Download PDF
ads:
UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA
CÂMPUS DE BOTUCATU
FACULDADE DE CIÊNCIAS AGRONÔMICAS
CONHECIMENTO SOBRE PLANTAS MEDICINAIS COM ATIVIDADE
DE CONTROLE DO COLESTEROL, PRESSÃO ARTERIAL E
PROBLEMAS RENAIS, UTILIZADAS PELA POPULAÇÃO RESIDENTE
NO BAIRRO DOS MARINS, MUNICÍPIO DE PIQUETE – SP.
LÍVIA CRISTINA PEREIRA BARROS
Dissertação apresentada à Faculdade de
Ciências Agronômicas da Unesp - Campus de
Botucatu, para obtenção do título de Mestre e
m
Agronomia – Área de Concentração Horticultura
BOTUCATU – SP
Agosto
2007
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA
CÂMPUS DE BOTUCATU
FACULDADE DE CIÊNCIAS AGRONÔMICAS
CONHECIMENTO SOBRE PLANTAS MEDICINAIS COM ATIVIDADE
DE CONTROLE DO COLESTEROL, PRESSÃO ARTERIAL E
PROBLEMAS RENAIS, UTILIZADAS PELA POPULAÇÃO RESIDENTE
NO BAIRRO DOS MARINS, MUNICÍPIO DE PIQUETE – SP.
LÍVIA CRISTINA PEREIRA BARROS
ORIENTADOR: PROF. DR. LIN CHAU MING
CO-ORIENTADORA: PROFA. DRA. ISABEL DE CARVALHO
Dissertação apresentada à Faculdade de Ciências
Agronômicas da Unesp - Campus de Botucatu,
p
ara obtenção do título de Mestre em Agronomi
a
Área de Concentração Horticultura
BOTUCATU – SP
Agosto - 2007
ads:
II
III
FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA SEÇÃO TÉCNICA DE AQUISIÇÃO E TRATAMEN-
TO DA INFORMAÇÃO – SERVIÇO TÉCNICO DE BIBLIOTECA E DOCUMENTAÇÃO - UNESP –
FCA - LAGEADO - BOTUCATU (SP)
Barros, Lívia Cristina Pereira, 1980-
B277c Conhecimento sobre plantas medicinais com atividade de
controle do colesterol, pressão arterial e problemas rena-
is, utilizadas pela população residente no Bairro dos Ma-
rins município de Piquete - SP / Lívia Cristina Pereira
Barros. – Botucatu : [s.n.], 2007.
ix, 166 f. : il. color., gráfs., tabs.
Dissertação (Mestrado)-Universidade Estadual Paulista,
Faculdade de Ciências Agronômicas, Botucatu, 2007
Orientador: Lin Chau Ming
Co-orientador: Isabel de Carvalho
Inclui bibliografia
1. Plantas medicinais. 2. Etnobotânica. 3. Mata Atlântica.
4. Comunidade rural. 5. Mantiqueira, Serra da. I. Ming,
Lin Chau. II. Universidade Estadual Paulista “Júlio de
Mêsquita Filho” (Campus de Botucatu). Faculdade de Ciênci-
as Agronômicas. III. Título.
III
“Marins”
(trecho da trova)
I
Marins um nome escrito apenas com seis
letras, um bairro bem brasileiro,
Um pedaço de chão do novo planeta, em
que reside um povo bom, hospitaleiro, tão
apreciado como o astro cometa,
conhecido até lá no estrangeiro!
II
Marins, um bairro extraordinário, tem
seus poucos habitantes. Mas todos são
proprietários. Quase todos são sitiantes,
alguns são fazendeiros
Sua produção é boa e importante, extraída
do rebanho leiteiro, um povo que trabalha
bastante.Mas são felizes o ano inteiro!
III
Marins, com sua singela Capela,
Com sua torre erguida, parecendo um barco
caravela,
Ao entrarmos no interior dela,
Vemos imagem de N. Sª. Aparecida,
padroeira do bairro, com sua coroa tão
bela, com seu manto azul, com
ornamentação amarela, Maria nossa
mãe e matutina Stela!
IV
Marins, um pedaço de chão,
de terra bem brasileira,
situado, na serra da Mantiqueira,
um bairro de progresso bem evoluído,
com sua gente de boas maneiras,
no alto da serra com seu pico bem erguido
cercado de altas cordilheiras,
Com mais de dois mil metros de altitude
É bem conhecido e admirado,
IV
V
Suas nascentes de água,
Formando um vale comprido,
com suas torrentes, formando belíssimas
cachoeiras, com seu constante ruído,
iluminados pelos raios solares,
formam as cores de nossa bandeira!
Com seu leito bem protegido,
nas longas restingas capoeiras,
com seus campos verdejantes e floridos,
formando a mais bela natureza furajeira!
VI
Marins, com sua gente honesta,
com suas casas modestas,
com sua tradicional festa,
com sua musica seresta,
trazendo-nos alegria e diversão,
a cada um de meus irmãos,
retratando em cada testa,
o amor de seu coração,
uma dedicação que nos presta,
repleta de paz e saudosa recordação!
João Batista Rodrigues
(Trovador do Bairro dos Marins)
IV
A MÃE NATUREZA, REPRESENTADA POR N.SRA. APARECIDA
Que me fez vir ao mundo com uma energia feminina, capaz de amar a diversidade humana, e
sensível para tentar descrevê-la.
AOS MEUS PAIS, DALTRO E MARTA
Por seu carinho e amor que me mantém viva e por me ensinar que as maiores virtudes do
mundo são a simplicidade e a gratidão.
AOS MEUS IRMÃOS, TÚLIO E FLÁVIO
Por me fazerem entender a palavra saudade.
A MARCO TÚLIO BATISTA DO CARMO
Pela compreensão e amor em todos os momentos.
A MARIA ESTELA SÂMIA E ZÉZE DA DETINHA
Pela dedicação, paciência e incentivo nas horas mais difíceis de minha vida.
A D. CIDA, D. INEZ, SR. JOAQUIM, SR LUCAS E A TODOS OS DEMAIS
MORADORES DOS MARINS
Pela acolhida, respeito, confiança, amizade e principalmente coragem para podermos viver
esta aventura tão gostosa do “se conhecer...”.............Sem vocês nada disso faria sentido!
DEDICO.
V
AGRADECIMENTOS
- Ao Professor Dr. Lin Chau Ming, pela paciência, amizade, confiança, brilhante orientação para
realização do trabalho e pelo exemplo de paixão e dedicação à Etnobotânica;
- À Dra. Isabel de Carvalho, pela amizade, carinho e aprendizado.
- Ao Dr. Ari Freitas Hidalgo e a Dra. Maria José Queiroz de Freitas Alves pela colaboração e
participação na banca examinadora deste trabalho;
- À Dra. Sandra Maria Pereira, por todo apoio dado em campo e fora dele;
- Ao Programa de Pós-graduação em Agronomia, área de concentração Horticultura (PPPG-
Horticultura), da Faculdade de Ciências Agronômicas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de
Mesquita Filho”;
- Ao Conselho Nacional de Pesquisa - CNPq pela concessão de bolsa de mestrado;
- Aos moradores do bairro rural dos Marins e de Piquete, que participaram direta e indiretamente
do trabalho de pesquisa de campo, sem os quais não seria possível a sua realização, em especial a
Maria Aparecida Rodrigues, Inez da Soledade Rodrigues, Joaquim e Geraldo Bertolino Pinto, Lucas e
Irene Rodrigues, Sandra e Quito Zago, Renata e Geraldo Augusto (Gugu) Fortes e D. Rose;
- Aos professores e funcionários do PPG - Horticultura pelos ensinamentos e atenção ao longo
das disciplinas do curso;
- À Casa da Agricultura de Piquete pelo apoio institucional através do repasse de informações;
- À Fundação Christiano Rosa da cidade de Piquete, pela disponibilidade e atenção;
- Aos colegas do curso pela convivência e companheirismo, Jomar Barbosa, Ariane Salata,
Jamille Casa, Erval Damatto, Andréa Higuti, Clayton de Biase, Mirela Cultrera, Maria dos Anjos
Costa, Lenita Haber, Raquel Mattana, Gláucia Moreira, Cristian Iezid, Fábio Tonnin , Márcia Maciel;
- Às mestras e amigas Milena C. Pilla, Juliana de Faria Lima Santos, e Juliana Bendini pela
amizade sincera e terna e por me apoiarem sempre e principalmente nesta etapa final;
- Aos amigos de Botucatu, juntos nas horas de alegria intensa, Bzerra, Bacalhau, Xiquinha,
Miudinha, Kaxa, Ariovaldo Pereira dos Santos e Juliano Spadotto;
- À Flavinha da Pompéia pela paciência e colaboração na diagramação;
- À minha família, principalmente meus pais.
Agradeço.
VI
SUMARIO
Página
1. RESUMO..............................................................................................................................11
2. SUMMARY..........................................................................................................................13
3. INTRODUÇÃO ...................................................................................................................15
4. OBJETIVOS........................................................................................................................18
5. REVISÃO DE LITERATURA...........................................................................................20
5.1. Diversidade humana e etnobotânica..............................................................................................20
5.2. Estudos etnobotânicos realizados na Mata Atlântica.....................................................................23
5.3. Mata Atlântica...............................................................................................................................25
5.4. O Vale do Paraíba Paulista............................................................................................................29
5.5. Plantas medicinais e as doenças escolhidas neste estudo ..............................................................33
6. MATERIAL E MÉTODOS................................................................................................38
6.1. Área de Estudo ..............................................................................................................................38
6.2. Metodologia...................................................................................................................................42
7. RESULTADOS E DISCUSSÕES ......................................................................................45
7.1. Caracterização cultural do lugar....................................................................................................45
7.2. Dados Sócio-culturais....................................................................................................................62
7.3 Aprendizado e a transmissão do conhecimento sobre plantas........................................................72
VII
7.4. Percepção das doenças estudadas segundo os entrevistados .........................................................77
7.5. Ocorrência e freqüência das doenças estudadas segundo o Sistema Oficial de Saúde..................87
7.6. Ocorrência e freqüência das doenças estudadas entre o grupo de entrevistados............................93
7.7 Doenças estudadas pelo ponto de vista êmico................................................................................96
7.8. Plantas medicinais utilizadas.......................................................................................................115
7.9 Parte utilizada, formas de utilização e critério para a coleta das espécies medicinais..................126
8. CONCLUSÃO....................................................................................................................137
8.1 Considerações Finais....................................................................................................................139
9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................141
VIII
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Mapa de cobertura da Área de Proteção Ambiental da Serra da Mantiqueira ...................... 26
Figura 2 - Mapa dos Municípios do Vale do Paraíba Paulista .............................................................. 30
Figura 3 - Paisagem da cidade de Piquete ............................................................................................. 41
Figura 4 - Visão ilustrativa da Serra da Mantiqueira contemplando a cidade de Piquete, o
Bairro dos Marins e o Pico dos Marins .................................................................................... 42
Figura 5 – Mutirão de construção da 1
a
Capela de N. S. Aparecida no ano de 1937 no Bairro dos
Marins .................................................................................................................................................... 48
Figura 6- Fotos da Capela de Nossa Senhora Aparecida no Bairro dos Marins em ordem cronológica
(1937, 1972, 2007), mostrando as diversas formas de construção e reforma ........................................ 50
Figura 7 – (A) Pátio de Tropas, local de “pouso” dos tropeiros .............................................. 54
Figura 7 - (B) Antiga estrada do Bairro dos Marins, com tropas subindo ............................................. 54
Figura 8 – “Canudo”, utensílio levado nas tropas para o transporte de queijo ........................ 55
Figura 9 – Tropas que faziam o transporte dos Marins a Cruzeiro, carregadas com carvão ..................55
Figura 10 - (A) Saco alvejado e trançado de artesanato de Abrolho feito por artesã do Bairro dos
Marins .................................................................................................................................................... 56
Figura 10 – (B) Amostras de artesanato de Abrolho, guardadas por uma das entrevistadas do Bairro dos
Marins. ................................................................................................................................................... 56
Figura 11 - Artesanato feito com madeira: monjolo pequeno, escacador de cana pequeno, pilãozinho,
pilão grande feito por artesão do Bairro dos Marins ............................................................................. 57
Figura 12- Utensílios usados para tropas e montarias, feitos artesanalmente com couro e crina de
eqüinos e muares no Bairro dos Marins ................................................................................................ 57
Figura 13 – Distribuição dos 74 entrevistados cadastrados por faixa etária do Bairro dos Marins,
Piquete-SP .............................................................................................................................................. 63
Figura 14 – Estrutura etária dos especialistas entrevistados no Bairro rural dos Marins, Piquete-SP .. 65
Figura 15 – Distribuição do tempo de moradia dos especialistas entrevistados no Bairro dos Marins,
Piquete-SP .............................................................................................................................................. 66
Figura 16 – Grau de escolaridade dos especialistas entrevistados no Bairro dos Marins, Piquete-SP .. 67
IX
Figura 17 - Principais atividades exercidas pelos especialistas entrevistados dentro da comunidade do
Bairro dos Marins, Piquete-SP .............................................................................................................. 68
Figura 18- Origem e transmissão do conhecimento sobre plantas medicinais entre os especialistas
entrevistados no Bairro dos Marins, Piquete-SP ................................................................................... 73
Figura 19- Forma de aprendizagem do conhecimento sobre as plantas medicinais entre os especialistas
entrevistados no Bairro dos Marins, Piquete-SP ................................................................................... 75
Figura 20- Relação entre o efeito de remédios feitos com plantas medicinais, doenças e problemas, na
cura ou melhora dos especialistas entrevistados no Bairro dos Marins, Piquete-SP ............................. 83
Figura 21 -Doenças que antigamente não se ouvia falar segundo os especialistas entrevistados no
Bairro dos Marins, Piquete-SP .............................................................................................................. 85
Figura 22- Número de ocorrência das doenças estudadas entre todos os pacientes atendidos pelo PSF
durante o ano de 2006 e 2007 no Bairro dos Marins, Piquete-SP ......................................................... 89
Figura 23- Freqüência média (%) dos pacientes que apresentam as doenças alvo, atendidos pelo PSF no
Bairro dos Marins, Piquete-SP .............................................................................................................. 91
Figura 24. Ocorrência das doenças estudadas dentro do grupo de especialistas entrevistados no
Bairro dos Marins, Piquete-SP ................................................................................................. 94
Figura 25- Distribuição por família das plantas medicinais utilizadas no Bairro dos Marins, Piquete-SP
.............................................................................................................................................................. 116
Figura 26- Hábito das plantas medicinais pesquisadas no Bairro dos Marins, Piquete-SP ................. 117
Figura 27- Local de ocorrência e coleta das plantas medicinais estudadas no Bairro dos Marins,
Piquete-SP ............................................................................................................................................ 118
Figura 28– Parte vegetal das plantas utilizadas medicinalmente pelos especialistas entrevistados para as
doenças estudadas no Bairro dos Marins, Piquete-SP ......................................................................... 128
Figura 29 – Formas de utilização das plantas medicinais citadas pelos especialistas entrevistados no
Bairro dos Marins, Piquete-SP ............................................................................................................ 130
Figura 30- Plantas medicinais difíceis de serem encontradas atualmente no Bairro dos Marins, Piquete-
SP, segundo os especialistas entrevistados .......................................................................................... 135
LISTA DE ANEXOS
Anexo I-Cadastramento das famílias que compõem o Bairro ............................................... 156
X
Anexo II- Entrevista com profissionais do PSF, que atuam no Bairro dos Marins ................159
Anexo III- Entrevista semi-estruturada aplicada aos moradores da amostragem “bola de neve “ ...... 160
LISTA DE TABELAS
Tabela 1- Sintomas descritos pelos especialistas entrevistados para diagnosticar a pressão alta
no Bairro dos Marins, Piquete-SP ............................................................................................ 98
Tabela 2 – Plantas usadas para o tratamento de pressão alta segundo os especialistas
entrevistados no Bairro dos Marins, Piquete-SP .................................................................... 101
Tabela 3 – Plantas usadas para o tratamento de colesterol alto segundos os especialistas
entrevistados no Bairro dos Marins, Piquete-SP .................................................................... 105
Tabela 4 Plantas usadas para o tratamento de problemas renais e urinários no Bairro dos Marins,
Piquete-SP ............................................................................................................................................ 107
Tabela 5- Espécies medicinais, citadas pelos entrevistados do Bairro dos Marins, Piquete-SP,
para as doenças alvo deste estudo .......................................................................................... 112
Tabela 6- Espécies medicinais cultivadas, citadas pelos especialistas entrevistados do Bairro
dos Marins, Piquete-SP, segundo a forma de vida e o local de ocorrência e coleta .............. 120
Tabela 7- Grau de manejo e número de espécies espontâneas de plantas medicinais citadas
pelos especialistas entrevistados no Bairro dos Marins, Piquete-SP ..................................... 123
Tabela 8- Espécies medicinais espontâneas, citadas pelos especialistas entrevistados do Bairro
dos Marins, Piquete-SP, segundo a forma de vida e o local de ocorrência e coleta, a origem e
grau de manejo ....................................................................................................................... 124
11
1. RESUMO
CONHECIMENTO SOBRE PLANTAS MEDICINAIS COM ATIVIDADE DE
CONTROLE DO COLESTEROL, PRESSÃO ARTERIAL E PROBLEMAS RENAIS E
URINÁRIO, UTILIZADAS PELA POPULAÇÃO RESIDENTE NO BAIRRO DOS
MARINS, MUNICÍPIO DE PIQUETE-SP. Botucatu (SP), 2007 160p. Dissertação
(Mestrado em Agronomia/Horticultura). Faculdade de Ciências Agronômicas, Universidade
Estadual Paulista.
Autor: Lívia Cristina Pereira Barros
Orientador: Prof. Dr. Lin Chau Ming Co-orientadora: Profa. Dra. Isabel de Carvalho
Esta pesquisa teve como objetivo principal realizar levantamento
etnobotânico junto à comunidade rural do Bairro dos Marins, no município de Piquete, a
respeito do conhecimento sobre as plantas medicinais com atividades de controle do
colesterol, pressão arterial e problemas renais. Outros objetivos a alcançar disseram respeito à
ocorrência e à freqüência das doenças na comunidade; verificar como os moradores
reconhecem e nomeiam as doenças estudadas; identificar quais espécies de plantas medicinais
são conhecidas e usadas pelos moradores, sua forma de utilização e preparo; e entender como
12
funciona a troca de informação sobre as plantas medicinais dentro da comunidade. A coleta de
dados foi baseada em métodos empregados em Antropologia, como entrevistas semi-
estruturadas e estruturadas e observação participante. Para viabilizar a estruturação da
pesquisa, as entrevistas se dividiram em três etapas. Na primeira etapa foram feitas visitas a
todas as casas do Bairro. A escolha do entrevistado de cada unidade residencial teve como
critério que este fosse responsável pelo sustento da família. Foram entrevistadas 74 pessoas,
mediante entrevistas estruturadas e semi-estruturadas. Foram coletados dados sócio-culturais e
levantados os problemas de saúde mais recorrentes na comunidade e as plantas usadas para
tratar cada um deles. Na segunda etapa foram entrevistados profissionais e agentes da área da
saúde do Programa de Saúde da Família (PSF). Nessa etapa foi utilizado roteiro com
perguntas. Para a terceira etapa foi usada a técnica de amostragem “bola de neve”, que
consistiu em conversar com algumas pessoas da comunidade e perguntar se conheciam
moradores que tinham significativo conhecimento sobre plantas medicinais, com esta técnica
foram indicadas 15 pessoas. Para complementar a pesquisa foram escolhidos mais cinco
entrevistados pelo método conhecido como amostragem por julgamento, o critério para
escolha destes foi o maior número de espécies medicinais citadas durante a primeira etapa e
conhecimento e uso das plantas para as três enfermidades propostas neste estudo. Durante a
realização da terceira etapa optou-se por utilizar entrevistas semi-estruturadas com perguntas
abertas a fim de verificar como esses especialistas nomeiam as afecções estudadas e como
reconhecem os problemas de saúde a partir dos sintomas. A coleta de dados de campo foi
realizada entre março de 2006 e março de 2007. Foram encontradas 57 plantas medicinais para
as doenças estudadas, distribuídas em 32 famílias botânicas, sendo as que se mais se
destacaram, Lamiaceae (n=8; 15,4%), Asteraceae (n=7; 13,5%), Poaceae (n=3; 5,8%) e
Solanaceae (n=2; 3,80%). Entre as indicações de uso mais freqüente estão plantas usadas para
problemas nos rins e vias urinárias. Com a pesquisa, apesar de ter se restringido a alguns
grupos de doenças, tornou-se possível verificar que no Bairro dos Marins existe o uso intenso
de plantas medicinais nos cuidados primários de saúde, para os grupos das doenças estudadas.
Palavras-chave: Etnobotânica, Mata Atlântica, Comunidade Rural, Serra da
Mantiqueira.
13
2. SUMMARY
KNOWLEDGE ABOUT MEDICINAL PLANTS WITH ACTIVITY ON CONTROL
OF THE CHOLESTEROL, ARTERIAL PRESSURE AND KIDNEY PROBLEMS,
USED BY THE RESIDENT POPULATION OF THE MARINS, PIQUETE
MUNICIPALITY- SP Botucatu (SP), 2007 160p. Dissertação (Mestrado em
Agronomia/Horticultura). Faculdade de Ciências Agronômicas, Universidade Estadual
Paulista.
Author: Lívia Cristina Pereira Barros
Adviser: Prof. Dr. Lin Chau Ming Co-adviser: Profa. Dra. Isabel de Carvalho
The main objective of this research was to do an ethnobotanical survey
in the rural community Marins, Piquete municipality, on their knowledge about medicinal
plants with activity on cholesterol control, blood pressure and kidney problems. Other
objectives were to evaluate the occurrence and the frequency of the diseases in the
community, to verify how the inhabitants know and name the studied diseases, to identify
which species of medicinal plants are known and used by the inhabitants, how they prepare
and use each one and to understand how the exchange of information works in the community.
14
The collection of data was based on methods used in Anthropology, like semi-structured and
structured interviews and also participant observation. In order to facilitate the research, the
interviews were divided in three stages. In the first stage all the houses of the community were
visited. The person who was responsible for the family support was chosen as the one who
would be interviewed. Seventy four people were interviewed by using semi-structured and 74
structured interviews. Sociocultural data were collected, as well as the community’s most
common health problems and the plants used to treat each problem. In the second stage,
professionals and healthcare workers from the healthcare family program (PSF) were
interviewed. On the third stage, it was used the “snow ball” technique, which consists on
talking to some people of the community and asking them whether they know some
inhabitants who have a significant knowledge about medicinal plants. Fifteen persons were
indicated with the use of this technique. To complete the research, five more persons were
interviewed by the method know as judgment sampling. The criterion used to choose these
five interviewed was the greatest number of medicinal plants species mentioned on the first
stage and the knowledge and use of plants for the three diseases proposed on this study.
During the realization of the third stage, it was chosen the semi-structured interviews with
open-ended questions in order to verify how these experts name the studied diseases and how
they recognize health problems by the symptoms. The data collection was carried out from
March, 2006 to March, 2007, totalizing 180 days of fieldwork. Fifty seven medicinal plants
were found for the studied diseases distributed in thirty two botanical families. Lamiaceae
(n=8; 15,4%), Asteraceae (n=7; 13,5%), Poaceae (n=3; 5,8%) e Solanaceae (n=2; 3,80%). The
plants used against kidney and urinary tract problems are among the most commonly used by
this population. As conclusion, it was possible to verify that this community, Marins, widely
uses medicinal plants to treat primary health problems, for the studied diseases group.
Keyworks: Ethnobotanic, Tropical Atlantic Forest, Rural community, Serra da
Mantiqueira
15
3. INTRODUÇÃO
O Brasil inclui-se entre os países de maior biodiversidade mundial,
com mais de 100 mil espécies de plantas superiores distribuídas em diversos biomas. Entre
estes biomas está a Mata Atlântica, com mais de 20 mil espécies de plantas, situada entre os
25 “hotspots” mais importantes do mundo (Myers et al., 2000).
Juntamente com a diversidade de recursos naturais, o Brasil possui
significativa diversidade de etnias e culturas que influenciam nossos hábitos cotidianos, em
especial no que diz respeito ao conhecimento e uso das plantas medicinais.
Os poucos maciços florestais que restam da Mata Atlântica no Estado
de São Paulo encontram-se distribuídos em locais de relevo acidentado, como a região da
Serra do Mar, Vale do Ribeira e a Serra da Mantiqueira, o que dificulta tanto o extrativismo
quanto a agricultura em larga escala, levando à preservação destes ambientes mesmo depois de
seguidos ciclos de exploração e expansão agrícola, sofridas por este bioma. Parte destas áreas
encontra-se atualmente em unidades de conservação criadas pela União e governos estaduais,
como Parques Estaduais e Áreas de Preservação Ambiental.
16
Neste contexto existem populações rurais que convivem com este
ambiente há séculos e detêm um rico conhecimento sobre os recursos naturais da Floresta
Atlântica. Com a intensa migração para maiores centros urbanos, que se observa no Brasil ao
longo do processo de industrialização e atualmente, verifica-se que este conhecimento
tradicional tende a se perder em decorrência da erosão cultural, visto que este conhecimento
não está documentado em livros e enciclopédias e sim guardado com pessoas; as quais em sua
maioria transmitem estas preciosas informações de forma oral, para pessoas de sua confiança,
geralmente membros de sua própria família. A migração ou êxodo rural das famílias que
compõem as comunidades rurais para áreas urbanas pode ser relacionada a vários fatores,
como a falta de políticas públicas que incentivem a permanência dos pequenos produtores no
campo e, principalmente, a falta de investimento em infra-estrutura como escolas de ensino
médio e superior e hospitais com atendimentos de emergência em bairros rurais.
Na Serra da Mantiqueira paulista esta realidade de erosão cultural vem
associada à escassez de estudos botânicos, tanto qualitativos quanto quantitativos, sobre
espécies de plantas de potencial medicinal, principalmente quando se fala de estudos
etnobotânicos. Nesse sentido, esta região necessita do desenvolvimento de estudos científicos
do ponto de vista botânico, social e cultural, para que o conhecimento popular possa vir a
contribuir ativamente para a preservação da biodiversidade local.
Órgãos mundiais como a Organização Mundial de Saúde (OMS), nas
últimas décadas vêm recomendando a utilização de plantas medicinais e incentivando países
em desenvolvimento a resgatar e validar cientificamente o conhecimento botânico tradicional
a respeito do uso de plantas medicinais na atenção básica a saúde. No Brasil, desde a década
de 80, foram criados documentos que visam a introdução de plantas medicinais e a fitoterapia
nos programas públicos de saúde. Dentro destes termos em 2003 foi criada a proposta de
inclusão de plantas medicinais e fitoterapia no Sistema Único de Saúde (SUS), com o objetivo
de garantir o acesso às plantas medicinais, fitoterápicos e serviços relacionados à fitoterapia,
com segurança, eficácia e qualidade, na perspectiva da integralidade da atenção à saúde para
os usuários do programa.
Neste sentido, estudos etnobotânicos que partem de levantamentos
sobre a utilização de plantas medicinais, na vida cotidiana de comunidades tradicionais,
17
podem contribuir para a descoberta de novas plantas e princípios ativos desconhecidos pela
ciência atual e para a conservação das plantas que são conhecidas e usadas e que futuramente
podem fazer parte da gama de plantas usadas nos programas públicos de saúde. Sendo assim, a
presente pesquisa parte de informações coletadas junto aos moradores do Bairro dos Marins,
que faz parte da APA da Serra da Mantiqueira, e tem como foco levantar o conhecimento
associado ao uso de plantas medicinais para doenças como hipertensão arterial,
hipercolesterolemia e problemas ligados aos rins e bexiga, visando inserir esta comunidade no
processo de discussão sobre a conservação da diversidade biológica local, no resgate de
informações a respeito de plantas medicinais nativas e futuramente, incentivar o uso destas
espécies como fonte alternativa de renda para o bairro.
18
4. OBJETIVOS
OBJETIVO GERAL
Realizar levantamento etnobotânico das plantas medicinais,
conhecidas e usadas, no controle do colesterol, pressão arterial e problemas renais por pessoas
que residem no Bairro dos Marins no Município de Piquete, SP.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS
1 Caracterização sócio-cultural junto aos moradores do bairro;
2 Verificar, no Bairro dos Marins, a ocorrência e a freqüência das
afecções objeto deste estudo;
3 Saber como os moradores reconhecem e nomeiam as doenças
estudadas;
4 Levantar e identificar quais espécies de plantas são conhecidas e
usadas pelos moradores no tratamento das afecções;
19
5 Levantar a forma de utilização das plantas medicinais no
tratamento das doenças;
6 Descrever e entender como funciona a troca de informação sobre
as plantas medicinais dentro do bairro.
20
5. REVISÃO DE LITERATURA
5.1. Diversidade humana e etnobotânica
Apesar de a espécie humana se adaptar às mudanças ambientais, assim
como outras espécies do planeta, atualmente existe tendência a considerar os seres humanos
desligados do meio ambiente, como se existissem fora do meio no qual eles vivem.
Recentemente estudos detalhados sobre a variabilidade da diversidade genética humana estão
disponíveis, porém os processos que geram esta diversidade ainda são mal compreendidos,
limitando-se a associações simples. Ainda não se tem compreensão integrada entre o meio
ambiente físico, biológico, cultural e os fatores subjacentes à variação biológica humana
(Garay e Becker, 2006). Compreender a dinâmica do meio ambiente em relação aos humanos
deve incluir os homens como parte integrante do sistema. Alguns atributos das culturas
humanas, a rotação de culturas agrícolas, por exemplo, representam solução aos problemas de
sobrevivência em determinados ambientes (Correa et al., 1996).
A percepção humana do meio ambiente é função dos laços entre
estímulos sensoriais, a estruturação cognitiva da informação e as modulações culturais,
produzindo experiências e valores relativos a este meio ambiente. Existem ainda os processos
21
psicológicos, as tradições sociais e valores culturais que afetam profundamente a percepção
dos indivíduos em relação às espécies de um dado ecossistema (Garay e Becker, 2006).
A diversidade cultural manifesta-se pela diversidade da linguagem, das
crenças religiosas, das práticas de manejo da terra, na arte, na música, na estrutura social, na
seleção de cultivos agrícolas, na dieta e em todos os demais atributos da sociedade humana
(Correa et al., 1996). A diversidade cultural ajuda o ser humano em sua necessidade de
permanente adaptação a novas condições ambientais, ditadas pela mutação permanente do
processo evolutivo da Terra. Assim, estudar as relações entre sociedade - natureza,
compreende também estudar a biodiversidade humana.
Dentro das Ciências Sociais, destacam-se autores que realizaram
estudos antropológicos, com enfoques na inter-relação de fatores culturais e ambientais, como
Steward (1948) que propôs a ecologia cultural e Bookchin (1980) que criou a antropologia
ecológica ou neo-funcionalista, as duas correntes de pensamento contribuíram e contribuem
ainda para entender a complexa relação entre homem/ambiente.
Dentro desta perspectiva surgem os Etnocientistas, que enfocam o
estudo do conhecimento das populações humanas sobre os processos naturais, como o
antropólogo Lévi-Strauss (1989) que analisou os sistemas de classificação indígena, Darcy e
Berta Ribeiro (1986) que publicam a Suma etnológica brasileira, que se torna um marco
importante para a etnociência no Brasil (Diegues e Arruda, 2001).
Deste modo, as etnociências foram recebendo conceitos de outras
ciências, construindo métodos e teorias. Dentro das etnociências destacam-se a etnobiologia e
a etnoecologia, disciplinas que se posicionam numa interface com as tradicionais disciplinas
da academia, e podem efetivamente contribuir para os debates científicos atuais relativos a
diversidade biológica e cultural (Albuquerque et al., 2006).
Para Albuquerque (2002), esse tipo de pesquisa rompe, de certa forma,
com o discurso contemporâneo da ciência, principalmente quando postula que tanto as
técnicas tradicionais como o conhecimento botânico popular, não são primitivos e inferiores;
que o conhecimento tradicional botânico, como modo distinto de aprendizado, também é
forma válida de conhecimento.
22
A etnobiologia é o estudo do papel da natureza no sistema de crenças e
da adaptação do homem a determinados ambientes. Relaciona-se com a ecologia humana, mas
enfatiza as categorias e conceitos cognitivos utilizados pelos povos em estudo (Posey, 1986).
Segundo Martin (1995), o termo etnoecologia é utilizado cada vez
mais no sentido de se contemplar todos os estudos que descrevem a interação das populações
locais com o meio ambiente natural, incluindo disciplinas relacionadas, tais como a
etnobiologia, a etnobotânica, a etnoentomologia e a etnozoologia. A etnobotânica é a parte da
etnoecologia que se refere às plantas, relacionando a antropologia à botânica, mas também
envolve outras disciplinas. Recentemente, a etnobotânica tem propiciado maior entendimento
da ecologia envolvida no uso de plantas (Prance, 1995).
Tradicionalmente, os etnobotânicos têm dirigido seus esforços aos
objetivos da botânica econômica, a qual busca novidades de produtos naturais com valor
comercial, a maior parte das vezes para o benefício de países desenvolvidos. Desde o final dos
anos 60, alguns etnobotânicos foram recriando e modificando estas primeiras metas dirigindo
sua atenção na aplicação de seus estudos para problemas de conservação e desenvolvimento
(Martin, 1995).
Neste contexto, verifica-se que estudos etnobotânicos podem
contribuir para à compreensão e à preservação da diversidade cultural humana, que engloba
processos complexos e dinâmicos sempre em transformação dentro das inúmeras sociedades
existentes. Dentro de pesquisas onde as plantas medicinais e suas propriedades terapêuticas
são o foco, a etnobotânica pode elucidar questões ligadas aos critérios e ferramentas que
levam os grupos humanos a escolher determinadas espécies de plantas em detrimento de
outras, assim como pode contribuir no entendimento das escolhas destes grupos na forma de
preparo e manejo das plantas e como esta forma de manejo pode ou não afetar a quantidade e
qualidade das substancias ativas que levam a cura. Trabalhos etnobotânicos devem também
apoiar e justificar a manutenção das culturas tradicionais e em alguns casos, subsidiar a
reprodução de práticas de manejo dos recursos naturais feito por estas comunidades que
interagem com o ambiente usando tecnologias adaptadas a realidade local que preservam e
enriquecem o meio ambiente. Ainda nesta perspectiva estudos com populações rurais e locais,
podem contribuir para ações práticas como planos de manejo de unidades de conservação, e na
23
criação de leis ambientais em que o homem faça parte do ecossistema, lembrando a
importância das comunidades tradicionais na conservação das Florestas tropicais.
5.2. Estudos etnobotânicos realizados na Mata Atlântica
Vários estudos abordam o tema Etnobotânica em áreas da Mata
Atlântica. Costa (2002) registrou dados etnobotânicos enfocando o uso de plantas medicinais
por cinco curandeiros em três comunidades no município de Iporanga, Vale do Ribeira, Estado
de São Paulo. Foram descritas 114 espécies e dessas, a maioria era extraída da flora local. A
autora salienta a importância da compreensão do conhecimento tradicional para que se criem
projetos adequados de saúde pública.
Silva (2003), em estudo etnobotânico com plantas medicinais em um
bairro rural de Piquete –SP conduzido por meio de entrevistas semi-estruturadas, catalogou
121 plantas medicinais utilizadas para diferentes fins. Dessas, 50 são plantas exóticas e
cosmopolitas introduzidas e 71 são nativas. A autora recomenda que sejam realizados mais
estudos nessa área, um antigo caminho do ouro e tropas do século XVIII e XIX que se situa
dentro da APA da Mantiqueira.
Vasconcellos (2004) realizou estudo etnobotânico sobre o uso de recursos
vegetais nos terreiros de uma comunidade quilombola do Vale do Ribeira –SP. Neste estudo
foram descritas 260 plantas representadas por 73 famílias botânicas, sendo estas pertencentes às
202 espécies identificadas. A maior parte das espécies é cultivada, de ocorrência de fora da Mata
Atlântica e a categoria de uso principal foi alimentar, com 40,21%, seguida de medicinal com
29,18%.
Pinto et al. (2004) em pesquisa feita sobre plantas medicinais em
comunidades rurais em área de Mata Atlântica localizada em Itacaré – BA, verificaram que a
população tem usado plantas medicinais como uma importante atividade terapêutica. Foram
entrevistadas 26 famílias. Os autores verificaram que a parte da planta mais usada pela
comunidade para os preparados medicinais são as folhas. O total de plantas coletadas foi de 98
espécies pertencentes a 40 famílias botânicas.
24
Hanazaki et al. (1996) comparam a diversidade de uso de plantas em duas
comunidades caiçaras da Floresta Atlântica (na Ponta da Almada e na praia de Camburí). Foram
feitas 102 entrevistas, sendo citadas 227 etnoespécies de plantas, principalmente utilizadas para
alimentação, medicina, ferramentas e madeiras para construção de casas e canoas. Usando índices
de diversidade, os autores comparam os usos das plantas entre as comunidades estudadas, entre os
gêneros e as categorias da idade. Encontraram diferenças quantitativas no conhecimento sobre
plantas entre categorias do gênero para cada tipo do uso (medicinal, alimento e ferramentas). Os
entrevistados mais velhos e mais novos também apresentaram conhecimento diferente sobre
plantas para ferramentas e medicinais, mas não para plantas usadas para construção.
A mesma autora em 2006 realizou estudo etnobotânico de uma população
rural próxima do Parque Estadual Carlos Botelho, SP, no qual foram analisados os usos de
recursos vegetais em uma região próxima a uma área de conservação, sendo entrevistados 58
habitantes. Foram mencionadas 248 etnoespécies, correspondendo a mais de 200 espécies
botânicas. As plantas foram agrupadas em quatro habitats (A = floresta bem preservada; B =
floresta perturbada, em estágios sucessionais avançados; C = ambientes recentemente perturbados;
D = áreas cultivadas e quintais). Uma maior diversidade foi encontrada para o habitat A, seguido
por C+D, e finalmente por áreas da categoria B; entretanto, era esperada uma riqueza maior de
espécies para a área B quando comparada a C+D. Há poucas espécies comuns, e proporções
comparáveis de espécies intermediárias e raras, para todos os habitats. As espécies comuns
ocorrem em todos os tipos de habitat. A autora concluiu que o conhecimento local das plantas dos
habitats bem preservados foi mais diverso do que para plantas de outras áreas, sugerindo que a
relação entre habitantes e a área de conservação é ainda intensa.
Zeni & Bosio 2006, estudaram plantas medicinais usadas na
comunidade rural de Nova Rússia, município de Blumenau-SC em área ocupada por Mata
Atlântica onde foram feitas 48 entrevistas. Foram coletadas e identificadas 110 espécies de
plantas, pertencentes a 49 famílias e a 98 gêneros. Muitas destas plantas são cultivadas ou
cresceram espontaneamente em diversos ambientes.
Estas pesquisas mostram que populações tradicionais apresentam um
conhecimento refinado do ambiente em que vivem, podendo contribuir na prática com estratégias
comunitárias de conservação da diversidade ecológica dos ecossistemas em que estão inseridas.
25
O saber popular na região da Mata Atlântica como um todo e as
plantas medicinais sempre foram objeto de estudos etnobotânicos, porém não se pode esquecer
que algumas áreas de preservação deste importante bioma, como a Serra da Mantiqueira,
foram negligenciadas quando se trata de estudos etnobotânicos. Esta região necessita ser mais
bem estudada para que o conhecimento popular não se perca, pois este, propicia elementos
para alternativas de subsistência e para a conservação da biodiversidade local.
5.3. Mata Atlântica
A Floresta Atlântica designa um complexo vegetacional que, embora
dominado pela Floresta Pluvial Montana, engloba vários tipos muito díspares. A Floresta Atlântica
é de altitude, localiza-se sobre a imensa cadeia montanhosa litorânea, que corre ao longo do
oceano Atlântico, desde o Rio Grande do Sul até o Nordeste; e sua área central reside nas grandes
serras do Mar e da Mantiqueira, abrangendo os Estados de São Paulo, Minas Gerais, Rio de
Janeiro e Espírito Santo (Rizzini, 1979). As várias formações florestais e ecossistemas associados
à Mata Atlântica são definidas como Floresta Ombrófila Densa, Floresta Ombrófila Mista,
Floresta Ombrófila Aberta, Floresta Ombrófila Estacional Decidual, Floresta Ombrófila Estacional
Semidecidual, manguezais, restingas, campos de altitude e brejos interioranos (Diegues et al.,
1995).
Situada entre as coordenadas geográficas 22
o
30’ a 23
o
00’ de latitude Sul
e 44
o
30’ a 46
o
00’ de longitude Oeste, a Serra da Mantiqueira abrange áreas dos Estados de Minas
Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro. Os Campos de Altitude são uma de suas formações vegetais
predominantes. Ocorrem em elevações superiores a 1800 metros e em linhas de cumes localizadas.
São caracterizados por uma ruptura na seqüência natural das espécies de formações
fitofisionômicas que os precedem, a mata nebular e mata pluvial costeira. As comunidades
florísticas, próprias desses locais, são influenciadas por variações particularíssimas dos fatores
ecológicos abióticos na região. Característica importante é o fato destas abrigarem numerosos
casos de endemismos, tanto de habitat quanto de endemismos de biótipos (Capobianco, 2001
apud Silva, 2002 2001).
26
A Área de Proteção Ambiental (APA) da Mantiqueira (Figura 1), é
uma unidade de conservação federal, criada através do Decreto n
o
91.304 de junho de 1985, e
abrange vários municípios de São Paulo e Minas Gerais, incluindo também Resende, no
estado do Rio de Janeiro. Em São Paulo os seguintes municípios estão incluídos na APA da
Mantiqueira: Campos do Jordão, Cruzeiro, Lavrinhas, Pindamonhangaba, Piquete, Santo
Antônio do Pinhal, Queluz, São Bento do Sapucaí, Tremembé, Guaratinguetá e Lorena
(SEMA, 1998).
Figura 1 - Mapa de cobertura da Área de Proteção Ambiental da Serra da Mantiqueira
(
www.ibama.gov.br/siucweb/unidades/tst.php?cod_uc=apa/mapasucs/37, modificado pela autora).
Segundo o Dossiê Mata Atlântica, a Serra da Mantiqueira é
considerada uma das áreas prioritárias para conservação da Mata Atlântica, destacando-se no
lado paulista os municípios de Queluz, Lavrinhas, Cruzeiro, Piquete, Campos do Jordão, São
Bento do Sapucaí, Santo Antônio do Pinhal, Monteiro Lobato, Igaratá, Santa Izabel, Nazaré
Paulista, Joanópolis e Bragança Paulista (Capobianco, 2001 apud Silva, 2002)
27
Para Ming (2005), a APA da Serra da Mantiqueira é uma importante
área de conservação na região sudeste brasileira, envolvendo formações vegetais e
ecossistemas associados ao Domínio da Mata Atlântica como Floresta Ombrófila Densa
Sub-Montana a Alto-Montana, além de áreas com Campos de Altitude, apresentando uma
vegetação com alta heterogeneidade florística e estrutural, devido à variedade de altitudes,
climas e outros fatores ambientais. Segundo Correa (2006), na referida APA também
persistem formas de cultura tradicional de grande interesse e diversidade, sociedades que
vivem segundo tradições indígenas e ibéricas de enorme importância cultural e antropológica.
O clima, de acordo com Köppen, é classificado como subtropical de
altitude, úmido a super-úmido. A temperatura média anual oscila entre 12
o
a 18
o
C, chegando
próximo de zero no inverno (Fravin, 1983), fator que contribui para atrair o interesse turístico
pela região.
Segundo Neves (2004), em Campos do Jordão, um dos principais
centros receptores turísticos da região da Serra da Mantiqueira, a ocupação do solo tem sido
responsável pelas transformações na área, sendo esse processo associado à dinâmica
demográfica do município. Grandes áreas de preservação permanente, como maciços
florestais, foram suprimidas devido à expansão demográfica. Atribui-se esse fato ao histórico
processo de ocupação do município e posterior expansão da construção civil decorrente do
desenvolvimento turístico que trouxeram, assim, conseqüências impactantes ao meio ambiente
local. A ameaça também se dá ao patrimônio étnico e cultural, ou seja, as comunidades
tradicionais, que por séculos convivem com o ambiente local, retirando da mata e seus
ecossistemas associados, sem destruí-los, os recursos básicos para sua vida. Este patrimônio é
composto de conhecimentos sobre a floresta e seus ciclos, o valor de suas madeiras, fibras,
folhas e frutos, a variedade de suas plantas medicinais e um conjunto excepcional de ritos,
mitos e manifestações artísticas que corre risco de desaparecimento, junto com essas
comunidades, cada vez mais ameaçadas em seus locais e restritas em suas atividades.
Assim, estratégias que contemplem a conservação de ecossistemas
tropicais, como a Floresta Atlântica, devem agregar aspectos econômicos, sociais e culturais
concretos, tais como manutenção e regularização dos mananciais hídricos que abastecem as
grandes cidades, conservação da diversidade existente para uso futuro (especialmente espécies de
28
interesse medicinal) e exploração sustentável dos recursos florestais múltiplos (mel, madeira,
palmito, plantas ornamentais, plantas medicinais, espécies frutíferas, etc.) (Reis et al., 2000).
O estudo do uso de plantas para vários fins nas comunidades
tradicionais está se tornando uma necessidade urgente, especialmente no mundo tropical. Tais
comunidades vêm sofrendo crescentemente pressões econômicas e culturais da sociedade
envolvente, com conseqüências funestas para as suas culturas tradicionais. O conhecimento
acumulado por essas populações, através de séculos de contato estreito com seu meio
ambiente, viria enriquecer bastante o pouco que ainda sabemos sobre a utilização da flora
tropical (Amorozo & Gely, 1988).
A sociedade rural que compõe o Bairro dos Marins vem convivendo
com a Mata Atlântica há pelo menos um século e tem amplo conhecimento das espécies que
compõe este bioma, tanto no que diz respeito às plantas medicinais quanto às plantas usadas
para construção, artesanato e para lenha. Esta relação de proximidade com o ambiente tem
sido perdida ao longo do tempo, principalmente devido às leis ambientais de proteção da Mata
Atlântica, que em sua maioria não são compreendidas pelos moradores locais. É preciso
lembrar que não só as florestas tropicais estão desaparecendo rapidamente como também as
populações tradicionais que nelas habitam. Junto com essas comunidades perde-se um rico
conhecimento acumulado durante anos de experimentações junto à vegetação que a rodeia.
Atualmente se torna imprescindível colocar as populações
locais/rurais, nas discussões junto aos órgãos que regulamentam as políticas de conservação e
preservação da biodiversidade, dentro dos biomas onde elas se inserem, para que tanto a
diversidade de espécies da fauna, flora e microrganismos sejam preservadas, quanto as
diversas culturas que compõe a história e a identidade brasileira.
29
5.4. O Vale do Paraíba Paulista
O Vale do Paraíba Paulista (Figura 2) é uma das mesorregiões pertencentes ao Estado de São
Paulo. A região administrativa é composta por 39 municípios e sua sede é a cidade de São José
dos Campos. Segundo a Fundação SEADE
(
http://www.seade.gov.br/produtos/perfil/perfil.php, acessado em 13 de agosto de 2006),
atualmente o Vale do Paraíba Paulista detém 6% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional,
devido principalmente à industrialização e às exportações.
Ao longo dos últimos séculos, o Vale do Paraíba sofreu grande
degradação ambiental por estar inserido, entre os dois maiores pólos urbanos do país, São
Paulo e Rio de Janeiro. Uma serie de ciclos de exploração agrícola, como o café, substituído
pela agropecuária, fez com que a derrubada da Mata Atlântica se processasse de forma
drástica. Segundo Vieira et al. (2002), devido à pressão antrópica restam apenas 4% de sua
formação florestal primária. Esses remanescentes situam-se principalmente ao longo das
serranias costeiras devido à dificuldade que o acentuado declive oferece ao uso da terra e ao
corte das madeiras.
30
Figura 2 – Mapa dos Municípios do Vale do Paraíba Paulista.
(www.
http://www.cidadeaparecida.com.br/aparecida/municipio/cidade/mapa.htm, modificado
pela autora).
Tendo em vista a importância de ser citada a referência bibliográfica
de dados históricos, chama-se a atenção para os seguintes parágrafos: (1º parágrafo desta
página até o 4º parágrafo da página 31), são dados obtidos por meio de revisão histórica feita
pela ONG que tem sua sede em Piquete – Fundação Christiano Rosa, a partir de fontes e
registros históricos do Vale do Paraíba Paulista, que se encontram catalogados e revisados no
acervo da coleção dessa Fundação.
Historicamente, a primeira entrada pelo Vale do Paraíba partiu de São
Paulo em outubro de 1596, comandada por João Pereira de Souza Botafogo. Esta expedição
tinha como missão encontrar uma serra lendária, resplandecente – uma montanha de prata –
que os índios afirmavam existir na região. Assim, a expedição transpõe a Mantiqueira, se
perde nas vertentes do rio Sapucaí e nada encontra. Em 1601, é organizada uma segunda
31
entrada, comandada por André de Leão, partindo de São Paulo atravessando o Vale. Em 1621
acontece a terceira expedição, comandada por Martin Corrêa de Sá, que entra por Parati,
seguindo trilhas indígenas. A região, nessa época, era habitada pelos Puri, descritos por vários
viajantes e naturalistas europeus que passaram pelo Vale do Paraíba nos séculos XVIII e XIX,
como nômades, vivendo da caça e da pesca, da colheita de mel, frutos silvestres e extração do
palmito e raízes. À medida que os colonizadores ocupavam essas terras, os Puri foram
gradativamente sendo expulsos da margem direita do Paraíba e acuados para as matas virgens
das encostas Mantiqueira, onde foram caçados.
O primeiro núcleo de povoamento do Vale do Paraíba se consolidou
em 1645 e recebeu o nome de São Francisco das Chagas de Taubaté. Já em 1651, foi instalada,
pelo Capitão Domingos Luiz Leme, a Vila de Santo Antônio de Guaratinguetá. Dentro desse
território encontravam-se as terras que mais tarde comporiam o município de Piquete.
A busca por metais valiosos, principalmente o ouro, levou expedições
provenientes de Taubaté a avançarem pela Serra da Mantiqueira, atravessando a garganta do
Embaú para atingirem finalmente o planalto mineiro.
Em 1703, o taubateano Miguel Garcia Velho, à frente de uma
bandeira, descobriu as minas de “Caxambu” e “Itagybá”, hoje município de Delfim Moreira.
No entanto, essas minas eram pobres e logo se esgotaram. Todavia, a força do bandeirismo
começara a definhar após 1750. Com a abertura de novos caminhos nas Minas Gerais e a
conseqüente diminuição do comércio no território Valeparaibano, Lorena assim como
Guaratinguetá e Pindamonhangaba instalaram engenhos de açúcar e aguardente, aproveitando
a grande quantidade de escravos dispensados da mineração, época que provocou o urbanismo
mais racional das Vilas e Freguesias. Esse dinamismo foi viabilizado principalmente por
Lázaro Fernandes que abriu caminho para negociar os produtos de sua lavoura com o arraial
serrano. Logo, novos moradores foram atraídos para a localidade: os Silva Ramos, Gonçalves
da Silva e Gonçalves de Carvalho, de Guaratinguetá, os Ramos da Silva e os Bicudo de
Pindamonhangaba, e os Rodrigues Ramos, de Taubaté.
Devido à necessidade de descoberta de novos caminhos para as minas,
foi aberta uma “picada” cruzando a serra dos Marins. Esse caminho passou a ser trilhado então
pelos tropeiros que desciam com a produção rural sul-mineira e subiam com os produtos
32
valeparaibanos e litorâneos, principalmente o sal. O caminho dos Marins era na verdade, uma
trilha que passava por desfiladeiros, colocando em risco homens e animais. Isso levou a
Câmara de Lorena a determinar, em janeiro de 1862, a construção da estrada dos Marins.
Apesar de penoso e longo, esse caminho serrano era cheio de vida e movimento. Muitas
famílias foram se instalando às suas margens. Uma capela sob a invocação de Nossa Senhora
Aparecida foi construída, em regime de mutirão, e passou a aglutinar os moradores dando
origem ao bairro dos Marins (Fundação Christiano Rosa, 2000).
Entra em cena então a figura do “caipira”, definida por Diegues & Arruda
(2001), como sitiantes, meeiros e parceiros em pequenas propriedades, nas quais desenvolvem
atividades agrícolas e de pecuária, cuja produção se dirige para a subsistência familiar e para o
mercado. Porém, a pequena propriedade caipira, segundo os autores, tende a ser incorporada pela
grande propriedade, e somente têm conseguido subsistir em nichos onde a mecanização agrícola
não pôde avançar, como nas áreas montanhosas de Mata Atlântica e da Serra do Mar.
As famílias que compõem o Bairro dos Marins, começaram uma
agricultura itinerante, que derrubava e queimava novas glebas de mata para roça combinada
com a caça, pesca e coleta. Em virtude da dispersão do povoamento existem, de um lado,
famílias vivendo isoladas e de outro, algumas agrupadas, formando o bairro rural. A herança
deixada pelo processo de povoamento e ocupação do Vale do Paraíba na sociedade que
compõe o Bairro é formada principalmente pelos laços de parentesco arraigados onde apenas
alguns sobrenomes aparecem na comunidade, muitos deles vindos de figuras ilustres que
compuseram as Bandeiras. Outro aspecto importante a ser citado é a ascendência tropeira dos
moradores que até hoje é lembrada com orgulho e festejada pelos moradores mais antigos do
Bairro. Essa herança cultural está implícita no cotidiano do Bairro tanto no que diz respeito a
prática hortícolas de manejo quanto no conhecimento dos ciclos naturais da Floresta
Atlântica, neste sentido se faz urgente um estudo aprofundado das características sociais,
econômicas e culturais dessa sociedade.
33
5.5. Plantas medicinais e as doenças escolhidas neste estudo
Plantas medicinais são plantas que têm atividade biológica, possuindo
um ou mais princípios ativos úteis à saúde humana (Veríssimo, 2002). Segundo Shrestha &
Dhillion (2003), mais de 60% da população do mundo, e 80% da população de paises em
desenvolvimento, dependem diretamente de plantas para fins medicinais.
Acredita-se que a utilização de plantas medicinais como terapia
preventiva e curativa seja tão antiga quanto o próprio homem. Os inúmeros medicamentos
atualmente utilizados são resultantes do conhecimento tradicional, oriundo de diversas
populações em todo o mundo (Martin et al., 1994).
Segundo um estudo realizado pelo Programa das Nações Unidas para o
Meio Ambiente em 1997, cerca de 119 substâncias químicas em estado puro, extraídos de
aproximadamente 90 espécies de plantas, são utilizadas nos produtos farmacêuticos e por volta
de 21 mil nomes de plantas têm sido identificados para usos medicinais em todo o mundo
(Rojas, 2005) Ainda segundo o autor calcula-se que 35 mil espécies são usadas para fins
medicinais em todo o mundo, no qual se inclui o maior espectro de biodiversidade utilizado
pelos seres humanos.
O uso de plantas medicinais pela população mundial tem sido muito
significativo nos últimos tempos. Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) 2000,
mostram que cerca de 80% da população mundial fez uso de algum tipo de erva na busca de
alívio de alguma sintomatologia dolorosa ou desagradável. Desse total, pelo menos 30% deu-
se por indicação médica.
De acordo com Hellman (1994), as definições de saúde e doença
variam entre indivíduos, grupos culturais e classes sociais. Na maioria dos casos a saúde
significa muito mais do que ausência de sintomas desagradáveis. Segundo o autor, a OMS,
define como “um estado de completo bem estar físico, mental e social, e não simplesmente a
ausência de doença ou enfermidade”.
Para Alexiades (1996), os sintomas referem-se à uma experiência
pessoal e social de se estar doente e, como tal, é socialmente construída. Nesse contexto, as
34
plantas medicinais são usadas para tratar sintomas e não apenas as doenças. Segundo Matos
(2000), a percepção de que algo presente nas plantas pode causar reações no organismo
humano que contribua para o bem-estar ou para a cura de enfermidades data de tempos
imemoriais.
A hipertensão é o principal fator de risco para o desenvolvimento de
acidente vascular cerebral (AVC) e insuficiência renal (Rosendorff et al., 2007). A hipertensão
arterial sistêmica é definida como uma entidade clínica na qual o indivíduo apresenta níveis
elevados de pressão arterial que conferem um significativo aumento do risco de eventos
cardiovasculares e renais da população mundial, muitos deles podendo ser prevenidos pelo
precoce e adequado tratamento dessa doença justificando uma programação terapêutica a curto
e longo prazo.
De acordo com o Ministério da Saúde em 1988,
(
www.portal.saude.gov.br, acessado em 20 de janeiro de 2007), foram realizados os primeiros
estudos no Brasil que demostravam que a mortalidade por Acidente Vascular Cerebral era
bastante alta, sendo que em 1985 ocorreram 73.205 óbitos por estas afecções (9,3% do total de
óbitos). Para o mesmo ano, 7,9% dos óbitos foram devidos à doença isquêmica do coração
(doença coronária). Já para o Estado de São Paulo no mesmo ano, a proporção de óbitos por
doença coronária era ligeiramente superior (11,2%) à de óbitos por AVC (10,6%). Segundo
Neto et al. (1990), o fator de risco mais fortemente associado com os AVCs é a hipertensão
arterial sistêmica (HAS).
O manual de cardiologia da Sociedade Brasileira de Cardiologia
(www.sbc.org.br), chama atenção para estudos americanos que mostram que a prevalência da
HAS aumenta progressivamente com a idade em ambos os sexos. Estudos recentes realizados
para verificar a HAS no Brasil, demonstram uma prevalência de 26% na população geral
adulta, variando conforme o estudo e a localidade pesquisada de 22,3% até 44%. Os
segmentos sociais mais pobres são os que possuem maior prevalência de hipertensão e
também de complicações como acidentes vasculares. As regiões rurais apresentam menor
prevalência de hipertensão em relação à metropolitana. O índice de prevalência de hipertensão
varia numa mesma população de determinada origem conforme ocorrem migrações, portanto o
ambiente é um importante fator determinante. A urbanização, os hábitos sociais e a atividade
35
profissional são determinantes maiores. Pela natureza assintomática desta doença, a maioria da
população hipertensa não é diagnosticada, até apresentar o seu primeiro evento cardiovascular.
Segundo Gonçalves et al. (1980), os níveis de pressão arterial variam
amplamente, tanto de indivíduo para indivíduo, como para o mesmo indivíduo, na
dependência da idade e das condições emocionais e físicas em que o registro desta variável é
realizado. De acordo com os mesmos autores, a prevalência da hipertensão é tanto maior
quanto mais elevada for a ingestão de sódio. Existem ainda evidências mostrando correlação
entre a freqüência da doença e o grau de obesidade. Finalmente, é bem estabelecido que a
prevalência da hipertensão é decididamente maior entre indivíduos com antecedentes
familiares de hipertensão, demonstrando inequivocamente a importância do fator genético.
Ainda segundo Gonçalves et al. (1980), a presença do colesterol está
intimamente relacionada à hipertensão, já que o mesmo se adere às paredes dos vasos sangüíneos,
dificultando a passagem do sangue e sua chegada aos diferentes órgãos do corpo, inclusive o
coração. A doença coronariana, principal causa do infarto no coração, pode estar relacionada ao
aumento dos níveis de colesterol no sangue.
O colesterol é um tipo de gordura presente no organismo e nos alimentos
de origem animal utilizada pelo organismo para a produção de alguns hormônios. Existem dois
tipos de colesterol: “bom” colesterol (HDL = Lipoproteína de alta densidade), importante para as
funções do organismo, e “mau” colesterol (LDL = Lipoproteína de baixa densidade).
Muitos fatores podem contribuir para o aumento do colesterol, como
tendências genéticas ou hereditárias, obesidade e atividade física reduzida, porém, um dos
fatores mais comuns é a dieta.
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), o Brasil está entre
os países com índices de colesterol mais elevados do mundo. Estudos recentes (2004-2006)
desenvolvidos pela Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC)/Funcor S.n.t em parceria com o
laboratório AstraZeneca, alertam que um em cada cinco brasileiros tem taxas colesterol acima
de 200 mg/dl, nível considerado perigoso pelas entidades internacionais de saúde. Ou seja,
cerca de 38,9 milhões de pessoas têm colesterol alto no país. Este projeto chamado Corações
do Brasil que teve início em 2004 percorreu 74 cidades de Norte a Sul do país, mobilizou mais
36
de 800 profissionais de saúde e mediu o colesterol de 1239 pessoas. Outros números que
chamam a atenção na pesquisa demonstram que quase um terço da população entre 45 e 54
anos, faixa etária mais propensa a eventos cardiovasculares graves, tem colesterol acima de
200 mg/dl. A pesquisa alerta ainda que, 8% das pessoas até 24 anos ultrapassaram esse limite.
Além do colesterol, as doenças ligadas aos rins também se relacionam
à hipertensão, posto que um dos fatores que regulam a pressão arterial é o mecanismo renal de
regulação dos fluidos corpóreos. Os rins desempenham papel fundamental no controle da
pressão arterial, não só por serem responsáveis pela excreção de sódio ingerido, mas também
por serem os órgãos produtores de renina, enzima importante na produção de angiotensina II,
potente substância hipertensora (Gonçalves et al., 1980).
Ainda segundo Gonçalves et al., 1980, os diuréticos têm sido
utilizados com sucesso no controle da pressão arterial. Essas drogas provocam depleção
crônica de sal e água, diminuindo o volume plasmático e conseqüentemente a pressão arterial,
tornando sua musculatura menos responsiva aos estímulos hipertensivos naturais e mais
sensível a outros hipotensores associados à terapêutica.
Nesse contexto, de busca por uma medicina mais natural na cura dos
males as plantas medicinais ganharam destaque nacional e internacional nos últimos anos. O
Brasil é o país de maior biodiversidade do planeta que, associada a uma rica diversidade étnica
e cultural que detém um valioso conhecimento tradicional associado ao uso de plantas
medicinais, tem o potencial necessário para desenvolvimento de pesquisas que resultem em
tecnologias e terapêuticas apropriadas.
De acordo com Santos (2006), nos últimos anos tem crescido muito a
preferência pelo uso de medicamentos fitoterápicos, cuja demanda tem estimulado, inclusive,
o surgimento de vários programas estaduais e municipais voltados para pequenos (as)
produtores (as) rurais, comunidades e Saúde Pública.
As plantas medicinais dentro das estratégias de sustentabilidade, têm
um papel bastante interessante, pois, sendo um recurso natural, culturalmente mantido, de
grande importância para a manutenção da saúde local, com potencialidades para um benefício
mais amplo (pela descoberta de novos fármacos, por exemplo), constitui-se num significatico
37
instrumento para as políticas conservacionistas, pela possibilidade do resgate da diversidade
cultural, aliada à conservação da diversidade biológica (Kubo, 1997).
Neste estudo foram escolhidas três doenças que se relacionam entre si
e cuja prevenção e cura estão intimamente ligadas aos hábitos de vida dos pacientes. Dentro
dos hábitos adotados pelos pacientes estão as plantas medicinais usadas para cada tipo de
doença. Estas plantas nem sempre são indicadas por médicos ou por outros profissionais da
área da saúde; em sua maioria são plantas escolhidas com base em experiências e resultados
benéficos visto pelos pacientes ou por pessoas próximas a eles. Esta gama de plantas merece
ser estudada de forma científica para que este conhecimento tradicional possa ser catalogado e
validado de modo que venha a contribuir futuramente para que os moradores do Bairro dos
Marins tenham a garantia do resultado benéfico das plantas de sua farmacopéia, e para que
estas possam vir a ser uma alternativa segura de menor custo e de maior acessibilidade para a
substituição dos fármacos hoje usados pela maioria dos pacientes que sofrem destas doenças.
38
6. MATERIAL E MÉTODOS
6.1. Área de Estudo
6.1.1. Caracterização do Município de Piquete
A cidade de Piquete localiza-se no Estado de São Paulo, na região do
Vale do Paraíba, encravada aos pés da Serra da Mantiqueira, na divisa com o Estado de Minas
Gerais, com área total de 16.600 ha, dividida em 2.515,4 ha de área urbana e 14.084,6 ha de
área rural. (
www.ibge.gov.br/cidadesat, acessado em 28 de outubro de 2006).
O Município é conhecido como “cidade paisagem” por ser cercado por
elementos de grande beleza cênica que fazem parte da Serra da Mantiqueira, como o Focinho
do Cão e o Pico dos Marins (Figura 3).
39
6.1.2. Histórico econômico do município de Piquete
Segundo o Plano de Microbacia Hidrográfica realizado em 2004 pela
Secretaria de Agricultura e Abastecimento o Município de Piquete era exclusivamente agrícola até
o final do século XIX, produzindo grandes e variadas quantidades de produtos. O café sobressaía,
seguido pelo fumo e os bairros rurais eram bem povoados, não havendo alta concentração
populacional na cidade. No início do século XX, em 1904, é construída no município uma
fábrica de pólvoras, provocando grandes transformações socioeconômicas. Os trabalhadores
da lavoura foram transportados para a fabricação de produtos químicos, observando-se um
intenso êxodo rural e fazendo com que a agricultura entrasse em decadência. Logo depois,
passa a se desenvolver a pecuária mista como uma opção de atividade, pois não exigia mão-
de-obra intensiva.
Ainda segundo a Secretaria de Agricultura e Abastecimento, a fábrica
de pólvora ditava a vida do município, abastecendo com altos subsídios seus funcionários,
colaborando para o enfraquecimento da produção agrícola da cidade. Nos últimos 30 anos, a
fábrica de pólvora, hoje Indústria de Material Bélico Fábrica Presidente Vargas (IMBEL –
FPV), vem sofrendo acentuada decadência, ocasionando uma alta taxa de desemprego.
Atualmente a agricultura se mostra decadente, com dificuldades de mão-de-obra, tanto
quantitativamente quanto qualitativamente. Os plantios se reduziram a pequenas áreas com
milho (Zea mays L.), feijão (Phaseolus vulgaris L.), batata (Solanum tuberosum L.), cana-de-
açúcar (Saccharum officinarum L.) e a pecuária, em sua maioria com criação de gado holandês
e mestiço para produção de leite e corte. As técnicas de produção usadas são bastante
rudimentares e os pequenos produtores sofrem com o baixo preço do leite, o que tem
estimulado a procura por alternativas econômicas mais viáveis. (Plano de microbacia
hidrográfica, 2004).
Em levantamento realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística no ano de 2000 (IBGE), a população do município, é subdivida em 14.191 (quatorze
mil cento e noventa e um) habitantes na zona urbana e 987 (novecentos e oitenta e sete) habitantes
no perímetro rural, totalizando 15.178 (quinze mil cento e setenta e oito) habitantes, sendo 7.761
mulheres e 7.417 homens (
www.ibge.gov.br/cidadesat, acessado em 28 de outubro de 2006).
40
O número médio de pessoas por família, em domicílios particulares, é
de quatro moradores, em 3.871 (três mil oitocentos e setenta e uma) residências
aproximadamente. A renda familiar do município gira em torno de um a dois salários mínimos
por mês.
6.1.3. Bairro dos Marins
O Bairro dos Marins faz parte da zona rural do município de Piquete,
ocupando a porção central média do Rio Paraíba do Sul, conhecida como Microbacia
Hidrográfica do “Ribeirão do Passa Quatro” e possui um grande número de nascentes,
córregos e riachos concentrados numa pequena área geográfica. O Bairro se situa a 15
quilômetros da cidade de Piquete e seu acesso se faz por estrada vicinal asfaltada (Figura 4).
O Pico dos Marins (2.420,7m) está entre os mais altos do Estado de
São Paulo, juntamente com a Pedra da Mina (2.797.m), o Pico Três Estados (2.665m) e o Pico
do Itaguaré (2.308m). O Pico é um afloramento rochoso granitóide, constitui um maciço de
cerca de 20 km
2
de extensão (Pereira, 2001). O bairro se situa no sopé do Pico dos Marins e
recebe alguns turistas que sobem ao pico nos feriados e fins de semana.
Segundo órgãos ambientais municipais, a área da microbacia possui
grandes áreas com remanescentes florestais de Mata Atlântica, bosques de candeia,
remanescentes de palmito e taquarussu. Animais como lobo guará, jaguatiricas, onça parda e
pintada, já foram vistos na região, além de espécies endêmicas de aves, como a Andorinha
Morcego.
Encontra-se a uma altitude que varia entre 800m, onde se encontra a
Capela de Nossa Senhora Aparecida (núcleo do Bairro), chegando a 2.420,7m, no Pico dos
Marins.
Segundo a classificação de Köppen a temperatura da região é
moderada com verão quente e chuvoso (CWA) para os meses mais frios com a média de
temperatura menor que 20°C. Nas áreas baixas o clima é de verão brando e chuvoso com
temperatura moderada (CWB). Há geadas no inverno e as médias de temperatura no inverno e
41
outono é inferior a 18°C com temperaturas mínimas inferior a 12°C nas áreas serranas (Plano
de microbacia hidrográfica, 2004).
A principal atividade econômica da comunidade é a fabricação do
queijo (curado, minas, mussarela e nozinho) e a manufatura de artesanato com linhas de
crochê e tricô. Existe também um comercio informal de animais de pequeno porte como
galináceos e suínos, que ajudam a completar o quadro da economia local.
Com a chegada do asfalto ao bairro que aconteceu em 2001, o
intercâmbio entre a cidade e o bairro se tornou mais freqüente e algumas casas de veraneio estão
surgindo na área, voltando o olhar de alguns moradores para o turismo. Atualmente o acesso dos
moradores à cidade se dá por meio de vans particulares que fazem a linha Piquete - Marins três
vezes por semana. Os moradores locais recebem assistência técnica de órgãos estaduais,
CATI/SAA-SP e órgãos municipais, Secretaria de Agricultura e Meio Ambiente de Piquete.
Segundo esses órgãos existe na comunidade uma disposição para a discussão na busca da
reestruturação do espaço rural do município que possibilite a permanência do homem no campo.
Figura 3 - Paisagem da cidade de Piquete (modificado pela autora).
42
Figura 4 - Visão ilustrativa da Serra da Mantiqueira contemplando a cidade de Piquete, o
Bairro dos Marins e o Pico dos Marins (Fonte: www.
earth.google.com.; modificada pela
autora).
6.2. Metodologia
Para caracterizar culturalmente a comunidade estudada, usou-se o
termo comunidade rural, porém alguns habitantes do bairro se autodenominam caipiras.
Autores como Diegues e Arruda (2001) relacionam as populações tradicionais não indígenas
usando as seguintes denominações: açorianos, babaçueiros, caboclos/ribeirinhos amazônicos,
caiçaras, caipiras/sitiantes, campeiros (pastoreio), jangadeiros, pantaneiros, pescadores
artesanais, praieiros, quilombolas, sertanejos/vaqueiros e varjeiros (ribeirinhos não
amazônicos).
A coleta de dados de campo foi realizada entre março de 2006 e março
de 2007, totalizando 180 dias em campo.
A metodologia empregada está baseada na Antropologia Cultural
comum em levantamentos de dados etnobotânicos, incluindo observação participante,
entrevistas semi-estruturadas e estruturadas (Bernard, 1988) e conversas informais.
43
A metodologia escolhida visou obter características sócio-culturais dos
informantes e características botânicas das plantas usadas para fins medicinais, suas indicações
e formas de utilização.
Para facilitar a estruturação da pesquisa, as entrevistas se dividiram em
três etapas. Assim, na primeira etapa foram feitas visitas a todas as casas do Bairro. O total de
famílias do Bairro chega a 77 e o número de moradores chega a aproximadamente 300. Deste
modo, visitou-se 74 casas. As três casas restantes, não puderam entrar na pesquisa pela falta de
disponibilidade dos entrevistados. A escolha do entrevistado de cada unidade residencial teve
como critério ser responsável pelo sustento da família. Foram entrevistadas 74 pessoas, usou-
se entrevistas estruturadas e semi-estruturadas (Anexo I). Foram coletados dados sócio-
culturais e realizado levantamento dos problemas de saúde mais recorrentes na comunidade e
as plantas usadas para tratar cada um deles.
Na segunda etapa foram entrevistados seis profissionais e agentes da
área da saúde do Programa de Saúde da Família sendo eles, um clínico geral, enfermeira, dois
auxiliares de enfermagem, um técnico em enfermagem e uma assistente social. Esses
profissionais e agentes de saúde fazem visitas ao bairro uma vez por mês e com eles foi
possível definir o número de casos de hipertensão, hipercolesterolemia e problemas ligados
aos rins e a bexiga dos pacientes residentes no bairro, também com a ajuda desses
profissionais e de outros médicos (urologista, clinico geral e homeopata) que foram
consultados durante a pesquisa, foi possível traduzir os sintomas êmicos, para as três
categorias de doenças trabalhadas. Nessa segunda etapa foram utilizados roteiro com
perguntas pré-definidas (Anexo II) e conversas informais.
Para a terceira etapa foi usada a técnica de amostragem tipo de “bola
de neve” (Bernard, 1988), que consistiu em conversar com algumas pessoas da comunidade e
perguntar se conheciam moradores que tinham significativo conhecimento sobre plantas
medicinais, com esta técnica foram indicadas 15 pessoas. Para complementar a pesquisa foram
escolhidos mais cinco entrevistados pelo método conhecido como amostragem não aleatória
por julgamento, o critério para escolha destes cinco entrevistados foi o maior número de
espécies de plantas medicinais citados na primeira etapa e o conhecimento e uso das plantas
para as três enfermidades propostas neste estudo. Durante a realização da terceira etapa optou-
44
se por utilizar entrevistas semi-estruturadas (Anexo III) com perguntas abertas a fim de
verificar como esses especialistas nomeiam as afecções estudadas e como reconhecem os
problemas de saúde a partir dos sintomas.
Dessa maneira, simultaneamente às primeira e terceira etapas, foi
realizada a coleta de material botânico a partir de indicações e colaboração dos próprios
entrevistados.
As plantas foram coletadas no ambiente onde elas crescem. As
espécies foram prensadas a seco e identificadas pelo Prof. Dr. Lin Chau Ming, Faculdade de
Ciências Agronômicas da Unesp, de Botucatu SP. Com o auxilio da MSC. Inês Machiline
Silva e Dra. Elsie Franklin Guimarães do Jardim Botânico do Rio de Janeiro e da Dra Roseli
Buzanelli Torres pesquisadora do Núcleo de Pesquisa e Desenvolvimento do Jardim Botânico
e curadora do herbário do Instituto Agronômico de Campinas (IAC). As plantas coletadas
foram depositadas no Herbário do Jardim Botânico do Instituto Agronômico de Campinas com
cópias enviadas ao Herbário Irina Delanova Gemtchújnicov - UNESP – Botucatu, SP.
45
7. RESULTADOS E DISCUSSÕES
7.1. Caracterização cultural do lugar
“O TROCO DO CAIPIRA”
I
Vou escrever estas trovas, fazendo comparação!
A fim de desabafar, o que sinto no coração!
II
Quando acertamos um negócio, sempre um troco é voltado!
Assim o caipira vai dar o troco, aos cidadãos estudados!
III
Pessoas muito instruídas, de alto gabarito!
Confiando no seu estudo, pensando que isto é bonito!
46
IV
Não sabem corrigir os outros, aproveitaram certa ocasião!
Critica no meio do público, por um simples cochilão!
V
Deveriam ser mais educadas. Com os mais velhos, ter mais respeito,
verificar o que vai falar, corrigir também seu defeito!
VI
Como diziam os antigos, simples frases da tradição!
As pessoas quanto mais estudam, mais ficam sem educação!
VII
Basta saber explicar, que as pessoas compreendem!
É como diz o ditado, Bata na capa, que o burro entende!
VIII
Com este gesto de humilhação, a gente se sente envergonhado!
Quando o caipira é genioso, acaba ficando afastado!
IX
Estes cidadãos acham, que estão levando vantagem!
É aí que o caipira irrita, e põe no jornal, em reportagem!
X
Agora tirem a prova, verifiquem se a conta está certa!
Vistam a carapuça, vê se ela não aperta!
(Lucas Rodrigues, trovador do Bairro dos Marins).
47
A origem do nome Marins tem uma versão própria, contada pelos
moradores da comunidade: segundo eles, Marins foi o nome dado ao Bairro devido à
existência de dois irmãos que se chamavam João e Antônio Marins. Antônio mudou-se para
Minas Gerais. O irmão João continuou morando no bairro que é conhecido hoje como Bairro
dos Marins.
A sociedade rural dos Marins formou-se predominantemente a partir
da vinda de pessoas e famílias das cidades vizinhas mineiras, que tinham a religião católica
como marco principal de suas vidas.
Em 1937 foi erguida em mutirão a Capela de Nossa Senhora
Aparecida (Figura 5) e fundada a Sociedade São Vicente de Paulo, que fazia a conferência das
doações feitas à capela. As formas de cooperação entre os moradores são historicamente
importantes, ainda que seu perfil tenha se modificado em períodos recentes. Entre essas
formas está o mutirão que, segundo os entrevistados, era feito sempre que existia uma
“empreita grande” para ser cumprida, ou seja, quando havia uma tarefa grande a ser feita.
Dado que uma pessoa sozinha demoraria muito tempo para realizá-la, então para ajudar na
realização da tarefa todos os moradores do bairro se juntavam e colaboravam. O “dono do
mutirão” era o responsável por chamar as pessoas e organizar os trabalhos, e pedia um
“ajutório”, isto é, no dia do mutirão as pessoas trabalhavam sem receber dinheiro, recebiam
apenas a alimentação, que ficava por conta do “dono do mutirão”. Vale notar que essa ajuda
era retribuída posteriormente, quando houvesse outros mutirões.
48
Figura 5 – Mutirão de construção da 1
a
Capela de N. S. Aparecida no ano de 1937 no Bairro dos
Marins (Foto: Fundação Christiano Rosa).
Cabe considerar que o mutirão não servia apenas para a realização de
construções, mas também para a plantação e colheita de grandes lavouras. Na atividade dos
mutirões as mulheres usualmente se reuniam para servir as refeições aos homens, enquanto
estes trabalhavam. De acordo com os relatos dos moradores mais antigos, os mutirões sempre
apresentavam expressivo significado social global, acabavam em festas, durante o dia de
trabalho, era comum que fossem entoados cantos antigos, chamados de “cantoria de mutirão”.
Hoje no Bairro ainda existe cooperação entre os moradores, principalmente na construção de
casas; mas os mutirões de hoje, diferente dos de antigamente que chegavam a reunir mais de
100 pessoas, aglutinam poucas pessoas geralmente as mais próximas de quem precisa de ajuda
como irmãos e primos.
“O mutirão é assim, conforme plantava bastante roça de milho,
roçada de pasto. Eu fiz bastante mutirão de roçada de pasto e carpida de milho, então
49
conforme precisava saía pedindo o ajutório prá turma, o ritmo do povo era o ritmo de
mutirão”.(J.B)
“O mutirão era uma coisa gostosa onde todo mundo se reunia, aqui
na Serra já teve mutirão de mais de 150 homens e depois do mutirão sempre acontecia as
festas os forró, a gente cantava e dançava até o sol raiá. No mutirão as muié ficava no fogão
preparando as comidas e o café que não podia faltá. Enquanto elas cuzinhava, os homem
trabalhava e cantava no eito, chamava de cantoria de mutirão, mas faz tanto tempo que acho
que ninguém mais alembra as letra das musica, mas era bonito de vê aquele bando de gente
cantando”(C.C).
A Capela de Nossa Senhora Aparecida foi erguida pela devoção dos
primeiros moradores do Bairro, em atenção a um destes, que recebeu uma graça de Nossa
Senhora Aparecida e construiu uma capelinha de pau-a-pique, para agradecer à santa. Como a
primeira capelinha era muito pequena, então em 1937 ela foi substituída por construção maior
feita pelo mutirão formado pelos moradores do Bairro, esta também era feita de pau-a-pique.
Por pau-a-pique entende-se a técnica que, segundo os entrevistados, usa uma trama de pau
roliço e bambu colocados na vertical e horizontal, a qual é posteriormente coberta por uma
massa de terra misturada com capim e areia. Segundo os moradores, todas as casas do bairro
eram antes feitas de pau-a-pique, contudo hoje só restam duas delas sendo o restante das
construções substituídas por estruturas com tijolos, ferros e cimento. A Capela de Nossa
Senhora Aparecida foi reconstruída e aumentada mais duas vezes, uma delas em 1950 e outra
em 1987, sendo que nesta última ocorreram duas modificações importantes para caracterizar a
fase histórica presente: foram usados tijolos no lugar da técnica de pau-a-pique, e o trabalho
não foi feita por meio de mutirões (Figura 6).
50
(A)- Capela do Bairro sendo construída em 1937 com mutirões e pau-a-pique.
(B)- Capela do Bairro em 1972, reformada em mutirões usando cimento.
51
(C)-Capela do bairro em 2007, depois da última reforma de expansão feita em 1987.
Figura 6- Fotos da Capela de Nossa Senhora Aparecida no Bairro dos Marins em ordem cronológica
(1937, 1972, 2007), mostrando as diversas formas de construção e reforma (Fotos A e B: Fundação
Christiano Rosa e Foto C: autora).
A religião católica de certo modo norteia a vida no bairro. Cerca de
90% dos moradores dos Marins são católicos, a religião atua como fator aglutinador dos
moradores; os recados de eventos importantes para a comunidade por exemplo, são dados após
as missas e celebrações feitas na capela que fica no núcleo do Bairro.
No plano deste tipo de sociabilidade, destaca-se que os moradores
também se encontram uns na casa dos outros, para novenas, terços e rezas e nesses momentos
de encontros se fala de tudo o que está ocorrendo no Bairro, e nessas horas também ocorrem
trocas de receitas sobre as plantas medicinais. Nota-se no Bairro a ocorrência de algumas
52
festas religiosas. Em junho, acontece festa caipira em homenagem a Santo Antônio, São Pedro
e São João. A festa mais tradicional é a festa da Padroeira, comemorada em outubro, em
homenagem à santa protetora do Bairro, Nossa Senhora Aparecida. Em maio, antigamente,
acontecia a festa de Santa Cruz, comemorada junto às cruzes da estrada onde moradores
morreram, mas hoje esta comemoração não existe mais. As festas religiosas, de maneira geral,
são feitas para arrecadar dinheiro para a Capela do Bairro e sempre começam com a reza do
terço ou com uma celebração. As comidas servidas são feitas no Bairro, com ajuda de toda a
comunidade (pastéis, canjicas, paçocas, doces diversos, etc.).
O Bairro foi importante passagem de tropeiros, e ainda hoje se contam
muitas histórias dessa época. O Pico dos Marins servia como ponto de referência das pessoas
que transportavam o ouro que vinha de Minas, com destino ao Rio de Janeiro. Antigamente
segundo o entrevistado L.R. dono do museu do Bairro “Cantinho Histórico dos Marins”, tudo
era transportado a lombo de mulas e burros, com cangalhas, bruacas de couro e jacás. Este
entrevistado hoje com 64 anos, conta com saudades as histórias de seu irmão que era tropeiro.
As tropas dos Marins saiam carregadas de queijo, frango, carvão,
madeira, etc; e voltavam carregando mantimentos que os moradores encomendavam para o
tropeiro. A viagem dos Marins até Cruzeiro ia “cortando estrada”, isto é, por meio de trilhas
antigas que são usadas até hoje no Bairro; a viagem durava em média dois dias. O “pouso” do
tropeiro era feito nos pátios de tropas, que eram locais já delimitados onde muitos tropeiros se
reuniam (Figura 7).
O queijo que seria “puxado” pela tropa era preparado um dia antes.
Depois de pronto o queijo era lavado, curado no soro e secava na prateleira até a hora de ser
colocado no canudo (Figura 8), artefato feito de madeira no qual cabiam em média 10 kg de
queijo. Os canudos eram colocados em balaios e cada burro levava uma carga de 100 kg de queijo.
Nesta época muitos produtos agrícolas para alimentação humana eram
plantados no Bairro. O entrevistado J.B. relembra que o sistema de lavoura usado era de roçada e
queimada, e conta que chegou a levar para as cidades vizinhas mais de 300 kg de raízes de batata,
inhame, abóbora e mandioquinha salsa por semana, tudo puxado pelas tropas. Na época do relato,
a viagem dos Marins a Piquete, com a tropa carregada durava, em média quatro horas. Neste
53
relato, é destacado que as lavouras terminaram devido à fiscalização florestal, que proibiu a roçada
e a queimada.
“Antigamente era roçada e queimada não precisava nem colocar adubo,
plantava de 2 a 3 hectares, não faltava terra, depois de colhida a gente deixava a terra parada,
formando palhada e só plantava aquela terra de novo depois de 10 anos, mas depois veio o
IBAMA e aí não dava mais gosto fazê lavora” (J.B.)
As tropas também faziam o transporte de carvão (Figura 9) e candeia
(Vanillosmopsis erythropa (DC.) Sch. Bip.).O entrevistado L.R. relata que “fez a vida” retirando
candeia das encostas do Pico, e que seu irmão levava a madeira até a cidade de Cruzeiro, em
Minas Gerais, para ser vendida para indústrias e fazendas de todo o país. Segundo o mesmo
entrevistado, que começou a tirar a candeia em 1964 e parou em 1980, devido a problemas com a
fiscalização, a candeia serve para fazer esteio de casa e moirões de cerca.
“A candeia é madera boa de cerne, que dura trinta anos, mas tem que
saber cortar, tem que ser árvore madura de mais de dez anos, não pode ser árvore nova se não,
não presta. O problema da candeia é que pega fogo fácil, por isso tem que ficar de olho” (L.R.).
O entrevistado acrescentou que a candeia era vendida por dúzias. Eram
feitas pilhas de dúzias de candeia, cada pilha continha 15 dúzias. A candeia era cortada com
machado e era “puxada” (transportada) do local de corte, por tropas, depois empilhada no
centro do Bairro, de onde eram encaminhadas mais tarde para outras cidades. A tropa fazia
duas viagens por dia, transportando em média oito a dez dúzias por dia, dependendo do
diâmetro da madeira.
A retirada das candeias começou a ser fiscalizada no fim da década de
60. Nessa época, segundo LR., já se sabia que não era possível tirar a madeira sem
autorização. A licença era liberada em Piquete, e tinha duração de um ano, recobrindo um total
54
aproximado de 300 dúzias de troncos. Depois, para tirar a licença, ficou mais difícil, pois sua
emissão foi transferida para Taubaté. Com a complicação na retirada da licença, o comércio de
candeia foi se tornando fraco, sendo inexistente atualmente.
Figura 7 – (A) Pátio de Tropas, local de “pouso” dos tropeiros
(Fonte: Fundação Christiano Rosa).
Figura 7 - (B) Antiga estrada do Bairro dos Marins, com tropas
Subindo. (Fonte: Fundação Christiano Rosa).
55
Figura 8 – “Canudo”, utensílio levado nas tropas para o transporte de queijo.
Figura 9 – Tropas que faziam o transporte dos Marins a Cruzeiro, carregadas
com carvão. (Fonte: Fundação Christiano Rosa).
56
Em resumo, atualmente a principal atividade do Bairro é a fabricação
caseira de queijo e para complementar a renda da família, algumas mulheres fazem artesanato.
Segundo as mulheres, o artesanato foi iniciado por necessidade, pelo gosto e habilidade e sua
técnica é passada de geração a geração. Elas contam que F.R., já falecida, mãe de dezoito
filhos, costurava toda a roupa da família e com os retalhos de panos fazia tapetes, colchas,
vestidos de noivas, enxovais de bebê e outros bordados. Os sacos que vinham com
mantimentos eram abertos, alvejados e desfiados, trabalhava-se com os fios fazendo um
trançado, ao qual se dava o nome de abrolho. Hoje o abrolho não é mais feito no bairro, o
artesanato é feito de tricô e crochê (Figura 10).
O trabalho atualmente feito pelas mulheres chega à cidade de Piquete e
aos turistas por meio de atravessadores, que segundo as artesãs, pagam pouco pela mão-de-
obra do serviço e vendem os produtos bem mais caros, levando todo o lucro.
Figura 10 - (A) Saco alvejado e trançado de
artesanato de Abrolho feito por artesã do Bairro
dos Marins.
Figura 10 – (B) Amostras de artesanato de
Abrolho, guardadas por uma das entrevistadas
do Bairro dos Marins.
No bairro também são confeccionados objetos artesanais, usados no
dia-a-dia, feitos por meio de entalhe na madeira, como pilão, gamela, monjolo, escacador de
moer cana, (Figura 11) Jacás, “apás” e peneiras são feitos de taquara e embira. Havendo ainda
57
o artesanato trançado de couro e sedenho (crina de animais) usados, para fazer laço e rédeas de
montaria (Figura 12).
Figura 11 - Artesanato feito com madeira: monjolo pequeno, escacador de cana pequeno,
pilãozinho, pilão grande feito por artesão do Bairro dos Marins (autora).
Figura 12- Utensílios usados para tropas e montarias, feitos artesanalmente com couro e crina de
eqüinos e muares no Bairro dos Marins (autora).
58
O turismo rural e ecológico, apesar de ser apontado pelos órgãos de
extensão rural da região como uma alternativa possível de ampliação da renda para os
moradores locais, ainda não acontece de forma efetiva, principalmente pela falta de
investimento em infra-estrutura e divulgação pelos órgãos públicos. O Bairro é uma das rotas
de acesso ao Pico dos Marins, mas existem outros meios de se chegar ao local. Vale salientar
que no bairro existem ainda diversas cachoeiras e poços de impressionante beleza cênica,
porém as estradas de acesso a esses locais são precárias, dificultando a chegada dos turistas.
No início de 2007 teve início um projeto da prefeitura, juntamente com a CATI e instituições
parceiras, para a pavimentação dessas estradas.
Como referido anteriormente (metodologia), preferiu-se caracterizar a
comunidade do Bairro dos Marins como sendo uma comunidade rural, porém alguns
moradores a chamam de comunidade caipira. O debate sobre o conceito e a
caracterização/auto-caracterização de populações/comunidades tradicionais vem sendo
desenvolvido principalmente pelas Ciências Sociais que tem refletido sobre esse tipo de
organização social sob enfoques variados (Diegues e Arruda, 2001).
Segundo Diegues (1993), em análise baseada em perspectiva marxista,
as culturas tradicionais estão associadas a modos de produção pré-capitalistas, próprios de
sociedades em que o trabalho ainda não se tornou mercadoria; em que a dependência do
mercado já existe, mas não é total. Essas sociedades desenvolveram formas particulares de
manejo dos recursos naturais, que não visam diretamente o lucro, mas à reprodução cultural e
social, além de percepções e representações em relação ao mundo natural, marcadas pela idéia
de associação com a natureza e a dependência de seus ciclos. Culturas tradicionais, nessa
perspectiva, seriam aquelas principalmente associadas à pequena produção mercantil e
distinguem-se daquelas próprias das sociedades capitalistas, em que não só a força de trabalho
como a própria natureza se transformam em objeto de compra e venda.
Outro elemento essencial na caracterização das comunidades é o
território e as práticas de manejo dos recursos naturais próprias dessas comunidades. Segundo
Diegues e Arruda (2001), território pode ser definido como uma porção da natureza e do
espaço sobre o qual determinada sociedade reivindica e garante a todos, ou a uma parte de
seus membros, direitos estáveis de acesso, controle ou uso na totalidade ou parte dos recursos
59
naturais existentes. O território forneceria, portanto os meios de subsistência, de trabalho e
produção dos aspectos materiais e das relações sociais como as relações de parentesco. As
práticas de manejo das comunidades tradicionais são caracterizadas pelo respeito aos ciclos
naturais, que observam a capacidade de recuperação das espécies animais e plantas utilizadas.
Esse sistema não visa somente à exploração econômica, mas revela a existência de um
conjunto complexo de conhecimentos adquiridos pela tradição herdada dos mais velhos.
Na presente pesquisa, trata-se de um bairro rural, que segundo Queiroz
(1971) e Mello e Souza (1964) apud Silva (2002) é o espaço ocupado pelos caipiras. Estes
autores, que avaliam o bairro rural paulista como uma unidade básica de civilização caipira, é
encontrado ainda em áreas de povoamento mais antigo do Estado, que se estabeleceu em
função da expansão geográfica dos paulistas nos séculos XVI, XVII e XVIII. Nessa
perspectiva os bairros rurais definem-se mais pelas relações sociais do que por um regime
econômico específico, sendo que este sirva como parâmetro para a diferenciação interna dessa
categoria social. Assim, o bairro rural é definido pela sua forma específica de implantação no
solo: um habitat disperso, centralizado por pequeno núcleo de habitações em torno da capela,
pelos vínculos sociais que unem seus membros, considerando a festa religiosa um meio de
promover a reunião entre vizinhos, onde assumem coletivamente a responsabilidade pela
realização e economia da festa. A autora (Queiroz (1971) e Mello e Souza (1964) apud Silva
(2002)) salienta ainda que existe uma dinâmica no mundo rural dos bairros caipiras, traduzida
por transformações, por melhorias, por decadências, ora devido aos fatores internos e da
própria organização e estrutura dos bairros, ora em função das transformações no município e
região a que os bairros pertencem, com tendências e movimentos internos diversos daqueles
que habitualmente se encontram nas cidades.
Assim torna-se necessário observar algumas mudanças ocorridas ao
longo dos anos no Bairro. Relembrando a Figura 6, na qual estão apresentadas fotos da capela
em ordem cronológica, nota-se algumas mudanças na paisagem e no cotidiano da comunidade.
Na primeira foto (A) tirada em 1937, verifica-se ausência de edificações ao redor da capela, a
estrada era de terra batida, não existia iluminação elétrica, e a paisagem no morro atrás da
capela mostra a vegetação bastante escassa composta por pastos e poucas árvores isoladas a
mata preservada se encontrava apenas nos topos dos morros. Na foto (B) tirada no ano de
60
1972 observa-se o aparecimento de algumas construções ao redor da capela, segundo os
moradores nesta época estava se formando o núcleo do Bairro. A técnica de construção
também se modificou, havendo a substituição da taipa ou pau-a pique por tijolos, a estrada
aparece mais bem definida, apesar de ainda ser de terra. A luz elétrica ainda não tinha chegado
ao Bairro e apenas alguns moradores que tinham roda d’água conseguiam o acesso à
iluminação noturna e ao rádio, segundo os moradores essa energia da “usina caseira” não
conseguia esquentar a água do chuveiro. A energia elétrica só chegou seis anos depois em
1978, quando começam a ser observadas as grandes mudanças no Bairro. Em 2001 a estrada
(foto C), que une o Bairro à cidade de Piquete é asfaltada, facilitando o acesso dessa
comunidade rural ao centro urbano mais próximo. Com a chegada da estrada os moradores
começaram ter a opção de mandar seus filhos para estudar fora do Bairro, e a acessibilidade às
estruturas de saúde da cidade fica facilitada. Nota-se que a paisagem da vegetação ao redor da
capela (foto C) também se modificou, sendo possível verificar a formação de novas capoeiras
em lugares onde antes era apenas pasto.
Sabe-se que a história das sociedades são dinâmicas e se modificam
através do tempo levada por diversos fatores. No Bairro dos Marins foram elencados nos
depoimentos, pelo menos três fatores exógenos que acarretaram significativa mudança no
cotidiano da comunidade.
A primeira grande mudança sobreveio com a energia elétrica, que
trouxe consigo a televisão. A chegada da televisão, segundo o relato de alguns moradores, fez
com que os encontros e as reuniões na capela se tornassem menos freqüentes, notando-se que
as famílias foram crescentemente se isolando em suas casas e as relações comunitárias no
bairro foram se enfraquecendo. Esta nova realidade constata com a consciência de que, antes
da TV, as pessoas do Bairro tinham maior disponibilidade para atender e participar dos
problemas comunitários.
A segunda mudança que veio “de fora da comunidade” foi a proibição
da extração dos recursos naturais das matas ao redor do Bairro. As leis de proteção à natureza
impostas pelos órgãos ambientais locais e regionais aos moradores fez com que a relação da
comunidade com a flora e a fauna local se modificasse irreversivelmente. Impedidos de extrair
a madeira e de praticar a caça, os moradores tiveram que se adaptar a uma nova relação com a
61
natureza, muitos receberam e ainda recebem multas e punições para que se adequem as leis
ambientais. As idas aos locais de mata se tornaram menos freqüentes e os ambientes mais
freqüentados passaram a ser os pastos e capoeiras novas, interferindo no conhecimento da
comunidade em relação as espécies nativas da Mata Atlântica. As leis ambientais também
contribuíram para modificar a base alimentar da comunidade, impedidos de praticar a lavoura
de corte e queima, muitos agricultores deixaram de plantar. Atualmente, por exemplo, os
produtos básicos da alimentação rural local como o arroz, feijão, milho e batata, são
comprados nas cidades próximas, porém se observa o aumento da área florestada no local em
função do não-manejo.
Por fim, a terceira mudança ocorrida no Bairro foi a chegada da
estrada que propiciou maior intercambio entre o Bairro e a cidade, um processo de troca que
se deu nos âmbitos econômico, social e principalmente cultural. Quando o acesso aos serviços
públicos oferecidos em Piquete se tornou mais fácil para essa sociedade rural, alguns
moradores de Piquete se mudaram para o Bairro trazendo com eles a cultura de um centro
urbano maior e todas as suas implicações. Em suma a estrada, deu a possibilidade dos
moradores estudarem nas escolas das cidades próximas, esta nova realidade fez com que
partes dos jovens fossem perdendo o interesse pelas coisas da terra e deixando de aprender
com seus pais importantes lições. O atendimento básico de saúde não emergencial que antes
era resolvido no próprio bairro pelas parteiras, rezadeiras e pessoas que dominavam a prática
da medicina tradicional, em alguns casos, passou a ser realizado por profissionais da área de
saúde, nos hospitais de Piquete e arredores, fazendo com que a medicina convencional viesse a
se incorporar ao cotidiano do Bairro.
A partir desta caracterização da comunidade estudada torna-se possível
compor uma visão que contemple a complexidade dos aspectos sociais, culturais e ambientais,
embasada não apenas em conteúdos provenientes da leitura de livros e textos, como também
em depoimentos dos moradores que mostram aguda consciência da dinâmica de suas
formações na qual estão historicamente envolvidos.
62
7.2. Dados Sócio-culturais
7.2.1. Idade, tempo de moradia e origem dos moradores do Bairro dos Marins
No Bairro dos Marins as moradias, se encontram dispersas. Porém,
existe um núcleo, onde se localiza a escola do bairro, a Capela Nossa Senhora Aparecida, uma
mercearia e três bares. O total de famílias no Bairro é 77 e o número total de moradores na
comunidade foi de aproximadamente 240 pessoas, sendo que o número de pessoas que
residem na casa no momento da entrevista foi em média três pessoas.
Para a caracterização geral dos moradores do Bairro foram entrevistadas
74 pessoas no censo socioeconômico. Como dito anteriormente (metodologia) para obtenção
desses dados, foram feitas visitas a todas as casas do bairro, onde se entrevistou o responsável pelo
sustento da casa que estivesse presente na hora da entrevista. Deste modo, visitou-se 74 casas; as
três casas restantes, não puderam entrar na pesquisa pela falta de disponibilidade dos moradores.
Foram cadastrados 60 mulheres e 14 homens. Provavelmente o número
maior de mulheres seja decorrência do horário escolhido para as entrevistas, no período da
manhã e da tarde, onde a maior parte dos homens da comunidade está trabalhando fora da
residência.
A idade média dos entrevistados foi de aproximadamente 46,87 anos,
sendo que a menor idade encontrada foi 16 anos e a maior idade foi 85 anos. O maior número
de entrevistados situa-se na faixa etária entre 26 e 45 anos (30 pessoas - 40%), com maior
concentração entre 26 e 35 (17 pessoas – 22%) o menor número de entrevistados estava na
faixa entre 16 e 25 (7 pessoas - 9%) (Figura 13).
A média de residência dos entrevistados no Bairro foi de 30 anos.
Como a média de idade foi de 46 anos, pode-se confirmar a informação de migração para as
cidades e bairros próximos. Verificou-se no Bairro, algumas situações de mudança entre os
cadastrados. Resultado semelhante foi verificado no estudo feito por Ming (1995) na Reserva
Extrativista Chico Mendes com seringueiros, o autor afirma que mesmo constatando as
63
migrações, a média (26,8 anos) encontrada por ele de tempo de residência no mesmo seringal
ajuda nos conhecimentos sobre a flora da região.
Figura 13 – Distribuição dos 74 entrevistados cadastrados por faixa etária do Bairro dos Marins,
Piquete-SP.
Entre os entrevistados de idade entre 20 e 40 anos, o número médio de
plantas citadas para os problemas de saúde mais comuns no bairro foi 12,5 plantas, enquanto
entre os entrevistados de idade entre 50 e 70 anos o número médio de plantas citadas foi de
19,2. Entre os entrevistados com idade acima de 70 anos, o número médio de plantas citadas
foi 23,1. Este resultado demonstra a tendência dos entrevistados mais idosos citarem um maior
número de plantas para as doenças de maior ocorrência no bairro. Este resultado sugere que o
conhecimento de plantas medicinais no Bairro dos Marins está associado à idade dos
entrevistados, como em outros trabalhos realizados com conhecimento popular sobre plantas
medicinais (Hidalgo, 2003; Santos, 2006). Nota-se que o conhecimento sobre plantas se
acumula entre as pessoas mais idosas, o fato desses entrevistados terem uma experiência maior
de vida, uma convivência mais longa com o ambiente que o cerca e uma freqüência maior na
práticas do uso das plantas, pode explicar esta constatação. Na comunidade estudada verifica-
64
se que a complexa percepção sobre plantas medicinais, é desenvolvida durante uma vida
inteira. Ou seja, sempre se está aprendendo sobre as plantas, seus usos e suas interações.
“Tudo quanto é mato é remédio, mas muita coisa que tá no mato eu
ainda não conheço, mas tenho tempo ainda para isso....” (FD, 70 anos)
O conhecimento sobre as plantas pode ser afetado por fatores sócio-
culturais e interculturais, como o modo de produção que o entrevistado pratica, o ambiente
biológico o nível de contato com uma cultura externa, a etnia e a religião. Também está
relacionado com influências intraculturais como o gênero, a idade, educação, alfabetização,
ocupação, local de nascimento entre outros. Os dados da origem dos entrevistados no Bairro
são condizentes com o histórico de ocupação e formação do Bairro, onde uma parcela
significativa, (30 pessoas - 40,5%) dos moradores são descendentes de famílias mineiras de
municípios que fazem divisa com o Bairro, enquanto que 33 pessoas (44,5%) nasceram na
cidade de Piquete, e além disso sete pessoas (9,4%) dos entrevistados tiveram sua origem em
cidades do Vale do Paraíba próximas a Piquete, como Lorena, Guaratinguetá e
Pindamonhangaba. Dentre o grupo de entrevistados, quatro pessoas (5,4%) tiveram sua origem
em outros estados como Rio de Janeiro, Bahia e Sergipe. Esses entrevistados vieram para o
Bairro por motivo de casamento com pessoas que moravam aqui. No grupo de entrevistados
não houve relato de pessoas que moram no Bairro que não tenham parentesco e raízes com as
famílias que formam a comunidade, como ex-turistas, no entanto existem casas de veraneio no
Bairro, porém estas, são ocupadas apenas nas férias ou feriados.
A partir do censo com os 74 moradores, foi possível identificar dentro da
comunidade, pelo método “Bola de neve” 15 pessoas como as mais entendidas de plantas
medicinais, para complementar a pesquisa foi usada conjuntamente a metodologia “amostragem não
aleatória por julgamento”, onde se chegou a mais cinco entrevistados, o critério usado para escolha
dos entrevistados no segundo método foi que o entrevistado tivesse significativo conhecimento de
plantas medicinais para pressão alta, colesterol e problemas ligados aos rins e bexiga.
65
Dentro dos 20 especialistas entrevistados temos cinco (25%)
entrevistados do sexo masculino e 15 (75%) do sexo feminino. A menor idade encontrada foi
36 anos e a maior 76 (Figura 14). A faixa etária de maior número de entrevistados ficou entre
61 e 70 anos (10 pessoas, 50%), aparecendo uma alta proporção de idosos, pois 60% dos
entrevistados têm mais de 60 anos de idade. Esses dados confirmam o resultado encontrado
anteriormente no cadastro feito com as 74 pessoas, que o conhecimento sobre as plantas
medicinais se encontra em maior escala entre os moradores mais velhos.
2010 0 102030405
31-40
41-50
51-60
61-70
71-80
Faixa Etária
Porcentagem pornero
0
Homem Mulher
Figura 14 – Estrutura etária dos especialistas entrevistados no Bairro rural dos Marins, Piquete-SP.
Quanto à origem destes moradores, verificou-se que eles são atores
ativos da historia do bairro, pois 45% dos entrevistados nasceram e viveram no bairro durante
toda a vida e apenas um dos entrevistados não nasceu na região.
O tempo de moradia no Bairro (Figura 15) muitas vezes reflete o grau
de afinidade e interação deste entrevistado com ambiente natural que o cerca. Nota-se nos
Marins, que, tanto a idade, quanto o tempo de moradia, influenciam no conhecimento sobre as
plantas medicinais, por este motivo se torna primordial que seja feito junto à comunidade um
trabalho de valorização e resgate do conhecimento acerca dos recursos naturais, em especial
de plantas medicinais, essencial para comunidades de baixa renda e com difícil acesso à
66
medicina convencional, visto que este conhecimento pode ser deixado de ser assimilado pelas
gerações futuras.
0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70%
05 - 20 anos
21 - 40 anos
41 - 70 anos
Figura 15 – Distribuição do tempo de moradia dos especialistas entrevistados no Bairro dos
Marins, Piquete-SP.
7.2.2. Escolaridade
Quanto ao grau de escolaridade (Figura 16), 90% dos entrevistados não
terminaram o ensino fundamental. Essa realidade pode ser explicada pois a escola existente no
bairro foi construída em 1972, a partir da doação do terreno por um dos moradores.
Anteriormente a este fato, as aulas eram dadas no barracão da capela. Atualmente a escola ensina
até a 4
a
série do ensino fundamental. Para continuar os estudos, as crianças vão para Piquete onde
existem escolas que oferecem até o ensino médio. A dificuldade de acesso à escola e a necessidade
de mão-de-obra para cuidar dos afazeres na terra, na época em que os colaboradores estavam na
idade escolar podem ser a justificativa para o baixo índice escolar dos entrevistados. Atualmente a
dificuldade de acesso aos estudos ainda persiste, pois apesar de ser oferecido um carro escolar que
leva as crianças até as escolas de Piquete, este pega os alunos apenas até onde vai o asfalto e os
67
estudantes que moram mais afastados ficam prejudicados. Ainda conta com o fato de que em
Piquete não são oferecidos cursos técnicos ou superior e para ter acesso a estes, os moradores
precisam recorrer as cidades vizinhas como Lorena, Delfim Moreira e Cruzeiro.
Figura 16 – Grau de escolaridade dos especialistas entrevistados no Bairro dos Marins, Piquete-SP.
7.2.3. Ocupação dos entrevistados
A ocupação dos entrevistados (Figura 17) varia de acordo com o
gênero, pois as tarefas são bem divididas no bairro e em sua maioria são complementares na
renda familiar. Entre entrevistados 50% fabricam e vendem queijo nos dias de hoje e 85% já
tiveram o queijo como principal renda da família. O trabalho de fabricação e venda do queijo é
dividido entre os gêneros e varia de família para família. O gráfico foi feito baseado nas
ocupações que os entrevistados consideram principal, por isso não existiram categorias
sobrepostas.
Entre os entrevistados do gênero masculino, dois criam rebanho
bovino para a fabricação do queijo e fazem o transporte e venda de animais de pequeno porte
como galináceos e suínos. Um dos entrevistados é dono da única mercearia do bairro, o outro
68
é artesão, serrador e mateiro aposentado; o artesanato feito por ele é o entalhe de madeira e
taquara, profissão que aprendeu com o pai, enquanto o último trabalha tirando leite e como
caseiro para outras pessoas.
25%
50%
10%
5%
5%
5%
Artesanato
Fabricaçao de queijo
D. de casa
caseiro
comerciante
Bananicultura
Figura 17 - Principais atividades exercidas pelos especialistas entrevistados dentro da comunidade do
Bairro dos Marins, Piquete-SP.
A ocupação das mulheres entrevistadas varia, sendo 25% artesãs, 53%
queijeiras e 35% donas-de-casa aposentadas. Essas categorias podem se sobrepor, existindo
mulheres que, mesmo aposentadas, fazem queijo e artesanato para complementar a renda da casa.
Apesar do passado agrícola desta região (café, banana, feijão,
tubérculos), verificou-se neste estudo que apenas um dos colaboradores cita a bananicultura
como principal atividade. A agricultura no Bairro com o passar dos anos foi sendo deixada de
lado. Antigamente havia plantio de produtos agrícolas para venda fora do Bairro e algumas
famílias tinham bancas em feiras das cidades vizinhas, onde se vendia, milho, feijão, abóbora,
etc. Com a proibição da agricultura itinerante de corte e queima, a crescente dificuldade de
compra de insumos, e da concorrência com supermercados, ficou inviável o plantio e as
famílias resolveram deixar de plantar. Atualmente no Bairro, pouco se planta, compra-se
quase tudo, inclusive produtos básicos da alimentação, como hortaliças: alface, tomate,
pepino, abóbora e amiláceos (mandioca, batatinha e batata doce). O plantio feito no bairro é
69
basicamente para o sustento animal e poucas espécies são para consumo da família; as
espécies plantadas são pouco diversas e se resumem ao milho, cana-de-açúcar e banana
principalmente. Geralmente a banana é vendida para a cooperativa de Guaratinguetá.
O Bairro dos Marins reflete o processo que vem ocorrendo em regiões
rurais de todo o país, um processo de transformação trazido pelo moderno, produtos
industrializados de grandes empresas agrícolas com grandes áreas plantadas, concorrendo com
o pequeno produtor rural sem assistência técnica e sem incentivo do governo. Este contraste
leva esses produtores a deixar de plantar, levando junto seu conhecimento sobre o manejo de
espécies comestíveis, fundamentais pra garantir sua diversidade alimentar.
Em levantamentos realizados com plantas medicinais (Ming, (1995),
Hidalgo, (2003) e Santos, (2006)) é comum encontrar nas comunidades, profissionais que
desempenham um papel de cura mística ou espiritual, como curandeiros (as), benzedores (as),
rezadores (eiras), raizeiros (as). Nos Marins estas categorias não apareceram durante a
pesquisa. De acordo com os relatos de moradores antigos, no Bairro antigamente quem
desempenhava este papel eram as parteiras. Esta constatação pode estar ligada à forte
influência da igreja católica no Bairro que, segundo os moradores nega o trabalho de cura feito
por esses profissionais.
“Aqui no Bairro nunca teve benzedô ou rezadêra, aqui quem cuidava
da saúde e sabia de planta eram os mais velhos, as parteira, os mateiro. Hoje só se faz a
fumentação nas criança pra espantá bicha assustada e fazê a criança acalmá, mas isso vem
dos antigo, e quem cura é Deus. A pessoa que faz é só um instrumento.” ( M.A.)
A “fumentação” consiste em passar os ramos da hortelã e salsinha
junto com azeite que primeiramente é queimado, nas crianças que estão agitadas ou com
sintomas de verme. Os ramos são passados nos braços e nas pernas, fazendo o desenho
imaginário de uma cruz. Posteriormente é preparado o chá dessas plantas e dado aos pacientes.
Segundo os relato dos moradores não se pode passar no ventre, pois a criança piora. Os
moradores relatam que este tratamento sempre funcionou. A “fumentação” como descrita
70
acima, onde se faz o uso de plantas e é traçado o desenho de um crucifixo, a despeito dos
moradores locais não a considerarem desta forma, se parece com a descrição popular dadas as
benzições. Segundo Schultes (1984 e 1988) apud Ming (1995), o benzimento está presente em
na cultura de diversos povos de todas as religiões brasileiras e outros países latinos e africanos.
“A fumentação é o primeiro pras criança, é um remedião. Uma vez
meu filho tava doente e nada dava jeito, levei até no médico da cidade, o menino queimava de
febre e chorava a noite toda, quando vi que ele tava piorando, já era tarde da noite, peguei o
menino nos braço e fui na casa da comadre e levei as plantas, foi só ela termina de fumentá o
menino parou de chorá, a febre parô e ele dormiu a noite todinha, ela me ensinô a fazê e fiz
durante três dia, no terceiro dia o menino não tinha mais nada” (O.M.)
Segundo Costa (2002), benzimentos e simpatias são processos de
tratamento de doenças consideradas espirituais, ou não-naturais e podem ou não envolver o
uso de plantas, e o conceito de benzimentos e simpatias e a eficácia do tratamento, está
fortemente relacionada com a fé das pessoas envolvidas neste processo, independentemente da
religião que praticam. Aqui cabe discutir porque o processo de “fumentação” usado na
comunidade não é associado ao benzimento, e as pessoas que os praticam não são conhecidos
como benzedores(as). Como dito anteriormente na caracterização do Bairro, a Igreja Católica
tem uma forte atuação na vida comunitária, e é comum verificar a visita de pessoas do clero ao
Bairro. A proximidade com o Santuário Nacional de Nossa Senhora Aparecida colabora com a
influencia da Igreja Católica Romana no Bairro.
A fé dos cristãos católicos em Nossa Senhora Aparecida teve origem
na graça recebida por três pescadores, que após um dia de trabalho infrutífero, apanharam em
suas redes a imagem do corpo de Nossa Senhora da Conceição faltando a parte da cabeça,
após lançar a rede novamente, apanharam a cabeça que faltava e a partir deste evento a pesca
deles se tornou abundante. Assim a fama de milagres da imagem cresceu, arrebanhando
diversos devotos que faziam romaria a casa onde a imagem do pescador se encontrava. O
santuário de Nossa Senhora Aparecida foi criado por volta de 1945, para abrigar a Imagem
71
Santa, e então nasceu a cidade de Aparecida, em 1888 foi criada a “Basílica Velha”, em 1928
a vila de aparecida se emancipou de hoje é o maior centro de peregrinação da América Latina.
(www. Santuarionacional.com.br)
A discussão sobre a influencia do catolicismo praticado pela Igreja de
Roma no catolicismo popular brasileiro, foi abordada por diversos autores com diferentes
enfoques, Hoornaert (1978, 1994) que pesquisou o catolicismo no Brasil no período de 1550 a
1800, procurou entender como uma religião imposta pelos colonizadores (baseada na
obrigatoriedade e no medo) se moldou na alma do brasileiro e as formas de sincretismo que
daí resultaram. Queiroz (1971), que estudou o catolicismo brasileiro, admite que mesmo no
início da colonização brasileira, o catolicismo já se cindia em oficial e popular, dicotomia
trazida pelos portugueses que já a vivenciavam na Europa. Segunda a autora, quando este
catolicismo cindido, entrou em contato com as religiões nativas e cultos africanos, o resultado
teria sido uma malha de sincretismos religiosos. Freyre (1983) salienta que as grandes
distâncias, a insuficiência de padres e a vivencia própria da religiosidade pelo povo, teriam
contribuído para que as populações manifestassem um tipo de catolicismo popular
independente do clero, um catolicismo que tende a configurar-se como uma liturgia mais
social que religiosa.
O catolicismo popular foge de padrões canônicos e da ortodoxia das
determinações da Igreja Católica Romana, aceita os ritos e folguedos das festas em devoção
aos santos como as festas do Divino e do Santo Reis e acredita também na eficiência de
processos de cura como benzimentos, simpatias e promessas. E seus atores principais
curandeiros, bezendores e rezadeiras fazem também fazem parte do consciente coletivo que
compõe a medicina popular, principalmente por exercer uma função de cura, ajuda e
aconselhamento de determinadas doenças.
Percebe-se que a Igreja Católica Romana está presente na região do
Vale do Paraíba, há pelo menos um século e esta influencia pode ser a causa de no Bairro, as
categorias de profissionais que desempenham um papel de cura mística ou espiritual, serem
desempenhadas por pessoas que não levam esses nomes (curandeiros (as), benzedores (as),
rezadores (eiras), raizeiros (as)) e desta forma a “fumentação” não é considerada um
benzimento. Com a estratégia de não usar a denominação mais comuns (rezas, benzimentos e
72
simpatias) dados aos rituais praticados na comunidade, os moradores antigos podem manter
seus rituais tradicionais, a revelia da intervenção da Igreja Católica.
De acordo com os relatos dos moradores, a Igreja Católica também
pode estar influenciando a cultura das festas populares na comunidade, devido à proibição de
bebidas alcoólicas durante as festas. Observou-se que algumas festas tradicionais do Bairro
deixaram de ser realizadas. De acordo com os moradores, a venda de bebida alcoólica ajuda a
completar a receita da festa, que tem como um dos objetivos arrecadar dinheiro para
manutenção da Capela do Bairro. Durante a pesquisa, a Festa da Padroeira, a mais tradicional
do Bairro, que ocorria anualmente não foi realizada.
No Bairro já ocorreram alguns cursos sobre o uso de plantas
alimentares e medicinais, dados, inclusive por algumas instituições católicas e órgãos
municipais, porém não se pode afirmar que o conhecimento sobre as plantas usadas para os
problemas de saúde que fazem parte deste estudo tenha sofrido ou não influência destes
cursos.
7.3. Aprendizado e a transmissão do conhecimento sobre plantas
De acordo com CavalliSforza e Feldman (198l) apud Begossi (1993),
transmissão cultural é a capacidade de aprender e transmitir conhecimento entre gerações. A
transmissão cultural pode ocorrer de forma vertical (pais para filhos), horizontal (mesma
geração) e oblíqua (entre gerações). Paciornick (1989) considerou que os níveis horizontais
são transmissões de amigo para-amigo, vizinho-para-vizinho e de comadre-para-comadre. No
Bairro (Figura 18) entre o grupo de entrevistados, verificou-se que a forma de transmissão
predominante é a vertical passada de pais para filhos. Verificou-se também a transmissão de
conhecimento sobre plantas entre avós e netos e entre irmãos. Na categoria “família”, estão
representadas as relações de alto grau de parentesco e proximidade, (pais, filhos, irmãos, avós,
netos, marido, sogra, cunhada, etc.) também. O grupo “pessoas da comunidade” está
representado pelos vizinhos, amigos e nas relações de compadrio, muito valorizada no Bairro.
Também neste grupo estão as parteiras e mateiros mais antigos. Atualmente no Bairro não
73
existem mais parteiras. Segundo o relato das mulheres entrevistadas, as parteiras detinham um
significativo conhecimento não só sobre as plantas medicinais, mas sobre todo um conjunto de
ciclos naturais tanto ambientais (dias que iam chover de acordo com as fases da lua) quanto
dos seres humanos, principalmente das mulheres e das crianças.
85%
8%
5%
Família Pessoas da Comunidade Família e Pessoas da comunidade
Figura 18- Origem e transmissão do conhecimento sobre plantas medicinais entre os especialistas
entrevistados no Bairro dos Marins, Piquete-SP.
“O primeiro parto que vi foi o da minha sobrinha mais velha. Naquela
época eu ainda era mocinha e cuidava das criança mais miudinha, a meninada pequena
pelejava para ver o que tava acontecendo mas não podia. Juntava todas as mulheres da
família na casa para ajudar, ficava tudo na cozinha, tinha uma chalerona que fazia uma
chazera a noite toda, tinha muita planta, umas era pra fazê chá outras era para o banho da
criança e da mãe. O chá era para fazer o bebê descê mais rápido e tinha umas planta que
misturava com pinga, tinha carapiá, buta, lembro que a grávida tomava chá e banho, antes e
depois de ganhá o bebê. Alembro que ia também arruda por causa do cheiro forte que ficava
na casa. A gente ficava só esperando a parteira dá notícia. Naquele tempo dava trabalho ter
filho, se não fosse a Dona A.B. muita gente aqui no bairro não tinha nascido....” (I.R.)
74
“Aprendi de planta de remédio com meu pai e meus irmão mais velho,
andando pelas grota que tem nesses fundão pra pegar madêra e caçá, a gente aprendia na
marra por que tinha que sabê, quem anda no mato tem que sabê que remédio é pro quê, numa
emergência se salva assim... “ (F.D.)
As formas de aprendizagem do conhecimento (Figura 19) sobre as
plantas medicinais dentro do grupo de entrevistado ocorre predominantemente de forma oral,
dentre os participantes da pesquisa. 45% (nove pessoas) aprenderam a usar e conhecer as
plantas apenas ouvindo a explicação de outras pessoas, 30% (seis pessoas) aprenderam tanto
ouvindo a explicação, quanto observando outras pessoas fazendo. 25% (cinco pessoas)
afirmaram que durante sua experiência de aprendizado ajudaram quem os ensinava tanto na
coleta de plantas, quanto na preparação de remédios caseiros a base de ervas medicinais.
Nenhum dos que responderam a entrevista disse ter aprendido sobre as plantas medicinais por
conta própria.
A troca de informações sobre as plantas na comunidade acontece
sempre que as pessoas se encontram depois da missa, nas reuniões de família, nas visitas de
comadres, na ida para a roça. É comum ouvir nas ruas troca de receitas de chás e xaropes. As
plantas medicinais fazem parte do cotidiano da comunidade, existe troca de mudas e até
mesmo de plantas secas prontas para serem usadas. Nota-se ainda, um grande intercâmbio de
receitas e mudas com as cidades mineiras vizinhas que fazem divisa com o Bairro devido à
origem mineira de grande parte da população local.
75
0 1020304050
Apenas ouvindo
Observando
Ajudando
Testando por conta
propria
Formas de aprendizagem do conhecimento sobre as
plantas medicinais
Porrcentagem(%)
Figura 19- Forma de aprendizagem do conhecimento sobre as plantas medicinais entre os especialistas
entrevistados no Bairro dos Marins, Piquete-SP.
Como dito anteriormente, foram ministrados pelas instituições locais e
pela Igreja Católica, cursos sobre plantas alimentares e medicinais. Atualmente, também ocorre a
influência de meios de comunicação como a televisão, rádio, jornais e revistas que falam sobre
plantas, em uma das entrevistas foi citado a “Terapia do Limão” aprendida em um livro.
Nota-se que dentre os entrevistados do gênero masculino existe um
conhecimento maior sobre as plantas medicinais que crescem nas matas e capoeiras, enquanto que
as mulheres detêm um conhecimento maior sobre as plantas cultivadas em hortas e quintais. O
conhecimento diferenciado entre os gêneros pode estar relacionado às diferentes paisagens onde os
entrevistados passam a maior parte do seu tempo e por isso tem um contato mais próximo. As
mulheres trabalham mais nas hortas e quintais, enquanto os homens freqüentam mais ambientes de
matas e capoeiras. Para as plantas que crescem em ambiente de pasto, esta diferença não foi
observada. Resultados semelhantes foram encontrados na pesquisa feito por Amorozo & Gély
(1988), com caboclos do Baixo Amazonas no estado do Pará e ainda pela mesma autora
76
juntamente com Pinto e Furlan (2006), em área de Mata Atlântica com comunidades rurais na
Bahia. Em ambos, verificou-se a diferenciação do conhecimento entre os gêneros, onde as
mulheres dominam melhor o conhecimento das plantas cultivadas próximas ao domicílio
(quintais, hortas,jardins) enquanto os homens detêm um conhecimento maior sobre plantas
medicinais nativas que crescem em florestas e capoeiras. Os autores afirmam que a diferenciação
está relacionada aos locais onde os diferentes gêneros tem maior contato e manejo.
Ainda dentro do conhecimento diferenciado entre os gêneros, nota-se
que as mulheres entrevistadas demonstram conhecer com maior riqueza de detalhes a forma de
preparo e uso de remédios para as doenças pesquisadas do que os homens. Queiroz (1984) que
encontrou situação semelhante, relata que as mulheres ficam em casa e tem um contato maior
com os filhos, elas avaliam as condições de saúde dos familiares e tomam a decisão de
procurar os agentes de cura próprios para cada caso de doença, por esse motivo, também no
Bairro dos Marins, o conhecimento sobre a forma de preparo e utilização de remédios caseiros
a base de plantas medicinais é maior entre as mulheres.
Foi perguntado aos entrevistados, como é a freqüência de uso das
plantas medicinais dentro da comunidade atualmente, comparando-se com a época em que
eles eram mais novos e 90% dos entrevistados afirmaram que o uso das plantas medicinais na
comunidade veio diminuindo ao longo dos anos. Apenas um entrevistado, afirmou que o uso
está aumentando, não só na comunidade, como em todo lugar, pois sempre escuta falar de
plantas medicinais na televisão, e um entrevistado não soube responder. Dentre os 20
entrevistados, cinco mulheres afirmaram espontaneamente que existe uma falta de interesse de
alguns moradores em cultivar plantas medicinais em seus quintais e hortas e isso vem
ocorrendo recentemente.
“Aqui no Bairro tem gente que acha mais fácil, descer em Piquete, e ir
na farmácia e pagar caro por um remédio pra dor de barriga, do que ir no quintal pegar
umas folhas de goiabera e fazer um chá.... Tem gente que pensa que agora tudo que vem da
cidade que é bom, o que é da roça não tem mais valor, pra ser bom tem que custar caro.”
(A.C.)
77
Talvez a constatação dessas entrevistadas esteja ligada a fatores
culturais, como a recente facilidade de acesso à medicina contemporânea com a chegada do
Programa Saúde Família (PSF) ao Bairro, que fornece remédios gratuitamente para a
população, pode servir de desestímulo para que algumas pessoas continuem cultivando em
suas hortas, remédios usados para problemas de saúde básicos que podem ser resolvidos
facilmente com o uso de plantas, como dores de cabeça, diarréia, hematomas, etc. Outro
aspecto pode ser a aculturação sofrida pela comunidade quando em contato com a cultura
nacional, que tende a desvalorizar o modo de produção e o estilo de vida com base no
conhecimento tradicional. Segundo Queiroz e Canesqui, (1986) ocorre a transformação
cultural do caiçara na medida em que se intensificam as relações capitalistas de produção na
região. Segundo os autores, é possível observar que o capitalismo progressivamente altera os
sistemas tradicionais de crenças e práticas de cura, destituindo-os de legitimidade e
marginalizando seus agentes, criando novos agentes e novos significados para as velhas
crenças e costumes. Porém, no Bairro dos Marins para validar esta afirmação é preciso que se
realizem estudos diretamente ligados a investigação antropológica com enfoque medicinal.
7.4. Percepção das doenças estudadas segundo os entrevistados
As noções, como as de saúde e doença, dentro de sociedades e a
percepção dos indivíduos que compõe estas sociedades sobre esses conceitos, referem-se a
fenômenos complexos que conjugam fatores biológicos, sociológicos, econômicos, ambientais
e culturais. Atualmente existem diversos discursos sobre a saúde/doença, cada um com
enfoques e olhares diferentes sobre o tema. Há entre os autores um consenso de que esses
conceitos, para serem mais bem compreendidos, necessitam que se caracterize culturalmente,
como foi feita por esta pesquisa, a sociedade alvo do estudo.
Diversos autores trataram deste tema enfocando diferentes culturas e
diferentes comunidades ao redor do mundo. Segundo Helman, (1994) em grande parte das
sociedades não industrializadas, a saúde é conceituada como o equilíbrio no relacionamento
78
entre o homem com o homem, com a natureza e com o mundo sobrenatural. Um distúrbio em
qualquer uma dessas relações pode ser manifestado através de sintomas físicos ou emocionais.
Ainda segundo o autor, mesmo em comunidades ocidentais onde estas definições de saúde
tendem a ser menos abrangentes, estes conceitos incluem aspectos físicos, psicológicos e
comportamentais.
Segundo Queiroz & Canesqui (1986), a noção de equilíbrio pode ser
tomada como uma noção fundamental para a medicina de numerosas sociedades de tecnologia
simples. Na América Latina, esta noção está presente no equilíbrio do homem com o seu meio
natural (dentro da lógica do "quente e frio"), no equilíbrio do homem com o seu meio social
(através da crença de que crises no relacionamento social provocam doenças) e no equilíbrio
do homem com ele mesmo e com agentes sobrenaturais (através da crença de que crises
emocionais ou influências sobrenaturais provocam doenças).
A lógica do “quente e o frio” são formas de sistematizar determinada
propriedade medicinal da natureza em relação a partes do corpo humano. Pode ser considerada
de um cetro modo de ciência médica popular, desde então, explicação para o motivo de muitas
doenças naturais, e assim sugere caminhos de tratamento e prevenção (Queiroz, 1984).
Segundo Worsley (1982) apud. Amorozo (1996) em sociedades
tradicionais, os sintomas de doenças físicas são explicados de forma a não separar a natureza
do sobrenatural, o mundo social do mundo da natureza e o indivíduo de sua matriz social; mas,
pelo contrário, existe uma interdependência de todos os quatro (natureza, sobrenatural,
sociedade e indivíduo). A abordagem da doença é feita, não em um esquema biomecanicista,
mas sim cósmico. Por isso, em sociedades tradicionais, as doenças podem ser reconhecidas em
três níveis etiológicos, nos quais ocorre o diagnóstico da afecção: o nível físico (ou "natural"),
o nível sobrenatural e o nível social.
Para os entrevistados do Bairro dos Marins os conceitos de
saúde/doença estão ligados à ausência ou à presença de dor, e à boa aparência do organismo
(físico), isto é, quando o corpo está com uma aparência saudável, é sinal de saúde.
79
“Eu acho que doença é coisa ruim que dá no corpo da gente... É as
doença que sente, tá no corpo da gente, Se fala que tá doente, é porque tá sentindo dor.....” (Q.Z.).
“Quando se tá doente, todo mundo sabe, por que mesmo que a doença
seja de dentro da gente, o corpo fica estranho, as veiz a pessoas fica branca sem cor, as veiz
fica indisposta, não conversa direito, mesmo quando qué escondê não consegue por que, de
longe, quem conhece já sabe...” (M.R.)
Outro conceito ligado a saúde/doença é a impossibilidade de se
trabalhar e resultado semelhante foi encontrado por Silva-Almeida (2005), trabalhando com
medicina tradicional no vale do Ribeira, SP. Segundo a autora, vários autores enfatizam que
nas classes trabalhadoras, em que a força física é o instrumento com o qual se consegue o
sustento do corpo, a definição de saúde é dada, via de regra, pela disposição física para a vida
em geral, principalmente para trabalhar. Nesse contexto, os entrevistados consideram-se
sadios sempre que podem exercer suas atividades cotidianas sem muito sofrimento, mesmo
que estejam de fato doentes.
“Tem dia que a gente trabaia o dia intero e não sente uma dorzinha, o
corpo ta lá rijo no fim do dia sem reclamá de nada, mas tem dia que a gente só que ficá
deitado, debaixo das coberta, vendo o dia passá sem vontade de acende um fogo pra faze um
café, aí pode contá que lá vem doença....”(A.B.)
Dentro do conceito de equilíbrio entre o homem e o meio onde ele
vive, no Bairro observou-se a lógica do "quente e frio" que consiste num sistema que classifica
como quente ou frio, certos elementos, principalmente alimentos e ervas medicinais, e atribui
uma performance terapêutica diferencial desses elementos no corpo humano. Assim, doenças
quentes devem ser tratadas com ervas medicinais e alimentos frios, e as doenças frias devem
ser tratadas com ervas medicinais e alimentos quentes (Queiroz ,1984).
80
Segundo Hellman (1994) este sistema binário, que está presente em
muitos grupos culturais no mundo (islâmico, indiano, chinês e sul-americano), inclui uma
classificação de alimentos, remédios, doenças, estados físicos e mentais, poderes naturais e
sobrenaturais. Para manter a saúde, é preciso manter o equilíbrio entre os dois poderes
opostos que determinam a “temperatura” interna do corpo, evitando principalmente a
exposição prolongada a qualquer uma destas qualidades. De acordo com os entrevistados, as
pessoas podem adoecer por fatores externos, como frio, chuva e vento, ou pelo próprio
descuido do doente.
“Às vezes tá bom sem sentir nada, aí vai tira camisa, suado, num vento
frio, daí, vem uma gripe, um resfriado qualquer.... Principalmente quando toma chuva, o
corpo tá quente, esqueceu de levar uma sombrinha um agasalho e tá com o corpo quente, aí
toma aquela chuva fria, sempre dá alguma dor. Eu mesmo se tomo alguma chuva já vem
sinusite, dor de cabeça.” (S.Z)
“A mulher quando fica de dieta (resguardo pós- parto), não pode beber
nada frio, tem que ser de preferência bebida quente, uma sopinha de fubá, uma cajinha de
galinha, tem que te muito cuidado com esse negocio de frio e quente por que as veiz a pessoa
não ta avisada e come uma coisa fria na dieta, não pode.....” (R.F.)
.
Ainda segundo Hellman (1994), tanto a gravidez quanto a menstruação
podem ser classificadas como doenças quentes, em estudo americano constatou-se que
algumas porto-riquenhas em pós-parto acreditavam que determinados alimentos frios podiam
coagular o sangue. Como medida preventiva, bebem tônicos à base de substâncias quentes.
Outra causa das doenças, segundo os entrevistados, é a vontade divina, e também a cura se dá
por meio da fé que o doente tem em se curar. Esta constatação também foi observada em
outros trabalhos etnobotânicos, (Costa, (2002); Silva-Almeida, (2005); Santos, (2006))
realizados em comunidades rurais, afastadas do meio urbano, enfocando a percepção das
doenças e suas causas.
81
“Doença e saúde é coisa da vida, é coisa de Deus, as veiz tem que se
assim, quem vai saber a vontade divina...” (O.S.).
Quando perguntado aos entrevistados se eles consideravam a pressão
alta, o colesterol elevado e problemas que atacam os rins e a bexiga, como doenças, a resposta
foi igual para todos, todos afirmam que sim.
Entre os entrevistados, foi possível notar que existe uma diferenciação
entre doença e mal-estar. Para grande parte dos entrevistados, as doenças são mais sérias e
necessita-se um tratamento prolongado e repouso do doente, o mal-estar é passageiro, e alguns
relatam que, mesmo sem remédio ou repouso, o mal-estar pode melhorar.
Esse fato também foi observado por Silva-Almeida (2005) que relatou
que alguns sintomas de enfermidades crônicas podem ser ignorados, como, por exemplo, o
atordoamento derivado da pressão alta, afecção que acomete muitos. A atordoação só é levada
em conta quando impede o trabalho, havendo vários relatos de morte por elevação súbita da
pressão arterial durante a lida na roça.
“Tem diferença ente uma febrinha a toa que passa sozinha, e entre
uma que dura dias e até semana, tem que prestar atenção direitinho por que se a febre não
passa é por que tem coisa séria no meio, aí é até bom procura um médico”(S.M.Z, 39 anos).
Entre os entrevistados, observou-se o relato de doenças que só se sabe que
está curado, quando se faz exames e o médico garante que a doença melhorou. Esta constatação
demonstra que, de alguma maneira, a classificação e conceito de doenças estão sendo
influenciados pela medicina oficial (medicina não tradicional). Para Amorozo (1996), isso não
destrói os esquemas explicativos preexistentes, mas acrescenta novas possibilidades a estes.
Os vinte entrevistados concordam que atualmente as pessoas,
independente da idade biológica, adoecem mais do que há décadas atrás. Quando foi
82
perguntado o motivo desta constatação, a maioria respondeu que é por causa do modo como as
pessoas vivem atualmente. Esse modo de vida, observado nos depoimentos tem uma relação
direta com algumas mudanças ocorridas no Bairro.
A proibição do corte e a queima da mata ao redor do Bairro, para que
pudesse se formar as lavouras, fez com que as pessoas parassem de produzir seu alimento, e
fez com que a população se afastasse de alguns costumes antigos. Assim, a dependência do
meio ambiente que os cercava foi substituída pela dependência do mercado e do comércio da
cidade. Esta troca de modo de sobrevivência causa nos entrevistados mais antigos um certo
descontentamento e decepção; para os moradores mais antigos a relação com a terra, de
plantar, colher, retirar a matéria-prima para fazer as suas casas, lenha para o fogo, se mostra
mais digna do que ir a cidade para adquirir esses bens. Observa-se também que existe uma
tendência dos entrevistados em afirmar que hoje se recorre menos ao uso das plantas
medicinais para cura de doenças. Como dito anteriormente, essa constatação vem associada ao
fato de população dos Marins, atualmente ter um acesso facilitado à cidade de Piquete e aos
programas de saúde do governo. Nos Marins nota-se o uso conjunto de plantas medicinais
associadas com fármacos e para os entrevistados essa prática é comum e não causa efeitos
maléficos na saúde.
“Anda tudo errado, o jeito de comer, de viver a vida, ficamos
acomodados e nos sentimos culpados e adoecemos” (B.C.).
“Antigamente tudo que precisava era feito em casa. Plantava de tudo,
era comida, era remédio, tudo vinha da terra, hoje tudo é químico e faz mal” (O.M.)
“Antes doença era tratada em casa com remédio do mato, não tinha
isso de ir ao médico por qualquer gripinha, por que também médico num tinha, tinha mas era
difícil, para ir no médico, só em caso de morte mesmo” (C.C, 75)
83
Perguntou-se para os colaboradores da pesquisa se existem doenças
que as plantas medicinais são incapazes de curar (Figura 20).
20%
44%
4%
8%
20%
4%
Aids
Cancer
pneumonia
depressão
cura tudo
bico de papagaio
Figura 20- Relação entre o efeito de remédios feitos com plantas medicinais, doenças e problemas, na
cura ou melhora dos especialistas entrevistados no Bairro dos Marins, Piquete-SP.
Os entrevistados citaram cinco doenças das quais as plantas medicinais
não conseguem curar. Quatro colaboradores da pesquisa responderam que as plantas
medicinais curam todas as doenças, mas a cura depende da fé da pessoa que prepara o remédio
e também da fé da pessoa que recebe o remédio. Dentre as doenças citadas prevaleceram a
AIDS e o câncer.
Percebe-se que quando foi feita esta pergunta, dois dos colaboradores
da pesquisa, recorreram às suas experiências recentes com as plantas medicinais.
Quanto às respostas, o bico de papagaio e pneumonia, foram dados em
fatos recentes que ocorreram com os entrevistados. O entrevistado que respondeu bico de
papagaio sofre deste mal há muitos anos e usa um preparado de álcool com ervas para aliviar a
dor, porém segundo ele, a dor melhora, mas sempre volta. A resposta dada pneumonia também
partiu deste mesmo princípio.
84
De acordo com Rubel apud Hellman (1994), doenças populares são as
síndromes das quais os membros de um determinado grupo dizem ser vítimas e para as quais
uma cultura reconhece uma etiologia, um diagnóstico, medidas preventivas e sistemas de cura.
Ainda segundo o autor, existem doenças graves e de risco que se tornam doenças populares,
tais como o câncer, a AIDS e doenças cardíacas. Estas doenças, que são difíceis de tratar e
controlar, acabam por simbolizar grande parte das ansiedades mais comuns das pessoas, como
o medo. Assim essas doenças se tornam mais que uma simples condição clínica: elas se
tornam metáforas para diversos perigos da vida cotidiana. Entre os entrevistados do Bairro dos
Marins percebeu-se uma certa precaução em relatar doenças como a AIDS e o câncer.
Foi perguntado aos moradores se existem doenças conhecidas
atualmente que antigamente não se ouvia falar ou não eram muito freqüentes, Foram citadas
oito doenças. Segundo os entrevistados a Aids, depressão, estresse e colesterol, são doenças
“novas”, “modernas” (Figura 21), que eles só conheceram há alguns anos. As outras doenças
citadas, segundo os entrevistados, antigamente elas já tinham ouvido falar delas, mas não com
tanta freqüência como atualmente.
“Câncer é coisa antiga, mas antes não tinha esse nome não, chamava
ferida braba,e quem tava doente, evitava contar para qualquer um, era coisa muito sofrida quem
tinha. Hoje todo mundo anda com isso, para onde você olha tem alguém com isso” (Q.Z)
“Colesterol fui ouvi falá dele esse ano, quando fui no médico e o
Dotor me pediu uns exame de sangue. Aí quando voltei lá, ele disse que eu tava com
colesterol alto, fiquei assustado, aí a enfermeira me explicou que eu tinha que toma remédio
pra diminuí e tinha que come menos gordura....”(S.P)
85
0% 5% 10% 15% 20% 25% 30% 35% 40% 45%
AIDS
Estresse
Pressão alta
Colesterol
Depressão
Diabetes
ncer
Gastrite
Doenças
Figura 21 -Doenças que antigamente não se ouvia falar segundo os especialistas entrevistados no
Bairro dos Marins, Piquete-SP.
Dentro das doenças foco deste estudo, o colesterol e a pressão alta
aparecem como doenças recentes, e segundo os entrevistados são doenças que só se ouviu
falar há alguns anos e esta constatação pode estar ligada ao histórico destas doenças no Brasil.
Segundo Rafael Leite Luna, presidente da Sociedade Brasileira de Cardiologia, entre 1997 e
1999, em publicação feita pela SBC (
www.sbc.org.br/publicoes, acessado em 02 de
fevereiro de 2007). A história da hipertensão no Brasil começou em meados dos anos 40
com o primeiro livro que surgiu no Brasil sobre distúrbios de pressão de autoria de Genival
Londres, do Rio de Janeiro em 1945, chamado Hipertensão Arterial, patologia, clínica e
terapêutica. Antes de 1950 não havia um tratamento medicamentoso efetivo para a hipertensão
arterial e mais da metade dos hipertensos graves morria de insuficiência cardíaca congestiva,
15% de coronariopatia, 15% de insuficiência renal e 15% de hemorragia cerebral”. Ainda
86
segundo Luna, em 1950 o único tratamento clínico eficaz, a Dieta de Kempner, era receitada
pelos melhores clínicos; consistia de 400g diárias de arroz, acompanhada de frutas e
açucarados, sendo hipocalória, hipossódica, hipoproteica, insípida e de difícil tolerância,
porém, a única medida terapêutica real àquela época. Assim, com o avanço dos estudos foram
surgindo novas medicações e novas formas de diagnosticar a doença. Na década de 70, com a
possibilidade de dosagem laboratorial da renina e da aldosterona, nos laboratórios de análise
clínica, o estudo da fisiopatologia da hipertensão deu um grande salto no Brasil. Em 1978,
uma pesquisa epidemiológica sobre hipertensão arterial, foi realizada pela Secretaria de Saúde
do Rio Grande do Sul e Fundação Oswaldo Cruz; este foi, realmente, o primeiro estudo, em
larga escala, feito no Brasil, abrangendo todo um estado. Apenas no início dos anos 90, a
monitorização ambulatorial da pressão arterial (MAPA) popularizou-se no Brasil
(www.sbc.org.br/publicoes).
Esse relato histórico condiz com o depoimento do entrevistado que
relatou que há vinte anos viu ser feita a primeira aferição de pressão.
“A pressão alta, vi falá dela tem uns 20 anos, quando meu pai
adoeceu e mediu pela primeira vez, nunca tinha visto o aparelhinho de medir antes, hoje tem
jeito de medi a pressão em qualquer lugar, até no meio da rua” (S.P.)
O acesso facilitado e sem custo a ferramentas modernas de diagnóstico
das doenças, pelo Sistema Único de Saúde (SUS), como o colesterol que é feito a partir de
exames de sangue e com pedido médico, pode explicar por que essas doenças estão entrando
em contato com a população rural do Bairro dos Marins nos últimos anos.
A medicina popular brasileira tem seu conteúdo construído por
diferentes perspectivas e suas raízes na pluralidade de um continente que já foi habitado por
diversas etnias indígenas e contribuições dos que chegaram de Portugal e da África.
Essa mistura de culturas e crenças que mais tarde foi também
influenciada por migrantes de todas as partes do mundo, compõem hoje nossa concepção
sobre saúde, doenças, sintomas e curas. Não foi preciso esperar pelas ciências biológicas e
87
políticas para construir explicações sociais para se contextualizar onde se encontra. A
medicina convencional praticada hoje em dia convive com a diversidade de conhecimento
popular e ambas se influenciam e se modificam criando uma nova concepção de conceitos.
7.5. Ocorrência e freqüência das doenças estudadas segundo o Sistema Oficial de
Saúde
Nas sociedades modernas urbanizadas, ocidentais ou não,
freqüentemente existe o pluralismo médico. Nelas há muitos grupos e indivíduos que
oferecem ao paciente sua maneira particular de explicar, diagnosticar e tratar as doenças.
Embora esses métodos terapêuticos coexistam, são baseadas em premissas completamente
distintas, Para o indivíduo doente, no entanto, a origem desses tratamentos importa menos do
que sua eficácia em aliviar o sofrimento (Helman, 1994). Analisando as sociedades complexas
é possível identificar três alternativas de assistência a saúde sobrepostas entre si, a informal a
popular e a profissional, e cada uma delas possui seus próprios meios de explicar e tratar as
doenças,como também de definir quem cura e quem é o paciente, e especificar como ambas
devem interagir em seu encontro terapêutico (Kleinman, 1980).
Para verificar se as três doenças propostas têm ocorrência no Bairro e a
freqüência em que elas ocorrem, foram feitas entrevistas com profissionais da área de saúde
do Programa de Saúde da Família (PSF).
Segundo o site do Ministério da Saúde (
www.portal.saude.gov.br,
acessado em 20 de janeiro de 2007), o Programa de Saúde da Família - PSF - foi concebido
pelo Ministério da Saúde em 1994, com o objetivo de proceder a reorganização da prática
assistencial em novas bases e critérios, em substituição ao modelo tradicional de assistência,
orientado para a cura de doenças e no hospital. A atenção está centrada na família, entendida e
percebida a partir do seu ambiente físico e social, o que vem possibilitando às equipes da
família uma compreensão ampliada do processo saúde/doença e da necessidade de
intervenções que vão além de práticas curativas. Estas equipes são responsáveis pelo
acompanhamento de um número definido de famílias, localizadas em uma área geográfica
88
delimitada. As equipes atuam com ações de promoção da saúde, prevenção, recuperação,
reabilitação de doenças e agravos mais freqüentes, e na manutenção da saúde desta
comunidade.
Nos Marins, o PSF, vem funcionando desde 2006, e é composto por
uma equipe de seis profissionais (clínico geral, enfermeira, dois auxiliares de enfermagem,
técnico em enfermagem e assistente social) e as visitas ao bairro ocorrem uma vez por mês.
De acordo com o clínico geral, o PSF visa o tratamento prioritário de
diabetes, hipertensão e saúde da criança e da mulher. O esquema de atendimento no Bairro
funciona da seguinte forma: primeiramente é feito um cadastro dos pacientes que chegam para
a consulta. Esta etapa é desenvolvida pela assistente social e auxiliar de enfermagem, onde é
distribuída uma senha para atendimento por ordem de chegada. Após esta etapa, os pacientes
são chamados pela enfermeira que faz o histórico e ouve as queixas atuais e se for necessário
os encaminha para a consulta com o clinico geral. Esta etapa é chamada de triagem.
As consultas com o clínico geral são realizadas na escola em uma sala
improvisada, pois no Bairro não tem posto de saúde, reivindicação antiga da comunidade. Após a
consulta o paciente volta para a enfermeira que distribui os remédios e faz marcações de exames.
Os exames mais simples podem ser feitos no hospital de Piquete, como exames de sangue e urina,
porém exames mais complexos são encaminhados para Lorena, Guaratinguetá e Taubaté. O
hospital de Piquete não possui estrutura par tratar emergências graves, por isso, os moradores que
têm problemas emergenciais graves, são geralmente deslocados para Lorena.
Segundo os profissionais da saúde, as doenças que mais ocorrem no bairro
são hipertensão, diabetes, problemas respiratórios, hipercolesterolemia, verminoses, problemas na
coluna, infecção urinária e pedras nos rins. Porém uma contagem numérica não tinha sido feita
anteriormente a esta pesquisa, então, foi feita uma solicitação junto ao médico responsável que
autorizou que fossem repassados os dados numéricos dos pacientes atendidos no Bairro.
Para verificar a ocorrência das doenças propostas neste estudo (Figura 22),
foi fornecida pelo PSF a contagem do número total de atendidos pelo PSF, e o número de doentes e
pacientes que apresentavam pelo menos três das doenças alvo. Ao todo foram atendidos pelos
profissionais da saúde 105 pacientes, dentre estes homens, mulheres, crianças e idosos.
89
Para realizar a contagem foram fornecidos pelo PSF, apenas os dados dos pacientes que
apresentaram pelo menos uma das doenças alvo deste estudo. Desta forma foram identificados 37
pacientes sendo 11 homens (29,72%) e 26 mulheres (70,28%) dentro deste grupo ainda, identificou-
se 12 (32,43%) pacientes que apresentaram idade superior a 60 anos.
Hipercolesterolemia
Afecçoes renais e
urinarias
Hipertensao
N
=
12
N
= 25
N
= 17
Figura 22- Número de ocorrência das doenças estudadas entre todos os pacientes atendidos pelo PSF
durante o ano de 2006 e 2007 no Bairro dos Marins, Piquete-SP.
Verifica-se que entre as doenças que ocorrem no bairro, as três
enfermidades representam mais da metade do total de ocorrência (51,92%) entre os pacientes,
este dado foi obtido fazendo a contagem de todas as vezes que a doença aparecia mesmo que
fossem para o mesmo paciente. Assim, a hipertensão aparece 25 vezes (23,80%), problemas
renais e urinários 17 vezes (16,19%) e colesterol 12 vezes. (11,42%), confirmando a afirmação
dos profissionais da saúde de que as doenças alvo deste estudo estão entre as de maior
ocorrência no Bairro dos Marins.
Todos os profissionais da saúde entrevistados concordam que para as
três doenças hipertensão, colesterol e afecções na bexiga e rins, existe maior prevalência entre
pessoas idosas, porém atualmente essas mazelas, podem acontecer em qualquer idade,
dependendo principalmente dos hábitos de vida dos pacientes.
90
Quando perguntados se o paciente vem medicado de casa, os
profissionais da saúde, afirmaram que a maioria dos pacientes com quadros de hipertensão,
colesterol e problemas renais e bexiga fazem usos de plantas medicinais antes de chegarem ao
médico, e que existem pacientes que relatam o uso de fármacos prescrito juntamente com o
uso das ervas medicinais. Foi perguntado ao médico se ele prescrevia alguma planta medicinal
ou fitoterápico para estes tipos de doença e a resposta foi negativa.Verificou-se que os
profissionais da saúde não consideram as plantas medicinais perigosas e não interferem quanto
ao uso delas junto aos pacientes. Percebe-se que os profissionais de saúde que se formam pela
Academia de Medicina Oficial, vêem a terapêutica com plantas medicinais de uma maneira
romântica onde essas plantas mesmo que associadas a fármacos alopáticos não oferecem risco
ao equilíbrio da saúde do paciente. Para que essa prática perigosa se modifique é preciso que
as Escolas de Medicina insiram em sua grade curricular matérias que contemplem a
terapêutica com plantas medicinais e o uso adequado de qualquer sub-produto das plantas,
assim como a fitoterapia e a homeopatia.
De acordo com a enfermeira, para as três doenças, tanto a evolução do
quadro do doente e a prevenção dependem dos hábitos de vida do paciente. As principais
orientações dadas são: alimentação com pouco sal e gorduras saturadas, ingestão de mais de
dois litros de água diariamente, que o paciente não fume e faça caminhadas diárias.
Verifica-se que a hipertensão é a doença alvo de maior freqüência
média entre os pacientes atendidos (Figura 23) tanto quando ocorre isolada (12%), ou
associada ao colesterol (4%) e a problemas renais (5%). Entre a população brasileira, a
hipertensão tem prevalência de 26% na população geral adulta. Porto (1998), lembra que a
prevalência da hipertensão varia amplamente no mundo, com valores próximos de 4% na
China, e em torno de 20% nos EUA. Segundo Lessa
(1993), que apresentou uma revisão de 51
estudos brasileiros (incluindo crianças e adolescentes) sobre a da hipertensão arterial, realizada
entre 1970 e meados de 1993, as diferenças entre as prevalências mencionadas no Brasil são
muito amplas, variando entre 7,2% e 40,3% no Nordeste; 5,04% a 37,9% no Sudeste; 1,28% a
27,1% no Sul e 6,3% a 16,75% no Centro-Oeste, devidas, em parte, à diversidade de
características metodológicas importantes entre os estudos.
91
Figura 23- Freqüência média (%) dos pacientes que apresentam as doenças alvo, atendidos pelo PSF
no Bairro dos Marins, Piquete-SP.
Dentro do grupo de pacientes atendidos no PSF no Bairro dos Marins,
os problemas associados aos rins apresentam freqüência média de 7 % quando ocorre isolada,
e associada ao colesterol de a freqüência média é de 1%. Existem diversas doenças que
ocorrem relacionados aos rins e vias urinárias que podem ser de origem imunológica,
inflamatória, infecciosa, neoplásica, degenerativa, congênita, e hereditária. Esses problemas
geralmente estão associados ao desempenho correto das funções dos rins, fatores externos
como alimentação e tabagismo e fatores genéticos (www.sbn.org.br). Neste estudo, foram
abordadas as doenças que aparecem entre os entrevistados do Bairro dos Marins e como elas
se relacionam com as outras doenças alvo desta pesquisa.
Segundo os profissionais do PSF, as principais queixas dos pacientes
que sofrem de problemas ligados aos rins e a bexiga no Bairro são infecção urinária, pedra nos
rins (litíase renal), nefrite e obstrução urinária. Existe no Bairro o caso de um paciente que
perdeu o rim devido à insuficiência renal crônica, agravados pelo fato do paciente sofrer de
hipertensão, diabetes e hipercolesterolemia.
92
As infecções de trato urinário (ITU) estão entre as doenças infecciosas
mais comuns na prática clínica, particularmente em crianças, adultos jovens e mulheres
sexualmente ativas, sendo apenas menos freqüente do que as de trato respiratório. Elas
também se apresentam como as infecções hospitalares mais freqüentes em todo o mundo. Este
tipo de infecção é predominante entre as mulheres, de modo que 48% apresentam pelo menos
um episódio de ITU ao longo de suas vidas (Hörner et al., 2006).
Segundo a Sociedade Brasileira de Nefrologia, a litíase renal é uma
doença que atinge em torno de 10% da população geral, sendo que suas causas estão
associadas à herança genética e aos hábitos de vida das pessoas. Desta maneira o excesso de
ingestão de sódio, alimentos ricos em proteínas animal e baixa ingestão de líquidos, aumentam
as chances de a pessoa desenvolver cálculo renal. Os homens são acometidos numa proporção
de 3:1 em relação às mulheres, esta diferença talvez se dê por fatores hormonais, profissionais
e pelo fato dos homens geralmente ingerirem mais proteína animal do que as mulheres
(
www.sbn.org.br, acessado em 10 de março de 2007).
O colesterol foi a doença de menor freqüência média (3%) dentro do
quadro de 105 pacientes atendidos no PSF. Segundo Lessa et al. (1995), são raros os estudos
sobre dislipidemias no Brasil, os estudos populacionais são ainda mais restritos, baseados em
pequenas amostras ou grupos específicos de trabalhadores.
No início da década de 80, em Salvador, a freqüência de
hipercolesterolemia nos casos incidentes de infarto agudo do miocárdio, com colesterol
dosado na fase aguda da doença, era de cerca de 41%. Embora populacional e de incidência, o
desenho deste estudo não permitia a obtenção da freqüência do colesterol elevado nos não-
casos. Em outro estudo realizado no sudeste, para funcionários de hospitais universitários, a
prevalência de hipercolesterolemia foi de 26% no Rio de Janeiro (Nogueira et al., 1990).
Estudos foram feitos comparando classes sociais e níveis de colesterol e relatam a prevalência
de níveis séricos mais elevados para o colesterol e triglicérides em classes sociais mais
elevadas (Rouquayrol et al., 1987).
Verifica-se que a freqüência e ocorrência das doenças alvo deste
estudo varia de acordo com o gênero, hábitos de vida e também em relação ao tamanho da
amostra estudada, sugere-se que para obter resultados mais seguros que se realize um estudo
93
de caso em relação as três doenças utilizando uma metodologia mais voltada a resultados
clínicos baseadas em métodos usados na medicina. Porém, pode-se afirmar, que no Bairro dos
Marins, a hipertensão, hipercolesterolemia e problemas associados aos rins e bexiga têm
ocorrência significativa na população e sua freqüência pode ser estabelecida afirmando que é
maior para hipertensão, seguida de problemas renais e urinários e por último, o colesterol
elevado. A freqüência e a ocorrência dessas doenças, dentro da comunidade, assim como
outros fatores, podem interferir no conhecimento sobre as plantas usadas para tratar de cada
uma delas, esta discussão será feita a seguir, no item 7.7.
7.6. Ocorrência e freqüência das doenças estudadas entre o grupo de
entrevistados
Para entender a distribuição das doenças entre os 20 especialistas
entrevistados e se essa distribuição pode interferir no conhecimento sobre as plantas usadas
para a cura, foi levantado junto aos entrevistados os portadores das afecções estudadas. É
preciso lembrar que este dado, devido à pequena amostra, é relativamente menos significativa
do que os dados levantados junto ao PSF, onde a amostra foi feita com todos os pacientes
atendidos no Bairro. Dentre os 20 entrevistados, nove pessoas (45%) já foram atendidas pelo
PSF.
Verificou-se que 20% não apresentaram nenhumas das doenças
propostas neste estudo, 30% afirmaram ter problemas ligados aos rins e bexiga enquanto, 5%
declararam sofrer de hipertensão. O colesterol elevado não apareceu sozinho em nenhuma das
respostas.
Dentro do grupo de entrevistados nota-se que a doença de maior
freqüência foi a ligadas aos rins e bexiga, seguida de hipertensão e por último aparece o
colesterol elevado. Este resultado, diferente dos encontrados junto aos dados do PSF, pode ser
explicado devido ao grande número de mulheres entrevistadas que, como observado
anteriormente, apresenta alta prevalência de ITU urinárias ao longo da vida.
94
7.6.1. Doenças associadas
As três doenças associadas apareceram em 15% dos entrevistados,
enquanto 20% apresentaram problemas de hipertensão e rins, 5% apresentaram problemas de
colesterol e rins e 10% declararam ter hipertensão e colesterol associados (Figura 24).
0 5 10 15 20 25 30 35
Problemas nos rins e bexiga (PRB)
Não apresentam as doenças estudadas
Hipertensão e PRB
Hipertensão, Colesterol e PRB
Hipertensão e Colesterol
Hipertensão
Colesterol e PRB
Doenças estudadas
Porcentagem de ocorrência (%)
Figura 24. Ocorrência das doenças estudadas dentro do grupo de especialistas entrevistados
no Bairro dos Marins, Piquete-SP.
Segundo Pascoal et al. (1996), o rim e a hipertensão arterial interagem
de maneira íntima e complexa. O debate se a hipertensão é a causa ou a conseqüência da
doença renal não tem apenas importância acadêmica. No exame de um caso isolado, muitas
vezes é difícil determinar se o rim está originando ou sendo vítima da hipertensão,
evidenciando que etiologias diferentes podem ser clínica e laboratorialmente possíveis. Não
obstante, a hipertensão é agora citada como causa da insuficiência renal de 25% dos pacientes
iniciando tratamento dialítico crônico nos EUA. Diálise e transplante são terapêuticas
extremamente dispendiosas e a prevenção da lesão renal associada à hipertensão assume
também grande importância econômica. Ainda segundo Pascoal, em 1914, Volhard e Fahr
95
achavam que todos os casos de hipertensão eram secundários à doença renal. Esta hipótese foi
amplamente aceita até os anos 40, quando Talbott e Smith relataram que o dano renal era
conseqüência, mais do que causa, de hipertensão primária. Esta inter-relação permanece
controversa, mas, sem dúvida, o rim exerce grande influência na maioria dos casos de
hipertensão. A associação entre hipertensão e doença renal crônica tem sido reconhecida desde
o trabalho pioneiro de Richard Bright no Guy's Hospital em 1836 apud Pascoal, 1993. A
doença renal crônica é a causa mais comum de hipertensão secundaria (2 a 5%), a qual ocorre
em aproximadamente 80% dos pacientes com insuficiência renal crônica.
Dados do Multiple Risk Factor Intervention Trial (MRFIT) mostram
que aproximadamente 6% dos pacientes hipertensos não tratados apresentaram declínio na
função renal que os coloca em risco significante para o desenvolvimento de insuficiência renal
crônica (Walker et al., 1992). Há uma correlação entre o nível da pressão arterial e a
progressão da insuficiência renal. Por outro lado, independentemente do tipo de doença renal,
a incidência e a intensidade da hipertensão aumentam progressivamente à medida que a
função renal deteriora, de tal forma que virtualmente todos os pacientes com insuficiência
renal crônica estão hipertensos quando iniciam o tratamento dialítico. Há sugestiva evidência
de que o tratamento da hipertensão retarda a progressão da insuficiência renal na fase pré-
dialítica e reduz a incidência de eventos cardiovasculares na vigência do tratamento dialítico.
(National High Blood Pressure Education Program Working Group, 1991)
Encontram-se poucos estudos brasileiros que relacionam as altas taxas
de colesterol com doenças renais. Segundo Lima e Kubrusly (2004), a hipercolesterolemia é
um fator determinante para o surgimento da arteriosclerose, principal causa do infarto agudo
do miocárdio, acidente vascular cerebral, trombose, angina e demais doenças isquêmicas.
Pode afetar ainda, artérias do cérebro, coração e rins.
A hipótese que o dislepidemias podem causar a doenças associadas aos
rins foi primeiramente analisado há mais de um século e tem sido de intenso interesse avaliar
como tratamentos que reduzem as taxas de gordura no sangue podem melhorara insuficiência
renal. (Tonelli et al., 2005).
Durante a última década foram feitos avanços consideráveis no
entendimento clínico e experimental nos mecanismos que envolvem as doenças renais
96
crônicas. Foram identificados a hipertensão, diabetes e dislepidemias como fatores de risco
independente para perda progressiva da função renal. Em humanos, há estudos que
comprovam que a redução da hipertensão tem efeitos benéficos nas taxas de perda dos rins,
porém permanece obscuro se a redução de lipídios circulantes terá o mesmo efeito benéfico na
redução de doenças renais. Considerando que doenças cardiovasculares estão intrinsecamente
ligadas a doença renal, no futuro próximo pode-se tentar comprovar que, diminuindo as taxas
de gordura no sangue, consegue-se reduzir as taxas de mortalidade associadas aos rins e
também a doenças cardiovassculares (Keane, 2000).
Segundo os autores acima citados, as três doenças alvo desta pesquisa
relacionam-se entre si, porém esses mecanismos ainda não foram totalmente desvendados pela
medicina científica moderna. Desta forma, os dados das doenças associadas em populações
rurais merecem ser estudadas por esse ângulo,e comparadas com os dados existentes em
populações não rurais, visto que essas doenças podem ser prevenidas e curadas de acordo com
os hábitos de vida dos pacientes.
7.7 Doenças estudadas pelo ponto de vista êmico
O sistema classificatório popular não se encontra ordenado e
disponível sob o domínio de algum usuário ou praticante; na verdade, ele se encontra disperso
por uma infinidade de usuários que se apropriam apenas de fragmentos dos sistemas. Não
constitui-se, portanto, um sistema no sentido de ter sido elaborado, formalizado
intelectualmente, como encontrado na academia, tornando-se assim mais ou menos coerente,
obedecendo assim a determinadas regras de ordenação (Carrara, 1995)
De acordo com Silva-Almeida (2005) as representações merecem um
olhar atento para evitar incorrer no erro de considerar as crenças tradicionais como fanatismo ou
ignorância e compreender as opções feitas em determinadas situações. Já o uso de plantas,
possivelmente o principal recurso empregado por quem pratica ou faz uso da medicina tradicional,
deve ser investigado tendo em vista que contextos culturais podem moldar esse uso.
97
Nesse sentido, entender o “êmico”, o ponto de vista do “outro”,
consiste numa das principais ferramentas para compreensão de suas atitudes, processo de cura,
percepções e o uso dos recursos vegetais para o equilíbrio do corpo e espírito.
Procurou-se compreender essa visão na comunidade estudada, para
cada doença foi estabelecido, segundo os próprios entrevistados, uma listagem dos modos de
compreensão das doenças e sintomas estudados, assim como a etimologia de cada uma.
7.7.1 Pressão alta
Como visto nos dados do PSF, entre as doenças estudadas, a pressão
alta é a de maior prevalência no Bairro, e todos os 20 entrevistados já fizeram exames para
diagnosticá-la.
No Bairro, a pressão é medida por uma moradora, que antigamente,
quando o acesso aos médicos era mais difícil e não existia o PSF, ajudava as pessoas no bairro
na aferição da pressão e aplicava injeções. A pressão arterial também pode ser medida
mensalmente, com as visitas da equipe do Programa de Saúde da Família.
Entre o grupo de 20 entrevistados, a pressão arterial aparece entre 45%
(9 pessoas) dos entrevistados (sozinha ou associada a outras doenças), além disso, todos os
entrevistados já ouviram falar da doença e conhecem alguém que tenha. Os nomes dados a
hipertensão no Bairro segundo os entrevistados são: Pressão alta, pressão desregulada ou
pressão nervosa.
Os nomes êmicos dados as doenças e aos sintomas relacionados as três
doenças estudadas, foram “traduzidos” pela pesquisadora com auxílio dos profissionais do
PSF que atendem no Bairro, e em conversas informais feitas com médicos da área da urologia,
cardiologia e homeopatia. Também com o auxílio desses profissionais foi possível a realizar a
classificação dos sintomas relacionados à pressão alta, descritos pelos entrevistados
representados na Tabela 1.
Os sintomas descritos, não variaram muito, porém dois dos
entrevistados que têm a doença, disseram não sentir nenhum sintoma.
98
Tabela 1- Sintomas descritos pelos especialistas entrevistados para diagnosticar a pressão alta
no Bairro dos Marins, Piquete-SP.
Sintomas ligados a dores
corporais
Sintomas ligados a emoções Sintomas ligados a sensações
Dor na nuca Nervoso Calor intenso
Dor de cabeça Desespero Coração disparado
Dor no peito Angústia Vontade de vomitar
Dor no braço Ansiedade Suor frio
Visão turva
Cansaço
Perna inchada
Para a maioria dos participantes da pesquisa, a pressão alta está
relacionada com as emoções e variações de humor diárias, principalmente a emoções ligadas
ao Sistema Nervoso Central, como ansiedade, angustia e desespero.
Em estudo realizado por Peres et al. (2003), com 32 pacientes
hipertensos atendidos no Sistema Publico de Saúde, no município de Ribeirão Preto, SP; a
etiologia da doença hipertensiva, na visão dos pacientes, foi ligada a: aspectos emocionais
(35%), hábitos alimentares inadequados (30%), herança familiar (6%), álcool (6%), obesidade
(2%), cigarro (2%), sendo que 20% dos sujeitos desconheciam o que pode causar a
hipertensão. Nota-se que grande parte das respostas também se referiu aos aspectos
emocionais como fatores que dificultam o controle da pressão arterial. Dentro desta categoria,
foram encontradas respostas ligadas ao nervosismo e irritação (60%), à preocupação (31%) e à
ansiedade (9%). A ocorrência desses estados emocionais foi associada pelos pacientes a
problemas em casa (35%), contrariedade (21%) e situação financeira (12%). Em relação às
causas da pressão alta, 35% (7 pessoas) dos entrevistados relatam que as mesmas estão ligadas
99
aos maus hábitos alimentares e de vida, como o excesso de sal na comida, a falta de ingestão
de água e o tabagismo.
Ainda segundo Peres (2003), cerca de 40% dos entrevistados referiam-
se a mudanças nos hábitos alimentares e de vida como ferramenta para controlar sua pressão.
Dentro da categoria hábitos alimentares, as mudanças mais citadas foram evitar o sal (43%) e
a gordura (26%). Já a categoria mudança nos hábitos de vida envolveu respostas sobre fazer
caminhada e ginástica (80%) e evitar o fumo (20%).
Acredita-se que as crenças de acordo com as quais as pessoas tendem a
viver afetam diretamente os hipertensos na forma como enfrentam a doença e o tratamento
dessa enfermidade (Car et al., 1988).
Os entrevistados relatam o uso de muitas plantas calmantes para
melhorar os sintomas da hipertensão. As plantas citadas para a hipertensão neste estudo são
em sua maioria, depressoras do sistema nervoso central, e ajudam a combater os sintomas
ligados a emoções e as sensações (Teske e Trentini, 1995); (Matos, 2001).
“Para a pressão eu uso planta que acalma, por que eu sei que minha
pressão ta alta, quando eu fico muito nervosa, as vezes nem consigo dormi aí o chá do capim
cidreira resolve mesmo, tomo igual suco, um pouquinho durante o dia, aí a noite durmo
tranqüila...” (T.D.)
Foram citadas 27 espécies medicinais (Tabela 2) para o tratamento
desta doença, sendo que a mais citada foi Lippia alba (Mill.) N.E. Br (erva cidreira), com 14
citações e Cymbopogon citratus (DC.) Stapf. (capim cidreira), com 10 citações.
A ação sedativa da L. alba foi comprovada cientificamente. Sua ação
sedativa branda relaciona-se tanto ao citral presente no óleo essencial, quanto aos
verbascosídeo extraídos de folhas frescas da planta, ou ainda aos flavonóides não identificados
(Furtado 2000, apud Gilbert et al. 2005). Segundo o mesmo autor, em testes feitos em
camundongos a partir de extratos hidroalcóolicos aplicados por via oral, foi observado o efeito
depressor central. Recentemente (Vale et al., 2002 apud Furtado et al., 2005) descobriu-se que
100
componentes do óleo essencial de L. alba, como o limoneno, citral e o mirceno, aumentam o
tempo de sono, embora o citral não afete no início do sono, ele aumenta sua duração.
“... A erva cidreira aqui no Bairro, todo mundo sabe usá, quando
criancinha a gente já aprende, e é difícil achá uma horta por aqui que não encontra essas
bendita planta... “ (M.A.R.).
Cymbopogon citratus (DC.) Stapf teve sua ação sedativa positiva
testada em estudos preliminares usando a decocção de folhas frescas e outros estudos mostram
atividade hipotensora, ou seja, diminui a pressão sanguínea. Também existem testes para
comprovar sua ação diurética (Carballo, 1995).
Nos Marins, o capim cidreira, pode ser usado de diversas formas para
baixar a pressão sanguínea, sendo a mais comum, o chá das folhas frescas ou secas e na forma
de suco das folhas frescas. Dentre as plantas citadas para hipertensão, algumas têm o efeito
anti-hipertensivo comprovado cientificamente como, Allium sativum L. (Alho), Melissa
officinalis L. (Melissa), Cuphea carthagenensis (Jacq.) J.F.Macbr (sete sangrias) (Teske e
Trentini,1995) Mentha viridis (L.) L. (hortelã preta) Cecropia glaviozi Snethl. (embaúva)
(Matos, et al., 2001).
Cirqueira e Alves (2006), em estudos utilizando ratos wistar
anestesiados, tratados com o extrato aquoso do chá das folhas de pitanga (Eugenia uniflora L),
tiveram sua ação hipotensora comprovada. Alves et al. (2003 e 2006), usando a mesma
metodologia obteve resultado semelhante para as sementes de salsinha (Petroselinum sativum
Hoffm.).
Verificou-se na literatura etnofarmacológica e etnobotânica [(Ming
(1995), Kubo (1997), Silva-Almeida (1998), Amorozo (2002), Costa (2002), Martins et al.
(2005), Albuquerque,(2005))], que as plantas citadas para pressão alta neste estudo estiveram
presentes em muitos outros trabalhos realizados em diferentes partes do Brasil e do mundo
com diferentes tipos de comunidades.
101
Táxons Nome Popular N
o
Citações
Annonaceae
Annona muricata L. Graviola 2
Apiaceae
Foeniculum vulgare Mill. Erva doce 3
Petroselinum sativum Hoffm. Salsinha 2
Asteraceae
Chamomilla recutita (L.) Rauschert Camomila 3
Bidens pilosa L. Picão 3
Cecropiaceae
Cecropia glaviozi Snethl. Embauva 1
Crassulaceae
Kalanchoe brasiliensis Cambess. Saião 1
Cucurbitaceae
Sechium edule (Jacq.) Sw. Chuchu 1
Lamiaceae
Lavandula angustifolia Mill. Sálvia 3
Melissa officinalis L Melissa 5
Mentha crispa L. Hortelã rasteiro 8
Mentha viridis (L.) L. Hortelã preta 8
Ocimum gratissimum L Alfavaca cravo 1
Ocimum selloi Benth. Atroveram 1
Rosmarinus officinalis L. Alecrim 4
Salvia officinalis L. Sálvia 1
Liliaceae
Allium sativum L. Alho 7
Lythraceae
Cuphea carthagenensis (Jacq.) J.F.Macbr Sete sangrias 4
Moraceae
Morus nigra L. Amora 4
Myrtaceae
Eugenia uniflora L. Pitanga 1
Passifloraceae
Passiflora edulis Sims Maracujá 3
Poaceae
Cymbopogon citratus (DC.) Stapf Cidreira 10
Saccharum officinarum L. Cana-de-açúcar 1
Rutaceae
Citrus sp. Lima 5
Tropaelaceae
Tropaeolum majus L. Cocolhar 1
Verbenaceae
Lippia alba (Mill.) N.E. Br Erva cidreira 14
Sem identificação Malva de cheiro 5
Tabela 2 – Plantas usadas para o tratamento de pressão alta segundo os
es
p
ecialistas entrevistados no Bairro dos Marins
,
Pi
q
uete-SP.
V
102
Em estudo sobre conhecimento popular de plantas medicinais,
realizado por Santos (2006), em comunidade rural no Vale do Paraíba, entrevistando 17
especialistas, foram citadas 21 espécies de plantas para o tratamento da pressão alta.
Comparando com este estudo, verifica-se que existiram nove espécies em comum entre os dois
estudos, entre elas estão a salsinha, erva de São João, chuchu, sete sangrias, embaúva,
maracujá, cidreira de capim e a erva cidreira.
Em Trindad e Tobago, Lans (2006), realizou um levantamento de
plantas usadas para diabetes e problemas urinários e hipertensão e verificou-se que foram
citadas 21 plantas para diminuir a pressão arterial sendo que duas espécies e cinco gêneros
também foram citadas pelos entrevistados do Bairro dos Marins. Entre eles carambola e picão
(Annona muricata L. e Bidens pilosa L.), Morus sp., Ocimum sp., Cecropia sp., Kalanchoe
sp., e Passiflora sp. Ambos os estudos usaram o método “bola de neve”.
Segundo os entrevistados, como foi observado na percepção das
doenças, o colesterol é uma doença que apareceu recentemente, quando o acesso aos exames
de sangue ficou mais fácil; antigamente não se ouvia falar de colesterol.
“Colesterol vim saber que eu tinha por que o médico geriatra pediu os
exame de sangue, mas essas coisas a gente não entende direito, demorô até chega os resultado e o
médico pode vê, quando ele falou que no meu exame o colesterol tava alto, fiquei assustado, por
que não entendo nada, depois que ele explicô direitinho que tem a vê com as gordura que a gente
come que entope as veia e pode até mata, se descuidá “ (J.D.)
Em relação à causa da doença, 60% dos entrevistados disseram que o
colesterol está ligado a hábitos alimentares irregulares como a ingestão de carne vermelha,
leite integral, manteiga, ou seja, todo o tipo de gordura.
No Brasil, quase um terço da população entre 45 e 54 anos, faixa etária
mais propensa a eventos cardiovasculares graves, tem colesterol acima de 200 mg/dl. Verifica-
se ainda que 8% das pessoas até 24 anos ultrapassaram esse limite. "A constatação de que
103
quase um em dez jovens tem colesterol elevado preocupa", afirma Fernando Alves da Costa,
membro da Sociedade Brasileira de Cardiologia/Funcor. Segundo ele, a informação aponta
para um estilo de vida que pode comprometer a saúde dos futuros adultos. "Isso mostra o
grave erro alimentar e o sedentarismo comuns a muitas de nossas crianças e adolescentes",
reitera. (
www.sbc.org.br/dislepidemias, acessado em 04 de maio de 2007.)
Nos Marins os nomes dados ao colesterol, pelos entrevistados são:
Gordura nas veias, sangue grosso, limo nas veias, limo nas tripas, sangue gordo. No que diz
respeito aos sintomas, 20% dos entrevistados que apresentam colesterol elevado afirmam não
sentir nenhuma dor ou desconforto, enquanto 5% dos entrevistados com hipercolesterolemia
relatam sentir dores e inchaços nos tornozelo, sensação de peso no corpo, moleza e cansaço. Aqui
também os dados êmicos foram traduzidos pela pesquisadora com auxílio de profissionais da
área da saúde.
Nos Marins quando perguntados sobre plantas usadas para colesterol, os
entrevistados costumam citar plantas que tenham atividade depurativa do sangue.
“O médico veio falando que minha mulher tem colesterol e disse que
era por que tava juntando gordura nas veias e podia dá derrame e infarte. Aí fui no mato e
peguei umas planta para limpar o sangue dela, que antigamente a gente usava quando dava
muito tumor e aparecia umas coisa estranha no corpo, essas plantas aprendi com meu avô
que ia na mata pegar pra minha avó preparar, é coisa antiga mais funciona, agora dei pra
mulher tomá aí vamo vê no que dá.....” (Q.Z.)
Foram citadas 13 espécies medicinais para diminuir os níveis de
colesterol no sangue, sendo a mais citada a carqueja (Baccharis sp.) cinco citações, seguida de
berinjela (Solanum melongena L).
Nas primeiras décadas do século XX, foi confirmado que a berinjela
comum, escura, ingerida liquefeita crua e com casca é muito eficiente nesse particular,
cabendo a Roffo (1943), na Argentina, demonstrar pela primeira vez, em animais (coelhos e
104
cães) e humanos, que esse vegetal tem a virtude de diminuir o colesterol e reduzir a ação das
gorduras sobre o fígado.
No Brasil Camacho et al., 1996, baseado em informações
etnobotânicas, realizou o primeiro teste com a berinjela em coelhos, alimentados com uma
dieta rica em colesterol. Esses coelhos tratados com 40 g/dia de berinjela in natura tiveram o
seu colesterol total reduzido em 30%, confirmando assim o estudo de Roffo (1943).
Em 1998, Cruz et al. estudando 20 pacientes hipertensos, com idade
média de 59,6 anos, Índice de Massa Corporal (IMC) de 28,1 kg/m2, por 222 dias de
observação, usando o suco de berinjela violeta escura com casca liquefeito com suco de
laranja, obtiveram uma redução de até 30% no colesterol total e 43% na fração LDL-
colesterol, sem alteração significativa das frações HDL-CL e VLDL-CL, bem como do peso
corporal.
“Comecei a tomá a berinjela quando o médico disse que eu tava com
esse negócio de colesterol, tomei direitinho igual a vizinha me ensinou, só que comecei a
ismagrecê dimais, fiquei só osso. Aí parei de tomá, mas o colesteró num sei se baxô por que
num fui mais no médico vê....” (T.D.)
Carqueja é uma planta nativa do Brasil, muito difundida e utilizada
tradicionalmente na medicina popular, sendo recomendada nos distúrbios digestivos como
náusea, má digestão e diarréia (Low et al, 1994). A carqueja é rica em óleos essenciais,
contendo acetato de carquejila, alcoóis, terpenos, acetato de carquejol, saponinas,
chondilasterol, quercetina e kaempferol (Bragança, 1996)
105
Táxons Nome Popular N
o
Citações
Amaranthaceae
Hebanthe paniculata Mart. Cipó sumo 2
Annonaceae
Annona muricata L. Graviola 2
Asteraceae
Ageratum conyzoides L. Erva de São João 1
Baccharis sp. Carqueja 9
Bidens pilosa L. Picão 1
Crassulaceae
Kalanchoe brasiliensis Cambess. Saião 1
Leguminoseae Caesalpinoide
Bauhinia forficata Link. Unha de Vaca 4
Lythraceae
Cuphea carthaginensis (Jacq.) J.F.Macbr Sete sangrias 2
Malpighiaceae
Malpighia glabra L. Acerola 3
Oxalidaceae
Averrhoa carambola L. Carambola 2
Poaceae
Saccharum officinarum L. Cana de açúcar 4
Rutaceae
Citrus sp. Limão rosa 4
Citrus sp. Lima 2
Smilacaceae
Herreria salsaparilha Mart. Salsa Parrilha 4
Solanaceae
Solanum melongena L. Berinjela 7
Não identificada Inhame do Japão 2
Tabela 3 – Plantas usadas para o tratamento de colesterol alto segundos os
especialistas entrevistados no Bairro dos Marins, Piquete-SP.
106
Segundo Teske e Tretini, (1995), a carqueja exerce uma ação benéfica
sobre o fígado e intestinos, em decorrência de seus princípios amargos. Purifica e elimina as
toxinas do sangue pela ação diurética que exerce, além de ter uma propriedade
hipoglicemiante, muito útil em casos de diabetes. Experimentos pré-clínicos em camundongos
demonstram baixa toxidade do carquejol e a continuidade dos estudos em cães tem
demonstrado uma redução da pressão sanguínea e da amplitude do ritmo respiratório,
observando-se inclusive redução do colesterol de 5 a 10%.
O número baixo de espécies citadas para problemas ligados ao
aumento do colesterol no sangue pode estar relacionado ao fato de ser uma doença
assintomática a não ser em casos mais graves, onde seu diagnostico só pode ser feito por meio
de exames de sangue pedidos por médicos, além de ser uma doença conhecida há pouco tempo
pela comunidade.
7.7.3. Dor nos rins e bexiga
Dos 20 entrevistados 70% afirmaram ter ou já ter tido algum problema
na bexiga ou nos rins, exatamente por causa dos sintomas ligados a dores intensas nas costas e
na hora de urinar; essa doença é de fácil diagnóstico mesmo para leigos. No bairro, os
principais problemas nos rins e bexiga, são cálculos renais e infecções urinárias. Dentre os
entrevistados, houve um caso de perda de um dos rins.
Os nomes dados para esses males no bairro são: Areia nos rins, pedra nos
rins, dor descadeiras, dor de urina, dor de bexiga. Os principais sintomas apontados são dor nas
costas, dor na barriga, dor na hora de urinar, urina presa, urina fedida, urina com sangue, urina
pouquinho e toda hora, ardência no xixi, bexiga presa, bexiga pesada, vômito.
Para problemas nos rins e bexiga, foram citadas 30 espécies (Tabela
4). Por decisão da autora, para preservar o conhecimento da comunidade estão agrupadas na
Tabela 4 apenas 29 espécies medicinais sendo que as mais citadas foram, Phyllanthus niruri L.
(quebra pedra falso) e Costus spicatus (Jacq.) Sw. (cana do brejo).
107
Em estudo realizado por Santos (2006) numa comunidade rural na
região do Alto Vale do Paraíba, foram encontradas 35 plantas utilizadas para os problemas de
rins e bexiga; nesse estudo uma das plantas mais citadas foi o Phillanthus tenellus Roxb.
Esta planta tem seu uso difundido de norte a sul do país, conforme
pesquisas de Amorozo & Gély (1988) estudando comunidades isoladas do Pará e Riter et. al.
(2002) estudando uma população no Rio Grande do Sul
Tabela 4 Plantas usadas para o tratamento de problemas renais e urinários no Bairro dos Marins,
Piquete-SP.
Táxons Nome Popular N
o
Citações
Alismataceae
Echinodorus grandiflorus Mitch Chapéu de couro 5
Asteraceae
Achyrocline satureioides (Lam.) DC. Macela amarela 4
Ageratum conyzoides L. Erva de São João 1
Acanthospermum australe (Loefl.) Kuntze Carrapichinho 3
Baccharis sp. Carqueja 5
Bidens pilosa L. Picão 1
Mikania hirsutissima DC. Cipó Cabeludo 3
Bromeliaceae
Ananas comosus (L.) Merr. Abacaxi 2
Chloranthaceae
Hedyosmum brasiliense Miq Bugre 1
108
Commelinaceae
Dichorisandra thyrsiflora J.C. Mikan Cana da Índia 1
Cucurbitaceae
Sechium edule (Jacq.) Sw. Chuchu 1
Equisetaceae
Equisetum hyemale L. Caninha do brejo 3
Euphorbiacea
Euphorbia prostrata Aiton Quebra Pedra verdadeiro 3
Lamiaceae
Ocimum selloi Benth. Buscopam/ Atroveram 1
Peltodon radicans Pohl Hortelã de bugre 1
Lauraceae
Persea americana Mill. Abacate 5
Moraceae
Morus nigra L. Amora 4
Myrtaceae
Eugenia cf. uniflora L. Pitanga 1
Syzygium cumini (L.) Skeels Maria Preta 3
Oxalidaceae
Averrhoa carambola L. Carambola 2
Phyllanthaceae
Phyllanthus niruri L. Quebra pedra falso 10
Piperaceae
Pothomorphe umbellata (L.) Miq. Capeva 2
Poaceae
Imperata brasiliensis Trin. Sapê 2
109
Zea mays L. Milho 6
Smilacaceae
Herreria salsaparrilha Mart. Salsa Parrilha 4
Solanaceae
Solanum cernuum Vell. Panacéia 1
Vitaceae
Cissus verticillata (L.) Nicholson &C.E. Jarvis Uva ursina 1
Zingiberaceae
Costus spicatus (Jacq.) Sw. Cana do Brejo 11
Rosaceae
Pyrus communis L. Pêra 1
Estudos feitos com o extrato aquoso de P. niruri mostram que esta planta
tem um efeito potente e eficaz na inibição do crescimento do oxalato de cálcio nos rins (pedra nos
rins) e que este efeito independe das alterações que ocorrem na excreção do citrato e do magnésio
na urina. (Campos e Shor, 1999, Freitas et al., 2002, apud Gilbert et al., 2005).
A planta Costus spicatus é uma espécie utilizada na farmacopéia
popular pela sua ação depurativa e diurética, para alívio de infecções urinárias e para expelir
pedras renais. Informações etnofarmacológicas registram o uso das raízes e rizomas como
diurético, tônico, emenagogo e diaforético, enquanto o suco da haste fresco diluído em água
tem uso contra gonorréia, sífilis, nefrite, picadas de insetos, problemas da bexiga e diabetes
(Albuquerque, 1989, Mors et al., 2000). Embora o gênero Costus seja amplamente utilizado na
medicina popular, ainda são poucos os estudos farmacológicos a respeito dos extratos dessas
plantas (Saito et al., 2004).
Dentre as plantas usadas para problemas renais foi observada a lógica
do “quente e frio”, como mencionado anteriormente (tópico 7.4). Esta é uma lógica que tem
princípio e fim e traz ações no que se refere não só ao natural (em termos de propriedades
terapêuticas) como também ao corpo humano (em termos de anatomia, fisiologia e suas
110
disfunções). Tanto pode ser considerada um sistema de classificação como uma “ciência do
concreto”. (Queiroz, 1984).
A classificação das doenças “quente e frio” também foi descrita em
outras pesquisas etnobotânicas. Em estudo realizado no Município de Iporanga com
curandeiros, no Vale do Ribeira, a mesma classificação foi encontrada por Costa (2002).
Também foi observado em estudo etnobotânico no Vale do Paraíba para o grupo de doenças
de lesão de pele (Santos, 2006). Do mesmo modo como nos Marins este sistema de
classificação não se limita apenas a classificar plantas medicinais e doenças, mas também
plantas alimentares e sintomas.
“Tem gente que toma o abacate para os rins, mas o abacate é quente,
eu acho que faz mal, não pode tomá pros rins por que os rins não pode com quentura, tem que
se coisa fria, se não, faz mal” (M.D.)
“... Esse negócio de quente e frio aprendi faz tempo, pros rins é um
perigo tem que sê remédio fresco não pode ser quente, você pode ferver o chá, mas tem que
esperar esfriar e se pude põe na geladera pra ficá mais frio ainda se tomá quente piora as dô
e prende o xixi de veiz.....” (G.B.)
“... O quente que eu falo tem de tudo, tem planta quente, que é pra
curá friage, tem remédio frio que toma pra curá quentura, mas aí ocê tem que sabê se o que a
pessoa tem é quente ou frio...” (T.D.)
Segundo Goldwater (1983), esse sistema de classificação é conhecido
em toda América Latina e aplicado por indígenas e outros especialistas tradicionais na
manutenção da saúde e tratamento das doenças. Essas pesquisas são importantes para tentar
melhorar o estado nutricional e de saúde das pessoas da América Latina e de outras regiões
111
que adotam esse sistema classificatório, além de fornecer subsídios para a adoção de um
sistema de saúde mais adequado à realidade cultural de cada grupo humano.
Foi notado entre os entrevistados o costume de misturar as plantas para
fazer remédios caseiros para os rins e as plantas que vão geralmente neste preparado são,
milho, abacate, quebra pedra e a cana do brejo. Observou-se que esta mistura varia de acordo
com a disponibilidade das plantas, e elas podem ser substituídas por outras também usadas
como diuréticas como o quebra-pedra falso (
Phyllanthus niruri L ) e amora (Morus nigra L.)
Para as três doenças alvo deste estudo, foi citado um total de 58
espécies de plantas medicinais, sendo que 14 espécies foram repetidas para pelo menos duas
doenças. Para preservar o conhecimento dessa comunidade, preferiu-se representar na Tabela
5 apenas 57 espécies. Diversos fatores podem contribuir para que uma comunidade, conheça
ou não, espécies medicinais. Neste caso, atribui-se um número maior de espécies citadas para
doenças que têm os sintomas mais facilmente reconhecidos pela comunidade (problemas nos
rins e bexiga). Outro aspecto que provavelmente exerce influência no número de espécies
conhecidas para determinada doença, são os números de casos da doença entre o grupo
estudado. Nota-se que o colesterol teve a menor incidência entre as doenças estudadas, tanto
no grupo de entrevistados, quanto no grupo de atendidos pelo PSF, e para o colesterol o
número de espécies conhecidas também foi menor. O fato de a doença estar a menos tempo
presente na vida dos entrevistados, como o caso da hipertensão e do colesterol que são
doenças que apareceram recentemente na comunidade (20 a 10 anos) pode também estar
influenciando no número de espécies conhecidas.
112
Tabela 5- Espécies medicinais, citadas pelos entrevistados do Bairro dos Marins, Piquete-SP,
para as doenças alvo deste estudo Legenda: HPT= hipertensão, CLT= colesterol elevado,
PRB= problemas relacionados aos rins e bexiga. Número da exsicata: O.C= observado em
campo, IAC= número de depósito do herbário do Instituto Agronômico de Campinas, LCPB=
número de coleta da pesquisadora ainda não herborizado.
Espécies Nome Popular HPT CLT PRB N
o
exsicata
Allium sativum L. Alho
X
O.C
Achyrocline satureioides (Lam.) DC. Macela amarela
X
IAC 48437
Acanthospermum australe (Loefl.) Kuntze Carrapichinho
X
LCPB 143
Ageratum conyzoides L. Erva de São João
X X
LCPB 173
Ananas comosus (L.) Merr. Abacaxi
X
O.C
Annona muricata L. Graviola
X X
LCPB 159
Averrhoa carambola L. Carambola
X X
IAC 48448
Baccharis sp. Carqueja
X X
LCPB 170
Bauhinia forficata Link. Unha de Vaca
X
O C
Bidens pilosa L. Picão
X X X
IAC 48438
Cecropia glaviozi Snethl. Embauva
X
IAC 48441
Chamomilla recutita (L.) Rauschert Camomila
X
OC
Cissus verticillata (L.) Nicholson &C.E.
Jarvis
Uva ursina
X
LCPB 167
Citrus sp Lima
X X
O C
Citrus sp. Limão rosa
X
O C
Costus spicatus (Jacq.) Sw. Cana do Brejo
X
IAC 48443
Cuphea carthaginensis (Jacq.) J.F.Macbr Sete sangrias
X X
LCPB 103
Cymbopogon citratus (DC.) Stapf Cidreira
X
LCPB 171
Dichorisandra thyrsiflora J.C. Mikan
Cana da Índia
X
IAC 48442
Echinodorus grandiflorus Mitch Chapéu de couro
X
IAC 48435
113
Equisetum hyemale L Caninha do brejo
X
LCPB 195
Eugenia uniflora L. Pitanga
X X
IAC 48447
Euphorbia prostrata Aiton
Quebra-pedra
verdadeiro
X
O C
Foeniculum vulgare Mill. Erva doce
X
IAC 48436
Hebanthe paniculata Mart. Cipó sumo
X
LCPB 112
Hedyosmum brasiliense Miq Bugre
X
IAC 48475
Herreria salsaparilha Mart. Salsa parrilha
X X
LCPB 176
Imperata brasiliensis Trin. Sapê
X
LCPB 172
Kalanchoe brasiliensis Cambess. Saião
X X
LCPB 166
Lavandula angustifolia Mill. Sálvia
X
LCPB 192
Lippia alba (Mill.) N.E. Br Erva cidreira
X
IAC 48478
Malpighia glabra L. Acerola
X
IAC 48444
Melissa officinalis L Melissa
X
LCPB 193
Mentha crispa L. Hortelã rasteiro
X
O C
Mentha viridis L. Hortelã preta
X
LCPB 186
Mikania hirsutissima DC. Cipó Cabeludo
X
IAC 48439
Morus nigra L. Amora
X X
IAC 48477
Ocimum gratissimum L.
Alfavaca cravo
X
IAC 48445
Ocimum selloi Benth. Atroveram
X X
LCPB 78
Passiflora edulis Sims. Maracujá
X
IAC 48449
Peltodon radicans Pohl. Hortelã de bugre
X
LCPB 139
Persea americana Mill. Abacate
X
LCPB 160
Petroselinum sativum Hoffm. Salsinha
X
O C
Phyllanthus niruri L
Quebra pedra
falso
X
LCPB 163
114
Pothomorphe umbellata (L.) Miq Capeva
X
IAC 48450
Pyrus communis L. Pêra
X
O C
Rosmarinus officinalis L. Alecrim
X
IAC 48446
Saccharum officinarum L. Cana de açúcar
X X
LCPB 179
Salvia officinalis L. Salvia
X
LCPB 192ª
Sechium edule (Jacq.) Sw.
Chuchu
X X
IAC 48476
Solanum cernuum Vell. Panacéia
X
LCPB 36
Solanum melongena L. Berinjela
X
O C
Syzygium cumini (L.) Skeels Maria Preta
X
LCPB 155
Tropaeolum majus L. Cocolhar
X
IAC 48452
Zea mays L. Milho
X
O C
Não identificada Inhame do Japão
X
O C
Não identificada Malva de cheiro
X
IAC 48489
O sistema médico de classificação (doenças, sintomas, formas de
prevenção e cura) dentro do grupo de entrevistado do Bairro dos Marins, como qualquer outro
aspecto cultural desta comunidade, está constantemente se modificando e se adaptando como
uma resposta ao universo dinâmico onde essa sociedade se insere. Muitos fatores foram vistos
e discutidos nos itens anteriores sobre os aspectos que podem afetar o conhecimento e o uso
das plantas medicinais de uma população. Foram descritos fatores culturais, sociais e
ecológicos e influências inter e intraculturais. O cenário não permite que esses fatores sejam
isolados e analisados separadamente. Para entender cada uma dessas interações é preciso um
olhar amplo e minucioso por parte do pesquisador. De outro lado vemos estudos sobre o
conhecimento popular de plantas medicinais gerar produtos farmacêuticos com qualidades
adequadas ao interesse de uma indústria milionária. Infelizmente esta realidade de
desenvolvimento de novos produtos não tem promovido o bem estar das comunidades
estudadas, que se encontram ameaçadas e desprezadas tanto em seu “saber popular” quanto na
matéria-prima (animais, plantas, microrganismos.) onde está embasado este conhecimento.
115
Com a abordagem êmica é possível verificar que para as três doenças
proposta no estudo existe um sistema de classificação e diagnose popular próprio da
comunidade, por vezes influenciada pela medicina moderna, em outras com base em
experiências pessoais e coletivas, como a de se associar o tratamento do colesterol, a plantas
usadas há muitos anos no bairro, para depurar e limpar o sangue.
7.8. Plantas medicinais utilizadas
Foram encontradas 58 espécies de plantas medicinais (apêndice 2) para
as doenças estudadas, distribuídas em 32 famílias botânicas, sendo as que se mais destacam,
Lamiaceae ( n=8; 15,4%), Asteraceae (n=7; 13,5) e Poaceae ( n=3; 5,8%) e Solanaceae (n=2;
3,80%) (Figura 25). Encontram-se resultados semelhantes em diversos trabalhos etnobotânicos
com plantas medicinais para diferentes tipos de doenças em diferentes partes do Brasil e do
mundo. Dento destes trabalhos nota-se que as famílias Lamiaceae e Asteraceae, são a que mais
se destacam.
Na Figura 25, estão representadas as famílias, com pelo menos duas
espécies citadas, famílias com apenas uma espécie citada estão representadas pela categoria
“outras”, houveram duas espécies que não foram identificadas. Autores como Costa (2002),
Begossi, et al. (2002), Santos (2006), estudando comunidades inseridas na Mata Atlântica e
Amorozo et al.(2006) em trabalho feito com comunidades rurais na Bahia, encontraram
resultante semelhante para as famílias Lamiaceae e Asteraceae citadas, o mesmo foi observado
por (Almeida & Albuquerque 2002) trabalhando no semi-árido pernambucano para diferentes
categorias de doenças e problemas de saúde.
116
0
5
10
15
20
25
30
35
Outras
Lami
a
ceae
As
te
r
aceae
Po
ac
eae
Ap
iaceae
My
r
tac
eae
R
utaceae
So
lan
a
ceae
Famílias
Número de espécies
Figura 25- Distribuição por família das plantas medicinais utilizadas no Bairro dos Marins,
Piquete-SP.
Estes resultados são explicados por Bennett e Prance (2000), onde
afirmam que as famílias Lamiaceae, Asteraceae, Poaceae, Fabaceae e Malvaceae dominam a
lista de plantas medicinais exóticas com maior representatividade em espécies introduzidas
nas farmacopéias de vários grupos nativos do norte da América do Sul. Estas são famílias com
muitas espécies que contêm substâncias com atividade biológica. Há evidências de que a
seleção de plantas para uso medicinal não é feita ao acaso e que famílias botânicas com
compostos bioativos tendem a ser mais bem representadas nas farmacopéias populares
(Moerman e Estabrook, 2003 apud Amorozo et al., 2006).
Como em diversas outras comunidades que fizeram parte de estudos
etnobotânicos, no Bairro dos Marins estas plantas são espécies herbáceas que geralmente são
cultivadas ou ocorrem como ervas daninhas. A preferência para seu uso pode ser relacionada
tanto a sua fácil disponibilidade, porque são comum nas áreas perturbadas e também a respeito
dos fatores relacionados à sua atividade biológica. Baseado na teoria da evidência e da
disponibilidade, Stepp e Moerman, (2001) apud Gazzaneo et al. (2003) sugerem que estas
plantas concentram compostos biológicos muito ativos em função de seu hábito ou de suas
estratégias de vida.
117
7.8.1. Hábito, local de ocorrência e grau de manejo das plantas medicinais
Os hábitos das plantas de uso medicinal indicadas são
predominantemente herbáceos 47% (n= 17), seguido de arbóreos 24% (n=9), arbustivos
16,10% (n=6) e trepadores ou lianas 13% (n=5). (Figura 26)
A região estudada apresenta diversidade grande de paisagem como
pastos, matas, capoeiras, além da diversidade de quintais e hortas ao redor das casas dos
moradores.
0%
5%
10%
15%
20%
25%
30%
35%
40%
45%
50%
HERBÁCEO ARBOREO ARBUSTIVO TREPADOR
Hábito das plantas medicinais
Figura 26- Hábito das plantas medicinais pesquisadas no Bairro dos Marins, Piquete-SP.
A predominância do extrato herbáceo pode estar relacionada à facilidade de acesso ao
local de coleta e ao manejo deste tipo de planta, aliado ao fato dos entrevistados serem em sua
maioria mulheres que têm mais costume de lidar em paisagens de quintais e hortas. Este fato
118
também pode ajudar a entender o padrão de exploração preferencial das plantas exóticas
cultivadas.
“Na minha horta e no quintal tem todas as plantas que eu preciso para fazer meus
remédios, quando eu preciso de uma que não tem por aqui, dou logo um jeito de conseguir
uma mudinha, gosto de ter tudo fácil e perto”.(I.R.)
Este resultado foi relatado por outros pesquisadores, como em Kubo (1997), que em sua
pesquisa com plantas medicinais no Rio Grande do Sul, encontrou 57% de plantas herbáceas
seguidas de 17% arbóreas seguido de escandentes 6,3% e epíteto e hemiparasítico 0,9%.
Na figura 27 observa-se que, somando os principais locais de coleta das plantas, horta,
quintal e pasto, 82% das plantas são coletadas em ambiente onde a grande maioria de plantas é
herbácea, corroborando com os dados de forma de vida (hábito) das plantas encontradas. A
preferência dos entrevistados por plantas de hábito herbáceo que crescem em hortas e quintais,
pode ser relacionada à área onde se situa a comunidade (área de preservação ambiental), onde
segundo os entrevistados os órgãos florestais de fiscalização atuam freqüentemente de forma
punitiva. Este fato pode explicar porque a população que faz uso de plantas medicinais prefere
coletar suas espécies em locais onde não terão problemas com a legislação ambiental.
Figura 27- Local de ocorrência e coleta das plantas medicinais estudadas no Bairro dos Marins,
Piquete-SP.
119
O local onde a comunidade costuma coletar as plantas varia de
entrevistado para entrevistado. As hortas feitas nos Marins geralmente são cuidadas pelas
mulheres, enquanto o quintal pode ser cuidado por homens e mulheres. As roças são
ambientes onde existe participação dos dois gêneros. A mata é um ambiente onde os homens
têm mais convivência do que as mulheres. No Bairro observa-se que quando as mulheres vão
para as matas geralmente o fazem acompanhadas de uma presença masculina.
“Eu conheço bem minhas plantinhas que uso sempre, que tão aqui na
horta e no quintal ,conheço também as que tão no caminho onde passo, na beira da estrada
ou de rio, agora tem planta que só dá lá no grotão, aí tem que chamá o marido ou pedi pra
ele pegá” (S.Z)
7.8.2. Grau de manejo das plantas medicinais encontradas
As espécies citadas pelos entrevistados foram primeiramente separadas
em cultivadas 59,32% (n=35) e espontâneas 40,67% (n=22). Para melhor entendimento, as
plantas cultivadas (Tabela 6) são consideradas aquelas que os entrevistados fazem um grau de
manejo maior. Nesta categoria considerou-se plantas que recebem intervenção direta dos
colaboradores da pesquisa, ou seja, são plantas que vêm sofrendo intervenção antrópica ao
longo da história humana.
120
Tabela 6- Espécies medicinais cultivadas, citadas pelos especialistas entrevistados do Bairro
dos Marins, Piquete-SP, segundo a forma de vida e o local de ocorrência e coleta. Legenda:
H= herbáceo, At= arbustivo, AbB= arbóreo, T= trepadeira, Q= quintal, Ho= Horta, R= roça,
P= pasto.
Táxons Nome Popular Hábito Local de ocorrência e coleta
Allium sativum L. Alho H _
Ananas comusus (L.) Merr. Abacaxi H Q
Annona muricata L. Graviola Ab Q
Averrhoa carambola L Carambola Ab Q
Chamomilla recutita (L.) Rauschert Camomila H Ho
Cissus verticillata (L.) Nicholson
&C.E. Jarvis
Uva ursina H Ho
Citrus sp Lima Ab Q
Citrus sp. Limão rosa Ab Q
Cymbopogon citratus (DC.) Stapf Cidreira H Ho
Dichorisandra thyrsiflora J.C.
Mikan
Cana da Índia At Ho
Equisetum hyemale L Caninha do
brejo
H Ho
Foeniculum vulgare Mill. Erva doce H Q
Lavandula angustifolia Mill. Sálvia H Ho
Lippia alba (Mill.) N.E. Br Erva cidreira At Ho
121
Malpighia glabra L. Acerola At Q
Melissa officinalis L Melissa At Ho
Mentha crispa L. Hortelã rasteiro H Ho
Mentha viridis (L.) L. Hortelã preta H Ho
Morus nigra L. Amora Ab Q
Ocimum gratissimum L Alfavaca cravo At Ho
Passiflora edulis Sims Maracujá T Q
Persea americana Mill. Abacate Ab Q
Petroselinum sativum Hoffm. Salsinha H Ho
Pyrus communis L. Pêra Ab Q
Rosmarinus officinalis L. Alecrim At Ho
Saccharum officinarum L. Cana de açúcar H R
Salvia officinalis L. Salvia At Ho
Sechium edule (Jacq.) Sw.
Chuchu T Ho
Sem identificação Malva de
cheiro
H Ho
Solanum cernuum Vell. Panacéia At Ho
Solanum melongena L. Berinjela At Ho
Syzygium cumini (L.) Skeels Maria Preta Ab Q
Tropaeolum majus L. Cocolhar H Q
Zea mays L. Milho H R
122
Não identificada Inhame do
Japão
H Q
O grande número de espécies cultivadas pode ser relacionado a
diversos fatores um deles é o histórico de ocupação da área de estudo que, como visto da
revisão bibliográfica, teve muita influência dos portugueses que vinham com as bandeiras
atrás das minas de ouro. Essa miscigenação étnica ao longo de séculos, além das mudanças
culturais, serviu para introdução e popularização de espécies da Europa, África e Ásia
(Bennett & Prance, 2000).
Em trabalho realizado por Albuquerque (2005), estudando o
conhecimento de especialistas locais em comunidades rurais no Estado de Pernambuco, foi
observada uma situação similar, onde 54.5% das plantas citadas eram cultivadas. Segundo o autor
a ênfase nas plantas cultivadas observada por ele não era inesperada, porém esperava uma
proporção maior entre as espécies nativas tendo em vista que os entrevistados eram especialistas
que detinham um grande conhecimento dos recursos naturais. O autor conclui dizendo que a
relação de espécies cultivadas e não cultivadas, varia entre as comunidades, devido aos diferentes
graus de acesso em relação aos recursos da Floresta Atlântica.
As plantas espontâneas (não cultivadas, ruderais ou nativas da Mata
Atlântica) merecem aqui uma maior atenção, e foram divididas em categorias distintas, de acordo
com a relação entre elas e os entrevistados. Essa categorização foi feita a partir da observação do
pesquisador, sendo que os nomes das categorias e espécies não foram sistematizados a partir de
resposta dos entrevistados. Assim, as três categorias sistematizadas são: Plantas medicinais
beneficiadas, plantas medicinais protegidas e plantas medicinais extraídas.
Plantas beneficiadas: Plantas que tem um grau de manejo maior,
geralmente elas crescem espontaneamente em matas capoeiras ou pastos e são transplantadas
para um local mais próximo a casa dos entrevistados, estes locais onde a planta é inserida,
geralmente são quintais e hortas.
123
Plantas protegidas: Grau de manejo mais baixo do que as
beneficiadas são espécies que crescem em beiras de cercas e pastos, mesmo podendo ser
consideradas daninhas ou invasoras, por seu valor medicinal, os entrevistados mantém o local
onde elas crescem, limpo de outras pragas para ajudar no seu desenvolvimento.
Plantas extraídas: Grau de manejo próximo a zero. São espécies que
nascem nas matas ou capoeiras e que são extraídas, por vezes parte da planta, por vezes a
planta toda para serem usadas, logo depois da coleta ou armazenada para serem usadas quando
necessário.
Tabela 7- Grau de manejo e número de espécies espontâneas de plantas medicinais citadas
pelos especialistas entrevistados no Bairro dos Marins, Piquete-SP.
Categorias Beneficiadas Protegidas Extraídas
Grau de manejo
Alto Médio Baixo
Número de espécies
5 10 6
O maior número de espécies, está na categoria de plantas protegidas,
que sofrem um grau de manejo intermediário, entre elas destacam-se, carqueja, cana do brejo e
quebra pedra falso, espécies mais citadas para tratar o colesterol e problemas renais e
urinários. Dentre as espécies cultivadas estão a erva cidreira e a cidreira de capim,que foram
as mais citadas para problemas de pressão alta; ainda entre as cultivadas destaca-se a berinjela
uma das mais citadas para problemas de colesterol.
124
Tabela 8- Espécies medicinais espontâneas, citadas pelos especialistas entrevistados do Bairro
dos Marins, Piquete-SP, segundo a forma de vida e o local de ocorrência e coleta, a origem e
grau de manejo. Legenda: H= herbáceo, At= arbustivo, Ab= arbóreo, T= trepadeira;Q=
quintal, Ho= Horta, R= roça, P= pasto; PP= plantas protegidas, PB= plantas beneficiadas e
PE= Plantas extraídas.
Espéceis Nome Popular
Hábito
Local de ocorrência Origem Grau de manejo
Acanthospermum
australe (Loefl.)
Kuntze
Carrapichinho H P América tropical PP
Achyrocline
satureioides
(Lam.) DC.
Macela
amarela
H P América do Sul PP
Ageratum
conyzoides L.
Erva de São
João
H P Cosmopolita tropical PP
Baccharis sp. Carqueja H P América do Sul PP
Bauhinia
forficata Link.
Unha de Vaca Ab P Brasil PB
Bidens pilosa L. Picão H Q América tropical PE
Cecropia
glaviozi Snethl.
Embauva Ab M América do Sul PE
Costus spicatus
(Jacq.) Sw.
Cana do Brejo At Q América do Sul PB
Cuphea
carthagenensis
(Jacq.) J.F.Macbr
Sete sangrias H P América do Sul PP
Echinodorus
grandiflorus
Mitch
Chapéu de
couro
H P Américas PB
125
Eugenia uniflora
L.
Pitanga Ab P Brasil PP
Euphorbia
prostrata Aiton
Quebra Pedra
verdadeiro
H M Américas PP
Hebanthe
paniculata Mart.
Cipó sumo T M América do Sul PB
Hedyosmum
brasiliense Miq
Bugre Ab M América do Sul PE
Herreria
salsaparilha
Mart.
Salsa Parrilha T M Brasil PE
Imperata
brasiliensis Trin.
Sapê H P América tropical PE
Kalanchoe
brasiliensis
Cambess.
Saião At P América do Sul PP
Mikania
hirsutissima DC.
Cipó Cabeludo T M América do Sul PE
Ocimum selloi
Benth.
Buscopam/
Atroveram
H P Brasil PP
Peltodon
radicans Pohl
Hortelã de
bugre
At P
Brasil PB
Phyllanthus
niruri L
Quebra pedra
falso
H P América tropical PP
Pothomorphe
umbellata (L.)
Miq
Capeva At P América do Sul PB
126
Nota-se que os aspectos ecológicos das plantas citadas é intrínseco aos
aspectos culturais e históricos da comunidade estudada, não foi possível com os dados obtidos
fazer uma relação precisa entre as doenças estudadas e os aspectos ecológicos e de manejo das
plantas mais citadas, visto que esta relação é influenciada por diversos fatores, no entanto
nota-se que, os dados do ambiente onde as plantas são coletadas, demonstram que, se dá
preferência por plantas onde o acesso é facilitado tanto pela proximidade (hortas e quintais),
como pelo fato da restrição as plantas de ambiente de florestas e matas (pastos e roçados).
Outro fator a ser destacado é a facilidade de manejo de espécies em hortas e quintais enquanto
as plantas da floresta tem seu manejo mais devagar e trabalhoso; as árvores de florestas são
geralmente arbóreas, enquanto as plantas de quintais e pastos são herbáceas fáceis de ser
coletadas e transplantadas. Mesmo com essas preferências as plantas encontradas nas matas,
geralmente em ambientes menos acessados, também são usadas para as doenças alvo como a
salsa parrilha e o cipó cabeludo, que são usadas respectivamente para o colesterol e problemas
renais e urinários.
7.9. Parte utilizada, formas de utilização e critério para a coleta das espécies
medicinais
A partir da Conferência das Nações Unidas sobre o meio ambiente e
desenvolvimento em 1992, realizada no Rio de Janeiro, uma questão importante começou a
fazer parte do cotidiano de quem trabalha com plantas medicinais e conhecimento popular.
Durante a convenção, ficou certo que os conhecimentos tradicionais, seus valores e suas
práticas de manejo de recursos devem ser reconhecidos pelos Governos, pois muitos
benefícios atualmente obtidos e usufruídos em diversas necessidades humanas são fruto dessa
vivência milenar e deve-se ainda, garantir as populações indígenas e comunidades
tradicionais, oportunidade de participação nos benefícios econômicos e comerciais decorrentes
do uso desses métodos e conhecimentos tradicionais.
Entre o meio acadêmico muito se discute sobre essa questão, mas
ainda não se chegou a um consenso. Em 2001 foi lançada a Medida Provisória n. 2.186-16, de
23 de agosto de 2001, regulamentada pelo Decreto n. 3.945, de 23 de setembro de 2001, que
127
visa regulamentar o acesso ao conhecimento tradicional associado a recursos genéticos,
implicando em acompanhamento de procedimentos e autorizações de acesso, onde o órgão
público que faz esse acompanhamento é o CGEN (Conselho de Gestão do Patrimônio
Genético), ligado ao Ministério do Meio Ambiente.
Esta discussão abrange vários aspectos, desde como proceder no
retorno à comunidade, como repartir os benefícios associados a esse conhecimento, a forma de
abordar essa questão dentro das comunidades, firmar ou não contratos com as comunidades
estudadas, e mesmo o conceito de propriedade intelectual ainda precisa ser melhor discutido e
esclarecido junto aos pesquisadores.
Por parte dos pesquisadores nota-se que alguns vêm adotando
procedimentos para proteger este patrimônio cultural, principalmente na divulgação dos resultados
obtidos com a pesquisa. Segundo Albuquerque e Hanazaki, (2006), no caso de plantas medicinais,
há pesquisadores que não divulgam plantas interessantes encontradas em seus estudos até que se
construa um instrumento que garanta à comunidade, detentora original do conhecimento, os
devidos direitos, caso a planta venha originar um medicamento. Por acreditar que essa medida
não resolve o problema discutido acima, mas serve como proteção aos entrevistados, preferiu-se
não entrar em detalhes na descrição dos dados representados abaixo.
Para o preparo de remédios caseiros associados às doenças alvo deste
estudo, foram identificadas 12 partes vegetais diferentes das espécies medicinais citadas pelos
entrevistados (Figura 28). A folha é a parte vegetal mais utilizada, com 51%, seguida de planta
inteira, 9%, folhas e frutos, frutos, raiz, broto, bulbo, estigma, caule, flor, casca e sementes.
Para todos os grupos de doenças, a folha foi a parte vegetal mais usada, seguida da planta toda,
apenas para o colesterol a segunda parte mais usada foram as raízes.
Resultado semelhante foi encontrado por Santos (2006) estudando
plantas para os problemas de diabetes, hipertensão, má digestão, problemas urinários e lesões
de pele no vale do Paraíba na região do Parque Estadual da Serra do Mar, onde a parte vegetal
usada predominantemente foram as folhas (53%) seguidas da planta toda (13%).
128
0
10
20
30
40
50
60
F
olh
a
s
To
d
a
pl
ant
a
Ra
m
o
s/
F
o
lh
a
s
Fol
h
a
s
/
Fr
utos
F
ruto
Ra
iz
Brot
o
Bulb
o
Es
tig
m
a
Ca
u
le
F
lo
r
Fo
lh
as
/
Casc
a
F
olh
a
s/Sem
e
nt
e
s
Parte usada
Poncetagem (%)
Figura 28– Parte vegetal das plantas utilizadas medicinalmente pelos especialistas entrevistados para as
doenças estudadas no Bairro dos Marins, Piquete-SP.
Segundo Hidalgo (2003), a folha é o órgão da planta onde ocorre a
fotossíntese, processo pelo qual a plantas produz açúcares e outros produtos biologicamente
ativos, que serão metabolizados e usados para o crescimento da planta e demais processos
essenciais para a vida do vegetal, Dentre as substâncias produzidas estão diversos compostos
secundários muitos dos quais usados na produção de fármacos ou como modelo para a síntese
de moléculas.
No Bairro dos Marins, as folhas são usadas frescas ou secas e o
processo de secagem e armazenagem das partes vegetais das plantas varia de acordo com o
entrevistado e com a planta usada, porém observou-se que 95% dos entrevistados têm o
costume de usar as folhas ainda frescas no preparo dos remédios caseiros. Dentre as plantas
armazenadas observa-se o cabelo de milho (estigma), usado para problemas renais e urinários,
e, segundo os entrevistados, tem que ser usado maduro e seco.
“... O cabelo do milho tem que ta maduro pa colher, não pode estar
verde, tem que esperar madurá, ficar marrom; depois você coloca para secar, eu pego e seco
129
no sol dentro de um saco de pão, saco de plástico eu não uso por que as vezes faz o milho
mofa......” (A.C.)
Em diversos trabalhos etnobotânicos, o chá é a forma de preparo de
maior prevalência. Os principais modos de preparo dos remédios caseiros são apresentados na
figura 27. Kubo (1997), Costa (2002) e Santos (2006), estudando plantas medicinais em
comunidades rurais observaram que a forma de preparo mais utilizada pelos moradores locais
é o chá.. O mesmo foi visto no Bairro dos Marins (Figura 29), onde entre os entrevistados,
observa-se uma tendência a chamar de chá todas as formas de preparo onde a planta passa por
um processo de fervura, mesmo que isso ocorra despejando a água quente em cima da planta,
e não necessariamente fervendo ou cozinhando a planta na água. Apenas uma espécie foi
citada para uso externo, o cocolhar (Tropaeolum majus L.) que é usado para hipertensão. Esta
planta é colocada na testa da pessoa que está com pressão alta, o doente fica em repouso com a
folha da planta que tem que ser trocada por outra assim que o cheiro da folha acabar.
“O cocolhar é um remedião, pra pressão e dor de cabeça é colocá na
testa esperá uns minuto e dá um sono gostoso, aí você cochila um pouquinho, quando
acordar não vai sentir mais nada....” (I.R.)
130
77%
8%
7%
6%
2%
Chá
Suco
Tintura
Salada
Uso tópico
Figura 29 – Formas de utilização das plantas medicinais citadas pelos especialistas entrevistados no
Bairro dos Marins, Piquete-SP.
Nos Marins foi observado que para plantas usadas para problemas
renais, um dos entrevistados de maior idade (que faleceu durante o período da pesquisa),
relatou o uso do cordiá, que, segundo este entrevistado, nada mais é do que uma mistura de
plantas cozidas juntas.
“Para os rins você prepara um cordiá, pega as planta abacate,
quebra-pedra, cana do brejo, cabelo de milho e mistura tudo numa panela elas vão ferve,
você pega e côa e deixa esfriar, tem que tomá fria, não pode tomar quente”.(J.T.P)
De acordo com o dicionário Aurélio, cordial é “medicamento ou bebida
que fortalece ou conforta”. Esse tipo de preparação foi citada em uma comunidade rural no Vale
do Paraíba por Santos (2006), estudando casos de doenças renais e urinárias, e, segundo a autora,
esse tipo de preparação foi citado apenas para os casos de “dor de urina e bexiga”, não relatado
para outros casos. Neste trabalho as espécies usadas no Cordiá não foram publicadas.
131
O uso do “cordiá” também relatado no Vale do Ribeira em três
comunidades rurais no município de Iporanga, SP, estudadas por Costa (2002), era usado para
casos de febre, dor de barriga e disenteria. No trabalho realizado por Costa (2002), não houve
espécies semelhantes ao cordiá feito nos Marins.
Foi perguntado aos entrevistados quais critérios eram usados na
escolha do momento de coleta das plantas medicinais e todos os 20 entrevistados responderam
que o principal critério é a aparência da planta, ou seja que as plantas estejam sadias. Quanto a
outros critérios citados, estes dizem respeito às fases que a lua se encontra (35%) e a hora do
dia (25%). De acordo com os entrevistados algumas plantas citadas na pesquisa, para que
tenham o efeito esperado, devem ser coletadas ou no final da tarde ou no início da manhã, Este
critério foi indicado para algumas das espécies citadas para problemas nos rins e na bexiga,
como o caso do abacaxi, que deve dormir no sereno e ser retirado antes do nascer do sol para
fazer o efeito desejado. Os entrevistados relataram que a melhor hora do dia para se coletar as
plantas medicinais é no início da manhã.
“Quando vô faze um remédio pego as planta logo cedo, por que
depois o sol queima as coisa boa que ela dá pra gente, e também escolho as planta sem bixo e
sem marca, essa verdinha com a cara boa” (S.P.)
Embora de modo difuso, devido às mudanças sociais e culturais que
vêm sofrendo as comunidades rurais, percebe-se nos Marins que a lua é um dos astros que tem
influência direta sobre as plantas e sobre a vida social da comunidade. È comum que os dias
em que são marcadas festas e datas especiais de comemoração dentro do Bairro, observar as
pessoas consultarem o calendário ou o céu durante a noite, para verificar se no dia da festa a
lua influenciará nas chuvas na região. Esse “sinal” fornecido pela Lua também é observado
nas épocas de plantio de mudas de algumas espécies medicinais, pois segundo os
entrevistados, mesmo na época de seca, na mudança de lua, acontecem chuvas isoladas que
são usadas como a primeira rega das mudas.
132
Sobre a melhor fase da lua indicada como critério para colher as
plantas, foram obtidas respostas variadas, mas grande parte das respostas observadas, relata a
fase em que a lua está entrando na crescente indo para a cheia.
“ Oia um exemplo, aqui no calendário, vamo dizê que a gente tem que
pegar uma planta pra faze um remédio forte, no dia que deu no calendário que é o dia da lua
crescente você já pode pegá a planta, por que o calendário fala tal dia, mas a força da lua
entre três dias antes do dia dela. Quando a lua tá crescendo para a cheia ela tá pegando
força pra incorpá, a mesma coisa é com as planta, a lua minguante é pra cortá madera nun
carunchá, bambu essas coisa, mas pra planta de remédio a lua é a crescente pra cheia” (Q.Z)
Trabalhos com enfoques étnicos têm abordado o uso dos ciclos lunares
como sendo um elemento de leitura usado pelas populações tradicionais para compreender as
mudanças ambientais. Alguns trabalhos nessa área foram feitos com caiçaras, que usam os
diferentes ciclos lunares para a pesca artesanal, segundo Costa-Neto e Marques (2001), que
estudaram pescadores artesanais na comunidade de Siribinha, município de Conde na Bahia
sob um enfoque etnoecológico e verificaram que o ciclo lunar afeta tanto o comportamento
dos peixes quanto o de seus predadores humanos. O trabalho de campo, realizado por eles em
duas fases qualitativamente distintas, teve início em março de 1996 e foi concluído em março
de 1998, tendo sido interrompido em 1997, onde foram entrevistados 114 pessoas, distribuídos
segundo a comunidade em que residem, de acordo com os autores na percepção local, um
conjunto de termos marca as mudanças das correntes, nomeadas como “maré de lançamento”,
“maré de quebra” e “maré morta”. Para diagnosticar uma corrente de maré eles prestam
atenção no horário de surgimento e desaparecimento da lua na abóbada celeste (“Quando a lua
se põe meia-noite a maré começa a crescer”). Outros trabalhos foram feitos nesse contexto,
Kruel e Peixoto (2004) e Ramires et al. (2006) e estudando diferentes recursos pesqueiros com
pescadores artesanais no Brasil.
Segundo Cunha (2003), no contexto da relação sociedade-natureza,
típica do universo dos caiçaras, é possível evidenciar tanto mecanismos de ordem natural
133
quanto de ordem cultural regulando a vida social. Entre os primeiros, citam-se, como
exemplo, os chamados sistemas de alerta, que, por meio da combinação dos ventos, das
condições da maré e da lua, indicam se as condições são favoráveis para as pescarias ou não.
Na verdade, são mecanismos naturais que se interpõem no universo da pesca, porém
elaborados ou apropriados socialmente a partir da observação, da experimentação e da
cosmovisão. Esses “sistemas de alertas” são mecanismos que indicam as condições de perigo
ou evitam o livre acesso de outros pescadores nos mesmos pontos – o que acabaria por levar
ao esgotamento dos recursos.
No Bairro, as fases da lua também parecem que funcionam como
“alertas” para entender os ciclos das chuvas na região, porém, percebe-se que este
conhecimento está guardado apenas por algumas pessoas do Bairro, podendo desaparecer se
não for reconhecida a sua importância e estimulada a sua transmissão.
Os entrevistados relataram também a dificuldade de se encontrar
algumas plantas medicinais atualmente e (Figura 30) assim surgiu entre os entrevistados, uma
discussão interessante sobre se o que está difícil de encontrar, na realidade, são as pessoas que
cultivam, conhecem e usam as plantas medicinais.
“Ai, hoje é poca gente que quer sabê de mexer com planta de
remédio, é um ou outro, o que tá difícil de encontrar não é as muda de planta,é as pessoa que
planta e cuida da muda. Quem gostava de mexe com essas coisa foi ficando velho, e os jovem
não querem saber disso mais não, aí como não tem quem gosta de plantá e cuidá dos remédio
de planta, elas vão se acabando e pra trocá muda a gente tem que ir longe e procurá gente
mais velha” (B.C)
A troca de mudas continua intensa no Bairro, porém a diversidade de
plantas conhecidas e usadas entre os entrevistados tem diminuído. Foram citadas 12 espécies
de plantas que os moradores têm dificuldade de encontrar atualmente, destas plantas, oito são
cultivadas. Os entrevistados relatam que existem mudas de plantas que antigamente todos
tinham em casa, como é o caso do alecrim, da camomila e da losna, mas atualmente no bairro
essas plantas estão escassas.
134
“Antigamente a gente via nos quintais nas hortas, uma porção de
plantas pra remédio, todo mundo tinha muda e era fácil conseguir um pé de qualquer coisa
que precisava com o vizinhos, hoje até o alecrim tá difícil, o meu pezinho secou e andei o
bairro todo atrás de uma muda, por fim desisti por que quem tinha as planta tava com o pé
pequeno e não dava para tirar muda.... então fiquei sem o alecrim...” (E.P)
Entre as espécies selecionadas como difíceis de encontrar está o cardo
santo (citado, mas não disponível para coleta) que é usado no preparo de chás para resfriados e
gripes fortes; a espécie hortelã pimenta (citado, mas não disponível para coleta) que é usada
para a mesma finalidade do cardo santo, também não se encontrou no bairro. O cipó são
domingo foi encontrado pela pesquisadora, porém estava sem folhas e flores, impedindo sua
coleta e identificação, o cipó são domingo é usado na comunidade para tratar o fígado e
estômago.
A espécie medicinal citada mais difícil de ser encontrada no Bairro é o
cardo santo, 23% das respostas, seguido do hortelã pimenta 17% das respostas, cipó são
domingo 10% das respostas. alguns descrevem o cardo santo como uma planta ruderal que
tem época em que ela aparece outras que ela seca, porém houveram relatos afirmando que o
cardo santo precisa ser plantado pois não é uma espécie espontânea na região.
Dentre as 12 plantas citadas, apenas quatro foram descritas pelos
entrevistados como espontâneas, o cipó são domingo, serralha, dormideira e puáia.
135
3%
9%
10%
0,1724
0,1724
23%
Cardo santo Não tem dificuldade de encontrar as plantas
Hortelã-pimenta Alecrim
Cipó são domingo Camomila
Losna Belladona
Serralha Macelinha
Dormideira Puáia
Cibalena
Figura 30- Plantas medicinais difíceis de serem encontradas atualmente no Bairro dos Marins,
Piquete-SP, segundo os especialistas entrevistados.
Vários aspectos podem se relacionar com o uso e o desuso de uma
espécie de plantas medicinais. Segundo Amorozo (2002) a composição da farmacopéia
popular é um processo dinâmico, estando sujeita tanto a aquisições quanto a perdas. Na
comunidade dos Marins esse processo parece estar muito mais relacionado com a perda tanto
quantitativa, quanto qualitativa desse saber, porém deve-se levar em conta outros aspectos
como a necessidade de utilização de determinada espécie e a substituição dela por outras com
resultados semelhantes; deve-se considerar também a modificação da paisagem, que vêm
ocorrendo ao longo da história do Bairro, como foi observado analisando os dados, as espécies
cultivadas são mais difíceis de serem encontradas confirmando o fato de que essa perda não
está relacionada a extinção de espécies e sim a extinção deste rico saber popular.
A espécie medicinal citada mais difícil de ser encontrada no Bairro é o
cardo santo, 23% das respostas, seguido da hortelã pimenta 17% das respostas, cipó são
domingo 10% das respostas. Alguns descrevem o cardo santo como uma planta ruderal que
tem época em que ela aparece outras que ela seca, porém houve relatos afirmando que o cardo
santo precisa ser plantado, pois não é uma espécie espontânea na região. Dentre as 12 plantas
136
citadas, apenas quatro foram descritas pelos entrevistados como espontâneas, o cipó são
domingo, serralha, dormideira e puáia.
137
8. CONCLUSÃO
O Bairro dos Marins como muitas outras comunidades rurais vem
passando por processos de transformações onde, o moderno e o tradicional se relacionam e se
influenciam, formando assim uma nova realidade onde as pessoas nela inserida precisam se
reinventar a todo tempo.
a. Os moradores do Bairro dos Marins apresentam vínculo estreito
com a região da Serra da Mantiqueira, área onde está inserida esta população, tanto no aspecto
sócio-cultural quanto econômico e na dependência dos recursos naturais oferecidos pela
Floresta Atlântica.
b. As doenças propostas neste estudo, (hipertensão, hipercolesterolemia e
problemas relacionados aos rins e bexiga) têm ocorrência significativa e estão entre as doenças de
maior freqüência no Bairro entre os paciente atendidos pelo PSF, sendo que a hipertensão tem maior
freqüência média, seguida de problemas ligados aos rins e bexiga e hipercolesterolemia. Dentre o
grupo dos 20 entrevistados, notou-se uma inversão entre a doença de maior freqüência, sendo que
problemas ligados aos rins e bexiga aparece em primeiro lugar seguida de hipertensão e colesterol.
138
c. Existem no Bairro diferentes modos de nomear e classificar as doenças
estudadas e os sintomas relacionados a elas. A etimologia dessas afecções está relacionada a
fatores sociais, culturais e históricos e também é influenciada pelo contato com a medicina
convencional moderna.
d. O conhecimento sobre as plantas usadas para colesterol, pressão
arterial e problemas renais está diretamente relacionado à familiaridade que essas pessoas tem
em reconhecer e diagnosticar essas doenças e os moradores demonstraram possuir
significativo conhecimento sobre as plantas medicinais, objeto desta pesquisa.
e. As formas de utilização das plantas são principalmente em forma de
chás e sucos, sendo que a parte vegetal mais utilizada são as folhas. Os critérios para a escolha
da coleta de plantas se baseiam em mecanismos naturais e ecológicos relacionados ao meio
ambiente como, aparência das plantas, fases da lua e as horas do dia.
f. A transmissão do conhecimento sobre as plantas medicinais no
Bairro ocorre predominantemente de forma oral e a maioria aprendeu ouvindo os parentes
mais próximos como pais, avós e irmãos. O conhecimento também é transmitido dentro da
comunidade entre vizinhos, amigos e pelas relações de compadrio, havendo diferenciação do
conhecimento entre os gêneros, onde as mulheres têm maior conhecimento acerca das plantas
cultivadas e os homens das plantas nativas da Floresta Atlântica.
139
8.1. Considerações Finais
Os resultados encontrados reforçam o pensamento de que a Serra da
Mantiqueira é berço de comunidades onde os recursos naturais da Mata Atlântica, são
preservados, devido em primeiro lugar a cultura de um povo que se preocupa mais com as
relações de troca entre os seres humanos e a natureza do que com aspectos mercantilistas,
onde o que importa não é extrair e consumir apenas, mas também contribuir e enriquecer o
meio ambiente. Esta relação, que tem se mostrado mais sustentável do que a relação moderna
homem/ambiente, reflete a trajetória histórica dessa comunidade, que precisou entender cedo
que a natureza é finita e precisa ser cuidada, lembrando que o convívio com o ambiente
natural perpassa por todos os aspectos da vida cotidiana dessas pessoas relacionando-se
também, com o jeito de olhar para conceitos tão complexos como saúde, doença e cura.
No Bairro dos Marins o conceito de cura e bem estar está
intrinsecamente ligado à forma mais natural de viver, onde o sustento das famílias, tanto
alimentar como medicinal se torna digno, quando retirado diretamente da terra onde foi
plantado ou manejado. A forma de lidar com as doenças “modernas”, onde os sintomas e os
tratamentos precisam ser diagnosticados por laboratórios e por médicos, estão sendo por essa
comunidade traduzidos e inseridos dentro da rica cultura tradicional. Essa tradução, é feita no
dia a dia da comunidade em conversas com vizinhos, padres que trabalham nas pastorais da
saúde, médicos que atendem no Bairro, programas de tv e rádio, ouvidos e assistidos por eles e
principalmente nas relações com familiares, mostrando que o conhecimento popular é
dinâmico e se modifica de acordo com o tempo e espaço onde a comunidade se insere.
Cabe a comunidade acadêmica científica e aos órgãos públicos, que
reconhecem o valor e a importância de se preservar um saber tão rico e complexo, que corre
perigo de se extinguir juntamente com o meio ambiente que o rodeia, colaborar com ações práticas
e leis adequadas à realidade local. Porém é preciso ter a clara idéia de que este conhecimento,
adquirido de experiências pessoais e construído durante gerações, é propriedade única das pessoas
que formam a comunidade dos Marins, e precisa ser respeitado tanto culturalmente como
economicamente e as contribuições para a medicina convencional, que possam vir a ser
aproveitadas, precisam ser discutidas e repartidas com as pessoas que o detêm.
140
Sugere-se que seja feito junto à comunidade um trabalho de
reconhecimento e valorização do saber popular sobre as plantas usadas como remédio, este
trabalho que já teve início com esta pesquisa que contribuiu para despertar e redescobrir na
comunidade a importância das plantas na vida cotidiana deve ser feito em parceria com as
entidades e lideranças locais que na comunidade ainda não estão totalmente fortalecidas.
Espera-se que o conhecimento aqui levantado, futuramente possa ser aproveitado de maneira
prática para melhorar o bem estar e a qualidade de vida dos moradores locais.
141
9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALBUQUERQUE, J. M. Plantas Medicinais de Uso Popular. Brasília: ABEAS, 1989. 100p.
ALBUQUERQUE, P. A., ANDRADE, L.H.C., SILVA, A.C.O. Use of plant resources in a
seasonal dry forest (Northeastern Brazil). Acta bot. bras. n. 19. v. 1. p. 27-38. 2005.
ALBUQUERQUE, U.P. Introdução à etnobotânica. Recife: Bagaço, 2002.87p.
ALBUQUERQUE, U. P. Etnobiologia e Biodiversidade. NUPEEA, 2005.
ALBUQUERQUE, U.P, LUCENA, R.F.P. Can apparency affect the use of plants by local
people in tropical forests? Interciencia, v. 30, p. 506-511. 2005.
142
ALBUQUERQUE U.P. Re-examining hypotheses concerning the use and knowledge of
medicinal plants: a study in the Caatinga vegetation of NE Brazil. J. Ethnobiol
Ethnomedicine. v. 2: p. 30. 2006.
ALBUQUERQUE, U.P., HANAZAKI, N. As pesquisas etnodirigidas na descoberta de novos
fármacos de interesse médico e farmacêutico: fragilidades e pespectivas. Revista Brasileira
de Farmacognosia. v. 16: 678-689, 2006.
ALEXIADES, M. Collecting ethnobotanical data: An introduction to basic concepts and
techiniques (cap. 3). in: Selected guideleines for ethnobotanical research: a field manual.
The New York Botanical Garden. 1996.
ALVES, M. J. Q. F., CAMPOS, K. E., BRACCIALLI, A. L. Efeito diurético e
antihipertensivo do extrato aquoso de salsa (Petroselium sativum) em ratos SHR. In: III
Simpósio Miguel R. Covian, 2003, Ribeirão Preto. Anais do Evento. Ribeirão Preto, 2003. p.
05-05.
ALVES, M. J. Q. F., CAMPOS, K. E., BALBI, A. P. C. Diuretic and hipotensor actviy of
aqueous extract of brazilian parsley seeds (Petroselium sativum Hoffm) in rats. In: I Encontro
nacionals sobre ética na experimentação animal, 2006, Botucatu.
J.venom.anim.toxins.incl.trop.dis. v. 12. p. 665-665. 2006.
AMOROZO, M.C.M., GÉLY, A.L. Uso de plantas medicinais por caboclos do Baixo
Amazonas, Barcarena, PA. Boletim do Museu Paraense Emilio Goeldi: Série Botânica. v. 4,
n.1, p. 47-131, 1988.
AMOROZO, M.C.M. A abordagem etnobotânica na pesquisa de plantas medicinais. In: DI
STASI, L. C. (Org.). Plantas medicinais: Arte e Ciência. São Paulo: UNESP, 1996. p. 47-68.
143
AMOROZO, M.C.M. Uso e diversidade de plantas medicinais em Santo Antonio do Leverger,
MT, Brasil. Acta Botanica Brasilica, v. 16, n. 2, p. 189-203, 2002.
AMOROZO, M.C.M., FURLAN, A., PINTO, E.P.P. Conhecimento popular sobre plantas
medicinais em comunidades rurais de Mata Atlântica – Itacaré, BA, Brasil, Acta bot. Bras.,
2006.
BEGOSSI, A. Ecologia Humana: Um Enfoque Das Relações Homem-Ambiente.
Interciencia, v. 18, n. 1, p.: 121-132. 1993.
BEGOSSI, A.; HANAZAKI, N. TAMASHIRO, J. Y. Medicinal plants in the Atlantic Forest
(Brazil): knowledge, use and conservation. Human Ecology, v. 30, n. 3, 2002.
BENNETT, B.C, PRANCE G.T. Introduced plants in the indigenous pharmacopoepia of
Northern South America. Economic Botany 54, pg. 90-102, 2000.
BERNARD, H.R. Research methods in cultural anthropology. Newbury Park: SAGE,
1988. 520 p.
BRAGANÇA L. A. R. Plantas medicinais antidiabéticas. Uma abordagem
multidisciplinar. Rio de Janeiro: Editora EDUFF, 1996.
CABALLERO, J. Perspectivas para el quehacer etnobotanico em. BARRARA, A. La
Etnobotânica: Três puntos de vista y una perspectiva. Xalapa, Mexico: Instituto Nacional
de Investigaciones sobre Recursos Bioticos, 1983. p. 25-28.
144
CAMACHO, R.D. ALVES, M.J.Q.F., RÚBIO, C.R e BRUNO-NETO, S. Alterações dos
níveis plasmáticos de colesterol em coelhos produzidos pela ingestão de berinjela. In: II
Workshop de Plantas Medicinais de Botucatu, 1996, Botucatu SP, Anais, pg. 64.
CAPOBIANCO, J. P. R. (Org.) Dossiê Mata Atlântica 2001: Projeto monitoramento
participativo da Mata Atlântica. São Paulo: Instituto Sócio Ambiental, 409p. 2001.
CAR, M.R., PIERIN, A.M.G., MION JUNIOR, D., GIORGI, D.M.A. Crenças de saúde do
paciente com hipertensão arterial. Rev Paul Enferm. v. 8, p. 4-7. 1988.
CARRARA. D. Possangaba: Pensamento médico popular. Rio de Janeiro. 1995.
CASTELLUCI, S. Et al. Plantas Medicinais relatadas pela comunidade residente na Estação
Ecológica de Jataí, Município de Luiz Antonio/SP: Uma abordagem Etnobotânica. Rev. Bras.
Pl. Med., Botucatu, SP, v.3, n.1, p.51-60, 2000.
CIRQUEIRA, R. T., ALVES, M. J. Q. F. Atividades antibacteriana, diurética e hipotensora da
Eugenia uniflora. In: 9o Encontro Regional de Biomedicina, 2006, Botucatu. Anais do
evento. Botucatu : Comissão Organizadora, 2006.
CORREA, F., COSTA, J.P., ALBUQUERQUE, J.L.R. Roteiro para o entendimento de seus
objetivos e seu Sistema de Gestão Consórcio Mata Atlântica e do Conselho Nacional da
Reserva da Biosfera da Mata Atlântica. Série Cadernos da Reserva da Biosfera da Mata
Atlântica. Caderno nº 2 A Reserva da Biosfera da Mata Atlântica. 1 ed. São Paulo, 1996.
145
COSTA – NETO, E.M., MARQUES, J.G.W. Atividades de pesca desenvolvidas por
pescadores da comunidade de Siribinha, município de Conde, Bahia: Uma abordagem
etnoecológica. Série Ciências Biológicas, v. 1, n.1, p.71-78. 2001.
COSTA, M.A.G. Aspectos etnobotânicos do trabalho com plantas medicinais realizado
por curandeiros no município de Iporanga, SP. 2002, 134 f. Dissertação de Mestrado
(Mestrado em Ciências Agronômicas/Horticultura) – Faculdade de Ciências Agronômicas,
Universidade Estadual Paulista. Botucatu, 2002.)
CRUZ, J, CRUZ, H.M.M., BARBOSA-FILHO, J.M. Tratamento das Hiperlipidemias. In:
Jenner Cruz, Rui Toledo Barros, Helga Maria Mazzarolo Cruz (Org.). Atualidades em
Nefrologia. Ed. Sarvier. São Paulo v. 5, p. 460-467. 1998.
CUNHA, L.H.O. Saberes patrimoniais pesqueiros. Desenvolvimento e Meio Ambiente, n. 7,
p. 69-76, jan./jun. Editora UFPR. 2003.
DIEGUES, A.C.S. Populações tradicionais em unidades de conservação: o mito da
natureza intocada. São Paulo: USP/NUPAUB (Série Documentos e relatórios de pesquisa,
n.1). 1993.
DIEGUES, A.C.S., VIANA, L., ADAMS, L. Conflitos entre populações humanas e áreas
naturais protegidas na Mata Atlântica. São Paulo: USP/NUPAUB, 1995.
DIEGUES, A.C.S., ARRUDA, R.S.V. Saberes tradicionais e biodiversidade no Brasil.
Brasília: Ministério do Meio Ambiente. 2001. 176p.
FONSECA-KRUEL, V.S., PEIXOTO, A.L. Etnobotânica na Reserva Extrativista Marinha de
Arraial do Cabo, RJ, Brasil. Acta bot. bras. v. 18, n.1, p.177-190. 2004.
146
FRAVIN, L.J.B. Levantamento da cobertura vegetal do município de Campos do Jordão no
período de 1962 à 1977, através de fotografias aéreas. Revista Silvicultura em São Paulo, v.
17, n. 19, p 39-45. 1983.
FREYRE, G. Casa-grande & senzala. 22. Ed. Rio de Janeiro: J. Olympio, 1983.
FUNDAÇÃO CHRISTIANO ROSA Proposta para criação do CEDECO – Centro de
Educação para Ecologia, Meio Ambiente e Conservação e Preservação de Germoplasma.
Piquete, 1991.
GARAY, I. E.G, BECKER, B.K. As dimensões humanas da biodiversidade: O desafio de
novas relações sociedade-natureza no século XXI. Petrópolis: Editora Vozes, 2006. 483p.
GAZZANEO, L.R, LUCENA, R.R.P. AND ALBUQUERQUE, U.P. Knowledge and use of
medicinal plants by local specialists in an region of Atlantic Forest in the state of Pernambuco
(Northeastern Brazil). Journal of Ethnobiology and Ethnomedicine, v.1, n. 9, p. 1-9. 2005.
GILBERT, B. FERREIRA, J.L.P., ALVES, L.F. Monografias de plantas medicinais
brasileiras e aclimatadas. Curitiba: Abifito, 2005.
GOLDWATER, C. Traditional medicine in Latin America. In: BANNERMAN, R.H.,
BURTON, J., WEN-CHIEH, C.(Ed.) Traditional medicine and health care coverage. World
Health Organization (OMS). Geneva, p. 37-49, 1983.
GONÇALVES, E.L., OLIVEIRA, H.L., KIEFFER, J., GERMEK, O.A., PEREIRA, V.G.
Manual de Clínica Médica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan. 1980.
147
HANAZAKI, N., LEITAO-FILHO, H.F., BEGOSSI, A. Uso dos recursos da Mata Atlântica:
O caso da Ponta da Almada (Ubatuba, Brasil). Interciência, v.21, n.5, p. 1-17, 1996.
HELLMAN, C.G. Cultura, Saúde e Doença. Trad. Eliane Mussmich. 2 ed. Porto Alegre:
Artes Médicas, 1994. 333p.
HIDALGO, A.F. Plantas de uso popular para o tratamento da malária e males associados da
área de influência do Rio Solimões e Região de Manaus, AM. Tese (Doutorado em
Horticultura) – Universidade Estadual Paulista, Botucatu, SP. 2003.
HOORNAERT, E. Formação do catolicismo brasileiro, 1550-1800. Petrópolis: Vozes,1978.
HOORNAERT, E. Thales de Azevedo e a sociologia do catolicismo no Brasil. Revista
Eclesiástica Brasileira (REB), fasc. 214, p. 427-438, junho 1994.
HÖRNER, R., VISSOTTO, R., MASTELLA, A., SALLA, A., MENEGHETTI, N,
FRASSON, L., DAL FORNO, R.A., RIGHI & LOIVA O. DE OLIVEIRA. Prevalência de
microrganismos em infecções do trato urinário de pacientes atendidos no Hospital
Universitário de Santa Maria. RBAC, vol. 38, n. 3, p.: 147-150, 2006.
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE.
www.ibge.gov.br/cidadesat, acessado
em 28 de outubro de 2006.
KEANE, W.L. The role of lipids in renal disease. Kidney International. v. 57, p. 27-31.
2000.
KLEINMAN, A. Patients and Healers in the Context of Cultures. An Exploration of
Boderland between Anthropology and Psychiatry. Berkeley/Los Angeles? University of
California, Press, 1980.
148
KUBO, R.R. Levantamento das plantas de uso medicinal em Coronel Bianco, RS. Porto
Alegre, RS, 1997. 161 f. Dissertação (Mestrado em Botânica) – Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, RS.
LANS, C. A. Ethnomedicines used in Trinidad and Tobago for urinary problems and diabetes
mellitus. Journal of Ethnobiology and Ethnomedicine. v. 2. n. 45. 2006.
LESSA, J.L.C. Estudos Brasileiros Sobre a Epidemiologia da Hipertensão Arterial: Análise
Crítica dos Estudos de Prevalência. Inf. Epidemiol., SUS, Cenepi, Ministério da Saúde 1993;
n. 3, 59-75.
LESSA, J.L.C., MIRABEAU, L., CARNEIRO, J. MELO, J., OLIVEIRA, V., PINHEIRO, J.,
MEIRELES, F., REIS-NETO, J., REIS, F., GOUVÊA, M.C., COUTO, M., OLIVEIRA, M.R.,
SOUZA, S. Prevalência de Dislipidemias na Demanda Laboratorial de Três Diferentes
Prestadores de Assistência, Salvador, BA. Arq. Brás. Cardiol. v. 70, n. 5, 1998.
LÉVI-STRAUSS, C. O pensamento selvagem. Campinas: Papyrus, 1989.
LIMA, R.C, KUBRUSLY L.F. Diretrizes da cirúrgia de revascularização miocárdica
valvopatias e doenças da aorta. Arq. Bras. Cardiol. Vol. 82, suppl. 5, São Paulo, 2004.
LOW T., TONY R., BERESFORD, R. Segredos e virtudes das plantas medicinais. Plants
Readers Digest Livros, 1994.
MARTIN, G. J. Ethnobotany: A Methods Manual . WWF International, UNESCO, Royal
Botanical Gardens, Kew. UK. Chapman & Hall. 1 ed. 268p. 1995.
149
MARTINS, A.G., ROSARIO, D.L., BARROS, M.N. & JARDIM, M.A.G. Levantamento
etnobotânico de plantas medicinais, alimentares e tóxicas da Ilha do Combu, Município de
Belém, Estado do Pará, Brasil. Rev. Bras. Farm. n. 86, v.1. p. 21-30. 2005.
MATOS, F. J.A. Plantas Medicinais. Vol. I. IOCE, Fortaleza, 2000.
MATOS, F.J.A. Guia Fitoterápico. 2 ed. Fortaleza. 2001.
MING, L.C. Levantamento de plantas medicinais na reserva extrativista Chico Mendes
Acre. Botucatu, 1995. 180 f. Tese (Doutorado em Ciências Biológicas) – Faculdade de
Ciências Agronômicas, Universidade Estadual Paulista, Botucatu, 1995.
MING, L. C. Projeto de Pesquisa em Bioprospecção e bioensaios de plantas com atividades
aticâncer e no controle de colesterol, pressão arterial e diurese na APA da Serra da
Mantiqueira do Estado de São Paulo sob o enfoque randômico e etnobotânico, 2005.
Ministério da Saúde:
www.portal.saude.gov.br, acessado em 20 de janeiro de 2007.
MORS, W. B., RIZZINI, C. T., PEREIRA, N. A. Medicinal Plants of Brazil. Michigan:
Incorporated Algonac, 2000.
MYERS, N; MITTERMELER, A. R.; MITTERMELER, C. G.; FONSECA, G.B.A.; KENT, J.
2000. Biodiversity Hotspots for conservation priorities. Nature 403: 853-858.
National High Blood Pressure Education Program Working Group. Report on hypertension
and chronic renal failure. Arch Intern Med. n. 151, p.1280-1287, 1991.
150
NETO, E.J., LOTUFO, P.A., LÓLIO, C.A. Tratamento da hipertensão e declínio da
mortalidade por acidentes vasculares cerebrais. Rev. Saúde Pública, n.24, p. 332-6,1990.
NEVES, C.R.F. Análise das áreas de proteção ambiental enquanto instrumento da
política nacional do meio ambiente Estudo de caso: APA Campos do Jordão. (Monografia
– Geografia – Universidade de Taubaté) Taubaté, 2004, pg. 58.
NOGUEIRA, A.R, ALVES, P.M, MIRANDA R.F, BOECHAT, N.L. Colesterol e outros
fatores de risco cardiovascular em servidores da UFRJ. Prevalências e influências sociais.
ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE. CD10: Classificação Estatística Internacional de
doenças e problemas relacionados à saúde. 8ª ed. São Paulo: EDUSP 1191p. 2000.
PACIORNICK, E. F. 1989. Plantas medicinais do Município de Curitiba, Paraná. Família
Asteraceae Dumortier. Curitiba, 187p. Dissertação (Mestrado em Botânica). Setor de
Ciências Biológicas da Universidade Federal do Paraná.
PASCOAL I.F., SALDANHA L.B., LEO P., PRADO M.J.B.A., MARCONDES M., PRADO
E.B.A. Pregnancy aggravates adriamycin-induced nephropathy in hypertensive rats.
Hypertension in Pregnancy, v. 12, n. 2, p.248, 1996.
PEREIRA, R.L., ÁVILA, C.A., MOURA, C.AV., ROIG, H.L. Geologia e Geoquímica do
Granito Mendanha e do Granitóidemarins e Idade 207pb/206pb do Granito Mendanha,Faixa
Ribeira, São Paulo. São Paulo, UNESP, Geociências, v. 20, n. 1,p. 49-60, 2001.
PERES D.S.; MAGNA J.M., VIANA L.A. Portador de hipertensão arterial: atitudes, crenças,
percepções, pensamentos e práticas. Rev. Saúde Pública. v. 37, n. 5. p. 635-42, 2003.
151
PINTO, E.P.P., AMOROZO, M.C.M., FURLAN, A. Conhecimento popular sobre plantas
medicinais, em comunidades rurais, em área de Mata Atlântica – Itacaré, BA. Acta Botânica
Brasílica Aceito para publicação, v.20, 2006.
PORTO, CC. Hipertensão Arterial. In: Porto CC editores. Doenças do coração: prevenção e
tratamento. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan, p. 453-60. 1998.
POSEY D.A. Etnoentomologia de tribos indígenas da Amazônia. In: RIBEIRO BG (Ed),
Suma Etnológica Brasileira. Série Etnobiologia. Editora Vozes, Petrópolis, RJ, Brasil, 1986. p.
251-273.
PRANCE, G.T. Ethnobotany Today and in the Future. In: Ethnobotany: Evolution of a
Discipline. By Diosocorides Press. P. 60-68.1995.
PRANCE, G.T. Ethnnobotany and the future of conservation. Biologist, v. 47, n.2, p. 65-68,
2000.
QUEIROZ, M. I. P. de. Os catolicismos brasileiros. Cadernos do Centro de Estudos Rurais
e Urbanos, n.º 4, p. 157-188, 1971.
QUEIROZ, M. de S. & CANESQUI, A.M. Contribuições da antropologia à medicina: Uma
revisão de estudos no Brasil. Rev. Saúde pub. São Paulo, v. 20. p. 141-151 1986.
QUEIROZ, M. S. Hot and cold classication in traditional Iguape medicine. Etnology, v. 23,
n.1, p. 63-72. 1984.
152
RAMIRES, M., MOLINA, S.M.G., HANAZAKI, N. Etnoecologia caiçara: o conhecimento
dos pescadores artesanais sobre aspectos ecológicos da pesca. Biotemas, v.20, n.1, p.101-113.
2006.
REIS, M. S., GUERRA, M.P., MANTOVANI, A. Manutenção e uso da biodiversidade na
Mata Atlântica. . In: CONGRESSO BRASILEIRO DE APICULTURA, 13., 2000,
Florianópolis-SC. Anais do XIII Congresso Brasileiro de Apicultura: Confederação
Brasileira de Apicultura, 2000. [CD ROM].
RIBEIRO, D., RIBEIRO, B.G. (Editor). Suma Etnológica Brasileira. 2ª Ed. Petrópolis,
Vozes/Finep, 1986.
RITER, M. R. Plantas usadas como medicinais no município de Ipê, RS. Revista Brasileira
de Farmacognosia, v. 12, n. 2, p.51-62, 2002.
RIZZINI, C.T. Tratado de fitogeografia do Brasil: aspectos sociológicos e florísticos. São
Paulo: Editora da Universidade de São Paulo. 1976-1979, v.2. 374p.
ROFFO, A.H. Eggplant in decholesterolization (Solanum melongena). Bol Inst Med Exp
Estud Trat Câncer. 1943, v. 20, p. 515.
ROJAS, A.G. En busca de una distribución equitativa de los beneficios de la
biodiversidad y el conocimiento indígena. 1a. ed. – San José, C.R.: UICN/Mesoamérica,
2005. 390 p.
ROSENDORFF, C. Treatment of Hypertension in the Prevention and Management of
Ischemic Heart Disease. Circulation May 29, 2007. Disponível em:
http://www.circ.ahajournals.org
153
ROUQUAYROL MZ, VERAS FMF, VASCONCELOS J, BEZERRA RC, GOMES ILP,
BEZERRA, F.A.F. Fatores de risco em doença coronária: Inquérito epidemiológico em
estratos habitacionais de um bairro de Fortaleza. Arq. Bras. Cardiol. v: 49. p. 339-47. 1987.
SAITO, S.T., CIGNACHI, G., GASPARRI, SAFF, J. Avaliação da atividade mutagênica e
antimutagênica induzidas pelo extrato vegetal da Costus spicatus. Revista de Iniciação
Científica da ULBRA. n.3. p. 51 a 60. 2004.
SANTOS, J.F.L. Uso popular de plantas medicinais na comunidade rural da Vargem
Grande, Município de Natividade da Serra, SP. 2006, 104 f. Dissertação de Mestrado
(Mestrado em Ciências Agronômicas/Horticultura) – Faculdade de Ciências Agronômicas,
Universidade Estadual Paulista. Botucatu, 2006.
SEADE. Fundação Sistema Estadual de Informações de Análise de Dados. [on line]. MPV
[13/08/2006].
http://www.seade.gov.br/produtos/perfil/perfil.php
SECRETARIA DE AGRICULTURA E ABASTECIMENTO COORDENADORIA DE
ASSISTÊNCIA TÉCNICA INTEGRAL – CATI. Programa estadual de microbacias
hidrográficas. Guaratinguetá-SP Plano de Microbacia hidrográfica. Programa estadual de
microbacias hidrográficas, 2004 Guaratinguetá- SP.
SEMA. Atlas das unidades de conservação ambiental do Estado de São Paulo. São Paulo:
Secretaria de Estado do Meio Ambiente. Parte II – Interior. 1998.
SHRESTHA , P.M., DHILLION , S.S. Medicinal plant diversity and use in the highlands of
Dolakha district, Nepal. Journal of Ethnopharmacology. 86 81–96, 2003.
154
SILVA-ALMEIDA, M.F, AMOROZO, M.C.M. Medicina Popular no Distrito de Ferraz,
Município de Rio Claro, São Paulo. Brazilian Journal of Ecology, n. 1, p. 36-46, 1998.
SILVA-ALMEIDA, M.F. Medicina tradicional no Município de Iporanga, Vale do Ribeira –
SP. Tese (Doutorado em Ciências Biológicas/Biologia Vegetal). Faculdade de Ciências
Biológicas. Universidade Estadual Paulista. Rio Claro, 2005.
SILVA, S.M.P. Conhecimento tradicional dos recursos vegetais medicinais do bairro rural do
Benfica, Piquete – SP. 2003. 114f. Tese (Doutorado em Ciências Agronômicas/Horticultura).
Faculdade de Ciências Agronômicas, Universidade Estadual Paulista. Botucatu, 2003.
Sociedade Brasileira de Cardiologia - SBC (
www.sbc.org.br/publicoes, acessado em 02 de
fevereiro de 2007).
Sociedade Brasileira de Nefrologia – SBN (
www.sbn.org.br, acessado em 10 de março de
2007).
STEWARD, J.H. The marginal tribes. In: Handbook of South America Indians.
Washington: Smithsonian, v. 5. 1948.
TESKE, M., TRENTINI, A.M.M. Compêndio de Fitoterapia, 2a ed., Herbarium Lab.
Botânico, Curitiba, Paraná, 1995.
TONELLI, M., ISLES, C., CRAVEN, T., TONKIN, A., PFEFFER, M.T., SHEPHERD, J.,
SACKS, F.D., FURBERG, C., STUART., M., COBBE, M.D., SIMES, J.WEST, J.,
PACKARD, C., CURHAN, G. Effect of Pravastatin on Rate of Kidney Function Loss in
People With or at Risk for Coronary Disease . American Heart Association, v. 112, p. 171-
178, 2005.
155
VASCONCELLOS, M. C. Um olhar etnobotânico para os usos dos recursos vegetais dos
terreiros de uma comunidade remanescente de quilombos do Vale do Ribeira, SP. 2004. 141 f.
Dissertação (Mestrado em Agronomia)–Faculdade de Ciências Agronômicas, Universidade
Estadual Paulista, Botucatu, 2004.
VERISSIMO, S.H.F. Medicamentos à base de plantas medicinais no Brasil. Disponível em:
http://www.org.br/~sferreira Acesso em 15/08/2006.
VIEIRA, R.F., SILVA, S.R., ALVES, R.B.N., SILVA, D.B.S.; WETZEL, M.M.V.S.; DIAS,
T.A.B.; UDRY, M.C.; MARTINS, R.C. Estratégias para Conservação e Manejo de
Recursos Genéticos de Plantas Medicinais e Aromáticas: resultados da 1
a
. Reunião
Técnica. EMBRAPA-CENARGEN/IBAMA/CNPq. 184p. 2002.
WALKER, W.G., NEATON, J.D., CUTLER, J.A., NEUWIRTH, R., COHEN, J.D. For the
MRFIT Research Group: Renal function change in hypertensive members of the Multiple Risk
Factor Intervention Trial. Racial and treatment effects. JAMA. n. 268, p. 3085-3091, 1992.
WEST, M., PACKARD, C., CURHAN, G., SHEPHERD, J., SACKS, F.M., FURBERG, C.,
STUART, M.C., SIMES, J., TONELI, M., ISLES, C., CRAVEN, T., TONKIN, A., PFEFFER,
M.A. Coronary Disease Effect of Pravastatin on Rate of Kidney Function Loss in People With
or at Risk. n.112. p. 171-178. 2005. Disponível em:
http://circ.ahajournals.org/cgi/content/full/112/2/171T. Acesso: 23-05-07.
ZENI, A. L.B, BOSIO, F. Medicinal plants used in the Nova Russia, Brazilian Atlantic Rain
Forest Rev. Bras. Pl. Med., Botucatu, v.8, n.esp., p.167-171, 2006.
156
Anexo I- Cadastramento das famílias que compõe o Bairro
Nome: Idade:
Local:
Origem( itinerário):
Tempo no local:
Problemas de saúde mais comuns na sua casa: Para as
doenças citadas você utiliza plantas medicinais
157
Nome problema Sintomas
Planta Onde coleta
158
Pessoas que moram na casa:
Nome idade parentesco ocupação N de
filhos
Onde os
filhos
moram
159
Anexo II- Entrevista com profissionais do PSF, que atuam no Bairro dos Marins.
Nome:
Ocupação:
Quanto tempo trabalha no bairro:
a) Quais as doenças mais comuns em cada faixa etária e sexo
b) Os pacientes já vêm medicados quando chegam para ser atendidos no PSF?
c) Quais os problemas mais graves de saúde que já surgiram no Bairro
d) Costuma indicar alguma planta medicinal pra o tratamento de saúde
e) Sintomas usados para diagnosticar hipertensão, colesterol elevado e problemas nos rins?
160
Anexo III- Entrevista semi-estruturada aplicada aos moradores da amostragem “bola de neve “
Nome:
Idade:
Levantamento cultural sobre as plantas
1-O que entende por doença? E Saúde?
2-Quando está curado?(como sabe)?
3- O que vc entende por remédio do mato ou plantas medicinais?
4-O remédio do mato cura qualquer doença?
5-Se for não:Qual doença não pode ser curada?
6-Por que o (a) sr (a) acha que a gente adoece?
7- Existem doenças conhecidas hj em dia que antigamente não se ouvia falar?
8- Você pode dizer quais são elas?
161
9-Antigamente quando não tínhamos acesso aos exames modernos como se tratava destas
doenças?
10- Como aprendeu a conhecer e usar as plantas? Vc aprendeu olhando ou ajudando?
11- Existe alguma planta que vc usa, mas que aprendeu a usar sozinha? Qual planta é ?
Como e por que vc escolheu esta planta?
12- Existem plantas que era comum na sua infância que hj em dia não é usada ou não se
encontra mais?
13- Como é o uso de plantas nos dias de hoje? Se usam mais ou menos as plantas como
remédio? Por que?
Problemas de saúde: Rins
1- Vc tem ou teve algum problema de saúde relacionado aos rins ou na bexiga?
2- Quais nomes vc chama esses problemas?
3- Quem tem esses problemas o que sente no corpo?
4- Você já sentiu ou sente algum desses desconfortos, quais?
162
5- Alguém na sua família tem problemas nos rins ou bexiga, quem?
6- Você conhece alguma planta para tratar esses problemas?
7- Em casa vc costuma usar plantas medicinais para a cura dos rins?
8- Como aprendeu a usar essas plantas?
9- Você toma remédios de farmácia para esses sintomas? Quais?
10- Você costuma tomar remédios para os rins junto com plantas medicinais?
11- Para você problemas nos rins é doença?
163
Problemas de saúde: Colesterol
1- Você tem ou teve algum problema relacionada ao sangue?
2- Quais nomes vc chama esses problemas?
3- Você já fez exames de sangue? Vc tem colesterol elevado?
4- Quem tem esse problema o que sente no corpo?
5- Você já sentiu ou sente algum desses desconfortos, quais?
6- Alguém na sua família tem problemas no sangue, quem?
7- Você conhece alguma planta para tratar o colesterol?
8- Em casa você costuma usar plantas medicinais para o colesterol?
9- Como aprendeu a usar essas plantas?
10 - Você toma remédios de farmácia para esses sintomas? Qual?
11- Você costuma tomar remédios para colesterol junto com plantas medicinais?
164
12- Para você colesterol elevado é doença?
Problemas de saúde: Pressão Alta
1-Vc tem ou teve algum problema relacionada a pressão?
2-Quais nomes vc chama esses problemas?
3-Quem tem esses problemas o que sente no corpo?
4-Você já sentiu ou sente algum desses desconfortos, quais?
5-Você já mediu a sua pressão? Como ela é?
6-Alguém na sua família tem problema de pressão, quem?
7-Você conhece alguma planta para tratar a pressão
8-Como e com quem aprendeu a usar essas plantas?
9- Você toma remédios de farmácia para esses sintomas? Qual?
10-Você costuma tomar remédios para os rins junto com plantas medicinais?
165
11-Para você pressão alta é doença?
Remédios e preparados caseiros
1- Vc costuma fazer remedos caseiros com as plantas que conhece?
2-Como é feito o remédio?
5-Como que é usado o remédio (formas de uso)?
6-Quantas vezes toma esse remédio durante o dia?
7-Se o remédio não for usado como o (a) sr (a) ensinou dá algum problema?
8-Esse remédio pode ser tomado por qualquer hora?Usa erva medicinal pra tratar?
9-Ensina ou faz remédio caseiro pra outras pessoas, a não ser pessoas da sua família?
10-Com quem o(a) sr (a)aprendeu a fazer o remédio?
11-Há quanto tempo o (a) sr (a) faz remédio?
166
12-Tem algum remédio que o (a) sr (a) faz e usa mais de uma erva?Quais?
13-Alguém acompanha ou ajuda o (a) sr (a) fazer o remédio ou pegar as plantas?Quem?
14-Se for não :O (a) sr (a) ensina a alguém os remédio que sabe fazer?
15-Como o (a) sr (a) lembra do modo de fazer e das quantidades certas das coisas que usa
pra fazer o remédio?Escreve em algum lugar?
16-A planta pode ficar guardada antes de fazer o remédio?Quanto tempo?
17-Tem algum horário do dia que é melhor para coletar a erva?
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo