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É importante observar, depois de refletirmos sobre esta trágica e interessante
analogia, que nenhum dispositivo do Cap. II do título Recursos no CPC
mantém sua redação original. Mais da metade dos 72 artigos não são mais os
mesmos e muitos foram modificados mais de uma vez, com (sic), por
exemplo, os arts. 511 e 526
114
.
Para corroborar as palavras acima, extraí-se a lição de BARBOSA
MOREIRA sobre o chamado “fogo de artilharia reformadora”:
A disciplina dos recursos vem sendo um dos terrenos de eleição das
reformas do nosso processo civil, empreendidas ao longo da última década.
No Código, o texto original do Título X do Livro I, dedicado a matéria,
continha 70 artigos (de 496 à 565). A esses cumpria acrescentar mais dois
(464 e 465), extraviados no Título VIII, mas na realidade atinentes a uma
figura – a dos embargos de declaração – tratada pela lei como recurso,
independentemente de controvérsias doutrinárias, pretéritas e presentes,
sobre a respectiva “natureza”. Pois bem: dos 72 artigos, se nossas contas
estão corretas, só 30 (menos da metade, portanto) – os de números 499, 501,
502, 503, 504, 505, 507, 509, 510, 512, 513, 515, 517, 520, 530, 534, 547,
548, 549, 552, 553, 554, 555, 556, 559, 560, 561, 562, 564 e 565 –
conservam o teor original; todos os restantes foram atingidos, em tal ou qual
medida, e alguns mais de uma vez, pelas sucessivas modificações que o
texto codificado sofreu, a partir da Lei 8.038, de 28.05.1990. Em nenhum
outro título do estatuto processual se concentrou com tanta intensidade o
fogo da artilharia reformadora. Uma conjectura alternativa não pode deixar
de ocorrer aqui ao espírito do observador. Com efeito: ou se vem enxergando
no Título X, do Livro I a parte do Código mais inçada de defeitos – quando
nada pelo ângulo prático, que predominou, em linha de princípio, na escolha
dos alvos de ataque - , ou então os promotores das reformas, sobretudo as
mais recentes, têm razões especialíssimas para vivenciar com maior
intensidade os problemas, reais ou supostos, da atividade judicante em grau
superior, e, em conseqüência, para atropelar-se no afã de dar-lhes soluções –
igualmente reais ou supostas
115
.
Frise-se que a obra de Barbosa Moreira é de 1999, ou seja, foi escrita antes
das ondas reformistas de 2001 e 2005, que trouxeram novas e drásticas mudanças ao já tão
reformado e remendado capítulo dos recursos. Assim, se em termos gerais pode-se afirmar,
sem medo de errar, que o sistema recursal sempre foi objeto de ataque dos legisladores
(baseados em estudos muitas vezes feitos pelos componentes dos Tribunais), é certo que o
114
WAMBIER, op. cit., p. 241.
115
BARBOSA MOREIRA, op. cit.