61
E é nesse contexto que podemos melhor situar o esforço das cidades para forjar uma
imagem distintiva e criar uma atmosfera de lugar e de tradição que aja como um
atrativo tanto para o capital como para pessoas ‘do tipo certo’ (isto é, abastadas e
influentes). O aumento da competição entre lugares deveria levar à produção de
espaços os mais variados no âmbito da crescente homogeneidade da troca
internacional. No entanto, na medida em que essa competição abre as cidades a
sistemas de acumulação, acaba sendo produzida uma monotonia ‘serial’ e ‘recursiva’,
‘gerando a partir de padrões e moldes já conhecidos lugares quase idênticos em
termos de ambiente em diferentes cidades. (HARVEY, 2006, p. 266).
À esta descrição de David Harvey é possível associar a definição de espaço
operada por Marc Augé. Para ele, a supermodernidade seria caracterizada pela
produção de não-lugares, espaços que, ao contrário dos lugares, não são
marcados por identidade, história, caracterizando-se espaços padronizados,
gerais, por onde os seres passam ou se fixam por um tempo determinado,
como: supermerdados, shoppings, aeroportos, redes de lanchonetes etc. Quem
entra em um desses locais não precisa entrar em outros do mesmo gênero
para saber o que encontrará, uma vez que, são todos arquitetonicamente
arranjados da mesma forma, para que o ser sinta-se sempre no mesmo lugar,
ou antes, em lugar nenhum.
Se um lugar pode se definir como identitário, relacional e histórico, um espaço que não
pode se definir como identitário, nem como relacional, nem como histórico definirá um
não-lugar. (...) Um mundo onde se nasce numa clínica e se morre num hospital, onde
se multiplicam, em modalidades luxuosas ou desumanas, os pontos de trânsito e as
ocupações provisórias (as cadeias de hotéis e os terrenos invadidos, os clubes de
férias, os acampamentos de refugiados, as favelas destinadas aos desempregados ou
à perenidade que apodrece), onde se desenvolve uma rede cerrada de meios de
transporte que são também espaços habitados, onde o freqüentador das grades
superfícies, das máquinas automáticas e dos cartões de crédito renovado com os
gestos do comércio ‘em surdina’, um mundo assim prometido à individualidade
solitária, à passagem, ao provisório e ao efêmero, propõe ao antropólogo, como aos