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UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
CENTRO BIOMÉDICO
FACULDADE DE ENFERMAGEM
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM
TADEU LESSA DA COSTA
AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS ACERCA DAS PESSOAS COM
HIV/AIDS ENTRE ENFERMEIROS:
UM ESTUDO DE ZONA MUDA
Rio de Janeiro
2007
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TADEU LESSA DA COSTA
AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS ACERCA DAS PESSOAS COM
HIV/AIDS ENTRE ENFERMEIROS:
UM ESTUDO DE ZONA MUDA
Dissertação apresentada, como requisito
final para a obtenção do tulo de Mestre
em Enfermagem, ao Programa de Pós-
Graduação em Enfermagem, da
Faculdade de Enfermagem da
Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
Linha de Pesquisa: Políticas e Práticas em
Saúde Coletiva e Enfermagem.
Orientadora: Profª Titular Denize Cristina de Oliveira
Rio de Janeiro
2007
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CATALOGAÇÃO NA FONTE
Autorizo, apenas para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial desta tese.
____________________________ __________________________
Assinatura Data
C837 Costa, Tadeu Lessa da.
As representações sociais acerca das pessoas com HIV/Aids entre
enfermeiros : um estudo de zona muda / Tadeu Lessa da Costa. - 2007.
204 f.
Orientadora: Denize Cristina de Oliveira.
Dissertação (mestrado) Universidade do Estado do Rio de
Janeiro, Faculdade de Enfermagem.
1. AIDS (Doença). 2. AIDS (Doença) pacientes. 3. Representações
sociais. 4. Inovações tecnológicas. 5. Enfermagem em saúde pública. I.
Oliveira, Denize Cristina de. II. Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
Faculdade de Enfermagem. III. Título.
CDU
614.253.5
TADEU LESSA DA COSTA
AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS ACERCA DAS PESSOAS COM
HIV/AIDS ENTRE ENFERMEIROS:
UM ESTUDO DE ZONA MUDA
Dissertação apresentada, como requisito
final para a obtenção do título de Mestre
em Enfermagem, ao Programa de Pós-
Graduação em Enfermagem, da
Faculdade de Enfermagem da
Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
Linha de Pesquisa: Políticas e Práticas em
Saúde Coletiva e Enfermagem.
Aprovado em: ____________________________________________________
Banca Examinadora:
_____________________________________________
Profª Titular Denize Cristina de Oliveira (Presidente)
_____________________________________________
Prof. Dr. Pedro Humberto Faria Campos (1º Examinador)
_____________________________________________
Prof. Titular Celso Pereira de Sá (2º Examinador)
Rio de Janeiro
2007
RESUMO
COSTA, T.L. As Representações Sociais acerca das pessoas com HIV/Aids entre
Enfermeiros: um estudo de zona muda. 2007. 202 p. Dissertação (Mestrado em Enfermagem)
Faculdade de Enfermagem, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro,
2007. Orientadora: Profª Titular Denize Cristina de Oliveira.
Este estudo teve como objetivos analisar o conteúdo e a estrutura das representações
sociais de enfermeiros acerca da pessoa com HIV/AIDS, considerando seus elementos
explicitados e não explicitados. Trata-se de um estudo quali-quantitativo, descritivo, pautado
na abordagem estrutural das representações sociais, desenvolvido em duas fases de campo,
em um hospital universitário da cidade do Rio de Janeiro. Na primeira fase aplicou-se a
técnica de evocações livres associada à técnica de substituição, com o termo indutor “portador
do HIV/AIDS”, na qual 150 enfermeiros respondiam “em seu próprio nome” (situação
normal) e, após, como se fossem “as pessoas em geral” (situação de substituição). Estes dados
foram analisados através das técnicas de Teste t de Student e construção de quadros de quatro
casas, com o auxílio do software EVOC 2003. Na segunda fase foi aplicado um questionário
entre 30 enfermeiros, contendo questões de caracterização, escala de likert, técnica da mise en
cause e sobre o risco de enfermeiros se infectarem pelo HIV, tendo sido os dados analisados
através de estatística descritiva. Os resultados evidenciaram diferentes elementos na
representação analisada. Na situação normal as cognições centrais foram cuidado precaução
profissional, educação em saúde e tratamento, destacando-se, pela importância atribuída aos
elementos, ajuda, controle da doença, esperança, família, medicações, prevenção e
solidariedade. A cognição confirmada como central foi tratamento, com uma possível
centralidade para a prevenção. Na situação de substituição as cognições centrais foram
homossexualidade, medo, preconceito, com destaque pela ordem de importância à
contaminação, contágio, doença e prática-sexual. Considerando a hipótese de zona muda na
explicitação da representação social em tela, foram identificados os elementos
homossexualidade, medo, prática sexual, promiscuidade, morte e uso de drogas.
Corroboraram a hipótese de zona muda, em contraposição à possibilidade de um efeito de
transparência representacional, a avaliação positiva dos sujeitos para os aspectos da situação
normal e o oposto para aqueles da substituição, a negação sucessiva dos elementos contra-
normativos nos diversos instrumentos empregados e as normas anti-discriminatórias em
relação às pessoas com HIV/AIDS e contra a homofobia. Identificou-se, igualmente, que os
depoentes consideraram que um enfermeiro tem baixa vulnerabilidade ao HIV no trabalho
hospitalar e alta em sua vida privada. Conclui-se que existe um processo de mudança nas
representações sociais do HIV/AIDS, com a introdução da possibilidade de convivência com
a doença e a diminuição da importância da morte. Por outro lado, evidenciou-se a possível
existência de significativas permanências, as quais consistiram nos elementos identificados
como provavelmente integrantes da zona muda nas representações sociais estudadas, com a
vinculação das pessoas com HIV/AIDS à homossexualidade, à prática sexual e
promiscuidade, ao uso de drogas e à morte, bem como a atitudes de preconceito e ao
sentimento de medo.
Palavras-chave: AIDS; Portador; Representações Sociais; Zona Muda; Enfermagem.
ABSTRACT
COSTA, T.L. Social Representations about people with HIV/AIDS among Nurses: a “mute
zone” study. 2007. 202 p. Dissertation (Masters in Nursing) – Faculty of Nursing, Rio de
Janeiro State University, Rio de Janeiro, 2007. Advisor: Full Professor Denize Cristina de
Oliveira
The purpose of this study was to analyze the content and structure of nurses’ social
representations about people with HIV/AIDS, considering their explicit and non-explicit
elements. This quali-quantitative, descriptive study, guided by the structural approach to
social representations, was conducted in two field stages at a university hospital in Rio de
Janeiro City. The first stage involved applying the free evocation and proxy techniques, using
the stimulus-term “person with HIV/AIDS”, in which 150 nurses responded “for themselves”
(the normal situation) and then as if they were “people in general” (the proxy situation). These
data were analyzed by the Student-t Test and by constructing four-box charts, assisted by
EVOC 2003 software. The second stage entailed applying a questionnaire to 30 nurses,
containing qualifying and Likert scale questions, using the “challenge” or “scrutiny”
technique, and on the risk of nurses’ being infected by HIV. The data were analyzed using
descriptive statistics. The results revealed various elements in the representation analyzed. In
the normal situation, the core cognitions were professional-care-precaution, health education
and treatment, while the elements help, controlling the disease, hope, family, drugs,
prevention and solidarity stood out for the importance attributed to them. Treatment was
confirmed as the core cognition, with prevention as possibly core. In the proxy situation, the
core cognitions were homosexuality, fear, prejudice, while contamination, contagion, disease
and sexual practice were prominent in order of importance. The “mute zone” hypothesis was
examined in making the social representation explicit: the elements identified were
homosexuality, fear, sexual practice, promiscuity, death and drug use. The mute zone
hypothesis was corroborated, rather than a possible representational transparency effect, by 1)
the subjects’ evaluating positively the aspects of the normal situation and negatively those of
the proxy situation; 2) their successive negation of the contra-normative elements in the
various instruments used and 3) the norms opposing discrimination against people with
HIV/AIDS and homophobia. Respondents were also observed to consider that nurses’
vulnerability to HIV is low in their hospital work and high in their private life. It was
concluded that a process of change has been underway in social representations of HIV/AIDS
since it has become possible to live with the disease and the importance of death is declining.
Meanwhile, the possibility of significant permanence was also revealed, consisting of
elements identified as probably belonging to the “mute zone” in the social representations
studied and linking people with HIV/AIDS to homosexuality, sexual practice and
promiscuity, drug use and death, as well as attitudes of prejudice and feelings of fear.
Key words: AIDS; Person with HIV/AIDS; Social Representations; Mute Zone; Nursing.
DEDICATÓRIA
À minha família, com a qual compartilho minhas dificuldades, incertezas, felicidades,
tristezas e conquistas e, sobretudo, meu porto seguro nos momentos mais necessários.
À minha sempre companheira Gláucia, em todas as situações de alegrias, tristezas,
conquistas, dificuldades, perdas, saúde, doença, reflexões, dúvidas, discussões, crescimento
profissional e acadêmico. É um grande prazer e privilégio partilhar contigo a minha
existência, da qual este trabalho constituiu-se em parte.
Às pessoas que vivem com a soropositividade ao HIV ou com AIDS e àquelas que, tal
como afirmam Mann, Tarantola e Netter (1993), morreram sem se deixar ser derrotados pela
AIDS.
AGRADECIMENTOS
Ao Deus que tornou possível a nossa existência e permite nosso constante crescimento ao
longo desse caminho: Vida!
À professora Denize Cristina de Oliveira, minha orientadora, pelos ricos momentos de
compartilhamento de conhecimentos, pelo estímulo e paciência constantes, pela dedicação e
pelo esforço em estar sempre presente em nossa caminhada no sentido do aprendizado da
prática da investigação científica e pela compreensão genuinamente humana nos momentos
mais difíceis, tornando possível a realização deste trabalho e, portanto, de nosso crescimento
acadêmico e profissional, de modo prazeroso e instigante. Como aluno do Programa de Pós-
Graduação em Enfermagem da Faculdade de Enfermagem da UERJ (PPGEnf-FENF/UERJ),
agradeço, ainda, pelo profundo envolvimento e preocupação com o desenvolvimento
científico da profissão, expresso, entre outros, na coordenação de professores e discentes
rumo à conquista da elevação do conceito do referido Curso na avaliação da CAPES.
Ao professor Celso Pereira de Sá, que nos acompanhou desde a fase de construção do projeto
desta pesquisa, sempre com muito zelo pela construção e produção de conhecimentos em
representações sociais, apontando para aspectos teóricos e metodológicos importantes no
decorrer do desenvolvimento do estudo.
Ao professor Pedro Humberto Faria Campos, pela solicitude em participar de nossa banca
examinadora, trazendo à baila elementos relevantes para a versão final do estudo.
Ao professor Antônio Marcos Tosoli Gomes, que, igualmente, nos acompanhou em toda a
trajetória de construção do estudo, na apresentação de pertinentes questões e reflexões na
consecução da pesquisa, bem como tendo demonstrado-se como um incentivador constante de
nosso crescimento acadêmico e profissional.
Ao professor Luiz Fernando Rangel Tura, pela participação como suplente em nossa banca
examinadora, com uma atenta leitura do estudo e apontamento de importantes pontos para seu
aperfeiçoamento.
À professora Sonia Acioli, com quem muito pudemos refletir e construir conhecimentos
acerca de Saúde Coletiva, Enfermagem e HIV/AIDS, certamente, com impacto na elaboração
deste estudo. Além disso, agradeço pelo permanente incentivo ao nosso crescimento.
Ao professor Sérgio Correa Marques, pelas valiosas conversas sobre as questões referentes ao
HIV/AIDS e representações sociais e pelo apoio e estímulo recebidos no decorrer de toda
trajetória e, mesmo, além do Curso de Mestrado.
Aos professores do PPGEnf-FENF/UERJ, pela constante dedicação no processo de formação,
numa demonstração de busca permanente pelo aperfeiçoamento da produção científica da
enfermagem e, por conseguinte, da melhoria da qualidade de vida das pessoas.
Aos pesquisadores e discentes integrantes do Projeto de Pesquisa “Representações e Memória
Profissional da Aids entre Enfermeiras no Brasil: um estudo bi-cêntrico Rio de
Janeiro/Florianópolis”, com os quais foi, também, possível discutir e aprofundar, nos
encontros as questões psicossociais do HIV/AIDS, em uma perspectiva interdisciplinar.
2
Aos nossos companheiros da turma de 2006 do Curso de Mestrado, em especial, à Ariádina,
Raquel e Suzana, com as quais foi possível compartilhar inesquecíveis momentos de
aprendizado e reflexões, bem como de apoio e incentivos no decorrer deste percurso.
À, hoje, mestre Noraísa Alves Pereira, com quem, também, compartilhei momentos de
reflexão e troca de experiências durante o primeiro ano do Curso de Mestrado.
À Ana Paula Munhen, que, como bolsista de pesquisa do Grupo de Pesquisa “A Promoção da
Saúde de Grupos Populacionais”, cooperou, de modo dedicado, na construção dos corpora
para a análise pelo software EVOC.
Aos companheiros (nossos professores, colegas mestrandos, pesquisadores e bolsistas de
pesquisa) do Grupo de Pesquisa “A Promoção da Saúde de Grupos Populacionais”, que me
receberam de modo caloroso, permitindo a vivência de um processo indubitavelmente único
de solidariedade, partilha de saberes e de trabalho.
Aos sujeitos desta pesquisa, que, em meio às atividades desenvolvidas no hospital,
concederam-me alguns momentos em prol da pesquisa em enfermagem, bem como da
melhoria da assistência à saúde das pessoas.
Aos colegas e à chefia de enfermagem da Clínica Médica do Hospital dos Servidores do
EstadoRJ, sempre incentivadores de nosso crescimento profissional.
Aos secretários do PPGEnf-FENF/UERJ, Fabíola, Marcelo e Renan, que com dedicação e
responsabilidade nos atenderam gentilmente em diversos momentos desta trajetória.
Aos meus pais Luiz e Neiva e aos meus irmãos Vinnicius e Rafael, pela permanente
cumplicidade e amor em minha vida.
À minha, também, família, Sr. Aldo, “Tia” Zélia, Patrícia e André, pelo apoio incondicional,
amizade e acolhimento em todos os momentos.
Aos meus tios Carlos e Marlene e aos meus primos Leonardo e Thiago, que me acolheram em
seu lar durante o Curso de Graduação e parte do Curso de Mestrado.
À professora e amiga Ana Lucia Jezuíno da Costa, que soube receber-me na Coordenação de
Cursos de Enfermagem da ETIS, como estagiário durante o Curso de Graduação em
Enfermagem, e ensinar-me importantes lições, quando o futuro não parecia tão certo.
À professora Kaneji Shiratori, com quem teve início, no Curso de Graduação em
Enfermagem, a minha oportunidade de valioso aprendizado em investigação científica.
Aos professores Osnir Claudiano da Silva Júnior e Almerinda Moreira, com os quais pude,
outrossim, muito aprender durante o Curso de Graduação em Enfermagem.
Pensar sobre a doença! Tranqüilizar a imaginação do doente, para
que ao menos ele não tenha de sofrer, como tem acontecido até agora,
mais com o pensar sobre a sua doença do que com a doença em si
isso, a meu ver, seria alguma coisa! Seria muita coisa!
Friedrich Nietzsche
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
I.
O HIV/AIDS: ASPECTOS BIOMÉDICOS, EPIDEMIOLÓGICOS E
PSICOSSOCIAIS
I. 1
ELEMENTOS CONCEITUAIS E CAMINHOS PERCORRIDOS PELA EPIDEMIA DO
HIV/AIDS
I. 2
AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DO HIV/AIDS ENTRE PROFISSIONAIS DE
SAÚDE
II.
A TEORIA DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS
II. 1
ASPECTOS CONCEITUAIS E A TEORIA GERAL DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS
II. 2
A TEORIA DO NÚCLEO CENTRAL E O CONCEITO DE ZONA MUDA DAS
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS
III.
TRAJETÓRIA METODOLÓGICA
III. 1
PRIMEIRA FASE DO ESTUDO
III.1.1
TÉCNICA DE EVOCAÇÕES LIVRES E DE SUBSTITUIÇÃO
III.1.2
ANÁLISE DAS EVOCAÇÕES LIVRES EM SITUAÇÃO NORMATIVA NORMAL E NA
SUBSTITUIÇAO
III.2
SEGUNDA FASE DO ESTUDO
III.2.1
QUESTIONÁRIO DE CARACTERIZAÇÃO
III.2.2
ESCALA DE LIKERT
III.2.3
MISE EN CAUSE OU TÉCNICA DO QUESTIONAMENTO
III.2.4
ANÁLISE DO QUESTIONÁRIO DE CARACTERIZAÇÃO
III.2.5
ANÁLISE DA ESCALA DE LIKERT
III.2.6
ANÁLISE DA MISE EN CAUSE OU TÉCNICA DO QUESTIONAMENTO
III.2.7
SÍNTESE DO PROCEDIMENTO METODOLÓGICO DE COLETA DE DADOS E
CONSTRUÇÃO DOS INSTRUMENTOS
IV.
ELEMENTOS EXPLÍCITOS E ESCONDIDOS NAS
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS SOBRE A PESSOA COM HIV/AIDS:
A PERSPECTIVA DOS ENFERMEIROS
IV. 1
CARACTERIZAÇÃO DOS SUJEITOS DA PESQUISA
IV.2
AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS ENFERMEIROS ACERCA DO PORTADOR
DO HIV/AIDS: CONTEÚDO, ESTRUTURA E IDENTIFICAÇÃO DOS ELEMENTOS
DA ZONA MUDA
IV.2.1
ESTRUTURA DA REPRESENTAÇÃO SOCIAL SOBRE O PORTADOR DO HIV/AIDS
EM CONTEXTO NORMATIVO DE COLETA DE DADOS
IV.2.2
ESTRUTURA DA REPRESENTAÇÃO SOCIAL SOBRE O PORTADOR DO HIV/AIDS
EM SITUAÇÃO DE SUBSTITUIÇÃO DE COLETA DADOS
IV.2.3
COMPARAÇÃO DOS CONTEÚDOS E DAS HIPÓTESES ESTRUTURAIS DAS
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS ACERCA DO PORTADOR DE HIV/AIDS EM
SITUAÇÃO NORMATIVA E DE SUBSTITUIÇÃO
IV.3
AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS ENFERMEIROS ACERCA DO PORTADOR
DO HIV/AIDS: TESTES DE VERIFICAÇÃO DOS ELEMENTOS CENTRAIS E DA
ZONA MUDA
IV.3.1
RESULTADOS E DISCUSSÕES DOS DADOS OBTIDOS COM A APLICAÇÃO DO
QUESTIONÁRIO DE CARACTERIZAÇÃO
IV.3.2
RESULTADOS E DISCUSSÕES DOS DADOS OBTIDOS COM A APLICAÇÃO DA
ESCALA DE LIKERT
IV.3.3
RESULTADOS E DISCUSSÕES DOS DADOS OBTIDOS COM A APLICAÇÃO DA MISE
EN CAUSE
IV.3.4
RESULTADOS E DISCUSSÕES DOS DADOS OBTIDOS ACERCA DA PERCEPÇÃO DOS
SUJEITOS ACERCA DA AMEAÇA DE INFECÇÃO PELO HIV ENTRE ENFERMEIROS
V.
CONCLUSÕES
REFERÊNCIAS
APÊNDICES
APÊNDICE A - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
(1ª FASE)
APÊNDICE B - QUESTIONÁRIO DE CARACTERIZAÇÃO DOS SUJEITOS DA
PESQUISA
APÊNDICE C - INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS DA FASE 1 DA
PESQUISA- EVOCAÇÕES LIVRES
APÊNDICE D - DICIONÁRIO COM AS PADRONIZAÇÕES DAS EVOCAÇÕES
PARA A SITUAÇÃO NORMAL E SUBSTITUIÇÃO
APÊNDICE E - RELATÓRIO GERADO PELO PROGROMA RANGMOT DO EVOC
2003 PARA O CORPUS UNIFICADO (SITUAÇÃO NORMAL E SUBSTITUIÇÃO)
APÊNDICE F - COMPARAÇÃO (COMPLEX) ENTRE OS CORPORA DA SITUAÇÃO
NORMAL E DE SUBSTITUIÇÃO
APÊNDICE G - RELATÓRIO DO PROGRAMA RANGMOT PARA O CORPUS DAS
EVOCAÇÕES NA SITUAÇÃO NORMAL
APÊNDICE H - RELATÓRIO DO PROGRAMA RANGMOT PARA O CORPUS DAS
EVOCAÇÕES NA SITUAÇÃO DE SUBSTITUIÇÃO
APÊNDICE I - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (2ª FASE)
APÊNDICE J - INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS DA FASE 2 DA PESQUISA
APÊNDICE L - DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS SUJEITOS À ESCALA DE
LIKERT.
APÊNDICE M GRÁFICOS COM A DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS
SUJEITOS À ESCALA DE LIKERT.
13
INTRODUÇÃO
Esta dissertação vincula-se ao projeto de pesquisa de cooperação internacional Brasil
França, denominado: “Representações e Memória Profissional da Aids entre Enfermeiras no
Brasil: um estudo bi-cêntrico Rio de Janeiro/Florianópolis”, o qual tem como escopo o estudo
das representações sociais da AIDS elaboradas por enfermeiras em dois momentos históricos
do desenvolvimento da epidemia do HIV/AIDS no país a partir de 1982 e após 1998. A
Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS) surgiu, no início da década de 80, e tornou-
se um importante marco da passagem do século XX para o XXI, quando se pensava que as
doenças infecto-contagiosas estavam sob controle da medicina, sendo as devastadoras e
incontroláveis epidemias, imagens de um passado longínquo (GALVÃO, 2000; MANN;
TARANTOLA; NETTER, 1993; MARQUES, M., 2002; NASCIMENTO, 2005).
A descrição de um tipo incomum de pneumonia, causada por Pneumocistis carinii
associada, basicamente, a condições de imunodepressão grave, em um grupo de cinco
homossexuais sem antecedentes patológicos, em 1981, em Los Angeles, nos Estados Unidos
da América (EUA), atraiu a atenção da comunidade científica para esta entidade mórbida.
Além disso, conforme artigo publicado no Morbidity and Mortality Weekly Report
1
(MMWR), um boletim oficial do Center for Disease Control and Prevention
2
(CDC), destes
cinco primeiros casos, dois já haviam falecido (CDC, 1981).
Ainda em 1981, como descreve Nascimento (2005), outros artigos foram publicados
em meios médicos de informação, como o Lancet, New England Journal of Medicine e em
números subseqüentes do MMWR. Nestes, foram relatados e discutidos casos semelhantes da
nova doença, sem um conceito clínico específico e com várias denominações, carregadas de
aspectos morais, como Pneumonia Gay, Câncer Gay, Síndrome Gay ou, mesmo, Gay Related
Immune Deficiency (GRID) (Imunodeficiência Ligado aos Gays).
A partir de um artigo de Laurence Altman, cronista de medicina do New York Times,
publicado em julho deste mesmo ano, o público tomou conhecimento da emergência deste
novo agravo como “um fenômeno patológico curioso que intriga os especialistas e que
começa a assustar os gays de Nova York”. Então, esta nova e misteriosa doença relacionada
aos homossexuais masculinos jovens, que os levava à morte, constituiu-se em presença
freqüente na mídia em geral (NASCIMENTO, 2005).
1
Tradução: Relatório Semanal e Morbidade e Mortalidade.
2
Tradução: Centro de Controle e Prevenção de Doenças.
14
Conforme asseveram Barbará, Sachetti e Crepaldi (2005), a suposta seletividade do
agravo por um dado grupo ou um certo modo de vida gerou uma primeira representação para
o fenômeno. Na homossexualidade poderia estar sua origem, tornando os homossexuais,
epidemiologicamente, um “grupo de risco”, terminologia que marcaria de modo indelével a
construção social e histórica da AIDS.
Em 1982, ainda nos EUA, surgiram casos da doença entre hemofílicos, usuários de
drogas injetáveis (UDI), pessoas que receberam transfusão sangüínea, como hemofílicos
heterossexuais e haitianos, os quais, também, passaram a ser identificados como grupos de
risco”. Este fato levou a proposição e a divulgação da expressão AIDS pelo CDC (SÁ;
COSTA, 1994). A doença surgia e permanecia, portanto, como uma “estranha”, acometendo
pessoas “estranhas” (NASCIMENTO, 2005), às quais, logo, se somaram as prostitutas e
travestis.
A partir desta configuração inicial, ainda em 1982, foram identificados três modos de
transmissão: sangue; mãe para o filho; e por meio da relação sexual. Em 1983, foi identificado
o agente etiológico da AIDS: um retrovírus, sendo denominado por um comiinternacional
que avaliou o caso de Human Immunodeficiency Vírus (Vírus da Imunodeficiência Humana -
HIV) (GALVÃO, 2002; NASCIMENTO, 2005).
Como afirma Jodelet (2001), até então, com a ausência de referências médicas, houve
um favorecimento a uma qualificação social da doença e, antes que as pesquisas biológicas
trouxessem esclarecimentos sobre a natureza da AIDS, as pessoas elaboraram suas teorias
apoiadas nos dados que dispunham sobre seus atingidos e os seus vetores.
Neste processo, surgiram diversas metáforas da AIDS, tal qual apontam Sontag (2007)
e Malcolm et al. (1998): AIDS como morte (por meio de imagens como a grande ceifadeira);
AIDS como horror (gerando temor em relação aos seus atingidos); AIDS como crime (com
referência aos “culpados”, os desviantes das normas sociais, e os “inocentes”, as pessoas em
geral, as mulheres monogâmicas e crianças); AIDS como punição (pelo comportamento
desviante); AIDS como o outro (vista como algo relacionado aos que estão à parte); AIDS
como guerra (como algo a ser combatido a qualquer custo, sendo justificadas todas as
estratégias de enfrentamento pelo Estado e pelas pessoas); AIDS como vergonha (ocasionada
pela degradação física e moral que provoca); e AIDS como poluição (em referência ao seu
modo sexual de transmissão, ligado ao imaginário social sobre a sífilis).
Esta dimensão e implicações morais trazidas à baila pela nova doença é tão
significativa que levou, em 1987, Jonathan Mann, Diretor Fundador do Programa Global de
AIDS da Organização Mundial da Saúde (OMS), à proposição da existência de, pelo menos,
15
três fases da epidemia em qualquer comunidade. Tais fases seriam tão distintas que poderiam
ser descritas mesmo, como epidemias diferentes, embora intimamente relacionadas
(PARKER; AGGLETON, 2006).
A primeira seria a infecção pelo HIV, geralmente, silenciosa e não notada, a qual se
desenvolve, com freqüência, ao longo de muitos anos sem ser amplamente percebida ou
compreendida (PARKER; AGGLETON, 2006).
A segunda fase consistiria na epidemia de AIDS, propriamente dita, a síndrome de
doenças infecciosas ou de tipos de tumores oportunistas que podem ocorrer devido à infecção
pelo HIV e sua ação sobre o sistema imunológico, depois de determinado tempo, em geral
alguns anos (PARKER; AGGLETON, 2006).
Finalmente, a denominada terceira epidemia, considerada potencialmente a mais
explosiva, seria a das respostas sociais, culturais, econômicas e políticas à AIDS, que têm se
caracterizado por níveis excepcionalmente altos de estigma, discriminação e, também,
negação coletiva. Trata-se, para Mann, de uma questão tão central quanto a doença em si, com
conseqüências tão ou mais deletérias e sinérgicas quanto a epidemia do HIV e da AIDS
(PARKER; AGGLETON, 2006).
Alguns autores, ao analisarem a resposta global ao HIV/AIDS, afirmam que a mesma
configurou-se de forma inadequada e descoordenada, existindo uma dicotomia fundamental
entre o relativo sucesso, em nível individual e da comunidade, acompanhado da ameaça de
um fracasso coletivo, em nível nacional e internacional. Para exemplificar o retardo global na
resposta à epidemia, de 37 países pesquisados no trabalho da “Coalizão Global de Políticas
contra a AIDS”, intitulado “A AIDS no mundo”, em 13 deles, até 1993, o chefe de Estado ou
governo não havia feito declarações públicas sobre a AIDS. Em outros 13 países, a primeira
declaração sobre a AIDS do chefe de Estado ou governo ocorreu em 1989 ou mais tarde.
No Brasil, o primeiro pronunciamento do Presidente da República se deu, apenas, em de
dezembro de 1991, por ocasião do Dia Mundial de Luta contra a AIDS (MANN;
TARANTOLA; NETTER, 1993).
Beneficiando-se da ausência ou limitações para a elaboração de respostas concretas
por parte do Estado, a epidemia apresenta, atualmente, números expressivos, com
aproximadamente 40 milhões de pessoas vivendo com o HIV no mundo, das quais 2 milhões,
na América Latina e no Caribe, até dezembro de 2005 (UNAIDS, 2006). No Brasil, de um
quantitativo inicial de 10 casos, em 1982, chegou-se, até junho de 2006, à notificação de
433.067 casos de AIDS. Soma-se, também, no país, de 1980 a 2005, um total de 183.074
óbitos pelo agravo, com a estimativa da existência, em 2004, de 593.787 pessoas infectadas
16
(BRASIL, 2006d). Consiste, portanto, em um relevante desafio para o campo da Saúde
Pública (BASTOS; HACKER, 2006; MANN; TARANTOLA; NETTER, 1993; OLIVEIRA
et al., 2007a).
A emergência da epidemia do HIV/AIDS, com seus respectivos significados,
repercutiu, também, sobre os serviços e profissionais de saúde (GIR et al., 2000), entre os
quais, além das denominações referidas anteriormente, esta “doença estranha” foi chamada,
em hospitais da Califórnia e Nova Iorque, nos EUA, de Wrath of God Syndrome (Wogs), ou
seja, Síndrome da Ira de Deus (TREICHLER, 1988).
Como asseveram Gir et al. (2000), evidencia-se, ainda na atualidade, não obstante os
avanços no conhecimento e terapia no campo do HIV/AIDS, que muitos profissionais de
saúde convivem com a desinformação, o preconceito e atitudes inadequadas em relação à
doença e às pessoas que convivem com a mesma. Apontam, também, para o fato de que os
profissionais devem estar preparados sob dois aspectos: proteção profissional e condutas
pautadas em princípios éticos e humanitários, não permeadas pelo preconceito e pela
estigmatização.
Neste sentido, Giami et al. (1997), se interessaram em estudar as representações de
enfermeiras, na França, em relação à AIDS, bem como suas implicações para a sua vida
profissional, na interação com seus portadores e com outros pacientes, e para a vida pessoal.
Na perspectiva desses autores, o desenvolvimento da epidemia pegou desprevenidos os
hospitais e os profissionais que nele atuavam, uma vez que não dispunham de guias para a
ação, o que acabou por propiciar a constituição de um conhecimento próprio à enfermagem.
Este saber envolvia esquemas de pensamento científico e técnico, mais ou menos pertinentes,
e freqüentemente herdados de uma experiência anterior arcaica, com representações e
fantasias aterradoras, em continuidade com aquelas da população em geral.
As enfermeiras, conforme afirmam Giami et al. (1997), são e poderiam ser ainda
mais alvos preferenciais e espaços privilegiados do trabalho de prevenção, bem como de
estudos. Isto porque, certos parâmetros como a informação, sensibilização e o contato
conferem a tal grupo profissional um relativo avanço em relação à população em geral,
permitindo, de certo modo, antecipar, com alguma credibilidade e, num prazo relativamente
reduzido, os ajustamentos psicológicos, afetivos e cognitivos no que concerne ao HIV/AIDS e
aos portadores.
Nesta perspectiva, Fox, Aiken e Messikomer (1990), ao discutirem as implicações da
AIDS para a profissão de enfermagem, falam do lugar privilegiado ocupado por esta última,
17
tendo em vista que os enfermeiros cuidam das pessoas em meio à saúde, dor, perdas, medo,
desfiguração, morte, desafios, crescimento, nascimento e transição, sobre uma base íntima.
Asseveram também, as referidas autoras, que a AIDS é única entre as doenças
contemporâneas, pois é, simultaneamente, aguda, crônica, progressiva, infecciosa, fatal e,
apesar das terapias farmacológicas, para grande parte dos problemas que acometem pessoas
com a doença, não existem substitutivos para o lidar, formas de cuidados físicos e
interpessoais, face a face. Tais aspectos, constituem o centro da enfermagem, em relação aos
quais se destaca entre os profissionais de saúde (FOX; AIKEN; MESSIKOMER, 1990).
Assim, entre as diversas pesquisas de caráter psicossocial desenvolvidas em relação às
questões relacionadas ao HIV/AIDS, quantitativo significativo refere-se, igualmente, à
abordagem de suas relações com os profissionais de enfermagem, em diferentes loci de
atuação, como evidenciado em levantamentos bibliográficos efetivados por Oliveira et al.
(2006), Acioli et al. (2006) e Marques, Tyrrel e Oliveira (2006).
Além disso, tal qual identificado por tais levantamentos, houve, entre as pesquisas,
também, um destaque para a utilização do aporte oriundo da teoria das representações sociais
(TRS) como referencial (ACIOLI et al., 2006; MARQUES; TYRREL; OLIVEIRA, 2006;
OLIVEIRA et al., 2006). Isto porque, dentre outros aspectos, a TRS permite explicar as
relações estabelecidas entre o universo individual e as condições sociais nas quais os sujeitos
interagem, permitindo resgatar, na situação de pesquisa, um contexto mais próximo daquele
vivenciado por profissionais e por atores expostos ao HIV, em seus cotidianos de vida e
trabalho (OLIVEIRA et al., 2007a).
Os estudos efetivados à luz desta teoria contribuem, portanto, para a identificação de
uma “teoria do senso comum” constituída a partir das diversas dimensões do HIV/AIDS,
permitindo compreender as diferentes formas dos grupos sociais lidarem com o fenômeno, em
contextos e momentos distintos. Neste ponto, é importante salientar que
[...] se desejamos transformar as práticas de saúde, é necessário pensá-las em sua expressão
objetiva e subjetiva, uma vez que as estratégias de intervenção em saúde são efetivadas por
pessoas, que agem segundo as suas representações do real e também segundo as suas
representações do possível. Transformar as ações, portanto, significa, transformar as
representações que as orientam (OLIVEIRA, 2005, p.137).
A TRS teve seu surgimento a partir da pesquisa “La psychanalyse, son image et son
public”, desenvolvida e publicada, em 1961, por Serge Moscovici, o qual as define como
[...] um conjunto de conceitos, proposições e explicações originado na vida cotidiana no curso
de comunicações interpessoais. [...] são o equivalente, em nossa sociedade, dos mitos e
sistemas de crenças das sociedades tradicionais; podem também ser vistas como a versão
contemporânea do senso comum (MOSCOVICI, 1981 apud SÁ, 2002, p. 31).
18
Desta forma, a TRS é considerada como a “grande teoria”, complementada por três
abordagens complementares, entre as quais, a teoria do núcleo central, construída com o
propósito de tornar a grande teoria mais heurística para a prática social e para a pesquisa (SÁ,
2002).
Jean-Claude Abric, propositor da teoria do núcleo central ou abordagem estrutural das
representações sociais, em 1976, a partir de sua tese de doutorado, afirma que existe uma
organização interna nas representações sociais, com um núcleo que lhe confere o significado e
determina as relações entre seus elementos (SÁ, 2002).
Em trabalhos recentes, ABRIC (2003b, 2005) assinala a existência de uma região não
explicitada das representações sociais caracterizadas nas pesquisas. Esta região não
explicitada foi, então, inicialmente denominada de zona muda (em francês, zone muette) e
Flament, Guimelli e Abric (2006) sugeriram, posteriormente, o termo zona mascarada (em
francês, zone masquée).
Esta região não explicitada das representações sociais, destaca Abric (2005), não
consistiria no recalcado, no inconsciente da teoria psicanalítica, estando disponível na
consciência dos sujeitos, que, devido às normas sociais em jogo no contexto, não a
verbalizam.
Este fenômeno aconteceria, sobretudo, para determinados tipos de objetos mais
sensíveis, fortemente marcados por valores e normas sociais, entre os quais, pode-se dizer,
estão incluídas questões referentes ao HIV/AIDS com suas diversas metáforas, conforme
discutido por Sontag (2007), numa peculiar relação entre doença e comportamento sexual
(GALVÃO, 2000).
É importante, neste ponto, lembrar que as representações sociais são um guia para a
ação dos atores sociais (ABRIC, 2000) e, deste modo, ainda que alguns de seus elementos não
sejam explicitados, consistem em norteadores para as práticas cotidianas.
Assim, considerando a atuação dos profissionais enfermeiros em relação a atividades
de prevenção da transmissão do HIV/AIDS, bem como de atendimento à pessoas que
convivem com o HIV ou desenvolveram a AIDS, pensamos ser importante perguntar: como
estes profissionais representam a pessoa soropositiva ao HIV ou com AIDS? Existem
elementos escondidos ou não explicitados (zona muda ou mascarada) na representação desses
sujeitos em relação às pessoas vivendo com HIV/AIDS? Quais elementos seriam estes? Como
se situam os enfermeiros em relação à estrutura das representações sociais sobre as pessoas
que vivem com o HIV/AIDS?
19
Com base em tais inquietações, apresentamos como objeto de estudo desta pesquisa as
representações sociais de enfermeiros acerca da pessoa soropositiva ao HIV ou com AIDS,
considerando seus elementos explicitados e não explicitados (zona muda ou mascarada)
Definimos como objetivo geral analisar o conteúdo e a estrutura das representações sociais de
enfermeiros acerca da pessoa soropositiva ao HIV/AIDS, considerando seus elementos
explicitados e não explicitados (zona muda ou mascarada).
Os objetivos específicos são os seguintes: identificar os elementos constituintes e sua
estruturação nas representações sociais acerca da pessoa soropositiva ao HIV ou com AIDS
entre enfermeiros; verificar a existência de elementos de uma zona muda nas representações
sociais de enfermeiros acerca da pessoa soropositiva ao HIV ou com AIDS; e discutir as
implicações da existência de uma zona muda nas representações sociais de enfermeiros acerca
da pessoa que vive com o HIV/AIDS para as suas práticas profissionais.
Um primeiro aspecto que torna relevante a realização deste estudo é o fato de as
representações sociais, no campo da saúde, tal qual afirmam Oliveira e Rodrigues (2001),
encontrarem-se, freqüentemente, voltadas para a intervenção, sobretudo no campo da
enfermagem. O senso comum, para o reconhecimento do qual a teoria das representações
sociais, e mais especificamente, sua abordagem estrutural têm contribuído, coloca-se como
ponto de partida para os processos de intervenção nas questões de saúde ou, mais
particularmente, para o processo de cuidar em enfermagem. Nesse sentido, a identificação de
elementos não explicitados, que ficariam escondidos em pesquisas sobre as representações
sociais com metodologias convencionais, consiste em uma forma importante de melhor
conhecer uma realidade social para a qual se poderá, posteriormente, propor ações.
É importante lembrar que, como assinalam (2002) e Abric (2000), as
representações sociais são orientadores das ações dos atores sociais em relação a determinado
objeto. Tratando-se de enfermeiros, este estudo permite desvelar elementos de suas
representações sociais em relação às pessoas soropositivas ao HIV ou com AIDS que, embora
não tenham surgido nas investigações tradicionais, norteiam as suas ações nas práticas
profissionais preventivas, de assistência e interação com os doentes cuidados.
Assim, a verificação da existência de elementos não explicitados ou de uma zona
muda nas representações sociais destes profissionais relacionadas às pessoas que vivem com
HIV ou AIDS, pode constituir-se em um importante instrumento para a melhoria da qualidade
da assistência prestada às últimas, e também contribuir para a constituição de respostas para a
diminuição de vulnerabilidades individuais e sociais relacionadas ao HIV/AIDS.
20
Neste ponto, ressalta-se que, de acordo com Abric (2005), a zona muda nas
representações sociais tendem a ocorrer, sobretudo, em relação a alguns objetos sociais mais
sensíveis, marcados fortemente por valores e normas sociais, o que, acredita-se, incluem as
questões referentes ao HIV/AIDS. Nascimento (2005) afirma que nunca uma doença trouxe
tantas implicações para a sociedade, passando por questões mais subjetivas, como
sexualidade, sexo, desejo, atitude, até aquelas mais objetivas, como negociação de custo de
medicamentos, quebra de patentes e turismo mundial.
Dado o caráter recente do desenvolvimento da proposta de existência e estudo da zona
muda das representações sociais, observa-se ainda número reduzido de publicações sobre a
temática, pelo que se acredita, igualmente, ser importante a efetivação desta investigação.
Além disso, a exploração desta nova proposição da abordagem estrutural das
representações sociais, contribui para a compreensão da complexa relação estabelecida entre
as representações e práticas sociais, em que algumas vezes se observa determinadas
defasagens, conforme apontado por Rouquette (1998), Abric (2005) e Herzlich (1991). Deste
modo, pode-se pensar que a existência de determinados elementos não explicitados, sobretudo
se centrais na representação social, podem corresponder a certas práticas, algumas vezes,
vistas como contraditórias.
Finalmente, pode-se dizer que este estudo poderá trazer uma contribuição
metodológica, ainda que preliminar, ao campo de estudo da teoria das representações sociais,
a qual, como constataram e Arruda (2000), tem se mostrado pertinente para a abordagem
de objetos na área da saúde, principalmente, na enfermagem. Conforme afirma Abric (2003b;
2005), se a existência de uma zona muda para certos objetos nos parece indiscutível,
permanece um problema fundamental: o de descobrir como colocar em funcionamento novos
instrumentos que permitam demarcá-la e evidenciá-la. Assim,
[...] se esta noção se mostrar essencial, ela abrirá um campo de pesquisa, tanto teórico quanto
metodológico, que permitirá à teoria das representações sociais conhecer desenvolvimentos
inovadores (ABRIC, 2005, p.34).
Considerando o exposto, serão apresentados, seguidamente, os conceitos, trajetória e
as representações sociais do HIV/AIDS, bem como as definições, abordagem estrutural e a
zona muda das Representações Sociais.
21
I. O HIV/AIDS: ASPECTOS BIOMÉDICOS, EPIDEMIOLÓGICOS E PSICOSSOCIAIS
I.1 ELEMENTOS CONCEITUAIS E CAMINHOS PERCORRIDOS PELA EPIDEMIA DO
HIV/AIDS
Neste subcapítulo serão apresentados alguns elementos conceituais e históricos do
desenvolvimento da epidemia da AIDS, tendo em vista propiciar um maior entendimento
acerca do contexto de elaboração das representações sociais.
O HIV consiste em um retrovírus, da família Retroviridae e subfamília dos lentivírus,
compreendendo dois tipos - HIV-1 e HIV-2 - sendo o primeiro mais comum no Brasil. Sua
transmissão pode ocorrer por meio dos fluidos trocados no ato sexual, sangue e
hemoderivados, e também de mãe para o filho nos períodos intraparto e perinatal, ou ainda
através do aleitamento materno (FAUCI; LANE, 2006).
A doença causada pelo HIV é caracterizada por uma imunodepressão grave, em
conseqüência de deficiência quantitativa e qualitativamente progressiva de um subgrupo de
células do sistema imune, qual seja, o de linfócitos T, também denominadas de células T
auxiliares (AOKI, 2001).
Dado o papel fundamental exercido por tais linfócitos na promoção da resposta imune,
a diminuição de seu quantitativo para valores próximos e, sobretudo, abaixo de 200/mm
3
de
sangue, gera um estado de imunodeficiência (AIDS), com o risco do desenvolvimento de
infecções oportunistas e neoplasias no indivíduo infectado (FAUCI; LANE, 2006).
É importante ressaltar que, entre a ocorrência da infecção do sujeito pelo vírus até a
manifestação do estado de imunodeficiência, ou seja, da doença propriamente dita, decorrem,
em geral, alguns anos, durante os quais a pessoa portadora do vírus permanece em estado
assintomático, embora com atividade de replicação do HIV e possibilidade de sua transmissão
(FAUCI; LANE, 2006).
A doença, tal qual citado em tópico anterior, teve seus primeiros casos identificados
em 1981, em Los Angeles, nos EUA, tratando-se da ocorrência de um tipo incomum de
pneumonia, causada por Pneumocistis carinii, em cinco jovens homossexuais, dos quais dois
já haviam falecido, quando da publicação do fato pelo CDC (CDC, 1981).
Conforme afirma Nascimento (2005), mesmo antes da publicação desses casos pelo
CDC, esta nova entidade clínica era notada em hospitais da Califórnia e de Nova Iorque,
desde os últimos anos da década de 1970, sendo, conforme Treichler (1988), denominada
pelos profissionais de saúde de tais instituições de Síndrome da Ira de Deus.
22
Além das infecções por Pneumocistis carinii, foram, também, relatadas outras
doenças, que geralmente acometiam pessoas idosas ou em estado de imunodepressão, como
toxoplasmose cerebral, herpes simples, candidíase oral e esofagiana, criptococose no sistema
nervoso central e sintomas como febre persistente, linfadenopatia, associados ou não ao
Sarcoma de Kaposi
3
(SK). Uma nota do boletim do CDC, publicada em 1981, sinalizou,
então, para a freqüência e malignidade pouco usual do SK e recomendou à comunidade
médica, atenção para a ocorrência destas manifestações em homossexuais (NASCIMENTO,
2005). Assim, formulava-se, à época, uma hipótese segundo a qual haveria uma correlação
entre certos aspectos das práticas homossexuais e este tipo de pneumonia nesta população
(OPPENHEIMER, 1988).
Neste mesmo período, reforçando esta lógica, em outros artigos publicados em meios
médicos e em boletins ulteriores do CDC, nos EUA, foram relatados e discutidos casos com
características semelhantes, ainda sem um conceito preciso, porém com diversas
denominações permeadas por conotações morais, como “pneumonia gay”, “câncer gay”,
síndrome gay” ou “Imunodeficiência Ligada aos Homossexuais” (NASCIMENTO, 2005).
Neste sentido, Oppenheimer (1988) destaca que a associação entre homossexualidade
e a deficiência imune se deu tendo por base uma amostra muito reduzida - apenas cinco casos
caracterizando um processo de generalização sem base empírica.
Deste modo, Giami et al. (1997), afirmam que, desde o início, o discurso e a
investigação se colocaram sob um feixe de hipóteses que, muito rapidamente, funcionou
como um estereótipo. Ilustram este fato a partir de Grmek (1989), o qual descreve que, à
época da emergência da epidemia, a maior parte dos epidemiologistas americanos negava a
possibilidade de transmissão heterossexual, constituindo-se em um poderoso obstáculo
epistemológico. Constituiu-se, a partir daí, a noção epidemiológica de “grupo de risco” para a
AIDS, o qual seria representado pelos homossexuais masculinos, sobretudo jovens
(GALVÃO, 2000; PARKER; AGGLETON, 2006).
Como aponta Herzlich (1992), a ambigüidade na enunciação dos mecanismos de
transmissão “câncer gay” ou síndrome homossexual induziu a fazer da homossexualidade
o único conteúdo explicativo da doença, desconsiderando a pluralidade dos meios sociais a
que pertencem os homossexuais e a diversidade dos modos de vida pelos quais estruturam sua
identidade.
3
Formação neoplásica que acomete a pele e, em pessoas com AIDS, pode atingir, também, órgãos vitais, como
os pulmões (FAUCI; LANE, 2006).
23
No Brasil, circulavam nos meios científicos os mesmos discursos. Esse fato pode ser
evidenciado em entrevista à imprensa dada pelo Coordenador da Escola Paulista de Medicina,
em 1985, justificando uma maior incidência de AIDS entre os homossexuais do seguinte
modo:
[...] a imunodepressão é conseqüência da própria maneira como os homossexuais se
relacionam sexualmente. A relação anal é imunodepressora. O esperma introduzido no
homossexual inocula antígenos que desequilibram o sistema de defesa do organismo que o
recebe (NASCIMENTO, 2005, p.89).
De mesmo modo, um professor e médico do Hospital Gaffrée e Guinle, um dos
primeiros a receber pacientes com AIDS no Rio de Janeiro, também em 1985, reforçando a
idéia da ligação do agravo com as práticas sexuais de homossexuais, vistas de modo “não
natural” em sua relação com o sêmen, explicava que:
[...] nas mulheres, o sêmen não provoca deficiência imunológica, pois a mucosa vaginal está
naturalmente preparada para recebê-lo. Biologicamente, a mulher foi preparada para receber
o esperma. O homem não [...] evidências de que os homens estão mais propensos a terem
deficiência imunológica do que as mulheres (NASCIMENTO, 2005, p.89).
Com esta perspectiva, portanto, ainda em julho de 1981, próximo ao período do
primeiro boletim do CDC, é apresentada ao público esta nova entidade mórbida, nos seguintes
termos: “um fenômeno patológico curioso que intriga os especialistas e começa a assustar os
gays de Nova Iorque”. Tratava-se de um artigo publicado, como outrora mencionado, no New
York Times (GRMEK, 1989).
Pode-se dizer que, em outros países o novo agravo foi apresentado à sociedade a partir
da mesma lógica assumida pela imprensa norte-americana. Apenas para citar alguns, no
Brasil, a primeira notícia foi veiculada, também em 1981, pelo Jornal do Brasil, com o título
“Câncer em homossexuais é pesquisado nos EUA” (GALVÃO, 2000, 2002). No mesmo ano,
no jornal O Globo, foi publicada, segundo Nascimento (2005, p.86), a seguinte notícia:
Homossexuais masculinos, em particular os viciados em drogas, estão sujeitos a uma
enfermidade misteriosa, que reduz a imunidade natural às infecções e, com freqüência, leva à
morte. A síndrome, recém-descoberta, é tão nova que ainda não recebeu denominação [...].
Este período configurou o que Galvão (2000) e Daniel e Parker (1991) denominam de
“mal de folhetim”, pois as notícias chegaram antes mesmo dos primeiros casos serem
identificados neste país.
Na França, segundo Herzlich e Pierret (1988), referidas por Camargo (2003), na
grande imprensa, a AIDS foi citada pela primeira vez em 1982, no Libération como
“misterioso câncer dos homossexuais americanos”, e no Le Quotidien como “uma doença
desconhecida ameaça os homossexuais”. Três meses depois destas notícias, a doença surgiu
24
na televisão francesa, em telejornal de horário nobre, em que o professor Saimot falou sobre o
“câncer dos homossexuais”.
Após, constatou-se a ocorrência da doença entre usuários de drogas injetáveis,
hemofílicos e haitianos, de modo independente, sem relação com as práticas sexuais. Esta
constatação fez com que a AIDS fosse, também, conhecida como doença dos quatro H (em
alusão aos Homossexuais, Heroinômanos, Hemofílicos e Haitianos), nos EUA, na década de
1980 (NASCIMENTO, 2005). Além disso, foram atingidos nos primórdios da epidemia,
também as prostitutas e travestis. Assim, houve a incorporação, à idéia inicial de
homossexualidade relacionada à AIDS, de elementos da pretensa realidade vivida por estes
novos “grupos de risco”, como a promiscuidade, a imoralidade, o vício e a transgressão de
normas sociais (BARBARÁ; SACHETTI; CREPALDI, 2005).
É importante destacar que a presença destes grupos entre os atingidos levou à
formulação e divulgação do termo AIDS pelo CDC, em 1982. Porém, quando o vocábulo
AIDS se afirmou definitivamente, articulou-se ao seu redor todas as conotações negativas que
a sua introdução havia tentado descartar, numa demonstração de que a criação de um termo
científico nem sempre consegue associar caráter de neutralidade a uma doença. Com isso, a
ligação entre AIDS e homossexualidade, emergida da epidemiologia e amplamente divulgada
pela dia, acabou se disseminando e enraizando no imaginário da população (BARBARÁ;
SACHETTI; CREPALDI, 2005).
De acordo com Jodelet (2001), antes que a pesquisa biológica trouxesse algum
esclarecimento sobre a natureza da AIDS, as pessoas elaboraram teorias apoiadas nos dados
que dispunham em relação aos portadores e aos vetores do “novo mal”.
Assim, Sontag (2007), em sua obra intitulada “AIDS e suas metáforas”, assevera ser
dupla a genealogia metafórica
4
da AIDS. Enquanto micro-processo, ela é encarada como o
câncer: como uma invasão. Quando o que está em foco é a transmissão da doença, invoca-se
uma metáfora mais antiga, que lembra a sífilis: a da poluição.
Esta construção e apresentação iniciais da síndrome marcariam de modo fundamental
a forma pela qual esta doença e seus atingidos seriam concebidos pelos diferentes grupos e em
contextos sociais diversos, tal como afirmam alguns autores, como Daniel e Parker (1991),
Galvão (2000) e Parker e Aggleton (2006).
Deste modo, a AIDS traria implicações profundas para as relações sociais e para
outros campos, por combinar comportamento sexual e doença (GALVÃO, 2000),
4
Metáfora, aqui, entendida como Sontag (2007), a partir de Aristóteles, consistindo em dar a uma coisa o nome
de outra.
25
perpassando as relações entre indivíduos até aquelas de caráter internacional. Neste sentido,
como menciona Nascimento (2005), nunca um país teve sua economia tão rapidamente
atingida quanto o Haiti, fato causado pelo decréscimo da atividade turística no país, gerado
pela presença de haitianos no bojo da categoria epidemiológica de risco para a doença.
Em 1983, houve a descoberta do agente etiológico da AIDS, o HIV, resultante de uma
disputa entre o Instituto Pasteur, na França, e o Instituto Nacional de Saúde, dos EUA, que
terminaria em 1992, com o reconhecimento dos direitos para o primeiro (NASCIMENTO,
2005).
Porém, como assinalam Bárbara, Sachetti e Crepaldi (2005), a descoberta do vírus e
de suas formas de transmissão pelo sexo, sangue e vertical permitiram, por um lado, uma
tentativa de controle da epidemia, e, por outro, exacerbaram o medo e a conotação moralista
de um discurso que fazia da sexualidade “descontrolada” a grande causa do mal.
Corroborando este pensamento, Giami et al. (1997), argumentam que a associação
entre a sexualidade (e a homossexualidade), promiscuidade e as drogas, por um lado, e a
doença e a morte, por outro, constituem os ingredientes privilegiados de um estereótipo.
Na perspectiva de Daniel e Parker (1991), uma interpretação que denominam de pré-
crítica da AIDS servia, especialmente, de apelo à quarentena e à segregação, justificando o
pânico e o pavor que sustentam a chamada Terceira Epidemia, como denominada por
Jonhatan Mann. Tal concepção fomentava a imagem da doença como contagiosa, incurável e
mortal.
No que diz respeito a esta faceta da resposta social à AIDS, de segregação e
quarentena, Sontag (2007) destaca a incorporação de conceitos militares ao campo da saúde,
sobretudo, após a descoberta dos microrganismos como causadores de doenças. Assim, de
acordo com a referida autora, a metáfora militar talvez seja inevitável em uma sociedade
capitalista, uma sociedade que cada vez mais restringe o alcance e a credibilidade do apelo
aos princípios éticos, que considera absurdo o indivíduo não sujeitar suas ações ao cálculo do
interesse próprio e do lucro. A guerra seria, portanto, uma das poucas atividades que não
devem ser encaradas de modo “realista”, ou seja, levando-se em conta os gastos e os
resultados práticos, pois, em uma guerra total, gastos são exagerados e imprudentes. A guerra,
cabendo a sua apropriação para a saúde, no combate às doenças, é definida como uma
emergência, na qual nenhum sacrifício é considerado excessivo.
O fato de a doença ter sido apresentada como algo restrito a certos “grupos de risco”,
geralmente de um outro país, forma à visão particular de temor de um “outro” alienígena,
como o inimigo é encarado nas guerras modernas. A transformação da doença em inimigo, se
26
não determina, pelo menos reforça a atribuição de culpa ao paciente, muito embora continue
considerado-o como vítima. A idéia de vítima sugere a inocência, a qual, por uma gica
inexorável que rege todos os termos relacionais, remete à culpa. Esta, por sua vez, associada
ao escândalo da revelação de uma identidade pretensamente relacionada ao desvio da conduta
sexual, gera um significativo sentimento de vergonha ligado à AIDS (SONTAG, 2007).
Sontag (2007), afirma, também, que qualquer enfermidade tida como um mistério e
temida de modo bastante incisivo será considerada moralmente, se não literalmente,
contagiosa. E o contato com alguém acometido por uma doença tida como um mal misterioso
provoca, de forma inevitável, a sensação de transgressão, pior ainda, de violação de um tabu,
sendo o próprio nome de tais doenças imbuído de um poder mágico.
Jodelet (2001), por sua vez, reforça tal argumentação, lembrando que um aspecto da
AIDS que, desde o início, atingiu o público em geral, foi a sua transmissão pelo sangue e
esperma, dando lugar a uma visão biológica inquietante acerca do contágio, que poderia
ocorrer, também, por meio de outras secreções corporais, reavivando crenças antigas, cujo
vigor a própria autora constatara, outrora, em estudo sobre a representação social da doença
mental.
Assim, como apontam autores como Daniel e Parker (1991), Giami et al. (1997),
Galvão (2000), Marques, M. (2002), Parker e Aggleton (2006) e Oliveira et al. (2007a), as
respostas da sociedade em termos de preconceito e discriminação, com uma estigmatização e
descaracterização da pessoa acometida pela AIDS, foi um aspecto marcante da trajetória da
epidemia.
Não se pode deixar de mencionar, igualmente, a resposta das religiões frente à doença,
tendo em vista sua influência no cotidiano e no imaginário das pessoas. Pode-se dizer que,
dependendo da “vocação” e do “mandado”, para cada uma das diferentes religiões, posições
com nuances diversas foram delineadas (GALVÃO, 1997).
Nos primeiros anos da epidemia, no Brasil, por exemplo, tanto as igrejas católicas
quanto as pentecostais marcaram a sua posição quanto à doença, encarando-a antes como uma
decadência moral do indivíduo que como uma doença. Nesta perspectiva, em 1985, Dom
Eugênio Salles, cardeal-arcebispo do Rio de Janeiro, escreveu o artigo “O mal e a covardia
dos bons”, no qual apresenta a AIDS como “castigo divino” e um revide da natureza contra as
“inversões” ocorridas no campo da sexualidade (GALVÃO, 1997).
Algumas expressões religiosas como as Afro-brasileiras, inclusive, foram
estigmatizadas, às quais se atribuiu a presença de muitos homossexuais entre seus
componentes e seguidores, bem como rituais envolvendo sangue (GALVÃO, 1997).
27
Outro exemplo, noticiado na imprensa em 1987, situando-se na interface da resposta
religiosa e dos serviços de saúde, refere-se ao fato de duas freiras do Hospital São Vicente de
Paulo, no Rio de Janeiro, terem se recusado a atender onze hemofílicos soropositivos, dos
quais três faleceram por falta de atendimento. As freiras foram, então, indiciadas
criminalmente por omissão de socorro (GALVÃO, 1997).
De um modo geral, apenas a partir da década de 1990, algumas correntes religiosas,
como a católica, desenvolveram respostas numa perspectiva denominada por Galvão (1997)
de mais samaritana, com manutenção, por exemplo, de casas de apoio, mas ainda
sustentando posições rígidas sobre a sexualidade e o sexo e colocando-se contrária ao
emprego do preservativo masculino como método preventivo de saúde pública.
As evoluções e descobertas, no curso da epidemia, se dariam de modo acelerado e, em
1986, médicos, ao administrarem uma determinada droga para o tratamento do SK,
perceberam que a mesma auxiliava na melhora do quadro geral do paciente. A referida droga
levava a diminuição da quantidade de HIV circulante e ao aumento da quantidade de células
de defesa orgânicas, com a diminuição das infecções oportunistas. Deu-se, desta maneira, a
descoberta da Zidovudina (AZT), como a primeira terapia farmacológica e eficaz para a
AIDS, tendo sido confirmada e liberada para uso pelo Food and Drugs Administration (FDA),
nos EUA, em 1987. Tem-se, portanto, o início do desenvolvimento de medicações para o
controle do curso da doença, o que, mais tarde, tornaria possível sua conceituação como
doença crônica (SCHAURICH; COELHO; MOTTA, 2006).
No Brasil, a possibilidade de ter acesso a tal tratamento ocorreu a partir de 1991,
mesmo assim, com uma cobertura muito reduzida e, conforme Sá e Costa (1994), com
critérios bastante rígidos.
Outro importante aspecto emergente no curso da epidemia, refere-se à participação
progressiva do grupo de mulheres e crianças entre os atingidos (CASTILHO; CHEQUER,
1997), os quais passaram, junto com hemofílicos e receptores de transfusão sangüínea, a
serem vistos como “vítimas inocentes” da doença (GIAMI et al., 1997; GALVÃO, 2000;
NASCIMENTO, 2005).
Neste ponto, Giami et al. (1997) assinalam que a representação dos grupos e pessoas
atingidas se torna mais complexa e citam o caso de uma jovem, descrita como “vítima
acidental da AIDS”, contraída a partir de seu marido usuário de drogas injetáveis, noticiado
em um número da Newsweek, em 1986.
A participação das mulheres, em especial, com o conseqüente aumento da transmissão
vertical do HIV, tornou-se mais significativa, sobretudo, na cada de 1990, havendo, no
28
Brasil, uma diminuição da razão homem/mulher em relação à infecção pelo vírus de 28 para 1
em 1985, para valores próximos à 4 para 1, em 1995 (CASTILHO; CHEQUER, 1997).
Atualmente, esta relação encontra-se, aproximadamente, em 2 para 1 e, para algumas faixas
etárias, observou-se, mesmo uma inversão daquela (BRASIL, 2006d). Esta alteração na
trajetória epidemiológica da doença foi denominada de feminização da epidemia do
HIV/AIDS (TEIXEIRA, 2003).
É importante ressaltar, também, que a participação da transmissão do HIV relacionada
à homossexualidade apresentou queda significativa no Brasil, representando, em 1983,
praticamente o universo das notificações e, a partir daí, sua participação reduziu-se
progressivamente até 1993, quando equivalia a 36% dos casos, sendo a categoria de exposição
heterossexual correspondente a 44,2% (CASTILHO; CHEQUER, 1997). Em 2005, a
categoria de exposição homossexual correspondeu a 16,8% e a heterossexual, 44,2% entre
homens e 94,5% para as mulheres (BRASIL, 2006d). Assim, Mann, Tarantola e Netter (1993)
e Bastos e Boschi-Pinto (1993) apontam, a partir de outros estudos, que o fato de a doença ter
sido vinculada fortemente à aspectos morais negativos e aos ditos grupos de risco, gerou uma
crença na imunidade à doença e dificuldades na adoção de medidas preventivas, como o uso
do condom, por exemplo.
Aliadas a tais transformações, observou-se no Brasil a interiorização e pauperização
da epidemia do HIV/AIDS. Antes, mais circunscrita às regiões litorâneas brasileiras, passou a
atingir, progressivamente, municípios de menor porte e regiões mais distantes dos grandes
centros urbanos. Além disso, tomando como indicador sócio-econômico o grau de instrução, a
epidemia tem acometido número crescente de pessoas com menor renda, diferentemente do
que ocorria em seus casos iniciais (PARKER; CAMARGO JR, 2000).
Passa-se, portanto, progressivamente, da noção de grupos e comportamento de risco
para o HIV/AIDS, para o conceito de vulnerabilidade ao mesmo. Isto porque, tal como
afirmam Munõz-Sánchez e Bertolozzi (2007), verificou-se que a vulnerabilidade supera o
marco do conceito de risco, tradicionalmente empregado no âmbito da epidemiologia clássica.
De acordo com Ayres (2002), o risco designaria as chances de susceptibilidade,
atribuíveis a um indivíduo qualquer de grupos populacionais particularizados, delimitados em
função da exposibilidade a agentes (agressores ou protetores) de interesse técnico ou
científico. A adoção deste conceito no campo do HIV/AIDS culminou com a estigmatização e
discriminação de determinados grupos, com comportamentos socialmente reprovados, bem
como constituiu-se em um aspecto a dificultar a adoção de medidas preventivas pelos grupos
sociais ditos fora do risco, como apontam Ayres et al. (2003).
29
Por sua vez, a vulnerabilidade é entendida
“[...] como o movimento de considerar a chance de exposição das pessoas ao adoecimento
como a resultante de um conjunto de aspectos não apenas individuais, mas coletivos,
contextuais, que acarretam maior suscetibilidade à infecção e ao adoecimento e, de modo
inseparável, maior ou menor disponibilidade de recursos de todas as ordens para se proteger
deambos” (AYRES et al., 2003, p.122).
Deste modo, Ayres et al. (1997), definiram a questão da vulnerabilidade ao HIV/AIDS
como o esforço de produção e difusão de conhecimento, debate e ação sobre os diferentes
graus e naturezas da suscetibilidade de indivíduos e coletividades à infecção, adoecimento ou
morte pelo HIV/AIDS, segundo a particularidade de sua situação quanto ao conjunto
integrado dos aspectos sociais (ou contextuais), pragmáticos (ou institucionais) e individuais
(ou comportamentais) que os põem em relação com o problema e com os recursos para seu
enfrentamento.
Com isso, tem-se a focalização não apenas dos modos de vida dos sujeitos, mas,
também, na inclusão da possibilidade dos mesmos terem acesso a um conjunto de recursos
sociais mais amplos de proteção, envolvendo outros campos além da saúde, representando um
prisma mais complexo para a orientação de ações mais profícuas em saúde e, mais
especificamente, para o campo da prevenção da transmissão do HIV/AIDS (AYRES et al.,
2003).
Faz-se mister, outrossim, destacar a redução da taxa de mortalidade por AIDS,
conforme aponta Brasil (2006c), após a introdução da Terapia Anti-Retroviral Altamente
Ativa (HAART), uma combinação entre três tipos de drogas
5
, que passou em 1996 a ter
distribuição universal e gratuita no Brasil, a partir da Lei 9.313, de 13 de novembro de 1996
(BRASIL, 2006a, 2003b). Deste modo, a taxa de mortalidade pela doença foi reduzida de 9,7
óbitos por 100 mil habitantes, em 1995, a qual acompanhava a incidência de AIDS, para 6,3
óbitos por 100 mil, a partir de 2000. Observou-se, também, um aumento de cerca de cinco
anos na idade mediana dos óbitos, refletindo um aumento na sobrevida das pessoas com
AIDS (BRASIL, 2006c). Com isso, alguns autores passaram a considerar a AIDS como uma
doença de caráter cada vez mais crônico (SCHAURICH; COELHO; MOTTA, 2006).
Por outro lado, não obstante as conquistas e avanços terapêuticos e evoluções
conceituais no campo do HIV/AIDS, a terceira epidemia, ou seja, os significados associados à
doença e a estigmatização e discriminação de seus portadores, persistem como uma questão
central a ser enfrentada (PARKER; AGGLETON, 2006).
5
As drogas disponíveis, até então, consistiam em três classes: Inibidor de Transcriptase Reversa Análogo e Não
Análogo de Nucleosídeo, respectivamente, ITRN e ITRNN e a de Inibidores de Protease (IP). Estas medicações,
de um modo geral, atuam em diferentes processos metabólicos inibindo a replicação do HIV (BRASIL, 2003b).
30
Tal problemática, ainda se faz presente no contexto dos serviços de saúde, com
importantes implicações para a vida das pessoas que vivem com o HIV, que deixam ou
evitam procurar por auxílio neste âmbito, para suas famílias e para a sociedade, segundo
afirmam Rozenblat, Biagini e Sánchez (1999) e Foreman, Lyra e Breinbauer (2003).
Isto posto, passar-se-á, adiante, a apresentação de algumas pesquisas desenvolvidas
acerca do HIV/AIDS à luz da teoria das representações sociais, como desenvolvida por
Moscovici e outros autores das três abordagens complementares, tendo como foco os
profissionais de saúde. Dentre estas, serão destacadas aquelas pesquisas pautadas na
abordagem estrutural das representações sociais.
I. 2 AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DO HIV/AIDS ENTRE PROFISSIONAIS DE SAÚDE
Conforme identificado em levantamento de literatura efetivado por Oliveira et al.
(2007b), foram publicados 136 estudos sobre representações sociais em relação à AIDS,
abrangendo artigos, dissertações e teses, o que demonstra a relevância da teoria das
representações sociais para a elucidação de aspectos concernentes às dimensões psicossociais
envolvidas na epidemia do HIV/AIDS.
Jodelet (1998a), acerca desse interesse, afirma, em prefácio de obra sobre AIDS e
representações sociais, que, desde muito cedo, o tema AIDS reteve atenção dos
pesquisadores, com relação a uma epidemia cujas dimensões morais e sociais são o
relevantes quanto o aspecto médico, propriamente dito.
Assim, afirma Tura (1998) que os estudos no campo das representações sociais
relacionadas à prática de saúde são importantes e assumem toda sua significação, pois
possibilitam a apreensão de processos e mecanismos pelos quais o sentido do objeto de estudo
é construído pelos sujeitos concretos em suas relações cotidianas. E, no caso da AIDS,
encontram-se imbricados a sexualidade, a necessidade de afirmação do indivíduo, o afeto, as
demandas e desejo, em conjunção com normas, valores, informações e outros fatores de
diferentes ordens.
Ainda, segundo o referido autor, citando Morin (1994), as ameaças e enigmas que
emergiram com o surgimento do fenômeno social da AIDS podem desencadear um processo
de elaboração, nos planos individual e coletivo, de teorias que combinam valores, crenças,
atitudes e informação. Teoria que o indivíduo utiliza para construir uma visão coerente do
objeto e de si no mundo, ao mesmo tempo em que procura negociar um espaço de aceitação e
inclusão com os grupos com os quais interage.
31
Jodelet (2001) afirma que a apropriação da AIDS pela mídia e pelos diferentes grupos
sociais, antes mesmo que pesquisas biológicas trouxessem esclarecimentos sobre a doença,
propiciou a formação de duas interpretações. Uma, de tipo moral e social, e outra, de tipo
biológico, ambas com implicações para as diferentes relações e esferas da vida das pessoas,
inclusive, as acometidas pelo agravo. Para a autora, estas representações se inscrevem nos
quadros de pensamento preexistentes e enveredam por uma moral social. A liberdade do sexo
seguro se opõe às “virtudes” da tradição e encontra, aí, um novo cavalo de batalha, sustentado
pela autoridade religiosa, como exemplificado anteriormente. Forjam-se, então, palavras
portadoras de representação, em que aidético soa como judaico, aidetório como sanatório ou
crematório, com um poder de evocação tal que induzem a enquadrar os doentes numa
categoria à parte e a adotar ou justificar condutas de discriminação.
Estas duas representações moral e biológica são construídas para acolher um
elemento novo, a AIDS, e apóiam-se em valores variáveis segundo os grupos sociais de
onde tiram suas significações e em saberes anteriores, reavivados por uma situação particular.
Encontram-se ligadas tanto a sistemas de pensamento mais amplos, ideológicos ou culturais, a
um estado dos conhecimentos científicos, quanto à condição social e à esfera da experiência
privada e afetiva dos indivíduos (JODELET, 2001).
Nesta perspectiva, um quantitativo significativo de pesquisas sobre AIDS no campo
das representações sociais refere-se ao universo dos profissionais de saúde, entre os quais se
encontram os enfermeiros (OLIVERIA et al., 2007b). Assim, considera-se que essas
investigações são compreendidas como relevantes para o entendimento do objeto delimitado
para o presente estudo, que se insere no campo das representações de enfermeiros sobre a
pessoa vivendo com o HIV/AIDS.
Silva e Abrantes (1995) se interessaram por conhecer as representações sociais da
AIDS entre enfermeiras. Neste trabalho, as referidas autoras afirmam que a AIDS despontou
no cenário de saúde como uma doença desconhecida, mas não rara, pois acomete uma parte
considerável da população. É grave, continuam aquelas, mata lentamente e ultrapassa o
horizonte clínico e o social, caracterizando-se como um modo de transmissão reprovado pelas
normas vigentes. E, na fala dos sujeitos participantes dessa pesquisa, o contágio pelo HIV é
originado na falta de proteção, sendo, portanto, culpa e castigo do indivíduo, este, responsável
por seu comportamento. Houve, também, entre os depoentes, a expressão de que qualquer um
poderia ser acometido, participando da relação do ser humano com a doença, o medo e a
religiosidade, num reforço aos parâmetros culturais. As enfermeiras entrevistadas
apresentaram a AIDS como sinônimo de morte, de forma prevenível e ameaçadora,
32
constituindo em fonte de sofrimento pelo confronto com a finitude. Falaram, também, estas
últimas, sobre o sentimento de impotência diante do paciente e do sofrimento que vivenciam
como pavor, desespero, solidão, revolta e desalento que a doença traz em si.
Marques, Francisco e Clos (2003) focalizaram um grupo de 366 trabalhadores de um
hospital universitário da cidade do Rio de Janeiro, buscando analisar a representação social da
AIDS, em 2002, por meio da aplicação de um questionário e da análise posterior pelo método
de Análise de Correspondências Múltiplas. Cabe ressaltar que, entre os sujeitos, 145 eram
servidores técnico-administrativos e 221 profissionais de enfermagem. Assim, foram
evidenciados quatro grupos com aspectos representacionais algo distintos sobre o objeto em
tela.
O grupo formado por pessoas com formação de nível superior, enfermeiros,
conceituaram a AIDS como ligada à falta de amor, preconceito, discriminação e
promiscuidade, não se destacando, aqui, a idéia da morte, como em Silva e Abrantes (1995).
Afirmaram, também, ser a doença prevenível, evitável, surgindo no mundo por uma evolução
biológica. Para a sua prevenção, referiram a utilização de preservativos, materiais descartáveis
e o controle no número de parceiros. Para o grupo que atua com pacientes em regime
ambulatorial, a AIDS significava morte e perigo, podendo ser transmitida por beijo na boca,
lágrima, saliva, urina, inseminação artificial, instrumentos de manicura e odontológicos, como
discutido por Jodelet (1998b) a respeito das “falsas crenças”. Assinalaram, estes sujeitos que
continuariam a manter relações com o companheiro caso fosse soropositivo, parecendo
indicar uma contradição. Além disso, verificou-se a presença de dimensões imagéticas sobre a
AIDS, que traduziram uma sensação de medo diante do risco (MARQUES; FRANCISCO;
CLOS, 2003).
O grupo de trabalhadores com idade superior a 60 anos apresentou a AIDS como
vergonha, desgraça e castigo, associando-a com grupos de homossexuais e prostitutas.
Consideraram que, mesmo os assentos de vaso sanitário, poderiam transmitir o vírus. O
último grupo, composto por sujeitos com cargo superior técnico-administrativo, consideraram
a AIDS como uma doença social que desperta sentimentos negativos, mas não significa
morte. Surgiu no mundo por causa não conhecida ou proveniente de nação estrangeira.
Embora tenham afirmado que utilizam todas as formas de prevenção, referiram não ser
possível a transmissão do HIV por via vertical, instrumentos de manicura e odontológicos,
contato com o sangue e secreções genitais (MARQUES; FRANCISCO; CLOS, 2003).
De outro modo, com a preocupação centrada nas relações de cuidado estabelecidas
entre enfermeiras e pacientes soropositivos ao HIV, Silva (2004) efetivou uma investigação
33
com coleta de dados na cidade de São Paulo, entre 2000 e 2002, acerca das representações
sociais da AIDS para os dois grupos (enfermeiras e pacientes soropositivos). Desta maneira,
foi constatado por meio do estudo das representações sociais, no cotidiano dos que vivem a
situação da soropositividade ao HIV, após a recepção do diagnóstico e da alusão à própria
morte, um jogo para a normalização do mesmo. Não importando que fosse paradoxal, a
normalização poderia permitir um caminhar, mesmo que incerto, para enfrentar o cotidiano e
a possibilidade de aceitação por seus pares e pela sociedade, no seio da qual reconhecem a
estigmatização e a discriminação. Tal normalização é apresentada no sentido da aceitação da
doença pelos sujeitos como um elemento menos ameaçador, na tentativa de encará-la como
uma morbidade em si.
Por sua vez, para as enfermeiras, como ocorrido em pesquisa de Placco (2005), houve
o estabelecimento de um paralelismo entre passado e presente, em que a doença é
apresentada, em período próximo a seu surgimento, como ligada à morte e ao abandono. Com
o tempo, segundo Silva (2004), com a socialização de novas informações sobre a AIDS e seus
acometidos, as enfermeiras, tal qual ocorrera com os usuários, passaram por um processo de
normalização do agravo no cotidiano de suas relações sociais. Para as enfermeiras, o contato
com o usuário e a sensibilização às inquietações modificaram as suas percepções e atenuaram
as medidas ligadas ao medo do contágio, favorecendo uma aproximação maior com os
doentes. Tal achado se assemelha aos de Giami et al. (1997), em estudo na França, ao se
referirem às enfermeiras classificadas como experientes, com menores níveis de estresse e
sofrimento ao lidar com clientes com AIDS.
Freitas e Sadigursky (2004), ao se interessarem por perscrutar as representações
sociais sobre a AIDS entre 25 portadores do HIV e 15 profissionais de saúde na Bahia,
encontraram resultado semelhante, sendo para os últimos sujeitos, a doença representada
como nova, perigosa e atingindo os que não se previnem. Para as pessoas soropositivas, o
conteúdo das falas apontou para diferentes concepções, como doença do “outro”, comum,
punitiva, perigosa, para a qual haverá cura. A soropositividade, de acordo com os portadores,
favorece a exclusão social e suscita desejo de anonimato, de suporte religioso e familiar,
como mecanismos de ajuda. A convivência com o diagnóstico levou à mudança de vida, pela
crença em uma morte próxima, havendo um sentimento de culpa por não terem se protegido,
indignação e raiva, sobretudo entre as mulheres, pela contaminação no próprio lar.
Ainda nesta perspectiva de pesquisa comparativa, Ribeiro et al. (2005),
desenvolveram um estudo envolvendo profissionais de saúde e pessoas soropositivas ao HIV,
tendo em vista identificar suas representações sociais sobre a AIDS. Participaram 41 sujeitos
34
soropositivos, e 77 profissionais, sendo 21 médicos, 22 enfermeiros, 15 psicólogos e 19
assistentes sociais, da cidade de João Pessoa, Paraíba. Os dados foram coletados por meio da
associação livre de palavras, com os termos indutores AIDS, atendimento e tratamento, e
analisados com a análise fatorial de correspondência (AFC). Os achados da pesquisa
evidenciaram que, a emergência da depressão em ambos os grupos, sugeriu a possibilidade de
uma nova forma de ancorar a AIDS, não apenas nas DST ou nas grandes pestes, mas também,
associada aos transtornos psicoafetivos.
Para os profissionais de saúde, demonstrou-se uma visão biológica e pragmática da
doença, reforçando o modelo biomédico e, por outro lado, a valorização da família como
fonte de apoio aos pacientes. Segundo Ribeiro et al. (2005), a objetivação do atendimento
aliada ao medo e o cuidado pelos sujeitos em questão, pode estar associada ao processo de
receio de contágio por acidente de trabalho, comum a este tipo de serviço. De acordo com os
profissionais de saúde, a AIDS traz em si preconceito, discriminação social e estigma
maiores, pois relaciona sexo, sangue, homossexualidade, prostituição, traição, trazendo à tona
o mais íntimo das pessoas, escondido por meio de tabus. Assim, para os autores, as
concepções da doença, para estes profissionais são muito semelhantes às da sociedade em
geral, que ainda discrimina e contribui para a morte social dos portadores, ao vincularem o
HIV com a “grande peste e as sujeiras do mundo”.
Por outro lado, na faixa etária entre 34 e 44 anos, verificou-se elementos mais
positivos nas representações dos profissionais, ancorados na interface e complexidade do
indivíduo portador de HIV, como foi demonstrado em componentes figurativos como
solidariedade, amor, respeito e atenção. O primeiro deles, inclusive, configurou-se como
importante forma de enfrentamento da doença, como sugeria o sociólogo Herbert de Souza.
Pôde-se perceber, então, a incorporação de diferentes novos aspectos à representação social
da AIDS, ainda que em um subgrupo específico do estudo (RIBEIRO et al., 2005).
Com um foco mais voltado para os profissionais de saúde, Ribeiro, Coutinho e
Saldanha (2004), analisando a representação social da AIDS e seu tratamento entre médicos e
enfermeiros, respectivamente, em número de 25 e 31, no estado da Paraíba, trouxe resultados
interessantes. A coleta de dados se deu pela associação livre de palavras, aos termos indutores
AIDS e tratamento e a análise foi realizada segundo a AFC. Para os médicos, a AIDS foi
representada como uma doença que provoca medo, morte, sendo a prevenção necessária. Esta
última se articularia em dois eixos: um psicossocial, pelo apoio, e outro, pelo uso do
preservativo. A prevenção emerge, igualmente, com relação ao medo do contágio
profissional/acidente de trabalho. O tratamento, para tal grupo, é associado como gratuito,
35
exigindo competência e acompanhamento integral, efetivo e, também, mantendo a esperança
do surgimento da cura para a doença.
Na perspectiva dos enfermeiros, a doença, de modo semelhante ao encontrado por
Marques, Francisco e Clos (2003), foi associada à promiscuidade, preconceito e
desinformação, remontando, novamente, a lógica de “grupos de risco”. Entretanto, surgem
articulações com o tratamento e a cura como esperança para os portadores do HIV. Porém,
entre médicos e enfermeiros acima de 44 anos, como evidenciado em Ribeiro et al. (2005), a
AIDS mostrou-se ligada à idéia de doença em si, enquanto o tratamento configurou-se com
elementos como apoio, solidariedade, carinho, além de informação e orientação.
Considerando outras categorias de profissionais de saúde, tem-se a investigação de
Patriota (2005), sobre as representações sociais da AIDS entre assistentes sociais, na cidade
de Campina Grande PB. Foram entrevistados 34 sujeitos, pelo que se identificou, também,
para este grupo, a AIDS como doença incurável e transmissível. Emergiu a idéia de que se
constitui em um grande mal, cercado pelo mistério, sendo um “verdadeiro horror”. A
principal forma de transmissão referida foi a sexual, ligada à gica das práticas sexuais
socialmente repreensíveis, com múltiplos parceiros, reiterando a noção de grupos de risco.
Como efeitos da doença, foram apontados o sofrimento, degradação física e morte. Em
relação aos sentimentos envolvidos na representação, foi identificado como positivo, a
solidariedade e, como negativo, o medo. De acordo com as conclusões da autora, tais
resultados indicaram a permanência nas representações sobre a AIDS, para o grupo em
questão, de elementos cultivados ao longo de sua evolução sócio-histórica, de modo
consensual e hegemônico.
Na perspectiva da abordagem estrutural, tendo como foco as representações sociais da
AIDS entre sujeitos envolvidos com a profissão de enfermagem, podem-se destacar os
estudos de Fernandes e Oliveira (2002) e Marques, Oliveira e Francisco (2003). Fernandes e
Oliveira (2002), tiveram como sujeitos 150 alunos do curso de graduação em enfermagem e
150 do curso de comunicação social, em Cuiabá - Mato Grosso, tendo sido os dados coletados
por meio de evocações livres e questionário. Constatou-se que, como também apontado nos
estudos descritos anteriormente, apesar das mudanças ocorridas no perfil epidemiológico da
AIDS, sobretudo, no Brasil, para uma heterossexualização da epidemia, 21,3% dos depoentes
afirmaram serem os homossexuais os mais sujeitos à infecção, com 22% referindo ser o
agravo transmitido pela saliva, dimensão esta já discutida em Jodelet (1998b).
Como práticas de prevenção da infecção pelo HIV, foram constatadas por Fernandes e
Oliveira (2002) nas respostas dos sujeitos do estudo, o uso de preservativo, a redução no
36
número de parceiros, ter relação sexual com pessoas de confiança, sendo inseguros o sexo
anal, oral e relações homossexuais. Tais achados se assemelham àqueles encontrados por
Oltramari e Camargo (2004), Carvalho (1998) e Madeira (1998).
Como elementos considerados centrais na representação social dos estudantes de
enfermagem, no estudo de Fernandes e Oliveira (2002), emergiram: discriminação; doença;
medo; morte; preconceito; e prevenção, e para aqueles de comunicação social, surgiram:
camisinha; doença; morte; preconceito; prevenção; sexo; e sofrimento. De acordo com as
autoras, o conteúdo da representação dos graduandos de enfermagem é marcado pela
afetividade, despertada pela doença. O medo pode estar associado a situações de risco e
vulnerabilidade impostas pelo trabalho cotidiano, podendo desencadear respostas não
racionalizadas diante de situações que geram ansiedade.
Observa-se, é importante destacar, significativas semelhanças desses resultados com
os apresentados por Tura (1998) e Camargo (2000), considerando a totalidade dos elementos
que se constituem, provavelmente, como centrais. No que se refere à presença da morte,
doença e sexo, aproxima-se, também, do encontrado por Flores-Palacios e Leyva-Flores
(2003) e, no concernente ao papel da prevenção e camisinha, guarda similitudes com os
achados de Thiengo, Oliveira e Rodrigues (2002).
Marques, Oliveira e Francisco (2003), em estudo envolvendo 366 sujeitos de um
hospital universitário da cidade do Rio de Janeiro, dos quais 145 eram servidores do corpo
técnico-administrativo e 221 profissionais de enfermagem, utilizaram como método as
evocações livres ao termo indutor AIDS. Nesta perspectiva, compondo os elementos
provavelmente centrais para os profissionais de enfermagem, estavam os seguintes: medo;
morte; preconceito; prevenção; sexo; e sofrimento, e para os servidores técnico-
administrativos: morte; preconceito; sofrimento; e tristeza. Assim, observa-se, novamente, a
semelhança entre os núcleos centrais das representações sociais sobre a AIDS, sendo os
elementos medo, morte, preconceito e prevenção, comuns ao estudo de Fernandes e Oliveira
(2002), para o grupo de enfermagem.
O estudo efetivado por Camargo (2000), utilizando, do mesmo modo, o termo indutor
AIDS para as evocações livres entre universitários dos cursos de medicina, odontologia,
administração e economia, em Florianópolis, apresentou resultado semelhante, ainda que com
algumas variações. Nesse estudo foi realizada uma análise comparativa entre o conteúdo e a
estrutura das representações nos quatro grupos de estudantes, numa combinação entre as
variáveis relativas ao sexo (masculino e feminino) e à área de estudo (ciências humanas ou da
saúde). Desta maneira, como elementos centrais presentes nos referidos grupos, emergiram
37
doença, sexo, prevenção, morte, com o acréscimo de drogas, a resultados de pesquisas
anteriores. E, grande parte dos elementos constituintes em torno destes identificados como
centrais, foram discriminação, promiscuidade, descuido, tristeza, preconceito e solidariedade,
referindo-se ao portador da doença ou aos seus próximos. A representação social da AIDS
pareceu, assim, operar na realidade cotidiana sobre o conhecimento e o posicionamento que
os estudantes tinham sobre o portador do HIV.
Aqui, não obstante as particularidades encontradas, as representações sociais da
doença se organizaram de modo a considerá-la como algo exterior, ligada a drogas e sexo,
prevenível, mas que pode levar à morte. Cabe ressaltar, neste ponto, que embora com o
potencial de levar à morte, sendo apenas os elementos sexo e prevenção comuns a todos os
núcleos centrais das representações dos quatro subgrupos estudados, o autor sugeriu a
hipótese de um processo de substituição da noção da idéia de doença mortal (CAMARGO,
2000). Este aspecto poderia, possivelmente, como mencionado em momento anterior, ocorrer
devido à evolução observada no campo da terapêutica anti-retroviral e pelas campanhas
preventivas veiculadas pela mídia. Tais achados parecem apontar no mesmo sentido daqueles
encontrados por Thiengo, Oliveira e Rodrigues (2002).
Perscrutando a problemática no campo de sujeitos envolvidos com a profissão de
odontologia, Ragon (2005), em sua dissertação de mestrado, aplicou a técnica de evocações
livres com o termo indutor AIDS, e adoção das técnicas de análise de simitude e dupla
negação, junto a 290 pós-graduandos. Os resultados das evocações permitiram, como em
Fernandes e Oliveira (2002) e Tura (1998), a identificação dos elementos doença, morte e
prevenção, como prováveis centrais e, portanto, organizadores da representação em questão.
Entretanto, considerando os achados dos testes de centralidade, apenas se confirmaram a
doença e a prevenção como componentes do núcleo central das representações sociais deste
grupo sobre a AIDS. Assim, a autora sugere a possibilidade do início de um processo de
mudança desta representação, dentro de um contexto de transição de práticas originadas num
modelo biomédico focalizando a doença, para práticas de promoção da saúde com uma
abordagem mais ampla.
Embora não tivessem focalizado profissionais ou estudantes de cursos relacionados ao
campo da saúde, pensa-se ser pertinente, dada sua importância para a compreensão das
representações sociais da AIDS e de seus elementos significantes e oranizadores, propiciado
pela abordagem estrutural, apresentar, também, os estudos de Tura (1998) e Thiengo, Oliveira
e Rodrigues (2002). Além disso, estas pesquisas tiveram os dados coletados na cidade do Rio
da Janeiro, em que se assemelha com a presente investigação.
38
Tura (1998) desenvolveu uma investigação sobre as representações sociais da AIDS,
tendo por sujeitos 797 jovens escolares, em 1996, tendo sido aplicado a cnica de evocações
livres, também denominada de associação livre de palavras, ao termo indutor “AIDS”. Os
termos evocados mais freqüentemente pelos sujeitos foram, portanto, em ordem decrescente:
morte; sexo; camisinha; doença; sofrimento; prevenção; drogas; tristeza; medo; e vírus,
correspondendo a 68%, aproximadamente, do total das evocações. Entre estes, os
considerados mais importantes pelos sujeitos, com o mesmo ordenamento, foram: camisinha;
morte; prevenção; sexo, correspondendo a 61% do total.
O cruzamento entre tais informações permitiu apontar como prováveis elementos
centrais ou organizadores da representação social da AIDS para o grupo, a morte, sexo,
camisinha, doença, prevenção e tristeza. E, na aplicação da técnica de análise de similitude,
destacaram-se, dentre esses, os elementos morte, sofrimento e doença. A morte, identificada
como importante componente da representação, trouxe em seu bojo a idéia da doença com um
destaque relativo, uma vez que a AIDS aparece como uma doença que mata ou que ainda não
tem cura e mata, correspondendo ao núcleo figurativo da representação. A presença deste
elemento como organizador de várias cognições é adjetivada pelos estudantes, de forma a
tornar-se distante, imaginária, sem concretude, mobilizando, antes de tudo, o medo e a
tentativa de afastamento do discurso moralista, o qual discrimina o “outro” que não se previne
(TURA, 1998).
Outro aspecto relevante do estudo de Tura (1998), e que parece relacionar-se com a
questão da influência das normas sociais, é o fato de, na categoria “grupo de risco”, elemento
periférico, observar-se haver algo de muito espontâneo nas evocações dos estudantes. Cerca
de 83%, aproximadamente, das evocações da categoria basearam-se em palavras
classicamente difundidas pelos meios da comunicação social como exemplos de grupos de
risco. Em contrapartida, encontraram-se enunciações racionalizadas, as quais pareciam
relacionadas com o esforço de não deixar aflorar a discriminação, que tem forte presença no
sofrimento e na relação simbólica com a doença.
Thiengo, Oliveira e Rodrigues (2002), buscaram, como Tura (1998), focalizar a
representação social da AIDS entre adolescentes, alguns soropositivos e outros não, tendo
desenvolvido uma pesquisa em um ambulatório de uma instituição hospitalar pública. A
amostra constituiu em 100 sujeitos, sendo o método para coleta de dados utilizado,
igualmente, a técnica de evocações livres ao termo indutor AIDS. Os resultados foram
diversos dos encontrados por Tura (1998), desta vez, tendo por prováveis elementos centrais
na representação social da AIDS para o grupo estudado, a prevenção, camisinha e cuidado,
39
refletindo, como evidenciado em estudos anteriores, a possível incorporação de campanhas
circulantes na mídia. A morte e a doença compuseram a periferia da representação, mais
próxima da centralidade.
Assim, apesar de terem por sujeitos jovens e adolescentes, sem vinculação com a
formação profissional no campo da saúde, é possível constatar a presença de semelhanças
significativas entre as representações sociais destes sujeitos e aquelas expressas pelos
profissionais de saúde. Isto porque, como afirma Ragon (2005), as representações da AIDS
não são apenas guiadas pela racionalidade científica, estando inseridas em uma rede de
significações e sentidos mais amplos, o que permite a sua naturalização, facilita a
comunicação social e presta-se à orientação de condutas.
Pôde-se, então, no conjunto dos estudos elencados, notar o conteúdo e a estruturação
das representações, permeados por aspectos referentes aos conhecimentos, às repostas sociais
à epidemia e às conseqüências do modo pelo qual foi apresentada à sociedade, convivendo os
seus portadores com a discriminação, preconceito e estigma.
Entretanto, foi possível observar em algumas pesquisas, sobretudo, nas mais recentes,
a presença de uma menor negatividade associada à doença, como a idéia de doença em si e
prevenção, com uma diminuição da importância da morte, sugerindo, conforme apontaram
alguns autores, como Camargo (2000), Ragon (2005) e Oliveira et al. (2007c) a possibilidade
de ocorrência de um processo inicial de mudança nas representações sociais da AIDS.
40
II. A TEORIA DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS
II.1 ASPECTOS CONCEITUAIS E A TEORIA GERAL DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS
A Teoria das Representações Sociais consiste em uma forma sociológica de Psicologia
Social, originada, na Europa, a partir da obra seminal de Serge Moscovici “La psychanalyse,
son image et son public”, publicada em 1961, na qual abordou a apropriação da teoria
psicanalítica por parte de diferentes grupos sociais de Paris, na década de 50 (FARR, 2003;
SÁ, 2002; VALA, 2002).
Este estudo realizado por Moscovici trouxe a balia, concomitantemente, uma
problemática específica e outra de caráter mais geral ou universal. Revelaria sua dimensão
específica ao tratar da questão concernente à difusão e apropriação do conhecimento
científico pelo homem dito comum e, sua faceta mais geral, ao propor a análise dos processos
por meio dos quais os sujeitos, em interação social, constroem teorias acerca dos objetos
sociais, tornando possível a comunicação e a organização dos comportamentos
(MOSCOVICI, 2003; VALA, 2002).
Neste sentido, Jodelet (2001), ao discutir acerca da importância das representações
sociais para a vida cotidiana, afirma que tal fato se pela necessidade própria de mantermo-
nos informados sobre o mundo à nossa volta, haja vista ser preciso a ele ajustarmo-nos, saber
como modular nossos comportamentos, dominá-lo física ou intelectualmente e identificar e
resolver os problemas que se apresentam.
Por sua vez, a tarefa de definição das representações sociais apresenta-se como
significativamente complexa e difícil, tendo levado o próprio Moscovici, na obra em que a
propôs, a destacar que se a sua realidade é fácil de captar, o mesmo não ocorre com seu
conceito (SÁ, 2002).
Como ocorre com o conceito de representações, utilizado em muitos setores das
Ciências Humanas com sentidos sobremaneira distintos e, por vezes imprecisos, alerta-nos
Flament (2001b) que o mesmo pode ocorrer em relação às representações sociais, quando não
observadas características mínimas. Assim, (2002), citando Farr (1992), aponta para a
necessidade de maior precisão em relação ao conceito das representações sociais, bem como
das formas pelas quais aquelas se relacionam com outros termos chave nas ciências sociais,
pelo risco que se corre de tudo ser considerado representação social.
41
Jodelet (2001, p.22) define Representações Sociais como uma forma de
conhecimento socialmente elaborada e partilhada, com um objetivo prático, e que contribui
para a construção de uma realidade comum a um conjunto social.
Campos (2005), por sua vez, apresenta a teoria das representações sociais como um
constructo que permite compreender a dimensão normativa e os processos de transformação
dos conhecimentos partilhados por um dado grupo, acerca da realidade social.
Denominada, também, de saber ingênuo ou natural, esta forma de conhecimento se
diferencia do conhecimento dito científico, considerando sua relevância para a vida social,
bem como para a elucidação dos processos cognitivos e das interações sociais (JODELET,
2001).
Abric (1994, p.13) define representações sociais como [...] o produto e o processo de
uma atividade mental pela qual um indivíduo ou um grupo reconstitui o real com que se
confronta e lhe atribui uma significação específica. Elas são determinadas, ao mesmo tempo,
pelo próprio sujeito (sua história, vivência), pelo sistema social e ideológico no qual se
encontra inserido e pela natureza dos vínculos que mantém com tal sistema (ABRIC, 2001).
A representação consiste, portanto, em um ato de pensamento no qual um sujeito
reporta-se a um objeto, que pode ser uma pessoa, uma coisa, um acontecimento material,
psíquico ou social, um fenômeno natural, uma idéia, uma teoria, entre outros (JODELET,
2001). Não existe representação sem objeto, bem como também não o sem um sujeito que
representa, sendo a representação, igualmente, elaboração e expressão deste (SÁ, 1998).
Assim, Abric (1994) ao discutir este aspecto da teoria das representações sociais, qual
seja, a sua constituição na relação entre sujeito e objeto, afirma que o ponto de início da teoria
é o abandono da distinção clássica entre o sujeito e o objeto.
É relevante salientar que nem todos os grupos ou categorias sociais participam de uma
determinada representação social, havendo a possibilidade de que, para um dado grupo, um
objeto esteja ligado somente a uma série de opiniões e de imagens relativamente desconexas,
não se constituindo em representação (IBAÑEZ apud SÁ, 1998).
Este aspecto relaciona-se às condições de emergência das representações sociais de
um determinado objeto em um grupo social, quais sejam: 1) a dispersão da informação; 2) a
focalização; e 3) a pressão à inferência (SÁ, 2002, 1998; VALA, 2002). O primeiro elemento
diz respeito ao fato de que a informação circulante sobre um dado problema ou objeto não é
sempre claramente definida, sendo, na maioria das vezes, ambígua ou imprecisa. Isto não
ocorre de maneira uniforme e independente das clivagens sociais, pois a informação não
circula do mesmo modo, bem como não circula o mesmo tipo de informação em todos os
42
grupos sociais. O segundo, refere-se à modulação da focalização de um certo objeto por um
grupo, estando articulado aos recursos educativos, interesses profissionais e ideológicos dos
indivíduos em distintos domínios de seu meio. Finalmente, o terceiro consiste na necessidade
de tomada de posição pelo grupo frente a determinado fenômeno, a depender da urgência de
problemas relacionados ou de instâncias sociais externas.
Tendo em vista que uma explicação adequada dos fenômenos das representações
sociais deve dar conta de suas origens, de seus fins ou funções e das circunstâncias de sua
produção, pode-se dizer que as mesmas possuem quatro funções essenciais: a) função de
saber, permitindo aos atores sociais a aquisição e a integração de conhecimentos em um
quadro assimilável e compreensível para eles mesmos, em coerência com seu funcionamento
cognitivo e os valores aos quais eles aderem; b) função identitária, pois situam os indivíduos e
os grupos dentro do campo social, permitindo a elaboração de uma identidade social e pessoal
compatível com o sistema de normas e valores socialmente e historicamente construídos; c)
função de orientação, constituindo-se em um guia para a ação dos sujeitos; e d) função
justificadora, pois permitem a justificativa das tomadas de posição e do comportamento dos
atores sociais, a posteriori (ABRIC, 1994, 2000; SÁ, 2002).
Assim, as representações sociais produzem normas de conduta, regulam
comportamentos, prescrevendo possibilidades para a ação: os comportamentos freqüentes ou
comuns, os comportamentos pouco freqüentes ou pouco prováveis, porém aceitáveis ou
justificáveis e aqueles considerados inaceitáveis, não condizentes com o objeto social
representado (CAMPOS, 2005).
De acordo com a proposição de Moscovici, a estrutura de cada representação tem duas
faces, tão pouco dissociáveis quanto a frente e o verso de uma folha de papel: a sua face
figurativa e a sua face simbólica, fazendo compreender em todo sentido uma figura e em toda
figura um sentido. A partir deste entendimento, pode-se extrair uma primeira caracterização
de seus processos de formação (SÁ, 2002).
Neste sentido, explica Sá (2002, p.46) que:
[...] a duplicação de um sentido por uma figura, pela qual se a materialidade a um objeto
abstrato, é cumprida pelo processo de objetivação. A duplicação de uma figura por um
sentido, pela qual se fornece um contexto inteligível ao objeto, é cumprida pelo processo de
ancoragem.
A objetivação, também denominada de objetificação, diz respeito à forma como se
organizam os elementos constituintes da representação e ao percurso através do qual tais
elementos adquirem materialidade e tornam-se expressões de uma realidade pensada como
natural. A ancoragem, por seu turno, refere-se aos processos por meio dos quais o não-
43
familiar se torna familiar e, uma vez constituída uma representação, esta se converte em um
organizador para as relações sociais (VALA, 2002).
De modo a especificar a proposição inicial de Moscovici, a qual ficou conhecida como
a “grande teoria”, surgiram três abordagens complementares, quais sejam: a processual,
proposta por Denise Jodelet; a relacional, por Willem Doise; e a estrutural ou, como
inicialmente denominada, de teoria do núcleo central, inaugurada por Jean-Claude Abric (SÁ,
1998, 2002).
Considerando os objetivos do presente estudo, serão apresentados neste capítulo os
principais elementos teóricos relacionados à abordagem estrutural das representações sociais.
II.2 A TEORIA DO NÚCLEO CENTRAL E O CONCEITO DE ZONA MUDA DAS
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS
De acordo com (1998), a abordagem estrutural das representações sociais foi a
única das abordagens complementares que chegou a formalizar-se como uma teoria, tendo,
por isso, sido denominada de teoria do núcleo central. Flament (2001b), salienta que esta,
fundamentalmente, contribui para tornar mais heurística para a prática social e para a pesquisa
a teoria das representações sociais.
A abordagem estrutural teve sua origem a partir da tese de doutorado Abric, em 1976,
no contexto da qual ele formulou a hipótese da existência de um núcleo central das
representações sociais, sustentando que estas possuem uma característica específica: a de
serem organizadas em torno de um ou mais elementos, os quais confeririam significado à
representação (ABRIC, 2000; SÁ, 1998, 2002).
De acordo com a perspectiva trazida pela abordagem estrutural, as representações
sociais são compostas por um sistema central, com elementos que fazem a nucleação da
representação, e por um sistema periférico, com características e funções distintas daquelas do
sistema central. As representações sociais e os seus dois componentes referidos funcionariam
como uma entidade, com papéis específicos e complementares (ABRIC, 1994; FLAMENT,
2001b; OLIVEIRA, 2001; SÁ, 2002).
Nesta perspectiva, para Flament (2001b), uma representação social é um sistema
dentro do qual o núcleo central é uma estrutura que determina a organização de todo o sistema
representacional. Constitui-se, assim, em um subconjunto da representação, composto de um
ou de alguns elementos, cuja ausência desestruturaria ou daria um significado radicalmente
diferente à representação em seu conjunto (ABRIC, 2001).
44
A respeito da determinação do sistema central, ou núcleo central, Abric (2000) afirma
que esta é essencialmente social, ligada às condições históricas, sociológicas e ideológicas,
sendo este sistema diretamente associado aos valores e normas, definindo os princípios
fundamentais em torno dos quais se constituem as representações. Para o mesmo autor, “é a
base comum propriamente social e coletiva que define a homogeneidade de um grupo, através
dos comportamentos individualizados que podem parecer contraditórios”, tendo um papel
imprescindível na estabilidade e coerência da representação, assegurando sua perenidade.
(ABRIC, 2000, p.33).
Enquanto estrutura organizada, o núcleo central possui três funções essenciais
(ABRIC, 1994, 2000, 2001, 2003a; SÁ, 1996, 2002; OLIVEIRA, 1996, 2001):
uma função geradora: é o elemento por meio do qual se cria, ou se transforma, o
significado dos outros elementos constitutivos da representação, conferindo sentido aos
mesmos;
uma função organizadora: ele determina a natureza dos vínculos, unindo entre si os
elementos da representação, sendo, portanto, o elemento unificador e estabilizador da
representação; e
uma função estabilizadora: confere estabilidade à representação social acerca de
determinado objeto.
Assim, o núcleo central é duradouro e evolui, geralmente, de forma muito lenta. Além
disso, é relativamente independente do contexto imediato dentro do qual o sujeito utiliza ou
verbaliza suas representações, pois sua origem está em outro lugar: no contexto global que
define as normas e os valores dos indivíduos e grupos (ABRIC, 2000). Ele é determinado, por
um lado, pela natureza do objeto representado e, por outro, pela relação que o sujeito mantém
com tal objeto. De modo mais preciso, podemos dizer que é a finalidade da situação na qual
se produz a representação que vai determinar seus elementos centrais (ABRIC, 2001).
Dessa forma, como afirmam Abric (1994) e (2002), o núcleo central pode assumir
duas dimensões distintas:
uma dimensão funcional, como por exemplo, em situações com uma finalidade operatória,
serão, então, privilegiados na representação e constituirão o núcleo central os elementos mais
importantes para a realização da respectiva tarefa; e
uma dimensão normativa, em todas as circunstâncias onde intervêm diretamente
componentes sócio-afetivos, sociais ou ideológicos. Em tal tipo de situação, pode-se pensar
45
que uma norma, um estereótipo, uma atitude fortemente marcada estarão no centro da
representação.
No que se refere ao caráter normativo do núcleo central, pode-se observar três
posições, segundo Flament (1999): Abric (1976) sugere que este núcleo pode ser formado por
elementos normativos e funcionais; Moliner (1995) propõe um modelo bi-dimensional
fazendo aparecer quatro campos, dentre os quais na zona do núcleo central, o campo das
normas; Flament (1994) propõe considerar a representação como inteiramente composta de
prescrições, ou seja, de normas.
Esta dimensão afetiva, ao que alguns autores denominam de “dimensão atributiva”, é
importante à medida que influencia, e às vezes organiza ou determina, cognições ou
comportamentos normativos (CAMPOS; ROUQUETTE, 2003).
Em trabalho acerca da afetividade no contexto das representações sociais, mais
especificamente, em sua abordagem estrutural, Campos e Rouquette (2003) propõem que a
dimensão afetiva mantém uma relação não-aleatória com o núcleo central das representações.
Isto porque, para os referidos autores, esta dimensão não se constitui em uma estrutura
paralela, nem em uma subestrutura secundária. Conforme as diferentes situações, a
representação é ativada de modo mais normativo ou funcional, podendo ser ativados,
portanto, elementos mais ou menos carregados afetivamente.
A respeito da determinação do sistema periférico, Abric (2000) afirma que esta é mais
individualizada e contextualizada, estando este sistema mais associado às características
individuais e ao contexto imediato e contingente, nos quais os sujeitos encontram-se
inseridos. Para o autor, “o sistema periférico permite uma adaptação, uma diferenciação em
função do vivido, uma integração das experiências cotidianas”, permitindo modulações
pessoais em referência ao núcleo central comum, gerando representações sociais
individualizadas (ABRIC, 2000, p. 33).
Sendo mais flexível que o sistema central, o sistema periférico o protege de algum
modo, permitindo a integração de informações e, mesmo, de práticas diferenciadas. Comporta
uma determinada heterogeneidade de comportamentos e de conteúdo, pelo que não consiste
em um componente menor da representação. Pelo contrário, é fundamental, pois em
associação ao núcleo central, permite a ancoragem na realidade social dos sujeitos
(FLAMENT, 2001b; OLIVEIRA, 2001; SÁ, 2002).
Além disso, entende-se que a heterogeneidade do sistema periférico não é sinal da
existência de representações diferenciadas, pelo contrário, a análise do sistema periférico
constitui um elemento essencial no estudo dos processos de transformação das representações,
46
sendo um importante indicador de futuras alterações ou um sinal indiscutível de uma evolução
nas situações onde a transformação de uma representação está em curso (ABRIC, 2000).
Assim, podemos concluir que o significado da representação de um grupo acerca de
um dado objeto social é encontrado no núcleo central e que duas representações só são
distintas se os núcleos se diferirem. Do mesmo modo, uma representação se transforma se
os elementos constitutivos do seu núcleo mudarem (ABRIC, 1994; FLAMENT, 2001b; SÁ,
1996).
A partir de pesquisas realizadas, Flament (2001b), ao abordar a relação entre as
práticas e as representações sociais, afirma que aquelas têm um papel preponderante no
desencadeamento de profundas transformações desta, em nível de seu núcleo central.
Algumas circunstâncias, independentemente de uma representação, podem levar uma
população a ter práticas em desacordo, mais ou menos violento, com a representação. Essas
discordâncias, então, passam a se inscrever nos esquemas periféricos que se modificam,
protegendo, por algum tempo, o núcleo central. Se o fenômeno se amplia, o núcleo central
pode ser atingido e modificar-se estruturalmente, levando, conseqüentemente, a uma real
transformação da representação.
Tendo em vista esses pressupostos, o mesmo autor aponta para a existência de dois
casos extremos de desacordo entre práticas e representações. Em um primeiro caso, as
práticas estão em contradição explícita com a representação, levando ao surgimento do que
denominou de esquemas estranhos. Na presença desses esquemas, a eventual modificação da
representação sebrutal, rompendo com o passado. Em um segundo caso, as práticas são
admitidas pela representação, mas ocorrem apenas de forma esporádica, ao passo que as
circunstâncias da situação as tornam muito freqüentes, determinando uma modificação no
nível de ativação dos esquemas periféricos. Nessa situação, a eventual modificação da
representação será progressiva, sem ruptura com o passado.
Considerando as relações entre práticas e representações, bem como as pressões
sociais que cumprem papel importante na determinação das representações sociais, destaca-se
a proposição do conceito de zona muda das representações sociais (ABRIC, 2003b), que será
discutido a seguir.
Abric (2003b, 2005), ao propor a noção de zona muda das representações, o faz a
partir de alguns questionamentos, os quais considera essenciais, não apenas para o campo das
representações sociais, mas para os pesquisadores em geral, envolvidos nas pesquisas sobre o
universo do pensamento. Tais inquietações são as seguintes: quando uma população responde
47
a uma sondagem sobre representações, ela nos fornece, de forma verdadeira e completa, a sua
representação? Coletamos representações reais, completas e autênticas?
Em um certo número de ocasiões, sustenta Abric (2005), a resposta é “sim”,
entretanto, em todo um conjunto de outras situações, numerosos problemas surgem:
defasagens entre o que as pessoas dizem e o que pensam, entre o seu discurso e sua prática, ou
seja, entre as representações recolhidas pelos pesquisadores e as representações presentes na
mente das pessoas.
Considerando o papel da normatividade social na expressão das representações
sociais, Flament (1999) desenvolveu uma pesquisa sobre a representação do estudo entre
estudantes de Psicologia. Nesta investigação, afirma que a idéia do papel da normatividade
em uma representação social não é nova, lembrando que Abric, em 1976, sugere que no
núcleo central elementos normativos e funcionais e que, a pesquisa experimental de Abric
e Taffani (1995) pereceu mostrar que alguns elementos podem ser, por vezes, funcionais ou
normativos.
Deste modo, apresenta Flament (1999) a idéia segundo qual as repostas coletadas em
um estudo habitual refletem, amplamente, as opiniões bem vistas ou mal vistas por
determinadas instâncias de referência. Não porque os sujeitos se declarem sobre tal influência,
mas pela correlação observada entre as respostas ditas padrão (aos questionários tradicionais)
e aquelas da referência.
Tal idéia pôde ser comprovada por meio da aplicação de um questionário tradicional e,
após, com a solicitação de que os sujeitos respondessem às mesmas questões deste, como se
fossem bem vistas e mal vistas pelos professores, pessoas entre 40 e 50 anos e outros
estudantes. Os resultados mostraram semelhanças entre as respostas dadas ao questionário
padrão e aquelas na situação normativa de bem vistos em relação a todas as referências
mencionadas e, também, do instrumento normativo mal visto entre si. Além disso, as
respostas dadas às diferentes referências variaram, sugerindo que modelos normativos
diferentes produzem influências diferentes (FLAMENT, 1999).
Neste sentido e a partir de uma série de trabalhos posteriores, Flament, Guimelli e
Abric (2006) afirmam que uma representação social pode ter várias facetas, das quais algumas
não são expressas em todas as circunstâncias. Conforme Abric (2003b, 2005), para objetos
mais sensíveis, intensamente permeados por valores e normas sociais, os sujeitos podem, em
determinadas situações, não exprimir todo o conteúdo de sua representação social. Nestas
situações, pode-se dizer que existem duas facetas ou dois componentes da representação: uma
representação explícita, verbalizada pelas pessoas; e uma segunda parte da representação, não
48
verbalizada ou não expressa, o que se denomina zona muda (em francês, zone muette),
recentemente também apresentada por Flament, Guimelli e Abric (2006) como zona
mascarada (em francês, zone masquée).
É importante salientar que, como assevera Abric (2003b, 2005), a zona muda não se
caracteriza por processos inconscientes da representação, ou o recalcado da teoria
psicanalítica. Ela faz parte da consciência dos sujeitos, contudo seus elementos não podem ser
expressos pelos mesmos, porque não desejam fazê-lo pública ou explicitamente.
A partir destas constatações, Abric (2005) explica que a existência de uma zona muda
ou mascarada de uma representação social de determinado objeto sensível, deve-se às normas
sociais, sendo os elementos não explicitados ou escondidos, imbuídos de um caráter contra-
normativo. Assim, a zona muda seria um subconjunto específico de cognições e de crenças
que, mesmo disponíveis, não são expressas pelos sujeitos nas condições normais de produção
e, se assim o fossem, poderiam pôr em questão os valores morais ou as normas valorizadas
pelo grupo (GUIMELLI; DESCHAMPS, 2000).
Os sujeitos são confrontados com pressões sociais mais ou menos intensas, segundo o
nível de sensibilidade do objeto da representação e os sujeitos selecionam os aspectos
expressáveis da representação em função do contexto normativo que percebem na situação na
qual se encontram. Com isso, tem-se por resultado a produção de um discurso que se poderia
classificar como “politicamente correto” acerca do objeto representado (ABRIC, 2003b, 2005;
FLAMENT; GUIMELLI; ABRIC, 2006; OLIVEIRA, 2004).
O aspecto, então, que subsidiaria a não explicitação de certos elementos da
representação em um dado contexto, bem como a não transgressão das normas sociais, seria a
participação de processos fundamentais de interação e comunicação social (ABRIC, 2005).
Um desses processos, denominado de gestão de impressões, consiste em querer dar aos outros
uma imagem positiva de si, e um dos meios de obtê-lo seria pela expressão de atitudes que
pareceriam as mais adequadas para cada situação. Citando os exemplos das pesquisas de
Sharp e Getz, aponta Abric (2005) para o fato de que os sujeitos podem ser levados a
verbalizar apenas atitudes, opiniões ou crenças conformes à norma, e não a expressão
daquelas contra-normativas, sendo os vieses cognitivos associados à auto-apresentação, uma
das causas de ocorrência da zona muda. De outro modo, a desiderabilidade social é, portanto,
um dos elementos fundadores da existência possível do processo de mascaramento das
representações sociais (ABRIC, 2005).
Remetendo, neste ponto, à questão do desenvolvimento da pesquisa em representações
sociais, pautada na abordagem estrutural, faz-se mister conhecer o que não é expresso pelos
49
sujeitos acerca da representação de um determinado objeto. Isto porque, se os elementos não
expressos são periféricos, não se trata de algo tão grave; porém, se são elementos do cleo
central, o significado da representação, em sua totalidade, encontrar-semascarado, ou seja,
“o não dito que é essencial, e toda representação coletada pelo pesquisador se torna
falsificada” (ABRIC, 2005, p.25).
Com esta preocupação, e partindo do entendimento de que as influências das normas
sociais vigentes em dado contexto levam à produção de zona muda, Abric (2005) aponta para
uma pista metodológica, no sentido da captação da mesma. O procedimento consistiria em
reduzir a pressão normativa exercida sobre o sujeito, no momento da coleta de dados. Ou seja,
é necessário, de algum modo, reduzir os mecanismos de defesa de ordem social, tornando
possível que os sujeitos possam exprimir os aspectos contra-normativos de suas
representações sociais.
No processo normativo, Abric (2003b; 2005) sinaliza, portanto, para dois elementos
considerados essenciais: o próprio sujeito e seu grupo de referência, posto que a norma social
resulta da interação entre esses agentes. Para a redução, então, da pressão normativa em uma
dada situação de coleta de dados, Abric (2005) sugere duas possibilidades: agir sobre o
sujeito, utilizando a técnica de substituição; e agir sobre o grupo de referência, mais
precisamente, tentando afastar o sujeito deste, por meio da técnica de descontextualização
normativa.
A técnica de substituição consiste em solicitar ao sujeito que responda, primeiramente
em seu próprio nome, as questões habituais de pesquisa, e posteriormente, demandar que o
faça no lugar de outras pessoas. Permitir-se-ia, desta maneira, ao sujeito manter uma certa
distância, reduzindo seu envolvimento, sob a justificativa de que “não sou eu quem pensa isto,
são os outros” (ABRIC, 2005, p.28). Ou seja, por meio da cobertura de outrem, seria possível
que a pessoa expressasse suas próprias idéias indesejáveis ou contra-normativas.
Trabalhos anteriores sobre objetos sensíveis de representação, como AIDS e trabalho
infantil e do adolescente, realizados por Thiengo, Oliveira e Rodrigues (2002), Oliveira et al.
(2000) e Oliveira (2004), demonstraram que este tipo de estratégia afeta de modo muito
importante o tipo de verbalização e os resultados obtidos.
No entanto, foram Guimelli e Deschamps (2000) os que primeiro sistematizaram e
utilizaram técnicas específicas para identificar a zona muda nas representações sociais na
abordagem estrutural, mais especificamente, em estudo sobre as representações sociais de
franceses acerca dos ciganos.
50
A aplicação inicial da técnica de substituição pelos referidos autores consistiu,
basicamente, em solicitar que as pessoas evocassem as primeiras palavras surgidas em suas
mentes ao pensarem no termo “ciganos”, e após, que o fizessem como se fossem “os
franceses, em geral”. Os resultados mostraram, na situação normal, os ciganos representados
como “nômades” e “músicos” e, na situação de substituição (falando pelos franceses, em
geral), aqueles foram representados, com maior freqüência, como “ladrões”. Evidenciou-se,
portanto, a presença de um importante elemento negativo, mascarado no contexto tradicional
de coleta, sugerindo uma apresentação mais positiva de si, pela norma de tolerância
(GUIMELLI; DESCHAMPS, 2000).
Outra interessante apropriação da técnica se deu por Deschamps e Guimelli (2004),
em estudo sobre a segurança e a insegurança, entre os franceses. Assim, na situação
tradicional ou normal de coleta, a segurança relacionou-se à “calma”, ordem”, “paz”, e a
insegurança surgiu como “medo”, “perigo” e outros sinônimos. Na substituição, entretanto,
emergiram, para a segurança, os termos “prevenção”, “armas”, “prisão”, “menos estrangeiros”
e, para a insegurança, surgiram “desemprego”, “estrangeiro”, “periferia”, “droga” e “jovens”.
Pode-se perceber, portanto, que falando pelos outros, observa-se o desvelamento de elementos
ligados à adoção de medidas de autodefesa e causas socialmente contestáveis em relação ao
objeto de representação, o que poderia gerar uma imagem negativa de si, se expressas pelos
depoentes.
É importante salientar que um limite importante desta técnica consiste na dificuldade
de interpretar as respostas obtidas, pois estas podem, efetivamente, apontar para um fenômeno
projetivo e revelar a zona muda de uma representação. Ou podem, simplesmente, refletir a
representação do sujeito a respeito de um outro grupo, sem a adição de elementos de suas
próprias representações, ou seja, produzir o efeito de uma transparência representacional
(ABRIC, 2003b, 2005; FLAMENT; GUIMELLI; ABRIC, 2006).
De todo modo, de acordo com Abric (2003; 2005), a técnica de substituição permite
levantar hipóteses sobre a existência e a natureza da zona muda das representações sociais.
Porém, é importante salientar que, em um estudo experimental desenvolvido por Flament,
Guimelli e Abric (2006), os efeitos produzidos por esta técnica se integraram de maneira
unidimensional (Efeito Guttman), a outras variáveis não relacionadas com a transparência,
conferindo maior validade à sua aplicação e resultados no sentido do desvelamento de
elementos escondidos em uma representação social.
Por sua vez, a técnica de descontextualização normativa foi estruturada de acordo com
a idéia de que a pressão normativa sobre um sujeito é mais forte quando é dirigida a alguém (a
51
um destinatário) com quem são compartilhados os mesmos valores. Assim, seria bem mais
fácil expressar idéias desviantes, contra-normativas, em face de uma pessoa menos próxima
ao sujeito, ou com quem ele pensa não compartilhar o mesmo sistema de valores (ABRIC,
2003b, 2005). Deve-se, então, nesta técnica, utilizar duas condições de coleta de dados: uma
dita normal, quando os sujeitos pensam responder para um pesquisador que compartilha o seu
sistema de valores, ou o mesmo grupo de referência com relação ao objeto estado; e uma
condição de descontextualização normativa, propriamente dita, em que os sujeitos pensam
responder a um pesquisador que não pertence ao seu grupo de referência em relação ao objeto
de estudo.
A técnica de descontextualização normativa foi utilizada, segundo Abric (2003b,
2005), em uma pesquisa sobre as representações sociais de estudantes de Letras de Aix-en-
Provence, na França, acerca dos magrebinos. O procedimento consistiu, portanto, em produzir
um contexto normal, no qual pesquisadores se apresentavam aos sujeitos do estudo como
estudantes de Letras, portanto, compartilhando valores e normas sociais com aqueles, e
realizavam a coleta de dados. Após, constituía-se a situação de descontextualização
normativa, em que os pesquisadores se apresentavam aos depoentes como estudantes de
Direito, com os quais, então, aqueles não compartilhavam o mesmo universo de valores e
normatividade.
Os resultados obtidos com o procedimento mostraram-se interessantes, com o
aparecimento, na situação normal, como elementos mais freqüentes, geografia”, cultura”,
“racismo” e “caloroso” e, na situação de descontextualização, os seguintes: “geografia”,
“delinqüência”, “racismo” e “imigração”. Tais achados sugerem, novamente, a busca por uma
apresentação mais positiva de si, na coleta habitual e uma transgressão à norma de tolerância
e não discriminação na situação de diminuição da normatividade, que poderia permitir uma
má impressão dos depoentes (ABRIC, 2003b, 2005).
Há, ainda, outras técnicas e uma combinação entre as mesmas, relatadas por Flament,
Guimelli e Abric (2006), como a ativação do estereótipo e a articulação entre a técnica de
substituição e descontextualização normativa, por exemplo. Porém, como foram, ainda, pouco
exploradas, não serão explicitadas neste capítulo.
Além dos elementos discutidos, faz-se pertinente destacar as reflexões de Codol
(1972), o qual aponta que a relação entre representações e comportamentos, aqui
compreendidos aqueles relacionados à situação de coleta de dados, remontam à importância
da representação da tarefa, do outro, do grupo e do contexto. Tais aspectos poderiam
influenciar, portanto, na percepção da normatividade presente na situação de aplicação das
52
técnicas de coleta de dados, levando a uma produção ou mascaramento de elementos
“politicamente corretos” ou contra-normativos.
É importante, também, ressaltar, como Flament, Guimelli e Abric (2006), que as
pesquisas desenvolvidas neste campo têm como foco a situação de coleta de dados, levando a
duas pontuações: um relativo aos métodos de estudo; e, outro, em relação a uma eventual
generalização a outras situações de comunicação. Em relação ao primeiro ponto, questionam
os autores: tendo em vista as diferenças evidenciadas entre os resultados, a partir de diferentes
situações normativas, onde estaria a verdadeira representação? Respondem, então, que estaria
na totalidade do corpus discursivo que se pretenderia coletar, lembrando que a coleta jamais é
exaustiva e que variáveis, como tipo de questionamento, pesquisador, sexo dos depoentes,
ativação do estereótipo e ordem de aplicação de questionários podem, igualmente, contribuir
com a elucidação dos efeitos de mascaramento/desmascaramento.
Considerando o segundo ponto, em relação à generalização dos resultados produzidos
pelas referidas técnicas para situações cotidianas, afirmam que os aspectos envolvidos
possuem naturezas distintas das enquetes, sendo aquelas muito mais complexas. Assim, trata-
se de um campo de pesquisa distinto do examinado pelos estudos estruturais, mesmo se
alguns dos resultados produzidos nestes sejam susceptíveis de serem naquele evocados
(FLAMENT; GUIMELLI; ABRIC, 2006).
Posto isto, no capítulo ulterior será descrito o percurso metodológico da presente
pesquisa, com a delimitação do tipo de estudo, sujeitos, campos e técnicas de coleta e análise
dos dados.
53
III. TRAJETÓRIA METODOLÓGICA
Trata-se de um estudo quali-quantitativo, descritivo, pautado na abordagem estrutural
da teoria das representações sociais, tal qual apresentada por Abric (1994, 2000, 2003a,
2003b), Sá (1996, 2002), Campos (2003) e Oliveira (1996, 2001).
O desenvolvimento do estudo teve sua fase de campo, de tratamento e análise dos
dados divida em dois momentos, para os quais se fez necessário uma configuração específica
de sujeitos e técnicas de pesquisa. Os resultados obtidos na análise da primeira etapa de
campo subsidiaram a construção das estratégias e dos instrumentos aplicados na segunda.
Esta estratégia teve por base a idéia de que estudar o conhecimento que os indivíduos
possuem acerca de um dado objeto e a maneira pela qual este é organizado e utilizado pelos
grupos sociais, implica numa perspectiva incontornável da pluri-metodologia (ABRIC, 1994;
APOSTOLIDIS, 2003; SÁ, 1998). A idéia desses e de outros autores de que as representações
sociais não podem se satisfazer de apenas um método de estudo não é nova, sendo
constantemente discutidos o interesse e a necessidade de um tipo de abordagem pluri-
metodológica para circunscrever os fenômenos representacionais, no contexto de sua
complexidade. Acrescenta Apostolidis (2003), que este tipo de abordagem permitiu o avanço
teórico e a produção de exemplos, atestando o valor heurístico da teoria de representações
sociais. Deste modo, esta estratégia visa conferir não somente validade, mas também, e,
sobretudo, rigor, amplitude e profundidade à pesquisa.
Considerando a pluralidade de decisões e das técnicas envolvidas no presente estudo,
para propiciar uma maior inteligibilidade, a descrição do trajeto percorrido em cada etapa será
realizada separadamente, a seguir.
III. 1 PRIMEIRA FASE DO ESTUDO
Esta primeira fase do estudo teve como objetivo a identificação da estrutura da
representação social da AIDS, no inteiro grupo de enfermeiros participantes da pesquisa, bem
como da estruturação da representação em dois contextos normativos específicos normal e
substituição, conforme proposto por Abric (2003b). Além destes dois objetivos buscou, ainda,
analisar as dimensões associadas ao objeto de estudo em questão e o universo semântico
empregado pelos sujeitos.
54
Assim, os sujeitos desta fase foram 150 enfermeiros pertencentes ao quadro
permanente, de um hospital universitário localizado no município do Rio de Janeiro. Tal
instituição de saúde possuía, no período de desenvolvimento da presente investigação,
aproximadamente, 180 enfermeiros no desenvolvimento de atividades, correspondendo ao
universo de sujeitos. Portanto, participaram deste momento do estudo, 83,3% do universo de
profissionais do referido hospital. A sua inclusão se deu de modo aleatório, de acordo com a
presença no local de trabalho nos dias delimitados para a coleta de dados.
A escolha destes sujeitos se deu pela natureza das atividades que desenvolvem nessa
instituição, estando em interação com expressivo e diversificado quantitativo de clientes e
também em situações de contato e interação com os mesmos, envolvendo dimensões direta ou
indiretamente atingidas pela epidemia do HIV/AIDS, como demonstra o estudo de Gir et al.
(2000), sobre as alterações nas práticas profissionais de enfermeiros em hospitais, em
decorrência do surgimento do HIV/AIDS. Somado a isto, Giami et al. (1997) apontam para o
fato de que as enfermeiras são, e poderão ser ainda mais, alvos privilegiados de estudos
sobre o HIV/AIDS, considerando parâmetros como informação, sensibilização e contato com
os clientes, bem como pela natureza das suas atividades, contexto de trabalho e, mesmo, em
sua vida privada, com implicações para familiares, amigos ou outros. Para estes, pode-se dizer
que elas constituem-se como referência em questões relacionadas com o processo saúde-
doença.
No que se refere aos aspectos éticos, a participação dos sujeitos no estudo se deu
conforme a Resolução 196/96, do Conselho Nacional de Saúde (CNS), tendo sido garantidas
as condições que preservam a dignidade da pessoa humana, com o projeto de pesquisa
aprovado por um Comitê de Ética em Pesquisa.
Assim, os sujeitos foram esclarecidos em relação ao estudo, aos seus autores e
instituição de vinculação, bem como acerca das implicações de sua participação no mesmo,
com a disponibilização do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (APÊNDICE A), do
qual ficou uma cópia em poder do entrevistado e outra com o pesquisador, ambas assinadas
pelos dois. Foi garantido o anonimato dos participantes, o sigilo em relação às informações
concedidas, bem como o direito à desistência a qualquer momento da pesquisa. Além disso,
não houve ônus ou bônus aos sujeitos por sua aceitação em integrar a pesquisa e riscos
associados à integração no estudo.
Os campos de coleta de dados foram 47 setores de um hospital universitário situado no
município do Rio de Janeiro. Esta instituição tem por características: ser de grande porte;
possuir atendimento nas variadas especialidades clínicas e cirúrgicas e de alta-complexidade;
55
assistência na área de saúde materno-infantil, saúde mental e saúde do adolescente; dispor de
um serviço de acompanhamento ambulatorial nas referidas especialidades; contar com um
Banco de Sangue; e constituir-se, também, em um Serviço de Assistência Especializada
(SAE) em HIV/AIDS (BRASIL, 2007).
Cabe, neste ponto, destacar que o objetivo dos SAE é, fundamentalmente, prestar um
atendimento integral e de qualidade aos pacientes, por meio de uma equipe de profissionais de
diversas áreas da saúde. Entre suas atividades estão: cuidados de enfermagem; orientação e
apoio psicológico; atendimento ginecológico, pediátrico e odontológico; controle e
distribuição de anti-retrovirais; distribuição de preservativos; atividades educativas para
adesão à terapia anti-retroviral e para prevenção e controle de DST e AIDS (BRASIL, 2007).
As atividades destacadas propiciam um maior contato e interação entre os profissionais que
atuam neste cenário e as pessoas soropositivas ao HIV ou com AIDS, que demandam por
atendimento em seus diferentes serviços e em diversos momentos, sendo importante contexto
para desenvolvimento de estudos psicossociais referentes aos fenômenos ligados ao
HIV/AIDS (JODELET, 2005; GIAMI et al., 1997).
A delimitação de setores do hospital com características variadas como campos de
estudo, pautou-se no entendimento de que as pessoas soropositivas ao HIV ou com AIDS
demandam por atendimento devido à outras necessidades de saúde, além daquelas associadas
ao campo das Doenças Infecto-Parasitárias (DIP). Este fato proporciona, assim, o contato de
profissionais dispostos em diferentes espaços do hospital com estes clientes. Considerou-se
também, que após a introdução da HAART, em 1996, observou-se um aumento no tempo de
vida das pessoas soropositivas ao HIV ou com AIDS, dando origem a outras demandas
relacionadas aos efeitos colaterais da terapêutica anti-retroviral, como comprometimentos
cardiovasculares e lipodistrofia, só para citar alguns (ANDRADE; COTTER, 2006; JAIME et
al., 2006).
Além disso, dado o impacto do surgimento do HIV/AIDS no final do século XX,
como apontam Marques, Oliveira e Francisco (2003), a representação social do HIV/AIDS e
de seus atingidos foi socialmente construída e compartilhada por diversos grupos, entre os
quais o de enfermeiros, em que esta questão compõe, também, o repertório da formação
profissional.
Isto posto, pode-se concluir que nos diferentes espaços de atendimento do referido
hospital, e não somente nas unidades relacionadas às DIP, os profissionais em foco precisam,
em seu cotidiano, tomar decisões e posições acerca de dimensões ligadas às questões trazidas
à baila pelo HIV/AIDS e pela possibilidade de contato com seus atingidos.
56
Esta instituição, outrossim, encontra-se entre as primeiras a atender pessoas infectadas
pelo HIV ou com AIDS, ainda na década de 80, em um contexto em que se dispunha de
quantitativo reduzido de conhecimentos científicos sobre a doença. Como relatam alguns dos
autores deste período, mesmo os profissionais apresentavam muitas dúvidas sobre diversos
aspectos relacionados à AIDS, tendo que se adaptar à nova realidade (MENEGHIN, 1986).
Além disso, por se tratar de um hospital universitário, portanto, significativamente
ligado à pratica de ensino e à pesquisa, configura-se como um espaço de circulação e contato
de diversos tipos de saberes e experiências, considerando a presença de diferentes categorias
profissionais, com diferentes inserções sociais, alunos de graduação e pós-graduação, bem
como os usuários de seus serviços, entre os quais, pessoas que vivem com o HIV/AIDS.
Nesta etapa da fase de campo, que se deu no período compreendido entre 05 janeiro e
15 de fevereiro de 2007, aplicou-se um instrumento (APÊNDICE B) direcionado à
caracterização sócio-econômica dos sujeitos e de dados referentes à variáveis previamente
delimitadas como relevantes para a compreensão do objeto de estudo, tais como tipo e tempo
de contato com pessoas soropositivas ao HIV ou com AIDS. Um segundo instrumento
correspondeu à coleta dos dados resultantes da técnica de evocações livres e da técnica de
substituição (APÊNDICE C), as quais serão explicitadas, subseqüentemente.
III.1.1 TÉCNICA DE EVOCAÇÕES LIVRES E DE SUBSTITUIÇÃO
A técnica de evocações livres é, também, conhecida como associação livre ou teste por
associação de palavras. Caracteriza-se como um teste projetivo que teve sua origem na
Psicologia Clínica, e que tem por objetivo ajudar a localizar as zonas de bloqueamento e de
recalcamento do pensamento, isto é, a exclusão do campo da consciência, de certas idéias,
sentimentos e desejos que o indivíduo não quer admitir, e que, entretanto, continuam a fazer
parte da vida psíquica (OLIVEIRA et al., 2005).
Abric (1994) afirma que, apesar de ser também baseado numa produção verbal, o
método das evocações ou associações livres permite reduzir as dificuldades e os limites das
expressões discursivas habitualmente utilizadas nas pesquisas de representações sociais.
A evocação livre possibilita a apreensão das projeções mentais de maneira
descontraída e espontânea, revelando, inclusive, os conteúdos implícitos ou latentes que
podem não ser revelados nas produções discursivas. Somado a isso, ela leva à obtenção do
conteúdo semântico de forma rápida e objetiva. Pode-se, ainda, considerar que, em ambos os
57
casos, se diferencia de outras técnicas de coleta de dados, como a entrevista e o questionário
(OLIVEIRA et al., 2005).
A aplicação dessa cnica em estudos de grupos sociais permite o alcance de dois
objetivos: o de estudar os estereótipos sociais que são partilhados espontaneamente pelos
membros do grupo; e a visualização das dimensões estruturantes do universo semântico
específico das representações sociais (OLIVEIRA et al., 2005).
A coleta de dados, propriamente dita, consiste em solicitar aos sujeitos que produzam
um determinado número de palavras ou expressões que lhe ocorrerem, a partir de um termo
indutor dado, para, seguidamente, solicitar aos mesmos que organizem suas respostas em
ordem de importância, da mais para a menos importante. Esse último procedimento na coleta
produzirá uma nova ordem de dados hierarquizados pelo sujeito, freqüentemente diferente da
hierarquia natural ou espontânea, que, associada ao cálculo das freqüências, permitirá o
estabelecimento de uma hipótese de centralidade dos diversos elementos produzidos
(OLIVEIRA et al., 2005; SÁ, 2002). O termo indutor utilizado neste estudo foi “portador do
HIV/AIDS”, sendo o enunciado configurado do seguinte modo: “Diga as cinco primeiras
palavras ou expressões que vêm imediatamente à sua mente ao pensar na expressão “portador
do HIV/AIDS”.
A escolha do termo indutor no estudo da zona muda é um capítulo importante, uma
vez que, além de corresponder ao objeto em estudo, deve também suscitar no sujeito os
conteúdos de pensamento reprimidos associados a esse objeto. Para a escolha da expressão
indutora foram, testados, previamente, os termos “AIDS” e “portador do HIV/AIDS”, e
comparados os seus achados, tanto na técnica de evocação quanto na de substituição, em
termos daqueles com maior potencial para revelar a zona muda da representação social da
AIDS. Assim, este último apresentou melhores resultados, tendo sido selecionado para o
emprego na pesquisa.
De acordo com Oliveira et al. (2005), a quantidade de palavras ou expressões a serem
evocadas deve ser previamente estabelecida pelo pesquisador, recomendando-se que não
exceda seis palavras, pois a partir de sete palavras um declínio na rapidez das respostas,
descaracterizando a técnica no que se refere à sua naturalidade e espontaneidade. Assim,
delimitamos como cinco o número de palavras ou expressões produzidas por cada sujeito da
pesquisa.
O produto das evocações pode ser registrado de diferentes formas: em um formulário
impresso, estruturado, contendo espaço para as palavras ou expressões e para a numeração
correspondente à ordem das evocações produzidas; pode ser auto-aplicado ou aplicado pelo
58
entrevistador; ou registrado em fitas cassete durante a realização da entrevista e transcrito,
posteriormente (OLIVEIRA et al., 2005).
Optou-se, deste modo, por um instrumento estruturado impresso, o qual foi aplicado
individualmente e preenchido com as evocações pelos próprios entrevistados, tendo em vista
propiciar uma maior liberdade para os mesmos no decorrer do processo.
O pesquisador apresentava, inicialmente, as orientações sobre o preenchimento do
formulário, inclusive, com uma dramatização prévia para familiarização com a técnica a partir
de outros termos indutores de caráter mais lúdico. Durante o preenchimento do instrumento
pelos enfermeiros participantes da pesquisa, o pesquisador manteve-se presente para o
esclarecimento de dúvidas, caso necessário.
Como mencionado em momento anterior, a técnica de evocações livres descrita foi
associada à técnica de substituição, para a demarcação e identificação de hipóteses de
elementos da zona muda da representação estudada, conforme proposto por Abric (2003b,
2005).
A técnica de substituição objetiva a diminuição das pressões normativas sobre o grupo
estudado, por meio do deslocamento dos sujeitos do contexto marcado pela normatividade.
Assim, conforme Abric (2003b, 2005), seria possível a obtenção de elementos com caráter
contra-normativo presentes na representação, dos quais os sujeitos têm consciência, porém
escondem ou mascaram na situação de coleta de dados.
O referido deslocamento dos sujeitos das pressões normativas em jogo no contexto de
explicitação da representação social se daria, portanto, através da solicitação aos depoentes
para que, após falarem por si mesmos, o fizessem, também, como se fossem outros sujeitos
(ABRIC, 2003b, 2005). Foram testados, assim, diferentes grupos de referência para a
substituição em uma aplicação piloto do instrumento de coleta de dados, quais sejam:
enfermeiros em geral; profissionais de saúde em geral; equipe de saúde; e pessoas em
geral, tendo os três primeiros gerado resultados semelhantes no sentido da expressão,
fundamentalmente, de conteúdos de conhecimento profissional relacionado ao objeto. Por
outro lado, o último grupo permitiu o acesso, além de aspectos de conhecimentos científicos
sobre o termo indutor delimitado, aos aspectos mais subjetivos, ligados à questões morais e
julgamento de valor.
Deste modo, pensou-se ser mais pertinente a adoção do deslocamento dos sujeitos do
estudo, em substituição, pelas pessoas em geral, tendo em vista a obtenção de elementos
possivelmente velados sob o prisma da normatividade profissional.
59
Assim, para um melhor entendimento, pode-se sistematizar o procedimento de
aplicação da técnica de evocações livres associada à de substituição.
Primeiramente, foi solicitado aos sujeitos que escrevessem no devido espaço no
instrumento de coleta de dados as cinco primeiras palavras ou expressões que lhe viessem
imediatamente à mente ao pensar no termo indutor “portador do HIV/AIDS”, com a
hierarquização subseqüente das mesmas, da mais para a menos importante, o que se
configurou como a produção de respostas em situação normal. Após, solicitamos aos
enfermeiros que registrassem, igualmente, em espaço apropriado no referido instrumento,
quais as cinco primeiras palavras ou expressões, em suas concepções, viriam imediatamente à
mente das pessoas em geral, a partir do mesmo termo indutor citado, com ulterior
hierarquização dos termos, também, como pensavam que fariam estes últimas,
correspondendo ao denominado de situação de substituição.
Obteve-se, deste modo, de cada depoente, 10 palavras ou expressões hierarquizadas
por importância, referentes ao termo indutor em tela, das quais cinco correspondiam à
situação normal e as cinco demais, à situação de substituição. Os elementos oriundos desta
última consistiram, então, em hipóteses para a zona muda das representações sobre a pessoa
soropositiva ao HIV ou com AIDS para o grupo estudado.
III.1.2 ANÁLISE DAS EVOCAÇÕES LIVRES EM SITUAÇÃO NORMATIVA NORMAL E NA
SUBSTITUIÇAO
A análise do material coletado por meio da técnica de evocações livres associada à
técnica de substituição foi realizada com o auxílio do software desenvolvido por Vergès,
denominado EVOC (Ensemble de programmes permettant l’analyse des evocations) versão
2003, o qual permite a organização das evocações produzidas de acordo com as suas
freqüências e com a ordem de evocação, que neste estudo foi hierarquizada pelos sujeitos. .
De acordo com Oliveira et al. (2005) e Sá (1996, 2002), o cruzamento entre estes dois
critérios (freqüência e hierarquização das evocações) possibilita a formação de um Quadro de
Quatro Casas, que expressa o conteúdo e a estrutura das representações sociais para dado
objeto de estudo. Utilizou-se da construção desse quadrante, portanto, para os dois corpus de
análise - em situação normal e em situação de substituição, resultando em dois quadrantes
passíveis de serem comparados através de uma análise qualitativa.
É relevante ressaltar que o EVOC 2003 realiza, também, a comparação estatística por
meio do Teste t de Student ou Teste t, entre as produções semânticas de subgrupos de sujeitos
60
ou sub-populações. Utilizando essa ferramenta foi efetivada a comparação entre as evocações
dos dois sub-corpora - em situação normal e em situação de substituição.
Para a realização do conjunto da análise, conforme apontado por Oliveira et al. (2005),
tornou-se necessário a efetivação de alguns procedimentos específicos em cumprimento aos
requisitos do referido software e ao objetivo de comparação entre os dois contextos
normativos, que se concebe como distintos.
Inicialmente, foi realizada a digitação, em tabela no programa Microsoft WORD, do
software Microsoft Office, e uma padronização preliminar dos termos evocados, com correção
ortográfica, substituição das preposições ou espaços das expressões por hífen, uniformizando
os termos em forma plural ou singular e conforme o gênero, de acordo com cada caso. Neste
momento, tentou-se, ao máximo, a preservação das evocações como dispostas pelos sujeitos.
Em seguida, realizou-se a construção de um corpus, com as evocações hierarquizadas
produzidas pelos 150 sujeitos no programa Microsoft WORD, do seguinte modo: uma
primeira coluna correspondente à variável identificação dos depoentes (composta por três
algarismos, por exemplo, 001, 002, 003...); uma segunda coluna, com uma codificação
referente à variável situação de coleta (normal ou substituição); e, em seguida, os termos
produzidos, antecedidos por algarismos de 1 a 5, concernente à sua importância para os
participantes da pesquisa.
Para propiciar a comparação estatística entre a situação normal e de substituição, foi
construído um único corpus com as evocações em ambos os contextos, sendo: a identificação
de 001 a 150, na primeira coluna, associada à codificação “1” na segunda, correspondente às
evocações feitas ao termo indutor por si mesmos, ou seja, na situação normal de coleta; e a
identificação de 151 a 300, na primeira coluna, junto à codificação “2” na segunda, referente
às produções ao termo indutor pelas pessoas em geral, ou seja, na situação de substituição.
Esta codificação foi previamente definida, com a construção de um instrumento orientador.
Em seguida, procedeu-se a uma padronização das palavras e termos evocados, tendo
em vista a redução da dispersão dos seus conteúdos. Conforme sugerem Oliveira et al. (2005),
palavras ou expressões diferentes cujos significados são muito próximos foram padronizadas
com a mesma designação, garantindo que o sentido final expresso pelas mesmas fosse
mantido e, concomitantemente, pudessem ser reconhecidas pelo software como sinônimas.
Este processo ocorreu em dois momentos, pois ainda após a primeira padronização observou-
se que as produções referentes à situação normal mostraram-se sobremaneira dispersas, em
relação àquelas da situação de substituição, dificultando a comparação entre as mesmas.
61
Os termos homogeneizados foram então, substituídos nos corpora construídos
anteriormente. Com o intuito de preservar o universo semântico dos sujeitos, a ser utilizado na
interpretação dos resultados em etapa posterior, foi elaborado, a partir das referidas tabelas do
WORD, um dicionário de padronização das evocações (APÊNDICE D).
Isto feito, com o auxílio do programa WORD, o arquivo de documento (.doc) com o
corpus foi convertido em arquivo texto sem formatação ou somente texto (.txt) e deu-se,
então, início à utilização, propriamente dita, dos recursos do software EVOC 2003.
Como descrevem Oliveira et al. (2005), o software EVOC é formado por um conjunto
de programas articulados que, juntos, realizam a análise estatística das evocações. Em alguns
momentos, o pesquisador deve interferir em seu funcionamento para a definição de
parâmetros, porém, na maior parte das etapas de análise executadas, esta intervenção consiste
somente em preparações para cálculos seguintes ou fechamento de seus ciclos. Os programas
empregados neste estudo, foram: Lexique, Trievoc, Nettoie, Rangmot, RangFRQ, Selevoc e
Complex, acerca dos quais discorrer-se-á brevemente.
Os primeiros passos do EVOC são o Lexique e o Trievoc, que preparam o arquivo
para o passo seguinte, o Nettoie, em que a interferência do pesquisador no processamento.
Este último recurso viabiliza uma última revisão do conteúdo do arquivo de análise, bem
como sua correção (OLIVEIRA et al., 2005).
Após, efetiva-se a etapa Rangmot, que fornece um relatório com todas as palavras
evocadas, em ordem alfabética, e os cálculos estatísticos gerados na análise, ou seja, o número
de vezes em que cada termo apareceu em cada posição ou ordem de importância para os
sujeitos (1ª a 5ª), a freqüência total de cada palavra, o cálculo da média ponderada da ordem
de evocação para cada palavra, e a freqüência total e a média geral da ordem das evocações
(APÊNDICE E).
O próximo procedimento executado foi a aplicação do Selevoc, que permitiu a criação
de dois arquivos: evocnormal.tm3 e evocsubst.tm3 correspondentes, respectivamente aos
corpora com evocações produzidas na situação normal e na de substituição, a partir do corpus
unificado.
Os referidos arquivos foram, seguidamente, utilizados no programa Complex para a
comparação estatística com o “Teste t de Student” entre as produções semânticas na situação
normativa normal e aquelas elaboradas na substituição. Assim, foi gerado um relatório com a
discriminação dos termos presentes apenas no corpus da situação normal e no de substituição,
bem como com a referida comparação estatística dos elementos com freqüência igual ou
superior à cinco, comuns aos dois corpora (APÊNDICE F).
62
A partir dos dois arquivos mencionados, em formato de texto sem formatação,
gerados pelo Selevoc (um referente ao corpus da situação normal e outro da situação de
substituição), procedeu-se ao retorno, para cada um em separado, ao percurso inicial da
aplicação do EVOC, qual seja, os programas Lexique, Trievoc, Nettoie e Rangmot, com vistas
a construção dos dois quadrantes das representações em situação normal e substituição
Neste ponto, diferentemente do que foi realizado com o corpus unificado, como
orientam Oliveira et al. (2005), foi identificado na parte final do relatório gerado pelo
Rangmot, denominado distribuição das freqüências”, um ponto de corte para a freqüência
mínima de aparição dos termos, abaixo da qual aqueles presentes em cada corpus não
comporiam o Quadro de Quatro Casas, gerado ao final (APÊNDICES G e H). Este
procedimento se deu à luz da lei de Zipf, que permite, segundo Vergès (1999), identificar três
zonas de freqüências: uma primeira, na qual as palavras são muito pouco numerosas para uma
mesma freqüência; uma segunda, com palavras pouco numerosas para a mesma freqüência; e,
finalmente, uma terceira, utilizada como ponto de corte, onde o número de palavras é muito
importante para uma mesma freqüência.
Além da definição do ponto de corte, para viabilizar a etapa ulterior, a formação do
Quadro de Quatro Casas, fez-se necessário, para cada um dos corpura em questão, a
identificação do valor da freqüência média ou intermediária. Tal procedimento se efetivou
pelo seguinte cálculo, também com base na seção final do relatório Rangmot “distribuição das
freqüências”: acumulação inversa das evocações / somatório do número de palavras a partir
do ponto de corte delimitado anteriormente (APÊNDICES G e H).
Finalmente, com os dados gerados nos processos descritos, o próximo passo consistiu
em ter acesso, para cada corpus em separado e seus respectivos dados, ao programa
RangFRQ. Este, por sua vez, conforme Oliveira et al. (2005), permite a construção do Quadro
de Quatro Casas pela relação entre a freqüência mínima das evocações (definida no ponto de
corte), freqüência média (oriunda do cálculo apresentado em parágrafo anterior) e média das
ordens médias de evocação (gerado pelo Rangmot). Após a introdução desses parâmetros pelo
pesquisador, é possível a obtenção da edição da distribuição dos elementos pelos quadrantes
das Quatro Casas, o que foi realizado nesta investigação, para a situação normal e a de
substituição.
A configuração do Quadro de Quatro Casas, de acordo com Oliveira et al. (2005) e
(1996, 2002), se dá do seguinte modo: apenas os termos com freqüência maior ou igual à
freqüência nima estabelecida pelo pesquisador são dispostos na estrutura representacional;
os elementos com freqüência maior ou igual à freqüência média e com valor da ordem média
63
de importância (OMI) inferior ao da média das ordens médias de importância figurarão no
quadrante superior esquerdo do quadro; aqueles com freqüência menor que a freqüência
média e, no entanto, com a ordem média de importância menor que a média das ordens
médias de importância, encontrar-se-ão no quadrante inferior esquerdo; os termos com
freqüência maior que a freqüência média e com ordem média de importância maior que a
média das ordens médias de importância, terão lugar no quadrante superior direito; e, por fim,
aqueles com freqüência menor que a freqüência média e ordem média de importância maior
que a média das ordens médias de importância, serão localizados no quadrante inferior direito
(FIGURA 1).
FIGURA 1 ESQUEMA DO QUADRO DE QUATRO CASAS PARA A ANÁLISE DE EVOCAÇÕES LIVRES.
FONTE: Oliveira (2001).
A interpretação dos dados da análise das evocações livres se deu com base nos
pressupostos teóricos dos autores cuja produção vincula-se à abordagem estrutural das
representações sociais, no ínterim do qual mais especificamente, a zona muda.
Deste modo, de acordo com (1996, 2002), a combinação dos critérios freqüência e
ordem média de importância de cada termo possibilita um levantamento daqueles que
provavelmente pertencem ao núcleo central da representação, por seu caráter prototípico ou,
de outro modo, sua saliência. No Quadro de Quatro Casas, os elementos que, possivelmente,
compõem o núcleo central da representação encontram-se no quadrante superior esquerdo,
pois, como descrito anteriormente, contemplam os dois critérios em questão. Conforme Abric
(2003b), nem tudo que se encontra nesse quadrante é central, porém, dado o caráter
aproximativo da técnica, alguns elementos presentes em outras casas podem ser, também,
centrais na representação.
Neste sentido, Vergès (1994), citado por Sá (2002), afirma que a primeira parte de sua
estratégia acrescenta ao dado de natureza essencialmente coletiva da medida da freqüência um
outro, de origem individualizada, representado pela ordem em que são evocados os termos
64
quantitativamente mais salientes. Tal fato consistiria em um avanço em direção a uma efetiva
identificação das cognições centrais da representação, ou seja, o seu núcleo.
O quadrante inferior esquerdo corresponderia à denominada zona de contraste, em que
se dispõem elementos com baixa freqüência, mas considerados importantes pelos sujeitos pela
ordem de evocação, podendo revelar elementos que apontam para a existência de um
subgrupo na população estudada com uma representação distinta Pode, também, se constituir
como um complemento da primeira periferia (OLIVEIRA et al., 2005; ABRIC, 2003b).
O quadrante superior direito representa a primeira periferia, em que são dispostos os
elementos periféricos mais importantes da representação (ABRIC, 2003b; OLIVEIRA et al.,
2005). Finalmente, o quadrante inferior direito abarcaria a segunda periferia da representação,
a qual se constitui pelos elementos menos freqüentes e menos importantes para a
determinação do significado da representação (ABRIC, 2003b; OLIVEIRA et al., 2005).
Assim, foi possível obter um Quadro de Quatro Casas a partir dos corpora de cada
situação normativa (normal e de substituição) de modo separado, o que, além da comparação
estatística, permitiu uma comparação em termos de conteúdo e estrutura dos elementos das
representações sociais expressas pelos sujeitos (ABRIC, 2003b, 2005).
Considerando, portanto, a técnica de evocações livres em associação à técnica de
substituição como estratégias que possibilitaram o acesso ao universo semântico relacionado
ao objeto de estudo, inclusive, com a identificação dos elementos mais importantes em
contextos com maior e menor pressão normativa, pôde-se selecionar estratégias mais
apropriadas para um aprofundamento e verificação dos resultados obtidos. Trata-se da
segunda etapa da pesquisa, acerca da qual dissertar-se-á a partir de então.
III.2 SEGUNDA FASE DO ESTUDO
Para a segunda fase do estudo, foram escolhidos 30 enfermeiros, dentre os 150 que
compuseram a primeira fase do estudo, com a intenção de obter uma amostra de 20% destes.
Tal definição amostral teve como intuito o alcance de uma representatividade estatística de
sujeitos, cuja inclusão se deu, igualmente, de modo aleatório, de acordo com o mesmo critério
aplicado à primeira fase.
A participação dos depoentes pautou-se, outrossim, na Resolução 196/96 do CNS,
com: novo esclarecimento sobre o estudo e seus autores, disponibilização do Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido (APÊNDICE I), do qual uma cópia ficou em poder do
pesquisador e outra com o sujeito; direito à desistência em qualquer momento da pesquisa;
65
ausência de danos ou risco de danos, ônus ou nus no processo investigativo; e garantia do
sigilo quanto à sua identidade.
Os campos para a coleta de dados foram 18, dentre os 47 setores do hospital
universitário em questão, envolvidos na primeira fase do estudo, de modo que os dados
representassem não apenas ou, majoritariamente, alguns setores específicos, mas, ao máximo,
a diversidade do cenário de estudo.
Como mencionado, anteriormente, esta segunda fase teve por objetivo um
aprofundamento e verificação dos resultados emergidos na primeira, com a técnica de
evocações livres e a técnica de substituição. Mais especificamente, buscou-se a confirmação
da centralidade dos elementos dispostos no quadrante superior esquerdo da representação
identificada por meio daquelas técnicas, à exemplo do estudo de Sá (2002), sobre a
representação social da ciência para consumidores e não-consumidores.
Por sua vez, Abric (2003b) afirma que a aplicação de ferramentas que possibilitam a
verificação da centralidade de um elemento foi uma etapa determinante no reconhecimento e
no desenvolvimento da teoria do núcleo central. Acrescenta que tais ferramentas foram
elaboradas no quadro de pesquisas de laboratório, mas são, em seu formato atual, utilizáveis
no contexto de todo estudo de representações sociais, entre os quais aqueles de campo.
Assim, segundo (2002), apoiando-se no pensamento de Moliner (1994), a saliência
demonstrada de determinados elementos da representação, obtida neste estudo, por meio das
evocações, não assegura que realmente pertençam ao núcleo central, representando aquela
uma simples decorrência quantitativa de uma propriedade fundamental das cognições
centrais: o laço simbólico que as liga ao objeto de representação.
Isto posto, com intuito de verificar a centralidade dos elementos identificados na
primeira fase do estudo, bem como para, conforme Apostolidis (2003), o aprofundamento no
entendimento do objeto de investigação, foram utilizadas como técnicas: o Questionário de
Caracterização (ABRIC, 2003b); uma Escala de Likert (OLIVEIRA, T., 2001); e a Mise en
Cause (MEC) ou, também, denominada, Técnica de Questionamento (ABRIC, 2003b, SÁ,
2002).
Estas técnicas compuseram um questionário (APÊNDICE J), que foi aplicado, no
período de 14 a 30 de maio de 2007. A abordagem dos sujeitos se deu de maneira individual
com a presença do pesquisador durante todo o seu preenchimento, tendo em vista o
fornecimento de instruções e o esclarecimento de possíveis dúvidas dos sujeitos.
É importante ressaltar que, em todas as técnicas citadas, foi solicitado aos sujeitos
apenas que respondessem por si mesmos, ou seja, não se efetuou, nesta fase do estudo, a
66
tentativa de diminuição da pressão normativa sobre os participantes no contexto de coleta de
dados por meio da técnica de substituição. Com isso, as respostas obtidas possibilitaram a
confirmação ou não da centralidade para a situação normal de coleta, permitindo, não a
validação, mas o reforço das hipóteses de existência de zona muda nas representações sociais
estudadas, com base nos dados obtidos com a substituição nas evocações.
As definições e o procedimento de aplicação de tais ferramentas metodológicas são
explicitados em seguida, a começar pelo Questionário de Caracterização.
III.2.1 QUESTIONÁRIO DE CARACTERIZAÇÃO
Abric (2003b), em seu livro intitulado “Método de estudos das Representações
Sociais”
6
(tradução nossa) apresenta o Questionário de Caracterização, idealizado por
Flament, como mais uma possibilidade para a identificação dos elementos de uma dada
representação social, bem como sua organização, conforme os pressupostos dos estudos da
abordagem estrutural.
O referido autor, ao justificar a sua utilização, sustenta que, considerando ser o núcleo
central aquele que a significação da representação, pode-se considerar que um elemento
central tem, como propriedade, mostrar-se mais característico do objeto que qualquer outro
elemento da representação. Para a sua aplicação, realiza-se, inicialmente, uma pré-enquete
com duplo objetivo: conhecer as dimensões associadas ao objeto de representação; e as
palavras que os sujeitos utilizam no interior de cada tema, também, ligada ao objeto (ABRIC,
2003b).
Este processo, na presente investigação, baseou-se nos dados recolhidos por meio das
evocações livres e sua posterior análise através do Quadro de Quatro Casas, na primeira etapa
do estudo. Para cada tema associado ao objeto, propõe-se aos sujeitos uma lista de itens, cujo
número deve ser múltiplo de 3, sendo àqueles solicitado que selecionem os 3 elementos que,
para eles, seriam os mais característicos do objeto. Então, é demandado, também, a
identificação daqueles 3 que seriam menos característicos do objeto (ABRIC, 2003b).
Assim, com base nos elementos dispostos nos Quadros de Quatro Casas e no
dicionário de padronização para as evocações livres, apresentados em momento anterior, foi
elaborado um instrumento contendo 9 frases: 3 das quais advindas do quadrante superior
esquerdo do Quadro de Quatro Casas das situação de evocação normal; 3 encontrados
6
O texto em língua estrangeira é: “Méthode D’Étude des Représentations Sociales” (ABRIC, 2003b).
67
quadrante superior esquerdo referente à situação de substituição, ou seja, quando os sujeitos
evocavam em nome das pessoas em geral; e 3 outras, com distribuição entre a zona de
contraste e primeira periferia das duas situações (APÊNDICE J).
Deste modo, o pesquisador solicitou aos depoentes que apontassem os três elementos
que mais definiam e os que menos definiam o portador do HIV/AIDS. Além disso, logo após,
foi solicitado aos sujeitos que os classificassem como positivos ou negativos em relação ao
portador do HIV/AIDS.
Passar-se-á, agora, à descrição da aplicação da segunda técnica utilizada nesta fase do
estudo, qual seja, a Escala de Likert.
III.2.2 ESCALA DE LIKERT
A Escala de Likert baseia-se na premissa de que a atitude geral se remete às crenças
sobre o objeto em estudo, às forças que mantém tais crenças, bem como aos valores
vinculados ao objeto (OLIVEIRA, T., 2001). Consiste em um tipo de escala sóciopsicológica,
a qual possibilita uma discriminação quantitativa das pessoas com diferentes atitudes, medos,
motivações, percepções, traços de personalidade e necessidades (POLIT; BECK; HUNGLER,
2004).
A Escala de Likert refere-se à uma série de afirmações ou assertivas relacionadas ao
objeto de estudo apresentadas aos depoentes, acerca das quais estes devem apontar se
concordam ou não, bem como o grau de sua concordância ou discordância. São atribuídos,
então, escores a cada posicionamento dos sujeitos, podendo ser, de um modo geral, de 1 (para
discordância total) a 5 (para concordância total) ou -2, -1, 0, +1,+2, com a correspondência de
-2 para discordância total até +2 para concordância total. Esta possibilidade da apreensão da
intensidade do posicionamento dos participantes da pesquisa consiste um uma das
importantes vantagens desta escala sobre outras com estruturação semelhante (OLIVEIRA,
T., 2001).
Neste estudo, também o universo semântico emergido das evocações livres, no
contexto normativo normal e na substituição, com suas estruturações no Quadro de Quatro
Casas, foram utilizados para a elaboração de 21 assertivas em relação ao portador do
HIV/AIDS. Assim, buscou-se a inserção de elementos presentes nos quadrantes superiores
esquerdos nas duas situações de coleta citadas, daqueles de suas zonas de contraste
(quadrantes inferiores esquerdos) e alguns termos situados na periferia. Conforme Flament,
Guimelli e Abric (2006), que utilizaram estratégia semelhante para o estudo da zona muda, no
68
qual o presente estudo se inspirou, tentou-se estabelecer uma composição proporcional entre
afirmativas de caráter positivo, negativo e neutro. Por tal motivo, algumas assertivas
pretensamente neutras como “existem muitos portadores do HIV/AIDS no Brasil”, embora
não estivessem nos Quadros de Quatro Casas, foram incluídas nesta parte do questionário.
As respostas acerca de cada proposição eram marcadas pelos sujeitos com um “X” no
instrumento, podendo ser apresentadas em termos de: “discordo totalmente”; “discordo”;
“discordo em parte”; “concordo em parte”; “concordo”; e “concordo totalmente”, ao que foi,
respectivamente, atribuído um escore de 1 a 6 (APÊNDICE J).
Isto exposto, será apresentada, a partir de então, a Técnica Mise en Cause.
III.2.3 TÉCNICA DA MISE EN CAUSE OU DO QUESTIONAMENTO
De acordo com Abric (2003b), pode-se, por definição, dizer que os elementos centrais
de uma representação não são negociáveis, portanto, questioná-los deveria necessariamente
induzir uma mudança de representação, ou seja, o objeto não poderia mais ser reconhecido
como tal pelos sujeitos, se apresenta uma característica contraditória com um elemento central
de sua representação.
Este processo de refutação pode, então, servir, segundo Abric (2003b), de indicador da
centralidade de uma cognição. Apenas o questionamento dos elementos centrais dará,
conforme o mencionado autor, lugar a um processo de refutação.
Neste sentido, segundo Sá (2002), considerando que a ausência dos elementos centrais
levaria à desestruturação da própria representação, com a perda do conhecimento constituído
sobre dado objeto, observar-se-ia uma forte tendência a refutar os fatos ou informações em
contradição com os mesmos. Desta forma, com base em Moliner, assevera Abric (2003b) que
o processo de refutação pode ser utilizado como importante indicador da centralidade dos
elementos, pelo questionamento (em francês mise en cause) de sua participação no núcleo
central.
Conforme Guimelli (2002), ao discutir este processo em termos de “planos de
raciocínio”, surgiria, diante do questionamento de um elemento central, o que se denomina de
esquema de negação. Tal esquema tem por objetivo manter a integridade radical da
representação, rejeitando o elemento localizado na origem do próprio questionamento. Assim,
assegura, igualmente, a proteção da estrutura existente, não permitindo a assimilação das
informações discordantes. Como exemplo, o autor apresenta o seguinte:
69
Diz-se que uma empresa é caracterizada, normalmente, pelas relações hierarquizadas. Se, em
certas situações, observa-se relações anárquicas, tira-se geralmente a conclusão de que não
pode, definitivamente, se tratar de uma empresa (GUIMELLI, 2002, p. 133).
De modo diverso do exposto, os elementos periféricos, muito mais flexíveis, aceitam a
contradição ou o esquema estranho, conforme apontam Abric (2003b), Guimelli (2002) e
Flament (1987). Ele permitiria, como referido, a integração à representação de elementos
suscetíveis de pô-la em xeque, colocando para tal, razões aceitáveis pelo grupo. Em termos de
estratégia cognitiva, este procedimento seria particularmente vantajoso, pois torna possível
deixar intacto o essencial da representação, autorizando, ao mesmo passo, a integração de
elementos novos.
Para ilustrar, Guimeli relata:
Normalmente, uma empresa deve gerar lucro. Mas, acontece, às vezes, que ele não o faz e se
caracteriza, mesmo, por perdas financeiras. Contudo, as perdas financeiras podem ser
explicadas pelo contexto econômico desfavorável dentro do qual se encontra, em alguns
momentos, a empresa (GUIMELLI, 2002, p.132).
Este esquema estranho da ilustração apresentada, permitiu integrar à representação de
empresa, também, a noção de perdas financeiras, um elemento fortemente contraditório, sem,
com isso, trazer à representação modificações essenciais ameaçadoras para sua estrutura
(GUIMELLI, 2002).
Isto posto, a aplicação da técnica, de acordo com Sá (2002), colocando em evidência o
valor simbólico e, portanto, a centralidade de um elemento, consiste em perguntar aos sujeitos
se, na ausência de tal cognição, o objeto da representação ainda mantém sua identidade. O
mecanismo repousa, conforme Abric (2003b), sobre a utilização de uma dupla negação, para
reconhecer o elemento central da representação, sendo três etapas necessárias:
1) uma pré-enquete, visando identificar os principais temas enunciados pelos sujeitos
acerca do objeto de interesse, a qual, no presente estudo, se deu na primeira etapa, por meio
das evocações livres na situação normativa normal e de substituição;
2) após, é proposto aos sujeitos um questionário de centralidade propriamente dito, à
luz do princípio da dupla negação dos itens selecionados. Deste modo, no presente estudo,
foram apresentadas 21 assertivas na forma negativa aos sujeitos, cuja construção baseou-se,
como nas técnicas anteriores, no Quadro de Quatro Casas das duas situações normativas da
primeira fase da investigação. A questão foi, portanto, disposta para os depoentes desta
pesquisa, do seguinte modo (APÊNDICE J):
70
“Para você, uma pessoa que [1 não vivencia situações de sofrimento]
7
, poderia ser um
portador do HIV/AIDS? ( ) sim ( ) não
3) na análise interessa considerar a porcentagem de respostas “não para cada
assertiva, configurando, então, a dupla negação (a da pergunta e da resposta do sujeito), com o
surgimento do esquema da negação vinculado à elementos centrais, essenciais para a
representação estudada.
Ao fim do questionário aplicado nesta segunda fase, foram incluídas, ainda, duas
questões, cujo objetivo foi conhecer a percepção dos sujeitos sobre o risco de um enfermeiro
ser infectado pelo HIV em seu ambiente de trabalho e na vida privada. Trata-se de questões
fechadas (APÊNDICE J), as quais poderiam ser respondidas marcando com um “X” os graus
de risco reconhecidos, para cada âmbito da vida em separado, entre as opções: “muito alto”;
“alto”; “médio”; “baixo”; ou “muito baixo”.
A inclusão destas duas questões baseou-se nos achados do estudo de Falomir-
Pichastor et al. (2004), desenvolvido na Suíça, tendo por sujeitos estudantes universitários e a
população nas proximidades das universidades. A pesquisa desses autores verificou o papel de
aspectos moderadores da influência das normas sociais entre grupos, com concentração mais
específica no fenômeno da xenofobia. De acordo com os resultados gerais da referida
pesquisa, a ameaça percebida por um grupo acerca de outro, atua como fator moderador da
influência de normas anti-discriminatórias. Esta ameaça foi definida em termos realísticos
(sobre o poder político e econômico ou saúde física e bem-estar), e simbólicos (sobre a
distinção positiva da identidade do grupo, sua visão de mundo ou a superioridade percebida
de seus sistemas de valores).
Pensou-se ser oportuna a exploração deste aspecto, uma vez que, como apontam
inúmeros estudos, como os de Rissi, Machado e Figueiredo (2005) e Reis, Gir e Canini
(2004), os enfermeiros, pela natureza das atividades que desenvolvem, sobretudo, em dados
contextos institucionais, convivem com o risco de infecções por agravos diversos por
acidentes com materiais biológicos ou, mesmo, em sua vida privada, como explorado em
estudo de Giami et al. (1997), com enfermeiras na França.
Deste modo, serão apresentados, em seqüência, os procedimentos adotados para a
análise dos dados recolhidos por meio das técnicas de Questionário de Caracterização, Escala
de Likert, Mise en Cause e a percepção de risco de infecção por HIV entre enfermeiros.
7
Local de inserção dos 21 itens na assertiva apresentada aos depoentes.
71
III.2.4 ANÁLISE DO QUESTIONÁRIO DE CARACTERIZAÇÃO
Para a análise dos dados obtidos por meio do Questionário de Caracterização, Abric
(2003b) afirma que se pode atribuir à cada item um escore que varia de 1 (se for escolhido
como mais característico) a 3 (se é escolhido como menos característico) e desta maneira,
conhecer, sobre uma dada população estudada, os pesos de cada elemento.
Outra possibilidade, definida pelo mesmo autor como mais interessante, é a utilização
da distribuição das respostas da população para cada um dos itens em termos de freqüência
absoluta e relativa, em que, após a conversão para um “gráfico de linha”, três tipos de perfis
são possíveis: 1) curva em “J”, característica de elementos centrais, pois são massivamente
selecionados como mais característicos; 2) curva em “sino” (tipo curva de Gauss),
correspondente aos elementos periféricos, cujo estatuto básico é o de ser medianamente
importante para a caracterização do objeto; e 3) curva em “U”, ligada a julgamentos muito
contrastados por parte da população. Ou seja, para alguns sujeitos o elemento seria muito
característico e, para outros, não. Este tipo de curva indica, portanto, e possível existência de
dois subgrupos que se opõem sobre a centralidade de um item (FIGURAS 2 a 4).
FIGURA 2 PERFIL DA CURVA EM J”, CARACTERÍSTICA DE ELEMENTOS CENTRAIS.
FONTE: Abric (2003b).
Curva em "J"
12
24
64
0
20
40
60
80
menos define intermediário mais define
Papel na definição do objeto
%
72
FIGURA 3 PERFIL DA CURVA EM “U”, CARACTERÍSTICA DE ELEMENTOS DE CONTRASTE.
FONTE: Abric (2003b).
FIGURA 4 PERFIL DA CURVA EM SINO”, CARACTERÍSTICA DE ELEMENTOS PERIFÉRICOS.
FONTE: Abric (2003b).
Deste modo, as respostas dos sujeitos foram analisadas com o auxílio do software
Excel, integrante do pacote Microsoft Office, tendo sido construída uma planilha para cada
item do Questionário de Caracterização. Com base nos dados dispostos em tais planilhas,
foram construídos os gráficos. Como descrito, conforme o tipo de curva do gráfico para cada
item, tornou-se possível conhecer o seu papel na representação do objeto deste estudo.
Outrossim, para uma visualização mais abrangente dos resultados da aplicação desta
técnica, foi elaborada uma tabela com a distribuição das freqüências absolutas e relativas da
classificação das frases pelos sujeitos, como mais e menos definidoras do portador
HIV/AIDS, e aquelas não escolhidas, consideradas como elementos intermediários. A referida
tabela e os seus respectivos gráficos serão apresentados na seção dos resultados do estudo.
Curva em "sino"
18
77
5
0
20
40
60
80
100
menos define intermediário mais define
Papel na definição do objeto
%
Curva em "U"
42
19
39
0
10
20
30
40
50
menos define intermediário mais define
Papel na definição do objeto
%
73
Assim, pôde-se cotejar os resultados da aplicação desta técnica com aqueles referentes
à evocações livres, sob o formato do Quadro de Quatro Casas.
III.2.5 ANÁLISE DA ESCALA DE LIKERT
Neste estudo, a análise da Escala de Likert se deu de modo diverso do tradicional, qual
seja, por somatória dos escores. Optou-se, ao invés disso, também, pela aplicação dos gráficos
de linha, tal qual na análise da técnica anterior. Para tanto, as respostas dos depoentes foram
lançadas em uma planilha do programa Excel, configurando uma tabela com a somatória das
freqüências e o subseqüente cálculo das porcentagens da distribuição do posicionamento dos
sujeitos para cada item na escala, tendo gerado uma tabela ao final (APÊNDICE L).
Feito isto, efetivou-se a agregação entre os valores das freqüências absolutas e
relativas dos posicionamentos “concordo totalmente” e “concordo”, correspondendo à
consideração dos elementos como “mais característicos” ou como aqueles que “mais
definem” o objeto de estudo. Agregou-se, também, os dados das alternativas “discordo
totalmente” e “discordo”, ao que se atribuiu a condição de “menos característicos” ou como
aqueles itens que “menos definem” o objeto de estudo. Finalmente, o mesmo procedimento
foi executado em relação às posições “concordo em parte” e “discordo em parte”, considerado
equivalente aos “não escolhidos” ou “intermediários” da técnica anterior.
O passo que se seguiu foi a construção de uma nova tabela em outra planilha do Excel
com esta reconfiguração e a aplicação da função de conversão dos dados de cada assertiva da
escala para gráficos de linha (APÊNDICE M). Assim, foi possível conhecer o papel dos itens
da escala para a representação social em tela, bem como comparar os resultados com os
Quadros de Quatro Casas e com aqueles do Questionário de Caracterização.
III.2.6 ANÁLISE DA MISE EN CAUSE OU TÉCNICA DO QUESTIONAMENTO
A análise dos dados obtidos por intermédio desta técnica foi efetivada com o auxílio
do programa Excel, tendo iniciado pela criação e preenchimento de uma tabela em uma
planilha com as respostas dos depoentes.
Como apontam Abric (2003b) e (2002), o resultado de interesse nesta técnica é o
da dupla negação, portanto, foi efetuado o somatório das freqüências das respostas dos
sujeitos distribuídas entre “sim” e “não” e, após, calculadas suas respectivas porcentagens.
Este prodimento foi realizado com o auxílio do software Excel, por meio do qual se efetivou a
74
construção de uma tabela com a distribuição das respostas dos depoentes, sendo apresentada
na seção de resultados do estudo.
De acordo com Abric (2003b), para a identificação da porcentagem de respostas
duplas negativas para cada item, acima da qual se confirma a centralidade, deve-se utilizar o
teste estatístico de Kolmogorov-Smirnov, cuja fórmula é: D (limiar estatístico) = 1 1,36 / √n
x 100). Porém, este teste é recomendado para populações superiores a 35 sujeitos. Como,
neste estudo, esta técnica envolveu 30 participantes, foram considerados significativos, ou
seja, indicadores de centralidade, os resultados iguais ou superiores a 75% de negação, tal
qual Flament (1999, 2001a).
Deste modo, foi possível ter acesso aos elementos identificados como centrais para a
representação do portador do HIV/AIDS nesta pesquisa, bem como efetuar uma comparação
com os resultados das técnicas anteriores, considerando os elementos presentes no Quadro de
Quatro Casas das duas situações normativas das evocações livres, a normal e a de
substituição.
A análise da percepção do risco de enfermeiros se infectarem pelo HIV (duas últimas
perguntas), foi efetuada com o auxílio do programa Excel, tendo sido criada uma planilha e
construída uma tabela de freqüências para a disposição combinada das respostas dos sujeitos
àquelas, associado ao cálculo de suas respectivas porcentagens. Tal tabela será, também,
disposta no tópico referente aos resultados da pesquisa.
A discussão dos dados obtidos pautou-se na produção de autores acerca da Teoria das
representações sociais, especialmente, daqueles da abordagem estrutural, como Abric,
Deschamps, Flament, Guimelli, Campos, Oliveira e Sá e, bem como na de outros com
interesse para o campo de estudos sobre aspectos referentes ao HIV/AIDS e à enfermagem,
sobretudo, em uma aproximação psicossocial destes.
Como uma última seção do capítulo referente à trajetória metodológica, será efetivada,
com fins didáticos, uma síntese dos passos seguidos para a construção dos instrumentos e a
coleta de dados do estudo.
III.2.7 SÍNTESE DO PROCEDIMENTO METODOLÓGICO DE COLETA DE DADOS E
CONSTRUÇÃO DOS INSTRUMENTOS
Inicialmente, foram testados os termos indutores para a definição daquele a ser
utilizado nas evocações livres, na primeira fase do estudo, tendo sido delimitado portador do
75
HIV/AIDS. Foram testados, também, alguns grupos de referência para a técnica de
substituição, pelo que se mostrou mais pertinente as pessoas em geral.
Assim, na primeira fase do estudo, aplicou-se a técnica de evocações livres a 150
enfermeiros, a qual consistiu em solicitar que os mesmos produzissem as cinco primeiras
palavras ou expressões que imediatamente lhes viessem à mente, a partir do termo indutor
portador do HIV/AIDS. Em seguida, demandou-se, também, a hierarquização dos termos
pelos sujeitos. Este processo configurou a situação normativa de coleta de dados.
Após, foi solicitado aos depoentes a produção das cinco primeiras palavras ou
expressões que pensavam surgir imediatamente na mente das pessoas em geral, ao pensarem
naquele mesmo termo indutor. Solicitou-se, igualmente, a hierarquização das enunciações,
conforme acreditassem os sujeitos que o fariam as pessoas em geral. Esta aplicação
correspondeu à técnica de substituição, buscando gerar uma situação de redução das pressões
normativas para a coleta de dados.
Com as enunciações dos sujeitos nas duas situações foram construídos dois corpora de
análise que, submetidos ao software EVOC 2003, permitiram a configuração de dois quadros
de quatro casas, demonstrando os conteúdos e as estruturas das representações sócias daquela
sobre a pessoa com HIV/AIDS, ou seja, com a identificação de possíveis cognições centrais e,
também, contra-normativas ou escondidas na explicitação das representações.
Os passos descritos propiciaram o acesso ao contexto semântico e à estrutura das
representações sociais estudadas, em situação habitual de coleta de dados e em substituição,
tendo em vista a identificação de elementos que, de outro modo, poderiam permanecer
escondidos pelos depoentes.
A partir destes resultados, procedeu-se à delimitação de estratégias para a testagem da
centralidade da representação, bem como da contra-normatividade de alguns elementos
representacionais. Deste modo, como sugerido por Abric (2003b), pensou-se ser pertinente a
utilização do Questionário de Caracterização e, como Flament, Guimelli e Abric (2006), de
uma Escala de Likert.
Além disso, empregou-se a Mise en Cause, técnica clássica para o teste de
centralidade, e foram inseridas duas questões acerca da percepção dos sujeitos sobre o risco
de enfermeiros se contaminarem com o HIV, tendo em vista a hipótese de Falomir-Pichastor
et al. (2004), de que a influência de normas anti-discriminatórias no grupo são moduladas em
função da percepção de ameaça de outro grupo para aquele.
Isto posto, no tópico seguinte, proceder-se à apresentação dos resultados e
discussões do estudo.
76
IV. ELEMENTOS EXPLÍCITOS E ESCONDIDOS NAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS
SOBRE A PESSOA COM HIV/AIDS: A PERSPECTIVA DOS ENFERMEIROS
Neste tópico serão apresentados os resultados obtidos a partir da trajetória
metodológica, anteriormente descrita. Assim, descrever-se-á a caracterização dos sujeitos
integrantes das duas fases da pesquisa, o Quadro de Quatro Casas para a situação normal e a
de substituição, com a aplicação de comparação estatística, o Questionário de Caracterização,
a análise obtida com a Escala de Likert, a Mise en Cause, as questões sobre o risco de
infecção pelo HIV percebido pelos enfermeiros e, finalmente, o estabelecimento de algumas
conclusões acerca da zona muda nas representações em tela.
IV. 1 CARACTERIZAÇÃO DOS SUJEITOS DA PESQUISA
Os sujeitos do estudo consistiram, conforme descrito em momento anterior, em
enfermeiros do quadro permanente de um hospital universitário situado no município do Rio
de Janeiro. Tendo a pesquisa sido realizada em duas fases, na primeira foram integrados 150
depoentes e, na segunda 20% destes, ou seja, 30 profissionais.
Em relação à variável sexo, a maioria dos sujeitos era do sexo feminino, com 85,3%
na primeira fase e, 86,7% na segunda fase do estudo, conforme pode ser evidenciado na
Tabela 1. Esta distribuição reflete a composição predominante da profissão, de um modo
geral, historicamente praticada por mulheres, como afirmam alguns autores, devido ao papel
social exercido por estas, culturalmente, ligado ao cuidado com os filhos e outros membros da
família (GEOVANINI, 2002).
Além disso, no que tange às questões concernentes à epidemia do HIV/AIDS, como
apontam Oliveira et al. (2007a), é importante considerar a sua tendência à feminilização, bem
como a repercussão desta sobre o imaginário das enfermeiras, sobre a forma como percebem a
sua vulnerabilidade e o seu papel, tanto na esfera da vida profissional, quanto na privada.
TABELA 1 DISTRIBUIÇÃO DOS SUJEITOS DA PESQUISA DE ACORDO COM O SEXO. RIO DE JANEIRO, 2007.
SEXO
1ª fase
2ª fase
f
%
f
%
Feminino
128
85,3
26
86,7
Masculino
22
14,7
4
13,3
Total
150
100
30
100
77
Observou-se que a maior parte dos enfermeiros que participaram de ambas as fases do
estudo viviam com companheiro(a) no momento da coleta de dados, conforme disposto na
Tabela 2. Este achado se assemelha ao encontrado por Marques, S. (2002), em estudo
envolvendo servidores, igualmente, de um hospital universitário do município do Rio de
Janeiro.
Sendo a maioria composta por mulheres, cabe salientar que, conforme constataram
Giami et al. (1997) entre enfermeiras na França, estas concebiam a fidelidade e a confiança
em um parceiro como forma de proteção contra a infecção pelo HIV. E, embora não seja
diretamente o objeto deste estudo, alguns autores apontam para a dificuldade da mulher na
negociação do uso do preservativo nas práticas sexuais, sendo este, geralmente, associado a
aspectos desestabilizadores da relação, como a desconfiança ou uma potencial confissão de
infidelidade da parceira (MADEIRA, 1998; NASCIMENTO; BARBOSA; MEDRADO,
2005).
TABELA 2 DISTRIBUIÇÃO DOS SUJEITOS CONFORME O ESTADO MARITAL. RIO DE JANEIRO, 2007.
ESTADO MARITAL
1ª fase
2ª fase
f
%
f
%
Vive com companheiro(a)
96
64
19
63,3
Não vive com companheiro(a)
54
36
11
36,7
TOTAL
150
100
30
100
Em relação ao quantitativo de filhos, tal qual pode ser constatado na Tabela 3, a
maioria dos enfermeiros possuía, pelo menos, um filho, correspondendo a 69,3% entre
aqueles da primeira, e 73,3% entre os da segunda etapa do estudo. Além disso, 41,3% e
46,7%, respectivamente, da primeira e segunda fase, afirmaram ter de dois a três filhos.
78
TABELA 3 DISTRIBUIÇÃO DOS SUJEITOS DO ESTUDO SEGUNDO O QUANTITATIVO DE FILHOS. RIO DE
JANEIRO, 2007.
NÚMERO DE FILHOS
1ª fase
2ª fase
f
%
f
%
1
36
24
5
16,6
2 a 3
62
41,3
14
46,7
≥ 4
6
4
3
10
Na possui
46
30,7
8
26,7
TOTAL
150
100
30
100
A renda pessoal mensal dos depoentes oscilou entre R$ 2.000,00 e R$ 14.000,00, na
primeira fase, e R$ 4.000,00 e R$ 8.000,00, na segunda fase da investigação, com a média de,
aproximadamente, R$ 4.500,00 para ambas e desvio padrão de R$ 1.500,00. Assim, como
demonstrado na Tabela 4, a maioria dos sujeitos possuía renda mensal entre R$ 3.000,00 e R$
4.999,99.
Cabe apontar que esta faixa se situa acima do Produto Interno Bruto (PIB) per capita,
tendo como referência o ano de 2004, para a cidade do Rio de Janeiro, cujo valor foi de R$
12.224,00, do estado do Rio de Janeiro, com PIB per capita de R$ 14.638,00, e para o Brasil,
com R$ 10.520,00, em 2005 (IBGE, 2007a, 2007b, 2007c).
TABELA 4 DISTRIBUIÇÃO DOS SUJEITOS DE ACORDO COM A RENDA PESSOAL MENSAL. RIO DE JANEIRO,
2007.
RENDA PESSOAL MENSAL (R$)
1ª fase
2ª fase
f
%
F
%
2.000,00 a 2.999, 99
10
6,7
4
13,4
3.000,00 a 3.999,99
40
26,7
7
23,3
4.000,00 a 4.999,99
32
21,3
8
26,7
5.000,00 a 5.999,99
29
19,3
5
16,7
6.000,00 a 6.999,99
21
14
4
13,3
7.000,00 a 7.999,99
5
3,3
1
3,3
≥ a 8.000,00
11
7,3
1
3,3
Não informaram
2
1,4
0
0
TOTAL
150
100
30
100
A faixa etária predominante no estudo foi a de 40 a 49 anos (64,7% na primeira fase e
70% na segunda fase), com maior quantitativo de sujeitos entre 40 e 44 anos (40% na
primeira e 53,3% na segunda fase) (TABELA 5). A média de idade foi de 44 anos, com uma
79
mediana de 43 e moda de 42 anos, para ambas as fases, confirmando a maior presença de
depoentes nesta circunscrição etária. A idade mínima foi de 30 e a máxima de 67 anos, para a
primeira fase e, para a segunda, respectivamente, de 33 e 67 anos.
Assim, os sujeitos deste estudo encontravam-se na fase que, Santos e Antunes (2007)
denominam de fase adulta média, que compreende as idades entre 40 a 50 anos. São pessoas,
portanto, que em sua fase adulta jovem ou na adolescência, propriamente dita, testemunharam
o surgimento da epidemia do HIV/AIDS, com a sua divulgação preliminar pela mídia e os
primeiros casos, no Brasil, em 1982 (GALVÃO, 2000, 2002).
TABELA 5 DISTRIBUIÇÃO DOS SUJEITOS SEGUNDO A FAIXA ETÁRIA. RIO DE JANEIRO, 2007.
IDADE (ANOS)
1ª fase
2ª fase
f
%
f
%
30 a 34
14
9,3
1
3,3
35 a 39
15
10
3
10
40 a 44
60
40
16
53,3
45 a 49
37
24,7
5
16,7
50 a 54
9
6
2
6,7
55 a 59
9
6
1
3,3
≥ a 60
6
4
2
6,7
TOTAL
150
100
30
100
A média do tempo de formação como enfermeiros foi de 20 anos, com desvio padrão
de 5 anos. O tempo de formação variou entre 6 e 36 anos para a primeira e entre 10 e 32 anos
para a segunda fase do estudo.
Desta maneira, conforme pode ser constatado na Tabela 6, existem dois subgrupos
quantitativamente significativos, para as duas fases do estudo. Um primeiro, com tempo de
formação entre 15 e 19 anos, e o ingresso na vida profissional entre o final da década de 80 e
início da década de 90. Ou seja, com a entrada no mercado de trabalho e, provavelmente, no
curso de graduação, quando os primeiros casos de AIDS haviam sido identificados no
Brasil (GALVÃO, 2000, 2002).
O segundo subgrupo, com tempo de formação entre 20 e 24 anos, que congregou a
maioria dos participantes da pesquisa (TABELA 6), por sua vez, ingressou no curso de
graduação, em parte, quando a doença se configurava no Brasil, como o que Galvão (2000)
denomina de “mal de folhetim”, sendo os casos apresentados, pela mídia, de homossexuais
estrangeiros acometidos por um tipo de pneumonia e câncer raros. Quando ingressaram no
mercado de trabalho, igualmente, os casos iniciais no país, já haviam sido notificados, em São
80
Paulo, em 1982, (GALVÃO, 2002), e, a partir de 1984, no Rio de Janeiro (RIO DE
JANEIRO, 2006).
TABELA 6 DISTRIBUIÇÃO DOS DEPOENTES DE ACORDO COM O TEMPO DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL COMO
ENFERMEIRO. RIO DE JANEIRO, 2007.
TEMPO DE FORMAÇÃO
PROFISSIONAL (ANOS)
1ª fase
2ª fase
f
%
f
%
≤ a 9
6
4
0
0
10 a 14
18
12
4
13,3
15 a 19
40
26,7
9
30
20 a 24
59
39,3
12
40
25 a 29
17
11,3
3
10
≥ a 30
10
6,7
2
6,7
TOTAL
150
100
30
100
Tendo por subsídio o tempo de atuação como enfermeiros, foi possível, então,
constatar que não houve um hiato significativo entre o término da graduação e o ingresso no
campo de trabalho na área. Desta maneira, a média de tempo de atuação como enfermeiros foi
de, aproximadamente, 19,7 anos, com desvio padrão de 5,5 anos. O referido tempo variou
entre 6 e 36 anos para os indivíduos da primeira e 10 e 32 para aquelas da segunda fase da
presente investigação.
Como faixas temporais com maiores quantitativos de sujeitos, obteve-se distribuição
muito semelhante à da variável tempo de formação profissional, ou seja, com destaque para o
subgrupo com 20 a 24 anos de atuação profissional como enfermeiros (39,3% dos depoentes
da primeira e 40% daqueles da segunda etapa da pesquisa) e para o subgrupo com 15 a 19
anos de prática profissional (correspondendo a 26% para a primeira fase e 30% para a
segunda) (TABELA 7).
O tempo de atuação na área de enfermagem mostrou resultados semelhantes, o que
abarca a possibilidade de os sujeitos terem desenvolvido, anteriormente à formação como
enfermeiros, atividades como técnicos/auxiliares de enfermagem, com média de 20,3 anos,
desvio padrão de 5,5 anos, e mediana e moda de 20 anos, para ambos os grupos.
81
TABELA 7 DISTRIBUIÇÃO DOS SUJEITOS CONFORME O TEMPO DE ATUAÇÃO COMO ENFERMEIROS. RIO DE
JANEIRO, 2007.
TEMPO DE ATUAÇÃO
COMO ENFERMEIRO (ANOS)
1ª fase
2ª fase
f
%
f
%
≤ a 9
6
4
0
0
10 a 14
20
13,3
5
16,6
15 a 19
39
26
9
30
20 a 24
59
39,3
12
40
25 a 29
16
10,7
2
6,7
≥ a 30
10
6,7
2
6,7
TOTAL
150
100
30
100
Considerando o tempo de atuação no hospital universitário em questão, observou-se
uma oscilação entre 6 meses e 36 anos, para os integrantes da primeira fase do estudo e entre
2 anos e 6 meses e 32 anos, para aqueles da segunda. O tempo médio de atuação foi de,
aproximadamente, 14 anos, com desvio padrão de 7 anos para ambos os grupos de sujeitos. A
mediana e a moda para o primeiro grupo foram de 15 anos e, para o segundo, de 13 anos, o
que sugere uma diferença pouco significativa entre os mesmos.
Assim, é possível perceber, de acordo com a Tabela 8, que a faixa mais representativa
é a de enfermeiros entre 11 e 15 anos de atuação no hospital, correspondendo a 43,3% da
variação. Pode-se, então, concluir que os sujeitos do estudo possuem um tempo significativo
de exercício de profissional, bem como de trabalho hospitalar, o que lhes permitiu,
possivelmente, acumular práticas e experiências diversificadas com pacientes HIV positivos
ou com AIDS, sobretudo, em uma unidade universitária, a qual consiste em referência para
diversos municípios próximos ao do Rio de Janeiro.
Além disso, o período de entrada deste grupo no hospital, entre 1992 e 1996, antecede
àquele da apresentação pela comunidade científica da HAART e sua distribuição universal e
gratuita, pelo Ministério da Saúde, embora alguns anti-retrovirais (ARV) e medicações para
complicações da AIDS já fossem disponibilizadas pelo Sistema Único de Saúde (SUS), desde
1992 (GALVÃO, 2000, 2002).
É, também, nesta primeira metade da década de 1990, mais especificamente, em 1996,
que, no município do Rio de Janeiro, constata-se uma inversão, de fato, no perfil da epidemia
da AIDS, com uma superação de número de casos de transmissão homossexual pela
heterossexual (RIO DE JANEIRO, 2006). Este aspecto, possivelmente, se refletiu na demanda
originada para a instituição em tela, principalmente, após 1996, com a distribuição dos ARV,
pelo Ministério da Saúde, passando o hospital constituir-se em uma unidade importante para
82
dispensação dos referidos medicamentos, orientações e acompanhamento das pessoas
convivendo com a AIDS (BRASIL, 2007).
TABELA 8 DISTRIBUIÇÃO DOS SUJEITOS SEGUNDO O TEMPO DE ATUAÇÃO NO HOSPITAL UNIVERSITÁRIO. RIO
DE JANEIRO, 2007.
TEMPO DE ATUAÇÃO
NO HOSPITAL (ANOS)
1ª fase
2ª fase
f
%
f
%
< a 1
1
0,6
0
0
1 a 5
28
18,7
5
16,7
6 a 10
4
2,7
3
10
11 a 15
65
43,3
13
43,3
16 a 20
16
10,7
4
13,3
21 a 25
27
18
2
6,7
26 a 30
7
4,7
2
6,7
≥ a 31
2
1,3
1
3,3
TOTAL
150
100
30
100
Conforme pode ser observado na Tabela 9, a distribuição dos locais de atuação dos
sujeitos no hospital se mostrou heterogênea. Dos setores com atendimento clínico e cirúrgico,
nas duas fases da pesquisa, integraram, aproximadamente, 30% dos sujeitos. Tais espaços são
denominados setores abertos e proporcionam, para casos específicos, a presença de
acompanhantes para o cliente internado (BRASIL, 2006b). Ou seja, pode se configurar,
pensa-se, como um espaço com maior diversificação para interações sociais.
Em seguida, com 28%, na primeira fase e, 20%, na segunda, se destacaram as
unidades de cuidados intensivos. Pode-se dizer que tais setores demandam maior contato
físico por parte do enfermeiro com o cliente, o qual, freqüentemente, se encontra gravemente
enfermo e com a capacidade de suprir suas necessidades básicas seriamente comprometidas.
Além do que, consistem em contextos referidos pelos profissionais como mais estressantes
(SALICIO; GAIVA, 2006).
É interessante ressaltar a presença de enfermeiros envolvidos com atividades de chefia
e supervisão de enfermagem (12%, na primeira fase e 10%, na segunda), cuja tomada de
decisões influencia, de um modo geral, o processo de funcionamento dos setores do hospital.
As unidades ambulatoriais e/ou com atendimento externo (8,7% na primeira fase e
13,3%, na segunda), caracterizavam-se pelo atendimento ambulatorial infantil, para o
adolescente, para a psiquiatria, oncologia e adultos em geral. Abarcavam, igualmente, o
serviço de Banco de Sangue, que desenvolvia consultas de enfermagem com os candidatos ao
83
processo doação de sangue, no ínterim do qual se efetivava testes sorológicos para HIV, entre
outros.
Além disso, registra-se a presença de setores de internação, como unidades de cuidado
materno-infantil (10% na primeira e segunda fase do estudo) e, em destaque, o setor de
Doenças Infecto-Parasitárias, onde eram atendidos a maior parte dos clientes com
complicações decorrentes da AIDS. Embora este último locus corresponda apenas a 3,3% dos
sujeitos na primeira fase e 10% na segunda, consistiam na totalidade dos enfermeiros do
quadro permanente, aí, atuantes, no período de coleta de dados da pesquisa.
TABELA 9 DISTRIBUIÇÃO DOS SUJEITOS CONFORME O SETOR DE ATUAÇÃO NO HOSPITAL UNIVERSITÁRIO.
RIO DE JANEIRO, 2007.
SETORES DE ATUAÇÃO
1ª fase
2ª fase
f
%
f
%
Unidades de Cuidados Intensivos/Semi-intensivos
42
28
6
20
Unidades de internação nas diversas clínicas
28
18,7
5
16,7
Unidades Cirúrgicas
18
12
4
13,3
Serviço de Supervisão e Chefia de Enfermagem
18
12
3
10
Unidades Ambulatoriais e/ou com atendimento externo
13
8,7
4
13,3
Unidades de internação infantil
8
5,3
0
0
Unidades de internação de gestantes/parturientes/puérperas
7
4,7
3
10
Unidade de internação de Doenças Infecto-Contagiosas
5
3,3
3
10
Outros
11
7,3
2
6,7
TOTAL
150
100
30
100
Mesmo com o quantitativo de sujeitos com atuação em dois locais ou mais de
atendimento à saúde da população a maioria (66,7%, na primeira fase e 63,3%, na segunda do
estudo) informou que mantinha contato esporádico com clientes soropositivos ao HIV ou com
AIDS, como pode ser notado na Tabela 10.
TABELA 10 DISTRIBUIÇÃO DOS SUJEITOS SEGUNDO A FREQÜÊNCIA DE CONTATO COM CLIENTES
SOROPOSITIVOS AO HIV OU COM AIDS. RIO DE JANEIRO, 2007.
FREQÜÊNCIA DE CONTATO COM
CLIENTES COM HIV/AIDS
1ª fase
2ª fase
f
%
f
%
Esporádico
100
66,7
19
63,3
Freqüente
48
32
11
36,7
Informaram não estabelecer contato
2
1,3
0
0
TOTAL
150
100
30
100
84
Não obstante o contato com clientes com HIV ou AIDS ser, para a maior parte dos
enfermeiros, esporádico, quando o mesmo ocorria, se dava de modo físico, majoritariamente
(63,3%, na primeira fase e 70%, na segunda) (TABELA 11), ou seja, envolvendo toque,
manipulação de secreções, sangue e outros, durante a interação ou procedimentos técnico-
profissionais.
Neste ponto, é pertinente lembrar o papel que o contato com pessoas portadoras de
determinadas doenças consideradas como “mal” ou “tabus” desempenha para a sociedade,
como assinala Sontag (2007), bem como as representações historicamente ligadas ao corpo e
suas secreções nas crenças relativas ao contágio, tal qual discutido por Jodelet (2001), em
relação à AIDS e sua teoria biológica.
TABELA 11 DISTRIBUIÇÃO DOS SUJEITOS DE ACORDO COM O TIPO DE CONTATO, PREDOMINANTEMENTE,
ESTABELECIDO COM CLIENTES SOROPOSITIVOS AO HIV OU COM AIDS. RIO DE JANEIRO, 2007.
TIPO DE CONTATO COM
CLIENTES COM HIV/AIDS
1ª fase
2ª fase
f
%
f
%
Contato físico
95
63,3
21
70
Contato verbal
53
35,3
9
30
Refere não ter contato
2
1,4
0
0
TOTAL
150
100
30
100
No que tange à formação profissional, a maior parte dos enfermeiros participantes do
estudo (60,7% na primeira fase e 66,7%, na segunda fase do estudo) haviam cursado pós-
graduação lato sensu, entre os quais, alguns o fizeram nos moldes de residência. Observou-se,
também, que 24% dos sujeitos que compuseram a primeira fase e 23,3% daqueles da segunda
etapa do estudo concluíram ou participavam, além dos referidos anteriormente, de cursos
stricto sensu mestrado (TABELA 12).
Se somados os sujeitos que concluíram, ao menos, algum curso latu senso, percebe-se
que os valores correspondem a 87,4% do total de participantes na primeira etapa da pesquisa e
90%, na segunda. Assim, pode-se dizer que, além de possuírem tempo significativo de
experiência profissional e de atuação no hospital em questão, se interessaram por um
aprofundamento posterior à graduação, em áreas específicas do conhecimento, sendo as mais
freqüentes: Administração de Serviços de Saúde e de Enfermagem; Enfermagem Médico-
Cirúrgica; Terapia Intensiva; Metodologia ou Didática do Ensino Superior; e Enfermagem do
Trabalho.
Cabe destacar, igualmente, que apenas três enfermeiros na primeira fase e um, na
segunda etapa do estudo, haviam cursado especialização no campo de Doenças Infecto-
85
Parasitárias e três, para a primeira etapa, tiveram como temática central da dissertação de
Mestrado o HIV/AIDS.
TABELA 12 DISTRIBUIÇÃO DOS SUJEITOS DE ACORDO COM A FORMAÇÃO PROFISSIONAL. RIO DE JANEIRO,
2007.
FORMAÇÃO PROFISSIONAL
1ª fase
2ª fase
f
%
f
%
Especialização e/ou Residência
91
60,7
20
66,7
Especialização e/ou Residência e Mestrado
concluído ou em andamento
36
24
7
23,3
Mestrado
2
1,3
0
0
Especialização e/ou Residência, Mestrado e
Doutorado concluído ou em andamento
4
2,7
0
0
Nenhum
17
11,3
3
10
TOTAL
150
100
30
100
Dos sujeitos que participaram da primeira etapa da pesquisa, 78,7% referiu não ter
participado de cursos voltados para temática relativas às DST/HIV/AIDS (TABELA 13). Na
segunda fase, tais depoentes corresponderam a 76,7% do total. Nesta categoria não foram
considerados eventos ou palestras pontuais, considerando ser a carga horária mais extensa em
cursos específicos. Este resultado corrobora o descrito anteriormente, no que concerne à
formação profissional.
TABELA 13 DISTRIBUIÇÃO DOS SUJEITOS CONFORME A PARTICIPAÇÃO EM CURSOS SOBRE DST/HIV/AIDS.
RIO DE JANEIRO, 2007.
PARTICIPAÇÃO EM CURSOS
SOBRE DST/HIV/AIDS
1ª fase
2ª fase
f
%
f
%
Participaram
32
21,3
7
23,3
Não participaram
118
78,7
23
76,7
TOTAL
150
100
30
100
Como principal fonte de informação sobre temas relativos ao HIV/AIDS, para os
depoentes, conforme pode ser visualizado na Tabela 14, observou-se ser: os artigos e livros
científicos (28,7% dos depoentes da primeira fase do estudo e 23,4% dos da segunda); o local
de trabalho (com 22% dos sujeitos da primeira e 23,3% daqueles da segunda fase da
pesquisa); a internet (com 21,3% dos participantes da primeira e 23,3% dos integrantes da
segunda fase do estudo); e televisão e jornais e revistas em geral que, se somados,
correspondem a 21,3% para a primeira etapa e 23,3, para a segunda etapa da pesquisa. A
86
categoria local de trabalho é composta por conversa com enfermeiros ou outros profissionais
de saúde, sobretudo, médicos, nas instituições em que atuavam, acerca de casos de pacientes
atendidos.
Em relação à internet, os principais sítios aos quais referiam os sujeitos ter acesso
eram: governamentais, como Ministério da Saúde (53,1% para os depoentes da primeira fase
do estudo); e portais eletrônicos, em geral (71,5% dos integrantes da segunda fase da
pesquisa). Entretanto, se agregadas as fontes de informação com características semelhantes,
percebe-se uma distribuição heterogênea das mesmas, entre os sujeitos da primeira fase, com:
39% correspondendo à artigos e livros científicos e sítios governamentais, na internet; 31,3%
relacionado à televisão, jornal, revistas e sítios em geral, na internet; e 22% no local de
trabalho. Em relação à segunda fase da investigação, tal distribuição se configurou,
respectivamente, como 30,1%, 40% e 23,3%.
É importante salientar a diferenciação entre as três fontes de informação destacadas,
considerando o exposto por Epstein (1996), quando afirma ser o que se conhece como AIDS,
produto de uma complexa interação entre governos, pessoas com HIV/AIDS, pesquisadores
das ciências básicas e sociais, jornalistas, profissionais de saúde, Organizações Não-
Governamentais, tradições religiosas, indústria farmacêutica, bancos multilaterais, entre
outros.
Este aspecto assume importância no campo das representações sociais, pois, conforme
Jodelet (2005), os meios de comunicação social participam na construção e na disseminação
das representações sociais. Ao que Camargo (2003) acrescenta que esses meios, além das
relações face a face, como as referidas pelos enfermeiros deste estudo, como nos locais de
trabalho, são relevantes para que as representações sociais possam circular nos grupos e no
interior de uma dada sociedade.
Assim, para o presente estudo, parece haver uma significativa importância, para os
sujeitos, do discurso científico, daquele veiculado pela mídia, em geral, e das interações
sociais, propriamente ditas, descritas em termos de outros profissionais, no contexto do
trabalho.
87
TABELA 14 DISTRIBUIÇÃO DOS SUJEITOS SEGUNDO A PRINCIPAL FONTE DE INFORMAÇÃO EM RELAÇÃO AO
HIV/AIDS. RIO DE JANEIRO, 2007.
PRINCIPAL FONTE DE INFORMAÇÃO
SOBRE O HIV/AIDS
1ª fase
2ª fase
F
%
f
%
Artigos e livros científicos
43
28,7
7
23,4
Local de Trabalho
33
22
7
23,3
Internet
32
21,3
7
23,3
Televisão
16
10,7
4
13,3
Jornais e revistas em geral
16
10,6
3
10
Outra
10
6,7
2
6,7
TOTAL
150
100
30
100
Uma vez efetivada a caracterização dos sujeitos que integraram as duas fases da
pesquisa, serão apresentados, em seguida, os resultados referentes à aplicação da técnica de
evocações livres.
IV.2 AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS ENFERMEIROS ACERCA DO PORTADOR DO
HIV/AIDS: CONTEÚDO, ESTRUTURA E IDENTIFICAÇÃO DOS ELEMENTOS DA ZONA
MUDA
Conforme descrito no capítulo referente à trajetória metodológica do estudo, para a
identificação do conteúdo e estrutura das representações sociais dos enfermeiros acerca da
pessoa soropositiva ao HIV ou com AIDS, foi utilizada a técnica de evocações livres, como
descrita por Abric (2003b), Sá (2002) e Oliveira et al. (2005). Além disso, tendo em vista o
desvelamento de possíveis elementos escondidos ou mascarados na referida representação,
aplicou-se, outrossim, a técnica de substituição, tal qual apresentada por Abric (2003b; 2005).
A análise dos dados coletados, como também explicitado, anteriormente, se deu com o
auxílio do software EVOC 2003, que possibilitou, pelo cruzamento da freqüência e ordem
média de importância produzidas pelos sujeitos, a elaboração do Quadro de Quatro Casas,
para a situação normal e de substituição, bem como a comparação estatística com Test t de
Student, entre as mesmas.
Assim, para a configuração do Quadro de Quatro Casas, além dos elementos
constituintes da representação em questão, de suas freqüências e ordens médias de
importância, foi possível inserir os resultados dos testes estatísticos entre os corpora dos dois
contextos normativos diferentes.
Adicionou-se à estrutura do Quadro, também, o sentido de positividade ou
negatividade da atitude (respectivamente, com os símbolos + ou -) para os termos evocados
88
pelos sujeitos, em que aqueles dispostos de forma colorida, foram classificados pelos sujeitos,
na segunda fase da pesquisa. Os demais elementos tiveram tal classificação inferida pelos
pesquisadores, sendo apresentados com símbolos em cor preta.
Como a introdução conjunta destes corpora no software EVOC 2003, tal qual
descrito, teve por objetivo a realização, somente, da comparação estatística entre os mesmos,
apresentar-se-á, seguidamente, os resultados de cada um, de modo separado.
IV.2.1 ESTRUTURA DA REPRESENTAÇÃO SOCIAL SOBRE O PORTADOR DO HIV/AIDS EM
CONTEXTO NORMATIVO DE COLETA DE DADOS
Para a situação habitual de aplicação da técnica de evocações livres, em que os
sujeitos produziram cinco palavras ou expressões ao termo indutor “portador do HIV/AIDS”
por si mesmos, constatou-se um total de 747 evocações, entre as quais 174 foram diferentes.
A média das ordens médias de importância (OMI) calculada pelo EVOC 2003 foi aproximada
para 2.9 (APÊNDICE G).
Com base na Lei de Zpif de distribuição de palavras, como sugerem Oliveira et al.
(2005), foi escolhida como freqüência mínima 11, sendo descartados na composição do
Quadro de Quatro Casas, os elementos enunciados um número de vezes menor que aquela
pelos sujeitos. Feito isso, calculou-se o valor da freqüência média de evocações, cujo
resultado foi aproximado para 18 (APÊNDICE G), considerando que o programa do EVOC
2003, RangFRAQ, não aceita a introdução de casas decimais.
Assim, tornou-se possível a construção do Quadro de Quatro Casas para a situação
normal, conforme apresentado na figura seguinte (FIGURA 5).
89
OMI
2,9
2,9
Freq
Med.
Termo evocado
Freq
OMI
8
Test t
Atitude
Termo evocado
Freq
OMI
Test t
Atitude
18
educação-saúde
cuidado-precaução-
profissional
tratamento
25
20
18
2,240
2,700
2,444
p 0,025
p 0,025
+
+
+
preconceito
sofrimento
medo
discriminação
efeitos-aids
38
31
26
24
24
3,053
3,000
3,962
3,042
3,542
p 0,005
_
_
_
_
_
18
família
esperança
ajuda
medicações
solidariedade
controle-doença
prevenção
17
16
15
14
13
12
11
2,706
2,688
2,733
2,571
2,769
2,833
2,182
p 0,05
p 0,025
+
+
+
+
+
+
+
morte
tristeza
doença
carinho
14
13
13
11
3,500
2,923
3,846
3,000
_
_
+/_
+
FIGURA 5 - QUADRO DE QUATRO CASAS AO TERMO INDUTOR PORTADOR DO HIV/AIDS” ENTRE ENFERMEIROS DE UM
HOSPITAL UNIVERSITÁRIO SITUAÇÃO NORMAL. RIO DE JANEIRO, 2007.
De acordo com Abric (2003b), (1996, 2002) e Oliveira et al. (2005), os elementos
presentes no quadrante superior esquerdo do Quadro de Quatro Casas pertencem à zona do
núcleo central. Cabe destacar que nem todos os componentes desta casa são, necessariamente,
centrais, ao mesmo passo que elementos presentes em outros quadrantes podem ser centrais,
em determinadas situações. Conforme pode ser observado na Figura 5, as cognições com
características centrais foram cuidado-precaução-profissional, referindo-se aos cuidados e à
proteção do profissional diante da exposição ao risco de infecção pelo HIV no trabalho,
educação-saúde, termo padronizado para orientações ou práticas de educação em saúde e
tratamento, referindo-se à terapêutica e sua continuidade.
Neste ponto, faz-se necessário salientar que o núcleo central constitui a base comum e
consensual de uma representação social, aquela que resulta da memória coletiva e do sistema
de normas ao qual certo grupo se refere, constituindo-se em prescrições psicossociais
absolutas. Possui três funções, quais sejam: geradora, permitindo conferir significado a uma
dada representação social; organizadora, determinando a organização interna da
representação; e estabilizadora, pois confere significativa estabilidade à representação social,
preservando o fundamento dos modos de vida e a identidade e permanência de um grupo
social (ABRIC, 2003a).
Assim, inicialmente, é interessante notar que, ao solicitar aos sujeitos a produção de
evocações ao termo “portador do HIV/AIDS”, houve uma associação do objeto com uma
importante faceta da identidade daqueles, qual seja, a de profissionais de saúde, mais
8
Ordem Média de Importância.
90
especificamente, de enfermagem. Conforme Abric (2003a), a existência de um núcleo central
ilustra fortemente uma das idéias de Moscovoci, no sentido de que, em toda representação
social, o sujeito e o objeto não são marcadamente distintos.
Segundo Abric (2003a), pode-se classificar os elementos do núcleo central em dois
tipos: funcionais e normativos. Estes últimos seriam diretamente originados do sistema de
valores dos indivíduos, consistindo em uma dimensão fundamentalmente social do cleo.
Por sua vez, os primeiros são associados às características descritivas e à inscrição do objeto
nas práticas sociais ou operatórias, determinando as condutas diante do objeto.
Isto posto, pode-se dizer que os elementos identificados como provavelmente centrais
neste estudo, têm caráter, sobretudo, funcional, determinando as condutas dos enfermeiros em
relação à pessoa que vive com HIV/AIDS, envolvendo a proteção pessoal no trabalho, as
orientações e o tratamento. Nota-se a ausência de um elemento com características mais
normativas, ligadas aos valores, permitindo ao núcleo central realizar o seu duplo papel, a
saber, avaliativo e pragmático (ABRIC, 2003a).
Este achado parece se assemelhar aos de Ragon (2005), em que o núcleo central da
representação social da AIDS para pós-graduandos em odontologia foi identificado como
doença e prevenção. Guarda similitudes, também, com o resultado da pesquisa efetivada por
Thiengo, Oliveira e Rodrigues (2002), sobre a mencionada representação social entre
adolescentes, cujo provável núcleo constituía-se de prevenção, camisinha e cuidado.
Considerando, em particular, a análise de cada cognição integrante da zona do núcleo
central da representação social acerca do portador de HIV/AIDS, o elemento com maior
destaque refere-se à educação em saúde, com uma freqüência de evocação de 25 e uma ordem
média de importância de 2,24, representando a maior freqüência e a menor OMI da análise.
Sob esta designação, encontram-se as palavras ou expressões: aconselhamento; educação;
educação em saúde; orientação; orientações para equipe; orientações sobre infecções
oportunistas e controle de carga viral; orientações para tratamento; orientações à equipe de
enfermagem; orientações à pacientes; orientações gerais sobre ser portador; e palestra.
Aponta, portanto, para atividades profissionais em torno da questão do HIV/AIDS,
relacionadas tanto às pessoas que convivem com a doença quanto a outros trabalhadores de
saúde.
A educação em saúde, de acordo com Sabóia (2003), como campo específico da
atividade educativa se configurou, através dos tempos, como uma das estratégias, mais ou
menos explícitas do poder público para garantir o desenvolvimento de ações de controle ou
prevenção de doenças. Tal tipo de iniciativa surgiu, no Brasil, no início do século XX, com o
91
país assolado por epidemias e graves problemas sociais, assumindo uma conotação de
determinação de normas de conduta moral, de convívio social e de higiene, consideradas
capazes de modificar bitos e adaptar os indivíduos à sua condição de vida. Recentemente,
surgiram perspectivas mais críticas e emancipadoras em relação ao processo educativo em
saúde, sobretudo, a partir da teoria pedagógica freireana (ALVIM; FERREIRA, 2007).
Em relação à enfermagem, desde o início da trajetória de formação acadêmica, no
Brasil, registros da ênfase no papel da educação a ser assumido no cotidiano de trabalho,
nas mais diversas situações. Atualmente, no âmbito dos cursos de graduação, atualização e
especialização em enfermagem este aspecto é, ainda, destacado e valorizado, tendo em vista
suas contribuições para a prevenção de agravos e para a promoção da saúde da população
(SABÓIA, 2003). A orientação geral assumida na área é aquela da educação como processo
dialógico, no entanto, as práticas nem sempre são condizentes com essa perspectiva filosófica.
No campo do HIV/AIDS, as atividades educativas assumem, desde o início da
epidemia, lugar de importância, aumentada, sobretudo, com a constatação, nas décadas
posteriores, de que a medicina tradicional não obteve êxito na tentativa de seu controle, por
meio do desenvolvimento de vacinas ou pela sua cura (NASCIMENTO, 2005; GALVÃO,
2000). Nesta perspectiva, a educação em saúde ganha dimensão central, mesmo, nas políticas
nacionais, como as do Ministério da Saúde, e em organismos internacionais, como o Banco
Mundial. Este último, ao firmar o primeiro acordo para apoio financeiro ao Brasil, no início
da década de 1990, para a resposta à epidemia em questão, exigiu a maior parcela dos
recursos destinada à estratégias de prevenção, sendo o investimento em tratamento
considerado dispendioso pelo órgão e desaconselhável para países em desenvolvimento
(GALVÃO, 2000).
Neste sentido, a participação do enfermeiro no processo educativo no campo do
HIV/AIDS é destacada em múltiplas facetas, abarcando aspectos como a prevenção da
ocorrência da infecção pelo HIV em diferentes grupos populacionais (OLIVEIRA et al.,
2006; PRAÇA; GUALDA, 2003; THIENGO; OLIVEIRA; RODRIGUES, 2002; THIENGO;
OLIVEIRA; RODRIGUES, 2005; FRANCISCO et al., 2004) e no contexto do
aconselhamento pré e pós-teste sorológico para HIV (BRASIL, 1997; CAPPI et al., 2001).
Além disso, fomenta-se a participação deste profissional nas orientações às pessoas
que vivem com o HIV/AIDS, considerando sua adesão à terapia anti-retroviral
(COLOMBRINI et al., 2006; FIGUEIREDO et al., 2001; GIR; VAICHULONIS;
OLIVEIRA, 2005), sua sexualidade, vida em família e com companheiro sorodiscordante ou
não (SILVEIRA; CARVALHO, 2002; FERNANDES; HORTA, 2005; FREITAS; GIR;
92
FUREGATO, 2002) e nas intervenções junto à equipe de enfermagem e outros profissionais,
no que diz respeito, também, às relações de cuidado e à utilização de equipamentos de
proteção individual e coletiva (GIR et al., 2004; SÊCCO et al., 2003).
O segundo elemento a se destacar na zona do núcleo central foi aquele referente à
adoção de medidas de proteção individual e coletiva no trabalho e, tendo em vista o termo
indutor em questão, no cuidar de pessoas com HIV/AIDS. Sua freqüência foi de 20 e ordem
média de importância de 2,70. As formas enunciadas pelos sujeitos foram: precaução
profissional; precaução padrão; precaução; tenho que me proteger; cuidados especiais de
proteção; cuidados no manusear com o paciente; proteção de si e da equipe; proteção pessoal;
proteção do profissional; descuido na proteção; luvas; e cuidados de precaução.
A presença deste elemento em destaque na representação social em tela, remete a
determinados aspectos históricos mais gerais, relacionados à forma pela qual, freqüentemente,
lida-se com as doenças que emergem com caráter misterioso e associadas ao contágio e, mais
especificamente, ao modo pelo qual os profissionais de saúde se posicionaram diante do
impacto da epidemia nos diferentes contextos de assistência.
Como analisa Sontag (2007), todas as epidemias de rápida difusão, mesmo aquelas em
que não há suspeita de transmissão sexual, nem é atribuída qualquer culpa aos doentes, dão
origem à práticas de distanciamento e exclusão, mais ou menos semelhantes. Cita, a autora,
como exemplo, a pandemia de gripe de 1918-19, em que os policiais tinham ordem de colocar
máscaras de gás antes de entrar na casa de doentes e muitos barbeiros e dentistas usavam
máscaras e luvas. Mas a epidemia de gripe, que dizimou 20 milhões de vidas humanas, durou
quinze meses. No caso de uma epidemia em câmera lenta, como a da AIDS, estas mesmas
precauções parecem ganhar vida própria. Passam a fazer parte do grupo profissional, em vez
de serem apenas adotadas durante um breve período de emergência, e em seguida,
abandonadas.
O surgimento desta nova doença, no início da década de 1980, acerca da qual pouco se
conhecia, gerou uma série de repercussões nos serviços de saúde, em que se negava o
atendimento ou observava-se a utilização de diversos recursos para lidar com clientes com
AIDS, como capotes, luvas, máscaras, gorros, entre outros. Tais instrumentos eram
relacionados, sobretudo, à proteção do profissional, e não do cliente (GIAMI et al., 1997; GIR
et al., 2000; NASCIMENTO, 2005; SÁ; COSTA, 1994; SILVA; ABRANTES, 1995).
Em 1987, o CDC publicou um “Guia para a prevenção da transmissão do HIV e vírus
da hepatite B nos profissionais de saúde”, em que as precauções passaram a ser recomendadas
para todos os pacientes, independentemente do diagnóstico, ou seja, dando legitimidade às
93
denominadas precauções universais. Estas incluíam o uso de equipamentos como luva,
máscara, protetor ocular e avental, sempre que previsto o contato com sangue, sêmen,
secreções vaginais, líquido amniótico, cérebro-espinhal, pericárdico, peritonial, pleural,
sinovial, entre outros. Havia, igualmente, recomendação quanto à manipulação cuidadosa de
objetos cortantes e agulhas, devendo ser os mesmos desprezados, após o uso, em recipientes
resistentes. Em 1996, tais medidas de proteção foram denominadas de precaução padrão, com
a permanência da essência em relação ao risco universal (GIR et al., 2000).
Desta forma, em pesquisas acerca das alterações trazidas pelo HIV/AIDS ao trabalho
de enfermagem, em hospital público de ensino de São Paulo, os sujeitos referiram, como
principais, a incorporação de medidas de proteção individual e coletiva no atendimento aos
clientes, em diversas circunstâncias (GIR et al., 2000; GIR et al., 2005).
Um destes estudos, realizado em 1997, com uma amostra de 100 enfermeiros,
identificou que 76% dos sujeitos, com cinco ou mais anos de atuação profissional, referiram
mudanças em suas práticas nos serviços de saúde. E, 88% dos depoentes apontaram como
alterações a proteção e as precauções universais (68,4%) ou a introdução de atividades de
educação continuada (22,4%), e somente, 9,2% apontaram modificações na assistência
propriamente dita (GIR et al., 2000). Outra pesquisa, envolvendo 100 auxiliares de
enfermagem da referida instituição, no mesmo período, obteve resultados semelhantes (GIR et
al., 2005).
Por outro lado, dada a presença deste elemento na zona do núcleo central da
representação social em tela, é importante salientar que a adoção das medidas de proteção
individual e coletiva no trabalho em saúde tem configurado-se como um desafio para
enfermagem. Conforme Gir et al. (2004), uma aceitação “teórica” das normas e
orientações de biossegurança, porém sua operacionalização, freqüentemente, não permeia as
práticas diárias, mostrando-se de modo descontínuo e, até, contraditório. No caso do estudo
relatado anteriormente, por exemplo, se a paramentação na assistência foi uma destacada
alteração trazida pelo HIV/AIDS para a vida profissional, 20% dos enfermeiros entrevistados
apresentou justificativas parcialmente corretas e 53%, incorretas, para o emprego dos diversos
artigos de proteção.
Rodrigues e Sobrinho (2005) obtiveram resultados semelhantes em uma pesquisa
sobre as representações sociais da AIDS entre 100 cirurgiões-dentistas, em Natal (RN), por
meio de aplicação de questionário, entrevistas e observação. Entre os entrevistados, 29%
responderam que não atenderiam pessoas comprovadamente soropositivas ao HIV ou com
AIDS. Como motivos para tal, foram apontados a falta de informação sobre o tema, falta de
94
condições psicológicas e condições inapropriadas de biossegurança no local de trabalho. Em
relação aos profissionais que prestariam o atendimento, 57% afirmaram que empregariam
medidas de autoproteção especiais ao fazê-lo.
De acordo com os autores citados, apesar do discurso dos entrevistados sobre
biossegurança e a ênfase na autoproteção, as luvas, por exemplo, mencionadas
freqüentemente pelos profissionais como elemento imprescindível, eram, não raras vezes,
ignoradas quando da observação de campo, trabalhando os dentistas em contato direto das
mãos com a saliva e outros fluidos dos clientes. Sobre estes achados, Rodrigues e Sobrinho
(2005) afirmam, então, que, embora as representações sociais sejam um guia para a ação, tal
relação não se de modo mecânico, servindo aquelas como uma matriz de referência de
produções de significado para as ações do cotidiano.
Este aspecto do processo de trabalho em saúde foi apontado, também, em estudos no
campo das representações sociais por Fernandes e Oliveira (2002), Ribeiro et al. (2005) e
Ribeiro, Coutinho e Saldanha (2004) em ligação à cognição afetivamente carregada medo,
evocada pelos profissionais de saúde, em relação ao termo indutor “AIDS”.
Finalmente, outro elemento que compôs a zona do núcleo central da representação
social do portador do HIV/AIDS para os enfermeiros foi tratamento, com freqüência de 18 e
ordem média de importância de 2,44. Os termos padronizados sob tal denominação foram:
tratamento; terapêutica; e tratamento contínuo.
Pode-se dizer que a presença da cognição em questão, provavelmente, sofreu
influência da divulgação dos avanços observados no desenvolvimento de medicações anti-
retrovirais, com início em 1987, quando foi aprovada e disponibilizada para comercialização,
nos EUA, a primeira droga contra o HIV: o AZT (SCHAURICH; COELHO; MOTTA, 2006).
Apesar dos benefícios trazidos por tal medicamento e por outros descobertos após, um marco
neste campo, consistiu na apresentação da HAART, em 1996, na XI Conferência
Internacional de AIDS, em Vancouver (Canadá), quando alguns pesquisadores declararam,
inclusive, acreditar na cura da doença pelo tratamento precoce com uma combinação tríplice
de drogas (ANDRIOTE, 1999; GALVÃO, 2002).
De acordo com Nascimento (2005), houve ampla divulgação da descoberta da nova
terapia anti-retroviral, também denominada de coquetel, gerando um clima geral de otimismo.
No Brasil, houve, inclusive, um pronunciamento do então Presidente da República, em cadeia
nacional de rádio e televisão, ao final de 1996, o qual garantia o fornecimento do referido
tratamento para as pessoas soropositivas ao HIV ou com AIDS, no país.
95
Esta iniciativa fazia do Brasil o primeiro país a aprovar uma legislação específica, a
Lei 9.313/96, garantindo a distribuição universal e gratuita da HAART para as pessoas que
vivem com HIV ou AIDS. A introdução desta terapia permitiu, então, uma redução
significativa da mortalidade por AIDS, bem como um aumento no tempo de vida das pessoas
acometidas pela doença, culminando com sua classificação, por alguns autores da área, como
uma doença com características cada vez mais próximas da cronicidade (SCHAURICH;
COELHO; MOTTA, 2006).
É interessante observar a participação da cognição em questão, também, em outros
estudos, ainda que com o foco voltado para a representação social do HIV/AIDS, ou seja, não
diretamente sobre seus portadores, como ora busca-se na presente investigação. Desta
maneira, observa-se que o tratamento ou aspectos relacionados, como medicações e
medicamentos, não assumiam posições centrais, emergindo, freqüentemente, na segunda
periferia das representações sociais da AIDS.
Em estudo desenvolvido por Fernandes e Oliveira (2002), acerca da representação
social da AIDS entre estudantes de enfermagem, aspectos que pudessem remeter à questão do
tratamento não compuseram o Quadro de Quatro Casas, mostrando-se, apenas na segunda
periferia para o grupo de graduandos do curso de comunicação social. E, Marques, Oliveira e
Francisco (2003), outrossim, não evidenciaram tais elementos na estrutura da referida
representação entre profissionais de enfermagem e servidores cnico-administrativos de um
hospital universitário da cidade do Rio de Janeiro.
Por sua vez, Camargo (2000), ao abordar a representação em tela, entre graduandos do
sexo masculino e feminino, de cursos da área da saúde (odontologia e medicina) e humanas
(administração e economia), também identificou a idéia de tratamento, na segunda periferia
da representação, apenas entre homens de cursos biomédicos. E, Ragon (2005), em estudo
envolvendo estudantes de pós-graduação em odontologia, constatou a presença de
medicamento, igualmente, na segunda periferia da estrutura da representação social da AIDS.
Assim, a presença da cognição tratamento pode apontar para um processo de mudança
no conteúdo e na estruturação das representações sociais da AIDS, como sugeriram Camargo
(2000) e Ragon (2005). Ou, de outro modo, pode evidenciar uma dimensão associada,
particularmente, à representação social das pessoas soropositivas ao HIV ou com AIDS, entre
profissionais de saúde, no caso mais específico desta pesquisa, enfermeiros.
Faz-se mister, neste ponto, ressaltar, conforme afirmam Giami et al. (1997) em estudo
sobre a representação da AIDS entre enfermeiras na França, que a inexistência de recursos
para tratamento dos doentes, no início da década de 1980, consistia em um dos aspectos a
96
causar angústia e estresse no atendimento. Neste contexto, o profissional percebia-se como
impotente diante da morte inevitável provocada pela doença, o que, mesmo, tendia a
descaracterizá-la como uma morbidade para os cuidadores.
Um outro aspecto que chama a atenção, neste sentido, encontra-se entre os resultados
de uma investigação sobre a representação social da AIDS entre pessoas com idade acima de
50 anos, desenvolvida por Brasileiro e Freitas (2006), em Goiânia, no ano de 2003. Para os
sujeitos deste estudo, a AIDS foi considerada mais amena do que o câncer, pois, com o
tratamento, poderiam viver dez anos ou mais, segundo as informações disponibilizadas pelos
profissionais de saúde e, com esta última patologia, referiram que provavelmente morreriam
em um período muito mais curto de tempo. Ou seja, a partir da possibilidade de tratamento
anti-retroviral, os participantes da pesquisa apresentaram um novo conceito para a AIDS, a
qual, inicialmente, de acordo com Sontag (2007), tomou o lugar do pavor ocupado pelo
câncer à respeito da morte. Foi citado, também, pelos depoentes, a esperança de cura pela
terapêutica e pelo desenvolvimento de novas drogas à longo prazo.
No quadrante inferior esquerdo do Quadro de Quatro Casas encontram-se as cognições
ajuda, controle da doença, esperança, família, medicações, prevenção e solidariedade
(FIGURA 5). Os elementos desta casa integram a chamada zona de contraste, sendo
enunciados por menor quantitativo de sujeitos, os quais, por outro lado, referiram-nos como
muito importantes. Esta configuração pode revelar a existência de um subgrupo com uma
representação social diferente, cujo núcleo central seria constituído por um ou mais elementos
deste quadrante, mas pode, igualmente, se apresentar como um complemento da primeira
periferia (ABRIC, 2003b; OLIVEIRA et al., 2005).
Nesta perspectiva, pode-se dizer que os elementos dispostos neste quadrante, em
relação à representação social em tela nesta pesquisa, apontam para a existência de um
subgrupo que construiu cognições mais positivas acerca do objeto de estudo, além de atribuir
uma dimensão humanística ao portador do HIV/AIDS.
Desta maneira, os elementos controle da doença, medicações e prevenção, parecem
reforçar, de modo mais direto, as cognições provavelmente centrais relativas ao controle da
doença.
Primeiramente, cabe ressaltar que o termo prevenção foi considerado como o mais
importante na representação social do portador do HIV/AIDS, para o grupo estudado, com
uma ordem média de importância de 2,18. Foram homogeneizados, para a sua composição, as
palavras e expressões: prevenção; falta de prevenção; prevenção para sexo; e como evitar.
Assim, consiste em um conhecimento e uma conduta diante da possibilidade de transmissão
97
do vírus causador da doença, reforçando a assimilação do conhecimento científico sobre a
doença, bem como a dimensão comportamental das atividades de educação em saúde,
identificada como provável elemento central.
A prevenção configurou-se em uma resposta fundamental diante de uma doença para a
qual a medicina moderna não conseguiu desenvolver vacinas para controle e/ou erradicação
ou tecnologias para a cura (NASCIMENTO, 2005), sendo, como mencionado anteriormente,
estratégia assumida tanto em nível governamental nacional quanto internacional (GALVÃO,
2000; MANN; TARANTOLA; NETTER, 1993) e, por certo período, a única resposta
científica.
Além disso, a idéia de prevenção se inscreve em uma proposta de reestruturação do
paradigma dominante no campo da saúde, qual seja: o hospitalocêntrico, fulcrado,
basicamente, na atenção individualizada e especializada à saúde, concebida como ausência de
um estado de morbidade (AROUCA, 2003). Esta necessidade de redefinição do olhar, no
campo das políticas e práticas em saúde no Brasil, foi sustentado pelo Movimento da Reforma
Sanitária, sobretudo, na década de 1970, culminando com a impressão de um novo conceito
de saúde no relatório final da VIII Conferência Nacional de Saúde, em 1986, e na
Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988 (LUZ, 2006). Assim, dispõe o art.
198 da Carta Magna em vigor, como uma das diretrizes para o Sistema Único de Saúde
brasileiro (SUS): a “[...] atenção integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem
prejuízos aos serviços assistenciais” (BRASIL, 2003a, p.20).
Esta mudança na concepção de saúde e sua positivação na presente Constituição
Federal, trouxe implicações, também, para o segmento de formação profissional em saúde, o
qual, não obstante as limitações e dificuldades encontradas, passou a tentar um ajuste aos
princípios e diretrizes do SUS (CECCIM; FEUERWERKER, 2004).
Retomando as questões do HIV/AIDS e das pessoas que convivem com a referida
doença, de acordo com Nascimento (2005), os avanços e conquistas nas respostas produzidas
pelo Brasil, neste campo, tiveram importante influência das lutas ensejadas pelo Movimento
da Reforma Sanitária e seus ideais, e das incursões políticas em prol da abertura democrática
empreendidas no país, na década de 1980. Segundo a autora, os debates em torno das
problemáticas trazidas pela doença em tela ganharam impulso no bojo das discussões erigidas
em torno da redefinição do modelo de atenção à saúde, no país. Como exemplo, aponta para a
estruturação de uma Política Nacional de Sangue, cujos princípios foram, também, dispostos
na Carta Magna, de 1988, com uma importante mobilização de pessoas portadoras de
98
hemofilia, entre as quais se pode destacar o sociólogo e um dos fundadores da Associação
Brasileira Interdisciplinar de AIDS (ABIA), Herbert de Souza.
Tendo em vista os resultados de outros estudos no campo das representações sociais,
Ribeiro, Coutinho e Saldanha (2004) identificaram, entre enfermeiros e médicos que atendiam
portadores do HIV, a representação da AIDS como doença que causa medo e morte, onde a
prevenção se faz necessária. Esta, por sua vez, perpassando por dois eixos: um psicossocial,
ligado à necessidade de apoio às pessoas que vivem com o agravo em tela; e outro
comportamental, representado pelo uso do preservativo nas relações sexuais.
Marques, Francisco e Clos (2003), perscrutando as representações sociais da AIDS
entre subgrupos de servidores de um hospital universitário, evidenciaram que, para
enfermeiros, trata-se de um agravo prevenível, por meio da utilização de material descartável,
preservativos e controle no número de parceiros. Este último aspecto associado à
promiscuidade.
Na perspectiva da abordagem estrutural das representações sociais acerca da AIDS,
Marques, Oliveira e Francisco (2003), em pesquisa envolvendo profissionais de enfermagem
de um hospital universitário, e Fernandes e Oliveira (2002), tendo por sujeitos graduandos em
enfermagem, identificaram a prevenção como elemento provavelmente central. Assim,
também o fizeram Ragon (2005) e Camargo (2000), respectivamente, entre cirurgiões-
dentistas, no Rio de Janeiro, e graduados em odontologia e medicina, em Florianópolis.
Em estudos voltados para a população adolescente, Tura (1998) e Thiengo, Oliveira e
Rodrigues (2002), igualmente, constataram a cognição prevenção com características de
componentes centrais da representação social da AIDS, por meio da aplicação da técnica de
evocações livres.
A presença deste elemento na zona de contraste neste estudo pode estar relacionada ao
fato de se tratar da representação sobre pessoas infectadas pelo HIV, ou seja, portadoras do
mesmo. Isto, por sua vez, permite pensar acerca de uma relativa defasagem em relação à
questão das implicações da (re)infecção para o curso da doença, seu tratamento e a
convivência com a mesma.
Além disso, cabe salientar que, não obstante consistir em uma importante resposta
frente à doença, a ênfase na prevenção exige um processo reflexivo ampliado, pois, por outro
lado, pode gerar uma culpabilização dos portadores do HIV/AIDS, como constatado por
Freitas e Sadigursky (2004), em que, para o grupo de profissionais de saúde, a AIDS era
representada como um agravo novo, perigoso, acometendo as pessoas que não se previnem.
99
Neste sentido, Madeira (1998), a partir de entrevistas com 48 jovens, em investigação
sobre as representações sociais da AIDS, evidenciou uma articulação do processo discursivo
daqueles em dois pólos: o medo e a prevenção. Esta, por sua vez, era marcada, sobremaneira,
pela terminologia empregada na mídia, com o reforço de estereótipos.
Em reforço à cognição provavelmente central tratamento, encontrou-se, no quadrante
inferior esquerdo do Quadro de Quatro Casas, controle da doença e medicações. Em relação
ao primeiro, foram padronizadas as seguintes evocações: controle da doença; necessidade de
controle; controle da carga viral; preocupam-se com a terapêutica adequada; acesso a
cuidados médicos; acesso à saúde; necessidade de cuidado; cuidado da saúde;
acompanhamento; assistência; assistir; consultas; política de saúde voltada para HIV; falta de
recursos institucionais; e falta de recursos dos serviços e dos indivíduos. Para a composição
do segundo termo citado, foram homogeneizados: medicações; medicamentos; remédios;
muitos medicamentos; remédio; medicação; e falta de medicações.
Pode-se dizer que estes aspectos apontam, fundamentalmente, para uma percepção da
necessidade de políticas que garantam o acesso aos recursos de cuidados em saúde para as
pessoas que vivem com HIV/AIDS, envolvendo acompanhamento, atividades de assistência,
cuidado, consultas, exames de monitoramento de parâmetros clínicos, terapia adequadamente
recomendada e distribuição das medicações. Além disso, é assinalado pelos sujeitos
limitações quanto à disponibilidade destes elementos nas unidades de atendimento.
Assim, parece haver na representação social dos enfermeiros, uma preocupação
concernente ao acesso das pessoas soropositivas aos serviços e cuidados de saúde,
considerando a estrutura necessária nestes para o acompanhamento adequado daqueles
clientes.
Tal qual referido na discussão referente ao elemento tratamento, presente na zona do
núcleo central, a evocação dos termos controle da doença e medicações em relação ao
portador de HIV/AIDS sugere a idéia da possibilidade de um relativo controle do agravo e,
logo, a sobrevivência das pessoas acometidas pela doença. Observa-se, portanto, indícios de
uma mudança representacional, na qual a AIDS (e os seus portadores) deixam de ser
associados à morte e passam a ser associados ao tratamento e à esperança.
Em relação às demais cognições presentes na zona de contraste, a saber, ajuda,
esperança, família e solidariedade, pode-se dizer que representam um discurso e atitude mais
positiva acerca das pessoas que vivem com HIV/AIDS, com um caráter mais humanístico. É
possível, outrossim, pensar que tais elementos apontam para uma visão mais complexa do
100
processo saúde-doença, envolvendo, além de aspectos clínicos, a subjetividade, a dimensão
coletiva e uma rede social de apoio para aqueles convivendo com a doença.
De acordo com os pressupostos da abordagem estrutural das representações sociais,
este achado permite considerar a existência de um subgrupo com uma representação cujo
núcleo central possui uma configuração distinta daquela identificada para o grupo, expresso
no quadrante superior esquerdo (ABRIC, 2003b; SÁ, 2002; OLIVEIRA et al., 2005).
O termo ajuda foi composto pelas evocações: ajuda; necessidade de ajuda; como
ajudar; necessidade de apoio; apoio; apoiar; e auxílio. Família foi composta pelas palavras e
expressões: família; apoio familiar; inserção familiar; convivência na família; e orientações a
familiares. Por sua vez, a cognição esperança surgiu a partir da homogeneização de:
esperança; esperança de vida; esperança de melhora; esperança de cura; oportunidade;
perspectiva de vida; e possibilidades. E, finalmente, para a solidariedade não se realizou uma
padronização de termos.
Assim, a ajuda representa uma dimensão atitudinal positiva da representação social
acerca das pessoas com HIV/AIDS entre os enfermeiros em questão e parece, intimamente,
relacionada à solidariedade, a qual pode ser compreendida de igual modo no contexto da
representação.
A solidariedade constitui-se, de acordo com Daniel e Parker (1991), Silva (1998),
Ferreira (1999) e Galvão (2000), em uma forma de resposta construída socialmente,
sobretudo, a partir da influência da atividade de ativistas e Organizações Não-Governamentais
(ONG) no campo do HIV/AIDS, em oposição ao processo de estigmatização e discriminação
em relação às pessoas com a doença, tão acentuado na década de 1980.
Entre os referidos grupos atuantes, pode-se destacar, no Brasil: o Grupo de Apoio à
Prevenção à AIDS (GAPA), criado em 1985, em São Paulo, envolvendo militantes
homossexuais, profissionais de saúde, professores universitários e advogados; a ABIA,
fundada em 1986, no Rio de Janeiro, entre outros, por Herbert de Souza e Herbert Daniel,
sendo a primeira ONG com um presidente e fundador soropositivo; e o Grupo pela
Valorização, Integridade e Dignidade dos Doentes de AIDS (Grupo pela VIDDA), instituído
em 1989, também, no Rio de Janeiro, com a participação de Herbert Daniel, com o intuito de
propiciar às pessoas com HIV/AIDS um protagonismo diante da epidemia (FERREIRA,
1999; GALVÃO, 2000; SILVA, 1998).
O surgimento desta última entidade, em particular, marcou o cenário nacional de
respostas frente ao HIV/AIDS, pois o discurso passou a centrar-se não somente na prevenção,
mas também, nas pessoas com a doença, em razão do aumento no número de casos, assim
101
como dos avanços terapêuticos, com a introdução de medicamentos como o AZT, que
propiciaram melhora nas condições de saúde dos soropositivos (SILVA, 1998; GALVÃO,
2000). Neste sentido, como afirma Galvão (2000), conhecer o status sorológico e lutar por
melhores condições de atendimento passaram a ser prioritários. O slogan adotado por pessoas
com HIV/AIDS, neste período, em diferentes regiões do mundo foi: “Nós não somos somente
o problema, mas parte da sua solução”.
Como asseveram Silva (1998) e Ferreira (1999), as ONG/AIDS passaram a constituir-
se como grupos de pressão contra o estigma e a discriminação às pessoas com HIV/AIDS, que
se manifestava e, ainda pode ser constatado em diversos contextos sociais, como no local de
trabalho, serviços de saúde, instituições de ensino, igreja e na família. Buscavam, assim, por
meio da informação, da sensibilização da sociedade e da advocacy
9
, a criação de uma rede
social de apoio e não exclusão para os acometidos pelo agravo em questão.
A atuação das ONG/AIDS e, portanto, de suas causas, ganhou maior visibilidade e
reconhecimento, no Brasil, sobretudo, a partir do início da década de 1990, em que houve a
criação de uma unidade de articulação com ONG, no ínterim do Programa Nacional de AIDS
e com o empréstimo do Banco Mundial a este país, permitindo maior emprego de recursos no
apoio às atividades desenvolvidas por aquelas (GALVÃO, 2000).
Como discute Ferreira (1999), em sua dissertação de mestrado sobre a violência aos
direitos humanos das pessoas com HIV/AIDS, um dos entraves enfrentados pelas pessoas
com HIV/AIDS e pelas ONG/AIDS consistia no acesso e atendimento das mesmas no âmbito
dos serviços de saúde. Neste contexto, torna-se, muitas vezes, difícil a obtenção de leitos para
casos de AIDS, observam-se violações quanto ao sigilo do diagnóstico, resultando em sua
insistência em diversos guias e manuais do Ministério da Saúde, e limitações na interação
entre os profissionais e estes clientes.
Como resultado, Rozenblat, Biagini e Sánchez (1999), Parker e Aggleton (2006) e
Foreman, Lyra e Breinbauer (2003) salientam o dispêndio de energia que poderia ser
empregada para a prevenção à transmissão do HIV/AIDS e no cuidado e apoio às pessoas
vivendo com a doença. Além disso, ocorre uma sinergia em sentido oposto, com o
afastamento dos sujeitos dos serviços de saúde e, portanto, de uma importante fonte de
orientações para os mesmos, famílias e para a sociedade, em geral.
9
Embora sem uma tradução precisa para o português, trata-se de um jargão empregado no campo do HIV/AIDS
para designar a militância frente à discriminação, inclusive, com o envolvimento de um trabalho de assessoria
jurídica às pessoas com a doença (GALVÃO, 2000).
102
Esta dimensão da ajuda e da solidariedade, outrossim, emergiu em estudos anteriores
sobre a representação social do HIV/AIDS, entre diversos grupos, como demonstrado por
Lage (2003), em um subgrupo de estudantes de Paris, de 10 a 15 anos, Agirrezabal e Valencia
(2001), entre estudantes de nível médio e universitários, no País Basco, e Ribeiro et al. (2005)
e Ribeiro, Coutinho e Saldanha (2004), entre profissionais de saúde.
Entretanto, pesquisas desenvolvidas à luz da abordagem estrutural indicaram que tais
elementos situam-se na segunda periferia das representações sobre a AIDS entre adolescentes,
no Rio de Janeiro (TURA, 1998; THIENGO; OLIVEIRA; RODRIGUES, 2002),
universitários da área das ciências humanas, do sexo feminino, em Florianópolis
(CAMARGO, 2000) e servidores técnico-administrativos de um hospital universitário, do Rio
de Janeiro (MARQUES; OLIVEIRA; FRANCISCO, 2003). Cabe apontar que em estudo
comparativo entre graduandos de enfermagem e de comunicação social, efetivado por
Fernandes e Oliveira (2002), a solidariedade foi identificada, apenas para estes últimos,
também, na zona de contraste do Quadro de Quatro Casas.
Deste modo, pode-se, neste ponto, novamente pensar em um processo de evolução das
representações sociais em torno do HIV/AIDS ou em uma ativação de dimensões atitudinais
relacionadas, mais especificamente, às representações sociais das pessoas que convivem com
a doença.
O elemento família, no contexto da soropositividade ao HIV e da convivência com a
AIDS, se insere, igualmente, na perspectiva de uma rede de apoio e cuidados importante para
a pessoa com HIV/AIDS. Segundo Figueiredo e Rissi (1999), uma vez que se caracteriza pela
proximidade e pela manutenção de vínculos afetivos fortemente estabelecidos, independente
de sua direção, a família representa uma fonte de recursos que poderiam ser canalizados para
amenizar o convívio com a doença, atenuando seus efeitos desagregadores, oriundos de pré-
concepções relativas ao gênero, à sexualidade, drogadição e homossexualidade.
Na perspectiva destes autores, a sobrevida pela infecção pelo HIV, dilatada pelo
advento da HAART, possibilitou uma diminuição da hospitalização da pessoa com
HIV/AIDS, o que incide sobre seu retorno à origem, em muitos casos, à família
(FIGUEIREDO; RISSI, 1999). Assim, é importante considerar o impacto da soropositividade
para o contexto familiar, que Martin e Baldessin (1990) definem pelo surgimento de diversas
reações e sentimentos, como vergonha, culpa, raiva, negação, rejeição, indiferença, acolhida,
compreensão, apoio e aceitação.
Como salientam Parker e Aggleton (2006), no contexto da epidemia do HIV/AIDS,
nem todas as respostas familiares são positivas, sendo o oposto mais comum. Neste sentido, o
103
medo da rejeição e da estigmatização dentro de casa e da comunidade local impede,
freqüentemente, que as pessoas com HIV/AIDS possam compartilhar a informação sobre seu
status sorológico aos familiares. Isso, sobretudo, se ocorre uma sinergia com conotações
relativas à questões como homossexualidade, uso de drogas e de promiscuidade ensejadas
pela doença.
Além disso, tendo em vista a inserção da família em uma rede social mais ampla, estes
autores apontam para o fato de que os esforços desta instituição para administrar a
estigmatização produzida pela comunidade ao redor podem, também, influenciar no tipo de
cuidado fornecido à pessoa que vive com a doença. Neste sentido, é comum a observação de
familiares mantendo seus parentes afetados circunscritos ao lar ou impedindo que sejam
questionados, na tentativa de proteção aos mesmos (PARKER; AGGLETON, 2006).
Este achado parece assemelhar-se ao obtido no estudo de Ribeiro et al. (2005), no
qual, para profissionais de saúde, na faixa etária de 24 a 33 anos, a AIDS, entre outros
aspectos, é ancorada em transtornos psicoafetivos, como a depressão, gerando sofrimento e a
necessidade do apoio da família.
Finalmente, a esperança emerge como um outro importante constituinte da zona de
contraste da representação social em questão, tendo em vista que pode constituir-se em uma
cognição mais carregada afetivamente, conforme discutido por Campos e Rouquette (2003),
em estudo sobre a dimensão afetiva na representação social de “meninos de rua”.
Este elemento representa uma dimensão positiva associada à pessoa que vive com
HIV/AIDS, de modo diverso do imaginário construído socialmente em torno da aquisição da
doença. Cabe, neste ponto, lembrar que, desde o seu surgimento, a AIDS esteve intensamente
ligada à idéia de morte, a qual se manifestava em um curto espaço de tempo e de forma
assustadora, em indivíduos de determinados grupos ou adeptos de certos comportamentos
(BARBARÁ; SACHETTI; CREPALDI, 2005; DANIEL; PARKER, 1991). Esta, inclusive,
fora a forma de apresentação da doença à sociedade pela mídia, como referido em tópico
anterior (GALVÃO, 2000; NASCIMENTO, 2005).
Antes mesmo da morte biológica, devido à infecções oportunistas ou certos tipo de
neoplasia, a pessoas com HIV/AIDS eram, já, visualizadas como portadoras daquela e,
portanto, excluídas socialmente e destituídas de seus direitos de cidadania, o que levou
Herbert Daniel a cunhar a expressão “morte civil” (DANIEL; PARKER, 1991).
A presença desta cognição foi identificada, também, em estudos mais recentes em
relação à representação social da AIDS, sobretudo, em associação à idéia da possibilidade de
tratamento da doença e, mesmo, sua cura futura, pelo desenvolvimento de novas terapias
104
medicamentosas (RIBEIRO et al., 2005; RIBEIRO; COUTINHO; SALDANHA, 2004;
BRASILEIRO; FREITAS, 2006). Na perspectiva da abordagem estrutural, de quatro
subgrupos de universitários pesquisados por Camargo (2000), apenas no de mulheres dos
cursos da área da saúde, a esperança emergiu, estando na segunda periferia da representação.
É interessante, igualmente, neste sentido, notar os achados de Ribeiro et al. (2005) ao
solicitarem aos médicos e enfermeiros participantes da pesquisa que produzissem evocações
ao termo indutor “tratamento da AIDS”. Entre os primeiros profissionais, o tratamento é
representado como gratuito, exigindo competência e acompanhamento. Para o segundo grupo
mencionado, o tratamento mostrou-se associado com a cura e a esperança. Além disso, para
os sujeitos com idades acima de 44 anos, este termo indutor gerou ligações com apoio,
solidariedade, carinho, informação e orientação. Tais aspectos parecem, portanto, reforçar a
importância da cognição provavelmente central tratamento na representação social em tela no
presente estudo.
No quadrante superior direito do Quadro de Quatro Casas, como pode ser visualizado
na Figura 5, foram identificados os elementos discriminação, efeitos-aids, medo, preconceito
e sofrimento. Conforme Abric (2003b) e Oliveira et al. (2005), as cognições presentes nesta
casa constituem a primeira periferia da representação social, a qual abarca os componentes
periféricos considerados mais relevantes. Sua posição foi determinada por sua destacada
freqüência e a atribuição de menor importância pelos sujeitos, dentre a totalidade das
evocações produzidas.
No quadrante inferior direito do Quadro de Quatro Casas, encontram-se os termos
carinho, doença, morte e tristeza (FIGURA 5). De acordo com os pressupostos da abordagem
estrutural, estes elementos configuram a segunda periferia da representação social em questão,
sendo pouco freqüentes e definidos como menos importantes entre as evocações enunciadas
pelos depoentes da pesquisa (ABRIC, 2003b; OLIVEIRA et al., 2005).
O sistema periférico da representação social, segundo Abric (2000), se organiza em
torno do núcleo central desta, constituindo-se em seus elementos mais acessíveis, mais vivos
e mais concretos. Deste modo, possuem três funções primordiais, quais sejam: a de
concretização, regulação e defesa da representação. A primeira função propicia a ancoragem
da representação na realidade, pela interface entre o núcleo central e a situação concreta na
qual a representação é elaborada ou colocada em funcionamento. Componentes susceptíveis
de entrar em conflito com os fundamentos da representação poderão, também, ser integrados,
seja lhes atribuindo uma importância menor, seja lhes reinterpretando na direção do
significado estabelecido pelo núcleo central, ou, ainda, lhes atribuindo um caráter de exceção.
105
A segunda função refere-se ao fato de que, mais leves que as cognições centrais, têm papel
essencial na adaptação da representação às evoluções do contexto, modo pelo qual as
informações novas ou transformações no meio podem integrar-se na periferia. A terceira
função, a de defesa, permite a proteção do núcleo central e garante sua estabilidade.
Assim, não se trata de um componente menor da representação, ao contrário, sendo
fundamental, pois, associado ao sistema central, permite a ancoragem na realidade. Mais
associado às características individuais e ao contexto imediato e contingente, nos quais as
pessoas encontram-se inseridas, a periferia da representação possibilita uma adaptação, uma
diferenciação em função do vivido, uma integração das experiências cotidianas. Dada sua
flexibilidade, viabiliza a integração de informações e, até, de práticas diferenciadas, bem
como uma certa heterogeneidade de comportamentos e de conteúdo, o que, por sua vez, não
consiste em sinal de representações diferentes (ABRIC, 2000).
Nesta perspectiva, o preconceito e a discriminação presentes na primeira periferia da
representação parecem refletir o contexto social em que se inserem os sujeitos, bem como o
desconhecimento e falsas crenças sobre o HIV/AIDS e as atitudes observadas diante das
pessoas que vivem com a doença.
Cabe destacar que o termo preconceito obteve a maior saliência quantitativa nas
evocações livres em situação normativa, com freqüência de 38, refletindo a sua importância
em termos das práticas sociais e da realidade social a partir da qual se constrói a representação
social em questão. Além disso, tendo em vista a sua OMI de 3,053, próxima à média das
ordens médias de importância, qual seja, de 2,9, deve-se levantar a hipótese de sua
centralidade na representação social em tela, embora tenha figurado na primeira periferia do
Quadro de Quatro Casas.
Sob a padronização preconceito foram agrupadas as palavras e expressões:
preconceito; preconceitos; imagem estereotipada do indivíduo com SIDA; julgamento; e
mitos. Para a discriminação, por sua vez, foram homogeneizados: discriminação;
discriminado; discriminadas; como será que as outras pessoas vão ver isso; estigma; marcado;
paciente que sofre com o estigma da doença; e rótulo. Correspondem ao que Mann
denominou como a terceira epidemia, ou seja, a epidemia de significados, com efeitos tão ou
mais deletérios e sinérgicos aos da epidemia do HIV/AIDS, propriamente dita (MANN;
TARANTOLA; NETTER, 1993; PARKER; AGGLETON, 2006; DANIEL; PARKER, 1991).
Como afirma Jodelet (2001) a AIDS consistiu na primeira doença em que a história
médica e social de desenvolveram juntas, tendo a mídia e as pessoas se apoderado deste mal
desconhecido e estranho, cuja proximidade ainda não tinha sido revelada. A ausência de
106
referências médicas favoreceu, então, uma qualificação social da doença e, antes que a
pesquisa biológica trouxesse esclarecimentos sobre a natureza do agravo, foram socialmente
elaboradas teorias apoiadas em dados disponibilizados sobre as primeiras vítimas e os
supostos vetores da enfermidade.
Tal qual discutido, em momento anterior, o fato de os primeiros atingidos terem sido
pessoas apontadas como homossexuais, prostitutas, usuários de drogas e, mesmo,
hemofílicos, fez da nova entidade mórbida uma “doença estranha” de “pessoas estranhas”
(NASCIMENTO, 2005). Em relação a estes grupos, sobretudo aos três primeiros, existiam
discriminação e preconceitos, sendo considerados pela sociedade transgressores de normas
sociais (GALVÃO, 2000; MANN; TARANTOLA; NETTER, 1993).
Passados mais de 25 anos do surgimento dos primeiros casos da doença, com diversas
modificações na trajetória epidemiológica e em conceitos relacionados à mesma, a
discriminação e a estigmatização consistem, ainda, em importante obstáculo para a melhoria
da qualidade de vida das pessoas que vivem com HIV/AIDS, seus familiares e, também, para
a prevenção de sua transmissão (PARKER; AGGLETON, 2006).
Como afirma Ferreira (1999), se, atualmente, constata-se que o discurso científico ou
mesmo o político, está mais próximo do “politicamente correto”, a partir principalmente de
uma maior hegemonia da lógica democratizante, tem-se, na prática, um rol de discriminações
e preconceitos operando socialmente com intensidades e nuanças variáveis de país a país, com
importantes diferenças às vezes dentro do mesmo grupo cultural. Neste bojo, insere, a
mencionada autora, as questões referentes ao HIV/AIDS.
Parker e Aggleton (2006) apontam para a necessidade de uma nova interpretação da
estigmatização e da discriminação, bem como sua identificação em diversos contextos, como
nas famílias e comunidades, em instituições de ensino, nos locais de trabalho, em viagens e,
mesmo, em sistemas e serviços de saúde e programas para HIV/AIDS.
Este aspecto pode relacionar-se, também, ao medo e ao sofrimento, observados na
primeira periferia. O primeiro termo foi evocado como: medo; medo da doença; morro de
medo dessa doença; assustado; medo de contágio; medo de adquirir; medo da morte; medo ao
contato; medo de aproximação; temem aproximação; medo de contaminar-se; medo de
contaminação; medo de se contaminar; pavor; e temor. O segundo elemento citado
apresentou-se sob as formas: sofrimento; dor; sofrimento social; sofrido; e pessoas sofridas.
Desta forma, a estigmatização e a discriminação podem gerar sofrimento para as
pessoas com HIV/AIDS e, a percepção deste, uma atitude de medo de adquirir a doença. O
medo, também, pode relacionar-se à prática profissional dos sujeitos da pesquisa, dada a
107
possibilidade de ocorrência de acidentes envolvendo fluidos orgânicos, por exemplo, como
discutido por Ribeiro, Coutinho e Saldanha (2004).
Outro aspecto possivelmente relacionado às cognições sofrimento e medo refere-se à
padronização efeitos-aids. Para a composição desta, foram agregadas as evocações: infecção;
infecções; infecções oportunistas; riscos de infecções oportunistas; doenças oportunistas;
doenças; sarcoma de kaposi; cor; cor da pele; lesões; imunodeprimido; imunodepressão; baixa
imunidade; queda de cabelo; diarréia; emagrecimento; emagrecidas; magreza; magro; aspecto;
lipodistrofia; e efeitos colaterais. Deste modo, consistem em aspectos mais concretos da
conviência com a soropositividade ao HIV ou com a AIDS, englobando, inclusive,
conseqüências deletérias ligadas ao tratamento da doença com os anti-retrovirais.
Além disso, associa-se ao medo e ao sofrimento, a idéia da morte suscitada pela
convivência com a doença AIDS, que, por sua vez, remetem ao sentimento de tristeza,
cognições estas presentes na segunda periferia da representação analisada. Esses três
elementos caracterizados como periféricos reforçam a hipótese de uma mudança
representacional em curso, uma vez que apareciam como centrais nos estudos realizados até o
início dos anos 2000.
O elemento carinho, também visualizado na segunda periferia, parece relacionar-se
aos elementos ajuda, solidariedade e família, identificados na zona de contraste, compondo
um quadro de atitudes mais positivas, com caráter mais humanístico diante da realidade em
que se insere a convivência com o HIV/AIDS. Neste contexto, como observado a partir,
sobretudo, dos elementos da primeira periferia, destaca-se o preconceito, a discriminação, o
medo, o sofrimento e os efeitos biológicos da doença.
É interessante salientar alguns aspectos emergidos na representação social em tela, em
comparação a estudos anteriores, considerando a importância de determinados elementos no
imaginário social acerca do HIV/AIDS.
Assim, um primeiro ponto a chamar a atenção é a disposição da morte da estrutura da
representação social acerca da pessoa com HIV/AIDS para o grupo em questão, de modo
distinto do identificado por Marques, Oliveira e Francisco (2003), para servidores técnico-
administrativos e profissionais de enfermagem em um hospital universitário do Rio de
Janeiro. Para estes grupos, a referida cognição ocupou posição provavelmente central, ainda
que com um termo indutor diferente, a saber “AIDS”. Também compuseram, neste estudo, a
zona do núcleo central, o medo, o preconceito e o sofrimento, guardando similitudes com os
achados ora apresentados, apenas no que concerne à discriminação e tristeza, presentes, igual
e respectivamente, na primeira periferia. Entre graduandos de enfermagem, os elementos
108
medo, morte e preconceito, foram, também, identificados entre os provavelmente centrais na
representação social da AIDS, em pesquisa desenvolvida por Fernandes e Oliveira (2002).
Entretanto, Camargo (2000) e Ragon (2005) sugerem a possibilidade, a partir de seus
achados, do início de um processo de mudança nas representações sociais da AIDS, tendo em
vista a ausência do elemento morte em um dos quatro subgrupos de universitários estudados
pelo primeiro autor e a sua refutação em teste de centralidade aplicado na investigação da
segunda, entre cirurgiões-dentistas.
Em relação às atitudes, como pode ser visualizado na Figura 5, houve um predomínio
daquelas cognições apontadas como positivas pelos sujeitos da pesquisa para os prováveis
elementos centrais. Assim, educação em saúde, cuidado-precaução-profissional e tratamento
foram, respectivamente, classificados como positivos por 100%, 90% e 96,7%, dos 30
sujeitos da segunda fase da pesquisa, conforme descrito no capítulo da Trajetória
Metodológica.
Para a zona de contraste, embora não avaliados pelos depoentes, é possível a
inferência de que se encontram, igualmente, marcados pela positividade. Por sua vez, a
primeira e a segunda periferia tiveram maior presença de termos negativos, sejam aqueles
avaliadas de tal modo pelos 30 enfermeiros da segunda etapa da pesquisa, como medo
(93,3%), preconceito (96,7%) e sofrimento (90%), como os outros inferidos, discriminação,
efeitos da AIDS, morte e tristeza.
Como termo positivo na periferia, tem-se apenas carinho. A evocação doença guarda
certa ambigüidade, considerando a possibilidade do caráter instrumental desta palavra para
profissionais da área da saúde, tendo sido considerada a convivência com a mesma como
positiva (46,7%) e negativa (53,3%), entre os 30 sujeitos da segunda etapa deste estudo.
As evocações mais associadas a este corpus, ou seja, à situação normativa de produção
discursiva, de acordo com os resultados da aplicação do teste t de Student, com seus
respectivos valores de níveis de significância (p), tendo mostrado-se estatisticamente
significantes, foram os seguintes: cuidado-precaução-profissional ou proteção profissional (p
0,025) e tratamento (p 0,025), pertencentes ao provável núcleo central; esperança (p 0,05) e
medicações (p 0,025), identificados na zona de contraste; e sofrimento (p 0,005), situado na
primeira periferia.
Após, então, a descrição e discussão do conteúdo e estrutura da representação social
acerca das pessoas com HIV/AIDS entre os enfermeiros, em situação normativa ou normal,
proceder-se-á à apresentação dos resultados obtidos por meio da associação entre a técnica de
evocações livres à técnica de substituição. Tal procedimento teve por objetivo, como
109
mencionado anteriormente, a diminuição das pressões normativas sobre os depoentes no
momento da coleta de dados, com a possibilidade do desvelamento de facetas contra-
normativas, ou seja, que não fossem consideradas “politicamente corretas” na representação
social em tela para os sujeitos da pesquisa.
IV.2.2 ESTRUTURA DA REPRESENTAÇÃO SOCIAL SOBRE O PORTADOR DO HIV/AIDS EM
SITUAÇÃO DE SUBSTITUIÇÃO DE COLETA DADOS
Como descrito em tópicos anteriores, as representações sociais possuem diversas
facetas, entre as quais algumas podem não ser expressas em todas as circunstâncias
(FLAMENT; GUMELLI; ABRIC, 2006). Um dos aspectos que podem influenciar na
explicitação de elementos das representações pelos atores sociais consiste nas pressões sociais
percebidas pelos mesmos, em determinado contexto, sobretudo, para objetos mais sensíveis
(ABRIC, 2003b), como pensa-se serem aqueles relacionados ao HIV/AIDS.
De acordo com Abric (2005), o papel das pressões ou normas sociais sobre a produção
discursiva dos sujeitos acerca de determinado objeto de representação consiste um uma pista
metodológica para a tentativa de fazer emergir possíveis aspectos considerados contra-
normativos. Para tal, seria, portanto, necessária uma redução das pressões normativas
exercidas sobre os indivíduos, conferindo a possibilidade de expressão de posições definidas
socialmente como indesejáveis na situação. Neste sentido, dois elementos são essenciais: o
próprio sujeito e seu grupo de referência, uma vez que a norma social resulta da interação
daquele e com este.
Assim, com o intuito de investigar a possibilidade da existência de elementos não
explicitados ou mascarados na representação social dos enfermeiros acerca da pessoa que vive
com HIV/AIDS, utilizou-se como estratégia a técnica de substituição, a qual permite uma
diminuição da pressão normativa pela redução da implicação dos sujeitos sobre o discurso
contra-normativo produzido (ABRIC, 2003b, 2005; FLAMENT; GUMELLI; ABRIC, 2006).
Para a operacionalização da referida estratégia, associou-se a técnica de substituição à
técnica de evocações livres, em um procedimento que consistiu, então, em demandar aos
sujeitos da pesquisa, após a coleta tradicional, a produção de cinco palavras ou expressões
que, imediatamente viriam à mente das “pessoas em geral”, ao pensarem no termo “portador
do HIV/AIDS”. Este contexto discursivo foi denominado de situação de substituição, em que
se considera a redução da implicação dos enfermeiros na explicitação de possíveis elementos
contra-normativos, vistos como não “politicamente corretos” acerca da representação em tela.
110
Com a construção de um corpus a partir das evocações dos depoentes em situação de
substituição e sua posterior análise com o auxílio do software EVOC 2003, foi possível
evidenciar a produção de 746 palavras ou expressões, sendo 115 diferentes. Deste modo,
pode-se observar que o corpus referente à situação normal de coleta apresentou-se mais
disperso, com 174 termos diferentes, em um total 747 enunciações.
A freqüência mínima para a situação de substituição, definida pelo mesmo critério
citado para a situação normal de evocação, foi 11, a partir do que se tornou possível a
identificação da freqüência média, com resultado aproximado para 28. É interessante, neste
ponto, notar que este valor é significativamente superior àquele encontrado para a situação
normal de coleta de dados, devido a uma maior dispersão em seu corpus. A média das ordens
médias de evocação calculada pelo referido software foi, também, aproximada para 2,9.
Uma vez definidos os parâmetros mencionados, foi possível a construção do Quadro
de Quatro Casas para a situação de substituição, ao qual se inseriu, igualmente, a dimensão
atitude e os valores encontrados pela comparação estatística por meio do Teste t com o corpus
da situação normativa normal de evocação livre. O resultado pode ser visualizado, a seguir, na
Figura 6.
111
OMI
2,9
2,9
Freq
Med.
Termo evocado
Freq
OMI
Test t
Atitude
Termo evocado
Freq
OMI
Test t
Atitude
28
medo
preconceito
homossexualidade
83
61
30
2,048
2,148
2,400
p < 0,005
p 0,010
_
_
_
piedade
morte
discriminação
46
41
28
3,435
3,195
3,679
p < 0,005
p < 0,005
_
_
_
28
contaminação
doença
prática-sexual
contágio
25
18
17
11
2,480
2,833
2,824
1,909
p < 0,05
_
+/_
_
_
promiscuidade
afastamento
desinformação
isolamento
uso-drogas
rejeição
sofrimento
27
24
21
17
15
14
13
3,148
3,417
2,905
3,294
3,600
3,286
4,231
p 0,010
_
_
_
_
_
_
FIGURA 6 - QUADRO DE QUATRO CASAS AO TERMO INDUTOR PORTADOR DO HIV/AIDS” ENTRE ENFERMEIROS DE UM
HOSPITAL UNIVERSITÁRIO SITUAÇÃO DE SUBSTITUIÇÃO. RIO DE JANEIRO, 2007.
No quadrante superior esquerdo, em que se encontram os elementos, como descrito,
provavelmente centrais da representação social (ABRIC, 2003b; OLIVEIRA et al., 2005),
observa-se as cognições homossexualidade, medo e preconceito. Desta maneira, pode-se dizer
que consistem em termos com caráter mais normativo, originado do sistema de valores dos
indivíduos, expressando uma dimensão fundamentalmente social, pois se ligam à historia e à
ideologia do grupo. Segundo Abric (2003a), tal tipo de elementos determinam os julgamentos
e as tomadas de posição relativas ao objeto, neste caso, a pessoa com HIV/AIDS.
O termo provavelmente central com maior destaque foi medo, abarcando um total de
83 evocações, tendo sido atribuída uma ordem média de importância de 2,048. Na situação de
substituição, envolveu uma maior diversidade de enunciações, a saber: medo; medo da
doença; morro de medo dessa doença; medo de contágio; medo de adquirir; medo da morte;
medo ao contato; medo de aproximação; temem aproximação; medo de contaminar-se; medo
de contaminação; medo de se contaminar; pavor; e temor. Consiste, portanto, em uma
cognição carregada afetivamente, tal qual discutido por Campos e Rouquette (2003) e
associada a diversas situações, perpassando pelo medo da doença, de sua aquisição, da morte
até o receio em entrar em contato com as pessoas com HIV/AIDS.
De acordo com Sontag (2007), as doenças que causam mais medo são as consideradas
não apenas letais, mas também, desumanizadoras, com uma associação à alterações físicas e
comportamentais peculiares dos seus portadores. Neste sentido, discute a autora sobre o
destaque das mudanças faciais, entre as quais as mais temidas são as que conotam putrefação
e, subsidiando os juízos morais em relação à doença, encontram-se julgamentos estéticos a
112
respeito do belo e do feio, do limpo e do sujo, do conhecido e do estranho ou insólito. Assim,
mais importante que a desfiguração é o fato desta refletir um processo subjacente e
progressivo de dissolução da pessoa, como o que foi associado à AIDS. No que tange ao
comportamento, o diagnóstico da mencionada patologia não apenas reflete um estado de
morbidade, mas, igualmente, uma suposta evidência da existência de uma transgressão aos
valores sociais por meio de práticas consideradas desviantes, relacionadas ao sexo ou à
drogadição, por exemplo.
Além disso, é preciso lembrar a ancoragem da AIDS, sobretudo, na peste, calamidade
que muito é utilizada como metáfora para os piores males coletivos, pois a existência de
uma atmosfera representando a generalização da infecção é utilizada como estratégia para a
moralização de uma doença. Tal estratégia serviu, também, para alimentar temores cultivados
várias gerações com o fim de gerar consensos em julgamentos de condutas e valores
sociais diversos, acentuados na década de 1960 e 1970 (SONTAG, 2007).
O medo, como outrora mencionado nas pesquisas desenvolvidas por Marques,
Oliveira e Francisco (2003), Fernandes e Oliveira (2002) e Camargo (2000), foi constatado,
também, entre os elementos provavelmente centrais, em semelhança ao presente achado em
situação de substituição.
Este aspecto, por sua vez, relaciona-se à cognição preconceito, evocada 61 vezes e
com uma ordem média de importância de 2,148. Na composição deste termo foram
padronizados os seguintes: preconceito; preconceitos; imagem estereotipada do indivíduo com
SIDA; e julgamento.
Como discutido anteriormente, considerando a ausência de referências médicas
específicas, os diversos grupos sociais se apoiaram nos dados que dispunham sobre as vítimas
da AIDS e seus supostos vetores e construíram suas próprias teorias sobre este novo “mal”
surgido no final do século XX. Para a composição do imaginário acerca do referido agravo
contribuíram diversas instâncias e meios de comunicação social, com grupos e interesses
específicos envolvidos, como as revistas médicas, imprensa escrita em geral, televisão, entre
outros (JODELET, 2001; NASCIMENTO, 2005).
A AIDS foi, então, logo representada socialmente como uma doença fatal, que atinge
determinados grupos da sociedade, caracterizados como diferentes daqueles de pertencimento
das pessoas em geral. Assim, cada cultura erigiu suas imagens sobre culpados e vítimas,
considerando sua história e os grupos estigmatizados anteriormente, mesmo, ao surgimento
do fenômeno em questão (JOFFE, 1995).
113
O grupo mais fortemente associado ao desvio moral e à culpa pela doença refere-se ao
dos homossexuais masculinos, cuja presença se deu tanto no universo reificado, como atestam
os primeiros artigos médicos sobre a AIDS, quanto no consensual, tal qual evidenciam
estudos sobre a mídia e no campo das representações sociais (BARBARÁ; SACHETTI;
CREPALDI, 2005; JODELET, 2001; JOFFE, 1995; NASCIMENTO; 2005).
A alusão ao referido grupo constitui-se, portanto, na terceira cognição identificada no
provável núcleo central da situação de substituição, com uma freqüência de 30 e ordem média
de importância de 2,40. As formas de enunciação pelos sujeitos do estudo foram:
homossexualidade; isso é coisa de gay; gay; homossexual; homossexualismo; e viado. Este
elemento parece representar uma imagem ou estereótipo dos mais susceptíveis à doença ou
culpados pela mesma.
É interessante destacar, como o faz Terto Jr. (1997), que mesmo antes da emergência
do HIV/AIDS existiam diversos preconceitos associados à homossexualidade, seja no
domínio da moral religiosa, seja no campo discursivo da ciência e da saúde.
Desta forma, as relações entre homossexualidade e saúde, neste último século, têm
sido motivo de debates e controvérsias, tanto no âmbito das ciências médicas, quanto no dos
movimentos sociais. Durante este período, a homossexualidade foi considerada como uma
doença, e os indivíduos com práticas homossexuais tratados como portadores de um distúrbio
ou alguma patologia, que poderia ser diagnosticada no domínio biológico, genético ou de um
desenvolvimento psíquico anormal. O advento da AIDS potencializou e complexificou tal
interação e serviu para o recrudescimento de preconceitos contra os homossexuais,
transformando-se a própria homossexualidade masculina em sinônimo da doença em questão
(TERTO JR., 2002).
Passados mais de 20 anos de epidemia, a AIDS continua como um grave problema no
cotidiano dos homossexuais masculinos, pois as representações sociais que apresentavam
estes sujeitos, ora como vítimas, ora como culpados pela doença, ainda permanecem, segundo
Terto Jr. (2002). Como conseqüências, tais indivíduos continuam a sofrer estigma e
discriminação decorrentes da associação AIDS-homossexualidade, ou seja, da lógica inicial
de grupo de risco. Paralelamente a isso, devem ser consideradas as repercussões sobre a
prevenção da transmissão do agravo, ainda visto como próximo do outro grupo, diminuindo a
adesão à utilização de métodos de proteção. Além disso, a homofobia, ainda presente nos
serviços de saúde, consiste em um obstáculo para o acesso aos mesmos, bem como,
freqüentemente, para um tratamento adequado aos agravos.
114
Não obstante a associação AIDS-homossexualidade ainda se mostrar presente, este
não se constitui, desde a primeira metade da década de 1990 para o Brasil, no grupo com
maior número de casos da doença, posição ocupada pelos heterossexuais (CASTILHO;
CHEQUER, 1997). De acordo com Brasil (2006d), em 2005 a transmissão do HIV entre
homossexuais correspondeu a 16,8% do total de casos entre homens, enquanto para os
heterossexuais do sexo masculino, este valor foi de 44,2% e para o feminino de 94,5%.
Considerando os achados de outros estudos de representações sociais, a atitude de
preconceito relacionado à AIDS foi identificada como possivelmente central, por Marques,
Oliveira e Francisco (2003) e Fernandes e Oliveira (2002). Por outro lado, embora pudesse ser
compreendida no bojo da atitude citada, a homossexualidade não figurou no Quadro de
Quatro Casas construídos por estes autores. E, nas investigações de Camargo (2000) e Ragon
(2005), a homossexualidade surge apenas na segunda periferia da representação.
O quadrante inferior esquerdo, também denominado de zona de contraste, é composto
pelos elementos contaminação, contágio, prática-sexual e doença. Sobretudo, os dois
primeiros termos podem guardar conotações diversas, especialmente, no campo do
HIV/AIDS, com uma relação peculiar entre sexo e doença (GALVÃO, 2000), pelo que se
torna pertinente, também, a apresentação das padronizações envolvidas em suas composições.
A cognição contaminação, evocada 25 vezes, com ordem média de importância de
2,48, abarca as enunciações: contaminação; contaminante; doença transmissível; formas de
transmissão; transmissão; e transmissor. O contágio, com freqüência de evocação de 11 e a
maior importância atribuída pelos sujeitos, com ordem média de importância de 1,909,
contempla as seguintes: contágio; altamente contagiosa; como pega; como pegar; doença
contagiosa; forma de contágio, e formas de contágio.
Tais universos semânticos apresentam semelhança no que concerne à possibilidade de
transmissibilidade da doença, porém a primeira enunciação, qual seja, a contaminação
encontra-se mais relacionada ao campo de conhecimento científico, como denotado pelos
termos contaminação, transmissão, doença transmissível e formas de transmissão. É
interessante notar que houve, também, uma apresentação pejorativa, por alguns depoentes, da
pessoa com HIV/AIDS como um transmissor da doença ou, mesmo, contaminante.
A segunda evocação citada, o contágio, por outro lado, consiste em uma padronização
que parece envolver uma maior preocupação ou ansiedade quanto às formas pelas quais se
a transmissibilidade da doença em tela, inclusive, com a expressão da idéia de alta
potencialidade de contágio, podendo refletir uma dimensão de informações acerca da
115
transmissão do agravo, porém devendo-se considerar, também, uma proximidade com o que
Jodelet (1998b) classificara como falsas crenças sobre o contágio.
Jodelet (1998b), neste sentido, salienta a imprecisão do emprego do termo contágio,
inclusive, na literatura científica, pois longe de limitar-se ao contato, propriamente dito, inclui
a transmissão por vias aéreas e, em conseqüência pela proximidade física, o que assemelharia
a AIDS a diversos tipos de infecções. Mesmo entre sujeitos com bom nível de informação,
poderiam operar falsas crenças, de modo semelhante, devido à sua condicionalidade. Esta,
por sua vez, relaciona-se aos aspectos de facilitação, mais ou menos pertinentes ou
imaginários, podendo apoiar-se, ainda, em informações difundidas por canais oficiais, por
exemplo, no caso da transmissão pelo sangue. A sua presença se faz sentir, sobretudo: na
doação de sangue e cuidados dentários; transmissão do vírus pela saliva, com a possibilidade
de sangramento; e uso de barbeador de pessoas com HIV/AIDS.
A condicionalidade, portanto, atuaria como moderador das falsas crenças,
explicando sua permanência racional e, mesmo a informação bem fundamentada, não
impede que os sujeitos que pretendem não prestar àquelas crenças evoquem outros riscos
ou manifestem reticência em adotar determinados comportamentos (JODELET, 1998b).
Somado a isso, faz-se mister ressaltar o papel desempenhado pela ancoragem da AIDS
na imagem da peste e do câncer. A primeira doença, considerada como mal devastador e
implacável, vinculada socialmente à crenças como os miasmas e, a segunda, como fatalidade,
sem causas bem definidas (SONTAG, 2007).
O sentido trazido por tais elementos parecem reforçar, de modo mais direto, a
atribuição do medo e do preconceito presentes como prováveis elementos centrais na situação
de substituição, ligando-se à informações ou falsas crenças acerca da transmissibilidade do
HIV/AIDS, bem como o receio diante da possibilidade de contaminação.
Em estudo desenvolvido por Ragon (2005), o elemento contaminação também
emergiu na zona de contraste, sendo evocado 38 vezes, com ordem de importância de 1,95, o
que permite pensar na relevância deste conteúdo da representação entre profissionais de
saúde.
Em relação à prática-sexual, evocada com freqüência de 17 e com ordem média de
importância de 2,824, agregou as produções discursivas: sexualidade; relação-sexual;
relacionamento-sexual; e sexo. Esta cognição pode, igualmente, representar um conhecimento
acerca da transmissibilidade do HIV, porém reflete, pela posição de importância ocupada na
estrutura da representação, uma seletividade na apropriação da referida informação, que
existem outros modos de infecção, como verticalmente (de mãe para o filho, na gestação,
116
parto ou amamentação) e pelo sangue (compartilhamento e agulhas ou seringas, transfusão de
sangue ou exposição ocupacional).
Nesta perspectiva, deve-se salientar o papel que, desde o início, a sexualidade
desempenhou na formação do imaginário social acerca da AIDS, sendo os primeiros casos
identificados e divulgados de homossexuais, numa explicitação da ligação entre a doença e o
comportamento sexual (GALVÃO, 2000; GIAMI et al., 1997). Desta forma, a cognição
prática sexual, também parece reforçar a homossexualidade, entre os elementos com
características centrais e apontar para uma ligação entre a pessoa com HIV/AIDS e seus
comportamentos no campo da sexualidade.
Além disso, como afirmam Oliveira et al. (2007a), é preciso considerar a possível
influência do contexto de inserção dos sujeitos sobre as suas representações sociais acerca da
AIDS e das pessoas que vivem com a mesma. No município do Rio de Janeiro, a incidência
do agravo entre os homossexuais predominou, no início, mantendo-se superior aos
heterossexuais até 1996, quando houve uma equiparação e, então, estes últimos passaram a
responder pelo maior número de casos. As formas de infecção por via sangüínea, por uso de
drogas injetáveis e hemotransfusão corresponderam a uma proporção não superior a 20% dos
casos nos primeiros anos da década de 1980, com queda, respectivamente, após 1997 e 1992
(RIO DE JANEIRO, 2006). Esta configuração inicial, considerando o papel da influência dos
meios de comunicação social e o contato com os clientes, pode ter influenciado na construção
das representações sociais, pois em estudos efetivados por Tura (1998), Marques, Oliveira e
Francisco (2003) e Thiengo, Oliveira e Rodrigues (2002), elementos direta ou indiretamente
relacionados ao sexo compuseram a centralidade na estrutura representacional acerca da
AIDS.
Por outro lado, em Florianópolis, no estado de Santa Catarina, em que no início da
década de 1980, conforme Oliveira et al. (2007a), a maior parte dos casos identificados se deu
entre usuários de drogas injetáveis, Camargo (2000), além das dimensões ligadas ao sexo,
constatou a presença do elemento drogas com características centrais na estrutura da
representação da AIDS em três de quatro subgrupos de universitários analisados.
Pode-se citar, neste contexto, o papel das campanhas governamentais e da dia em
geral, com uma ênfase para o uso do preservativo nas relações sexuais como modo prevenção
da infecção pelo HIV (NASCIMENTO, 2005), com a possibilidade do fortalecimento da
relação entre sexo e AIDS.
O elemento doença, finalmente, compreende as formas: doença; doença grave; doente;
doença presente; doença aids; e vai ficar doente, com freqüência 18 e ordem média de
117
importância de 2,83. Refere-se, então, à doença em si, sua gravidade e a concepção do
portador do HIV/AIDS como doente, remetendo à lógica de um discurso mais funcional, com
caráter biomédico.
Isto posto, pode-se dizer que a zona de contraste para a situação de substituição possui
um caráter mais funcional, haja vista a dimensão de conhecimentos biomédicos que comporta
sobre a doença, sua transmissão e, portanto, das pessoas que vivem com a mesma. Dada a
polissemia de elementos como a contaminação e o contágio, pode sugerir, também, uma
vinculação com o que Jodelet (1998b) denominou de falsas crenças acerca da
transmissibilidade da doença e a representação da pessoa com HIV/AIDS como desviante
sexual e uma possível fonte de infecção.
No quadrante superior direito, correspondente à primeira periferia da representação,
foi possível identificar os termos discriminação, morte e piedade. O primeiro, discutido
anteriormente, na situação normal, pode estar relacionado às dimensões do preconceito, medo
e homossexualidade, presentes no provável cleo central e, também, às facetas concernentes
à contaminação, ao contágio e à prática sexual, encontradas na zona de contraste. Consiste em
um tipo de resposta ou atitude diante da AIDS e seus portadores. Foi evocada com uma
freqüência de 28 e com ordem média de importância de 3,679, padrão semelhante ao
encontrado para a situação normal de produção discursiva.
A morte pode associar-se à discriminação, configurando o que Herbert Daniel
denominou de morte social (DANIEL; PARKER, 1991), ou a uma conseqüência da doença
percebida pelos sujeitos, remetendo à representação da AIDS como doença mortal. No caso
desta pesquisa, considerando o objeto de estudo, a pessoa com HIV/AIDS conviveria com a
ameaça presente na idéia de morte, tendo tal elemento sido enunciado 41 vezes, com ordem
média de importância de 3,195.
A piedade, com maior saliência quantitativa na primeira periferia, com freqüência de
evocação de 46 e ordem média de importância de 3,435, foi composta pelos termos: piedade;
sentimento de piedade; coitado; pobre coitado; compaixão; dó; pena; sentimento de pena; e
penalizado. Parece corresponder a uma cognição mais afetivamente carregada e com caráter
negativo, remetendo a aspectos destacados, como o medo de contaminação das pessoas e de
contato, devido ao preconceito e a discriminação, a ligação com sexualidade concebida como
desviante e a morte.
Neste ponto, como afirma Jodelet (1998b), a partir dos resultados de uma pesquisa
sobre a representação social da AIDS entre pessoas próximas e distantes de portadores da
doença, a defesa contra o perigo potencial que podem os soropositivos encarnar para a
118
sociedade, em razão da diferença de costumes e pela contagiosidade que lhes é atribuída, se
opõe à compaixão diante de seu destino humano, do qual os sujeitos não conseguem se
distanciar, mesmo quando tem o sentimento agudo do risco que a doença faz pesar sobre cada
um.
Na segunda periferia da representação, ligada mais imediatamente às experiências
individuais e à realidade em que se inserem os sujeitos, constatou-se a emergência dos
elementos afastamento, desinformação, isolamento, promiscuidade, rejeição, sofrimento e
uso de drogas. Consistem naqueles menos evocados e aos quais os sujeitos atribuíram menor
importância na representação e expressam atitudes, sentimentos e julgamentos em relação ao
portador do HIV/AIDS, em reforço aos elementos do provável núcleo central, da zona de
contraste e da primeira periferia.
Faz-se mister salientar que o afastamento e a rejeição envolvem um movimento de
distanciamento da sociedade sofrido pelas pessoas com HIV/AIDS, enquanto alguns sujeitos
expressaram um sentido inverso, o do isolamento, relacionado à indisposição daquelas para a
interação social.
A promiscuidade parece intrinsecamente ligada à dimensão da prática sexual, na zona
de contraste e à homossexualidade presente no provável núcleo central, podendo constituir-se,
também, em mais uma faceta de explicitação do preconceito e da discriminação. Além disso,
surge uma associação, ainda que com menor saliência, da pessoa com HIV/AIDS à
desinformação e à drogadição, um elemento importante na trajetória de construção do
imaginário social acerca da doença e dos seus atingidos (GALVÃO, 2000; MARQUES, M.,
2002; NASCIMENTO, 2005), mas com menor relevância neste estudo, devido à posição
ocupada na estrutura da representação.
Em relação à avaliação das atitudes, como pode ser observado na Figura 6, houve um
predomínio, na situação de substituição, de elementos marcados pela negatividade. As
cognições com características centrais homossexualidade, medo e preconceito foram
apontados pela maioria dos depoentes como associados à atitudes negativas, por
respectivamente, 100%, 93,3% e 96,7% dos 30 enfermeiros da segunda fase da pesquisa,
como explicado na Trajetória Metodológica. Foram considerados negativos, também, a
prática sexual, na zona de contraste, e o sofrimento, na segunda periferia da estrutura da
representação, com 73,3% e 90% dos mencionados sujeitos, na segunda fase do estudo.
O termo doença, presente na zona de contraste, apresentou dupla conotação para os 30
enfermeiros que compuseram a segunda fase da pesquisa, relacionando-se, para um subgrupo,
à positividade (46,7%), e para outro, à negatividade (53,3%). Os demais componentes tiveram
119
suas avaliações inferidas pelos pesquisadores, conforme exposto da na trajetória metodológica
do estudo, igualmente, como possivelmente negativas.
As evocações mais associadas ao corpus de análise referente à situação de
substituição, conforme resultado de aplicação do Test t de Student, com os valores de p
estatisticamente significantes, foram: medo (p < 0,005); prática sexual (p 0,05); preconceito
(p 0,010); morte (p < 0,005); piedade (p < 0,005); e desinformação (p 0,010).
IV.2.3 COMPARAÇÃO DOS CONTEÚDOS E DAS HIPÓTESES ESTRUTURAIS DAS
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS ACERCA DO PORTADOR DE HIV/AIDS EM SITUAÇÃO NORMAL
E DE SUBSTITUIÇÃO
Nesta seção proceder-seao desenvolvimento da comparação entre o conteúdo e a
estrutura das representações sociais acerca da pessoa com HIV/AIDS nas duas situações de
produções discursivas descritas, considerando, também, a avaliação das atitudes, a
comparação estatísticas entre os corpora e as possíveis hipóteses de elementos mascarados,
ou seja, de Zona Muda, na representação estudada.
Pode-se afirmar que os quadrantes superiores esquerdos dos dois Quadros de Quatro
Casas mostraram-se, sobremaneira, distintos, com a presença, na situação normal dos
elementos cuidado-proteção-profissional (proteção do profissional), educação em saúde e
tratamento e, na situação de substituição, com homossexualidade, medo e preconceito. Assim,
a primeira condição é marcada pela descrição e funcionalidade e, a segunda, permeada pela
normatividade, ligada ao sistema de valores e aos julgamentos do grupo, como discutido por
Abric (2003a).
Tal qual afirmam Abric (2000) e (2002), duas representações podem ser
consideradas diferentes se os seus sistemas centrais assim se configurarem. Com base neste
pressuposto, os achados das duas situações parecem apontar para representações com
significados diversos, sendo a primeira ligada à prática profissional de proteção de si e às
pessoas com HIV/AIDS como sujeitos que necessitam de orientações em saúde e tratamento
e, a segunda, associada ao medo e ao preconceito em relação à doença e a seus portadores,
caracterizados, inclusive, como homossexuais, ou seja, com práticas sexuais definidas
socialmente como desviantes.
O medo e o preconceito emergem na primeira periferia da situação normal, com uma
freqüência de evocação significativamente aquém do observado na situação de substituição.
Enquanto na coleta habitual os elementos em questão são apontados, respectivamente, por 26
e 38 sujeitos, com a redução das pressões normativas, o foram por 81 e 63 depoentes. Houve,
120
também, uma expressiva variação na atribuição de suas importâncias, sendo, na primeira
situação, conferidos os valores médios de 3,962 e 3,053 e, na segunda, de 2,048 e 2,148, na
mesma ordem.
A homossexualidade não se encontra no Quadro de Quatro Casas da situação normal,
porém, em tal contexto de coleta foi evocada por quatro depoentes, com ordens de
importância distribuídas de 2 a 5.
Por sua vez, os elementos cuidado-precaução-profissional, educação-saúde e
tratamento, também, não compuseram o Quadro de Quatro Casas para a situação de
substituição, tendo sido, respectivamente, nesta apontados por nove, um e oito depoentes.
Em relação à zona de contraste, observou-se uma configuração, igualmente, distinta
entre as duas situações normativas de coleta de dados. A aplicação tradicional da técnica de
evocações livres revelou a presença de elementos mais positivos e humanísticos nesta casa,
com a possibilidade da existência de um subgrupo com uma representação distinta da
ensejada no quadrante superior esquerdo. Tais constituintes foram: ajuda; controle da
doença; esperança; família; medicações; prevenção; e solidariedade. Para a situação de
substituição, evidenciou-se a composição com termos mais funcionais, ligados à informações
sobre a doença e suas formas de transmissão, mas, também, com a possibilidade de uma
conotação negativa, ao relacionar a pessoa com HIV/AIDS, além da doença, à contaminação,
contágio e sua prática sexual. Entre estes, apenas a doença é identificada na situação normal,
integrando a segunda periferia da representação, ou seja, com papel de menor destaque em
sua estrutura.
Cabe destacar, também, que todos os elementos das duas zonas de contraste estiveram
presentes em ambos os corpora analisados, sendo suas freqüências e importâncias maiores
nas situações normativas descritas no parágrafo anterior.
Na primeira periferia dos Quadros foi possível constatar semelhança no que diz
respeito ao termo discriminação, inclusive, com freqüências e ordem dias de importância
com valores muito próximos. Os demais elementos mostraram-se distintos em relação à
posição na estrutura, como: medo e preconceito, presentes na zona do núcleo central de
substituição, portanto, conforme apontado, com maior destaque nesta situação; morte,
observada na segunda periferia da situação normal, em que assume menor importância; e
sofrimento, situado na primeira periferia da situação habitual de coleta, podendo desempenhar
um papel mais ameno que o da morte, localizada na condição de redução das pressões
normativas ou de substituição.
121
O componente efeitos-AIDS (conseqüências biológicas da doença), encontra-se,
somente, no Quadro construído para a situação normal de evocação, assim como a piedade,
para a substituição. Entretanto, ambos os termos compõem os corpora das duas abordagens
de coleta de dados, tal como ocorre aos outros quadrantes, com predomínio na condição
referente à estrutura em que são evidenciados a partir das Figuras 5 e 6.
A segunda periferia das duas situações normativas guardam, igualmente, diferenças
significativas, considerando o pensamento social construído em torno das questões do
HIV/AIDS. Além dos elementos morte e doença, discutidos anteriormente, na situação
normal nota-se a atitude de carinho e o sentimento de tristeza e, em outra perspectiva, na
condição de substituição, tem-se as atitudes de rejeição e afastamento, bem como a
associação da pessoa com HIV/AIDS à desinformação e à condutas socialmente repreensíveis
como promiscuidade e o uso de drogas, além do sofrimento, também já abordado.
Neste ponto, novamente, constata-se a presença dos termos carinho, tristeza, rejeição,
afastamento, desinformação, promiscuidade e uso de drogas nos dois corpora produzidos a
partir da aplicação das técnicas de coleta de dados em questão, tendo os mesmos maiores
freqüências e importância na situação concernente ao Quadro de Quatro Casas em que
figuram.
Considerando a comparação estatística realizada pelo programa Complex do EVOC
2003, entre os corpora das duas condições de coleta de dados, por intermédio do Teste t de
Student, constatou-se como elementos associados à situação normativa de produção de
evocações, com seus respectivos valores de p: cuidado-precaução-profissional (p 0,025);
tratamento (0,025); esperança (0,05); medicações (p 0,025); e sofrimento (p 0,005). Para a
situação de substituição, os termos estatisticamente associados foram: medo (p < 0,005);
preconceito (p 0,010); prática sexual (p < 0,05); morte (p < 0,005); piedade (p < 0,005); e
desinformação (p 0,010). É possível notar, portanto, como na distribuição pelos Quadros de
Quatro Casas, uma vinculação de elementos com uma visão mais positiva ou biomédica sobre
a convivência com HIV/AIDS na situação normal e a ligação de aspectos mais negativos e
estereotipados à situação de substituição.
Cabe salientar que a comparação estatística, conforme descrito no capítulo referente à
Trajetória Metodológica, foi efetuada pelo Complex apenas entre os elementos comuns aos
dois corpora de análise e com freqüência mínima de cinco em cada um. Deste modo, outros
termos componentes dos Quadros de Quatro Casas, mesmo que não comparados pelo
mencionado programa por não preencherem tal requisito, apresentaram diferenças
significativas de aparição entre as duas situações em questão. A enunciação provavelmente
122
central homossexualidade e outras como, contaminação, promiscuidade, afastamento e
isolamento foram evocadas, respectivamente, na condição de substituição, 30, 25, 27, 24 e 17
vezes, enquanto na normal, apenas, 4 vezes para os três primeiros e 2 para os demais. Do
mesmo modo, a cognição com características centrais educação em saúde e, a periférica,
efeitos da AIDS tiveram freqüência de 25 e 24, na situação habitual de coleta e de 1 e 4, na
mesma ordem, na situação de redução das pressões normativas. Assim, observa-se o mesmo
padrão de distribuição evidenciado pelo teste estatístico t de Student, com aspectos mais
positivos ou biológicos na situação normal e aqueles mais negativos ou ligados aos
julgamentos, valores e estereótipo na situação de substituição.
Estes aspectos remetem à observação de Flament, Guimelli e Abric (2006, p.16), de
acordo com os quais [...] o mascaramento de traços negativos é acompanhado,
freqüentemente, pelo destaque de traços positivos (tradução nossa)
10
.
Em relação à avaliação das atitudes, constatou-se que os sujeitos consideraram,
predominantemente, as cognições com características centrais para a situação normal como
positivas e aquelas da situação de substituição, como negativas. Na zona de contraste também,
evidenciou-se distribuição semelhante, com atitudes positivas na condição habitual de coleta e
negativas na substituição, tendo sido a avaliação inferida pelos pesquisadores, com exceção
de prática sexual. A primeira e a segunda periferia, com menor importância na representação,
demonstraram caráter negativo em ambas as situações, com apenas o elemento carinho como
positivo na coleta normal.
Este conjunto de achados se assemelha ao encontrado por Guimelli e Deschamps
(2000), em estudo acerca da representação social dos franceses acerca dos ciganos, e por
Deschamps e Guimelli (2004), em pesquisa sobre a representação social de franceses sobre a
segurança e a insegurança, em que tais autores sugeriram a hipótese da ocorrência de um
mascaramento de alguns elementos das representações.
Como ocorreu nos estudos de Guimelli e Deschamps (2000), foi possível identificar,
na presente pesquisa, que o número de evocações nas duas situações de coleta foi semelhante,
com 747 para condição normal e 746 palavras ou expressões na substituição. Além disso,
como descrito anteriormente, parte significativa dos termos encontrava-se presente nas duas
situações, porém aqueles com conotação mais negativa acerca da pessoa com HIV/AIDS
emergiram com maiores freqüências e importância quando os sujeitos falavam em nome das
“pessoas em geral”, como medo, preconceito, homossexualidade, prática sexual,
10
No idioma original, o trecho traduzido é: «[...] le masquage de traits négatifs s’accompagne souvent de
l’affichage de traits positifs.»
123
contaminação, contágio, promiscuidade, afastamento, rejeição, isolamento, uso de drogas e
morte.
Assim, encontra-se semelhança, também, com os resultados de Deschamps e Guimelli
(2004), sobre a representação social da insegurança entre franceses, em que se evidenciou, em
situação normal, uma representação com caráter mais descritivo, voltada para emoções e
sentimentos e, no contexto de substituição, com uma configuração estigmatizante, relacionada
às causas (desemprego, drogas e periferia) e grupos percebidos como responsáveis por aquele
problema (como estrangeiros e jovens).
Nesta pesquisa, em condição habitual de coleta de dados, pode-se identificar a
configuração de uma representação, igualmente, com caráter essencialmente descritivo,
focalizando atividades profissionais e atitudes mais positivas em um subgrupo, como ajuda,
família, solidariedade e esperança. Na condição de substituição, o apontamento de
possíveis causas para o contágio ou contaminação, como prática sexual, promiscuidade e
desinformação, alguns “culpados”, como homossexuais, de modo mais destacado, e os
usuários de drogas, com menor ênfase; e conseqüências como o afastamento, rejeição,
isolamento e discriminação, devido ao medo e preconceito, podendo gerar um sentimento de
pena ou piedade.
A explicação para estes resultados pode residir, simplesmente, no fato de que os
sujeitos possuam uma representação mais positiva do que aquela atribuída às “pessoas em
geral” (GUIMELLI; DESCHAMPS, 2000), tendo ocorrido, na situação de substituição o que
Flament, Guimelli e Abric (2006) denominam de transparência representacional, ou seja, que
os enfermeiros tenham exposto, não as facetas escondidas de seu pensamento sobre a pessoa
com HIV/AIDS, mas aquilo que, de fato, imaginam ser a visão de outro grupo. Neste sentido,
Wagner (2000), afirma que nas sociedades modernas, esta habilidade de conhecer o que
outgroups relevantes pensam não é surpresa. A comunicação de massa, as discussões e
conversações com parceiros na família, com colegas de trabalho e pessoas nas ruas, tornam
outros grupos e suas ideologias transparentes, referindo-se a isto a reflexividade de grupos na
sociedade moderna: primeiro, saber o que meu grupo conhece; segundo, ter uma idéia dos
sistemas de conhecimento de outros grupos.
Entretanto, como afirmam Guimelli e Deschamps (2000), é, também, razoável pensar
que tenha ocorrido uma influência da desiderabilidade social, a qual consistiria na tentativa
consciente de uma apresentação mais positiva de si por parte dos depoentes, levando-os ao
velamento de julgamentos negativos ou contra-normativos em relação ao objeto em tela.
124
Neste ponto, parece pertinente estabelecer um paralelo com o pensamento de Flament
(2001a), quando este discute sobre a influência dos aspectos normativos na expressão de uma
representação social. Para o referido autor, a palavra “norma” é, freqüentemente utilizada em
psicologia social sem uma definição precisa e, sobretudo, sem que se prove ser aquilo
declarado como “normativo” efetivamente “normativo”. Afirma, então, que encontrou uma
pista para fazê-lo nos trabalhos de Jellison e Green, os quais buscavam relacionar a norma da
internalidade às normas sociais. Para tanto, pedia-se aos sujeitos que respondessem um
questionário de modo tradicional, como se fossem “bem vistos” e “mal vistos”, obtendo um
resultado de oposição entre as respostas, de acordo com a intenção de ser aprovado (bem
visto) ou reprovado (mal visto) por uma autoridade pertinente.
Assim, a última hipótese sobre a ocorrência de efeito de zona muda nesta pesquisa é
corroborada pela avaliação realizada pelos sujeitos sobre as atitudes ensejadas nos termos
evocados, presentes na zona do núcleo central das duas situações normativas. Os resultados
deste procedimento mostraram que a maior parte dos sujeitos expressou a consciência de um
efeito positivo produzido pelos elementos proteção do profissional, educação em saúde e
tratamento e da geração de um efeito negativo em homossexualidade, medo e preconceito,
além da associação da pessoa com HIV/AIDS ao seu comportamento ou prática sexual. Ou
seja, com a possibilidade da existência de uma modulação ou racionalização das respostas
para um gerenciamento positivo da imagem de si, processo discutido por Abric (2005), acerca
das causas de um efeito de mascaramento na representação social.
É importante, portanto, apontar para alguns aspectos que poderiam propiciar a
existência de uma zona muda nas representações sociais dos enfermeiros envolvidos na
pesquisa acerca da pessoa que vive com HIV/AIDS, tendo em vista as possíveis pressões
sociais sobre a enunciação dos sujeitos.
Primeiramente, deve-se ressaltar a resposta das pessoas soropositivas ao HIV ou com
AIDS diante do contexto de intensa discriminação e estigmatização vislumbrado, sobretudo,
na década de 1980, quando da eclosão e circulação de notícias dos primeiros casos da doença,
em diversos países, entre os quais, o Brasil (GALVÃO, 2000; NASCIMENTO, 2005; SPINK
et al., 2001).
Conforme apontam Nascimento (2005) e Galvão (2000), os grupos estigmatizados
pelas atribuições conferidas à nova doença não permaneceram no silêncio e desenvolveram
atividades para minorar tal condição. Assim, surgiu o GAPA, em 1985, a ABIA, em 1986, e,
especialmente, o Pela VIDDA, em 1989, marcando, de modo mais preciso, o protagonismo
das pessoas com HIV/AIDS no cenário da construção de respostas à epidemia. Estas
125
iniciativas, e outras erigidas após, segundo Guimarães e Ferraz (2001), constituíram-se em
uma reação à equação “AIDS=MORTE”, inaugurando um novo discurso cujo mote seria
VHIVENDO com HIV/AIDS. Ensejavam, então, a desconstrução da idéia de morte civil e
social imposta aos portadores da doença em questão, por meio da promoção de informações
sobre o agravo, apoio e, também, assistência jurídica às pessoas atingidas, como ferramenta
contra a discriminação e em prol dos direitos de cidadania.
O estabelecimento destes atores no cenário nacional e internacional da epidemia de
HIV/AIDS, bem como as atividades de assistência, divulgação de informações e assistência
jurídica, com denúncia e luta contra a discriminação e estigma se constituiu, pensa-se,
conforme Guimarães e Ferraz (2001), em um novo discurso, impingindo pressões e demandas
com vistas ao respeito e não-exclusão ou julgamento moral das pessoas com a doença.
Na perspectiva de Ventura (2003), o movimento de defesa das pessoas com
HIV/AIDS foi hábil, propondo o discurso da solidariedade social como uma questão de
direitos humanos e o viver com AIDS como uma questão de cidadania. Com isso, apropriou-
se das conquistas contemporâneas de determinados grupos (homossexuais masculinos, das
mulheres, da saúde) no campo dos direitos humanos, para responder prontamente aos
julgamentos arbitrários de valores, ora camuflados nas medidas tradicionais de saúde pública,
ora nas ações discriminatórias presentes nos diversos contextos sociais. É, justamente, no
terreno do conflito que a mobilização avançou na construção de uma ordem mais favorável às
suas reivindicações, forjando uma identidade própria que redefiniu e alterou posições e
relações sociais.
A vinculação das questões do HIV/AIDS aos Direitos Humanos, por sua vez, reforçou
e conferiu maior legitimidade para a luta contra a discriminação e estigmatização, bem como
os associou de modo intrínseco à promoção e proteção da saúde (VENTURA, 2003).
Além disso, o referido movimento teve repercussão importante sobre as respostas
governamentais, as quais, em suas campanhas iniciais, abordavam a temática AIDS com
agressividade, pouco esclarecimento e contribuíam para uma atitude discriminatória em
relação ao atingidos pela doença. A primeira campanha nacional, diga-se de passagem, em
1987, teve o lema “AIDS, você precisa saber evitar” e em suas peças publicitárias utilizava
frases de impacto, como “AIDS mata!” ou “Quem cara não AIDS”. Lembrando dos
registros noticiosos que veiculavam a perplexidade presente no meio científico, associando os
homossexuais masculinos à doença grave e ainda desconhecida no meio médico, percebe-se
que estas mensagens reforçavam a estigmatização do homossexual. Este último, sob o prisma
citado, corporificava o perigo e a ameaça de morte (NASCIMENTO, 2005).
126
Em momento posterior, ocorreu uma mudança do foco governamental, com a tentativa
de apontar para a necessidade de estabelecimento de solidariedade diante da pessoa com
AIDS, associando as mensagens sobre a AIDS ao slogan: “Amor não mata” (NASCIMENTO,
2005).
Porém, no início da década de 1990, com o governo Collor, observou-se um retrocesso
neste campo, com o enfraquecimento das parcerias com a sociedade e a assunção de
mensagens mais negativas veiculadas pela televisão, rádio e cartazes, nas quais se registrava
um apelo ao medo da doença e dos seus portadores, reforçando o caráter não curável e mortal
desta. Os temas das mencionadas campanhas eram: “se você não se cuidar a AIDS vai te
pegar” e “Eu tenho AIDS, eu não tenho cura” (NASCIMENTO, 2005).
Com a saída do citado presidente e, conseqüentemente, com a mudança da direção
política do Ministério da Saúde, decisiva nas orientações das campanhas governamentais,
um redirecionamento das mensagens no sentido da prevenção da infecção pelo HIV e não do
afastamento ou segregação das pessoas portadores deste. Segundo Nascimento (2005), desde
que as autoridades de saúde pública perceberam que a AIDS não era uma doença privativa de
determinado grupo de risco”, tendo sido fundamental o papel das ONG nessa
conscientização, os enfoques das estratégias de prevenção deixaram de estampar a marca da
exclusão e, na sua maioria, passaram a imprimir a idéia de solidariedade, com slogans como
“previna-se do vírus, não das pessoas”.
Neste sentido, desde 1988, foi instituído, pela Assembléia Geral das Nações Unidas, o
Dia Mundial de Luta contra a AIDS, em que se a divulgação de informações sobre a
prevenção do agravo, assistência aos seus portadores e mensagens de solidariedade em todos
os países, resultando em um estímulo amplo para a discussão sobre a temática
(NASCIMENTO, 2005).
Em âmbito governamental deve-se, ainda, citar iniciativas no combate à discriminação
contra a pessoa com HIV/AIDS, abarcando, também, outras formas de preconceito que podem
atuar em sinergia. Assim, pode-se citar, como exemplo, o Projeto Afroatitude, ações contra a
Homofobia, inclusive, com o apoio financeiro ao desenvolvimento de projetos com tal
finalidade e de Paradas Gays, e a implantação de um sistema de monitoramento e avaliação de
violações dos direitos humanos em HIV/AIDS (BRASIL, 2006c). Conforme boletim
publicado pela ABIA (2003), inclusive, os profissionais de saúde foram alvos diretos das
ações de combate à homofobia, como ilustrado na Figura 7.
127
FIGURA 7 CARTAZ CONTRA A DISCRIMINAÇÃO DA POPULAÇÃO HOMOSSEXUAL ASSINADO PELO
MINISTÉRIO DA SAÚDE.
FONTE: ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA INTERDISCIPLINAR DE AIDS (ABIA). Solidariedade: 20 anos de luta contra a
AIDS no Brasil: uma história de perda, ganhos e desafios. Boletim ABIA. Rio de Janeiro, n. 50, p. 4-5, out./nov.,
2003.
Uma outra perspectiva relevante adotada pelo Estado refere-se ao fomento da
associação entre AIDS e vida, traduzida em mensagens presentes em posição de destaque nos
sítios eletrônicos e impressos atuais do Ministério da Saúde, como “A vida é mais forte do
que a AIDS” (BRASIL, 2006c), buscando sobrepor essa ligação àquela com a morte.
Somado a estes apontamentos acerca da influência dos discursos produzidos pelas
ONG/AIDS e pelo nível governamental, encontram-se mudanças, igualmente, no âmbito da
mídia. De acordo com Spink et al. (2001), formal ou informalmente, mecanismos de
contenção ou moralização, no sentido positivo dos termos, vêm sendo continuamente
desenvolvidos. Deste modo, os jornalistas passaram, com o tempo, a evitar termos com
conotações discriminatórias ou preconceituosas, diferentemente do início da epidemia, em
que as notícias com caráter sensacionalista eram predominantes. Segundo Biancarelli (1997,
p.143),
[...] a maioria da imprensa evoluiu, aprendeu e adotou atitudes “politicamente corretas”,
como se diz. Por exemplo, com exceção do uso em títulos, a palavra “aidético” foi
substituída por doentes de AIDS ou portador do HIV. Grupos de risco passaram a ser grupos
mais expostos a risco. E drogados viraram dependentes ou usuário de drogas.
Tal qual corrobora Mann et al. (1996), citado por Spink et al. (2001), a seleção das
palavras é importante, pois está associada, por um lado, à luta entre os esforços de prevenção
e assistência ao HIV e AIDS e, por outro lado, ao status quo do pensamento da comunidade,
ao que parece ser cabível acrescentar, e das pressões no seio desta. Dentre os exemplos de
evolução da linguagem da AIDS estão: prostitutas, hoje, amplamente designadas profissionais
do sexo; pacientes/vítimas da AIDS para pessoa com AIDS; viciado para usuário de drogas;
hemofílicos para pessoas com hemofilia; pessoa promíscua para pessoa com vários parceiros
sexuais, apenas com o intuito de mencionar alguns.
128
Considerando a inscrição destas alterações no contexto de uma lógica democratizante
contemporânea, que se quer calcada no respeito às diferenças e aos Direitos Humanos,
Ferreira (1999) aponta para o fato de que se é possível constatar o discurso científico ou
mesmo o político, mais próximo do “politicamente correto”, tem-se, na prática, um rol de
discriminações e preconceitos operando socialmente, com intensidades e nuanças variáveis de
país a país, com importantes diferenças, às vezes, dentro do mesmo grupo cultural.
Um outro aspecto a considerar na circunscrição do contexto de expressão das
representações sociais acerca da pessoa com HIV/AIDS refere-se ao fato de que a coleta de
dados foi efetuada, igual e sabidamente, por um enfermeiro (autor deste estudo), portanto, do
mesmo grupo de pertença profissional dos depoentes, o que, como explicita Abric (2005),
pode contribuir para a existência de uma zona muda. Diante disso, é razoável pensar na
possibilidade do efeito de uma racionalização das respostas dos participantes da pesquisa,
tendo em vista a sua aprovação pelo aplicador do instrumento de coleta, com base no sistema
de valores que aqueles imaginam compartilhar com este.
Entre o conjunto de elementos valorizados no campo profissional de enfermagem,
cabe destacar o cuidado integral ao ser humano, visto em sua dimensão biológica, psicológica
e social, com o respeito à vida, à dignidade, aos direitos da pessoa humana, sem a ocorrência
de discriminação de qualquer natureza (COFEN, 2000).
Além disso, alguns autores, como Ressel e Gualda (2002), discutem sobre o que
denominam de invisibilidade e ocultamento em relação ao tema da sexualidade na formação e
na prática de enfermagem. Assim, um sinal de que a enfermagem é tratada na enfermagem
como um tabu é a própria carência de estudos, de discussões e de reflexões realizadas em
nível acadêmico e na própria prática profissional, além do que, quando viabilizadas, aparecem
numa perspectiva patologizante, limitada ao coito, ao ato sexual como fonte de risco e não de
prazer.
Neste sentido, Figueiredo e Carvalho (1999), em estudo sobre o corpo da enfermeira
como instrumento de cuidado, apontam para uma lacuna nas representações daquelas sobre si
mesmas, no que diz respeito à sexualidade. Deste modo, emerge a dificuldade destes sujeitos
em lidar com esta dimensão, o que se corrobora em uma projeção da imagem da enfermeira
como anjo assexuado.
De acordo com Sobral et al. (1995), a enfermagem, como uma instituição social,
possui uma autorização social implícita em suas normas culturais para a manipulação do
corpo do outro. Este aspecto se processa no cuidado de enfermagem, pelo toque, o qual, neste
contexto, se investe de poder, transmitido por meio de discursos vislumbrados na formação e
129
na prática profissional, bem como nas técnicas empregadas no cuidar. Os discursos excluem a
dimensão do erótico, do sensual, encontrando-se permeados pelo preconceito, intensificando
tabus e mitos, os quais permitem a geração de um clima de proibição sobre o assunto, que
desperta dúvidas e incertezas. Estas, por sua vez, se sobrepõem ao não dito, ao não não
explicitado.
Assim, a influência desses elementos descritos poderiam, também, contribuir para o
efeito de mascaramento observado, sobretudo, no que concerne às facetas ligadas à
sexualidade.
Deve-se, outrossim, salientar a valorização da crença no comprometimento com o
universo reificado de saber entre os profissionais de nível superior em questão, sobretudo,
para os enfermeiros entrevistados, que atuavam em um hospital universitário, agregando
atividades de ensino, pesquisa e assistência (MARQUES, S., 2002). Em reforço a esta
assertiva, faz-se mister lembrar, como descrito na Trajetória Metodológica, que o pesquisador,
além de se apresentar aos depoentes como enfermeiro, também, o fazia como aluno de Pós-
Graduação (mestrado) em instituição de ensino integrante da mesma universidade à qual se
ligava o hospital.
Assim, para a ativação de elementos mais funcionais ou descritivos na zona do núcleo
central, e de termos mais positivos na zona do contraste para a situação habitual de coleta
podem ter contribuído, também: este pretenso compartilhamento de valores profissionais entre
pesquisador e depoentes; a vinculação dos últimos com uma instituição que valoriza ensino,
pesquisa e assistência, nas dependências da qual, inclusive, se deu a coleta dos dados; e a
apresentação do pesquisador como aluno de mestrado em enfermagem da mesma
universidade de pertencimento do hospital cenário da investigação.
Pensa-se, então, que as prováveis pressões sociais exercidas pelo conjunto de aspectos
elencados anteriormente sobre os sujeitos da pesquisa, possam ter sido minoradas com a
diminuição da implicação dos mesmos, propiciada pela técnica de substituição, conforme
sugere Abric (2003b, 2005). Os elementos com caráter negativo ou contra-normativos na
representação em questão foram aqueles que denotaram associação das pessoas com
HIV/AIDS: à homossexualidade; ao sentimento de medo; à atitude de preconceito; à
possibilidade de contaminação e contágio pela pessoa com HIV/AIDS; à atividade ou prática
sexual, de um modo mais destacado e à promiscuidade; à atitude de afastamento e rejeição; à
morte; e ao fato de serem usuários de drogas; com a geração de um sentimento de pena ou
piedade.
130
Pode-se dizer, também, considerando o exposto, que a expressão destes elementos
pelos sujeitos na situação habitual de coleta de evocações livres concorreria para uma
apresentação de uma imagem ou impressão negativa acerca dos mesmos, inclusive, pondo em
questão valores como o não julgamento e a não discriminação. Pelo processo de gestão de
impressões, como afirma Abric (2005), os depoentes, provavelmente, procuraram evitar a
explicitação de tais associações.
É interessante destacar, novamente, que uma significativa limitação da técnica de
substituição diz respeito ao fenômeno de transparência representacional, ou seja, de um grupo
expressar a representação que, de fato, pensa ter o outro, em lugar do qual se coloca (“as
pessoas em geral”). Entretanto, corroborando o seu valor, além das pesquisas desenvolvidas
por Guimelli e Deschamps (2000) e Deschamps e Guimelli (2004), em estudo desenvolvido
por Flament, Guimelli e Abric (2006), sobre a representação social sobre os muçulmanos
entre franceses, a estratégia trouxe resultados integrados com os de outras variáveis, as quais
não tiveram relação com a transparência.
A partir da construção dos Quadros de Quatro Casas para a situação normal e de
substituição de coleta de dados, viabilizou-se a apropriação do conteúdo e estrutura das
representações sociais dos enfermeiros acerca da pessoa com HIV/AIDS, inclusive, com o
levantamento de hipóteses sobre elementos escondidos pelos sujeitos, considerando seu
caráter negativo ou contra-normativo.
Considerando as recomendações de Abric (1994, 2000, 2003b), passar-se à
apresentação dos resultados oriundos da aplicação do Questionário de Caracterização, da
Escala de Likert, da Mise en Cause e das questões sobre a ameaça de infecção pelo HIV entre
enfermeiros, que objetivam a confirmação ou refutação dos resultados, até aqui, apresentados.
IV.3 AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS ENFERMEIROS ACERCA DO PORTADOR DO
HIV/AIDS: TESTES DE VERIFICAÇÃO DOS ELEMENTOS CENTRAIS E DA ZONA MUDA
Neste subcapítulo serão apresentados os resultados da segunda desta pesquisa, que,
conforme descrito na trajetória metodológica, foi desenvolvida com a aplicação de um
questionário elaborado a partir dos elementos integrantes dos Quadros de Quatro Casas das
situações normal e substituição, ao termo indutor “portador do HIV/AIDS”. Os sujeitos
envolvidos, nesta etapa, corresponderam a 20% do quantitativo da primeira, ou seja, 30
enfermeiros, igualmente, distribuídos entre os diversos setores do hospital universitário em
questão, tal qual disposto na caracterização dos depoentes da investigação.
131
Nesta fase, foram aplicadas técnicas que consistem em subsídios para aprofundamento
e verificação dos dados encontrados anteriormente, por meio da coleta e análise das
evocações livres. Cabe ressaltar que, de modo diverso desta última, não se aplicou, neste
momento, a técnica de substituição, tendo os sujeitos respondido, apenas, por si mesmos. Por
conseguinte, as respostas em tal contexto permitem a confirmação ou refutação dos achados
referentes à situação normal e a corroboração ou atenuação das hipóteses estabelecidas para a
condição de substituição, descrito de outra forma, para os possíveis elementos escondidos da
representação em foco.
Assim, dar-seinício pelos resultados obtidos com a aplicação do Questionário de
Caracterização.
IV.3.1 RESULTADOS E DISCUSSÕES DOS DADOS OBTIDOS COM A APLICAÇÃO DO
QUESTIONÁRIO DE CARACTERIZAÇÃO
A técnica do Questionário de Caracterização consiste em mais uma estratégia para a
identificação dos elementos que compõem uma representação social e de sua organização
interna. Parte do pressuposto de que, sendo o núcleo central o determinante do significado de
uma determinada representação, tem como propriedade ser mais característico para o objeto
que qualquer outro elemento (ABRIC, 2003b).
Para a sua operacionalização, a partir de uma pré-enquete, neste caso, das evocações
livres, conheceu-se as dimensões associadas ao objeto em dado grupo, bem como as palavras
mais utilizadas pelos sujeitos. Após, com base no processo anterior, foi proposto aos
depoentes uma lista de nove itens, quantitativo múltiplo de três. Pediu-se, então, que
selecionassem o terço das assertivas apresentadas consideradas mais características do objeto,
bem como o terço visto como menos característico, tendo permanecido sem classificação
aqueles concebidos como intermediários. Com isso, tornou-se viável conhecer os termos mais
associados ao objeto na perspectiva dos depoentes, os quais seriam, provavelmente, centrais, e
os demais, a depender de sua distribuição, periféricos ou de contraste (ABRIC, 2003b).
Como descrito na trajetória metodológica do estudo, para a identificação dos aspectos
mais e mais característicos, bem como aqueles considerados intermediários pelos sujeitos,
efetuou-se a sua distribuição freqüencial simples, a partir da qual foi calculada sua
porcentagem. Assim, adotou-se 50% como valor mínimo percentual para a consideração da
provável centralidade de cada elemento na representação em tela, conforme sugere Abric
(2003b).
132
Além disso, norteou a interpretação dos achados a configuração das curvas obtidas
com a aplicação dos valores percentuais obtidos em “gráficos de linha”. Tal qual sugerido por
Abric (2003b), as curvas em “J seriam características de elementos centrais, aquelas em
“sino”, de periféricos e, em formato de “U”, para contraste, sendo possivelmente centrais para
um subgrupo de pessoas.
Assim, os nove elementos apresentados aos sujeitos para a sua avaliação em relação
ao grau de associação com o portador de HIV/AIDS, com a respectiva distribuição das
respostas apresentadas pelos mesmos, encontram-se dispostos na Tabela 15.
TABELA 15 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS SUJEITOS DO ESTUDO AOS ITENS DO QUESTIONÁRIO DE
CARACTERIZAÇÃO. RIO DE JANEIRO, 2007.
Itens apresentados
Mais
Não
Menos
TOTAL
característico
Escolhido
Característico
f
%
f
%
F
%
f
%
A necessidade de fazer tratamento
15
50
10
33
5
17
30
100
A homossexualidade
2
7
6
20
22
73
30
100
Conviver com o sofrimento
8
27
6
20
16
53
30
100
Necessidade de orientações para a saúde
15
50
12
40
3
10
30
100
A sensação de medo
6
20
12
40
12
40
30
100
Utilização de medidas de proteção individual
para cuidar do paciente
5
17
19
63
6
20
30
100
Os preconceitos a eles dirigidos
16
53
10
33
4
14
30
100
Conviver com uma doença
19
63
7
23
4
14
30
100
A prática sexual
4
14
10
33
16
53
30
100
Como pode ser visualizado na Tabela 15, os itens considerados pelos sujeitos como
mais característicos ao portador do HIV/AIDS, com valor percentual igual ou superior a 50%,
são: necessidade de fazer tratamento (50%); necessidade de orientações para a saúde (50%);
os preconceitos a eles dirigidos (53%); e o fato de conviver com uma doença (63%).
Os dois primeiros elementos citados correspondem àqueles presentes no quadrante
superior esquerdo do Quadro de Quatro Casas para a situação normal, ou seja, entre os
prováveis elementos centrais da representação em questão. Este resultado reforça a hipótese
da centralidade destes itens na representação social em tela.
Em relação à configuração das curvas presentes nos gráficos construídos a partir dos
valores percentuais, observou-se, para o elemento tratamento, um padrão mais próximo ao
“J”, conforme descrito por Abric (2003b), e mostrado, a seguir (FIGURA 8).
133
FIGURA 8 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS SUJEITOS SOBRE O GRAU DE ASSOCIAÇÃO DO TRATAMENTO
À PESSOA COM HIV/AIDS. RIO DE JANEIRO, 2007.
No que diz respeito, por sua vez, ao elemento necessidades de orientações para a
saúde, apesar de uma apresentação deste item como mais característico por 50% dos sujeitos,
a curva observada no gráfico construído revelou uma configuração pouco diversa de “J”, com
desnível entre as suas extremidades, com uma elevação daquela da direita, porém, com uma
acentuação, ainda que inferior a 50% (40%), em seu ponto central, como disposto
ulteriormente (FIGURA 9). De todo modo, considerando a comparação com os padrões
possíveis para esta situação, a maior proximidade se dá com o desenho em “J”.
FIGURA 9 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS SUJEITOS SOBRE O GRAU DE ASSOCIAÇÃO DAS ORIENTAÇÕES
PARA A SAÚDE À PESSOA COM HIV/AIDS. RIO DE JANEIRO, 2007.
É interessante destacar a emergência da convivência com uma doença como o
elemento mais característico da pessoa que vive com HIV/AIDS, que surgiu, apenas, na
segunda periferia do Quadro de Quatro Casas para a situação normal e, na substituição, na
zona de contraste. Porém, nesta última condição, a idéia de doença encontrava-se mais ligada
à sua gravidade, bem como à apresentação de seu portador como doente ou potencialmente
doente, distanciando-se da conotação mais diretamente ligada à convivência.
Necessidade de fazer tratamento
17
33
50
0
10
20
30
40
50
60
menos característico
intermediário
Papel na definição do portador do HIV/AIDS
%
mais característico
Necessidade de orientações para a saúde
10
40
50
0
10
20
30
40
50
60
menos característico
intermediário
Papel na definição do portador do HIV/AIDS
%
mais característico
134
O gráfico construído a partir das distribuições percentuais das respostas dos depoentes
acerca do mencionado elemento apresentou curva caracteristicamente em “J”, denotando sua
importância na representação em questão (FIGURA 10).
FIGURA 10 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS SUJEITOS SOBRE O GRAU DE ASSOCIAÇÃO DA CONVIVÊNCIA
COM UMA DOENÇA À PESSOA COM HIV/AIDS. RIO DE JANEIRO, 2007.
A presença da doença como elemento mais característico da pessoa com HIV/AIDS
remete aos resultados das pesquisas desenvolvidas por Ribeiro et al. (2005), abarcando as
categorias de médicos e enfermeiros com idade superior a 44 anos, em que a AIDS mostrou-
se ligada à idéia da doença em si. Na perspectiva da abordagem estrutural, o estudo de
Fernandes e Oliveira (2002), bem como a investigação efetivada por Camargo (2000),
identificaram este elemento entre os provavelmente centrais. Ragon (2005), por sua vez,
obteve achado semelhante com a aplicação das evocações livres, tendo, também, sido
confirmado pelo teste clássico de centralidade com a técnica Mise en Cause.
Pode-se dizer, também, que a ligação entre pessoa com HIV/AIDS, doença e
orientações para a saúde, sugere a possibilidade de um início de um processo de mudança
representacional, inserida em um contexto de transição de práticas, originadas em um modelo
biomédico, focalizando a doença, para práticas de promoção da saúde, com uma abordagem
mais ampla.
Por outro lado, a interseção entre a convivência com uma doença e a necessidade da
fazer tratamento, como mais característicos da pessoa com HIV/AIDS, parece apontar para a
dimensão da percepção da AIDS, como um agravo com caráter crônico.
O item acerca dos preconceitos dirigidos às pessoas com HIV/AIDS, igualmente,
considerado entre os mais característicos às mesmas, parece reforçar a saliência desta
dimensão presente na convivência com a doença, tendo figurado-se como a cognição mais
Conviver com a doença
14
23
63
0
10
20
30
40
50
60
70
menos característico
intermediário
Papel na definição do portador do HIV/AIDS
%
mais característico
135
freqüente na situação normal de coleta de evocações, localizada na primeira periferia da
representação. Este aspecto corrobora os resultados de outros estudos em relação à
representação social da AIDS entre atores sociais do campo da enfermagem, nos quais o
elemento em foco emergiu entre aqueles com propriedades centrais (FERNANDES;
OLIVEIRA, 2002; MARQUES; OLIVEIRA; FRANCISCO, 2003).
Dada a constatação do termo preconceito em relação à pessoas com HIV/AIDS na
zona do núcleo central para a situação de substituição, pode-se pensar que sua assunção pelos
sujeitos mediante o Questionário de Caracterização reduz a possibilidade da figuração entre
os elementos definidos anteriormente como hipóteses para a zona muda da representação. O
gráfico delineado com base nos dados quantitativos de porcentagem das informações
concedidas pelos enfermeiros participantes da pesquisa apresenta, igualmente, padrão mais
próximo a uma curva “J”, tal qual mostrado, seguidamente (FIGURA 11).
FIGURA 11 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS SUJEITOS SOBRE O GRAU DE ASSOCIAÇÃO DE
PRECONCEITOS DIRIGIDOS À PESSOA COM HIV/AIDS. RIO DE JANEIRO, 2007.
Como apontado por diversos autores, como Parker e Aggleton (2006), Galvão (2000),
Rozenblat, Biagini e Sánchez (1999) e Foreman, Lyra e Breinbauer (2003), o referido aspecto
reflete, provavelmente, a percepção das dificuldades, ainda, freqüentemente enfrentadas pelas
pessoas que vivem com HIV/AIDS em sua inserção em diversos espaços sociais, como
família, escola, trabalho, igreja e serviços de saúde, devido aos preconceitos e ao processo de
estigmatização relacionados à doença.
Os itens do Questionário de Caracterização utilização de medidas de proteção
individual para cuidar do paciente e conviver com o sofrimento, sensação de medo,
homossexualidade, e a prática sexual não apresentaram associação significativa, de acordo
com as respostas dos depoentes, à pessoa com HIV/AIDS.
Preconceitos a eles dirigidos
14
33
53
0
10
20
30
40
50
60
menos característico
intermediário
Papel na definição do portador do HIV/AIDS
%
mais característico
136
O elemento utilização de medidas de proteção individual para cuidar do paciente foi
considerado como mais característico por apenas 17% dos enfermeiros, resultado que se
mostra diferente do encontrado por meio das evocações livres, em que o mesmo figurou na
zona do núcleo central para a situação normal de coleta. Por conseqüência, segundo Abric
(2003b), deveria se apresentar entre os itens, também, mais característicos para o objeto
estudado. Entretanto, a maior parte dos sujeitos considerou este aspecto como intermediário
na caracterização ou definição da pessoa com HIV/AIDS (63%), gerando um padrão de curva
em “sino” no respectivo gráfico, o qual aponta para a sua presença na periferia da
representação (FIGURA 12).
FIGURA 12 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS SUJEITOS SOBRE O GRAU DE ASSOCIAÇÃO DE UTILIZAÇÃO
DE MEDIDAS DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL PARA CUIDAR DO PACIENTE À PESSOA COM HIV/AIDS. RIO DE
JANEIRO, 2007.
Este aspecto parece refletir a própria complexidade ensejada na adoção de medidas de
proteção profissional, em que, como afirma Gir et al. (2000) e Gir et al. (2005), para o campo
da enfermagem, os profissionais referem ser a introdução da biossegurança como alteração
mais saliente trazida pelo HIV/AIDS para o trabalho em saúde e, por outro lado, a maior parte
daqueles apresentam justificativas somente parcialmente corretas ou, mesmo, incorretas, para
o uso de tais recursos. Outros estudos, como os de Gir et al. (2004), entre enfermeiros, e
Damasceno et al. (2006), entre profissionais de saúde, relatam uma baixa utilização de
equipamentos de proteção profissional na prática de assistência aos clientes. Na área de
odontologia, Rodrigues, Sobrinho e Silva (2005) constataram ocorrência semelhante, em que
os cirurgiões-dentistas descreveram a importância do papel das precauções padrão para a
realização do seu trabalho, porém, na fase de observação da pesquisa, o raras vezes estes
artefatos não eram adotados.
Utilização de medidas de proteção individual para
cuidar do paciente
20
63
17
0
20
40
60
80
intermediário
Papel na definição do portador do HIV/AIDS
%
menos característico
mais característico
137
Em relação à sensação de medo, evidenciou-se uma concentração das respostas dos
enfermeiros entre sua assunção como item que “menos define”, ou seja, menos característico
(40%) e como intermediário (40%), conforme visualizado na Tabela 18. Assim, figurou-se
com menor importância para a constituição do significado da representação social sobre a
pessoa com HIV/AIDS, como encontrado por meio da técnica de evocações livres, a qual
propiciou sua identificação como elemento periférico.
Concomitantemente, pode-se dizer que este achado pode consistir em um reforço para
a hipótese deste elemento entre aqueles negativos ou contra-normativos para a representação
em estudo, tendo em vista que, na situação de substituição, emergiu como provável cognição
central. Neste ponto, assume relevância o fato de ter sido a sensação de medo refutada por
40% dos depoentes. A curva gerada pelos dados obtidos junto aos sujeitos, não obstante sua
extremidade esquerda mostrar considerável elevação, apresenta maior semelhança com o
padrão “sino”, portanto, definidora de elementos periféricos (FIGURA 13).
FIGURA 13 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS SUJEITOS SOBRE O GRAU DE ASSOCIAÇÃO DE SENSAÇÃO DE
MEDO À PESSOA COM HIV/AIDS. RIO DE JANEIRO, 2007.
O elemento conviver com o sofrimento foi considerado como menos característico pela
maior parte dos sujeitos (53%), apresentando-se, portanto, como um aspecto menos
importante para a determinação do significado e organização interna da representação social
acerca da pessoa com HIV/AIDS no grupo de enfermeiros, com 20% destes apontando-o,
também, como intermediário. De outro modo, deve-se destacar o fato de que, apenas para
pouco mais de um quarto dos depoentes (27%), este item foi concebido como mais
característico do objeto em tela. A disposição dos referidos no gráfico de linha revelou um
padrão aproximado de “U”, ou seja, de elementos de contraste (FIGURA 14), propiciado pelo
último subgrupo de sujeitos mencionado.
A sensação de medo
40
40
20
0
10
20
30
40
50
menos característico
intermediário
Papel na definição do portador do HIV/AIDS
%
mais característico
138
FIGURA 14 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS SUJEITOS SOBRE O GRAU DE ASSOCIAÇÃO DE CONVIVER
COM O SOFRIMENTO À PESSOA COM HIV/AIDS. RIO DE JANEIRO, 2007.
Este resultado mostrou, de certo modo, diferir do encontrado por meio das evocações
livres, em que se identificou o sofrimento como elemento da primeira periferia da estrutura do
Quadro de Quatro Casas da representação social sobre a pessoa com HIV/AIDS em situação
normal e da segunda periferia em condição de substituição. Observa-se, portanto, que para um
subgrupo de depoentes, a dimensão do sofrimento possui maior importância para a definição
ou, de outra maneira, é mais característico às pessoas com HIV/AIDS, podendo relacionar-se
aos preconceitos vivenciados pelas mesmas na convivência com a doença, ou ainda uma
expressão de solidariedade cristã.
Por outro lado, apesar do apontamento do preconceito dirigido aos portadores de
HIV/AIDS como aspecto característico destes últimos, deve-se destacar que as respostas dos
enfermeiros no que tange à homossexualidade e à sua prática sexual, estigmas, de um modo
geral, mais freqüentemente associados às pessoas com AIDS, como apontam Daniel e Parker
(1991), Ferreira (1999), Terto Jr. (1997; 2002) e Parker e Aggleton (2006). Na perspectiva
dos depoentes, os elementos em foco são menos característicos do objeto estudado, com 73%
para o primeiro e 53%, para o segundo.
De modo diverso, a configuração obtida pela distribuição dos valores percentuais das
respostas dos sujeitos em gráficos de linha apresentou uma exibição de um padrão “J”
invertido (FIGURAS 15 e 16). Assim, tendo em vista que a curva em “J” indica uma provável
centralidade, pode-se pensar que sua inversão implica em uma refutação ou negação da
associação dos elementos em tela à pessoa com HIV/AIDS, apontando para uma
representação mais positiva sobre esta última ou, com base nos achados das técnicas de
evocações livre e de substituição, para um possível reforço das hipóteses destes aspectos entre
aqueles mascarados ou escondidos na expressão dos sujeitos.
Conviver com o sofrimento
53
20
27
0
10
20
30
40
50
60
menos característico
intermediário
Papel na definição do portador do HIV/AIDS
%
mais característico
139
FIGURA 15 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS SUJEITOS SOBRE O GRAU DE ASSOCIAÇÃO DE
“HOMOSSEXUALIDADE À PESSOA COM HIV/AIDS. RIO DE JANEIRO, 2007.
Parece, igualmente, razoável pensar que os preconceitos dirigidos às pessoas com
HIV/AIDS, vistos como dimensão mais característica, não se referem à práticas sexuais
consideradas desviantes ou ao medo ensejado pela doença e seus portadores ou que, em outra
perspectiva, trata-se de uma atitude atribuídas aos outros, permitindo manter a apresentação
de um imagem positiva de si, numa possível estratégia de gerenciamento de impressões,
conforme Abric (2005).
FIGURA 16 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS SUJEITOS SOBRE O GRAU DE ASSOCIAÇÃO DE “PRÁTICA
SEXUAL À PESSOA COM HIV/AIDS. RIO DE JANEIRO, 2007.
Considerando os resultados obtidos por meio da aplicação do Questionário de
Caracterização evidenciou-se um reforço à hipótese da centralidade dos elementos tratamento
e orientações para a saúde ou educação em saúde, os quais foram identificados na zona do
núcleo central do Quadro de Quatro Casas em situação normal. A dimensão referente à
utilização de medidas de proteção individual para cuidar do paciente com HIV/AIDS não se
Homossexualidade
73
20
7
0
20
40
60
80
menos característico
intermediário
Papel da definição do portador do HIV/AIDS
%
mais característico
A prática sexual
53
33
14
0
10
20
30
40
50
60
menos característico
intermediário
mais característico
Papel na definição do portador do HIV/AIDS
%
140
mostrou como característica, em contraposição com o encontrado por meio das evocações
livres em condição habitual de coleta.
Além disso, emergiram como aspectos característicos ao objeto estudado, a
convivência com uma doença e os preconceitos dirigidos aos portadores desta, os quais se
localizaram na periferia da representação para a situação normal e, o primeiro, na zona de
contraste para a situação de substituição, embora com uma conotação mais negativa, e o
segundo, no provável núcleo central em contexto de substituição. Assim, este resultado parece
enfraquecer a hipótese desses elementos participarem da zona muda da representação social
em foco.
A cognição medo apresentou padrão mais próximo de elemento periférico, reforçando
o achado do Quadro de Quatro Casas para a condição normal de coleta, bem como sua
hipótese como possível elemento de zona muda, já que, além de sua classificação como
aspecto negativo pelos depoentes, sua freqüência e importância foram maiores na situação de
substituição. Nesta, inclusive, mostrou-se como provavelmente central.
O sofrimento se mostrou como o menos característico entre os demais elementos do
Questionário de Caracterização, para a maioria dos sujeitos. Porém, um subgrupo de pouco
mais de um quarto dos enfermeiros considerou tal aspecto como mais característico, gerando
uma configuração de elemento de contraste, ainda que de maneira pouco acentuada. Deste
modo, apresentou uma divergência, embora em menor grau, com o encontrado no Quadro de
Quatro Casas para as duas situações normativas, em que foi identificado na periferia.
Finalmente, os itens homossexualidade e prática sexual foram concebidos pelos
sujeitos do estudo como menos característicos à pessoa com HIV/AIDS que os elencados
anteriormente, expressando uma representação mais positiva acerca destes sujeitos, não os
associando a comportamentos sexuais peculiarmente desviantes.
IV.3.2 RESULTADOS E DISCUSSÕES DOS DADOS OBTIDOS COM A APLICAÇÃO DA ESCALA
DE LIKERT
Conforme exposto no capítulo da Trajetória Metodológica, na segunda fase do
desenvolvimento da presente pesquisa, foram inseridas no questionário apresentado aos
sujeitos, vinte e uma assertivas acerca da pessoa que vive com o HIV/AIDS, com base nos
resultados da técnica de evocações livres e de substituição, expressos nos Quadros de Quatro
Casas descritos, em seção anterior. A idéia de aplicação deste procedimento adveio de estudos
efetivados por Flament, Guimelli e Abric (2006), acerca da representação social sobre Islã e
141
muçulmanos entre os franceses, nos quais estes autores exploraram, também, os efeitos do
mascaramento na explicitação de uma representação.
Assim, foi demandado aos depoentes que expressassem seu grau de acordo ou
desacordo com cada assertiva em uma escala com as seguintes possibilidades de
posicionamento: discordo totalmente, discordo, discordo em parte, concordo em parte,
concordo e concordo totalmente. As respostas dos sujeitos foram, então, lançadas em um
banco de dados construído no software Excel, com a posterior elaboração de uma tabela com
a distribuição em termos de freqüências simples e porcentagens (APÊNDICE L).
Para a análise dos dados obtidos, buscou-se a organização dos dados de modo a
propiciar a interpretação conforme a lógica de um Questionário de Caracterização (ABRIC,
2003b), como descrito anteriormente. Para tanto, procedeu-se ao agrupamento das respostas
com sentidos semelhantes, a saber: discordo totalmente e discordo, considerado como aspecto
menos característico; discordo em parte e concordo em parte, concebido como intermediário;
e concordo e concordo totalmente, denotando o elemento como mais característico para o
objeto investigado.
O critério utilizado para a leitura dos resultados consistiu no mesmo adotado no
subcapítulo anterior, com o reforço da importância da assertiva para a representação social
sobre a pessoa com HIV/AIDS, pela sua classificação como mais característica por 50% ou
mais dos sujeitos do estudo. Para auxiliar na interpretação do posicionamento do grupo em
relação às questões apresentadas, foram, também, construídos gráficos de linha, a partir da
distribuição dos valores percentuais observados nos resultados, tendo em vista os
pressupostos expressos por Abric (2003b), em que curvas em J indicam a possibilidade de
centralidade de um item, em U, sua configuração como elemento de contraste e, emsino,
associadas a aspectos periféricos na representação.
Deste modo, dentre as assertivas apresentadas, nove foram consideradas pelos sujeitos
do estudo como características à pessoa com HIV/AIDS, as quais são dispostas na Tabela 16,
a seguir, com suas respectivas distribuições de repostas.
142
TABELA 16 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS DEPOENTES ÀS ASSERTIVAS DA ESCALA DE LIKERT
CONSIDERADAS CARACTERÍSTICAS DO PORTADOR DE HIV/AIDS. RIO DE JANEIRO, 2007.
ASSERTIVAS CONSIDERADAS MAIS
CARACTERÍSTICAS PELOS SUJEITOS
Menos
característico
Intermediário
Mais
característico
TOTAL
f
%
f
%
f
%
f
%
A família é importante para o portador do HIV/AIDS.
0
0
1
3,3
29
96,7
30
100
Eles necessitam de apoio e ajuda.
0
0
1
3,3
29
96,7
30
100
Existem muitos portadores do HIV/AIDS no Brasil.
0
0
2
6,6
28
93,4
30
100
Eles precisam sempre receber muito carinho.
0
0
4
13,3
26
86,7
30
100
Eles podem controlar sua doença com o tratamento.
1
3,3
4
13,3
25
83,4
30
100
O HIV/AIDS gera imunodepressão e doenças oportunistas
em seus portadores.
1
3,3
5
16,7
24
80
30
100
Ao cuidar de um portador do HIV/AIDS, utiliza-se medidas
de proteção individual.
1
3,3
5
16,7
24
80
30
100
Os portadores do HIV/AIDS m esperança e perspectivas
de vida.
1
3,3
7
23,3
22
73,4
30
100
Os portadores do HIV/AIDS tomam muitas medicações.
1
3,3
9
30
20
66,7
30
100
De acordo com a Tabela 16, pode-se notar, de um modo geral, que as assertivas com
maior grau de concordância pelos sujeitos do estudo são aquelas originadas a partir dos
elementos dispostos no Quadro de Quatro Casas, referente à situação normal de coleta.
Somado a isso, cabe ressaltar que os gráficos construídos pela distribuição dos valores
percentuais das respostas dos enfermeiros em relação à cada afirmativa apresentada na tabela
em questão, mostraram padrão de curvas do tipo J, reforçando a sua importância para o
significado da representação estudada (APÊNDICE M).
Assim, a importância da família e da necessidade de apoio e ajuda para o portador de
HIV/AIDS, vislumbradas na zona de contraste do Quadro de Quatro Casas para a situação
normal, foram os aspectos que, na presente escala, apresentaram maior grau de concordância
pelos enfermeiros (96,7%) (TABELA 16), apontando para uma percepção do papel de uma
interação social na convivência com a doença, inclusive, envolvendo as pessoas consideradas
mais próximas, com as quais se mantém maiores vínculos afetivos.
De acordo com Schenker e Minayo (2004), a família encontra-se intensamente
implicada no desenvolvimento saudável, ou não, de seus membros, sendo compreendida
como o elo que os une às diversas esferas da sociedade. No caso do HIV/AIDS, como
apontam Figueiredo e Rissi (1999), sobretudo após a introdução da HAART, as pessoas com
a doença tiveram seu quantitativo de internações hospitalares reduzido, com uma maior
presença em seu locus de origem, o qual, freqüentemente, consiste em sua família, unidade
primária de cuidados.
143
Conforme afirmam Parker e Aggleton (2006), não raras vezes, existem obstáculos à
melhoria da qualidade de vida dos soropositivos ao HIV no contexto em questão, seja pelo
próprio preconceito de seus entes ou pelo isolamento social proporcionado por estes para que
aqueles e os outros membros da família não sejam vítimas de discriminação em outras
instâncias sociais. Esta afirmação vai ao encontro do pensamento de Fernandes e Neman
(2002), para os quais, apoiando-se em Strawn (1989), a família representa um importante
espo de criação de carências emocionais e/ou sociais para o portador do HIV ou, se
seguindo uma linha oposta, amenizando tais necessidades, podem contribuir para a projeção
de esperança e qualidade de vida.
Em relação ao apoio e ajuda, além da dimensão familiar, parece remeter, também, à
atuação dos profissionais diante da convivência das pessoas com a doença, considerando a
presença dos elementos educação em saúde e tratamento presentes na zona do núcleo central
do Quadro de Quatro Casas para situação normal, bem como a saliência dos mesmos
constatada pelo Questionário de Caracterização descrito, anteriormente.
Além disso, aos dois elementos referidos soma-se o sentido trazido pela assertiva
acerca do carinho em relação à pessoa com HIV/AIDS, com concordância de 86,7% dos
sujeitos (TABELA 16). Este aspecto também se mostrou presente no Quadro de Quatro Casas
em situação habitual de coleta das evocações livres, embora com menor destaque, tendo
emergido em sua segunda periferia. Assim, pode-se dizer que consiste, também, em uma
atitude positiva, com caráter humanístico diante das pessoas vivendo com a doença.
O elemento tratamento, associado à assertiva eles podem controlar sua doença com o
tratamento obteve concordância por 83,4% dos depoentes, mostrando-se, portanto, também,
como característico do portador de HIV/AIDS para os mesmos. Esta cognição apresentou-se
como provável elemento central na representação em tela, igualmente, pela aplicação da
técnica de evocações livres em situação normal, bem como pelo Questionário de
Caracterização, reforçando a possibilidade de sua centralidade.
Em reforço a esta dimensão do tratamento referida anteriormente, a maioria dos
depoentes (66,7%) mostrou-se de acordo com a idéia de que os portadores do HIV/AIDS
tomam muitas medicações (TABELA 16). Este aspecto emergiu na zona de contraste do
Quadro de Quatro Casas em situação normativa normal, tendo sido, então, menos evocado,
porém considerado como mais importante pelos que o fizeram. Assim, é interessante notar
que consiste, também, no contexto da aplicação da presente escala, na assertiva com menor
percentual de concordância entre os enfermeiros.
144
De modo semelhante ao encontrado pelo resultado das evocações livres em condição
normal de coleta e, ao mesmo tempo, diverso dos achados do Questionário de Caracterização,
a assertiva sobre utilização de medidas de proteção individual para cuidar de pacientes com
HIV/AIDS, obteve a concordância de 80% dos enfermeiros. Considerando os resultados
anteriores a este respeito, parece razoável pensar que, embora não tivesse emergido entre os
mais característicos dentre os itens dispostos no Questionário de Caracterização, consiste,
também, em um aspecto saliente na representação dos profissionais em questão, ainda que,
figurando em sua periferia, em relação, portanto, à realidade de inserção dos sujeitos.
Tendo em vista as pressões normativas em jogo no momento da coleta de dados, esta
distribuição das respostas acerca do aspecto citado na presente escala pode apontar para a
expressão de um discurso politicamente correto ou desejável sobre a biossegurança no
contexto do trabalho em saúde. Como atestam Gir et al. (2004), Sarquis e Felli (2000) e
Rodrigues, Sobrinho e Silva (2005), freqüentemente, observa-se uma negligência na adesão
aos equipamentos de proteção individual no cotidiano de assistência aos clientes, ainda que
refira o trabalhador sobre a existência e a importância dos mesmos. E, Gir et al. (2000) afirma
que o profissional deve estar preparado para o cuidado às pessoas com HIV/ADS sob dois
aspectos, a atuação com condutas éticas e humanitárias, não permeadas pelo preconceito e
estigma e, também, no sentido da proteção profissional.
Uma outra dimensão a se destacar entre as respostas emitidas pelos sujeitos refere-se à
esperança e perspectivas de vida para a pessoa que vive com HIV/AIDS, com o registro de
73,4% de concordância (TABELA 16). Junto aos termos ajuda e família figurou na zona de
contraste da estrutura do Quadro de Quatro Casas para a situação normal de coleta, sugerindo
a existência de um subgrupo de enfermeiros com uma representação cujo núcleo seria
formado por tais cognições. Este achado reforça a possibilidade da centralidade, também,
deste elemento, sendo sua presença, conforme discutido em momento anterior, importante,
haja vista a construção simbólica em torno do HIV/AIDS associada à idéia de doença fatal,
cujo diagnóstico, ainda hoje, como afirmam Guimarães e Ferraz (2001), é recebido como um
atestado de óbito por muitas pessoas. Além disso, a faceta de morte civil, como descrita
por Herbert Daniel, ocasionada pelo processo de estigmatização e discriminação relacionado
ao agravo e aos seus portadores (DANIEL; PARKER, 2001).
As assertivas existem muitos portadores do HIV/AIDS no Brasil e o HIV/AIDS gera
imunodepressão e doenças oportunistas em seus portadores, finalmente, denotam
informações sobre a doença e foram incluídos entre os itens da Escala de Likert como
pretensamente neutros, tal qual o fizeram Flament, Guimelli e Abric (2006).
145
Em seguida, na Tabela 17, são apresentadas as oito assertivas para as quais as
respostas dos sujeitos oscilaram entre discordo em parte e concordo em parte, na Escala de
Likert proposta. Considerando os aspectos enunciados anteriormente, os valores de freqüência
e porcentagem daquelas foram agregados e caracterizados como padrão intermediário, à luz
do procedimento efetuado para o Questionário de Caracterização. Assim, as curvas presentes
nos gráficos gerados a partir da inserção dos dados no banco de dados e tabelas construídas
com o auxílio do programa Excel são mais próximas ao padrão sino (APÊNDICE M), ou
seja, relacionado a elementos periféricos e, portanto, com menor importância para a
determinação do significado e organização interna da representação social (ABRIC, 2003a,
2003b; OLIVEIRA, 1996, 2001; SÁ, 1996, 2002).
TABELA 17 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS SUJEITOS DO ESTUDO ÀS ASSERTIVAS DA ESCALA DE LIKERT
CONSIDERADAS INTERMEDIÁRIAS EM RELAÇÃO AO PORTADOR DE HIV/AIDS. RIO DE JANEIRO, 2007.
ASSERTIVAS PREDOMINANTEMENTE
INTERMEDIÁRIAS
Menos
Característico
Intermediário
Mais
característico
TOTAL
f
%
F
%
f
%
f
%
Eles são pessoas que dão muito valor à vida.
1
3,3
24
80
5
16,7
30
100
De um modo geral, os portadores do HIV/AIDS
costumam se isolar.
3
10
23
76,7
4
13,3
30
100
Eles contam com a solidariedade das pessoas.
3
10
23
76,7
4
13,3
30
100
Eles convivem com o sofrimento.
1
3,3
20
66,7
9
30
30
100
Eles têm ou já tiveram muitos parceiros sexuais.
13
43,4
16
53,3
1
3,3
30
100
Eles adquiriram o vírus e a doença por meio da
atividade sexual.
14
46,7
15
50
1
3,3
30
100
Eles são discriminados, o que ocorre inclusive no
hospital.
2
6,7
15
50
13
43,3
30
100
Eles representam uma fonte de contaminação para
outras pessoas.
13
43,3
14
46,7
3
10
30
100
A assertiva com maior concentração de respostas dos depoentes de modo
intermediário refere-se à apresentação dos portadores do HIV/AIDS como pessoas que dão
muito valor à vida, com 80% (TABELA 17). Embora este aspecto não figurasse diretamente
nos Quadros de Quatro Casas obtidos com o auxílio do EVOC 2003, pensou-se ser
interessante incluí-lo no questionário com vistas a um melhor entendimento acerca da
dimensão da concepção dos sujeitos acerca da relação entre a pessoa com HIV/AIDS e a
convivência com a doença. Não obstante, é interessante destacar, também, que a maioria dos
enfermeiros apresentou posicionamento com tendência mais favorável à afirmativa em
questão (APÊNDICE L), sendo uma atitude considerada mais positiva acerca do objeto
estudado.
146
A associação entre as pessoas com HIV/AIDS e o isolamento social, emergida na
segunda periferia do Quadro de Quatro Casas para a situação de substituição mostrou posição
intermediária para os enfermeiros, correspondendo a 76,7% das respostas (TABELA 17).
Cabe salientar que este aspecto consiste na concepção de que os portadores da doença evitam
o contato social, portanto, em um sentido inverso ao do afastamento das pessoas destes, ou
seja, da discriminação. A maior parte dos sujeitos (43,3%) mostrou tendência à concordância
com a assertiva em tela (APÊNDICE L).
Este aspecto pode refletir uma percepção do fato de que, como salienta Goffman
(1988) e Parker e Aggleton (2006), os processos de estigmatização e discriminação sofridos
pelas pessoas fazem, em determinadas circunstâncias, que as mesmas reduzam ou mesmo,
evitem certos tipos de convívio social vistos como adversos. Entre tais circunstâncias e
espaços, os últimos autores apontam, inclusive, para os serviços de saúde, ocasionando
conseqüências deletérias para os doentes e para a sociedade, com a subutilização daqueles e o
aumento das vulnerabilidades sociais e individuais ao agravo em foco. De todo modo, faz-se
mister ressaltar que tal elemento apenas revelou-se significativamente em situação de
substituição, possivelmente, por seu caráter negativo ou sua associação ao pensamento dos
outros.
A solidariedade em relação aos soropositivos ao HIV ou com AIDS, vislumbrada na
zona de contraste do Quadro de Quatro Casas em situação normal, apresentou menor
importância pela aplicação da presente escala, haja vista sua posição intermediária,
correspondendo a 76,7% dos depoentes. Porém, 43,3% dos enfermeiros com tal
posicionamento, portanto, a maioria, apresenta tendência favorável à esta assertiva
(APÊNDICE L), reforçando as justificativas descritas no subcapítulo concernente aos
resultados das evocações livres.
A assertiva em relação à convivência das pessoas com HIV/AIDS com o sofrimento,
mostrou localização na estrutura da representação semelhante ao encontrado pela técnica de
evocações livres e a subseqüente construção do Quadro de Quatro Casas para a situação
normal e de substituição, ou seja, na primeira periferia para o primeiro caso e na segunda para
o último. O valor percentual referente ao posicionamento intermediário foi de 66,7%
(TABELA 17). Entretanto, guarda similitude com o achado do Questionário de
Caracterização no que concerne à existência de um pequeno subgrupo (30%) para o qual este
aspecto se encontra mais associado ao objeto de investigação em tela.
A dimensão do sofrimento na representação social acerca da AIDS, foi demonstrada
por diversos autores, como Patriota (2005) e, na perspectiva da abordagem estrutural,
147
identificaram-no na zona de contraste, Fernandes e Oliveira (2002), entre graduandos em
enfermagem, Ragon (2005), entre cirurgiões-dentistas, Thiengo, Oliveira e Rodrigues (2002),
entre adolescentes e Camargo (2000), com universitários do sexo masculino de cursos de
saúde e humanas. Entre profissionais de enfermagem de um hospital universitário do Rio de
Janeiro, Marques, Oliveira e Francisco (2003) identificaram tal elemento como
provavelmente central, assim como Tura (1998), entre adolescentes desta mesma cidade, e
Fernandes e Oliveira (2002), entre universitários do curso de comunicação social. Na
periferia, surgiu em pesquisa de Camargo (2000), entre universitárias do sexo feminino de
áreas de humanas e saúde.
Assim, na maior parte da literatura científica descrita, assumiu o aspecto em foco
provável centralidade para os grupos ou subgrupos investigados, apontando para a
possibilidade de sua importância para um subgrupo menor de enfermeiros deste estudo acerca
da pessoa com HIV/AIDS, de um processo de mudança na representação em questão, com a
diminuição de seu papel na mesma ou para uma expressão mais positiva da representação em
questão.
Em relação à discriminação, identificada na primeira periferia, a mais importante do
Quadro de Quatro Casas, para ambas as situações, pensou-se ser interessante investigar,
também, a percepção dos sujeitos sobre a sua ocorrência nos loci de atendimento à saúde,
mais especificamente, no hospital, o qual consiste em cenário para o estudo. Evidenciou-se,
deste modo, um reforço à posição intermediária, de outro modo, periférica, apontada por 50%
dos sujeitos (TABELA 17). Porém, observou-se uma tendência para a concordância sobre tal
aspecto em 33,3% dos 50% dos depoentes da pesquisa que adotaram posição intermediária
(APÊNDICE L) e, também, a presença de um subgrupo pouco menor (43,3% dos
enfermeiros), para o qual este aspecto foi característico em relação aos portadores de
HIV/AIDS.
Este achado se assemelha ao encontrado por Marques, Oliveira e Francisco (2003),
entre profissionais de enfermagem em um hospital universitário localizado no município do
Rio de Janeiro, com a discriminação, também, na primeira periferia da representação.
No que tange à discriminação no contexto dos serviços de saúde, Foreman, Lyra e
Breinbauer (2003) afirmam que, lamentavelmente, as pessoas com HIV/AIDS informam,
freqüentemente, o fato de se sentirem estigmatizados, excluídos socialmente e vítimas de
comportamento discriminatório por parte do pessoal desta área. Asseveram, também, que o
modo pelo qual os profissionais de saúde definem saúde e doença, concedem ou negam o
148
acesso aos tratamentos que salvam vidas, apresenta extraordinária influência no bem-estar
físico e emocional dos sujeitos soropositivos ou no daqueles vulneráveis à doença.
Deste modo, as pessoas com HIV/AIDS são especialmente sensíveis aos
comportamentos dos profissionais de saúde, tendo sido encontrado em um estudo
desenvolvido no Reino Unido, que 96% dos soropositivos entrevistados informaram se
importar mais com as atitudes da equipe de saúde do que com sua competência ou com a
eficácia do tratamento (FOREMAN; LYRA; BREINBAUER, 2003).
Por outro lado, as assertivas sobre a aquisição do HIV por meio da prática sexual e
acerca do envolvimento das pessoas com HIV/AIDS com muitos de parceiros sexuais
(sugerindo a idéia de promiscuidade), apresentaram, respectivamente, 50% e 53,3% dos
depoentes com posicionamento intermediário (TABELA 17), porém com uma tendência para
a discordância, em ambos os casos, da maioria destes (26,7% e 30%, na mesma ordem)
(APÊNDICE L). Além disso, registrou-se, outrossim, para as duas afirmativas, subgrupos de
pouco menos de 50% dos enfermeiros (46,7% e 43,4%) que expressaram uma discordância,
ou seja, não as consideraram características ao portador da doença em foco.
Pensa-se que estes dados, somados àqueles do Quadro de Quatro Casas para a situação
de substituição e aos aspectos da homossexualidade e, sobretudo, da prática sexual, obtidos
por meio do Questionário de Caracterização, apresentam a possibilidade de reforçar a hipótese
de uma zona muda acerca de tais elementos. Isto porque, um subgrupo de sujeitos expressa
uma tendência à concordância sobre a discriminação no ambiente hospitalar e, mesmo,
próximo a 50% dos depoentes o fazem de forma direta, porém as formas de estigmatização
mais associadas à pessoa com HIV/AIDS não são confirmadas pelos mesmos, sendo, por
conseqüência, atribuídas aos “outros” profissionais da saúde com os quais mantém uma
relação próxima e dividem o espaço de trabalho. Como afirma Guimelli e Deschamps (2000),
sobre a representação social dos ciganos entre os franceses, se os entrevistados atribuem os
aspectos negativos da representação aos “franceses em geral”, é razoável pensar em um efeito
de tentativa de transferência, ou seja, em uma faceta escondida daquela, não emergida quando
os sujeitos falam por si mesmos. No entanto, estes últimos também compõem o grupo de
“franceses em geral”, com o qual compartilha, então, as facetas da representação, em
princípio, escondidas.
Em relação à assertiva de que os portadores de HIV/AIDS representam uma fonte de
contaminação para outras pessoas, destacaram-se dois subgrupos, um correspondente a
46,7% dos sujeitos, o qual assume, caracteristicamente, posição intermediária, e outro, com
43,3% dos mesmos, que expressaram sua discordância à respeito. Este aspecto mostrou-se
149
presente na zona de contraste do Quadro de Quatro Casas para a situação de substituição de
coleta de evocações livres, considerado, portanto, embora com menor freqüência de aparição,
mais importante pelos sujeitos nesta condição de coleta de dados. Assim, pode-se dizer que o
mesmo padrão não é observado nos resultados da aplicação da Escala de Likert, no contexto
da qual assume posição de menor destaque e, até, de refutação pelos depoentes, apontando
para uma representação mais positiva acerca da pessoa com HIV/AIDS ou com a
possibilidade de reforço da hipótese da contaminação como constituinte da zona muda da
mencionada representação social.
Na Tabela 18, disposta a seguir, encontram-se dispostas as assertivas consideradas
pela maioria dos sujeitos do estudo como menos características à pessoa com HIV/AIDS, ou
seja, acerca das quais apresentaram maior grau de discordância. As curvas geradas nos
gráficos a partir destas questões configuram-se de modo mais próximo ao padrão de “J
invertido, dada a observada elevação em sua extremidade esquerda, apontando para uma
refutação por parte do grupo de enfermeiros (APÊNDICE M).
TABELA 18 - DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS SUJEITOS DO ESTUDO ÀS ASSERTIVAS DA ESCALA DE LIKERT
CONSIDERADAS MENOS CARACERÍSTICAS AO PORTADOR DE HIV/AIDS. RIO DE JANEIRO, 2007.
ASSERTIVAS CONSIDERADAS
MENOS CARACTERÍSTICAS
Menos
característico
Intermediário
Mais
característico
TOTAL
f
%
f
%
f
%
f
%
Ele está próximo da morte.
25
83,4
4
13,3
1
3,3
30
100
Eles mantêm ou tiveram relações
homossexuais.
19
63,4
9
30
2
6,6
30
100
Lidar com portadores do HIV/AIDS gera
sensação de medo.
13
43,3
12
40
5
16,7
30
100
A idéia de que a pessoa com HIV/AIDS encontra-se próxima da morte foi considerada
menos característica ou, de outro modo, obteve a discordância por 83,4% dos depoentes. Este
aspecto emergiu na segunda periferia do Quadro de Quatro Casas para a situação normal, a
qual consiste na menos importante da representação (ABRIC, 2003b; OLIVEIRA et al. 2005).
Foi identificado, com destaque maior, também, na primeira periferia do Quadro de Quatro
Casas para a situação de substituição. Deste modo, pode-se dizer que apresenta o presente
achado apresenta maior grau de semelhança com a condição habitual de coleta de evocações
livres.
Este aspecto remete à discussão trazida à baila por Camargo (2000), Ragon (2005) e
Oliveira et al. (2007c), em que apontam para a possibilidade de um início de processo de
transformação nas representações sociais da AIDS, com uma diminuição da importância da
150
associação entre a doença e a morte observada em seus trabalhos investigativos,
respectivamente, entre universitários da área da saúde e de humanas, cirurgiões-dentistas e
profissionais de enfermagem. Aliado a isso, destaca-se o surgimento de elementos como
tratamento no provável núcleo central do Quadro de Quatro Casas em situação normal, bem
como seu reforço pelo Questionário de Caracterização e pela Escala de Likert, e presença de
esperança na zona de contraste do mencionado Quadro, com seu reforço na referida escala.
Ressalta-se, também, o surgimento da idéia da convivência com uma doença entre os pontos
mais característicos no Questionário de Caracterização.
Conforme apontado por Giami et al. (1997) e Silva e Abrantes (1995), a representação
da AIDS, entre as enfermeiras, como doença que levava rapidamente à morte gerava estresse
e sofrimento nas mesmas, percebendo, muitas vezes, como impotentes as suas ações
profissionais. Então, pensa-se que a idéia da possibilidade de controle da doença pela
terapêutica medicamentosa surgida possa permitir uma percepção de maior papel profissional
junto aos portadores do agravo, sobretudo, considerando as variadas dificuldades
demonstradas por diversos autores acerca da equipe de saúde no lidar com as situações
relacionadas à morte (MOREIRA; LISBOA, 2006; RÊGO; PALÁCIOS, 2006).
Por outro lado, haja vista a emergência deste aspecto na zona do núcleo central no
Quadro de Quatro Casas nos estudos sobre a representação social da AIDS, efetivados por
Marques, Oliveira e Francisco (2003) e Fernandes e Oliveira (2002), não se pode deixar de
pensar na possibilidade de uma apresentação mais positiva de si mesmos pelos sujeitos, com a
diminuição da importância de aspectos negativos acerca da pessoa com HIV/AIDS. Neste
ponto, faz-se necessário resgatar as perspectivas assumidas pelas campanhas governamentais
e pelas ONG/AIDS, no sentido do fomento da associação entre AIDS e vida, em uma resposta
à morte civil e à discriminação em relação aos portadores da doença, substituindo a imputação
do medo da doença e dos doentes pela idéia de prevenção positiva e do apoio aos
soropositivos (BRASIL, 2006c; NASCIMENTO, 2005).
De todo modo, mesmo com a aplicação da técnica de substituição, o elemento morte
não figurou entre os elementos com características centrais da representação da pessoa com
HIV/AIDS, sendo sua posição mais importante, como descrito, a primeira periferia, nesta
condição. Parece, então, razoável pensar que, ainda com um possível efeito de mascaramento
à respeito, os dados apontam no sentido do pensamento sustentado por Camargo (2000),
Ragon (2005) e Oliveira et al. (2007c), sobre um início de mudança nas representações
sociais da AIDS, com o deslocamento do termo em foco da posição de centralidade.
151
Outra dimensão avaliada como menos característica à pessoa com HIV/AIDS refere-se
à sua associação com a homossexualidade (63,4%) (TABELA 18), também, presente no
Quadro de Quatro Casas para a situação de substituição e, igualmente, refutada pelos
depoentes no Questionário de Caracterização.
Nesta perspectiva, pode refletir a mudança do perfil epidemiológico da epidemia do
HIV/AIDS, em que os heterossexuais passaram a representar o grupo mais atingido (BRASIL,
2006d; CASTILHO; CHEQUER, 1997). Por outro lado, tendo em vista a associação ainda
observada no imaginário social entre AIDS e homossexualidade, tal qual aponta Terto Jr
(1997, 2002), como sexualidade desviante e, também, ligada à idéia de promiscuidade, pode-
se pensar na possibilidade de um reforço à sua hipótese como integrante da zona muda da
representação em questão, levantada pela técnica de substituição.
Em relação ao medo, presente no provável cleo central do Quadro de Quatro Casas
em situação de substituição, observou-se que foi considerado como menos característico para
os sujeitos do estudo no lidar com portadores do HIV/AIDS (43,3%) e intermediário para um
subgrupo pouco menor (40%). E, apenas 16,7% dos enfermeiros concordaram com esta
afirmativa, o que guarda certa similitude com o achado em situação normal, no qual tal
aspecto foi identificado, apenas, na periferia da representação.
Os resultados referidos acerca do medo da pessoa com HIV/AIDS parecem, ao menos
em parte, reforçar, igualmente, a possibilidade de sua figuração entre os elementos de zona
muda, haja vista seu caráter contra-normativo, sobretudo, se expresso por um profissional do
campo de saúde e, mais especificamente, de enfermagem. Neste sentido, é interessante
observar que, em outros estudos (FERNADES; OLIVEIRA, 2002; MARQUES; OLIVEIRA;
FRANCISCO, 2003), sobre a representação social da AIDS, este aspecto figurou na zona do
núcleo central, ou seja, revelando o medo da doença e, pelo encontrado na presente pesquisa,
o discurso “politicamente correto” da importância de não apresentá-lo quando se pensa nos
seus portadores.
É interessante, outrossim, neste ponto apresentar alguns resultados encontrados por
Galvão et al. (2006). De acordo com estes autores, a assistência de enfermagem aos clientes
com HIV/AIDS assume características muito peculiares, entre outras coisas, pelo medo do
contágio durante a assistência, mostrando-se o cuidar, muitas vezes, técnico e impessoal.
Assim, numa análise da comunicação proxêmica entre a equipe de enfermagem e os clientes
com HIV/AIDS em cenário hospitalar, constataram que o toque, quando se apresentava, era
marcadamente por motivo de intervenções técnicas, predominando uma distância maior entre
os sujeitos, considerada inadequada para os tipos de interação desenvolvidos neste espaço.
152
Considerando os posicionamentos diante da assertiva eles despertam, de um modo
geral, um sentimento de piedade, apresentaram uma distribuição, sobremaneira, diversificada
em três subgrupos, com 36,7% dos sujeitos mostrando-se de acordo, 33,3%, em situação
intermediária e 30%, em desacordo com a mesma, pelo que não figurou nas tabelas dispostas,
anteriormente. Entre o valor percentual intermediário, 26,7% dos sujeitos, portanto, sua
maioria, (APÊNDICE L), apresenta tendência favorável ao elemento em questão.
Não obstante a dificuldade na interpretação do presente achado, dada a sua dispersão,
parece não haver um reforço de sua figuração entre os elementos de zona muda, como
sugerido pelo Quadro de Quatro Casas em situação de substituição, ainda que pereça se
configurar como um aspecto negativo e contar com menor aprovação pelos enfermeiros, se
comparado com elementos como tratamento, esperança, carinho e ajuda, por exemplo.
Finalmente, considerando os resultados descritos neste subcapítulo, foi possível
constatar a assunção pelos sujeitos como mais características as assertivas dispostas na Escala
de Likert com conotações mais positivas sobre a pessoa com HIV/AIDS, conforme a Tabela
16, e uma atribuição de menor importância ou refutação daquelas com caráter mais negativo,
como a maior parte dos elementos presentes nas Tabelas 17 e 18.
Estes aspectos permitem, novamente, pensar em uma representação mais positiva
sobre a pessoa com HIV/AIDS entre os enfermeiros incluídos no estudo ou, por outro lado,
com a possibilidade de estabelecer uma ligação com o processo de gestão de impressões,
como sugere Abric (2005), no sentido da desiderabilidade social.
Isto posto, no subcapítulo seguinte, serão apresentados os resultados advindos da
aplicação da cnica do questionamento ou Mise em Cause, entre os sujeitos da pesquisa,
sobre a representação social acerca dos soropositivos ao HIV ou com AIDS.
IV.3.3 RESULTADOS E DISCUSSÕES DOS DADOS OBTIDOS COM A APLICAÇÃO DA MISE EN
CAUSE
Como descrito no capítulo referente à Trajetória Metodológica do estudo, os
elementos centrais de uma representação social são, por definição, inegociáveis e seu
questionamento deveria induzir, necessariamente, uma mudança na mesma, não podendo mais
o objeto ser reconhecido como tal por determinado grupo de sujeitos. Esse processo de
refutação pode servir, de acordo com Abric (2003b), como indicador da centralidade de uma
determinada cognição no contexto de uma representação social, tendo em vista que apenas o
questionamento dos elementos centrais lugar à negação do objeto. Com base em tais
153
pressupostos tornou-se possível a proposição da técnica Mise en Cause (MEC) ou técnica do
questionamento (ABRIC, 2003b; SÁ, 1996, 2002).
É interessante destacar que, segundo Flament (2001a), outras estratégias
desenvolvidas por diversos autores da abordagem estrutural das representações sociais não
permitiam a determinação do núcleo central de uma representação, identificando bons
candidatos à centralidade, o que, para este autor, não seria suficiente. Na perspectiva do
mesmo, foi necessário esperar 12 anos, de 1976, quando da Tese de Doutoramento de Abric,
até 1988, para que a Tese de Pascal Moliner desse uma resposta satisfatória à tal questão, qual
seja, a MEC. Este método é, ainda
11
, utilizado e apresenta, sempre, resultados curiosos.
O mecanismo da MEC repousa, conforme Abric (2003b), na utilização de uma dupla
negação para o reconhecimento de um elemento central de uma representação social. Tal
como afirma Flament (2001a), a idéia é simples, consistindo em um fato psicologicamente
banal, não tendo nada de social em si, de que a dupla negação é psicologicamente mais forte
que a simples afirmação, ainda que, logicamente, isto seja equivalente.
O procedimento consistiu, então, em apresentar aos sujeitos incluídos na segunda fase
do estudo vinte e um afirmativas com aspectos acerca da pessoa com HIV/AIDS em forma de
sua negação e perguntar aos mesmos se era, ainda dessa maneira, possível reconhecer o objeto
em questão. De acordo com Abric (2003b), (1996, 2002) as respostas dos sujeitos que
interessam são aquelas, também, negativas, ou seja, “não”, configurando, então, a dupla
negação. Como sugerido por Flament (1999, 2001a), foi adotado o valor percentual mínimo
de 75% de refutação para a confirmação da centralidade de um elemento.
Tendo sido apresentado aos sujeitos o enunciado “Para você, podemos dizer que uma
pessoa que [assertiva negativa] poderia ser um portador do HIV/AIDS?, obteve-se a
distribuição das respostas conforme a Tabela 19, a seguir.
11
Refere-se ao período até a elaboração do escrito por Flament, em 1996, ou seja, oito anos após a proposição da
MEC por Pascal Moliner.
154
TABELA 19 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS SUJEITOS ÀS QUESTÕES PROPOSTAS NA MISE EM CAUSE
SOBRE A PESSOA COM HIV/AIDS. RIO DE JANEIRO, 2007.
ASSERTIVAS PROPOSTAS
sim
não
TOTAL
f
%
f
%
f
%
não precisa de tratamento.
5
16,6
25
83,3
30
100
não necessita de atividades de prevenção.
8
26,6
22
73,3
30
100
não necessita de orientações sobre a sua saúde.
10
33,3
20
66,6
30
100
não pode contaminar outras pessoas.
10
33,3
20
66,6
30
100
não sofre discriminação por causa de sua doença.
11
36,6
19
63,3
30
100
não vivencia situações de sofrimento.
12
40
18
60
30
100
não convive com a idéia de morte.
14
53,3
16
46,6
30
100
Existe preconceito em relação a ela.
15
50
15
50
30
100
pessoas não tendem a se afastar dela.
15
50
15
50
30
100
não sofre rejeição.
17
56,6
13
43,3
30
100
não desperta medo nas outras pessoas.
18
60
12
40
30
100
não toma muitas medicações.
18
60
12
40
30
100
Os profissionais que cuidam dela não adotam sempre
medidas de proteção individual.
19
63,3
11
36,6
30
100
desperta um sentimento de piedade nos outros.
20
66,6
10
33,3
30
100
não conta com a solidariedade das pessoas.
22
73,3
8
26,6
30
100
não tem boas relações com sua família.
25
83,3
5
16,6
30
100
não se isola.
25
83,3
5
16,6
30
100
não utiliza drogas.
29
96,6
1
3,3
30
100
não adquiriu sua doença por meio de prática sexual.
29
96,6
1
3,3
30
100
não é homossexual.
30
100
0
0
30
100
não tem vários parceiros sexuais.
30
100
0
0
30
100
O aspecto que apresentou dupla negação acima de 75% entre os sujeitos refere-se ao
tratamento, com 83,3% de respostas negativas, apontando para sua centralidade na
representação do grupo de enfermeiros acerca da pessoa com HIV/AIDS (TABELA 19). Este
achado assemelha-se ao encontrado no Quadro de Quatro Casas em situação normal, em que o
elemento em questão figurou no quadrante superior esquerdo, correspondente ao provável
núcleo central. Guarda, também, similitudes com os resultados obtidos por meio do
Questionário de Caracterização e da Escala de Likert, métodos nos quais tal dimensão obteve
padrão de distribuição das respostas característico de cognições centrais. Considerando os
pressupostos da abordagem estrutural das representações sociais, a referida cognição
determina o significado da representação, organizando as relações entre os seus demais
constituintes (ABRIC, 2003a, 2003b; SÁ, 2002; OLIVEIRA et al., 2005).
155
É interessante destacar, neste sentido, os resultados dos estudos de Ribeiro et al.
(2005) e Ribeiro, Coutinho e Saldanha (2004), em que, ao termo indutor tratamento para a
AIDS, os profissionais de saúde integrantes do estudo associaram os elementos mais positivos
esperança, apoio, solidariedade, carinho, informação e orientação. Tais componentes
estiveram, também, presentes nas evocações livres dos enfermeiros da presente pesquisa, em
situação normal, apontando para a articulação entre os mesmos e o aspecto, aqui, identificado
como central na representação sobre a pessoa com HIV/AIDS.
Deve-se, também, apontar que o tratamento ou aspectos relacionados, como
medicações e medicamentos, não assumiam posições centrais, emergindo, freqüentemente, na
segunda periferia das representações sociais da AIDS, conforme investigações desenvolvidas
por Fernandes e Oliveira (2002), Camargo (2000) e Ragon (2005). Este achado parece indicar
uma maior ênfase na possibilidade de controle da doença e convivência com a mesma no
deslocamento da representação social da AIDS para a de seus portadores, ensejando uma
percepção mais positiva sobre a vida com a soropositividade, proporcionada, possivelmente,
pela introdução de novas terapias anti-retrovirais e uma redução das taxas de internações e
mortalidade pelo agravo.
Além disso, pode-se dizer que este resultado consiste em um indicador, tal como
discutido anteriormente, de um processo de mudança nas representações sociais do
HIV/AIDS e das pessoas que convivem com a doença, associadas, inicialmente, de modo
significativo à idéia de morte ou fatalidade. Como afirma Tura (1998), em estudo sobre a
representação da AIDS entre adolescentes, a vinculação entre doença e morte remete ao
núcleo figurativo, sendo o agravo em tela algo para o qual não há cura e que mata.
Outro aspecto a chamar a atenção entre os resultados da aplicação da MEC refere-se
ao elemento prevenção, o qual, embora não correspondendo a 75% de negação, alcançou
valor próximo, a saber: 73,3% (TABELA 19). Entretanto, esta cognição não emergiu no
quadrante superior esquerdo, correspondente aos componentes da representação candidatos à
centralidade, tendo sido verificada na zona de contraste do Quadro de Quatro Casas em
situação normal de coleta. Assim, mostrou-se, pela técnica de evocações livres, como
provavelmente central para um subgrupo de enfermeiros, conforme os pressupostos
enunciados por Abric (2003b), (1996, 2002) e Oliveira et al. (2005), configurando-se,
também, como o termo considerado mais importante no contexto do referido Quadro
(FIGURA 5).
Nesta perspectiva, mostra-se pertinente salientar o resultado da investigação de Ragon
(2005), sobre a representação social da AIDS entre cirurgiões-dentistas do município do Rio
156
de Janeiro, em que, à aplicação da técnica de evocações livres, foram encontrados como
prováveis elementos centrais doença, prevenção e morte. Porém, com a MEC, houve a
confirmação, apenas, dos dois primeiros, apontando para um início de um processo de
mudança representacional para o grupo, em um contexto de transição de práticas, as quais
tiveram origem em um modelo biomédico tradicional, fulcrado na doença, para práticas de
promoção da saúde.
Deste modo, é razoável considerar que a prevenção como um aspecto importante para
as pessoas com HIV/AIDS, seja central, senão para o grupo de enfermeiros estudado, como
sugere o Quadro de Quatro Casas em situação normal, para um subgrupo dos mesmos.
Por outro lado, as cognições com características centrais à técnica de evocações livres
com a formação do Quadro de Quatro Casas educação-saúde (educação ou orientações em
saúde) e cuidado-precaução-profissional (proteção profissional) não se confirmaram pela
MEC, obtendo a primeira 66,6% e, a segunda, 36,6% de negação (TABELA 19). A
necessidade de orientações para a saúde em relação ao portador do HIV/AIDS, além do
observado nas evocações, apresentou características centrais nos resultados do Questionário
de Caracterização e, por sua vez, a proteção profissional, as obteve, também, na Escala de
Likert.
Neste sentido, tendo em vista os pressupostos sobre os quais repousam a técnica do
questionamento, pode-se dizer que, embora tais elementos fossem considerados
característicos ao objeto estudado segundo os sujeitos, não se mostraram imprescindíveis ou
inegociáveis em relação ao mesmo para o grupo estudado.
Do mesmo modo, os elementos família, solidariedade e medicações, encontrados na
zona de contraste para o Quadro de Quatro Casas para a situação normal, não obtiveram valor
percentual significativo de refutação pelos depoentes, correspondendo, respectivamente, a
16,6%, 26,6% e 40% (TABELA 19). O primeiro e o terceiro aspectos mostraram-se,
inclusive, mais característicos pela Escala de Likert e, o segundo, como intermediário,
posição corroborada pela MEC.
Por sua relação com a cognição com características centrais tratamento, deve-se
ressaltar que a assertiva referente às medicações, embora apresentando aspecto indicativo de
importância na representação social em tela pela Escala de Likert, no âmbito desta, contou
com o menor grau de concordância dos enfermeiros entre os itens apontados como mais
característicos. Uma possibilidade de compreensão dos resultados oriundos destes dois
métodos sobre tal questão pode advir do fato de o tratamento, para os depoentes, consistir em
157
algo mais amplo do que, apenas, a terapêutica farmacológica, visão compatível e legítima à
luz dos pressupostos teóricos do campo da enfermagem.
No entanto, o exemplo advindo de uma avaliação de Flament (1999), sobre as
respostas obtidas por um item de um questionário empregado por Moliner em pesquisa sobre
as representações sociais do estudo entre estudantes franceses pode, igualmente, revelar um
outro subsídio para o entendimento dos referidos achados. Segundo o autor, a afirmativa no
instrumento de coleta de dados de Moliner de que o estudo demanda “muito trabalho” pode
ter parecido “excessiva” para os entrevistados, levando a sua discordância junto aos mesmos.
Assim, também, a apresentação aos sujeitos, na presente investigação, do aspecto concernente
a tomar medicações em termos de “muitas medicações”, pode ter sido interpretada como
excessivo por aqueles e, por isso, demonstrado menor fração de concordância na Escala de
Likert e dupla negação na MEC, haja vista ser esta psicologicamente mais forte que a simples
afirmação.
Em relação aos elementos comuns à periferia dos Quadros de Quatro Casas para as
duas situações normativas de coleta envolvidas no estudo discriminação, sofrimento e morte,
apresentaram valores percentuais de dupla negação, na mesma ordem, de 63,3%,60% e 46,6%
(TABELA 19), portanto, confirmados na mencionada posição no contexto da representação
da pessoa com HIV/AIDS. Em relação ao último termo, este achado vai ao encontro daquele
obtido por Ragon (2005), reforçando a hipótese de um processo de mudança na representação
social da AIDS, pelo sentido mais positivo trazido pelo deslocamento da morte de sua
centralidade. Porém, não se pode desconsiderar a possibilidade da tentativa de uma
apresentação de facetas menos negativas nas representações pelos depoentes, conforme o
processo de gestão de impressões (ABRIC, 2005), considerando uma perspectiva
progressivamente assumida na abordagem governamental e de ONG/AIDS no sentido da
associação entre AIDS e vida, em um movimento oposto ao do início da epidemia, em que se
fomentava o medo e a ligação da doença à morte, como discutido em seção anterior.
No que se refere aos termos presentes no provável núcleo central do Quadro de Quatro
Casas para a situação de substituição, a saber, preconceito, medo e homossexualidade, não
foram significativamente refutados pelos sujeitos no ínterim da MEC, tendo, respectivamente,
demonstrado a seguintes percentagens de dupla negação: 50%; 40%; e 0% (TABELA 19). Tal
constatação propicia uma possibilidade de reforçar a hipótese de zona muda acerca destes
elementos, sobretudo, aos dois últimos, com menor refutação pelos depoentes no presente
método, bem como sendo considerados menos característicos ao objeto pelos depoentes ao
Questionário de Caracterização e à Escala de Likert. Destaca-se, sobretudo, o terceiro termo
158
descrito, pela ausência da negação entre os enfermeiros, em uma semelhança ao padrão
observado no Questionário citado.
No que concerne às cognições preconceito e medo, especificamente, constata-se uma
confirmação de suas posições na estrutura da representação social em tela encontrada no
Quadro de Quatro Casas em situação normal, quais sejam, na primeira periferia. O primeiro
termo, inclusive, foi o mais freqüente do Quadro de Quatro Casas nesta condição de coleta.
De acordo com Flament (2001a), estes fenômenos de saliência periférica correspondem a
itens extremamente desejáveis e/ou, como parece ser aqui o caso, significativamente
freqüentes, ou seja, facilmente acessíveis, notadamente, em associações livres.
Em relação aos demais elementos testados na MEC, presentes apenas no Quadro de
Quatro Casas para a situação de substituição ou de redução das pressões normativas,
igualmente, não foram refutados de modo quantitativamente significativo pelos depoentes, ou
seja, não apresentando valores iguais ou superiores a 75%.
A contaminação, embora expressivamente mais evocada em condição de substituição,
pode ter apresentado valor de refutação mais elevado (66,6%) (TABELA 19) devido à sua
ligação à dimensão dos conhecimentos sobre a transmissão do HIV/AIDS, conforme descrito
no subcapítulo referente à análise dos Quadros de Quatro Casas.
É interessante salientar o fato de que houve um quantitativo que pode ser considerado,
igualmente, importante de sujeitos para os quais seria inegociável à representação social do
portador do HIV/AIDS a vivência do afastamento (50%) e rejeição (43,3%) por parte das
pessoas. Por outro lado, mostrou-se pouco significativa a imprescindibilidade do sentido
inverso, ou seja, do movimento de isolamento social (16,6%) (TABELA 19) por parte da
pessoa que vive com a doença, embora tenha sido avaliado como aspecto intermediário por
meio da Escala de Likert, com um a uma possibilidade de reforço à sua figuração como
possível elemento de zona muda. Este resultado remete ao relatado por Abric (2005) em
relação à representação social dos magrebinos entre os franceses, em que, em situação
normal, na segunda periferia da representação emerge a expressão “não se quer integrá-los” e,
em descontextualização normativa, “não querem se integrar”. Assim, com o auxílio da MEC,
a partir dos dados emergidos com a técnica de substituição, constatou-se uma maior
freqüência da idéia, em situação normal, de que as pessoas com HIV/AIDS não são integradas
pela sociedade.
O uso de drogas, presente na segunda periferia do Quadro de Quatro Casas para a
situação de substituição foi refutado por somente 3,3% dos depoentes (TABELA 19),
podendo reforçar a sua configuração como possível elemento escondido em situação normal,
159
ainda que com menor importância para a modificação do significado da representação social
estudada.
Finalmente, o item referente à prática sexual, presente na zona de contraste do Quadro
de Quatro Casas para a situação de substituição e aquele concernente ao envolvimento com
vários parceiros sexuais (sugerindo a idéia de promiscuidade), foram duplamente negados,
por, apenas, 3,3%, no caso do primeiro, e 0%, para o segundo (TABELA 19). Haja vista os
seus sentidos pejorativos ou depreciativos em relação à pessoa com HIV/AIDS, bem como os
achados provenientes das técnicas do Questionário de Caracterização e Escala de Likert,
associado aos resultados ligados à homossexualidade, pode-se dizer que a possibilidade de
uma corroboração para a presença destes elementos entre as facetas veladas na expressão da
representação social em tela pelos enfermeiros.
Isto posto, no subcapítulo seguinte, apresentar-seos resultados obtidos acerca da
ameaça de infecção pelo HIV entre enfermeiros, tal qual percebida pelos sujeitos da pesquisa.
IV.3.4 RESULTADOS E DISCUSSÕES DOS DADOS OBTIDOS ACERCA DA PERCEPÇÃO DOS
SUJEITOS ACERCA DA AMEAÇA DE INFECÇÃO PELO HIV ENTRE ENFERMEIROS
Tal qual explicitado na seção referente à metodologia do estudo, foram apresentadas
aos sujeitos, ao final do questionário aplicado na segunda fase de campo, duas questões com o
intuito de explorar a percepção dos mesmos acerca do grau da possibilidade de um enfermeiro
ser infectado pelo HIV em seu contexto de trabalho hospitalar, bem como na vida privada. A
investigação destes aspectos inspirou-se nos achados de pesquisa desenvolvida por Falomir-
Pichastor et al. (2004), os quais apontaram para o fato de que a ameaça percebida por um
grupo acerca de outro atua como fator moderador da influência de normas anti-
discriminatórias.
Esta ameaça pode ser considerada em sentido realístico (sobre o poder econômico e
político ou saúde física e bem-estar) e simbólico (sobre a distinção positiva da identidade do
grupo, sua visão de mundo ou a superioridade percebida de seu sistema de valores)
(FALOMIR-PICHASTOR et al., 2004). Deste modo, as questões propostas se concentram no
âmbito do primeiro tipo, haja vista a possibilidade de comprometimento da saúde, com a
infecção pelo HIV, no trabalho ou na vida privada dos enfermeiros.
A distribuição das respostas apresentadas pelos sujeitos da pesquisa encontra-se,
então, disposta na Tabela 20, a seguir.
160
TABELA 20 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS SUJEITOS ÀS QUESTÕES SOBRE A AMEAÇA PERCEBIDA PELOS
SUJEITOS ACERCA DA INFECÇÃO PELO HIV ENTRE ENFERMEIROS. RIO DE JANEIRO, 2007.
PERCEPÇÃO SOBRE A
POSSIBILIDADE DE INFECÇÃO
PELO HIV
Na vida
profissional no
hospital
Na vida
pessoal
f
%
f
%
Muito alto
2
6,6
4
13,3
Alto
5
16,7
14
46,7
Médio
4
13,3
5
16,7
Baixo
5
16,7
5
16,7
Muito baixo
14
46,7
2
6,6
TOTAL
30
100
30
100
A chance de infecção pelo HIV entre enfermeiros em seu trabalho desenvolvido no
hospital foi percebida como muito baixa por 46,7% dos sujeitos e, considerando-se a junção
com aqueles que a consideraram como baixa (16,7%), é possível constatar ser este
posicionamento o majoritário, correspondendo a 63,4% do total das respostas. Este aspecto
mostra-se interessante, permitindo o desenvolvimento de algumas reflexões, tendo em vista os
elementos teóricos do campo do HIV/AIDS, bem como outros resultados emergidos na
presente investigação.
Primeiramente, pode-se pensar na possibilidade das referidas respostas dos sujeitos
refletirem uma dimensão das informações sobre o risco de infecção pelo HIV, em situações de
acidentes de trabalho, como aqueles com material pérfuro-cortante ou por outras formas de
contato com material biológico. A estimativa média para a aquisição do vírus em tais
circunstâncias é descrita por Brasil (2004) com uma variação entre 0,09% (exposição em
mucosas) até 0,3% (em acidentes percutâneos), sendo que, para pele não-íntegra, supõe-se
risco inferior àquele relacionado a mucosas. Porém, este risco pode aumentar de acordo com a
gravidade do acidente ou o estado clínico do paciente envolvido.
Sendo assim, chama a atenção a saliência do elemento proteção profissional por meio
da técnica de evocações livres e da aplicação da Escala de Likert, o que, em princípio, parece
apontar para uma relação de contradição, uma vez sendo o risco de infecção pelo HIV no
trabalho percebido como baixo e muito baixo. Conforme afirmam Gir et al. (2004), este
aspecto consiste em um obstáculo, pois observa-se, freqüentemente, uma subestimação por
parte do trabalhador de enfermagem de sua vulnerabilidade à infecção pelo HIV em sua
prática de assistência, sendo os equipamentos de proteção, não raras vezes, negligenciados ou
161
utilizados, apenas, na realização de procedimentos com pessoas sabidamente soropositivas ou
com AIDS.
Por outro lado, no que se refere à vida privada, 46,7% dos sujeitos referiram ser alta a
chance de infecção pelo HIV na vida privada e, 13,3%, a apresentaram como muito alta. Se
agregados estes valores, constata-se que a maioria (60%) dos depoentes considerou ser alta ou
muito alta a possibilidade de aquisição do HIV por enfermeiros em sua vida privada,
correspondendo ao padrão inverso do vislumbrado para a vida profissional.
Assim, se na vida profissional a possibilidade de infecção pelo HIV é percebida como
baixa, por sua subestimação ou pela referência à adoção das formas de proteção, na vida
privada, há um apontamento no sentido de obstáculos para a proteção dos enfermeiros, diante
da vulnerabilidade de aquisição do agravo em questão.
Considerando o fato de a maior parte dos depoentes serem do sexo feminino, bem como
viverem com companheiro no momento da coleta de dados, podem os mesmos ter
apresentado suas respostas em referência às suas próprias práticas sexuais, em que, como
asseveram Nascimento, Barbosa e Medrado (2005), Praça e Gualda (2003) observa-se uma
dificuldade das mulheres na negociação de uso de métodos preventivos com seus parceiros.
Como demonstrara Souza Filho (2000), a partir de pesquisa realizada no Rio de Janeiro,
acerca da relação entre sexualidade/afetividade e AIDS, as mulheres e os homossexuais foram
os grupos mais relacionados à heteronomia. Outro aspecto que pode estar relacionado ao
resultado observado refere-se à feminilização da epidemia de HIV/AIDS.
É interessante notar que estes achados se mostraram diversos daqueles encontrados por
Giami et al. (1997), em estudo no qual as enfermeiras francesas insistiram sobre a sua
exposição ao risco de uma contaminação por via sangüínea profissional, como o risco
principal de serem infectadas pelo HIV.
Assim, haja vista as constatações enunciadas em face das hipóteses apresentadas por
Falomir-Pichastor et al. (2004), é possível pensar em um maior papel das pressões normativas
em relação ao objeto estudado, no âmbito profissional, em que a percepção de ameaça da
saúde pela infecção pelo HIV mostrou-se reduzida, permitindo uma maior influência das
normas anti-discriminatórias. Este aspecto, por sua vez, pode contribuir para a configuração
de um contexto mais propício ao velamento de alguns elementos depreciativos ou pejorativos
da representação social sobre as pessoas com HIV/AIDS, entre os profissionais incluídos na
pesquisa.
Entretanto, não se pode deixar de considerar o encontrado no que diz respeito à
vulnerabilidade ao HIV percebida na dimensão privada da vida dos enfermeiros, que, em
162
outro sentido, de acordo com as hipóteses de Falomir-Pichastor et al. (2004), tenderia a
diminuir a influência das normas anti-discriminatórias referente ao grupo das pessoas com
HIV/AIDS. Trata-se de um importante aspecto para o desenvolvimento de aprofundamentos
posteriores.
163
V. CONCLUSÕES
A epidemia do HIV/AIDS consiste em uma importante questão para o campo da
Saúde Pública, trazendo implicações para diversificadas dimensões da vida humana, desde os
aspectos mais objetivos, como a atividade econômica e as negociações em torno dos anti-
retrovirais, até aqueles mais subjetivos, como as relações interpessoais e atitudes diante da
doença e das pessoas que convivem com a mesma.
Este estudo buscou a identificação e a análise das representações sociais de um grupo
de enfermeiros acerca das pessoas soropositivas ao HIV ou AIDS, inclusive, com seus
possíveis elementos escondidos, devido ao seu caráter contra-normativo. Estas facetas contra-
normativas das representações sociais não podem ser expressas em situações habituais de
coleta de dados, pois vão de encontro aos valores partilhados no grupo de pertença dos
sujeitos, podendo colocá-los em xeque, bem como gerar uma imagem negativa daqueles que
as explicitam.
Para a situação normativa de coleta de dados, a representação social dos enfermeiros
acerca da pessoa com HIV/AIDS apresentou aspectos valorizados mais positivamente, tendo
como elemento central o tratamento. Este significado atribuído à representação em questão
trouxe à baila a possibilidade, para os sujeitos, de um controle da doença e a convivência com
esta, havendo, assim, um afastamento da morte.
No campo das práticas profissionais, pode-se dizer que a dimensão do tratamento
aponta, também, para uma atuação ou disposição para mesma, dos enfermeiros, diante das
pessoas com HIV/AIDS, no sentido de apoio no que tange à sua adesão à terapêutica, com a
possibilidade de uma convivência com o agravo em questão.
Considerando os achados deste e de estudos anteriores, é possível perceber um
processo de mudança na representação social sobre AIDS e as pessoas que vivem com a
mesma, com a diminuição da importância ou destaque da morte.
É interessante destacar que, se a doença fomentada como algo inevitavelmente fatal e
sem possibilidade de tratamento pode gerar medo em uma tentativa de promover a assunção
de maior preocupação das pessoas com a sua prevenção, apresenta um efeito, sobremaneira,
deletério sobre as pessoas que convivem com a soropositividade, que, somando-se ao
preconceito e à estigmatização, pode gerar a experiência de uma morte em vida, ou seja, de
uma morte social.
164
A dimensão das atividades de educação em saúde e da utilização de medidas de
proteção profissional no trabalho, embora presentes, inicialmente, no provável núcleo central
da representação social sobre a pessoa com HIV/AIDS, não foram confirmados, como tal,
pela MEC, na segunda fase da investigação. Entretanto, mostram-se como questões de
destaque na periferia da representação, apontando para a dimensão das práticas profissionais
de enfermagem diante do objeto estudado.
Por sua vez, mostrou-se importante, na perspectiva dos enfermeiros, para a pessoa
com HIV/AIDS a necessidade de prevenção, aspecto possivelmente associado, inicialmente, a
um subgrupo de sujeitos, porém, obtendo destaque pela aplicação da MEC, na segunda fase
da pesquisa. Esta cognição pode estar associada a uma preocupação por parte dos
profissionais no sentido da transmissão do vírus ou da reinfecção pelo mesmo, a qual poderia
alterar desfavoravelmente o controle da doença pelo tratamento. Além disso, possibilita o
resgate da educação em saúde como possibilidade de desenvolvimento de ações profissionais.
Foram, também, encontrados os aspectos referentes à ajuda, família, esperança, com
caráter, também, mais positivos e humanitários em relação à pessoa com HIV/AIDS. Embora
quantitativamente menos salientes, foram considerados entre os mais importantes para os
enfermeiros, sugerindo a possibilidade da existência de um subgrupo com uma representação
organizada por esta dimensão humanística.
Apenas na periferia da representação explicitada pelos sujeitos foram identificados
aspectos mais negativos como o medo, o preconceito, a discriminação, os efeitos da
imunodeficiência, o sofrimento, a morte e a tristeza, apontando, portanto, para a realidade de
inserção e desenvolvimento de práticas, com menor importância para o significado da
representação social.
Por outro lado, não obstante os aspectos indicativos de mudança nas representações
sociais acerca da pessoa com HIV/AIDS, foi possível identificar como possíveis elementos de
zona muda, a partir da técnica de substituição associada à técnica de evocações livres, o
medo, o preconceito, a homossexualidade, como provavelmente centrais para os sujeitos. A
contaminação, a doença, sua prática ou comportamento sexual e o contágio, se destacaram,
também, nesta condição, pela importância atribuída pelos depoentes. Os elementos morte,
piedade, afastamento, desinformação, isolamento, promiscuidade, rejeição e o uso de drogas a
contaminação, promiscuidade e o uso de drogas, emergiram na periferia.
Em condição de redução das pressões normativas, observou-se, portanto, como em
outras pesquisas no campo da zona muda, o deslocamento do discurso dos sujeitos de seu
caráter descrito para elementos mais normativos e pejorativos, que poderiam produzir uma
165
imagem negativa daqueles se explicitados em situação normal. Assim, da necessidade do
tratamento para o controle da doença e de atividades de prevenção, passou-se para a
focalização dos culpados pela doença, os homossexuais, para a atitude de medo e preconceito,
implicando em alterações para o significado da representação social coletada em situação
tradicional. Além disso, foram apontadas outras causas, como a prática sexual com sentido
depreciativo associada à homossexualidade e à promiscuidade, o uso de drogas e a
desinformação. A diferença entre as duas condições normativas foi, inclusive, comprovada
por meio do teste estatístico t de Student, para as cognições comuns aos dois contextos de
enunciação.
Dentre estes aspectos, apresentados como hipóteses de zona muda para a
representação social investigada, receberam a possibilidade de corroboração por meio de
outras técnicas a associação entre a pessoa com HIV/AIDS à homossexualidade, ao medo, à
dimensão das práticas sexuais, à promiscuidade e à morte.
Por outro lado, não se pode deixar de considerar a possibilidade de, ao invés de um
desvelamento de facetas escondidas das representações sociais dos sujeitos, a técnica de
substituição obter como resultado a representação de um grupo sobre o modo como um outro,
neste caso, o das “pessoas em geral”, concebem o objeto de estudo, ou seja, o efeito de
transparência representacional.
Neste estudo, os resultados da técnica pareceram, igualmente, associados àqueles
advindos das estratégias empregadas na segunda fase do estudo, as quais geraram uma
corroboração da negação pelos sujeitos dos aspectos mais contra-normativos em relação ao
objeto de estudo. Especialmente, foi interessante notar uma consciência por parte dos
depoentes sobre os efeitos marcadamente positivos para os elementos do Quadro de Quatro
Casas para a situação normal e, negativos para aqueles localizados, em situação de
substituição, indo ao encontro dos pressupostos do processo de gestão de impressões.
Neste sentido, encontrou-se que a percepção de vulnerabilidade dos enfermeiros pela
infecção pelo HIV, no contexto do trabalho hospitalar, apresentou-se como baixa ou muito
baixa. Desta maneira, poderia ocorrer uma maior influência sobre os sujeitos de normas anti-
discriminatórias neste espaço, propiciando, portanto, a existência de pressões normativas
capazes de inibir a explicitação de posições contra-normativas. Por outro lado, foi informada
pelos depoentes a concepção de uma maior possibilidade de um enfermeiro adquirir o vírus
em sua vida pessoal, o que aponta para a necessidade de sua abordagem em investigações
ulteriores.
166
Além disso, diversos autores, destacam, em um quadro de influência social, a ação de
uma norma de não-discriminação, a qual conduziria a autocensura de discursos homofóbicos,
sexistas, racistas e outros de caráter estigmatizantes. E, se os enfermeiros falam em nome das
pessoas em geral, parece razoável pensar que os mesmos, também, compõem este grupo.
Assim, os elementos contra-normativos citados, além da geração de uma imagem
negativa dos sujeitos do estudo, apontam para algumas implicações para as práticas
profissionais no campo do HIV/AIDS.
As dimensões da sexualidade, com uma associação pejorativa entre prática sexual,
promiscuidade e homossexualidade, produzindo uma imagem estereotipada das pessoas com
HIV/AIDS implicam no reforço dos tabus e, por conseguinte, das dificuldades dos
profissionais em lidar com este aspecto. Deste modo, consistem em questões a serem
consideradas no sentido do desenvolvimento de atividades de preventivas, bem como para o
cuidado às pessoas que vivem com a doença em tela.
É importante destacar que, tal como fizeram outros autores, o medo, vinculado ao
preconceito, podem gerar respostas ou reações inadequadas pelos profissionais, levando-os ao
afastamento dos clientes. Este aspecto consiste em uma relevante faceta de repercussão do
universo de significados associados à epidemia do HIV/AIDS sobre os serviços de saúde, o
qual acarreta na subutilização destes recursos, cuja potencialidade poderia contribuir para a
melhoria da qualidade de vida das pessoas com HIV/AIDS, de seus familiares, bem como
para a prevenção de ocorrência de novas infecções ou, mesmo, reinfecções pelo vírus.
Pode-se dizer, portanto, que o emprego da técnica em questão mostrou-se útil nesta
pesquisa, permitindo ter acesso a um universo semântico não expresso em condições
tradicionais de produção de associações, acerca do objeto de estudo em tela. Por sua vez, a
verificação dos resultados obtidos por meio do Questionário de Caracterização, da Escala de
Likert e da MEC, propiciou a diminuição da força de hipótese de zona muda acerca de
determinados aspectos, bem como a corroboração sobre outros, revelando-se, igualmente,
pertinente.
Conforme afirmam outros autores, a zona muda é muito recente para estar
completamente dominada, controlada e verificada e, neste sentido, pensa-se ter este estudo
consistido em uma contribuição, ainda que de modo preliminar, mostrando-se necessários
aprofundamentos posteriores.
Acredita-se que esta pesquisa possa ter, também, contribuído para o campo de
conhecimentos em Saúde Coletiva, dada a amplitude desta, em que o pensamento social
ocupa espaço importante. Além disso, concorreu para o fornecimento de subsídios para o
167
universo da enfermagem e do HIV/AIDS, pelo apontamento de possíveis princípios
orientadores da ação, na complexa trama de relações com as pessoas que vivem com a
referida doença, as quais se encontram inseridas no contexto que Jonathan Mann denominara
de “Terceira Epidemia”.
Por fim, com esta pesquisa, na tentativa de desvelar as diversas metáforas,
especialmente, aquelas valorizadas mais negativamente, associadas ao campo do HIV/AIDS,
pensa-se ter concorrido para que estas possam ser substituídas por outras, mais benfazejas,
permitindo modos mais profícuos de enfrentamento e, mesmo, de convivência com a referida
doença e, particularmente, com os seus portadores.
168
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182
APÊNDICES
APÊNDICE A - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (FASE 1)
Eu,____________________________________________________________, RG
___________________________, ciente das informações prestadas pelos pesquisadores,
concordo em participar da pesquisa intitulada “As representações sociais do HIV/AIDS entre
enfermeiros de um hospital universitário do município do Rio de Janeiro”, a qual tem por
objetivo geral: analisar o conteúdo e a estrutura das representações sociais de enfermeiros que
atuam em unidades hospitalares acerca do HIV/AIDS.
Esta pesquisa é desenvolvida sob a responsabilidade do mestrando Tadeu Lessa da Costa
*
e de
sua orientadora, a professora Titular Denize Cristina de Oliveira, do Programa de Pós-
Graduação em Enfermagem da Faculdade de Enfermagem da Universidade do Estado do Rio
de Janeiro (UERJ).
Declaro, portanto, estar informado(a) que em nenhum momento serei exposto(a) a riscos,
devido à minha participação na pesquisa, e que poderei, a qualquer momento, recusar a
continuar, sem nenhum prejuízo para a minha pessoa. Reconheço, também, que as respostas
obtidas, serão usadas apenas para fins científicos e utilizadas em trabalhos e eventos
acadêmico-científicos, sem qualquer identificação que possa comprometer-me.
Informo estar esclarecido(a) que não terei nenhum tipo de despesa ou gratificação pela
participação nesta pesquisa, e que terei acesso aos resultados publicados em periódicos
científicos.
Tendo em vista o exposto, concordo voluntariamente em participar do referido estudo.
Rio de Janeiro, _____ de ___________________ de 2007.
__________________________ __________________________
Pesquisador Sujeito da Pesquisa
*
Contato com o pesquisador: (21) 2284-2703; e-mail: tadeulessa@yahoo.com.br
183
APÊNDICE B - QUESTIONÁRIO DE CARACTERIZAÇÃO DOS SUJEITOS DA PESQUISA
Nº: _________
Pseudônimo: ____________________________________________________
Identificação: ______________ Sexo: masc. fem. Idade: __________
Estado marital: ( ) vivo com companheiro ( ) não vivo com companheiro
Renda pessoal mensal: ____________________________________________
Nº de filhos: ( ) 1 ( ) 2-3 ( ) ≥ 4 ( ) não tem
Tempo de formação profissional: _____________________________________
Principais fontes de acesso à informação sobre HIV/AIDS:
( ) televisão ( ) rádio ( ) revistas em geral ( ) artigos científicos
( ) internet em geral ( ) internet bases de dados ( ) jornal impresso
( ) livros em geral ( ) livros científicos
Participação em cursos de capacitação/especialização:
Curso/Especialização
Ano
Setor onde trabalha: ______________________________________________
Tempo de atuação em enfermagem:__________________________________
Tempo de atuação como enfermeiro:__________________________________
Tempo de atuação no setor:_________________________________________
Contato com clientes soropositivos ao HIV ou com AIDS, atualmente:
( ) esporádico ( ) freqüente
Tipo de contato:
( ) contato físico ( ) contato verbal ( ) outro especificar:____________-
_____________
Tempo de atuação profissional com pessoas que vivem com HIV/AIDS: ____anos ____meses
184
APÊNDICE C - INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS DA FASE 1 DA PESQUISA-
EVOCAÇÕES LIVRES
PARTE 1
1) Escreva as 5 palavras que vêm imediatamente à sua mente em relação a expressão
Portador de HIV/AIDS?
_____________________________ ( )
_____________________________ ( )
_____________________________ ( )
_____________________________ ( )
_____________________________ ( )
2) Agora, enumere-as, de 1 a 5, da MAIS importante para a MENOS importante.
PARTE 2
1) Para você, quais as 5 palavras ou expressões que viriam imediatamente à mente das
pessoas em geral, se pensassem a expressão Portador de HIV/AIDS?
_____________________________ ( )
_____________________________ ( )
_____________________________ ( )
_____________________________ ( )
_____________________________ ( )
2) Quais dessas palavras você acha que seriam as MAIS e as MENOS importantes para as
pessoas em geral? Enumere-as, de 1 a 5, da MAIS importante para a MENOS importante.
185
APÊNDICE D - DICIONÁRIO COM AS PADRONIZAÇÕES DAS EVOCAÇÕES PARA A
SITUAÇÃO NORMAL E SUBSTITUIÇÃO
TERMO PADRONIZADO
TERMOS REFERIDOS
acompanhamento-psicológico
Acompanhamento psicológico, falta de apoio psicológico, apoio
psicológico, atenção psicológica
Adolescência
adolescência, adolescente
Afastamento
afastamento, afastar-se, tentam ignorar, abandono, indiferença,
distância, distanciamento, longe, quero distância
Ajuda
ajuda, necessidade de ajuda, necessidade de apoio, apoio, apoiar,
auxílio, como ajudar
Amizade
amigo; amigos
Angústia
angústia, ansiedade
Antiretrovirais
coquetel, medicações arv
Autocuidado
autocuidado, cuidado zelo, desejo de se cuidar, cuidados consigo
mesmo, como se cuidar
auto-estima
auto-estima, baixa auto-estima, amor próprio
Camisinha
camisinha, falta uso de camisinha, sexo seguro, camisinha (dst);
preservativos, uso de preservativo
Carinho
carinho, afeto, estima, ternura
como-contaminou-se
como se contaminou, como foi a contaminação, curiosidade quanto a
forma de contaminação; motivo do contágio, como pegou, como
contraiu a doença
Condenação
condenação, condenado, sentenciado à morte; sentença de morte,
pessoa condenada à morte
Confiança
confiança, confiar, confiança na equipe de saúde, acreditar
Contágio
contágio, altamente contagiosa, como pega, como pegar, doença
contagiosa; forma de contágio, formas de contágio
Contaminação
contaminação, contaminante, doença transmissível, formas de
transmissão, transmissão, transmissor
Controle
controle, controlável
Controle-doença
controle da doença, acesso a cuidados médicos, acompanhamento,
assistência, assistir, consultas, cuidado da saúde, cuidados de saúde,
necessidade de controle, política de saúde voltada para hiv, acesso à
saúde, falta de recursos institucionais, necessidade de cuidado, falta
de recursos dos serviços e dos indivíduos, preocupam-se com a
terapêutica adequada, controle da carga viral
Controle-emocional
controle emocional, apoio emocional, emocional
Coragem
coragem, força para continuar a viver, força de vontade para se tratar
Cuidado-enfermagem
cuidado de enfermagem, assistência de enfermagem, cuidado
holístico, cuidar de enfermagem
Cuidado-especial
cuidado especial, cuidado específico
Cuidado-precaução-prof
precaução profissional, ressaltam o uso da precaução padrão,
precaução, tenho que me proteger, cuidados especiais de proteção,
cuidados no manusear com o paciente, proteção de si e da equipe,
proteção pessoal, proteção do profissional, descuido na proteção,
luvas, cuidados de precaução
Cura
cura, busca da cura
Curiosidade
curiosidade, curiosidade mórbida
Debilitado
debilitado, déficit nutricional, debilidade física
Desespero
desespero, pânico
desinformação
desinformação, sem informação, ignorância, desconhecimento,
desconhecimento da doença, desinformado
Diagnóstico
diagnóstico, descoberta, será que tenho o vírus
Diálogo
diálogo, necessidade de falar à respeito, conversar
dificuldades
dificuldade-tratamento; dificuldade de aceitação de tratamento;
dificuldade
186
discriminação
discriminação, como será que as outras pessoas vão ver isso, estigma,
marcado, paciente que sofre com o estigma da doença, rótulo,
discriminado, discriminadas
Doença
doença, vai ficar doente, crônico, doente crônico, doença crônica;
doença grave, doente, doença aids, doença presente
Educação-saúde
educação em saúde, orientações para equipe, orientações sobre
infecções oportunistas e controle de carga viral, orientações para
tratamento, orientações à equipe de enfermagem, orientações à
pacientes, orientações gerais sobre ser portador, palestra, educação,
aconselhamento, orientação
efeitos-aids
infecções oportunistas, riscos de infecções oportunistas, sarcoma de
kaposi, imunodeprimido, lipodistrofia, queda de cabelo, diarréia,
imunodepressão, baixa imunidade, infecção, lesões, cor, cor da pele,
doenças oportunistas, doenças, infecções, emagrecimento,
emagrecidas, magreza, magro, aspecto, efeitos colaterais
Erro
erro, errado
Esperança
esperança, oportunidade, possibilidades, esperança de melhora,
esperança de vida, perspectiva de vida, esperança de cura
falta-cuidado
descuido de si, não se cuidou, vagabundo descuidado, descuidados,
falta de cuidado consigo
falta-informação
falta de informação, falta conhecimento, falta de conhecimento, falta
de esclarecimento, sem orientações
Família
família, orientações à familiares, apoio familiar, inserção familiar,
convivência na família
Fragilidade
fragilidade, fragilidade do paciente
Futuro
futuro, perspectiva
grupo-risco
grupo de risco; andar com pessoas de risco, grupo
homossexualidade
Homossexualidade, isso é coisa de gay, gay, homossexual,
homossexualismo, viado
hospitalização
hospitalização, hospital
humanização
humanização, humanitude
inclusão-social
inclusão social, participação com o meio
Informação
conhecimento, informação das pessoas e do parceiro
irresponsabilidade
inconseqüente, inconseqüente, irresponsável
Isolamento
isolamento, ausência dos amigos, ausente social, deve ser isolado,
isolado, recusa amigos
Limitações
limitações, limitação, restrição
Luta
luta, perseverança, persistência, lutador
Medicações
medicações, remédio, medicação, falta de medicações,
medicamentos, muitos medicamentos, remédios
Medo
medo, medo da doença, morro de medo dessa doença, assustado,
medo de contágio, medo de adquirir, medo da morte, medo ao
contato, medo de aproximação, temem aproximação, medo de
contaminar-se, medo de contaminação, medo de se contaminar,
pavor, temor
Melhoria-tratamento
melhoria no tratamento, tecnologia, avanços médicos, novos
tratamentos
Morte
morte, doença fatal, moribundo, morreu, morte certa, vai morrer
múltiplos-parceiros
múltiplos parceiros, vários parceiros, libertinagem, sexo livre,
infidelidade
naturalidade
naturalidade, comum
Negação
negação, dificuldade de aceitação, negação para cuidar
opção-sexual
opção sexual, perfil sexual
Parceiro
parceiro, parceria
Pessoa
Pessoa, pessoas
piedade
piedade, sentimento de piedade, coitado, pobre coitado, compaixão,
dó, pena, sentimento de pena, penalizado
Pobreza
pobreza, necessidade social e financeira, miséria
prática-sexual
sexualidade; relação-sexual; relação sexual; relacionamento-sexual;
187
relacionamento sexual; sexo;
Preconceito
preconceito, preconceitos, imagem estereotipada do indivíduo com
sida, julgamento, mitos
Prevenção
prevenção, falta de prevenção, prevenção para sexo, como evitar
Procurou
procurou, bem feito, confiar na própria sorte
promiscuidade
promiscuidade, pessoa que sai com todo mundo, promiscuidade
sexual, promíscuo
Prostituição
prostituição, puta
Qualidade-vida
qualidade de vida, sobrevida melhor
Rejeição
rejeição, aversão, desprezo, exclusão, marginalização, repulsa,
segregação
relacionamento-interpessoal
relacionamento interpessoal, dificuldade de relacionamento, algumas
de difícil relacionamento
Revolta
revolta, agressividade, indignação, raiva, revoltada
Risco
risco, comportamento de risco, risco de contaminação, estar em risco
de contaminação, vida em risco, risco de transmissão
Sangue
sangue, medo de transfusão, transfusão sangüínea, hemotransfusão,
doação de sangue
Sobrevida
sobrevida, tempo de vida, até quando vai viver, vida longa,
longevidade, como-vai-sobreviver, expectativa de vida
sofrimento
sofrimento, dor, sofrimento social, sofrido, pessoas sofridas
Solidão
solidão, sozinho
Sujeira
sujeira, sujo
toque-pega
se tocar pega, não pegar na mão, não tocar, não sentar na mesma
cadeira, não beijar, evitam o contato
tratamento
tratamento, terapêutica, tratamento contínuo
Tristeza
tristeza, choro
uso-drogas
uso de droga, uso de drogas, dependência química, drogado, drogas,
usuário de drogas, usuário de droga, viciado, viciados
Vencedor
Vencedor, vencer preconceito
Vergonha
vergonha, constrangimento
Vida
vida, vida normal, levar uma vida normal, viver
188
APÊNDICE E - RELATÓRIO GERADO PELO PROGROMA RANGMOT DO EVOC 2003 PARA
O CORPUS UNIFICADO (SITUAÇÃO NORMAL E SUBSTITUIÇÃO)
DISTRIBUTION TOTALE :1493 : 300* 300* 299* 299* 295*
RANGS 6 ... 15 0* 0* 0* 0* 0* 0* 0* 0* 0* 0*
RANGS 16 ... 25 0* 0* 0* 0* 0* 0* 0* 0* 0* 0*
RANGS 26 ... 30 0* 0* 0* 0* 0*
Nombre total de mots differents : 207
Nombre total de mots cites : 1493
moyenne generale : 2.99
DISTRIBUTION DES FREQUENCES
freq. * nb. mots * Cumul evocations et cumul inverse
1 * 87 87 5.8 % 1493 100.0 %
2 * 26 139 9.3 % 1406 94.2 %
3 * 15 184 12.3 % 1354 90.7 %
4 * 20 264 17.7 % 1309 87.7 %
5 * 5 289 19.4 % 1229 82.3 %
6 * 6 325 21.8 % 1204 80.6 %
7 * 4 353 23.6 % 1168 78.2 %
8 * 2 369 24.7 % 1140 76.4 %
10 * 6 429 28.7 % 1124 75.3 %
11 * 2 451 30.2 % 1064 71.3 %
12 * 1 463 31.0 % 1042 69.8 %
13 * 2 489 32.8 % 1030 69.0 %
14 * 2 517 34.6 % 1004 67.2 %
15 * 1 532 35.6 % 976 65.4 %
17 * 1 549 36.8 % 961 64.4 %
19 * 3 606 40.6 % 944 63.2 %
20 * 1 626 41.9 % 887 59.4 %
22 * 2 670 44.9 % 867 58.1 %
23 * 3 739 49.5 % 823 55.1 %
25 * 1 764 51.2 % 754 50.5 %
26 * 4 868 58.1 % 729 48.8 %
28 * 1 896 60.0 % 625 41.9 %
29 * 3 983 65.8 % 597 40.0 %
31 * 2 1045 70.0 % 510 34.2 %
34 * 1 1079 72.3 % 448 30.0 %
44 * 1 1123 75.2 % 414 27.7 %
52 * 1 1175 78.7 % 370 24.8 %
55 * 2 1285 86.1 % 318 21.3 %
99 * 1 1384 92.7 % 208 13.9 %
109 * 1 1493 100.0 % 109 7.3 %
189
APÊNDICE F - COMPARAÇÃO (COMPLEX) ENTRE OS CORPORA DA SITUAÇÃO NORMAL E
DE SUBSTITUIÇÃO
Nombre de mots differents : 174 115
Decompte des mots n'appartenant qu'a un fichier
Nombre de mots uniquement dans le fichier 1 : 93
Nombre de mots uniquement dans le fichier 2 : 33
Nombre de mots commun aux deux fichiers : 81
Nombre de mots de frequence > 5 uniquement dans le fichier 1 : 11
Nombre de mots de frequence > 5 uniquement dans le fichier 2 : 24
Nombre de mots de frequence > 5 commun aux deux fichiers : 24
CALCUL DES SPECIFICITES
mots commun aux deux listes :
mot : ajuda 15 8
mot : camisinha 7 7
mot : controle-doença 12 7
mot : cuidado-precaução-prof 20 9
mot specifique superieur fichier 1 : 1.44 cuidado-precaução-prof
mot specifique inferieur fichier 2 : -1.44 cuidado-precaução-prof
difference superieure a 10% t de Student = 2.04 cuidado-precaução-prof
mot : desinformação 8 21
mot specifique superieur fichier 2 : 1.71 desinformação
mot specifique inferieur fichier 1 : -1.71 desinformação
difference superieure a 10% t de Student = 2.41 desinformação
mot : discriminação 24 28
mot : doença 13 18
mot : esperança 16 7
mot specifique superieur fichier 1 : 1.32 esperança
mot specifique inferieur fichier 2 : -1.33 esperança
difference superieure a 10% t de Student = 1.88 esperança
mot : família 17 9
mot : medicações 14 5
mot specifique superieur fichier 1 : 1.46 medicações
mot specifique inferieur fichier 2 : -1.46 medicações
difference superieure a 10% t de Student = 2.06 medicações
mot : medo 26 83
mot specifique superieur fichier 2 : 3.87 medo
mot specifique inferieur fichier 1 : -3.86 medo
difference superieure a 10% t de Student = 5.46 medo
mot : morte 14 41
mot specifique superieur fichier 2 : 2.58 morte
mot specifique inferieur fichier 1 : -2.58 morte
difference superieure a 10% t de Student = 3.64 morte
mot : piedade 9 46
mot specifique superieur fichier 2 : 3.53 piedade
mot specifique inferieur fichier 1 : -3.53 piedade
difference superieure a 10% t de Student = 4.99 piedade
mot : preconceito 38 61
mot specifique superieur fichier 2 : 1.64 preconceito
mot specifique inferieur fichier 1 : -1.64 preconceito
difference superieure a 10% t de Student = 2.31 preconceito
mot : prevenção 11 6
mot : prática-sexual 8 17
difference superieure a 10% t de Student = 1.80 prática-sexual
mot : rejeição 8 14
190
mot : sangue 5 5
mot : sobrevida 9 5
mot : sofrimento 31 13
mot specifique superieur fichier 1 : 1.92 sofrimento
mot specifique inferieur fichier 2 : -1.92 sofrimento
difference superieure a 10% t de Student = 2.71 sofrimento
mot : solidariedade 13 9
mot : tratamento 18 8
mot specifique superieur fichier 1 : 1.38 tratamento
mot specifique inferieur fichier 2 : -1.38 tratamento
difference superieure a 10% t de Student = 1.96 tratamento
mot : tristeza 13 7
mot : uso-drogas 8 15
fin de la comparaison
nombre des evocations des fichiers initaux : 747 746
191
APÊNDICE G - RELATÓRIO DO PROGRAMA RANGMOT PARA O CORPUS DAS EVOCAÇÕES
NA SITUAÇÃO NORMAL
DISTRIBUTION TOTALE : 747 : 150* 150* 150* 149* 148*
RANGS 6 ... 15 0* 0* 0* 0* 0* 0* 0* 0* 0* 0*
RANGS 16 ... 25 0* 0* 0* 0* 0* 0* 0* 0* 0* 0*
RANGS 26 ... 30 0* 0* 0* 0* 0*
Nombre total de mots differents : 174
Nombre total de mots cites : 747
moyenne generale : 2.99
DISTRIBUTION DES FREQUENCES
freq. * nb. mots * Cumul evocations et cumul inverse
1 * 82 82 11.0 % 747 100.0 %
2 * 21 124 16.6 % 665 89.0 %
3 * 17 175 23.4 % 623 83.4 %
4 * 15 235 31.5 % 572 76.6 %
5 * 4 255 34.1 % 512 68.5 %
6 * 1 261 34.9 % 492 65.9 %
7 * 1 268 35.9 % 486 65.1 %
8 * 6 316 42.3 % 479 64.1 %
9 * 4 352 47.1 % 431 57.7 %
10 * 4 392 52.5 % 395 52.9 %
11 * 2 414 55.4 % 355 47.5 %
12 * 1 426 57.0 % 333 44.6 %
13 * 3 465 62.2 % 321 43.0 %
14 * 2 493 66.0 % 282 37.8 %
15 * 1 508 68.0 % 254 34.0 %
16 * 1 524 70.1 % 239 32.0 %
17 * 1 541 72.4 % 223 29.9 %
18 * 1 559 74.8 % 206 27.6 %
20 * 1 579 77.5 % 188 25.2 %
24 * 2 627 83.9 % 168 22.5 %
25 * 1 652 87.3 % 120 16.1 %
26 * 1 678 90.8 % 95 12.7 %
31 * 1 709 94.9 % 69 9.2 %
38 * 1 747 100.0 % 38 5.1 %
FREQ. MÉDIA = 11 355/19 18
192
APÊNDICE H - RELATÓRIO DO PROGRAMA RANGMOT PARA O CORPUS DAS EVOCAÇÕES
NA SITUAÇÃO DE SUBSTITUIÇÃO
DISTRIBUTION TOTALE : 746 : 150* 150* 149* 150* 147*
RANGS 6 ... 15 0* 0* 0* 0* 0* 0* 0* 0* 0* 0*
RANGS 16 ... 25 0* 0* 0* 0* 0* 0* 0* 0* 0* 0*
RANGS 26 ... 30 0* 0* 0* 0* 0*
Nombre total de mots differents : 115
Nombre total de mots cites : 746
moyenne generale : 2.99
DISTRIBUTION DES FREQUENCES
freq. * nb. mots * Cumul evocations et cumul inverse
1 * 49 49 6.6 % 746 100.0 %
2 * 18 85 11.4 % 697 93.4 %
3 * 6 103 13.8 % 661 88.6 %
4 * 4 119 16.0 % 643 86.2 %
5 * 8 159 21.3 % 627 84.0 %
6 * 3 177 23.7 % 587 78.7 %
7 * 5 212 28.4 % 569 76.3 %
8 * 2 228 30.6 % 534 71.6 %
9 * 3 255 34.2 % 518 69.4 %
11 * 1 266 35.7 % 491 65.8 %
13 * 1 279 37.4 % 480 64.3 %
14 * 1 293 39.3 % 467 62.6 %
15 * 1 308 41.3 % 453 60.7 %
17 * 2 342 45.8 % 438 58.7 %
18 * 1 360 48.3 % 404 54.2 %
21 * 1 381 51.1 % 386 51.7 %
24 * 1 405 54.3 % 365 48.9 %
25 * 1 430 57.6 % 341 45.7 %
27 * 1 457 61.3 % 316 42.4 %
28 * 1 485 65.0 % 289 38.7 %
30 * 1 515 69.0 % 261 35.0 %
41 * 1 556 74.5 % 231 31.0 %
46 * 1 602 80.7 % 190 25.5 %
61 * 1 663 88.9 % 144 19.3 %
83 * 1 746 100.0 % 83 11.1 %
FREQ. MÉDIA = 11 491/17 28
193
APÊNDICE I - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (FASE 2)
Eu,____________________________________________________________, RG
___________________________, ciente das informações prestadas pelos pesquisadores,
concordo em participar da SEGUNDA FASE da pesquisa intitulada “As representações
sociais do HIV/AIDS entre enfermeiros de um hospital universitário do município do Rio de
Janeiro”, a qual tem por objetivo geral: analisar o conteúdo e a estrutura das representações
sociais de enfermeiros que atuam em unidades hospitalares acerca do HIV/AIDS.
Esta pesquisa é desenvolvida sob a responsabilidade do mestrando Tadeu Lessa da Costa
*
e de
sua orientadora, a professora Titular Denize Cristina de Oliveira, do Programa de Pós-
Graduação em Enfermagem da Faculdade de Enfermagem da Universidade do Estado do Rio
de Janeiro (UERJ).
Declaro, portanto, estar informado(a) que em nenhum momento serei exposto(a) a riscos,
devido à minha participação na pesquisa, e que poderei, a qualquer momento, recusar a
continuar, sem nenhum prejuízo para a minha pessoa. Reconheço, também, que as respostas
obtidas, serão usadas apenas para fins científicos e utilizadas em trabalhos e eventos
acadêmico-científicos, sem qualquer identificação que possa comprometer-me.
Informo estar esclarecido(a) que não terei nenhum tipo de despesa ou gratificação pela
participação nesta pesquisa, e que terei acesso aos resultados publicados em periódicos
científicos.
Tendo em vista o exposto, concordo voluntariamente em participar do referido estudo.
Rio de Janeiro, _____ de ___________________ de 2007.
__________________________ __________________________
Pesquisador Sujeito da Pesquisa
*
Contato com o pesquisador: (21) 2284-2703; e-mail: tadeulessa@yahoo.com.br
194
APÊNDICE J - INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS DA FASE 2 DA PESQUISA
Abaixo você encontrará uma lista de nove proposições.
1) Escolha as 3 alternativas que, na sua opinião, melhor definem o portador do HIV/AIDS.
A necessidade de fazer tratamento.
A homossexualidade.
Conviver com o sofrimento.
Necessidade de orientações para a saúde.
A sensação de medo.
Utilização de medidas de proteção pessoal para cuidar do paciente.
Os preconceitos a eles dirigidos.
Conviver com uma doença.
A prática sexual.
2) Dentre as 6 restantes, marque as 3 alternativas que menos definem a idéia que vofaz do
portador do HIV/AIDS.
3) Marque agora, cada uma das alternativas acima com o símbolo +, caso você a considere
POSITIVA e com o símbolo -, caso você a considere NEGATIVA.
4) Abaixo há uma lista de frases sobre os portadores de HIV/AIDS.
Sobre os portadores do HIV/AIDS, indique o seu grau de acordo ou desacordo com cada uma
das proposições, marcando o número correspondente.
Discordo
totalmente
Discordo
Discordo
em parte
Concordo
em parte
Concordo
Concordo
totalmente
4.1
Eles têm ou tiveram muitos
parceiros sexuais.
1
2
3
4
5
6
4.2
Eles podem controlar sua doença
com o tratamento.
1
2
3
4
5
6
4.3
Eles mantêm ou já tiveram relações
homossexuais.
1
2
3
4
5
6
4.4
Existem muitos portadores do
HIV/AIDS no Brasil.
1
2
3
4
5
6
4.5
Os portadores do HIV/AIDS têm
esperança e perspectivas de vida.
1
2
3
4
5
6
4.6
Os portadores do HIV/AIDS tomam
muitas medicações.
1
2
3
4
5
6
4.7
Lidar com portadores do HIV/AIDS
gera sensação de medo.
1
2
3
4
5
6
195
4.8
A família é importante para o
portador do HIV/AIDS.
1
2
3
4
5
6
4.9
Eles necessitam de apoio e ajuda.
1
2
3
4
5
6
4.10
De um modo geral, os portadores
do HIV/AIDS costumam se isolar.
1
2
3
4
5
6
4.11
O HIV/AIDS gera imunodepressão
e doenças oportunistas em seus
portadores.
1
2
3
4
5
6
4.12
Eles precisam sempre receber
muito carinho.
1
2
3
4
5
6
4.13
Ele está próximo da morte.
1
2
3
4
5
6
4.14
Eles contam com a solidariedade
das pessoas.
1
2
3
4
5
6
4.15
Eles representam uma fonte de
contaminação para outras pessoas.
1
2
3
4
5
6
4.16
Ao cuidar de um portador de
HIV/AIDS, utiliza-se medidas de
proteção individual.
1
2
3
4
5
6
4.17
Eles adquiriram o vírus e a doença
por meio da atividade sexual.
1
2
3
4
5
6
4.18
Eles convivem com o sofrimento.
1
2
3
4
5
6
4.19
Eles são pessoas que dão muito
valor à vida.
1
2
3
4
5
6
4.20
Eles são discriminados, o que
ocorre inclusive no hospital.
1
2
3
4
5
6
4.21
Eles despertam, de um modo geral,
um sentimento de piedade.
1
2
3
4
5
6
5) Para você...
Sim
Não
5.1
Uma pessoa que não vivencia situações de sofrimento poderia ser um
portador do HIV/AIDS?
5.2
Uma pessoa que não precisa de tratamento poderia ser um portador do
HIV/AIDS?
5.3
Uma pessoa que os profissionais que cuidam dela não adotam sempre
medidas de proteção individual poderia ser um portador do HIV/AIDS?
5.4
Uma pessoa que não é homossexual poderia ser um portador do HIV/AIDS?
5.5
Uma pessoa que não necessita de orientações sobre a sua saúde poderia ser
um portador do HIV/AIDS?
5.6
Uma pessoa que não desperta medo nas outras pessoas poderia ser um
portador do HIV/AIDS?
5.7
Uma pessoa que não existe preconceito em relação a ela poderia ser um
portador do HIV/AIDS?
5.8
Uma pessoa que não convive com a idéia de morte poderia ser um portador
do HIV/AIDS?
5.9
Uma pessoa que não desperta um sentimento de piedade nos outros poderia
ser um portador do HIV/AIDS?
196
5.10
Uma pessoa que não tem vários parceiros sexuais poderia ser um portador do
HIV/AIDS?
5.11
Uma pessoa que não tem boas relações com sua família poderia ser um
portador do HIV/AIDS?
5.12
Uma pessoa que não pode contaminar outras pessoas poderia ser um
portador do HIV/AIDS?
5.13
Uma pessoa que não se isola poderia ser um portador do HIV/AIDS?
5.14
Uma pessoa que não necessita de atividades de prevenção poderia ser um
portador do HIV/AIDS?
5.15
Uma pessoa que não toma muitas medicações poderia ser um portador do
HIV/AIDS?
5.16
Uma pessoa que não conta com a solidariedade das pessoas poderia ser um
portador do HIV/AIDS?
5.17
Uma pessoa que não sofre discriminação por causa de sua doença poderia
ser um portador do HIV/AIDS?
5.18
Uma pessoa da qual as pessoas não tendem a se afastar dela poderia ser um
portador do HIV/AIDS?
5.19
Uma pessoa que não utiliza drogas poderia ser um portador do HIV/AIDS?
5.20
Uma pessoa que não sofre rejeição poderia ser um portador do HIV/AIDS?
5.21
Uma pessoa que não adquiriu sua doença por meio de prática sexual poderia
ser um portador do HIV/AIDS?
6) Para você, quais as chances (de 0 a 100%) de um(a) enfermeiro(a) adquirir o HIV em seu
trabalho no hospital?
_______% Muito Alto ( ) Alto ( ) Médio ( ) Baixo ( ) Muito Baixo ( )
7) Para você, agora, quais as chances (de 0 a 100%) de um(a) enfermeiro(a) adquirir o HIV
em sua vida pessoal?
_______% Muito Alto ( ) Alto ( ) Médio ( ) Baixo ( ) Muito Baixo ( )
Muito obrigado pela colaboração. Sua participação foi muito importante para nós.
197
198
APÊNDICE M GRÁFICOS COM A DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS SUJEITOS À
ESCALA DE LIKERT.
Eles têm ou já tiveram muitos parceiros sexuais
43,4
53,3
3,3
0
10
20
30
40
50
60
Menos característico Intermediário Mais característico
Papel na caracterização do portador do HIV/AIDS
%
FIGURA 17 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS ENFERMEIROS À ASSERTIVA EM RELAÇÃO AO PORTADOR
DO HIV/AIDS ELES TÊM OU JÁ TIVERAM MUITOS PARCEIROS SEXUAIS. RIO DE JANEIRO, 2007.
Eles podem controlar sua doença com o
tratamento
3,3
13,3
83,4
0
20
40
60
80
100
Menos característico Intermediário Mais característico
Papel na caracterização do portador do HIV/AIDS
%
FIGURA 18 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS ENFERMEIROS À ASSERTIVA EM RELAÇÃO AO PORTADOR
DO HIV/AIDS ELES PODEM CONTROLAR A SUA DOENÇA COM O TRATAMENTO. RIO DE JANEIRO, 2007.
Eles mentêm ou já tiveram relações
homossexuais
63,4
30
6,6
0
10
20
30
40
50
60
70
Menos característico Intermediário Mais característico
Papel na caracteriação do portador do HIV/AIDS
%
FIGURA 19 “GRÁFICO DE CURVA COM A DISTRIBUIÇÃO PORCENTUAL DAS RESPOSTAS DOS ENFERMEIROS
À ASSERTIVA EM RELAÇÃO AO PORTADOR DO HIV/AIDS ELES TÊM OU JÁ TIVERAM RELAÇÕES HOMOSSEXUAIS.
RIO DE JANEIRO, 2007.
199
Existem muitos portadores do HIV/AIDS no Brasil
0
6,6
93,4
0
20
40
60
80
100
Menos característico Intermediário Mais característico
Papel na caracterização do portador do HIV/AIDS
%
FIGURA 20 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS ENFERMEIROS À ASSERTIVA EM RELAÇÃO AO PORTADOR
DO HIV/AIDS EXISTEM MUITOS PORTADORES DO HIV/AIDS NO BRASIL. RIO DE JANEIRO, 2007.
Os portadores do HIV/AIDS têm esperança e
perspectivas de vida
3,3
23,3
73,4
0
10
20
30
40
50
60
70
80
Menos característico Intermediário Mais característico
Papel na caracterização do portador do HIV/AIDS
%
FIGURA 21 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS ENFERMEIROS À ASSERTIVA EM RELAÇÃO AO PORTADOR
DO HIV/AIDS OS PORTADORES DO HIV/AIDS TÊM ESPERANÇA E PERSPECTIVAS DE VIDA. RIO DE JANEIRO,
2007.
Os portadores do HIV/AIDS tomam muitas
medicações
3,3
30
66,7
0
10
20
30
40
50
60
70
80
Menos característico Intermediário Mais característico
Papel na caracterização do portador do HIV/AIDS
%
FIGURA 22 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS ENFERMEIROS À ASSERTIVA EM RELAÇÃO AO PORTADOR
DO HIV/AIDS OS PORTADORES DO HIV/AIDS TOMAM MUITAS MEDICAÇÕES. RIO DE JANEIRO, 2007.
200
Lidar com os portadores do HIV/AIDS gera
sensação de medo
43,3
40
16,7
0
10
20
30
40
50
Menos característico Intermediário Mais característico
Papel na caracterização do portador do HIV/AIDS
%
FIGURA 23 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS ENFERMEIROS À ASSERTIVA EM RELAÇÃO AO PORTADOR
DO HIV/AIDS LIDAR COM OS PORTADORES DO HIV/AIDS GERA SENSAÇÃO DE MEDO. RIO DE JANEIRO, 2007.
A família é importante para o portador do
HIV/AIDS
0
3,3
96,7
0
20
40
60
80
100
120
1 2 3
Papel na caracterização do portador do HIV/AIDS
%
FIGURA 24 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS ENFERMEIROS À ASSERTIVA EM RELAÇÃO AO PORTADOR
DO HIV/AIDS A FAMÍLIA É IMPORTANTE PARA O PORTADOR DO HIV/AIDS. RIO DE JANEIRO, 2007.
Eles necessitam de apoio e ajuda
0
3,3
96,7
0
20
40
60
80
100
120
Menos característico Intermediário Mais característico
Papel na caracterização do portador do HIV/AIDS
%
FIGURA 25 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS ENFERMEIROS À ASSERTIVA EM RELAÇÃO AO PORTADOR
DO HIV/AIDS ELES NECESSITAM DE APOIO E AJUDA. RIO DE JANEIRO, 2007.
201
De um modo geral, os portadores do HIV/AIDS
costumam se isolar
10
76,7
13,3
0
20
40
60
80
100
Menos característico Intermediário Mais característico
Papel na caracterização do portador do HIV/AIDS
%
FIGURA 26 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS ENFERMEIROS À ASSERTIVA EM RELAÇÃO AO PORTADOR
DO HIV/AIDS DE UM MODO GERAL, OS PORTADORES DO HIV/AIDS COSTUMAM SE ISOLAR. RIO DE JANEIRO,
2007.
O HIV/AIDS gera imunodepressão e doenças
oportunistas em seus portadores
3,3
16,7
80
0
20
40
60
80
100
Menos característico Intermediário Mais característico
Papel na caracterização do portador do HIV/AIDS
%
FIGURA 27 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS ENFERMEIROS À ASSERTIVA EM RELAÇÃO AO PORTADOR
DO HIV/AIDS O HIV/AIDS GERA IMUNODEPRESSÃO E DOENÇAS OPORTUNISTAS EM SEUS PORTADORES. RIO DE
JANEIRO, 2007.
Eles precisam sempre receber muito carinho
0
13,3
86,7
0
20
40
60
80
100
Menos característico Intermediário Mais característico
Papel na caracterização do portador do HIV/AIDS
%
FIGURA 28 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS ENFERMEIROS À ASSERTIVA EM RELAÇÃO AO PORTADOR
DO HIV/AIDS ELES PRECISAM SEMPRE RECEBER MUITO CARINHO. RIO DE JANEIRO, 2007.
202
Ele está próximo da morte
83,4
13,3
3,3
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
Menos característico Intermediário Mais característico
Papel na caracterização do portador do HIV/AIDS
%
FIGURA 29 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS ENFERMEIROS À ASSERTIVA EM RELAÇÃO AO PORTADOR
DO HIV/AIDS ELE ESTÁ PRÓXIMO DA MORTE. RIO DE JANEIRO, 2007.
Eles contam com a solidariedade das pessoas
10
76,7
13,3
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
Menos característico Intermediário Mais característico
Papel na caracterização do portador do HIV/AIDS
%
FIGURA 30 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS ENFERMEIROS À ASSERTIVA EM RELAÇÃO AO PORTADOR
DO HIV/AIDS ELES CONTAM COM A SOLIDARIEDADE DAS PESSOAS. RIO DE JANEIRO, 2007.
Eles representam uma fonte de contaminação
para outras pessoas
43,3
46,7
10
0
10
20
30
40
50
Menos característico Intermediário Mais característico
Papel na caracterização do portador do HIV/AIDS
%
FIGURA 31 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS ENFERMEIROS À ASSERTIVA EM RELAÇÃO AO PORTADOR
DO HIV/AIDS ELES REPRESENTAM UMA FONTE DE CONTAMINAÇÃO PARA AS OUTRAS PESSOAS. RIO DE
JANEIRO, 2007.
203
Ao cuidar do portador de HIV/AIDS, utiliza-se
medidas de proteção individual
3,3
16,7
80
0
20
40
60
80
100
Menos característico Intermediário Mais característico
Papel na caracterização do portador do HIV/AIDS
%
FIGURA 32 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS ENFERMEIROS À ASSERTIVA EM RELAÇÃO AO PORTADOR
DO HIV/AIDS AO CUIDAR DO PORTADOR DE HIV/AIDS, UTILIZA-SE MEDIDAS DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL. RIO
DE JANEIRO, 2007.
Eles adquiriram o vírus e a doença por meio da
prática sexual
46,7
50
3,3
0
10
20
30
40
50
60
Menos característico Intermediário Mais característico
Papel na caracterização do portador do HIV/AIDDS
%
FIGURA 33 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS ENFERMEIROS À ASSERTIVA EM RELAÇÃO AO PORTADOR
DO HIV/AIDS ELES ADQUIRIRAM O VÍRUS E A DOENÇA POR MEIO DA PRÁTICA SEXUAL. RIO DE JANEIRO, 2007.
Eles convivem com o sofrimento
3,3
66,7
30
0
10
20
30
40
50
60
70
80
Menos característico Intermediário Mais característico
Papel na caracterização do portador do HIV/AIDS
%
FIGURA 34 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS ENFERMEIROS À ASSERTIVA EM RELAÇÃO AO PORTADOR
DO HIV/AIDS ELES CONVIVEM COM O SOFRIMENTO. RIO DE JANEIRO, 2007.
204
Eles são pessoas que dão muito valor à vida
3,3
80
16,7
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
Menos característico Intermediário Mais característico
Papel na caracterização do portador do HIV/AIDS
%
FIGURA 35 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS ENFERMEIROS À ASSERTIVA EM RELAÇÃO AO PORTADOR
DO HIV/AIDS ELES SÃO PESSOAS QUE DÃO MUITO VALOR À VIDA. RIO DE JANEIRO, 2007.
Eles são discriminados, o que ocorre, inclusive,
no hospital
6,7
50
43,3
0
10
20
30
40
50
60
Menos característico Intermediário Mais característico
Papel na caracterização do portador do HIV/AIDS
%
FIGURA 36 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS ENFERMEIROS À ASSERTIVA EM RELAÇÃO AO PORTADOR
DO HIV/AIDS ELES SÃO DISCRIMINADOS, O QUE OCORRE INCLUSIVE NO HOSPITAL. RIO DE JANEIRO, 2007.
Eles despertam, de um modo geral, um
sentimento de piedade
30
33,3
36,7
0
5
10
15
20
25
30
35
40
Menos característico Intermediário Mais característico
Papel na caracterização do portador do HIV/AIDS
%
FIGURA 37 DISTRIBUIÇÃO DAS RESPOSTAS DOS ENFERMEIROS À ASSERTIVA EM RELAÇÃO AO PORTADOR
DO HIV/AIDS ELES DESPERTAM, DE UM MODO GERAL, UM SENTIMENTO DE PIEDADE. RIO DE JANEIRO, 2007.
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