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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC/SP
RONALDO PEREIRA CAMPOS
A ABORDAGEM DO TEOREMA FUNDAMENTAL DO
CÁLCULO EM LIVROS DIDÁTICOS E OS REGISTROS DE
REPRESENTAÇÃO SEMIÓTICA
MESTRADO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
São Paulo
2007
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2
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC/SP
RONALDO PEREIRA CAMPOS
A ABORDAGEM DO TEOREMA FUNDAMENTAL DO
CÁLCULO EM LIVROS DIDÁTICOS E OS REGISTROS DE
REPRESENTAÇÃO SEMIÓTICA
Dissertação apresentada à Banca Examinadora da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como
exigência parcial para obtenção do título de MESTRE
EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA, sob a orientação do
Prof. Dr. Benedito Antonio da Silva.
São Paulo
2007
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3
Banca Examinadora
____________________________________
____________________________________
____________________________________
4
Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial desta
Dissertação por processos de fotocopiadoras ou eletrônicos.
Assinatura: _______________________________________ Local e Data: ______________
5
Dedicado aos meus pais, Francisco e Maria,
com muito carinho, por tudo que
sempre fizeram por mim
6
AGRADECIMENTOS
Ao Prof. Dr. Benedito Antonio da Silva por
orientar-me com dedicação e competência,
incentivando sempre a realização deste trabalho.
Às Professoras Doutoras Abigail Fregni Lins e
Maria Cristina Souza de Albuquerque Maranhão,
por oferecerem pertinentes sugestões para o
aperfeiçoamento desta pesquisa.
A todos os professores e funcionários do
Programa de Estudos Pós-Graduados em
Educação Matemática da PUC-SP.
À Secretaria da Educação do Estado de São
Paulo pela concessão da bolsa auxílio por meio
do Programa de Bolsa Mestrado.
Agradeço ainda a todos os colegas de trabalho,
em especial, ao professor Adalberto por ter me
incentivado desde o início e ser sempre positivo
nas suas atitudes. Aos professores Heleno, Abílio
7
e Otávio por terem, de alguma maneira,
participado desse processo. Ao amigo Eliel
Zullato, sempre presente e participativo às
discussões envolvendo o trabalho.
Aos amigos Giglio e Amari, que de alguma forma
me incentivaram, promovendo discussões,
sugerindo idéias.
Agradeço especialmente à minha família.
O autor
8
RESUMO
Neste trabalho, verificamos como quatro livros didáticos tratam o Teorema
Fundamental do Cálculo. Para isso, pesquisamos que diferenças fundamentais
são evidenciadas no enfoque dado por diferentes autores, e, além disso,
observamos se esses autores, em seus textos, exploram a coordenação dos
registros de representação na apresentação do TFC. O referencial teórico
utilizado são os Registros de Representação Semiótica de Raymond Duval. Este
escreve que para a aquisição do conhecimento matemático, devem-se empregar
simultaneamente dois registros de representação, e não cada um tomado
isoladamente. Para nortear a nossa pesquisa, elaboramos critérios (indicadores)
de organização para a análise baseados em Bardin, que sugere etapas para uma
elaboração de resultados. À medida que verificamos por meio desses indicadores
a maneira pela qual o autor apresenta o Teorema, fomos analisando com base
nos registros de representação. A partir dessas análises, observamos que um dos
livros não discute explicitamente, na unidade de enfoque de nossa análise, a
questão referente à inter-relação entre Derivada e Integral, que é proporcionada
pelo Teorema Fundamental do Cálculo, porém o faz no volume dois de sua obra.
Quanto aos registros de representação, verificamos que os autores exploram a
coordenação desses em seus livros, embora uns a façam de uma forma mais
evidente que aquela sugerida nos outros, contudo, justificativas para tanto,
sendo que elas se encontram no prefácio dos mesmos; assim, podemos notar
que isso se deve também ao público alvo para o qual se destina cada um dos
9
livros. Observamos que a data de publicação dos livros não tem relação direta
com a diversidade de registros empregados pelos mesmos.
Palavras-chave: teorema fundamental do cálculo; livro didático; registros de
representação semiótica; coordenação de registros; indicadores.
10
ABSTRACT
In this research, we verify as four didactic books present the Fundamental
Theorem of Calculus. For this we search that basic differences are evidenced in
the approach given for different authors, and, moreover, we observe if these
authors, in its texts, explore the coordination of the registers of representation in
the presentation of FTC. The used theoretical referential is the Registers of
Representation Semiotics of Raymond Duval. This writes that for the acquisition of
the mathematical knowledge, two registers of representation must be used
simultaneously and not each one taken separately. To guide our research, we
elaborate criteria (indicator) of organization for the analysis, based in the book
“Analysis of Content” of Bardin that suggests stages for an elaboration of results.
To the measure that we verify through these indicators the way for which the
author presents the Theorem, was analyzing on the basis of the representation
registers. From these analyses, we observe that one of books does not argue
explicit, in the unit of prominence of our analysis, the referring question to the
interrelation between Derivative and Integral, that it is given by the Fundamental
Theorem of Calculus, however makes it two of its book by vol. How much to the
representation registers, we verify that the authors explore the coordination of
these in its books, although some make it of a more evident form that one
suggested in the others, however, it has justifications for in such a way, being that
they meet in the preface of the same ones; thus, we can notice that this if also
must to the type of reader for which if it destines each one of books. We observe
11
that the date of publication of books does not have direct relation with the diversity
of registers used for the same ones.
Key-words: fundamental theorem of calculus; didactic book; representation
registers semiotics; coordination of registers; indicator.
12
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO.................................................................................................13
CAPÍTULO I – PROBLEMÁTICA...........................................................................16
CAPÍTULO II ASPECTOS DO DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO: GÊNESE
DO TEOREMA FUNDAMENTAL DO LCULO...................................................35
CAPÍTULO III – FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICO-METODOLÓGICA....................74
CAPÍTULO IV – ANÁLISE DOS LIVROS DIDÁTICOS..........................................95
IV. 1 Curso de Análise – E. L. LIMA............................................................96
IV. 2 Um Curso de Cálculo – H. L. GUIDORIZZI.......................................116
IV. 3 Cálculo – J. STEWART.....................................................................135
IV. 4 Cálculo - Um Curso Universitário – E. E. MOISE..............................164
CAPÍTULO V – CONSIDERAÇÕES FINAIS......................................................194
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...................................................................200
13
APRESENTAÇÃO
O tema que nos propusemos estudar é relativo ao Teorema
Fundamental do Cálculo. Ele está inserido na linha de pesquisa do grupo G2
intitulado “Matemática do Ensino Superior: Didática do Ensino do Cálculo”. Neste
grupo, paralelamente à nossa pesquisa, o tema referido foi tratado em outros dois
trabalhos: um deles é relativo à mobilização de registros de representação
semiótica efetuada por professores de Cálculo; já o outro, fundamenta-se na
mudança de quadros de Régine Douady, sendo que os sujeitos de pesquisa são
alunos do Ensino Superior.
Nosso trabalho busca investigar como quatro livros didáticos tratam o
Teorema Fundamental do Cálculo, pois entendemos que a forma como este
Teorema vem apresentado em alguns livros e apostilas pode dificultar a
apreensão dos objetos matemáticos e dos tópicos inerentes aos mesmos.
Procuramos responder duas questões: uma delas é relativa a
diferenças fundamentais que são evidenciadas no enfoque dado pelos autores
dos livros; a outra é referente à exploração da coordenação de registros por parte
desses autores.
Para alcançar objetivo da pesquisa, utilizamos os registros de
representação semiótica de Raymond Duval que serviram como ferramenta de
análise. Verificamos através de tratamentos e conversões efetuados no texto se
os autores exploram, e como, a coordenação de registros. Segundo este autor, tal
coordenação é uma condição para que os objetos matemáticos sejam
apreendidos, e ainda, que eles não sejam confundidos com suas representações.
14
Como subsídio para organização do trabalho, fizemos uso de
procedimentos teórico-metodológicos apresentados por Bardin, através do Livro
“Análise de Conteúdo, que indica a elaboração de critérios (indicadores) para que
estes auxiliem a análise (baseada na teoria de Duval, no caso), tanto no que diz
respeito à organização propriamente dita, quanto em revelar aspetos relevantes
do texto que podem estar “implícitos” ao leitor.
Com base nesses indicadores (consideramos que os registros
apresentados também o sejam), podemos evidenciar diferenças no enfoque dado
pelos autores, tanto no que diz respeito ao TFC e tópicos inerentes ao mesmo,
quanto à exploração da coordenação de registros na apresentação desse
Teorema.
Os resultados mostraram que o enfoque dado pelos autores, além do
uso de diferentes registros independem da data de publicação das obras, sendo
que os dois, em geral, são relativamente indicados e discutidos nos prefácios, isto
é, nestes, também são revelados o enfoque a ser dado pelo autor, inclusive no
que se refere aos registros de representação.
Para responder nossas questões de pesquisa e alcançar o objetivo
proposto, organizamos este trabalho em 5 capítulos:
No primeiro, intitulado Problemática, apresentamos o tema, o contexto
que o envolve e o problema de pesquisa. Neste, é destacada a revisão de
literatura, sendo que através dela, enfatizamos problemas relativos ao Ensino e
Aprendizagem do Cálculo. Além disso, apreciamos alguns trabalhos que
contribuíram como referência para nossa investigação como um todo.
No capítulo II, são discutidos aspectos históricos ligados ao
desenvolvimento do Cálculo, com ênfase ao Teorema Fundamental do Cálculo e
às idéias que conduziram Newton e Leibniz à sistematização dos métodos de
seus predecessores.
A seguir, no capítulo III, designado Fundamentação Teórico-
Metodológica, apresentamos os registros de representação semiótica que
serviram como ferramenta de análise e conclusões, além de os procedimentos
teórico-metodológicos baseados em Bardin, os quais nortearam e subsidiaram a
15
investigação. Ao final deste, encontram-se referências de trabalhos ligados à
investigação de noções matemáticas em livros didáticos e a questão de pesquisa.
O Capítulo IV traz a análise da abordagem dada ao TFC nos quatro
livros escolhidos. Com base na teoria de Duval e em indicadores elaborados para
evidenciar diferenças do enfoque de cada autor, foram verificados neste, se os
mesmos exploram a coordenação entre registros de representação. Ao final do
capítulo, é apresentado um resumo enfatizando diferenças e semelhanças entre
as obras no que diz respeito às questões propostas.
Finalizando o trabalho, são apresentadas no capítulo V, as
considerações finais que se constituem em um breve resumo da pesquisa como
um todo, algumas conclusões, reflexões sobre o trabalho e algumas questões
sugeridas como possível fonte de inspiração a outros pesquisadores da área da
Educação Matemática.
16
CAPÍTULO I
PROBLEMÁTICA
Ao ingressar no Ensino Superior, os estudantes da área das Ciências
Exatas se deparam com a disciplina de lculo Diferencial e Integral (CDI) como
curso básico para rios outros. De acordo com Candido, Barufi e Monteiro
(2004), espera-se que essa disciplina, por meio de vários tipos de problemas,
propicie aos alunos uma visão mais ampla de como o conhecimento matemático
pode ser articulado. No entanto, o processo de ensino e aprendizagem CDI é
desenvolvido na maioria das vezes sob a forma de: definições, teoremas,
propriedades, exemplos e exercícios, em que o aluno é levado ao fracasso e ao
abandono desta importante disciplina, fundamental nos primeiros anos dos cursos
de Ciências Exatas. A forma como o professor aborda os temas dessa disciplina
pode não levar à apreensão dos mesmos, pela importância dada ao uso das
técnicas e reprodução de situações do tipo “calcule”, “determine” sem dar um
significado ao porquê das construções, algoritmizando demasiadamente o
assunto. Entendemos que a forma como o CDI vem apresentado em alguns livros
e apostilas pode dificultar a apreensão dos objetos matemáticos e dos tópicos
inerentes aos mesmos.
De acordo com Cury (1999), as dificuldades relacionadas com o ensino
de Cálculo nos cursos universitários são comuns aos estudantes e professores de
vários países. Esses cursos, em geral, seguem uma distribuição de assuntos
considerada “padrão” e enfatizam, principalmente, o uso de listas de exercícios
após a apresentação dos conteúdos. A autora escreve que mesmo que se
17
cumpra o programa da disciplina, é possível tentar novas abordagens, com
ênfase na resolução de problemas, na modelagem matemática, no uso do
computador e no aproveitamento das informações disponíveis na Internet.
Oliveira (2004) escreve que em geral é dada pouca ênfase a questões
conceituais do Cálculo. Ele ressalta que, embora a abordagem de seu ensino e
aprendizagem se importe mais com uso de algoritmos e/ou aplicação de fórmulas,
talvez facilitadores do processo, a repetência nesses cursos é ainda significativa.
O pesquisador concorda com Tall que “[...] um abismo grande entre a
manipulação simbólica ou algorítmica no cálculo e a prova de teoremas de
existência na análise (Tall apud Oliveira, p. 9). Estamos de acordo com o autor
quando ele escreve que um aluno ao se deparar com um curso de Cálculo, cujo
tratamento enfatiza o uso de algoritmos e/ou aplicações de fórmulas, poderá
sentir muitas dificuldades com questões conceituais, quando for estudar Análise
Matemática.
Em sua dissertação de mestrado, Hsia (2006) aponta que os alunos,
antes de ingressarem na Universidade, trabalham alguns conceitos matemáticos,
muitas vezes, de forma isolada. Além disso, os professores esperam que esses
alunos tenham o domínio de algumas técnicas operatórias e da linguagem lógico-
formal, os quais não estão suficientemente estabelecidos no início do curso
universitário. Como conseqüência disso, alguns alunos se tornariam meros
repetidores de definições, reprodutores do conteúdo “transmitido”, resolveriam
exercícios iguais aos exemplos dados pelo professor, aplicariam técnicas que, de
tanto repetir, conseguiram razoavelmente memorizar.
Assim como Oliveira (2004) e Hsia (2006), Silva (2004) concorda que o
fracasso e a repetência nesses cursos podem ser conseqüência de uma
metodologia de ensino que se baseia muitas vezes em aulas expositivas,
exemplos, lista de exercícios e provas que privilegiam técnicas. Concorda ainda
que em aula, o professor talvez acredite que os alunos possuam certos
conceitos, assim como o domínio de técnicas e linguagem formal de que um
curso de Cálculo necessite. Ainda sobre problemas de ensino e aprendizagem do
Cálculo, escreve que nos livros didáticos fatores que podem gerar dificuldades
para a compreensão de conceitos matemáticos, ao priorizar a representação
simbólica.
18
Barufi (1999) escreve que os índices de aprovação nos cursos de
Cálculo situam-se abaixo da expectativa, caracterizando uma situação que pode
ser considerada como problemática. Ela ressalta ainda, que boa parte dos alunos
no Ensino Médio, não trabalhou com nenhuma das noções do Cálculo e que os
novos conceitos são apresentados sob uma abordagem pouco relacionada com a
maneira pela qual o tema foi sendo historicamente estruturado. Isso poderia gerar
uma grande dificuldade, principalmente se as questões do Cálculo forem
apresentadas num contexto formal, logicamente estruturado.
Em nosso trabalho de revisão bibliográfica, percebemos que os
problemas relativos ao ensino e aprendizagem do CDI são variados. Citamos
alguns: pouco embasamento conceitual por parte dos alunos; problemas relativos
à confusão com notações e pouco domínio com a linguagem lógico-formal;
formação no Ensino Médio, muitas vezes, sem enfatizar a parte conceitual; ensino
de temas como algo pronto e acabado; metodologia baseada em exposição
teórica e emprego de técnicas de reprodução sem significado; utilização de livros-
texto pouco adequados ao contexto de determinado curso; etc. Percebemos
também que as complexidades de aprendizagem dos conceitos fundamentais,
como a Derivada e a Integral, têm estimulado pesquisadores em Educação
Matemática em várias direções, tais como: o uso de novas tecnologias, utilização
de novas metodologias, o estudo de diferentes teorias cognitivas, análise de
material didático (Hsia, 2006, p. 13). Esse último item será focalizado neste
estudo.
Nos últimos anos, surgiram pesquisas (Vianna (1998), Barufi (1999),
Oliveira (2004), Silva (2004), Hsia (2006), etc.) visando diagnosticar possíveis
causas das dificuldades apresentadas no processo de ensino e aprendizagem de
assuntos referentes ao CDI, bem como outras (Melo (2002), Scucuglia (2006),
etc.) tentando buscar soluções lançando mão de tecnologias facilitadoras de
aprendizagem dos conceitos tratados nessa disciplina. Vários softwares e
seqüências de ensino têm sido criados e usados na Educação Matemática, porém
o livro didático ainda continua sendo amplamente utilizado como manual dos
professores.
Em sua tese de Doutorado, Vianna (1998) escreve que no curso de
Cálculo é que geralmente se o primeiro contato do estudante de graduação
19
com a matemática em um nível avançado, em que ele vai utilizar, por exemplo, o
raciocínio dedutivo fora do contexto da geometria. A autora ressalta que esse
primeiro contato dos estudantes não tem sido bem sucedido, e aponta algumas
razões para isso, tais como: aquelas ligadas com as dificuldades inerentes a
conceitos específicos, além daquelas relativas às dificuldades originadas pela
forma pela qual o próprio curso foi estruturado.
A finalidade de sua pesquisa é identificar alguns obstáculos referentes
ao curso de Cálculo. Para tanto, a autora escolhe como foco de seu trabalho o
Teorema Fundamental do Cálculo (TFC), explicitando que o mesmo tem um papel
fundamental em todo o curso, pois investigando a compreensão dos estudantes
sobre o TFC, é possível também identificar dificuldades com outros conceitos
relacionados a ele. Vianna justifica que “o TFC foi escolhido como base desta
pesquisa porque é um dos tópicos mais importantes ensinados no cálculo,
estabelecendo a ligação entre os conceitos da diferenciação e a integração” (Ibid.,
1998, p. 2).
A investigação da compreensão dos estudantes sobre o TFC, ao final
do curso de Cálculo, busca, principalmente, identificar as principais dificuldades
dos mesmos em tentar compreender as definições formais e os conceitos do
Cálculo que podem impedir que se apreciem as idéias centrais que estão por trás
do TFC. Uma das perguntas desse estudo é se os estudantes podem evocar
imagens visuais associadas aos conceitos de Derivada e Integral, a fim de aplicá-
los na resolução de problemas, na interpretação dos gráficos das funções f
(integranda) e
F
(primitiva de
f
), além de dar uma interpretação geométrica para
o TFC.
Na intenção de procurar respostas, a autora utiliza um questionário e
entrevistas baseadas nas respostas ao mesmo. Além disso, ela faz uso de tarefas
no computador baseando-se em entrevistas também.
Os resultados apresentados mostram que alguns estudantes não
resolvem as perguntas gráficas. Segundo a autora, isto não significou que não
tiveram estas imagens em suas mentes, entretanto, tiveram-nas mais como
ilustrações para os conceitos que como ferramentas. A análise do questionário
revela que muitos estudantes não usaram as imagens da Integral como área ou
da Derivada como inclinação da reta tangente. As primeiras entrevistas
20
evidenciam que alguns estudantes notaram estas imagens, e, embora um número
significativo deles pudesse indicar a conexão entre a Derivada e a inclinação da
reta tangente e entre a Integral e a área de uma região plana, isto não significou
que podiam usá-la. De acordo com Vianna, os estudantes resolveram algumas
perguntas usando procedimentos algorítmicos, porém os mesmos não utilizaram
as imagens gráficas para verificar a resposta.
Relativamente às entrevistas em torno de atividades no computador, os
resultados mostram que a maioria dos estudantes tinha conhecimento sobre
imagens das retas secantes e tangentes, além da área sob o gráfico de uma
função. Entretanto, não tinham “familiaridade” com as imagens dos gráficos de
f
e
F
, e suas relações. Isso pareceu novo a eles, particularmente as imagens
referentes à função integral
F
(primitiva de
f
). Evidenciou-se ainda, que
algumas características da função
F
, em termos de visualização e representação
gráfica, são mais difíceis do que as de
f
. As entrevistas também revelam que
esses gráficos seriam melhor compreendidos se as imagens da reta tangente e
da área estivessem em suas mentes não somente como uma figura estática, mas
como uma construção dinâmica.
Em relação à questão de os estudantes usarem ou não imagens para
dar uma interpretação geométrica para o TFC, a autora escreve que eles não
responderam essa questão, pois, dado o fato que o uso destas imagens em
compreender e em resolver os problemas que tratam de conceitos era “pobre”
para eles. Os resultados, segundo Vianna, sugerem que as imagens gráficas são
usadas pelo professor, geralmente, mais para ilustrar os conceitos do que como
ferramentas para resolver problemas.
Segundo a pesquisadora, o emprego das imagens revela que os
estudantes tendem a usá-las como conceito que podem diferir da definição
formal. As imagens que os estudantes usam para representar definições podem
conter somente aspectos parciais destas. A razão pela qual os estudantes tendem
a empregar estas imagens é relacionada parcialmente à maneira que as
definições são apresentadas na sala de aula e em livros didáticos.
Desde já, fica uma questão: como será que os livros didáticos abordam
o TFC e como os autores explanam em seus textos os conceitos relacionados ao
Teorema? Poderíamos nos reportar a Barufi (1999), que aponta a importância do
21
livro didático como norteador do processo de ensino do Cálculo. Poderíamos
também nos referenciar em Silva (2004), que verifica em alguns livros, quais os
registros de representação utilizados pelos autores e se os mesmos propiciam a
coordenação entre esses registros, o que é fundamental para a compreensão em
matemática, segundo Duval. Voltaremos a discutir essas questões.
Assim como Vianna (1998), Scucuglia (2006) propõe-se a investigar o
Teorema Fundamental do Cálculo devido a sua importância no contexto do ensino
e aprendizagem do Cálculo. A investigação desse teorema pode revelar
conhecimentos de conceitos relativos ao mesmo, que são importantes para o seu
aprendizado.
Um dos principais enfoques em seu grupo de pesquisa são as
representações múltiplas no ensino de funções, isto é, o fato de o software gráfico
ou de a calculadora gráfica possibilitarem ao estudante coordenar diferentes tipos
de representações - gráfica, algébrica e tabular - de uma função ou de uma
família de funções. Assim, surgiu a possibilidade de elaborar uma atividade com
calculadoras gráficas para investigar o TFC.
Em seu trabalho, o autor discute como Estudantes-com-Calculadoras-
Gráficas investigam o Teorema. Baseia-se na perspectiva epistemológica Seres-
Humanos-com-Mídias, que evidencia o papel das tecnologias no processo de
produção de conhecimento. Para tanto, ele realiza experimentos de ensino com
duas duplas de estudantes do primeiro ano da graduação em matemática, que
haviam estudado o assunto, e que estavam familiarizadas com a calculadora “TI-
83”.
O autor acredita que a experimentação com calculadoras gráficas,
proposta na pesquisa, pode ajudar no estabelecimento de conexões entre a
matemática difundida no Ensino Médio e a matemática exposta na comunidade
acadêmica. Ao invés de propor uma abordagem tradicional a estudantes de
primeiro ano da graduação, no sentido de expor diretamente os resultados de um
teorema e buscar uma demonstração complexa deste, o autor procura possibilitar
que os estudantes conjeturem os resultados do TFC de modo experimental, com
a calculadora gráfica, e em seguida propõe uma demonstração mais “acessível”,
com notações e simbologias mais simples, não exacerbadamente complexas.
22
Um trabalho que nos inspirou tanto no que se refere ao
desenvolvimento histórico do Cálculo quanto no que diz respeito à análise do TFC
em alguns livros didáticos foi a tese de doutorado de Palaro (2006). Nessa
pesquisa a autora busca levantar os aspectos caracterizadores da concepção de
Educação Matemática de Henry Lebesgue, que revolucionou a Análise
Matemática com a criação de uma nova teoria da medida, e, fundamentado nesta,
uma nova definição de integral, mais abrangente do que a de Riemann.
Para proceder a esses levantamentos, ela realiza uma pesquisa de
caráter bibliográfico sob a abordagem histórico-descritiva. A autora propõe-se a
investigar o contexto histórico-filosófico da Matemática da época, buscando
identificar as necessidades que levaram esse matemático às suas mais
importantes criações; a levantar as premissas da filosofia da Matemática que
Lebesgue propagava; propõe-se ainda a apresentar aspectos do desenvolvimento
histórico do Cálculo do século XVII até Lebesgue, e embasado nesse
desenvolvimento, a identificar as perspectivas adotadas em alguns livros didáticos
no que se refere à forma como esses definem a Integração como operação
inversa da diferenciação ou como limite de uma soma; e finalmente, a
pesquisadora investiga como o matemático pensava o processo de ensino e
aprendizagem da Matemática e o papel do professor nesse processo.
Em suas considerações, escreve que Lebesgue sempre priorizou a
atividade, e assim, considerava a Matemática um instrumento, isto é, uma
linguagem que se mostra e desenvolve-se nas aplicações e que, particularmente,
não tem objetos próprios. Esta forma de pensar o fazer Matemática estava em
harmonia com a filosofia da Matemática que ele propagava e com o ensino que
proporcionava a seus alunos. Segundo ela, esta visão filosófica justifica a
concepção de Lebesgue de que todo conhecimento surge da atividade, a partir da
qual se abstraem os conceitos, são feitas as generalizações, a simbolização e,
por último, a atividade é transformada em uma teoria. Relativamente ao ensino,
ele pregava que o professor deveria trabalhar com tais atividades, tratando a
Matemática como um ramo da Física, porém em uma atitude diferente da do
físico, recorreria à observação apenas no início, para abstrair os conceitos.
A autora enfatiza que Lebesgue, ao se referir aos cursos de formação
de professores,
23
[...] era convicto de que não bastava exigir que os futuros
professores adquirissem habilidades técnicas e soubessem
recitar as lições dos livros didáticos. Mas, era, sim, necessário
exigir desses alunos uma ‘profunda reflexão crítica, lógica e
pedagógica’ sobre o que teriam de ensinar; pois deveriam tornar-
se capazes para escolher, com razão, uma dentre as várias
possibilidades de apresentar um assunto, a partir de suas
comparações, ou então, criar uma outra se fosse o caso. (Ibid.,
2006, p. 226.)
Relativamente à História da Matemática, a pesquisadora enfoca, em um
capítulo de sua tese, aspectos do desenvolvimento do Cálculo, desde Fermat
(1601-1665) até o século XVIII. Aborda neste, o que ela chama de “origem e auge
do Teorema Fundamental do Cálculo”, enfatizando a relação entre quadratura e
tangente, e, apresentando as contribuições de Newton e Leibniz. Particularmente,
no que diz respeito à nossa pesquisa, esse capitulo referenciou-nos relativamente
à estruturação de parte do nosso trabalho, além de contribuir com o nosso
aprendizado sobre o assunto.
Ainda sobre o TFC, a autora faz uma discussão do mesmo em quatro
livros didáticos, destacando que o Cálculo originou-se de dois problemas distintos
que surgiram em épocas diferentes: os problemas de áreas e tangentes que
foram tratados de forma independente até o final do século XVII quando, então,
foi percebido que ambos se relacionavam constituindo o que é hoje conhecido
como o TFC.
Essa discussão visa identificar como esses livros introduzem a Integral
e sob qual perspectiva abordam esse teorema, na intenção de perceber qual o
período histórico que os caracterizam.
Ficou evidenciado que em algumas das obras os autores definem a
Integral como o limite de soma, e em outras, a integração vem definida como
operação inversa da diferenciação. A pesquisadora enfatiza que quando a Integral
é definida como uma soma, é necessário provar que existe uma relação entre a
integração e a diferenciação por meio do TFC. Porém, quando a integração é
definida como operação inversa da diferenciação, o TFC é uma conseqüência da
definição, e o que necessita ser provado é que a integral tem relação com o
problema da medição de área e, para tanto, usa-se o TFC. Segundo a autora,
24
“esta forma de definir integral, retrata bem o espírito algébrico dominante, nos
séculos XVII e XVIII [...]” (Ibid., 2006, p.182).
A análise dos três livros de Cálculo revelou que a perspectiva adotada é
a mesma do período que antecede Riemann e Lebesgue, pois se baseia em
condições suficientes para que uma função seja integrável como fez Cauchy
com classes de funções contínuas. Na outra obra (livro de Análise), a perspectiva
adotada baseia-se nos trabalhos de Riemann e Lebesgue, que buscam as
condições necessárias para o estabelecimento do TFC referindo-se à classe de
funções integráveis.
Em nosso trabalho nos referenciamos também pelos artigos de Baldino
(1995) e Tall (1991j), que expõem alguns aspectos sobre o ensino do TFC, e,
além disso, buscamos idéias no livro “Calculus” de Spivak (1967).
Segundo Baldino (1995) em seu artigo intitulado Cálculo infinitesimal:
passado ou futuro”, o objetivo de qualquer curso de Calculo não é ensinar, nem a
teoria dos limites nem a teoria dos infinitésimos, mas sim, que nesses cursos, o
aluno aprenda processos básicos de equacionar e resolver problemas envolvendo
os conceitos de Derivada e de Integral.
O autor mostra, com base no livro de Swokowski (1995), que a
estrutura desse e de outros livros pode gerar dificuldades para os alunos,
principalmente no que diz respeito ao conceito de Integral. O objetivo do
pesquisador é mostrar que essas dificuldades se originam na insistência de
manter o conceito de limite como fundamento do Cálculo.
Em seu artigo, escreve que “um sintoma” (entre outros) de que as
coisas não vão tão bem com a Integral quanto com a Derivada é que a notação
dxxf )(
para a antiderivada (primitiva) de uma função que Swokowski apresenta
no início do capitulo sobre integração, fica totalmente “misteriosa”. Ele questiona:
“Por que denotar antiderivadas assim e não, por exemplo, por
1
dx
d
?” (Ibid.,
1995, p. 7). Em seguida, mostra um exemplo ressaltando a relação inversa entre
a Derivada e Integral, a partir das notações
e
d
.
25
A mudança de variáveis apresentada em 5.2, não explora a força
dessa notação e aparece como um ritual burocrático com dx e du
(Swokowski 1995, p. 319):
+=
CxgFdxxgxgf
))(()('))((
Se
)(
xgu
e
dxxgdu
)('
, então
+=
CuFduuf
)()(
Por que não optar por
+==
CxgFxgFddxxgxgf
))(()))((()('))((
com cancelamento dos símbolos
e
d
? [...] (Ibid., 1995, p. 8).
O autor ainda enfatiza que a maioria dos alunos que passam por cursos
de Cálculo, lembra que a Integral é um limite de somas e que a área da parábola
é obtida pela variação da primitiva
3
3
x
, mas não conseguem explicar o que uma
coisa tem a ver com a outra. Outro fato revelador é quando se pede para calcular
a derivada, por exemplo, de
+
x
a
dtt
4
2
1
, a maioria deles, primeiro, se empenha em
calcular uma primitiva. Isso mostra que reduziram o conceito ao algoritmo.
Spivak (1967), em seu livro “Calculus”, chama atenção para que não se
confunda o corolário (do Teorema Fundamental do Cálculo) “Se f é contínua em
],[ ba e 'gf
para alguma função
g
, então
=
b
a
agbgf )()(
com a própria
definição de Integral. Baldino e Spivak, nesses exemplos, mostram que a notação
utilizada pode gerar dificuldade tanto na apreensão do conceito, quanto na
questão relativa à confusão entre o objeto matemático e a sua representação.
Ainda relativo a problemas envolvendo notações, Tall (1991j), em seu
artigo intitulado “Visualizing Differentials in Integration to Picture the Fundamental
Theorem of Calculus”
1
, apresenta, a partir de suas investigações, que existe uma
confusão manifesta no significado de notações como dxdy / e
dxxf )( . A
primeira é apresentada como a derivada da função )(xfy
e “deve” ser pensada
como um único símbolo indivisível, e não como um quociente. Na segunda, o dx
em
dxxf )( significa “com respeito a x”, embora, segundo Tall, os alunos
1
Visualizando Diferenciais na Integração para retratar o Teorema Fundamental do Cálculo.
26
necessitam fazer a substituão
dx
dx
du
du =
para calcular a integral pela
substituição. O autor escreve que:
Um pouco mais tarde podem se defrontar com problemas para
resolver a equação diferencial
y
x
dx
dy
=
(antes havia sido dito que
dxdy
/
é um símbolo indivisível)
para começar 'separando as variáveis’
xdxydy
(o que faz o
dx
aqui?) ponha então um sinal integral [...]
y dy
= –
x dx
(aqui presume-se que o
dx
significa agora “com respeito a x”),
para obter as soluções
c
xy
+=
2
2
22
(Ibid., 1991, p. 1).
O autor enfatiza que poucos livros-texto de Cálculo parecem ter uma
visão totalmente coerente do significado do diferencial que trabalha durante todo
o curso. Ele mostra neste artigo, referenciando-se às primeiras publicações de
Leibniz no lculo, que um significado diferente que possa ser dado ao
dx
conforme se trabalhe na diferenciação, ou na integração, e que existe
relacionamento entre esses significados. Para isso, Tall (1991), expõe suas idéias
baseando-se na visualização do Teorema Fundamental do Cálculo com o uso do
computador, e nesse, não se deve olhar o gráfico de )(
xfy
, mas sim o de
)(
xIy
, em que )()('
xfxI
. Ele apresenta os dois gráficos com a mesma
subdivisão do intervalo [a, b] em sub-intervalos, como mostram as figuras I. 1 e I.
2:
27
Figura I. 1: “A soma da área
b
a
dxxf )(
” (Ibid., 1991, p. 4)
Figura I. 2: “A soma
b
a
dxxf )(
como uma soma dos comprimentos
dy
” (Ibid., 1991, p. 4).
Em cada ponto x da subdivisão considera-se a tangente à curva )(
xI
no ponto ))(,(
xIx
, então, o incremento correspondente à tangente é
dxxfdxxIdy
)()('
. Assim,
b
a
dxxf )(
(figura I. 1) é vista como a soma
dy
,
em que cada um
dy
(figura I. 2) é a componente vertical do vetor tangente ao
gráfico de
)(xIy
. Tem-se que
dy
é a soma dos segmentos verticais, e,
quando
dx
é extremamente pequeno, o gráfico é relativamente “reto” de
x
a
dxx
+
, portanto é aproximadamente igual ao acréscimo
)()( xIdxxI
, e,
28
adicionar os incrementos de
a
x
a
bx
=
dá
)()( aIbI
. Assim, adicionar as
etapas verticais
dy
, em um sentido aproximado, resulta em
)()( aIbI
. A figura I.
2 dá uma indicação dessa idéia.
O pesquisador explica que o símbolo
b
a
dxxf
)(
é usado para representar
o limite de
b
a
dxxf )(
quando
dx
é muito pequeno, e o argumento dado apenas
fornece uma intuição “poderosa” a respeito do porquê deste limite ser
provavelmente
)()()(
aIbIdxxf
b
a
=
.
Ele ressalta a importância do computador e de seus recursos tais como
o “zoom” e a extrapolação de uma escala (do eixo-
x
, por exemplo) mantendo a
outra constante para que se possam visualizar algumas propriedades requeridas
da função, sobretudo o que diz respeito à continuidade da mesma.
De forma geral, problemas com o ensino e aprendizagem do TFC
podem estar ligados aos conceitos que o envolvem (Vianna (1998) e Scucuglia
(2006)); ou à confusão (ou incoerência) entre notações (Tall (1991) e Baldino
(1995)). Podemos afirmar ainda, como notamos em Palaro (2006), que os livros
didáticos podem não abordar questões fundamentais para o entendimento do
TFC, por exemplo: a definição de Integral pode ser confundida com o corolário
2
do
Teorema.
O TFC é um dos temas centrais Cálculo Diferencial e Integral e foco da
nossa investigação. A justificativa da escolha desse tema foi reforçada com a
revisão de literatura, que ampliou nossos conhecimentos sobre o mesmo, e de
certa forma, norteou-nos relativamente ao andamento da pesquisa.
Lima (2002 p.132) escreve que esse Teorema estabelece a importante
conexão entre Derivada e Integral. A primeira, ligada ao problema de se
determinar a reta tangente a uma curva em um ponto, enquanto a segunda, ligada
ao problema para se encontrar a área de uma figura plana. Apenas
aparentemente, entre os dois problemas parece o existir relação.
2
Se
f
é contínua em
],[ ba
e
gf
para alguma função
g
, então
=
b
a
agbgf )()(
(Spivak, 1967).
29
Relativamente a isso levantamos questões: será que os livros didáticos abordam
essa “importante conexão”? E como a abordam?
Debruçamo-nos sobre algumas pesquisas referentes ao tratamento de
temas do Cálculo, dado por livros didáticos. Estas contribuíram com fecundas
referências, entre elas, a sugestão da utilização de Bardin (2003) para orientar o
nosso trabalho no que se refere aos procedimentos de organização para a
análise. Escrevemos agora sobre as mesmas.
Hsia (2006), em sua pesquisa, procurou investigar como o aluno utiliza
o livro didático, quando ele estuda a Integral de Riemann. O trabalho referenciou-
se nos registros de representação semiótica
3
de Raymond Duval. Segundo a
pesquisadora, o objeto matemático Integral dispõe de vários registros de
representação para possibilitar o acesso ao seu conceito.
Para a realização desse trabalho, a autora utilizou o livro Cálculo de
James Stewart por ser bastante utilizado nos cursos de graduação, além de
apresentar variados registros de representação da Integral.
Os alunos participantes da pesquisa são alunos do segundo e quinto
semestres do curso de matemática de uma universidade de São Paulo, período
noturno. Os alunos do segundo semestre ainda não conheciam a noção de
Integral, enquanto que os do quinto, já haviam estudado tal conceito.
Foram elaboradas cinco tarefas individuais para cada aluno. A primeira
tinha o objetivo de verificar como os alunos manuseiam o livro; a segunda
atividade preocupava-se em verificar se os alunos sabem mobilizar vários
registros para estudar e qual o registro privilegiado por eles; a terceira, com a
finalidade de investigar se os alunos iniciam suas buscas no tópico cujo título não
contempla a palavra “Integral”. A quarta e quinta tarefa objetivavam investigar a
escolha de um problema, dentre muitos propostos, e as estratégias que eles
3
Segundo Duval, os objetos matemáticos são abstratos e para serem apreendidos, devem ser
evocados através de representações semióticas. É importante não confundir o objeto matemático
com a sua representação, e para que isso não ocorra, o aluno tem que transitar naturalmente
pelos vários registros de representação (o simbólico numérico e o algébrico; o figural gráfico e o
geométrico; e a língua natural), e deve coordenar simultaneamente, ao menos dois desses
registros para a compreensão em termos de atividades cognitivas matemáticas. O autor propõe
que se analisem as dificuldades de aprendizagem em matemática tomando como estudo prioritário
a conversão (transformação de uma representação mudando de registro) das representações e
não os tratamentos (transformação de uma representação ficando no interior de um mesmo
registro). Para isto é preciso distinguir bem esses dois tipos de transformação.
30
lançam mão para resolver um exercício quando solicitados, e ainda, se mobilizam
diferentes registros simultaneamente.
É importante ressaltar que houve a presença de uma observadora,
além da aplicadora (pesquisadora), porém sem a interferência de ambas. Houve
também entrevistas com a finalidade de complementar e esclarecer os dados
coletados.
Durante a realização das tarefas, os alunos se motivaram com a
possibilidade de aprender, utilizando o livro didático. Esse fato contrariou a
perspectiva da autora, que era a de que os alunos não gostassem de estudar
utilizando o mesmo.
Relativamente à compreensão de texto, a pesquisa revelou, pela forma
que o esquema foi solicitado e apresentado, que os alunos fazem uma
segmentação do mesmo, destacando e pontuando tópicos. Sobre esses tópicos,
a maioria dos estudantes evidenciou a sua compreensão sobre o conceito
estudado, utilizando pelo menos dois registros predominantes: um visual (gráfico)
e outro discursivo. Muitos alunos utilizaram também outros registros, além de
outros símbolos matemáticos que apareciam no texto. A autora escreve que isto
se deve ao fato de o livro também utilizar vários registros de representação no
texto. Ela escreve também que os esquemas e as resoluções de exercícios, feitos
pelos alunos, fornecem indicações que a maioria deles percebeu pelo menos os
rudimentos do conceito que está sendo tratado.
A pesquisa também pretendeu investigar as diferenças entre a
resolução das questões de um aluno que nunca estudou a Integral e de um que
teve contato com o conceito. Ficou evidenciado, através dos dados obtidos que
não houve diferenças percepveis entre as produções de um ou outro grupo.
Oliveira (2004) analisa como o conceito de Integral é apresentado em
dois livros didáticos. Como ferramenta de análise, utiliza a teoria de Sfard no que
se refere às concepções operacional (uma noção matemática é tratada como um
processo) e estrutural (tal noção é tratada como objeto). O autor escreve que para
passar de uma concepção à outra o aluno deve passar por estágios
hierarquizados denominados: interiorização, condensação e reificação.
Os livros analisados são: Calculus de M. Spivak (1965) e Cálculo de J.
Stewart (2002). O pesquisador tenta responder como o conceito de Integral é
31
abordado e em que medida a apresentação em cada um deles se aproxima da
concepção operacional ou da estrutural, no sentido de Sfard. O autor tenta
investigar ainda se o enfoque do tema nas obras, propicia a transição entre uma
e outra concepção (processo e objeto).
A organização para a análise dos livros escolhidos foi feita com base
em Bardin (1977) que sugere três etapas: a pré-análise fase de organização; a
exploração do material e o tratamento dos resultados e a interpretação.
Destacamos, desde já, que utilizamos também em nossa pesquisa, os princípios
teórico-metodológicos apresentados por Bardin.
Em suas conclusões, escreve que a obra de Spivak apresenta a
Integral axiomaticamente, ou seja, a partir de uma construção refinada de
definições e teoremas, ele primeiro a define e depois trabalha as suas
propriedades. A análise evidenciou que o tratamento formal deste livro contraria a
teoria de Sfard que primeiro deve ocorrer a concepção operacional e depois a
estrutural. A concepção estrutural é predominante nesse livro.
A obra de Stewart, por sua vez, mostra a Integral partindo de uma
introdução sobre cálculo de áreas, posteriormente apresenta a definição e, em
seguida, destaca suas propriedades. A pesquisa evidenciou que o capítulo que
trata da definição de Integral neste livro está de acordo com os princípios I e II
estabelecidos por Sfard o primeiro postula que a concepção operacional deve
preceder a estrutural e o segundo que um processo de nível superior deve ser
feito para se atingir a reificação. O autor conclui que o Cálculo apresentado em
Stewart pode indicar que o ensino não vai ao sentido oposto do seu
desenvolvimento histórico.
Em sua dissertação, Silva (2004) procurou verificar como dois livros
didáticos apresentam o conceito de Integral fundamentando-se nos registros de
representação semiótica de Duval. Para tanto, selecionou os livros “Um Curso de
Cálculo” volume I, de H. L. Guidorizzi e “Cálculo” volume I, de J. Stewart, ambos
com abordagens diferenciadas e destinados a públicos diferentes. As estratégias
para a efetivação da análise se baseiam, assim como em nosso trabalho, em
alguns princípios apresentados pelo livro “Análise de Conteúdo” de Bardin.
Silva (2004) investiga se os autores, nos livros, propiciam a articulação
entre os registros de representação: simbólico (algébrico ou numérico), figural
32
(geométrico ou gráfico) e língua natural. Inicialmente apresenta uma análise
quantitativa dos tipos de registros de representação utilizados por cada um dos
autores. Depois, é feita de forma separada uma análise dos registros para cada
um dos livros para investigar como a Integral é introduzida, como os exemplos
são tratados e quais as caractesticas das listas de exercícios.
Em suas conclusões ele ressalta:
Apesar de o livro não ser o único elemento responsável pelo
saber adquirido pelo estudante, ele tem um papel destacado no
processo de ensino e aprendizagem, em função da sua
importância como instrumento pedagógico para o professor,
sugerindo-lhe conteúdo, atividades e até mesmo metodologia de
ensino (Ibid., 2004, p. 137).
Concordando com Duval, Silva (2004) escreve que transitar pelos
registros de representação semtica é de fundamental importância, e os livros
devem propiciar ao leitor a articulação dos mesmos.
A pesquisa evidenciou que os autores dos dois livros utilizam rios
registros na apresentação do conteúdo, nos exemplos e nos exercícios propostos,
e em alguns casos propondo a articulação deles, que segundo Duval, é
fundamental para a apreensão do objeto matemático.
Segundo o autor, na definição da Integral, Stewart explora mais os
registros que Guidorizzi, principalmente o gráfico. Relativamente às cnicas de
integração, a ênfase de ambos é o registro algébrico.
O pesquisador ressalta que ambos os livros não utilizam os vários
registros para diferenciar o objeto (Integral) matemático e a sua representação.
Conclui que esta questão deveria ser mais explorada.
A tese da pesquisadora Barufi (1999), referência também para Melo
(2002), Oliveira (2004), Silva (2004) e Hsia (2006), procura investigar de que
maneira é feita a negociação de significados nos cursos de Cálculo, para
esclarecer em que medida a abordagem do tema realizada é uma simples
revelação (apresentação do tema como algo pronto, acabado) ou uma construção
significativa, a fim de possibilitar a construção do conhecimento desejável por
parte dos alunos.
33
Para realizar tal investigação, a autora busca respostas em um conjunto
de livros de Cálculo Diferencial e Integral e alguns de Análise Real (são 24 livros
no total). A idéia é compreender os fatores determinantes dos problemas
enfrentados pelo ensino de Cálculo nos cursos básicos da Universidade,
particularmente aqueles relacionados ao papel desempenhado pelos livros
didáticos.
Em suas conclusões, a pesquisadora escreve que a negociação de
significados pode ocorrer de várias maneiras. Através da língua materna que
tem a vantagem de estar mais próxima dos alunos do que a linguagem
matemática. “Através da linguagem corrente é possível falar muito mais sobre os
objetos, esclarecer relações entre eles, construir metáforas e analogias,
articulando o desconhecido com o estabelecido [...]” (Ibid., 1999, p. 154). As
ilustrações também permitem a negociação de significados, pois possibilitam
melhor visibilidade e os argumentos geométricos normalmente são mais aceitos
do que os puramente lógicos. Permitem ainda tal negociação a colocação de
problemas desafiadores, pois os mesmos podem ser capazes de semear idéias
sobre a utilidade do assunto, tornando-o significativo. A autora ressalta que
apesar de os livros poderem apresentar a linguagem corrente, a visualização e
problemas motivadores, a presença do professor se mostra fundamental para que
haja a negociação de significados.
Referente aos livros didáticos, Barufi (1999) escreve que a abordagem
realizada pelos diferentes autores pode ser comparada com dois paradigmas
existentes: a que respeita a seqüência na qual o Calculo foi construído
(construção significativa), e, aquela estabelecida no Cálculo organizado (como
uma revelação) e sistematizado na perspectiva lógico-formal.
A pesquisa explicita que um curso de Cálculo introdutório, que se
constitua em uma revelação, na qual as idéias ficam encobertas pela lógica
interna, não condiz com o nível de maturidade matemática do aluno ingressante
na Universidade, nem ao menos tem significado para os estudantes que
pretendem se encaminhar para o estudo da matemática pura.
A análise evidencia também que, apesar de a data de publicação dos
livros ser de muitos anos atrás, existiam aqueles que apresentavam propostas
34
em que as idéias e os problemas eram privilegiados, e a lógica interna não era tão
preponderante. Portanto, a dificuldade não reside na falta de bons livros.
Apresentamos agora a proposta do nosso trabalho: verificar como
quatro livros didáticos abordam o TFC tanto no que se refere às diferenças
fundamentais evidenciadas no enfoque dado pelos diferentes autores, quanto no
que diz respeito à exploração da coordenação dos registros de representação
semiótica realizada por esses autores na apresentação desse teorema.
Nessa investigação utilizamos alguns princípios metodológicos da obra
“Análise de Conteúdo” de Bardin (2003), que sugerem cronologicamente três
etapas: a pré-análise; a exploração do material; e o tratamento dos resultados
obtidos e interpretação. Com base nessas etapas nos orientamos quanto à
escolha dos livros, e principalmente, quanto à organização da análise e
conclusões.
Assim, elaboramos, de acordo com Bardin, alguns critérios
(indicadores) para organizar a análise da abordagem dada ao TFC nos livros
didáticos selecionados, que será feita com base nos registros de representação
semiótica de Duval. Segundo o autor, “a coordenação dos registros constitui uma
condição de acesso à compreensão em Matemática” (Ibid., 2003, p. 22).
Utilizamos critérios de análise baseados nessa teoria para verificar se os autores
exploram ou não a coordenação de tais registros, e para isso, tentamos identificar
os tratamentos e conversões presentes nos textos desses livros.
35
CAPÍTULO II
ASPECTOS DO DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO:
GÊNESE DO TEOREMA FUNDAMENTAL DO CÁLCULO
A intenção deste capítulo é apresentar aspectos do desenvolvimento
histórico relacionados com a construção do Cálculo, sobretudo o que diz respeito
ao Teorema Fundamental do Cálculo que estabelece a importante conexão
entre a Derivada e a Integral.
A Derivada e a Integral são as duas noções básicas do Cálculo
Diferencial e Integral. Do ponto de vista geométrico, a primeira está ligada ao
problema de traçar a tangente a uma curva enquanto que a segunda está
relacionada com o problema de determinar a área de certas figuras planas.
Segundo Eves (2004, p. 417), o desenvolvimento histórico do Cálculo
seguiu a ordem contrária daquela apresentada em textos e cursos atuais sobre o
tema. A noção de integração teve origem em processos somatórios ligados ao
cálculo de certas áreas, certos volumes e comprimentos. A diferenciação, por sua
vez, desenvolvida bem mais tarde, resultou de problemas sobre tangentes a
curvas e de questões sobre máximos e mínimos. Mais tarde ainda, verificou-se
que a integração e a diferenciação estão relacionadas entre si, sendo cada uma
delas a inversa da outra.
Baron (1985, v. 3, p. 55) escreve que, antes de Newton e Leibniz, tal
relação inversa foi explorada por muitos matemáticos, mais notadamente por
Torricelli, Barrow e por Gregory, porém o primeiro notou tal relação apenas de
36
forma intuitiva, e os outros publicaram o teorema fundamental mantendo um
tratamento geométrico, não desenvolvendo uma notação específica.
Newton e Leibniz são considerados os inventores do Cálculo Diferencial
e Integral porque perceberam a relação inversa entre a integração e a
diferenciação, dada pelo TFC; por terem desenvolvido novas notações e criado
diversas regras, apresentando um tratamento anatico para as mesmas; e, além
disso, porque seus métodos eram mais gerais que os de seus predecessores
(Ibid., v. 3, p. 69).
O TFC “nasce” com o lculo apenas no século XVII, no entanto, a
gênese desse pensamento remete à análise de problemas de quadratura e
cubatura, ou seja, problemas relativos a áreas e volumes, tratados na Grécia
Antiga por Eudoxo e principalmente por Arquimedes.
Os primeiros problemas que apareceram na História relacionados com
as integrais são aqueles referentes à quadratura
4
. Um dos problemas mais
antigos enfrentados pelos gregos foi o da medição de superfícies a fim de
encontrar suas áreas. Quando os antigos geômetras começaram a estudar as
áreas de figuras planas, eles as relacionavam com a área do quadrado, por ser
essa a figura plana mais simples. Assim, buscavam encontrar um quadrado que
tivesse área igual à da figura em questão.
Hipócrates de Chios (cerca de 440 a.C) executou as primeiras
quadraturas quando encontrou a área de certas “lunas”, regiões que se parecem
com a lua próxima do seu quarto crescente. Antiphon (cerca de 430 a.C.)
procurou encontrar a quadratura do círculo através de uma seqüência infinita de
polígonos regulares inscritos: primeiro um quadrado, depois um octógono, em
seguida um hexadecágono, e assim por diante (figura II. 1). Havia, entretanto, um
problema: essa seqüência nunca poderia ser concluída. Apesar disso, essa foi
uma idéia que deu origem ao método da exaustão
5
. Antiphon teria que ter usado
o conceito moderno de limite para finalizar seu processo com rigor matemático.
4
Termo que se tornou sinônimo do processo de determinar áreas.
5
O método da exaustão consiste em "exaurir" a figura dada por meio de outras de áreas (Figura II.
1) e volumes conhecidos. O caso mais conhecido é o problema da quadratura do círculo.
37
Figura II. 1
Segundo Boyer (1996), o método de exaustão é atribuído a Eudoxo
(408 355? a.C). Tal método admite que uma grandeza possa ser subdividida
indefinidamente e sua base é a proposição:
Se de uma grandeza qualquer subtrairmos uma parte não menor
que sua metade e do resto novamente subtrai-se também uma
parte não menor que a metade e se esse processo de subtração
é continuado, finalmente resta uma grandeza menor que
qualquer grandeza de mesma espécie (Ibid., 1996, p. 63).
O método de exaustão (nome dado no século XVII por Gregório de
S.Vicente) é também conhecido por Princípio de Eudoxo-Arquimedes, por ter na
sua base a teoria das proporções apresentada por Eudoxo e porque Arquimedes
(287–212 a.C.) foi o matemático que maior visibilidade lhe deu.
De acordo com Eves (2004), foi Arquimedes quem aplicou tal método
de maneira mais “elegantee quem mais se aproximou da atual e “verdadeira”
integração.
Vejamos como ele procedeu à quadratura de um segmento parabólico,
um dos exemplos mais antigos para determinação de áreas:
Sejam C, D, E os pontos do arco de segmento parabólico (Figura
97) obtidos traçando-se LC, MD, NE paralelos ao eixo da
parábola pelos pontos médios L, M, N de AB, CA, CB. Usando a
geometria da parábola, Arquimedes mostrou que
38
Figura 97
4
ACB
CEBCDA
=+
Repetindo sucessivamente esse raciocínio conclui-se que a área
do segmento parabólico é dada por
...
4
4
4
32
+
+
+
+
ABCABCABC
ABC
=
+++
...
4
1
4
1
4
1
1
32
ABC
=
ABC
3
4
Aqui o trabalho foi abreviado usando-se a fórmula da soma da
série geométrica; Arquimedes, porém, procedia por dupla reductio
ad absurdum
6
, nos moldes do método de exaustão (Eves, 2004,
p. 421).
Quando Arquimedes demonstrou que a área de um segmento
parabólico é 4/3 da área do triângulo que tem a mesma base e altura, ele
intuíra esse resultado pelo seu método mecânico. O método de exaustão serviu
como um instrumento para provar a quadratura da parábola nos moldes do
padrão de rigor matemático da época. O método por si só, não se presta para a
descoberta inicial do resultado. Em geral, o matemático descobria as fórmulas
através do método mecânico (método de equilíbrio ou da alavanca), depois as
demonstrava rigorosamente pelo método da exaustão.
6
Arquimedes mostra que a área do segmento parabólico não pode exceder 4/3 da área do
primeiro triângulo inscrito e, da mesma forma, que não pode ser menor que esse valor.
39
O tal método mecânico consistia em um esquema para equilibrar entre
si os elementos de figuras geométricas, isto é, para determinar uma área ou
volume, Arquimedes “cortava” a região correspondente em um número grande de
tiras planas ou de fatias paralelas finas e colocava esses pedaços em uma das
extremidades de uma alavanca, de tal maneira a estabelecer o equilíbrio com
uma figura de área ou volume e centróide conhecidos. (Eves, 2004, p. 422).
Segundo Ávila (2002, p. 43):
O método de demonstração indireta, com dupla redução ao
absurdo, embora proporcione rigor preciso, exige conhecimento
prévio do que se pretende demonstrar, portanto não serve como
instrumento de descoberta. O método mecânico de Arquimedes,
ao contrário, permite [...] descobrir resultados novos [...]... esse
método exige a decomposição de figuras planas em seguimentos
retilíneos ou de volumes em áreas. Assim, os corpos geométricos
são vistos como agregados de elementos ”indivisíveis“, como os
seguimentos retilíneos de figuras planas ou área no caso dos
sólidos. Mas essa concepção atomística esbarrava nas
dificuldades que o infinito trazia para o raciocínio matemático. Se
um sólido é um agregado de figuras planas, poder-se-ia obter seu
volume como a soma de uma infinidade de áreas? Ou como a
soma de infinita de volumes infinitamente pequenos? Sem
responder a perguntas como essas, Arquimedes utilizava seu
método como instrumento útil de descoberta e manifesta-se
convencido de sua eficácia nas mãos de outros matemáticos de
sua época ou do futuro.
A idéia (heuristicamente fértil) do método de equilíbrio consiste em
considerar toda grandeza como sendo formada de um número muito grande de
porções atômicas, embora essa idéia não tenha uma fundamentação rigorosa.
Resumindo, há dois aspectos nas antigas origens do lculo Integral.
Um deles é representado pelo rigoroso método de exaustão, derivado de Eudoxo;
o outro está relacionado com o método de equilíbrio de Arquimedes, derivado da
visão atomística associada a Demócrito (460–370 a.C). O primeiro, não muito
distante dos conceitos do século XIX, era um método rigoroso para estabelecer a
validade de um teorema. O último, assemelhando-se mais ao estágio do cálculo
no século XVII, fazendo uso de indivisíveis, foi um instrumento que levou à
descoberta de conclusões aceitáveis. Arquimedes explorou ambos aspectos com
sucesso, uma vez que, seu método mecânico (de equilíbrio) levou a teoremas
sobre áreas, volumes e centros de gravidade, e, am disso, demonstrava esses
40
teoremas da maneira tradicionalmente rigorosa pelo método de exaustão (Boyer,
1992, p. 7).
Eves (2004) escreve que a teoria da integração quase não foi
desenvolvida no período que vai das realizações de Arquimedes até praticamente
os tempos modernos.
Algumas contribuições medievais, no entanto, resultaram em um
avanço, no século XIV, em uma direção que havia sido evitada na antiguidade, ou
seja, a matemática arquimediana era essencialmente estática e o estudo das
mudanças dinâmicas
7
ganhava força nessa altura da idade média, pois
começavam a ser levantadas questões do tipo: se um objeto se move com
velocidade variável, até que ponto se moverá num dado tempo? Questões dessa
natureza começavam a ser discutidas, porém os intelectuais do período medieval
não tinham herdado da antiguidade nenhuma análise de variáveis matemática,
sendo assim, começaram a desenvolver, por si próprios, um cálculo integral
primitivo. Um dos matemáticos desse movimento foi Nicole Oresme (1323–1382),
que através do trabalho “Tractatus de latitudinibus formarum”, estudou as latitudes
e as variações de latitudes. Ele utilizava um método gráfico, relacionando álgebra
e geometria, e pode ser considerado um precursor da geometria anatica de
Fermat e Descartes. Seus estudos também podem ser vistos como pioneiros, no
que se refere à ciência da cinemática, mais tarde estabelecida por Galileu. Como
exemplo de seus métodos, apresentamos aqui uma demonstração do que, em
termos modernos, pode ser escrito como
=
a
a
xdx
0
2
2
. Estudando a distância
percorrida por um objeto em movimento com velocidade variável, Oresme
associava os instantes de tempo dentro do intervalo aos pontos de um segmento
de reta horizontal (longitude), e para cada um desses pontos erguia um segmento
de reta vertical (latitude), cujo comprimento representava a velocidade do objeto
no tempo correspondente. Ao conectar as extremidades dessas latitudes, obtinha
uma representação da variação funcional da velocidade com relação ao tempo.
Segundo Boyer (1992), esse é um dos mais antigos exemplos na História da
Matemática do que hoje seria chamado “gráfico de uma função”.
7
Problemas relacionados ao movimento e às mudanças de intensidade das coisas em geral (por
exemplo, da temperatura, densidade, iluminação), que recebiam o nome de latitudes.
41
Figura II. 2
Oresme sabia que a área sob este gráfico representava a distância
percorrida, pois é a soma de todos os incrementos de distâncias correspondentes
às velocidades instantâneas. Ele afirmava que se um corpo se move com
velocidade uniformemente diforme (ou seja, com taxa de variação de velocidade
uniforme), a partir do repouso em A (figura II. 2), então o gráfico seuma linha
reta formando um triângulo retângulo com a base AB (a linha de longitudes) e a
ordenada (latitude) final BC. Como a área do triângulo é a medida da base
multiplicada pela metade da medida da altura, ele concluiu que a distância
percorrida pelo objeto é a mesma que percorreria um outro corpo que se movesse
pelo mesmo espaço de tempo com velocidade uniforme igual a DE, velocidade do
primeiro objeto no ponto médio D do intervalo de tempo. O argumento utilizado
era que a representação de um objeto em movimento durante o tempo AB com
velocidade DE era o retângulo FGBA, e a distância percorrida nesse caso é dada
pela área desse retângulo, que é igual a área do triângulo ABC (Ibid., 1992, p. 9).
Na Idade Média, os avanços da matemática, foram, nem tanto no rigor,
mas na aplicação de todos novos a problemas novos. O infinito e o
infinitesimal retomam sua posição nos estudos matemáticos, em parte por causa
da perda de rigor, e o problema do movimento foi estudado quantitativamente. O
estudo do movimento, através dos infinitesimais, foi diretamente responsável pelo
desenvolvimento da diferenciação, porém nenhum método sistemático ou
terminologia para lidar com tal conceito foi desenvolvido na antiguidade ou no
período medieval.
De acordo com Baron (1985), os matemáticos (do século XV e início do
século XVI) preocuparam-se com uma grande variedade de problemas práticos,
42
por exemplo, relativos à mecânica, à agrimensura, à contabilidade, etc. Havia
mais interesse em aplicar a geometria do que em entender Euclides. no final
do século XVI, o conhecimento da matemática grega ampliou-se muito. Devido à
publicação de traduções em latim dos “Elementos” de Euclides e das “Cônicas” de
Apolônio, desenvolveram-se habilidades matemáticas, que permitiram estudos
mais aprofundados de parte
8
da obra de Arquimedes, modelo no final do século
XVI.
Stevin (1548–1620) utilizava a matemática da época, freqüentemente,
para fins práticos, contribuindo com o desenvolvimento dos princípios da estática.
Ele e Valério (1552–1618) foram os primeiros matemáticos dos tempos modernos
a usarem métodos comparáveis aos de Arquimedes, porém tentaram modificar a
estrutura da demonstração, ou seja, os dois tentaram evitar a dupla redução ao
absurdo do método de exaustão fazendo uma passagem direta ao limite (Ibid.,
1985, v. 2, p. 6).
No inicio do século XVII, o interesse em novos métodos de quadratura e
cubatura causou a introdução de novas curvas, além daquelas conhecidas pelos
gregos.
O interesse de Galileu (1564–1642) pelo movimento produziu um
desenvolvimento acentuado das propriedades das curvas geradas por
movimento, por exemplo, a ciclóide. Ele trabalhou os princípios da dinâmica e
realizou estudos que deram origem à ciência da cinemática, ou do movimento
considerado sem preocupação com suas causas. A visão de Galileu era muito
semelhante à de Oresme, e sua demonstração de que um corpo em queda livre
percorre uma distância igual à de um corpo com a metade da velocidade máxima
atingida é praticamente a mesma de Oresme.
Segundo Eves (2004), o astrônomo Kepler (1571–1630) baseou-se em
procedimentos de integração a fim de determinar as áreas (quadratura da elipse)
envolvidas em sua segunda lei do movimento planetário, e, para calcular volumes
(cubatura) de barris de vinho. Kepler tinha sua própria versão, tosca mas eficaz,
na qual os pontos de rigor refinados eram intencionalmente ignorados a fim de
8
Em meados do século XV, trabalhos de Arquimedes chegaram à Europa Ocidental através de
uma tradução de uma cópia (do século IX) de seus manuscritos (Eves, 2004, p. 424). Grande
parte de sua obra, só se tornou conhecida no início do século XX.
43
chegar às aplicações, que eram seu interesse principal. Mostramos como
exemplo que ele... (figuras II. 3 e II. 4):
[...] considerava uma circunferência como um polígono regular de
um número infinito de lados. Tomando-se cada um desses lados
como base de um triângulo cujo vértice é o centro da
circunferência, então a área do círculo correspondente fica
dividida numa infinidade de triângulos delgados, todos de altura
igual ao raio do círculo. Como a área de cada um desses
triângulos delgados é o semiproduto de sua base por sua altura,
segue-se que a área do círculo é igual ao semiproduto da
circunferência pelo raio. Analogamente, pode-se considerar uma
esfera como constituída de uma infinidade de pirâmides delgadas
de vértice (comum) no centro da esfera. Disso decorre que o
volume da esfera é um terço do produto de sua superfície pelo
raio. Embora passiveis de objeções, sob o ponto de vista do rigor
matemático, esses métodos produzem resultados corretos de
maneira bem mais simples. (Ibid., 2004, p. 424).
Em notação moderna:
....
2
1
.
2
1
.
2
1
321
+++= crcrcrÁrea
( )
...
2
1
321
+++= cccr
( )
nciacircunferêr
2
1
=
Figura II. 3
...
3
1
3
1
3
1
321
+++= rBrBrBVolume
( )
...
3
1
321
+++= BBBr
r
3
1
=
(
área da superfície esférica
)
Figura II. 4
44
Stevin, Galileu e Kepler necessitavam dos métodos de Arquimedes,
como matemáticos práticos que eram, entretanto desejavam evitar o rigor do
método de exaustão. Em grande parte foram as modificações introduzidas nos
antigos métodos infinitesimais que finalmente conduziram ao cálculo. Stevin foi
um dos primeiros a sugerir modificações (Boyer, 1996, p. 221), enquanto que
Galileu e Kepler foram os primeiros a abandonarem a estrutura de demonstração
introduzida por Arquimedes em troca do uso dos indivisíveis ou quantidades
infinitamente pequenas (Baron, 1985, v. 2, p. 11). Galileu teve contato com o
conceito de indivisíveis através das contribuições medievais à dinâmica, e Kepler,
em seu tratado sobre medida de barris de vinho, adotou os métodos mais
eficazes de Arquimedes. Porém, as integrações de Galileu e Kepler foram
ofuscadas por um tratado escrito em 1635 por Cavalieri (1598–1647), intitulado
“Geometria indivisibulus continuorum nova quadam ratione promotora”. Nesse
livro os indivisíveis eram aplicados com tanto êxito a problemas de mensuração
de áreas e volumes, que o postulado fundamental recebe o nome de “teorema de
Cavalieri”, permanece intacto nos textos elementares até os dias de hoje (Boyer,
1992, p. 11):
Se dois sólidos (ou regiões planas) têm alturas iguais, e se
secções paralelas às bases e a distâncias iguais delas estão
sempre numa dada razão, então os volumes (ou áreas) dos
sólidos (ou regiões) também estão nessa mesma razão (Ibid.,
1992, p. 11).
A idéia que estava por trás disso não era nova, ela estava relacionada
ao método mecânico de Arquimedes e às integrações de Oresme e Galileu.
Embora Cavalieri tenha concebido, de algum modo, o conceito medieval de
indivisíveis, como uma invenção ou artifício que funcionava, ele admitia que as
demonstrações de Arquimedes eram necessárias.
Segundo Eves (2004), tudo indica que um indivisível de uma porção
plana dada é uma corda dessa porção e um indivisível de um sólido dado é uma
secção desse sólido. Considera-se que uma porção plana seja formada por uma
infinidade de cordas paralelas e que um sólido seja formado por uma infinidade de
secções planas paralelas. De acordo com o autor, Cavalieri argumentava que
fazendo-se deslizar cada um dos elementos do conjunto das cordas paralelas de
45
uma porção plana dada ao longo do seu próprio eixo, de modo que as
extremidades das cordas ainda descrevam um contorno contínuo, a área da nova
porção plana é igual à da original, uma vez que ambas são formadas das mesmas
cordas. Um procedimento análogo com os elementos do conjunto das secções
planas paralelas de um lido dado fornecerá outro sólido com o mesmo volume
original. Esses resultados, generalizados, fornecem os chamados princípios de
Cavalieri:
1. Se duas porções planas são tais que toda reta secante a elas e
paralela a uma reta dada determina nas porções segmentos de
reta cuja razão é constante, então a razão entre as áreas dessas
porções é a mesma constante.
2. Se dois sólidos são tais que todo plano secante a eles e
paralelo a um plano dado determina nos sólidos secções cuja
razão é constante, então a razão entre os volumes desses
sólidos é a mesma constante (Ibid., 2004, p. 426).
Em notação moderna, ilustramos o uso dos princípios de Cavalieri para
determinar a área compreendida por uma elipse de semi-eixos a e b:
Considere a circunferência e a elipse
1
2
2
2
2
=+
b
y
a
x
,
ba
>
e
ayx =+
22
,
referidas ao mesmo sistema de coordenadas retangulares, como
mostra a figura 99.
Tirando y em função de x em cada uma dessas equações,
obtém-se respectivamente,
46
(
)
2/1
22
xa
a
b
y =
,
(
)
2/1
22
xay =
.
Daí resulta que a razão entre as duas ordenadas
correspondentes quaisquer da elipse e da circunferência é
a
b
.
Portanto a razão entre as duas cordas verticais correspondentes
da elipse e da circunferência é
a
b
. Pelo principio de Cavalieri
conclui-se que:
área da elipse =
a
b
(área do círculo)
ou
área da elipse =
(
)
aba
a
b
ππ
=
2
(Ibid., 2004, p. 426-427).
Os princípios de Cavalieri representam ferramentas úteis para o cálculo
de áreas, volumes, sendo que suas bases intuitivas podem tornar-se rigorosas
com o Cálculo Integral moderno. Com aceitação desses princípios como
evidentes, intuitivamente, podem-se resolver muitos problemas de mensuração
que requereriam técnicas avançadas de cálculo (Ibid., 2004, p. 426). Por exemplo,
em seus trabalhos posteriores, Cavalieri estendeu a integração de Oresme de
kt
,
de modo a incluir a integral de
n
kt
, enunciando o equivalente da
fórmula
+
=
+
T
o
n
n
n
kT
dtkt
1
1
. Esse resultado era conhecido, independentemente, por
outros matemáticos como Roberval, Torricelli, Fermat, Barrow e outros.
Entretanto, parece que Cavalieri foi o primeiro a publicá-lo (Boyer, 1992, p. 12).
Roberval inclusive, que manipulou com habilidade o método, proclamou-se seu
inventor (Eves, 2004, p. 428). Em outras palavras, o método dos indivisíveis não
era propriedade de Cavalieri, mas sim, estava sendo amplamente utilizado por
matemáticos da época.
Os primeiros problemas que apareceram na História relacionados com
as derivadas são aqueles referentes a questões ligadas às tangentes. Desde a
época dos Gregos antigos, se conhecia a reta tangente como sendo uma reta
que intercepta uma curva em um único ponto, generalizando a situação
47
observada no caso da circunferência. No entanto, essa idéia é muito imprecisa e
precisamos de um tratamento bem mais rigoroso para a questão da tangente à
uma curva.
Euclides (cerca de 300
A
.C.) provou o familiar teorema que diz que a
reta tangente a um círculo em qualquer ponto P é perpendicular ao raio em P.
Arquimedes e Apolônio utilizavam métodos geométricos, que diferiam entre si,
para a determinação de tangentes. O primeiro tinha, por exemplo, um
procedimento para encontrar a tangente à sua espiral, e o segundo, descreveu
métodos para determinar tangentes a parábolas, elipses e hipérboles. Mas estes
eram problemas geométricos que foram estudados apenas por seus interesses
particulares limitados, pois os gregos não perceberam nenhuma linha em comum
ou qualquer valor nestes teoremas. Problemas de movimento e velocidade,
básicos para nosso entendimento de derivadas hoje em dia, também surgiram
com os gregos antigos, embora estas questões tenham sido originalmente
tratadas mais filosoficamente que matematicamente. rios outros todos para
resolver o problema de encontrar a tangente a uma curva em um ponto foram
desenvolvidos ao longo da história.
Após os Gregos, o interesse por tangentes a curvas reapareceu no
século XVII, como parte do desenvolvimento da geometria analítica, que foi
desenvolvida, independentemente, por Descartes (1596–1650) e Fermat (1601–
1665), e cujas bases estavam lançadas desde o tempo de Oresme. A
geometria analítica significava, primeiro, que curvas podiam ser representadas
por equações. Mas como qualquer equação poderia produzir uma nova curva, os
estudiosos da geometria das curvas no começo desse século estavam se
confrontando com uma explosão delas a pesquisar e a tradição grega dos
métodos geométricos sintéticos não eram mais suficientes. A introdução de
símbolos algébricos como uma ferramenta para estudar a geometria das curvas
também contribuiu para o desenvolvimento do conceito de derivada. Com o
tempo, o tratamento se tornou mais algébrico e menos geométrico,
proporcionando um contínuo progresso no desenvolvimento dos conceitos de
funções, derivadas, integrais e outros tantos tópicos relacionados ao Cálculo.
Segundo Baron (1985, v. 2, p. 30), até então, os métodos de tangentes
eram interessantes para certos tipos de problemas, mas com o advento da
48
notação algébrica eles se tornaram logo obsoletos. Um dos defeitos desses
métodos está no fato de que as soluções dependem de propriedades especiais da
curva considerada, e desta forma cria dificuldade para serem generalizadas. Além
da determinação de tangentes, as novas curvas apresentavam problemas para a
determinação de suas áreas e perímetros.
Eves (2004, p. 428) escreve que embora as considerações sobre
problemas relativos a tangentes remontem aos gregos antigos, parece razoável
afirmar que a primeira manifestação clara do todo diferencial se encontra em
algumas idéias de Fermat, expostas em 1629. Boyer (1992, p. 15) afirma ainda
que o referido matemático foi o inventor do processo chamado “diferenciação”.
Fermat desenvolveu um método simples de achar máximos e mínimos.
Ele conhecia o fato de que os incrementos de uma curva polinomial tornam-se
infinitesimais nas vizinhanças de um ponto de máximo ou de mínimo, sendo
assim, transformou esse fato em um processo para determinar esses pontos. Em
notação moderna, eis o método: Se
)(
xf
tem um máximo ou mínimo em
x
e se
e
é muito pequeno, então o valor de
)(
exf
é quase igual ao de
)(
xf
. Portanto,
pode experimentar fazer
)()(
xfexf
e, para tornar essa igualdade correta,
impor que
e
assuma o valor zero. As raízes da equação resultante darão os
valores de
x
para os quais
)(
xf
assume um máximo ou mínimo (Eves, 2004, p.
429).
Vejamos o procedimento esboçado, considerando o primeiro exemplo
de Fermat:
Sobre um método para determinação de máximo e mínimo.
Dividir o segmento
AC
em
E
, de tal modo que o retângulo
ECAE
possa ser máximo.
Seja a reta
AC
dividida em
E
, de tal modo que o retângulo
ECAE
possa ser um máximo.
Seja
AC
igual a
B
e um dos segmentos igual a
A
: o outro será
A
B
, e o retângulo, cujo máximo procuramos, será
.
AqBA
Agora seja
E
A
a primeira parte de
B
, o resto será
E
A
B
e o retângulo formado pelos segmentos será
49
EqAEBEAqBA
2
, que consideraremos ser
aproximadamente igual a
.
AqBA
Removendo termos comuns:
EqAEBE
2~
e dividindo por
,
E
E
A
B
2
~
.
Desprezando
E
,
B
é igual a
A
2
. Para resolver o problema
devemos dividir a reta ao meio: é impossível existir um método
mais geral. (Fermat apud Baron, 1985, v. 2, p. 36).
Na tradução acima,
Aq
significa
2
A
e o símbolo ~ quer dizer
“aproximadamente igual”. A notação é a mesma utilizada por Fermat, sendo que
ele usou letras maiúsculas para representar constantes e variáveis, ao mesmo
tempo. Isso faz parecer que ele não estava muito preocupado em introduzir uma
notação apropriada. Atualmente, este método é equivalente ao cálculo de
0
)()(
lim)(
0
'
=
=
E
AFEAf
Af
E
(Baron, v. 2 p. 36). Ele ignorava que a condição de
)(
'
Af
se anular não é suficiente para se ter um máximo ou mínimo, mas apenas
necessária, além disso, seu método também não distinguia entre valor máximo e
valor mínimo (Eves, 2004, p.429). Fermat também não explicava precisamente
porque fazia
E
igual a zero, mas, de acordo com Boyer (1992, p. 15), esta falta
de clareza por parte dele não diminuiu sua genialidade, que suas idéias
ajudaram a solucionar muitos problemas referentes ao Cálculo.
Fermat desenvolveu um trabalho pioneiro não no que se refere à
diferenciação, mas também no que diz respeito à integração, pois além de um
método para determinar a tangente de curvas do tipo
n
xy
=
, ele desenvolveu um
método para determinar a integral dessas curvas que “... era o mais refinado entre
os existentes na época, e es mais próximo da integral de Riemann do que
qualquer outro anterior ao século XIX.” (Ibid., 1992, p. 14).
II. 1 Origens da Relação entre integração e diferenciação
Quando álgebra foi usada pela primeira vez para descrever curvas na
geometria analítica, podemos ver os primeiros sinais de uma conexão entre
50
tangentes e quadraturas. Em seu estudo das "parábolas de ordem superior",
n
kty
=
, onde
k
é constante e
,...4,3,2
n
, Fermat desenvolveu a fórmula
k
y
para
a subtangente em qualquer ponto sobre a curva. A partir daí, e do ponto de vista
de hoje, teria sido fácil encontrar a fórmula para a derivada, mas para Fermat,
1
n
nx
não era o objetivo. Em alguma época na década de 1640, mostrou que a
área entre qualquer uma das parábolas de ordem superior e o eixo horizontal,
para
ax
0
, era igual à área do retângulo de largura
a
e altura
1
+
k
a
n
. Hoje,
podemos ver que ele estava próximo do Teorema Fundamental do Cálculo, como
teria sido expresso em termos de suas parábolas de ordem superior. Mas aquilo
não parecia ser de seu interesse. Segundo Boyer (1992, p. 14), Fermat conhecia
as regras de diferenciação e integração. Aparentemente sabia que no primeiro
caso multiplicava-se o coeficiente pelo expoente e diminuía-se este último de uma
unidade. No segundo caso, aumentava-se o expoente de uma unidade e dividia-
se o coeficiente pelo novo expoente. No entanto, parece que ele o percebeu
nada de significativo nesta relação recíproca.
O físico e matemático italiano Evangelista Torricelli (1608–1647)
resolveu problemas propostos por Fermat relacionados com a quadratura das
curvas superiores, tais como as parábolas, as hipérboles e as espirais. Em suas
notas não publicadas a sua morte, Torricelli também desenvolveu sua
construção de retas tangentes a "hipérboles de ordem superior" de Fermat,
nm
kxy
=
, a partir da quadratura destas curvas, mas sem qualquer pista de idéias
mais abrangentes e gerais. Adicionalmente, Torricelli relacionou a construção de
retas tangentes a espirais,
nm
kr
θ
=
em coordenadas polares, à quadratura da
espiral (Boyer, 1996, p. 245–247).
De acordo com Baron (1985, v. 2 p. 39), Torricelli e também Isaac
Barrow predecessor de Newton também exploraram, de maneira sistemática,
o problema de geração de curvas através do movimento, e os resultados levaram
a uma relação entre os problemas da tangente e quadratura.
Apresentamos idéias básicas, em notação moderna, empregadas por
Torricelli, generalizando e estendendo idéias desenvolvidas por Galileu e
Cavalieri:
51
1. A noção medieval do gráfico velocidade-tempo, no qual a
distância total percorrida é representada pela área sob a curva.
2. A abordagem de Cavalieri da quadratura considerando “soma
de retas” e os resultados obtidos por Cavalieri para a quadratura
de curvas.
Assim, em um gráfico velocidade tempo, a distância s percorrida
em um tempo T é obtida tomando-se a soma das ordenadas:
e, em geral,
(Baron, 1985, v. 2, p. 41).
Ao passar de uma equação para a distância em termos de tempo para
a da velocidade como função do tempo, e inversamente, Torricelli percebeu o
caráter inverso dos problemas de quadratura e tangente. Quando ele morreu a
maior parte de seu trabalho não havia sido publicada. Se tivesse vivido mais é
possível que se tornasse o inventor do Cálculo (Boyer, 1996, p. 247).
Os resultados de Torricelli eram bem conhecidos de seus alunos,
principalmente Vincenzo Viviani (1622–1703), e através dele, James Gregory
(1638–1675) e Isaac Barrow (1630–1677) quando estes posteriormente viajaram
52
e estudaram na Itália. Desta maneira, muitas das técnicas do que agora
chamamos de cálculo foram transmitidas para a Inglaterra.
Gregory, um dos predecessores de Newton, publicou, enquanto estava
na Itália, dois trabalhos
9
. Em um deles, que continha resultados muito
significativos em análise infinitesimal, preocupou-se em estender e generalizar o
método de exaustão, no qual a quantidade requerida
L
era inserida entre
seqüências de figuras inscritas (
I
) e circunscritas (
C
), ou seja,
123321
...... CCCCLIIII
nn
<<<<<<<<<<
. O outro Geometriae foi o
primeiro tratado sistemático contendo operações para a determinação de arco,
tangente, área, e volume, que apareceriam em um trabalho de cálculo
infinitesimal (Baron, 1985, v. 2, p. 42). Em uma parte desse trabalho, envolvendo
retificação (encontrar o comprimento de um segmento de uma curva), Gregory
considerou a área entre a curva
y
e o eixo
t
, começando em
a
t
como uma
função do extremo direito,
x
t
. Então encontrou a reta tangente a esta nova
curva em
x
t
e mostrou que sua inclinação neste ponto era igual à ordenada
y
,
da curva original. Este processo aproximou Gregory do Teorema Fundamental do
Cálculo, e foi sua tentativa de resumir e organizar a geometria do cálculo como
ele a conhecia (o muito da qual tinha aprendido durante seus estudos na Itália).
Ele não não procurava o Teorema Fundamental do Cálculo aqui, como
também não estava usando as fórmulas convenientes usadas hoje em dia.
Newton seguiu Gregory (1638–1675) ao pensar na área da região entre uma
curva e o eixo horizontal como uma variável; o extremo esquerdo era fixo, mas o
extremo direito podia variar. Este truque lhe permitiu estender algumas fórmulas
de quadratura de Wallis e o levou ao Teorema Fundamental do Cálculo.
Segundo Boyer (1996), Geometriae apresenta um tratamento
essencialmente geométrico que não o torna fácil de entender. O autor ainda
afirma que se Gregory
[...] tivesse expresso sua obra analiticamente poderia ter-se
antecipado a Newton na invenção do cálculo, pois conhecia
virtualmente todos os elementos fundamentais pelo fim de 1688.
Conhecia muito bem quadraturas e retificações e provavelmente
9
Respectivamente: Vera circuli et hyperbolae quadratura” e “Geometriae pars universalis”, neste
o tratamento era essencialmente verbal e geométrico (Baron, 1985, v. 2 p. 44).
53
percebia que eram inversas de problemas de tangentes. (Ibid., p.
265).
Eves (2004, p. 431) afirma que os predecessores imediatos de Newton
na Inglaterra foram Wallis e Barrow.
John Wallis (1616–1703) fez uso sistemático das séries em análise,
contribuindo muito nesse campo para abrir caminho para Newton. Em um de seus
tratados, ele expõe a primeira discussão a respeito das cônicas como curvas de
segundo grau, em vez de considerá-las como secções de um cone, além disso,
ajudou a tornar “inteligível” a geometria de Descartes, nova, porém de escrita
obscura (Boyer, 1992, p. 40). Também inventou o símbolo
para infinito e, ao
usá-lo, obscureceu lugares onde agora sabemos que deveria ter usado o limite.
Todo o processo geométrico desenvolvido por Cavalieri foi aritmetizado
por Wallis. Em seu trabalho Arithmetica infinitorum”
10
(1655), Wallis desenvolveu
princípios de indução e interpolação que o levaram a encontrar diversos
resultados, por exemplo, ele estendeu a fórmula de quadratura
n
kxy =
para casos
quando
n
era um número racional diferente de -1, usando indivisíveis, razões
inteligentes e apelos ao raciocínio por analogia. A dependência de Wallis em
fórmulas o levou a várias quadraturas interessantes.
Baron (1985, v. 2, p. 56) escreve que, através da publicação de
Arithmetica, um grande interesse na possibilidade de expansão em série como
um meio de integração foi estimulado por Wallis, que conhecia o problema da
“quadratura” do círculo através de expansão em série de
)1(
2
x
.
Vejamos em um exemplo, utilizando notação moderna, como ele
procurou determinar
π
buscando uma expressão para a área
4
π
, de um
quadrante do círculo
1
22
=+ yx
. Isso equivale a calcular
1
0
2/12
)1( dxx
, o que ele
não tinha condões de fazer diretamente, pois não conhecia o teorema geral do
binômio. Ele sabia como achar as áreas representadas por
1
0
02
)1( dxx
,
10
Livro que apesar de algumas imperfeições lógicas, manteve-se como um tratado modelo por
muitos anos.
54
1
0
12
)1( dxx
,
1
0
22
)1( dxx
, e assim por diante, sendo essas áreas iguais a
,
15
8
,
3
2
,1
..., respectivamente. Essa seqüência levou Wallis a considerar o problema
da determinação da lei que para
,...3,2,1,0
n
forneceria a seqüência precedente.
O que ele procurava era o valor interpolado dessa lei para
2
1
=n
. E, por um
processo complicado, finalmente deduziu a expressão para
2
π
como o produto
infinito
...
7
7
5
5
3
3
1
...8664422
. Os matemáticos da época, freqüentemente, recorriam a
processos de interpolação para calcular quantidades que não conseguiam obter
diretamente (Eves, 2004, p. 432).
Enquanto as principais contribuições de Wallis ao cálculo situam-se na
teoria da integração, as mais importantes de Barrow talvez sejam aquelas ligadas
à teoria da diferenciação (Eves, 2004, p. 433).
Na época que Isaac Barrow (1630–1677) estava escrevendo “Lectiones
opticae” (1669), recorreu à ajuda de Newton (Boyer, 1996, p. 267). Este, por sua
vez, beneficiou-se de partes dessa obra referentes a novas maneiras de
determinar áreas e tangentes a curvas. Nesse livro, o método de Barrow foi muito
significativo para os desenvolvimentos posteriores do cálculo, no que se refere à
determinação de tangentes a curvas pelo uso do triângulo diferencial (Boyer,
1992, p. 42). Vejamos, por exemplo, como Barrow expôs seu método:
suponhamos que se pretenda obter a tangente
t
à curva no ponto
P
(figura II. 5).
Sendo assim, ele determinava um outro ponto
T
em
t
do seguinte modo: seja
Q
um ponto da curva, então, como
P
e
Q
são pontos vizinhos, os triângulos
PTM
e
PQR
são praticamente semelhantes, em especial quando o triângulo menor
torna-se infinitamente pequeno, de modo que pode-se escrever
TM
MP
QR
RP
=
)1(
aproximadamente.
55
Figura II. 5 (Boyer, 1992, p. 43)
Indicando as coordenadas de
P
e
Q
respectivamente por
),( yx
e
),( ayex
, e substituindo esses valores na equação da curva dada e
desprezando os termos envolvendo potências de
a
e
e
de expoentes maiores
que 1, pode-se achar a razão
e
a
. Como
M
é um ponto conhecido, pode-se agora
achar
T
(sobre o eixo x) usando o comprimento do segmento
TM
, dado por
e
a
y
, conseqüência direta de
)1(
(Boyer, 1992, p. 43).
Como ilustração, apliquemos o método à
333
ryx =+
(uma particular
curva de Lamé). Como
Q
“está” na curva, suas coordenadas satisfazem a
equação, então
333
)()( rayex =+
,
ou
332233223
3333 rayaayyexeexx =+++
.
Desprezando os quadrados e as potências superiores de
e
e
a
, além
de usar o fato de que
333
ryx =+
, obtém-se
033
22
=+ ayex
,
do que resulta
56
2
2
y
x
e
a
=
(Eves, 2004, p. 434).
O referido aspecto significativo do método de Barrow para o
desenvolvimento posterior do Cálculo não foi a construção efetiva da reta
tangente, mas sim a razão
e
a
. Se ele tivesse dividido por
e
e depois desprezado
termos, seu método seria quase idêntico à seqüência de passos que
freqüentemente seguimos ao aplicar a definição moderna de derivada. Isto pode
ser visto fazendo-se
ex
=
e
ay
no procedimento.
Barrow foi o primeiro professor da cadeira Lucasiana de Matemática e
Filosofia Natural em Cambridge. Devido às semelhanças em educação e
formação, suas Lectiones geometricae” (1670) e o “Geometriae pars universalis”,
de Gregory cobriram praticamente o mesmo assunto (Baron, 1985, v. 2, p. 47). O
trabalho de Barrow se aprofundou de alguma maneira nos esforços do século
XVII levando ao desenvolvimento do cálculo. Em particular, ele mostrou no
mínimo uma compreensão intuitiva do fato que tangentes e quadraturas eram
operações inversas. Ao discutir velocidade e distância, mostrou como a reta
tangente a uma curva poderia levar à construção e quadratura de outra curva, e
vice-versa. Em seu tratado, Lectiones geometricae, primeiro mostrou
geometricamente que a área entre uma curva crescente, mas arbitrária,
)(tf
, e o
eixo horizontal,
x
t
a
, era igual a
y
vezes a subtangente de uma curva
auxiliar,
)(xh
, onde
y
é a ordenada da curva dada em
x
t
. A linguagem
geométrica de Barrow provavelmente escondeu o fato de que seu
)(xh
era, na
realidade, um múltiplo constante do que agora chamamos de antiderivada,
)(xF
.
Mais além, ele provou um teorema relacionando a soma de retângulos
infinitesimais preenchendo a região entre uma curva e o eixo horizontal,
bta
,
ao retângulo cuja largura é uma constante e cuja altura é
)()( aFbF
em notação
moderna. Desta maneira, antecipou o Teorema Fundamental do Cálculo. Esse
tratado foi o ápice dos processos geométricos do culo XVII que levaram às
nossas modernas derivada e integral. Embora seu aluno e protegido Newton, o
tenha encorajado a incluir alguns métodos algébricos adicionais no seu trabalho,
57
Barrow era no fundo um geômetra muito talentoso. Assim parece que não
percebeu que o cálculo, através do Teorema Fundamental do Cálculo, é uma
“entidade intelectual única”. Em resumo, sua descrença no poder dos métodos
algébricos foi, em parte, responsável pelo fato de que ele não transformou suas
descobertas geométricas em um procedimento analítico geral e efetivo. Apesar
disso, ele foi responsável por numerosos teoremas sobre quadraturas e
tangentes, e talvez o reconhecimento mais claro na época do significado das
relações entre esses dois tipos de problemas. Todas as suas proposições,
entretanto, foram apresentadas em formas geométricas que envolviam
construções complicadas e não naturais, ao invés de um simbolismo adequado.
Se elas fossem reapresentadas nos termos do cálculo, seriam equivalentes a
muitas das regras-padrão e dos teoremas de diferenciação e integração, incluindo
o Teorema Fundamental do Cálculo (Boyer, 1996, p. 267-268).
Apesar de todo o desenvolvimento do Cálculo apresentado até a
época de Barrow, necessitava-se de uma fundamentação lógica
para o mesmo, bem como de um simbolismo geral apropriado e
da criação de regras analíticas formais. Em resumo, era preciso
um Cálculo manipulável e aplicável. Neste contexto, surgem
Newton e Leibniz que, apesar de terem trabalhado
independentemente e de forma diferente, contribuíram com a
criação do almejado Cálculo aplicável e de caráter universal,
caracterizado como base para o Cálculo moderno (Palaro, 2006,
p. 83).
II. 2 Newton e Leibniz
Um grande número de resultados bem sucedidos que tinham sido
acumulados tornou possível perceber mais claramente o advento de um modelo
padrão, de um quadro organizado, que por sua vez despertou o interesse para o
estabelecimento de regras algorítmicas, e graças a elas, foi logo possível formular
resultados e evitar várias passagens ao mesmo tempo. Gregory e Barrow, por
volta de 1670, tentaram estabelecer esse quadro organizado, porém os seus
esforços não foram reconhecidos,que eles preferiam referir-se aos métodos da
geometria euclidiana e à estrutura das demonstrações de Arquimedes, enquanto
58
a tendência da época ainda favorecia os métodos algébricos não rigorosos
(Baron, 1985, v. 3, p. 5).
A tradição atribuiu a Newton e Leibniz um papel central na invenção do
Cálculo, e ainda que este não tenha começado nem terminado com estes dois
matemáticos, cabe a eles um grande mérito (Ibid., 1985, v. 3 p. 5), pois, de forma
independente, ambos unificaram os procedimentos de resolução apresentados
por seus predecessores, reconheceram a natureza inversa da diferenciação e da
integração, estabeleceram rmulas, regras e algoritmos possíveis de serem
aplicados a uma ampla classe de curvas, possibilitando a resolução de muitos
problemas com um mínimo de esforço (Boyer, 1992, p. 17).
II. 2. 1 Contribuições de Newton ao Cálculo
Segundo Boyer (1992, p. 19) a contribuição de Isaac Newton (1642–
1727) o é nem tanto uma lei para a diferenciação ou para a integração, ou
mesmo a revelação destas como operações inversas entre si, mas sim, que o
elemento essencial em sua invenção do Cálculo foi o reconhecimento de que tudo
isso constitui parte de uma nova análise a aplicação de processos infinitos ao
estudo geral de funções de qualquer tipo.
A orientação de Newton foi atribuída a Barrow, mas é certo que ele
nunca foi seu orientador, em qualquer sentido formal. A relação entre eles se deu
através de algumas aulas que abordavam problemas de espaço, tempo e
movimento, além do que, Barrow provavelmente emprestava e recomendava
livros (Baron, 1985, v. 3 p. 8). Entre outras obras, Newton estudou os Elementos
de Euclides, Miscellanae de Schooten, La géométrie de Descartes, trabalhos de
Kepler e Viète, a Clavis de Oughtred e Arithmetica infinitorun de Wallis. Não
demorou muito para que ele passasse a criar e desenvolver sua própria
matemática, primeiro descobrindo o teorema do binômio generalizado, depois
inventando o método dos fluxos, como ele chamava o atual cálculo diferencial
(Eves, 2004, p. 436).
Boyer (1996) escreve que o teorema do binômio generalizado foi
descoberto em 1664 ou 1665, porém foi anunciado pela primeira vez por Newton
59
em uma carta de junho de 1676, enviada a Oldenburg (1615?–1677), mas
destinada a Leibniz. Em uma segunda carta de outubro do mesmo ano Newton
explicou detalhadamente como tinha chegado a essa série binominal. Ele
escreveu que no começo de seu estudo de matemática deu com o trabalho de
Wallis sobre a determinação da área (de
0
=
x
a
x
x
) sob curvas, cujas
ordenadas são da forma
(
)
n
x
2
1
. Examinando as áreas para expoentes
n
iguais
a
3,2,1,0
e assim por diante ele observou que o primeiro termo sempre é
x
, o
segundo
3
3
0
x
ou
3
3
1
x
ou
3
3
2
x
ou
3
3
3
x
conforme a potência n seja 0 ou 1 ou
2 ou 3 e assim por diante. Por isso, pelo princípio de Wallis de interpolação
Newton assumiu que os primeiros dois termos na área para
2
1
=n
deveriam ser:
3
2
1
3
x
x
.
Do mesmo modo, procedendo por analogia, ele achou outros termos, os cinco
primeiros sendo:
9
128
5
7
16
1
5
8
1
3
2
1
975
3
xxx
x
x .
Percebeu então que o primeiro resultado poderia ter sido achado
obtendo primeiro
( )
=
8642
2
1
2
128
5
16
1
8
1
2
1
11 xxxxx
por interpolação com
o mesmo processo e depois achando a área por integração dos termos dessa
série. Em outras palavras, Newton não passou diretamente do triângulo de Pascal
para o teorema binominal, mas indiretamente de um problema de quadratura para
o teorema binominal.
É provável que tenha sido benéfico para o futuro da obra de Newton
que ele seguisse esse caminho indireto, pois isso tornou claro para ele que era
possível operar com séries infinitas de modo muito semelhante ao usado para
expressões polinomiais finitas. A generalidade dessa nova análise infinita foi
então confirmada para ele quando ele obteve a mesma série infinita por extração
da raiz quadrada de
2
1 x
pelo processo algébrico usual, verificando finalmente o
60
resultado por multiplicação da série infinita por ela mesma para recuperar o
radicando original
2
1 x
. Assim também Newton verificou que o resultado obtido
para
(
)
1
2
1
x
por interpolação (isto é o teorema binominal para
1
=
n
)
concordava com o resultado obtido por divisão.
Por esses exemplos Newton tinha descoberto algo muito mais
importante que o teorema binominal; ele tinha verificado que a análise por séries
infinitas tinha a mesma consistência interior, e estava sujeita às mesmas leis
gerais, que a álgebra de quantidades finitas. As séries infinitas não deveriam
mais ser consideradas apenas como instrumentos de aproximação; eram outras
formas das funções que representavam. Como Wallis expressou a idéia em sua
Álgebra ao descrever o teorema binominal de Newton, essas séries infinitas ou
séries convergentes "indicam a designação de alguma quantidade particular por
uma Progressão regular de quantidades, que continuamente se aproximam dela,
e que se prolongadas infinitamente, devem ser iguais a ela”.
O próprio Newton nunca publicou o teorema binominal, nem o provou;
mas redigiu e finalmente publicou várias exposições de sua análise infinita. A
primeira dessas, cronologicamente, foi a De analysi per aequationes numero
terminorum infinitas”.
A partir dessas idéias de Newton, outros não mais tentaram evitar
processos infinitos, como tinham feito os gregos, pois esses eram agora
considerados como matemática legítima.
Em síntese, o método das séries infinitas foi uma ferramenta
indispensável para Newton na quadratura das curvas e na retificação dos arcos.
Mediante a expansão em séries, ele foi capaz de resolver a integral de
expressões que envolviam raízes, integrando-as termo a termo (Baron, 1985, v. 3
p. 19).
A De analiysi de Newton foi de grande importância por ser a primeira
exposição sistemática da principal descoberta matemática de Newton - o Cálculo.
Barrow, o mais importante dos mentores de Newton, era primariamente um
geômetra, e o próprio Newton foi freqüentemente descrito como um expoente da
geometria pura; mas os primeiros esboços manuscritos de suas idéias mostram
que Newton usava livremente a álgebra e uma variedade de instrumentos
algorítmicos e notações.
61
Em 1666 ele não tinha ainda desenvolvido sua notação para fluxos,
mas tinha formulado um método sistemático de diferenciação que o estava
muito longe do publicado em 1670 por Barrow. Basta substituir o
a
de Barrow
pelo
qo
de Newton e o
o
de Barrow pelo
po
de Newton para chegar à primeira
forma dada ao cálculo por Newton. Evidentemente, para Newton
o
representava
um intervalo de tempo muito pequeno e
op
e
oq
pequenos incrementos pelos
quais
x
e
y
variam nesse intervalo.
A razão
p
q
, portanto será a razão das taxas instantâneas de variação
de
x
e
y
, isto é, a inclinação da curva
0),(
yxf
. A inclinação da curva
mn
xy =
,
por exemplo, é encontrada a partir de
(
)
(
)
mn
opxoqy +=+ expandindo ambos os
lados pelo teorema binominal, dividindo tudo por
o
, e desprezando os termos que
ainda contenham
o
, sendo o resultado:
1
1
=
n
m
y
x
n
m
p
q
ou
1
=
n
m
x
n
m
p
a
Os expoentes fracionários não preocupavam Newton, pois seu
método de séries infinitas lhe tinha dado um algoritmo universal. Lidando mais
tarde com uma função explícita só de
x
Newton abandonou seu
p
e
q
e usou
o
como pequena variação da variável independente, notação que foi tamm usada
por Gregory. Em De analysi, por exemplo, Newton provou como segue que a área
sob a curva
nm
axy
/
= é dada por:
1)/(
1)/(
+
+
nm
ax
nm
Seja z a área, então teremos:
nnm
ax
n
m
n
z
/)( +
+
=
Parece ser essa a primeira vez na história da matemática que uma área
foi achada pelo inverso do que chamamos diferenciação, embora a possibilidade
de usar tal processo evidentemente fosse conhecida por Barrow e Gregory, e
talvez também por Torricelli e Fermat. Newton tornou-se o efetivo inventor do
cálculo porque foi capaz de explorar a relação inversa entre inclinação e área
através de sua nova análise infinita. Por isso é que mais tarde ele viu com maus
62
olhos toda tentativa de separar seu cálculo de sua análise por séries infinitas
(Boyer, 1996, p. 272).
Em 1671, Newton escreveu o ”Tractatus de methodis serierum et
fluxionum” método dos fluxos que foi publicado em 1736. Nesse trabalho,
ele considerava que uma curva era gerada pelo movimento contínuo de um ponto.
Com base nessa suposição, a abscissa e a ordenada de um ponto gerador
passam a ser, em geral, quantidades variáveis. A uma quantidade variável ele
dava o nome de fluente e à sua taxa de variação dava o nome de fluxo do fluente.
Se um fluente, como a ordenada do ponto gerador, era indicada por
y
, então o
fluxo desse fluente era denotado por y
&
. Em notação moderna esse fluxo equivale
a
dt
dy
, em que
t
representa o tempo (ou uma quantidade que varie de maneira
constante). Esse taxa de crescimento constante de alguma fluente é o que
Newton chamava fluxo principal, podendo o fluxo de qualquer outro fluente ser
comparado com esse fluxo principal. Ele indicava o fluxo de y
&
por y
&&
e assim por
diante. Por outro lado, denotava o fluente de
y
pelo próprio
y
no interior de um
pequeno quadrado, ou às vezes por
|
y . Introduziu também um outro conceito,
chamado por ele de momento de um fluente: trata-se do incremento infinitamente
pequeno sofrido por um fluente como
x
, por exemplo, num intervalo de tempo
infinitamente pequeno
o
. Assim, o momento do fluente
x
é dado por ox
&
. Newton
salientou que podemos, em qualquer problema, desprezar os termos que
aparecem multiplicados por potências de
o
iguais a ou maiores que 2 e obter
assim uma equação envolvendo as coordenadas
x
e
y
do ponto gerador da
curva e seus fluxos x
&
e y
&
(Eves, 2004, p. 439). Como exemplo consideremos a
curva
0
axy . Substituindo
x
por oxx
&
+
e
y
por oyy
&
obtemos
0
aoyoxoyxoyxxy
&&&&
. Mas, por hipótese,
0
axy , que, portanto, sendo
eliminada e os termos remanescentes sendo divididos por
o
, resulta em
0
oyxyxxy
&&&&
. Mas, como se supõe
o
infinitamente pequeno para que possa
representar momentos de quantidades, os termos que estão multiplicados por ele
nada serão em relação ao resto. Portanto descartamo-los e resta:
0
xyyx
&&
.
(Boyer, 1992, p. 49).
63
Em resumo, no tratado sobre fluxos encontram-se formulados os dois
problemas fundamentais que correspondem à diferenciação e à integração. No
primeiro, dada uma relação ligando alguns fluentes, pretende-se estabelecer uma
relação envolvendo esses fluentes e seus fluxos isso é equivalente à
diferenciação. No segundo, dada uma relação entre alguns fluentes e seus fluxos,
pretende-se achar uma relação envolvendo apenas os fluentes. Trata-se do
problema inverso, que equivale a resolver uma equação diferencial (Baron, 1985,
v. 3, p. 36).
De acordo com Palaro (2006, p. 97):
Newton enuncia claramente os problemas fundamentais do
Cálculo: ‘Sendo dada a relação das quantidades fluentes,
encontrar a relação de suas fluxões. E inversamente’. Com isso,
ele está dizendo que considerando um ponto em movimento,
esse movimento é descrito, dando a posição e a velocidade do
ponto em relação ao tempo. Chama a relação posição-tempo de
fluente e a relação velocidade-tempo de fluxão; qualquer uma das
relações sendo dada, a outra pode ser determinada. Além de
descobrir o Teorema Fundamental do Cálculo, usa-o para
resolver problemas de cálculo de áreas.
A idéia de desprezar termos em que
o
aparece com expoente igual a
ou maior que 2 foi justificada mais tarde por ele através de idéias primitivas sobre
limites (Eves, 2004, p. 439), que foram escritas em seu tratado “De quadratura
curvarum” (1676) e dessa vez tentou evitar tanto quantidades infinitamente
pequenas quanto quantidades que fluem, substituindo-as por um princípio de
“primeiras e últimas razões”. Ele achava a “primeira razão de aumentos
nascentes” ou a “última razão de incrementos evanescentes” como segue.
Suponhamos que se procure a razão das variações de
x
e
n
x . Seja
o
o
incremento de
x
e
nn
xox +
)(
o correspondente incremento de
n
x . Então a
razão dos incrementos será
+
+
21
2
)1(
:1
nn
ox
nn
nx
Para achar a primeira e última razão faz-se
o
desaparecer, obtendo
a razão
)(:1
1
n
nx . Aqui Newton realmente se aproxima do conceito de limite, a
objeção principal sendo o uso da palavra “desaparecer”. “Existe realmente uma
64
razão entre incrementos que desapareceram?” (Boyer, 1996, p. 273). Newton não
esclareceu a questão e ela continuou a perseguir os matemáticos durante todo o
século XVIII.
II. 2. 2 Contribuições de Leibniz ao Cálculo
Quando Leibniz (1646–1716) foi a Paris em 1672 em missão
diplomática, seus conhecimentos de matemática eram muito superficiais, apesar
disso, foi introduzido a idéias emergentes de Cálculo por Christiaan Huygens
(1629–1695), um membro da nova Academia Francesa. Leibniz estudou muitos
dos trabalhos de autores
11
de matemática avançada, e relatou que aqueles de
Blaise Pascal (1623–1662) eram especialmente úteis. A maior parte dos escritos
de Leibniz sobre cálculo recaíram em três grupos: seus manuscritos - quase todos
diários - começaram enquanto ele estava em Paris; os artigos que publicou no
Acta Eruditorum nas décadas de 1680 e 1690; e um manuscrito, History and
Origin of the Differential Calculus (1714). Entre 1672 e 1676 ele estudou e
familiarizou-se como métodos infinitesimais e fez muitas descobertas
matemáticas, criando seu Cálculo, com a descoberta do Teorema Fundamental
do Cálculo e uma notação para o mesmo, bem como fórmulas elementares de
diferenciação (Eves, 2004, p. 442).
Uma das principais preocupações de Leibniz era uma boa notação, e foi
feliz em desenvolver a mesma que usamos hoje (Boyer, 1992, p. 50). Ele sempre
teve como objetivo encontrar uma linguagem simbólica geral, pela qual pudesse
traduzir todos os processos de raciocínio e argumentação, por meio de regras
lógicas, facilitando a obtenção de conhecimentos e propiciando novas invenções
(Baron, v. 3, p. 43).
Durante um período em Paris, Leibniz realizou estudos que se referem
às seqüências de diferenças, aos triângulos característicos, à transmutação e à
série
π
. Baron (1985) escreve que tais estudos foram importantes porque
continham as idéias que ele utilizou posteriormente na sua invenção do Cálculo.
11
Leibniz estudou trabalhos de Barrow, Cavalieri, Descartes, dentre outros.
65
De acordo com palaro (2006, p. 100), Leibniz iniciou suas descobertas,
assim como Newton, na área do Cálculo, com trabalhos que envolviam séries
infinitas, analisando a relação inversa entre somas e diferenças de seqüências
numéricas.
Foi proposto por Huygens a Leibniz que resolvesse o problema de
somar a série cujos termos são os valores recíprocos dos números triangulares,
que são 1, 3, 6, 10, 15,...,
2
)1(
rr
,etc. Portanto, ele deveria calcular
=
+
1
)1(
2
r
rr
.
Leibniz descobriu que as seqüências, cujos termos podem ser expressos como
diferenças, são facilmente somadas, e assim aplicou essa idéia ao problema de
Huygens, chegando ao resultado
2
)1(
2
1
=
+
=r
rr
.
O resultado serviu de incentivo para que Leibniz encontrasse muitas
outras somas de seqüências e adquirisse muita habilidade para somar séries
infinitas, o que se tornou importante para sua invenção do Cálculo. Ele escreve
que “somar seqüências e tomar as suas seqüências de diferenças são operações
mutuamente inversas num certo sentido” (Leibniz apud Baron, 1985, v. 3 p. 46), e
aplica esse conhecimento à adição de inúmeras séries diferentes, estendendo a
idéia à geometria. Ele notou (como outros matemáticos) que o problema da
quadratura poderia ser considerado como a adição de uma seqüência de
ordenadas eqüidistantes (figura II. 6). Se a distância entre as ordenadas é igual a
Figura II. 6 (Baron, 1985, v. 3, p. 46)
1, então a soma das ordenadas é aproximadamente igual à área da curva. Desse
modo, as diferenças das ordenadas consecutivas na seqüência dão
66
aproximadamente o declive das tangentes. Se a unidade 1 for escolhida menor,
as aproximações da área e do declive da tangente vão se tornar melhores.
Leibniz esperava que, se a unidade fosse escolhida infinitamente pequena, as
aproximações iriam se tornar exatas. Dessa maneira ele notou uma analogia
entre o cálculo de diferenças finitas e de somas, por um lado, e a determinação
de áreas e de tangentes pelo outro: a adição das seqüências corresponderia à
quadratura de curvas e tomar as diferenças corresponderia à determinação das
tangentes. A relação inversa entre tomar somas e diferenças sugeriu a Leibniz
que “as determinações de áreas e de tangentes também são operações inversas”
(Leibniz apud Baron, 1985, v. 3, p. 46). Assim sendo, nasceu, apesar de estar
indefinida nesse período, a idéia de um cálculo de diferenças infinitamente
pequenas e de somas de seqüências de ordenadas que servissem para resolver
os problemas de quadraturas e de tangentes, problemas cuja reciprocidade foi
reconhecida.
Visto que as idéias de Leibniz sobre integrais, derivadas e cálculo em
geral foram desenvolvidas a partir de analogias com somas e diferenças,
tomemos um exemplo, para o Teorema Fundamental do Cálculo: se fosse dada
uma seqüência finita de números tais como
216 e 125, 64, 27, 8, 1, 0, :Y
, com
diferenças
91 e 61, 37, 19, 7, 1, :y
, ele notou que a soma das diferenças,
125) - (216 8) - (27 1) - (8 0) - (1 ++++=
y
se alternavam em torno da diferença
entre o primeiro e o último valor de
Y
, ou seja,
0 - 216
. Agora, para Leibniz, uma
curva era um pogono feito de um número infinito de lados, cada um com
comprimento “infinitesimal”. Então, escreveu em 1680, “Eu represento a área de
uma figura pela soma (infinita) de todos os retângulos limitados pelas ordenadas e
diferenças das abscissas”, isto é, como
ydx
. Então, “elevando a alturas
maiores” se baseando na analogia com somas finitas e diferenças, Leibniz
afirmou que ao encontrar a área representada por
ydx
, deve-se encontrar uma
curva
Y
tal que as ordenadas
y
são diferenças de
Y
, ou
dY y
. Em termos
modernos,
Y
é nossa antiderivada, e assim, Leibniz formulou uma afirmação
inicial de parte do Teorema Fundamental do Cálculo. Posteriormente, em um
artigo de 1693 no Acta Eruditorum, Leibniz escreveu, “o problema geral de
quadraturas pode ser reduzido a encontrar uma curva que tenha uma dada lei de
67
tangência”, e continuou a especificar esta lei na forma da outra parte do Teorema
Fundamental do Cálculo.
Huygens aconselhou Leibniz a estudar obras de Cavalieri, Descartes,
Sluse, Pascal, Barrow, Gregory e outros, pois notou que ele possuía
conhecimentos limitados destes autores. Leibniz, ao ler Pascal, encontrou uma
passagem na qual ocorre o “triangulo característico”. Percebeu que, além do
círculo, o uso desse triângulo poderia ser generalizado e aplicado a curvas
arbitrárias (Baron, 1985, v. 3 p. 47).
De acordo com Boyer (1992), ao ler um manuscrito em 1675, Leibniz
obteve o que chamou um triângulo “característico” (figura II. 7),
Figura II. 7 (Ibid., p. 45)
e procedeu basicamente da seguinte maneira:
y
p
a
l
= (provavelmente ele
imaginava esses segmentos como lados, em um sentido intuitivo e aproximado,
de triângulos semelhantes). Daí
""
ylretparet
(Ibid., 1992, p. 45). Somando
esses retângulos, Leibniz escreveu primeiro, na notação de Cavalieri,
(1) ylomnpaomn
..
(
.
omn
representa “todos”);
mas no mesmo manuscrito ele disse “será útil escrever ...
l
em vez de omn. l,
isto é, a soma dos l (Leibniz apud Boyer, 1992, p. 46), usaremos o sinal
antes
de ele o ter feito. Então a equação (1) torna-se
(2)
= ylpa
68
em que a soma,
yl é de
0
a
y
e assim fornece a área,
2
2
y
, de um triângulo
isósceles reto (figura II. 8). Dessa forma, Leibniz obteve a relação
(3)
==
2
2
y
ylpa
ou
==
y
y
ydypdx
0
2
2
,
Figura II. 8 (Ibid., p. 45)
como é que se prefere pensar na integração hoje. Leibniz, naturalmente, estava
apenas começando a desenvolver essas idéias. Se assumimos, como Leibniz
implicitamente o fazia, que curva passa pela origem, então podemos escrever
pdx como
x
pdx
0
.
A transmutação (1673) consiste em uma regra geral de transformação
para as áreas sob curvas. Leibniz utilizou o triângulo característico para deduzir
tal regra. O teor da transmutação pode ser resumido de seguinte maneira: a área
sob uma curva pode ser considerada como sendo a soma das áreas de
retângulos pequenos, mas também como sendo a soma das áreas de triângulos
pequenos. Essa regra de transformação reduz a quadratura de uma curva dada C
à quadratura de uma outra curva C’ que pode ser construída a partir de C,
69
mediante suas tangentes. Segundo Baron (1985, v. 3, p. 48), a regra é útil nos
casos em que a quadratura da curva C’ é, por acaso, mais simples do que a
quadratura da curva C.
Com a utilização da regra de transmutação, aplicada a um grande
número de curvas, Leibniz pode deduzir, por exemplo, a quadratura das
parábolas e das hipérboles superiores. Entretanto, o mais importante foi a
aplicação da regra à quadratura do círculo, através da qual ele encontrou a rie
...
11
1
9
1
7
1
5
1
3
1
1
4
+++=
π
etc, chamada de série de Leibniz na Europa, porém
na Inglaterra é chamada de Série de Gregory, que este a encontrou mais cedo
(em 1671).
De acordo com Baron (1985), essas regras de transformação foram
muito importantes para o Cálculo que Leibniz inventou mais tarde. Ele ficou
impressionado com o poder de tais regras para resolver problemas de
quadraturas. Sendo assim, ele estava ciente de uma linguagem simbólica geral
para a matemática infinitesimal e que tal linguagem deveria cobrir em particular
essas regras de transformação. E foi exatamente isso que o (
,
d ) simbolismo de
Leibniz, inventado em 1675, conseguiu.
De forma resumida, e de acordo com Baron (1985), exporemos as três
idéias importantes que fundamentaram a invenção do Cálculo de Leibniz:
O interesse dele pelo simbolismo e pela notação, vinculado à sua idéia de
uma linguagem simbólica geral – ele cria o mbolo
para indicar somas e
passa a usar d para indicar diferenças, operação inversa de
. E ainda,
ansiando uma simbologia que traduzisse os argumentos do Cálculo,
desenvolve regras (não todas) operacionais para
e d .
O reconhecimento de que somar seqüências e tomar as suas diferenças
são operações inversas e que, semelhantemente, a determinação de áreas
e a de tangentes são operações inversas – essa reciprocidade é dada pelo
Teorema Fundamental do Cálculo;
O triângulo característico e o seu uso para deduzir transformações gerais
de áreas (por exemplo, a transmutação).
70
Em 1675, Leibniz reuniu essas idéias em uma série de estudos sobre o
tratamento analítico de problemas infinitesimais, que contém sua invenção do
Cálculo.
De acordo com Boyer (1996, p. 277) Leibniz sempre teve uma
percepção da importância de boas notações como subsídio ao pensamento, e sua
escolha no caso do Cálculo foi particularmente próspera. Depois de algumas
tentativas ele se fixou em dx e dy para as diferenças menores possíveis
(diferenciais) em
x
e
y
. Baron (1985, v. 3, p. 58) escreve que a diferencial de
uma variável
y
é a diferença infinitamente pequena entre dois valores
consecutivos de
y
. Vejamos um exemplo: para a curva traçada em relação a um
eixo-
x
e a um eixo-
y
(figura II. 9) Leibniz considera a seqüência das ordenadas
y
e a seqüência correspondente das abscissas
x
. As ordenadas estão situadas
infinitamente próximas; dy é a diferença infinitamente pequena entre duas
ordenadas
y
, e dx é a diferença infinitamente pequena entre duas abscissas
x
;
portanto dx é a distância entre duas ordenadas
y
consecutivas. As diferenciais
são infinitamente pequenas e isso significa que podem ser comparadas entre si (a
razão dy /dx é finita). Mas com respeito às quantidades finitas ordinárias as
diferenciais podem ser desprezadas: xdxx
=
+
. Produtos de diferenciais podem
ser desprezados com respeito às próprias diferenciais: adxdydxadx
que
adya
=
. Para cada ponto
),(
yx na curva (figura II. 9) podemos formar o
triângulo característico dsdydx
,,
( ds é a diferencial do comprimento do arco
s
).
Figura II. 9 (Baron, 1985, v. 3, p. 58)
71
Se o segmento da reta ds , infinitamente pequeno, for prolongado, formará a
tangente à curva em
),(
yx e teremos
τ
::::
ytdsdydx
. Assim, para determinar
as tangentes é suficiente determinar a razão dxdy
:
. A relação entre
y
e
x
usualmente é dada em forma de uma equação (a equação da curva). A fim de
calcular a razão entre dy e dx é preciso diferenciar essa equação, ou seja, é
preciso formar a equação diferencial da curva. Para isso devem-se aplicar as
regras de cálculo.
De acordo com Boyer (1996, p. 278), Leibniz publicou suas descobertas
sobre o Cálculo Diferencial na Acta Eruditorum em 1684. Nessa revista científica,
ele apresenta um todo geral que se aplica às funções algébricas racionais ou
irracionais e às transcendentes, além disso, expõe rmulas para seu Calculo:
0
=
da , para
a
constante; dvduvud
)(
; vduudvuvd
)(
; dunuud
nn 1
)(
= ;
2
/)()/(
vudvvduvud = .
Novamente na revista científica Acta Eruditorum, porém em 1686,
Leibniz publicou uma explicação do seu Cálculo Integral em que mostra que as
quadraturas o casos especiais do método inverso do das tangentes. Aqui ele
deu ênfase à relação inversa entre diferenciação e integração no Teorema
Fundamental do Cálculo. Expõe que “na integração das funções familiares ‘está
incluída a maior parte de toda a geometria transcendente (Ibid., p. 278).
Para Leibniz a soma, ou integral, ydx
é a soma de retângulos
infinitamente pequenos yxdx ; portanto ydx
é a área da curva
)(
xy . Observando
a figura II. 10, a diferencial da área
BCO
)
(a diferença entre dois valores
consecutivos daquela área) é o retângulo hachurado ydx à direita na figura, ou
seja, ydxydxd =
. O que mostra a relação inversa entre d e
. E de forma
recíproca ydy =
(Baron, 1985, v. 3, p. 60).
72
Figura II. 10 (Ibid., p. 60)
Os conceitos apresentados formaram a base de um sistema
conveniente e poderoso para a solução de problemas, porém eram insatisfatórios
se considerados sob o rigor matemático, pois as quantidades infinitamente
pequenas não foram definidas e não foi provado que podem ser desprezadas com
respeito às quantidades finitas. Portanto, o esclarece se tais quantidades
existem e se os resultados obtidos através do uso dessas quantidades são
corretos (Ibid., v. 3, p. 61).
Leibniz argumentou sobre o Teorema Fundamental do Cálculo por
analogia e Newton baseou sua justificativa em fluxos e fluentes, que por sua vez
dependiam da intuição de pontos se movendo ao longo de uma curva.
O Teorema Fundamental do Cálculo, “continha uma maneira prática de
computar” e era uma abreviação dos métodos rigorosos das tangentes e
quadraturas de Arquimedes e outros geômetras gregos clássicos. Por outro lado,
Jakob (1654–1705) e Johann Bernoulli (1667–1748) e outros matemáticos e
cientistas do culo XVIII que se aproveitaram do cálculo de Leibniz,
especialmente de sua notação fértil, usaram livremente, expandiram e aplicaram-
no, freqüentemente com resultados espetaculares.
Colin Maclaurin (1698–1746) provou parte do Teorema Fundamental do
Cálculo para funções de potência simples,
n
xy = , onde
,...,3,2,1
n e Joseph
Louis Lagrange (1736–1813) estendeu a idéia básica de Maclaurin a fuões
crescentes representadas por uma série de potências. A prova moderna do
Teorema Fundamental do lculo foi formulada para funções contínuas em
73
bxa
por Augustin Louis Cauchy (1789–1857) em 1823. Com seu todo,
Cauchy proveu a chave, para todas as funções contínuas, que finalmente uniu
rigorosamente os dois ramos principais do cálculo em uma estrutura, ambos
elegantes e úteis.
74
CAPÍTULO III
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICO-METODOLÓGICA
Lembramos que alguns dos princípios metodológicos de Bardin (2003)
para análise de conteúdo, os quais exporemos mais adiante, referenciaram nosso
trabalho quanto à sua organização; ressaltamos, porém, que, para orientar a
nossa pesquisa referente à abordagem dada ao Teorema Fundamental do
Cálculo em livros didáticos, utilizamos como ferramenta de análise, os registros
de representação semiótica de Raymond Duval. Segundo esse autor, para a
aquisição de conhecimentos matemáticos, esses registros devem ser articulados
e, portanto, sua teoria pode fundamentar nossa investigação.
A comunicação em Matemática se estabelece por meio de
representações. De acordo com Damm (2002), os objetos a serem estudados são
conceitos, propriedades, estruturas, relações que podem expressar diferentes
situações, portanto, para seu ensino precisamos levar em consideração as
diferentes formas de representação de um mesmo objeto matemático. Para
estudar a aquisição de conhecimentos matemáticos, é preciso então recorrer à
noção de representação. Como a Matemática trabalha com objetos abstratos, e
estes não são diretamente acessíveis à percepção, necessita-se para a sua
apreensão, fazer uso de uma representação.
Mas o que seriam essas representações?
As representações são símbolos, sinais, digos, tabelas, gráficos,
algoritmos, desenhos que possibilitam a comunicação entre os sujeitos e as
75
atividades cognitivas do pensamento, admitindo registros de representação
diferentes de um mesmo objeto matemático.
Duval estabelece três abordagens da noção de representação:
As representações mentais que têm a função de objetivação e o
método para seu estudo é o de conversão;
As representações computacionais que são internas e não
conscientes do sujeito. Estas privilegiam o tratamento, traduzindo
informações externas a um sistema, sob uma forma que seja
possível recuperá-las e combiná-las no interior do sistema;
As representações semióticas que são externas e conscientes do
sujeito. São relativas aos signos, linguagem natural, língua formal,
escrita algébrica, gráficos cartesianos, figuras, de um objeto
matemático.
De acordo com autor, as representações semióticas realizam, de
maneira indissociável, as funções de objetivação e de tratamento, além da função
de comunicação. Essas representações semióticas têm dois aspectos: a sua
forma (o representante) e o seu conteúdo (o representado).
As representações semióticas estabelecem a comunicação em
Matemática; elas são necessárias nas atividades cognitivas do pensamento, ou
seja, sem as representações semióticas não é possível efetuar certas funções
cognitivas essenciais do pensamento. Essas atividades cognitivas, requeridas
pela Matemática, devem ser procuradas, segundo Duval (2003), nas duas
características seguintes:
1) A importância das representações semióticas Essa importância se deve a
duas razões fundamentais: primeiro – as possibilidades de tratamento matemático
dependem do sistema de representação utilizado. Por exemplo, fazer a translação
de uma parábola no sistema de eixos cartesianos ortogonais é uma forma de
tratamento gráfico. Segundo os objetos matemáticos não são diretamente
perceptíveis ou observáveis. O acesso a esses objetos está ligado à utilização de
um sistema de representação.
76
2) A grande variedade de representações semióticas utilizadas em Matemática
São sistemas de numeração, figuras, escritas algébricas e formais,
representações gráficas e a língua natural.
Duval enfatiza três atividades cognitivas fundamentais ligadas à
apreensão ou produção de uma representação, ou seja, para que um sistema
semiótico possa ser um registro de representação são necessários: a formação
de uma representação identificável, o tratamento e a conversão.
A formação de uma representação identificável Esta pode ser estabelecida
por meio de um enunciado compreensível na língua natural, através do desenho
de uma figura geométrica, da escrita de uma fórmula, de um gráfico, etc. A
formação de uma representação identificável depende de regras que garantam o
reconhecimento das representações e a possibilidade de sua utilização para
tratamento. Essas regras já estão estabelecidas na sociedade, cabendo ao sujeito
usá-las para reconhecer tais representações.
O tratamento de uma representação é a transformação dessa representação
no pprio registro onde foi tomada, ou seja, é uma transformação interna a um
registro. Por exemplo: o cálculo algébrico; a translação é um tipo de
transformação interna ao registro gráfico; a reconfiguração é um tratamento para
as figuras, etc. Existem regras de tratamentos próprias a cada registro, e elas
variam de um registro a outro. Os tratamentos são ligados à forma (o
representante) e não ao conteúdo do objeto matemático.
A conversão de uma representação é a transformação desta em uma
representação em outro registro, conservando os mesmos objetos denotados. Por
exemplo: passar da língua natural à escrita algébrica, ou então, passar do registro
numérico ao registro gráfico, etc.
O quadro III. 1 apresenta tipos diferentes de registros mobilizáveis no
funcionamento matemático:
77
Representação discursiva Representação não-discursiva
Os tratamentos não
são algoritmizáveis.
Registro língua natural Registro figural geométrico
Os tratamentos são
algoritmizáveis
Registro simbólico numérico
Registro simbólico algébrico
Registro figural gráfico
Quadro III. 1
Duval escreve que:
A originalidade da atividade matemática está na mobilização
simultânea de ao menos dois registros de representação ao
mesmo tempo, ou na possibilidade de trocar a todo o momento
de registro de representação. [...] a compreensão em matemática
supõe a coordenação de ao menos dois registros de
representações semióticas (Duval, 2003 p. 14).
Passar de um registro de representação a outro (fazer a conversão) não
é somente mudar o modo de tratamento, é também tentar explicar as
propriedades ou os diferentes aspectos de um mesmo objeto em outro registro.
Duas representações de um mesmo objeto, produzidas em dois registros
diferentes, não têm o mesmo conteúdo cognitivo.
Ressaltamos que a conversão, do ponto de vista matemático, intervém
na escolha do registro no qual os tratamentos a serem efetuados são mais
econômicos, mais potentes(Ibid., p. 16), ou para obter um segundo registro que
serve de base aos tratamentos que se efetuam em um outro registro, sendo
assim, um complementa o outro. O autor ainda escreve que a conversão não tem
nenhum papel intrínseco nos processos matemáticos de justificação ou prova,
porque estes se fazem com base em tratamentos efetuados em um determinado
registro discursivo (quadro III. 1). Do ponto de vista cognitivo é a conversão que
aparece como atividade de transformação fundamental, que segundo Duval é
aquela que conduz aos mecanismos subjacentes à compreensão” (Ibid., p. 16).
O problema no ensino de Matemática se estabelece justamente porque
se levam em consideração as atividades cognitivas de formação de
representação e os tratamentos necessários em cada registro. Porém, o que
garante a apreensão do objeto matemático não é a determinação de
78
representações ou as várias representações possíveis de um mesmo objeto, mas
sim a coordenação entre estes vários registros de representação.
Devemos não confundir o tratamento com a conversão. O quadro III. 2
ilustra e resume esses dois tipos de transformação:
Transformação
de uma representação semiótica em
uma outra representação semiótica
Quadro III. 2 (Duval 2003, p. 15).
O autor ressalta que a atividade de conversão possui dois tipos de
fenômenos característicos: as variações de congruência e de não-congruência e a
heterogeneidade dos sentidos da conversão.
As variações de congruência e de não-congruência
O fenômeno de congruência ocorre quando a passagem de um registro
de representação (registro de partida) leva a outro registro de representação
(registro de chegada) de forma natural, isto é, a representação do registro de
partida é transparente à representação do registro de chegada. Já o fenômeno da
não-congruência ocorre quando o registro de partida impõe maior dificuldade de
pensar ou visualizar a representação no registro de chegada, isto é, a
representação no registro de chegada não transparece absolutamente no registro
Permanecendo no mesmo sistema:
Tratamento.
Mudando de sistema, mas conservando a
referência aos mesmos objetos: Conversão.
Quase sempre, é somente este tipo
de transformação que chama a
atenção porque ele corresponde a
procedimentos de justificação.
De um ponto de vista “pedagógico”,
tenta-se algumas vezes procurar o
melhor registro de representação a
ser utilizado para que os alunos
possam compreender.
Este tipo de transformação enfrenta os
fenômenos de não-congruência. Isso
se traduz pelo fato de os alunos não
reconhecerem o mesmo objeto através
de duas representações diferentes.
A capacidade de converter implica a
coordenação de registros mobilizados.
Os fatores de não-congruência mudam
conforme os tipos de registro entre os
quais a conversão é, ou deve ser,
efetuada.
79
de saída. As conversões não-congruentes, segundo Duval, são as mais
numerosas e são responsáveis pela maioria das dificuldades de aprendizagem
matemática, já que elas dificultam a coordenação entre registros.
A heterogeneidade dos dois sentidos da conversão
É importante levar em conta os dois sentidos da conversão. Nem
sempre ela se efetua quando se invertem os registros de partida e de chegada.
Duval coloca que:
Geralmente, no ensino, um sentido de conversão é privilegiado,
pela idéia de que o treinamento efetuado um sentido estaria
automaticamente treinando a conversão no outro sentido. Os
exemplos propostos aos alunos são instintivamente escolhidos,
evidentemente, nos casos de congruência. [...] (Ibid., p. 20).
Ressaltamos que estes dois fenômenos, ligados à conversão, não
foram analisados neste trabalho, sendo que o enfoque, relativo ao tema
investigado, deu-se à coordenação de registros.
O objeto matemático não pode ser identificado com o conteúdo de sua
representação. A compreensão em Matemática requer a coordenação dos
registros, ela está ligada ao fato de dispor de ao menos dois registros de
representação diferentes. Essa é a única possibilidade de que se dispõe para não
confundir o conteúdo de uma representação com o objeto representado. O autor
conclui que para analisar as dificuldades em Matemática, é preciso estudar
prioritariamente a conversão dos registros e não os tratamentos, pois a
capacidade de converter implica na coordenação de registros.
Neste trabalho, enfocamos o Teorema Fundamental do Cálculo (TFC)
como objetivo da pesquisa, e para isso, analisamos alguns livros didáticos para
verificar como os mesmos abordam esse importante teorema do Cálculo. Com
base nos registros de representação semiótica de Raymond Duval, tentamos
identificar os tratamentos e as conversões presentes nos textos desses livros, por
constituírem um instrumento sempre presente no trabalho do professor na sala de
aula.
80
Pode-se notar na obra de pesquisadores a importância dada pelos
mesmos à análise de texto. Escrevem que os livros didáticos exercem influência
no processo de ensino e aprendizagem, e sendo assim, poderiam (ou não)
favorecer uma visão mais articulada da Matemática, mostrando a dinâmica de sua
estrutura e a história dos seus objetos, e que o modo de organização e a
qualidade de conteúdos tratados poderiam facilitar o trabalho pedagógico.
Wuo (1999, p. 3) escreve que:
[...] Mesmo não sendo o livro o elemento único a garantir que o
que ali se apresente corresponda ao saber apreendido pelos
estudantes, o destaque de ser (o livro) o grande curriculista,
dada a sua importância como instrumento pedagógico para o
professor, quando lhe sugere conteúdo, metodologia e atividades.
Barufi (1999) escreve que o livro didático escolhido pelo professor, para
suporte ao seu trabalho, constitui um indício significativo de como será
desenvolvido um curso de Cálculo. Para a autora, o livro adotado pelo professor
faz transparecer suas escolhas metodológicas. A idéia da mesma é compreender
os fatores determinantes dos problemas enfrentados pelo ensino de Cálculo nos
cursos básicos do ensino superior, no que diz respeito ao papel desempenhado
pelos livros didáticos.
Silva (2004) analisou como dois autores de livros didáticos introduzem
os conceitos da Integral e suas principais aplicações. O autor ressalta a
importância do livro didático, apesar das novas tecnologias de ensino, escrevendo
que para a aquisição do conhecimento matemático, o aluno se como um
pesquisador na luta pelas novas descobertas” (Ibid., p. 16) e, nessa perspectiva,
os livros tornam-se objetos importantes para o processo de ensino e
aprendizagem. Em seu trabalho, levanta uma questão: “Por que utilizar uma teoria
produzida para estudar a aquisição do conhecimento para analisar livros
didáticos?” (Ibid., p. 18). Para responder a essa questão, o autor se reporta ao
capítulo III da obra Conversion et Articulation des Representation Analogiques
de Duval, que é dedicada a analisar as representações produzidas em um
capítulo de livro, em uma seqüência, em trabalhos de alunos ou mesmo em
artigos de revistas, etc.
81
[...] não se podem analisar as representações sem,
primeiramente, identificar as funções que comandariam a sua
produção. Essas são as duas questões que devemos abordar
agora. Como efetuar uma análise funcional de representações? O
que se pode esperar de uma análise funcional de
representações? (Duval apud Silva, 2004, p. 19).
Duval destaca que a análise de texto ganhou força com as pesquisas
de vários autores conhecidos. Ele enfatiza ainda, que quando se analisam os
modelos de compreensão elaborados até o momento, pode-se perceber que os
mesmos são essencialmente centrados no leitor e não tomam verdadeiramente
as caractesticas próprias do texto que podem modificar a situação de leitura e a
natureza da tarefa de compreensão.
A análise de texto pode se mostrar importante, pois os tratamentos que
intervêm no processo de compreensão do mesmo não são unicamente os ligados
ao grau de complexidade da forma lingüística, dependem também do conteúdo
cognitivo que ele traz.
Não se pode destacar o fato de que certas ‘apresentações’
podem ser mais facilmente completas que as outras, ou que elas
podem ser mais adequadas aos procedimentos exigidos para se
apropriar do conteúdo tratado. Se a compreensão, durante a
leitura, resulta da “interação entre um leitor e um texto” ela pode
ser tão importante para suplantar o desnível entre conteúdo
cognitivo próprio do texto, com aquilo que é próprio do leitor
(Duval apud Silva, 2004, p. 20).
A base do conhecimento do leitor é muito importante, porém a estrutura
do texto pode facilitar ou dificultar sua compreensão, no que concerne ao êxito da
leitura.
Entendemos que o livro didático em geral é fundamental para muitos
professores. Sua escolha pelo professor pode direcionar de alguma forma, a
maneira como o aluno irá aprender uma determinada noção. Compreendemos
que a aquisição de conhecimento por parte do aluno, através do seu livro, pode
ser melhor articulada se a coordenação dos diferentes registros for explorada no
texto. Por isso, para nortear o trabalho, utilizamo-nos dos registros de
representação semiótica de Duval, que trata de aspectos cognitivos relacionados
com a aquisição dos conhecimentos matemáticos.
82
Devido à relevância do tema e ao crescente número de trabalhos de
pesquisa em análise de textos e com base em Duval, levantamos uma questão:
Como o TFC é tratado em livros didáticos? Analisaremos essa questão, tentando
responder: que diferenças fundamentais são evidenciadas no enfoque dado por
diferentes autores na apresentão do Teorema? A coordenação dos registros de
representação é explorada pelos autores na apresentação do TFC?
Apresentamos a seguir os procedimentos metodológicos baseados em
Bardin, que orientaram a organização da análise e subsidiaram a busca de
respostas para as questões levantadas anteriormente. Assim, verificamos como
quatro livros didáticos abordam esse Teorema com base nos registros de
representação semiótica.
Os livros são:
Curso de Análise volume 1, de Elon Lages Lima. edição. Instituto de
Matemática Pura e Aplicada, CNPq, 1982.
Um curso de Cálculo volume 1, de Hamilton Luiz Guidorizzi. edição.
Editora LTC. Rio de Janeiro. 2001.
Cálculo volume 1, de James Stewart. edição. Editora Pioneira Thomson
Learning. São Paulo. 2006.
Cálculo: um curso universitário volume 1, de Edwin. E. Moise. Editora
Edgard Blücher Ltda. São Paulo. 1970.
Para a escolha e organização da análise das quatro obras referidas,
utilizamos alguns princípios teórico-metodológicos inspirados e adaptados do livro
“Análise de Conteúdo de Bardin (2003). Essa organização é sugerida
cronologicamente por meio das três etapas que seguem: a pré-análise; a
exploração do material; o tratamento dos resultados obtidos e interpretação.
A pré-análise: é a etapa da organização propriamente dita. Tem por objetivo
tornar operacionais e sistematizar as idéias iniciais. Segundo a autora, trata-
se de estabelecer um programa que, podendo ser flexível (quer dizer, que
permita a introdução de novos procedimentos no decurso da análise), deve, no
83
entanto, ser preciso(Ibid., 2003, p. 95). A pré-análise consiste de três fases:
(A) a escolha dos livros didáticos; (B) a formulação de hipóteses; e (C) a
elaboração de indicadores que fundamentem a interpretação final.
(A) A escolha dos livros didáticos: a autora propõe um contato com o universo
de documentos suscetíveis de fornecer informações sobre o problema
levantado. Ela indica uma primeira leitura superficial, para depois, efetuar
leituras mais minuciosas. Para a nossa pesquisa, antes da escolha
propriamente dita, estabelecemos contato com os possíveis livros a analisar
para que tivéssemos uma primeira relação com o texto. A partir daí, a leitura
tornou-se mais aprofundada.
Ela sugere quatro regras principais para a escolha dos documentos. São elas:
regra da exaustividade; da representatividade; da homogeneidade; e de
pertinência. Utilizamos duas delas: as regras da representatividade e de
pertinência.
A regra de representatividade: a análise efetua-se em uma amostra, sendo
que a amostragem é dita rigorosa se for uma parte representativa do universo
inicial. Os resultados obtidos para essa, poderão ser generalizados ao todo.
Assim sendo, proceder-se-á a uma redução do universo que permite diminuir a
parte submetida à análise. Em particular, no que diz respeito à nossa
pesquisa, nos referenciamos também pelos vários livros analisados por Barufi
(1999), Silva (2004), Oliveira (2004), Hsia (2006) e Palaro (2006).
A regra de pertinência: os documentos devem ser adequados de modo a
corresponderem ao objetivo que suscita a análise. Aqui também,
selecionamos um universo de livros que contivessem o assunto relativo à
apresentação do Teorema Fundamental do Cálculo.
(B) A formulação das hipóteses: consiste em explicitar e precisar dimensões e
direções de análise. A autora escreve que as hipóteses nem sempre são
estabelecidas quando da pré-análise, argumenta ainda que não é obrigatório
84
ter como guia um corpo de hipóteses, para se proceder à análise. No caso da
nossa pesquisa, não estabelecemos um corpo de hipóteses.
(C) A elaboração de indicadores que fundamentem a interpretação final: o
pesquisador, após a escolha do tema de investigação, procederá à
organização sistemática em indicadores. Estes têm dois objetivos: primeiro
evidenciar elementos que o estejam, talvez, explícitos no texto, e, além
disso, servir como uma organização (Bardin) para a análise; e segundo
efetuar a análise (Duval) propriamente dita do assunto em questão, ou seja,
esses indicadores podem servir também como ferramenta analítica.
De acordo com o exposto, elaboramos, para a nossa pesquisa, alguns
indicadores que possam colocar em evidência (ou não) noções referentes à
apresentação do TFC, e que possam revelar diferenças no enfoque dado
pelos diferentes autores. Estes indicadores, que estão explicitados mais
adiante, serviram também como uma organização para a análise. Os
diferentes registros de representação semiótica são os indicadores utilizados
para a análise da abordagem dada ao TFC, relativa à coordenação desses
registros pelos autores.
A exploração do material: esta é uma etapa longa e fastidiosa(Ibid,. p. 101)
que consiste essencialmente de operações em função de regras previamente
formuladas. A autora escreve que se as operações da pré-análise foram
adequadamente concluídas, a fase de análise propriamente dita não é mais
do que a administração sistemática das decisões tomadas(Ibid., p. 101). No
caso da nossa pesquisa, após leitura minuciosa, fizemos a transcrição de
partes representativas do capítulo que trata da apresentação do TFC e noções
ligadas a ele, como definições, outros teoremas, exemplos, comentários, etc.
Essas transcrições nos orientaram também quanto à organização do trabalho
e foram pertinentes como subsídios para a efetivação da análise através dos
indicadores.
O tratamento dos resultados obtidos e interpretação: nesta etapa os
resultados “brutos” devem ser tratados de maneira a serem significativos e
85
válidos por meio de operações simples que permitem estabelecer quadros de
resultados, padrões e modelos, os quais condensam e colocam em destaque
as informações da análise. De acordo com Bardin, os resultados obtidos
podem servir de base a uma outra análise disposta em torno de novas
dimensões teóricas, ou praticada graças a técnicas diferentes” (Ibid., p. 101).
A escolha das obras, de acordo com a fase A da pré-análise, baseou-se
em critérios que evidenciam a preocupação de apresentar ou não condões de
existência da Integral, explicitando exigências tais como: a função ser contínua,
ser ou não limitada, a existência do supremo, do ínfimo, o fato de o integrando
possuir ou não primitiva, fatos esses essenciais para o entendimento do TFC e a
sua respectiva utilização. Os livros “Curso de Análise” (Lima) e “Um Curso de
Cálculo” (Guidorizzi), à primeira vista, apresentam o TFC a partir de funções
integráveis. Esses livros são destinados a públicos diferentes. O primeiro é
destinado a leitores com experiência de um a dois semestres de Cálculo,
enquanto o segundo é destinado a leitores como um primeiro curso. os livros
“Cálculo: um curso universitário” (Moise) e Cálculo” (Stewart), numa pré-análise,
apresentam o TFC a partir de funções contínuas. Ambos são textos introdutórios
para cursos de Cálculo.
Outro critério utilizado para a escolha dos livros baseou-se na
apresentação do assunto. Os livros de Lima e Guidorizzi possuem abordagens
parecidas que seguem o padrão: definições, teoremas, exemplos e exercícios.
Moise apresenta os conceitos em forma de “espiral”
12
como salienta o próprio
autor em seu prefácio, enquanto Stewart introduz o conteúdo através de
problemas, intitulados por ele de: “Projeto descoberta”.
Com relação aos critérios de escolha dos livros, baseados nos registros
de representação semiótica, observamos, abordagens distintas em relação à
apresentação do TFC. Lima utiliza em sua maior parte o registro simbólico
algébrico e tratamentos nele. Guidorizzi utiliza o registro simbólico algébrico, e
também, de forma discreta, o registro língua natural, e mais discretamente ainda o
registro figural gráfico. Já Stewart, utiliza o registro simbólico algébrico
12
Os conceitos e idéias são apresentados em ordem crescente de dificuldade, generalidade e
exatidão.
86
(predominante) e língua natural de forma mais equilibrada, utilizando
consideravelmente o figural gráfico, enquanto Moise emprega proporcionalmente
os registros simbólico algébrico, figural gráfico e língua natural.
Desde já, é importante salientar que a escolha dos livros não se deu por
serem os mais adotados nos cursos de Cálculo, mas sim pelos motivos
apresentados nos parágrafos anteriores.
Para alcançar o objetivo da pesquisa, com base em Bardin (2003),
fizemos uma pré-análise comparativa dos conteúdos abordados nos livros
escolhidos. Esta etapa consistiu em um primeiro olhar sobre a maneira como
cada um dos autores se coloca frente aos conteúdos tratados, isto é, como
introduz o TFC, se utiliza ou não exemplos, ilustrações gráficas, se propõe ou não
aplicações, se apresenta ou não exercícios resolvidos, que tipo de exercícios o
propostos, etc. Este trabalho inicial teve por objetivo uma organização para
evidenciar aspectos ligados ao TFC, isto é, operacionalizar e sistematizar os
procedimentos de análise baseados em Duval.
A pré-análise referida nada mais foi que uma leitura superficial, com
objetivo de estabelecer contato com as abordagens feitas pelos autores, para
verificar, no que diz respeito ao TFC, os critérios que revelam o tipo de
abordagem desse tema e quais o os registros de representação utilizados por
esses autores. A partir deste momento, a leitura foi se tornando minuciosa para
que fosse possível centrar as atenções nas conversões entre diferentes registros,
bem como nos tratamentos em cada registro.
Como instrumento de organização para a análise destes livros, no que
diz respeito ao TFC, utilizamos indicadores que revelam o tipo de abordagem do
tema, na tentativa de evidenciar as diferenças fundamentais nos enfoques dados
pelos autores, e, como ferramenta de análise propriamente dita, utilizamos, com
base em Duval, indicadores que possam revelar a exploração da coordenação
dos registros de representação semiótica, para verificar como esse teorema é
tratado nas obras mencionadas.
Valemo-nos dos primeiros indicadores na tentativa de identificar que
diferenças fundamentais são evidenciadas no enfoque dado por diferentes
autores, na apresentação do TFC, no que diz respeito:
87
1) à contextualização;
2) se partem de casos particulares aos casos gerais ou vice-versa;
3) a condições de existência;
4) à questão da continuidade e integrabilidade;
5) à referência sobre a inter-relação derivada-integral;
6) à demonstração;
7) às aplicações: práticas e/ou intrínsecas à matemática
8) aos exemplos e exercícios
Esses indicadores
13
, utilizados na organização da análise dos livros, no
que concerne à apresentação de tal teorema, são assim explicitados:
1) quanto à contextualização
A contextualização foi observada no que diz respeito à apresentação do
TFC: se o mesmo é apresentado (ou não) por meio de textos contendo
rudimentos da História da Matemática e se esses explicitam (ou não) as idéias
fundamentais que propiciaram o desenvolvimento do lculo; e/ou se o texto
parte de problemas (relativos à Física, à Química, à Economia, àqueles
intrínsecos à própria Matemática, etc.); e ainda se é apresentado nos moldes:
definições, teoremas, exemplos e exercícios.
2) se partem dos casos particulares aos gerais ou vice-versa
O TFC, em alguns livros, é apresentado a partir dos casos particulares
(funções contínuas) em direção aos casos gerais (funções integráveis), ou
mesmo, são tratados apenas os casos particulares. Em outros, os casos gerais
são tratados apenas em apêndices. em outros livros, o tema vem abordado
partindo-se dos casos gerais em direção aos particulares.
3) condições de existência
13
Ressaltamos que essa organização não necessariamente seguiu a ordem em que esses
indicadores se encontram descritos.
88
No que se refere a condições de existência da função primitiva, foi
observado se o assunto é abordado e como; ou se o autor não enfatiza muito
essas condições.
4) continuidade e integrabilidade
Verificamos como os autores abordam a questão da continuidade e da
integrabilidade das funções, isto é, se eles apenas mencionam essa questão ou
abordam a mesma de uma forma mais detalhada.
5) referência sobre a inter-relação derivada-integral
O TFC relaciona a integração com a derivação como sendo uma o
inverso da outra; sendo assim, foi verificado se os autores fazem referência a
essa inter-relação e como abordam a mesma nos textos.
6) demonstração
A demonstração do TFC pode depender da forma como o mesmo é
apresentado. De acordo com isso, verificamos como conceitos, outros teoremas,
propriedades e etc, foram utilizados nessa demonstração.
7) aplicações
Com relação às aplicações do TFC, foi observado se os autores
abordam aquelas referentes à Física, à Química, à Economia, etc, e/ou
aplicações próprias da Matemática tais como: demonstração de outros teoremas,
obtenção da primitiva, cálculo de áreas e/ou volumes, etc.
8) exemplos e exercícios
89
No caso dos exemplos, foram verificados os enunciados e resoluções,
no que diz respeito ao tipo e objetivo dos mesmos quanto: à utilização de técnicas
de integração, se privilegiam demonstrações ou não, se propõem aplicações ou
não. para os exercícios, foram analisados apenas os enunciados,
relativamente ao tipo e ao objetivo, conforme escrito para os exemplos.
À medida que utilizamos tais indicadores para evidenciar diferenças no
enfoque dado por cada um dos autores, vamos efetuando a análise através
daqueles relativos aos registros de representação, e assim verificar se esses
autores, nos livros, propiciam a coordenação entre os registros:
A) simbólico (correspondendo ao numérico e ao algébrico);
B) figural (correspondendo ao gráfico e ao geométrico), e;
C) língua natural.
Em cada registro considerado, buscamos descrever os tratamentos
envolvidos.
Em resumo, a ênfase dessa análise, com base em Duval, foi dada à
apresentação do TFC, procurando investigar como o assunto é introduzido,
conduzido e como ele é tratado nos exemplos e exercícios.
A seguir, apresentamos uma descrição dos quatro livros escolhidos,
levantando as principais características de cada um, e dentro dessa, estão as
unidades de análise investigadas.
A obra “Curso de Análise” de Elon Lages Lima foi publicada pelo IMPA
e o CNPq. É composta de dois volumes, sendo que a primeira edição do volume I
data de 1976 e a terceira edição, que foi a analisada, de 1982. Diferente das
outras três obras analisadas e destinadas a cursos introdutórios de Cálculo, o
primeiro volume desta corresponde, conforme ele mesmo argumenta no prefácio
da primeira edição, à “primeira parte de um Curso de Análise” (Lima, 1982) em
que os leitores devam possuir experiência em cursos anteriores de lculo, e
sendo assim, terão alguns conhecimentos relativos a manipulações elementares
90
(que serão deixadas de lado) e a interpretações intuitivas de certos elementos
fundamentais. Revela que a ênfase se na conceituação precisa, no
encadeamento lógico das proposições e na análise das propriedades mais
relevantes dos objetos estudados. Destaca também que os exemplos e exercícios
privilegiam conceitos, proposições, reconhecimento de hipóteses e aplicações dos
teoremas. O autor sugere uma lista de referências bibliográficas para esclarecer,
completar ou abordar sob outros aspectos os temas estudados em seu livro.
Sugere também que se reescreva (com palavras próprias) definições, teoremas,
demonstrações, exemplos de cada tópico estudado. E ainda ressalta a
conveniência em desenhar figuras a fim de atribuir significado intuitivo aos
raciocínios do texto. Termina seu prefácio expressando que “embora as figuras
não intervenham diretamente na argumentação lógica, elas servem de guia à
nossa imaginação, sugerem idéias e ajudam a entender os conceitos”.
São apresentados primeiramente os conceitos e teoremas (seguidos de
corolários às vezes) todos demonstrados; depois, alguns poucos exemplos. Os
exercícios (em número elevado) se encontram apenas no final de cada capítulo,
estes, subdivididos em parágrafos. Ao longo do livro quase não figuras, nem
problemas (aplicações), além do que, não existem referências ou notas históricas.
Ressaltamos que a unidade de referência para a análise da abordagem
dada ao TFC é o parágrafo 3 (páginas 254 a 258) do capítulo IX denominado
“Integral de Riemann”.
“Um Curso de Cálculo” de Hamilton Luiz Guidorizzi foi publicado pela
editora LTC - S.A. e é dividido em quatro volumes, dos quais analisamos o
primeiro da quinta edição, ano 2001. Este livro foi lançado em 1985 e baseia-se
nos cursos de Cálculo ministrados na Escola Politécnica da USP, no Instituto de
Matemática e Estatística da USP e no Instituto de Ensino de Engenharia Paulista.
Em seu prefácio, o autor afirma que procurou fazer com que os conceitos e
teoremas apresentados venham, sempre que possível, acompanhados de uma
motivação ou interpretação geométrica ou física. Além disso, escreve que
algumas demonstrações de teoremas foram deixadas para o final da seção ou
colocadas em apêndices. Como o livro também é destinado a cursos de Física e
Engenharia, expressa que talvez seja necessário antecipar o estudo das integrais,
91
explicando que alguns problemas, como equações diferenciais, ocorrem no início
desses cursos. Ele afirma que o “segundo” TFC e as integrais impprias são
estudadas no volume II. No restante do prefácio descreve sobre a localização de
alguns tópicos ao longo dos quatro livros.
O conteúdo é dividido em capítulos, e estes em seções. Nestas em
geral, os conceitos e teoremas são apresentados primeiro, e depois o dados
exemplos. Os exercícios se encontram, na maioria das vezes, no final de cada
seção. Há uma quantidade razoável de figuras, que desempenham um papel
coadjuvante, pois, essencialmente, os argumentos são algébricos para serem
verificados nas figuras. Além disso, o autor não faz referência à gênese do
Cálculo e também não aparecem notas históricas.
Existem problemas e aplicações à Física, ao cálculo de áreas, volumes,
comprimentos de curvas, centros de massa, etc. Porém, esses problemas
servem, basicamente, para ilustrar resultados, não se caracterizando como um
ponto de partida para o desenvolvimento das idéias sobre o tema.
Nesse livro (vol. 1), a unidade de referência para a análise da
abordagem dada ao TFC são as seções 11.5 e 11.6 (páginas 305 a 317) do
capítulo 11 denominado “Integral de Riemann”.
“Cálculo” foi lançado e publicado em 2001 no mercado brasileiro pela
Editora Pioneira Thomson Learning como uma tradução do livro “Calculus” de
James Stewart. Esta obra é dividida em dois volumes, sendo que analisamos o
primeiro da quinta edão, ano 2006.
No prefácio, o autor revela a preocupação de escrever um livro que
tome parte na descoberta do cálculo pelos estudantes”, possibilitando a estes, o
desenvolvimento de capacidades cnicas, além de comunicar aos mesmos, “um
sentido” de utilidade que o tema proporciona. A ênfase, segundo ele, está na
compreensão dos conceitos e para atingir tal objetivo, embora não utilize os
termos da teoria de Duval, aborda o conteúdo empregando diferentes
representações, afirmando que os “tópicos devem ser apresentados de forma
geométrica, numérica e algebricamente [...] com o acréscimo do ponto de vista
verbal ou descritivo”.
92
Nesta nova edição encontram-se diversas modificações em relação às
anteriores. Uma delas, ligada à apresentação do TFC, foi a introdução de um
exemplo (transcrição IV. 48) na seção 5.3. O motivo deste, segundo Stewart,
deve-se à dificuldade que alguns alunos tiveram em entender a noção de uma
função definida por uma integral com limite de integração variável. Assim, ele
indica que “[...] seria interessante dar uma olhada no Teorema Fundamental do
Cálculo antes de ler o Exemplo 1”.
O autor ainda destaca em seu prefácio que: uma maneira de motivar a
compreensão conceitual é através de problemas, ressaltando aqueles que
permitem abordagens gráficas, numéricas e algébricas; os exercícios são
apresentados em nível gradativo de dificuldade; estes, e também os exemplos,
oferecem dados do “mundo real”; algumas atividades sugerem e outras exigem a
utilização de recursos computacionais; são apresentados Projetos (“Aplicados”,
“de Laboratório”, “Escritos” e “Descoberta”) de extensão que visam a trabalhar a
imaginação dos estudantes, envolvê-los com a tecnologia, fazer comparação de
métodos atuais com aqueles usados pelos iniciadores do Cálculo e promover a
antecipação de conceitos que seo discutidos posteriormente.
O conteúdo do livro é dividido em capítulos, e estes, em seções. No
geral, esses capítulos, quando da apresentação do conteúdo, são introduzidos
por meio de alguns problemas. Diversos exemplos são utilizados, não
necessariamente após os assuntos tratados. Os exercícios, diversificados e em
número elevado, encontram-se ao final das seções. O autor faz uso considerável
de diferentes figuras e de tabelas numéricas. Além disso, o livro apresenta notas
históricas que fazem referência, algumas vezes, à gênese do Cálculo.
Ressaltamos que a análise da abordagem dada ao Teorema
concentrou-se na seção 5.3 (página 393 a 402) do capítulo 5 intitulado
“Integrais”.
A obra “Cálculo: Um Curso Universitário” de Edwin Evariste Moise foi
publicada pela Editora Edgard Blücher LTDA em 1970 como uma tradução do
livro “Calculus”. Ela é composta de dois volumes em edição única, sendo que o
primeiro, foi o analisado.
93
O autor afirma que o conteúdo apresenta “mais a fundo do que é
costume, a matéria normalmente coberta pelos cursos de cálculo introdutório de
um ano [...]”. Notamos que no prefácio, ele revela a forma pela qual os conteúdos
serão apresentados e tratados ao longo do livro. Enfatiza o “processo em espiral”,
que consiste em apresentar os assuntos de formas diferenciadas e em ordem
crescente de dificuldade, generalidade e exatidão. Como exemplo, destacamos
um trecho que evidencia tal processo:
[...] a idéia de integral definida faz sua primeira e mais simples
aparição na seção 2.10; é generalizada na seção 3.6 e não é
apresentada na sua forma final (usando somas de Riemann)
senão na seção 7.1, onde as somas de Riemann são
necessárias no cálculo de comprimento de arcos.
Moise destaca que ao tratar um assunto no texto, busca motivar as
idéias iniciais com a apresentação dos conteúdos como “enigmas interessantes” e
que o leitor possa lançar mão daquelas consideradas significativas. Nesse
sentido afirma que: “há muitos outros pontos nos quais as idéias são introduzidas,
em formas simples, em conexão com uma discussão de outros assuntos”.
Ainda no prefácio, ressalta que muitos resultados foram demonstrados
antes de serem enunciados, sendo que a demonstração foi apresentada sob
forma de um todo para resolver uma certa classe de problemas. Segundo o
autor, desta maneira, privilegiam-se idéias em um primeiro curso, e não ”receitas”.
Os problemas ao longo do texto são destacados como “técnicos”,
“teóricos”, “tipo quebra-cabeça, “exercícios gráficos” (estes levam o leitor,
segundo ele, a passar de idéias analíticas a imagens visuais e vice-versa) e de
“descoberta”. Estes últimos antecipam idéias que serão tratadas mais adiante no
texto, enfatiza o autor.
Os conteúdos (divididos em capítulos e estes em seções) geralmente
retomam o que foi estudado em seções anteriores (processo em espiral), assim,
eles não são iniciados por meio de definições e teoremas. Os exemplos (às vezes
não são “numerados”) o apresentados ao longo da exposição dos assuntos e
não ao final das seções apenas. As figuras ocorrem em quantidade considerável.
Os problemas são pontos de partida em vários casos para se abordar o conteúdo.
As referências ou notas históricas são pouco utilizadas pelo autor.
94
Destacamos que nossa análise referente a este livro concentrou-se na
seção 3.7 (página 103 a 111) denominada “A derivada da Integral” e 6.1 (página
250 a 251) como uma introdução do capítulo 6, intitulado “A cnica de
integração”.
95
CAPÍTULO IV
ANÁLISE DOS LIVROS DIDÁTICOS
Reafirmamos que o nosso trabalho tem por objetivo investigar como o
Teorema Fundamental do Cálculo é tratado em quatro livros didáticos à luz dos
registros de representação semiótica. Utilizamos alguns procedimentos
metodológicos, baseados em Bardin, para evidenciar características relativas a
objetos e noções matemáticas inerentes ao TFC, e que supomos, relevantes,
para a efetivação da análise com base na teoria de Duval.
Estes procedimentos têm como propósito, além de evidenciar de que
modo o texto apresenta a informação, organizar esta para que se efetue a análise
propriamente dita. De acordo com Bardin, o propósito a atingir é explicitar de
“uma forma variável e a facilitação do acesso ao observador, de tal forma que
este obtenha o máximo de informação” (Ibid., p. 45).
Com relação à análise, ela foi feita separadamente para cada um dos
livros no que se refere aos tratamentos e conversões dos registros que são
utilizados nessas transformações.
96
IV. 1 – Curso de Análise de E. L. Lima
O autor apresenta o TFC no capítulo IX denominado “Integral de
Riemann”, que começa na página 238 e contém uma introdução, além de sete
parágrafos. Conforme escrevemos anteriormente, a unidade de análise relativa a
esse livro foi aquela em que o TFC é apresentado ao leitor, que no caso é o
parágrafo 3 (página 254 a 258). Porém, apreciamos, sem maiores detalhes,
algumas outras partes desse capítulo para situar o leitor na condução da
apresentação de tal teorema, isto porque, as idéias de Lima vêm apresentadas
com base em conceituações precisas e no encadeamento lógico das proposições
conforme escreve o próprio autor no prefácio.
Sendo assim, entre as páginas 247 e 253, o autor expõe algumas
definições e teoremas que dizem respeito à integrabilidade das funções. Para
isso, ele parte de uma função limitada
14
condição necessária
15
para que a
mesma seja integrável.
Transcrição IV. 1 (Ibid., p. 247)
Em páginas anteriores Lima indica, respectivamente, que a integral
inferior e a integral superior da função limitada Rbaf
],[:
o representadas
14
Para que
f
seja limitada em
],[
ba
é necessário e suficiente que exista
0
>
M
tal que
Mxf
)(
para todo
],[
bax
.
15
Ser limitada não é condição suficiente para que
f
em
],[
ba
seja integrável. Uma condição
suficiente é a integral inferior ser igual a superior; outra, seria a função
f
ser contínua em
],[
ba
;
ou ainda, se
f
for descontínua em apenas um número finito de pontos de
],[
ba
. Nos três casos
f
deve ser limitada.
Uma função limitada Rbaf
],[:
chama-se integrável quando
=
___
___
)()(
b
a
b
a
dxxfdxxf
.
Este valor comum é chamado a integral de f e indicado com
b
a
dxxf
)(
ou simplesmente,
b
a
f
.
97
por
b
a
dxxf
___
)(
e
___
)(
b
a
dxxf
. Para designar essas integrais usa os registros língua
natural e simbólico; apesar disso, a coordenação não se estabelece, visto que
neste caso, o autor apenas usa tais registros para designar uma noção.
Relativamente à notação da integral, utiliza dois registros diferentes (
b
a
dxxf
)(
e
b
a
f
), ambos simbólicos. O autor enfatiza que, às vezes, por questão de
“simplicidade” escreverá
b
a
f
. Ressaltamos que este registro não possibilita
algumas formas de tratamento, pois não fica evidente a variável que se deseja
integrar, no sentido de se determinar uma primitiva. Porém, entendemos que
utilize esta notação quando a mesma não venha afetar a apreensão da noção
envolvida (por exemplo: quando expõem as propriedades da integral).
Após mostrar sua definição de Integral de função integrável, apresenta
e demonstra alguns lemas, teoremas e corolários. No que diz respeito ao nosso
trabalho, referente à abordagem dada à apresentação do TFC, fizemos a
transcrição do teorema 5, que trata das propriedades da Integral:
98
Transcrição IV. 2 (Ibid., p. 250-251)
O teorema 5, composto de seis propriedades, vem enunciado,
principalmente, através do registro simbólico, ao passo que a língua natural é
utilizada apenas nos casos em que tal registro simbólico tem limitação relativa ao
objeto que se pretende representar. Por exemplo, o registro de representação
99
língua natural “integrável” complementa os registros simbólicos utilizados no
teorema 5. Evidentemente o autor poderia usar no lugar de f integrável” o
registro
=
___
___
)()(
b
a
b
a
dxxfdxxf
, porém este poderia dificultar a apreensão das
noções relativas às propriedades apresentadas. O termo “integrável” é utilizado
como um registro complementar, que segundo Duval, é fundamental no sentido
da sua parcialidade em relação ao objeto. Talvez, propriedades desse tipo são
apresentadas, principalmente, no registro simbólico porque o mesmo possibilita
tratamentos mais eficazes.
As propriedades do teorema 5 foram utilizadas pelo autor na
apresentação, comentários e demonstração do TFC. Voltaremos a mencioná-las.
O próximo teorema exposto essencial para entendimento do TFC e
para a nossa análise com base nos registros de representação vem enunciado
na língua natural e no registro simbólico.
Transcrição IV. 3 (Ibid., p. 252)
A continuidade da função f em
],[
ba garante que a mesma seja
integrável em
],[
ba , e portanto, que existe a Integral (número real) definida no
referido intervalo.
O teorema 7 e seus corolários trazem também condições de
integrabilidade de uma função. Apresenta uma condição necessária (ser limitada)
e uma suficiente para cada um dos três casos.
TEOREMA 6. Toda função contínua Rbaf
],[:
é integrável.
100
Transcrição IV. 4 (Ibid., p. 253)
A transcrição acima mostra que o autor emprega os registros simbólico
e língua natural para apresentar condições em que uma função é integrável.
Esses registros também são utilizados na demonstração desse teorema e nas
justificativas de seus corolários.
O Teorema Fundamental do Cálculo, os objetos matemáticos que estão
ligados a ele, alguns exemplos e exercícios, além de algumas aplicações são
apresentados a seguir. A análise de como se esta apresentação, baseando-se
nos diferentes registros de representação semiótica, é o objeto de nosso estudo.
Utilizamo-nos agora dos oito indicadores elaborados como norteadores da
análise, feita com base em Duval.
Lima inicia o terceiro parágrafo denominando-o de “O Teorema
Fundamental do Cálculo” (Ibid., p. 254), e nele, considera uma função
Rbaf
],[:
integrável. Referindo-se ao primeiro item do teorema 5,
mencionado, afirma que para todo
],[
bax
tem-se que
],[|
xaf é integrável. Daí,
define RbaF
],[:
como sendo uma função tal que
=
x
a
dttfxF
)()(
.
A seguir, mostra que
F
é uniformemente contínua
16
em
],[
ba utilizando
para isso os itens 1, 4 e 5 do teorema 5, embora não explicite o uso dessas
propriedades (através delas são feitos os tratamentos).
16
“Uma função
RXf
:
diz-se uniformemente contínua quando, para cada
0
>
ε
, existe
0
>
δ
tal que
εδ
<
< )()(,,
yfxfyxXyx
.” (Ibid., p. 189).
TEOREMA 7. Seja Rbaf
),[:
limitada. Se, para cada
),[
bac
,
],[|
caf
é integrável, então f é integrável.
COROLÁRIO 1. Seja Rbaf
],[:
limitada. Se, para bdca
<
<
<
quaisquer,
],[|
dcf é integrável, então f é integrável.
COROLÁRIO 2. Seja Rbaf
],[:
limitada, com um número finito de
descontinuidades. Então f é integrável.
101
Transcrição IV. 5 (Ibid., p. 254)
O autor utiliza propriedades do referido teorema 5 para convencer de
forma lógica e rigorosa o resultado
F
contínua
17
em
],[
ba . Isto evidencia que o
texto o sugere a contextualização, ou seja, ele apresenta as noções apenas
nos moldes: definições, teoremas, exemplos e mais tarde, exercícios. O registro
de representação usado em maior proporção é o simbólico algébrico e os
tratamentos feitos nele, estão, como já ressaltamos, implícitos. O registro em
língua natural é utilizado em menor proporção.
Em seguida, é apresentado o exemplo 8 em que se chama a atenção
para um caso em que f é descontínua em apenas um ponto do intervalo de
integração. Com ele, o autor ilustra que, apesar de f ser descontínua em
],[
ba ,
ela é integrável no mesmo intervalo. O corolário 2 do teorema 7 garante que se a
função no intervalo em questão for limitada (é no caso) e possuir um número finito
de descontinuidades, ela é integrável. Esse exemplo evidencia que Lima trata a
questão da continuidade e da integrabilidade de maneira explicita no texto, de
forma que tal exemplo (ilustrado a seguir) aborda aspectos conceituais.
Ressaltamos que esses aspectos estão ligados ao TFC, o que é apresentado
mais adiante.
17
“[...] toda função uniformemente contínua é contínua. Mas a recíproca não vale.” (Ibid., p. 189).
Se tivermos
Ktf
)(
para todo
],,[
bat
então, dados quaisquer
],,[,
bayx
tem-se
.)()()(
xyKdttfxFyF
y
x
=
102
Transcrição IV. 6 (Ibid., p. 255)
Nesse exemplo, o autor utiliza o registro simbólico e em seguida faz a
conversão ao registro gráfico para permitir a visualização das funções f e
F
,
além da possível relação entre elas. Ao nosso entender, ele utiliza também esses
registros para evidenciar visualmente a questão de a continuidade de f não ser
necessária para que ela seja integrável (explicita condições de existência mais
gerais para que f seja integrável, ou seja, mesmo se f não for contínua, ela
pode ser integrável). Estamos de acordo com Duval pelo fato de que a conversão
entre os registros permite ao leitor, perceber outros aspectos da situação
representada, ou seja, a mudança de registro possibilita que o objeto
representado (função integrável, por exemplo) não seja confundido com o
conteúdo de sua representão.
Ainda nesse exemplo, Lima explicita uma relação entre f e
F
, em
língua natural, mostrando que a continuidade de
F
, por sua vez, não implica na
de f . Mais precisamente, ele escreve que:
F
é contínua, mas não é derivável
no ponto
1
=
x , que corresponde a uma descontinuidade de f .” (Ibid., p. 255).
Através da articulação desses três registros de representação, notamos que o
texto pode sugerir a coordenação dos mesmos, e segundo Duval, ela é uma
condição de acesso à compreensão em Matemática. Também na língua natural, o
autor indica que
=
x
a
dttfxF
)()(
denomina-se uma integral definida e escreve que
EXEMPLO 8. Seja Rf
]2,0[:
definida por
0)(
tf se
10
<
t e
1)(
tf
se
.21
t Tomando
,]2,0[:
RF
,)()(
0
=
x
dttfxF
temos
0)(
xF se
10
x e
1)(
xxF se
.21
x
103
o “processo de passar de f para
F
melhora, ou “amacia” as qualidades da
função.“ (Ibid., p. 255).
Para mostrar que f contínua implica
F
derivável, apresenta e prova o
Transcrição IV. 7 (Ibid., p. 255)
Embora esse teorema venha expresso através de dois registros
diferentes (no registro simbólico e na língua natural), o mesmo o sugere a
conversão, pois lembremos que a mesma se efetua quando ocorre a mudança de
registro conservando o mesmo objeto denotado. Por exemplo, o registro
)()(
'
cfcF = não é uma conversão do registro
F
é derivável no ponto
c
”, pois, o
teorema diz que além de
F
ser derivável em
c
, a sua derivada também é f em
c
, portanto são objetos deferentes. O fato de o texto não sugerir a conversão não
possibilita a coordenação dos registros.
Ressaltamos que o teorema oito, segundo alguns autores, é o
“fundamental do Cálculo”, no entanto Lima não o designa como tal. Sendo assim,
a inter-relação entre derivada e integral começa a ser apresentada.
Na demonstração do referido teorema, com base nos indicadores
elaborados, o autor parte da hipótese de continuidade de f no ponto
c
e da
definição de que
=
x
a
dttfxF
)()(
. O encadeamento lógico da demonstração é feito
com base em algumas propriedades da integral (teorema 5) e no teorema (da
Média)
+
=
hc
c
hcfdtcf
)()(
, mas não explicita os mesmos no texto. O autor prova
que
F
é derivável no ponto
c
, e, além disso, que a derivada de
F
é f , no ponto
c
.
TEOREMA 8: Seja Rbaf
],[:
integrável. Se f é contínua no ponto
c
],[
ba
, então a função RbaF
],[:
, definida por
=
x
a
dttfxF
)()(
, é derivável no ponto
c
e se tem
)()(
'
cfcF = .
104
Transcrição IV. 8 (Ibid., p. 255)
Notamos que os registros apresentados pelo texto são o simbólico
algébrico e a ngua natural (no final e em menor proporção), apesar disso a
conversão não é sugerida durante a demonstração. O autor apóia-se no primeiro
registro para efetuar os tratamentos com base nas propriedades da integral,
outros teoremas e relações, já mencionados.
Ressaltamos que na demonstração do teorema 8 observa-se a
conversão de registros, pois o enunciado dele apresenta também o registro língua
natural e a demonstração, por sua vez, é mostrada essencialmente no registro
simbólico algébrico. Porém, a conversão efetuada é utilizada a partir do ponto de
vista matemático, que segundo Duval, escolhem-se os registros nos quais os
tratamentos a serem realizados sejam mais eficazes, mais econômicos. Segundo
ele, existe uma diferença entre o ponto de vista matemático e o ponto de vista
cognitivo, sendo que no segundo a mudança de registro (conversão) deve ser
efetuada paralelamente ou a todo o momento para que haja apreensão global do
objeto representado.
Em seguida, Lima apresenta um corolário que garante a existência de
F
derivável, desde que f seja contínua no intervalo
],[
ba e, além disso, que a
derivada de
F
é f .
Demonstração: Dado
0
>
ε
, podemos achar
0
>
δ
tal que
],,[
bat
εδ
<
< )()(
cftfct
. Então, se
δ
<
<
h
0
e
],[
bahc
,
temos
==
+
+
)()(
1
)(
)()(
cfhdttf
h
cf
h
cFhcF
hc
c
++
==
hc
c
hc
c
h
h
dtcftf
h
dtcftf
h
εε
1
)()(
1
)]()([
1
.
Isto mostra que
)()(
'
cfcF =+ . De modo análogo se relaciona com h
negativo, obtendo-se
)()(
'
cfcF = , donde
)()(
'
cfcF = .
105
Transcrição IV. 9 (Ibid., p. 256)
Percebe-se que o autor busca ressaltar condições suficientes de
existência para que
F
exista de forma clara e explícita, e em seguida a esse
corolário, ele aborda essa questão, principalmente, na ngua natural.
Transcrição IV. 10 (Ibid., p. 256)
Na língua natural, ele designa
F
derivável como uma função primitiva
de f , desde que fF =
'
. De acordo com o exposto, o autor apresenta dois
registros diferentes para representar o mesmo objeto. Um deles é a língua natural
(“função primitiva”) que propicia tratamentos feitos através de associações verbais
para conduzir uma forma de raciocínio. outro, o registro algébrico
(“
=
x
a
dttfxF
)()(
”) que favorece tratamentos nele.
No segundo parágrafo da transcrição IV. 10, Lima volta a se referir ao
aspecto da continuidade e da integrabilidade das funções, agora na língua
natural, que o fizera nos registros gráfico e algébrico no exemplo 8 da página
255. Ele ainda se refere a este no exemplo a seguir.
COROLÁRIO: Dada Rbaf
],[:
contínua, existe RbaF
],[:
derivável,
tal que fF =
'
.
Chama-se primitiva de uma função Rbaf
],[:
a uma função
derivável RbaF
],[:
tal que fF =
'
. O corolário acima diz que toda função
contínua num intervalo compacto possui primitiva.
Nem toda função integrável f possui uma primitiva
F
. Com efeito,
já sabemos que se
'
Ff
então f não pode ter descontinuidade de primeira
espécie.
106
Transcrição IV. 11 (Ibid., p. 256)
Na primeira parte do exemplo 9, o autor volta a se referir ao exemplo de
uma função
F
contínua. Mas, como esta função não é derivável no ponto
1
=
x ,
ela não pode ser uma primitiva de f , dado no exemplo 8, ou seja, o fato de uma
função ser integrável o garante que ela tenha uma primitiva. Ainda
relativamente à transcrição IV. 11, é apresentada uma função f , que apesar de
ser descontínua, possui primitiva. No entanto, convém ressaltar que essa função
não é limitada, e segundo Riemann, não pode ser integrável. O exemplo 9 es
praticamente no registro ngua natural, sendo que é utilizado o registro simbólico,
apenas para mostrar dois tipos de funções com as peculiaridades mencionadas.
Partindo do fato que se uma função f possui uma primitiva
F
, Lima
argumenta que, então, existe uma infinidade delas, que diferem entre si por uma
constante, pois possuem a mesma derivada f .
Transcrição IV. 12 (Ibid., p. 256)
Tal resultado é o Teorema Fundamental do Cálculo para funções
contínuas, pois escreve que
F
é de classe
1
C (ou seja, é contínua e tem
derivada primeira contínua). Mais adiante, apresentará tal teorema a partir de
casos mais gerais – o de funções f integráveis que possuem uma primitiva.
Verificamos que o autor ênfase às questões que envolvem
condições de existência da primitiva: continuidade e integrabilidade. a questão
da inter-relação derivada-integral é sugerida ao leitor, porém ela não é tratada de
EXEMPLO 9: A função f do Exemplo 8 não possui primitiva em inter-
valo algum que contenha o ponto 1 em seu interior. Por
outro lado, a função descontínua
)0)0((
1
cos
1
sen2)(
== f
x
x
xxf
possui a primitiva
x
xxF
1
sen)(
2
= ,
0)0(
F .
[...] se RbaF
],[:
é de classe
1
C então
=
b
a
aFbFdttF
)()()(
'
.
107
forma explícita. Ressaltamos que essas questões (principalmente do corolário do
teorema 8 até esta parte do texto) são apresentadas, sobretudo, com enfoque no
raciocínio argumentativo expresso pela língua natural. De acordo com Duval,
mesmo que um registro seja privilegiado (neste caso, a língua natural), deve
existir sempre a possibilidade de passar de um registro a outro.
Em seguida, ele prova o resultado
=
b
a
aFbFdttF
)()()(
'
para a
derivada de
F
contínua:
Transcrição IV. 13 (Ibid., p. 256)
O autor, na prova desse resultado, tem por base o teorema 8, pois a
derivada de
F
é contínua. Além disso, usa o fato de duas primitivas diferirem por
uma constante para chegar à conseqüência desejada. Notamos nessa parte do
texto que os tratamentos são mais evidentes no registro simbólico algébrico com
algumas associações verbais (língua natural) para conduzir ao resultado.
Antes de enunciar o teorema 9 e designá-lo como o TFC, Lima escreve
que não é preciso a derivada de
F
ser contínua para tal resultado.
Transcrição IV. 14 (Ibid., p. 256)
Com efeito, sendo
'
F
contínua, pelo Teor. 8 a função
=
x
a
dttFx
)()(
'
ϕ
e a função
F
são ambas primitivas de
'
F
em
],[
ba . Logo
)()(
xFx
ϕ
constante. Como
0)(
a
ϕ
, segue-se que
)()()(
aFxFx
ϕ
, logo
)()()(
aFxFx
=
ϕ
, ou seja,
=
x
a
aFxFdttF
)()()(
'
,
para todo
].,[
bax
Tomando bx
=
, obtemos o resultado desejado.
TEOREMA 9 (Teorema Fundamental do Cálculo). Se uma função inte-
grável Rbaf
],[:
possui uma primitiva
RbaF
],[:
, então
=
b
a
aFbFdxxf
)()()(
.
108
Este teorema diz que o resultado
=
b
a
aFbFdxxf
)()()(
pode ser
utilizado bastando para isso que a função f seja integrável e possua uma
primitiva
F
. Da forma que está enunciado, esse teorema não explicita a relação
inversa entre a Derivada e a Integral, entretanto, esta relação é mais bem
evidenciada como escreve o autor:
Transcrição IV. 15 (Ibid., p. 257)
O contexto no qual está inserido o TFC, nas suas diferentes “versões”,
privilegia, como ressalta o autor em seu prefácio, o encadeamento lógico das
idéias, ou seja, ele é apresentado nos moldes: definições, teoremas, exemplos,
etc. O registro mais utilizado nesse contexto é o da língua natural. Faz uso
também do registro simbólico algébrico e alguns tratamentos nele, sendo que o
registro gráfico é utilizado apenas no exemplo 8 (transcrição IV. 6), porém, neste,
os tratamentos não o evidenciados. De forma geral, a coordenação dos
registros de representação não é explicitamente sugerida no texto, visto que a
conversão se faz, às vezes, apenas como uma simples mudança de registro, isto
é, não existe a articulação simultânea de pelo menos dois registros para
representar o mesmo objeto matemático e noções ligadas a ele, e isto, pode
dificultar a sua apreensão.
No que tange às diferentes apresentações do TFC, primeiro, Lima
apresenta um caso particular do mesmo para funções contínuas e depois
generaliza (casos mais gerais) para funções integráveis que possuem primitiva.
Relativo a condições de existência da primitiva, esse assunto é abordado e
enfatizado em várias passagens do texto, o mesmo pode-se dizer das questões
relativas à continuidade e integrabilidade das funções.
Verificados os indicadores mencionados, que evidenciam o enfoque
dado pelo autor e explicitam idéias fundamentais ligadas ao TFC, podemos
Em outros termos, se uma função RbaF
],[:
possui derivada inte-
grável, então
=
b
a
dttFaFbF )()()(
'
109
observar a utilização, por excelência, do registro simbólico e, principalmente, o da
língua natural. Apesar de Duval enfatizar a relevância do raciocínio argumentativo
pelo emprego da língua natural, ele também afirma, conforme já escrevemos
anteriormente, que mesmo um registro sendo privilegiado, deve existir sempre a
possibilidade de passar de um registro ao outro.
Ressaltamos que embora, às vezes, o texto sugira a conversão, esta se
faz do ponto de vista matemático e não do ponto de vista cognitivo, ou seja, o que
ocorre é uma simples mudança de registros e não a troca a todo o momento dos
mesmos.
A inter-relação derivada-integral é sugerida pelo autor, porém não é
tratada explicitamente no texto, ou seja, em nenhum momento Lima utiliza termos
como: “inter-relação derivada-integral”, “relação inversa...”, “Derivada e Integral
como operações inversas”, “conexão entre as operações...”, etc, que evidenciem
tal relação. Convém observar que, na transcrição IV. 15, o TFC vem expresso
pela conexão entre Derivada e Integral, de uma forma mais explícita. Resumindo,
o fato é que essa questão é enfatizada pelo autor no texto, pom não usa termos
que possam explicitá-la ao leitor. Relativamente aos registros de representação, o
Teorema é apresentado, em cada uma das transcrições IV. 14 e IV. 15, tanto no
registro simbólico quanto no da língua natural. O autor, porém, usa duas
representações diferentes no interior desses dois registros citados. Isso está
evidenciado na demonstração do mesmo, feita com base no TFC apresentado na
transcrição IV. 15.
Transcrição IV. 16 (Ibid., p. 257)
Demonstração. Para qualquer partição
},...,{
0 n
ttP = de
],[
ba , o Teo-
rema do Valor Médio nos
= =
==
n
i
n
i
iiiii
ttFtFtFaFbF
1 1
1
'
1
)()()]()([)()(
ξ
, onde
iii
tt <<
ξ
1
para todo ni
,...,1
. Indicando com
'
i
m e
'
i
M respectivamente o
inf
e
o
sup
de
'
F
no intervalo
],[
1
ii
tt
, temos
'''
i
)(m
ii
MF
ξ
, donde
);()()();(
''
PFSaFbFPFs . Portanto,
=
b
a
dttFaFbF )()()(
'
.
110
Lima parte da hipótese que
F
em
],[
ba possui derivada integrável para
chegar ao resultado
=
b
a
dttFaFbF )()()(
'
. Para isso, ele parte do primeiro
membro da igualdade que quer demonstrar e para cada subintervalo da partição
18
do intervalo
],[
ba , como
F
é contínua, aplica o Teorema do Valor dio
19
, e faz
tratamentos no registro simbólico algébrico. Em continuação, utiliza as
propriedades do ínfimo e supremo de
F
no intervalo
],[
1
ii
tt
, além dos
conceitos de soma inferior e superior, fazendo também tratamentos no registro
simbólico algébrico para conduzir ao resultado. Em menor proporção, faz-se o uso
da língua natural para nortear as deduções.
Após a demonstração, e principalmente na língua natural (sugerindo
uma conversão), o autor faz referência ao TFC, destacando nos parênteses
(transcrição IV. 17) o fato de a primitiva de f dever existir para que o resultado
do TFC possa ser empregado. Lembremos que quando f é contínua
necessariamente ela possui uma primitiva, porém neste caso (teorema 9) f é
integrável, e nem toda função desse tipo possui primitiva.
Transcrição IV. 17 (Ibid., p. 257)
Relativo a aplicações que envolvem o TFC, dentro na nossa unidade de
análise, verificamos que as mesmas são intrínsecas à Matemática, ou seja,
18
Uma partição
P
de um intervalo
],[
ba
é um conjunto finito
},...,,{
10
n
tttP =
onde
bttta
n
=<<<=
...
10
.
19
TVM - Seja
RbaF
],[:
contínua. Se
F
é derivável em
),( ba
,
);,( bac
a
b
aFbF
cF
=
)()(
)(
.
O Teor. 9 diz que as únicas primitivas de uma função integrável
Rbaf
],[:
(se existirem) o da forma
x
a
dttf )(
+ constante. Ele re-
duz a avaliação de
b
a
dxxf )(
, (quando a função f
possui primitiva) à
obtenção de uma primitiva de f , [...]
111
privilegiam a demonstração de outros teoremas (por exemplo: o de mudança de
variável, integração por partes, etc). Nestas aplicações, tanto na exposição dos
teoremas quanto na demonstração dos mesmos, Lima utiliza o registro simbólico
algébrico e o na língua natural. Os tratamentos são feitos basicamente no
primeiro registro, enquanto que o segundo é utilizado apresentar conceitos,
propriedades, relações, etc. Destacamos que existem algumas aplicações para
obtenção de primitivas, mas nenhuma delas privilegia o manuseio de cnicas. O
autor enfatiza uma aplicação TFC através do exemplo 10 que veremos mais
adiante.
No que concerne aos exemplos, existem apenas três, sendo que dois
deles foram analisados, e ambos tratavam especificamente de encadear
paulatinamente as condições essenciais requeridas que uma função deve
satisfazer para a aplicação do TFC. O exemplo 10, entretanto, apresenta uma
aplicação de tal teorema.
Transcrição IV. 18 (Ibid., p. 257)
A transcrição acima é o enunciado do exemplo a seguir.
Como aplicação do Teorema Fundamental do Cálculo, obteremos
agora o desenvolvimento de Taylor de
log
em torno do ponto 1 (ou de
(
)
x
+
1
log
em torno de
0
=
x
).
112
Transcrição IV. 19 (Ibid., p. 257/258)
113
O enunciado deste exemplo sugere demonstrações com base na
aplicação do TFC para se obter um resultado (desenvolvimento de Taylor).
Conforme o autor discorre sobre o mesmo, podemos verificar que é um tipo de
exemplo que utiliza a obtenção de primitivas, e que esta ressalta aspectos
conceituais e não técnicos, para conduzir aos resultados. Com base nos
indicadores elaborados, o objetivo do exemplo em questão, além daquele
ressaltado pelo autor, é o de mostrar deduções lógicas através de teoremas,
propriedades, relações, e etc. Relativamente aos tratamentos e conversões,
podemos notar que os primeiros são feitos no registro simbólico. A conversão, por
sua vez, é sugerida no final do exemplo, quando se faz a substituição por
1
=
x no
desenvolvimento de Taylor. Tal conversão é do registro algébrico para o registro
numérico (essa é a única vez, nessa unidade de análise, que o autor emprega tal
registro), porém é uma simples mudança de registros. Segundo Duval (2003, p.
16), quando a conversão é efetuada “somente para escolher o registro no qual os
tratamentos são mais eficazes, ou para obter um segundo registro que serve de
guia aos tratamentos que se efetuam em um outro registro”, não podemos falar
que está ocorrendo uma coordenação dos registros de representação semiótica,
pois a mesma requer uma mobilização ao mesmo tempo de pelo menos dois
registros diferentes, o que não ocorre.
Destacamos, no que se refere ao exemplo 10, que a língua natural é
utilizada apenas para conduzir a argumentação para que se efetuem deduções.
Os exercícios estão todos no final do capítulo e não explicitam
referência ao TFC. Por meio da nossa investigação, podemos observar que seus
enunciados sugerem o desenvolvimento de aspectos conceituais, principalmente
aqueles tratados ao longo desse capítulo, sendo que a maioria deles são
teoremas, e por sua vez, privilegiam demonstrações. Quanto aos registros, esses
exercícios estão representados pelo simbólico e língua natural, e indicam que, em
suas resoluções, serão efetuadas tratamentos no registro simbólico algébrico.
Podemos notar também que tais exercícios não sugerem a conversão dos
registros, e muito menos, a coordenação deles.
Em resumo, analisando a apresentação do TFC, quanto aos
indicadores elaborados, a contextualização não é sugerida, ocorrendo apenas o
encadeamento lógico das idéias nos moldes: definições, teoremas, propriedades,
114
alguns exemplos e exercícios. Emprega ao longo da unidade de análise
principalmente o registro simbólico e, em menor proporção a ngua natural.
O autor parte de casos mais gerais envolvendo funções f integráveis,
buscando condições de existência para casos particulares de funções contínuas
(quase não os menciona). No que se refere a condições de existência da
primitiva, Lima aborda o assunto de forma detalhada, principalmente utilizando-se
do registro da língua natural, além do simbólico e do figural gráfico (neste caso),
sugerindo a coordenação de registros.
No texto, faz referência sobre a conexão entre Derivada e Integral
apenas na abertura do capítulo, no entanto, ao longo da apresentação do TFC o
autor não explicita tal relação por meio de termos, embora enfatize a mesma no
enunciado dos teoremas, demonstrações e exemplos. Ainda que utilize a língua
natural e o registro gráfico (este apenas uma única vez), os tratamentos
envolvendo essa conexão são efetuados no simbólico algébrico.
As demonstrações do TFC, ambas logicamente estruturadas, utilizam
propriedades da integral, alguns teoremas e uma delas faz referência explícita à
partição do intervalo
],[
ba . Empregam basicamente o registro simbólico e
tratamentos nele.
Quanto às aplicações (além daquela mencionada anteriormente sobre o
desenvolvimento de Taylor), são todas intrínsecas à Matemática, sendo que
privilegiam a demonstração de outros teoremas, sendo que os tratamentos são
feitos geralmente no registro simbólico algébrico.
Os exercícios privilegiam demonstrações, sendo que nenhum privilegia
a técnica de integração.
Esta análise revela que o texto sugere discretamente a coordenação de
registros, sendo que a mesma ocorre mais explicitamente apenas no exemplo 8
(transcrição IV. 6), entre o figural gráfico, língua natural e simbólico algébrico. No
entanto, esse exemplo é bastante elucidativo nas questões que envolvem a
conexão Derivada-Integral, condições de existência da primitiva, continuidade e
integrabilidade de funções.
Embora a coordenação não seja explicitamente sugerida pelo texto, é
provável que o leitor, ao procurar entender os exemplos e demonstrações dos
teoremas, sejam motivados a lançar mão da conversão para o registro gráfico
115
(principalmente no que diz respeito ao significado da função
F
) para elaborar
os tratamentos e, posteriormente, retornar ao registro simbólico.
Em outras palavras, como esta obra não se destina a leitores de um
curso inicial de Cálculo, o autor não efetua com freqüência a articulação entre os
registros simbólico algébrico e gráfico, mas é provável que suponha que sua
abordagem, utilizando um encadeamento lógico-formal claro e rigoroso, seja
suficiente para promover, quando necessário, uma coordenação de registros que
a maturidade do leitor estaria apta a efetuar, principalmente envolvendo o registro
gráfico.
116
IV. 2 – Um curso de Cálculo de H. L. Guidorizzi
O TFC
20
é apresentado neste volume no capítulo 11 denominado
“Integral de Riemann”. Este inicia na página 299 e é subdividido em oito seções,
sendo que ao final de algumas seções encontram-se exercícios relativos aos
assuntos das anteriores, mais aqueles abordados na seção em questão.
A unidade de análise, conforme especificamos anteriormente, refere-
se às páginas 305 a 317. Entretanto, e sem maiores detalhes no que diz respeito
aos nossos indicadores, apreciamos algumas partes fora dessas páginas, isto
porque, alguns aspectos e conceitos pertinentes à nossa análise se encontram no
capitulo 10 sob a designação de “Primitivas”; no final do capítulo 11 (mudança de
variável e aplicações à Física como Trabalho e Energia Cinética); no apêndice 4;
e no capítulo 2 do segundo volume. Achamos conveniente destacar alguns
desses aspectos e conceitos por estarem ligados ao tratamento dado ao TFC no
texto.
No capítulo 10 (seção 10.1), Guidorizzi trata de assunto referente à
relação entre funções com derivadas iguais. O autor inicia com um caso mais
geral de funções com derivada zero em todo seu domínio e o ser constante.
Ilustra tal fato com o exemplo
<
>
=
0 se 1-
0 se 1
)(
x
x
xf , talvez, para motivar o seguinte
teorema: “Seja f contínua no intervalo
I
. Se
0)(
xf em todo
x
interior a
I
,
então existirá uma constante k tal que kxf
)(
para todo
x
em
I
.” (Ibid., p.
284). Antes mesmo de demonstrá-lo, ressalta, na língua natural, que se f tiver
derivada zero em todos os pontos de um intervalo, então f será constante nesse
intervalo.” (Ibid., p. 284). Notamos que o autor utiliza representações diferentes
para abordar como se comporta uma função constante e a sua derivada em um
intervalo.
Na demonstração desse, apóia-se na hipótese de f ser contínua e
emprega o Teorema do Valor Médio, fazendo os tratamentos no registro algébrico
para provar que existe kxf
)(
, sendo k uma constante.
20
O autor apresenta o Teorema em duas partes, sendo que se refere à primeira como “1º TFC”
(volume 1) e à segunda como “2º TFC” (este se encontra no volume 2).
117
Em seguida, o autor apresenta uma conseqüência do teorema
representado, primeiramente, no registro da língua natural: “[...] se duas funções
tiverem derivadas iguais num intervalo, então, neste intervalo, elas diferirão por
uma constante.” (Ibid., p. 285).
Depois, representa a mesma conseqüência por meio do registro
simbólico e da língua natural:
Transcrição IV. 20 (Ibid., p. 285)
Apesar de apresentar este aspecto, relativo a funções com derivadas
iguais, neste capítulo, ressaltamos que ele está ligado ao TFC e é relevante para
o seu entendimento.
Na demonstração do referido corolário mostra que a diferença entre f
e
g
é outra função h e que esta é uma constante nas condições da hipótese,
pois a sua derivada é zero no intervalo
I
.
Transcrição IV. 21 (Ibid., p. 285)
Até aqui verificamos que o autor faz uso também da língua natural para
que o leitor tenha, talvez, mais possibilidades no que diz respeito à apreensão dos
objetos matemáticos apresentados. Apesar disso, ocorre uma simples mudança
de registro, pois os tratamentos são feitos apenas no registro simbólico algébrico,
118
e, de acordo com isso, podemos considerar que a coordenação dos registros não
é sugerida nesta parte do texto.
No que diz respeito aos exemplos desta seção, eles são em número de
5, e são representados essencialmente nos registros da língua natural e no
simbólico, e neste são feitos os tratamentos. O registro numérico aparece em
menor proporção como condições para se chegar aos resultados. A maioria
destes exemplos é do tipo “determine” (apenas um deles é do tipo “prove”) em
que o autor utiliza alguns conceitos já tratados no livro, principalmente o de
Derivada.
os exercícios objetivam, em sua maioria, a demonstração (são do
tipo: “prove”, “mostre”, “conclua”), porém existem aqueles do tipo “determine”. Os
enunciados destes exercícios estão no registro língua natural e simbólico e
sugerem que para a sua resolução sejam efetuados tratamentos no segundo
registro (única exceção ao exercício 4 que explora o esboço de um gráfico). Como
nos exemplos, o registro simbólico numérico aparece em alguns poucos
exercícios como condições (relativas às constantes) para “determinar” uma única
função a partir da sua função derivada. Como observação, as notações de
Newton e Leibniz são utilizadas pelo autor tanto nos exemplo como nos
exercícios. Com isso, Guidorizzi usa representações diferentes para a Derivada
no registro simbólico, fazendo alguns tratamentos no algébrico e no numérico.
Na seção seguinte (10.2) define o que vem a ser primitiva de uma
função nos registros língua natural e simbólico. Ele escreve: “Seja f uma função
definida num intervalo
I
. Uma primitiva de f em
I
é uma função
F
definida em
I
, tal que
)()(
xfxF
para todo
x
em
I
.” (Ibid., p. 290). Principalmente no
registro da língua natural, ele ressalta que kxF
)(
( k constante) também é uma
primitiva de f em
I
e a designa como uma família de primitivas da função f no
intervalo
I
. Ele introduz a notação
dxxf
)(
também para representar a família de
primitivas de f , e escreve que kxFdxxf +=
)()(
, chamando cada termo da
família de uma integral indefinida de f . De forma não explícita, começa a mostrar
a derivação e a integração como operações inversas. Notamos que o autor lança
119
mão de dois registros simbólicos diferentes para representar o mesmo objeto, no
caso uma família de primitivas.
Os exemplos dessa seção (em número de 15) privilegiam, quase na
totalidade, o registro simbólico algébrico e tratamentos nele, não sugerindo a
conversão. O registro numérico é discretamente utilizado, e ainda assim, nos
últimos 3 exemplos. Convém ressaltar que alguns deles sugerem a relação
inversa entre a derivada e a integral, mas novamente, não de forma explícita.
Relativamente aos exercícios, que são em mero de 11, os 4 primeiros
tratam apenas de cnicas para se determinar as primitivas de uma função e
estão todos no registro simbólico algébrico, sendo que nenhum caso favorece a
conversão em suas resoluções. Os exercícios 5, 6 e 10, propiciam em suas
resoluções, além do registro simbólico algébrico, também a manipulação do
numérico (em menor proporção), porém, como os tratamentos são feitos apenas
no algébrico, os três exercícios não sugerem a conversão. o 7, 8 e 9
apresentam os seus enunciados também na língua natural e podem ser
considerados como aplicações à Física por tratarem de grandezas relativas ao
movimento
21
.
Em síntese, neste capítulo, dos exemplos aos exercícios, apesar de
algumas mudanças de registros, a coordenação dos mesmos não é sugerida pelo
texto, visto que não mobilização simultânea dos registros utilizados e nem a
troca deles a todo o instante.
Guidorizzi dedica o capítulo 11 para definir a Integral de Riemann. Após
as três primeiras seções, destinadas à definição de integral, trabalha
propriedades, o TFC, mudança de variável e cálculos de áreas e de Trabalho.
Para definir a Integral, inicia a seção 11.1 pela noção de partição de um
intervalo em
n
subintervalos no registro simbólico e depois representa esse
conceito no registro figural gráfico:
Transcrição IV. 22 (Ibid., p. 299)
21
Tempo, posição, deslocamento, velocidade, aceleração, etc.
120
O autor ressalta em língua natural que cada um dos
n
subintervalos
não são necessariamente de igual tamanho, porém a figura sugere que eles
sejam. A seguir ele escreve que o maior desses subintervalos designa-se por
amplitude da partição e será indicada por
i
xmáx
, para
ni ,...,2,1
=
.
Na seção 11.2 o texto discorre sobre a Soma de Riemann,
apresentando-a no registro simbólico, e, na intenção de dar um significado
geométrico para a mesma, recorre ao registro gráfico.
Transcrição IV. 23A (Ibid., p. 299-300)
Desde já podemos dizer que o autor busca condições necessárias
(casos mais gerais) para introduzir mais adiante a Integral, pois os pontos
i
c ,
como ele ressalta na língua natural, são escolhidos arbitrariamente (conforme
também mostra a transcrição IV. 23A), além disso os subintervalos
],[
1
ii
xx
o
têm necessariamente o mesmo comprimento. Tem-se que cada termo
ii
xcf
)(
da
soma de Riemann na transcrição acima, que está no registro simbólico,
representa no registro geométrico, a área de um retângulo cujas medidas da base
e da altura são respectivamente é
1
=
iii
xxx e
)(
i
cf , e isso é mostrado na
transcrição abaixo:
121
Transcrição IV. 23B (Ibid., p. 299-300)
O fato de
)(
i
cf ser positivo ou negativo, o que implica no sinal da
parcela
ii
xcf
)(
, é ressaltado pelo autor tanto no registro simbólico quanto no
gráfico, sendo que há uma mudança do primeiro para o segundo, porém, não são
feitos tratamentos em nenhum desses registros.
Em seguida, na língua natural, Guidorizzi que ressalta que a Soma de
Riemann pode ser interpretada como “a diferença entre a soma das áreas dos
retângulos
i
R que estão acima do eixo
x
e a soma das áreas dos que estão
abaixo do eixo
x
.” (Ibid., p. 300). Depois, apresenta um exemplo em que o
intervalo foi dividido em seis partes, empregando para isso os registros simbólico,
gráfico e língua natural.
Transcrição IV. 23C (Ibid., p. 299-300)
Em algum momento no texto, o autor explicita que o objeto matemático
denominado Soma de Riemann, indicado no registro simbólico por
=
n
i
ii
xcf
1
)(
,
é um número real. Depois usa outro registro (o gráfico) para uma visualização do
122
objeto, por último, representa o mesmo na língua natural. Segundo Duval, várias
representações de um mesmo objeto permitem que não se confunda tal objeto
com o conteúdo de sua representação.
Na seqüência, o texto apresenta na língua natural e também no registro
simbólico, sendo
F
uma função definida em
],[ ba
, tem-se:
=
=
n
i
ii
xFxFaFbF
1
1
)]()([)()(
, enfatizando que o primeiro membro da referida
igualdade é o acréscimo que
F
sofre quando se passa de
a
x
a
bx
=
e que o
segundo membro é a soma sos acréscimos de
F
em cada subintervalo da
partição. Aplica-se essa igualdade para demonstrar o resultado seguinte:
Transcrição IV. 24 (Ibid., p. 301)
O autor não explicita que as condições do Teorema do Valor Médio
estão satisfeitas pois sendo
F
derivável
)( fF
, será contínua em
],[ ba
.
No exemplo, se
f
for contínua e os
1
=
iii
xxx
forem “muito
pequenos”, escreve que
)()(
ii
cfcf
para qualquer escolha de
i
c
. Sendo assim,
o acréscimo
123
=
n
i
ii
xcfaFbF
1
)()()(
,
concluindo que
=
=
n
i
ii
xmáx
xcfaFbF
i
1
0
)(lim)()(
.
Destacamos que a relação entre a função
F
e a sua derivada
f
(apresentada também na seção anterior) é estabelecida por este resultado e que
posteriormente desembocano TFC.
Embora não tenhamos mostrado, a língua natural é utilizada para
nortear a argumentação através dos conceitos, propriedades e teoremas,
conduzindo ao resultado. Mas, ressaltamos que isso não significam conversões,
visto que a mudança de registros não se refere aos mesmos objetos. O que
ocorre são tratamentos efetuados no mesmo registro, no caso, o simbólico.
Guidorizzi apresenta o mesmo exemplo em uma “versão cinemática”.
Na verdade, ele apenas substitui algumas notações por termos que expressam
grandezas físicas tais como tempo, velocidade, deslocamento. O
desenvolvimento desse é semelhante ao do exemplo da transcrição IV. 24, no
que diz respeito aos tratamentos. Referente a essa versão cabe uma ressalva: o
autor apresenta uma aplicação do assunto em questão, e isso pode sugerir uma
tentativa de contextualizar a definição de Integral, motivada pelo problema.
A Integral de Riemann, introduzida na seção 11.2, é definida na seção
11.3. O autor escreve que quando
i
xmáx
tender a zero, a Soma de Riemann
tende a um limite que é representado no registro simbólico por
Lxcf
n
i
ii
xmáx
i
=
=
1
0
)(lim
. Esse limite
L
, se existir, é denominado Integral da
função
f
no intervalo
],[ ba
, indicando-o por
b
a
dxxf )(
. Ressalta que, por
definição,
=
=
b
a
n
i
ii
xx
xcfdxxf
i
1
0
)(lim)(
. Observamos que a Integral é definida
como o limite de uma soma, e para isso, o autor emprega o registro simbólico e o
da ngua natural. O fato de mostrar na seção anterior que
124
=
=
n
i
ii
xmáx
xcfaFbF
i
1
0
)(lim)()(
, pode sugerir, a partir da igualdade anterior a
esta, que a definição da Integral se reduza ao TFC, o que não é o caso.
O autor não entra em detalhes, mas escreve que se o limite
L
existe,
então
f
é dita integrável em
],[ ba
. Convém salientar que a questão da
integrabilidade de é tratada em um apêndice e também no volume 2, assim, a
discussão sobre a mesma se dará mais adiante, de acordo com os indicadores
elaborados.
A representação da Integral está no registro simbólico e suas
propriedades também. Estas são apresentadas na seção 11.4, pelo teorema
transcrito a seguir.
Transcrição IV. 25 (Ibid., p. 303)
Diferentemente de Lima, Guidorizzi não utiliza tais propriedades na
apresentação e demonstração do TFC, e isso, se verificado mais adiante. Este
autor utiliza alguns itens do teorema acima somente nos exemplos e exercícios,
no entanto não se refere explicitamente a tais propriedades. Os tratamentos feitos
nas demonstrações do referido teorema estão todas no registro simbólico. Apenas
o item
)d
mostra um registro figural gráfico para auxiliar os tratamentos feitos no
outro registro, o que caracteriza uma conversão de registros.
Na seção seguinte (11.5) são apresentados o Teorema Fundamental do
Cálculo, as noções que estão ligadas a ele, alguns exemplos e exercícios, além
de algumas aplicações. A análise de como se dá esta apresentação, baseando-se
125
nos diferentes registros de representação semiótica, é o objeto de nosso estudo.
Utilizamo-nos agora daqueles oito indicadores elaborados como norteadores da
análise, feita com base em Duval.
O autor, e novamente, afirma que para
f
integrável, o limite
L
da
Soma de Riemann existe e é único para qualquer escolha dos
i
c
. Em seguida,
começa a demonstrar o TFC mesmo antes de ter ele sido enunciado. Para isso,
fundamenta-se nas hipóteses de que
f
é integrável e
fF
em
],[ ba
. De
acordo com os indicadores, observamos que se partem de casos mais gerais,
como as funções integráveis
22
do grupo que possuem primitivas; também que os
1
ii
xx
não são necessariamente iguais; além de o texto ressaltar também que
o valor de
L
independe da escolha dos
i
c
23
. Vejamos:
Transcrição IV. 26 (Ibid., p. 305-306)
22
São discutidas as funções integráveis que não possuem primitivas no apêndice 4 deste livro e
também no volume 2.
23
Alguns textos o trazem como ponto médio do intervalo
1
ii
xx
, ou extremo esquerdo do
intervalo, ou ainda, extremo direito.
126
A demonstração deste primeiro TFC está relacionada com a forma que
a Integral foi definida, no caso, como o “limite de uma soma”. Como o acréscimo
)()( aFbF
é igual a soma dos acréscimos de cada intervalo, o autor faz uso do
TVM (pois,
F
é derivável em
1
ii
xx
) para começar os tratamentos feitos no
registro simbólico algébrico. Da hipótese
)()(
ii
cfcF =
resta a equação 1, e,
quando
i
xmáx
tender a zero o limite da Soma de Riemann torna-se igual ao
acréscimo
)()( aFbF
, chegando ao resultado. Como discussão, poderíamos
dizer que a conversão é sugerida em “... que
f
seja integrável em
],[ ba
e que
admita uma primitiva
)(xF
em
],[ ba
, isto é,
)()( xfxF
em
],[ ba
”, ou seja, texto
sugeriria mudança do registro da língua natural (
F
primitiva) para o registro
algébrico (
)()( xfxF
).
Notamos que a condução do texto até aqui, não evidencia de forma
explícita a relação inversa entre a Derivada e a Integral, isto é, o autor não faz uso
de termos como “conexão”, “inter-relação”, “relação inversa entre...”, etc, no
entanto, ele apresenta essa relação por meio da função
F
e a sua derivada
f
.
No enunciado deste primeiro TFC são empregados o registro simbólico e a língua
natural, como vemos:
Transcrição IV. 27 (Ibid., p. 306)
As condições
f
integrável e
fF
, ambas em
],[ ba
, o necessárias
para que se possa usar a igualdade acima. Guidorizzi escreve que no apêndice 4
provará que toda função contínua é integrável. Deste resultado segue que “se
f
for contínua em
],[ ba
e
F
uma primitiva de
f
em
],[ ba
, então
127
)()()( aFbFdxxf
b
a
=
.” (Ibid., p. 306). Ressaltamos, no entanto, que este não é
o “2º TFC”
24
.
Referente a condições de existência da primitiva, ele apenas menciona
que
f
integrável e possui uma primitiva
F
, porém não aborda esta questão neste
momento. Questões como a integrabilidade e continuidade, ligadas ao TFC,
também não são discutidas explicitamente, embora estejam presentes nos
enunciados dos teoremas e exemplos. Essas questões, no entanto, são
abordadas no apêndice 4 (demonstração) e no volume dois (uma discussão sobre
as mesmas).
Apesar de tratar das funções
f
integráveis no enunciado do TFC, não
trabalha sobre as mesmas, referindo-se apenas às contínuas nos exemplos,
aplicações ou exercícios. O fato de particularizar a utilização do Teorema apenas
para funções contínuas, nesse momento, sugere que os exemplos e exercícios
privilegiem técnicas, e não os conceitos que envolvem tal teorema.
No que diz respeito à contextualização, observamos que ela não se faz
presente no texto, pois o assunto não é apresentado através de problemas, e
também, porque não existem referências a aspectos históricos ligados às origens
do TFC e das noções que o envolvem. O que ocorre é a apresentação do assunto
nos moldes: definições, teoremas, exemplos e exercícios. Notamos que a
representação mais utilizada se encontra no registro simbólico e tratamentos nele,
sendo que a língua natural quase não é utilizada. O autor utiliza pouco o registro
gráfico para revelar outros aspectos do Teorema, como por exemplo, não lança
mão desse registro para mostrar a relação entre o gráfico de
f
e
F
. Guidorizzi
apenas utiliza o registro gráfico para mostrar a Soma de Riemann, mas não
emprega o mesmo na apresentação do TFC, no sentido de se fazer uma
discussão sobre relações entre as funções
F
e
f
.
Apoiando-nos nisso, podemos dizer que a coordenação dos registros
de representação não é sugerida explicitamente pelo texto, visto que a conversão
se faz, às vezes, apenas como uma simples mudança de registro, isto é, não
existe a articulação simultânea de pelo menos dois deles para representar o
24
O autor discute o TFC e a sua demonstração no volume 2. Mais adiante, porém,
apresentamos o mesmo.
128
mesmo objeto matemático e noções ligadas a ele, e isto, pode dificultar a
compreensão do Teorema.
Na seqüência, são apresentados 7 exemplos, todos do tipo “calcule”, os
quais privilegiam a utilização do TFC para se determinar a integral a partir de
funções elementares e contínuas no intervalo de integração. Isso nos diz que não
são discutidas questões relativas à existência de primitivas, que toda fuão
contínua possui uma primitiva. O mesmo pode se dizer, como enfatizamos, de
questões referentes à integrabilidade e continuidade.
Como todos os exemplos são semelhantes quanto à sua forma,
objetivos e resoluções, transcrevemos apenas o terceiro. Assim, a apreciação
deste vale para os outros.
Transcrição IV. 28 (Ibid., p. 307)
Tanto o enunciado quanto a resolução privilegiam apenas o registro
simbólico, com tratamentos algébricos e numéricos. Conforme os tratamentos se
efetuam, algumas propriedades da integral são utilizadas, embora o autor não
explicite esse uso. Podemos notar nesse e nos outros exemplos que não são
sugeridas mudanças de registros, o que indica que a coordenação deles não está
sendo explorada. Duval ressalta que mesmo um registro sendo privilegiado, deve
existir sempre a possibilidade de passar de um ao outro, pois quanto maior for a
flexibilidade entre esses diferentes registros, maior será a possibilidade de
apreensão do que está sendo representado.
129
Na seção (11.5) que trata do TFC, são apresentados 60 exercícios que
possuem as mesmas características dos exemplos no que tange ao tipo e
objetivo, e ainda, no que se refere aos tratamentos no registro algébrico e
numérico. Estes exercícios apenas são mais variados em termos do integrando,
mas ainda assim, as funções são todas contínuas no intervalo de integração.
Como vimos, os exemplos e exercícios tratados até aqui privilegiam
aplicações de técnicas com o objetivo, quase que exclusivo, de encontrar uma
primitiva para a função do integrando. na seção seguinte (11.6), o TFC
também é bastante utilizado como aplicação para o cálculo de áreas, sendo que
aparece uma maior diversificação nas características dos exemplos e exercícios
no que se refere ao tipo e objetivo dos mesmos. Essa diversificação corresponde
também aos registros empregados, visto que os problemas são expressos na
língua natural, no registro simbólico, e ainda no registro gráfico, esse último
utilizado para contribuir na interpretação geométrica das regiões a serem
calculadas. Um desses exemplos (o terceiro) é enfatizado a seguir, pois mostra a
diferença entre a Integral definida (número real) e a área delimitada pelo gráfico e
o eixo dos
x
.
130
Transcrição IV. 32 (Ibid., p. 313)
O enunciado do exemplo 3 faz uso da língua natural e do registro
simbólico, e a sua resolução faz uso do registro gráfico e tratamentos somente no
registro algébrico e no numérico. Apesar de o autor expor diferentes registros
nesse exemplo, os tratamentos não ocorrem no registro gráfico, ou seja, o texto
não sugere a articulação simultânea dos registros, nem apresenta a troca a todo o
momento dos mesmos. Diante disso, a conversão ocorre como uma simples
mudança de registro, embora ela auxilie nos tratamentos efetuados no simbólico
algébrico e também no numérico.
Os exemplos 2, 4, 5 e 6 são semelhantes no que se refere à aplicação
direta do TFC, pois em todos, as funções são estritamente positivas. Também
apresentam diferentes registros, chamando a atenção o gráfico e o simbólico
(com tratamentos algébricos e numéricos).
131
Particularmente os exemplos 4, 5 e 6 trazem duas funções e tem por
objetivo determinar a área da região delimitada pelos seus gráficos em um
intervalo determinado.
o exemplo 7 (transcrição IV. 37) apresenta um a aplicação à
cinemática. Este tem por objetivo determinar o deslocamento
25
e o espaço
percorrido
26
por uma partícula entre os instantes 1 e 3 segundos. No primeiro
caso basta aplicar o TFC diretamente estendido ao intervalo
]3,1[
. Para o
segundo caso tem-se que aplicar o TFC em cada subintervalo
]2,1[
e
]3,2[
para
depois somar as duas integrais. Lembremos que nesse caso deslocamento está
ligado ao cálculo da integral em
]3,1[
e o espaço percorrido corresponde
numericamente à área da região no plano. Ressaltamos que esse exemplo
apresenta no enunciado os registros língua natural e simbólico, e em sua
resolução, encontram tratamentos no registro algébrico e numérico. Existem
também dois registros gráficos diferentes para que seja evidenciado o intervalo de
integração, nesse sentido a mudança do registro algébrico para o gráfico traz
vantagens do ponto de vista do tratamento, pois ela facilita a compreensão ou a
descoberta.
25
O texto enfoca que a integral definida em
],[ ba
corresponde cinematicamente ao deslocamento
de uma partícula em
],[ ba
.
26
Já a área delimitada pelo gráfico no intervalo
],[ ba
e o eixo dos
x
, corresponde ao espaço
percorrido nesse intervalo.
132
Transcrição IV. 33 (Ibid., p. 315-316)
No que se refere à utilização do TFC aos exercícios desta seção (em
número de 26), ela está nos mesmos moldes dos 7 exemplos. Do ao 2é
necessário desenhar o “conjunto
A
e calcular a área, portanto, são aplicações
intrínsecas à Matemática. Seus enunciados estão na estão na língua natural e no
registro simbólico e sugerem, nas resoluções, a utilização do registro gráfico.
Nota-se, porém, que os tratamentos a serem privilegiados na resolução são
apenas no registro simbólico (algébrico e numérico).
Já o restante dos exercícios, são aplicações à Física e podem ser
resolvidos com base no exemplo 7. Os enunciados, na língua natural e no registro
133
simbólico, não evidenciam que se deva utilizar o registro gráfico em suas
resoluções nas quais os tratamentos serão efetuados no registro simbólico
(algébrico e numérico).
Embora as seções em que a análise se concentrou não sugerissem
explicitamente discussões a respeito da continuidade e integrabilidade; de
condições de existência da primitiva; e, da conexão Derivada-Integral,
ressaltamos que elas ocorrem no apêndice 4 (página 509 a 533) e no volume 2
(capítulos 1 e 2).
O apêndice 4 destaca condições necessárias (ser limitada, segundo
Riemann) para que uma função seja integrável, enfatizando: somas superior e
inferior de funções contínuas; integrabilidade das mesmas e de função limitada
com número finito de descontinuidades; além de o critério de integrabilidade de
Lebesgue. Os tratamentos são efetuados no registro simbólico algébrico, sendo
que a língua natural é utilizada em menor proporção.
Com relação aos capítulos 1
27
e 2 do segundo volume, o autor enfatiza
a relação entre uma função dada por integral e a respectiva derivada, ou seja,
explicita a inter-relação entre a derivação e integração por meio, segundo ele, do
Teorema Fundamental do Cálculo. Além dos registros da língua natural e do
simbólico, é utilizado com destaque, o figural gráfico. Neste são representadas
(em eixos cartesianos distintos) as funções
f
e a sua integral, denotada
geralmente por
F
. Observamos que Guidorizzi, utilizando-se desses diferentes
registros, propicia através do texto a coordenação deles; e ainda que, a língua
natural é utilizada consideravelmente nas discussões propiciadas pelo autor no
que se refere ao indicador “condições de existência da primitiva”.
Em síntese, e tomando como referência os indicadores estabelecidos,
verificamos que Guidorizzi, ao longo das partes analisadas, apresenta o TFC nos
moldes: definições, teoremas, exemplos e exercícios. Notamos que a
contextualização desse Teorema não se faz presente no texto porque não ocorre
a apresentação (ou resolução) de problemas, bem como não existem referências
históricas ligadas às origens do TFC. Embora sejam empregados os registros da
língua natural e gráfico, os tratamentos ocorrem geralmente no simbólico.
27
Este destaca vários exemplos de funções integráveis e não integráveis sugerindo que o leitor
reveja o apêndice 4 do volume 1.
134
O autor parte de casos mais gerais para os casos mais particulares,
buscando condições de existência para que o TFC possa ser utilizado, ou seja,
parte das funções integráveis para depois particularizar o TFC para as funções
contínuas.
Relativamente a condições de existência da função primitiva, ele não
aborda tal assunto de forma explicita na unidade de análise, embora o faça
enfaticamente no volume 2, empregando os registros gráfico e língua natural
também.
As questões referentes à continuidade e integrabilidade são apenas
mencionadas na unidade em que nossa análise foi concentrada, sendo que foram
tratadas no apêndice 4 deste volume e destacadas também no volume 2. Neste, o
autor propõe discussões sobre a mesma.
A relação inversa entre derivação e integração é apresentada na
unidade de análise, mas não de forma enfática. O autor não utiliza termos que
explicitem tal relação, por exemplo, “conexão”, “inter-relação”, etc. Os registros
empregados no que diz respeito a esta questão são, principalmente o simbólico
algébrico e em menor proporção a língua natural. Ressaltamos que no volume 2,
o autor emprega am destes, o figural gráfico também, enfatizando a função
dada por integral e a sua derivada em sistemas de eixos cartesianos distintos,
permitindo uma visualização da relação entre elas.
No que se refere à demonstração do TFC, o autor se baseia na
definição de integral como um limite de soma. Com base nas hipóteses de que
f
é integrável e
fF
, faz uso da noção de partição de um intervalo e do Teorema
do Valor Médio. Assim, efetua os tratamentos no simbólico algébrico.
No geral, os exemplos e exercícios (nas aplicações ao cálculo de área e
à Física também) privilegiam técnicas, abordando apenas funções elementares e
todas contínuas. O autor faz uso do registro gráfico e da língua natural nos
exemplos, porém, os tratamentos são efetuados todos no registro algébrico e
numérico. Os enunciados dos exercícios se apresentam na língua natural e no
simbólico, sugerindo a utilização do registro gráfico em algumas de suas
resoluções. Ressaltamos que em alguns desses casos, tanto nos exemplos como
nos exercícios, é sugerida a coordenação de registros.
135
IV. 3 – Cálculo de J. Stewart
O capítulo 5 do livro de Stewart, intitulado “Integrais”, possui uma
pequena introdução (pág 368) e está subdividido em seis seções, dentre as quais
está o TFC. Ao final de cada seção, encontram-se exercícios variados no que se
refere a enunciados e objetivos.
O enfoque de nossa análise concentrou-se na seção 5.3 (página 393 a
402); no entanto, e como nas outras obras, investigamos diferentes partes
pertinentes à apresentação e aplicação do TFC. Assim, ressaltamos que essas
partes
28
foram analisadas sem maiores detalhes, tanto no que diz respeito ao
conteúdo de suas páginas, quanto aos registros de representação.
A primeira seção que relaciona alguns aspectos da abordagem dada ao
TFC é a 4.10 sob a designação de “Antiderivadas”. Primeiramente, na língua
natural, o autor ressalta de forma sucinta, algumas aplicações (problemas) à
Física, Engenharia e Biologia, escrevendo que “[...] em cada caso, o problema é
encontrar uma função
F
cuja derivada é uma função conhecida
f
. Se a função
F
existir, ela é chamada ‘antiderivada’ de
f
(Ibid., p. 353). Ele sugere com isso
uma motivação para o tema a ser tratado nas próximas páginas. Logo em seguida
define que “Uma função
F
é denominada uma antiderivada de
f
sobre um
intervalo
I
se
)()( xfxF
para todo
x
em
I
(p. 353). Na primeira citação,
chama atenção para o fato de a antiderivada
29
poder não existir, porém ainda não
explicita algo relativo a esse assunto. Na segunda, ressalta que para ser
considerada uma antiderivada,
F
tem de ser derivável em todo o intervalo
I
e a
sua derivada é
f
.
Depois da definição, menciona um exemplo referente a antiderivada de
função quadrática
2
)( xxf =
. Nesse momento, e com base no exemplo, explicita
que se
3
3
1
)( xxF =
é uma antiderivada de
f
, então
CxxH +=
3
3
1
)(
(
C
constante)
também é, pois
)()()( xfxHxF
. Ele menciona que em outra seção foi
enfatizado que se duas funções têm a mesma derivada em um intervalo, então
28
São as seções: 4.10 denominada “Antiderivadas”; 5.1 e 5.2, destinadas a definição da Integral;
29
Lima e Guidorizzi designam o termo antiderivada por primitiva.
136
elas diferem por uma constante, depois anota o mesmo no registro simbólico
CxFxH
)()(
, sugerindo uma conversão. Existe até esse momento uma
predominância de registros na língua natural, sendo que o simbólico também é
utilizado. No entanto, uma representação do que chama de “família de funções” é
apresentada no registro gráfico, e nele é evidenciado um tratamento designado de
translação (no caso: vertical).
Transcrição IV. 34 (Ibid., p. 353)
Relativamente a essa transcrição, nota-se que o autor mobiliza dois
registros diferentes ao mesmo tempo, apresentando os tratamentos gráfico e
algébrico, respectivamente. Cada um dos registros mostra conteúdos cognitivos
diferentes, sendo que a mudança em um implica na mudança do outro (por
exemplo, a cada deslocamento para cima de uma unidade no gráfico,
corresponde a um acréscimo de uma unidade no termo independente da função).
Ambas as representações expressam o mesmo objeto, no caso, uma antiderivada
ou uma família delas. Com base nisso, podemos dizer que o autor, nesse
exemplo, explora a coordenação dos registros, e que esta, de acordo com Duval,
é considerada uma condição para a diferenciação entre os objetos matemáticos e
suas representações.
Em continuação, são apresentados oito exemplos, sendo que os quatro
primeiros são do tipo “encontre” uma antiderivada a partir de funções que
requerem técnicas elementares de antiderivação. Esses exemplos permitem ao
137
leitor refletir sobre a existência de várias antiderivadas de uma função. Com
relação aos registros de representação, notamos que os tratamentos são feitos
basicamente no registro algébrico e numérico para encontrar a solução. O autor
também emprega a língua natural para conduzir a argumentação e sugere, em
alguns casos, conversões.
Particularmente no exemplo dois, após o cômputo da antiderivada,
Stewart enfatiza na língua natural sobre possíveis aplicações, escrevendo que é
muito comum situações como a desse exemplo em que é solicitado descobrir uma
função sendo fornecida a sua derivada, referenciando-se assim, às Equações
Diferenciais.
Os exemplos 3 e 4 apresentam, am de tratamentos no registro
algébrico, alguns no registro numérico. O terceiro
30
, chama a atenção pelo
registro gráfico que relaciona a função denotada por
f
(antiderivada) e a sua
derivada por
f
. O autor explicita, na língua natural também, que o fato de a
antiderivada ser crescente indica que a função
f
é positiva (vide transcrição IV.
35). Destacamos, então, nesse caso, que o texto explora uma conversão da
língua natural para o registro gráfico. Mais adiante (seção 5.3), veremos que ele
utiliza essas duas representações para ressaltar a relação inversa entre a
Derivada e a Integral, estabelecida pelo TFC.
Transcrição IV. 35 (Ibid., p. 355)
30
Nesse exemplo
12
)1(20)(
++=
xexf
x
e uma antiderivada é
xtgexf
X
1
20)(
+=
.
138
A situação anterior ilustra o que preconiza Duval, ao enfatizar que
mesmo um registro sendo privilegiado, deve existir sempre a possibilidade de
passar de um registro ao outro, pois diferentes registros de representação de um
mesmo objeto não têm o mesmo conteúdo cognitivo. Esses diferentes registros,
então, complementam-se nesse aspecto e permitem a apreensão global do objeto
matemático.
Os dois próximos exemplos referem-se a técnicas diferentes quanto ao
esboço de uma antiderivada
F
a partir de uma função
f
. O exemplo 5 mostra a
mesma técnica do estudo do comportamento de funções, e são usados os
registros simbólico e língua natural, além dos dois gráficos esboçados (
F
e
f
,
em sistemas de eixos diferentes, e um embaixo do outro, facilitando as
comparações e a leitura). Notamos a conversão de cada um dos dois primeiros
para o registro gráfico e vice-versa, pois pode-se ler o gráfico e “acompanhar”
pelo texto para perceber as características dos objetos em questão (a função
f
e
a respectiva antiderivada
F
). Este exemplo sugere que o texto favorece a
coordenação de registros.
No exemplo 6, para o esboço do gráfico da antiderivada, o autor o faz
pelo que chama de “campo de direção”, usando vários segmentos pequenos de
tangentes e inclinações dos mesmos que auxiliam no esboço. Essas inclinações
são obtidas substituindo-se alguns valores no registro algébrico de
f
, pois
)()( xfxF
=
. Por exemplo, ele escreve que “uma vez que
1)0(
f
, o gráfico de
F
tem inclinação 1 quando
0
=
x
. Logo, traçaremos vários segmentos curtos da
tangente com inclinação 1, todos centrados em
0
=
x
(Ibid., p. 356). Em seguida
faz-se o mesmo para outros valores de
x
, resultando no esboço do gráfico da
antiderivada
F
(transcrição IV. 36). Nesse exemplo, além dos registros língua
natural e gráfico, é sugerido também o registro numérico para se determinarem
algumas inclinações que auxiliem no esboço. A mudança de registro (conversão)
ocorre do algébrico para o numérico e depois para o gráfico.
139
Transcrição IV. 36 (Ibid., p. 356)
Após este esboço, o autor ressalta que qualquer outra antiderivada de
f
seria obtida deslocando-se o gráfico de
F
para cima ou para baixo.
Os exemplos 7 e 8 apresentam aplicações à Cinemática em que uma
antiderivada é determinada a partir de uma função dada. Os enunciados estão no
registro da língua natural e, em menor proporção, no algébrico. nas
resoluções, os tratamentos efetuados estão no registro algébrico, sendo que
algumas associações verbais (língua natural) de informações extras são feitas
para conduzir ao resultado.
No final da seção encontram-se 79 exercícios que objetivam,
principalmente, a determinação da antiderivada de uma função, seja na forma
algébrica ou gráfica. No que se refere aos enunciados, o 44 primeiros, estão no
registro simbólico algébrico. Do exercício 17 ao 44 e do 50 a 52, os enunciados
exigem a verificação da resposta, comparando os gráficos de ambas funções,
com o auxilio de recursos computacionais. Do 45 ao 49, são apresentados
enunciados no registro gráfico e sugerem esboços das funções, também com a
utilização de tecnologias computacionais. Os exercícios 53 a 56 propõem esboços
de gráficos a partir do campo de direção. O restante dos exercícios são
enunciados principalmente no registro da língua natural, mas os objetivos o os
mesmos: achar uma função antiderivada e, a partir dela, calcular alguns dados
140
pedidos. A maioria desses últimos sugere para sua resolução, tratamentos no
registro algébrico e em menor proporção, no numérico.
Pela sintética descrição dos exercícios, podemos perceber a utilização
de diversas representações das noções tratadas na seção, como o autor mesmo
enfatiza em seu prefácio. A mudança de registros é, então, constantemente
sugerida pelo texto, que fornece subsídios para que o leitor não confunda o objeto
(antiderivada) e a forma pelo qual está representado.
No capítulo 5, denominado “Integrais”, o autor ressalta que “agora é um
bom momento de ler (ou reler) a seção ‘Uma Apresentação do Cálculo’ (página
2). Ela discute a unificação das idéias do Calculo [...]” (Ibid., p. 368). Em uma
pequena introdução deste, Stewart relembra que utilizara os problemas da
tangente e da velocidade para introduzir a noção de Derivada, e neste capítulo,
afirma que usará os problemas da área e da distância para formular a idéia de
uma Integral. Eis uma parte dela:
Transcrição IV. 37 (Ibid., p. 369)
Tanto na “Apresentação” quanto nesta introdução são enfatizadas as
idéias principais que propiciaram o desenvolvimento do lculo, além da
unificação dessas idéias através do TFC. Isso evidencia a preocupação do autor
em contextualizar os objetos matemáticos apresentados e tópicos inerentes a
eles.
Inicia o capítulo apresentando, primeiro, o problema da área, e depois,
separadamente, o da distância. Destacamos desde já, que nessa seção é
ressaltado que esses dois problemas se valem do mesmo tipo de limite.
O primeiro problema consiste em achar a área
S
sob uma curva
)(
xfy
em um intervalo
],[
ba
. Tal problema é apresentado nos registros gráfico
e simbólico.
141
Transcrição IV. 38 (Ibid., p. 369)
Após isso ele questiona o que vem a ser “área”, para depois de dois
longos exemplos, defini-la. Através destes, busca aproximar a região
S
por
retângulos e depois tomar o limite da soma de suas áreas, à medida que aumenta
o número desses retângulos.
O primeiro exemplo refere-se à uma estimativa para a área da região
sob a parábola
2
xy =
, em
]1,0[
. Primeiramente divide a região em 4 partes iguais
e depois faz uma estimativa melhor dividindo em 8 partes. Salientamos que o
autor, tanto no registro gráfico quanto no simbólico numérico enfatiza as somas
superiores e as inferiores, apresentando tais estimativas. A língua natural também
é utilizada na argumentação, porém o registro algébrico não é usado,
estabelecendo alguns tratamentos no registro figural gráfico e em maior
proporção no registro numérico.
O segundo requer uma prova de que a soma das áreas dos retângulos
aproximantes superiores do exemplo 1 tende a um terço. Nesse exemplo, os
tratamentos são feitos no registro simbólico algébrico e alguns no figural gráfico,
sendo que a língua natural também é utilizada.
Observamos que do primeiro para o segundo exemplo, Stewart parte de
casos particulares (4 e depois 8 retângulos de mesma base) para um caso mais
geral (infinitos retângulos) da região sob a parábola
2
xy =
em
]1,0[
. Em relação
aos registros de representação, a coordenação dos mesmos é sugerida no texto,
142
pois ele apresenta a mudança de registros várias vezes, principalmente no
exemplo 1, do figural gráfico para o numérico e vice-versa.
Em seguida, usa as idéias de ambos exemplos para definir a área de
uma região
S
sob o gráfico de uma função
f
, num intervalo
],[
ba
. Assim sendo,
divide a mesma em
n
faixas de igual largura, cada uma indicada por
n
ab
x
=
.
Depois, apresenta dois gráficos para a visualização das
n
regiões
i
S
, das
larguras
x
dos intervalos
],[
1
ii
xx
e das alturas
)(
i
xf
, estas últimas tocando o
gráfico de
f
nos extremos direitos
31
. Como a área do
i
-ésimo retângulo é
xxf
i
)(
, então a soma das áreas dos retângulos
xxfxxfxxf
n
+++
)()()(
21
é aproximadamente a área de
S
. Embasado
nessas idéias, apresenta a definição de área.
Transcrição IV. 39 (Ibid., p. 374)
Além de ressaltar que o limite acima sempre existe, visto que supõe
f
contínua, o autor generaliza essa definição, tomando agora qualquer número
*
i
x
no subintervalo
],[
1
ii
xx
e a respectiva altura )(
*
i
xf
, apresentando a expressão
])()()([lim
**
2
*
1
xxfxxfxxfA
n
n
+++=
para a área de
S
. Podemos notar que ele
continua dividindo os subintervalos em larguras iguais, porém os
*
i
x
são
quaisquer números em
],[
1
ii
xx
, conforme mostra a transcrição IV. 40.
31
Stewart ressalta que também pode ser provado que se obtém o mesmo valor se usar os
extremos esquerdos dos subintervalos:
])()()([limlim
110
xxfxxfxxfLA
n
n
n
n
+++==
.
143
Transcrição IV. 40 (Ibid., p. 374)
No que diz respeito aos tratamentos, eles são feitos no registro figural
gráfico e também no simbólico, com o auxilio da língua natural. Notamos a
conversão entre os dois primeiros registros.
Apresentado o problema da área e a definição da mesma em termos de
limite de uma soma, finaliza que
=
=
n
i
i
n
xxfA
1
*
)(lim
. Ressaltamos que este
registro permite tratamentos mais econômicos que o apresentado anteriormente.
Em continuação, apresenta um exemplo (agora para a curva
x
exf
=)(
entre 0 e 2) que está resolvido nos mesmos moldes dos dois anteriores e
descritos, ou seja, utiliza a mesma forma e os mesmos registro de representação
em sua resolução.
O segundo problema, o da distância, é apresentado basicamente
através do exemplo 4
32
, principalmente nos registros simbólico numérico (no qual
os tratamentos são efetuados) e língua natural, e em menor proporção, no
simbólico algébrico.
O autor termina essa seção enfatizando que as expressões da distância
e da área possuem a mesma forma, indicando que a primeira pode ser calculada
pela área sob o gráfico da velocidade. Ele refere-se a aplicações afirmando que
“outras quantidades de interesse nas ciências naturais e sociais [...] podem ser
interpretadas com sendo a área sob uma curva” (Ibid., p. 378). Os exercícios
desta seção são variados, tanto nos enunciados quanto nas resoluções, no que
32
O autor baseia-se em uma tabela que apresenta valores de tempo e velocidade, buscando
estimar a distância percorrida por um carro.
144
diz respeito aos registros de representação, sendo que alguns deles sugerem a
utilização de recursos computacionais, e/ou sistemas algébricos computacionais
(maple, derive, mathematica ou TI89/92).
Na seção 5.2, afirma que o limite
=
n
i
i
n
xxf
1
*
)(lim
existe mesmo
quando
f
o é necessariamente positiva, e apresenta esse limite como a
Integral definida.
Transcrição IV. 41 (Ibid., p. 380)
Notamos que para a definição da Integral, o autor parte de casos
particulares de funções contínuas e de subintervalos
x
todos iguais, no entanto,
ressalta que os pontos
*
i
x
são quaisquer números em
],[
1
ii
xx
, não importando
como são escolhidos os mesmos, que o limite que figura na definição sempre
existe e fornece o mesmo valor.
A definição de Integral é apresentada no registro simbólico e no da
língua natural, e neste enfatiza, entre outros aspectos, que o tal limite também
existe se
f
for limitada e tiver um número finito de descontinuidades “removíveis
ou saltos”, mas não descontinuidades infinitas, ou seja, o limite existe também
para um conjunto de funções mais amplo
33
, além das contínuas.
Em 5 notas, o autor faz algumas observações sobre notações
b
a
dxxf )(
para integral e
=
n
i
i
xxf
1
*
)(
, para representar a soma de Riemann. Sobre essa
soma, explica que se
f
assume valores positivos e negativos em
],[ ba
, então ela
33
Ele não explicita o conjunto como o das funções limitadas que são integráveis.
145
é a “[...] soma das áreas dos retângulos que estão acima do eixo
x
e o negativo
das áreas dos retângulos que estão abaixo do eixo
x
[...]” (Ibid., p. 382). E
quando toma o limite dessa soma, obtém a Integral definida, que pode ser
interpretada como a “área líquida”, isto é, a diferença das áreas
21
)( AAdxxf
b
a
=
, sendo que
1
A
representa a área da região acima do eixo dos
x
, enquanto que
2
A
representa aquela abaixo do mesmo eixo. Isto pode ser
visualizado na transcrição a seguir (figura 4).
Transcrição IV. 42 (Ibid., p. 382)
Particularmente na nota número 5, Stewart enfatiza que os
subintervalos da definição podem ter larguras diferentes e que às vezes é
pertinente trabalhar com os
i
x
desiguais. Sobre isso faz uma ressalva:
Transcrição IV. 43 (Ibid., p. 382)
Esta transcrição nos revela também que o autor se preocupa em
generalizar a definição da Integral, pois ressalta que os subintervalos não sejam
necessariamente iguais, desde que o maior deles tenda a zero na passagem ao
limite. Lembramos que ele enfatizara antes, que o limite pode existir mesmo
146
que a função
f
o seja contínua, além do que, esse limite não depende do
*
i
x
escolhido em cada subintervalo.
Diferentemente de Lima e Guidorizzi que definem a Integral a partir de
funções limitadas, Stewart a define supondo que elas sejam contínuas, embora
faça uma ressalva, como mencionamos, de que essa definição pode ser mais
ampla no que diz respeito ao conjunto de funções envolvidas.
Notamos que na apresentação da Integral e observações sobre a
mesma, o autor utiliza o registro simbólico e explora, em grande proporção, o da
língua natural. Ele sugere mudança de registros, por exemplo, quando se refere à
soma de Riemann no simbólico, depois, na língua natural e ainda no registro
gráfico (transcrição IV. 42, à esquerda).
Em seguida são apresentadas as propriedades da Integral, sendo que
algumas delas são utilizadas na demonstração do TFC e estão presentes, mesmo
que implicitamente, nos exemplos e exercícios. Também diferente da abordagem
dada aos outros dois livros, essas propriedades se baseiam em funções
f
e
g
contínuas.
Transcrição IV. 44 (Ibid., p. 387-388)
147
Transcrição IV. 45 (Ibid., p. 389)
O autor expõe as propriedades da integral no registro simbólico
algébrico, sendo que as suas “provas”, intuitivas, apóiam-se na língua natural, em
alguns registros gráficos que auxiliam na visualização dos argumentos, e no
registro algébrico. Ressaltamos que os gráficos das propriedades 5 e 8 são
utilizados na apresentação e demonstração do TFC.
Ainda nesta seção, três exemplos são apresentados para verificação
dessas propriedades, tendo seus tratamentos, basicamente, no registro simbólico
algébrico. O último deles chama a atenção por apresentar o resultado também no
registro gráfico, sugerindo uma conversão.
Enfatizamos também que embora as provas de tais propriedades não
sejam tão “formais” quanto as de Lima e Guidorizzi, o autor desse livro apresenta
diferentes registros de representação no decorrer delas. Segundo Duval a
mudança de registro tem vantagens do ponto de vista do tratamento, pois ela
facilita a compreensão ou a descoberta.
Os exercícios, referentes a esta seção, são em número de 69, e tanto
nos enunciados quanto nas resoluções propiciam o uso de vários registros de
representação tais como o simbólico algébrico, o numérico, o gráfico e a língua
natural. Notamos que todos eles são aplicações intrínsecas à matemática, sendo
que a maioria privilegia cnicas, no entanto, alguns envolvem questões
conceituais e/ou demonstrações. Além disso, alguns requerem a utilização
sistemas algébricos computacionais (CAS).
148
Finalizando a seção 5.2, apresenta um dos “Projetos Descobertas” com
subtítulo de “Funções Áreas”. Este é composto de 4 atividades que têm por
objetivo antecipar alguns resultados que serão discutidos no capítulo seguinte.
Transcrição IV. 46 (Ibid., p. 392-393)
149
Basicamente, estas atividades organizam-se no esboço de algumas
curvas e na relação entre as funções que originam essas curvas e a área sob as
mesmas. Explicitamente, o conteúdo dessas atividades permite que se perceba
de uma forma intuitiva, que a derivada de uma função “área” é a própria função
que origina o gráfico que está sobre essa área, ou seja, o conteúdo delas
expressa o TFC.
Os enunciados das referidas atividades estão no registro da língua
natural e no simbólico, e sugerem, em suas resoluções, a utilização do gráfico e
em menor proporção, do registro numérico, além do algébrico. Assim sendo, tais
atividades sugerem a mudança de registros, que é uma condição para a
compreensão em Matemática.
Até este momento, verificamos como estão abordadas algumas noções
ligadas ao TFC. Este teorema, as referidas noções a ele conectadas, exemplos,
exercícios e algumas de suas aplicações, são apresentados a seguir. A análise de
como se esta apresentação, baseando-se nos diferentes registros de
representação semiótica, é o objeto de nosso estudo. Utilizamo-nos agora dos
indicadores elaborados como norteadores da análise, feita de acordo com Duval.
Em pequeno texto no início da seção 5.3, o autor escreve que o TFC
faz a conexão entre a Derivada e a Integral, lembrando os problemas da tangente
e da área, que as originaram. Nesse mesmo, ressalta sobre a precisa relação
inversa entre as duas, conferindo a Isaac Barrow a descoberta de tal relação.
Enfatiza, porém, que foram Newton e Leibniz os exploradores dessa relação e
“usaram-na para desenvolver o Cálculo como um método matemático sistemático
(Ibid., p. 393).
Notamos que Stewart apresenta, mais adiante, o TFC em duas partes,
sendo que a primeira é destinada à exploração da função
=
x
a
dttfxg )()(
, em que
f
é contínua em
],[ ba
e
x
variando entre
a
e
b
. Afirma que se
x
é fixo, então a
integral é definida por um número, e, se
x
varia, a integral define uma função
denotada por
)(xg
. O autor usa a língua natural e o registro simbólico para
ressaltar que
)(xg
representa um número que depende de
x
, explicitando que se
f
for positiva, então
)(xg
é interpretada como uma área sob o gráfico de
f
em
150
],[ xa
(o Projeto Descoberta aponta para isto). Usa também o registro gráfico
para representar estas idéias.
Transcrição IV. 47 (Ibid., p. 393)
Antes mesmo de o autor continuar a argumentação, relativa a
=
x
a
dttfxg )()(
(vide também transcrição IV. 47), para concluir que
)()( xfxg
,
ele apresenta o primeiro exemplo
34
(transcrição IV. 48), e neste é mostrado um
esboço, em cinco etapas, do gráfico de
f
e as respectivas áreas representadas
pela função
g
nos pontos 1, 2, 3, 4 e 5. O cômputo das respectivas áreas se
baseia em triângulos, retângulos e em estimativas, sendo que o resultado é a
soma das áreas que estão acima do eixo
t
, menos a soma das áreas que estão
abaixo do eixo
t
. As figuras 2 e 4 são respectivamente as funções
f
e
g
, sendo
que a construção de
g
pautou-se nas áreas sob o gráfico de
f
.
34
Este exemplo é novidade nesta edição, pois segundo o autor, em seu prefácio, existe “[...] uma
certa dificuldade em entender a noção de uma função definida por uma integral com limite de
integração variável”. O autor enfatiza para a leitura do TFC antes de ler o exemplo 1.
151
Transcrição IV. 48 (Ibid., p. 394)
Nesse exemplo, o autor apresenta os registros da língua natural,
algébrico, numérico e gráfico, no entanto, a conexão entre a Integral e a
Derivada, é mais bem evidenciada no último registro, visto que os tratamentos
algébricos e numéricos não destacam tanto essa conexão.
Com o objetivo de enfatizar a noção de função “área”, ele sugere uma
coordenação dos registros simbólico e gráfico, explicitando os tratamentos em
cada um deles. Segundo Duval, a coordenação entre diferentes registros de
representação é uma condição para que haja a apreensão do objeto ou noção
matemática.
De acordo com os indicadores elaborados, podemos dizer a
contextualização relativa ao TFC é feita a partir da resolução de problemas
152
(Projeto Descoberta e exemplo 1) e de uma nota histórica que explicita idéias
fundamentais ligadas ao desenvolvimento do cálculo sistematizado. Nessa
contextualização, como mostramos, são empregados diversos registros de
representação.
Apoiando-se também no exemplo 1, Stewart continua sua
argumentação, apresentando de forma intuitiva que
)()( xfxg
. Para isso, faz
conversões entre os registros gráfico e simbólico, fazendo tratamentos,
principalmente, no segundo. A língua natural também é utilizada nessa
argumentação. Vejamos: ele mostra que
)()( xghxg
é aproximadamente igual
a área do retângulo (em destaque na transcrição IV. 49) de largura
0
>
h
e altura
)(xf
, expondo que
)()()( xfhxghxg
, e fazendo
)(
)()(
xf
h
xghxg
.
Quando
h
tende a zero, o limite do primeiro membro desta semelhança é a
derivada de
g
em
x
, sendo assim ele conclui intuitivamente que
)(
)()(
lim)('
0
xf
h
xghxg
xg
h
=
=
.
Transcrição IV. 49 (Ibid., p. 394)
Como o exemplo 1 está entre as transcrições IV. 47 e 48, ressaltamos
que talvez não sejam notados tratamentos no registro gráfico, mas eles ocorrem.
Assim sendo, a coordenação também é propiciada nesse caso, pois o autor
possibilita a troca entre os registros simbólico e gráfico pelo menos duas vezes.
Depois de contextualizar a inter-relação Derivada-Integral através de
uma nota histórica; de uma noção intuitiva relativa à função integral e a sua
153
respectiva derivada; e, de um exemplo, estes dois últimos, utilizando-se de
diferentes registros de representação, Stewart, na seqüência, enuncia a “parte 1
do TFC e enfatiza ainda mais essa inter-relação, escrevendo que “esse teorema
diz que a derivada de uma integral definida em relação ao seu limite superior é o
integrando calculado no seu limite superior” (Ibid., p. 395).
Transcrição IV. 50 (Ibid., p. 395)
Este teorema diz que a continuidade de
f
em
],[ ba
implica que a
função integral, denotada por
g
, seja derivável em
),( ba
e tenha
f
como sua
derivada, para todo
x
em
],[ ba
. O enunciado, embora esteja expresso na língua
natural e no registro simbólico, não sugere a conversão, pois, não há mudança de
registros conservando o mesmo objeto denotado. No entanto, como
ressaltamos anteriormente, a mudança de registros e a coordenação dos mesmos
ocorrem em sua apresentação.
Referentemente à demonstração (transcrição IV. 51) do TFC, com base
nos indicadores elaborados, o autor parte da hipótese de continuidade de
f
para
provar que a função
=
x
a
dttfxg )()(
é derivável em
),( ba
, isto é, que existe
h
xghxg
h
)()(
lim
0
para todo
x
em
),( ba
, e além disso, mostrar que esse limite é
igual a
)(xf
. O encadeamento lógico dessa demonstração é feito, também, com
base em algumas propriedades da integral (explicitando e nomeando-as no texto),
no Teorema do Valor Extremo
35
, na noção de limite e no Teorema do Confronto
36
.
35
“Se
f
for contínua em um intervalo fechado
],[ ba
, então
f
assume um valor máximo
absoluto
)(cf
e um valor mínimo absoluto
)(df
em algum número
c
e
d
em
],[ ba
(Ibid., p.
281).
36
“Se
)()()( xhxgxf
quando
x
está próximo de
a
(exceto possivelmente em
a
) e
Lxhxf
axax
==
)(lim)(lim
, então
Lxg
ax
=
)(lim
(Ibid., p. 110).
154
Transcrição IV. 51 (Ibid., p. 395)
Embora o registro da língua natural seja utilizado também na
argumentação, observamos que os tratamentos, no texto, são efetuados no
simbólico, sendo que o autor propicia a conversão deste para o gráfico
(transcrição IV. 51).
Nesta demonstração, ressaltamos que apesar de os tratamentos o
ocorrerem no registro gráfico, entre este e o simbólico, é sugerida a coordenação,
155
visto que o leitor pode utilizar o primeiro para acompanhar os passos da
demonstração, e depois voltar ao registro simbólico. Por exemplo, ao leitor, o
gráfico possibilita a visualização de uma das propriedades da integral
(
Mhdttfmh
hx
x
+
)(
), e depois, por meio da mesma figura, pode acompanhar que
quando
h
tende a zero,
u
e
v
tendem a
x
, devido
f
ser contínua para todo
x
em
],[ hxx
. Esta “troca” de registros de representação a todo o momento, ou
seja, a coordenação de pelo menos dois deles, de acordo com Duval, é uma
condição para a compreensão em Matemática, particularmente na nossa
pesquisa, de noções que envolvem o TFC.
Transcrição IV. 52 (Ibid., p. 395)
O autor, após a demonstração do teorema, enfatiza, novamente, a
conexão Derivada-Integral, apresentando o registro simbólico
=
x
a
xfdttf
dx
d
)()(
37
, e destacando, também, na língua natural, que “se primeiro
integramos
f
e depois diferenciamos o resultado, retornamos à função original”
(Ibid., p. 396).
Em seguida, porém antes do TFC “parte 2”, são apresentados os
exemplos 2, 3 e 4 que se referem também, como o primeiro, visto anteriormente,
37
Notação de Leibniz, segundo Stewart.
156
à relação entre a função dada por uma integral e a sua derivada, ou seja, o
objetivo destes é ressaltar sobre o conteúdo da “parte 1” do referido teorema.
O exemplo 2, na língua natural e registro simbólico (com tratamentos
nele), pede para se determinar a derivada da função
+=
x
dttxg
0
2
1)(
. O autor
destaca que como
2
1)( ttf +=
é contínua, então pelo TFC, tem que
2
1)( xxg +=
.
O seguinte exemplo apresenta tanto o enunciado quanto a resolução no
registro simbólico, e neste, são feitos os tratamentos. No entanto, o autor ressalta
na língua natural, o uso da Regra da Cadeia, mesmo sem explicitar, na resolução,
o porque de sua utilização.
Transcrição IV. 53 (Ibid., p. 397)
Esses dois últimos exemplos não sugerem a conversão, pois os
tratamentos são feitos apenas no registro simbólico, sendo que a língua natural,
nesse caso, não proporciona ao leitor perceber os tratamentos nela.
Entretanto, a coordenação entre registros é propiciada no texto do
exemplo 3. Notamos neste, que a língua natural é utilizada também para ressaltar
alguns aspectos históricos, além de aplicações da função (de Fresnel)
=
x
dt
t
senxS
0
2
2
.
)(
π
. Pelo TFC, o autor diferencia esta, escrevendo que
157
2
.
)(
2
x
senxS
π
=
. Em seguida, representa as funções
S
e a sua derivada,
denotada por
f
, em um mesmo sistema de eixos cartesianos, caracterizando
uma conversão entre os registros simbólico e gráfico. Enfatizamos que a relação
entre a função
f
e a sua integral
S
(ambas contínuas), apresentada tanto em um
registro quanto no outro, sugere a coordenação dos mesmos, pois possibilita ao
leitor, efetuar tratamentos em um, e depois fazer a conversão para efetuar
tratamentos no outro, isto é, este exemplo propicia a troca de registros a todo o
momento, e isto implica na mudança de modo de tratamento, e além disso, na
explicitação de propriedades ou diferentes aspectos do objeto. Duval afirma que
reconhecer o objeto matemático, em vários registros é uma condição para não
confundi-los com as suas representações.
Transcrição IV. 54 (Ibid., p. 396)
Stewart destaca ainda, que “[...]
S
é crescente quando
0)(
xf
e
decrescente quando
0)(
xf
. Logo, isso uma confirmação visual da Parte 1
do Teorema Fundamental do Cálculo”. (Ibid., p. 396).
Verificamos que o autor enfatiza a relação entre uma função e a sua
integral. No entanto, no que diz respeito à apresentação desta parte do TFC
(incluindo seus quatro exemplos, mencionados), de acordo com os indicadores
elaborados, notamos que todas as funções integrandas são contínuas, e que,
158
portanto, suas funções integrais são deriváveis. Assim, não são feitas discussões
e nem referências no texto, a casos mais gerais de funções integráveis, ou seja,
não discute a continuidade de
F
, se
f
fosse integrável.
Na seqüência, o autor lembra que o processo de cômputo da Integral,
como um limite de somas, pode, às vezes, ser “longo e difícil”. Sendo assim,
ressalta que a “parte 2” do TFC apresenta um “método mais simples” para o
cálculo da mesma. Vejamos isto:
Transcrição IV. 55 (Ibid., p. 397)
Este enunciado, apresentado no registro simbólico e na língua natural,
faz referência novamente, à conexão Derivada-Integral. Ressaltamos que,
diferentemente de Lima e Guidorizzi que apresentam funções integráveis no
enunciado da “parte 2” do TFC, o texto de Stewart parte de funções contínuas
para tratar do referido teorema, isto é, são evidenciadas, nele, as condições
f
contínua e
fF
, ambas em
],[ ba
, sendo que elas são suficientes para que se
possa utilizar a igualdade
=
b
a
aFbFdxxf )()()(
.
O autor, referente aos indicadores organizados, não discute sobre a
existência de funções antiderivadas (primitivas) no sentido da continuidade e
integrabilidade da função do integrando. Isto pode se dever ao fato de as
contínuas em um intervalo sempre possuírem primitivas nesse intervalo. No
entanto, ele menciona no exemplo 9, mais adiante, que a Integral
3
1
2
1
dx
x
não
existe porque a função integranda possui “uma descontinuidade infinita” no
intervalo considerado, mas discute a necessidade de a função integranda ser
limitada, uma vez que no TFC, exige que ela seja contínua num intervalo fechado,
o que implica em ela ser limitada. Em resumo, ele aborda em um exemplo e em
159
alguns exercícios questões sobre existência da Integral, pom não enfatiza a
respeito da existência de primitivas.
Em seguida, para demonstrar o referido teorema, com base na hipótese
de continuidade
f
, utiliza-se da “parte 1” do TFC e do fato de que
F
e
g
(antiderivadas de
f
) de diferem por uma constante, pois têm a mesma derivada
f
. Assim, como
0)(
ag
e
=
b
a
dttfbg )()(
, usa
CxgxF
)()(
para
a
x
e
bx
=
, concluindo que
)()()( bgaFbF
.
Transcrição IV. 56 (Ibid., p. 397)
Observamos que os registros de representação utilizados nesta
demonstração são o simbólico algébrico e a ngua natural. Uma conversão é feita
(de
F
e
g
diferem por uma constante, para
CxgxF
)()(
), mas apenas para
que os tratamentos efetuados sejam mais eficazes no algébrico. Com base em
Duval, ressaltamos ainda que a conversão sugerida no texto se faz, do ponto de
vista matemático, uma vez que a língua natural serviu de suporte ou guia aos
tratamentos efetuados no outro registro.
Stewart ressalta que a partir de uma antiderivada de uma função, pode-
se computar a integral dessa função, fazendo a diferença dos valores dessa
160
antiderivada, nos extremos do intervalo de integração, referindo-se à “parte 2” do
teorema, e isto, sugere uma conversão do registro simbólico
=
b
a
aFbFdxxf )()()(
para o da língua natural. Ele ainda destaca uma
interpretação do mesmo à cinemática, empregando o registro simbólico, além da
língua natural.
A seguir, são apresentados 5 exemplos, sendo que os 4 primeiros se
referem a funções contínuas e objetivam a utilização do TFC para o cômputo de
áreas e integrais definidas.
Três dos exemplos, nos enunciados e resoluções, utilizam a língua
natural como suporte aos tratamentos efetuados nos registros simbólicos
algébrico e numérico.
Destacamos um deles, que emprega, além dos outros, o registro de
representação gráfico. Este, porém, apresenta somente a função integranda.
Transcrição IV. 57 (Ibid., p. 399)
Neste exemplo, a conversão é efetuada da língua natural para que os
tratamentos sejam feitos no registro simbólico (algébrico e numérico), no entanto,
o texto não sugere a coordenação, pois, embora apresente diferentes registros de
161
representação, ele não propicia a troca a todo o momento dos mesmos. A
conversão ocorre, porém, como uma simples mudaa de registros.
Diferente dos outros quatro, o objetivo do último exemplo desta seção é
a verificação da possibilidade de um erro, pois a função a ser integrada não é
contínua no intervalo de integração, assim, o TFC não pode ser aplicado,
segundo o autor.
Transcrição IV. 58 (Ibid., p. 399)
O referido exemplo enfatiza impossibilidade de aplicação do TFC
quando suas hipóteses não são satisfeitas (no caso, a função integranda deve ser
contínua em
],[ ba
. Relativamente aos tratamentos, estes são feitos no registro
simbólico (algébrico e numérico), porém a ngua natural é relevante no sentido
proporcionar ao leitor a verificação do erro, este, talvez implícito nos outros
registros utilizados.
O autor finaliza a seção apresentando a junção das duas partes do
Teorema, e ainda ressalta que, juntas, estabelecem que a diferenciação e a
integração são processos inversos.
Transcrição IV. 59 (Ibid., p. 399)
162
No que diz respeito aos registros, o os mesmos apresentados nas
duas partes separadas. Destacamos que são representadas as partes 1 e 2
respectivamente por
)()( xfdttf
dx
d
x
a
=
e
=
b
a
aFbFdxxF )()()(
, ambas no
registro simbólico. Essas formas de representação evidenciam ainda mais a
relação inversa entre a Derivada e a Integral. Ressaltamos, porém, que estas
formas e aquelas da transcrição IV. 58 não caracterizam conversões, pois são
apenas transformações internas ao registro simbólico.
Após isso, em outra nota histórica, cita alguns matemáticos que
contribuíram para o desenvolvimento do Calculo, destacando a dificuldade de se
mensurar áreas, volumes, etc, antes da sistematização de tal todo, devido
principalmente, à Newton e Leibniz.
Relativamente aos exercícios, são em número de 70 e se encontram ao
final desta seção, sendo que suas características são bem diversificadas tanto no
que diz respeito aos objetivos quanto no emprego dos registros de representação
– no enunciado e nas resoluções.
O fato comum a esses exercícios é que tratam apenas de funções
contínuas no intervalo
],[ ba
, e isto sugere que não se propõem discussões a
casos mais gerais de funções. Muitos deles sugerem o esboço dos gráficos da
função
F
(antiderivada) e sua respectiva derivada
f
(função integranda),
proporcionando ao leitor verificar a relação entre essas duas funções. A primeira
questão, inclusive, pede para explicar “claramente” o que se entende por
diferenciação e integração como processos inversos (esta, como notamos, na
língua natural).
Stewart faz referências a algumas aplicações que estão mencionadas
nos exercícios, algumas delas, relativas à Engenharia, probabilidade, estatística.
A maioria das aplicações ligadas ao TFC, no entanto, são intrínsecas à
Matemática.
Observamos que muitos destes exercícios propiciam tratamentos em
pelo menos dois registros, sugerindo explicitamente a conversão. Alguns deles
sugerem ao leitor a simples mudança de registros, outros, a coordenação entre
eles também.
163
No geral, este livro apresenta, no tocante ao tipo e ao objetivo, uma
enorme variedade de exemplos, de exercícios, e ainda, como mencionamos, de
uma atividade diferenciada denominada “Projeto Descoberta” que tem objetivo de
antecipar os conceitos que serão trabalhados adiante. Além disso, ele apresenta
uma diversidade, também, de registros de representação empregados nesses
exemplos, exercícios, nessa atividade e ao longo da apresentação dos conceitos
e do TFC.
Em síntese, e observando os indicadores elaborados, a
contextualização é feita através de texto que coloca a inter-relação entre a
Derivada e a Integral; de um dado histórico que atribui a Isaac Barrow a
descoberta da relação entre o problema da reta tangente e o problema da área; e,
da atividade proposta no inicio da seção (Projeto Descoberta). Ao longo dessa
contextualização, são utilizados diversos registros de representação, sendo
efetuados tratamentos em um deles. Às vezes, esses tratamentos ocorrem em
dois registros diferentes, sugerindo, assim, em alguns casos, a coordenação entre
os mesmos.
O autor trata de casos particulares de funções contínuas não coloca
casos mais gerais relativos à função ser integrável e possuir uma antiderivada.
Menciona uma vez, discretamente, sobre a existência da Integral nos casos de
descontinuidades finitas, porém não aborda essas questões no texto de forma
detalhada. Faz referência (pelo menos três vezes no texto) sobre a relação
inversa entre a Derivação e a Integração, fazendo referência explícita ao TFC.
Quanto às aplicações, elas são diversificadas. Exploram tanto a idéia
do TFC em outras áreas como a Física, Engenharia, Biologia, Economia, etc (na
página 406 e 407 escreve sobre várias aplicações) como na parte que se refere
intrinsecamente à Matemática (usa esse teorema para demonstrar outros
resultados, por exemplo, a regra da substituição e cálculo de áreas).
Os exemplos e exercícios são bem distintos quanto ao tipo e objetivo,
vão desde cálculos e aplicações de técnicas às aplicações práticas. Poucos
exercícios ou quase nenhum privilegiam a demonstração.
Esta análise evidencia que a apresentação do TFC nesta seção sugere
a coordenação, predominantemente, entre os registros simbólico e gráfico, e em
alguns casos, a língua natural também sugere essa coordenação.
164
IV. 4 – Cálculo: um curso universitário de E. E. Moise
Diferentemente dos outros livros analisados, o livro de Moise vol 1,
apresenta o TFC e conceitos inerentes ao mesmo, basicamente, ao longo de 6
seções, ora no mesmo capítulo ora em capítulos diferentes, pois, como o próprio
autor enfatiza no prefácio, a profundidade dos conceitos envolvidos não pode ser
alcançada logo da primeira vez em que eles são colocados; sendo assim,
apresenta os mesmos em ordem crescente de dificuldade e generalidade,
referindo-se ao que designou deprocesso em espiral”.
Das partes apreciadas, o enfoque principal de nossa análise,
particularmente aos indicadores elaborados, concentrou-se na seção 3.7 “A
Derivada da Integral” e na 6.1 (introdução do capítulo 6 denominado “A técnica de
integração”). Destacamos que as outras partes
38
foram verificadas para mostrar,
de certa forma, como o autor expõe suas idéias no texto e como as liga a
apresentação do TFC.
Deste modo, a primeira seção (2.10) verificada apresenta uma solução
para o problema da área para parábolas” (Ibid., p. 56). O autor ressalta que
Arquimedes descobriu um método para calcular tais áreas, mas que aqui,
mostrará uma “solução mais simples e um tanto mais fácil do problema”.
Moise escreve que a questão da área do setor parabólico estará
resolvida se puder calcular a área de dois “triângulos curvilíneos” e subtraí-la da
de um trapézio. Esses “triângulos” (transcrição IV. 60) representam a área sob a
curva da parábola
2
xy =
, que é o exemplo utilizado pelo autor para ilustrar sua
solução.
Observamos que o referido problema é apresentado na ngua natural e
depois no registro figural gráfico, caracterizando uma conversão. Isto possibilita
ao leitor, além de uma visualização, acompanhar os tratamentos, mais adiante,
explícitos no registro simbólico algébrico.
38
As outras seções são: 2.10: Solução para o problema da área para parábolas; 3.6: A integral de
uma função o negativa; 3.9: Princípio da compressão: a Derivada da Integral; 4.7: Regra de
Simpson. Cálculo de pi; 7.8: Integrabilidade de funções contínuas; e, Apêndice D. Ressaltamos
que estas seções foram analisadas sem maiores detalhes, tanto no que diz respeito ao conteúdo
de suas páginas, quanto aos registros de representação.
165
Transcrição IV. 60 (Ibid., p. 57)
Com base em um outro registro gráfico, o autor aproxima a área sob o
gráfico da parábola
2
xy =
, dividindo o intervalo
],0[ h
em
n
partes iguais, sendo
que a altura
2
n
ih
do
i
-ésimo retângulo é o ponto da parábola que corresponde
ao extremo direito do respectivo intervalo, denotado por
n
ih
.
Transcrição IV. 61 (Ibid., p. 57)
O autor, então, expõe que a área de cada um desses retângulos é dado
por
3
23
2
n
ih
n
h
n
ih
=
e que a área da reunião de todos eles é igual a
= =
=
n
i
n
i
i
n
h
n
ih
1 1
2
3
3
3
23
. Passando para a ngua natural, ele afirma que o problema se
resolve quando
n
for “muito grande”, que o limite
n
A
da última igualdade deve
166
ser área da região sob a parábola em
],0[
h
. Ressaltamos que ele demonstra em
seção anterior a esta que
)12)(1(
6
1
2
++=
=
nn
n
i
n
i
. Embora não utilize ainda a
notação de limite e nem o termo infinito, apresenta que a área da região sob o
gráfico de
2
xy =
no intervalo em questão “deve ser”
3
3
h
.
Notamos o cuidado do autor em relação a termos que utiliza,
apresentados no registro na língua natural
39
, porque alguns são conceitos, que
serão definidos em seções posteriores.
Depois de enfatizar sobre o erro na aproximação feita pelo número de
subdivisões do intervalo, e que ele diminui conforme
n
aumenta, apresenta,
então, a notação
3
lim
3
h
A
n
n
=
, escrevendo também que “O limite de
n
A
, quando
n
se aproxima de infinito, é
3
3
h
(Ibid., p. 59). Nesta parte, faz uso apenas dos
registros da língua natural e simbólico, efetuando os tratamentos neste último.
Em continuação, Moise questiona que resposta teria a esse problema
se a área tivesse sido aproximada por retângulos inscritos sob a curva em
questão. Para responder, utiliza os extremos esquerdos do intervalo, procedendo
de forma análoga à primeira, descrita anteriormente. Ele ressalta que este
processo leva ao mesmo limite, ou seja,
3
3
h
. Além disso, mostra que o referido
procedimento é válido também para curvas do tipo
2
.
xk
(
k
positivo), sendo que o
resultado é
3
.
3
xk
. Em seguida, escreve (teorema 2) que
b
a
dxxk
2
.
representa a
área sob a curva
2
.
xk
de
a
x
até
bx
=
, e que essa área é dada (teorema 3) por
)(
3
33
ab
k
.
No registro simbólico e principalmente no da língua natural afirma que
(1) a área
n
A
(referente à dos retângulos “exteriores”) e (2)
n
A
(relativa à dos
“interiores”) tendem ao mesmo limite, denotando-o por
L
, quando
n
. A
39
Isto é, em relação aos termos e utilizados, por exemplo: “
n
muito grande”; “deve ser”; “
n
se
torna grande sem limitação”; “limite”, etc.
167
seguir, define: “Seja
R
uma região no plano. Se
R
satisfaz as condições (1) e (2)
então
R
é dita mensurável e o número
L
é chamado área de
R
(Ibid., p. 62).
Em uma nota histórica, destaca que a definição de mensurabilidade foi
estabelecida por Jordan no século XIX, porém, que as idéias que permeiam esse
conceito são antigas e datam de mais de dois milênios, referindo-se, em seguida,
à área do círculo efetuada através da área de polígonos inscritos e circunscritos,e
que ambas tendem ao mesmo limite (
2
.
r
π
), logo a região circular é mensurável.
Os enunciados dos 18 exercícios, ao final da seção, apresentam
diferentes registros, mas não sugerem a coordenação deles nas resoluções, uma
vez que a maioria favorece tratamentos no simbólico algébrico e em menor
proporção no numérico, além do que, o uso do figural gráfico é indicado em
apenas um deles. Do primeiro ao quinto exercício é dada a mesma curva
2
5
xy =
com intervalos diferentes para o cálculo das respectivas áreas, no entanto esse
se torna relativamente simples, que se tem o resultado
)(
3
.
33
3
2
ab
k
dxxk
b
a
=
(teorema 3).
De forma geral, nesta seção, os tratamentos apresentados estão
essencialmente no registro simbólico, sendo que o figural gráfico é utilizado
também, caracterizando conversões; algumas, no entanto, são sugeridas entre a
língua natural e o simbólico algébrico. As conversões são utilizadas do ponto de
vista matemático, ou seja, a mudança de registros se faz apenas para que os
tratamentos sejam mais eficazes em um deles. Assim, os registros em que
supostamente não ocorram tratamentos, servem de guia ao outro, no caso o
simbólico.
No próximo capítulo, o autor inicia a seção 3.6 referindo-se à integral de
uma função não negativa. Parte do mesmo exemplo mencionado na seção 2.10
relativo a área
h
A
da região sob o gráfico de
2
.
xky =
, indicando que se
0
>
h
é
fixo, então esta área é determinada por
3
3
h
k
. No entanto, ressalta que
h
A
pode
ser considerada uma função de
h
, denotando-a por
3
3
h
k
A
n
=
.
168
Fazendo uma conversão para o registro gráfico, destaca a área
h
A
sob
a função
2
.
xky =
. O autor, para que não haja confusão entre notações, introduz
)(
xF
como a área sob a curva
)(
xf
de 0 a
x
, e, após alguns tratamentos no
registro numérico para valores particulares de
F
, enfatiza uma relação entre
essas funções, no registro simbólico.
Transcrição IV. 62 (Ibid., p. 98)
Observamos até aqui que, com base no problema da área da região
sob parábolas do tipo
2
.
xk
, Moise começa a explicitar a relação entre as referidas
funções da transcrição IV. 62, além disso, e a partir de então, usa essas idéias
para generalizar tal relação. Assim, apoiando-se nos registros simbólico, gráfico e
principalmente na língua natural, ele ressalta que o procedimento utilizado é
válido para funções contínuas não negativas em um intervalo qualquer.
Em seguida, para destacar tal generalização, apresenta dois exemplos:
o primeiro, objetiva encontrar uma função para a área
)(
xF
sob a curva
1)(
ttf
, para
1
t
(esta representada também no registro gráfico). Como a
figura entre
)(
tf
e o eixo
t
em
],1[
x
é um trapézio, usa a área deste para
encontrar
)32(
2
1
)(
2
+= xxxF
, função que depende de
x
. Ressaltamos que este
exemplo apresenta uma conversão entre os registros simbólico algébrico e o
gráfico, mas apenas referente à função
f
, sendo que os tratamentos para
determinar
F
, estão evidenciados no primeiro. No entanto, a língua natural
permite que esses tratamentos sejam percebidos no gráfico, propiciando, neste
caso, uma coordenação entre registros.
169
Notamos que o segundo exemplo (transcrição a seguir), aproveitando o
resultado
)(
3
.
33
3
2
ab
k
dxxk
b
a
=
da seção 2.10, enfatiza que
],[
ba
pode ser um
intervalo qualquer.
Transcrição IV. 63 (Ibid., p. 99-100)
Notamos também neste exemplo, a conversão entre os registros
simbólico e gráfico no caso de
f
, e o uso do registro língua natural para que os
tratamentos, efetuados no simbólico, sejam evidenciados no gráfico, visto que
neste caso, a área não é tão elementar como a do exemplo anterior.
O gráfico à direita na transcrição IV. 63 sugere uma ilustração genérica
da função
)(
xF
que representa a área sob
)(
tf
, que é representada por
x
a
dttf
)(
.
O autor, em seguida, destaca que “em todas estas situações,
)(
xF
é determinada
por (a) uma dada função
f
, (b) o mero
a
e (c) o número
x
. Tudo isso é
englobado pela notação
=
x
a
dttfxF
)()(
(Ibid., p. 100). Salientamos desde já que
o autor faz referência explícita aos números
a
e
x
, pois, na seção seguinte,
170
utiliza-os de uma forma diferente, relativamente aos outros livros. Isto é, usa o
TFC para calcular áreas, de uma forma não habitual à apresentada nas outras
obras. Trataremos disso mais adiante.
Na seqüência, Moise generaliza os procedimentos mencionados nos
parágrafos anteriores, para o caso de a função contínua
f
ser negativa em
“alguns” valores de
],[
bat
, além daquele em que o limite inferior de integração é
variável, afirmando para este último que: “Se
x
a
, calculamos antes
a
x
dttf
)(
, e
então mudamos o sinal” (Ibid., p. 100). Utilizando a língua natural, ele argumenta
sobre o significado do sinal das áreas, e após isso, mostra ambos casos, tanto no
registro simbólico quanto no gráfico, conforme mostramos a seguir:
Transcrição IV. 64 (Ibid., p. 100-101)
Para enfatizar esses dois casos, utiliza um exemplo (transcrição IV. 65)
no qual são evidenciados tratamentos no registro simbólico algébrico. O registro
figural gráfico é mobilizado para o cômputo das áreas de triângulos e trapézios, e
conseqüentemente, a determinação da função
)(
xF
que a área sob o gráfico
de
)(
tf
. Assim, este último sugere tratamentos nele também, propiciando a
171
coordenação entre ele e o registro simbólico, isto porque, as conversões entre os
mesmos são necessárias para que se efetuem os referidos tratamentos, ou ainda,
a mudança de registros ocorre várias vezes.
Transcrição IV. 65 (Ibid., p. 101)
O exemplo acima mostra três situações nas quais um dos limites de
integração é fixo e vale
1
=
a
. Com isso o autor exemplifica o caso do sinal da
integral (vide
2
x
), e ainda, o referente ao limite de integração para
x
a
(veja
1
x
) em que é feita a mudança de ordem dos limites.
Lembremos que nesta parte do texto, o autor não explicita ainda a
determinação da função
F
por antiderivação, ficando a mesma para a seção
seguinte.
A seguir são apresentados 24 exercícios relativos aos assuntos
tratados nesta seção.
Basicamente, o objetivo do ao 18º é encontrar, com base nos
procedimentos mencionados, a integral de 0 a
x
para as funções
|| t
,
1
2
+t
e
t
sig
, suas respectivas derivadas, etc. Notamos que o autor também objetiva, a
partir desses exercícios, sugerir a inter-relação Derivada-Integral, que será
explicitada na seção seguinte.
172
Destacamos os 6 primeiros referentes à primeira função.
Transcrição IV. 66 (Ibid., p. 101-102)
Os enunciados estão, principalmente, no registro simbólico e na língua
natural, sendo que o registro gráfico que representa a função
tsigtf
)(
,
descontínua em um ponto, é apresentado. Coerentemente à análise do exemplo
anterior (transcrição IV. 65), esses exercícios propiciam a coordenação dos
registros, visto que os tratamentos no simbólico algébrico se efetuam a partir de
conversões do registro gráfico, para a determinação de
)(
xF
. Em contrapartida, a
derivada de
F
, possibilita visualizar a função
f
, assim é sugerida novamente
uma conversão, agora do simbólico para o gráfico. Essa mudança de registros
várias vezes, sugere a possibilidade de uma coordenação entre os mesmos.
Neste livro, Moise não intitula nenhum dos capítulos ou seção por
Teorema Fundamental do Cálculo, porém na seção 3.6, como verificamos,
começa a discutir a relação entre a função integral e a sua derivada. Agora, na
seção 3.7, intitulada “A Derivada da Integral”, ele explicita a conexão entre estas
duas noções. Neste momento, também utilizamos os indicadores elaborados
para subsidiar a referida análise, feita com base na teoria de Duval.
173
Baseando-se principalmente nos exercícios, o autor escreve: “vimos
que se
=
x
a
dtxfxF
)()(
, então
)()(
xfxF
(Ibid., p. 103), ressaltando o conteúdo
do TFC, no entanto, nessa seção este teorema não é designado como tal, sendo
que isto ocorre apenas no capítulo 6.
Após destacar a relação entre a função integral
F
e a sua derivada
f
também na língua natural, apresenta no registro gráfico ambas funções. Embora
não seja enfatizado o comportamento de uma em relação à outra, no primeiro
registro, o figural gráfico sugere que para
0
f
tem-se
F
crescente.
Transcrição IV. 67 (Ibid., p. 103)
De um modo informal, como afirma o próprio autor, mostra que se
f
é
contínua, então a relação
)()(
xfxF
se faz verdadeira, demonstrando-a apenas
na seção 3.9. Para isso, como a função
f
é positiva, ele parte da idéia de função
integral nos pontos
0
x
e
x
)(
0
xx <
. Assim, por meio de tratamentos no registro
simbólico algébrico com base no figural gráfico (transcrição IV. 68), conclui que a
área do retângulo
)()(
00
xxxf
é aproximadamente a diferença entre as áreas
)(
xF
e
)(
0
xF
.
174
Transcrição IV. 68 (Ibid., p. 103-104)
Verificamos na transcrição IV. 68 que o texto propicia conversões entre
os registros gráfico e simbólico algébrico, sendo que os tratamentos são
efetuados, principalmente no segundo. A língua natural é também utilizada nessa
argumentação, na busca do convencimento de que
)(
)()(
0
0
0
xf
xx
xFxF
. Ainda
que, talvez, não sejam notados tratamentos no figural gráfico, ressaltamos eles
são sugeridos, deste modo, a coordenação também é propiciada, pois o texto
possibilita a troca entre os registros simbólico e gráfico algumas vezes. As
conversões, de acordo com Duval, têm vantagens do ponto de vista dos
tratamentos, pois elas permitem notar aspectos diferentes em relação ao mesmo
objeto matemático, facilitando a compreensão do mesmo.
O autor, além de afirmar que o erro
E
(gráfico da transcrição IV. 68)
diminui quando
0
x
tende a
x
, mostra que essas idéias são válidas também
quando
0
xx <
, e na seqüência, lembra que o limite do primeiro membro (fração à
175
esquerda) da semelhança
)(
)()(
0
0
0
xf
xx
xFxF
é a derivada de
)(
0
xF
, conforme
ilustra a transcrição a seguir.
Transcrição IV. 69 (Ibid., p. 105)
Esta parte do texto ressalta a relação entre a Derivada e a Integral,
principalmente através do teorema 1.
O registro figural gráfico permite visualizar o conteúdo do teorema 1 (no
simbólico), pois, a derivada de
)(
0
xF
, que é a inclinação da reta em
0
x
, é a
própria função
f
no ponto
0
x
, e inversamente, a integral da função
f
em
0
x
é a
função
F
no ponto
0
x
. Ressaltamos que dois registros diferentes possibilitam
perceber outros aspectos dos objetos matemáticos, assim, eles se
complementam em relação à parcialidade que um tem em relação ao outro. Duval
afirma que mesmo um registro sendo privilegiado, deve haver sempre a
possibilidade de passar de um ao outro.
Alguns exemplos que nos referimos antes, tratavam de funções
polinomiais do segundo e primeiro graus primeiramente positivas, e depois
176
negativas também. Agora, Moise apresenta aplicações, baseando-se na inter-
relação entre a derivada e a integral, a um grupo mais amplo de funções
contínuas, isto é, utiliza a relação inversa para resolver problemas de uma
maneira diferente da empregada pelos outros autores, apesar de o método ser o
mesmo.
Antes de seguir com os exemplos, observamos, no que se diz respeito
aos indicadores elaborados, que a contextualização ao longo dessa análise se dá,
basicamente, por meio da resolução de alguns problemas (área do setor
parabólico), apenas aqueles intrínsecos à matemática. O autor parte de alguns
problemas particulares de funções polinomiais (do tipo
2
x
,
2
.
xk
e depois as do
grau), na busca do convencimento do método que expõe. No geral, ele não se
refere a fatos históricos ligados diretamente ao TFC, apenas faz menção discreta
à mensurabilidade e área na seção 2.10, destacando Jordan em ambas
definições.
Ainda com relação aos indicadores, notamos que o texto enfoca apenas
casos particulares de funções contínuas, não se referindo às integráveis, segundo
Riemann, isto é, ele não faz discussão ou aborda este conjunto de funções nas
seções que analisamos. Desde já, isto indica que os exemplos e exercícios
também não tratam deste tipo de questão, no que diz respeito à nossa unidade de
análise.
Observamos que a inter-relação Derivada-Integral é enfatizada, tanto
na língua natural, quanto nos registros simbólico e figural gráfico, essencialmente,
por meio da função dada por integral e a sua respectiva derivada.
Em continuação, Moise apresenta dois problemas com enunciados
diferentes, pom ambos têm objetivos semelhantes: “Problema 1. Calcular a área
sob o gráfico de
4
xy =
, de
0
=
x
a
1
=
x
(Ibid., p. 106). Ele escreve que para
resolver o primeiro, é necessário verificar antes o “Problema 2. Ache uma fórmula
para a função
dttxF
x
=
0
4
)(
(Ibid., p. 106). Assim, para determinar a referida
fórmula, emprega o teorema 1 da transcrição IV. 69, mobilizando tratamentos no
registro simbólico algébrico (predominante) e no numérico. A língua natural
também foi utilizada, porém, como suporte (ou guia) aos tratamentos feitos nos
outros dois. Ressaltamos que este exemplo não sugere explicitamente
177
conversões entre os registros mencionados e que, conforme se efetuam os
tratamentos, a relação inversa entre a derivada e a integral se evidencia no texto.
Antes de enunciar o “teorema 2”, utilizando como referência do segundo
problema o resultado
5
5
1
)(
xxG =
, o autor ressalta, no registro simbólico, que
como as derivadas de
G
e
F
são iguais para todo
x
e que
0)0()0(
FG
, isto
garante que
)()(
xFxG
para todo
x
.
Transcrição IV. 70 (Ibid., p. 107)
Este teorema, enunciado na língua natural e no registro simbólico,
destaca que se as funções
F
e
G
são iguais em pelo menos um ponto do
intervalo comum a elas, e ainda, se ambas têm a mesma derivada para qualquer
valor
x
pertencente a este intervalo, então elas são iguais para quaisquer valores
do referido intervalo.
Na seqüência, o autor enfatiza que “os teoremas 1 e 2, em combinação,
permitem-nos resolver uma grande variedade de problemas sobre áreas [...]”
(Ibid., p. 108). Assim, com o objetivo de mostrar a utilidade (aplicação) de ambos,
apresenta dois exemplos que são semelhantes, e por isso, julgamos conveniente
destacar apenas o primeiro deles.
178
Transcrição IV. 72 (Ibid., p. 108)
O registro gráfico permite visualizar os limites de integração inferior e
superior que são respectivamente
1
e
1
, no entanto, não sugere tratamentos
nele, am de não mostrar a relação entre a função
f
e a sua integral. A
conversão, então, nesse caso, deu-se apenas como uma simples mudança de
registros, ou seja, serviu para se obter um segundo que serve de guia aos
tratamentos efetuados no outro, no caso o simbólico algébrico.
Na demonstração, o autor destaca as passagens em que foram
utilizados os teoremas 1 e 2, ele usa o primeiro deles para a determinação da
função integral
)(
xG
, pois
)1(
F
e
)1(
G
são diferentes por uma constante, no
caso
3
2
. Assim, para que
)(
xF
e
)(
xG
sejam iguais em
1
(teorema 2), adiciona
179
3
2
a
)(
xG
, deste modo, consegue para todo
x
que
)()(
xFxG
. Para finalizar,
substitui o limite de integração superior por
1
e consegue que a integral procurada
seja
)1()1(
GF
=
, utilizando em seguida a fórmula encontrada para
)(
xG
no ponto
1
, chega ao resultado
3
4
. Na seqüência, Moise afirma que este procedimento
pode ser utilizado em outros casos também, resumindo o método aplicado aos
dois exemplos. Ressaltamos que tal método é o conteúdo do TFC.
Transcrição IV. 73 (Ibid., p. 109)
Notamos que a inter-relação Derivada-Integral é também enfatizada
pelo autor no que diz respeito aos exercícios, pois, Moise destaca que: “aqui e
daqui para frente em todo este conjunto de problemas, você deve explicar quais
as funções você está usando como as funções
f
,
F
e
G
(Ibid., p. 109).
A maioria dos 20 exercícios dessa seção tem como objetivo principal o
cálculo de áreas e de integrais pelos métodos utilizados ao longo da seção 3.7.
No entanto, em muitos deles, o autor (essencialmente na língua natural) sugere
que o leitor reflita sobre questões relativas à verificação de hipóteses, obtenção
de resultado sem efetuar cálculos e previsão de resultados apenas com base no
esboço do gráfico. Por exemplo, no exercício 19, referente ao cálculo de
1
1
2
1
dt
t
, o autor enfatiza que o resultado do cálculo obtido mecanicamente
180
pode não ser correto se não observar as hipóteses dos teoremas utilizados, deste
modo, ele sugere também que se interprete geometricamente a resposta obtida.
Com exceção dos exercícios 19 e 20, os outros tratam apenas de
funções contínuas, para a utilização do TFC. Além disso, notamos que todos eles
são aplicações intrínsecas à Matemática.
No que tange aos registros de representação, destacamos que os
enunciados dos mesmos se apresentam no simbólico algébrico e na língua
natural. Relativamente às resoluções, o uso do figural gráfico (como esboço) é
sugerido em apenas 3 exercícios. Assim, no geral, os tratamentos são efetuados
predominantemente no registro simbólico algébrico e em menor proporção no
numérico. Ressaltamos que nos que sugerem o uso do figural gráfico, as
conversões são simples mudanças de registros, sendo que no restante dos
exercícios, as resoluções não sugerem conversões. Diante disso, podemos
afirmar que de forma geral, nesses casos, a coordenação não é propiciada pelo
autor.
A seguir, na seção 3.9, é demonstrado o teorema
40
que contém a
essência do TFC (apresentado na seção 3.7 e designado como teorema 1) para
funções contínuas crescentes, e depois, para as decrescentes. Essa
demonstração é extensa ocupando várias páginas do livro, assim sendo, julgamos
conveniente apresentar um resumo da mesma. Com base nos indicadores
organizados, verificamos que o autor utiliza ao longo dela: o valor médio
41
m
de
f
dado pela função
=
x
x
dttf
xx
xm
0
)(
1
)(
0
; noções de limite e o “Teorema da
Compressão
42
”. Partindo de
=
x
a
dttfxF
)()(
, fixa um
0
x
para calcular
)(
0
xF
.
Então, efetuando tratamentos no registro simbólico algébrico, mostra que
40
“Se
f
é contínua num intervalo contendo
a
então
=
x
a
x
xfdttfD
)()(
em cada ponto
x
do
intervalo” (Ibid., p. 105). O autor a chama também como “fórmula de diferenciação” (Ibid., p. 457).
41
“Dada uma função contínua
f
, num intervalo
],[
0
xx
. o valor médio de
f
em
],[
0
xx
é um
número
m
tal que
=
x
x
xxmdttf
0
)()(
0
(Ibid., p. 118). A constante
m
tem a mesma Integral
que
f
.
42
Designado também como Teorema do Confronto.
181
==
=
0
0
0
)()(
lim)(
0
xx
xFxF
xF
xx
x
x
xx
dttf
xx
0
0
)(
1
lim
0
)(lim
0
xm
xx
=
. Utilizando-se também
de argumento geométrico, demonstra que para
f
crescente e
xx <
0
, tem-se
)()()(
0
xfxmxf <<
, assim,
))(()())((
000
0
xxxfdttfxxxf
x
x
<<
e desde que
0
0
>xx
tem-se a expressão
)()(
1
)(
0
0
0
xfdttf
xx
xf
x
x
<
<
. Em forma de outro
teorema, mostra que se
0
xx <
então
)()()(
0
xfxmxf <<
e pela continuidade de
f
, apresenta que
)()(lim
0
0
xfxf
xx
=
)(lim
0
xm
xx
=
. Desta maneira, como
)(lim)(
0
0
xmxF
xx
=
, então
)()(
00
xfxF =
, concluindo que
=
x
a
x
xfdttfD )()(
.
Em seguida, usando as idéias apresentadas, Moise demonstra o
teorema para o caso em que
f
não está definida em
0
x
. Por último faz o mesmo
para
f
decrescente em um intervalo. Convém salientar que no apêndice D
(página 457) o autor prova tal teorema para qualquer intervalo no qual
f
é
contínua.
Os registros de representação empregados em todas essas
demonstrações são o simbólico algébrico (predominante), a língua natural
(apenas como suporte para os tratamentos no primeiro) e o figural gráfico. A
utilização deste último foi destacada pelo autor em cada teorema apresentado,
permitindo que os argumentos algébricos fossem acompanhados também pela
visualização gráfica. Em resumo, na demonstração conversões entre os
registros citados, e ainda que os tratamentos não ocorram explicitamente nos
diversos registros gráficos, entre estes e o simbólico, é sugerida a coordenação,
visto que o leitor pode utilizar o primeiro para acompanhar os passos da
demonstração, e depois voltar ao registro simbólico.
Ao longo das seções 3.7 e 3.9, Moise dedica-se ao tema ”Derivada da
Integral”, como ele mesmo se refere ao título delas, sendo que volta a este
assunto, na seção 4.7 intitulada “Regra de Simpson. Cálculo de
π
”. Nesta seção,
ele discorre novamente sobre a essência do TFC (transcrição a seguir), no
entanto, ainda não o designa como tal, fazendo-o apenas na introdução do
capítulo 6.
182
Transcrição IV. 74 (Ibid., p. 171)
Embora as notações sejam diferentes ele retoma o teorema da seção
que faz menção à
=
x
a
x
xfdttfD )()(
para
f
contínua no intervalo, e a partir dele,
enuncia o teorema 1 como um “resumo” do descrito na transcrição IV. 74.
Ressaltamos que tal descrito faz referência ao método utilizado na seção 3.7 para
cômputo de algumas áreas e integrais, e, portanto, nos referimos ao mesmo
anteriormente.
Observamos que o autor destaca, no registro simbólico e na língua
natural, a “primeira parte” do TFC, sendo que a “segunda” (teorema 1) está
basicamente no simbólico.
Adiantamos desde já, de acordo com os indicadores, que as questões
relativas às condições de existência da primitiva o são tratadas explicitamente
pelo autor no texto. Notamos que dois exercícios, tratados anteriormente
atentam para as hipóteses do TFC, no entanto, não se faz uma discussão
183
explícita sobre tais condições, isto é, não se abordam questões do tipo: em que
condições essas primitivas existem? E se a função integranda não for contínua?
Funções descontínuas possuem primitivas? E as integráveis, possuem? Etc.
Conjeturamos que isso se deve ao fato de as funções tratadas nestas partes do
livro serem contínuas.
A questão da continuidade e integrabilidade também não é destacada
nas seções
43
que analisamos, porém ela é tratada no fim do capítulo 7 (intitulado
“Integral Definida”), sendo que neste, o enfoque do autor é relativo às funções
contínuas. No caso do nosso trabalho, tal questão é observada no que se refere
aos aspectos ligados, particularmente, à apresentação do TFC e conseqüências
para a utilização/aplicação do mesmo. De acordo com isso, verificamos que essa
questão não é não abordada explicitamente no texto, e nem se propõe discussão
sobre a interferência da mesma, relativamente a esse teorema.
A seguir, destacamos a demonstração do teorema 1 da última
transcrição:
Transcrição IV. 75 (Ibid., p. 171-172)
O procedimento utilizado na demonstração baseia-se nos dois teoremas
(transcrições IV. 69 e IV. 70) enunciados na seção 3.7, portanto, destacados
anteriormente. Apenas a notação se encontra diferente, sendo que a função
denotada por
)(xH
difere de
)(xG
por uma constante, esta denotada por
)(aG
,
43
Seções que constituem as unidades de enfoque da nossa análise.
184
daí vem que (1)
0)()(
aFaH
, além de (2)
)()( xFxH
, assim, pelo teorema
da unicidade, se (1) e (2) ocorrem, então para qualquer valor de
x
tem-se
)()( xFxH
=
. Particularmente, se
bx
=
, chega-se ao resultado
)()()( aGbGbH
.
Notamos que os tratamentos efetuados na demonstração do TFC
(designado teorema 1 pelo autor transcrição IV. 74) privilegiam o registro de
representação simbólico algébrico, embora, ao longo das seções verificadas,
evidenciamos que a relação entre a Derivada e Integral apresentada e abordada
com ênfase pelo autor, no texto, valeu-se de diferentes registros, sugerindo a
coordenação dos mesmos em vários casos, inclusive em algumas demonstrações
também.
Ressaltamos que no decorrer de nossa investigação, a língua natural
conduziu (deu suporte) argumentações e orientou os tratamentos efetuados,
principalmente, no registro simbólico. Convém salientar ainda, que embora o
registro gráfico da função integral
F
tenha ocorrido algumas vezes, o autor o fez
separado da sua respectiva função derivada, assim, a língua natural também
serviu de guia para que a visualização (e as vezes até tratamentos) fosse eficaz,
e deste modo, possibilitando a apreensão das noções inerentes ao TFC.
Nesse sentido, e de acordo com Duval, reiteramos que diferentes
registros de representação de um mesmo objeto, não têm o mesmo conteúdo
cognitivo. Assim, a parcialidade de cada um pode ser compensada pela troca dos
mesmos, ou seja, pela possibilidade de conversão entre eles. Esses diferentes
registros, então, complementam-se nesse aspecto e permitem a apreensão global
do objeto matemático.
Em continuação, ainda nessa seção é apresentada uma técnica
(intitulada “Regra de Simpson”) que permite o cômputo de áreas e integrais por
aproximação, utilizando funções quadráticas. No entanto, destacamos que tal
regra não é foco de nossa pesquisa. Os exemplos dessa seção e também os
exercícios tratam da mesma, sendo assim, não constam nessa pesquisa.
O Teorema Fundamental do Cálculo, abordado de maneira destacada
em seções anteriores, é apresentado sob esta designação apenas na seção 6.1.
O enunciado e a demonstração dele são basicamente os que constam nas
transcrições IV. 74 e IV. 75, tanto no que diz respeito às hipóteses e artifícios de
185
demonstração quanto aos registros de representação utilizados nos mesmos.
Diante disso, transcrevemos apenas o seu enunciado.
Transcrição IV. 75 (Ibid., p. 171-172)
Como as hipóteses deste teorema e conceitos inerentes ao mesmo,
foram abordados pelo autor no texto, inclusive através de problemas propostos e
de algumas aplicações intrínsecas à matemática, então, o objetivo dele nesta
seção é o cálculo e a manipulação técnica de algumas integrais mais complexas
que as já mostradas.
Assim, na página 250 é ressaltada a importância do TFC, no que diz
respeito à resolução não apenas de problemas envolvendo áreas, mas também a
uma variedade daqueles que, à primeira vista, não se parecem com problemas de
áreas.
Em seguida (seção 6.2), são abordadas questões relativas a variáveis
dependentes e independentes, com o objetivo de enfatizar sobre a técnica de
mudança de variável. Após isso, o autor apresenta duas tabelas: uma de
derivadas e integrais elementares e outra, mais completa, de primitivas
“imediatas”. Tais tabelas sugerem que os processos de integração e diferenciação
são inversos um do outro, no entanto, o objetivo dos exemplos e exercícios é
basicamente a obtenção de uma primitiva. Deste modo, os 3 exemplos
apresentados se referem à técnica de mudança de variável e os 60 exercícios
(todos no registro simbólico e tratamentos nele) no final da seção requerem,
exclusivamente, a determinação de uma primitiva. Destacamos o enunciado
destes: “Calcule as seguintes integrais e faça a verificação, em cada caso, por
diferenciação” (Ibid., p. 258-259). Notamos que o enunciado explicita a conexão
(enfatizada ao longo das seções analisadas) entre os processos de integração e
derivação,
186
As seções (6.1 e 6.2), apreciadas resumidamente, apresentam e
sugerem todos os tratamentos no registro simbólico algébrico, não ocorrendo o
figural gráfico. A língua natural é utilizada, no entanto, não proporciona
conversões entre ela e o simbólico. Assim, também não é explorada ou ao menos
sugerida a coordenação entre registros, nesta parte apreciada. Duval afirma que
mesmo um registro sendo privilegiado, deve existir sempre a possibilidade de
passar de um registro ao outro.
Em resumo, analisando a apresentação do TFC, quanto aos critérios
estabelecidos, a contextualização se faz basicamente por meio da resolução de
problemas, entre eles, o da área do setor parabólico (resolvido de forma diferente
à de Arquimedes). Nestes problemas o uso de diferentes registros se caracteriza,
propiciando a coordenação entre os mesmos.
O autor enfatiza casos particulares de funções contínuas, não propondo
discussões a respeito de funções integráveis que possuem primitivas ou funções
com descontinuidades finitas, deste modo não aborda no texto, de forma explícita,
sobre condições de existência da primitiva, nem o faz através de exemplos.
Com relação à referência sobre a Derivada e sua inter-relação com a
Integral, o autor atenta para esta questão ao longo de todas as seções
verificadas, embora não use termos como “inter-relação” ou mesmo “relação
inversa”, etc. No que refere aos registros de representação e esta questão,
notamos que ele propicia no texto conversões, principalmente, entre o registro
simbólico e o figural gráfico, embora não apresente no texto e nem sugira nos
exemplos e exercícios um tratamento das funções integral e sua respectiva
derivada em um mesmo sistema de eixos cartesianos. Convém salientar que
apresentamos algumas transcrições que trazem ambas em eixos distintos ou
isolados, possibilitando ao leitor notar em cada uma delas individualmente, alguns
tratamentos no registro simbólico.
A demonstração do TFC , como ressaltamos, com base na hipótese
que
f
é contínua, parte da função integral
)(xF
com o objetivo de provar que a
sua derivada é
)(xf
para todo
x
no intervalo. Para a conseqüência do mesmo
(segundo alguns autores), Moise utiliza, basicamente, o fato de que duas
primitivas de
f
diferem por uma constante, pois, ambas têm a mesma derivada, e
como
0)()(
aFaH
pelo teorema da unicidade, conduz ao resultado.
187
Observamos que a “primeira parte” demonstrada faz apelo ao figural gráfico
também, sugerindo conversões e até mesmo a coordenação entre este registro e
o simbólico. A língua natural também é empregada. em relação à “segunda
parte” (referimo-nos por conseqüência do TFC), os tratamentos são feitos apenas
no simbólico algébrico.
Quanto às aplicações, nas seções analisadas, verificamos que o autor
aborda somente aquelas relativas à própria matemática, ou seja, utiliza o teorema
para: o cômputo de áreas e/ou integrais, principalmente; para demonstrar outros
teoremas e para a obtenção de primitivas (aqui inúmeros exercícios), sendo
que o objetivo destes últimos é aprimorar a técnica de integração.
De forma geral, notamos, através dessa análise, que a coordenação
entre os registros de representação é explorada nas seções em que nossa
investigação se concentrou. Tal coordenação, de acordo com Duval, é uma
condição fundamental para a compreensão global de objetos matemáticos, então,
diante disso, podemos afirmar que o texto apresenta condições para que os
objetos matemáticos ligados ao TFC possam ser apreendidos.
A análise dos livros revela que Lima e Guidorizzi não sugerem
contextualização referente ao assunto investigado, sendo que o abordam, desde
o início, basicamente por meio de definições, teoremas, exemplos e exercícios.
Diferentemente destes autores, Stewart contextualiza as noções relativas ao
Teorema, apresentando: quatro atividades sobre “Funções Áreas” (Projeto
Descoberta), que antecipam alguns resultados discutidos nas seções seguintes;
um pequeno texto que ressalta a inter-relação entre a Derivada e a Integral,
inclusive fazendo referência a aspectos históricos que ilustram a origem dessa
relação; além de apresentar também um exemplo ressaltando o papel da função
integral e a sua respectiva derivada, utilizando-se para isso, de diferentes
registros. Moise, no que diz respeito à contextualização, introduz a Integral e o
TFC, essencialmente, por meio da resolução de problemas (o primeiro deles
sobre a área do setor parabólico), justificando o “processo em espiral” que
emprega ao longo da obra, ou seja, as idéias mais difíceis são apresentadas em
ordem crescente de dificuldade, generalidade e exatidão. Ressaltamos que este
188
autor não aborda aspectos históricos ligados às origens do TFC, embora
apresente o assunto com base em um problema relacionado com as mesmas,
utilizando para isso, diferentes registros de representação.
Os textos de Lima e Guidorizzi, relativamente ao nosso enfoque de
pesquisa, partem de casos gerais (
f
integráveis, segundo Riemann) para casos
particulares (
f
contínuas), sendo que o primeiro autor não aborda exemplos ou
exercícios destas últimas funções no integrando, embora trate sobre as mesmas
no parágrafo analisado; o segundo autor, por sua vez, apresenta apenas
integrandos contínuos nos exemplos e exercícios da seção em que a nossa
investigação se concentrou, porém, trata e discute no volume 2, questões
envolvendo funções integráveis. Neste aspecto, os textos de Stewart e Moise são
semelhantes, pois, estes introduzem o TFC a partir de casos particulares (funções
contínuas), não abordando ou propondo discussões mais detalhadas, no que se
refere a grupos mais gerais de funções integráveis que possuem uma primitiva.
Convém a ressalva de que estes últimos autores mencionam, discretamente, a
existência da Integral nos casos de “descontinuidades finitas” (Stewart) e infinitas,
porém não discutem explicitamente essas questões no texto.
Com relação a condições de existência da primitiva, Lima e Guidorizzi
apresentam funções integráveis que possuem primitiva. O primeiro autor, a
respeito desta questão, propõe discussão utilizando-se também dos registros da
língua natural e do figural gráfico. O segundo, como ressaltamos, promove a
mesma, no segundo volume da obra, empregando diferentes registros. Diante
desse fato, os dois autores propiciam a coordenação dos mesmos. Stewart e
Moise, no entanto, não tratam sobre essas condições em seus textos, isto é, os
autores não “dão pistas” para que o assunto seja notado, levando o leitor a refletir
sobre o mesmo ambos não tratam de funções integráveis que possuem
primitiva, de modo geral, trabalham com funções contínuas.
No que tange à questão da continuidade e à integrabilidade, Lima não
só expõe essa questão como também aborda a mesma de uma forma mais
detalhada e explícita no texto, principalmente na língua natural. Guidorizzi o
aborda essa questão na apresentação do TFC, apenas escreve que no apêndice
provará que toda função contínua é integrável, embora trate da mesma, conforme
destacamos, no volume 2, empregando também os registros gráfico e língua
189
natural. Relativamente a esta questão, Moise e Stewart se restringem às funções
contínuas, sendo assim não propõem discussão a respeito da mesma. Vale
ressaltar que Stewart, em apenas um exemplo (pág 399, exemplo 9), apresenta
uma função descontínua em um intervalo, chamando a atenção (principalmente
na língua natural) para a não possibilidade de utilização do TFC. Moise faz o
mesmo para um exercício (fora da unidade de análise pretendida no trabalho)
semelhante, inclusive utilizando para isso, tanto o registro gráfico quanto o da
língua natural.
A inter-relação Derivada-Integral é sugerida por Lima logo na introdução
do capítulo “Integral de Riemann”, embora esta parte do texto não pertença à
unidade de análise que nos propusemos investigar.
“É uma circunstância notável que a noção de área esteja
relacionada com as derivadas. Esta interdependência entre
derivação e integração é expressa pelo fato de que o conjunto
A
,
acima associado à função
f
, tem como área o número
)()( aFbF
, desde que
F
seja uma função cuja derivada é
f
.
Neste capítulo [...] estabeleceremos as relações mais importantes
entre a integral e a derivada “(Lima, 1982, p. 239).
Ele discute essa conexão se valendo também dos registros gráfico
(exemplo 8, transcrição IV. 7) e língua natural, propiciando conversões entre
estes e o simbólico, sugerindo também, neste caso, a coordenação entre eles.
Guidorizzi, por sua vez, não evidencia ou destaca tal inter-relação (na unidade de
análise), isto é, embora apresente o TFC, ele não aborda esta utilizando outros
registros que não seja o simbólico, sendo que neste, não explicita esta questão.
Salientamos, no entanto, que este autor utiliza o registro gráfico, para revelar
outros aspectos do TFC, como por exemplo, a relação entre o gráfico de
f
e
F
apenas no volume 2, porém o faz em sistemas de eixos distintos, como Lima no
exemplo citado anteriormente.
Ainda relativamente à conexão entre Derivada e Integral, Stewart (pelo
menos três vezes) faz referência, explicitando a relação inversa entre elas. Para
isto usa diferentes registros de representação, inclusive utiliza-se do registro
190
gráfico para evidenciar a relação entre uma função e a sua integral, no mesmo
sistema de eixos. Faz isto em exemplos, sugerindo ao leitor fazê-lo em exercícios.
O autor, assim, propicia a coordenação entre os diferentes registros de
representação, sendo que ela, de acordo com Duval, é uma condição para a
apreensão em Matemática. No nosso caso, relativamente aos tópicos inerentes
ao TFC.
Moise também enfatiza a relação inversa entre derivação e integração
nas seções que analisamos. Embora não use os termos que empregamos em
nosso trabalho tais como “inter-relação”, “conexão”, “relação inversa”, etc, o autor
aborda tal questão desde o início das seções investigadas, apresentando a
mesma, proporcionalmente, nos registros simbólico, língua natural e figural
gráfico. Nestes últimos, aborda a relação entre a função dada por integral e a sua
derivada em sistemas de eixos diferentes.
No que diz respeito ao indicador “demonstrações”, apresentamos
“enunciados” do TFC a seguir, apenas como referência para evidenciar diferenças
no enfoque de cada um dos autores:
(1) Seja
f
uma função contínua no intervalo
],[ ba
. A função
F
, dada por
=
x
a
dttfxF )()(
, é derivável em todos os pontos interiores ao intervalo
[,]
ba
e
sua derivada é dada por
)()( xfxF
.
(2) Se
f
é uma função contínua no intervalo
],[ ba
, então
=
b
a
aGbGdttf )()()(
,
onde
G
é uma qualquer primitiva de
f
, isto é, tal que
fG
.
(3) Se
f
integrável em
],[ ba
e se
F
for uma primitiva de
f
em
],[ ba
, então
=
b
a
aFbFdxxf )()()(
.
Ressaltamos que a exposição de tais enunciados e suas respectivas
demonstrações depende da maneira como a Integral foi apresentada. No caso,
Lima
44
define a mesma, a partir de somas superiores e inferiores de funções
44
Destacamos que este autor define a integral também como limite de somas na página 263 do
volume 1.
191
limitadas. Guidorizzi
45
, Stewart e Moise a definem como o limite de uma soma, no
entanto, este último autor, por sua vez, define a integral após a apresentação do
TFC.
Diante disso, o texto de Lima, primeiramente, apresenta (1),
designando-o “teorema 8”, sendo que a demonstração é feita com base na
hipótese de continuidade de
f
no ponto
],[ bac
e na definição de que
=
x
a
dttfxF )()(
. Assim, utiliza-se de algumas propriedades da integral e da
igualdade
+
=
hc
c
hcfdtcf )()(
(relativa ao Teorema da Média), porém, o
explicita os mesmos no texto. Mais adiante, no livro, ele enuncia (3),
demonstrando-o a partir do segundo membro daquela igualdade, utilizando para
cada subintervalo da partição de
],[ ba
, como
F
é contínua, aplica o Teorema do
Valor Médio, e no restante, usa a noção de somas superiores e inferiores. O autor
nas duas “partes” do TFC emprega, essencialmente, o registro de representação
simbólico algébrico, não sugerindo tratamentos em outros.
Guidorizzi, na unidade de análise cuja investigação se concentrou,
apresenta apenas
46
(3). Assim, demonstra o Teorema a partir das hipóteses de
que
f
é integrável e
fF
em
],[ ba
. Para isso, parte do segundo membro da
igualdade em (3), e como Lima, utiliza-se da noção de partição de um intervalo e
do TVM. No entanto, finaliza com base na noção de limite de uma soma. Os
tratamentos, ao longo desta demonstração, são efetuados basicamente no
registro simbólico.
Stewart e Moise apresentam os enunciados do TFC e suas
demonstrações de forma semelhante. Primeiramente apresentam (1), e, com
base na hipótese de continuidade de
f
em
],[ ba
e na definição de que
=
x
a
dttfxF )()(
: o primeiro autor utiliza-se do Teorema do valor Extremo, da
noção de limite e do Teorema do Confronto; já o segundo, emprega o valor médio
de
f
(relativo ao Teorema da Média) , noções de limite e o Teorema da
Compressão. Particularmente, esses dois autores empregam, junto aos
45
A definição de integral a partir de somas superiores e inferiores de funções contínuas é
apresentada no apêndice 4 do primeiro volume.
46
O autor enuncia e demonstra (1) no volume 2.
192
tratamentos no simbólico algébrico, o registro figural gráfico também, e assim, a
partir destas conversões, permite ou sugere a coordenação entre estes registros,
subsidiados ainda, pela língua natural. Os dois autores, mais adiante, e também
de forma análoga, apresentam (2), e, para demonstrar este, com base na
hipótese de continuidade
f
, utilizam-se de (1) e do fato de que
F
e
g
(antiderivadas de
f
) de diferem por uma constante, pois têm a mesma derivada
f
. Assim, como
0)(
aG
e
=
b
a
dttfbG )()(
(
G
é uma primitiva de
f
), usa
CxgxF
=
)()(
para
a
x
e
bx
=
, concluindo que
)()()( bGaFbF
. Em (2),
verificamos o emprego da língua natural e tratamentos no registro simbólico
algébrico, não sugerindo a coordenação, uma vez que a primeira serviu somente
de suporte ou guia aos tratamentos efetuados no outro registro, caracterizando
uma conversão, mas apenas do ponto de vista matemático.
O motivo de nos estendermos relativamente ao indicador
“demonstração do TFC”, justifica-se pelo fato de que a forma como expusemos os
dados analisados, permite evidenciar diferenças no enfoque dado por cada autor,
além de verificar se a utilização dos registros, no texto, propicia a coordenação
entre os mesmos.
Referente a aplicações que utilizam o TFC, Lima trata apenas daquelas
intrínsecas à matemática, no caso, que privilegiam a demonstração de outros
teoremas. Ele emprega, principalmente, o registro simbólico, e em menor
proporção o da língua natural. Guidorizzi, por sua vez, apresenta em seu texto,
também as intrínsecas à matemática, mas diferentemente de Lima, trata daquelas
que objetivam a obtenção de uma primitiva, cálculo de áreas e/ou volumes, etc. O
autor aborda também aplicações à Física (principalmente à Mecânica). Em
relação aos registros, os tratamentos, embora privilegiados no simbólico
(algébrico e numérico), podem ser acompanhados pelo figural gráfico, e alguns
também, através dangua natural. Diante disso, com base na nossa investigação,
verificamos que em vários casos, o autor propicia a coordenação entre diferentes
registros.
Em seguida, relativamente às aplicações, Stewart apresenta-as de
forma diversificada. Explora tanto a parte de resolução de problemas (relativos à
Física, Engenharia, Economia, Estatística, etc), como a parte que se refere à
193
própria matemática (a maioria delas). Para isso, emprega diferentes registros de
representação, possibilitando a coordenação entre eles, em vários casos. Moise,
por sua vez, mostra aplicações apenas intrínsecas à matemática (como Lima),
porém, aborda aquelas que se referem, basicamente, ao cálculo da Integral por
meio da obtenção de uma primitiva (destacando-a como uma função dada por
integral), e, para tanto, faz uso dos registros gráfico e língua natural, além,
evidentemente, do simbólico. Com base nisso, notamos que em vários casos o
autor explora a coordenação dos registros de representação.
No diz respeito aos exemplos e exercícios, baseando-nos também pela
análise dos dois últimos parágrafos, Lima privilegia demonstrações, sendo que
nenhum deles utiliza técnicas de integração. em seu livro, Guidorizzi faz
predominar técnicas (obtenção de primitivas e cálculo da Integral) utilizando
apenas funções contínuas. Stewart os apresenta de forma bem diversificada, vão
desde lculos e aplicações de cnicas às aplicações práticas. Alguns poucos
exercícios privilegiam a demonstração. Em Moise, os exemplos e exercícios
objetivam o cálculo de integrais e a utilização das técnicas de integração.
194
CAPÍTULO V
CONSIDERAÇÕES FINAIS
No início do curso de Mestrado, tínhamos como meta a investigação de
algum tema que fosse de fundamental importância no contexto do Ensino do
Cálculo Diferencial e Integral. De modo que optamos pelo TFC devido à sua
intrínseca relação com noções básicas de um curso de Cálculo como a Derivada
e a Integral.
Assim, começamos a investigação do modo como o Teorema é
abordado em alguns livros didáticos, entre eles, aqueles que nos forneceram
dados para a efetivação da pesquisa. Além disso, por meio da revisão de
literatura, ampliamos nossos conhecimentos a respeito do tema tanto no que se
refere ao objeto matemático (Tall (1991j), Scucuglia (2006), Viana (1998)) quanto
aos aspectos ligados à sua origem (Palaro (2006)), e ainda, quanto ao ensino do
mesmo (Viana (1998)). Outros trabalhos nos ofereceram idéias relativas ao “como
começar a investigar” (Silva (2004), Barufi (1999), Oliveira (2004)). A
fundamentação teórica (Duval) e os procedimentos baseados em indicadores
(Bardin) de organização, pertinentes aos aspectos da pesquisa e que se
complementaram, tiveram como raiz principal, os trabalhos destes três últimos
autores, assim como a idéia de investigar o TFC, partindo do material fornecido
pelos livros didáticos.
Consideramos que a Teoria dos Registros de Representação Semiótica
foi útil como uma ferramenta de análise para responder as questões de pesquisa,
pois permitiu que pudéssemos verificar como o TFC é tratado em livros didáticos
195
tanto no que diz respeito a diferenças fundamentais no enfoque dado a esse tema
por cada um dos autores, quanto à exploração da coordenação de registros por
parte dos mesmos, pois segundo Duval, esta é uma condição – primeiro: para que
os objetos matemáticos (inerentes e fundamentais para o entendimento do
Teorema) não sejam confundidos com as suas representações e segundo: para
a apreensão desses objetos.
Relativamente aos indicadores elaborados, consideramos que eles,
além de sugerir uma organização para o trabalho, foram essenciais para permitir
que conceitos importantes ligados ao TFC fossem evidenciados, e assim, revelar
diferenças no enfoque de cada autor. Segundo Bardin, tais indicadores
apresentam a informação de outro modo daquela que se encontra, possibilitando
ao leitor, percebê-la de outra maneira.
Os critérios de análise baseados na teoria de Duval e os indicadores
elaborados se complementaram ao longo da análise, permitindo que o objetivo do
trabalho fosse realizado, isto é, houve uma integração entre eles na busca de
respostas para as questões de pesquisa, pois ambos permitiram verificar
diferenças no enfoque de cada autor, e ainda, os primeiros possibilitaram
constatar a exploração da coordenação de registros, os segundos, evidenciar
também os objetos matemáticos ligados ao tema de investigação.
Embora esta complementação tenha existido e subsidiado nossa
análise, encontramos algumas dificuldades ao longo de nossa pesquisa, relativas
à utilização de todos os indicadores, pois eles não são mutuamente exclusivos e
às vezes o são, sendo que a caracterização detalhada de alguns tópicos
referentes ao tema, fosse imprecisa em alguns momentos. Isto se deveu, na
nossa visão, ao número elevado de indicadores elaborados, e também, porque os
livros possuem abordagens distintas. No entanto, julgamos que este fato
contribuiu para a riqueza do nosso trabalho (e de nossa aprendizagem também),
no sentido de buscar meios para contornar tal dificuldade. Outro fato relativo a
dificuldades, foi evidenciar e/ou descrever, possíveis tratamentos no registro da
língua natural. A conversão deste registro para outro ou vice-versa foi notada
mais facilmente.
196
Mas afinal, que diferenças fundamentais são evidenciadas no enfoque
dado por diferentes autores na apresentação do Teorema?
Essas diferenças estão evidenciadas e resumidas no final do capítulo
anterior, e a análise de cada um foi criteriosa e extensa, sendo que procuramos
fazê-la de forma simultânea
47
, tanto no que se refere aos registros de
representação, quanto aos indicadores. No entanto vale ressaltar que os quatro
autores, em seus prefácios, justificam, de certo modo, o próprio enfoque a ser
tomado na condução do texto. Alguns muito reveladores como é o caso de Lima,
Stewart e Moise, sendo que Guidorizzi, nem tanto. Relativo aos registros, os
prefácios mais reveladores da diversificação ou não dos mesmos são também o
de Stewart, Moise e Lima.
Notamos principalmente que o primeiro autor destaca sua abordagem
baseando-se: em leitores com alguma experiência em Cálculo; em conteúdos
estruturados logicamente, dando ênfase à conceituação precisa; e, na análise de
propriedades fundamentais no que diz respeito aos objetos estudados. Embora
não apresente quase figuras no texto, Lima destaca em seu prefácio que elas são
convenientes no sentido de atribuírem significado intuitivo aos raciocínios
requeridos. Stewart enfatiza que uma forma de motivação para a compreensão
dos conceitos é através de problemas (entre eles alguns projetos), principalmente
os que sugerem abordagens algébricas, numéricas e gráficas (termos que o autor
emprega no prefácio). Moise, por sua vez, revela que os conteúdos serão
apresentados: “em forma de espiral” (buscando generalização ao longo do texto);
e, por meio de problemas (destaca a utilização de gráficos para complementar
idéias analíticas e vice-versa). Guidorizzi enfatiza em seu prefácio,
principalmente, a ”ordem” que os conteúdos estão dispostos ao longo dos
volumes. Sugerem também, de forma discreta em relação à Stewart e Moise, a
utilização de figuras e interpretações físicas como motivação para a apresentação
dos assuntos. Ressaltamos (relativamente às unidades de análise) que Guidorizzi
geralmente apresenta exemplos e/ou problemas após a abordagem dos temas,
47
À medida que verificávamos os indicadores elaborados, a análise se efetuava com base nos
registros de representação.
197
enquanto que os últimos dois autores os expõem, em vários casos, antes de
institucionalizar os conteúdos.
A coordenação dos registros de representação é explorada pelos
autores na apresentação do TFC?
No geral, e de acordo com os dados da análise, verificamos que:
Lima utiliza, predominantemente, o registro simbólico algébrico e
emprega consideravelmente o registro da língua natural na apresentação do TFC.
O conteúdo do livro é indicado para alunos que possuem um curso inicial de
cálculo, talvez por isso o autor quase não recorra ao registro gráfico. Apesar
disso, em alguns poucos casos, o autor propicia a coordenação dos registros
citados (fazendo tratamentos no primeiro), utilizando o segundo como registro de
representação complementar. Embora o registro gráfico tenha sido utilizado
apenas uma vez, ele é bastante elucidativo no que se refere a alguns indicadores
(condições de existência da primitiva, inter-relação derivação-integração,
continuidade e integrabilidade de
f
).
Guidorizzi faz uso do registro simbólico algébrico predominantemente.
O registro gráfico não é explicitamente explorado na introdução do TFC, embora
seja empregado em vários exemplos e exercícios, sugerindo, assim em alguns
casos a coordenação entre registros.
Stewart utiliza os registros algébrico, gráfico e língua natural em
proporções mais parecidas. Propicia, assim, a coordenação dos registros de
representação em várias passagens do texto analisado. Emprega o registro
simbólico algébrico para os tratamentos e o registro gráfico como auxiliar, e, às
vezes, efetuando alguns tratamentos nele também (translação vertical, por
exemplo, função integral e sua respectiva derivada no mesmo sistema de eixos,
etc).
Moise emprega os registros simbólico algébrico, figural gráfico e língua
natural proporcionalmente. No entanto, o autor faz os tratamentos basicamente
no registro simbólico algébrico, utilizando a língua natural e o registro gráfico
(alguns poucos tratamentos são possibilitados também) como registros auxiliares
para propiciar, em vários casos, a coordenação entre os mesmos.
198
Apesar de a análise ter sido aprofundada, ressaltamos que o nosso
intuito não foi o de comparar um livro como outro, nem o de mensurar qual deles
privilegia ou não a diversidade de representações. Deste modo, julgamos que,
talvez, a “forma” de abordar a apresentação do TFC em livros poderia ser mais
bem conduzida no que diz respeito à diversidade dos registros de representação
semiótica. E essa diversidade deveria ser explorada tanto nos exemplos quanto
nos exercícios. Explorada no sentido de mobilizar ao mesmo tempo, em uma
atividade, pelo menos dois registros de representação, permitindo o tratamento
em ambos registros ao mesmo tempo. Mas isso não deve implicar em apresentar
de forma resumida os conteúdos matemáticos; ou mesmo implicando em
definições “parciais” (Vianna (1998)); ou ainda, apresentado incoerências relativas
ao emprego de notações (Tall (1991j)), Baldino (1995)).
Com base em nossa análise e conclusões, o que deve existir, é uma
coerência tanto na utilização de diferentes registros utilizados, quanto na
apresentação de questões conceituais e fundamentais também, para estudos
posteriores.
Esta pesquisa pode colaborar para que pesquisadores, professores, e
talvez, até alunos da graduação possam refletir e buscar alternativas para que
textos, independentemente do tipo de leitor, possam ser mais bem utilizados para
o acesso e apreensão de objetos matemáticos em geral. Este trabalho, no que diz
respeito a quem o efetuou, contribuiu como uma alavanca para desmistificar a
utilização deste ou de outro livro, no sentido de que todos eles podem ser bem
utilizados. Tenham eles, registros mais “acessíveis” ou apresentação mais
“conceitual”, ou ainda, conteúdos apenas, logicamente estruturados. Contribuiu
ainda, para que o “pesquisador-aluno”, no que diz respeito aos vários conceitos,
propriedades e teoremas utilizados ao longo dos livros analisados, fossem
apreendidos com base, por que não, nos indicadores levantados e diferentes
registros apresentados.
Diante disso, ficam também algumas perguntas para reflexões
posteriores de professores e/ou pesquisadores, que são relativas a alguns
conceitos e/ou teoremas que supomos, com base na nossa pesquisa,
fundamentais no ensino de Cálculo, inclusive, segundo Bardin, sobre outros
aspectos teóricos. Assim: sendo o Teorema do Valor Médio, tão utilizado no
199
contexto do ensino e aprendizagem do referido tema, e ao longo de vários cursos,
por que não investigar como o mesmo está sendo abordado, como referência, em
várias demonstrações? Na prática, o aluno de graduação nota a importância do
mesmo em provas de outros teoremas? E o que isso pode implicar, se tal aluno
não observar sua utilização?
200
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