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SÃO PAULO
2007
PONTIFíCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
ELlSÂNGELA VENÂNCIO ANANIAS
ATLETAS EM CAMPOS: O MOVIMENTO ATLETAS DE CRISTO
COMO MEDIADOR NAS RELACÕES ENTRE CAMPO ESPORTIVO E
CAMPO RELIGIOSO
MESTRADO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO
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SÃO PAULO
2007
PONTIFíCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
ELlSÂNGELA VENÂNCIO ANANIAS
ATLETAS EM CAMPOS: O MOVIMENTO ATLETAS DE CRISTO
COMO MEDIADOR NAS RELACÕES ENTRE CAMPO ESPORTIVO E
CAMPO RELIGIOSO
MESTRADO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO
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Dissertação apresentada À Banca Examinadora da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial
para obtenção do título de MESTRE em Ciências da Religião,
sob orientação do Prat. Doutor- Edin SuedAbumanssur
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Banca Examinadora
~ -:o/-~
( ~<~~eJÁ..~.~
Dedicatória
À minha Constelação de Marias: Julia, Celeste e Luiza, e ao
meu porto sempre seguro: Glydiston.
AGRADECIMENTOS
Agraceço a Deus, que me fez iniciar, prosseguir e perseverar
nesta pesquisa.
Sinceramente, ao meu Orientador e amigo Edin, pela confiança
e paciência.
RESUMO
r
ANANIAS, Elisângela Venâncio. Atletas em Campos: o Movimento Atletas de Cristo
como mediador nas relações entre Campo Esportivo e Campo Religioso
A presente pesquisa teve como objetivo estabelecer em que momento do
cenário brasileiro houve a necessidade da fundação do Movimento Atletas de Cristo.
A análise do contexto social, político, econômico, esportivo e religioso, no qual foi
fundado o Movimento Atletas de Cristo, contribuiu para a compreensão da natureza
das relações entre Esporte e Religião, na Modernidade. Este movimento de atletas
evangélicos veio a desempenhar papel de mediador entre os Campos Religioso e
Esportivo da época que mantinham, até então, relações de estranheza. O quadro
teórico é composto por uma apresentação da história do esporte moderno no
ocidente, nos séculos XIX e xx. A teoria social de Pierre Bourdieu sobre a análise
dos conceitos de Habitus e Campo, embasaram a discussão das hipóteses, no que
se refere à compreensão do Campo Esportivo e Religioso. A pesquisa de campo foi
de natureza qualitativa, com análise de fontes primárias e secundárias; a coleta de
dados consistiu na observação participante das reuniões periódicas do Movimento
Atletas de Cristo, na leitura crítica de 80 testemunhos de atletas de Cristo e nas
entrevistas com atletas e diretores do Movimento. Mediante o referendal teórico e a
pesquisa de campo, pudemos verificar nossas hipóteses, respondendo a duas
questões que se mostraram centrais a essa pesquisa: o Movimento Atletas de Cristo
foi fundado no bojo do processo de mudanças dos anos 60 que constituiu o Campo
Esportivo e o Religioso; e, a segunda questão, o Movimento Atletas de Cristo, ao ser
fundado, possibilitou a inserção de atletas evangélicos nesses dois campos.
Palavras Chave: Atletas de Cristo, Esporte, Religião.
ABSTRACT
ANANIAS, Elisângela Venâncio. Athletes in Fields: the Movement Athletes of Christ
as mediating in the relations between Sporting Field and Religious Field
The present research had as objective to establish where moment of the
Brazilian scene had the necessity of the foundation of the Movement Athlete of
Christ. The analysis of the social context, politician, economic, sporting and religious,
in which the Movement was established Athlete of Christ, contributed for the
understanding of the nature of the relations between Sport and Religion, in
Modernity. This movement of christians athletes carne to play role of mediator
between the Fields Religious and Sporting of the time that kept, until then, queerness
relations. The theoretical picture is composed for a presentation of the history of the
modern sport in occident, centuries XIX and XX. The social theory of Pierre Bourdieu
on the analysis of the concepts of Habitus e Field, had based the quarrel of the
hypotheses, as for the understanding of the Field Sporting and Religious. The field
research was of qualitative nature, with analysis of primary and secondary sources;
the collection of data consisted of the participantcomment of the periodic meetings of
the Movement Athlete of Christ, of the critical reading of 80 certifications of athlete of
Christ and of the interviews with athlete and directors of the Movement. By means of
the theoretical reference and the research of field, we could verify our hypotheses,
answering the two questions that if had shown central offices to this research: the
MovementAthlete of Christwas established in the bulge of the process of changes of
years 60 that it constituted the Sporting Field and the Religious one; e, the second
question, the Movement Athlete of Christ, to the established being, two fields made
possiblethe insertion of christiansathletes in these.
Words Key:Athlete of Christ, Sport, Religion.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO , 09
CAPíTULO 1- DO JOGO AO ESPORTE 15
1.1-
1.2-
1.3-
1.4-
FUTEBOL:o precurssor dos esportes , 15
A "esportivização"dos jogos e passatempos 18
Os protagonistas do esporte 25
O esporte no contexto brasileiro , 29
CAPíTULO 11- A DINÂMICA DO MOVIMENTO ATLETAS DE CRISTO 33
2.1-
2.2-
2.3-
2.4-
A proposta de evangelização 33
Os recursos de evangelização 35
A mídia e os atletas de Cristo 39
Sobre a pesquisa de campo 45
2.4.1- As reuniõesdo MovimentoAtletas de Cristo 45
2.4.2- Ostestemunhosdosatletasde Cristo 48
2.4.3- Entrevistas com os atletas de Cristo 51
CAPíTULO "I-ATLETAS EM CAMPOS 59
3.1-
3.2-
3.3-
3.4-
3.5-
3.6-
Um movimento nas instituições.. 59
Uma releitura esportiva das Escrituras 64
Os conceitos de Habitus e Campo Simbólico em Pierre Bourdieu 70
Atletas de Cristo e Campo Religiosos 72
Atletas de Cristo e Campo Esportivo 75
O MovimentoAtletas de Cristo na intersecção entre os dois campos..79
CONCLUSÃO ... , .." 87
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 91
ANEXOS ... ... 96
9
INTRODUÇÃO
O Movimento Atletas de Cristo, surgido em fins da década de 70, com a proposta
de evangelização através da linguagem universal do esporte, foi fundado por um
pequeno grupo de atletas evangélicos, que acreditavam que o esporte é um dos meios
mais significativos para dar conta da missão cristã de proclamar o Evangelho a todas as
nações.
A fundação deste Movimento repercutiu não só nos contextos esportivo e
religioso, mas causou surpresa aos demais segmentos sociais da época. Os atletas
evangélicos membros do Movimento ADC, ao longo dos últimos 30 anos, tem sofrido
algumas resistências e críticas, principalmente em suas manifestações públicas.
O mundo dos esportes, historicamente sempre manteve vínculos com o universo
simbólico da religiosidade popular. No Brasil, um país de maioria católica, esta relação
estabeleceu-se com o Catolicismo Popular e com as religiões afro brasileiras.
Os atletas evangélicos nunca gozaram de expressividade, no contexto brasileiro,
isto é compreensível se analisarmos a hegemonia Católica brasileira desde a
colonização. Mas o Movimento ADC veio a apontar elementos que se mostraram
comuns entre os campos religioso e esportivo, principalmente através do processo de
racionalização e urbanização, pelo qual passava o Brasil, a partir da década de 60.
Com isto em mente, acreditamos que o estudo do Movimento ADC, no Brasil,
propicia-nos uma das vias de compreensão, do que representou e representa o
esporte, enquanto fenômeno moderno, e da relação entre este e o universo religioso.
Na busca de elementos para a contextualização histórica do surgimento do
Movimento ADC, julgamos necessário um retorno no tempo, e chegamos a Inglaterra
do século XVIII e XIX, para fazermos uma análise do que representavam as práticas
corporais naquele período, e quais mudanças foram feitas com a crescente
industrialização, modernização e racionalização da vida e das várias esferas sociais.
A partir do século XIX, o movimento esportivo inglês estava pronto para
ser exportado. Embaixadores, administradores coloniais, missionários,
10
comerciantes, marinheiros e colonos encarregaram-se de difundir o
esporte pelo mundo. (BETTI, 1997, p. 19)
Ao analisarmos o processo de modernização pelo qual passou o esporte,
influenciado pelas diversas mudanças ocorridas nas outras esferas sociais, percebemos
que um Movimento como o de Atletas de Cristo, aponta para as reais mudanças tanto
no campo esportivo como religioso, no Brasil da década de 70.
Nossa hipótese central é de que o Movimento Atletas de Cristo, ao surgir de uma
demanda de atletas evangélicos do Protestantismo Histórico, veio a mediar as relações
entre dois campos aparentemente distintos e estranhos, como eram o Campo Religioso
e Esportivo na década de 70. A partir de então os atletas vinculados ao Movimento
passaram a ter maior respeitabilidade e inserção nos dois campos.
Historicamente sabe-se, que o Protestantismo Histórico, sempre seguiu padrões
de disciplina religiosa com implicações sociais. Nos Estados Unidos, nação de maioria
Protestante, o esporte estabeleceu seus fundamentos no pensamento puritano.
Esta idéia condicionou toda prática esportiva americana, em moldes que se
mantém ainda hoje, evidenciados numa regularidade e estabilidade nos treinamentos e
competições de seus atletas. Esta idéia de metodização e racionalização do esporte
chegou até nós na década de 70 e propiciou algumas mudanças no campo esportivo,
com maior investimento em políticas públicas para os esportes, maior exigência e
disciplina nos treinamentos e cobrança de postura profissional dos envolvidos no meio
esportivo.
O Campo Religioso brasileiro passava por algumas mudanças, devido ao
processo de modernização e urbanização, que se intensificou na década de 70. Na
busca de adaptação da população, que migrava do campo para as cidades, à nova vida
nos moldes urbanos, sugiram alguns movimentos sociais e religiosos visando atender
as novas demandas da população.
O Movimento ADC surgiu neste contexto, e embora não possa ser enquadrado
na dinâmica dos Novos Movimentos Religosos, que surgiram na mesma época, foi
influenciado, e constitui uma resposta as mudanças do período.
Os Novos Movimentos Religiosos traziam uma proposta de ruptura com as
instituições prévias. O Movimento ADC traz uma proposta de continuidade da
11
religiosidade Protestante, mas com maior flexibilização nas normas de conduta, visando
a inserção de novos grupos. No campo esportivo o Movimento sugere normas de
conduta que visem a incorporação de regras e práticas para o bom andamento das
práticas esportivas.
Neste mesmo período, o Campo Esportivo e Religioso são impactados pela
expansão dos meios de comunicação de massas, principalmente a televisão, que passa
a transformar as relações no interior dos vários segmentos sociais.
O esporte espetáculo se torna a representação mais clara, desta expansão no
Campo Esportivo, que através dos grandes eventos esportivos, passa a movimentar
grandes quantias de dinheiro, e transforma as relações deste campo em relações
mercadológicas. A forte pressão exercida pelos meios de comunicação sobre os atletas,
desencadeia uma corrida acelerada na busca de resultados a qualquer custo.
Tal situação nos força a perguntar, como é possível num ambiente marcado por
tantos interesses, surgir um Movimento evangélico, com a proposta de alcançar o
mundo através da linguagem universal do esporte, tendo como instrumento de
proclamação a Bíblia?
Nossa pesquisa partiu do pressuposto, de que o contexto social, político e
economico, da década de 70do século XX, possibilitou o surgimento e inserção de um
movimento evangélico, que veio ao encontro das necessidades dos indivíduos
envolvidos no processo de mudanças dos Campos Religioso e Esportivo.
Na busca de compreendermos este processo, no qual surgiu o Movimento
Atletas de Cristo, nos debruçamos sobre os estudiosos que, a partir da década de 60,
passaram a refletir a respeito das mudanças ocorridas na sociedade que
desencadearam os movimentos sociais e religiosos da época.
As categorias de análise de Habitus e Campo Simbólico de Pierrre Bourdieu dão
suporte a nossa discussão sobre o Movimento ADC, no que concerne às mudanças
ocorridas no Campo esportivo e religioso, enquanto esferas de representação e
atuação social surgidas com a Modernidade.
Max Weber também ampara nossas reflexões, como referencial na compreensão
do ethos protestante, e em que sentido podemos inferir uma análise da conduta do
atleta profissional frente às exigências apresentadas, a partir da década de 70, pelo
12
Campo Esportivo com a modernização das táticas e técnicas de treinamento desportivo,
e do Campo Religioso com uma maior flexibilização com relação à conduta dos fiéis.
O conceito de Habitus, engloba o de ethos, ao apresentar, no papel dos sujeitos
envolvidos no processo, não só questões referentes a prática, mas também valores
éticos e morais. Assim, através do Habitus religioso e esportivo dos atletas
evangélicos, buscamos elementos que compensaram a opção de serem membros do
Movimento ADC e o que isso representou para sua inserção nos dois campos.
O categoria Campo Simbólico, nos permitiu avaliar as tensões, desencadeadas
com a modernidade, que são próprias de cada campo e que definem e caracterizam a
autonomia entre os diferentes campos. Essas mesmas tensões permitem, através da
complexificação das relações em cada campo, estabelecer relações de disputa e troca
com os outros campos.
Acreditamos que o Movimento ADC tenha surgido de pontos em comum,
característicos do Campo Esportivo e Religioso, apresentados no contexto brasileiro da
década de 70.
Com isso perseguimos, durante a pesquisa, respostas para as seguintes
questões:
- Em que momento o campo religioso e o campo esportivo se cruzariam?
- Quais fatores sociais levaram ao nascimento, inserção e permanência do
Movimento ADC?
- Por que o Movimento mantém-se enquanto movimento, e não se
institucionalizou?
- E qual o papel da mídia na dinâmica do Movimento ADC?
Levando-se em consideração a possibilidade de haver uma relação entre a
fundação, repercussão e permanência do movimento Atletas de Cristo como resposta a
algumas demandas sócio-religiosas dos atletas cristãos, o objetivo deste trabalho será
tentar estabelecer em que momento houve a necessidade da criação de um movimento
como este, que de certa forma tem possibilitado uma relação de simbiose entre atletas
evangélicos, seus meios de atuação profissional e o desenvolvimento de forma mais
plena de suas crenças religiosas, num ambiente de respeito e tolerância por parte dos
dois campos.
13
Iniciaremos com um capítulo histórico que nos remete ao contexto no qual o jogo
popular se torna o esporte que conhecemos hoje, pela da análise da exportação do
modelo esportivo inglês que passou a percorrer o mundo ocidental em fins do século
XVIII e início do XIX, o que este processo representou para a Europa do período e para
as outras culturas ao longo do século XIX e XX, como estas transformações nas
práticas corporais chegam ao Brasil e de que forma o futebol se estabelece e propicia a
inserção de diferentes modalidades esportivas a partir de sua institucionalização.
No capitulo II faremos a discussão dos dados através da análise da proposta de
evangelização do Movimento ADC, e dos recursos de que disponibiliza para efetivarem
suas ações.
Os dados coletados foram obtidos através de observação direta às reuniões do
Grupo de Atletas de Cristo, leitura dos testemunhos veiculados pelo Movimento, e de
entrevistas que complementaram as observações e leituras. Trata-se assim de uma
pesquisa de natureza qualitativa que buscou estabelecer relações entre o contexto
socio-religioso e esportivo no qual surgiu o Movimento Atletas de Cristo e o papel de
mediador entre Campo Esportivo e Religioso que este movimento tem desempenhado
nos últimos 30 anos.
Visando a verificação da hipótese, de que o Movimento ADC agiria como
mediador das relações e tensões entre o Campo Esportivo e Religioso, apresentaremos
que fatores teriam motivado e facilitado a fundação do Movimento Atletas de Cristo, sob
à luz de teóricos da sociologia e sociologia do esporte, numa visão panorâmica do
Campo Esportivo e Religioso e suas mudanças a partir da década de 60.
O modelo esportivo Inglês é apresentado como hegemônico sob alguns
aspectos, mas que permite um movimento de resistência, como é o caso do modelo
ginástico alemão, que se opunha à imposição do modelo inglês, julgado por eles como
um movimento da elite burguesa.
No capítulo III, trazemos a discussão do Movimento ADC a partir dos pontos em
comum entre duas instituições conhecidas como antagônicas, a Igreja e o Esporte, a
partir de uma análise da teoria de Hobsbawm sobre as Tradições Inventadas. Num
segundo ítem analisamos o surgimento de um movimento cristão, denominado
14
Cristandade Muscular, nos EUA do início do século XIX, que tem uma proposta
semelhante à apresentada pelo Movimento ADC, de “releitura esportiva das Escrituras”.
Como suporte a nossa discussão sobre o Campo Esportivo e Religioso,
apresentamos as definições de Habitus e Campo Simbólico em Pierre Bourdieu, que
nos apontaram elementos que suportam à análise de cada Campo e a relação com o
Movimento ADC, e posteriormente confrontamos estes dois campos, apresentando em
quais pontos eles se cruzam e permitem a inserção do Movimento ADC naquele
período e contexto, do Brasil das décadas de 70 e 80.
Finalmente apresentamos, com base nos dados coletados, a conclusão de nossa
pesquisa, embasados no referencial teórico, com a verificação da hipótese central e as
secundarias, levantadas por nós no início deste trabalho.
15
CAPÍTULO I
DO JOGO AO ESPORTE
Neste primeiro capítulo, analisaremos alguns aspectos que tem movimentado
significativamente o meio esportivo. Consideraremos as características fundantes do
esporte moderno, como sua herança do modelo esportivo inglês, influência da
resistência alemã através dos movimentos ginásticos, a crise entre amadorismo X
profissionalismo e como surgiu o esporte que hoje conhecemos. Buscaremos
elementos que apontem a influência destas mudanças no contexto brasileiro.
1.1- FUTEBOL: O precurssor dos esportes
[... ] no dia 18 de fevereiro de 1894, desembarcava, no porto de Santos,
Charles William Miller.(...) Na bagagem trazia duas bolas de futebol.
Pouco mais de um ano após a sua chegada, exatamente no dia 15 de
abril de 1895, na várzea do Carmo, aconteceu aquele que seria
considerado o primeiro jogo de futebol oficial do Brasil... (NAPOLEÃO e
ASSAF, 2004, p.16)
Apesar deste histórico de exportação, a incorporação do futebol à nossa cultura
nos faz acreditá-lo como puramente nacional. Ocorreu uma assimilação geral do futebol
por nossa cultura e vice-versa.
Para entendermos um pouco como o fenômeno esportivo expandiu-se pelo
mundo, faz-se necessário visitar a Inglaterra do século XIX, de onde partiu o modelo
esportivo ocidental para o restante do mundo, em especial o mundo colonial.
O esporte, de uma maneira geral, foi difundido pelo mundo com o
Movimento Esportivo Inglês, que em fins do século XIX, através de
administradores coloniais, missionários, comerciantes, marinheiros e
colonos, tornou-se um fenômeno de expansão mundial. (BETTI, 1997,
p.19)
Ao ser difundido, o esporte passa a adquirir características culturais locais,
estabelecendo uma dinâmica própria, e, dependendo do país em que foi introduzido,
16
proporciona vínculos que podem desencadear uma pratica que supera a nação de
origem. Um exemplo é o caso da India, ex-colônia britânica, hoje é um dos países de
melhor desempenho no críquete, esporte genuinamente inglês.
No caso brasileiro, o futebol é um exemplo mais do que claro desta adoção de
um esporte popular de um “povo por outro povo”
1
, que resulta num processo complexo
no qual as propriedades lúdicas intrínsecas de um esporte misturam-se com fatores
culturais próprios de cada sociedade. (BETTI,1997, p. 20).
O futebol no Brasil sempre foi marcado por forte vínculo com o universo religioso,
em especial com as religiões de matriz Africana e com o Catolicismo Popular. Encarada
sem estranhamento, esta relação futebol e religião sempre esteve presente em nossa
sociedade.
A relação se estabelece como suporte espiritual e até terapêutico no
atendimento às necessidades de alguns atletas, em busca de cura de lesões,
assinatura de bons contratos, proteção para jogos importantes. A mão invisível dos
religiosos, acreditam alguns, sempre tem auxiliado o cotidiano do futebol no Brasil.
Embora religião e futebol apresentem esta relação estreita, poucos são os
trabalhos que abordam este tema de forma metódica, visando compreender quais
fatores propiciaram esta forte ligação.
Manifestações populares importantes sofrem mudanças ao longo da história
permitindo diferentes formas de expressão. Nos últimos 40 anos, no Brasil, tanto as
manifestações religiosas como as esportivas passaram por transformações que
desencadearam novas formas de relacionar Esporte e Religião.
Em fins da década de 70, surge, o que aqui será o foco de nossas discussões,
um Movimento de Atletas Cristãos, que não apresenta relação aparente com o Futebol,
mas que nasce de uma demanda de atletas evangélicos do meio futebolístico,
provenientes de Igrejas Protestantes Históricas, que diferentemente das religiões de
1
Expressão utilizada por Betti (1997), no texto Violência em Campo, para se reportar ao imperialismo cultural que
foi desencadeado pelo modelo esportivo ocidental. Lançamos mão da expresão apenas para exemplificar o ajuste do
futebol à nossa cultura.
17
matriz Africana e do Catolicismo Popular, sempre estabeleceu com o universo esportivo
uma relação de estranhamento, isso no que diz respeito ao Brasil.
2
Voltaremos um pouco na história para entendermos melhor em que ponto um
movimento cristão como o de Atletas de Cristo poderia ter encontrado um possível
ponto em comum entre Futebol e Protestantismo.
Ao tornar-se uma forma de trabalho, já que desde 1910 os jogadores eram
recompensados financeiramente após as partidas, o Futebol profissionalizou-se em
1933, e passou então a exigir mais do atleta, na busca da “compatibilização entre
ascetismo e disciplina”
3
.
Por despertar interesses diversos, o Futebol sempre apresentou um ambiente de
muitos conflitos que refletem em sua organização, ou melhor, desorganização, com
campeonatos confusos, dirigentes despreparados, atletas desorientados, uma estrutura
administrativa amadora, classista, clubista e outros tantos adjetivos para escancarar a
falta de profissionalismo que impera no futebol brasileiro.
Com este quadro de despreparo da estrutura dos clubes no Brasil, os atletas se
encontram sem o suporte profissional necessário para gerir suas carreiras. “Diante
destas dificuldades, muitos jogadores, especialmente os mais remunerados e expostos
à mídia, buscam fórmulas para atingir o equilíbrio, através de um ascetismo exigido
pelos dirigentes de futebol”. (NUNES, 1999, p.210).
Somadas a estas exigências do universo futebolístico, a partir da década de 60,
no contexto religioso, surgiam Novos Movimentos Religisos
4
que expressavam sua fé
religiosa com maior liberdade. Isso influenciou as religiões mais tradicionais como o
Protestantismo Histórico, e seus membros passaram a exigir maior flexibilização nas
regras de disciplina e conduta, o que propiciou a grupos, que antes à margem do
universo religioso evangélico, como artistas, atletas, músicos, pudessem assumir sua fé
e inserir-se em grupos com idéias comuns.
2
Fazemos esta afirmação para o contexto religioso no Brasil, já que para o contexto mundial, em alguns países, de
maioria Protestante, o esporte tem forte incentivo destes meios, a própria YMCA é responsável pela origem de
muitas modalidades esportivas.
3
Francisco Nunes (1999), em referência à crescente exigência em relação aos atletas com o profissionalismo.
4
Nomenclatura utilizada por Silas Guerriero para definir os novos movimentos que passaram a surgir neste período.
Utilizaremos a partir de agora a forma abreviada NMRs.
18
Assim o surgimento do Movimento Atletas de Cristo
5
, em fins da década de 70 e
início da de 80 do século XX, provocou uma mistura de surpresa e ceticismo tanto no
universo esportivo e religioso como no todo social, os quais a princípio não sabiam o
que representaria um movimento evangélico para estes dois segmentos.
Tendo como meta a evangelização através do esporte, o Movimento ADC inicia
suas atividades e tem como campo de trabalho o meio futebolístico, do qual saem seus
líeres fundadores, um goleiro de futebol, conhecido como o “Goleiro de Deus
6
”, e
Baltazar, um atacante conhecido como o “Artilheiro de Deus
7
”, com a difícil tarefa de
“discipular” desportistas, profissionais e amadores a fim de atingir a grande massa de
torcedores. (Nunes, 1999, p.210)
Para o Movimento de ADC, ao ter sua mensagem embasada na transparência de
um bom testemunho de vida, o atleta que não se enquadrasse neste contexto
dificilmente conseguiria caminhar com o grupo, mas aqueles que se agregaram ao
movimento, assumindo-se “proclamadores da mensagem salvadora de Jesus Cristo”,
passaram a exercer sua profissão à luz do perfil do atleta nota 10
8
.
1.2 – A “esportivização” dos jogos e passatempos
Como dito anteriormente, herdamos o esporte moderno do movimento esportivo
inglês, e enquanto forma fundante, praticamos e nos relacionamos com o esporte
segundo as bases sociais e históricas da “forma de jogar” inglesa, produto das classes
sociais inglesas do século XIX. (BETTI, 1997, 25)
O Fair play
9
, hoje difundido no meio esportivo, ao menos enquanto ideal
para os jogos, teve início neste período. Os termos “amador” e “fair play”
descendem do liberalismo burguês, isto é, trata-se de uma ideologia na
5
Utilizaremos a forma abreviada Movimento ADC.
6
Joâo Leite da Silva Neto, que por ser um dos líderes do movimento ADC, ganhou o apelido de João de Deus.
(Nunes, 2003,p.26)
7
Baltazar Maria de Morais Junior, um dos líderes do grupo Atletas de Cristo, foi um dos primeiros jogadores a
comemorar seus gols apontando para o céu, por isso ganhou o apelido de Artilheiro de Deus. (Nunes, 2007,p.29)
8
Ver perfil do atleta nota 10 esta no anexo 1.
9
Para Carvalho o fair play e, antes de tudo, respeito pela regra escrita do jogo, e assenta-se em duas condições
essenciais: desejo sincero de que o adversário possa lutar em igualdade de circunstâncias e máxima honestidade na
escolha dos meios para alcançar a vitória.(Citado em Betti, 1997,p.25)
19
qual é destacada a legalidade; o liberalismo destaca as regras dos jogos
sociais e não procura “novos jogos”, isto é, nenhuma mudança estrutural
social. Desde criança, os privilegiados aprendem a obedecer as regras
que favorecem sua classe; não é surpresa, portanto, que os
desfavorecidos queiram burlar estas mesmas regras, tanto no campo
esportivo como na vida.(GuTTMANN, 1987)
Com seu caráter elitista inicial, o esporte moderno sempre primou por respeito às
regras que possam dar base à reprodução e permanência de sua classe, assim como
manter à margem aqueles que não se enquadram nas mesmas.
Com a modernização dos esportes e sua institucionalização, teceu-se um ideal
de igualdade de oportunidades promovidas pela democracia e tolerância esportiva, e ao
menos nos ambientes mais secularizados, economicamente avançados, esperava-se
uma maior flexibilização para a inclusão de novos grupos sociais, vencendo as barreiras
racistas e classistas que marcaram o início do esporte moderno.
No entanto, vemos em pleno século XX na civilizada e moderna Escócia, dois
times de futebol, Celtic e Rangers, numa guerra religiosa de longa data, que só foi
amenizada por questões puramente financeiras, pois pela lógica de mercado, na
bifurcação entre sucesso e sectarismo, optou-se, com cifras nos olhos, pelo primeiro
caminho.
Na realidade a competição esportiva precisaria ser decidida somente pelas
diferenças de habilidades, motivação, estratégia e sorte, mas as dimensões adquiridas
pelo esporte moderno na atualidade promoveu diferentes formas de expressão que
extrapolaram os gramados e as quadras, assim a aceitação e respeito às regras do
esporte, embora haja a política do “fair play”, ainda tem de vencer as questões de
bastidores, para que o princípio da justiça realmente entre em campo.
Primeiramente o esporte, ao receber a nomenclatura de esporte moderno,
apresenta as características de tal fenômeno, que segundo Guttmann (1978), definem-
se pela secularização, igualdade, especialização, racionalização, burocracia,
quantificação e recorde; todas elas presentes nas sociedades herdeiras do Movimento
Esportivo Inglês, algumas mais desenvolvidas do que outras.
Historicamente, os esportes têm recebido, nas mais diversas culturas,
diferentes nomenclaturas, como jogos, jogos tradicionais, passatempos;
mas o que os contextualiza enquanto esporte, primeiramente, é a
estrutura da atividade, vinculando-se a algum tipo de competição, na
qual indivíduos ou grupos se confrontam em busca de objetivos
20
conflitantes, utilizando algum tipo de regra conhecida por todos e nas
quais, ao final, um dos oponentes (ou grupo de oponentes) é identificado
como vencedor. (STIGGER, 2005, p.15)
Uma outra aproximação possível entre essas atividades, chamadas de esporte, é
com relação às características despertados nas mesmas, ao tomarem contato com
diferentes culturas. Ao caminharmos por dentro destas atividades, percebemos a forte
presença do universo simbólico evidenciado pelo universo cultural de cada contexto.
Muitas vezes esses aspectos simbólicos perdem importância quando a atividade
é analisada de fora do contexto. A análise dos jogos olímpicos gregos, que se
caracterizavam por serem “festivais sagrados, aspectos fundamentais da vida religiosa”
e que eram desvinculados de preocupações com registros que quantificassem as
façanhas esportivas, considera que eles se inserem no mundo dos esportes e que,
mais do que isso, podem “ser concebidos como os antecessores dos esportes
modernos”. (GUTTMANN, 1978, p.21)
Da mesma forma que traçamos o processo pelo qual o Futebol foi inserido no
contexto cultural brasileiro, identificando-se fortemente com o que aqui encontrou, as
outras modalidades esportivas passaram por processos semelhantes, considerando-se,
é claro, o percursso histórico anterior, e a forma como chegou à nossa cultura.
Segundo Chartier (1994), o fato de o esporte moderno (não vinculado aos rituais
festivos ou religiosos) adquirir uma autonomia em relação às outras dinâmicas sociais é
porque lhe são atribuídos espaço e tempo próprios de realização.
O que nos parece aqui, sem grandes pretensões, é que houve uma ruptura com
os jogos e passatempos anteriores ao século XIX, em especial os praticados na
Inglaterra. Estes passaram pelo advento da industrialização e posterior racionalização
da vida com a conseqüente ressignificação de seus conteúdos e formas, e
transformaram-se no que hoje chamamos de esporte moderno.
Em determinado momento histórico, ocorreu um número tão grande e tão
significativo de transformações que foi possível identificar os processos de
industrialização e de surgimento do esporte. Estes passaram a ser vistos como formas
específicas e determináveis sociologicamente de, respectivamente, um novo tipo de
estrutura e organização do trabalho e uma nova espécie de prática de competição e de
jogos.(ELIAS, 1992).
21
Alguns autores como Elias, Hobsbawn e Bourdieu, cada qual com seus
conceitos e análises, reconhecem no esporte moderno uma tradição
inventada
10
, fruto de rupturas com outras formas de passatempo
desenvolvidas até o seu surgimento. (STTIGGER, 2005, p.20)
Após seu surgimento na Inglaterra do século XVIII e XIX, alguns esportes foram
difundidos pelo mundo, com grande parcela de responsabilidade depositada na
Revolução Industrial iniciada neste mesmo país, e que se expandiu por todo o mundo,
em especial pelo mundo ocidental.
Com isso, iniciou-se em fins do século XVIII e início do XIX, o que Elias chamou
de “esportivização dos passatempos populares”. A partir daí o termo esporte abarcava
atividades recreativas, de lazer, práticas físicas em geral, todas as atividades que
tinham em comum o esforço físico.
Segundo os autores citados acima, essa transformação liga-se ao
desenvolvimento de uma diferente forma de comportamento que ocorria naquele
naquela sociedade que percebia em si mesma a crescente necessidade de
regularidade de conduta e de sensibilidade, em geral expressas também nos
passatempos populares, tornando-os menos violentos e regulados por regras que
controlavam a violência e que possuíam “o caráter de um impulso civilizador.”(ELIAS,
1992b, p.194)
Numa comparação entre esporte praticado na Inglaterra durante o Estado
Medieval (1314 a 1615) e o esporte que conhecemos hoje, iniciado com o Estado
Moderno, segundo Elias (1992), fica evidente a falta de disciplina e violência nos
primeiros, mas que embora fossem turbulentos e muitas vezes selvagem, assim como
atualmente, agradava seus praticantes intensamente.
Não existiam regras escritas e, muito diferente do que aconteceria atualmente,
nada indica que fossem realizados da mesma forma em diferentes comunidades, pois
as pessoas jogavam com base nos costumes locais e não com regras instituídas
regional ou nacionalmente, o que tornava a organização muito mais imprecisa do que
hoje. (ELIAS, 1992, p. 270-274)
Algo que gostaríamos de destacar nessa pequena comparação entre o ontem e
o hoje, do esporte moderno, é que num mesmo país a dinâmica do jogo respondia às
10
A expressão tradição Inventada é adotada por Eric Hobsbawn, em A invenção das tradições (1984)
22
demandas locais, e por muitas vezes a violência nada mais refletia do que os conflitos
entre os diferentes grupos e comunidades.
A prática do futebol envolvia cidades inteiras, e sem muitas regras claras
acabava por ter algumas pequenas regras criadas durante o jogo, mas que não
passavam de resoluções orais, as quais posteriormente não eram necessariamente
adotadas.
Uma outra manifestação esportiva que data do mesmo período e local é a caça à
raposa, a qual, ao contrário do futebol, envolvia um número determinado de pessoas,
com regras bem definidas, dentro das quais os “gentlemem ingleses” caçavam raposas
por esporte. (ELIAS, 1992, p.237)
Com esse exemplo da caça à raposa é possível voltarmos à afirmação
do início desta discussão, em que o esporte nada mais é do que uma
tradição inventada, isso parece garantir o prazer do combate sem o risco
de sofrer consequências da violência. A introdução de regras elaboradas
(e muitas vezes reelaboradas) tornava a prática menos desigual e,
portanto, mais excitante. (STIGGER, 2005,p.29)
Bourdieu também compartilha do sentido assumido pelo esporte moderno, no
que se refere a este como produto de uma ruptura com atividades preexistentes; para
isso acredita ser importante a elaboração de uma história social do esporte, na qual
tentar-se-ia responder, a partir de um conjunto de condições sociais, se poder-se-ia
verdadeiramente falar de esporte “em oposição ao simples jogo”. (1983, p.138)
Na busca de respostas este autor baseia-se na história do futebol e do rugby,
modalidades esportivas que teriam sido inventadas nas “public schools” inglesas, e
considerando-se que esses esportes seriam os mais antigos, podemos inferir que
emprestaram grande parte de suas características às modalidades mais novas.
“Parece indiscutível que a passagem do jogo ao esporte [...] tenha se
realizado nas grandes escolas reservadas às ‘elites’ da sociedade
burguesa e nas “public schools” inglesas, onde os filhos das famílias da
aristocracia ou da grande burguesia retomaram alguns jogos populares,
isto é, vulgares, impondo-lhes uma mudança de significado e de função
muito parecida àquela que o campo da música erudita impôs às danças
populares, [...] para fazê-las assumir suas formas eruditas como a
suíte.”(BOURDIEU, 1983, p.139)
É nas escolas, apesar de serem compostas por jovens da alta sociedade, que o
esporte assume a função de disciplinar e coibir atitudes violentas. O rugby e o futebol
23
eram tolerados nas escolas inglesas com o objetivo de controle sobre os estudantes,
acreditava-se que através do jogo com regras formava-se o caráter dos jovens e
desenvolvia-se as virtudes desejadas para uma vida em sociedade.
Muito embora o período histórico, que marcou e motivou a fundação do
Movimento ADC, corresponda aos anos 70 e 80 do século XX, no século anterior, num
contexto diferenciado pelas circunstâncias históricas da época, o esporte demandava
de seus praticantes a também cobrada disciplina e a regularidade na conduta do século
XX.
A prática esportiva, como conhecemos hoje, é denominada por Bourdieu
de processo de “autonomização do campo das práticas esportivas”
(1983b, p.140), o que significa um processo em que essas atividades
deixam de estar relacionadas e dependentes de outras, como a
determinados rituais, festas agrárias e religioas, passando a ter vida
própria. (STIGGER, 2005, p.35)
Além do processo de autonomização existe também o de racionalização das
práticas esportivas, o que imprime um caráter prevísivel e de maior controle das
mesmas. Isto está bem representado em todo o processo de secularização,
cientifização, burocratização, quantificação, pelo qual passou o esporte em sua versão
moderna.
A invenção coletiva dos esportes escolares seria, então, fruto de uma
pacificação operada no interior dos colégios, a partir aproximadamente
de 1830, na Inglaterra: “Mediante a aplicação de um mesmo habitus
social, que preside a parlamentarização da política inglesa, assim como
a esportificação pioneira dos passatempos das classes de proprietários
territoriais (como a caça à raposa), habitus que estaria presente nas
autoridades escolares e em menor grau entre os alunos.”(BOURDIEU,
1995,p.149)
Num processo posterior, através do associacionismo, o esporte se
institucionaliza, fundando clubes e ligas esportivas, o que só vem respaldar toda
codificação das regras e condutas dos praticantes.
As associações esportivas representavam, na Inglaterra do século XIX, um
mecanismo de encontro entre pessoas socialmente equivalentes. O esporte, na sua
origem, além de representar uma afirmação ideológica dos valores das classes altas
inglesa, oferecia “lucros de distinção” para essas mesmas classes. (BOURDIEU, 1983,
p.143)
24
Um dos refúgios distintivos das classes superiores inglesas, no contexto
do esporte, foi a defesa do amadorismo (visto como critério de esporte
dessa demanda social) contra o profissionalismo (considerado o esporte
das classes baixas, que necessitavam compensar o que deixavam de
ganhar quando a ele se dedicavam). A crise entre amadorismo e
profissionalismo, ocorrida em vários esportes, é uma das chaves para a
compreensão do processo de democratização dessa prática,
inicialmente reservada a amadores, mas posteriormente democratizada
e transformada em espetáculo de massa. (STIGGER, 2005, p. 39)
Ao optar pelo profissionalismo, o futebol, ao contrário do rugby, democratizou-se
mundialmente, além de ter motivado os grupos menos privilegiados a praticarem o
esporte e até ascenderem socialmente. (STIGGER, 2005, p. 42)
Ao popularizar-se, o esporte passou a ser objeto de disputas
institucionais, com o interesse de conquistar politicamente as massas.
Ligada ao sentimento de identidade coletiva, a concorrência (rivalidade)
entre diferentes grupos sociais (países, cidades, regiões, organizações),
é um fator importante no “desenvolvimento de uma necessidade social
[...] socialmente constituída” das práticas esportivas. (Ibidem)
Um fato interessante, e intencionamos com isso nos aproximar das práticas
esportivas contemporâneas, é que vinculado à aceitação do esporte mundialmente,
está o surgimento do mercado esportivo, através do qual tanto no passado como no
presente, as relações no universo esportivo se ressignificaram.
Podemos aqui dizer que no passado tínhamos praticantes (com números
imprecisos), e que aos poucos foi-se introduzindo o espectador. Hoje temos
consumidores e produtores esportivos, relação esta que, associada ao advento da
mídia, vem homogeneizando o esporte segundo interesses puramente mercadológicos
e, nos bastidores é deixado o caráter heterogêneo que marca a trajetória do esporte e
de seus praticantes.
Discutiremos a seguir o que vem a ser este caráter homogeneizante atribuído ao
esporte, e quais fatores presentes nas práticas corporais, que permitem a coexistência
dos fatores heterogeneizantes.
25
1.3 - Os protagonistas do Esporte
As discussões apresentadas anteriormente podem ser resumidas em duas
posições assumidas por dois grupos de autores com relação aos diversos aspectos que
envolvem o esporte moderno:
Bouet, Brohn, Guttmann, Mandell e Guay que o caracterizam como uma
realidade cultural específica, visto sob um caráter homogêneo, com
lentes que o definem como reprodutor, objetivo, seletivo, etc; e, um
segundo grupo: Elias & Dunning, Pociello, Bourdieu, Bento e Padiglione,
que apesar de reconhecerem os elementos estruturais da sociedade,
levantam os aspectos distintivos de atores e de grupos sociais.
(STIGGER, 2005,p. 73)
O segundo grupo de autores, mesmo reconhecendo elementos estruturais da
sociedade, voltou-se também para aspectos distintivos de atores e de grupos sociais.
Apesar de não apresentarem dados empíricos sobre o tema, esses autores
demonstram insatisfação em relação à pretendida posição passiva dos protagonistas do
esporte e conduzem a reflexão para a aceitação da heterogeneidade das
manifestações esportivas, ou seja, para a idéia de que existe uma diversidade cultural
nesse contexto. Para eles, o esporte poderia ser visto como uma prática social passível
de ser apropriada de forma diferente em realidades específicas, em que, com
características distintivas, se inseriria em modos de vida particulares. (Ibidem)
Ao difundir-se mundialmente, o esporte assume a posição de fenômeno global, e
enquanto espetáculo de grande expressão social sofre fortes pressões para que seja
veiculado sob um caráter homogêneo, com regras bem definidas e condutas
previsíveis. Mas não podemos esquecer que uma mesma manifestação esportiva, ao
entrar em contato com diferentes culturas, se resignifica e tem como produto formas
diferentes de expressar-se, mesmo sob as mesmas regras, já que seus protagonistas
são provenientes de diferentes ambientações sócio-culturais.
Damo (2003) propõe uma articulação entre as noções de campo (Bourdieu),
tipos ideais (Weber) e configuração (Elias), chega à “diversidade futebolística”, fruto da
26
busca de explicitar o fenômeno esportivo como reflexo da diversidade sócio cultural em
que vivemos. (Stigger, 2005)
Tomando como exemplo os treinamentos de times profissionais de futebol,
algumas situações cotidianas, próprias de cada contexto, cedem ao imprevisível, e
algumas práticas são adaptadas visando manter o interesse e a motivação do grupo,
que pode variar em razão de diversos fatores.
Num relato de experiência de um Preparador Físico de Futebol, a trabalho num
time do Oriente Médio, a composição destas circunstâncias que promovem um
afastamento das atividades regulares e previsíveis ficam mais claras:
...eu estava em campo, num trabalho físico-tático, quando de repente, ao toque da
cirene da Mesquita, ficamos só os estrangeiros em campo.
No relato acima, o profissional trabalhava com atletas profissionais de futebol da
1
a
. Divisão da Liga Catare, quando no período de Ramadan, ao chamado para a
oração, os atletas, obedientemente, abandonaram o treino e foram orar, retornando
posteriormente para a sessão de treinamento.
Embora as regras existam, e devam ser seguidas em competições oficiais, no
cotidiano das manifestações esportivas, nas diferentes culturas, os protagonistas
definem em que nível se dá a obediência a essas regras, que podem ser flexibilizadas
pela primazia do interesse do grupo em questão. O gosto
11
muitas vezes pode afastar
ou aproximar os grupos das normas oficiais de cada esporte, mas sempre são
buscadas estratégias para manter-se uma tensão-excitação
12
próprias e necessárias à
prática esportiva.
Autores como Bourdieu (1983b), Guttmann (1979) e Guay (1993) ao refletirem
sobre as regras, cada qual a sua maneira, apresentam a seguinte posição:
as regras funcionam como artefatos culturais ligados a uma
racionalidade específica da modernidade, vinculadas ao interesse de
adequar meios aos fins na perspectiva de que seja assegurada a
previsibilidade e a calculabilidade no decorrer das competições
esportivas; regras que acabam por ser constrangedoras, seletivas e
autocráticas. (STIGGER, 2005, p. 87)
11
Expressão de Bourdieu para evidenciar um dos fatores que caracterizariam o esporte como heterogêneo.
12
Expressão de Elias & Dunning (1992) para caracterizar motivação e prazer intrínsecos ao esporte e também
componente do aspecto heterogêneo do mesmo.
27
Pela análise configuracional de Elias e Dunning (1992c), a dinâmica dos jogos
esportivos, ao se pensar nos envolvidos em cada equipe ou grupos adversários,
também apresentam relações de tensão entre si, pelo caráter de interdependência. A
tensão é necessária, desde que sob níveis equilibrados, como fator motivacional ao
grupo e seus atores.
Um exemplo típico desta análise se dá quando se reúne jovens estudantes, e na
divisão de duas equipes se delega autonomia aos mesmos, o que se percebe é que
serão formadas equipes desequilibradas do ponto de vista das habilidades motoras dos
pequenos jogadores, o que define os grupos segundo seus gostos e conhecimento um
do outro. Já num grupo de adultos, que tambem se encontram com certa regularidade,
perceberemos que serão montadas equipes equilibradas, isto visando a um equilíbrio
nas tensões necessárias para as equipes.
O fenômeno esportivo, com as características definidas por Guttmann
(1979), tomou como de assalto o mundo da cultura corporal de
movimento
13
, tornando-se sua expressão hegemônica, ou seja, a cultura
corporal de movimento esportivizou-se. (BRACHT, 2005, p.15)
Apesar do caráter hegemônico assumido pelos valores desencadeados pelo
processo de esportivização das práticas, ao expandir-se mundialmente, o esporte
moderno enfrentou, em algumas culturas, como a alemã, oposição e resistência ao
modelo inglês, caracterizando-o como cultura burguesa. A Alemanha, chegou a
construir uma organização de clubes de esporte/ginástica especificamente para a
classe trabalhadora, visando não desenvolver o esporte de forma disciplinadora e com
orientação ao rendimento, mas sim ajudar os homens a desenvolverem atividades
próprias sem caráter preparatório.
Já em outros contextos, como a cultura africana, parte de suas práticas corporais
originais foram folclorizadas, e o esporte moderno passou a ser central, mesmo com
práticas desenvolvidas de forma precária.
No Brasil, muitas são as discussões a respeito da diferenciação do que pode ser
classificado como esporte ou outras formas de manifestação corporal. Em 1985,
13
Expressão utilizada por Valter Bracht para representar as diversas atividades físicas no contexto social.
28
instituiu-se uma Comissão de Reformulação do Esporte Brasileiro, no governo de José
Sarney, a qual chegou a elencar esta diferenciação em três tipos de manifestação: a)
desporto-performance; b) desporto-participação e c) desporto-educação.(BRACHT,
2005, p.78)
Ao analisarmos de perto a dinâmica do esporte moderno, perceberemos que as
três formas estão vinculadas, principalmente ao considerarmos uma 4
a
. forma de
manifestação, a do esporte rendimento ou espetáculo, pois para Bracht (2005) esta
última expressa a nomenclatura mais clara do que representa o esporte atualmente: a
de mercadoria veículada pelos meios de comunicação de massa.
Diegel (1986) faz um resumo interessante do que seria este esporte rendimento
ou espetáculo, com as seguintes características:
- Procura talentos que possam ser patrocinados pelo Estado. Promove o
desenvolvimento tecnológico;
- Possui um pequeno número de atletas que tem o esporte como principal
ocupação;
- Possui uma massa consumidora que financia parte do esporte-espetáculo;
- Os meio de comunicação de massa são co-organizadores do esporte-
espetáculo.
Este modelo acima descrito, atualmente, traça as diretrizes para as outras
formas de práticas corporais. Isso se deve ao fato da forte esportivização das práticas
corporais, principalmente após a década de 80 do século XX, pela necessidade de
ajuste dessas práticas com a sociedade urbano-industrial que se firmava.
O que vem ocorrendo hoje é um processo de “privatização” e comercialização do
atendimento dessas necessidades. A característica marcante deste setor é o
nascimento acelerado de novas práticas corporais, que se apresentam sob o caráter
descartável, ou, para usar um termo de Chauí (1986), trata-se da “cultura do efêmero”.
O termo tradicional se mostra muitas vezes fora de lugar, pois a velocidade com
que novas propostas têm sido apresentadas torna práticas recentes em antigas, e as
tradicionais, fora de uso. Até o caráter institucional de alguns clubes e associações, que
foram criados visando oferecer aos membros uma prática esportiva diferenciada, está
cedendo à terceirização destes serviços, a fim de não fecharem.
29
Contextualizado mundialmente, de forma panorâmica, buscaremos elementos
que nos permitam refletir sobre esta realidade no contexto brasileiro, analisando as
relações estabelecidas entre o esporte moderno e o estado, considerando a influência
dos contextos econômicos, políticos e culturais.
1.4. O Esporte no Contexto Brasileiro
No contexto original inglês, o Estado via o esporte como uma forma de disciplinar
e controlar as ações violentas e descompassadas com o todo social, em especial com a
sociedade urbano-industrial e burguesa que se formava na Inglaterra de finais do
século XVIII e início do XIX. Com os Jogos Olímpicos Modernos introduziu-se um forte
elemento ao âmbito esportivo, a categoria de nação, com conotação política. Desta
forma o caráter intervencionista do modelo inglês modifica-se para a estimulação e
fomento sistemático às manifestações esportivas. (BRACHT, 2005, p. 82-83)
Um dado importante ao analisarmos a relação entre Esporte e Estado é
identificarmos qual tipo de relação existe, a princípio, entre Estado e a sociedade civil
do contexto em questão. Num primeiro momento, organizado no âmbito da sociedade
civil ao longo de sua institucionalização, o esporte e suas organizações passaram a ser
palco de constantes intervenções estatais, em decorrência de diversos princípios, como
a manutenção da ordem pública, a aspiração pública por melhoria da condição física da
população, a afirmação do prestígio nacional, isso com vistas a tecer um perfil de
política social apresentada pelas plataformas políticas.
No Brasil, para entendermos o peso do Estado na conjuntura esportiva,
precisamos analisar o período da Ditadura Militar, no seio da qual se desenvolveu uma
relação de cunho corporativista entre Estado e organização esportiva, o que se
prolongou até o final da década de 60.
A relação se deu com total poder do Estado em definir as “regras do jogo”,
impondo um retrocesso à autonomia das organizações esportivas até então presentes.
Atendendo aos interesses autoritários do Estado, as organizações esportivas passaram
a cumprir funções públicas. A partir da Nova República, a orientação da política
30
esportiva no Brasil passa a se dar por meio das relações com a organização esportiva,
assumindo características corporativistas e neocorporativistas
14
. (BRACHT, 2005, p.76)
Uma vez que o Estado não pode ficar indiferente ao resultado das ações
“autônomas” da organização esportiva, ele precisa vincular a autonomia concedida aos
seus resultados políticos, isto é, aos resultados esperados. Isso significa que a
autonomia da organização esportiva, nesse caso, será uma autonomia “funcional” ou
“controlada”.
Na verdade, não só no Brasil como no mundo, o Estado tem ditado as regras do
contexto esportivo, principalmente através das grandes organizações representativas
do esporte, como o Comitê Olímpico Internacional, as Federações Internacionais das
diferentes modalidades esportivas, como a FIFA. O Estado dá a estas organizações um
reconhecimento público e às vezes as sustenta, mas em troca define quais funções
serão desempenhadas pelas mesmas, isso gera recursos públicos às organizações,
que promovem as políticas públicas e os interesses de indivíduos ou grupos que atuam
por detrás das mesmas. ( BRACHT, 2005, p.77)
Um dos pontos que podemos constatar, sobre o nível de relacionamento entre
estes dois segmentos, é com relação à concessão de recursos financeiros, como no
caso de isenções e incentivos fiscais. No caso brasileiro, muitas federações são
altamente dependentes do poder público sob o aspecto financeiro. Parece ser de
interesse das organizações esportivas manterem este relacionamento com o Estado, já
que os benefícios são claros, mantém-se uma relação de benefício mútuo, desde que
as partes interessadas cumpram suas funções.
Mesmo não ocupando lugar de destaque nas políticas públicas, o esporte tem
sido alvo de atenção e intervenção do Estado, isso não só na realidade brasileira.
Desde a origem do esporte moderno, na Inglaterra, as intervenções estatais se davam
para conter ou reprimir ações indesejáveis do ponto de vista da manutenção da ordem
pública. (BRACHT, 2005, p.82)
No Brasil, a relação entre Estado e esporte mantém-se predominantemente
corporativista, com forte presença do caráter de nação e representação da mesma
14
Segundo Bracht, a primeira forma organizacional ocorreu numa relação de imposição pelo Estado, já num
momento posterior, a interação com o Estado se daria de forma voluntária.
31
internacionalmente. Esta predominância da estrutura corporativa tem desencadeado
dificuldades, na atualidade, para que se estabeleçam novas parcerias de incentivo ao
esporte, permanece a estrutura baseada nas recompensas aos heróis que legitimam
tais relações. No topo da pirâmide encontram-se os campeões necessários à inovação
de práticas esportivas, fator motivacional para que a população se mantenha ativa e
para que se possa recrutar melhores praticantes, além de promover o consumo dos
produtos vinculados à prática esportiva. (Bracht, 2005, p.86-87)
Na realidade, os interesses econômicos determinam todas estas relações no
triângulo Estado, cultura e esporte, ou seja, valores e significados estão fortemente
vinculados à relação monetária. Isto fica claro ao considerarmos as falsas ideologias de
promoção do esporte nacional, como “o esporte é saúde”. De que maneira isso é
possível com os constantes casos de doping no esporte, até mesmo de doping
induzido, na busca a qualquer custo pelo resultado?
O discurso hegemônico do esporte moderno está vinculado à crença no
processo linear de desenvolvimento do mesmo. Para a compreensão da forma como se
deu a instalação e permanência do esporte no modelo que conhecemos atualmente, é
necessário analisar as características assumidas pelo esporte em cada contexto sócio-
cultural, no qual ele foi implantado. Parte disto fizemos nos primeiros itens deste
capítulo, com a visão panorâmica do esporte moderno.
A compreensão do processo de hegemonia no Brasil passa, sem dúvida, pela
compreensão da dinâmica da produção e do consumo da cultura. Olivem sugere, para
tanto, examinar as manifestações culturais que ocorrem no Brasil, verificando os
seguintes pontos:
a) primeiramente em que grupo se originam e o que representam
para eles;
b) a seguir, dever-se-ia analisar como são encaradas estas
manifestações culturais pelo resto da sociedade e em que momento e
por quais motivos elas são apropriadas e reelaboradas por outros
grupos;
c) finalmente, estudar os mecanismos através dos quais certas
manifestações culturais, que estavam inicialmente restritas a
determinadas classes sociais, tornam-se uma prática disseminada em
toda a sociedade e são ressemantizadas e transformadas em símbolos
nacionais, assumindo assim um caráter de identidade brasileira.
(OLIVEM, 1983, p.61-62)
32
Mas esta visão de esporte manipulável não se dá pela simples passividade de
seus atores, pois alguns elementos apontam para certas formas de resistência, para
Chauí “a cultura popular é capaz de conformismo ao resistir e capaz de resistência ao
conformar”. Apesar do caráter ambígüo da expressão, a autora aponta para a
necessidade de estudos empíricos que identifiquem formas de resistência política ou
cultural na dinâmica do esporte moderno. (CHAUÍ, 1986, p.124)
Por uma análise da relação estabelecida entre as práticas esportivas na
antigüidade e as instituições do mesmo período, veremos que em muito pouco estas
práticas se assemelham com o esporte moderno, apesar de termos que considerar
alguns pontos que permanecem até hoje, na dinâmica dessas práticas esportivas.
Um exemplo é o jogo de pelotas dos antigos Maias, nesta prática identificamos
semelhanças com os conhecidos jogos de voleibol e basquetebol, mas na relação de
sentido que estabeleciam com a instituição da época, podemos verificar a distância do
que o esporte representa hoje. Aquela atividade estava intimamente relacionada à
instituição religiosa, que nas sociedades antigas era o centro articulardor e gerador de
significado. O jogo de pelota possuía todo um valor solene e sagrado em sua forma
ritualística de ser desenvolvido. (BRACHT, 2005, p. 97)
No contexto das sociedades modernas, as práticas corporais se ressignificaram,
tornando-se, com certo caráter de autonomia, uma nova instituição – o esporte, isto
dentro de uma dinâmica em que várias outras esferas se autonomizaram em relação ao
poder militar e religioso tradicional, aos quais, no princípio, as práticas corporais e todas
as manifestações da sociedade em geral estavam vinculadas intimamente.
Exposto os aspectos que deram origem ao esporte moderno, as condições nas
quais as relações no interior do mundo esportivo se ressignificaram mundialmente, e
como todo este processo influenciou o esporte nacional, passaremos agora a uma
análise da proposta de evangelização do Movimento ADC, e dos recursos físicos e
humanos de que vêm lançando, desde a sua fundação. Posteriormente analisaremos
os dados coletados com a pesquisa de campo, apontando elementos para a verificação
de nossa hipótese.
33
CAPÍTULO II
A DINÂMICA DO MOVIMENTO ATLETAS DE CRISTO
Neste capítulo trabalharemos com a proposta do Movimento ADC, apresentando
e discutindo seus objetivos, estratégias e recursos desde a sua fundação. Analisaremos
quais vínculos vêem sendo estabelecidos entre o Movimento ADC e a mídia esportiva.
E discutiremos os dados coletados na pesquisa de campo, na busca de elementos que
nos possibilitem verificar nossa hipótese.
2.1 – A proposta de evangelização
As primeiras reuniões do Movimento ADC tiveram início em abril de 1978, mas o
movimento Atletas de Cristo existe oficialmente desde 4 de fevereiro de 1984, e é uma
entidade sem fins lucrativos que subsiste através de doações voluntárias.
Os princípios norteadores do Movimento são:
- “Nossa VISÃO é que o mundo todo pode ser alcançado para Cristo através da
linguagem universal do esporte;
- Nossa MISSÃO é levar o atleta a Jesus Cristo a fim de levar o Evangelho ao
mundo através do atleta;
- Nosso OBJETIVO é fazer isto nesta geração
15
”.
Na busca de atingir seus objetivos, os líderes fundadores do Movimento ADC,
definem algumas estratégias de ação no Congresso Anual dos Atletas de Cristo,
oportunidade em que se reúnem todos os grupos do Brasil.
15
Estes princípios se mantém desde o início do movimento, e em todo o material didático dos atletas podem ser lidos
na contra capa.
34
Estes Congressos visam atender a algumas necessidades dos atletas, tanto em
questões da pratica esportiva como também auxiliando na gestão de suas carreiras fora
dos gramados e quadras. Os Congressos são compostos de palestras, dinâmicas,
grupos de discussão temática e é o momento em que os líderes do movimento
discutem e definem as formas de ação para o ano seguinte.
A sede do Movimento ADC, conhecida como o “QG” dos Atletas de Cristo, fica
em São Paulo e de lá sai todo material que será utilizado pelos líderes no trabalho de
evangelização do Movimento.
Na sede trabalha um pequeno número de funcionários que tem a incumbência
de tratar de assuntos burocráticos, no que se refere a questões institucionais, da
preparação de todo material para evangelização, disponibilizar através do site dos ADC
todo material de marketing (bonés, camisetas, dvd’s, cartões personalizados, livros, etc)
e manter a publicação do Jornal de Atletas de Cristo.
Grande parte do trabalho de evangelização ocorre periodicamente nos grupos de
atletas dentro dos clubes e também nos grupos locais que se encontram semanalmente
em vários pontos da cidade. O trabalho dos líderes que tocam os grupos locais é
voluntário e nas reuniões é apresentado todo material didático de evangelização. Esse
material permite ao atleta ter maior contato e aprofundamento com o Evangelho numa
linguagem mais acessível àqueles que atuam no mundo do Esporte.
Esses líderes podem ser ex-atletas, amadores ou simplesmente interessados na
proposta de evangelização através do esporte. Ao sentirem interesse pela proposta,
entram em contato com o Movimento que lhes pede uma indicação formal de suas
igrejas para participarem da formação de líderes, através da qual são capacitados a
evangelizarem através da linguagem universal do esporte.
Estas formações de líderes são ministradas por um grupo de atletas de cristo
que já estão no movimento desde o início, e são estes mesmos que preparam o
material que é utilizado em cada formação. Os temas são definidos após uma avaliação
dos trabalhos que vêm sendo desenvolvidos nos grupos locais e de algumas demandas
dos atletas que os líderes acreditam que devam ser atendidas.
35
Esta avaliação ocorre anualmente, quando os líderes formadores, se reúnem no
Congresso Anual dos ADC’s, e em meio às palestras e dinâmicas que compõe o
Congresso, avaliam e definem as estratégias de ação para o próximo ano.
Eventualmente esses líderes se reúnem mais uma ou duas vezes no ano para
definirem assuntos pendentes.
As estratégias de ação do Movimento ADC, ao serem definidas, precisam chegar
aos sujeitos que serão contemplados e impactados pela mensagem do movimento
através do esporte. Para isso os líderes formadores lançam mão de alguns recursos
que são reformulados periodicamente e visam atingir às demandas dos atletas.
No ítem que se segue falaremos um pouco destes recursos que são utilizados
pelos ADC e como a aceleração nos processos de mudanças sociais têm influenciado a
reformulação destes recursos.
2.2 - Os Recursos de Evangelização
Ao visitarmos a sede do Movimento ADC, não tinhamos idéia da organização dos
recursos físicos e humanos que dão suporte aos Atletas de Cristo. O diretor executivo
Alex Dias Ribeiro, responsável direto pelo Q.G., nos apresentou toda a rotina de
trabalho e falou dos recursos que têm disponíveis para atender a proposta do
Movimento ADC.
Segundo Alex Dias Ribeiro, esta geração atual, é a primeira a dispor de todos os
recursos técnicos (rádio, TV, internet, etc.), todo os recursos naturais, espirituais,
econômicos, para atingir todos os habitantes do planeta com a mensagem evangélica.
Isso aliado ao poder do Esporte, em mobilizar grande número de pessoas, parecem ser
os ingredientes básicos para o trabalho de evangelização do Movimento ADC.
Sobre as ESTRATÉGIAS:
- Promover por todos os meios, a proclamação do Evangelho através do esporte.
- Equipar líderes e obreiros para a evangelização e o discipulado dos atletas.
36
- Desafiar a igreja a se engajar neste projeto, fazendo uma tabelinha com os
atletas no cumprimento da Grande Comissão.
Ao analisarmos quais elementos estariam no centro de atenções dos líderes do
Movimento ADC para serem usados no trabalho de pregação, notamos que o
testemunho de vida do atleta representa o carro chefe em matéria de estratégia de
evangelização e marketing. O foco da mensagem está no que o atleta era antes da sua
conversão e nas inúmeras mudanças que ele acredita ter ocorrido após “aceitar a
Cristo”
16
.
A importância da mensagem, presente nas religiões de salvação, na qual o
renascimento individual e conversão desempenham papéis centrais no processo de
transformação do modo de vida do converso, se aproxima da postura assumida pelo
atleta ao perseguir uma posição de destaque no esporte de alto rendimento. O
testemunho reforçaria esta mudança de vida e atuaria como fator motivacional junto a
novos indivíduos e grupos em vias de conversão.
“Os Testemunhos consistem em relatos que marcam as diferenças entre a vida
antes e depois da conversão, relatos sobre uma graça alcançada, sobre um
acontecimento do cotidiano. Para o Movimento ADC os testemunhos dos atletas
representam a matéria–prima na divulgação e legitimação da proposta evangelizadora.
O testemunho é o bem simbólico mais apreciado no Pentecostalismo” e também na
dinâmica do Movimento ADC. (NOVAES, 1985, p. 78)
Acreditamos que o testemunho representa, assim como a oração e a leitura
bíblica, elementos rituais da rotina do evangélico. Para lançar mão destes recursos, na
evangelização de outros atletas, o Movimento ADC elaborou um material didático para
os iniciantes – “novo no time” – que é dividido em 3 apostilas, respectivamente sob os
títulos de Nascimento, Crescimento e Amadurecimento, elementos considerados
básicos pelo Movimento ADC para a vida do Cristão.
Alguns exemplos de títulos de lições contidas nestes manuais: “Pontapé Inicial”,
“Uma tocha no fim do túnel”, “Pivozão de Jesus”, “Concentração para a Batalha”, “De
Juvenil a Profissional”.
37
Este material didático é apresentado aos iniciantes nas reuniões dos Atletas de
Cristo, que ocorrem todas as semanas em diferentes pontos da cidade de São Paulo ou
outros locais em que o Movimento desenvolve suas atividades. Ao “entrar para o time”,
os “estreantes” recebem o material e são encorajados a adquirirem uma Bíblia,
considerada essencial para o cumprimento das lições.
A utilização do manual pode ser feita de 3 formas:
1) Sozinho, caso o atleta não tenha um companheiro mais experiente para
auxiliá-lo. Ao concluir as tarefas, estas podem ser enviadas para o escritório do
Movimento ADC em São Paulo;
2) Com uma outra pessoa mais experiente, assim as lições podem ser
respondidas em conjunto;
3) Em pequenos grupos, juntamente com outros atletas sob supervisão de um
líder, que tenha passado pela formação para ministro do esporte.
Nas lições os temas são bem variados, e enfatizam sempre elementos do
cotidiano da vida dos atletas, abordam temas da carreira de atleta, como obstáculos,
sucesso, vitória, derrota, decepções, badalação, promiscuidade no esporte, casamento,
relações em família, gestão administrativa e econômica de suas carreiras, como se
posicionar frente a mídia esportiva, etc
O Jornal do Movimento, com edição mensal, existe desde 1985 e nas primeiras
edições resumia-se a uma folha de sulfite. A partir do n
o.
14 passou ao formato de duplo
ofício; tamanho que dobrou na edição n
o.
31, circulando portanto, com total de 8
páginas. O crescente sucesso levou a edição de n
o.
175, ano 18, de dezembro de 1999,
a circular com a tiragem de 35.000 exemplares
Segundo dados estatísticos do Movimento, os membros atualmente totalizariam
9.500 atletas, espalhados por todo o Brasil e, embora cerca de 90% dos atletas sejam
do meio futebolístico, o Movimento tem representantes nas mais variadas modalidades
esportivas: skate, surfe, capoeira, caratê, etc.
16
Linguagem utilizada nos meios evangélicos para estabelecer um marco na conversão.
38
Pensando na imagem do Atleta de Cristo frente ao público alvo, já na década de
80, os atletas que tinham grande expressão em seus clubes e estavam em destaque
por suas carreiras promissoras, passaram a ser treinados pelo Movimento ADC, para se
expressarem bem frente à mídia esportiva.
No início do Movimento, na década de 80, um gesto marcou a caminhada dos
Atletas de Cristo: ao final de cada jogo os atletas evangélicos escolhiam um atleta da
equipe adversária e lhe entregavam uma Bíblia acompanhada de frases do tipo “Jesus
te Ama” ou “Jesus Salva”. A mídia esportiva veículava constantemente estas ações que
atingiam um público grande de telespectadores.
Em muitos momentos os Atletas de Cristo sofrem com o preconceito por parte de
companheiros de profissão, dirigentes, técnicos, torcedores que muitas vezes não
“colocam fé” no aspecto competitivo do atleta evangélico e da mídia em geral que se
mostra resistente às manifestações públicas da fé dos atletas.
Na Copa do Mundo, em 2002, o grupo de atletas de cristo, que fazia parte da
seleção brasileira, ao conquistar o “Penta” expressou sua fé em Cristo através de faixas
e camisetas com dizeres evangélicos. Passado algum tempo a FIFA, orgão máximo que
rege o futebol internacional, proibiu este tipo de manifestação por parte dos atletas.
Há duas semanas, critiquei os jogadores da seleção que fizeram
merchandising religioso logo após a vitória sobre a Alemanha.
Argumentei que, ao “desvestirem”o uniforme oficial para revelar outra
camiseta, que traziam por baixo, com slogans de uma causa religiosa,
eles se aproveitaram da visibilidade pública conquistada pelo time
nacional para promover convicções particulares. O que é indevido e
invasivo. O Brasil é um Estado laico: nenhuma função de representação
do Brasil pode ser apropriada por uma forma de fé. Não é democrático.
Mesmo que essa fé congregue 99% da população, não é democrático. A
minoria não pode ser excluída nesses momentos de representação
nacional. Quando se transformam a festa do pentacampeonato num
evento de divulgação de culto qualquer, esses jogadores usurpam a
camisa oficial que trajavam. Ato contínuo, excluíram das comemorações
os brasileiros que não partilham do mesmo culto. (BUCCI, 2002)
Com relação à pretensa perseguição aos atletas de Cristo no passado e
atualmente, o diretor executivo de Atletas de Cristo nos diz:
39
Hoje a perseguição é oficial, já vem dentro dos clubes, eles não podem levantar a camisa:
“Jesus ama você”, isso é uma coisa que fere a declaração universal dos direitos humanos, isso
é uma coisa grave...
Um outro recurso do Movimento ADC, é atuar junto aos grandes eventos
esportivos, como copas do mundo, olimpíadas, panamericanos. Nestes eventos o
Movimento leva um grupo de voluntários que desenvolve diferentes funções, como
panfletar junto aos torcedores, fazer reuniões nas vilas e concentrações, dando suporte
aos atletas evangélicos que se encontram em competição e também buscando
evangelizar outros.
A Copa do Mundo de 1994, nos EUA, foi um momento histórico para o
Movimento ADC, pois 6 Atletas de Cristo foram convocados para compor o plantel
basileiro. A realização de eventos durante as copas é uma das principais atividades do
movimento, pois cerca de 90% dos membros de ADC são do meio futebolístico.
(NUNES, 2003, p. 44)
Com a conquista do Tetracampeonato, os Atletas de Cristo ganharam maior
visibilidade, pois ao estarem em evidência na mídia, os Atletas de Cristo que estavam
na seleção, a cada gol, a cada defesa, a cada partida externavam com gestos em
campo sua gratidão a Deus. (Ibidem)
2.3- A mídia e os Atletas de Cristo
Desde o início do Movimento ADC, uma das preocupações dos líderes tem sido
com relação ao discurso apresentado por alguns Atletas de Cristo ao serem
entrevistados. A televisão é um dos meios mais poderosos de veiculação de informação
na atualidade e, com isto em mente, os líderes de ADC têm treinado seus atletas para
discurssarem e responderem as questões feitas pela mídia esportiva de forma clara e
objetiva e quanto possível falarem da mensagem Cristã.
“Com a televisão, estamos diante de um instrumento que, teoricamente,
possibilita atingir todo mundo. Para tanto, algumas questões são
levantadas: o que tenho a dizer esta destinado a atingir todo mundo?
40
Estou disposto a fazer de modo que meu discurso, por sua forma, possa
ser entendido por todo mundo? Será que ele merece ser entendido por
todo mundo? Pode-se mesmo ir mais longe: ele deve ser entendido por
todo mundo?”(BOURDIEU, 1997, p. 18)
As Igrejas evangélicas também se utilizam dos meios de comunicação de massa,
comprando emissoras de rádio e TV, como forma de popularizar sua mensagem.
Através da TV é possível atingir aquele público que não quer sair de casa para ir a
Igreja, assim muitas denominações têm conseguido os telefiéis, que podem depositar
seus dízimos ou adquirir publicações evangélicas com uma simples ligação.
Como prática corporal, o Esporte esta sempre envolvido com a questão dos
sentidos do movimento. Na história do esporte, desde que adentrou a modernidade,
exitem aqueles que praticam e se envolvem com a atividade em si, e aqueles que
assistem e falam a respeito do que estão vendo. As percepções que se tem da prática
são muito distintas. Analisando os sentidos, ao que joga é oportunizado sentir, cheirar,
tocar, ouvir o esporte em si mesmo, já o que assiste simplesmente visualiza o que à
distância ocorre com o(s) outro(s) em movimento.
O praticante, até pouco tempo, não conseguia ver-se em movimento, e o
espectador se privava dos demais sentidos. Com o recurso do “replay”, os atletas agora
conseguem assistir seus jogos. Este recurso revolucionou as transmissões esportivas,
que em alguns esportes, como o tênis, tem auxiliado a arbitragem na decisão de lances
duvidosos.
Históricamente, a mídia tem influenciado as atitudes tanto dos praticantes como
dos espectadores no mundo dos Esportes, e com o advento da televisão, e a
transformação do espectador em telespectador, que agora vê pelos olhos do outro,
muitas relações se resignificaram.
A televisão transformou a audiência do esporte em todo mundo e forçou
o esporte a um papel de dependência, na medida em que o tornou
menos capaz de subsistir com espectadores ao vivo, dependendo do
patrocínio resultante das transmissões televisivas.
Na década de 80
romperam-se as barreiras internacionais das relações lucrativas
entre o esporte e a televisão, que atingiram até países do antigo
bloco socialista europeu. Calculou-se que, em 1990, foram
invetidos 38,7 bilhões de dólares em propaganda na televisão
41
norte-americana, e grande parte destes recursos dirigiram-se aos
programas esportivos, nos quais a inclusão de anúncios é mais
cara. As cotas do direito de transmissão pagos pela televisão para
os dois clubes finalistas do Campeonato Paulista de 1992 foi da
ordem de 180 mil dólares (MIDIWINTER,E, 1986 op. Cit. BETTI,
1997, p. 32)
O esporte espetáculo, produzido por profissionais e destinado ao consumo de
massa, alavancou o desenvolvimento de uma indústria do espetáculo esportivo que,
submetida às leis da rentabilidade, visa a maximizar a eficácia minimizando os riscos (o
que, particularmente, acarreta a necessidade de um pessoal técnico especializado e de
uma verdadeira gerência científica, capaz de organizar racionalmente o treinamento e a
manutenção do capital físico dos profissionais.Tomando como exemplo o futebol
americano, onde o corpo de treinadores, médicos, public relations, excede o corpo de
jogadores e serve, quase sempre, de apoio publicitário a uma indústria de
equipamentos esportivos). (BOURDIEU, 1983, P.145-146)
O esporte espetáculo apareceria mais claramente como uma mercadoria
de massa e a organização de espetáculos esportivos como um ramo
entre outros do show business, se o valor coletivamente reconhecido à
prática de esportes (principalmente depois que as competições
esportivas se tornaram uma das medidas de força relativa das nações,
ou seja, uma disputa política) não contribuísse para mascarar o divórcio
entre a prática e o consumo e , ao mesmo tempo, as funções do simples
consumo passivo.(Ibidem,p. 144)
O componente comercial do esporte – a ambição de lucrar com sua promoção e
operação – atingiu seu apogeu na segunda metade do século XX. O desenvolvimento
das funções políticas e econômicas do esporte é intensificado pela reportagem
esportiva. É por meio da popularidade dos astros esportivos, da constante recepção de
informações e imagens sobre o esporte, e da combinação do sucesso com a imagem
do produto, que o esporte se torna interessante para a indústria. (WEISS, 1986)
Numa comparação do poder que tem sido reservado aos meios de comunicação
de massa, um de nossos entrevistados alertou para o fato de que com a tarefa de
proclamar o Evangelho a todas as nações, os atletas membros do Movimento ADC,
42
devem fazer uso de todas as oportunidades frente às câmeras para efetivar esta
missão.
Como exemplo foi utilizada uma matéria feita por uma revista americana, que
tinha na capa dois grandes astros do esporte, Michael Jordan e Ronaldinho Gaúcho,
nosso entrevistado sugere uma pequena mudança na foto, e coloca no lugar de
Ronaldinho Gaúcho o então jogador do Milan Kaká, que além de estar em franca
ascensão em sua carreira profissional é um dos ativos membros de Atletas de Cristo.
Segundo nosso entrevistado, caso esta foto fosse real, não seriam necessárias
palavras para que milhões de pessoas fossem impactadas pela mensagem Cristã.
Por mais incrível que possa parecer, com a produção em massa dos aparelhos
de TV e a difusão de canais por todo o mundo, instaurou-se, inicialmente, um
relacionamento de certa rivalidade entre a televisão e os dirigentes esportivos, pois
estes temiam que o televisionamento ao vivo pudesse diminuir o público pagante de
ingressos (CARLSON, 1990). Mas o temor logo se revelou desnecessário e, com o
aparecimento do sistema de satélites para transmissões a longa distância, ao vivo, a
partir dos anos 60, esporte e televisão passaram a partilhar uma “relação simbiótica”,
ambas se beneficiando em diferentes proporções, principalmente no plano econômico.
O esporte é reconhecidamente um fenômeno “midiatizado”, e a figura do ídolo,
do herói, ganha dimensões singulares ao passar pelo discurso da imprensa esportiva. A
mídia atua na produção do espetáculo e na construção de ídolos e heróis.
“O grupo de Atletas de Cristo de São Paulo, começou a fazer sucesso, ganhou
matéria de capa na Revista Placar e várias reportagens durante o ano de 1985”, os
ídolos do futebol na época eram Muller e Silas, craques do São Paulo e da Seleção
Brasileira, ambos membros atuantes do Movimento junto a Igreja Batista do Morumbi,
onde lideravam as reuniões dos Atletas de Cristo. (NUNES, 2003, p. 33)
A imprensa esportiva, ao monopolizar os direitos de transmissão das
competiçõoes esportivas, vem direcionando o discurso da reportagem esportiva,
visando atender a seus interesses de mercado. O que vai ao ar, o que será capa ou
manchete dos jornais, é previamente determinado, e comercializa o que lhe parece
interessante.
43
O Movimento ADC vem, ao longo de seus 30 anos de existência estabelecendo
diferentes formas de relacionar-se com a mídia esportiva, esta em seu discurso, num
primeiro momento apresentava o caráter de novidade do Movimento ADC. A mídia
atuava sob dois papéis, ora como divulgadora das imagens e entrevistas dos membros
do Movimento, promovendo a mensagem dos de evangelização através do esporte, ora
agindo como o advogado do supertraíra
17
, lançando mão da vida pessoal de alguns
atletas evangélicos para por em dúvida a credibilidade tanto do atleta como da proposta
do Movimento ADC.
Ao propor uma nova associação entre a imagem e a linguagem, a televisão
molda também novas maneiras de percepção. A TV é telepresença, o objeto é
presentado (e não mais representado) em tempo real – daí o sensacionalismo da
“transmissão ao vivo”. O esporte molda-se perfeitamente à forma dessa nova linguagem
das imagens; tudo é instantaneidade, ação e velocidade.
Nos referimos aqui ao Movimento ADC como surgido da religiosidade
Protestante Histórica, embora a imprensa esportiva por muitas vezes faz questão de
vincular os membros do Movimento ADC à Teologia da Prosperidade
18
, que faz parte
da dinâmica de algumas denominações pentecostais e neopentecostais que surgiram
no Brasil a partir da década de 60. A imprensa esportiva vinculava o discurso do atleta
que se convertia e adquiria bens materiais, como seguidor desta Teologia da
Prosperidade.
O diretor executivo do Movimento ADC procura passar, sob esta questão, uma
posição de imparcialidade, mas em algumas matérias veículadas pelo Jornal dos ADC’s
ele deixa evidente sua opinião contrária à Teologia da Prosperidade. Como fazem parte
do Movimento ADC atletas evangélicos das mais variadas denominações, o diretor de
ADC fez questão de dizer, ao ser entrevistado, que o Movimetno não esta preocupado
com essas divisões, desde que o atleta se disponha a assumir sua missão na
proclamação do Evangelho esta pronto para caminhar com eles.
17
Nome dado ao diabo na linguagem dos atletas de cristo.
18
A teologia da prosperidade surgiu nos EUA, na década de 40, tendo como representante Kenneth Hagin, a
mensagem tem como foco garantir aos fiéis prosperidade material.
44
O esporte no Brasil tem sobrevivido às custas de seus heróis, que esparsamente
surgem e se destacam ora no tênis, ora na natação. O futebol compõe o representante
mais fixo e perene culturalmente. Mais recentemente o voleibol, em menores
proporções, também tem se fixado no imaginário dos esportistas. Parte desta
efemeridade das práticas esportivas se deve a influência exercida pelos meios de
comunicação que decidem o que tem maior ou menor importância nos horários nobres
e direitos de transmissão das competições esportivas.
Através de suas transmissões, a televisão tem fragmentado e distorcido o
fenômeno esportivo, ao selecionar imagens esportivas e interpretá-las para nós. Ela
propõe um certo “modelo” do que é “esporte” e “ser esportista”. Mas, sobretudo, fornece
ao telespectador a ilusão de estar em contato perceptivo direto com a realidade, como
se estivesse olhando através de uma janela de vidro. A televisão é uma janela através
da qual o homem contemporâneo se abre para o mundo. Já não abrimos mais a janela
para ver o que se passa, apenas apertamos o botão da TV. É a tele-realidade.
(VIRILLO, 1983)
Nos esportes coletivos o interesse da câmera é seguir a bola; para o
telespectador, a partida existe onde está a bola, e isso é feito ao preço de uma visão
mais global do evento. Em compensação, a televisão fornece muita informação
adicional, na forma de câmera lenta, replays, closes, etc.
Optamos aqui por tecer algumas considerações a respeito do papel e influência
da mídia sobre as práticas esportivas, pelo fato de que parte da divulgação da imagem
e discurso do Movimento ADC tem sido veículado através da mídia esportiva. Um outro
agravante é que muitas das novas denominações evangélicas também têm feito uso de
recursos midiáticos para arrebanharem fiéis, nesta corrida por audiência, membros,
adeptos e telespectadores e alguns princípios éticos acabam por se perderem em prol
da lei de mercado.
Com o poder de imprimir aspectos reais aos embates simbólicos, a mídia tem
feito uso de alguns códigos de linguagem, imagem e som para legitimar uma agonia
dramática e sensacionalista apresentada nos eventos esportivos, com forte enfase na
45
performance individual, pitadas de incerteza e risco, com uma narrativa ora integradora,
ora apocalíptica
19
.
Faz-se necessária uma leitura do alcance pretendido pela mensagem
evangelizadora do Movimento ADC, já que ao fazer uso dos recursos midiáticos, ele
deve estar ciente dos diferentes códigos e signos utilizados pela imprensa, em especial
a Televisão, que traduzem e interpretam a vida e a realidade para posteriormente
presentificá-la ao telespectador.
2.4 – Sobre a pesquisa de campo
Nossa pesquisa de campo constituiu-se de : observação participante a 5
reuniões do Movimento ADC, 5 entrevistas com membros do Movimento e leitura de 80
testemunhos de atletas de Cristo, divulgados através do site do Movimento ADC.
2.4.1 - As reuniões do Movimento Atletas de Cristo
Frequentamos 5 reuniões dos Atletas de Cristo, junto a IBAB, no segundo
semestre de 2006.
O local da reunião que frenquentamos, esta próximo de dois clubes de futebol, o
Nacional e o Palmeiras, e como não poderia ser diferente, a maioria dos participantes
são atletas desses dois times.
A número de participantes ficava entre 30 a 40 participantes , incluindo neste
número um grupo de 4 rapazes que compunham a banda, 1 líder treinado pelo
Movimento ADC, 1 missionário que foram nossos contatos prévios para assistirmos as
reuniões, 20 a 25 atletas, dos quais 5 ou 6( dependendo do dia) atletas profissionais e
os outros de categorias de base, e fechando o grupo algumas namoradas e pais de
atletas.
19
Segundo Umberto Eco os meios de comunicação apontam para esta dicotomia, no qual o caráter apocalíptico diz
respeito ao homem de cultura que pode simplesmente dar seu testemunho do que era a cultura, enquanto o integrado
se mostra mais otimista, e crer ter havido uma democratização dos bens culturais.
46
Em comparação a outros grupos do Movimento ADC, o número de participantes
é relativamente alto, isto ocorre, segundo o líder local, pela presença de jogadores
profissionais de futebol que estão em expressão na mídia e que integram grandes
equipes de futebol, como Mineiro, Marcinho, Felipe.
Em todas as reuniões frequentadas, ao chegarmos, já se encontravam lá os
integrantes da banda, que já estavam afinando seus instrumentos. São rapazes jovens,
membros da igreja local e simpatizantes do grupo ADC.
Com relação ao líder deste grupo, com o qual entrei em contato préviamente, e
que me autorizou a estar participando das reuniões: trata-se de um ex-praticante
amador de futebol de salão, evangélico já antes da entrada para o Movimento ADC,
que teve seu primeiro contato com o Movimento através do treinamento (CEFLAL) para
atuar como Ministro do Esporte junto a sua comunidade, a partir de então foi convidado
à ser o líder deste grupo sediado na Igreja Batista da Água Branca.
Auxiliando o líder havia um missionário, membro da IBAB, que é ex-atleta de
futebol de salão e handebol, e era atleta amador de futebol de campo.O primeiro
contato deste missionário com o Movimento ADC, foi na cidade de Barretos onde
liderava o grupo local de Atletas de Cristo. Quando encerrou sua carreira como jogador
destas modalidades, mudou-se para a cidade de São Paulo e atualmente exerce a
função de treinador de futebol de categorias de base.
Estas reuniões ocorrem, sempre as segundas-feiras, das 20:00 às 21 :30, o dia
da semana e horário são para tentar atender aos participantes, que são em sua maioria
jogadores de futebol, e as segundas-feiras, estes atletas normalmente folgam , pois
jogam aos domingos.
O andamento da reunião não difere muito de um culto evangélico, a não ser pelo
fato de que quem conduz a reunião é sempre o líder, com rara presença de um pastor.
Das 5 reuniões que frequentamos, apenas em 1 dia tivemos a presença do Pastor Ed
Rene, que conduziu a reunião neste dia.
As reuniões não apresentam as exigências formais de um culto evangélico, como
seqüência liturgica, vestimentas, rigidez de horário, etc. Não há muitos momentos
litúrgicos, o tempo destinado ao louvor é bem amplo, ocorrendo muitas vezes no início,
e final, mas por vezes notamos louvores durante a reunião também.
47
Notamos que em todas as reuniões o louvor é um período de muita emoção, no
qual os membros parecem estar em “transe”, alguns choram, outros ajoelham-se,
outros oram em voz alta. Os louvores atuam como motivadores para a “entrada no
clima” dos participantes da reunião.
Como o grupo, por nós frequentado, é composto por muitos atletas jovens,
notamos que a maioria deles não possui uma Bíblia e não tem muita intimidade no
manuseio da mesma.
Os atletas profissionais, que participavam deste grupo, como Marcinho que na
época estava no Palmeiras e atualmente no Cruzeiro, Mineiro que na época estava no
São Paulo e agora atua para o Hertha Berlim da Alemanha, quando chegavam às
reuniões causavam certo rumor entre os jovens jogadores, que compunham a maioria
dos presentes.
A dinâmica da reunião é a seguinte: inicia—se com louvores, posteriormente é
pedido para o líder que todos se apresentem dizendo o nome e qual modalidade
praticam, aos novatos dá-se as boas vindas; é feita a leitura de um texto bíblico, o líder
faz o comentário do texto normalmente vinculando a questões rotineiras dos atletas; é
dada a voz ao participantes para pedidos de oração, exposição de testemunhos, são
dadas informações sobres os Atletas de Cristo que se encontram no exterior; há o
período de oração; mais louvores são entoados; há o encerramento. No final parece
que é servido um lanche aos participantes, mas desta parte fui privada, devido ao
horário, já avançado.
Durante o período de oração são feitos pedidos aos atletas que se encontram
lesionados, ou sem contrato, e também são feitos agradecimentos, logo após o
testemunho, daqueles que assinaram contrato com algum clube.
Algo que nos pareceu interessante neste grupo, foi grande presença de atletas
jovens, de categorias de base, além da regularidade de alguns pais de atletas, que
chegavam a dar testemunhos sobre seus filhos e se emocionavam com a dinâmica das
reuniões.
2.4.2 - Os testemunhos dos atletas de Cristo
48
Um dos pontos que marcam a entrada para os Atletas de Cristo é a construção
de um testemunho de vida, que é a base de todas as outras ações do atleta junto ao
Movimento ADC.
Lemos cerca de 80 testemunhos de Atletas de Cristo, que se encontram no site
do Movimento. A grande maioria deles tem a característica de expor dois atletas, um
antes do Movimento ADC e outro depois de sua entrada para a missão. Essa idéia do
renascimento após a conversão é muito presente no testemunho dos atletas.
Parece haver um protocolo de testemunhos, pois a grande maioria deles tem a
mesma seqüência: iniciam com o atleta perdido, cercado de dificuldades, com
problemas profissionais, pessoais ou lesionados, e ao entrarem em contato com o
Evangelho, através do Movimento ADC, há uma pequena resistência de início, certa
descrença, mas ao “aceitarem a Jesus”começam a notar as grandes mudanças em
suas vidas, e passam a estar mais motivados e preparados para essas dificuldades
anteriores.
O contato com o Movimento é, na grande maioria das vezes, mediado por algum
familiar ou amigo próximo, que já teve sua vida transformada pela conversão. Por esse
motivo enfatizamos que as reuniões dos ADC’s é um dos mais fortes meios de
evangelização.
Na primeira fase do atleta que esta testemunhando ele acredita já conhecer a
Deus, e tem algum tipo de relação com Ele, mas ao enfrentar dificuldades profissionais,
pessoais, financeiras, tenta encontrar soluções sem sucesso; neste momento de
dificuldades são convidados por um parente próximo ou amigo íntimo, a frequentar
uma das reuniões ou cultos dos ADC’s; ao entrarem em contato com esse “Jesus”é que
percebem que realmente não conheciam a Deus, e estavam se relacionando com Ele
de maneira errada.
“Minha vida religiosa era bastante ativa. Procurava ir à igreja quase todos os dias da semana, e
sempre que lá estava, dizia para mim mesmo: a partir de hoje serei um cara bonzinho. Mas logo
49
que terminava a missa, virava a esquina e começava a fazer as mesmas coisas erradas de
sempre.”(Batista – Futebol)
20
Ao entrarem para o Movimento, os atletas se percebem modificados, mais
motivados, e mesmo frente as mesmas dificuldades parecem ter algo diferente. Um
Atleta de Cristo do Braço de Ferro testemunha:
...”no ano de 2000, consegui participar da seletiva para o Campeonato Mundial realizado em
Mogi Guaçú – SP, onde me classifiquei para o mundial dos EUA daquele ano. Só que tinha um
detalhe: eu não ainda não tinha o dinheiro para a estadia e alimentação para o período de
competição do mundial nos EUA. Eu tinha apenas uma semana para conseguí-lo mas Deus
usou pessoas que eu nunca imaginaria para me ajudarem. Consegui apenas o valor para a
estadia mais 3 dólares. E eu encarei o desafio mesmo assim. Chegando lá, gastei meus únicos
3 dólares para comer minha primeira refeição (...) Depois disso me alimentei com biscoitos
recheados e suco de uva, e me segurava com o café da manhã do hotel. Chegado o dia da
competição, ao ver o tamanho dos atletas eu dise pra mim mesmo: ‘Que é que eu tô fazendo
aqui, meu Jesus? Esses caras são muito grandes!’ Sabendo que, humanamente falando, eu
seira incapaz de vencera aqueles ‘gigantes’, me afastei da delegação brasileira e fui para trás
do palco, onde seria realizado o evento. E orando a Deus disse assim: ‘Senhor Jesus, eu não
posso vencer esses gigantes, mas que quando eu estiver ali, que não seja o meu braço, mas o
teu braço, e que não seja a minha força, mas a Tua força, pois eu sei que não me trouxe aqui
em vão!’E em menos de uma hora eu conquistei o Campeonatod Mundial de Bra;o de Ferro! Foi
incrível! Até agora a ficha não caiu, foi tremendo!” (Eduardo Patrício – Braço de Ferro)
A entrada para o Movimento se dá através da mediação de alguém próximo ao
atleta, um irmão, a mãe, a esposa, um amigo que na maioria das vezes já são
evangélicos, ou tiveram uma conversão marcante, com grande transformação de vida, e
por isso passam a encorajar outros a fazerem o mesmo.
...”um amigo me falou de Jesus. No começo nem dei crédito, mas o amor de Cristo através
daquela vida me alcançou pois aquele cara, meses atrás, estava com a vida e a família
destruídas. Usando drogas o dia inteiro. Eu mesmo pude presenciar essa situação quando
estive em sua casa, no Sul. Realmente algo havia acontecido. Agora ele estava ali do meu lado,
falando de Jesus e de tudo o que Ele tinha feito e sua vida. Suas palavras me consolaram, mas
ainda faltava algo. Ele me convidou, então, para ir a uma reunião dos Surfistas de Cristo.
Aceitei, ainda sem entender direito tudo aquilo que ele havia me falado. Ali, naquela simples
reunião, dei o primeiro passo para Jesus. Algo então começou a mudar ...”(Tadeu Pereira –
Surfe)
20
Todos os testemunhos citados neste ítem foram acessados através do site dos Atletas de Cristo:
www.atletasdecristo.org.
50
O encontro com Jesus é marcante, constituindo o marco transformador da vida
dos atletas.
“Quando conheci a Jesus e descobri que confiar nele é o maior barato. Meus olhos se abriram e
percebi que tudo o que eu tinha antes era uma máscara muito grande. Com isso, a máscara
caiu na hora e fui liberto. Para quem era tão pobre que só pegava onda em tábuas de madeirite
e ganhou sua primeira prancha como prêmio numa competição, Deus deu o título de campeão
brasileiro. Para um cara feio, magro e triste por causa das drogas, Deus deu alegria, muita
saúde, energia física e a beleza do brilho no olhar. Para quem era escravo do sexo sem ter um
amor de verdade, Deus deu Adriana, uma jóia rara, com que me casei e consitituímos uma linda
família. Com Cristo as coisas vão sempre se encaixando.”(Jojó de Olivença – Surfe)
Ao se tornarem membros do Movimento ADC, alguns atletas sentem a
necessidade de transmitir e falar do que aconteceu em suas vidas, um primeiro passo é
pensarem na transformação que passaram após a conversão e constroem seus
testemunhos de vida, que é a primeira forma de evangelização junto aos mais
próximos, colegas de profissão, parentes, amigos.
“...Entreguei minha vida para Cristo numa Igreja, mas acabei me consagrando no Congresso de
ADC em 94, em Campinas. Em 97, desci para o Campeonato Mundial em Barretos com 400
Bíblias para evangelizar os cowboys e tropeiros; e também, para participar dos
rodeios”.(Eduardo Domingues – Montador de Touros)
O Movimento ADC, conta hoje com 9.500 membros, espalhados em 120 grupos
em todo Brasil. A atuação desses atletas junto ao Movimento pode ser através do
preenchimento de uma simples adesão fornecida pelo Movimento, participando
efetivamente das reuniões dos ADC’s, sendo proclamadores da mensagem dos ADC’s,
em seus clubes, trabalhando voluntariamente junto ao grupo, cedendo seus
testemunhos de vida para serem veículados pelo movimento, se manifestando
publicamente frente aos meios de comunicação como um Atleta de Cristo, atuando na
promoção de eventos sociais para o movimento, organizando e liderando trabalhos
sociais junto a população carente, ect. Estas são algumas das áreas nas quais atuam
os Atletas de Cristo.
51
2.4.3 - Entrevistas com os atletas de Cristo
Elaboramos previamente um roteiro de entrevistas
21
, que nos serviu de base
para entrevistarmos tanto os Atletas de Cristo que atuam como atletas profissionais,
como também os que já como ex-atletas, se mantém nos trabalhos do Movimento, e
praticam algum esporte como amadores.
Na definição do roteiro, buscamos levantar questões que atendessem a
verificação de nossa hipótese, de que o Movimento ADC teria atuado, quando de sua
fundação em fins da década de 70, como mediador entre o universo esportivo e a
religiosidade protestante da época.
Entrevistamos 5 Atletas de Cristo: O atual diretor executivo do Movimento(ex-
piloto de Fórmula I), o vice-presidente (atleta da seleção master de futebol), 1 atleta do
surfe, 1 atleta do futebol e 1 atleta do caratê.
O Roteiro é composto por 10 questões centrais sobre o que pretendemos com os
ADC’s, mas algumas foram adaptadas para as entrevistas, devido a alguns já serem
membros a muito tempo, e já estarem bem engajados na rotina do Movimento, puderam
dar informações mais centrais do trabalho dos ADC’s. Outros nos auxiliaram na
compreensão do que é o trabalho dos ADC’s em seus meios de atuação profissional.
Ao serem questionados sobre o que é ser atleta e cristão ao mesmo tempo, e da
possibilidade da coexistência de perfis, as respostas foram semelhantes.
Todos foram unânimes em dizer que é perfeitamente possível ser atleta e cristão,
pois o ser cristão auxilia a lidar com os momentos de derrota e vitória. Dando “Glorias a
Deus” na vitória, e oferecendo a vitória a Ele, e da mesma forma na derrota por serem
capazes de perceber que é parte de suas profissões.
Uma expressão utilizada por 3 de nossos entrevistados é a de que o Movimento
ADC veio “unir o útil ao agradável”, isso para representarem que a mistura entre ser
atleta e cristão nada tem de chocante para eles.
Um de nossos entrevistados, que já era cristão de berço, veio de Campinas, que
era uma cidade pequena na década de 80, para São Paulo, e disse que quando aqui
21
O roteiro de entrevista encontra-se no anexo 2.
52
chegou o Movimento ADC foi muito importante para que ele pudesse dar continuidade a
sua vida de cristão, mesmo numa cidade grande, e contribuindo para sua carreira
enquanto atleta profissional de futebol.
“É Atletas de Cristo na verdade, pra mim foi assim, unir o útlil ao agradável, porque eu já era
cristão, e eu estava no comecinho de carreira.(...) então eu vim pro São Paulo em 82, e quando
subi para o profissional em 85 eu já comecei a fazer parte do trabalho aqui em São Paulo, então
pra mim foi assim...era o que eu precisava. Imagina um garoto vindo de uma cidade pequena
como Campinas em 1982, Campinas tinha 100 a 200 mil habitantes eu acredito, São Paulo já
era essa...esse, essa cidade grande, essa metrópole que sempre foi, então é, o susto voce
chegar aqui e de repente encontrar um trabalho voltado para sua profissão, quer dizer, foi a
melhor coisa que me aconteceu, e ai a gente começou a ir com os contatos com o Alex Dias
Ribeiro que até hoje é o nosso chefe, ai no trabalho e, então Atletas de Cristo pra mim foi dar
continuidade na minha vida cristã, só que já tratando de coisas temas específicos e
relacionados ao futebol que era o meu caso.” (sujeito 1)
Ainda sobre a questão de ser cristão e atleta ao mesmo tempo, 3 dos
entrevistados, fizeram questão de frisar que antes de ser atletas são cristãos, que ser
cristão vem em primeiro lugar :
“Ser cristão vem em primeiro lugar, atleta de Cristo não é um atleta cristão, é um cristão atletas,
que é a coisa mais importante da vida de uma pessoa, é seguir Jesus Cristo, é o que carimba
seu passaporte para a eternidade...”(Sujeito 2)
“... primeiro voce é de Cristo, acima de qualquer coisa, voce é uma pessoa salva por Deus, e
voce poderia ser um médico, poderia ser um advogado, mas acima de tudo voce é uma pessoa
Cristã, porque o atleta ele vai acabar, ele vai passar...”(Sujeito 3)
“Em primeiro lugar eu queria dizer que é primeiro ser um cristão que é o mais importante, e em
sendo um cristão ser um cristão que pratica esporte, e aí o atela varia conforma quanto tempo
ele dedica ao esporte...”(Sujeito 5)
Com relação à mudança ocorrida em suas vidas, 2 de nossos entrevistados que
não eram cristãos antes de entrarem para o movimento, disseram que Deus
transformou suas vidas, e que eles puderam perceber com a entrada para o Movimento
ADC que eles enquanto possuidores de um dom e talento dados por Deus, deveriam
atuar em seus meios profissionais de forma diferenciada.
“... a postura de você como uma atleta Cristã ser luz para o restante do grupo de pessoas que
não tem o amor de Deus, de pessoas que tem buscas vazias, que tem vázio no coração, então
essa é a importância da Missão ADC...”(sujeito 3)
53
“...é o Alex como um dos principais líderes dos ADC ele veio é...é... fortalecer a idéia de que a
gente tinha um chamado especial dentro do esporte, e eu me senti muito bem auxiliado por ele,
fui muito bem orientado... E através do Atletas de Cristo eu pude abrir, ampliar minha visão
com relação a vontade de Deus...”(Sujeito 4)
Sobre a Criação do Movimento, os entrevistados foram unânimes em dizer que a
dinâmica das Igrejas evangélicas da década de 70 e início da de 80 não tinham
propostas nas quais segmentos sociais como atletas, músicos, artistas, dentre outros,
pudessem ser inseridos, da mesma maneira no esporte, atletas evangélicos não
“combinavam” com o cotidiano desregrado da maioria dos atletas.
“Na época em que o Movimento surgiu, as igrejas nacionais, a maioria, consideravam o esporte
como uma atividade perniciosa ã vida espiritual do cristão, muitos atletas, muitos cristãos,
encerraram suas carreiras ou terminaram sua carreira no esporte quando foi dito pra eles que
tinham que fazer uma escolha , ou seguir a Jesus ou praticara esporte, atletas de Cristo surgiru,
como um movimento de Atletas Cristãos que entendiam que Deus deu talento pra eles e este
talento devia ser multiplicado no meio esportivo...”(Sujeito 2)
Sobre a imagem do atleta, principalmente do atleta de futebol, a resistência era
muito grande:
“...um atleta de futebol hoje não é visto com discriminação, marginalizado como era naquele
tempo, hoje ele já é visto como alguém que se preocupa em estudar, ele é visto como alguém
que gosta de computador, ele é visto como alguém que sabe se comportar num ambiente fora
do ambiente do futebol, que até então ele era visto como alguém que nunca estudou, e que
ficou rico mais que não tinha estrutura nenhuma, então ninguém queria uma pessoa como essa
ao lado da filha, porque era uma pessoa que tinha dinheiro mais que não tinha cabeça, então
só pensava em coisa errada...”(Sujeito 1)
Os atletas que já eram evangélicos antes da entrada para o Movimento,
enfrentavam resistência, por serem atletas, de seus próprios familiares, que pertenciam,
na época às igrejas evangélicas
:
“já era cristão, meus pais eram crentes já então quando eu, até tive um pouco de dificuldade
para ir para o futebol, porque meu pai era da Assembléia de Deus, que era uma linha um pouco
mais fechada com relação ao futebol...”(Sujeito 1)
Ao serem questionados a respeito do alcance da proposta do movimento através
da linguagem universal do esporte, dentro dos clubes as respostas foram interessantes.
54
Levantaram o fato do Brasil ser um país de maioria católica, portanto no início tiveram
certa resistência de evangelizar dentro dos clubes, e que essa proposta teve que sofrer
algumas alterações durante a caminhada dos ADC’s
“essa proposta foi mudando com o passar dos tempos, dos anos, porque no princípio pelo
Brasil ser um país na época era né, na sua maioria Católico, então a gente tinha muita
resistência com relação a um jogador crente proclamando o Evangelho...”(Sujeito 5)
Questionamos sobre como eles evangelizam nos clubes, ou em seus meios de
atuação profissional, as respostas dos tres atletas foi de que o primeiro passo para
evangelizar é um bom testemunho, através de suas condutas enquanto atletas dentro
dos clubes:
“num campo de futebol, a vida dele esta exposta ali a milhares de fãs e a atitude dele é... com
certeza influencia as multidões, então essa é a vida do ídolo, do atleta de destaque, ele
sempre em evidencia, ele tá sempre em destaque, ele tá sempre tendo a oportunidade de
influenciar alguém, então o testemunho dele é fundamental.”(Sujeito 4)
“Primeiro é com a postura, com respeito, respeitando a todos, amando a todos é com
testemunho claro, vivo, de vida né, até porque alguns me conheceram antes de ver a Cristo, a
mudança que houve, se impondo, porque quando voce se impõe as pessoas te respeitam, se
impõe de uma maneira amorosa, carinhosa, não de maneira taxativa nem violenta, e aí as
pessoas percebem isto, então voce manifesta o amor de Deus, o poder de Deus, através do
seu testemunho e da sua postura.”(Sujeito 3)
Pedimos para que os entrevistados traçassem o perfil do Atleta de Cristo, e mais
uma vez verificamos a forte presença do testemunho de vida destes atletas, da
importância de serem disciplinados, honestos, de viverem segundo o que aprendem
com a vida cristã.
“Eu penso numa pessoa integra, uma pessoa correta, honesta, que procura fazer as coisas
corretamente, as coisas certas, que procura agir com justiça, que respeita a liderança, que
respeita regras, que é alguém competente, que é alguém que ama a camisa que veste da
missão, que zela pela missão, que protege o nome de Cristo com um bom testemunho, então
assim o perfil de alguém que conhece a Palavra, que manuseia bem a Palavra de
Deus...”(Sujeito 3)
eu falando de mim mesmo né hoje eu me acho uma pessoa super normal, super normal, é
consciente do meu papel na sociedade como cidadão e procuro viver a minha vida não
baseado nos valores do mundo mas nos valores de Deus, esse é o perfil”(sujeito 4)
55
“... eu acho que um atleta cristão deve ser um seguidor de Jesus Cristo, ele tem que ser o cara
de Cristo tá, no meio esportivo, multiplicando o talento que Deus deu pra ele no meio esportivo,
sendo o sal da Terra, sendo Luz do Mundo, sendo um proclamador, tendo esta visão de que
pode alcançar o mundo pra Cristo através da linguagem universal do esporte, por que nós
temos a melhor mensagem de todos os tempos, a única mensagem que pode produzir vida
eterna no ser humano, e só que os meios de apresentar esta mensagem eles não tem que ser
pré-estabelecidos ou só existe um meio, até porque os meios variam de acordo com a tribo que
voce quer alcançar, então se voce vai pra China falar de Jesus Cristo voce tem que falar Chinês
né, se voce vai pra Lituânia voce tem que aprender a falar o idioma de lá, e... e hoje existe uma
tribo muito grande de gente que é seguidor de esporte, apaixonada por esporte, só a tribo
corinthiana tem mais..., tem uma população maior que muitos países, muitas nações do
mundo, então quem tem credibilidade para falar com essa tribo aí, que é um tipo de gente que
talvez nunca entrasse numa igreja, é... são os heróis deles, os heróis do futebol, então quem
tem credibilidade perante quem é fã de futebol, ninguém tem mais credibilidade que os
jogadores, então eu creio que Deus esta levantando uma parte deles, creio não tenho certeza,
pra serem os arautos, os proclamadores da nossa era.”(Sujeito 2)
Com relação a forte ligação entre futebol e o movimento, e o espraiamento da
mensagem para outras modalidades esportivas, as respsotas variaram muito. Um dos
entrevistados acredita que a mensagem de Atletas de Cristo seja uma mensagem
simples e o relacionamento informal com que os líderes do movimento abordam os
grupos de atletas, tenha facilitado a que jogadores de futebol tenham se identificado
com a mensagem, fala também da importância dos grupos locais.
“É simples, acredito que pela estratégia de trabalho e pela forma de abordagem dos atletas pela
maneira simples e natural como o Alex e sua equipe é... é chegaram até outros atletas, através
de relacionamento, da amizade, mostrando as diferenças de servir a Cristo e de não servir,
então essa forma estratégica foi fundamental pra que outros atletas de modalidades diferentes
pudessem também hoje se agregarem ao movimento e através da divulgação dos
núcleos.”(Sujeito 5)
Um outro atleta acredita que a repercurssão no meio futebolístico é apenas
devido a fatores culturais, e atribui a fixação do movimento ao fato de ter surgido com
os atletas profissionais e depois passou as categoria de base.
“...foi uma questão cultural, que no Brasil o futebol é o carro chefe, e uma questã de
casualidade que começou de cima para baixo, começou com os atletas de alta performance,
que eram profissionais, e depois foi atingindo os mais de baixo, então foi assim, uma questão
de cultura...” (sujeito 5)
56
Sobre o surgimento de novas denominações evangélicas, e se isso causou
alguma mudança para o movimento, ao agregar atletas das mais variadas modalidades
e denominações, as respostas se dividiram para um grupo em parte essa abertura
para novas denominações de certa forma facilitou o trabalho dos atletas de Cristo pois
atualmente ser evangélico não causa mais o mesmo impacto que anteriormente, nas
década de 70 e 80.
“Eu acho assim, que o que é de Deus não vai morrer, vai prosperar, vai crescer, vai multiplicar,
então eu acredito que nós tanto os Atletas de Cristo como os Surfistas de Cristo enfrentou
muitas barreiras né e preconceitos das próprias denominações né, e .... mais hoje graças a
Deus tem muitas igrejas que abraçaram a visão,que abraçaram a idéia né, puderam ver assim a
conquista do Reino de Deus assim de uma ótica muito mais ampla não é, e puderam entender
que Deus também ama os esportistas e estenderam assim o apoio né, pra missão continuar
atuando, e isso é de extrema necessidade, por quanto a missão é a ponte entre o Atleta e a
Igreja.”(Sujeito 4)
“Eu vejo como uma oportunidade maravilhosa de superar as diferenças, respeitar as diferenças,
e isso não influencia em nada, mostra a unidade do corpo, o que muda, o que altera um
pouquinho de uma pra outra são os costumes de uma denominação, uma é mais rigida outra
não, e graças a Deus isso já tem diminuído bastante, antigamente um atleta, um membro da
Assembléia de Deus jamais poderia praticar esporte, então eu vejo que o Espirito Santo está
agindo em todas elas e utilizando o esporte pra alcançar o mundo de fato.”(Sujeito 3)
Para outro grupo, acreditam que o surgimento de inúmeras denominações
evangélicas, com propostas diferenciadas, provocou uma saída do foco, que para o
movimento esta em Jesus Cristo, e no compromisso de proclamar a mensagem cristã
ao mundo.
“Eu acho que isso afastou os atletas do propósito que Deus tem para a vida destes atletas,
imagina, Deus da um talento fantástico para um atleta, um atleta capaz de alcançar o mundo, e
ele fica querendo brincar de ser pastor dentro da igreja e pregar para uma meia duzia de crente
que já estão convertidos e estão mal informados, quando eles podiam estar alcançando bilhões
de pessoas com o testemunho, com o empenho em ser o arauto do reino de Deus no mundo,
entendeu!”(Sujeito 2)
Além disso estes sujeitos, acreditam que o Movimento teve sua proposta
prejudicada, em partes, pois o grande número de denominaçções dificulta o
compromisso de estar vinculado a uma Igreja de dar continuidade ao trabalho dos
ADC’s.
“...antes voce tinha Igreja Assembléia de Deus, Igreja Batista, Igreja Presbiteriana, de repente
Igreja Metodista, hoje voce tem, numa mesma denominação, voce tem igrejas independentes
57
que saíram (...) se eu não estou sendo bem aceito aqui eu vou pra aquela, (...) porque no
Cristianismo, segundo o meu ver, a parte central algumas coisas que não se negociam, e
depois tudo de mais é enfeite, pode diferenciar de uma igreja para outra, mas não é o cerne da
vida cristã, então eu acho que devido a isso também o atleta ficou muito livre pra sair dessa
igreja e pra ir para outra, antigamente voce pra sair de uma igreja pra outra voce precisava de
uma carta do pastor, hoje o cara vai chega lá, e se o dízimo dele for om então ele não precisa
de carta de ninguém...”(Sujeito 1)
Sobre o papel da mídia junto ao movimento, questionamos apenas os dois
sujeitos que estão vinculados diretamente com o movimento, o diretor e o vice-
presidente, e as respostas foram que a mídia deve ser utilizada para a proposta de
alcançar o mundo para Cristo.
“eu acho que a gente tem esse pulpito gigante, que eu fale em 86, quando eu estava na Copa
do Mundo, porque o presidente da FIFA, João Havelange, brasileiro, gostaria que eu fosse
titular da seleção, a Globo fez uma entrevista comigo no Jornal Nacional, eu falei durante 5
minutos no Jornal Nacional, iso se a gente tivesse que pagar, custaria eu não sei, hoje 5
minutos do Jornal Nacional, eu acho que não menos do que, 1 milhão de reais, de doláres, eu
devo tá falando coisa pequena, mas por estar na Seleção Brasileira, e porque o João
Havelange queria que eu jogasse, eu falei 5 minutos, falei 1 minuto sobre o que eles queriam e
4 minutos sobre o amor de Deus, metade da população brasileira ouviu a mensagem, então eu
acho que a gente tem que ter essa percepção de que realmente a gente tá numa posição
privilegiada.”(Sujeito 1)
No final da entrevista pediamos aos atletas uma mensagem que estivesse
vinculada a sua missão enquanto Atleta de Cristo:
“Eu acredito que se eu pudesse definir em uma só palavra seria – Proclamação...”(sujeito 1)
“...eu sou Cristão, e como Cristão eu tô com Maria e não abro: “Faça tudo como Ele
mandar”(bodas de Canaa). Então eu estou desta maneira, fazendo tudo conforme ele mandar,
seguindo a risca e o resto é invenção.”(Sujeito 2)
“A minha contribuição pra Missão (movimento) é de estar sempre dando um bom testemunho, é
de não manchar o nome de Cristo em primeiro lugar e nem manchar o nome da Missão, sempre
é... sendo boas referências”(sujeito 3)
“...é a minha missão daqui pra frente já quase final de carreira é continuar sendo a pessoa que
eu sempre fui como cristão e procurar sempre estar inflenciando pessoas né, procurar ser bem
melhor, ser um bom cristão e levar a mensagem pras pessoas que precisam né, porque a gente
tem uma grande tendência a se acomodar achar que já acabou as forças, que já rendemos tudo
que tinha pra render...”(sujeito 4)
58
“não deixe de falar deste livro da Lei; antes medita nele dia e noite, para que tenhas cuidade de
fazer segundo a tudo quanto nele esta escrito; porque então farás prosperar o teu caminho, e
serás bem sucedido. Não te mandei eu? Se forte corajoso não temas, e nem te espantes
porque eu o Senhor teu Deus serei contigo onde quer que você vá”. (Josué 1:8,9) (sujeito 5)
Concluindo, pudemos verificar que assim como nas reuniões, e na descrição dos
testemunhos, que a ênfase na boa conduta dos Atletas de Cristo sempre vem sendo
uma constante na proposta do Movimento. Isso é bem representado no processo de
transformação, que se dá na conversão e entrada para o Movimento. Além disso o
papel do Movimento é central não só na mudança ocorrida com o próprio sujeito, com
relação a sua conduta e forma de encarar a vida, mas também como eles passam a ser
vistos pelos seus pares e demais pessoas com as quais se relacionam. Ao perceberem
a mudança, os dirigentes, colegas de profissão, a mídia passam a encarar os Atletas de
Cristo com mais respeito e credibilidade. A criação do Movimento para os atletas
evangélicos foi o que eles chamaram de “Unir o útil ao agradável”.
59
CAPÍTULO III
ATLETAS EM CAMPOS
Como nosso objeto de estudo é o Movimento Atletas de Cristo (ADC), e nossa
hipótese central vem no sentido de que este movimento cristão, que surgiu em fins da
década de 1970, exerceria a mediação entre Campo Esportivo e Campo Religioso,
lançamos mão dos conceitos de habitus e Campo Simbólico
22
em Pierre Bourdieu,
como uma das vias para compreendermos o contexto social e religioso no qual surgiu
este movimento.
3.1 - Um movimento entre instituições
No capítulo I apontamos para algumas questões que levaram o Esporte, em seu
processo de institucionalização, a desenvolver toda uma rede de novos significados nas
relações entre os sujeitos e grupos envolvidos nas práticas corporais. Desta forma na
sociedade ocidental, que adotou o Esporte Moderno como modelo hegêmonico e
central em suas práticas corporais, alguns vínculos com as outras instituições passaram
a ser estabelecidos, isto na busca de legitimação e consolidação deste modelo.
Analisando a teoria de Campo
23
de Bourdieu, poderíamos representar as
tensões que ocorrem no interior das várias esferas da sociedade moderna, como
definidoras da posição que cada campo ocupa na estrutura social mais ampla. Essas
mesmas tensões também estabeleceriam os limites entre os campos, e as
possibilidades de disputa entre os mesmos.
Fruto das disputas e tensões próprias dos Campos Esportivo e Religioso, o
Movimento ADC, representaria um momento em que as exigências destes dois campos
22
Para Bourdieu a eficácia do campo simbólico reside na possibilidade de ordenar o mundo natural e social através
de discursos, mensagens e representações, que não passam de alegorias que simulam a estrutura real de relações
pessoais. (2005, p. XIV)
60
se cruzariam. Deste lugar comum entre os campos teria surgido a proposta do
Movimento ADC, sem a pretensão de substituir as ações das instituições nos dois
campos, a Igreja e o Esporte. O Movimento ADC, reconhece a legitimidade destas duas
instituições, que possuem o monopólio do capital específico
24
de seus campos.
Partimos do pressuposto de que ao passar a existir instituicionalmente, em 04 de
fevereiro de 1984, o Movimento ADC já nos oferece algumas reflexões sobre as duas
grandes instituições que ligam-se diretamente a sua dinâmica, uma de tradição antiga -
a Igreja, e outra “inventada” pelo processo da modernidade – o Esporte.
Por tradição inventada entende-se um conjunto de práticas,
normalmente reguladas por regras tácita ou abertamente aceitas; tais
práticas, de natureza ritual ou simbólica, visam inculcar certos valores e
normas de comportamento através da repetição, o que implica,
automaticamente, uma continuidade em relação ao passado.
(HOBSBAWM, 1984, p. 9)
Consideraremos também que para a fundação do Movimento ADC, um grupo de
indivíduos, com interesses comuns, se arriscaram na fronteira entre essas duas
instituiçõs, ambas de caráter sagrado para seus fiéis e praticantes. E estes sujeitos,
partiram de suas experiências nestas instituições, no interior das quais foram motivados
a estabelecerem uma nova forma de manifestação.
Acreditamos que a surpresa causada com a fundação do Movimento ADC, para
as duas instituições e também para sociedade da época, foi pela novidade em
apresentar-se não como mais um movimento que viria a romper com as formas
institucionais tradicionais, mas sim com uma proposta que valorizava os princípios de
cada uma delas.
Focalizados na “proclamação do Evangelho através de uma linguagem universal
do esporte”, o grupo fundador do Movimento ADC tinha no mínimo a convicção da
importância do Evangelho, e a confiança na possibilidade de isso ser efetivado através
de seus meios de atuação profissional, o Esporte.
23
Esta teoria os campos se apresentam à apreensão sincrônica como espassos de posições (ou de postos) cujas
propriedades dependem das posições nestes espaços, podendo ser analisadas independentemente das características
de seus ocupantes (em parte determinadas por elas)
24
Falar em capital específico para BOURDIEU, é dizer que um capital vale em relação a um certo campo, portanto
dentro dos limites deste campo, e que ele só é convertível em outra espécie de capital sob certas condições.
61
O Movimento ADC surge num processo de relativa continuidade de algo
preexistente, em decorrência de uma história que permitiu sua inserção. Entre duas
instituições, já legitimadas, o Movimento se circunscreve com a intenção de dispertar
para possíveis formas de diálogo entre elas.
Ao analisarmos a história dos movimentos sociais poderemos ter uma idéia de
como eles surgem e se estabelecem, em determinados períodos, segundo as
demandas expressadas por seus sujeitos. No processo de invenção das tradições ao
longo dos séculos XIX e XX, parte da legitimação destas se dava pelo caráter de
continuidade que estabeleciam com uma tradição precedente, mesmo manifestando-se
de forma contrária às idéias e práticas anteriores, partiam de uma reação às estas.
A estrutura de cada campo constituiu-se pela relação de forças entre os
agentes ou instituições engajadas na luta pelo monopólio no interior de
cada campo. Na complexificação das relações dentro dos campos,
passou a ser exigida uma maior distribuição do capital específico que,
acumulado no curso das lutas anteriores, orienta as estratégias
ulteriores. (BOURDIEU, 1983, p. 90)
É o contraste entre as constantes mudanças e inovações do mundo moderno e a
tentativa de estruturar de maneira imutável e invariável ao menos alguns aspectos da
vida social que torna a “invenção das tradições” um assunto interessante para os
estudiosos da história contemporânea. (HOBSBAWM, 1984, p.10)
O capital específico refere-se a um determinado campo, e está circunscrito
dentro de certos limites. O monopólio deste capital determina os pólos nas relações de
força dentro de cada campo, na disputa os dominantes (possuidores de maior capital
específico) tendem a lançar mão de estratégias de conservação, enquanto no outro
extremo os recém chegados, os mais jovens normalmente, tendem à estratégias de
subversão – as da heresia. (BOURDIEU, p. 90)
É importante ressaltar que, embora poucos sejam os estudos que abordem o
processo exato pelo qual essas tradições são inventadas, espera-se que esta
“invenção” ocorra com mais freqüência quando uma transformação rápida da sociedade
debilita ou destrói os padrões sociais para os quais as velhas tradições foram feitas,
62
produzindo novos padrões com os quais essas tradições são incompatíveis. (Ibiden, p.
12)
Tais tradições têm nas instituições seus representantes e legitimadores,e pelo
processo de aceleração das mudanças ocorridas com a modernidade essas
instituições, ao perderem sua capacidade adaptativa e de flexibilização ao novo,
provomovem/ motivam a invenção de novas tradições.
O conhecimento da história de cada campo, e do processo de lutas e legitimação
de cada campo, permite a formulação de uma nova proposta. Bourdieu faz uma
analogia deste quadro de disputas através do jogo:
“Pelo conhecimento prático do jogo que é tacitamente exigido aos recém-
chegados, toda a história do jogo, todo o passado do jogo, estão presentes em cada ato
do jogo”.(BOURDIEU, 1983, p. 91)
Instituições antigas, com funções estabelecidas, referências ao passado
e linguagens e práticas rituais podem sentir necessidade de fazer
algumas adaptações, conservando velhos costumes em condições
novas, ou usar velhos modelos para novos fins.(Ibiden, p. 13)
“As práticas tradicionais existentes – canções folclóricas, campeonatos de
ginástica e de tiro ao alvo – foram modificadas, ritualizadas e institucionalizadas, para
servir a novos propósitos nacionais.” (Ibidem, p. 14)
Os artífices dessas novas invenções modelam suas peças partindo de uma
mesma matéria-prima, são novamente forjadas e reelaboradas como novos acessórios
para rituais resignificados através de novas versões de antigos discursos, com
vocabulário simbólico ampliado, buscando novas formas de expressar velhos sentidos e
para tal criam todo um arsenal simbólico como forma de personificar interesses
comuns.
Nas reuniões do Movimento ADC, presenciamos algumas dessas
resignificações, indo de encontro a reformulação de práticas precedentes. A reunião na
realidade é um culto evangélico, percebemos isso pela própria condução do ritual, que
ficam caracterizados elementos simbólicos originários no contexto da liturgia
63
Protestante, como a oração, os hinos e a Palavra
25
, embora isso aconteça nas reuniões
com certa informalidade..
Ao apresentar-se enquanto movimento, e manter-se enquanto tal, ao longo
desses 30 anos de existência, o Movimento ADC tem sofrido constantes adaptações e
renovações, do ponto de vista de suas estratégias de ação junto aos atletas, dirigentes
esportivos e torcedores (espectadores e telespectadores). Ao manter seus objetivos
definidos em sua fundação, por ser um Movimento e não uma instituição, suas
estratégias de ação não são vistas como reguladoras e definidoras de condutas, isso
mantém-se enquanto papel da Instituição Igreja e do Esporte.
Mesmo frente às constantes disputas de poder existentes nestas duas
instituições, o Movimento ADC tem desenvolvido suas atividades paralelamente às
mesmas, sem aparente influência do ponto de vista estrutural. Isso tem, sob nosso
ponto de vista, garantido a permanência e crescimento do Movimento.
Concluiremos por ora, com algumas sugestões de reflexão, que podem ser
desenvolvidas a partir desta relação entre movimento e instituição, para estudos
futuros.
Acreditamos que pela dinâmica social moderna, de constante aceleração e
aparente transformação nas práticas de uma maneira geral, o Movimento ADC, embora
tenha sido fundado sem a intenção de regular e disciplinar a conduta de seus membros
e simpatizantes, e sem pretensões de substituir as instituições que teriam este papel;
ao analisarmos o material didático de evangelização utilizado pelo Movimento, e
também as respostas dos sujeitos por nós entrevistados, em alguns momentos parece
haver uma sobreposição de funções entre o Movimento ADC, a Igreja e o Esporte.
Como suporte teórico a esta análise, consideraremos 3 categorias de
Hobsbawm, feitas pelo autor como observações gerais sobre as tradições inventadas
desde a Revolução Industrial, que nos parecem permitir uma aproximação à dinâmica
entre movimento e instituição:
a) aquelas que estabelecem ou simbolizam a coesão social ou as condições de
admissão de um grupo ou de comunidades reais ou artificiais;
25
Fazemos referência aqui ao momento durante a reunião dos atletas em que é lido um versículo da Biblia Cristã,
com um discurso posterior visando aproximações necessárias às demandas do grupo em questão.
64
b) aquelas que estabelecem ou legitimam instituições, status ou relações de
autoridade;
c) aquelas cujo propósito principal é a socialização, a inculcação de idéias,
sistemas de valores e padrões de comportamento.
A aproximação da primeira categoria, seria no que se refere a adesão ao
movimento, que se dá através do preenchimento de um formulário de adesão, no qual
não há aparentemente nenhum compromisso efetivo com a Missão de Atletas de Cristo,
a vinculação e participação partiria de identificação do indivíduo ou grupo com a
proposta.
No caso da legitimação institucional, embora o Movimento não substitua o
espaço da Igreja ou do Esporte, ao incorporar atletas evangélicos e simpatizantes,
estaria intrínseca a pertença a estas duas instituições e um habitus
26
próprio das
mesmas. E, por fim, ao apresentar uma proposta de treinamento para atletas que
pretendem proclamar o Evangelho Cristão, estariam implícitas ações com alguma
interferência nos padrões de valores e comportamento dos envolvidos no processo de
pertença ao Movimento ADC.
No item que se segue, abordaremos o fenômeno esportivo sob uma análise da
relação estabelecida entre as práticas corporais e a religiosidade o Ocidente, mais
especificamente na construção da imagem corporal nos EUA.
3.2 – Um releitura esportiva das Escrituras
Embora pareça nova esta idéia de releitura esportiva das escrituras, na Inglaterra
do início do século XIX e nos Estados Unidos em meados do mesmo século, os
adeptos da Cristandade Muscular já vislumbravam um Jesus Cristo esportista, e
acreditavam que a moralidade é tanto uma questão de forma muscular quanto de
piedade religiosa, e os melhores cristãos têm o dever de possuir um corpo atlético.
(COURTINE, 1993, p.92)
65
No final do século, “emergiu um número cada vez maior de adeptos que
viam em Cristo um homem de ação, um atleta espiritual, empreendedor
e temerário: sua vida inteira testemunhava seu entusiasmo pelas
alegrias e esforços desse baixo mundo; seu calvário não fora mais do
que uma última corrida de obstáculos, conduzindo-o ao primeiro lugar no
podium.”(COURTINE, 1993, p.92)
Na sociedade americana dos séculos XIX e XX, as práticas corporais adquiriram
fortes vínculos com as crenças religiosas, estas investiam no terreno esportivo, pois
guiados pelo pensamento puritano de hábitos de ordem, de exatidão, de disciplina,
acreditavam na transformação da sociedade nos moldes requeridos pelo processo de
industrialização e racionalização.
Com o papel de manter sob certa ordem e controle as várias esferas da
sociedade, ao ser concebido, não só como prática corporal, mas também como um
estilo de vida, o pensamento esportivo, que tinha suas bases psicológicas enraizadas
no pensamento moral e religioso, estabeleceu um discurso científico enquanto base
metodológica para suas práticas, com forte presença da área médica que encarava o
movimento corporal como um signo essencial à saúde.(COURTINE, 1993, p. 93)
Ao ocupar lugar central na dinâmica social moderna, o Esporte passou a ser
objeto de estudos das mais diferentes áreas, que buscavam elementos para
compreender os diversos fenômenos sociais que eram gerados pelas práticas corporais
modernas.
A antropologia cultural proporcionou aos historiadores linguagens para a
discussão dos significados simbólicos do corpo, em particular como contextualizados no
interior de sistemas de mudança social; e de uma maneira bem similar, a sociologia, e a
sociologia médica acima de tudo, encorajou os historiadores a tratarem o corpo como a
encruzilhada entre o ego e a sociedade. (BURKE, 1983)
Os sociólogos do corpo ainda consideram a obra de Weber valiosa, pois
uma das resistências estáveis de sua avaliação da ética protestante está
na revelação de como o que poderia ser assumido antes como
comprometimentos (questões de salvação e justificação) doutrinários
abstratos (“desencarnados”) tornaram-se de tal forma internalizados
26
O conceito de habitus, em Bourdieu, será por nós trabalhado no próximos capítulo, por pretendemos aqui
caracterizar a ação individual dos sujeitos dentro das duas instituições mencionadas.
66
para terem profundas implicações no controle e na disciplina pessoal do
corpo.(PORTER, 1983, p.302)
A modernidade estimulou incontáveis formas de se apresentar o corpo sob as
vestes do consumo, que propiciou diferentes imagens e relacionamentos do mesmo
frente às diferentes esferas institucionais. As práticas corporais sofreram, nos anos 80,
uma massificação e domesticação, isto através de sofisticado maquinário eletrônico,
que chegaram ao ponto de “dialogarem” com os praticantes, ou seja, para manter-se a
disciplina corporal dos treinamentos e combater a dor provocada pela intensidade dos
mesmos, as máquinas eram programadas para motivar os clientes.(COURTINE, 1993,
p.85)
Na sociedade ocidental, a cultura contemporânea do corpo é
inteiramente dominada pelo ciclo da absorção e da eliminação, tanto
orgânico, quanto econômico: o “body-building”, a autodisciplina da
transpiração, todo esse trabalho feito nas máquinas de musculação, o
gasto compulsivo de energia, de matérias, de bens acumulados, são os
usos em espelho, similares e invertidos, das atividades cotidianas de
preenchimento de carrinhos de supermercado e de incorporação de
alimentação.(COURTINE, 1993, p.86)
Ao categorizar-se essas práticas entre o simples hedonismo de hoje e da
disciplina de ontem, parece-nos que a história do corpo continua a sofrer mazelas cada
vez mais acentuadas, com uma face de suposto prazer e equilíbrio entre corpo e alma,
que acaba por mascara a realidade das práticas corporais no ocidente.
A idéia de renascimento individual e conversão corporal,
progressivamente inscrita no pensamento do puritanismo americano
sobre o corpo, ganhou força a partir do início do século XIX, quando
pastores e fiéis começaram a ser mais otimistas quanto à possibilidade
de assegurar sua salvação na terra. Começaram a querer que o estado
de graça e a perfeição dependessem da conduta humana: desde então,
a atenção moral dirigida à saúde ganhou uma importância essencial.
Cuidar do próprio corpo era assegurar a salvação da própria alma. Isto
teve a complementação dos ideais democráticos, da idéia de igualdade
que contribuíram para que a noção de perfectilidade humana se
desenvolvesse e exercesse uma nova influência social.(Ibidem, p.89)
Estes elementos de regulação e controle das práticas esportivas, na sociedade
americana, têm se mantido estáveis até nossos dias. A prova disso é a constância e
67
regularidade dos atletas norte-americanas que participam de grandes competições
esportivas, nestas ocupando o topo distanciado em número de medalhas em grandes
competições esportivas, das mais variadas modalidades.
Recentemente, tivemos os Jogos Panamericanos aqui no Rio de Janeiro e
pudemos ter uma idéia do que o esporte representa para os americanos, pois numa
competição como esta, considerada por eles de médio porte, para a qual são enviados
atletas novos e sem grande expressão mundial, conseguem manter a hegemonia nas
competições e dispararem no quadro de medalhas.
O pensamento moral e religioso tinha estabelecido os fundamentos psicológicos
da era esportiva, enquanto o discurso científico estabelecera suas bases
metodológicas. Restava-lhes penetrar os modos de vida.
Ao tornar-se um estilo de vida, a partir de 1890, o esporte vigorava como o
passaempo favorito do macho americano de classe média. Nos primeiros 20 anos do
século XX, a exposição pública dos corpos adquire pouco a pouco uma
respeitabilidade, com certo grau de espetacularização. Neste período, a burguesia
tradicional, aspirando sucesso, deflagra o espírito competitivo como o motor do terreno
esportivo e da vida social.
A figura do self se apresenta no cenário emergente, por um individualismo
disciplinado, com caráter devocional necessário, próprio do ethos puritano frente ao
trabalho, que agora transfere-se ao universo das práticas esportivas. Assim, o espírito
de competição e o desejo de vencer passaram a ser um campo de investimento do
esporte, mais do que no passado.
Com a entrada nos anos 60, e o impulso hedonista em prol do “Have fun”,
“feeling good”, “being in shape”, ocorre uma súbita liberação, com esfacelamento da
antiga base moral puritana. Mas o espírito competitivo e a busca pelo prazer pessoal
coexistem num contexto ambíguo das práticas esportivas.
No movimento histórico que conduziu uma sociedade puritana à era do consumo
de massa, não se encontra, como por vezes se supõe, uma estratégia puramente
repressiva que submeteria, hoje ainda, o corpo individual ao jugo do puritanismo de
ontem. “Nos Estados Unidos, a cultura do corpo é uma das forma essenciais de
68
compromisso estabelecido pela ética puritana com as necessidades de uma sociedade
de consumo de massa.”(COURTINE, 1993,p. 102)
As transformações nas formas de práticas corporais que promoveram o
“desencantamento”, as interdições que freavam o gozo material, inibiam o consumo,
restringiam a atividade física, foram relaxadas, juntamente com o recuo dos discursos
religiosos de responsabilidade moral e com a dissolução progressiva das formas de
enquadramento comunitário, como a família. Na cultura profissional e esportiva, que
tomou o lugar da família, a exigência de disciplina passou a ser associada menos à
ordem do que ao sucesso, menos à moral do que à promoção pessoal. (ELIAS, 1977)
A aparência, que a ética protestante queria austera, é fruto de um labor
narcísico; o invólucro corporal torna-se o resultado de uma atenção obsessiva, com
ritos quase religiosos de um culto profano. Não bastava às praticas esportivas a simples
manutenção dos pré-requisitos morais e éticos para a busca do bem-estar, a corrida
passa a ser pela aceleração da transformação corporal e busca de
resultados.(COURTINE,1993, p. 103)
O esporte brasileiro é herdeiro deste processo de transformações das práticas
esportivas, e das diferentes relações que o corpo estabeleceu em cada período
histórico, além do grande investimento em ciências do esporte, processo que se
acelerou a partir da década de 60.
Neste período, no Brasil, passou-se a investir muito em políticas públicas através
do esporte, visando a popularização das várias modalidades esportivas, com as
conhecidas políticas de “esporte para todos”. Com a ampliação e diversificação das
práticas esportivas, um maior número de pessoas passou a ter acesso a algum tipo de
atividade física, que propiciou a população uma qualidade de vida melhor.
Ao vincular-se às questões de saúde e bem-estar, da população, e da busca de
melhor rendimento e resultados em competições por parte dos atletas, houve um
grande investimento em ciências do esporte. Muitos profissionais do esporte foram
incentivados a sair do país visando envolvimento com o que havia de mais avançado
nas pesquisas sobre treinamento desportivo, além, é claro, de conhecer os projetos
desenvolvidos para Educação Física nos países mais desenvolvidos.
69
Essa cientificização das práticas esportivas, acarretou algumas mudanças nas
relações que o esporte vinha estabelecendo com o universo religioso. Num país, de
maioria Católica, as relações dos profissionais do esporte sempre se deu no universo
do catolicismo popular, uma mescla de catolicismo “tupi” e religiões afro brasileiras.
Em uma época em que o Brasil usava de “o maior país católico do
mundo”, o antropólogo Darcy Ribeiro dizia que os fiéis daqui eram
diferentes – católicos, sim, mas macumbeiros, festeiros e santeiros. Na
terra em que a paixão pelo futebol é dogma e as rodas de samba se
misturam às rodas de rezas, as crenças são tão escancaradas quanto
os corpos nas praias do Rio e as desigualdades sociais.(...) Não importa
o batismo do atleta – o campo é sempre espaço sagrado, alguns
jogadores, divinos, e Deus, todo mundo sabe, é brasileiro.(Daniela
Chiareti, 2006)
A surpresa causada na década de 80, com a fundação do Movimento ADC, se
justifica pelo fato de o campo esportivo ser um universo de caráter místico, fruto das
relações com o catolicismo popular e com as religiões afro brasileiras. A proposta do
Movimento ADC, de evangelização através do Esporte, mediada pela religiosidade
protestante, trazendo um “novo” Jesus Cristo, com o qual os atletas dialogavam
diretamente, sem a mediação de “santos” ou “pais de santo”, despertou a curiosidade
de muitos.
A proposta do Movimento ADC veio de encontro à necessidade de um reforço
disciplinar na conduta dos envolvidos no contexto da instituição esportiva, que no
Brasil se mostrava com características amadoras, com forte jogo de interesses políticos
e econômicos.
O Movimento de Atletas de Cristo, através de sua mensagem de proclamação do
evangelho, utilizando-se do que chamam de linguagem universal do esporte, passou a
promover um diálogo entre as diferentes tribos cristãs no meio do esporte, facilitando a
inserção de atletas evangélicos tanto no meio esportivo como religioso.
Na proposta do Movimento, o atleta cristão, com a posse do talento que lhe foi
dado por Deus, tem como Missão proclamar o Evangelho aos companheiros de
equipe, dirigentes, familiares, torcedores. E um dos pontos chaves para alcançar estes
segmentos é através do testemunho de vida de cada atleta.
70
Faremos uma análise na sequência do Campo Esportivo e Religioso contexto
brasileiro da década de 70 e 80, com vistas a buscarmos elementos que nos apontem a
configuração da intersecção desses dois campos, na qual surgiu o Movimento ADC.
3.3 – Os Conceitos de Habitus e Campo Simbólico em Pierre Bourdieu
O conceito de campo faz parte do corpo teórico da obra de Bourdieu. Trata-se de
uma noção que traduz a concepção sociológica do autor. Campo seria um espaço de
relações entre grupos com distintos posicionamentos sociais, espaço de disputa e jogo
de poder. Ainda segundo o mesmo autor, a sociedade é composta por vários campos,
vários espaços dotados de relativa autonomia, mas regido por regras próprias.
“O habitus não é destino, como se vê às vezes. Sendo produto da história, é um
sistema de disposição aberto, incessantemente confrontado por experiências novas e,
assim, incessantemente afetado por elas.” (BOURDIEU, 1992, p.108)
O habitus aparece como o terreno comum em meio ao qual se
desenvolvem os empreendimentos de mobilização coletiva cujo êxito
depende forçosamente de um certo grau de coincidência e acordo entre
as disposições dos agentes mobilizadores e as disposições dos grupos
ou classes cujas aspirações, reivindicações e interesses, os primeiros
empalmam e expressam através de uma conduta exemplar ajustada às
exigências do habitus e através de um discurso [novo] que reelabora o
código comum que cimenta tal aliança. (BOURDIEU, 2005, p. XLII)
Acreditamos que a partir da década de 60 passou a haver uma sobreposição
entre Campo Religioso e Campo Esportivo, no que corresponde à conduta dos atletas
cristãos nos dois campos. Tal conduta e os valores morais que até então se
apresentavam de formas distintas e muitas vezes opostas, a partir das mudanças
ocorridas em cada campo, acabou convergindo para um campo comum.
As rupturas com a sociedade tradicional, ocorridas nas décadas de 60 e 70 no
Brasil, representadas pela decadência no poder das instituições reguladoras de
condutas sociais – famíla, escola, igreja demandaram alguns ajustes dos indivíduos aos
novos padrões apresentados pela modernidade.
71
A racionalização das relações, o uso de novas tecnologias, a transferência da
economia do meio rural para o urbano, o que já vinham ocorrendo desde o início do
século XX, provocaram o que chamamos aqui de reformulação do Campo Simbólico.
Na década de 70, o Campo Esportivo, representado pelo fenômeno esportivo
moderno
27
, passa a exigir de seus atletas uma conduta mais disciplinada, e os
profissionais envolvidos na preparação dos mesmos começam a estruturar suas
práticas pautados em conhecimentos científicos, utilizando a nova tecnologia esportiva
que tinham em mãos (cronômetros, câmeras, vestimentas, acessórios esportivos, em
geral).
Com as mudanças ocorridas no Campo Religioso, o habitus de seus agentes foi
também alterado e neste processo as Igrejas Protestantes Históricas, até então
inflexíveis no diálogo com as outras esferas sociais, começam a perder seus membros
para novas formas de expressão da fé cristã.
Segundo Giddens (1991), num mundo descontextualizado, é propiciada a
construção de novos espaços de expressão, que antes eram limitados às esferas
tradicionais. O gradual processo de autonomização e legitimação dos vários campos,
no contexto da modernidade, apresentam alguns pontos comuns, como é o caso da
normatização de relações que se referem à produção e comercialização de bens
simbólicos.
Nos tópicos que se seguem, abordaremos os dois campos e as mudanças
ocorridas em cada um deles, após a década de 60, que propiciou o surgimento do
Movimento ADC, e a forma como o habitus apresentado pelos atores de cada campo
transformou relações de estranhamento em possibilidades de diálogo.
27
O esporte enquanto fenômeno da modernidade foi melhor explorado no 1º. Capítulo..
72
3.4 - Atletas de Cristo e Campo Religioso
O Movimento ADC surgiu num período em que tanto o Campo Esportivo quanto
o Campo Religioso passavam por algumas mudanças, devido ao crescente processo
de modernização que desencadeou, entre outras mudanças, novas formas do indivíduo
pensar e expressar sua religiosidade.
Embora o período que marca as primeiras reuniões do Movimento ADC, em
1976, coincida com o surgimento do chamado neopentecostalismo, o movimento surgiu
pela ação de um grupo de atletas e ex-atletas, membros das igrejas Protestantes
Históricas e das igrejas pentecostais mais tradicionais. Diferentemente do que apontam
algumas pesquisas, naquele início não havia nenhuma relação entre o Atletas de Cristo
e as igrejas pentecostais emergentes.
Desde a década de 50, com o panorama sócio-político brasileiro, e o quadro de
desgaste religioso e teológico que as Igrejas Protestantes Históricas apresentavam,
com propostas que não mais atendiam aos seus membros de forma satisfatória, se
inicia um processo de mundanças no Campo Religioso.(ABUMANSSUR, 1991,p.39)
Após a década de 60 houve uma aceleração na aparição de novos movimentos
religiosos, principalmente na vertente evangélica, que em muitos casos deram origem a
novas denominações.
A dinâmica eclesiástica das Igrejas Protestantes Históricas no Brasil sempre
apresentou certa resistência a novas propostas teológicas, isto provocou rompimentos
e grupos que levaram adiante a possibilidade de um trabalho religioso mais voltado ao
social, seguiram independentes da estrutura denominacional. (ABUMANSSUR, 1991)
O Movimento ADC, embora não tenha surgido de um rompimento de seus
fundadores com suas respectivas igrejas, foi motivado de forma semelhante, pois os
atletas cristãos, assim como outros seguimentos sociais, que não se enquadravam no
perfil dos membros de suas igrejas, sofriam com a proposta Protestante mais
tradicional, o que muitas vezes os afastava do Campo Esportivo.
73
Dado que o atleta cristão tinha a sua Igreja, na qual exercia suas obrigações
enquanto fiel e também participava de seu clube enquanto atleta, o que levou à
necessidade da fundação de um movimento como o Atletas de Cristo?
Nossa hipótese é a de que as mudanças ocorridas, tanto no Campo Esportivo
quanto Religioso, propiciou uma aproximação e até homogeinização das condutas nos
dois campos, com isso a fundação do Movimento ADC veio legitimar a mediação do
diálogo entre eles, além de promover a manutenção do status de atleta e de cristão
frente ao contexto social.
Muitos dos membros do Movimento ADC enfrentaram, no Campo Religioso,
fortes rejeições do ponto de vista ético e moral, sendo postos à margem das primeiras
Igrejas Protestantes Históricas que se instalaram no Brasil - estas não faziam questão
de inserir grupos como artistas, atletas, músicos e outros no contexto de suas
congregações. Tais profissionais, no processo de adesão, deveriam abrir mão de seu
campo de atuação profissional para se manterem membros de suas igrejas.
Um de nossos entrevistados, ao ser questionado a respeito da dificuldade
enfrentada em se assumir enquanto cristão, deixa claro qual era sua relação com a
igreja até o surgimento do Movimento ADC:
... porque as igrejas, na verdade, a maioria está ensinando um
evangelho esquisito né e estão muito preocupadas com pode e não
pode, do que relacionamento, do que valores muito mais importantes do
que esse, então eu vim de uma formação Cristã, de que eu carregava na
minha bagagem uma lista de coisas que pode e não pode, entendeu!? E
através do Atletas de Cristo eu pude abrir, ampliar minha visão com
relação à vontade de Deus, e pude entender que ser cristão é muito
mais que uma religião do que filosofias ou que...ou regras, é um
relacionamento com Deus e com o próximo de verdade, então foi muito
importante a ... a participação, o envolvimento dos Atletas de Cristo nos
primeiros passos da...da minha vida como missionário do esporte.
Com uma proposta de valorização da profissão de atleta, enquanto um “dom e
talento dados por Deus”, o Movimento ADC promove não só uma mediação entre
Campo Esportivo e Campo Religioso, mas permite ao atleta cristão uma atuação mais
centrada e disciplinada em sua profissão.
74
As Igrejas Protestantes Históricas encontravam-se despreparadas para
receberem grupos como o de atletas cristãos. Em muitos casos, a vida que era
promovida pelo universo esportivo de alto rendimento concorria, de forma direta, com a
proposta de salvação apresentada por essas Igrejas.
Os protestantes, desde a Reforma, especialmente os Calvinistas e os
Puritanos, sempre seguiram padrões de disciplina religiosa com
implicações sociais. Para Weber, a ética protestante propõe tanto as
virtudes da vida austera, que recomenda a moderação e o não
consumismo, como as do “ascetismo intramundano”
28
.(Nunes, 2003,
p.11)
Embora o perfil, assumido pelas Igrejas Protestantes Históricas no Brasil, tenha
sido de pouca abertura à influência das mudanças sócio-políticas, que se acenturaram
na década de 60, alguns membros que acreditaram numa nova proposta teológica
acabaram por dissociarem-se de suas igrejas.
Sem vínculos institucionais, os Novos Movimentos Religiosos
29
(NMRs)
proliferaram em fins da década de 60, vindo numa crescente até os dias atuais. Embora
o Movimento ADC não possa ser enquadrado nesta nomenclatura, teve, assim como os
NMRs, seu sucesso atribuído às novas propostas teológicas, nas quais as redes
congregacionais não mais se desenvolvem nem se fixam por valores morais ou éticos,
como no passado, mas pela valorização das diferenças, com ênfase na pluralidade dos
sujeitos e suas experiências.
Um dado importante, nesta aproximação entre o atleta cristão e o Campo
Religioso, é com relação à mobilização que causa o fenômeno esportivo, do ponto de
vista simbólico – “o atleta-astro torna-se um símbolo representativo e descarregam-se
sobre os times esportivos, de forma substitutiva, intensos sentimentos de fidelidade
local ou nacionalista.” (WEISS, 1969, p.6).
A relação que se estabelece entre o espectador/fã e o atleta-astro, ou com o
time ao qual este último pertence, é de devoção. Há todo um ritual que permeia esta
28
Expressão Weberiana para caracterizar o ethos protestante, valorizando o trabalho racional exercido
cotidianamente enquanto dever moral e vontade de Deus.
29
Nomenclatura baseada no quadro apresentado no Livro: Novos Movimentos Religiosos:o quadro brasileiro, Silas
Guerriero, 2006.
75
relação, e em alguns casos esta devoção substitui, de forma autônoma e única, o ritual
religioso.
Os grandes eventos esportivos, como Jogos Olímpicos e Copas do Mundo,
mobilizam setores da sociedade, como a economia, política, cultura, entre outros, que
as próprias atividades vínculadas estritamente a estes, como o comércio, a indústria,
não adquirem por si só a dimensão alcançada pelo fenômeno esportivo.
Veremos, de forma mais clara, no item que se segue, as relações estabelecidas
entre o que chamamos de conduta cristã, representada pela ação do Atleta de Cristo, e
o Campo Esportivo, retomando as dimensões assumidas pelo fenômeno esportivo na
modernidade.
3.5 – Atletas de Cristo e Campo Esportivo
Desde a Grécia Antiga, o fenômeno esportivo vem marcando presença nas mais
diversas culturas, assumindo ao longo da história novas facetas, movidas pelas
constantes mudanças no cenário mundial, mas tem mantido sua conexão com a
religião.
Sem nos aprofundarmos em demasia em suas várias etapas, apresentaremos o
esporte, antes da modernidade, e o que ocorreu com este fenômeno social, após a
revolução industrial, quando se torna esporte moderno, em sua manifestação atual.
Os esportes modernos se diferenciam do ideal esportivo da Grécia Antiga em
alguns pontos, e o fato de seu surgimento ter coincidido com o advento do
industrialismo nos permite elencá-los:
1) Pelo Secularismo, rompeu-se o nexo original entre esporte
e festas religiosas ou dias festivos, o que antes era patrocinado pelas
Igrejas Cristãs, perde espaço nas nações industrializadas.
2) Igualdade de oportunidades para competir e nas condições
de competição – os antigos jogos olímpicos não estavam aberto para
todos, já os esportes modernos trazem, ao menos enquanto ideal, a
76
igualdade de oportunidades, embora não alcance a todos de forma
plena..
3) A especialização das funções, com esportes organizados,
profissionalização e especialização, onde a função do amador, singular
no mundo antigo e medieval, cede lugar hoje a astros profissionais.
4) Pelo processo de racionalização, os esportes modernos
passam a ser regidos por regras e os times organizados em federações.
5) Organização buracrática.
6) Quantificação, no que se refere à tecnologia que
disponibiliza toda aparelhagem para medidas e fidelidade nos dados
estatísticos.
Orientação para a busca dos recordes, os antigos conheciam
vencedores e perdedores, mas não batedores de recordes.
Na modernidade, para utilizar um termo weberiano, ocorreu um
certo desencanto dos esportes, mas permanecem alguns dos laços
entre religião e esporte.
(COLEMAN,1985,p.9)
Incluiremos por nossa conta, uma dimensão que não foi abordada pelo autor
acima, que é o caso do esporte voltado para o consumo, tendo o atleta como
mercadoria, chamando atenção ao caráter mercadológico cada vez mais presente no
esporte de alto rendimento.
Na sociedade moderna, o esporte é patrocinado e financiado por empresas
comerciais, inculcado nas escolas, regulamentado por comissões esportivas e
supervisionado pelo próprio Estado. O esporte moderno mobiliza interesses diversos,
Hoberman posiciona este fenômeno (assim como a religião, a sexualidade e a vida
intelectual), como nunca axiologicamente neutro, pois reflete as contradições sociais
em sua dinâmica, e escreve:
O esporte é uma questão política latente em qualquer sociedade, já que
os temas culturais inerentes a uma cultura do esporte são
potencialmente ideológicos num sentido político. Este conteúdo político
latente torna-se mais evidente quando se consideram algumas grandes
polaridades referentes ao esporte e ao mundo político: amadorismo
versus profissionalismo, individualismo versus coletivismo, supremacia
masculina versus feminismo, nacionalismo versus internacionalismo,
sensacionalismo versus higienismo. Todos estes conflitos temáticos
acontecem no mundo do esporte e todos possuem significado ideológico
no sentido mais amplo do termo.(HOBERMAN,1984,p.20)
77
Numa sociedade secularizada, como a Ocidental, que apresenta em seu
contexto diversas atividades e empreendimentos humanos de grande importância para
a vida econômica, política, social e cultural, ainda assim o fenômeno Esporte tem
mantido seus fiéis.
Mundialmente, os esportes, nos diferentes países, foram assumindo
características próprias. Na Inglaterra e nos EUA, no período da Revolução Industrial,
chegou-se à erradicação dos esportes e dos jogos populares, isso devido a um
movimento religioso, desencadeado pelo desprezo puritano pelos jogos.
Num momento posterior, em fins do século XIX e início do XX a
associação cristã de moços (YMCA), representou, no contexto moderno,
forte meio de incentivo e difusão do esporte enquanto jogos organizados
para as classes trabalhadoras, muitos clubes de futebol na Inglaterra
eram patrocinados pelas Igrejas, esta nova reformulação nos esportes,
visando as classes trabalhadoras tinha, para Michel Foucault, a intenção
de discipliná-los e vigiá-los.(COLEMAN, 1985,p.31)
No século XX, o Campo Esportivo passa a assumir caráter cada vez mais
autônomo, com grande número de fãs e praticantes, com o advento dos novos meios
de comunicação (filme, rádio, televisão), o aperfeiçoamento das inovações
tecnológicas, comercialização (de jogadores, de eventos), a crescente
profissionalização, a organização burocrática do aparato esportivo, a fusão do esporte e
nacionalismo, a centralidade dos esportes na disputa dos blocos capitalista e socialista
na Guerra Fria, foram todos motivos que alavancaram o esporte moderno, nos moldes
atuais.
Em razão disto, desde a década de 1960, a Sociologia do Esporte, enquanto
disciplina acadêmica, tem acelerado seus estudos deste fenômeno como forma de
compreender a força social contida no mesmo.
São recentes estudos acadêmicos KUNZ (2004), Bracht ( 2005) TUBINO ( 2001)
- que abordam o tema do Esporte, de forma criteriosa. Na atualidade, o esporte, e tudo
o que por ele é movido, assumiu dimensão tal que mesmo o indivíduo que não está
diretamente envolvido com o mesmo é chamado a posicionar-se criticamente frente ele.
78
Os espetáculos esportivos vêm lançando mão de um universo simbólico, que tem
como base o ritual, através do qual praticantes e simpatizantes se sujeitam e são
imersos numa teia de relações, como meros produtores e consumidores, os quais não
refletem sobre a extensão e importância do esporte enquanto fenômeno social.
A organização esportiva que dirige o esporte-espetáculo e que procura
manter-se enquanto dirigente da instituição esportiva somente mantém a
questão da educação, da saúde e da confraternaização no seu discurso,
para suprir eventuais déficits de legitimidade social, no entanto,
concretamente, trata-se de mero exercício de retórica: a lógica interna
que dirige, que orienta as ações no interior do sistema esportivo de alto
rendimento é impermeável aos argumentos educacionais, da saúde e da
confraternização. (BRACHT, 2005, p. 110)
A passagem do esporte enquanto prática reservada à elite (para amadores),
para o esporte espetáculo, produzido por profissionais para as massas espectadoras,
tem sido determinado por processos econômicos, os quais alteraram as relações de
poder no interior deste campo. A demanda por sensacionalismo e a urgência de
produzir um resultado separa os experts e profissionais dos leigos e torcedores.
(BOURDIEU, 1986),
Tanto o Campo Religioso, mencionado no item anterior, como o Campo
Esportivo apresentavam um quadro de mudanças e incorporação de novas propostas
entre as décadas de 1960 a 1980, indicando que nos dois campos as interações com
os fiéis, profissionais ou torcedores necessitavam adequar-se ao novo contexto social,
político e econômico que se apresentava.
O Campo Esportivo é marcado pelo jogo de interesses políticos por parte dos
dirigentes esportivos, pelas disputas em torno do controle da indústria esportiva entre o
setor público e privado, disputa-se a musculatura atlética dos praticantes, a
compensação econômica, numa busca constante por atletas profissionais, pelo
monopólio na transmissão dos espetáculos esportivos estabelecidos pela mídia
esportiva, dentre outros, compondo um campo vulnerável a oscilações e interesses.
A realidade esportiva não pode ser considerada consensual, constituída
enquanto padrão único, pois o esporte deve ser apresentado na sua
heterogeneidade, só assim podemos identificar suas diferentes
expressões, que estão diretamente relacionadas com as formas de
79
apropriação deste fenômeno por seus praticantes. (STIGGER, 2005,
p.68)
É neste contexto multidimensional que o fenômeno esportivo se apresenta,
movimentando os mais diversos setores da sociedade, e o papel do atleta vai se
redefinindo num todo cultural, que exige múltiplas formas de expressão. Retomamos
assim o conceito de habitus, que para Bourdieu tem papel fundamental na constituição
e reprodução da vida social.
O habitus, como se diz a palavra é aquilo que se adquiriu, mas que se encarnou
no corpo de forma durável sob a forma de disposições permantente. Mas, os
ajustamentos que são incessantemente impostos pelas necessidades de adaptação às
situações novas e imprevistas, podem determinar transformações duráveis no habitus,
mas dentro de certos limites: entre outras razões porque o habitus define a percepção
da situação que o determina.(BOURDIEU, 1983, p. 104)
3.6 - O Movimento Atletas de Cristo na Intersecção entre os dois campos
Na busca de compreendermos as contribuições do Movimento ADC na mediação
do diálogo entre Campo Religioso e Campo Esportivo, apropriaremo-nos da concepção
weberiana de vocação, que em sua conotação religiosa, tanto no alemão – “beruf,
como no inglês - “calling”, representa uma missão dada por Deus. Concepção que
remete a uma posição na vida, de um ramo de trabalho, presente predominantemente
nos povos protestantes.
Como produto da Reforma, a idéia de vocação é nova, referindo-se ao
cumprimento do dever no seio das profissões mundanas, como o mais
excelso conteúdo que a auto-realização moral é capaz de assumir. Por
essa concepção, reconhece-se que o único meio de viver que agrada a
Deus não está em suplantar a moralidade intramundana pela ascese
monástica, mas sim, exclusivamente, em cumprir com os deveres
intramundanos, tal como decorrem da posição do indivíduo na vida, a
qual por isso mesmo se torna a sua “vocação profissional”.
(WEBER,
2005,p. 72)
80
Esta concepção de vocação, presente nas vertentes protestantes históricas,
contribuiu como fator condutor do Movimento ADC, quando seus líderes fundadores
conceberam tal movimento. A afinidade entre uma conduta ascética, própria da vida
cristã, materializada na execução de um trabalho que agrada a Deus, e a necessidade
de uma conduta de vida disciplinada na busca de resultados no esporte de alto
rendimento, proporcionou o sucesso e a permanência do movimento até hoje.
No esporte de alto rendimento a disciplina dos atletas é fundamental, isso
independentemente da modalidade esportiva praticada. Isto posto, ressaltamos aqui a
importância de uma vida regrada para um bom desempenho profissional, assim
enfatizando o nosso objeto de estudos, que é o Movimento ADC e sua fundação em
fins da década de 1970.
Acreditamos haver uma “afinidade eletiva”
30
entre o que se esperava da conduta
de um cristão evangélico e a conduta disciplinar que passou a ser exigida dos atletas
profissionais.
A qualificação ética e moral do profissional se deu ao estabelecer um discurso
que legitima a profissião de atleta profissional enquanto um dom dado por Deus, e que,
para agradar a Este, deve ser exercida de forma plena, visando a salvação numa vida
futura.
Assim, cremos que a afinidade eletiva do Movimento Atletas de Cristo se dá
quando correlacionamos e elencamos os pontos chaves da vida ascética
intramundana
31
, pregada pelo protestantismo histórico, e não como pensaram alguns
teóricos que acreditaram que esta afinidade ocorreria quando da mudança no campo
religioso e a inserção de novas denominações evangélicas, que sob a placa da
Teologia da Prosperidade
32
, teriam desencadeado a fundação do Movimento Atletas de
Cristo.
30
“Afinidade eletiva” entre certas formas da fé religiosa e certas formas da ética profissional, em A Ética Protestante
e o Espírito do Capitalismo, 2004, p.83
31
ver nota 26 sobre ascetismo intramundano
32
Teologia surgida nos EUA, na década de 40, formulada por Kenneth Hagin.
81
Segundo sua vocação atlética, com a posse do talento que lhe foi dado por
Deus, o atleta cristão, visando o sucesso, ao assumir uma postura ascética, própria dos
meios evangélicos protestantes, tem grandes possibilidades de atingir o alvo.
Para o atleta cristão que visa uma inserção e participação maior e mais
expressiva, tanto no Campo Religioso, em sua comunidade, quanto no Campo
Esportivo, clube ou agremiação em que atua, o Movimento ADC veio mediar esta
relação, que até então, quando da criação do movimento, era de estranhamento.
Um movimento religioso, que se arrisca a desenvolver suas atividades, sem
vínculos institucionais com uma igreja, ao situar-se entre dois campos de tensões
constantes, como é o caso dos Campo Religioso e Esportivo, e se propõe a assumir
papéis que deveriam ser estruturados e desenvolvidos por estes dois campos, causa
inúmeras discussões.
Num país de maioria Católica, como o Brasil, o fato de o Movimento ADC
promover um diálogo entre Campo Esportivo e Campo Religioso já representa uma
ruptura com o tradicional, pois sob a lógica evangélica e a forma como penetrou em
território nacional, estes dois campos sempre estiveram, no que se refere a normas de
conduta, em pólos claramente distintos, e em muitos sentidos até mesmo eram vistos
como adversários, para usar uma expressão comum a ambos.
Ao analisarmos, no capitulo 2, como se deu a vinculação histórica entre a
religião e o esporte nos Estados Unidos, assumindo características que se mantém,
ainda hoje, sob um caráter hegemônico das práticas esportivas, percebemos que o
Movimento ADC em nosso contexto constitui-se como pioneiro em sua proposta de
evangelização através do esporte, lançando mão da religiosidade Protestante numa
nação de maioria católica.
Tomando como referência a tensão existente entre Campo Religioso e Campo
Esportivo, sob a luz do texto de Weber - Rejeições Religiosas do Mundo e suas
Direções - analisaremos quais relações as religiões proféticas e de salvação
estabeleceram com o mundo e com as várias esferas de ação desencadeadas pelo
processo de racionalização.
82
Segundo Weber (1982), o objetivo racional da religião redentora tem sido
assegurar ao que é salvo um estado sagrado, e com isso o hábito que garante a
salvação. O estabelecimento deste estado pode se dar através de orgias, ascetismo ou
contemplação. Para sermos coerentes com nosso objeto de estudo, analisaremos a via
do ascetismo, que, representado numa ação ativa no mundo, traduz-se no trabalho
como vocação na concepção já apresentada no item anterior.
Há uma tensão entre o Campo Religioso e o Esportivo no percurso histórico
estabelecido por cada um deles, devido ao advento da modernização e a crescente
racionalização das relações humanas. Estas, por assumirem caráter autônomo e
legítimo no contexto social, disputam os mesmos atores sociais, traçando linguagens
aparentemente opostas do ponto de vista da conduta permitida em cada um dos
campos.
O avanço da racionalização e a sublimação da posse exterior e interior
das “coisas mundanas’ – no sentido mais amplo – tornou mais forte a
tensão por parte da religião, pois a racionalização e a sublimação
consciente das relações do homem com as várias esferas de valores,
exteriores e interiores, bem como religiosas e seculares, pressionam no
sentido de tornar consciente e lícita a autonomia interior das esferas
individuais, permitindo, com isso, que elas se inclinem para as tensões
que permanecem ocultas na relação com o mundo exterior.
(Weber,
1982, p.377)
Num cenário de ruptura com o tradicional, o Movimento ADC traz à tona a
problemática do atleta evangélico, que se encontrava depreciado em seu meio de
atuação profissional por não assumir plenamente seu habitus de atleta, e de certa
forma rejeitado pelo Campo Religioso simplesmente por ser um profissional do esporte.
Atletas que pertenciam ao universo evangélico, até a fundação do Movimento
ADC, não vislumbravam a mínima possibilidade de se expressarem enquanto tais, pois
ao habitus do atleta evangélico era incorporado todo ethos protestante, marcado pelas
proibições e sanções características do campo religioso protestante, desta forma ao
atleta era dificultada a ação no campo esportivo sob o mesmo habitus.
83
“Os NMRs no Brasil, de maneira geral, não se caracterizam por posturas
sectárias, mas estão sempre abertos ao diálogo, postulando caminhos próprios para se
chegar ao que acreditam ser o mesmo Deus.” (Guerriero, 2006, p. 209)
Embora o Movimento ADC não se enquadre na classificação de Guerriero sobre
Novos Movimentos Religiosos, ele apresenta algumas características comuns, além de
ter surgido no mesmo período em que se intensificou o aparecimento desses novos
movimentos no cenário brasileiro.
Os movimentos cristãos, que tiveram maior expressão a partir da década de 60,
vêm lançando mão de uma linguagem mais acessível às camadas populares, o que tem
, nos últimos 30 anos, promovido e facilitado um trânsito religioso maior, além da
identificação dos fiéis com um evangelismo que aborda suas necessidades mais
imediatas.
Através do Movimento ADC, alguns atletas evangélicos que acreditaram na
proposta de evangelização através do esporte, ao serem impactados pela mensagem
universal do esporte, se sentiram melhor engajados tanto em suas igrejas, como nos
clubes em que atuavam como atletas profissionais.
A Ética das Proibições
33
, era o tendão de Aquiles dos atletas evangélicos ou em
vias de conversão, pois não queriam abrir mão do que caracterizava o habitus esportivo
naquele período, o qual apresentava em oposição ao habitus religioso requerido pelos
meios protestantes. Alguns atletas evangélicos acreditavam que ao se assumirem como
evangélicos, frente ao campo esportivo, teriam que fazer uma opção por um dos
campos.
Pelo mesmo perfil dos novos movimentos evangélicos surgidos principalmente
nos últimos 30 anos, com ênfase numa mensagem mais acessível e menos proibitiva, o
Movimento ADC também se aproxima dos atletas por um discurso que não segue a
ética das proibições, na qual os usos e costumes predominavam, mas com uma
linguagem de superação deste discurso que no passado afastavam os atletas cristãos
do Campo Religioso.
33
Expressão usada por Cândido Procópio Ferreira de Camargo, para referir-se aos usos e costumes das igrejas
protestantes históricas.
84
O discurso evangélico, que nas comunidades mais tradicionais segue uma linha
mais proibitiva, sob uma linguagem, nas pregações, com perfil ético e moral, visando
regrar a conduta dos membros, no Movimento ADC cede lugar a uma linguagem mais
inclusiva, que chega a ser até de caráter ecumênico, se considerarmos as várias
denominações cristãs que frequentam as reuniões dos atletas, incluindo alguns
simpatizantes católicos.
Sem exigir de seus membros atitudes de afastamento do mundo e de suas
atividades profissionais de atletas que são, o Movimento ADC postula que os atletas
devem manter-se em seus meios de atuação, dedicando-se a suas atividades
profissionais da melhor maneira possível, visando a construção de seus testemunhos
de vida.
As novas formas de expressão religiosa rompem com o caráter uniforme das
religiões tradicionais, propondo uma prática que considera o habitus agindo de forma
dinâmica no contexto social mais amplo, e formas de pensar estanques se flexibilizam
cedendo lugar a diferentes possibilidades de envolvimento e expressão religiosa.
Durante as entrevistas, constatamos que muito, embora tenha crescido em
número, o núcleo central do Movimento ADC continua basicamente o mesmo, foram
incorporados alguns membros que se enquadraram no perfil, também definido pelos
líderes fundadores, de Atleta nota 10
34
, e que caminham juntos na elaboração e
definição das diretrizes do Movimento.
Como num movimento espiral, compondo a periferia do movimento, estão os
atletas que foram sendo associados, cedendo sua imagem para veiculação através dos
recursos midiáticos (DVD’s, Testemunhos, etc), constituindo os meios de
evangelização junto aos simpatizantes do Campo Esportivo. Caminhando em direção
ao centro estariam os atletas mais envolvidos, participando de cursos e dinâmicas do
movimento, e mais nuclearmente estariam os líderes fundadores, traçando as
estratégias e linhas de ação do movimento.
34
Ver nos Anexos o perfil do atleta nota 10 traçado pelo Movimento ADC
85
O Movimento ADC, embora tenha parte de seu sucesso justificado por essa
mudança de foco no Campo Religioso, centrado agora no indivíduo e no exercício livre
e pessoal de sua devoção, apresenta um discurso de retorno ao início do Cristianismo.
Segundo um de nossos entrevistados, a grande dificuldade de lidar com os
novos membros do Movimento ADC seria o “Evangelho Light”, que algumas
denominações evangélicas vêm ofertanto aos seus fiéis, o que segundo ele estariam
afastando os novos membros, e declara:
“...se os do presente tivessem a garra e a vontade de anunciar que os
do passado tinham, então eu acho que é tempo de uma volta às origens,
não só de Atletas de Cristo mas da Igreja Brasileira, e a volta à origem é
voltar pra onde? Onde tudo começa? ... É na Cruz, então nós temos que
voltar pra lá entende, é lá que tudo começou, é lá que Cristo deu sua
vida por nós, é lá que o nosso ego tem que ser crucificado, que a gente
passa a viver sob nova direção, nós estamos precisando de nova
direção (...) e aí a graça é barata, vale tudo e tal, então Deus não é tão
importante, a não ser que ele me dê um bom contrato, um carro do ano,
a mulher do ano, então é isso que pregam por aí entendeu, então eu
acho que a voz profética está chamando a gente agora, no sentido de
voltar para a cruz, e viver a vida com os nossos pecados crucificados
com Jesus, eu acho que é o próximo passo...”(Sujeito 2)
A compreensão do que seria este evangelho light, mencionado por nosso
entrevistado, passa pela análise do papel desempenhado pela imprensa esportiva,
quando da fundação e primeiros anos de atuação do Movimento ADC, em que se
vinculavam o discurso de alguns atletas evangélicos em ascenção profissional e
financeira ao discurso de algumas vertentes religiosas evangélicas que tinham como
ideologia a Teologia da Prosperidade (mencionada por nós no capítulo 2). Ao constituir-
se enquanto movimento religioso baseado no ethos protestante, os líderes fundadores
do movimento se mostram claramente contrários a estas vinculações feitas pela
imprensa com a Teologia da Prosperidade.
O que chamamos de núcleo duro do Movimento ADC, constituído pelos líderes
fundadores e primeiros atletas a serem incorporados ao grupo, propõe um Movimento
que não pretende substituir a Igreja, mas sim possibilitar o diálogo destas com o Campo
Esportivo, estabelecendo uma rede de relacionamentos e promovendo uma interação
86
entre os dois através da formação espiritual de um atleta que não se mostre tão
vulnerável às oscilações da profissão.
O Movimento ADC dá suporte ao atleta que encontra dificuldades sociais,
políticas, econômicas e espirituais para gerir seus negócios e sua vida frente ao mundo,
assim como as relações que se estabelecem nos Campos Esportivo e Religioso.
87
CONCLUSÃO
Ao percorrermos alguns pontos que acreditamos serem necessários para a
compreensão, do que representou a fundação do Movimento Atletas de Cristo em fins
da década de 70 e início da de 80 do século XX, estamos cientes que, pela presente
pesquisa, não nos foi possível esgotar as várias possibilidades de estudo que o objeto
permite. Salientamos que buscamos elementos para a elaboração de uma pesquisa
criteriosa, dentro de nossas possibilidades e limites. O referencial teórico, por nós
utilizado permite outras formas de análise e reflexão do objeto, a partir de diferentes
motivações.
Recortamos nosso objeto de estudo através da hipótese central de que o
Movimento Atletas de Cristo surgiu, com o papel de mediar as relações de estranheza
e resistência existentes entre os Campos Esportivo e Religioso. Uma outra questão na
fundação do Movimento é a conjuntura favorável pela qual passava a sociedade
brasileira nas décadas em questão. O contexto social, político, econômico e cultural
acabaram por influenciar e modificar as relações entre o Esporte e a Religião. E, neste
processo de mudanças, a mídia veio a desempenhar papel central não só na fundação
como na divulgação e permanência do Movimento ADC.
Levantadas as possibilidades de relações entre esporte, religião e mídia, o
referencial teórico veio dar suporte na busca de elementos para a verificação da
hipótese.
No capítulo I, analisamos o processo de constituição do esporte na formatação
que conhecemos hoje. Ao abordarmos a questão da transformação dos jogos e
passatempos populares em esporte e a expansão do modelo esportivo inglês para o
ocidente, chegamos ao Brasil, no qual o esporte se estabelece em meio a muitas crises
e conflitos, caracterizados pelo processo de profissionalização tanto do futebol quanto
das outras modalidades esportivas.
Com as exigências apresentadas pelo mundo dos esportes nas décadas de 70 e
80 do século XX, houve a necessidade de transformação neste campo, que passou a
88
demandar de seus atletas maior disciplina melhor desempenho nas competições de alto
rendimento.
Com isso, ao ser fundado, o Movimento ADC, traz uma proposta de
evangelização através do esporte, explicitando, já com seu surgimento, a existência de
pontos em comum entre o Esporte e a Religião, através das vertentes evangélicas da
época. As exigências que foram feitas pelo campo esportivo a partir da década de 70,
visando a melhora no rendimento dos atletas, vieram ao encontro da conduta
disciplinar e ética exigida pelo protestantismo histórico.
No capítulo II, apresentamos a proposta de evangelização do Movimento ADC,
com seus recursos físicos e humanos. Verificamos a aproximação entre esporte,
religião e mídia através da análise dos objetivos, proposta e recursos do Movimento
ADC.
Através da proposta do Movimento, os atletas evangélicos puderam ser inseridos
no contexto esportivo, que até então não tinham expressão significativa, e foram
reconhecidos por suas igrejas, que os rejeitavam por serem atletas. Pelo Movimento
ADC, os atletas evangélicos se sentiram participantes nos dois campos, e através das
entrevistas eles deixam claro qual foi o sentimento, quando da fundação do Movimento,
que definiram como “unir o útil ao agradável”.
Através da análise das reuniões dos ADC’s isto também se verifica. Só o fato do
grupo de atletas de cristo poder reunir-se numa Igreja Batista, considerada
historicamente de moldes tradicionais, já representa o avanço na conquista deste
espaço pelos atletas evangélicos, que antes era considerado limitado.
A mídia vem atuando junto ao Movimento ADC desde a fundação, divulgando a
proposta através dos atletas ídolos que fazem parte do Movimento. As revistas
esportivas da época, e também a imprensa esportiva de uma maneira geral, na época
da fundação do Movimento estampava em suas manchetes matérias que revelavam os
Atletas de Cristo dentro e fora de suas profissões. A revista Placar, especializada em
esporte, principalmente futebol, fez uma série de reportagens, durante o ano de 1985,
com os craques do São Paulo da época, que eram membros dos ADC’s.
89
Os testemunhos dos Atletas de Cristo também revelam o papel da mídia, pois
grande parte dos atletas convertidos e agregados ao Movimento, passam a ganhar
expressão na mídia, principalmente quando se destacam em suas carreiras, ou quando
cometem atitudes que vão de encontro à proposta do Movimento. Neste sentido a mídia
atua na promoção e também de forma crítica frente aos atletas evangélicos,
pertencentes ao Movimento ADC.
O Movimento, objetivando atingir a massa de torcedores, também faz uso da
mídia, e para tanto realiza treinamentos junto aos atletas membros, para que estes
possam se expressar de forma mais objetiva e efetiva frente aos meios de
comunicação.
O papel de mediador do Movimento, entre Campo Esportivo e Religioso,é
verificado pelas entrevistas, pelas quais os sujeitos expressam que o Movimento
propiciou aos atletas evangélicos a apropriação de seus dons e talentos (“dados por
Deus”) para desempenharem suas funções de esportistas através de uma conduta
regrada e pautada nos valores cristãos.
O capítulo III nos dá suporte teórico à verificação de nossa hipótese.
Apresentamos, no início o que vem a ser um movimento social, no contexto da
modernidade, que surge a partir das instituições já consagradas e legitimadas. Neste
contexto, ao se manter enquanto um movimento, os ADC’s permanecem e até
aumentam seus membros, desempenhando o papel de mediar os conflitos provenientes
das tensões próprias dos campos Esportivo e Religioso e que fogem ao controle dos
mesmos.
O movimento da Cristandade Muscular, surgido em meados do século XIX nos
EUA, com uma proposta de releitura esportiva das Escrituras, já naquela época,
imprimiu uma nova dinâmica às relações no contexto das práticas esportivas. O
investimento do puritanismo no campo esportivo promoveu um lugar comum entre o
universo religioso e esportivo que se mantém até hoje.
Concluindo, a análise dos conceitos de habitus e campo simbólico, permitiu
encontrarmos elementos tanto do contexto esportivo como religioso, que no processo
de mudanças por que passava o Brasil das décadas de 70 e 80, desencadearam
90
transformações que propiciaram a coexistência destes dois campos através do habitus
específico de seus membros comuns, os atletas evangélicos, que passaram a usufruir
de uma atmosfera de mais respeito e tolerância tanto em seus ambientes públicos de
trabalho como na esfera privada.
A presente pesquisa, longe de ter esgotado os elementos empíricos e teóricos
que nos deram suporte na verificação da hipótese, levantada no início do trabalho, abre
para novas possibilidades de pesquisas e reflexões do objeto por nós analisado.
Apontaremos na sequência, o que acreditamos ser as vias de estudo que não foram por
nós exploradas devido ao recorte que fizemos do objeto.
Uma análise mais criteriosa do papel da mídia na tríade esporte, religião e mídia,
parece ser bastante instigadora. Em nossa pesquisa, demos especial enfoque ao
contexto esportivo e religioso para atendermos nossa proposta inicial. Em alguns
momentos nos pareceu que a mídia desempenha papel de amarração destas
estruturas.
Os significados assumidos pela corporeidade na modernidade, na dinâmica dos
Novos Movimentos Religiosos, encontrando espaço e expressividade que antes lhes
eram negados.
Uma questão que nos motiva desde já é a percepção dos atletas envolvidos com
o Movimento ADC, da dimensão representativa deste movimento na diminuição das
tensões próprias de cada campo, abafando ou mascarando possíveis rompimentos com
as instituições consagradas.
91
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Analysis. In Sociology of Sport Journal, News Brunswick, 1991.
95
STIGGER, Marco Paulo. Educação Física, Esporte e Diversidade. Campinas: Autores
Associados, 2005.
TUBINO, Manoel. O que é Esporte. São Paulo: Brasiliense, 1999.
TUBINO, Manoel. As Teorias da Educação Física e do Esporte: uma abordagem
epistemológica. São Paulo: Manole, 2002.
URBAN, Hurban B. Sacred Capital: Pierre Bourdieu and the Study of Religion. In;
Method & Theory in the Study of Religion, no. 15, 2003, pp. 354-389.
WEBER, Max. Rejeições Religiosas do Mundo e suas Direções. In Ensaios de
Sociologia. Rio de Janeiro: LTC, 1982.
____. Economia e Sociedade I. Brasília: Ed. UNB, 2003.
____. A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. São Paulo, Companhia das
Letras, 2004.
WEISS, Paul. Sport: A Philosophic Inquiry, Feffer and Simons, inc., Londres, 1969.
ANEXOS
96
ANEXO I - O Perfil do Atleta de Cristo Nota 10
1. Ama a Deus sobre todas as coisas e através de Cristo tem uma intimidade tão
grande com o criador que o próprio Deus mora dentro dele;
2. Está tão entrosado com o Treinador (Deus) que tem a mente de Cristo, ou
seja, pensa o que Cristo pensaria dentro e fora de campo;
3. Cada passo seu é dirigido pelo Espírito Santo, que lhe dá o poder sobrenatural
de competir e falar de Cristo com uma autoridade que vem diretamente do céu;
4. Conhece e maneja e pratica a Bíblia tão bem como a bola, a raquete, o
volante, etc., pensando sempre nas palavras deste livro;
5. Tem um compromisso sério com a sua família e com a sua igreja;
6. Ama a seus colegas, adversários e torcedores como a ele mesmo e os trata
como criaturas muito amadas por Deus;
7. Tem uma vida moral pura. É íntegro, cumpridor dos seus contratos. Seu nome
na praça é de bom pagador, fiel e honesto;
8. A sua palavra é confiável. O seu sim é sim, e o seu não é não;
9. Tem uma conduta tão bonita que os outros dizem: se é pra ser igual a ele, eu
também quero ser um Atleta de Cristo. Os que falam mal dele envergonham-se do que
diziam ao conhecê-lo de perto. É Sal e Luz entre os seus companheiros;
10. É uma companhia agradável para todas as horas, acessível mas firme nos
seus princípios;
11. É disciplinado, cumpridor de seus horários e seus deveres, cuida do seu
corpo como morada do Espírito Santo. É humilde e não se julga melhor do que
ninguém;
12. É hábil embaixador da paz entre os companheiros de equipe, adversários,
cartolas e torcedores;
97
13. É estável. A derrota, a má fase, a contusão, a perseguição, a trairagem, a
morte, a maré braba não consegue separá-lo do amor de Cristo. Nada abala a sua
confiança em Deus. Ele tem certeza de que em Cristo é mais que vencedor, e por isso
é capaz de encorajar aos outros;
14. Investe os seus recursos (tempo, talento e bens) na expansão do reino de
Deus;
15. Tem a visão de alcançar o mundo para Cristo através da linguagem universal
do esporte;
16. Tem um compromisso sério e real com a missão Atletas de Cristo.
98
ANEXO II - ROTEIRO DE ENTREVISTAS
1. Atleta e Cristão, o que isto representou(a)?
2. Movimento Atletas de Cristo e o Mundo Esportivo;
3. Movimento Atletas de Cristo e Religião;
4. O que o Movimento representou para sua carreira profissional?
5. O Atleta de Cristo e os atletas não evangélicos;
6. O Altleta de Cristo e a missão de evangelizar;
7. A proposta do Movimento na atualidade?
8. Atleta de Cristo e Futebol?
9. Fale sobre o seu testemunho;
10. Qual a sua mensagem.
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