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A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
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A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
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A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
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A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
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A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
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Agradecimentos
O estudo, ora apresentado, foi iniciado no 1º. semestre de 2005, no
Programa de Pós Graduação de Arquitetura e Urbanismo na Escola de
Engenharia de São Carlos – Universidade de São Paulo. Sendo financiado pela
FAPESP – Fundo de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo. Nestes
quase três anos de pesquisa muitos contribuíram para a sua realização.
Cordiais agradecimentos...
... aos professores e professoras ...
A Prof
a
. Cibele Saliba Rizek, pela fuga do óbvio, pelas reclamações
que estimularam o meu amadurecimento intelectual, pela legitimação
do trabalho docente e de pesquisa, pelo seu brilhantismo, por
consolidar minha formação sociológica e, principalmente, por sua
disposição e paciência em me orientar.
Ao Prof. Gey Espinheira, ao Velho Mago, pela sua poesia tão sábia,
pela sua energia tão forte e benigna; por ter me comunicado os
sentidos da sociologia e os fazeres do sociólogo; por me inserir no
mundo acadêmico e profissional; por sinalizar que na efemeridade da
vida nós humanos temos uma função importante – ser felizes.
A Prof
a
. Inaiá Maria de Carvalho, pela sua graciosidade e
inteligência, pelo seu trato cordial e animador; pela coerência na
produção científica; por toda sua contribuição e representatividade na
interlocução dos estudos sociológicos do Estado da Bahia.
Aos docentes do Programa de Pós Graduação em Arquitetura e
Urbanismo da EESC/USP e da FAU/USP, entre estes, destaco, as
contribuições do Prof. Carlos Martins e do Prof. João Whitaker. O
curso das disciplinas ministradas por eles contribuíram muito para
minha formação.
Aos docentes do Programa de Pós Graduação em Sociologia da
FFLCH/USP, entre estes, destaco, as contribuições da Profa. Maria
Célia Paoli, Profa. Vera Telles, e principalmente Francisco de
Oliveira, por sua tão profícua análise sobre o Estado brasileiro.
Aos docentes do Programa de Pós Graduação em Sociologia da
UFSCar.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
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Aos docentes do Programa de Pós Graduação em Sociologia do
IFCH/Unicamp.
Aos pesquisadores do Centro de Recursos Humanos da
Universidade Federal da Bahia, entre estes, destaco a Profa. Anete
Ivo e a Profa. Guaraci Adeodato. E a todo o corpo técnico da
instituição.
Cordiais agradecimentos ...
... às instituições
A USP – Universidade de São Paulo, em especial a EESC – Escola
de Engenharia de São Carlos, por todas as possibilidades que a
instituição possibilita ao discente.
FAPESP – Fundo de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo,
pelo subsídio financeiro da pesquisa, pelo acompanhamento do meu
trajeto e pela legitimação que a instituição oferece.
UFBA – Universidade Federal da Bahia, sobretudo a FFCH –
Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, pelo aprendizado inicial
e imprescindível para minha formação acadêmica; também ao CRH –
Centro de Recursos Humanos, por ter me recepcionado em 2001, e
possibilitado interlocuções cruciais na minha caminhada.
Cordiais agradecimentos ...
... aos colegas, companheiros e amigos ...
A Isabele Duplat, amiga e colega de iniciação científica, pelas leituras
e correções ortográficas neste e em outros estudos.
A Patrícia Smith, colega de núcleo de pesquisa no CRH, pelas
leituras e críticas aos capítulos deste estudo.
A Alberto Álvaro, companheiro de iniciação científica, pelas
discussões sobre as palafitas de Novos Alagados e sobre o subúrbio
de Salvador.
A Regina Trindade Lopes, amiga e colega de graduação, pelas
aventuras sociológicas cometidas juntos.
A Zelma Ferreira e a Nelma Barbosa, grandes amigas, pelas terapias
de grupo que nossas conversas promoviam.
A Sarah Freitas, colega de mestrado em algumas disciplinas, pelas
conversas e freqüentes contatos em São Paulo.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
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A Danúbia Azevedo, Leandro Mercês e Carlos Eduardo “Cacau”,
pela ajuda na aplicação dos questionários desta pesquisa.
A Kall Assunção, pelo carinho e conforto de sua companhia em
momentos de angústia.
A Carolina Antonângelo, colega do mestrado, pelos risos e
brincadeiras, tão necessários em algumas aulas tediosas.
Aos amigos, Vilmar Júnior, Morsa Caldo, Max Azambuja, Michel,
Edmar e aos demais colegas de residência em São Carlos, pelo
convívio e troca de experiências.
Às colegas, Cátia e Celine, colegas na residência em São Paulo,
pelos cafés e baladas compartilhadas.
Ao grande amigo de infância Antonio Benigno, pela motivação
contagiante, por sua presença constante na minha trajetória.
Cordiais Agradecimentos ...
... às comunidades ...
Aos moradores dos Conjuntos Habitacionais: Jardim Nova
Primavera, Loteamento Vale das Dunas e Vila Viver Melhor.
Agradecimentos especiais ...
... aos familiares...
Minha mãe Florisete Figueiredo Carvalho – pela força que não seca!
– pelo estimulo, amor, carinho e paciência.
Meu irmão Bruno de Carvalho – pelo estímulo e participação na
aplicação dos questionários e entrevistas deste estudo.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
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Dedico este estudo
àqueles que lutam por uma
sociedade mais justa e
menos excludente,
àqueles que buscam o
reconhecimento de seus direitos,
àqueles que mesmo excluídos
procuram se reconhecer como cidadãos
àqueles que não se vendem por
favores eleitorais,
àqueles que mesmo desassistidos
por políticas democráticas,
ainda continuam com esperança
e não se submergem no mundo
da violência e do crime.
Dedico com muito
carinho aos moradores
dos conjuntos habitacionais
focalizados neste estudo.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
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Resumo
Este estudo consiste em uma análise sobre as formas de inserção da habitação
popular no tecido urbano de Salvador. Compreende como os conjuntos
habitacionais se relacionam com o seu contexto urbano adjacente e com a
cidade. Para isso, pesquisamos nos conjuntos habitacionais: Vilar Viver Melhor,
Loteamento Vale das Dunas e Jardim Nova Primavera, estes conjuntos estão
localizados em diferentes áreas de Salvador, o que permite um recorte analítico
comparativo entre as três realidades. O estudo também compreende as investidas
dos agentes do capital financeiro nos programas habitacionais populares.
Palavras Chaves: habitação popular. cidade. inserção social
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
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Abstract
This study analyses the process of popular houses’ insertion in the urban tissue
of Salvador. Consists in how the habitacional groups interact with its urban
neighborhood and with the whole city. The sites studied was Vilar Viver Melhor,
Loteamento Vale das Dunas e Jardim Nova Primavera. They are located in
different areas in Salvador what permits an analysis among the three realities.
The study encloses too the financial investments in popular houses programs.
Key words: popular house, city, social insertion.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
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Sumário
Índice de Abreviaturas
Índice de Figuras
Índice de Tabelas Difusas
Índice das Principais Fotografias
APRESENTAÇÃO.............................................................................................................
INTRODUÇÃO: Abordagem Teórico Metodológica.................................................
CIDADE E POBREZA: TRANSFORMAÇÕES URBANAS......................................
I - A constituição histórica de uma cidade desigual ...................................................
II - Salvador e suas configurações: do EPUCS (1945) ao Plandurb (1978)................
III - Dois planos & suas concepções: Plano Cia e Plandurb .......................................
IV- Bahia de Todos os Santos e de Todos os Pobres: pobreza figurações e territórios
...............................................................................................................
V - A pobreza na cidade moderna...............................................................................
VI - A territorialização da pobreza em Salvador - BA .................................................
PENSANDO A HABITAÇÃO POPULAR NO BRASIL E NA BAHIA......................
I - Origem da moradia popular no Brasil......................................................................
II - Percurso de um problema – a política habitacional no Brasil.................................
III - Os preceitos da Arquitetura Moderna na Constituição do habitat econômico no
Brasil......................................................................................................................
IV - A habitação popular em Salvador – BA................................................................
V - A ineficácia dos programas de produção de moradia em Salvador.....................
TRÊS CONJUNTOS, TRÊS SITUAÇÕES DE UM MESMO PROCESSO : Viver
Melhor, Vale das Dunas e Nova Primavera...........................................................
I - Conformação do tecido urbano de Salvador: áreas de contexto e habitação
popular..................................................................................................................
II - Os conjuntos habitacionais e sua localização no tecido urbano de Salvador........
III - Convergência & Divergências no cruzamento de realidades intra-urbanas de
Salvador – do quantitativo ao qualitativo, aproximação de perfis..........................
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
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ESTADO: EXCLUSÃO-INCLUSIVA E OS ARREMEDOS DA HABITAÇÃO
POPULAR..................................................................................................................
I – A lógica da captura: o Estado e a exceção .............................................................
II – O Estado e a expansão da pobreza urbana em Salvador .......................................
III - A falência dos programas estatais – Referências interestaduais de uma mesma
questão: continuísmo e autocracia nos programas de habitação popular......................
CONCLUSÃO...............................................................................................................
REFERÊNCIAS............................................................................................................
ANEXOS.......................................................................................................................
Anexos 1: Modelo do questionário aplicado............................................................................
I
Anexos 2: Entrevistas realizadas durante a pesquisa.............................................................
III
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
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Índice de Abreviaturas
BID -Banco Interamericano de Desenvolvimento
BIRD -Banco Mundial
BNH -Banco Nacional da Habitação
DCET/UNEB -Departamento de Ciências Exatas e da Terra
CAB -Centro Administrativo da Bahia
CAIXA -Caixa Econômica Federal
CEASA - Centro de Abastecimento da Bahia
CEDURB -Companhia de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia
CEPED -Centro de Pesquisa e de Desenvolvimento
CECH/UFSCAR -Centro de Educação e Ciências Humanas
CIA - Centro Industrial de Aratu
CIAM’S -Congressos Internacionais de Arquitetura Moderna
CNPU -Comissão Nacional de Regiões Metropolitanas e Políticas Urbanas
CONDER -Companhia de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia
COPEC -Complexo Petroquímico de Camaçari
CRH/UFBA -Centro de Recursos Humanos
DINURB -Distrito Industrial Urbano
EESC/USP -Escola de Engenharia de São Carlos
EUST -Estatuto de Uso do Solo e Transportes
FAU/USP -Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
FAPESP -Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de São Paulo
FAU/UFBA -Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
FFCH/UFBA -Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas
FFLCH/USP -Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas
FDJ -Faculdade Dois de Julho
FGTS -Fundo de Garantia por Tempo de Serviços
FINEP -Fundo Nacional de Apoio a Pesquisa
FUNDHAP -Fundo de Habitação Popular
FTC -Faculdade de Ciências Tecnológicas
HAMESA -Habitação e Melhoramentos S.A.
IBGE -Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IGEO/UFBA -Instituto de Geociências
IFCH/UNICAMP -Instituto de Filosofia e Ciências Humanas
IPEA -Instituto de Planejamento Econômico e Social
MSTS -Movimento de Sem Teto de Salvador
PLADURB -Plano de Desenvolvimento Urbano de Salvador
PLANHAP -Plano Nacional de Habitação Popular
PMD -Plano Metropolitano de Desenvolvimento
PMS - Prefeitura Municipal de Salvador
PND - Plano Nacional de Desenvolvimento
PNDU -Política Nacional de Desenvolvimento Integrado
RMS -Região Metropolitana de Salvador
SAP - Departamento de Arquitetura e Urbanismo EESC/USP
SERFHAU -Serviço Federal de Habitação e Urbanismo
SFH -Sistema Financeiro de Habitação
SIFHAP - Sistema Financeiro de Habitação Popular
UNEB -Universidade do Estado da Bahia
UNICAMP -Universidade Estadual de Campinas
UFSCar -Universidade Federal de São Carlos
UFBA -Universidade Federal da Bahia
USP -Universidade de São Paulo
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
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Índice de Figuras
FIGURA 1 - Pintura do Plano Lusitano para Salvador
FIGURA 2 - Evolução da ocupação de Salvador – 1600/1940
FIGURA 3 - Esquema do Modelo Radial Concêntrico
FIGURA 4 - Mapa do Esquema Radial Concêntrico
FIGURA 5 - Mapas de Expansão do Tecido Urbano de Salvador no transcorrer
das décadas 1940/1970.
FIGURA 6 - Mapas dos Vetores de Expansão de Salvador – 1978
FIGURA 7 - Mapas de Expansão do Tecido Urbano de Salvador no transcorrer
das décadas 1980/2006.
FIGURA 8 - Mapa de áreas de contexto em Salvador
FIGURA 9 - Mapa de Tipologias Socioespaciais de Salvador
FIGURA 10 - Mapa de famílias com renda per capita até meio salário mínimo –
2000
FIGURA 11 - Mapa de infra estrutura
FIGURA 12 - Mapas de Localização dos Conjuntos Habitacionais
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
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Índice de Tabelas Difusas
TABELA 1
- População das cinco maiores cidades do Brasil.
TABELA 2
- Distribuição da População pelos Vetores de Expansão.
TABELA 3
- Áreas na cidade de Salvador –BA.
TABELA 4
- Formas de ocupação na configuração urbana.
TABELA 5 - Taxas de Desemprego 2003-2004
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
17
Índice de Tabelas da Pesquisa de Campo
TABELA 1 - Distribuição de Freqüência e percentuais das principais
características sócio-econômicas e demográficas da população dos
três conjuntos habitacionais.
TABELA 2 - Distribuição de Freqüência e percentuais das principais relações
entre o morador e a unidade habitacional dos três conjuntos
habitacionais.
TABELA 3 - Distribuição de Freqüência e percentuais do cruzamento dos
valores (uso e troca) exercidos pela unidade habitacional na vida
da população de cada conjunto.
TABELA 4A - Distribuição de Freqüência e percentuais dos problemas e das
qualidades apresentadas no Conjunto Vila Viver Melhor.
TABELA 4B - Distribuição de Freqüência e percentuais dos problemas e das
qualidades apresentadas no Conjunto Lot. Nova Primavera
TABELA 4C - Distribuição de Freqüência e percentuais dos problemas e das
qualidades apresentadas no Conjunto Lot. Nova Primavera.
TABELA 5A - Distribuição de Freqüência e percentuais relacionadas à
Representação Comunitária vista pela comunidade – Conjunto
Vila Viver Melhor.
TABELA 5B - Distribuição de Freqüência e percentuais relacionadas à
Representação Comunitária vista pela comunidade – Conjunto
Lot.Vale das Dunas.
TABELA 5C - Distribuição de Freqüência e percentuais relacionadas à
Representação Comunitária vista pela comunidade – Conjunto
Nova Primavera.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
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Índice das Principais Fotografias
Foto 1 - Visão Aérea do Conjunto Vila Viver Melhor
Foto 2 - Visão Frontal do Conjunto Loteamento Vale das Dunas
Foto 3 - Visão Lateral do Conjunto Loteamento Vale das Dunas
Foto 4 - Visão da Unidade Habitacional do Conjunto Jardim Nova Primavera
Foto 5 - Visão Frontal do Barraco de Palafita
Foto 6 - Visão Panorâmica do Conjunto Jardim Nova Primavera
Foto 7 - Visão Diversas Conjunto Jardim Nova Primavera
Foto 8 - Visão Diversas Conjunto Vila Viver Melhor
Foto 9 - Visão Diversas Loteamento Vale das Dunas
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
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A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
20
APRESENTAÇÃO
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de
Salvador – BA., é o resultado de uma pesquisa iniciada a partir de meu ingresso
no Mestrado em Teoria e História da Arquitetura e Urbanismo, em março de
2005, subsidiado pela FAPESP – Fundo de Amparo a Pesquisa do Estado de
São Paulo e vinculado ao Programa de Pós Graduação em Arquitetura e
Urbanismo da Escola de Engenharia de São Carlos – EESC/USP. Este estudo
teve como orientadora a Prof
a
. Associada Cibele Saliba Rizek.
Para além das compreensões teóricas sobre a habitação popular no
período pós-BHN em Salvador, este trabalho representa um aprofundamento de
pesquisas iniciadas junto ao núcleo de estudos: “Cultura, Cidade e Democracia:
Sociabilidades e Representações Sociais”, no CRH/UFBA
1
. Os primeiros
contatos com a temática urbana ocorreram durante o período de Iniciação
Científica PIBIC/CNPq (2002-2003), em consonância com a atividade de
monitoria de disciplina em que atuava em interseção com a pesquisa, assim
como a participação em Avaliações Pós-Ocupações em conjuntos habitacionais
de pequeno porte
2
em Salvador.
Ao longo do período de Iniciação Científica observei o processo de
ocupação do Conjunto Habitacional Nova Primavera, no Subúrbio Ferroviário de
Salvador, onde, a cada incursão no local, se percebia algo novo: a forma
arquitetônica que destoava dos tipos de construções do entorno, a rotatividade
das pessoas que ali começavam a morar, a subversão ou extensão das funções
de moradias que se transformavam em bares, igrejas, vendas etc.
1
Centro de Pesquisa vinculado a Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal da
Bahia (CRH - Centro de Recursos Humanos), instituição onde comecei minha iniciação científica.
2
Refere-se a conjuntos com menos de 500 unidades habitacionais. No processo de avaliação pós –
ocupação participei como assistente de pesquisa de campo.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
21
As dinâmicas observadas geraram inquietações
3
e um maior interesse em
compreender como se realizam os programas e a política habitacional de
Salvador, no que se refere às tentativas, via conjuntos habitacionais, de
amenizar a necessidade de moradia das camadas populares, principalmente
daqueles que antes se aglomeravam clandestinamente na cidade informal e
juridicamente ilegal – palafitas, encostas, depressões.
Provocado pelas transformações no espaço construído – Conjunto
Habitacional – e convencido pelos resultados da pesquisa realizada na Iniciação
Científica
4
, que possui como uma das constatações a fragilidade associativa da
população que inicialmente foi a ele destinada
5
, busquei através da realização
deste estudo, apresentado no formato de dissertação, uma inteligibilidade mais
profunda das relações estabelecidas entre conjuntos habitacionais populares e a
totalidade do tecido urbano: o conjunto habitacional, enquanto projeto
arquitetônico, e as relações sociais com suas variantes (adequação,
inadequação, transitoriedade, habitabilidade, periferização, paisagem, mercado
de trabalho etc.); refletindo sobre os dois aspectos da inserção urbana – o
conjunto habitacional no tecido urbano e a população na cidade formal. A partir
destas dimensões compreenderemos como o conjunto habitacional e seus
habitantes se encontram inseridos no contexto urbano: paisagem, mobilidade,
acesso, localização, rede de serviços etc.
3
A tentativa de compreender e explicar uma realidade social, através de uma orientação teórica, traz em
sua latência as escolhas intencionais do pesquisador, às vezes conscientes e outras inconscientes. Em
outras palavras, a pesquisa nas ciências humanas, traz em sua gênese as pré-noções do pesquisador.
Deste modo, a relação de estudo e pesquisa com o objeto de estudo desta dissertação são margeadas por
essas características, pois já tínhamos referenciais e certas curiosidades sobre o objeto. Para Durkheim
(2000), as pré-noções são expressões da consciência individual do sujeito-pesquisador e tudo o que as
representações poderiam significar para a investigação sociológica é uma fonte de erros e deformações.
4
Pesquisa: “Deserdados do Mar e Segregados em Terra” (PIBIC-CNPq 2002/2003), cujos resultados
foram publicado nos anais do XI Congresso Brasileiro de Sociologia (UNICAMP-SP - 2003); XI Encontro de
Ciências Sociais do Norte e Nordeste (Aracaju –SE-2003); V SEMOC – Semana de Mobilização Científica
(UCSAL - Ba - 2003); XXI Seminário Estudantil de Pesquisa (UFBA – BA , 2003) e na 55
a
Reunião
Anual da SBPC (UFPE/2003).
5
Cf. SOARES, A. M. de C. Gestão & Participação em projetos habitacionais populares, Nova Primavera –
um estudo de caso. Dissertação de Especialização UNEB. Salvador, 2004.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
22
Deste modo, o estudo empreendido de título: A Inserção de Conjuntos
Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA., demonstrará
como diferentes conjuntos habitacionais construídos no período pós-BNH, em
Salvador, se relacionam com a cidade e seu universo social. Para atender este
objetivo o trabalho apresentado foi dividido em seis blocos:
Introdução: Abordagem teórica – metodológica: na introdução,
manifestaremos os principais objetivos do estudo e como eles foram atingidos
no transcorrer de sua execução; enfatizaremos os aportes e referências teóricos,
assim como a realização da pesquisa de campo – métodos utilizados e como as
informações foram analisadas e cruzadas com os dados qualitativos: entrevistas
e cadernos de campo.
Cidade e Pobreza: transformações urbanas: consideraremos este o
primeiro capítulo da dissertação, tem o objetivo de contextualizar sucintamente a
constituição histórica de Salvador; introduzindo uma discussão sobre a
importância dos seus planos na tessitura urbana e enfatiza as formas de
apropriação do espaço, caracterizando os territórios de pobreza e de riqueza em
Salvador. Neste capítulo demonstramos como a lógica do capital se apropria da
cidade e interfere na vida urbana; evidenciamos a atuação do padrão periférico
de urbanização e suas interfaces com as figurações da pobreza soteropolitana.
A partir de uma análise sobre Salvador, realizamos uma reflexão estrutural das
lógicas de apropriação da terra urbana e como elas atuam na manutenção da
periferização em determinadas partes da cidade. Após uma compreensão
conceitual e territorial da pobreza, de suas formas de ancoragem subjetiva e
objetiva, chegaremos de maneira focalizada à questão da habitação popular e
como ela se situa dentro da territorialização da pobreza.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
23
Pensando a habitação popular no Brasil e na Bahia: o foco deste
segundo momento do estudo é pontuar o percurso histórico de como os
conjuntos habitacionais se constituíram no Brasil. Para isso retomamos a
importância da arquitetura moderna e a influência que ela exerceu na produção
de habitação popular; explicitamos os principais marcos desta arquitetura que
revolucionou os paradigmas arquitetônicos anteriores, e como ela chega ao
Brasil – em seus desdobramentos técnicos, e ideológicos. Após discorrer sobre
a arquitetura moderna e suas influências na constituição da habitação popular,
enfatizaremos os períodos em que os conjuntos habitacionais foram construídos
no Brasil. Neste contexto, um breve histórico da habitação popular será
elaborado, descrevendo os principais programas realizados e como eles
repercutiram no cenário urbano brasileiro. Partindo do nacional para o
regional/local chegaremos à realidade habitacional soteropolitana, destacando
os principais períodos de construção dos conjuntos habitacionais e suas formas
de alocação no tecido urbano, explicitando como os conjuntos habitacionais se
espacializaram em Salvador.
Três conjuntos, três situações de um mesmo processo – Viver
Melhor, Vale das Dunas e Nova Primavera: no terceiro capitulo,
responderemos aos principais questionamentos deste estudo; caracterizaremos
três conjuntos habitacionais na cidade de Salvador, destacando as relações que
estes espaços estabelecem com a cidade e como eles estão inseridos no tecido
urbano. Nesta parte do trabalho analisaremos os dados colhidos com a pesquisa
de campo, dando ênfase ao co-relacionamento de informações e de realidades.
Para além da exposição cartográfica da cidade de Salvador, a partir dos
diversos mapas apresentados, seguidos por tabelas e gráficos, esta parte do
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
24
trabalho apresenta informações importantes sobre a habitação popular e suas
formas de inserção na cidade. O terceiro capítulo dialoga com os demais
capítulos deste estudo, sobretudo com o primeiro; as informações sobre a
pobreza introduzidas naquele capítulo, aqui são confirmadas pelo cruzamento
de variáveis presentes na pesquisa realizada nos três conjuntos habitacionais. A
hipótese de que os conjuntos habitacionais são absorvidos e apenas
parcialmente inseridos na cidade é aqui, a partir dos dados da pesquisa,
problematizada e confirmada.
Estado: exclusão-inclusiva e os arremedos da habitação popular: o
quarto capítulo, manterá diálogos reflexivos com os demais capítulos,
articulando de maneira propositiva temas que estão subjacentes à temática
abordada na dissertação. Pautada nos capítulos anteriores, neste, retomaremos
a problematização dos conceitos de exclusão e sua relação com o Estado,
compreendendo como a falta de moradia à camada popular, ou como o parcial
atendimento desta falta, via conjuntos habitacionais, se constitui como uma
exclusão-inclusiva, orientada por um Estado comprometido com o capital
internacional financeirizado.
Conclusão: no item conclusivo estabeleceremos relações entre as
reflexões e teorizações expostas nos capítulos da dissertação, avaliando assim,
os resultados do estudo principalmente no que concerne à análise compreensiva
da inserção dos conjuntos habitacionais na cidade.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
25
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
26
INTRODUÇÃO: ABORDAGEM TEÓRICO-METODOLÓGICA
O problema habitacional soteropolitano é histórico e um dos mais perversos
entre os problemas da capital baiana; a falta do direito à moradia, manifestada em
Salvador tem origem no final da segunda metade do século XIX, principalmente no
período pós-abolição da escravatura. Em meados do século XIX, com a
aprovação da lei de terras em 1850
6
, especificava-se o que era solo público e
privado, o que passou a exigir uma demarcação mais precisa dos espaços
privados na cidade. Com a abolição em 1888, grande parte dos escravos
libertados tomou o rumo das cidades para oferecerem sua força de trabalho,
concorrendo em desigualdade com o branco e o estrangeiro. Não tendo onde
morar, o ex-escravo dirigia-se às periferias, subúrbios, morros e várzeas das
cidades
7
.
O problema da moradia emergente no final do século XIX, marcado por
uma desigualdade na distribuição da terra rural que se explicita no urbano
8
, se
exacerba durante o século XX, e chega ao século XXI com um vergonhoso déficit
habitacional de 5.890.285 unidades de moradias
9
. Nas metrópoles como São
Paulo, Rio de Janeiro, Salvador entre outras
10
, o problema de moradia mostra sua
6
Cf. (MARICATO, E. 1997) a promulgação da Lei das Terras teve, contudo, maior impacto sobre a
ordenação das ruas e casarios nos núcleos urbanos, já que ela distingue pela primeira vez na história, o
que é solo público e solo privado. Através desta lei temos uma demarcação mais precisa dos espaços na
cidade, como também alinhamento de fachadas, das calçadas e das ruas que passam a obedecer uma
traçado mais preciso. Contudo a generalização da compra e venda da terra não se implantou, porém,
imediatamente após a aprovação da Lei das Terras, de 1850.
7
Referenciando o nordeste brasileiro, Gilberto Freyre (1990) evidencia a transformação social ocorrida no
final do século XIX, analisando as relações divergentes e convergentes dos Sobrados & Mucambos,
continuidades da Casa-Grande & Senzala, que eram situações habitacionais destinadas às classes de
rendas diferentes.
8
O problema habitacional brasileiro, não pode, por suposto, ser analisado como um problema estritamente
urbano, pois ele tem variáveis acentuadas no rural. Antes de suas variáveis rurais e urbanas a questão
habitacional é um problema social.
9
Cf. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Censo Demográfico, 2000; Fundação João
Pinheiro ( FJP); Centro de Estatística e Informação (CEI); Déficit Habitacional no Brasil 2000/ 2001. Refere-
se aos dados básicos do déficit habitacional de áreas urbanas e rurais
10
Tomando por base os percentuais dos loteamentos irregulares, que serve como um dos demostrativos de
nosso déficit habitacional, temos algo em torno de 20% nas cidades do Rio de Janeiro, Belo Horizonte e
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
27
Fotos do auto
r
do estudo em Pes
q
uisa de cam
p
o
“nudez”, se manifestando pelos morros, encostas, depressões, mangues etc. Em
Salvador, a topografia íngreme fez com que dezenas de famílias, na década de 40
do séc. XX, encontrassem na baía de Todos os Santos, o lugar para improvisarem
suas moradias, em barracos sobre o mangue, situação de precariedade
11
que
persiste e se exacerba no séc. XXI, demonstrando como são ineficazes os
programas habitacionais desenvolvidos pelo poder público.
Fotos de Aglomerados de Palafitas
Salvador - BA – 2006
Porto Alegre (LABHAB, apud MARICATO 2000, p. 153). Em São Paulo, segundo o IBGE, o percentual é 30%
(2,6 milhões de pessoas). Em Fortaleza, 28% e, Salvador 33% (SOUZA apud Maricato, 2000, p. 153). E
Recife se destaca, contando com 40% de loteamentos irregulares, segundo o IBGE (MARICATO, 2000).
11
A precarização e o déficit nas formas de moradia não é uma situação específica da cidade grande, nos
pequenos municípios, assim como na zona rural, ele também existe e não pode deixar de ser mencionado.
Segundo dados fornecidos pela Fundação João Pinheiro (FJP) o Déficit Habitacional 2000, no que se refere
à área rural, não incluindo a região norte do país é de 1.750.198 unidades.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
28
O déficit de moradia para as parcelas menos privilegiadas da sociedade,
assim como a ineficácia dos programas habitacionais populares e seus paliativos,
ainda se traduzem como um problema presente nas cidades brasileiras,
sobretudo, em Salvador – BA. Essa situação se integra como uma das mais
emblemáticas questões que se soma ao quadro de exclusão
12
social que atinge a
cidade moderna, fazendo crescer a legião de sobrantes - os “esquecidos do
progresso” - no sentido de Jacques Donzelot (1999) - que pertencem a uma lógica
própria do capitalismo - a exclusão.
A partir da reflexão sobre o quadro da precarização habitacional em
Salvador, compreenderemos neste estudo como os conjuntos habitacionais pós -
BNH
13
se inserem no tecido urbano da capital baiana.
Pior ainda do que nos tempos do finado BNH, não existe hoje
uma política nacional de habitação. Existe sim, e não de todo
destituído de recursos, um desconexo feixe de políticas
totalmente divorciadas entre si: uma política dotada de recursos
administrados pelo governo federal, outra também federal, com
recursos do Orçamento Geral da União, outras tantas
empreendidas pelos estados e muitas outras pelos municípios,
com recursos próprios ou com empréstimos internos e externos.
(BOLLAFFI, G. & CHERKEZIAN, H. 1998, p. 129)
Na análise das variáveis e formas de inserção dos conjuntos habitacionais
no tecido urbano, focalizaremos quais relações são mantidas entre os conjuntos e
a cidade; esta investigação, conforme veremos, se realizou a partir do estudo de
12
O termo “exclusão” presente em diversos momentos deste trabalho tem sua noção aproximada ao
entendimento de Jacques Donzelot. A exclusão, ao ser tematizada em 1974, serviu para designar os
“esquecidos do progresso”. Neste caso, tratava-se simplesmente de uma certa forma de moderar a euforia
da sociedade do bem estar e de convocá-la ao alargamento da responsabilidade social. Já no início dos anos
1980, de modo bem diverso daquela omissão involuntária da década anterior, passa a significar uma solução
deliberada para a garantia de continuidade do modelo social. Nas palavras do próprio Donzelot (1991, p. 5),
para garantir a atualização do sistema “[...] é preciso reduzir os efetivos, não conservar senão os indivíduos
capazes de ajustar-se às mutações tecnológicas e rejeitar os outros, todos os outros”.
13
Os projetos habitacionais populares, construídos no período pós – BNH em Salvador, recorte do estudo
proposto, aparentam uma “continuidade” dos projetos construídos no período BNH (1964 - 1986), no que se
refere ao processo de gestão e a utilização de uma arquitetura autocrática e padronizada, com falhas
manifestas tanto em seu projeto arquitetônico, como na falta de participação popular em sua execução.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
29
três conjuntos habitacionais populares, construídos em períodos e locais
diferentes do tecido urbano: Conjunto Vila Viver Melhor (1997/1998); Conjunto
Loteamento Vale das Dunas (2000/2001); Conjunto Jardim Nova Primavera
(2002/2003). Dentre os objetivos deste estudo se destacam: 1-Identificação dos
últimos conjuntos habitacionais populares de Salvador; 2- Verificação dos
aspectos físicos do espaço habitacional dos conjuntos; 3- Percepção dos
elementos estruturantes e estruturadores do espaço habitacional do conjunto; 4-
Análise e comparação dos conjuntos habitacionais estudados; 5- Constatação das
similaridades entre os conjuntos, levando em consideração o período de
construção e a localização no Tecido Urbano; 6- Compreensão das relações
ecológicas, no que se refere as relações intersociais existentes entre a população
e o ambiente construído. 7 – Análise dos interesses que se imbricam com a
“política” habitacional do Estado e quais seus efeitos nos usos e ocupações do
solo urbano.
Como o objeto do estudo se integra a Salvador
14
, fazendo ela própria parte
do objeto, vale lembrar que esta cidade é marcada por uma paisagem urbana
heterogênea, tanto na dimensão morfológica: cidade alta e cidade baixa
15
, como
nas configurações de seu desenho urbano. No período transitório entre as
décadas de 40 e 50 do século XX, observou-se o surgimento oficial das primeiras
favelas
16
de Salvador. Em 1942, chama atenção a execução do EPUCS
(Escritório do Plano de Urbanismo da Cidade de Salvador)
17
que, mesmo tendo
14
A capital baiana representa uma referência urbana importante no Brasil, não só por sua dimensão
populacional de aproximadamente 2,5 milhões de habitantes (IBGE,1991), apontada com a terceira cidade
do país, mas sobretudo pelo seus 455 anos de história.
15
Flavio Villaça (1998) considera que o sítio geográfico é condicionante das particularidades que o modelo
urbano assume em cada cidade, dando exemplo com as principais metrópoles do Brasil.
16
Antes existiam muitos cortiços e palhoças, que mesmo indicando uma condição de favelização, ainda não
era designada como tal.
17
Cf. SAMPAIO A. H . (1999) Cap 2, o EPUCS, foi um dos resultados da I Semana de Urbanismo, realizada
em 1935 em Salvador, demarcando um novo ideário para o planejamento de Salvador, enquanto cidade
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
30
contribuído para o planejamento urbano da cidade, não conseguiu reverter o
quadro de crescimento desordenado e déficit habitacional. Dando continuidade ao
processo de planejamento iniciado pelo EPUCS, em 1978, se inaugura o
PLANDURB (Plano de Desenvolvimento Urbano da Cidade de Salvador), ambos
os instrumentos de planejamento que incorporaram o uso de modelos urbanísticos
espaciais voltados para a ocupação e para a funcionalização da circulação na
cidade. Na época do segundo plano (1978) a principal questão urbana de
Salvador, era a habitação popular, sobretudo o déficit quantitativo e qualitativo dos
conjuntos habitacionais.
Como dito anteriormente, emerge como problema a ser analisado “a
inserção do conjunto habitacional popular no tecido urbano de Salvador-BA”, um
estudo que focaliza três realidades intra-urbanas e privilegia um quadro
bibliográfico constituído de trabalhos que abordam as relações de produção e
seus desdobramentos no Brasil, pois entendemos que as relações de produção ao
se expressarem na desigual distribuição de renda se constituem com fatores
indutores da exclusão e segregação urbana, que possuem como um de seus
reflexos uma desigual produção e apropriação do espaço na cidade. Deste modo,
as referências aqui apresentadas obedecem ao seguinte quadro esquemático: As
relações existentes entre história, cidade, urbanismo; Origem da habitação
popular no Brasil; Políticas e Programas de Habitação BNH e pós - BNH; A lógica
capitalista da produção de moradia popular nos anos de 1980, 1990 e 2000; A
forma urbana de Salvador e de seus conjuntos habitacionais populares e suas
transformações e dinâmicas, refletindo sobre os conceitos de exclusão e
segregação urbana.
moderna. O EPUCS teve como maior idealizador o professor Mario Leal Ferreira. Segundo CARDOSO,
C.R.C (2004, P. 132) O EPUCS começa a funcionar efetivamente em abril de 1943, como iniciativa de
introduzir o urbanismo na práxis urbana.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
31
Na compreensão desta questão emblemática algumas dimensões teóricas
podem ser apontadas, David Harvey (1980) afirma que a organização do espaço
urbano tornou-se cada vez mais importante com os investimentos de capital fixo
18
.
O autor explicita que o entendimento de espaço não pode ser considerado apenas
como uma dimensão física dissociada das práticas sociais que lhe dão sentido. O
pensamento de David Harvey pode se relacionar com a morfologia da prática de
Michel Certeau (1985), quando este discute a distribuição espacial e social dos
agentes e sua incidência diretamente sobre as práticas da população, isto é, os
usos que se faz de um espaço e as formas destes usos são importantes para o
entendimento da vida social.
Ainda sobre a organização do espaço urbano, a reflexão de Lefebvre
(1991) manifesta que para se entender a realidade urbana é necessário se
considerar o valor de uso e a ação dos conflitos específicos entre o valor de uso e
o valor de troca. Este conflito entre valor de uso e de troca nos leva a
problematizar os conjuntos habitacionais, ao se perceber a subversão dos valores
das unidades habitacionais, ou seja, porque a função de moradia se transforma
em função comercial? Por que o valor de uso se transforma em valor de troca, no
momento que o mutuário vende sua unidade habitacional? Além de suscitar esta
problemática, Henri Lefebvre (1991) contribui para a definição de tecido urbano,
conforme veremos no transcurso do estudo.
Transcendendo a dimensão estrutural forma-função, Lefebvre (1991)
explicita a importância do entendimento urbano através do que denomina nível
ecológico – relações intersociais e laços societários – tornando-se essencial no
estudo do habitat. Neste sentido, entendemos que a forma e a função urbana
18
Cf. David Harvey (1999) em – A condição Pós – Moderna, acrescenta na discussão sobre a organização
urbana a importância exercida pelo capital financeiro (capital fluído).
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
32
devem ser compreendidas em simultaneidade com os processos manifestos no
universo social. A forma do conjunto habitacional assenta-se em um espaço que
se dinamiza através dos conteúdos sociais. Elementos próximos deste ponto de
reflexão podem ser ainda encontrados nas dimensões que Santos (1988) explicita:
[...] o espaço é um sistema de realidades que supõe uma
legalidade: uma estruturação e uma lei de funcionamento, sendo
o espaço uma realidade funcional de relações, um conjunto de
formas contendo cada qual frações da sociedade em movimento.
As formas têm um papel na realização social, pois o conteúdo
(universo social) não é independente da forma, e cada forma
encerra uma fração do conteúdo. [...] Para se entender o espaço
urbano, se faz necessário à assimilação das categorias de
universalidade, particularidades e singularidade, assim como as
de formas, função, processo e estrutura. (SANTOS, Milton. 1988,
P.26.27)
No sentido de se buscar a origem da habitação popular no Brasil, a
contribuição de Bonduki (1998), tratou do surgimento do problema habitacional,
partindo do final do século XIX até meados do século XX, intercalando análises
sobre o autoritarismo sanitário (higienismo), legislações do período e códigos de
posturas, até se chegar à política populista de Vargas e as problematizações das
décadas de 40 e 50. Neste contexto histórico-analítico, o autor destacou as
soluções habitacionais produzidas inicialmente pelo mercado rentista e a
passagem deste tipo de iniciativa para a habitação social. O estudo de Bonduki
enfatizou a problemática da habitação como uma questão social e política
apontando suas relações intrínsecas com as formas de intervenção estatal. Entre
suas análises, destaca-se a Lei do Inquilinato (1942), a criação dos IAP’s como
uma das origens da habitação social no Brasil e a frustrada política da Fundação
da Casa Popular, nos anos 40.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
33
Eva Blay (1978) afirmou que as políticas destinadas à habitação popular se
alteram conforme o período histórico, sendo peculiar à classe social focalizada e
na maioria das circunstâncias a habitação tem sido usada como forma de
preservação e controle da força de trabalho. Blay considera que o sistema político
do BNH conseguiu realmente retardar a solução do problema habitacional
brasileiro.
Durante o século XX, inúmeros programas foram destinados à política de
habitação. Azevedo & Andrade (1982) avaliam o potencial de programas de
habitação, na faixa de renda até três salários mínimos, entre o período da FCP –
Fundação da Casa Popular 1946 e da criação do BNH – Banco Nacional de
Habitação, em 1964. Os autores explicitam as formas de inserção da política
habitacional no desenvolvimento urbano. Segundo Azevedo & Andrade, desde o
inicio, os programas habitacionais no Brasil já possuíam um caráter nitidamente
fragmentário, que sob o prisma social tiveram efeitos perversos.
Rolnik (1997) defendeu a premissa de que as políticas urbanas e
habitacionais brasileiras sempre favoreceram os agentes de intermediação
financeira em detrimentos do usuário final. Afirmou que o BNH, ao invés de
ampliar e democratizar o mercado habitacional para todas as faixas de renda,
criou um mercado imobiliário dependente dos recursos públicos e assentado em
um modelo de urbanização sem urbanidade. Contribuindo com as afirmações de
Rolnik, a socióloga Brandão (1997) indicou que o Brasil sempre teve dificuldades
em articular mercado e políticas públicas; no caso da habitação para a população
de baixa renda, a autora considerou que esta sempre foi tratada como um
compartimento isolado dos demais segmentos da oferta habitacional.
Analisando a política habitacional no período militar, Maricato (1987) partiu
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
34
da abordagem que vinculava espaço de acumulação e espaço de miséria,
compreendendo o papel do Estado na organização e realização do capital
imobiliário brasileiro. O estudo é localizado nas décadas de 70/80, quando foi
possível acompanhar o auge e a decadência do regime militar de 1964.
Considerando a moradia como uma mercadoria especial, a autora explícita que o
modo de produção capitalista requeria que o trabalhador fosse dominado não
apenas no local de trabalho, como também no local de moradia, que neste caso
seriam os conjuntos habitacionais.
Taschner (1997) contribuiu para as análises sobre a moradia fazendo um
resgate histórico do problema habitacional, desde o final do século XIX até
meados dos anos 90 do séc. XX, avaliando as retrospectivas e as perspectivas e
descrevendo os principais aspectos da política habitacional no Brasil nos
seguintes períodos: início da industrialização, governo de Vargas, Regime Militar e
nas administrações de Sarney, Collor, Itamar e FHC
19
.
Após fazer um percurso histórico sobre programas e políticas
habitacionais, o clássico estudo de Valladares (1978) considerou que o conjunto
habitacional se configurava como um espaço urbano de transitoriedade. Segundo
a autora, grande parte dos indivíduos removidos para os conjuntos habitacionais
os abandonavam após algum tempo, voltando à favela de origem, colocando em
questão a “solução habitacional” que o governo lhes havia oferecido.
20
Valladares
evidencia que as alterações das condições de vida e de trabalho do mutuário
decorrentes da mudança radical do lugar da moradia, assim como os custos
19
Como na proposta deste projeto se dará notada atenção para as políticas habitacionais pós- BNH, a
execução de obras habitacionais durantes os governos de (Sarney, Collor, Itamar, FHC, Lula) serão
estudadas e comparadas.
20
A observação de Licia Valladares está em consonância com o pensamento de Henri Lefebvre (1991) no
que se refere à ação dos conflitos específicos entre o valor de uso e o valor de troca. No caso da citação,
o valor de troca do embrião exerceu uma maior força diante das necessidades do mutuário, anulando o
valor de uso.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
35
sociais que a remoção implicava e a atribuição do valor de troca no imóvel foram
fatores que serviriam como justificativas para a transitoriedade no conjunto
habitacional.
Em estudo organizado por Maria Ruth Sampaio (1998) destaca-se que a
rotatividade em áreas de conjuntos habitacionais é constante, muitas vezes
justificada pela não adaptação
21
dos moradores, que são “re-expulsos” pela falta
de condição de manutenção da vida, frente aos novos encargos gerados pela
moradia formalizada. A autora explicitou em seu estudo que a rotatividade dos
moradores era notória, tanto nos barracos como também nas habitações
construídas pelo governo, destacando que a facilidade de reversão do imóvel em
dinheiro é uma das causas apontadas pelos moradores. Taís especificidades
abordadas em ambos os estudos, são vistas na realidade habitacional/popular de
Salvador e em suas dificuldades de “inserção no tecido urbano”.
As lógicas capitalistas na produção de habitação, segundo Carvalho &
Pinho (1996), faz expandir o padrão periférico
22
de urbanização, pois interfere
desigualmente na produção do espaço urbano. Em uma lógica similar à descrita
por estes autores, Ribeiro (1997) analisou a ação do capital de incorporação
imobiliária residencial no Rio de Janeiro. Partiu do estudo das habitações
coletivas/rentistas do final do século XIX, compreendendo a substituição deste tipo
de ação pela do capital imobiliário das incorporadoras que combinavam a
modernização com a exclusão. Ribeiro reconheceu o papel dos diferentes
“agentes modeladores” do espaço urbano, que participaram da produção e
regulação do espaço, identificando os seus interesses na apropriação dos lucros.
21
A não adaptação em um determinado lugar, pode encontrar diversos motivos que a justifique, entre
estes é importante destacar a falta de condições econômicas para a manutenção da vida, assim como, a
efêmera possibilidade gerada de conseguir se capitalizar com a venda do imóvel, um dinheiro pouco que
logo se acaba, mas naquele momento significativo para a família descapitalizada.
22
Detalharemos a forma deste padrão periférico no primeiro e quarto capitulo deste estudo.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
36
Em relação à realidade dos conjuntos habitacionais sociais de Salvador, a
dissertação de Espírito Santo (2002) serviu como referência para este estudo ao
analisar a trajetória da URBIS (Habitação e Urbanização na Bahia S. A.), levando
em consideração variáveis cronológicas e locacionais, assim como as diretrizes
das políticas habitacionais do Estado. Em uma de suas conclusões, a autora
enfatizou que a produção da URBIS serviu para a introdução de um padrão
específico de urbanização e para a consolidação da forma periférica do
crescimento da cidade, confirmando a lógica capitalista referida por Carvalho &
Pinho (1996), produtora do padrão periférico da urbanização.
Neste mesmo contexto Gordilho (2000), forneceu preciosas contribuições
para a fundamentação deste estudo ao discorrer sobre a ação estatal e as
políticas públicas no transcorrer das décadas, assim como as intervenções
recentes na produção habitacional de Salvador.
Mesmo com destacada importância no estudo da política habitacional de
Salvador, tanto o trabalho de Espírito Santo (2002), como o de Ângela Gordilho
(2000), não se aprofundaram nas questões relativas à inserção dos conjuntos
habitacionais no tecido urbano, assim como não se dedicaram à compreensão de
como a população destes conjuntos foi absorvida, no espaço habitacional e no
universo dos direitos de cidadania. Neste sentido, apesar do acervo considerável
de estudos sobre habitação no Brasil, poucos são aqueles que tratam da relação
de inserção dos conjuntos habitacionais populares na cidade.
Para este estudo foram importantes também as análises sobre a forma
urbana de Salvador feitas por Heliodório Sampaio (1999), que permitiram o
entendimento da conformação da cidade, partindo da dualidade entre a cidade
real e a cidade ideal e revelando como o urbanismo moderno se constituia em
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
37
Salvador. Utilizando como variáveis as análises sobre o processo de acumulação
capitalista, o papel do estado e a organização do espaço, o livro revelou
importantes entendimentos de Salvador, destacando as intervenções modernas
na organização da forma urbana da cidade.
Como a maioria dos conjuntos habitacionais de Salvador se localizam em
áreas periféricas ou suburbanas da cidade, os estudos de Espinheira (1999),
contribuiram para este estudo no instante que exploraram uma série de
contradições que marcaram a trajetória metropolitana e que favoreceram a
desigualdade sócio espacial, principalmente no que se refere ao Subúrbio
Ferroviário . Buscando um entendimento da periferia de Salvador, Serpa (2001)
explícitou a produção do espaço periférico da capital, partindo de reflexões sobre
a morfologia urbana e a forma que se realiza a apropriação dos múltiplos espaços
da cidade, avaliando como se distribuem os comércios e serviços nas periferias
urbanas. Como o termo periferia em alguns contextos se remete à segregação e
exclusão urbana
23
o trabalho de Flávio Villaça (1998), fertilizou as discussões
conceituais, no momento que problematizou sua conformação no espaço intra-
urbano. O autor entende a segregação através de uma implacável separação
territorial e social, que se constituiu a partir do conflito de classe. Villaça (1998,
p.145) afirma que a segregação
24
“é constituída no momento em que a burguesia
exerce o domínio e a prevalência nas condições de deslocamento espacial”,
substanciou a afirmação, indicando que em alguns casos a segregação é gerada
23
Vale mencionar os estudos de CALDEIRA (1997) que reflete sobre as diferenças entre segregação e
exclusão e sobre os diversos tipos de segregação que se fazem presentes e como elas se manifestam na
dinâmica urbana, especialmente a partir do exemplo dos “condomínios fechados”. Há discordâncias em
relação às reflexões sobre segregação, entre CALDEIRA (1997) e RIBEIRO (1997), que discutiremos em um
outro momento.
24
Cf. SOUZA, M. A. GORDILHO (2000), a reprodução do espaço sob a lógica capitalista fez com que a
segregação social sempre existisse, deste os primórdios da metrópole industrial, separando ricos e pobres.
Cf. FERNANDES, R.B (2004), no caso especifico de Salvador, desde o princípio da COHAB, em meados de
1960, houve uma indução a expansão urbana periférica.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
38
por investimentos produtivos e imobiliários, assim como pelo Estado que
priorizando em áreas e bairros de classes dominantes.
As burguesias produzem para si um espaço urbano tal que
otimiza suas condições de deslocamentos [...] ao fazê-lo tornam
piores as condições de deslocamento das demais classes [...] a
estruturação do espaço urbano se dá sob a ação do conflito de
classe. (VILLAÇA, 1998, p. 328)
Apoiado por um quadro de referências bibliográficas que se ampliará na
seqüência dos capítulos, o estudo empreendido foi oxigenado através da pesquisa
de campo, realizada nos três conjuntos habitacionais selecionados. Os
procedimentos metodológicos utilizados combinam a análise dos dados
quantitativos mensurados com aplicação de questionários, a observação, a
entrevista e o estudo de caso, foi um procedimento também seguido nas
pesquisas da SAGMACS [Sociedade de Análise Gráfica e Mecanográfica Aplicada
a Complexos Sociais], que foi o primeiro escritório de planejamento, montado
interdisciplinarmente, a realizar uma comparação entre os dados oficiais sobre
as favelas do Rio de Janeiro, com informações correlacionadas à qualidade de
vida e formas de apropriação do espaço, procedimento metodológico que também
será encontrado em outros trabalhos
25
.
O resultado de pesquisa apresentado neste estudo, expresso no capitulo III,
se organiza da seguinte forma: 1º. momento – Pesquisa Quantitativa – Aplicação
de Questionários: para a construção do perfil sócio econômico demográfico da
comunidade, com avaliações dos moradores em relação ao seu conjunto
habitacional; 2º. momento (Parte I) – Pesquisa Qualitativa – com realização de 19
25
Cf. (VALLADARES, L. 2005, p. 123), Os relatórios da SAGMACS [Sociedade de Análise Gráfica e
Mecanográfica Aplicada a Complexos Sociais] analisavam as favelas como realidades heterogêneas e uma
população igualmente heterogênea [...] privilegiando uma visão unificadora quanto à especificidade da
favela.[...] A favela apresentada nessa pesquisa não constitui um mundo à parte, seus habitantes são
pobres como outros pobres, eles mesmos vítimas do clientelismo político. [...] Trata de considerar as
favelas como bairros pobres a serem urbanizados, ou seja, equipá-las com os mesmos serviços municipais
já oferecidos aos outros bairros da cidade.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
39
entrevistas, entre os principais representantes dos conjuntos habitacionais, e, com
técnicos e estudiosos da área em estudo; 2
O
. momento (Parte II) – Memórias e
Notas de Pesquisa, que sinalizam a constituição de um desenho etnográfico sobre
as áreas do estudo. No 3º. momento da pesquisa realizou-se a visita a órgãos
técnicos e a instituições governamentais, com a finalidade de buscar informações
sobre a constituição técnica e orçamentária dos projetos habitacionais.
A aplicação dos questionários objetivou traçar um perfil sócio, econômico e
demográfico dos conjuntos habitacionais, sem necessariamente construir um
quadro de validade estatística
26
. Foram aplicados 151 questionários com homens
e mulheres em sua maioria chefes de famílias residentes nos três conjuntos em
estudo: Conjunto Habitacional Vila Viver Melhor (62 questionários); Conjunto
Habitacional Loteamento Vale das Dunas (48 questionários); Conjunto
Habitacional Jardim Nova Primavera (41 questionários). Na seleção das pessoas
para responderem os questionários, utilizamos a escolha aleatória simples – na
qual toda a população tem igual probabilidade de fazer parte do grupo de
entrevistados.
Os 151 questionários aplicados equivalem a 3,5% da população dos três
conjuntos habitacionais que é de aproximadamente 4.470 hab. – 01 por família.
Na distribuição das freqüências das informações contidas no questionário
27
, foi
utilizado o método quantitativo-probabilístico e os dados foram agrupados em
26
Precisamos um número de questionários, que fossem capazes de nos dar informações quantitativas sobre
os conjuntos habitacionais. Mesmo sabendo da importância do uso de um quadro amostral, simplificamos a
pesquisa com a análise quantitativa de apenas [3,5%] da população em estudo. Estamos certos que o
recorte não significa propriamente uma amostra, até porque esta exigiria uma maior complexidade em seu
cálculo, e julgamos que o percentual [3,5%] não é suficiente para demonstrar esta complexidade,
desenhando, apenas, a fisionomia da realidade dos conjuntos habitacionais. O uso da distribuição de
freqüências e percentuais, nos permitiu descrever e aproximar as características sócio-econômicas e
demográficas da população em estudo, assim como demonstrar a avaliação que os moradores têm em
relação ao seu respectivo conjunto habitacional. As “médias” e “medianas” foram construídas a partir da
incidência de respostas que após somadas eram divididas pelo número de vezes que cada resposta incidiu.
27
O questionário se configura como um simples instrumento de levantamento de dados, que possibilitará o
cruzamento de variáveis correlatas à situação de vida dos moradores dos conjuntos: renda, escolaridade,
número de dependentes, grau de satisfação com a unidade habitacional etc.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
40
forma de tabelas e gráficos. A compilação destes dados nos permitiu descrever e
aproximar as características sócio-econômicas e demográficas da população em
estudo, assim como demonstrar a avaliação que os moradores têm em relação ao
seu respectivo conjunto habitacional.
O questionário utilizado foi estruturado com 30 quesitos, pré-codificado,
contendo 95% das questões fechadas, que abordavam características sócio-
econômicas, demográficas e de grau de satisfação da comunidade com a unidade
de moradia e com o conjunto. Na aplicação dos questionários, que se configurou
como um levantamento sistemático de situações, buscamos aproximações com o
perfil individual e coletivo dos moradores, assim como a renda, o grau de
escolaridade, o número de familiares etc.
Com caráter exploratório a pesquisa foi desenvolvida a partir de
mecanismos, que incluíram; o pré-teste dos questionários junto aos três campos
de estudo, adequando e adaptando termos e palavras ao contexto de vida dos
moradores. Depois de serem aplicados por uma equipe interdisciplinar
28
composta
por alunos de graduação, esses instrumentos em um segundo momento, também
foi objeto de discussão com essa mesma equipe. Foi criado um Banco de Dados
no Acess/Excel, racionalizando os dados de forma relativa (cada população do
estudo) e absoluta (toda população do estudo), atentando para a compreensão
das freqüências simples e das comparações entre distribuições e proporções.
28
Para a aplicação dos questionários contei com o apoio de uma equipe interdisciplinar formada por
estudantes de graduação: Carlos Eduardo Santiago (Estudante de Admistração/ FDJ); Bruno Carvalho
Soares (Estudante de Geografia/UFBA); Danúbia Azevedo Santana (Estudante de Psicologia/FTC); Leandro
Mercês (Estudante de Ciências Sociais/UFBA); Elisângela Ferreira (Estudante de Urbanismo/UNEB); Hilton
Zenha (Estudante de Urbanismo/UNEB); Ronaldo Gusmão (Estudante de Urbanismo/UNEB). Alguns destes
estudantes realizam sua Iniciação Científica no CRH/UFBA – Centro de Recursos Humanos da Universidade
Federal da Bahia e outros fazem parte de Pesquisa na disciplina Políticas e Projetos Habitacionais,
ministrada pela Prof
a
. Dra. Débora Nunes do curso de Bacharelado em Urbanismo da Universidade do
Estado da Bahia. Estes estudantes aceitaram voluntariamente o convite de me acompanharem na Aplicação
dos Questionários nos Conjuntos Habitacionais em estudo, foi uma experiência interessante porque houve
discussões interdisciplinares no final da aplicação dos questionários.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
41
Acrescentamos que os gráficos e tabelas da pesquisa de campo
29
apresentados
neste estudo tem o objetivo de contextualizar os perfis de cada conjunto
habitacional, conferindo mais substância às análises sobre a forma de inserção
dos conjuntos no tecido urbano da cidade.
As entrevistas, como ferramentas imprescindíveis para a elaboração da
pesquisa, complementaram o questionário. Neste contexto foram realizadas
entrevistas com lideranças dos conjuntos: 05 no Conjunto Habitacional Vila Viver
Melhor; 04 no Conjunto Habitacional Loteamento Vale das Dunas; 04 no Conjunto
Habitacional Jardim Nova Primavera. Além da pré-seleção feita com a sondagem
no momento anterior à aplicação dos questionários, os critérios utilizados na
escolha dos entrevistados, foram: (a) tempo de moradia no conjunto habitacional
com prioridade para os que estão desde a inauguração; (b) grau de envolvimento
e participação nas discussões da comunidade. Realizamos pesquisas também
com técnicos da CONDER e com um professor da Universidade Federal da Bahia,
que realiza estudos e investigação de campo no Subúrbio Ferroviário de Salvador.
Na pesquisa também utilizamos o método que pode ser qualificado como
da escuta flutuante
30
, bem como a observação participativa, conversas informais e
provocações de bate-papos com os moradores em seu cotidiano, dando
prioridade para os que se encontravam em ociosidade pelas ruas do conjunto,
escutando e escrevendo as informações, os dizeres e falas, o que tinham como
objetivos de vida. Esses registros das principais inquietações da comunidade em
29
Cf. (VALLADARES, L. Prado, 2005) O Padre Lebret, por sua vez insistia que toda a pesquisa deveria ter,
como ponto de partida, a busca de uma “visão global” baseada na observação direta e nas entrevistas
(Lebret, 1952:14) mas também sublinhava que toda pesquisa carecia, em uma segunda etapa de um
procedimento estatístico , que compreendesse a classificação, a identificação dos tipos e das classes, a
síntese dos perfis de tipos de classes. [...] A propósito das entrevistas, ressalta que estas jamais deverão
soar como interrogatório. Em seu método é dada uma importância na representação gráfica dos dados:
diagramas, quadros e mapas.
30
Terminologia de Sigmund Freud, referindo-se a importância da escuta e sua utilização como método de
interpretação da realidade.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
42
relação ao conjunto habitacional, deram origem aos cadernos de campos que
registravam este momento da pesquisa, em tom de pequenas notas etnográficas,
que se somaram à interpretação qualitativa do objeto em estudo.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
43
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
44
CIDADE E POBREZA: TRANSFORMAÇÕES URBANAS
I – A constituição histórica de uma cidade desigual
O passado de uma cidade por si só, não é capaz de explicar
intrinsecamente o seu presente, permite sinalizações importantes que podem
aguçar as reflexões sobre seus problemas atuais e futuros. Ao mencionarmos
fases da constituição histórica de Salvador estamos compreendendo a
tessitura
31
de processos urbanos que se iniciaram no século XVI e constituíram,
no século XX, uma metrópole com elevados índices de desigualdades
32
.
A concepção de desigual/desigualdade que permeará este capítulo é
aquela que se instaurou historicamente no jogo das antíteses da cidade
geograficamente alta e baixa; economicamente rica e pobre; socialmente
remediada e miserável, da cidade das diversas formas de acumulação e
apropriação, concentrações e exclusões, que tiveram seus desdobramentos nas
ideologias e formas de planejamento
33
, que se expressaram no tecido urbano
através de suas lógicas de segregar e excluir. Deste modo, é plausível
retornarmos concisamente à constituição da cidade soteropolitana, enfatizando
não apenas a sua origem histórica, mas elementos importantes para
compreender a sua territorialização urbana.
A cidade de Salvador, fundada em 1549, em seus primeiros séculos foi a
maior expressão urbana da colônia portuguesa no Atlântico Sul. Inicialmente
cercada por muralhas e com grandes portões de entrada, foi por dois séculos a
31
Este termo usal na literatura sociológica se refere a contextos, processo de constituição, neste caso, da
cidade e de seus espaços intra-urbanos; tecer; tecelagem alinhavamentos pertinentes a feitura do tecido
urbano.
32
O desigual a que nos referimos não é apenas o sinônimo do não-igual, diferente, diverso, irregular e/ou
acidentado – topografia íngreme de Salvador.
33
Estes planejamentos se realizaram de maneira obedientes a uma dinâmica sócio econômica e política
que atendem aos interesses de uma minoria
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
45
principal representação lusitana no hemisfério sul e, em igual período, foi a sede
política
34
e administrativa da colônia portuguesa; possuía o principal porto
marítimo da América Latina e era um dos maiores centros comerciais do
comércio transatlântico.
A forma urbana de Salvador obedecia ao plano de cidade fortaleza
concebida a partir de um esquema estratégico
35
, fruto de um projeto de
dominação da Coroa Portuguesa, construída sobre uma topografia íngreme e
acidentada
36
, Salvador foi alocada paralelamente ao mar possibilitando uma
visão privilegiada de quem aportasse na baía de Todos os Santos. A cidade
começava na ponta da baía
37
, no atual bairro da Barra, subia em direção à
Cidade Alta e continuava pela praia rumo à Cidade Baixa, desembocando no
interior da baía, até a península de Itapagipe e nos bairros do Bonfim e
Montserrat, tramando seu tecido urbano
38
de fora para dentro, ou melhor do mar
34
Cf. (SOUZA, A. M. G. 2000) Como primeira capital do país, desde os tempos coloniais atraiu grandes
investimentos. Essa posição conferiu-lhe um grande e significativo acervo arquitetônico colonial,
particularmente localizado na sua área central, constituindo-se um dos mais importantes referenciais do
patrimônio histórico no Brasil.
35
Cf. Carta Régia trazida por Tomé de Souza (1549), [...] ordenei ora de mandar nas ditas terras fazer
uma fortaleza e povoação grande e forte em um lugar conveniente para dai se dar favor e ajuda as outras
povoações e se ministrar justiça e prover nas cousas que competirem a meu serviço e aos negócios de
minha fazenda e a bem das partes; e por ser informado que a Bahia de todos os Santos é o lugar mais
conveniente da Costa do Brasil para se poder fazer a dita povoação e assento, assim pela disposição do
ponto de rios que nela entram, como pela bondade e abundância e a saúde da terra e por outros
respeitos, hey por meu serviço que na dita Bahia se faça à dita povoação e assento e para isso vá uma
armada com gente, artilharia, armas e munições, e tudo mais que for necessário.
36
Cf.(MATTOSO, K. M
a
. Q.,1992, p. 41 e 45). Salvador se ergue com arrogância sobre uma costa
rochosa, verdadeiro promontório com setenta metros de altura, que fecha e domina uma ampla baía
semeada de ilhas e ilhotas - se localiza a Bahia. [...] A ponta sul da península em que se ergue, a cidade
tem a forma de um losango, cuja orla corre, exatamente ao longo de uma falha imensa que se chama
falha de Salvador. Cf. (RUY, 1949, p. 21) [...] o lugar escolhido então, de situação estratégica
privilegiada, debruçando a pique sobre o mar, dominando-o com ótimas aguadas e porto extenso, de
fácil defesa caso viessem ataques do mar ou de terra, uma vez que esse altiplano dominaria os morros
vizinhos, de que se isolava por riachos e lagoas que enchia as baixadas de valados profundos.
37
A constituição enquanto pequeno vilarejo na ponta da baía de Todos os Santos – a vila de Pereira
Coutinho, então proprietário/donatário de capitania, se realiza antes da instalação da cidade oficial de
Tomé de Souza, fundada em 1549.
38
A terminologia tecido urbano estará presente em todo o estudo, desta forma, esclarecemos que a
noção utilizada remete ao conceito de Henri Lefebvre. O tecido urbano é uma espécie de redes de
malhas desiguais, um ecossistema não equilibrado. Dentro do tecido urbano existem ilhas de miséria e
opressão [...] assim a cidade e o urbano não podem ser compreendido sem as instituições oriundas das
relações de classes e de propriedade (LEFEBVRE, Henri.1991. 34).
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
46
para o continente. A partir do plano pré-estabelecido, a cidade estratégica
39
deveria constituir-se num porto seguro dotado de infra-estrutura e concepção
arquitetônica militar. A escolha do sítio foi justificada pelas condições
topográficas, tendo em vista a necessidade defensiva e de segurança.
Mesmo localizada sobre uma topografia escarpada, pode-se perceber
(Figura 1) que a cidade conseguia ter formas regulares, dentro de um sistema de
quarteirões relacionados entre si e circundados por uma muralha. Mas esta
forma física inicialmente racionalizada, que deu origem ao tecido urbano de
Salvador, vai se expandido sorrateiramente e logo ultrapassa as muralhas
40
. O
Plano Luso, mesmo tendo servido como instrumento de orientação para
Salvador, não conteve a dinâmica urbana e o processo de ocupação
desordenado nas décadas posteriores à sua implementação.
Figura 1 – Pintura do Plano Urbano Lusitano para Salvador
39
A idéia de cidade estratégica ou cidade fortaleza pode ser justificada pela privilegiada localização
geográfica e pela busca do controle sobre a extensão do litoral, ao mesmo tempo, a cidade deveria estar
bem protegida em caso de possíveis ataques de índios ou estrangeiros, tanto por terra como por mar. A
cidade foi fundada enquanto o ponto de partida de um processo de ocupação pelos portugueses: para
fixar-se em ponto para poder explorar toda capacidade produtiva das terras brasileiras com a monocultura
de cana-de-açúcar, como também garantir o domínio permanente de um território. (Grifos do autor do
trabalho)
40
Cf. (AZEVEDO, T. 1955, p. 131 e 149) [...] a cidade surgia como nenhuma outra em seu tempo, com a
considerável população de 1.000 pessoas e uma completa organização judiciária, fazendária,
administrativa e militar [...] a cidade de Salvador iria crescer rapidamente, ultrapassando os acanhados
limites fortificados destas. [...] Mem de Sá quando assumiu o governo geral, encontrou a Bahia mais larga
do que a antiga fortaleza; dos primitivos muros de taipa iam desaparecendo os vestígios. Dali a dois anos
ele mesmo noticiava a el rei que ‘a cidade vai a muito crescimento’.
Fonte – CD ROM – Imagens (REIS, G. Nestor, 2000)
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
47
A cidade de São Salvador, como as cidades do Império português,
recebeu um “termo” cuja composição até o terceiro quartel do século era de
vinte freguesias. Sendo orientada pelo modelo português de estrutura
administrativa, dividiu-se em comarcas, que se constituíam como unidades
administrativas
41
. O núcleo matriz da cidade do Salvador passaria a se
configurar em duas partes distintas: a “Cidade Alta”, centro administrativo,
político, religioso e de residências, e a “Cidade Baixa”, a praia, o porto e seus
armazéns. Este projeto de cidade, dividida em parte alta e baixa, assemelhava-
se às cidades portuguesas; no caso de Salvador, tal divisão serviu como eixo
inicial para a estruturação da malha urbana. As seguintes projeções
cartográficas demonstram bem a evolução da cidade de Salvador.
Figura 2 – Evolução da ocupação de Salvador – 1600/1940
Fonte – Atlas Escolar Bahia: espaço geo-histórico e cultural. 2ª. Ed. João Pessoa: Grafset, 2004.
41
Cf. (VILHENA, 1969).O termo da cidade da Bahia era composto, até o terceiro quartel do século XIX,
por vinte freguesias, que passamos a listar: O Salvador na Sé, Nossa Senhora da Conceição na Praia,
Santíssimo Sacramento no Pilar, Santo Antônio além do Carmo, Nossa Senhora da Penha em Itapagipe,
Santíssimo Sacramento em Sant´Anna, Nossa Senhora das Brotas, São Pedro Velho, Santíssimo
Sacramento na rua do Passo e Nossa Senhora da Vitória - freguesias “urbanas”; São Bartolomeu em
Pirajá, Nossa Senhora do Ó em Paripe, São Miguel em Cotegipe, Nossa Senhora de Piedade em Matoim,
Santo Amaro da Ipitanga (Nossa Senhora da Conceição de Itapoã), São Pedro no Sauípe da Torre, o
Senhor do Bonfim na Mata, Santa Vera Cruz em Itaparica, Santo Amaro em Itaparica, Nossa Senhora da
Encarnação em Passe - freguesias “rurais” ou “suburbanas”.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
48
No processo de ocupação da cidade de São Salvador:
[...] observa-se, entre a sua fundação e a década de 1950 do
século XX, três tipos de ocupação: de 1549 até finais do século
XVI, a cidade apresenta um plano regular, com ruas que se
cruzam em ângulo reto, e adapta-se à topografia; entre o século
XVII e finais do século XIX, há um crescimento sem plano
nenhum para o conjunto, com ruas sinuosas e pequenas praças;
e entre o final do século XIX e a primeira metade do século XX,
são ampliadas as funções urbanas e tem-se a introdução dos
transportes modernos, havendo a necessidade de alargamento
das ruas e abertura de praças. (SANTOS,1959, p.63)
O plano vindo de Portugal não conseguiu manter a regularidade da sede
colonial por muito tempo: no século XVIII, percebeu-se que o plano inicial foi
deixado para trás, não acompanhando o crescimento da cidade que aconteceu
sem orientação projectual. No final do século XVIII, o poder público já havia
percebido a necessidade de tornar o traçado urbano de Salvador mais regular
42
,
mas as mudanças só começaram a ocorrer no final do século XIX. Ainda é
importante observar que, ao longo da Primeira República (1889-1930), as
pequenas intervenções pontuadas e localizadas não se configuraram como um
modelo de plano urbanístico, pois não consideravam a cidade na sua totalidade,
circunscrevendo-se na abertura de avenidas e construções de praças, ruas e
jardins na área central, enquanto as outras áreas da cidade evoluíam sem
acompanhamento técnico.
42
Cf. (CARDOSO, Ceila. 2004) Desde os fins do século XVIII, em Salvador, podem-se ler registros que
direcionam a conscientização e as iniciativas governamentais no sentido de tornar a cidade mais regular.
São reincidentes as deliberações do poder público no sentido de dar alguma ordem ao traçado das ruas e
a sua manutenção. No século seguinte se acentuaria, de forma mais contundente, a preocupação em
torná-la mais limpa e livre das impurezas e doenças advindas do viver coletivo. (p.43). Cf. (SAMPAIO,
1999, p.61) Já no final do século (1784-1788), coube ao engenheiro Manoel Teixeira, preparar um plano de
ação para a cidade, contemplando pavimentação de ruas, alinhamentos , recuos e jardins e correções
várias [...]. O víeis higienista ali já se instalava como procedimento urbanístico básico. Os projetos
desenvolvidos até então, eram projetos tópicos, localizados e setoriais, inexistindo uma “totalidade” urbana
projetada. Cf. (CARDOSO, Ceila. 2004).Em fins do século XIX, na decadência do patriarcado rural e
desenvolvimento do urbano, decorrência da crise do açúcar, a cidade de Salvador torna-se o centro de
convergência dos interesses regionais e reorganizaram as estruturas: familiar, econômica e cultural,
reconfigurando-se e recaracterizando-se a sua espacialidade. Neste processo urbano, a indústria e o
comércio movimentam e regulamentam a cidade apesar da baixa produção industrial frente ao momento
nacional (p.45). Acrescento que as reformas de Haussmann, em meados do séc. XIX em Paris objetivando
uma modernização da cidade, influenciaram as intervenções que foram feitas nas cidades brasileiras.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
49
Segundo Simas (1978), entre as últimas décadas do século XIX
43
e
próximo aos meados do século XX, a cidade de Salvador passou por um
incipiente processo de industrialização, implicando numa mudança de
mentalidade em relação às transformações urbanas e na necessidade de tornar
a cidade moderna. Neste contexto, Salvador como boa parte das grandes
capitais brasileiras nas primeiras décadas do século XX
44
, sofreu inúmeras
demolições com a justificativa do cumprimento das necessidades higiênicas
45
.
As práticas urbanas exercidas pelos engenheiros higienistas e sanitaristas
referenciavam a busca da estética, a ampla circulação viária e a salubridade do
meio físico. Conforme a referência de Cardoso (2004), em 1905, o Engenheiro
Theodoro Sampaio, dentro dos ideais de saneamento e comunicação, propôs
um novo esquema viário e um engenhoso meio de articulação entre a cidade
alta e baixa
46
.
No transcorrer da história de Salvador, aqui manifestada sucintamente, o
seu tecido urbano sofreu uma série de transformações. Continuidades e
descontinuidades levaram a cidade colonial do século XVI a se transformar em
43
Na segunda metade do século XIX foi construído o Elevador Lacerda, para a ligação entre cidade-alta e
cidade-baixa, facilitando a comunicação entre as duas dimensões da cidade. Exercendo também uma
maior articulação na configuração urbana de Salvador.
44
Cf. (RIBEIRO, Luis César Q. e CARDOSO, Adauto, 1996, p.65) No período pós anos 20, observou-se a
realização da I Semana de Urbanismo de Salvador 1935 [...] com a instituição do Escritório do Plano de
Urbanismo da Cidade de Salvador, em 1943. São Paulo implantou seu Plano de Avenidas e também
Recife ganhava um plano diretor. Cabe ressaltar que todas essas iniciativas se deram sob a égide de
interventores nomeados pelo Governo Vargas.
45
Cf. (SAMPAIO, 1999, p. 166) O recorte positivista latente nos saberes de médicos e engenheiros
predomina, inexistindo no caso baiano nesta etapa a figura do urbanista clássico, assentada na formação
do arquiteto.
46
O Engenheiro Theodoro Sampaio antecipa uma série de idéias posteriormente retomadas pelo EPUCS.
De certo modo, Theodoro Sampaio, politécnico assumido, distancia-se da visão mais pragmática
implementada por J.J. Seabra na constituição das primeiras experiências de modernização urbanística da
cidade. Cf. (SAMPAIO, 1992 apud FERNANDES, pág. 86) o governo J.J. Seabra, no início do século XX,
vai se reforçar das novas contribuições, quando ali: “[...] buscaram abastecer-se em São Paulo de
arquitetos, escultores e pintores, decoradores e artesãos especializados, com o fito de mudar, como
pretendem e em parte conseguiram, a plástica de Salvador”.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
50
uma cidade moderna de grande magnitude
47
e detentora de expressivos índices
de pobreza e desigualdade social, conforme elucidaremos nos próximos itens
deste trabalho.
II – Salvador e suas configurações: do Epucs (1945) ao Plandurb (1978)
Com pouco mais de 2,6 milhões de habitantes, IBGE - Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística - 2004, Salvador é a terceira cidade mais populosa do
país e comanda a sexta região metropolitana brasileira. De acordo com estudos
de Almeida e Damasceno (2005) cresceu à taxa de 1,9% no ano de 2004: mais
rápido que Recife e Belo Horizonte, mas a uma velocidade inferior à de
Fortaleza e Brasília. A capital da Bahia comanda a sétima mais populosa região
metropolitana do Brasil, com quase 3,3 milhões de habitantes.
Salvador, a partir dos anos 40 do século XX, começou a passar por um
gradativo processo de transformações urbanas: no campo político, a capital
sofria influência das ideologias no Estado Novo (1937-1945); no campo
econômico, uma notável dinâmica da industrialização brasileira no pós-guerra
48
.
Ambos fatores foram de grande estímulo para o desenvolvimento do processo
de modernização de Salvador. Sendo assim, após a I Semana de Urbanismo de
1935, surgia o primeiro esquema traçado para a modernização da cidade, em
1942, que começou a ser posto em execução com a criação do EPUCS
49
-
Escritório do Plano de Urbanismo da Cidade do Salvador, em 1943.
47
Salvador é atualmente a 3ª. cidade em número de habitantes do Brasil, ficando após São Paulo e Rio
de Janeiro. Segundo dados do IBGE (2004) Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – São Paulo
possui 10.927.985 hab, seguida pelo Rio de Janeiro 6.094.183 hab e Salvador 2.672. 560 hab.
48
Cf. (REIS FILHO, N. G. 1996, p. 11) Em relação ao período entre 1945 e 1964, pode se dizer que o
impulso econômico e o estímulo à industrialização representado pela Segunda Guerra Mundial se
traduziram fisicamente pelo crescimento expressivo de algumas cidades e por um discreto incremento do
índice de urbanização que passou de 31,24% em 1940, para 36,16% em 1950.
49
Este plano, inicialmente, contou com a coordenação do professor Mário Leal Ferreira, que faleceu cinco
anos após a apresentação de seu Plano à prefeitura, ou seja, antes do mesmo ser finalizado. Dando
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
51
O EPUCS, objetivando o planejamento de Salvador, enfocava a
problemática urbana sob uma ótica global. Este escritório de planejamento
sinalizou as diretrizes de crescimento para a cidade. Muitas das configurações
que temos hoje em Salvador foram originárias deste plano que marcou a história
de desenvolvimento urbano da capital baiana, direcionando as diretrizes de
expansão e tessitura urbana. A forma física elaborada pelo EPUCS se mostrava
radial concêntrica, organicamente adaptada ao sítio e seus condicionantes
geomorfológicos.
Figura 3 – Esquema do Modelo Radial – Concêntrico
Fonte: Sampaio, 1999.
Através da observação da (Figura-3) percebemos as lógicas de
funcionalidade que nortearam o planejamento urbano a partir da utilização do
modelo Radial Concêntrico para as ocupações e circulações na cidade;
observam-se recortes tipo trevos com adaptações específicas para cada zona,
com implantações de loteamentos que posicionavam as residências nas
cumeadas e o sistema viário pesado nos talvegues. Em relação à circulação
continuidade aos trabalhos, em 1948, o arquiteto Diógenes Rebouças, dirigiu o CPUCS – Comissão do
Plano de Urbanismo da Cidade de Salvador, sendo apoiado pelo então prefeito Araújo Pinho frente a um
conselho de assistência ao plano.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
52
urbana, muitas idéias discutidas na I Semana de Urbanismo (1935) foram
utilizadas, a exemplo das propostas de parkways das quais partiram as
sugestões para o primeiro plano formal a ser elaborado para a cidade do
Salvador, a fim de torná-la uma cidade modelo.
Conforme os estudos de Sampaio (1999) a concepção viária articulou de
modo competente cumeadas e vales, destinando circuitos para o transporte
coletivo, e privilegiando os vales ao tráfego rápido, dando fluidez aos
automotores. A trama radial concêntrica tem nas vias radiais a ligação bairro-
centro e nas concêntricas a ligação bairro-bairro, interligando o centro principal
pela “base de tráfego”, num complexo urbanístico em vários níveis, separando
os modos de circulação.
Neste contexto, o EPUCS articulava-se a partir de dois grandes sistemas
viários: as vias de penetração e as vias de irradiação distribuídas em cintas
concêntricas e linhas radiais. Do plano ainda constavam proposições especiais
nas áreas de saúde, saneamento, serviços, segurança, educação, cultura e
habitação. As vias davam uma nova dimensão na configuração da cidade,
indicando as áreas para a expansão urbana de Salvador.
O zoneamento estabelecido no EPUCS recebia influência da América do
Norte
50
, sendo indicados para a zona urbana os seguintes setores: um Setor
Portuário (SP); um Setor Portuário e Comercial (SPC); um Setor Industrial (SI);
dois Setores de Transição (ST); e sete Setores Residenciais (SR). Neste
sistema de zoneamento, percebemos zonas residenciais concêntricas a partir da
zona comercial e de transição, além de duas zonas “satélites” periféricas
50
Cf. (MANCUSO, F., 1980, p. 171/172) El zoning, nascido na Alemanha, encuentra em Norteamérica el
terreno mais fértil para su desarrollo. [...] El zoning se introduce oficialmente en USA como instrumento de
mediácion e los conflictos y de los intereses de um conjunto de agentes presentes en la ciudad, y se vê
necesario desde el momento em que tales conflictos alcanzan los niveles mas elevados y los mecanismos
tradicionales de autoregulación ya no fucionam.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
53
(Itapagipe e Pituba). Estas zonas obedeciam critérios de densidade altas,
médias e baixas, de forma decrescente no sentido centro-periferia.
A
A preocupação com a habitação social foi indicada, no EPUCS, a partir de
uma proposta de intervenção direta do Estado na questão, adquirindo terras,
regulando o mercado, subsidiando a moradia popular e criando as chamadas
“habitações transitórias” para os estratos de menor renda, privilegiando a
localização próxima ao emprego. Segundo (SAMPAIO, p.45, 1999) “o EPUCS
pressupunha o acesso a terra e aos serviços básicos”, tal pressuposto, atrelado
ao discurso do Estado, objetivava criar as bases do bem estar social, o que não
Figura 4 – Mapa do Esquema Radial – Concêntrico Adaptado ao Sítio
Fonte: Sampaio, 1999.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
54
foi efetivado, pois a funcionalidade do plano deu ênfase a tentativas de integrar
o tecido urbano, sobretudo no que se refere a articulação viária.
Com o falecimento do idealizador do EPUCS, prof. Mario Leal Ferreira,
em 1948, criou-se a “Comissão do Plano de Urbanismo da Cidade de Salvador
CPUCS, sob direção do professor Diógenes Rebouças, em uma tentativa
frustrada de dar continuidade aos trabalhos. O plano de urbanismo apresentado
pela CPUSC constava de uma proposta de modelo físico para a cidade baseada
nos aspectos geomorfológicos
51
da região, assim como nas diretrizes gerais,
que apontavam para o: saneamento, água e esgoto, zoneamento e
comunicações. O CPUCS foi extinto em 1958. Em 1959, criou-se a SURCAP –
Superintendência de Urbanismo da Capital, que depois foi substituída, nos anos
de 1970, pela OCEPLAN - Órgão Central de Planejamento, que tentou de forma
frágil dar continuidade ao processo de planejamento urbano iniciado nos anos
de 1940.
A partir da década de 40, surgiram alterações nas práticas de
intervenções urbanas, que passaram a ser orientadas pela nova dinâmica
industrial que se desenvolvia em algumas capitais brasileiras; o fluxo migratório
para as cidades e todas as suas variáveis correlatas constituíam a necessidade
de se pensar novas formas de intervenções urbanas, que viriam se fazer
presentes na segunda metade do século XX.
51
Cf. (COSTA, E., 2004) Considerando-se os aspectos geomorfológicos, identificaram-se então, em
frente a baía de Todos os Santos , uma cadeia de morros ligados entre si por gargantas e, do lado oposto
pequenos planaltos em forma de folhas de trevos, encostas arborizadas e pequenos vales que se
articulavam. No modelo físico proposto, as várias gargantas prestam-se para centros cívicos e de
abastecimento: as nervuras das folhas de trevo para ligação entre os centros e as residências; os fundos
dos vales maiores, com os talvegues para as vias de tráfego pesado, parques e bosques ou coletores-
tronco de águas e esgotos. Nas encostas brandas, localizariam-se os edifícios multifamiliares, e nos
altiplanos os loteamentos unifamiliares, consolidados pelos modelos Radial Concêntrico e de Trevo.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
55
Nos anos 60, não houve grandes inovações na política de planejamento.
Algumas decisões foram concretizadas, mas apenas como conseqüência dos
processos iniciados nos anos anteriores. Na década de 60, é preciso observar a
criação do BNH
52
– Banco Nacional de Habitação – e do SERFHAU
53
– Serviço
Federal de Habitação e Urbanismo, criado em 1966, por meio do qual se
formaliza a necessidade da institucionalização do planejamento, com a
formatação de planos
54
e diretrizes que, em boa parte, se esgotaram na teoria,
sem execução prática.
III – Dois planos & suas concepções: Plano CIA e PLANDURB
A cidade de Salvador, entre as décadas de 1940 e 1970, se transformou
em um dinâmico centro polarizador
55
. Sua trama urbana se tornou complexa,
com vias e avenidas; o tecido urbano cresceu, a cidade se adensou, o processo
de industrialização ganhou fôlego e a execução de um novo planejamento
urbano se tornava necessária para ordenar seu crescimento e as formas de uso
e ocupação do solo. Nas décadas posteriores aos anos de 1950, Salvador
constitui-se como a principal referência nordestina no movimento de ampliação e
52
Maiores informações sobre o BNH e a política habitacional neste período, serão explicitadas no próximo
capítulos.
53
Cf. (VILLAÇA, p. 172, 1999) [...] o SERFHAU, pretendeu (sem conseguir) estimular o planejamento
urbano no Brasil, pois quis estimular os planos individuais da cada cidade [...] sua atuação insere-se, se
não na prática (já que a maioria dos planos não saiu do papel), pelo menos nas idéias referentes ao
planejamento urbano.
54
Ver:. VILLAÇA, Flávio. Uma contribuição para a história do planejamento urbano no Brasil. In DEÁK C.
& SCHIFFER, S. O processo de urbanização no Brasil. São Paulo, Edusp/Fupam, 1999.
55
Cf. (ALMEIDA, Paulo H., 2006, p.25) Na segunda metade do século XX, a Bahia permaneceu um dos
estados menos urbanizados do país – tinha, em 1980, segundo os elásticos critérios do IBGE, um grau de
urbanização ainda muito inferior à média do Brasil, com 49,25% da sua população residindo em cidades,
enquanto 67,57% da população brasileira já se encontrava nesta situação ( IBGE, 1983). [...] Mesmo com
taxas de urbanização inferiores em relação a de outras capitais do Brasil, é inegável o avanço da
“metropolização” de Salvador nas décadas de 1960 e 1970, um fenômeno, então, comum nas várias
capitais brasileiras. Vale mencionar ainda que Paul Singer (1980) ratifica a constatação do economista
Paulo Almeida, ao explicitar que por volta de 1940, Salvador era a menos desenvolvida das grandes
capitais regionais do Brasil, em termos industriais: a porcentagem de sua população ocupada na
indústria de transformação era de sua população ocupada na indústria de transformação era então
menor que a de São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre e Recife. (1980, p. 42).
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
56
no processo da industrialização moderna
56
, com a instalação da CHESF –
Companhia Hidroelétrica do São Francisco – e da PETROBRAS. Segundo
Francisco de Oliveira dialogando com o economista baiano José Sérgio Gabrielli
de Azevedo
57
:
[...] A massa de investimentos da PETROBRAS não tem paralelo
na história econômica do Estado: entre 1955 e 1959, o total
desses investimentos corresponderá de 1 até 7,4% da renda
total e de 8,1% a 66,9% da renda interna industrial do Estado
da Bahia. A massa de salários pagos pela PETROBRAS
despejada na economia baiana crescerá à razão anual de 18%
reais, entre 1958 e 1969, e no mesmo período se elevará de
7,64% a 38,7% do total de renda industrial interna do Estado,
tendo atingido o nível de quase 50% no ano de 1967. A
dinâmica dessa radicalidade concentrará a renda em Salvador
quase como em nenhuma outra parte do Brasil. (OLIVEIRA apud
AZEVEDO, 1975, p. 43).
Os investimentos na constituição de um tecido industrial que gravitava na
petroquímica e na siderurgia tiveram um forte impacto no desenvolvimento da
capital baiana, com um evidente desdobramento no crescimento urbano.
Conforme Oliveira (1987, p. 49) “o Estado da Bahia absorverá mais da metade
de todos os investimentos industriais realizados no Nordeste, nas décadas de
(1960/70)”. O valor da transformação industrial por pessoa ocupada
quadruplicou entre os anos de 1950 e 1970. Neste período foi construído o
Centro Industrial de Aratu, para o qual todas as facilidades foram concedidas:
terrenos vendidos e preços simbólicos, infra-estrutura completa.
Com a implantação do Centro Industrial do Aratu (CIA) e do Complexo
Pólo Petroquímico de Camaçari (COPEC), consolidava-se a instituição da área
metropolitana de Salvador. Para Almeida (2006, p.25) “com a mudança do perfil
da indústria regional, e os investimentos no CIA e no COPEC, ocorreram
56
Sobre este assunto ver (CARDOSO, 2004). Arquitetura e Indústria: a Península de Itapagipe como Sítio
industrial de Salvador Moderna 1891 – 1947. Dissertação de Mestrado – EESC/USP – 2004.
57
Cf. OLIVEIRA, Francisco. O Elo Perdido – Classe e identidade de classe. Editora Brasiliense, Rio de
Janeiro, 1987.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
57
alterações importantes na macroestrutura da economia baiana causando
impacto na economia de Salvador e no seu hinterland imediato”. Segundo o
autor, a participação da indústria no PIB estadual saltou de 12% em 1960, para
31,6% em 1980, e 38,1%, em 1990.
Na segunda metade do século XX, ocorreram mudanças radicais
no tecido urbano de Salvador. Isto se deu de forma bastante
rápida e abrupta, entre as décadas de 1960 e 1970, com a
realização de grandes obras que acompanharam e anteciparam
os vetores de expansão urbana e de uma intensa ocupação
informal de famílias de baixa renda na periferia. [...] A prefeitura
de Salvador, que detinha a maioria das terras do município,
transferiu sua propriedade para (algumas poucas) mãos
privadas através da Lei da Reforma Urbana, em 1968.
Promoveu uma ampliação substancial do sistema viário com a
abertura das avenidas de vale, extirpando do tecido urbano
mais valorizado um conjunto significativo de assentamentos de
população pobre, que ocupavam tradicionalmente os fundos
até então inacessíveis dos numerosos vales de Salvador.
(CARVALHO, Ináia M..M; SOUZA, Ângela, G.; PEREIRA, G.
Corso. 2004, p.284).
Nos anos de 1960, período da ditadura militar, a execução do Plano CIA
atendeu, dentro das possibilidades, as novas demandas geradas pelo processo
de industrialização
58
. Segundo Heliodório Sampaio (1999, p.217/218), o plano
CIA, ao contrário do planejamento integrado do EPUCS de Mário Leal Ferreira –
na vertente do “town planning” – aproxima-se do urbanismo modernista dos
CIAM’s; por outro lado, decorreu de um planejamento econômico de
característica cepalina (CEPAL) liderado por Rômulo Almeida, no pós - anos 50.
É evidente que o plano CIA teve atuação diferente do EPUCS, pois
seguiu as orientações dos CIAM’s (Congressos Internacionais de Arquitetura
58
Segundo Francisco de Oliveira no prefácio do livro Bahia de Todos os Pobres (1980, p. 15), a expansão
capitalista, no setor industrial, apresenta características semelhantes àquelas observadas no Centro-Sul:
bens intermediários, sobretudo e, secundariamente, de consumo durável e de capital, utilização intensiva
de capital e altos graus de concentração e centralização.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
58
Moderna) e da Carta de Atenas, adotando um planejamento funcional, voltado
para o atendimento do interesse da indústria com implantação e articulação de
grandes vias e com um desenvolvimento urbano de enfoque sistêmico apoiado
na vertente de um planejamento urbano-regional, estruturando vias importantes
para o desenvolvimento metropolitano. O plano desenvolvido focalizou o
desenvolvimento viário da cidade e abria a estrutura urbana para a especulação
imobiliária.
Este plano possuía uma concepção setorizada e estava a serviço do
processo de industrialização em uma dimensão de planejamento que articulava
produção-transporte-consumo. A principal diferença entre o Plano CIA e o
EPUCS estava no fato deste possuir uma visão mais global e totalizada da
cidade, enquanto o Plano Cia focalizava um desenvolvimento apoiado na
circulação viária, direcionada aos interesses da zona de produção industrial. A
principal conquista do Plano Cia foi a orientação dada ao contexto da micro-área
formada pelo Centro Industrial do Aratu; Complexo Petroquímico de Camaçari e
o Terminal Marítimo de Aratu, referências para o desenvolvimento estratégico-
industrial do nordeste brasileiro. Ambos os planos tiveram grande importância
nas alterações e crescimento do tecido urbano de Salvador:
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
59
Figura 5 – Mapas do tecido urbano de Salvador no transcorrer das décadas 1940/70.
Fonte: Arquivos SEPLAM/PMS
Adaptação: SOARES, Antonio Mateus de C. e ALMEIDA, Ricardo A. (2006).
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
60
A partir da comparação dos mapas, percebemos a expressiva expansão
urbana de Salvador no transcorrer das décadas. Enquanto na década de 40
observou-se uma ocupação centrada na zona sudoeste, na borda da Baía de
Todos os Santos e na área de ocupação inicial da cidade, na década de 60
observamos uma interiorização das ocupações
59
; seguindo as orientações do
planejamento inicial , o tecido urbano cresceu continuamente nos anos de 1970;
com uma acentuada ocupação na Orla Atlântica, movimento que se mostra
constante nas décadas posteriores
60
.
Tabela 1 - População das cinco maiores cidades do Brasil*
1960 1970 1980 2005
CIDADE DEM. CIDADE DEM. CIDADE DEM. CIDADE DEM.
1º.
R. Janeiro 3.307.163 S. Paulo 5.241.232 S. Paulo 7.033.529 S. Paulo 10.927.985
2º.
S. Paulo 3.164.804 R.Janeiro 4.315.746 R.Janeiro 5.093.232 R.Janeiro 6.094.183
3º.
Recife 788.569 B.Horiz. 1.126.368 Salvador 1.469.276 Salvador 2.672.360
4º.
B.Horiz. 642.912 Recife 1.070.078 B.Horiz. 1.184.483 B.Horiz. 2.375.329
5º.
Salvador 630.878 Salvador 1.017.591 Recife 1.108.883 Fortaleza 2.374.944
*Os dados do IBGE se referem apenas ao distrito sede. (Adaptada do Caderno LAP \11)
A população de Salvador, que era de 630.878 habitantes em 1960
61
,
cresce para 1.017.591 (1970); a partir daí, Salvador se deslocou da 5º. posição
(1960) em número de habitantes para a 3º. posição (1980) com 1.469.276 (vide
tabela 1), posição mantida até os dias atuais, com uma população de 2.672.560
(2005). Muitos estudiosos consideram que esta expansão urbana foi motivada
pelo processo de industrialização. Contudo Paul Singer (1974), em estudo feito
em algumas capitais brasileiras detectou que não só a industrialização, mas
outros fatores contribuíram para a rápida urbanização de algumas cidades
59
A interiorização estimulada pela elevação dos valores da terra nas proximidades da Orla Atlântica, fez
expandir o subúrbio ferroviário e grandes aglomeração na área do Miolo Urbano, a exemplo do Complexo
Cajazeiras.
60
Vide Figura 7 – Conjunto (2) mapas de expansão do tecido urbano de Salvador no transcorrer das
décadas 1980-2006, nas páginas (22/23) deste capítulo.
61
Não foram utilizados dados de 1940, pelo de fato de optarmos em utilizar dados do IBGE, que
começam a ser disponibilizados, apenas a partir dos anos 50 do séc. XX.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
61
brasileiras. Certamente seu estudo pode ser estendido à análise do caso de
Salvador.
[...] A correlação, que se observa, entre industrialização e
crescimento demográfico não se explica pelo aumento do
emprego industrial que por si só, absorve geralmente uma fração
muito pequena e decrescente da população ativa da cidade.
Assim entre 1950 e 1960, a população paulistana aumentou 74%
(de 2.198.096 para 3.825.351 habitantes), ao passo que o pessoal
ocupado na indústria paulistana só aumentou 55% (de 299.213
para 461.973 pessoas).[...] Neste caso, Recife é uma exceção,
pois o crescimento de sua população reflete a decomposição das
relações coloniais de produção no campo, a qual provocou forte
afluxo populacional à cidade fazendo com que sua população
cresça sem que isto signifique uma expansão correspondente da
economia industrial urbana. Nesta cidade seria um erro encarar o
aumento demográfico como sintoma do seu desenvolvimento
industrial. (SINGER, 1974, p. 328).
Salvador nos anos de 1970, além do crescimento demográfico, sofreu
uma série de transformações sociais, administrativas e econômicas, a exemplo
do deslocamento do centro econômico tradicional, que se situava no bairro do
Comércio, que foi gradativamente perdendo sua função polarizadora com a
instalação do Shopping Iguatemi
62
(1975), assim como de novos sub-centros
comerciais modernos em outras áreas da cidade; o Centro Administrativo da
Bahia (CAB), que se localizava no Centro Histórico foi transferido para um
moderno conjunto de prédios localizado na Avenida Paralela – área norte da
cidade; a região industrial antes localizada no interior do perímetro urbano,
especificamente nas imediações do Bairro da Calçada e no Subúrbio Ferroviário
– Península de Itapagipe – foi transferida para os municípios de Camaçari,
compondo o Complexo Petroquímico de Camaçari (COPEC) e para o Centro
62
Cf. (CARVALHO, Ináia M. M.; PEREIRA, Gilberto, 2006, p. 284). A nova centralidade gerada pelo
Shopping Iguatemi e pelo conjunto de serviços que sua área de entorno passou a oferecer, não apenas
direcionou a expansão da cidade no sentido orla norte, como efetuou a dinâmica do centro tradicional
na área antiga da cidade, contribuindo para o seu gradativo esvaziamento.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
62
Industrial de Aratu (CIA), em uma perspectiva que estabeleceu uma maior
integração viária com Salvador e sua região metropolitana.
Com a instalação destes complexos industriais, começaram a surgir
bairros residenciais de classe média e alta para atender à demanda de
profissionais que vinham de outros estados (São Paulo e Rio de Janeiro), assim
como da nova classe média
63
local que surgia juntamente com o
desenvolvimento industrial. Desta forma, temos o adensamento de bairros como
Pituba, Costa Azul, Stiep, localizados nas proximidades da Orla Atlântica e já se
direcionando para a área norte - nordeste da cidade. Neste processo, surgiu o
bairro Caminho das Árvores – em um esquema de grandes quadras loteadas –
e o bairro do Itaigara, ambos predominantemente residenciais. Enquanto os
bairros citados abrigavam a classe abastada da cidade
64
, sendo orientados por
um zoneamento pré-estabelecido, os bairros do Subúrbio Ferroviário de
Salvador cresciam aceleradamente, abrigando operários de baixa renda,
migrantes e desempregados.
As diversas intervenções urbanas ocorridas provocaram repercussões na
estrutura da cidade principalmente quando percebemos o deslocamento e a
instalação de equipamentos importantes (Shoppings Centers, galerias, CAB –
Centro Administrativo, novas avenidas etc.) que induziram e vetorizaram a
expansão urbana. Estes equipamentos podem ser entendidos, no sentido de
Milton Santos (1997), como elementos fixos que geraram fluxos e dinamizaram o
tecido urbano. Os elementos fixos, neste caso os equipamentos, os espaços
edificados onde se aglomeram populações levadas pelo trabalho ou pela busca
63
Cf.OLIVEIRA, F. O Elo Perdido – Classe e identidade de classe. Ed. Brasiliense, Salvador, 1987.
64
A classe média alta, anteriormente consolidada, residia em bairros tradicionais como Campo Grande,
Corredor da Vitória, Graça, Canela, Ladeira da Barra e outros, contudo está tendência se altera nos anos
de 1990.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
63
do atendimento em serviços criaram massas e polarizaram contingentes de
pessoas, direcionando o movimento de parcelas da população em um espaço
intra-urbano
65
de influência, que dinamizou ao mesmo tempo que constituiu o
tecido urbano.
Os direcionamentos deixados pelo EPUCS se tornaram insuficientes para
conter a dinâmica da cidade que crescia rapidamente; o Plano Cia, orientado
para a estruturação física do tecido industrial, não visualizou a cidade em uma
perspectiva integrada, pois priorizou o circuito industrial integrando apenas vias
circulatórias de influência. Para além disso, as novas acessibilidades viárias
criadas por este plano, como a Avenida Centenário, foram redefinindo a
estrutura urbana, induzindo outras centralidades em desacordo com as diretrizes
do EPUCS .
Tais fatores conduziram ao desenvolvimento do EUST - Estudo de Uso do
Solo e Transporte e do PLANDURB – Plano de Desenvolvimento Urbano de
Salvador (1970), ambos iniciados na Gestão do Prefeito Jorge Haje, tendo
continuidade na Gestão de Manoel Castro, nos anos de 1970.
O urbanismo dos anos 70 diferia em conteúdo e método do
Plano do CIA, pelos sofisticados procedimentos dos “modelos”
de uso de solo e transporte, ao tempo que tentava resgatar a
noção de processo de planejamento instituído pelo EPUCS, nos
anos 40. Os novos procedimentos da CONDER – Companhia de
Desenvolvimento Regional da Bahia, repercutia na montagem do
“enfoque sistêmico” no PLANDURB. (SAMPAIO, 1999, p.245).
Na execução do PLANDURB observou-se uma concepção de intervenção
urbana similar à desenvolvida nos anos 40 pelo EPUCS, partindo de uma
intervenção integrada, aos moldes do “town planning”. Em 1975, a lei n° 2.773,
65
VILLAÇA, Flávio. Espaço Intra - Urbano no Brasil. São Paulo. Studio Nobel, Lincoln Institute,
Fapesp.1998.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
64
autorizou o Poder Executivo a iniciar estudos para a realização do Plano Diretor
de Desenvolvimento (PDDU), com revisão do PLANDURB, notadamente as Leis
do Processo de Planejamento de Ordenamento de Uso e Ocupação do Solo e a
do Plano - Diretor
66
.
Obedecendo ao novo contexto, as áreas da cidade vão se qualificando
diferentemente para a localização dos diversos subgrupos de usos, sempre com
base nos critérios de compatibilidade locacional. O PLANDURB contemplou,
como concepção de planejamento, a preservação ambiental e circulação
urbana, privilegiando, em seu enfoque metodológico, a distribuição espacial da
população e do emprego, relacionando uso do solo e transporte como variáveis
estratégicas do plano. A re-configuração da forma urbana aconteceu não de
maneira espontânea, mas orientada por um instrumento disciplinador com
diferentes graus de consciência e controle, norteado por modelos específicos de
uso do solo, circulação, percepção e apreensão dos espaços.
O modelo físico-territorial de Salvador (PLANDURB-1978) buscou
espacialmente compatibilizar o seguinte conjunto de estudos
67
: evolução
demográfica; evolução física urbana; sítio urbano; imagem da cidade;
características sócio-econômicas; disponibilidade de terras; infra-estrutura em
rede; áreas verdes e espaços abertos; padrões e índices urbanísticos; setor
secundário (industrial); setor terciário (comércio e serviço); circulação e sistema
66
Cf. (COSTA, 2004) Reativa-se, neste período, a participação do Conselho de Desenvolvimento Urbano
(CONDURB), que passa a ter ampla atuação na apreciação dos instrumentos em questão junto a várias
entidades representativas da comunidade [...]. Segundo parecer do Relator da Comissão de Terras
Públicas do Legislativo Municipal, em 7 de junho de 1985, quando do envio do Projeto de Lei no. 65/85,
que dispõe sobre o Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano de Salvador para o período até 1992,
“estão criadas as condições para que a administração municipal que se sucederá à atual possa dar a
esta cidade (...) uma atuação racional, programada e democrática.”
67
Neste processo, de adequação do PLANDURB destaca-se a participação da UFBA na realização de
estudos: Evolução física-urbana de Salvador (CEAB/UFBA); Sítio Físico de Salvador (IGEO/UFBA);
Evolução Demográfica de Salvador (1940-2000 – CRH/UFBA); Além de pesquisas de opinião para os
estudos “Imagem Ambiental Urbana” e “Áreas Verdes – Espaços Abertos” (CRH/UFBA).
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
65
viário. Os estudos para a cidade de Salvador foram realizados através dos
Vetores de Expansão, que deveriam indicar alternativas, a partir de uma espécie
de compatibilização das vantagens inerentes a cada uma delas.
Segundo dados da OCEPLAN - 1978 (Órgão Central de planejamento –
Prefeitura de Salvador), observou-se a seguinte população alocada (1975 –
1990) nos seguintes vetores de expansão: Margens da BR – 324; Avenida
Paralela; Miolo Urbano (OCP – Área de Ocupação Prioritária); (AUC – Área
urbana contínua); Demais áreas e (OCR – Área de Ocupação Restringida). Vale
salientar que os vetores de expansão mencionados continuam a orientar o
crescimento do tecido urbano de Salvador.
Tabela 2 – Distribuição da População pelos Vetores de Expansão
VETOR POP. 1975 (%) POP. 1990 (%)
BR – 324 280.835 26.5 396.390 17.2
PARALELA 151.370 14.3 179.890 7.8
MIOLO 302.050 28.5 339.943 14.7
AUC 162.361 15.3 1.038.112 44.9
Demais áreas /OCR 163.492 15.6 376.308 15.6
TOTAL 1.060.017 100 2.310.643 100
Fonte: OCEPLAN/PLANDURB – 1978.
Observa-se que a AUC – Área de Ocupação Contínua é a que mais
cresce em número populacional (1975 – 1990), uma das justificativas é o fato de
tratar-se de uma área urbana já consolidada; a Área do Miolo (Ocupação
Prioritária), que hoje compreende a área intercalada entre a BR – 324 (que liga
Salvador a Feira de Santana) e a Avenida Paralela, também sofreram
adensamento, mas não na mesma proporção da AUC.
Na indicação de vetores de expansão, pelo PLANDUR, percebia-se a
seguinte formatação, que indicava como o tecido urbano foi estruturado
fisicamente, a partir dos vetores:
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
66
Figura 6 – Mapas dos Vetores de Expansão de Salvador – 1978
É importante afirmar que muitas ações concebidas pelo PLANDURB já
estavam esboçadas pelo EPUCS, o que legitima a idéia de que houve uma
retomada de alguns princípios daquele primeiro plano de estudo, no que se
refere às decisões relativas ao processo de expansão urbana de Salvador.
Os investimentos no setor industrial e todo o processo de configuração e
re-configuração implantados pelos planos realizados para a cidade de Salvador,
estabeleceram a conformação de um padrão de produção do espaço que
atualmente se expressam através de três vetores de expansão: orla marítima
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
67
atlântica/norte; o “miolo” urbano e o subúrbio ferroviário no litoral da Baía de
Todos os Santos. De acordo com Ináia Carvalho e Gilberto Pereira (p.282, 2006)
[...] o primeiro vetor de expansão constitui a ‘área nobre’ da
cidade, local de moradia serviços de lazer, onde se concentram
a riqueza, os investimentos públicos; o segundo, área do
‘miolo’ começou a ser ocupado pela implantação de conjuntos
residenciais para a “classe média baixa”; e o subúrbio
ferroviário, que a partir de 1940 se constitui com a localização
de muitos loteamentos populares.
No transcorrer das décadas, observamos que nos anos 80 e 90 um
adensamento contínuo na área do miolo urbano de Salvador, sentido vetor norte
de expansão; em 2006, observou-se a projeção de um tecido ainda em
dinâmica, mas já com uma considerável ocupação na área do miolo, assim
como a consolidação da mancha na área da orla suburbana e da orla atlântica.
Através destes mapas, compreendemos como o tecido urbano se espalhou no
transcorrer das décadas, em uma progressão contínua em direção à área norte
da cidade, que passa a estruturar sua expansão urbana, a partir da Av. Paralela
(sentido Shopping Iguatemi – Aeroporto Internacional).
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
68
Figuras 7 – Mapas de expansão do tecido urbano de Salvador no das décadas 1980/2006.
Fonte: Arquivos SEPLAM/PMS
Adaptação: SOARES, Antonio Mateus de C. & ALMEIDA, Ricardo A. (2006)
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
69
IV – Bahia de Todos os Santos e de Todos os Pobres
68
: pobreza figurações
e territórios.
A metrópole soteropolitana cresce a cada instante – o percentual de
urbanização avança de 96,6% em 1991, para 98,4% em 2000
69
. Em
concomitância a este processo, observa-se a consolidação de um complexo
quadro de periferização e empobrecimento urbano. Salvador, terceiro
aglomerado populacional do país, é periferia do sistema capitalista no Brasil e
possui uma urbanização, marcada por um “padrão periférico
70
” obediente às
lógicas do capital e às investidas das forças imobiliárias. O adjetivo periférico
aqui empregado se legitima não apenas por Salvador se localizar no nordeste
brasileiro, fora do eixo centro-sul, ou por não possuir um complexo econômico-
industrial como São Paulo e Rio de Janeiro, mas por guardar expressivos
índices de pobreza que se materializam em seu tecido urbano e na própria
fisionomia de seus habitantes:
Entre as 12 principais capitais do Brasil, Salvador ocupa a 8ª.
posição em IDH [Índice de Desenvolvimento Humanos]. Nas
análises sobre o ICV [Índice de Condições de vida], a oscilação
da variável trabalho entre as décadas de 80 e 90, foi de 0,592
para 0,452, em decorrência do aumento do desemprego de
5,5% para 16,3% e da diminuição do número de empregados
com carteira assinada de 63,7% para 45%. O salário médio na
capital baiana diminuiu de R$ 322,00 para R$ 252,88, elevando
o índice de pobreza de 0,06 para 0,1. O número de pobres na
cidade aumentou de 26,9% para 33,6% ( Pesquisa do
PNUD/ONU – 2004).
Em 2004, o PIB baiano cresceu 9,9% enquanto, para o Brasil,
essa taxa foi de 4,9%.No primeiro semestre de 2005, o PIB da
68
Em referência ao livro: Bahia de Todos os Santos e de Todos os Pobres (1980), que reuniu artigos de
diversos intelectuais brasileiros, que juntos analisaram os dados da “Pesquisa Força de Trabalho e
Desenvolvimento”, realizada em 1971 pelo CEBRAP e CRH-UFBa, o livro teve como organizadores
Guaraci Souza e Vilmar Farias.
69
Cf. FERNANDES, Claudia Monteiro (2006). Condições Demográficas. In: CARVALHO, Ináia M..M &
CORSO, Gilberto Pereira (Org). Como anda Salvador ? EDUFBA, Salvador, 2006, 185 p.
70
Cf. (CARVALHO & PINHO.1996, p.36) [...] a lógica do capital caminha atrelada aos interesses
imobiliários estimulando a conformação do “padrão periférico” da urbanização, provocando a expansão
desigual do tecido urbano. Um maior aprofundamento e análise sobre o “padrão periférico” será realizado
no 4ª. capitulo.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
70
Bahia imprimiu bons resultados, registrando uma expansão de
3,6% do PIB em relação ao mesmo período do ano anterior. O
Estado da Bahia participa, com aproximadamente 56% das
exportações da Região Nordeste. [Mensagem, no. 83/2005.
Diário Oficial do Estado, em 15 e 16.10.2005]
71
.
A população de Salvador é de 2.672.360 hab., o déficit
habitacional é de 144. 767 e com 67.443 moradias em áreas de
favela ( IBGE, 2005).
Em 2003, Salvador constituía a terceira maior aglomeração de
pobreza metropolitana do país , atrás apenas de Recife ( 31,8%)
e de Fortaleza ( 36,0 %), conforme dados da PNAD.
Os números são contundentes: em Salvador, há 3.809
moradores de rua; faltam casas para cerca de 100 mil famílias,
enquanto em todo o Estado, 39.370 mutuários estão
inadimplentes com o sistema financiador de habitação. (Jornal A
Tarde, Salvador-Ba. 15/01/2006).
O trato com dados referentes à pobreza guarda em si um complexo
cruzamento de variáveis que, quando mal interpretadas, podem gerar análises
poucos precisas. Assim, para as necessidades deste estudo, daremos maior
importância para tentativa de constituição de uma inteligibilidade para a pobreza
enquanto fenômeno social e como ela se manifesta no tecido urbano de
Salvador. É uma obviedade necessária se afirmar que Salvador guarda um dos
maiores índices de pobreza e desigualdade social do país. Deste modo, dentro
da amplitude dimensional que o fenômeno da pobreza urbana pode tomar,
focalizaremos a pobreza de Salvador em suas interfaces com a segregação,
periferização e exclusão social
72
. Dada a diversidade de figurações da pobreza,
não é objetivo deste estudo o aprofundamento das formas de mensurar
73
,
71
Declarações do Governo do Estado sobre o aumento do PIB e qualidade de vida parecem confrontar os
dados do PNUD/ONU em relação ao aumento da pobreza. Estas declarações podem indicar que a
elevação do PIB estadual não guarda nenhuma relação com a distribuição de renda e/ou com a
diminuição da pobreza na Bahia.
72
A relação entre Estado como mantenedor da relação exclusão-inclusiva, assim como o próprio conceito
de exclusão associada ao capital neo-liberal será realizada no 4ª. capitulo deste trabalho.
73
Cf. (CODES, 2004, p. 129/130) As tentativas de mensuração da pobreza baseiam-se na utilização de
dados estatísticos, uma vez que a análise quantitativa é capaz de oferecer uma visão ampla e sistêmica
dessa questão social, prestando-se bem à idéia de servir de orientação para o desenvolvimento de
ações anti-pobreza. [...] A mensuração da pobreza predominantes no campo das Ciências Sociais,
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
71
quantificar ou classifica - lá, mas percebê-la no seu modo particular de
espacialização no tecido urbano de Salvador. Como fenômeno social que se
manifesta nas periferias e subúrbios dos grandes centros urbanos brasileiros, a
pobreza e o pobre configuram-se como um produto de um poderoso esquema
econômico de acumulação do capital.
A pobreza de Salvador e sua trajetória histórica de acúmulo de carências
foi tema de discurso que cercou os movimentos sociais; foi justificativa para a
busca de financiamentos internacionais; foi objeto de intervenção nas falaciosas
propostas políticas, e ainda, campo especial de pesquisa do discurso sociológico
e/ou técnico. A pobreza e seus índices se transformaram nas últimas décadas
em palavras legitimadoras da necessidade de reafirmação e de luta pelos
direitos sociais, pela igualdade e justiça.
Segundo Serge Paugam (2003, p. 64), “nas sociedades modernas, a
pobreza não é somente o estado de uma pessoa que carece de bens materiais;
ela corresponde, igualmente, a um status social específico, inferior e
desvalorizado”. O conceito de indivíduo pobre está associado ao de “fracassado
socialmente” (individualização e culpabilização da pobreza), de excluído por
não ter acesso em termos espaciais e temporais à cidade e seus benefícios, às
mercadorias e serviços, à tecnologia, ao conhecimento etc. A questão da
pobreza remete também à exclusão urbana e à construção cotidiana de um
desequilíbrio social que se desdobra em privação de renda estável,
desclassificação profissional e social, na falta de acesso aos serviços básicos
baseadas em dados estatísticos, são pautadas em uma análise da satisfação das Necessidades Básicas
e o estabelecimento das Linhas de Pobreza. [...] (CODES apud SALAMA;DESTREMAU, 2004) Medir a
pobreza significa “perceber e contar os pobres, e tentar avaliar a natureza e a gravidade do problema que
eles colocam, no que refere a critérios julgados pertinentes.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
72
etc. A pobreza em seu quadro de “despossessões” não possui impacto apenas
econômico, mas também subjetivo, social e político.
A pobreza como terminologia que indica uma situação social vai
instituindo seu significado em paralelo à conformação do direito à cidadania. Sua
discussão supõe igualmente a dimensão da cidadania e a luta pelo acesso aos
direitos básicos. Para Anete Ivo e Ilse Scherer– Warren (2004, p. 13-15) a
questão da pobreza como efeito da desigualdade econômica e social, aparece,
então, como questão política, já que interfere sobre as condições da justiça
redistributiva. Esta afirmação nos leva a montar uma equação reflexiva entre:
reprodução da pobreza produção da exclusão cidadania justiça social.
A reprodução da pobreza e a exclusão social geraram uma
desqualificação social, que se manifestou nas cidades brasileiras com força
implacável no processo de urbanização, criando um conjunto de precariedades
que submetem as populações de baixa renda a um cenário de segregação e
“despossessões” que aniquilam a cidadania e o acesso aos direitos básicos de
sobrevivência: saúde, educação, moradia, emprego etc. Conforme Carvalho e
Codes (2006), a pobreza e a precariedade das condições de subsistência são
determinadas pelas condições de trabalho e renda; a pobreza não pode ser
analisada de forma dissociada de fatores como o perfil educacional e os
processos de segregação socioespacial e segmentação urbana.
A pobreza e os pobres passam a ser o foco da atenção de projetos
sociais como grupo experimental para os dispositivos de poder
74
, ou como
mão-de-obra barata e descartável a ser utilizada no processo de produção,
74
Cf. Michel Focault (2003) O dispositivo de poder, conforme, gerencia a vida e a coloca a disposição de
um poder maior que se explicita através de sofisticadas tecnologias de governo, tendo como uma das
conseqüências uma metamorfose da economia social da filantropia em direção à atual administração
massiva da pobreza ou gestão da exclusão social.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
73
reprodução e reestruturação do capital em suas modalidades de
financeirização. A pobreza estrutural de nossos dias é observada, medida,
estudada, dimensionada, avaliada, gerida, administrada, mas não se vislumbra
a sua erradicação.
A pobreza contemporânea, sob os ditames de um capital financeirizado e
“molecular-digital”
75
, parece se transformar em uma situação mantida pela lógica
neoliberal, que coisifica e monetariza a vida. Desta forma, as reflexões sobre a
pobreza devem se pautar em questionamentos: o que é a pobreza? para que
servem os pobres? o que fazer dos pobres? o que é direito? o que é cidadania?
O pobre é aquele que tem de provar o tempo todo, se fazer ver e
reconhecer a si próprio e à sociedade, a sua própria
respeitabilidade num mundo em que os salários insuficientes, a
moradia precária, o subemprego e o desemprego periódico
solapam suas condições de possibilidade. Nesse caso, seria
possível dizer que a condição de pobreza se traduz na
experiência de uma liminaridade real ou virtual entre a ordem e a
desordem, experiência feita no jogo ambivalente de
identificações e diferenciações, elaborada entre a percepção de
uma condição comum de privação que dilui perigosamente as
fronteiras entre uns e outros e a construção de um universo
moral no qual homens e mulheres se reconhecem como
sujeitos capazes de lidar com os azares da vida e de se
distanciar, se diferenciar, dos que foram pegos pela maldição da
pobreza. É nos sinais que trazem dessa liminaridade que as
circunstâncias de vida são problematizadas, circunscrevendo-se
o modo como identidades são construídas e reconhecidas.
(TELLES, 1992, pp 120-121).
O pobre é figurado como um “despossuido” de direitos e de razões, faz
parte de uma parcela majoritária da população que tem seu cotidiano marcado
por diversas carências e privações. O pobre é vítima da pobreza e da falta de
satisfação das necessidades humanas básicas – a pobreza de forma endêmica
e naturalizada é uma violação dos direitos humanos. A pobreza, como
75
Ver:. SANTOS, Laymert, G. dos. In: Relatório Final do Projeto Temático Fapesp (2003-2004): Cidadania
e Democracia: o pensamento nas rupturas da politica. Subprojeto 9 : Biotecnologia, biodiversidade :
passagem para o molecular global. CENEDIC, FFLCH/USP, São Paulo, 2005.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
74
desrespeito a direitos econômicos e sociais básicos de grupos e indivíduos, foi
se constituindo como uma violação de direitos humanos; a pobreza e a
marginalização das populações criam sérios obstáculos à realização dos direitos
políticos e civis, na medida em que as privações enfraquecem a manutenção da
vida social e dificultam a participação política.
V – A pobreza na cidade moderna
A pobreza urbana tem formas próprias de manifestação e concentração;
sua materialidade é visível no espaço urbano através do improviso das formas
de moradia e das maneiras de ocupar os espaços da cidade. O pobre citadino
cria estratégias para lidar com a pobreza, contudo as formas de apropriação de
seu espaço na cidade seguem o comando da lógica do mercado imobiliário, que
reserva lugares específicos, seus restos, para a pobreza e para o pobre. Estes
lugares, produzidos por um Estado que se atrela aos interesses neoliberais
76
,
são esquecidos pelo poder público, redundando em espaços periféricos com
urbanização precária, redutos da violência, produzidos pela segregação social.
[...] a cidade como lugar se faz notar a partir do momento em
que é lida e mapeada como território de lutas, de conflitos e de
movimentos sociais, a partir do momento em que ‘novos
personagens entram em cena’, uma nova tematização entra em
jogo, não mais da marginalidade urbana como determinação
estrutural, mas da pobreza figurada como experiência, como
privação e invisibilidade, como impossibilidade de acesso à
esfera da cidadania, como questão pertinente às formas de
civilidade e de sociabilidade política (RIZEK, 2003, p. 89).
76
No que concerne a desterritorialização do capital, enfraquecimento do poder do Estado, e
outros interesses imperialistas, bem descritos por David Harvey (2004).
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
75
Ao ser segregado e estigmatizado, a pobreza priva o acesso à cidadania,
aos direitos
77
e põe em questão a própria noção da política. A cidade constituída
por territórios de conflitos é uma cidade multi-polarizada, segmentada e, ao
mesmo tempo, alinhavada pela lógica do capital que impossibilita que o pobre
saia da pobreza
78
, criando formas de “inclusão” pelo gerenciamento da
“exclusão”. Neste perverso esquema de naturalização e gestão filantrópica da
pobreza, a cidadania
79
é aniquilada, e sua noção clássica de “direito a ter
direitos” perde sentido.
As figurações da pobreza urbana têm como uma de suas variáveis a
segregação, entretanto a segregação não pode ser traduzida como uma simples
divisão territorial entre pobres e ricos. Para Flávio Villaça (2004, p. 106) toda a
segregação é coercitiva, e ainda neste sentido pode, se dizer que toda
segregação é dominação e exclusão urbana, dimensões contidas nas equações
da pobreza e que se espacializam e entrecruzam nas formas de apropriação
físicas dos espaços e na constituição ideológica de conteúdos sociais e
simbólicos que estão presentes na tessitura da cidade moderna.
Nos estudos comparativos entre as formas de manifestação da
segregação na França e no Brasil, Edmond Préteiceille (2004, p. 18) afirmou
que, mesmo com suas diferentes tipologias, a segregação é uma questão
política que pode ser requalificada em termos de exclusão social, econômica e
77
Cf. (TELLES. Vera,1998: 38) [...] os direitos estruturam uma linguagem pública que baliza os critérios
pelos quais os dramas da existência são problematizados em suas exigências de eqüidade e justiça.
78
Cf. (HARVEY. David, 2004) No tocante às classes, o Relatório do Desenvolvimento humano das
Nações Unidas (1996) afirma que “entre 1960 e 1991, a parcela dos 20% mais ricos passou de 70% para
85% da renda global – enquanto a dos mais pobres declinou de 2,3 para 1,4%”. A altura de 1991, “mais
de 85% da população mundial recebia apenas 15% da renda”, e “o valor líquido da renda das 358
pessoas mais ricas, os bilionários do dólar, equivalente à renda combinada dos 45% mais pobres da
população mundial.
79
Cf. (PAOLI, M.C.1989, p.43) O ponto crucial para a reformulação da noção de cidadania [...] pode ser
sintetizada na questão: de que modo o ‘direito a conquistar o próprio direito à cidadania’ (Chauí) ou, em
outros termos, o reconhecimento público do ‘direito a ter direitos’ (Hannah Arendt) pode se processar e se
exteriorizar no domínio público de modo a conferir legitimidade e credibilidade às instituições políticas?
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
76
étnico-racial. No caso das cidades brasileiras a segregação se explicita como
um movimento pelo qual um grupo populacional é forçado, involuntariamente
80
,
a se aglomerar em uma área espacial definida pelos grupos dominantes.
Segundo Marcuse (2004, p. 24), a segregação é um processo de
formação e de manutenção de um gueto, o que não se aplica ao Brasil
81
. O
autor ainda problematiza que atualmente são recorrentes formulações como:
“auto-segregação”; “guetos voluntários”; ou guetos de classe altas, considerando
estas formulações prejudiciais analiticamente. Nas peculiaridades do Brasil - e
no caso específico de Salvador - a segregação tem como marco compreensivo a
separação por classes econômicas, que possui rebatimentos na dimensão
racial; é pertinente, no caso de Salvador
82
, perceber a segregação em uma
perspectiva de cruzamento de variáveis sócio espaciais e étnico raciais, em uma
clara relação na qual os bairros pobres são habitados por uma população negra
e os bairros ricos por uma população branca.
Como a posição na estrutura social e a apropriação do espaço
urbano são estreitamente articuladas, o território soteropolitano
termina por assumir diferentes “cores”. [...] O miolo e o subúrbio,
que apresentam condições mais precárias de habitabilidade e
uma menor oferta de equipamentos e serviços urbanos,
concentrando as áreas classificadas com populares e
subproletárias abrigam, predominantemente, os pretos e os
pardos. Eles se concentram, especialmente em bairros como a
Liberdade (onde há uma forte identidade étnica, por conta de
movimentos sociais e culturais ali sediados), São Caetano,
Tancredo Neves, Pau da Lima e Cajazeiras. (CARVALHO, Ináia
M.M.de; PEREIRA, Gilberto C. 2006, p. 98).
80
Há autores como Tereza Caldeira (1997), que dualizam a clássica definição de segregação e
acrescenta à discussão a segregação voluntária – a auto-segregação, nas formas de “enclaves
fortificados”, a se expressar nos grandes condomínios de luxo – contudo, neste estudo optamos a não
utilizar este tipo de segregação como referencia. Tendo em vista que consideramos a segregação como
uma ação coercitiva e determinada pelo capital imobiliário.
81
Tal afirmação é circunstanciada pelo fato de que no Brasil a segregação tem uma forma diferenciada de
espacialização no tecido urbano, no caso de Salvador, por exemplo, as áreas pobres e segregadas estão
pulverizadas por todos os cantos da cidade, situação que não se constituem em guetos.
82
Cf. Censo IBGE-2002, em Salvador 54,8% de sua população de identifica como pardo e 20,4% como
negro, uma cidade habitada em sua maioria absoluta por afrodescendentes.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
77
Os territórios de pobreza e riqueza em Salvador, possuem pigmentação
diferenciada e associada ao poder aquisitivo de sua população. A afirmação de
Ilse Scherer Warren, segundo a qual
83
:
[...]a exclusão social é racializada, engendrada, etarizada e
espacializada, ou seja, tem cor, gênero ou sexo, idade e
localização. A pobreza mais extrema tende a ser preta,
feminina, bastante jovem ou idosa e localiza-se nas periferias
urbanas” (2004, p. 58).
Neste quadro a pobreza não é um estado social natural, mas o resultado
de um processo histórico de exploração, expropriação, discriminação, não
instituição de direitos e concentração de renda, riqueza, poder e informação. A
exclusão social, a periferização e a segregação urbana, enquanto problemas
atuais e urgentes, são produtos de um processo de desregulamentação de
mercados, precarização e flexibilização do trabalho, nova divisão social e
internacional do trabalho, entre outros processos que remetem a uma
composição social de grupos, classes, instituições, empresas e governos que
promovem a segregação de populações inteiras no sistema capitalista, isto é, a
produção de excluídos da sociedade, os condenados do sistema
84
.
VI – A territorialização da pobreza em Salvador-BA
A topografia íngreme e acidentada de Salvador torna mais aguda e
manifesta a pobreza urbana. Ao entrar na cidade, via BR-324, nos deparamos
com montanhas e depressões cobertas por um mosaico de barracos que
83
Tal afirmação pode ser pode ser aplicada sem restrições a Salvador, principalmente quando
focalizamos as áreas do subúrbio ferroviário e do miolo urbano.
84
Cf. FERNANDES, Florestan. Sociedade de Classes e Subdesenvolvimento. Rio de Janeiro, Zahar,
1968.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
78
chegam a desaparecer no horizonte, como se aquela paisagem favelizada
85
fosse infinita. Ao chegar na cidade, via aérea, e percorrermos a Avenida
Paralela, vetor norte de expansão, nos deparamos com outras áreas de densa
precariedade que se manifestam pelos bairros da Paz e outros aglomerados em
iguais condições. A pobreza urbana que se materializa e toma forma de cidade
está por toda parte em Salvador, misturada, pigmentada e pulverizada em
pontos estratégicos do tecido urbano contínuo, e até mesmo no mar, como o
Aglomerado de Palafitas de Novos Alagados.
Dada à oscilação topográfica do tecido urbano de Salvador surgem
dificuldades para uma circunscrição exata dos limites das áreas ricas e pobres
da cidade, contudo temos algumas concentrações que podemos chamar de
mares de pobreza e outras de ilhas de riqueza. Assim para melhorar o efeito de
nossas análises, categorizaremos dois tipos de territórios em Salvador: território
dos herdeiros da pobreza e território dos abastados.
O primeiro território, o qual daremos mais atenção, refere-se àquela parte
da cidade constituída por pobres, negros, os deserdados de direitos que se
incluem na lógica do capital imobiliário através da exclusão urbana, habitando
áreas insalubres, ilegais e em alguns casos invadidas: muito dos territórios dos
herdeiros da pobreza, são espaços esquecidos
86
pelo Estado, lugares
segregados e com elevados índices de violência, por onde se conforma a única
possibilidade de inserção na cidade.
85
Cf. (SOUZA, A. G.2000), no inicio de 1990, em Salvador, as chamadas “invasões” representavam 14%
da área ocupada com habitações na cidade, onde moravavam, aproximadamente , 30% da população.
Conjuntamente com outras áreas ocupadas de maneira informal, correspondiam a 32% da ocupação
habitacional , abrigando 60% da população. Como a ocupação dessas áreas,e a própria expansão da
cidade, ocorreu dentro do “padrão periférico”, as áreas com condições mais precárias de habitabilidade
concentram-se no Subúrbio Ferroviário e no Miolo, enquanto aquelas, em melhores condições, estão na
área central e na faixa ao longo da Orla Atlântica.
86
Estas áreas empobrecidas são lembradas pelo Estado de Direito apenas no momento do exercício da
violência policial, que hostiliza e submete a populão destes lugares a uma violência cotidiana.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
79
A segunda referência é a antítese da primeira, os territórios abastados,
são os bem servidos pela infra-estrutura urbana, habitados por pessoas que
estão empregadas no mercado formal da economia que possuem poder de
consumo, são áreas bem assistidas por serviços, transportes, segurança, áreas
de lazer, escolas, postos de saúde etc. Somam-se ao território abastado da
cidade os bairros tradicionais do Campo Grande, Canela, Corredor da Vitória,
Graça, assim como a maioria dos bairros que margeiam a Orla Atlântica: Barra,
Ondina, Rio Vermelho, Pituba e Costa Azul; e Itaigara, Alto do Itaigara, Caminho
das Árvores, Stiep e um complexo de condomínio fechados em Piatã, Itapoã,
Estela Mares etc. Territórios que poderíamos considerar como os da “cidade
formal” e “cidade legal”, possuidora de equipamentos urbanos e da atenção dos
órgãos públicos. Estes territórios podem ser compreendidos como “ilhas de
riquezas”, principalmente os bairros do Itaigara, Alto do Itaigara e Caminhos das
Árvores que se organizam como um conjunto de condomínios fechados, com
algumas ruas “privatizadas” e segurança particular 24h.
Na outra face da moeda, os territórios dos herdeiros da pobreza,
compreendidos como os espaços pobres e informais da cidade, aqueles ilegais
juridicamente ou fruto de dissimulados projetos públicos de reurbanizações
populares, habitados em sua maioria por negros, pobres e desempregados,
constituídos em sua maior concentração pelas áreas situadas ao norte (miolo
urbano), e ao sudoeste de Salvador (subúrbio ferroviário). Estes territórios
compreendem os seguintes bairros: Cajazeiras, Fazenda Grande, Boca da Mata,
Mussurunga I,II,III, Parque São Cristovão, Novo Horizonte ( Planeta dos
Macacos), ,conjunto habitacional Vale das Dunas, bairro da Paz (Guerra das
Malvinas) Alto do Girassol, Raposo, Sussuarana, Carobeira, Cassange, Nova
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
80
Brasília de Itapuã, área oeste do bairro de Itapuã e entorno; Ilha da Maré,
Valéria e proximidades; Subúrbio Ferroviário e seus vinte e dois bairros
(aglomerado de Alagados, Novos Alagados, Conjunto Nova Primavera, Baixa
Fiscal, Boiadeiro, Plataforma, Lobato, Itacaranha, Praia Grande, Periperi, Baixo
de Coutos, Paripe e outras aglomerações na região limítrofe dos bairros do
Uruguai, Calçada e Liberdade etc); Pau da Lima Invasão Brasilgás, Beco do
Bozó e etc; Tancredo Neves, Cabula VI, Beiru, Engomadeira, Narandiba, entre
outros.
Os espaços de pobreza de Salvador se aglomeram principalmente na
área sudoeste composta pelo Subúrbio Ferroviário e na área norte do miolo
urbano – parte geograficamente central do município – nas últimas décadas
houve uma ocupação mista, na área do miolo, mas com predominância de áreas
residenciais. Segundo Ângela Gordilho (2000, p. 60) é notória a ausência de
grandes equipamentos urbanos nas zonas habitacionais sudoeste e norte da
cidade, correspondendo ao Subúrbio e Miolo que, como visto, representam as
áreas de moradia da maioria da população com predominância de rendas mais
baixas.
No Subúrbio, predomina a informalidade, em termos urbanísticos
e de mercado, assim como a precariedade. No Miolo coexistem
habitações formais, conjuntos habitacionais de baixo padrão,
loteamentos populares e moradias precárias. [...] Em uma região
caracterizada pela pobreza de sua população, paradoxalmente,
grande parte dos habitantes são proprietários de seus domicílios
– precários ou não – podendo-se inferir que a impossibilidade de
acesso da maior parte da população ao mercado imobiliário
formal, e as soluções como aluguel de habitações ,a leva a
produzir sua própria moradia. [...] Isso quer dizer que mais de
80% dos domicílios são próprios e só 10% não é, também , de
proprietários dos terrenos, o que se explica pelas invasões e a
autoconstrução, processos motivados, em grande parte, pela
impossibilidade da população de adquirir suas moradias e,
também , pela carência de políticas públicas direcionadas a essa
questão. (PEREIRA, G. C.; SOUZA, Â. G. 2006, p. 143)
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
81
Desta forma, caracterizaremos três zonas de contexto, que podem ser
consideradas como espaços intra-urbanos
87
nos quais diferentes territórios se
articulam. Dimensionaremos a extensão do tecido urbano, dando assim uma
maior visibilidade territorial às análises sobre pobreza e seus contrapontos.
Apresentaremos na tabela seguinte a dimensão espacial das áreas de contexto
e, em seguida, alguns aspectos relevantes de cada área: central, suburbana e
do miolo urbano.
Tabela 3 – Áreas na cidade de Salvador – BA
88
(medidas)
CENTRO
(bairros adjacentes)
SUBÚRBIO
FERROVIÁRIO
MIOLO URBANO OUTRAS AR
É
AS
*
(incluindo Orla)
CIDADE DE
SALVADOR
(2.673.560 hab)
Km
2
25km
2
41.5km
2
115km
2
143.5km
2
325km
2
2.500ha 4.145 ha 11.500ha 14.350ha 32.500ha
m
2
25.000.00 m
2
41.450.00 m
2
115.000.00 m
2
143.500.00 m
2
325.000.00m
2
TOTAL(%) 7,5% 12,5 % 36,0% 44% 100 %
hab/km
2
31.000 – 41.000 11.000 – 21.000 15.000 – 25.000 ** 7.521
Fontes – Dados Secundários IBGE/PMS/PLANDURB
GORDILHO, Ângela (2000); PEREIRA & SILVA (1999)
* Este item se refere às áreas que intercalam outras áreas em estudo assim como áreas limítrofes de Salvador, incluindo a orla marítima.
**Devido a heterogeneidade destas áreas e dificuldade de demarcação, optamos em não fazer cálculos de (hab/km2) neste momento.
*** Posteriormente aprofundaremos outros dados sobre Salvador e as áreas de contexto de interesse nesta pesquisa.
Elaboração– SOARES, Antonio M.,2006 ( autor do trabalho)
A área que corresponde ao centro possui uma ocupação consolidada com
predominância de boa habitabilidade; é formada por bairros antigos (a partir da
déc. de 20) que foram importantes para o processo de estruturação da cidade.
Poderíamos considerar esta área como da cidade formal, possuidora de
equipamentos urbanos e da atenção dos órgãos públicos. Para efeito deste
87
Cf. VILLAÇA, Flávio. Espaço Intra - Urbano no Brasil. São Paulo. Studio Nobel, Lincoln Institute,
Fapesp.1998.
88
Para a construção desta tabela encontrei como referência os trabalhos de Ângela Gordilho (2000) e o
de Gilberto Corso Pereira & Bárbara- Christine Nentwing Silva (1999), cruzei as informações obtidas com
a leitura de mapas e dados do IBGE, Prefeitura Municipal de Salvador e Relatórios do instinto
PLANDURB.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
82
estudo consideramos como área central, os bairros que estão dentro da mancha
urbana intercalada desde os bairros da Barra-Ondina, Graça, Rio Vermelho,
Vasco da Gama, Bonocô, Iguatemi, Brotas, Matatu, até o bairro de Nazaré,
Comércio e centro histórico (Pelourinho) de Salvador.
A área correspondente ao Subúrbio Ferroviário compõe um dos maiores
territórios de pobreza de Salvador. Teve sua ocupação iniciada pela construção
da linha férrea, em 1860, contudo a área se constitui nos anos de 1940 com
muitos loteamentos populares que mantêm importantes manifestações da
cultura afrodescendente; o subúrbio tem aproximadamente 500 mil habitantes de
acordo com o último censo do IBGE, em sua maioria negros, pobres e com
baixa escolaridade, vítimas da maior violência urbana
89
do contexto
metropolitano. Nesta área há predominância de habitações precárias e
deficientes, com aglomerados de barracos em morros, encostas e até mesmo
sobre a Baía de Todos os Santos.
A outra área de contexto corresponde ao que chamamos de “o miolo de
Salvador”, assim denominado desde os estudos do Plano Diretor de
Desenvolvimento Urbano (PLANDURB/1970). Este nome se deve ao fato da
região situar-se, em termos geográficos, na parte central do município de
Salvador, ou seja, no miolo da cidade. Possuindo cerca de 11.500 ha, (Tabela 2)
ele está entre a BR 324 e a Avenida Luiz Viana Filho – Avenida Paralela –
estendendo-se desde a invasão
90
de Saramandaia até o limite norte do
município. Segundo Ináia Carvalho e Gilberto C. Pereira (2006, p.88), o miolo
89
Cf. (ESPINHEIRA. Gey,2004). Sociabilidade e Violência: criminalidade no cotidiano de vida dos
moradores do Subúrbio Ferroviário de Salvador: Ministério Público da Bahia, Universidade Federal da
Bahia, 2004.
90
Optaremos em utilizar o termo invasão ao de favela, pois a palavra é reconhecida e utilizada pelos
moradores das áreas em estudo. Invasão de invadir, ocupação coletiva sem autorização ou permissão
prévia.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
83
urbano de Salvador, começou a ser ocupado pela implantação de conjuntos
residenciais para a “classe média baixa” na fase áurea da produção imobiliária,
através do Sistema Financeiro de Habitação, tendo a sua expansão continuada
por loteamentos populares e sucessivas invasões coletivas, com uma
disponibilidade de equipamentos e serviços bastante restrita.
Figura 08 – Mapa de áreas de contexto em Salvador.
A área do miolo é formada por cerca de 41 bairros que ocupam
aproximadamente 36% da superfície da cidade, em uma densidade demográfica
no intervalo de [15.000 – 25.000 hab/km
2
], sendo que a parte mais densa
corresponde ao do complexo de Cajazeiras
91
. A área considerada do miolo
urbano – vetor norte – nas últimas décadas teve uma ocupação mista, mas com
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
84
predominância de áreas residenciais; nela se localiza o CAB – Centro
Administrativo do Estado da Bahia, complexo de órgãos governamentais, assim
como inúmeras universidades privadas e algumas concessionárias de
automóveis.
O mapa (Figura 8) nos permite uma visualização zoneada de áreas que
compõem o tecido urbano de Salvador: a Área do Centro (25km
2
), composta por
bairros bem atendidos em serviços e equipamentos urbanos, difere das Áreas
do Subúrbio Ferroviário (41,5km
2
) e do Miolo Urbano (115km
2
) que podem ser
considerados como territórios de pobreza e violência, onde se manifesta de
forma aguda, a precariedade urbana, falta de serviços e equipamentos.
Como conseqüência de um processo de urbanização, com territórios
marcados por diferenças econômicas e raciais, constituído a partir de formas
próprias de negociar e ocupar a terra urbana (lote/espaço), temos a proliferação
de um padrão de urbanização segregacionista, gerando o fenômeno da
periferização que aguça a discriminação por classe, na mesma esteira de uma
das mais cínicas formas de estruturar intervenções urbanas movidas por uma
ideologia de controle e separação a se expressar na forma desigual da
apropriação do solo urbano em Salvador, com a criação de áreas de “vocação
para classes de baixa renda”.
Neste contexto, a classificação das pessoas em "classes sociais", o ato
de classificar e ser classificado e as formas e padrões de ocupação por renda
das populações na cidade moderna evidenciam um processo de segregação
que contribui para o estabelecimento da naturalização de uma cultura de
pobreza e despossessões de direitos sociais, que se estabelece como um ethos
social contemporâneo, que nos remete à necessidade de uma compreensão do
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
85
conceito de pobreza em suas interfaces com a segmentação social. Conforme
Dabrowsky
92
, (2003, p.183) “a discriminação está na origem da segregação.
Uma é sociológica e a outra é geográfica, afirmação que corrobora as análises
de Espinheira, (2003, p.189), “que ao se referenciar o subúrbio Salvador, como
lugar sujo, feio, desumano, logo um lugar discriminado, conota-se que também é
habitado por pessoas também discriminadas e marcadas como seres
socialmente impuros
93
, doentes e desvalorizados”.
92
Cf .Delphine Dabvrowski, (2003) a urbanização fragmentada, como um das variáveis físicas da cidade
que opõe cada vez mais, ricos e pobres, como se constituíssem dois mundos superpostos. A autora
afirmar que o espaço se divide em dois, entre um “circuito superior”, moderno, no qual se predomina a
classe média, e em outro “circuito inferior”, exclusivamente reservado para os pobres.
93
A convivência com o feio, com o sujo, com a deterioração ambiental e com a violência gera uma auto
desvalorização e conseqüentemente uma baixa solidariedade social.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
86
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
87
PENSANDO A HABITAÇÃO POPULAR NO BRASIL E NA BAHIA
I- Origem da moradia popular no Brasil
É possível afirmar que o problema de moradia para as camadas pobres
emerge no final do século XIX a partir de uma série de mudanças sociais no
país, entre estas: a abolição da escravidão em 1888 e a incipiente
industrialização, estes dois fatores conjugados a um momento político de
renovação com a Proclamação da República em 1889, instaurou-se o início de
uma inversão na concentração populacional rural/campo – urbana/cidade
94
, que,
a partir das décadas de 30 e 40 do séc. XX, ganha força com as migrações que
favoreceram o crescimento das cidades brasileiras.
A abolição da escravatura em 1888 e a mudança no modo e nas relações
de produção, fez com que centenas de ex-escravos expulsos das fazendas e
das Casas Grandes & Senzalas
95
, chegassem às cidades, à procura de novas
94
Cf. Ermínia Maricato, na Revista Carta Maior (2006).Começamos o século XX com 10% da população
vivendo nas cidades e terminamos com este contingente elevado para 80%. Essa mobilização
impressionante foi engendrada pela industrialização, que priorizou uma urbanização acelerada. O
fenômeno ficou evidente nos governos de Getúlio Vargas, que regulamentaram o trabalho urbano, mas
não o rural.
95
Sem desconsiderar o lendário retorno dos soldados que lutaram na “Canudos de Euclides da Cunha”,
que se aglomeraram precariamente nos morros cariocas, podemos encontrar a sinalização histórica da
favela, nos Mocambos do Recife, então descritos por Gilberto Freyre em Sobrados & Mocambos (1936)
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
88
possibilidades de moradia e sobrevivência; o ex-escravo
96
destituído de
habilidades para as novas atividades urbanas é obrigado ao desempenho dos
trabalhos domésticos nos Sobrados, que se constituíam como a representação
urbana da Casa Grande. Com a abolição, as relações de produção foram
alteradas, sem, contudo criar mudanças significativas na vida do ex-escravo que
continuava sendo explorado e, ainda, tendo que criar estratégias de habitar a
cidade, surgindo aglomerados de habitações precárias, a exemplo dos
Mocambos
97
, representação de moradia na literatura de Gilberto Freyre,
destinada aos pobres da cidade recifense, o Mocambo
98
antítese do Sobrado,
pode ter sua análise ampliada quando percebemos os Sobrados & Mocambos,
como um sistema de relações que mantém através da desigualdade de renda e
de poder. Tal sistema, obedecendo às novas lógicas de apropriação urbana,
mostra suas derivações na atualidade das grandes cidades subdesenvolvidas, a
partir dos territórios ricos e pobres, a se expressar em bairros abastados e
empobrecidos. Mantêm-se um sistema de contradições marcado por uma
continuidade da Casa-Grande & Senzala (1933), que em um de seus focos, tratava da caracterização de
situações habitacionais destinadas às classes de rendas diferentes.
96
Cf. (MARICATO, E. 1997) Grande parte dos escravos libertados, especialmente nas regiões que
apresentavam declínio da cultura do café, no Vale do Paraíba, tomaram o rumo das cidades e ai
ofereceram sua força de trabalho, agora livre, concorrendo em desigualdade de condições com os
brancos pobres e os imigrantes que aqui chegavam. [...] Se na cidade imperial os escravos viviam junto
a seus proprietários, a cidade da República separa o trabalho do ócio. Expulsa os negros e brancos
pobres, para as periferias, subúrbios, morros e várzeas.
97
Em uma de suas análises Gilberto Freyre, em Sobrados & Mocambos (1990), afirma que a substituição
do trabalhador escravo rural, que morava em senzalas, pela emergência de uma força de trabalho
proletária, fez surgir os mocambos, palhoças e casebres, ou seja, temos com a abertura das portas das
senzalas, o surgimento das favelas.
98
Cf. (GONDIM, 1925:17 apud CORREIA, T. 2004:07). Descrevendo o mocambo: Imagine uma grande
área pantanosa, coberta de mangues, surgindo aqui e ali pequenas ilhas, umas esparsas, outras
contínuas, formadas por escavações feitas em suas adjacências e nelas se elevando pequenas
choupanas de taipa cobertas na sua maioria de folhas-de-flandres, palhas de coqueiro, capim, etc.
Outras vezes elas são construídas em terreno firme, mas de tal forma aglomeradas que dificilmente se
destinguem ruas de vielas ou vice-versa. Essas casas de aspectos miserável, cujo piso é construído de
barro socado, têm apenas duas entradas, uma na frente e outra na parte posterior, dando às vezes
dificilmente acesso, devido às suas limitadas dimensões, aos seus infelizes ocupantes. Compõem-se
geralmente de 3 compartimentos: sala, quarto e cozinha, nas piores condições de higiene, e abrigam na
maior promiscuidade famílias compostas de 10 ou mais membros.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
89
relação de proximidade e distanciamento: próximos geograficamente e distantes
socioeconomicamente.
Partindo da falência do sistema escravocrata no Brasil e do surgimento
da indústria – indicamos a origem das áreas favelizadas, compreendidas como
espaços marcados por uma improvisação na forma de apropriação do solo e na
própria construção das moradias. Deste modo, o entendimento sobre a origem
da favela aqui esboçado guarda relação de proximidade ao surgimento da
habitação popular, ambas reproduzidas a partir de uma lógica de apropriação,
marcada por múltiplas privações e precariedades. A favela é reduto de uma
população empobrecida e destituída do direito a uma habitação digna.
[...] a favela é o abrigo coletivo dos vencidos, e no esforço
competitivo pelos bens urbanos as áreas faveladas são também
as vencidas em termos de escolas, negócios, lojas de
quinquilharias, ruas iluminadas, livrarias, serviços sociais além
de tudo o que é comumente util, e sempre com pouca oferta. A
favela, então, é uma área onde a população carece de recursos
para competir com sucesso, e onde coletivamente há
necessidade de controle sobre os canais através dos quais tais
recursos são distribuídos ou mantidos. (HARVEY, 1980, p.65)
No surgimento histórico da favela, no final do séc. XIX
99
, temos o Rio de
Janeiro
100
na posição dianteira no acúmulo de déficits de moradias e de áreas
favelizadas, sendo seguido por São Paulo, Recife e Salvador, e no séc. XX, por
diversas capitais brasileiras. Na constituição destas áreas favelizadas fatores
estruturais como o crescimento populacional, a distribuição desigual de renda e
99
Cf. VALLADARES, Licia do Prado. A invenção da favela – Do mito de origem à favela.com. Rio de
Janeiro. 1ª. Edição Ed. Fund. Getúlio Vargas, 2005. 204p.
100
Cf. (REIS FILHO, N.G., p.30,1994) a favela surgiu no Rio de Janeiro, em fins do século XIX, com a
construção de um conjunto de barracos no chamado Morro da Providência (da Favela), que deu origem
ao nome. A seguir espalhou-se por outros morros da cidade. Os barracos eram construídos com restos de
materiais, em parte retirados das demolições efetuadas na mesma época, e em muitos casos apenas de
madeira, cobertos com zinco. Eram como uma simplificação do modelo de casas populares dos
pescadores portugueses, com formas que chegaram a existir no Brasil, em alguns locais, como os morros
da cidade de Santos. Mais tarde, as favelas se tornaram comuns em outras cidades, transformando-se
em dois tipos básicos, para ocupação de terrenos sem documentação regular.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
90
a questão fundiária se exacerbam com a ação de agentes imobiliários, que
induzem uma expansão urbana segregacionista e marcada por um padrão
periférico
101
que direciona os pobres para áreas longínquas e desprovidas de
infra-estrutura.
II - Percurso de um problema – a política habitacional no Brasil
O problema da escassez da moradia popular, destinada à população de
baixa renda, é datado do final do século XIX
102
, contudo, só a partir de 1930, no
período Vargas que as preocupações governamentais sobre o tema ganham
foco e o poder público interfere
103
na geração da habitação econômica, tendo
em vista que a produção realizada pelo setor privado se mostrava incapaz e/ou
desinteressada para atender a crescente demanda por moradia. Vale ainda
acrescentar que o modelo de produção habitacional oferecido pela iniciativa
privada, a partir das vilas operárias
104
, possuía um cunho ideológico e
101
Cf. 1
o
. Cap. desta dissertação.
102
Cf. Sinalizado na introdução deste trabalho no sentido de se buscar a origem da habitação popular no
Brasil, a contribuição de Bonduki (1998), trata do surgimento do problema habitacional, partindo do final
do século XIX até meados do século XX, intercalando análises sobre o autoritarismo sanitário
(higienismo), legislações do período e códigos de posturas, até se chegar à política populista de Vargas e
às problematizações das décadas de 40 e 50.
103
Cf. Nabil Bonduki (1999) a transformação do problema da habitação numa questão social, é marcado
por uma série de fatores, entre estes, a intervenção estatal nos anos 30 e 40; com a construção dos
primeiros conjuntos residenciais públicos, edificados no período do Estado Novo – com o uso de uma
arquitetura moderna de grande qualidade; a Lei do Inquilinato (1942) e a crise de habitação do pós-
guerra.
104
Cf. (CORREIA, T. 2004,p.31) À idéia do bem- estar da vida doméstica ligava-se a noção da casa
como uma referência espacial fixa da família: seu inlucro, o chamado “santuário doméstico”. Tal noção
está associada ao projeto de fixar os indivíduos, através de um ambiente compatível com o
desenvolvimento do gosto pelo lar. A acentuação do gosto pela casa – ao lado da incorporação de
hábitos de ordem, previdência e economia – foi um elemento fundamental no projeto burguês de
moralização do trabalhador. A atração dos trabalhadores pela casa era entendida como algo que
desfavorecia os ajuntamentos nas ruas e lugares públicos – com suas implicações políticas – e a
concentração em bares e bordéis – com suas implicações morais. A idéia de uma casa que retenha seus
moradores vincula-se a uma visão da comunicação excessiva, como algo que conduz à imoralidade
sexual e à agitação política.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
91
controlador
105
. Além disso, o industrial, ao construir as casas para o operário, no
sistema de parcelamento consignado em folha, deixava a infra-estrutura
106
(escola, posto de saúde e transporte etc.), sob a responsabilidade do poder
público. O industrial ao construir as vilas operárias, possuia como principal
objetivo fixar o operário no emprego e moldá-lo ao trabalho, exercendo sobre o
operário um poder de controle.
Após 1930, a expansão industrial
107
resultou em progressivo estímulo
108
a migração rural-urbana, e crescimento das cidades com suas respectivas
favelas, sobretudo na região sudeste, aumentando a necessidade por moradia.
Como medida do governo Vargas (1930-1945) tivemos o congelamento do
aluguel
109
– com regulações de preços e contratos – e a criação de programas
habitacionais, através dos Institutos de Aposentadoria e Pensões ( IAP’s)
110
. No
período posterior (1945- 1964), o Estado criou a Fundação da Casa Popular
111
(1946), segundo Bonduki (1998), com a FCP os Institutos de Aposentadoria e
Pensões produziram cerca de 124 mil unidades habitacionais, sendo 47,8 mil
em conjuntos e 76,2 mil financiamentos para a construção da casa própria.
105
Cf. (MARICATO, E. 1997, p.34) Muitos industriais investiam em vilas habitacionais para seus
operários, dando-lhes segurança de controle da mäo-de-obra mais qualificada, uma vez que os
trabalhadores ficavam sujeitos às normas estabelecidas pelos patrões quanto ao uso destas moradias [...]
que logo se mostrou incapaz para atender a demanda.
106
Acrescento que o próprio local onde era implantado os complexos indústrias (Teoria Locacional) e
consequentemente as habitações dos operários eram desprovidos de infra-estrutura.
107
Cf. (TASCHNER, 1997) O “estado empreendedor”, após negociação com credores estrangeiros, passa
a intervir fortemente na economia, assegurando um ritmo de crescimento do PIB da ordem de 4,6% ao
ano e uma expansão industrial de 5,2%, taxas bastante favoráveis num período de recessão mundial.
108
Este estimulo na verdade era dado pela falta de condição da população rural se manter no campo.
Expulsos da zona rural grandes contingentes populacionais se amontoavam de qualquer jeito na cidade
de Salvador.
109
Cf.(BONDUKI, 1998) O Decreto - Lei do Inquilinato de 1942, que congelou os aluguéis até 1964, foi
um dos responsáveis pela difusão da prática de auto-construção em loteamentos periféricos,
aumentando a área urbanizada das grandes cidades.
110
Cf. (MARICATO, E. 1997, p.36) Nessa época, o governo propõe, praticamente pela primeira vez, uma
política social de habitação promovida pelos Institutos de Aposentadoria e Pensões, que em 27 anos (
de 1937 a 1964) iriam financiar a construção de 140 mil moradias, a maior parte das quais destinada ao
aluguel. Muita publicidade para uma resposta modesta dos programas públicos de habitação.
111
Cf. (TASCHNER, 1997) Em 18 anos de experiência, a FCP produziu, em 143 conjuntos habitacionais,
18.132 unidades. Os números são realmente muito baixos, ainda mais quando comparados aos 124 mil
construídos e/ou financiados pelos IAPs, entre 1937 e 1945, ou seja, durante o período FCP,
construíram-se 1.047 unidades por ano, enquanto que os IAPs, entre conjuntos e financiamentos,
mantiveram média de 15,5 mil anuais.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
92
É importante enfatizar que a “política” habitacional no Brasil sempre
esteve subordinada à política urbana, no que se refere aos investimentos
imobiliários e industriais. Durante este período conhecido como populista (1945-
1964), as intervenções habitacionais eram basicamente com recursos públicos,
contudo, ainda neste período temos programas para remoção de favelas, com
subsídio de financiamentos externos.
No governo militar (1964-1985) a habitação recebeu maior investimento,
justificado pela necessidade de legitimação dos militares perante aos setores
populares. Os IAP’s foram extintos e se criou o INPS, os militares fundaram o
Sistema Financeiro de Habitação (SFH)
112
, objetivando incrementar o
desenvolvimento habitacional no Brasil, e o Banco Nacional de Habitação,
instituído pela Lei 4.380/64, que definia os princípios e parâmetros para a
viabilização do sistema financeiro. Especializado na área habitacional o BNH
113
conseguiu produzir um surto de crescimento no setor, em benefício
principalmente do trabalhador classe média.
Conforme Suzana Taschner (1997, p.40) entre 1964 e 1985, a
intervenção governamental atingiu elevado nível de coordenação e
sistematização: cerca de 4,5 milhões de unidades habitacionais foram
financiadas, ou seja, 24% do aumento de moradias no Brasil foi construído com
recursos do BNH. Contudo, só 1,5 milhão ( 33%) foi destinado aos setores
112
Cf. (MARICATO, E. 1997, p.35) O SFH promoveu uma profunda transformação no espaço urbano
brasileiro [...] Durante toda a sua existência o SFH financiou aproximadamente um quarto da produção
total das habitações construídas no período, abrangendo aí as moradias produzidas no mercado legal ou
ilegal. Mas seus investimentos favoreceram, predominantemente as classes médias emergentes e
classes altas, sustentáculos do regime ditatorial . Considerando que os juros do FGTS eram menores que
os do mercado.
113
No ano de 1963, o Seminário de Habitação e Reforma Urbana realizado em Petrópolis/RJ, promovido
pelo Instituto dos Arquitetos do Brasil, um marco histórico sobre a questão urbana brasileira, recomendou
mudanças radicais na política habitacional brasileira. Aproveitando as propostas então formuladas, o
primeiro governo militar, fundou o Banco Nacional da Habitação – BNH, por meio da Lei Federal no.
4380/64; o Sistema Financeiro da Habitação – SFH e o Serviço Federal de Habitação e Urbanismo –
SERFHAU.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
93
populares, sendo que os atingidos pelos programas alternativos ( entre 1 e 3
salários mínimos) foram contemplados com apenas 250 mil unidades, o que
significa 5,9% do total. O financiamento privilegiado de unidades para camadas
de renda média – juntamente com o subsídio indiscriminado, mostram que o
SFH
114
não conseguiu resolver a crise habitacional brasileira.
Nos anos 80, o BNH abriu falência
115
, foi fechado em 1986 tendo suas
atividades incorporadas pela CEF – Caixa Econômica Federal, deste então, o
país ficou sem uma “política” nacional de habitação, se é que podemos
considerar as intervenções do BNH, como verdadeiras políticas. A crise
econômica de 1980 e a extinção do BNH, deixou um imenso contingente de
trabalhadores da construção civil desempregados, aumentando o contigente de
favelados
116
. A população de baixa renda e desempregada, face a inexistência
de programas habitacionais populares, direcionava-se massivamente às áreas
favelizadas
117
e periféricas das grandes cidades
118
, porque eram nestas áreas
114
Cf. (GORDILHO, 2000, p.47) Ainda que ressaltem os resultados quantitativos, muitas críticas foram
feitas em relação à qualidade e aos custos exacerbados das intervenções do [BNH/SFH]. Por outro lado,
acreditava-se que o mercado e as políticas públicas, com o desenvolvimento industrial, responderiam às
demandas que se colocavam, o que, no entanto, não se configurou plenamente, devido principalmente
ao fato de que o Sistema Financeiro de Habitação foi montado para sobreviver com níveis de renda
compatíveis aos custos de produção, o que se tornou inviável com os índices de acirramento da pobreza
registrados no Brasil. [...] Dessa forma, na configuração urbana, esse tipo de produção habitacional teve
um papel marcante na expansão da área construída das grandes cidades. Traduziu-se basicamente em
dois padrões: um, para as rendas mais altas, através de edificações de unidades habitacionais maiores e
mais individualizadas, localizadas próxima à área central da cidade; o outro, para as famílias de renda
mais baixa, com limite máximo de 12 Salário Mínimo.
115
Cf. (AZEVEDO & ANDRADE, 1982) Os altos subsídios impostos pela inflação e a inadimplência
crescente foram alguns dos fatores que contribuíram para a extinção do BNH em 1986, seguida pelo
retraimento do sistema de financiamento público.
116
Cf. (MARQUES, E; TORRES, Haroldo; SARAIVA, C; 2003) A Prefeitura de São Paulo realizou um
Censo de Favelas em 1987, que demonstrou, que na década de 80, a população total residente em
favelas teria atingido aproximadamente 19% da população do município. Informando, ainda que na
década posterior (1987-1993), a população favelizada teria crescido à espantosa taxa de 15,2% ao ano.
117
Cf. (KOWARICK, L.1988), a favela em seus indicadores de precarização e espoliação das condições
de vida nos grandes centros urbanos se agrava nos anos 80, devido a uma combinação de aumento do
desemprego a um forte crescimento da violência.
118
Cf. (TASCHNER, 1997, p. 20) In 1980, urban population totaled more than 80 million peple,
concentrated mainly in the large cities. In the States of São Paulo and Rio de Janeiro, the metropolitan
population reaches, respectively, 50% and 80% of the total state population. In 1970, the 9 official
metropolitan regions account for 25% of the Brazilian population; in 1980, the percentage increases to
29%. Between 1970 and 1980, the population growth in the metropoitan regions. Urban living conditions
and, mainly the metropolitan ones, presented ever increasing problems. The growing impoverishment of
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
94
onde se encontrava terrenos com preços mais acessíveis às camadas pobres,
fazendo que esta tipologia de ocupação se consolidasse
119
.
Em Salvador, na década de 80, temos uma maior concentração da
população pobre em áreas longínquas e precarizadas como as do Subúrbio
Ferroviário e a do “miolo urbano”
120
. Como marco das intervenções habitacionais
do período BNH em Salvador, referenciamos a construção do Complexo
Habitacional de Cajazeira
121
. Assim como Salvador, neste período, outras
capitais brasileiras tiveram suas favelas acrescidas de contingentes
populacionais despossuídos de condições para adquirir a casa própria, e que
faziam da favela uma alternativa de habitar a cidade.
Diante deste quadro de crescimento desordenado da cidade, e aumento
do déficit de moradia, entre (1985-1989), no governo de José Sarney, os
projetos habitacionais ligaram-se essencialmente a SEAC – Secretaria Especial
de Ação Comunitária que, influenciada tacitamente por iniciativas internacionais,
criou Programas Nacionais de Mutirões para construção de moradia. Neste
momento é importante frisar que já no final dos anos 80 e primeiros anos da
década de 90, do séc. XX, tornou se crescente e notória a presença de diretrizes
de organismos financiadores internacionais nas intervenções urbanas
122
e no
financiamento de programas habitacionais
123
, a exemplo do BIRD – Banco
the population and the cost fo infraestrucuture services made for precarious living conditions. This
circumstance is evidenced by the increase of favelas in the main Brazilian cities. In the São Paulo
municipality, for instance, the percentage of squatters which was 1% in 1973 rises to 5% in 1980.
119
Cf. 1
o
. Cap desta dissertação.
120
Cf. (FERNANDES, R. B. 2000) Nas décadas de 80 e 90 o “Miolo Urbano” cresceu com taxas
superiores às de Salvador, constituindo-se num grande eixo de expansão da cidade. A densificação
prossegue, tornando necessárias ações estratégicas que contemplem as necessidades da expressiva
comunidade local e que se preocupem também com a qualidade de vida na região e em toda a cidade.
121
Cf. (SCHEINOWITZ, A. S. 1998) O Complexo de Cajazeiras foi projetada para receber um
contingente de aproximadamente 100.000 habitantes, possui hoje mais de 400 mil habitantes, ocupando
uma área de 20 milhões de metros quadrados.
122
Cf. ARANTES, Pedro F. O Ajuste Urbano: As políticas do Banco Mundial e do BID para as cidades
latino-americanas. Dissertação de Mestrado. FAU/USP, São Paulo, 2004.
123
O Conjunto Habitacional Jardim Nova Primavera, em Salvador, um dos conjuntos analisados nesta
dissertação, foi construído com financiamentos do BID.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
95
Mundial e do BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento, dotados de um
grande poder
124
de influência e decisão nas parcerias travadas com instituições
nacionais. Ao defenderem programas de mutirões para auto-construção,
cooperativas e programas correlatos de desenvolvimento social que pressupõem
a efetiva participação popular, estas instituições internacionais
125
tentam fazer
uso de uma prática que em grande medida se contextualiza em nossa realidade,
atuando, porém, em um esquema de mera apropriação e expropriação de força
de trabalho
126
.
Durante o governo de Fernando Collor de Melo (1990/92), que se seguiu
ao de Sarney, houve pouca inovação em seus dois anos e meio de mandato,
lançou o PAIH – Plano de Ação Imediata para Habitação, que se propunha a
financiar a habitação para famílias com até cinco salários mínimos. Neste
período, assistiu-se a um movimento de queda da produção, acompanhado de
redução do grau de proteção do parque produtivo nacional.
Com a posse do presidente Itamar Franco (1992) houve uma política de
descentralização de recursos que incentivou a criação de “Fundos” e
“Conselhos” estaduais e municipais. Formularam-se duas propostas (Habitar –
124
Cf. Chico de Oliveira, mimeo argüição de dissertação de mestrado (ARANTES, Pedro F.2004). O
BNDES tem orçamento maior que o BID, e em relação ao Brasil, nem se fala, e, entretanto ele não tem,
nem de longe, a importância que BIRD e BID detém na política econômica brasileira. Pior então para a
Caixa Econômica Federal, que atua nos segmentos de saneamento e habitação: quem ouve o presidente
da Caixa para tomar medidas de natureza macroeconômica?
125
Quando não diretamente os Bancos Internacionais intervém nas parcerias, se representam a partir de
fundações como a AVSI – Associação Voluntária para o Serviço Internacional – trata-se de uma entidade
dedicada à cooperação técnica e econômica entre os países, que é abastecida com recursos de diversas
procedências, sendo quase metade oriundos de projetos privados. Conforme relatórios Segundo
informações disponíveis no site da CONDER (www.conder.gov.br
) acessado em 05.12.2006. A AVIS está
investindo de três a quatro milhões de dólares por ano no Brasil. Quarenta e cinco por cento dos recursos
provêm do setor privado (pessoas físicas e firmas) e o restante recebemos do público (de governos
europeus, da União Européia, da Onu, dos bancos de desenvolvimento, além da cooperação
descentralizada). Tal instituição atuou no projeto de Ribeira Azul, construindo conjuntos habitacionais no
Subúrbio Ferroviário de Salvador, toda a série de moradias produzidas no Programa Nova Alagados, a
exemplo do Conjunto Nova Primavera, contou com o apoio desta fundação. Contando com a participação
direta do Governo da Bahia, com recursos do Governo Federal e do Banco Mundial.
126
Cf. Francisco de Oliveira em A Crítica da Razão Dualista (1972).
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
96
Brasil
127
e Morar Municípios), que pretendiam inicialmente investir na produção
em larga escala. No governo Itamar Franco a descentralização passou a ser
utilizado com um instrumento de estímulo nas investidas governamentais, tendo
em vista que estas medidas estão presentes nas regulamentações do FMI –
Fundo Monetário Internacional, se mostrando imprescindíveis para a
manutenção das parcerias com bancos internacionais. Deste modo,
sorrateiramente, mas com objetivos claros de manipulação política e econômica,
as orientações dadas pelo FMI, se integram à plataforma do governo Itamar, e
passam a ser aplicadas de forma a atender os princípios do Fundo Monetário.
O governo de Fernando Henrique Cardoso
128
(1995) desenhou a
implantação de um novo sistema financeiro, montando novos esquemas de
captação de recursos, dando prioridade para a concessão de créditos
diretamente à população, contudo as exigências burocráticas de comprovações
de renda para obtenção de crédito colocaram limites nesta medida,
direcionando-a a um número restrito de famílias. O Programa Carta de Crédito
129
(PCC), foi o destaque nos governos de mandatos FHC (1995 - 2002). O
Programa, mais uma vez repercutiu a lógica do mercado imobiliário; excluir a
maior parte da população brasileira de ter acesso à moradia, pois foi
confeccionado para um público que tinha até 12 salários mínimos, onde o
127
O Programa Habitar Brasil/BID tem como objetivo a execução de projetos integrados de urbanização
de áreas degradadas (favelas), ou de risco, localizadas em regiões metropolitanas, aglomerações
urbanas ou capitais, onde vivem, predominantemente, famílias com renda mensal de até três salários
mínimos.
128
Em 2001, na segunda gestão do governo de Fernando Henrique Cardoso, foi aprovado o Estatuto da
Cidade – Lei n. 10.257 de 10 de julho de 2001.
129
Cf. (ARRETCHE, 2002, p. 37) A gestão seletiva das linhas de financiamento não foi um resultado não-
intencional, derivado da exigência de adimplência com o governo federal para obtenção de recursos do
FGTS, isto é, o desfinanciamento das empresas públicas não foi resultado apenas das taxas de
inadimplência das prestadoras pública. A meta de prioridade de aplicação de recursos no Programa Carta
de Crédito em detrimento do Programa Pró-Moradia foi objeto de uma Resolução do Conselho Curador
do FGTS (n
o
. 246) já em 1996. Em outras palavras, o desfinanciamento das empresas públicas fez parte
de uma estratégia cujo objetivo central era introduzir mecanismos de mercado na gestão das políticas de
desenvolvimento urbano.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
97
recurso poderia ser adquirido para reformas, construção e compras de
habitação.
Durante o governo FHC o acúmulo do déficit habitacional brasileiro
tornou-se mais explícito, segundo a Fundação João Pinheiro, o déficit por novas
moradias durante a segunda metade da déc. de 90 era da ordem de 4,6 milhões
( entre moradias urbanas e rurais). Introduziram-se na contagem o número
(dimensão quantitativa do déficit) de domicílios improvisados: em baixo de
pontes, árvores e carros abandonados, assim como os números de moradias
construídas com material inadequado (dimensão qualitativa do déficit); e,
finalmente, os domicílios com co-habitação excessiva. Acrescenta-se a esses,
4,6 milhões de novas moradias, cerca de 5,3 milhões de casas que
necessitavam de melhorias qualitativas na infra-estrutura
130
.
Segundo Maricato (2000), a “política” habitacional no Brasil, até então,
como um segmento da construção civil, teve por suposto básico contribuir para a
dinamização da economia, com programas habitacionais descontextualizados e
constituídos a revelia das reais necessidades da população de baixa renda (0 - 3
salário mínimo). Parece não ter sido objetivo da política habitacional ampliar os
espaços da cidadania e garantir o pleno direito à habitabilidade, tal situação teria
sido responsável pela reorientação da política para os setores melhor
aquinhoados da sociedade aumentando assim o déficit habitacional para as
camadas de menor renda.
Se existe “déficit habitacional” é porque grande parte da
população urbana brasileira está excluída do mercado de
produção de moradias. São duas as razões de um lado, uma
distribuição profundamente desigual da renda gerada na
economia e, de outro, as condições que regem a produção
130
Cf. (TASCHNER, 1997) Housing policy in Brazil: Retrospective and Perspectives,. In: Congresso
Habitação do século XXI – Virginia/USA, Junho de 1997.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
98
capitalista de moradias no Brasil, que impõem um elevado preço
ao direito de habitar na cidade. (RIBEIRO & PECHMAN, 1983, p.
09)
Entre 1998 a 2003
131
, nosso déficit habitacional aprofundou-se, atingiu
cerca de 7 milhões de famílias, sendo 93% delas com renda mensal inferior a
cinco salários mínimos. Segundo os relatórios elaborados pelos técnicos do
Ministério da Cidade – criado no governo Lula – durante o governo FHC,
conforme Ermínia Maricato, em entrevista a Revista Carta Maior (2006) houve
uma expansão considerável no déficit habitacional junto à população de menor
renda. Na gestão FHC, a política habitacional ignorava a população que
ganhava de (0 a 7 salários mínimos) , sendo que a maior parte dos recursos
eram aplicados em faixas de renda acima destas. Situação reproduzida
historicamente e que marca uma continuidade nas práticas de intervenção da
política habitacional.
Durante o governo Lula (2002-2006), com o Ministério das Cidades
132
,
foram implementadas políticas voltadas à elaboração de planos diretores, como
determina o Estatuto da Cidade; estas políticas deveriam priorizar a
regularização fundiária e o atendimento das necessidades básicas da população
que vive em assentamentos precários, visando a inclusão sócio-espacial e a
integração dos assentamentos ao tecido urbano da cidade. Entre os projetos do
Ministério das Cidades, destinados à habitação popular, se destaca o programa
131
Cf. Relatórios do Ministério das Cidades. No período de 1998 a 2003, caiu o número de unidades
imobiliárias contratadas por meio de financiamentos da Caixa Econômica Federal ou das demais
instituições financeiras participantes do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE). Da
mesma forma, reduziu-se a taxa de investimento do país. Se, em 1998, os gastos com Formação Bruta de
Capital Fixo (FBCF) na construção civil representavam 70,1% do total de FBCF da economia, em 2003 tal
participação cai para 62,6%.
132
Cf. Relatórios do Ministério das Cidades (2006), com a criação deste, foi possível articular as
reivindicações históricas dos movimentos sociais com aquelas do setor da construção, definir prioridades
e, finalmente, dotar o país de uma efetiva Política Nacional de Habitação. Por sua vez, a criação do Fundo
Nacional de Habitação de Interesse Social e a aprovação da Resolução 460 pelo Conselho Curador do
FGTS favoreceram o direcionamento dos recursos ao atendimento da população de menor renda.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
99
Habitação de Interesse Social
133
, previsto para beneficiar famílias que recebem
até 3 salários mínimos ao mês, envolvendo desde a implantação de serviços de
saneamento, até a construção de conjuntos habitacionais para famílias que
vivem em áreas de risco.
Na gestão passada, e na atual gestão do governo Lula, ainda não houve
uma grande ação pública em torno da moradia
134
. Na gestão petista se destaca
a criação do Ministério das Cidades, o Programa Habitar Brasil – BID e o
Programa de Subsídio à Habitação PSH. Vale ainda acrescentar que a criação
do Ministério das Cidades gerou e ainda gera um grande número de
mobilizações em todo o país, propostas e discussões sobre os temas ligados a
habitação foram difundidos, todavia a ação prática do governo federal não se
constituiu com uma política que diminuísse o déficit nacional de habitação
popular.
Em linhas gerais, todas as políticas e programas destinados à produção
habitacional desde o Estado Novo, passando pelo Governo Militar, pela “Nova
República” até os dias atuais, não conseguiram saciar a necessidade por
moradia da população brasileira. As últimas publicações de pesquisas da
Fundação João Pinheiro
135
2004 (FJP) e o Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento (PNUD), PROJETO BRA/00/019 – Projeto de Apoio à
Implementação do Programa HABITAR-BRASIL/BID, detectaram no país um
déficit
136
habitacional quantitativo básico de 5.890.285, é maior do que a
133
Cf. Relatórios deste mesmo Ministério na execução deste programa se utilizou apenas 21,5% do
orçamento, dos R$ 660 milhões autorizados, gastou-se R$ 141,9 milhões.
134
Cf. IBGE O déficit habitacional brasileiro é crescente: em 2004 tínhamos 6,9 milhões de pessoas
precisando de moradia e em 2006 já tínhamos mais de 7,9 milhões.
135
Fundação João Pinheiro. Centro de Estatística e Informação. Déficit Habitacional no Brasil Municípios
selecionados e microrregiões geográficas. Belo Horizonte, 2004.
136
É importante atentar as divergências de informações que podem existir nos dados referentes a
exatidão do número de nosso déficit habitacional, os mencionados neste trabalho foram oriundos dos
cálculos da Fundação João Pinheiro, que parecem ser mais confiáveis, até mesmo pela tradição da
fundação neste tipo de estatística.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
100
população de grandes capitais brasileiras, como Salvador, Belo Horizonte e
Recife.
III – Os preceitos da Arquitetura Moderna na constituição do habitat
econômico no Brasil.
A concepção de habitat moderno que chega ao Brasil esteve
estreitamente associada ao debate em torno da questão da moradia no século
XIX e às propostas e diretrizes então formuladas nos CIAM’s – Congressos
Internacionais de Arquitetura Moderna
137
. Tal habitat se constituiu através de um
modelo de moradia que se estrutura a partir de uma nova relação entre a
moradia e o urbano. Neste contexto, a unidade habitacional surgiu articulada a
redes de infra-estrutura (saneamento, abastecimento de água, esgotos, sistema
viário, etc.), a equipamentos de uso coletivo (escolas, creches , etc.) e a lugares
específicos de trabalhos (indústrias, comércios, repartições, etc.), que permitiam
uma redefinição da forma e do uso da moradia e sua relação com a cidade
138
.
Foram referências na produção de habitat moderno no Brasil, as
iniciativas dos IAPs
139
– Institutos de Aposentadorias e Pensões, que
137
Influências do taylorismo se mostravam presentes na concepção da moradia formulada por arquitetos
ligados ao CIAM, em uma perspectiva de transpor a racionalidade do mundo fabril taylorizado para a
produção de moradias.
138
Nas décadas de 30 e 40, a arquitetura e o urbanismo seguem o modelo determinado pela Carta de
Atenas, divulgado no IV CIAM, onde foi estabelecido o novo modelo do urbanismo moderno. O tema
deste IV congresso, realizado em 1933, foi à cidade funcional, voltada a era maquinista e industrial, que
introduziu a temática do planejamento na análise urbanística através da Carta de Atenas, afirmando as
quatro categorias funcionais: habitação, trabalho, recreação e circulação, com enfoque idealista e de
caráter universal. Na carta, foram expostos sistematicamente à lógica do funcionalismo: separação da
habitação em bairros residenciais, a planta, o programa, as necessidades de uso, de luz, de ventilação e
outros.
139
Cf. (GONÇALVES,2001) Os projetos dos IAPs não tem a riqueza de composição arquitetônica dos
seus congêneres europeus, mas dialogam com eles. Merecendo ser observados com maior cuidado, pois
sua qualidade supera quase tudo o que se produziu em termos de conjuntos habitacionais no Brasil
durante o período do BNH.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
101
começaram a ser construídos nos anos 30, constituindo-se a partir de projetos
140
que adotavam as variáveis de economia, prática e técnica, então defendidas
pelos promotores da arquitetura moderna
141
. Entre os anos 30 e 50, durante o
período de crescimento e afirmação da indústria
142
brasileira, a construção de
conjuntos habitacionais e seus equipamentos foi entendida como necessidade
básica para conter o déficit de moradias que crescia progressivamente
143
. Neste
contexto, temos a construção em série de moradias populares e o início da
concepção do habitat moderno seguindo as racionalidades
144
exigidas pela
Arquitetura Moderna, no que se refere à produção em grande escala, economia
e rapidez na construção dos conjuntos habitacionais.
A produção realizada pelos IAP’S, obedecia aos princípios de economia,
racionalidade, com incorporação de equipamentos coletivos e estandardização
dos edifícios com o uso do concreto armado, diretrizes da Arquitetura Moderna
que foi depreciada em densidade, uso e qualidade no transcorrer dos anos. No
início da produção de habitação econômica/popular no país, percebeu-se em
140
Cf.(BONDUKI, p.136, 1998).Em 1938, no aniversário do Estado Novo, foram lançados os Institutos de
Previdência e seus conjuntos, neste momento fica patente que os partidos arquitetônicos e as
características da intervenção estatal no setor não resultaram de decisões pessoais ou técnicas,
tomadas apenas por tecnocratas dos IAPS ou do Ministério do Trabalho, e sim de uma reflexão
amadurecida, ou pelo menos debatida, no próprio núcleo de poder do Estado Novo.
141
Cf. (ARGAN, p.195, 1993) As primeiras tentativas de arquitetura moderna no Brasil, são uma
conseqüência do movimento chamado Semana de Arte Moderna de 1922, exercendo uma importante
função ideológica, contudo a arquitetura moderna brasileira teve seu maior desenvolvimento, durante o
Estado Novo, à sombra dos institutos de aposentadoria.
142
Cf.(KOPP, 1990). Com a industrialização e o surto maquinista, surge então, um cliente novo, um
cliente coletivo: os trabalhadores urbanos, porém sem capacidade de pagar por sua moradia. Como
conseqüência disto, o principal campo de atuação das intervenções passa a ser a habitação e seus
anexos, bem como os problemas urbanísticos dos quais a habitação constitui o principal.
143
Cf. (LE CORBUSIER, p. 93, 2004). “[...] O problema que assume um caráter de urgência, em todos os
países, é o da construção de casas necessárias ao alojamento das multidões que o fenômeno
maquinista concentrou nas grandes cidades. A descrição é inútil. Os fatos aí estão. Colocou-se o
problema da quantidade. Além do mais, impõem-se uma rigorosa economia e sabemos o motivo”.
144
A racionalidade empregada na concepção Arquitetura Moderna refere-se à melhor conexão possível
das partes em relação aos parâmetros de economia, política e produção. Em concomitância com a
racionalidade, temos método, função, empenho, vanguarda e arte, atribuindo-lhes princípios presentes no
movimento moderno. Este movimento determina um novo sistema de formas consideradas
universalmente válidas, desvinculadas do passado, e sempre em busca de uma constante superação da
forma e dos problemas urbanos, então manifestos.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
102
algumas edificações relativa
145
qualidade construtiva, que foi substituída pelas
produções do BNH – Banco Nacional de Habitação (1964).
[...] na massiva produção implementada pelo BNH a partir
de 1964, onde se manifestava a busca cega e inútil pela
redução de custos, sem levar em conta as outras
perspectivas propostas pela arquitetura moderna. [...]
Introduziu-se no repertório da habitação social brasileira,
um suposto racionalismo formal desprovido de conteúdo,
consubstanciado em projetos de péssima qualidade,
monótonos, repetitivos, desvinculados do contexto urbano
e do meio físico e, principalmente, desarticulados de um
projeto social. (BONDUKI, p. 136, 1998).
A partir de 1964, percebemos que pouca
146
construção habitacional de
qualidade foi realizada, sendo que as referências bem sucedidas no uso da
Arquitetura Moderna se encontravam em períodos anteriores a 1964, como por
exemplo, a construção do Conjunto Residencial Prefeito Mendes de Moraes
(Pedregulho)
147
, em Benfica, no Rio de Janeiro, um projeto do arquiteto Affonso
Eduardo Reidy
148
, que recebeu premiação na 1ª. Bienal da Arquitetura. Além do
Pedregulho
149
temos também o Conjunto da Gávea (fotos) e outros projetados
em São Paulo, como o conjunto residencial da Mooca do arquiteto Paulo
Antunes e o conjunto residencial Várzea do Carmo, projeto do arquiteto Attílio
145
Além da produção realizada pelos IAPs, a partir de uma relativa integração entre os conjuntos
habitacionais produzidos com redes de infra-estrutura, observou-se uma grande produção privada de
habitação para a classe média alta, projetadas por arquitetos como Oscar Niemeyer, A. Reidy, K. de Melo,
Abelardo de Souza e etc.
146
Algumas exceções pontuais, a exemplo das construções de Zezinho Magalhães em São Paulo.
147
Cf. (PEDROSA ,M. p.56) in: XAVIER, A. (2003) A unidade construída pela municipalidade do Rio se
localiza em um bairros antigos e pobres. O terreno apresenta um desnível de cinqüenta metros. A forma
sinuosa do bloco principal responde às condições topográficas existentes. Mas Pedregulho é ainda obra
isolada, em torno dela estão favelas, barracos, a efervescência da miséria e um urbanismo caótico.
148
Cf. (CORREIA, T, 2004, p.69) [...] No Brasil, nas décadas de 1930 e 1940, alguns arquitetos e
engenheiros como Affonso Reidy, Carmem Portinho, Henrique Mindlin contribuíram, através de escritos e
de realizações, para difundir concepções de racionalização da habitação moderna.
149
Cf. (BONDUKI apud CALVANCANTI, p.139,1998) Em Pedregulho, aparece a relação entre habitação
social, modernização, educação popular e transformação da sociedade. Para Reidy, Pedregulho dispunha
de serviços, como a escola, o centro e o símbolo de sua proposta de ação reeducadora do habitat.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
103
Correa Lima. Construções consideradas de referência em qualidade do uso da
arquitetura moderna, ainda que criticadas sob prisma da dimensão
autocrática
150
.
Fotos Conjunto Habitacional da Gávea – RJ
Mesmo com imposições autocráticas em relação à população,
percebemos que alguns preceitos (racionalidade, economia, rapidez) da
Arquitetura Moderna
151
se fizeram presentes na produção da habitação
econômica/popular no país, os conjuntos de Pedregulho
152
e da Gávea são
referências bem sucedidas, pelo fato de apresentarem uma relativa integração
com infra-estruturas e serviços, estando inseridos em áreas de contextos
urbanos já consolidadas, o que facilitou uma maior relação entre a casa/unidade
habitacional e a cidade.
150
Sobre a autocracia, ver Florestan Fernandes em Revolução Burguesa no Brasil, 1982.
151
Cf. RIZEK, Cibele Saliba. Resenha do livro Origens da Habitação Social no Brasil. Arquitetura
Moderna, Lei do Inquilinato e Difusão da Casa Própria. Nabil Bonduki. Estação Liberdade. São
Paulo,1998. (Publicada na Revista Novos Estudos CEBRAP).
152
(ARGAN, p. 172, in XAVIER, Alberto [org.], 2003) Mesmo soluções felizes do ponto de vista urbano
(como para ficar apenas num exemplo, o conjunto idealizado por Reidy no subúrbio de Pedregulho, no
Rio) refletem bem este processo imposto de cima para baixo, que se propõe a estender em círculos cada
vez mais largos a tipologia idealizada por uma elite.
Fotos do Conjunto Gávea - RJ
Fonte: BONDUKI, 1998
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
104
As construções em série de habitação popular nos anos 60, período
militar, podem indicar o início da depreciação do uso dos princípios da
Arquitetura Moderna. Tal afirmação pode ser percebida quando analisamos a
baixa qualidade construtiva e infra-estrutural das construções subsidiadas pelo
BNH, assim como a falta da participação popular nos projetos. As críticas dos
anos 60 manifestavam-se em termos estéticos, em conforto ambiental, nos
aspectos econômicos/funcionais, bem como na utilização de valores que
ignoravam as condições específicas do contexto onde se inseriam os conjuntos
e seus moradores. Situação que pode levar a questionamentos: a Arquitetura
Moderna e seus princípios se tornaram obsoletos na segunda metade do século
XX, ou o seu uso político - ideológico
153
fez com que ela perdesse seu status
discursivo de promotora do Bem Estar Social ?
Talvez referências ao contexto europeu
154
e norte americano,
concernentes à depreciação da habitação econômica moderna, nos levem a
entender o processo de perda de qualidade nestes tipos de construções no
153
Cf. ( CHAUÍ, 1981) A ideologia – é aquela versão da realidade social dada pela classe dominante tendo
em vista facilitar a dominação, pois tende a esconder dos homens o modo real como suas relações sociais
são produzidas.
154
Cf. (KOPP, p.90, 1987) Com o término da 2ª Guerra, a partir do período da reconstrução imediata a
meados dos anos 50, [...] a Arquitetura culmina com a realização na França do que se denominou de
Grandes Conjuntos Habitacionais. Isto é, arquitetura reproduzida em grande escala, muito sistemática,
extremamente monótona, promovendo a industrialização, e a pré fabricação [...] Na França
particularmente, e infelizmente com efeito caricatural, a responsabilidade é política. É responsabilidade da
política habitacional, econômica-financeira, se foram construídas três mil unidades num canto inacessível,
onde as pessoas não podem se deslocar para o trabalho. A culpa não pode ser atribuída aos arquitetos,
como Corbusier, Gropius ou Guinzburg. Ela recai sobre quem decidiu que se construíssem lá onde os
terrenos eram mais baratos, onde o especulador é proprietário.
Conjunto Residencial Pedregulho, um bloco serpeteante; blocos laminares e os equipa-mentos
coletivos . O edifício mais alto no fundo não foi construído. Fonte: BONDUKI, 1998
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
105
Brasil. As descrições dos conjuntos habitacionais franceses feitas por Anatole
Kopp (1987), são similares às descrições dos conjuntos habitacionais brasileiros
produzidos pelo BNH, construídos em áreas longínquas e desprovidos de
qualidade arquitetônica, configurando-se como “pesados” caixotes em tons
acinzentados pelo envelhecimento precoce: seria realmente possível chamar
essas construções de arquitetura? Ou são simulações de uma arquitetura que
existe apenas na projeção e no discurso técnico e ideólogico?
Nos Estados Unidos, as inadequações no uso da Arquitetura Moderna,
são explicitadas por Jane Jacobs, no livro: The death and life of great American
Cities, em 1961, assim como por Charles Jencks (1994), ao manifestar a Morte
da Arquitetura Moderna, a partir de uma crítica ao projeto do Conjunto Pruitt-
Foto Viviendas Pruitt-Igoe
Fonte- JENCKS, 1984
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
106
Igoe, em St. Louis Missouri
155
, construído de acordo com os ideais
progressistas dos CIAM.
Nesta perspectiva, Charles Jencks afirma que:
[...] podemos situar com precisión temporal la muerte de la
Arquitectura Moderna. Al contrario que las personas, cuya
disfunción legal depende de una compleja atribuición de
competências entre impulsos cerebrales y pulsaciones
cardíacas, la Arquitectura Moderna se extinguia de golpe y con
una sonora explosión. [...] La Arquitectura Moderna murió em St.
Louis Missouri, el 15 de julio de 1972 a las 3.32 de la tarde (más
o menos), cuando a vários bloques del infame proyecto Pruitt-
Igoe se les dio el tiro de gracia com dinamita. Previamente
habían sido objeto de vandalismo, mutilación y defecación por
parte de sus habitantes negros y aunque se reinvirtieron millones
de dólares para intentar mantenerlos con vida (reparando
ascensores, ventanas y repintando) se puso fin a su miséria. [...]
Pruitt-Igoe se construyó de acuerdo con los idelaes más
progresistas del CIAM (Congresso Internacional de Arquitectos
Modernos) y fue premiado por el Instituto Norteamericano de
Arquitectos cuando se diseño en 1951.”[...] (JENCKS, p. 09/10,
1984)
No Brasil alguns conjuntos habitacionais de tipologia econômica,
construídos com o uso da Arquitetura Moderna também apresentaram e
continuam a apresentar problemas
156
equivalentes aos do conjunto de Sant
Louis Missouri. A exemplo dos conjuntos financiados pelo BNH/SFH, produzidos
em grande escala e de forma estandartizada, desprovidos de espaços públicos e
equipamentos de sociabilidade e que cedo demonstravam toda a má qualidade
de sua construção, através de uma rápida deterioração da estrutura física.
155
Cf. (JENCKS, p. 09/10, 1984)MINORU YAMASAKI. Viviendas Pruitt-Igoe. St. Louis, 1952 – 1955. Varios
bloques laminares de este proyecto fueron dinamitados en 1972 después de haber sido continuo objeto de
vandalismo. El procentaje de crimen era mayor que en otras urbanizaciones, y Oscar Newman atribuyó
esto, en su libro Defensible Space, a los largos y anônimos pasillos y ala falta de espacios semiprivados
controlados. Otro factor es que se diseñó en un lenguaje purista que no concordaba con los códigos
arquitectönicos de los habitantes.
156
Como exemplo de uma construção realizada no pós-período BNH (1964-1986), que apresenta problema
na sua qualidade arquitetônica referenciamos o Conjunto Habitacional Nova Primavera, inaugurado em
2002, no Subúrbio Ferroviário de Salvador, como veremos detalhadamente no 3º cap., deste estudo.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
107
Como uma expressão do uso depreciado da arquitetura moderna
podemos referenciar em Salvador, o grande Complexo Habitacional de
Cajazeiras – com 13 conjuntos habitacionais, abrangendo cerca de 18.523
casas e apartamentos – projetado em 1979/80, financiado pelo BNH/SFH, na
área do “miolo urbano” da cidade, para receber um contingente de
aproximadamente 100.000 hab. O Complexo Habitacional de Cajazeiras se
configurou como uma estratégia do Governo do Estado junto ao BNH/SFH para
resolver a problemática habitacional da cidade. Possui hoje mais de 400 mil
habitantes, sendo considerado um emblema de uma proposta habitacional
deficiente tanto em concepção social como física
157
.
Fotos do Complexo Habitacional de Cajazeiras
157
Cf. O site produzido por estudantes de geografia da UCSAL (http://www.cajazeirasba.hpg.ig.com.br) o
Complexo de Cajazeiras tornou-se um bairro inchado e carente de apoio nos setores básicos de saúde,
educação e transporte. Cajazeira não conta até hoje com uma agência bancária e sequer um cemitério. O
bairro possui comércio próprio, hospital, posto de saúde, escolas de nível fundamental e médio, e delegacia
de polícia. Porém, a estrutura projetada tornou-se insuficiente para atender a atual demanda populacional,
que cresceu numa proporção inimaginável.
Fonte: http://www.cajazeirasba.hpg.ig.com.br
Consultado em 15 de janeiro de 2007
Fotógrafo: não identificado
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
108
O conjunto de Cajazeiras atualmente exibe as conseqüências da
concepção ideológica do projeto habitacional e do tipo de arquitetura que lhe foi
imposta – uma arquitetura depreciada, “uma não arquitetura” – que se manifesta
em prédios deteriorados e envelhecidos, um dos reflexos da má qualidade de
seu projeto, que se explicita também através das inúmeras rachaduras,
infiltrações, problemas elétricos e hidraúlicos etc, um problema infra-estrutural,
que se agrava com a falta de renda dos mutuários para fazer a manutenção das
unidades habitacionais. Um outro aspecto que pode ser somado ao da
deficiência infra-estrutural e arquitetônica, é que estes conjuntos habitacionais
se configuravam/configuram como espaços de transitoriedade, como
demonstram os estudos de Licia do Prado Valladares (1978), tratando do
conjunto Cidade de Deus no Rio de Janeiro; a transitoriedade, referida neste
caso poderia se justificar tanto pela hipótese de falta de adaptação com o novo
ambiente (social e físico) como também pela falta de condições econômicas
para a manutenção do imóvel, entrando em cena o jogo dos valores de uso e
troca
158
.
[...] após algum tempo de permanência em conjuntos
habitacionais, grande parte dos favelados removidos os
abandonavam. Voltavam à favela, colocando em questão a
“solução habitacional” que o governo lhes havia oferecido [...] a
imagem do conjunto habitacional que transmitem é a de um
espaço alternativo à favela, segregado na malha urbana, onde
as condições de vida são precárias. (VALLADARES, p.49, 1978).
O exemplo do Complexo Habitacional de Cajazeiras em Salvador,
evidencia que a depreciação da habitação econômica se manifestou com
expressividade na segunda metade do século XX, especificamente no período
das produções do BNH/SFH. Depreciação causada pelo uso parcial e “arbitrário”
158
Cf. Veremos no 3º Cap. deste estudo.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
109
dos preceitos da Arquitetura Moderna, tendo como rebatimento uma rápida
precarização das edificações e o descontentamento de seus moradores com o
projeto executado.
As inadequações no uso da Arquitetura Moderna na produção dos
conjuntos habitacionais não se limitavam/limitam à falta de qualidade, mas
estavam também na forma como estas construções chegavam aos seus
mutuários, constituindo-se em um tipo de intervenção urbana destinada ao
“povo”, mas feita sem propósito de atendimento dos reais direitos de
habitabilidade, no que se refere à localização, tipologia, tamanho etc., ou seja,
uma intervenção autocrática
159
realizada de cima para baixo e sem
preocupações com as expectativas de seus moradores.
Talvez no caso brasileiro o autocratismo nas intervenções
habitacionais, assim como, a precarização na qualidade
dos conjuntos, tenha como fatores geradores a sequiosa
associação entre agentes imobiliários privados, práticas do
Estado
160
brasileiro, uso ideológico da arquitetura moderna
e mercado de habitação, juntos na mesma investida de
obter maior lucro com o barateamento das produções em
série, rebaixando demasiadamente a qualidade das
construções habitacionais, precarizando ainda mais os
conjuntos habitacionais e vulnerabilizando socialmente os
seus moradores.
A inexistência de programas sociais contínuos e contextualizados, junto às
intervenções para moradia popular, ainda predomina. Os herméticos projetos
159
Cf. [AGENCIA BRASIL DE FATO, 03-02-2006 [http://www.brasildefato.com.br] acessada em
19.01.2007. A maior crítica dos movimentos ligados ao setor de habitação é a falta de participação
popular nas decisões do governo. “Tudo fica centralizado na Companhia de Desenvolvimento
Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo (CDHU), não se sabe quais são os critérios, o porquê se
decide implantar um programa neste e não naquele município, o número de famílias a serem atendidas”.
Segundo o deputado estadual Simão Pedro (PT), “É uma política clientelista com fins eleitorais, pois o
governo faz acordos com deputados e prefeitos das regiões das obras para que as inaugurações gerem
dividendos políticos no futuro”. A situação referenciada está presente em todo o país, a CONDER em
Salvador, equivalente ao CDHU, possui as mesmas práticas autocráticas de intervenção, como veremos
no 3
o
. cap. deste estudo, nos casos dos Conjuntos Vilar Viver Melhor, Nova Primavera e Vale das Dunas.
O que nos leva a afirmar que este tipo de autocratismo, continua presente na execução dos projetos de
habitação no Brasil.
160
O autocratismo, ainda presente nas intervenções urbanas sempre se mostrou presentes nos projetos
governamentais, contudo ele parece sofisticar-se com o Estado neo-liberal.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
110
habitacionais, exibindo uma dissimulada
161
Arquitetura Moderna, não fomentam
as possibilidades de inserção social de seus moradores. O poder estatal através
das grandes construtoras, em suas tentativas autocráticas de construir habitação
econômica para as camadas populares, utiliza parcialmente os preceitos
originais da Arquitetura Moderna. Os complexos habitacionais das grandes
cidades servem como ilustração de um espaço habitacional precário, que
compromete a vida de seus moradores e o próprio sentido da produção
arquitetônica, no que remete à importância inicialmente dada a habitação
econômica e a função do habitar.
IV – A habitação popular em Salvador-BA
Nas primeiras décadas da segunda metade do séc. XX, em uma
dinâmica de crescimento urbano acelerado, com o desenvolvimento da
indústria petroquímica, surgem as primeiras tentativas
162
de amenizar o
déficit
163
de moradias em Salvador. Neste período observamos a construção
de conjuntos habitacionais em série, os primeiros foram o Conjunto Tiradentes,
1960, localizado no Caminho de Areia (Cidade Baixa); Conjunto São Judas
161
No que concerne ao uso de seus preceitos de acordo as diretrizes de funcionalidade e integração
entre moradia e cidade, assim como à qualidade que esta arquitetura apresentou no incio de seu uso no
Brasil.
162
Antes deste período, anos 60 e 70, tivemos a construção de alguns conjuntos habitacionais, a partir
dos Institutos de Previdências IAPI, contudo o número destas construções foram insuficientes para
atender a uma pequena parcela de pensionistas, mesmo tendo sido uma experiência satisfatória, sua
produção não causou impacto na diminuição do déficit de habitação popular.
163
O expressivo déficit de moradia na capital foi induzido por diversos fatores, entre estes: as migrações
nos anos 60,70 e 80 movidas pela “febre industrial”; o desemprego da população; crise financeira; os
altos custos de terra urbana; assim como a falta de direcionamento dos programas públicos de habitação,
somando-se a ausência de regulamentação fundiária etc. No processo de sua urbanização Salvador foi
sendo ocupada a deriva de um planejamento, o que repercutiu em um denso processo de favelização que
começa a ganhar notoriedade na déc. de 40 do séc. XX, período de início oficial do acúmulo de déficits
de moradias na capital baiana.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
111
Tadeu, 1970 , no bairro do Cabula; Complexo habitacional de Cajazeiras
164
,
1970/80; Complexo habitacional Fazenda Grande I e II, localizados na área do
“miolo urbano”; Conjunto São Rafael, 1980, localizado na Avenida Paralela
165
etc; construídos com o apoio do BNH – Banco Nacional de Habitação. No
período pós-BNH, a partir da segunda metade dos anos 80, foram construídos
o Conjunto Loteamento Vale das Dunas (1990), na área do “miolo urbano”;
Conjunto Viver Melhor/ Ogunjá, 1992, nas proximidades da Avenida Vasco da
Gama; Conjunto Araças I e II, 1995, e o Conjunto Nova Primavera
166
, 2002,
estes últimos localizados no Subúrbio Ferroviário de Salvador.
Os conjuntos referenciados estão alocados em áreas diferentes do tecido
urbano, com pequenas diferenças quanto a tecnologia construtiva, mas dotados
de uma mesma arquitetura depreciada, tanto na dimensão do design, como na
qualidade física.
A trajetória da produção de moradia popular em Salvador, na forma de
conjuntos habitacionais produzidos em série é simultânea à produção nacional,
que, a partir dos anos 60, começou a se orientar com a instalação do SFH –
Sistema Financeiro de Habitação
167
. Com a indicação, nos anos 70, de novas
áreas de expansão para o tecido urbano de Salvador, o crescimento foi
vetorizado para a zona norte da cidade. Neste período houve um aumento na
164
Cf. Informações no site (http://www.cajazeira.hpg.ig.com.br) acessado em (5/01/2007), a área formado
por nove conjuntos habitacionais dentro da Grande Cajazeiras (complexo habitacional popular), quatro
Fazendas Grande e a Boca da Mata, é considerado a maior da América Latina. Os bairros que integram
diretamente à área de influência do território de Cajazeiras, são: Águas Claras, Castelo Branco, Pau da
Lima, áreas localizadas na região na região do “miolo urbano” de Salvador.
165
Área norte da cidade de Salvador, considerada vetor de expansão urbana, com crescente
especulação imobiliária, nos terrenos adjacentes.
166
Este Conjunto Habitacional, foi inaugurado como 2
a
. Etapa do Projeto Novos Alagados, realizada pelo
Governo do Estado da Bahia; Banco Mundial; AVSI – Associação Voluntários para os Serviços
Internacionais. Como já exposto foi neste conjunto que realizei parte de meus estudos da Iniciação
Científica (Pibic/CNPq - 2003).
167
Cf. Gordilho (2002, p.170) a partir dos anos 60 a produção habitacional em Salvador foi incentivada
através dos financiamentos promovidos pelo BNH/SFH, visando promover a construção e a aquisição da
moradia, sobretudo para as classes de menor renda.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
112
produção de habitação pelo BNH/SFH, que se localizou na área norte/nordeste
da cidade, onde foram construídos grandes conjuntos habitacionais
168
,
principalmente nas circunscrições do “miolo urbano”. Nos anos 80, Salvador
continuou o processo de crescimento demográfico, seguido pela expansão
periférica das fronteiras urbanas e por pressões na demanda por moradias.
[...] até final dos anos setenta, o sistema BNH/SFH deu ênfase à
produção de novas unidades em conjuntos habitacionais de
casas e apartamentos na periferia. Os limites da demanda
solvável logo impuseram outros projetos, envolvendo a auto
construção, tais como lotes urbanizados, unidades-embrião,
além da tentativa de uso de tecnologias alternativas para
construção, que evidentemente não lograram sucesso do seu
intento, diante da estreita possibilidade de retorno de
investimento. Por outro lado, a persistência das favelas e
parcelamentos informais fez expandir o financiamento público
para outros tipos de atuação, que passaram a considerar a
favela como solução. Nesse sentido, na década de 1980,
incrementaram-se os financiamentos do BNH/SFH para
intervenções em áreas ocupadas, tais como infra-estruturação,
enfim, medidas para urbanização e melhoria de áreas ocupadas
informalmente. (GORDILHO,2000, p.46)
Os principais agentes que atuaram no percurso da constituição da
habitação popular em Salvador, junto ao BNH/SFH, tiveram o Estado como base
de sustentação e gerenciamento, através da criação de diversos órgãos e
agentes institucionais, entre estes, a URBIS
169
– Habitação e Urbanização da
Bahia S. A – criada em 1965, que se destacou como o principal agente do
Estado apresentando, ao longo da sua atuação, oscilações na produção de
moradias, conforme as injunções governamentais. Atuou preferencialmente na
construção de casas dentro da tipologia embrião. Durante quase uma década
(1987 a 1998), a URBIS não construiu nenhuma unidade habitacional, em
168
A exemplo do Complexo de Cajazeiras e dos Conjuntos Fazenda Grande I e II
169
Cf. (GORDILHO, 2002, p.170) Pela URBIS, na RMS – Região Metropolitana de Salvador, foram
produzidos em torno de 45 mil unidades habitacionais, até meados dos anos oitenta.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
113
função da crise financeira interna, pois ficou inadimplente com o Governo
Federal. Contudo, passou a assumir parcialmente o papel de executora da
política estadual de implantação de equipamentos públicos no Estado. Durante
o período de atividades da URBIS, surgiu a AMESA – Administração e
Melhoramentos de Salvador – em 1974, com a finalidade única de atuar no
aglomerado de palafitas de Alagados
170
e com o objetivo principal de urbanizar a
área; criou uma base física destinada, especificamente, a essa intervenção,
posteriormente, foi transformada em Habitação e Melhoramentos da Bahia S.A. -
HAMESA (1982), tendo seu âmbito de ação expandido para todo o Estado.
A partir do lançamento pelo Governo Federal, através da Secretaria de
Política Urbana/Caixa Econômica Federal (SEPURB/CEF), do programa Pró-
Moradia, em 1995, e do programa Habitar – Brasil, em 1996, a URBIS, que se
credenciava como promotora dessas linhas de atuação, volta a trabalhar na
questão habitacional, em 1997, não mais na perspectiva de construir conjuntos
habitacionais, mas de operar na urbanização de áreas carentes de infra-
estrutura, serviços e equipamentos, iniciando os estudos para a implantação do
projeto Viver Melhor
171
, designação adotada pelo governo estadual para esse
novo tipo de intervenção na questão habitacional. A URBIS durou de 1965 até
1998, quando foi promulgada a sua liquidação.
Outros órgãos, com a finalidade de facilitar o acesso à moradia, também
atuaram no setor, como o Instituto de Orientação às Cooperativas Habitacionais,
INOCOOP – instituição privada de interesse público, fundado em 1969, tendo
170
Cf. (SOARES, Antonio; ESPINHEIRA, Gey, 2004) Alagados se constituiu com um aglomerado de
palafitas, nos anos 40 do século XX, chegou a possuir próximo de cem mil habitantes nos anos 70,
mesmo com intervenções urbanas no local, a precarização habitacional continua na mesma versão de
palafitas sobre o mangue, conhecida como Novos Alagados.
171
Um dos três conjuntos habitacionais, pesquisados neste estudo, faz parte deste programa de atuação,
conforme veremos no 3º próximo capitulo deste estudo.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
114
sua produção desativada em 1994, atuando durante 25 anos. Tivemos também
a atuação do Instituto de Aposentadoria e Pensões do Estado da Bahia -
IAPSEB (1967 - 1969) tendo curta atuação na área habitacional, trabalhando
exclusivamente, na construção de apartamentos destinados a funcionários
públicos.
Em 1998, incorporando as atividades da URBIS, foi criada a Companhia
de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia – CONDER, inicialmente
vinculada à Secretaria de Planejamento Ciência e Tecnologia SEPLANTEC,
posterior SEDUR, órgão estadual executor de intervenções urbanas. No quadro
de agentes e órgãos institucionais a atuação da PMS – Prefeitura Municipal de
Salvador, nos últimos anos, foi direcionada à produção e urbanização de lotes,
com relativa intervenção na área da ação social: legalizando posse de terra e
informando a população quanto aos programas de financiamento. Em 2001,
também a PMS criou a Secretaria de Habitação (SEHAB)
172
, com objetivo de
trabalhar na constituição de um plano de habitação para Salvador, identificando
três linhas de atuação: regularização fundiária; construção e ofertas de novas
habitações; e na urbanização de áreas sub-normais. Somando-se a estes
órgãos, recentemente, tivemos a criação, através da lei 7.988, de 21.12.2001, da
Secretaria de Combate à Pobreza e a Desigualdades Sociais (SECOMP),
integrando-se como mais uma instituição na luta contra o problema da
precariedade habitacional em Salvador.
V – A Ineficácia dos Programas de Produção de Moradia em Salvador.
172
Informações no histórico do site da Secretária de Habitação de Salvador
(www.sehab.salvador.br.gov.br
). Acessado em 20.01.2007.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
115
Salvador se apresenta no cenário nacional como a maior capital do país
fora do eixo Rio - São Paulo; tem uma população estimada de 2.672.360 hab.,
seguida por um déficit habitacional de 144. 767 e com 67.443 moradias em
áreas de favela (IBGE, 2005). A falta de efetividade de programas habitacionais
destinados às camadas de renda familiar entre (1 a 5 SM), comprometeram e
continuam a comprometer o setor habitacional brasileiro. Em Salvador, estima-
se que 96,7% do déficit
173
habitacional acumulado está concentrado na
população de renda de até cinco salários mínimos
174
, situação que se agrava
quando percebemos os elevados índices de desemprego da população pobre de
Salvador
175
que, desprovida de condição financeira para ter o acesso à moradia,
é obrigada a optar pela auto-construção, geralmente construindo em
loteamentos clandestinos ou irregulares, em áreas sujeitas a fortes restrições
quanto ao uso e à ocupação do solo, portanto, ilegais, do ponto de vista jurídico.
Conforme Villagra e Oliveira (2006) qualquer programa que venha a ser
desenvolvido em Salvador, que não considere a grande demanda das famílias
que ganham até 1 SM e as sem rendimento, estará ignorando 51,3% do déficit
habitacional. Se for incorporada à demanda dos que ganham até 2 SM, o
estrato atingirá 73,4% do total e, até três, atinge-se o percentual de 88,6%.
Deste modo, os programas devem ser pensados focalizando uma população
empobrecida e com grande número de desempregados, com chefes de famílias
que não desempenham atividades remuneradas
176
e, em alguns casos
173
Cf. (GORDILHO, A., 2000, p. 43) A urbanização acelerada, verificada nas primeiras décadas deste
século XX, logo suscitou a discussão do déficit habitacional, entendido como defasagem entre
crescimento populacional e oferta de moradias.
174
Cf. Informações disponibilizadas pelo IMICNEGÓCIOS. Governo da Bahia tenta combater o
desemprego.2003. Disponível em: < http://www2.conteudoeconomico.com.br>.(acesso em 23/01/07)
175
Cf. 1
o
. Cap. deste estudo.
176
Cf. Dados da Pesquisa realizada para este estudo, disponibilizadas no 3
o
.cap. demostraram que o
índice de chefes de família que estão sem atividades remuneradas nos Conjuntos Habitacionais Vila
Viver Melhor, Loteamento Vale das Dunas e Jardim Nova Primavera é o mesmo nos três conjuntos, sendo
de [35%] para todos, seguida pela prática de biscatagem (serviços temporários sem registro, dentre estes
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
116
sobrevivem precariamente através dos programas de Bolsa Família do Governo
Federal, que não alteram substancialmente as condições de vida destas
pessoas.
A falta de um amplo redimensionamento do limite de renda para que as
camadas populares (1 - 5 SM) tivessem acesso à moradia é histórico e continua
a pressionar o atual contexto da “política” habitacional brasileira, constituindo-se
como um dos entraves de difícil solução para equacionar o nosso déficit
habitacional. Desde o período da produção dos IAPS, passando pelo BNH/SFH,
a prioridade dos programas realizados foi para funcionários públicos e para
famílias com rendas acima de 12SM
177
.
Durante o período de vigência do BNH (1964/86), a produção
correspondeu a um total de 4,5 milhões de unidades, o que
representa em torno de 25% do parque imobiliário brasileiro
produzido para o período. Desse total, somente 1,5 milhão de
unidade (33,3%) destinaram-se às camadas populares da
população, tendo sido produzidas apenas 250 mil unidades em
programas alternativos, ou seja para renda de (1-3 SM).
(AZEVEDO & ANDRADE, 1982, p. 74).
A partir de 1995/1996, o Governo Federal, através da CEF – Caixa
Econômica Federal, voltou a atuar no mercado habitacional financiando
diversos programas, entre estes o Habitar-Brasil e o Pró-Moradia, destinados à
população de baixa renda, a Carta de Crédito Associativo/FGTS e o PAR –
Programa de Arrendamento de Residências, para os estratos médio e médio-
baixo, e o programa de demanda caracterizada da CEF (PRODECAR), que atua
se destacam serviços na construção civil – marceneiro, pedreiro, eletricista, pintor, encanador etc.), que
possui a oscilação média em torno de [25% 35%].
177
Cf. (GORDILHO, A., 2000, p. 45) Os interesses da indústria de construção e do setor financeiro
desempenharam papel fundamental na formação da política habitacional. A produção para as classes de
renda mais alta foi intermediada pelos bancos privados, que financiavam diretamente as empresas
incorporadas e, finda a construção, repassavam os financiamentos de longo prazo para os mutuários
finais. Em relação às famílias de renda mais baixa, o sistema funcionava através de empresas públicas,
as COHABs locais, responsáveis, basicamente, pela produção de habitações para as faixas entre 3 SM
até 5 SM, e os INOCOOPs, para as faixas de até (12 salário mínimo), nestes casos, construindo-se
através de empreiteiras.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
117
nas faixas superiores de renda. A CEF concentrou-se no financiamento direto
ao comprador, através de diversas linhas de crédito imobiliário, eliminando
assim os intermediários que encareciam o custo final dos empreendimentos,
mas, por sua vez, também não conseguiu atuar junto às famílias com renda
entre 0 e 5 salários mínimos, a não ser através do programa Viver Melhor
178
.
Em Salvador, e em todo o Estado da Bahia, diversos programas
institucionais, foram criados com a finalidade de atender às demandas
habitacionais das famílias com faixa de renda variável entre 0 e 5 SM. Entre os
principais programas para atendimento das necessidades habitacionais da
população de baixa renda no Estado da Bahia, se destacam: o Morar Melhor,
destinado a um público de ( 0 – 5 SM) e que tem como fonte de recursos o
Orçamento Geral da União; Pró-Moradia
179
, destinado a um público de ( 0 – 5
SM), tem como fonte de recurso o FGTS; Habitar Brasil/BID, destinado a um
público de ( 0 – 5 SM); tem fonte de recurso compartilhada: Governo Federal
(40%) e Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID (60%); PRO-INFRA,
programa de infra-estrutura, destinado a um público de ( 0 – 5 SM), tem como
fonte de recurso o Orçamento da União; PAR – Programa de Arrendamento
Residencial, destinado a um público de ( 0 – 5 SM), tem como fonte de recursos
os fundos orçamentários do próprio PAR; PHSP – Programa Habitacional para
o Servidor Público, tendo como fonte de recursos os fundos orçamentários do
próprio PHSP; PRCH –Programa de Restauração do Centro Histórico, tendo
178
Programa habitacional gerenciada pela CONDER, subsidiado por recursos do Estado da Bahia em
associação com instituições financeiras internacionais – BID e BIRD.
179
O programa Pró Moradia no Estado da Bahia é implementado por meio da concessão de
financiamentos com recursos do FGTS. A responsabilidade da execução dos empreendimentos é da
Companhia de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia - CONDER. O programa atende às
comunidades com obras e serviços nas áreas de habitação, urbanização, infra-estrutura de equipamentos
comunitários. No momento, o Pró-Moradia está promovendo obras em Salvador (Saboeiro, Roberto
Santos III, Vila Nova de Pituaçú, Vila Valéria, Bate Faixo e Vida Nova-Caji), Itamaraju, Gandú, Porto
Seguro, Cabrália (Coroa Vermelha e margem do rio Iaiá), Santo Estevão, Feira de Santana, Amélia
Rodrigues, Barreiras, Santa Maria da Vitória e Barreiras.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
118
fonte de recurso compartilhada: Governo Federal e Estadual, o Banco
Interamericano de Desenvolvimento – BID
180
, e o PAR, PAC – Programa
Aprendendo a Construir, tendo como fonte de recurso financiadora o Governo do
Estado; PSM – Programa de Subsídio à Habitação, tendo como fonte de recurso
o Governo do Estado.
Muitos programas habitacionais foram criados no Estado, contudo, seus
alcances ainda foram tímidos para conter o grande déficit habitacional,
sobretudo de Salvador, que apresenta um dos maiores déficits quantitativo
(número de moradias) e qualitativo (infra-estrutura e serviços) do país. Para
Angela Gordilho (2000, p. 94), então Secretária de Habitação de Salvador, o
nosso problema não é quantitativo mas qualitativo – a questão não é mais em
“substituir” as unidades habitacionais e sim “melhorar” e “incluí-las” no tecido
urbano. Contudo, se compararmos a evolução do déficit habitacional em
Salvador nos últimos dez anos, contrariaremos parcialmente a afirmação de
Gordilho (2000, p.94), pois constataremos que a dimensão quantitativa do
problema ainda é expressiva: com base nos dados do IBGE (1995) os números
para o déficit quantitativo (novas moradias) era de 108.165, e segundo o mesmo
Instituto de Pesquisa em (2005) nosso déficit habitacional aumentou para 144.
767, evidenciando um acréscimo na ordem de mais de 30 mil unidades
habitacionais.
O comprometimento social e técnico dos atuais projetos de habitação são
marcados pela lentidão e a falta de estratégias do poder público para promover:
180
Desde os anos 90 do século XX, percebemos a presença de instituições internacionais através de
bancos subsidiadores – BIRD e BID, intervindo em projetos habitacionais, como agentes financiadores de
programas para moradia , fazendo valer a vontade de suas diretrizes na execução do projeto. Os
parceiros nacionais , receiosos em perder o financiamento realizam o jogo destas instituições ,
dissimulando gestões democráticas e participações populares na perspectiva de satisfazer as regras do
financiador internacional.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
119
a indução da ocupação em áreas mais favoráveis, através da legislação e de
investimentos na infra-estrutura; a oferta habitacional subsidiada para famílias
de renda (1 –3 SM) ; a repressão à ocupação de áreas de risco; a recuperação,
para uso habitacional, de prédios antigos em condições precárias. Mesmo com
as declarações de intenções e das diversas tentativas de baratear os custos da
moradia, o sistema de habitação, praticamente não conseguiu atender ao
público alvo, nem no caso da URBIS, cujos custos finais não permitiram preço
de venda ao mutuário com renda entre 5 e 7 SM, e muito menos no INOCOOP,
que terminou produzindo imóveis com preços finais somente para famílias dos
estratos médios com renda superior a 10 SM
181
.
A ineficácia dos programas destinados às camadas de renda baixa fez
aumentar o déficit de moradia em Salvador e induziu o surgimento de novos
atores sociais, que se expressam na articulação de movimentos, como o MSTS
– Movimento dos Sem Teto de Salvador, que surgiu em 2003, possuindo como
bandeira reivindicativa a luta pela moradia digna, cujos integrantes são
biscateiros, desempregados, sub-empregados, mães solteiras, retirantes, enfim,
indivíduos com renda média de um salário mínimo ou sem renda
182
.
O MSTS – Movimento dos Sem Teto de Salvador – surgiu justamente dessa
necessidade: moradia como direito social. Com grande capacidade de
mobilização, o MSTS tem se destacado no cenário social e político da capital
baiana por colocar em pauta a questão da moradia como problema crucial da
sociedade, como questão perene, e não apenas como mote para discurso de
autoridades governamentais ou candidatos. Com 300 famílias em junho de
181
Ver: VILLAGRA, R. M. T. A; OLIVEIRA, A. M. da S.. Elementos limitantes da oferta de habitação de
interesse social na cidade do Salvador-Ba. Revista Sitientibus, Feira de Santana, n.35, p.29-56, jul./dez.
2006
182
Cf. Os Estudos da Pesquisa de Mestrado (2005) de Luiz C. dos Santos. In: Vizinhos do Incoformismo
– o movimento dos sem-tetos de Salvador. Junto ao Programa de Pós-Graduação em Ciência Sociais na
Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas/UFBA.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
120
2003, quando começou, o movimento conta hoje com mais de 20 mil famílias
cadastradas, ocupando dezenas de prédios públicos e privados espalhados pela
cidade. (Fonte: Jornal A Tarde (20/08/2003), Salvador-Ba.)
As contradições urbanas de Salvador, se explicitando através de um
acúmulo de precariedades, potencializam o conflito entre classes e se
expressam através da constituição de movimentos como o MSTS, que tem como
objetivo principal a luta pela moradia. O aumento progressivo de pessoas que
participam do movimento é reflexo da falta de possibilidades de acesso à casa
própria (em 2003 o movimento possuía 300 famílias, atualmente possuí 20 mil).
Tal situação se agrava com as inúmeras mudanças no sistema de financiamento
da habitação – no jogo de criação e extinção de programas de moradias e
freqüentes oscilações quanto às participações das diferentes esferas de
governo – assim como a insatisfação histórica dos mutuários com as unidades
habitacionais, seguida pela transitoriedade da população nos conjuntos pela
falta de condições econômicas de manterem a moradia, optando a subordinar o
valor de uso pelo de troca
183
. Situação que continua a existir nos novos
conjuntos habitacionais, demonstrando o grau de incapacidade das tentativas do
Poder Público no sentido de prover habitação compatível com o nível de renda
(0 - 3 salário mínimo) da população.
183
Ver 3
o.
Cap. deste estudo, onde demonstramos dados de pesquisa que constatam a ambivalência do
valor de uso e troca, em três conjuntos habitacionais em Salvador.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
121
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
122
TRÊS CONJUNTOS, TRÊS SITUAÇÕES DE UM MESMO PROCESSO –
VIVER MELHOR, VALE DAS DUNAS E NOVA PRIMAVERA.
I- Conformação do tecido urbano de Salvador: áreas de contexto e
habitação popular.
O tecido urbano de Salvador não se desenvolveu de forma espontânea,
ou à deriva dos interesses ideológicos e econômicos de grupos dominantes,
contudo, dizer que a cidade não cresceu espontaneamente, não é concordar
que ela evoluiu de forma planejada. A partir da década de 1940, o crescimento
urbano de Salvador começou a ser induzido por um profícuo desenvolvimento
na indústria (petrolífera e siderúrgica), que fez surgir uma dinâmica de
crescimento urbano atrelada a déficits habitacionais e a um rápido processo de
expansão e adensamento de áreas favelizadas
184
que se iniciaram por volta de
1945. Estas áreas adensaram-se como parte integrante do fenômeno urbano
soteropolitano.
A partir da década de 40, como indica a primeira parte deste estudo,
iniciaram-se as concepções modernas de planejamento, inicialmente com o
EPUCS e depois com o Plano Cia e com o Plandur; a partir do plano para a
cidade, observa-se o direcionamento do crescimento urbano da capital baiana.
Salvador se adensava e os planos em suas tentativas de execução não se
propuseram a disciplinar a expansão da cidade. Em concomitância a este
crescimento urbano surgia uma grande necessidade de moradia para a camada
popular. Como alternativa para amenizá-las nasceram os conjuntos
habitacionais e os primeiros são das décadas de 60 e 70 do século XX.
184
A Invasão do Corta-Braço, mais tarde batizada como bairro de Pero Vaz, foi a primeira a ganhar vulto
em Salvador, o que aconteceu em 1946. Com a chegada contínua dos moradores das áreas rurais,
novas ocupações não tardaram a surgir. A segunda ganhou o manguezal à margem da Península de
Itapagipe e com suas palafitas foi batizada de Alagados. Tantas outras se instalaram nos anos
seguintes, algumas foram debeladas ainda nos instantes iniciais, outras firmaram resistência e acabaram
por se transformar em bairros.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
123
Ressalta-se que a história dos conjuntos habitacionais em Salvador é
contemporânea à história dos conjuntos habitacionais no Brasil, com
aproximadamente 60 anos de existência.
Com a criação do BNH – Banco Nacional de Habitação, e do SERFHAU –
Serviço Federal de Habitação e Urbanismo, em 1966, há uma clara formalização
da necessidade de institucionalização do planejamento, e dentro deste, do
problema da habitação. Neste período, as intervenções governamentais
atingiram um relativo nível de coordenação e sistematização, principalmente no
que se refere à habitação de interesse social. No processo de institucionalização
do planejamento urbano, promovido pelo SERFHAU, a questão habitacional se
consolidava como a principal necessidade da população pobre; e Salvador
enfrentava uma série de dificuldades na articulação de mercado e políticas
públicas destinada à habitação popular.
[...] Na consolidação do mercado imobiliário dos anos 60 até os
anos 80, destaca-se, sobretudo, a produção habitacional através
dos financiamentos promovidos pelo BNH/SFH (Lei n
o
.4.380),
visando promover a construção e a aquisição da casa própria,
especialmente para as classes de menor renda, que foram
responsáveis por uma ampla produção do parque imobiliário e
da infra estrutura urbana; apenas pela URBIS, na RMS – Região
Metropolitana de Salvador, foram produzidos em torno de 45 mil
unidades habitacionais, até meados dos anos oitenta”.
(GORDILHO, 2002, p. 170).
Para Maria Brandão (1997), “a habitação popular sempre foi vista como
uma parte isolada dos demais segmentos da oferta habitacional. Desta forma,
nenhuma política
185
destinada a grupos de baixa renda conseguiu ‘segurar’ seus
185
Conforme Ângela Gordilho (2000) ainda que significativas às políticas públicas de produção
habitacional não foram efetivas para suprir os elevados índices de demanda social.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
124
benefícios”. Mesmo com a manifesta falta de articulação de interesses e até
mesmo de políticas sérias que resolvessem a questão habitacional em Salvador,
a construção de conjuntos habitacionais, a partir dos anos 50/60 do século XX,
ganhou visibilidade, assim como espaços específicos no tecido urbano. A área
de predominância para a formação destes conjuntos foi, desde então, a área do
miolo urbano de Salvador. Contudo, outras áreas em escala menor também
foram utilizadas.
Tabela 4 – Formas de ocupação na configuração urbana
Município de Salvador - FORMAS DE OCUPAÇÃO NA CONFIGURAÇÃO URBANA
Classificação*
Áreas
(Km2) Áreas (ha) % Município % Habitação
Ocupação antiga (até a década de 1920) 9,61 961 3,43 8,45
Vilas habitacionais 0,36 36 0,13 0,32
Loteamentos privados 47,52 4.752 16,96 41,8
Ocupação coletiva por invasão 16,33 1.633 5,83 14,36
Conjuntos habitacionais 12,37 1,237 4,42 10,88
Loteamentos públicos 2,87 287 1,02 2,52
Outros tipos de parcelamento informal 20,51 2,051 7,32 18,04
Insuficiência de dados 4,13 413 1,47 3,63
Área ocupada c/ predominância de habitação 113,7 11,37 40,58 100
Grandes equipamentos 20,25 2,025 7,53 ,,,,
Área total ocupada 133,95 13,395 47,81 ,,,,
Áreas verdes e/ ou livre, elementos hídricos e vias 146,19 14,619 52,19 ,,,,
Área continental do município 280,14 28,014 100 ,,,,
Área insular do município 32,86 3,286 ,,,, ,,,,
Área total do município** 313 31,3 ,,,, ,,,,
Fonte: Gordilho-Souza, Angela. Limites do Habitar. Tese de Doutourado, FAUSP, 1999.
*Classificação estabelecida conforme metodologia de pesquisa, tendo como base o mapeamento Formas de Habitar.
Ocupação Habitacional na Cidade do Salvador, 1940/1991, FAUFBA/CNPq, 1991/97
** Dado oficial do IBGE- Censo, 1991, Bahia, Governo do Estado, SEI/CONDER, 1994b, p. 185
Conforme tabela de formas de ocupação na configuração urbana de
Salvador, os conjuntos habitacionais correspondem a 10,88% das formas de
habitação, ocupando uma área no tecido urbano de 12 km
2
. Tendo Salvador
uma população de aproximadamente 2,6 milhões de habitantes (Censo 2000),
em que a maioria enfrenta a má distribuição de renda
186
, o conjunto habitacional
186
Cf. (GORDILHO-SOUZA, 2000) [...] Salvador tem uma distribuição de renda que reflete um grave
quadro de pobreza. Segundo o IBGE, em 1990, 40,1% da população da RMS não tinha rendimento ou
vivia de benefícios. Quase a terça parte dos habitantes ganhava até 2 salários mínimos. Ao se agregar a
estes a faixa dos que ganhavam de 2 a 5 salários mínimos, e considerando parte da população sem
rendimento (segundo os percentuais relativos das duas faixas de renda acima), o índice de pobreza
aproximava-se de 75%. Além disso, cerca de 52% dos trabalhadores encontram-se no mercado informal
de trabalho.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
125
passaria a ser entendido como uma alternativa de inserção social, mas esta
inserção mostrou-se incompleta, como se verá adiante.
Na conformação do espaço urbano de Salvador, a questão da moradia
popular esteve presente como um problema que visava encontrar sua “solução”
a partir do direcionamento de contingentes populacionais para áreas periféricas
e suburbanas: miolo urbano e subúrbio ferroviário de Salvador. A “solução” que
não foi solução, fez expandir uma ocupação marcada por um “padrão periférico
de urbanização”. Segundo Carvalho & Pinho (1996) o “padrão periférico”
seguindo a lógica do capital, atrelou-se aos interesses imobiliários e provocou a
expansão do tecido urbano com a promoção de valorizações de terras
intersticiais – situadas entre a malha urbana contínua e esses novos
assentamentos. Este tipo de periferização padronizada, obediente a uma lógica
que associa interesses privados e públicos, sempre privilegiando o primeiro em
detrimento do segundo, não é uma peculiaridade de Salvador e se faz presente
em outras cidades brasileiras como Rio de Janeiro
187
e São Paulo
188
.
Como exemplo desta lógica do padrão periférico em Salvador, pode-se
tomar como referência o jogo de especulação
189
imobiliária que aconteceu na
área do miolo urbano de Salvador, a partir da abertura da Avenida Paralela
(anos de 1970), em um esquema de valorização via “terrenos de engorda” de
imensas áreas privadas – onde hoje se instalam condomínios de alto padrão
como o Alphaville. Neste quadro empurrou-se a população de baixa renda para
187
Cf. RIBEIRO, Luiz Cezar de Queiroz. Dos cortiços aos condomínios fechados: as formas de produção da
moradia no Rio de Janeiro: Civilização Brasileira: IPPUR-UFRJ: Fase, 1997.
188
Cf. MARICATTO, Ermínia. Metrópole na periferia do capitalismo. São Paulo, Hucitec, 1996.
189
SHCHEINOWITZ, A. S. O macroplanejamento da aglomeração de Salvador. Salvador: Secretaria da Cultura e
Turismo/EGBA, 1998.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
126
áreas longínquas e periféricas como é o caso do complexo habitacional de
Cajazeiras
190
.
Compreendendo as duas lógicas dentro de um esquema maior da
expansão capitalista e da necessidade de moradia, Carvalho & Pinho (1996)
afirmam que o Estado
191
reforçou o “padrão periférico” e a segregação social no
espaço de Salvador; a lógica do capital determinou que a provisão da
necessidade de moradia popular em Salvador se daria através do
desenvolvimento de grandes periferias. Assim uma perversa equação se
consolidou: cidade informal, ilegal, feia, triste e estigmatizada, território de
pobres para pobres & cidade formal, legal, bonita, feliz, território abastado para
os ricos, fazendo da relação “aos pobres a pobreza e aos ricos a riqueza”, uma
forma dominante e determinada de conformação urbana, em um jogo que o
Estado minimiza sua intervenção – serviços públicos e infra-estrutura – nas
áreas urbanas pobres e maximiza nas áreas ricas.
O “padrão periférico” de urbanização impulsionou a constituição de
territórios da pobreza em Salvador, tanto na área periférica do miolo urbano
como na do subúrbio ferroviário. São constituições oriundas das lógicas
instauradas por este tipo de urbanização que, em sua execução, não indicaram
apenas a localização geográfica destas áreas, mas também as formas de
apropriação e de estruturação destes espaços. Este “padrão periférico” exerceu
influência na paisagem urbana, nos espaços intra-urbanos e na constituição
continua da cidade e de seu tecido urbano
192
, fazendo crescer as “ilhas de
190
Ver CAJAZEIRAS – O crescimento desordenado de um bairro desordenado.
(http://www.cajazeira.hpg.ig.com.br
). Os bairros que integram diretamente à área de influência do território
de Cajazeiras, são: Águas Claras, Castelo Branco, Pau da Lima e Fazenda Grande de Cajazeiras.
191
Cf. Veremos no IV capitulo deste estudo.
192
Cf. (LEFEBVRE, Henri. 1991. 34) em seu conceito de tecido urbano: “[...] é uma espécie de redes de
malhas desiguais, um ecossistema não equilibrado, dentro dele existem ilhas de miséria e opressão [...]
assim a cidade e o urbano não podem ser compreendido sem as instituições oriundas das relações de
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
127
miséria e opressão”. Desta forma, a periferização em Salvador se constituiu no
processo de estruturação territorial, sendo socialmente produzida e ao mesmo
tempo reagindo sobre o social. Para Flávio Villaça (1998) “a estruturação do
espaço intra-urbano é feita pelo jogo da especulação imobiliária e da classe
dominante”, afirmação que converge com as formulações do “padrão periférico”
no seu jogo institucionalizado de territorialização da pobreza e riqueza.
Neste esquema se mostra oportuno repetirmos o mapa de contexto
(Figura 08), com alterações que permitirão visualizar áreas que compõem zonas
específicas
193
no tecido urbano de Salvador, fazendo contraponto com mapas
temáticos de outros autores
194
: renda, bens e serviços, infra-estrutura e
tipologias espaciais.
classes e de propriedade”.
193
Área do Centro (25km
2
), composta por bairros bem atendidos em serviços e equipamentos; Áreas do
Subúrbio Ferroviário (41,5km
2
) e do Miolo Urbano (115km
2
),
194
Elaborados por (CARVALHO, Ináia; PEREIRA, Gilberto, 2006), produzidos em pesquisa desenvolvida
no CRH/UFBA, integrada ao Projeto Observatório das Metrópoles, Desigualdades Socioespaciais e
Governança Urbana. Estes mapas foram cordialmente cedidos como referências nesta dissertação.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
128
Miolo Urbano
Subúrbio
Figura 8 – Mapa de contexto de Salvador
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
129
Figura 9 – Mapa de Tipologias Socioespaciais de Salvador
Fonte – CARVALHO, Ináia; PEREIRA, Gilberto, 2006.
130
Figura 10 – Mapa de famílias com renda per capita até meio salário mínimo -
Fonte – CARVALHO, Ináia; PEREIRA, Gilberto, 2006.
131
Fonte – CARVALHO, Ináia; PEREIRA, Gilberto, 2006.
Figura 11 – Mapas de Infra estrutura
132
O mapa de Tipologias Socioespaciais (figura 9), demonstra que a
categoria da população de menor poder aquisitivo, ou popular inferior, habita
com predominância absoluta a área do subúrbio ferroviário e a do miolo urbano
de Salvador, mesmo estando pulverizada, em menor escala, em outras partes
do tecido urbano. É também nestas áreas que observamos a maior
concentração de desempregados.
Tabela 5 – Taxas de Desemprego 2003-2004
Os grifos em verde correspondem a bairros do miolo urbano e os grifos
em amarelo ao subúrbio ferroviário de Salvador. Este percentual de
desempregados pode ser analisado de modo melhor contextualizado, quando o
correlacionamos com as informações da Pesquisa de Emprego e Desemprego
(PED) – a taxa de desemprego aberto em Salvador saltou de 8,9%, nos anos de
1987 – 88, para 12,6%, em 1997 – 88, e 15,2%, em 2003 –4. No quesito de
133
desemprego aberto, (que inclui os que não procuram emprego em razão do
“desalento”, tais porcentagens foram, respectivamente, 15,7%, 21,8% e 26,0%).
Isso significa que, no início do século XXI, após décadas de “industrialização”,
um em cada quatro soteropolitanos estava sem ocupação (ver ALMEIDA;
DAMASCENO, 2005a). As expressivas taxas de desemprego de Salvador,
fizeram dela na virada do século a metrópole brasileira recordista em
desemprego, não apenas segundo a PED, mas também de acordo com a
Pesquisa Mensal de Emprego – PME, do IBGE.
O mapa de renda
195
familiar (figura 10) demonstra que o maior percentual
de famílias que ganham até meio salário mínimo se localiza na área do Subúrbio
Ferroviário de Salvador e na área norte do miolo urbano. O contraste com a área
da orla atlântica e com a área do centro é brutal e serve como legitimador da
territorialização feita no primeiro capitulo deste estudo, no qual indicamos os
territórios de riqueza e pobreza. Segundo dados de pesquisas realizadas no
CRH/UFBA, considerando-se a freqüência de moradores com uma renda
mensal familiar per capita, de até meio ou de até um quarto do salário mínimo,
constata-se que o percentual de moradores pobres em Salvador, em 1991, foi
de 35,2% em 2000, 30,7%, havendo um decréscimo de 5% entre as duas
décadas.
O mapa de renda (figura 9) relacionado com os mapas (figura 10) de infra
– estrutura urbana, demonstra como os índices de baixa renda – pobreza – se
associam à falta de infra-estrutura (saneamento, água, lixo, telefone).
Conjugando os mapas (figura 10) percebemos como a falta de saneamento no
195
Para efeito de possíveis comparações conforme os dados do Censo 2000, a proporção de habitantes com
uma renda domiciliar per capita abaixo de meio salário mínimo chegava a 34,61% na RMS. Em 2001, 9,2%
da sua população ocupada tinha um rendimento médio mensal em todos os trabalhos de até meio salário
mínimo; 22, 4% de mais de meio a um salário; 28,1% de mais de um a dois salários (perfazendo 60% até
este valor), 12,00% de mais de dois a três salários, 10,0% de mais de três a cinco e apenas 12,0% de
mais de cinco salários mínimos conforme informações da PNAD 2001.
134
subúrbio ferroviário é grave, onde predomina o intervalo de [75% - 85%] de falta;
e/ou percebemos como o lixo tem um fim inadequado na área do miolo urbano
de Salvador, área onde os índices de acesso ao telefone são baixos,
comparados a outras áreas da cidade. Para Pereira e Souza (2006, p.147) “ o
acesso dos domicílios à linha telefônica reflete a distribuição espacial de renda
domiciliar, com altos índices nas áreas da orla e do centro tradicional, sendo
cada vez mais baixo ao norte de Salvador, no Subúrbio e no Miolo”.
As áreas onde temos a menor renda, a maior pobreza e a menor infra-
estrutura urbana, são também as mesmas onde prevalecem os maiores déficits
sociais, entre estes os de moradia. Conforme Gordilho (2000), o conceito de
déficit poderia se referir à falta da unidade habitacional, assim como às suas
condições de habitabilidade, infra-estrutura e inserção no contexto urbano.
Neste sentido, a autora evidencia que o grande problema na realidade
habitacional soteropolitana não é mais o déficit habitacional em relação à
demanda de novas unidades, mas a conservação e infra-estruturação dos
espaços onde estas unidades são construídas. Em relação às habitações sociais
em forma de grandes conjuntos habitacionais com tendência homogeneizante
destinados às classes mais pobres, Gordilho (2000) afirma que não alteravam as
condições de pobreza. Sendo que na dimensão da moradia popular, o problema
que cresce com a cidade, não é mais “substituir” e sim “melhorar” e “incluir” as
áreas ocupadas em contextos de boa habitabilidade
196
.
A conjugação e leitura destes mapas com o co-relação de índices e dados
secundários confirmaram a concentração e o desenho dos territórios pobres e
ricos de Salvador, assim como evidenciaram as contradições entre as áreas do
196
A afirmação de Ângela Gordilho, desperta polêmica, pois se percebe pelos próprios dados da Fundação
João Pinheiro, que no Brasil, e em especial Salvador, há um grande déficit tanto em número (dimensão
quantitativa) como em condições de habitabilidade (qualidade) de unidade habitacionais. Deste modo, é
importante refletir sobre tal questão.
135
centro e da orla atlântica em relação às áreas do subúrbio e do miolo urbano.
Dentro dos contextos apresentados, focalizaremos os diálogos entre este quadro
de deficiências e de rupturas no contexto urbano, com a produção de habitação
popular em Salvador, buscando compreender como os conjuntos habitacionais
construídos no período pós-BNH se inserem no tecido urbano de Salvador. Para
isso buscaremos analisar três conjuntos: (I) Nova Primavera; (II) Loteamento
Vale das Dunas; (III) Vila Viver Melhor; os três espaços intra-urbanos, se
localizam em contextos já apresentados neste estudo: o primeiro na área
suburbana; o segundo na área do miolo urbano; e o terceiro nas proximidades
da área central da cidade. Os dois primeiros se localizam em áreas geográficas
diferentes, contudo periféricas, o terceiro conjunto se localiza em uma área de
relativa centralidade (ver figura 7 – mapa de contexto).
II - Os Conjuntos habitacionais e sua localizacão no tecido urbano de
Salvador
Uma das formas de compreensão dos efeitos dos últimos programas
habitacionais realizados em Salvador se mostra possível através de uma análise
do modo como os conjuntos habitacionais estão inseridos no tecido urbano.
Para isto focalizaremos a realidade de três conjuntos de habitação popular que
se localizam em áreas distintas da cidade: (I) Jardim Nova Primavera [subúrbio];
(II) Loteamento Vale das Dunas [miolo urbano]; (III) Vila Viver Melhor [centro].
136
Figura 12 – Mapas de localização Conjuntos Habitacionais
Fonte - Site da PMS Adaptações – SOARES, Antonio M. 2006 (autor do trabalho)
Os conjuntos habitacionais destacados neste estudo possuem relações com
a cidade e com suas dinâmicas, que sinalizam as formas pelas quais estes
conjuntos se inserem no tecido urbano. Deste modo, delinearemos algumas
especificidades: infra-estrutura, história, localização, acessibilidade, serviços,
sociabilidade, população, renda, que nos permitirão compreender como o conjunto
habitacional e sua população interagem com a cidade.
(1)- O Conjunto Vila Viver Melhor: Inaugurado pelo Governo do Estado
da Bahia entre 1997/1998, integrado ao Programa Viver Melhor, inseriu-se na
Modalidade Pró-Moradia 1 – Urbanização de áreas. Como projeto piloto, este
conjunto habitacional foi construído sob a responsabilidade da CONDER, órgão
estatal que incorporou a antiga Urbis – Habitação e Urbanização da Bahia. A Vila
Viver Melhor constitui um aglomerado de 370 unidades habitacionais, cada
unidade com 42m
2
. Com aproximadamente 400 famílias. A população total é
137
estimada em 2.000 habitantes que se distribuem em uma área construída de
aproximadamente 15.540 m
2
. Localiza-se na Área Central da cidade de Salvador,
(Figura 7 e 11), nas margens da Av. Ogunjá, importante via que articula duas
grandes Avenidas de Salvador – Av. Vasco da Gama e Av. Bonocó.
A área onde se localiza o Conjunto Vila Viver Melhor foi ocupada há
aproximadamente 20 anos por moradores vindos de outras partes da cidade e do
interior do Estado da Bahia, que constituíram naquele espaço a invasão de
Yolanda Pires. A ocupação recebeu este nome devido ao fato desta Sra., então
primeira dama do Estado, possuir um expressivo trabalho de assistencialismo em
bairros e áreas empobrecidas de Salvador. Desta forma, algumas invasões
surgidas neste período receberam inicialmente este nome. Sendo uma área de
relevo acidentado marcado por depressões, os moradores construíram seus
barracos nas encostas, sem nenhuma norma de segurança. Conforme moradores
na década de 80, a área chegou a possuir cerca de dois mil barracos. A
instabilidade do terreno levava a freqüentes desmoronamentos com vítimas fatais,
o que levou a empresa responsável pelo projeto a conciliar uma intervenção que
contemplasse tanto um programa de habitação popular como também um projeto
de contenção de encostas. No período de construção do conjunto, os moradores
foram alocados em galpões construídos em terrenos baldios nas proximidades.
Nos galpões, a população passou quase 24 meses, em situação precária de
moradia.
Neste contexto, a população da invasão de Yolanda Pires foi contemplada
com o Projeto, que substituiu os barracos e as moradias precárias por novas
unidades habitacionais, dando prioridade à fixação do morador na respectiva área.
138
Foto 01 – Conjunto Vila Viver Melhora - 2006
139
Figura 12 – Mapa: Conjunto Vila Viver Melhor em recorte de contexto urbano
140
(2) O Conjunto Loteamento Vale das Dunas: Inaugurado pelo Governo
do Estado da Bahia entre 2000/2001, constitui um aglomerado de 112 unidades
habitacionais, cada uma com 32m
2
reversíveis em dois pavimentos. Com cerca
de 224 famílias, a população é estimada em 1.400 habitantes em uma área
construída de aproximadamente 3.584 m
2
. O projeto realizado com recursos
estatais foi de responsabilidade da CONDER, que contratou a TECSAN –
Tecnologia de Saneamento LTDA., para realizar a obra de melhoramento e
transferência de moradias. O conjunto se localiza na área norte do miolo urbano
da cidade de Salvador, circundado por áreas favelizadas e de habitação
precária, como o Bairro Novo Horizonte, conhecido como Planeta dos
Macacos
197
, e o Bairro da Paz, conhecido como Malvinas, bairros que estão em
constante conflito e disputa pelo controle do tráfico de drogas que existe na
área
198
.
A ocupação da área é de aproximadamente 20 anos, período equivalente
ao movimento de intensificação da ocupação do miolo urbano de Salvador, e a
população em sua maioria é provinda do interior do Estado. A área de ocupação,
assim como a que antecedeu a construção do Conjunto Vila Viver Melhor, era
também conhecida como Yolanda Pires, devido ao trabalho de assistencialismo
realizado pela então Primeira Dama do Estado. A antiga invasão recebia apoio
comunitário do Colégio Antonio Vieira, através de um casal de italianos, Nicolau
Campenas e sua esposa, que, juntamente com um padre, realizaram diversos
trabalhos sociais e comunitários na área. Segundo a população, após a
requalificação urbana a ajuda de cunho assistencial deixou de existir.
197
A denominação Planeta dos Macacos, é dada pela população, alguns rejeitam, mas a maioria se refere ao
bairro com este nome, vale lembrar que este bairro possui predominância absoluta, acima de 90% de população
negra (IBGE,2005); a associação entre macacos e negros de forma estigmatizadora, nomeia o bairro que
oficialmente se chama Bairro Novo Horizonte. O mesmo acontece com o Bairro da Paz, que é conhecido como
Bairro das Malvinas, em referência a guerra das Malvinas. Ambas associações que estigmatizam os habitantes
dos bairros, pode ser explicada pelo entendimento teórico da nominação e toda os seus dispositivos simbólicos
que são introjetados. Cf.BOURDIEU, Pierre. Poder Simbólico. Ed. Perspectiva, São Paulo, 1996.
198
Informação de pesquisa de campo – 2006.
141
Foto 03 e 04 – Visão frontal e panorâmica
A intervenção na área foi justificada pela necessidade de transferência de
moradores para outra área, tendo em vista as obras de abertura de uma via que
facilitaria um novo acesso ao Aeroporto Internacional de Salvador. Assim
algumas casas foram melhoradas e outras tiveram que ser transferidas para
áreas vizinhas, dando origem ao conjunto Vale das Dunas.
Foto 02
Visão frontal -2006
Foto 03 – Visão Lateral -2006
142
Figura 13 – Mapa: Conjunto Lot. Vale das Dunas em recorte de contexto urbano
143
3) O Conjunto Jardim Nova Primavera: Localizado no Subúrbio
Ferroviário de Salvador, área sudoeste da cidade, o conjunto Nova Primavera
corresponde à 2
a
.Etapa do Projeto Ribeira Azul/Novos Alagados – resultante do
acordo firmado entre o Governo do Estado da Bahia, representado pela
CONDER – Companhia de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia, o
Banco Mundial, a ONG Italiana AVSI – Associação Voluntários para o Serviço
Internacional e a Arquidiocese de Salvador. Inaugurado em 2002, o conjunto
habitacional constitui um aglomerado de 258 unidades habitacionais, cada
unidade com 48m
2
, destas, cerca de 15% são reversíveis para duas unidades.
Com aproximadamente 300 famílias, a população de Nova Primavera é
estimada em 1.500 habitantes, distribuídos em uma área construída de
aproximadamente 12.900 m
2
.
Com a intervenção do Programa Ribeira Azul na área de Novos
Alagados
199
, na década de 90 do séc. XX, gradativamente a população do
aglomerado de palafitas foi sendo transferida para conjuntos habitacionais.
Inicialmente houve a construção dos conjuntos Araçás I e II e posteriormente, a
construção do Conjunto Nova Primavera
200
, que se localiza nas proximidades
da antiga aglomeração das palafitas de Novos Alagados.
A população predominante (80%) no Conjunto Nova Primavera é
oriunda do aglomerado de palafitas de Novos Alagados. Os moradores
removidos do “território da maré” passam a viver em um outro contexto urbano,
com novos arranjos societários; relativa infra-estrutura e com encargos que
199
Cf. (SOARES, Antonio & ESPINHEIRA, Gey. In:. Anais NUTAU/USP. 2004) A formação do aglomerado
urbano de Novos Alagados no Subúrbio Ferroviário de Salvador, iniciou-se na década de 1970 como
continuidade de uma invasão de proporções ainda maiores, denominada de Alagados (final dos anos 40),
onde milhares de famílias sem oportunidade de ocupar espaço em terra firme, avançavam sobre a maré e
os manguezais da Baia de Todos os Santos e construíam suas palafitas, sem as mínimas condições de
habitabilidade. Diante do imenso quadro de adversidade urbana na região metropolitana de Salvador,
Novos Alagados, passa a se constituir uma alternativa de sobrevivência e inserção de centenas de famílias
no espaço urbano da cidade, mesmo que de modo informal.
200
Como o Conjunto Habitacional Nova Primavera localiza-se em área adjacente a Novos Alagados, e seus
moradores em aproximadamente 80% vieram das palafitas, julgamos necessário uma rápida referencia ao
histórico deste aglomerado habitacional.
144
antes, enquanto habitantes de um espaço juridicamente ilegal, não possuíam
(contas de luz elétrica, água, taxas de saneamento, IPTU etc). Este conjunto
habitacional possui um tipo de ocupação que o diferencia dos outros em estudo,
ou seja, ele foi ocupado por pessoas oriundas de uma situação urbana, que
mesmo geograficamente próxima da atual, possuía marcantes diferenças: antes
barracos de palafitas
201
, precariamente instalados sobre uma área de
manguezal na Baía de Todos os Santos, e, agora unidade habitacional de
alvenaria, em terra firme.
201
Chamo atenção que barraco de palafita é mais precarizado que o barraco em terra firme. Além de uma maior
falta de segurança o barraco de palafita está vulnerável a imersão na maré; seus moradores estão mais
susceptíveis a enfermidades e acidentes.
Foto: 4 – Unidade Habitacional do Conjunto - 2005
Fotos: 5 – Barraco Palafita – 2002 (Antiga Moradia)
145
A formalização urbana do conjunto Nova Primavera, gerou uma paisagem
totalmente diferente da paisagem da maré. Neste sentido, percebemos uma
alteração marcante no cotidiano dos moradores
202
transferidos, tanto na
dimensão da tipologia da habitação como na relação social e ecológica com o
espaço.
Segundo os atuais moradores, há aproximadamente dez anos, a área de
Nova Primavera
203
, que antes era um terreno ocioso, foi ocupada por cerca de
500 pessoas provindas das palafitas, que se instalaram e construíram seus
barracos, contudo, não permaneceram na área. Os sem teto foram reprimidos,
tiveram barracos queimados e alguns foram presos. A ocupação não prosperou,
pois o terreno era de propriedade particular. Como não houve continuidade na
ocupação, as pessoas voltaram para as palafitas de Novos Alagados
204
. Neste
contexto, dando continuidade às intervenções do Programa Ribeira Azul, a
CONDER construiu o conjunto habitacional na mesma área que antes foi
ocupada.
202
Cf. (VALLADARES, 1980, p 96). Na verificação das alterações das condições de vida e de trabalho
decorrentes da mudança radical do local e do tipo de moradia, chamo atenção para os custos sociais e
econômicos que a remoção implica.
203
Cf. Relato de Moradores O nome Nova Primavera foi dado devido a ocupação ter se realizado no inicio
da primavera.
204
Cf. Informações da Pesquisa Deserdados do Mar e Segregados na Terra (Pibic-Cnpq 2003/04). Os
líderes do movimento da invasão foram: Bitonho, Lazarato, Jaci, Andréa, Valdelice, entre outros.
Fotos: 6 – Visão Panorâmica Conjunto Habitacional 2004
146
Figura 14 – Mapa: Conjunto Jardim Nova Primavera em recorte de contexto urbano
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
147
III - Convergências & divergências no cruzamento de realidades intra-
urbanos de Salvador – do quantitativo ao qualitativo, aproximação de
perfis.
Pelo fato de estarmos tratando de três realidades específicas, localizadas
em espaços diferenciados do tecido urbano, as leituras e as discussões dos
índices que serão apresentados após cada tabela podem conter pequenas
variações na sistematização das análises. Assim, nosso objetivo é indicar um
conjunto de dados que relacionem o perfil sócio-econômico e demográfico
aproximado para cada conjunto habitacional: (I) – Vila Viver Melhor; (II) –
Loteamento Vale das Dunas; (III) – Jardim Nova Primavera, relacionando suas
especificidades ao contexto urbano de inserção.
A (Tab. 1 - seguinte), apresenta informações sobre as famílias que
compõem os conjuntos, tendo o chefe da família como principal referência para
as generalizações e cruzamentos de variáveis. A partir da relação com a faixa
etária do chefe familiar podemos afirmar que nos conjuntos Viver Melhor e Nova
Primavera a maioria das famílias é relativamente jovem, sendo que o intervalo
de idade dos chefes de família está entre [18-35 anos]; já no Loteamento Vale
das Dunas há uma sensível elevação na faixa etária do chefe familiar e, por
conseqüência, um aumento relativo na idade da família. As famílias
consideradas jovens podem indicar um número significativo de crianças e
adolescentes dependentes dos pais e em idade escolar que, devido à
menoridade, ainda não estão aptos a ingressarem no mercado formal do
trabalho
205
, implicando numa maior responsabilidade orçamentária para seus
205
É bem verdade que a tenra idade impossibilita o ingresso legal no mercado formal da economia,
contudo, sabemos que é comum em áreas de empobrecimento sócio econômico como as de nosso
estudo, encontrarmos crianças fora da escola e trabalhando no mercado informal e até mesmo
clandestino. Entretanto tal constatação não foi verificada em nossa pesquisa, pois a mesma não estava
voltada para este tipo de questão.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
148
progenitores. Uma outra característica de famílias jovens é a instabilidade no
”mercado formal de trabalho”
206
; muitas vezes, o fato de ter formado
compromisso familiar precocemente obriga o responsável familiar a se
enquadrar no mercado de trabalho de qualquer jeito, seguindo a lógica da
necessidade e “da mão para toda obra”. Sem escolaridade, eles são obrigados a
desempenharem qualquer trabalho para tentar adquirir a subsistência.
206
Refiro-me ao acesso aos direitos trabalhistas: carteira de trabalho, plano de saúde, férias remuneradas
etc.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
149
Tabela – 1 Distribuição de Freqüência e percentuais sócio-econômicos e demográficos da população dos conjuntos
habitacionais.
Características
(População)*
(I) Viver Melhor
(62)
100%
(II) Vale das Duna
s
(48)
100%
(III) Nova Primavera
(41)
100%
1.Faixa Etária Modal– Chefe de Família
18 35 anos
51% 28% 46%
36 49 anos
31% 52% 42%
(+) 50
18% 20% 12%
100% 100% 100%
2.Origem da Família
1.Outra área de SSA
60% 42% 83%
2.Interior do Estado
38% 50% 15%
3.Outro Estado
2% 8% 2%
100% 100% 100%
3.Chefe de família
1.Homem
35% 20% 25%
2.Mulher
65% 80% 75%
100% 100% 100%
4. Escolaridade – Chefe de família (%)
1.Analfabeto
3% 5% 10%
2.Ler e escreve
26% 25% 22%
3.Ensino Fundamental (completo)
34% 48% 58%
4.Ensino Médio (completo)
37% 22% 10%
100% 100% 100%
5.Renda Familiar (em salários mínimos)
1. Menos de 01 Salário Mínimo
32% 38% 50%
2. 01 Salário Minino
32% 32% 10%
3. Entre 01 02 Salários Minino
12% 8% 20%
4. Entre 02 05 Salários Minino
10% 8% 10%
5.Sem renda
14% 14% 10%
100% 100% 100%
6.Estado Civil
1.Casado (a)
25% 25% 14%
2.Solteiro (a)
28% 30% 41%
3.Viúvo (a)
2% 2% 3%
4.Divorciado (a)/Separado(a)
5% 3% 2%
5.Amaziado (a)/ Ajuntado (a)
40% 40% 40%
100% 100% 100%
7.Situação Econômica (chefe da familiar)
1.Empregado
40% 25% 35%
2.Desempregado
35% 35% 35%
3.Comerciante
2% 3% 3%
4. Pensionista
3% 2% 2%
5.Biscate (atividade temporária)
20% 35% 25%
100% 100% 100%
8.Dependentes (média por chefe de família)
[5] [5] [5]
9.Principais Ativ. Econômica (chefe da familiar)
1.Comerciante
2% 2% 2%
2.Construção Civil (pedreiro,pintor,eletricista etc.)
25% 15% 15%
3.Costureira
1% 2% 2%
4.Doméstica/Diarista
40% 45% 40%
5.Professor (a) (creche/ensino fund.)
1% 1% 1%
6.Motorista/Motoboy
1% 5% 4%
7.Segurança
5% 5% 5%
8.Serviços Gerais
20% 22% 25%
9.Vendedor (a)
4% 2% 4%
10.Outros
1% 1% 2%
100% 100% 100%
() – Equivalência aproximada Fonte – Pesquisa de Campo
2006 * A base para este estudo foi de 151 questionários
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
150
O item 3 (Tab 1) contempla a identificação do chefe da família, os três
casos em estudo apresentam um intervalo percentual de [65% 85%] de
mulheres responsáveis pelo lar. Vale salientar que no Estado da Bahia houve
um aumento considerável de mulheres responsáveis pela família. Conforme
Fernandes (2006, p. 71), no Estado, o percentual de mulheres chefes de família
passou de 22,4% para 29,3%, de 1991 a 2000, e, na região metropolitana, o
aumento foi ainda mais significativo, de 27,9% (proporção já elevada) para
38,1%. Os municípios da Região Metropolitana de Salvador que possuíam as
maiores proporções de famílias sob a responsabilidade de mulheres eram
Salvador, São Francisco do Conde e Itaparica.
No caso em foco, a incidência de mulheres chefes de famílias se mostra
expressiva. Ao cruzar estes dados com os percentuais do estado civil do chefe
familiar, que indicam uma superioridade de solteiros (as) em relação a casados
(as) e cerca de 40% de amaziados (as) é possível supor que a chefia familiar
feminina é acompanhada de um elevado índice de mulheres solteiras. Contudo,
a ausência do homem como chefe familiar e a possível incidência de filhos
criados sem a presença do pai natural não se configuram como um indício de
desestruturação familiar, mas de uma reorientação da composição familiar.
Sendo perceptível que estas famílias chefiadas por mulheres são mais
vulnerabilizadas por dificuldades de obtenção de renda, até porque no Brasil
persistem as diferenças salariais por gênero, e neste jogo, o trabalho realizado
por mulheres é depreciado em relação ao masculino
207
.
207
Cf. (FERNANDES, C. M., 2006, pág. 71) Levando em conta as maiores dificuldades de inserção do
mercado de trabalho das mulheres, em condições equivalentes às masculinas, principalmente recebendo
menores salários estudos mostram que famílias sob responsabilidade de mulheres são mais vulneráveis
a dificuldades no seu provimento financeiro. De acordo com Guimarães (2003), “as famílias sob
responsabilidade feminina costumam ter menos adultos e mais crianças. Salvo exceções, as mulheres
chefes de famílias são divorciadas, viúvas ou solteiras. Com efeito, segundo as informações da PNAD
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
151
A mulher, mãe e chefe de família é uma predominância nos três casos em
estudo, dentro deste mesmo intervalo percentual percebe-se que os(as)
filhos(as) as têm como principal referência em casa
208
e, em alguns casos,
mesmo a mãe possuindo uma relação amorosa com um outro parceiro, a chefia
e responsabilidade pelo lar continua com ela.
No caso específico do Conjunto Nova Primavera, essa situação ganha
uma maior nitidez, pois a predominância de mulheres como chefe de família já
era percebida deste a moradia anterior no Aglomerado de Palafitas de Novos
Alagados
209
. Uma outra constatação importante é que a maior parte dos
cadastros das unidades habitacionais estão no nome das mulheres
210
, são elas
também que mais reivindicam por melhorias nas condições do conjunto:
Moradoras de Nova Primavera reclamam; Nilzete P. da Silva, “– As casas estão
rachando por dentro e por fora, eu fico com receio que um dia desabe, mas
tomarei providências”; Marisa Santos de Assunção, “– O esgoto está retornando
para dentro de minha casa, principalmente nos dias de chuva, isto é um
absurdo; Márcia Souza Brasil, “ – Trabalho como diarista, vivo de biscates e não
tenho dinheiro para pagar as contas de água e luz que vieram altas”. (Jornal A
Tarde 22/04/2004).
O índice de chefes de família que estão sem atividades renumeradas é o
mesmo nos três conjuntos habitacionais, sendo de [35%] para todos, seguida
pela prática de biscatagem (serviços temporários sem registro, dentre estes se
de 1999, apenas 3,3% das pessoas que se declararam cônjuges estão em famílias cuja chefia é
feminina”.
208
Informação circunstanciada pelo cruzamento de dados percentuais com dados de entrevistas
realizadas (anexo).
209
Cf. Informações da Pesquisa Deserdados do Mar e Segregados na Terra (Pibic-Cnpq 2003/04)
210
Informação da CONDER junto ao setor da DEHAB – Departamento de Habitação. (Vide Termo de
ocupação anexo).
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
152
destacam serviços na construção civil – marceneiro, pedreiro, eletricista, pintor,
encanador etc.), que possui a oscilação média em torno de [25% 35%].
A população dos conjuntos habitacionais em estudo apresentou uma
heterogeneidade nas formas de ocupações. Contudo, a principal atividade
econômica da população nos três casos em estudo é exercida pelas mulheres
em uma média de [40%]. Trata-se de atividades como domésticas ou diaristas,
percentual que coincidiu com a condição de chefia familiar. Desta forma é
legitima a afirmação de que as mulheres são predominantes na chefia familiar, e
a atividade como doméstica se encontra presente entre as ocupações
211
apresentadas.
As localizações dos conjuntos favorecem o crescimento das atividades de
serviço doméstico: o Viver Melhor é circundado por bairros já consolidados e
centrais que demandam por empregados domésticos, assim como o Vale das
Dunas, que se localiza nas proximidades de condomínios de classe média.
Nestes dois conjuntos, o trajeto casa-trabalho é feito a pé
212
. Por fim, o
conjunto Nova Primavera, que se localiza no Subúrbio, área que já possui
tradição em ofertar mão de obra doméstica para outras partes da cidade,
também por ser alocado nas margens da Av. Afrânio Peixoto, é beneficiado por
211
Para Francisco de Oliveira, no Prefácio: os exilados da opulência, do Livro Bahia de Todos os Pobres
(1980), em relação às estratégias de sobrevivência, onde há uma certa heterogeneidade de ocupações,
“[...] a família como uma situação de classe, em suas estratégias de sobrevivência, faz combinar: diversas
formas de rendimentos, de consumo e de cooperação, bem como formas diversas de uma pseudo-
exploração (p.16)”.
212
Informação colhida com as entrevistas (2006). Cf. (CARVALHO. Ináia M. M. & CODES, Ana L.. M. de
Codes, 2006) Nota de rodapé 7, pág.131: Pesquisas sobre as periferias urbanas têm ressaltado como
seus moradores são atingidos pela carência de transportes públicos, pelo seu preço e pelo desgastes
dos longos percursos para atividades cotidianas, como a escola e o trabalho. No caso de Salvador, esses
problemas são agravados pela pobreza, uma vez que, segundo estimativas da Agência Nacional de
Transportes Públicos – ANP, baseadas em informações para 2004, do IPEA/IBGE, 35% da população de
Salvador (correspondendo a 921.140 pessoas) não pode arcar com o custo de passagem de ônibus.
Com isso, essas pessoas permanecem prisioneiras de estreitos limites de deslocamento ou são
obrigadas a fazer longos percursos a pé, com um enorme desgaste físico e prejuízo para a saúde, como
mostram depoimentos coletados por uma reportagem do jornal A Tarde, publicada em 31 de julho de
2005.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
153
um sistema de ônibus coletivos que se integra a bairros de classe média, como
Pituba, Itaigara, Caminho das Árvores etc.
É importante atentarmos para as tipologias ocupacionais e as formas de
geração de renda dos moradores dos conjuntos em foco, pois o trabalho
enquanto categoria de análise guarda relação com a estruturação da vida social,
já que é a expressão da dimensão econômica que é imprescindível à
compreensão das formas de apropriação do solo urbano e das múltiplas
relações com a cidade. Formas de trabalho precarizados e marcadas por
expropriações de direitos indicam situações de empobrecimento social e
precarizações nas diversas tentativas de inserção na cidade.
Partiremos agora para aproximações entre renda e composição familiar: o
número de dependentes por chefe de família nos conjuntos habitacionais em
estudo é cerca de 5 pessoas. Em Salvador, de uma maneira geral, tivemos nos
últimos anos uma redução demográfica do número de filhos por família.
Segundo Fernandes (2006, pág. 79) “considerando as mulheres em idade
reprodutiva – de 15 a 49 anos – as taxas de fecundidade caem e a média do
estado da Bahia fica em 1,87 FTNV/mulher”. Tal situação de redução
demográfica pode se relacionar com a emergência de políticas e programas de
planejamento familiar e maior divulgação dos meios anti-contraceptivos; isso não
significa que a redução no crescimento demográfico seja acompanhada pela
redução da pobreza
213
. Isto é, mesmo com famílias menores, a pobreza ainda é
grande.
213
Ver ESPINHEIRA, Carlos (Gey) & SOARES, Antonio Mateus de C. Pobreza e marginalização: um
estudo da concentração e da desconcentração populacional nas metrópoles latino-americanas: o
caso de Salvador, no Brasil. In ANAIS do XV Encontro Nacional de Estudos Populacionais, ABEP,
Caxambú - MG, 2006.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
154
Confirmando esta equação [demografia x pobreza] os dados de renda das
famílias dos conjuntos habitacionais indicam que mais de [60%] das famílias dos
três conjuntos vivem com valores menores ou iguais a um salário mínimo. No
contexto da Região Metropolitana de Salvador, segundo os dados do Censo
IBGE - 2003, a proporção de habitantes com uma renda domiciliar per capita
abaixo de meio salário mínimo chega a 34,61% na RMS. Em 2001, 9,2% da sua
população ocupada tinha um rendimento médio mensal nas fontes de renda de
até meio salário mínimo; 22, 4% de mais de meio a um salário; 28,1% de mais
de um a dois salários (perfazendo 60% até este valor), 12,00% de mais de dois
a três salários, 10,0% de mais de três a cinco e apenas 12,0% de mais de
cinco salários mínimos conforme informações da PNAD 2001 ( IBGE, 2003).
Ao refinarmos a seqüência de percentuais de renda por conjunto,
percebemos que o Jardim Nova Primavera é o que possui o maior número de
famílias [50%] recebendo menos de um salário por mês, e o Vila Viver Melhor é
o que apresenta o maior índice de pessoas recebendo mais de um salário
mensal, equivalente a [54%]. Mesmo com variações percentuais, a pobreza se
manifesta expressivamente nos três conjuntos. As pequenas dispersões que
aparecem, principalmente do Viver Melhor em relação aos demais, podem ser
justificadas por sua localização que é mais central, próxima de equipamentos
polarizadores, como exemplo: uma loja da cesta do povo, dois postos de
gasolina e um grande supermercado da rede Extra, que dinamizam a área e
movimentam pessoas do conjunto com lavagens diárias de carros e comércio
ambulante, gerando um soldo extra para os moradores. Uma outra questão é a
facilidade de deslocamento a pé, levando as pessoas a economizarem o
dinheiro do transporte coletivo. Sendo assim, na análise das atividades de renda
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
155
há uma certa homogeneidade de médias percentuais entre os três conjuntos
habitacionais em estudo, sendo que o conjunto Viver Melhor é beneficiado em
termos da movimentação de renda por se alocar em uma área que é próxima de
áreas residenciais e comerciais, possibilitando ao morador do conjunto o
exercício de diversas atividades para geração de renda.
A taxa de analfabetismo está presente nos três conjuntos habitacionais,
contudo o Jardim Nova Primavera é o que apresenta o maior índice de
analfabetos; a população mais escolarizada é a do conjunto Vila Viver Melhor,
seguida pelo do Vale das Dunas. Poderemos sinalizar algumas hipóteses para
tentar justificar estes índices: em relação ao Nova Primavera ele já se localiza
em um contexto geográfico – área suburbana – onde se concentram baixos
índices de escolaridade, variável que guarda relação com a condição sócio
econômica. As necessidades de sobrevivência levam as pessoas a privilegiarem
o trabalho
214
, em quaisquer circunstâncias, em detrimento do estudo. Um outro
fator pode ser sinalizado pela falta de estímulo e programas
215
direcionados a
um público específico, assim como distância e má conservação das escolas etc.
Algumas indicações utilizadas para o Nova Primavera podem servir de
justificativa para os índices de analfabetismo nos outros dois conjuntos. No
entanto, percebemos que o Vila Viver Melhor, por se inserir em um parte do
tecido urbano que possui alguns equipamentos, como o benefício da
proximidade de escolas públicas que funcionam no período noturno, possam em
alguma medida estimular a população deste conjunto a ir à escola.
214
Cf. (ALMEIDA e DAMASCENO, 2005) Constataram que os trabalhadores com apenas o primeiro
grau incompleto perfaziam 38,4% dos ocupados na região administrativa de Tancredo Neves, 35% em
Pau da Lima, 43% em Ipitanga, 44% em Valéria e 78% no Subúrbio Ferroviário em 2003-2004, segundo
informações da PED.
215
O Programa Bolsa Família do Governo Federal, não possui grande impacto na renda das famílias dos
conjuntos habitacionais em estudo, o número de contemplados com o programa é pequeno (uma média
de 5 a 8 famílias por conjunto), não constituído em fator de mudança de realidade familiar [ informações
de pesquisa de campo].
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
156
Poderemos levantar uma última hipótese mais ampla, que se refere à
relação que cada área de contexto mantém com a cidade e com o morador do
conjunto. O subúrbio, das três áreas, é a mais estigmatizada e mais pobre,
situação que pode induzir o morador a transferir o status negativo, construído
socialmente pelos moradores das outras áreas abastadas, para seu cotidiano,
em uma relação de introjeção de sentimento de impotência e de bloqueio,
impossibilitando assim o ingresso e o progresso nos estudos, uma relação
transmitida e produzida culturalmente – “pobre não nasceu para estudar e sim
para trabalhar”. [Fala de moradora do subúrbio].
Ainda sobre o grau de escolaridade, o cruzamento de índices nos permite
constatar que o conjunto habitacional que possui o menor grau de escolaridade
é o mesmo que possui a menor renda familiar [o Jardim Nova Primavera]; e, o
que possui maior renda familiar é o que possui a população mais escolarizada [a
Vila Viver Melhor]. Que nos leva a perceber a repetição de uma óbvia equação
entre renda x grau de instrução, e que, nos casos em estudo, tem relação com a
diminuição ou elevação da renda.
No item origem da família há uma aproximação entre os conjuntos Vila
Viver Melhor e Jardim Nova Primavera. Neles, a maioria da população é oriunda
de outras áreas de Salvador, enquanto no Loteamento Vale das Dunas a maior
parte da população é provinda do interior do Estado. Entre os três conjuntos, o
Jardim Nova Primavera é o que apresenta o maior índice de moradores oriundos
de Salvador, com aproximadamente [85%] dos moradores. Como as famílias
são relativamente jovens, suas constituições podem ter sido derivadas de
imigrantes que chegaram em Salvador no período de 1970 – 1975
216
, movidos
216
Cf. (SOUZA, Guaraci A. A.; FARIAS, V. 1980 ) O coeficiente de imigrantes para Salvador, em relação
a população total vem diminuindo, desde as décadas 40/50 de 71,4% para 47,2% no período 70/75, é o
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
157
pelo êxodo-rural e pela tentativa de trabalho direito e/ou indireto na indústria que
vinha se desenvolvendo. Este índice pode também ser explicado pelo fato do
conjunto ter sido construído especificamente para atender aos re-localizados do
aglomerado de palafitas de Novos Alagados, ou seja, famílias que há algum
tempo já estavam em Salvador.
Como no conjunto habitacional Nova Primavera a ocupação foi realizada
com pessoas que antes compartilhavam as mesmas práticas e se reconheciam
nos interesses comuns de regularização e melhoria habitacional, podemos
acreditar que, por isto, exista neste conjunto uma maior compreensão da
representação comunitária como agentes transformadores. Situação de
reconhecimento e organização comunitária
217
que ainda não existe no conjunto
Vale das Dunas, onde se encontra uma maior diversidade nos lugares de
origem dos moradores, implicando em um conjunto de pessoas com diferentes
histórias de vidas e práticas sociais. Neste contexto o conjunto Viver Melhor, fica
em uma relação intermediária aproximando-se mais do Jardim Nova Primavera,
nele [60%] da população é oriunda de outros bairros de Salvador que foram se
aglomerando na área antes da intervenção, contudo, em sua constituição não
houve um expressivo contingente de pessoas oriundas de uma mesma
realidade.
Na (Tab. 1), não foram mensuradas informações de cunho étnico e
religioso, contudo os últimos dados do IBGE, assim como algumas pesquisas
218
que informa o trabalho. [...] Esse declínio tem com contrapartida a elevação do coeficiente endógeneo,
isto é, a reprodução dos que já moram em Salvador. No total, as taxas de crescimento populacional da
capital baiana, depois do longo declínio do período 1900-1950, quando foi a mais baixa entre as nove
principais cidades brasileiras, experimentam sensível elevação. Como se explica o crescimento do
coeficiente endógeneo? Em primeiro lugar, ocorre uma baixa na mortalidade devida à simples mudança
de lócus da força de trabalho, de rural para urbana.
217
Retomaremos esta discussão com maior ênfase nas tabelas de número ( 5a,5b,5c)
218
As pesquisas foram: Metrópoles, Desigualdades, Sócio-Espaciais e Governança em Salvador
(PRONEX/CNPq/Fapesb); Sociabilidade e Violência: Redução de Danos Sociais no Subúrbio Ferroviário
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
158
realizadas no Centro de Recurso Humanos da Universidade Federal da Bahia,
informam que [95%] da população destes conjuntos habitacionais é formada por
afrodescendentes e negros mestiços, número esperado, levando em
consideração que Salvador possui a maior concentração de negros da América
Latina. Em relação à religião, observamos uma disputa em números entre os
adeptos das religiões evangélicas (Assembléia de Deus, Batista, Universal do
Reino de Deus etc.) e a religião católica que pode se combinar com a do
candomblé, enfatizando que o sincretismo na Bahia é bastante comum
219
.
de Salvador (Ministério da Justiça e UFBA), e Deserdados do Mar e Segregados em Terra (Pibic/CNPq
2003–2004).
219
Guardando a importância destas duas variáveis: étnica e religiosa, não foi do interesse desta pesquisa
aprofundar maiores detalhes sobre elas, tendo em vista que nossa análise recairá em questões de cunho
mais econômico e de perfil demográfico.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
159
Fotos dos três conjuntos habitacionais em estudo:
Fotos: 7 – Conjunto Jardim Nova Primavera [Subúrbio Ferroviário]
Fotos: 8 – Conjunto Vila Viver Melhor [ Área central]
Fotos: 9 – Conjunto Loteamento Vale das Dunas [Miolo Urbano]
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
160
Na (Tab. 2) – quesito I, a análise se direciona às relações existentes
entre o morador e o conjunto habitacional, ou seja, como o morador usa e
TABELA - 2
Distribuição de Freqüência e percentuais das principais relações entre o morador e a unidade habitacional
dos três conjuntos habitacionais*.
(I) Viver Melhor
(62)
100%
(II)Vale das
Dunas
(48)
100%
(III) Nova Primavera
(41)
100%
QUESITO I
(Resid.).
88% 85% 87%
1.Função da U.Hab.
(Comer)
12% 15% 13%
(Sim)
81% 75% 60%
2.Alteração da U.Hab.
(Não)
19% 25% 40%
100% 100% 100%
(Suficiente)
15% 46% 53%
(Masq/Sufic.)
5% 12% 10%
(Pequena)
48% 40% 30%
3.Dimensão da U.Hab.
(Muito Peq.)
32% 2% 7%
100% 100% 100%
QUESITO II
(Ótimo)
12% 20% 12%
(Bom)
50% 45% 55%
(Regular)
25% 25% 22%
1.Avaliação da U.Hab.
(Ruim)
13% 10% 11%
100% 100% 100%
(Ótimo)
22% 14% 20%
(Bom)
49% 48% 58%
(Regular)
20% 32% 12%
2.Satisfação/ posse da
U.Hab.
(Ruim)
9% 6% 10%
100% 100% 100%
QUESITO III
(Sim)
78% 69% 35%
1.Saída de morad. das U.
Hab.
(Não)
22% 31% 65%
100% 100% 100%
2.Principais Motivos da
saída
(Falta de condições
econômica)
15% 10% 13%
(Problemas com a
vizinhança)
[...] 15% [...]
(Estrut. das U. Hab)
25% [...] 12%
(Falta de Adapt. co
m
o novo contexto
hab.)
60% 75% 75%
100% 100% 100%
() – Equivalência aproximada Fonte – Pesquisa de
Campo 2006 * A base para este estudo foi de 151 questionários
** U. Hab. – Unidades Habitacionais (casa)
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
161
avalia seu conjunto habitacional. Nos três casos em estudo, há a predominância
média acima de [85%] da função residencial, mesmo tendo algumas casas com
função mista (residencial e comercial). Neste mesmo quesito, há indicativos de
que a maioria dos moradores dos conjuntos habitacionais alteraram ou
realizaram algum tipo de reforma em sua unidade habitacional, na Vila Viver
Melhor [81%], no Vale das Dunas [75%], no Jardim Nova Primavera [60%]. Entre
os três aglomerados, a população que menos alterou suas moradias foi a do
Jardim Nova Primavera. Este conjunto é o mais recente, sua população é a que
tem a menor renda familiar e que está menos insatisfeita com a dimensão da
moradia e condições de habitabilidade.
Em relação à satisfação relativa ao tamanho das unidades habitacionais,
há algumas oscilações consideráveis entre as percentagens: na Vila Viver
Melhor [82%], a população considera a casa pequena ou muito pequena,
enquanto apenas [42%] dos moradores do Loteamento Vale das Dunas e
[37%] do Jardim Nova Primavera considera o mesmo; a maioria absoluta dos
moradores do Jardim Nova Primavera
220
[53%] considera o tamanho da casa
suficiente. Talvez, se buscássemos explicações na tipologia e na dimensão da
moradia anterior ao conjunto habitacional (palafitas, barracos em encostas,
barracos em depressões, falta de saneamento etc.), pudéssemos justificar estes
diferentes índices de satisfação entre a população, correlacionando o tamanho
das famílias, a renda familiar e a idade do conjunto.
Na (Tab. 2) - quesito II, nos itens de avaliação geral e grau de satisfação
com a posse da unidade habitacional há uma relativa e ponderada equalização
220
Como já referenciado 80% dos moradores deste conjunto é provindo de aglomerado de palafitas.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
162
de índices, quando somamos os quesitos bom e ótimo, temos uma média
satisfatória acima dos 65% nos dois itens.
Gosto do conjunto, gosto de minha casa, apesar de ser
pequena, né! [...]. Aqui é uma maravilha, principalmente a minha
[casa] que os quartos é em cima, ai eu fico doida! Quando estou
retada subo para o quarto e fico lá, não atendo ninguém, nego
pode morrer ali chamando. [Garçonete, moradora do Conjunto
Vila Viver Melhor, 2006]
O conjunto habitacional é bom e ao mesmo tempo não é! No
meu caso na época em que eu vir morar aqui, em 1984, a gente
tinha paz, tinha até o que comer dá própria reserva, a gente
pescava, em Novos Alagados. O lado ruim foi quando as
pessoas começaram a mudar a natureza, as coisas não
andavam mais como antes, e o índice de criminalidade
começou a crescer, mesmo assim eu prefiro agora. [Moradora/
Aux. de Enfermagem do Jardim Nova Primavera, 2006].
Oxente! A mudança para a nova casa aqui no conjunto foi uma
maravilha, água dentro de casa, banheiro, luz [...] tudo individual,
cada um paga o seu, oxê melhorou muito. [Diarista, moradora do
Conjunto Vila Viver Melhor, 2006
[...] a única coisa que eu não gosto aqui no Vale das Dunas é de
morar neste lugar apertado, eu queria morar em minha casa, ter
minha área, ter meu espaço, mas tirando isto é ótimo aqui.
[Costureira, moradora do Loteamento Vale das Dunas, 2006]
A satisfação pode também advir do sentimento de conquista da casa, no
que se refere a uma maior privacidade e segurança. Parte considerável dos
moradores dos conjuntos se mostram satisfeitos com a moradia atual, contudo
a satisfação sempre tem como referência comparativa as condições infra-
estruturais precárias da moradia anterior. Alguns, ao se referirem à antiga
moradia, demonstram uma certa nostalgia na fala, contudo a saudade do
passado, por si só, não se configura em uma insatisfação com a moradia atual.
Vale ainda acrescentar que quando os moradores saem do esquema de
comparação (moradia anterior e atual), dentro das dimensões de satisfação e
insatisfação, há manifestações de descontentamentos em relação ao conjunto,
como veremos nas próximas tabelas.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
163
No quesito III (Tab II), buscando sinalizadores compreensivos para o
problema da transitoriedade e rotatividade populacional, tão incidentes nos
conjuntos habitacionais populares, procurou-se saber sobre a saída dos
moradores e seus motivos, conforme os seguinte índices: nos conjuntos Vila
Viver Melhor e Loteamento Vale das Dunas observou-se que parte da
população, em média de 70%, afirmam que há saída de moradores, tendo como
principal motivo a “falta de adaptação”, variante esta que se vincula à falta de
condições econômicas para a manutenção dos encargos da nova moradia.
Contudo, no Jardim Nova Primavera – o de menor renda familiar, o mais pobre e
com menor grau de escolarização – o índice de mudanças de moradores é
menor, estando em torno de 35% de observância de saídas.
As pessoas vendem suas casa sim! E o preço para estas casas
não passam de R$ 5.000, vendem e voltam a morar nas
invasões , eles vendem porque não sabem o que querem não
tem noção da coisa, porque estas casas não são palácios mas
para a vida que se tinha antes nas palafitas são maravilhosas.
[Aux. de Enfermagem, moradora do Jardim Nova Primavera,
2006].
Na avaliação das moradias, a população do Jardim Nova Primavera em
sua maioria considera o tamanho da unidade habitacional suficiente, estes
moradores parecem menos críticos e mais satisfeitos
221
em relação ao conjunto
do que a população dos outros dois aglomerados. A população que se mostrou
mais crítica e menos satisfeita com as dimensões das unidades habitacionais foi
a da Vila Viver Melhor, conjunto no qual a renda familiar e o grau de
escolaridade são maiores em relação aos outros dois. Um outro fator é a relação
comparativa imediata com as construções da área de contexto – bairros centrais
221
Talvez este dado se relacione ao contexto habitacional de origem da população, antes moradores de
palafitas, relação que pode justificar a avaliação positiva da nova moradia (casa de alvenaria,
saneamento, construção em terra firme etc.).
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
164
já consolidados, urbanizados e com construções superiores aos do conjunto
habitacional, tanto no tamanho como na dimensão da estética e na qualidade
habitacional.
A (Tab. 3) demonstra os valores que a população atribui às suas
unidades habitacionais. Em relação às possibilidades de troca e venda, a
maioria absoluta nos três casos em estudo, em média de [85%], venderia sua
unidade habitacional, o que torna perceptível o duplo valor da casa – de uso e
troca – e a preponderância da troca em relação ao uso, sinalizando uma fértil
discussão sobre a mercantilização da moradia popular e a força do fator
econômico no direcionamento da subversão dos valores, movida por uma certa
incidência no interesse de venda da moradia, mediado por um discurso dos
Tabela – 3
Distribuição de Freqüência e percentuais do cruzamento dos valores (uso e troca) exercidos pela unidade
habitacional na vida da população de cada conjunto.
(I) Viver Melhor
(62)
100%
(II)Vale das
Dunas
(48)
100%
(III) Nova Primavera
(41)
100%
QUESITO I
(Sim)
85% 88% 81%
1.Troc/Vend. a U. Hab
(casa)**
(Não)
15% 12% 19%
100% 100% 100%
2. Venderia a U. Hab (casa
)
R$ ***
(-) R$ 5.000,00
[...] 9% 10%
R$ 5.000,00
R$ 8.000,00
8% 25% 11%
R$ 5.000,00
R$ 15.000,00
36% 23% 12%
(+) R$15.000,00
22% 4%
[...]
Não sabe
19% 27% 48%
Não venderia
15% 12% 19%
100% 100% 100%
() – Equivalência aproximada Fonte – Pesquisa de Camp
o
2006 * A base para este estudo foi de 151 questionários
** U. Hab. – Unidades Habitacionais (casa)
*** O Intervalo de valores foi criado junto às respostas dos moradores, ou seja, criamos uma intercalação de valores estimados seguindo a atribuição de preço de
venda do mutuário.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
165
moradores, na maioria dos casos plausível “de venda necessária para a
manutenção da sobrevivência familiar”.
O valor de venda presumido pelos moradores em relação às unidades
habitacionais possui significativas diferenças. Vejamos os maiores índices:
[36%] dos moradores da Vila Viver Melhor indicam um intervalo de valores para
a venda de suas casas que oscila entre (R$ 5 R$ 15 mil); no loteamento Vale
das Dunas [23%] dos moradores também indicam um intervalo de preço para a
venda de (R$ 5 R$ 15 mil); no Jardim Nova Primavera apenas [12%] indicam
este mesmo intervalo de (R$ 5 R$ 15 mil). O conjunto habitacional que possui
o percentual de valor de venda presumido mais alto é o da Vila Viver Melhor, e o
mais baixo é o do conjunto Jardim Nova Primavera. A boa localização do Viver
Melhor pode vir a justificar o valor venal presumido por seus moradores, isto é,
sua proximidade com serviços e com equipamentos urbanos (escolas, creches,
hospitais); o conjunto mantém uma relação estratégica com sua área de
contexto, que também é beneficiada por um status urbano que se distancia da
estigmatização e do preconceito lançado sobre a área suburbana, onde se
localiza o Nova Primavera, ou a área norte do miolo urbano, na qual se localiza
o Vale das Dunas, circundado por bairros tidos como “perigosos” – Planeta dos
Macacos e Malvinas.
As unidades habitacionais dos conjuntos populares em estudo, desde a
sua produção em série são provisionados pelo Estado, associado ao mercado
imobiliário: construtoras, incorporadas, agentes financeiros de produção e
empresas de construção civil; e, depois, por seus próprios mutuários como um
objeto mercantil, destinado a gerar renda e ao atendimento das necessidades de
quem possui o poder de compra e de manutenção do imóvel. Para David Harvey
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
166
(1980, p.42) “A renda inclui a troca, em valor, de direitos de propriedade de um
indíviduo [...] Do ponto de vista do poder do indíviduo sobre os recursos, é troca
no valor real de sua propriedade que interessa, e não o processo pelo qual essa
troca foi promovida”. Para Harvey, o processo social de determinado salário é
parcialmente modificado pelas trocas na localização das oportunidades de
emprego (por categorias), comparadas com trocas nas oportunidades de
moradia (por tipo).
Nesta lógica imobiliária, as casas populares se tornam valiosas
mercadorias
222
com explícito valor de troca que move a rotatividade nos
conjuntos habitacionais. Como mercadoria
223
necessária à reprodução da vida
social, a casa possui rápida cotação e reversão em dinheiro, ou seja, é um bem
de fácil negociação e troca.
[...] O valor de uso sempre existiu nos produtos do trabalho
humano, seja para satisfazer necessidades de alimentação, de
vestimenta ou de habitação, ou para atender a necessidades
simbólicas. Já o valor de troca nem sempre existiu. Quando
viviam em sociedades de baixo desenvolvimento econômico, os
homens consumiam tudo o que produziam, sobrando pouco ou
nada para trocar. Eram sociedades cujas economias viviam em
função da sobrevivência, em que a produção não tinha como
objetivo a troca ou a venda, e sim o consumo. Quando a
especialização tornou possível uma produção superior ao
consumo, gerando um excedente em relação às necessidades
da sociedade, a troca tornou-se um objetivo cada vez mais
importante para a produção. [...] Mercadoria é algo que tem os
dois tipos de valor – o valor de uso e o valor de troca. O valor de
uso de uma mercadoria é a utilidade que ela tem. (SADER, E.
2000 p.70/71).
222
Cf. (SADER, 2000) Se alguém produz algo para seu uso ou para dar de presente a alguém, esse algo
é um produto, mas não uma mercadoria. Mas se ele trocar esse objeto por dinheiro ou por outro produto
qualquer, esse objeto passa a ser uma mercadoria. A mercadoria é, portanto algo produzido para o uso
de outra pessoa, que a obtém mediante a troca por dinheiro ou por outra mercadoria que, por sua vez,
atende á sua necessidade. Neste sentido, a casa-mercadoria, tem dupla valorização: uso e troca.
223
Vale mencionar a clássica referência dos Estudos de Karl Marx, sobretudo, o Capital, Cap. I, Volume I,
no que se refere ao conceito de mercadoria, produção e lógica do consumo.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
167
As unidades habitacionais logo são percebidas por alguns moradores
como uma mercadoria de potencial valor de troca, susceptíveis de uma venda
imediata, mesmo recebendo orientações expressas contratualmente, no ato da
concessão do imóvel, de que as unidades habitacionais não podem ser
passadas, locadas ou vendidas, os moradores desobedecem as prescrições
contratuais e negociam suas casas. Os mutuários, propensos à venda do imóvel
quando conseguem um determinado valor não resistem e passam o imóvel –
fazendo prevalecer o valor de troca.
A partir da venda do imóvel, migram para outros bairros mais pobres
muitas vezes mais distantes e favelizados, repetindo o mesmo processo que
realizaram antes, mas agora relativamente “capitalizados” por algum tempo com
o dinheiro obtido com a venda, que pode ser investido em outro imóvel ou na
abertura de um comércio. Mas, na maioria dos casos o dinheiro obtido com a
venda logo se exaure e, como um ciclo que faz parte da lógica “imobiliária”, o
morador re-inicia o processo de luta pela moradia
224
. Nesta dimensão o direito à
moradia, na contramão da mercadorização, ganha complexidade, pois a
necessidade de moradia, é suplantada pela necessidade econômica de
capitalização que, na maioria dos casos, é reflexo de uma necessidade maior de
subsistência. O direito à moradia é uma necessidade na vida desta população,
contudo, as estratégias de sobrevivência subvertem o direito adquirido – na
medida em que ele pode ser improvisado em uma moradia inferior – em soldo
para prover a subsistência imediata: alimentação, saúde e/ou tentativas
frustradas de fazer render o dinheiro adquirido com venda.
224
Conforme nos indica Licia do Prado Valladares (1980) no livro Passa-se uma casa.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
168
Sobre esta discussão Henri Léfebvre (1991) aponta que, para se entender
a realidade urbana, é necessário se considerar o valor de uso e a ação dos
conflitos específicos entre o valor de uso e o valor de troca. Este conflito entre
valor de uso e de troca conduz à problematização da função dos conjuntos
habitacionais: ou seja, porque a função de moradia se transforma em função
comercial das casas? Por que o valor de uso se transforma em valor de troca,
no momento em que o mutuário vende sua unidade habitacional? O valor de
uso e a função social da casa não conseguem manter sua imunidade em relação
à força e as necessidades geradas pela economia monetária moderna.
Principalmente a manutenção do valor de uso da casa destinada às camadas
populares, que se torna cada vez mais dispendioso – agregam-se valores de
troca à dimensão do valor de uso pelos serviços – carregados de encargos
financeiros, que os mutuários não conseguem quitar, sendo consumidos pelo
endividamento que aumenta a cada mês. O valor de uso cede espaço para o
valor de troca, lutam, relutam, se interpolam e a dimensão mais próxima das
prerrogativas da circulação do dinheiro, vai ganhando espaço no circuito da
troca. O dinheiro com sua força invisível volatiliza, prescreve e organiza o papel
e o valor
225
das mercadorias e do indivíduo na vida monetarizada.
A casa mercadoria é a casa cujo valor de troca subordina o seu valor de
uso; para além desta compreensão, podemos dizer que o valor de troca
movimenta a especulação em relação às construções populares, tendo reflexos
na arquitetura popular ou arquitetura da pobreza. A troca, ao permitir o fluxo,
inibe a fixidez nos objetos e relações, se contrapõe ao enraizamento das
225
Cf. (WAIZBORT L. 2000, p. 140 ) [...] Simmel elabora uma teoria subjetiva do valor, que se exprime na
troca. O conceito de valor que Simmel desenvolve no complexo da filosofia do dinheiro implica em
distanciamento . O que determina o valor de um objeto é o desejo de possuí-lo ou usufruí-lo, e supõe
portanto um processo que envolva distância e aproximação. [...] quando o dinheiro é o denominador
comum tudo, o que está em jogo não é mais o “o quê”, mas sim o “quanto.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
169
pessoas e transforma a casa em um objeto descartável. Desta forma, as
racionalidades da casa descartável e monetarizada se manifestam em seu valor
de troca, que consegue manter uma relação ambivalente como o valor de uso
226
.
A casa descartável como objeto de troca é submetida a um controle
externo, a um discurso e a um funcionamento planejado por mediadores que as
vendem como uma mercadoria qualquer, desprovida de sentido, identidade,
emoção – uma mercadoria cara para “gente barata” – em uma perspectiva
monetária, lucrativa e excludente, que só faz beneficiar o “padrão periférico” da
urbanização.
226
Cf. (LE CORBUSIER, 2004, p. 162) [...] quando a “casa” só tiver seu valor de uso, e não um valor de
troca e de perpetuação freqüentemente mantida de modo artificial. A casa descartável ao contrário do que
acontece hoje com a casa durável, não seria a única coisa a se valorizar continuamente enquanto se
desvaloriza sempre todo o resto, a começar do papel moeda e da força de trabalho, limitada pela idade e
sufocada pelo maquinismo e pela acentuada reprodução de espécie
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
170
A (Tab.4) apresenta os percentuais de problemas e qualidades do
Conjunto Viver Melhor. Assim, [98%] da população ali pesquisada indicam que
há problemas infra-estruturais e sociais no conjunto: na dimensão física, os dois
principais problemas recaem sobre o tamanho da moradia [18%] e na falta de
equipamentos de lazer (praça e jardim) [16%]; na dimensão social, os dois
principais problemas são a violência [10%] e o conflito com a vizinhança [10%].
Na construção do ranking, o principal problema em incidência na opinião dos
Tabela – 4 a
Distribuição de Freqüência e percentuais dos problemas e das qualidades apresentadas no conjunto
CONJUNTO HABITACIONAL VILA VIVER MELHOR (62)
100%
1.Sim
98%
1.Existência de
Problema
2.Não
2%
100%
2. Principais Problemas 1.Dimensão Física – Estrutural
Variáveis: Percentagem (%)
1.1.Qualidade da Arquitetura da Construção
10%
1.2.Tamanho da moradia
18%
1.3.Instalações Elétricas/ Hidráulicas
15%
1.4. Falta de Equipamentos (Praças/Jardins/Lazer)
16%
1.5. Falta de Equipamentos (Posto de Saúde/ Prédios
Escolares)
6%
1.6. Pavimentação/Saneamento/ Circulação (ruas)
12%
2.Dimensão Social – Conteúdos e Manifestações
Variáveis:
2.1.Violência (assalto; roubo; estupro; assassinato etc.)
10%
2.2. Tráfico de Drogas
[...]
2.3. Conflito com a Vizinhança
10%
2.4. Falta de Lazer
1%
2.5. Acidentes automobilísticos (atropelo)
2%
Percentagem total - 100%
3. Ranking de
Problemas
Posição** Problema Percent. Insatisf. (%)
1º. Lugar
Instalações Elétricas/
Hidráulicas
44%
2º. Lugar
Tamanho da moradia
25%
3º. Lugar
Falta de Equip.
(Praça;Jardim;áreas de lazer)
48%
4º. Lugar
Violência
38%
4. Ranking de
Qualidades
Posição** Qualidade Percent. Satisf. (%)
1º. Lugar
Localização
50%
2º. Lugar
Transporte coletivo
33%
3º. Lugar
Proximidade ao centro
27%
() – Equivalência aproximada Fonte – Pesquisa de
Campo 2006 A base para este estudo foi de 151 questionários
**As variáveis concorreram entre si para as posições (Pro1;Prob2;Prob3;Prod4), assim como em segunda análise as posições (Qual 1; Qual 2; Qual 3)
percentagens que equivalem ao maior somatório para respectiva posição, não tendo qualquer relação com a percentagem da posição seguinte, ou seja é um
a
probabilística percentual baseada na incidência primitiva.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
171
moradores são as instalações elétricas e hidráulicas [44%], seguida pelo
tamanho da moradia [25%], falta de equipamentos de lazer [48%] e pela
violência [38%]. Como principais qualidades, os moradores destacaram a
localização [50%] e a facilidade de acesso ao transporte público coletivo [33%],
esta variável é uma das mais manifestadas nas falas de satisfação em relação
ao conjunto, de fato a localização do Vila Viver Melhor permite uma rápida
acessibilidade a áreas de serviços da cidade:
O ponto positivo aqui é o deslocamento, você pode se deslocar
daqui para qualquer local, mesmo que não tenha transporte,
você vai, se você que ir ao Campo Grande andando, você vai, se
você que ir na praia andando, você vai, se você que ir no
Iguatemi andando, você vai, se você que ir no comércio, você
vai. Então isto aqui você está situado no eixo de Salvador. E
ainda tem outra, aqui você está próximo de cemitério e de
hospital, está próximo de banco, está próximo de colégio. Então
só um cara que for ignorante, pode achar que aqui não esta
bom. [Presidente de Associação, morador da Vila Viver Melhor,
2006]
Ah! Meu filho, aqui é bom porque é perto de tudo, a gente
arranja um biscate, quando as patroas não querem pagar
transporte, ai a gente vai a pé, vai andando, ta entendendo, é
bom por isso a localização. Tem super mercado próximo, tem
médico, está entendendo, tudo é perto. [Diarista, moradora do
Vila Viver Melhor, 2006]
É, olha eu vou te dizer por mais que eu quisesse vender esta
casa, eu não vendia porque eu tenho médico todo o mês, eu
saiu daqui às 03h00 da manhã. Aqui é perto de tudo, destes
lugares assim, é o conjunto mais perto que tem, só passa ônibus
aqui às 05h30 da manhã, ai eu acordo cedo para chegar cedo
no médico. [Dona de casa, moradora do Vila Viver Melhor,
2006]
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
172
A localização privilegiada do Vila Viver Melhor, faz dele o conjunto que
possui o valor de troca mais alto em relação aos outros, a acessibilidade
também possibilita maiores chances de trabalhos e/ou desempenhos de
atividades para geração de renda temporários para os moradores, assim como,
diminuição do gasto com transporte coletivo. Como demonstrado nos mapas e
na fotografia área, o conjunto Vila Viver Melhor se localiza em uma área de
interligação de duas avenidas expressas: Avenida Bonocó que dá acesso ao
Shopping Iguatemi, ao terminal rodoviário e ao vetor norte da cidade; a Avenida
Vasco da Gama direciona a acessibilidade ao centro tradicional e ao centro
antigo (Pelourinho) da cidade, assim como também à orla atlântica de Salvador,
como ambas as avenidas são estruturantes do tecido urbano, elas possibilitam
uma boa articulação do conjunto com a cidade, favorecendo aos moradores uma
maior circulação.
Na (Tab. 4b) os dados levantados sobre o Conjunto Loteamento Vale das
Dunas, indicam que [99%] da população constata a existência de problemas: na
dimensão física, na falta de equipamentos e prédios (posto de saúde e escolas)
[20%], seguido pela falta de equipamentos de lazer (praças e jardins) [16%].
Equipamentos estes necessários para a sociabilidade e aproximação das
pessoas; na dimensão social, o recorde se refere à violência [22%], sendo
frisada como principal problema da área, ou seja, o contexto que o conjunto
habitacional de insere, entre bairros de intensa favelização já é de alto índice de
violência; o problema da violência no Lot. Vale das Dunas é seguido pela
presença do tráfico de Drogas [3%].
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
173
No ranking de posicionamento os principais problemas referem-se à baixa
qualidade da construção [30%]; a falta de equipamentos de lazer (praças e
jardins) [42%] e falta de equipamentos de necessidades básicas (saúde e
educação) [44%]; e, novamente, a violência [62%]. Dentre as principais
qualidades os índices indicam [51%] para a boa vizinhança.
Tabela – 4b
Distribuição de freqüência e dos problemas e das qualidades apresentadas no conjunto
CONJUNTO HABITACIONAL LOTEAMENTO VALE DAS DUNAS (48)
100%
1.Sim
99%
1.Existência de
Problema
2.Não
1%
2. Principais Problema
s
1.Dimensão Física – Estrutural
Variáveis: Percentagem (%)
1.1.Qualidade da Arquitetura da Construção
9%
1.2.Tamanho da moradia
11%
1.3.Instalações Elétricas/ Hidráulicas
12%
1.4. Falta de Equipamentos (Praças/Jardins/Lazer)
16%
1.5. Falta de Equipamentos (Posto de Saúde/ Prédios
Escolares)
20%
1.6. Pavimentação/Saneamento/ Circulação (ruas)
1%
2.Dimensão Social – Conteúdos e Manifestações
Variáveis:
2.1.Violência (assalto; roubo; estupro; assassinato etc.)
22%
2.2. Tráfico de Drogas
3%
2.3. Conflito com a Vizinhança
2%
2.4. Falta de Lazer
2%
2.5. Acidentes automobilísticos (atropelo)
2%
Percentagem total- 100%
3. Ranking de
Problemas
Posição** Problema Percent. Insatisf. (%)
1º. Lugar
Baixa Qualid.Constr.
30%
2º. Lugar
Falta de Equip.
(Posto de Saúde; Prédios Esc.)
44%
3º. Lugar
Falta de Equip.
(Praça;Jardim;áreas de lazer)
42%
4º. Lugar
Violência
62%
4. Ranking de
Qualidades
Posição Qualidade Percent. Satisf. (%)
1º. Lugar
Boa vizinhança
51%
2º. Lugar
Facilidade Transporte
col.
16%
3º. Lugar
[...] [...]
() – Equivalência aproximada Fonte – Pesquisa de
Campo 2006 A base para este estudo foi de 151 questionários
**As variáveis concorreram entre si para as posições (Pro1;Prob2;Prob3;Prod4), assim como em segunda análise as posições (Qual 1; Qual 2; Qual 3);
percentagens que equivalem ao maior somatório para respectiva posição, não tendo qualquer relação com a percentagem da posição seguinte, ou seja é uma
probabilística percentual baseada na incidência primitiva.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
174
Os problemas do Vale das Dunas são vários, no âmbito social
temos a saúde uma; outra, o colégio: nós não temos colégios
nem das séries chamadas iniciais, nem da 5ª. a 8ª, série, muito
menos do 1ª. ao 3ª. ano; o transporte temos, mas em distância
de 1.000 ou 1.500 metros até chegarmos a uma parada de
ônibus, temos uma questão que hoje eu chamo como isolamento
social. [Professor, morador do Loteamento Vale das Dunas,
2006].
Os fragmentos das entrevistas realizadas comprovam que o conjunto
além de apresentar deficiência de transportes coletivos – não entra ônibus na
área e o ponto de ônibus mais próximo se localiza no bairro de São Cristovão –
sofre com a falta de equipamentos e serviços, entre estes postos de saúde e
prédios escolares, levando a população a se deslocar para outros bairros à
procura de serviços básicos. Uma outra variável que chama atenção no
Loteamento Vale das Dunas
227
, é o índice de violência
228
que é alto, com
manifestações de medo na fala dos moradores:
[...] Mesmo enchendo d’água eu prefiro a casa que eu tinha
antes, tem muitas coisas aqui no conjunto que eu não posso
revelar, eu não posso dizer o motivo que eu não gosto daqui.
Tem muita violência, agora mesmo a gente está aqui em guerra,
gangue contra gangue [...] [Diarista, mãe de 6 filhos, moradora
do Loteamento Vale das Dunas, 2006].
227
Segundo os moradores, poucas pessoas conhecem o conjunto como Vale das Dunas, mas sim como
Conjunto Yolanda Pires, contudo eles não gostam porque deste nome, pois “antes havia outra área da
cidade com este nome era um lugar manjado por violência. Se você mora aqui e vai procurar emprego em
algum local, ai se você dizer que mora no Yolanda Pires, ou no Planeta [ela se refere ao bairro Novo
Horizonte, conhecido como Planeta dos Macacos], ai já é uma coisa a menos, mesmo que você tenha a
capacidade de suprir a vaga naquele emprego, você vai sofrer restrições devido à fama de violência do
lugar”. [Costureira, moradora do Loteamento Vale das Dunas, 2006].
228
Cf. SOARES, Antonio M. de C. Violência, crimes e jovens empobrecidos.In: ESPINHEIRA, G. (org.)
Sociabilidade e Violência: criminalidade no cotidiano de vida dos moradores do Subúrbio
Ferroviário de Salvador. UFBA, Salvador, 2004. [lançado em 2005]
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
175
Na (Tab. 4c) os dados compilados foram do Conjunto Jardim Nova
Primavera. Neste [87%] dos questionários indica a existência de problemas no
conjunto, na dimensão física os dois principais são: falta de equipamentos de
lazer (jardim e praças) [32%]; e, a falta de equipamentos de necessidades
básicas (saúde e educação) [15%]. Na dimensão das relações sociais os dois
principais problemas destacados são a violência [20%], seguida pelo tráfico de
Tabela – 4c
Distribuição de Freqüência e percentuais dos problemas e das qualidades apresentadas no conjunto
CONJUNTO HABITACIONAL JARDIM NOVA PRIMAVERA (41)
100%
1.Sim
87%
1.Existência de
Problema
2.Não
13%
2. Principais Problemas 1.Dimensão Física – Estrutural
Variáveis: Percentagem (%)
1.1.Qualidade da Arquitetura da Construção
12%
1.2.Tamanho da Construção
10%
1.3.Instalações Elétricas/ Hidráulicas
3%
1.4. Falta de Equipamentos (Praças/Jardins/Lazer)
32%
1.5. Falta de Equipamentos (Posto de Saúde/ Prédios
Escolares)
15%
1.6. Pavimentação/Saneamento/ Circulação (ruas)
2%
2.Dimensão Social – Conteúdos e Manifestações
Variáveis:
2.1.Violência (assalto; roubo; estupro; assassinato etc.)
20%
2.2. Tráfico de Drogas
3%
2.3. Conflito com a Vizinhança
1%
2.4. Falta de Lazer
1%
2.5. Acidentes automobilísticos (atropelo)
1%
Percentagem Total- 100%
3. Ranking de
Problemas
Posição** Problema Percent. Insatisf. (%)
1º. Lugar
Baixa Qualid.Constr.
32%
2º. Lugar
Falta de Equip.
(Posto de Saúde; Prédios Esc.)
27%
3º. Lugar
Falta de Equip.
(Praça;Jardim;áreas de lazer)
50%
4º. Lugar
Violência
75%
4. Ranking de
Qualidades
Posição Qualidade Percent. Satisf. (%)
1º. Lugar
Facilidade Transporte
col.
46%
2º. Lugar
Boa vizinhança
35%
3º. Lugar
Localização
25%
() – Equivalência aproximada Fonte – Pesquisa de
Campo 2006 A base para este estudo foi de 151 questionários
**As variáveis concorreram entre si para as posições (Pro1;Prob2;Prob3;Prod4), assim como em segunda análise as posições (Qual 1; Qual 2; Qual 3);
percentagens que equivalem ao maior somatório para respectiva posição, não tendo qualquer relação com a percentagem da posição seguinte, ou seja é uma
probabilística percentual baseada na incidência primitiva.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
176
drogas [3%]. No ranking construído, os principais problemas apresentados são:
baixa qualidade construtiva das moradias [32%]; seguida pela falta de
equipamentos de lazer (praças e jardins) [50%] e falta de equipamentos de
necessidades básicas (saúde e educação) [27%]; e, a violência [75%]. Como
principal qualidade a pesquisa indica a facilidade de acesso aos transportes
coletivos [46%]; a boa vizinhança [36%] e a localização [25%].
Aqui falta saúde, escola, não tem nada disso aqui no conjunto
Nova Primavera, só tem uma escola ao nível de 2º. Grau, as
pessoas têm que se deslocar daqui para estudar fora. [Líder
Comunitário, morador do Jardim Nova Primavera, 2006].
A CONDER entregou a casa sem reboco, e ainda 70% das
casas estão sem reboco. A infra-estrutura do Conjunto é de total
descaso, as quadras dos conjuntos não são niveladas, não tinha
iluminação; o tanque de água do vizinho fica no quarto do outro
vizinho, a casa que fica em cima pertence a uma família e a de
baixo a outra família; os tanques ficam todos em um quarto;
falta posto de saúde; faltam escolas. [...] Aqui no conjunto o
calçamento está rachando; esgotamento sanitário, quando chove
alaga tudo. Outro ponto negativo foi às paredes-meias, porque
como a parede é meia tudo que se passa em sua casa seu
vizinho escuta, outra coisa você não pode fazer nada na casa
sem a alteração do vizinho. [Líder Comunitário, morador do
Jardim Nova Primavera, 2006].
Olha, aqui tem seus prós e contras, tem umas coisas boas e
outras ruins, tem coisas que ainda não nos acostumamos, como
tiroteio, insegurança, não temos o direito de sair de madrugada
do conjunto porque estaremos correndo risco de uma bala
perdida, como em minha casa já teve [ ela aponta a marca da
bala na parede] porta perfurada. [Doméstica, moradora do
Jardim Nova Primavera, 2006].
Algumas variáveis do Jardim Nova Primavera se aproximam em
percentuais de variáveis do Loteamento Vale das Dunas, isto pode se justificar
por ambos conjuntos se localizarem em espaços de forte presença do “padrão
periférico de urbanização”, área do subúrbio ferroviário e do miolo urbano. Os
índices de violência
229
são altos em ambos espaços, não sendo uma
229
Cf. ESPINHEIRA, Gey. Salvador: Sociabilidade e Violência na vida cotidiana em Salvador. In
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
177
especificidade do conjunto habitacional, mas sim da área de contexto, que
guarda expressivos índices de pobreza e informalidade.
Nos três casos em estudo a falta de equipamentos, serviços, assim como
a infra-estrutura do conjunto se destacam como problemas, pois as pessoas
são obrigadas a se deslocarem para outras áreas da cidade em busca destes
equipamentos, contudo, como já mencionado no Viver Melhor, a contundência
destes problemas é menor devido a sua fácil articulação com os equipamentos
urbanos dos bairros adjacentes.
Em relação aos percentuais relacionadas à representação comunitária,
apresentamos os seguintes gráficos e considerações
230
:
Conjunto Habitacional Vila Viver Melhor:
Bahia Análise e Dados, (v.11). Salvador: Superintendências de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia,
2001.
230
Não é nosso objetivo aprofundarmos o detalhamento deste item, contudo às informações
apresentadas demostrará a organização comunitária dos três conjuntos em estudo.
Tabela – 5. A
Distribuição de Freqüência e percentuais relacionadas à Representação Comunitária vista pela comunidade
CONJUNTO HABITACIONAL VILA VIVER MELHOR (62)
100%
EXISTE REPRESENTAÇÃO COMUNITÁRIA? A REPRESENTAÇÃO COMUNITÁRIA REALIZA
TRABALHOS COMUNITÁRIOS ?
Sim –- 82% Não – 18% Atuante – 25% Ñ Atuante –44% ÑT.Envol.–31%
A base para este estudo foi de 151 questionários Fonte – Pesquisa de Campo 2006
1 Gráfico de Representação
Comuniria
Sim
Não
2 Participação na Representação
Comuniria
Atuante
Ñ Atuante
Ñ.T. Envol.
Há representantes no conjunto? Você considera a representação
comunitária do conjunto ?
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
178
A (Tab. 5a) - indica o grau de representação comunitária do Conjunto Vila
Viver Melhor. Neste conjunto, [82%] dos questionados disseram que há
associação comunitária, contudo, ela existe mas não atua [44%]. Nesta mesma
chave [31%] dos entrevistados afirmam que a associação existe, mas que eles
não têm envolvimento com ela. Na dimensão dos problemas sociais apontados
pela população da Vila Viver Melhor, há um índice de [10%] que aponta a
existência de conflitos entre vizinhos, variável que pode ser aproximada à
questão da baixa participação comunitária na associação. Os dados apresentam
que a comunidade indica conhecimento da existência da representação, mas
não legitima a sua atuação.
Entre os conjuntos em foco, o Viver Melhor apresentou o maior índice de
conflitos internos, além de um considerável descrédito em relação às atuações
da associação comunitária, que segundo os moradores existe, mas não atua.
Percebemos conflitos entre vizinhos e um desestímulo em participar das
tomadas de decisões coletivas.
Aqui, os moradores não contribuem com nada, não participam
de nada, receberam suas casas e ficaram todo mundo
acomodado, só se preocupam movimentar quando vem
acontecer alguma coisa que vai prejudicar a eles. No ano
passado mesmo, teve um cidadão ai que a SUCOM veio para
derrubar a ampliação que ele estava fazendo, ele em um
instante veio correr aos membros da associação, intercedemos
junto a eles, é tanto que não derrubaram a ampliação deles.
[Presidente de Associação, morador da Vila Viver Melhor, 2006]
A associação comunitária existe né! Mas eu não sei se eles
fazem alguma coisa. Eu não participo, nem perco meu tempo
para participar. [Diarista, moradora do Conjunto Vila Viver
Melhor, 2006]
A comunidade não tem união. E principalmente os que dizem ser
mandatários da Associação, em vez de ser pelos moradores é
contra os moradores eles podem fazer tudo, os outros não
podem fazer nada. [Doméstica, moradora do Conjunto Vila Viver
Melhor, 2006]
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
179
Olha aqui tem associação, mas não funciona! Um jogando para
cima do outro, entendeu! Se um faz alguma coisa, joga na cara –
alega, se o outro não faz diz que faz, ai começa a briga.
[Garçonete, moradora do Conjunto Vila Viver Melhor, 2006]
A população do Viver Melhor apresenta dificuldades para se organizar
coletivamente e reivindicar as necessidades do conjunto. O conflito é acirrado
pelas constantes brigas entre os vizinhos: motivados por barulho, fofocas
depreciativas, confusão entre crianças, desorganização do lixo na rua,
competição pelos exíguos espaços externos (vias e corredores do conjunto) etc.
Talvez o fato deste conjunto ter sido constituído com pessoas de diferentes
origens e trajetórias, possibilite a existência destes conflitos; um outra
dimensão que pode ser levantada como hipótese é a de que no conjunto não
existem espaços e lugares de lazer e entretenimento, isso dificulta a
aproximação e a sociabilidade entre os moradores, e, até mesmo, o
fortalecimento de laços de solidariedades entre os vizinhos. A falta de
sentimento de comunidade tem rebatimentos nas formas de organização e
participação na associação comunitária que, pela falta de convergência de
interesses, enfrenta situações de tensão com características similares às do
conjunto Vila Viver Melhor.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
180
4 Participação na Representação
Comunitária
Atuante
Ñ Atuante
Ñ.T. Envol.
3 Gráfico de Representação
Comunitária
Sim
Não
O Loteamento Vale das Dunas pode ser interpretado de forma
semelhante quanto à justificativa para a falta de participação.
Conjunto Habitacional Loteamento Vale das Dunas:
Na (Tab. 5b) foram compilados os dados do Conjunto Loteamento Vale
das Dunas. Neste conjunto [75%] da população questionada afirmou que não há
representação comunitária no conjunto; dos [25%] que dizem existir a
representação [75%] não tem nenhum envolvimento. Dos três casos em estudo,
o Loteamento Vale das Dunas possui o maior índice de não envolvimento com a
representação comunitária. Vale acrescentar que é neste conjunto – onde a
representação comunitária não é reconhecida e legitimada pela comunidade –
que o índice de violência remonta a [62%] nas respostas dos moradores.
A associação daqui é um problema! Até um trabalho social que a
gente queira fazer eles implicam, se a gente for realizar um
Tabela – 5.B
Distribuição de Freqüências e percentuais relacionadas à Representação Comunitária vista pela comunidade
CONJUNTO HABITACIONAL LOTEAMENTO VALE DAS DUNAS (48)
100%
EXISTE REPRESENTAÇÃO COMUNITÁRIA? A REPRESENTAÇÃO COMUNITÁRIA REALIZA
TRABALHOS COMUNITÁRIOS?
Sim –- 25% Não – 75% Atuante – 12% Ñ Atuante –13% ÑT.Envol.–75%
A base para este estudo foi de 151 questionários Fonte – Pesquisa de Campo 2006
Você considera a representação
comunitária do conjunto ?
Há representantes no conjunto?
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
181
trabalho social, ai parece beltrano presidente, sicrano é
presidente e empata a gente fazer o trabalho, porque não tem
união entre o presidente da Associação e os moradores. O
presidente é só ele, só ele e pronto, entendeu, ele não quer
saber da comunidade a comunidade que se dane!!! [Costureira,
moradora do Loteamento Vale das Dunas, 2006].
Este conjunto foi construído como eles [o pessoal da CONDER]
quiseram não houve participação, não houve acordo com os
moradores, não houve reunião, não teve nada disso entendeu, a
CONDER construiu em um ano, e este conjunto não era isso
aqui, era um projeto totalmente diferente, a maquete que está no
aeroporto é uma coisa ao chegar nas casas vêem outra coisa,
porque isso não era para ser duas casas era para ser uma só,
entendeu, ai eles fizeram este tipo de coisa, reduziram
totalmente os direitos dos moradores. [Costureira, moradora do
Loteamento Vale das Dunas, 2006].
Apresentando elevados índices de falta de participação comunitária e de
negação da representação associativa, que é deslegitimada não sendo
reconhecida como uma organização séria, o Loteamento Vale das Dunas possui
problemas relativos à participação comunitária, maiores do que o Vila Viver
Melhor; por estar localizado em uma área de expressiva violência, a
desarticulação comunitária e a falta de uma associação atuante e presente,
estimula que os atos violentos se manifestem com maior incidência no conjunto,
até mesmo entre os próprios moradores. Aqui é uma terra de ninguém meu filho!
[Fala de moradora entrevistada].
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
182
Conjunto Habitacional Jardim Nova Primavera:
5 Gráfico de Representação
Comunitária
Sim
Não
A (Tab 5c) – Apresenta os dados do Conjunto Jardim Nova Primavera,
neste conjunto [81%] da população reconhecem a representação comunitária.
Há aqui também um índice recorde entre os conjuntos em estudo, já que (75%)
da população afirmar uma atuante representação comunitária do conjunto.
Nos três conjuntos em estudo, encontramos representantes e líderes das
respectivas associações comunitárias. Sendo que elas se mostram presentes da
seguinte forma: (I) Vila Viver Melhor, a Associação existe e é oficialmente
registrada, mas não há reuniões periódicas; no (II) Loteamento Vale das Dunas,
a Associação existe, é registrada, mas está desativada, não havendo reuniões
periódicas; no (III) Jardim Nova Primavera, a associação não existe oficialmente,
ainda se encontra sem registro jurídico, contudo há reuniões e encontros
periódicos.
Na construção do conjunto podemos dizer que houve
participação em algumas coisas, em outras coisas não, por
exemplo, nós não sabíamos que as casas iam ser entregues
Tabela – 5c
Distribuição de Freqüências e percentuais relacionadas à Representação Comunitária vista pela comunidade
CONJUNTO HABITACIONAL JARDIM NOVA PRIMAVERA (41)
100%
EXISTE REPRESENTAÇÃO COMUNITÁRIA? A REPRESENTAÇÃO COMUNITÁRIA REALIZA
TRABALHOS COMUNITÁRIOS?
Sim –- 81% Não – 19%
Atuante –72% Ñ Atuant - 10% ÑT.Envol.-18%
A base para este estudo foi de 151 questionários Fonte- – Pesquisa de Campo 2006
6 Participação na Representação
Comunitária
Atuante
Ñ Atuante
Ñ.T. Envol.
Você considera a representação
comunitária do conjunto ?
Há representantes no conjunto ?
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
183
sem reboco, para a gente as casas iam ser entregues todas
prontinhas e tudo certo, a gente só soube da mudança do
projeto na questão das lajes, que a gente interveio e exigiu que
colocasse os quartos em cima, passando de 22m
2
para quase
50m
2
em área construída, mas ai agente não sabia que ia
receber a casa sem reboco, ai a obra acabou e o dinheiro da
obra também e foram empurrando com a barriga, ai os
moradores entraram para suas casas e pronto. [Líder
Comunitário, morador do Jardim Nova Primavera, 2006].
O projeto ia ser só sala, cozinha e banheiro, isso foi uma vitória
até da gente né! Você ver que a Associação não existe
juridicamente mas de fato ela existe! A gente brigou forte com a
CONDER, porque ela só queria dá 22m
2
de área construída e ai
quando a gente foi ver o embrião que eles fizeram como
protótipo, ai a gente viu que não tinha condições, porque agente
morava em palafita e tinha geladeira, tinha fogão, tinha sofá,
tinha televisão, móveis como qualquer casa normal ai a gente
parou a obra e dissemos que se fosse daquela forma, não ia ter
projeto, porque aquilo não era casa de gente morar, ai eles
falaram que a gente só tinha crítica e não tinha solução, e qual
era a solução, se aqui não tinha espaço físico para ser maior, foi
ai que eu e mais alguns colegas do grupo de lideranças, nos
reunimos e enviamos proposta, já que não tinha espaço físico
porque não bate a laje e faz os quartos em cima, isso foi uma
idéia da gente , da comunidade mesmo, claro se você vai fazer
um projeto tem que inserir a comunidade, não adianta você
chegar com o pacote pronto, colocar e você vai ter que aceitar.
[Líder Comunitário, morador do Jardim Nova Primavera, 2006].
O conjunto Nova Primavera apresenta um grau de organização
comunitária diferenciado em relação aos outros conjuntos deste estudo. No
Nova Primavera há reconhecimento do grupo e relativa participação nas
tomadas de decisão. A associação que ainda não foi registrada e sequer tem
um espaço próprio paras as reuniões periódicas existe e possui expressiva
atuação. Como pode ser notado nas falas anteriores houve uma sensível
participação comunitária no processo de execução do projeto do conjunto
habitacional, algo inédito em se tratando de uma intervenção urbana realizada
pela CONDER, cujas realizações são marcadas por autoritarismo e falta de
estimulo ao diálogo. Tal organização comunitária não existe no Vale das Dunas
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
184
e no Viver Melhor, e pode ser explicada pelo histórico de luta comum da maioria
dos moradores do conjunto – antes habitantes de palafitas.
A participação como uma construção coletiva que se desenvolve ao longo
do tempo, apoia-se no diálogo e na capacidade de compreensão das
necessidades e interesses comuns de uma comunidade, algo que já existia na
prática cotidiana deste grupo – Deserdados do Mar e Segregados na Terra
231
.
Desta forma, nos casos apresentados percebemos que a participação e a
organização comunitária dos conjuntos não obedecem a regras de localização
geográfica, ou até mesmo de renda ou grau de instrução, mas a um desejo
comum sinalizado por processos históricos e sociais.
Neste recorte de realidades, a afirmação de que os conjuntos
habitacionais populares em Salvador tem uma inserção parcial e marcada por
precariedades é coerente. O contra argumento de que os conjuntos
habitacionais não estão inseridos no tecido urbano, não percebe que as
investidas da lógica do capital imobiliário formata tipologias de inserção que
seguem a lógica do crescimento periférico da cidade. Logo os conjuntos
habitacionais podem ser compreendidos como intervenções institucionalizadas,
legalizadas, formalizadas, que dissimuladamente são promovidas pela lógica da
periferização, a se expressar numa arquitetura de baixa qualidade e com falta de
funcionalidade nas unidades habitacionais – verdadeiros caixotes – e
acomodação parcial nos contextos empobrecidos em que se localizam.
231
Cf. SOARES, Antonio Mateus de C. & ESPINHEIRA, Gey. Deserdados do Mar e Segregados na
Terra. Relatório de Pesquisa [2002-2003 Pibic/CNPQ]– Realizada no CRH/UFBA, Salvador, 2003.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
185
Em menos de dois anos de inaugurado o Conjunto Nova Primavera exibe sua
má qualidade construtiva
232
, a arquitetura utilizada é de consumo massivo de
baixo custo de produção; baixo investimento criativo e tecnológico. Neste caso,
e como em outros descritos, a arquitetura moderna foi depreciada e aplicada
parcialmente. Será que se pode denominar isso de "arquitetura"? As unidades
habitacionais além de terem sido entregues sem acabamento interno, parecem
descartáveis, o que contraria o conceito de habitabilidade, bem estar social e
qualidade de vida.
Assim como o Nova Primavera, o Viver Melhor apresentou rachaduras em
algumas unidades habitacionais, tendo como justificativa técnica: “ que a falta de
acomodação do terreno, que leva cinco anos, tem gerado as rachaduras”. Para
além disto, o Vila Viver Melhor manifesta problemas elétricos e hidráulicos, o
que levou muitos moradores a trocarem as tubulações de suas casas.
A realidade do Loteamento Vale das Dunas não foge à regra de
precarização, neste conjunto que também apresenta problemas hidráulicos,
elétricos e de conforto ambiental, seus moradores reclamam que o
revestimento/reboco, realizado nas unidades habitacionais é de baixa
qualidade. Além da falta de espaços e equipamentos de lazer e entretenimento,
comum nos três conjuntos em foco.
Os projetos de habitação popular, se tornaram problemas urbanos, sob o
uso de uma arquitetura depreciada, há tanto tempo maltratando as cidades, os
232
Cf.(Jornal A Tarde, 22/04/2004, p. 5). “Casas racham em Novos Alagados”: [...] A alegria de receber
casa nova transformou-se em pesadelo para os moradores do Conjunto Nova Primavera, em Novos
Alagados. Entregues a partir de 2001, as novas moradias estão cheias de rachaduras e sendo invadidas
constantemente por água de esgoto, para desespero dos moradores. Essas habitações fazem parte do
Programa Ribeira Azul e abrigam famílias que moravam em cima de palafitas. Além de paredes rachadas,
na parte mais baixa do loteamento os esgotos estão retornando para dentro das casas porque o terreno
fica abaixo do nível do mar. Para completar o quadro de dificuldades, os moradores (pessoas de baixa
renda ou sem nenhuma) afirmam que não têm condições para pagar as mensalidades e as contas de
água, que chegam com preços altos.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
186
bairros e os moradores, são mais um atrativo para empreiteiras e para a
incorporação imobiliária do que para a paisagem urbana e para a moradia em si
mesmo. Sem fazer com que os moradores fizessem, eles próprios, parte do
projeto de “melhoria” urbana, esses conjuntos habitacionais, como os descritos,
tão ostensivamente precários, não têm integração arquitetônica e social com a
cidade, assim como os seus moradores não têm auto-sustentação econômica.
Como conseqüência desta condição e da situação que configura o tipo
autocrático da gestão do programa governamental empreendido, a construção
da habitação popular favorece mais às empreiteiras e às incorporadoras
imobiliárias
233
do que à cidade e aos seus moradores.
233
Cf. RIBEIRO, Luiz Cezar de Queiroz. Dos cortiços aos condomínios fechados: as formas de
produção da moradia no Rio de Janeiro: Civilização Brasileira: IPPUR-UFRJ: Fase, 1997.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
187
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
188
ESTADO – EXCLUSÃO/INCLUSIVA E OS ARREMEDOS NAS
QUESTÕES URBANAS
I – A lógica da captura: o Estado e a exceção
O Estado brasileiro dentro do jogo econômico global é capturado por uma
progressiva desestatização que põe limites à sua autonomia. Tal captura
suspende a concepção clássica do Estado de Direito
234
; põe em xeque o
conceito de Estado enquanto instituição reguladora; e invoca a discussão sobre
o atual papel do Estado, assim como, a compreensão dos inúmeros ajustes que
ele é obrigado a se submeter, sob a ordem dos agentes (BIRD, BID, FMI, OMC)
do capital financeiro.
Para compreender o transcurso da submissão do Estado brasileiro,
Francisco de Oliveira
235
, fertiliza nossa discussão, ao enfatizar que o Estado pós-
64, foi moldado de acordo aos interesses da dinâmica do capitalismo
monopolista, em que a relação entre as classes
236
tornou-se uma mera relação
de poder, e não mais de arbitragem, como no ciclo “populista” anterior. A relação
de captura que a acumulação monopolista mantém com o Estado, se fortaleceu
com a burguesia internacionalizada; e, com a “exclusão urbana” de grande
parcela da população.
234
A suspensão do Estado de Direito, manifestará o Estado da Urgência, que se funda na lógica do Estado
da Exceção, uma zona ilocalizável de indiferença, que para Agambem não se configura em um ambiente
ditatorial, mas em um espaço vazio de direito. Conforme Giorgio Agambem, em reportagem ao Jornal Folha
de São Paulo: “O Estado de Exceção define um regime da lei no qual a norma vale, mas não se aplica
(porque não tem força), e atos que não possuem o valor de lei adquirem sua força. A força de lei flutua
como um elemento indeterminado que pode ser reivindicado ora pela autoridade do Estado, ora pela
autoridade de uma organização revolucionária”.
235
Cf. As últimas teorizações sobre o Estado in: (OLIVEIRA, F.) “Ornitorrinco” (2003); “Política numa era de
indeterminação” (2002); “O Estado e a Exceção: ou o Estado de Exceção”(2003); “O Momento Lênin
(2004)”.
236
Cf. (ARON, 2002, p. 266). O Estado é considerado essencialmente como instrumento da dominação de
uma classe. Em conseqüência, um regime político é definido pela classe que exerce o poder. Os regimes da
democracia burguesa são assemelhadas àqueles em que a classe capitalista exerce o poder, embora
mantenham a fachada das instituições livres.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
189
Neste movimento comandado pelos agentes do capital financeiro, o
Estado sofre impactos com a desterritorialização
237
dos fluxos econômicos tendo
como reflexos a mudança estrutural do trabalho, a emergência de instituições
econômicas supranacionais, a aceleração da movimentação de capitais no
mercado financeiro, com outros fatores, que se “somam a uma mudança lógica
instrumental de produção dos sistemas de mercadorias, revelando a
consagração de uma doutrina política econômica: o Neoliberalismo”
(ESPINHEIRA, 2004, p.95).
No mesmo processo de rápida internacionalização das relações
econômicas, às suas reinvenções aceleram a centralização dos capitais
238
nos
paises imperialistas ao passo que desmantela as regulações internas de países
subdesenvolvidos como o Brasil; este desmantelo desorganiza e deslegitima as
ações do Estado, gerando o aumento de problemas sociais como o desemprego,
falta de moradia, miséria, marginalidade, violência, exacerbando a situação de
“exclusão social”. Estas situações que são impostas pelo neoliberalismo
produzem um contexto de subordinação e enfraquecimento do Estado, que
ganha vulto e entonações diferenciadas nas últimas décadas. No caso brasileiro,
o acúmulo histórico de subserviência econômica se evidencia na atualidade a
partir de sofisticadas formatações de domínio, que exercem tacitamente uma
política de exclusão-inclusiva através de um arsenal de programas
humanitários
239
de combate à pobreza.
237
Cf. (ZIZEK, Slavoj, p.170, 2003) Efetivamente, é a atual oposição ao capitalismo global que oferece uma
espécie de imagem espelhada da afirmação de Deleuze acerca da exigência inerentemente antagonística
da dinâmica capitalista (uma forte máquina de desterritorialização que gera novos modos de
reterritorialização.
238
Cf. (PALLOIX & ZARIFIAN, 1988; LAUTIER, 1994, apud KOWARIC, L. 2003)
239
Cf. (ZIZEK, 2003, p.111) os excluídos não seriam somente os terroristas, mas todos aqueles que se
colocam na ponta receptora da ajuda humanitária. O Homo sacer de hoje seria o objeto privilegiado da
biopolítica. “ o que é privado da humanidade começa a ser sustentado por ela com desprezo.” [...] O autor
ainda nos chama a atenção para o paradoxo dos campos de refugiados que recebem ajuda humanitária,
expõe duas faces, “humana” e “desumana (...)Não basta enumerar os exemplos atuais do Homo Sacer: os
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
190
Uma vez mais, convoco ao exame empírico: as políticas
chamadas de emprego e renda são à exceção do desemprego;
elas aprofundam o desemprego, ou a mantém, com o propósito
de combatê-lo. As políticas de mutirões para satisfazer a
demanda por habitação é a cidade como exceção; é a
desmercatilização da força de trabalho sob a forma de trabalho
virtual que prepara o enorme exército “informal”[...]. O Fome
Zero é o marketing como política. Mesmo uma “política” contra
a qual ninguém pode colocar-se, a cópia brasileira das políticas
do Estado ou o Estado como exceção. (OLIVEIRA p.12,
2003).
O sistema econômico neoliberal se reproduz no Estado brasileiro
240
, a
partir de um esquema econômico baseado em uma sequiosa lógica de
concentração de renda; crescimento exacerbado da pobreza; e uma infinidade
de ações assistencialistas no formato de programas sociais, a exemplo das
bolsas paliativas: auxílio remédio, vale gás, bolsa família, bolsa escola etc. Um
arsenal de programas humanitários que reforçam a lógica do capital financeiro e
cria um complexo jogo de exclusão-inclusiva, na medida em que assegura o
principio do “direito de viver”
241
, através da doação de uma renda mínima aos
pobres.
Tal situação compromete ainda mais o entendimento do conceito de
“exclusão”
242
tornando-o amplo e escorregadio, o que nos obriga a criar um novo
quadro analítico para a categoria. O que antes poderia ser classificado como
sobrantes, inúteis e desabilitados socialmente – excluídos, ou como Kowarick
(2003, p. 74) provocativamente indica como “uma vasta parcela daqueles que
estão à margem, desligados ou desenraizados dos processos essenciais da
sans papiers na França, os habitantes das favelas no Brasil e a população dos guetos afro-americanos nos
EUA, etc. É absolutamente crítico completar essa lista com o lado humanitário sejam as figuras modernas
do Homo Sacer”.
240
Cf..(OLIVEIRA p.09, 2003). As desigualdades históricas da sociedade brasileira vieram juntar-se
aquelas advindas da reestruturação produtiva e da globalização, reformatando o mercado, funcionalizando
a relação Estado-capital, transformando políticas em antipolíticas de funcionalização da pobreza, erigindo
em norma o que dela se afastava, pontuando um esforço teórico que transitou da busca da normatividade
para a racionalização da exceção.
241
Cf. (POLANYI, KARL,2003). La grande transformation, Gallimard.
242
Meu objetivo é de apenas indicar e problematizar a complexidade que esta noção possui, sobretudo
quando passam a ser objeto de captura e enquadramento dentro da lógica de agentes financeiros.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
191
sociedade”, no momento atual, exige um maior cuidado em sua apropriação
como categoria teórica. A simples compreensão da exclusão como um
despossessão de direitos, é inocente, e se transforma em jargão intelectual para
os que trabalham com a pobreza urbana.
[...] exclusão [é] uma palavra-chave da retórica republicana
francesa. Não só ela se origina na França, mas também está
ancorada na interpretação da história republicana
revolucionária francesa e do pensamento republicano. Desse
ponto, de vista, a exclusão não é concebida como um simples
fenômeno econômico ou político, mas como uma falta de
“nacionalidade”, um esgarçamento do tecido social.
(KOWARICK, L. p.76, 2003 apud SIVER, 1994)
Neste quadro, é imprescindível se perceber que a própria situação de
exclusão é capturada e estrategicamente congelada dentro da lógica
capitalista, que enfraquece a autonomia do Estado
243
, a situação de exclusão
se amplia e é revestida por uma pseudo inclusão social. O excluído não é mais
aquele sujeito que está totalmente fora das formalizações do direito a ter
direito, ele é “integrado, incorporado, enquadrado na lógica financeira”, ele é
resgatado e incluído tanto por uma sofisticada introjeção ideológica de
inclusão, como pelas políticas de assistencialismo humanitário
244
. Tal situação
sinaliza as modalidades práticas da constituição de um Estado de Exceção
245
que se pauta atualmente através da promoção de políticas públicas destinadas
à funcionalização da pobreza.
243
Cf. [...] tem ocorrido um amplo e diverso processo de desresponsabilização do Estado em relação aos
direitos de cidadania, e, no seu lugar, surgem ações de cunho humanitário que tendem a equacionar as
questões da pobreza em termos de atendimento particularizado e local. (KOWARICK, L. p. 86, 2003)
244
O despossuído de acesso ele não tem emprego, mas tem direito a uma bolsa família, ele não tem
dinheiro para pagar o transporte público, mas tem um cartão de gratuidade para seu deslocamento; não
tem condições para comprar o remédio que necessita, mas recebe do governo o auxilio-remédio etc.
245
Não é nosso objetivo aprofundar as problematizações sobre o Estado de Exceção, contudo podemos
dizer que segundo (AGAMBEM, 2003ª) A exceção é uma espécie de exclusão [...] o que caracteriza
propriamente a exceção é que aquilo que é excluído não está, por causa disto, absolutamente fora da
relação com a norma; ao contrário, esta se mantém em relação com aquela na forma de suspensão. A
norma se aplica à exceção desaplicando-se, retirando-se desta. O estado de exceção não é, portanto, o
caos que precede a ordem, mas a situação que resulta da sua suspensão. Neste sentido, a exceção é
verdadeiramente, segundo o étimo, capturada fora (ex-capere) e não simplesmente excluída. [...]
Chamemos relação de exceção a esta forma extrema da relação que inclui alguma coisa unicamente
através de sua exclusão.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
192
A suspensão do Estado de Direito, que se funda na lógica do Estado da
Exceção – uma zona ilocalizável de indiferença – que para Giorgio Agambem
(2003) não se configura em um ambiente ditatorial, mas em um espaço vazio
de direitos. A lógica do Estado de Exceção
246
, que tem sua fundamentação
filosófica em Walter Benjamin: “A tradição dos oprimidos nos ensina que o
estado de exceção em que vivemos é na verdade regra geral”, se funda em
uma sociedade de economia financeirizada, em que o direito
247
legal existe
mais não prescreve, enquanto ação efetiva.
Na contestação viabilizada por Giorgio Agambem (2003. p.19), a “vida
nua” insurge localizada em um Estado de Exceção, onde existe a plena
ausência de ação política
248
. A “vida nua” se constitui como uma categoria
criada para o livre exercício do poder soberano sobre aqueles que sub-existem
em um mundo onde o direito não se efetiva. Podemos nos referir aos milhares
de seres viventes, que através da “vida nua” se figuram nos cortiços,
albergues, febens, “carandirus”, favelas, conjuntos habitacionais populares, etc.
Lugares onde a exceção além de regra é paradoxalmente a única forma de
inclusão.
A lógica da exclusão pela inclusão, se manifesta nos problemas
urbanos, sobretudo na questão habitacional, a foto do Aglomerado de Novos
246
Cf. (AGAMBEM, Giorgio, 2003, p.29) O Estado de Exceção define um regime da lei no qual a norma
vale, mas não se aplica (porque não tem força), e atos que não possuem o valor de lei adquirem sua
força. A força de lei flutua como um elemento indeterminado que pode ser reivindicado ora pela
autoridade do Estado, ora pela autoridade de uma organização revolucionária.
247
Cf. TELLES, Vera (1994, 1996, 2001).
248
Cf. (RANCIERE, 1999, 368/370) [...] A política não é em primeiro lugar a maneira como indivíduos e
grupos em geral combinam seus interesses e seus sentimentos. É antes um modo de ser da comunidade
que se opõe outro modo de ser, um recorte do mundo sensível que se opõe ao outro recorte do mundo
sensível [...] A política, em última instância, repousa sobre um único principio, a igualdade. Só que esse
princípio só tem efeito por um desvio ou uma torção específica: o dissenso, ou seja, a ruptura nas formas
sensíveis da comunidade. Ele tem efeito ao interromper uma lógica da dominação suposta natural. Esse
efeito é a instituição de uma divisão ou de uma distorção inicial. Essa distorção é que é testemunhada
pelas palavras aparentemente muito simples: demos e democracia.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
193
Alagados, em Salvador, indica uma situação de destituição de direitos,
empobrecimento social, ausência do poder estatal. Enfim, neste espaço as
péssimas condições de vida, possibilitam a figuração da “vida nua”, que é
capturada pela lógica da exceção. Deste modo, os que estão cruelmente
excluídos nas palafitas, através da lógica da exclusão pela inclusão, serão
incluídos nos projetos de habitação popular de Salvador, simulando uma
inclusão, que no plano superficial é prescrita, mas não se efetiva, pois a
condição de indigência social continua.
Foto de Novos Alagados em Salvador – Subúrbio Ferroviário (2004)
A vida desprotegida, a mercê da sorte figurada em “vida nua”, conforme
indica Giorgio Agambem (2003), se instala onde a ausência da lei é norma,
onde excluídos são capturados, “nutridos” e controlados por ações
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
194
gerenciadas de programas humanitários. A vida de alguns moradores de
conjuntos habitacionais populares de contextos empobrecidos como o Subúrbio
Ferroviário e a área do “miolo urbano” em Salvador, servem como exemplos
desta lógica, que se manifesta em um complexo esquema de exclusão pela
inclusão: a família que sai da flagrante exclusão de direitos manifesta nas
palafitas de Alagados, é “incluída” como mutuário em conjuntos habitacionais,
na pseuda inclusão, às condições necessárias para a manutenção da vida
continuam a não existir, a necessidade pela subsistência é continua, o
assistencialismo estatal das famigeradas bolsas, tentam simular a inclusão
diminuindo a exclusão e o ciclo de despossessão é mantido e legitimado pelo
Estado.
No caso da habitação popular a moradia é “cedida”
249
, mas seus
moradores além de serem controlados e desprezados, são vistos como
desqualificados sociais, impotentes por sua própria exclusão, e “necessitados”
do resgate humanitário e assistencialista, que além de dissimular, aumenta a
sua impotência e dependência. Nesta situação o Estado se mostra conivente e
forçado a legitimar a ação dissimuladora, pois está lógica gerenciada pelos
agentes do capital financeiro se mostra soberana ao Estado enfraquecido.
II – O Estado e a expansão da pobreza urbana em Salvador
O capital que dinamiza a cidade é o mesmo que exacerba as
desigualdades sociais, determinando um padrão especifico de urbanização que
249
O ceder referido não é sinônimo de doação, pois sabemos que a moradia popular é paga, quando não
pelos moradores, pelos cofres públicos.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
195
se funda na segmentação do território
250
urbano a partir de uma forma
específica de dominação das elites
251
, que se manifesta através da segregação
social
252
e da consolidação de um padrão periférico para o crescimento urbano.
Neste movimento o Estado, capturado pelo capital financeiro, intervem na
cidade para atender interesses pré-determinados por este mesmo capital.
Na esfera urbana, este sequioso jogo que há tempos se manifesta em
nosso pais, se exacerba na atualidade com um abrupto encolhimento do
Estado
253
, figurando-se nos agenciamentos e nas parcerias imobiliárias com
construtoras e incorporadoras
254
que constroem áreas ricas como as Avenidas
Antonio Carlos Magalhães e a Tancredo Neves, nas proximidades do
Shopping Iguatemi e do Shopping Salvador, e áreas empobrecidas como o
subúrbio ferroviário e o “miolo” urbano de Salvador. Nestas investidas do
capital, o Estado contribui para a consolidação do “padrão periférico” de
urbanização, que se enquadra em uma conjuntura econômica que mantêm
exacerbada a desigualdade social, condenando uma grande parcela da
população brasileira a uma pobreza progressiva e submetida a formas de
gerenciamentos filantrópicos de caráter pseudo-humanitário.
250
Cf. Evidenciado no 1º. capitulo desta estudo: os territórios são determinantes das condições de vida. A
localização da moradia e outros lugares e eixos por onde os habitantes circulam – locais de trabalho,
lazer, redes de serviços públicos e privados, equipamentos e bens de consumo coletivo, sistema viário e
de transporte etc. – definem acessos desiguais aos bens da cidade.
251
Cf. (TELLES, 1999, pp. 87-88) [...] nossas elites podem ficar satisfeitas com sua modernidade e dizer
candidamente que a pobreza é lamentável, porém inevitável [...]. Nessa pobreza transformada em fato
bruto da natureza há também o esvaziamento da função crítica das noções de igualdade e justiça.
252
Cf. (Telles, 2004) Trata-se de (...) uma relação social que diz respeito social que diz respeito à
dinâmica da cidade, aos modos como a riqueza é distribuída (a disputada) e corporificada nas suas
materialidades, formas e artefatos (Harvey), definindo as condições desiguais de acesso a seus
espaços,bens e serviços.
253
Que se deixa capturar pelo comando financeiro do neoliberalismo.
254
Cf. Algumas análises sobre o desempenho das incorporadoras imobiliárias na apropriação da cidade
moderna é realizada por RIBEIRO, Luiz Cezar de Queiroz. Dos cortiços aos condomínios fechados:
as formas de produção da moradia no Rio de Janeiro: Civilização Brasileira: IPPUR-UFRJ: Fase, 1997.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
196
Neste esquema, o Estado como motor de desenvolvimento do país
255
,
parece ter perdido sentido, pois seu poder é vulnerabilizado e cada vez mais
minimizado, fazendo elevar o índice da pobreza e o aumento de uma legião de
trabalhadores sem trabalho, muitos em situação de desalento. Situação que
subverte o sentido do Estado regulador da economia, em um Estado de
arbitragem
256
, obediente à economia neoliberal, um Estado capturado pela
lógica da financeirização do capital e colocado a serviço da manutenção e
gestão da pobreza, um Estado que em suas práticas se propõe apenas a
arbitrar alguns conflitos.
Como resultante deste contexto, temos o aumento da disparidade entre
classes e um elevado crescimento da pobreza. Em Salvador, por exemplo,
entre as décadas 80 e 90, conforme o PNUD, o número de pobres aumentou
de 26,9% para 33,6%. A situação se torna mais gritante porque a pobreza
aumenta em concomitância com a desigualdade social, na qual uma parcela
considerável da população passa a ser relegada a uma situação de pobreza
absoluta
257
(sem documento, sem moradia, sem direito político, sem
cidadania).
255
Cf. (OLIVEIRA, 2003) Em uma análise sobre o Brasil o autor afirma que o subdesenvolvimento viria a
ser, portanto, a forma de exceção permanente do sistema capitalista na sua periferia. Segundo Chico de
Oliveira, no Brasil, quase se fundem mais-valias absolutas e relativas: “absoluta porque o capital usa o
trabalhador quando necessita dele, relativa porque isso é possível somente devido à enorme
produtividade. A contradição: a jornada da mais-valia relativa deveria ser de diminuição do trabalho não-
pago, mas é o seu contrário. Então, graças à produtividade do trabalho, desaparecem os tempos de não-
trabalho: todo o tempo de trabalho é tempo de produção”.
256
Cf. SANTOS, Laymert Garcia. Brasil contemporâneo: Estado de exceção?. Texto discutido em
reuniões no CENEDIC/ FFLCH-USP, mimeo, 2006.
257
(LIMA, A.L. M.C., 2004, p.133/139) A pobreza absoluta, por sua vez, está associada ao mínimo
necessário para garantir a vida. Ela focaliza a questão da existência de necessidades essenciais, que
devem ser satisfeitas independentemente de comparações contextuais, como estilos de vida e níveis
socioeconômicos. [...] A pobreza absoluta define-se com base nas necessidades essenciais que,
teoricamente, deveriam ser inalienáveis aos seres humanos, independentemente de comparações
contextuais. A pobreza relativa, por seu turno, é definida por comparação, levando em consideração o
contexto social em que se insere o sujeito.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
197
Nos últimos quarenta anos, com a aceleração do capitalismo industrial
que fomentou uma situação de modernização à Salvador
258
, a expansão
urbana seguiu aceleradamente a lógica imobiliária, que se convencionou
denominar de especulação, termo que pode parecer em princípio exagerado,
tornan-se adequado quando se observam os recursos utilizados pelos agentes
imobiliários, proprietários e incorporadores, em suas interferências
institucionais para elevar a apropriação de lucros e a realização de
empreendimentos em locais em que há restrições legais. Mas não só nesta
direção. O capital sempre atua em muitas frentes concomitantemente, e uma
delas é a da política institucional para fazer pender, em seu favor, as decisões
em casos ambíguos. Desta forma o Estado capturado e associado com o
capital financeirizado se volta para o atendimento dos anseios privados em
detrimento das necessidades sociais.
Na mesma equação de uma condição de pobreza estrutural,
correlacionamos o crescimento da periferização, que nas cidades brasileiras,
sobretudo em Salvador, não é uma conseqüência imediata do crescimento
urbano, mas uma forma de promovê-lo com a segregação
259
social e espacial
e às forças do mercado, da especulação imobiliária, da propriedade privada
etc. dando aos pobres a pobreza das condições de vida que a própria
urbanização segregada produz: distância excessiva, precariedade de
transporte e vias de acesso, das construções, da infra-estrutura em rede, de
segurança, de serviços os mais diversos etc. A periferização, compreendida
258
Com instalação de diversas industrias de base, petroquímicas, químicas, siderúrgicas etc., alterações
nos ordenamentos urbanos: articulações viárias, avenidas, praças, saneamento etc, que fomentaram
uma situação de modernização a cidade.
259
Cf. (RIZEK,2003, p. 57 ), “restituindo o território à elaboração cidadã, poderia ao menos
desestabilizar os vetores da segregação, estendida aqui como forma de dominação que limita o acesso
de parcelas da população aos bens da cidade. Modo pelo qual as experiências da desigualdade poderiam
ganhar dimensão pública aos revés da experiência privatizante das carências locais
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
198
como uma das figurações da pobreza, faz parte do mesmo diagrama de
expropriação de direitos sociais, construída e mantida por um modelo de
desenvolvimento forjado e mantido por programas neoliberais legitimados pelo
Estado brasileiro, que minimiza suas intervenções nas áreas urbanas pobres e
maximiza nas áreas ricas.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
199
III – A falência dos programas estatais – Referências interestaduais de
uma mesma questão: continuísmo e autocracia nos programas de
habitação popular.
Os “pesados” conjuntos habitacionais construídos em série nas
periferias das grandes cidades brasileiras continuam
260
a se fazer presentes
em nossas paisagens urbanas. O uso depreciado dos preceitos da arquitetura
moderna permanecem e manifestam-se nos atuais projeto de habitação, que
são concebidos de forma semelhante às produções de moradia do período
BNH/SFH. Como demonstram as fotografias, no transcorrer das últimas
décadas ocorreram poucas alterações na tipologia construtiva dos conjuntos
habitacionais o que sinaliza um continuismo nas práticas de intervenção de
habitacional social.
260
Como exemplo desta continuidade os últimos conjuntos habitacionais construídos em Salvador: Vila
Viver Melhor; Loteamento Vale das Dunas e Conjunto Jardim Nova Primavera; assim como toda a
produção em série dos CDHU’s no Estado de São Paulo, podendo ser considerados como expressões
contemporâneas da continuidade do esquema autocrático de execução de projetos habitacionais do
BNH/SFH.
Conj. Construído no (1960/70) período BNH/SFH –
Rio de Janeiro. Fonte: BONDUKI,1999
Conj. construído no (1960/70) período BNH/SFH -
Rio de Janeiro. Fonte: BONDUKI,1999
Conj. construído em 2000/2001- Lot. Vale das
Dunas – Salvador . Fonte: SOARES.Antonio,2006
Conj. construído em 2002- Jardim Nova Primavera
– Salvador . Fonte: SOARES.Antonio,2002
Período BNH Período Pós - BNH
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
200
Além da dimensão física (arquitetura, forma, tamanho, volumetria,
densidade, desenho) a continuidade do tipo de proposta habitacional se
explicita em programas e intervenções marcadas pela autocracia e pela baixa
qualidade dos projetos, apresentando falhas tanto na arquitetura utilizada como
na concepção urbanística da intervenção, com implicações na gestão do
projeto e na satisfação dos mutuários.
[...] as análises do perfil da intervenção social do Estado no
pós- 64 tem destacado a centralização a nível Federal como
uma de suas características fundamentais. [...] As políticas
habitacionais e de desenvolvimento urbano implementadas
pelo BNH, são exemplos deste fenômeno. Suscitando reflexões
sobre a “centralização” ou “descentralização” da política
habitacional, e quais as implicações na gestão e execução do
projeto. (ARRETCHE,1996, p.75)
Diversas referências poderiam fazer parte da constituição de uma
fisionomia que demonstrasse a continuidade e o centralismo no tipo de
intervencão, assim como das deficiências históricas e atuais de nossos
programas de moradia destinados à população de baixa renda; deficiências
quantitativas e qualitativas, sociais e infra-estruturais que se acumularam e
ganharam forma e expressão nas grandes cidades do séc. XXI: forma de uma
arquitetura do “descaso” – um amontoado de cubículos – que se faz notar nas
periferias das capitais brasileiras. Em Salvador, podemos referenciar os
últimos conjuntos habitacionais construídos pela CONDER (Companhia de
Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia), entre estes : o Vila Viver
Melhor, o Loteamento Vale das Dunas e o Jardim Nova Primavera, este último
continuidade dos Conjuntos Araçás I e II, localizados no Subúrbio Ferroviário
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
201
de Salvador, e que tiveram dezenas de unidades habitacionais condenadas
pela Defesa Civil, por apresentarem rachaduras, colocando em risco a vida de
diversas famílias. Em São Paulo, principal cidade do país, chamaremos a
atenção para alguns dos conjuntos produzidos em série pela CDHU
(Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São
Paulo), localizados na parte noroeste da extrema periferia da zona oeste da
cidade, no contexto regional dos bairros populares do Jaraguá, Perus e
adjacências da Parada de Taipas.
A CDHU em São Paulo e a CONDER em Salvador, podem ser
entendidas como instituições públicas equivalentes em suas estratégias de
construção habitacional, marcadas pela autocracia e desrespeito à população.
Ambas companhias possuem práticas de produção de moradia popular que se
expressam de maneira a dar continuidade a “política” habitacional
centralizadora desenvolvida no período BNH, que se mantêm atualmente de
forma mais excludente, pois o número de produção de unidade habitacionais
diminuiu em relação aos anos 70 e 80, e a faixa de renda/familiar para ter
acesso aos financiamentos da Caixa Econômica aumentou ainda mais em
relação ao período anterior.
Estes dois órgãos estatais de Desenvolvimento Urbano – CDHU em São
Paulo e CONDER em Salvador, têm seus programas habitacionais reprovados
pelos movimentos sociais
261
e por um número expressivo de moradores dos
conjuntos. Em São Paulo, a principal crítica da União dos Movimentos de
Moradia (UMM-SP), em relação ao CDHU, se refere à falta de participação
261
Mesmo ações pontuais com a União da Juta em São Paulo, financiado pelo CDHU, se configuram
como ações contínuas de participação.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
202
popular
262
nas decisões de planejamento e execução do projeto. Situação que
se repete e se agrava em Salvador pela insatisfação dos moradores com o
processo de execução e a própria qualidade do projeto, como narra o Jornal A
Tarde, (22/04/2004, p. 5): [...] as novas moradias estão cheias de rachaduras e
sendo invadidas constantemente por água de esgoto, para desespero dos
moradores. Essas habitações fazem parte do Programa Ribeira Azul
263
e
abrigam famílias que moravam em cima de palafitas [...]. Reportagem que se
refere aos Conjuntos Araçás I e II, que pertencem ao mesmo programa do
Conjunto Jardim Nova Primavera.
Não houve participação da comunidade na execução da obra
deste conjunto, foram como eles [ técnicos CONDER]
quiseram, não houve participação, não houve acordo com os
moradores, não houve reunião, não teve nada disso entendeu,
a CONDER construiu em um ano, e este conjunto não era isso
aqui, era um projeto totalmente diferente [...]. Porque isso não
era para ser duas casas era para ser uma só, entendeu, ai eles
fizeram este tipo de coisa, reduziram totalmente os direitos dos
moradores. (Fala de Moradora de Conjunto Habitacional em
Salvador – Entrevista realizada em 2006)
Além da autocracia dos programas e da baixa qualidade arquitetônica
dos conjuntos habitacionais, o número de unidades produzidas continua
deixando centenas de famílias sem acesso à moradia. Em São Paulo, o
número de moradias populares produzidas nos últimos 12 anos pelo governo
262
Cf. Slavoj Zizek (2003) sobre a “realidade esvaziada de substância”, a participação integraria, do lado
do Estado, “o modo de administração competente” a que se reduziu a política. E, do lado da Sociedade
Civil (no caso popular), o movimento que se pretende de inclusão das classes dominadas na política,
tomado na chave do “reconhecimento político” dos excluídos , opera como desusbstancialização da
desigualdade e da dominação. Como respeito às “diferenças” sem colocar em xeque o problema da
desigualdade, por sua vez, tratadas no registro das carências de cada um e do necessário respeito em
relação ao ponto de vista do Outro (o “povo”), ao “conhecimento popular” da realidade urbana (suas
carências). Apenas se este não oferece dano à ordem posta, da lógica dos investimentos e da
propriedade.
263
Cf. (Relatórios da Conder, 2000) O Ribeira Azul foi um Programa de Redução da Pobreza Urbana,
elaborado com o intuito de aplacar a pobreza em uma das partes mais degradadas da Região
Metropolitana de Salvador (RMS). A área denominada “Ribeira Azul”, delimitada para a intervenção do
Programa, compreende um conjunto de bairros situados no Subúrbio Ferroviário, somando 4km
2
e
abrigando cerca de 40 mil famílias, o que eqüivale a aproximadamente 150.000 habitantes, representando
6% da população atual do Município de Salvador. Destas famílias, cerca de 2.500 pessoas moram em
palafitas nas áreas alagadas de duas enseadas, a Enseada do Cabrito e a Enseada dos Tainheiros.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
203
do Estado, não deu conta sequer de 25% do déficit habitacional. Segundo
reportagem do Jornal Agência Brasil de Fato (02.03.2006), na última década, a
CDHU produziu e entregou 222.701 unidades habitacionais no Estado de São
Paulo, que possui um déficit aproximado de 1 milhão de moradias. O número
de produção habitacional se mostra irrisório, frente a grande demanda da
população. Além disso, as unidades habitacionais quando entregues aos
mutuários apresentam diversos problemas de infra-estruturas
264
. Como se não
bastassem, o déficit quantitativo e qualitativo, estes mesmos programas são
alvos de freqüentes denúncias de mau uso do dinheiro público e de
irregularidades diversas:
[...] A CDHU é, ainda, alvo de diversas denúncias de corrupção
e irregularidades. O Tribunal de Contas do Estado de São
Paulo (TCE) apontou 380 contratos irregulares na empresa e
existem outros 706 processos em andamento sobre outras
irregularidades. A bancada governista da Assembléia
Legislativa do Estado de São Paulo tem “abafado” os pedidos
de Comissão Parlamentar de Inquéritos (CPIs), que são
instauradas na Casa há três anos – mesmo com denúncias
públicas. Jornal Agencia Brasil de Fato (02.03.2006),
264
No3. Cap. deste estudo apresentamos os principais problemas infra-estruturais dos últimos
conjuntos habitacionais construídos em Salvador.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
204
Fotografias da última série de Conjuntos Habitacionais, produzida pelo CDHU, na
extrema periferia da zona oeste da cidade de São Paulo. As ilustrações referenciam o
tipo de arquitetura utilizada, no que concerne a standartização das unidades
habitacionais e racionalização econômica do projeto. Indica um desenho
arquitetônico mais harmônico do que os realizados em Salvador. Contudo, estas
intervenções se aproximam as de Salvador no negligenciamento da dimensão
“política” do projeto, marcada por medidas autocráticas.
Fotos de Conjuntos Produzidos pela CDHU – Zona Oeste de São Paulo - 2004
Fotografias – Antonio Mateus de C. Soares
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
205
Fotos de Conjuntos Produzidos em Parceria com a CONDER– Subúrbio
Ferroviário de Salvador- 2003/04 – A expressão do envelhecimento
precoce.
Fotografias – Antonio Mateus de C. Soares
Fotografias do Conjunto Habitacional Jardim Nova Primavera, inaugurado em 2002 e já
com as marcas do envelhecimento precoce, assim como das intervenções populares,
realizadas a qualquer modo sem acompanhamento técnico. As ampliações feitas pelos
moradores das unidades habitacionais, demonstram a incapacidade do tamanho da
moradia para atender as necessidades espaciais da família.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
206
As produções habitacionais da CDHU e da CONDER sinalizam uma falta
de adequação dos projetos com as reais necessidades sociais e econômicas
da população de baixa renda. Os últimos conjuntos produzidos, principalmente
os gerenciados pela CONDER, em Salvador, são referências do
negligenciamento e do “descaso” com as condições de habitabilidade e
inserção social das camadas populares. O exemplo dos Conjuntos Araçá
265
I e
II, construídos no Subúrbio Ferroviário de Salvador, que antes de completar 10
anos de inauguração tiveram algumas de suas unidades habitacionais
demolidas por apresentarem rachaduras, situação que compromete a
visibilidade social do projeto realizado, põem em risco a vida dos moradores e
justifica o elevado grau de descrédito e insatisfação
266
da população mutuaria
com os programas habitacionais realizados pela CONDER.
O arruinamento precoce de algumas unidades habitacionais dos
Conjuntos Araçá I e II é ironicamente explicado
267
pelos técnicos responsáveis
da CONDER, em um tom de situação inelutável, por ter sido construído
“praticamente em cima do manguezal, onde o terreno precisa de um tempo de
adensamento de, no mínimo, cinco anos, para se saber como vai ficar”
268
. A
265
Este conjunto se refere a primeira etapa do Projeto de Recuperação Ambiental e Promoção Social de
Novos Alagados, promovido a partir da parceria entre a organização internacional não-governamental, a
AVSI (Associação Voluntários para o Serviço Internacional), e o Governo do Estado da Bahia, através da
CONDER (Companhia de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia). A primeira etapa, com a
construção do conjunto Araça I e II, teve como meta atender as comunidades de Nova Esperança,
Senhor do Bonfim, 19 de Março e São João – núcleos pertencentes ao aglomerado urbano de Novos
Alagados - destinados a relocalização das famílias residentes em palafitas. A segunda etapa, foi a
construção do conjunto habitacional Nova Primavera – objeto de discussão deste estudo, no 3
a
. Cap.,
visando atender o mesmo propósito dos dois primeiros.
266
Cf. Fala de Morador, em entrevista realizada em 2006 [...] no Conjunto Araçás I, ninguém tinha
convicção que iria acontecer as rachaduras e desabamentos e aconteceu, porque aqui [Conjunto Nova
Primavera]não iria ter também as condições disto acontecer? Pode vir acontecer sim, e sem contar
também, viu Mateus, você tocou em um ponto que eu havia esquecido, agente sabe que nas etapas do
Conjunto Araçás I e II, o pessoal não tinha este ônus de pagar a casa, ai eu faço a pergunta: Por que o
pessoal do Conjunto Nova Primavera que vieram de palafitas como os de Araçás I e II, que também
vieram de palafitas vão ter que pagar, nós somos melhores ou piores do que eles.
267
Em entrevista realizada para atender as necessidades deste estudo, junto a arquiteto da DEHAB –
Departamento de Habitação da CONDER, 2006.
268
Cf. (Pesquisa de mestrado, 2006) Informação colhida em entrevista realizada com arquiteto, funcionário
da CONDER.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
207
explicação técnica do gestor da Companhia de Desenvolvimento Urbano da
Bahia vai de encontro à preservação ambiental ao tempo em que confessa a
pressa e o erro técnico de avaliação da base geológica do terreno em que se
ergueram as unidades habitacionais. Mas, se neste caso o massapé – terreno
movediço – foi o responsável, no Conjunto Jardim Nova Primavera os danos
mais gerais são resultantes da baixa qualidade física da engenharia utilizada e
pela falta de acabamento interno das unidades habitacionais. Situação que
demonstra que o interesse dos últimos programas habitacionais realizados pela
CONDER, em Salvador, parece ser orientado para a satisfação dos anseios
das empreiteiras e incorporadoras imobiliárias na dissimulação de uma
“política” urbana que exacerba a precarização das condições de vida da
população de baixa renda.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
208
Fotos de unidades habitacionais que desabaram nos Conjuntos Araçás I e II –
conjuntos produzidos pela CONDER. Subúrbio Ferroviário de Salvador- 2003/04
Fotografias – Antônio Mateus de C. Soares
Imagens da demolição do Conjunto Araçá I e
II,motivada pelo aparecimento de rachaduras. Este
conjunto faz parte do mesmo programa
do Conjunto Nova Primavera. Uma referência do
descaso técnico do projeto e do desrespeito social
com os mutuários.
Fotografias – Antônio Mateus (2004)
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
209
A CONDER entregou a casa sem reboco, e ainda 70% das
casas estão sem reboco. A infra-estrutura do Conjunto é de
total descaso, as quadras dos conjuntos não são niveladas,
não tem iluminação; o tanque de água do vizinho fica no quarto
do outro vizinho, a casa que fica em cima pertence a uma
família e a de baixo a outra família; os tanques ficam todos em
um quarto; falta posto de saúde; faltam escolas. (Fala de Líder
Comunitário do Conj. Jardim Nova Primavera – Entrevista
realizada em 2006).
Fotos internas Conjuntos Produzidos em Parceria com a CONDER – Subúrbio
Ferroviário de Salvador- e entregues a população inacabados 2003/04.
Fotografias – Antônio Mateus de C. Soares
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
210
Tanto os projetos habitacionais desenvolvidos pela CONDER, como pela
CDHU, não se configuram como políticas de habitação, mas como medidas de
intervenção estatal ideológicas e populistas executadas parcialmente a partir
da realização de programas autocráticos em áreas favelizadas e/ou de riscos,
publicizando dissimuladamente em tons de grandiosidade em ão de política
pública “o resgate de centenas de famílias que ilegal ou informalmente se
amontoavam em áreas precarizadas’’
269
.
A constituição desta síntese ilustrativa das últimas produções do período
pós-BNH indica que como problema, os programas e projetos de habitação
popular não encontraram ainda solução; como questão social ela continua a
não dar respostas eficazes para a população que lhe demanda. O Estado em
sua lógica de exclusão pela inclusão continua minimizando suas
responsabilidades frente ao problema habitacional brasileiro. Na Bahia, assim
como em São Paulo, e também em outras capitais brasileiras, a exceção
captura o Estado, enquadra o planejamento e diz que têm e quem não têm o
verdadeiro direito à cidade.
269
Slogan de propaganda de intervenção urbana freqüente nos relatórios da CONDER, consultados para
este estudo.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
211
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
212
Notas Conclusivas
Como ficou patente neste estudo, a habitação popular no Brasil é um
problema de mais de 100 anos e persiste em continuar. O déficit habitacional
brasileiro é progressivo, em 2004 tínhamos 6,9 milhões de pessoas sem
moradia digna, em 2006 o número avança para 7,9 milhões
270
. A habitação
popular além de ser uma mercadoria de alto custo, os setores financeiros,
dificultam o seu acesso, através de uma burocracia excessiva. O capital
financeiro além de capturar o Estado de Direito determina que a provisão da
necessidade de moradia popular, nos paises subdesenvolvidos só se mostra
possível através do desenvolvimento de grandes periferias. A barbárie parece
instaurar-se! A exceção virá regra, e a nossa legião de cidadãos sem cidadania
amontoam-se nas cidades brasileiras. (Grifo meu)
Ao mesmo momento que Robert Castel (1995), afirma “que não se
constrói cidadania sobre a inutilidade social”, ele diz de formar subliminar que a
extensa vulnerabilidade em que vivemos é de responsabilidade do Estado, pois
é ele que permitiu o crescimento da desigualdade social e o desenvolvimento
de uma “sociedade incivil” no sentido de (DONZELOT, J. 1999, p.94). O capital
venceu o social e aniquila homeopaticamente o Estado de Direito. (...) A
exceção capturou a política habitacional: os números do déficit continuam a
aumentar, as poucas unidades habitacionais que são entregues a população
são arremedos que pouco alteram a situação de vulnerabilidade social em que
os despossuidos de direito vivem. (Grifo meu)
270
Ministério das Cidades – Secretária Nacional de Habitação, 2006
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
213
Às situações apresentadas neste estudo, referindo-se aos conjuntos
habitacionais: Loteamento Vale das Dunas, Vila Viver Melhor, Jardim Nova
Primavera, e suas relações com a cidade de Salvador, possibilitam
considerações quanto à parcialidade de sua inserção no tecido urbano, assim
como a ineficácia do Estado em promover uma política habitacional coerente
com as reais necessidades da população de baixa renda.
Como observamos no trabalho a inserção dos conjuntos habitacionais e
de seus habitantes na cidade é muito mais do que a alocação no tecido urbano,
ela envolve um conjunto de variáveis objetivas e subjetivas que estão
presentes desde a qualidade da arquitetura até a relação política, social e
econômica que os moradores mantêm com o espaço construído e com a
cidade. Deste modo, os casos estudados, tiveram uma inserção debilitada, por
uma lógica que além de não primar pela qualidade construtiva do projeto, não
respeitaram os seus moradores, impedindo-os de participarem das tomadas de
decisões.
A habitação popular e o atendimento parcial da função de inserção
social são dimensões das ambivalências criadas entre cidade formal, informal,
legal e ilegal ou, sintetizando, ambientes da riqueza e ambientes da pobreza. A
realização de projetos de habitação popular obedientes à lógica de apropriação
capitalista fabrica conjuntos habitacionais como o Viver Melhor, o Nova
Primavera e o Vale das Dunas, destituídos de qualidades na infra-estrutura
física e de integração com a cidade. Para além disto, o estudo demonstra que
os interesses dos agentes imobiliários urbanos, nas investidas em projetos
para a população pobre, são diferentes das necessidades apresentadas pela
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
214
população, e tem como conseqüência o insucesso social da intervenção e uma
insatisfação generalizada entre a população.
De forma predominante os projetos habitacionais em foco também nos
permitem refletir sobre a destituição da prática política
271
enquanto
possibilidade de diálogo entre população, técnicos e governo. A política em
entendimento amplo sinaliza as condições mínimas para a existência coletiva,
ela não pode ser pensada como uma ação isolada e individualizada, não pode
ser confundida com as técnicas de governabilidade impostas pela lógica
econômica do capital financeiro que captura e controla a vida social. A
política
272
se constitui como uma construção em antagonismos, regida por
embates de idéias. Para Jacques Ranciére a política se faz a partir do
dissenso.
O dissenso: não é um conflito de pontos de vista nem mesmo
um conflito pelo reconhecimento, mas um conflito sobre a
constituição mesma do mundo comum, sobre o qual nele se vê
e se ouve, sobre os títulos dos que nele falam para serem
ouvidos e sobre a visibilidade dos objetos que nele são
designados. O dissenso não é a guerra de todos contra todos.
Ele dá ensejo a situações de conflito ordenadas, a situações de
discussão e de argumentação. Mas essas discussões e
argumentações são de um tipo particular. Não podem ser a
confrontação de parceiros já constituídos sobre a aplicação de
uma regra geral a um caso particular. Com efeito, deve
primeiro constituir o mundo no qual elas são argumentações.
(RANCIÉRE, 1996, p. 68).
Os projetos elaborados em questão além de possuir uma baixa qualidade
construtiva, foram realizados a revelia de uma verdadeira participação popular
271
Cf. (ARENDT, 1995, p. 189) A prática política não é o sinônimo de governar, mas de falar e ser ouvido
na presença de outros; um diálogo em que todos têm o direito à palavra, pois é com a “palavra que nos
inserimos no mundo humano” e esta inserção confirma o fato original e singular de estar no mundo.
272
Cf. (RANCIÉRE, 1996, p. 372) [...] a palavra política pode ser entendida como um conjunto de atividades que
vêm perturbar a ordem da polícia pela inscrição de uma pressuposição que lhe é inteiramente heterogênea. Essa
pressuposição que lhe é inteiramente heterogênea é a igualdade de qualquer ser falante com qualquer outro ser falante
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
215
e cidadã. A falta de uma intervenção urbana realmente compartilhada com a
comunidade marcou a elaboração dos projetos dos conjuntos, como resposta
observou-se um quadro de precarizações e de múltiplas vulnerabilidades, que
frustraram as expectativas dos moradores ao passo que fizeram alguns deles
venderem suas unidades habitacionais, por falta de condição econômica para
manterem.
De forma geral, a gestão e o planejamento de obras urbanas voltadas
para a população de baixa renda, quando construídas desvinculadas de uma
ação
273
popular eficaz não fomentam possibilidades para uma efetiva inserção
no tecido urbano. A participação referida, não é ouvir ou dar opinião, mas fazer
e fazer-se parte de um projeto, ou seja, ser também modificado no projeto e
pelo projeto. Neste sentido a participação em projetos de intervenção devem
ser reorientados por construções de diálogos entre: população, técnicos e
governo. A participação deve ser constituída privilegiando a liberdade do
pensar, falar
274
e agir, a conversa o diálogo, o direito a palavra, além de dar
sentido à participação, são premissas que devem induzir a autonomia da
tomada de decisão. O conflito é outra variável importantíssima na manutenção
do real sentido da política e dos projetos coletivos, pois é através do conflito
que temos a constituição da política
275
, dos acordos múltiplos e do direito ao
argumento. Eis o paradoxo encontrado no caso em estudo: há um projeto
urbano-arquitetônico, mas não há um projeto social de inclusão urbana. Os
273
Cf. (NETO-DANTAS, 1999, p. 63) A reflexão Arendtiana sobre a ação não se deve ter no sujeito, mas
se derramou sobre o que podemos chamar de fato não processual da ação – a espontaneidade do
impulso que a faz emergir, junto como discurso – e sobre os processos limitadores dos efeitos da ação no
mundo.
274
Cf. (ARENDT, 1995, p. 136) [...] os homens no plural, isto é, os homens que vivem e se movem a
agem neste mundo, só podem experimentar o significado das coisas por poderem falar e ser inteligíveis
entre si e consigo mesmo. [...] Os bárbaros não sabem falar, por isso optam pela violência – violência e
barbaridade – a barbárie é a falta de espaço público, é a falta de discussão.
275
Cf. (RABOTNIKOF, 2005, p.45) [...] el hecho de volver la mirada sobre el espacio público expresa em
gran parte las esperanzas y desconciertos en las formas de percibir y pensar la política.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
216
moradores dos conjuntos habitacionais continuam sendo vistos como
problemas.
Os conjuntos habitacionais – a arquitetura e a população – antes de ser
concebidos como espaços preenchidos por unidades físicas e aglomerados de
pessoas, alocadas no tecido urbano, devem ser compreendidos, como espaços
plurais, contidos na cidade totalizada. Tal concepção, unidade e totalidade,
articularia estratégias para a construção de um projeto habitacional integrado
com a cidade. Deste modo, para se pensar uma intervenção habitacional que
realmente se integrasse com seu contexto urbano, tanto na escala física como
social, seria necessário o desenvolvimento de estratégias compartilhadas, que
além de entender a cidade como fenômeno dinâmico, utilizasse métodos
dialógicos e participativos
276
. A intervenção referida, além de um ato de
planejamento é uma ação de orientação e amparo social que deve ser pensada
democraticamente e contextualizada conforme as realidades sociais,
envolvendo todos os interessados, que juntos devem estabelecer um roteiro
para a elaboração de um programa de ação compartilhada.
A efetivação da participação é complicada, mas não impossível. Ela
depende de condições objetivas decorrentes da estrutura econômica-social, da
cultura política que se constrói historicamente e de condições subjetivas em
termos da organização e mobilização da sociedade civil. Contudo, os esforços
não podem ser medidos para se alcançar esta participação, pois é o diálogo
participativo (o falar, o ouvir, o discutir, o discordar) que fazem a política.
Assim, qualquer iniciativa participativa que se realize sem a interlocução da fala
276
Cf. (DE GRAZIA, 2003:54) [...] é necessário se dá atenção à participação da população organizada
como condição para a conquista de direitos, da cidadania, de novas políticas públicas que incorporem os
excluídos e dê novas referências para as cidades.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
217
e da palavra, no sentido Arendtiano, é uma ação
277
sem sentido político. A
ausência da fala e da palavra para Hannah Arendt (1987) é simultânea ao
surgimento da violência e ao aniquilamento da vida humana. A política se
configura pela possibilidade da ação da palavra, ou não é política. A falta
dessas possibilidades transforma a política em administração e o cidadão em
fantoche. Segundo (FELTRAN. G. 2005) eliminados os espaços
compartilhados de entendimento da vida, espaços públicos, portanto, elimina-
se a própria política e a possibilidade de fundação do que a autora chama de
mundo comum
278
.
A não confirmação destes conjuntos habitacionais, enquanto um
equipamento de inserção urbana, é visível e explicita-se pela sua infra-
estrutura depreciada e pela ausência de uma discussão compartilhada, entre
técnicos e população, em sua construção, configurando-se em uma
intervenção urbana dissociada de uma política social de inserção à urbanidade.
Além de impessoal, descontextualizada, a arquitetura utilizada no Conjunto
Habitacional é de baixa qualidade, e leva a um envelhecimento precoce das
unidades habitacionais, o que permite afirmar que projetos urbanos de
habitação popular desprovidos de uma contextualização com as realidades dos
moradores não se constituem como projetos de inserção e integração no
território dos direitos sociais de acesso a cidadania.
277
Cf. (ARENDT, 1987, p. 204) [...] Além de toda ação possuir a tendência inerente a violar todos os
limites e transpor todas as fronteiras, há o fato de que a ação atua sobre seres que também são agentes,
daí toda reação ser sempre uma nova ação e, portanto, também ilimitada; a segunda propriedade é a
imprevisibilidade: não só é impossível prever as conseqüências lógicas de cada ato mas há,
principalmente, o fato de que, a partir do momento fugaz do ato se inicia uma nova história, que terá seu
sentido independente daquele ato que a gerou, um sentido que somente se revela quando ela termina,
quer dizer, revela-se ao espectador e não ao ator.
278
Cf. (ARENDT 1987, p.56) O mundo comum é constituído pelo conjunto dos espaços entre as pessoas,
formado por categorias interpretativas; o mundo não é uma estrutura é um agir constante; o mundo é
criado por ações. A ação é a capacidade de dar início a um novo começo, a potência de fazer coisas que
se perdem em seu acontecer.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
218
(...) restituindo o território à elaboração cidadã, poderia ao
menos desestabilizar os vetores da segregação, estendida
aqui como forma de dominação que limita o acesso de parcelas
da população aos bens da cidade. Modo pelo qual as
experiências da desigualdade poderiam ganhar dimensão
pública aos revés da experiência privatizante das carências
locais. (RIZEK,2003, p. 57 )
Desta forma, a gestão segregacionista e autocrática destes conjuntos
habitacionais populares possui, como uma de suas expressões, a arquitetura
econômica ou popular, destinada aos pobres, que segue à risca os ditames do
radicalismo capitalista que determina aos ricos a riqueza e aos pobres a
pobreza. A habitabilidade estabelecida como um direito humano, também
presente na Carta de Atenas como uma das funções da cidade, se transforma
em mercadoria, em objeto de especulação, um mero objeto de consumo em
que se pode obter lucro com sua comercialização.
A falta do debate qualificado dos programas de habitação social/popular
no Brasil, não é novidade, inúmeros trabalhos
279
debatem e condenam às
dissimuladas técnicas políticas de se construir moradia para pobres. A
participação social, ou gestão participativa, legitimada pelo o Estatuto da
Cidade (2001), não se concretiza, servindo apenas para a negação do “direito a
ter direito”.
O espaço de debates entre os responsáveis técnicos e a população; a
relevância do discurso; o embate de idéias; o conflito político e ação discursiva,
são variáveis que inexistem na construção da habitação social no Brasil, os
conjuntos estudados em Salvador, são apenas um exemplo próximo da
279
Como exemplo: RIZEK, C. S., BARROS, J. S., BERGAMIN, Marta de Aguiar. A política de produção
habitacional por mutirões auto gestionários: construindo algumas questões. ANAIS do X ENA. Belo
Horizonte: v.1, n.1, p.1 - 22, 2003. e também, SOARES, A. M. de C.Das palafitas aos novos conjuntos
habitacionais In: Seminário Internacional NUTAU 2004, 2004, São Paulo.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
219
negação da participação, via aniquilamento da palavra
280
, e da política. A falta
de participação política transforma o indivíduo em fantoches de técnicas de
gestões. Os moradores destes conjuntos são vítimas de um poder estatal que
os ignoram enquanto cidadãos de fato e de direito.
A falta do diálogo participativo, em projetos sociais de construção de
moradia, a imposição do projeto sem a consulta prévia dos envolvidos, tem
implicações na sustentabilidade social do projeto, ou seja, a situação de
excluído social é permanente. A liberdade de participar, a ação e o discurso
plural que deveriam nortear a participação coletiva foram substituídas por
sorteios e por uma mera consulta de meia dúzia de pessoas.
A liberdade, no movimento da ação, é uma condição indispensável na
criação do mundo comum e das decisões coletivas que são propícios para a
transitividade que efetiva a própria ação e o discurso – atos comunicativos da
convivência entre seres singulares.
A liberdade de movimento é também a condição indispensável
para a ação, e é na ação que os homens primeiramente
experimentam a liberdade no mundo. Quando os homens são
privados do espaço público – que é constituído pela ação
conjunta e a seguir se preenche, de acordo consigo mesmo,
com os acontecimentos e estórias que se desenvolvem em
história – recolhem-se para sua liberdade de pensamento.
(ARENDT, 1987, p.181)
O desestimulo à ação como envolvimento político faz da participação
um simulacro e a política ganha feições de técnica gestionária. O direito não é
negociado, é imposto de maneira negligenciada, salvacionista e humanitária
281
.
280
Segundo Hannah Arendt, os homens no plural, isto é, os homens que vivem e se movem e agem
neste mundo, só podem experimentar o significado das coisas por poderem falar e ser inteligíveis entre
si e consigo mesmo.
281
Cf. (ZIZEK, 2003, p.111) os excluídos não seriam somente os terroristas, mas todos aqueles que se
colocam na ponta receptora da ajuda humanitária. O Homo sacer de hoje seria o objeto privilegiado da
biopolítica. “o que é privado da humanidade começa a ser sustentado por ela com desprezo.” [...]O autor
ainda nos chama a atenção para o paradoxo dos campos de refugiados que recebem ajuda humanitária,
expõe duas faces, “humana” e “desumana”.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
220
Neste sentido, poderia ousar a dizer que estas formas de habitação social e
sua concepção são exemplos da “desumanização planejada”, como manifesta
Hannah Arendt (1995), ao tratar da perca da qualidade humana nas pessoas.
Mesmo sabendo que a ignorância instrucional do individuo e sua falta de
discernimento e de interesse para se qualificar o tornam inaptos e
desestimulados para a participação
282
, percebo que muitos programas com
suas técnicas gerenciais, tiram proveito deste tipo de desqualificação humana
e os mantêm no constante desprovimento do senso crítico político. A
participação política nas decisões de urbanismo deve ser percebida como uma
possibilidade de aquisição e extensão da cidadania com a incorporação da
massa no processo discursivo e conflitivo do espaço público.
[...] com procedimentos e regras próprias, sempre discutidas e
renovadas de forma democrática e a partir da reflexão da ação
é possível contornar as demandas fragmentadas e
particularistas de determinados grupos sociais e de estabelecer
um espaço dialógico. É necessário re-qualificar a participação
popular nos termos de uma participação cidadã que interfere,
interage e influência na construção de um senso de ordem
público regida pelos critérios da equidade e justiça. (TELLES,
1994, p. 52)
A execução destes três conjuntos foi marcada pela a ausência da fala,
situação que os constitui como mais um dos muitos projetos sociais
283
que se
realizaram de qualquer jeito, desrespeitando o homem e simulando uma “ação
282
Cf. ( TEIXEIRA, E. C., 1999, p.200) A educação política, por si só, não é suficiente para suprir as
deficiências e superar os obstáculos à participação nas decisões que se tornam cada vez mais
complexas, envolvendo multiplicidade de interesses, incertezas, custos, garantindo conquistas
institucionais e políticas já alcançadas.
283
Cf. (TEIXEIRA, E. C., 1999, 181) A incapacidade de o Estado atender a uma série de demanda, a
perplexidade dos movimentos em enfrentar a nova situação e criar novas alternativas, levaram a um certo
refluxo e indecisão sobre como agir. Daí, a tentativa de isolar-se em projetos alternativos, produtivos,
sociais, na busca de resolver problemas e carências de determinados grupos sociais. (TEIXEIRA, E. C.
apud DOIMO) [...] há no Brasil uma erosão do campo ético-político popular, reconhecendo, porém, que
nesse processo “foram liberadas várias energias sócio-políticas e recursos de poder, capazes de compor
novas alternativas de participação”.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
221
política”, que contraria em gravidade, o pensamento político de Hannah Arendt,
pois nestes casos em estudo o diálogo foi inexistente, não houve arranjos
deliberativos e a noção de política arendtiano exterminada de forma fulminante.
A realidade das atuais políticas de construção de moradia se configuram como
insensatos programas de gestões, que administram e gerenciam não apenas o
projeto mas à vida das pessoas, em suas subjetividades e desejos. O teoria de
Hannar Arendt (1987;1995;2001;2004), nega radicalmente a compreensão da
política como gestão, como administração de conflitos como estando ligada à
governabilidade, ou restrita à chamada “sociedade política”.
Os tempos sombrios parecem não ter fim na contemporaneidade...
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
222
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
223
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236
QUESTIONÁRIO
Nº da entrevista: ___________Nome do entrevistado: _____________________________
Endereço:________________________________________________________________
01 – SEXO:
( ) Mas ( ) Fem
02 – IDADE: _________
03 –ORIGEM:
( ) Interior do Estado
( ) Palafita em Salvador
( ) Outra área de Salvador
Onde?______________
04 – SITUAÇÃO CONJUGAL:
( ) Casado ( ) Solteito ( ) Separado/ Divorciado ( ) Amaziado/Ajuntado
05 – NÚMERO DE DEPENDENTES RESIDENTES EM CASA:
( ) Nenhum ( ) Menos de 3 dependentes
( ) Entre 3 e 5 dependentes ( ) Mais de cinco dependentes
06 – SITUAÇÃO ECONÔMICA DO CHEFE DA FAMÍLIA:
( ) Empregado ( ) Desempregado
Função exercida? ____________
( ) Biscate ( ) Comerciante _______________
( ) Pensão/Aposentadoria
07 – RENDA FAMILIAR:
( ) Menos de 01 salário mínimo ( ) Entre 01 e 02 salários mínimos
( ) Entre 02 e 05 salários mínimos ( ) Mais de 05 salários mínimos
( ) Nenhuma renda
08 – MAIOR ESCOLARIDADE DE ALGUM MEMBRO DA FAMILIA:
( ) Ensino Fundamental incompleto ( ) Ensino Médio incompleto
( ) Ensino superior incompleto ( ) Ensino Fundamental completo
( ) Ensino Médio completo ( ) Ensino superior completo
( ) Curso técnico ( ) Não alfabetizado
09 – TEMPO DE MORADIA NO CONJUNTO:
( ) Alguns meses ( ) 01 ano
( ) 01 ano e alguns meses ( ) 02 anos
( ) 05 anos ( ) Desde a inauguração
10 – RELAÇÃO COM A UNIDADE HABITACIONAL:
( ) Proprietário desde a inauguração
( ) Proprietário por compra em mãos de terceiros
( ) Locatário ( ) Empréstimo
( ) Ocupado sem autorização prévia
11 – SITUAÇÃO DO PAGAMENTO DA UNIDADE HABITACIONAL:
( ) Quitada ( ) Em amortização ( ) Em atraso
( ) Outros________________ ( ) Não sabe
12 – QUANTOS CÔMODOS TÊM SUA MORADIA ATUAL? ( Especificar )
( ) Entre 1 e 3 ( ) Possui 03 cômodos ( ) Possui 04 cômodos
( ) Possui 05 cômodos ( ) Entre 05 e 08 cômodos ( ) Mais de 08 cômodos
13 – O SR.(A) FEZ ALGUMA ALTERAÇÃO NO IMÓVEL (MUDANÇA NA PLANTA
ORIGINAL? (MÚLTIPLA ESCOLHA)
( ) 1. Sim. Quais?
( ) 1. Eliminação de paredes internas ( ) 2. Construção de paredes internas
( ) 3. Ampliação da moradia, anexada a casa ( ) 4. Ampliação da moradia, separada da casa
( ) 5. Acabamento (louças e metais) ( ) 6. Revestimento (pisos e paredes)
( ) 7. Muro e Grade ( ) 8. Outros. Quais?____________________
( ) 2. Não
14. SUA MORADIA É UTILIZADA PARA: (MÚLTIPLA ESCOLHA)
( ) 1. Uso exclusivo residencial
( ) 2. Geração de renda: comércio, produção, prestação de serviços. Qual?__________________
( ) 3. Práticas religiosas (cultos, missas)
( ) 4. Associativismo (reuniões comunitárias)
( ) 5. Aluguel de cômodo ou cama
( ) 6. Outros. Quais?:_______________________
15. PARA AS NECESSIDADES DE SUA FAMÍLIA O SR.(A) CONSIDERA QUE O TAMANHO
(DIMENSÃO) DA UNIDADE HABITACIONAL ENTREGUE A SUA FAMÍLIA É:
( ) 1. Mais que suficiente ( ) 2. Suficiente ( ) 3. Pequena ( ) 4. Muito pequena
16. A SUA MORADIA É LIGADA A REDE DE ÁGUA?
( ) 1. Sim, com medidor individual ( ) 2. Sim, com medidor coletivo
( ) 3. Sim, ligação direta na rede ( ) 4. Não
17. SUA MORADIA É LIGADA À REDE DE ENERGIA ELÉTRICA?
( ) 1. Sim:( ) 1. Sim, medidor individual ( ) 2. Sim,medidor coletivo( ) 3. Sim, empréstimo do vizinho
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237
( ) 4. Sim, ligação direta ao poste de luz ( ) Não
18. O SR. (A) SABE QUAL O VALOR TOTAL DO IMÓVEL?
( ) 1. Valor: R$___________ ( ) 2. Não sabe
19. AS PRESTAÇÕES SÃO PAGAS:
( ) 1. No nome do morador-mutuário
( ) 2. Em nome do antigo proprietário/mutuário
( ) 3. As prestações não são pagas
20. O SR.(A) SABE DE ONDE VIERAM OS RECURSOS PARA A OBRA?
(MÚLTIPLA ESCOLHA)
( ) 1. Órgão público municipal ( ) 2. Órgão público estadual
( ) 3. Caixa Econômica Federal ( ) 4. Empreiteira/construtora
( ) 5. Outros. Quais?:________________ ( ) 6. Não sabe
21. NA SUA OPINIÃO, QUAIS OS TRÊS PRINCIPAIS PROBLEMAS QUE AFETAM A SUA
MORADIA?
1. Primeiro problema: Nº_____2. Segundo problema: Nº_____3. Terceiro problema: Nº_____
Indique os problemas:
( ) 1. Problemas nas instalações elétricas ( ) 14. Enchentes
( ) 2. Problemas nas instalações hidráulicas ( ) 15. Falta ou precariedade de transporte
( ) 3. Problemas de umidade e de infiltração de água ( ) 16. Falta de escolas
( ) 4. Qualidade da construção ( ) 17. Falta de equipamentos de saúde
( ) 5. Tamanho da moradia ( ) 18. Falta de equipamentos de esporte (quadras, campo de
futebol, etc.)
( ) 6. Valor da prestação ( ) 19. Falta de praças
( ) 7. Problemas com a vizinhança ( ) 20. Falta de manutenção de equipamentos coletivos
(bancos, prédios públicos, etc.)
( ) 8. Falta de parquinho para as crianças (playground) ( ) 21. Falta de comércio
( ) 9. Falta de água ( ) 22. Violência e falta de Segurança
( ) 10. Esgoto (rede e tratamento) ( ) 23. Atropelamento
( ) 11. Lixo e destinação inadequada ( ) 24. Mudança freqüente dos moradores
( ) 12. Pavimentação precária (asfalto, paralelepípedo...) ( ) 25. Não existem problemas
( ) 13. Falta ou precariedade de iluminação
22. O SR. (A) TEM CONHECIMENTO DA SAÍDA DE MORADORES DESTE CONJUNTO
HABITACIONAL?
( ) 1. Sim. Porquê? (múltipla escolha)
( ) 1. Falta de condições de pagamento das prestações ( ) 2. Problemas familiares
( ) 3. Estruturas das unidades habitacionais ( ) 4. Falta de Adaptação
( ) 5. Outros. Quais:__________ ( ) 6. Não
23. NO CASO DE SUA MORADIA APRESENTAR PROBLEMAS DE CONSTRUÇÃO SR. (A)
SABE COMO PROCEDER?
( ) 1. Sim Como? ______________________________ ( ) 2. Não
24. O SR. (A) RECEBEU CÓPIA DA PLANTA DA SUA MORADIA?
( ) 1. Sim ( ) 2. Não ( ) 3. Não Sabe
25. NA SUA OPINIÃO, QUAIS AS MAIORES QUALIDADES DA SUA MORADIA?
1. ______________________________________________________________________
2. ______________________________________________________________________.
26. NA SUA OPINIÃO O FATO DE POSSUIR ESTE IMÓVEL SIGNIFICAR PARA VC. E SUA
FAMÍLIA
( ) 1. Ótimo ( ) 2. Bom ( ) 3. Regular ( ) 4. Ruim
27. COMO ADQUIRIU A UNIDADE HABITACIONAL:
( ) Através de cadastro no programa ( ) Repasse da unidade habitacional
( ) Compra de terceiro ( ) Troca de moradias
( ) Re- qualificação ( ) Não se aplica
28. COMO AVALIA O CONJUNTO HABITACIONAL:
( ) Ótimo ( ) Bom ( ) Regular ( ) Ruim ( ) Péssimo
29. EXISTE REPRESENTAÇAO ASSOCIATIVA NO CONJUNTO:
( ) Sim ( )Oficial ( ) Ñ oficial
Qual?______________
( ) Não
30. EM RELAÇÃO A ASSOCIAÇÃO DO SEU CONJUNTO HABITACIONAL VC.PODE
AFIRMAR:
( ) Existe mais não atua ( ) Existe e é atuante
( ) Não existe ( ) Existe mas não tenho envolvimento
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238
ENTREVISTA
Listagem das Entrevistas: Conjunto Habitacional Vila Viver Melhor
Série I – Viver Melhor
15.02.2006
Srta. CATILENE DOS S. BONFIM (Moradora da área favelizada antes da intervenção e atual moradora-
caminho 3). Possui 24 anos; moradora há 12 anos da área; separada; garçonete; tem 5 filhos; foi uma
das primeiras moradoras a ter sido contemplada com a troca de casa.
1 – Há quanto tempo você mora aqui Catilene?
Moro desde os doze anos de idade, hoje já tenho 24 anos.
2– Sua função, você trabalha em que?
Agora estou trabalhando em um Bar, sou garçonete, mas antes era dona de casa
3– Você tem quantos filhos?
Tenho 5 filhos
4 – Catilene como era a sua vida antes do Conjunto Vila Viver Melhor, onde você morava?
Morava logo na frente do Viver Melhor, entendeu? Só que minha vida era ruim porque o lugar que eu
morava sofreu um deslizamento e soterrou uma casa com várias pessoas, eu já vivia assustada. Quando
o Viver Melhor chegou para mim, foi a melhor coisa que existiu, porque logo que chegou começou a tirar
as pessoas do meio e do fundo, ai eu fiquei logo pedindo para me tirar lá da frente, porque foi época de
chuva, ai depois que fez isso aqui está uma maravilha, eu dou graças a Deus de não ver um barro, não
vejo um barro,não penso em voltar para invasão, não penso em voltar para um lugar de barro.
5 – E sua casa antes como era?
Minha casa antes era um barraco, um quarto, uma sala e uma cozinha, o banheiro eu utilizava o da casa
de minha mãe.
6 – E hoje como é a sua vida no Conjunto Viver Melhor, você gosta do conjunto, gosta de sua
casa?
Gosto do conjunto, gosto de minha casa, apesar de ser pequena, né!.Porque não existe família pequena
aqui no Viver Melhor, todas as famílias são grandes, pobre só sabe fazer filhos [risos]. Mas tirando o caso
de filho pequeno, é uma maravilha, principalmente a minha [casa] que os quartos é em cima, ai eu fico
doida!!! Quando estou retada subo para o quarto e fico lá, não atendo ninguém, nego pode morrer ali
chamando.
7 – Quais os principais problemas do Conjunto Viver Melhor, Catilene?
Os esgotos quando entopem e os carros do lava jato que sobem aqui rasgando, em tempo de pegar os
meninos entendeu e acontecer um acidente. E, os esgotos, estes esgotos aqui, em um mês tem 30 dias,
28 dias fica entupido derramando pela rua.
8 – Mas não tem uma Associação Comunitária, um grupo organizado aqui no Viver Melhor para
tentar e de encontro a estes problemas, para tentar reclamar na prefeitura, para tentar reclamar na
CONDER ?
Olha de ter tem! Só que fica um jogando para cima do outro, entendeu? Se um faz, joga na cara – alega,
se o outro não faz diz que faz, ai começa a briga, e como você perguntou ai, tipo um trabalho social,
existe, a mulher de André, que era da comissão, mas entre aspas, existe teatro, ela pega os meninos e
cadastra para ir para o Vila Velha, para ver teatro de graça, mas entre aspas, pois é só os da vontade
deles.
9 – E você está satisfeita com o Conjunto?
Tô!
10 – Mas houve casas aqui no Conjunto que racharam?
É, a minha também rachou, desde quando me entregaram, a escada já era toda rachada perto da divisão
com o lastro da laje é toda rachada.
11 – Mas você não tem medo? Você já reclamou?
Sim, já reclamei, [a filha da entrevista está no colo e pede peito, ela diz que daqui a pouco dará, pois está
fazendo a entrevista comigo].
12 – Você falou dos problemas do conjunto dos pontos negativos, e os pontos positivos?
O positivo é que tem esta praça grande ai para meus filhos correrem, apesar de não ter privacidade por
causa dos carros, mas tem a praça, tem a quadra, é só isso.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
239
13 – No período da invasão havia conversas entre a comunidade? Havia participação? Houve
participação na mudança para o Conjunto Vila Viver Melhor?
Não de todo mundo, mas de haver, havia !
14 – Vocês participaram deram opinião na construção do Conjunto Vila Viver Melhor?
Participamos, teve muita reunião, quase todo dia tínhamos reunião aqui, pois logo no começo eles
queriam trazer pessoas que não eram daqui, ai agente fez as reuniões.
15 – Então Catilene, você acha que tinha participação da comunidade?
Acho, havia sim, havia sim, só não havia para aqueles que não queriam ir para as reuniões, ao contrário
havia.
16 – Há violência no Conjunto Viver Melhor?
De haver violência, há! principalmente nos fins de semana – a cachaça!!! Porque aqui há mais bares do
que casa, né, você pode reparar aqui quase todas as casas viraram comércio viraram bar,ai nego bebe
demais, é briga de vizinho, briga por causa de menino, mas tudo por causa de cachaça, a maioria das
brigas é por causa de cachaça.
17 – O que você acha da lavagem de carro?
Uma negação!!! Porque minha mãe duas vezes foi parar no Ernesto Simões [hospital], por causa de
queda de pisar em óleo, foi mal mesmo, uma vez ela ficou tão mal, tão mal que nós ficamos com medo
de pegar. Eu já me sujei toda de óleo, as pessoas saem daqui arrumadas, e lá embaixo se sujam todas
no lava jato, é!, é!, você sair toda arrumada e lá em baixo tem que suspender a barra da calça para não
sujar no lava jato.
18– Mesmo sabendo que a lavagem de carro é uma fonte de renda para a comunidade, você é
contra o lava jato?
Sou, sou contra, é fonte de renda para eles, pois benefício aqui para cima eles não trazem nenhum, nada,
nada mesmo, tem gente aqui que não tem condições de pagar água e luz, eles lá esnobam água, aquela
torneira fica ligada o dia todo, a água que gasta dá para abastecer uma cidade, a água fica ligada o dia
todo sem precisão, luz ali, eles pegam do poste, rouba da rua e quem paga é o pessoal daqui de cima. Eu
trabalho, antes de eu trabalhar, eu não boto água para gelar na geladeira, por causa dos meninos, para
os meninos não beberem, eu boto água no filtro. Minha luz malmente era a televisão, pois meu som está
quebrado, ochê!!! ai minha luz vinha R$ 18,00, R$ 20,00, você acha que eu gastei, nada, nada disso.
19 – O que você acha que falta aqui no Conjunto Viver Melhor?
Um Posto de Saúde, os Postos de Saúde não atendem, atende só a população de Brotas, Bonôco e
Vasco da Gama [bairros adjacentes] aqui é Ogunjá, eles não atendem, nem para vacinar uma criança.
20 – A Associação Comunitária é atuante?
Não, não acho não, porque veio, isto tem que colocar, veio um pessoa fazer um trabalho voluntários de
médicos, veio dois carros do Sarah [Hospital importante de Salvador], fazer um trabalho comunitário aqui,
Nivaldo da comissão queria cobrar a luz e o espaço, era pediatria e ginecologia, aqui se você for fazer um
aniversário na sede, você tem que pagar R$ 50,00 a associação, ele diz que é da luz.
21 – Para aonde vai este dinheiro?
Só ele sabe!
22– Se você encontrar um comprador para sua casa, você venderia?
Olha no momento eu vendo, sabia, porque a zuada aqui é demais, você está ouvindo, isso ai vai até de
madrugada, e aquele passeio ali é ponto de descaração, ninguém dorme neste beco, se estes meninos
tivesse alguma coisa para ocupar o tempo deles, eles estaria cansados e iriam dormir. Outra coisa é a
poluição sonora, é de domingo a domingo, muito mesmo.
23– Quem fica com seus filhos para você ir trabalhar, Catilene?
Meus filhos, eu botei no Orfanato, eu pego dia de sexta-feira pela tarde, levo domingo a tarde.
Sr. CARLOS M. DOS SANTOS (Presidente da Associação Vila Viver Melhor) 60 anos; mora na área
há mais de 18 anos; eletricista e militante político.
1-Sr. Carlos as casas aqui no Conjunto Viver Melhor, racham?
Vou passar para você uma experiência que eu tenho lidado dentro da parte de construção civil, há mais
de 30 anos, e você como estudante de arquitetura, deve estar sabendo disso. Qualquer edifício, qualquer
prédio, qualquer obra que você faça em qualquer solo, mesmo que você tenha uma base estrutural, até a
base de 5 anos tem que ter acomodação de solo perante o peso em que ele recebe. Então algumas das
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
240
rachaduras das fissuras, qualquer prédio desses ai!, se o terreno não for bem agalgado, e a fundação
não for eficiente ele dar algumas fissuras o que ocorreu aqui foi isso, não é totalmente, não é todas as
casas, tem algumas partes que o solo é mais resistente, em outros o solo tem a tendência a erosão,
então para a época que está para acomodação, ele desce no período de 5 anos, uns 5 centímetros de
acordo com a elevação de construção.
2- Sr.Carlos e foi isso o que aconteceu?
É, o que aconteceu foi isso, a questão da acomodação do solo, mas já que o pessoal não tem este
conhecimento, ai acham que é uma coisa absurda, mas não tem nada haver.
3-Quantas casas já racharam?
Ah! Uma minoria, inclusive tem uma criatura ai! Do lado do caminho 2, que estava me procurando com
este problema, ai eu passei para ele ir na CONDER, mas eu expliquei a ele, que não iria resolver nada,
pois já passou o prazo de manutenção, já são umas casas que já têm 9 anos como eu já falei. Então a
empresa que construiu, como a empresa contratante, só deram direito de dar manutenção nas casas a
o prazo de 5 anos, passou de 5 anos, fica por conta do proprietário.
4- O senhor se senti bem morando no Conjunto Viver Melhor?
Olha, eu não tenho do que me aqueixar, a única coisa que eu me aqueixo são os moradores.
5-Achando um valor negociável em sua casa o Sr. venderia?
Olha, eu não venderia, eu sairia e deixaria para uma filha, mas não venderia não, eu tenho aqui 3 filhas
que já tem suas casas, mas duas ainda não têm casa, ai eu deixaria a casa para essas ai.
6- Sr. Carlos, quais são os pontos positivos do Conjunto Vila Viver Melhor?
O ponto positivo aqui é a deslocação, você tem, você pode se deslocar daqui para qualquer local, mesmo
que não tenha transporte, você vai, se você que ir ao Campo Grande andando, você vai, se você que ir
na praia andando, você vai, se você que ir no Iguatemi andando, você vai andando, se você que ir no
comércio, você vai. Então isto aqui você está situado no eixo de Salvador. E ainda tem outra, aqui você
está próximo de cemitério e de hospital, está próximo de banco, está próximo de colégio. Então só um
cara que for ignorante, pode achar que aqui não esta bom.
7- Sr. Carlos aqui no Conjunto Vila Viver Melhor, há violência?
Aqui não tem não! Nem violência, nem o tráfico de drogas, nem o mão de visgo, aqui agente não adota.
8- Em relação à Associação Comunitária, o pessoal participa da Associação, como é ? As pessoas
participam das reuniões?
Aqui, os moradores não contribuem com nada, não participam de nada, receberam suas casas e ficaram
todo mundo acomodado, não procura, ou só se procura movimentar quando vem acontecer alguma coisa
que vai prejudicar a eles. No ano passado mesmo, teve um cidadão ai que a SUCOM veio para derrubar
a ampliação que ele estava fazendo, ele em um instante veio correr aos membros da associação, eu
mesmo fui um dos que fiz cartas e mandei para a SUCOM, intercedemos junto a eles, é tanto que não
derrubaram a ampliação deles.
9-Então a Associação que existe é atuante?
Nós que somos da Associação, quando tem algum movimento que venha prejudicar os co-irmãos,
agente procurar correr atrás. Porque o que eu não quero para viver, não vou querer para os demais.
10- Sr. Carlos se o Sr. pudesse dá uma grande contribuição para o Conjunto Vila Viver Melhor o
que o Sr. daria para está comunidade? (Em relação a infra-estrutura, em relação ao serviço, o que
acha que necessita no conjunto).
No conjunto ou aos moradores do conjunto? Olha rapaz cada um tem o seu problema, para você ver o
que cada um está passando, só se você fizer uma triagem. Eu acho que o instrumento superior é a
divisão de renda pois, quem ganha muito, muito quer ganhar mais quer tirar daqueles que não tem nada.
11- Percebemos aqui no Conjunto que muitas pessoas alteram a função de moradia para a
comercial? Como se dá isto?
Algumas casa! Bem poucas casas! Olha só o que teve, nós temos ali [o entrevistado aponta a área no
Conjunto], uma área que foi [destinada ao] centro comercial mesmo, você daqui está presenciando ali foi
elaborada para ser comércio, mesmo em baixo e moradia em cima. E alguns outros comércios que o
pessoal fez em suas casas, é o meio de sobrevivência ao desemprego que está ai. Hoje a aranha
procura viver do que tece, mesmo contra a vontade do destruidor que tenta destruir, o pessoal que
destrói né!, a fauna, a frora, a froresta, o mar, os rios, e o home está se destruindo por si próprio achando
que ele está fazendo uma grande coisa, mas ele esta olhando só o lado dele e se destruindo também.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
241
Sra NEUSA DE JESUS MARQUES (Moradora do Conjunto Habitacional – caminho Área 2) – 45 anos;
mãe solteira; doméstica, mora no conjunto há 15 anos, foi uma das primeiras a comprar barraco na antiga
favela Yolanda Pires.
1 – Há quanto tempo a Sra. mora no Conjunto Vila Viver Melhor, Dona Neuza?
Eu tenho mais ou menos aqui dentro uns 15 anos, agora na casa aqui que agente recebeu, tem 7 anos.
2– A Sra. trabalha do que? Qual função exerce?
Sou doméstica.
3– Quantas pessoas moram aqui com a Sra.?
Quatro pessoas.
4- Como era a sua vida antes do Conjunto Vila Viver Melhor?
Minha vida antes do Viver Melhor, sempre trabalhando, trabalhando, trabalhando, e não tendo nada,
trabalhando para melhorar mais um pouco.
5– A Sra. vivia aqui na área do Conjunto?
Antes eu morava de aluguel, eu sempre morei de aluguel, aluguel e trabalhando e pagando, né!
colocando menino em creche, pegando menino, melhorou um pouco depois que eu sair do aluguel.
6– Quando a Sra. saiu do aluguel a Sra. foi para onde?
Quando eu sair do aluguel eu comprei um barraco, na época, na antiga invasão
7– Qual o nome da invasão?
Era invasão Yolanda Pires
8– Aqui era Yolanda Pires, também?
Era Yolanda Pires também, eu cheguei aqui, em 1º. de Abril de 1988, 1989 por ai, com um mês que eu
cheguei aqui, ai começou os desabamentos, vixe, tinha um Sr. que morava no fundo ai ele desmanchou o
barraco dele, porque ele disse que era solteiro e que eu tinha meus filhos e para o barraco não cair em
cima do meu, ai ele desmanchou, ai meu filho foi um dilúvio foi gente para sexta do povo, gente para a
Fonte Nova, foi uma loucura, e ai eu comecei a querer ir para a Fonte Nova também para poder ganhar
uma casa, mas o pessoal dizia que não, que meu barraco estava bom, ai eu tirei tudo de dentro de casa,
depois eu botei tudo novamente dentro de casa, e ai estava ocorrendo deslizamento de terras e mortes
também né, teve gente que morreu aqui com deslizamento. Aquele rabanceira ali [ela aponta] de fora a
fora até lá em cima foi uma loucura, o único lugar que não teve deslizamento foi este lado daqui, que era
morro, nunca teve problema este lado aqui, mas lá na frente, lá no lado principal, oh! Meu Deus,
misericórdia, oxente, qualquer chuva, dava em deslizamento.
9– Então depois de todo o sufoco morando na Invasão houve o benefício da área?
Foi, ai houve o beneficio
10– Como foi a mudança do barraco para a nova unidade habitacional?
Antes de entrar este projeto aqui muitas pessoas estavam construindo suas casas de blocos, ta
entendendo? Ai muitas pessoas foram para o galpão. Eu mesmo na época fiquei em casa alugada, mas
eu não dormia ficava em frente de casa sentada, com medo, para quando começar a chover eu pegar
os meninos e sair correndo, causa do deslizamento. Era assim mesmo, e agora graças a Deus eu durmo
né, melhorou bastante pena que o pessoal não sabe conservar, né.
11 – A Sra. acha que a situação atual no Conjunto é melhor?
Muito, muito mesmo, muito, não tem como comparar
12 – Como foi a mudança e a adaptação na nova casa?
Oxente! Uma maravilha, maravilhosa, água dentro de casa banheiro, luz que antigamente usava era gato,
não tinha esgoto, a água agente pegava era numa torneira só para todo mundo pegar, lava, e hoje cada
qual tem né, tudo individual, cada um pega e tudo, oxê melhorou muito.
13– Quais são os principais problemas do Conjunto Viver Melhor?
Os problemas que tem aqui acho que as pessoas não sabem valorizar, tá entendendo, jogam lixo na rua,
entopem esgotos. Só é mesmo a valorização que ninguém sabe ter, enquanto uns dá valor, né, outros
não estão nem ai.
14 – Dona Neusa, em sua opinão quais são os principais pontos positivos do Conjunto? Por que é
bom morar aqui?
Ah! Meu filho, porque é perto de tudo, agente arranja um biscate, quando as patroas não querem pagar
transporte, ai agente vai a pé, vai andando, ta entendendo, é bom por isso a localização, tem super
mercado próximo, tem médico, está entendendo, tudo é perto.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
242
15 – A Sra. está satisfeita com a casa?
Eu estou né! Mas quando chove, agente tem que se cobrir com plástico, porque pinga muito, chovisco
desde a inauguração pinga muito. O que eu aqueixo aqui é por que a cozinha é na sala, ta entendendo,
mas de resto eu gosto muito daqui, da minha casa, Quanto eu arrumo, faço uma faxina, na casa, fico
namorando cada cantinho, a vista de quem já morou em barraco, né.
16 – E os pontos negativos, os pontos que devem mudar no conjunto?
É o que meu Deus? Acho que não tenho nenhum para falar não!
17 – A Sra. não acha que a lavagem de carro é um problema?
Olha, se eu morasse lá em baixo até que sim, mas como moro aqui em cima, não me incomodo em nada.
Eu falo com meu filho, esse ai [ela aponta o filho], não quero que traga problemas de lá de baixo, para
aqui, problemas de lá ficam lá. Mas às vezes eu fico assim, me perguntando, se eu morasse ali [perto do
lugar da lavagem dos carros], o que seria também, pois muita gente vive daquilo você acredita, pais de
família que trabalham ali, que sustentam, que ganham o pão para os filhos, ta entendendo, por isso.
18 – Existe Associação Comunitária no Conjunto?
Existe né! Mas eu não sei se eles fazem alguma coisa. Eu não participo, nem perco meu tempo para
participar.
19 – Por que a Sra. não participa?
Ah! Chega lá, sempre a mesma ladainha, ladainha, nós mesmo estamos sabendo que vamos ter que
pagar IPTU, né, tô sabendo assim por alto que vai ter que pagar.
20– A Sra. vai pagar as prestações da casa?
Desde que chegamos aqui que recebemos estas casas novas, a proposta é está, que tem que pagar. E
vai e faz reunião, e reúne e discute e não resolve nada, se chegar para todo mundo eu vou ter que pagar
né. Por que sair daqui, eu não quero.
21– Se alguém quisesse comprar a sua casa a Sra. venderia?
Um valor que desse assim para eu ir para um lugar melhor, um lugar mais nobre eu até venderia, mas
assim para ir para qualquer lugar para sair daqui para ir para outra favela, para o subúrbio passar tudo
que eu já passei, ai não.
22– Tem muita violência aqui?
Não! Não! Aqui é calmo, outro dia mesmo eu estava até conversando, sair daqui umas 03h00 da manhã
para ir para o médico, sozinha, ai tinha uns vigias ali, acho aqui seguro.
23 – Porque a Sra. sai daqui tão cedo para ir ao médico?
Para poder pegar ficha, senão agente não encontra. Então eu sair daqui a qualquer hora, eu não tenho
medo, outros lugares que agente vai, ninguém sai, e aqui todo mundo já conhece todo mundo. Aqui tem
assim, uma briguinha aqui e outra ali, mas é muito bom aqui.
Sra. ANTONIA BATISTA (Moradora do Conjunto Habitacional) – 50 anos; faxineira; viúva; moradora há
14 anos da área, uma das moradores mais antigas da área.
1 –Como é o seu nome e sua idade?
Me chamo Antonia Batista, tenho 50 anos
2 –Há quanto tempo a Sra. mora aqui?
Moro aqui há 14 anos
3– A Sra. trabalha de que?
Sou faxineira, faço faxina
4– Dona Antonia, como era a sua vida antes do Conjunto Viver Melhor? Como era a sua vida antes
de ter a casa própria?
Olha eu acho que a minha vida antes de ter a casa própria era melhor porque ninguém se incomodava
com a vida de ninguém, agora agente não pode fazer nada em nossa casa. Outra coisa, essa casa aqui,
até hoje não tenho a escritura da casa, é a mesma coisa da gente não ter a casa. Porque se qualquer dia
ele dizer assim eu vou tomar a casa, eles tomam né. Assim agente tinha a casa da gente, minha casa era
dois quartos, sala, cozinha, banheiro, área de serviço, terreno grande, laje batida e tudo, hoje em dia
receber um cochicho-lo destes, só um quarto, sala, cozinha, e banheiro, quarto e sala não, só sala e
cozinha. Porque só sala e banheiro, pois tem um quarto em cima e fui eu quem aumentei, fiz os quartos
dos meninos em cima, mas tinha um quarto só. E a sala era a sala e a cosinha, no que eu fiz os quartos
dos meninos eu botei a cozinha em uma área que era uma areazinha de serviço eu fiz a cozinha. Mas é
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
243
um sufoco, olha ai como eu estou, igual a um cuscuz [ela estava suada], estava na cozinha colocando
tempero na comida, uma quentura grande.
5 – A Sra. senti saudade de sua casa anterior?
Ah! Eu sinto, porque tinha mais espaço, sinto muita saudade de minha casa anterior.
6 – Atualmente no Conjunto Vila Viver Melhor, o que a Sra. acha que pode ser considerado um
problema?
Eu acho aqui considerado um problema é, sei lá, as imundícies aqui as pessoas não conseguem
conservar nada, não tem nem caixa de lixo, agente bota o lixo por cima e sai por baixo, antes não tinha
nem caixa de lixo, mas pelo menos era invasão. Hoje em dia não é mais invasão e podia ser tudo
civilizado né [risos da entrevistada].
7– Dona Antonia, e a comunidade daqui é unida?
Não, a comunidade não tem união. E principalmente os que dizem ser mandatários da Associação, em
vez de ser pelos moradores é contra os moradores eles podem fazer tudo, os outros não podem fazer
nada.
8– A Associação Comunitária existe?
Existe, e é mais ou menos atuante, não faz nada, se fizesse alguma coisa não estava este esgoto ai
como está a caixa de lixo, agente colocando por cima e saindo por baixo. Uma caixa de lixo melhorzinha
que tinha aqui eles puxaram e colocaram lá embaixo, e agente ficou com está toda acabada. Quando
chega o final de semana, é lixo para todo lado, aqui está frente de porta, eu que varro, todo santo dia é eu
que varro. Porque é lixo para todo o canto.
9– Em relação à lavagem de carro lá em baixo o que a Sra. acha?
Oh! Meu filho, ali eu não posso dizer nada, porque é muitos país de famílias, que estão desempregados,
e pelo menos é uma renda de emprego que eles tem para sustentar as famílias. Eu não acho, nem
errado, porque não me incomoda eu pouco passo ali em baixo, é uma raridade. Para os moradores de lá
eles acham ruim, mas quem mais lava carro ali são os moradores da li mesmo, não sei porque eles estão
achando ruim. Porque a mim, não incomoda.
10 – Quais os pontos positivos, quando a Sra. compara com a invasão anterior?
Ponto positivo é como eu lhe disse, ponto positivo é a urbanização, é a rede de esgoto, água encanada, o
ponto positivo que eu acho aqui é só isso. Mas tem muita coisa desregulada aqui, que ninguém faz nada,
ninguém toma parte de nada.
11 – Em relação às cobranças das casas?
Eu não posso me aqueixar, porque até agora não veio cobrança para mim, este lado daqui para baixo,
não vai receber cobrança. O lado de lá vai receber porque este lado daqui veio o dinheiro das Nações
Unidas, e foi para fazer as casas dos moradores todas, mas só que eles aplicaram em outros lugares,
daqui para lá já foi deste dinheiro [ela indica as partes que se refere, neste momento ficamos na calçada
da casa] e esta parte de cá foi financiada pela caixa ai está parte de cá está sendo cobrada, daqui, deste
lado de minha casa para baixo não vai pagar.
12 – E o pessoal dos módulos III, IV e V, vão pagar?
Estas pessoas já moravam na área da invasão, mas tem umas 5 famílias que vieram de outras áreas, o
trato que eles fizeram com agente foi este, nós retiramos daqui [invasão], e nos colocaram no galpão,
construíram as casas novas [ refere-se a casa que mora hoje] e nós vimos morar aqui, o trato foi este.
13 – Dona Antonia a Sra. venderia sua casa?
Sim! Venderia, venderia porque são muitos problemas, aqui são muitos problemas é desunião, quando
era invasão não tinha isto, depois que urbanizou tudo é uma desunião. Eu venderia, só que eu não posso
nem vender, porque eu não tenho escritura, nenhuma.
14– A Associação sempre foi desorganizada como a Sra. diz?
Sempre foi assim! O único que organizou aqui um pouco foi Dinho, quando estava no poder dele,
organizou muitas coisas aqui, mas depois que passou para os outros, pronto!!!
15– Tem violência no Conjunto Habitacional?
Não, até que isso não tem, até que não tem violência, aqui é um lugar calmo, graças a Deus, é uma
raridade ter assim violência aqui, é uma raridade.
16 – A localização do Conjunto Viver Melhor, parece que é muito boa para os moradores, não é?
É, olha eu vou te dizer por mais que eu quisesse vender esta casa, eu não vendia porque eu tenho
médico todo o mês, lá na Escola de Medicina, porque aqui não tem médico, não tem nada, eu sinto
problema de pressão de coração de tudo, ai eu tenho que ir para o atendimento na Escola de Medicina,
eu saiu daqui sozinha às 03h00 da manhã, só com o menino pequeno que estava aqui comigo, ai ele vai
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
244
mais eu, aqui é perto de tudo, destes lugares assim, é o mais perto que tem, só passa ônibus aqui às
05h30 da manhã, ai eu acordo cedo para chegar cedo. Por isso eu imagino ir para outro local causa
disso, por causa desta responsabilidade que eu tenho para ir para o médico e em outro lugar longe eu
não posso ir de pé, e já para a Escola de Medicina, eu vou de pé.
17 – O que a Sra. considera que é extremamente necessário no Conjunto Habitacional?
Era um posto de Saúde, um posto policial, não é porque é violento aqui, mas desta pista para lá é violento
sim, é uma raridade a polícia daqui fazer ronda, só quando este tal André [ morador do Conjunto que é
policial] está no comando, ai a viatura passar aqui mais de dia do que de noite. Outra coisa é mais
limpeza na rua, isso é o que eu queria que melhorasse aqui.
18 – No período da mudança da invasão para o Conjunto Habitacional houve participação da
comunidade ?
Olha, no começo não houve participação porque eles disseram uma coisa e cumpriram outra, eles
disseram que agente iria para o galpão, muitas casas eles iriam derrubar, casas que estivessem em
áreas de risco. Eles derrubariam todas, a casa que agente queria não era este tipo de casas, agente
queria casinhas separadas, cada um ter sua casinha separada, e, eles fizeram este tipo de coisas, se um
vizinho bate um prego na parede de lá, aqui já está me incomodando porque é a mesma parede, se o
vizinho fala de lá, se for falar alguma coisa para eu não ouvir tem que falar bem baixinho para eu não
ouvir, isso é precário!!! Isso é péssimo!!!. E a localização que botaram a gente foi péssima, pois quando
chegou a minha vez de descer, [se refere a descer da invasão para o conjunto habitacional] o galpão
estava todo comido, todo esbagaçado, era rato, barata, era cobra era tudo. Agente só faltou morrer lá no
galpão, levamos 03 anos no galpão, antes da gente vir para aqui, tivemos que fazer abaixo assinado,
porque disseram que o dinheiro não deu para terminar a casa da gente e a gente iria ficar no galpão,
agente já estava prevendo pedir esmola para fazer a casa da gente lá perto dos galpões, onde a gente
estava, porque agente não estava agüentando mais. O galpão era lá em baixo junto do CREA, cada qual
tinha sua divisão no galpão, era duas partes no galpão, uma em baixo e uma em cima, os que viviam em
baixo não tinha sossego, porque era tanto lixo que o pessoal de cima jogava em baixo, uns galpões
caindo os pedaços. Depois de muitos abaixo assinados, depois de muita luta que agente fez, muita luta!!!,
foi que Deus ajudou e terminaram de fazer a casa, e colocaram a gente lá.
Sr. EDINHO SANTOS (Ex-Presidente da Associação Viver Melhor) – 39 anos, pai de família, é um dos
ativistas no conjunto, participando das manifestações e reclamações em prol da comunidade.
1 – Como o Sr. de chama e qual sua principal atividade econômica?
Me chamo Edinho Santos, sou formado em magistério, mas minha principal atividade econômica é no
ramo de construção civil
2 – Sr. Edinho conte a história do Conjunto Viver Melhor?
Eu moro aqui nesta área há 17 anos e acompanhei todo o projeto da construção do conjunto, está área
aqui sofreu re-qualificação, aqui tinha uma favela a Yolanda Pires, a intervenção veio para retirar a favela
e construir estas habitações, na verdade este conjunto tem a proposta de ser um Plano Piloto pois a
intervenção objetiva resolve o problema de contenção de encosta e de moradia, na primeira etapa foram
284 unidades habitacionais, na segunda etapa foram 28 casas e na terceira etapa 48 casas, cada
unidade medindo 32m
2
.
3 – Como é a sua relação com a vizinhança do conjunto habitacional?
Minha relação com a vizinhança é boa
4 – Qual comparação o Sr. faz da moradia atual e da moradia anterior?
A atual é muito pequena, a anterior era maior, muitos moradores antes da intervenção já tinha suas
casas de alvenaria e estavam ampliando, está é muito pequena.
5 – O Sr. alterou a sua unidade habitacional?
Sim alterei, eliminei paredes, coloquei revestimento de paredes amplie cômodos e etc.
6 – Quanto custa uma casa destas atualmente?
Olha, quando eu recebi está casa ela me foi passada por cerca de R$ 5.833,36, agora depois desta
reforma eu não vendo por menos de R$ 17.000,00
7 – Sr. Edinho quais os principais problemas do Conjunto Habitacional atualmente?
São diversos entre estes infiltrações, umidade, falta de equipamentos diversos etc.
8 – Como o Sr avalia a Associação Comunitária atualmente?
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
245
Existe associação inclusive eu já fui presidente, com a associação construímos uma quadra poliesportiva,
alguns quebra-molas. Mas agora a associação está na mão de outras pessoas, a associação agora es
parada.
Listagem das Entrevistas: Conjunto Habitacional Loteamento Vale das Dunas:
Série II
Sra. VALDETE B. DA SILVA ( Líder Comunitária) – Costureira, moradora antiga da área antes da
intervenção, e atual moradora do conjunto.
1 – Como a Sra. se chama e como chegou aqui no Conjunto Lot. Vale das Dunas?
Me chamo Valdete da Silva, eu, cheguei aqui através de mudanças de casas, minha casa foi
desapropriada para passar uma rua, para poder passar a pista Nova do Aeroporto, ai as nossas casas
foram retiradas, não só a minha como outras, aí mudaram agente para aqui. Eu tenho aqui quatro anos,
mais ou menos isso. Eles tiraram agente para fazer melhorias, sabe, ai teve um monte de coisa,
desembargação de construção até chegar aqui, depois que chegamos aqui tiveram alguns cursos, alguns
projetos sociais.
2 – Quais foram os critérios utilizados para a escolha da casa?
Não teve critério algumas pessoas foram sorteio, outras pessoas foi porque eles mesmos tiraram as
casas das pessoas para a passagem da pista que vai ao aeroporto, e outros porque moravam em
situações de risco, não tinham condições de construir, moravam em barracos este tipo de coisa assim,
mais ou menos, entende, pessoas que não tinham condições de construírem uma casa, ai como eles
queriam mudar a área, mudar o bairro, ai eles fizeram este tipo de troca com as pessoas.
3 – Houve algum tipo de conflito entre os moradores e a CONDER?
Teve discussões porque a maioria não queria sair de seu local de origem, ai a CONDER, teve de entrar
em acordo, teve pessoas que não queriam de jeito nenhum, muitos a CONDER teve que comprar as
casas, pois as casas das pessoas eram maiores que estas aqui, ai a CONDER teve que pagar uma
indenização, para estas pessoas, que não queriam aceitar de jeito nenhum, mas foram poucas pessoas,
poucas mesmo, olha eu moro neste bairro há uns 12 anos, aqui no conjunto tenho uns quatro anos.
4 – Dona Valdete a Sra. preferia a sua outra residência ou está aqui?
Eu preferia lá, tinha área livre, eu tinha espaço para plantar eu tinha jardim, tinha muitas plantas, não tem
nem comparação.
5 – A sua antiga moradia era em uma área de invasão?
Lá era o seguinte, escuta, era uma invasão, quando eu vir morar aqui, eu fui a 4ª. pessoa a morar aqui
dentro, entendeu, quando acabou a invasão total, só que eu já estava construindo, eles só me tiraram
porque do lado de minha casa ia passar uma rua, como realmente passou uma rua aonde era a minha
casa, foram quatro pessoas que estavam na mesma trajetória foram obrigados tirar para passar a rua.
6 – Como era a sua moradia antes?
Era maior que está aqui, bem maior, minha casa lá era 3 (três) quartos, sala, cozinha, banheiro.
7– Em relação ao nome do lugar percebi que os moradores não gostam do nome Yolanda Pires, a
Sra. sabe o motivo?
Não gostam que chamem de Yolanda Pires porque este lugar era muito manjado por violência. Se você
mora aqui e vai procurar emprego em algum local, ai vai fazer entrevista de emprego, ai se você dizer que
mora no Yolanda Pires, ou no Planeta [ela se refere ao bairro Novo Horizonte, conhecido como Planeta
dos Macacos], ai já é uma coisa a menos, mesmo que você tenha a capacidade de suprir a vaga naquele
emprego, você vai sofrer restrições, fica um meio isolado disso, devido à fama de violência. Muitos
moradores concordam para trocar o nome, de não existir Yolanda Pires, na realidade se não fosse a
política o nome deste conjunto aqui seria Vila Nicolau Campenas. Porque esta área daqui foi muito
ajudada pelo colégio Antônio Vieira, veio um casal de Italianos, ajudaram muito as pessoas da área a
construírem suas casas, se não houvesse política o nome daqui seria Vila Nicolau Campenas, não seria
nem Yolanda, nem Vale das Dunas. Se fosse a população antiga mesmo que escolhesse seria Vila
Nicolau Campenas.
8– Por que seria este nome?
Porque este nome Vila Nicolau Campenas, porque um casal de italianos ajudou muito isto aqui
entendeu? Fez muito trabalho social e faz muito até hoje, mas no começo eles ajudaram muito, fizeram
casas, foram 49 casas, distribuíram cextas básicas e realizaram cursos profissionalizantes como cursos
de costureiras, pedreiros, motoristas, entendeu, vigilantes, este casal ajudou muito a comunidade.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
246
9– Existe este serviço social ainda na comunidade de Vale das Dunas?
Existe, mas é mais devagar, sabe porque, os moradores que foram beneficiados já não moram mais aqui
entende, e depois da morte do Padre o pessoal ficou mais devagar para estas coisas.
10 – Quatro anos sendo moradora do conjunto, o que a Sra, acha do conjunto?
Eu acho por mim é bom entender, a única coisa que eu não gosto é de morar neste lugar apertado, eu
queria morar em minha casa, ter minha área, ter meu espaço, mas tirando isto é ótimo aqui.
11– A Sra. gosta do conjunto mas só não gosta das casas, é isso?
É! Eu mesmo pessoalmente, não gosto das casas, entendeu, gosto de uma área livre.
12– Quais seriam as principais dificuldades do conjunto atualmente?
A principal é a segurança, área de saúde, um Posto Médico próximo, um colégio para as crianças, é um
perigo que elas correm, com estas rivalidades de bairros, não só as crianças como os adultos que
precisam estudar a noite, muitos deixam de estudar pela falta de espaço, não que agente não tenha
espaço para construir, porque agente tem.
13– Em relação à participação da comunidade na execução da obra do conjunto, houve
participação?
Não! Foram como eles quiseram não houve participação, não houve acordo com os moradores, não
houve reunião, não teve nada disso entendeu, a CONDER construiu em um ano, e este conjunto não era
isso aqui, era um projeto totalmente diferente, a maquete que está no aeroporto é uma coisa ao chegar
nas casas vêem outra coisa. Porque isso não era para ser duas casas era para ser uma só, entendeu, ai
eles fizeram este tipo de coisa, reduziram totalmente os direitos dos moradores.
14–Em relação a este muro que separa o conjunto da pista, alguns moradores acham o muro
necessário, outros descordam, o que a Sra. acha?
O muro tem suas vantagens e desvantagens, a vantagem é porque dá segurança as crianças e a
desvantagem é que a agente fica ilhado, fica preso entendeu, agente aqui não tem um ponto de ônibus,
agente aqui não têm acesso a transporte, saúde, educação, e a entrada [se refere ao muro que separa a
pista], agente fica ilhada, agente fica presa e o muro nem resolve o problema que ele pensaria resolver.
Eles [técnicos da CONDER], acham que este muro ai era para proteger, mas as crianças vão e pulam do
mesmo jeito, agente que fica preso tipo uma prisão, porque agente aqui só tem uma saída entrada e
saída, só com uma só.
15–Como é a convivência do vizinho aqui?
Em relação aos vizinhos graças a Deus, não tenho o que dizer.
16– E a Associação Comunitária existe?
A Associação Comunitária meu amigo é um problema !!! Não existe, só tem nome, existe uma
associação, tem vários presidentes, vários nomes, mas a associação não funciona.
17– Este problema da Associação dificulta a falta de representação no conjunto?
Muito! Até um trabalho social que agente queria fazer não pode, não pode fazer, se agente for trabalha
em um trabalho social, ai parece beltrano presidente, sicrano é presidente e empata agente fazer o
trabalho social, porque não tem uma união com o que diz ser presidente da Associação com os
moradores, entendeu o presidente é só ele, só ele e pronto, entendeu, ele não quer saber da comunidade
a comunidade que se dane!!!
18– E em relação à mudança de moradores e chegada de moradores novos no conjunto, existe
este movimento?
Existe sim, e é freqüente, vem e vai, vai e vem é essa coisa.
19– A Sra. atribui está mudança a algum fator específico?
Tem moradores que vem e não se acostumam entendeu, por causa da violência e você sabe que todos
os bairros tem violência e coisa que não é só aqui em nosso bairro que tem, em toda a comunidade tem .
As pessoas que vem e mudam, são do interior, e o pessoal acostumado a viver em uma vida tranqüila ai
quando chegam na cidade grande não agüentam ver as agressões, este tipo de coisa, para mim isto é
natural, entendeu?
20– Agora fale um pouco sobre a Sra. tem quantos filhos?
Tenho três filhos, crio dois, sou costureira, gosto do que faço, deixei de trabalhar na rua para costurar,
entendeu? Meu objetivo é criar uma pronta entrega, criar uma geração de renda não só para mim, mas
para várias mães que não têm condições de trabalhar fora e que queira ter uma renda familiar para
ajudar em casa, meu objetivo é este, já que eu não posso trabalhar na rua como sempre fiz [diz ter
problema de saúde] eu quero ensinar um pouco do que eu sei para as mães que não tem condições
no conjunto.
21–Mas o que falta para colocar este objetivo em prática?
O que falta? Espaço e um local adequado entendeu, para agente colocar as mães e material, matéria
prima, porque pessoas não faltam , tem bastante mães que tem vontade de aprender uma profissão e
construí uma vida melhor para seus filhos, sem sair do seu habitat natural, porque muitas vezes as mães
saem de casa para trabalhar fora correndo perigos entendeu, então agente que fazer assim, entendeu,
meu objetivo, não só meu como de outras pessoas é criar um meio de trabalho dentro de nossa
comunidade, todo mundo poder ter o seu sem está saindo, abandonando meus filhos em casa, que nem
as minhas filhas foram criadas, eu tinha que sair fora para trabalhar e ela ter que ficar sozinha, ser criada
sozinha, entendeu meu objetivo é este.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
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22–Se a Sra. fosse falar dos pontos positivos do conjunto, o que a Sra. destacaria?
É bom! Pelo seguinte, mesmo tendo muita violência, é o tipo de coisa que pais e mães de famílias, não
são agredidos, não são molestados entendeu, entram e saem a hora que querem, entendeu, não tem
problema nenhum sabe. A violência que existe é uma coisa gerada pela falta de oportunidade que estas
pessoas não tem de criar alguma coisa para fazer, entendeu, ai vai criando uma violência, entendeu?
23–A Sra. fala muito da violência, na sua opinião tem como diminuí-la, com um trabalho social,
maior participação da associação, coisa e tal?
Se estivesse um espaço livre para agente fazer coisas com estes adolescentes, até mesmo este pessoal,
eu acho que iria ser algo totalmente diferente, porque não iria ter espaço para ingressar em um caminho
que não era adequado, entendeu? Porque a maioria destes adolescentes foi criando uma situação ruim
porque não tem oportunidades, entendeu. Porque o projeto da gente é o que? É criar capoeira, é criar
futebol, áreas de lazer entendeu, mais para os adolescentes, só que estas guerras de presidentes de
associação, de quererem serem donos atrapalha.
24–Dona Valdete a Sra. já pensou em vender a sua casa?
Não! Porque eu gosto de morar aqui, eu não venderia não, criei as minhas filhas aqui, eu não vendeira,
não! Olha pelo tempo que moro aqui, eu só venderia para ir para o interior eu ficaria aqui mesmo. Com
todos estes problemas, com todas estas dificuldades me sinto bem morando aqui.
Sr. EDUARDO BOMFIM (Professor e Militante) Morador do Conjunto há 02 anos, um dos idealizadores
de uma ONG comunitária para o conjunto habitacional.
1-Como se chama e qual sua profissão?
Me chamo Eduardo, sou professor.
2-Como o Sr. chegou aqui no Loteamento Vale das Dunas?
Minha história particular não foi tida como opção, foi mais uma queda no padrão de vida assim radical,
vida intempéries comercial e pessoal, neste pais né, que não respeita alguns profissionais jogando estes
em lugares, não que seja ruins né, mais que não seja a opção deles, né! Essa é uma realidade.
3-O Sr. mora aqui há quanto tempo professor?
Moro há uns três anos
4- Quais os principais problemas enfrentados pela comunidade do Conjunto Loteamento Vales das
Dunas atualmente?
Na realidade são várias, no âmbito social temos a saúde, não me refiro a saúde do Estado ou do
Município, pois no município temos a implantação de Postos Móveis de Saúde como o SAMU, mas me
refiro a um posto médico no conjunto para o atendimento pré-ambulatorial, um programa de planejamento
familiar que é um caso gravíssimo não só no conjunto, mas no país como um todo, então uma série de
questões uma outra o colégio, nós não temos colégios nem das séries chamadas iniciais, nem da 5ª. a
8ª, série, muito menos do 1ª. ao 3ª. ano e por ai agente não tem uma comunidade escolar hoje, uma
edificação escolar ajudaria em vários aspectos, como por exemplo, como questão de uma Ong – Ação
Criativa, que estamos tentando implantar, já trabalhamos desde janeiro de 2004, fica difícil você ter
espaços para colocar porque dependemos de situações de órgãos públicos, que precisam construir,
reformar e essas coisas não são baratas, são caras! O problema principal também vem que agente que
colocar uma situação de ajuda social, ou seja, um governo paralelo, que nada mais nada menos é
formada por associações, Ongs essas coisas, são governos paralelos elas aparam as arestas que os
governos deixam a desejar, também não se pode jogar toda a responsabilidade para o governo, a
comunidade tem que se organizar, tem que se integrar, se ajudar, querem fazer e querem mudar sua
realidade, não adianta as pessoas quererem trabalhar em prol da comunidade, desde quando a
comunidade não quer se trabalhar em prol de si mesmo, então o que tem aqui também tem este detalhe;
o transporte temos, mas em distancia uma de 1.000 ou 1.500 metros até chegarmos a uma parada de
ônibus, temos uma questão que hoje eu chamo como isolamento social, tudo bem que tem uma avenida
de alta velocidade, uma avenida de escoamento que é chamada de muro, mas eu chamo este muro de
muro de Berlin, porque na época como se foi colocado de não deixar as crianças atravessarem, talvez a
mercê de cuidados, ou pessoas que não possam cuidar de seus filhos, muitas vezes deixam em casa
sozinho, por ali brincando, com o filho do vizinho, e tem crianças que são muito traquinas e elas saem
mesmo, que não se pode dominar com muita tranqüilidade, ai neste caso o muro ajudou muito, [separa o
conjunto habitacional da pista expressa do Aeroporto], mas como tem uma passarela que atravessa de
um lado a outro, porque não puxar essa passarela, um braço dela, colocar uma parada de ônibus, abrir
um acesso com pista de aceleração e desaceleração e fazer uma linha de ônibus, entrando em um lado
e saindo por outro, porque além de ajudar um pouco mais a comunidade, integraria um pouco mais com a
questão do transporte, o direito de ir e vir, constitucional que está ai mais não se usa, as pessoas não vê
por ai.
5- Em relação à infra-estrutura física, em relação à arquitetura do Conjunto Habitacional Vale das
Dunas e das unidades habitacionais, qual a sua opinião?
Olha! Eu por exemplo, além de professor, trabalhei como projetista, nossa construção tem um detalhe,
estas habitações foram trabalhadas para famílias de no máximo quatro pessoas, pela estrutura e pela
metragem da unidade, não é, ou seja, o metro quadrado em cada unidade destas é no máximo para três
ou quatro pessoas, não dá para mais que isto, mas nós sabemos que na periferia não há família com
este número, são poucas famílias que você encontra com quatro ou cinco pessoas sempre muito mais
que isto, e na maioria das vezes elas terminam crescendo mais ainda ao longo do tempo, e essas
pessoas ficam praticamente assim o que chamamos de aperto de moradias, uma situação social muito
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
248
séria. É ruim? Não! Não é ruim por ser própria e por ter uma infra-estrutura de água, esgoto, energia,
telefone tudo perfeito, saneamento, asfalto, não tempos ruas de barros aqui, você pode olhar não temos
nenhuma rua sem ser pavimentadas aqui, não tem problema de energia, não tem problema de telefone,
não tem problema de água. O único problema aqui é o que eu já citei anteriormente, que é o transporte, e
também o problema educacional, que queremos romper este problema, mas não temos uma unidade
escolar, tanto nas séries iniciais, como até o terceiro ano, não que na área de São Cristovão não tenha,
mas pelo menos para as séries iniciais, seria interessante ter um colégio destes aqui, de 1ª. a 4ª. série, né
ou a pré escola, que a constituição do Estado hoje não permite, nem o Estado, nem o município, dizendo
que não é o dever deles, mas é o dever de quem? Do pobre! Da pessoa que não tem uma estrutura
financeira! Vão ter que custear a pré – escola o maternal, como ?
6- Em relação à Associação Comunitária, existe no Conjunto Vale das Dunas?
Rapaz ! Existe está associação de nome, houve no início uma tentativa de mudar está situação, mas
houve divergências, como em todas as associações, contudo as divergências na associação daqui são
permanentes. Em outras associações se termina amparando as arestas entram em acordos, em
situações nas quais quem tem idéias diferentes são levadas há um consenso, situação comum em toda a
sociedade. É comum, mas às vezes ao lado da intransigência da intolerância isto ai não avança. E quanto
neste quadro, um outro grupo tenta montar uma outra situação e talvez de até um avanço social, uma
melhoria, tentar chamar a comunidade para avanços conjuntos, ai usa-se os boicotes, a idéia daí que o
fulano não gosta, que o presidente não gosta e ele tem o direito, porque fulano é o diretor e não quer, ai
porque eu não quero fulano, ai fica uma situação de uma intolerância e falta de bom senso.
7- Em se tratando de um Conjunto Habitacional de apenas 5 anos, o professor não considera que
há um envelhecimento precoce nas unidades habitacionais?
Em relação a isto, são dois lados de uma mesma moeda, eu digo o seguinte há uma infra-estrutura há,
foi uma tentativa do governo da época melhorar o padrão de vida da comunidade, como um todo, pela
pavimentação, água, energia, uma infra-estrutura enfim, mas, na realidade eu não vejo tanto pelo lado do
desleixo dos moradores este envelhecimento. Na verdade é o seguinte, a questão social invade muito
cada família desta, são pessoas de baixa renda, abaixo da linha de pobreza, e pessoas apenas que
sobrevivem com os programas do governo, as chamadas bolsas-escolas, bolsas-famílias, mais do que
isto não avançam. Uma pessoa como está sequer tem condição de comprar um material de limpeza para
limpar sua própria casa, muito menos para se juntar a uma outra unidade e tentar fazer uma limpeza, uma
pintura em um prédio destes completo, apesar de ter a mão de obra, há mão de obra, mas o material não
tem, é preciso o que? É preciso que uma associação, um grupo, uma ONG faça essas arrecadações e
utilize estas mãos de obras, que é especializada no local, porém desempregada, e ai se eles tivessem o
material se disporiam a fazer isso, e melhorar um lado de vida deles. A questão do lixo, por exemplo,
colocada na maioria das vezes, aqui não é nem tão grave assim, mas em alguns casos as pessoas
colocam o lixo fora do dia que o caminhão passa e essas coisas, o lixo, por exemplo, a criança come um
salgado ou um doce e tem a cultura péssima de jogar o lixo por onde passa, eu não considero isto como
um relaxamento, eu considero isto como uma falta de informação, uma falta de gente para tentar re-
educar e re-socializar estas pessoas, ou a maioria deles, para que eles possam somar e que a coisa não
se agrave a cada dia. Uma outra coisa é que as pessoas tentam sobreviver e desacreditam das
associações e de grupos de algumas pessoas que se utilizam destes parâmetros para advogarem em
causa própria.
8- Em relação à falta de Organização Comunitária, o Sr. acha que é possível mudar? Tem alguma
alternativa?
Essa alternativa existe sim e é possível de mudar, como em todos os lugares que eu já vi e outros que
já trabalhei e foi possível mudar! Era totalmente impossível ai dizia é impossível, você não consegue, ai
não sai ai não avança, no final das contas agente mudou, como era impossível? Como era totalmente
impossível? Era possível se fazer um transplante de órgão, era impossível o homem voar, era impossível
um transatlântico navegar, era impossível um monte de coisa, mas a impossibilidade deixou de existir, no
momento que alguém acreditou no sonho, mas quando ele acreditou neste sonho, ele perseguiu este
sonho. Então não adianta as pessoas dizerem não acontece, não, é impossível não, pois a
impossibilidade só existe na fraqueza daquele que quer ser fraco.
9- Em relação ao nome Yolanda Pires e a mudança para Loteamento Vale das Dunas, o que você
tem a dizer?
Nesta questão ai eu vou dizer assim, muitas vezes as pessoas rotulavam determinadas relações sociais,
rotulavam por um fato ocorrido na época, por exemplo uma questão de violência, se muitos casos
violentos acontecem em um determinado lugar, o que isso provoca? Com isso ai as pessoas de fora
quando os jornais estampam, no bairro de Beiru morreram três, chacina no Beiru, chacina não sei aonde,
aquilo começa a ficar rotulado, pelos fatos da violência, ai algumas pessoas tentam fazer mudar este
nome na tentativa talvez de desvincular os fatos do local.
10- Em relação à localização do Conjunto Vale das Dunas, você sabe que ele está ilhado de
bairros famosos pela criminalidade e violência. O Sr. acha que isto trás implicações para o
conjunto?
Nessa questão assim de preconceito ou negatividade não, eu vejo, na realidade são os nomes que deram
na época de fundação, nomes que sempre se referem a coisas do mal, ruim [por exemplo]Iraque, que
significa guerra, será que ali tinha que ser Iraque porque ali acontecia tanto problema como o Iraque;
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
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outro exemplo Malvinas, foi uma guerra e aqui do lado tem um bairro que o nome é Malvina; Yolanda
Pires este não tem nada haver, este foi o único nome que na realidade não era um nome por maldade e
por guerras, por tragédias ou chacinas, não é nada disso, era o nome de uma ex-primeira dama do
Estado, ou seja, era a mulher do governador, que inclusive construiu este conjunto aqui, mas o que
rótula o nome Yolanda Pires na época era a questão da violência , rotularam o nome Yolanda Pires pela
violência do local, então assim ficou, si houve a tentativa de mudar o nome, talvez até para tentar
desvincular, assim como foi o caso [dos nomes de bairros] de Beiru e Tancredo Neves, por exemplo, que
tentaram mudar o nome buscando uma melhoria na imagem do lugar. Agora em relação a dizer que a
proximidade com os bairros já citados têm influência ruim, posso dizer que não. Eu posso te dá outros
nomes de bairros vizinhos ao Loteamento Vale das Dunas, tipo Loteamento Novo Horizonte, não tem
nada haver com o Malvinas, as coisas são bastantes distintas.
11 – Quais os pontos você re-elege para uma tentativa de re-socializar a comunidade do
Conjunto, tendo em vista que em sua própria fala, você diz que ela necessita de uma re-
socialização?
O fortalecimento das instituições não governamentais, isto é o governo paralelo que tem que existir dentro
da comunidade. O dia que o governo, e os governantes, começarem a entender que o governo paralelo
não é uma tentativa de tomar o poder, ou de fazer o pode local ser maior do que o poder constituído
executivo, e começar fortalecer as ONG’s, as Associações de uma maneira programada, de uma
maneira trabalhada, fiscalizada, supervisionada ai as coisas deixam de sofrer, porque não adianta sentar
dentro de um gabinete e ficar criando fórmulas mirabolantes de construção de melhorias disso e aquilo
apenas com o intuito eleitoreiro. Agora quem conhece a sua necessidade é a sua própria comunidade. Se
você está em casa e come filé hoje, amanhã ovo, hoje come, amanhã não come, só você sabe de sua
realidade, a não ser que você conte para alguém ou permita que alguém saiba. Ao contrário só quem
sabe de sua realidade é você mesmo.
Sra. NEUZA SOARES DA SILVA (Vendedora de Acarajé) 42 anos, moradora da área favelizada antes
da intervenção e atual moradora do Conjunto.
1 – Como a Sra. se chama e há quanto tempo mora aqui?
Me chamo Neuza Soares da Silva, moro aqui há 6 anos.
2– Como a Sra. chegou aqui?
Eu morava em Vilas [área próxima] e vinha passear aqui neste bairro, ai eu comprei uma casa aqui nesta
área, ai a CONDER precisou da área onde eu tinha comprado minha casa ai ela me tirou de lá e me
colocou aqui.
3–Porque a CONDER lhe retirou de sua casa?
Porque precisou da área para abrir uma pista para o Aeroporto
4–A Sra. gosta do Conjunto Loteamento Vale das Dunas?
Eu gosto porque tem área a vontade para os meninos brincarem
5–A Sra. prefere sua morada de agora ou a de antes?
Moço eu preferia a de antes, minha casa de antes tinha quintal, eu vazia tudo em meu quintal e aqui não
tem quintal, não tem como eu puxar. Antes minha cozinha era grande e hoje é este cumbicuzinho, eu
preferia lá onde eu estava, na troca eu sair perdendo.
6– Mas em relação à infra-estrutura?
Eu acho boa a infra-estrutura do conjunto, o tamanho da casa é mais ou menos; o tamanho da casa é
muito pequeno, na casa antiga tinha como eu ampliar aqui não.
7– Quais os pontos positivos que a Sra. elege para o Conjunto Habitacional?
Tem áreas para os meninos brincarem e tem o campo.
8– E os pontos negativos do conjunto?
A violência
9–A Sra. está pagando alguma taxa pela casa?
Não estou pagando e nem vou pagar
10–Se a Sra. pudesse mudar daqui a Sra. mudaria?
Mudaria dando risada
Sra. MARIA APARECIDA MACHADO (Doméstica) 33 anos, moradora da área favelizada antes da
intervenção e atual moradora do Conjunto.
1– Nome completo e idade?
Me chamo, Maria Aparecida, tenho 33 anos
2– Como a Sra. chegou aqui no Conjunto Vale das Dunas?
Meu negócio antes de eu vir para aqui foi este, minha casa enchia de lama, todas as águas que caia na
rua entrava para a minha casa, quase todos os meus filhos tiveram pneumonia, eu tive alergia nas
pernas, e assim mesmo eles não queriam me entregar a casa, disse que tinha abaixo assinado para eu
não vir morar aqui, ai meu irmão com tanto conhecimento que tem começou a andar ai foi que ela [
técnica da CONDER] me ofereceu R$ 500 para eu ficar quieta ai eu não aceitei, ai depois de muita briga
eles resolveram me entregar a casa.
3–A senhora sempre morou aqui no bairro Yolanda Pires?
Sim, mas não era do lodo da invasão, era na outra invasão perto do Planeta dos Macacos
4–Por que a CONDER não queria te dá a casa?
Porque eu tenho o seguinte comigo não brigo com ninguém não deixo meus filhos brigarem com
ninguém na rua para evitar confusão, mas se bater em meus filhos eu viro uma cobra, ai eu disse logo a
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
250
elas [técnicas da CONDER], se eu vir para o conjunto e alguém bater em meus filhos vai ter, ai ela disse
que as pessoas daqui tinha feito um abaixa assinado para eu não vir morar aqui.
5– Em relação ao Conjunto Habitacional o que a Sr. acha?
Não acho nada bom aqui!
6– Dona Maria a Sra. prefere a moradia que tem hoje ou a que tinha antes?
Mesmo enchendo d’água eu acho a casa que eu tinha antes, tem muitas coisas aqui que eu não posso
revelar, eu não posso dizer o motivo que eu não gosto daqui. Tem muita violência, agora mesmo agente
está aqui em guerra, gangue contra gangue e quem está sofrendo é agente morador, os filhos da gente
estudam no Planeta dos Macacos e não podem ir para a escola, porque o cidadão de lá disse [chefe do
tráfico], que qualquer criança que entrar lá ele mata.
7–A Sra. acha que o principal problema aqui hoje no Conjunto Habitacional é a Violência?
Acho!
8– Porque se mudou o nome de Conjunto Yolanda Pires para Loteamento Vale das Dunas?
Porque o prefeito veio aqui e mudou o nome, ele disse que era um nome muito vulgar muito baixo.
9– A Sra. gosta do Conjunto Loteamento Vale das Dunas?
Não!
10–Se fosse o caso da Sra. vender e mudar de casa a Sra. o fazia isso?
Era rapidinho
11–Qual a sua principal dificuldade no Conjunto Habitacional?
Tudo!
12– Aponte algumas das suas principais dificuldades aqui no Conjunto Vale das Dunas?
Vizinho não presta, não revelei aquele dia porque ela estava presente; vizinho levanta falso, eu tenho
uma vizinha mesmo que está escarrerada através de outra vizinha. É uma fuxicada, a maioria dos
vizinhos daqui coloca você em ponta de bala, aqui tem uma mesma que disse que ela para matar um é
daqui para ali e só ela se deitar com um vagabundo. Vamos supor minha filha sai e brinca com a filha de
uma vizinha eles não querem saber, eles acham que a criança é adulta ai então que bater, e ai vai,
muitas coisas acontecem aqui filho, tudo encubado.
13– O que foi feito com a casa que a Sra. tinha antes?
Ela me disse [a técnica da CONDER], que ia passar para uma mulher, mas quando eu passo por lá, foi
um rapaz que invadiu.
14– A Sra. senti saudade da outra casa?
Sinto! Mesmo enchendo de lama, mesmo com todas as dificuldades que eu passei, mas eu queria minha
casa, em minha casa eu era feliz e aqui eu não sou!
15– Alguém já lhe machucou aqui?
Eu já passei tanta coisa aqui moço [começa a chorar], aqui eu não tenho felicidade não a única felicidade
que eu tinha era na outra casa, lá eu era feliz e aqui eu não sou.
16– A Sra. tem quantos filhos?
Ao todo são sete filhos, mas estou apenas com três, meus irmãos levaram os outros.
17– A Sra. não tem vontade de vender está casa e mudar para próximo de seus irmãos ?
Eu tenho medo de vender e não achar o preço de não achar um dinheiro que de para eu comprar outra
casa.
18– O que a Sr. mudaria no Conjunto Vale das Dunas?
Tudo! Começando pela vizinhança e depois o foco de tóxico, os filhos da gente não tem segurança, não
tem posto de saúde não tem escola.
19– Em relação a este muro que tem ai o que a Sra. tem a dizer?
Foi feito causa de tanta morte que tinha com os filhos da gente que atravessavam a pista, ai a
comunidade que pediu o muro.
20– A Sra. acha que o fato do Conjunto Habitacional está próximo do Planeta dos Macacos e do
bairro das Malvinas, isso gera algum reflexo negativo aqui para o conjunto?
Só o Planeta dos Macacos
Listagem de Entrevista: Conjunto Habitacional Jardim Nova Primavera
Série III
Sr. RICARDO BRASIL (Presidente da Associação Nova Primavera) – 34 anos; casado; morou 15 anos
em palafita, atual morador do conjunto; um dos articuladores para a legalização da Associação Jardim
Nova Primavera. Funcionário da CUT – Central Unica dos Trabalhadores – Salvador.
1 –Seu nome, idade e qual principal ocupação de renda?
Ricardo Brasil, tenho 34 anos, sou líder comunitário, morador desta comunidade há 30 anos, quando
cheguei para morar aqui eu tinha 4 anos, em morei em Palafita propriamente durante 15 anos de minha
vida. Este projeto é antigo, ninguém nem mais acreditava que ele iria ser executado. A grande
preocupação da gente é que por trás deste projeto agente tinha é que ter tido uma contrapartida, porque
ninguém morava em palafita porque queria entendeu?
2–Antes de discutirmos o Projeto do Conjunto Nova Primavera, como era a sua vida na palafita?
Olha a vida em palafita como todo mundo sabe era a baixo da linha de pobreza, uma série de
dificuldades: o índice de violência era grande; agente não tinha nenhuma segurança, passamos muitas
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
251
dificuldades porque tinha parte que era aterrado e outra não, agente tinha que sair com as roupas no
saco, para vestir quando saísse do aglomerado de palafita, porque senão se sujava todo. Agente sabe
que a mudança para o conjunto mudou um pouco a qualidade de vida da gente mais agente sabe que
o projeto poderia ter sido melhor. A vida na palafita era complicada: ponte de tábuas, acidentes que
aconteciam, como vou tornar a falar os marginais, a violência, a vigília que os moradores faziam para
evitar que os marginais invadissem o barraco à noite e tomasse tudo que agente tinha. Então este projeto
[habitacional] foi benéfico para a agente, mas na questão ambiental e estrutural ficou devendo, entende?
Assim, agente deveria ter tido uma contrapartida, um programa de sustentabilidade, entendeu, porque a
pessoa que morava na palafita, não tinha nenhum encargo, assim não se pagava luz, água, esgoto, etc?
O que agente mais questionava é que o projeto deveria ter todo um programa de sustentabilidade para a
geração de renda, com fábricas de velas, sabão e implementação de cooperativas, entendeu? O que
aconteceu no inicio, as cobranças, eles iam aceitando, mas do meio para o fim eles iam esquecendo.
Olha Mateus, teve gente aqui que vendeu casa por R$ 2.000 e R$ 2.500, não porque não precisavam
morar, mas porque a CONDER precionava, dizendo que iriam cobrar a taxa mensal aos moradores,
quem não pagasse ia perder a casa, as pessoas ficaram desesperadas, são pessoas em sua maioria
sem instrução,a maioria mal sabe ler ou escrever, teve gente que chegou para mim e disse olha Ricardo
se for para perder a casa para a CONDER eu prefiro vender a casa e partir para outra invasão , ou,
voltar para o interior. Se você ver o montante das casas que têm aqui no Conjunto, você vai perceber que
muitos dos atuais proprietários nem moravam aqui no Conjunto, houve no início uma saída grande de
moradores do conjunto e revenda para atravessadores.
3– Sr. Ricardo você indica em seu relato que faltou no projeto o execução de um programa de
geração de renda para a comunidade, e em relação a infra-estrutura?
Pois é! A CONDER entregou a casa sem reboco, e ainda 70% das casas estão sem reboco. A infra-
estrutura do Conjunto é de total descaso, as quadras dos conjuntos não são niveladas, não tinha
iluminação; o tanque de água do vizinho fica no quarto do outro vizinho, a casa que fica em cima pertence
a uma família e a de baixo a outra família; os tanques ficam todos em um quarto; falta posto de saúde;
faltam escolas.
4– Com todos estes problemas você se senti satisfeito no Conjunto?
É claro que com a mudança da palafita houve uma melhoria, antes eu acordava tinha que atravessa uma
ponte de tábua, hoje tenho uma rua; antes vivíamos em meio a Leptospirose e acidentes com quedas das
pontes. Mas a luta é para a continuidade na melhoria de vida dos moradores daqui.
5– Há uma associação comunitária registrada e devidamente atuante no Conjunto Nova
Primavera?
Olha Mateus, estamos há dois anos tentando oficializar estas associações, de fato ela existe mais
juridicamente ainda não oficializamos.
6– Qual o principal ponto positivo do Conjunto Nova Primavera?
O fato de está em terra firme é um ponto positivo
7– Quais os pontos mais negativos do Conjunto Nova Primavera?
Posto de saúde, calçamento rachando; esgotamento sanitário, quando chove alaga tudo. Outro ponto
negativo foi as paredes-meias, porque como a parede é meia tudo que se passa em sua casa seu
vizinho escuta, outra coisa você não pode fazer nada na casa sem a alteração do vizinho, qualquer
conserto em sua casa você tem que mexer com o seu vizinho e muitas vezes se você tiver algum
problema com seu vizinho o negócio fica mais complicado. Então Mateus são estes os três principais
problemas do conjunto: calçamento, sistema de esgoto e paredes-meias.
8– Nós percebemos que aqui nesta área há muitas entidades e associações, isso não gera
algum tipo de conflito?
Você tocou em um ponto até correto, eu gosto de trabalhar com a comunidade, desde os 18 anos eu
trabalho com vida comunitária, eu tenho 34 anos e nunca fiquei rico e isso eu tenho orgulho de falar
nunca conseguir um real ou um centavo para mim mesmo, não tenho necessidade disso, por isso que
Deus me ilumina entendeu, se eu conseguir uma coisa eu penso no coletivo. Eu acredito que tem muita
associação que não gosta de mim aqui, porque eu tenho autonomia para chegar, eu bato de frente com
a CONDER, se precisar eu bato de frente com a prefeitura, entendeu? Então eu não tenho o rabo preso,
é uma questão que agente sabe que poderia ser melhor entendeu? Não é só montar uma associação e
fica estagnado, conseguindo recurso a nível Estadual, Municipal e Federal, você ver nós não tínhamos
aquela sinaleira [se refere à sinaleira da Avenida Suburbana], ai eu fui trabalhar de manhã mais ela [se
refere a esposa] o carro veio pegou a criatura, um ônibus levou assim de uma pista a outra, largou o
corpo com mais de 50 metros, a criatura teve morte instantânea, ela quase desmaiou [a esposa] eu ia
trabalhar e nem fui mais, coloquei ela no ônibus e voltei. Olha agente já fez muitos ofícios, muitos abaixo
assinados e nunca resolveu nada, ai eu falei com o pessoal, será gente que vamos deixar isto acontecer
mais uma vez, ai resolvemos fechar a pista, nós fechamos a pista ai causamos um congestionamento de
Coutos até o Largo do Tanque, agente engarrafou tudo agora, depois o que aconteceu, passado o fato ai
aparece uma entidade coloca 20 ou 30 crianças na rua para ganhar Ibope. A questão da segurança aqui
é antiga entendeu? Foi um tema bastante forte aqui em nossa comunidade, eu propôs, ai eles queriam
fazer uma caminhada da paz, ai eu disse mais não resolve nada, pois não vai ter impacto, agente tem que
organizar é uma caravana conseguir dois ônibus chega na porta da Secretária da Segurança Pública e
fazer uma manifestação lá, agente sabe que a mídia é uma verdadeira força, agente não vai fazer um
protesto aqui, porque não vai ter a mesma repercussão do que no centro da cidade, quando eu falava
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
252
que agente tinha que bater de frente com a violência eles falavam [as associações e instituições locais]
que agente tinha era que fica calado, a maioria das entidades aqui, diziam que quem tinha que resolver
isto era a polícia e ai agente era conivente e a violência cada vez mais crescendo.
9– Nos conjuntos Araçás I e II, contemporâneos a este conjunto, você percebe que algumas casas
desabaram, não corre o risco de acontecer isto com o Conjunto Nova Primavera?
Olha, Mateus está pergunta é de nível técnico, eu não sei te responder, agora eu tenho medo que isto
aconteça aqui, eles falam [técnicos da CONDER] que não era para agente mudar a estrutura das casas,
já pensou você receber a casa sem reboco e ficar sem reboco a vida toda, eles garantem que estas casas
representam a nova era da tecnologia da construção civil popular e eles garantem isso, mas eu tenho
medo sim, eu já fiz denúncia de casas que estavam rachando aqui, e eles vieram e fizeram um paliativo,
tinha casa que realmente estava rachando, lá no Conjunto Araçás I, ninguém tinha convicção que iria
acontecer e aconteceu, porque aqui não iria ter também as condições de acontecer isto? Pode vir
acontecer sim, e sem contar também, viu Mateus, você tocou em um ponto que eu havia esquecido,
agente sabe que nas etapas do Conjunto Araçás I e II, o pessoal não tinha este ônus de pagar a casa, ai
eu faço a pergunta: Por que o pessoal do Conjunto Nova Primavera que vieram de palafitas como os de
Araçás I e II, que também vieram de palafitas vão ter que pagar, nós somos melhores ou piores do que
eles.
10– Em relação ao pagamento das taxas as pessoas estão pagando, não –pagando, a CONDER, já
começou a cobrar?
Sim, estão começando a pressionar, estão enviando algumas cartas, uma carta ousada, dizendo que se
os moradores não pagarem vão responder judicialmente, e que a CONDER vai tomar as medidas
cabíveis, é uma forma de repressão é uma forma de intimidar entendeu? É o que eu falo com o pessoal,
viu Mateus, enquanto eles não cumprirem com o acordo de criação de condições para que as pessoas
paguem estas casas, ninguém pagar, eles disseram [pessoal da CONDER], que iam fazer cooperativas,
são projetos que foram prometidos estavam dentro dos objetivos, implementar programas de geração de
renda, criação de fábricas de velas, sabão, fábrica de tijolos para empregar nem que seja um membro
de cada família. Para que assim dessem condições de fazer o pagamento das casas, depois eles tiraram
o deles da reta e a comunidade que não tem ninguém para ser a favor mesmo, só Deus. Na televisão
passou a propaganda da CONDER com estas casas, mas na televisão é uma coisa a realidade é
totalmente diferente.
11– Ricardo no projeto inicial estava preescrito que as casas iam ser entregues sem reboco, sem
piso?
O projeto ia ser só sala, cozinha e banheiro, isso foi uma vitória até da gente né, você ver que a
Associação não existe juridicamente mais de fato ela existe, agente brigou forte com a CONDER, porque
ela só queria dá 22m
2
de área construída e ai quando agente for ver o embrião que eles fizeram como
protótipo ai agente viu que não tinha condições , porque agente morava em palafita e tinha geladeira,
tinha fogão, tinha sofá, tinha televisão,móveis como qualquer casa normal ai agente parou a obra e
dissemos que se fosse daquela forma, não ia ter projeto, porque aquilo não era casa de gente morar, ai
eles falaram que agente só tinha crítica e não tinha solução, e qual era a solução, se aqui não tinha
espaço físico para ser maior, foi ai que eu e mais alguns colegas do grupo de lideranças, que eu tomei o
curso, que foi até cedido pela CONDER, se eu não me engano foi de oito a nove meses de capacitação
de liderança, ai agente se reuniu e enviou proposta, que não tinha espaço físico porque não bate a laje
e faz os quartos em cima, isso foi uma idéia da gente , da comunidade mesmo, claro se você vai fazer um
projeto tem que inserir a comunidade, não adianta você chegar com o pacote pronto, colocar e você vai
ter que aceitar.
12 – Então houve participação na construção da Nova Primavera?
Houve participação em algumas coisas, em outras coisas não, por exemplo, nós não sabíamos que as
casas iam ser entregues sem reboco, para agente as casas iam ser entregues todas prontinhas e tudo
certo, agente só soube da mudança do projeto na questão das lajes, que agente interviu e exigiu que
colocasse os quartos em cima, passando de 22m
2
para quase 50m
2
em área construída, mas ai agente
não sabia que ia receber a casa sem reboco, ai a obra acabou e o dinheiro da obra também e foram
empurrando com a barriga, ai os moradores entraram para suas casas e pronto.
13 – Aqui no Conjunto Nova Primavera as pessoas ainda costumam vender a casa e se
transferirem para outra área da cidade?
Não! Agora é raridade, olha quando você tem algum conhecimento é difícil as pessoas te passarem a
perna, aqui no Conjunto 90% dos moradores não tem este conhecimento.
14 – Ricardo em relação as taxas você acha que as pessoas não devem pagar a taxa?
Não, porque 90% dos moradores daqui estão no mercado informal [diarista; ou empurrando carrinho na
Feira de São Joaquim], como retirar 10% de um salário se a maioria das pessoas não tem salário. Olha a
CONDER fez até gente analfabeta assinar com os dedos, com a impressão digital, documentos se
comprometendo a pagar a taxa. Pode um negócio deste?
15 – As associações que já existem na área, inclusive entidades como: Kilombo Kiôi; CEDEP;
Sociedade 1º. de Maio; cooperaram de algum forma para todo estas discussões antes da execução
do Conjunto Habitacional?
Tem entidades eu não vou citar nomes, que não atendem as necessidades da comunidade. Por exemplo,
se eu moro em palafita eu conheço as minhas necessidades, e eu tenho que lutar para melhorar minhas
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
253
condições de vida, não esperar que outras pessoas venha fazer isso por mim. Algumas entidades se
omitem em relação aos nossos problemas.
16– Todos os moradores que moravam em Palafitas foram contemplados com a Unidade
Habitacional aqui no Conjunto Nova Primavera?
Muita gente ficou de fora, teve gente do Conjunto Araçás – onde algumas casas caíram, que vieram e
conseguiram casas neste projeto, inclusive eu aqui Ricardo Brasil, incentivei 12 famílias que eles
[técnicos da CONDER] quiseram excluir do projeto, estas pessoas são da rua Cléristo Andrade, que eu
morei, eles disseram que o pessoal não iria sair mais das palafitas ai eu disse:Não! O projeto Nova
Primavera contemplava o pessoal daquelas áreas e eles tinham que sair das palafitas de qualquer jeito.
Na verdade o pessoal da CONDER, queria passar as casas destinadas a este pessoal da rua Cléristo
Andrade para o pessoal das casas que caíram do Conjunto Araçás. Mesmo assim, temos aqui no
conjunto pessoas que vieram dos Araçás.
17– O que você indicaria como de necessidade urgente no Conjunto Jardim Nova Primavera?
O ponto principal é a construção de um espaço para ser a sede de uma Associação Comunitária, para
realizarmos muitos projetos, retirá-los das drogas; trabalhar com idosos etc., Mas falta incentivo.
Sra. LINDINALVA ALVES DA R. LIMA (Líder Comunitária) – 38 anos; Aux. de Enfermagem/ cuida de
idosos; mãe-solteira; ex-moradora da palafita e uma das líderes comunitárias do Nova Primavera.
1– Seu nome e sua principal ocupação?
Lindinalva Rocha Lima, trabalha com idosos.
2– Dona Lindinalva como era a vida no Aglomerado de Palafita?
Para muitas pessoas era ruim para mim não
3– Como era a dinâmica na palafita? Como era morar em um barraco sobra a água?
É bom e ao mesmo tempo não é, no meu caso na época em que eu vir morar aqui, em 1984, agente tinha
paz, tinha até o que comer dá própria reserva, agente pescava, comia um sirizinho básico. E o lado ruim
foi quando as pessoas começaram a mudar a natureza, as coisas não andavam mais como antes e o
índice de criminalidade começou a crescer.
4– Era seguro morar sobre a palafita?
Era, nunca molhou! Era uma casa normal, uma casa de construção comum, muito mais quentinha, na
minha casa por exemplo eu tinha duas salas, dois quartos, cozinha, banheiro, entrando pela cozinha, o
corpo físico do banheiro ficava fora e tinha vaso sanitário.
5– Quando a Sra. saiu da palafita?
Vai fazer quatro anos, eu cheguei aqui em 2002
6– E com a mudança da palafita x conjunto habitacional, houve alteração da vida?
Mudou entra aspas, aqui não tem infra-estrutura quase nenhuma, por exemplo não tem uma área de
lazer para as crianças. Esta frente ai que dá para a Av. Suburbana, era para ter um jardim, mas não tem
nada.
7– Dona Lindinalva quais foram os critérios para a transferência?
Através do número de cadastramento que foi feito inicialmente.
8– Quais os principais problemas do Conjunto atualmente?
Está começando a melhorar né, uma pessoa que não é moradora no conjunto, mas que é líder
comunitária fez junto com agente diversos abaixo assinados ai conseguimos junto a Luciana fazer com
que os postes daqui da rua pudessem ter iluminação porque antes não tinha, até a semana passada,
todos estes postes eram sem lâmpadas.
9– Você acha que o principal problema do Nova Primavera é o Conjunto em si, às unidades
habitacionais ou a falta de infra-estrutura básica?
É essa questão ai falta saúde, escola, aqui não tem nada disso aqui nesta área do conjunto Nova
Primavera, São João, Cabrito, só tem uma escola ao nível de 2º. Grau, as pessoas têm que se deslocar
daqui para estudar fora.
10– Dona Lindinalva se a Sra. encontrasse um comprador para a sua casa a Sra. venderia?
Venderia sim, e comprava outra casa em um lugar melhor, mas eu vou e volto atrás, porque eu tenho
uma filha deficiente aqui, e aqui agente tem uma ótima rede de transporte, nós os suburbanos, como
dizem em se tratando de transporte é maravilhoso, só falta dinheiro para poder sempre que necessário
pegar o ônibus.
11– Dona Lindinalva as pessoas daqui do Conjunto Nova Primavera, vendem suas casas e vão
para outra invasão?
Vende sim, e o preço para estas casas não passam de R$ 5.000, vendem e voltam a morar nas invasões
, eles vendem porque não sabem o que querem não tem noção da coisa, porque estas casas não são
palácios mas para a vida que se tinha antes nas palafitas, não a minha vida que antes era melhor que
hoje, são maravilhosas. Quanto eu morava na palafita eu era casada, eu tinha duas televisões, vídeo
cassete, etc. É eu disse, uma vez uma amiga minha de Brotas [outro bairro de Salvador], ela me disse eu
quero conhecer a sua casa, eu falei eu moro em palafita, ela disse é mesmo! Eu falei é! Aí eu levei ela e
mais outra amiga para conhecer minha casa, ai passamos por uns 300 metros de ponte de tábua na rua
Cléristo Andrade, quando ela chegou dentro de casa toda arrumadinha, toda bonitinha, ai ela disse, você
tem até televisão, tem sofá, tem tudo, eu respondi você pensa que uma pessoa que mora em palafita
mora em jornal é (risos)?
12 – A Sra. gosta do Conjunto Nova Primavera?
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
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Gosto, e principalmente o lugar que me deram, a minha rua aqui no conjunto é muito privilegiada, é um
lugar tranqüilo, juntei com meus vizinhos, fizemos o portão, é aquela coisa agente tem aquela segurança.
13– Existe associação comunitária no conjunto? E as pessoas do conjunto participam desta
associação ?
Estamos tentando legalizar, eu e o Ricardo, mas o pessoal daqui é muito arredio a este tipo de coisa, não
são instruídos, muitos são analfabetos. Eu e Ricardo somos taxados como moralistas que querem fazer
àquilo que não podem, quando na verdade estamos lutando pelas coisas boas. Possa até ser que eles
não vejam isto amanhã, mas meu filho, meus netos e bisnetos vão alcançar e vão ouvir sua a
labutou muito para ter isso aqui, isso é importante.
14 – O que o Conjunto Habitacional Nova Primavera mais precisa atualmente?
Uma escola com nível de 1º. 2º. Grau, uma sala de computação para os meninos da comunidade; um
posto de saúde, não um PSF, que não servisse apenas para a comunidade do conjunto Nova Primavera,
mas também a área ao redor do conjunto. E uma pequena fábrica para os moradores desempregados do
conjunto, um programa de geração de renda.
Sra MARLENIR DOS SANTOS (Moradora do Conjunto Habitacional)39 anos; diarista; ex-moradora de
palafita,participou ativamente de todo do processo de mudança da palafita para o conjunto habitacional.
1– Qual o seu nome e qual a sua ocupação de renda?
Marlenir dos Santos, tenho 39 anos e sou diarista vivo de faxina
2– Como era a sua vida na palafita e por quanto tempo a Sra. morou em palafita?
Era muito ruim sabe agente não tinha segurança, não tinha rede de esgoto, não tinha energia, quando
chovia a maré enchia e agente ficava sem energia pois era gato. Aqui no seco agente tem, água
encanada, rede de esgoto, tudo limpinho, lá na maré tinha carniça na água, um mal cheiro danado, aqui
é terra firme e bem melhor. Na palafita eu passei 10 anos, eu fui morar na palafita em 1991, aqui no
conjunto habitacional eu vou fazer 4 anos.
3– Como foi a mudança e o processo de adaptação?
Foi muito boa, eu gostei de lá para cá eu gostei, eu só não gosto desta casa uma coisa, a parede e meia,
por exemplo se você fazer uma zuada de noite o outro vizinho do lado não dorme, agora a vizinha ai do
lado alugou a casa, e o homem que alugou dorme com o cachorro dentro de casa, seis horas da manhã
o cachorro fica latindo ai ninguém mais dorme, é mole! O pessoal vende as casas e nem é todo o
morador que é igual, que faz silêncio, que olha o outro lado do vizinho, que necessita levantar cedo para
trabalhar. O principal problema do conjunto é a parede e meia.
4– Tem representantes comunitários no Conjunto Nova Primavera?
Eu vejo ai Linda e Ricardo, mas não vejo eles fazerem nada. Vamos ver neste caso da CONDER, querer
cobrar as taxas aos moradores, vamos ver o que vai dar, se vai ter reunião coisa e tal.
5– Você não acha que falta uma área de lazer no Conjunto Nova Primavera?
Olha! O que adianta neste conjunto ter uma área de lazer, se as pessoas não agravando a todos não
sabem conservar. Ali eles dizem que tem uma praça, mas qual a mãe de família que vai sentar em uma
praça daquela com certos tipos de famílias que tem ali, uma baixaria, uma fofoca. Eu digo se for para
construir uma praça que façam, mas tem que ser fora das casas.
6– A Sra. não tem saudades da palafita?
Não!
7– Dona Marlenir a Sra. venderia sua casa se encontrasse comprador?
Para eu sair daqui da suburbana, eu venderia.
8– A Sra. gosta do Conjunto Habitacional?
Gosto mas estou enjoando daqui
Sra. SILMARIA MARIA DOS SANTOS (Ex- Moradora da Palafita e atual Moradora do Conjunto
Habitacional); cuida de idosos; mãe de três filhas.
1 – Como a Sra. se chama e qual a sua principal ocupação?
Me chamo Silmaria Santos, tenho 32 anos, cuido de idosos
2– Como era a sua vida na palafita?
Horrível, não tinha esgotamento sanitário, não tinha água, não tinha luz, tudo era na base do gato, não
tinha segurança, agente convivia com tudo, tiroteio, bandidagem e tudo, e achar bem em tudo –
simplesmente ignora.
3–Como foi a mudança para o Conjunto Nova Primavera?
Do ruim para o melhor eu não sinto saudade da palafita
4– Quais as principais dificuldades daqui do Conjunto Nova Primavera?
Segurança não temos, não tem parque para as crianças, não temos agentes de saúde, não temos posto
médico.
5– Se você achasse comprador aqui para a sua casa você venderia?
Não, porque eu tenho filhos e tenho que pensar neles.
6– A Sra. de adaptou bem aqui no Conjunto Nova Primavera?
Sim, apesar das pragas que teve eu me adaptei tranqüilamente; os vizinhos são bons; o tamanho da
casa está bom.
7– No conjunto habitacional Nova Primavera há associação comunitária?
Se existi eu não sei
8– A Sra. está satisfeita com o Conjunto Habitacional?
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
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Olha, aqui tem seus prós e contras, tem umas coisas boas e outras ruins, tem coisas que ainda não nos
acostumamos, como tiroteio, insegurança, não temos o direito de sair de madrugada do conjunto porque
estaremos correndo risco de uma bala perdida, como em minha casa já teve [ ela aponta a marca da bala
na parede] porta perfurada.
9– Acontece tiroteio com pessoas do Conjunto Habitacional?
Sim, todo o mês tem três mortes aqui nesta área quando não por tiros, é por atropelo ai nesta avenida
suburbana.
10 – Quais os pontos positivos do Conjunto Habitacional?
Temos um teto, sabemos que podemos sair e voltar e teremos sempre um lugar para quando
retornarmos.
Série IV – Entrevista 1
Entrevistado (a) – Denis Rosário, 33 anos – Secretária Executiva do Quilombo Kiôio, entidade social
credenciada a Pastoral Católica e a Paróquia São Brás – Subúrbio Ferroviário de Salvador; a entrevistada
já foi moradora de palafitas no aglomerado de Novos Alagados.
Entrevistador (1) – Jornalista Holandês Eric Beuchiman
Entrevistador (2) – Antonio Mateus de Carvalho Soares; Transcrição(03/04/2006)
Local – No Conjunto Habitacional Jardim Nova Primavera – Na casa da entrevistada – Salvador- Ba.
Data – 10/10/2004
1– Seu nome e há quanto tempo mora aqui?
Me chamo Denis Rosário, moro em Novos Alagados há 10 anos, antes eu morava em Morro de São
Paulo, minha família resolveu vir para cá pois lá não havia condições de estudo, não tinha muitas escolas,
por esse motivo nos mudamos.
2–Você morou em palafitas?
Inicialmente eu morei em Palafita, que são aquelas casas na água, mas depois meu pai que era
Marinheiro, agora aposentado, conseguiu juntar um dinheirinho e comprou uma casa, aqui perto mesmo.
Lá em Morro de São Paulo, a vida era mais difícil, não havia condições de desenvolvimento, ainda não
tinha o turismo como têm hoje.
3– Você ainda mora com sua família, não pretende quando casar mudar daqui?
Ainda moro com minha família, não pretendo mudar daqui não, atualmente temos um nível de vida
melhor, agora eu estou na universidade, e pretendo ficar aqui, continuar trabalhando aqui.
4– Fale-me um pouco sobre o seu trabalho aqui?
Sim, o trabalho aqui pertence à Igreja Católica, Paróquia de São Brás, e é um projeto de promoção
humana, porque a maioria das mulheres daqui, são sozinhas não têm marido, então desenvolvemos este
projeto especialmente para mulheres, temos cerca de 300 mães cadastradas, o requisito é que elas
sejam mães, e tenham mais de 1 filho, as mulheres aqui tem muitos filhos, temos famílias que chegam a
10 a 14 pessoas em uma casa, ai nós cadastramos estas mães, são dividas em grupos, aqui elas
recebem toda a orientação, saúde, também cursos educacionais e profissionalizantes e também damos
uma assistência médica, temos três médicos voluntários,damos uma ajuda em alimentação e no que está
mãe precisar, estamos aqui. Além destas palestras de saúde, temos palestras de promoção humana,
dignidade, porque a maioria destas mães quando elas entram aqui, estavam ai jogadas, sem nenhuma
noção de higiene, saúde, quanto elas entram aqui essas pessoas são cruas, marcadas pela violência,
muita fome, um problema aqui é a fome, praticamente todas eram moradoras, de palafitas, hoje, não tem
mais palafitas, mas a pobreza continua igual. Então nós acolhemos essas mulheres e vamos
desenvolvendo, ao ponto de muitas delas está abrindo seu próprio negócio, fruto dos próprios cursos que
são dados aqui, a exemplo dos cursos de produtos de limpeza. Muitas das mulheres que fizeram os
cursos, começam a produzir, o projeto empresta o dinheiro para elas montarem o negócio, ai elas vão
pagando em pequenas parcelas, depois continuam.
5 –São vocês que emprestam o dinheiro para elas?
Sim, nós emprestamos o dinheiro para elas comprarem todo o material que elas precisam, elas se
comprometem a pagar, e todas que tomaram o dinheiro até hoje sempre pagaram, elas pagam da
maneira que elas podem, não determinamos o valor. E agora não estão passando fome, como antes,
muitas que não conseguiam comprar nenhum gás para cozinhar, agora não passam por este sufoco.
6– Você fala das mulheres cruas, e a idéia de higiene, coisa assim, é porque elas nunca foram à
escola?
A maioria interrompeu os estudos, outras nem foram, muitas são vítimas da violência família porque os
companheiros batem muito, elas apanham, muitas são vítimas da violência sexual, muitas são mulheres
de bandidos de traficantes, muitas os filhos estão morrendo por causa do tráfico. Então são mulheres
assim, que ninguém ligavam para elas, é verdade, não tinha o consolo de uma crença, e aqui também
tem o lado espiritual, elas começam a freqüentar as missas
7 – Tem muito tráfico de drogas aqui?
Sim, a área aqui é de tráfico de drogas.
8– Você falou da violência e tem muita violência aqui?
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
256
Sim, tem muita violência principalmente à violência em casa, aqui tem muitos casos de mulheres que
apanham muito dos maridos e temos casos que somos obrigados a socorrer. E, levar essas mulheres ao
hospital.
9 – E por que elas continuam com seus maridos, não tem outra opção?
Sim, elas não têm emprego, não sabem ler [...] e os maridos batem nelas por causa da bebida, não põem
nada em casa e só participam mesmo da fabricação dos filhos, está é a verdade. E quando chegam em
casa, é batendo na família, quando não nas mulheres, são nos filhos, temos muitos casos destes aqui.
10 – Estas mulheres que você se referiu quando põe seu negocio, seu comércio, elas continuam
aqui ou mudam de bairro?
Elas pensam melhorar de vida, mas querem permanecer aqui, a maioria antes moravam nas palafitas,
ganharam estas casas do Conjunto Nova Primavera, agora elas têm uma pequena estrutura para vender,
mas não há condição de sair para outro lugar, o que elas ganham com estes negócios, não dá para elas
saírem daqui, só dá para sobreviver, para elas não passarem fome.
11– E neste projeto, vocês possibilitam um melhor futuro para as crianças?
Sim, aqui no Subúrbio, para a sociedade só se produz marginal todo mundo acha que quem mora no
Subúrbio é marginal, mas muitos jovens aqui estão ingressando nas faculdades, que é uma grande prova
que isto aqui está mudando.
12 – Quando estes jovens terminam a faculdades eles ficam aqui, ou eles vão para outro lugar?
Eles continuam permanecendo aqui, tem muitos que trabalham aqui mesmo e outros mesmo trabalhando
em outros lugares, continuam aqui.
13 – Se aqui tem tanta violência, tem tantos problemas, se você tem a opção de mudar de lugar,
porque não mudar?
A violência está em todo lugar, eles ficam aqui porque querem mudar o lugar que eles nasceram e
continuam morando, buscando a melhoria neste lugar. E melhorar significa prevenir que os jovens entrem
no tráfico. Aqui mesmo na paróquia tem um curso pré-vestibular gratuito, é uma chance que este jovem
que sempre estudou em escola pública possa se preparar para entrar em uma faculdade.
14 – Isso significa que tem um sentido comunitário aqui?
Sim, tem bastante o sentimento comunitário.
15 – Só há este trabalho comunitário aqui?
Não, há uma série de trabalhos, tem centros educativos que preparam também os jovens, há a Sociedade
1º. de Maio, então podemos dizer que há um conjunto de entidades que trabalham em projetos sociais
aqui.
16– E o governo do Estado está fazendo alguma coisa?
Olha, especialmente em nosso projeto não, eles têm vários trabalhos. Agora tiraram as palafitas e deram
estas casas [Conjunto Viver Melhor], houve uma melhora? Sim! Mas quem passava fome nas palafitas
continuam passando nas novas casas sólidas.
17 – Isso por que não têm suficientes empregos?
Sim, não têm emprego, e quando tem, as pessoas não estão plenamente preparadas para ele.
Série IV – Entrevista 2
Entrevistado (a) – Maria Gomes do Carmo, 47 anos – Vendedora de Artesanato (ela mesmo fábrica as
flores com sabonete e vende nos finais de semana em bares da cidade); foi moradora de barraco no
bairro de Boiadeiro, adjacente ao Conjunto Nova Primavera, onde atualmente mora; mãe solteira,
desempregada.
Entrevistador (1) – Jornalista Holandês Eric Beuchiman
Entrevistador (2) – Antonio Mateus de Carvalho Soares; Transcrição(05/04/2006)
Local – No Conjunto Habitacional Jardim Nova Primavera – Na casa da entrevistada – Salvador- Ba.
Data – 10/10/2004
1 – Como a Sra. se chama?
Me chamo Maria Gomes do Carmo
2 – Onde a Sra. morava antes de chegar aqui?
Eu estava morando na rua 1. de novembro, rua 15 E, bairro de boiadeiro, aqui mesmo no Subúrbio
Ferroviário de Salvador
3 – Em que tipo de casa a Sra. morava?
Casa de bloco, mas sem ferro, cheguei neste endereço em 1989
4 – Antes deste endereço a Sra. morava onde?
Morava na rua 2 de Outubro, no. 121 E, na Regis Pacheco, mas era uma rua muito ruim também, essa
rua fica no fundo da delegacia furtos e roubos, ali perto da Baixa Fiscal.
5 – A casa era igual a de antes?
A casa era igual à outra, de bloco, mas não tinha ferro, em uma péssima condição de moradia também,
não tinha esgoto, era ruim, péssimo.
6 – A Sra. é daqui de Salvador mesmo?
Sim, sou, nascida e criada aqui em Salvador.
7 – E seus pais?
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
257
Meus pais são do interior, mas vieram para aqui também, mas já são finados, eles vieram causa da
pobreza, a roça não estava dando mais para manter a família, ai eles vieram para Salvador. Minha mãe
sempre contava que quando a roça acabou eles vieram.
8 – Como eram as condições de vida quando você era jovem?
Rapaz, minhas condições de vida, sempre foi trabalho, até hoje, eu não sei contar uma condição de vida
tranqüila assim, sem muito trabalho, trabalho árduo, sempre trabalhei arduamente.
9 – A senhora passava fome quando era jovem?
Tive, tive várias crises, lá em casa minha mãe pobre, foi morar com meu padrasto, entramos em crise
minha mãe foi vender em tabuleiro na rua, foram várias crises. Nunca tive regalias não!
10 – Quantos irmão tem?
Tenho sete irmãos.
11 – Como foi quando você mudou para aqui?
Eu mudei para aqui [Conjunto Nova Primavera], foi através da CONDER, ai eu fiquei sabendo, as casa de
minha rua como eram muitos ruins e a ser demolidas e as pessoas iriam vir para o conjunto, me
ofereceram R$ 3.000 mil reais, mas eu preferi a casa no lugar do dinheiro.
12 – A Sra. mora com quantas pessoas aqui?
Só eu e meu filho
13 – A sra. está contente com a nova casa?
Me sinto bem nesta casa, aqui são dois quartos eu fico a vontade no meu quarto e ele fica a vontade no
quarto dele, a casa que eu morava antes era um vão só, agora há dois tanques de água no meu quarto
aqui, um tanque para a casa de baixo e um tanque para minha casa. Nesta sala eu fico a vontade para
fazer os meus artesanatos.
14 – Qual o tipo de artesanato a Sra. faz?
Faço flores de sabonete, rosinhas de sabonete.
15 – A Sra. ganha muito dinheiro com isto?
Dá para passar né, dá para pagar luz, água.
16 – E o seu filho trabalha?
Não, ele estuda, eu que trabalho arduamente todos os dias, todos os dias mesmo.
17 – E o seu filho estuda para fazer o que no futuro?
Ele tem sonho de ser marinheiro, está se esforçando para estudar, o exercito ele não quer não, mas a
marinha ele quer, eu tenho a fé em Deus, eu sou cristã né, que ele irá conseguir realizar o sonho dele.
18 – Você fez algum curso para aprender fazer o artesanato?
Não eu aprendi olhando, aprendi sozinha, ralo o sabonete, faço a massinha e toco o pau a fazer.
19 – E a vida aqui no bairro é tranqüilo?
Sim, é tranqüilo, só teve alguns problemas no início causa das casas, as pessoas queriam as casas da
frente, a minha vizinha queria que eu trocasse a minha casa com a do irmão dela, mas eu não quis.
Queria colocar bar aqui, mas eu não quis, houve muita discórdia nos sorteios das casas, mas só isso.
Graças a Deus, mas disse que teve uma briga ai estes dias, causa de um terreno, um tal de um beco,
uma mulher queria tomar o beco da vizinha, só isso.
20 – Você gostaria de ficar toda a sua vida neste conjunto habitacional ou gostaria de mudar?
Gostaria de mudar porque as coisas aqui são muito difíceis, aqui não tem supermercado, não tem
farmácia perto, você sabe eu faço estas coisas de artesanato, às vezes não encontro sabonete rosa para
comprar, tenho que caminhar muito para encontrar o sabonete no Supermercado Bom Preço, lá em cima
no bairro de Plataforma, tenho que subir essa ladeira, ou ir na Feira de São Joaquim, ou de ônibus para a
Calçada ou Terminal da França. Eu que durmo tarde, acordo com os pés inchados de tanto andar.
21 – E o seu filho gosta daqui?
Não, ele detesta aqui, também tem vontade de mudar. O meu filho aqueixa de amizade, os jovens aqui
não fazem amizade, aqui os jovens não sabem ser amigos, muita droga, muita amizade. Ele se aqueixa,
fala - Oh! Mãe eu queria morar em um lugar, assim que tivesse amigos para passear, para jogar bola,
bater papo, sem está onda que rola aqui. Olha, você acredita que eu tive uma vizinha para bater papo, só
quando eu morei no Uruguai, desde que vir morar aqui nesta área na Suburbana, pouca intimidade, um
bom dia, uma boa tarde, você acredita que a maioria das mães de famílias aqui são fofoqueiras, é
encrenqueira e a pessoa tem que sair de baixo, agente se senti mal em um lugar assim né !
22 – Mudar para onde?
Aqui no Subúrbio mesmo, mudar para o bairro de Paripe, eu vendo rosa lá, lá tem diversos
supermercados, tá ótimo ali tem abastecimento, tem feirinha.
23 – Você se senti mal porque não pode oferecer algo melhor para seu filho?
Se eu sinto culpa! Tenho, sinto culpa sim, eu já pensei, mas sempre explico para ele, o que posso fazer
como pobre eu faço, eu sempre explico a ele, para ele ter paciência, para ele não roubar, para não ser
preso, ter paciência um dia ele chega lá com os estudos dele, e realizar os sonhos deles.
24 – A Sra. tem sorte de ter somente um filho?
É verdade, tive essa sorte, na verdade tive quatro mais morreu três, eu tive juízo de não ter tido mais, eu
sempre imaginava em encontrar uma pessoa para morar e mal tratar ele, eu vi muitas amigas minhas
tentando, ah! não deu certo com este homem, arranja outro e um vanbora fazer filhos. É eu só tive esse e
agora, pior, eu sou cristão, na minha igreja, não pode de jeito nenhum, sexo, sem casamento, e eu há
muitos anos que não tenho marido, graças a Deus!!! melhor para mim, porque sei que não correrei risco
nenhum de gravidez.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
258
25 – E os seus outros filhos do que morreram?
O primeiro foi de bronco-pneumonia, tinha dois meses e sete dias, era uma menina; o segundo também
foi bronco-pneumonia, tinha um ano e quatro meses, e o terceiro eu fiz um aborto. Vida do mundo
miserável, eu digo a você hoje eu gosto de ser uma cristã, porque eu não vou mais fazer farra, naquela
época arranja uma paquerinha para tomar uma cervejinha, daqui a pouca um motelzinho, gravidez
inesperada, neguinho caindo fora, viu, e ai vanbora problema, mas hoje eu estou livre disso, só tenho a
agradecer a Deus. Esse aborto que eu fiz mesmo, foi um paquera, né, eu com 25 anos, ele com 25 anos,
eu gata, ele gato e ai pronto, quando foi na hora “h” da gravidez o homem pulou fora, dizendo que o filho
não era dele, e como o filho seria dele, só estávamos juntos há três dias, coisa e tal.
Série IV – Entrevista 3
Entrevistado (a) – Cristiane Ribeiro dos Santos, 28 anos, doméstica, antiga moradora de palafita no
Aglomerado de Novos Alagados e moradora do Conjunto Nova Primavera.
Entrevistador (1) – Jornalista Holandês Eric Beuchiman
Entrevistador (2) – Antonio Mateus de Carvalho Soares; Transcrição(05/04/2006)
Local – No Conjunto Habitacional Jardim Nova Primavera – Na casa da entrevistada – Salvador- Ba.
Data – 10/10/2004
1 – Como a Sra. se chama?
Me chamo Cristiane Ribeiro dos Santos
2 – Há quanto tempo a Sra. mora aqui?
Um ano e três meses
3– Onde a Sra. morava antes de chegar aqui?
Há nove anos morava na maré, na palafita, barraco sobre a água, o nome da rua era Santa Isabel, a casa
era pequena, barraco sobre a água e de seis em seis meses, agente tinha que trocar a casa, senão ela
caia, e quanto chovia molhava tudo, os meninos só viviam caindo na maré, eu mesmo tenho duas
cicatrizes. Vivíamos com ratos e baratas e com outros bichos que apareciam. A casa que eu morava era
um barraco de maderite em cima da água mesmo, quando ventava parecia que a casa ia cair.
4 – Você morou 9 (nove) anos na palafita e antes, você morava onde?
Morei nove anos e lutei muito para consegui está casa hoje, se fosse pelo pessoal da CONDER estaria lá
na maré até hoje. Começaram a tirar todo mundo da maré e me deixaram lá, eu ameacei a CONDER, ou
me davam uma casa ou eu iria a uma emissora de televisão dar uma queixa, os meninos [filhos dela]
todos cheios de creca, eu disse ou você me tiram daqui ou eu vou denunciar vocês. Antes disso eu
morava no bairro Fazenda Grande do Retiro, com minha mãe, mudei para aqui porque meu marido é
daqui, mora aqui a 23 anos.
5 – Você está trabalhando? O que gostaria de fazer?
Não pretendo trabalhar mais, ninguém dá oportunidade, gostaria de fazer qualquer coisa na vida, desde
quando ganhasse um dinheiro, para rebocar a casa, ajudar a manter o filho na escola, tudo é muito caro,
então tem que ajuda o marido.
6 – O que seu marido faz?
Meu marido é vendedor ambulante, vende chocolate para viver, ele tira uns R$ 80,00 por mês, depende
pois se estiver chovendo ninguém vai comprar chocolate. Destes R$ 80,00, temos que está tirando o
rango da semana, gastamos R$ 20,00 ou R$ 30,00 e fora a água e a luz, e estão querendo que agente
pague a casa 10% do salário minino, para agente pegar o documento da casa, temos que pagar, ou paga
ou então não pega, agente está lutando para não pagar, pois onde agente morava agente não pagava
nada. Agente não pediu, eles que quiseram mudar agente de lá, se agente não tem trabalho nem nada,
disseram ai [o pessoal da CONDER] que iriam dar trabalho agente, tipo cooperativa, para ajudar os
moradores, mas até hoje não saiu nada, e ai como agente vai fazer? Pense ai uma pessoa que é
desempregada, paga água, luz, e ainda 10% do salário para pagar casa.
7 – Você pretende ficar aqui?
Pretendo, eu gosto daqui, aqui tá bom, ou bom ou ruim, aqui tá bom, agente não tem condições de fazer
uma casa desta, né, o salário que agente ganha não dar nem para agente viver, todo mundo
desempregado. Eu pretendo ficar aqui, eu gostei daqui, ponto de ônibus perto 24h.
8– Você é daqui de Salvador?
Sou daqui de Salvador mesmo, nasci aqui.
9– E seus pais são daqui de Salvador?
São do interior e vieram para aqui trabalhar.
10– O que espera para seus filhos?
Espero para meus filhos que eles estudem, e tenha um futuro bom, que Lula dê os trabalhos que ele
prometeu, e que a educação mude, está muito ruim a educação do estado, eu estudo no noturno e faltam
professores, se antes não prestava hoje está pior ainda.
11 – Por que estuda ainda?
Para tentar melhorar de vida, concluir o 2º. Grau para poder arranjar um emprego, em tudo que você
fazer hoje, exige o 2º. Gra
Série IV – Entrevista 4
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
259
Entrevistado (a) – Diva Barbosa Machado, 80 anos, moradora de palafita, que resistiu até o último
momento a saída do Aglomerado de Palafita.
Entrevistador (1) – Jornalista Holandês Eric Beuchiman.
Entrevistador (2) – Antonio Mateus de Carvalho Soares; Transcrição (05/04/2006)
Local – No Aglomerado de Palafita de Novos Alagados – No barraco da entrevistada – Salvador- Ba.
Data – 10/10/2004
1 – Há quanto tempo a Sra. mora aqui?
Tenho 25 anos morando nesta área, antes morava também na maré, mas não era aqui, era no Uruguai.
2– Como era a casa que a Sra, morava antes?
Era, era igual a esta, um barraco de entulho sobre a água, mas eu vendi a casa para um rapaz e fui
morar com minha filha, mas não me dei bem, agente quando chega a uma certa idade tem que morar
sozinha. Ai eu conseguir uma lama perto do barraco de minha filha ai eu resolvi construir um barraco e
morei mais ou menos de 10 a 12 anos, até vir para este aqui.
3 – A Sra. é de Salvador mesmo?
Não sou de São Gonçalo dos Campos [interior do Estado], agora somando todo o tempo que estou aqui
tem uns 45 anos.
4 – Porque a Sra. veio para aqui?
Lá em São Gonçalo dos Campos não tinha condições de eu criar minhas filhas, ai vir para aqui trabalhar
de doméstica, lavei roupa na casa de família, paguei meu INPSS, me enchi de doença não sei como, e
hoje sou aposentada. Não pude mais trabalhar, fiz três operações, ai aposentei, mas antes de lavar roupa
eu trabalhava em Trapiche de Fumo. Mas quanto eu cheguei aqui em Salvador, fui morar em um barraco
alugado no bairro da liberdade, como não tinha como pagar o aluguel, me falaram destes barracos de
palafitas aqui ai eu fui morar primeiro nos barracos de palafitas do [aglomerado] do Uruguai e depois vir
para aqui, [aglomerado de palafita de Novos Alagados], ai foi onde eu acabei de criar as minhas filhas
com lavagem de roupa.
5– A Sra. não tem marido?
Não, não tenho, há uns 33 anos estou sozinha, depois que meu marido morreu não arranjei outro, não me
casei depois, não quis mais saber de homem. Criei minhas filhas sozinhas graças a Deus, foram cinco
filhas criadas, tinha um rapaz, mas ele morreu.
6– Quando a Sra. veio morar em Salvador não tinha medo?
Medo eu nunca tive, mas eu não tinha mesmo era ordenado, não tinha emprego, sair de São Gonçalo,
deixei minhas filhas lá com vizinhos e parentes e vir sozinha para aqui. Quando eu cheguei aqui o
trabalho que eu vir acertada, não era para fazer só uma coisa, mas um monte de coisas, lavar roupas,
cuidar de crianças, arrumar casa. Minha conterrânea me trouxe para aqui e me explorou. Eu não tinha
nem tempo para procurar uma pessoa para escrever cartas para eu mandar para minhas filhas.
7 – Por que veio para Salvador? Por que não foi para outro lugar?
Eu até pensei em ir para o Rio de Janeiro, arrumei até as malas, mas depois pensei lá eu não conhecia
ninguém, e o Rio de Janeiro era mais difícil para eu me comunicar com minhas filhas.
8 – A Sra. mora neste lugar há 25 anos, como era antes?
Moro nesta área há uns 25 anos, no início não tinha luz, não tinha energia, não tinha água, não tinha
nada, era uma sede, agente comia pão seco com café, isso no governo de Antonio Balbino, eu me
lembro. Aqui não tinha água, mas depois com a fundação da Sociedade 1º. de maio [associação que
existe até hoje no bairro], que muito ajudou está comunidade da maré.
9 – Tinha banheiro na sua casa?
Não tinha, e ainda não tem, há tinha muitos mosquitos que mordiam muita gente.
10 – Hoje em dia está melhorando as coisas aqui?
Sim, está melhor, mas estes pedacinhos de casas que deram para agente me deixou muito
decepcionada, eu já recebi minha chave, mais ainda não mudei nada, não tenho vontade de mudar, como
vou mudar de casa, eu ando de moletas, aqui já estou adaptada, mas eu vou ter que mudar. Olha eu
disse para os funcionários da CONDER e digo para quem parecer, esses pedacinhos de casas que
estamos recebemos [ela se refere as casas do Conjunto Jardim Nova Primavera], eu na idade que estou,
estou indignada. Outra coisa disseram que não podem ampliar estas casas, eu não vou poder levar o
material que tenho aqui no barraco para ampliar a outra casa [ ela se refere às madeiras de seu barraco
atual], estou muito insatisfeita com estes pedacinhos de casas que não, podem ampliar, mas eu já disse
vou levar alguns pedaços de paus daqui, que agüentem pregos para eu ampliar a casa.
11 – A Sra. vai ter que pagar alguma taxa pela nova casa?
Eu ouvir dizer lá na Associação 1º. de Maio que iríamos pagar uma taxa, que tem como base o salário
mínimo, mas eu não vir ninguém pagar ainda.
12 – A Sra. tem condições de pagar está taxa?
Eu não tenho condições de pagar está taxa, minha aposentadoria é só dá para comprar remédios.
13– A Sra.vai sentir saudade da palafita?
Sim, pois eu construir este barraco, madeira a madeira, construir do tamanho que estar, nós construímos
os barracos, vou sentir saudade do espaço do barraco, que é maior do que o das novas casas [ela se
refere à casa do Conjunto Jardim Nova Primavera]. Mas eu não posso deixar de falar que aqui no barraco
não tem segurança, quando chove agente se molha, a outra casa é mais segura.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
260
14 – Suas filhas moram onde?
Um mora aqui do lado, duas moram no [bairro do] Uruguai, e uma em Mussurunga. As casas delas são
de construção, elas trabalham lavando roupas e fazendo faxinas e assim levam a vida.
15 – Como está a situação de sua água e sua energia elétrica?
Olha aqui tudo é gato [ligação clandestina]
Entrevista com Professor da UFBA – Pesquisador do Subúrbio
Série V
Prof. Dr. Carlos Geraldo D’Andréa [Gey] Espinheira (Pesquisador [do CRH/UFBA] com diversas
pesquisas realizadas no Subúrbio Ferroviário de Salvador – uma das áreas de nosso estudo).
1– Prof. como se realizou o processo de urbanização de Salvador?
Nós tínhamos uma sociedade planificada a partir dos anos de 1940/48, com a execução de grandes
planos urbanos que marcaram a estruturação atual desta cidade. Mas esta cidade se divide em várias
dimensões: a cidade legal, a cidade clandestina. A cidade clandestina é duas vezes maior do que a
cidade legal, legal do ponto de vista da obediência das regulamentações municipais, planejamentos de
impostos, das taxas e da submissão das normas de construções aos padrões do município. A cidade
ilegal é constituída de expansão urbana desordenada, sem planejamento, ao sabor das forças populares
no sentido tanto político, como no sentido de aglomeração de concentração de migração, ocupando
sempre os terrenos mais desvalorizados, mais altos e de encostas, ou vales úmidos, insalubres, ou
mesmo sobre o mar da Enseada da Ribeira na região da baía de Todos os Santos, estas ocupações
constituem hoje o que chamamos de invasão, substituindo até mesmo a terminologia de favela, que
conotava habitações precárias, mas a invasão já conota uma intencionalidade da acusação de
ilegalidade, então o Estado de Direito já ajuda a denominar de invasão, como se estas pessoas fossem
culpadas em primeiro lugar pela invasão em segundo pela situação de pobreza, e, como temos um
número muito grande de invasões, nós temos uma altíssima taxa de criminalidade que se relacionam
com estas invasões de tal modo, que a associação: pobreza, urbanização precária e criminalidade
constitui toda uma coerência todo um esquema que faz com que as taxas de criminalidade estejam nos
bairros pobres e bairros de urbanização precária .
2– O Prof. fala que é a partir de 1965 que realmente houve uma aceleração na urbanização de
Salvador, como se realizou este processo?
Nós tivemos em Salvador, uma situação muito peculiar no conjunto das capitais brasileiras, pois Salvador
passou um longo tempo sem nenhum impacto de investimento, capaz de mudar a fisionomia da cidade,
uma espécie de letargia urbana e demográfica, a partir de 1960 e mais propriamente 1965, num projeto
de descentralização industrial para o entorno da Bahia, tivemos a instalação do Centro Industrial do Aratu
e o Complexo Petroquímico de Camaçari, dois importantes complexos industriais que exigiram muita mão
de obra na construção civil, para construção de suas instalações e em seguida para a operacionalização
dos dois parques industriais, que esta mão de obra primeira não poderia operar pela falta de
especialização e uma nova mão de obra provinda do sudeste do país e inclusive do exterior, que se
agregaram criando em Salvador novos bairros e forçando estas populações empobrecidas se alojarem
como podiam nos terrenos periféricos, nos terrenos de encostas, criando uma situação de periferia
urbana, que a cidade até então não conhecia.
3– Qual o perfil das pessoas que “invadem” a cidade?
São pessoas que vieram do interior do Estado fugindo da seca, são familiares de pessoas que aqui já
estavam, vítimas da falta do acesso ao mercado imobiliário, um pobre na cidade de Salvador
absolutamente, não tem como comprar terra urbana, não há nenhum imobiliário que venda terrenos
parcelados e legalizados para uma população de baixa renda, então a única solução é invadir. Assim a
invasão vai se dando pelo próprio crescimento demográfico, crescimento vegetativo, assim como
decorrente das pressões migratórias que continuam vindo para Salvador, fugindo das péssimas
condições de vida e da decadência do plantio do cacau na região sul, das seca na região do Semi-Árido,
e também da busca de melhores condições de vidas, pela concentração dos melhores serviços na região
metropolitana. Nos temos uma grande distorsão no Estado da Bahia, na qual Salvador que é a capital
tem uma população de aproximadamente 2.500.000 hab. e a segunda cidade do Estado tem apenas
500.000 hab., isso gera uma descompensação na rede urbana do Estado, então a população do interior
saltam de suas cidades, sem possibilidades de emprego, sem possibilidades de serviços mais
sofisticados e vêm direto para Salvador em busca destas condições, então temos este fenômeno de
Salvador com uma alta atratividade destas populações desgarradas, econômica, social e culturalmente.
4– As condições de vida que eles [os moradores das favelas] encontram aqui são melhores que as
do interior do Estado?
Sim, são melhores, pois em todo os centros urbanos por piores que sejam as condições de alojamentos,
as possibilidades são maiores. Inclusive as possibilidades da economia clandestina, a economia do tráfico
de drogas, da prostituição e da violência urbana, nós tivemos, por exemplo, em novembro 150 assaltos
em ônibus coletivos, o número aumentou para 300 em dezembro e deve se manter estabilizado até os
meses de janeiro, fevereiro, até o carnaval. Então esta população, mesmo não obtendo uma condição de
vida dentro da legalidade consegue sobreviver no crime e na transgressão, por que há uma cultura de
crime tão enlarguecida que a violência se tornou banal, então isso se constitui uma oportunidade de vida
também.
A Inserção de Conjuntos Habitacionais Populares no Tecido Urbano de Salvador – BA
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5– Quais as condições estruturais (água, energia e saneamento) assim como as condições de vida
nestas áreas invadidas?
Olha! Em todas essas áreas temos energia elétrica e água potável, quando não temos a água potável do
sistema integrado de abastecimento – EMBASA, temos sistemas locais de abastecimentos, poços,
chafarizes. O que falta a esta população é saneamento básico, na forma de esgotos e ruas pavimentadas,
precisa também de uma limpeza pública assídua, e um delineamento que permita os carros de serviços
atenderem a população. Então estas áreas são precárias na alta densidade – uma casa colada com a
outra casa, em cima da outra casa, então esta densidade estimula o fator da intolerância e essa
proximidade excessiva gera criminalidade, mas de algum modo às condições urbanas precárias são
melhores que as condições urbanas semi-rurais, ou rurais do interior do Estado, ou de cidades pequenas
destituídas destes serviços, então estas pessoas numa diversidade maior de arranjos de vida, constroem
suas casas da maneira que podem – tijolo a tijolo, vão verticalizando permitindo que outros membros da
família morem, então na mesma casa se constrói um padrão habitacional estranho, mas condizente a
pobreza, daí podemos dizer que a população resolve seu problema de como morar e de habitar a cidade
feia e desumana que existe dentro da cidade de Salvador.
6– Qual a fonte de renda destas pessoas, você fala de economia clandestina, de criminalidade,
setor informal, mas o que eles fazes para viver afinal?
São todas essas coisas ao mesmo tempo, quando o setor informal não dá conta, quando há uma
pressão pela ilegalidade, pela formalização pela polícia administrativa da prefeitura, eles correm então
para os setores da ilegalidade. Sobretudo, o tráfico de drogas, e os mais jovens que estão sob bloqueio
do não acesso ao primeiro emprego por não possuírem um padrão de educação exigido que permitam a
possibilidade do emprego, eles se dirigem muito aos pequenos furtos, roubos tráficos e posteriormente
assaltos, seqüestros e outras formas de violência.
7– Prof. o Sr. diz que a partir da década de 60 Salvador tem uma urbanização acelerada. Como
avalia a transição das décadas, e estas nas gerações e vida das pessoas que moram nas invasões
de Salvador?
Olha! Nós observamos um fato muito curioso quando passamos por processos acelerados de mudanças
urbanas tanto de Salvador no crescimento da região metropolitana como em outras áreas da cidade,
estas populações quando conseguem um determinado patrimônio, quando elas constroem uma casa
elas vendem estas casas para pessoas de maior renda e migram para outros bairros mais pobres e
repetem o mesmo processo que eles realizaram antes, vivendo mais longe, mas ao mesmo tempo
conseguem uma certa capitalização para morar de uma forma melhor, nestes lugares mais distantes.
Então é como se a fronteira urbana fosse se expandindo e essa primeira geração, não toda ela, mas uma
boa parte dela migra e vende sua casa para pessoas de mais alta renda, até mesmo pessoas que tendo
invadido antes, podem agora comprar suas casas em uma sucessão de distanciamento do centro, mas
ao mesmo tempo melhorando suas condições de vida porque apropriadas deste sobre valor auferido com
a venda da primeira habitação podem viver um pouco melhor até mais adiante.
8–Isto significa que os filhos desta segunda geração freqüentam a escola por mais tempo?
Conseguindo assim, melhores empregos?
Sim, porque estas pessoas já vivem uma vida urbana mais consolidada, já estão por tanto inseridos na
relação com estes serviços urbanos, então esta geração é menos sofrida do que a geração anterior e do
que os povoadores mais recentes. Podemos dizer ainda que quanto mais recente é o imigrante mais
precária é a condição de vida dele. Então com o passar do tempo, a própria forma de morar se transforma
também em uma forma de capitalização, uma capitalização através dos setores imobiliários da
construção, da valorização, o forçar a prefeitura a urbanizar o local, o que atribui um sobre valor ao imóvel
construído, assim, ao vender este imóvel e mudarem para uma área menos urbanizada ele vai obter
algum lucro, é como um processo cíclico vai dando continuidade a esta dinâmica.
9 – Este tipo de urbanização segue o mesmo ritmo desde 1965 ou houve alguma variação?
Não, nos tivemos um grande impacto que vem desde 1965 até o final de 1970, uma certa redução nos
anos de 1980 e uma redução maior nos anos de 1990, quantitativamente tem sido menos o fluxo
imigratório nos últimos 20 anos.
10 – Por que esta redução ocorre?
Porque não tivemos nenhum outro impacto industrial ou pós-industrial, como tivemos na década de 1960
e 1970, pois neste período tivemos o Centro Industrial do Aratu e o Pólo Petroquímico e mais algumas
indústrias, não diretamente ligadas ao pólo, mais na mesma região do Pólo Petroquímico e não mais
tivemos outro impacto industrial, a não ser mais recentemente nos anos de 1990 a chegada da FORD e
da Monsanto, mas que são duas indústrias poupadoras de mão de obra e que absorvem, só uma
pequena quantidade de mão de obra qualificada, logo não houve o mesmo impacto registrado no
passado.
11 – O fenômeno da urbanização daqui da Bahia se pode comparar ao que houve no séc. XIX nos
Estados Unidos, ou na Europa onde as pessoas iam do interior para as cidades a procura de
emprego, buscando melhores condições de vidas?
Eu tenho a impressão que sim, nós não fugimos do modelo do capitalismo ocidental. Mas no Brasil
especificamente, podemos dizer que o que aconteceu na Bahia a partir dos anos de 1960 para cá foi o
que aconteceu em São Paulo dos anos 1920 até os anos de 1980, período no qual todo o Brasil
convergia para São Paulo, posso dizer que em São Paulo há mais baianos do que na cidade de
Salvador, só que nos últimos anos na urbanização de São Paulo tivemos uma descentralização dos
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pólos industriais a partir dos anos de 1960, promovido pelo governo militar, que estimulou que a
industrialização brasileira fosse descentralizada no território brasileiro, tanto que quando a Bahia se torna
um dos pólos da descentralização, boa parte deste fluxo migratório que se dirigia a São Paulo se
reorienta para a região da área metropolitana de Salvador, mas agora não temos nem oferta, nem
propaganda de oferta para atrair as populações, toda a nossa atenção esta voltada para um outro tipo de
investimento e propaganda que é o turismo, este exige por tanto um outro tipo de mão de obra, um outro
tipo de perspectiva e estão vindo para cá pessoas ligadas ao campo cultural, e estas pessoas não
oferecem maior impacto ao campo da urbanização, porque já são pessoas que têm dinheiro, já são
urbanizadas e resolvem por conta própria seus problemas de moradia.
12 – E como fica a criminalidade neste quadro?
A criminalidade em grande medida está relacionada à pobreza, em outra parte está relacionada aos
gerentes do tráfico de drogas e dos jogos. E a outra criminalidade que não é eventual nem sistêmica,
diferente destas que me referi, a criminalidade que pode acontecer em qualquer parte do mundo, quando
as pessoas em um determinado momento transgridem a lei, mas não como uma forma de vida, não como
uma forma continuada e estruturada, não como uma carreira de Projeto de Vida.
13 – O desenvolvimento urbano no Brasil sempre resultou em uma saída do campo para a cidade?
Nós temos um desenvolvimento desigual, nós tivemos, por exemplo, uma grande economia, a economia
do Cacau que concentrava milhares de pessoas em torno da produção do cacau, por conta da praga da
vassoura de bruxa a economia do cacau praticamente se extinguiu. Então toda essa massa humana que
vivia nesta região teve que migrar para os centros que ofereciam alguma oportunidade e curiosamente as
pessoas tem um censo de comunicação extraordinário e quando houve falar que uma determinada área
está oferecendo algum tipo de riqueza, vem um pioneiro que fala com um segundo que comunica a um
terceiro, e ele atrai, e converge, é como se a migração fosse sempre orientada, sem falar no fato de que
tem empresários que sabem a que tipo de mão de obra ele vai precisar e onde esta mão de obra mora
e como vai buscar. Quando o migrante experimenta uma outra vida diferente da vida provinciana que
tinha antes, ele não quer mais retroagir, viver a vida pequena provinciana. Pois a cidade grande por pior
que ela seja, em suas condições de vida, oferecem uma melhor perspectiva que antes.
14 – Com quais palavras o Sr. finalizaria a nossa entrevista?
A nossa urbanização em grande medida é espontânea, ela não é o resultado de um planejamento
racional do governo, mas do livre jogo das forças, da especulação imobiliária e das forças digamos de
mercado, ofertando ou não ofertando emprego. Então, por falta deste planejamento urbano, ou de um
planejamento de desenvolvimento econômico seqüenciado e monitorado, que hoje denominamos de
sustentável, nós temos este tipo de desordem, descompensação na urbanização de nossas cidades,
todas as grandes cidades brasileiras são assim.
Registro de Contato com a CONDER: Sra. MARIA LUIZA PETITINGA (Gerente do DEPLAM –
Departamento de Planejamento e Ambiente/CONDER) 52 anos, Arquiteta-Técnica da CONDER;
Professora da UFBA – Já coordenou inúmeros projetos de planejamentos e planos habitacionais para
Salvador e para o interior do Estado da Bahia.
Relatório de Visitas na CONDER – 22 de fevereiro de 2006
O primeiro contato na CONDER – Companhia de Desenvolvimento da Região Metropolitana de Salvador,
foi realizado com uma visita no DEHAB – Departamento de Habitação, chefiado pelo arquiteto João
Bosco F. Dias, neste departamento conversei com Dulce Lavine – sub-gerente do SUVIM – Subgerência
do Viver Melhor, neste contato tive acesso a documentos do Lota. Vale das Dunas (São Cristovão):
Relatório Técnico Preliminar; Projeto Inicial; Projeto Executivo; Mapa do Projeto; Fotografias; Estudo de
Macro-Áreas e de Adensamento. Neste departamento conversei também com o arquiteto Maurício
Almeida, que orientou que procurasse outros setores da CONDER, pois o DEHAB, não continha todas as
informações que procurava. Assim, fui ao DEPROJ - Departamento de Projeto, conversei com o sub-
gerente do setor Marcelo Guedes, que indicou me informou que as informações sobre os outros dois
Conjuntos Habitacionais que procurava seriam passadas pela GEPES – Gerencia de Programas
Especiais, no DEPLAM – Departamento de Planejamento e Ambiente, como a arquiteta Maria Luiza
Petitinga, que forneceu informações preciosas sobre o Conjunto Viver Melhor/Ogunjá e sobre o Conjunto
Nova Primavera, oferecendo a cópia dos Relatórios de Atividades – Ação Urbis 1997/2000, e o Relatório
do Programa Viver Melhor 1995/2001.
23 de fevereiro de 2006 –
Na mapoteca da CONDER obtive informações com Cláudio Pelozzi, analista de sistemas responsável
pelo INFORMES – Serviço de Informações Geográficas do Estado da Bahia.
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