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HERIKA REGIANE DEZIDERIO
AS RELAÇÕES AMOROSAS PELOS “CHATS” DA INTERNET:
A SOLIDÃO NA CONTEMPORANEIDADE
MESTRADO EM PSICOLOGIA SOCIAL
PUC-SP
2007
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HERIKA REGIANE DEZIDERIO
AS RELAÇÕES AMOROSAS PELOS “CHATS” DA INTERNET:
A SOLIDÃO NA CONTEMPORANEIDADE
Dissertação apresentada à Banca Examinadora
da Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, como exigência parcial para obtenção do
título de MESTRE em Psicologia Social, sob a
orientação do Prof. Dr. Odair Sass.
PROGRAMA DE ESTUDOS PÓS-GRADUADOS EM PSICOLOGIA SOCIAL
PUC-SP
2007
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Banca Examinadora
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RESUMO
Este trabalho se propõe a investigar a possível associação entre a procura de
relações amorosas por meio das salas de bate-papo disponíveis na Internet e a solidão. A
vida citadina na atualidade prevê uma aproximação crescente entre as pessoas, seja por
meio das grandiosas construções que concentram multidões, seja pela ampliação dos
sistemas de comunicação, dentre os quais focalizamos a Internet. Entretanto, apesar dos
aglomerados urbanos e dos diversos recursos técnicos que supõem uma integração
desmedida entre os sujeitos, o que amplamente vigora é a ausência de intimidade entre
os homens e a sua condição de isolamento corporal e afetivo. Do que decorre o
questionamento sobre os chats, aos quais se vincula a imagem de liberdade para fazer
amigos, encontrar parceiros amorosos e escapar da solidão. Observamos que a
padronização dos contatos, o ritmo acelerado das palavras digitadas e a ênfase na
quantidade de diálogos, em detrimento de seu conteúdo são apenas alguns dos aspectos
que tolhem a espontaneidade dos freqüentadores e incidem na pseudoliberdade. Por sua
vez, os milhares de contatos amorosos mediados por computadores conectados à Rede
Mundial raramente extrapolam a virtualidade para se transformarem em encontros
presenciais, o que nos permite verificar a lógica delimitadora dos chats: a substituição
do prazer pelo pré-prazer. Com o propósito de levantar dados sobre o objeto deste
estudo, elaboramos um instrumento de pesquisa composto por duas escalas – uma para
aferir a procura por relacionamentos amorosos nos chats e a outra para verificar a
solidão dos freqüentadores desse aparato. As escalas foram apresentadas, sob a forma de
questionário, a 60 sujeitos presentes em salas de bate-papo dirigidas à faixa etária de 20
a 30 anos. Os resultados confirmaram que a procura por relacionamentos amorosos nos
chats está associada à solidão. Para fundamentarmos as análises, privilegiamos alguns
conceitos da teoria crítica da sociedade, especialmente o de indústria cultural,
desenvolvido por Horkheimer e Adorno, e as noções de “vivência”, “experiência” e
“choque” postuladas por Benjamin. Recorremos, ainda, à psicanálise freudiana,
essencialmente ao discorrer sobre o amor. Por fim, concluímos que a fugacidade dos
relacionamentos amorosos efetuados nos chats e a solidão em muitos dos usuários se
associam também a aspectos objetivos e não a uma condição puramente subjetiva.
Palavras-chave: solidão, relações amorosas, Internet, Teoria Crítica, Psicanálise.
ABSTRACT
The search for love relationships through chat rooms and it’s feasible association
to loneliness it’s the purpose of this paper. The modern city life predicts by the means of
concentrating people in huge buildings or by the ever-growing communication system,
like the internet, a constant nearness between humans. However, despite the urban mass
and the technical resources that allow greater people-to-people interactions, a forceful
loss of relationship intimacy and affective and body isolation are present. This way,
questions about the chat rooms and it’s image of free friendship, love partnership and
loneliness ending philosophy arouse. The fast typing words, the pattern of messages and
the amount above the quality of the contacts are some of the free will restraining aspects
to chat rooms haunters, giving them a fake feeling of freedom. Among the thousands of
World Wide Web based love relations, one rarely overcomes the virtual ambience to be
an actual encounter, leading us to discern a restrictive chat logic: the substitution of the
pleasure by the “pre-pleasure”. Focused in obtain data about this study subject, two
scales were built as a research instrument – one for verify the search for love
relationships through chat rooms and another to evaluate the chat room members
loneliness – those scales formed a questionnaire witch was presented to 60 persons in
20-30 years age ruled chat rooms. The results confirmed the association between
loneliness and love relationship search in chat rooms. To support the analysis, we used
some concepts of the critical theory of society, mainly the culture industry one,
developed by Horkheimer and Adorno. The principles of “shock”, and the two types of
Experience (Erlebnis – the shallow experience – and Erfahrung – the profound
experience) postulated by Benjamin and the freudian psychoanalysis were also used, the
later in our debate about love. We concluded that the fugacity of the chat room based
love relationships and the loneliness as observed on many users are also linked to
objective aspects and not to a pure subjective condition.
Keywords: loneliness, love relationships, Internet, Critical Theory, Psychoanalysis.
Dedico aos amores da minha vida:
Aos meus pais e ao meu Seré.
AGRADECIMENTOS
Ao CNPq pelo financiamento que possibilitou levar adiante esta pesquisa.
Aos professores Dr. Odair Sass e Dr. José Leon Crochík pela seriedade e
dedicação dispensadas durante as orientações; pela paciência, mas, sobretudo, pelas
exigências que instigaram a minha capacidade de auto-superação e por acompanharem
os meus primeiros passos nesse árduo, mas envolvente trabalho como pesquisadora.
Aos professores Dr. Antonio A. S. Zuin e Dra. Maria Cristina Vicentin, pelas
importantes contribuições durante o exame de qualificação e por aceitarem prontamente
ao meu convite para compor a banca avaliadora.
Aos professores do Programa de Pós-graduação em Psicologia Social, pelos
ensinamentos, sem dúvida, indispensáveis à minha formação.
A Marlene, pelo gentil auxílio e empenho com os processos burocráticos.
A Betinha, por fazer-me sentir o EHPS (Programa de Educação: História,
Política e Sociedade), como minha segunda casa.
Aos meus colegas de turma da Psicologia Social: Gorete, Raquel, Roseli,
Simone, Fê, Alê, Guilherme, Célia, Lívia e Gabi, pelo debate do projeto que fomentou
em mim importantes reflexões e pelas boas lembranças deixadas.
À querida Gabi, colega de mestrado e amiga dedicada, sempre pronta a atender
os meus pedidos de ajuda.
Aos meus colegas do Programa de Pós-graduação em Educação: História,
Política e Sociedade, por me receberem com carinho e partilharem seus conhecimentos.
A Fernanda Mazzante, pelas significativas contribuições na fase inicial da
elaboração das escalas.
A doce Lú, pelas longas e confortantes conversas.
Aos meus colegas do NUPTEC (Núcleo de Psicologia e Tecnologia),
principalmente, à amiga Bel, por lembrar-se do meu trabalho em seus momentos de
estudo e contribuir com interessantes sugestões de leitura; também por me apresentar o
Serginho Aragaki, a quem tanto estimo.
Aos meus amigos: Valmir, Alex, Vi, Alê, Mary, Erika Melim, Jú, Lú e Paty,
pelos divertidos encontros, que sempre aliviaram as minhas tensões; pelo apoio e
carinho demonstrados durante os nossos anos de amizade.
Às amigas Lis, Cris e Roseli, por fazerem parte da minha trajetória profissional e
confiarem em meu trabalho, desde os tempos da graduação.
Aos meus pais, pelo amparo, incentivo e por investirem nos meus sonhos; por
serem o meu alicerce e participarem de mais essa fase da minha vida.
Ao meu amor, companheiro e porto seguro, Seré, por guardar consigo a palavra
certa para cada momento de preocupação e por acompanhar as minhas descobertas.
Também por ouvir os meus medos, acolher o meu choro, o meu sorriso, o meu mau
humor e comemorar cada obstáculo superado. Sua constante presença me fortalece e
ilumina os meus caminhos!
Às pessoas que contribuíram direta ou indiretamente para a conclusão desta
pesquisa.
Aos sujeitos participantes deste estudo – “Ulisses” usuários de chats – com seus
nomes e codinomes: solitários ou não, mas com suas procuras em diversos níveis.
“Devolvo ao público o que ele me ofereceu;
dele tomei emprestada a matéria desta obra:
e é justo que, tendo-a terminado com todo o respeito pela
verdade de que sou capaz e que ele merece de mim,
eu lhe restitua o que lhe pertence”.
(J. De La Bruyère – escritor francês, 1645 – 1696).
Índice Geral
Introdução ............................................................................................................. 12
1. A Indústria Cultural: O progresso, a tecnologia e a Internet ............................ 15
1.1. A Internet e a configuração das relações sociais ............................... 24
2. O indivíduo e a solidão na contemporaneidade ............................................... 28
2.1. O conceito de solidão e seus sentidos ............................................... 31
3. Considerações sobre o amor: a sexualidade e a civilização ............................. 39
3.1. A visão da psicanálise freudiana sobre o amor ................................. 42
4. Os relacionamentos amorosos por meio dos chats ........................................... 48
5. Relações amorosas e solidão nos chats da Internet .......................................... 64
5.1. Problema de Pesquisa ........................................................................ 64
5.2. Objetivo ............................................................................................. 64
5.3. Hipótese de Pesquisa.......................................................................... 64
5.4. Método ............................................................................................... 65
6. Apresentação e discussão dos dados ................................................................ 74
6.1. Caracterização dos usuários .............................................................. 74
6.2. Discussão dos resultados ................................................................... 78
6.2.1. A procura por parceiros nos chats ...................................... 79
6.2.2. A solidão em freqüentadores de chats ................................ 88
Considerações Finais ............................................................................................ 95
Referências bibliográficas .................................................................................... 100
Referências de mídia eletrônica ........................................................................... 102
Anexos .................................................................................................................. 103
Anexo A – Estágios da elaboração do instrumento de pesquisa .............. 104
Anexo B – Versão final do questionário .................................................. 107
Anexo C – Itens explicados do questionário ............................................ 109
Anexo D – Escala UCLA de Solidão ....................................................... 113
Anexo E – Consentimento do provedor ................................................... 116
Anexo F – Figuras .................................................................................... 118
Anexo G – Questionário aplicado em sala de bate-papo .......................... 122
Anexo H – Questionário aplicado no MSN Messenger ............................ 127
Anexo I – Questionário respondido por e-mail ....................................... 134
Índice de Tabelas
Tabela 1: Composição da amostra por grupos de salas do Por Idade, 20 a 30 .. 66
Tabela 2: Freqüência de acesso aos chats, por período ...................................... 71
Tabela 3: Freqüência de acesso aos chats por dia da semana, à meia noite ....... 72
Tabela 4: Sexo declarado dos sujeitos da pesquisa ............................................. 74
Tabela 5: Idade dos sujeitos da pesquisa ............................................................ 75
Tabela 6: Sujeitos segundo local e condição de acesso ...................................... 75
Tabela 7: Sujeitos segundo estado civil .............................................................. 76
Tabela 8: Escolaridade dos sujeitos .................................................................... 77
Tabela 9: Situação de residência dos sujeitos ..................................................... 78
Tabela 10: Respostas para a escala de relacionamentos amorosos: freqüências
e proporções .........................................................................................................
86
Tabela 11: Escala de relações amorosas: média e desvio padrão ....................... 87
Tabela 12: Respostas para a escala de solidão: freqüências e proporções .......... 93
Tabela 13: Escala de solidão: média e desvio padrão.......................................... 94
12
Introdução
O avanço tecnológico associado às crescentes aglomerações urbanas e à
dinâmica que caracteriza a vida citadina na atualidade, faz presente uma possibilidade
cada vez maior de interação entre os sujeitos, seja por meio dos altos edifícios que
concentram um grande número de pessoas, seja pela ampliação do acesso às linhas de
telefonia e da comunicação com diversas partes do mundo pelo uso da Internet.
Ocorre que, diante de tantos recursos pretensamente estimuladores da
aproximação dos indivíduos, se sustenta uma contradição: a crescente possibilidade de
comunhão entre as pessoas e uma massa formada por sujeitos que se conhecem apenas
superficialmente ou se desconhecem completamente. É diante desse paradoxo, que
surge um debate que extrapola a qualidade da aproximação entre as pessoas e se dirige
ao conceito de solidão.
A solidão nos conduz a outro tema quase sempre a ela associado – o isolamento
– que parece não se limitar apenas ao distanciamento entre corpos, mas passível de ser
remetido à ausência de intimidade entre os indivíduos. Assim, o que se verifica é o
isolamento instalado na vida do homem contemporâneo, apesar de imerso em uma
sociedade que, fundamentada na tecnologia, promete aproximações em instâncias
profissionais e pessoais, dentre as quais destacamos as relações amorosas.
Resta esclarecer que a discussão sobre a solidão e o isolamento, firmada em
diferentes áreas do conhecimento e no senso comum, serviu de inspiração para a
delimitação do problema dessa pesquisa: compreender a solidão contemporânea,
possivelmente advinda desse estado de isolamento, e o modo como ela se vincula à
busca de relações amorosas pelos chats – recurso da Internet recentemente desenvolvido
com a premissa de aproximar pessoas.
O frenético avanço da tecnologia sinaliza a relevância de analisarmos
criticamente o espaço ocupado pelo homem em meio ao progresso que invade e
mobiliza a vida das pessoas, e não oferece abertura para escolhas e reflexões. Essa
pesquisa visa contribuir para a compreensão de como os sujeitos agem e reagem à
tendência crescente de relacionamentos amorosos ou busca de parceiros pela Internet,
considerada como elemento dessa expansão tecnológica.
13
Para um entendimento da inserção tecnológica na atualidade, a partir da
perspectiva crítica que pretendemos sustentar, levamos em consideração o conceito de
indústria cultural proposto por Horkheimer e Adorno, em 1947. Essa indústria consiste
em um sistema de produção cultural massificada que concede aos objetos produzidos
uma marca comercial. Seu funcionamento se manifesta de forma totalizante e determina
a padronização da cultura, além de propagá-la nas mensagens audiovisuais dos meios de
comunicação de massa. O sujeito mobilizado ou imobilizado por essa indústria, bem
como pelo conteúdo a que se refere, é destituído de sua real importância e passa a ser
valorizado por seu potencial de produção e consumo.
Ao conceito de indústria cultural acrescemos as noções de “vivência” e
“experiência” discutidas por Benjamin (1975). Embora o teórico estivesse voltado para
a sociedade do século XIX, a sua análise dos contatos fugazes e das sensações
imediatas, como característica das “vivências” e do distanciamento humano do campo
da “experiência”, como forma de sensibilidade aprofundada, ajuda a compreender as
relações nas salas de bate-papo – caracterizadas pela efemeridade – e a pensar sobre a
procura por parceiros amorosos em um cenário marcado pela tecnologia.
Com base nos conceitos da teoria crítica, esperamos esclarecer as indagações
pertinentes à interação do indivíduo com o aparato tecnológico Internet, essencialmente
no tocante à busca por parceiros amorosos, e discutir o conceito de solidão
relacionando-o com esse tipo de procura. Da psicanálise, destacamos alguns textos de
Freud, especificamente “O mal estar na civilização” (1996a), “Os três ensaios sobre a
sexualidade” (1996b) e “Contribuições à Psicologia do Amor” (1996), a fim de
aprofundar conceitualmente as reflexões sobre a solidão e as relações amorosas.
A Internet, que servirá como referência objetiva para a realização de toda a
pesquisa, oferece uma pluralidade de temas emergentes, dentre os quais, mencionamos
relações profissionais, educação à distância, cibercultura
1
, crimes pela rede. Cabe
explicitar que diante das possibilidades, optamos por focalizar as relações amorosas
estabelecidas no chamado ciberespaço.
O interesse pelo tema decorreu de um caso clínico que incluía, entre as queixas,
essa forma de relação. O que se destacava nas sessões clínicas era o lugar central que a
1
Diz respeito ao encontro entre pessoas de vários países e culturas distintas no ciberespaço (âmbito da
Internet).
14
busca por relacionamentos amorosos, condicionados pela Internet, ocupava na vida do
sujeito. O nosso interesse pelo assunto aumentou em decorrência de diálogos com
outros psicólogos que relataram a constância, em seus consultórios, de pacientes
envolvidos com esse tipo de aproximação com o outro.
Essa experiência determinou a procura de uma bibliografia que oferecesse a
compreensão da busca por contatos amorosos pelos chats
2
, considerando a relação do
sujeito com a sociedade, e não apenas as condições puramente subjetivas – aspectos
internos ou intrapsíquicos – que pudessem motivar a escolha dos indivíduos pelas salas
de bate-papo, nem as designações psicopatológicas dessa nova configuração dos
relacionamentos. Pesquisas como a de Álvaro (2003), sobre as salas de bate-papo
dirigidas às crianças e adolescentes, e a de Alves (2005), que analisa o sexo virtual na
Internet, discutem as relações nos chats, por essa perspectiva psicossocial, e são fontes
relevantes para este estudo.
Para a consecução da pesquisa coligimos, como material de análise, os dados
obtidos por meio da aplicação de um instrumento desenvolvido especialmente para o
objeto de investigação estipulado. Trata-se de um questionário composto por duas
escalas – uma elaborada com o propósito de avaliar a procura por relacionamentos
amorosos pelos chats e a outra com o intuito de verificar a solidão dos sujeitos
participantes.
O questionário foi apresentado a usuários de salas de bate-papo e os resultados
permitiram obter a correlação entre as duas variáveis tomadas como alvo desse estudo: a
solidão e a procura por relacionamentos amorosos em salas de bate-papo disponíveis na
Internet. A explicação detalhada do método e dos procedimentos empregados na etapa
empírica da pesquisa encontra-se no tópico “Relações amorosas e solidão nos chats da
Internet”.
2
Chats e salas de bate-papo são tratados como sinônimos e correspondem a espaços virtuais oferecidos
pelos provedores de acesso, utilizados por parte de seus usuários, para estabelecer contatos com outros
internautas.
15
1. A Indústria Cultural: o progresso, a tecnologia e a Internet.
“À medida que a civilização avança, a poesia
quase inevitavelmente declina”.
TH. B. Macaulay (historiador inglês, 1800-1859)
É notória, na sociedade capitalista contemporânea, a inserção das mais diversas
tecnologias empregadas em inúmeros maquinários que servem à indústria e à vida
humana. As redes de informação e os estudos científicos de diferentes áreas contribuem
para esse desenvolvimento tecnológico crescente, que inclui desde os avanços no
sistema de comunicação e as conquistas na medicina diagnóstica, até os lançamentos na
microeletrônica, todos amparados por novas descobertas técnicas. Contudo, partimos da
premissa de que a tecnologia não é neutra e tampouco alheia ao modo como é utilizada
– ela fortalece crescentemente a indústria, incluindo a indústria cultural.
O conceito de indústria cultural foi desenvolvido por Horkheimer e Adorno e
publicado no texto “A Indústria Cultural: o Esclarecimento como Mistificação das
Massas”, do livro Dialética do Esclarecimento, em 1947. Os autores preferiram
empregar o termo indústria cultural em vez de “cultura de massas”, para desvincular o
seu sentido da idéia, própria da cultura de massas, de algo que pudesse surgir da
coletividade de maneira espontânea, como por exemplo, a arte popular. Segundo
Horkheimer e Adorno (1985), a espontaneidade contida na cultura de massas é uma
característica ausente na indústria cultural, pois o que ela fabrica, na maioria das vezes,
segue um rigoroso planejamento, a fim de garantir o consumo coletivo, um consumo
que ela própria determina ao sujeito que, por sua vez, freqüentemente aprova, ainda que
isso possa lhe causar um mal-estar.
O termo “indústria”, quando associado à expressão “indústria cultural”
(Horkheimer e Adorno, 1986), se refere não somente ao sistema de produção, mas à sua
forma organizativa caracterizada pela estandardização dos procedimentos técnicos, pela
cisão entre operários e meios de produção e pelo domínio da maquinaria. No conceito
de indústria cultural, a palavra “indústria” está ligada à padronização do objeto
produzido e à racionalização das técnicas de distribuição.
16
Pois bem, no texto referido, “A Indústria Cultural: O Esclarecimento como
Mistificação das Massas” (1947), os autores enfatizam a degeneração da cultura,
decorrente dos aspectos regressivos do desenvolvimento técnico e da redução das
relações a mercadoria. Outro ponto discutido se refere à diversidade de produtos
ofertados pelos meios de comunicação de massa, mas que estruturalmente são quase
indiferenciados. Segundo Horkheimer e Adorno (1985) é para esse detalhe ilusório nos
produtos que a indústria cultural faz a atenção do consumidor recair, com o intuito de
ocultar o controle que ela própria exerce sobre os indivíduos.
Como parte integrante da indústria cultural e dos meios de comunicação
pretensamente democráticos, a Internet é controlada pelos seus provedores de acesso,
que em quase nada se diferenciam uns dos outros, tais como as estações de rádio
mencionadas por Horkheirmer e Adorno (1985, p.74-75) as quais, segundo os autores,
transformam todos em igualmente ouvintes. O formato, os serviços e as vantagens que
os diversos provedores oferecem, são estruturalmente semelhantes, e transformam todos
em meros usuários. A discussão sobre os benefícios que um ou outro provedor possa
oferecer apenas sustenta a idéia de concorrência e livre escolha. Sobre a unidade nos
meios de comunicação de massa, difundida pela indústria cultural, Horkheimer e
Adorno (1985) asseveram:
As distinções enfáticas que se fazem entre os filmes das categorias A e B, ou
entre as histórias publicadas em revistas de diferentes preços, têm menos a
ver com o seu conteúdo do que com a sua utilidade para a classificação,
organização e computação estatística dos consumidores. Para todos algo está
previsto; para que ninguém escape, as distinções são acentuadas e difundidas.
(Horkheimer e Adorno, p. 116).
No caso das salas de bate-papo da Internet, o que se dispõe como “democrático”
confunde o freqüentador, que se imagina com autonomia de escolha. De fato, ele pode
até escolher entre uma sala e outra, escolher quais dos recursos disponíveis utilizará em
sua conversa, pode escolher um dos itens do menu que iniciará o contato com o seu
interlocutor, mas o usuário parece não se dar conta de que tantas escolhas já foram
selecionadas por ele, segundo um perfil de consumo previamente traçado, que dirige a
sua atuação nos chats.
De acordo com Lasch, (1984) na sociedade burguesa marcada pelo consumismo,
oportunidade de escolha não significa optar por uma coisa, mas escolher todas as coisas
17
ao mesmo tempo. O casamento aberto e os relacionamentos sem compromisso
expressam essa “liberdade de escolha” que permite não descartar opção alguma, uma
vez que todas as possibilidades permanecem potencialmente em aberto. As imagens
propagandeadas pelos meios de comunicação de massa expressam possibilidades
inesgotáveis a todos os consumidores. O sujeito pode, inclusive, ser o que bem desejar.
Contudo, o preço que se paga por esse “benefício” é submeter-se à condição de produto
descartável.
As amizades, os romances e a carreira profissional integram o ritmo frenético
das relações sociais sujeitas à mesma descartabilidade. No “vai-e-vem” da
contemporaneidade, nada, nem ninguém, são insubstituíveis: essa é a racionalidade da
sociedade de produção e consumo massificados. A liberdade de escolha, segundo Lasch
(1984, p.29) “resulta, na prática, numa abstenção de escolha.(...)A liberdade passa a ser
a liberdade de escolher entre a marca ‘x’ ou a marca ‘y’, entre amantes intercambiáveis,
entre trabalhos intercambiáveis, entre vizinhos intercambiáveis”.
Sobre a indústria cultural, o que a torna tão fortemente poderosa é
essencialmente a capacidade que ela possui de se identificar com a necessidade que de
antemão já produziu, além da imagem que inculca nos sujeitos de que trabalha com
dedicação para satisfazê-los. Mas o que se esconde por detrás desse simulacro é que
essa indústria se interessa pelo homem apenas como consumidor ou trabalhador e
qualquer esforço que ela empregue tem em vista a conservação desses dois únicos
papéis pelos indivíduos:
Enquanto empregados, eles são lembrados da organização racional e
exortados a se inserir nela com bom-senso. Enquanto clientes verão o cinema
e a imprensa demonstrar-lhes, com base em acontecimentos da vida privada
das pessoas, a liberdade de escolha, que é o encanto do incompreendido.
Objetos é que continuarão a ser em ambos. (Horkheimer e Adorno, 1985,
p.137)
A reflexão realizada por Horkheimer e Adorno (1985) sobre os papéis exercidos
pelo indivíduo ante a indústria cultural auxilia a compreensão da atuação dos usuários
dos chats. Na condição de quem consome um serviço que promete aproximar pessoas
por meio de um computador conectado à Internet, o sujeito que acessa as salas de bate-
papo concentra a sua atenção na tela: nas palavras e imagens que se destacam diante dos
olhos e nos sons que invadem os ouvidos. Paralelamente, as mãos precisam se
18
movimentar sobre o teclado e o mouse em ritmo acelerado. Podemos dizer que o
indivíduo consome enquanto trabalha, e trabalha enquanto consome. É preciso
dedicação e presteza para conduzir e conciliar os diálogos nas salas.
A tirania da indústria cultural atinge a alma dos sujeitos e a pena para aqueles
que divergem do esquematismo proposto por ela, é a exclusão social. Pode-se pensar e
até fazer diferente, mas a conseqüência é a posição de fracasso diante da atividade
industrial. O que costuma acontecer com os sujeitos é que “a produção capitalista os
mantém tão bem presos em corpo e alma que eles sucumbem sem resistência ao que
lhes é oferecido” (Horkheimer e Adorno, 1985, p.125). O conformismo e a adaptação se
instalam sem que seja necessário o uso da força física.
No entanto, ao contrário do que se possa supor à primeira vista, a indústria
cultural permite questionamentos – até mesmo contra o próprio sistema capitalista –
desde que a ameaça de castração, com seu papel interditor e normativo, seja mantida.
Essa ameaça envolve o consumidor com tal intensidade que não lhe dá chance de
resistir: a indústria cultural se encarrega de não largar o sujeito para submetê-lo, em
todos os momentos, à sua ideologia de consumo. A promessa divulgada ao consumidor
é a de que todas as necessidades poderão ser satisfeitas por seus produtos, mas não é só
isso, ele se tornará eternamente dependente daquilo que essa indústria supostamente é
capaz suprir.
A indústria do entretenimento também exerce o seu controle: se por um lado
dirige a diversão, por outro, insista-se, faz o consumidor acreditar que a sua vontade é
respeitada. Assim, o entretenimento pode ser tomado como uma poderosa arma pela
indústria cultural: divertir o sujeito é cercear a sua capacidade crítica e mantê-lo
resignado para moldá-lo como um boneco feito em argila. Prova disso é que a premissa
maior da diversão é simplesmente não ter que pensar em nada, concordar com tudo e se
deixar levar sem resistência pelo que é dado como prazeroso. Divertindo-se, o sujeito
também se entrega ao riso infundado de quem acompanha a humilhação do próprio
desejo. Rir não é apenas a defesa encontrada para negar o sofrimento, é também uma
expressão sádica diante da figura ridicularizada de um outro reproduzido na tela e que
tanto tem a ver com aquele que ri.
Ao sujeito cabe seguir à procura de sua felicidade, muito embora a indústria
cultural se encarregue de deixar claro que a vida plenamente feliz, ainda que possa ser
19
alcançada por qualquer um, não está disponível para todos. Para ser feliz é preciso ter
sorte. É preciso ser encontrado por um caça-talentos, ganhar em um sorteio ou entrar na
sala de bate-papo certa, na hora certa. Com isso, a vida dos consumidores parece ser
conduzida como um jogo de loteria, no qual poucos apostadores conseguem acertar os
números premiados. Desse modo, resta ao sujeito contentar-se em admirar o sucesso
dos poucos e privilegiados sortudos que a indústria se encarrega de fabricar.
O que se constata é a forma como o conteúdo exibido pelos meios de
comunicação de massa, a TV, o cinema e mais recentemente o computador, se aproxima
cada vez mais da realidade de quem assiste. Enquanto as mercadorias se fundem no
sujeito, as particularidades de cada indivíduo vão desaparecendo e se aproximam de
uma pseudo-individualidade. A imitação dos astros do cinema ou das telenovelas
desobriga o sujeito de se esforçar para ser alguém, de desenvolver um “eu” com suas
próprias peculiaridades. Estilos e personalidades podem ser comprados como kits pré-
fabricados. É só apertar o botão do controle remoto: o garoto rebelde, a boa moça, o
intelectual, a bonitona, o esportista, o conquistador. Os chats que a Internet oferece
parecem configurar o cenário ideal para a expressão desses personagens estereotipados,
utilizados freqüentemente como forma de apresentação nas salas:
A indústria cultural realizou maldosamente o homem como ser genérico.
Cada um é tão-somente aquilo mediante o que pode substituir todos os
outros: ele é fungível, um mero exemplar. Ele próprio enquanto indivíduo é o
absoluto substituível, o puro nada, e é isso mesmo que ele vem a perceber
quando perde com o tempo a semelhança. (Horkheimer e Adorno, 1985,
p.136).
Embora a Internet seja considerada uma vasta fonte de conhecimento, é também
mais um sinônimo de prestígio e aceitação. Quem não tem acesso à rede é
desqualificado pela sociedade e pelos pares. O valor de uso para o sujeito, tornar-se bem
informado, perdeu espaço para o valor de troca, ser bem visto pelas outras pessoas. É
preciso ser usuário de Internet para obter espaço em um mundo movido pelo
desenvolvimento técnico, caso contrário há que se pagar o preço da marginalização.
Para ser percebido e valorizado é preciso estar conectado.
De acordo com Türcke (2004), o conceito de sensação que antes significava
percepção, na sociedade atual adquiriu novo sentido. A sensação envolve todo tipo de
acontecimento que escapa à rotina, enquanto a percepção extrapola a ruptura da rotina e
20
se destaca como um espetáculo. Em uma sociedade caracterizada pela sensação –
acontecimentos surpreendentes e novidades infindáveis – o esforço empreendido é para
ser percebido e se sobressair em meio aos demais. Para o autor citado, no mundo atual
“ser significa ser percebido" (Türcke, 2004, p.66). É sobre essa premissa que o mercado
procura se edificar e apresentar cada um de seus produtos: eles devem ser
extraordinários, pois somente a mercadoria que se destaca é percebida (é alguma coisa),
e apenas o que é percebido é vendável.
Para se destacarem e serem percebidos, os freqüentadores de chats, se
transformam individualmente em um objeto. O aproveitamento dos recursos oferecidos
pelos provedores para incrementar as conversas, e até mesmo o apelido com o qual se
apresentam nas salas determinam o sucesso de si próprios como mercadoria. Tal
sucesso se expressa pelo número de diálogos que o sujeito estabelece ou pela
quantidade de pessoas que o convidam para uma conversa. Isso ajuda a explicar o fato
de algumas pessoas passarem horas numa sala de bate-papo sem conseguir firmar
qualquer contato, enquanto outras se dão o luxo de selecionar aqueles com quem irão
dialogar, tamanha a oferta que se lhes apresenta.
O êxito nos chats é determinado também pela capacidade de surpreender, pois
esse tipo de funcionamento corresponde ao dinamismo da sociedade atual que Türcke
(2004) descreve como a “sociedade da sensação”, ou seja, uma sociedade bombardeada
por estímulos que privilegiam a satisfação imediata. O autor assevera que: “onde se
deve surpreender para poder sobreviver; onde a luta pela existência se transforma em
um problema estético, então se faz cumprir o estado de coisas da sociedade da sensação,
para a qual caminhamos a passos largos”. (Türcke, 2004, p.63)
Além disso, o crescente número de pessoas que utilizam os chats parece revelar
uma compulsão, uma ação e atração, repetidas, pelos choques audiovisuais que
configuram fontes de prazer. A compulsão, aqui, não é psicopatológica nem um sintoma
subjetivo, mas a reprodução de um processo psicossocial. Os usuários das salas de bate-
papo, em particular, se encantam com o funcionamento das telas coloridas, o
movimento das palavras digitadas que aparecem e desaparecem subitamente, os sons e
outros efeitos aparentemente fabulosos que conduzem os contatos neste âmbito.
Na sociedade contemporânea, os estímulos audiovisuais são exibidos em tal
velocidade, que constituem um vício para o sujeito. A transmissão simultânea dos
21
eventos invade a vida das pessoas que clamam por uma aproximação da realidade, ainda
que, deveras, nada exista de autêntico a não ser o arrepio que sentem diante dos
acontecimentos que acompanham. Seqüestros, assaltos, incêndios, catástrofes das mais
diversas são exibidas “ao vivo”, para que as pessoas possam fazer parte delas, mas sem
correr riscos e no conforto de seus lares. O que parece ficar claro é que, além de ser
percebido o sujeito precisa também perceber, para ter a certeza de que está vivo. E
quando não é invadido pelos plantões que noticiam os tiroteios, ataques terroristas e
outras explosões de violência, costuma buscar a continuidade do espetáculo nas telas do
cinema.
Reiterados e intensos estímulos devem ser lançados pela indústria do
entretenimento de maneira cada vez mais freqüente diante dos telespectadores, afinal,
aquilo que não choca e não atinge freneticamente o sujeito é destituído de valor e
marginalizado. A procura por estímulos cada vez mais potentes e impactantes tem a
finalidade de sustentar o vício do consumidor. Na condição de viciado nos choques
audiovisuais, o sujeito sabe que a felicidade plena não será alcançada, mas uma força
maior – a compulsão e a conformação – permanece cobrando esses estímulos.
Além da compulsão pela qual o sujeito é dominado, uma outra maneira de
entender o seu envolvimento com a indústria de imagens e bens massificados é a
dificuldade que ele tem de romper com a ingenuidade sobre a técnica para considerar
que o progresso caminha em duas vias antagônicas. O que resulta são as inovações
tecnológicas apresentadas a todo o momento que acabam por mascarar a barbárie da
sociedade, bem como aplacar as suas contradições. Prova disso é o fato de carregarmos
as condições objetivas necessárias para eliminar a fome no mundo, mas o que
predomina e se alastra ainda mais é a miséria.
Disso conclui-se que o esclarecimento, não cumpre o importante papel que se
lhe atribuiu de libertar a humanidade do medo da aniquilação. Não aproxima o homem
da liberdade, nem o distancia das incoerências sociais, pois ainda que espelhado na
técnica, o sujeito continua preso às mesmas condições sociais e à regressão de suas
capacidades, que na sociedade capitalista o remetem ao papel de mercadoria. De acordo
com Horkheimer e Adorno:
22
O que não se diz é que o terreno no qual a técnica conquista seu poder sobre
a sociedade é o poder que os economicamente mais fortes exercem sobre a
sociedade. A racionalidade técnica é hoje a racionalidade da própria
dominação. Ela é o caráter compulsivo da sociedade alienada de si mesma
(Horkheimer e Adorno, 1985, p.114).
A técnica pode ser entendida como a produção e organização do objeto, além de
sua reprodução e distribuição mecânica, que permanecem alheias ao próprio objeto.
Atualmente, a técnica desempenha um papel decisivo, pois em sua relação com o
sujeito, configura um membro com força própria e com um poder quase mágico, porém,
dele dissociado. Segundo Adorno, essa dissociação implica o fortalecimento da frieza e
à incapacidade de amar outros sujeitos, fato que:
(...) não deve ser entendido num sentido sentimental ou moralizante, mas
entoando a carente relação libidinal com outras pessoas. Elas são
inteiramente frias e precisam negar também em seu íntimo a possibilidade do
amor, recusando de antemão nas outras pessoas o seu amor antes que o
mesmo se instale. A capacidade de amar, que de alguma maneira sobrevive,
eles precisam aplicá-la aos meios. (Adorno, 2000, p.133)
De acordo com Escóssia (1999) há uma ambigüidade que permeia os efeitos
sociais e subjetivos atribuídos à técnica. Segundo a autora, enquanto a técnica parece
promover a democratização de informações, as atitudes políticas referentes a ela
permanecem cada vez mais distantes dos sujeitos; a técnica possibilita o intercâmbio
racial e cultural, mas o que ainda se presencia é a cisão e o ódio entre raças e nações e a
perseguição de interesses particulares; se o homem é posto a salvo de algumas
atividades desgastantes, graças aos avanços da técnica, em contrapartida, acaba a mercê
de um cotidiano marcado pela competição acirrada. Escóssia (1999, p.14) completa
dizendo: “Os resultados dessa competição desenfreada, frequentemente associada aos
avanços tecnológicos, parecem contabilizar mais excluídos do que ‘vencedores’”.
Com a ascensão da técnica e o fortalecimento dos veículos de comunicação, tais
como o cinema, o rádio e a imprensa, a indústria cultural se sobressai e condensa o
sujeito e o todo, o particular e o universal. Mas, em meio a essa unificação forçada que
indiferencia os indivíduos, atua um tipo de controle social voltado para a geração de
lucros. De acordo com a teoria crítica, a socialização burguesa instrumentada ordena aos
sujeitos que se identifiquem com o todo, mas não os agrupa, ao contrário, os aliena,
23
isola e dessensibiliza. Cabe à indústria cultural fazer com que o sujeito constitua um
elemento secundário, um objeto a serviço da maquinaria e das “vantagens” do
progresso.
A propósito do progresso, em “Educação após Aushwitz”, Adorno (2000)
ressalta a sua permanente tendência à civilização. Para o autor, combater o progresso é
“caminhar contra o vento”, afinal, contrariar o espírito que move o mundo é trabalhoso
e desmotivador. Além disso, aliada ao progresso e como conseqüência dele, a técnica e
sua reprodução mecânica tende a formar indivíduos cuja incapacidade de amar outros
sujeitos alimenta um amor voltado para máquinas e coisas.
Já o pensamento freudiano salienta que o crescente desenvolvimento social
instala, na mesma medida, o esquecimento dos assuntos humanos e das necessidades
subjetivas. As pulsões, com isso, reprimidas, passam a ser projetadas na sociedade:
Embora a humanidade tenha efetuado avanços contínuos em seu controle
sobre a natureza, podendo esperar efetuar outros ainda maiores, não é
possível estabelecer com certeza que um progresso semelhante tenha sido
feito no trato dos assuntos humanos; e provavelmente em todos os períodos,
tal como hoje novamente, muitas pessoas se perguntaram se vale realmente a
pena defender a pouca civilização que foi assim adquirida. Pensar-se-ia ser
possível um reordenamento das relações humanas, que removeria as fontes
de insatisfação para com a civilização pela renúncia à coerção e à repressão
dos instintos, de sorte que, imperturbados pela discórdia interna, os homens
pudessem dedicar-se à aquisição da riqueza e à sua fruição. Essa seria a idade
de ouro, mas é discutível se tal estado de coisas pode ser tornado realidade.
Parece, antes, que toda civilização tem de se erigir sobre a coerção e a
renúncia ao instinto; sequer parece certo se, caso cessasse a coerção, a
maioria dos seres humanos estaria preparada para empreender o trabalho
necessário à aquisição de novas riquezas. Acho que se tem que levar em
conta o fato de estarem presentes em todos os homens tendências destrutivas
e, portanto, anti-sociais e anticulturais, e que, num grande número de pessoas,
essas tendências são suficientemente fortes para determinar o comportamento
delas na sociedade humana. (Freud, 1996a, p. 16-17).
Freud, na citação acima, menciona, de um lado, a coerção e a repressão como
aspectos necessários para a sobrevivência dos indivíduos, e por isso questiona a
existência de uma civilização sem renúncia aos instintos. De outro lado reconhece como
grandiosa a idéia de edificar a existência na satisfação plena e irrestrita. Contudo, insiste
que há de se reconhecer a agressividade inerente a cada um dos seres humanos como
tendências destrutivas que, reunidas, determinam a sociedade: é nessa base que a
civilização acaba por se firmar.
24
1.1. A Internet e a configuração das relações
Prossigamos pelo cenário do progresso tecnológico, agora para discorrer sobre
um de seus frutos: a Internet – Interconnect Networks (Redes Conectadas). Foi em
meados de 1960, com um projeto militar norte-americano desenvolvido em pequena
rede, que se iniciou um modo de comunicação peculiar capaz de unir pessoas
geograficamente distantes. No Brasil, a inserção da Internet só ocorreu bem mais tarde,
em 1991, com finalidade acadêmica e submetida ao Ministério da Ciência e
Tecnologia
3
. Após forte processo de expansão, a Internet configura um novo meio de
comunicação e aproximação. Seu uso cada vez mais popularizado continua
transformando a relação do ser humano com a tecnologia e, por conseqüência, as
relações sociais e interpessoais cotidianas.
Quando nos referimos ao crescimento da Internet, devemos levar em
consideração, antes de tudo, que há uma controvérsia acerca do número exato de seus
usuários. O motivo desta controvérsia não se sabe ao certo, já que dispomos de
tecnologia capaz de mensurar, com enorme precisão, o número de internautas
existentes. Contudo, cabe supor que a ocultação dessa informação esteja relacionada a
interesses diversos, predominantemente os interesses de mercado. Um exemplo diz
respeito à quantidade de freqüentadores nas salas de bate-papo. Embora a informação na
página inicial dos chats se refira ao número de pessoas nas salas, em consulta a um
grande provedor recebemos a informação de que se trata da quantidade de acessos e não
de usuários. Isso quer dizer que uma pessoa, que utiliza duas salas ou mais,
simultaneamente, é contabilizada mais de uma vez.
Com a finalidade de ter uma idéia da quantidade de acessos à Rede, tomamos
como referência um levantamento realizado pelo IBGE em parceria com o Comitê
Gestor da Internet no Brasil, que apontou aproximadamente 32 milhões de usuários
brasileiros
4
de Internet, em 2005. Consideramos também uma pesquisa do Ibope
5
que
3
Fonte: Abranet – Associação Brasileira dos Provedores de Acesso (www. abranet.org.br).
4
Conforme PNAD – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios. Os dados detalhados podem ser
conferidos em www.ibge.gov.br.
5
Pesquisa realizada pelo Ibope/NetRatings nos primeiros nove meses de 2005. Fonte: www.ibope.com.br.
Informações mais detalhadas sobre o número e perfil dos internautas estão disponíveis apenas para
compradores, na loja virtual deste mesmo site.
25
revelou que 32,1 milhões de brasileiros utilizaram a Rede Mundial de Computadores
nos primeiros nove meses de 2005.
Segundo os dados apresentados por um estudo sobre o uso da Internet no Brasil
(TIC Domicílios e TIC Empresas), realizado entre julho e agosto de 2006 pelo “Núcleo
de Informação e Coordenação do Ponto BR
6
”, dos sujeitos participantes, 19,63%
possuem computador, sendo que 14,49% deles acessam a Internet. Os resultados
também revelam que, da população brasileira, 33,32% já acessou a Internet alguma vez,
índice esse associado à classe social e à escolaridade. Dos que pertencem à classe A,
95,08% são usuários de computadores e apenas 12,23% dos sujeitos das classes D e E,
utilizam o equipamento. No que se refere à escolaridade, 86,85% das pessoas com nível
superior acessam a Internet, em contrapartida, somente 5,67% dos que possuem baixa
escolaridade fazem uso da Rede Mundial de Computadores.
Ainda de acordo com a mesma pesquisa, o local em que os sujeitos mais
utilizam a Internet é o domicílio, com 40,40% das respostas, seguido por Lan houses e
Cyber Cafés, com 30,10% das respostas. Quanto à finalidade do acesso, 78,18%
mencionou comunicação, 75,40% a busca de informações e 70,80% lazer; sendo que
64,76% utilizam a Internet para enviar e receber e-mail, 38,46% para enviar mensagens
instantâneas (Ex. MSN Messenger), 36,41% participam de sites de comunidades e
relacionamentos (Ex. Orkut), 27,36% fazem uso de chats ou listas de discussão, 10,09%
utilizam a Internet para criar ou atualizar blogs e websites e 8,41% usam telefone via
Internet e videoconferência. Dos participantes do estudo que acessam a Internet,
29,36% dos homens e 25,23% das mulheres admitem o uso das salas de bate-papo. A
faixa etária que mais se adere a esse recurso é de 16 a 24 anos (34,08%).
Dos entrevistados, 36,03% dos homens e 30,68% das mulheres utilizaram a
Internet pelo menos uma vez. Quanto à freqüência de utilização da Internet, a maior
parte, 46,01% o faz diariamente. A faixa de idade em que mais se menciona o acesso à
Rede é de 16 a 24 anos, com 58,83% das respostas, seguidos por 46,47% dos sujeitos
entre 10 e 15 anos. Sobre o tempo médio de uso, 44,88%, a maior parte, portanto, utiliza
a Internet de 1 a 5 horas por semana.
6
A pesquisa completa sobre o perfil dos usuários de Internet e as informações detalhadas sobre o método
adotado para esse levantamento estatístico podem ser encontradas no site: www.cetic.br.
26
As estatísticas apresentadas revelam sem dúvida o crescente número de usuários
de Internet e o índice significativo de adesão aos seus diferentes serviços. Ela é
considerada um poderoso instrumento de difusão de informação que inclui indivíduos e
organizações. Esse aparato é freqüentemente descrito como uma rede de
telecomunicações que aproxima pessoas distintas, com objetivos variados. No espaço
virtual ou ciberespaço, as diversidades raciais, políticas e religiosas parecem conviver
lado a lado, num ambiente sem fronteiras. As diferenças geográficas e culturais são
transcendidas a favor da pluralidade de interesses compartilhados num espaço universal
e acessível a todos os conectados.
Entretanto, o encantamento que a Internet promove com a propagação de
informação e entretenimento e os “benefícios” que ela traz comprometem a capacidade
de seus usuários de observar e compreender a dominação e a influência ideológica que
exerce. A respeito dessas vantagens, Álvaro (2003, p. 7) escreve: “A possibilidade de
‘conversar’ com o mundo inteiro, de fazer ‘amizades’, de ‘debater’, é o que
pretensamente se coloca como liberal. Porém, ao acessar a rede o que se encontra é a
reprodução entorpecente da ideologia dominante”.
Das vantagens prometidas pela Internet, não podemos deixar de mencionar a
nova maneira de conhecer pessoas, sem sair de casa, sem se expor nem correr riscos e,
principalmente, com opções dificilmente encontradas em outros lugares. Para Maia
(1996): “O sempre igual é oferecido como se fosse diferente, dando aos sujeitos a
impressão de que têm a escolha e confundindo esta possibilidade com a
individualidade”. Se, por um lado, há uma possibilidade de encontros múltiplos e
variados na rede, de outro, não existe um contato direto entre as pessoas, portanto as
relações são “descorporificadas”. Para Silva, M (1999), a comunicação estabelecida por
meio da Internet é desprovida de afeto, do olhar e exposição ao outro, promovendo o
isolamento. Ainda segundo o autor:
O cidadão do mundo globalizado está mais separado da sociedade do que
antes. Conectado afasta-se das pessoas que estão fisicamente ao seu redor,
para dedicar-se as relações mediadas (...). Pode-se escrever, falar e, até
mesmo, ver e ser visto através de câmeras acopladas ao computador,
trocando idéias ou praticando o cibersexo (...), no entanto, o resultado das
ações on-line é o aumento da carência pelo toque corporal. (Silva, M, 1999,
p.27).
27
Embora Silva, M (1999) tenha retratado o empobrecimento das relações e a
ausência de afeto, características encontradas no homem contemporâneo, o cenário que
presenciamos hoje se mostra um pouco diferente, mais exacerbado no tocante à
separação dos corpos. Atualmente, nos deparamos com seres cada vez mais integrados:
em seus condomínios, nas empresas em que trabalham, nas instituições das quais fazem
parte e na própria Internet, que surge com a promessa de unificação sem barreiras.
Assim, arriscamos dizer que o distanciamento corporal e a insensibilidade entre os
sujeitos, descritos por Silva, M (1999), tornou-se ainda mais hostil, já que extrapola até
mesmo a integração desmedida alcançada pela sociedade.
Também não podemos deixar de levar em conta que a idéia perpetuada pelos
meios de comunicação de massa, com base no sistema vigente, é a de que todo e
qualquer progresso é motivado por um desejo de beneficiar a sociedade e tem como
objetivo facilitar a vida das pessoas. Afinal, para que serviriam as salas de bate-papo a
não ser para ajudar os indivíduos solitários a encontrar parceiros, fazer amizades, se
divertir? Esse seria o compromisso da indústria dos provedores.
Além disso, os sujeitos também compartilham a falsa idéia de camaradagem.
Sabem que ela de fato não se cumpre, mas precisam acreditar que de algum modo
estejam amparados. Assim, os sujeitos se relacionam, à medida que permanecem
impermeabilizados: a solidão é ressaltada. Tão integrados e, ao mesmo tempo, tão
distantes, é nessa contradição que as relações na contemporaneidade encontram o seu
fundamento.
28
2. O indivíduo e a solidão na contemporaneidade
“A solidão mostra o original, a beleza ousada e
surpreendente, a poesia. Mas a solidão também
mostra o avesso, o desproporcionado,
o absurdo e o ilícito”.
TH. Mann (escritor alemão, 1875-1955), Morte em Veneza.
Autores da teoria crítica, tais como Horkheimer e Adorno (1973), discutem as
diferentes concepções de indivíduo adotadas pela Sociologia, Psicologia e Filosofia, em
momentos históricos distintos e criticam a ênfase que, muitas vezes, algumas disciplinas
dão ao indivíduo como categoria externa à sociedade – visão que os autores consideram
ingênua. O conceito de indivíduo, desde o seu aparecimento, procura traduzir auto-
suficiência e individualidade, no entanto, Horkheimer e Adorno (1973, p.47) ressaltam:
“a vida humana é, essencialmente e não por mera casualidade, convivência”.
O indivíduo surge, de fato, apenas quando consegue ter consciência de si, se
autodeterminar e se diferenciar das outras pessoas em crenças e interesses, além de dar
prioridade ao seu autodesenvolvimento. Para que ele desenvolva a consciência de si, a
sociedade tem um papel importante:
Entretanto, mesmo essa autoconsciência da singularidade do eu, que não
basta para fazer, por si só, um indivíduo, é uma autoconsciência social; e vale
a pena lembrar aqui que também o conceito filosófico de ‘autoconsciência’
supera o indivíduo ‘abstrato’ e leva à mediação social. (Horkheimer e
Adorno, 1973, p.47)
Considerando a relevância da singularidade e da consciência de si no processo
de individuação, ao focalizarmos os freqüentadores de salas de bate-papo, observamos a
dificuldade de manifestação da “real identidade” do sujeito e a sua indiferenciação em
relação aos que compartilham o mesmo aparato. Nesse espaço, o “eu virtual”, que é
representado por recursos como pseudônimos – muitas vezes ligados a pessoas famosas
– e figuras de “carinhas” padronizadas, se confunde com o “eu real”, com aquilo que o
sujeito é quando dissociado dos recursos oferecidos pelos chats. As mesmas figuras e,
por vezes, os mesmos pseudônimos, são utilizados por dezenas ou centenas de pessoas,
29
simultaneamente. O que conferiremos é uma das grandes promessas dos chats: a de
aproximar as pessoas da realidade, a ponto das experiências virtuais e presenciais serem
percebidas como uma coisa só.
Na sociedade contemporânea, marcada pela perseguição do melhor desempenho,
se verifica uma forte tendência às atitudes individuais e ao tratamento subjetivo das
questões objetivas. O indivíduo se aproxima muito mais do individualismo com base na
ilusão de que deve seguir sozinho e que tão somente sozinho consegue o que deseja. A
esse respeito, Horkheimer e Adorno esclarecem:
Com a entronização do princípio de concorrência, a eliminação dos limites
das ordens correlativas e o início da revolução técnica na Indústria, a
sociedade burguesa desenvolveu um dinamismo social que obriga o
indivíduo econômico a lutar implacavelmente por seus interesses de lucro,
sem se preocupar com o bem da coletividade. (Horkheirmer e Adorno, 1973,
p.55)
Segundo Lasch (1986), a individualidade exacerbada pode ser entendida como
uma estratégia de sobrevivência diante das mudanças sociais, dentre as quais se destaca
“a substituição de um mundo confiável de objetos duráveis, por um mundo de imagens
oscilantes, que torna cada vez mais difícil a distinção entre realidade e fantasia.”(Lasch,
1986, p.13). Isso quer dizer que em uma sociedade configurada pela produção em
grande escala e pelo consumo imediato – uma vez que os produtos são criados para
serem rapidamente substituídos por mercadorias mais aperfeiçoadas – as relações
sociais se fundam na produção e no consumo massificados, além de privilegiarem as
impressões superficiais.
O autor explicita que, ao sujeito inserido na “cultura do sobrevivencialismo”, as
estratégias de sobrevivência se impõem em razão de um cotidiano repleto de
dificuldades: doenças, drogas, desemprego, conflitos conjugais, violência. Algumas
dessas estratégias são a falta de compromisso afetivo com outras pessoas, a apatia e o
desejo de viver um dia de cada vez e com toda a intensidade possível motivado pelo
sentimento de brevidade da própria existência.
Ademais, o “sobrevivente” reduz seus relacionamentos face a face e a sua
confiança em ligações pessoais ou compromissos mais longos, os quais, num mundo
instável e efêmero, representam riscos cada vez mais difíceis de tolerar. Dessa forma, a
30
melhor estratégia para sobreviver é atuar cada vez mais individualmente. A
racionalidade das salas de bate-papo parece refletir essa necessidade de autopreservação
e sobrevivência do homem burguês. Eis que diante da tela, em sua casa ou em seu
trabalho, o sujeito está supostamente protegido, não apenas da violência das ruas e das
pessoas “mal intencionadas”, mas da exposição ao outro e dos laços mais sólidos.
De volta à discussão sobre o indivíduo, tendo como base o pensamento de
Horkheimer e Adorno (1985, p.113), o que se verifica é a ilusão de independência plena
que domina o homem moderno. Envolvido em sua onipotência, o indivíduo
contemporâneo se isola e age por si só, mas isso não o torna menos refém do sistema:
“(...) os projetos de urbanização que, em pequenos apartamentos higiênicos, destinam-se
a perpetuar o indivíduo como se ele fosse independente, submentem-no ainda mais
profundamente a seu adversário, o poder absoluto do capital.”(Horkheirmer e Adorno,
1985, p.113)
Nesse universo, a Sociologia oferece a sua forte contribuição com o pressuposto
de que o indivíduo é socialmente mediado
7
. O indivíduo só pode ser definido pela sua
correlação com outras pessoas e, antes mesmo de se autodeterminar, se relaciona com
os seus semelhantes. Esse processo ocorre por meio dos papéis sociais que o homem
representa. É de acordo com esses papéis sociais e da relação com os seus semelhantes
que o indivíduo é revelado:
Inclusive, a pessoa é, como entidade biográfica, uma categoria social. Ela só
se define em sua correlação vital com outras pessoas, o que constitui,
precisamente, o seu caráter social. A sua vida só adquire sentido nessa
correlação, em condições sociais específicas; e só em relação ao contexto é
que a máscara social do personagem também é um indivíduo. (Horkheirmer e
Adorno, 1973, p.48)
Para Horkheirmer e Adorno (1973), os estudos freudianos sobre o indivíduo e a
multidão oferecem grande contribuição não somente ao destacar a irracionalidade e o
respeito ao líder, mas também ao admitir o poder de autonomia do indivíduo em meio à
coletividade. Ao contrário de pesquisadores como Le Bon, cujos trabalhos sobre
7
Na Psicologia Social, a relevância do aspecto social na formação do indivíduo é tratada, com
profundidade, de acordo com a perspectiva meadiana, na obra de SASS, Odair. Crítica da Razão
Solitária: a Psicologia Social segundo George Herbert Mead, Bragança Paulista: Editora Universitária
São Francisco, 2004.
31
comportamento em sociedade se concentram apenas nos aspectos negativos da
massificação, Freud não se apega à tese de que todo indivíduo – independente de sua
personalidade, caráter, inteligência, atividades que exerce – ao se integrar à multidão,
abre mão de si e se dilui no grupo. Assim, para aqueles que acreditam no domínio das
massas pelos meios de comunicação, Horkheimer e Adorno alertam:
(...) mas os veículos de comunicação, só, por si, não constituem um perigo
social. O seu conformismo não faz mais do que reproduzir ou ampliar as
predisposições para uma submissão ideológica, a qual encontra o seu objeto
na ideologia apresentada pela comunicação às vítimas, conscientes ou
inconscientes. (1973, p.87).
Para os autores citados, ao invés de se condenar as massas de modo
indiscriminado, há de se admitir a importância de cada indivíduo pensar sobre o que o
leva a fazer parte das coletividades, já que elas são inerentes à sociedade, e assumir uma
posição mais autônoma.
2.1. O conceito de solidão e seus sentidos
A fim de discutir a relação do indivíduo com a solidão, recorremos de início às
reflexões de Paz (1992). Para o autor, todos os homens, em algum momento da vida,
estão sós. O ser humano é o único que se sente só e busca o outro, empregando esforços
desde o nascimento, na tentativa de se livrar do isolamento. Nesses termos, a solidão
está associada ao isolamento e o seu caráter dialético é perdido no momento em que a
sociedade moderna tenta suprimi-la ou tenta transformar os homens em seres
absolutamente iguais: a solidão perde o seu caráter de prova, de verdadeira “expiação,
passando a ser unicamente o resultado de uma incapacidade de comunhão, quando
deveria ser justamente uma etapa para essa última”. (Paz, 1992, p. 184).
O autor referido também recupera os mitos e santos de períodos primitivos da
história, para explicar um dos papéis da solidão: romper com o mundo caduco para que
um novo mundo possa surgir. Para alguns povos, a solidão significa a purificação
necessária para que cada indivíduo volte a compor o grupo; a mesma solidão, que
segundo Paz (1992), precisa ser vivida para favorecer a comunhão das pessoas no
32
cenário atual. Outro significado que ele dá à solidão é o de criação, haja vista que o
trabalho perdeu esse caráter criativo com o passar dos tempos. Em sua obra dedicada ao
tema, o autor expressa a dualidade relacionada ao conceito de solidão: “a solidão é uma
pena, mas também uma promessa de fim do nosso exílio. Toda vida é habitada por essa
dialética” (Paz, 1992, p.176).
No que se refere à solidão na contemporaneidade, Katz (1996) ressalta que os
pesquisadores devem rever o modo como tratam tal conceito, quando o consideram
como produto apenas da “vontade psicológica”, visão que ele considera equivocada e
parcial, pois desconsidera o aspecto social da solidão. Para o mesmo autor, “o usuário
de Internet está, de algum modo, condenado à solidão” (Katz, 1996, p.63), mas isso não
se deve somente à ordem subjetiva. O autor sugere que a solidão dos usuários de
internet vai além um estado psicopatológico ou de inadequação. É preciso compreender
a Internet e a sua utilização em um cenário de transformações sociais.
Em se tratando da solidão associada aos sujeitos que fazem uso da Internet,
quando nos deparamos com as estatísticas sobre visitas às salas de bate-papo
constatamos que a utilização dessa ferramenta aumenta significativamente nos finais de
semana (vide tabela 3, p. 72). Isso leva a uma análise do que faz um sujeito que dedica a
sua semana prioritariamente ao trabalho e aos estudos, a estabelecer contato por meio
dos chats em vez de usar o tempo escasso que lhe resta para o lazer e relacionamentos
interpessoais presenciais (amorosos, fraternos e familiares).
Para compreender esse fenômeno, é preciso olhar para o papel da indústria
cultural na vida do sujeito contemporâneo. Nota-se que a propaganda aparece nos chats,
em meio à diversão, e se utiliza do entretenimento para dissimular o objetivo de
consumo. A Internet como instrumento tecnológico, e as salas de bate-papo como
produto desse instrumento, apenas reproduzem o esforço do sujeito em relação ao
trabalho sob a falsa aparência de mínimo esforço:
O prazer com a violência infligida ao personagem transforma-se em violência
contra o espectador, a diversão em esforço. Ao olho cansado do espectador
nada deve escapar daquilo que os especialistas excogitaram como estímulo;
ninguém tem o direito de se mostrar estúpido diante da esperteza do
espetáculo; é preciso acompanhar tudo e reagir com aquela presteza que o
espetáculo exibe e propaga. Deste modo, pode-se questionar se a indústria
cultural ainda preenche a função de distrair, de que ela se gaba tão
estentoreamente. (Horkheimer e Adorno, 1985, p.130)
33
O entretenimento atua quando a solidão torna-se um problema, e uma saída de
fácil alcance pode ser encontrada na Internet, da maneira mais “prazerosa” possível,
dados os atrativos disponíveis. Não é de se espantar que estejamos falando exatamente
sobre uma das premissas da indústria cultural: amparar o sujeito e não deixá-lo só. De
fato, são tantas as possibilidades oferecidas pelos meios de comunicação de massa, que
até pode parecer difícil ser um solitário. Inúmeros programas de TV, como novelas,
filmes e seriados, além dos programas de rádio, são exemplos daquilo que é ofertado
por essa indústria. Mas a novidade – que tão pouco tem de novo – está na força da
Internet, com o seu potencial de reunir em um só instrumento toda esta variedade. Sobre
o compromisso dos meios de comunicação em massa de não permitir que o indivíduo
entre em contato com a sua solidão, Katz afirma:
(...) especialmente os meios de comunicação em massa não suportam a
solidão, pois esta se põe como maior obstáculo à sua propagação e existência.
Procuram incluir o maior número de pessoas em sua produção, condição
básica para sua ampliação e existência concretas. E por isso adoecem a
solidão, apresentando-a sempre sob forma negativa. (Katz, 1996, p.42)
É importante ressaltar que a diversão promovida pela indústria cultural parece
não retirar o sujeito da sua condição de solitário. O seu insucesso reside no papel
designado ao entretenimento pelos meios de comunicação em massa. Horkheimer e
Adorno afirmam:
Todavia, a indústria cultural permanece a indústria de diversão. Seu controle
sobre os consumidores é mediado pela diversão, e não é por um mero decreto
que esta acaba por se destruir, mas pela hostilidade inerente ao princípio da
diversão por tudo aquilo que seja mais que ela própria. (Horkheimer e
Adorno 1985, p.128).
A sensação constante de solidão, mesmo em meio a tantas pessoas, se fortalece
no sujeito moderno imerso em um cotidiano em que os falsos vínculos se sobressaem. O
automatismo crescente dos contatos parece promover cada vez mais a inacessibilidade
dos indivíduos. Se nos perguntam se está tudo bem, respondemos que sim mesmo que
não esteja. Um “bom dia” é sempre retribuído com um “bom dia” automático. Por esse
34
caminho, muitas relações acabam por se resumir a diálogos contidos e estereotipados
que dizem pouco ou nada daquilo que o indivíduo é ou sente. Esse é um fato que pode
contribuir para o distanciamento das pessoas, já que não se reconhece o outro pelo que
ele é verdadeiramente. Bem pouco se revela de si próprio e quase nada se sabe sobre
aqueles que estão ao redor. Em outras palavras, o sujeito resiste à verdadeira
“experiência”, àquela que é composta por laços mais aprofundados, à medida que se
entrega à experiência danificada dos contatos parciais e que esvaecem subitamente, as
“vivências”, conforme Benjamin (1975).
De acordo com esta perspectiva, entendemos que solidão não significa estar só.
Silva F. (2005, p.12), cita o exemplo de Baudelaire, poeta francês do século XIX que,
segundo ele, cultivou a própria solidão em meio às outras pessoas, ou ainda, justamente
pelo fato de estar entre elas. Portanto, o indivíduo pode não estar só, mas sentir-se
solitário. Desse modo, é possível se relacionar com o outro, ir para o trabalho, levar os
filhos ao colégio e reunir a família para um jantar, mas ainda ser solitário. Isso pelo fato
de que as relações sociais, em seus diversos níveis, podem ser construídas com base na
superficialidade e nos papéis que precisam ser cumpridos.
Quando discutimos a questão dos solitários que freqüentam as salas de bate-
papo, é difícil não tratarmos do isolamento, visto que a maior parte dos que acessam os
chats o fazem na ausência de outras pessoas (vide tabela 6, p.75), em um contato
exclusivo com a tela e com aqueles que, virtualmente, estão por trás dela. Além disso, o
que também intensifica o isolamento dos sujeitos que se dedicam a esse tipo de relação,
é o fato de que tais contatos são desprovidos de olho no olho: há uma ausência de
exposição direta e um cerceamento dos sentidos. O isolamento, muito mais afetivo, do
que físico, parece, ainda, ser uma condição que acompanha os sujeitos contemporâneos,
inseridos em uma civilização regulada pela técnica.
O isolamento, como analisa Benjamin (1975) no texto “Sobre alguns temas em
Baudelaire”, atinge fortemente as multidões que circulam pelas ruas, num “vai-e-vem”
desenfreado. Raros são os momentos em que se olham e se cumprimentam e, quando o
fazem, comumente imprimem uma formalidade. Os grandes aglomerados urbanos
reproduzem os passos apressados dos sujeitos que caminham rumo aos próprios
interesses. A multidão aproxima os corpos, mas isola os espíritos. Nas salas de bate-
papo, corpos e espíritos parecem distanciados pela prevalência da virtualidade que não
garante, nem estimula a solidez dos contatos estabelecidos.
35
De acordo com Tarde (2005), a idéia de multidão está associada a uma coesão
física entre os sujeitos, enquanto a de público, seja qual for a sua natureza, se refere a
uma coletividade integrada apenas mentalmente. Os encontros presenciais que
disseminam as correntes de opinião tornam-se, a cada dia, mais dispensáveis, pois os
meios de comunicação de massa já permitem que os homens influenciem uns aos outros
sem que tenham de sair de suas próprias casas: basta ligar a TV, ler o jornal ou acessar a
Internet. No momento em que os componentes desse público recebem as mensagens são
individualmente tocados por cada uma delas e, ainda que solitários, sentem como se
estivessem em meio a uma platéia de ouvintes do mesmo discurso. O que preserva o
vínculo entre esses sujeitos é a certeza de que suas idéias são partilhadas
simultaneamente por outras tantas pessoas, sem que para isso seja necessário encontrá-
las.
O autor referido escreve que a justificativa para o contágio do público é o
interesse pelo que há de novo, as últimas notícias, quando, de fato, a atração é
despertada por tudo o que é de interesse coletivo. Nessa medida, as salas de bate-papo
dispostas na Internet, podem ser compreendidas como uma recente ferramenta que
desperta crescentemente a curiosidade coletiva, já os seus freqüentadores, fisicamente
isolados, podem ser analisados como grandes públicos que se organizam segundo
interesses diversos.
Se por um lado a multidão é restrita ao espaço físico e até às condições
climáticas, de outro, o alcance do público é ilimitado, o que o torna potencialmente mais
poderoso em sua capacidade de influenciar. De acordo com Tarde: “Nesse sentido, o
público poderia ser definido como uma multidão virtual” (Tarde, 2005, p.15). O que há
de comum entre o público e a multidão é que ambos não prevêem a conciliação das
diversidades, mas a incorporação de um caráter homogêneo entre seus adeptos.
De volta à discussão sobre a solidão, Katz (1996) adverte que ser solitário nem
sempre pode ser entendido como algo negativo, como uma condenação. Ser solitário,
para ele, também representa escolha: a opção de quem não deseja compartilhar. O autor
ainda exemplifica com a nova configuração do casamento que rompeu a sua estrutura
clássica. Atualmente, muitos casais, embora casados, decidem morar em casas
separadas, não apenas para manter a sua escolha pela solidão, mas para preservar a
própria convivência.
36
Katz (1996) tenta explicar o motivo pelo qual o solitário costuma ser visto com
estranheza: “Os humanos são tomados e aferidos como ‘particulares’ de algo
universalizante. E por isso, a solidão, que se recusa à inscrição social, é produzida pelos
saberes urbanamente organizados, vivida e pensada como um processo negativo.”
(Katz, 1996, p.111).
Alguns trabalhos sobre a solidão desenvolveram instrumentos de medida, fosse a
partir de um tratamento unidimensional ou, ainda, levando em conta as múltiplas
dimensões da solidão. Dentre os instrumentos elaborados, se destaca a “Escala UCLA”
(Revised UCLA Loneliness Scale) como a mais utilizada para mensurar solidão nos
trabalhos sobre o tema. A “Escala UCLA de Solidão” foi elaborada na Universidade da
Califórnia, Los Angeles, por Peplau e Ferguson (1978) e revisada em 1980 (Peplau e
Cutrona). No Brasil, a validação da “Escala UCLA de Solidão” ocorreu em 1984, por
Pinheiro e Tamayo. Tal escala avalia a solidão de maneira global, ou seja, sem ater-se
aos níveis de solidão em categorias diferentes de relacionamentos.
A discussão que realizamos até agora a respeito da solidão apresenta algumas
dimensões do conceito, ora tratadas como afastamento (associado ao isolamento), ora
como aproximação (relacionada à socialização), e podem ser assim resumidas:
1. A solidão que isola o sujeito tornando-o frio e alheio aos outros. Uma
solidão que cega e aliena, na medida em que bloqueia o reconhecimento de si e
do outro. Tende a ocorrer baseada na falsa crença de auto-suficiência. Essa
dimensão inclui a solidão em meio a uma aproximação coletiva forçada ou “os
solitários na multidão” (Benjamin, 1975). Também abarca “os solitários em
meio a um público” ou uma platéia (Tarde, 2004). Arriscamos dizer que,
nesses casos, o isolamento, embora nem sempre seja físico, se apresenta no
campo da afetividade, em razão dos frágeis contatos estabelecidos.
2. A solidão imposta ao sujeito, quase sempre associada também ao isolamento
físico que, muitas vezes, coloca o solitário em uma posição de passividade ou
diante de dificuldades para superar tal imposição. Desse grupo fazem parte os
desempregados, prisioneiros, deficientes físicos, indivíduos que fazem parte de
minorias étnicas ou religiosas. Katz (1997) os define como “solitários sociais”.
37
Podemos unir a este, os indivíduos que Katz (1996) chama de “solitários
naturais”. Embora o autor tenha tratado essas categorias de modo separado,
entendemos que os solitários naturais, também o são, socialmente, e não apenas
no campo da psicopatologia. A este grupo dos solitários naturais estão
associados os psicóticos e deficientes mentais, que constituem um tipo de
solitários pela exclusão. Para Katz:
(...) nestes excluídos, a solidão é um dado natural que aparece como ameaça
de dissolução grupal. Basta ver o que um sem número de terapias médicas e
psicológicas faz para socializar os naturalmente só, tentando incutir-lhes a
força de vontade para participar da vida comum, exigindo coerência
normativa em seus ditos e fazeres. (Katz, 1997, p.43)
3. A “solidão consciente” que representa uma situação ou um estágio da vida
do indivíduo que avança em busca da maturidade interior por meio da auto-
reflexão. Configura um recolhimento em prol da criatividade e do
esclarecimento acerca de si e do mundo. O sujeito escolhe ser solitário e
precisa da solidão para sentir-se bem.
Parte das características anteriormente mencionadas está ligada a uma
dificuldade de comunicação entre as pessoas e à falta de intimidade nas relações. A esse
propósito, Benjamin (1975) faz uma referência a Engels e destaca que, na obra desse
autor, a multidão aparece como algo que provoca angústia e desconforto, o que está
presente na descrição que realiza dos transeuntes nas ruas de Londres:
Uma cidade como Londres, onde se pode caminhar horas a fio sem chegar
sequer ao início de um fim, tem qualquer coisa de desconcertante. Esta
concentração colossal, esta acumulação de dois milhões e meio de homens
num só ponto...mas tudo o que isso custou, somente se descobre a seguir.
Depois de ter vagabundeado alguns dias pelas calçadas das ruas
principais...começava-se a ver que esses londrinos tiveram que sacrificar a
melhor parte da sua humanidade para realizar os milagres da civilização de
que a sua cidade fervilha; que centenas de forças latentes neles permanecem
inativas e foram sufocadas...Já o bulício das ruas tem qualquer coisa de
desagradável e fastidioso, algo contra o que a natureza se rebela. Estas
centenas de milhares de pessoas, de todas as classes e condições sociais, que
se cruzam nessa balbúrdia, não serão por acaso todos os homens, com as
mesmas qualidades e capacidades, e com o mesmo interesse em ser felizes?
(...) No entanto passam pelos outros com pressa, como se nada tivessem em
comum, nada que ver uns com os outros; no entanto, o único entendimento
38
que os une é esse, tácito, de cada um se conservar do seu lado da calçada, à
direita, para que as duas correntes de multidão que avançam em direções
opostas não se estorvem reciprocamente; no entanto, não passa pela cabeça
de ninguém honrar os demais nem sequer com um olhar. A indiferença
brutal, o fechamento insensível de cada um nos próprios interesses privados,
manifesta-se tanto mais repugnante e ofensivo quanto mais alto é o número
de indivíduos condensados em um espaço apertado (Engels apud Benjamin,
1975, p.42)
A descrição dos londrinos escrita por Engels pode ser articulada à frieza em
relação ao outro, a pouca simpatia e à incapacidade para identificação entre os sujeitos,
mencionados por Adorno (2000). Trata-se de uma indiferença cristalizada no caráter das
pessoas, em uma sociedade em que predominam os vínculos superficiais e o “jogo de
interesses”. Segundo Adorno (2000), todos se sentem mal-amados e são praticamente
incapazes de amar. Esse sentimento – ou falta de sentimento – invade uma massa
solitária e origina uma convivência coletiva insuportável, daí: “A incapacidade para
identificação foi sem dúvida a condição psicológica mais importante para tornar
possível algo como Auschwitz em meio a pessoas mais ou menos civilizadas e
inofensivas”. (Adorno, 2000, p.134).
Com base nessa discussão, compreendemos a solidão como um estado de
isolamento afetivo que pode, ainda que não necessariamente, ser acompanhado do
isolamento físico; tal estado é caracterizado pela impossibilidade ou desejo do sujeito de
não estabelecer relações afetivas e/ou físicas com outras pessoas.
É importante destacar que não nos cabe a tarefa de defender uma visão fatalista
ou heróica da solidão; antes, cabe atentar para a sua ligação com a busca de relações
amorosas pela Internet e a escolha desse aparato em especial e não de outras alternativas
disponíveis na sociedade.
39
3. Considerações sobre o amor: a sexualidade e a civilização.
“O amor é a capacidade de perceber o
semelhante no dessemelhante”.
TH. W. Adorno (filósofo alemão, 1903-1969),
Mínima Moralia, III, Monogramas.
É notável que os temas “amor” e “sexualidade” alimentam inúmeras discussões
no campo científico e no senso comum. Os relacionamentos amorosos, não menos,
também movimentam os meios de comunicação de massa: as páginas de revistas sobre
comportamento, os suplementos de jornais e os sites de variedades. Muitos deles
dedicam colunas diárias ou semanais a especialistas que oferecem conselhos amorosos,
dicas sobre sexo e estratégias de “sobrevivência” no campo das relações. Os leitores não
apenas se enaltecem com essas informações, como também se confortam por saberem
que não estão sozinhos em suas incertezas. Além disso, o cinema e a televisão já
permitem aos telespectadores uma identificação imediata da sua realidade e seus
conflitos de amor, com a dos personagens de filmes, novelas e seriados, os quais
afirmam e reafirmam, com suas frívolas histórias, que apaixonar-se e desapaixonar-se já
se tornaram tarefas fáceis.
Um dos autores da teoria crítica, Marcuse (1969), para discutir a sexualidade e a
civilização, dedica-se à análise do último modelo da dinâmica psíquica proposto por
Freud, sobre o qual destaca a dialética entre os instintos de vida (Eros) e o de morte
(Tânatos). Para o teórico citado, ainda há um distanciamento entre a sexualidade e o
Eros, como instinto vital, pois a sexualidade está submetida ao mesmo princípio que o
instinto de morte. A sociedade sente-se ameaçada por Eros – “relações duradouras e
expansivas” (Marcuse 1969, p.193) – e emprega esforços para restringi-lo. Eros, por sua
vez, é debilitado pela sublimação freqüentemente imposta pela cultura. Como a
civilização está fundamentada no trabalho alienado, a satisfação se torna um privilégio
de poucos.
Bauman (2004), recupera a comparação entre amor e morte realizada por Klima
(apud Bauman, 2004). Para Klima, a chegada tanto do amor, como da morte, é única e
não prevê a vontade de quem os vive. Devido ao aparecimento inesperado, não se pode
40
aprender a amar, como também não se pode aprender a morrer. Ademais, chegada a
hora, não se consegue evitá-los. Como o amor e a morte aparecem repentinamente, os
homens empregam esforços para extrair algum conhecimento dessas experiências,
estabelecer ligações históricas e dar a elas algum sentido. Esses esforços são necessários
para que o sujeito se sinta mais tranqüilo e permaneça acreditando naquilo que é
racional, previsível e controlável. Assim, pode apoiar-se na ilusão de que é possível
aprender a morrer e amar, como se aprende a jogar xadrez.
Por outro lado, Bauman (2004) ressalta que tratar o amor como acontecimento
único na vida já se tornou questionável, afinal, é fato que os indivíduos se sentem cada
vez menos presos a um compromisso de amor eterno, no estilo “até que a morte nos
separe”. As características dos laços amorosos na atualidade, ainda menos representados
pela durabilidade do Eros, tornam mais difícil assegurar que o amor presente será o
último. Uma noite de sexo, não raramente, é chamada de “noite de amor”. Como
conseqüência, o amor, aos poucos, parece deixar de existir.
A grande oferta de vivências amorosas faz os sujeitos tratarem o amor como
uma competência a ser adquirida com a prática constante. Cada nova vivência parece
mais estimulante que a anterior e, acredita-se, menos impactante que a vivência futura.
Entretanto, o conhecimento que se perpetua é o do “amor” como episódios intensos,
curtos e frágeis. A habilidade adquirida com esse acúmulo de episódios amorosos é a de
entrar e sair de cada um deles, com tanta rapidez que mal se percebe quando tudo
recomeça. O que se verifica, em muitos casos, é uma compulsiva experimentação cujo
resultado, ao contrário do que se possa pensar, é a incapacidade de amar.
Dessa maneira, o que estamos descrevendo é o modo como o sujeito
contemporâneo passou a tratar os relacionamentos amorosos. A esse respeito, podemos
pensar nas salas de bate-papo como um aparato tecnicamente desenvolvido para atender
essa nova configuração no campo das relações, associadas às transformações
psicosociais. Os relacionamentos amorosos estabelecidos no âmbito dos chats são um
reflexo desses novos parâmetros de relacionamento amoroso e do sentido do amor pelo
outro.
As salas de bate-papo também parecem retratar a fragilidade dos laços humanos
e o sentimento contraditório “de apertar os laços e ao mesmo tempo mantê-los frouxos”.
(Bauman, 2004, p.8). Ademais, podemos dizer que o chat, tido como o cenário mais
41
recente das relações virtuais, não provoca, antes reforça e maximiza a fugacidade que se
perpetua nos relacionamentos presenciais. Para Bauman (2004), as relações amorosas,
de um modo geral, tornaram-se “virtuais”. A essa virtualidade ele associa a vida
moderna líquida, em que a velocidade dirige os relacionamentos firmados e desfeitos
abruptamente.
Longe de um regresso nostálgico ao antigo modo de se relacionar, o que
pretendemos é entender o funcionamento dos romances na atualidade. Os
“relacionamentos reais”, os que solicitam compromisso, podem parecer deveras
complexos e desgastantes, ao contrário dos “relacionamentos virtuais”, supostamente
mais perspicazes e objetivos, nos quais é possível embarcar e sair com facilidade e sem
culpa. Nas salas de bate-papo, a fragilidade e fugacidade dos encontros amorosos se
destacam mais intensamente:
Entrevistado a respeito da crescente popularidade do namoro pela Internet,
em detrimento dos bares para solteiros e das seções especializadas dos jornais
e revistas, um jovem de 28 anos da Universidade de Bath apontou uma
vantagem decisiva da relação eletrônica: ‘Sempre se pode apertar a tecla de
deletar’.(Bauman, 2004, p.13).
Na sociedade que define prazos cada vez mais curtos para a execução de
atividades, a cultura destaca o produto para consumo instantâneo. Os relacionamentos
amorosos também seguem a mesma tendência: visam a satisfação imediata dos
impulsos e não a satisfação dos desejos. Isso porque o desejo precisa de mais tempo
para ser esmiuçado, compreendido e saciado. Nesse sentido, o único desejo que deve ser
satisfeito é o de entregar-se aos impulsos. No campo das relações amorosas, render-se
aos impulsos significa abrir as portas para contatos desengajados, que vêm e vão, sem
conseqüências que possam impedir outras aproximações amorosas excitantes e
momentâneas. Segundo Bauman (2004):
A promessa de aprender a arte de amar é a oferta (falsa, enganosa, mas que se
deseja ardentemente que seja verdadeira) de construir a ‘experiência
amorosa’ à semelhança de outras mercadorias, que fascinam e seduzem
exibindo todas essas características e prometem desejo sem ansiedade,
esforço sem suor e resultados sem esforço (Bauman, 2004, p.22)
42
Assim como as mercadorias, os relacionamentos têm prazo de validade. Quando
deixam de agradar, são descartados, tal como os produtos defeituosos ou fora de moda.
Em outros casos, se fazem presentes “as relações de bolso”, em que ambos os parceiros
se aproximam e se descartam mútua e continuamente. A relação passa a ser um
conveniente investimento para os dois lados, haja vista que o objetivo maior é a
satisfação dos impulsos, desde que nenhum dos parceiros se entregue ao envolvimento.
O que permanece dessas relações é a sensação de que sempre se pode dar a meia-volta.
Os sujeitos que utilizam os chats conversam, fazem amigos e procuram por
romances: contatos que aparecem e desaparecem. Entretanto, as mensagens não param
de circular. O foco é o dinamismo das palavras que deve sustentar a instantaneidade das
relações. Nas salas de bate-papo, importa menos o conteúdo dos diálogos e mais o
volume acelerado de palavras. O que se sobressai é uma agitada interação com o outro.
Afinal, o que mantém os chats funcionando são as mensagens continuamente trocadas
entre os seus freqüentadores, além da “intimidade” dos sujeitos forçadamente conciliada
com produtos, à medida que, eles próprios, também se fazem produtos.
3.1. A visão da psicanálise freudiana sobre o amor
O modo como o amor no ocidente foi sendo configurado, por meio de figuras
mitológicas como Eros e Psychê
8
, aproximou os homens de um tipo específico de amor:
o que oferece completude e totalidade para os seres. Dessa maneira, ao “outro”, para a
psicanálise freudiana, é designado o papel de reparar aquilo que nos falta ou o que não
temos mais, ou seja, o primeiro objeto de amor, perdido na infância – a mãe. Portanto,
nem todo o esforço empregado pelo sujeito para reencontrar o seu objeto de desejo é
capaz de recuperá-lo, tal como era nos primeiros anos de vida, o que nos permite dizer
que a satisfação do indivíduo é sempre adiada e o desejo é sempre insatisfeito (Freud,
1996).
8
“Em grego, a palavra psyché significa “alma” e a palavra éros significa amor. A lenda simboliza a
aliança difícil entre a alma humana e o amor, única condição da verdadeira felicidade.” (Gandon, 2000, p.
219)
43
Em sua discussão sobre o amor, Freud (1996a), revela que o ego, embora pareça
unitário e autônomo, está associado ao Inconsciente, representado pelo Id. O autor
reconhece, entretanto, a existência de um ego exterior bem demarcado, que destoa desta
delimitação bem definida em apenas um estado: no auge do sentimento de amor,
quando a fronteira entre ego e objeto corre o risco de deixar de existir. Freud (1996a,
p.75) menciona que “um homem que se ache enamorado declara que ‘eu’ e ‘tú’ são um
só e está preparado para se conduzir como se isso constituísse um fato”, condição, essa,
que pode envolver processos patológicos.
De acordo ainda com o autor citado, o homem, por sua própria constituição,
experimenta com mais freqüência a infelicidade, cujas fontes podem estar no próprio
corpo, no mundo externo e na relação com as outras pessoas. Para ele, o sofrimento
advindo desta última fonte tende a ser o mais penoso. A felicidade, no entanto, passa a
ser submetida pelo homem, ao princípio da realidade, e cada vez mais restringida à
superação do sofrimento. Assim, escapar da infelicidade põe a busca pelo prazer em
segundo plano. As salas de bate-papo, para parte de seus freqüentadores, pode ser
compreendida como uma tecnologia recente, capaz de evitar os riscos de rejeição e
desprazer, próprios dos relacionamentos face a face.
Dentre as defesas utilizadas pelo sujeito contra o desprazer originário dos
relacionamentos humanos, encontra-se o isolamento voluntário que consiste em se
afastar fisicamente e, outras vezes, afetivamente das outras pessoas. Desse modo, o
indivíduo evita o temeroso contato com o mundo externo. Além das saídas possíveis já
mencionadas, Freud (1996a) aponta um modo mais radical de combater a realidade
tomada como inimiga e fonte de sofrimento. O sujeito que para ser feliz, considera ser
necessário romper qualquer tipo de ligação com a realidade porque ela lhe parece cruel,
pode tornar-se um eremita. O eremita substitui o mundo ameaçador por outro mais
adequado aos seus desejos, um “novo” mundo que ele próprio constrói. No entanto,
Freud alerta:
Mas quem quer que, numa atitude de desafio desesperado, se lance por este
caminho em busca de felicidade, geralmente não chega a nada. A realidade é
demasiado forte para ele. Torna-se louco; alguém que, a maioria das vezes,
não encontra ninguém para ajudá-lo a tornar real o seu delírio. (Freud, 1996a,
p. 89)
44
Porém, para conquistar a felicidade e manter distante o desprazer, Freud (1996a)
destaca por último o amor como o centro de tudo e, junto a ele, o prazer que se obtém
em amar e ser amado. O sujeito se mantém independente de seu destino e concentra a
fonte de satisfação nos processos internos, sem se desprender do objeto externo. É
justamente do relacionamento emocional com esse objeto externo que o indivíduo extrai
a sua felicidade.
O amor sexual se torna uma referência de felicidade e faz o indivíduo
experimentar o mais intenso prazer. Entretanto o homem se mantém em uma posição de
fragilidade constante, pois, embora a satisfação seja atingida, não pode evitar a perda do
objeto amado e o conseqüente estado de infelicidade. O desamparo pela perda do amor,
segundo Freud (1996a) é o mais sofrido de todos. Segundo o autor, os homens se
dividem em três tipos, de acordo com suas escolhas objetais:
O homem predominantemente erótico dará preferência aos seus
relacionamentos emocionais com outras pessoas; o narcisista tende a ser
auto-suficiente e buscará suas satisfações principais em seus processos
mentais internos; o homem de ação nunca abandonará o mundo externo, onde
pode testar a sua força. (Freud, 2000, p.18)
Com base na passagem acima, arriscamos dizer que a existência de homens
predominante eróticos, assim categorizados por Freud, tornou-se socialmente
desestimulada. O alvo da sociedade capitalista passou a ser, quase que tão somente, o
homem de ação, aquele que entre uma concorrência e outra contribui para a geração de
lucros e a ostentação do consumo. Concorrência de quem produz mais, concorrência de
quem lucra mais, concorrência de quem compra mais. E nesse ritmo o homem sustenta a
prova de sua força, força esta que lhe permite sobreviver. Contudo, não se pode
descartar, também, a prevalência dos sentimentos de auto-suficiência e individualidade,
conforme já dissertamos no capítulo dedicado ao conceito de solidão.
Nos estudos freudianos, o conceito de amor, a princípio, não é tomado como um
objetivo, todavia, se mostra importante para o entendimento da transferência no
processo de análise, com a descoberta do amor do paciente pelo analista. Freud (1996),
no entanto, esclarece que todo amor se sustenta em uma relação de transferência e que,
esta, não se restringe apenas à relação com o analista. Em seus primeiros casos clínicos
45
sobre histeria, o autor conclui que o sintoma ocorre pela falta de relacionamento
amoroso.
Nesses termos, a possibilidade de se ligar a um parceiro faz o sujeito questionar
o amor às figuras parentais e o confronta com uma vida nova, composta por outros
modelos de amor. Além disso, Freud (1996) faz alguns esclarecimentos no tocante ao
tema amor, ao discorrer sobre suas descobertas acerca da sexualidade. Um deles se
refere ao fato de que o primeiro investimento de amor é narcísico e se constitui pelo
enamoramento de si mesmo. Porém, com o passar do tempo, o investimento no “eu”
começa a perder força e a libido se desloca para o objeto, que é tomado como objeto de
amor.
Um importante legado da obra de Freud (1996) para a compreensão do conceito
de amor é o trabalho intitulado “Contribuições à Psicologia do Amor”, no qual o autor
ressalta a relevância de oferecer um tratamento científico ao assunto, deveras
amplamente explorado por poetas e escritores dedicados aos romances, visto que no
campo da literatura poética, a sensibilidade dos artistas procura desenvolver criações
exclusivamente voltadas ao prazer dos leitores.
Nesse mesmo trabalho, o autor referido discute a impotência psíquica presente
nas relações amorosas, a qual define como um obstáculo interno capaz de bloquear o ato
sexual e impedir o homem de obter prazer. Tal impotência aparece como produto da
insatisfação do sujeito que, movido pelo desejo, busca em seus objetos de amor, a mãe –
sua primeira figura relacional e mediadora no contato com o mundo. Ocorre que,
quando oferece ao bebê o seu leite, a mãe não apenas o mantém vivo e alimentado, mas
assume o importante papel de erotizá-lo e “nutrir” o seu psiquismo, além disso, o corpo
frágil da criança encontra na mãe a sua extensão.
Para a criança, ser saciado pelo alimento trazido pela mãe é estar completo: esta
marca permanece no sujeito e conduz o seu desejo na busca por outros objetos. Em
suma, o sujeito nostálgico se vê impotente em uma repetida e frustrada procura por
objetos substitutos da figura materna, que nunca conseguem reproduzir fielmente o
objeto primeiro: “A mãe deu à criança a vida, e não é fácil encontrar um substituto de
igual valor para essa dádiva sem par”. (Freud, 1996, p.178). A esse dinamismo, Freud
(1996) acrescenta o caráter depreciativo do objeto da pulsão, quando associado ao
objeto de amor, ou seja, o objeto encontrado sempre fica aquém do objeto idealizado.
46
No que se refere aos usuários de chats, verificamos uma característica de
descontentamento em relação aos supostos objetos de amor que se apresentam diante da
tela, o que os mantém numa busca ansiosa e desgastante por outros contatos ou outras
relações que possam trazer-lhes satisfação. Parte dos sujeitos chega a passar horas
seguidas nas salas, dialogando com diversas pessoas. As conversas que se encerram são
sucessivamente emendadas em outras, sem que haja tempo para uma reflexão sobre a
conversa precedente.
O primeiro objeto de amor da criança, a figura materna, viabiliza duas
correntes: a da ternura (afetiva) e a da sensualidade (sexual) que ainda está surgindo.
Posteriormente, uma dessas correntes – a sensual – é desviada deste primeiro objeto e
permanece ligada ao desejo sexual. Já a corrente da ternura, quando reforçada no
período de latência do desenvolvimento, passa a ter os seus alvos sexuais recalcados.
Este cenário muda com a chegada da puberdade, em que novos objetos sexuais
aparecem e a sensualidade prevalece sobre a ternura.
Apenas com o tempo e algumas novas elaborações próprias do início da
adolescência, os objetos sexuais poderão se ligar, novamente, à ternura. Vale ressaltar
que a satisfação genital, por meio do ato sexual, não determina a existência do amor. De
outro modo, a satisfação também pode se associar ao pré-genital, como ocorre com os
contatos amorosos via chat, não levados à cabo, ou seja, mantidos apenas como virtuais.
O que se observa é que, mesmo que a satisfação se dê pelo ato sexual ou por qualquer
tipo de alvo, esta nunca será como fora imaginada: eis o cenário que ostenta a já
mencionada impotência psíquica.
A respeito do que possa originar a impotência psíquica, Freud (1996) acredita
ser uma falha na combinação entre as duas correntes já mencionadas aqui, classificadas
por ele como afetiva e sensual. Para o autor, a união entre estas duas correntes
determina o comportamento amoroso normal do sujeito e qualquer desajuste na
associação entre ambas é capaz de ocasionar um prazer tolhido. Nesse sentido, o
pensamento freudiano parece consoante com o funcionamento das relações amorosas
nas salas de bate-papo, de modo que o amor e o desejo parecem quase sempre cindidos,
em seus freqüentadores. Segundo Freud:
Toda esfera do amor (...) permanece dividida em duas direções
personificadas na arte do amar tanto sagrada como profana (ou animal).
47
Quando amam, não desejam, e quando desejam, não podem amar. Procuram
objetos que não precisem amar, de modo a manter sua sensualidade afastada
dos objetos que amam (Freud, 1996, p. 189)
Outro aspecto discutido por Freud (1996) refere-se à restrição do amor imposta
pela sociedade, de tal forma que o homem só consiga gozar o amor mediante um
obstáculo. Um exemplo citado pelo autor, é a experiência do casamento que, embora
acompanhada da liberdade sexual, muitas vezes não se associa à satisfação completa.
(Freud, 1996, p.193). Em outras palavras, o autor se refere a uma espécie de
impedimento ou resistência para que a libido seja intensificada ou, ainda, o prazer
atrelado ao desencontro do objeto. Tal dinâmica parece se assemelhar ao tipo de relação
estabelecida entre os usuários de chats, em que a mediação das telas, câmeras e outros
equipamentos, são colocados como entraves para o confronto com o “objeto inteiro” ou
o “olho no olho”. Sendo assim, a satisfação reside naquilo que se supõe como oculto
pelo contato virtual.
Em seu trabalho “Psicologia de Grupo e Análise do Ego”, Freud (2000) associa
o amor à libido, ou seja, parte do pressuposto de que Eros, sexualidade e amor estão
relacionados e articulados. O “sexual” é considerado pelo autor como o centro desse
amor. Nessa obra, ele destaca o importante papel do amor para o surgimento e
manutenção da civilização. Isso ocorre quando o sujeito deixa de investir o amor apenas
em si mesmo (narcisismo) e passa a projetá-lo em outros objetos: este é o processo que
permite a formação grupal, visto que os laços emocionais destinados apenas ao próprio
sujeito ou ao objeto primeiro de sua infância não bastariam para formar a sociedade.
Freud, além de dissertar sobre a relação do homem com o processo civilizatório,
contribuiu também para entendermos a gênese e as dimensões do amor, mas talvez não
pudesse supor a proporção que a busca pelo objeto de amor tomaria. Hoje temos a
Internet e o chat, que difundem entre os seus benefícios, amparar os sujeitos em suas
necessidades, inclusive as de amor.
48
4. Os relacionamentos amorosos por meio dos chats
“Movem-se os amantes em direção aos
simulacros das coisas amadas, para falar com as
criaturas imitadas”.
Leonardo da Vinci (artista e cientista italiano, 1452-1519).
Com o desenvolvimento da Internet surgiu um novo tipo de comunicação.
Milhões de pessoas em todo o mundo participam das salas de bate-papo, oferecidas
pelos provedores de acesso à Rede Mundial de Computadores, como forma de
aproximação e procura de parceiros amorosos. Para entendermos melhor a extensão do
número desses contatos estabelecidos nos chats, tomemos os dados de uma única noite
em que se constatou a presença de mais de 35 mil conexões
9
nas salas de um grande
provedor.
Quando pensamos nas características dos diálogos travados nas salas de bate-
papo, qualificamos tais contatos como “virtuais”. É importante esclarecer que o
conceito de virtualidade
10
foi discutido por diversos autores. Levy (1996, p.15), por
exemplo, recorre à gênese da palavra “virtual”, advinda do latim medieval virtualis,
derivado de virtus, que significa força, potência. Na filosofia escolástica é virtual o que
existe em potência e não em ato.
O que nos resta aqui é pensar em um tratamento para o termo “virtual” que se
aproxime do objeto dessa pesquisa. É fato que a materialidade dos encontros presenciais
não é prioridade nos contatos estabelecidos por meio dos chats, porém a discussão não
se encerra nesse aspecto. A virtualidade dos chats pode ser tida como um pouco
diferente das definições aqui citadas, visto que, apesar da separação dos corpos e da
mediação imposta pela máquina, o objeto se faz presente, mesmo que do outro lado da
tela. Dito de uma outra maneira, ao contrário da definição que Levy (1996) propõe, não
é a essência nem a força de realização que constituem as relações nas salas de bate-
9
Dados colhidos em 24/08/2007, às 21h40. (Fonte: UOL – www.uol.com.br).
10
Maquiavel, no ano 1513, em O Príncipe, já discorre sobre o virtù (virtus em latim), obra em que
apresenta um tratado sobre o governo e propõe um método de busca e manutenção do poder político
(Maquiavel, 2000); nela a palavra virtù está relacionada com a virtude, ou à virilidade, e diz respeito ao
conjunto de aspectos necessários ao príncipe, para que ele possa exercer o seu domínio e manter a
liberdade da pátria.
49
papo, uma vez que o contato com o “outro” ocorre de fato, ainda que mediado pela
imaginação ou outros artifícios próprios desse tipo de comunicação virtual. Nessa
medida, o “virtual”, na Internet, implica o controle do aparato sobre a imaginação. O
que equivale dizer que a força do virtual (virtus) mencionada por Levy (1996), é
realizada não pela potência (pelo potencial do sujeito), mas pela objetividade do aparato
que dirige e controla a imaginação do usuário.
Quanto às relações sociais “não-virtuais” podemos dizer que, de modo
convencional, elas passam por um contato físico prévio – o “face a face”. Em um
primeiro momento, encontra-se a pessoa fisicamente e, à medida que se troca
informações, se identifica áreas de interesse comuns, afinidades e demais características
atrativas, tem-se a possibilidade de conhecê-la de modo mais profundo, intimamente.
Os relacionamentos via Internet produzem uma inversão das relações sociais
tradicionais, pois enquanto essas relações necessitam da materialidade, o ciberespaço ao
contrário, não condiciona a relação social ao contato presencial. Há um
redimensionamento do processo de relação interpessoal e social.
Nas salas de bate-papo, as pessoas interagem no campo “virtual”, para depois,
eventualmente, se conhecerem fisicamente. Além disso, o que chama a atenção do outro
não é alguma particularidade visual, mas a maneira como se expressa em palavras, seu
bom humor, sua inteligência, seu nickname
11
. A partir daí, o contato é estabelecido e os
interlocutores podem identificar compatibilidades e trocar informações pessoais. O
futuro desse relacionamento é definido conforme a vontade de cada usuário. Em um
segundo momento, pode haver ou não um contato interpessoal e físico em conseqüência
da aproximação no ciberespaço.
É importante ressaltar, a título de informação, que a procura por alguém na
Internet não se limita ao âmbito das salas de bate-papo, mas também pode ser realizada
por meio dos “sites de relacionamento”. Neles, os usuários inserem o seu perfil em um
questionário pré-formatado ou, se preferirem, utilizam um sistema de busca, com base
em um filtro capaz de apresentar o cadastro das pessoas com as características da
preferência do solicitante. Basta especificar faixa etária, sexo, religião, área de atuação
profissional, entre outras delimitações, para que seja fornecida uma listagem precisa dos
11
Nicknames são apelidos pelos quais os usuários de salas de bate-papo costumam ser identificados. O
internauta raramente se apresenta com o nome verdadeiro em seus acessos aos chats.
50
cadastros. Mas esse modo de estabelecer contatos – por meio dos sites de
relacionamento – recentemente discutido por alguns estudiosos, não é objeto da presente
pesquisa, pois aqui a análise incide sobre os chats.
Voltemos, então, à caracterização dos contatos realizados nas salas de bate-papo.
Notamos que na linguagem falada, as pessoas contam com o auxílio de expressões
faciais, de gesticulação e da entonação de voz para dar emoção às palavras. No mundo
virtual das salas de bate-papo, são as palavras digitadas no teclado do computador que
permitem iniciar um contato e não uma troca de olhares. Aqui merece destaque a
palavra que, dentre outras funções, também é utilizada como arma de sedução. Por não
haver a presença física entre os participantes, ocorre uma supervalorização dos sentidos
da visão e audição, aos quais se limita a comunicação por intermédio dos chats.
De um modo mais abrangente, ao procurarmos entender o fenômeno dos
contatos nos chats, nos deparamos com um homem em que ressalta a busca frenética
por algo, sem conseguir encontrá-lo. Além disso, quanto mais tempo os freqüentadores
desse aparato passam em frente aos computadores, mais tempo desejam passar. Os
diálogos estabelecidos, muitas vezes, são repetidos e fragmentados. Nas salas de bate-
papo é comum um freqüentador “conversar”
12
simultaneamente, com pessoas distintas,
sobre os mesmos assuntos ou assuntos diferentes ou, até mesmo, acessar mais de uma
sala ao mesmo tempo. O que verificamos no indivíduo contemporâneo, e não
diferentemente nos usuários de chats, é uma inquietação, uma angústia que gera
irritabilidade, pelo fato de não haver relação entre as atividades às quais se dedica, fato
que contribui para a compulsiva e eterna procura anteriormente mencionada.
Desse modo, nos chats, a compulsão de efetuar um número cada vez maior de
contatos, ainda que estes não permitam elaboração ou manifestação criativa é uma
tentativa de aliviar a angústia e atingir a satisfação. Esses contatos podem ser
caracterizados apropriadamente como vivências que geram outras vivências. O fato
delas não deixarem marcas lança o indivíduo permanentemente na busca de outras
vivências, o que gera irritação e descontentamento. (Benjamin, 1975).
O fato de que o sujeito dificilmente consegue alcançar a satisfação deve ser
relacionado ao desenvolvimento da indústria cultural, mesmo que a ele sejam oferecidos
produtos cada vez mais excitáveis como os novos e crescentes recursos presentes nas
12
Conversar e teclar são tratados, aqui, como sinônimos.
51
salas de bate-papo. Podemos mencionar, por exemplo, as mudanças no formato dos
chats. Hoje, os diálogos podem ser “enriquecidos” com emoticons ou representações
gráficas em forma de “carinhas” que tentam expressar sentimentos ou reações; além
disso os participantes podem compartilhar sons que simulam beijos ou gargalhadas,
ouvir uma das rádios do próprio provedor enquanto conversam ou teclam
13
e podem
acessar os chats utilizando a própria foto. Para usufruir este último elemento é
necessário estar cadastrado em outro serviço do provedor, chamado “UOL K”, pois é de
lá que a foto pode ser recolhida para ser utilizada nos chats
14
. Para concluir a lista de
“vantagens” oferecidas, resta ainda uma possibilidade que só contempla aqueles que
possuem webcam: criar uma sala exclusiva de “vídeo papo”.
Porém, por meio de toda essa variedade, o “sempre igual” é apresentado como
“novo” e, com isso, um número cada vez maior de sujeitos é atraído pelos “benefícios”
oferecidos pelos chats, como fazer novas amizades, conhecer um grande amor ou
simplesmente passar o tempo. Tudo fica ainda mais fácil e prazeroso quando se pode
desfrutar os diversos atrativos disponíveis nas salas: sons, “carinhas”, fotos, músicas. A
aparência de novidade oculta, sob a forma de diversão e entretenimento, uma estrutura
praticamente imutável, que administra a padronização dos contatos e impede a reflexão
do sujeito.
O papel da tecnologia, nesse caso, junto com o vasto número de recursos
desenvolvidos de maneira ininterrupta, é minimizar o esforço do sujeito, cansado pelo
trabalho. Essa promessa, contudo, reserva uma contradição, visto que mesmo esgotado
pelo trabalho o sujeito se coloca frente à tela, em seu tempo livre, e tenta preenchê-lo
com o uso de um instrumento que reproduz as mesmas condições do trabalho, com a
mesma velocidade e o mesmo objetivo: produzir mais em menos tempo. O número de
pessoas com quem o indivíduo tecla define a sua popularidade. Ele precisa ser rápido
para que o tempo disponível seja bem aproveitado. É por esse motivo que respostas
demoradas costumam ser rejeitadas, pois, são incompatíveis com todo o processo.
A condição de produtividade imposta aos usuários de chats, permite considerar
que o tempo de lazer se confunde com o tempo de trabalho. Além disso, o tempo de
lazer também converge para o consumo, por meio da exposição automática à
13
Teclar é uma expressão utilizada pelos internautas que significa conversar, exclusivamente no
ciberberespaço. Nesta pesquisa, teclar, conversar e dialogar são tratados como sinônimos.
14
No UOL K, o usuário monta um perfil público, com fotos e preferências.
52
publicidade corrente na sala. No que se refere aos produtos ofertados pela indústria
cultural, Horkheimer e Adorno escrevem:
A violência da sociedade industrial instalou-se nos homens de uma vez por
todas. Os produtos da indústria cultural podem ter a certeza de que até
mesmo os distraídos vão consumi-los alertamente. Cada qual é um modelo da
gigantesca maquinaria econômica que, desde o início, não dá folga a
ninguém, tanto no trabalho quanto no descanso, que tanto se assemelha ao
trabalho (Horkheirmer e Adorno, 1985, p.119)
Quando Adorno (1995) discute o tempo de lazer ou tempo livre, considera que o
seu uso ou aproveitamento está associado à condição da sociedade. A sociedade atual
pode ser caracterizada pelo aprisionamento do indivíduo ao trabalho e pela
indiferenciação entre os sujeitos e papéis sociais que eles exercem. Tais funções ou
papéis determinam uma existência ao homem que se distancia do que ele é, de fato:
“Numa época de integração social sem precedentes, fica difícil estabelecer, de forma
geral, o que resta nas pessoas, além do determinado pelas funções. Isto pesa muito sobre
a questão do tempo livre” (Adorno, 1995, p. 71). Limitado à condição do “não ser” ou
enclausurado em seus papéis sociais, o sujeito parece indicar, não somente o
empobrecimento do seu tempo-livre, mas a sua própria solidão. Isso ocorre quando a
sua verdadeira identidade deve ser negada a favor de suas funções e, com isso, as
relações estabelecidas se tornam desprovidas de intimidade.
Ainda sobre o tempo livre, Adorno (1995) destaca a cisão historicamente
construída entre o “tempo livre” e o “tempo não livre”. O tempo livre pode ser
considerado como o privilégio do ócio, já o tempo não livre se aproxima do tempo de
trabalho e deve ser ocupado por ele. Porém, presenciamos que o “tempo livre” se
assemelha à ausência de liberdade no “tempo não-livre”. Por isso, o autor citado indaga:
como fica o tempo livre quando os homens já nascem inseridos em um regime de
produtividade crescente, em que prevalece a não-liberdade? Em resposta, sugere um
modelo em que o horário de trabalho não se encontre em total oposição ao tempo livre e
que todos os indivíduos e não somente poucos, possam se beneficiar de um tempo de
trabalho e um tempo livre, igualmente sérios e igualmente prazerosos (Adorno, 1995).
No entanto, reiteramos que a separação dos dois tempos em si é necessária para
sustentar o sistema de dominação e controle: “Toda mescla, aliás, toda falta de distinção
nítida, inequívoca, torna-se suspeita ao espírito dominante. Essa rígida divisão da vida
53
em duas metades enaltece a coisificação que entrementes subjugou quase
completamente o tempo livre.”(Adorno, 1995, p. 73)
Há outro aspecto do tempo livre: o tédio, cuja origem se concentra no estado de
passividade dos sujeitos. O tédio assola o indivíduo, pois a expectativa quanto ao
aproveitamento do tempo livre acaba frustrada pelo repetido cotidiano. Para combater o
tédio, Adorno conclui: “Se as pessoas pudessem decidir sobre si mesmas e sobre suas
vidas, se não estivessem encerradas no sempre-igual, então não se entediariam”.
(Adorno, 1995, p. 76). Para a passividade contribuem os fatores que dizem respeito aos
sentimentos de impotência e estagnação, de que nada poderá ser feito para mudar a
própria condição, sentimentos que são comparáveis ao modo como as pessoas se
relacionam com a política. Mas, um dos fatores mais importantes para a instalação do
tédio no homem é a fantasia danificada em prol da adaptação:
A falta de fantasia, implantada e insistentemente recomendada pela
sociedade, deixa as pessoas desamparadas em seu tempo livre. A pergunta
descarada sobre o que o povo fará com o tempo livre de que hoje dispõe –
como se este fosse uma esmola e não um direito humano – baseia-se nisso.
Que efetivamente as pessoas só consigam fazer tão pouco de seu tempo livre
se deve a que, de antemão, já lhes foi amputado o que poderia tornar
prazeroso o tempo livre.” (Adorno, 1995, p.77).
A dificuldade de expressão da capacidade criativa aparece exatamente com a
opressão da fantasia e transforma o tempo livre do homem em um tempo sem sentido,
sem historicidade e com um fim em si mesmo. Por esse motivo, não há como esperar
um tempo livre plenamente prazeroso, tendo em vista que a condição primeira para isso,
ou seja, a própria fantasia, fora antes mutilada. É sob essas condições que o tédio se
instala.
Nesse sentido, quando se procura um parceiro amoroso em salas de bate-papo,
muitas vezes, perde-se de vista o jogo da conquista, a essência do flerte e a descoberta
gradual do outro, pois como a fantasia está deformada, o que prevalece é a quantidade
de conversas, a rapidez com que elas ocorrem e a padronização dos diálogos, tendo
como pano de fundo o consumo. O que faz o sujeito freqüentar essas salas para buscar
um parceiro parece ser uma tentativa desesperada de superar o tédio. Porém, com a
capacidade de fantasiar prejudicada, o que lhe resta, em muitos momentos, é o próprio
tédio.
54
A propósito do tempo livre, Adorno (1995) também verifica que uma maneira
dos sujeitos procurarem preenchê-lo, é criando “hobbies”. Não ter um “hobby”,
socialmente, é sinal de uma vida vazia, atrasada e repleta de desprazer, associada à idéia
de dedicação exclusiva ao trabalho exaustivo. Ademais, a tentativa desesperada de
ocupar o tempo de lazer com “hobbies”, pode ser compreendida como uma forma de
impedir que se viva a solidão. Afinal, no momento em que os indivíduos são distraídos
pelos “hobbies”, a solidão permanece, supostamente, de lado.
O sujeito não se dá conta do modo como o negócio que cerca o “hobby” já
determina a sua escolha, previamente, com base na imposição de suas próprias
necessidades. Estas são apropriadas pelo comércio para que sejam disseminadas entre
as pessoas, em seu tempo-livre. Portanto, se o sujeito tem necessidade de conversar com
diversas pessoas, fugir da solidão, romper fronteiras ou conhecer um grande amor, a
indústria dos provedores oferece os chats. Os provedores não podem obrigá-lo a fazer
uso da sala de bate-papo, mas a sua própria necessidade por essa “liberdade” de
comunicação o faz recorrer a tal recurso.
O tempo livre assume a função de restaurar o sujeito para que ele trabalhe mais e
melhor. Embora a sua promessa seja a de não lembrar, de forma alguma, o tempo não
livre ou o tempo de trabalho, o tempo livre acaba por se tornar uma extensão do tempo
de trabalho. Esse processo ocorre “por baixo do pano, porém, são introduzidas, de
contrabando, formas de comportamento próprias do trabalho, o qual não dá folga às
pessoas” (Adorno 1995, p.73).
Acessar a Internet e “matar o tempo” conversando com outras pessoas, por meio
de salas de bate-papo, tornou-se um “hobby” recente, mas também mediado pela força
de trabalho e pelo regime de lucro. Portanto, a atividade de teclar com outras pessoas
nas horas vagas também é convertida em mercadoria. Veja-se o número de publicidade
nos chats que cresce junto com a variedade de seus recursos.
A publicidade é lançada aos olhos dos intenautas na página inicial das salas de
bate-papo de um grande provedor. As chamadas para participação nas diversas salas
dividem espaço com a divulgação de inúmeros produtos e links de lojas online. Um dos
itens presentes nos “destaques” diz: “Sexta-feira! Que tal uma pausa? Relaxe em nossas
salas”. Por meio dele, é possível notar como se dá a mensagem de diversão aliada à
publicidade, nos chats.
55
Teses e dissertações de outros pesquisadores que também analisaram os chats e
mencionaram as propagandas veiculadas por eles, como Álvaro (2003) e Silva M.
(1999), confirmam o poder de consumo cada vez mais presente nas salas de bate-papo.
Os autores citados se referem aos banners, que aparecem nas extremidades da tela
utilizada para a conversa, ou à publicidade a que o sujeito é submetido no percurso até a
sala desejada. O caminho é iniciado com a obrigatória passagem pela página principal
do provedor, em seguida, o acesso à tela com as salas disponíveis para conversa, e por
fim a sala escolhida. Assim, no trajeto que se percorre, o número de propagandas
disseminadas é grande, mas não acaba por aí. Recentemente, a publicidade passou a ser
veiculada com muita intensidade dentro das próprias salas de bate-papo, e inserida entre
os diálogos dos participantes. Basta clicar nos links publicitários lançados nos chats que
o sujeito é imediatamente remetido ao site que permite a compra do produto divulgado.
A cada cinco minutos, aproximadamente, são lançados entre as conversas dos
participantes três links patrocinados. Em uma hora de observação, das 11h26 às
12h26
15
, foram apresentados 36 tipos diferentes de anúncio, de aparelhos eletrônicos,
cursos e serviços dos mais diversos. O que é vendido ao indivíduo é a imagem de que os
chats ajudam a fazer amizades, encontrar um novo amor e afastá-lo da solidão, mas o
que é comprado por ele vai muito além. Entre um diálogo e outro são muitas as
propagandas às quais ele é submetido.
Dessa maneira, também podemos associar o uso dos chats à noção de “choque”,
tal como Benjamin (1975) apresenta. Os choques se referem ao estímulo externo que
deve se tornar mais impactante ao sujeito moderno, cuja sensibilidade encontra-se
empobrecida. A indústria cultural apela para o “choque”, a fim de atingir os sujeitos
com as suas mensagens; os provedores de Internet, como representantes dessa indústria,
não se empenham menos para chamar a atenção de seus usuários. O choque gerado
pelos estímulos excitantes dos novos e variados recursos é igual ao que é provocado
pela publicidade, cada vez mais direta e diversificada, isso porque, com o tempo, nos
tornamos mais imunes aos estímulos, que devem ser cada vez mais crescentes e
atrativos.
15
Dados colhidos em 04/05/2006, em uma das salas de bate-papo da categoria Por Idade, de 20 a 30
anos, do provedor UOL (www.uol.com.br).
56
Nos chats, os choques são freqüentes e tudo funciona de maneira muito rápida: a
proposta de uma conversa, o desenvolvimento do diálogo e a forma que ele assume,
padronizado e repleto de abreviações. Perguntas e respostas devem estar submetidas ao
tempo. É ele que define o ritmo do contato – pergunta rápida, resposta rápida – como
um refrão de música que se repete inúmeras vezes e, se algum dos sujeitos, por qualquer
motivo, apresenta lentidão nas respostas, pode ser excluído do diálogo sem maiores
explicações. Não há profundidade, elaboração ou criatividade nos diálogos que se
resumem a perguntas e respostas clichês. Além disso, há um roteiro oferecido pelo
provedor para “facilitar” a conversa na sala de bate-papo e otimizar o tempo dos
interlocutores na digitação das palavras.
Com essa atuação, a indústria cultural tenta desvelar a necessidade do sujeito e,
como conseqüência, esgota a espontaneidade que possa existir quando se conhece
alguém diretamente. A ele é concedida apenas a chance de “falar para, perguntar para,
concordar com” e conduzir as conversas nas salas de bate-papo. Com outras palavras,
sons e imagens padronizadas. Porém, essa forma limitada de expressão é “vendida”
como uma grande gama de oportunidades para se comunicar com o outro, e o
aprisionamento das palavras desaparece na forma de liberdade.
O sujeito deve, necessariamente, escolher um dos formatos pré-estabelecidos e
organizados em um roteiro para se reportar ao seu interlocutor. Além disso, conta com a
possibilidade de ignorar as mensagens de certos usuários e, caso queira, desfazer essa
opção, selecionando “receber mensagem de”. Também é possível só receber mensagens
de um internauta especificado por ele ou manter diálogos reservados, sem que as outras
pessoas da sala tenham acesso ao conteúdo. Outras opções são: uma lista de sons e
imagens que ilustram sentimentos, como a tristeza e a alegria.
A efemeridade e o automatismo que caracterizam os diálogos estabelecidos nos
chats nos remetem de modo análogo à descrição da multidão nas cidades, feita por
Edgar Allan Poe e retomada por Benjamin, no texto “Sobre alguns temas em
Baudelaire” (Benjamin, 1975). Nesse relato, é destacado o fato de que os esbarros entre
os sujeitos que circulam em meio à massa de pessoas são imediatamente retribuídos
com sorrisos ou outros gestos forçados, não geram traumas, não são elaborados e
passam pela consciência sem deixar marcas. Segundo Benjamin (1975, p.50): “O texto
de Poe evidencia a relação entre desordem e disciplina. Os seus transeuntes se
57
comportam como se, adaptados para autônomos, já não se pudessem exprimir a não ser
de forma automática. O seu comportamento é uma reação a chocs.”
As relações sociais na contemporaneidade parecem se configurar de acordo com
um enquadramento social capaz de amputar a espontaneidade dos indivíduos. Nesse
sentido, para Crochík (2000), a uniformização dos corpos em prol das exigências sociais
é capaz de levar o sujeito a um aprisionamento e à redução da sua esfera psíquica.
Segundo o autor, “refletir sobre a prisão moderna, que substituiu os castigos corporais
pela tortura psíquica, ainda é necessário, pois ela continua a se esconder por detrás de
formas que pretensamente visam o bem-estar, a saúde, a felicidade, a liberdade”
(Crochík, 2000, p.27).
A premissa de liberdade é consoante com a idéia de que, com o uso de
pseudônimos nas salas de bate-papo, é possível desfrutar da instigante oportunidade de
ser quem não se é, ser mais do que um ou não ser ninguém. Tal como Ulisses, na
Odisséia de Homero
16
, que de maneira engenhosa “joga” com as palavras
17
ao ser
questionado sobre sua identidade pelo ciclope devorador Polifemo, e se entrega às mais
diversas aventuras durante o tempo em que permanece distante de sua pátria. O sujeito
que freqüenta as salas de bate-papo parece se portar de maneira também astuta e
aventureira, quase sempre omitindo o nome real e tentando experimentar todos os
recursos das salas de bate-papo, bem como a grande possibilidade de contatos que elas
oferecem.
Ulisses se nomeia Oudeis (Ninguém) para escapar das garras do monstro, mas,
para tanto, precisa negar quem de fato é: Ulisses. Aprisionado com alguns de seus
companheiros numa caverna cuja entrada permanecia bloqueada por uma pedra que
apenas o ciclope era capaz de remover, Ulisses acompanha a morte de alguns de muitos
dos que estavam com ele, comidos vivos por Polifemo. Com isso, planeja uma fuga:
oferece vinho ao ciclope, que se delicia com a bebida e acaba adormecendo. Em
seguida, o herói aproveita para furar o único olho de Polifemo, que grita de dor. Os
irmãos do monstro, ao ouvirem seus gritos de desespero, perguntam o que está
16
Nossas análises sobre o personagem Ulisses, da Odisséia de Homero, são baseadas no “Excurso I –
Ulisses ou Mito e Esclarecimento”, presente no livro Dialética do Esclarecimento (Horkheirmer e
Adorno, 1985), em que a Odisséia é tratada de maneira comparativa com o percurso que o homem seguiu
em direção à racionalidade.
17
Em grego, Oudeis se parece com o verdadeiro nome de Ulisses: Odysseus.
58
acontecendo, e o ciclope só consegue dizer que “ninguém” o feriu. Os outros ciclopes,
como não sabiam que “ninguém”, na verdade, se referia a Ulisses, decidiram ir embora.
Tanto Ulisses como os parceiros de viagem que restaram conseguem escapar
agarrados aos carneiros de Polifemo e, sem que sejam percebidos pelo cego monstro,
correm em direção ao navio. Ulisses, mesmo contrariando seus amigos e correndo o
risco de ser pego, não resiste à oportunidade de gritar a sua verdadeira identidade ao
ciclope e quase é atingido por uma pedra arremessada por Polifemo na direção do navio.
Pelo desafio ao monstro, é lançada uma maldição sobre Ulisses, para que não retorne à
sua casa. De fato, o regresso do herói só acontece muitos anos depois, após ter
enfrentado diversos perigos, diante dos quais todos os seus companheiros pagaram com
a vida.
O que o ato de pôr em jogo a própria vida para desafiar o monstro, com seu
verdadeiro nome, poderia significar para Ulisses? Ulisses parecia temer que algum tipo
de força o transformasse, realmente, em “ninguém” e o seu comportamento, naquele
momento, serviu para restaurar a sua própria identidade: o herói precisava ser
reconhecido como Ulisses, até mesmo pelo monstro que parecia desprezar. Na
sociedade contemporânea, o reconhecimento ainda se faz necessário, mas de outra
forma, mediado pelos produtos que transformam as relações sociais em mercadoria.
Nas salas de bate-papo, da observação de vários diálogos estabelecidos entre
alguns usuários, notamos uma pergunta freqüentemente presente e, muitas vezes, feita
logo no início da conversa por um dos interlocutores: “qual é o seu nome?” Em um
âmbito em que prevalecem os pseudônimos, parece ser necessário atestar a passagem do
Oudeis para “alguém” antes de dar continuidade ao contato com o outro. Até mesmo
durante a aplicação do instrumento desta pesquisa, ocorreram alguns questionamentos
sobre o verdadeiro nome da pesquisadora, ainda que durante todo o tempo o seu nome
real tenha sido mencionado.
Essa transitoriedade dos diversos personagens que configura os chats parece ter
um caráter semelhante ao mito de Ulisses. Seja denominando-se “ninguém”, seja
assumindo os mais diversos papéis, o freqüentador das salas de bate-papo abdica, ainda
que temporariamente, de sua verdadeira identidade. Ulisses se faz desaparecer a favor
de sua sobrevivência, assim como muitos internautas parecem encontrar na omissão do
“eu” a melhor forma de proteção nos chats. No caso dos usuários de salas de bate-papo,
59
particularmente, diante do discurso da segurança (clonagem de senhas, pragas virtuais,
estelionatos, etc) preponderante na sociedade atual, não se conhece ao certo a fronteira
que separa a necessidade de proteção física da necessidade de preservação da
intimidade.
O que podemos conferir, entretanto, é que o mesmo pensamento de
autoconservação tão fortemente cristalizado no homem burguês, já estava presente em
Ulisses. O herói, embora exposto de maneira desafiadora diante da morte, empreendia
esforços e colecionava estratégias para se manter vivo e retornar à sua pátria. Já que
ocupava uma posição de fragilidade em relação à natureza ou às potências míticas,
Ulisses lançava mão do intelecto ou da razão, para permanecer lutando por sua
existência, assim como faz o homem contemporâneo com o uso de enorme arsenal
técnico adquirido progressivamente, do qual a Internet faz parte.
Do mesmo modo que a natureza exterior precisa ser controlada por meio da
técnica, a natureza interior, também ameaçadora, necessita ser dominada. A dominação
interna ocorre, no entanto, por meio do processo de repressão. Ulisses já era o protótipo
do homem que precisa renunciar para atingir a autonomia e se autoconservar. Ele
renunciou não somente à própria identidade, para manter-se vivo diante do ciclope, mas
às muitas tentações que o cercaram durante toda a sua viagem, pois somente abdicando
conquistaria o seu objetivo de retornar a Ítaca e reencontrar sua família, ou seja, se
constituir sujeito. Segundo Horkheimer e Adorno:
A história da civilização é a história da introversão do sacrifício. Ou por
outra, a história da renúncia. Quem pratica a renúncia dá mais de sua vida do
que lhe é restituído, mais do que a vida que ele defende. Isso fica evidente no
contexto da falsa sociedade. Nela cada um é demais e se vê logrado. Mas é
por uma necessidade social que quem quer que se furte à troca universal,
desigual e injusta, que não renuncie, mas agarre o todo inteiro, por isso
mesmo há de perder tudo, até mesmo o resto miserável que a
autoconservação lhe concede. (Horkheimer e Adorno, 1985, p.61).
Quando renuncia, o sujeito deixa de lado o pleno prazer, com toda a sua
vivacidade, para se entregar a um gozo parcial. De acordo com Gagnebin “esse preço é
alto: não é nada menos que a própria plasticidade da vida, seu lado lúdico, seu lado de
êxtase e de gozo; a vida se autoconserva renunciando à sua vivacidade mais viva e mais
preciosa – daí a infinita tristeza do homem burguês adulto bem sucedido.” (p.42, 1997).
60
Por sua vez, o episódio das sereias, na Odisséia de Homero, que Horkheimer e
Adorno (1985) recuperaram, pode servir como metáfora para entendermos o
posicionamento dos indivíduos frente às salas de bate-papo. Como Ulisses, os sujeitos,
quando freqüentam os chats, se encontram atados diante do que lhes é apresentado e
efetivam a limitação de seus contatos ao rol de padronizações das salas de bate-papo.
Para ouvir o canto das sereias, sem que fosse enfeitiçado, Ulisses teve que ser amarrado
ao mastro. Em contrapartida, os remadores tiveram seus ouvidos preenchidos com cera,
a fim de que não cedessem aos clamores do herói para ser solto, o que o colocaria em
risco. Além disso, sem ouvir o canto, os tripulantes também estariam salvos e
continuariam a remar.
Assim como Ulisses permaneceu amarrado, com o intuito de ouvir o belo canto
das sereias, sem a ele sucumbir, também imobilizados – frente ao formato das salas, dos
diálogos e da publicidade corrente – devem conservar-se os sujeitos que desejam
continuar fiéis aos chats. Contemplativo diante da tela, o usuário pouco tem a fazer
além de “admirar” os recursos que lhe são oferecidos, e quase nada pode acrescentar de
si ao que já é dado como “acabado” pela indústria dos provedores: sons, imagens,
diálogos semi-prontos:
Ulisses não tenta tomar um caminho diverso do que passa pela ilha das
Sereias. Tampouco tenta, por exemplo, alardear a superioridade de seu saber
e escutar livremente as sedutoras, na presunção de que sua liberdade
constitua proteção suficiente. Ele se apequena, o navio toma a sua rota
predeterminada e fatal, e ele se dá conta de que continua como ouvinte
entregue à natureza, por mais que se distancie conscientemente dela. Ele
cumpre o contrato de sua servidão e se debate amarrado ao mastro para se
precipitar nos braços das corruptoras.” (Horkheirmer e Adorno, 1985, p. 64).
Mesmo diante de toda a crítica até agora realizada, acerca da apropriação
desmedida dos recursos das salas de bate-papo pelos seus usuários, não podemos deixar
de lado o caráter de experimentação que circunda o participante desse universo. A
atuação, de certo modo lúdica, de Ulisses diante das muitas situações com as quais teve
de se deparar por sua longa viagem, também lembra os usuários de chats:
As aventuras de que Ulisses sai vitorioso são todas elas perigosas seduções
que desviam o eu da trajetória de sua lógica. Ele cede sempre a cada nova
sedução, experimenta-a como um aprendiz incorrigível e até mesmo, às
61
vezes, impelido por uma tola curiosidade, assim como um ator experimenta
insaciavelmente os seus papéis. (Horkheimer e Adorno, 1985, p.56)
Os sujeitos que se utilizam das salas de bate-papo parecem envolvidos com os
estímulos que ali são oferecidos, entregando-se a um tipo de prazer que se limita ao “vir
a ser”. A possibilidade de que, em um dado momento, a satisfação seja atingida traz em
si uma espécie de gozo: o gozo do adiamento ou, segundo Freud (1996b), o chamado
pré-prazer. Para melhor entendimento, retomemos o exemplo de Ulisses quando pede
para seus companheiros o amarrarem ao mastro, a fim de que não se deixe sucumbir ao
canto das sereias. O herói poderia ter seus ouvidos preenchidos com cera, como fizeram
os demais homens do barco, mas precisou experimentar o prazer, ainda que parcial, de
ouvir as encantadoras sereias, mesmo impedido de ceder à tamanha sedução, pois
permanecera atado durante todo o tempo. Se não o fizesse, não teria enfrentado o
desconhecido. Para Horkheimer e Adorno (1985, p.63) Ulisses “tem que se virar, eis aí
sua maneira de sobreviver, e toda a glória que ele e os outros aí lhe concedem confirma
apenas que a dignidade de herói só é conquistada humilhando a ânsia de uma felicidade
total, universal, indivisa”.
Como Ulisses, também se encontra boa parte dos indivíduos que procuram
relações amorosas por meio de salas de bate-papo. Poucas são as relações virtuais que
se estendem para o campo presencial, se compararmos com a enorme quantidade de
pessoas que freqüentam os chats, mas há um prazer que alimenta a dedicação a esses
contatos: a busca por algo a ser encontrado. Em suma, se a satisfação está na procura e
não no objeto em si, não há como discutir a busca de relações amorosas por meio das
salas de bate-papo, sem que se admita algum tipo de gozo. Nesse caso, a satisfação é
conquistada com o que Freud (1996b) denomina “pré-prazer”.
De acordo com a teoria freudiana, se trata do pré-prazer o prazer proveniente das
zonas erógenas, que difere do prazer mais intenso, denominado “prazer final”, cuja
origem está na expulsão das substâncias sexuais durante o ato sexual. O pré-prazer
aparece em menor grau já na infância, enquanto o prazer final surge apenas na
puberdade, com as transformações psíquicas e corporais. Na infância, o pré-prazer se
encerra em si mesmo. Já na puberdade, o pré-prazer proveniente das zonas erógenas,
possui a função de levar o indivíduo ao ápice da satisfação, com o alcance do alvo
sexual.
62
A apreciação de um objeto sexual atraente e belo, a troca de olhares, o toque nas
mãos e todo o processo de sedução, são formas de estimulação das zonas erógenas, que
geram prazer. Com o aumento da excitação ocorre a preparação das genitálias para o ato
sexual e uma conseqüente tensão que precisa ser canalizada por uma via de prazer ainda
maior. O último prazer é o mais intenso de todos: a máxima satisfação. Surge após a
expulsão das substâncias sexuais, com a descarga da tensão sexual, que, por efeito desse
processo de liberação, desaparece temporariamente.
O perigo no qual a atuação inadequada do pré-prazer e a sua ligação distorcida
com a sexualidade infantil implicam, para Freud (1996b), é de que esse prazer
preliminar seja tão grande, a ponto de ocupar a posição do alvo sexual. Nesse caso, que
o autor referido considera um desvio da sexualidade normal, há uma perda da força
pulsional durante o período de preparação para o prazer final e o indivíduo se satisfaz
apenas com o pré-prazer.
Nas salas de bate-papo há um jogo de sedução presente; os olhos e ouvidos dos
usuários permanecem atentos aos sinais de atributos que possam parecer-lhes atrativos
em um potencial objeto: apelido, forma de se expressar, características e ocupações
reveladas pelo interlocutor, sons e desenhos utilizados, e até mesmo fotos. Mas como já
foi dito, em boa parte dos casos de contatos por meio dos chats, não há um encontro
presencial. Assim, o prazer preliminar, tal como Freud (1996b) explicita, prevalece.
Como o alvo não é atingido, a tensão que ainda permanece, continua a ser conduzida
pelo indivíduo em direção a outros objetos, outros usuários.
Ademais, é possível concluir que a indústria cultural procura manter o estágio do
prazer preliminar no sujeito, de tal modo que permaneça ludibriando-o com suas
promessas de prazer e diversão. Um prazer que nunca se realiza completamente. Com o
seu caráter de adiamento, essa indústria revela aos consumidores que nada mais têm a
fazer além de “apreciar a banda sem poder ouvi-la tocar”, ou seja, os sujeitos devem se
contentar com o gozo da espera pelo gozo, visto que:
A indústria cultural não sublima, mas reprime. Expondo repetidamente o
objeto do desejo, o busto no suéter e o torso nu do herói esportivo, ela apenas
excita o prazer preliminar não sublimado que o hábito da renúncia há muito
mutilou e reduziu ao masoquismo. Não há nenhuma situação erótica que não
junte a alusão e à excitação a indicação precisa de que jamais de deve chegar
a esse ponto. (Horkheirmer e Adorno, 1985, p.131)
63
À espera do paraíso prometido, o indivíduo tem um encontro diário com o seu
tedioso cotidiano. Ao mesmo tempo em que tem o seu desejo estimulado pelos
“glamourosos” produtos oferecidos pela indústria cultural, o sujeito é confrontado com
a condição de ter de renunciar ao seu objeto de desejo. Nas salas de bate-papo, o pré-
prazer é reforçado pela idéia sedutora de que é possível conhecer milhares de pessoas,
sem qualquer esforço, em um ambiente cercado por poderosos recursos de imagens e
sons, os quais distraem e divertem o sujeito, enquanto supostamente cumprem o papel
de aproximá-lo dos demais.
64
5. Relações amorosas e solidão nos chats da Internet.
5.1. Problema de Pesquisa
A Internet, como fruto da expansão tecnológica, oferece uma nova modalidade
de relacionamentos, qualificada de virtual. O sítio dedicado especialmente a esses
contatos, a sala de bate-papo, tornou-se um atrativo para usuários com interesses
diversos, dentre os quais, a busca por parceiros amorosos. Sobre essa forma de interação
é formulada a pergunta principal que orienta este estudo: a procura por parceiros
amorosos pelos chats está associada à solidão?
5.2. Objetivo
O objetivo central desta pesquisa é verificar a possível associação entre a solidão
e a busca de relacionamentos amorosos por meio das salas de bate-papo, em sujeitos
que utilizam esse recurso da Internet.
5.3. Hipótese de Pesquisa
A hipótese central da pesquisa é a de que a procura pelos relacionamentos
amorosos, por meio de chats, esteja associada à solidão.
65
5.4. Método
a) Sujeitos e Plano de Amostragem
Os sujeitos desse estudo são freqüentadores das salas de bate-papo do provedor
UOL, de ambos os sexos, entre 20 e 30 anos. A escolha por essa faixa de idade ocorreu
pela preferência da pesquisadora por atuar com um público que, supostamente, já tenha
alcançado certa maturidade para participar de uma pesquisa, sobre solidão e
relacionamentos amorosos. Além disso, segundo levantamento do perfil dos usuários de
Internet, descrito no tópico “A Internet e a configuração das relações”, trata-se de uma
faixa de idade que apresenta forte adesão às salas de bate-papo.
A amostra da pesquisa foi composta com base na faixa etária determinada. Com
isso, optamos pelas salas destinadas a pessoas de 20 a 30 anos, do provedor UOL
18
. As
salas de 20 a 30 anos pertencem à categoria Por Idade, que inclui diversas faixas de
idade a partir de 10 anos (fig. 8, anexo F). Além disso, a categoria Por idade, de 20 a 30
anos possui 119 salas, das 3018 presentes no provedor UOL, e está dividida em quatro
grupos, conforme a especificação da Tabela 1, apresentada adiante.
Para esse estudo, contamos com 60 usuários, que responderam a um
questionário, pela Internet, o qual será detalhado em “instrumento de pesquisa”. A
definição do número de sujeitos levou em consideração a intenção de obtermos uma
amostra representativa, em relação à quantidade de salas na categoria escolhida. Para
tanto, pensamos, a princípio, em aplicar o questionário em um internauta de cada sala.
Contudo, durante algumas visitas, constatamos que muitas das 119 salas que fazem
parte da categoria Por idade, de 20 a 30, permanecem vazias, já que os usuários tendem
a optar pelas salas mais movimentadas.
Por esse motivo, decidimos realizar uma aplicação a cada duas salas. Entretanto,
durante a aplicação definitiva dos questionários, nos deparamos com outro obstáculo:
18
A escolha pelo provedor pago Universo Online ocorreu pelo fato da empresa atingir um número
bastante representativo de usuários no Brasil. Segundo o Ibope NetRatings, no primeiro semestre de 2007
o UOL teve média mensal de 10,495 milhões de visitantes únicos domiciliares no Brasil, o que representa
70% de alcance no mercado dos portais de conteúdo no país. (Fonte: Universo Online S/A –
http://sobre.uol.com.br).
66
nos grupos 20 a 30 (1) e 20 a 30 (2) mais da metade das salas permanecem vazias, ou
seja, um número maior do que prevíramos. Assim, tivemos de realizar mais de uma
aplicação em algumas delas, a fim de atingir o número estabelecido de sujeitos para
compor a amostra. É importante destacar que o grupo 20 a 30 (1) contém o maior
número de salas (49), o que possivelmente contribui para uma concentração mais
elevada de espaços vazios. A distribuição da amostra composta por 60 sujeitos
19
pode
ser conferida na tabela 1.
Tabela 1: Composição da amostra por grupos de salas do Por Idade, 20 a 30 anos.
Grupos de salas
(Por idade, 20 a 30 anos)
Número de salas Número de sujeitos na
pesquisa
20 a 30 (1)*
49 salas 25 sujeitos
20 a 30 (2)*
20 salas 20 sujeitos
20 a 30 São Paulo
30 salas 15 sujeitos
20 a 30 Rio de Janeiro
20 salas 10 sujeitos
Total
119 salas 60 sujeitos
Nota: *Os grupos de salas classificados, pelo provedor UOL, como 20 a 30 (1) e 20 a 30 (2), por não
especificarem uma região de acesso, tal como São Paulo e Rio de Janeiro, costumam receber usuários de
diversas partes do Brasil.
Conforme se verifica na tabela 1, o maior número de questionários foi aplicado
em freqüentadores do grupo 20 a 30 (1), cujos sujeitos na amostra totalizam 25, uma
vez que esse é o grupo com maior quantidade de salas de bate-papo. Em contrapartida, o
menor número de aplicações ocorreu no grupo 20 a 30 Rio de Janeiro, cujos sujeitos na
amostra totalizam 10.
19
Conforme já explicado anteriormente, segundo informações do provedor, os números divulgados se
referem aos acessos e não à quantidade de freqüentadores. Isto é, nos casos em que o mesmo visitante
acessa duas ou mais salas, simultaneamente, são contabilizados dois ou mais acessos.
67
b) Material
b.1.Equipamento: Para a coleta de dados utilizamos um computador multimídia
com conexão à Internet e acesso ilimitado ao provedor escolhido. O computador possui
drive gravador de CDs e uma impressora jato de tinta, para a reprodução do material.
b.2. Instrumento de pesquisa: A fim de obter as informações necessárias ao
objeto de investigação, sem perder de vista a necessidade de um instrumento de
pesquisa compatível com o referencial teórico, elaboramos duas escalas, apresentadas
sob a forma de questionário: uma com o intuito aferir a busca por relacionamentos
amorosos por meio das salas de bate-papo e a outra elaborada para avaliar a solidão dos
usuários.
Conforme já foi mencionado, existem algumas escalas
20
que avaliam a solidão, a
mais consagrada delas se chama “Escala UCLA de Solidão”, também validada no
Brasil. Tomamos o cuidado de testá-la com os usuários de salas de bate-papo, antes de
prosseguirmos com o desenvolvimento de nossa própria escala. Caso se adequasse ao
nosso objeto de estudo, nos encarregaríamos de utilizá-la associada à escala para medir
a busca por relações amorosas nos chats.
No entanto, o que pudemos constatar foi que o seu grande número de itens, além
de dificultar a aplicação, pareceu desmotivar a participação dos internautas, visto que a
desistência antes do término do questionário foi bastante elevada. A conclusão foi que,
embora a “Escala UCLA” seja reconhecida e bastante eficaz, o público atendido por
esta pesquisa requeria um instrumento mais específico. Sendo assim, retomamos o
desenvolvimento de nossa escala para medir a solidão em usuários de salas de bate-
papo.
Pois bem, cada escala elaborada para esse estudo contém seis questões
afirmativas, cada uma com seis possibilidades de resposta, representadas por números
de 1 a 6, de modo que 1 representa concordância máxima do sujeito com a afirmativa e
20
Outros exemplos de instrumentos para aferir solidão são a EMS – Escala Multifatorial de Solidão
(Lins, 1998) e o Inventário de Solidão Social Versus Emocional (Vincenzi e Grabosky, 1991)
68
6 discordância máxima
21
. Apenas os números de 1 a 6 lhes são apresentados e o sujeito
é orientado a escolher somente um número que melhor represente o seu grau de
concordância com a afirmativa. Assim, quanto mais próxima de 1 é a resposta do
sujeito, maior é a sua procura por relacionamentos amorosos nas salas de bate-papo e
maior também é o seu nível de solidão.
Consideramos que as respostas de 1 a 3 representam graus de concordância e,
portanto, revelam níveis maiores de solidão e procura por parceiros amorosos, já as
respostas de 4 a 6 revelam graus de discordância, portanto, níveis mais baixos de
solidão e procura por parceiros amorosos. As questões redigidas para as duas escalas
(vide anexos B e C) objetivam aferir a relação entre a busca por relacionamentos
amorosos por intermédio dos chats e a solidão.
O questionário completo inclui, além das 12 questões das escalas, seis perguntas
que permitem avaliar o perfil demográfico dos sujeitos da amostra: data de nascimento,
sexo, escolaridade, estado civil, residência, local e condição de acesso às salas
22
. Para
definir o número de perguntas no questionário, partimos do pressuposto de que, ao
aceitar participar do estudo, o sujeito seria desviado de seu objetivo central na sala de
bate-papo, ou seja, conversar com outras pessoas. Por esse motivo, teríamos de ser
breves na aplicação de um instrumento de pesquisa, com a apresentação de um pequeno
número de questões claras e objetivas, a fim de evitar a desmotivação e, conseqüente,
desistência do sujeito.
A afirmativa 12 do questionário é propositalmente a mesma que a 7, porém
invertida, ou seja, escrita em ordem contrária. Essa medida pretende verificar o grau de
atenção do sujeito participante, freqüentemente disperso pela grande estimulação
promovida pelas salas de bate-papo. Caso houvesse algum questionário com mais de 2
pontos de diferença nas respostas às questões 12 e 7, este deveria ser eliminado da
amostra. Todavia, nenhum questionário precisou ser excluído.
Quanto à escala para avaliar a procura por relacionamentos amorosos, nosso
objetivo foi desenvolver afirmativas capazes de discriminar a busca dos usuários por
21
A escala de atitudes do tipo Likert foi adotada por possuir a clareza e a objetividade que são necessárias
a um instrumento de pesquisa aplicado em salas de bate-papo, aparato cujas características mencionamos
com profundidade no corpo teórico do trabalho.
22
Se os usuários costumam acessar as salas sozinhos ou acompanhados
69
relações amorosas nos chats, em meio a outros propósitos: amizades ou contatos apenas
para passar o tempo (sem finalidade específica).
No que se refere à elaboração das afirmativas da escala para medir o grau de
solidão dos freqüentadores de chats, utilizamos alguns indicadores de solidão,
formulados com base na discussão teórica precedente. A aferição da solidão dos sujeitos
respondentes foi efetuada de acordo com tais indicadores. São eles:
1) A solidão é caracterizada pelo isolamento afetivo do sujeito e por sua
dificuldade de se relacionar intimamente com outras pessoas; pode ou não estar
associada ao isolamento físico.
2) A solidão é uma escolha ou uma impossibilidade de estabelecer relações
mais profundas.
3) O solitário é aquele que se isola afetivamente e tende a se isolar
fisicamente dos demais, ainda que possa estar em meio a muitas outras
pessoas, como na multidão ou, potencialmente, como numa platéia.
4) O solitário pode recorrer a diversos meios para sustentar a solidão ou dela
tentar escapar; o que inclui a procura por relações amorosas mediadas pelo
computador.
b.2.1. Pré-teste com o instrumento de pesquisa: Desde o início de sua
elaboração, o questionário composto pelas duas escalas – uma para medir a procura por
relações amorosas, por meio das salas de bate-papo, e a outra para indicar o grau de
solidão nos mesmos usuários – bem como as questões para identificação dos sujeitos
que foram apresentadas antes das escalas, passaram por diversas mudanças.
As alterações efetuadas no instrumento de pesquisa decorreram de aplicações
precedentes à coleta final dos dados, também denominadas pré-testes. Os objetivos dos
pré-testes, durante esse estudo, foram: verificar as tendências de respostas dos usuários,
70
a consistência do instrumento e suas possíveis falhas, além das dificuldades na sua
aplicação.
c) Procedimento da coleta de dados
A coleta de dados foi realizada mediante o acesso da pesquisadora às salas de
bate-papo. Com o intuito de proceder a aplicação das duas escalas desenvolvidas, cada
sujeito da amostra foi orientado a assinalar, em cada uma das 12 afirmativas que
correspondem às duas escalas, um número, de 1 a 6, que mais se aproximasse do valor
atribuído a cada afirmativa e correspondente a seu grau de concordância. As respostas
permitiram aferir o grau de solidão e a busca por relacionamentos amorosos nos chats.
Em seguida, as respostas obtidas durante a aplicação das duas escalas foram
submetidas ao teste de correlação de Spearman
23
, com o intuito de verificar se a solidão
e a procura por relações amorosas nas salas de bate-papo, de fato, estão associadas.
Além disso, também foi calculado o Alpha de Cronbach, a fim de observar se cada uma
das escalas apresenta consistência interna entre seus seis itens, de modo que juntos
sejam capazes de aferir a variável estipulada.
Os resultados apresentaram uma correlação de 0,66, a um nível de significância
de 0,01, o que mostra uma boa correlação entre a procura por relacionamentos amorosos
nos chats e a solidão. Embora o coeficiente alcançado tenha sido um pouco menor que o
obtido com o pré-teste das escalas, 0,76, em ambos os momentos, se evidencia que a
procura por relações amorosas nos chats está associada à solidão, ou seja, quanto maior
a procura por relacionamentos amorosos nas salas de bate-papo, mais alto também é o
índice de solidão.
A escala sobre busca por relacionamentos amorosos pelos chats apresentou um
Alpha de 0,60 e a escala para avaliar solidão em usuários de salas de bate-papo resultou
em um Alpha de 0,79. Sendo assim, podemos dizer que ambas as escalas apresentam
boa consistência interna entre os seus seis itens. Embora tenhamos obtido, com o pré-
23
A associação entre busca por relações amorosas nos chats e solidão poderia ser obtida por outros
procedimentos estatísticos. Todavia, consideramos que a prova de correlação de postos de Spearman se
aplica bem às variáveis desse estudo, por se tratar de uma escala de nível ordinal.
71
teste do questionário, um Alpha pouco mais elevado para a escala de relacionamentos
amorosos, 0,78, e menos elevado para a escala de solidão, 0,69, nos dois momentos
descritos, as escalas evidenciam consistência interna entre os seus itens.
A aplicação dos questionários foi realizada aos sábados, no período noturno, das
19h à meia-noite, pelo fato desse horário concentrar o maior número de usuários. Tal
constatação ocorreu após observação e coleta seqüencial da freqüência de usuários nas
salas de bate-papo UOL, durante 24h, das 6h de sábado até às 6h de domingo. Assim, a
hipótese inicial de que o maior número de acessos ocorre durante as noites de sábado –
dia e período em que as pessoas costumam estar mais disponíveis para atividades de
lazer – foi corroborada pelos dados obtidos. O período noturno apresentou 0,38 dos
acessos de sábado, conforme mostra a tabela 2:
Tabela 2: Freqüência de acesso aos chats, por período (*)
Período Acessos Proporção
6h Ōņņņ 12h
70650 0,12
12h Ōņņņ 18h
182545 0,32
18h Ōņņņ 24h
217627 0,38
24h Ōņņņ 6h
100446 0,18
Total
571268 1,00
* Dados coletados em 20 e 21 de maio de 2006 (Fonte: UOL – www.uol.com.br).
O dia de maior freqüência foi verificado por meio da observação dos acessos aos
chats, durante sete dias (de segunda-feira a domingo), sempre à meia-noite, tomando
como referência o horário com maior número de visitas na coleta de 24h. Conforme os
dados dispostos na tabela 3, o dia da semana que apresenta o maior número de acessos é
o sábado, com 0,20 do total.
72
Tabela 3: Freqüência de acesso aos chats, por dia da semana, à meia noite (*)
Dia da semana Acesso Proporção
Segunda-feira
22639 0,12
Terça-feira
24507 0,13
Quarta-feira
23795 0,12
Quinta-feira
23391 0,12
Sexta-feira
28331 0,15
Sábado
38250 0,20
Domingo
30807 0,16
Total
191720 1,00
* Dados coletados de 23 a 29 de maio de 2006 (Fonte: UOL – www.uol.com.br).
Sobre a decisão de aplicar os questionários nos próprios chats, consideramos que
essa seria a melhor maneira de atingir o nosso público alvo, em número mais elevado,
uma vez que a proporção de sujeitos que freqüentam as salas de bate-papo, ao mesmo
tempo, como indicam as tabelas 2 e 3, é bastante significativa.
As respostas aos questionários foram, então, coligidas do seguinte modo: no dia
da semana e período previamente estipulados, sábado à noite, lançamos a todos os
freqüentadores da sala o convite para participarem da pesquisa. Nas raras vezes em que
não houve adesão à proposta, o convite foi realizado a cada um dos usuários presentes
na sala de bate-papo, individualmente e no módulo “reservado”. Aos usuários que
aceitaram participar do estudo, foram oferecidas as seguintes opções, tal como
comentamos no item “instrumento de pesquisa”, todas elas por via eletrônica: responder
pela própria sala de bate-papo, responder por e-mail ou por um programa de
comunicação instantânea denominado MSN Messenger, cuja utilização segue associada
a uma conta criada especialmente para atender aos participantes da pesquisa.
Aos que escolheram a sala de bate-papo como forma de responder o
questionário, as questões foram enviadas, uma a uma, pois o site só permitia proceder
dessa maneira. A cada nova resposta que o sujeito concedia, outra questão era remetida
e, assim, sucessivamente. No MSN Messenger foi possível enviar as questões e receber
suas respectivas respostas em grupos de três. Já por e-mail, o questionário completo foi
enviado, em formato Word, aos sujeitos que assim optaram, de modo que as respostas
73
foram preenchidas no próprio arquivo e seguidamente reenviadas para o e-mail da
pesquisadora, também criado apenas para esse trabalho.
O conteúdo dos questionários aplicados nos chats foi gravado em CD e
reproduzido como informações desta pesquisa, mediante autorização prévia dos
envolvidos, solicitada pela pesquisadora no início da conversa. Quaisquer dados
relatados que pudessem caracterizar ou comprometer o indivíduo, como local de
trabalho ou estudo, e-mail, nome, bairro onde mora e fotos foram excluídos, de modo a
resguardá-lo. O provedor UOL também foi consultado, a fim de obtermos a permissão
necessária para a divulgação dos dados coletados nas salas (Anexo E).
Três dos questionários respondidos estão dispostos nos anexos (Anexos G, H e
I), para exemplificar o modo como foram realizadas as aplicações. Ademais, o conjunto
das respostas ao instrumento de pesquisa foi racionalizado sob a forma de tabelas.
74
6. Apresentação e discussão dos dados
A apresentação e análise dos dados que seguem têm como base a aplicação do
instrumento de pesquisa, na amostra antes especificada: 60 usuários das salas de bate-
papo UOL, com idade entre 20 e 30 anos, sem distinção de sexo.
6.1. Caracterização dos usuários
No que se refere ao perfil sócio-demográfico dos freqüentadores de chats que
responderam o questionário, os resultados obtidos foram apresentados, sumariamente,
quanto ao sexo, idade, local e condição de acesso aos chats, estado civil, faixa etária,
nível de escolaridade e com quem residem.
Tabela 4: Sexo declarado dos sujeitos da pesquisa
Sexo Freqüência Proporção
Feminino
5 0,08
Masculino
55 0,92
Total
60 1,00
Em relação ao sexo dos sujeitos da pesquisa, conforme disposto na tabela 4,
observamos que a grande maioria é do sexo masculino, 55 ou 0,92 do total de
participantes, enquanto apenas 5 ou 0,08 das freqüentadoras dos chats aceitaram
participar do estudo. Esse resultado pode ser explicado de duas maneiras:
1º) Registramos em todas as salas visitadas, um número bem mais elevado de
pessoas identificadas com nomes ou apelidos masculinos, o que aponta para uma
possível predominância deste sexo no âmbito das salas de bate-papo. Essa observação é
confirmada pelos dados de um levantamento estatístico sobre o perfil dos usuários de
Internet, descrito no corpo teórico do trabalho, que mostra um número maior de homens
freqüentadores de chats; 2º) Os diálogos nos chats parecem regidos por uma regra
75
implícita: mulheres, na maioria das vezes, aceitam apenas conversar com usuários que
se identificam como homens e, por sua vez, os homens se mostram quase sempre
solícitos com usuários que lhes pareçam mulheres. Com isso, os convites para a
participação na pesquisa foram atendidos, ou despertaram curiosidade, com maior
freqüência, pelo público supostamente masculino.
Tabela 5: Idade dos sujeitos da pesquisa
Idade Freqüência Proporção
20Ōņņņ 25
29 0,49
25Ōņņņ 30
31 0,51
Total
60 1,00
No que diz respeito à faixa de idade dos usuários de salas de bate-papo,
constatamos uma participação equilibrada quanto aos dois grupos descritos na tabela 5:
29 ou 0,49 do total de respondentes pertencem à faixa de idade entre 20 e 25 anos, da
qual excluímos os sujeitos de 25 anos, e um número pouco maior, 31 ou 0,51 deles,
estão no grupo de 25 a 30 anos. Além disso, a média de idade dos participantes deste
estudo é de 25 anos.
Tabela 6: Sujeitos segundo local e condição de acesso
Local / condição de acesso Freqüência Proporção
Sozinho em casa
48 0,80
Sozinho no trabalho
3 0,05
Em casa, acompanhado
4 0,07
No trabalho, em meio a outras pessoas
1 0,02
Casa de amigos
1 0,02
Lan Houses
3 0,05
Total
60 1,00*
Nota:*Arredondamento de 2 casas decimais.
76
Quanto ao local e à condição em que os usuários participantes desta pesquisa
acessam os chats, um número significativo, 48 ou 0,80, dos 60 sujeitos, afirmam fazer
uso das salas de bate-papo quando estão sozinhos em casa. Se acrescentarmos a esse
valor os 3 ou 0,05 dos participantes que declararam freqüentar os chats sozinhos no
trabalho, obteremos uma marca de 51 ou 0,85 dos 60 participantes que informam
utilizar esse recurso sozinhos.
Essa proporção sugere que o uso das salas de bate-papo, por si só, está associado
a um estado de isolamento do freqüentador. Esse isolamento pode ser apenas ocasional
ou representar um indício de solidão, conforme discutiremos mais à frente, nas análises
da escala de solidão. De todo modo, os dados obtidos reforçam a idéia salientada nesse
trabalho de que durante o tempo em que se entregam às relações mediadas, os sujeitos
quase sempre se distanciam dos contatos reais.
Tabela 7: Sujeitos segundo estado civil
Estado civil Freqüência Proporção
Solteiro
44 0,73
Casado
6 0,10
Separado*
1 0,02
Namorando
6 0,10
Parceiros**
3 0,05
Total
60 1,00
Notas: *Inclui as categorias: separado e divorciado.
**Inclui sujeitos que declaram residir com parceiros.
Quanto ao estado civil dos participantes, conferimos pelos dados dispostos na
tabela 7, a predominância de usuários solteiros que utilizam as salas de bate-papo, ou
seja, 44 ou 0,73 deles. O número elevado de solteiros parece fortalecer a consideração
recorrente nesse estudo, de que a imagem que os sujeitos têm do chat, corresponde a um
ambiente propício para os que estão sozinhos se divertirem e, quem sabe, encontrar
parceiros amorosos.
No que se refere aos sujeitos que namoram, 6 ou 0,10 do total, àqueles que são
casados, 6 ou 0,10 do total, ou os que moram com parceiro, 3 ou 0,05 do total de
77
participantes, é possível pensar em uma utilização, cuja finalidade não inclua a procura
por contatos amorosos, o que pode ocorrer também com usuários solteiros. Contudo, há
também a chance de que, parte desses freqüentadores de chats que se disseram
compromissados, procure por relacionamentos amorosos fugazes e desengajados. Pelo
fato dessas relações virtuais raramente se estenderem para o campo presencial, os
sujeitos tendem a não considerá-las como traição, portanto, dificilmente acreditam que
os seus relacionamentos reais serão prejudicados.
Tabela 8: Escolaridade dos sujeitos.
Escolaridade Freqüência Proporção
Primeiro grau completo
1 0,02
Segundo grau incompleto
4 0,07
Segundo grau completo
19 0,32
Superior incompleto
18 0,30
Superior completo
14 0,23
Pós-graduação
4 0,07
Total
60 1,00
Em relação ao nível de escolaridade dos usuários, verificamos, por meio da
tabela 8, que apenas 1 ou 0,02 dos sujeitos possui o primeiro grau. Os 59 ou 0,98
usuários restantes apresentam, no mínimo, o segundo grau incompleto. A maior parte
dos respondentes, ou seja, 19 ou 0,32 do total possui o segundo grau completo. Em
seguida, temos um número significativo de participantes com o superior incompleto: 18
ou 0,30 do total. Esse resultado sugere que a utilização das salas de bate-papo esteja
associada ao nível de escolaridade, de modo que os sujeitos com baixa escolaridade,
possivelmente, pela dificuldade de acesso aos computadores
24
, também tendem a
apresentar pouca habilidade no manejo de seus recursos, como os chats.
24
Conforme pesquisa mencionada no capítulo “A Internet e a configuração das relações”.
78
Tabela 9: Situação de residência dos sujeitos.
Residência Freqüência Proporção
Sozinho
12 0,20
Com parceiro
5 0,08
Com amigos
3 0,05
Com familiares
40 0,67
Total
60 1,00
De acordo com os dados apresentados na tabela 9, quando questionados sobre
com quem residem, um número significativo de participantes, 40 ou 0,67 do total,
revelam que moram com familiares. Esse resultado é seguido por outros 12 sujeitos ou
0,20 que residem sozinhos, enquanto 5 ou 0,08 vivem com parceiros e apenas 3 ou 0,05
do total de participantes moram com amigos.
6.2. Discussão dos resultados.
Observa-se o crescimento da Internet e o número cada vez maior de pessoas que
fazem uso de seus recursos, dentre eles as salas de bate-papo, as quais são oferecidas
pelos provedores de acesso e divulgadas como uma vantajosa e inovadora maneira de se
comunicar, fazer amigos, namorar, relaxar e, até mesmo, escapar da solidão. Ademais,
os chats permitem o sujeito manter sigilo sobre a sua identidade e estabelecer diálogos
concomitantes com muitas pessoas, ainda que elas estejam geograficamente distantes:
em outras partes do país ou do mundo. Para usufruir desses “benefícios”, o usuário só
precisa ter acesso a um computador conectado à Internet, o que significa que ele pode
estar em sua própria casa, no local de trabalho ou numa lan house.
O alcance das salas de bate-papo cresce a cada dia, prova disso é que já existem
salas direcionadas para um público a partir dos 10 anos de idade. Os mesmos recursos
utilizados pelos adultos que freqüentam as salas de bate-papo podem ser facilmente
operados por crianças de 10 anos. Assim, a indústria cultural não somente antecipa mais
um instrumento de dominação dos indivíduos de tão baixa idade, mas, também regride o
nível mental dos adultos ao de uma criança de 10 anos. Embora o indivíduo, para
79
participar dos chats, tenha de ter atenção, concentração e presteza, em contrapartida,
deve deixar de lado uma atividade intelectual mais aprofundada para que nada escape
do que se apresenta diante de seus olhos.
A facilidade na utilização dos chats, até para os menos acostumados com suas
ferramentas, além do protocolo que antecipa algumas necessidades dos sujeitos e os
pequenos detalhes “aperfeiçoados” que representam as raras mudanças nas salas de
bate-papo, reproduzem a propagação da mesmice pela indústria cultural. Essa
padronização, ressalte-se, deve ser preservada, pois qualquer atuação destoante do
“sempre igual” revela-se uma ameaça ao funcionamento de todo esse sistema. O ritmo
frenético de produção e reprodução mecânica garante que a harmonia seja mantida e
que nada de novo e arriscado surja.
Ao usuário, por sua vez, cabe a novidade que não causa estranheza, isto é, a
mesma estrutura maquiada de novidade. A indústria cultural, com o seu dinamismo que
envolve o lançamento constante de produtos, ao mesmo tempo em que encanta com
uma aparência de novidade, cuida para que tudo permaneça familiar para o consumidor.
É assim que funciona a indústria cinematográfica com suas reproduções seqüenciais dos
filmes de maior sucesso. De maneira semelhante parecem ser elaborados os recursos
para as conversas nos chats; embora estejam em constante mutação, mantêm no usuário
a confortável sensação de que permanecem interados com o instrumento.
6.2.1. A procura por parceiros nos chats.
É necessário admitir que um grande número de pessoas compartilhando o
mesmo espaço, ainda que ele seja virtual, se transformou em uma forma de seduzir cada
vez mais freqüentadores para as salas de bate-papo. O sujeito encontra nos chats, uma
maneira aparentemente simples de conhecer diversas pessoas, sem precisar se expor e
sem correr riscos. Todavia, com tantas opções de contatos e parceiros amorosos em
potencial, o que permanece camuflada é a função de produto a qual o sujeito é
submetido, uma vez que a sua presença nas salas tem como objetivo atrair mais usuários
e sustentar a imagem de variedade e diversão veiculada pela mídia.
80
Essa imagem de que as salas de bate-papo representam um cenário múltiplo, no
que se refere aos contatos amorosos, parece ser perpetuada com êxito pelos meios de
comunicação de massa, conforme mostram os resultados da questão 1, contida na
“escala de relacionamentos amorosos” (tabela 10):“as salas de bate-papo despertam o
meu interesse pela variedade de pessoas com quem se pode flertar sem precisar sair de
casa”. Dos 60 sujeitos participantes, 0,66 ou 40 deles concordam plena ou parcialmente
que o interesse de freqüentar as salas de bate-papo esteja relacionado com a
possibilidade de estabelecer relacionamentos amorosos com diversas pessoas, sem
necessidade de sair de casa. Observe-se que o maior número de respostas ocorreu para o
nível máximo de concordância, valor 1, com 0,30 ou 18 do total de sujeitos.
Os resultados que obtivemos sugerem que a propaganda das salas de bate-papo
atinge o seu alvo: a mensagem propagada pelos provedores, de que as salas de bate-
papo consistem em um cômodo e poderoso recurso para unir pessoas e iniciar um
romance é absorvida pelo público, tal como divulgada. Além disso, as respostas para a
questão 2, “eu seria capaz de estabelecer relacionamentos amorosos com pessoas de
salas de bate-papo”, mostram que a maior parte dos sujeitos participantes, 0,65 ou 39
deles, concordam plena ou parcialmente que podem estabelecer relacionamentos
amorosos com pessoas conhecidas em salas de bate-papo. A maioria dos respondentes,
representados por 0,27 ou 16 do total, revela um nível de concordância, no valor 3, para
esta afirmativa.
Assim, ainda que as salas de bate-papo possam configurar um ambiente propício
às simulações sobre a própria identidade (sexo, idade, atributos físicos e características
de personalidade), tal aspecto não parece ser um obstáculo para a maior parte dos
sujeitos que admite ser capaz de estabelecer relacionamentos amorosos com pessoas
conhecidas em salas de bate-papo. Desse ponto de vista, a possibilidade de transitar por
milhares de salas e conhecer diversas pessoas em pouco tempo, costuma ser considerada
como uma quebra de barreira espacial e comportamental: a facilidade com que o sujeito
entra e sai das salas e a chance de se expressar com mais liberdade, podem ser citadas
como exemplos dessas quebras de barreiras.
No entanto, o que podemos conferir é uma pseudoliberdade, visto que os
diálogos se limitam a um repertório pré-estabelecido pelo provedor. Cada frase é
obrigatoriamente iniciada com uma das expressões que fazem parte de uma lista
presente nas salas. Além disso, um quadro de sons e outro de desenhos que simbolizam
81
gestos ou emoções também compõem esse aparato. Há ainda o fato de que os contatos
nos chats são restringidos a grupos temáticos, como faixa etária, regiões de acesso e
práticas sexuais. Desse modo, verificamos que os estereótipos se reiteram nas salas de
bate-papo, ao passo que a criatividade e espontaneidade de seus freqüentadores são
cerceadas.
A organização dos usuários nas salas lembra uma prateleira de supermercado.
Os nicknames são dispostos em ordem alfabética e cada freqüentador escolhe os
recursos que possam destacá-lo dos demais: fotos, figuras, apelidos sugestivos e
coloridos. Como um produto a disposição para ser consumido o usuário tenta chamar a
atenção e vencer a concorrência, a fim de estabelecer o maior número de diálogos
possível. Já no papel de consumidor, ele estabelece seus critérios para a compra e
percorre o supermercado. Ao encontrar um produto interessante, o coloca no carrinho e
tem a possibilidade de continuar a caminhar em busca de outras opções, outros diálogos.
Ainda como consumidor, o sujeito é surpreendido por um número significativo de
propagandas que são divulgadas em meio às conversas com os outros internautas.
Ademais, se faz necessário ressaltar a velocidade com a qual o sujeito deve
digitar as palavras, a concentração nos diálogos que se apresentam na tela e a tentativa
de produzir mais conversas em um tempo cada vez menor, os quais lembram o ritmo de
trabalho nas fábricas. A diversão parece dar espaço ao esforço e se confunde com o
tempo de trabalho. Respostas muito demoradas podem significar exclusão do diálogo,
afinal, o bom trabalhador deve permanecer fiel ao seu trabalho, produzir de maneira
acelerada e automática.
Segundo Benjamin (1975), o automatismo dos homens pode ser associado ao
comportamento dos apostadores em jogos de azar, haja vista os gestos rápidos de
manipulação das cartas e o compasso frenético das máquinas de apostas, além do que,
as seqüenciais partidas não exigem uma ligação histórica. A mesma coisa acontece com
os sucessivos diálogos travados nos chats, cada qual encerrado em si próprio, não
apenas pelas frases desconexas que se perpetuam entre os interlocutores, mas pelo fato
desses contatos raramente serem levados adiante, para além das salas.
Ainda assim, não podemos deixar de mencionar que os sujeitos participantes das
salas de bate-papo são invadidos por sensações pré-prazerosas que proporcionam a
ilusão de prazer. De fato, os estímulos que as salas possibilitam podem parecer tão
82
intensos e alegóricos que, para os sujeitos, chegam não apenas a simular, mas a tomar o
lugar do prazer. Os contatos virtuais se fazem de tal forma prazerosos que, muitas
vezes, dispensam o encontro “real”, o “olho no olho”. Dessa maneira, constatamos que
a lógica delimitadora dos chats, do ponto de vista psicossocial, é a substituição do
prazer pelo pré-prazer. Isso significa que os encontros movidos a glamourosos recursos
de imagens e sons raramente excedem os limites da virtualidade.
De qualquer forma, há aqueles que não se sentem plenamente confortáveis em
procurar parceiros amorosos pelas salas de bate-papo, conforme revelam os resultados
alcançados com a questão 3“me sinto mais à vontade para procurar um parceiro em
salas de bate-papo, que nos lugares freqüentados cotidianamente, como trabalho,
faculdade, bares e casas noturnas”. As respostas revelam que apesar da maior parte dos
sujeitos não descartar a hipótese de estabelecer relacionamentos amorosos com pessoas
conhecidas em chats, 0,52 ou 31 deles discordam plena ou parcialmente de que a sala de
bate-papo seja o local onde se sentem mais confortáveis para procurar parceiros, dos
quais 0,33 ou 20 deles apresentam valor 6, o que significa discordância máxima para
essa afirmativa. Ora, se boa parte dos internautas não se sente tão confortável em
procurar namorado pelos chats, o que ainda os faz aderir a essa prática? O usuário
parece saber que a promessa de felicidade oferecida pela indústria cultural não pode ser
cumprida, mas permanece fiel ao seu funcionamento e ao seu espetáculo.
A explicação para isso inclui além do prazer, ainda que preliminar, presente
nessa prática de contatos via chat, o fato do sujeito sentir-se atendido em sua
necessidade por sucessivas e impactantes imagens e sons que despertam cada vez mais a
sua atenção e o livram da monotonia. Por isso, a indústria dos provedores tenta “inovar”
frequentemente os seus produtos; as antigas formas de estimulação oferecidas pelos
chats, já não surtem mais efeito e meras conversas em espaços virtuais não convencem
como antes. É necessário ampliar e aperfeiçoar o espetáculo, para que o usuário em
busca de seqüenciais “vivências” possa ser surpreendido.
Uma forma de encantar o sujeito é torná-lo mais próximo da realidade, enquanto
navega pelas salas de bate-papo: por meio de “carinhas” que expressam sentimentos,
sons que tentam reproduzir reações, sistemas acoplados que tocam as músicas de
sucesso das rádios e prometem deixar o sujeito acordado diante da tela ou, ainda,
imagens e fotos que fazem o usuário acreditar que esteja cada vez menos distante de
outros indivíduos.
83
Ocorre que, na sociedade atual, mediada pela tecnologia, predominam as
sensações imediatas, tal como Benjamin (1975) propõe e denomina “vivências”. Esse
tipo de experiência danificada, que não penetra no sujeito, persiste como uma forma de
sensibilidade contemporânea. O que se presencia é que, com a invasão de estímulos
promovida pela indústria cultural, o sujeito torna-se cada vez mais imune a essas
sensações. Como conseqüência, esses estímulos precisam ser aprimorados para, em
meio a tantas outras vivências, atingir e despertar os sujeitos: devem se configurar como
“choques” e gerar impacto. Os recursos existentes nas salas de bate-papo se constituem
como choques, pois visam deter a atenção do internauta e apelar às suas sensações, para
torná-lo um usuário dedicado. Além disso, os contatos padronizados, objetivos e quase
sempre muito rápidos, dificultam uma relação íntima entre os sujeitos.
Nesse sentido, reitere-se, o que se destaca nos contatos por meio das salas de
bate-papo é a característica de superficialidade, seja pelos disfarces de muitos
freqüentadores acerca da própria identidade, seja pela ênfase à grande quantidade de
conversas – limitadas e pouco esclarecedoras a respeito de si e do outro – em detrimento
de seu conteúdo. Esses diálogos, como já citamos, por não deixarem marcas, não podem
compor a experiência do indivíduo. Tanto os nicknames, como as figuras já prontas para
expressar os comportamentos do usuário, limitam a sua comunicação e, por si só, são
dados da parcialidade presente nos vínculos via chats. Podemos dizer, portanto, que o
âmbito das salas de bate-papo transcreve e sustenta o campo das vivências, com a
fugacidade das relações que nela se firmam.
Sobre o protocolo de figuras existente nas salas, cujo intuito é sintetizar e
exprimir o que poderia ser considerado sentimento, podemos dizer que se realiza um
tipo de comunicação primitiva nesse âmbito virtual. Nessa medida, Darwin (2000)
explica as expressões dos animais, antes da própria comunicação verbal. As expressões
faciais e a linguagem gestual comunicam, mas não apresentam uma gramática, uma vez
que esbarram na falta de palavras. Nas salas de bate-papo, o menu que contém figuras
de expressão, comumente utilizado pelos freqüentadores, revela esse tipo de
comunicação primitiva, porém tecnificada, pois a linguagem gestual arcaica estudada
por Darwin (2000) é revitalizada pela supertecnologia.
Uma das facilidades que se divulga a respeito das salas de bate-papo, conforme
já mencionamos, é o encontro de parceiros amorosos. Esse é o objetivo de muitos dos
freqüentadores que estão nos chats. De acordo com os resultados da questão 4 “acesso
84
salas de bate-papo não apenas com o objetivo de passar o tempo ou fazer amizades,
mas também para procurar relacionamentos amorosos”, o maior número de respostas
ocorreu para um nível máximo de concordância, valor 1, com 0,23 ou 14 dos 60
sujeitos. Isso mostra que a maioria dos usuários utiliza os chats tanto para procurar
parceiros, como para outras finalidades, embora o total de respostas tenha igualmente se
divido nos grupos de concordância e discordância com a questão: 0,50 ou 30 sujeitos,
em cada um deles. Entretanto, com o seu poder de transformar tudo em algo vendável,
pode-se dizer que a indústria cultural consegue desdobrar, até mesmo, o amor em um
“amor romântico”, com a mesma facilidade que o transforma em libertinagem, em
despudor.
Todavia, se faz importante esclarecer que a preocupação aqui não é o sentido
moral, mas o entendimento de que ao amor, como a tudo, essa indústria imprime a sua
marca comercial. Dos belos astros de cinema pelos quais suspiram as mulheres, aos
chats que prometem fazer encontrar a alma gêmea, o que se configura é a mera
repetição de um objeto que deve ser buscado, mas não alcançado. Os heróis e mocinhas
são reproduzidos nos sucessivos filmes, do mesmo modo que as salas de bate-papo dos
diversos provedores, com suas semelhanças entre si, consistem em meras duplicações;
excitam o sujeito e despertam o seu desejo, pois é sobre esse desejo que a indústria
cultural se sustenta. Ela reafirma por meio de seus produtos a renúncia imposta pela
civilização.
É desse modo que conferimos a participação parcial dos órgãos do sentido na
comunicação mantida pelos chats: visão e audição são perpetuados, enquanto tato e
olfato só seriam possíveis se o contato virtual pudesse ser concretizado em um encontro
presencial. Como o número de casos em que as relações virtuais se estendem para o
campo “real” é pequeno, tendo em vista os milhares de usuários de salas de bate-papo e
contatos estabelecidos neste âmbito, devemos admitir que essas relações são dirigidas
pelo pré-prazer, pois se concentram no campo da virtualidade: naquilo que pode ser,
mas não é. Significam a possibilidade do encontro, que quase sempre acaba em
desencontro, visto que as relações costumam nascer e morrer no próprio chat.
Poderíamos comparar o sujeito dos chats com um dos personagens presentes em
Baudelaire e analisado por Benjamin (1975). Trata-se de um poeta que caminha em
meio à multidão até se deparar com uma mulher que o encanta e por quem se apaixona:
um amor à primeira e à última vista, já que a mesma massa que apresenta a amada ao
85
poeta, também a faz desaparecer, por entre os milhares de corpos que seguem em um
mesmo compasso. Nesse caso, também estamos falando de um encontro que acaba em
desencontro; um amor que embora não se concretize, deixa no homem sensações
fascinantes, mas limitadas ao pré-prazer, ao gozo não levado a cabo. Segundo Benjamin
“o objeto de um amor que somente o citadino conhece” (1975, p.45). Assim parece
posicionar-se o usuário de sala de bate-papo que se dedica à procura por relações
amorosas, já que da multidão de outros tantos internautas emergem alguns contatos –
alguns possíveis amores – que novamente se diluem na efemeridade da massa virtual.
No entanto, há aqueles que não se satisfazem somente com os prazeres
preliminares promovidos pelos chats, conforme as respostas concedidas pelos sujeitos à
questão 5 “Só entro nas salas de bate-papo a fim de encontrar alguém interessante
para namorar”. Embora um número significativo de sujeitos apresente algum grau de
concordância quanto à utilização dos chats, como mais um recurso para encontrar
parceiros amorosos, um número bastante elevado discorda plena ou parcialmente de que
utilize as salas de bate-papo apenas com a finalidade de procurar relacionamentos
amorosos: 0,73 ou 44 do total de respondentes. O maior número de respostas foi
apresentado para o valor 6, que representa nível máximo de discordância com a questão,
cuja proporção foi de 0,58 ou 35 dos sujeitos que participaram da pesquisa.
Podemos pensar, também, que o resultado obtido nessa questão tenha sido
influenciado por uma suposta imagem pejorativa, de insuficiência e de fracasso,
daqueles que só entram nas salas de bate-papo com a finalidade de encontrar parceiros
amorosos ou que estabelecem relações amorosas apenas por meio dessas salas, o que
também pode ser verificado pela questão 6 “depois que conheci as salas de bate-papo,
deixei de perder tempo com outras formas de encontrar parceiros”.Dos 60 sujeitos que
participaram da pesquisa, apenas 0,34 ou 20 deles concordam plena ou parcialmente que
deixaram de lado outras formas para encontrar parceiros amorosos, depois que
conheceram as salas de bate-papo, sendo que a maioria, 0,46 ou 28 do total de
participantes, apresentou um nível de discordância máxima com a questão, representado
pelo valor 6. Concordar plena ou parcialmente, com essas duas últimas questões pode
significar reconhecer-se como um malogrado ou um anti-social, incapaz de estabelecer
relações amorosas fora da Internet. A seguir, estão dispostos, sob a forma de tabela, os
resultados alcançados com a “escala de procura por relacionamentos amorosos nos
chats”:
86
Tabela 10. Respostas para a escala de relacionamentos amorosos:
Freqüências (F) e Proporções (P)
Questões
Valor
123456
F
18 15 11 14 7 12
1
P
0,30 0,25 0,18 0,23 0,12 0,20
F
128106 4 4
2
P
0,20 0,13 0,16 0,10 0,07 0,07
F
10168105 4
3
P
0,16 0,27 0,13 0,17 0,08 0,07
F
9571163
4
P
0,15 0,08 0,12 0,18 0,10 0,05
F
754639
5
P
0,12 0,08 0,07 0,10 0,05 0,15
F
4 1120133528
6
P
0,07 0,18 0,33 0,22 0,58 0,46
F
60 60 60 60 60 60
Total
P
1,00 1,00 1,00 1,00 1,00 1,00
Com a finalidade de verificar a tendência das respostas e o seu grau de dispersão
nas escalas de relacionamentos amorosos e solidão, além de objetivar extrair
informações sistematizadas dos dados brutos, utilizamos o cálculo da média e do desvio
padrão em cada uma delas. Da “escala de procura por relações amorosas nos chats”, a
questão que apresentou menor média e, portanto, maior índice de concordância foi a 1
(2,8):“as salas de bate-papo despertam o meu interesse pela variedade de pessoas com
quem se pode flertar sem precisar sair de casa”. Já a questão que mostrou a maior
média e, com isso, maior índice de discordância em seu total de respostas foi a 5 (4,6):
“Só entro nas salas de bate-papo a fim de encontrar alguém interessante para
namorar”. Esses resultados, apresentados na tabela 11, sugerem que embora os sujeitos,
em sua maioria, se interessem pelos chats, devido à possibilidade de encontrar parceiros
87
amorosos, essa não costuma ser a única motivação para muitos que acessam a
ferramenta.
Conforme os dados dispostos nas tabelas 11 acerca do desvio padrão obtido com
a aplicação da escala de relações amorosas, verificamos que o conjunto de respostas
mais homogêneo ocorreu para a afirmativa 1, “as salas de bate-papo despertam o meu
interesse pela variedade de pessoas com quem se pode flertar sem precisar sair de
casa” (desvio padrão: 1,61) que, como já foi mencionado, revelou grande número de
concordâncias. Já o conjunto de respostas mais heterogêneo, o que apresentou maior
discrepância, ocorreu para a questão 6 (desvio padrão:2,00) “depois que conheci as
salas de bate-papo, deixei de perder tempo com outras formas de encontrar parceiros.
Tabela 11: Escala de relações amorosas: média e desvio padrão.
Questões Média Desvio Padrão
1
2,8 1,61
2
3,2 1,79
3
3,7 1,95
4
3,5 1,84
5
4,6 1,84
6
4,3 2,00
Total
3,68 11,03
É necessário admitir a presença de sujeitos nas salas de bate-papo que utilizam
esse aparato apenas como mais uma forma de encontrar parceiros amorosos; outros,
ainda, só pretendem passar o tempo e fazer amizades. Entretanto, os resultados obtidos
com a escala para medir a procura por relacionamentos amorosos nas salas de bate-papo
corroboram que flertar, conseguir um namorado ou encontrar o grande amor é, no
mínimo, um dos objetivos da maior parte dos sujeitos.
88
6.2.2. A solidão em freqüentadores de chats.
A indústria cultural faz com que o indivíduo acredite ser possível conciliar o
universal e o particular, enquanto o que prevalece é a pseudo-individualidade. O que se
divulga como original, todavia, não passa de mera padronização: as músicas, os astros
de cinema, os roteiros de filmes e, por fim, os sujeitos. Os detalhes que diferenciam uns
sujeitos dos outros são socialmente produzidos e condicionados: da marca da calça ao
corte de cabelo, não há “originalidade” que essa indústria já não tenha previsto e
monopolizado. Retirados esses detalhes, pode-se dizer que tanto a protagonista da
novela, como a empregada doméstica, tanto o astro de cinema, como o funcionário
público, todos se tornam apenas iguais.
Todo homem burguês, na condição de ser genérico, parece mostrar a mesma
coisa: o cotidiano frio e competitivo dos grandes centros urbanos. À medida que a
sociedade desenvolve o indivíduo, constitui também a sua individualidade e o princípio
de que todos devem seguir seus fins particulares. Essa mesma individualidade é o que
contribui para que os sujeitos se tornem frágeis e solitários, a mercê da indústria
cultural. Segundo Horkheimer e Adorno:
O burguês cuja vida se divide entre o negócio e a vida privada, cuja vida
privada se divide entre a esfera da representação e a intimidade, cuja
intimidade se divide entre a comunidade mal humorada do casamento e o
amargo consolo de estar completamente sozinho, rompido consigo e com
todos, já é virtualmente o nazista que ao mesmo tempo se deixa entusiasmar e
se põe a praguejar, ou o habitante das grandes cidades de hoje, que só pode
conceber a amizade como social contact, como o contato social das pessoas
que não se tocam intimamente (Horkheimer e Adorno, p.145-146, 1985).
A solidão se instala de maneira crescente, ainda que diante do mais caloroso
sentimento de amor. O amor, capaz de ligar um ser ao outro, acaba por se submeter à
frieza da sociedade e se esvaece antes mesmo de se realizar. A prevalência da solidão na
contemporaneidade, apesar das tecnologias que prometem aproximação, é o que parece
mostrar o resultado da questão 7, pertencente à “escala de solidão” (Tabela 12) “é
comum que eu freqüente salas de bate-papo ao me sentir solitário”. Dos sujeitos
participantes, 0,68 ou 41 deles concordam plena ou parcialmente que fazem uso das
salas de bate-papo quando se sentem solitários. Além disso, o maior número de
89
respostas foi concedido para um nível máximo de concordância com a afirmativa,
representado pelo valor 1, ou seja, 0,36 ou 22 do total de participantes. A versão
invertida da mesma questão, afirmativa 12,“ao me sentir solitário é comum que eu
freqüente as salas de bate-papo”, apresentada ao sujeito com a finalidade de avaliar o
seu nível de atenção para com o questionário respondido, apenas confirma a mesma
tendência de respostas, uma vez que, 0,54 ou 33 dos participantes concordam plena ou
parcialmente, que fazem uso de chats aos se sentirem solitários. O maior número de
respostas ocorreu para o nível máximo de concordância, com 0,23 ou 14 do total. Desse
modo, podemos pensar que não somente a imagem de praticidade para encontro de
parceiros é comprada pelos sujeitos que utilizam os chats, mas também a aparente
vantagem de que a solidão já pode ser contornada com apenas alguns clicks.
No entanto, o que se faz conferir é que os meios de comunicação isolam; não
apenas quando o locutor de rádio se estabelece nas residências e assume o papel da
própria comunicação entre as pessoas, que deixam de conversar entre si. O progresso
tende a separar as pessoas no trabalho; os empregados que outrora conseguiam trocar
palavras durante o expediente, ainda com alguma privacidade, já não o fazem mais. As
modernas construções aglomeram todos em escritórios cercados por portas e janelas de
vidros que os sujeitam à vigilância do chefe e do público em geral.
No que diz respeito ao isolamento físico, os automóveis substituíram os trens e
restringiram ainda mais a possibilidade de contato entre os viajantes. O carro particular,
aliás, reduz a desconfortante situação de ser um “carona” e ter que se preocupar, durante
o percurso, com o repertório de assuntos que dizem nada sobre tão pouco: a previsão do
tempo ou a tragédia mais recente mostrada na TV. Em cada carro se fala nada mais do
que o previsível e nada menos do que é conversado nos demais carros. As famílias
isoladas que percorrem a cidade em seus carros discutem o que é de interesse funcional.
Por fim, pode-se dizer que o isolamento torna os homens cada vez mais parecidos entre
si.
A individualidade, excessivamente estimulada pela sociedade, além da
desconfiança acerca das outras pessoas, que freqüentemente assola o homem burguês
ameaçado pela alta competitividade e pelos riscos de violência dos grandes centros
urbanos, parece levá-lo a optar por maneiras privadas de sobrevivência. É o que
sugerem os resultados obtidos com a questão 8, “me sinto melhor quando estou
sozinho”, que procura evidenciar um tipo de solidão por escolha. Do total de sujeitos
90
0,57 ou 35 deles concordam plena ou parcialmente que se sentem melhores quando
sozinhos. O maior número de respostas ocorreu para a concordância, valor “3”, com
0,28 ou 17 do total de participantes. Essa questão avalia o isolamento, aqui considerado
como um critério para aferir a solidão.
Mas se há uma preferência por estar só, o que faz esses indivíduos prosseguirem
numa busca frenética por contatos nas salas de bate-papo? Em muitos freqüentadores,
verificamos uma compulsão pela busca de relações nas salas, ao mesmo tempo em que
são fomentadas a frieza e a negação do outro. Também podemos pensar que, para
alguns, o chat talvez seja um recurso que os desobriga de um contato real e mais
próximo, em outras palavras, esse aparato pode ajudar a manter o estado de isolamento
daqueles que assim o desejam. Já outros podem ser influenciados pela visão negativa
socialmente postulada acerca do solitário. A busca por contatos, nesse caso, pode estar
relacionada com a tentativa de reverter essa condição, ainda que, para tanto, o indivíduo
tenha de contrariar o próprio desejo de ficar só.
Essa impressão negativa do solitário talvez possa explicar os resultados da
questão 9 “eu me sinto uma pessoa solitária”. Dos 60 sujeitos, 0,42 ou 25 deles
concordam plena ou parcialmente de que são solitários, sendo que a maioria revelou
discordância máxima da afirmação de que são solitários: 0,45 ou 27 do total de
respostas. Embora um número significante de sujeitos concorde com afirmativas que
indicam indiretamente a existência de solidão, quando questionados diretamente sobre o
assunto, esses mesmos sujeitos tendem a discordar da questão.
Nos grandes centros urbanos, o homem se isola em meio à multidão, ainda que
haja contato físico com outras pessoas Além disso, o sujeito também pode se isolar
sendo parte de um público ou de uma platéia, quando não há aproximação corporal, mas
uma troca de idéias e crenças entre os indivíduos. No que diz respeito aos usuários das
salas de bate-papo, podemos pensar em uma multidão de sujeitos concentrados num
mesmo espaço virtual, e que pela dificuldade de intimidade, permanecem isolados. Em
contrapartida, também podemos supor que, por se tratar de um contato virtual associado
ao isolamento físico, o que há nos chats são grandes públicos divididos segundo
diferentes perfis e interesses.
Na obra de Baudelaire (apud Benjamin, 1975), embora a multidão não seja
descrita, ela é intrínseca, e muitos de seus relatos transmitem o seu encontro com esse
91
emaranhado de pessoas que circulam pelas ruas. Em Baudelaire, multidão e cidade se
misturam e se completam: uma é o reflexo da outra. A diferença entre o flanêur, homem
que caminha tranquilamente em meio à massa, e o homem que circula nas grandes
metrópoles, Benjamin já anunciava: no homem da multidão “o hábito tranqüilo cedeu
lugar a um toque maníaco” (1975, p.47). O homem da multidão, movido pela massa
desordenada, deve se voltar aos seus negócios e perseguir seus interesses privados. Com
certa ponderação, devemos nos lembrar que Benjamin se remetia ao homem do século
XIX, mas há algo de muito familiar em seus comentários: um homem angustiado e
ansioso que se assemelha aos sujeitos que circulam de um lado para o outro nos atuais
centros urbanos.
O período que nos separa da análise realizada por Benjamin revela um grandioso
aprimoramento técnico e a Internet é um produto desse avanço. A esse aparato estão
ligados os freqüentadores das salas de bate-papo. Os usuários de chats conservam
características do poeta descrito por Baudelaire, como já relatamos, mas o ultrapassam
no que se refere às suas nuances ainda provincianas: os sujeitos das salas de bate-papo
conquistaram essa inquietação do homem da multidão, acrescida de um avançado
repertório tecnológico: a troca de olhares permanece desestimulada e o seu estado de
isolamento se sobressai.
O isolamento, aliás, surge como uma das conseqüências do conforto
proporcionado pelas grandes tecnologias. Se já não é mais necessário disputar espaço
com centenas de pessoas nas feiras populares ou enfrentar as longas filas dos
supermercados para fazer as compras do mês, se as movimentações bancárias já
desobrigam o deslocamento do cliente até as agências e encontrar amigos ou parceiros
amorosos é possível com apenas alguns clicks, em contrapartida, as relações
interpessoais parecem cada vez mais dispensáveis e a mediação humana recua diante da
mediação tecnológica (ou da máquina).
Entretanto, talvez o isolamento não seja tão satisfatório, pelo menos para parte
dos usuários de chats. É o que sugere o resultado obtido com a questão 10 “falta-me
mais companhia”, em que um número significativo, 0,46 ou 28 dos sujeitos, concordam
plena ou parcialmente que lhes falta companhia. Quando não se escolhe permanecer
solitário, é possível lançar mão de alguns recursos que supostamente permitem ao
sujeito livrar-se da solidão. O chat parece ser um desses recursos, conforme as respostas
concedidas à questão 11“as salas de bate-papo me ajudam a sair da solidão”, 0,60 ou
92
36 dos 60 sujeitos, concordam plena ou parcialmente que as salas de bate-papo são
capazes de ajudá-los a sair da solidão. O número mais elevado de resposta ocorreu para
um nível máximo de concordância com essa afirmativa, com 0,28 ou 17 do total de
respostas.
O comportamento do usuário de chats que navega por essas salas e explora todo
o aparato a ele oferecido, lembra o caráter aventureiro do herói Ulisses, na Odisséia.
Ulisses não deixa de experimentar, com grande astúcia, as situações com que se depara
em sua longa jornada, e posiciona-se de maneira desafiadora ante as adversidades. Com
isso, o herói Ulisses revela ao homem da sociedade atual os caminhos tortuosos que ele
deve percorrer para alcançar o sucesso. No entanto, ao final de sua viagem, o herói
Ulisses convive com a solidão e o desamparo, uma vez que nem toda a sua
engenhosidade serviu para salvar seus companheiros, mortos durante o percurso.
Dessa maneira, a astúcia de Ulisses já se aproxima, em muito, da sedimentação
da razão burguesa: o solitário astucioso é o protótipo do homem movido pelo capital.
Para Horkheimer e Adorno (1985) a fraqueza de Ulisses se assemelha à fragilidade do
indivíduo contemporâneo destituído da coletividade. Tanto a Ulisses, como a Robison
Crusoé, restaram-lhes o desamparo e o isolamento:
Ulisses vive segundo o princípio primordial que constituiu outrora a
sociedade burguesa. A escolha era entre lograr o arruinar-se. O logro era a
marca da ratio, traindo sua particularidade. Por isso a socialização universal,
esboçada na história de Ulisses, o navegante do mundo, e na de Robison, o
fabricante solitário, já implica desde a origem a solidão absoluta, que se torna
manifesta ao fim da era burguesa. Socialização radical significa alienação
radical. (Horkheimer e Adorno, 1985, p.66)
Ora, se Horkheimer e Adorno (1985), já anunciavam a solidão como condição
inerente ao homem burguês, esta passou a ser muito menos um estado subjetivo e muito
mais um aspecto psicossocial, sustentado pelo cenário em que as relações são
estabelecidas na contemporaneidade. Desse cenário fazem parte a competitividade, a
perseguição de interesses privados em detrimento das necessidades coletivas, e os
vínculos orientados por e como mercadorias.
Na tabela 12, estão apresentadas as respostas dos sujeitos para a “escala de
solidão em usuários de chats”:
93
Tabela 12. Respostas para a escala de solidão: freqüências (F) e proporções (P)
QuestõesValor
7 8 9 10 11 12
F
22 8 14141714
1
P
0,36 0,13 0,23 0,23 0,28 0,23
F
1210410710
2
P
0,20 0,16 0,07 0,16 0,12 0,16
F
7177 4129
3
P
0,12 0,28 0,12 0,07 0,20 0,15
F
6431028
4
P
0,10 0,07 0,05 0,17 0,03 0,13
F
455477
5
P
0,07 0,08 0,08 0,07 0,12 0,12
F
9 1627181512
6
P
0,15 0,27 0,45 0,3 0,25 0,20
F
60 60 60 60 60 60
Total
P
1,00 1,00 1,00 1,00 1,00 1,00
No que se refere à “escala sobre solidão”, a afirmativa que apresentou maior
média (4,0) foi a 9: “Eu me sinto uma pessoa solitária”, para a qual o maior número de
respostas se concentrou em uma alta discordância. Conforme já mencionamos, embora
os usuários apresentem índices de concordância para outras afirmativas capazes de
medir solidão, quando perguntados diretamente sobre o assunto, tendem a revelar
grande discordância. Assim, podemos pensar que reconhecer-se como parte deste
“grupo de solitários” pode gerar resistência. Já a questão que apresentou menor média,
2,7, e maior número de concordância foi a 1: “é comum que eu freqüente salas de bate-
papo ao me sentir solitário, o que confirma a adesão à essa ferramenta, quando os
sujeitos se sentem solitários.
No que se refere ao desvio padrão, na “escala para aferir a solidão em usuários
de chats”, o conjunto de respostas mais homogêneo ocorreu para a afirmativa 8 (desvio
padrão: 1,78), “me sinto melhor quando estou sozinho”. Já o grupo de respostas mais
94
heterogêneo, com maior discrepância entre as respostas, ocorreu para a questão 9
“depois que conheci as salas de bate-papo, deixei de perder tempo com outras formas
de encontrar parceiros” (desvio padrão: 2,10), conforme mostra a tabela 13:
Tabela 13: Escala de solidão: média e desvio padrão.
Questões Média Desvio Padrão
7
2,7 1,83
8
3,6 1,78
9
4,0 2,10
10
3,6 1,99
11
3,3 1,98
12
3,3 1,85
Total
3,42 11,53
Obtivemos um maior índice de concordância nas questões relativas à solidão, do
que o alcançado com a escala de procura por relações amorosas nos chats, conforme
mostram os resultados referentes às médias das respostas, apresentadas nas tabelas 12 e
13. Para a escala de relações amorosas, as respostas se concentraram em uma média
3,68 e para a escala de solidão as respostas se concentraram em uma média 3,42. Desse
modo, podemos compreender que, ainda que muitos sujeitos não freqüentem as salas de
bate-papo com o objetivo de encontrar parceiros amorosos, a solidão tende a estar
presente como uma marca impressa no homem tecnificado.
95
Considerações Finais
A realidade contemporânea abarca transformações sociais perceptíveis no
cotidiano citadino. Gostaríamos de dar aqui dois exemplos dentre muitos. O primeiro
vem das novas tecnologias que são difundidas na indústria, na economia e na vida do
homem moderno, e o segundo da disposição dos grandes projetos arquitetônicos nas
grandes metrópoles. Volvemos, de início, ao primeiro exemplo, a fim de ressaltar que a
sociedade burguesa, com seus ideais de produção, consumo e lucro desenfreados,
determina que os sujeitos estejam sempre inseridos em um ritmo acelerado de inovações.
É nesse cenário que surge a Internet, como um poderoso sistema de comunicação de
massa a serviço da reprodução do sistema imposto pela sociedade administrada, em
quase todas as esferas da vida social e em particular aquelas da indústria cultural.
As recentes aquisições técnicas, a televisão, o rádio, as revistas, os jornais e o
telefone puderam ser reunidos em apenas um instrumento: o computador, conectado ao
mundo inteiro por meio de uma rede de comunicação. Os recursos da Internet costumam
ser utilizados para enviar mensagens eletrônicas, realizar transações bancárias, pesquisas,
videoconferências, compras, ouvir músicas, assistir a vídeos, além de possibilitar
contatos de níveis pessoais e profissionais. É possível, ainda, viajar, visitar lugares e
conhecer pessoas de todo o planeta, com toda a segurança que a tecnologia oferece,
afinal, “tudo” se faz sem sair do lugar e “tudo” se conquista com a proteção dos muros
que cercam as casas e os edifícios: o mesmo concreto que separa as pessoas de carne e
osso.
A imagem reiterada que se propaga é de que a Internet inaugura, a cada dia,
novas funções e “vantagens”. Mas o modo como a comunicação é determinada por essa
ferramenta faz com que o usuário esqueça a mediação da máquina, bem como suas
conseqüências. Na medida em que a tecnologia oferece mais conforto, paralelamente
isola os sujeitos. Um isolamento que extrapola até mesmo a multidão de pessoas
aglomeradas pelas grandes construções urbanas e pelas Redes Interconectadas.
Constatamos que o saber utilitário empregado a favor da comodidade do homem lhe
permite despender menos tempo na execução de muitas tarefas, e também tornar-se mais
auto-suficiente e menos dependente dos seus semelhantes, o que só reforça a sua
96
condição de isolamento e o pressuposto de que quanto maior o conforto, mais confinado
permanece o sujeito moderno.
Dentre os diversos serviços oferecidos pela Rede Mundial de Computadores
destacamos as salas de bate-papo, que concentram milhares de pessoas e possibilitam o
contato entre elas, em um espaço chamado de virtual. Porém, as supostas vantagens de
fazer amizades, encontrar parceiros amorosos e até sair da solidão parecem desviar a
atenção do que realmente está por trás de tanta tecnologia, além de contribuir para a
conformação dos sujeitos frente aos interesses de comercialização e lucro da indústria.
Podemos dizer que o fascínio e a confiança depositados nesse instrumento de
comunicação embotam qualquer manifestação crítica sobre ele. O que resta ao indivíduo
é a falsa impressão de que, a ele, só cabe gozar dos benefícios oferecidos.
Contudo, notamos que grande parte desses contatos travados nas salas de bate-
papo nasce e morre na própria sala. Isso quer dizer que, dificilmente, eles extravasam a
barreira da virtualidade e da separação dos corpos, para se configurarem como encontros
presenciais. Desse modo, concluímos que a lógica que delineia os relacionamentos nos
chats é a substituição do prazer pelo pré-prazer. Assim, muitos dos sujeitos parecem
obter satisfação com o “vir a ser”, ou seja, com a espera pelo prazer final. Já que esse
prazer raramente é levado a cabo, a satisfação completa tende a não ocorrer, o que faz o
indivíduo sustentar a sua busca incessante por potenciais fontes de satisfação, outros
objetos virtuais. Nesses termos, podemos dizer que a tecnologia traz como efeito o
enfraquecimento dos laços sociais, além de potencializar o individualismo.
Nas salas de bate-papo as relações mediadas por máquinas dispensam os
compromissos mais duradouros e os riscos de exposição ao outro. Em geral, os
relacionamentos nesse âmbito são delineados pela liquidez e se diluem com a própria
virtualidade. Nesse sentido, entendemos que os contatos fugazes estabelecidos nos chats
reproduzem uma tendência dos relacionamentos amorosos atuais, menos sólidos e mais
desengajados. Observamos a desvalorização das relações presenciais, a superficialidade
dos vínculos, a frieza dos contatos e a solidão como aspectos psicossociais presentes nos
chats. Com o uso desse aparato, particularmente, a intimidade parece desviada de outros
seres humanos e passa a ocorrer com a máquina.
A comodidade prometida pela Internet se refere à realização de quase tudo e com
o mínimo de esforço possível, apenas com o comando das teclas, mas acaba por oferecer
97
o que todos os outros meios de comunicação de massa sempre ofereceram: mercadorias.
Exemplificamos com a venda de espaços publicitários nos chats, cuja expansão ocorre de
acordo com o aumento de pessoas que acessam as salas. De maneira menos evidente, na
medida em que a presença dos sujeitos nas salas ajuda a fortalecer as idéias vendidas de
liberdade e de opções para relacionamentos, cada um deles também se porta como
produto.
A linguagem que conduz os diálogos nas salas é marcada por abreviações e pela
rapidez. Estas são regras implícitas para se adequar ao grupo e ser aceito pelos seus
membros. Os usuários que tentam teclar, mas apresentam lentidão nas respostas,
freqüentemente são ignorados ou excluídos. Os contatos eliminam qualquer
possibilidade de historicidade, são efêmeros e, por não deixarem marcas, se constituem
como “vivências” que geram outras “vivências”. O “agora” é que dirige o tempo nesse
âmbito. Isso quer dizer que as conversas encerradas pelos sujeitos, quase sempre são
emendadas em outras conversas, sem que haja tempo para a elaboração dos contatos
precedentes. O período necessário para que a intimidade seja estabelecida é
desconstruído. Ademais, para lançar qualquer frase aos seus interlocutores, o sujeito
deve fazer uso de um roteiro pré-estabelecido pelos provedores e disponível em cada um
dos chats.
Os recursos recentes que compõem as salas de bate-papo prometem uma
semelhança muito maior com a realidade, com sons que tentam reproduzir sentimentos e
figuras de rostos que procuram simbolizar os atributos físicos dos usuários. Também é
possível se apresentar com fotos e, até mesmo, utilizar câmeras acopladas ao
computador. No entanto, estas e outras tantas inovações nos chats não passam de meras
repetições, sob a forma de novidade, as quais mascaram, por meio de pequenos detalhes
que se alteram, uma estrutura que permanece praticamente imutável.
Concluímos, assim, que a liberdade de escolha que o sujeito acredita possuir nos
chats é convertida em uma grande marca da indústria cultural: a padronização. Do que
decorre o obscurecimento do sujeito, de quem ele é, de fato, visto que por meio dessa
ferramenta, as características físicas ficam reduzidas a alguns desenhos, e a apresentação
nas salas, a apelidos comumente inspirados em pessoas famosas, muitas vezes, utilizados
por centenas de outros usuários. Do mesmo modo, a comunicação entre os
freqüentadores e a expressão de seus sentimentos se restringe aos modelos pré-
existentes, pelos quais outros milhares de pessoas que acessam as salas também podem
98
optar. Portanto, notamos que a liberdade pregada pelos provedores, nada mais é do que
uma pseudoliberdade. A fronteira entre o “eu”, o “outro” e a “máquina” se torna tão
tênue, quanto insuficiente para haver diferenciação. Até mesmo a estimulação sensorial,
nesse meio, fica reduzida à visão e à audição, enquanto, o tato, o olfato e o paladar são
desconsiderados. Conferimos que não há espaço para a autenticidade e a espontaneidade
dos sujeitos.
Devido à grande oferta de sensações apelativas pela indústria, o sujeito vai se
tornando imune aos estímulos que lhe são apresentados. Por esse motivo, as salas de
bate-papo oferecem ferramentas mais aperfeiçoadas e estímulos continuamente mais
intensos, a fim de garantir que o espetáculo continue a gerar o choque necessário ao
usuário e o mantenha na condição de consumidor passivo. Ainda que o sujeito esteja
consciente de que a satisfação esperada por ele jamais será a satisfação atingida, o que
continua a atraí-lo, nesse aparato, é a possibilidade de ser surpreendido, a todo o
momento, por produtos mais sedutores.
Com a promessa de entreter e divertir, a sala de bate-papo confere ao momento
de lazer as mesmas características do tempo de trabalho. Os olhos e ouvidos entregues
ao que se coloca na tela, a velocidade com que são digitadas as palavras e a valorização
da quantidade de conversas em detrimento de seu conteúdo, reproduzem as mesmas
condições de trabalho que alienam o sujeito por meio de ações mecanizadas. A estrutura
dos chats lembra as linhas de produção das fábricas e contribuem para a manutenção de
suas características deveras dominadoras, mesmo fora do trabalho.
Por outro lado, apesar de toda a crítica até agora realizada, gostaríamos de reiterar
o caráter exploratório que envolve o uso dos chats, uma vez que os sujeitos se dedicam a
experimentar os recursos e os contatos que esse aparato oferece. Parte dos usuários,
ainda, busca apenas essa fonte de exploração nas salas de bate-papo: não estão à procura
de relacionamentos amorosos e priorizam seus contatos presenciais, o que indica o
potencial de resistência de vários freqüentadores a esse tipo de relação virtual.
Também reconhecemos a existência de diferentes posicionamentos sobre a
relação do homem com a tecnologia e todos os seus frutos, afinal, concentramos nossa
investigação em um objeto fértil para análises, em níveis e áreas distintas. Ademais, a
presente pesquisa suscita outros desdobramentos a quem possa interessar. No próprio
âmbito dos chats, uma das possibilidades seria o estudo comparativo da solidão e da
99
procura por relacionamentos amorosos em diferentes faixas de idade. Outra opção é a de
verificar a suposta associação entre o tempo de permanência nos chats e a solidão. Ainda
no tocante ao uso dos recursos que a Internet oferece, a solidão dos sujeitos pode ser
investigada, quando ligada ao uso de sites de relacionamentos
25
.
Por fim, salientamos que os resultados obtidos com a aplicação das duas escalas
desenvolvidas para este estudo, uma para aferir a busca de relacionamentos amorosos no
chats e a outra para verificar a solidão, confirmaram a hipótese da pesquisa: quanto
maior a procura por relacionamentos amorosos nos chats, maior também é o grau de
solidão. Todavia, observamos que parte dos usuários que não utilizam as salas para
procurar parceiros amorosos, ainda assim, apresentam um grau elevado de solidão. Nessa
medida, insista-se, compreendemos a solidão como um aspecto psicossocial decorrente
do modo de vida burguês que privilegia os fins privados, em detrimento da coletividade.
Mais ainda, em uma sociedade em que predomina o poderio da indústria cultural, os
interesses de mercado minimizam a importância do homem e das relações interpessoais.
25
O site de relacionamentos Orkut possui mais de mil comunidades em português que versam sobre a
solidão. Entre as que possuem mais membros estão as comunidades: “Solidão” (107.481 membros);
“Necessária solidão” (45.745 membros) e “Tenho medo da solidão” (20.492 membros).
100
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102
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tecnologias da Informação e da Comunicação no Brasil 2006. Disponível em
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103
ANEXOS
104
Anexo A – Estágios da elaboração do Instrumento de Pesquisa
Os ajustes efetivados no que se referem aos sujeitos e à amostragem, ao
instrumento de pesquisa e ao procedimento de aplicação, proporcionaram maior
confiabilidade à aplicação definitiva do questionário e serão sumariamente descritos nos
três próximos tópicos:
a) Sujeitos e amostragem
O último pré-teste com as escalas, antes da aplicação final, teve uma amostra
composta de 32 sujeitos. Contudo, a fim de obtermos dados mais consistentes e
representativos da população dos usuários de chats, para a coleta definitiva, adotamos
uma amostra constituída por 60 sujeitos.
Ainda no que se refere à amostra, embora tenhamos optado por estratificá-la ao
público freqüentador das salas destinadas à faixa etária de 20 a 30 anos, supomos que a
heterogeneidade desta população tenha influenciado os resultados das coletas que
precederam a aplicação final do instrumento de pesquisa, devido às imprecisões acerca
do número de freqüentadores nas salas, idade, sexo e outras informações importantes.
A esse respeito, algumas medidas talvez tenham contribuído para o maior
controle da amostra e para torná-la mais homogênea: excluir do grupo os sujeitos fora
da faixa etária estipulada pela sala e procurar aplicar os questionários somente no dia ou
período de maior fluxo – apenas priorizá-los não foi o suficiente – visto que horários e
dias distintos costumam receber pessoas com características e objetivos também
diferentes.
Durante a semana pela manhã, por exemplo, muitos sujeitos que desejam apenas
“matar” o tempo de trabalho costumam acessar as salas. Esses usuários, em geral,
diferem dos que fazem uso dos chats no sábado à noite, os quais tendem a investir o seu
tempo de lazer em conversas travadas no âmbito das salas.
105
b) Instrumento de pesquisa
Quanto às características da escala, pensamos numa escala do tipo Likert,
inicialmente assim formulada: 1 – concordância plena; 2 – concordância; 3 – leve
concordância; 4 – leve discordância; 5 – discordância; 6 – discordância plena; mas os
seis itens nela presentes deveriam ser de fácil compreensão, além de discriminar de
maneira eficaz as diferentes opiniões dos usuários. Fizemos diversas versões, e o
formato permanente consiste apenas em uma numeração de 1 a 6, escolhida pelo usuário
de acordo com o seu grau de concordância com cada afirmativa, ou seja, quanto maior o
grau de concordância do sujeito, mais próxima de 1 deve ser a sua resposta. Ao
contrário das versões iniciais, esta última não descreve o grau de concordância que cada
número representa, a fim de facilitar o processo de aplicação e evitar interpretações
equivocadas dos respondentes.
No que se refere à redação das afirmativas das escalas, concluímos que o
instrumento ainda apresentava algumas ambigüidades e imprecisões, após a aplicação
do pré-teste final. Constatamos, por exemplo, que a questão “faço uso das salas de bate-
papo como mais uma forma de encontrar parceiros amorosos” favorecia duas
interpretações já que, aqueles que dela discordavam, poderiam tanto não fazer uso das
salas para esse fim, quanto a utilizarem exclusivamente para procurar parceiros
amorosos e não somente como “mais uma forma”. Além disso, notamos que a questão
mencionada estava avaliando algo muito próximo da afirmativa que a antecedia no
questionário “acesso as salas de bate-papo também para procurar relacionamentos
amorosos e não apenas passar o tempo ou fazer amizades”. Devido a essa imprecisão,
decidimos substituir a afirmativa, por outra que consideramos mais objetiva para
verificar os sujeitos que utilizam os chats exclusivamente para busca de parceiros: “
entro nas salas de bate-papo a fim de encontrar alguém interessante para namorar”.
Sobre as questões que avaliam o perfil demográfico dos sujeitos, questionamos a
permanência ou não de algumas perguntas, como sexo e idade, já que o contexto dos
chats favorece as simulações. Todavia, na última versão do pré-teste e na aplicação
definitiva do instrumento de pesquisa elas foram mantidas por considerarmos essenciais
para a caracterização dos participantes. A pergunta sobre idade, no entanto, foi alterada
para data de nascimento, com o intuito de dificultar a sua distorção pelo respondente.
106
c) Aplicação dos questionários
Fizemos muitas modificações nas instruções ao usuário participante da pesquisa,
devido a uma série de falhas presentes até a formulação de sua versão definitiva:
inicialmente as orientações pareciam muito formais, depois extensas demais e, após
uma nova alteração, se tornaram confusas e dificultavam a compreensão dos
internautas. Após as correções, a versão final tem uma mensagem clara e direta sobre a
forma adequada de responder ao questionário, com frases curtas e uma linguagem
acessível.
Durante as primeiras aplicações realizadas era freqüente a interrupção dos
sujeitos que, ansiosos por acabar, perguntavam repetidas vezes sobre o término do
questionário. Tomamos a medida de informar junto com os esclarecimentos sobre a
finalidade da pesquisa, que não iríamos tomar muito tempo do participante, e fornecer
uma estimativa de 10 minutos, caso as respostas fossem rápidas.
Obter respostas rápidas dos usuários também foi uma dificuldade que
enfrentamos. Cercados por inúmeros estímulos, os internautas apresentavam lentidão
nas respostas ou abandonavam o questionário antes do fim. Esse fato nos remeteu a uma
avaliação crítica da qualidade das respostas dos sujeitos. As chances de que os
questionários fossem respondidos com pouca ou nenhuma atenção eram grandes. No
entanto, tais problemas foram minimizados com as seguintes medidas: a) No início da
aplicação, pedir para que o sujeito procurasse ser o mais breve possível em suas
respostas; b) Oferecer-lhe diferentes âmbitos para participar da pesquisa: a própria sala
de bate-papo, e-mail ou um programa de comunicação instantânea denominado MSN
Messenger, c) Tornar as afirmativas ainda mais objetivas, claras e dispensar questões
desnecessárias.
107
Anexo B – Versão final do questionário.
QUESTIONÁRIO
a) Data de nascimento: ____/____/____
b) Sexo: 1. Feminino 2. Masculino
c) Escolaridade: 1) 1º grau 2) 2º grau incompleto 3) 2º grau completo 4) Superior
incompleto 5) Superior completo 6) Pós-graduado
d) Estado civil: 1) Solteiro 2)Casado 3)Separado ou divorciado 4)Namorando 5)Mora
com parceiro
e) Você costuma freqüentar as salas de bate-papo: 1) sozinho em casa 2) sozinho no
trabalho 3)Em casa, acompanhado de outras pessoas 4)No trabalho, em meio a outras
pessoas 5) Casa de amigos 6) lan house 7) Outro. Qual?______
f)Você reside: 1) Sozinho 2)com parceiro 3) com amigos 4) com familiares
Instruções: Para cada afirmação apresentada a seguir, escolha em uma escala de 1 a 6 o
número que melhor representa o seu grau de concordância, de modo que 1 indica
concordância máxima e 6 significa discordância máxima. Isto é, quanto mais você
CONCORDAR com a afirmação, mais próxima de 1 será a sua resposta e quanto mais
DISCORDAR, mais próxima de 6 ela deverá ser. O seu anonimato será mantido!
1. As salas de bate-papo despertam meu interesse, pela variedade de pessoas com quem
se pode “flertar” sem precisar sair de casa.
108
2. Eu seria capaz de estabelecer relacionamentos amorosos com pessoas das salas de
bate-papo.
3. Me sinto mais à vontade para procurar um parceiro em salas de bate-papo, que nos
lugares freqüentados cotidianamente, como trabalho, faculdade, bares e casas noturnas.
4. Acesso salas de bate-papo não apenas com o objetivo de passar o tempo ou fazer
amizades, mas também para procurar relacionamentos amorosos.
5. Só entro nas salas de bate-papo a fim de encontrar alguém interessante para namorar.
6. Depois que conheci as salas de bate-papo deixei de perder tempo com outras formas
de encontrar parceiros.
7. É comum que eu freqüente salas de bate-papo ao me sentir solitário.
8. Me sinto melhor quando estou sozinho.
9. Eu me sinto uma pessoa solitária.
10. Falta-me mais companhia.
11. As salas de bate-papo me ajudam a sair da solidão.
12. Ao me sentir solitário é comum que eu freqüente salas de bate-papo.
109
Anexo C – Itens explicados do questionário.
Algumas perguntas foram elaboradas com o intuito de conhecer o perfil dos
usuários das salas de bate-papo. São elas:
a) Data de nascimento: ____/____/____
b) Sexo: 1. Feminino 2. Masculino
c) Escolaridade: 1) 1º grau 2) 2º grau incompleto 3) 2º grau completo 4) Superior
incompleto 5) Superior completo 6) Pós-graduado
d) Estado civil: 1) Solteiro 2)Casado 3)Separado ou divorciado 4)Namorando
5)Mora com parceiro
e) Você costuma freqüentar as salas de bate-papo: 1) Sozinho em casa 2)
Sozinho no trabalho 3)Em casa, acompanhado de outras pessoas 4)No trabalho, em
meio a outras pessoas 5) Casa de amigos 6) Lan house 7) Outro. Qual?______
f)Você reside: 1) Sozinho 2)Com parceiro 3) Com amigos 4) Com familiares
As afirmativas que se seguem formam as duas escalas elaboradas: “escala de
relações amorosas” e “escala de solidão”. Pretendemos explicitar o que cada uma delas
procura avaliar em seus respondentes:
1. As salas de bate-papo despertam meu interesse pela variedade de pessoas com
quem se pode “flertar” sem precisar sair de casa.
110
Esta afirmativa procura avaliar o nível de atração do sujeito em participar de
chats, devido ao fato desta ferramenta concentrar um grande número de pessoas que se
pode paquerar.
2. Eu seria capaz de estabelecer relacionamentos amorosos com pessoas das
salas de bate-papo.
Procura avaliar quanto o sujeito se predispõe a estabelecer relacionamentos
amorosos com pessoas conhecidas em chats. Mesmo que o participante da pesquisa não
faça uso das salas de bate-papo para relacionamentos amorosos, saberemos se há a
possibilidade de que ele se dedique a essa prática.
3. Me sinto mais à vontade para procurar um parceiro em salas de bate-papo, que
nos lugares freqüentados cotidianamente, como trabalho, faculdade, bares e casas
noturnas.
Indica o grau de preferência do respondente, pela procura de parceiros amorosos
nas salas de bate-papo, mediante a comparação com outros ambientes que ele possa
freqüentar em seu cotidiano.
4. Acesso salas de bate-papo não apenas com o objetivo de passar o tempo ou
fazer amizades, mas também para procurar relacionamentos amorosos.
Entendemos que o sujeito pode acessar as salas de bate-papo por três razões,
conforme nossas visitas aos chats da UOL: passar o tempo, fazer amizades e
envolvimentos amorosos de diversos níveis, como paquera, namoro ou até o sexo
virtual.
Esta questão, portanto, visa identificar aqueles que utilizam as salas não somente
com o objetivo de fazer amizades ou passar o tempo, mas também os sujeitos que
pretendem estabelecer relacionamentos amorosos.
111
5. Só entro nas salas de bate-papo a fim de encontrar alguém interessante para
namorar.
Ao contrário da afirmativa anterior, esta questão procura avaliar se o sujeito
utiliza as salas de bate-papo com a finalidade única de encontrar parceiros amorosos.
6. Depois que conheci as salas de bate-papo, deixei de perder tempo com outras
formas de encontrar parceiros.
Avalia quanto o usuário abriu mão de procurar relacionamentos amorosos em
outros ambientes, que não sejam os chats. E, ainda, o quanto o “face a face” ficou
comprometido no tocante à busca de parceiros, depois que o sujeito começou a
freqüentar as salas de bate-papo.
7. É comum que eu freqüente salas de bate-papo ao me sentir solitário.
Procura medir se a sala de bate-papo é um recurso comumente utilizado pelo
sujeito ao se sentir solitário.
8. Me sinto melhor quando estou sozinho.
Visa verificar se o sujeito se sente melhor quando isolado das outras pessoas. O
isolamento, como dissertado na parte teórica deste trabalho, pode ser tomado como um
provável indicador da solidão. Neste caso, a questão ainda avalia um tipo específico de
solidão: a que ocorre por escolha, visto que o sujeito irá responder o quanto se sente
melhor frente a esta condição.
112
9. Eu me sinto uma pessoa solitária.
Afere quanto o sujeito se considera um solitário.
10. Falta-me mais companhia.
Avalia se o participante sente-se privado de companhias ou, ainda, o quanto o
seu relacionamento com outras pessoas encontra-se comprometido, os quais são tratados
como critérios para medir a solidão.
11. As salas de bate-papo me ajudam a sair da solidão.
Verifica se o sujeito percebe os chats como um recurso capaz de tirá-lo da
condição de solitário.
12. Ao me sentir solitário é comum que eu freqüente salas de bate-papo.
Conforme já mencionamos, a questão 12 é a mesma que a 7, porém invertida. O
objetivo aqui é o de avaliar o grau de atenção dos sujeitos participantes.
113
Anexo D – Escala UCLA de Solidão
Você responderá a um questionário com diversas afirmações. Peço, por favor,
para que leia cada uma delas com bastante atenção. Escolha entre os números 1,2,3,4
aquele que melhor representa o seu grau de concordância ou discordância sobre cada
afirmação. Para fazer isso, utilize a seguinte escala:
1 – Discordo totalmente
2 – Discordo
3 – Concordo
4 – Concordo totalmente
1 – Eu sou uma pessoa sociável.
1 2 3 4
2 – Falta-me companhia.
1 2 3 4
3 – Ninguém realmente me conhece bem.
1 2 3 4
4 – Eu não me sinto sozinho.
1 2 3 4
5 – Tenho muito em comum com as pessoas que estão ao meu redor.
1 2 3 4
114
6 – Eu me sinto isolado dos outros.
1 2 3 4
7 – Eu me sinto em harmonia com as pessoas em volta de mim.
1 2 3 4
8 – Posso conseguir companhia quando quero.
1 2 3 4
9 – Existem pessoas a quem eu posso recorrer
1 2 3 4
10 – Eu não estou mais ligado por muito tempo a ninguém.
1 2 3 4
11 – Eu me sinto deixado de lado.
1 2 3 4
12 – Minhas relações sociais são superficiais.
1 2 3 4
13 – Eu me sinto infeliz sendo tão retraído.
1 2 3 4
115
14 – Existem pessoas com quem eu posso conversar.
1 2 3 4
15 – Eu me sinto parte de um grupo de amigos.
1 2 3 4
16 – Existem pessoas das quais eu me sinto próximo.
1 2 3 4
17 – Não existe ninguém a quem eu possa recorrer.
1 2 3 4
18 – Estou sozinho em meio a tanta gente.
1 2 3 4
19 – Meus interesses e idéias não são compartilhados por aqueles que me
rodeiam.
1 2 3 4
20 – Existem pessoas que realmente me compreendem.
1 2 3 4
Fonte: LINS, Maira Leiko Okada. Construção e Validação de Instrumento de Mensuração de Solidão.
Dissertação de Mestrado, Universidade de Brasília, 1998.
116
Anexo E – Consentimento do provedor.
-----Mensagem original-----
De: Dellabarba, Marcel [mailto:[email protected]]
Enviada em: terça-feira, 24 de julho de 2007 19:21
Assunto: RES: Informação pesquisa
Olá Herika,
Qualquer pessoa pode conversar livremente nas salas do Bate-papo UOL,
inclusive sobre trabalhos acadêmicos.
As mensagens trocadas são de responsabilidade dos usuários. O UOL não tem
como identificar nem tratar de forma diferenciada um ou outro participante. Então, tudo
ok.
Obrigado
Marcel
De: Herika [mailto:[email protected]]
Enviada em: quarta-feira, 18 de julho de 2007 15:05
Para: Dellabarba, Marcel
Assunto: Informação pesquisa
Boa Tarde, Marcel!
Entrei em contato, há algum tempo atrás - talvez você se recorde - para obter
algumas estatísticas a respeito das salas de bate-papo. Tais dados foram solicitados para
o meu trabalho de Mestrado, em Psicologia Social, pela PUC-SP, que discute a procura
por relações amorosas nos "chats", e fui prontamente atendida.
Entretanto, para esse meu trabalho em fase de conclusão, utilizo como material
de análise a aplicação de um questionário em usuários dessas salas, com o devido
117
consentimento dos participantes e preservando a identidade de cada um deles. Embora
as salas de bate-papo sejam de utilização pública, gostaria de saber se há algum
problema em publicar esses resultados na dissertação, para fins acadêmicos, de tal
modo, que será feita a necessária referência ao provedor UOL.
Agradeço a atenção dispensada;
Herika Deziderio
118
Anexo F – Figuras
Figura 1 – Roteiro oferecido pelos chats UOL, utilizado pelos usuários em seus diálogos. (*)
(*) Coletado em 15/10/2006, em uma das salas de bate-papo da UOL.
Figura 2 – Opções de sons presentes nos chats da UOL (*)
(*) Coletado em 15/10/2006, em uma das salas de bate-papo da UOL.
119
Figura 3 - Opções de imagens oferecidas pelos chats da UOL (*)
(*) Coletado em 15/10/2006, em uma das salas de bate-papo da UOL.
Figura 4Links patrocinados divulgados entre as conversas dos usuários dos chats (*).
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(*) Coletado em 04/05/2006, na sala de bate-papo UOL “Por Idade” – 20 a 30 anos (4)
120
Figura 5 – Página inicial das salas de bate-papo UOL: vendas de produtos e chamadas
para conversas dividem o mesmo espaço (*).
(*) Coleta realizada em 27/05/2006, sexta-feira, na página inicial das salas de bate-papo UOL
Destaques
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121
Figura 6 – Opção reservadamente associada ao fala para (*)
(06:35:18) Casado (reservadamente) fala para Linda: OI VAMOS TC?
1
(*) Dados coletados em 05/06/2006, em uma das salas de bate-papo da UOL.
Figura 7 - Opção “xinga” associada a uma imagem que expressa desejo (*)
(07:44:12) ratinha xinga Todos:
(*) Dados coletados em 05/06/2006, em uma das salas de bate-papo da UOL.
Figura 8. Grupos de salas existentes na categoria Por Idade dos chats da UOL.
1
Os apelidos foram trocados para preservar os sujeitos.
122
Anexo G – Questionário aplicado em sala de bate-papo(*)
(10:53:16) HERIKA entra na sala...
(10:53:53) HERIKA (reservadamente) fala para Todos: boa noite! Alguém
gostaria de responder a um questionário de pesquisa?
(10:55:37) HERIKA (reservadamente) fala para Todos: Boa noite! Alguém
gostaria de responder a um questionário de pesquisa?
(10:56:00) Vida loka tbm ama fala para HERIKA: de que tipo/
(10:56:02) Vida loka tbm ama fala para HERIKA: ??
(10:56:14) HERIKA (reservadamente) fala para Vida loka tbm ama: para
o meu trabalho de mestrado.
(10:56:33) HERIKA (reservadamente) fala para Vida loka tbm ama: um
questionário bem objetivo, que se refere ao uso de chats
(10:56:37) Vida loka tbm ama (reservadamente) fala para HERIKA: fala
(10:56:40) Vida loka tbm ama (reservadamente) fala para HERIKA: ??
(10:56:58) HERIKA (reservadamente) fala para Vida loka tbm ama:
como prefere responder: e-mail, msn ou por aqui?
(10:57:11) Vida loka tbm ama (reservadamente) fala para HERIKA:
aqui?
(10:57:22) Vida loka tbm ama (reservadamente) fala para HERIKA: vc n
se importa
(10:57:26) Vida loka tbm ama (reservadamente) fala para HERIKA: ?
(10:57:39) HERIKA (reservadamente) fala para Vida loka tbm ama: pode
ser, como ficar melhor para você
(10:57:47) Vida loka tbm ama (reservadamente) fala para HERIKA:
123
firmez\a
(10:57:56) Vida loka tbm ama (reservadamente) fala para HERIKA:
comece
(10:58:05)
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(10:58:17) HERIKA (reservadamente) fala para Vida loka tbm ama:
obrigada, vou pedir para que procure ser o mais breve possível em suas
respostas, ok?
(10:58:30) Vida loka tbm ama (reservadamente) fala para HERIKA:
vamu la
(10:58:40) HERIKA (reservadamente) fala para Vida loka tbm ama: a)
Data de nascimento: ____/____/____
(10:59:10) Vida loka tbm ama (reservadamente) fala para HERIKA: 21
10 77
(10:59:13) HERIKA (reservadamente) fala para Vida loka tbm ama: b)
Sexo: 1. Feminino 2. Masculino
(10:59:20) Vida loka tbm ama (reservadamente) fala para HERIKA: m
(10:59:29) HERIKA (reservadamente) fala para Vida loka tbm ama: c)
Escolaridade: 1) 1º grau 2) 2º grau incompleto 3) 2º grau completo 4)
Superior incompleto 5) Superior completo 6) Pós-graduado
(10:59:46) Vida loka tbm ama (reservadamente) fala para HERIKA: 2
grau comp
(10:59:48) HERIKA (reservadamente) fala para Vida loka tbm ama: d)
Estado civil: 1) Solteiro 2)Casado 3)Separado ou divorciado 4)Namorando
5)Mora com parceiro
124
(11:00:02) Vida loka tbm ama (reservadamente) fala para HERIKA: solt
(11:00:23) HERIKA (reservadamente) fala para Vida loka tbm ama: e)
Você costuma freqüentar as salas de bate-papo: 1) sozinho em casa 2)
sozinho no trabalho 3)Em casa, acompanhado de outras pessoas 4)No
trabalho, em meio a outras pessoas 5) Casa de amigos 6) lan house 7)
Outro. Qual?______
(11:00:43) Vida loka tbm ama (reservadamente) fala para HERIKA:
sozinho
(11:00:51) Vida loka tbm ama (reservadamente) fala para HERIKA: em
casa
(11:00:57) HERIKA (reservadamente) fala para Vida loka tbm ama:
sozinho em casa?
(11:01:06) Vida loka tbm ama (reservadamente) fala para HERIKA: sim
(11:01:10) HERIKA (reservadamente) fala para Vida loka tbm ama:
f)Você reside: 1) Sozinho 2)com parceiro 3) com amigos 4) com familiares
(11:01:19) Vida loka tbm ama (reservadamente) fala para HERIKA: soz
(11:01:56) HERIKA (reservadamente) fala para Vida loka tbm ama: vou
passar as instruções referentes a segunda parte da pesquisa, ok?
(11:02:09) Vida loka tbm ama (reservadamente) fala para HERIKA: de
boa
(11:02:13) HERIKA (reservadamente) fala para Vida loka tbm ama:
Instruções: Para cada afirmação apresentada a seguir, escolha em uma
escala de 1 a 6 o número que melhor representa o seu grau de
concordância, de modo que 1 indica concordância máxima e 6 significa
discordância máxima. Isto é, quanto mais você CONCORDAR com a
afirmação, mais próxima de 1 será a sua resposta e quanto mais
125
DISCORDAR, mais próxima de 6 ela deverá ser. O seu anonimato será
mantido!
(11:02:45) HERIKA (reservadamente) fala para Vida loka tbm ama:
alguma dúvida?
(11:02:49) Vida loka tbm ama (reservadamente) fala para HERIKA: n
(11:03:33)
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(11:04:02) HERIKA (reservadamente) fala para Vida loka tbm ama: 1.
As salas de bate-papo despertam meu interesse, pela variedade de pessoas
com quem se pode “flertar” sem precisar sair de casa.
(11:04:24) Vida loka tbm ama (reservadamente) fala para HERIKA: 3
(11:04:36) HERIKA (reservadamente) fala para Vida loka tbm ama: 2.
Eu seria capaz de estabelecer relacionamentos amorosos com pessoas das
salas de bate-papo.
(11:04:44) Vida loka tbm ama (reservadamente) fala para HERIKA: 2
(11:05:01) HERIKA (reservadamente) fala para Vida loka tbm ama: 3.
Me sinto mais à vontade para procurar um parceiro em salas de bate-papo,
que nos lugares freqüentados cotidianamente, como trabalho, faculdade,
bares e casas noturnas.
(11:05:16) Vida loka tbm ama (reservadamente) fala para HERIKA: 2
11:05:28) HERIKA (reservadamente) fala para Vida loka tbm ama: 4.
Acesso salas de bate-papo não apenas com o objetivo de passar o tempo ou
fazer amizades, mas também para procurar relacionamentos amorosos.
(11:05:47) Vida loka tbm ama (reservadamente) fala para HERIKA: 3
(11:05:50) HERIKA (reservadamente) fala para Vida loka tbm ama: 5.
Só entro nas salas de bate-papo a fim de encontrar alguém interessante
para namorar.
126
(11:06:01) Vida loka tbm ama (reservadamente) fala para HERIKA: 2
(11:06:09) HERIKA (reservadamente) fala para Vida loka tbm ama: 6.
Depois que conheci as salas de bate-papo deixei de perder tempo com
outras formas de encontrar parceiros.
(11:06:19) Vida loka tbm ama (reservadamente) fala para HERIKA: 2
(11:06:27) HERIKA (reservadamente) fala para Vida loka tbm ama: 7.
É
comum que eu freqüente salas de bate-papo ao me sentir solitário.
(11:06:42) Vida loka tbm ama (reservadamente) fala para HERIKA: 1
(11:07:00) HERIKA (reservadamente) fala para Vida loka tbm ama: 8.
Me sinto melhor quando estou sozinho.
(11:07:20) Vida loka tbm ama (reservadamente) fala para HERIKA: 5
(11:07:23) HERIKA (reservadamente) fala para Vida loka tbm ama: 9.
Eu me sinto uma pessoa solitária.
(11:07:38) Vida loka tbm ama (reservadamente) fala para HERIKA: 1
(11:07:41) HERIKA (reservadamente) fala para Vida loka tbm ama: 10.
Falta-me mais companhia.
(11:07:48) Vida loka tbm ama (reservadamente) fala para HERIKA: 1
(11:08:01) HERIKA (reservadamente) fala para Vida loka tbm ama: 11.
As salas de bate-papo me ajudam a sair da solidão.
(11:08:13) Vida loka tbm ama (reservadamente) fala para HERIKA: 2
(11:08:17) HERIKA (reservadamente) fala para Vida loka tbm ama: 12.
Ao me sentir solitário é comum que eu freqüente salas de bate-papo.
(11:08:30) Vida loka tbm ama (reservadamente) fala para HERIKA: 2
(11:08:38) HERIKA (reservadamente) fala para Vida loka tbm ama: ok,
terminamos. Obrigada pela ajuda e disponibilidade.
127
Anexo H – Questionário aplicado no MSN Messenger (*)
Herika diz:
olá!
E. (Endereço de e-mail não confirmado) diz:
oi
E. (Endereço de e-mail não confirmado) diz:
tudo bem?
Herika diz:
Bem e com você? Obrigada por aceitar participar da pesquisa
Herika diz:
Irei enviar de 3 em 3 perguntas para facilitar, ok?
E. (Endereço de e-mail não confirmado) diz:
tudo bem
E. (Endereço de e-mail não confirmado) diz:
ok
Herika diz:
Vou pedir para que, por favor, procure ser o mais breve possível em suas
respostas, ok?
E. (Endereço de e-mail não confirmado) diz:
ok
128
E. (Endereço de e-mail não confirmado) diz:
manda ver
Herika diz:
a) Data de nascimento: ____/____/____
b) Sexo: 1. Feminino 2. Masculino
c) Escolaridade: 1) 1º grau 2) 2º grau incompleto 3) 2º grau completo 4)
Superior incompleto 5) Superior completo 6) Pós-graduado
E. (Endereço de e-mail não confirmado) diz:
a) 13/03/1979
E. (Endereço de e-mail não confirmado) diz:
b) Masculino
E. (Endereço de e-mail não confirmado) diz:
c) Superior completo
Herika diz:
d) Estado civil: 1) Solteiro 2)Casado 3)Separado ou divorciado 4)Namorando
5)Mora com parceiro
e) Você costuma freqüentar as salas de bate-papo: 1) sozinho em casa 2)
sozinho no trabalho 3)Em casa, acompanhado de outras pessoas 4)No trabalho, em
meio a outras pessoas 5) Casa de amigos 6) lan house 7) Outro. Qual?______
f)Você reside: 1) Sozinho 2)com parceiro 3) com amigos 4) com familiares
E. (Endereço de e-mail não confirmado) diz:
d) 5
E. (Endereço de e-mail não confirmado) diz:
129
e) 1 f)2
Herika diz:
Enviarei as instruções referentes à segunda parte do questionário, tudo bem?
E. (Endereço de e-mail não confirmado) diz:
ok
Herika diz:
Para cada afirmação apresentada a seguir, escolha em uma escala de 1 a 6 o
número que melhor representa o seu grau de concordância, de modo que 1 indica
concordância máxima e 6 significa discordância máxima. Isto é, quanto mais você
CONCORDAR com a afirmação, mais próxima de 1 será a sua resposta e quanto
mais DISCORDAR, mais próxima de 6 ela deverá ser. O seu anonimato será
mantido!
E. (Endereço de e-mail não confirmado) diz:
ok
E. (Endereço de e-mail não confirmado) diz:
manda
Herika diz:
1. As salas de bate-papo despertam meu interesse, pela variedade de pessoas
com quem se pode “flertar” sem precisar sair de casa.
2. Eu seria capaz de estabelecer relacionamentos amorosos com pessoas das
salas de bate-papo.
130
3. Me sinto mais à vontade para procurar um parceiro em salas de bate-papo,
que nos lugares freqüentados cotidianamente, como trabalho, faculdade, bares e
casas noturnas.
E. (Endereço de e-mail não confirmado) diz:
1) grau 1
E. (Endereço de e-mail não confirmado) diz:
2) grau 4
E. (Endereço de e-mail não confirmado) diz:
3) grau 6
Herika diz:
4. Acesso salas de bate-papo não apenas com o objetivo de passar o tempo ou
fazer amizades, mas também para procurar relacionamentos amorosos.
5. Só entro nas salas de bate-papo a fim de encontrar alguém interessante para
namorar.
6. Depois que conheci as salas de bate-papo deixei de perder tempo com
outras formas de encontrar parceiros.
E. (Endereço de e-mail não confirmado) diz:
4) 1
E. (Endereço de e-mail não confirmado) diz:
5) grau 6
E. (Endereço de e-mail não confirmado) diz:
6) grau 6
131
Herika diz:
7. É comum que eu freqüente salas de bate-papo ao me sentir solitário.
8. Me sinto melhor quando estou sozinho.
9. Eu me sinto uma pessoa solitária.
E. (Endereço de e-mail não confirmado) diz:
7) grau 4
E. (Endereço de e-mail não confirmado) diz:
8) grau 6
E. (Endereço de e-mail não confirmado) diz:
9) grau 6
Herika diz:
10. Falta-me mais companhia.
11. As salas de bate-papo me ajudam a sair da solidão.
12. Ao me sentir solitário é comum que eu freqüente salas de bate-papo.
E. (Endereço de e-mail não confirmado) diz:
10) grau 5
E. (Endereço de e-mail não confirmado) diz:
11) grau 6
E. (Endereço de e-mail não confirmado) diz:
12) grau 4
Herika diz:
ok, terminamos
132
Herika diz:
obrigada por participar
E. (Endereço de e-mail não confirmado) diz:
posso dar uma sugestão?
Herika diz:
claro
E. (Endereço de e-mail não confirmado) diz:
eu achei a pergunta 12 idêntica à 7
E. (Endereço de e-mail não confirmado) diz:
e acho que podem haver mais perguntas que possibilitem que o entrevistado
ofereça respostas que não tenham tanto a ver com solidão
E. (Endereço de e-mail não confirmado) diz:
o motivo de eu estar no chat tinha pouco a ver com solidão
E. (Endereço de e-mail não confirmado) diz:
mas, de qualquer forma, espero que minhas respostas tenham te ajudado em
algo
Herika diz:
Suas sugestões são importantes, E. Muito obrigada.
E. (Endereço de e-mail não confirmado) diz:
Não há de que
133
Herika diz:
Obrigada pela participação.
Herika diz:
Boa noite!
(*) O usuário aparentemente estava utilizando o seu próprio nome, durante a aplicação do questionário.
Por esse motivo mantivemos apenas a inicial “E” na reprodução do diálogo.
134
Anexo I – Questionário respondido por e-mail.
QUESTIONÁRIO
a) Data de nascimento: ____/____/____
23/11/1985
b) Sexo: 1. Feminino 2. Masculino
2
c) Escolaridade: 1) 1º grau 2) 2º grau incompleto 3) 2º grau completo 4) Superior
incompleto 5) Superior completo 6) Pós-graduado
4
d) Estado civil: 1) Solteiro 2)Casado 3)Separado ou divorciado 4)Namorando 5)Mora
com parceiro
4
e) Você costuma freqüentar as salas de bate-papo: 1) sozinho em casa 2) sozinho no
trabalho 3)Em casa, acompanhado de outras pessoas 4)No trabalho, em meio a outras
pessoas 5) Casa de amigos 6) lan house 7) Outro. Qual?______
1
f)Você reside: 1) Sozinho 2)com parceiro 3) com amigos 4) com familiares
3
Instruções: Para cada afirmação apresentada a seguir, escolha em uma escala de 1 a 6 o
número que melhor representa o seu grau de concordância, de modo que 1 indica
concordância máxima e 6 significa discordância máxima. Isto é, quanto mais você
CONCORDAR com a afirmação, mais próxima de 1 será a sua resposta e quanto mais
DISCORDAR, mais próxima de 6 ela deverá ser. O seu anonimato será mantido!
1. As salas de bate-papo despertam meu interesse, pela variedade de pessoas com quem
se pode “flertar” sem precisar sair de casa.
135
5
2. Eu seria capaz de estabelecer relacionamentos amorosos com pessoas das salas de
bate-papo.
4
3. Me sinto mais à vontade para procurar um parceiro em salas de bate-papo, que nos
lugares freqüentados cotidianamente, como trabalho, faculdade, bares e casas noturnas.
6
4. Acesso salas de bate-papo não apenas com o objetivo de passar o tempo ou fazer
amizades, mas também para procurar relacionamentos amorosos.
3
5. Só entro nas salas de bate-papo a fim de encontrar alguém interessante para namorar.
6
6. Depois que conheci as salas de bate-papo deixei de perder tempo com outras formas
de encontrar parceiros.
6
7. É comum que eu freqüente salas de bate-papo ao me sentir solitário.
2
8. Me sinto melhor quando estou sozinho.
5
9. Eu me sinto uma pessoa solitária.
6
10. Falta-me mais companhia.
6
11. As salas de bate-papo me ajudam a sair da solidão.
3
12. Ao me sentir solitário é comum que eu freqüente salas de bate-papo.
4
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