Download PDF
ads:
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
RAQUEL RENNÓ
ESPAÇOS RESIDUAIS:
ANÁLISE DOS DEJETOS COMO ELEMENTOS
COMUNICACIONAIS
Doutorado em Comunicaçao e Semiótica
SÃO PAULO
2007
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
RAQUEL RENNÓ
ESPAÇOS RESIDUAIS:
ANÁLISE DOS DEJETOS COMO ELEMENTOS
COMUNICACIONAIS
Tese apresentada ao Programa de Estudos
Pós-Graduados em Comunicação e
Semiótica da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo como requisito
parcial para a obtenção de título de doutor
em Comunicação e Semiótica
, sob
orientação do Prof. Dr. Amálio
Pinheiro.
Doutorado em Comunicação e Semiótica
SÃO PAULO
2007
ads:
Banca Examinadora
________________________
________________________
________________________
________________________
________________________
Agradecimentos
Ao professor Amálio, sempre um grande companheiro no
meu percurso de pesquisa.
Ao professor Louis Bec, pela possibilidade de pesquisa em
seu laboratório científico e individual.
Ao CNPQ por permitir o desenvolvimento do projeto.
A todos os moradores das comunidades e associações
comunitárias em São Paulo e Madri, que me abriram as
portas para os movimentos da residualidade.
Resumo
Os conceitos de espaço residual e terrain vague são apontados por estudos
sociológicos, urbanísticos e antropológicos como elementos importantes no cenário
urbano, necessários para um fazer criativo, um intervalo no sistema oficial da cidade.
Esta conformação residual é tanto material quanto semiótica (ou informacional) e existe
em relação direta com o sistema codificado que busca seu controle; quanto maior a
racionalização ou quanto mais impositiva for esta ação, maior o número de resíduos
criados, maior a entropia. Desta forma, a noção de resíduo pode ser utilizada não apenas
como adjetivo da constituição do lugar geográfico, mas também como conceito de
comunicação, que contempla a possibilidade de novas configurações a partir de
fragmentos de textos aparentemente distantes.
O presente estudo tem como objetivo compreender os modos de geração e
apropriação dos resíduos nos espaços urbanos por meio das relações entre sistemas de
linguagens, isto é, entendidos como elementos comunicacionais.
O estudo tem como base a abordagem da Semiótica da Cultura, mais
especificamente o conceito de Semiosfera proposto por Iuri Lotman, por meio do qual se
pode perceber que quanto maior a capacidade de um sistema de gerar e se apropriar dos
resíduos comunicacionais, maior riqueza e complexidade se obtém. A partir deste
conceito inicial foi estabelecida uma proposta metodológica comparativa com estudos de
autores que analisam as relações comunicacionais no espaço urbano em um contexto
brasileiro, como Lucrécia Ferrara, Amálio Pinheiro e Nelson Brissac.
Para o principal corpus de análise foi escolhida a cidade de São Paulo, por sua
relevância como metrópole latino-americana e ao mesmo tempo por possuir elementos
que permitem que se ampliem as conclusões obtidas para a compreensão dos espaços
residuais em outras grandes cidades. Para o estudo de como opera a construção
semiótica do espaço físico de controle foram analisados 100 anúncios de publicidade
imobiliária da cidade de São Paulo durante o ano de 2004. Para o estudo específico dos
espaços residuais foi realizado um estudo de campo em comunidades presentes em duas
áreas da cidade de São Paulo e analisadas as alterações que sofreram durante os anos de
2004 a 2006.
A partir das análises realizadas foi possível compreender que os resíduos, por não
pertencerem mais a nenhum sistema organizado, são elementos instáveis, movediços.
Oferecem uma situação de potencialidade e instabilidade, mas também de
disponibilidade.
Os distintos modos de se apropriar da informação, dos espaços e objetos
residuais na cidade demandam uma intensa capacidade de adaptação e de criação de
novos sistemas de linguagem que são muitas vezes ignorados em estudos que priorizam
o contexto de fragilidade econômica e exclusão social onde estão inseridos.
Abstract
The concepts of residual space and terrain vague are appointed by sociological,
urban and anthropological studies as important elements in the urban scenario, necessary
to make a creative, a break in the official system of the city. Such residual conformation
is both material and semiotical (or informational) and is directly linked to the codified
systems trying to control it. The higher the rationalization, or the more imposing this
action is, the higher is the number of residues created, the higher is entropy. Hence, the
notion of residue may be used not only as an adjective to the constitution of the
geographical site, but also as a concept of communication, contemplating the possibility
of new configurations from fragments of apparently distant texts.
This study aims to comprehend the generation and appropriation modes of
residues in urban spaces through the relations among language systems, understood as
communicational elements.
The study is based on the approach of Cultural Semiotics, specifically as
regarded in the concepts of semiosphere proposed by Iuri Lotman and of baroque,
understood as a means of cultural organization deriving from the proposition established
by Severo Sarduy, Alejo Carpentier and Amálio Pinheiro, among others. Based on such
concept, we may notice that higher richness and complexity are achieved the higher a
system’s capability to generate and appropriate communicational residues is. A
comparative methodological proposal was established based on this concept, including
studies by authors who analyze the communicational relations in urban spaces of Europe
and the USA, such as Manuel Delgado, Kevin Lynch, Ignasi de Solà-Morales, Denise
Scott-Brown and Brazilian authors like Ermínia Maricato, Lucrécia D´Alessio Ferrara e
Nelson Brissac.
São Paulo was chosen as the main corpus of our analysis due to its relevance as a
Latin-American metropolis and, at the same time, because it possesses elements that
allow us to expand the conclusions reached for the comprehension of residual spaces in
other big cities. We analyzed over 100 real state advertisements in the city of São Paulo,
placed in 2004, to study how the semiotical construction of the physical space of control
operates. For the specific study of residual spaces, a field research was carried out in
communities belonging to two areas of the city of São Paulo, encompassing the changes
suffered during the years 2004 to 2006.
Based on the analyses undertaken, it was possible to understand that residues,
since they no longer belong to any organized system, are unstable, volatile elements that
provide a situation of potentiality and instability, but of availability as well. The distinct
ways of appropriating information, spaces and residual objects in the city require an
intense capability to adapt and create new language systems which are often ignored in
studies that prioritize the context of economic fragility and social exclusion where such
systems are inserted.
Sumário
Introdução: para um método residual ……………………………………….….….. 01
Capítulo I
Resíduos como elementos da cultura …………………………………………..…… 06
1.1 Resíduos e a fragmentaçao da identidade …………………………………....…… 07
1.2 Culturas do residual ……………………………………………………………..... 18
1.3 Resíduos recombinados, dando forma ao informe …...………………...………… 26
Capítulo II
Metrópole entre fixos e fluxos ………………………………………………….…… 37
2.1 Arquitetura e trânsito, arquitetura em trânsito ………………………………....…. 38
2.2 Cidade à venda: o mecanismo econômico da construção do lixo …………..…...... 44
Capítulo III
Espaço e resíduo ………………………………………………………......…………. 64
3.1 Espaços residuais, espaços intersticiais, terrain vague ..…….................................. 65
3.2 Espaços residuais como possibilidade de uma outra cidade ………………....…… 71
Capítulo IV
Conclusões ………………………………………………………………………….. 100
Referências Bibliográficas ……………………………………………………...… 105
Anexos
“Exu não era associado ao capeta nos rituais
africanos. Quando os exploradores europeus
conheceram o culto ao Exu na África, ao
verem essa entidade de sexualidade
indefinida, o intermediador, o mensageiro, o
que não se encontra em nenhum lugar
definido, a entidade da comunicação, do
móvel, do instável, logo pensaram: esse só
pode ser o diabo.”
Muniz Sodré
1
Introdução: para um método residual
Falar resíduos nos obriga a combinar diversos veis de sistemas que vão do
espaço físico propriamente dito, grupos sociais excluídos pelo
poder público e privado,
os resíduos deixados pelas ruas (dentro e fora das lixeiras) e que vão sendo
reorganizados pelos moradores dos espaços residuais e
utilizados na construção de
casas, no corcio de material reciclado, até veis que envolvem resíduos
comunicacionais, fonte dos moradores de favela
que fazem o gato, a gambiarra
1
,
desviando o curso previsto dos fluxos operantes na cidade. O próprio trabalho de
pesquisa para analisar estes fenômenos envolve a coleta e a c
ombinação de elementos
aparentemente distantes, fazendo uso de teorias que devem combinar o novo, revisando
o que já foi estabelecido, sem poder pertencer
a nenhuma estrutura gida ou
previamente es tabelecida em sua completude. Como observa Santos (2004:15), “Para
apreender o presente, é imprescindível um esfoo no sentid
o de voltar as costas, o ao
passado, mas às categorias que ele nos legou. Conservar categorias envelhecidas
equivale a erigir um dogma
, um conceito. E, sendo histórico, todo conceito se esgota no
tempo.”
Pinheiro
2
menciona a importância de se relacionar elementos de modo síncrono-
diacrônico evitando estar restrito a linhas históricas ou teoria
s excludentes que podem
perder de vista as relações que se estabelecem entre sistemas mais distan tes que no
entanto influem de modo recíproco:
“Não podemos, portan to, perder de vista, ao analisarmos os textos e os
ambientes midiático-culturais, essa necessária vinculação síncrono-
diacrô
nica entre o ideário contemporâneo das cidades e uma propeno para
a assimilação do heteroneo inscrita de modo germinativo nos processos
micro
e macroestruturais. Desdobram-se, aquém das obrasindividuais”,
situações multi-informacionais de bairro a bairro, com as mais complexas
permutas en
tredigos, linguagens e séries, a partir de uma habilidade e
oportunidade sintáticas dadas pelo caráter mesto, migrante e externo-solar
des
tas sociedades, muito difíceis de serem descritas. Assim como num
poema é desejável que se tam nexos recíprocos da letra ao verso e às
estrofes, do mesmo
modo, guardadas as diferenças e propoões, podem-se
verificar os encaixes das séries da cultura (arquiteturas, festas, vestuário,
culinária) com
os processos criativo-midiáticos, do jornal impresso aos meios
digitais.”
Lootsma (in: KOOLHAAS, 2001:471) afirma a importância de uma abordagem
transdisciplinar p ara o estudo das relações sociais que ocorrem no espaço urbano,
di
zendo queas disciplinas clássicas da arquitetura e do urbanismoo o suficientes
para entender, planejar e controlar esta paisagem urban
a, nem a conduta de seus
1
Termo que deixa de designar apenas a rampa de luzes no palco e passa a significar no Brasil servo
elétrico malfeito, especialmente com a
finalidade de obter energia elétrica de maneira ilegal (Dicionário
Eletrônico Michaelis, 2005).
2
“Por entre mídias e a rtes, cultura”. In:mus 2, publicação do projeto Rumos Itaú Cultural. Caxias do
Sul: Itaú Cultural, 2007.
2
habitantes.”
3
David Tomas analisa as relações entre sistemas de comunicação e
transporte, al go que segundo ele foi proposto por Vertov em Um homem e um
a mera,
mas que atualmente com a segmentação das tecnologias e sua reorganização sob linhas
históricas paralelas tende a se perder. Como
exemplo ele cita a visão inédita que o
viajante começou a ter quando se construiu a primeira locomotiva, ao ver a paisagem em
velocidade enquadrad
a pela janela, a vibração do va gão (que causava distintas
impressões tanto para quem viaja dentro do trem quanto para quem o via de fora), algo
que se conecta diretamente com uma invenção da mesma época: a fotografia (e, logo
depois, o cinema). Bruce Jenkins
4
menciona a freqüência com que os filmes realizados
pelos irmãos Lumière mostravam o funcionamento de máquinas (como a locomotiva, a
caldeira
de um barco a vapor, o trajeto de um pedreiro à obra ou mesmo a destruição de
um muro). Para eleera como se a inovadora máquina do cinematógrafo
possuísse o
somente a vocação do visível, mas uma profunda afinidade com o mundo dos artefatos
menicos e o entorno edificado. Se poderia di
zer que uma boa parte do culo XX
tomou forma material sob o vigilante olhar damera de filmar.”
5
Bakhtin (1997:376) aponta que ouma orientação científica que se preserve
em sua forma primitiva, inalterada. Nas ciências, o houve uma época em que
existisse
uma mesma e única orientação. Segundo o autor, “a fusão de todas as visões numa única
e mesma orientação seria fatal à ciência. Nãomal algum em
que as delimitações
sejam muito marcadas, mas devem ser conciliadoras. O reconhecimento das zonas
fronteiriças (é nelas que costumam aparecer
as novas orientações e disciplinas)”.
Essa visão é compartilhada por Lotman em sua análise da relação entre arte,
técnica e ciência (1981: 28). Segundo ele, o desenvolvimento atual da
teoria da
comunicação mostra que a interação é o contrário do nivelamento. A comunicação entre
dispositivos idênticos é inútil, por ser despr
ovida de complexidade. Para ele, a
especialização das diversas esferas da cultura, fazendo da comunicação um problema
semiótico complexo, determina simultaneamen
te a sua necessidade recíproca. “Não se
trata de transformar a ciência em cultura, ou vice-versa. Quanto mais a arte for arte e a
ciên
cia ciência, tanto mais específicas serão suas funções culturais e tanto mais o
diálogo entre elas será possível e fecundo”, ou como mencion
a Spengler (1998:124-
126), o matemático que o tiver algo de poeta nunca será um matemático completo.
Para o autor é importante ter claro que o car
áter fragmentário e provisório do
conhecimento o deve ser considerado como um sinal de imperfeição, mas como uma
necessidade his tórica. Não há grande comple
xidade no estudo das constâncias, mas sim
nas variedades e nas lógicas ornicas das variedades de conhecimento no tempo e no
espaço. Os
processos culturais compreendido s a partir de sua incompletude, suas
dinâmicas de fluxos contínuos, suas tensões o resolvidas é o que amplia os limites
e
permite intermbios entre sistemas distintos.
3
“Las disciplinas clásicas de la arquitectura y del urbanismo ya no son suficientes para entender,
planificar y contr olar este paisaje urbano
, ni la conducta de sus habitantes.”
4
Em MOURE, Gloria. Gordon Matta-Clark . Ba r celona: Ediciones Polígrafa, 2006, p. 280.
5
era como si la innovadora máquina del cinematógrafo poseyera no solamente la vocación de lo visible,
sino una profunda afinidad con el mundo de los a
rtilugios menicos y el entorno edificado. Se podría
decir que una buena parte del siglo XX cobró forma material bajo la vigilante mirada de la
mara de
filmar.”
3
A cultura deve ser apreciada como um meio pelo qual a relação entre os grupos
se efetua, um conjunto de informações não-hereditárias que são arma
zenadas e
transmitidas por grupos em domínios diferenciados de manifestação da vida. A
compreensão da produção simlica de uma sociedade se dá pela análise das t
rocas
informacionais que ocorrem tanto no interior de dada organização, como entre diferentes
estruturas. (MACHADO, 2003:157)
Essa concepção de cultura de influência
cibernética foi ampliada por alguns
autores, dentre eles Maturana, e Varela
6
, que notam a importância do ruído como fator
transformador dos elementos biológicos e da mente coletiva humana.
Wiener
7
pautou a teoria cibernética na idéia de controle; o próprio nome
cibernética vem da palavra grega kubernetes, que significa piloto. Nesse sentido, t
anto
seres vivos quanto máquinas lutavam constantemente contra a tendência à entropia. Para
ele a informação deveria ser medida pela capacidade que havia n
a transmissão de vencer
a tendência natural à entropia, isto é, à dispersão da ener gia (e de informação). Wiener
sabia do paradoxo que isso impunha, já que a informa
ção de maior rapidez de
compreensão (de menor dispersão) e de menor complexidade carrega menor taxa
informativa. Mesmo pontuando que a entropi a não pode ser considerada a pri
ori como
algo negativo, citando o exemplo da dispersão da energia solar como possibilitadora da
existência da vida na Terra, a visão ainda era de
um sistema de input e output (e
conseente feedback) onde o dentro e fora do sistema estavam bem definidos. Ele
apontava que a informação era o modo de pe rmutar com
o mundo exterior e se adaptar a
ele, mas foi apenas a partir do trabalho de Maturana e Varela que se propõe a idéia de
mundo exterior
como algo não homoneo e dependente das possibilidades de
compreensão e percepção de cada ser vivo, assim como as trocas entre organismo e
sistema alteram ambos. A disper
são da informação é parte da troca, e elementos que
antes poderiam ser considerados não-parcipes de um sistema são apropriados por
outros, reconstruindo estruturas
, assumindo novas funções e em muitos casos
alimentando posteriormente o próprio sistema de onde foram excluídos. Wiener sabia
que a flexibilidade em adaptar-se às alte
rações no ambiente permite a exp ansão de
organismos vivos e, conseentemente deveria servir de modelo para as máquinas a
serem desenvolvidas. Para Bateson, é o
rdo, mais que a redundância e o controle, que
possibilita o desenvolvimento de novos padrões. A flexibilidade (ou potencial de
mudaa) torna-se um fator impo
rtantíssimo nos sistemas (e Bateson2000: 502-513 –
faz uma referência direta a este conceito aplicado ao contexto urbano). Sendo assim, não
se pode confundir a teoria do controle como
mero fator de regulagem, mas sim um
elemento que possibilitaria a aprendizagem ao alterar sistemas de desempenho.
6
Proposta desenvolvida no decorrer do li vro de MATURANA, Humberto e VARELA, Francisco.
Autopoiesis and cognition. Nova Iorque: Kluwer Print, 1980.
7
Proposta desenvolvida no decorrer do livro Ciência e Socieda de. São Paulo: Cultrix, 1993.
4
A idéia de resíduo tem a ver com o ruído, algo que está fora de um sistema
codificado. Quanto mais energia se produz, mais fragmentos são gerados. Deste modo, a
medida da
entropia é um modo de se mensurar t ambém o vel de produção de energia.
Mais que isso, comoobservado por Prigogine
8
, a maior capacidade de absorção do
ruído é um fator que possibilita a complexificação de um sistema. Essa tarefa demanda
ainda mais energia e conseentemente,
maior a entropia. Lotman descreve que é
precisamente a destruição desta totalidade (do sistema) que provoca um
processo acelerado de re cordaçãode re construção do todo semiótico por
uma parte dele
. Esta reconstrução de uma linguagemperdida, em cujo
sistema o texto dado adquiriria a condição de estar dotado de sentido, sempre
resulta praticamente na cri ação
de uma nova linguagem, e não a reconstrução
de uma antiga, como parece a partir do ponto de vista da auto-consciência da
cultura.” 9 (1996: 31)
Esta noção é importante para esclarecer que a idéia de ciclo o tem a ver com o
retorno íntegro de algo quepassou, o que anularia a possibilidade
do inesperado, um
determinismo que não pode ser aplicado aos sistemas culturais. Há, na verdade,
elementos fragmentados que não desaparecem ao estarem fora de um sistema, e por
isso
mesmo podem voltar a ser parte dele em novas conees. Isso tem a ver com a noção de
semiose, onde distintos sistemas que se relacionam nas bordas da semiosfera (espaço
dos
processos semióticos que é ao mesmo tempo resultado e condição para o
desenvolvimento da cultura: fora da semiosfera não há comunicação nem linguagem
10
)
não operam nem em mesma velocidade nem em veis semelhantes. Lotman (1996:35)
aponta que a comunicação humana parte do pressuposto de que nãouma identidade
(em termos de idênticos) ent
re quem fala e quem ouve. E quanto mais distintos são os
sistemas que se combinam, mais complexa e rica é a informação gerada: “O
desenvolvimento dinâmico dos elementos d
a semiosfera (as subestruturas) está orientado
à sua especificação e, por conseguinte, ao aumento da variedade interna da mesma.”
11
8
Proposta desenvolvida no decorrer do livro de PRIGOGINE, I. e NICOLIS, G. Exploring Complexity.
São Francisco: Freeman, 1989.
9
precisamente la destrucción de esta totalidad provoca un proceso acelerado derecordación’ – de
reconstrucción del todo semiótico por una
parte de él. Esta reconstrucción de un lenguaje ya perdido, en
cuyo sistema el texto dado ad quiriría la condición de est ar dotado de sentido, si empre r
esulta
prácticamente en la creación de un nuevo lenguaje, y no la recreación del viejo, como parece desde el
punto de vista de la autoconciencia
de la cultura.”
10
Conceito proposto por Iuri Lotman (2000a, 2000b, 1999, 1998a, 1998b).
11
“El desarrollo dinámico de los elementos de la semiosfera (las subestructuras) está orientado hacia la
especificación de éstos y, por consiguiente, hacia el aumento
de la variedad interna de la misma.”
5
É sabido (e amplamente utilizado pela publicidade) que a comunicação mais
eficiente é a mais codificada. A questão é que eficiência pode ser um valor ba
stante
parcial para avaliar uma troca de informações, já que parte do ponto de vista do emissor
e leva em conta um vetor unilateral, que prioriza
a r ecepção. A mensagem eficiente seria
a que chega com menosruídopara o receptor. É o paradoxo que se enfrenta na
comunicação: a entropia (ou ruído) é mais fre
ente que a ordem; a comunicação como
troca de fluxos informacionais está sempre em busca de uma codificação que permita o
mínimo de dispersão da energia. Por outro
lado, deixar que a entropia seja de certa
forma incorporada ao processo comunicativo é o que permite maior complexidade da
informação. E sabe-se
que uma mensagem com umdigo extremamente fechado tem
uma taxa informativa tão pequena que passa a não comunicar. Esse fenômeno cria uma
violência percepti
va, que não permite o descolamento entre o signo e o objeto,
submetendo toda percepção a um só esquema.
O código está sempre em expansão e trocando energia. As mídias
(compreendidas de modo mais amplo, não restritas aos tradicionais meios de massa)
operam em circuitos formados em ambientes, onde a entropia surge como elemento mais
const
ante e osdigos como traços culturais. A idéia de ambiente aqui é tomada a partir
de seu significado do grego, perivello, que significa “golpear de
todos os lados ao
mesmo tempo”. Tem a ver não com uma relação direta com o mundo natural, mas com
simultaneidade, que inclui processamento constante. Recepção não é mera
decodi
ficação, mas recodificação segundo os parâmetros de quem recebe.
Sabemos que nossa compreensão do objeto se dá por meio do signo. Ambos
estão in variavelmente rela
cionados, mas o signo nunca esgota as possibilidades de
observação de um objeto. Esta situação de incompletude é o que permite admitir que a
análise (como conhecimento cien
fico estruturado pela linguagem verbal) não poderá
esgotar o conhecimento sobre o corpus, ao mesmo tempo em que deve evitar estruturas
estabelecidas
a priori que, ao propor uma verdade, um só vetor de pensamento, acabam
por favorecer estruturas teóricas rígidas e excludentes ou certo etnocentrismo q
ue
termina por nos afastar da complexidade que se apresenta.
6
I. Resíduos como elementos da cultura
7
1.1 Resíduos e a fragmentação da identidade
Os estudos sobre resíduos permeiam trabalhos das mais distintas ár eas do
conhecimento. Para tentarmos definir a idéia de resíduo optamos por primei
ramente
tentar identificar suas designações e usos na língua. Alguns termos são listados aqui,
para que se possa compreender a dimensão de seu significado no uso corrente:
Lixo
(lat. lixiu ou lixu): Aquilo que se varre para tornar limpa uma casa, rua, jardim etc.
2 Varredura. Restos de cozinha e refugos de toda escie, como
latas vazias e
embalagens de mantimentos, que ocorrem em uma casa. 3 Imundície, sujidade. 4
Esria, ralé. 5 Inform Interferência de canais adjacentes. 6 In
form Conjunto de dados
ou informações desatualizadas ou erradas, e que não são mais necessárias. L. hospitalar:
lixo formado por materiais
usados em hospitais, como seringas descartáveis, ampolas de
remédio vazias e outros objetos.
Detrito
(lat. detritu): Resto, resíduo de uma substância orni ca. 2 Geol Material solto,
que resulta diretamente da desintegração e abrasão de rochas, especial
mente quando
composto de fragmentos destas. 3 Produto de qualquer desintegração ou desgaste. 4
Fragmento ou material fragmentário. Resíduo de uma substância que se desorganizou
por a
trito. (Mais usado no plural.)
Dejeto
(lat. dejectu): Ação de evacuar excrementos. 2 As próprias marias fecais
expelidas de uma vez. 3 Nome comum a todos os produtos de desassimilação eliminados
pel
o organismo, qualquer que seja a via de expulsão.
Resíduo
(lat. residuu): adj. Que resta; restante, remanescente. sm 1 Aquilo que resta, que
subsiste de coisa desaparecida. 2 Quím Radical. 3 Parte insolúvel depois da filtração
. 4
Cinzas após ignição. 5 Substância que resta depois de uma operação química ou de uma
destilação; resto, sobra. 6 O que se acha no fun do. 7 Fezes, borra, lia, sedi mento. 8
Sociol El
emento cultural que sobreviveu a mudaas com as quais está em contradição.
R. halonico, Quím: o que se o btém privando os ácidos oxigenados do seu hidronio
sico.
Nos termos acima
12
, nota-se a recorrência do termo desnecessário, indesejado, o
que resta. Objetos, lugares, pessoas, tempo desperdiçado, deteriorado, sem serventia.
Essa noção de sobra indesejada
e inútil revela o modo como nos relacionamos com o
que é residual.
Lynch (2005) descreve que ocorre algo similar em inglês com o termo waste, que
tanto
em português quanto em in glês derivam do latim vastus, semelhante a vanus (vazio
ou inútil) e a palavra em sânscrito que se referia à falta
, algo deteriorado ou deficiente.
Originalmente waste significava enorme vazio, árido, inútil e hostil ao homem. Segundo
Lynch, que optou pela palavra em seu liv
ro Waste Away (laado postumamente),
dedicado int eiramente aos processos de dete rioração, há apenas cem palavras na língua
inglesa que tenha m tantas definições no di
cionário. Muitas acepções do termo waste,
12
Dicionário eletrônico Aurélio - versão 2004.
8
que vão desde as já citadas anatureza sel vagem e inútil”, “doença e “gasto
insensatotêm valor negativo. O termo em inglês americano junk, que antes
servia para
designar especificamente sucat a, agora serve para designar coisas de má qualidade
(junkfood ou mesmo junk-space como propõe Koolh
aas
13
para definir os espaços
descartáveis e massificados dos shoppings, aeroportos, parques de diversão). O verbo to
trash, que antes se referia apenas à limpeza
, como a poda de árvores, significa
atualmente destrar algo com violência para produzir lixo. Em português lixo torna-se
um qualificati
vo depreciativo de um objeto, um lugar, uma obra de arte ou mesmo um
indivíduo.
De acordo com Douglas (1966), Lynch (2005) e Adams
14
(este último em uma
abordagem mais especificamente semiótica), a primeira reação de um grup o social com
relação ao lixo é tentar ignorá-lo. Se ignor
ar o lixo se torna impossível parte-se para a
idéia de tabu que deve ser evitado ou eliminado. Os sacos de lixo são geralmente negros
ou de tons
escuros, que ocultam seu conteúdo e o fazemdesaparecer”. Quando se
coloca o lixo em uma caçamba ou ele é recolhido das ruas, ele
não é mais visto e
portanto não constitui mais um problema. Segundo Adams, o seguinte passo a ser
tomado caso não se lograsse ignorar ou evitar os dejetos ser
ia incorporá-l os ao sistema
(em termos semióticos), tornando-os parte dele. Naturalmente esses processos não se
dão em uma seqüência linear e coexistem na cidade. Ao
longo do trabalho serão
analisados alguns processos presentes em centros urbanos que dizem res peito a ess as
práticas, entre a geração, exclusão e a ap
ropriação dos resí duos.
Sabe-se no entanto que o que se considera ou o resíduo depende de cada
sistema cultural e seu entorno. Em algumas culturas encontram-se rituais
nos quais se
comem fezes ou se contempla um cadáver em decomposição a céu aberto, um modo de
dominar esse elemento que nos rodeia e que tem forte poder simlico. Bataille
(1957:67-68),
dentro de uma visão marxista, aponta para a idéia do gasto (dépense),
como algo relacionado com a morte, com o excremento, os dejetos da sociedade
(objetivos e
subjetivos), algo que reafirma o baixo e o material negado pelo idealismo
intelectual: “Esta força e ruptiva se acumula naqueles que estão necessa
riamente situados
mais abaixo. A burguesiao trabalhador comunista como algo o repugnante e sujo
como os órgãos sexuais cobertos de pêlos ou partes bai
xas.”
15
13
Revista Content, vol. 33. Colônia: Taschen, 2004.
14
“Shifting through the trash” In: The American Journal of Semiotics. Vol. 11, número 1-2, Bloomington:
Indiana University, 1994, pp. 63-87.
15
“Esta fuerza eruptiva se acumula en aquellos que están necesariament e situados más abajo. La burguesía
ve a lo trabajador comunista como algo tan r
epugnante y sucio como los velludos órganos sexuales o
partes bajas’.”
9
Um dos sinônimos de lixo ou resíduo também é a palavra sedimento
16
, o que se
deposita, o que fica. Na verdade essa referência pode est ar mais relacionada ao que se
acumulaabaixo”, que é associado às impurezas do
que a algo estático. Não é casual o
uso recorrente do termo ralé (um dos sinônimos já citados de lixo) comoa camada mais
baixa da sociedade, o zé-pov
inho, gentuça, gentalha, plebe, povão
17
. Há claramente um
conceito de alto vs. baixo que se relaciona com a idéia presente na filosofia ocidental de
separação entre mente vs. corpo e conseentemente sagrado
vs. profano, vida vs. morte,
entre outras tipologias ba seadas na dualidade onde a superação do baixo (do corpo) ou a
transcendência da mari
a levaria à pureza do espírito, a intelincia em seu maior vel
de sofisticação.
No entanto, em algumas culturas podemos encontrar festividades como se
ob
serva no Día de los Muertos (a maio r festa mexicana realizad a no dia de Finados) no
México, onde a convincia com aqueles quemorreram é pa
rte de uma festividade
alegre, onde música e comida participam de um ritual de reencont ro e descanso.
Comem-se caveiras de açúcar, são feitas oferendas
com objetos preferidos dos mortos,
presentifica-se a pessoa que faleceu, seu espaço (o cemitério) é o espaço de reunião, de
comemoração carnavalizada. Como propõe Bakhtin
18
, a relativização da verdade e do
poder dominantes constitui um dos sentidos profundos do riso carnavalesco nas suas
variadas manifestações; ao ridicular
izar tudo o que se arroga de uma condição imutável,
transcendente, definitiva (como a própria morte), estas festividades celebram a mudaa
e a renovação do mundo.
O esp
aço reflete e é pal co das distintas relações que se estabelecem com o que é
residual. Os países economicamente centrais pagam a países economicamente
subdesen
volvidos para que recebam lixo tóxico. Este p rocedimento funciona como os
sacos negros citados por O´Donnel, fazem o lixo desaparecer da vista ou dos l
imites do
país, além de representarem um modo mais barato de dar conta deles que os tratamentos
requeridos para neutralizarem seus efeitos.
O lixo ornico é
úmido, tem cheiro forte. A maior parte dos odor es, no entanto,
são inócuos, enquanto muitos que não se detectam são extremamente tóxicos. Os perigos
de certos tipos de resíduos são a
poiados por teorias científicas atuais sobre infecções,
sobre agentes vivos, mas a aversão às fezes é algo muito mais antigo, profundo e extenso
que
a teoria microbiana. Na verdade, as velhas aversões é que tornam aceitável a nova
teoria. Belcebu, nome bíblico para o diabo, vem
do hebreusenhor das moscas”. Sheol,
o inferno, era o nome do depósito de lixo de Jerusalém. Desde Freud
19
se sabe que o
contato do bebê com suas fezes é imediatamente reprimido pela mãe. Não se deve estar
16
Sedimento (lat. sedimentu): depósito resultante da precipitação de substâncias dissolvidas ou suspensas
num líquido; maria deposit ada; lodo que as águas deixaram ao
retirar-se; fezes. (Dicionário Eletrônico
Michaelis, 2005)
17
Dicionário eletrônico Aurélio - versão 2005 (V 5.0 40).
18
O conceito de carnavalização foi desenvolvido principalmente no livro Cultura Popular na Idade
Média: o contexto de Fraois Rabelais. Tradução
de Yara Frateschi Vieira. São Paulo: Hucitec; Bralia:
Universidade de Bralia, 1987.
19
Três ensaios sobre teoria da sexualidade. Obras psic ológicas completas de Sigmund Freud. Edição
Standard Brasileira. Vol. VII. Rio de Janei
ro: Imago, 1989.
10
à vontade com o que é sujo. Rechaça-se mas ao mesmo tempo se teme a sujeira,
exatamente porque nosso contato com ela é reprimido. Nossa relação com o que é
consider
ado sujo é paradoxal porque busca evitar constantemente o que está ao nosso
redor ou em nós mesmos (fezes, suor). O contato diário com o mundo contamina, nos
impregna. Por
isso o banho adquire em tantas culturas uma vocação simlica de
purificação onde, segundo Flusser
20
, “a distância entre eu e o mundo se restabelece”.
Como aponta o autor, é inútil querer objetivar a prática humana da higiene; Hygieia em
grego (
ou Salus, em latim) era a deusa da saúde e da prevenção de doenças (da
salvação), isto é, o caráter mitológico da limpeza é claro na cultura oc
idental. No
entanto, se fosse possível eliminar toda e qualquer forma do que se considera sujeira
dentro dos padrões humanos ocidentais atuais (as bacrias, as mos
cas, a poeira, etc.),
seja no ar, na terra, entre os animais, terminaríamos por exterminar a própria raça
humana. O exemplo da ecologia da
natureza também encontra referente na ecologia
social
21
, já que o isolamento total de povos além de praticamente impossível, terminaria
por eliminar o próprio grupo. No entanto, as tentativas de purificação, como bem
apont
am Laplantine e Nouss (2002:76), não escapam de um movimento de
transformação, que questionaria a própria idéia de imutabilidade que buscam manter.
O espaço externo,
a rua, por um lado oferecem a possibilidade de descobertas, de
intermbios com o outro, mas por isso mesmo podem ser vistos como um espaço a ser
evitado. É o
lugar onde estão a sujeira e os perigos (e Douglas
22
mostra que ambas as
coisas costumam ser vistas como equivalentes). Freyre (2000:12) menciona que quando
no Brasil a paisagem social começou a se alterar logo
após a abolição da escravatura, o
início da urbanização das cidades trouxe para mais perto o cortiço e o sobrado, dois
elementos distantes soci a
lmente que começavam a coabitar o mesmo ambiente de
trânsito, que eram as ruas. Ela se torna então um espaço proibido às donas de casa,
(“mulheres da rua
eram as prostitutas) e aos meninos criados em casa, em oposição aos
moleques (“menino de ruaainda é uma denominação comum para o infrator menor de
idade).
Falar de l
ixo, de resíduos em termos mais gerais, é abordar também a perda.
Relaciona-se com o ciclo da natureza, ciclo da vid a - nascimento, florescimento
e morte
-, uma idéia que em muitas sociedades é rejeitada ou evitada. A noção de degradação
tem a ver com impureza, contaminação, algo que deve ser combatido par
a que as coisas
sigam limpas e perenes. O que resulta em um paradoxo, já que se sabe que tanto em
termos biológicos quanto semióticosa necessidade de se interca
mbiar constantemente
- sejam substâncias, ou informações - para que um sistema possa prosseguir em um
ambiente (que não deve ser confundido com sua permanência em
ter mos identitários). A
maria se recicla através do sistema da vida. Pouco a pouco a energia se degrada por
entropia. A vida se alimen ta desses passos. Cada usu
ário deixa seus resíduos ao seguinte
usuário da cadeia.
20
http://www.flusserstudies.net/pag/04/banheiros.pdf
21
Segundo Mckenzie (in: Grafmeyer e Joseph, 1979:150), dentro da Escola de Chicago a ecologia
humana poderia ser definida em termos gerais como o estudo das rela
ções espaciais e temporais dos seres
humanos que são afetados pelos fatores de seleção, distribuição e ad a ptação ligados ao ambiente.
22
Purity and danger. An analysis of concept of pollution and taboo. Londres: Routledge Classics, 1966.
11
Foucault (1984: sem numeração de página) desenvolve o conceito de
heterotopias para abordar espaços que sobram, “contra-sítios, espécies de utopias
realizadas n
as quais todos os outros sítios reais dessa dada cultura podem ser
encontrados, e n as quais o simultaneamente representados, contestados e invertidos”.
Sua exemplificação
do que seria um heterótopo (os cemitérios) se assimila à função
observada por Lynch (2005) sobre os depósitos de lixo, um lugar que está à parte (ou
que se deseja que esteja fora
, esquecido) mas que ao mesmo tempo m antém uma relação
intrínseca com a cidade. Foucault usa o exemplo dos cemitérios, que a o culo 18
estavam no centro das cid
ades, geminados com as igrejas e que a partir do início do
culo 19 (quando, segundo o autor, as descobertas cienficas comam a trazer dúvidas
sob
re a ressurreição e a concepção cristã de vida e morte e a sociedade começa a d ar
importância aos restos mortais) começaram a ser construídos nas linhas exter
iores das
cidades. Quando o cemitério deixa de ter seu valor sublime de imortalidade
inquestionável e começa a ser percebido como depósito do residual é que se começa
a
associá-los à transmissão de doenças. Estar próximo aos dejetos humanos era portanto
estar próximo da própria morte.
Como coloca Bateson (2000:471) dentro de uma per
spectiva cibernética, quando
se divide corpo e mente torna-se inevitável que a morte tente ser ignorada ou torne-se
tabu, enquanto criam-se mitos sobre a
transcendência da mente sobre o corpo. Mas no
momento em que se percebe que a mente não está somente no indivíduo mas é parte de
um coletivo em relação (não somente a
ntropontrica), podemos perceber a morte sob
outro aspecto. Da mesma forma, a importância doeué relativizada e o outronão é
mais uma ameaça
a ser destruída ou um elemento sem intelincia a ser subjugado.
A noção de algo que resta, que sobra, ou pedaço dissociado de um organismo
questiona também a noção de
identid ade, de todo único, que permanece forte e
incorruptível. Como nos mostra Canclini, essa idéia também traz problemas para a
compreensão de processos cu ltur
ais:
“Sobre as identidades existem narrativas em conflito, mas poucas possibilidades de
defini-las com rigor como objetos de estudo. (...) Devemos levar a rio os rela
tos
sobre identidades porque muita gente os usa como guias de conduta, sendo capaz de
a morrer por eles. Mas o que sabemos das identidades indica que estas não t êm
consistênc
ia fora das constrões históricas em que foram inventadas e dos
processos em que se decompõem ou se esgotam. Alguns elementos utili zados para
delimitar ca
da identidade, por exemplo o uso da língua, são passíveis de estudos
rigorosos, mas outros componentes que muitas vezes são dados como definições
identitárias (cor da pele, gostos, háb
itos) oscilam entre o determinismo biologicista e
vagas convicções subjetivas.” (CANCLINI, 2003:78)
Segundo Blanquart, o próprio conceito de indivíduo deve ser evitado para a
compreensão dos estudos urbanos:indivisum em latim ou atome em grego: parc
ula
elementar de uma maria, que pode ser sempre a mesma. A idéia de indivíduo é
compavel com 1=1, todos iguais, como identidade (idem). Os indivíduos são passíveis
12
de serem massificados. Este é o engano, é a mesma coisa que serializar.”
23
(revista
Poïesis, 2003, p. 115). O conceito de serialização (sérialiser) vem da informática, e
consiste em transformar dados de sistemas diferentes em bytes (tirando del
es o quede
próprio) de modo a que possam ser transmitidos em sistemas ou redes informáticas
distintas. O que aponta Blanquart é que a noção de idêntico, que pode servir
a sistemas
artificiais em alguns casos, é tomada como referência p ara o planejamento urbano, no
qual previamente se estabelecem grupos idêntic
os para que se possa trabalhar com
conceitos generalist as, que pouco têm a ver com redes sociais complexas. A idéia da
estabilidade, seja do indivíduo, seja
de um grupo é utópica mas ao mesmo tempo
tranilizadora. Como propõe Kristeva
24
, o inmodo gerado pelo outro é porque o
estrangeiro está em nós mesmos, a instabilidade que ele provoca é inerente a todos. Mais
que um elemento potencialmente
contaminador e corrosivo, a figura do que nos é
estranho oferece ameaça ao atuar como um espelho que nos deixa próximos do que
Freud
25
já havia identificado como o eu perdi do que se imagina independente e
harmonioso.
Os discursos das chamadas ciências duras estão repleto de alusões metaricas
que guardam valores que são assumidos como verdades irrefutáveis. Emmanuel L
izcano
(2006) analisa as metáforas utilizadas em cada cultura para o discurso das matemáticas.
Ele cita que no Egito antigo o mito de Oris era
construído a partir da fragmentação
(sua mulher Isis recolhe pedaços de seu corpo morto por Seth para poder ter um filho
com ele que lhe permitiria
viver novamente reencarnado), e isso se re fletia diretamente
no modo de abstração dos matemáticos de então, que pensavam sempre a partir do uno
(ou número 1) fra
gmentado. Por outro lado, osnúmeros quebradosou a fragmentação
do número 1 para os matemáticos gregos (que tanto influenciaram a Plao) consistiam
na dissol
ução da identidade, da essência fundadora, o que era intolerável. Lizcano
menciona que em A República, o próprio Platão mencionava o desprezo que tinham os
ma
temáticos gregos com relação aos que trabalhavam com a matemática “vulgar”,
voltada ao comércio (a logística), que tomo u emprestado o conceito de númer
o
fragmentado dos egípcios: “Os que têm conhecimento do número e de sua essência se
burlam de quem trata de dividir a unidade em si, e não o permitem.”
26
(apud Lizcano,
2006:198) O número 1 é o número real por excelência, o nascimento, está relacionado
com o momento em que o homem toma consciência de sua independên
cia no mundo,
seueu”. Para os gre gos simbolizava o início de todas as coisas e de todas as medidas.
Os números fracionados ou racionais e posteriormente os
irracionais destram a ordem
corpóreo-ornica estabelecida pelos deuses e prevista nos números naturais.
23
«indivisum en latin ou atome en grec: particule élémentaire d´une matière, qui peut être toujours la
même. L´idee d ´individu est compatible avec: 1=1, tous parei
ls, comme identité (idem). Les individus
peuvent être massifiés. C´est ça l´entubage, c´est du même que est rialisé
24
Étrangers à nous-mêmes, Paris, Fayard, 1988.
25
“O ego e o Id”. In: Obras psicogicas co mpletas de Sigmund Freud. Edição Standard Brasileira. Vols. I
a VII. Rio de Janeiro: Imago, 1989.
26
“Cuantos tienen financiamiento del número y de su esencia se burlan de quien trata de dividir la unidad
en , y no lo permiten.”
13
Spengler (1998:120-153) relaciona matemática e linguagem mostrando que
dentro desta lógica na cultura ocidentaluma idéia de limitar extensões, criando assim
uma
estrutura estável que o homem percebe como necessária e parte da natureza. O
pensamento a respeito dos números estaria segundo o autor r elacionado com sistemas,
leis do mundo, tomadas como algo limitado, rígido, sedimentado e vinculado com a
idéia da morte. Essas delimitações se aplicam para a definição de indivíduo (eu vs.
outro), para um grupo social e suas vincias no tempo e espaço. O espaço e o tempo se
dividem, se mensuram e assim aparentemente se tornam submissos às leis
compreensíveis
pelo homem.
Douglas (1966:41) observa que a noção de delineamento territorial
especificamente sobrepassa a questão política, cria um desenho, uma for ma que possui
uma estrutu
ra interna possuidora de energia pararepelir ataques e atrair a
conformidade, que poderíamos chamar de valorização da visão uniforme de cultura ou
sociedade manifestada por meio dos discursos sobre a identidade. Dentro desta visão, o
estrangeiro é um elemento que pertence ao grupo, mas como define Simmel
27
, “um
inimigo do interior”, alguém que desde dentro traz a exterioridade. Ao invés de ser visto
como um elemento que acrescenta, torna-se o que deixa em evidência
os paradoxos do
indivíduo. Sua principal característica é a mobil idade no sentido de introduzir ao mesmo
tempo proximidade e distância em um grupo que pensa estar
estruturado de modo
estável. Esta mobilidade é um elemento gerador de desestruturação mas ao mesmo
tempo renovação, ainda que esta ocorra por meio de conflitos sociais.
Bateson (2000:435) menciona que a organização do mundo a partir de dualidades
no Ocidente também oferece certo equilíbrio, sendo por isso muito mais freente que
uma est
rutura triádica, por exemplo. O autor percebe que dentro desta visão
desenvolvem-se opostos que na natureza não são possíveis, como jovens vs. velhos,
mente vs. mari
a. Essa busca constante do equilíbrio está ligada segundo ele à tendência
autocorretiva dos indivíduos, à idéia de que ao primeiro sinal de perturbação a mente se
fe
cha, isolando o problema “como uma ostra transforma em rola um agente invasor de
seu corpo”. Bateson, no entanto, tinha claro que o que se nota comoagente in
vasor
muda de acordo com o contexto. Para ele, a percepção de como se relacionar com o que
vem de fora é perpetuada ou conservada de acordo com uma cu
ltura. A partir deste
ponto de vista fica claro que quanto maior forem os estímulos, o contato com as
diferenças, mais porosa se torna esta percepção.
27
“Digressions sur l´étranger”. In: GRAFMEYER e JOSEPH. école de Chicago. Naissance de
écologie urbaine. Malesherbes : Flammarion, 2007, p. 54.
14
Abed Al-Jabiri (in: Autour de Averroès, 2003:33-48) diz que a freqüên cia com
que o pensament o intelectual ocidental tratou do tema da alteridade no último culo é
sintoma de um sentimento de instabilidade, de inseguraa e anstia quanto ao futuro.
É necessária uma maior compreensão da heraa e trocas culturais que existir
am entre o
mundo judaico, cristão e árabe, como modelo de integração não meramente transitório,
muito menos relegado a guetos que coabitam um espaço, mas como elemento
constitutivo
do tecido social e urbano do mundo mediterrâneo por muitos culos e que
permitiriam compreender a riqueza de um sistema cultural extremamente heteroneo
28
.
A análise das metáforas é elemento importante para se compreender o que se
congela em um dado sistema cultural. Sabe-se que a in fluência que possuem nas
sociedades gera uma confusão entre signo e objeto a um ponto que o signo perde, como
definiu Tynianov (1966:65),sua vocação de camaleão dotado de distintas nuances e
distintas co
loraçõespara se tornar transparente, o objeto em si. A metáfora acaba sendo
tomada como verdade irrefutável. Como menciona Canclini (2003:48): “Como
aconteceu t
antas vezes na história, a metaforização do inapreensível, quando se refere a
alterações muito rápidas e violentas das identidades habituais, às vezes c
onstrói imagens
conciliadoras. Em outros casos, pensa em monstros.” Sontag nos livros “A doença como
metáfora e “Aids e suas metáforas discorre sobre o tema das doença
s e a metáfora
militar que começou com os estudos das patologias celulares. Quando o microorganismo
que causa as doenças é descoberto, as metáforas de g
uerra gan ham força, gerando
estragias dedefesa do corpo contra o agente invasor ou a medicinaagressiva”,
usando o exemplo da própria autora
sobre a linguagem da quimioterapia e das pestes que
trazem os estrangeiros:
“A doença invariavelmente vem de outro lugar (...). A idéia de que as
doenças que afligem a Europam de fora faz parte da secular imagem da
Europa como entid
ade cultural privilegiadae os europeus manifestam uma
indiferença extraordinária em relação ao impacto devastador que eles
próprios tiv
eram sobre o mundo etico eprimitivo’, introduzindo doenças
européias (...). Mas essa observação, que pode parecer uma simples anedota
sobre a inevitabilidade do ch
auvinismo, revela uma verdade mais importante:
a de queuma ligação entre o imaginário da doença e o imaginário do
estrangeiro. Suas raízes se
encontram talvez no próprio conceito de errado,
sempre identificado com o o-nós, o estranho. A pessoa poluente é sempre
errada, observou Mary Douglas. O inve
rso também é verdadeiro: a pessoa
considerada errada é vista, ao menos potencialmente, como uma fonte de
poluição”. (SONTAG, 1989:58-59)
28
A própria figura de Averr oès (ou I bn Ruchd, 1126-1198) é um exemplo de um pensador europeurabe
que discutiu as filosofias românicas, judaicas na Europa
a partir de suas traduções latinas de Aristóteles
(que são consideradas a introdução no resto da Europa das o bras do filósofo grego) mas não nos p
aíses
islâmicos, que em sua época o consideraram herege e determinaram que seus livros fossem queimados.
15
Um processo similar ocorre com os grupos sociais marginalizados atualmente ou
com os imigrantes nos EUA e Europa. A imigração nos países economicamente centrais
é
sempre tratada pelos políticos e amplamente divulgada pela mídia local como uma
questão preocupante, que deve ser resolvida por toda a nação, seja
americana ou
européia, por ser um fato ameaçador. É a desordem tentando invadir a ordem so cial, o
lixo tentando invadir a cidade (como cita o jornal El P
aís, usando uma exp ressão que
se tornou clichê nos mei os de comunicação espanis:avalanche imigratória”). Como
complementa Sonta g: “As ideologias políticas aut oritária
s têm interesse em promover o
medo, a idéia de que alienígenas estão prestes a assumir o controle.” (1989:74) Essa
idéia não está restrita às autoridades. Na verdade, a noção do
imigrante como invasor é
usada sem maiores cerimônias pelos meios de comunicação nos chamados países de
Primeiro Mundo porque tem respaldo em grande parte da opinião p
ública, encontra
referência em crenças refletidas por metáforas antigas sobre a necessidade de proteção
da integridade do indivíduo ou do grupo e sua
identidade”. Como declarou o então
Ministro do Interior e atual presidente frans, Nicolas Sarkos y, a violência que eclodiu
emrias cidades francesas em 2005 e que d
ava mostras da existência de uma Fraa
pobre, esquecida e insatisfeita, passa a ser não um problema dos franceses, mas dos
imigrantes
29
.
A política migratória da Espanha cria os chamados imigrantesde primeira”, que
seriam os latino-americanos, que são convocados a repovoar cidades que pe
rderam
praticamente toda sua população nos últimos anos (Programa de Repoblación
Comunitária)
30
e servir às forças armadas espanholas (desde 1997 o serviço militar na
Espanha não é mais obrigatório, sendo suprido em grande parte por alist
amento
voluntário de imigrantes latino-americanos). Ao mesmo tempoos imigrantes de
segunda”, os marroquinos e os subsaarianos, que chegam à Espanha em embarcações
c
landestinas e que são considerados um “verdadeiro problema”, tomando a primeira
página em praticamente todos os dias dos meses de julho e agosto (quando a tentativa de
travessia a o território espanhol é aumentada pelo bom tempo). Os subsaarianos n a
Espanha sofrem as medidas mais duras de extradição e falta de
leis que regularizem sua
situação. Situação m ais difícil é enfrentada pelos marroquinos, que pelo acordo que
mantêm com a Espanha são imediatamente ext
raditados se o identificados pela polícia,
não têm direito ao trabalho no serviço militar espanhol (segundo o ex-Ministro da
29
Le Figaro, 3/5/2006, Immigration : Sarkozy fend sa vision «ferme et juste» : «Les violences qui ont
écla dans nos banlieues ne sont pas sans rapport avec l'échec consternant de la politique d'immigration»
El Pais, 7/6/2006, Las puertas
de Europa: España y nueve países europeos han acordado establecer un
operativo para patrullar toda la zona del África atlántica "susceptible" de ser punto
de origen de pater as y
cayucos que viajan hacia Eu ropa y, sobre todo, hacia Canarias, que acusa casi cada a la presión de esta
avalancha
migratoria.
The New York Times, 6/6/2006, Bush Turns to House in Immigration Debate
: President Bush tried on
Tuesday to win back the trust of conservatives who have distanced themselves from him on immigration,
promising to "get this border enforced" and warning t
hose who enter the country illegally that "if you get
caught, you get sent home."
30
Lynch (2005) analisa os processos de decadência de cidades e pequenos povoados nos EUA, que
ocorrem a partir da grande mobilidade da população e do interesse dos j
ovens de irem às cidades grandes;
segundo ele, na Europa essa mobilidade é menor devido aos constantes programas de intervenção do
poder público, como é o caso
do Programa de Repoblación Comunitária, que mesmo recent e, já mostra
problemas pela falta de integração entre os novos e os ve lhos moradores e a pouca o
ferta de emprego no
local , que com freqüência transforma estes povoados em cidades-dormitório.
16
Defesa da Espanha, por “óbvias raes de seguraa, já que fazem parte daameaça do
sul’, cujosplanos estragicose aprática muçulmanapode
riam alterar o cotidiano do
quartel
31
.”), são vistos com grande desconfiaa por muitos espanis
32
e so frem
constante repressão policial por serem associados ao tráfico de drogas.
Não se deve i gnorar que por trás destes discursosum gr ande inte
resse por
parte do poder p úblico e privado em manter na ilegalidade um grande contingente de
pessoas que servirão às indústrias locais como operários
sem direitos e empregados, da
mesma forma que os imigrantes na cidade, ao serem associados ao crime e à desordem,
podem ser livremente transladados a outros sítios sempre
que haja interesse de
supervalorização de um espaço pela especulação imobiliária. O importante é perceber
como estas estragias são colocadas em pr
ática com o aval de grande parte da
população a partir da construção de discursos que utilizam elementos presentes na
cultura sobre a ameaça da imi g
ração para a estabilidade da vida nos países
economicamente centrais. Sousa Santos (2006:280) propõe a diferenciação entre
desigualdade e excl usão. No caso da desigu
aldadeuma hierarquia estruturada, onde
quem está abaixo está dentro do sistema, e é fundamental a ele. No caso da exclusão o
grupo está fora do sistema, podendo ser
expulso ou mesmo exterminado em casos
extremos. Se tomarmos essa diferenciação para analisar o que ocorre nos países
economicamente centrais, podemos ver que nos disc
ursos midiáticos e políticos (mesmo
nos discu rsos assistencialistas, que publicitam a ajuda que os países darão aospobres
imigrantes que ali estão) há a constatação de q
ue estes imigrantes são passíveis de
exclusão. Sua presença é fruto do esp í rito humanitário que lhes permite estar ali ou d a
falta de fiscalização e leis mais du
ras para evitar a imigração. Mas de finitivamente não
são parte do grupo e nada têm a trazer às sociedades que os recebe. No entanto, a
realidade
na economia é outra. Os imigrantes ilegais constituem uma força de trabalho
importante e os que estão legalizados contribuem significativamente no aumento de
impostos
em países com taxa de natalidade próxima a zero com problemas de deficit
social crônico.
33
Trata-se portanto de um discurso que os coloca como excluídos, em
uma so ciedade que os considera excluídos, mas que na verdade se constitui como um
sistema desigual. Desta fo
rma, a desigualdade pode ser mantida sem maiores
questionamentos.
31
El Mundo, 18 de marzo del 2002, E. Montánchez, Madrid.
32
“Los ocho siglos de domínio musulmán”, Manuel Ferrer Regales, Universidad de Navarra.
http://www.unav.es/historia/aetas/boletin/ocho/textos/ciudad.html.
33
Para uma análise da estragia americana de supostamente fechar o cerco contra os imigrantes que
acabou gerando um aumento no número de empregados il
egais no mercado americano ver Saskia Sassen:
“La Política migratoria. Del control a la regul ación”. In: Revista Minerva, Madrid: Circulo de B
ellas
Artes, número 05, 2007 - http://www.circulobellasartes.com/ag_ediciones-minerva-
LeerMinerva.php?art=145.
17
Os p rodutos culturais refletem exemplarmente a idéia do outro como invasor. A
repercussão da transmissão radionica de Welles (1938) de “A Gue rra dos Mundos
(baseada no livro
de H.G. Wells, 1898) se tornou um dos prin cipais eventos midiáticos
da história da comunicação. Sem aprofundar a discussão sobre a reconhecida qualidade
do trabal
ho realizado por Welles e da realização do filme de Spielberg (2005) poucos
anos após o atentado às Torresmeas de 11 de setembro de 2001, esses exemplos
mostram como
o tema da destruição da paz por um “grupo de alienígenas destruidores
sobre os quais se sabe nada ou muito pouco é algo de forte apelo ao grande púb
lico.
O medo que o agente estranho gera também inclui certa sedução e o
questionamento pela simples existência de alguém que deixou para trás todos ou qua
se
todos os elementos que constituem a tão defendidaidentidade” como grupo. Como
menciona Kristeva (1988:47):deixar sua falia, sua língua, seu país, para vir a se
colocar em outr
o lugar, é de uma audácia que acompanha um frenesi sexual: é o mais
proibido, tudo é possível”.
34
Este constante estado de exceção faz com que o imigrante
cara do que Delgado (2007:194) chama dedireito à indiferença”, isto é, impede que
eles se fundam n a multidão, o que se reve
la tanto pelo olhar do racista a gressor quanto
pelo olhartolerantedos defensores das minorias, que criam discursos que incentivam
a visão do imigr
ante como avis rara.
A noção de outro não está somente ligada ao imigrante ou migrante. Em muitos
países, os menos favorecidos economicamente, ainda que em número tão significa
tivo
que seria um erro considerá-los como minoria, também costumam ser estrangeiros em
sua própria terra. Em constantes projetos urbanísticos presentes em quase todo
o mundo
a intervenção em um bairro pobre, decadente, com objetivo derecuperaro espaço;
na maioria delesuma hi gienização urbana (apoiada por fortes
interesses econômicos)
que invariavelmente resulta na transposição dos residentes para áreas cada vez mais
afastadas do centro da cidade. Na cidade de São Paul
o, por exemplo, odigo de Obras
vigente no começo do culo XX dispensava de alvará de construção e taxas municipais
as casas e vilas de operários construídas
fora do perímetro urbano. Lynch (2005:119)
menciona que após o grande terremoto de São Francisco e o inndio de 1906 a cidade
foi rapidamente reconstruída para as classes
mais abastadas, enquanto muitas pessoas
pobres foram sendo transferidas a distintos pontos da cidade por anos. Na Europa
também não é diferente, como mostra o f
ilme de Agnès Varda, “Os catadores e eu” (Les
Glaneurs et la Glaneuse, 2000), que registra a indignação de ciganos e desempregados
na Fraa que viviam em vans e
acampamentos que eram sistematicamente retirados de
seus lugares e transferidos a outros.
34
“S´arracher à sa famille, à sa langue, à son pays, pour venir se poser aillers, est une audace
qu´accompagne une frénésie sexuelle: plus d´interdit, tout est possible.”
18
Vigarello, por sua vez, aponta que a associação do mau cheiro com o perigo de
doenças deu início ao controle dos lugares, principalmente onde estavam
os mais pobres.
Ele cita que ao redor de 1770 em Paris os lugares suspeitos eram aqueles onde se
acumulavamos pobres, com os corpos nem sempre protegidos por
roupa de baixo:
“Evocar a limpeza é opor-se àsneglinciaspopulares, aos maus cheiros
urbanos, às promiscuidades incontroladas. Na cada de 1780, a crítica
não se restr
inge ao artificialismo dos aristocratas: logo as práticas do povo
passam a ser reprovadas como jamais foram. Os espaços são os primeiros
visados. Cemitérios, prisões, hospitais, matadouros de animais de repente
salpicam a cidade de abscessos sinistros, a induzir o remodelamento do
espaço urbano. Surgem ref
ormas, no final do culo, para aumentar a
circulação e a renovação do ar, para eliminar as fontes mais perceptíveis de
fetidez. É preciso evitar, a
cima de tudo, as atmosferas estagnadas:
deslocamento dos cemitérios cujos ba fios são preocupantes, proliferação de
reformas para modificar arquitetur a e
localização dos hospitais, multiplicação
de medidas contra a sedimentação dos dejetos.” (VIGARELLO, 1996:163)
Os mais pobres passam assim, de pessoas que vivem em um ambiente sujo e
impuro”, a simbolizar a própria sujeira, da mesma forma que os restos mor
tais do
cemitério que citava Foucault. A idéia de atmosfera estagnada contra a qual se deve
combater é um elemento retomado por propostas urbanísticas poster
iores como o projeto
da Paris de Haussmann, com grandes avenidas, ambientes abertos para a livre
circulação, onde ao mesmo tempo os cidaos possam ser mais fac
ilmente controlados.
1.2 Culturas do residual
Lizcano e Spengler deixam claro que mesmo nasmencionad as estragias
discursivas das ciências exatas que buscam criar efeitos de sentido de pr
ecisão absoluta
deve-se levar em conta que nãouma só matemática, uma só filosofia dos números, se
considerarmos que, como todo pensamento humano, estão diretamente ligad
as ao
contexto e aos sistemas de distintas culturas. A percepção de limite onde terminaria o
eu/nós e começam os outros difere de uma cultura a outra, assim como
a noção de todo
indivisível. Desta forma, sociedades como as da Arica Latina, de grande tradição oral
e tradicionalmente menos submetidas à lógica da linguagem es
crita se comparadas à
Europa central, por exemplo, se relacionam de modo distinto com a noção de limite e
estrutura fixa e equilibrada. Estas diferenças se
fazem notar na construção das cidades.
35
35
Val e notar que p ara isso não se pode pensar em relações hierárquicas como se a cultura oral fosse mais
primitiva que a escritura. De Zayas (in: Autour de
Averroès, 2003:72) acredita que em culturas onde o oral
é mais predominante, a escritura é quase uma letra morta que não pode exprimir em sua totalidade o
êxtase criativo.
19
Spengler (1998:123) diz que a cidade européia quer ser outra coisa, quer se r mais
que a natureza, daí os telhados agudos, aspula s barrocas que buscam se
r um mundo
em si, onde a mesmo a natureza é reconstruída por meio de parques, lagos, vasos de
flores, fontes e as montanhas se transformam em lugares
de vistas panorâmicas. Na
Arica Latina, como descrito por Lezama Lima (1993), a paisagem altera o homem e
não somente é alterada por ele; é onde mais cla
ramente se percebe que a natureza é
cultura. A arquitetura rural da região, feita de madeira, barro, bambu, chamada por Lina
Bo Bardi (1995:7) de um a
tom alcriadodo povo com os arquitetos “que não sabem
construir”, é um exemplo. Mesmo em cidades de proporções gigantescas como São
Paulo, ainda é possível ver
no meio da cidade ocupações que misturam modos de vida
rural e urbano, hortas e criação de galinhas à beira de marginais de rios e vias expressas
(onde se localizam muitas favelas). Estes exemplos, mais do que uma anedota,
representam uma alternativa real de subsistência que tem sido alvo nos últimos
anos de
propostas que combinam poder público, privado e universidades em projetos que visam
fornecer possibilidades para uma agricultura urban
a, incluindo o uso de espaços
vazios
36
. É importante assinalar que a apropriação do ambiente natural para a construção
de moradia não é exclusividade da Arica Latina, muito menos está restrita aos
setores
menos favorecidos economicamente. Sabe-se que a cultura mediterrânea, em sua
tradição mestiça, também oferece exemplos interessantes e que questionam a história
ofi
cial da arquitetura das cidades européias, que muitas vezes ignora o saber-fazer do
homem comum. Na Espanha, um exemplo do uso do ambiente natural pa
ra moradias
pode ser visto nas casas cueva nos arredores de Granada, que são tanto ocupadas
informalmente quanto comercializadas.
Casa cueva nos arredores de Granada (Espanha
)
36
http://www.ipes.org/au/donde_intervenimos/brasil_governador_valadares.html
http://www.agriculturaurbana.org.br/sitio/textos/otimizando.htm
20
Preparação da terra para a agricultura em uma favela em Brasília (DF).
Casa de pau-a-pique em Itaúnas (ES)
Scott Brown mostra exemplos da apropriação de elementos estéticos da
publicidade, dos outdoors, pe
las tribos ou organizações s ociais africanas que estariam à
primeira vista fora da cidade urbanizada de acordo com parâmetros econô
micos. Essas
combinações que presenciou durante o tempo em que viveu na África do Sul (onde
nasceu) foram, segundo ela, o que permitiu um olhar di
stinto que foi compartido com
Venturi e professores d a universidade Pennsylvania (EUA). Desse processo resultou seu
livro mais conhecido, “Aprendendo com Las Vegas” (com Ve
nturi), que mostra as
relações que se estabelecem em uma cidade organizada a partir de todo tipo de anúncios
publicitários distribdos por
uma grande avenida que corta toda a cidade, onde a própria
arquitetura é publicidade. Segundo ela, só a partir de um olhar queestava a
costumado
com as sobreposões entre antigo e novo, unido a uma formação transdisciplinar que
obteve nos EUA, ela e Venturi poderiam propor uma
análise que pudesse ser aplicada a
uma arquitetura que levasse em conta a inteli ncia das manifestações cotidianas e que
deveria contribu
ir no processo criativo do próprio arquiteto
37
.
37
Conferência de Denise Scott-Brown no evento Basurama, realizado em março de 2006 no centro La
Casa Encendida em Madrid.
21
Vila da tribo africana Mapoche, onde os habitantes reinterpretaram a idéia das
vilas suburbanas ocidentais em desenhos decorativos
38
.
Bateson (2000), em seus estudos sobre ecologia e cibernética, menciona que a
Revolução Industrial, a despeito das mudaas importantes que trouxe para
a sociedade,
impediu o homem de perceber que a criatura que ganha do meio ambiente na verdade
está destruindo a si mesma. Muito ant
es da explosão urbana no Brasil, e antes que a
devastação da natureza fosse uma preocupação em todo o mundo, José Martí, no final do
sé
culo 19, publicou textos nos quais a natureza era tomada como categoria política,
como agente ativo do processo de constituição de todo o continent
e americano. Para
Martí, a percepção da cultura da natureza nos setores populares era um elemento crucial
para a estruturação cu
ltural e econômica de toda a América (incluindo a América do
Norte):o há batalha entre civilização e barrie, mas sim entre falsa erudição e
na
tureza.”
39
Embora admirador de Darwin, ele apontava falhas no estudo do pesquisador
quando este admirava toda a fauna e flora encontradas na América, ma
s desprezava o
homem que ali vivia, como se não fosse parte desta mesma natureza. Apontava que
quando se estuda um ato histórico ou individ
ual, nota-se que a intervenção humana na
natureza a acelera, altera ou detém e que toda história trata somente da narração do
traba
lho de ajuste e dos combates entre a natureza extra-humana e a natureza humana,
quando na verdade se deveria priorizar uma
abordagem integradora entre o homem e seu
entorno.
38
In: Venturi e Scott-Brown. Architectur e as sign and systems - for a mannerist time. Cambridge: The
Belknap Press (MIT Press), 2004, p. 108.
39
In: Gillermo Castro, “Para una cultura latinoamerica na de la naturaleza”, http://www.revistapolis.cl/,
Revista online da Universidade Bolivariana, vol. 2, número 7, 2004 (sem numeração de página).
22
Essa noção permite que se compreendam sistemas da cultura sem cair em
discursos dualistas entre dominadores e oprimidos, entre a globalização destruidor
a das
identidades locais” que devem ser preservadas e que têm mais eficiência como slogan
publicitário turístico, p arte da mesma
máquina globalizante” que combatem. Canclini
(2003:77) observa que essa estrutura dualizada se reproduz em muitos estudos europeus
e norte-americanos
sobre os habitantes latino-americanos durante todo o século XX. A
oposição cria enfrentamentos entre identidades inconciliáveis. Por isso, segundo o au
tor,
não é possível desconstruir essas visões estereotipadas sem promover uma ruptura entre
as noções de cultura e identidade, de modo a questioná-la
como núcleo ou sinônimo de
cultura. O autor pontua que:
“Estudos antropológicos e sociopolíticos so bre a integração européia têm
mostrado que os programas destinados a construir projetos comuns não
bast
am para r eduzir a brecha entre a Europa dos mercados ou dos
governantes e a dos governantes e a dos cidadãos. (...) Uma explicação
possível
para o fenômeno é que nenhum programa voluntarista de integração
pode conseguir gra nde coisa quando não se sabe o que fazer com a
heterog
eneidade, isto é, com as difereas e os conflitos que não são
redutíveis a uma identidade homonea” (2003:23)
Simmel (1998: 34) havia dito que o ato de abrir a porta para sair de casa
representa uma possibilidade de estar receptivo ao que a princípio pode se
r visto como
algo negativo. A incerteza, o estranho, tornam-se elementos liberadores e de
modificação. Na cidade nãoas relações de parentes
co e vizinhaa do ambiente rural,
o indivíduo tende a estar sem as tradicionais raízes. No entanto, sabemos que as cidades
não são i
guais, e os modos de interação são dis tintos em cada cultura. Autores como
Morin (1997), Carpentier (1969), Freyre (2000) entre outros, mostram que alguns
sistemas cult
urais têm maior facilidade de absorver o que é externo e incl-lo como
parte do sistema. Santos havia observado que perceber o e
ntrópico, o que resta, é tarefa
realizada pelos homens lentos, os excldos do sistema racionalizante e da aceleração
alienadora
do capital, dizendo quedurante séculos, acreditávamos que os homens m ais
velozes detinha m a intelincia do mundo. Agora, estamos descobrindo que,
nas
cidades, o tempo que comanda, ou vai comandar, é o tempo dos homens lentos.”
(2002a:325).
A possibilidade de transformação na cultura se dá pelo cho
que entre elementos
de sistemas distantes e pela incorporação ou reincorporação do residual, gerando um
mosaico, um conjunto complexo que evide
ncia novos usos derios elementos. Esse
processo é claramente mais complexo e possível em culturas do excesso, onde a
combinação de eleme
ntos múltiplos e distintos é parte do mecanismo de construção de
sistemas. Santos colabora com essa visão ao falar da flexibilidade tropical,
onde “quanto
menos inserido é o homem mais facilmente o choque da novidade o atinge e a
descoberta de um novo saber lhe é mais fácil. A
surpresa exige uma reformulação da
consciência (2002a:330)”. O autor acreditava que se estava saindo da era tecnológica
para a era demográf
ica e popular. Segundo ele, o caminho da escassez permite que se
perceba o seu próprio valor. O conforto traria uma certeza de uma permanência
simlica que os excldos não possuem. Como definem Laplantine e Nouss (2002:64),
23
a dúvida está intrinsecamente ligada à mestiçagem, à suspeita que se levanta sobre
qualquer totalidade homonea, incluindo a personalidade indiv
idual.”
Segundo Sousa Santos (2007:359-360), a temporalidade barroca é a
temporalidade da interrupção. Esta interrupção é o que causa a auto-reflexividade e
su
rpresa, ambos elementos importantes para o fazer criativo. A auto-reflexividade é
gerada pela falta de mapas, de estruturas prede
terminadas a serem se guidas. A surpresa
ocorre pelo suspense gerado pela suspensão. A interrupção, segundo o autor, provoca a
admiração e a novidade e
impede o fechamento e o acabamento. Para Dorfles (1984), o
intervalo é o que impede a linearidade (seja nas chamadas artes plásticas, na músi
ca, na
arquitetura, ou no próprio movimento da cidade), trazendo elementos de outros
contextos e permitindo a fragmentação da narrativa.
Em o
utra abordagem, Paulo Freire (2007) defende a idéia da percepção do outro
e da incorporação de seus saberes como tarefa inerente à educação. Para el
e, educação
não poderia ser vista como mera transmissão de saberes, mas intermbio entre mundos.
Para isso, os saberes populares não poderi
am estar nem divididos nem abaixo do
chamado saber intelectual, da mesma forma que o saber deveria conectar novos sistemas
que incluiriam mente (e as emoções) e corpo para o d esenvolvimento de novos modos
de interpretação. Esse processo deveria ser dinâmico, o que levav
a o ed ucador a dizer
que suas propostas não deveriam ser tomadas como modelos, mas pressupostos que
teriam de ser revistos e atualizados
em tempos e contextos espaciais distintos.
A incorporação do outro (outro sistema cultural, outro tempo, outro espaço)
como forma de criação e pensam
ento foi denominada por Sarduy (s/d) como um
procedimento barroco, seguido por Alejo Carpentier (1969), Lezama Lima (1993),
Haroldo de Campos (1974, 1981)
40
, entre outros. O barroco como definido por Sarduy
não é uma escola, não possui regras a serem seguidas e não necessariamente se restringe
à produção latino-
americana, se levarmos em consideração a influência de autores
europeus como Luís dengora (1986), Marcel Proust (2002), James Joyce (1999-
2002), Stéphane Mallarmé (1974) nas ob
ras dos já citados escritores latino-americanos.
Como elemento de análise, não se restringe à produção artística sendo, como define
Glissant (1990:13) “um modo de viver
a unidade-diversidade do mundo”, um
pensamento em movimento do centro para fora, rompendo assim seus próprios limites e
fazendo com que os centros se multipli
quem como se fossem margens. Invariavelment e
isso inclui a devida apropriação da linguagem (seja ela verbal, visual, musical, etc.) no
que Ca
rpentier denomina a combinação harmoniosa do que e como se fala, o significado
alterando e sendo alterado pelo significante
41
. Não se trata de uma proposta
academicista, mas um modo de reestruturação da linguagem de modo aberto, e m
expansão, a partir dos objeto
s que se apresentam.
40
Fazemos referência a textos críticos sobre o chamado barr oco ou neobarroco como procedimento
criativo, embora o pensa mento barroco
estivesse presente nas obras poéticas e de prosa destes autores .
41
Alejo Carpentier, entrevista concedida à TVE em 1997, disponível em
http://www.apirrona rse.com.ar/?p=1652.
24
Entre outros termos que de certa forma poderiam ser relacionados com a idéia de
pensamento barroco, como a mestiçagem, o multiculturalismo e o
sincretismo, podemos
perceber algumas difereas, que devem ser apontadas . Sincretismo vem de duas
palavras do grego, que signif
icam por um lado “coalizão de dois adversários em um
terceiroe “falar como um cretense”, isto é, ser um impostor. O caráter negativo da
idéia
de ser um outro que se encontra em sua etimologia, juntamente com a possibilidade de
se confundir com a idéia de fusão em um todo amorfo (ou me
lting pot como usam
alguns autores norte-americanos ao se referirem à cultura latino-americana), além de seu
uso em termos folclóricos que o
s define como fenômenos eticos faz com que o termo
seja evitado por pesquisadores das culturas mestiças. Laplantine e Nouss (2002:9)
relacionam o t
ermo sincretismo com o patwchwork, a mera coexistência entre elementos
distintos de modo morno, uniforme, onde não agitamento e alteração recíproca
entre
eles. Seguindo o mesmo raciocínio, o multiculturalismo se apresentaria como o contrário
do barroco. É a defesa das minorias, dos grupos étnicos, o politica
mente correto, uma
proposta ancorada em origens e identidades essenciais que, para serem pr eservadas, não
podem contaminar-se mutuamente.
Por o
utro lado, o próprio termo mestiçagem está relacionado ao barroco.
Carpentier afirma que nascer mestiço obriga a se perceber desde o início
comooutra
coisa”, o que engendra por si só um barroquismo, uma ambiidade fundamental.
Campos (1981:11-14) afirma que a “cultura latino-americana o
teve inncia (infans: o
que não fala). Nunca foi asica. Nasceu adulta como certos heróis mitológicos e falando
umdigo universal extre
mamente elabor ado: odigo retórico barroco.” Um exemplo
citado pelo autor é o Manifesto antropofágico, que mostra a necessidade da relação entre
o nacional e o universal, questionando a perspectiva do brasileiro como o “bom
selvageme propondo a idéia domal selvagem”, o que devora o ou
tro, o antropófago.
“Este pen samento não implica em uma submissão, mas sim uma transculturação ou
melhor dito, uma transvalorização: uma visão c
rítica da história como função negativa
(no sentido de Nietzche), capaz tanto de apropriação como de expropriação,
desierarquização, desconstrução.”
A importância da vincia das cidades para os autores de pensamento barroco é
clara. É caminhando pelas ruas, passando pelas aglomeraç
ões, pelos mercados, pelas
praças, escutando os sons, odores e imagens em movimento da urbe que se pode ter uma
maior percepção do entorno
, como descreve Sarduy (s/d: 9), em umandar ao acaso,
sem fixação, sem centro possível, numa superabundância de imagens e a criação de um
contraponto rítmico para o movimento da realidade que se procura reconstruir.”
A partir dessa idéia, Carpentier (1969:23) analisa que as proporções do
continente
americano também eram um elemento importante para gerar esse “choque da
novidade” que permite revelar o outro: “A distância é dura e ta
ntálica, por isso mesmo
que cria imagensespelhismos que estão fora dos alcances musculares do
contemplador. A desproporção é cruel porquanto se opõe ao
módulo, à euritmia
pitarica, à beleza do número, ao corte do ouro
25
Essa desproporção espacial se reflete em um modo de pensar que sobrepassa o
logocentrismo ocidental, ou como define Campos (1981:17):passa
pelos interstícios da
historiografia tradicional, se filtra por suas brechas, passa obliquamente pelas suas
fissuras.” É um modo de pensam
ento que faz uso da residualidade não apenas como
caminhos de percurso, mas criando entremeios, vazios, “contra o saturado do
homoneo” (Laplantine
e Nouss, 2002:79). O percurso residual não é direto, não busca
o caminho mais rápido ou mais eficiente, não apresenta uma totalidade nem uma
essên
cia, faz uso da multiplicidade de leituras, prefere a ambiidade, se apresenta,
como descreve Sarduy (s/d:175) “como uma rede de conees de su
cessivas filigranas,
cuja expressão gráfica não seria linear, bidimensional, plana, mas em volume, espacial e
dinâmico.” Vale notar que não se quer
definir aqui o pensamento barroco como pura
residualidade, como u m entre-pensamentos, o que traria a estabilidade que a própria
noção de barroco q
uestiona. É um modo de conectar o que é residual com sistemas
centrais, tempos passados com presente, sistemas distantes que não obedecem a u
ma
estrutura de áreas de conhecimento ou estruturas históricas rígidas. “Mais do que
circunscreve territórios, busca traçar linhas d
e contato” (Laplantine e Nouss, 2002:89).
Desta forma, a idéia de resíduo se relaciona com o excesso. Excesso na produção
econômica, na apropriação especulativa do es
paço da cidade, que revela ao mesmo
tempo o descontrole, a exclusão. O desperdício de bens ou de espaço (como os enormes
jardins em palácios europ
eus e mansões não utilizados pelos seus próprios donos) é uma
forma de demonstração de poder. No entanto, existem outras formas d e excesso, não o
e
conômico, mas o cultural, como se obse rva na Arica Latina. Como menciona
Chiampi (1998: 30):
“No cenário da produção simlica de hojepós borgianao excesso, o
surplus barroco expõem o esgotamento e uma saturação que contrariam,
como
quer Sarduy,a linguagem comunicativa econômica, austera’ que se
presta à funcionalidade de conduzir uma informação conforme a regra da
troca capit
alista e da atividade do homo faber, o ser para o trabalho”.
O próprio fato de se viver o tempo fora d a idéia de produtividade (ainda que esta
exclusão do sistema produtivo seja compulsória) é um ato contest
atório. Lynch, Lizcano
e Semprini entre o utros autores analisam que em muitos grupos sociais perder tempo é
algo impensável. A máximatempo é dinhe
iro descreve claramente essa crea. A
indústria do turismo cria a possibilidade de se viver o tempo livre de um modo
produtivo, com visitas e p
asseiosobrigatórios”, guias do que se deve ver, do quenão
se pode perder”. Foucault (1984) menciona que em uma sociedade onde o lazer é a
re
gra, o ócio é uma escie de desvio. Daí a importância dos homens lentos descritos por
Santos e sua ação na contra-racionalidade.
Dentro de um
sistema social muitas vezes o que se considera residual é asso ciado
a algo fora de lugar, fora da norma, algo que não pertence m
ais a uma estrutura e que
está disponível para reutilização. Apropriar-se de informação, espaços e objetos que
surgem aleatoriamente tem a ver
com a capacid ade de adaptação de um indivíduo ou
grupo, ainda que essa adaptabilidade seja por vezes fruto de uma situação de emern
cia
e carência extremas. É um trabalho subversivo ou da contra-racionalidade como propõe
26
Santos, porque está na contramão do processo homoneo de consumo. Não segue as
normas previstasde cima para baixo”. Ao mesmo tempo, por não pertencer
mais a
nenhum sistema organizado é instável, móvel, um inmodo na cidade. Uma situação de
potencialidade e instabilidade, mas ta
mbém de disponibilidade. Para Gibson (1986),
dentro de uma abordagem ecossemiótica (que busca estudar a relação e a conexão entre
sistemas diver
sos que se alteram mutuamente em um ambiente) asdisponibilidades
são elementos informacionais que dependem não somente da natureza
dos objetos, mas
também das possibilidades de per cepção do sujeito. Percepção neste caso tem a ver com
ser ativado pela interação no amb
iente, não necessariamente com uma idéi a de sensação
ou simples estímulo. Neste processo, tanto objeto quanto sujeito em seu ambiente são
alterados
e o espaço urbano é um cenário privilegiado para a compreensão destas
relações.
As cidades latino-americanas refletem essa idéia d
e excesso e combinatórias
inesperadas. Carpentier (1969:16) aponta a necessidade de se passar dos escritos
nativistas, baseados em uma nature
za que exclui o fazer do homem, para as análises dos
espaços urbanos como parte desta relação do homem com o entorno (que inclui a
nature
za):
“Começamos a descobrir agora que (as cidades latino-americanas) possuem o
que poderíamos chamar um terceiro estilo: o estilo das coisas que o tê
m
estilo... Com o tempo, esses desa fios aos estilos existentes foram se tornando
estilos. Não estilos serenos ou clássicos pelo alargamento de um classi c
ismo
anterior, mas sim por uma nova disposição de elementos, de texturas, de
fealdades embelezadas por aproximações fortuitas, de enc
respamentos e
metáforas, d e alusões a outras coisas que são, em suma, a fonte de todos os
barroquismos conhecidos. O que sucede é que o ter
ceiro estilo, mesmo
porque desafia tudo aquilo que se te ve, a determinado momento, por bom
estilo ou m au estilosinônimos de bom gosto e mau gosto – costu
ma ser
ignorado por aqueles que o contemplam diariamente, a que um escritor, um
fotógrafo ardiloso, proceda à sua revelação.”
Confrontar estas cidades consideradas caóticas, sem estilo com noções que
ultrapassam o julgamento do certo e errado arquitetônico, e permitir que o q
ue se
possa alterar os próprios limites do que se conhece como arquitetura e urbanismo,
observando osrios mundos que ali se encerram, é o que
permite que uma cidade seja
um centro de reflexão sobre o fazer social, sem cair em provincianismos que recortam
somente a parteorde
nadade um centro urbano, eliminando as relações que colocam
em dúvida saberes estruturados e cartilhas.
1.3 Resíduos recombinados, dando forma ao informe
Todo lixo c
ontém informação. Essa informação se reflete em uma memória
coletiva (compreendida como mecanismo da cultura) que faz que com que objetos
usados e jogados f
ora por alguns sejam recuperados por outros. Como mencionam
Laplantine e Nouss (2002:116),a memória é em si mesma uma operação mestiça: a
le
mbraa pertence ao presente de uma consciência que a manifesta mas que ao fazê-lo
ressuscita algo quenão é.” As grandes cidades mostram di
stintas formas de se
27
socializar a partir do comércio de materiais usados ou mesmo encontrados em lixos.
Desde as vendas de garagem norte-americanas, o
s rastrillos espanis e os mercados
estabelecidos ou improvisados de venda e troca de objetos como o Sahara no Rio de
Janeiro e c
amelôs do bairro de Santa Ifinia em São Paulo, entre tantos outros. São
objetos com história, que contam um pouco de uma memória coletiva que
vai sendo
continuamente apagada por modas e ciclos de vida de produto mas que permanece
nestes pequenos comércios paralelos ou revive
pelo próprio sistema de modas e
tendências, que se reapropria do que jogou fora.
Lynch (2005) estabelece uma diferenciação entre objetos de segu
nda mão,
desvalorizados, relegados aos pobres, e o que se considera antiguidade, objetos de alto
valor simlico e mercadológico. Para Lynch, as
antiguidades nunca foram jogadas fora,
são objetos constantemente mantidos que desafiam a decadência, por isso mesmo
dotados de valor. No
entanto, a relativamente recente tendência de se recuperar objetos
mais prosaicos (muitos considerados lixo) e dotá-los de valor, a
moda vin tag e, os
mercados de rua coma ntiguidadesde não mais de uma cada, a busca por máquinas
tecnológicas das cadas de 70
e 80 são apontados por Lynch como modos de se
construir uma escala de valores e conseente diferenciação para um grupo de
entendidos”. Para isso, esses
elementos devem ser associados a um uso prévio mas não
tão próximo a ponto de serem confundidos com lixo. Essa idéia de proximidade
apontada pelo a
utor é importante porque mostra a relação paradoxal que se tem com
resíduos, pois produzimos a maior parte do lixo quando consumimos produtos d e todas
a
s ordens, expelimos resíduos corporais como parte de nosso processo de sobrevincia,
tornamo-nos resíduos quando morremos e exatamente essa prox
imidade e
impossibilidade real de estar desconectado do que é dejeto é que caus a a repulsa.
A apropriação dos dejetos por pa rte dos migrantes
, imigrantes ou outros grupos
sociais que não encontram seu espaço na cidade racional encobre questões que vão
muito além das fragilidades econ
ômicas e legais que enfrentam. Resíduos geográficos,
materiais, possuem um valor simlico que tem a ver com uma resistência à lógica
de
consumo e ordenação. A miséria, a falta de apoio, tornam mesmo os indivíduos que
estão à margem do sistema tradicional de consumo produtores em poten
cial, que têm de
apreender o espaço e seu entorno para daí tirar o que necessitam. Seu deslocamento
constante torna essa cap acidade d e adapt
ação a contextos distintos ainda mais urgente e
aguçada. Por não possuíremdireito à cidadeestão, como apontado anteriormente, à
margem do tempo compartimentado, es
truturado. Recolhem e recuperam pouco a pouco
o lixo queem espalhados pelas ruas, nos depósitos de lixo ou mesmo nos sac
os de
lixo, que são abertos e separados por eles.
Brissac (2002:s/n) analisa a cidade de São Paulo como palco de tensões entre
forças do capit
al global e da apropriação local, mas também como Santos (2004, 2002a,
2002b, 1993), não compreende essas forças como criadoras de claras dualidades e
destaca seu caráter mo
vediço e de relação com as forças da exclusão que as geram,
mostrando que a cidade pode ser dividida e estruturada pelo capital e pelo trabal
ho, mas
estas divisões, por seu caráter rígido e excludente são reconfiguradas pelos sem-teto,
pelos migrantes, pelos comerciantes
informais. Como a máquina de guerra proposta por
Deleuze e Guattary (1997), não procuram medir, mas deslocar. Dissolvem os limites
28
impostos construindo territórios moventes e dinâmicos ocupando mar gens e espaços
residuais criados pelo poder público e pela especulação
imobiliária, mudando a
disposição do território urbano, densificando e intensificando pontos, distribuindo-se
pelo espaço:
“Ocorre uma inversão da figura do excldo: ele não está mais no limite, mas
no meio. São e lementos que só se distinguem pelo movimento e o repo
uso,
pela velocidade e a lentidão. O migrante estabelece uma micro-física,
definida por passagens, por lin has de ruptura e conexão, que se opõ
e à
macro-geometria do sedentário. (...) Subordinação do habitat ao percurso,
conformação do dentro ao fora. Esses movimentos imperceptíveis, entre as
coisas, c
onfiguram espaços de intervalo, sem recorre r a formas, à arquitetura.
Tudo para ele é uma questão de logística: carregar, guardar, escond
er, passar
para frente. Daí a relação do camelô, do favelado, do sem-teto com os
materiais improvisados e descartáveis. Arranjos inexato
s contra estru turas
arquitetônicas. O ambulante, o itinerante, como os catadores de papel,
seguem o fluxo da matéria.”
Foto de 2004 Vila Madalena. Um aviso para que o lixo deix ado ali pela
vizinhança não fosse recolhido e pudesse ser reaproveitado pelos moradores do
espaço residual.
29
Foto de 2004 Comércio de sucata na Comunidade Nassau.
Foto de 2006 Mesmo com a remoção da Comunidade Nassau, alguns ex-moradores da favela
ainda trab alham catando lixo na região, necessitando agora percorrer distâncias de no mínimo 3
quilômetros por trajeto a pé (distância da residência da CDHU mais próxima de onde estava a
favela).
30
Foto de 2006 Na frente do Clube Casa de Nassau, o Sr. Moacir Pereira seleciona
o lixo reaproveitáv el.
Foto de 2004 de outra comunidade que ocupa parte da Avenida Raimundo, em
Pirituba.
31
Para Blanquart (revista Po ïesis, 2003:127) a idéia de reciclagem é fu ndamental
para a compreensão da dinâmica da cidade. Para o autor,
o ser vivo se recicla, seus
restos são apropriados por outros e esse processo deveria ser adotado para a vida da
cidade, que também é um tec
ido vivo. O processo de continuidade e descontinuidade
constante, que é parte de uma urbe, pode e deve ser integrado por meio da reciclagem
cultural e material.
Nas últimas cadas, o conceito de reciclagem tem se tornado uma preocupação,
ainda que as ações efetivas
nesse sentido sejam menos efetivas do que se propõe. Por um
lado, a cidadeoficial” continua ger ando mais lixo, seja entre os habitantes ou nas
indústrias, os maiores produtores de dejetos tóxicos. Enquanto países como Estados
Unidos relutam em se comprometer ativamente em reduzir a poluão
e o lixo (ainda que
seja um dos maiores produtores mundiais nessa ár ea), países da Europa central
transferem suas indústrias consideradas de a
lto risco e muito poluidoras para países
economicamente de Terceiro Mundo, que não somente as recebe como ainda disputam
entre si o direito a possuí
-las em seu território.
42
Em São Paulo o lixo que se coleta de modo seletivo e que pode ser reciclado não
passa de 4% do total. Ainda assim, o trabalho de reciclag
em (principalmente de
alumínio) no Brasil é alto, devido à formação de cooperativas com boa gestão, ao alto
valor do material como sucata, ao trabalho
de catadores de lixo e ao comércio informal
de reciclagem já que sua subsistência provém em grande parte da mesma fonte: o lixo.
Um l
evantamento realizado pelo setor mostra que entre 2000 e 2005 a participação de
condomínios e clubes na coleta de latas usadas passou de 10% para 24%. As
latas de
alumínio se tornaram o carro-chefe da reciclagem no país. O Brasil é há 5 anos o líder
mundial em reciclage m de alumí
nio (96,2%, segundo a ABAL - Associação Brasileira
do Alumínio).
No momento em que a reciclagem de alguns materiais começa a adquirir valor
comercial
, representa uma possibilidade de renda para os moradores de favelas e espaços
residuais na América Latina e África. Este processo, no entanto,
não possui o status
glorificado que se observa em documentários educativos sobre a importância de se
diminuir e reaproveitar o lixo. Constit
ui um tr abalho quase ilegal, sem nenhum tipo de
direito trabalhista e de alto risco.
43
42
Uma das disputas atuais mais comentadas é a que se estabeleceu entre Argentina e Uruguai, que
envolveu desd e manifestações popul
ares a conflitos diplomáticos, para decidir que país acolheria uma
fábrica de celulose de capital espanhol em áreas próximas ao rio de La Pl
ata, que divide os dois países.
http://www.cpcmercosur.gov.ar/cpcprensa/2006/2006-12/20061215.htm
http://www.elcorreo.eu.org/esp/article.php3?id_article=6669
43
Folha de S. Paulo, 22/9/2005: “Catadores de lixo serão expulsos de Pinheiros: A Coopam are
(Cooperativa de Catadores Autônomos de Papel, Aparas e Ma
teriais Reaproveitáveis) ser á despejada da
parte de baixo do viaduto Paulo 6º, em Pinheiros (zona oeste ), lo cal que ocupa desde 1989. Os catadores
foram notificados neste mês, mas disseram que não irão sair. O despejo gerou polêmica e mobilizou
alunos e professores da FAU (Faculdade de Arqu
itetura e Urbanismo da USP), que re alizam aulas no local
e têm o trabalho da cooper ativa como alvo de pesquisa. Para o professor d
a FAU e urbanista Jo
Whitaker, o prefeito José Serra (PSDB) retomou uma política de "expulsão da população pobre das áreas
mais ricas, do c
entro expandido". A cooperativa reúne 56 cooperados e beneficia uma média de 130
toneladas de material para reciclagem por mês.
32
Como exemplo podemos citar os 5 mil catadores de lixo do aterro sanitário de
Gramacho, na rego metropolitana do Rio de Janeiro. Os catadores de lix
o são a base de
uma pirâmide de trabalho ameaçada por cnicas de reciclagem que começaram a ser
incorporadas pelas grandes indú
strias. Jardim Gramacho é o nome de um bairro de
Duque de Caxias, cidade da região metropolitana a 20 qu ilômetros do Rio. O "Lixão",
como é chamado, ocupa
uma área de um milhão de metros quadrados nas margens da
Baía de Guanabara, e recebe uma média diária de 10 mil toneladas d
e resíduos vindos do
Rio de Janeiro, Duque de Caxias, Nilópolis e São João de Me riti. Volume que equivale a
85% do lixo urbano gerado a cad a dia no
Rio de Janeiro. Múltiplos focos des
produzidos pela decomposição de matéria or nica ferve m em fogo brando em
montanhas de resíduos que, embora
sejam compactadas por tratores, desmoronam como
castelos de cartas e põem vidas em perigo. "Esse é o trabalho mais sacrificado do
mundo. O tr
abalho sujo que ninguém quis fazer", disse o presidente da Associação de
Catadores de Gramacho, Paulo Roberto Gest eira de Souza. As cooperativa
s formam o
terceiro degrau da pirâmide do lixo. Estão acima dos “galpões”, que por sua vez
superam os catadores de lixo. É nos "galpões" que, no final do
dia, terminam os achados
dos "catadores". Ao contrário dos "galpões", as dezoito cooperativas re gistradas na
Prefeitura do Rio de Janeiro não reve
ndem os resíduos, mas os reciclam. Para as
cooperativas, entretanto, a reciclagem p arece ter deixado de ser necio. "Trabal
hamos
no meio do lixo, mas sem muito material para recuperar porque agora virou moda que as
grandes fábricas reciclem seus resíduos", di
sse Gesteira de Souza. A "moda" foi
percebida na associação de Gramacho desde maio com o abandono de 130 dos 270
filiados. "Preferiram tentar a sorte
em outras coisas desde que caíram os ganhos", disse.
Segundo a Comlurb, desempregados, ex-presidiários, ex-delinentes, jovens ou velho s ,
encontram
no lixo uma alternativa para o que se pode chamar sobrevincia.
44
Além do exemplo citado podemos en contrar por todo o Brasil casos de
discriminação contra os catadores de lixo. Mesmo quandoum plano de reciclagem
de
materiais, ele é muitas vezes imposto sem a inclusão das pessoas quetrabalhavam
com o lixo. Em Goiânia
45
foi denunciado que catadores de lixo estavam sendo
espancados pela polícia como modo de impedir seu trabalho e, principalmente, su a
organização c
omo cooperativa. A press ão sobre a importância ecológica da reciclagem e
o “crescimento sustentável” faz com que haja preocupação com o lixo mate
rial, mas se
exclua os que om utilizando como modo de subsistência. Esta rede social passa a ser
o resíduo do resíduo.
44
Folha de S. Paulo, 10/12/2005. “A dura vida dos catadores de lixo do Rio de Janeiro”, por Hernán
Bahos Ruiz - Rio de Janeiro.
45
http://www.midiaindependente.org/pt/blue/2006/12/369276.shtml, 3 de dezembro de 2006. Acessado
em agosto de 2007.
33
O trabalho com o lixo é algo tradicionalmente depreciado. Na Índia a casta mais
baixa (os chamadosintocáveis”) tinha de habitar a pa
rte mais exterior da cidade. Como
menciona Lynch,trata-se de um trabalho menosprezado onde gente menosprezada
manipula material menos
prezado, uma situação que parece estar fora de controle
(2005:63). Delgado, em seus ensaios que analisam espaço urbano e cinema, fala da
dificuld
ade de se abordar esse processo de coleta e combinação do que é rechaçado, do
que está no chão, nos sacos de lixo, nos cantos escuros da cidade:
“(...) uma das reflees mais profundas quese fez sobre o trabalho de
compilar o que está aí como descartado, para exaltar sua beleza, foi
o filme
“Os catadores e eu”, da diretora francesa Agnès Varda (1999), uma reflexão
visual so bre a vincia do gesto de agachar-se para recol
her coisas do chão
que Millet soube retratar tão sublimemente em seu quadro La glaneuse.
Homenagem às respigadoras do quadro e ao seu autor, mas
também à própria
cineasta ouadicionamosao etnógrafo sobre o terreno, que como as
protagonistas da obra d e Millet – com efeito, a respiga
dora do filme é a
própria diretoranão fazem outra coisa que colher coisas que os demais
repudiaram por serem velhas, usadas ou humildes.” (2003:35)
46
Nesse filme, a direto ra aborda a respiga no meio rural, um processo coletivo que
com o advento das novas máquinas colheitadeiras passa a ser
uma ação residual em si
mesma, um processo individual restrito àqueles que por limitações econômicas não
podem comprar seus alimentos. A partir desse eixo ela
passa ao espaço urbano, dos
catadores do meio rural aos catadores de lixo, mostrando ao mesmo tempo a criatividade
queno estar despe
rto para o que a cidade e o campo aleatoriamente oferecem e a
marginalização a que estas pessoas são submetidas. Ao mesmo tempo a diretor
a aborda
os processos que geram o que é considerado resíduo nesses espaços, tanto a partir das
imposões mercadológicas sobre comercialização, c
onsumo e preservação dos produtos
consumidos quanto à exclusão de certos indivíduos ou grupos sociais (os ciganos
rejeitados pela socied ade f
rancesa, os desempregados e alcoólatras rejeitados pelos
ciganos) evidenciando o caráter arbitrário do processo. Fala também da mob
ilidade, algo
característico dos respigadores, dos que não têm lugar na so ciedade (sem-teto, mendigos
expulsos de suas habitações
ou mesmo aqueles que o querem ter um lugar fixo). A
obra de Varda aborda essas questões diretamente relacionadas ao tema mas tam
bém fala
do processo da construção do filme, que tem uma proposta claramente aberta e que vai
sendo constrdo a partir das idéias que se colo cam pelos
entrevistados, os próprios
catadores, elementos invisíveis da sociedade, ou pelo psicanalista (dono de um vinhedo e
um dos entr
evistados no filme) queem seu trabalho a necessidade de estar atento e
recolher os fragmentos do que o sujeito nãoem si mesmo.
46
“...una de las reflexiones más profundas que nunca se han hecho so bre la labor de compilar lo que está
ahí, como desechado, para ensalza
r su belleza, ha sido la película Les glaneurs ei la glaneuse, de la
directora francesa Agnès Varda (1999), una reflexión visual sobre la vi
gencia del gesto de agacharse para
recoger cosas del suelo que Millet supo retratar tan sublimente en su cuadro Las es pi gadoras. Homen
aje a
las recogedoras de espigas del cuadro y a su autor, pero también a la propia cineasta oañadimosal
etnógrafo sobre el t err
eno, que como las protagonistas de la obra de Milleten efecto laespigadorade la
película es la propia directorano hacen otra cosa que
cosechar cosas que los de más han repudiado por
viejas, usadas o humildes.”
34
Em Madri, por exemplo, a reciclagem espontânea de parte do lixo ocorre de
modo freente, já que as próprias caçambas oferecem de tu do: c
omputadores,
impressoras, TVs, roupas usadas. Esses materiais são vendidos principalmente pelos
imigrantes subs aarianos, em locais de fluxo ou próximos a
mercados de rua mais
estabelecidos como o de Tetuán ou o de Rastro, constituindo uma atividade marginal
que se combina com outras
realizadas principalmente por imigrantes chineses como o
top manta” (venda de CDs e DVDs piratas) e acessórios falsificados.
“Top manta (venda de produtos oriundos de pirataria) em Madri 2006.
35
Venda de produtos recuperados do lixo próximo ao mercado do Rastro, M adri
(2007).
Não somente os dejetos materiais disponíveis na cidade são apropriados pelos
habitantes dos espaços residu
ais e de algumas favelas. Mesmo antes de se falar d a
tecnologia digital e suas propostas de recuperação e reapropriação nas mais
diferentes
escalas, já podemos observar que nos agrupamentos informais a “gambiarraou conexão
de luz clandestinaseria uma forma de apropriaçã o
dos meios para usos não previstos.
McLuhan usa o exemplo da luz etrica para sinalar informação pura, “um meio sem
mensagem, a meno
s que seja usada para explicitar algum anúncio verbal ou algum
nome. (...) Embora desligadas de seus usos, tanto a luz como a energia
etrica eliminam
os fatores de tempo e espaço da associação humana, exatamente como o fazem o rádio, o
tegrafo, o telefone e a tel
evisão, criando a participação em profundidade.” (1974:22-
23). Umberto Eco discorda em certo ponto da afirmação de McLuhan, apontando que
um erro de interpretação ao des
ignar toda a cadeia de comunicação comomeio:
“Dizer que a luz é um mídia
47
significa não dar-se conta d e que existem pelo
menos três aceões deluz’. A luz pode ser um sinal de informação (uso a
eletricidade
para transmitir impulsos que com base nodigo Morse
significam mensagens particulares); a luz pode ser uma mensagem (se minha
amante p
õe uma luz n a janela, isso significa que o marido saiu); a luz pode
ser um canal (se estou com a luz acesa no quarto posso ler a men
sagem-
livro). Em cada u m desses casos o impacto de um fenômeno sobre o corpo
social varia de acordo com o papel que desempenha na cade
ia
comunicativa.” (1985:169)
47
O termo mídia se apresenta aqui respeitando a tradução para o português do texto de Eco, mas na
acepção da Teoria da Comunicação deveria
ser trazido no singular (meio) como no texto de McLuhan.
36
E complementa dizendo que o significado da mensagem muda de acordo com o
digo que se interpreta, o que para Eco contradiz que o meio seja a
mensagem. No
entanto, mesmo com a afirma ção de Eco sobre a mídia de massa tradicional (o livro foi
escrito antes do advento da Internet), dev
e-se ter em conta que o receptor em nenhum
caso é passivo, pois interpreta as m ensa gens a partir dedigos próprios e distinto s
depe
ndendo do contexto, sendo ao mesmo tempo capaz de alterar a mensagem. Bakhtin
pontua que:
“A pessoa aproxima-se da obra com uma visão do mundo já formada, a partir
de um dado ponto de vista. Esta situação em certa medida determina o j
zo
sobre a obra, mas nem por isso permanece alterada: ela é submetida à ação da
obra que sempre introduz algo novo (...). Compreender não dev
e excluir a
possibilidade de uma modificação, ou a uma renúncia, do ponto de vista
pessoal. O ato de compreensão supõe um combate cujo m
óvel consiste numa
modificação e num enriquecimento recíprocos.” (1997:382)
Trata-se de um processo de tradução const ante que se intensifica com a
necessidade de realizar combinações inusitadas com o que está dis
ponível. Por um lado,
o lixo é abundante, por outro, como fazer para que possa ser reinserido no sis tema e em
que sistema(s)? As possibilidad
es são inúmeras, já que nãolei que defina o uso destes
materiais nem o modo de interação destas pessoas. Estar esquecido pela cidade ofi
cial
passa a ser vivenciado a partir d e maiores possibilidades de escolha. As garrafas PET
podem ser recicladas, usadas para a construção
de moradias, levar água ou guardar
moedas e objetos pequenos que se encontram pela rua. Uma caixa de papelão pode ser
cobertor, casa
ou armário. Misturar-se ao mercado de rua semanal pode ser a
possibilidade de revender peças recuperadas do lixo, ou a m
anta por sobre onde se vende
a mercadoria pirata pode transformar-se em trouxa de roup as quando a fiscalização
policial se aproxima.
37
II. Metrópoles entre fixos e fluxos
Edicio Prestes Maia (SP)
38
2.1 Arquitetura e trânsito, arquitetura em trânsito
A idéia de habitação e de cidade está comumente relacionada à idéia de posse, de
estabilidade, que estaria em contraposição à idéia de nomadismo, de trânsito
, que apesar
de estar em voga nos discursos so bre os chamados novos meios ainda é vista com
resistência nos espaços urbanos. D
eve-se pertencer a um lugar, possuir uma moradia.
De a cordo com Careri (2004:33-34), o nomadismo e o sedentarismo com a construção
do espaço simlic
o surgem de uma ambiidade original. Após a divisão deneros
entre Adão e Eva, segue a divisão do trabalho e, por conseqüência, do espaço
, onde
Caim era a alma sedentária (terra) e Abel a nômade (pastoreio). No entanto, os animais
necessitam da terra para mover-se e alime
ntar-se, o que gerou uma disputa em que Caim
finalmente termina por matar Abel, sendo condenado por Deus a ser um nômade, já que
tudo o que plantaria
não daria frutos. Segundo Careri, Caim era o Homo Faber, o
homem que se apropria da natureza para construir um universo controlado e artific
ial,
enquanto Abel seria o Homo Ludens, o homem que joga, brinca e constrói um sistema
emero de relações entre vida e natureza. Ca
im tinha uma vida dedicada ao trabalho de
plantar, um trabalho de valor útil-produtivo, enquanto Abel dispunha de tempo livre em
sua
s caminhadas pastoreando para dedicar-se à especulação intelectual, à exploração do
território, à aventura, um tempo não utilitário por excelência
48
. Careri analisa a inversão
de valores que termina por associar a idéia deerrar no sentido nômade, com a de
errar”, a de haver cometido uma
falta. O nomadismo de Abel deixa de ser um privilégio
e se torna um castigo divino. Perde-se o lugar a que se pertence, o que torna Abel um
hom
em sem raiz, condenado a andar por todos os lugares sem pertencer a nenhum.
Na Gcia Antiga, um dos maiores castigos que se podia inflig
ir a um condenado
por algum crime era ser expulso de seu grupo, sendo impedido de utilizar como
identificador o nome do povoado onde havia nascido
. Representava uma morte
simlica, uma amputação, o indivíduonão era mais parte de nenhum espaço.
Povos como os judeus, que têm toda sua história marcada pelo trânsito, pelo
movimento, são condenados p elo nomadismo. Careri (2002:30-38) menciona que
nen
hum o utro povo sentiu de modo m ais duro as ambiidades morais inerentes à sua
vida errante: “Em sua origem, Yahvé era o Deus do caminho, seu s
antuário a Arca
Móvel, sua morada uma tenda, seu altar um monte de pedras toscas. (...) Richard Sennet
afirma que em realidade Yahvé foium Deus do
tempo mais que do lugar, um Deus que
prometeu dar a seus seguidores um sentido divino a sua triste peregrinação’.”
49
É uma
questão paradoxal: o nomadismo é condenado pelos povos sedentários e ao mesmo
tempo é compreendido como uma condenação pelos que peregrinam, o q
ue não é
comum a todos os grupos nômades.
48
O nome de Abel vem do hebreu hebel, que significahálito ouvapor”, um te rmo que se refere a
qualquer coisa animada e transitória. Caim
por sua vez provém de kanah, que seriaadquirir”, “obter”,
possuire portanto governar ou subjugar. (CHATWIN apud Careri, 2002: 32)
49
“En su origen, Yahvé es el Dios del Camino. Su sanctuario es el Arca Móvil, su morada es una tienda,
su altar es un montón de piedras toscas. Y a
unque promete a Sus Hijos una ti erra bien irrigada (...) en su
coran desea pa ra ellos el desierto. Richard Se nnet afirma por su parte que e n r
ealidad ‘Yahvé fue un
Dios del Tiempo m ás que del Lugar, un Dios que prometió a sus seguidores dar un sentido divino a su
triste peregrinación’”.
39
Segundo Delgado (2007:65-66), a construção dos Est ados centraliza dos na
Europa se deu a partir de um controle fóbico contra comunidades real ou miticamente
e
rrantes, como os ciganos, os judeus e posteriormente os vagabundos e todo tipo de
agentes do fluxo migratório. Perambular é estar em constante
estado de ambivalência, é
contraproducente. De certo modo tem a ver com formas de li berdade como o sexo livre
ou as experiências com e
ntorpecentes. O vagabundo, o usuário de drogas, o errante não
possuem um vetor de direção previvel, estão “fora de controle.” Para ser, é necessário
estar; quem va
ga não tem posão fixa, está como define Delgado, dis -posto.
O processo da cultura exige, por outro lado, a mobilidade, a viagem. Laplantine e
No
uss (2002:16-17) citam a figura arquetípica de Ulisses, o viajante e de Abraão, o que
nunca regressou a seu ponto de partida. Os gregos, que desprezavam
os “bárbaros” (os
gagos, os que balbuciam, os estran geiros), eram eles próprios viajantes, estran geiros nas
muitas terras em que chegava
m. E invariavelmente, se “barbarizavame influenciavam
a cultura local com sua própria cultura. O que segundo os autores também serve para
mostrar que a busca da pureza européia não tem sentido antropológico por estar em
contradição com a história mestiça da própria Europa, feita de migrações
, conquistas,
movimentos. Não u ma raiz única, “mas raízes que vão de encontro a outras raízes
(Glissand, apud Laplantine e Nouss, 2002:39). No entanto, não é
estranho perceber
porque quanto mais fechada a noção denós”, mais diferente e perigosa se torna a idéia
dosoutros”. Lotman (2000:142) diz que a função
das fronteiras no espaço semiótico
(ou semiosfera) é criar ao mesmo tempo uma organização e uma desorganização. A
visão do selvagem ou do
rbaro é nada mais que a imagem invertida de uma sociedade
que priorizava a racionalidade.
Martí aponta para o preconceito bastant
e difundido que ignora o poder de errar
como conhecimento do território e valoriza somente a alteração violenta do ambiente:
“Se u m homem que ama
os bosques caminha por eles durante a metade de cada dia, se
arrisca a ser visto como um vagabundo, mas se dedica-se todo o dia para a
especulação,
destruindo estes bosques e deixando nua a terra antes que tenha chegado sua hora, é
estimado como um cidadão empreendedor . Como se um povo
não tivesse mais interesse
em seus bosques que derrubá-los!”
50
50
In: Gillermo Castro, “Para una cultura latinoamerica na de la naturaleza”, http://www.revistapolis.cl/,
Revista online da Universidade Bolivariana, vol
. 2, número 7, 2004 (sem numeração de página).
40
Careri critica o lugar-comum que assume a arquitetura e o nomadismo como
opostos e mos tra que na verdade trata-se de uma relação comple
mentar, onde arquitetura
e nomadismo se unem por meio da idéia de percurso. Segundo ele, de acordo com
estudos sobre os primeiros povos
da Humanidade, pode-se concluir que o nomadismo
deu vida à arquitetura, no momento em que o conhecimento e o mapeamento dos
territórios percorridos
se davam pela construção simlica da paisa gem: marcar os
territórios por onde se passa com pedras e posteriormente construções.
A idéia do a
rtista Gordon Matta-Clark de cortar edifícios (Splittinga casa de
surbio cortada ao meio é sua obra mais conhecida) estava em primeiram
ente dissolver
a construção arquitetônica como uma entidade fixa na mente das pessoas, devolver a
idéia de espaço mutável, questionar não s
omente a prática arquitetônica como mero
necio como também romper com o que ele chamava detabu”, o muro e a rigidez da
propriedade na m
ente das pessoas. Ele lidava com a idéia de proibição, de respeito à
propriedade privada (ele mesmo esteve na Europa como foragido da políci a por interv
ir
no galpão do porto de Nova Iorque que estava abandonado para realizar a obra Pier 52,
que não chegou a ser aberta ao público por se tra
tar de uma propri edade - ainda que
abandonada - privada). Para o artista, os edifícios encerram tanto uma evolução cultural
em miniatura qu
anto um modelo das estruturas s ociais dominantes. Ele tinha em seus
trabalhos com edifícios um modo de se organizar e defender a necess
idade de uma
mudaa do sistema vigilante, que impõe a utilização e o d estino da propriedade como
um fim em si mesmo (MOURE, 2006:22).
Segundo Simmel (1979:53), se um elemento que congrega a vida nômade
compreendida como liberdade e a fixidez como semente geradora da civilização, é a
fig
ura do estrangeiro. Se gundo o autor, toda a história econômica mostra que a figura do
estrangeiro se confunde com a do comerciante. O trânsito re
alizado por mercadores
desde o início dos tempos é responsável na história por intermbios importantíssimos
que superam as dicotomias entre habita
nte local e o estrangeiro, criando novas
possibilidades de ampliação da cultura. Tarrius (1992:1) cita que os comerciantes,
atraídos à cidade pela facilidade
de encontrar mais pessoas, mais rique zas, acabavam por
gerar o que se conhece de primeiras sociedades u rbanas. Braudelapontav
a em seu
estudo sobre o mundo mediterrâneo na época de Felipe II que os imigrantes não podem
ser estigmatizados como homens dignos de pena
, como o estereótipo do imigrante
econômico que é retratado com freqüência nos meios de comunicação, mas sim como
elementos indispensáveis par
a a introdução de novas cnicas e conhecimentos nas
comunidades por onde passam ou se estabelecem.
Alain Tarrius (1992:17) mostra em seus estudos s
obre os imigrantes magrebinos
no Mediterrân eo que existe uma sistemática ignorância por parte dos índices de
crescimento e ações
nas cidades da Europa das relações de efervesncia e intermbio
produzidas por estes grupos, limitando-se a divulgar apenas as interv
eões de grandes
conglomerados econômicos e políticos no cenário urbano, contribuindo para a idéia de
que as cidades se modernizam e ativa m e
conomicamente apenas a partir de uma ação de
cima para baixo da pirâmide social. Dentro dessa visão, os imigrantes são elementos que
desor
ganizam o plano previsto, indivíduos parasitas das possibilidades providas pelo
poder público e privado. Na verdade, os imigrantes criam um
a relação entre nomadismo
41
e sedentarismo que desestabiliza a idéia de permanência de um modo d e vida de um
lugar e que agita e reativa um dado siste ma
cultural, gerando uma nova urbanidade. Os
usos do espaço e os ritmos de mobilidade desenvolvidos por estes grupos se inscrevem
em lógicas
distintas das que se estruturam nos lugares de acolhida. Desta forma, o que
pode parecer à primeira vista como obra de uma minoria limitada em
interstícios ou
enclaves, se revela portador de centralidades móveis, não sendo possível sua
compreensão a partir da lógica interna do lugar a
onde chegam. Não estão relacionados
com a centralidade histórica compreendi da como permanência. Esse processo gera por
um lado possíveis conflito s , mas favor
ece que toda a estrutura urbana se reconstrua e se
renove.
Delgado (2003:18) também chama a atenção para o processo de movimentação e
aquecimento gerado pelos imigrantes ou excldos das cidades, mostrando q
ue a
desestabilização é exatamente o que permite criar a porosidade e a complexidade nos
sistemas urbanos. A capacidade de interação destes
grupos se dá pela adaptação e
“competência para a reprodução de esquemas de conduta para que possam ser
compreendidos como possuidores de certa pr
evisibilidade permitindo que sejam aceitos.
Para o autoresse trabalho que se desenvolve em grande medida em vazios, em espaços
sociais inte
rsticiais e secundários, sem a proteção estruturadora das instituões
primárias, está afetado por um desequilíbrio endêmico e sedistorcido consta
ntemente
por todo tipo de perturbações.”
51
O espaço nodal que representa por um lado uma ameaça ao controle totalitário e
por outro possibilidades de encontro, pode estar constitdo de uma estru
tura
arquitetônica que se adapta e se modifica ao longo do tempo ou ser completamente
emero, como as manifestações populares nas rua
s. O movimento dos Sem Teto do
Centro (MTSC) (http://www.mstc.org.br
) é uma organização que articula associações de
moradores das ocupações e de projetosocupados. Tem como objetivo organizar lutas
p
elo direito à moradia em centros urbanos, tanto em termos de ocupação de edifícios
vazios quanto mobilizando politicamente coletivos ligados a ou
tros grupos como a
Frente de Luta pela Moradia ou Movimento pela Moradia do Centro e outras causas
sociais na defesa política dos inter
esses dos excldos, seja incentivando a eleição de
políticos que consideram ligados às causas populares ou mesmo solicitando recursos
públicos
para a construção de moradias aos se m-teto. A ocupação do edifício Prestes
Maia no centro de São Paulo, a maior ocupação urbana da América La
tina, entre
disputas com a polícia e com o poder público há 5 anos, recebeu o apoio de intelectuais,
políticos, artistas brasileiros e estrange
iros, em uma li s ta divulgada no site do
movimento e em outros s ites de grupos que apoiavam os sem-teto. Ainda assim, as
famílias foram
removidas em junho de 2007 para unidades habitacionais como os
CDHU de Itaquera e outros apartamentos cujos locais ainda seriam definidos.
52
51
se trabajo que se desarrolla en gran medida en hueco, en espacios sociales intersticiales y secundarios,
sin la protección estructuradora d
e las instituciones primarias a pl e no funcionamiento, está afe ctado por un
desequilibrio endémico y se ve distorsionado constantemente por todo tipo de pertur
baciones”. (Delgado,
2003: 18)
52
Para uma análise aprofundada do trabalho do MSTC, ver dissertação de mestrado intitulada “Naufrágios
Urbanosde Mila Goudet, defendida no curso
de pós-graduação em Psicologia Clínica da PUC de São
Paulo e orientada por Suely Rolnik em 2005.
42
Zona de uso comum no edicio Prestes Maia
Biblioteca do edicio Prestes Maia, estruturada pelos ocupantes
O Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, por outro lado, ocupava um espaço
residual em Taboão da
Serra (fora da áreantrica da cidade). O modo de pressionar o
grupo para que desocup asse o local se deu não pe la força policial, mas pelo sist
emático
abandono por parte do poder público: o lixo produzido pelos moradores da área e pelo
grupo que ocupava uma área da Estrada de São
Francisco não foi recolhido por mais de
quatro meses. Para sere m ouvidos pela prefeitura constrram uma barricada fechando o
acesso na
estrada com o próprio lixo que se acumulava, a que a prefeitura viesse
recol-lo.
53
Esse exemplo serve para mostrar como ainvisibilidade a que o grupo
estava condenado é momentaneamente interrompida no momento em que o lixo que
oc
upava as laterais da estrada passa a ser disposto no meio da estrada, impedindo a
passagem de automóveis. No momento em que alteram
o fluxo previsto, criando o que
Delgado (2007:156) chama de “coágulo societário”, passam a ser, ainda que por um
momento, viveis para a cidade que os
exclui.
53
O registro fotográfico completo da ação pode ser acessado em http://www.mtst.info/node/324.
43
Fotos da ação do MTST em Taboão da Serra 2006
A partir de uma visão aparentemente contrária, mas que poderia ser tomada como
complementar, Santos (1993:20) aponta para a importância da permanência c
omo fator
de alteração das dinâmicas globalizantes que, fazendo uso da aceleração e da
comunicação homonea e de fácil assimilação, buscam criar um
discurso propício às
ações do capital. Segundo o autor, “é pelo lugar que revemos o mundo e ajustamos nossa
interpretação, pois nele o rendito
, o permanente, o real triunfam, afinal, sobre o
movimento, o passageiro, o imposto de fora.” Santos (2002a:319) refere-se ao
movimento e velocidad
e do capital, que na verdade não são capazes de transformar
todos os lugares como muitas vezes se pensa. É distinto da idéia dos fluxos e
nomadis
mos dos imigrantes e migrantes, uma força fragmentada e fragmentária que
ocorre por meio de grupos que estão fora do plano previsto pela ace
leração imposta por
um pequeno grupo econômico. As ações de controle, embora encontrem nas cidades um
44
palco para suas manifestações simlicas (das quais as construções-monumentos são um
exemplo mais vivel), têm no próprio espaço u
rbano a resistência que permite que se
constituam modos de vida de ritmos e estruturas distintas: “A cidade é o lugar onde a
racionalidade es
tá mais contida, onde a anarquia assegura a biodiversidade (ou vice-
versa).”(Santos, 2002a:319)
Jacobs mostra a importância da rua como meio de c
irculação das informações
para criar u ma ordem complexa na cidade. Esta ordem, ou auto-organização, funciona
porque permite interações locais
para criar uma ordem global. Segundo Johnson
(2003:70-71), “as redes de informação das vidas nas caadas têm uma gr anularidad e tal
que permit
em o surgimento de um importante aprendi zado”. E diz que as cidades sem
vida nas caadas, que priorizam a circulação de automóveis, têm um potencia
l para
interações tão limitado p elas altas velocidades e grandes distâncias que impedem o
desenvolvimento d e uma intelincia social. Es
tes autores concordam com Santos
(2002a:235), que menciona que quem na cidade tem grande mobilidade acaba por ver
pouco, da cidade e do mundo:sua comunh
ão com as imagens, freentemente pré-
fabricadas, é sua perdição. Seu conforto, que não desejam perder, vem exatamente do
convívio com ess as imagen
s. Os homens lentos, para quem tais imagens são miragens,
não podem, por muito tempo, estar em fase com esse imaginário perverso e ir
descobrindo
as fabulações.”
2.2 Cidade à venda: o mecanismo econômico da construção do lixo
A contra-racionalidade constitui uma força de resistência, mas não deve ser vista
como indep
endente d a racionalidade ou forças de controle no espaço urbano. Sze Tsu ng
Leong (in: KOOLHAAS, 2001:193) deixa claro que da mesma forma que a produção
industrial excreta
produtos de dejetos, o espaço de controle também gera seu próprio
tipo de resíduo. O espaço é tr atado cada vez mais como um recurso a ser explor
ado,
processado e manipulado, e deve ir sendo descartado, abandonado, jogado fora. “Em
termos espaciais, uma boa parte da cidade se gera mais
por omissão que por intenção,
criando-se assim uma nova cartografiauma escie de solo numéricocomposta por
espaços de controle e espaços residuais. (...) Controle
e resíduo não são separáveis; são
simultâneos e intercambiáveis”. Estas relações podem ser comparadas com os
movimentos na semiosfera
definida por Lotman (2000a, 2000b, 1999, 1998a, 1998b),
onde o residual é periodicamente resgatado do estancamento, enquanto os espaços de
controle por sua vez vão caindo na ob
solesncia.
Mesmo antes de o capital se apropriar amplamente da cidade, elase havia
tornado um instrumento político. Schoonbrodt (revista Poïesis, 2003:237) lembra que
polis e civitas eram sinônimos em grego e latim. Com o tempo a p alavrapolítica
tornou-se uma referência à ação de um grupo domina
nte, que dirigia a sociedade civil.
Essa referência pode parecer elementar a princípio, mas mostra que a di visão entre o
grupo civil
do político indica que a cidade começa a ser um instrumento de poder, um
modo de controle da própria sociedade que a constitui. Entre muitos exemplo
s podemos
citar o grupo r eligioso conservador de origem espanhola Opus Dei, que em seu primeiro
centro de encontros em 1933 (a Academia DYA) ministrava aula
s na área de direito e
arquitetura. Duas áreas cruciais para o gerenciamento do poder. Naredo (2005:1-2) cita o
45
exemplo do ditador espanhol Franco, que em seu regime percebia a importância de se
controlar a sociedade civil a partir deseu núcleo ba
se: a habitação. E mostra que a
compra da casa própria foi algo incentivado no período franquista como modo de
estabelecer umaordem:
“A mudaa da cultura do aluguel para a cultura da casa própria: em 1950 a
situação era justamente a contrária: as casas ocupadas p
elos seus
proprietários supunham somente 46% do total e eram muito mais
minoritária s nas grandes cid a des. Em Barcelona somente 5% das casas
estavam o
cupadas pelos seus proprietários, em Madri, 6%, em Sevilha 10% e
em Bilbao 12%. A criação franquista de um Ministério da Habita ção
objetivou, entre outras coisa
s, a promoção da casa própria como vacina frente
à instabilidade social: com a retórica falangista do momento, se dizia que
para criar “gente de
ordem” haveria que facilitar o acesso da população à
propriedade da habitação e atá-la às responsabilidades de pagamentos
importantes. Somente um continuísmo di
gno da melhor causa no que
concerne a esta política permitiu alterar a cultura do aluguel em favor da
propriedade e outorgar à Espanha
o recorde europeu neste campo.”
54
Sze Tsung Leong (in: KOOLHAAS, 2001:189) diz que:o espaço de controle é
automático. Sua operatividade alcaa uma eficiência ótima quando o consumidor o
perpetua
inconscientemente, quando é visto como o curso natural d a modernização.”
55
Deleuze (1992:219) resume clar amente essa idéia dizendo que o marketing é agora o
instrumento de controle social. “Este controle é de curto prazo e de
rotação rápida, mas
também contínuo e ilimitado, ao passo que a dis ciplina era de longa duração, infinita e
descontínua. O homem não é mais o homem c
onfinado, mas o homem endividado.”
De acordo com Santos (2002:a30), o espaços se tornaram mercadoria visando sua
especulação econômica, ideológica, polític
a, isoladas ou em conjunto, onde o marketing
serve de complemento ou mesmo substituto à planificação urbana.
Se antes havia uma deterioração
dos objetos a curto prazo e dos lugares a longo
prazo, agora existem espaços que se degradam rapidamente e s ão descartados como
obj
etos. Um dos trabalhos de Matta-Clark (Fak e-Estates ouestados falsos”) consistiu
em comprar pequenas tiras de terra, algumas me dindo 30 ce
ntímetros de lar gura, entre
casas e edifícios em Nova Jersey, vendidas em um leilão público da prefeitura. Sua
idéia, que não pôde ser cu
mprida em vida, era a de devolver essas parcelas de terra ao
54
“El cambio de la cultura de alquiler a la cultura de la vivi enda propia: En 1950 la situación era justo la
contraria: las viviendas
ocupadas por sus propietarios suponían solo el 46 % del total y eran mucho más
minoritari a s en las grandes ciudades. En Barcelona solo el 5 % de las
viviendas estaba ocupado por sus
propietarios, en Madrid el 6 %, en Sevilla el 10 %, en Bilbao 12 %. La cr eación franquista de un
Ministerio de Vivie
nda a puntó, entre otras cosas, a promover la vivienda en propiedad como vacuna frente
a la inestabilidad social: con la retórica falangis
ta del momento se d ecía que para ha cer “gente de orden
había que facilitar el acceso de la población a la propiedad de la viviend
a y atarla a responsabilidades de
pagos importantes. Solamente un continuismo digno de mejor causa en lo que concierne a esta política
permitió cambi
ar l a cultura del alquiler en favor de la propiedad y otorgar a España el cord europeo en
este camp o.”
55
el espacio de control es automático. Su operatividad alcanza una eficiencia óptima cuando el
consumidor lo perpetúa inconscientemente, cua
ndo es visto como el curso natural de la modernización.”
46
povo de Nova Iorque. Tratava-se de uma ação de extrema ironia, que denunciava a
agressividade da privatização do solo que chegava a
ponto de comercializar espaços que
por sua extensão nunca poderiam ser realmente ocupados por pessoas.
De acordo com a teoria marxista
, o capitalismo busca tornar objetos obsoletos
visando manter a escassez dos bens. A escassez unida à máquina publicitária aumenta a
produção e mantém
a taxa de lucros frente à sua tendência constante de queda. As
modas e as tendências visam m anter sistematicamente esse ciclo
de consumo de bens e
serviços. O modelo mais conhecido e utilizado em marketing é o da Matriz BCG, criada
pelo Boston Consulting Group, pioneiro na análise estr
agica da carteira de produtos.
Para usar este modelo se traça uma matriz entre a participação dos produtos no mercado
e o crescimento dest
e mercado. Formam-se então os quatro quadrantes onde os produtos
podem estar e que são denominados de Oportunidade, Estrela, Vaca leiteira e A
nimal de
estimação:
Oportunid ade: produtos com alta taxa de crescimento e baixa participação no mercado.
A maioria dos necios inicia-se como oportunidades. O ponto de interroga
ção reflete
que a empresa precisa refletir muito antes d e colocar dinheiro num negócio que pode dar
certo ou errado.
Estrela: são as oportu
nidades que dera m lucro. Um produto ou serviço estrela é líder em
um mercado de alto crescimento. Não necessariamente são geradoras de flu
xo de caixa
positivo, pois demandam recursos num mercado e m crescimento e precisam defender-se
da concorrência.
Vaca leiteira
: são os geradores de caixa que se formam usualmente quando a taxa de
crescimento cai abaixo dos 10%. Não precisando mais financiar su a exp
ansão, como no
quadrante estrela e sendo líd er de mercado, usualmente as vacas leiteiras são utilizadas
para pagar as contas da empres
a e manter seus outros negócios.
Animal de estimação: são negócios de baixa participa ção em mercados de baixo
crescimento. Ger am pouco luc
ro ou dão prejzo e consomem mais tempo d a
administração do que valem. Tendem a ser descartados.
47
Com o passar do tempo todo produto/servo tende a mudar de posição na matriz,
refletindo as mudaas em sua participação e crescimento do m
ercado. Começam como
oportunidades, depois como estrelas, depois como vacas leiteiras e então como animais
de estimação. Estes est ados se traduzem e
m estágios conhecidos como introdução,
crescimento, maturidade e declínio. O conceito de ciclo de vida pode ainda ser usado
para analisar toda uma cat
egoria de produtos, uma forma de produto ou mesmo uma
marca. Essa idéia se vê claramente refletida na cidade com a construção de novas
centralida
des, na promoção de bairros como se fossem marcas.
Introdução: é o período de crescimento lento das vendas, onde grandes despesas
de laamento são necessárias.
Crescimento: neste estágiouma rápida aceitação d e mercado, e melhoria
significativa no lucro. O mercado apresenta uma abertura à expa
nsão que deve
ser explorad a.
Maturidade: é o momento de redução no crescimento das vendas, porque o
produto foi a ceito pela maioria dos consumidores potenciais. Este público
de
ve ser mantido fiel. O lucro estabiliza-se a entrar em de clínio graças ao
aumento das despesas de marketing em defendê-lo da concorrê
ncia.
Declínio: período de forte queda nas vendas e no lucro. É o momento de
desacel eração, eliminação ou revitalização, com a introdução de um novo
produto/
serviço e seu próprio ciclo de vida.
48
14%
3%
Maioria
tardia
Maioria
inicial
Adotantes
iniciais
Nas estragias de marketing há também o ciclo de adoção de produtos, e a partir
daí os próprios consumidores são classificados:
Nessa proposta, os chamadosretardatáriossão aqueles que relutam a adotar a
tendência, normalmente identificados como consumidores mais ve
lhos e que d esconfiam
das novidades. Os inovadores e os adotantes iniciais são os que constantemente buscam
novidades no mercado, sendo em
sua maioria jovens e dispostos a pagar mais pelo que
crêem que lhes trará diferenciação e status.
Existe então no mercado (que inc
lui não somente a publicidade mas ta mbém os
meios de comunicação que buscam detectar o que é in e outo que está incldo ou
excl
do) o processo contínuo de classificar algo como novidade ou passível de ser
descartado.
Assim como os objetos, os bairros da cidade vão a
dquirindo valor es de marca.
Desta forma, dizer em São Paulo que alguém é morador do bairro do Morumbi ou dos
Jardins, da mesma forma que dizer que outro
é morador de Itaquera ou Cidade Ademar,
por si só, já permite que se crie uma idéia da classe s ocial à qual este indivíduo pertence.
São image
ns que refletem a cristalização de valores investidos nos espaços. Criam um
mapeamento da cidade que pouco ou nada tem a ver com as di
visões distritais
estabelecidas pelos órgãos públicos. Assim, temos por exemplo, a região do Jardim
Paulista d ando nomes a empreendimentos imobiliários q
ue estão localizados
oficialmente em Pinheiros ou n a Bela Vista.
Além da iniciativa privada, com suas intensas ações de marketing, temos
a mídia
como agente que assume um papel importante nesta cristalização de valores. Flavio
Villaça constatou que 70% das notícias da imprensa p a
ulistana se concentravam no
quadrante sudoeste da cidade. Quando se fazia referência a uma zona fora dessa área se
diziaavenida da z
ona leste”, “acidente na zona norte”, ou seja, a parcela que concentra
a maior parte dos bairros ricos de São Paulo é tomada pelo todo da cidade
. Isso se
16%
34% 34%
retardatários
inovadores
49
confirma com os incidentes com o PCC (Primeiro Comando da Capital) durante o ano
de 2006. Somente a partir do momento em que bairros de classe média alta foram al
vo
de ações explícitas de violência serevelada n a voz dos formadores de opinião a
indignação com uma situação quemuito domina outras áreas da
cidade. Por outro
lado, são publicadas reportagens específicas como a “Superbairro”, trazida pela Veja
São Paulo em 19 de fevereiro de 2003, que
mostravatodas as vantagens de se morar em
Moema”. Entre 1999 e 2000 a Rede Globo de Televisão produziu e emitiu uma
telenovela intitulada “Vila
Madalena”, que explorava a idéia do bairro paulistano como
um reduto de hippies eesotéricos”.
Essa idéia é ampliada hoje em dia pelas intensas
campanhas publicitárias que
determinam onde é interessante morar. O reconhecimento de um bairro como uma marca
pode ocorrer por meio de sua compo
sição comercial (as lojas da rua Oscar Freire, os
bares, restaurantes e danceterias da Vila Olímpia), que acompanha ou faz acompanhar
os
empreendimentos residenciais. Como dissemos anteriormente, os conteúdos veiculados
pelas mídias de massa também ajudam a criar uma ima
gem de um bairro, assim como as
construtoras, que fazem amplo uso da ferramenta publicitária para a divulgação de seus
laamentos.
Apresentam
-se aqui alguns materiais de divulgação destes empreendimentos, que
permite m compreender como eles são constrdos em termos de marca, mesmo ant
es de
saírem da planta. São anún cios em mídia impressa, principal meio de divulgação destes
produtos (seja material encartado ou impresso e
m jornais, seja distribdo nos faróis ou
por meio de guias distribdos em pontos comerciais).
Fig. 1 Fig. 2
50
Fig. 3 Fig. 4
Os nomes dos edifíciossintetizam a idéia geral de valor que se procura
associar a eles. No exemplo 1 temos o Jardins de Monet, u m edif
ício de 4 dormitórios
no City Lapa, no exemplo 2, Réserve du Parc, um edifício de 4 suítes em Perdizes e no
exemplo 3, Le Jardin a Giverny, 4 dormitórios no bairro do B
rooklin; todos bairros
reconhecidos como sendo de alto padrão. A utilização de palavras que têm ligação com a
natureza ou área verde (Jardins, Parc) é bast
ante usual na publicidade de
empreendimentos imobiliários em São Paulo, cidade que por sua vez tem uma imagem
associada a poluição, trânsito e conc
reto.
Em praticamente todos os mais de 100 anúncios levantados desde o início de
janeiro de 2003 para o estudo do corpus, os imóveis
são retratados por meio de
ilustrações criadas por computador onde aparecem sem nenhum outro edifício próximo.
Estabelece-se um mundo
possível extremamente paradoxal: em um caderno de imóveis
(Guia Qualimóvel), publicado mensalmente, há 120 ofertas de imóveis, muitos no
mes
mo bairro, mas nenhum deles está próximo de outros nas ilustrações. Os anúncios de
imóveis oferecem quase todos, independentemente do proje
to e da localização, as
mesmas vantagens: boa localização, área verde, lazer total, seguraa e bom espaço
interno. Não é preciso uma aná
lise aprofundada para perceber as incongruências nas
promessas aí estabelecidas. E quando o desejo deexclusividade” (outro adjetiv
o
bastante comum em anúncios de imóveis) é comum a uma grande parcela de
consumidores? Sempre um lugar que lhe permitirá ser incldo e
m um grupo
exclusivo”. Como pontua Semprini (2003), os mundos possíveis criados pelas marcas
permite m a conceão de uma elite simbolica mente aberta,
em oposição a uma elite
econômica, que é fechada. É evidente que estes empreendimentos imobiliários oferecem
produtos distintos com preços que variam bastant
e. No entanto, a publicidade de imóveis
não permite compreender esta segmentação, declarando o sonho possível a todos os que
podem pa gar, seja
de R$50.000 a R$500.000.
51
Podemos observar a crescente importância dos nomes dos novos edifícios,
contrastando com os nomes de edifícios constrdos na cada de 70, por
exemplo, que
em muitos casos possuíam apenas um nome próprio feminino (Diana, Márcia, Stella) ou
nomes de ruas. Os nomes dos edifícios atu ais possuem
logotipo, isto é, são mais do que
uma mera identificação, passam a sintetizar os valores em jogo. Assim, o uso de nomes
de edifícios em lí
ngua estrangeira (estragia publicitária tradicional para dar mais
pesoe importância a um estabelecimento comercial) tornou-se quase
uma regra nos
novos empreendimentos; os edifícios residenciais tradicionais, principalmente os de alto
padrão (mais de 100m
2
e de no mínimo 3 dormitórios) fazem uso da língua francesa; os
menores, utilizam nomes em língua italiana (exemplo 4, edifício Allegro no bairro da
Saúde), que acompanha os projetos em estilo neoclássico muito populares entre os novos
prédios. Os flats e studios em sua maioria têm nome
em língua inglesa, buscando a
referência com os EUA, principalmente a cidade de Nova Iorque, onde os modelos (flat,
loft e studio) tornara
m-se conhecidos em bairros como o Soho, anteriormente ocupado
por artistas que aí tinham a oportunidade de alugarem um amplo espaço a preço baix
o e
que posteriormente foi renovado e revalorizado.
A estética clean (termo por si só revelador), utilizada com freqüência em lojas de
luxo e
na decoração de ambientes internos de edifícios e casas, serve para dar idéia de
status a objetos que fazem parte da produção e con
sumo de massa, como os próprios
imóveis à venda. Cria-se a noção de algo meticulosamente selecionado e exclusivo. A
contenção e a higiene são ele
mentos amplamente utilizados na publicidade (incluindo
nesse conceito a construção de pontos de venda), principalmente de bens de luxo.
Ao padroniza
r-se o tipo de oferta e valores oferecidos, estes projetos
arquitetônicos vão padronizando também a aparência dos bairros. Esta tendência
,
primeiramente observada nos edifícios comerciais, que tem nos prédios da avenida Lu iz
Carlos Berrini e Nações Unidas um bom exemplo atual, vem
sendo seguida pelos
imóveis residenciais. Bairros quem passando por um processo de adensamento
populacional recente (típicos de espaços que
se tornam prioritariamente verticais), como
Moema ou Vila Nova Conceição, já apresentam quadras inteiras com prédios de
características arquitetônicas ba
stante similares.
52
Fig.5
Fig. 5A
O anúncio do empreendimento Hype Jardins, entre a alameda Itú e a Campinas,
no Jardim Paulista (imagem número 5), abre na p arte superior com a fr
ase “Coloque seu
estilo no centro d as ateões”. Ao lado, um a foto que personifica o consumidor, ap enas
um close dos olhos cobertos com óculos de sol da cor
pink, cor que retoma a cor do logo
do Hype Jardins. A pessoa passa a ser vista a partir do Hype Jardins, ou como é deixado
claro na frase ao l
ado, por causa do Hype Jardins. A foto esclarece algo a mais: Hype
Jardins não evidencia, mas confere estilo a quem o possui. As “fotos da região”,
localizadas im
ediatamente abaixo, mostram imagens de r estaurantes, vitrinas de lojas e
fachadas de prédios de luxo encontrados na área dos Jardins. O
texto abaixo esclarece:
um grande quadrado maravilhoso, ladeado pela Faria Lima, Rebouças, Paulista e
Brigadeiro Luís Antonio. É um lu
gar que agrupa os mais famosos restaurantes, bares e a
alta moda, como a loja da Forum, projetada por Isay Weinfeld, e a Diesel. É um ped
aço
do planeta que sempre foi e será Hype.”
53
Os bairros-marca concorrem entre si, assim como produtos em umandola.
Desta forma, a última frase busca dar destaque à localização, se comparada à de
seus
concorrentes (principalmente os novos bairros da moda, como Vila Nova Conceição e
Moema):Hype está em uma região que sempre foi e sempre será hyp
e”, não está sujeito
aos ciclos da moda. Em outro panfleto, temos a definição do que é Hype :pode ser da
hora ou algo que está no auge” (para
quem prefere u ma explicação menos arriscada,
mais hype).
Atributos opostos são unidos em uma só opção, em um só produto, assim o
consumidor é
dispensado de fazer uma escolha entre vantagens que prefere (morar
próximo a uma área verde ou próximo detudo”? – Fique com os dois!). Desta form
a,
os imóveis, como produtos, vão traduzindo valores de grupos sociais e de consumidores
e construindo seu sistema onde se mesclam a idéia de um empree
ndedor com os desejos
dos consumidores.
A partir deste ponto de vista, o ciclo de vida de produto é fator que gera lucro e
sua aceleração é o que permit
e a continuidade de novos laamentos em quantidade e
ritmo intensos. Este processo não se limita a bairros, mas inclui cidades inteiras como
marcas
a serem vendidas para atrair investimentos. Arantes (2001:201) aponta que no
Brasil o discurso entusiasta sobre a glo balização faz referência ao
limiar de um
verdadeiro renascimento urbano, com o surgimento das ‘cidades que dão certo’. “E o
certo porque estão se transformando em verdadeiros atores
políticos, graças sobretudo à
generalizada e estimulante concorrência ent re tu do e todos (...). Aí o novomilagre
brasileiro: reestruturação prod
utiva com urbanidade.” Esse anseio pelamodernidade e
progresso é um dos meios encontrados pelas ações de especulação imobiliária e
projetos
de alteração agressiva do espaço pelo poder público para encontrar o apoio da
população.
A própria competição entre metrópoles que menciona Arantes
tem nos
megaedifícios um elemento simlico central; embora essa tendência tenha dimindo
após o atentado de 11 de setembro, o mov
imento já foi retomado com grande força
principalmente em Hong Kong, Singapura e algumas cidades da Arábia Saudita, os
novos centros do poder econômico a
tual. A arquitetura de impacto torna-se então a
logotipia da cidade-marca. O transporte também é um agente importante na constituição
da cidade me
rcadológica. Cândido Malta Campos Filho men ciona quea finalidade do
sistema viário não é o transporte, ou seja, a lógica não é o viário mas, acima
de tudo, o
imobiliário. São cons trd as avenidas imobiliárias e não eixos viários.” (apud Maricato,
2001:160)
O processo ao mesmo tempo intenso e artificia
l de se construir estruturas
espaciais de modo alheio às relações sociais que ocorrem neste espaço acaba gerando
tanto o entrincheira
mento do indivíduo em um ambiente protegido, quanto o isolamento
dos grupos economicamente menos favorecidos em guetos ou zonas excldas da
cidade.
Borja e Castells (1997:185) analisam que o processo de especulação imobiliária é de
constante exclusão, muito diferente da idéia linear d
e progresso divulgada pelo poder
público e privado para justificar suas ações: “vende-se uma parte da cidade, enquanto o
resto é ab
andonado e escondido.” Uma situação onde por um lado anúncios imobiliários
54
comercializam uma cada vez menos possível privacidade e seguraa da propriedade
privada, que se traduz em isolamento e exclusão. Condomínio
s fechados e monitorados
por sistemas de vigilânciam tornando o uso do solo e a fragmentação das interações
cada vez mais semelhantes a
o modelo norte-americano. Não se trata somente de uma
preocupação geral da “classe dominante” que quer se ver livre dos pobres, mas de um
forma
to de urbanização altamente lucrativo, que permite a criação de bairros de luxo em
áreas menos valorizadas da cidade (que sãorecuper
adasexpulsando-se os mais pobres
para zonas cada vez mais distantes), muitas vezes propostos por empreiteiras que atuam
emrios países e
vendem um mesmo formato em distintos locais.
Kwinter e Fabricus (in: KOOLHAAS, 2001:574) mencionam entre suas análises
do avanço da iniciativa privada em solo a
mericano, o uso das picapes (ou outros
automóveis 4x4) nas ruas da cidade, tendência observada na cidade de São Paulo
56
. Para
os autores, este tipo de automóvel, adaptado dos vculos de infantaria da Segunda
Guerra, e que nos EUA constituem mais de 60% das vendas
de automóveis, é a extensão
dos condomínios fechados, o vculo que por um lado promete seguraa e por outro
transforma seus motoristas em patrul
heiros de uma cidade hostil, o que na opinião dos
autores é um sinal de desdém e hostilidade por parte dos motoristas em relação à cidade.
Johnsons
(2003:27-30) cita a descrição de Manchester feita por Engels onde os
bairros populares estariam separados da parte da cidade reservada à classe média. Na
s
grandes metrópoles atuais o que ocorre não é necessaria mente que as zonas mais pobres
estejam fisicamente distantes das partes ma
is nobres da cidade, mas s im que são criadas
estragias de visibilidade tanto coletivas (vias expressas, comunicação publicitária)
quanto indiv
iduais (estar fechado no ambiente do automóvel, estar acostumado anão
veros moradores de rua, as favelas nos interstícios) que as
tornam inviveis. Mas a
Engels não passava desapercebido que a cidade funciona como uma máquina de ampliar
padrões. Para elenãoa nec
essidade de um bao Haussmann nesse mundo, apenas
alguns poucos padrões rep etitivos de movimentos, ampliados em formas maiores que
duram por v
idas inteiras: aglomerações, favelas, bairros.”
Em Houston, onde segundo o estudo publicado no livro Mutaciones
57
o livre
comércio exerceu ações das mais agressivas, é mais fácil construir um novo edifício que
recuperar um antigo, e issoaca
ba sendo assimilado pela população, que na festa de
Halloween queima, juntamente com os tradicionais bonecos de pano, casas desocupadas.
O que se
analisa sobre cidades nos EUA e Inglaterra pode ser observado cada vez mais
em ou tros países, sejam economicamente de Primeiro ou de Te
rceiro Mundo: um
crescimento descontrolado da ocupação do solo criando uma ocupação extensiva,
condomínios de luxo com preços que sobem a cada
dia; cons trução de condomínios de
segunda morada por multinacionais como Polaris, de forte atuação nos países
europeus - que o respeitam regulamentações d
e uso de solo e água ou se aproveitam
56
Vendas de 4x4 cr escem 21% em relação a 2005; dez trilheiros dão dicas de como cair na lama.
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/especial/fj2308200601.htm.
57
KOOLHAAS, Rem; BOERI, Stefano; KWINTER, Sanford; FABRICIUS, Daniel a; OBRIST, Hans
Ulrich; TAZI, Nadia. Mutaciones. Tradução de Victor Tez, Lluís Rey, Ivan Alcázar, Alex Martínez,
Anna Campeny, G
lória Bohigas, Isabel Nuñez e Jordi Palou. Barcelona: Actar, 2001.
55
de lugares onde as leis sobre o uso sustentável do espaço sejam mais brandas ou quase
inexistentes. As regras de comerciali
zação das habitações constrdas seguem as leis do
mercado livre, e são inflacionadas artificialmente a partir da manipulação das r
egras de
oferta e demanda. Segundo Delgado (2007:19), se planifica o urbano mas não a cidade,
que é vendida ao comércio espacial, que estimula a
propriedade (e a necessidade de se
possuir uma moradia) mas restringe a sua apropriação. Segundo o autor, a renúncia da
administração pública em pl
anejar a cidade, deixando praticamente livre a apropriação
pela especulação imobiliária para sua posterior transformação em produto, só pode ser
realizada ao se desenvolverem modos de vigilância dos esp aços para evitar problemas
no desenvolvimento dos mecanismos de marke
ting urbano.
Como exemplo podemos citar um estudo realizado para u m concurso de
intervenção em um bairro degradado de Murci a (La Paz), na
região do Levante
58
, onde
foi detectado que a proposta inicial apoiada pela prefeitura visava o aumento em 300%
da ocupação do solo, com a construção de edifíc
ios de luxo. Isto obrigatoriamente
expulsaria a praticamente todos os atuais habitantes do bairro que seriam incapazes de
pagar o a
luguel ou pr eço dos apartamentos no novo bairrosu pervalorizado”. Ess a
proposta tinha apoio de grande parte da população da cidade que associava
a zona a um
foco de criminalid ade por ser uma área ocupada por muitos ciganos e imigrantes (que
foram alocados aí na cada de 70 em
uma outra ação de expulsar do centro os grupos
menos favorecidos). Este dado, no entanto, não tinha respaldo nos dados oficiais sobre
c
riminalidade na cidade. Essas propostas de renovaçã o d e bairros desfavorecidos estão
presentes em quase todos os países (há inclusive o termo que vem do ing
lês,
gentrification, que significa a substituição d e moradores de baixa renda em uma região
para dar lugar a outros de n ível
socioeconômico mais alto, com a conseente
valorização do solo). Ma ricato diferenciarenovação”, a ação de arrasar para construir
novos edif
ícios e equipamentos comerciais e de ócio, dareabilitação”, que preserva ao
máximo e tenta r ecuperar as estruturas existentes. Essa pr
eocupação não tem a ver com
idéias preservacionistas que enrijecem as estruturas urbanas, criando maquetes em escala
real próprias ao c
onsumo turístico. Na verdade, comomencionava Scott-Brown,
mesmo nos lugares mais degradados, há um sistema de relações que deve ser
compree
ndido e em grande parte mantido. São as relações de vizinhaa, o pequeno
comércio, a dinâmica das ruas, que muitas vezes desaparecem do di
scurso padrão do
poder privado e da mídia que identifica os bairros mais pobres à decadência, à
ilegalidade, violência e tráfico de drogas
.
Na Espanha o processo de especulação imobiliária afeta diretamente as classes
economicamente desfavorecidas, os imigrantes, ciganos e ca
da vez mais os jovens
espanis. Há a presea de muitas casas vazias (12% em Madri segundo a estimativa
do grupo Vivienda Digna), fenômeno que
também é similar ao que observa Kwinter e
Fabricus em cidades norte-a mericanas. As hipotecas de 30 a 50 anos tomam atualmente
em torno de 42,5% do sa
lário de uma família, segundo dados da Asociación de Usuarios
de Bancos, Cajas de Ahorros y Seguros (ADICAE) e 60,8% entre pessoas com menos de
58
Ver anexo o projeto completo realizado pelo Estudio de arquitetos FAM e Raquel Rennó, ganhador de
uma menção honrosa no concu r so proposto pelo Colégio
de Arquitetos de Murcia como alte rnativa à
proposta de renovação apresentada pela empreiteira Lopez Rejas.
56
35 anos, segundo o Consejo de la Juventud.
59.
Entre propostas como Barcelona 92, a
reconstrução de Madri pela atual prefeitura e as constantes acusações de corrupção e
abuso de poder públic
o na área imobiliária, o quelevou um prefeito à prisão
60
, há a
proposta do atual governo federal de propor a habitação de 35m
2
para jovens com
financiamento custeado pelo estado, o que é rejeitado pelo grupo que luta pela Vivienda
Digna por considerar que
investirão anos de trabalho em um apartamento que não
servirá para uma futura família. Ao mesmo tempo se soma a isso a presea cada vez
m
aior de imigrantes latino-americanos, que vão alterando a paisagem e a economia da
cidade
61
. Após cadas de deficit na contribuão ao serviço social, há pela primeira vez
um aumento na contribuição devido aos imi grantes, principalmente os
equatorianos, que
foram responsáveis por 15% dos nascimentos na Espanha em 2006, gerando o maior
nível na taxa geral de natalidade desde 1993
62
. Esse grupo, a despeito das discussões
sobre leis de imigração, torna-se u m público-alvo para imobiliárias, que se especializam
em vender
propriedades para a cada vez maior comunidade latino-americana na
Espanha
63
. Do mesmo modo é possível realizar uma hipoteca para comprar propriedades
no Equador e Colômbia, em uma rede de comércio global que atende a um
grupo local.
O exemplo de Madri é ilustrativo de um cenário que ocorre nas grandes cidades
atuais. Como analisa Castells (1980:23), a contradição presente
na crise urbana reside
em que os serviços coletivos requeridos pelo modo de vida do desenvolvimento
capitalista da cidade o são suficientem
ente rentáveis para serem produzidos pelo
capital. Desta forma, os equipamentos coletivos e o sistema de urbanização são
determinados
pelo Es tado, que ao invés de regular ou equilibrar as contradições geradas
politiza e globaliza os materiais de organização da vida u
rbana. Neste sentido as
mobilizações d e vizinhos ou de outros grupos com interesses comuns como ocorreu nos
anos 70 e 80 em Madri e Barcelona são fu ndam
entais para buscar alterações e
compen s ações na máquina de mercado que estrutura a cidade.
59
A corrida pela hipotecaé algo que faz parte do dia-a-dia; como exemplo podemos citar que nos meses
de agosto e setembro os cereais Kellos na Es
panha ofereceram o sorteio de “hipoteca grátisna compra
de cereais Corn Flakes.
60
O prefeito de Marbella foi o primeiro na Esp anha a ser preso por diversos crimes relacionados à
utilização de solo público e todos seus secretários
puseram seus cargos à disposição em 2006. A principal
acusação foi de ceder zonas públicas a empreiteiras, o que deixou a cidade com me gahotéis e lojas
de
luxo, mas sem espaço suficiente em solo urbano para hospitais e escolas públicas.
61
Aume nto da arrecadação de impostos e aumento da população em povoados muito pequenos. No
momento a Espanha discute uma lei que possibilit
aria ao estrangeiro de fora da UE vot a r .
62
El Universo, 16/07/2006. “Natalidad sube em España por Ecu atorianos”.
http://www.eluniverso.com/2006/06/17/0001/626/1F7A4025FDB949C6AACD4B89686D1FB0.aspx.
La Vanguardia Digital, 25/07/2007. “El boom demográfico supera todo
s los índices em Catalunya”.
http://www.lavanguardi a.es/lv24h/20070429/imp_51337877176.html.
63
De acordo com o Instituto Nacional de Estatística (censo de 2001), Madri possui quase 6 miles de
habitantes em sua área metropolitana, aind a não tem a prese
a massiva de imigrantes como Londres
(40%) ou Paris (36%), contando com 11% de imigrantes não europeus entre seus cidadãos, mas possui
22,5% dos latino-americanos pres entes na Espa
nha e um contínuo au mento de imigrantes de dentro e fora
da UE a cada ano. Esta cifra só é equiparável a todo o território da Catalun
ha, com mais 22,4% dos
imigrantes legais. De todos os imigrantes presentes na cid ade, 75,6% prom de países americanos, sendo
que deste total 34,14% são equatorianos
(169.256). O segundo grupo latino-americano mais presente é o
de colombianos, que sozinhos (77.071) superam o total de marroquinos na cidade (76.474).
57
Uma das organizações coletivas mais recentes geradas de modo espontâneo a
partir da crise da habitação na Espanha e que foi organizad
a por meio de blogues e SMS
(mensagens envi adas a celulares) foi pela Vivienda Digna, que se constitui em sua
maioria de jovens d e
a 35 anos que, pelo aumento da especulação imobiliária na
Espanha, são incapazes de pagar aluguel, de morar sozinhos ou de vive
r sem
comprometer ao menos 60% de seu salário no pagamento do aluguel. A primeira
manifestação que se viu pela cidade ocorreu a partir da subversão
da campanha de
laamento do filme V de Vendetta, que tinha como logotipo a letra V, ao utilizar esse
logo para o movimento, espalhando a letra por
toda a cidade (como ocorreu no filme e
em sua divulgação p ublicitária), mas com usos específicos às preocupações locais de
Madri e Barce
lona.
Imagens de 2006
58
Castro e Barreto da Silva (2001:156) mostram como se d eu a passagem de um
estado prot etor, que proporcionava a possibilidade do acesso à moradia ao momento
a
tual, do avanço do mercado na área imobiliária, explicando que nos países centrais,
especialmente nas primeiras cadas do século XX, uma forte r
elação regulou salário e
preço da moradia. A reforma urbana submeteu a terra à sua função so cial e articulou-a
ao sistema financeiro.
Investimentos significativos foram feitos na expansão da infra-
estrutura urbana criando uma situação de equalização de oportunidades fre
nte a alguns
indicadores de qualidade de vida urbana (transporte, saneamento, equipamentos sociais
de saúde e educação, etc.). Mais r
ecentemente, a reestruturação produtiva acarretou a
diminuão dos subdios fortalecendo o papel do mercado.
Estas ações têm impacto direto
na organização das cidades. Sze Tsung Leong
(2001:195) menciona que:exacerbando as instabilidades para seu benefício próprio, em
ciclos de declive
e obsolesncia acelerados artificialmente e alter ando constantemente
seus focos de um lugar a outro, o espaço de controle inevitave
lmente produz interstícios,
contradições, quá inclusos momentos de liberdade que se situam não tanto fora mas ao
largo e no interior do espaço de c
ontrole.”
64
A chamada “bolha imobiliária” vai
aumentando o número de cidadãos pobres demais para possuírem dívidas de hipoteca,
criando um grupo de excl
dos do sistema mercantil que não se limita aos cha mados
países de Economia de Terceiro Mundo, e que se espalha e desenvolve em habitações
irregul
ares ou em grandes favelas com um número de habitantes maior que muitas
cidades, ainda que alguns critérios quantitativos sirvam m ais para
mascarar do que para
evidenciar a questão. O que menciona um estudo da Harvard Project on the C ity
(KOOLHAAS, 2001: 718) é que, a despeito da noção mais c
orriqueira de que as cidades
de países em desenvolvimento com suas disparidades econômicas, presea massiva do
comércio informal, tráfico intenso e
aparente falta de planejamento urbano estariam em
uma fasede evoluçãoanterior às metrópoles do chamado Primeiro Mundo, na verdade
poderiam
oferecer uma visão do futuro de algumas cidades na Europa e nos EUA.
Bairros como Villaverde, no norte de Madri, foram alvo de um movimento
de
construção de moradias populares de baixa qualidade no início da cada de 50. Outras
construções de uso temporário, que tinham como objetivo
irem substituindo as favelas,
foram se tornando definitivas. Atualmente o bairro segue o ritmo de aumento das
construções privadas vendidas a um
alto preço e que se encontram por praticamente toda
a cidade, fazendo uso d e uma arquitetura reiterativa que confere um aspecto homoneo
a toda re gião (e outros bairros). Estas construções são vendi das aos imigrantes e estratos
da sociedade economicamente menos favorecidos, ao c
usto de um endividamento para
toda vida.
64
“Exacerbando las inestabilid ades para su propio beneficio, en ciclos de declive y obsolescencia
acelerados artificialmente y ca mbiando cons
tantemente sus focos de un lugar al otro, el espacio del control
inevitablemente produ ce intersticios, contradicciones, qui incluso momentos de lib
ertad que se sitúan no
tanto fuera sino a lo largo y en el interior d el espacio del control.”
59
A paisagem que seem Villaverde exemplifica o que Castells (1980:55)
descreve sobre a rego periférica de Madri: uma ocupação extensi
va em áreas virgens
visando su a valorização e maior lucro possível, a construção de blocos densos se m
espaço entre eles, com o mínimo d e ser
viços disponível, que terminam em um meio de
um campo devastado, como se tivessem sobrevivido a uma guerra. Se a partir da pressão
popular se com
eça a melhorar a infra-estrutura destes bairros, sua conseente
valorização faz com que camadas de moradores de maior nível socioeconômico
comecem a ser atraídas ao local, gerando um aumento na densidade e criando as tensões
quese podem observar em bairros ntricos como L
avapiés.
Foto - Visão do bairro de Villaverde com várias gruas em áreas de construção
2006.
Foto - Edicio na região - 2006
60
Foto - Vista geral do bairro a partir de sua entrada com edicios recém-
construídos 2006
Se por um lado os bairros periféricos sofrem com a falta d e serviços que está
concentrada no centro da
cidade, a infra-estrutura dos bairrosntricos se torna moeda
de troca. Seus moradores sofrem com a densificação populaciona l, o aumento
desenfr
eado dos preços dos imóveis e as propostas de gentrificação que vão sendo
colocadas em prática com o apoio de parte dos proprietários dos imóv
eis (individuais ou
grandes companhias imobiliárias) que deixam seus edifícios degradados para que
posteriormente possam serrenovados”, com a
ajuda do poder público, para obterem um
maior lucro
65
.
Uma pesquisa realizada por Philip Zimbardo mostra que quanto mais nítidos o s
sinais de degradação, com maior velocidade ela se dá. Esse dado
também foi confirmado
pela rede de trens p aulista, que percebeu que o descaso por parte dos usuários com o
cuidado com trens e estações
era devido ao fato de o espaço sugerir decadência pela falta
de manutenção e limpeza em muitos pontos. Essa tendência foi percebid
a de modo
inverso em pesquisas realizadas pela Cia. de m etrô de São Paulo, nas quai s se constatou
que a limpeza do local era ma
ntida pelos usuários que em muitos casos eram também
usuários de trem. Scott-Brown d enunciava as estragias como a do município de Nova
Ior
que que deixava zonas como a do sul do Bronx se degradarem a um nível tal que
pudesse intervir de modo agressivo implantando projetos que desse m
lucro. A mesma
estragia é denunciada por associações de vizinhos em muitas partes da Espanha, onde
a especulação imobiliária est
á entrando de modo cada vez mais ativo em projetos de
construção de condomínios ou instalação de habitações para turismo.
65
Muitos dos inquilinos estão protegidos pela Lei de Arrendamentos urbanos, que impede seu despejo e
congela os aluguéis. Demolir um edifício de
gradadodevido ao iminente risco de desabamentoé uma
estragia para driblar estas r estrições e poder usufruir de um grande aumento
de lucro com a esp eculação
imobiliária. Somente em 2007, 26 edifícios no bairro de Lavapiéstinham sua demolição declarada.
61
O bairro de Lavapiés está localizado no centro da cidade de Madri, próximo às
principais estações de trem e metrô do país e tem acesso direto à ma
ior parte das zonas
turísticas da cidade; por estas raes é alvo de planos de intervenção e especulação
imobiliária. O último deles transforma
rá quase todo o bairro em zona de uso exclusivo
para pedestres, o que, segundo comenta a associação de vizinhos local, é o primeiro
passo para
trazer o comércio de luxo ou de grandes redes que pouco a pouco expulsarão
o pequeno comércio local como modo de ir alterando o perfil
dos moradores do bairro.
O au mento no preço do aluguelé sentidoaproximadamente 5 anos; a zona vinha
recebendo anteriormente artistas e moradores de casa
s okupas, o que gerou muitas
atividades culturais na região e foi tornando a área (embora muitos a considerem
perigosa) ponto de arte alt
ernativa e centro boêmio da cidade. O comércio de produtos
africanos, árabes, chineses e indianos se alterna com bares e restaurantes (nesse caso
indianos e ára
bes principalmente) e transforma a zona em um ponto d e encontro para
jovens. No entanto, enquanto se recebe bem a presea de restaurantes
e mercados
eticos”, o imigrante em si, principalmente os de origem africana, sofre com o
preconceito e a pressão policial diária. O centro
da cidade de Madri, mesmo com o
aumento constante de preços dos imóveis, ainda é a região que concentra imigrantes de
rios países, enquanto os
latino-americanos, por sua predominância em termos
quantitativos, ocupam também de modo intenso outros bairros mais periféricos da
cidade.
66
Imigrantes no bairro de L avapiés, 2006.
66
A Praça de Lavapiés é o ponto cent ral do bairr o, um ponto de encontro dos moradores e um local onde
ocorrem diariamente blitz policiais que buscam imi g
rantes ilegais e possíveis traficantes de drogas,
segundo declaração d e policiais. A interferência policial na zona não foi possível de ser
re gistrada pois
não foi permitido tirar fotos das blitz (em um caso as fotos tiradas foram apagadas damera por um
policial que dizia ser
proibidopor causa das ações de terroristas em Madri”).
- Blog Malasaña, 6/6/2007 - F. JAVIER BARROSO. “Policía al asalto e n Lavapiés - Agentes
municipales desnudan en la call
e a un presunto camello e irrumpen con gritos xenófobos en un bar de
Centro”. http://2demayo.blogspot.com/.
62
A destruição de bulevares, a construção de vias expressas cortando a cidade (o
modelo da cidade para os automóveis) e a falta de serviços no
s bairros mais afastados
são cada vez mais comuns às grandes cidad es atuais, diminuindo festas e encontros
populares, e as relações de vizin
haa de modo geral. Como menciona Castells
(1980:137), as fest as, as conversas em praças e cafés são muito mais do que um
elemento de anima
ção urbana: constituem a defesa de um modo de vida mas também um
meio d e or ganização e mobilização, que além de ser pouco lucrativo, a
inda pode
representar uma ameaça aos projetos de especulação urbana. Tanto a praça de Lavapiés
quanto a de Tirso de Molina, próxima a e
la, foram alvo de uma reforma que as deixou
limpas, vazias, abertas ao controle e hostis ao encontro casual, seguindo as estragias
encontr
adas na cidade para evitar que pessoas dormissem nos bancos de metrô e de
parques (os “bancos anti-mendigo”, também presentes em São Paulo), b
ancos totalmente
distantes uns dos outros ou que obrigavam as p essoas a estarem de costas a outras,
deixando claro que aquele e
ra um objeto para um eventual descanso, jamais para ser
usado para passar tempo ou para encontros fortuitos.
.
Foto de edicio de imigrantes em Lavapiés 2006.
63
Foto reformas no bairro de Lavapiés 2006.
Foto - Praça de Lavapiés, recém-reformada 2006.
64
III. Espaço e resíduo
Agrupamento próximo à marginal Tietê. Foto de 2004.
65
3.1 Espaços residuais, espaços intersticiais, terrain vague
O espaço urbano encerra espaços vazios, mas não existem espaços neutros. O
conceito de espaço residual est
á presente tanto na arquitetura quanto nos estudos sobre
urbanismo. Robert Venturi opõe espaço residual a espaço dominante em
suas análises
sobre construções arquitetônicas. Nos casos analisados pelo autor o desenho
arquitetônico preum prog
rama que inclui estes dois espaços em tensão na criação de
um todo complexo. Dentro desta perspectiva claramente hierarquizada, os
espaços
residuais são controlados e seu uso previsto (embora passível de ser alterado). Já nas
cidades a própria noção de todo é s
ubjetiva. Os tempos distintos que operam
concomitan temente no espaço urbano, os diferentes tipos de planejamento e usos que
são ju
stapostos ou mesmo sobrepostos criam esp aços residuais não previstos. No
entanto, por sua característica d eespaço que sobra”, tornam-se inmodos
espaços
“vazios”, desvios da norma. Venturi aponta para um problema da visão dos arquitetos:
em vez de procedermos ao reconh
ecimento e à exploração dessas espécies
características de espaços, convertemo-los em estacionamentos ou gramados raquíticos -
uma
terra de ninguém entre a escala regional e a local. (2004:111)”
Ferrara (2000:179) descreve os espaços residuais relacionando-os em
uma
perspectiva entrópica e informacional em que o espaço residual é uma sobra física e ao
mesmo tempo corresponde a u
m pedaço desnecessário à cidade oficial. Segundo a autora
o paradoxo está em ser uma conseqüência incontornável; quanto mais
falta espaço,
maior é a quantidade de pedaços residuais, ou seja, “corresponde a um impasse entre
funcionalidade e vis
ibilidade urbana”. São esp aços que não se adaptam a usos funcionais
ao mesmo tempo em que não são adequados à concentração comercial
ou de serviços ou
outras formas de consumo espacial.
Ezra Park (in: Grafme yer e Joseph, 1979:200), analisando a cidade de Chicago,
m
enciona que as partes abandonadas da cidade t endem a se transformar em zonas de
ocupação ocasionais e transi
tórias, atraindo imigrantes recém-chegados e artistas que
buscam refúgio contraos fundamentalismos e o espírito rotariano
67
da cidade dita
oficial. O autor utiliza o termo terrain vague para descrever os acampamentos
temporários ao longo da via fé
rrea de trabalhadores ou desempregados à espera de uma
oportunidade, uma sociedade emera e com leis estritas que s e asse
melhariam aos
agrupamentos dos pioneiros desbravadores dos Estados Unidos. De modo d istinto mas
de certo modo complementar, Halbwachs (in: Graf
meyer e Joseph, 1979:297) analisa a
ocupação do espaço pelas gangues juvenis de Chicago que se reuniam para jogar,
brincar, re alizar
pequenas depredações e delitos. Ruas de comércio, parques, mas
também zonas abandonadas, docas, bordas de canais e de via
s férreas, além de bairros
mal freentadosem ger al, eram escolhidos pelas gangues pelo seu caráter pitoresco
ou oportuno. Estes
espaços considerados desorganizados, onde era possível a existência
67
O Rotary Club é uma instituição presente atu almente em todo o mundo. Nasceu em Chicago e m 1905 e
buscava reunir profissionais libe
rais e executivos p ara possibilitar intermbios profissionais em torno de
projetos de ajuda social. O caráter predominan
temente elitista e pró-capitalista do clube e o perfil WASP
(sigla que d esigna a elite americana formada pelo branco, a
nglo-saxão e protestante) de seus mem bros
fizer am com que fosse alvo de duras críticas por parte dos pesquisadores que forma
vam a Escola de
Chicago, com o Ezra Park.
66
de um modo de vida emero e pouco regulado, se localizava em interstícios da cidade
mais rigidamente estruturada, e
ram fissuras, lacunas do organismo social oficializado.
Não estavam, portanto, em uma relação de oposição entre cen tro e perif
eria, estavam
entre”, eram veios que percorriam a cidade, assim como os percursos dos trens na
cidade. As vias férreas, considera
das pelos autores de grande importância nas estruturas
sociais que se desenvolviam em Chicago, cortavam bairros, ruas, não
respeitavam os
limites e o percurso dos pedestres. Eram, como ilustr a Halbwachs, um m apa industrial
que se sobrepôs ao mapa
urbano. Este desenho se combinava com os vastos muros que
limitavam fábricas, asnovas fortalezasda cidade, cuja proximidade
era evitada pelos
grupos mais abastados e conseentemente apropriadas por grupos excluídos da cidade
por seu caráter interst
icial, gerando novos modos de vida.
O conceito de terrain vague oferecerias leituras: espaço vazio, obsoleto,
abandonado, deteriorado
, mas também indefinido, impreciso. Alguns autores o traduzem
para terreno vago, terreno baldío (castelhano), wasteland (inglê
s), enquanto outros como
Solà-Morales preferem o termo frans por sua amplitude d e significados que permite
reunir territórios e
edifícios. Ele chama a atenção para o significado de terrain, que se
refere a um território urbano ou de limites definidos
, um a proporção de terra
aproveitável. Vague por sua vez, além da relação com vanus do latim (ocioso, vazio),
tem também relação com o t
ermo germânico vagr-wogue, que se refere à onda das
águas, movimento, instabilidade (de o nde vem o termo wave em inglês). Também s
e
refere ao termo vagus do latim, que significa indeterminado, incerto, fazendo de terrain
vague um termo quase paradoxal. Quase po
rque sabemos que a cidade é o espaço onde o
definido e o indefinido coexistem, e não são poucos os exemplos que ilustram esta
relação. Em
resumo, o termo vague traz a iia de potencialidade e movimento,
expectativa. São em si mesmos lugares da contra-racion
alidade, fora das estruturas
produtivas, como define Brissac (“Terreno Vago”, 2002: sem numeração de página),
remanescentes das div
ersas operações de reconfiguração de suas regiões em escalas mais
amplas e complexas. Lugares de forças mais do que f
ormas, onde a estruturação
urbanística não consegue organizar, mesmo porque estes espaços são os r esíduos criados
direta ou indiretam
ente por esta mesma urbanização. Solà-Morales detalha a
potencialidade inerente destes sítios:
“Aparecem como co ntra-imagem da cidade, tanto no sentido de sua crítica
como no de um início de sua possíve l alternativa. (...) E
sta ausência de
limite, este sentimento quase oce ânico, para dizê-lo com a expressão de
Freud, co ntém expectativas de mobi
lidade, vagabundeio. (...) A presença do
poder convida a escapar de sua presença totalizadora, o conforto sedentário
chama a
o nomadismo desprotegido; a ordem do urbano chama a indefinição
do terrain vague. Se convertem deste modo em incios territoriais dos
prob
lemas estéticos e éticos que propõem, envolvem a pr oblemática da vida
social contemporânea.”
68
(1995:61)
68
“Aparecen como contraimagen de la ciudad, tanto en el sentido de su crítica como en el de un inicio de
su posible alterna
tiva. (...) Esta ausencia de límite, este sentimiento casi oceánico, para decirlo con la
expresión de Freud contiene expecta
tivas d e movilidad, vagabundeo. (...) La presencia del poder invita a
escapar de su presencia totalizadora, el confort s
edentario llama al nomadismo desprotegido; el orden
67
Dentro da definição do autor, terrain vague pode ser o espaço que sobra nas
margens dos rios, canteiros, áreas mais inacessíveis ou
de acesso restringido, áreas que
ladeiam avenidas, espaços sob pontes. Lugares que também não respeitam a ordenação
centro-perife
ria, que estão nos interstícios da cidade. Segundo Ferrara
(2000:178), a
degradação urbana é estrutural, faz parte do processo de metropolização. Segundo a
autora, é preciso entendê-lo de modo a
que a riqueza desta informação não se perca no
caos e seja traduzida como crise. A iia de caos ou crise, que no senso comum exp
ressa
insegurança, é, em termos informacionais, índice de grande abertura e riqueza do
pensamento e da ação. Caos ou cris
e podem ser considerados equivalentes às
transformações radicais, connuas e impreviveis que atingem o cotidiano, a
í incluídos
os fenômenos urbanos.
Lynch analisa o processo atual de abandono das cidades norte-americanas por
raes prin
cipalmente econômicas, mas também climáticas, processo que ocorre desde
1800. Para o autor, esse fenômeno não deveria ser visto
de modo negativo, porque ao
contrário da iia de fracasso, há a geração de um outro espaço, que pode s er vivenciado
e aproveit
ado de modos distintos. Os espaços abandonados concentram modos de vida
descartados e possibilidades de se recuperar e começar coisa
s novas. Para o autor, a
obsessão com a pureza e per manência nos obriga a eliminar os resíduos. Admirar os
dejetos, os espaços ab
andonados, no entanto , permite ver as continuidades em fluxo, as
trajetórias e o desenvolvimento, um ponto de apoio ent
re passado e futuro. Zardini fala
das possibilidades que encerram os espaços decadentes ou desordenados da cidade:
“O que a agora se considerou como elementos negativos na cidade
contemporâneaheterogeneidade, variedade excessiva, desord
em,
desarmonia, a coexistência incongruente de diferentes elementosagora
constituem um recurso, uma qu alidade com a qu
al se define uma nova
paisagem. Mas aceitar a heterogeneidade d a cidade contemporânea não é um
feito simplesmente
estético, mas t ambém político, social, étnico. Não se trata
de mascarar ou de exorcisar, mediante uma variedade ficcia, um
a realidade
concebida como cada vez mais uniforme, homonea e controlada, ou de
ocultar sob uma desordem aparente e uma
anarquia visual uma ordem
escondida sempre mais forte e persuasiva. Trata-se, pelo contrário, de
reconhecer, ac
eitar e dar voz às distintas individualidades presentes na
sociedade e na cidade contemporânea, fazendo que sua compreensão
constitua uma paisagem política, social, física, mais rica e articulada, bas eada
no contraste e não na excluo recíproca
, reconferindo assim uma nova
consistência à cidade do princípio do milênio.” (in: KOOLHAAS, 2001:436-
437)
69
urbano llama a la indefinición del terrain vague. Se convierten de este modo en indicios territoriales de los
problemas estétic
os y éticos que plant ean, envuelven, la problemática de la vida social contemporánea”.
69
“Lo que hasta ahora se han considerado elementos negativos en la ciudad contemporánea
heterogeneidad, excesiva variedad,
desorden, desarmonía, la coexistencia incongruente de diferentes
elem entosahora constituyen un recurso, una calid ad
con la que de finir un nuevo paisaje. Pero aceptar la
heterogeneidad de la ciudad contemporánea no es un hecho simpleme
nte estético, sino político, social,
étnico. No se trata de enmascarar o de exorcizar, mediante una va riedad ficticia, una
r ealidad concebida
como cada vez más uniforme, homogénea y cont rolada, o de ocultar bajo un desorden aparente y una
anarq
uía visual, un ordene scondidosiempre más fuerte y persuasivo. Se trat a e n cambio de reconocer,
aceptar y dar voz a l
as distintasindividualidadespresentes e n la so ciedad y en la ciudad contemporánea,
68
numerosos casos de grupos que questionam a estruturação em grande parte
autoritária das cidades. É sabido, por exemplo, que os situac
ionistas eram a mantes do
Mercado de Les Halles, em Paris, e organizaram muitas manifestações contra a sua
demolição que deu
lugar à atual estação de transportes Les Halles. Eles claramente
apoiavam na cidade os mercados públicos, as ruas tortuosas
, as pequenas lojas de bairro,
as ruínas de construção, as fissuras da cidade, elementos que para eles eram alternativas
ao
espetáculo criado prioritariamente pelas forças do capital. Segundo Schoonbrodt, os
mercados públicos, os pequenos comércios são adaptávei
s, nos dando mostra de uma
arquitetura de grande qualidade, mas quenão vemos nunca nas revistas de arquitetura.
É um t
ipo de construção que é chamada de banal, mas que torna a cidade habitável.”
(revista Poïesis, 2003: 235)
Bakhtin (1997:396) afirma que “O cotidiano do h
omem possui uma forma, e esta
forma é sempre ritualizada (pelo menosesteticamente’). É justamente nessa ritualização
que a im
agem artística pode apoiar-se. A memória e o consciente no ritual do cotidiano e
na imagem”. Assim como muitos autoresem nos t
errain vague grandes possibilidades
criativas, grupos artísticos como os dad aístas e situacionistas encontram nestes lugares
fora
da lógica oficial da cidade uma possibilida de de experimentá-la de outra forma
(Sadler,1998:15). Os situacionistas perceb
eram que se pode tomar ação sobre a cidade
depois que se retireo véu de refinamento que cai sobre elapor meio do planejamen
to
e do capital. Se se desvel a esta representação oficial da modernidade e do urbanismoo
espetáculopode-se descobrir a vida
autêntica que aí fervilha. Matta-Clark, por outro
lado, via nos edifícios abandonados, nos bairros decadentes e nos marginaliz
ados, partes
de resíduos da entropia física e social, os n on-u-ments, como chamava, a alternativa aos
monumentos que só criavam mur
os e exclusão:o anti-monumento, como uma
descrição de tudo o que saiu mal desde Eiffel (uma torre que se eleva a qualquer altura
leva o visitante a apartar-se).” (in: MOURRE, 2006:377).
Os situacionistas adaptaram o conceito de heteroglossia e carnavalização de
B
akhtin (2005, 1997, 1987) para as cidades. Acreditavam no poder transformador da
cultura cotidiana e viam beleza no que geralmente se consi
dera feio. Debord afirmava:
“beleza aqui não tem o sentido de beleza plástica, mas de apresentação móvel, de soma
de poss
ibilidades simultâneas” (apud Sadler, 1998:103). A cidade s ituacionista era da
ordem do movimento e da ação. Antes mesmo das apropria
ções das novas tecnologias,
s e podia notar a relação entre os estudos de mapas de Debord (mapas de cidades e
redes
de metrô), seus trabalhos com sons eletrônicos e néons e o trabalho de artistas
como Smithson e Pollock. E Debord complementa: O “graffi
ti é um sinal da energia
primitiva do cotidiano, mostra que o indivíduo nasceu para se comunicar e é importante
lutar con
tra as forças que tentam ordenar e cal ar essas vozes díspares da cidade” (apud
Sadler, 1998:97).
haciendo que su comprensión constituya un paisaje político, so cial, físico, más rico y articulado, basado en
el contraste y no en
la exclusión recíproca, reconfiriendo a una nueva consistencia a la ciudad de
principios de milenio.”
69
Para Smithson, por sua vez, os espaços industriais abandonados e o lixo
constituem uma paisagem entrópica, que resta do exce
sso de consumo e por isso mesmo
são possuidores de grande valor estético. Para ele o artista tem de fazer uso d este
material não p
ara torná-los irreconhecíveis, mas para tornar vivel sua beleza. A
entropia in telectual, como ele denominava, fra gmentava o p
ensamento e rompia com
qualquer iia unitária de visão de mundo e conseentemente, de objeto. Nesse aspecto
estava interessado
pela iia da Biblioteca de Babel de Borges, que con tinha tudo o que
já havia sido escrito e que na verdade (como apresenta Bor
ges em seu conto) é o próprio
universo. E comple menta quea linguagem torna-se um museu infinito cujo centro está
em qualquer lugar
e cujos limites estão em lugar nenhum”(apud FLAM, 1996:XV)
70
.
Em resumo, para estes artistas, os terrain vague e edifícios abandonados eram um
micro-universo onde era possível perceber
de modo concreto a totalidade e ao mesmo
tempo, a impossibilidade de uma unidade sistêmica.
Lynch aborda especificamente os
terrain vague e os depósitos de lixo como
lugares potenciais de ausência de controle, de estímulo da criatividade, não por
coin
cidência preferido por jovens e crianças que descobrem elementos perdidos e geram
novos usos para eles. Tanto o espaço quan
to os objetos ali presentes não têm mais um
papel predefinido, e por isso mesmo podem ser ressemantizados.
Canclini (2003:188) analis
a que as criações artísticas, lentas e divergentes, às
vezes representam em seus procedimentos as contradições não-r
esolvidas das pol íticas
globais, as pericias da desigualdade e a necessidade dos marginalizados de
interromper os fluxos tota
lizadores com afirmações do próprio, com invenções
desglobalizantes. “Estou insinuando em que sentido a interrupção artística se
co
rrelaciona com movimentos culturais e sociais mais amplos. Com movimentos
ingenas e ecológicos que reafirmam a territorialidade e
os usos locais de bens n aturais
e sociais irreduveis à lógica global, com setor es de desempregados ou excluídos da
produtivid
ade e do consumo mundializados que (...) organizam manifestações e
movimentos.”
Lynch menciona que os lugares deteriorados são lugar
es sem tempo, “não porque
sejam eternos, mas porque aí não existe uma organização do tempo. Por isso, o que está
deteriorado ou vazio
pode ser uma forma de se escapar do tempo organizado.” Coloca-se
assim um problema de temporalidade, como explicitado por Sa
ntos:
“Temos, sem dúvida, um tempo universal, tempo despótico, instrumento de
medida hegemônico que comanda o t empo dos o utros. Esse tempo d
espótico
é responsável por temporalidades hierárquicas, con flitantes, mas
convergentes. Nesse sentido todos os tempos são globai
s, mas nãoum
tempo mundial. O espaço se globaliza, mas não é mundial como todo senão
como metáfora. Todos os lugares são mundiais m
as não um espaço
mundial. Quem se globaliza, mesmo, o as pessoas e os lugares. O que
existe mesmo o temporalidades hegemônicas e
temporalidades não-
hegemônicas ou hegemonizadas. As primeiras são o vetor da ação dos
70
language becomes an infinite museum whose center is everywhere and whose limits are nowher e”.
70
agentes hegemônicos da economia, da política e da cultura, da sociedade
enfim. Os outros agentes sociais, hegemonizados pelos
primeiros, devem se
contentar de tempos mais lentos”. (2002a:16)
Após a criação da UE, que preplanos macro de alteração da cidade mesclados
com a manutenção de certas áreas com vistas à preser
vação de monumentos e bairros
tradicionalmente importantes para o turismo, o que exi ste são construções em situação
preria, mui
tas vezes desocupadas por vi das de impostos com o governo e que são
ocupadas por grupos de jovens e/ou imigrantes (os squats
, em inglês, bezetze häuser em
alemão ou casas okupa em castelhano). Não raro é nesses edifícios ocupados que
trabalhos d
e encontro para mobilização das causas pró-moradia e contra a violência
contra os imigrantes ocorrem e por isso mesmo
o alvo constante de confrontos com a
polícia. Aind a que seja possível encontrar no território mediterrâneo algumas habitaçõe
s
auto-construídas, elas aparecem de forma rara e em áreas rurais ou fora do conjunto
urbano, dado o controle da ocu
pação do solo e a situação demodernizaçãop ela qual
m passando todas as grandes cidades européias. Há atualmente a reorganização de
apartamentos e casas para acomodarrias falias de imigrantes, como um cortiço,
mas que nem sempre envolve construções ant
igas. Muitos apartamentos (ou pisos patera
em castelhano, uma referência ao tipo de embarcação ilegal em que chegam muitos
dos
imigrantes ilegais da África) são su bdivididos e a sala se transforma em cozinha, não
janela nos quartos ou o corredo
r é adaptado para virar um quarto.
Casa Okupa “La Escalera Caracola”, Lavapiés (2006).
71
Fotos de reportagem sobre pisos patera em Barcelona. ABC XL Semanal, n. 1008,
18-24 de fevereiro de 2007.
3.2 Espaços residuais como possibilidade de uma outra cidade
Os espaços residuais aparecem e são ocupados também nas metró
poles
brasileiras. A grande diferença em relação aos espaços que analisavam os autores e
artistas nos Estados Unidos e na Europa
é que o que é definido como espaço de
ocupação emera passa a ser um lugar, um espaço de convincia, de const ituição de
uma com
unidade (ainda que posteriormente ela possa ser removida pelo poder público
ou constituir-se definitivamente em uma área habi
tável, por meio de uma proposta de
urbanização). Há uma constante lu ta nesse espaço a partir do tempo de ocupação. Sabe-
se que quanto
mais tempo o grupo se estabelecer aí, mais indivíduos atrairá, mais
organizada estará a comunidade e mais difícil ou l
enta será a remoção. Há muitos casos
em que comunidades que estãocadas ocupando um espaço sejam posteriormente
removidas, a de modo viol
ento, mas as políticas públicas se alteram, os governantes
mudam, e o espaço residual persiste, assim como os grupos que não têm
acesso à
moradia regular que o percebem como disponível. Enquanto o terrain vague dos Estados
Unidos e Europa representam umintervalo” c
omo descreve Dorfles, elemento
importante para a criação, um corte na ri gidez do desenho da cidade, e por isso mesmo,
redesco
berto por artistas, jovens e crianças, o espaço residual no Brasil é apropriado pela
necessidade, ainda que isso não signifi
que que nestas comunidades não exista um
processo criativo e cultural intenso. O espaço residual é o que resta àqueles que não
podem ha
bitar outras zonas, ou que buscam estar mais próximos da cidade, do trabalho.
Enquanto os imigrantes ilegais na Europa
não podem habitar estes espaços por serem
demasiado viveis (e a luta do imigrante ilegal é ser invivel e integrar
-se ao resto dos
cidadãos da cidade), os excluídos das cidades brasileiras buscam ser viveis por um
72
lado (quando se organizam em lutas pelo direito à moradia como nos movimentos dos
Sem Teto do Centro ou no já citado exemplo do Movim
ento dos Trabalhadores Sem
Teto) e amalgamar-se ao resto da cidade por outro, para poderem seguir vivendo no
local onde
estão. Desta forma, o método de análise se altera, na medida em que alguns
espaços residuais foram tão modificados com o tempo que à prim
eira vista parecem
parte da cidadeoficializada”. Não se trata de redescobrir espaços vazios na cidade para
serem posteri
ormente ocupados ou vividos dentro d e uma experiência estética como
poderia ocorrer na Europa ou EUA, mas redescobrir espaçoso
cupados como espaços
residuais, na med ida em que não passaram por um planejamento urbanístico
propriamente dito, mas foram r
eorganizados pelos que os ocuparam.
A mensuração da presença da ocupação il egal no Brasil constitui por si só um
proble
ma. Os dados sobre o número de favelas no Brasil não são confiáveis, pois
segundo Maricato os governos teriam dificuldade em
identificar a situação fu ndiária de
alguns assentamentos para uma classificação rigorosa. Segundo a autora, o IBGE
subdime
nciona a presença de agrupamentos irregulares na cidade, mas ainda assim, o
censo de 1991-2000 mostra que o crescimento das favel
as no Brasil foi de 22%, um
dado que por si é impressionante. O IBGE não considera os agrupamentos de menos
de 50 residências, o que
caracteriza grande parte das ocupações de espaços residuais,
embora os agrupamentos deste tipo sejam numerosos na ci
dade (2018 ocupações e 1856
loteamentos ilegais, segundo fontes do estudo de 2007 realizado pela prefeitura).
O que se sabe é que a ma
ior parte da população em muitas das capitais brasileiras
vive em ocupações irregulares (o que inclui ocupação ilega
l do solo e lotea mentos
ilegais), tornando a “cidade oficial algo acessível apenas a uma minoria. Segundo o
estudo de Castro e B
arreto da Silva em 1997
71
, nos últ imos 15 anos a oferta de
loteamentos ilegais foi maior que a soma de todas as unidades habitacionais oferecidas
pelo
mercado privado. Essas habitações constituem um mercado lucrativo,
principalmente porque o terreno pode ser readquirido pelos
proprietários por meio de
ações violentas como expulsões ou mesmo inndios criminosos.
O exemplo de São Paulo
Grande parte da população da cidad e (2,07 miles segundo o IBGE) vive em
loteamentos ou habitações irregulares. De acordo com um
estudo finalizado em 2007,
realizado para a Prefeitura de São Paulo em parceria com a Or ganização Aliança das
Cidades e com apoio
do Banco Mundial, há atualmente 1,1 milhão em favelas, 1,6
miles em loteamentos ilegais, aproximadamente 500 mil pessoas em cortiços
e 10 mil
moradores de rua, uma tendência que se apresenta crescente em todo o país
72
. Os
espaços residuais ainda são dificilmente analisados, dada a dificuldade de sua definição.
A metodologia leva em considera
ção somente se as moradias são ilegais e não o tipo e
tamanho do espaço que ocupam.
71
CASTRO, M. C. Pozzi; SILVA, H. M. Barreto da SILVA. Legislação e mercado residencial em São
Paulo . São Paulo: LABHAB;FAUUSP, 1997.
72
Na anál ise comparativa dos últimos 5 anos, notou-se que a área ocup ada pelas habitações ilegais não
aumentou significativam
ente, mas sim a densificação e o crescimento vegetativo da população nas áreas
ocupadas (Fonte: estudo Habit - Prefeitur
a de São Paulo, Aliança das Cidades e Banco Mundial).
73
A intervenção em zonas irregulares se d á de modo a gressivo pelo poder público
com o apoio das empresas. Fix (2001:32) cita o caso do
processo de remodelação da
Avenida No va Faria Lima e Berrini, onde um p ool de empresários organizados sob o
nome de “Associ ação de Promoção Ha
bitacional e Socialarrecadou 8 miles de reais
de 122 contribuintes para a compra de um terreno e a construção de um conj
unto
habitacional no Ja rdim Educandário, a 15 km do local, para receber as falias
removidas. Arantes (2001:204) cita o caso de Er
nia Maricato (Secretária de Habitação
da prefeitura na gestão de Luíza Erundina), quando foi proposta uma lei que
regularizaria a que
stão fundiária nas favelas. Maricato precisou enfrentar a resistência
dos empresários imobiliários que exigiam a remoção das fav
elas alegando o uso público
das áreas ocupadas (de propriedade da Prefeitura). Maricato afirma queo mercado
imobiliário
controla os investimentos públicos urbanos que são o fator mais importante
de valorização imobiliária” (2001:43). Os grandes programas da
s empresas imobiliárias
juntamente com eventos internacionais de port e como eventos esportivos, encontros e
congressos políticos,
são momentos em que alimpezada cidade ocorre de modo mais
violento, e é temida pelos moradores de ocupações ilegais que sa
bem que, como o
“câncerda cidade, serão deslocados para áreas de acesso cada vez mais restrito. Daí a
proteção contra o despejo que a
s áreas de risco (morros, encostas, rios poluídos ou a
vizinhança de fábricas poluentes) oferecem.
Para essa população o que resta são propost
as insuficientes de urbanização,
muitas vezes servindo apenas como publicidade para os políticos que a propõem, como
no conhec
ido caso do projeto Cingapura, uma proposta de urbanização insuficiente (e
com acusações d e superfaturamento) em que os poucos
edifícios construídos se
colocavam de frente a avenidas, cobrindo o resto das ocupações informais que estavam
por detrás.
Edifícios do projeto Cingapura, 2005.
74
Fix citandido Malta dizendo queo fato de transformar barracos e m
predinhosaparece como se as pessoas tivessem se tra
nsformado de ladrões em classe
média”. Dessa forma, segundo a autora, “seriainduzida uma integração social ao
mesmo tempo em q
ue os prédios se destacam na paisagem da via expressa, como
verdadeiros outdoors” (2001:24). Como conclui a autora:
não foi por mera coincidência que a lei de extinção do tráfico (de escravos)
foi promulgada uma semana antes da Lei d
as Terras. Afastando a
possibilidade de trabalhadores sem recurso to rnarem-se proprietários,
garantia a sujeição do trabalh
adorlivre aos postos de trabalho antes
ocupados p elos escravos. Não surpreende então que o Est ado não admita o
direto formal del
es à cidade. Porém custou mais compreender que por isso
mesmo o próprio Estado recicle a antiga política senhorial da informalidade
da vida de favor em chão alheio.” (2001:203)
A política de exclusão nas cidades brasileiras não é um fato novo. Freyre
(2000:14) já menciona que no início do culo XIX os jesuítas e
ram do nos de sítios e
chácaras, muitos compreendidos nas sesmarias
73
da cidade e explorados contra o
interesse público e algumas vezes fazendo uso de meios icitos para suas ações,
encar
ecendo o terreno, obrigando as casas menores a se concentrarem ao dos morros
e nos mangues (antes de serem aterrados
e ocupados pelos mais ricos).
A 1822, a terra por meio da concessão de sesmarias era de propriedade de
nobres portugueses, jesu
ítas e bandeirantes que ajudassem a ocupar a terra onde antes
viviam os ingenas. O resto da população tinha de se conten
tar em ocupar terras de
modo ilegal. Entre 1822 e 1850 foi reconhecido o direito dos posseiros desde que as
terras estivessem cultivadas
. Após a criação da Lei de Terras em 1850 a aquisição de
terras públicas só poderia ser realizada a partir da compra, gerando os la
tindios e
concentração de terras improdutivas e obrigando os que não podiam comprar terras (a
maioria dos escravos libertos, t
rabalhadores e imigrantes pobres) a serem o-de-obra
dos grandes fazendeiros ou posseiros ilegais. Os trabalhadores sem
terra foram migrando
aos centros urbanos, ocupando a cidade também de modo irregular. Maricato afirma
que:
as reformas urbanas, realizadas em diversas cidades brasileiras entre o final
do culo XIX e início do culo XX, lanç
aram as bases de um urbanismo
moderno ‘à modada periferia. Realizavam-se obras de saneamentosico
para eliminação das ep
idemias, ao mesmo tempo em que se promovia o
embelezamento paisagístico e eram implantadas as bases legais para um
m
ercado imobiliário de corte capitalista. A população excluída desse
processo era expulsa para os morros e franjas da cidade” (2001:17).
73
Instituição jurídica portuguesa que foi adaptada ao Brasil na épo ca da colônia e que normatizava a
distribuição das terras a
nobres ou membros da elite religiosa e que gerou a concentração de terras a
poucos donos, originando um conflito que levo
u à extinção deste mecanismo entre 1822 e 1850.
75
O Brasil apresentou intenso processo de urbanização, esp ecialmente na segunda
metade do culo XX. Em 1940, a população urbana era
de 26,3% do total. Em 2000 ela
é de 81,2%. A partir das cadas de 80 e 90, com a grave crise econômica que marcou o
país, há o aumento do d esempre
go (e do trabalho informal), o crescimento da violência
nos centros urbanos (concentrada, segundo estudos do Núcleo de Violênci
a da USP, em
zonas de favelas - moradores com mais baixa renda e nível de escolaridade), em um
cenário que como vimosapresen
tava um modelo antigo de exclusão econômica. Não
se pode, portanto, esquecer que grande parte da população que trabalha formalme
nte em
indústrias e comércio não tem acesso à moradia digna, sendo obrigada a viver em áreas
irregulares ou invadidas. As p
eriferias cr esceram 14,7% entre 91 e 96, enquanto os
núcleos centrais apresentaram um crescimento de 3,1% (dados do IBGE, 2000).
Maricato (2001:21) mencio
na que as iniciativas de promoção pública, como os
conjuntos habitacionais populares, também não enfrentaram a questão fun diária ur
bana.
Os governos municipais e estaduais deixaram os vazios urbanos disponíveis para futuros
investimentos públicos e priv
ados, para realocar a população em áreas inadequadas ao
desenvolvimento urbano racional, penalizando seus moradores e
também os
contribuintes que tiveram que arcar com a extensão da infra-estrutura.
Cada espaço residual se organiza de modo
distinto, já que é fruto de uma
intervenção esp ecífica em um local com características particulares. Desse modo, foram
escolhidos doi
s exemplos de agrupamentos informais em uma área mais próxima do
centro da cidade de São Paulo e outro fora do centro e
xpandido. O bairro d e Piritu ba por
exemplo, por ser mais longe do centro, está se verticalizando mais lentamente que outros
bairros
da Zona Oeste/Norte como a Lapa, Santana, Barra Funda ou Pinheiros, mas
ainda assim apresenta um movim ento constante de mudan
ça. As favelas e espaços
residuais conviviam com casas de classe alta e média e atualmentem tendo seu espaço
limitado pelos
grandes edifícios que são construídos na região. O que muda
constantemente é a noção de centro, que com o crescimento da cidade ta
mbém vai tendo
seus limites ampliados. A Vila Madalena, por outro lado, por ser um bairro mais central
e ter passado por um pr
ocesso de verticalização muito intenso nos últimos anos, possui
poucos espaços residuais; desta forma analisare mos um dos únicos espaços
ocupados de
modo irregular presente na região a 2004.
Não é casual que os exemplos de ocupação que foram selecionados em 2004 já
não esteja
m mais p resentes atualmente. É parte da configuração dos espaços residuais
sua efemeridade, dada sua fragilidade por
motivos expostos anteriormente.
Pirituba
Os tempos de urbanização distin tos refletem-se na comp osição arquitetônica dos
ambientes. O espaço residual analisado, a comunida
de em Pirituba, é estruturado como uma
tira”, tendo a avenida Raimundo Pereira de Magalhães de um lado e a rodovia dos
Bande
irantes de outro, criando um conjunto onde a comunidade tod a se dá a ver como uma
grande fachada, sempre de frente para a a
venida. Naquela área o que separa a rodovia dos
Bandeirantes da avenida Raimundo é um desnível de solo, ao qual as construç
ões da
comunidade se adaptaram.
76
A “tiraestá localizada ao lado do clube da sociedade holandesa de São Paulo, chamado
“Casa de Nassau
74
e que emprestou o nome à própria comunidade, com o um m odo de
contaminaçã o. Sua constituição como “fachada” que se volta à avenida Raimundo Pereira
de
Magalhães cria uma narrativa que a conecta ao que está ao lado, com o um eixo sintagmático. A
própria entrada do clube é f
reentemente ocupada pelos moradores que a utilizam como espaço
de encontro e lazer ou mesmo para pedir esmolas aos sóci
os do clube, isto é, mesmo sendo um
espaço privado, o clubetem parte dele apropriado pelo agrupamento móvel que ocupa os
espaços
sem levar em conta as regras que organizam o uso do s espaços públicos e privados.
Tanto a parte não ocupada pela favela
em 2004 quanto o espaço vazio que resto u de sua
remoção, como se pode ver nas fotos, foi preenchida por grama e algumas árvores, em um
ra
quítico projeto paisagístico que só evidencia mais a potencialidade do espaço residual como
lugar a ser ocupado. Como des
creve Ferrarapaisagismo, em uma versão limitada e
empobrecedora, restringe-se a ocupar o espaço livre com o verde, a fim d
e orientar ou controlar
os usos: por onde andar, onde permanecer, com o cobrir, como mostrar ou valorizar, como
impedir , como isolar; enfim, u
mdigo de comportamentos que utiliza o verde como
instrumento, um verde utilitário e metarico.” (2000:182)
Foto - Do lado esquerdo a rodovia dos Bandeirantes, do lado direito a avenida Raimundo. A área
arborizada entre as duas pistas (iniciativa que ocorreu após a instalação da comunidade Nassau,
como uma tentativa de “frear o avanço dela) é o espaço residual ocupado mais à frente pela
comunidade. Foto de 2004.
74
Nem o próprio clube resistiu à verticalização da área e após 50 anos de funcionamento foi desfeito e
desde o início de 2007 e
stá em disputa entre sócios-proprietários que querem vender o terreno para a
construção de um condomínio resi dencial e os que p
retendem tombá-lo para prese r var a área verde e as
casas que constituíam o clube.
77
Por não ter mais de quinze anos, e pelas constantes tentativas de remoção, a utilização de
madeira e zinco nas resid
ências é predominante. A fragilidade da estrutura arquitetônica se
reflete nas constantes in tervenções da polícia e
do poder público.
Foto - Casas da comunidade Nassau, chamada “Favela Nassau”. Registro de 2004.
78
Foto - Casas da comunidade com o bairro de Pirituba ao fundo - 2004.
Foto - Vista da Favela Nassau a partir da avenida Raimundo. Foto de 2004.
79
Foto Moradores da Favela Nassau na entrada do clube da Sociedade Holandesa de São
Paulo (Casa de Nassau) 2004.
Foto - Vista a partir da avenida Raimundo: do lado direito está a comunidade Nassau
2004.
80
Foto de 2006 Vista após a remoção da favela de Nassau.
Foto de 2006 Vista de alguns dos elementos que sinalizam a proibição da ocupação do solo após a
remoção da favela.
81
Foto de 2006 - área que era ocupada pela Favela Nassau.
Foto de 2006 área ao lado do Clube Nassau antes ocupada pela Favela Nassau.
82
Foto de 2006 após a desocupação da Favela Nassau.
Foto de 2006 Vista das casas que se localizavam em frente à comunidade.
83
Foto - Vista a partir da avenida Raimundo: casas geminadas que ficam em frente à
comunidade 2004.
Foto - Vista a partir do clube da comunidade holandesa “Casa de Nassau: em primeiro
plano vê-se o teto de zinco das construçõ es da comunidade Nassau. Em segundo plano as
residências de luxo da área do City América 2004.
84
Foto - Barbeiro/Pirituba. Registro de julho de 2004.
A luz é um elemento que norteia a forma como se constrói; no espaço residual
analisado isso
não é diferente. A limitação da energia elétrica (que aparece em pequenas
conees clandestinas) faz com que se busque a luz do
ambiente exterior. Durante o dia,
as casas têm portas e jan elas totalmente abertas, permitindo também a circulação de a
r
nos pequenos ambientes. Os estabelecimentos comerciais também são bastante abertos,
consistindo de um balcão com cadeiras do la
do de fora, que tanto marcam claramente
sua presença como comércio na área quanto convidam para o convívio interpessoal. Em
uma das fotos tiradas em Pirituba vemos que a mesmo o barbeiro trabalha ao ar livre.
Os centros comerciais desempenham um
papel importante também nos espaços
residuais. Atentos às oportunidades mais variadas, o comércio sempre acompanha o
morador, se
ja do condomínio de luxo ou das comunidades mais carentes, modificando e
sendo modificado por ele.
Na comunidade analisada,
assim como em outras, os bares e as salas de cultos
evangélicos dividem a função de centros de convívio. Daí a grande quanti
dade de
estabelecimentos: em áreas de menos de uma quadra pode-se encontrar entre dois a
quatro bares e pelo menos
um centro religioso.
Os bares, estrategicamente localizados, agem como pontos nodais que
desempenham um papel que tradicio
nalmente as praças ocupavam nas cidades. É onde a
comunidade se encontra, discute e se vê. Diferentemente das favel
as, onde sua maior
organização e tamanho permite a criação de um cotidiano mais in dependente doresto
da cidade, os esp
aços residuais estão à mostra. Enquanto nas favelas os bares são alvo de
85
policiamento constante, por serem palco de cenas de mortes e a chacinas n a
madrugada, no espaço residual, em sua co
nstituição que se dá a ver constantemente por
quem está “de fora”, permitem congregar funções sociais de ócio como o dominó, o
bilh
ar e o jogo de cartas, além do futebol transmitido pela TV ao longo das caadas,
servindo como ponto de encontro.
A localização
e as inscrições que transformam a fachada em um grande cartaz
são fundamentais para gerar diferenciação, já que arquitetonic
amente as construções
criam um todo imagético homon eo devido aos inúmeros patchworks de que são
compostas. No excesso de informação, o
contraste é dado pela maior limpeza visual,
gerada pelo uso de tinta de uma ou duas cores no máximo ou pela predom
inância das
linhas horizontais, como observamos no “Bar do Primo”, em Pirituba. Nãouma regra
predefinida; como em todo espaço comercial, o
planejamento de uma fachada/vitrina
inicia-se pela busca do contraste com o entorno.
Foto - Bar do Primo/Pirituba, 2004.
86
Foto - Assembléia de Deus/Pirituba, 20 04.
Vista da Comunidade Nassau da avenida Raimundo (os automóveis em frente aos
estabelecimentos comerciais são de propriedade dos moradores) e casas do bairro de luxo
City América ao fundo. Foto de 2004.
87
Foto de 2006, após a remoção da Favela Nassau.
Todas as famílias que ocupavam a Comunidade Nassaumais de 15 anos
foram transferidas para habitações do CDHU (Companhia do Des
envolvimento
Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo) em distintos pontos da cidade (Sítio
Jaraguá, Jardim Ipanema e Canta G
alo), desmembrando a comunidade ali formada
durante 15 anos. O caso de Moacir Pereira é típico: perdeu o direito a uma habitação
porq
ue sua e, que era a titular do barraco onde vivia, morreu durante os trâmites e a
ele não foi concedido o direito de um
a casa. Não procurou seus direitos porque havia
perdido seu RG e acredit ava que não poderia ter direito a outro. Chegou a pagar R$200
a
um advogado para que pudesse providenciar uma segunda via, mas segundo ele, era
tarde demais porque a r emoçãoesta
va finalizada. Arantes (2001:205) analisa que esta
situação de ilegalidade constanteextrapola a questão da habitação, constituindo-se n
o
epicentro de todas as exclusões, herdadas e vindouras. O habitante dessa cidade oculta,
por medo atávico do despejo, nunc
a procura a justiça, muito menos a polícia, que a
pretexto justamente de sua condição de infrator nato tem o hábito de invadir
sua casa
quando bem entende.”
A transferência dos habitantes para condomínios do CDHU não tem apenas o
agravante de sepa
rar os habitant es ou mesmo de forçá-los a uma vida d e compra do
novo imóvel (já que como foi mencionado antes, a habitação ilega
l também é
comercializada), mas também contraria a busca dos ocupantes dos esp aços residuais em
estar em um lugar ao
lado de áreas urbanizadas que lhes possibilita usufruir da infra-
estrutura (escolas, transporte, comércio) que não encontram
nos bairros mais afastados.
A maior parte dos habi tantes preferiria continuar onde estavam, o que foi confirmado em
88
conversa com os mor adores que estavam sendo desocupados da Comunidade Nassau e
pelos dados do estudo realizado para a Prefeit
ura de São Paulo em parceria com a
Organização Alian ça das Cidades e com apoio do Banco Mundial, citado anteriormente.
As ob
ras da prefeitura também estimulam de duas formas a ocupação dos espaços
residuais. Por um lado porque os cria (em aas v
iárias e grandes avenidas que vão
cortando a cidade) e por outro porque ao trazer grande fluxo de automóveis colabora
par
a que o entorno seja urbanizado.
Fix denuncia a dife rença no tratamento dado para o que ela chama de “cidadãos”,
aqueles que
têm seu direito garantido à vida na cidade e os moradores das o cupações
informais. Os cidadãos quando se organizam podem cons
eguir que sua voz seja ouvida.
os moradores das favelas sofrem com a divisão e cooptação de suas lideranças, que
recebem inde
nização diferenciada do resto da comunidade, além de sofrerem a pressão
de tratores e policiais (FIX, 2001:8). Muitas são realocadas em
áreas de proteção
ambiental pela própria prefeitura aumentando o problema de contaminação em zonas
verdes e man
anciais.
Outros espaços residuais ao longo da avenida Raimundo Pereira de Magalhães
(além da Comunidade Nassau) mostram tempos
distintos de uso. Na fotografia abaixo
vemos casas de alvenaria sem pintura ou reboco ao fundo enquanto um comércio
bastan
te estruturado se distribui lado a lado de frente à avenida. Nota-se a mesma
estruturação em forma de fachada que a Comunidade
Nassau, com a diferença de que se
trata agora de uma formação mais antiga, que se apropriou do espaço de modo
praticament
e definitivo. Isso pode ser observado tanto em termos de materiais utilizados
na construção quanto na comunicação com o externo; est
e comércio não é mais um
comércio local, voltado à comunidade que ocupava o espaço residual, m as uma
formação em conexão com o esp
aço programado da avenida e da rodovia que está
próxima: menicos, borracharias e pequenos bares trazem uma oferta especia
lizada e
adaptada à demanda das autopistas e rodovias.
89
Comércio com casas de alvenaria ao fundo. Foto de 2004.
Freyre (2000) cita que n a São Paulo do fim do culo XIX, com o
enriquecimento da cidad e, o modo de se diferenciar dos mais pobres se da
va por meio
do uso de materiais mais perenes e nenhum tipo d e vegetal, além da altura do edifício. O
processo de passa
r das casas construídas com sucata para as de alvenaria constitui ainda
hoje também um processo de importância siml
ica. Da mesma forma pode-se p erceber
que com a criação da numeração para as casas, estabelecida pelos próprios moradores, se
c
oncretiza um meio de possuir um endereço, de deixar de ser um ocupante de um espaço
sem lugar para ser parte
do sistema da cidade.
Algumas vezes, a integração do espaço ao entorno somada à presença de favelas
e ocupações residua
is por toda cidade causa confusão aos próprios moradores. No caso
da Comunidade Ilha Verde no bairro do Jaguaré em São Paulo, em fase
de desocupação,
o fato de estarem lá há mais de três cadas fez com que os moradores mais jovens não
soubessem que viviam em uma
favela. Como o caso mostrado no jornal OESP da
moradora Daniela Elídio, de 20 anos, que trabalha na Unil ever, estuda em uma
universidade
particular e só descobriu que vivia em uma favela quando percebeu que
suas amigas da escola não a visitavam pelo fato
de o local ser consideradoperigoso”.
75
75
O Est ado de São Paulo, 15 de julho de 2007 - http://www.estadao.com.br/cidades/not_cid19329,0.htm.
90
Foto de 2006 da mesma área mostrada na foto anterior. Nota-se que ao contrário dos
espaços residuais mais frágeis, este sofreu pouca alteração se comparado com 2004.
As fotos a seguir mostram u m lugar de u ma temporalidade anterior, uma
ocupação mais recente e por isso mesmo mais visive
lmente informal. Trata-se de uma
apropria ção de um terreno baldio, um pouco afastado da avenida Raimundo, mas
bastante pr
óximo da conexão entre a marginal Tietê e a rodovia dos Bandeirantes, u ma
área que não chegou a ser explorada comercialmente
antes da chegada da rodovia mas
que já começa a receber a construção de prédios de condonios. Essa comunidad e
constitui-se de modo
mais fechado em si mesma (notem-se as cercas feitas de madeira e
papelão), tendo suas construções voltadas à lateral ou de
costas à avenida. Por estar
localizada dentro de uma área verde, há a plantação de hortas e a criação d e galinhas.
Nãoali nenhu
ma construção de alvenaria e nenhum comércio de constituição vivel
ou marcada (exceto pelo comércio realizado entre os mora
dores sem a utili zação de um
ponto-de-ven da”). As formas de interação e lazer ocorrem de modo ainda mais
individualizado q
ue na Comunidade Nassau, e têm pouca conexão com o entorno das
avenidas, comércios e rodovias. O ambiente dessa comunidade é a nat
ureza que o
circunda, que pro algum alimento e que de certa forma garante uma vincia mais
protegida, mais afastada d
a vista de quem está “fora”. Em 2006 se construiu um pequeno
muro de modo a impedir o estabelecimento de mais pessoas no local. A Secr
etaria d a
Habitação do Estado de São Paulotem prevista a remoção desta comunidade.
91
Foto de 2004 de outra comunidade na avenida Raimundo Pereira (Pirituba).
Foto de abril de 2006 onde se nota a construção de um muro de concreto impedindo o
aumento de ocupantes da zona.
92
Foto de 2006 Vista de frente à comunidade mostrada nas duas f otos anteriores,
evidenciando o avanço das construções verticais na área.
Vila Madalena
Essa comunidade, estabel ecida desde o início dos anos 90 e removida em 2005, é
a única da região de Alto de Pinheiros e Vila Madalen
a, uma área muito valorizada nos
últimos anos. Marta Nehring realizou um docu mentário em 2004 so bre a comunidade
chamado “Vizinhos”, que mostr
a a relação que havia entre os moradores da comunidade
e os vizinhos morador es das casas e edifícios de alto padrão na regi
ão. Há um claro
desconhecimento por parte dos dois grupos vizinhos, evidenciando a impossibilidade de
um convívio mútuo. Mesmo se
ndo uma área residencial, fora d as grandes vias para
automóveis, o encontro entre os moradores do espaço residual se
limitava aos bares da
própria ocupação, enquanto o trânsito nos edi fícios e residências ao redor era de
automóveis q
ue entrava m e saíam das residências ou passavam pelas ruas. As duas
praças próximas à área não eram utilizadas
por nenhum dos moradores, constituindo
mais um espaço residual que uma possibilidade de encontro.
O lixo deixado pelos mora
dores d as residências de luxo era aproveitado pela
comunidade do espaço residual (d aí a mensagem “Sucata tem don
oda página 28, que
avisava aos lixeiros que o que estava ali seria usado pelas pessoas), embora o processo
de recuperação e re
ciclagem não ficasse à vista como na Comunidade Nassau. Por não
estaremprote gidos por uma avenida de alta velocidade como em Pirituba
(onde do
ponto de vista do carro sepouco e praticamente nãopedestres), as atividades
sociais que se davam na rua est
avam relacionadas aos bares de alvenaria que
visualmente pareciam seroficiais”. Os bares em barracos funcionavam à n
oite, mais
93
protegidos da vista dos passantes. Nãooutro tipo de comércio vivel como o barbeiro
e menico que se observava em Pirituba. A oc
upação intensa pela especulação
imobiliária de luxo na região desde o início dos anos 90 foi cercando a comunidade, que
sabia d
e sua situação de fragilidade, de não-pertença àquele local.
Neste caso, dado o alto valor do solo aliado à sua escassez, em uma á
rea que
passa por uma intensa verticalização, nem mesmo as construções de alvenaria de
algumas casas e bares foram poup
adas da remoção. Um muro de concreto e arame
farpado foi construído no local, buscando proteger a área de novas ocupações
.
As casas se estabeleceram na parte de trás dos bares, que se dispunham de frente
para a caada, criando um ambiente
por um lado protegido, por outro permitindo
visibilidade por parte dos moradores, por estarem acima das construções da
caada,
aproveitando o desnível do solo da área.
Foto de 2004 da comunidade na Vila Madalena.
94
Foto de 2006 após a remoção da comunidade.
95
Foto de 2004 Vista geral da comunidade (que, assim c omo a Comunidade Nassau, era
denominada favela de modo geral).
96
Foto de 2004.
Foto de 2006 após a remoção da comunidade.
97
Foto de 2006 muros protetores contra novas invasões na área.
Foto de 2006 Criança brincando entre os muros e arames de proteção contra novas
ocupações.
98
Foto de 2004 vista interna de um dos bares da comunidade.
Foto de 2004 Vista de um sábado com o cotidiano dos bares e encontros nas
calçadas.
99
Quando a ocupação estava presente, os bares eram totalmente de alvenaria e
buscavam criar uma área interna maior, embora a maior concentração de freentadores
permane
cesse sempre do lado de fora, dominando a rua e fazendo dela uma calçada. A
busca pela luz e pelos ambientes abertos criava um ambiente de convincia onde as
a
tividades que tradicionalmente seriam desempenhadas de modo privado eram
realizadas à vista de todos, tornando-se assim parte da vincia pública.
A noção de exclusão ec
onômica, bastante utilizada em estudos sobre
comunidades carentes, o deve limitar as análises destes espaços. Nestes ambientes,
onde os contrastes são s entidos lado a lado, a questão urbana se
mostra de forma mais
clara. Nos espaços residuais, a divisão entre o público e o privado passa a ser mais tênue,
ambos passam a ser parte de um grande conj
unto urbano.
É o indivíduo que se coloca como elemento central e que confere sentidos a estes
espaços. Por um lado, a noção de pertea a uma comunidade surge de modo mais
intenso, mesmo que isso ocorr
a por uma necessidade frente à fragilidade que possuem
com a constante possibilidade de serem desocupados pelo poder público. Por outro, estes
lugares atuam como agentes catalizadores do
entorno, reciclando, sobrepondo e
proporcionando uma visão exemplar do que pode ser a comunidade auto-organizada.
100
IV. Conclusões
Ocupação vertical em Hong Kong, 2006.
101
Se a o início do culo XX a idéia de unid ade era a que prevalecia, atualmente,
com as descobertas na área d a ecologia, biologia e psicaná
lise (que influenciaram o
pensamento no campo da cultura e comunicação), há cada vez mais a consciência para
um mundo fragmentado e heteroneo. Estas descobertas não viera
m sem um inmodo,
sem questionar idéias antigas sobre a identidade, alteridade e estabilidade da essência
fundament al do homem. No entanto, os processos chamados globali zantes
e a economia
de mercado voltam a trazer a idéia de hierarquia entre incluídos e excluídos, entre centro
e periferia. Esta visão do mundo, embora não possa ser ignorada, é par
cial e não pode
ser tomada como referência para estudos culturais por estar vinculada a projetos
econômicos cuja realização difere nos distintos contextos do plano h
omogeneizante que
propõe. Se a crítica mais comum sobre o discurs o da pluralidade está li gada à idéia de
que ela ainda não possui uma forma ou expressão epistemológica adequ
ada é talvez
porque a tranilidade do discurso unificador ainda é atraente. Por outro lado, pode ser o
indício de que múltiplas epistemologias estão surgindo, como fruto d
a pluralidade que se
encontra, questionando os saberes bem delimitados e revelando a importância de
fenômenos que se ignoravam a então por não poderem ser descritos pelos apar
atos
conceituais previamente estabelecidos.
Como expõe Sousa Santos (2007:243), estamos por um lado lidando com
epistemologias alternativas que são transformadas em resíduos ao serem
silenciadas,
demonizadas, trivializadas, marginalizadas. Por isso mesmo a alternativa reside nestes
elos, nestes vazios, nestes fragmentos. Segundo o autor, a ciência moderna
sofre de
horror vacui”, por onde se busca neutralizá-lo pelas idéias de permanência, duração,
identificação, classificação. Se áreas como a psicanálise, a arqueo
logia e a própria
semiótica se ocupam do estudo dos resíduos deve partir também das ciências sociais em
geral uma proposta de analisar os processos de identi
ficação do que não pertence a um
sistema para rejeitá-los como lixo. Essa dimensão envo lve um comprometimento que é
também político, porque trata de grupos sociais, espaços, objetos q
ue geram um modo
de conhe cimento que é deixado de lado como resíduo. Por isso a importância de se
detectar os processos de geração residual mas também retomar a idéi a de que não
se
referem a uma mera dicot omia entre o dentro e fora, mas de um ciclo no qual os resíduos
são parte importante da efervesn cia dos processos culturais.
Por outro lado, se c
omo coloca Sousa Santos (2007:243-244), a perda da
confiaa epistemológica na ciência ocorre junt amente com o seu aumento de sua
credibilid ade por p arte da crença popular, podemos esta
belecer um paralelo que por um
lado mostra a pluralidade das epistemologias ou o surgimento de epistemologias da
pluralidade que ocorrem de modo concomitante com
o aumento do discurso da defesa
das identidades individuais e sociais, gerado tanto pelos medos das ameaças de ataques
terroristas nos países economicamente centrais, quanto pe
la necessidade de se
comercializar culturas e territórios e utilizar o discurso identitário para garantir a
personalid ade da marca de produtos. Desta forma, o discurso da
pluralidade dentro da
área da comunicação e cultura assume um lugar fundamental. É onde visões
aparentemente contraditórias podem ser confrontadas e a crença n as identidades
cultur
ais possa ter seu mecanismo evidenciado.
102
É preciso co mpreender em que medida a residualidade gerada pela constante
exclusão e ignorância em relação a saberes populares e organização dos grupos sociais
periféricos é
um processo que imp ede que se crie a necessária elasticidade cognitiva da
qual se beneficiariam tantoexcluídos” quantoexcludentes”. Tampouco serviria cair
em diferenciaçõ
es dasminoriasou de gruposmenos favorecidos” como ummodo
de conhecimento que não reconhece” (Sousa Santos, 2006:313). O pensamento barroco,
que prioriza as trocas na fronteira, que Lotman (2000:136-137) aponta ser
o local onde
os processos semiotizantes ocorrem de modo mais intenso, tem o centro como uma
presea mais tênue, o que torna as próprias distinções entre centro e periferia mais
difíceis de
serem estabelecidas e assim a própria noção de i dentidade e alteridade
também são mais difusas. O centro passa a ser um acoplamento entre margens.
O conceito de residual pode permitir
a compreensão da organização da cidade
como modo de coexistência de sistemas distintos que se alteram mutuamente. É preciso,
no entanto, o transformar esta análise em uma defesa d
a habilidade que os não-
cidadãos da cidade possuem em resolverem problemas de modo a justificar a ausência
de apoi o por parte do Estado. Por isso a importância de não
reduzir as análises dos
processos comunicativos destes grupos a um slogan ou uma idéia única e simplista,
mesmo porque, no caso das favelas e comunidades residuais no Brasil, sua
incidência
quantitativa é o significativa que impede que se possa referir a esse fenômeno como
um evento relegado a uma minoria à parte. Os espaços residuais o múltiplos
, assim
como seus moradores. Também não se pode criar uma simples oposição entre espaço
oficial vs. espaço residual. Muitos dos moradores das favelas são trabalhadores formais,
e as
habitações ilegais não escapam à especulação imobiliária. Como menciona Verna
(apud Davis, 2006:104), “a causasica da favelização urbana não é a pobreza
, mas sim
a riqueza urbana”.
Os movimentos na sociedade que buscam excluir os economicamente menos
favorecidos, os imigrantes ou quaisquer grupos que não sejam considerados pa
rte da
sociedade chamadaoficial”, criam não somente um problema a estas pessoas que se
em in capazes de se integrarem, mas implicam também na alienação
do grupo que
exclui. Não se trata de evitar a construção do lixo, o que seria impossível. Trata-se de
tomar consciência do processo de criação do lixo para que e
le possa ser recuperado de
modo criativo e não seja somente fruto de um ciclo de consumo, mas da cultura. Flusser
(2006:60-61) diz que a história humana não é uma linha linear que
vai da natureza em
direção à cultura, “mas um círculo que gira da natureza à cultura, da cultura ao lixo, do
lixo à natureza e assim por diante”. Por isso falar
do resíduo é retomar na análise um
elemento que sempre foi parte dos processos culturais .
O conceito de residual está em sintonia com o que Pinheiro já havia estabelecido
como categorias
para a compreensão dos processos culturais: o migrante, o mestiço e o
aberto. Mais especificamente, os elementos residuais são resultantes dos processos
culturais e de sistemas de maioraque
cimento”, onde os processos culturais se dão em
maior velocidade, são gerados com maior freqüência, e possuem principalmente a
capacidade de absorver o quede residual em outros sistemas
e neles próprios. Sem
103
essa possibilidade o que existe é um sistema ensimesmado, simétrico, com a tendência
ao fechamento e ao subdesenvolvimento.
Desta forma, há a coexistência da aceleração do ca
pital, como mencionada por
autores como Santos (2002a), mas que ao mesmo tempo encontra no espaço local tanto
seu modo de concretude quanto sua resistência. O espaço torna-se um objeto de
c
onsumo descartável, mas ao mesmo tempo ele é apropriado e reconfigurado por aqueles
que não podem participar de seu consumo. Os modos como os sem-teto, favelados,
imigrantes ile
gais, ciganos transitam pelo espaço são também possuidores de uma
fragmentação e possibilidade de adaptação que põem em xeque as estragias velozes de
ocupação
do capital. Seo resíduo artificialmente criado pelo “ciclo de vida do
produto em Marketing, e os discursos lineares eeficientes da publicidade, há os
resíduos culturais produzidos por
sociedades onde o excesso e a grande quantidade de
combinações possíveis nos processos culturais são responsáveis pelas apropriações tanto
dosrestos obsoletosdo mercado quanto dos
resíduos imateriais que o contato entre
sistemas distantes oferece. Este processo cria possibilidades de vida emergentes com
resultados estéticos que sobrepassam o âmbito artístico, combinando o uso
do espaço
com meios tecnológicos, comunidades residuais com grupos de dia tática, a gambiarra
de luz com os warchalkers
76
. É importante propor estas possibilidades, que podem ser
desenvolvidas em um próximo estudo, para que as tecnologias não sejam compreendidas
logo de saída como um elemento elitista e
invariavelmente conectado ao mercado que
laa osmelhores e mais potentes” com cada vez maior rapidez.
Seria contraditório imaginar o conceito de residual como estrutura anal
ítica
predeterminada de sistemas culturais que abrigam tantas culturas distintas (Europa
Ibérica, América Latina), como um modo de organizar um sistema onde o próprio
corpus se a
ltera tão rapidamente. Trata-se de pensar em conceitos fluidos que
questionem a idéia de identi dade, que obriguem a pensar que o instável é uma constante
e a estabilidade uma busca
que tem elementos mais mitológicos que científicos. Como
colocam Laplantine e Nouss (2002:86), estes conceitos por sua transitoriedade,
mutabilidade e movimentação contínua são cont raditórios, o podendo ser
invocados
como resposta, já que constituem a própria questão que perturba toda a cultura
(incluindo a individual) quando se busca a estabilidade.
A negação da diferença implica em questõ
es éticas, estéticas e é uma busca
utópica, que só pode ser colocada em prática a partir de ideologias totalitárias. Essa
cegueira, embora não se trate de
um fato recente, acaba sendo apropriada pela filosofia
de mercado atual, onde a competição compreendida como algo natural gera uma
hierarquia que justifica ações continuamente e
xcludentes tanto em termos sociais quanto
materiais.
O exemplo dos espaços residuais em grandes cidades mostra como as forças de
controle não são cap azes de eliminar a participação
coletiva na constituição da cidade.
Sua presença nos interstícios da cidade questiona a idéia da oposição estável entre centro
76
Grupos que se organizam p ara detectar e informar locais onde há conexão de Internet sem senha para
acesso que esteja disponível à apropriação.
104
vs. periferia não apenas em termos geográficos, mas também culturais. A metrópole
latino-americana, atravessada por a ções do global, é reorientada pelo loca
l, criando um
resultado que evidencia que os processos culturais não se limitam à superestrutura da
rede social, mas participam dos modos de produção nos mais variados veis.
A gambiarra
, as estragias de fuga e fluidez do mercado pirata, as apropriações
emeras do esp aço pelos camelôs, pelos catadores de lixo e pelos moradores dos
espaços residua
is oferecerem uma visão mais ampla das apropriações informacionais
dinâmicas que não estão restritas aos grupos de mídia tática ou coletivos de ativistas
políticos nem a
os meios digitais como a Internet e a telefonia celular. É importante
mostrar que estas formas de organização residuais possuem uma mobilidade constante
que encontra nos sem-teto e nos
imigrantes ilegais agentes importantes cujos modos de
ação nos territórios por onde transitam devem ser co mpreendidos para que sejam
incorporados a uma análise comunicacional que não esteja
restrita aos chamados novos
meios sem uma percepção espacial.
Não se trata de um oti m ismo em que não se percebe que nos produtos piratas e
nas práticas de mercado informal
se encontra um braço de um capitalismo voraz e não
necessariamente su a alternativa, da mesma forma que, como apontado anteriormente,
nas políticas anti-imigração o que se buscav
a na verdade não era impedir a entrada dos
imigrantes aos paísesde Primeiro Mundo”, mas manter em um estado de ilegalidade
permanente grupos que servem de mão-de-obra barata à
s grandes indústrias (produtoras
e de serviços). É exatamente por saber que nos discursos pró-iden tidade e anti-pirataria
se ocultam interesses de contínua exploração dos gruposexcluídos” que é
necessário
compreender como estes discursos estão impregnados de incongruências e promessas de
falsa estabilidade. Somente desconstruindo estes discursos é possível ver o que se
esconde por detrás, per
ceber que o processo de exclusão vai se alimentando do sistema
paralelo dos excluídos, que podem ter sua existência ignorada a qualquer momento.
No entanto, a presença qu
antitativa destes grupos nas cidades e sua permanência
no tempo não podem ser ignoradas. Esta presença e o contato com o território que por
um lado busca excl-los são geradores
de resultados informacionais importantes, e o
processo de apropriação e ocupação do território de modo fluido, sua percepção do
ambiente e recodificação dos dejetos constitui uma forma de construção cri
ativa
fundament al para a constituição dos processos culturais emergentes.
105
Referências bibliográficas
AUGÉ, Marc. Não lugares. Introdução a uma antropologia da supermodernidade. Campinas:
Papirus, 2001.
AVERROÈS. La intelligence et la pensée.
Tradução, introdução e notas de Alain de Libera.
Paris: Flammarion, GF 974, 1998.
ARANTES, Olia. Urbanismo em fim de linha. São Paulo: EDUSP, 2001.
BAKHTIN, Mikhail. Problemas da poética de Dostovski. Tradução de Paulo Bezerra. São
Paul
o: Forense Universitária, 2005.
_____. A estética d a criação verbal. Tradução de Maria Ermantina Pereira. São Paulo: Ma rtins
Fontes, 1997.
_____. A Cultura Popular na Ida de Média e
no Renascimento: o contexto de Fraois Rabelais.
Tradução de Yara Frateschi Vieira. São Paulo: Hucitec; Bralia: Universidade de
Bralia, 1987.
BATAILLE, Georges. eti sme. Paris: Les Éditions de Minuit, 1957.
BATESON, Gregory. Steps to an ecology of mind. Chicago: University of Chicago Press, 2000.
BENJAMIN, Walter. “Paris do Segundo Império”. In: Obras esc
olhidas III. Tradução de José
Carlos Martins Barbosa e Hemmerson Alves Baptista. São Paulo: Brasiliense, 1989.
_____. “Magia e cnica, arte e política. Ensaios sobre literatura e histó
ria da cultura”. In: Obras
Escolhidas I. Tradução de Sergio Paulo Rouanet. São Paulo: Br asiliense, 1987.
BORJA, Jordi; CASTELLS, Manuel. Local y global: la gestión de las ciuda
des en la era de la
información. Madrid: United Nations for Human Settlements (Habitat) -Taurus, 1997.
BORJA-VILLEL, Manuel. F undació A ntoni Tápies. Barcelona: Edicions de l´Eixample
,
Fundació Antonipies, 2004.
BRISSAC, Nelson. “KRZYSZTOF WODICZKO” e “Terreno Vago”. In:
http://www.pucsp.br/artecidade/. Acessado entre agosto de 2003 e janeiro de 2006.
CAMPOS, Haroldo de. «Da razão antropofágica: a Europa sob o signo da devoração», Re vista
Coquio-Letras, Lisboa: 62, 1981.
_____. «Superación de
los lenguajes excl usivos», in: Arica Latina en su literatura, 2ª ed.,
coord. César Fernández Moreno, México/Madrid/Buenos
Aires, Siglo XXI, 1974.
CANCLINI, Néstor García. A globalização imaginada. Tradução de Sérgio Molina. São Paulo:
Iluminuras, 2003.
_____. Imaginários urbanos. Buenos Aires: Eudeba, 1997.
CARERI, Fr
ancesco. Walkscapes, el andar como práctica estética. Tradução de Maurici Pia.
Barcelona: Editorial Gustavo Gilli, 2002.
CARPENTIER, Alejo. «Lo barroco y lo
real-maravilloso». In: Razón de ser, Caracas, Eds. del
Rectorado de la Universidad Central de Venezuela, 1976.
_____. Literatura e consciência política
na Arica Latina. Tradução de Manuel Palmeirim.
São Paulo: Global Editora, 1969.
106
CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede. Tradução de Roneide Majer. São Paulo: Paz e Terra,
2002.
_____. Cidade, democracia e socialismo. A experiência das associa
ções de vizinhos de Madrid.
Tradução de Gloria Rodríguez. Rio de Ja neiro: Paz e Terra, 1980.
CASTRO, M. C. Pozzi; SILVA, H. M. Barreto da. Legislação e mercado residencial em São
P
aulo. São Paulo: LABHAB;FAUUSP, 1997.
CHIAMPI, Irlemar. Barroco e modernidade. São Paulo: Perspectiva/FAPESP, 1998.
DAVIS, Mike. Planeta favela. Tradução de Beatriz Medina. São Paulo: Boitempo, 2006.
DE CERTEAU, Miche
l. invention du quotidien II. Habiter, cuisiner. Paris: Gallimard, 1994.
_____. invention du quotidien I. Arts de faire. Paris: Gallimard, 1990.
DEBORD, Guy.
La sociedad del espetáculo. Tradução de José Luis Pardo. Valência: Pre-textos,
1999.
DELEUZE, Gilles. “Post-scriptum sobre as sociedades de controle”. In: Conversações: 1972-
1990. Rio de Janeiro:
Editora 34, 1992.
_____ e GUATTARY, Félix. Mil Platôs - capitali smo e esquizofrenia. Vol. 5. Tradução de Ana
Lúci a de Oliveira. Rio de Janeiro: Editora 34, 1997.
DELGADO, Manuel. Sociedades Movedi
zas. Pasos hacia una antropología de las calles.
Barcelona: Editorial Anagrama, 2007.
_____. El animal pú blico. Hacia una antropol
ogía de los espacios urbanos. Barcelona: Editorial
Anagrama, 1999.
_____. “Naturalismo y realismo en antropología urbana. Problemas metodológicos para una
etno
grafía de espacios públicos”. In: PUENTE, Alfredo (org.). Excentrici(u)dades.docs.
León: Ofi cina León Gaudi, 2003.
DOCTOR, Rafael (org.). Nuevas cartografías de Madrid. Ma
drid: La Casa Encendida, 2004.
DORFLES, Gillo. in tervalle perdu. Paris: Meridiens Klincksieck, 1984.
DOUGLAS, Mary. Purity and Danger. An analysis of concept of pollution a
nd taboo. Londres:
Routledge Classics, 1966.
ECO, Umberto. Viagem na irrealidade cotidiana. Tradução de Aurora Bernardini e Humberto
Andrade. Rio de Janeir o: Nova Fronteira, 1985.
FERRARA, Luccia D’A
léssio. Design em espaços. São Paulo: Rosari, 2002.
_____. Os significados urbanos. São Paulo: EDUSP/FAPESP, 2000.
_____. A estratégia dos signos. São Paulo: Perspectiva, 1986.
FERRAZ, Ma
rcelo Carvalho; BO BARDI, Lina; CANDIDO, Antonio. Arquitetura rural na
Serra da Mantiqueira. São Paulo: Instituto Lina Bo Bardi, 1995.
FIX, Mariana. Parceiros da Exclusã
o. São Paulo: Boitempo, 2001.
FLAM, Jack. Robert Smithson. The collected writings. Berkley: The University of California
Press, 1996.
FLUSSER, Vilém. O mundo codificado. Tra
dução de Raquel Abi-Samara. São Paulo: Cosac e
Naify, 2007.
107
FOUCAULT, Michel. “De outros espaços”. Tradução de Pedro Moura. Conferência proferida no
Cercle dtudes Architecturales em 14 de Março de 1967. E-zine Virose
http://www.virose.pt (publicado i gualmente em A
rchitecture, Movement, Continuité, 5,
de 1984).
FREUD, Sigmund. Obras psicog i cas completas de Sigmund Freud. Edição Standard
Brasileira. Vols. I a VII. Rio de Janeiro: Imago, 1989.
FREYRE, Gil
berto. Sobrados e mocambos. Rio de Janeiro: Record, 2000.
GIBSON, James J. Ecological aproach to visual perception. London: Studio Visa, 1986.
GLISSANT, Édouard. Poétique de la relat
ion. Paris: Gallimard, 1990.
GÓNGORA, Luis de. Antología poética. Madrid: Castalia Didáctica, 1986.
GOUDET, Mila. Naufrágios urbanos. Dissertação de mestrado orientada por Suely Rolnik
apresentada ao Programa de Psicologia Clínica da PUC de São Paulo (2005).
GRAFMEYER, Yves; JOSEPH, Isaac (orgs.). ecole de Chicago. Naissance de l´écologie
urbaine. M
alesherbes: Flammarion, 2007.
GUATTARY, Féli x. Cartographies schizoanalytiques. Paris: Éditions Galilée, 1989.
JACOBS, Jane. Morte e vida de grandes cidades. Tradução de Carlos Mendes Rosa. São
Paulo:
Martins Fontes, 2000.
JAMESON, Fredric. Pós-modernismo. A gica cultural do capitalismo tardio. Tradução de
Maria Elisa Cevasco. São Paulo: Ática, 2002.
JOHNSON, Steven. Em
ergênciaA dinâmica de rede em formigas, cérebros, cidades e
softwares. Tradução de Maria Carmelitadua Dias. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003.
_____. Cu
ltura da interfacecomo o computador transforma nossa maneira de criar e
comunicar. Tradução de Maria Luiza X. de A. Borges. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar,
2001.
KOOLHAAS, Rem; BROWN, Simon; LINK, Jon. Content. Vol. 33. Colônia: Taschen, 2004.
_____; CHUNG, Chuihua Judy; INABA, Jeffrey; LEONG, Sze Tsung (orgs.).
Project on the city
2Harvard Design School Guide to Shopping. Cambridge: Taschen, 2001.
_____; BOERI, Stefano; KWINTER, Sanford; FABRICIUS, Daniela; OBRIST, Hans Ulrich;
TAZI, Nadia.
Mutaciones. Tradução de Victor Tenéz, Lluís Rey, Iva n Alcázar, Alex
Martínez, Anna Campeny, Glória Bohigas, Isa bel Nuñez e Jordi Palou. Barcelona:
Actar, 2001.
_____. Deliri
ous new york. Nova Iorque: The Monacelli Press, 1978.
JOYCE, James. F innegans WakeFinnicius Revém. Vols. 1 a 4. Tradução de Donaldo Schuler.
São Paulo: Ateliê Editorial, 1999-2002.
LAPLANTINE, Fra
nçois; NOUSS, Alexis. A mestagem. Tradução de Ana Cristina Leonardo.
Lisboa: Flammarion, 2002.
LEFEBVRE, Henri. O direito à cidade. São Paulo: Centauro, 2001.
LIMA, Lezama. La expresión a
mericana. La Habana: Letras Cubanas, 1993.
LIZCANO, Emmanuel. Metáforas que nos piensan. Madrid: Ediciones Bajo Cero, 2006.
108
LYNCH, Kevin. A imagem da cidade. Tradução de Jefferson Luiz Camargo. São Paulo: Martins
Fontes, 1997.
_____ e SOUTHWORTH, Michael. Echar a perder, una análisis del deterior
o. Tradução de
Joaqn Rodriguez Feo.Barcelona: Gustavo Gilli, 2005.
LOTMAN, Iuri M. Universe of the mind, a semiotic th eory of culture. Bloomington: Indiana
University Press, 2000a
.
_____. La semiosfera IIISemiótica de las artes y de la cultura. Tradução e organização de
Desiderio Navarro. Madrid:tedra Univesitat de Valencia, 2000b.
_____. Cultura y
explosión. Tradução de Delfina Muschietti. Barcelona: Gedisa, 1999.
_____. La semiosfera ISemiótica de la cultura y del texto. Tradução e organização de
Desiderio N
avarro. Madrid:tedra Univesitat de Valencia, 1998a.
_____. La semiosfera IISemiótica de la cultura, del texto, de la conducta y del espacio.
Tradução e
organização de Desiderio Navarro. Madrid:tedra Univesitat de Valencia,
1998b.
_____; USPENSKII, Boris; IVANOV, V. Ensaios de se miótica sovtica. Tradução de Victoria
Navas e Salvato T
elez de Menezes. Lisboa: Horizonte Universitário, 1981.
KOTLER, Philip; ARMSTRONG, Gary. Princípios de Marketing. Tradução de Vera Whately.
Rio de Janeiro, LTC, 1999.
KRISTEVA, Julia. Étrangers à nous-mêmes
. Paris: Fayard, 1988.
MACHADO, Irene. Escola de SemióticaA experiência de Tártu-Moscou para o estudo da
Cultura. São Paulo: Ateliê Editoria l/FAPESP, 2003.
MALKUZYNSKI, Pierrette. “El c
ampo conceptual del (neo)barroco. Recorrido histórico y
etmológico”. Tradução de Desiderio Navarro. In: Revista Criterios 32, La Habana,
julho-dezembro de 1994, pp.131-170.
MALLARMÉ, Stéphane. Um la
nce de dados. Tradução de Haroldo de Campos, Augusto de
Campos e Décio Pignatari. São Paulo: Perspectiva, 1974.
MARICATO, Ermínia. Brasil, cidades. Alternativas para a
crise urbana. Petrópolis: Vozes,
2002.
MARTIN-BARBERO, Jesús, Ofício de Cartógrafo. Travesías latinoamericanas de la
comunicación en la cultura. Santiago: Fondo
de Cultura Económica, 2002.
MATURANA, Humberto. A o ntologia da realidade. Organização e tradução de Cristina Magro,
Miriam Graciano e Nelson Vaz. Belo Horizonte: Edit ora da U
FMG, 2002.
_____ e VARELA, Francisco. Autopoiesis and cognition. Nova Iorque: Kluwer Print, 1980.
MCLUHAN, Marshal. Os meios de comunicação como extensões do home
m. Tradução de Décio
Pignatari. São Paulo: Cultrix, 1974.
MEYER, Regina Maria Prosperi; GROSTEIN, Marta Dora; BIDRMAN, Ciro. São Paulo
metpole. São Paulo: EDUSP, 2004.
MITCHELL, William J. The cybo
rg self and the networked city. Cambridge: MIT Press, 2003.
MORIN, Edgard. O todo, vol.4. As idéias, seu habitat, sua vida, seus co stumes,
sua
organização. Tradução de Juremir Machado da Silva. Porto Ale gre: Sulina, 1997.
109
MOURE, Gloria. Gordon Matta-Clark. Catálogo da exposição do Centro de Arte Reina Sofia,
Barcelona: Ediciones Polígrafa, 2006.
NAREDO, José Manuel. “Los mitos inmobiliarios de nuestro tiempo”. J
ornal La Vanguardia, 20
de outubro de 2005
NIETZCHE, Friedrich. Para além do bem e d o mal. Tradução de Alex Marins. São Paulo:
Martin Claret, 2003.
PARTOUCHE, Marc. Art and Cognition.
Pratiques Artistiques et Sciences Co gnitives.
Marseille: Cyprès-Ecole d´Aix-en-Provence, 1994.
PIAS, Claus (org.). Cybernetics-Kybernetik I e
II. Berlim: Diaphanes, 2004.
PIGNATARI, Décio. Informação, lingu agem, comunicação. São Paulo: Ateliê Editorial, 2002.
_____. Semiótica da arte e da arquitetura. São P
aulo: Ateliê Editoria l, 2004.
PINHEIRO, Amálio. “Por entre dias e artes, a cultura”. In:mus 2, publicação do projeto
Rumos do Itaú Cultural. Caxias do Sul: Itaú Cultural, 2007.
_____. Aquém
da identidade e da oposição. Formas na cultura mesta. Piracicaba: UNIMEP,
1995.
_____. A textura obra realidade. São Paulo: Cortez, 1983.
POPPER, Karl. A
lógica da pesquisa científica. Tradução de Leonidas Hegenberg. São Paulo:
Cultrix, 2004.
PRIGOGINE, I. ; STENGERS. Entre le temps et l´éternité. Manchecourt: Flamma
rion, 1992.
_____ e NICOLIS, G. Exploring complexity. São Francisco: Freeman, 1989.
PROUST, Marcel. Em busca do tempo perdido. Tradução de Fernando Py. Rio de Janeiro:
Ediouro, 2002.
RAQUEJO, Tonia. L
and Art. Coleção Arte Hoy. San Sebastian: Editora Narea, 1998.
RENNÓ, Raquel. Do Mármore ao Vidromercados públicos e supermercados, curva e re
ta
sobre a cidade. São Paulo: Annablume, 2006.
ROSAS, Ricardo. “Notas sobre o coletivismo artístico no Brasil”. Revista Digital Tropico,
http://p.php.uol.com.br/tropico/html/textos/2578,1.shl. Acessada em 20 de agosto
de 2006.
_____. “(Ins) urncias”. Revista Digital Rizoma,
http://www.rizoma.net/interna.php?id=210&secao=artefato. Acessada em 20 de
agosto de 2006.
ROWE, Colin; KOETHER, Fred. Collage City. Cambridge: MIT Press, 1983.
SADLER, Simon. The situationist city. Londres: The MIT Press, 1998.
SANTOS, Milton. Pensando o espaço do H
omem. São Paulo: EDUSP, 2004.
_____. A natureza do espaço. São Paulo: EDUSP, 2002a.
_____. Por uma geografi a nova. São Paulo: EDUSP, 2002b.
_____. O Novo Mapa do mundoFim de
Século e Globalização. São Paulo: Hucitec, 1993.
110
SARDUY, Se vero. Barroco. Tradução de Maria Lurdesdice. Lisboa: Vega, s/d.
SASSEN, Sas kia. “La Política Migratória. Del control a la regulación”. Revista Minerva número
05/2007. In: http://www.circulobellasartes.com/ag_ediciones-minerva-
LeerMinervaCompleto.php?art=145&pag=1#leer.
Acessada em 7 de junho de 2007.
_____. As cidades na economia mundial. Tradução de Carlos Eunio de Moura. São Paulo:
Nobel, 1998.
SEMPRINI, Andrea. La Società di
flusso - Senso e identità nelle società contemporanee. Milão:
Franco Angeli, 2003.
SIMONDON, Gilbert. Du mode dexistence des objets te
chniques. Paris: Aubier Philosophie,
1989.
SIMMEL, Georg. El individuo y la libertad. Ensayos de Crítica de la Cultura. Barcelona:
Península, 1998.
SOJA, Edward W. Ge
ografias pós-modernas - A reafirmação do espaço na teoria social crítica.
Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1993.
SOLÀ-MORALES, Ignasi. Territórios. Bar
celona: Gusta vo Gil i, 2002.
_____. Diferencias, topografia de la arquitectura contemporânea. Barcelona: Gustavo Gilli,
1995.
_____.Urbani intersticielle”. In: Inter
Art Actuel, Quebec, 1995.
SOLÀ-MORALES I RUBIÓ, Manuel de. Las formas de crecimiento urbano. Barcelona:
Edicions UPC, 1997.
SONTAG, Susan. Aids e suas metáforas. Tradução de Pau
lo Henriques Britto. São Paulo:
Companhia das Letras, 1989.
SOUSA SANTOS, Boaventura. P ara um novo senso comum: a ciência, o d ireito e a política na
tra
nsição paradigmática. Vol. 4. A gramática do tempopara uma nova cultura
política. São Paulo: Cortez, 2006.
_____. Para um novo senso comum: a c
iência, o direito e a pol ítica na transição paradigmática.
Vol. 1 A crítica da razão indolentecontra o desperdício d
a experiência. São Paulo:
Cortez, 2000.
SPENGLER, Oswald. La Decadencia de Occidente. Bosquejo de uma morfología de la historia
universal. Tomos
II e II. Tradução de Manuel Morente. Madrid: Editorial Esp asa Calpe,
1998.
TARRIUS, Alain. Les Fourmis d’Europe. Migrants riches, migrants pa uvres et nouvelles vi
lles
internationales. Paris: Éditions L’Harmattan, 1992.
TYNIANOV, I. Le problème du langue poétique. Milão: Il Saggiatore, 1966.
TOMAS, David. Es thétique des arts diati
ques, ed. Louise Poissant. Qbec: Presses
delUniversité du Qbec, 2003.
VARGAS, Heliana Comin. O espaço terciárioO lugar, a arquitetura e a imagem do
corcio. São Pa
ulo: SENAC, 2001.
111
VENTURI, Robert. Complexidade e contradição em arquitetura. Tradução de Álvaro Cabral.
São Paulo: Martins Fontes, 2004.
_____ e SCOTT BROWN. Architecture as sign a nd syste
ms - for a mannerist time. Cambridge:
The Belknap Press (MIT Press), 2004.
_____; SCOTT BROWN, Denise; IZENOUR, Steven. Aprendendo com la s Vegas. Tradução de
Pedro Maia Soares. São Pau
lo: Cosac e Naify, 2003.
VIGARELLO, Georges. O limpo e o sujo, uma história da higiene corporal. São Paulo: Martins
Fontes, 1996.
VON GLASERSFELD, Ernst. ‘Cybernetic and t he art of living’, 13t
h European Meeting on
cybernetics and systems research. Viena, Abril, 1996.
_____. ‘Distinguishing the observer: an attempt at interpreting Maturana’. (on line), 1997.
http://www.oikos.org/vonobserv.htm. Site acessado em 26 de outubro de 2004.
WIENER, Norbert. Ciência e Sociedade. São Paulo: Cultrix, 1993.
WILHEIM, Jorge. Cidades: o substantivo e o adjetivo. São Paul
o: Perspectiva, 2003.
112
Periódicos
Autour d´Averroès. L´héritage andalou. Número 1, Marselha: éditions Parentses, 2003.
Poïesis. Archictecture, ville et socie humaine. Inventer la ville: loeuvre collectiv
e. Número
15, 2003. Toulouse: Éditions Poïesis.
Sign Systems Studies. Número 29.1, 2001 Tartu: Tartu University Press, Estonia.
The American Journal of Se miotics. Vol. 11, número 1-2, Bloomington: Indiana University,
1994.
DVD
Coleção Paulo FreireLegado e Inspirações. São Paulo: Atta Mídia e Educação, 2007.
Encontro com Milton Santos ou o mundo globaliz
ado visto do lado de . Direçao Silvio
Tendler. Brasil: Caliban, 2006
Vizinhos. Marta Nehring. Brasil : Tatu Produçoes , 2004
Les glaneuses et la glaneuse. Direçao Agnès V
ardá. Total Fim: Fraa. 2000
Websites
http://www.centrodametropole.org.br/
Acessado em agosto de 2006.
http://www.corocoletivo.org/
Acessado em agosto de 2006.
http://www.flusserstudies.net/
Acessado em maio de 2007.
http://www.fol ha.uol.com.br/
Acessado em agosto de 2006.
http://www.ine.es/
Acessado em 31 de agosto de 2006.
http://www.leobassi.com
Acessado em agosto de 2006.
http://www.madrid.org/
Acessado em agosto de 2006.
http://madrid.indymedia.org
Acessado em agosto de 2006.
http://www.metareciclagem.org
Acessado em agosto de 2006.
http://midiaindependente.org
Acessado em agosto de 2006.
http://www.mtst.info/
Acessado em 24 de julho de 2005 e 31 de janeiro de 2006.
http://www.opusdei.es
Acessado em 31 de janeiro de 2006.
http://www.revistapol is.cl
Acessado em junho de 2007.
http://robertsmithson.com
Acessado em junho de 2006.
http://www.sindominio.net/fiambrera/
Acessado em junho de 2006.
http://uol.com.br
Acessado em agosto de 2006.
http://www.vayatele.com/2006/07/06-v-de-vivienda.php
Acessado em agosto de 2006.
http://vivienda.todaviapordeterminar.com/index.php
Acessado em agosto de 2006.
http://www.unav.es/historia/aetas/boletin/ocho/textos/ciudad.html
Acessado em agosto de 2006.
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
Anexos
Catador de lixo. Riacho Fundo, Distrito Federal, 2006.
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
RUTH TOLEDANO
V de violencia
RUTH TOLEDANO
EL PAÍS – 26.05.2006
La mejor manera, ya se sabe, de combatir el miedo es asustando
"Todos los españoles tienen derecho a disfrutar de una vivienda digna y adecuada. Los poderes
públicos promoverán las condiciones necesarias y establecerán las normas pertinentes para hacer
efectivo este derecho, regulando la utilización del suelo de acuerdo con el interés general para
impedir la especulación. La comunidad participará en las plusvalías que genere la acción
urbanística de los entes públicos" (artículo 47, Constitución Española).
El domingo pasado la consigna era: Por una vivienda digna. V de vivienda. El final fue: V de
violencia. Tras la afluencia de gente de la semana anterior, se había repetido la convocatoria a
través del correo electrónico, de los SMS y de algunos blogs, una llamada independiente que no
lideraba ninguna asociación, partido político o sindicato: pura acción ciudadana. Se hizo el
llamamiento a una sentada en la Puerta del Sol que concentró a más de 1.500 personas y que
intentó convertirse en una marcha hacia las inmediaciones del Congreso contra la que la policía
cargó con la saña que caracteriza a las fuerzas antidisturbios, ya sea de forma espontánea o
atendiendo a las órdenes oportunas.
La del domingo era una protesta pacífica por el elevado precio y por las malas condiciones de la
vivienda, la respuesta casi festiva a una especulación inmobiliaria que alcanza cotas de
vergüenza, como todos los días podemos comprobar en las propias carnes contribuyentes o
sencillamente abriendo el periódico para asistir al último escándalo financiero: el sector
inmobiliario siempre anda implicado en los delitos de mayor trascendencia.
La V de vivienda se convirtió en V de violencia cuando los concentrados en Sol intentaron
moverse hacia la Carrera de San Jerónimo, Alcalá o Preciados y la policía les impidió el paso,
encerrándolos en la plaza. Ahí empezaron los primeros empujones, que pronto se convirtieron en
porrazos. He visto marcas de porras que al Defensor del Pueblo también le interesaría ver y que la
delegada del Gobierno debería llevar reproducidas a sus flamantes reuniones.
Es más que preocupante que una acción como la descrita sea sofocada a estas alturas
democráticas con violencia policial. Tales cuerpos de seguridad justificarán su actuación con el
viejo argumento de la provocación, pero llueve sobre mojado: en una de las manifestaciones
pacíficas contra la guerra de Irak hubo casi doscientos heridos y convirtieron también la Puerta
del Sol en una ratonera donde la gente permaneció aterrorizada. Los medios de comunicación
apenas dieron cobertura al episodio y la policía aseguró que había habido provocación por parte
de algunos manifestantes, pero doscientos heridos por golpes de quienes tienen que defendernos
es algo inaceptable.
En menor medida, la carga del otro día fue similar. Y aun concediendo que en este tipo de
circunstancias pueda haber algún elemento descontrolado que pretenda reventar el desarrollo
pacífico de los acontecimientos, lo lógico en un Estado realmente libre y democrático es que los
cuerpos de seguridad defiendan al resto de los participantes de esos mismos elementos, en lugar
de atacar indiscriminadamente y con una fuerza que de bruta pasa con facilidad a brutal. El otro
día hubo también detenidos, que pasaron por calabozos que describen como repugnantes y en los
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
que recibieron un trato que si es como denuncian sería para abrir una investigación en todas las
comisarías. Los sucesos de Fuenlabrada, en los que fueron también detenidos dos jóvenes
hermanos por portar banderas y lanzar consignas republicanas al paso de Felipe de Borbón y su
esposa Letizia, no es precisamente un buen índice sobre la libertad de expresión, sobre todo
acerca de ciertos asuntos.
La única explicación para que esto se produzca se encuentra en el miedo que haya podido
provocar en el Gobierno el éxito de la primera sentada, celebrada el domingo anterior al de la
carga y representativa, por ser secundada rápida y fluidamente, de la necesidad de exponer en la
calle uno de los mayores problemas del sistema y de la operatividad de los nuevos canales de
comunicación social y de convocatoria. Tienen un miedo a que la cosa crezca y se les vaya de las
manos: siempre les quedará París para ilustrarlo. Y la mejor manera, ya se sabe, de combatir el
miedo es asustando. Les damos un susto a la segunda y no se atreverán a salir una tercera. Se
equivocan, porque la tercera será el próximo domingo, pero además se equivocan si piensan que
pueden tapar a porrazos un problema, el de la vivienda, que existe y que volverá a manifestarse
tarde o temprano. Pero además se equivocan desatendiendo la voz de muchos jóvenes, y no tan
jóvenes, que están en su derecho a ocupar las calles para su expresión. Cerrarles la boca con
violencia es encender una mecha que nadie quiere ver arder
1
.
______________
1
Em dezembro de 2006, segundo o jornal El País de 23/12, a manifestação pela Vivienda Digna já
mobilizava 15 mil participantes em Madrid, 7 mil em Barcelona, 2 mil em Sevilha e algumas centenas em
Valencia, Málaga, Alicante, Zamora, Murcia e Merida. No mesmo jornal no dia 30/11 foi publicado que o
relator de assuntos de habitação da ONU, Miloon Kothari, declarou que a situação da especulação
imobiliária na Espanha é “muito grave” e que não encontra paralelo em outros países economicamente
desenvolvidos.
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u105468.shtml
10/02/2005 - 09h10
Justiça determina remoção da única favela do Alto de Pinheiros
Publicidade
VICTOR RAMOS
da Folha de S.Paulo
Depois de cerca de 40 anos, a única favela do Alto de Pinheiros, bairro de classe média alta na
zona oeste de São Paulo, está prestes a ser desocupada. A Justiça decidiu pela reintegração de
posse aos proprietários da área e a saída dos atuais moradores deve ocorrer neste semestre.
A favela, localizada na rua Djalma Coelho, é vizinha de casas e prédios de alto nível e fica
próxima de áreas como a Vila Madalena e a praça do Pôr-do-Sol.
A decisão pela reintegração foi tomada pelo Tribunal de Alçada Civil, em segunda instância, no
final do ano passado, e tem poucas chances de ser modificada, conforme admitem os próprios
advogados dos moradores.
De acordo com a Associação em Defesa da Moradia, que representa os moradores na Justiça,
aproximadamente 100 famílias vivem no lugar.
Antonio de Arruda Sampaio, advogado dos proprietários do terreno, disse que a expectativa é
conseguir uma solução negociada para a saída dos moradores. "A esperança é que haja um
entendimento entre as partes."
Os moradores da favela também esperam uma saída negociada, recomendada por seus próprios
advogados. Representantes dos proprietários da área discutem valores com algumas famílias que
vivem no local para que elas deixem a favela.
Segundo a Folha apurou, esses valores variam em torno de R$ 4.500, dependendo do tamanho da
casa.
O prazo que vem sendo discutido para a saída, dentro desse acordo, vai até abril. Segundo os
moradores da área, as famílias que vivem na favela estão cientes da situação e não pretendem
resistir à decisão judicial. Eles disseram que a intenção da maioria é sair antes que haja uma ação
de despejo com uso de força policial.
A disputa judicial em torno da área já vem se arrastando por mais de 30 anos, com decisões
favoráveis ora para os proprietários do terreno, ora para os moradores da favela. Com a decisão
do Tribunal de Alçada Civil, no entanto, a disputa jurídica parece ter chegado ao fim, apesar do
recurso interposto pela defesa. "Eles vão ter de sair", disse Edvaldo Falcão, um dos advogados
dos favelados.
Adenor Patrício de Almeida, 58, conhecido como "seu Dinha", está no local há mais de 40 anos.
Dono de um bar na favela e um dos mais antigos ocupantes da área, reconhece que terá de se
mudar. "Dessa vez não tem jeito. No final de março já devem estar derrubando tudo."
Isso apesar de o local constar no Plano Diretor - lei municipal que orienta o crescimento e a
ocupação da cidade - regional de Pinheiros como área de interesse social, o que autoriza a
prefeitura a fazer parcerias com a iniciativa privada para a construção de habitações para os atuais
ocupantes.
No entanto, de acordo com a subprefeitura de Pinheiros, nenhum projeto habitacional está
previsto para o local. A função social do local foi citada no recurso, mas Falcão afirmou não
acreditar numa mudança.
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
Movimentos sociais protestam contra política higienista da Prefeitura de São Paulo
http://ocupacaoprestesmaia.zip.net/
(18/05/2006)
CARTA ABERTA À POPULAÇÃO DA CIDADE DE SÃO PAULO
Nós, integrantes das Pastorais Sociais da Arquidiocese de São Paulo, dos Catadores de Materiais
Recicláveis e do Povo da Rua, denunciamos as diversas ações que vêm violando constantemente
direitos do povo pobre de nossa cidade.
DESTACAMOS ALGUMAS VIOLÊNCIAS:
1. O poder público municipal da cidade de São Paulo tem feito despejos violentos de ocupações do
centro com o uso de violência policial, sem uma política de acolhimento ou políticas voltadas à
moradia popular, além de interromper projetos de moradia em andamento.
2. Essa prefeitura tem realizado a expulsão da população pobre do centro de São Paulo usando, para
isto, diversos mecanismos como: o custeamento com dinheiro, pressão psicológica ou violência
policial.
3. Proíbe, ainda, o trabalho dos catadores de materiais recicláveis dificultando a organização de
cooperativas solidárias e legítimas de catadores, impedindo esses trabalhadores de lutarem por seus
direitos e inibindo as lideranças na organização dos grupos.
4. A administração pública está expulsando do centro, com violência policial, mulheres em situação
de marginalização utilizando o falso argumento de que todas estão ligadas ao tráfico de drogas.
5. A população de rua continua sendo ameaçada e assassinatos acontecem com freqüência, além dos
albergues estarem sendo transferidos para as periferias da cidade.
6. Com o argumento de um suposto embelezamento da cidade, a prefeitura de São Paulo pratica uma
política higienista agredindo a dignidade humana de nossa população e criminalizando a pobreza.
DIANTE DISTO, EXIGIMOS:
o A participação na construção de políticas públicas com um diálogo franco, direto e constante com a
prefeitura.
o A atuação integrada das Secretarias Municipais para buscarmos juntos/as soluções eficazes para a
inclusão de pessoas que foram excluídas da nossa cidade.
o Livre acesso às ruas e ao centro da cidade.
o Fim da opressão e repressão da população empobrecida do centro.
Temos direito de trabalhar, morar e organizar nossa vida no centro da cidade de São Paulo, local onde
sempre estivemos. A firmeza permanente na luta e conquista de nossos direitos vai prosseguir! Não se
iludam os que pensam que abriremos mão do que é nosso!
Assinam: Pastoral Operária, Pastoral da Mulher Marginalizada, Pastoral da Moradia, Pastoral do Povo
de Rua, Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis, Movimento Povo da Rua,
Pastoral Indigenista, Pastoral do Menor, Pastoral da Juventude, Movimento Fé e Política, CEBs,
Conselho Indigenista Missionário (CIMI-SP), Serviço Franciscano de Apoio à Reciclagem
(RECIFRAN), Cooperativa de Catadores do Glicério, Organização de Auxilio Fraterno (OAF), Casa
da Solidariedade do Ipiranga, SPM - Pastoral dos Migrantes, CLASP (Conselho de Leigos da
Arquidiocese de São Paulo), Pastoral da Criança, Cedeca, Pastoral Afro, Pastoral da Sobriedade,
Pastoral Carcerária.
Apóiam: Irmãs Catequistas Franciscanas, Grupo Justiça e Paz Irmã Dorothy - CRB - SP, Padres
Oblatos de Maria Imaculada, Serviço de Paz, Justiça e Ecologia do Brasil (SERPAJE), Educação de
Carentes e Afro-descendentes (EDUCAFRO), Serviço Franciscano de Solidariedade (SEFRAS).
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
http://www.centrodametropole.org.br/divercidade/numero6/5.htmlDocumentários -
Filme aborda a relação entre moradores de favela na Vila Madalena e seus vizinhos
O documentário, finalizado em 2004, retrata o início do bairro da Vila Madalena e seu
desenvolvimento urbano, revelando que a cidade de São Paulo cresceu de forma desordenada,
unindo pessoas de diferentes níveis sociais e econômicos em um espaço cada vez menor.
Divulgação
A convivência entre moradores de uma
favela da Vila Madalena com os moradores
mais abastados das redondezas foi abordada
no documentário Vizinhos , de Marta
Nehring. Por meio dos depoimentos é
possível observar como se dava a relação
entre esses vizinhos tão diferentes e o que
uns pensavam sobre os outros.
Cena do filme Vizinhos
Divulgação
A favela, que foi removida no final do primeiro
semestre de 2005, também será o tema do próximo
filme de Nehring. A documentarista filmou todo o
processo de despejo, a derrubada dos barracos e o
debate entre os ex-moradores sobre a situação,
analisando os reais motivos que os levaram a serem
expulsos do local.
O filme Vizinhos participou da 28ª Mostra de Cinema
em São Paulo e da 17ª Mostra de Audiovisual Paulista.
Atualmente está selecionado para o 12º Festival de
Cinema de Cuiabá e o Festival de Cinema e Vídeo de
Curitiba.
Cena do filme Vizinhos
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
Comunicado da Secretaria do Estado, responsável pela remoção da comunidade de Nassau:
Segunda-feira, 06 de Dezembro de 2004
Começa nesta terça-feira, dia 7, a remoção de 348 famílias que vivem na favela Nassau,
localizada na avenida Raimundo Pereira Magalhães, n°4.001, em Pirituba, para apartamentos da
Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU). Os imóveis estão localizados
nas zonas leste, norte e sul da cidade. A desativação da favela será iniciada às 10 horas, com a
derrubada dos primeiros barracos. Autoridades estaduais irão acompanhar a mudança das 14
primeiras famílias para o Conjunto Habitacional da CDHU, onde entregam as chaves dos
apartamentos aos moradores. O empreendimento fica na avenida Raimundo Pereira de
Magalhães, n° 9.491, em Pirituba, distante três quilômetros da favela. Ao todo, os moradores da
favela serão transferidos para quatro endereços e as mudanças serão feitas em etapas até o
próximo dia 13. Durante a entrega das chaves, será assinado um convênio que formaliza a
transferência de todas as famílias da favela Nassau para os empreendimentos da CDHU. Para
evitar novas ocupações, o convênio prevê, além da demolição dos barracos, a retirada dos
entulhos, execução de um projeto de paisagismo e a recuperação de um muro existente no local.
Os novos apartamentos possuem 44,73 m² e 45,46 m² de área construída e contam com dois
dormitórios, sala, cozinha, banheiro e área de serviço. O investimento da CDHU nos quatros
empreendimentos é da ordem de R$ 12,8 milhões. A favela Nassau existe há 15 anos e a
erradicação que será realizada faz parte de um amplo programa do Governo do Estado: o Pró-Lar
Atuação em Favelas e Áreas de Risco, desenvolvido pela CDHU para garantir melhores
condições de vida às famílias que moram em situação precária, em barracos sem infra-estrutura e
em condições totalmente insalubres. A comunidade de Nassau transferida para os
empreendimentos da CDHU está inserida nesse programa. Durante os seis primeiros meses,
nenhum morador pagará prestações dos imóveis. Após este período, quem tiver renda familiar
mensal de um salário mínimo, pagará R$ 39,00 por mês à Companhia. Além disso, todos terão
carência de dois meses nas contas de água e luz. A CDHU também fará o trabalho social e de
convivência condominial com os moradores. A CDHU vem desenvolvendo há sete meses um
trabalho social junto aos moradores da favela Nassau para identificar as condições
socioeconômicas de cada família com o objetivo de realizar melhor inserção e adequação da
população no programa. Permuta - Um dos empreendimentos para o qual as famílias serão
transferidas foi construído pela Prefeitura de São Paulo. As famílias serão atendidas por causa de
uma permuta de demanda realizada com a municipalidade. A parceria previa que a CDHU iria
atender famílias da favela Jardim Primavera, zona leste da Capital, que estavam assentadas em
faixa de obra do córrego Taboão. Ao todo, 200 famílias da favela foram transferidas para o
empreendimento Iguatemi D construído pela CDHU e outras 72 serão atendidas até o fim deste
ano, no conjunto Itaim Paulista C, também edificado pela CDHU. Em contrapartida, a Prefeitura
de São Paulo disponibilizou 200 moradias do empreendimento City Jaraguá para atender famílias
que viessem a ser definidas pela companhia. O atendimento será feito agora para 200 moradores
da favela Nassau. Melhorias no bairro - Outra favela próxima a Nassau e que já foi desativada
em março deste ano, é a Anástacio. Foram transferidas 145 famílias para o conjunto Pirituba B,
na avenida Raimundo Pereira Magalhães, n° 9.851, ao lado do conjunto Jaraguá I, para onde vão
140 famílias da Nassau a partir desta terça-feira. O investimento da CDHU no empreendimento
Pirituba B foi de R$ 4 milhões. De 2003 até hoje, o Governo do Estado investiu R$ 1,2 bilhão em
programas habitacionais da Região Metropolitana de São Paulo, sendo que desses R$ 188,6
milhões beneficiaram mais de 12 mil famílias com novas moradias e urbanização de áreas
degradadas. Foram realizadas, por exemplo, na capital, a remoção das favelas Paraguai, Viaduto e
Anastácio, Vila da Paz, entre outras. Da Superintendência de Comunicação Social da CDHU
Por Victor Emanuel Lopes (LRK)
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
http://www.saopaulo.sp.gov.br/sis/newsmail.php?nid=58745
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
O pior de Madrid – proposta do ator e comediante Leo Bassi para denunciar as
intervenções agressivas do poder público, privado (e religioso) na cidade.
E S P A Ñ A , 6 de marzo del 2004
Última salida del BassiBus esta temporada: Una imagen impactante recordará la guerra de Irak
Viaje a "lo peor de Madrid": Turismo lúdico-político
Leo Bassi
Con la presentación en Madrid de los servicios Bassibus, Leo Bassi inaugura una nueva era del
turismo en la capital: el Turismo Político. Consciente de la importancia para la economía
española de estar a la última en las nuevas tendencias turísticas, Leo Bassi ha decidido
revolucionar la manera de gozar de Madrid.
Sin menospreciar la importancia de sus monumentos, museos y parques históricos, el artista
italiano quiere demostrar que el prodigioso crecimiento urbano de los últimos años ha creado
nuevos y sorprendentes lugares de grandísimo impacto visual y emocional que los clásicos "Tour
Operadores" ignoran.
Con esta filosofía nace "Viaje a lo Peor de Madrid". Para llevar a la gente adonde nadie les ha
llevado antes, visitando el Madrid de hoy, con sus horrores estéticos y sus desastres ecológicos y
sociales. Recordando los atentados contra la memoria histórica, las burlas al código penal, las
estafas astronómicas y el asalto planificado al sistema democrático...
Una ciudad donde los ricos que viven en urbanizaciones-búnker defendidas por ejércitos
privados. Una ciudad de sectas medievales que dominan el mundo de las finanzas, de niños que
caminan sin zapatos en las aldeas de chabolas rumanas; de pistas de nieve artificial que
pertenecen a dueños iraquíes y de tumbas faraónicas para viejos dictadores.
Un Madrid lleno de grúas, invadido de asfalto y de hormigón. Con proyectos ambiciosos y que, al
mismo tiempo, resulta profundamente paleta y provinciana en su deseo de ser "moderna".
Una realidad patética que encanta al Bassi-Bufón y que hace de Madrid un espectáculo
esperpéntico, felliniano, de una comicidad inmejorable... y que disfrutarán los pasajeros de los
Bassibus.
Una última consideración. La iniciativa es profundamente política teniendo en cuenta como telón
de fondo las elecciones del 14-M. Constatando el estado de desánimo de la oposición en España,
el Bassibus, en su humilde propuesta, pretende reavivar el espíritu rebelde y crítico sin el cual la
democracia no puede desarrollarse.
Los seis viajes anteriores del BassiBus
25 de enero- En el primer viaje a "Lo Peor de Madrid", el Bassibus viajó al Valle de los Caídos.
Se proyectó una entrevista en vídeo con uno de los únicos presos todavía vivos que trabajaron en
su construcción, el historiador Nicolás Sánchez Albornoz, y se presentó Francolandia, el parque
temático sobre el franquismo. La guinda final la puso el irreverente bufón italiano afincado en
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
España, que colocó una foto de la reunión de Franco y Sadam Hussein en 1974 sobre la tumba del
dictador español.
1 de febrero- En el segundo trayecto, se visitó la estación del AVE en Yebes, Guadalajara, a 10
km. de la ciudad para satisfacer los intereses inmobiliarios de la familia de la presidenta de la
Comunidad de Madrid, Esperanza Aguirre, en concreto, de la tía de su marido, que es propietaria
de las fincas colindantes y pretende construir allí toda una ciudad para 35.000 habitantes.
Previamente, el autobús pasó por la sede del Partido Popular, en la calle Génova, y sus
alrededores, donde se encuentran la galería de arte Marlborough y el restaurante Jockey, del que
es dueño el ex-Consejero de Obras Públicas de la Comunidad de Madrid, Luis Eduardo Cortés, y
en el que un filete cuesta 67 €. La carta de Jockey le fue mostrada más tarde al patriarca de un
poblado gitano, quien no pudo emitir juicio alguno sobre la misma porque.. no sabía leer.
8 de febrero- En el tercer viaje del Bassibus, los pasajeros pudieron contemplar el parque de nieve
Xanadú y sus tramas inmobiliarias, la sede de Euroholding, buque insignia de Francisco Vázquez
y su sobrino Francisco Bravo, empresarios implicados en el escándalo de Tamayo y Sáez. El
actor Gustavo Gonzalo, protagonista del cartel preelectoral del Partido Popular, confesó ante la
sede de este que no vota por el PP.
15 de febrero- En el cuarto y último viaje, se fue al Parque temático de la Warner, donde se
concedió el I Bassibus "Lo Peor de Madrid" a los directivos de AOL Time Warner y Six Flags
por su inteligencia empresarial al controlar el establecimiento de ocio con la posesión únicamente
de un 4 por ciento de las acciones, y se pudo contemplar las vastas extensiones de terreno
circundantes en las que está previsto crear un amplio complejo residencial para 60.000 personas
con los concomitantes centro comercial y campo de golf.
22 de febrero- Leo Bassi regresa al Valle de los Caídos con una caravana de seis Bassibuses, con
340 personas y periodistas de Alemania, Francia, Portugal y España. Sorprendentemente,
Patrimonio Nacional cerró el monumento nacional sin explicación alguna y no devolvió un
céntimo de los 1.360 euros que los pasajeros habían pagado por sus entradas. También se visitó la
urbanización donde vivirá Aznar, el futuro cuartel general de la OTAN en España y se saltó la
valla del campo de golf municipal de Majadahonda, para pasear por la vía pecuaria que invade.
29 de febrero- Esta vez "Lo peor de Madrid" estuvo dedicado a la organización ultracatólica de
los Legionarios de Cristo, cuyo poder se acrecienta año tras año apoyado en personas cercanas al
gobierno Popular, como Macarena Botella, hermana de Ana Botella. Visitamos su entorno
socioeconómico en las urbanizaciones del noroeste de Madrid, la "catedral" de Pozuelo, la
universidad Francisco de Vitoria, también en Pozuelo y, la Plataforma de Padres del Colegio
Virgen del Bosque, adquirido por Legionarios de Cristo el septiembre pasado, nos puso al día de
la difícil tarea de trabar el proceso de implantación de su reaccionario plan educativo. El viaje
terminó en el polo opuesto, en el poblado gitano de "La Jungla", en Mejorada del Campo,
bailando sevillanas y con Leo Bassi atravesando un tupido muro de cajas de cartón en una
minimotocicleta.
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
Mundos Soñados – boletín organizado por el colectivo Fiambrera Obrera
Bienvenidos a esta edición de mundos
Soñados.
Esta es la revista de nuestra agencia de
viajes especializada en turismos inversos.
El turismo es un fenómeno universal. La
humanidad nunca ha dejado de viajar y
realizar intercambios: yo voy a tu playa,
tu vienes a mi invernadero, yo saqueo tu
país, tu trabajas por cuatro duros en el
mío.
Mundos Soñados nos acerca de
nuevo a la experiencia de Viajar, la que
nos hace sentir esa punzada que supone
llegar a sitios desconocidos, encontrarse
con otros climas, con otras costumbres,
con la misma policía... sentir dulcemente
que echamos algo de menos: los papeles,
un trabajo digno, que nos consideren seres
humanos.
En "mundos Soñados" hemos pensado en
todo. Deseamos que nuestra revista sea
una revisión de todas aquellas
posibilidades que Vd. sabe que existen
pero que nunca ha conocido de cerca:
* Extraído de Mundos Soñados, versão digital da revista impressa distribuída em centros culturais
e nas ruas de Madri.
de entrada disfrute de "Port SIVEntura"
el parque temático especializado en
sistemas de vigilancia costera.
Conozca las últimas tecnologías en
detección de cuerpos calientes. Los
cuerpos fríos como el dinero siguen
siendo indetectables. Entre en los más
excitantes viajes a la naturaleza de
plástico con invernaderos, mosquitos y
mucho calor en nuestra sección de
Turismo Verde, o las posibilidades de
multiaventura que nuestras ofertas de
Turismo Kaki.
Si lo que desea es quedarse unas
semanas interminables aquí le
mostraremos una rigurosa selección de
hoteles para todos los disgustos de la
cadena "Paradores de Internamiento".
Y para volver a su país con casi
ninguna garantía, aquí encontrará las
mejores ofertas de Deportation-Class,
para su deportación en románticas
bodegas de ferry o en sedantes vuelos
regulares.
Todo esto en un sector en plena
expansión: no olvide que nuestro
mercado natural, el de la gente más
pobre del planeta, no ha dejado de
crecer, como nuestros beneficios, en las
últimas décadas. ¿Será casualidad que
los mismos destinos del turismo
convencional sean los puntos de partida
de este "turismo inverso" en que se
especializa mundos Soñados?
¿Qué aquellos países que alguna vez
fueron colonias, sean ahora los
principales proveedores de materias
primas y mano de obra barata y dócil?
Y si no es suficientemente barata y dócil,
no hay más que ajustar las leyes de
extranjería, estamos en ello, amenazar
con deportar a cientos de miles de
personas y seguir con el negocio.
Pero sobre todo no olvide que la riqueza
no ha dejado de crecer, tanto que los
países más ricos ya ni siquiera van a las
"cumbres contra el hambre", la riqueza
ha crecido tanto que la gente tiene cada
vez menos: menos derechos sociales,
menos libertades, menos futuro y sobre
todo menos presente...
¿Quién nos quita eso que nos falta?
Bienvenido pues a mundos Soñados, de
donde quizá nunca haya salido por lo
demás.
*
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
Fragmento de texto publicado no site do Metareciclagem:
http://www.metareciclagem.org
Estranho como idéias e objetivos perdem seus valores tão rápidamente, em tão curto tempo.
Estranho ver tantos prédios nos centros de grandes cidades abandonados, mais parecendo uma
cidade fantasma - como São Paulo.
Por outro lado milhares de famílias nas ruas, jogadas a própria sorte. As possibilidades vão se
fechando por todos os lados: sem casa, já não conseguem emprego, nem estudar; e o olhar
preconceituoso da cidade fecha todas as outras portas. Mas que sociedade estamos falando? Não
estamos nela? Não somos essa sociedade?
Essas pessoas têm seus sonhos, apesar de estarem na rua. Esses sonhos começam a se realizar ao
se ter novamente uma casa, um endereço. Para isso se unem para ocupar, ocupar espaços mal
utilizados, espaços que ficam desocupados enquanto se espera ter mais valor enquanto famílias
estão nas ruas. "Todo espaço mal utilizado será ocupado". E cresce o Movimento Sem-teto
Uma quantidade enorme de componentes eletrônicos jogados no lixo, produção desenfreada de
bens; o que faremos com esse todo lixo uma vez que tudo se torna inútil tão rápido?
Dá-me uma chave de fenda e meia-dúzia de idéias velhas e transformarei o mundo. Essa é a idéia
do Metareciclagem.
Metareciclagem ocupando espaços. Sem-tetos apropriando o conhecimento.
Sem-tetos escrevendo a história, sua história. questionando a forma de escrita, quem escreve e
para que escreve.
Metareciclando espaços: escolas, o trabalho, as idéias, fazendo do lixo armas para construção de
outra sociedade.
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
LEMA: “LA PAZ” IDENTIDAD MEDITERRANEA
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
LEMA: “LA PAZ” IDENTIDAD MEDITERRANENEA
A. ANTECEDENTES
B. PROYECTO
1. AUMENTO DE DIVERSIDAD
2. EFICIENCIA ENERGÉTICA, SOSTENIBILIDAD, NORMATIVA AMBIENTAL
3. HIBRIDACIÓN PROGRAMÁTICA
4. COMPACIDAD: CIUDAD MEDITERRÁNEA
5. REGENERACIÓN DEL TEJIDO SOCIAL
6. REFUERZO Y DESARROLLO DE LA IDENTIDAD DEL BARRIO
7. INTEGRACIÓN MURCIA – LA PAZ
8. GESTIÓN ECONÓMICA PARTICIPATIVA
C. RESUMEN NUMÉRICO
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
A. ANTECEDENTES
La difícil situación a la que se enfrenta el concurso nos hace pormenorizar en las
antecedentes, causas e historia del barrio a tratar en este proyecto-estudio de La
Paz e inevitablemente de la ciudad de Murcia. El barrio conflictivo debe solventar
sus deficiencias desde la actuación en diferentes frentes, variados y heterogéneos a
múltiples niveles. De esta forma, el proyecto presentado atiende a esos aspectos
diferenciados, algunas veces fuera de la propia arquitectura, No se pretende hacer
un extenso documento; más bien un escrito conciso que mira directamente a la
problemática, la analiza y plantea soluciones.
Desarrollamos a continuación los puntos detectados en el estudio sobre las
carencias del barrio y las características de los habitantes del mismo y la situación
de sus hogares.
1. PUNTOS DESFAVORABLES DE LA ZONA:
- Deficiente desarrollo del planeamiento urbanístico interno de los barrios.
- Alta densidad de la población.
- Presencia de un núcleo de viviendas de renta baja y por consiguiente una
concentración de población de bajo nivel económico y formativo.
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
- Ausencia de equipamientos de servicios que atraigan al resto de la población del
municipio a la zona.
- Altas tasas de desempleo, mas altas que la media municipal, baja cualificación
profesional y poca presencia de mujeres en el mercado de trabajo
- Alta presencia de grupos de etnia gitana y la presencia incipiente de inmigrantes que
se espera aumentar con el aumento del grupo en España y Murcia.
- Debilidad de la actividad comercial y de servicios y, como consecuencia, de la
capacidad de generar nuevos empleos, al que se añade a la percepción subjetiva de
inseguridad en la zona que dificulta la atracción de inversiones en la zona.
- Presencia de puntos conflictivos de venta de drogas y la irradiación de la inseguridad
para el resto de la zona.
- Altas tasas de abandono, absentismo y fracaso escolar asi como analfabetismo.
- Envejecimiento de la población y paulatino despoblamiento.
2. PUNTOS FAVORABLES DE LA ZONA:
- Fuerte desarrollo de las zonas circundantes.
- Proximidad con el casco histórico y la zona comercial.
- Presencia de 3 ejes de comunicación que conectan con el resto de la ciudad y del
municipio.
- Posibilidad del aumento de los equipamientos por la demolición y traslado del estadio
La Condomina como motor de impulso del desarrollo económico.
3. CONTEXTO
Los datos más relevantes para el conocimiento de la situación que nos ocupa, son
los indicadores demográficos que nos permiten apreciar las singularidades de las
personas que habitan el barrio. Según las fuentes proporcionados por los
organizadores del concurso los datos de interés son los siguientes:
Datos demográficos – 2005
Sexo y edad
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
1. La distribución de la pirámide entre las mujeres de La Paz es la que menos sigue
el diseño general de la distribución de la ciudad.
2. La distribución de población total de hombres (48.73%) y mujeres(51.24%) en el
barrio no es tan distinta del total de Murcia (hombres 49.65% y 50.35% mujeres).
3. Menor presencia en La Paz de residentes entre 31 y 60 años. Sucede lo mismo
con el porcentaje mayor de personas de 21-30 en el barrio frente al total de la
ciudad.
Gráficos creados por los concursantes:
Pirámide de población
Piramide Murcia
0 5 10 15 20
%
%
Hombres Mujeres
81 o mas
71-80
61-70
51-60
41-50
31-40
21-30
11 hasta 20
0-10
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
Piramide La Paz
0 5 10 15 20 25
%
%
Hombres Mujeres
81 o mas
71-80
61-70
51-60
41-50
31-40
21-30
11 hasta 20
0-10
Piramide Murcia vs. La Paz
0 5 10 15 20 25
%
%
Murcia La Paz
81 o mas
71-80
61-70
51-60
41-50
31-40
21-30
11 hasta 20
0-10
Nacionalidad
Nacionalidad La Paz
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
%%%
Hombres Mujeres Total
Espana
Ecuador
Marruecos
Bolivia
Senegal
Nigeria
Ghana
Ucrania
Otros
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
Crecimiento y densidad
En cuanto el municipio, tiene un 9,2% de crecimiento, la Zona con todas sus áreas
tiene un decrecimiento de 9,5% en su población, casi 3000 habitantes en 10 años.
La tasa de natalidad es mas alta que la media municipal (1,7).En La Paz la media es
de 1,9, crecimiento que concretamente queda anulado por el abandono continuo de
residentes pero no mejora la situación para las familias.
La densidad en la Zona es alta, casi el doble de la ciudad de Murcia:
Ciudad de Murcia Zona Urban (no solo La Paz)
12549 hab por km2 24963 hab por km2
Nivel formativo
Instruccion La Paz
0
5
10
15
20
25
30
35
40
menor de 5
anos
analfabetos
educacion
primaria
formacion
profesional_ba
titulo de
posgrado
Hombres %
Mujer es %
Total %
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
Instruccion Murcia
0
5
10
15
20
25
30
35
menor de 5
anos
analfabetos
educacion
primaria
formacion
profesional_bac
titulo de
posgrado
Hombres %
Mujeres %
Total %
Instruccion Murcia vs.La Paz
0
5
10
15
20
25
30
35
40
menor de 5
anos
analfabetos
educacion
primaria
formacion
profesional_bac
titulo de
posgrado
Murcia %
La Paz %
Tasas de paro
La no incorporación de la mujer en el mercado de trabajo es un problema de la ZAU
pero también de toda la ciudad de Murcia, según dados de la memoria.
La tasa general de paro en la Zona es 3 puntos más alta que la media de la ciudad.
Distribución de la actividad económica
La actividad económica está fragmentada y concentrada en el comercio minorista y
de servicios a personas, con carácter familiar y de baja profesionalización. Notese la
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
muy baja presencia de licencias a empresas y comercio mayorista, lo que torna
frágil el dinamismo económico en la zona.
La percepción de inseguridad es un hecho que impide la entrada de empresas y
personas de otras áreas de la ciudad en la zona con propuestas de activación
económica, así como el perfil de los habitantes de la zona, que no atraen a
empresarios locales.
Situación actual de las viviendas
Hay en el barrio 2300 viviendas construidas en los años 70 inferiores a 40m2 de
superficie útil, con baja calidad de construcción y en mala conservación. Muchas de
ellas en estado insalubre y sin los requisitos mínimos que exige la normativa actual
de construcción y habitabilidad. Hay muchos relatos de habitantes que se quejan de
suciedad, malos olores, poca aireación y falta de iluminación natural en los edificios.
Se añade a eso el problema de viviendas ilegales y hacinamiento (hasta 3 familias
por vivienda). Es destacable que el 35% de las viviendas sociales o gratuitas de la
ciudad están concentradas en la zona. Los edificios tampoco disponen de bajos
comerciales, lo que impide una actividad diurna de diversidad barrial. No hay índices
generales de Murcia para comparaciones en términos de precio de la vivienda, pero
se sabe que las viviendas de la Zona están entre las mas baratas de la ciudad.
B. PROYECTO
Bajo la nueva realidad que poco a poco se va planteando en los proyectos de
urbanismo, y en la época que vivimos, definimos y defendemos nuestro proyecto
como una propuesta que surge de la evolución de las necesidades, de las formas de
pensar y actuar, de los nuevos vínculos sociales y familiares, el desarrollo de las
nuevas tecnologías y los cambios naturales que nos deben hacer pensar en
proyectos sostenibles a lo largo del tiempo.
Damos el paso de no definir una planificación urbana, sino algo mucho más
completo y que debe definirse con conceptos exteriores a la propia arquitectura,
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
como he dicho antes. La Paz necesita una Gestión Estratégica urbana participativa.
Proponemos, a través de una estrategia común a muchos aspectos, una serie de
puntos que definen todos los niveles de actuación y participación de los diversos
agentes que deben intervenir en este proceso. Enumeramos y desarrollamos los
puntos clave de nuestra propuesta:
1. AUMENTO DE DIVERSIDAD
Actualmente el barrio de la paz adolece de una excesiva homogeneidad de usos y
funciones. El nuevo barrio, debe huir de la planificación funcionalista (zonificación
aislada de programas).
Se dota al barrio de un aumento de complejidad de usos aumentar las posibilidades
de ocio, comercio, viviendas, etc. Se trata de generar un barrio vivo, donde el resto
de los murcianos puedan disfrutar de el también. El barrio de la paz como lugar vivo
y vital. Referente dentro de la ciudad de Murcia.
Con el aumento de diversidad se incrementa el grado de organización de un
territorio y su potencial intercambio de información con los demás barrios. En todo
momento se huye de crear espacios "exclusivos" según niveles de renta o niveles
de programa. La ciudad actual produce un urbanismo complejo y diverso, dando
respuesta a la cantidad de realidades sociales y a sus diferentes situaciones
A partir de los datos socioeconómicos actuales, sabemos que hay un problema
crónico de desnivel en términos de franjas sectarias y de formación al nivel de los
residentes actuales, y una baja diversidad en la conformación actual del barrio, que
genera un aislamiento del área y una des-continuidad con el entorno. El objetivo es
la utilización mixta y reurbanización de terrenos abandonados de modo compatible
con el medio ambiente.
La diversidad está reflejada en la propuesta general del barrio, de alta mezcla,
permeable, donde no hay un plan homogéneo, que privilegie apenas a un tipo de
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
público, ni impositivo en términos de diseño. Se toma en cuenta las personas que
viven actualmente en La Paz, pero también el aumento deseado de la ocupación,
más aún a partir de la presencia de públicos con otros niveles formativos y edad
económicamente activa que han dejado el barrio en los últimos años.
La percepción de inseguridad es más importante que la inseguridad en si misma, no
confirmada en los datos oficiales. De esto se deduce que el cambio externo de la
zona debe dar la impresión de un área segura, con iluminación artificial, cámaras, o
otras estrategias, como parte de una acción que no segregue ni excluya la zona del
resto de la ciudad. No hay marquesinas para la espera en paradas de autobús, así
como de señalización vertical y horizontal tanto direccional como informativa.
Comercio
El comercio es un punto importante del proyecto; la situación marginal de esta zona
frente al centro comercial (mismo con su proximidad al centro histórico) es uno de
los problemas que traen la poca circulación de personas de fuera del barrio y no
crean una dinámica con los barrios vecinos, aumentando la sensación de gueto de
pobreza y estimulando la práctica de actividades marginales.
El proyecto busca atraer inversiones de la iniciativa privada, principalmente por
medio del estímulo del aumento de la densidad poblacional así como su
diversificación en términos de renta y edad.
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
El proyecto afirma que si es posible cubrir,a la población más pobre el acceso a la
vivienda en el barrio por medio de políticas públicas o privadas, muy difícilmente se
podrá mantener sus casas si no hay una ampliación del estoque general de
viviendas, caso contrario, la transferencia de la residencia a los sectores de
población de mayor poder adquisitivo será inevitable.
Otra cuestión que se plantea es el crecimiento de la ciudad de Murcia, lo que amplia
poco a poco la idea de centro y transfiere el problema de donde localizar las áreas
de habitantes de baja renta hasta su confrontación con la especulación inmobiliaria.
La idea es trabajar con conceptos mixtos de clases y usos locales, mismos en áreas
urbanas de tamaño reducido.
La tipología del comercio prevé la atracción susceptible (compra por impulso), a
partir de pequeños comercios con venta de productos de oportunidad y la atracción
de barrio, como talleres y oficinas de interés general para la ciudad y negocios en
colaboración, combinados con las ofertas de equipamientos.
Los comercios de la región deben aprovechar el ambiente urbano, ser una compra
por paseo, al azar. El centro cultural y las residencias de estudiantes serán
participes de la generación del flujo y convivencia social que es propuesta y al
mismo tiempo aprovechada por los comercios y hostelería. La arquitectura de los
comercios que se propone está en íntima relación con el proyecto general urbano
del barrio.
El comercio informal, los rastrillos, son buenas oportunidades de generar atracción
de flujo y al mismo tiempo promover modos de subsistencia a grupos todavía menos
profesionalizados y con menores condiciones financieras.
2. EFICIENCIA ENERGÉTICA, SOSTENIBILIDAD, NORMATIVA AMBIENTAL
Entre los parámetros de situación ambiental más determinantes destacamos lo que
a continuación siguen:
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
- Alta contaminación atmosférica debido al tráfico en la región, la temperatura,
ausencia de vento y precipitaciones, etc, que no es un problema específico de la
zona, sino de toda la ciudad.
- Presencia de zonas verdes en deterioro.
- Residuos presentes fuera de contenedores y en algunos puntos tirados por la
calle.
- Zona de aparcamiento que no pertenece a los residentes y ausencia de ciclovía
y en algunos puntos, zona peatonal.
A partir de estos datos evidentes tras la inspección visual de la zona, determinamos
las siguientes condiciones a tener el cuenta en el proyecto respecto a la localización
y particularización del barrio de La Paz en Murcia.
La reflexión sobre la adecuación entre recursos y eficiencia energética en la ciudad
debe estar ligada con las densidades, las tipologías edificatorias y los grados de
habitabilidad del parque edificado existente, integrados convenientemente en todos
los documentos de planeamiento urbano. Se propone la adecuación de una
normativa ambiental específica para Murcia.
Se propone como estrategia las siguientes actuaciones:
Se estudian las cartas bioclimáticas de olgyay y de givoni para Murcia. A partir de
ellas se determinaron las necesidades específicas para alcanzar las condiciones de
confort, tanto a escala urbana como a escala del edificio, especificándose las
estrategias generales para las necesidades de captación o protección solar, las
relativas al viento y por último las del aporte de humedad al ambiente.
El proyecto prevé la reducción y tratamiento de residuos, gestión eficiente del agua y
reducción del ruido, reducción del consumo de energía a base de hidrocarduros.
3. HIBRIDACIÓN PROGRAMÁTICA
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
El plano de trabajo propuesto esta dividido en tres niveles. El primero privilegia el
uso público, con comercio mixto de pequeñas y medianas proporciones,
aparcamiento, equipamientos, áreas verdes y viviendas. El nivel 1 tiene un uso mas
concentrado en equipamientos, menor presencia de comercio y mayor presencia de
viviendas. El nivel 2 prioriza las viviendas y tiene uso más privado.
Los problemas principales que tiene el barrio en términos urbanísticos son:
- Alta densidad
- Alta homogeneidad
- Desconexión con el entorno
El mal estado de las viviendas actuales y el concepto de la mezcla como
fundamento para regenerar el tejido social nos llevan a reconstruir el barrio creando
nuevas viviendas de mejor calidad y al mismo tiempo insertando actividades
económicas y sociales distintas que sirvan de generadores de diversidad. La
distribución por el barrio en los 3 niveles propuestos crea un tejido de viviendas y
usos comerciales que generan movimiento y actividad, regenerando el barrio en
puntos distribuidos por toda la zona y al mismo tiempo permitiendo una apertura
para nuevos usos y crecimiento interno y conexión con el exterior. No se piensa en
una actuación planimétrica. No tiene sentido hablar de la mezcla si no podemos
desarrollarla en todas las direcciones. De esta manera la propuesta se convierte en
volumen planificado de manera inmediata.
Tipos de actividades previstas:
- Pequeños y medios comercios que visan crear una red de conexión externa y flujo
interno.
- Espacios de uso social interno y externo
- Oficinas y talleres que mezclen lo público y lo privado
- Viviendas que atiendan a la población actual y la nueva y las conecten a la vida
social de la calle.
Descripción de las capas o niveles propuestos:
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
4. COMPACIDAD: CIUDAD MEDITERRÁNEA
Rescate de los valores de la ciudad mediterránea.
Se pretende una ciudad compacta, densa y heterogénea, con gran continuidad
formal, multifuncional, heterogénea y diversa en toda su extensión. Es un modelo
que permite concebir un aumento de complejidad en sus parte internas que es la
base para obtener una vida social cohesionada y una plataforma económica
competitiva, al mismo tiempo que se ahorra suelo, energía y recursos materiales, y
se preservan los recursos agrícolas y naturales. Se aumentan el número de viajes a
pie, lo cual produce una mejora de la calidad urbana. Se mejoran y amplían los
itinerarios peatonales y el mosaico de plazas y zonas verdes.
La compacidad como primera medida para un desarrollo sostenible. Lejos de crear
inmensas redes de infraestructuras para una baja densidad, la compacidad de la
ciudad que proponemos permite una mayor economía de medias a todos los
niveles. En otro sentido, la estrategia compacta nos ayuda a poder crear una
densidad y variedad cercana del tejido social. La mezcla reacciona mejor cuanto
más cerca esté una de otra. La intensidad de relaciones que permite la cercanía y
la densidad al mismo tiempo, no tiene reflexión en ningún otro sistema de
habitabilidad.
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
El transporte público puede ser racionalizado y conseguir, con voluntad de hacer un
servicio eficiente que atienda a la práctica totalidad del barrio. Todo esto a un coste
entrópico menor que el derivado de una movilidad equivalente en transporte privado.
Las alternativas de transporte en la ciudad compacta son el medio que permite
obtener una mayor complejidad del sistema que, en términos de información, implica
hacer más próximos los entes del sistema urbano con relación potencial y poder
acceder a los intercambios con medios de menor consumo energético y un menor
impacto sobre los sistemas naturales.
5. REGENERACIÓN DEL TEJIDO SOCIAL
La propuesta trata de integrar desde el sindicalismo la experiencia del trabajo en el
entorno, a incorporar desde el movimiento vecinal nuevas dimensiones al concepto
de calidad de vida. Se trata de superar la tendencia de algunos movimientos a
actuar como grupos de presión de un solo tema, pues esto permite tomas de
decisión más opacas y convierte a los gobiernos en árbitros de una resultante de
fuerzas contrapuestas.
Debido a las situaciones extremas que ya tenemos en el barrio actualmente,
utilizaremos la vivienda como entronque para un mayor enraizamiento social. La
combinación de diferentes rentas, etnias y situación social dentro de los límites
razonables pude crear, como en experiencias anteriores positivas, un nuevo orden
social más igualitario para todos y de mayor enriquecimiento.
Paralelo a esto, se debe incrementar la asistencia social que ya existe a los grupos
más desfavorecido, por diferentes causas. Los principales usuarios de los servicios
sociales son actualmente personas con problemas de minusvalía, baja formación o
formación nula e ingresos económicos que no cubren las necesidades básicas. La
idea es mantener las ayudas que ya se ofrecen y ampliarlas a grupos y enfoques
todavía no atendidos (inserción laboral, entrenamiento de comerciantes, proyectos
de colaboración entre poder público y privado).
Plan de asociaciones
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
Los principales usuarios de los servicios sociales que actualmente se ofrecen en la
zona son mujeres, que en el caso de la zona constituyen el centro de la familia. Son
personas con problemas de minusvalía, baja formación o formación nula y ingresos
económicos que no cubren las necesidades básicas. La idea es mantener las
ayudas que ya se ofrecen y ampliarlas a grupos y enfoques todavía no atendidos,
crear organizaciones de vecinos con distintas aportaciones, que trabajen en el
ámbito de la ayuda a los propios vecinos y sirvan como forum de discusión de las
ideas que se van implementando, al mismo tiempo que crean un grupo de
interlocución con el poder público, privado y la población de otras áreas de Murcia:
Las asistencias deben encaminarse en los siguientes sentidos:
- Acompañamiento de la gestión urbana por los vecinos.
- Asesoramiento para la inserción laboral a partir de planes españoles y europeos
de ayuda; pacto a favor del empleo por parte del empresariado.
- Ayuda a la administración del hogar.
- Integración de marginados y acceso a los servicios básicos
- Educación de adultos.
- Asesoramiento a los niños por profesores, educadores, equipo psicopedagógico
- Entrenamiento para pequeños comerciantes, mejorar procedimientos de gestión,
identificar nuevos canales de comercialización, establecer proyectos de
colaboración con otras empresas, etc.
- Incentivar la creación de nuevas actividades económicas, apoyar la gestión
empresarial con ayuda profesional, jurídica y económico-financiera.
- Incentivar las cooperativas comerciales vecinales.
- Crear una estructura de colaboración entre ciudades Europeas y asociaciones
con experiencias y cuestiones similares - observatorio
6. REFUERZO Y DESARROLLO DE LA IDENTIDAD DEL BARRIO
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
Dentro de la estrategia global se entronca como cuerpo de todo el desarrollo la
creación de actividades coordinadas con la formación, estimulando la producción y
divulgación de procesos y productos culturales de los residentes y sus relaciones
con la vida cultural de la ciudad de Murcia. El objetivo es desarrollar actividades y
talleres que supongan el desarrollo de destrezas y habilidades de los distintos
miembros de la unidad familiar y fomentar la convivencia y las relaciones grupales
que provoquen percepciones positivas de las relaciones sociales y promueven la
readaptación social. Combinar proyectos de educación con proyectos culturales (ya
que la propia separación entre los dos conceptos es bastante discutible) es
importante para construir el sentido de auto estima, juntamente con permitir modos
de expresión y estructuración simbólica de su entorno por estas personas. Crear un
espacio de convivencia e intercambio entre los vecinos estimulando el conocimiento
y aceptación mutua. Divulgar las acciones, aclarar sobre los reales problemas del
barrio y crear y mantener la fuerza de la identidad local.
La idea general es tornar la actuación de las asociaciones más dinámicas en el
sentido de traer soluciones a una minoría, y así mismo permitir modos de expresión
en distintos niveles de este mismo grupo. También en la propuesta de programas de
formación y culturales puedes desarrollarse el potencial de las tecnologías de la
información en el barrio; proyectos relacionados con la capacitación de jóvenes pero
también el uso crítico de los medios, involucrando colectivos y proyectos de artistas
y investigadores para la creación de contenidos de interese local generado y
divulgado por los propios vecinos; divulgación de proyectos de recuperación de
basura tecnológica y uso de softwares de código libre.
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
Centro Cultural y deportivo
La asociación de vecinos se queja de que no hay ningún centro de ocio-formación-
diversión para jóvenes en el barrio. El proyecto prevé la creación de actividades
coordinadas con la formación, estimulando la producción y divulgación de procesos
y productos culturales de los residentes y sus relaciones con la vida cultural de la
ciudad de Murcia. El objetivo es desarrollar actividades y talleres que supongan el
desarrollo de destrezas y habilidades de los distintos miembros de la unidad familiar
y fomentar la convivencia y las relaciones grupales que provoquen percepciones
positivas de las relaciones sociales y promueven la readaptación social
También está previsto la creación de sistemas de divulgación en la región y para la
ciudad de Murcia con oficinas de información, cartelerías y folletos, pagina web,
revista de información, reportajes, etc para la creación de una memoria del proceso
del cambio del barrio.
7. INTEGRACIÓN MURCIA – LA PAZ
Eliminación de bordes y fronteras.
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
Actualmente el barrio de la paz se encuentra completamente aislado del
funcionamiento de la ciudad de Murcia. La Avenida de la Fama y la Ronda de
Levante, constituían un límite poco permeable. Una isla en centro de la ciudad. No
solo los problemas sociales hacen de este barrio un lugar poco penetrable. Las
condiciones físicas del lugar y el planeamiento de los años 50, hacían de este lugar
un espacio impenetrable.
En el nuevo barrio de la Paz, se conecta la trama con la de la ciudad, permitiendo
una mayor accesibilidad y por lo tanto una libre circulación por su interior.
Estrategia:
Se propone polarizar todo el tráfico en una de las vías de borde (Av. Levante),
transformándose en una vía rápida y de acceso a grandes equipamientos. La
Avenida de la Fama se hace mucho más lenta y con menos flujo de tráfico para que
la conexión con la ciudad sea completa.
Transporte público.
Se propone como caso concreto la modificación de la ruta de la línea 8 de
autobuses,
para que recorra de norte a sur el nuevo barrio de la Paz. Este hecho, genera una
conexión con el transporte público a 250m de cualquier punto del barrio.
8. GESTIÓN ECONÓMICA PARTICIPATIVA
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
El proceso de gestión participativa
El complicado proceso que afectará a cualquier reforma del barrio de la paz, deberá
llevar condigo una propuesta de participación ciudadana si se quieres que todos los
esfuerzos lleguen a buen puerto. Esto permitirá establecer criterios de transparencia
política y relacional, y a la larga hacia una propuesta muy concretizada con el lugar y
sostenible a más largo plazo. La participación y la concertación, al interior de
procesos transparentes y democráticos, son elementos clave para avanzar hacia el
desarrollo integral y sostenible de los pobladores y sus distritos.
La estrategia central de la iniciativa es la participación ciudadana como elemento
fundamental de las decisiones de desarrollo local. Este es un claro condicionante
para que las acciones dirigidas a mejorar la seguridad humana y calidad de vida
sean efectivas. El nivel organizativo establecido es clave en esta iniciativa.
La gestión participativa se concentra en los siguientes mecanismos de actuación:
-Planificación estrategia integral
-Presupuesto participativo
-Cogestión del plan integral de desarrollo
-Programas proyectos y acciones
Un proceso participativo de planificación urbana y de presupuesto
Una mayor transparencia y eficiencia en la gestión y administración local con la
impulsión de conceptos, mecanismos y herramientas como la co-gestión municipio-
población, la planificación participativa y el presupuesto participativo.
La estructura orgánica de el proceso participativo es el siguiente:
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
Metodología
La metodología a disponer en estos procesos es fundamental a la hora de ser
transparentes y tener como vocación el conseguir la mayor satisfacción para
todos los habitantes del barrio, tanto los que habitan ahora como los futuros
habitantes. Los pasos a seguir son los siguientes:
1 .Lanzamiento Público. Comunicación
2. Talleres preparatorios
3. Talleres temáticos
4. Consejo Barrial
5. Consulta ciudadana
6. Consejo Barrial
7. Presupuesto participativa
8. Seguimiento de las acciones
Detallamos a continuación los beneficios y las actuaciones a elaborar una
estructura orgánica de gestión participativa.
- Estímulo a colaboraciones
entre la iniciativa privada y el poder
público:
Reconociendo la imposibilidad de
implementación de todos los
proyectos con recursos unicamente
públicos, las inversiones públicas
deberán tener el carácter de
estimuladores de la inversión
privada. O sea, las acciones del
poder público, previamente
discutidas con la población,
deberán hacer posibles la inversión
privada orientada para la
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
valoración de la área como espacio
integrador de una identidad local e
del desarollo del barrio.
- Creación de un forum permanente
de vecinos
El grupo (sea por medio de
comisiones, centros o
asociaciones) debe discutir las
acciones presentes y futuras del
barrio y servir de puente para el
dialogo permanente con el poder
público y privado
Es importante que las asociaciones y el forum de vecinos estén en constante
conexión, para que no se desarrolle la idea de grupos opuestos, segregando la
gente más necesitada y poniéndolos en situación contraria a los propietarios de
inmuebles en el barrio.
Es importante integrar desde el sindicalismo la experiencia del trabajo en el entorno,
a incorporar desde el movimiento vecinal nuevas dimensiones al concepto de
calidad de vida. Se trata de superar la tendencia de algunos movimientos a actuar
como grupos de presión de un solo tema, pues esto permite tomas de decisión más
opacas y convierte a los gobiernos en árbitros de una resultante de fuerzas
contrapuestas.
Al trabajo con el poder público y los vecinos sumase las discusiones con
universidades y el propio colegio de arquitectos, mismo después del término de las
actividades de recuperación urbanística. Para la participación ciudadana es muy
importante elementos visibles que hacen creíbles las voluntades públicas.
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
La gestión del realojo.
Debido al mal estado de las viviendas actuales del barrio de la paz. La mal
conservación que han tenido, la falta de cumplimiento de la normativa vigente y al
hacinamiento de las familias en pisos de 45 m2. La verdadera solución al problema
parte por enfrentarse al problema real y no hacer grandes edificios que expulsan a
los habitantes a barrios más periféricos sino tratar de crear un nuevo barrio con la
identidad de la mezcla. Se plantea una plan estratégico de realojo con los sitemas
asociados de movilidad intra barrio y un sistema de demolición selectiva. No se
derribará ninguna casa que no haya sido previamente construida en un lugar
cercano. Los espacios libres de nuestra propuesta, respecto a lo existente son los
primeros en ser construidos. Eso liberará las vías principales para generar el nuvo
barrio propuesto. Esta primera fase conlleva que una vez construidos los primerops
edificios de realojo se demolerán los antiguos bloques para poder construir sobre
ellos de nuevo y volver a desalojar después. Este proceso tiene 3 fases en tiempo
que llevarán a construir las viviendas para los nuevos habitantes del barrio de la paz
en último término. Todo esto se ve reflejado en la documentación técnica
correspondiente.
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
Viabilidad económica de la propuesta
Sabiendo según las fuentes del concurso, el suelo será cedido por el Ministerio de la
Vivienda y el Ayuntamiento de Madrid. Los precios de las viviendas, tanto de
construcción (en metros cuadrados construidos) como los precios de venta (sobre
m2 construido), están comprobados con la Federación regional de Empresarios de
construcción de Murcia FRECOM, sobre precios oficiales en vivienda protegida. Los
resultados de los cálculos aproximados de inversión, ventas nos dan un beneficio
que permite la viabilidad económica del proyecto sobre la inversión privada. Esto se
detalla en el esquema que aparece a continuación y en las tablas numéricas del
punto C.
paz, aunque la ocupación no fuera alta ( hasta tres familias en pisos de 45m2),
obliga a que el número de viviendas debe duplicarse para conseguir una armonía en
el nuevo orden del tejido social, de la variedad tipológica de viviendas y de cara a
conseguir una densidad fuerte y una compactación sobre el barrio para generar la
diversidad de usos y la hibridación programática.
En último término de la gestión, el principio de una viabilidad económica clara,
está en los planteamientos del proyecto. La alta densidad que ya tenía el barrio de la
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
C. RESUMEN NUMÉRICO
1. DIVERSIDAD DE PROGRAMA
LEMA: “LA PAZ”. IDENTIDAD MEDITERRANEA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
2. INDICADORES URBANÍSTICOS
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
3. PORCENTAJES Y SUPERFICIES PROGRAMÁTICAS
4.
TEJIDO SOCIAL Y VIVIENDA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
5.
TIPOLOGÍA, PORCENTAJE Y GRADO DE PROTECCIÓN DE LAS VIVIENDAS
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
6.
ESTUDIO DE LOS GRADOS DE CONFORT PARA LA CIUDAD DE MURCIA.
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
7.
ESTUDIO DE LA VIABILIDAD ECONÓMICA
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
CONCURSO DE IDEAS “LA PAZ ES POSIBLE. EL BARRIO QUE TODAVÍA PUEDE SER CIUDAD.”
LEMA: “LA PAZ” IDENTIDAD MEDITERRANEA
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo