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O “saber absoluto”, ou seja, a filosofia especulativa, entra em cena quando a
consciência religiosa é suprassumida, isto é, quando a consciência sabe a “essência
absoluta”, não mais existindo entre ambas um abismo. A superação do objeto do Eu
é a extrusão do sujeito de si mesmo, não tendo somente uma esfera negativa de
significação que é a alienação, mas a positiva que é o saber a nulidade do objeto e o
que isso lhe permite, que é a recuperação, por parte do Eu, do que antes era a
extrusão mesma e a objetividade, e “assim está junto de si no seu ser-outro como
tal”
16
. Este é o movimento da consciência e aí ela é a totalidade de seus momentos,
quer dizer, enquanto a consciência toma-se a si em seus vários momentos, ela se
torna seu próprio mover-se, ou seja, este processo de extrusão de si, saber da
extrusão e recuperação em si da extrusão.
A totalidade é ser como existente (Dasein, ser-aí) imediato, o “isto” (o objeto
da certeza sensível, singular, determinado), coisa percebida (objeto particular, pois
nele já há mediação), essência ou universal (objeto do entendimento). A totalidade do
objeto envolve tanto uma visada a partir da universalidade quanto da singularidade,
como vimos nas dialéticas da certeza sensível, da percepção e do entendimento, cujo
resultado foi a emergência da consciência de si, pois o entendimento descobriu a si
mesmo ao buscar leis para os fenômenos e princípios explicativos em geral
17
. A
descoberta da verdade da consciência como o interior será o ponto de partida da
dialética da consciência de si. Assim, se antes o objeto era o ser sensível, percebido
ou essencial, na dialética da consciência de si ele será o Si, ou seja, seu próprio Eu –
Eu, entretanto, que é diferenciado em si mesmo, Eu que é Outro. Dessa maneira, os
movimentos da consciência de si também passarão pelos momentos de singularidade,
particularidade e universalidade, quer dizer, o Eu será ora singular, ora particular e
ora universal. A singularidade do Eu é o movimento que faz de si o único, para o
qual a totalidade é marcada com o sinal da negatividade, é não-Eu. Porém isso se
modifica quando um Outro surge e, pelo reconhecimento, o Eu se particulariza. A
universalidade é alcançada quando a consciência de si, nas figuras do senhor e do
escravo, é formada pela experiência que faz de si, tornando-se razão (Verstand). Em
sua plenitude, a consciência deve, então, conjugar estas três determinações; deve saber
do objeto e de Si mesma. Entretanto, este saber não é “mero conceituar puro do
16
Hegel, PhG, § 788.
17
A dialética da “razão observadora”, não analisada nesta dissertação, repete em um outro nível os
movimento da dialética do entendimento. Por isso, diz Hegel: “Assim, do ponto de vista do objeto
[que] enquanto imediato, é um ser indiferente, vimos a razão observadora buscar e encontrar a si mesma
nessa coisa indiferente” – PhG, § 790.
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