Download PDF
ads:
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO – PUC-SP
NIVIA CARATIN FERNANDES
FAMÍLIA-ESCOLA – A PARTICIPAÇÃO MASCULINA
a compreensão dos homens – pais ou responsáveis – sobre sua
atuação na escolarização dos filhos e participação na escola
MESTRADO EM EDUCAÇÃO
São Paulo
2007
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO – PUC-SP
NIVIA CARATIN FERNANDES
FAMÍLIA-ESCOLA – A PARTICIPAÇÃO MASCULINA
a compreensão dos homens – pais ou responsáveis – sobre sua
atuação na escolarização dos filhos e participação na escola
Dissertação apresentada à Banca Examinadora
da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,
como exigência parcial para obtenção do título de
MESTRE em Educação: Psicologia da Educação,
sob a orientação da Professora Doutora Heloisa
Szymanski.
São Paulo
2007
ads:
Banca Examinadora:
__________________________________________
__________________________________________
__________________________________________
Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou
parcial desta dissertação/tese por processos de fotocopiadoras ou eletrônicos.
Assinatura:___________________________ Local e Data:________________
DEDICATÓRIA
A meu pai
(in memorian)
À minha mãe,
pela compreensão devido à espera nos momentos de
cuidado em razão de minha dedicação à pesquisa.
Aos meus filhos, Daniel, Fabiana e Tiago,
pelos momentos de carinho e de alegria que me deram
forças para prosseguir na jornada.
Aos meus netos, Beatriz, Gustavo, Larissa e Otávio,
que chegaram nesta fase especial de minha vida,
energizando e encantando meus dias.
Ao Reinaldo, esposo querido,
companheiro de todas as horas, pelo amor, amizade e
apoio irrestrito.
AGRADECIMENTOS
• À Prof
a
. D
ra
.
Heloisa Szymanski, minha orientadora, pelo cuidado,
respeito e preciosas orientações.
• Aos membros da banca examinadora, Prof. Dr. Geraldo Romanelli e
Prof
a
. D
ra
.
Wanda Maria Junqueira de Aguiar, pela atenção, pelas
sugestões e honrosa oportunidade de compartilhar o presente trabalho.
• Às amigas e amigos do projeto Diálogo e Participação, em especial
Teresa, Maristela e João, com quem vivi momentos de alegrias, dúvidas e
apoio.
• Aos meus professores,
que ao longo de minha formação, contribuíram com seus conhecimentos
e modelos de docência.
• À Prof
a
. D
ra
. Anete Busin Fernandes,
pelo incentivo na busca de novos conhecimentos e crescimento em nosso
convívio de supervisão no trabalho clínico.
• Aos meus alunos do curso de Pedagogia, pelas trocas de experiências e
aprendizado a respeito dessa relação fundamental, família e escola.
• Aos pais, educadores e alunos da Escola Municipal,
que acolheram nossa proposta de trabalho, tornando possível esta
pesquisa.
• À Pontifícia Universidade Católica de São Paulo pela concessão do
benefício bolsa docente Pós-graduação Stricto Sensu.
RESUMO
Este trabalho tem como objetivo aprofundar a compreensão sobre como os
pais homens ou responsáveis compreendem a sua participação na escolarização de
seus filhos e nas atividades promovidas pela escola. O contexto estudado foi o de
uma escola de classe popular situada na periferia de São Paulo.
O referencial teórico escolhido foi a abordagem dialógica de Paulo Freire e as
contribuições de Daniel Thin e Bernard Lahire para a compreensão das relações entre
famílias de classes populares e escola. Além das idéias de Freire, Thin e Lahire este
trabalho contém uma revisão de literatura sobre os temas Família como fenômeno
social e histórico, Relação família-escola, e O papel do pai-homem na relação família-
escola. Desenvolveu-se uma pesquisa qualitativa na qual foram feitas entrevistas
reflexivas, segundo a proposta de Szymanski, com 11 pais ou responsáveis. Para a
análise, foi adotado o referencial hermenêutico. Por meio de imersões no texto de
referência, foram identificadas unidades de significado que foram agrupadas em
constelações, a partir das quais foram propostos alguns temas para discussão. São
eles: As dificuldades de trazer os pais para as entrevistas – o próprio processo de
coleta de dados foi um dado relevante. As justificativas dos pais para a sua baixa
participação – insatisfação com a maneira de a escola resolver os problemas, pouca
disponibilidade de tempo devido à longa e irregular jornada de trabalho, e diversas
formas de inibição. A questão de gênero – a mentalidade machista naturaliza as
justificativas para a divisão de responsabilidades entre os pais. A inibição –
fortemente associada à autodesvalia ou a uma identidade social. O papel chave do
diretor – capacidade de mobilizar a comunidade. O círculo vicioso das insatisfações
na relação pai-escola configura um problema estrutural – professor tem dificuldade
em conduzir classes problemáticas, convoca o pai para que mude o comportamento
do filho; o que o pai faz não satisfaz o professor e recebe nova reclamação, o pai
castiga o filho, e filho se sente cada vez mais desqualificado. Este problema revela
uma contradição de alguns membros da escola: por um lado, há um discurso que
reclama da pouca participação do pai, por outro lado, faz movimentos de “expulsão”
do pai, por meio de humilhação, escuta na posição de dominante e sinais de que
prefere a presença da mãe.
O encaminhamento desse problema estrutural não pode ser feito segundo
apenas a lógica da escola ou das expectativas do professor. Estão em jogo
polaridades dialéticas, em que o referencial dialógico de Paulo Freire é especialmente
adequado, pois propõe que as contradições e impasses sejam enfrentados por meio
do diálogo, isto é, sejam expressos, refletidos, discutidos e que se construa
coletivamente a superação.
Palavras-chave: referencial dialógico, participação paterna, relação família-escola,
classes populares e a educação, Paulo Freire.
ABSTRACT
The objective of this work is to study how fathers or other responsible male
peer perceive their participation in the schooling of their children and in the activities
promoted by the school. The context in case is a school situated at a poor peripheral
neighborhood of São Paulo.
The theoretical basis are Paulo Freire's dialogical approach and Daniel Thin
and Bernard Lahire's contribution on the relationship between low income families and
school. This work also includes a literature review on themes such as 'Family as a
social and historic phenomenon', 'The relationship between school and family', and
'The role of the father in the relationship between school and family'. Reflective
interviews, as proposed by Szymanski, were done with 11 fathers or responsible male
peer, in order to produce qualitative data. These were analyzed through hermeneutic
method. After close readings of the interviews' transcriptions, units of meaning were
identified and then regrouped into 'constellations', from which some themes were
brought up for discussion. The themes are the following: 'The hardships of bringing the
fathers to the interviews', the collecting data process being relevant data as well; 'The
explanations fathers give for their low participation', their dissatisfaction with the way
the school solves problems, not having themselves spare time due to excessive and
irregular work hours, and several kinds of inhibitions; 'The gender issue', the sexist
mentality does not recognize the different responsibilities between mother and father
as being cultural, but as 'natural'; 'The inhibition', strongly associated with low self-
esteem or to their social identity; 'The school director's key-role', his capacity to
mobilize the community. The conclusion is that the feeling of dissatisfaction brought up
in the relationship between school and father turns into a vicious cycle and becomes a
structural problem. The teacher has a hard time managing difficult classes, he or she
calls upon the father to deal with his child's behavior. The way the father does it is
unsatisfactory for the teacher, who complains again. The father reprimands his child,
who ends up with an even lower self-esteem. There is a contradiction inherent to some
people working at the school: on the one hand, they complain on the father's low
participation, on the other hand, they push him away through humiliation, by putting
themselves in a dominant position and by revealing a preference for the mother's
presence.
Dealing with this issue cannot follow exclusively neither the schools logic, nor
the teacher's expectations. Dialectic polarities are in place, therefore, the Paulo
Freire's dialogical approach seems to be the most adequate. In this approach,
contradictions and obstacles are dealt through dialog, being expressed, reflected upon
and discussed in order to build a solution collectively.
Key-words: dialogic approach, Father participation, Relationship between family and
school, Lower classes and education, Paulo Freire.
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO ............................................................................................ 1
Capítulo 1.
INTRODUÇÃO .................................................................................................. 7
Referencial dialógico de Paulo Freire ........................................................ 7
A família como fenômeno social e histórico ............................................. 11
Relação família-escola ............................................................................. 18
Revisão de literatura sobre a relação família-escola ............................... 23
O pai homem ............................................................................................ 29
Capítulo 2.
O MÉTODO .................................................................................................... 34
2.1. OBJETIVO DA PESQUISA ............................................................... 34
2.2. PESQUISA QUALITATIVA ............................................................... 34
2.3. ENTREVISTA REFLEXIVA ............................................................... 36
2.4. MODOS DE PROCEDER NO DESENVOLVIMENTO
DA ENTREVISTA ............................................................................. 37
2.5. CONSTITUIÇÃO DA SITUAÇÃO DE PESQUISA ............................ 40
O contexto ......................................................................................... 40
Pais participantes da pesquisa ......................................................... 45
Dificuldades para conseguir os participantes ................................... 46
A imersão .......................................................................................... 48
2.6. DESCRIÇÃO DOS ENCONTROS .................................................... 58
Aquecimento ..................................................................................... 58
Encontro com os genitores ............................................................... 59
Primeira Entrevista ............................................................................ 61
Segunda Entrevista ........................................................................... 66
Terceira Entrevista ............................................................................ 69
Entrevista Devolutiva ........................................................................ 71
2.7. PROCEDIMENTOS DE ANÁLISE .................................................... 78
Procedimentos operacionais de análise de entrevistas ....................80
Capítulo 3.
ANÁLISE DAS ENTREVISTAS ...................................................................... 82
Constelações ........................................................................................... 82
Como os pais percebem e assumem os seus papéis na escolarização
dos seus filhos ......................................................................................... 83
Interação com a escola no processo de escolarização dos filhos ................. 86
Recursos e estratégias aos quais recorrem para desempenhar o seu
papel na escolarização dos filhos ............................................................ 89
Disposições afetivas de pais homens na relação com a escola ..............92
Como os pais vêem a escola ................................................................... 93
Justificativas para o afastamento dos genitores ...................................... 98
A questão de gênero .............................................................................. 101
Diretor .................................................................................................... 105
Capítulo 4.
DISCUSSÃO ................................................................................................. 108
Capítulo 5.
CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................... 114
REFERÊNCIAS ............................................................................................ 116
TERMO DE CONSENTIMENTO .................................................................. 127
Diante da Criança
Como fazer meu filho?
Não há receitas para tal.
Todo o saber, todo o meu brilho
de vaidoso intelectual
vacila ante a interrogação
gravada em mim, impressa no ar.
Bola, bombons, patinação
talvez bastem para encantar?
Imprevistas, fartas mesadas,
louvores, prêmios, complacências,
milhões de coisas desejadas,
concedidas sem reticências?
Liberdade alheia a limites,
perdão de erros, sem julgamento,
e dizer-lhe que estamos quites,
conforme a lei do esquecimento?
Submeter-me à tua vontade
sem ponderar, sem discutir?
Dar-lhe tudo aquilo que há
de entontecer um grão-vizir?
E se depois de tanto mimo
que o atraia, ele se sente
pobre, sem paz e sem arrimo,
alma vazia, amargamente?
Não é feliz. Mas que fazer
para consolo desta criança?
Como em seu íntimo acender
uma fagulha de confiança?
Eis que acode meu coração
e oferece, como uma flor,
a doçura desta lição:
dar a meu filho meu amor.
Pois o amor resgata a pobreza,
vence o tédio, ilumina o dia
e instaura em nossa natureza
a imperecível alegria.
Carlos Drummond de Andrade
1
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
APRESENTAÇÃO
Minha presença no mundo não é a de quem se
adapta, mas a de quem nele se insere. É a
posição de quem luta para não ser objeto, mas
também sujeito da história. (Pedagogia da
Autonomia)
Paulo Freire
interesse pelo tema surgiu a partir de vivências e observações
marcantes ao longo da minha trajetória profissional no campo da
Educação, em diferentes papéis. Num primeiro momento da minha vida
de educadora, como professora de Ensino Básico (Educação Infantil e Ensino
Fundamental) por 18 anos, trabalhei em instituições de ensino da rede particular
do Município de São Paulo. Lembro até hoje do nervosismo inicial e depois da
sensação de alívio por ter concluído bem a minha primeira Reunião de Pais e
Mestres. Mesmo naquele início de carreira, sem experiência, eu sabia da
importância desse encontro, que se estabelecia entre professor e pais de alunos.
Assim, por todos esses anos, sempre tive um cuidado especial em aproveitar
esses momentos e outras oportunidades, que se apresentavam para conhecer as
famílias de meus alunos, para expor o trabalho que desenvolvia com as crianças
e ouvir os anseios dos pais ou responsáveis.
Posteriormente, assumi o cargo de Orientadora Educacional por sete anos
em uma instituição particular de São Paulo. No desenvolvimento de inúmeras
atividades eu interagia constantemente com alunos, famílias, coordenadores
pedagógicos, diretores, professores e outros funcionários da instituição. Dessa
experiência, ficou a impressão de que havia um enriquecimento na vida escolar
do aluno nas ocasiões em que era promovido o encontro entre os pais, o
professor e a orientadora educacional e esse constituía um espaço privilegiado
para o ouvir.
2
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Durante a formação em Psicopedagogia (Clínica e Institucional) desenvolvi
um projeto de alfabetização para alunos com dificuldades de aprendizagem em
uma escola da rede Estadual de Ensino Básico. O tema do projeto foi “Um caso
de intervenção de psicopedagogia institucional: ‘crianças que não aprendem’”
(Fernandes, 2001). A queixa inicial daquele trabalho foi “a extrema dificuldade de
aprendizagem de alunos de 2ª. Série que não sabiam ler e escrever
1
”.
O grupo que participou do projeto foi formado por crianças de 9 a 12 anos.
Após um programa de intervenção de 70 horas (24 encontros semanais de 01
hora e 30 minutos com as crianças e mais 15 encontros com pais, professores,
diretora e coordenadora pedagógica), todos superaram a “incapacidade” em
leitura e escrita. Observou-se na ocasião que a interação com alguns dos pais foi
um dos fatores que trouxe esclarecimentos importantes e colaboraram para o
planejamento das intervenções e, possivelmente, para a melhora do rendimento
das crianças.
Além dessas experiências, participei como professora tutora no Programa
PEC – Forprof – Projeto para formação universitária de professores da rede
Estadual (2001-2002) e depois da rede Municipal (2003-2004 e 2006-2007).
Percebi ao longo do desenvolvimento do programa que a atividade
“Caracterização da comunidade escolar”, na qual os professores entravam em
contato com a comunidade, foi marcantemente favorável para o início de
transformações positivas naqueles professores.
Os “professores-alunos” do projeto conheceram mais as famílias dos seus
alunos e mudaram suas expectativas e ações, pois passaram a falar de modo
diferente. Antes da caracterização, eu ouvi vários comentários como: “Não vejo a
hora que acabe a reunião de pais para me entender só com meus alunos” ou, em
direção contrária, “Aquela mãe nem respondeu o bilhete que enviei, acho que
nem liga para o chamado da escola para conversar sobre seu filho”
(posteriormente a professora descobriu que a mãe não sabia ler), ou ainda “Só
comparecem quando são convocados. Como se trata de um convite [não
compulsório] há acomodação e negligência por parte de alguns pais”.
1
Fala da diretora, Coordenadora Pedagógica e professora da escola.
3
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Depois que foi desenvolvida essa atividade na qual cada professor fez
pesquisas para caracterizar a comunidade, percebeu-se uma transformação
nessas professoras. Alguns depoimentos revelam tal transformação: “Precisamos
interagir mais com os pais”; “Precisamos ter uma parceria com os pais para
enfrentar os desafios”; “A instituição escolar em geral pouco investe na
informação das famílias realizando poucos momentos de troca de experiências,
dedicando às reuniões que ocorrem às cobranças, reclamações ou processos
burocráticos do processo educacional” e ainda “A cultura escolar considera as
famílias como entidade incapaz de entender e colaborar no processo”. As
mudanças nas verbalizações apontaram para o início da quebra de preconceitos
e minimização de barreiras. Foi como se um mito (distanciamento que gera
fantasias negativas) se quebrasse.
O processo de formação desses professores ocorreu em várias instâncias:
ambiente de aprendizagem “on-line”, videoconferências, teleconferências,
ambiente de aprendizagem “off-line” e vivências educadoras. Ao longo dessas
propostas foi possível problematizar, explicitar e debater situações contextualizadas,
por meio de um caráter integrador, focalizando o cotidiano, as crenças, as
inovações, os estereótipos, as resistências, os pressupostos, as relações sociais,
os projetos, assim como os conteúdos, os métodos e as técnicas.
Em suma, fazendo uma retrospectiva do dia-a-dia nas várias
instituições/instâncias anteriormente citadas, da escola particular e pública do
Ensino Básico à Instituição particular de Ensino Superior percebo que esse dia-a-
dia foi permeado por comentários que indicavam ora satisfação a respeito da
relação professor-família, ora queixas sobre a falta de compreensão do “outro”.
Refletindo sobre essas diferentes impressões, cresceu uma grande
inquietação, pois mesmo dentro de mim fui notando diferentes pontos de vista
marcados pelos diversos papéis que eu vivi como mãe, professora do ensino
infantil e fundamental, orientadora educacional, psicopedagoga e professora
tutora em formação de professores.
Com base nessas experiências, aos poucos fui delineando um campo de
interesse para minha pesquisa: a relação família-escola. Com base nas vivências
4
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
e observações fui me interessando pelo aprofundamento da compreensão desta
relação, uma vez que se trata de uma dimensão fundamental para a melhoria de
resultados educacionais, para a formação e a realização profissional dos
professores, para a formulação de Políticas Públicas para a Educação e para o
desenvolvimento da cidadania.
Tal interesse levou-me à Professora Dra. Heloisa Szymanski, do programa
de Pós-Graduação em Psicologia da Educação da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo que me introduziu no Grupo de Pesquisa em Práticas
Educativas e Atenção Psicoeducacional na Família, Escola e Comunidade por ela
coordenada. Já como mestranda, passei a integrar a equipe de pesquisadores da
disciplina projeto: Prática Educativa na Creche, Escola e Comunidade:
Participação e Diálogo.
Essas iniciativas, incluindo esta minha pesquisa, fazem parte de um
programa maior denominado Diálogo e Participação: a prática dialógica na
família, escola e comunidade. Este programa é um trabalho
amplo que se propõe a implementar e avaliar uma proposta educacional
participativa e dialógica, inspirada nas idéias de Paulo Freire, em
diferentes contextos educacionais – escola pública de ensino
fundamental, família, creche, biblioteca e instituição de educação
complementar (ONGs comunitárias). (Szymanski, 2004)
Nas pesquisas referentes ao tema, observei que muitos pesquisadores
tratam da importância do vínculo escola-família-comunidade
2
. Entretanto, esses
autores reconhecem a carência de pesquisas sobre a qualidade de tal vínculo.
Compreendi então que uma pesquisa de campo se fazia necessária para que eu
pudesse ouvir
3
diretamente a compreensão dos pais a respeito de sua
participação. Só com esta iniciativa eu estaria contribuindo para compreender a
realidade.
2
Um levantamento de literatura a esse respeito, resultado de meus estudos, pode ser encontrado na
página 18 desta dissertação.
3
“Quando realmente ouço, ouço o que alguém me diz (e não apenas o que fala), e isso me remete ao
mundo” (Freire, 2005a).
5
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Assim, inspirada em Paulo Freire, que “não pensa pensamentos, pensa a
realidade e a ação sobre ela” (Gadotti, 2001), decido iluminar-me em seus
referenciais. Também entendo que apenas tomar conhecimento da realidade não
basta, é preciso ir além através da conscientização, constituindo-se uma ação
transformadora gerada a partir da análise das necessidades da situação real em
estudo, para que, então, especificadas as direções relevantes, possa traçar metas
e alcançar efetivas realizações.
A conscientização implica, pois, que ultrapassemos a esfera
espontânea de apreensão da realidade, para chegarmos a uma esfera
crítica na qual a realidade se dá como um objeto cognoscível e na qual
o homem assume uma posição epistemológica. (Freire, 1980: 26)
Portanto, procuro adicionar seus ensinamentos a esta pesquisa e, de início,
considero que “minha segurança se fundamenta na convicção de que sei algo e
de que ignoro algo a que se junta a certeza de que posso saber melhor o que já
sei e conhecer o que ainda não sei” (Freire, 1999: 153).
Consciente de que existem políticas educacionais em vigor voltadas para a
melhoria da relação entre a escola e a comunidade, expressas na Lei de Diretrizes e
Bases e nos Referenciais Curriculares de 1996, busco referências teóricas e
dados da realidade que possam me revelar o que pensa o pai de aluno a respeito
de sua participação na escolarização de seus filhos. Interessa-me ainda observar
e concluir sobre a participação paterna na escola, uma vez que, sobre este dado
específico, parece que há carência documental de resultado efetivo.
Este estudo parte de uma temática geral que é a relação família-escola e
segue procurando descortinar compreensões sobre a participação do pai homem,
segundo a ótica deste, na escolarização de seu filho, assim como sua
participação nas atividades promovidas pela escola, tendo como “locus” o
ambiente de uma escola da periferia de São Paulo.
Esta pesquisa apresenta no capítulo 1 uma introdução aos princípios que
sustentarão o desenvolvimento do trabalho. Inicialmente são apresentadas as
razões da escolha do referencial dialógico de Paulo Freire; nas três seções
6
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
seguintes foram incluídas revisões históricas e conceituais sobre os temas
“Família como fenômeno social e histórico”, “Relação família-escola” e “O papel
do pai-homem na relação família-escola”. Por fim, apresenta-se uma síntese da
revisão da literatura sobre os temas tratados neste trabalho. As contribuições
estão agrupadas em quatro categorias: 1. as contribuições que mostram os
benefícios produzidos por uma boa relação escola-família; 2. as contribuições que
apontam as dificuldades e obstáculos para se construir e manter um bom
relacionamento, 3. as contribuições que propõem meios alternativos para se
construir o bom relacionamento e 4. as contribuições dos pensadores críticos que
podem proporcionar um alargamento da compreensão, superando o senso
comum ou “mitos”.
No segundo capítulo – o Método – são descritas as opções metodológicas
adotadas para o desenvolvimento da pesquisa. Na primeira seção é formalizado o
objetivo do trabalho. Na segunda, terceira e quarta seção, são apresentadas,
respectivamente, justificativas da opção pela pesquisa qualitativa, o decorrente
instrumento para coleta de dados (entrevista reflexiva) e os procedimentos para
entrevista reflexiva; a quinta seção contém um relato sobre a constituição da
situação de pesquisa – o contexto, os participantes da pesquisa, as dificuldades
para se conseguir os participantes selecionados e um relato da imersão na
realidade, realizada antes das entrevistas. Na sexta seção são descritos os
escritos e algumas falas representativas. Na sétima seção são descritos os
procedimentos usados na análise hermenêutica das entrevistas.
O capítulo três contém o resultado da análise hermenêutica, na forma de
constelações que congregam unidades de significado.
No capítulo quatro é apresentada uma série de discussões, procurando
construir uma síntese na direção da compreensão do fenômeno em estudo –
como os pais vêem sua participação na escolarização dos filhos e nas atividades
propostas pela escola. De modo mais específico, busca-se identificar em quais
situações existem ou não essa participação, e o que dificulta a participação. O
capítulo cinco contém algumas considerações finais sobre o trabalho e algumas
sugestões para pesquisas futuras.
7
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Capítulo 1
INTRODUÇÃO
“Educar não é a mera transmissão de
conhecimentos, mas sim conscientização e
testemunho de vida, senão não terá eficácia".
Paulo Freire
este capítulo são apresentadas algumas idéias do educador Paulo
Freire, cujo referencial dialógico sustenta o desenvolvimento desta
pesquisa. Procuro contextualizar o problema a ser investigado, com
informações sobre família, a relação família-escola e o papel do pai-homem na
relação família-escola. Finalizo com uma breve revisão da literatura sobre os
temas tratados nesta pesquisa.
Amparada nas contribuições de Paulo Freire, construo o meu trabalho visando
despertar o interesse de meus leitores para a questão levantada. Desejo compartilhar,
solidariamente, os dados coletados. Com o conhecimento obtido, certamente será
possível uma outra compreensão sobre a participação familiar junto à instituição
escolar e assim estarei contribuindo, lado a lado, com demais educadores
interessados, para o diálogo permanente, propósito maior do mestre Paulo Freire.
Referencial dialógico de Paulo Freire
Dentre outros referenciais, Freire pareceu-nos o mais apropriado para
refletir sobre condições concretas da realidade existente em escolas de periferia,
atendendo predominantemente uma população carente de recursos. Freire voltou
seu olhar especificamente para uma pedagogia orientada pelo diálogo
4
(relação
4
O diálogo consiste em uma relação horizontal e não vertical entre as pessoas implicadas, entre as
pessoas em relação. No seu pensamento, a relação homem-homem, homem-mulher, mulher-mulher e
homem-mundo são indissociáveis. Como Freire afirma: "Ninguém educa ninguém. Ninguém se educa
sozinho. Os homens se educam juntos, na transformação do mundo" (Freire, 2005a: 78).
8
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
horizontal, em oposição ao autoritarismo, à punição e à violência), para a
participação (em oposição à passividade) comunitária, para que o professor
conheça a realidade da comunidade e, para que todos aprendam e adotem a
reflexão crítica (desvelando as contradições que os interesses ideológicos
procuram esconder).
As contradições e os dilemas presentes no cotidiano, aceitas implicitamente até
então como naturais e inevitáveis, passam a ser expressas, refletidas e discutidas
neste estudo. Freire recomenda que se respeite (com humildade, paciência) e se
aproveite o conhecimento trazido pela realidade da vivência do sujeito (o ponto de
partida para avançar na leitura do mundo), a valorização tanto da prática, quanto da
teoria (aprender democracia praticando democracia).
Freire acentua que o educador deve despertar no oprimido a esperança de
libertação das condições desumanas, por meio da transformação social e
construção de uma sociedade justa, democrática e igualitária.
Ele fala do conceito de “inédito-viável”, algo inédito, que no sonho utópico se
sabe existir, “mas que só será possível a partir da práxis libertadora, quando a partir da
reflexão-ação se derrubam as situações-limite que nos limitam a ser menos” (Freire,
2003: 206). As pessoas têm várias atitudes diante dessas situações-limite: "ou as
percebem como um obstáculo que não podem transpor; ou como algo que não
querem transpor; ou ainda como algo que sabem que existe e precisa ser rompido e
então se empenham na sua superação" (idem, ibidem: 205).
A autodesvalia (Freire, 2005a: 56) é uma das características do oprimido,
que resulta da introjeção que eles fazem da visão que deles têm os opressores.
De tanto ouvirem de si mesmos que são incapazes, indolentes, que não sabem
nada, que não podem saber, acabam por se convencer de sua “incapacidade”. É
como homens que os oprimidos têm que lutar, e não como “coisas”, na relação de
opressão em que estão e na qual se encontram destruídos. A luta por esta
reconstrução começa no autoconhecimento dos homens destituídos.
Uma característica marcante do pensamento de Freire é a sua relação
direta com a realidade a ser transformada. Freire defendeu esse compromisso,
9
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
deixando em segundo plano os esquemas burocráticos, do poder político e do
poder acadêmico. Para Freire, conscientização é transcender o mero
conhecimento da realidade.
A tomada de consciência significa a passagem da imersão na realidade
para um distanciamento desta realidade. A conscientização ultrapassa o
nível da tomada de consciência através da análise crítica, isto é, do
desvelamento das razões de ser desta situação, para constituir-se em
ação transformadora desta realidade. (Freire, 1980: 25)
Outra idéia fundamental de Freire é a da inconclusividade ou permanente
provisoriedade da humanidade, individual e social, uma perspectiva diretamente
relacionada à necessidade de uma permanente formação, reconstituição,
aperfeiçoamento, aprendizagem e conscientização – um fazer que se refaça
constantemente na ação, enfim “para se ser, tem que se estar sendo”.
Um dos primeiros artigos
5
publicados por Paulo Freire é sobre “escola
primária” no qual escreve como se deve organizar a participação dos pais na
escola, pública ou privada. Já se faz presente a preocupação em discutir os
problemas educacionais da escola por meio da realidade vivida. O conteúdo
mostra sensibilidade e aguda percepção em relação à realidade na qual pais e
professores estavam inseridos.
A atenção às relações família-escola, entre outras situações, é
demonstrada desde 1947, no trabalho desenvolvido no centro social do SESI
6
onde difundia a sua preocupação com a busca do diálogo para refletir sobre as
conseqüências políticas de uma relação pais-filhos baseada no castigo; realiza
uma série de debates com os professores e com as famílias sobre a questão da
disciplina, “defendendo uma relação dialógica, amorosa, entre pais, mães, filhas,
filhos, que fosse substituindo os castigos violentos” (Freire, 2003: 15-29).
5
Segundo o Instituto Paulo Freire, é o mais antigo trabalho escrito, datado de 1955. Trata-se de um
“roteiro para discussão nos Círculos de Pais e Mestres”.
6
Serviço Social da Indústria, SESI, Departamento Regional de Pernambuco, instituído pela
Confederação Nacional das Indústrias, cuja forma legal lhe foi dada através de decreto presidencial.
10
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Um grande incentivador dos encontros promovidos entre a família e a
escola investiu muito na implantação dos grupos que denominou “Conselhos de
Escolas”, antigamente chamados de “Círculos de Pais e Professores” ou até,
“Associação de Pais e Mestres”. Tal “instrumento” de participação da
comunidade, segundo ele, permite que as famílias vão se inteirando dos
acontecimentos da escola, chegando a um grau de relacionamento que promova
colaboração mútua. “Participando, intervindo, colaborando, o homem constrói
novas atitudes, muda outras, elabora e reelabora experiências, educa-se”.
Quando foi Secretário da Educação do município de São Paulo, em 1989, Paulo
Freire instituiu o chamado “Conselho de Escola” resgatando experiência anterior
dos "Círculos de Pais e Professores”.
O exercício da paternidade é um dos temas pelos quais Paulo Freire tinha
grande apreço. O Instituto Paulo Freire, conjuntamente com Paulo Silveira,
promoveu, em 1996, o Ciclo de debates sobre o exercício da Paternidade,
reunindo profissionais e pesquisadores de variadas orientações. Um dos produtos
desse ciclo foi um livro que, infelizmente não pôde contar com um artigo do
próprio Freire, como era seu desejo, pois foi publicado após a sua morte. O
Instituto Paulo Freire considera que essa iniciativa faz parte do compromisso de
continuar a luta de Freire,
Seja como filho, pai, mestre ou aluno, Paulo Freire nos falava de um
Exercício da Paternidade substantivado pela autonomia, pela ética, pela
amorosidade e pelo respeito. (Silveira, 1998: 25)
O referencial de Paulo Freire é aqui utilizado para interpretar os dados
levantados e produzir uma compreensão da situação que pode começar a
identificar sementes para futuras intervenções.
11
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
A família como fenômeno social e histórico
“O mundo familiar mostra-se numa
vibrante variedade de formas de
organização, com crenças, valores e
práticas desenvolvidas na busca de
soluções para as vicissitudes que a vida
vai trazendo. Desconsiderar isso é ter a
vã pretensão de colocar essa
multiplicidade de manifestações sob a
camisa-de-força de uma única forma de
emocionar, interpretar, comunicar”.
Heloisa Szymanski
Panorama histórico
A família não é uma instituição estática. É viva e passa por transformações
constantes ao longo da história da humanidade, por ser uma instituição social,
paulatinamente construída.
Na Idade Média e no início dos tempos modernos, os filhos eram cuidados
e protegidos por seus pais, no seio de uma organização familiar, mas o
sentimento de família unindo emocionalmente seus membros ainda não estava
atrelado à sua existência. “A família cumpria uma função – assegurava a
transmissão da vida, dos bens e dos nomes (...) ela não tinha idéia da educação.
Hoje, nossa sociedade depende e sabe que depende do sucesso de seu sistema
educacional.” (Ariès, 1978: 275-276). Os cuidados dispensados aos filhos eram os
físicos e limitavam-se aos necessários à sua sobrevivência, até mais ou menos os
primeiros sete anos, quando então passavam a conviver com os adultos,
aprendendo sobre valores e costumes. Assim, “a socialização acontecia no
convívio com a sociedade, não sendo determinada ou controlada pela unidade
familiar” (idem, ibidem: 275-276). A partir do fim do século XVII, a aprendizagem
social das crianças vai aos poucos perdendo seu espaço no âmbito da
coletividade, dando lugar à educação escolar. “O grande acontecimento foi o
reaparecimento no início dos tempos modernos da preocupação com a educação
(Ariès, 1978: 276).
12
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Ariès, que baseou seus estudos na análise dos documentos iconográficos,
mostrou a passagem do principal personagem: a multidão, para as cenas de
família que, a princípio, no século XVI, eram raras e depois começam a se fazer
notar, no século XVII, com um detalhe que correspondia à realidade: a
representação da vida em família, inicialmente exterior e pública e posteriormente
na intimidade da vida privada.
Só com a burguesia é que a vida familiar ganha um cunho mais intimista e
sentimental, dando início aos vínculos afetivos entre seus membros. Essa
evolução da família, durante muito tempo, limitou-se aos nobres, aos burgueses,
aos artesãos e aos lavradores ricos, pois uma grande parte da população, a mais
pobre e numerosa, ainda viveu como as famílias medievais, com as crianças
afastadas da casa dos pais por quase mais um século. Com o passar do tempo, o
“sentimento de família” e, uma outra face que o acompanha, o “sentimento da
casa” (Ariès, 1978: 271) estende-se a toda a população e a família com sua vida
particular influencia os costumes contemporâneos.
A evolução histórica da família brasileira é ricamente apresentada por
Costa (1983), partindo da época colonial (1530), passando pela chegada da
família imperial (1808), pela proclamação da independência (1822) e pela
formação da burguesia. Nessa retrospectiva histórica, a referência central é o
médico higienista, que lutou para se afirmar com um status diferenciado de outros
“profissionais” que cuidavam de problemas de saúde (cirurgião-barbeiro e os
práticos da medicina popular – “jesuítas, pajés, curandeiros, entendidos, etc.”)
(idem, ibidem: 74). Esses médicos têm um papel relevante na transformação da
família colonial para a família burguesa.
Durante o Brasil colônia, o patriarca tinha um “direito esmagador” sobre a
mulher e os filhos, baseado na ética religiosa e na posse da terra.
A família colonial fundou sua coesão num sistema piramidal cujo topo
era ocupado pelo homem, em sua polivalente função de pai, marido,
chefe de empresa e comandante de tropa. (...) Os demais membros do
grupo ligavam-se mutuamente e ao pai, de modo absolutamente
passivo. (...) O pai representava o princípio de unidade da propriedade,
da moral, da autoridade, da hierarquia (..) A decorrência deste estado
13
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
de coisas era o afastamento emocional do homem para com o resto da
família. Quanto mais distante e inacessível, tanto mais autoridade
possuía. (Costa, 1983: 95)
A chegada da corte portuguesa muda toda configuração social e o status
das famílias. A classe dominante que estava restrita aos grandes latifundiários,
passa a ser constituída por “aristocratas portugueses, comerciantes, políticos e
diplomatas estrangeiros, literatos e artistas (...)” (Costa, 1983: 104). O que
ocasionou uma grande mudança na sociabilidade: importância das aparências,
das festas e reuniões burguesas.
Ser rico ou aristocrata não assegurava incondicionalmente ao jovem o
casamento mais vantajoso. O bom não contentava, procurava-se o
melhor. A aparência física, as boas maneiras, o requinte na educação, a
sofisticação do gosto, etc., ingressaram na contabilidade do poder,
quase em pé de igualdade com o dinheiro e os títulos de nobreza.
(Idem, ibidem: 107)
Essa transformação social na importância do capital cultural e social
(Bordieu, 1998) teve impacto direto nas famílias. Os atributos do indivíduo
passam a ser tão importantes quanto aos das famílias e as mulheres tiram
proveito da “crise de poder do patriarca colonial” para ocupar um espaço melhor
na configuração familiar (Costa, 1983: 108).
Nesse ponto, o médico higienista, muito habilidosamente e por
contingências sociais, passa a ter papel de destaque – o de “novo herói
disciplinador dos costumes e único capaz de solucionar a crise doméstica” (idem,
ibidem: 109). O médico, por meio de acrobacia verbal, exerce controle, distribui
responsabilidades e proibições para as famílias. De família colonial, passa-se à
família colonizada. No campo político, em convergência com os interesses dos
governantes, a falta de patriotismo é denominada deficiência moral.
Em meio a esse processo, o autor aponta uma grande violência praticada
pelos médicos higienistas – a estigmatização dos negros, por considerá-los
empecilho ao projeto higienista e resistentes ao poder normalizador.
14
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
De ‘animal’ útil ao patrimônio e à propriedade, ele tornou-se ‘animal’
nocivo à saúde (...) fonte de doenças orgânicas (...) produtor de defeitos
morais (...) causa de prostituição (...) desregramentos morais e sexuais.
(Costa, 1983: 121)
Esta injustiça social possivelmente teria contribuído para a constituição das
desigualdades de condição social das classes populares.
A idéia de infância que permanece até nossos dias tem início
simultaneamente ao sentimento de família, valorizado pelas instituições
(principalmente a Igreja). Surgem do mesmo processo pelo qual se desenvolveu o
sentimento de classe social da burguesia ascendente.
A sociedade não é uma entidade uniforme e imutável. Pelo contrário, é
constituída por pessoas agrupadas em diferentes classes. Os critérios para esses
agrupamentos podem ser: poder político, poder econômico, acesso a direitos e
privilégios, traços culturais. Além disso, uma visão dialética da evolução das
sociedades mostra que os arranjos dessas condições e forças variaram muito ao
longo da história, em razão de interesses, conveniências e pressões. E nesses
contextos, as concepções relacionadas à educação também variaram: o conceito
de infância, organização e mecanismos sociais para a socialização da criança e
os papéis de cada agente (família, escola, estado) no processo de socialização.
Para analisar os graves e complexos problemas da educação das classes
populares brasileiras é importante compreender criticamente à evolução das
condições sócio-político-econômicas nas quais estas classes tentam sobreviver
e/ou superar. As vítimas desses problemas – os educandos e as famílias das
classes populares – acabam sendo culpabilizados, conforme a visão que se tem
da educação. De algum modo as seguintes visões culpam a vítima. A visão
individualista valoriza a competência e competição entre os melhores, mais aptos
e com maior acesso a recursos. A visão culturalista atribui à classe ou meio de
origem o principal fator do fracasso. Para a visão biológica ou naturalizada, as
dificuldades das crianças são devido a deficiências físicas. Segundo uma visão
idealizada, a sociedade é harmônica e dá oportunidades iguais para todos, mas
elas não conseguem em virtude de suas deficiências.
15
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Na sociedade contemporânea (capitalista, globalizada) a escola e seus
agentes (educadores, professores e administradores) têm como um dos seus
papéis o de legitimar a reprodução das classes sociais, justificando a lógica da
dominação e das exclusões. Segundo esta lógica, a escola se apresenta para
promover a socialização (aquisição das habilidades e regras valorizadas e
necessárias para conviver em determinada sociedade), dar a escolaridade que
propiciaria ascensão social (o termo da moda é empregabilidade). Caso algum
educando não consiga, ou não colabore neste processo, a culpa é sua, ou da sua
família, ou do seu meio.
A escola ocupa uma incômoda posição de ambivalência: vocação e
discurso voltados para libertação, mas uma prática que reforça a alienação; busca
promover a conscientização, porém desestimula a reflexão crítica, defende e
transmite valores de uma classe da qual o próprio professor está excluído.
As concepções “criança como ser natural” e “condições sociais de ser
criança” retratam a clássica polêmica entre natural e cultural (social), enquanto
fundamentos para explicar a gênese e formação das algumas condições humanas
e sociais. A concepção de “criança como ser natural” tem base biológica, por
conseguinte seria uma condição que sempre existiu de uma determinada forma e
que deve ser aceita como inevitável. Segundo Charlot (1979), a criança é vista
modernamente como “um ser usualmente definido pelo que tem de contraditório:
inocente e má, imperfeita e perfeita, dependente e independente, herdeira e
inovadora” (idem, ibidem: 111). A naturalização destas polaridades reduz a
condição da infância a uma mera questão de “auxiliar a criança no seu processo
de assimilação das normas e penalizar aquelas que as recusam”. Por trás dessa
concepção existe a suposição de que todas as crianças são iguais ou, senão, são
anormais. Nessa visão a condição sócio-histórica não é considerada.
Por outro lado, a concepção que leva em conta a “condição social de ser
criança” (Charlot, 1979: 111) considera fatores sociais como determinantes. A
condição sócio-histórica (um momento e uma situação determinada) faz toda a
diferença, inclusive no desenvolvimento biológico da criança. A própria questão
da educação sofreu profundas alterações ao longo do tempo, à medida que a
16
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
classe dominante passou da aristocracia feudal para a burguesia, provocando
mudanças na estrutura familiar (de comunitária para nuclear e mais fechada) e no
formato e na responsabilidade pela aprendizagem social das crianças (das formas
comunitárias para o convívio restrito da família e da escola). Essa condição da
família, atualmente vigente, embora fortemente determinada pelos fatores
históricos, passou a ser considerada como um modelo “eterno, universal e
natural.” Nesse modelo a criança “é marginalizada econômica, social e
politicamente” (idem, ibidem: 111).
Lahire (2004), analisando as condições sociais das crianças e das famílias
das classes populares contemporâneas, faz ressalvas à concepção ambientalista
que adota noções como contexto, ambiente, sociedade, estrutura (idem, ibidem:
348), de um modo reificado (abstratos e separados dos indivíduos isolados).
Lahire compreende que somos seres sociais vivendo em permanente condição de
interdependência, especialmente nos casos de aquisição da linguagem, do
capital cultural e da escolarização. Não se trata, nesses casos, de meras
transmissões unidirecionais, pois os agentes destinatários (criança aprendiz) têm
papel relevante na construção e elaboração do próprio domínio lingüístico, escolar
e cultural – disposições sociais, maneiras de ver, sentir, agir, esquemas,
comportamentais e mentais (idem, ibidem: 340). Por outro lado, por conta dessa
condição de interdependência, as crianças das classes populares estão mais
sujeitas aos fatores perturbadores que podem prejudicar a escolarização.
Esses elementos perturbadores podem ser de natureza extremamente
variada: nascimento ou morte de um irmão ou de uma irmã, que
provoca a modificação temporária ou permanente da economia dos
laços afetivos no seio da família, um desemprego que acarreta
modificações de comportamentos, um início de trabalho de uma mãe
que até então estava em casa, saída de um irmão mais velho ou de
uma irmã mais velha da família, um divórcio que modifica as situações
habituais de socialização (...) qualquer acontecimento que venha a
transformar a estrutura de coexistência familiar pode fazer com que tudo
o que tinha sido adquirido com dificuldade possa ser reconsiderado.
(Lahire, 2004: 347)
17
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Como diz Miranda (1989: 128), “não existe, portanto, uma natureza infantil,
mas uma condição de ser criança, socialmente determinada por fatores que vão
do biológico ao social, produzindo uma realidade concreta”.
Os conceitos sobre infância obtidos pelos pais, por influência da Biologia e
da Psicologia, têm um viés naturalizante, ou seja, reduzem as características da
criança e dos pais a condições naturais e instintivas e, assim sendo, tais
características seriam universais, teriam sido sempre assim, excluindo as
influências do caráter histórico e de construção social. Fenômenos reduzidos a
explicações naturais não podem nem devem ser mudados. Essas concepções
acabam determinando as expectativas e ações de agentes em educação.
A concepção de família é uma construção social, tanto que, segundo
Szymanski, podemos ter em mente dois modelos de família – a “família pensada”
(idealizada e verbalizada, segundo expectativas sociais) e a “vivida” (com
características concretas, nem sempre reconhecidas e admitidas).
A função socializadora e educacional da família, isto é, transmissora de
valores, saberes e hábitos culturais é muito diferente hoje de como foi até o
século XVI
7
. Antes, estas funções eram mais coletivas e à medida que foi
predominando o modelo de família burguesa, tornou-se cada vez mais nuclear.
Esse modelo de referência – patriarcal, homem racional e supridor; mulher
instintiva, emocional e “rainha do lar” – é usado como um padrão de avaliação e
as famílias que não conseguem adotar esse modelo ou escolhem arranjos
alternativos são tidas como “desestruturadas”.
Szymanski defende que a superação dos problemas crônicos em educação
na classe popular requer revisão de tais concepções e observa ainda que haja
maior aproximação da realidade concreta.
A compreensão da relação família-escola é ampliada e aprofundada por
Szymanski com a proposta de uma visão dialética, que vai além do senso
estabelecido sobre a infância e sobre os papéis e condições dos dois agentes
educadores – pais e professores. A despeito de saberes pragmáticos que devem
7
Como descrito nas considerações sobre família, página 12 desta dissertação.
18
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
ser valorizados pelos professores, os pais necessitam muito de formação
suplementar, o que pode ser exeqüível em uma relação de parceria escola-
família. “Na família, como ‘lócus’ educacional, também podem estar se formando
históricos e transformadores – sujeitos da procura, da decisão, da ruptura, da
oposição”. (Szymanski, 2000: 15).
Não se pode, com isso, minimizar as atribuições da família no contexto
educacional e até de aprendizagem, pois as primeiras experiências são nela
vivenciadas. Desde o nascimento lhes são atribuídos padrões comportamentais,
quer de costumes, quer de hábitos.
Na concepção de Freire, sendo a educação um processo que visa à
humanização, ela só pode se realizar através de práticas humanizadoras. É neste
sentido que ele aponta o diálogo como elemento essencial para o processo de
aprendizagem e afirma: “É a partir do diálogo estabelecido com o outro
representado pela cultura que o homem constrói a sua humanidade”. Por esse
motivo é que, para Freire, o vetor do processo de desenvolvimento segue do
social para o individual, o que implica a suma importância do engajamento do
contexto familiar.
Relação família-escola
“Neste lugar de encontros não há sábios ou
ignorantes. Há homens que, em comunhão,
buscam saber mais.”.
Paulo Freire
Nós, nascidos no século XX, fomos socializados e formados com idéias
tidas como verdades universais e ontológicas e por isso não questionadas. Essas
“verdades” resultam em desdobramentos dentro de certa lógica: a infância, um
fato natural, a sociedade regida pelas forças competitivas (é natural, justo e lógico
que vença o melhor e o mais forte), a exclusão é culpa dos excluídos
(incompetentes); a escola tem o papel de socializar de uma forma tida como a
melhor e única, preparando a criança idealizada (abstrata) para viver em uma
19
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
sociedade harmônica (conflitos de interesses e diferenças nas possibilidades e
direitos são negados, dissimulados ou distorcidos). A concepção naturalista é um
dos pilares que sustenta esta distorção, daí a importância fundamental de
questionar, problematizar e criticar tal construção. A concepção de que a
realidade é uma construção social possibilita enfrentar dialeticamente as
ambivalências, conscientizar do mal-estar e limitações, para então construir
coletivamente alternativas de saída, ainda que gradativas.
Miranda (1989: 133) apresenta alternativas de saída e uma delas refere-se
às indicações que propõe à escola, por intermédio de ações que proporcionem
uma educação que “deverá facilitar a apropriação e valorização das
características sócio-culturais próprias das classes populares”. Para isso, “garantir
a aprendizagem dos conteúdos essenciais da chamada cultura básica” fazendo
síntese das ações anteriores, “crítica dos conteúdos ideológicos propostos pela
cultura dominante e a reapropriação do saber que já foi alienado das classes
populares pela dominação” e, assim, passar a contemplar os interesses das
classes populares, e a considerar a realidade do educando e sua família.
Para Freire (1999: 136) a relação família-escola precisa iluminar-se na
seguinte fala: “aceitar e respeitar a diferença é uma dessas virtudes sem o que a
escuta não se pode dar (...). Sobretudo me proíbo entendê-los. Se me sinto
superior ou diferente, não importa quem seja, recuso-me a escutá-lo ou escutá-la.”
Paulo Freire defende que o problema central do homem é o de não assumir
sua dignidade enquanto homem, de deter uma cultura que lhe é própria e que é
capaz de fazer história. Quando o homem puder compreender que a vivência de
suas experiências diárias é fundamental ao processo de trabalho coletivo e
solidário que pode ser realizado com sucesso ao ser compartilhado com a escola,
certamente haverá menos resistências e muito maior participação das famílias.
Embora o enfoque mestre da abordagem de Freire seja referente à escola,
ressalta sempre o valor desta questão familiar. Ele acredita que a motivação
interna à participação e aproveitamento é muito maior quando o assunto é de
domínio, pois, assim sendo, inspira confiança e gera abertura ao diálogo.
Sua visão é persistente quanto a valores de justiça social. Demonstra
fraterna dedicação à conquista das equivalências. Acredita no diálogo
20
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
participativo como pilar de uma educação transformacional que permita o
engajamento do homem em sociedade, livre de “pré-conceitos”.
A participação das famílias na estrutura administrativa da escola deve ser
estimulada, a fim de descentralizar o poder. Uma participação político-
democrática da comunidade contribui com o exercício da cidadania. Quanto maior
for a aproximação com a família, maior e melhor serão as relações sociais com a
escola. Paulo Freire chama a atenção para as múltiplas exigências que se
colocam para os professores no sentido de construção de um trabalho que
promova a cidadania de educadores e educandos.
De Paro (1993: 34) vem uma sugestão para a instalação de processos
eletivos para a escolha de dirigentes, por representatividade dos corpos docente,
discente e pais integrados por meio de associações afins.
- Quando se busca um novo modelo para a operacionalização do
trabalho pedagógico, contribui-se inevitavelmente, para o exercício da
cooperatividade, solidariedade, reciprocidade e cumplicidade, pondo
abaixo os confrontos de interesses e controle hierárquico.
- Quando há resistências para a instalação da proposta, fica explicitada
a origem de uma comunicação interna antiquada, verticalizada e
fechada para a descentralização.
Muitos são os fatores que devem ser considerados para que haja
condições de um relacionamento integrativo entre família e escola, sobretudo
quando temos como pano de fundo uma sociedade desigual, quer cultural, quer
economicamente. Em estudo semelhante, Szymanski (2003) destaca a
importância da aproximação escola-família, inicialmente, pelo simples motivo de
se conhecer, mutuamente, objetivos, conteúdos, metodologia e emoções. Propõe
a horizontalização da comunicação, para que a aproximação entre as partes seja
real, produtiva e, sobretudo, eficaz (idem, 1997).
Importante ressalvar que todo esforço de integração e parceria com a
comunidade não deve provocar confusão de papéis. Como coloca Szymanski
(1997: 223), nota-se freqüentemente uma confusão quanto a quem cabe a
21
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
educação das crianças e quais aspectos são específicos de cada instituição.
Algumas professoras queixam-se que as famílias delegam a elas toda a educação
dos filhos e, com razão, sentem-se sobrecarregadas e mesmo incapazes de
realizar tal tarefa. Algumas vezes as famílias sentem-se desautorizadas pela
professora, que toma para si tarefas que são de competência da família.
Nessa mesma direção, Reali e Tancredi (2002: 75) colocam que:
a escola, as famílias e as comunidades podem partilhar a
responsabilidade pelo sucesso acadêmico dos alunos, mantendo-se as
especificidades dos papéis de cada um dos sujeitos dessa interação.
Num de seus estudos, Freire concluiu que o importante é a comprovação
de que os alunos, quando chegam à escola, também têm o que dizer, e não
apenas escutar. Sempre se preocupou com a educação das classes populares,
incluindo o diálogo e o contato com a realidade do aluno.
Já Nicolau (2002: 120), ao abordar a importância da pré-escola para o
desenvolvimento infantil defende que “aproveitar as opiniões emitidas pelas
famílias, trocar idéias com elas, constituem estratégias adequadas à integração
da criança à pré-escola. O diálogo é a melhor estratégia para que isto ocorra.”
Dentre os diversos desafios da pré-escola está a descontinuidade entre os
valores, forma de viver e de comunicar das crianças e aqueles trabalhados pela
pré-escola. Para tanto, a autora defende que “uma difícil continuidade deve ser
buscada sempre entre a cultura original da criança e a cultura na qual ela irá
viver. E a participação das famílias precisa ser mais ativa no processo
educacional dos filhos” (idem, ibidem: 120).
A superação dos desencontros entre a escola e as famílias poderá ocorrer
mediante a construção coletiva de uma nova cultura escolar, aqui compreendida
como um complexo de padrões de comportamentos, crenças, valores, materiais
coletivos característicos de um grupo.
Em termos educacionais, a proposta de Paulo Freire é antiautoritária.
Defende que professor, aluno e seu ambiente (físico e social) devem engajar-se
22
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
num diálogo permanente caracterizado por seu “relacionamento horizontal”, sem
hierarquia. Acredita que quando o aprendizado incluir o conhecimento das
experiências diárias das famílias tornar-se-á uma relação pedagógica mais
fecunda (Freire, 1999).
Existe possibilidade de sucesso escolar, mesmo em famílias de classes
populares, cujos pais são analfabetos, com pouco capital cultural. Confirmando as
concepções de Paulo Freire, a pesquisa de Lahire (2004: 343) comprova que
essa possibilidade existe e identifica a forma de convivência dessas famílias. Elas
conseguem realizar a “integração social e simbólica da experiência escolar” por
meio do diálogo (escuta atenta, questionamento interessado, compartilhamento
de experiências novas – portanto, perturbadoras – para a criança) e
reorganização de papéis domésticos (à “criança letrada” cabe ler
correspondências, explicar o conteúdo, preencher documentos, escrever bilhetes,
consultar lista telefônica, apoiar escolaridade de irmãos menores, etc.). Mesmo
reconhecendo sua inferioridade, esse pai analfabeto age no cotidiano com
atenção e interesse – atitudes que demonstram aos filhos que o que aprendem na
escola tem sentido e valor, atribuindo assim um lugar simbólico e legítimo ao
“escolar” na configuração familiar. Outro ponto destacado em Lahire (idem,
ibidem: 20) é a importância de se associar a prática da leitura com manifestações
de afeto da família.
Abordar a relação que as famílias mantêm com a escola é – como
Nogueira, Romanelli e Zago (2003: 9) relatam – algo que ainda não possui uma
tradição de estudos no Brasil. No levantamento que fizeram, nas décadas de
1980 e 1990, em periódicos científicos de circulação nacional na área de
Educação ou de áreas afins, encontraram três artigos sobre um total de 37 que
tratavam da família em suas relações com a vida escolar dos filhos.
A pesquisa brasileira, segundo Spósito (1992: 9), dirige suas preocupações
para os processos mais globais das ações educativas e para as políticas estatais
sem dar atenção devida aos estudos sobre a família, categoria contida dentro do
conceito de comunidade.
23
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Thin (2006: 20) vai além e na sua pesquisa sobre a relação família-escola
adota uma abordagem efetivamente interdisciplinar.
Tratava-se de escapar das sociologias setoriais, das divisões em
campos subdisciplinares que, em geral, correspondem a divisões
institucionais (família, educação, escola, linguagem), para estudar
processos que atravessam diferentes instituições, diferentes grupos
sociais, diferentes espaços.
Revisão de literatura sobre a relação família-escola
Buscando sintetizar de um modo didático o levantamento da literatura a
respeito do tema, optou-se por agrupar as contribuições dos autores em quatro
categorias: 1) as contribuições que mostram os benefícios produzidos por uma
boa relação escola-família; 2) as contribuições que apontam as dificuldades e
obstáculos para se construir ou manter um bom relacionamento, 3) as
contribuições que propõem meios alternativos para se construir o bom
relacionamento e, 4) as contribuições de pesquisadores críticos que podem
propiciar um alargamento da compreensão, superando o senso comum ou
“mitos”.
Em relação aos benefícios produzidos por uma boa relação escola-família,
pode-se encontrar uma mudança positiva na atitude dos pais com a escola
(Bhering e Siraj-Blatchford, 1999; Cyster et al, 1979; Dauber, 1993; Epstein, 1986;
Jowett, 1991, 1988; Smith, 1980; Wolfendale, 1992, 1983).
Uma pesquisa realizada no Brasil em 2002 pela Unesco (2004: 119, apud
Paixão, 2006: 59) buscou levantar a opinião de cinco mil professores (escolas
públicas e particulares) de 27 unidades da federação. O fator apontado pelos
professores como o mais importante para a aprendizagem dos alunos foi o
Acompanhamento e apoio familiar” (78,3%), seguido de longe por outros fatores:
“Relação professor/aluno” (53,9%), “Competência do professor” (31,9%), “Infra-
estrutura, equipamento e condições físicas da escola” (14,8%), “Gestão da
escola” (9,7%) e “Nível econômico e social da família do aluno” (7,1%).
24
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Contribuiria também com este objetivo, a mudança positiva de atitude dos
pais em relação ao próprio filho (Bueno e Garcia, 1996; Coelho, 1994; Dauber,
1991; Fernandes, 2001; Kreider, 1988; Sipavicius, 1992; Szymanski, 1994).
A criação de relacionamento de solidariedade e parceria (Szymanski, 1994;
Zanella et al, 1997) também contribui para a promoção da transformação social,
influenciando na política educacional (Carvalho, 1989; Zanella, 1997) e
proporcionando visível melhoria de comportamento do aluno (Fernandes, 2001;
Nakayama, 1996; Nogueira, 1998; Vasconcelos, 1995).
Quanto às dificuldades e os obstáculos para o bom relacionamento,
levantados pelos diversos autores, pode-se destacar a desvalorização
profissional. A escola moderna inicialmente foi concebida para a classe média,
mas à medida que teve o seu atendimento ampliado a uma população que foi
crescendo desregradamente, quer em número, quer em renda, perdeu a
capacidade de manutenção da qualidade e essa degeneração comprometeu as
condições de trabalho do professor.
Os desdobramentos do processo de democratização do acesso à escola
(“escola para todos”) sem a devida preparação e suporte à sua implantação,
jogando toda a responsabilidade nas mãos da escola, também demonstrou certa
involução. Sem negar a validade do objetivo final, que é promover o acesso e
reduzir a evasão, tem sido muito danosa à situação de crianças com dificuldade
de aprendizagem que vão se acumulando em classes superlotadas. Esses maus
resultados escolares acabam sendo geradores de tensões e antagonismos entre
professores e família (Gomes, 1995; Carvalho, 1989).
Existem divergências nas expectativas da escola e da família quanto a
papéis e responsabilidades de cada um, resultando na possibilidade de um relacio-
namento tenso e conflituoso (Elkin, 1968; Ariès, 1978; Carvalho, 1989; Dias, 1992;
Gomes, 1993; Cunha, 1996; Zanella, 1997; Casas, 1998; Bhering e Siraj-Blatchford,
1999; Chechia e Andrade, 2002; Grünspun e Grünspun apud Chechia, 2002).
O preconceito de uma parcela de professores acaba gerando situações de
isolamento, distanciamento e até desconhecimento do cotidiano das famílias por
25
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
parte do professor (Zanella et al, 1997; Gomes, 1995; Carvalho, 1989; Campos,
1982). Alguns professores argumentam que os próprios pais subestimam a
importância que educação tem para seus filhos. Contrariando estes preconceitos,
algumas pesquisas revelam que existem pais que valorizam e lutam por escola
(Campos, 1982; Spósito, 1984; Carvalho, 1994). Outras pesquisas relatam que os pais
desejam ter acesso às informações pedagógicas (sala de aula, funcionamento geral)
sobre o filho (Bhering e Siraj-Blatschford, 1999; Mizukami et al; 1998).
É bem verdade que há casos de dificuldade e limitações dos pais: baixo
nível de escolaridade, inexperiência em participação, indisponibilidade de tempo,
a diferença de hierarquia entre professores e pais, as diferenças de classe social
(Bueno e Garcia, 1996; Carvalho, 2004, Chaves e Barbosa, 1998; Coelho, 1994;
Ehrlich, 1985; Falcão Filho, 1989; Fraiman, 1997; Lareau, 1987; Maldonado, 1991;
Minervino, 1997; Mitsch, 1996; Pinto, 1985; Pinto e cols, 1994; Pinheiro apud Ferraz,
1980; Reali e Tancredi, 2001; Sena, 1991; Sipavicius, 1992; Smolka, 1989; Szymanski,
1994; Troppmair, 1996; Valente, 1993), mas, nessas nada é mais grave do que o
professor que vê a participação da família como ameaça a sua autoridade ou
interferência indevida no trabalho pedagógico (Carvalho, 2004; Epstein, 1990).
Numa época de multiplicidade na constituição das próprias famílias,
acabam sendo geradas dificuldades relacionadas às mudanças sociais do fator
gênero: divisão de responsabilidades entre pai e mãe, mãe chefe de família que
trabalha e cuida sozinha do filho (Carvalho, 2004; Sigolo e Lollato, 2001; Zanella
et al, 1997).
A partir da obtenção de tais informações, passam a existir propostas de
alguns autores no sentido de se construir e manter um bom relacionamento.
Sugerem que haja um movimento inicial da escola incentivando a participação
dos pais (Paro, 2000; Carvalho, 1989; Passos et al., 1988; Epstein, 1986). Para
outros, promover esse estreitamento e aproximação relacional não deve ser visto
apenas como uma opção extra (Pinheiro apud Ferraz, 1986; Smolka, 1989;
Mizukami et al., 1998).
A escola deve criar condições para a aproximação (Paro, 2000; Bastiani,
1993; Silva et al., 1995), deve buscar conhecer melhor e concretamente a
26
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
população atendida, seus familiares, o bairro onde vivem (Gomes, 1995, 1994). O
professor, representando a visão da escola, pode e deveria mudar sua visão e
atitude preconceituosa ou indevidamente generalizada sobre o aluno/família
(Lareau, 1987, Reali e Tancredi, 2001), se não por iniciativa própria, ao menos
recebendo preparação para desenvolver competência para melhor promover a
aproximação (Lareau, 1987, Reali e Tancredi, 2001).
É preciso também que se ressalte o papel das organizações comunitárias
(APM, CE, SAB); as mediações institucionais (Zanella et al. 1997),
proporcionando estreitamento de relações ao favorecer a participação dos pais na
gestão e no projeto pedagógico (Epstein, 1987; Paro, 2000).
Completando a revisão de literatura, são apresentadas as contribuições
dos pensadores críticos.
Um das questões apontadas é a da identificação das profundas diferenças
entre professores e famílias de classes populares, importantes para compreender
as raízes das tensões e mal-entendidos. A relação família-escola deve merecer
um olhar mais atento (crítico), procurando se avançar além do “óbvio e
natural”, que normalmente representa apenas a perspectiva do professor
(Paixão, 2006: 57).
Em geral, o professor é percebido como um membro da classe média ou
pequena burguesia assalariada e dominante no espaço social escolar; os pais dos
alunos são membros de classes desprovidas de status e qualificação e são os
dominados no espaço social escolar (Thin, 2006: 17). Os professores têm domínio
da linguagem escolar, das regras operacionais e da lógica escriptural-teórica; os
pais têm fraco ou nenhum domínio da linguagem e recursos escolares, não
dominam as regras operacionais, mas devem tentar participar do jogo, e usam
uma lógica oral-prático (Lahire, apud Thin, 2006: 25). O professor conta com
algum “professor oculto” na família, supondo que os alunos “continuem, em casa,
o trabalho pedagógico que vem desenvolvendo”; em geral, as famílias não
dispõem de ninguém preparado ou com tempo para desempenhar esse papel, e
nem de dinheiro para pagar por esse serviço (Paixão, 2006: 59). O professor
segue a lógica do modo escolar de socialização, na qual o espaço pedagógico é
27
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
isolado da vida social comum, o aprendizado ocorre separado da prática,
ensinam-se procedimentos intelectuais abstratos, com “objetivos mais distantes,
mais gerais ou mais universais” que são possíveis no médio e longo prazo; o
modo de socialização segundo a lógica popular ocorre em espaço não-
pedagógico, confunde com a vida social comum, o uso do tempo e espaço é mais
espontâneo, aprende-se praticando, participando das tarefas cotidianas, imitando
os adultos e a lógica predominante é o da operacionalidade prática e imediata
(Thin, 2006: 38). Para os professores, quando as práticas decorrentes da lógica
popular são diferentes do “normal e esperado”, são consideradas inadequadas,
aumentando o sentimento de desqualificação dos pais (idem, ibidem: 19). Para os
professores, quando os pais não são “vistos” no espaço escolar, são
categorizados como “omissos”, “indiferentes”, “não interessados”, e nos casos de
dificuldade escolar, essa omissão explicaria o fracasso escolar. A pesquisa de
Lahire vai contra essa afirmativa, demonstrando que os pais são interessados e
que a simples presença dos pais na escola não garante o sucesso escolar. A
omissão parental é um mito construído pelos professores (Lahire, 2004: 334).
Outra fonte freqüente de tensão e mal-entendido entre professor e a família é o da
autoridade e aplicação de sanções. O educador em geral busca que a criança
atinja a autonomia – capacidade “de se comportar por conta própria em
conformidade com as regras e as normas da vida escolar e social”. (Vincent,
1994, apud Thin, 2006: 36). Pelo lado dos pais, o controle dos comportamentos
se dá pela vigilância direta, com os pais fisicamente presentes. Alguns limites são
fixados, são “pouco negociáveis e fora desses limites concedem toda liberdade”.
Em caso de transgressão, as sanções são “aplicadas diretamente ao ato
repreensível ou reprovado e tem como objetivo primeiro interromper o ato”. Muitos
pais inclusive concedem aos professores esse poder para aplicar castigo. Esse
modo de proceder choca com a concepção de autonomia do professor, que
desqualifica os pais, ao mesmo tempo como “muito autoritários e severos”, “muito
permissivos” e prejudiciais à “autonomia” do aluno. (Thin, 2006: 35). Essas várias
diferenças provocam mal-entendidos e tensões estruturais, que não podem
ser resolvidos apenas com esclarecimentos (Thin, 2006: 31) ou
simplesmente, fazendo com que os pais passem a ser mais visíveis na escola
(Paixão, 2006: 57).
28
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Outra questão identificada entre os críticos é a das menores aspirações
das famílias populares em relação ao futuro. Enquanto as famílias de classe
média vêem a escolarização, incluindo o curso superior, como meio de ascensão
social, as famílias de classes populares “têm aspirações estritamente limitadas
pelas oportunidades objetivas (...) pela estatística intuitiva das derrotas e dos
êxitos parciais”. “Isso não é para nós” (Bordieu, 1998: 46). Essas famílias buscam
apenas oportunidades de “escapar de atividades duras e pouco valorizadas que
realizam” (Paixão, 2006: 71), porém isso não significa falta de interesse na
escolarização dos filhos.
A terceira questão refere-se ao capital cultural (produtos escolares, bens
culturais e simbólicos) disponível à criança cotidianamente e o seu peso no
sucesso escolar ao longo de todo processo escolar e universitário. Faz parte do
capital cultural o domínio lingüístico ou “práticas linguageiras”, uma ferramenta
importante não apenas na escolarização, como também em outros setores
sociais, pois a sintaxe possibilita o “deciframento e a manipulação de estruturas
complexas”. Para Bordieu (1998: 41), como o capital cultural é transmitido de
maneira osmótica, indireta, sem muito esforço deliberado é confundido com um
“dom”, e assim é usado para justificar diferenças de mérito e desigualdade de
oportunidades. Entretanto, ele é produzido e transmitido em condições sociais
restritas e este fato produz “desigualdades de destino escolar”.
Pelo levantamento efetuado pôde-se perceber que a relação escola-família
é um tema complexo, por envolver diferentes variáveis e parâmetros que exercem
diferentes impactos, dependendo do momento histórico. (Lareau 1987; Reali e
Tancredi, 2001; Sigolo e Lollato, 2001).
Assim sendo, não tem sentido pretender traçar um diagnóstico único ou
construir um modelo único, generalizável, pois cada unidade escolar, cada
professor, cada família tem sua especificidade (Szymanski, 2000). Podem ocorrer
diversos níveis de participação, desde o simples comparecimento às reuniões
convocadas até a participação na gestão. Portanto, este trabalho busca
aprofundar a compreensão deste complexo problema, por meio de uma pesquisa
em uma escola da periferia de São Paulo.
29
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Articulando e refletindo sobre os diversos estudos, identifiquei uma lacuna
fundamental no saber sobre a relação família-escola: a compreensão qualitativa
desse vínculo, nas suas especificidades. Conforme sustentam os autores
apresentados na revisão bibliográfica, a relação entre a escola, representada
especialmente por seus dois principais atores – dirigentes e professores, e a
família dos alunos – os pais, a mãe, o pai ou o responsável, é um dos fatores
importantes para a melhoria da qualidade do ensino. Entretanto, em obras
recentes os autores desta área afirmam que existem poucas pesquisas sobre este
assunto (Nogueira et al., 2003; Bhering et al., 1999; Zanella et al., 1997; Spósito,
1992; Romanelli, 2004).
Depreende-se, a partir do que foi exposto, que este projeto pode contribuir
para reduzir essa carência, articulando conhecimentos para aprofundar a
compreensão sobre o problema, indo além dos preconceitos, senso comum e
generalizações.
Neste projeto tem-se a consciência de que o conceito, a condição e os
papéis da família têm mudado ao longo da história. As mudanças
socioeconômicas e os movimentos migratórios têm provocado alterações na
formação do núcleo familiar, nos tipos de vínculo, no papel da mulher, (Carvalho,
2004; Sigolo e Lollato, 2001; Zanella et al, 1997). Carvalho (2004) adverte que
“família e pais não são categorias homogêneas”. Szymanski (2000) aponta para a
“contínua transformação em sua estrutura, organização, crenças, valores e
sentimentos”, compartilhando a idéia de que um critério para caracterizar o núcleo
familiar pode ser o do laço afetivo, mais do que o da consangüinidade (Gomes,
1994; Szymanski, 2000, 1995).
O pai homem
A definição do termo “pais” na grande maioria das pesquisas apresentadas
inclui mãe, pais e todos os outros responsáveis pela guarda legal da criança, mas
isso não implica a participação de pais homens nos estudos, pois neles
prevaleceram mães que costumam ser mais presente na escola, tanto no Brasil
como em outros países.
30
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Romanelli (2004) faz uma interessante revisão de obras da Antropologia
para localizar o papel da cultura na construção da representação da paternidade.
Este estudo embasa a afirmação de que a paternidade é um fato culturalmente
construído e é apenas em parte biológico, portanto variável nos diversos tipos de
sociedades humanas. O autor discrimina os papéis da mãe e do pai na
socialização dos filhos e filhas, na sociedade contemporânea:
os homens têm dificuldade para viver relacionamentos fundados na
intimidade, mas encontram facilidade para incorporar a individuação e a
separação [...],
enquanto que,
para as meninas, o vínculo com a mãe gera apego e relacionamento
íntimo com ela, trazendo como resultado uma dificuldade no processo
de individuação, mas facilitando a empatia e a sensibilidade para a
convivência social [...],
resultando em uma configuração matricentrada, confirmando a tendência de
“agregar e incorporar o marido à família da esposa, em função da proximidade
mãe/filha e da separação mãe/filho”. A pesquisa desenvolvida pelo autor com
famílias de classe média revela que a tarefa de socialização dos filhos “coube,
total, ou primordialmente, à mãe”, contribuindo para identificar um dos fatores que
leva à baixa participação do pai homem nos encontros escola-família.
Esta constatação também é feita por Paixão (2006: 69).
A responsabilidade de acompanhar não apenas os deveres de casa,
mas também o processo de escolarização em geral dos filhos, cabe, na maior
parte dos casos, às mães, às mulheres. Essas tarefas são consideradas
femininas não só pela escola ou pelas famílias, mas fazem parte da
construção do feminino em nossa sociedade. À mulher cabe ocupar-se de
atividades referentes ao cuidado. São raros os pais que assumem como
responsabilidade sua ajudar os filhos nos deveres de casa.
A origem da cultura “machista”, que explica boa parte dessa forma de
dividir os papéis, é localizada historicamente por Costa (1983) na atuação dos
31
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
médicos higienistas, durante o surto da urbanização e crescimento da classe
burguesa. Esses médicos mantinham uma guerra aberta contra três categorias de
homens: os libertinos (“irresponsáveis e abomináveis”, (...) “temerário ao contágio
das doenças venéreas”, (...) que induzem “a esposa ao adultério” e “as filhas à
imoralidade”, (...) dissipador da riqueza pessoal (...) propensos ao roubo,
falsificação de firmas e mesmo de homicídio); os celibatários (párias que
recusavam o casamento enquanto jovens, devido a “paixão desvairada por
prostitutas”, (...) homens que “enlouqueciam mais e viviam menos que os
casados”) e os homossexuais (“execrado porque sua existência negava
diretamente a função paterna”, (...) merecedores do sentimento da repugnância.
Para combater essas anormalidades da natureza masculina, visando ao
cumprimento do “dever de pai, o homem recebeu a autorização para ser ‘macho’”.
Ser homem, segundo os médicos, importava em ser mais sensual e
menos amoroso; mais racional e menos sentimental; mais inteligente e
menos afetivos, etc. (...) A honra e o poder do ‘pai higiênico’ vão
depender, sobretudo da posse da mulher e da respeitabilidade sexual.
(...) o verdadeiro homem era dono da mulher e fiscal dos filhos (...)
ciumento guardião da moral higiênica. (Costa, 1983: 251)
Um aspecto relacionado ao pai, homem que sofre impacto significativo da
escolarização, é o da herança paterna – projeto de uma posição social e
constituição de uma identidade para o filho. Bordieu (1998: 231) identifica uma
transformação importante provocada pela escolarização na instituição da herança
paterna. Antigamente essa era uma “atribuição exclusiva da palavra do pai ou da
mãe, depositários da vontade e da autoridade de todo o grupo familiar”. Hoje a
escola tem o poder de confirmar ou contrariar esse projeto do pai, pois
forçosamente qualquer projeto para o filho passa pela escolarização.
A questão da herança paterna e do capital cultural é ricamente ilustrada
pela análise sócio-psicanalítica feita por Norbert Elias (1995) em relação à vida de
Mozart, juntando a figura do gênio musical com a história de indivíduo fragilizado.
A história da família Mozart – pai (regente substituto de orquestra), a mãe
submissa, filha e o filho, ambos músicos prodígios – numa época (final do século
XVIII) em que a burguesia estava ainda tentando ocupar uma posição
32
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
socialmente relevante na sociedade dominada politicamente pelo absolutismo é
paradigmática para entender a luta desigual entre a classe aristocrática e a
pequena burguesia. O cargo de Leopold Mozart na corte de Salzburgo – um dos
muitos pequenos principados da Áustria – tinha o mesmo status do pasteleiro,
cozinheiro e criado, bastante distante do status das pessoas pertencentes à corte.
“Filho de artesão, ambicioso e inteligente” investiu todas as fichas no filho para
“escapar de uma situação insuportável” (idem, ibidem: 72) e “encontrasse uma
colocação em cortes maiores” (idem, ibidem: 26). Foi um pai possessivo: amigo,
professor rígido, empresário, organizador de eventos, guia de viagens e
controlador dos contatos. O desenvolvimento desse tipo de vínculo foi facilitado
por conta da grande necessidade de amor e afeto do filho. Um forte sentimento de
não ser digno de amor, uma insegurança que acompanhou Mozart por toda a
vida, que resultava em busca de provas de amor, em vulnerabilidade e
dependência de aprovação dos outros. “Uma forte ligação amorosa se forjou
entre ele e o filho, que a cada realização musical era recompensado com um
grande prêmio em termos de afeto” (idem, ibidem: 59). O pai conseguiu organizar
várias e longas turnês (Munique, Viena, Londres, Milão, Paris, Mannheim, etc.)
para exibir as crianças prodígio. Apesar do êxito alcançado – prestígio e contatos
com os maiores compositores da época (enriquecendo o estilo de Mozart), um
razoável e irregular retorno financeiro – resultou em prejuízos para Mozart: piora
da saúde já fragilizada, agravamento da dependência pelo pai especialmente para
os contatos sociais, imaturidade (ilusão) para perceber as possibilidades
concretas da realidade e para lidar com as frustrações. Os Mozarts, pai e filho,
viviam em dois mundos bastante distintos, pequena burguesia, com hábitos pouco
refinados, linguagem de baixo calão, desprezados e desprovidos e aristocracia
ociosa, que buscava na música um mero entretenimento. Ao mesmo tempo em
que odiavam os nobres da corte, desejavam ser tratados como igual. A relação de
dependência era humilhante e despertava ressentimentos, mais no filho que no
pai. O ressentimento intensificou-se quando Mozart teve de romper
definitivamente com o príncipe de Salzburgo e saiu novamente em busca de uma
colocação, ainda com esperanças, e viu-se rejeitado (inclusive pela esposa) e
sem recursos. Morreu aos 35 anos e foi enterrado numa vala comum. A história
da família Mozart e da sua condição social tem muitos pontos em comum com a
33
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
das famílias de classe popular contemporâneas, no que se refere às dificuldades
de acesso a melhores condições de vida e por conseqüência, afetando a questão
da herança paterna, enquanto projeto de vida para o filho.
Zanella et al (1997) destacam que a literatura brasileira, neste tópico, ainda
é escassa e sugerem mais estudos sobre a atuação dos pais. Bhering e Siraj-
Blatchford (1999) estão de acordo com a colocação de Zanella et al a respeito da
escassez de pesquisas com pais homens.
Assim, com base nas declarações de autores e pesquisadores que
apontam a importância da relação família e escola, nas políticas educacionais em
vigor (Leis de Diretrizes e Bases, Referenciais Curriculares) que confirmam essa
relevância e, na minha própria experiência como educadora, surge a minha
indagação básica, relacionada ao tripé pais-escola-comunidade:
O que os pais homens pensam a respeito das suas participações na
escolarização de seus filhos? O que pensam os genitores a respeito de sua
participação na escola?
Este trabalho parte do tema geral relação família-escola e busca pesquisar
em termos mais específicos como é compreendida a participação dos pais,
segundo pais de alunos de uma escola da periferia de São Paulo.
Portanto, este estudo propõe compreender como os homens, pais ou
responsáveis por alunos desta comunidade de periferia compreendem as
iniciativas de participação e integração no processo ensino-aprendizagem. Tudo
que é novo, para chegar a ser confiável, passa por um árduo processo de
descrenças. É necessário empenho e persistência até que alcance a
“acomodação” de institucionalizar-se como “comum”, “habitual”, “praxe”. Assim,
nessa condição de pesquisadora e educadora, apoiada nos fundamentos de
Paulo Freire, pretendo desvelar a questão da atuação integrativa do homem, pai
ou responsável por aluno, na comunidade escolar.
34
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Capítulo 2
O MÉTODO
2.1. OBJETIVO DA PESQUISA
ste trabalho teve como objetivo compreender como os pais ou responsáveis,
homens, compreendem as iniciativas de participação e integração no
processo ensino-aprendizagem. Apoiado nas concepções de Paulo Freire
pretendeu desvelar a atuação integrativa do homem, pai ou responsável por aluno, na
escolarização de seu filho, dentro da comunidade escolar, retomando as indagações
básicas, relacionadas ao tripé pais-escola-comunidade é:
O que os genitores pensam a respeito de participação dos pais homens na
escolarização dos seus filhos? O que pensam os genitores a respeito de sua
participação?
2.2. PESQUISA QUALITATIVA
A questão que se buscou responder: “O que pensam os pais homens a
respeito da sua participação na escolarização de seu filho? O que pensam os pais
a respeito da participação do pai homem na escola?”, e a escolha do referencial
dialógico de Paulo Freire apontaram para uma estratégia metodológica de
natureza qualitativa. Os pressupostos teórico-epistemológicos sobre os quais
assentam a questão e o referencial de análise foram mais orientados para a
compreensão da singularidade das situações estudadas, para a identificação de
diferenças sutis entre situações aparentemente semelhantes. (Hermann, 2003).
35
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Martins e Bicudo (2005: 23) ressaltam a diferença entre uma pesquisa
quantitativa (voltada para fatos, objetividade, rigor estatístico e generalização) e
pesquisa qualitativa (voltada para a compreensão de fenômenos, da subjetividade
e do particular).
Diferentemente da pesquisa quantitativa, a qualitativa busca uma
compreensão particular daquilo que estuda. Uma idéia mais geral sobre
tal pesquisa é que ela não se preocupa com generalizações, princípios
e leis. A generalização é abandonada e o foco da sua atenção é
centralizado no específico, no peculiar, no individual, almejando sempre
a compreensão e não a explicação dos fenômenos estudados
.
Segundo Demo (2002: 134), uma das vantagens do método qualitativo é
que “pode respeitar melhor a realidade, porque a coloca como referência central,
não o método acima da realidade”. Em outro trecho Demo (idem, ibidem: 26)
coloca que, “perde-se a representatividade estatisticamente regulada, mas se
ganha proximidade mais calorosa com o fenômeno”. Esta colocação de Demo
ilustra com muita propriedade a situação desta pesquisa.
Esta posição a favor de uma abordagem qualitativa (etnográfica ou
monográfica) para compreensão de “singularidades e casos particulares” é
reforçada com Lahire (2004: 14).
Nunca devemos nos esquecer que estamos diante de seres sociais
concretos que entram em relação de interdependência específicas, e
não “variáveis” ou “fatores” que agem na realidade social. Não podemos
igualmente perder de vista que as abstrações estatísticas devem
sempre ser contextualizadas (...) levar em consideração situações
singulares, relações afetivas entre seres sociais interdependentes,
formando estruturas particulares de coexistência (“uma família”), em vez
de correlações entre variáveis que são recomposições sociológicas de
realidades sociais (...) desestruturantes demais ou abstratas demais
para compreender certas modalidades do social. (Idem, ibidem: 32)
36
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
2.3. ENTREVISTA REFLEXIVA
O instrumento escolhido para a coleta de dados foi a entrevista reflexiva.
Esta modalidade de entrevista é adequada para nossa pesquisa, pois leva em
consideração:
a subjetividade dos protagonistas [entrevistador e entrevistados],
podendo se constituir um momento de construção de novo
conhecimento, nos limites da representatividade da fala e na busca de
uma horizontalidade nas relações de poder [...] leva em conta a
recorrência de significados durante qualquer ato comunicativo.
(Szymanski, Almeida e Prandini, 2004: 14).
Esta modalidade de entrevista é coerente com o referencial de Paulo Freire
por dois aspectos: a busca de uma relação política horizontal (eliminar a distância
devida às diferenças cultural, social e econômica entre entrevistador e
entrevistado) e por ser simultaneamente uma interação e uma intervenção, na
medida em que a reflexão pode contribuir para uma “tomada de consciência”,
condição imprescindível para a transformação social. Outra qualidade da
entrevista reflexiva é a potencialidade para “aprimorar a fidedignidade [pois
propicia] o movimento reflexivo: o entrevistado pode voltar para a questão
discutida e articulá-la de uma outra maneira em uma nova narrativa, a partir da
narrativa do pesquisador” (Szymanski, 2004: 15).
Martins & Bicudo (2005: 28), ao caracterizarem a pesquisa qualitativa
quanto à forma de coleta de dados e de interpretação, reforçam as vantagens da
entrevista reflexiva:
A forma pela qual os dados são coletados na pesquisa qualitativa é a
comunicação entre os sujeitos e o tratamento dos dados é feito através
da interpretação, compreendida como um modo de ajuizar o sentido das
proposições que levam a uma compreensão ou aclaramento dos
sentidos e significados da palavra, das sentenças e dos textos.
37
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
A escolha de um entrevistador do sexo masculino
Com o objetivo de tornar a comunicação o mais natural possível durante a
entrevista, buscando-se eliminar a distância devido à diferença de gênero entre
entrevistador e entrevistados, por sugestão da banca de qualificação, optou-se
pelo entrevistador do sexo masculino. O entrevistador faz parte do grupo de
pesquisadores envolvido no projeto Diálogo e Participação
8
.
2.4. MODOS DE PROCEDER NO DESENVOLVIMENTO DA ENTREVISTA
Szymanski (2004: 10), com base em experiência própria e de seus
orientandos, apresenta “formatos, modos de proceder e aspectos a serem
observados” no desenvolvimento da entrevista reflexiva. O modo de proceder na
entrevista reflexiva é constituído por alguns momentos: preparação, contato
inicial, atividades de aquecimento, colocação da questão desencadeadora,
colocação pelo pesquisador de questões para refinamento (questões para
confirmar a compreensão do pesquisador, questões para confirmar sínteses,
questões de esclarecimento, questões focalizadoras, questões de
aprofundamento e de devolução) (Szymanski, 2004: 18-57).
a) Preparação
Como a entrevista reflexiva é essencialmente uma atividade de interação
humana que procura ir além de uma entrevista convencional, é muito importante
que o entrevistador esteja preparado para que o momento da entrevista seja
bastante proveitoso e leve a uma melhor fidedignidade possível. Antes de
qualquer coisa, o entrevistador deve ter clareza dos seus objetivos, de quais
informações específicas deseja obter, pois esta consciência é que irá possibilitar
8
Diálogo e Participação: a prática dialógica na família, escola e comunidade. Este programa é um
trabalho amplo que se propõe a implementar e avaliar uma proposta educacional participativa e
dialógica, inspirada nas idéias de Paulo Freire, em diferentes contextos educacionais – escola pública
de ensino fundamental, família, creche, biblioteca e instituição de educação complementar (ONG's
comunitárias) (Szymanski, 2004).
38
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
lidar com situações imprevistas, por exemplo, desvio do assunto/tema,
questionamentos, dificuldades de compreensão da questão.
No caso específico desta pesquisa, o objetivo geral da entrevista com os
pais foi levantar informações a respeito de como esses pais moradores da
periferia compreendem a participação dos pais ou responsáveis homens. O verbo
“compreender” no caso de pesquisa qualitativa tem conotação mais ampla e profunda
que o nível meramente cognitivo ou intelectual. Buscou-se identificar, também, nuance
de natureza sócio-histórica, política, afetiva e existencial, enfim aspectos da realidade
muito difíceis de serem captados e relatados apenas com números.
b) Contato inicial.
A apresentação do pesquisador a cada entrevistado, colocando seus dados
pessoais, da instituição e do tema da pesquisa já contribuiu para o
estabelecimento deste primeiro contato, quando é essencial que, por meio de
uma conversa agradável, estabeleça-se uma relação de confiança. Procura-se
mostrar o cuidado com as questões éticas e a seriedade da entrevista, e solicita-
se a permissão para gravação, assegurando ao entrevistado o direito ao
anonimato (sigilo), ao acesso às gravações, às transcrições e às análises.
Apresenta-se o Termo de Consentimento, explicando os motivos e deixando a
decisão da aceitação e da assinatura para o entrevistado. Também se coloca
para o entrevistado a possibilidade de que ele faça as perguntas que desejar
durante as entrevistas.
c) Atividades de aquecimento
As questões de aquecimento possibilitam o conhecimento mútuo. O
pesquisador criará oportunidade para que o entrevistado possa, num clima
informal, fornecer seus dados biográficos – idade, origem, tempo de residência no
bairro, número de filhos que freqüentam a escola e, entre outros aspectos, se já
participou de alguma atividade nesta escola. Os assuntos destacados, numa
conversa informal, contribuirão para se traçar um perfil do entrevistado e criar um
clima de aproximação.
39
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
d) Questão desencadeadora
A preparação inclui também uma cuidadosa elaboração das questões
desencadeadoras, com várias alternativas de formulações ou fraseamentos para
o caso de se perceber que o entrevistado não compreendeu claramente os
objetivos e o foco da questão geradora. O referencial para formular estas
questões é o objetivo pretendido com as respostas. Para contornar essas
dificuldades, se ocorrerem durante a entrevista, é indicado o confronto gentil e
contínuo de respostas, introduzindo perguntas que desfaçam possíveis
ambigüidades. Evitar perguntas genéricas, pedir exemplos concretos, preparar-se
para interagir com cada entrevistado, procurar informar-se ao máximo sobre as
circunstâncias que cercam o problema, portanto estratégias e procedimentos
cuidadosos para evitar viés na condução da pesquisa.
e) Questões para refinamento das informações coletadas
Ao longo da entrevista, o entrevistador pode recorrer, na forma de diálogo
coloquial, a várias modalidades de questões para refinamento de informações, a
fim de atingir os objetivos pretendidos: questões para confirmação da sua
compreensão; questões para confirmação de sínteses, questões para
esclarecimentos, questões para focalização e questões para aprofundamento. O
uso destas questões, além de demonstrar atenção às contribuições do
entrevistado, abre possibilidades para refutação, correções e, sobretudo,
reflexões. “A compreensão posta na forma de pergunta abre a possibilidade de
diálogo, na aceitação ou não da questão” (Szymanski, 2004: 38).
f) Devolução
Após a transcrição da entrevista e da pré-análise, desenvolve-se um
segundo encontro, que consiste na apresentação dos resultados da entrevista de
um modo organizado e visa verificar a fidedignidade do que foi compreendido pelo
entrevistador e, se pertinente, aprofundar ou esclarecer questões pendentes. Este
procedimento representa mais um cuidado em equilibrar as relações de poder
entre entrevistador-entrevistado. Uma contribuição que geralmente ocorre para o
entrevistado é a possibilidade de reflexão e de sistematização de suas
concepções sobre o tema.
40
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
2.5. CONSTITUIÇÃO DA SITUAÇÃO DE PESQUISA
Conforme apresentado no capítulo anterior, o objetivo da pesquisa foi
aprofundar a compreensão sobre o que pensam os homens, genitores e avôs
responsáveis a respeito da sua participação na escolarização de seu(s) filho(s), e
o que pensam a respeito da participação dos pais (homens) em uma realidade
escolar da rede pública de ensino.
Esta seção descreve a constituição da situação da pesquisa (o contexto e
os participantes), tendo em vista o objetivo acima.
O contexto
Considerando que os entrevistados numa pesquisa fazem parte de um
ambiente social específico, e que o conhecimento das condições concretas desse
ambiente é relevante para compreender a situação dos entrevistados,
apresentamos algumas informações que caracterizam especificamente o
contexto: informações sociais, econômicas e culturais da comunidade e da
instituição.
Iniciei minha aproximação com a comunidade no segundo semestre de
2004, participando da disciplina-projeto. Além das atividades desta disciplina-
projeto do curso do mestrado, aprofundei minha imersão na comunidade por meio
de trabalhos no projeto “Diálogo e Participação – a prática dialógica na família,
escola e comunidade”
9
. Todas essas experiências possibilitaram maior
conhecimento dos contextos da pesquisa, pois várias reuniões ocorreram nas
dependências da escola, da associação de bairro, na quadra da associação de
moradores e congregou representantes de todas as entidades citadas, inclusive
de outras escolas da região.
9
Essa proposta de intervenção está fundamentada no artigo “A família como um lócus educacional:
perspectivas para um trabalho psicoeducacional” (Szymanski, 2000), no qual a autora articula
contribuições da Antropologia e Sociologia (Berger & Luckmann e Canevacci), da História (Ariès), da
Psicologia (Bronfenbrenner) e na Educação (Paulo Freire, During e Gadotti). Szymanski propõe que a
família, tanto no papel de educadora, quanto no de educanda (“objeto de atenção educacional”), seja
campo específico de pesquisa e prática profissional em Educação e Psicologia.
41
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Freire in Brandão (1981: 35) faz uma distinção importante a respeito do
levantamento de dados sobre uma realidade social concreta, segundo uma
abordagem participante (como é o projeto Diálogo e Participação), em
contraposição a uma abordagem que se pretende objetiva e sem envolvimento.
Freire coloca o desafio de se ir além dos fatos e dados materiais, considerando-se
também “a percepção que deles estejam tendo a população envolvida.” Esse
desafio implica superar dialeticamente a dicotomia subjetividade-objetividade.
Dirigi-me ao local junto com duas colegas do grupo Diálogo e Participação,
com o objetivo de aprender o caminho que atravessa os diversos tipos de ruas e
ruelas daquele bairro da periferia de São Paulo. Olhos atentos, buscando
referências para poder aprender – aliás, quantas outras coisas eu estava
aprendendo! – o trajeto que leva à comunidade.
Grandes avenidas e viadutos vão ficando para trás, entramos à direita
numa última placa de sinalização indicando o bairro em questão. Depois de percorrer a
avenida principal, as ruas começam a ficar mais estreitas e repletas de lombadas de
diversas alturas, o terreno mais acidentado com curvas sinuosas e o grande
movimento de carros passa a dar lugar a uma grande movimentação de pessoas,
adultos e crianças que surgem de repente pelas calçadas estreitas e tortuosas.
As casas populares encontram-se construídas em pequenos terrenos,
algumas com entrada para carro, outras com um pequeno comércio na frente e
inúmeras com os tijolos expostos por falta de acabamento, mas garantindo um
teto para abrigo de seus moradores.
O comércio local compõe-se de estabelecimentos pequenos de bebidas e
mantimentos e de outros gêneros de necessidades básicas (padarias, casas de
carne, cabeleireiros, oficinas de costura, etc.). Há alguns bares onde os homens
costumam reunir-se em torno de mesas de sinuca e pebolim.
As poucas praças abrigam a população em diferentes movimentos,
crescendo a freqüência ao entardecer dos dias durante a semana e durante todo
o dia nos finais de semana, talvez compensando o pouco espaço disponível nas
casas para compartilhar com a família e vizinhos.
42
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Os templos de diferentes credos surgem em meio aos quarteirões
irregulares, alguns bem modestos outros mais amplos.
Há algumas linhas de ônibus que circulam com dificuldade pelas estreitas
ruas, chegando a dificultar muito o trânsito quando tem mais de um ônibus
transitando, um em cada sentido, exigindo habilidade dos motoristas dos ônibus e
paciência dos motoristas dos outros veículos que precisam aguardar a vez para
prosseguir na direção desejada. Além disso, quem dirige necessita estar muito
atento, pois crianças surgem inesperadamente de todos os lados, principalmente
nos horários de entrada e saída de escola.
As inúmeras idas ao local proporcionaram familiaridade com o trajeto que
foi sempre o mesmo por um motivo – o alerta de que não era prudente passarmos
por certos trechos (nunca vire “à direita”), pois essas regiões eram consideradas
de risco, área do “pessoal da pesada e do tráfico”.
Prolifera-se construções de diferentes aspectos espalhadas pelos morros –
pequenas casas de alvenaria, uma região de prédios de apartamentos da
COHAB, inúmeros barracos de madeira, frutos de uma ocupação recente que
está se transformando, pois vários barracos de um a dois cômodos estão sendo
atualmente edificados com blocos e telhas de amianto.
Este novo trecho do percurso, por ser mais “aberto”, parece que expõe
mais as pessoas. Inúmeras crianças cruzam nosso caminho, várias com mochilas
nas costas, algumas em pequenos grupos, outras correndo e brincando com cães
(em profusão), companheiros das brincadeiras na rua. Temos nossos olhos
atentos ao dirigir para não pôr em risco nenhuma pessoa e animal.
O número acentuado de pessoas, ou circulando pelas ruas ou paradas
conversando em pequenos grupos, chama a atenção, parece que as estreitas
calçadas são uma continuação das residências, dando-nos a impressão de que
todos se conhecem ou observam o que acontece com todos.
O bairro vem conseguindo melhoramentos por meio de ações comunitárias,
uma vez que a atuação do poder público não supre todas as necessidades da
região.
43
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Após atravessar esta região, encontramos uma escola em fase final de
reforma (de salas de latinha para um prédio de alvenaria), alguns pontos finais de
ônibus e mais adiante “nossa” escola, no alto de uma pista com asfalto recente.
A escola foi fundada em 1993 e conta com corpo diretivo composto por um
Diretor (efetivo), um Assistente de Direção, duas Coordenadoras Pedagógicas
(efetivas), 51 professores e 14 funcionários, para 1250 alunos divididos em 31
turmas, sendo 17 classes do Fundamental I e 14 do Fundamental II.
Aproximadamente 80% do corpo docente são efetivos. É precária ainda a
contribuição de recursos à APM, mas a direção tem esperança de que a partir dos
trabalhos de equipe em benefício da aproximação família/escola, conseguir-se-á
um novo quadro para os próximos anos. O índice de repetência em 2002 foi de
20% ao final da 4
a.
série e 30% ao final da 8a. As turmas de Fundamental II do
período noturno apresentam expressivo índice de evasão
10
.
Assim que se entra constata-se que a escola recebe uma boa manutenção,
tendo os ambientes limpos e a construção conservada, cuidados que fazem com
que nos sintamos em um ambiente agradável.
A escola funciona em quatro períodos, para atender a população dos
arredores, região fronteiriça entre duas subprefeituras da periferia de São Paulo.
Os três primeiros atendem alunos do Ensino Básico (ensino fundamental) e o
último período, o noturno é reservado para programa de alfabetização de jovens e
adultos.
Quanto às famílias que compõem a comunidade, conhece-se, oficialmente,
o número de 550. São, em sua maioria, constituídas por migrantes nordestinos
entre 26 e 35 anos que formatam o lar com o casal e média de 2 e 3 filhos ainda
crianças. Economicamente, vivem na precariedade, uma vez que o desemprego é
elevado e a sobrevivência baseia-se no subemprego. Dentre os homens, a
maioria atua na informalidade da construção civil e, dentre as mulheres, impera o
serviço doméstico.
10
Dados extraídos de “Projetos de pesquisa”, de Heloisa Szymanski, enviado à Fapesp em 2004.
44
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
O documento “Mapas da vulnerabilidade social da população da cidade de
São Paulo”
11
(CEBRAP, SESC e SAS-MSP, 2004) apresenta os resultados do
mapeamento de indicadores (socioeconômicos e demográficos e outros) de
famílias de diferentes regiões de São Paulo. O documento identifica os chamados
riscos sociais (precariedade de serviços públicos de saúde, de infra-estrutura
urbana, condições materiais da família, risco de homicídio e gravidez não
planejada, especialmente na adolescência). Outro dado relevante para o projeto
Diálogo e Participação é a disponibilidade de equipamentos públicos no espaço
urbano, um fator favorável à redução da vulnerabilidade social, já identificado no
projeto Diálogo e Participação.
O estudo coordenado por Sposati (CEBRAP, SESC e SAS-MSP, 2004)
torna evidente a grande heterogeneidade de situações de vulnerabilidade social,
inclusive nas regiões mais precárias. Esta discriminação é relevante quando se
pensa em programa de intervenção, tanto de instituições governamentais quanto
não-governamentais.
Se por um lado, é verdade que existem áreas que apresentam enormes
acúmulos de vulnerabilidade e riscos sociais, é também verdade que
nem sempre eles se sobrepõem: em muitos lugares, há presença de um
determinado tipo de “risco” – e não necessariamente de outro.
(CEBRAP, SESC e SAS-MSP, 2004).
Segundo esse mapeamento de 2004, a região onde o trabalho de pesquisa
é desenvolvido está entre as que apresentaram as piores situações de
vulnerabilidade da Zona Norte, Oeste e Centro do Município de São Paulo. O
percentual de pessoas que residem em setores de altíssima vulnerabilidade social
é de 40,6%
12
.
Quanto aos indicadores de condições de habitação: a) referente ao
provimento de esgoto, a região estudada está em oitavo lugar (entre dez) e, b) na
11
Elaborado pela prefeitura do município, traz informações relevantes e precisas sobre as diversas
regiões e bairros de São Paulo. O documento é composto por quatro volumes e os dados sobre o bairro
em questão estão no volume 2 – Região Norte, Oeste e Centro.
12
Os outros nove subdistritos apresentaram percentuais de 34.5%, 32.0%, 25.1%, 24.2%, 22.4%,
18.7%, 7.3%, 2.8%, 0.6% e 0.0%.
45
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
distribuição das favelas, está na primeira colocação, com 83 favelas, sendo que o
segundo colocado apresenta 47 favelas.
Quanto aos indicadores de riscos associados à juventude no contexto
urbano – violência e gravidez precoce – novamente a região da pesquisa
encontra-se nas duas faixas mais elevadas.
Nas visitas à região, pude aproximar-me e constatar “in loco” as condições
da região, confirmados pelos dados da referência citada anteriormente. Constatei
pessoalmente que a população tem sido exposta a riscos devido a condições de
moradias inadequadas, agravos de saúde, envolvendo crianças pequenas,
gravidez precoce e alta incidência de homicídios entre jovens.
A vulnerabilidade social deste grupo pode ser amenizada pelo provimento
de serviços e políticas promovidas pelo Estado, através do bom atendimento de
saúde, oferta de espaços com boas escolas, espaços de lazer e adequadas
condições de habitação, porém o Estado não supre a região o suficiente e as
ações comunitárias esforçam-se para minimizar/aplacar as necessidades de sua
população. Uma Associação de Moradores encarrega-se de analisar prioridades e
mobilizar realizações. Empenha-se ainda para conseguir uma Biblioteca Pública,
como também fazer vingar na comunidade um projeto para a assistência a 150
jovens por meio de atividades que incluem reciclagem, apoio pedagógico, Artes,
Cultura e Palestras informativas.
Pais participantes da pesquisa
Foram contatados homens, genitores e avôs, responsáveis por alunos da
escola de ensino fundamental, residentes nesta comunidade da periferia da zona
norte de São Paulo, e convidados para participarem da pesquisa. Realizamos três
entrevistas e uma entrevista devolutiva. No total participaram 11 homens.
As idades dos homens participantes variaram de 27 a 59 anos. Tiveram
diferentes oportunidades de estudo com grau de instrução diverso: ensino
fundamental incompleto (terceira, quarta, sexta e sétima série), ensino
fundamental completo, ensino médio incompleto e ensino médio completo.
46
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Desenvolvem trabalho em setores diversos e assumem as seguintes
funções: trabalho em ferro-velho, cobrador de ônibus, porteiro, motorista de
transporte escolar, garçom aposentado por invalidez com trabalho informal, ex-
trabalhador de construção civil aposentado por invalidez, metalúrgico, coordenador
líder de sacolas para supermercado, motorista particular e trabalho informal.
O tempo de constituição das famílias varia de 6 a 29 anos de convivência,
com três novas uniões. Quanto ao número de filhos, temos dois pais com filho
único e os outros de 3 a 4 filhos. Há também dois avôs, um que cuida do neto,
pois o pai da criança não assumiu o filho e um que cuida da neta de 11 anos
durante a semana.
Os participantes são descritos com mais detalhes na descrição das
entrevistas.
Dificuldades para conseguir os participantes
A estratégia adotada para convidar os pais homens foi a de contatá-los
pessoalmente nos encontros promovidos pelo projeto Diálogo e Participação.
Num desses encontros, cujo objetivo foi o de levantar o que entendiam por
educação, que opinião tinham da escola real e o que gostariam de ter numa
escola ideal, todos os pais da escola foram convidados pela direção por meio de
um comunicado formal e por escrito da escola. Os encontros foram marcados por
séries (1a. e 2a. / 3a. e 4a. / 5a. e 6a. / 7a. e 8a.). Nesses encontros o
comparecimento de pais homens foi muito baixo (de nenhum a até três pais por
série). Como termo de comparação, esta mesma atividade do projeto Diálogo e
Participação, foi desenvolvida na outra unidade educacional do mesmo bairro
(Creche). O comparecimento e a participação de pais homens foi muito maior
(perto de 50% dos presentes). Uma explicação provável é que o projeto Diálogo e
Participação começou há mais tempo naquela creche e o vínculo com os
genitores já está estabelecido.
Posteriormente, em continuidade às atividades do projeto Diálogo e
Participação, foi agendada uma reunião de devolutiva e para eleição de
47
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
prioridades dos pais. Nesse dia, nenhum dos pais que estiveram nas reuniões
anteriores compareceram, mas vieram outros cinco pais. Todos os genitores
presentes nos encontros e devolutiva foram contatados. Expliquei o objetivo e
importância da pesquisa e perguntei a cada um se estaria disposto a colaborar
com a pesquisa. Peguei o número de telefone e disse que ligaria para confirmar e
relembrar. Assim, juntando a relação inicial de sete pais com os cinco desta
reunião devolutiva, comecei o trabalho com uma relação de 12 pais homens. Na
semana que antecedeu o primeiro encontro da pesquisa – agendada para um
domingo – liguei para cada um dos 12. Um deles comunicou que não poderia
comparecer, pois o seu turno de trabalho cairia no domingo, um outro que teria de
viajar para um casamento no interior. No dia da reunião, dos dez pais que
aceitaram participar, compareceram apenas três. Como apenas três presentes
seria um grupo pequeno, tentou-se conseguir trazer mais pais. Da escola liguei
para dois pais que haviam passado a impressão que compareceriam. Entretanto,
um deles disse que era o aniversário da esposa e que não poderia comparecer,
pois estava com muitos convidados. O outro, que era muito participante nas
reuniões, justificou que não viria, pois alguns dias antes se indispôs com o diretor.
Após esse primeiro encontro, participei de outra atividade do projeto
Diálogo e Participação. Novamente compareceram poucos pais. Um pai homem e
duas mães. Este genitor foi convidado para próxima entrevista, que ocorreria no
mês seguinte. Para essa segunda entrevista, aqueles nove genitores que não
puderam estar presentes na primeira entrevista foram novamente convidados.
Compareceu apenas o genitor convidado por último.
Para esse mesmo dia, estava marcada uma outra reunião do projeto
Diálogo e Participação, para a qual foram novamente convidados todos os pais e
mães, com a finalidade de se conversar sobre educação dos filhos, mas não
compareceu nenhum pai homem. Mais tarde, após o encerramento do encontro,
chegou um pai, pois pensara que era para fazer reserva de matrícula. Esse pai foi
convidado para participar desta pesquisa, aceitou e foi entrevistado.
Para a reunião de devolutiva, todos os cinco genitores que participaram
dos três encontros foram convidados, pois se pretendia apresentar os pontos
principais das transcrições e solicitar que confirmassem, ajustassem ou
48
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
completassem as informações. Além disso, para enriquecer tais informações
coletadas, foi solicitado ao diretor que convidasse outros pais para participar da
devolutiva e ele enviou convites para os genitores da escola. No dia do encontro
compareceram seis responsáveis (quatro genitores e dois avôs). Os cinco
participantes anteriores não compareceram.
A imersão
O interesse pela relação família-escola e minhas inquietações a respeito
deste tema levaram-me ao mestrado em busca de aprofundamento e, então,
como uma pesquisadora, buscando a compreensão desta relação, iniciei minha
imersão na comunidade no segundo semestre de 2004, através da participação
nas atividades da disciplina-projeto: Práticas Educativas
13
na Família, na Creche,
Escola e Comunidade: participação e diálogo, sob coordenação da professora
Heloisa Szymanski, com o objetivo de acompanhar a implementação de uma
proposta educacional participativa e dialógica em diferentes contextos
educacionais (família, creche, educação complementar e escola do ensino
fundamental ao médio).
Assim, meu primeiro contato com a comunidade deu-se com a participação
em atividades com mães, pais e/ou responsáveis das crianças de uma creche e a
equipe da PUC (alunos pesquisadores e coordenadora do projeto).
Essa minha imersão foi se aprofundando. Do ponto até onde eu já sabia
chegar sozinha (local das atividades da disciplina-projeto) seguimos em frente,
para baixo e para cima, isto é, descemos a encosta do morro por uma “rua” com
trechos de terra batida e outros de asfalto precário. Passamos por uma região de
ocupação recente e subimos a encosta de outro morro até chegar ao alto, onde
se situa a escola em questão.
13
As práticas educativas familiares foram aqui consideradas como sendo “(...) ações contínuas e
habituais, realizadas pelos membros mais velhos da família, nas trocas intersubjetivas, com o sentido
de possibilitar a construção e apropriação de saberes, práticas e hábitos sociais pelos mais jovens,
trazendo, em seu interior, uma compreensão e uma proposta de ser-no-mundo com o outro”
(Szymanski, 2001: 87).
49
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
O envolvimento no projeto Diálogo e Participação – a prática dialógica na
família, escola e comunidade trouxe-me a oportunidade, em vários encontros ao
longo de mais de dois anos, de entrar em contato com outras pessoas da
comunidade: alunos, pais, professores e funcionários da escola em que minha
pesquisa se desenvolveu.
Essa maneira de aproximação, imergindo na “realidade concreta” (Freire:
1981: 35) também atende a necessidade de utilização de mais de um instrumento
de coleta de dados quando se deseja conhecer o cotidiano de uma instituição.
Síntese da imersão: constelações
Nesta seção apresento os resultados de um exercício analítico com os
dados coletados no projeto mais amplo, Diálogo e Participação, utilizando os
procedimentos de análise indicados (seção 2.7, p. 78 desta dissertação).
É uma versão preliminar de análise, com os dados da imersão que serão
aprofundadas mais adiante, com a análise das entrevistas com os genitores.
As releituras dos registros dos encontros com pais, mães, gestores,
professores e funcionários da escola dos quais participei, bem como as releituras
da documentação de outros encontros possibilitaram desenvolver uma
compreensão que foi se constituindo por meio de constelações ou unidades de
significado. Essas constelações são, conforme descritas a seguir, as seguintes:
“como a escola convida os pais
14
e se prepara para recebê-los”, “atitudes
positivas da escola na interação com os pais
15
”, “o desafio de conseguir que os
pais
16
venham”, “dificuldades da escola em interagir com os pais
17
”, “dificuldades
dos pais
18
em participar na escola, do ponto de vista da escola”, “dificuldades dos
14
Nesse momento, o termo pais refere-se a pais e mães. Este estudo teve como base os encontros do
projeto Diálogo e Participação e constituiu a imersão, portanto as informações obtidas incluem pais e
mães sem discriminação, é uma compreensão única das famílias dos alunos da escola onde a
pesquisa se realiza.
15
Idem anterior.
16
Idem anterior.
17
Idem anterior.
18
Idem anterior.
50
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
pais
19
em participar na escola, do ponto de vista dos pais
20
” “percepção da força
da coletividade”, “o que professores falam sobre os pais
21
”, “como os pais
22
vêem a
escola”, “a importância do diretor”. Por fim, uma constelação emergiu da reflexão sobre
as “polaridades dialéticas” (ambivalências, contradições ou paradoxos), um desafio da
realidade que aponta para a importância da abordagem dialógica.
Como a escola convida os pais e se prepara para recebê-los
Os pais são convidados por meio de recado por escrito entregue aos
alunos. Percebe-se um esmero na preparação de uma das reuniões com os pais,
que foi realizada conjuntamente com uma festividade, buscando criar uma
atratividade para os pais. A reunião foi organizada e preparada com
antecedência: cadeiras enfileiradas, vídeo, computador que fica à disposição para
pais acompanharem os projetos. Nesse evento, são apresentadas para as
famílias e alunos as atividades desenvolvidas durante o ano, informam-se sobre
os projetos em andamento em prol da comunidade e para o ensino dos alunos e,
anuncia-se um evento que vão realizar para a comunidade. A escola prepara e
disponibiliza o portfólio de cada aluno, o que possibilita um bom acompanhamento
do desenvolvimento escolar. O professor orienta e passa valores em situações
que vê necessidade de sua intervenção.
Atitudes de aproximação da escola na interação com os pais
Algumas ações e movimentos da escola (diretor e professores) chamaram
a atenção por caracterizarem um esforço de melhoria da qualidade de interação
com os pais. Em uma fala de abertura em um evento de comemoração dos dez
anos da escola, o auxiliar da diretoria destacou o fato de que o diretor e todos os
professores (exceto a coordenadora pedagógica) também tiveram uma origem
humilde, estudaram em escola pública até o segundo grau e cursaram faculdade
19
Idem anterior.
20
Idem anterior.
21
Idem anterior.
22
Idem anterior.
51
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
particular. Esta mensagem de que “somos semelhantes”, além de sinalizar uma
relação horizontal, foi colocada no sentido de transmitir a possibilidade concreta
que a escolarização proporciona para trabalho digno. Nessa mesma ocasião, foi
colocado que a escola tem a “intenção e o compromisso de proporcionar ensino
da melhor qualidade possível aos seus filhos”. Outra demonstração de que essa
escola busca melhorar a interação com os pais foi o professor que não expõe o
aluno em situações constrangedoras perante outros pais e o respeito com que os
alunos são tratados por todos os funcionários da instituição (grande mudança e
conquista realizada pela atual gestão que assumiu há três anos). Os alunos,
apesar de suas condições sociais desfavoráveis, são vistos agora como seres
humanos com potencial para formação escolar. Relatam que anteriormente
ocorriam episódios de desrespeito a alunos, referindo-se a eles como “favelados”.
A fala dessa mãe:
Ela [filha] não tá nada bem! Eu estou esperando o professor, quero
muito falar com ele. Minha filha não quer mais vir pra escola não sei
mais o que faço. Ela se queixa que os professores falam que ela não
aprende porque é “favelada”.
Este tipo de estigmatização ainda pode ocorrer esporadicamente, mas são
objetos de providências da diretoria e coordenadora pedagógica. Outra atitude
positiva da escola para com a comunidade é a distribuição de cesta básica
(adquirida por esforço e iniciativa da própria escola) para famílias que necessitam
de ajuda. Pode-se notar que a escola procura contato com as famílias e oferece
várias atividades intra e extramuros.
O desafio de conseguir que os pais venham
Entretanto, de modo geral, é um desafio conseguir que os pais venham. O
diretor comentou que tem sido difícil trazer a família para dentro da escola,
inclusive está tentando estratégias diferentes para alcançar tal propósito.
(...) está quase amadurecida a idéia de uma festa para a comunidade
(...) especialmente para que vocês possam participar com a gente (...)
está decidido (...) depois eu falo, é surpresa. Vai ser muito animado.
52
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Admite que a deficiência possa ser devida à falha da escola no modo como
convida os pais, de não conseguir que eles compreendam as razões da chamada.
Diz que não há participação espontânea deles – pai só vêm no dia da reunião. E
ocorre uma situação agravante – justamente os pais de alunos com problemas ou
com mais dificuldades não comparecem às reuniões. Por outro lado, o mesmo
diretor deixa expressa uma contradição – fica preocupado com a possibilidade de
que venham muitos pais, pois não haveria lugar para todos se acomodarem.
Parece ser freqüente a afirmação da escola, de que os pais que mais
precisariam vir não aparecem. “Nós sempre tivemos salas cheias. Agora os pais
daqueles alunos mais problemáticos não vêm. Mas a gente insiste”. Como
pesquisadora e educadora, automaticamente surgem algumas questões: O que
será que está afastando especificamente estes pais? De que modo é a relação
escola-família nestes casos? A escola já parou para refletir sobre seu modo de
intervir nestes casos? Que outra atitude seria mais eficaz para conseguir uma
parceria com estas famílias em benefício destes alunos?
Dificuldades da escola em interagir com os pais
Apesar de as iniciativas de aproximação e do esforço em melhorar a
interação, percebeu-se que existe ainda uma longa caminhada para que a interação
escola-família seja satisfatória. Alguns professores colocaram que a escola só chama
os pais para reclamar e fazer queixa sobre os alunos, que a relação horizontal é
esquecida (“Nós não sabemos conversar, somos imediatistas, temos verdades
intocáveis”), e que a escola não conhece suficientemente bem a comunidade.
Dificuldades dos pais em participar na escola, do ponto de vista da escola
Poucos pais se colocam na reunião geral, enquanto que nas reuniões
menores existe mais participação. Seria um círculo vicioso no qual falta de prática
leva à inibição que dificulta cada vez mais a verbalização? Os pais conversam
mais entre si e com os professores na sala de aula. Os pais demonstram uma
atitude de passividade diante das propostas da escola, talvez porque não tiveram
53
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
participação no planejamento dos encontros. É como não se sentissem
protagonistas.
Dificuldades dos pais em participar na escola, do ponto de vista dos pais
Alguns pais queixaram-se de que a escola marca as reuniões em horários
de trabalhos deles. “Não posso vir à reunião porque trabalho” [este encontro foi
realizado num sábado]. Alguns que compareceram disseram que para poder estar
presente tiveram de pagar um substituto. (“Paguei uma pessoa para poder vir à
reunião”)
. Outros pais reclamaram que a escola “não dá atenção aos pais”.
Maiores esclarecimentos serão obtidos nas entrevistas com os pais.
Percepção da força da coletividade
Provavelmente devido às várias ONGs que atuam junto à comunidade, os
pais que participaram dos eventos registrados pelo projeto Diálogo e Participação,
em diversos momentos manifestaram-se sobre a importância da união,
solidariedade e apoio entre os vizinhos. “Os pais têm que se unir para melhorar as
condições do bairro”. Percebeu-se também que os pais se unem nas reuniões
para encaminhar queixas para a gestão escolar.
O que professores falam sobre os pais
Percebeu-se que julgamentos negativos a respeito dos pais predominam
entre os professores, provavelmente por decorrência das condições precárias das
famílias e as limitações dos pais em contribuir para alguma expectativa dos
professores de que os pais deveriam aliviar sua carga de responsabilidade. Esses
professores acham que os pais deveriam fazer os filhos realizarem as lições
(apesar de esses professores também não conseguirem).
Dei a aula inteira para eles fazerem e teve casos de alunos que
preferiram ficar batendo papo durante a aula toda e não fazer. Quer
dizer: dá 2 dias para eles fazerem as atividades, aí não entregam no
54
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
dia, dá mais o período da aula e eles não se comprometem, não fazem
e fica complicado isso.
Pais chegam tarde e não olham as crianças. Professores acham que os
pais não se preocupam em acompanhar o trabalho dos filhos “(...) espero que
vocês que são responsáveis por estas crianças, procurem ver assim, olha: O que
está vendo? O que está fazendo? O que você está aprendendo? Qual foi a
matéria de hoje?". Consideram os alunos agressivos apesar da rigidez da escola.
Acham que os pais se interessam mais em saber se chegou o leite. Que os pais
são ausentes – devido ao trabalho e até por erros cometidos (presos). Essa
ausência tem como conseqüência crianças e professores mais fragilizados. Que
os pais querem apenas um lugar seguro para o filho, enquanto ele trabalha.
Acham que os pais não encaram a educação como prioridade. Para esses
professores a responsabilidade pelo fracasso na alfabetização é dos próprios
alunos (falta de disposição para aprender) e da família (não incentiva a leitura).
É interessante comentar que nos sete encontros do projeto mais amplo
com pais (Escola, creche, ONGs) dos quais eu participei freqüentemente aparece
a educação e o estudo como a mais importante garantia para a formação e
possibilidade de atingir um futuro melhor.
Como os pais vêem a escola
A maioria dos pais considera a formação escolar muito importante para o
futuro do filho. Acham que a escola, além do ensino formal, também procura
ensinar respeito, bons sentimentos e pensamentos. Esses pais aprovam o que a
escola faz e estão satisfeitos por não existirem queixas dos filhos. Uma mãe
relata que uma reunião com a escola foi tão marcante que mudou sua vida. Um
indicador da qualidade desta escola é o nível de procura, acima da capacidade de
atendimento, sendo difícil achar vaga.
Por outro lado, outros pais têm opinião desfavorável da escola (“Antes, a
criança aprendia mais”, “Tenho queixas sobre a professora, mas reconheço que
posso estar sendo injusta, pois não a conheço”) e/ou do filho (“pais que culpam os
55
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
alunos e defendem os professores mal remunerados”, “Essas crianças vêm para
escola pelo social – para encontrar amigos”). Os pais acham que a escola faz
pressão para que os pais cobrem dos filhos maior empenho e comprometimento.
(“não estuda, não faz os deveres, não produz na sala de aula”.). As respostas dos
pais são variadas: batem (“Meu marido é ignorante, se ele pega ela, nem sei
(...)”), falam “duro” com o filho ou procuram conversar.
A importância do diretor
Esta constelação emergiu por conta das inúmeras citações e referências,
partindo de todos os envolvidos (professores, funcionários, pais e alunos). Além
da quantidade, essas falas trazem conotações marcantes, no sentido de que a
atuação diferenciada dessa personagem tem tido repercussões significativas para
as famílias.
Liderança e espírito de equipe. Algumas falas indicam existir na escola
uma liderança que propõe uma visão desafiadora e interessante (escola de
padrão de excelência em nível nacional) para o futuro, e que coordena “com garra
e união” a realização das ações. Os professores manifestam estar satisfeitos com
o fato de existir na escola “um grupo lutando e construindo a educação” com
engajamento e com apoio da direção. São feitas reuniões entre todas as séries e
entre professores da mesma série, há um senso de parceria e integração. O
projeto pedagógico é discutido coletivamente e existe apoio coletivo para as
mudanças propostas. A maioria dos envolvidos estão satisfeitos com os
relacionamentos interpessoais (sensação de bem-estar) com o espírito de equipe,
incluindo secretaria e funcionários.
Abertura ao diálogo e incentivo à participação. A fala dos professores e
funcionários revela que a direção tem uma postura participativa na escuta,
orientação e apoio. Essa postura política abrange a liberdade para ação
(autonomia e responsabilidade), discussão na distribuição de recursos e o
desenvolvimento de competências por meio de educação continuada.
Atenção ao aluno e à comunidade. Há falas de professores e funcionários,
enfatizando uma boa relação com a comunidade, principalmente do diretor, que
56
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
incentiva a participação dos pais. Pais falam que a escola melhorou muito nos
últimos cinco anos, com a atual direção, e que se sentem bem-vindos.
Professores confirmam que antes a escola tinha uma imagem ruim junto à
comunidade, e que a atual gestão melhorou e tem dado manutenção às
instalações.
Autoconsciência e reconhecimento das limitações. O diretor reconhece
com franqueza alguns pontos que precisam ser melhorados, passo fundamental
para serem possíveis tais mudanças: professores com preconceitos em relação
às limitações das famílias, dificuldades de professores para lidar com famílias e
para incentivá-las a participar mais. Reconhece que são processos de longo
prazo e que faz parte do processo conviver com restrições de verbas. Além disso,
reconhece também que não basta disponibilizar recursos educacionais para os
professores, é preciso capacitá-los no uso e incentivar permanentemente.
Bom clima da equipe da escola. Muitos professores e funcionários
expressaram satisfação em trabalhar nessa escola (“Eu dou graças a Deus por
trabalhar num lugar que tem vida”). Reconhecem o apoio da direção e dos
colegas e a convivência agradável, e que existe muito envolvimento.
Boa gestão dos recursos. É opinião da maioria que existe um bom
planejamento e controle dos recursos (bons professores, recursos pedagógicos,
móveis em boas condições, ausência de pichações, bom uso do espaço físico, etc.).
Polaridades dialéticas (ambivalências, contradições ou paradoxos)
Ao mesmo tempo em que se reconhece que boa parte dos agentes da escola
procura melhorar a interação com os pais, são identificadas algumas contradições,
contrastes e impasses. Esta constelação é muito importante no referencial de Paulo
Freire no qual as contradições e os dilemas presentes no cotidiano, tidas como
naturais e inevitáveis, precisam ser expressas, refletidas e discutidas.
Uma das contradições é que a escola limita as possibilidades de abertura
aos pais: vir às reuniões de pais (em horário que a escola marca sem consultar a
57
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
comunidade), com pauta fechada (ser informados sobre as notas, conversar com
o professor sobre aproveitamento e tirar dúvidas eventuais dúvidas). Pela
organização da pauta da reunião, a escola praticamente determina o que o pai
pode falar, dando pouca abertura para perguntas de outra natureza e sugestões.
Além desse encontro a escola abre o acesso para as festas.
Uma outra contradição foi observada em relação ao projeto Diálogo e
Participação. O desenvolvimento do projeto, cujo foco está indicado no próprio
título – diálogo e participação – teve o seu desenvolvimento retardado porque a
escola não sentiu confiança em permitir a participação dos pais, até que a escola
conhecesse em detalhes as propostas do projeto por meio de atividades
preliminares, sem participação direta das famílias. Não quiseram correr qualquer
risco de “não saber” previamente e que essa ignorância ficasse evidente perante
as famílias. Um indicador de que o projeto Diálogo e Participação, melhora a
interação escola-pais é que os pais de filhos da creche, onde este projeto está
mais adiantado, tomam mais a iniciativa de procurar a escola, verbalizam que
houve mudança na forma de educar (antes batiam) e têm melhor conhecimento
sobre as possibilidades de participação. Outro ponto contraditório é que, apesar
de fornecer cestas básicas para famílias carentes, há o reconhecimento que os
agentes da escola conhecem pouco sobre as reais condições do bairro.
Entrar em contato com o ambiente social específico dos sujeitos da
pesquisa e realizar a imersão para apreender as condições sociais, econômicas e
culturais da comunidade e da instituição foi um passo importante para a
constituição da situação da pesquisa. Pode-se ter uma visão inicial do que pais e
mães da escola pensam sobre os aspectos citados: a vivência, o contato
estabelecido, as informações obtidas e analisadas e finalmente organizadas em
constelações proporcionaram um conhecimento fundamental para os movimentos
seguintes, quando o contato com os sujeitos foi estabelecido através das
entrevistas e a partir daí pesquisar especificamente o que os responsáveis
homens, pensam sobre escolarização dos filhos e participação na escola.
58
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
2.6. DESCRIÇÃO DOS ENCONTROS
23
A constituição da situação da entrevista foi atendida com todo o cuidado,
conforme procedimentos descritos na seção 2.4. A síntese de cada encontro é
apresentada a seguir.
Aquecimento
Inicialmente, na forma de uma conversa agradável e bem descontraída,
com linguagem acessível, relatei alguns dados pessoais para estabelecer uma
relação de confiança, apresentei a pesquisa que estou desenvolvendo a algum
tempo na escola para compreender como se expressam as participações dos pais
homens na escolarização de seus filhos e agradeci sua possível participação.
Expliquei que a participação não era obrigatória, mas que seus relatos seriam de
extrema importância para o desenvolvimento do conhecimento. Dei a garantia da
confidencialidade, privacidade e sigilo das informações individuais obtidas.
Comentei que os resultados deste estudo poderão ser publicados em artigos e/ou
livros científicos ou apresentados em congressos profissionais, mas que serão
mantidas em sigilo as informações pessoais que possam identificá-los. Apresentei
o termo de consentimento, lendo e explicando o significado do seu conteúdo e
solicitei concordância para uso do gravador na entrevista, cujo conteúdo transcrito
ficará à disposição dos entrevistados.
Com a anuência para a participação, eu saí da sala e o entrevistador da
equipe continuou a conversa para levantar os dados biográficos dos pais. Assim,
pediu para eles falarem um pouco deles e de suas famílias. Durante a conversa,
levantou mais algumas informações para poder estabelecer um perfil dos
participantes: se tiveram oportunidade de estudar, até que série puderam estudar,
que tipo de trabalho exercem, quantos filhos têm, há quanto tempo constituíram
sua família, há quanto tempo seus filhos estudam nesta escola.
23
A transcrição dos encontros estará incluída nos exemplares da banca e disponíveis para
pesquisadores interessados no tema, no Programa de Pós-graduação da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, Educação: Psicologia da Educação e ECOFAM.
59
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Após as apresentações iniciais, questões desencadeadoras foram
propostas como alternativas de formulações ou fraseamentos para uma
compreensão clara dos objetivos da questão da pesquisa.
Eu gostaria de saber como é para vocês, como pais, participarem da
escolarização de seus filhos?
Como vocês fazem para acompanhar o estudo de seus filhos? O que vocês
fazem?
Como é para vocês este acompanhamento?
Vocês vêem diferença entre o acompanhamento que fazem para os
dois/três filhos? (Se mais de um filho)
Como os outros pais homens fazem? Algum amigo ou parente.
Como é para vocês pais, virem à escola para participar das várias
atividades que a escola propõe? Como vocês vêem a participação dos homens
pais na escola?
Estas questões foram apresentadas no decorrer da conversa para
complementar as falas dos genitores. Além disso, foi solicitada a eles a descrição
de situações do dia-a-dia em que exemplifiquem a participação na escolarização
dos filhos.
Encontros com os genitores
A seguir, serão apresentadas as sínteses de cada encontro realizado com
os genitores.
Ao todo ocorreram quatro encontros, o primeiro com um grupo de três pais,
o segundo e o terceiro com um pai em cada momento e novamente um grupo na
entrevista devolutiva.
A primeira entrevista ocorreu numa manhã de domingo do mês de outubro
de 2006 e foi conduzida por um pesquisador homem
24
do nosso grupo que estava
24
Conforme está relatado na página 37, decidiu-se por um pesquisador homem para o contato direto
com os genitores, de acordo com a sugestão da banca de qualificação, surtindo bons resultados (vide
página 101).
60
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
a par deste trabalho e com o qual eu já havia desenvolvido atividades com
genitores em outra instituição. Eu apresentei os objetivos da pesquisa, formalizei
o pedido para a participação deste trabalho e após explicações claras a respeito
da garantia de anonimato e liberdade para abandonar a pesquisa no momento em
que desejassem, assinamos o Termo de Consentimento Esclarecido. A seguir, foi
solicitada a permissão para a gravação da entrevista e garantido o acesso em
qualquer momento a todo o material e transcrições. Após estas medidas, retirei-
me da sala e o entrevistador assumiu a entrevista que teve a duração de uma
hora e meia.
Mesmo obtendo informações interessantes, senti a necessidade de
conversar com outros genitores e, assim, marquei num domingo, início de
dezembro, uma nova entrevista para a qual convidei novos genitores que conheci
em novos encontros de pais realizados em decorrência do prosseguimento do
projeto Diálogo e Participação, além desses, entro em contato com os primeiros
pais convidados e que não puderam estar presentes na primeira entrevista.
O encontro realizou-se com a presença de um pai que acatou nosso
convite no primeiro momento e mais um que chegou um pouco depois para fazer
a matrícula dos filhos na escola. Portanto acontecem em dois momentos com os
mesmos cuidados éticos descritos na primeira.
O entrevistador é novamente um pesquisador homem que busca deixar os
genitores descontraídos e assim, como da vez anterior, retiro-me após as
formalidades exigidas de apresentação do trabalho para deixá-los à vontade.
Cada encontro teve a duração aproximada de uma hora e quinze minutos.
Para a quarta entrevista organizada para a devolutiva, todos os pais com
os quais eu já havia feito contato foram convidados novamente, solicitamos
auxílio do diretor da escola para que ajudasse na divulgação e mais genitores
pudessem participar e foram enviados convites para todos os pais da escola.
Depois dessas providências, seis novos genitores compareceram para o
encontro.
61
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Quadro dos encontros:
1
o.
encontro 2
o.
encontro 3
o.
encontro 4
o.
encontro
22/10/2006 09/12/2006 24/03/2007
3 pais 1 pai 1 pai 6 pais
Encontro em grupo Encontro individual Encontro individual Encontro em grupo
Primeira Entrevista
Participaram da primeira entrevista os pais Donizete, Ronaldo e Jorge.
Pedimos que eles se apresentassem, contando sobre a constituição de sua
família, oportunidades de estudo e experiência profissional.
Donizete começou a apresentação. Disse que tem 58 anos, que é casado
há onze anos e tem 3 filhos. Relata que tem uma filha de 17 anos, um filho de 10
e uma mais nova com 8 anos. Os dois menores estudam na escola em que
desenvolvemos a pesquisa e a mais velha no colégio Marechal. Mais adiante da
entrevista, ele conta que teve oportunidade de estudar até o quarto ano, do atual
ensino básico, mas, apesar do pouco estudo, sabe muito mais que sua filha que
está no terceiro ano. Donizete, cobrador de uma empresa de transporte urbano,
explica que pode acatar nosso convite, pois sua folga coincidiu com a data
marcada.
Jorge comenta que tem 30 anos, é casado e tem 3 filhos – uma menina de
11 anos que estuda na 5a. série do EMEFE e mais dois meninos, de 8 e 5 anos.
Ele trabalha com ferro velho e para se ausentar e participar da entrevista teve de
conversar com uma pessoa para assumir seu dia de trabalho.
Ronaldo relata que tem 27 anos e três filhos. A mais velha, de 9 anos,
mora com a mãe, ele nunca a vê e assim nada sabe do seu desenvolvimento
62
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
escolar. Além dessa filha, tem uma menina de 2 anos e 8 meses e um menino de
3 meses com os quais convive e participa ativamente da formação. Ele trabalha
como porteiro e conta que estudou até a 8a. série na escola regular, mas estava
muito difícil trabalhar e estudar ao mesmo tempo, desistiu e voltou a estudar
eliminando gradativamente as matérias e completar o Ensino Médio. Lembra que
na época do primeiro casamento não estava maduro mentalmente, teve
problemas e para não arrumar confusão resolveu deixar de lado, para que o
tempo resolva as coisas e para não ter discórdia. Assim, explica que não tem
contato com a filha e não sabe como ela está na escola.
Indagados sobre a participação dos pais na escolarização dos filhos, todos
concordaram com a importância de saber o que está acontecendo com os filhos e
com a escola e Ronaldo relata que acredita que é muito importante dar apoio, não
só na educação escolar, mas também na educação pessoal de vida. Entende que
o pai passa um método e dá exemplo, dizendo isso pelo modo como vê seu
próprio pai, pois hoje reconhece tudo o que seu pai fez por ele ao “pegar no pé”,
tomar tabuada, ver os cadernos. Reflete e comenta que na época sentia-se
trancado e desejava estar livre para brincar com os amigos, mas, hoje em dia, vê
a diferença, pois alunos da oitava série não sabem fazer conta de dividir sem
calculadora.
Na seqüência, Ronaldo levanta o aspecto autoridade do professor e os
outros dois pais concordam que antigamente havia mais rigidez e que os alunos
tinham mais respeito pelos professores.
Além da dedicação dos professores, reconhecem a importância de um
acompanhamento mais ativo dos pais, mas, segundo eles, os compromissos
profissionais dificultam a vinda à escola. Donizete explica que seu trabalho de
cobrador numa linha de ônibus lhe dá folga uma semana no sábado e outra no
domingo; Jorge diz que trabalha no ferro velho direto, sem folga e, desse modo,
não é fácil ir até a escola.
Não ir até a escola pela falta de tempo devido ao trabalho faz com que
fiquem desinformados, envergonhados com a falta de conhecimento e
desatualizados, fatos que acabam por afastá-los ainda mais.
63
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Explicam que não freqüentam todas as reuniões de pais ou outros eventos,
porém acompanham os estudos dos filhos e desenvolvimento ao olhar o que
fizeram de lição, verificar o capricho e a letra, ao aconselhar os filhos a prestar
atenção, a ter mais cuidado, corrigir e escrever melhor, fazer o que é obrigação,
exigir resultados, falar a realidade, falar bravo e resumem com a expressão
“pegar no pé” dos filhos.
Indagados sobre a reação dos filhos sobre “pegar no pé”, Donizete diz que
os seus filhos não têm reação, mas Jorge relata que os seus têm medo, medo de
ele brigar ou bater neles. Ronaldo, que não tem condições de acompanhar a
escolarização da filha por viver afastado, reporta-se a sua própria vida e lembra o
quanto seu pai pegava no seu pé quando acompanhava sua vida escolar e fazia
lição com ele.
Comentam que procuram tomar decisões em comum com as esposas, não
debater na frente dos filhos, mas que geralmente a mãe alivia a pressão.
Questionados sobre essa diferença no modo de agir do pai e da mãe, dizem que
se os dois estiverem agindo com o mesmo intuito, sem um tirar a autoridade do
outro, não há discórdia entre eles.
Voltando-se para a própria infância, Donizete diz que numa família de 17
irmãos havia muita dificuldade do seu pai acompanhar a escolaridade dos filhos,
mas conta que os professores eram bravos e que tinha de fazer as coisas certas
para não apanhar na escola e depois em casa.
Donizete e Jorge não notam diferença em suas maneiras de educar os
diferentes filhos, agem da mesma maneira com todos e Ronaldo destaca que na
questão estudo, o acompanhamento deve ser o mesmo, mas, ressalta que a
educação de filho deve ser diferente da de filha.
A respeito do que os seus amigos pensam ou fazem para acompanhar os
filhos, os três genitores não têm a menor idéia, pois escolarização de filho não é
assunto de roda de conversa de homens com amigos ou parentes.
64
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Além disso, acham que a escola convoca os pais, mas aguardam a
presença das mães em reuniões, sempre com 80% ou mais de participação
feminina. Jorge diz que é melhor a mãe ir até a escola, pois ela sabe conversar e
quando ele vai há poucos homens. Donizete relata que se sua esposa não pode
participar é ele quem vai, porém fica quieto, pois apesar de trabalhar com o povo,
fica tímido ao falar com professor. Ronaldo descreve uma situação em que ele
acompanha a esposa ao levar o filho ao pediatra e se questiona se deveria estar
lá, pois só há mães e ele permanece quieto na sala de espera, só dirigindo a
palavra ao médico no momento da consulta. Na seqüência desses depoimentos,
chegam à conclusão de que as mulheres inibem os homens em reuniões, pois
têm de pensar no que vão falar e, portanto, é melhor só ouvir.
Os pais relatam que seria bom a escola chamar para elogiar e não só para
criticar os filhos e retomam a dificuldade em atender os chamados da escola em
razão do horário e dia de trabalho dos homens. Acham proveitosas as reuniões
de Pais e Mestres para obterem informações sobre os estudos dos filhos e
tomarem conhecimento do que eles fazem.
Finalizando a entrevista, os pais comentaram que acharam interessante
participar do encontro e Jorge deixou como desejo um maior diálogo nas reuniões
da escola e Ronaldo à espera de uma melhora no ensino, com professores tendo
mais autoridade e respeito e não aprovação automática. O sr. Donizete expressa
sua opinião ao dizer que o diálogo com o diretor poderia auxiliar a prevenir muitas
coisas.
Nota-se ao longo dos depoimentos que Ronaldo, por ter contato apenas
com os filhos pequenos e não poder acompanhar a educação de sua filha mais
velha, dá suas opiniões com base naquilo que viveu como filho, tendo seu pai,
atualmente, como um grande modelo a ser seguido.
65
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Encontro
Objetivos e questões desencadeadoras
Participantes
(nomes fictícios)
Encontro 1
22/10/2006
Objetivos: compreender o que pensam os genitores a
respeito de sua participação na escolarização de seus
filhos e de sua participação em uma realidade escolar
da rede pública de ensino.
1 – Aquecimento:
“Para começar eu queria pedir que vocês se
apresentassem, comentassem se tiveram oportunidade
de estudar, até que série puderam estudar, que tipo de
trabalho exercem, falassem a respeito de sua família,
quantos filhos têm, há quanto tempo constituíram sua
família, há quanto tempo seus filhos estudam nesta
escola”.
2 – Questões desencadeadoras:
“Eu gostaria de saber como é para vocês, como pais,
participarem da escolarização de seus filhos?”
“Como vocês fazem para acompanhar o estudo de
seus filhos? O que vocês fazem?”
“Como é para vocês este acompanhamento?”
“Se mais de um filho – Vocês vêem diferença entre o
acompanhamento que fazem para os dois/três filhos?
“Como os outros pais homens fazem, alguma amigo,
por exemplo, ou parente?”
“Vocês gostariam de mudar algo no seu modo de
agir?”
“Como é para vocês pais, virem à escola para
participar das várias atividades que a escola propõe?
Como vocês vêem a participação dos homens pais na
escola?”
Donizete
Ronaldo
Jorge
66
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Segunda Entrevista
Cícero tem 32 anos, é casado e tem um filho de 8 anos, na segunda série.
É técnico em computação e tem o Ensino Médio completo. Nasceu no Nordeste
do país e morou anteriormente em um estado do Sul. Seu filho estuda há dois
anos no EMEFE.
Ao iniciar seu relato, aponta a forma do ensino atual como motivo de
afastamento dos pais e acha que estes só comparecem quando o filho machuca-
se gravemente ou tem uma conduta muito grave. Diz que ele e sua esposa
participam e atendem aos chamados da escola, mas que esta não consegue
resolver os problemas que surgem ao longo do ano e por esta razão estiveram
presentes mais de uma vez pelo mesmo motivo, sem solução, inclusive acha que
certos problemas poderiam ser resolvidos pelas professoras sem necessidade de
chamar os pais. Reconhece que as professoras têm um elevado número de
alunos por sala, são dedicadas, contudo os alunos estão dominando os
professores ao invés de os professores dominarem os alunos. Sabe que seu filho
é levado, porém acha que o envia para a escola para ser educado e ele
retorna pior.
Cícero apresenta várias queixas em relação aos professores: diz que os
pais vão conversar com os professores e eles os ignoram, o aluno é agredido
dentro da sala de aula por aluno mais velho de outra série e o professor não vê,
não põem limites nos alunos, só criticam os alunos, não dão um ensino de
qualidade, não corrigem os cadernos dos alunos, não diversificam as atividades e
o aluno tem que ficar sempre sentado, copiar da lousa, não o mudam de lugar
para tentar solucionar os problemas e sugerem que façam alguma coisa diferente
como convidar pais para dentro da sala da aula.
Em relação ao diretor, considera-o legal, diz que este convida sempre os
pais, mas comenta que não adianta só um querer ajudar.
67
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Aponta o controle da saída de alunos como deficiente e reclama do
transporte escolar que deixa de levar aluno para casa e não tem auxiliar para
fechar a porta do veículo, pondo em risco a vida das crianças.
Acha que a escola quer que os pais enviem os filhos já preparados e que
saibam da responsabilidade que têm de ter dentro da sala de aula. Para Cícero, a
minoria dos pais incentiva seus filhos e já soube de pai que foi chamado duas
vezes pelo mesmo assunto sem resolver e trancou o filho em casa.
Cícero acompanha as atividades escolares, vê os cadernos, passa
exercícios, manda ler textos e exige que complete em casa aquilo que não
terminou em classe. Acha que deve haver pressão para as crianças trabalharem
e obedecerem. Ele e sua esposa acompanham de modo igual e entram em
acordo para que o filho não fique diante de posições divergentes.
Em relação a sua vida escolar, lembra que seu próprio pai não se
interessava e sua mãe, que cuidava de sua escolarização, é seu modelo. Para
Cícero, a pouca participação dos genitores se deve à falta de interesse e
comodidade, deixando para a mulher fazer e resolver os problemas dos filhos e
por pensarem que eles devem assumir a responsabilidade de olhar e trazer as
coisas para dentro de casa, e explica – parte machista do homem. Se for para pai
resolver, são poucos os que conversam, a maioria acha mais fácil pegar um
chinelo, uma cinta e bater.
68
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Encontro
Objetivos e questões desencadeadoras
Participante
(nome fictício)
Encontro 2
09/12/2006
Objetivos: compreender o que pensam os genitores a
respeito das suas participações na escolarização de
seus filhos e de sua participação em uma realidade
escolar da rede pública de ensino.
1 – Aquecimento:
“Para começar eu queria pedir que você se
apresentasse, comentasse se teve oportunidade de
estudar, até que série pôde estudar, que tipo de trabalho
exerce, falasse a respeito de sua família, quantos filhos
têm, há quanto tempo constituiu sua família, há quanto
tempo seu(s) filho(s) estuda(m) nesta escola”
Questões desencadeadoras:
“Eu gostaria de saber como é para você, como pai,
participar da escolarização de seu(s) filho(s)?”
“Como você faz para acompanhar o estudo de seu(s)
filho(s)? O que você faz?”
“Como é para você este acompanhamento?”
“Se mais de um filho – Você vê diferença entre o
acompanhamento que faz para os dois/três... filhos?
“Como os outros pais homens fazem, algum amigo, por
exemplo, ou parente?”
“Como é para você pai, vir à escola para participar das
várias atividades que a escola propõe? Como você vê a
participação dos homens pais na escola?”
Cícero
69
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Terceira Entrevista
Ribamar tem 42 anos, é casado e tem quatro filhos, dois estudam no
EMEFE e dois numa escola bem próxima. Nasceu no Norte do Brasil e lá
estudou até a 6a. série. Tentou dar continuidade aos estudos aqui no EJA da
própria escola, mas estava muito difícil conciliar estudo e trabalho.
Ribamar conta que veio até a escola por ser domingo e estar em casa, mas
sua esposa é quem mais participa no caso de reunião ou de outra necessidade.
Explica que não têm tempo e mesmo sua esposa trabalha de domingo a domingo.
Quando são chamados para reunião de pais, comparecem, pois sempre
tem algo interessante porque afinal de contas é para saber alguma sobre os seus
filhos, se o seu filho está se saindo bem, se está ultrapassando os limites na
escola, se não está estudando ou não quer fazer nada ou está bagunçando, qual
a condição do andamento dele na escola.
Reconhece que participa pouco, comparece e ouve o que a escola tem a
dizer e fica calado. Comenta que sempre há poucos homens e nessas condições,
10% de presença masculina, acha que eles ficam constrangidos e sentem
dificuldade para falar, ficam só para ouvir, inclusive explica que como ao final
chamam um por um todos os pais, geralmente não precisa estar perguntando.
Como ele tem dois filhos em outra escola, perguntou-se se havia alguma
diferença nas reuniões, mas ele fala mais das informações que obtém do
aproveitamento dos filhos e fala de alguns problemas com material escolar como
estragar e sumir lápis.
Sobre sua vida escolar, conta que seu pai não sabia ler e não se
preocupava com sua escolarização, não o incentivava de forma alguma, contudo
sua mãe tinha muita preocupação, incentivava e o empurrava para estudar,
considera que foi mais do que uma guerreira e graças a ela aprendeu um pouco.
Percebe que antigamente, na 4
a
. ou 5
a
. série, o aluno já sabia ler e
escrever tudo, e diz que chegou a estudar até a 6a. série.
70
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Encontro
Objetivos e questões desencadeadoras
Participante
(nome fictício)
Encontro 3
09/12/2006
Objetivos: compreender o que pensam os genitores a
respeito das suas participações na escolarização de seus
filhos e de sua participação em uma realidade escolar da
rede pública de ensino.
1 – Aquecimento:
“Para começar eu queria pedir que você se apresentasse,
comentasse se teve oportunidade de estudar, até que
série pôde estudar, que tipo de trabalho exerce, falasse a
respeito de sua família, quantos filhos têm, há quanto
tempo constituiu sua família, há quanto tempo seu(s)
filho(s) estuda(m) nesta escola”
2 – Questões desencadeadoras:
“Eu gostaria de saber como é para você, como pai,
participar da escolarização de seu(s) filho(s)?”
“Como você faz para acompanhar o estudo de seu(s)
filho(s)? O que você faz?”
“Descreva uma situação no seu dia-a-dia em que
exemplifique sua participação na escolarização de seu(s)
filho(s)”.
“Como é para você este acompanhamento?”
“Se mais de um filho – Você vê diferença entre o
acompanhamento que faz para os dois/três... filhos?
“Como os outros pais homens fazem, algum amigo, por
exemplo, ou parente?”
“Como é para você pai, vir à escola para participar das
várias atividades que a escola propõe? Como você vê a
participação dos homens pais na escola?”
Ribamar
71
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Entrevista Devolutiva
Para a realização desta entrevista devolutiva, o pesquisador da equipe que
realizou as entrevistas telefonou para os pais que participaram dos encontros
anteriores e para os pais que haviam sido convidados para cada uma das
entrevistas anteriores, mas que, por algum motivo, não puderam estar presentes.
Além desses pais, novos contatos foram feitos, com auxílio do diretor, que enviou
convite para os genitores da escola. Participaram da devolutiva os pais Miltom,
José, Miguel, Marco, Walter e Pedro, sendo que nenhum deles havia participado
dos encontros anteriores.
Miltom tem 59 anos, é casado pela segunda vez há 18 anos e tem duas
filhas do seu casamento e duas enteadas. Uma de suas filhas, de 28 anos, mora
com ele e também uma neta de 11 anos que cursa a quinta série, a menina passa
a semana com ele e aos sábados vai para a casa dos pais para passar o final de
semana. Como ele diz, praticamente ele é quem cria esta neta. Ele tem o ensino
médio completo e sua esposa que trabalha em casa de família está cursando o
EJA. Trabalhou como motorista particular.
José tem 52 anos, é casado e tem quatro filhos. A menina de 6 anos
estuda nesta escola e ele já esteve presente em duas reuniões. Estudou até a 3
a
.
série. Está aposentado por ter sofrido um acidente de trabalho na construção civil.
A esposa não trabalha fora de casa.
Miguel tem 49 anos e é casado há 29 anos, e tem duas filhas, de 28 e 25
anos, que completaram o 2o. Grau e comenta que participou de muitas reuniões.
Tem um neto que freqüenta a 2
a
. série, há três meses e, por conta disso, ele
esteve presente nesta escola na primeira reunião no início do ano letivo. Está
aposentado por acidente de trabalho e faz serviços eventuais para completar a
aposentadoria. Ele estudou até a 4
a
. série, mas precisou estudar mais três anos
para completar os estudos e manter o emprego de garçom num hotel
internacional. Sua esposa nunca trabalhou.
Marco tem 38 anos, é casado há 11 anos e tem 1 filho. Seu filho tem 6
anos e está há 3 meses nesta escola. Ele trabalha como motorista de transporte
72
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
escolar numa escola particular de São Paulo. Estudou até a 1
a
. série do Ensino
Médio. Sua esposa trabalha como vendedora.
Walter tem 36 anos, é casado e tem 1 filho e outro a caminho. Seu filho
está na 2
a
. série e há dois anos nesta escola. No momento está desempregado,
mas era coordenador líder de uma empresa de sacolas para supermercado. Teve
a oportunidade de estudar só até a 7
a
. série, pois precisou trabalhar na roça
desde os 12 anos, numa fazenda no nordeste.
Pedro tem 35 anos, é casado há seis anos e tem 3 filhos, um menino e
duas meninas. Nesta escola estudam há dois anos as duas meninas de 8 anos,
na 2
a
. série. É a primeira vez que ele participa de um encontro nesta escola e relata
que na escola anterior, como era próximo de seu trabalho, corria até lá na hora do
almoço, tendo estado lá três ou quatro vezes. Pedro estudou até o primeiro ano do
Ensino Médio, trabalha com metalurgia e sua esposa trabalha em casa.
Iniciamos com a apresentação do objetivo da pesquisa e, como os pais
presentes não participaram dos encontros anteriores, explicamos que a intenção
era apresentar a eles a compreensão que tivemos a partir da fala dos genitores já
entrevistados e proporcionar-lhes a oportunidade de refletir, complementar,
confirmar ou discordar dos pontos levantados e relatar outros casos com novas
informações.
Assim orientados, o entrevistador começou a expor os assuntos de maneira
clara e pausada para que pudessem refletir e acompanhar todas as informações.
Apresentou a questão da influência da geração anterior no modo dos pais
de hoje assistirem seus filhos, exemplos de recursos que os pais empregam para
educar seus filhos, as dificuldades decorrentes da falta de tempo dos pais, os
motivos dos pais virem pouco à escola, as diferenças entre a participação das
mães e dos pais, a possível preferência da escola em chamar as mães e não os
pais e a reclamação dos pais pelo fato de a escola chamar os pais para
apresentar críticas.
Assim que os pais terminam de ouvir as questões, já há uma grande
mobilização com suas falas exemplificando diversas situações na direção das
questões apresentadas e outras mais que enriquecem os dados já levantados.
73
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Eles criticam e descrevem suas disposições afetivas diante dos incidentes
ocasionados pelos filhos na escola, com repercussões na sua vizinhança, com
ausência dos pais nos encontros marcados na escola, gerando o não
esclarecimento da questão e o afastamento cada vez maior dos pais.
Chegam a dar exemplos em que há professor que chama de canto para o
pai não se sentir envergonhado diante dos outros.
Pedro, Walter e Marco queixam-se das inúmeras vezes que são obrigados
a comprar mais estojos de lápis devido ao desaparecimento de material sem
solução, pois o professor não resolve e o diretor não permite que se revistem as
mochilas. Reclamam ainda das inúmeras brigas e Walter diz que seu filho
apanhava muito e ele ensina-o a defender-se revidando os tapas. Eles dão
exemplos de alunos que agridem de modo violento e os pais não aparecem na
escola.
Miguel menciona que a mãe não tem voz ativa com os filhos, tendo
dificuldade para despertar os filhos para ir à escola, pois eles não atendem e
então é necessário o pai; com uma voz mais agressiva, fazer a criança levantar.
Um dos pais disse que chega a bater para poder ser atendido pelo filho.
Após esse pai comentar que bate para a criança atendê-lo, um outro pai,
Marco, complementa que genitor tem de pegar pesado quando o filho faz arte,
pois, segundo ele, mãe fala de um jeito que não impõe medo, mima e aí o pai
precisa agir, pôr limite. Refletindo sobre essas ações, ele comenta que percebe
que isso atrapalha e acha que, como conseqüência, seu filho apresenta
dificuldade na escola. Comenta que, enquanto o filho estuda, e surge dúvida de
escrita, ele tem medo do pai, pois se errar este vai gritar, xingar. Conversou com
a esposa e disse que o jeito é pressionar menos e ter mais parceria, pois, devido
ao trabalho, sai de madrugada e chega tarde, nem vê o filho durante a semana.
Aprofundou-se este tipo de intervenção e o entrevistador comentou que o
que ele (Mario/pai) percebeu é importante para a evolução dele e sugeriu que
observasse bem que crítica ao comportamento não é crítica a ele (filho) como
pessoa e seria importante deixar a criança perceber que continua gostando dele
(filho) e está criticando o comportamento.
74
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Com estas reflexões, lembram-se do modo agressivo com que seus pais
impunham limites e comentam que se os pais deles foram “ignorantes” não vão
ser também com seus filhos. Sugerem a moderação, a conversa sem xingar ou
bater.
Miltom diz usar um sistema diferente, pois controla de perto a neta, dando
mais ou menos liberdade, indo com freqüência à escola para a neta saber que se
fizer algo errado, logo o avô vai tomar conhecimento.
Comentam sobre o envio de bilhetes aos pais, pois muitos alunos não
entregam com medo da represália paterna e assim os pais demoram a saber das
ocorrências na escola ou até deixam de tomar conhecimento. Há pais que
entendem que a direção da escola deveria encontrar uma maneira mais direta de
contato com pais, por exemplo, via telefone. Além disso, Marco e Walter dizem
que por pior que seja a situação, o fato deve ser tratado com discrição, sem
deixar que todos saibam.
Eles discutem vários aspectos sobre disciplina e maneiras de comunicar a
família e chamar a atenção o aluno. Miltom explica que desde o ano passado os
professores foram orientados a não chamar a atenção dos alunos na frente da
classe e sim encaminhá-los à secretaria.
Marco comenta que é o primeiro ano que seu filho está nesta escola, mas
sua esposa a freqüenta mais do que ele e, a professora de seu filho costuma
enviar comunicados através do caderno e a primeira providência que ele toma ao
chegar em casa é olhar o caderno e reparar se o filho arrancou alguma folha.
Caso perceba algo, conversa com o filho e dá um jeito de ir até a escola para
esclarecer.
Outro pai reforça a idéia do acompanhamento diário, observando se o filho
está fazendo a lição de casa e telefonando para a escola para esclarecer alguma
dúvida.
Marco ainda relata que o filho já chegou em casa sem anotar a lição de
casa, alegando falta de tempo para copiar e ele conversou e orientou seu filho a
prestar mais atenção.
75
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Miltom diz que o principal é os pais estarem em contato com a escola,
presencialmente ou via telefonema e acompanhar em casa, pois isso beneficia a
criança.
Reforçam a importância do acompanhamento diário e ao comentarem que
o aluno está na sala para aprender e estudar e não para brincar, reportam-se à
sua própria experiência escolar quando havia palmatória ou a imposição de olhar
para a parede como medida disciplinadora.
Exemplos de ocorrências são explanados e os pais explicam suas
interferências, exigindo do filho sentar-se próximo da lousa para estar mais atento
ou não se envolver em confusões, caso contrário a cobrança deles será grande.
Em seguida, comentam sobre a influência pais x escola, o diretor é citado
como uma pessoa aberta e receptiva às idéias dos pais.
Assistir à aula dos filhos foi um tema controverso, alguns acreditam ser
interessante, mas outros acham que inibem as crianças, inclusive o diretor tem
esta medida à disposição, mas, segundo eles, nenhum pai aparece.
Na seqüência, levantam o assunto educação e dão opiniões diversas,
refletindo sobre o que é responsabilidade do professor e o que é competência dos
pais e para alguns cabe à escola ensinar a ler e escrever e à família educar. Há
pai que diz que o professor deve educar, mas não usar de violência.
Lembram de casos em que professores agridem alunos pondo de castigo,
puxando orelhas e aí os pais se rebelam e reconhecem que também há casos de
alunos que passam dos limites.
Miltom destaca que quando há participação e aproximação família x escola
é mais fácil de tomar conhecimento, providências e orientar as crianças.
Debatem um pouco sobre o assunto comunicação escola x família e a
maior parte entende que a escola não deve demorar para avisar a família quando
algo não vai bem com a criança, ficar aguardando reunião de pais ou acumular
76
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
repreensões e voltam ao tema bilhete para os pais que quase sempre a criança
não entrega e eles acabam sabendo das coisas pelos vizinhos que têm filho na
mesma escola.
Neste momento, o entrevistador põe novamente em pauta a questão da
mãe mais presente que o pai e eles enumeram as dificuldades: o fato da escola
nunca marcar encontros nos finais de semana, os empecilhos para falta em
serviço, a maior desenvoltura das mulheres nesses encontros.
A maior participação para alguns desses pais acontece quando estão sem
emprego/serviço, então dividem as tarefas de acompanhamento dos filhos – levar
à escola e auxiliar nas lições de casa.
Marco diz que nos finais de semana que não trabalha seu tempo todo é
voltado para seu filho, que faz questão de estar ao seu lado, inclusive hoje ele
queria vir junto.
O grupo comenta que não são todos os pais que se preocupam com a
cultura dos filhos.
O entrevistador apresenta uma síntese do que foi dito inclusive para
esclarecer para um pai que chegou após o início da entrevista. Como ninguém
questionou mais, foi solicitado que cada um falasse um pouco a respeito de sua
família, trabalho e oportunidade de estudo.
Durante as apresentações, comentam sobre a força que passam a ter
quando agem em grupo, a força da comunidade para a busca das resoluções dos
problemas.
77
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Encontro
Objetivo
Participantes
(nomes fictícios)
Encontro 4
24/03/2007
Objetivo: devolutiva.
1 – Aquecimento:
“Para começar, eu queria pedir que vocês se
apresentassem, comentassem se tiveram oportunidade
de estudar, até que série puderam estudar, que tipo de
trabalho exercem, falassem a respeito de sua família,
quantos filhos têm, há quanto tempo constituíram sua
família, há quanto tempo seus filhos estudam nesta
escola”
2 – Apresentação de uma síntese das entrevistas
anteriores:
– Como os pais percebem e assumem os seus papéis
na escolarização dos seus filhos.
– Interação com a escola dentro do processo de
escolarização dos filhos
– Recursos e estratégias aos quais recorrem para
desempenhar o seu papel na escolarização dos filhos.
– Disposições afetivas de pais homens na relação com
a escola
– Como os pais vêem a escola
– Justificativas para o afastamento dos genitores
disponibilidade de tempo.
– Questão de gênero
– Diferenças entre o homem e a mulher
– Diferenças dos pais e mães na geração anterior
3 – Oportunidade de eles contestarem,
complementarem ou acrescentarem aspectos ainda
não apresentados.
Miltom
José
Miguel
Marco
Walter
Pedro
78
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
2.7. PROCEDIMENTOS DE ANÁLISE
O referencial teórico adotado para a análise das entrevistas foi a
Hermenêutica, conforme descrita por Herman (2003). As idéias de Hermenêutica
são importantes contribuições para o rigor conceitual do referencial dialógico.
Segundo a autora, a Hermenêutica articula contribuições dos pré-socráticos
(harmonia entre pensamento e realidade e entre objetivo e subjetivo), de Hegel
(somos sujeitos na história) e Heidegger (a verdade como desvelamento).
Herman (2002: 10) afirma que “só através do diálogo é possível aprender” e
enfatiza o papel da linguagem, da história vivencial, quando diz que “a verdade
encontra-se imersa na dinâmica do tempo” (idem, ibidem: 15). Segundo Palmer
apud Herman (idem, ibidem: 23-24), a hermenêutica pode ter três sentidos: “dizer”
(“ouvir que conduz ao diálogo”); “traduzir” (tornar o mundo explícito ou
compreensível) e “explicar” (enquanto interpretação). Outros dois pontos que
merecem destaque são: “a experiência hermenêutica exige quebrar a resistência
para abrir-se ao outro, para deixar valer a palavra do outro” (idem, ibidem: 56), e
“o diálogo possibilita condições de reflexão”, pontos estes que apóiam as
orientações adotadas na entrevista reflexiva.
Segundo Minayo (apud Szymanski, Almeida & Brandini, 2004: 64),
hermenêutica “indica um ‘caminho de pensamento’ orientador para a
compreensão da comunicação contida no texto”. O texto no caso é o relatório de
transcrição das entrevistas.
Martins e Bicudo (2005: p. 99 e 102-104) propõem um proceder analítico
com os seguintes momentos de reflexão:
Imersão empática no mundo da descrição. O pesquisador busca colocar-se
no mundo do sujeito e “conseguir uma relação empática com o sujeito
através da descrição que efetua sobre a situação por ele vivida”.
Redução do ritmo de análise e permanência na descrição. O
pesquisador considera e dedica atenção a cada um dos pormenores de
modo a aprofundar na análise da descrição, com uma atitude
questionadora do tipo, “como posso ter acesso direto ao mundo deste
sujeito?”.
79
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Ampliação da situação. Se o momento anterior for conduzido
adequadamente, espera-se que a realidade do sujeito mostre “o seu sentido
e a sua significação torne-se ampla”, indo além da situação mundana do
sujeito, na qual um pormenor pode ter um sentido irrelevante.
Suspensão da crença e interesse intenso. Para evitar uma absorção
ingênua, simultaneamente à atitude de empatia, deve manter a dúvida a
respeito da descrição do sujeito. Esta dúvida não significa deixar de
acreditar na descrição, mas esforçar-se para ir além do juízo precoce e
simplista de falsidade “versus” verdade e, compreender “a gênese, as
relações e as estruturas em geral do fenômeno estudado...”.
Passagem dos objetos para os significados. Na análise, para
constituição dos objetos, os significados são isolados nas denominadas
“unidades de significado”. Na situação pesquisada e registrada na
descrição, os significados “se superpõem de tal modo que se implicam
mutuamente, constituindo uma unidade”.
Os autores sugerem iniciar a análise com uma busca de apreensão do
todo. O sentido do todo servirá de orientação para o delineamento das unidades
de significado – “discriminações espontaneamente percebidas nas descrições dos
sujeitos”. Por meio de releituras, para familiarização com a linguagem do sujeito,
da reflexão, da variação imaginativa, as unidades de significado são inter-
relacionadas e agrupadas em constelações ou categorias, de acordo com critérios
que sejam comuns às unidades que constituem cada constelação. Este diálogo
reflexivo com o texto possibilita ampliar e aprofundar a compreensão da realidade
do sujeito. Por fim, é elaborada uma síntese, por meio de proposições, que visa
representar o sentido do todo. (Szymanski, Almeida e Brandini, 2004: 66). Esta
forma de tratar os dados coletados nas entrevistas parte da suposição que:
a realidade psicológica não está pronta à mão no mundo e que não
pode ser vista simplesmente, mas que precisa ser constituída pelo
pesquisador. As unidades de significado também não estão prontas no
texto. Existem somente em relação à atitude, disposição e perspectiva
do pesquisador. (Martins & Bicudo, 2005: 99)
80
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Procedimentos operacionais de análise de entrevistas
Como no caso se trata de pesquisa qualitativa, é interessante oferecer ao
leitor todos os passos
25
ou momentos seguidos na transformação do material –
procedimento de análise – e exemplificar as transformações feitas com o material
original coletado. (Luna, 2003: 68). Nesse sentido, os procedimentos operacionais
foram:
Primeiro momento: transcrição
A análise dos dados iniciou-se com a transcrição das entrevistas gravadas,
resultando na primeira versão do registro documental de dados. A transcrição já
foi um primeiro momento de análise, pois foi realizada pela própria pesquisadora.
Além da fala do entrevistado, o mais fiel possível ao modo como foi enunciado,
constam também apontamentos de “percepções, impressões e sentimentos” do
pesquisador, e de “aspectos da interação” e, “interrupções, clima emocional,
imprevistos e a introdução de novos elementos” que ocorreram ao longo da
entrevista (Szymanski, 2004: 72-73). Esta primeira versão da descrição é
denominada também como Descrição ingênua (idem, ibidem: 82). Este momento
seguiu a orientação de Martins & Bicudo – Imersão empática no mundo da
descrição.
Segundo momento: elaboração do texto de referência
A seguir, efetuou-se “a limpeza dos vícios de linguagem e do texto grafado,
segundo as normas ortográficas e de sintaxe, sem substituição de termos”,
25
A denominação “passos” em geral é adotada pelos métodos de orientação mais
objetivistas/neopositivistas, e está relacionada com uma visão de linearidade e previsibilidade. Martins e
Bicudo adotam o termo “momentos” para enfatizar que o pesquisador deve manter uma atitude de
abertura. Neste caso vale a observação de Lahire (2004: 16): “O conhecimento sociológico só pode ser
criado através de um trabalho, sendo que as diferentes etapas da pesquisa não estavam jamais
separadas, como nos esquemas hipotético-dedutivos escolares. Tudo é válido a qualquer momento do
trabalho, para compreender melhor o que foi feito em qualquer outro momento. Em vez de refletir assim
que acabar a pesquisa, o sociólogo deve fazê-lo a cada instante e, particularmente, naqueles
momentos banais, aparentemente anódinos, em que tudo leva a crer que não há nada a se pensar.”
81
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
resultando daí uma segunda versão: o texto de referência – assim denominado
porque passou a ser o principal referente (Szymanski, 2004: 74).
Terceiro momento: Imersão na descrição, para identificação
de unidades de significados, categorias e temas.
Adotando a orientação de Martins & Bicudo (2005: 102) para reduzir o ritmo
de análise e permanecer na descrição, o texto de referência foi relido diversas
vezes, isto é, fez-se uma imersão na descrição. Por meio destas releituras criou-
se uma relação de proximidade com o texto, foram feitas anotações de “insights,
sínteses provisórias e visualização de falas dos participantes, referindo-se aos
mesmos assuntos” e, desse processo, emergiram “novas articulações
conceituais” ou “eixos de compreensão”: as categorias ou constelações, formas
de agrupamento de assuntos e conceitos singulares a cada pesquisador. Este
momento pode ser denominado também como “explicitação de significados” ou de
Descrição II” (Szymanski, 2004: 75). O pesquisador poderá ainda agrupar as
categorias por grandes temas, que representariam fios condutores que interligam
várias categorias. Esta possibilidade de direcionamento da análise é apresentada
por Martins e Bicudo (2005: 104) como “tematização dos significados e motivos
repetidos [...] a localização de temas repetitivos é importante porque elas apontam
para os aspectos essenciais do fenômeno”. A representação gráfica das
constelações, indicando as inter-relações entre elas, pode ter diversas
configurações, dependendo da compreensão e história pessoal do pesquisador.
Assim, conforme exposto, as entrevistas em forma de texto de referência
foram sendo analisadas, buscando a compreensão da singularidade das
situações estudadas. Muito mais do que leis gerais, buscou-se identificar
diferenças sutis, mas importantes, entre situações aparentemente semelhantes
(Hermann, 2003) e do “oculto no aparente” (Szymanski, 2004: 84).
82
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Capítulo 3
ANÁLISE DAS ENTREVISTAS
onforme exposto no item ‘2.7. Procedimentos de análise’, o referencial
teórico adotado para a análise das entrevistas foi a hermenêutica.
Coerente com essa abordagem, o trabalho de análise foi desenvolvido
com a seguinte seqüência de momentos: inicialmente foi feita a transcrição e se
procurou já iniciar uma imersão empática no mundo da descrição, bem como
formar uma compreensão geral; na seqüência, foram eliminados os vícios de
linguagem, resultando no texto de referência; foram feitas várias imersões nesse
referente-base para identificação das constelações (unidades de significados,
categorias e temas).
As constelações que emergiram foram: como os pais percebem e
assumem os seus papéis na escolarização dos seus filhos, a interação dos pais
com a escola no processo de escolarização dos filhos, os recursos e estratégias
aos quais recorrem para desempenhar o seu papel na escolarização dos filhos, as
disposições afetivas de pais homens na relação com a escola, como os pais vêem
a escola, as justificativas para o afastamento dos genitores, a questão de gênero
e o diretor.
A seguir serão apresentados elementos de análise para cada constelação
e algumas falas que ilustrarão a percepção que levou à identificação da
constelação em questão.
CONSTELAÇÕES
83
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Como os pais percebem e assumem os seus papéis na escolarização dos
seus filhos
A análise das falas revela uma diversidade de percepções e ações que
estão bastante condicionadas à situação existencial desse genitor ou
responsável: se tem compromisso profissional regular (ou está aposentado,
licenciado ou desempregado) e se domina os recursos da escolarização (ou é
analfabeto).
A fala dos genitores com escolaridade, com bom capital cultural
26
, revela
que eles olham a lição do filho quando chegam em casa. Outros, com um horário
extenso de trabalho, dedicam o final de semana para acompanhar mais de perto
as atividades dos filhos.
Cícero – Em casa eu pego todos os dias o caderninho dele lá, passo
exercícios para ele, mando ler textos, tudo. Só mexe no computador
e só liga a televisão depois de fazer as coisas do colégio; o que não
faz no colégio ele é obrigado a fazer em casa.
Entretanto, o desempenho desse papel está relacionado diretamente com o
nível de escolaridade dos pais. Aqueles que não puderam adquirir alguma
escolaridade têm uma atuação mais restrita.
Donizete – Eu olho os cadernos deles, se a letra está muito feia, eu
mando corrigir. A menina é mais esperta, mais calma (...) a letra é
mais bonita.
Pode-se observar que há acompanhamento limitado à análise das letras,
caligrafia, indicando uma atenção limitada.
A fala dos responsáveis que não têm compromisso profissional regular
(dois avôs aposentados, um desempregado, um aposentado por invalidez e outro
que tem horário flexível) revela que são os mais presentes no dia-a-dia e nas
convocações da Escola. O caso dos avôs que ajudam seus filhos na educação
26
Capital cultural: vide capítulo 1, revisão de literatura sobre a relação família-escola.
84
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
de seus netos mostra um dos muitos tipos de arranjo familiar contemporâneo. A
neta de um dos avôs mora com o avô durante a semana e fica na casa dos pais
no final de semana. O neto de outro avô aposentado está com ele porque o pai
biológico não assumiu essa paternidade. Os avôs comparecem regularmente na
escola. Os pais que não têm compromisso profissional regular também
comparecem, principalmente nas reuniões de pais.
Miltom – (...) Eu nem espero ser chamado, eu venho, eu converso
sempre com o diretor (...) Eu pergunto para o diretor – Então, posso
conversar com o professor para saber das coisas? Ele dá
autorização, eu venho, eu converso.
Na fala dos pais que valorizam a interação com a escola e que são os que
mais comparecem à escola, há críticas aos pais que nunca comparecem. Citam a
atitude aberta e receptiva do diretor e usam a própria reunião para a entrevista
[devolutiva] como exemplo – houve um convite pessoal do diretor a todos os pais,
enfatizando a importância do trabalho, foi agendado para um sábado e mesmo
assim compareceram apenas seis.
Miltom – Agora você vê, tem muita gente que critica o Tomaz, o
sistema dele, mas só que o sistema dele está dando certo. Eles não
concordam, mas só que, por exemplo, não vêm a nenhuma reunião.
Está aqui ó, foi mandado [o convite do diretor].
Marco – Geralmente com esse comunicado eu acho que enchia essa
sala aqui. Hoje tem o que 6, 7, 8? Dia de sábado, não tem desculpas.
Miguel – Talvez se eles amanhã convocarem as mulheres para elas
virem num sábado, elas topam. Não é por isso que os pais não se
preocupam com os filhos, eu acho que se preocupam sim, eles não
se preocupam em ter esse tipo de responsabilidade, de estar na
reunião, isso é da mulher, isso é da mulher.
Todos – [Falam juntos concordando.]
Os depoimentos de genitores que passam na escola com mais freqüência
associam este movimento também a uma forma de controle, pois assim a criança
sabe que se fizer algo inadequado sua família logo estará a par. Esse papel está
associado estritamente à vigilância por meio da presença física.
85
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Miltom – (...) se a gente estiver participando do negócio da escola,
então você vai estar sabendo de determinadas coisas (...) por
exemplo, o filho, a filha vai pensar – meu pai! Meu pai sempre está lá
na escola, se eu ficar aprontando eles vão descobrir. Então sempre
fica aquele negócio na cabeça dele então é aquela coisa mais
maneirada, ele não vai fazer ‘aquela coisa’ (...) só ‘coisa’ mais leve.
Esse avô sugere aos outros pais que têm um horário mais restrito, devido
ao trabalho, que utilizem o telefone para fazer o acompanhamento.
Miltom – Eu falo no sentido de que cada um tem as suas tarefas
dentro de casa, não sei a hora que o pai chega, pega o caderno e
sempre dá uma olhadinha. Não tem lição hoje, outro dia a mesma
coisa – não tem lição para casa. Espera aí, telefona, dá uma
telefonadinha para a professora; não precisa nem vir aqui.
Essas falas de muitos genitores revelam unanimemente que um dos papéis
do pai na escolarização é o de cobrar, pressionar, repreender e impor limite.
Miguel – A mãe vai lá e chama – Vamos filho, olha a hora. Ele vira
para o lado. A mãe chama de novo: Vamos (...) E aí o pai fala, o pai
fala duas ou três palavras. O pai tem voz mais agressiva. (...)
Walter – O meu é a mesma coisa.
Pedro – Isso, é a mesma coisa. É que a mãe é mais paciente.
Miguel – Aí o pai fala: Vamos lá! Passa mais dez minutos. Aí o pai
faz o quê? (...) vamos lá... – Eu carco o braço. (...) O pai tem que ter
voz ativa dentro de casa.
A sanção por meio de castigo físico está relacionada a casos em que o pai
não enxerga outro recurso para resolver situações problemáticas que não se
resolvem. E quando tomam medidas extremas, esperam que as mães aliviem a
pressão.
Ronaldo – Acho que se os dois [pai e mãe] estiverem agindo com o
mesmo intuito, nem o pai querendo tirar a autoridade da mãe, nem a
mãe querendo tirar a autoridade do pai, mas, aliviando a pressão.
Porque é ruim querer fazer as coisas sob pressão.
86
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Um genitor coloca que os pais, em casa, deveriam despertar a
responsabilidade nos filhos para terem um comportamento adequado na sala de aula.
Marco – O meu já chegou em casa sem lição de casa. Cadê a lição?
– Ah, não deu tempo de copiar. Como não deu tempo, o que você
estava fazendo? Ah! filho, você tem que prestar mais atenção na
escola.
Na imersão, quando os professores se referem à escola ideal, também
expressam que os pais deveriam assumir responsabilidade, participando mais na
vida escolar dos filhos e impondo mais limites. Esta atitude resultaria em um
fortalecimento emocional do aluno. Os professores acham que deveria existir
“mais momentos de reflexão entre pais e filhos com objetivo de formação e que a
escola, a família e a comunidade formassem uma corrente para ajudar as
crianças a incorporarem o valor da educação.” Para tanto, foi sugerida a
realização de palestras para a comunidade. Alguns professores disseram que os
pais participam pouco e têm pouco interesse pela vida escolar dos filhos, além de
ver a escola mais como um abrigo. Esses professores reclamaram que o trabalho
que é feito na escola não tem continuidade na casa do aluno, reconhecendo,
entretanto, as dificuldades de alguns pais, por serem analfabetos. Nesse sentido,
alguns funcionários reforçaram a percepção de que falta interesse dos pais pela
escolarização e colocaram que o interesse maior de muitos pais é pelo aspecto
assistencial (leite, uniforme, merenda, material escolar). Um aspecto colocado
pelos funcionários é o de que os pais deveriam transmitir valores aos seus filhos.
Os próprios alunos mostraram consciência da importância da participação dos
seus pais na escolarização, seja olhando o material (inclusive os bilhetes da
escola) e comparecendo às reuniões.
Interação com a escola no processo de escolarização dos filhos
A análise das entrevistas revela que, para alguns pais, devido à dificuldade
para se colocar em público, interagir com a escola significa “escutar o que a
escola fala”.
87
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Jorge – [...] É com a mãe! êta, é com a mãe mesmo. O pai fala
pouco. Não tem que estar falando, geralmente é a mãe.
Donizete – Eu, de vez em quando, até venho nas reuniões, às vezes
a minha mulher não pode vir aí eu venho. Em geral fico mais quieto
um pouco retraído (...) mas acho que seria melhor ter mais diálogo
também. Mas uma vez eu vim numa reunião e estava só eu e o resto
tudo mulher e criança e eu fui embora.
Donizete – Antes dava um pouco de vergonha porque a gente não
sabe (...) ‘tipo assim’ [participar na escola] – porque a minha mulher
acompanha a escola, leva aquele diálogo. Não ter tanta familiaridade
com a escola intimida um pouco.
Outros pais consideram que, desde que o filho esteja aprendendo a ler e
escrever, é desnecessário contato maior com a escola. Pequenos problemas, por
exemplo, relacionados a materiais, são relevados.
Pedro – Outro dia minha filha disse: Pai, precisa comprar lápis e
borracha. Mas, minha filha, eu não comprei ontem? Caramba! E o
professor? Como fica isso aí?
Se está todo mundo na sala e a
criança comunicou: “sumiu este livro”. Espera aí, não vai sair
ninguém. Quem está com o material de fulano? Aí minha esposa
perguntou para a mulher aí embaixo, não sei se falou com o diretor.
Ah, não pode fazer isso, não pode revistar a bolsa de ninguém
.
Quem dizer, eu digo que todo mundo reclama. Sumiu isso, sumiu
isso, não sei (...)
Walter – É isso, estou comprando direto material para o meu filho.
Marco – Ah, do meu filho sumiu aquele estojinho de lápis de cor, eu
comprei outro estojo para o moleque e depois de dois dias sumiu. Aí
eu falei: filho, mas e a professora? Ah, pai, eu falei com ela e ela
falou assim que ia ver. Ah, isso não existe. O que ele falou é
verdade. Viu lá, deu o sinal e fulano e beltrano, a professora vai ver
com quem está; devolve numa boa, a tia não vai falar nada, de
repente vocês estão escondendo para brincar, não é? Vocês estão
escondendo para devolver depois, deixar o amiguinho nervoso,
depois vocês vão devolver, mas a professora quer que vocês
devolvam porque ele vai precisar para pintar, o pai não tem
condições (...) então (...) a criança vai ficar com aquele receio, puxa,
eu peguei nossa, vou ter que devolver, vai falar que eu sou ladrão,
então na escola vai girar este tipo de coisa: Oh, o ladrão! Então a
88
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
professora acha que não é bom usar esse termo, rotulando e acabou
ali – é, fez uma brincadeira e não é fulano. É, fez – acabou
entendeu?
Um dos motivos fortes que faz com que pais interajam com a escola é a
ocorrência de algum caso de agressão grave, “quando filho é machucado na
escola”.
Cícero – São poucos [pais], geralmente só vêm na escola quando o
filho chega machucado em casa e aí vem querendo fazer escarcéu,
vêm culpar o professor – o que eu acho errado, entendeu? Se saiu
alguma violência, alguma coisa (...) Conversar, professor, o que
aconteceu? Saber os fatos, porque sabe que nenhum filho é santo.
Já começa por aí. Não pode querer chegar e por a culpa toda no
professor, pois são 40 alunos e por aí é difícil, sei que é difícil para o
professor.
Walter – Semana passada também eu fui chamado, o meu filho saiu
no tapa com um outro do tamanho dele e fui chamado, eu e minha
esposa. Aí minha esposa falou: – Eu vou. – Não, eu vou também.
Vim, só que quando eu cheguei aqui esperei e a outra mãe não veio,
o outro pai não veio, entendeu?
Alguns pais acham que o diretor e os professores não devem esperar
acumular muitos problemas dos alunos, isto é, não devem dar muitas chances
para só depois chamar os pais.
Pedro – Resumindo, na minha opinião, o professor não deve
acumular muito problema do filho aqui não, se aprontou hoje
comunica amanhã, está entendendo? (...) Ah, na reunião vou falar
com o pai, a mãe e tudo bem e chega na reunião – como é que o sr.
não avisou, entendeu? É o seguinte, aprontou hoje, se der para
avisar hoje avisa hoje. Olha, o seu filho fez isso, isso dá para o sr. vir
amanhã ou hoje mesmo, não acumular. O moleque que bagunça e
vai acumulando, acumulando não pode. Aprontou? Ó, tem o telefone
na secretaria. Ó, seu filho fez isso, dá para o sr. vir aqui?
Na imersão foram registradas várias manifestações sobre a agressividade,
por professores, funcionários e alunos. Os professores expressaram uma
89
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
sensação de solidão ao enfrentar situações de brigas entre alunos. Outros se
reconheceram despreparados para lidar com situações de violência dentro da
escola e reclamaram da omissão dos pais. Justamente os pais de crianças
problemáticas seriam os mais ausentes. Os pais também colocaram estes
problemas e suas dificuldades em lidar com elas. Reconheceram que participam
pouco na escola, mas que deveriam “fiscalizar” os filhos. As professoras
reconheceram as dificuldades dos pais para participarem mais, devido ao
trabalho, que as mães participam mais que os pais e que, por outro lado, os pais
têm mais autoridade sobre os filhos. Alguns professores sugeriram que os pais
fossem chamados não apenas para receberem críticas e que as reuniões fossem
mais freqüentes e por sala, ao invés de séries.
Recursos e estratégias aos quais recorrem para desempenhar o seu papel
na escolarização dos filhos
As falas dos genitores descrevem vários recursos, sendo que os mais
citados foram: pressão, exemplo, medo e espancamento.
De modo geral, o uso desses recursos é associado ao objetivo de propiciar
um futuro melhor para o filho.
Ronaldo – Eu acho que a gente tem que plantar hoje para esperar o
amanhã, tem que dar o exemplo como pai porque os filhos vêem
isso. Eles vêem a cobrança, vêem que você procura fazer o máximo
para agir do jeito que você fala e amanhã quando eles forem os pais
eles não vão ser iguais, mas eles vão procurar pegar o melhor que
você fez e fazer também para os filhos. Então eu acho que a gente
tem que estar cobrando, estar ajudando os filhos no
desenvolvimento, no desempenho escolar e esperar uma mudança
também no ensino em si porque antigamente o professor tinha uma
certa autoridade em sala de aula, hoje em dia ele já não tem tanta
autoridade.
Comentam que o que eles fazem (exemplos para os filhos) influi na
maneira dos filhos agirem.
90
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Marco – Olha, a educação vem de casa, se você ensina o seu filho
ali na tua casa de uma maneira correta certinho eu te garanto que ele
vai fazer a mesma coisa e se você jogar uma cadeira na parede ele
vai fazer a mesma coisa.
Esses recursos foram relacionados a experiências desses pais com seus
pais e seus professores, quando crianças.
Ronaldo – Na minha época, na época da minha mãe e dos meus
avós, eram mais rígidos. Na minha época, os alunos tinham medo e
respeito pelo professor.
Donizete – O pai não pegava no pé não, mas era o professor que era
bravo [risada]. – Ave Maria [risada]. Muitas [experiências de
professor bravo]. No interior, sabe? Se pisava na bola, errava a
conta, apanhava. E chegava em casa apanhava de novo.
A pressão é aplicada para mobilizar comportamentos como: fazer tarefas,
cumprir obrigações, compensar desinteresse do filho. Os exemplos de pressão
são: cobrar, só ligar a TV depois das lições e não sair de casa. O pai diz que deve
dar exemplo, pois acredita que os filhos percebem, como afirmam – “vêem que
você procura fazer o máximo” – e assimilam os valores desejados.
Despertar o medo no filho como falar bravo, ameaçar bater e exigir
resultados é uma forma de exercer controle sobre o filho para conseguir
resultados.
Cícero – Eu tenho um caso como o meu filho, sempre, tanto eu como
a mãe dele, a gente participa. Como toda criança é bem levada, esse
foi um ano que nós tivemos bastante problema com ele. Acho que o
professor tem que dominar o aluno e não o aluno dominar o
professor (...) meu filho é assim, a gente está tentando tirar isso dele,
mas tem um defeitinho, ainda se não estiver sob pressão do lado,
sempre fiscalizado ele não faz mesmo, ele sabe, mas tem preguiça.
O espancamento é citado como o recurso para casos extremos de
situações nas quais o pai não vê outra solução como, por exemplo, ser chamado
91
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
pela escola diversas vezes pelo mesmo problema. A mãe tem de deixar de fazer
suas tarefas para ir à escola. O espancamento é relacionado mais ao papel do
genitor.
Jorge – Os meus ficam com medo, medo que vou brigar com eles.
Pensam que vou bater.
(...) – Quando pai entra para resolver, não
conversa, bate.
Cícero – Porque dependendo da estrutura do pai, não vai querer
saber. A maioria vai chegar em casa e vai espancar o filho, que é
mais errado ainda. Cria uma revolta no filho. A questão que eu vejo
com muito dos pais – quando surge um problema o pai vem e não
resolve e quando o chamam novamente, por aquele mesmo
problema, vira uma coisa contínua (...) calma aí, já fui chamado uma
vez, já falei o que podia ser feito. (...) se já fui uma vez e não
resolveu, porque eu vou de novo? (...) Tenho um vizinho lá, que tem
um filho que estuda aqui. Ele veio aqui, foi chamado duas vezes pelo
mesmo assunto. Não resolveu, o que ele fez? Trancou o filho na
casa dele. Falei para o meu filho, eu não faço isso com você, já pego
de outro jeito, cortando as coisas que você gosta acho que bater não
adianta. Se bater adiantasse (...)
Foram colocadas algumas ressalvas em relação a este recurso: agressão
dos pais cria revolta na criança. Foi colocado que se deveriam buscar outros
recursos, por exemplo, reunir pai, mãe, diretor, professora com o aluno, ainda que
para colocar medo.
Cícero – Não, continua a mesma coisa e o pai já não vai mais, deixa
para a mãe. E você vê o casal sempre discutindo, por quê? Porque
sempre é chamado pela mesma coisa. (...) Acho que isso não pode
acontecer. Pode se reunir um pai, uma mãe, a professora, um diretor
e vamos por um medo no seu filho. Vamos falar que vamos expulsar
do colégio, colocar um medo na criança. Porque senão o que é que
acontece? Vê a coisa que só se está conversando e não deu em
nada, vai continuar no mesmo erro. Isso acontece muito.
Na imersão os pais disseram que a educação tem de ser dada na infância,
visando um futuro melhor. Muitos pais reconhecem-se ignorantes e sem recursos
92
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
para educar os filhos e esperam que a escola os oriente. Também as crianças
reconhecem na educação a possibilidade de um futuro melhor. Em relação ao uso
da violência para educar, alguns alunos manifestaram o medo de apanhar dos
pais e também de irmãos mais velhos que tem a incumbência de tomar conta
deles na ausência dos pais. Alguns alunos sugeriram que a escola fizesse
palestra para os pais para explicar “o que está errado”.
Disposições afetivas de pais homens na relação com a escola
Uma constelação que emergiu das falas refere-se a como os pais homens
se sentem no relacionamento com a escola e na escolarização dos filhos. Uma
disposição afetiva muito citada foi a do constrangimento por ser minoria nas
reuniões.
Jorge – A gente fica lá, esperando (...) chega lá, só tem mulher, só
tem duas pessoas igual a eu [pai homem].
Donizete – Antes dava um pouco de vergonha porque a gente não
está por dentro das coisas.
Jorge – Porque a mãe é mais social com o professor, ela chega e já
vai entrando e vai conversando com o pessoal (...) porque é mulher.
Outra forma de constrangimento ocorre na interação com o professor. A
fala de um pai, habituado a interagir com público, é reveladora da sensação de
desnível cultural ou simbólico entre alguém que ocupa o lugar de professor e
alguém pertencente à classe popular.
Donizete – Eu me sinto à vontade com pessoas porque eu trabalho
com o povo [é cobrador de ônibus]. Mas aqui não é a mesma coisa.
Eu me sinto mais tímido em falar com a professora.
Outro sentimento identificado foi o reconhecimento da importância da
reunião de pais. Alguns genitores colocaram a importância do comparecimento à
reunião de pais para tomar conhecimento mais completo da situação e inclusive
para evitar acusações injustas aos professores.
93
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Ribamar – Quando a escola convoca uma reunião de pais, Pais e
Mestres que eles falam, ou Pais e Responsáveis, eu sempre acho
alguma coisa interessante, porque afinal de contas, você está indo
que seja eu ou que seja a minha mulher, para você saber alguma
coisa sobre os seus filhos,
não é?
Alguns pais manifestaram um sentimento de insatisfação com a
escola/professora, no que se refere aos resultados da aprendizagem, atitude de
desinteresse em resolver problemas que ocorrem na sala de aula e atitude de só
criticar o aluno.
Cícero – Eu até entendo que a professora não consiga segurar ele,
uma vez ou outra tudo bem, mas que fique direto assim? O mesmo
aluno só dominando? A minha crítica é essa. Que o meu filho é
bagunceiro, eu sei que é. Só que a professora tem que pegar um
pouco e não a criança colocar um limite no professor. A minha crítica
maior é isso. (...) Agora, toda vez que você vem – ó, está aqui ó, é o seu
filho mais uma vez. Só vem pela crítica e se vira o problema é seu.
Na imersão já havia sido apontado pelos professores que faltam condições
para acompanhar mais de perto os seus alunos com dificuldade: classes com 40
alunos, falta de preparo para enfrentar situações limite, falta de professores.
Reclamam por serem tratados como os principais culpados pela situação e alguns
manifestaram sentimentos de desânimo e desmotivação. Alguns alunos
colocaram suas dificuldades, sentindo-se “burros” e sem disposição de ir à escola.
Como os pais vêem a escola
Nesta constelação foram agrupadas as unidades de significado de
natureza mais cognitiva – percepções, visões, avaliações, enfim conteúdos que
podem ser registrados como informações.
A análise das falas indica que os pais reconhecem a dificuldade de manter
a disciplina em uma classe de 40 alunos e que é preciso uma parceria do
94
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
professor com o diretor, com a equipe da escola e com os pais. A questão da
disciplina é associada a um exercício de poder autoritário (“pulso firme”).
Cícero – Não pode querer chegar e pôr a culpa toda no professor,
pois são 40 alunos e por aí é difícil, sei que é difícil para o professor.
Sei que se ele não toma a frente, a rédea, não age com pulso firme,
a sala domina o professor e não o professor a sala.
Outra fala sugere que o professor deveria usar estratégias didáticas
diferentes para criar interesse nos alunos e evitar a rotina: diálogos diferentes,
aulas diferentes, convidar os pais para participar de algumas atividades na sala
de aula. Entretanto, essa sugestão de caráter didático está baseada em
experiência anterior, em outro Estado.
Cícero – Eu acho que teria que fazer um diálogo diferente com os
alunos. Eu sou do Paraná – na realidade sou Cearense – o meu filho
estudava lá e [naquela instituição] o pai tinha que ir para dentro da
sala da aula
e tinha que fazer alguma coisa diferente, ou seja, eles
tiravam a criança da rotina. Para as crianças, vira uma rotina ficar
todos os dias sentados ali escrevendo na lousa e o professor
explicando. Fazer uma aula diferente, chamar os pais e propor
alguma atividade diferente. No Paraná era muito tranqüilo, tivemos
uma ou duas ocorrências com ele lá, tirando isso, normal.
Outro aspecto apontado por falas de alguns pais é uma avaliação positiva
da reunião de pais, pois participando dela é possível acompanhar o que está
ocorrendo na escola e conhecer melhor os professores. Especialmente os pais de
crianças que têm bom desempenho gostam da reunião, pois se sentem
orgulhosos dos filhos pelo bom aproveitamento.
Ribamar – Geralmente na reunião acontece isso e eu acho
proveitoso, acho sempre interessante porque você vai saber o que
está acontecendo, se o seu filho está se saindo bem, se está
ultrapassando os limites na escola, não está estudando ou não quer
fazer nada ou está bagunçando. Apesar de eu participar poucas
vezes em reunião, mas das vezes que participei eu sempre achei
interessante porque fala sobre o seu filho, qual a condição do
andamento dele na escola.
95
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Ronaldo – Eu acho que deveria ser ‘estilo assim’: não só para ouvir
reclamações sobre os filhos porque ele cometeu algum delito na
escola, aprontou alguma arte, mas vir para ouvir as qualidades do
filho porque é agradável para qualquer pessoa receber elogios e ver
o que ele está fazendo, se está tendo resultados.
Outras falas elogiam o diretor por estar sempre convidando os pais, por se
mostrar interessado por todos e ‘defender’ os alunos e os familiares.
Cícero – O diretor é legal, convida, sempre chama, é tranqüilo. (...) É
bom que assim a gente vê que tem alguém interessado também, só
que é assim, só que tem a questão – não adianta um só querer
ajudar e o outro falar: Ah, do jeito que está, está bom.
Eu vejo por
este lado também.
Miltom – (...) Essa coisa de professor chamar a atenção na frente de
todo mundo, acho errado. Tanto que fizemos diversas reuniões com
o Tomaz [diretor] e passamos isso para ele, tanto que desde o ano
passado ele já conversou com todos os professores.
A confirmação de que essa orientação para que o professor tenha tato de
conduzir assuntos constrangedores de um modo reservado, surge em outra fala.
Ronaldo – Eu comparecia nas reuniões dos meus irmãos, eu ia lá e
tudo mais, e acho que é proveitoso sim, porque se o assunto é um
pouco pesado o professor procura não constranger o pai na
presença dos outro e deixa para depois da reunião.
Por outro lado, aparecem também críticas, pois nem todos os professores
têm o cuidado de preservar o desconforto da família.
Marco – É por isso que os pais não querem vir aqui. Para que?
Tomar bronca de professor na frente de vinte, trinta, poxa, você vai lá
e vira o comentário (...). Sim, vira, isso não fica na escola, isso vaza,
vai até onde você mora. ‘Ó, você viu aquela mãe? Aquele pai? A
professora deu a maior bronca nele’. Poxa, que chato não é? Nossa!
Que vergonha! Fica marcado, é chato, eu mesmo não venho (...).
96
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Alguns pais de alunos mais peraltas pedem que o professor acompanhe
seus filhos mais de perto, se necessário, use pressão, coloque-os longe de
amigos também peraltas. Um desses pais deposita a esperança e a
responsabilidade nas mãos da escola: “façam o que for melhor, mas corrijam o
meu filho.”
Cícero – o professor, na minha opinião, tem que forçar o aluno,
‘vamos fazer!’, já sabe que o aluno é peralta, só faz as coisas sob
pressão, tem que estar pressionando, não deixar um minuto ali (...)
porque meu filho é assim, em vez de estar escrevendo quando a
professora vai apagar o quadro aí que ele vai começar a escrever.
Não estou dizendo que ele é santo, mas se a professora sabe que
ele é assim, tem que ter um acompanhamento mais de perto.
Coerentemente, foi este pai que afirmou que é difícil para o professor
conduzir uma classe com 40 alunos, uma vez que gostaria que o filho fosse
acompanhado quase que individualmente. Este pai reconhece que o filho é “muito
peralta”, pois já esteve envolvido em vários incidentes e num deles foi agredido
em sala de aula com sérios ferimentos, diz que o professor precisa ter maior
controle e autoridade sobre os alunos.
Cícero – A professora do ano anterior tinha mais controle sobre os
alunos. O ano passado eu tive só umas duas incidências com o meu
filho. Este ano eu já vim seis vezes no colégio. Teve um aluno do
período da tarde que entrou na sala na parte da manhã e bateu nele.
Aí fui falar com a professora. Ela me disse: ‘Olha, aí a gente não
pode fazer nada. Quando vi o aluno já estava na sala’. Calma aí, um
aluno da 4a. série invadir uma sala de 2a. série e bater numa criança
– algum erro tem. ‘Ah, é porque seu filho é isso, porque seu filho é
bagunceiro, a gente não consegue segurar’. Como não consegue
segurar uma criança de oito anos? Aí é complicado.
Esse pai reclama por ter sido chamado repetidas vezes, uma vez que acha
que a professora deveria resolver os problemas, e não ficar dizendo que o filho
não tem jeito. Reclama, pois se sente ignorado por só ouvir críticas da professora.
Uma das vezes que veio conversar, a normalidade durou três dias, até que o filho
brigou novamente e foi parar no hospital.
97
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Cícero – Quando a gente vem conversar, ela fala – ‘seu filho não tem
jeito’. É só isso que ela sabe falar. Agora, duas vezes eu já falei com
ela: se meu filho não tem jeito com você, coloca com outro professor,
vamos tentar mudar de sala. Não é o primeiro ano que ele está
estudando, já esteve em outras escolas. Já teve ocorrência lá, é
normal com criança. Ora, a partir do momento que o professor só
sabe criticar o aluno, o próprio aluno chega em casa e diz: “A minha
professora não corrigiu o meu caderno”. Então já se deixa jogado
mesmo.
Vários pais citam problemas com a perua de transporte, pois a criança não
retorna com o transporte escolar, pois consegue sair sem ser percebido e
permanece fora de escola. Os pais colocam a responsabilidade no funcionário
que controla a saída dos alunos, mas há outras reclamações neste sentido.
Cícero – (...) vim procurar o meu filho e não estava na escola. Cadê o
meu filho. Não sabe não? Porque não tem uma pessoa que abre e
fecha a porta? Simplesmente a escola liberou o garoto. A pessoa que
fica na porta do colégio é que deve saber, deve ter o controle de
todos os garotos que vão de perua ou não e conhecem todo mundo.
Deixou o meu filho sair. Estava do outro lado da escola, brincando
com outras crianças. E se acontecer alguma coisa, quem é que se
responsabiliza?
Pedro – Porque meu filho entrou na perua escolar “Vai e volta” e
aconteceu uma vez de ele sair antes da perua chegar. O que
aconteceu? – saiu do portão para fora para comprar bala, numa rua
perigosa dessa. Onde está a professora? Vê se tem alguém aí.
Entra, pega e não deixa ir do portão para fora. Só deixa a criança sair
quando chegar o responsável. Chegou no portão, não deixa sair não,
porque se o aluno sai é atropelado e aí quem é o culpado – é a
escola.
Na imersão os professores apontaram vários fatores que contribuiriam para
as dificuldades: os pais não cobram os deveres de seus filhos, professores
efetivados no meio do ano, descontinuidade dos projetos governamentais, forma
equivocada na implantação do sistema de ciclos/progressão automática, número
insuficiente de professores para atender alunos com dificuldade e para atender as
novas demandas da comunidade. Um aspecto que não surgiu nas entrevistas,
98
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
mas que aponta o agravamento da situação, foi a implantação do programa de
pré e pós-aula, sem o necessário aumento do quadro de professores e
funcionários, gerando muitos transtornos para os alunos, direção, pais,
professores e funcionários. Existia um preconceito em alguns professores em
relação às condições sociais (classe de trabalhadores), o que levava a uma
postura desfavorável no relacionamento com os pais, atribuindo os problemas de
aprendizagem a tais condições, mas que essa visão estaria sendo revista
gradualmente. Alguns professores com menor experiência admitem a dificuldade
de despertar o interesse dos alunos. Os professores e os funcionários apontaram
a importância do papel e do estímulo da família para a motivação dos alunos.
Existe um reconhecimento unânime (pais, professores e funcionários) dos
esforços da direção para atrair e envolver os pais. A direção reconhece que
precisa aprender a se relacionar melhor com a comunidade. Alguns pais notam as
melhorias e alguns já haviam sido convidados para assistir aulas junto com o filho,
sugerindo que os professores deveriam ser melhor preparados para trabalhar com
crianças, mais pacientes, que explicassem melhor as lições, dessem mais
condições para os alunos fazerem suas tarefas, que demonstrassem mais
autoridade para lidar com indisciplina na sala de aula.
Justificativas para o afastamento dos genitores
Nesta constelação estão agrupadas as unidades de significados
relacionadas às razões e motivos apresentados pelos pais que fazem com que
não compareçam à reunião de pais: inibição, disponibilidade de tempo e
insatisfação com a escola.
A inibição dos genitores foi citada por vários entrevistados. As falas
sugerem que essa inibição está relacionada à identidade social, de ser alguém
inadequado para estar ali. Na constelação ‘Disposições afetivas de pais homens
na relação com a escola’ há uma unidade de significado relacionado a esta:
constrangimento na interação com o professor.
99
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Jorge – Porque a mãe é mais social com o professor, ela chega e já
vai entrando e vai conversando com o pessoal (...) porque é mulher.
A gente fica lá esperando (...) chega lá, só tem mulher, só tem duas
pessoas igual a eu. [mim]
Ribamar – Os pais ficam inibidos em iniciar fala em público. Tem que
pensar o que vai falar. Pais ficam constrangidos nas reuniões com
muitas mulheres e poucos homens.
Uma variante de inibição aparece quando dizem que não participam para
evitar confronto ou constrangimento.
Walter – O pai preocupa também com o comportamento do aluno na
escola.
Acho que se o seu filho não se comporta bem na escola,
desculpe a palavra – é um capetinha – você vai lá na escola com
vergonha, com medo, porque vai levar bronca do professor. Às vezes
nem comparece na reunião por causa disso.
Fica com medo de ter
encrenca. – Olha, seu filho fez isso, quebrou a vidraça, então a
pessoa não comparece na reunião, então acho que é um erro, acho
que tem que comparecer. Pelo contrário se o seu filho é bom, já toma
iniciativa para comparecer na escola.
Marco – (...) Oh, você viu aquela mãe? Aquele pai? A professora deu
a maior bronca nele. Poxa! que chato não é? Nossa, que vergonha!
Fica marcado, é chato, eu mesmo não venho.
Ronaldo – Eu acho que deveria ser ‘estilo assim’: não só para ouvir
reclamações sobre os filhos porque ele cometeu algum delito na
escola, aprontou alguma arte, mas vir para ouvir as qualidades do
filho porque é agradável para qualquer pessoa receber elogios e ver
o que ele está fazendo, está tendo resultados.
A maioria dos genitores entrevistados mencionou que a maior dificuldade
tanto para acompanhar a escolarização dos filhos quanto para comparecimento
às reuniões é a pouca disponibilidade de tempo.
Marco – Porque eu saio, levanto às 4 da manhã, saio às 4h30,
trabalho com transporte escolar, levo criança, trabalho lá no Morumbi
sabe, então chego nove e meia [21h30] em casa, quando chego meu
filho está dormindo. Quando chego é tomar banho, dar um beijo no
moleque e dormir para levantar cedo. Eu fui levar meu filho porque
100
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
eu estou de férias. Aí escutei um rapaz que estava lá solicitar à
escola – ‘Não dá para o sr. marcar uma reunião num sábado que vai
vir bastante gente?’ Sabe o que ele falou? – ‘Ah, no sábado é
quando a gente descansa’.
Alguns pais trabalham inclusive nos finais de semana ou no período
noturno e um dos presentes afirmou estar presente na reunião por ser domingo, o
seu dia de folga.
Ribamar – O tempo é realmente muito pouco para isso.
Quem mais
acompanha essa parte, inclusive nesta escola, pois tenho dois filhos
aqui nesta escola e dois na outra escola, é minha esposa. A outra
fica mais perto de mim, eu estou sempre lá. Agora, aqui como é um
pouco mais distante, a minha esposa é quem mais participa, vem na
escola no caso de reunião, no caso de necessidade. E hoje eu vim
aqui porque é domingo e eu estou em casa e eu vim. Essa parte de
participação é ela quem faz.
Ronaldo – Infelizmente as circunstâncias hoje em dia não permitem.
Em questão de horário, eu acho que as escolas deveriam abrir um
horário separado
porque muitas vezes seu filho estuda de manhã só
que você trabalha de manhã, então eu acho que deveria ter um
esquema. Você poder conversar com o diretor da escola e estar
passando a situação sobre seu filho em outro horário.
Marco – Eu mesmo, estou falando pela minha pessoa, para mim vir
não tem jeito, a não ser que a escola comunicar num sábado dá para
mim vir, às vezes, sábado também eu faço um bico, trabalho de
motorista.
.
Outro motivo para o afastamento apontado pelos pais foi a insatisfação
com o tratamento dado pela escola para problemas que surgem com os filhos.
Algumas formas de atuação dos professores são consideradas ineficazes para
resolução dos problemas e este fato faz com que alguns pais passem a não vir
nas reuniões seguintes. Alguns pais consideram uma falta de interesse da
professora em resolver os problemas.
Pedro – Continua a mesma coisa e o pai já não vai mais, deixa para
a mãe.
101
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Cícero – A questão que eu vejo com muito dos pais – quando surge
um problema o pai vem e não resolve, e quando chamam
novamente, por aquele mesmo problema, vira uma coisa contínua
(....) calma aí, já fui chamado uma vez, já falei o que podia ser feito.
(...) se já fui uma vez e não resolveu, porque eu vou de novo?
Na percepção de um pai falta abertura da escola para uma participação
mais efetiva dos pais – acha que a escola convida apenas para festas, mas não
se sente convidado para participações mais efetivas.
Cícero – Vai ser uma festa, aí eles chamam os pais.
Jorge – O que mais chamou a atenção naquela reunião da escola?
[dirigida pelo professor H]. Se tivesse tido mais diálogo, seria melhor
[O prof. H simplesmente comunicou as deliberações da escola e não
abriu, nem incentivou o diálogo].
Na imersão foi apontado pelos professores que justamente os pais de filhos
mais problemáticos são os que não comparecem às reuniões. Outra justificativa
dos professores é a progressão automática que, além de afastar os pais,
fragilizou os professores. Outros professores acreditam que os pais são omissos
por não darem efetiva importância à educação/escolarização dos seus filhos.
A questão de gênero
Pretende-se que essa constelação englobe as diversas unidades de
significados relacionadas a diferenças entre homens e mulheres quanto a divisões
de papéis profissionais, familiares, domésticos e, sobretudo, parentais. O
pressuposto teórico é que muitas dessas diferenças são construções sociais. Um
dos fenômenos mais conhecidos e arraigados é o ‘machismo’. Outros dois
fenômenos muito comuns, mas que têm sofrido mudanças: atribuições para as
tarefas domésticas (que tem sido assumido por homens desempregados) e a
responsabilidade pela provisão financeira da família (que tem sido assumida
indistintamente por ambos os sexos). Com esta constelação busca-se
compreender a questão de gênero em relação à participação dos pais na
102
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
escolarização dos filhos. A educação machista reserva ao homem a obrigação de
prover materialmente a família e à mulher a educação dos filhos. Um pai
reconhece que esta mentalidade é muito arraigada na maioria dos homens e é
difícil mudar. Isso aconteceu devido à restrição de tempo, que é algo que dificulta
a participação de ambos, o pai vai menos do que a mãe na escola.
Cícero – Na minha opinião, [participação do homem] é mais falta de
interesse mesmo, entendeu? É mais cômodo deixar tudo para a
mulher fazer e ele ficar só observando. Tem muitos pais que dizem:
“A minha obrigação é só trazer as coisas para dentro de casa”. É a
parte machista dos homens. – Trazer as coisas para casa e as
mulheres resolverem os problemas dos filhos. Se for para pai
resolver, são poucos os que conversam. Para a maioria é mais fácil
pegar um chinelo, uma cinta e bater. Para eles é muito mais prático.
Muitos pensam assim. Para conseguir ser correto mesmo tem que
ser que nem cavalo. Só olha para frente. Só. É mentalidade machista
também entendeu?
Ribamar – Para mim, é mais difícil mesmo porque o meu tempo é
mais pouco. Apesar de que o tempo dela é também muito pouco,
porque ela trabalha de domingo a domingo. E o tempo da gente é
pouco, mas a participação dela é bem maior do que a minha.
Todos falam juntos – Eh! sobra mais para a mãe (...) normalmente,
quando mulher pode ir, o homem delega para ela. Comparece
apenas quando a mãe está impossibilitada. [um reconhecimento
unânime de que as mães assumem mais esse encargo].
Segundo os pais, a mulher dá conta de mais atividades que o homem.
Essa afirmação tem duplo sentido: é um elogio e é uma justificativa naturalizante
para abdicar da sua carga.
O afastamento dos pais homens resulta em uma perda de atualização com
os assuntos em curso na escola, o que realimenta o afastamento.
Ronaldo – A maior parte dos homens trabalha e a mulher só cuida de
casa, ou ela faz um biquinho (...) tem um pouco mais de tempo
disponível. E, por isso o homem acaba ficando desse jeito, com falta
de experiência em conversar com a escola. Eles ganham o dia. E aí
têm duas, três, quatro reuniões que ele não vai. Ele passa a não ficar
tão atualizado.
103
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Outro aspecto relacionado a gênero é a sociabilidade, facilidade e
disposição para abrir relacionamentos sociais com outros pais.
Pedro – Pais são diferentes das mães, elas criam laços de amizade
com outras mães da escola.
Estes dois aspectos de gênero realimentam um círculo vicioso: o pai não
vai por estar desatualizado; não indo fica cada vez mais desatualizado. O pai não
vai porque não tem amizade com outros pais; não indo, sente-se cada vez menos
incluído na comunidade. Desse modo, logicamente é a mulher que participa mais.
As mães em geral são mais sociáveis e dão mais opiniões (participação e
interação) enquanto os pais, apesar de acharem interessante, ficam mais calados
e só observam. Um dos pais chega a afirmar que a escola chama os pais, mas
ele sente que, de fato, a escola espera a presença da mãe. Ambos estão
preocupados com a educação dos filhos, porém com ações diferentes: o pai
pressiona e a mãe acompanha e incentiva, aliviando a pressão.
Ronaldo – A mãe, não, qualquer conversinha que dá – sabe como é
coração de mãe, né? Sempre alivia um pouco a barra.
Outra característica da diferença de gênero é que, segundo alguns pais, a
escolaridade dos filhos não faz parte das conversas em roda de amigos.
Ronaldo – Porque normalmente conversa de homem, geralmente é
[sobre] carro, futebol, mulher, dinheiro e passeio e sobre trabalho
também. Não envolve escolaridade de filho. (...) A questão não é ser
constrangedor ou não fazer o jeito da pessoa estar comentando. É
que em si a maioria dos pais não têm o hábito de comentar a vida
escolar dos filhos.
Na constelação “Questões de Gênero”, uma unidade de significado que se
mostrou importante é a que agrupa as diferenças dos pais e mães na geração
anterior. Vários pais colocaram a importância da presença da mãe na sua
104
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
escolarização. Esses pais usam essas lembranças como exemplos para a
educação dos filhos, buscando repassar aquilo que recebeu das mães,
principalmente a atitude de valorizar a educação.
Cícero – Não [o pai não estimulou o estudo], foi por mérito meu. Não
era uma pessoa que se interessava muito não. Minha mãe já
incentivava bastante, chegava junto. A minha mãe hoje é um espelho
para mim, é o que eu faço para o meu filho. No começo eu não
gostava muito não, era aquele tipo e aluno que se tivesse um colega
e dissesse vamos jogar bola eu desviava do caminho e ia jogar bola.
Mas ela chegava junto (...).
Os pais, quase na totalidade, contam como suas mães interferiram em sua
vida escolar, estimulando e acompanhando de modo bem próximo.
Ribamar – Olha, a minha mãe tinha muita preocupação. Meu pai não,
sempre foi largadão. Ele não sabia ler, nem assinar o nome dele
sabia. E não sei se é por esse motivo que ele não se preocupava
não. Pelo contrário – ele não impedia, vamos dizer assim, mas
também não incentivava de forma alguma, e nem sequer perguntava
– você não vai para escola hoje? – Isso não fazia parte dele, não.
Enquanto minha mãe incentivava e empurrava para estudar.
Realmente nesta parte ela foi mais do que uma guerreira, e graças a
ela eu aprendi um pouco.
Apenas dois pais citam a influência paterna na sua escolarização.
Miguel – É verdade, tive muita chance, meu pai me empurrava para
escola, ele era alfaiate, inclusive era ele que fazia nosso uniforme,
calça azul, camisa branca, com aquela gravatinha que colocava com
um broche aqui. Fazia tudo e de tarde chegava em casa com roupa
igual que parecia com o chão de tão sujo que era. Ia para a escola e
no caminho subia no pé de manga (...).
E nestes momentos de reflexão sobre o passado, um pai comenta que a
vida faz rever fatos que aconteceram com ele no passado e compreender a
intenção de seus pais durante sua formação.
105
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Ronaldo – Meu pai pegou no pé, minha mãe pegou no pé, foi
mostrando como é as coisas. O filho de primeira mão, quando ele
entra na fase de adolescência (...) digo por mim mesmo, eu achava
que era muita ‘pegação’ de pé, muita ‘encheção’ de saco (...), mas
depois, ele passa a conversar com pessoas da mesma idade, de
escolaridade e ele vê que alguns não sabem, então ele vê a
importância do pai e da mãe. Bem, isso nunca é na hora, a gente vê
depois.
A questão de gênero foi pouco citada na imersão, pois não era o foco dos
trabalhos. Existe uma rápida citação de professores que aponta que as mães
participam mais que os genitores e que estes têm mais autoridade na família.
Diretor
Esta constelação emergiu por força própria, por conta de ter sido
mencionado em inúmeras conversas entre os pais, ao comentar que a atuação do
diretor tem sido decisiva para melhorias no dia-a-dia da instituição. Os pais
relatam medidas que ele implementou juntamente com a comunidade –
professores, alunos, pais e funcionários. A maioria dos pais entrevistados já teve
contato com ele, pois ele circula pela escola e tem contato direto com a
comunidade.
Miltom – O Tomaz [diretor], não estou querendo criticar e nem
discriticar, ele manda recado só para o aluno ou aluna – Ó pai, tem
um recadinho aqui para o senhor. Ai vai passando. Ele manda a
segunda, a terceira, a quarta e vai indo. Aí tem uma hora que você
chega aqui e vai acabar tomando bronca (...). Oh, cansou de mandar
recado, cansou de mandar recado, chega uma hora que o Tomaz já
não deixou ele entrar mais. Enquanto o seu pai ou sua mãe não vier
aqui você não entra mais. (...) A bomba está estourando aqui, o pai e
a mãe têm que estar sabendo se o cara aprontou, brigou ou ele
discutiu com a professora, com o professor. Porque o esquema do
Tomaz [diretor] é assim, ele quer esclarecer as coisas porque às
vezes o aluno acaba escondendo mesmo, é aquele medo não é? –
Oh (...) aí depois meu pai ou minha mãe vai chegar em casa e eu
vou tomar uma surra!.
106
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Existe unanimidade entre os pais quanto à abertura, disponibilidade e
atenção do diretor para com a comunidade.
Miltom – (...) acho que seria bom chegar e conversar com o Tomaz,
porque ele é muito aberto para esse tipo de coisa. Às vezes ele nem
fica sabendo de determinadas coisas, a prioridade para ele é o 1º.
turno, a molecadinha, dá um toque conversa com ele, você e a
senhora, conversa para ver se ele dá jeito.
Ronaldo – Acho que deveria ter um esquema você poder conversar
com o diretor da escola e estar passando a situação sobre seu filho
em outro tipo de horário.
Cícero – O diretor é legal, convida, sempre chama, tranqüilo.
Donizete – [os pais] Tem que dialogar com o diretor para arrumar
essa casa para não cair.
Miltom – Eu nem espero ser chamado, eu venho, eu converso
sempre com o Tomaz. (...) Pergunto para o Tomaz: – Então, posso
conversar com o professor para saber das coisas? Ele dá
autorização, eu venho, converso.
Miltom – É
,
o Tomaz tem muito disso. Ele aceita
,
por exemplo,
alguém vem aqui dar uma opinião, ele pensa naquele negócio e
aplica aqui dentro.
Um pai destaca a atitude do diretor em proteger os alunos de constrangimento.
Miltom – Essa coisa de professor e professora estar chamando na
frente de todo mundo, acho errado. Tanto que fizemos diversas
reuniões com o Tomaz [diretor] e passamos isso para ele, tanto que
desde o ano passado e ele já conversou com todos os professores.
Oh! leva lá embaixo que a função é lá embaixo então você está lá
embaixo com o menino e a menina e está ali conversando. É o que
eu estou falando, tem muita coisa que ele manda e o pai e nem a
mãe não estão nem sabendo.
Milton – Agora você vê, tem muita gente que critica o Tomaz, o
sistema dele, mas só que o sistema dele está dando certo.
Alguns pais solicitam ao diretor que proporcione o encontro com pais e
mestres nos finais de semana, mas até o momento, ele não pode acatar esta
solicitação.
107
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Pedro – Bom, quer dizer que a gente pode faltar no serviço e às
vezes o patrão nem aceita. Você pode descontar o dia. Eu fui lá
entendeu. Não dá para fazer no sábado, então eu nem venho, não
dá.
Marco – O horário que a gente sai também. Eu saio cedo, 4 h da
manhã eu estou na rua já e chego às 8h da noite e trabalho de
segunda à sexta e às vezes até no sábado se (...). Eu fui levar meu
filho porque eu estou de férias aí [escutei] um rapaz que estava lá
[solicitar à escola] – Não dá para o sr. marcar uma reunião num
sábado que vai vir bastante gente? Sabe o que ele falou? – Ah, no
sábado é quando a gente descansa.
.
108
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Capítulo 4
DISCUSSÃO
Eu me sinto à vontade com pessoas
porque eu trabalho com o povo [é cobrador
de ônibus]. Mas aqui não é a mesma coisa.
Eu me sinto mais tímido em falar com a
professora.
Donizete
[pai de aluno]
propósito principal deste trabalho foi aprofundar a compreensão de
como os pais de classe popular vêem o seu papel na escolarização de
seus filhos e a sua participação nas atividades promovidas pela escola.
Para tanto, foram realizados quatro encontros, totalizando 11 entrevistas com pais
ou responsáveis – homens. As entrevistas transcritas foram analisadas, segundo
um olhar hermenêutico, resultando daí oito constelações.
Nesta etapa do trabalho – discussão – buscou-se articular os significados
das constelações na direção da compreensão do fenômeno escolhido. Essa
articulação entre constelações é um processo não-linear, isto é, as relações são
multidirecionais ou colaterais e se admite de antemão a inconclusividade ou
permanente que-fazer do que é humano (Freire, 2005: 84) e a superposição – um
elemento de uma categoria pode estar em outra categoria (Lahire, 2004).
O primeiro ponto a ser considerado, que a princípio seria apenas um
problema da prática de pesquisa, mas que por conta do tema proposto é uma
importante informação a ser analisada, é a dificuldade encontrada para trazer os
pais para as entrevistas. Inicialmente planejou-se realizar dois encontros, um
encontro para entrevistas e um segundo encontro para a devolutiva, com os
mesmos participantes. Conforme relatado no item 2.5, na seção “Dificuldades
para conseguir os participantes para as entrevistas”, como no primeiro encontro
vieram apenas três dos doze “confirmados”, foi realizado um segundo encontro
(com um pai) e mais um terceiro (com um pai), portanto dois encontros adicionais,
109
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
sendo que, na devolutiva, vieram seis pais, porém nenhum dos que estiveram nos
encontros anteriores. No estágio inicial do projeto
27
mais amplo no qual estava
inserida, durante a análise da documentação e das entrevistas com professores e
pais, esperava-se alguma dificuldade nesta atividade, entretanto havia uma
esperança de que não fossem tantas, pois tomamos o cuidado de contatar
pessoalmente os selecionados, e foram escolhidas datas de finais de semana
para os encontros.
Essa experiência relatada anteriormente remete diretamente ao tema do
trabalho: como os pais homens vêem a sua participação, e é importante para
comprovar um fato que é difícil para aqueles que têm interesse em trazer os pais
homens para a escola, mas que faz parte da realidade concreta. Para trabalhar na
superação desse desafio, deve-ser partir das justificativas fornecidas pelos pais
para a não participação, considerando-as com respeito e credibilidade, enfim
tendo uma escuta atenta e respeitosa. É importante que se considere cada uma
das justificativas, contextualizando-as nas condições de vida desses pais. As
principais delas foram: insatisfação com a escola (por ser chamado para resolver
o mesmo problema, por achar que o professor não tem interesse em resolver
efetivamente, ou por achar que a escola não dá efetiva abertura para a
participação dos pais, provavelmente por ter participado de alguma atividade em
que o representante da escola foi muito diretivo e intransigente); disponibilidade
de tempo (longa e irregular jornada de trabalho, às vezes incluindo os finais de
semana) e diversas formas de inibição (ao interagir nos encontros com presença
maciça de mães e com professores).
De modo geral o problema que desencadeia a insatisfação, discórdia ou
impasse entre pais e professores pode ser configurado como um “círculo vicioso”:
professores têm dificuldades de manter a disciplina e atenção em classes com
uma quantidade elevada de alunos (40); pais são chamados para receberem
reclamações sobre seus filhos e solicitação para que façam alguma intervenção;
alunos com dificuldade para acompanhar o desenvolvimento das aulas dizem se
27
Uma etapa inicial do projeto Diálogo e Participação consistiu no diagnóstico participativo, momento
em que todos os segmentos da instituição (gestores, professores, alunos, pais e funcionários) foram
convidados a dar seu parecer a respeito de educação, escola real, ideal e desejada; para tal, vários
encontros foram realizados.
110
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
sentir “burros”, ou que o professor não ensina direito e, por isso, sentem-se
desmotivados a ir à aula. A intervenção que o pai consegue realizar não resolve o
problema, a escola o convoca novamente e a tensão aumenta. Eventualmente o
pai castiga o filho, conforme a fala de alguns pais. Essa atitude desagrada à
escola e ao aluno. Os vínculos afetivos positivos são quebrados.
Conforme Thin (2006) este círculo vicioso é resultado de lógicas diferentes.
A do professor é uma lógica escolar, com uma linguagem e regras operacionais
próprias, educação para autonomia, uma lógica escriptural-téorica, segundo um
projeto pedagógico de longo prazo. A lógica dos pais das classes populares é
diferente, em geral, não dominam as regras operacionais da escola, a disciplina é
obtida por meio da presença física, pressão e, eventualmente, aplicação de
castigo; a lógica é oral-prática e têm objetivos mais imediatos. Agravado pelo fato
de a sua própria escolarização ter sido precária e, portanto, não poder
desempenhar o papel de “professor oculto” que dá continuidade às atividades da
escola, as intervenções ao alcance desse pai, são insatisfatórias, segundo as
expectativas do professor.
Pelo lado do professor, nas entrevistas iniciais, eles reconheceram as
dificuldades do seu ofício, as limitações para lidar com classe numerosa e com
alunos muito indisciplinados, com incidentes que envolvem agressões físicas e
roubos. Disseram sentir desânimo, solidão e desmotivação por serem apontados
como os principais culpados. Acreditam que a principal solução seria a maior
participação dos pais.
Esse círculo vicioso configura o que Thin (2006) denomina de um problema
estrutural e na qual a vítima maior é o aluno, cada vez mais desqualificado.
Problemas desta natureza não se resolvem apenas com esclarecimentos ou com
a simples presença dos pais na escola (Thin, 2006 e Lahire, 1997).
É importante que se reconheça as diferenças de lógicas e as condições
sociais das classes populares. Conforme a fala do diretor, alguns professores
ainda não teriam incorporado o fato de que as famílias dos alunos são de classes
populares e teriam preconceitos depreciativos (“favelados”, “não se interessam
pela escolarização dos filhos”, “famílias desestruturadas”).
111
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
O encaminhamento desse problema estrutural não pode ser feito, segundo
apenas a lógica da escola, ou as expectativas do professor. Estão em jogo
polaridades dialéticas (identificadas nas entrevistas com professores e pais, na
fase inicial).
Retomando o que foi anunciado anteriormente, o referencial dialógico de
Paulo Freire é especialmente adequado, pois propõe que as contradições e
impasses sejam, por meio do diálogo, enfrentados, expressos, refletidos e
discutidos.
Algumas questões fundamentais emergem: Que responsabilidades podem
ser atribuídas aos pais em relação aos problemas que ocorrem dentro da sala de
aula ou dentro da escola? O que é legítimo, o professor esperar ou cobrar dos
pais em relação aos problemas que ocorrem dentro de salas de aula? Os
professores poderiam colocar suas solicitações de modo mais adequado, isto é,
respeitando as condições sociais e culturais desses pais?
Outra justificativa para a baixa participação foi a pouca disponibilidade de
tempo, incluindo finais de semana. Pôde-se comprovar este fato durante o
processo de convite e confirmação para nossas entrevistas. Inicialmente foram
contatados 12 pais que estiveram presentes na escola em alguma atividade do
projeto Diálogo e Participação, o que indicaria alguma disponibilidade para a
participação. Na véspera do encontro foram contatados novamente para
relembrar o encontro e o horário. A maioria que não veio foi por motivo de
trabalho ou de compromisso familiar mais importante. Apenas um não veio por ter
se desentendido politicamente com o diretor. Notou-se também que aqueles que
participaram das entrevistas foram avisados que haveria uma devolutiva, mas
nenhum deles retornou, mesmo tendo sido feito um comunicado pessoal, ou seja,
o fato de um pai participar de alguma atividade não significa que participará de
outras. Não podem ser considerados pais que nunca vêm à escola, mas a
presença é irregular. Uma justificativa é a indisponibilidade de tempo. Por outro
lado, segundo a fala dos pais que estiveram na devolutiva, se para aquele
encontro fossem convidadas as mães, teria enchido a sala, por estar ocorrendo
no sábado. O que indica que existem outros fatores.
112
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Um ponto que chamou a atenção ao longo de todo o trabalho foi a do
constrangimento e inibição dos pais. Este ponto permeia transversalmente a
percepção dos pais sobre a sua participação na escolarização. Existe o
constrangimento por ser minoria, constrangimento na interação com o professor,
inibição por ser minoria entre as mulheres e por se sentir inadequado quanto à
sociabilidade. Este conjunto de disposições afetivas parece confirmar
concretamente o conceito de autodesvalia (Freire, 2005) e o de identidade social
(Bock, 2003). Um dos principais esforços dos educadores, sobre a proposta de
Paulo Freire, é justamente criar condições para que os autodesvalidos se libertem
da condição de oprimido, começando pelo resgate de suas dignidades. Não é
uma luta fácil, como bem ilustra a história da família Mozart (Elias, 1995).
Uma das questões muito presente é a do apoio efetivo dos pais na
escolarização. Percebe-se o peso do capital cultural (Bordieu, 1998) dos
responsáveis para se efetivar as possibilidades de apoio: conseguir assumir o
papel de “professor oculto” (Paixão, 2006) que continua as atividades
pedagógicas em casa ou, então, restringir-se a “observar se as letras estão
bonitas”. Por outro lado, esta atitude de “observar se as letras estão bonitas” pode
não ser pouco, se inserida num contexto de “integração social e simbólica da
experiência escolar” (Lahire, 2004), onde a escolarização assume um significado
amplo e acompanhado de amorosidade (Freire, 2003 e Lahire, 2004).
Uma fala quase unânime dos pais diz que o papel do genitor é o de
pressionar, cobrar, determinar limites e eventualmente punir. Segundo a lógica
das famílias da classe popular (Thin, 2006), é o que está ao alcance dos pais,
quando podem estar presentes fisicamente e atuando pontualmente. A punição
física ou coação psicológica está muito associada a situações limites nas quais o
pai sente-se cobrado pelo professor por problemas que não são solucionados
pela advertência verbal. A punição física não é solução que satisfaz a qualquer
dos implicados (aluno fica revoltado, ressentido e rebaixado, o professor sabe que
prejudica o aluno e o pai fica aborrecido por agredir o filho).
Um fator que está significativamente relacionado à percepção que os pais
têm do seu papel na escolarização de seus filhos e da sua participação nas
113
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
atividades promovidas pela escola é a questão de gênero. A mentalidade
machista é uma construção social (Costa, 1983) que influencia na divisão de
papéis entre o pai e a mãe (Paixão, 2006). Tal tipo de mentalidade naturaliza as
justificativas para a divisão de responsabilidades entre os pais (Paixão, 2006;
Carvalho, 2004; Sigolo e Lollato, 2001; Zanella et al, 1997). A maioria das falas
que justifica a pouca participação dos pais homens na escolarização tem alguma
relação com este mito, inclusive por meio de “elogios” à mãe (“dá conta de fazer
mais coisas”, “é mais sociável”, “está mais por dentro”, “é mais paciente”). A
mentalidade machista aparece também no fato de os homens não conversarem
sobre a escolaridade dos filhos em rodas de amigos. Essas justificativas são
reforçadas recursivamente: é melhor a mãe ir porque está mais atualizada com os
assuntos, a mãe se dá melhor na escola porque está mais integrada. Uma
tautologia...
Uma figura chave na dinâmica da realidade pesquisada é a do diretor.
Partindo do estabelecimento de uma visão do futuro (“ambições” da comunidade
para “chegar a um padrão de excelência em nível nacional”) em conjunto com a
equipe da escola e com a comunidade, passando pela liderança na construção de
bons vínculos com a comunidade e entre a equipe de trabalho e atuando no dia-a-
dia em direção das transformações desejadas.
As propostas do diretor e equipe dessa instituição é um exemplo real do
que Paulo Freire denomina de “inédito-viável” – em cinco anos, sair de uma
escola com péssima imagem, pais ausentes ou hostis, desrespeito no trato com
os alunos, instalações deterioradas para uma escola elogiada, instalações bem
conservadas e uma comunidade em crescente integração (começando por ora
com as mães). O diretor tem consciência de que estão desenvolvendo uma
mudança de longo prazo.
114
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Capítulo 5
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Pensar que a esperança sozinha transforma o mundo e
atuar movido por tal ingenuidade é um modo excelente de
tombar na desesperança, no pessimismo, no fatalismo. Mas,
prescindir da esperança na luta para melhorar o mundo,
como se a luta se pudesse reduzir a atos calculados
apenas, à pura cientificidade, é frívola ilusão. Prescindir da
esperança que se funda também na verdade como na
qualidade ética da luta é negar a ela um dos seus suportes
fundamentais. O essencial, é que ela, enquanto
necessidade ontológica, precisa ancorar-se na prática.
Enquanto necessidade ontológica a esperança precisa da
prática para tornar-se concretude histórica. É por isso que
não há esperança na pura espera, nem tampouco se
alcança o que se espera na espera pura, que vira, assim,
espera vã.
Paulo Freire
omo pesquisadora, considero importante reconhecer que iniciei este
trabalho ocupando um lugar de professor, para o qual a solução óbvia e
principal é “trazer os pais” para estreitar o relacionamento e a parceria
na desafiante tarefa de educar as crianças. Uma solução em si própria e
incondicional. Eu ainda não havia me apropriado da lógica que permeia o
pensamento e o modo de vida dos pais em estudo.
A partir do momento que se percebe a necessidade de se “descer” desse
lugar que é inevitavelmente “dominante”, a imersão muda de qualidade – deixa de
ser meramente intelectual para se tornar existencial e as orientações de Paulo
Freire passam a ter maior significância. As justificativas dos pais deixam de ter
apenas um sentido de “desculpas para a omissão”, elas expressam um
movimento de expulsão dos pais pela escola. E os baixos níveis de valor pessoal
e de aspirações deixam de ser restrições individuais para serem compreendidos
como limitações estruturais de uma identidade social.
115
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
Enfim, essa oportunidade de contatos mais estreitos com a realidade vivida
e com a literatura específica, possibilitou uma ampliação não só da minha
perspectiva como também um crescimento enquanto ser social.
A questão, instigante e desafiadora, que se coloca no momento de
finalização deste trabalho é como encontrar as condições que definem o que é
possível e o que é impossível? Ou, qual o caminho para o inédito-viável? (Paulo
Freire). Ou, como ajudar as crianças e os professores para o sucesso
improvável? (Lahire). As respostas a essas questões não estão em nenhuma
teoria ou competência individual. Problemas estruturais requerem a força do
coletivo, conforme as propostas de Paulo Freire.
Ao longo deste trabalho foram emergindo algumas idéias, relacionadas ao
tema que apresento como sugestões para futuras pesquisas:
Como a equipe da escola (diretor, coordenadores, professores e
funcionários) vê e atua para a participação dos pais homens na escolarização dos
filhos e nos projetos coletivos?
Como os pais homens que cursam ou cursaram o programa EJA –
Educação de Jovens e Adultos – participam na escolarização dos seus filhos?
Como os cursos de pedagogia (graduação ou educação continuada)
podem melhor preparar os professores, coordenadores e gestores para interação
efetiva com a comunidade?
Como pais homens, desempregados crônicos, podem contribuir na
escolarização dos filhos?
Como os avôs, homens aposentados, podem contribuir na escolarização
dos netos?
116
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
REFERÊNCIAS
ALVES, Alda. J. O planejamento de pesquisas qualitativas em educação. Cadernos
de Pesquisa, São Paulo, n. 77, p. 53-61, maio, 1991.
ANDRADE, Carlos Drummond de F. Diante da Criança. Rio de Janeiro: Record,
1996.
APPLE, Michel. Se avaliar o professor é a resposta, qual é a pergunta?. In: Veiga,
Ilma & Cunha, Maria I. Desmistificando a profissionalização do magistério.
Campinas: Papirus,1999.
ARIÈS, Philippe. História social da criança e da família. Trad. Dora Flaksnan, 2ª ed.
Rio de Janeiro: Ed. Guanabara, 1981.
BARRETO, Elba Siqueira de Sá. Bons e maus alunos e suas famílias, vistos pela
professora de 1º. grau. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n. 37, p. 84-89,
maio, 1981.
BASTIANI, J. Working with Parents. a whole school approach. Nottingham:
Nottingham University, 1993.
BHERING, Eliana. & SIRAJ-BLATCHFORD, Iram. A Relação Escola-Pais: um modelo
de trocas e colaboração. In: Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n. 106, p. 191-
216, março, 1999.
_______ ; DONADUZZI & CORDEIRO, Maria Helena. A representação social do
apoio familiar no processo educativo das crianças: a perspectiva de
educadores da pré-escola. In: Psicologia da Educação, São Paulo, 18, p. 11-
32, 1º. Sem de 2004.
117
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
_______ & DE NEZ, Tatiane B. Envolvimento de Pais em Creche: possibilidades e
dificuldades de parceria. In: Psicologia: Teoria e Pesquisa, v. 18, n. 1, p. 63-
73, jan.-abr. 2002.
BRASIL. Ministério da Educação, Secretaria de Educação Fundamental. PCN –
Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília: MEC/SEF, 1996.
BOCK, Ana Mercês B. Psicologia da Educação: Cumplicidade ideológica. In: MEIRA,
Maria Eugênia M. & ANTUNES, Mitsuko Ap. M. (org.) Psicologia escolar:
Teorias Críticas. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2003.
BORDIEU, Pierre. Escritos de Educação. Petrópolis: Ed. Vozes, 1998.
BUENO, B.G. & GARCIA, T.F. Êxito escolar: as regras da interação na sala de aula.
Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos. Brasília, v. 77, n. 186, p. 263-281,
mai./ago., 1996.
CAETANO, Luciana M. C. Relação escola e família: uma proposta de parceria. In:
Dialógica – Revista Acadêmica Digital dos Cursos de Pedagogia e
Comunicação Social da FAM – Faculdade de Americana, Americana-SP, ano
1, n. 01, jul./dez. 2005.
CAMPOS, Maria M. M. Escola e Participação Popular: a luta por educação elementar
em dois bairros de São Paulo. Tese de Doutorado ao Departamento de
Ciências Sociais da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da
Universidade de São Paulo.
CARVALHO, Maria do C. B. de & GUARÁ, Isa M.F.R. A Família: um sujeito pouco
refletido no movimento de luta pelos direitos da criança e do adolescente. In:
Rev. Bras. Cresc. Des. Hum., São Paulo, IV (1), p. 45-48, 1994.
CARVALHO, Maria Eulina. P. Modos de Educação, Gênero e Relações Escola –
Família. In: Cadernos de Pesquisa, São Paulo, v. 34, n. 121, p. 41-58,
jan./abr., 2004.
_______. Relações entre família e escola e suas implicações de gênero. In: Cadernos
de Pesquisa, n. 110, São Paulo: Fundação Carlos Chagas, p. 143-155, 2000.
CARVALHO, M. P. de & VIANNA, C. P. Educadoras e mães de alunos: um dês-
encontro. In. BRUSHINI, Cristina, (Org) SRJ, Bila, (Org) Novos olhares:
mulheres e relações de gênero no Brasil. São Paulo: Marco Zero, FCC/DPE,
1994.
118
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
CARVALHO, Marília P. Um invisível cordão de isolamento: escola e participação
popular. In: Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n. 70, p. 65-73, ago., 1989.
CASAS, Ferran. Calidad de vida de la infância y políticas integrales. V Congresso de
Intervención Social (Área temática: Família e Infância). Madrid, 1998.
CENTRO BRASILEIRO DE ANÁLISE E PLANEJAMENTO; SERVIÇO SOCIAL DO
COMÉRCIO; SÃO PAULO (SP) Secretaria de Assistência Social e Prefeitura
da Cidade de São Paulo. Mapa da vulnerabilidade social da população da
cidade de São Paulo: Zonas Norte, Oeste e Centro. São Paulo, 2004.
CHAVES, A .M.; e BARBOSA, M. F. Representações sociais de crianças acerca da
sua realidade escolar. Estudos de Psicologia. [S.L.], v. 15, n. 3, p. 29-40, 1998.
CHARLOT, Bernard. A Mistificação Pedagógica realidades sociais e processos
ideológicos na teoria da educação. Rio de Janeiro: Zahar, 1979.
CHECHIA, Valéria A., ANDRADE, Antônio S.. Representação dos pais sobre a escola
e o desempenho escolar dos filhos. In: Seminário de Pesquisa, V, Ribeirão
Preto, S.P.,TOMO II, LIVRO DE ARTIGOS, p. 207-219, 2002.
CODY, Frank & SIQUEIRA, Silvia. Escola e comunidade: uma parceria necessária.
Cotia: Íbis, 1997.
COELHO, A. S. B. F. A influência da estrutura do ensino no fracasso da
aprendizagem. Temas Sobre Desenvolvimento. v. 3, n. 18, p. 28-37, 1994.
COLE, A. & KNOWLES, G. Teacher development in partnership research: a focus on
methods and issues. American Educational Research Journal, v. 30, n. 3,
Washington, 1993.
COSTA, Albertina O.; BRUSCHINI, Cristina & SARTI, Cynthia A. A família em
destaque. In: Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n. 91, p. 7-22, nov., 1994.
COSTA, Antônio C. G. A Relação Família Escola. http:/www.aspx?id=3 acesso em 24
fev. 2005.
COSTA, Jurandir F. Ordem Médica e Norma Familiar. Rio de Janeiro: Edições Graal,
1983.
COTTON, K. & WIKELUND, K. R. Parent involvement in education. School
Improvement research Series. Portland, 1997.
119
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
CUNHA, Marcus V. A desqualificação da família para educar. In: Cadernos de
Pesquisa, São Paulo, n. 102, p. 46-64, nov., 1997.
CUNHA, Marcus V. A escola renovada e a família desqualificada: do discurso
histórico-sociológico ao psicologismo na educação. Revista Brasileira de
Estudos Pedagógicos. Brasília, v. 77, n. 186, p. 318-345, maio./ago., 1996.
CYSTER, R.; CLIFT, P.; BATTLE, S. Parental Involvement in Primary Schools.
Windsor: NFER Publishing Company, 1979.
DAUBER, S. L., & EPSTEIN, J.L. Parents' attitudes and practices of involvement in
inner-city elementary and middle schools. In N. Chavkin (Ed.), Families and
schools in a pluralistic society (pp. 53-71). Albany, NY: SUNY Press, 1993.
DEMO, Pedro. Complexidade e Aprendizagem. A Dinâmica não linear do
conhecimento. São Paulo: Editora Atlas S.A., 2002.
DIAS, M. L. Vivendo em família: relações de afeto e conflito. São Paulo:
Moderna,1992.
ELIAS, Norbert. Mozart Sociologia de um gênio. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor,
1995.
EPSTEIN, Joyce. School and Family partnership. In: ALKIN, M. (Ed.) Encyclopedia of
Educational Research, 6
th
Edition. New York: MacMillan, 1151, 1992.
_______ School and Family connections: theory, research, and implications for
integrating sociologies of education and family. Marriage and Family. Review,
V. 1-2, p.99-126, 1990.
_______ Toward a theory of family-school connections: teacher practices and parent
involvement. In K. Hurrelmann, F. kaufmann, & F. Losel (eds.), Social Intervention:
Potential and Constraints. New York/Berlin: Aldin/ de Gruyter, 1987.
_______ Parents' Reactions to Teacher Practices of Parental Involvement. The
Elementary School. Journal, 86, 277-294, 1986.
_______ & SANDERS, Mavis G. What We Learn from International Studies of School-
Family-Community Partnerships. Childhood Education 74, n. 6, 392-394, 1998,
acesso em 4 de março de 2005.
EHRLICH, M. I. Parental involvement in education: a review and synthesis of the
literature. In: Revista Mexicana de Análisis de la Conducta, v. 7, n. 1, p. 49-69,
1995.
120
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
ELKIN, Frederick. A criança e a sociedade. Rio de Janeiro: Block, 1968.
ESTEVÃO, Carlos V. Escola e Participação – O lugar dos pais e a escola como lugar
do cuidado. In: Ensaio: Avaliação e Políticas Públicas em Educação /
Fundação CESGRANRIO, Rio de Janeiro, v. 1, n. 1, out./dez., 1993.
FALCÃO, Filho. Participação dos Pais no Processo Educacional: desafio ou
impossibilidade? Revista Pedagógica. Belo Horizonte, v. 7, n. 42, p. 8,1989.
FERNANDES, Nivia C. Um caso de intervenção de psicopedagogia institucional:
“crianças que não aprendem”. Monografia de especialização em
Psicopedagogia, Pontifícia Universidade de São Paulo, 2001.
FERRAZ, C. Esses Pais de Alunos. Nova Escola, n. 02, p. 48-51, 1986.
FRAIMAN, Leonardo P. A importância da participação dos pais na educação escolar.
Dissertação de Mestrado. São Paulo: Instituto de Psicologia / Universidade de
São Paulo, 1997.
FREIRE, Ana M. A. Notas. In: FREIRE, Paulo. Pedagogia da esperança um
reencontro com a pedagogia do oprimido. São Paulo: Editora Paz e Terra,
2003.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 40ª. edição, 2005a.
_______ Educação como prática da liberdade. São Paulo: Editora Paz e Terra,
2005b.
_______ Pedagogia da Esperança. Um reencontro com a pedagogia do oprimido.
São Paulo: Editora Paz e Terra, 2003.
_______ Criando métodos de pesquisa alternativa: aprendendo a fazê-la melhor
através da ação. In: Brandão, Carlos Rodrigues (org.). Pesquisa Participante.
São Paulo: Brasiliense, 1981.
_______ Conscientização teoria e prática da libertação. Uma introdução ao
pensamento de Paulo Freire. São Paulo: Editora Moraes, 1980.
_______ Pedagogia da autonomia saberes necessários à prática educativa. São
Paulo: Editora Paz e Terra, 1999.
GADOTI, Moacir. & col. Paulo Freire uma biobibliografia. São Paulo, Cortez: Instituto
Paulo Freire; Brasília, DF, UNESCO, 2001.
GARCIA, Carlos Marcelo. Formação de professores: para uma mudança educativa.
Lisboa: Porto Editora, 1999.
121
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
GENTILE, Paola. Fala, Mestre! – Entrevista com Antonio Nóvoa. Revista Nova Escola
142. Ed. Abril, maio/2001, p.13-15. Apud. Material didático PEC-FORMAÇÃO
UNIVERSITÁRIA / 2004.
GOMES, Jerusa V. Família: cotidiano e luta pela sobrevivência. In: CARVALHO,
Maria C.B. (org.) EDUC, Cortez Editora, 1997.
_______ Relações Família e Escola – Continuidade/Descontinuidade no Processo
Educativo. In: Idéias, São Paulo, FDE, n. 16, p. 84-92, 1995.
_______ Socialização Primária: tarefa familiar? In: Cadernos de Pesquisa, São Paulo,
n. 91, p. 56-61, nov., 1994.
_______ Relações família e escola – Continuidade / descontinuidade no processo
educativo. Série Idéias. São Paulo, n. 16, p. 84-91, 1993.
_______ Família e Socialização. In: Família e Educação, Psicologia USP, São Paulo,
v. 3, n. 1/2, p. 93-105, 1992.
GRÜNSPUN, H. e GRÜNSPUN, F. Assunto de escola. In: Assuntos de família:
relacionamento-sexo-Tv-droga-escola. [S.L.]: Almed. [S.D.]
HADDAD, Lenira. A Relação Creche – Família: relato de uma experiência. In:
Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n. 60, p. 70-78, 1987.
HERMANN, Nadja. Hermenêutica e Educação. Rio de Janeiro: DP&A Editora, 2003.
JOWETT, S. & BAGINSKY, M. Parents and Education: a survey of their involvement
and a discussion of some issues. Educational Research, v. 30, n. 1, feb, 1988.
JOWETT, S.; BAGINSKY, M.; MACNEIL, M. M. Building bridges: parental involvement
in schools. NFER Research Library: Great Britain, 1991.
KREIDER, H. Early childhood digest: families and teachers as partners.
http://npin.gov/respar/texts/parschoo/n00099.html, acesso em 4 de março de
2005, 1998.
LAHIRE, Bernard. Sucesso escolar nos meios populares. As razões do improvável.
Trad. Ramon Amérido Vasques e Sônia Goldfeder. São Paulo: Ed. Ática, 2004.
LAREAU, A. Social class differences in family-school relationships: the importance of
cltural capital. Socyology of Education, v. 60, p. 73-85, 1987.
LEFÈVRE, Fernando. Família, Relativismo Cultural e Injustiça Social no Campo do
Desenvolvimento Humano. In: Rev. Bras. Cresc. Des. Hum., São Paulo, IV (1),
p. 40-44, 1994.
122
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
LUNA, Sérgio V. Planejamento de pesquisa. Uma introdução. São Paulo: EDUC,
2003.
MALDONADO, M. T. Comunicação entre pais e filhos. Petrópolis: Vozes, 1998/1991.
MANTONDON, Cléopâtre & PERRENOUD, Philippe. Entre pais e professores, um
diálogo impossível? Para uma análise sociológica das interacções entre a
família e a escola. Oeiras: Celta Editora, 2001.
MARTINS, Joel & BICUDO, Maria A. V. A Pesquisa Qualitativa em Psicologia
Fundamentos e Recursos Básicos. São Paulo: Centauro Editora, 2005.
MINERVINO, C. A. S. M. Relacionamento entre pais e filhos. Revista Pediatria
Moderna. São Paulo, v. 33, n. 9, p. 740-743, setembro, 1997.
MIRANDA, Marília. G. O processo de socialização na escola: a evolução social da
criança. In: LANE, S. & CODO, W. Psicologia Social – o homem em
movimento. Ed. Brasiliense, 1989.
MITSCH, R. Alimente o potencial do seus filhos. Trad. Cecília C. Bartolotti. São
Paulo: Loyola, 1996.
MIZUKAMI et al. Experiência de ensino-aprendizagem: vamos ajudar nossas
crianças?. Relatório de Pesquisa. UFSCar, 1998.
MOROZ, Melania & GIANFALDONI, Mônica H. T. A. O Processo de Pesquisa:
Iniciação. Série Pesquisa em Educação, v. 2. Brasília: Editora Plano, 2002.
NAKAYAMA, A. M. A disciplina na escola: o que pensam os pais, professores e
alunos de uma escola de 1o grau. São Paulo, Dissertação (Mestrado). Instituto
de Psicologia, USP, São Paulo, 1996.
NICOLAU, Marieta L. M. Escolarização e socialização na educação infantil. Acta
Scientiarium 22 (1): 1190-0125, 2000.
_______ A educação pré-escolar: fundamentos e didática. São Paulo: Ática, 2002.
NOGUEIRA, Maria A., ROMANELLI, Geraldo & ZAGO, Nadir. Família & Escola
trajetórias de escolarização em camadas médias e populares. Petrópolis:
Editora Vozes, 2003.
NOGUEIRA, M. A. & CATANI, A. Uma sociologia da produção do mundo cultural e
escolar. In: Bourdie, P. Escritos de Educação, Petrópolis: Ed. Vozes, 1998.
123
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
NOGUEIRA, M. A. Relação família-escola: novo objeto na sociologia da educação.
Cadernos de Educação. PAIDÉIA, FFCLRP-USP, Ribeirão Preto, Fev/ago,
1998.
OLIVEIRA, Lélia de Cássia F. Escola e família numa rede de (des)encontros. Um
estudo das representações de pais e professores. Taubaté, SP: Cabral Editora
e Livraria Universitária, 2002.
PAIXÃO, Lea P. Compreendendo a escola na perspectiva das famílias. in: Müller,
Maria Lúcia R. & Paixão, Lea P. (orgs). Educação, diferenças e desigualdades.
Cuiabá: EduFMT, 2006.
PARO, Vitor H. Por dentro da Escola Pública. São Paulo: Xamã Editora, 2000.
_______ Qualidade do ensino: a contribuição dos pais. São Paulo: Xamã Editora,
2000.
_______ Participação da Comunidade na Gestão Democrática da Escola Pública. In:
Idéias, São Paulo, FDE, n. 12, p. 39-47, 1992.
_______ A utopia da gestão escolar democrática. In: Cadernos de Pesquisa, São
Paulo, n. 60, p. 51-53, fev., 1987.
PASSOS, Inah; CARVALHO, Marília & SILVA, Zoraide I. F. Uma experiência de
gestão colegiada. In: Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n. 66, p. 81-94,
agosto, 1988.
PATTO, Maria H. S. A família pobre e a escola pública: anotações de um
desencontro. In: Psicologia USP, v. 3, n. 1/2, p. 107-121, 1992.
PERRENOUD, Philip. Dez novas competências para ensinar. Artes Médicas Sul, 2000.
PINTO, E. e cols. Contribuição para a análise dos indicadores sociais e familiares do
atraso escolar. Temas sobre desenvolvimento. São Paulo, v. 4, n. 21, p. 2-9,
1994.
PINTO, C. Reunião de Pais: Uma Experiência no Colégio Imaculada Conceição.
Revista Pedagógica, 3 (14), 32-33, 1985.
REALI, Aline M. M. R. & Tancredi, Regina M. S. P. Interação Escola-Famílias:
concepções de professores e práticas pedagógicas. In: MIZUKAMI, M. G. &
REALI, A. M. Formação de Professores práticas pedagógicas e escola, São
Carlos, Edufscar, 2002.
124
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
_______ Visões de professores sobre as famílias de seus alunos: um estudo na área
da educação infantil. http://www.ced.ufsc.br/~nee0a6/tregalin.PDF, acesso em
24, fev. 2005.
_______ Desenvolvendo uma metodologia de aproximação entre a escola e as
famílias dos alunos com a parceria da universidade. In: Anais do IV SEMPE-
Seminário de Metodologia para Projetos de Extensão, São Carlos, 20-31, ago.,
2001. http://www.itoi.ufrj.br/sempe/73-p35.htmn, acesso em 24, fev., 2005.
_______ Interação escola-família: buscando compreender a visão de professores.
Relatório de Pesquisa, 2001. www.bdtd.ufscar.br/tde_arquivos/ 8/TDE-2004-
12-06T14:57:23Z-295/Publico/DissRCZ.pdf, acesso em 25, fev., 2005.
ROMANELLI, Geraldo. Autoridade e poder na família. In: CARVALHO, M.C.B. (org.)
EDUC, Cortez Editora, 1997.
_______ Papéis familiares e paternidade em famílias de camadas médias. In:
ENCONTRO ANUAL DA ANPOCS, 19. Caxambu/MG. 17 a 21 de out. de
1995. GT – Família e Sociedade.
_______ Paternidade em Famílias de Camadas Médias. In: Estudos de Pesquisa em
Psicologia, www2.uerj.br/~revispsi/v3n2/sumariov3n2.html, 2004, acesso em
26 de maio de 2005.
_______ NOGUEIRA, M. A. & ZAGO, N. (orgs.) Família & Escola trajetórias de
escolarização em camadas médias e populares. Petrópolis: Editora Vozes,
2003.
SARTI, Cynthia. A. Família e individualidade: um problema moderno. In: CARVALHO,
M.C.B. (org.) EDUC, Cortez Editora, 1997.
_______ Contribuições da antropologia para o estudo da família. In: Família e
Educação, Psicologia USP, São Paulo, v. 3, n. 1/2, p. 69-76, 1992.
SENA, Maria das Graças de C. A educação das crianças: representação de pais e
mães das camadas populares. Tese Doutorado, Instituto de Psicologia,
Universidade de São Paulo, 1991.
SIGOLO, S. R. L. e LOLLATO, S. O. Aproximações entre escola e família: um desafio
para educadores, In: CHAKUR, C. R. de S. L. (org). Araraquara: FCL/
Laboratório Editorial / UNESP; São Paulo: Cultura Acadêmica Problemas da
educação sob o olhar da psicologia Editora, 2001.
125
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
SILVA, Maria A.S.S.; RIBEIRO, Maria J.R.; SAMPAIO, Maria M.F.& QUADRADO,
Alice D. A escola como foco de análise: um estudo de 16 unidades escolares.
In: Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n. 95, p. 43-50, nov., 1995.
SILVEIRA, Paulo (org.). Exercício da Paternidade. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.
SIPAVICIUS, N. A. A. O rendimento escolar na 1ª série do 1
o
grau em duas escolas
públicas paulistanas: um estudo com uso de regressão múltipla. Didática. São
Paulo, v. 28, p. 115-129, 1992.
SMITH, T. Parental and Pre-school. London: Grant Macintyre, 1980.
SMOLKA, A. Família e Escola: o que as crianças percebem e nos dizem. Leitura:
Teoria e Prática, 8 (13), 33-36, 1989.
SPÓSITO, Marilia. P. Família e educação: Uma questão em aberto. In: Revista de
Psicologia da USP. Família e educação, v. 3, n. 1/2, 1992.
_______ O povo vai à escola: a luta popular pela expansão do ensino público em São
Paulo. São Paulo: Loyola, 1984.
STRECK, Valburga S. Família e escola: em busca de condições de empoderamento.
In: Ciências Sociais Unisinos, vol. 37, n. 158, p. 187-203, 2001.
SZYMANSKI, Heloisa; ALMEIDA, Laurinda R. & BRANDINI, Regina C. A. R. A
Entrevista na Pesquisa em Educação: a prática reflexiva. Brasília: Líber Livro
Editora Ltda., 2004a.
_______ Diálogo e participação: a prática dialógica na família, escola e comunidade.
São Paulo. /Projeto de pesquisa enviado para FAPESP/ , 2004b.
_______ A Relação Família/Escola. Desafios e Perspectivas. Brasília: Editora Plano, 2003.
_______ Família-Creche: parceria em um projeto educacional. Relatório de Pesquisa.
Programa de Estudos Pós Graduados em Psicologia da Educação, PUCSP, 2001.
_______ A família como um locus educacional: perspectivas para um trabalho
psicoeducacional. In: Ver. Brás. Est. Pedag., Brasília: v. 18, n. 197, p. 14-25,
Jan./Abr., 2000.
_______ Encontros e Desencontros na Relação Família-Escola. In: Idéias, São
Paulo, FDE, n. 28, p. 213-225, 1997.
_______ Teorias e “Teorias” de Família. In: CARVALHO, M.C.B. (org.) EDUC, Cortez
Editora, 1997.
126
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
_______ De que famílias vêm nossos alunos? In: SERBINO, R.V. e GRANDE,
M.A.R.L., São Paulo, Editora UNESP, 1995.
_______ Educação para a família: uma proposta de trabalho preventivo. In: Rev.
Bras. Cresc. Des. Hum, São Paulo, IV (1), 1994.
THIN, Daniel André R. Famílias de camadas populares e a escola: confrontação
desigual e modos de socialização. In: Müller, Maria Lúcia R. & Paixão, Lea P.
(orgs). Educação, diferenças e desigualdades. Cuiabá: EduFMT, 2006.
TROPPMAIR, H. Autoridade dos pais. Revista do professor. Porto Alegre, v, 12, p.
46-47, abril/julho, 1996.
UNESCO. Perfil dos professores brasileiros: o que fazem, o que pensam, o que
almejam. 2004.
VALENTE, M. L. L. C. Fracasso escolar: problema de família? Dissertação (Mestrado)
em Psicologia. Faculdade de Filosofia e Ciências, UNESP, Marília-SP, 1993.
VASCONCELLOS, C. S. Disciplina: construção da disciplina consciente e interativa
em sala de aula e na escola. Cadernos Pedagógicos do Libertad, São Paulo,
v. 4, p. 101-115, 1995.
VEIGA, Ilma P. A. (org). Desmistificando a profissionalização do magistério. Papirus, 1999.
VIANNA, Cláudia P. Divergências mas não antagonismos: mães e professoras das
escolas públicas. In: Cadernos de Pesquisa, n. 86, p. 39-47, 1993.
VITALE, MARIA A. F. Socialização e família: uma análise intergeracional. In:
CARVALHO, M.C.B. (org.) EDUC, Cortez Editora, 1997.
WOLFENDALE, S. Empowering parents and teachers working for children. Londres:
Cassel, 1992.
_______ Parental involvement in children's development and education. London:
Gordon and Breach, 1983.
ZAGO, Nadir; ROMANELLI, Geraldo & NOGUEIRA, Maria A. Família e Escola –
trajetórias de escolarização em camadas médias e populares. Petrópolis:
Editora Vozes, 2003.
ZANELLA, A. et al.(1997). Participação dos pais na escola: diferentes expectativas.
In: ZANELLA, A.; SIQUEIRA, M. J. T. & MOLON, S. I. (orgs.) Psicologia e
práticas sociais, Porto Alegre: ABRAPSOSUL, 145-154, 1997.
127
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
I – IDENTIFICAÇÃO DO PARTICIPANTE DA PESQUISA
NOME: ________________________________________________________________
DOC.DE IDENTIDADE Nº. __________________ SEXO: (M) (F)
DATA DE NASCIMENTO.____/____/_____
ESCOLA: ______________________________________________________________
ENDEREÇO: ___________________________________________________________
BAIRRO: ____________________________ CIDADE: _________________________
CEP: ____________________TELEFONE: ___________________________________
II – DADOS SOBRE A PESQUISA CIENTÍFICA
TÍTULO DA PESQUISA: RELAÇÃO FAMÍLIA-ESCOLA NA PERSPECTIVA DA
PARTICIPAÇÃO MASCULINA: PAIS
PESQUISADORES RESPONSÁVEIS:Profa. Dra. Heloisa Szymanski e Nivia Caratin
Fernandes
CARGO/FUNÇÃO: Professora do Programa de Estudos pós-graduados em Psicologia da
Educação; Aluna do Programa de Estudos pós-graduados em Psicologia da Educação
AVALIAÇÃO DO RISCO DA PESQUISA: sem risco (probabilidade que o indivíduo sofre
algum dano como conseqüência imediata ou tardia do estudo)
III – EXPLICAÇÕES DO PESQUISADOR SOBRE A PESQUISA
Esta pesquisa tem como objetivo compreender como se expressam as participações dos
pais homens na escolarização de seus filhos e nas instituições escolares. Este trabalho
poderá auxiliar a relação família-escola e a participação dos pais em encontros que visem
à construção de projetos futuros no âmbito da Psicologia da Educação. A participação
não é obrigatória. Entretanto, seus relatos são de extrema importância para o
desenvolvimento do conhecimento no âmbito da Psicologia da Educação. Fica garantindo
aos sujeitos da pesquisa a confidencialidade, a privacidade e o sigilo das informações
individuais obtidas. Os resultados deste estudo poderão ser publicados em artigos e/ou
livros científicos ou apresentados em congressos profissionais, mas informações
pessoais que possam identificar o indivíduo serão mantidas em sigilo.
128
Família-Escola – A Participação Masculina
Nivia Caratin Fernandes
IV – ESCLARECIMENTOS DADOS PELO PESQUISADOR SOBRE
GARANTIAS AO PARTICIPANTE
Ficam garantidas aos sujeitos da pesquisa:
1. O acesso, a qualquer tempo, a informações sobre procedimentos, riscos e benefícios
relacionados à pesquisa, inclusive para dirimir eventuais dúvidas.
2. A salvaguarda da confidencialidade, sigilo e privacidade.
3. O direito de retirar-se da pesquisa no momento em que desejar.
V – INFORMAÇÕES DE NOME, ENDEREÇOS E TELEFONES DOS
RESPONSÁVEIS PELO ACOMPANHAMENTO DA PESQUISA, PARA
CONTATO EM CASO DE DÚVIDAS
Profa. Dra. Heloisa Szymanski e Nivia Caratin Fernanades
Programa de Estudos Pós-graduados em Psicologia da Educação – PUCSP
Rua Monte Alegre, 964 – Perdizes – São Paulo – Fone: (11) 3670-8527
VI – CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Declaro que, depois de convenientemente esclarecido pelo pesquisador e de ter
entendido o que me foi explicado, consinto em participar do presente Protocolo de
Pesquisa.
S.Paulo. / /
_____________________________ ______________________________
Participante da pesquisa. Pesquisador