instância é que poderia ser
??
Prevalece o entendimento doutrinário que sustenta o não
cabimento da rescisória da decisão que não conhece do recurso, fundamentando
que, nessas situações, rescindível é a própria decisão recorrida. Ousamos
discordar. Parece-nos que, em hipóteses como essa, a ação rescisória será cabível
não só da decisão que não conheceu do recurso de apelação, mas, também, se
houver um dos vícios do art. 485, do CPC, da própria sentença, havendo
cumulação de pretensões.
53
A ação rescisória no Superior Tribunal de Justiça, in Recursos no Superior Tribunal de
Justiça, São Paulo: Saraiva, 1991, p. 260/261, nota 3.
48
Ora, é de se convir que embora terminativa a decisão que
não conhece do recurso, no caso acima figurado, a mesma impossibilita a
discussão do mérito em outra ação, já que, em razão do não conhecimento do
recurso, é que passou em julgado a decisão de mérito. Logo, entendemos correta
a afirmação de que o direito à rescisão não se limita às decisões que diretamente
analisem o mérito, alcançando, também, as decisões terminativas que
impossibilitam a discussão do mérito em outra demanda. Ou seja, impedir que o
autor ajuíze a ação rescisória, em situações como a figurada, em que é flagrante o
equívoco cometido, é cercear-lhe o seu direito e autorizar que uma situação de
erro grave e flagrante torne-se indevidamente imutável.
Acresça-se, ainda, a possibilidade da sentença de primeira
instância não padecer de nenhum dos vícios a que alude o art. 485, do CPC. E
mais, a questão objeto da demanda ser controvertida perante os tribunais, o que
poderia obstar a admissão da ação rescisória (Súmula 343/STF). A situação não
nos parece correta. Endossamos a doutrina que admite que as sentenças
terminativas possam ser, excepcionalmente, rescindidas, justamente para se
evitar situações como a acima, que claramente impossibilita a discussão do
mérito em outra ação.
49
Flávio Luiz Yarshell é claro a esse respeito:
“... prevalece na doutrina a tese segundo a qual não cabe
rescisória contra a decisão que não conheceu o recurso, porque o
ato não se encaixa na disposição do art. 485, CPC. Possível de
desconstituição seria, sim, a decisão de mérito recorrida.
A solução, na generalidade dos casos, parece tecnicamente
correta, mas não dispensa alguma reflexão. É que, realmente, o
vício – dentre os arrolados pelo art. 485, do CPC – pode residir na
decisão (em sentido lato) recorrida, caso em que, sendo ela de
mérito e tendo transitado em julgado, não haverá qualquer
dúvida: é ela, e não o ato que reputou inadmissível o recurso, o
ato passível de ação rescisória.
Contudo, é também possível que o vício resida no ato que não
admitiu ou não conheceu do recurso e, mais do que isso, que esse
vício seja a causa determinante de sua não admissão. É pensar no
caso de não conhecimento do recurso por suposta
intempestividade fruto de típico erro de fato ou, ainda, por
violação a literal disposição de lei. Nesses casos o acórdão só não
é de mérito justamente porque foi perpetrado um erro – grave a
ponto de estar previsto no art. 485 do CPC.
50
Nessas hipóteses – em que o vício, mais do que residir no
julgamento de inadmissibilidade, seja a causa determinante do
não conhecimento do recurso –, dizer que o ato rescindível é o
recorrido significa, ainda que reflexamente, excluir da ação
rescisória a possibilidade de alegação desse mesmo vício, na
medida em que a declaração de não conhecimento do recurso é
estranha ao ato que se busca rescindir ... considerando as
hipóteses em que o vício seja a causa determinante do não
conhecimento do recurso, parece ser lícito fazer uma distinção,
supondo, para fins de raciocínio, que a ação rescisória pudesse
incluir, dentre outros fundamentos, o vício que causou o não
conhecimento”
54
.
No mesmo sentido é o entendimento de Bernardo Pimentel
Souza:
“Quando o recurso não ultrapassa a barreira da admissibilidade, é
o decisum recorrido que adquire a auctoritas rei iudicatae, após o
decurso in albis do prazo recursal para a impugnação do último
julgado proferido no processo. Não é juridicamente possível a
interposição de outro recurso, nem o ajuizamento de nova ação –
54
Ação rescisória, São Paulo: Malheiros, pg. 166/168.
51
tendo em vista o disposto nos artigos 301, §3º e 467. Porém, se o
vício previsto no artigo 485 diz respeito à última decisão, de nada
adianta atacar o primeiro decisum, pois ele não está contaminado
por defeito que autoriza a rescisão. Realmente, se o vício reside
no último julgado, ele é que deve ser impugnado via ação
rescisória ...”
55
.
Valiosas, ainda, as lições de Humberto Theodoro Júnior:
“... pode acontecer a necessidade de recorrer-se à rescisória,
quando a decisão última (rescindenda), embora não sendo de
mérito, importou tornar preclusa a questão de mérito decidida no
julgamento precedente.
...
Não se pode, outrossim, dizer que se na sentença existir motivo
para a rescisória esta deveria ser requerida contra a decisão de
primeiro grau e não contra o acórdão do Tribunal, cujo conteúdo
teria sido meramente terminativo.
55
Introdução aos recursos cíveis e à ação rescisória, Bernando Pimentel Souza, Saraiva, p.
729.
52
É que nem sempre é possível fazer-se o enquadramento da
sentença nos permissivos do art. 485. Mas, se houve o error in
iudicando no acórdão, o apelante sofreu violento cerceamento do
direito de obter a revisão da sentença de mérito, pela via normal
da apelação, que é muito mais ampla do que a da rescisória.
...
Tendo-se em vista a instrumentalidade do processo e
considerando-se que o error in iudicando, embora de natureza
simplesmente processual, afetou diretamente uma solução de
mérito, entendo que, nessa hipótese excepcional, a mens legis
deve ser interpretada como autorizadora da ação rescisória, a fim
de que, cassada a decisão ilegal do Tribunal, se possa completar o
julgamento de mérito da apelação, cujo trancamento se deveu a
flagrante negação de vigência de direito expresso”.
56
Em abono a este entendimento, o STJ tem decidido ---
majoritariamente --- pelo cabimento da ação rescisória em situações em que,
embora não exista decisão de mérito, a decisão terminativa inviabiliza o
ajuizamento de nova ação, tal como figurado no exemplo acima.
56
Ob. Cit, Vol. 1, 30 ed., Rio de Janeiro: Forense, pg. 655.
53
Veja-se:
“Ação rescisória. Apelação não conhecida por deserção.
Precedentes da Corte.
1. Precedentes da Corte considerando admissível a rescisória
quando não conhecido o recurso por intempestividade, autorizam
o mesmo entendimento em caso de não-conhecimento da
apelação por deserção. Ressalva do Relator.
2. Recurso especial conhecido e provido”
57
.
“Ação rescisória de rescisória. Ação rescisória contra Acórdão
que não conheceu de recurso por intempestividade. Precedentes.
1. Já decidiu a Corte que não cabe rescisória de ação rescisória
quando simples reiteração da anterior.
2. A ação rescisória há de referir-se sempre a processo em que a
lide seja julgada. Precedente da 2ª Seção admite a ação rescisória
quando não conhecido o recurso por intempestividade, para
57
STJ, RESp 636.251/SP, 3ª T., Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, ac.
03.02.2005, in DJU 11.04.2005.
54
corrigir erro e dar margem ao reexame da decisão de mérito.
Votos vencidos nesta parte”.
58
Desta forma, entendemos cabível o ajuizamento da ação
rescisória de decisões terminativas que, equivocadamente, acabam por não
conhecer do recurso, impedindo que o mérito venha a ser discutido em outra
demanda.
6. DA ANÁLISE DO CABIMENTO OU NÃO DA AÇÃO RESCISÓRIA
NOS PROCESSOS DE CONHECIMENTO, EXECUÇÃO E CAUTELAR.
Para a solução dos litígios existem três espécies de tutela
jurisdicional: a cognição, a execução e a cautela, distinguindo, uma das outras,
quanto aos diferentes pronunciamentos judiciais com que o juiz responde ao
exercício do direito de ação. O processo de cognição (= conhecimento) é
caracterizado pela pretensão resistida, que demanda o acertamento da
controvérsia, dando-se resposta definitiva ao pedido do autor. O processo de
execução tem lugar diante de uma pretensão insatisfeita, ou seja, não se discute o
direito do autor, busca-se, apenas, a satisfação do seu direito já reconhecido. O
processo cautelar, por sua vez, tem lugar quando, antes da solução definitiva da
58
STJ, Resp. 122.413/GO, 3ª T., Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, ac.
20.06.2000, in DJU 09.10.2000, p. 140.
55
lide, no processo de cognição ou de execução, há a necessidade de um
provimento jurisdicional para garantir a utilidade daqueles outros
59
.
O CPC, para o processo de cognição, prevê o procedimento
60
comum e os procedimentos especiais. O procedimento comum aplica-se a todas
as causas para as quais a lei não haja instituído um rito próprio ou específico (art.
272), subdividindo-se em ordinário e sumário (art. 272, do CPC). Os
procedimentos especiais são ritos específicos, catalogados no Livro IV, do CPC,
havendo duas modalidades: os de jurisdição contenciosa e os de jurisdição
voluntária
61
.
Não há na doutrina e na jurisprudência unanimidade quanto
ao cabimento da ação rescisória. Há zonas de certeza e outras que, ainda hoje,
muito se tem discutido. Entendemos que, na medida do possível, sempre que for
viável, estará autorizado o manejo da ação rescisória, não sendo lícita uma
interpretação restritiva. Ou seja, se houver decisão de mérito e se esta produzir
efeitos para fora do processo, pensamos que, seja qual for o processo, será
cabível a rescisória. Sustentamos o mesmo com relação às sentenças terminativas
que padeçam dos vícios do art. 485, do CPC e que impedem a repropositura da
demanda.
59
Humberto Theodoro Júnior, Ob. Cit. Vol. I, pg. 368.
60
Procedimento é sinônimo de rito do processo.
61
Humberto Theodoro Júnior, Ob. Cit. Vol. I, pg. 368/369.
56
No entanto, existe uma linha doutrinária que entende que o
fato de caber rescisória somente das decisões de mérito que tenham alçado a
coisa julgada material seria o suficiente para excluí-la das decisões que não
aquelas proferidas em processos de cognição contenciosa. Com este
entendimento, estariam excluídas da ação rescisória decisões proferidas nos
processos cautelares e de execução, bem como as decisões nos processos de
jurisdição voluntária
62
.
A conclusão alcançada por esta linha doutrinária parece-nos
extremada. Com efeito, é preciso destacar que não são todas as decisões de
mérito que são suscetíveis do ataque pela ação rescisória, já que algumas delas
não são aptas a formar a coisa julgada material. Vejam-se, por exemplo, as
sentenças proferidas em ações civis públicas e populares, quando são julgadas
improcedentes por insuficiência de provas. Nestas hipóteses, é possível a
repropositura da ação, com a apresentação de novas provas.
As decisões proferidas nos Juizados Especiais Cíveis,
mesmo aptas a formar a coisa julgada material, são insuscetíveis de impugnação
por meio da ação rescisória, por expressa previsão legal, conforme o art. 59, da
62
Alexandre Freitas Câmara, Ob. Cit,. pg.57/58.
57
Lei 9.099/1995
63
. O mesmo ocorre na ação direta de inconstitucionalidade e ação
declaratória de constitucionalidade (art. 26, da Lei nº 9868/1999) e na argüição
de descumprimento de preceito fundamental (art. 12, da Lei n.º 9.882/1999).
63
Veja-se o entendimento do TJ/RS:
“Vistos etc.
Indefiro a inicial da presente ação rescisória, forte no art. 490, I, do CPC, combinado com os
arts. 295, I, e parágrafo único, III, e 267, VI, ambos do CPC.
Com efeito, o pedido de rescisão de sentença prolatada no âmbito da competência de Juizado
Especial Cível mostra-se juridicamente impossível, uma vez que não autorizado pelo
ordenamento jurídico pátrio, consoante expressa disposição do art. 59 da Lei n.º 9.099/95, ora
transcrito: “Art. 59. Não se admitirá ação rescisória nas causas sujeitas ao procedimento
instituído por esta Lei.”
Este é o entendimento jurisprudencial deste Tribunal de Justiça, citando-se:
ACAO RESCISÓRIA. DECISÃO PROFERIDA NO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL.
SUPERADA A QUESTÃO DA COMPETÊNCIA, É DE SER DECLARADA A
IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO, CONFORME EXPRESSA VEDAÇÃO DO
ART-59 DA LEI N. 9099/95. DECLARARAM EXTINTA A AÇÃO. UNÂNIME. (FLS. 04).
(AÇÃO RESCISÓRIA Nº 70004073912, SEXTO GRUPO DE CÂMARAS CÍVEIS,
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: DES. BAYARD NEY DE FREITAS
BARCELLOS, JULGADO EM 26/04/2002)
AÇÃO RESCISÓRIA. JUIZADO ESPECIAL CÍVEL. CARÊNCIA DE AÇÃO.
IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. NÃO SE ADMITE AÇÃO RESCISÓRIA
CONTRA DECISÃO PROFERIDA NO ÂMBITO DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS
(ART-59 DA LEI N. 9099/95). CARÊNCIA DE AÇÃO RECONHECIDA. (4 FLS.) (AÇÃO
RESCISÓRIA Nº 599214046, DÉCIMA PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE
JUSTIÇA DO RS, RELATOR: DES. VOLTAIRE DE LIMA MORAES, JULGADO EM
15/03/2000)
AGRAVO REGIMENTAL. AÇÃO RESCISÓRIA. SENTENÇA PROFERIDA NO JUIZADO
ESPECIAL CÍVEL NÃO ESTÁ SUJEITA À AÇÃO RESCISÓRIA, FACE A REGRA DO
ART-59 DA LEI N° 9099/95. CARÊNCIA DE AÇÃO PROCLAMADA. PROCESSO
EXTINTO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. (AGRAVO REGIMENTAL Nº
70003770260, VIGÉSIMA PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS,
RELATOR: DES. FRANCISCO JOSÉ MOESCH, JULGADO EM 06/02/2002)
Desta forma, autorizado o julgamento singular, tendo em vista a manifesta inépcia da petição
inicial, diante da impossibilidade jurídica do pedido de rescisão de sentença sujeita a
procedimento de Juizado Especial Cível, com fundamento nos arts. 490, I; 295, I, e parágrafo
único, III; e 267, VI, todos do CPC, combinados com o art. 59 da Lei n.º 9.099/95, indefiro a
inicial da presente ação rescisória, extinguindo o processo sem julgamento do mérito ...” (Ação
Rescisória nº 70007039175, Décima Segunda Câmara Cível, Relator: DES. Carlos Eduardo
Zietlow Duro).
58
Como adiantado, ousamos nos filiar àqueles que, em certas
hipóteses, entendem cabível a ação rescisória nos processos de execução, cautelar
e de jurisdição voluntária.
É o que passamos a demonstrar.
6.1. DECISÕES PROFERIDAS NO PROCESSO DE CONHECIMENTO.
No processo de conhecimento contencioso, exceto se houver
previsão legal em sentido contrário, cabe ação rescisória das decisões de mérito,
aptas a formar a coisa julgada material, sejam elas proferidas no processo
principal ou incidental, singulares ou colegiadas. Ou seja, somente não caberá a
ação rescisória se houver vedação legal, nos moldes em que procuramos
demonstrar nas linhas precedentes.
As controvérsias sérias existentes estão relacionadas ao
cabimento ou não da ação rescisória nos processos de execução, cautelar, e no
processo de conhecimento de jurisdição voluntária, o que passaremos a analisar
abaixo.
59
6.1.1. DECISÕES PROFERIDAS NO PROCESSO DE CONHECIMENTO
DE JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA.
O entendimento doutrinário predominante é no sentido de
que nos procedimentos de jurisdição voluntária é descabido o manejo da ação
rescisória, fundamentando que na jurisdição voluntária não há processo, não há
lide, não há sentença de mérito, e, portanto, não há coisa julgada material, sendo
que as sentenças aí proferidas podem ser modificadas por fatos supervenientes
(art. 1.111, CPC), o que bastaria para excluir, pela raiz, o cabimento da ação
rescisória
64
.
Flávio Luiz Yarshell faz acentuada crítica a essas
proposições. O autor analisa o quê na jurisdição voluntária produz efeitos para
fora do processo, “apenas a eficácia do ato praticado pelas partes e chancelado
pelo Poder Judiciário, ou é essa eficácia e também a eficácia estatal do ato que
outorgou tal chancela”, concluindo que não somente o ato das partes produz
efeitos para fora do processo, mas, também, o ato estatal, entendendo ser
artificial a separação do ato praticado pelas partes do ato chancelado pelo Poder
Judiciário
65
.
64
Nesse sentido, pode-se citar, dentre outros, Sérgio Rizzi (Ação Rescisória, Editora
Revista dos Tribunais, pg. 30/31) e Márcia Conceição Alves Dinamarco (Ação Rescisória,
Editora Atlas, pg. 58/59).
60
Destaca o autor que o processo de jurisdição voluntária pode
padecer de vícios, sejam eles referentes ao ato das partes, sejam eles residentes
no ato estatal, e estes vícios não se confundem com as situações supervenientes a
que alude o art. 1.111, do CPC, de maneira que, se os vícios residentes no ato
estatal (e não das partes), corresponderem aos do art. 485, do CPC, é preciso
encontrar uma forma de saná-los, o que, nem sempre, é simples, citando como
exemplo situação em que a alegação de vício que macula a sentença não possa
ser apreciada pelo próprio órgão prolator, como nas hipóteses dos incisos I e II
do art. 485, do CPC, o que impediria a correção pelo próprio prolator, de maneira
que o vício existente no ato estatal deverá ser impugnado por meio de ação
rescisória.
O entendimento é interessante, não se pode negar. No
entanto, o acerto ou não da tese, diante da acentuada divergência doutrinária, não
é objeto de análise, destacando-se, apenas para motivar a reflexão, entendimento
precedente defendido por Coquejo Costa, para quem “juiz impedido que funcione
em procedimento de jurisdição voluntária não coloca a sua decisão sob o crivo da
ação rescisória”
66
.
65
Ação rescisória, pg. 177.
61
6.1.2. DECISÕES PROFERIDAS NO PROCESSO EXECUÇÃO.
O entendimento predominante na doutrina e na
jurisprudência é no sentido de que não há sentença de mérito no processo de
execução, argumentando-se que o processo de execução não é
preponderantemente marcado pelo contraditório, como no processo de
conhecimento, não havendo reconhecimento da existência ou não do direito, mas
sim a satisfação de um direito já reconhecido.
Sergio Rizzi anota que respeitáveis doutrinadores não
reconhecem a existência de sentença de mérito no processo de execução, citando
Humberto Theodoro Júnior, José Carlos Barbosa Moreira, Cândido Rangel
Dinamarco, Celso Neves e Antônio Cláudio Mariz de Oliveira
67
.
O Autor, contudo, filiando-se à posição de José Frederico
Marques, que entende haver sentença de mérito no processo de execução nas
hipóteses do art. 794, do CPC, entende cabível, se presentes os vícios do art. 485,
do CPC, a ação rescisória.
66
Ação Rescisória, LTr, 7ª edição, pg. 65.
67
Ob. Cit. pg. 16.
62
Flávio Luiz Yarshell discorda a tese acima referida,
fundamentando que “o que ... justifica a estabilidade da declaração expressa no
processo de execução não é simplesmente a afirmação formal de que o devedor
satisfez a obrigação (art. 794, I), mas sim objeto e o grau de cognição
empreendida para que se checasse a essa declaração”
68
.
Para o autor, não basta a existência de sentença do art. 794,
do CPC para que se conclua pelo cabimento da ação rescisória no processo de
execução. É necessário mais, ou seja, o que é relevante --- e fundamental ---
analisar é “(i) ... o objeto e a profundidade dessa cognição e (ii) em que medida,
com base na cognição empreendida, dá-se a declaração do direito no caso
concreto e (iii) sendo assim, em que medida projetam-se, para fora do processo,
efeitos materiais aptos a se tornar imutável pela coisa julgada material – e, dessa
forma, ensejar desconstituição através da ação rescisória”
69
.
A tese revela um temperamento do entendimento daqueles
que negam, peremptoriamente, o cabimento da ação rescisória no processo de
execução com aqueles que, por sua vez, admitem-na para as hipóteses do art. 794
c/c 795, ambos do CPC.
68
Ob. Cit., pg. 216.
69
Ob. Cit. pg. 211/212.
63
Teresa Arruda Alvim Wambier, por caminho diverso, admite
a ação rescisória --- em situações excepcionais --- no processo de execução.
Para a autora, no processo de execução, ao contrário do de
conhecimento, “nada se decide, em princípio, acerca do direito do autor, porque a
respeito deste direito não se discutiu na execução em que não houve embargos ou
impugnação. Não se tratava, em verdade, de relação jurídica a respeito da qual
havia conflito. Em outras palavras, não há, na execução, segundo o que nos
parece, lide, no sentido em que utilizamos expressão no que tange ao processo de
conhecimento. O que há é um mero “pedido”. No sentido de que o crédito,
conforme consta do título, seja satisfeito. E, correlatamente, na sentença se diz
que o direito do autor, na exata medida em que estava estampado no título, foi
satisfeito. Este é o conteúdo decisória da sentença que põe fim à execução não
embargada ou não impugnada”
70
.
E acrescenta: “esse efeito, que menciona o art. 795, do CPC,
não é nem a coisa julgada, nem a declaração, mas o fim da execução: é a coisa
julgada formal. Extingue-se, pois, a relação processual executiva. Nada mais”,
não sendo suscetível de rescindibilidade.
70
Teresa Arruda Alvim Wambier, Nulidades do Processo e da Sentença, RT, 6ª edição,
pg. 121/132.
64
Não obstante esta posição, a autora exemplifica duas
situações excepcionais que não se amoldariam a esta regra: a de reconhecimento,
de ofício, da prescrição da dívida e, outra, a de haver declaração judicial, no
curso da própria execução, de pronunciamento do juiz, reconhecendo que a
dívida foi paga, concluindo que, em tais casos, “não se pode negar que terá
ocorrido julgamento, embora em sede imprópria, e não há como se afastar, por
isso, a ocorrência de coisa julgada. Por tal razão, nesta hipótese caberá,
excepcionalmente, desde que preenchidos os demais pressupostos, ação
rescisória”
71
.
Parece-nos que os dois últimos autores acima citados,
embora por caminhos diversos, chegam à mesma conclusão, no sentido de que
somente será cabível a ação rescisória no processo de execução se a decisão for
fruto de uma cognição aprofundada e, se a mesma, produzir efeitos para fora do
processo, obstando a repropositura da execução; fora disso, cremos, não será
cabível a rescisória.
6.2. DECISÕES PROFERIDAS NO PROCESSO CAUTELAR.
No tocante ao processo cautelar, o que se tem sustentado é
que as decisões aí proferidas são irrescindíveis, salvo se acolhida as alegações de
71
Idem.
65
decadência e de prescrição do direito do autor
72
. Ou seja, para os que assim
entendem, a rescisória é admitida não porque aceita-se que tais sentenças possam
ser apanhadas pela coisa julgada material, mas sim porque obstam o ajuizamento
da ação principal.
Nada obstante este seja o entendimento predominante, calha
destacar tese mais liberal, que, a exemplo do que se viu no processo de execução,
admite o manejo da ação rescisória para outras hipóteses, conforme se observa da
doutrina de Flávio Luiz Yarshell.
Para sustentar o cabimento em outras hipóteses afora a da
prescrição e da decadência, o autor destaca que “... a decisão de mérito no
processo cautelar, em primeiro lugar, pode ser considerada aquela que,
desviando-se da finalidade clássica desse processo, define desde logo --- e não
apenas provisoriamente --- a relação de direito material e, nessa medida, projeta
efeitos para fora do processo”
73
A conclusão a que chega o autor é a de que “... a questão é
saber se o acolhimento ou rejeição da pretensão cautelar projeta efeitos
substanciais para fora do processo. E, como visto, para que isso ocorra, de duas
72
Art. 810, do CPC.
73
Ob. Cit., pg. 227.
66
uma, uma ...: ou se trata de cautelar “satisfativa” – caso em que a decisão que
acolhe a pretensão, apesar do rótulo, não é propriamente cautelar, na medida em
que elimina a crise existente no plano material, recompondo o ordenamento e
satisfazendo ..., e, nessa medida, projeta efeitos substanciais para fora do
processo e é apta à formação da coisa julgada, dando azo ao cabimento de ação
rescisória; ou se trata de situação pela qual é possível cognição sobre a relação
material, a partir da qual seja viável o reconhecimento da inexistência do direito
afirmado pelo demandante (hipóteses, já vistas, de decadência, prescrição e,
eventualmente, outras) – caso em que, da mesma forma, projetam-se efeitos
substanciais para fora do processo, adquirindo a decisão autoridade de coisa
julgada material, a permitir, em tese, a desconstituição por ação rescisória”
74
.
A essas hipóteses, o autor acresce outras duas que, segundo
seu ponto de vista, justificariam a desconstituição por ação rescisória.
A primeira delas está relacionada à hipótese do parágrafo
único, do art. 808, do CPC, que estabelece que “se por qualquer motivo cessar a
medida, é defeso à parte repetir o pedido, salvo por fundamento novo”. Ora,
imagine-se a possibilidade de o juiz extinguir a medida cautelar
equivocadamente, entendendo, p. ex., que o requerente não tenha executado a
medida cautelar no prazo de 30 (trinta) dias, e, que desta sentença, não tenha sido
74
Ob. Cit., pg. 236.
67
interposto recurso, não existindo novo fundamento a autorizar a repropositura da
medida cautelar.
Imaginando-se que o requerente tenha executado a medida
cautelar no prazo legal, parece-nos claro que a sentença estará viciada por error
in iudicando, e, como o dispositivo acima citado assemelha-se ao art. 268, do
CPC, parece correta a conclusão de que, se a sentença que põe fim à vigência da
medida cautelar extravasar o âmbito do próprio processo, impedindo que se
pleiteie nova medida cautelar, padecendo de um dos vícios do art. 485, do CPC,
cabível será o manejo da ação rescisória.
A outra hipótese está relacionada às sentenças cautelares que
concedem providencias, tornam-se irrecorríveis, e que estejam maculadas por um
dos vícios catalogados no art. 485, do CPC. A alegação de que o provimento
cautelar não projeta efeitos sobre a relação material, segundo o autor, não é
satisfatória, pois basta analisar a apreensão de um bem por meio de arresto, para
que se conclua que a providencia vai além de uma eficácia meramente jurídica,
cristalizando-se em ato concreto, concluindo que a solução é a de, também nessa
hipótese, admitir-se o cabimento da ação rescisória.
Com efeito, mesmo não sendo possível falar de coisa julgada
material no processo cautelar, acreditamos que as posições acima referidas têm
68
sustentação, pois não nos parece possível ao juiz corrigir tais vícios , p. ex., se a
sentença for proferida por juiz impedimento. Acresça-se que esses vícios não
podem ser considerados como “novo fundamento”, de forma autorizar, ao
próprio juiz, a desconstituição da sentença, já que são anteriores ou
contemporâneos a própria sentença, o que reforça o cabimento da ação rescisória.
Com as ressalvas necessárias, parece-nos que a análise do
cabimento da ação rescisória no processo cautelar assemelha-se à do processo de
execução, sendo necessário analisar se a sentença cautelar define, desde logo, a
relação de direito material, inviabilizando a ação principal, ou, ainda, se produz
efeitos para fora do processo, obstando a repropositura/modificação da medida
cautelar.
7. ADMISSIBILIDADE E ETAPAS DE JULGAMENTO DA AÇÃO
RESCISÓRIA.
A admissibilidade da ação rescisória, como qualquer outra
ação, depende da presença dos pressupostos processuais e das condições da ação.
Mas não é só. A ação rescisória exige, ainda, requisitos específicos: p. ex., a
existência de decisão de mérito transitada em julgado, salvo as exceções feitas; a
presença de uma das hipóteses especificadas no art. 485, do CPC; e que se atenda
69
ao prazo decadencial de dois anos (art. 495, do CPC). Ausentes um destes, a ação
será extinta sem resolução de mérito.
O julgamento da ação rescisória comporta três etapas
distintas e sucessivas, uma dependendo da outra: a de admissibilidade, a do juízo
rescindente e, por fim, a do juízo rescisório, que em determinadas hipóteses
inexiste. A dependência existente, todavia, não vincula o resultado.
Barbosa Moreira destaca que “cada uma das etapas é,
tecnicamente, preliminar à seguinte”, sendo que “o juízo rescindente e o juízo
rescisório são etapas do mérito da ação rescisória”. Essa distinção, segundo o
autor, é fundamental para aferir o cabimento de nova rescisória contra a decisão
do tribunal, já que, se não for admitida a rescisória, isto é, não ingressar nos
juízos rescindente/rescisório, não se poderá falar de decisão de mérito
75
.
A admissão da ação rescisória reflete, igualmente, na análise
do cabimento dos embargos infringentes, já que, pela novel redação, “alem da
necessária divergência no julgamento, agora é condição essencial à admissão dos
infringentes a decretação de procedência da ação rescisória ...”, de maneira que
“.. o recurso de embargos infringentes caberá somente em situações em que a
ação foi admitida, ou seja, em situações em que a admissibilidade da ação
70
rescisória foi superada ...”. Logo, “afasta-se admissibilidade de utilização do
recurso em caso de discrepância quanto à admissão da ação, sendo necessário o
ingresso na questão de fundo da ação e acolhimento da pretensão do autor ...”
76
.
A admissão da ação rescisória reflete, igualmente, no
depósito de cinco por cento feito pela parte autora (art. 488, II, CPC), já que, se o
Tribunal decidir, por unanimidade de votos, pela inadmissão da ação rescisória, o
depósito será levantado pela parte ré. No entanto, se a ação for inadmitida por
maioria de votos, o depósito de cinco por cento será levantado pela parte autora,
equivalendo-se a esta última hipótese a extinção por desistência da ação
rescisória
77
.
Se a ação for admitida, passa-se para o exame de mérito da
demanda, não se manifestando o tribunal, neste momento, sobre o aludido
depósito
78
. O juízo positivo de admissibilidade pode ser implícito, ou seja,
sempre que o Tribunal analisar o mérito da rescisória, presume-se que a mesma
foi admitida.
75
Comentários ao Código de Processo Civil, Editora Forense, 11ª edição, pg. 205.
76
Entendimento defendido por Fernando Anselmo Rodrigues, na defesa de tese para a
obtenção do título de mestre, perante a PUC/SP, pg. 114 (Recurso de Embargos Infringentes).
77
Alexandre Freitas Câmara, Ação rescisória, pg. 197.
78
Idem.
71
Uma vez admitida a ação rescisória (juízo positivo), passa-se
ao juízo rescindente, e, se procedente o pedido de rescisão, passa-se, por fim,
dependendo do caso concreto, para o juízo rescisório, etapa em que a ação
primitiva será rejulgada pelo tribunal, com a mesma liberdade que o julgador que
conduziu a ação primitiva teve, ou seja, poderá analisar as condições da ação,
provas, etc.
7.1. CUMULAÇÃO DE JUÍZOS.
O art. 488, I, do CPC estabelece que na ação rescisória, o
autor deverá “cumular ao pedido de rescisão, se for o caso, o de novo julgamento
da causa”, sendo a cumulação, se configurados os pressupostos necessários,
obrigatória, de maneira que, se ausente a cumulação, deve ser decretada a inépcia
da rescisória.
Não se pode negar, contudo, que à ação rescisória aplica-se o
art. 284, do CPC, o que conduz à conclusão de que, se a rescisória comportar
pedido rescisório e o autor somente tiver formulado o pedido rescindente, o
mesmo deverá ser intimado para, no prazo legal, emendar a inicial, somente
sendo autorizada a extinção do processo, se, intimado, o autor não proceder à
emenda da inicial. O mesmo ocorre se nem mesmo for formulado pedido
rescindente.
72
Admitida a rescisória, passa-se para as outras duas etapas: a
do juízo rescindente, quando, se presentes os vícios do art. 485, do CPC, a coisa
julgada que paira sobre a ação primitiva será desconstituída --- e a sentença, via
de conseqüência, rescindida ---, e a etapa do juízo rescisório, quando, então, se
cabível, a ação primitiva será rejulgada à luz do pedido formulado na rescisória
(art. 128 c/c 460, CPC), ressaltando-se que a rescisória poderá impugnar toda a
parte dispositiva (total) ou parte dela (parcial), o que dependerá da iniciativa da
parte autora.
Passemos à análise dessas etapas de julgamento do mérito da
ação rescisória, ou seja, dos juízos rescindente e rescisório.
7.2. JUÍZO RESCINDENTE.
O objetivo do juízo rescindente é a desconstituição da
sentença de mérito transitada em julgado, ou, segundo a tese aqui defendida,
também das sentenças terminativas que padeçam dos vícios do art. 485, do CPC
e que impeçam a discussão em outra relação processual.
73
Os limites do juízo rescindente são ditados pela parte autora
(art. 2, 128 e 460, do CPC), que pode pretender a rescisão integral da parte
dispositiva da sentença ou parte dela. No âmbito da ação rescisória, não se pode
cogitar de qualquer provimento de ofício, ficando, portanto, excluída a
possibilidade de haver, por força do princípio translativo, ampliação do juízo
rescindente
79
.
Pela mesma razão, ainda que o tribunal identifique na
sentença rescindenda um ou mais dos vícios do art. 485, do CPC, se os mesmos
não foram invocados pelo autor da demanda, não podem ser considerados para
fins de rescisão, devendo, a ação rescisória, ser julgada com base na causa de
pedir eleita pela parte autora.
É importante ressaltar, outrossim, que os vícios do art. 485,
do CPC não precisam --- necessariamente --- serem concentrados em uma única
ação rescisória (embora o usual e prático, segundo nos parece, seja a unicidade),
havendo mais de uma hipótese, poderão existir tantas ações quantos forem os
vícios existentes.
A indicação equivocada dos incisos do art. 485, do CPC,
bem como eventual equivoco na lei indicada como violada (inc. V), ou, situações
79
Flávio Luiz Yarshell, Ação Rescisória, p. 150.
74
análogas
80
, não acarretam a extinção da ação rescisória, já que é lícito ao tribunal
analisá-la de forma correta (iura novit curia), e, repita-se, determinar a emenda
da inicial.
O Juízo rescindente está vinculado não só ao pedido da parte
autora, mas, também, às hipóteses do art. 485, do CPC. A sentença não pode ser
desconstituída por nenhum outro suposto fundamento. É certo, contudo, que pode
haver cumulação de fundamentos na ação rescisória (cumulação de rescisórias).
Ou seja, o pedido de rescisão pode estar atrelado a mais de um dos fundamentos
do art. 485, do CPC, sendo, autonomamente, cada um deles suficientes para, uma
vez acolhido, conduzir à procedência do pedido.
Essa cumulação pode se dar nas hipóteses de rescisão, isto é,
dos incisos do art. 485, do CPC, e, até mesmo, quando houver cumulação de
fundamentos com base em um mesmo inciso, como, por exemplo, alegação de
duas (ou mais) violações de lei.
Diante do tema central deste trabalho (inc. V, do art. 485, do
CPC, parece-nos pertinente a análise da afirmação que acima se fez, segundo a
qual vigora para a ação rescisória a regra iura novit curia, sendo irrelevante que o
autor se equivoque quanto ao enquadramento da situação em um dos incisos do
80
Como por exemplo, equivocada qualificação jurídica do fato narrado.
75
art. 485, do CPC e, até mesmo, que não indique claramente o dispositivo que
reputa violado.
A aplicação da regra acima referida, quando se tratar de
alegação de violação a literal disposição de lei, não poderá conduzir ao
entendimento de que o tribunal está “livre” para reputar violada lei que não se
encaixe na narrativa da parte autora, ou seja, não poderá o tribunal eleger
violação não indicada
81
. Ou seja, a violação tem que resultar do que a parte
autora alega na rescisória e, não, diante a “vagueza” de informações, permitir ao
tribunal “eleger” violação que não foi apontada ou, até mesmo, notada pela a
parte autora.
Com a procedência do juízo rescindente, a sentença da ação
primitiva é desconstituída, ficando em aberto o julgamento da causa, o qual, se
couber, pode se dar no tribunal, no juízo rescisório, ou, dependendo da situação,
perante o juízo competente. Ou seja, não é sempre que haverá o juízo rescisório,
o qual estará condicionado à causa de pedir do juízo rescindente, já que, em
determinadas hipóteses, a sentença é rescindida e a ação primitiva retomará
regular andamento perante o juízo de primeira instância, há, ainda, a
81
“Na hipótese de violação a literal disposição de lei (CPC, art. 485, V), para ilustrar, isso
parece particularmente delicado. De um lado, é irrelevante que o autor se tenha equivocado
quanto ao dispositivo de lei violado, desde que tenha explicitado o quê quer ver desconstituído e
qual o fundamento para tanto. Por outro lado, não compete ao tribunal, a pretexto da iniciativa
do autor, reexaminar toda a decisão rescindenda, para verificar se nela haveria outras violações
76
possibilidade de que a rescisão da sentença esgote a atividade jurisdicional
cabível, como na hipótese do art. 485, IV, CPC.
Barbosa Moreira explica que, após a procedência do juízo
rescindente, que produz a invalidação da sentença, a regra é a de que o próprio
tribunal prossiga no juízo rescisório, sendo que, em certas ocasiões, isso não é
possível, podendo acontecer o seguinte:
“a) que a rescisão da sentença, por si só, esgote toda a atividade
jurisdicional concebível – por exemplo, se o pedido se fundou em
ofensa à coisa julgada de decisão anterior sobre a mesma lide (art.
485, n.º IV), caso em que, evidentemente, não se vai rejulgar a
matéria (sob pena de perpetuar-se nova ofensa!), prevalecendo a
solução dada à lide pela primeira sentença, cuja auctoitas rei
iudicatae fora ofendida;
b) que, embora insuficiente a rescisão, o remédio adequado à
correção do que erradamente se fizera não consista na imediata
reapreciação da causa pelo próprio tribunal que rescinde a
sentença, tornando-se necessária a remessa a outro órgão ...
hipótese em que a cognição deve ser devolvida ao juízo
competente, só se justificando que o tribunal passe ao iudicium
a literal disposição de lei não alegadas pelo demandante ...” (Flávio Luiz Yarshell, Ação
77
rescissorium se era a ele mesmo que pertencia a competência
para a causa; ou, ainda, quando a invalidade da sentença houver
sido mera conseqüência de vício que afetara o processo anterior,
de tal sorte que este precisará ser refeito, na medida em que
aquele o haja comprometido ...”
82
.
Neste contexto, conclui-se que a procedência do pedido
rescindente pode acarretar o julgamento do pedido rescisório (pelo tribunal),
rejulgando-se a demanda, ou, dependendo da causa de pedir eleita no juízo
rescindente, apenas a invalidação da sentença, hipótese em que não haverá o
juízo rescisório, podendo limitar-se à mera rescisão da sentença (art. 485, IV), ou
a rescisão e subseqüente retomada da ação perante o juízo competente (art. 485,
II, p. ex.).
7.3. JUÍZO RESCISÓRIO.
Julgado procedente o pedido rescindente e, admitida a
possibilidade do tribunal passar à análise do pedido rescisório, surge a questão da
dimensão deste julgamento. A extensão do julgamento estará atrelada à extensão
do pedido rescisório, ou seja, o tribunal somente poderá julgar o que foi objeto de
Rescisória, p. 151).
82
Ob. Cit., pg. 207/208.
78
rescisão, mas, uma vez rescindida a sentença (na íntegra ou em parte), a
indagação que se faz é de quais seriam as balizas para o julgamento pelo tribunal
?
Este julgamento, nos limites da rescisão, estará vinculado ao
pedido e a causa de pedir formulados na ação primitiva. Barbosa Moreira observa
que “não se admite ... rescisório implícito”
83
. Flávio Luiz Yarshell, parece
entender de forma diferente, destacando que a cumulação de pedidos a que a lei
faz alusão permite interpretar como sendo implícito o pedido referente ao juízo
rescisório, argumentando que “não haveria sentido em se desconstituir a decisão
de mérito e, a pretexto de que não teria havido pedido de novo julgamento, o
tribunal interromper aí seu julgamento”
84
.
Com efeito, o que nos parece é que, cabendo o pedido
rescisório, este deverá ser cumulado na ação rescisória, o que não se exige é que
o autor da rescisória esgote o âmbito deste julgamento, já que o mesmo estará
atrelado à rescisão operada e, ainda, ao pedido e à causa de pedir da ação
primitiva. Desconstituída a sentença, o juízo rescisório será feito com a mesma
liberdade que o juiz competente teria para julgar a ação primitiva, o que, talvez,
justifique o a posição daqueles que afirma ser possível o pedido rescisório
implícito.
83
Ob. Cit., pg. 208.
79
Destarte, uma vez acolhido o pedido rescindente, abre-se
para o tribunal --- no âmbito da rescisão --- a possibilidade de julgamento com a
mesma extensão e profundidade que teria o juízo competente para a ação
primitiva, o que permite, inclusive, reconhecer carência superveniente (falta de
interesse, por exemplo) e extinguir a ação matriz sem resolução de mérito (art.
267, CPC). Nesta etapa pode haver ampla incursão nas provas e elementos dos
autos.
Não obstante o que acima se expôs, parece-nos que o correto
é que, havendo a possibilidade de cumular o pedido rescisório, a cada
fundamento para o pedido rescindente, seja atrelado um pedido rescisório,
tornando “mais transparente” o julgamento da rescisória, facilitando, inclusive,
quando julgada procedente por maioria de votos, o manejo dos embargos
infringentes.
8. EFEITOS DO JUÍZO RESCINDENTE E DO JUÍZO RESCISÓRIO.
Admitida a rescisória e ultrapassadas as etapas dos juízos
rescindente e rescisório, cumpre analisar as implicações daí decorrentes, já que
os atos praticados na pendência da sentença rescindenda poderão ser diretamente
84
Ob. Cit., pg. 356.
80
afetados pela ação rescisória. Antes, contudo, diante da interferência existente, é
preciso analisar a natureza das decisões proferidas nos juízos rescindente e
rescisório.
8.1. DA NATUREZA DO JUÍZO RESCINDENTE E DO JUÍZO
RESCISÓRIO.
Há consenso na doutrina de que a decisão que julga
procedente o pedido rescindente (iudicium rescindens) é constitutiva negativa
(cria nova situação), ao passo que a decisão que julga este pedido improcedente é
declaratória negativa, isto é, declara que não existe o direito à rescisão da decisão
transitada em julgado. No juízo rescisório (iudicium rescissorium) a nova decisão
substitui a anterior, podendo o Tribunal manter, reformar ou alterar o julgamento,
sendo a decisão, conforme o caso, declaratória, constitutiva ou condenatória. Isto
é: dependerá da análise concreta do caso.
Questão interessante que surge com a procedência do juízo
rescindente (iudicium rescindens) é a de saber se tal decisão opera efeitos ex tunc
ou ex nunc. Barbosa Moreira, reconhecendo a natureza constitutiva do
provimento judicial, destaca que as sentenças constitutivas têm eficácia ex nunc,
81
com ressalva de expressa disposição legal em sentido contrário
85
. E, como no
CPC, não existe tal disposição, argumenta que seria necessário entender que a
rescisão da sentença no juízo rescindente, embora retire a decisão do mundo
jurídico, não apaga o passado.
O autor cita o entendimento de Jorge Americano em sentido
contrário, defendendo a eficácia ex tunc do juízo rescindente positivo. Para Jorge
Americano “a sentença proferida na ação rescisória retroage os seus efeitos à
época da sentença rescindida”. Barbosa Moreira acrescenta que na Alemanha é
forte a tendência a considerar que a decisão rescindente atua com força
retrooperante.
Analisados os dois entendimentos, o autor conclui que
ambos são radicais, e que a solução dependerá -- de fato -- da na análise do caso
concreto, levando-se em conta, por exemplo, dados do direito material, aludindo
que em questões de direito imobiliário, deverão ser observadas as normas
concernentes ao registro e à proteção da propriedade imobiliária e a proteção de
terceiros que --- de boa fé ---- eventualmente tenham adquirido o bem antes da
rescisão
86
.
85
Ferreira Pinto afirma que a procedência do juízo rescindente opera efeitos ex nunc, por
tratar-se de sentença constitutiva. Ou seja, não retroage para momento anterior à rescisão,
produzindo efeitos para o futuro (Ferreira, Pinto. Teoria e Prática dos recursos e da ação
rescisória no processo civil, Saraiva, 2ª edição, 1988, pg. 262).
86
Comentários ao Código de Processo Civil, pg. 208/210.
82
Este entendimento é compartilhado por Alexandre Freitas
Câmara:
“ ... o julgamento de procedência do pedido de rescisão tem
inegável natureza constitutiva, já que desfaz o julgamento
anterior. Não se pense, porém, que isso deve levar a negar
qualquer eficácia retroativa da decisão. É conhecida a afirmação,
por muitos feita, de que as decisões constitutivas produzem
eficácia ex nunc.
Assim, por exemplo, já se afirmou em sede doutrinária que
“usualmente, salvo disposição em contrário na lei (como, por
exemplo, no art. 1.596 do CC), a sentença constitutiva tem efeitos
ex nunc, isto é, a partir de sua prolação (e não a partir do seu
trânsito em julgado, a não ser que a lei assim estabeleça, dizendo
‘A partir do trânsito em julgado da sentença ...’)”. A idéia de que
a sentença constitutiva produz efeitos ex nunc, salvo quando a lei
dispuser de modo diverso, deve ser rechaçada, por ser – data
O autor conclui, aduzindo que “certas proposições, contudo, podem reputar-se assentes
em nossa doutrina. Assim, v.g., subsistem os atos jurídicos praticados pelo curador, apesar de
rescindida a sentença de interdição; a rescisão da sentença que decretara o desquite (hoje,
separação) ou anulara o casamento não torna adulterinos os filhos havidos, no intervalo, por
qualquer dos cônjuges; a da sentença de anulação do casamento invalida o segundo matrimônio
porventura contraído nesse ínterim, mas, dada a boa-fé, o segundo matrimônio continuará a
produzir os efeitos do casamento putativo”.
83
venia – uma simplificação. Veja-se, por exemplo, a clássica lição
de um dos maiores processualistas de todos os tempos:
“O ato constitutivo do juiz pode ter efeitos ex nunc
(por exemplo, divórcio) ou ex tunc (por ex., nulidade
de matrimônio). Por isso, não existe razão alguma
para que se reconheçam como verdadeiras sentenças
constitutivas somente as que produzem efeitos ex
nunc (como faz, por ex., Kisch)”
Não é o texto da lei que decide se a eficácia da sentença
constitutiva é ex nunc ou ex tunc, mas as peculiaridades do caso
concreto que o fazem ... No caso da decisão que julga procedente
o pedido de rescisão de provimento judicial transitado em
julgado, casos haverá em que seus efeitos se operarão apenas para
o futuro, e outros casos haverá em que a eficácia será
retrooperante ...”
87
-
88
O que marca, preponderantemente, a sentença constitutiva é
que ela cria, extingue ou modifica uma relação jurídica preexistente. Na
rescisória, julgado procedente o pedido rescindente, a sentença rescindenda é
87
Ob. Cit., pg. 200/201.
88
O dispositivo citado é o art. 1.596 do CC/16 e processualista mencionado é James
Goldschmidt.
84
desconstituída, franqueando-se ao tribunal, conforme o caso, o rejulgamento da
demanda.
Não se pode radicalizar e atribuir --- como regra --- à
referida decisão eficácia ex nunc. Não há como, em determinados casos,
compatibilizar os atos praticados entre o ajuizamento da ação primitiva e a
desconstituição da sentença rescindenda. Embora nas sentenças constitutivas, via
de regra, os efeitos produzidos sejam a partir da própria sentença (ex nunc) e, por
exceção, sejam ex tunc, quer nos parecer que as conseqüências do acolhimento
do pedido rescindente dependerão da análise do direito material discutido na
ação, que deverá ser equalizado em função da proteção que o direito material
reclama.
8.2. A PROCEDÊNCIA DA AÇÃO RESCISÓRIA E OS DIREITOS
ADQUIRIDOS POR TERCEIROS DE BOA FÉ.
A questão que se coloca, como conseqüência do que acima
se expôs, é se a procedência da ação rescisória pode afetar a esfera jurídica de
terceiro de boa fé que tenha adquirido direitos com base na sentença rescindenda.
Por exemplo, se a parte ré da ação rescisória saiu vitoriosa em uma ação
reinvidicatória (ação primitiva), e, por força desta sentença, alienou o bem para
85
terceiro de boa fé, pergunta-se: o terceiro será prejudicado pela rescisão da
sentença, a qual atribuiu a titularidade do bem ao réu da rescisória?
A resposta, segundo nos parece, tem que ser negativa.
Humberto Theodoro Junior, ao analisar a questão aqui
proposta, destaca que “ ... a rescindibilidade é equiparável à anulabilidade -- e
não à nulidade -- o vício não se traduz numa falha estrutural que impeça o
negócio de produzir seus efeitos naturais e necessários ... a eficácia da sentença
rescindível somente se opera após judicialmente decretada, produzindo os seus
efeitos até então, a sua desconstituição na pode alcançar o terceiro que, de boa-fé
e a título oneroso, contrata com a parte afetada pela ulterior rescisão ... quem,
pois, de boa-fé, adquiriu bem cujo título de origem sofra ulterior invalidação não
estará, por meio da ação rescisória, alcançado pelos efeitos reflexos do novo
julgamento. As partes da sentença desconstituída, diante da impossibilidade da
rescisão ser oposta aos terceiros de boa-fé, terão de resolver a questão entre eles
em perdas e danos ...”
89
.
O exemplo ilustra de forma clara que a procedência da ação
rescisória poderá gerar inúmeros efeitos, os quais não podem ser analisandos e
89
Ob. Cit., Vol. I, pg. 773/775.
86
catalogados por antecipação, dependendo das questões discutidas no bojo da ação
primitiva.
9. PARTES NA AÇÃO RESCISÓRIA.
9.1. DA LEGITIMIDADE ATIVA.
O CPC vigente somente disciplina a legitimidade ativa para
ação rescisória. De acordo com o art. 487, do CPC, a ação rescisória pode ser
proposta por “quem foi parte no processo ou o seu sucessor a título universal ou
singular (I), o terceiro juridicamente interessado (II) e o Ministério Público, nos
casos de omissão de sua audiência, quando era obrigatória sua intervenção, e
quando a sentença é o efeito de colusão das partes, a fim de fraudar a lei (III).
A ação rescisória pode ser ajuizada por quem tenha sido
parte na ação primitiva, ou seja, autor (es) e réu (s) ou por seu sucessor (es) a
título universal ou singular. Mesmo que a parte tenha sido revel na ação
primitiva, legitimada estará para a rescisória. Se, contudo, a parte for excluída da
relação processual, voluntariamente ou não, antes da prolação da sentença
87
rescindenda, não se pode, nesta hipótese, sustentar legitimidade para a
rescisória
90
.
O conceito de parte do art. 485, I, do CPC é o de parte no
processo (todos os sujeitos do contraditório – todos os que participam do
processo e influenciam no seu resultado) e, não, não o de parte na demanda (que
são apenas o demandante e demandado). Logo, o assistente, por exemplo, que
tenha figurado na ação primitiva tem legitimidade ativa para ajuizar a ação
rescisória
91
.
Na hipótese de haver sucessão no plano do direito material,
após o encerramento da ação primitiva ou, na pendência dela, sem que se
verifique a sucessão no plano do direito processual, o sucessor a título universal
ou singular, inter vivos ou causa mortis, estará legitimado para o ajuizamento da
ação rescisória.
Quanto ao terceiro interessado, há que se entender como
sendo aquele quem não participou da ação primitiva, sendo que sua intervenção
deverá ser qualificada por um interesse jurídico, não podendo ser econômico ou
moral.
90
Barbosa Moreira, Comentários ao CPC, 13ª ed., pg. 169.
91
Alexandre Freitas Câmara, Ação Rescisória, pg. 126.
88
A intervenção do terceiro juridicamente interessado deve ser
compatibilizada com o art. 472, do CPC, o qual prevê que a sentença faz coisa
julgada apenas entre as partes, não atingindo terceiros. Ora, se o terceiro é
protegido pelos limites subjetivos da coisa julgada, qual seria o interesse para a
ação rescisória ?
O raciocínio não é tão singelo. Por estranho que possa
parecer, há hipóteses em que os terceiros são, sim, atingidos pelos efeitos da
coisa julgada material.
A doutrina procura exemplificar hipóteses em que quem não
é parte no processo é atingido pelos efeitos da coisa julgada material, podendo-se
citar “o caso dos sucessores das partes (que já estão expressamente mencionados
no já mencionado inciso I do art. 487). O caso do substituto processual, no caso
de sentença proferida em processo em que tenha atuado em seu lugar um
legitimado extraordinário. Assim, por exemplo, o menor que é alçado pela coisa
julgada formada no processo de investigação de paternidade em que figurou
como autor o Ministério Público”
92
. E mais: “o adquirente de coisa litigiosa ...
quem, por também ser titular do direito discutido, seja atingido pela coisa
julgada, mesmo não sendo parte. É o caso de ação proposta por condômino,
92
Alexandre Freitas Câmara, Ação Rescisória, pg. 128.
89
postulando de outrem a coisa comum. O outro condômino que não seja parte ...
será atingido pela coisa julgada ...”
93
Em resumo, terceiro, para fins de ajuizamento da ação
rescisória (art. 487, II, do CPC), deve ser considerado “... aquele que não
participou do processo originário, mas foi prejudicado do ponto de vista jurídico
pelo decisum nele proferido, ainda que indiretamente. Então, têm legitimidade
ativa na condição de terceiro prejudicado os que poderiam ter ingressado no
processo primitivo como assistente --- simples ou litisconsorcial --- e
litisconsorte”
94
.
O inciso III, do art. 487, do CPC prevê a legitimidade do
Ministério Público para o ajuizamento da ação rescisória. Obviamente, esta
legitimidade decorre de quando o MP não for parte, pois, se assim o for, sua
legitimidade decorrerá do inciso I.
A legitimidade do inciso em tela está relacionada a duas
situações: a do MP não ter participado no processo em que era obrigatória sua
intervenção, e quando o fundamento da ação rescisória for a colusão processual
93
Fredie Didier Jr. e Leonardo José Carneiro da Cunha, Curso de Direito Processual Civil,
Vol. 3, 4ª ed. Editora Podivm, pg. 302.
94
Idem, pg. 302.
90
(art. 485, III, CPC). A primeira hipótese, destaca a doutrina
95
, nada mais é do que
um caso particular de incidência do art. 485, V, do CPC, porquanto a não
intervenção do MP em casos em que a mesma é obrigatória implica violação a
dispositivo legal (art. 82, do CPC ou disposição similar de lei especial), o que
também dá legitimidade à parte por tal violação de lei.
Barbosa Moreira equipara --- ao nosso ver com inteiro acerto
--- à hipótese da alínea ‘a’, do inciso III, do art. 487, do CPC, as situações em
que outro órgão não haja sido intimado, apesar de ser obrigatória a sua intimação,
citando --- como exemplo --- a intimação da CVM, nos termos do art. 31 da Lei
6.385, de 1976, reconhecendo, assim, a legitimidade do órgão para a ação
rescisória.
A segunda hipótese que justifica a legitimidade ativa do
Ministério Público, nos termos do inciso III, do art. 487, do CPC, é a de ter
havido colusão das partes, a fim de fraudar a lei (art. 485, III, do CPC). Por
evidente, o MP não será o único legitimado. Nesta hipótese, autor e réu que
tenham contribuído para a fraude deverão ser citados como litisconsortes
passivos necessários.
95
Barbosa Moreira, Comentários ao CPC ..., pg. 173. No mesmo sentido, Alexandre
Freitas Câmara, Ação Rescisória ..., pg. 129.
91
9.2. DA LEGITIMIDADE PASSIVA.
Conforme já adiantado, não há no CPC nada que discipline a
legitimidade passiva para a ação rescisória. Há, contudo, entendimento
razoavelmente uniforme na doutrina e na jurisprudência, entendendo que
legitimados passivos são, grosso modo, “todos aqueles que tenham participado
da relação processual original e não estejam no pólo ativo da ação rescisória”
96
,
entendendo-se aí, partes no processo, e, não, partes na demanda, como acima já
se expôs.
Com relação ao sucessor (a que título for), há que se
reconhecer, pelas mesmas razões do art. 487, I, do CPC, a legitimidade passiva
para a ação rescisória. A doutrina dominante
97
não endossa a restrição que é feita,
por parte minoritária da doutrina e pelo sistema alemão, à hipótese de sucessão
inter vivos a título particular, reconhecendo-se, legitimidade, indistintamente, ao
sucessor.
Pelo entendimento acima exposto, conclui-se que, na
rescisória proposta por terceiro juridicamente interessado e pelo MP, será
necessária a citação --- na qualidade de listisconsortes necessáriotos - art. 47,
96
Alexandre Freitas Câmara, Ação Rescisória ..., pg. 132.
97
Barbosa Moreira, Comentários ao CPC ... pg. 176. No mesmo sentido, Flávio Luiz
Yarshell, Ação Rescisória ..., pg. 143 e Alexandre Freitas Câmara, Ação Rescisória ...pg. 134.
92
CPC --- de todos que, no momento da decisão, figuravam como partes no
processo primitivo, e, se a rescisória for ajuizada por algum destes, todos os
demais deverão ser citados.
Em qualquer destas hipóteses, pode ocorrer de um ou mais
réu ter interesse coincidente com o da parte autora (= desconstituição da
sentença), hipótese em que poderão tornar-se litisconsortes ativos ao invés de
assumir a condição de réu (s) da rescisória
98
.
Não se pode deixar de destacar, conduto, à luz do que acima
se expôs, que se a sentença rescindenda for objetivamente complexa,
considerando como tal aquela cujo dispositivo contém mais de uma decisão (=
capítulos), somente deverão figurar como us da ação rescisória aqueles que
estiverem vinculados ao capítulo (s) da decisão que se pretenda rescindir, não se
justificando a presença de outras pessoas, que, não obstantes tenham figurado
como parte na ação primitiva, não estejam vinculadas à parte (s) da decisão que
se almeja rescindir.
Ou seja, a legitimidade passiva para a ação rescisória deve
ser analisada à luz do capítulo da sentença que se pretenda rescindir,
98
Barbosa Moreira, Comentários ao CPC ... pg. 176.
93
identificando-se, aí, o titular do direito material da ação primitiva, que será, por
conseqüência, parte legítima para figurar no pólo passivo da ação rescisória.
Esta conclusão conduz à seguinte indagação: se a sentença
contiver capítulo que estabeleça verba honorária e a rescisória impugnar toda a
decisão, o advogado deverá constar do pólo passivo da ação rescisória, na
qualidade de litisconsorte necessário?
A questão parece não ter sido enfrentada pela doutrina,
havendo um único autor, cujas conclusões nos parecem corretas, sustentando que
“merece consideração especial a possibilidade de que seja legitimado para
integrar no pólo passivo da ação rescisória terceiro que não integrou a relação
processual da ação matriz. Esta possibilidade depende diretamente do pedido
deduzido no juízo rescisório. A possibilidade acima referida relaciona-se
perfeitamente com o caso de uma ação rescisória que objetiva exclusivamente a
desconsituição do capítulo da sentença reservado à condenação ao pagamento
dos honorários advocatícios. O advogado da parte do processo originário, à época
um terceiro, apresenta-se, nessa oportunidade, na posição de parte da relação
jurídica material que está sendo objeto da discussão em sede de rescisória.
Assim, parece claro que essa ação rescisória trata de questão de interesse
94
somente do advogado e não mais do seu cliente/representado, o que torna
imprescindível a participação daquele na relação processual estabelecida ...”
99
.
A conclusão do autor acima referido parece-nos correta, já
que o advogado, em conformidade com o atual Estatuto do Advogado, é o credor
da verba honorária
100
. Sobre a disciplina em tela, são claras as ponderações feitas
por Yussef Said Cahali:
‘“Estabelecendo o art. 23 da Lei 8.906/94, que os honorários
incluídos na condenação, por sucumbência, pertencem ao
advogado, concedeu-se-lhe, agora, verdadeiramente, um direito
próprio e autônomo (expressão que antes era contestada por
alguns), com possibilidade de sua execução pelo próprio patrono,
ainda que tendo como causa geradora o mesmo fato do
sucumbimento da parte adversa do cliente vitorioso”.
101
-
102
-
103
99
Fredie Didier Jr. e Leonardo José Carneiro da Cunha, Curso de Direito Processual Civil,
Vol. 3, 4ª ed. Editora Podivm, pg. 303.
100
A Lei 8.906 (Estatuto do Advogado) é clara ao dispor que: “Art. 23. Os honorários
incluídos na condenação, por arbitramento ou sucumbência, pertencem ao advogado, tendo este
direito autônomo para executar a sentença nesta parte, podendo requerer que o precatório,
quando necessário, seja expedido em seu favor.” E, ainda, dispõe o art. 24, da mesma lei, o
seguinte: “Art. 24. A decisão judicial que fixar ou arbitrar honorários e o contrato escrito que os
estipular são títulos executivos e constituem crédito privilegiado na falência, concordata,
concurso de credores, insolvência civil e liquidação extrajudicial (...). § 3º. É nula qualquer
disposição, cláusula, regulamento ou convenção individual ou coletiva que retire do advogado o
direito ao recebimento dos honorários de sucumbência. § 4º. O acordo feito pelo cliente do
advogado e a parte contrária, salvo a aquiescência do profissional, não lhe prejudica os
honorários, quer os convencionados, quer os concedidos por sentença.”
101
Honorários Advocatícios, pp. 804 – 805.
95
E, precisamente porque o advogado é o credor da verba
honorária, que a jurisprudência do STJ, à luz do quanto preceituado pelo § 4.º, do
art. 24, da Lei 8.906, é iterativa, firmando o entendimento de que é ineficaz, ou
seja, não é oponível ao advogado, a transação entabulada entre as partes,
naquilo que diz respeito aos honorários, tal como se passa na hipótese dos autos.
Neste norte, aliás, há bem fundamentado acórdão, de relatoria do em. Min.
Eduardo Ribeiro, reconhecendo não ser oponível “ao advogado o acordo feito
pelas partes, naquilo que diga com os honorários que lhe são devidos.
104
Ora, se há previsão legal que atribui a verba honorária ao
advogado, parece evidente que, se na ação rescisória for formulado pedido que
102
Neste sentido manifestou-se o Col. Superior Tribunal de Justiça, reconhecendo que
“(...). I - Consoante o disposto no art. 23 da Lei n.º 8.906/94, o detentor do direito de percepção
aos honorários fixados judicialmente, será sempre o advogado constituído pela parte. Desta
assertiva, extrai-se a conclusão de que o advogado, em nome próprio, não em nome do cliente,
pode pleitear a revisão, via recurso, da fixação da verba honorária arbitrada em seu prol. II – O
interesse e a legitimidade recursal, neste caso, não se estendem à parte que logrou êxito na
demanda, à mingua de sua sucumbência e também por restar desconfigurada a utilidade e
necessidade do recurso. (...) ” (trecho da ementa relativa ao Recurso Especial n.º 244.802/MS,
Terceira Turma, Rel. Min. Waldemar Zveiter, DJ de 16.04.2001)
103
Semelhantemente, posicionou-se o E. Supremo Tribunal Federal, consignando a
legitimidade do advogado, no que diz respeito à referida verba: “DIREITO
CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL – FGTS – ATUALIZAÇÃO – CORREÇÃO
MONETÁRIA – RECURSO EXTRAORDINÁRIO – AGRAVO – SUCUMBÊNCIA – (...) 5.
No que concerne ao disposto na Lei nº 8.906, de 04 de julho de 1994 do Estatuto da Advocacia,
a eminente Ministra ELLEN GRACIE, no julgamento do AGRAG nº 281.590/SC, ocorrido a
02.10.2001, 1ª Turma, DJU de 19.10.2001, Ementário nº 2048-5, teve oportunidade de salientar:
"Ademais, falta, à parte, legitimidade e interesse para recorrer: postula-se, aqui, direito que se
sustenta autônomo do advogado; e a tese sustentada, de que os honorários cabem ao advogado,
por isso impossível a compensação, se reconhecida, importaria piorar a situação dos recorrentes,
resultando reformatio in pejus. 6. Embargos recebidos como agravo, a que se nega provimento.”
(STF – RE-ED 311580 – MG – 1ª T. – Rel. Min. Sydney Sanches – DJU 07.02.2003 – p.
00045)
104
RESP 53682 - SP, 3ª T., Rel. Min. Eduardo Ribeiro, DJU 25.09.1995, p. 31103.
96
acabe, ainda que reflexamente, por desconstituir a verba honorária fixada na
sentença rescindenda, parece-nos incontornável a necessidade do advogado
figurar no pólo passivo da rescisória, defendendo o direito material que lhe diz
respeito.
Ou seja, em decorrência do exposto acima e da clareza da
disposição legal acima referida, no sentido de que o advogado é credor da verba
de sucumbência e que, portanto, detém legitimidade para eventual recurso no
processo de conhecimento e, também, para a execução dessa mesma verba, é
induvidoso que o advogado coloca-se como litisconsorte necessário (art. 47, do
CPC) em ação rescisória que verse --- ainda que de forma reflexa --- a questão
relativa à verba honorária.
Destaque-se que ação rescisória tem natureza constitutiva
negativa e, como tal, para essa ação devem ser necessariamente citados todos
participantes da relação jurídica subjacente. Isto é, na linha do que já decidiu o
STJ,“é indispensável a presença dos litisconsortes passivos, no caso sub judice,
porquanto a solução da lide invade a esfera jurídica dos mesmos e a não citação
acarreta a nulidade do processo
105
. Este parece ser mais um exemplo das
conseqüências do acolhimento do pedido rescindente, já que, rescindida a
sentença (que impôs a verba honorária), automaticamente será atingida a esfera
105
ROMS nº 12408/RO, Rel. Min. Jorge Scartezzini.
97
jurídica do advogado, que será despojado da verba que, por lei, somente lhe diz
respeito.
Em amparo à tese aqui defendida, calha destacar que o
TJ/RS já decidiu pela legitimidade passiva do advogado para a ação rescisória,
precisamente porque teria o seu direito diretamente na hipótese de procedência
da ação, exatamente como se passa no caso dos autos, conforme ementa a seguir
transcrita:
“PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA.
LEGITIMIDADE PASSIVA. ADVOGADO. HONORÁRIOS.
SE A AÇÃO RESCISÓRIA OBJETIVA A ELIMINAÇÃO DA
VERBA HONORÁRIA, TEM LEGITIMIDADE PASSIVA O
ADVOGADO DOS RÉUS, CUJO DIREITO SERÁ
DIRETAMENTE AFETADO NA HIPÓTESE DE
PROCEDÊNCIA. AÇÃO RESCISÓRIA. CONTESTAÇÕES.
INTEMPESTIVIDADE. REVELIA. POR SE TRATAR A
COISA JULGADA DE MATÉRIA DE ORDEM PUBLICA, A
REVELIA NÃO GERA PRESUNÇÃO DE VERACIDADE DAS
ALEGAÇÕES QUE EMBASAM O PEDIDO DE
DESCONSTITUIÇÃO DA DECISÃO RESCINDENDA. AÇÃO
RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO A LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI
98
CARACTERIZADA. A DECISÃO QUE ARBITRA
HONORÁRIOS DE 15% PARA OS PATRONOS DE AMBAS
AS PARTES, SEM QUE TENHA HAVIDO SUCUMBÊNCIA
RECÍPROCA, INFRINGE A LITERAL DISPOSIÇÃO DO
ART. 21, "CAPUT", DO CPC. AÇÃO JULGADA
PROCEDENTE. (14 FLS - D).
106
Uma única hipótese, salvo reflexão mais aprofundada,
afastaria a necessidade de o advogado figurar no pólo passivo da ação rescisória
que, ainda que reflexamente, pudesse extirpar a verba honorária: a de o
advogado, no contrato de honorários firmado com o seu constituinte, estabelecer
que a verba honorária fixada em sentença será deste último, e não do advogado.
A dificuldade, contudo, é a de a parte autora da ação rescisória ter acesso a essa
informação.
Com base nessas considerações, pensamos que, se os
pedidos formulados na ação rescisória terminarem --- ainda que reflexamente ---
por extirpar a verba honorária, não há como negar que o advogado deverá figurar
no pólo passivo da ação rescisória na qualidade de litisconsórcio necessário, sob
pena de nulidade.
106
Ação Rescisória Nº 70005210273, Quinto Grupo de Câmaras Cíveis, Tribunal de
Justiça do RS, Relator: Mara Larsen Chechi, Julgado em 16/05/2003.
99
10. DO PROCEDIMENTO DA AÇÃO RESCISÓRIA.
A primeira questão a ser destacada é a de que a ação
rescisória está condicionada ao prazo decadencial de dois anos (art. 495, do
CPC), o que será analisado com maior vagar adiante.
Atendido este prazo, é curial que a ação rescisória deva
atender às condições da ação, e, também, aos pressupostos processuais, devendo
atender, como qualquer outra ação, ao art. 282, do CPC.
O art. 488 do CPC é claro quanto à necessidade da inicial
preencher os requisitos do art. 282, do CPC, acrescendo, ainda, a necessidade de
cumulação de pedidos (rescindente e rescisório) quando couber, e a necessidade
de a parte autora depositar 5% (cinco por cento) do valor atribuído à petição
inicial da ação rescisória, a título de multa, caso a ação seja, por unanimidade de
votos, declarada inadmissível ou julgada improcedente.
Não se pode negar, contudo, que à ação rescisória aplica-se o
princípio iura novit curia, isso, contudo, conforme se verá no tópico atinente ao
juízo rescindente, não permite o alargamento do julgamento, ou seja, o tribunal
100
tem liberdade para analisar as alegações do autor, mas isso não quer significar
que possa ampliar o juízo rescindente. No juízo rescisório, segundo nos parece, e
pensamos não poder ser diferente, no limite da rescisão, há maior liberdade ao
tribunal, tendo como balizas, apenas, a causa de pedir e o pedido formulado na
ação primitiva.
A parte autora deve atribuir, ainda, valor à petição inicial da
rescisória, o qual servirá como base de cálculo para o depósito de 5 %. Há
entendimento no sentido de que este valor deve ser equivalente ao valor atribuído
à ação primitiva, alguns entendendo que deve ser corrigido, outros entendendo
que deve ser nominal.
Não nos parece correto nenhum destes entendimentos. O
valor da causa na ação rescisória, segundo pensamos, deve ser --- na medida do
possível --- equivalente ao que se almeja rescindir. Se não for possível aferir esse
valor por ocasião do ajuizamento da ação rescisória, o valor atribuído à ação
primitiva poderá servir de referencial, mas, se não guardar perfeita sintonia com
o pedido da rescisória, não poderá, jamais, inviabilizar a ação, até mesmo porque
o valor da causa poderá ser alterado no curso ou afinal do processo, permitindo-
se a complementação do depósito. Pode a parte ré, ainda, apresentar impugnação
ao valor da causa.
101
O CPC não disciplina o recolhimento do depósito de 5 %. A
praxe forense recomenda que tal quantia seja recolhida previamente ao
ajuizamento da ação e que a guia seja anexada à inicial, já que o deferimento da
petição inicial pressupõe a existência do depósito. Existem, contudo, em alguns
tribunais, disposições em seus regimentos internos que disciplinam o depósito da
quantia de 5 %.
A exigência do depósito de 5 % não se aplica nas hipóteses
de ação rescisória ajuizadas pela União, Estado, Município ou MP. Não se exige
o depósito, igualmente, para os beneficiários da Lei 1060/50. Esse benefício
também tem sido atribuído para a CEF, na forma do art. 24-A, da Lei 9.028/95.
Uma vez preenchidos todos os requisitos legais, o relator da
ação rescisória deverá determinar a citação da parte demandada. O art. 491, do
CPC estabelece que no despacho que determinar a citação, o relator fixará o
prazo de contestação, que não poderá ser inferior a 15 (quinze) dias e nem
superior a 30 (trinta) dias.
E, “ressalvado o caso de distribuição (art. 263, 1ª alínea,
fine), à data do despacho liminar de conteúdo positivo retroage (art. 219, § 1º,
combinado com o art. 220) o efeito de impedir a consumação do prazo extintivo
– efeito que o art. 263 literalmente atribui à propositura da ação, mas que na
102
verdade melhor seria ter como decorrente da citação (art. 219, caput, fine,
combinado com o art. 220). Todavia, a retroação do efeito impeditivo fica
condicionada a que o autor promova a citação do réu nos 10 dias subseqüentes à
prolação do despacho, admitida a prorrogação até o máximo de 90 dias (art. 219,
§§ 2º e 3º, combinados com o art. 220). Caso a citação não se efetue com
observância desses prazos, a consumação da decadência se haverá por obstada na
data do despacho liminar (art. 219, § 4º, combinado com o art. 220); o efeito
impeditivo apenas se produzirá na data da própria citação, se até lá não se tiver
extinguido o direito”
107
.
Se a demora na citação da parte ré for decorrente da eventual
inércia do Poder Judiciário, doutrina e jurisprudência têm entendido que a parte
autora não pode ser prejudicada.
A inicial da rescisória poderá ser indeferida nas hipóteses do
art. 490, do CPC, mas, segundo nos parece inegável, quando for possível a
correção do defeito, deverá ser aplicado à rescisória o art. 284, do CPC.
Indeferida a inicial, não obstante não exista previsão de recurso no CPC,
abalizada doutrina entende aplicável --- por extensão --- a aplicação do 557, § 1º,
107
Barbosa Moreira, Comentários ao CPC ..., pg. 191/192.
103
do CPC
108
, não podendo ser esquecida a possibilidade de existir, nos regimentos
dos tribunais, recurso para tal decisão, o que, na prática, é o que mais se verifica..
Admitida a inicial e determinada a citação do Réu, surge a
dúvida se são aplicáveis à rescisória os arts. 188 e 191, do CPC. Há entendimento
nos dois sentidos na jurisprudência e na doutrina
109
-
110
.
No prazo fixado, a parte ré poderá apresentar defesa,
reconvenção e exceção, esta somente de impedimento ou suspeição, pois não se
afigura possível a exceção de incompetência, pois a mesma se presta para argüir
incompetência relativa e, no caso da ação rescisória, a competência é sempre
absoluta.
No tocante à reconvenção, além dos requisitos do art. 315,
do CPC, deverá ter a mesma natureza rescisória (do mesmo julgado), atendendo a
todos os requisitos da ação rescisória
111
, sendo competente o mesmo tribunal,
atendendo-se o prazo decadencial de dois anos.
108
Idem, pg. 191
109
A favor da aplicação do art. 191, do CPC: Barbosa Moreira (Comentários, pg. 193).
Contra: Bernardo Pimentel Souza (Introdução ..., pg. 784), Cássio Scarpinella Bueno (Códido
..., pg. 1501, Alexandre Freitas Câmara (Ação Rescisória ..., pg. 176).
110
A favor da aplicação do art. 188, do CPC: Nelson Nery Junior e Rosa Maria Andrade
Nery (CPC comentado ..., pg. 696), Alexandre Freitas Câmara (Ação Rescisória ..., pg. 178).
Contra: Barbosa Moreira (Comentários, pg. 193), Bernardo Pimentel Souza (Introdução ..., pg.
784)
111
Inclusive o recolhimento do depósito de 5%.
104
Na hipótese da parte ré ser citada e, no prazo fixado, não
apresentar contestação, será a mesma considerada como revel, sem que isso,
contudo, implique a presunção de veracidade das alegações feitas pela parte
autora (art. 319, do CPC), porquanto não se afigura sustentável que a revelia
implique presunção de veracidade contra a autoridade da coisa julgada, sendo
necessário, para a procedência da ação rescisória, não obstante a revelia, que a
parte autora comprove as suas alegações.
Esgotado o prazo de resposta, deve ser observado, no que for
aplicável, o regramento previsto nos capítulos “Das providências preliminares” e
do “Julgamento conforme o estado do processo”. Se for necessária a produção de
provas, o relator poderá delegar a competência ao juiz de primeiro grau (art.
492). Essa hipótese --- segundo nos parecer ---- é praticamente impossível na
hipótese do art. 485, V, do CPC, já que a violação não poderá demandar a
produção de provas.
Não se descarta, contudo, nas hipóteses em que couber a
instrução, a possibilidade da prova oral ser colhida pelo próprio tribunal (pelo
relator no seu gabinete, ou, ainda, em sessão do órgão colegiado). Além dessas
105
hipóteses, há, obviamente, a possibilidade de expedir-se carta de ordem para o
juízo a quo
112
.
A função do juízo de primeira instância é somente a de
colher a prova, não é lícito ao mesmo determinar as provas a serem produzidas, o
que, obviamente, deverá ser determinado pelo relator. No entanto, se for
determinada a produção de prova pericial perante o juízo de primeira instância,
não se pode negar que poderá ser facultado ao mesmo a indicação do perito
judicial.
É importante ressaltar que embora não exista previsão
expressa, a intervenção do MP é obrigatória na ação rescisória. É importante
ressaltar, ainda, que não obstante a rescisória não suspenda a exigibilidade da
decisão rescindenda, se estiverem presentes os pressupostos previstos em lei para
as medidas cautelares ou antecipatórias de tutela e houver requerimento da parte
autora, o relator poderá conceder tutela de urgência.
Encerrada a instrução, será aberta vista para que as partes,
querendo, apresentem alegações finais (art. 493, CPC), e, na seqüência, o
Ministério Público deverá apresentar o seu parecer. Ato contínuo, os autos serão
remetidos para o relator elaborar o relatório e voto, e, sucessivamente, ao revisor,
112
Barbosa Moreira (Comentários, pg. 197.
106
que pedirá dia para julgamento, quando será facultado às partes, e ao MP,
querendo, apresentar sustentação perante os julgadores da ação.
No julgamento da rescisória, quando cumulados
fundamentos, é fundamental que se agrupem os votos por fundamentos, pois, se
julgada procedente por maioria de votos, somente nessa hipótese a parte ré terá
condições de identificar o âmbito da divergência e, assim, opor utilmente os
embargos infringentes.
11. COMPETÊNCIA PARA A AÇÃO RESCISÓRIA.
O CPC não estabelece a competência para julgamento da
ação rescisória. No entanto, há consenso de que a ação rescisória é ação de
competência originária de tribunal, até mesmo por estar inserta no Título IX, sob
a rubrica “Do processo nos Tribunais”. A regra que orienta o processamento da
ação rescisória é a de que cada tribunal é competente para o julgamento da ação
rescisória contra as decisões por ele proferidas ou, no caso de terem transitado
em julgado perante o juízo de primeira instância, do tribunal que teria
competência recursal.
107
Há na doutrina duas situações excepcionais que são dignas
de nota: a da sentença proferida por juiz estadual investido de jurisdição federal
(109, § 3º, CF/88), cuja rescisória será de competência do TRF da respectiva
região, e das causas entre o Estado estrangeiro ou organismo internacional e
Município ou pessoa domiciliada ou residente no Brasil que são processadas e
julgadas, em primeiro grau, pela primeira instância da Justiça Federal (CF/88, art.
109, II), sendo que das sentenças aí proferidas cabe recurso ordinário para o STJ,
de maneira que a causa não passa pelo TRF. Interposto recurso ordinário, se o
STJ dele conhecer, a competência para a rescisória será do STJ. A questão que se
coloca é se não for interposto recurso ou, ainda, se interposto, o mesmo não for
conhecido, de quem será a competência para a rescisória? O entendimento é de
que é do E. STJ
113
.
Quando há recurso, questão de grande importância para
definir a competência (e o prazo) da ação rescisória, é a de saber se o recurso foi
ou não conhecido (teve juízo positivo de admissibilidade). Se não for interposta
apelação, é a sentença de primeira instância que transita em julgado, e, aí, não há
problema com relação à competência, já que será do tribunal que teria
competência para o julgamento do recurso de apelação que poderia, mas não foi
interposto
114
.
113
Fredie Didier Jr, Curso se Direito Processual Civil ..., pg. 305/306.
108
Se for interposto recurso de apelação, mas o mesmo não for
conhecido, o que transitará em julgado, de igual forma, será a sentença de
primeira instância, pois, como o recurso não foi conhecido, não houve a
substituição da decisão (art. 512, do CPC). Neste caso, a rescisória também será
interposta perante o tribunal que teria competência para o julgamento do recurso
de apelação, mas o que será rescindido será a sentença, e não o acórdão.
No entanto, se o recurso de apelação for conhecido, abrem-
se as seguintes hipóteses: a) a apelação é improvida; b) a apelação e provida para
reformar a sentença; ou c) a apelação é provida para, diante da existência de vício
de atividade, anular a sentença.
Nas duas primeiras hipóteses (‘a’ e ‘b’), se não houver
outros recursos, será o acórdão do tribunal que transitará em julgado
115
, e,
portanto, será o próprio tribunal competente para eventual rescisória do acórdão.
Na terceira hipótese (‘c) não há efeito substitutivo, já que a decisão foi anulada,
havendo somente efeito rescindente, devendo haver a retomada do feito no juízo
a quo.
114
Pareceu-nos extremamente didática a exposição feita por Fredie Didier Jr., razão pela
qual, com ligeiras adaptações, será adotada nos parágrafos abaixo.
115
Haverá o efeito substitutivo – art. 512, CPC.
109
Todavia, se for interposto recurso especial nas hipóteses ‘a’
e ‘b’ e o mesmo for conhecido (provido ou improvido), será o acórdão do STJ
que transitará em julgado, e, portanto, será do STJ a competência para eventual
rescisória, sendo rescindível o acórdão do STJ, e não o acórdão do Tribunal local
(art. 512, do CPC). O mesmo se dá se, eventualmente, for interposto recurso
extraordinário, e, admitidas as mesmas hipóteses, a competência será do STF.
A questão em tela guarda direta relação com o enunciado da
Súmula 249, do STF (“é competente o Supremo Tribunal Federal para a ação
rescisória, quando, embora não tendo conhecido do recurso extraordinário, ou
havendo negado provimento ao agravo, tiver apreciado a questão federal
controvertida”).
Com efeito, o que se nota na doutrina é que essa súmula tem
um erro técnico, já que onde consta “não tendo conhecido”, deve ser entendido
“conhecido, mas não provido”, já que, se houve exame de mérito do recurso, não
há falar-se em não conhecimento, o que, presentemente, tem sido corrigido pelo
E. STF
116
.
116
Alexandre Freitas Câmara, Ação Rescisória, ... pg. 44.
110
Outra questão delicada que merece análise é a da ação
rescisória ajuizada perante tribunal incompetente, o que pode ocorrer, segundo
doutrina já referida neste trabalho
117
, em três hipóteses:
(1ª) ação rescisória ajuizada perante tribunal local destinada a
desconstituir acórdão proferido pelo STJ ou pelo STF. Para este hipótese, o
autor sustenta a ausência de investidura de jurisdição, pressuposto
processual, sendo o caso de extinção da ação rescisória sem resolução de
mérito (art. 267, IV, do CPC. Em nota de rodapé, contudo, o autor cita o
entendimento de Cândido Rangel Dinamarco, destacando que o caso deve
ser tratado pelas regras usuais de competência, declinando-se dela para o
tribunal de superposição a que caiba conhecer da ação rescisória;
(2ª) ação rescisória ajuizada perante um tribunal quando a decisão que
transitou foi proferida por outro tribunal. Neste caso, o autor estará
postulando a rescisão de decisão que não transitou em julgado, havendo,
neste hipótese, carência da ação, o que deverá conduzir, de igual forma, à
extinção da ação rescisória sem resolução de mérito, com base no art. 267,
VI, CPC;
117
Idem, pg. 44/46.
111
(3º) embora difícil de acontecer, da ação rescisória ser ajuizada perante o
tribunal de um Estado, quando a competência seria de outro, concluindo-se,
que, nesta hipótese, seria o caso de declínio de competência para o tribunal
competente.
O autor traz outra questão interessante: a de saber se a
intervenção da União, empresa pública federal ou autarquia federal em uma
rescisória ajuizada perante um tribunal estadual implicaria o deslocamento da
competência para o Tribunal Regional Federal. O autor cita um precedente
favorável do STJ, mas externa opinião contrária
118
.
Essas questões são colocadas apenas para ilustrar a
problemática da competência na ação rescisória, demandando, no entanto,
reflexão mais detalhada e aprofundada, o que escapa do âmbito do presente
trabalho.
A análise da competência da ação rescisória não pode ser
encerrada sem que, antes, seja aborda a questão das sentenças complexas, ou
seja, as que têm mais de um capítulo, já que pode ocorrer de um, ou mais deles,
serem substituídos (art. 512, CPC) e outros não, o que acarretará o trânsito em
118
Idem, pg. 47/48.
112
julgado em momentos distintos, refletindo, pois, na possibilidade de existir mais
de uma ação rescisória e competências para processamento distintas.
O entendimento firmado perante o STJ, de que a ação é una
e indivisível, não sendo possível cogitar-se no seu fracionamento, é severamente
criticado na doutrina
119
, não havendo como se negar que, havendo vários
capítulos a sentença, os mesmos têm aptidão para transitar em julgado em
momentos distintos, sendo possível o ajuizamento de inúmeras ações rescisórias,
sendo que, para cada uma delas, poder-se-á ter competências distintas para o
processamento.
12. PRAZO PARA O AJUIZAMENTO DA AÇÃO RESCISÓRIA.
O prazo de dois anos para o ajuizamento da ação rescisória é
fixado pelo art. 495, do CPC, sendo o mesmo decadencial, não havendo
controvérsia quanto a isso, já que é potestativo, não podendo ser prorrogado,
suspenso ou interrompido. Mas a indagação que daí decorre é quando começa a
contar o prazo decadencial de dois anos? A resposta poderia ser singela: a partir
do trânsito em julgado da última decisão, o que, todavia, não é tão simples
quanto parece.
119
Barbosa Moreira, Sentença Objetivamente Complexa, Trânsito em Julgado e
Rescindibilidade, Revista do Advogado, AASP, novembro/06, pg.88
113
Como se expôs, nas sentenças complexas, pode ocorrer de os
capítulos transitarem em julgado em momentos distintos, reforçando aqui a
posição de que não está correto, data venia, o entendimento do STJ. Mas não é
só, outra questão intrincada está relacionada ao juízo de admissibilidade dos
recurso
A doutrina majoritária
120
considera que a decisão proferida
no juízo de admissibilidade do recurso tem natureza declaratória, operando
efeitos ex tunc, o que conduz à conclusão de que a decisão transitada em julgado
no momento em que se tornou imutável, e não no momento em que tal
imutabilidade tenha sido pronunciada. Há entendimento minoritário no sentido
de que o juízo de admissibilidade seria constitutivo e não declaratório, operando
efeitos ex nunc
121
.
Não nos parecem corretas nenhuma dessas posições.
Segundo entendemos, não se pode negar que o juízo de admissibilidade do
recurso tem natureza declaratória, mas há que se reconhecer que o mesmo opera
efeitos ex nunc. As exceções, que nos afiguram corretas, são a do recurso
120
Barbosa Moreira, Comentários ao CPC ..., pg. 265. No mesmo sentido, dentre outros,
Nelson Nery Júnior, Teoria Geral dos Recursos ...pg. 252/273.
121
Fredie Dier Jr., Pressupostos processuais e condições da ação, Saraiva, pg.49.
114
interposto manifestamente fora do prazo, e da inexistência de preparo recursal
(art. 511)
122
.
13. HIPÓTESES DE CAMBIMENTO.
No CPC de 1939, a ação rescisória era cabível das sentenças
proferidas: (1) por juiz peitado, (2) por juiz impedido, (3) por juiz incompetente
ratione materiae, (4) com ofensa à coisa julgada, (5) contra literal disposição de
lei e (6) com fundamento em prova falsa (art. 798).
No CPC vigente (1973) foram acrescidas mais 05 (cinco)
hipóteses de cabimento da rescisória (art. 485, do CPC): (1) a de resultar a
sentença de dolo da parte vencedora em detrimento da vencida (III), (2) a de
resultar de colusão entre as partes a fim de fraudar a lei (III), (3) quando, depois
da sentença, o autor obtiver documento novo (VII), (4) quando houver
fundamento para invalidar a confissão, desistência ou transação em que se baseou
a sentença (VIII), e (5) quando a sentença for fundada em erro de fato (IX)
123
.
122
A questão é defendida com profundidade por Flávio Cheim Jorge, que faz extensa
análise da doutrina (Teoria Geral dos Recursos Cíveis, RT, 3ª edição, pg. 60/63. Às duas
hipóteses em que se admite o efeito ex tunc, o autor acresce a de desistência do recurso,
destacando que operam-se efeitos semelhantes.
123
Humberto Theodoro Junior, Ob. Cit. ..., pg. 615.
115
As hipóteses de cabimento são taxativas (485), não
admitindo interpretação analógica ou extensiva. É importante ressaltar, contudo,
que há ainda as hipóteses de cabimento de ação rescisória da sentença que julga
partilha (CPC, 1.030), e que quando “a lei minus dixit quam voluiit, é lícita a
interpretação extensiva, como no caso da exegese do inciso VIII ..., em que se
deve compreender como nele incluída a previsão de rescisória contra sentença
que se basear em reconhecimento ... do pedido”
124
.
O foco central deste trabalho --- conforme já sinalizado --- é
a hipótese do inciso V, do art. 485, do CPC, ou seja, quando a decisão
rescindenda “violar literal disposição de lei”, o que passaremos a analisar nos
tópicos seguintes, iniciando-se pelo conceito de lei, o cabimento ou não de
rescisória de lei processual, passando por outras questões afetas ao tema e que
nos parecem relevantes.
14. DA AÇÃO RESCISÓRIA COM BASE NO ART. 485, V, DO CPC.
O art. 485, V, do CPC corresponde ao art. 798, I, ‘c’, do
CPC de 1939, reproduzindo a expressão “literal disposição de lei”, que é alvo de
criticas, argumentando-se que o melhor teria sido a locução “direito em tese”, já
que o sistema jurídico não se esgota naquilo que a lei parece expressar, não
124
Fredie Didier Jr, Curso de Direito Processual Civil ...pg. 295).
116
podendo ser afastada, dentro dessa concepção, a possibilidade de o juiz violar
norma não escrita
125
, inclusive princípio jurídico.
Para a compreensão desse dispositivo, a primeira tarefa a ser
cumprida é a de interpretar, utilmente, o que deve ser entendido como lei. É
tranqüilo na doutrina e na jurisprudência que a expressão “lei”, para fins do art.
485, V, do CPC, deve ser entendida de forma ampla, abrangendo a CF, lei
complementar, ordinária ou delegada, a medida provisória, o decreto legislativo,
a resolução (Carta da República, art. 59), o decreto emanado do Executivo, o ato
normativo baixado por órgão do Poder Judiciário (regimento interno)
126
.
Não há, enfim, qualquer distinção quanto a ser a lei
estrangeira ou nacional; material ou processual. No entanto, não se admite,
segundo autorizada corrente doutrinária, a rescisória contra texto de súmula,
mesmo as vinculantes, o que será objeto de análise em tópico específico.
Não se pode negar certa similaridade entre a ação rescisória
calcada no art. 485, V, do CPC e os recursos especial e extraordinário, havendo
quem sustente --- na doutrina --- que “a violação do direito expresso corresponde
ao desprezo pelo julgador de uma lei que claramente regule a hipótese e cuja não-
125
Barbosa Moreira, Comentários ao CPC ..., pg. 131.
126
Idem, pg. 131.
117
aplicação no caso concreto implique atentado à ordem jurídica e ao interesse
público”
127
. Essa similaridade permite uma interpretação comparativa, inclusive,
das Súmulas 343 e 400, do STF.
Nos recursos especial e extraordinário não é permitida a
análise de fatos, provas e cláusulas contratuais (Súmulas 5 e 7 STJ e 279, do
STF). Os fatos, provas e cláusulas contratuais são objeto de análise na dimensão
do que estiver contemplado no acórdão,o sendo permitido qualquer reexame
do conjunto probatório ou contrato para verifica a alegação de violação a
dispositivo de lei infraconstitucional ou constitucional. Nestes recursos somente
é permitida a análise de questão de direito.
No tocante à ação rescisória calcada no art. 485, V, do CPC,
salvo algumas exceções, parece-nos ocorrer o mesmo. Ou seja, para que o
tribunal possa analisar e acolher o pedido rescindente não poderá haver a
necessidade de reexame dos autos da ação matriz, mas, uma vez acolhido tal
pedido, conforme já abordado, será licito ao tribunal julgar com a mesma
liberdade que teve o juiz que presidiu a ação primitiva, podendo, aí, analisar os
autos, determinar a produção de prova, enfim, tudo o que for necessário para o
rejulgamento da ação, não se impondo a limitação que entendemos existir no
juízo rescindente.
127
Humberto Theodoro Júnior, citando a posição de Sérigo Sahione Fadel, Ob. Cit., ... pg.
118
A similaridade existe, mas não a identidade. Nos recursos
especial e extraordinário exige-se o requisito do prequestionamento, já que a
razão de ser --- destes recursos – é uniformizar a interpretação de lei
infraconstitucional (STJ) e constitucional (STF). Na ação rescisória, por sua vez,
não há falar-se da necessidade de prequestionamento. A ação será cabível desde
que exista uma das hipóteses do art. 485, do CPC, e, para a hipótese específica do
inciso V, haverá violação à lei “... não apenas quando se contraria expressamente
o dispositivo normativo, aplicando-o onde não cabe, mas também quando se lhe
nega vigência ou, ainda, quando evidente erro na qualificação jurídica dos
fatos”
128
.
O termo “literal” contido no art. 485, V, do CPC tem que ser
entendido como sendo direito expresso (escrito ou não), franqueando-se a ação
rescisória quando houver violação a “direito em tese”, incluindo aí a violação a
princípios.
Essa interpretação abrangente do conceito de lei parece-nos
correta. No entanto, fica condicionada --- por evidente --- à possibilidade da
violação (alegada) ser verificada de pronto. Se for necessária produção de provas,
ou, ainda, a incursão nas provas produzidas e nos fatos alegados para identificar a
619.
119
violação, cremos que a ação rescisória estará descartada, o que não afasta,
todavia, a possibilidade da violação decorrer da qualificação jurídica dos fatos,
hipótese em que a rescisória será cabível e que será melhor analisada em tópico
específico abaixo.
14.1. NORMA PROCESSUAL E AÇÃO RESCISÓRIA.
Segundo Nelson Nery Junior, há --- na doutrina ---
controvérsia sobre o cabimento da rescisória com base em vício de atividade,
destacando que tem quem entenda que somente os vícios de juízo autorizam o
ajuizamento de ação rescisória com fulcro no art. 485, V, do CPC.
Dentre os defensores desta tese, é citado Luiz Eulálio de
Bueno Vidigal
129
. Este entendimento, defendido por alguns no passado, hoje não
mais tem sentido. No manejo da ação rescisória com fulcro no art. 485, V, do
CPC, pode-se eleger como causa petendi norma de direito material e/ou norma
128
Rosalina Pinto da Costa Rodrigues Pereita, Revista de Processo n.º 86, pg. 125/130.
129
Alexandre Freitas Câmara destaca que este, realmente, era o entendimento do autor ao
tempo do CPC de 1939, destacando, contudo, que o autor parece ter alterado (ao menos
parcialmente) este entendimento ao comentar o código vigente, citando seus Comentários, vol.
Vi, p. 107, nota de rodapé nª 142 (ação rescisória, Editora Lúmen, p. 82, nota de rodapé 56).
120
de direito processual, não existindo a restrição que alguns faziam ao cabimento
somente para os vícios de juízo
130
.
Não há nada que justifique o cabimento da ação rescisória,
com base no art. 485, V, do CPC, somente para as hipóteses de erro de juízo.
Conforme exposto, este dispositivo deve ser interpretado de forma abrangente,
permitindo o ajuizamento de ação rescisória com base em vícios de juízo, e,
também, em vícios de atividade (processuais), ocorridos antes e/ou na própria
prolação da sentença.
Parece-nos inteiramente procedentes as críticas feitas por
Eduardo Talamini à corrente doutrinária que interpreta o art. 485, V, do CPC
restritivamente. De fato, de acordo com a doutrina dominante, o inciso V não se
limita somente às hipóteses de erro de juízo, contemplando, também, erros de
atividade. O fato do art. 485, do CPC trazer hipóteses específicas de erros de
atividade (inciso II, p. ex) não tem o condão de reduzir a abrangência do inciso
V, já que, naquelas hipóteses, permite-se a produção de prova, ao passo que no
inciso V a violação tem que ser evidente
131
, ou seja, a violação pode estar ligada
130
No mesmo sentido é o entendimento do STJ: “A violação de lei processual também
autoriza o uso da ação rescisória” (Resp 11.290-0/AM, Rel. Min. Sálvio Figueiredo, j.
05.05.1993).
131
Não pode demandar a análise de fatos e/ou produção de provas.
121
a norma processual (geradora de nulidade absoluta), podendo ocorrer antes ou na
própria prolação da sentença
132
.
Teresa Arruda Alvim Wambier ensina que as nulidades
processuais podem ser classificadas como nulidades de forma e nulidades de
fundo
133
. As nulidades de forma são --- como regra --- relativas, exceto se houver
previsão legal de nulidade, hipótese em que a nulidade será absoluta
134
-
135
. As
nulidades de fundo, por sua vez, ligadas à estrutura e à existência da ação e do
processo
136
são --- sempre --- absolutas, sendo que o que diferencia, umas e
outras, é que as últimas (absolutas) podem ser alegadas pelas partes a qualquer
tempo e grau de jurisdição, podendo, ainda, ser decretadas de ofício pelo juiz,
inexistindo preclusão (são vícios insanáveis que maculam de forma incontornável
o processo); ao passo que as primeiras (relativas) somente podem ser invocadas
pelas partes, ficando sujeitas à preclusão
137
.
132
Op. Cit., pg. 169/173.
133
Teresa Arruda Alvim Wambier, Nulidades do Processo e da Sentença, Editora Revista
dos Tribunais, 6ª edição, pg. 185/191.
134
O que decorre da interpretação conjunta dos artigos 243 e 244, do CPC.
135
Segundo a Autora, “as nulidades de forma que a lei qualifica de absolutas são aquelas
presunções absolutas de direito, em relação às quais seria, por assim dizer, perigoso deixar, em
parte, na dependência da iniciativa das partes privá-las de efeito (o que ocorreria se de
anulabilidade se tratasse)”. Op. Cit., pg. 187.
136
Estas nulidades dizem respeito aos vícios ligados aos pressupostos processuais positivos
(de existência / de validade), aos pressupostos negativos e às condições da ação.
137
Alexandre Freitas Câmara, em posição similar, anota que “a nulidade do ato processual
é relativa quano a norma cogente desrespeitada se destina a tutelar interesses particulares das
partes ... a nulidade é absoluta quando a norma se destina a tutelar interesse público ...Todos
esses vícios, porém, são internos a um processo em curso e nele podem ser reconhecidos ... Uma
vez transitada em julgado a sentença, não se poderá mais reconhecer a invalidade dos atos
processuais viciados, ainda que se tratasse de um vício insanável. É que, na verdade, os vícios
insanáveis só o são ao longo do processo em que se manifestaram. Uma vez transitada em
julgado a sentença, todas as invalidades estão sanadas ... Ocorre que, em alguns casos muito
graves, expressamente indicados em lei, no momento do trânsito em julgado (quando fica
122
Essa distinção é fundamental, pois não é toda violação à lei
processual que autoriza a ação rescisória. Por outras palavras, não é toda nulidade
que torna a sentença rescindível, mas, somente, as nulidades absolutas. As
nulidades relativas só podem ser argüidas pelas partes, sob pena de preclusão (=
convalidam).
Com base neste panorama, pensamos ser correto afirmar que
não é todo vício de atividade que torna a sentença rescindível, mas, somente,
aqueles vícios que possam gerar nulidades absolutas, sendo certo, ainda, que tais
vícios podem ocorrer no curso do processo (irradiando efeitos para a sentença) e,
ainda, na própria sentença.
Como exemplo de vício ocorrido no curso do processo,
pode-se citar a sentença viciada por cerceamento de defesa, e, por sua vez, vício
ocorrido quando da prolação da própria sentença, a falta de fundamentação. No
manejo da ação rescisória com base no art. 485, V, do CPC, o que é fundamental
é que exista relação de causalidade entre o dispositivo legal que se reputa violado
e a sentença que se almeja rescindir. Ou seja: “se a afronta à norma processual
havida no curso do processo gerar uma nulidade que contamina atos
sanada a invalidade) surge a rescindibilidade. Torna-se o provimento judicial rescindível, o que
significa que ele pode vir a ser desconstituído através de pronunciamento judicial que poderá ser
123
subseqüentes e atinge inclusive a sentença, é cabível, sem dúvida alguma, a ação
rescisória fundada no art. 485, V”
138
.
Portanto, não há nenhuma razão para se sustentar o
cabimento da ação rescisória com base no art. 485, V somente para as hipóteses
de vícios de juízo. A ação rescisória com base no art. 485, V será cabível,
também, nas hipóteses de vícios de atividade (nulidades absolutas), ocorridos no
curso do processo ou na própria sentença de mérito (contaminando-na).
14.2. NORMA CONSTITUCIONAL E AÇÃO RESCISÓRIA
O alcance da expressão “lei” contido no art. 485, V do CPC
é “largo”. Logo, não é correto excluir de sua abrangência ofensa à norma
constitucional
139
, o que somente se justificaria se se entendesse que a sentença
ofensiva à Constituição Federal é ineficaz, dispensando a ação rescisória.
Com base nessa consideração, é preciso analisar e
compatibilizar duas situações: (1) a primeira: a existência de uma decisão
transitada em julgado (e que adote como fundamento a inconstitucionalidade de
proferido no processo instaurado quando do ajuizamento da ação rescisória. (Ação Rescisória,
Editora Lumem Júris, pg.36/37).
138
Eduardo Talamini, Op. Cit., p. 172.
139
Incluídos aí os princípios.
124
um dispositivo) e a posterior declaração de constitucionalidade (desse mesmo
dispositivo perante o STF) e, a (2) segunda: existência de uma decisão transitada
em julgado (e que adote como fundamento a constitucionalidade de um
dispositivo) e a posterior declaração de inconstitucionalidade (desse mesmo
dispositivo perante o STF).
Desta análise pode-se indagar: as hipóteses comportam a
aplicação dos arts. 475-L, § 1º e 741, parágrafo único do CPC? Se negativo, qual
o mecanismo cabível para o ataque das sentenças à luz do sistema processual
vigente ?
Nos itens abaixo analisaremos as hipóteses acima
mencionadas e, nos limites deste trabalho, procuraremos externar nossa opinião,
reservando-nos, contudo, o direito de uma análise mais aprofundada., mormente
à luz da divergência doutrinária existente.
125
14.2.1. DA ANÁLISE DOS ARTS. 475-L, § 1º E 741, PARÁGRAFO ÚNICO
DO CPC À LUZ DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
Há grande polêmica em torno da constitucionalidade dos
dispositivos em questão. Os que advogam pela inconstitucionalidade
140
,
sustentam que a coisa julgada tem proteção constitucional (CF 5º XXXVI),
concluindo que decisão posterior, ainda que do STF, não tem o condão de
“cassar” decisão transitada em julgado, sendo que a decisão do STF que declara
inconstitucional a lei ou ato normativo tem eficácia retroativa (ex tunc), atingindo
situações pretéritas, limitada, tal eficácia, contudo, à coisa julgada. Os que
sustentam a constitucionalidade
141
, não enxergam qualquer violação à
Constituição, argumentando que, se assim fosse, haveria de se negar a
constitucionalidade da própria ação rescisória, e, quando a isso, não se questiona.
A inconstitucionalidade dos dispositivos, ao menos em
princípio, impressiona, já que “se a sentença transitou em julgado, não é
suficiente a posterior declaração de inconstitucionalidade para infirmar a garantia
de imutabilidade da decisão”
142
. Pelas razões acima expostas, parece não ser
possível admitir a eficácia retrooperante da declaração de inconstitucionalidade,
140
Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Andrade Nery, CPC comentado, 9ª edição, pg.
648/649.
141
Teori Albino Zavascki, Embargos à execução com eficácia rescisória, in Coisa Julgada
Inconstitucional, Editora Fórum, pg. 331.
142
Flávio Luiz Yarshell, Ação Rescisória ..., pg. 255.
126
pois, conforme já se verá nas linhas abaixo, tal eficácia é limitada pela coisa
julgada.
14.2.2. DECISÃO TRANSITADA EM JULGADO (QUE ADOTE COMO
FUNDAMENTO A INCONSTITUCIONALIDADE DE UM
DISPOSITIVO) E A POSTERIOR DECLARAÇÃO DE
CONSTITUCIONALIDADE (DESSE MESMO DISPOSITIVO PERANTE
O STF).
A situação que aqui se coloca é de a sentença adotar como
fundamento a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo e, ulteriormente, o
STF declarar que essa lei ou ato normativo é constitucional.
Nessa hipótese, segundo corrente doutrinaria que reputamos
correta, a única forma de impugnação é a ação rescisória, não sendo aplicáveis os
artigos arts. 475-L, § 1º e 741, parágrafo único do CPC, pelas seguintes razões:
(1) não se pode considerar inexistente a decisão viciada pela premissa ---
equivocada --- de inconstitucionalidade; (2) o art. 102, § 2º da CF não afasta esta
afirmativa, já que a eficácia e o efeito que dele constam não são suficientes para
afastar a coisa julgada; (3) a duplicidade estabelecida pela Lei 9.868/1999 não
permite concluir que, uma vez declarada constitucional a lei ou ato normativo
pelo STF, a sentença estaria, por via de conseqüência, “cassada”, e (4) não
127
constam dos dispositivos processuais em tela referência à declaração de
constitucionalidade, não sendo possível, no particular, interpretar de forma
extensiva
143
.
A prevalecer esse entendimento, cremos que a sentença (que
reputou inconstitucional determinada lei ou ato normativo) somente poderá ser
impugnada por meio de ação rescisória, fundada no art. 485, V, do CPC
144
.
14.2.3. DECISÃO TRANSITADA EM JULGADO (QUE ADOTE COMO
FUNDAMENTO A CONSTITUCIONALIDADE DE UM DISPOSITIVO) E
A POSTERIOR DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE
(DESSE MESMO DISPOSITIVO PERANTE O STF).
A prevalecer, igualmente, o entendimento da
inconstitucionalidade dos arts. 475-L, § 1º e 741, parágrafo único do CPC,
preservando-se a autoridade da coisa julgada como garantia constitucional,
também nesta hipótese o mecanismo de impugnação será a ação rescisória. A
sentença que viole à Constituição pode ser impugnada por recurso, inclusive o
extraordinário (art. 102, CF) e, após o trânsito em julgado, por ação rescisória
(art. 485, V, CPC).
143
Flávio Luiz Yarshell, Ação Rescisória ... pg. 252/254.
144
Nesse sentido parece ser o entendimento de Teresa Arruda Alvim Wambier, Nulidades
do Processo e da Sentença ..., pg. 410
128
A alegação de que a declaração de inconstitucionalidade
pelo STF acarreta a inexistência (“cassação”) da decisão parece ser extremada. A
esse respeito, Barbosa Moreira já externou a seguinte posição: “não nos
inclinamos a sugerir que se elimine a imunidade da res iudicata à posterior
declaração de inconstitucionalidade, mesmo no julgamento da ação direta”
145
. A
solução apresentada pelo autor, à vista do óbice do prazo decadencial de dois
anos para a ação rescisória, foi a de, de lege ferenda, permitir, a título
excepcional o ajuizamento da ação a qualquer tempo.
Todavia, admitida a autoridade da tese daqueles que
sustentam que a declaração de inconstitucionalidade da lei ou de ato normativo
implica a “cassação” da decisão transitada em julgado, parece estar correto o
entendimento dos que de negam a função rescindente da impugnação e dos
embargos nessas hipóteses, pois, se “a decisão funda-se em norma declarada
inconstitucional pelo STF, nada haverá a rescindir, pois a decisão que se baseia
em lei que não era lei ... não terá transitado em julgado porque, em princípio, terá
faltado à ação ... possibilidade jurídica do pedido”
146
.
145
Considerações sobre a chamada relativização da coisa julgada material, in Relativização
da coisa julgada, PODIVM, 2ª ed., pg. 220.
146
Teresa Arruda Alvim Wambier e José Miguel Garcia Medina, Relativização da coisa
julgada, in Relativização da coisa julgada, PODIVM, 2ª ed., pg. 344.
129
No entanto, referidos autores entendem que “só será possível
ao executado fazer esta alegação na impugnação se à decisão que julgou a ação
declaratória de inconstitucionalidade se tiverem imprimido efeitos ex tunc, em
conformidade com a regra geral, não tendo havido decisão com base nas
circunstâncias constantes do art. 27 da Lei 9.868/1999, segurança jurídica ou
excepcional interesse social, que autorizam se dê à decisão da ação declaratória
de inconstitucionalidade efeitos ex nunc”.
A abordagem da matéria exige exame mais aprofundado,
mas que, segundo nos parece, seria incompatível com as dimensões do presente
trabalho.
14.3. VIOLAÇÃO DECORRENTE DA QUALIFICAÇÃO JURÍDICA DOS
FATOS.
Conforme já destacado em tópico precedente, a ação
rescisória guarda certa similaridade com os recursos especial e extraordinário.
Nesses recursos, denominados de fundamentação vinculada, não basta a
existência de um acórdão, faz-se necessário que norma infraconstitucional ou
constitucional tenha sido violadas pelo tribunal. A atividade do STJ centra-se na
alegação de violação de lei infraconstitucional e do STF na violação de norma
constitucional.
130
A ação rescisória calcada no inciso V não tem função de
uniformizar a interpretação de lei (tanto que a competência não é centralizada em
um único tribunal), nem muito menos demanda o exaurimento das vias recursais
(Súm. 514, STF), não sendo necessário o prequestionamento. A sua função é a de
sanar a existência de vícios graves (de atividade ou de juízo) que maculem a
sentença, ou seja, permitir que o vício seja extirpado e a ação, sendo o caso de
rejulgamento, possa ser novamente julgada, solucionando-se a relação
processual.
Não obstante essas distinções, a ação rescisória assimila-se
aos recursos especial e extraordinário no tocante à liberdade que o tribunal tem
para verificar a alegação de violação a literal disposição de lei. Embora na ação
rescisória possa ser sustentável existir maior liberdade, parece certo que alegação
de afronta deverá ser constatável pelo mero exame das questões jurídicas,
considerando-se como premissas os fatos já delineados no processo. Não raras
vezes, contudo, a violação à norma jurídica decorre de uma errônea qualificação
jurídica dos fatos. Desta maneira, da mesma forma que a errônea qualificação
jurídica dos fatos rende ensejo a recurso especial e extraordinário, não se pode
negar o cabimento da ação rescisória decorrente de erro na qualificação jurídica
dos fatos.
131
A análise da qualificação jurídica dos fatos não se equivale à
valoração da prova, correspondendo à revisão do procedimento de subsunção dos
fatos à norma, com foco nas conclusões da sentença rescindenda, já que são essas
conclusões que determinarão a existência de violação ou não à literal disposição
de lei, e, portanto, a procedência ou não da ação.
Portanto, quando não for possível separar os fatos das
normas, implicando, a qualificação dos fatos, a definição do próprio direito
discutido na ação primitiva, é perfeitamente cabível a ação rescisória por
violação literal disposição de lei (art. 485, V, CPC), não para discutir como os
fatos ocorreram e a interpretação feita pelo juízo, mas, sim, para atribuir-lhes
qualificação correta, pois o que se analisa é o direito, e, não, como ocorreram os
fatos
147
.
14.4. SÚMULA VINCULANTE A AÇÃO RESCISÓRIA.
Outra questão que nos parece relevante averiguar, é a
hipótese de cabimento de ação rescisória (art. 485, V, do CPC) se,
hipoteticamente, uma sentença transitada em julgado violar enunciado de súmula
vinculante do STF. Não há controvérsia quanto ao fato de que a violação a
147
José Manoel de Arruda Alvim Netto, Qualificação jurídica do fato feita
equivocadamente dá azo à rescisória, Revista de Processo n.76, pg. 168.
132
enunciado de súmula persuasiva (predominante) não enseja o cabimento da ação
rescisória.
A questão a ser enfrentada é a seguinte: se a violação for de
súmula vinculante do STF, a ação rescisória será cabível ou não ? Existe
abalizado entendimento doutrinário no sentido de que a ação rescisória continua
não sendo cabível
148
. A questão, quer nos parecer, merece maior e melhor
reflexão.
A lei é, por excelência, fonte do direito. A súmula nada mais
é do que uma interpretação reiterada da lei, ou seja, da interpretação que o
Tribunal reputa correta. Logo, pode-se dizer que o comando decorre da lei, mas a
interpretação (correta) é aquela que tenha sido sumulada pelo STF. Por
intermédio da súmula vinculante, não restará (ao intérprete) outra interpretação
da lei.
Esse fato, segundo pensamos, é decisivo para a distinção da
súmula vinculante da súmula persuasiva, e nos faz pender, ao menos em
princípio, pelo cabimento da rescisória se a violação for de súmula vinculante, já
que a lei não poderá se interpretada de forma diferente do STF. Com a súmula
148
Barbosa Moreira, Comentários ao CPC ..., pg. 133. No mesmo sentido: Fredie Didier.
Jr., Curso de Direito Processual Civil ..., Vol. 3, pg.325.
133
vinculante, não é possível existir uma outra interpretação da lei. Ou seja, as
coisas se passam com o simples encaixe da situação concreta à hipótese
sumulada pelo STF, não havendo, pois, outra alternativa para o intérprete
adotar.
Há entendimento doutrinário que parece endossar a tese aqui
defendida. No tocante à súmula vinculante, é oportuno destacar que a lei prevê a
existência de reclamação, recurso e outros meios de impugnação para a hipótese
de haver decisão ou ato normativo que contrarie a súmula vinculante. Essa
previsão parece-nos ser cumulativa. No entanto, a reclamação está condicionada
ao recurso (Súmula 734/STF
149
). Esgotados os recursos e a possibilidade do
manejo da reclamação, parece-nos possível concluir que está franqueada a ação
rescisória.
14.5. SÚMULA 343/STF.
A locução “violar literal disposição de lei” traz, ainda, um
outro problema que repousa na Súmula 343/STF: “não cabe ação rescisória por
ofensa à literal disposição de lei quando a decisão rescindenda se tiver baseado
em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais”.
149
Não cabe reclamação quando já houver transitado em julgado o ato judicial que
se alega tenha desrespeitado decisão do supremo tribunal federal”.
134
Ou seja, o que parece transparecer do enunciado desta
súmula é que somente haverá violação à lei quando houver somente uma
interpretação aceita perante os tribunais, o que afastaria o cabimento quando
houvesse mais de uma interpretação. O fundamento desta súmula está
umbilicalmente ligado ao da Súmula 400/STF (“decisão que deu razoável
interpretação à lei, ainda que não seja a melhor, não autoriza recurso
extraordinário pela letra ‘a’ do art. 101, III, da CF”). Esta súmula nunca foi
aplicada para matéria constitucional e, atualmente, não tem sido utilizada para
matéria infraconstitucional.
A exemplo do que ocorria com a Súmula 400/STF, a Súmula
343/STF não tem sido aplicada em matéria constitucional, entendendo-se que,
violar a Constituição equivale atentar contra a própria base do sistema jurídico.
Não se pode negar que a interpretação da norma jurídica
pode ser divergente (e isso usualmente ocorre), e não há nada de errado nisso,
tanto que existem mecanismos processuais vocacionados à uniformização de
entendimento. Ou seja, compete ao STJ uniformizar a interpretação de norma
infraconstitucional e, ao STF, uniformizar a interpretação da Constituição
Federal.
135
Diante do que foi abordado neste trabalho, pode-se concluir,
sem embargo de opiniões em sentido contrário, que, se a jurisprudência e as
súmulas persuasivas não justificam a rescisória, a divergência de interpretação
sobre determinado dispositivo legal --- pelas mesmas razões --- não abre caminho
para a rescisória.
Essa conclusão não nos parece absoluta. Segundo o que
pensamos, se existirem poucas decisões em sentido contrário perante os
tribunais, isso não caracteriza interpretação controvertida. Mais, ainda. Se houver
precedente do STJ ou STF contemporâneo à prolação da decisão rescindenda, e,
ainda assim, existirem decisões controvertidas nos tribunais locais, não se pode
afastar o cabimento da ação rescisória, já que interpretação do dispositivo que
embasa a rescisória já terá sido analisado pelo tribunal competente para dizer a
última palavra sobre a interpretação norma infralegal (STJ) ou constitucional
(STF)., não nos parecendo sustentável cogitar na existência de divergência de
interpretação.
136
15. CONCLUSÃO.
Ao longo deste trabalho procuramos analisar as principais
características da ação rescisória, para, ao final, abordar a hipótese do inciso V,
do art. 485, do CPC. As idéias aqui expostas (e defendidas), que poderão ser
revistas com as críticas que virão e com as reflexões que certamente faremos,
permitem-nos concluir pela extrema utilidade da ação rescisória, mormente
diante da forte tendência de “relativização” da coisa julgada, o que não se afigura
tecnicamente correto, tampouco seguro, de maneira que, segundo pensamos, os
problemas que têm sido enfrentados poderiam ser adequadamente resolvidos se a
disciplina da ação rescisória sofresse algumas alterações, como, por exemplo, a
fluência do prazo decadencial somente a partir da obtenção de dado ou elemento
que possa autorizar o ajuizamento da ação, e, ainda, a inserção de inciso que
permitisse, de forma segura, contornar a crescente onda de relativização da coisa
julgada.
No entanto, enquanto a disciplina da rescisória não for
alterada, pensamos que à mesma deve ser atribuída maior utilidade e praticidade,
o que ousamos sustentar no presente trabalho, já que, muitas das hipóteses aqui
mencionadas e defendidas, tecnicamente, não têm abrigo no que dispõe o nosso
CPC.
137
16. BIBLIOGRAFIA
ALVIM, Arruda. Manual de direito processual civil. v. 2, 9.ed., rev., atual. e
ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.
ALVIM, Eduardo Arruda. Curso de direito processual civil. v. 1. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1998.
ALVIM, Thereza. Questões Prévias e os Limites Objetivos da Coisa Julgada.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 1977.
AMERICANO, Jorge. Estudo Theorico e Pratico da Acção Rescisória dos
Julgados no direito Brasileiro. 3. ed. correcta e augmentada. São Paulo:
Saraiva, 1936.
ANDRIOLI, Virgilio. Appunti di Diritto Processuale Civile. Nápoles: Eugenio
Jovene, 1964.
_______________. Commento al Codice di Procedura Civile, vol. II, 3. ed.,
reimpressão. Nápoles: Eugenio Jovene, 1954.
ARRUDA ALVIM NETTO, José Manoel de. Direito Processual Civil. Teoria
Geral do Processo de Conhecimento, vol. II. São Paulo: Ed. Revista dos
Tribunais, 1972.
ARRUDA ALVIM NETTO, José Manoel; ARRUDA ALVIM PINTO, Teresa
Celina. Ação Rescisória. Repertório de Jurisprudência e Doutrina. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1998.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 10520:
informação e documentação: citações em documentos: apresentação. Rio de
Janeiro: 2002.
138
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6023:
informação e documentação: referências - elaboração. Rio de Janeiro: 2002.
ATTARDI, Aldo. La Revocazione. Pádua: Cedam, 1959.
BARBOSA, Antônio Alberto Alves. Da Preclusão Processual Civil, 2.ed., rev. e
atual. 2.t. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1994.
BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Comentários ao Código de Processo Civil.
Vol. V, 7. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 1998.
BERMUDES, Sergio. Comentários ao Código de Processo Civil. vol. VII. São
Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1975.
BONSIGNORI, Angelo. La Revocazione del Pubblico Ministero dell´art. 397, n.
2, CPC, in Scritti dedicati ad Alessandro Raselli. T. 1. Milão: Giuffré, 1971.
BRANDÃO, Fabrício dos Reis. Coisa julgada. São Paulo: MP Editora, 2005.
BRASIL, Ávio. Rescisória de Julgados. Doutrina, Jurisprudência e Prática. Rio
de Janeiro, 1949.
BUTERA, antonio. La rivocazione delle sentenza Civile. Torino Unione
Tipografico: Editrice Torinense, Turim, 1936.
CALVOSA, Carlo. Riflessioni sulla frode alla legge nel processo in Rivista di
Diritto Processuale. Vol. IV (1949), parte I.
CÂMARA, Alexandre Freitas. Ação rescisória. Rio de Janeiro: Lúmen Júris,
2007.
CAMPOS, Antônio Macedo de. Ação Rescisória de Sentença. 1. ed. São Paulo:
Sugestões Literárias S/A, 1976.
CASTRO, Amílcar de. Comentários ao Código de Processo Civil. vol. VIII, 2.
ed. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1976.
139
CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de Direito Processual Civil. vol. III. 3. ed.
trad. De J. Guimarães Menegale. São Paulo: Saraiva, 1969.
COSTA, Coqueijo. A Rescisória na Justiça do Trabalho. Vol. II. Rio de Janeiro:
Revista Litis, 1975.
DE MARTINS, Raffaele Cognetti. La Rivocazione della sentenza nella
procedura civile. Turim: Fratelli Bocca, Editori, 1900.
DIDIER Jr., Fredie. Pressupostos processuais e condições da ação: o juízo de
admissibilidade do processo. São Paulo: saraiva, 2005.
_______________ (org.). Relativização da Coisa Julgada. 2.ed. Salvador:
JusPodivm, 2006.
_______________ e CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Curso de direito
processual civil. v. 3. Salvador: JusPodivm, 2007.
DINAMARCO, Cândido Rangel. Capítulos de sentença. São Paulo: Malheiros
Editores Ltda, 2002.
__________________________. Nova era do processo civil. São Paulo:
Malheiros Editores Ltda, 2003.
DINAMARCO, Márcia Conceição Alves. Ação rescisória. São Paulo: Atlas,
2004.
DINIZ, José Janguiê Bezerra. Ação Rescisória dos Julgados. São Paulo: LTr,
1998.
DINIZ, Maria Helena. Conflito de normas. 5.ed., aum. e atual. São Paulo:
Saraiva, 2003.
________________.As lacunas no direito. 7.ed. São Paulo: Saraiva, 2002.
140
D´ONOFRIO, Paolo. Commento al Codice di Procedura Civile. Vol. I, 4. ed.
Turim: Editrice Torinense, 1957.
FABRÍCIO, Adroaldo Furtado (coord. et al.). Meios de impugnação ao julgado
civil: estudos em homenagem a José Carlos Barbosa Moreira. Rio de
Janeiro: Forense, 2007.
FADEL, Sergio Sahione. Ação rescisória no novo código de processo civil.
M.S.R.
GIANNICO, Maricí. Carência de ação e ação rescisória. Jurisprudência.
Revista de Processo, Arruda Alvim (diretor), 123, ano 30, maio 2005. São
Paulo: Revista dos Tribunais.
GUERRA, Adriana Diniz de Vasconcellos. A Tutela Antecipada e sua
Admissibilidade em sede de Ação Rescisória. Rio de Janeiro: Forense, 2001.
JORGE, Flávio Cheim. Apelação cível: teoria geral e admissibilidade. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 1999 (Recursos no processo civil; 7).
__________________. Teoria geral dos recursos cíveis, 3.ed., rev., ampl. e
atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.
LEMOS, Luciano Braga. Primeiras Linhas da Ação Rescisória. Belo Horizonte:
Mandamentos, 2000.
LIEBMAN, Enrico Tulio. Eficácia e autoridade da sentença e outros escritos
sobre a coisa julgada, 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.
__________________. Notas às Instituições de direito Processual civil, de
Giuseppe chiovenda, vol. III, 3. ed. São Paulo: saraiva, 1969.
LIMA, Arnaldo Esteves; DYRLUND, Poul Erik. Ação Rescisória. 2. ed. Rio de
Janeiro: Forense Universitária, 2003.
LIMA, José Edvaldo Albuquerque de. Ação Rescisória nos Tribunais. Rio de
Janeiro: América Jurídica, 2002.
141
MACEDO, Alexander dos Santos. Da querela nullitatis sua subsistência no
direito brasileiro. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 1998.
MAGRI, Berenice Soubhie Nogueira. Ação anulatória : art. 486 do CPC. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1999. (Coleção estudos de direito de
processo Enrico Tullio Liebman; v. 41).
MARINONI, Luiz Guilherme. A Antecipação da Tutela. 5. ed. rev. e ampl. São
Paulo: Malheiros Editores, 1999.
______________________. Tutela Antecipatória, Julgamento antecipado e
Execução Imediata da Sentença. 4. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2000.
MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica a Aplicação do Direito, 2. ed.,Editora
da Livraria Globo, 1933.
MEDINA, José Miguel Garcia. O prequestionamento nos recursos
extraordinário e especial, 2. ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 1999. (Recursos no processo civil; 6).
MENDONÇA, Manoel Ignacio Carvalho de. Da Acção Rescisoria das Sentenças
e Julgados. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1916.
MESQUITA, José Ignácio Botelho de. A coisa julgada. Rio de Janeiro: Forense,
2005.
MIRANDA, Pontes de. Tratado da Ação Rescisória – Das sentenças e de outras
decisões. 1. ed. Campinas: Bookseller, 1998.
MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil. v.
V: arts. 476 a 565. Rio de Janeiro: Forense, 2003.
NASCIMENTO, Carlos Valder do. e DELGADO, José Augusto. Coisa Julgada
inconstitucional. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2006.
142
NEPOMUCENO, Luciana Diniz. A Antecipação da Tutela na Ação Rescisória.
Belo Horizonte: Del Rey, 2002.
NERY JÚNIOR, Nelson. Princípios FundamentaisTeoria Geral dos Recursos.
4.ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais.
___________________. Teoria geral dos recursos. 6. ed., atual., ampl. e reform.
São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004. (recursos no processo civil;
1).
NERY JÚNIOR, Nelson e WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (coords.). Aspectos
polêmicos e atuais dos recursos cíveis e de outras formas de impugnação às
decisões judiciais. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001 (série
aspectos polêmicos e atuais dos recursos; v.4).
NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Preclusões para o juiz: preclusão pro
judicato e preclusão judicial no processo civil. São Paulo: Editora Método,
2004.
_____________________________. (et al.). Reforma do CPC – Leis
11.187/2005, 11.232/2005, 11.276/2006, 11.277/2006 e 11.280/2006. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.
OLIVEIRA, Francisco Antonio de. Medidas Cautelares, Procedimentos
Especiais, Mandado de Segurança, Ação Rescisória e Ação Anulatória no
Processo Trabalhista, 2. ed. rev. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais,
1991.
OLIVEIRA, Gleydson Kleber Lopes de. Recurso especial. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2002 (Recursos no processo civil; 9).
PASSOS, José Joaquim Calmon de. Esboço de uma teoria das nulidades
aplicada às nulidades processuais. Rio de Janeiro: Forense, 2002.
PEREIRA, Rosalina Pinto da Costa Rodrigues. O art. 485, V, do Código de
Processo Civil. Revista de processo, Arruda Alvim (diretor), 86. São Paulo:
Revista dos Tribunais.
143
PINTO, Nelson Luiz. Manual dos recursos cíveis. 3. ed., ampl. e atual. São
Paulo: Malheiros Editores Ltda, 2002.
PORTO, Sérgio Gilberto. Coisa julgada civil. 3. ed., rev., atual. e ampl. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.
RÊGO, Bruno Noura de Moraes. Ação rescisória e a retroatividade das decisões
de controle de constitucionalidade das leis no Brasil. Porto Alegre: Sergio
Antonio Fabris Editor, 2001.
RIZZI, Sérgio. Ação Rescisória. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1979.
ROCHA, Cármen Lúcia Antunes (coord.). Constituição e Segurança Jurídica.
2.ed., rev. e ampl. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2005.
ROSAS, Roberto. Direito Sumular – Comentários às súmulas do Supremo
Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, 10. ed. rev. e atual. São
Paulo: Malheiros Editores Ltda, 2000.
SANTOS, Ulderico Pires dos. Teoria e Prática da Ação Rescisória. Rio de
Janeiro: Forense, 1978.
SATTA, Salvatore. Le Impugnazioni. Milão: Francesco Vallardi, 1964.
SILVA, Bruno Freire e. Ação rescisória. Curitiba: Juruá, 2005.
SILVA, Ovídio A. Baptista da. Sentença e Coisa Julgada – ensaios. Porto
Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1979.
TALAMINI, Eduardo. Coisa julgada e sua revisão. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2005.
TESHEINER, José Maria. Eficácia da Sentença e Coisa Julgada no Processo
Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.
144
THEODORO Jr., Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Vol. I, 45. ed.
Rio de Janeiro: Forense, 2006.
TUCCI, José Rogério Cruz e. A causa petendi no processo civil. 2.ed., rev., atual
e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. (coleção estudos de direito
de processo Enrico Tullio Liebman; v. 27).
VALLE, Christino Almeida do. Teoria e Prática da Ação Rescisória. 3. ed. Rio
de Janeiro: Aide Editora, 1990.
VIDIGAL, Luis Eulalio de Bueno. Da Ação Rescisória dos Julgados. São Paulo:
Saraiva, 1948.
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Controle das Decisões Judiciais Por Meio de
Recursos de Estrito Direito e de Ação Rescisória. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2001.
___________________________. Nulidades do processo e da sentença. 6.ed.,
rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. (coleção estudos
de direito de processo Enrico Tullio Liebman; 16).
___________________________ (coord.). Aspectos Polêmicos da Antecipação
de Tutela. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997.
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; MEDINA, José Miguel Garcia. O Dogma da
Coisa Julgada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.
WAMBIER, Luis Rodrigues; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim e MEDINA,
José Miguel Garcia. Breves comentários à nova sistemática processual civil
3. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.
YARSHELL, Flávio Luiz. Ação rescisória – juízos rescindente e rescisório. São
Paulo: Malheiros Editores LTDA, 2005.
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo