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Tese de Doutorado apresentada à
banca examinadora do Programa de
Pós
-
Graduação
Stricto Sensu
em
Direito do Estado (Área de
Co
ncentração: Direito Constitucional),
da Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo, como exigência parcial para
a obtenção do título de Doutor em
Direito, sob orientação do Professor
Titular Luiz Alberto David Araujo.
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BAHIA, Claudio José Amaral
CA_____
A Responsabilidade do Estado na Tarefa de
Garantir o Direito de Convivência Familiar de Crianças e
Adolescentes.
Orientador: Professor Titular Luiz Alberto David Araujo. São
Paulo/SP, 2007. 539 fls.
Tese (Doutorado e
m Direito)
Centro de Pós
-
Graduação da
PUC/SP. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo/SP.
1.
Responsabilidade do Estado.
2.
Convivência Familiar e
Comunitária.
3. Criança e Adolescente. Título II.
CDD _____._____
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Nota: ______________________
São Paulo, ___ de _________ de 2007.
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Aos meus pais, Glauco (in memorian) e Luciana,
pelo apoio e amor incondicionais que sempre
me deram.
À minha filha, Maria Júlia, na esperança de que
seu sagrado direito fundamental de convivência
familiar e comunitária seja, um dia, efetivamente
respe
itado pelo Estado brasileiro.
À Thaís Fayad Misquiati, por tudo.
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Ao meu orientador, Professor Dr. Luiz Alberto David
Araujo, pela paciência, auxílio, ensinamento, dedicação e
compreensão, cujos atributos foram indispensáveis e
essenc
iais, a fim de que este trabalho tenha encontrado
seu fim, e, principalmente, pelo fato de, ao longo do meu
curto caminho acadêmico, demonstrar, a cada minuto, a
inexorável importância da Constituição.
Aos Professores Michel Temer, Paulo Roberto Lauris,
G
islaine Semeghini Lauris, Lydia Neves Bastos Telles
Nunes, Rui Carvalho Piva, Conrado Rodrigues Segalla,
Eliana Franco Neme, Soraya Lunardi, Lucas Pimentel de
Oliveira, Daniela Rodrigueiro, José Roberto Anselmo, José
Roberto Martins Segalla, Michel de Souz
a Brandão, Danilo
Rothberg e Maria Claudina, Fernando Cavini e Egli Muniz.
Aos amigos Marcelo Augusto de Souza Garms, Ricardo
Beneli Dultra e Débora Fayad Misquiati, cujo auxílio se
mostrou importante à conclusão do presente trabalho.
As gentis funcionár
ias das Bibliotecas lotadas na
Instituição Toledo de Ensino em Bauru por toda ajuda e
apoio prontamente prestados, em especial a Mariza Xavier.
À Instituição Toledo de Ensino, pela imensurável
oportunidade de lecionar.
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Não obstante passa
dos mais de dezoito anos da promulgação da
Constituição Federal de 1988, ainda hoje é uma realidade se deparar com
preocupantes situações envolvendo omissões estatais em face dos
chamados direitos humanos fundamentais, mais precisamente no que
concerne a s
ua aplicação a segmentos sociais minoritários. Assim, o tema
central que se pretenderá trabalhar com o presente arrazoado, a par das
dificuldades práticas e consentâneas que lhe são pertinentes, diz respeito à
necessidade de concretização do direito fundam
ental de convivência
familiar e comunitária afeto a nossas crianças e adolescentes, cujo dogma
se encontra expressamente garantido pelo texto constitucional pátrio, mais
precisamente no
caput
de seu Art. 227. Nesse mesmo caminho, também
será objeto de estu
do a responsabilidade estatal nas situações em que não
se verifica possível à concretização do referido direito fundamental, por
manifesta omissão do ente público em casos tais, de modo que os sujeitos
constitucionais prejudicados por tal ato tenham, ao menos, a sua disposição
instrumentos de mitigação do dano causado pela inevitável ausência de
convivência familiar, o que, sem sombra de dúvidas, estará a prestigiar o
vetor basilar da isonomia, insculpido no
caput
do Art. 5º da
Lex Legum
. A
inércia e a omis
são estatais acima apontadas, acabam sempre por
redundar num ilícito efeito, qual seja, o de retirar da criança e do
adolescente expurgados da convivência familiar e comunitária a
possibilidade de um desenvolvimento afetuoso e digno, abrindo
-
lhe, assim,
o caminho para invocar uma tutela jurídico
-
constitucional efetiva, visando à
correção ou a mitigação da referida e danosa problemática. Destacar
-
se
-
á,
então, os veículos processuais aptos a decretar a responsabilização do
Estado pela omissão quanto ao direito fundamental à convivência familiar e
comunitária de crianças e adolescentes no plano concreto, com especial
destaque para a ação civil pública, o mandado de injunção e a ação de
conhecimento condenatória. Tais instrumentos, a par da existência de
outras possibilidades, são idôneos para buscar indenização embasada na
teoria de responsabilidade civil denominada de
perda de uma chance
.
Dentro desse contexto, o que se busca com a elaboração deste trabalho,
sem qualquer pretensão de se esgotar o tema, foi o de
colocar em
discussão que a convivência familiar e comunitária é um direito fundamental
essencial ao desenvolvimento de crianças e adolescentes, não podendo o
Estado recuar ou se furtar ao dever de colocar a disposição dos não
afortunados, mecanismos e con
dições que tenham, com eficácia, o condão
de minorar os problemas relativos à referida ausência, sob pena de ser
responsabilizado pela inconstitucional omissão em seu agir.
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Nonostante siano passati piú di diciotto anni dalla promulgazi
one della
Costituzione Federale del 1988, ancor oggi é uma realtá trovarsi di fronte a
situazioni preoccupanti che involgono omissioni statali in ció che riguarda i
cosiddetti diritti umani fondamentali e piú esattamente in ció che riguarda la
sua applicaz
ione a segmenti sociali minoritari. Cosí, il tema que si pretende
discutere con questa esplanazione, isieme alle difficoltá pratiche che gli sono
proprie, dice rispetto alla necessitá della concretizzazione del diritto
fodamentale di convivenza familiare e comunitaria che attinge i nostri bambini
e adolescenti, il dogma del quale si trova espressamente garantito nel texto
costituzionale patrio, piú esattamente nel caput del suo articolo 227. Seguendo
il medesimo cammino, sará oggetto di studio anche la resp
onsabilitá dello
stato nei casi in cui não si verifica possibile la oncretizzazione del citato diritto
fondamentale, per manifesta omissione dell'ente publico in questi casi,di modo
che i soggetti costituzionali prejudicati per questo comportamento dello stato
abbiano, per lo meno, a sua disposizione strumenti capaci di mitigare il danno
causato dalla inevitabile mancanza della convivenza familiare, il che, senza
dubbio alcuno, dará enfasi al vettore basilare dell'isonomia, incrostato nel
caput dell'articol
o 5o della Lex Legum. Línerzia e l'ommissione giá poste in
evidenza, finiscono sempre per sfociare in um effetto illecito come quello di
ritirare dal bambino e dall'adolescente privati della convivenza familiare e
comunitaria la possibilitá di uno sviluppo
affettuoso e giiusto , aprindogli ,in
questo modo, la via per richiedere uma tuttela giuridico
-
costituzionale effettiva
avendo come scopo la correzione o la mitigazione della sopracitata e dannosa
problematica. Allora si metteranno in evidenza i mezzi pro
cessuali capaci di
decreare la responsabilitá dello Stato a rispetto del diritto fondamentale alla
convivenza familiare e comunitaria di bambini e adolescenti nel piano concreto
com speciale rilievo per l'azione civile publica, l'ordine di intimazione e l'
azione
di conoscimento condannatoria. Questi strumenti, insieme ad altre possibilitá
che esistono, sono capaci di procurare l'indenizzazione fondamentata nella
teoria della responsabilitá civile chiamata
perdita di uma opportunitá
E in
questo modo di veder
e le cose, ció che si cerca, com la elaborazione di questo
lavoro,senza pretendere di esaurire il tema, é collocare in discussione il fatto
che la convivenza familiare e comunitária é un diritto fondamentale essenziale
per lo sviluppo di bambini e adolesce
nti, não potendo lo Stato recuare o
furtarsi al dovere di mettere a disposizione di quelli che la sorte não ha
contemplato, meccanismi e condizioni che abbiano, com efficacia, la capacitá
di minimizzare i problemi che concernono la citata assenza, correndo
il rischio
di essere responsabilizzato per la omissione incostituzionale nel suo modo di
agire.
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Aunque hayan pasado más de dieciocho años de la promulgación de
la Constitución Federal de 1988, aún hoy es uma realidad depararse com las
preocupantes situaciones envolviendo omisiones estatales ante los llamados
derechos humanos fundamentales, más precisamente en lo que se refiere a
su aplicación hacia los seguimientos sociales minoritarios. Así, el tema central
que se pretende trabajar con
el presente razonado al par de las dificultades
prácticas y adecuadas que son pertinentes, se refiere a la necesidad de
concretización del derecho fundamental de convivencia familiar y comunitaria
respecto a nuestros niños y adolescentes, en cuyo dogma se
encuentra
expresamente garantizado por el texto constitucional patrio, más precisamente
en el caput de su artículo 227. En ese mismo camino, también será objeto de
estudio la responsabilidad estatal en las situaciones en las que no se verifica
posible la c
oncretización de dicho derecho fundamental, por manifiesta
omisión del ente público en casos tales, de modo que los sujetos
constitucionales perjudicados por tal acto tengan, al menos, a su disposición
herramientas de mitigación del daño causado por la ine
vitable ausencia de
vida familiar, lo que sin cualquier dudas, estará a prestigiar el vector basilar de
la isonomia, inculpudo en el caput
del artículo 5º de la
Lex Legum.La inercia y
la omisión estatales arriba aputadas, acaban siempre por recaer en un ilícito
efecto, cual sea, el de quitar del niño y del adolescente echados de la
convivencia familiar y comunitaria la posibilidad de un desenvolvimiento
afectuoso y digno, abriéndole, de esta forma, el camino para invocar una
tutela juridico
-
constitucional efectiva, con vistas a la corrección o la mitigación
de dicha y dañosa problemática. Se destacarán, por lo tanto, los caminos
procesales hábiles a decretar la responsabilización del Estado por la omisión
cuanto al derecho fundamental a la convivencia familiar y comunitária de los
niños y adolescentes en el plano concreto, con especial destaque para la
acción civil pública, el mandado de injunción y la acción de conocimiento
condenatoria. Tales herramientas, al par de la existencia de otras
posibilidades, son idóneas para buscar una indenización basada en la teoria
de responsabilidad civil denominada de
pérdida de oportunidad
. En este
contexto, lo que se busca con la elaboración de este trabajo, sin cualquier
pretensión de agotarse el tema, fue es poner en discusión que la convivencia
familiar y comunitaria es un derecho fundamental esencial al desarrollo de los
niños y adolescentes, no podiendo el Estado cejar o huír al deber de ponerse
a la disposión de los no afortunados, mecanismos y condiciones que tengan
con eficacia, la facultad de minorar los problemas relacionados con dicha
ausencia , aún con la posible penalización de que sea responsabilizado por la
inconstitucional su manera de actuar.
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In spite of eighteen years have passed since the 1988 Federal
Constitution promulgation, still today it is a reality someone turns up
with preoccupying situations involving state omissions in the face of the
called fundamental human rights, more exactly in what concerns their
application to minority social segments. So, the main theme we intend
to accomplish with the present work informed about the practical and
adequated difficulties pertinent to them, is the necessary of concretion
of the fundamental right of familiar and community companionship
toward our children and teenagers, which dogma is expressed assured
at the constitutional text, more precisely in the caput of its Art. 227.
Following the same way, it will also be object of this study the State
responsibility toward the situations that is not possible the concretion of
the mentioned fundamental right, because of the public means
omission in such cases so that the constitutional subjects injured for
such act have, at least, at their disposal, mitigation instruments of the
harm caused by the unavoidable absence of familiar companionship,
which, without any doubt, will give credit to the isonomy fundamental
vector, devised in the caput of the Art. 5
th
of Lex Legum. The state
inaction and omission mentioned above come always to redound to
illicit effect, such as, take off the child and the teenager expurgated
from the familiar and community companionship the possibility of a kind
and condign development, opening for them a way in order to ask for
an effective juridical constitutional tutelage having in mind the
correction or the mitigation of the mentioned and damaging problem. It
will detach the processual ways capable to determine the State
responsibility by the omission toward the fundamental right to the
familiar and community companionship of the children and teenagers
on a real plan, with special prominence to the public civil action, the
injunction mandate and the condemnatory knowledge action. Such
instruments, informed about the existence of other possibilities, are apt
to search for indemnity based upon the theory of civil responsibility
called of loss of a chance. Inside this context, what is intended with this
work, without any illusion of exhausting the theme, was to bring to a
discussion that the familiar and community companionship is a
fundamental right essencial to the children and teenagers
development; and the State cannot draw back the obligation to give to
the less fortunates, efficient conditions in order to reduce the problems
concerning to the mentioned absence, under penalty of being
responsible for the inconstitutional omission of its acts.
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a.C.
antes de Cristo
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Ato das Disposições Constitucionais Transitórias
ampl.
ampliada
Art.
artigo
Arts.
artigos
atual.
atualizada
Câm.
Câmara
CC
Código Civil
CF
Constituição Federal
CF/88
Constituição Federal de 1988
coord.
coordenação
CPC
Códi
go de Processo Civil
Des.
Desembargador
DJ
Diário de Justiça
DOU
Diário Oficial da União
Dr.
Doutor
Dra.
Doutora
ed.
edição
inc.
inciso
j.
julgado
LACP
Lei sobre a Ação Civil Pública
Min.
Ministro
número
ONU
Organizaç
ão das Nações Unidas
p.
página
Profª.
Professora
Profº.
Professor
Rel.
Relator
rev.
revisada
SP
São Paulo
ss.
seguintes
STF
Supremo Tribunal Federal
STJ
Superior Tribunal de Justiça
T.
Turma
TACivSP
Tribunal de Alçada Civil de São Paulo
tirag.
tiragem
TJRJ
Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro
TJSP
Tribunal de Justiça de São Paulo
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RESUMO
................................................................................................
..
vi
RIASSUNTO
................................................................
.............................
vii
RESUMEN
................................................................................................
viii
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
................................
......................
ix
1
INTRODUÇÃO
................................................................
...............
14
2
A FAMÍLIA CO
MO FENÔMENO DE IMPORTÂNCIA SÓCIO
-
JURÍDICA
...
18
2.1
Conceito e Origem da Célula Familiar
................................
..............
24
2.2
Evolução Histórica da Família
................................
.........................
32
2.3
A Função Social da Família
................................
............................
37
2.4
Importância Psicossocial da Família
................................
................
45
2.5
A Família como Fenômeno Social de Relevânci
a Jurídica
.................
50
2.6
A Família como Objeto de Normatização Constitucional
...................
60
3
A NATUREZA JUSFUNDANTE DA FAMÍLIA
................................
..
70
3.1
A Constitucionalização do Direito Privado
................................
........
71
3.2
Princípios Constitucionais Aplicáveis ao Direito de Família
...............
93
3.2.1
Princípio da proteção da dignidade humana
................................
.....
98
3.2.2
Princípio da igualdade entre
homens e mulheres na condução da
entidade familiar
................................................................
.............
102
3.2.3
Princípio da afetividade
................................................................
...
105
3.2.4
Princípio da liberdade e do livre planejamento familiar
......................
108
3.2.5
Princípio da pluralidade familiar
................................
.......................
113
3.3
O
Status
Jusfundante do Direito à Família
................................
.......
118
3.3.1
Considerações gerais acerca dos direitos fundamentais
...................
118
3.3.2
Escorço histórico
-
dimensional
................................
.........................
125
3.3.3
Extensão e limites
................................................................
..........
131
3.3.4
A família como direito fundamental
................................
..................
136
4
A
S CRIANÇAS E ADOLESCENTES E O DIREITO FUNDAMENTAL
À CONVIVÊNCIA FAMILIAR E COMUNITÁRIA
..............................
154
4.1
A Proteção de
Crianças e Adolescentes no Plano Jurídico Constitucional
Brasileiro Anterior a 1988
................................................................
160
4.2
A Proteção de Crianças e Adolescentes na Constitui
ção Brasileira de 1988
...
171
4.3
Considerações Acerca do Estatuto da Criança
e do Adolescente e sua
Repercussão no Plano Jurídico Infraconstitucional
...........................
179
4.4
Princípios Aplicáveis à Proteção de Crianças e Adolescentes
...........
193
4.4.1
Princípio da proteção int
egral e da prioridade absoluta
.....................
193
4.4.2
Princípio do melhor interesse da criança e do adolescente
...............
196
4.4.3
Princípio do poder familiar
................................
..............................
199
4.4.4
Princípio da não
-
discriminação ou da igualdade entre todos os filhos
..
204
4.4.5
Princípio da condição peculiar da pessoa em desenvolvimento
...........
207
4.5
O Ministério Público e seu Papel Fundamental na Proteção
dos Direitos
de Crianças e Adolescentes
................................
............................
211
4.6
O Direito Fundamental de Crianças e Adolescentse à
Convivência Familiar
e Comunitária
................................................................
................
218
4.6.1
A família natural
................................................................
.............
227
4.6.2
A possibilidade e as formas de colocação em família substituta
........
230
4.6.2.1
Guarda
................................................................
..........................
231
4.6.2.2
Tutela e curatela
................................................................
............
232
4.6.2.3
Adoção
................................................................
..........................
234
4.6.2.4
A mãe social
................................................................
..................
242
4.6.3
Elementos de concreção e complementação do direito fundament
al à
convivência familiar e comunitária: direito à vida, à saúde,
à educação,
ao plano emprego, à cultura, ao esporte e ao lazer
...........................
245
4.7
Breves Considerações e
Citações Acerca da Proteção de Crianças e
Adolescentes
no Plano Internacional
................................
................
258
4.7.1
A
mérica do Sul
................................................................
...............
258
4.7.1.1
Constituição da Argentina
................................
...............................
261
4.7.1.2
Constituição da Bolívia
................................................................
...
262
4.7.1.3
Constituição da Colômbia
................................
...............................
262
4.7.1.4
Constituição do Equador
................................................................
.
263
4.7.1.5
Constituição do Paraguai
................................................................
264
4.7.1.6
Constituição do Uruguai
................................................................
..
264
4.7.1.7
Co
nstituição da Venezuela
................................
..............................
265
4.7.2
Américas Central e do Norte
................................
...........................
265
4.7.2.1
Constituição da Costa Rica
................................
.............................
265
4.7.2.2
Constituição de Cuba
................................................................
.....
266
4.7.2.3
Constituição de El Salvador
................................
............................
266
4.7.2.4
Constituição da Guatemala
................................
.............................
266
4.7.2.5
Constituição de Honduras
................................
...............................
266
4.7.2.6
Constituição de Nicarágua
................................
..............................
267
4.7.2.7
Constituição do Panamá
................................................................
.
267
4.7.2.8
Constituição da República Dominicana
................................
............
268
4.7.3
Europa
................................................................
..........................
268
4.7.3.1
Lei Fundamental da República Federal Alemã
................................
.
268
4.7.3.2
Lei Constitucional Federal Austríaca
................................
................
269
4.7.3.3
Constituição do Reino da Bélgica
................................
....................
269
4.7.3.4
Lei Fundamental sobre a Forma do Governo Filandês
......................
269
4.7.3.5
Constituição da República da Grécia
................................
...............
270
4.7.3.6
Constituição da República da Irlanda
................................
...............
270
4.7.3.7
Constituição da República da Itália
................................
..................
271
4.7.3.8
Constituição do Grão
-
Ducado do Luxemburgo
................................
.
271
4.7.3.9
Constituição do Reino dos Países Baixos
................................
........
271
4.7.3.10
Portugal
................................................................
.........................
271
5
A RESPONSABILIDADE DO ESTADO PELA NÃO-
CONCRETIZAÇÃO
DO DIREITO
FUNDAMENTAL DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES
À CONVIVÊNCIA FAMILIAR E COMUNITÁRIA
..............................
275
5.1
O Estado e seu Dever Inafastável de Concretização do
Direito Fundamental
à Convivência Familiar e Comunitária de Crianças e Adolescentes
...
280
5.2
O Reflexo Ilícito da Omissão
Estatal em Relação ao Dever de Concretização
do
Direito Fundamental de Convivência
Familiar e Comunitária de
Crianças e Adolescentes: A Responsabilidade pela Perda de uma Chance
...
306
5.2.1
Considerações gerais acerca da teoria da perda de uma chance
......
306
5.2.2
A aplicação da teoria da responsabilidade por perda de uma chance
como corolário do direito fundamental à proteção jurídica efetiva à
convivência familiar e comunitária de crianças e adolescentes
: a
quebra da isonomia
como fator de embasamento à responsabilidade
estatal
................................................................
...........................
316
5.2.3
O dano mora
l
................................................................
.................
353
6
BREVES CONSIDERAÇÕES ACERCA DA TUTELA JURISDICIONAL
COMO INSTRUMENTO DE REALIZAÇÃO
E DE REPARAÇÃO DO
DIREITO FUNDAMENTAL À CONVIVÊNCIA FAMILIAR
.................
362
6.1
O Controle de Constitucionalidade
................................
..................
367
6.2
O Controle Concentrado de Constitucionalidade
..............................
371
6.2.1
A ação direta de inconstitucionalidade
................................
.............
373
6.2.2
A ação declaratória de constitucionalidade
................................
.......
384
6.2.3
A ADIN por omissão
................................................................
.......
392
6.2.4
A argüição de descumprimento de preceito fundamental
..................
394
6.2.5
A ação direta interventiva
................................................................
402
6.2.6
A súmula vinculante
................................................................
.......
408
6.3
O Controle Difuso
................................................................
...........
411
6.4
A Ação Civil Pública, o Mandado de Injunção e a Ação de Conhecimento
Condenatória como Meios Processuais Aptos a Decretar a Responsabilização
do Estado pela Omissão Quanto ao Direito Fundamental à Convivência
Familiar e Comunitária de Crianças e Adolescentes no Plano Concreto
..
416
6.4.1
A ação civil pública
................................................................
.........
417
6.4.2
O mandado de injunção
................................................................
..
427
6.4.3
A ação de conhecimento condenatória
................................
............
443
7
CONCLUSÕES
................................................................
..............
457
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
................................
................
462
1
1
4
4
1
1
I
I
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T
R
R
O
O
D
D
U
U
Ç
Ç
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Ã
O
O
É inequívoca a assertiva de que, com a promulgação da Lei de Outubro, o
Brasil passou a vivenciar uma nova e sólida era no que se refere à positivação do
núcleo de direitos que confere e garante a condição digna mínima de humanidade
a seus cidadãos, p
lasmados, assim, com a perspicaz qualificação de
fundamentais
.
Ao menos no papel, foram deixadas para trás as duras marcas do período
ditatorial e assumiu
-
se uma manifesta vertente democrática, visando a uma busca
estatal incessante quanto à realização do
bem comum, de todos mesmo, sem
exceção, diferenciação ou distinção.
Entretanto, e depois de passados mais de dezoito anos de seu advento,
uma pergunta não se cala dentro da comunidade jurídica e dentro da própria
sociedade brasileira: será mesmo a Consti
tuição efetiva?
Será mesmo garantidora do conteúdo mínimo necessário e inafastável
para a consecução de uma vida digna aos membros que formam a aludida
comunidade estatal?
Inegável situação, que se amolda aos questionamentos anteriormente feitos,
diz res
peito ao direito fundamental de convivência familiar e comunitária afeto às
nossas crianças e adolescentes, cujo dogma se encontra expressamente garantido
pelo texto constitucional pátrio, mais precisamente no
caput
de seu Art. 227.
Tem mesmo a família es
pecial proteção do Estado?
Em se percebendo a fundamentalidade do direito à família, sua ausência
ou deficiência acarreta prejuízos ao desenvolvimento digno do indivíduo?
Nossas crianças e adolescentes, por intermédio de políticas públicas
sólidas, do re
conhecimento efetivo de seus direitos fundamentais sociais, têm
1
1
5
5
vivenciado, a contento, seu indelével direito de convivência familiar e comunitária
ou será que, na prática, a profundidade do dogma se dispersa diante da maliciosa
e pernóstica sombra da retórica vazia?
Um direito fundamental concedido pela Constituição Federal não pode,
em hipótese alguma, girar
in albis
, ser integralmente despido de efeito prático, sob
pena de, em assim sendo, tornar
-
se mera letra morta, o que se cumpre a todo
custo evitar.
Volta
-
se aqui à preocupação de que o texto constitucional não se
torne obra de mera retórica, de promessas vãs, a fim de servir aos
propósitos questionáveis de maus políticos, de maus administradores, de
maus cidadãos.
O objeto do presente trabalho é, justamente, tentar trilhar os caminhos de
respostas em busca da efetividade da Lei de Outubro, valendo
-
nos da
convivência familiar e comunitária como paradigma a ser estudado e dissecado,
mostrando
-
se, também, a influência que a nova ordem basilar inaugurad
a em
1988 espraiou em todos os setores do Direito, mesmo naqueles que alhures
foram classificados de eminentemente
privados
.
Foi
-
se o tempo em que as normas constitucionais eram tidas como meros
vetores, de caráter exortativo aos governantes e governados,
cujo cumprimento
ficava relegado a conceitos perigosos e duvidosos, como vontade política,
oportunidade e conveniência, sem qualquer responsabilidade ou vinculação, nas
hipóteses de descumprimento, do agente que obteve a legitimidade popular para
gerir a
chamada
coisa pública
e os interesses de toda sociedade, visando ao
atingimento do chamado bem comum.
O homem é um animal social por natureza, não se podendo afastar a
idéia de que o seio familiar realmente se entremostra, na maioria das vezes, como
o pon
to inicial e até mesmo único de contato da pessoa com o mundo que a
cerca, emergindo, daí, a sua indissociável importância para seu respectivo
desenvolvimento digno e escorreito.
1
1
6
6
Em verdade, não há como se falar em direitos de crianças e
adolescentes, sem antes perpassar pela importância e pela fundamentalidade da
família.
Entrementes, não é de hoje, não obstante, seu inafastável dever, que o
aparato estatal não se mostra apto a satisfazer a concretização dos direitos
fundamentais dos cidadãos a ele atrelados, incluindo
-
se, em tal ilícita situação, a
questão referente à convivência familiar e comunitária de nossas crianças e
adolescentes.
Nesse eito, em não cumprindo o Estado, a contento, com seus deveres e
com suas obrigações constitucionais, ou seja, dei
xando que corra ao largo o
direito fundamental à convivência familiar e comunitária de nossas crianças e
adolescentes, têm os prejudicados meios de buscar eventual reparação em face
de tal omissão pública?
Em outras palavras, até que ponto o não
-
agir esta
tal, manifestado pela
ausência de concreção do direito fundamental de convivência familiar e
comunitária, está a desprestigiar o vetor basilar da isonomia, insculpido no
caput
do Art. 5º da
Lex Legum
, fomentando diferenciações de cidadania que não foram
ob
jeto de apreço pelo legislador de 1988?
E qual a participação do Poder Judiciário nesse processo de
concretização e de reparação?
É, justamente, esse conjunto de respostas que se busca atingir com a
elaboração do presente trabalho, sem qualquer pretensão
de se esgotar o tema
ou de se apresentar uma solução indeclinável para a problemática.
A principal intenção, antes de tudo, é colocar em discussão a
convivência familiar e comunitária como um direito fundamental essencial ao
desenvolvimento de crianças e
adolescentes, cuja concretização guarda total
respeito ao postulado constitucional referente à proteção da dignidade
humana.
1
1
7
7
Assim, dentro desse contexto e sob a luz do texto constitucional vigente,
analisar
-
se
-
á se o Estado pode recuar ou se furtar ao de
ver de colocar à
disposição dos não
-
afortunados, mecanismos e condições que tenham, com
eficácia, o condão de, ao menos, minorar os problemas relativos à referida
ausência, ou, se a
perda dessa chance
de desenvolvimento digno se entremostra
passível de ser
reparada em casos tais.
Importante ponderar que, qualquer que seja a medida adotada, pode
-
se
afirmar, sem margem de erro, que a solução juridicamente adequada ou
verdadeiramente suficiente será aquela que, levando em consideração a
necessidade de efetiva
ção dos preceitos constitucionais de 1988, permitirá
edificar, no plano concreto, de modo conciliador, um direito fundamental intrínseco
ao indivíduo e à coletividade como um dever fundamental estatal que lhe é
inerente e inafastável.
Assim, a esperança é
de que a Constituição seja, realmente, efetiva e
que, em face de tal efetividade, parafraseando
-
se os dizeres do político alemão
Konrad Adenauer, todos vivam não só sob o mesmo céu, mas que tenham,
também, o mesmo horizonte.
1
1
8
8
2
2
A
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F
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D
D
I
I
C
C
A
A
O enfoque central que se pretende apresentar, neste trabalho, a par das
dificuldades práticas e consentâneas ao tema, diz respeito à necessidade de
responsabilização estatal pela não efetivação do direito fundamen
tal de convivência
familiar e comunitária afeto a nossas crianças e adolescentes,
1
mormente daqueles
abandonados à própria sorte, independentemente de origem, raça, credo, sexo,
orientação sexual, posição econômico
-
social, idade ou quaisquer outros element
os
de diferenciação, o qual se encontra expressamente garantido pelo texto
constitucional pátrio, mais precisamente no
caput
de seu Art. 227.
Nesse caminho, necessário se faz, então, estudo sobre o alcance e os
limites da referida responsabilidade estatal
nas situações em que não se verifica
possível à concretização do referido direito fundamental, por manifesta omissão
do ente público em casos tais, de modo que os sujeitos constitucionais
prejudicados por referidos atos tenham, ao menos, à sua disposição,
instrumentos
de mitigação do dano causado pela inevitável ausência de convivência familiar e
comunitária, o que, sem sombra de dúvidas, estará a prestigiar o vetor basilar da
isonomia substancial, insculpido no
caput
do Art 5º da
Lex Legum
.
Verifica
-
se,
cada vez mais, que os estudiosos do direito lançam seus
olhares de preocupação para a intermitente ocorrência de fatos omissivos por
parte do Estado, no que se refere ao cumprimento de seus deveres inerentes
enquanto guardião dos interesses sociais, cuja incidência deixa passar ao largo a
necessidade de concretização de direitos consolidados no seio do próprio texto
constitucional, mormente no que diz respeito aos princípios e objetivos
fundamentais da República.
1
FACHIN, Rosana Amara Girardi.
Em busca da família do novo milênio
. Rio de Janeiro:
Renovar, 2001, p. 68: “É ínsita à existência da pessoa humana o direito fundamental de
reali
zar sua aspiração de ter uma família, sem uma moldura prévia que obste, no todo ou em
parte, a realização desse desejo. A questão que agora se põe é a de dar efetividade a esse
interesse, elevado à categoria de direito fundamental”.
1
1
9
9
É inegável a candente gama protetiva oferecida ao cidadão e à sociedade
brasileira pelo texto constitucional de 1988, embora não menos verdadeira, seja a
assertiva de que existe um enorme e quase indevassável abismo entre aquilo que
se encontra positivado e aquilo que realmente acaba sendo aplicado
nas
comunas de nosso País, fato que demonstra, sem sombra de dúvidas, a
necessidade urgente de serem implementadas políticas e condutas que tragam
uma maior eficácia aos ditames basilares, especialmente nas circunstâncias que
digam respeito aos direitos fu
ndamentais do ser humano.
Todos os dias somos bombardeados por notícias que nos dão conta da exata
dimensão que a violência atingiu em nossa sociedade, tornando
-
nos reféns de nós
mesmos, na exata medida em que não mais se sabe se andar pela rua, visitar u
m
parente, sair para almoçar, não acabará se constituindo no último ato de nossas vidas,
não se perdendo de vista que o ápice da insuportabilidade se deu, ainda que de
maneira simbólica, com o brutal assinato do menor João Hélio, no Rio de Janeiro.
Após o
nefasto ilícito, o Congresso Nacional saiu em desabalada carreira,
no afã de aprovar uma série de textos legislativos visando um suposto e imediato
combate à violência, o que, diante da pouca análise e reflexão sobre os mesmos,
poderá agravar ainda mais a
situação, haja vista que infringências de direitos
fundamentias
in concreto
não se combatem com infringências de direitos
fundamentais
in abstrato
, e o AI
-
5 é a maior prova disso.
É preciso que se consiga, o mais breve possível, passar do plano retórico
para o plano concreto, acerca dos interesses básicos e mínimos para que uma
pessoa possa, efetivamente, levar uma vida qualificada pela dignidade. Não se
pode mais aceitar, passivamente, a ausência de comida, educação, moradia, luz
elétrica, água encanada,
esgoto tratado, instalações hospitales adequadas,
discriminação e, dentro do âmbito deste trabalho, de convivência familiar e
comunitária para nossas crianças e adolescentes.
Nesse sentido, Walter Claudius Rothenburg menciona:
[...] a atual preocupação
com o descumprimento de comandos
constitucionais num contexto intervencionista de necessidades
2
2
0
0
impostergáveis e, conseqüentemente, de exigências
irrenunciáveis, traduz
-
se em disposições de Constituições
modernas (Constituição iuguslava de 1974, Constituiçã
o
portuguesa de 1976, Constituição espanhola de 1978), cujo influxo
foi sentido pela Constituição brasileira de 1988.
2
Em verdade, o assunto toca a necessidade de que a sociedade de um
modo geral e, principalmente, aqueles que ostentam a honrosa condição
de
representantes eleitos pela vontade popular, tenham em mente a concreção, a
despeito da discussão ao derredor de sua força normativa ou não,
3
dos dizeres
estampados no Preâmbulo da Lei de Outubro, a saber:
Nós, representantes do povo brasileiro, reunid
os em Assembléia
Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático,
destinado a assegurar o exercício de direitos sociais e individuais, a
liberdade, a segurança, o bem
-
estar, o desenvolvimento, a igualdade
e a justiça como valores supremos de uma
sociedade fraterna,
pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e
comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução
pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a
seguinte Constituição da República Federativa
do Brasil.
Tais valores, em hipótese alguma, podem ficar apenas no
papel
como
meta utópica, sem plano ou prazo para concreção, execução e consumação.
Entrementes, e, embora a assertiva de que o referido texto constitucional seja
considerado como um dos m
ais importantes corpos jurídico
-
políticos existente no
mundo, no que se refere ao asseguramento de direitos aos cidadãos e sua coletividade,
a verdade é que, do ponto de vista prático, como dito alhures, vislumbra
-
se uma grave
crise de ineficácia social no que se refere a aplicação e a concretização de seus
preceitos, na exata medida em que as garantias nela previstas estão longe de serem
amplamente vivificadas no quotidiano brasileiro, a ponto de Paulo Gomes Pimentel
Júnior, de maneira arguta, elaborar a s
eguinte indagação:
2
ROTHENBURG, Walter Cl
audius.
Inconstitucionalidade por omissão e troca do sujeito
constitucional
.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005
, p. 86.
3
CANOTILHO, José Joaquim Gomes.
Direito constitucional e teoria da Constituição
. 3ª ed.
reimpr. Coimbra: Livraria Almedina, 1999, p
. 63: “[...] o preâmbulo desempenha ainda uma
outra importante função constitucional. Ele exprime, por assim dizer, o título de legitimidade
da Constituição, quer quanto à sua origem, quer quanto ao seu conteúdo (legitimidade
constitucional material)”.
2
2
1
1
[...] se a Constituição é uma lei
melhor, é a lei das leis de um
país
que dá validade a todo complexo normativo, símbolo de
lutas e conquistas, por quem governantes e povo devem
-
se guiar,
por que é que, no complexo normativo jurídico
estatal, ocupa o
lugar de uma das menos respeitadas? Quais as razões de sua
parcial ineficácia social?
4
Insista
-
se! É preciso que se dê, o mais rápido possível, uma resposta
concreta a tal questionamento, haja vista que, passados mais de dezenove anos
de
promulgação da Lei de Outubro, devem seus preceitos, na integralidade e na
máxima efetividade de seus desdobramentos, saírem dos armários da burocracia
e do discurso político para, verdadeiramente, adentrarem pelas portas e janelas
afetas aos anseios míni
mos e impostergáveis de cada pessoa que vive e faz parte
desse País, pois, do contrário e, parafraseando o título de obra famosa da
literatura mundial, ficaremos indagando se serão os cidadãos astronautas.
Como sabido e já mencionado em outra oportunidade
, a já degradante
situação de nossas crianças e adolescentes vem piorando dia após dia, o que,
sem sombra de dúvidas, irá acabar por repercutir na esfera de liberdade de todos,
pois, sem qualquer laivo de populismo, o infante faminto e sem família de hoje
tende a ser o latrocida de amanhã, o que se cumpre a todo custo evitar.
É preciso ponderar, ainda, que não se ignora, de outro lado, que a
dificuldade de efetivação dos direitos fundamentais passa pelo conflito de
interesses existente entre os mais diversos setores sociais, bem como em relação
à realidade de cada indivíduo, a teor do quanto imortalizado por Rosseau, no
Contrato social
:
[...] para descobrir as melhores regras de sociedade que convenham
às nações, precisar
-
se
-
ia de uma inteligência superior, que visse todas
as paixões dos homens e não participasse de nenhuma delas, que
não tivesse nenhuma relação com a nossa natureza e a conhecesse a
fundo, cuja felicidade fosse independente de nós, e contudo, quisesse
dedicar
-
se a nós que, finalmente, almej
ando uma glória distante
pudesse trabalhar num século e fruí
-
la em outro. Seriam precisos
deuses para dar leis aos homens.
5
4
P
IMENTEL JÚNIOR, Paulo Gomes.
Constituição & ineficácia social
. Curitiba: Juruá, 2004,
p. 57
-
58.
5
Capítulo VIII
Do Legislador.
2
2
2
2
Todavia, e sob pena de as diretrizes constitucionais normativas não
passarem de meros impressos em papel, como de há muito já alert
ava Ferdinand
Lassale,
6
certo é que não se poderá fazer tábula rasa à necessidade de
efetivação de políticas públicas que venham tentar, ao menos, minorar a situação
de sofreguidão dos cidadãos brasileiros, bem como de nossas crianças e
adolescentes, em es
pecial daqueles que, pelos contingentes da vida, se
encontram desprovidos da assistência, do suporte e do afeto familiar.
7
Em casos tais, tem
-
se que o Estado, por meio de seus representantes,
não poderá ficar inerte e nem omisso, sob pena de responsabilização pela não
-
concreção de direitos fundamentais, a qual, diga
-
se de passagem, não está mais
adstrita, ao menos depois de 1988, a condutas de caráter discricionário, de
oportunidade e de conveniência, apresentando, de maneira inequívoca, estrita e
inafastá
vel vinculação com aquilo que o legislador constituinte originário houve
por bem em determinar como sendo princípios e objetivos fundamentais de nossa
República.
Ora, se o tema toca a guarida e o
status
de direito fundamental, é porque
se entremostra essencial e indispensável ao correto e digno desenvolvimento da
pessoa humana, tangenciando, inclusive, o postulado base de nossa República,
qual seja, o da proteção da dignidade humana, encartado, com letra maiúscula,
no inc. III, do Art. 1º, da Constituição
Federal de 1988.
O hiato deixado no desenvolvimento de nossas crianças e
adolescentes, no que se refere à ausência de convivência familiar e
comunitária, deve ser preenchido ou, pelo menos, mitigado, com
oportunidades claras de aperfeiçoamento educacional
, cultural e laboral, de
modo que nosso País forje cidadãos capacitados para o desafio da vida em
comunidade e com iguais oportunidades de condições em relação àqueles
6
LASSALE, Ferdinand.
A essência da Constituição
. 6ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris,
2001, p. 40.
7
BARROS, S. R. A ideologia
do afeto. In:
Revista brasileira de direito de família
, nº 14. São
Paulo: Revista dos Tribunais, jul./set. 2002, p. 09: “[...] um afeto que enlaça e comunica as
pessoas, mesmo quando estejam distantes no tempo e no espaço, por uma solidariedade
íntima e fu
ndamental de suas vidas
de vivência, convivência e sobrevivência
quanto aos
fins e meios de existência, subsistência e persistência de cada um e do todo que formam”.
2
2
3
3
que tiveram a felicidade de crescer no seio de uma família bem estruturada,
existente e
presente.
Neste primeiro capítulo, abordar
-
se
-
á a evolução histórica do fenômeno
social denominado
família
,
8
bem como sua importância e seus desdobramentos
dentro dos campos da sociologia e da psicologia, seus desafios e características
no atual momento c
ontemporâneo, não se deixando passar ao largo os
importantes questionamentos sobre sua relevância jurídica e sua normatização
constitucional.
Indispensável tal análise preliminar, no afã de que, ao depois, se perceba
a influência de tais campos na seara j
urídica, haja vista que, em a criança e o
adolescente se desenvolvendo dentro de uma família estruturada econômica,
social, moral e psicologicamente, muitos dos graves e intrincados problemas
sociais de nosso País estariam com os dias contados, pois se est
aria ajudando a
erradicar a pobreza, o analfabetismo, a criminalidade, dentre tantos outros males
que afligem nossa sociedade e que, coincidentemente, se encontram entre os
objetivos fundamentais de nossa República, a teor do quanto positivado no Art. 3º
d
a Lei de Outubro.
Enfim, e parafraseando Ulysses Guimarães em discurso proferido quando da
promulgação da atual Carta Constitucional, cidadão é aquela pessoa que ganha,
come, sabe, mora, pode se curar e, fundamentalmente, tem uma família que o
acolhe e pr
epara para o desafio da vida, vida necessariamente em sociedade.
9
8
FARIAS, C. C. de. Direito constitucional à família (ou famílias sociológicas versus
famílias
reconhecidas pelo direito): um bosquejo para uma aproximação conceitual à luz da
legalidade. In:
Revista brasileira de direito de família
, nº 23. São Paulo: Revista dos
Tribunais, abr./mai. 2004, p. 07: “Ora, sem dúvida, a família traz consigo uma
dimensão
biológica, espiritual e social, afigurando
-
se mister, por conseguinte, sua compreensão a partir
de uma feição ampla, considerando suas idiossincrasias e peculiaridades, o que exige a
participação de diferentes ramos do conhecimento, tais como a s
ociologia, a antropologia, a
filosofia, a teologia, a biologia (e, por igual, a biotecnologia e a bioética) e, ainda, a ciência do
direito. Tentar compreendê
-
la de forma sectária, isolando a compreensão em alguma das
ciências, é enxergá
-
la de forma míope,
deturpada de sua verdadeira feição”.
9
CARVALHO FILHO, Milton Paulo de. Direito de família. In: PELUSO, Cezar (coord.).
Código
Civil comentado
: doutrina e jurisprudência. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 1.511: “Segundo a
doutrina mais avançada em direito de f
amília, a idéia de família é imortal, como a do núcleo
básico ao qual nos integramos ao nascer, um ponto de referência central do indivíduo na
sociedade, de solidariedade, que lhe dá segurança, transmite
-
lhe valores e o torna apto a
perseguir um projeto pa
ra sua realização pessoal e para alcançar a felicidade”.
2
2
4
4
2.1
Conceito e Origem da Célula Familiar
A origem da família remonta à origem do homem e tem suas
características e contornos definidos pela nuanças que envolvem e se
apresentam num determ
inado corpo social, de modo que extrair um conceito
único de família se entremostra um feito praticamente incompossível de ser
realizado.
Entretanto, tal tentativa se entremostra válida na digressão do presente
trabalho.
Em consonância com as definições trazidas por André Lalande, a título de
exemplo, percebe
-
se, claramente, a dificuldade de se produzir um conceito único
em relação ao fenômeno social denominado de
família
. Vejamos:
FAMÍLIA:
D. Familie; E. Family; F. Famille; I. Famiglia
.
Etimologicamente
(L. família), o conjunto de servidores (cf.
inversamente o emprego da palavra ‘casa’). De onde derivam
diferentes sentidos: A .Grupo de indivíduos parentes ou aliados
que vivem conjuntamente. Distinguiram
-
se, nesse sentido, vários
tipos de família: monogâ
mica, poligâmica, poliândrica, punaluana,
etc.
perpétua, temporária, etc. Ver as observações. B. O
conjunto de todos os indivíduos vivos num dado momento que
mantém entre si relações definidas de parentesco ou de aliança.
C. Sucessão de indivíduos que de
scendem um dos outros e
daqueles a que se uniram por aliança. D. Mais especialmente, e
sobretudo nas sociedades contemporâneas, o grupo formado pelo
pai, pela mãe e pelos filhos. E. Por analogia, nas ciências
biológicas, grupo de gêneros reunidos por carac
terísticas comuns
e que se pode considerar como descendentes de um tipo de
ancestral único. Termo usado primeiramente em botânica e que
mais tarde se estendeu à zoologia, onde se tornou muito usual.
Rad. int.:
Famili
.
10
Não obstante a mudança estrutural e
conceitual que a entidade familiar
sofreu (e ainda sofre) ao longo do tempo, inegável se mostra, num primeiro
momento, que sua origem está intimamente ligada ao surgimento da espécie
10
LALANDE, André.
Vocabulário técnico e crítico da filosofia
.
São Paulo: Martins Fontes,
1999
, p. 382
-
383.
2
2
5
5
humana e de sua precípua e inexorável necessidade de conviver e de se
rel
acionar com seus semelhantes, de modo a enfrentar, com mais condições e
benefícios, as intempéries e dificuldades do quotidiano.
É de se ponderar, também, que a evolução do conceito e das formas de
família hoje vivenciadas, na medida do possível, também f
oram observadas e
encampadas pelo Direito,
11
haja vista que este, obrigatoriamente e dentro de suas
peculiaridades científicas, há que se apresentar como instrumento dotado de
dinamicidade, ou seja, apto a acompanhar todo o circuito evolutivo e
transformado
r que recai, dia após dia, sobre as mais variadas relações sociais.
Prova disso é a constante preocupação jurídico
-
interpretativa no sentido
de outorgar legitimidade jurídica a relações e acontecimentos que antes eram
segregados da rede protetiva pela vigência exclusiva de preconceitos, podendo
-
se citar, como exemplo, a positivação constitucional da união estável e o
reconhecimento jurisprudencial das uniões homoafetivas como verdadeiras
entidades familiares, merecedoras da mesma atenção e albergue que as
tradicionais.
12
Foi
-
se o tempo em que o casamento era a única forma de se formar uma
família
do ponto de vista de proteção jurídica.
13
11
FACHIN, Luiz Edson.
Elementos críticos do direito de família
. Rio de Janeiro: Renovar,
199
9, p. 294: “Do ponto de vista das fontes formais, relevante foi a migração operada do
Código Civil à Constituição. O sistema clássico originário do Código Civil brasileiro é uma
página que na história antecede o Direito Constitucional da Família, um campo de saber que
rompe as fronteiras tradicionais do público (tendo espaço para um Estado forte quando os
desiguais e fracos dele necessitam para seus direitos fundamentais) e do privado (tendo os
horizontes abertos para um Estado fraco que permite aos indivíd
uos e a coletividade a
realização pessoal e social de suas aspirações)”.
12
WINGEN, Max.
A caminho de uma ciência da família?
Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris
Editor, 2005, p. 98: “A única coisa que se pode responder é que a família deve progredir na
med
ida em que progrida a sociedade, que deve modificar
-
se na medida em que a sociedade
se modifique, como sucedeu até agora. A família é produto do sistema social e refletirá o
estado de cultura desse sistema. Tendo a família monogâmica melhorado a partir dos
começos da civilização e, de uma maneira muito notável, nos tempos modernos, é lícito pelo
menos supor que seja capaz de continuar seu aperfeiçoamento até que chegue a igualdade
entre os dois sexos. Se, num futuro remoto, a família monogâmica não mais ate
nder às
exigências sociais, é impossível predizer a natureza da família que a sucederá”.
13
Ibidem, p. 45: “Em razão do significado fundamental das famílias para a realização pessoal do
indivíduo, bem como também para a formação da capacidade humana na soci
edade, sua
amplificação pode valer como contribuição para assegurar a capacidade futura da
comunidade”.
2
2
6
6
Desta feita, não mais soçobram como aplicáveis, nos dias de hoje, as
palavras vivificadas e proferidas pelo advogado e, na
época, deputado à
Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, Oscar de Macedo Soares,
quando, em 1895, comentando o ingresso na ordem jurídica do Decreto nº 181,
de 24 de janeiro de 1890, pontificou: “[...] o casamento foi sempre, em todos os
temp
os e entre todos os povos, considerado instituição da maior importância,
merecendo especial solicitude como garantia da família, que é a base da
sociedade”.
14
Em continuidade, tem
-
se que em qualquer época, lugar ou estado de sua
evolução (selvagem ou não), o homem sempre é encontrado em necessidade de
convivência com outros.
Desde o surgimento do homem sobre a Terra, este se reuniu em grupos
sociais, inicialmente pequenos, como famílias, clãs, tribos e, depois, em
grupamentos maiores, como aldeias, cidades
e, finalmente, Estados.
A razão dessa situação está na existência das duas dimensões sociais do
homem
material e espiritual
, as quais fazem com que aflore o desejo e a
necessidade de convivência coletiva.
O chamado impulso associativo natural é condizente com a necessidade
de origem material e espiritual de convivência, sem exclusão da vontade humana.
Isso ocorre porque o homem é o único animal racional e a razão tem como força
motriz a vontade. É esta vontade que nos mantém unidos em sociedade.
Div
ersas correntes procuraram, ao longo da história, explicar e justificar
esta necessidade física e espiritual de convivência do homem, já intitulada
impulso associativo natural
.
A doutrina destaca 03 (três) correntes, fundadas em posicionamentos
diversos:
14
SOARES, Oscar de Macedo.
Casamento civil
: decreto nº 181, de 24 de janeiro de 1890,
comentado e anotado. 2ª ed. Rio de Janeiro: Livreiro
-
Editor, 1895,
p. 05.
2
2
7
7
(i) a corrente grega: dentre os pensadores gregos, Platão e Aristóteles
divergiram sobre o tema. Para Platão, o homem é essencialmente alma e,
originariamente, povoou um mundo denominado
lugar celeste
. Entretanto, em
face de uma grande culpa, as almas perd
eram essa especial condição e
passaram a habitar a Terra, assumindo um corpo, como forma de expiação dos
pecados. Por esta razão, necessita de mútuo auxílio e esta sociabilidade dura
enquanto durar a existência corpórea. Já, Aristóteles, entendia o homem c
omo
constituído de corpo e alma. É, portanto, a própria natureza que induz o indivíduo
a associar
-
se com outros indivíduos e a organizar
-
se em uma sociedade;
(ii) a corrente cristã: partindo das premissas aristotélicas, atribui a
existência humana a uma v
ontade divina e afirma que o ser humano que não
pratica a sociabilidade desobedece aos desígnios de Deus. Seu principal
expoente foi Santo Tomás de Aquino;
(iii) a corrente contratualista: para esses pensadores, a sociabilidade é o
produto de um acordo de
vontades, o resultado da celebração de um hipotético
contrato firmado entre os homens. Mesmo dentre os contratualistas, encontramos
visões antagônicas, assumindo destaque Thomas Hobbes e Jean
-
Jacques
Rousseau.
Para Hobbes, autor do livro
O leviatã
, o hom
em é um ser mau e anti
-
social e a sociedade seria uma forma de limitar este comportamento agressivo.
Ao transferir para o Estado o poder e o ônus de administrar a todos, impõe
-
se a
ordem e a segurança. Algumas afirmações suas ficaram consagradas,
notadamen
te a que afirma que
homo homini lupus
(o homem é lobo do próprio
homem).
Para Rousseau, autor do livro
Contrato social
e em franca oposição
a Hobbes, o homem é essencialmente bom. Porém, levado a acreditar que a
vida em sociedade lhe traria mais benefício
s, aceitou transferir poder ao
Estado, dominado pelos ricos que estavam interessados nas propriedades.
Isso fez com que a sociedade somente servisse para corrompê
-
lo e torná
-
lo
infeliz.
2
2
8
8
Para Rousseau, uma vez formada a sociedade, o mecanismo possível
para fazê
-
la eficiente é a adoção do contrato social, responsável pela identificação
da vontade coletiva, do interesse comum.
Desta feita, e ainda que de maneira resumida, pode
-
se constatar que não
se admite o ser humano excluído do contexto social.
O homem f
ora da sociedade é sempre uma abstração, uma exceção, assim
como, no escopo do presente trabalho, a ausência de convivência familiar e comunitária
para nossas crianças e adolescentes se apresenta de todo inaceitável e inadmissível.
A sociedade pode ser co
nceituada sob diversos aspectos.
Na visão dos sociólogos, sociedade é uma união durável em vista de um
fim comum. Outra definição compreende qualquer agrupamento de pessoas em
processo de interação.
Buscando a lição de Celso Ribeiro Bastos,
Curso de teor
ia do Estado e
ciência política
, p. 24, tem
-
se que “[...] sociedade vem a ser toda forma de
coordenação das atividades humanas objetivando um determinado fim e regulada
por um conjunto de normas”.
A formação da sociedade obedece a algumas leis naturais. Tais regras já
estão presentes desde o momento do nascimento do homem, não havendo a
necessidade de serem transmitidas pela experiência ou percebidas pela
observação. Podem
-
se destacar algumas destas leis, como o desejo de paz, o
sentimento de necessidade,
a perpetuação da espécie, etc.
Assim como existem regras que estimulam a formação da sociedade,
existem outras que a desestimulam, como a necessidade de auto
-
afirmação, o
gosto pela liderança, a dificuldade em aceitar críticas e oposições.
Apenas pela razão e pela vontade humana, já vistas em linhas anteriores,
é que o homem supera as adversidades e permanece unido em coletividade.
2
2
9
9
A vida social necessita de uma organização, precisa de regras que façam
com que a existência coletiva seja harmoniosa ou, ao
menos, tolerante, incluindo
-
se nesse contexto, por óbvio, a família.
Para tanto, existem diversos instrumentos de controle: as normas
religiosas, as éticas e, também, as jurídicas.
Noutro giro verbal, e para que seja dotado de efetividade e de
eficácia,
o Direito deve, na medida do possível, acompanhar os fenômenos
evolutivos que o circundam, sob pena de, em assim não agindo, tornar
-
se
obsoleto e sem utilidade, situação essa que não se apresenta diferente em
relação à família.
Para Dalmo de Abreu Dallari
, faz
-
se:
[...] necessário salientar que esta primeira conclusão deverá
estar presente em todas as considerações sobre a vida
social, sua organização como um centro de poder, sua
dinâmica, seus objetivos e, especialmente, nas
considerações sobre a posição
e o comportamento do
indivíduo na sociedade, pois, uma vez que esta é um
imperativo natural, não se poderá falar do homem
concebendo
-
o como um ser isolado, devendo
-
se concebê
-
lo
sempre, necessariamente, como o homem social.
15
Inegável, assim, que a origem da família se confunde, como visto, com a
origem do próprio homem e da própria sociedade.
Como exemplo disso, tem
-
se que a Bíblia, livro sagrado das confissões
religiosas cristãs, aponta, como sendo a primeira família havida no mundo, aquela
formada com
a criação de Adão e Eva (Livro do Gênesis), para, ao depois e
dentro de sua linha doutrinária, outorgar especial e fundamental importância à
chamada
Sagrada Família
, composta por José, Maria e o menino Jesus
(Evangelhos).
15
DALLARI, Dalmo de Abreu.
Elementos de teoria geral do Estado
. 24ª ed. São Paulo:
Saraiva, 2003, p. 19.
3
3
0
0
Isso porque, acaba ela se converte
ndo em
start
, em início da vida em
coletividade,
16
de modo que, inegavelmente, a evolução desta última afeta
diretamente a evolução dos mais diversos sistemas sociais espalhados pelo
mundo e vice
-
versa.
Em razão da evolução da sociedade, percebe
-
se a exist
ência, em regiões
mais liberais, como em alguns Estados norte
-
americanos, a flexibilização das
normas afetas aos relacionamentos familiares, enquanto que, noutros lugares, um
recrudescimento de tais associações, negando
-
se, inclusive, a outorga de direito,
em termos de igualdade, aos membros que a formam, especialmente no que se
refere a mulheres e crianças, não sendo tão raros casos de segregação e
castigos físicos públicos.
Prova disso foi o drama vivenciado pelas nigerianas Amina Lawal
17
e
Safiya Husaini
.
18
A gravidez fora do casamento
mesmo para mulheres divorciadas
pode
ser considerada adultério e punida com a morte em alguns Estados do norte da
Nigéria, governados pela Sharia, a lei islâmica.
A pena para fornicação aplica
-
se às mulheres que nunca
foram casadas,
consistente no desferimento de cem chibatadas àquela que for considerada
culpada.
16
PERROT, M. O nó e o ninho. In:
Veja
: 25 anos
reflexões para o futuro. São Paulo:
Abril, 2004, p. 81: “Não é a família em si que nossos cont
emporâneos recusam, mas o
modelo excessivamente rígido e normativo que assumiu no século XIX. Eles rejeitam o
nó, não o ninho. A casa é, cada vez mais, o centro da existência. O lar oferece, num
mundo duro, um abrigo, uma proteção, um pouco de calor humano
. O que eles desejam
é conciliar as vantagens da solidariedade familiar e as da liberdade individual.
Tateando, esboçam novos modelos de família, mais igualitárias nas relações de sexos e
idades, mais flexíveis em suas temporalidades e em seus componentes,
menos sujeitas
à regra e mais ao desejo. O que se gostaria de conservar da família, no terceiro milênio,
são seus aspectos positivos: a solidariedade, a fraternidade, a ajuda mútua, os laços de
afeto e o amor. Belo sonho”.
17
Disponível em: <
http://www.amn
istia
-
internacional.pt/conteudos/amina/amina3.php>. Acesso
em: 12 dez. 2006.
18
Disponível em: <
http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2002/020318_nigeriadb.shtml>.
Acesso em: 15 dez. 2006.
3
3
1
1
Amina Lawal, em Março de 2002, acabou tendo expedida contra si, por
um Tribunal Sharia do norte da Nigéria, decisão condenando
-
a à pena de morte
por apedrejame
nto, sob o pálio de que teria confessado ter tido um filho enquanto
divorciada.
De acordo com o novo código penal Sharia, que se aplica apenas a
muçulmanos, a gravidez fora do casamento constitui uma prova evidente para
que uma mulher seja condenada por a
dultério.
A decisão foi anulada após uma intensa campanha realizada pela Anistia
Internacional e por outras entidades do mundo todo, tendo sido enviados mais de
06 milhões de e
-
mails, cartas e fac
-
símiles de vários pontos do globo contrários a
referida co
ndenação.
Safiya Husaini também foi condenada à pena de morte por
apedrejamento em razão de ter dado à luz um filho fora do casamento, uma vez
que ela era também divorciada.
O mais curioso dessa história é que Safiya engravidou de seu ex
-
marido,
sendo ce
rto que seu caso também causou comoção internacional.
Em 25 de março de 2002, o Tribunal da Sharia lhe concedeu decreto de
absolvição, sob o fundamento de que a criança foi concebida antes que o
adultério se tornasse provado.
Não se perca de vista que o argumento de defesa usado por Husaini, que
se encontrava separada do marido há sete anos, consubstanciou
-
se no fato de
que sua filha fora concebida durante o casamento, mas que o embrião ficara
adormecido
durante vários anos no seu útero.
Os exemplos acim
a, às escâncaras, demonstram a imensa dificuldade
vivenciada no dia
-
a
-
dia para se entenderem as regras sociais que formam a
3
3
2
2
família e qual a extensão de sua efetiva proteção nas mais diversas regiões e
culturas espelhadas pelo mundo.
19
Todavia, mesmo com t
ais dificuldades, paira a certeza de que o grupo
familiar é indispensável para o digno desenvolvimento humano,
20
daí a
necessidade de que lhe seja outorgada uma efetiva e eficaz proteção.
2.2
Evolução Histórica da Família
Parafraseando
-
se dispositivo da
Constituição da República da Irlanda,
pela clareza com que define a questão, tem
-
se que a família, de fato, se
caracteriza como sendo um grupo primário, natural e fundamental da sociedade e
como instituição moral com direitos inalienáveis e imprescritívei
s, anteriores e
superiores a qualquer lei positiva que, ao longo dos tempos, veio recebendo, com
maior ou menor intesidade, proteção estatal no que se refere a sua formação e
autoridade, sendo reconhecida como base necessária à ordem social e
indispensável
ao bem
-
estar de uma nação.
E, inegavelmente, o fator preponderante que diz respeito à
caracterização da família e, via de conseqüência, de sua evolução histórica,
19
KLEIN, Felipe Pastro.
Família, entidade familiar e união de ind
ivíduos do mesmo sexo.
In:
ARONNE, Ricardo (org.).
Estudos de direito civil
-
constitucional
”. São Paulo: Revista dos
Tribunais, jan. 1999, p. 126: “Analisar o papel da família, mesmo que em determinada época,
é tarefa árdua, visto que cada período, cada sociedade ou grupamento humano, tem a família
com formas e contornos distintos. Michelle Perrot leciona que a história da família é longa,
não
-
linear, feita de rupturas sucessivas. Acrescenta, também, que toda a sociedade procura
acondicionar a forma da famíl
ia a suas necessidades”.
20
COURT, P. M. Família e sociedade contemporâneas. In: PETRINI, João Carlos;
CAVALCANTI, Vanessa Ribeiro (orgs.).
Família, sociedade e subjetividades
: uma
perspectiva multidisciplinar. São Paulo: Vozes, 2005, p. 13: “É correto dize
r que, desde os
mais diversos pontos de vista, a situação da família não é boa. No entanto, a família, como
sociedade natural, guarda um enorme potencial de desenvolvimento para a história não
somente dela mesma, mas também de toda a humanidade. Não será tão fácil desmanchá
-
la,
como muitos ressaltam ou desejam. Apesar da legislação sobre o matrimônio e sua
conseqüente dissolução, da equiparação de todos os filhos nascidos dentro e fora do
casamento e de outras disposições legais que a debilitam ou a destroem, ademais das cada
vez mais freqüentes rupturas e até de questões como a violência intrafamiliar, penso que a
família mostrará, em médio e longo prazos, que é uma instituição mais forte que a legislação
e também que a confusão produzida pela mudança rápida e vertiginosa do entorno cultural e
social na qual está inserida”.
3
3
3
3
diz respeito ao chamado
vínculo afetivo
que une ao integrantes do referido
agrupamento soci
al.
Como bem esclarece Maria Berenice Dias:
[...] vínculos afetivos não são uma prerrogativa da espécie
humana. O acasalamento sempre existiu entre os seres vivos,
seja em decorrência do instinto de perpetuação da espécie, seja
pela verdadeira aversão qu
e todas as pessoas têm à solidão.
Tanto é assim, que se considera natural a idéia de que a
felicidade só pode ser encontrada a dois, como se existisse um
setor da felicidade ao qual o sujeito sozinho não tem acesso. Não
importa a posição que o indivíduo oc
upa na família, ou qual a
espécie de grupamento familiar a que ele pertence, o que importa
é pertencer ao seu âmago, é estar naquele idealizado lugar onde
é possível integrar sentimentos, esperanças, valores e se sentir,
por isso, a caminho da realização d
e seu projeto de felicidade.
21
Essa necessidade de afeição,
22
de união entre as pessoas, conforme já
repisado linhas atrás, teve papel preponderante na formação da sociedade.
Percebe
-
se que, por intermédio da constituição de famílias, acabou
-
se chegando
a c
onstituição de cidades, de regiões e de Estados, o que acaba significando,
sem sombra de dúvidas, que estudar
-
se a sua evolução é estudar a evolução da
vida em sociedade.
Nesse sentido, Luiz Carlos de Azevedo pondera:
[...] a família é o elemento constit
utivo da cidade; e esta, por sua
vez, diz
-
nos Fustel de Coulanges, representa ‘a associação
religiosa e política das famílias e das tribos’ (
La cite antique
.
Paris:
Hachette, 1905, p. 151).
Mas, assim como sucede com a família
romana, a grega há de ser vis
ta, também, sob dois enfoques: o
primeiro, mais restrito, larário, reduzido ao marido e pai, à mulher,
filhos, agregados, escravos; e o segundo, em sentido mais amplo,
21
DIAS, Maria Berenice; PEREIRA, Rodrigo da Cunha (coords.).
Direito de família e o novo
Código Civil
.
Belo Horizonte: Del Rey, 2002, p. 23.
22
Ibidem, p. 68: “Como diz João Baptista Ville
la, as relações de família, formais ou informais,
indígenas ou exóticas, ontem como hoje, por mais complexas que se apresentem, nutrem
-
se,
todas elas, de substâncias triviais e ilimitadamente disponíveis a quem delas queira tomar:
afeto, perdão, solidariedade, paciência, devotamento, transigência, enfim, tudo aquilo que, de
um modo ou de outro, possa ser reconduzido à arte e à virtude do viver em comum. A teoria e
a prática das instituições de família dependem, em última análise, de nossa competência em
dar
e receber amor. Talvez nada mais seja necessário dizer para evidenciar que o princípio
norteador do direito das famílias é o princípio da afetividade”.
3
3
4
4
abrangendo todos os membros do mesmo grupo, descendentes
de um ancestral comum, longínquo, na maioria das vezes mítico.
23
Ao analisar o fenômeno
família
na Grécia Antiga, observa Vera Slepoj:
[...] os Gregos consideravam a organização familiar como um
índice de superioridade moral e social do seu povo em relação
aos Bárbaros. Na família greg
a os componentes eram unidos pelo
vínculo do culto comum e dos recíprocos deveres sociais.
Objectivo e missão da organização familiar era a procriação de
prole legítima e a conservação do patrimônio familiar. As relações
entre as diferentes famílias era li
mitada.
24
No que diz respeito à
família romana
, tem
-
se que sua estrutura era
tipicamente patriarcal.
25
A palavra
pater
significa mais chefe do que pai, e o
pater
é quem tem o
poder: o
pater familias
refere
-
se ao ascendente mais velho, ainda vivo, que reúne
os descendentes sob a sua autoridade, formando a família.
Esse poder se estende não só sobre os descendentes, mas também
sobre as mulheres e os escravos. Ele exerce o poder marital (
manus
), sobre as
mulheres, o poder sobre os escravos (
dominica potestas
)
, sobre os filhos (
patria
potestas
).
No Direito romano, a família, em princípio, não se originava do
casamento, mas, da descendência (
pater familias
), e a esta se agrupavam as
mulheres de outras famílias, através do matrimônio.
23
AZEVEDO, Luiz Carlos de.
Introdução à história do direito
. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2005, p.
46.
24
SLEPOJ, Vera.
As relações de família
. Lisboa: Presença, 2000, p. 78
-
79.
25
LEITE, Eduardo de Oliveira (coord.).
Bioética e biodireito
: aspectos jurídicos e
metajurídicos. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 23: “A palavra família, como a entendemos
hoj
e, é de origem romana,
famulus
, que significa escravo. O termo se originou,
provavelmente, da palavra
osca famel
(
servus) que quer dizer escravo. O termo família não
se referia ao casal e seus filhos, ou ao casal e seus parentes, mas ao conjunto de escravo
s,
servos que trabalhavam para a subsistência e de parentes que se achavam sob a autoridade
do
pater
familias. Uma coisa é certa, na noção romana de família, que serviu de paradigma
ao mundo ocidental, a família representava um conjunto enorme de pessoas q
ue se
encontrava subordinada ao pater famílias”.
3
3
5
5
Sob o aspecto canônico, tem
-
se que a família foi a matéria que mais a
Igreja legislou, em especial, o matrimônio. Para a Igreja o matrimônio é um
sacramento. Para o mundo romano, apenas a união do marido e da mulher, a que
se comunicam certos efeitos jurídicos. Em razão do casamento
: “[...] o homem
deixará seu pai e sua mãe e se unirá à sua mulher; e os dois formarão uma só
carne. Assim, já não são dois, mas uma só carne. Portanto, não separe o homem
o que Deus uniu” (Mateus, 19, 5
-
6). Daí, uma conseqüência fundamental para o
casamen
to no Direito Canônico: a indissolubilidade do matrimônio.
No mundo germânico verifica
-
se que a família tinha uma estrutura muito
simples e não correspondia ao tipo patriarcal, mas ao paternal que se tornou,
afinal, o tipo dominante. O matrimônio tinha um
conteúdo moral muito elevado, no
qual a mulher não tinha posição secundária, era realmente esposa.
26
Todavia, a forma do matrimônio germânico estava impregnada do sentido
da compra: através do matrimônio o marido adquiria o poder sobre a mulher, o
qual re
cebia a denominação de
mundio
, e
mundoaldo
era o seu detentor.
Algumas vezes havia também uma doação feita pelo marido à mulher, que se
chamava
morgengabe
(o marido o pagava na manhã seguinte das núpcias).
Depois de algumas alterações na cerimônia do casa
mento, sua celebração
passou a realizar
-
se na presença de um juiz, que representava o Estado
situação
importantíssima, porque aí se tem a primeira antecipação histórica do casamento civil.
Os historiadores franceses André Burguière, Christiane Klapisch
-
Zuber,
Martine Segalen e Françoise Zonabend informam:
[...] o germânico antigo designava pelo plural
hîwon
o conjunto das
pessoas que dormiam sob um mesmo tecto, estivessem ou não
unidas por laços de parentesco (
Schlafgenossen
). Ora, na sua
versão bilíngü
e, a lei sálica, o texto mais representativo do direito
de franco, precisa serem membros de uma mesma família
não só
26
GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da.
O companheirismo
. 2ª ed. rev. atual. e ampl. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 35: “Várias influências do Direito germânico puderam
ser sentidas nessa época. A família germânica era do tipo paternal, ou seja, o pátrio poder é o
poder do pai e não o poder do chefe de família, sendo que à esposa era reservada uma
posição moralmente elevada”.
3
3
6
6
todos aqueles que dormem sob o mesmo teto mas também
os
hîwiski
, ou seja, os dependentes da casa. A família dos
códices tem pois uma vocaç
ão de unidade económica,
social. O seu significado senhorial afirma
-
se
crescentemente ao longo dos séculos VI a IX, a ponto de
ser freqüente as escrituras de transferência de propriedades
(
traditiones
) das abadias de Corvey, Fulda ou Saint
-
Emmeran de Ratis
bonne descreverem uma família composta
de
familiae
, de famílias de servos dispondo de um
mansus
,
mansum unum cum familia Willing
[...],
mansum unum et
hominem latum cum uxore et filis
.
27
Com relação a família na Europa, tem
-
se que os autores anteriormente
nominados relatam:
[...] a história da família nos países europeus, entre os séculos
XVI e XX, situa
-
se num contexto demográfico a partir de agora
muito bem conhecido graças à investigação sistemática de
vários recenseamentos e cadastros disponíveis, e so
bretudo
aos registros de baptismos, casamentos e sepulturas que se
encontram em muitas dioceses de vários países da Europa
desde o final do século XV, mas que apenas se começam a
generalizar na segunda metade do século XVI, de acordo com
as decisões do con
cílio de Trento, conservando nalguns casos
uma duplicação dos registros anteriores da autoridade civil. No
entanto a situação varia muito de país para país: entre a Itália,
onde existem recenseamentos, cadastros (o catasto florentino,
por exemplo) e regist
ros paroquiais consultáveis em muitos
casos desde o século XIV, e a Polónia, onde registros de
baptismos e casamentos só começam a ser efectuados no
final do século XVI e só excepcionalmente foram conservados,
há espaço para os historiadores, de há trinta
anos para cá,
pouco a pouco, pudessem esclarecer o que eram então as
estruturas demográficas e concluir que existia, à escala
europeia, um regime demográfico antigo. Apreendido, nos
casos mais evidentes, a partir do início do século XVI (mas
apenas na medi
da em que as fontes eram anteriormente
precárias), esse regime dá progressivamente lugar, no
decurso do século XIX, a novas estruturas que são as das
populações europeias de hoje.
28
A evolução da família no Brasil é remarcada por inúmeros atos de
discrimin
ação e de preconceito, sendo certo que quem mais sofreu (e ainda sofre)
com tais acontecimentos foram as mulheres e as crianças, pois tais elementos
27
BURGUIÈRE, André; KLAPISCH
-
ZUBER, Christiane; SEGALEN, Martine
et al
.
Hi
stória da
família
: tempos medievais: Ocidente e Oriente. Lisboa: Terramar, 1997, p. 26.
28
Ibidem
, p. 15.
3
3
7
7
sociais sempre foram colocados à margem de direitos e de participação no núcleo
familiar em que instalados.
29
Rosana Amara Girardi Fachin:
[...] a família colonial brasileira reproduz, em boa parte, aquela
sociedade: numa sociedade desigual, tende a família a espelhar
desigualdades; numa sociedade violenta, as relações familiares
podem não destoar desse mesmo
traço. E, nessa linha, nas
relações coloniais vai se tecendo um arranjo familiar que deixa
marcas na história do Direito e da sociedade, em seu tríplice
vértice: político, social e econômico. É inegável que ‘a História do
Brasil, nos três primeiros séculos
, está intimamente ligada a da
expansão comercial e colonial européia na época moderna’. E
nesse contexto se produz o desenho da família.
30
Assim, depois de muitas idas e vindas, tenta
-
se, hodiernamente e em face
da promulgação da Constituição de 1988, uma
retomada visando à reestruturação
da família no Brasil, deixando
-
se assente de dúvidas que todos os membros que
a formam possuem os mesmos direitos de proteção e de participação no que se
refere à condução de seus destinos.
Reconquista
-
se a idéia, a part
ir de 05 de outubro de 1998, de que, em
havendo entidades familiares fortes, independentemente de sua origem ou
Constituição, chegar
-
se
-
á também à formação de um Estado igualmente forte,
com menos problemas sociais e menos diferenciação entre seus cidadãos
.
2.3
A Função Social da Família
Inegavelmente, tem
-
se que a família, em regra, representa o primeiro
contato do ser humano com a sociabilidade.
29
FACHIN, 1999, p. 89: “Fonte de exclusão, as relações familiares começam a renascer para
dar origem a um berço de afeto, solidariedade e mútua constituição de uma história comum,
na qual a realização das individualidades frutifica na paixão e amadurece no amor que une e
rompe barreiras. É na tentativa de superar esse discrimen histórico e cultural, sem gerar
aniquilamentos ou supremacia. A ordem jurídic
a responde aos novos direitos por diversos
modos”.
30
FACHIN, 2001, p. 20.
3
3
8
8
É por intermédio dos laços familiares, mormente com o pai e com a mãe,
que a criança inicia desenvolvimento
no sentido de vivenciar a vida comunitária
para uma melhor satisfação de seus interesses e de suas necessidades, tomando
contato, principalmente, com sentimentos indispensáveis como amor, carinho e
afeto.
Tal situação fica bem clara desde o momento da concepção, haja vista a
importância de acompanhamento de todo o estado pré
-
natal, e, principalmente,
do nascimento, pois, se é verdade que, ao nascer, a criança, por intermédio do
choro, consegue externar sua vontade em relação a algo (sono, fome, dor, etc.)
,
não menos verdade é que, sozinha, chegaria rapidamente ao óbito.
É dentro do seio familiar, mesmo que este apresente uma série de
problemas inerentes às condições econômicas, educacionais e culturais, que
crianças e adolescentes desfrutam das primeiras
experiências sobre o que é certo
e o que é errado, não apenas no sentido dos valores morais intrínsecos a uma
determinada sociedade, via imposição ética e religiosa, mas também sobre o
aspecto do que lhe pode ser útil, aproveitável, prazeroso, ruim, incômo
do,
maléfico, prejudicial e, assim por diante.
31
Como dito anteriormente, a família, do ponto de vista social,
representa, inegavelmente, o primeiro contato do ser humano com seus pares
e se apresenta como indelével exemplo da necessidade imperiosa de o
in
divíduo efetuar um intercâmbio em relação aos demais, seja de modo
espontâneo, seja por imposição das situações afetas ao desenvolvimento de
uma vida em comunidade.
31
LACAN, J.
Os complexos familiares na formação do indivíduo
. Tradução de Marco
Antonio Coutinho Jorge e Potiguara Mendes da Silveira Júnior. Rio de Janeiro: Jorge Zahar
Editor, 2002
. p. 13: “Entre todos os grupos humanos, a família desempenha um papel
primordial na transmissão da cultura. Se as tradições espirituais, a manutenção dos ritos e
dos costumes, a conservação das técnicas e do patrimônio são com ela disputados por outros
gr
upos sociais, a família prevalece na primeira educação, na repressão dos instintos, na
aquisição da língua acertadamente chamada de materna. Com isso, ela preside os processos
fundamentais do desenvolvimento psíquico, preside esta organização das emoções s
egundo
tipos condicionados pelo meio ambiente, que é a base dos sentimentos, segundo Shand;
mais amplamente, ela transmite estruturas de comportamento e de representação cujo jogo
ultrapassa os limites da consciência”.
3
3
9
9
Inegavelmente pode afirmar
-
se, com segurança hercúlea que, no
momento em que o homem nasce,
passa a viver em sociedade e, a partir daí, a
teor do seu relacionamento com outros homens, surge, de maneira incontestável,
a necessidade de formulação de regras de convivência, a fim de que referida
interação se dê, na medida do possível, de modo pacífi
co e harmônico, como bem
nos ilustra a fábula escrita por Daniel Dafoe, denominada
As Aventuras de
Robinson Crusoé
.
Enquanto Crusóe viveu isolado e sozinho por vinte e cinco anos na ilha
em que naufragou, não verificou a necessidade de que regras fossem
e
stabelecidas para sua estada; porém, tal situação mudou
-
se radicalmente
quando ele passou a conviver com o índio
Sexta
-
Feira
, como bem se observa da
seguinte passagem:
[...] comecei a considerar que, tendo duas bocas para alimentar
em vez de uma, devia pr
eparar mais terra e semear mais
quantidade de grão. Escolhi um terreno adequado e comecei a
cercá
-
lo da mesma maneira que o fizera antes. Sexta
-
Feira não só
trabalhou com afinco e dedicação, mas também com muita
alegria. Expliquei
-
lhe a que isso se destina
va, ou seja,
precisávamos de uma colheita maior para dispormos de mais pão
porque éramos dois e precisávamos ter o bastante para alimentar
-
nos [...].
32
O homem somente consegue evoluir vivendo em sociedade, da qual a
família, inexoravelmente, faz parte int
rínseca.
Entretanto, a vida em sociedade (em família), para que atinja referido
desiderato, deve ser pautada pela observância de direitos e deveres, sob pena da
instauração indesejável e devastadora do caos.
Em suma, depreende
-
se que, embora os homens sejam iguais, não o são
suas idéias, suas premissas, suas necessidades, seus interesses e suas
vontades.
32
DAFOE, Daniel.
As aventuras de Robi
nson Crusoé
. São Paulo: Ática, 2001, p. 43.
4
4
0
0
Como indivíduo e ser autônomo, o homem procura realizar suas
oportunidades conforme seus interesses próprios (e nem sempre o faz por meios
honestos ou pr
ocessos leais); mas, essa satisfação de interesses só lhe é
possível em sociedade, quer dizer, em intercâmbio com outros homens, situação
que passa, necessariamente, pelo seio familiar.
Repise
-
se, por oportuno, que o atingimento de tal desiderato passa,
i
ndiscutivelmente, pelo direito fundamental e intangível de que as crianças e os
adolescentes tenham concretizado o já mencionado postulado constitucional que
lhes outorga convivências familiar e comunitária.
Para a socióloga portuguesa Chiara Saraceno, a
família corresponde
ao:
[...] espaço ao mesmo tempo físico, relacional e simbólico
aparentemente mais conhecido e comum, a ponto de ser usado
como metáfora para todas as situações que têm a ver com
espontaneidade, com a naturalidade, com o reconhecimento
sem
necessidade de mediação
‘somos uma família’, ‘uma linguagem
familiar’, ‘uma pessoa de família’
, a família revela
-
se como um
dos lugares privilegiados da construção social dos acontecimentos
e das relações aparentemente mais naturais. De facto, é de
ntro
das relações familiares, tal como são socialmente definidas e
regulamentadas, que os próprios acontecimentos da vida
individual que mais parecem pertencer à natureza, recebem seu
significado e através deste são entregues à experiência individual:
o na
scer e o morrer, o crescer, o envelhecer, a sexualidade, a
procriação.
33
Ressalte
-
se que as etapas referidas pela citação trazida à colação no
parágrafo anterior encontram
-
se encampadas pela maioria dos ordenamentos
jurídicos modernos, incluindo
-
se, em tal
rol, o Brasil, como bem demonstram os
dispositivos constitucionais afetos ao tema, inclusos ao longo do corpo da Lei de
Outubro.
Muitas são as teorias que tentam explicar, do ponto de vista da sociologia,
o fenômeno
família
.
33
SARACENO, Chiara.
Sociologia da família
. Lisboa: Editorial Estampa, 1997, p. 12.
4
4
1
1
Assim, e, valendo
-
nos do prec
ioso estudo elaborado por Semy Glanz na
obra denominada
A família mutante: sociologia e direito comparado
,
34
passamos
a explorar o assunto em discussão.
Explica o jurista fluminense que os primeiros estudos sociológicos sobre a
família, denominados
teorias
antigas
, datam do final do século XIX e princípio do
século XX, tendo como principais expoentes Morgan, Engels, Westermarck,
Durkheim, Mauss, Bachofen, dentre outros.
Nesse passo, reconhece
-
se que:
[...] os primeiros (Morgan, Engels, Bachofen, etc.) per
ceberam a
família como instituição social histórica, de que a estrutura e a
função são determinadas pelo grau de desenvolvimento da
sociedade global. Para MORGAN, a família não é estática,
evoluindo sempre, donde apontar ele a família consangüínea, em
que
ainda havia promiscuidade sexual entre irmãos e irmãs, não,
porém, entre pais e filhos; vem depois a família punaluana (termo
que vem de
punalua
= companheiro íntimo), proibindo o sexo
entre irmão e irmã; depois a família sindiásmica, em que se fixa a
uniã
o entre um homem e uma mulher, origem da moderna
monogamia, embora admitindo certas exceções.
35
Continua o referido autor, já abordando o que restou convencionado como
teorias modernas
:
[...] a partir de 1930, os sociólogos americanos adotaram novos
métod
os, com novas pesquisas, incluindo psicologia e psicanálise,
além das pesquisas antropológicas e propriamente sociológicas.
Nos anos 30, desenvolveu
-
se nos Estados Unidos a pesquisa
empírica, o que também ocorreu na Escandinávia e na Inglaterra.
Depois fun
da
-
se nos EUA o
Journal of Family History
. A família
passa a ser estudada com novas disciplinas, como a filosofia, a
história e psiquiatria e surgem os historiadores da vida doméstica.
Os teóricos da antipsiquiatria também passam a estudar a família,
‘reno
vando assim a teoria de Wilhelm Reich para quem o fascismo
e o autoritarismo têm sua fonte na família patriarcal’. Os
americanos fundaram a pesquisa estendida a três gerações, para
estudar a mudança social e familiar e novos métodos de pesquisa
passaram a ser usados.
36
34
GLANZ, Semy.
A família mutante
: sociologia e direito comparado. Rio de Janeiro: Renovar,
2005, p. 33
-
50.
35
Ibidem, p. 34.
36
Ibi
dem, p. 35.
4
4
2
2
Sob o enfoque sociológico, importante, também, frisar o estudo elaborado
por Yvonne Castellan,
37
para quem não se vislumbra a existência, a teor das
ciências exatas, de uma fórmula de vida familiar, defendendo, assim, que cada
família é única.
Em abono a sua tese, faz um comparativo em relação ao modo de vida e
constituição de famílias ao redor do mundo, destacando as situações abaixo
transcritas:
Inicia seu trabalho com enfoque às famílias russas, informando que tais
agrupamentos pertencem a
o ex
-
mundo socialista, cujas características
permeiam a formação de um sistema nuclear, prevalecendo a igualdade de
direitos entre homens e mulheres, com liberdade de acesso ao trabalho,
habitat
comum, liberdade na escolha do parceiro, não perdendo de vist
a a
existência, também, na nominada Rússia cristã, com o início no século X, de
famílias monogâmicas e aristocráticas, sendo estas eliminadas pelo movimento
revolucionário de 1917.
Na atualidade, considera que as fórmulas de origem patriarcal acabaram
sen
do substituídas pela intimidade conjugal.
No que se refere aos eslavos do sul, pontua a citada autora que tais
famílias eram extensas e, nos tempos atuais, denominam
-
se
zadruga
. Tiveram
seu auge na antiga Iugoslávia, embora se encontrem em extinção.
Apre
senta como característica o sistema patriarcal, uma vez que o
agrupamento é chefiado pelo pai ou pelo filho mais velho.
Frise
-
se que não se vislumbrava liberdade de opção em face dos
parceiros, na medida em que as mulheres eram escolhidas pelos interessad
os e
por estes
adjudicadas
, sendo certo que a ternura conjugal não se apresentava
como regra.
37
Yvonne Castellan,
apud, ibidem, mesma página.
4
4
3
3
A nominação
família extensa
está intrinsecamente ligada ao fato de que a
união de um homem e de uma mulher implicava, concomitantemente, na junção
entre as famílias respectivas.
Em continuidade, passa à análise da família na América do Norte, cuja
observação tornou
-
se dificultosa mediante a verificação de uma grande
diversidade, em face da diferenciação das regiões e das condições econômicas
apresentadas em casos que tais.
Os traços comuns encontrados dizem respeito à liberdade de escolha do
companheiro, à facilitação do divórcio, não valorização das crianças, cuja
importância está a depender dos sentimentos dos pais, pois há uma concepção
de que, a partir dos 03
anos, a criança já é responsável e deve aprender as
coisas por si mesma.
No que concerne ao fenômeno familiar na América Latina, a autora francesa
inicia seu pensamento afirmando a existência de dois grupos distintos: o primeiro,
designado de
modelo ibéri
co
, e, o segundo, apontado como
tipo índio
,
pobre
.
A primeira situação estaria a identificar castas economicamente
superiores, tendo como base a monogamia e o patriarcado, na qual a morada dos
filhos se encontrava posicionada próxima à dos genitores, dest
acando
-
se que,
sob os olhos do padre, o pai era a única e legítima autoridade.
Seguindo os passos evolutivos, conquistados por intermédio do progresso
legislativo, tem
-
se que, modernamente, percebeu
-
se um movimento de libertação
do indivíduo, soltando
-
se
este dos grilhões paternos, tendo
-
se como exemplo do
quanto asseverada, em regra, a liberdade de escolha para o casamento, para o
desenvolvimento das atividades laborais que lhe são interessantes, a percepção
de salário próprio, o controle de natalidade, o
percebimento de herança, dentre
outros fatores de relevo.
Em relação ao segundo grupo, necessário se faz salientar, sob o enfoque
da autora, que tal espécie familiar tem relação com o proletariado das urbes,
4
4
4
4
sendo rarefeitos os matrimônios e grande a lib
erdade sexual das pessoas que
fazem parte de referidos agrupamentos.
Tem grande ligação com a miséria em que tais grupos populacionais
vivem, situação que, indiscutivelmente, perdura até hoje.
Mister se faz a colocação de um parênteses, visando trazer a
problemática para a realidade brasileira: apresenta
-
se como claro exemplo da
dificuldade imposta pelo pobreza, a necessidade de criação de programas
assistenciais como o chamado
bolsa
-
família
, bem como da participação da
própria sociedade na tentativa de m
inorar referida situação, na tentativa de se
preencher o amargo vazio ilcitamente deixado pelo Estado.
A inesquecível e saudosa atuação do sociólogo Herbert de Souza, o
Betinho, representa um incomparável exemplo a ser rememorado.
Apresentando grande influência da religião, a família hindu se caracteriza
pela centralização fraterna, embora não se verifique mais o regime de
propriedade coletiva.
De outro lado, tem
-
se que na China ainda se sentem os efeitos da lei
maoísta de 1950, a qual mudou radicalmente a visão da família, na exata medida
em que consolidou a monogamia, tornando defesa, assim, a bigamia, o
concubinato, o noivado de crianças, as negociações dotais, bem como acabou
por estabelecer o equilíbrio entre homens e mulheres no que se refere ao
exe
rcício de direitos e o cumprimento de deveres.
Na chamada
África Negra
tem
-
se que a família segue as características
adotadas pela cultura e religião praticadas numa determinada região, recebendo,
assim, influências do islamismo, do ocidente ou até mesmo mantendo origens e
tradições de tempos outros.
Um dos fenômenos mais contrastantes no que se refere à formação das
entidades familiares se encontra nos países que adotaram o islamismo como
4
4
5
5
confissão religiosa, o que contribuiu, inegavelmente, para a disse
minação da
poligamia, da ausência de direitos e do completo desrespeito com a condição
humana da mulher, sendo certo que, em algumas regiões, são elas açoitadas ou
apedrejadas em público, com total apoio das autoridades públicas constituídas,
citando
-
se, c
omo exemplos disso, os casos vivenciados pelas nigerianas Amina
Lawal
38
e Safiya Husaini,
39
apresentados no item 1 deste capítulo.
De acordo com o renomado historiador Philippe Áries, para quem:
[...] a família tornou
-
se uma sociedade fechada onde seus
mem
bros gostam de permanecer, e que é evocada com prazer,
como o fazia o General de Martange em suas cartas no final do
século XVIII. Toda a evolução de nossos costumes
contemporâneos torna
-
se incompreensível se desprezamos esse
prodigioso crescimento do sent
imento de família. Não foi o
individualismo que triunfou, foi a família.
40
À guisa de conclusão deste tópico, tem
-
se como inconteste a importância
da família no que se refere a formação e o desenvolvimento da sociedade, como
um todo.
2.4
Importância Psic
ossocial da Família
Em sendo a família uma unidade de afeto e de desenvolvimento do ser
humano, não se pode deixar passar ao largo a influência, os efeitos e a
importância da Psicologia em tais situações.
41
38
Disponível em: <
http://www.amnistia
-
internacional.pt/conteudos/amina/amina3.php>. Acesso
em: 03 jan. 2007.
39
Disponível em: <
http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2002/020318_nigeriadb.shtml
>
.
Acesso em: 03 jan. 2007.
40
ARIÈS, Philippe.
História social da criança e da família
. 2ª ed. Rio de Janeiro: LTC, 1981,
p. 273
-
274.
41
PEREIRA, Rodrigo da Cunha.
Direito de família
: uma abordagem psiconalítica. 2ª ed. rev.
atual. e ampl.
Belo Horizonte: De
l Rey, 1999,
p. 13: “Ela é antes uma estruturação psíquica,
onde cada um de seus membros ocupa um lugar, uma função. Lugar do pai, lugar da mãe,
lugar dos filhos, sem entretanto, estarem necessariamente ligados biologicamente. Tanto é
assim, uma questão de
lugar, que um indivíduo pode ocupar o lugar de pai sem que seja o
pai biológico. Exatamente por ser uma questão de lugar e de função, que é possível, no
Direito, que se faça e que exista o instituto da adoção. Da mesma forma, o pai ou a mãe
biológica pode
m ter dificuldades, ou até mesmo não ocupar o lugar, de pai de mãe, tão
necessários (essenciais) à nossa estruturação psíquica e formação como seres humanos”.
4
4
6
6
Afirma Poster:
[...] as características mais pe
ssoais e particulares da vida intima
do indivíduo permanecem obscuras, somente se tornando sinais
significativos quando são remetidas à origem no corpo
medicamente significante da família. Logo a família é o segredo
do indivíduo.
42
A importância e a ligaçã
o da psicologia com as ciências jurídicas fica clara
ao se analisar o conteúdo de uma frase cunhada por Tobias Barreto, na medida
em que o citado mestre assevera que “[...]
o direito não é só uma coisa que se
conhece, é também uma coisa que se sente
”.
43
Ex
emplo disso diz respeito à eqüidade, haja vista consistir numa forma de
manifestação de justiça que tem o condão de atenuar a rudeza de uma regra
jurídica.
Divide
-
se em eqüidade legal
que seria aquela contida no texto da norma
que prevê várias possibili
dades de soluções
e eqüidade judicial
na qual o
legislador explícita ou implicitamente atribui ao inteiro arbítrio judicial a decisão do
caso concreto.
Rui Carvalho Piva, invocando conceito trazido pelo
Dicionário de filosofia
de Nicola Abbagnano, men
ciona:
[...] a psicologia é uma disciplina que tem por objeto a alma, a
consciência ou os eventos característicos da vida animal e
humana, nas várias formas de caracterização de tais eventos,
com o fim de determinar sua natureza específica. Prosseguindo
n
a conceituação acima, Nicola Abbagnano esclarece que esses
eventos podem ser considerados como puramente mentais (fatos
da consciência) ou como eventos objetivamente observáveis
(comportamentos), delimitando o campo da psicologia aos
fenômenos característi
cos dos organismos animais, em especial o
homem.
44
42
POSTER, M.
Teoria crítica da família
. Tradução de Álvaro Cabral. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Ed
itores, 1979, p. 44.
43
BARRETO, Tobias.
Introdução ao estudo do direito
. São Paulo: Landy, 2001, p. 38.
44
Rui Carvalho Piva, apud, ABBAGNANO, Nicola.
Introdução ao existencialismo
. São Paulo:
Martins Fontes, 2005, p. 215.
4
4
7
7
Inegável, também, a importância da psicologia no que diz respeito às
suas repercussões e implicações no seio familiar, principalmente em relação aos
indivíduos que a compõem, a ponto de o próprio Estatuto d
a Criança e do
Adolescente determinar, por exemplo, que, nas hipóteses de guarda e adoção, o
menor deve ser ouvido e acompanhado por um psicólogo.
No campo do Direito de Família, ganha cada vez mais espaço, nos
processos de separação de casais, a possibil
idade da chamada mediação
familiar, a qual consiste numa técnica parajudicial de resolução de conflitos, por
intermédio da qual os interessados solicitam ou aceitam a intervenção
confidencial de uma terceira pessoa, imparcial e qualificada, permitindo aos
envolvidos encontrar uma solução duradoura e mutuamente aceitável, que
contribuirá para a reorganização da vida pessoal e familiar.
Raquel Alcântara de Alencar e Eliedite Mattos Ávila, comentando o
programa de mediação familiar organizado e instalado pelo
Poder Judiciário em
Santa Catarina, asseveram que tem ele por objetivo:
[...] atender os conflitos familiares relativos à separação, à guarda
de filhos, à regulamentação de visitas, à partilha de bens, à
investigação de paternidade e outros, de uma forma
mais
acessível, célere e eficiente. Além disso, tem como intento
diminuir os sentimentos de hostilidade e ansiedade entre as
partes, que normalmente ocorrem nessas situações. Foi
estabelecido através da resolução nº 11/01, do Tribunal de Justiça
do Estado
de Santa Catarina, que dispõe sobre a instituição do
Serviço de Mediação Familiar, publicada em 20 de setembro de
2001. O serviço da mediação encontra
-
se disponível em alguns
Fóruns de justiça e Casas da Cidadania do Estado. Possui uma
equipe de atendimen
to composta por mediadores familiares das
áreas de serviço social, psicologia e direito, além de estagiários
das respectivas áreas.
45
A psicóloga paranaense Maria Lúcia Boarini,
46
em artigo denominado
Refletindo sobre a nova e a velha família
(Psicol. Estud
., vol. 8, Maringá 2003),
revela:
45
Disponível em: <
http://www.ibdfa
m.com.br/public/artigos.aspx?codigo=242
>. Acesso em: 19
fev. 2007.
46
Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1413
-
7372200301&script=sci_arttext>.
Acesso em: 20 fev. 2007.
4
4
8
8
[...] dentre os animais existentes e conhecidos sobre a face da
Terra, o homem é o mais dependente ao nascer. Nesta situação,
necessariamente deve ser alimentado, higienizado, aquecido,
afagado, enfim depende de outros par
a alcançar as mínimas
condições para manter
-
se vivo. Porém, tratando
-
se da espécie
humana, não basta estar vivo. Ao entrar no mundo, o homem se
introduz em uma organização social nutrida pelas mais variadas
necessidades e simbolismos, o que o coloca em con
tínua e
indefinida dependência do outro. Mais que isso, se comparadas a
uma rede rodoviária, as relações humanas não são vias de mão
única, pelo contrário, são um complexo de caminhos
pavimentados de parcerias, conflitos, paixões, angústias,
contradições,
embates e daí por diante. Como diria Voltaire (1694
-
1778): ‘O homem entra em guerra, ao entrar no mundo’. É nesta
‘guerra’ que se consolida a intersecção entre o desenvolvimento
do indivíduo, o grupo social e a forma de produção e organização
da sociedade.
Continua a psicóloga:
O primeiro grupo ao qual o ser humano pertence,
convencionalmente denominado família, é algo muito velho e,
paradoxalmente, muito novo. É um conceito velho se
considerarmos que o homem, invariavelmente, em seus primeiros
anos de vi
da, vai necessitar dos cuidados alheios, e qualquer que
seja o vínculo (de consangüinidade, de filantropia etc.) que o
prende aos adultos circundantes, deve contar com alguém ou com
um grupo de pessoas que lhe ofereça os cuidados necessários
para sua sobre
vivência. É um conceito permanentemente novo, à
medida que a família vai se transformando e remodelando
-
se de
acordo com os contornos da sociedade na qual esta inserida.
E finaliza, asseverando:
Em nossos dias, pelo menos no Brasil, a necessidade tem lev
ado
a mulher a se introduzir no mercado de trabalho, o que lhe
conferiu importante papel no provimento financeiro da família, não
sendo raros os casos em que é a única provedora. Tal fato, por
sua vez, vem promovendo o afastamento precoce dos filhos do
con
vívio familiar, e assim o processo de socialização da criança
está cada vez mais terceirizado (creches, escolas, natação, inglês,
informática.). Neste sentido, constatamos também a necessidade
de limitação do número de filhos, tornada possível pelo
desenvo
lvimento de métodos contraceptivos cada vez mais
seguros, o que, por sua vez, possibilita a desvinculação entre
sexualidade e procriação. Na perspectiva sociológica, temos o
prestígio crescente dos valores individualistas, que têm favorecido
‘o viver só’.
Desta forma não é raro mães e pais solteiros ou
separados que assumem a responsabilidade dos cuidados com os
filhos. Outrossim, graças aos avanços da medicina em relação à
4
4
9
9
longevidade, vivemos uma outra situação raramente encontrada
em décadas passadas: os
avós (ou mesmo apenas um deles)
vivendo só e regularmente (na melhor das hipóteses) recebendo a
visita de seus familiares.
Segundo Gustavo Ferraz de Campos Monaco:
[...] a família (Art. 18 da Convenção sobre os Direitos da Criança),
enquanto ‘espaço pri
vilegiado de suprimento de necessidades
básicas e de mediação entre o indivíduo e o meio’, adquire uma
importância substancial no que concerne ao desenvolvimento das
crianças. Com efeito, quando se fala em desenvolvimento da
criança, deve
-
se ter sempre em
mente o desempenho dos papéis
familiares pelos demais membros do grupo ao qual ela pertence,
bem como as inter
-
relações da família com a comunidade que a
circunda.
47
Por mais que idéias outras tenham tentado desnaturar a noção de família,
a verdade é que t
al organismo continua sendo a célula base de toda e qualquer
sociedade, isto é, de todo Estado que se intitula e se diz democrático, passando,
inclusive, neste período contemporâneo, por um precioso processo de
revitalização, restauração e respeito, haja v
ista que, na maioria dos hodiernos
ordenamentos jurídicos mundiais, professa
-
se um caminho sem volta de
constitucionalização do amor e do afeto.
Em consonância com o pensamento de Francesco D’Agostino,
apresenta
-
se:
[...]
la novità che va enunciata in termini semplici e piani è che la
famiglia è comunità di amore e di solidarietá, uma comunità che
non trova il suo fondamento ultimo né nella legge che lê dà
regolamentazione, né nell’utile che i suoi componenti possono
trarre da essa, ma nella capacita (in
sé misteriosa, ma
indubbiamente tipica dell’uomo) di amare familiarmente e di
fondare su questo amore una comunità de vita
.
48
O modelo tradicional de família cedeu lugar para uma nova família que,
muitas vezes, não encontra respaldo no ordenamento jurídico
; todavia, não se
47
MONACO, Gustavo Ferraz de Campos.
A proteção da criança no cenário int
ernacional
.
Belo Horizonte: Del Rey, 2005, p. 161.
48
D’AGOSTINO, Francesco. Una filosofia della famiglia
.
Milão: Fiufreè, 2003, p. 13.
5
5
0
0
pode olvidar que ela mantém seu caráter indispensável, isto é, continua
ostentando a inafastável qualidade de célula básica da sociedade, fundamental
para a sobrevivência desta e do Estado, apenas que, agora, busca seus
fundamentos de val
idade e renovação em valores e princípios diversos diferentes
daqueles que embasaram os alicerces família tradicional.
2.5
A Família como Fenômeno Social de Relevância Jurídica
A origem do Direito é comum à origem do Homem, pois, como já dito,
destina
-
se a efetuar a organização das relações humanas, proporcionando as
condições necessárias para o equilíbrio da existência dos cidadãos dentro da
sociedade.
49
O Direito, assim, regula, ordena e conforma todos os fatos sociais
relevantes, transformando
-
os em
jurídicos.
Por fato jurídico há de se entender todo acontecimento importante para o
mundo jurídico, e que, por conseqüência, tem o condão de gerar efeitos
relevantes nas mais variadas relações, tais como: (i)
fatos
naturais
: os
acontecimentos externos à p
essoa e que
normalmente
não se ligam diretamente
a elas, na medida em que se encontram além das forças do homem, ou seja,
decorrem da natureza das coisas. Dividem
-
se em:
ordinários
: aqueles que se
verificam mais comumente, como se dá com o nascimento, a mo
rte, etc.
extraordinários
: dizem respeito a acontecimentos excepcionais, a exemplo do que
ocorre com o chamado
caso fortuito
, que se encontra ligado a eventos naturais
como tempestades, inundações, etc. (ii)
atos
humanos
: referem
-
se aos
acontecimentos que
sempre se encontram diretamente ligados às atitudes
49
VENOSA, Sílvio de Salvo.
Contratos em espécie e responsabilidade civil
. São Paulo:
Atlas, 2001, p. 32: “Nesse diapasão, o homem sente necessidade de regras para ordenar sua
convivência. Desse modo, o Direito pertence ao mundo da cultura. O Direito é um dos muitos
instrumentos de adaptação criados pelo homem. A cultura abrange tanto a ordem material
como a ordem espiritual.
Nesse sentido, a pintura, a escultura, a obra literária, a poesia são
bens culturais. A atividade valorativa orientada para realizar a ordem, a segurança e a paz
social faz surgir o Direito, posicionado na realidade cultural ou mundo da cultura”.
5
5
1
1
humanas. Dividem
-
se em:
negócio
jurídico
: correspondem aos atos humanos aos
quais a lei outorga legitimidade, ou seja, o objetivo que se almeja alcançar através
deles encontra autorizativo no ordenamento
jurídico. Ex: Em um contrato de
compra e venda, os fins pretendidos pelos contratantes são comprar e vender,
objetivos esses que encontram inteiro respaldo na lei
obviamente desde que
sejam respeitadas as regras impostas pela legislação
, daí porque se
diz que o
negócio jurídico caracteriza
-
se pela possibilidade do alcançamento da vontade
através dele veiculada. (iii)
atos
ilícitos
: dizem respeito às atitudes humanas que
geram apenas deveres aos respectivos agentes, na medida em que colidem com
o ordenam
ento jurídico, dando origem, conseqüentemente, à responsabilização
dos mesmos em razão de erronia de conduta por eles perpetrada. Destaque
-
se
que, diferentemente do negócio jurídico cujo objetivo encontra sustentáculo na lei,
o ato ilícito é por esta total
mente rechaçado, razão pela qual a intenção
pretendida por meio dele não se mostra possível de ser legitimamente alcançada.
Como bem salienta Maria Helena Diniz:
[...] o homem é, ao mesmo tempo, indivíduo e ente social. Embora
seja um ser independente, n
ão deixa de fazer parte, por outro
lado, de um todo, que é a comunidade humana. Para que as
criaturas racionais atinjam seus objetivos, a condição fundamental
é de se associarem. Sozinho o homem é incapaz de vencer os
obstáculos que o separam de seus objet
ivos ou fins [...]. O
fundamento das normas está na exigência da natureza humana
de viver em sociedade, dispondo sobre o comportamento de seus
membros. As normas são fenômenos necessários para a
estruturação ôntica do homem.
50
Se o Direito visa regular as
relações entre seres humanos, inegável se
apresenta a mutabilidade e evolução plenas de seus fenômenos, enquanto as leis
da natureza, por exemplo, da física, da matemática, da química, são imutáveis,
constituindo uma realidade de há muito definida.
51
50
DINIZ,
Maria Helena.
Compêndio de introdução à ciência do direito
. 2ª ed. São Paulo:
Saraiva, 2004, p. 300.
51
FREIRE, Homero. Da pretensão ao direito subjetivo. In:
Estudos de direito processual
in
memorian
do ministro Costa Manso
, p. 59: “A ciência do direito f
az lembrar um soberbo e
imenso edifício ainda inacabado, cujos edificadores, interessados no aprimoramento da obra,
se afadigam em reexaminar e discutir o plano de construção, demolindo paredes aqui,
construindo outras acolá, remodelando, refazendo, no afã
de corrigir defeitos e suprir
lacunas”.
5
5
2
2
Como m
encionado anteriormente, o burilamento de uma exata definição
para o vocábulo
Direito
se apresentou, ao longo dos séculos, como tarefa de
extremada dificuldade, não se conseguindo, por via de conseqüência, atingir
conceito tal que venha a satisfazer e demonstrar, na sua integralidade, todo seu
alcance e imensidão.
Nas sábias palavras proferidas pelo jurista Heinrich Ewald Hörster:
[...] o facto não é de admirar: um fenômeno tão complexo como o
direito, um dos resultados mais importantes
senão o mais
imp
ortante
da cultura humana, apenas pode ser captado por
uma conjugação de ciências e métodos e muito dificilmente pelo
jurista só (1992:06).
Não obstante as dificuldades apresentadas, a verdade é que é possível
efetuarem
-
se afirmações sobre o Direito, em
bora estas, inegavelmente, abracem
sua complexidade em aspecto apenas parcial, escolhendo
-
se, para o presente
estudo, o foco relativo a sua função.
Desse intercâmbio, inevitavelmente, surgem tensões, zonas de conflito de
interesses, as quais somente são passíveis de solução por intermédio da função e
da força ordenadora do Direito.
Entrementes, é preciso que se esclareça que o Direito não realiza tal
tarefa de qualquer maneira, de qualquer modo; fá
-
lo a partir de uma idéia de
justiça, que o legitima, que
o torna aceito pela comunidade onde aplicado.
Valendo
-
nos uma vez mais dos ensinamentos de Hörster:
[...] a função do direito aparece
-
nos assim como uma necessidade
prática: mediante o estabelecimento das suas normas de conduta
jurídicas possibilita e assegura o desenvolvimento do homem na sua
convivência com os outros e ainda a satisfação dos seus interesses
próprios. Essa função tem em vista, portanto, designadamente os
aspectos da ordenação da liberdade individual e da criação da
segurança ou certeza na convivência social (1992:09).
Todavia, dentro de tal particular, mister se faz alertar que quando a
ordenação da liberdade vai longe demais, de modo a atingir duramente a
5
5
3
3
essência do ser humano, este tende a esquivar
-
se do cumprimento das normas
jurídicas, criando sistemas paralelos de proteção, frise
-
se, às margens das leis,
tais como: (i) regras internas de um presídio; (ii) movimento dos sem
-
terra; (iii)
regras estabelecidas pelo crime organizado em favelas; (iv) cheque pré
-
datado;
(v) concubinato; (vi) adoção à brasileira; (vii) métodos de sonegação fiscal, dentre
outros inúmeros exemplos existentes em nosso meio social.
Emerge daí que somente uma ordem jurídica edificada de maneira a
equilibrar os valores
liberdade
e
segurança
tende a ser aceita pel
a sociedade
onde aplicada, conseguindo, via de conseqüência, conciliar e ordenar as
divergências de interesses diuturnamente verificáveis entre os homens, entre
estes e a sociedade, e entre tais e o Estado, bem como os respectivos conflitos
conseqüentes de
tais relacionamentos.
Sói acrescentar, por oportuno, que, para se atingir o objetivo proclamado
alhures, o Direito, obrigatoriamente e dentro de suas peculiares científicas, há que
se apresentar como um instrumento dotado de dinamicidade, ou seja, apto a
acompanhar, na medida do possível, todo o circuito evolutivo e transformador que
recai, dia após dia, sobre as mais variadas relações sociais.
A necessidade de o Direito encontrar
-
se em constante mutação evolutiva
está bem demonstrada nos seguintes prové
rbios latinos:
Tempora mutantur et nos
in illis mutamur
(Os tempos mudam e nós mudamos com eles);
Mutationes facti,
jus mutatur
(Mudados os fatos, o direito muda).
Ao se proceder a análise dos adágios latinos acima declinados,
entremostra
-
se fácil extrai
r a conclusão de que as condições da convivência
humana não são, de forma alguma, imutáveis, pois, inegavelmente, sofrem (e
continuam sofrendo) alterações por intermédio da influência que é exercida
pelas constantes modificações sociais, culturais, econômi
cas, religiosas,
políticas, etc.
Noutro giro verbal, e para que seja dotado de efetividade e de eficácia, o
Direito deve, na medida do possível, acompanhar os fenômenos evolutivos que o
5
5
4
4
circundam, sob pena de, em assim não agindo, tornar
-
se obsoleto e sem
utilidade.
Assim, tem
-
se que uma constante do Direito é, portanto, a sua constante
renovação. Exemplo atual do quanto asseverado, diz respeito à escorreita,
recente (14/02/05) e corajosa manifestação exarada pelo ínclito magistrado da
Segunda Vara de Famílias e Sucessões de Porto Alegre, Roberto Arriada Lorea,
a saber:
Atribuir tratamento diferenciado aos jurisdicionados homossexuais
seria um desrespeito ao princípio da igualdade. Seria um absurdo
aceitar que o Poder Judiciário fechasse os olhos não só p
ara as
modificações de nossa sociedade, como para a Constituição
Federal que rege nossa nação, buscando, na falta de legislação
expressa, razão suficiente para julgar injustamente fatos que
ocorrem entre ‘minorias sociais’ e que já são constante
discrimina
das (cf. Proc. nº 00118148080).
Nesse eito, tem
-
se que o Direito, em hipótese alguma, pode apresentar
distância abissal entre sua positivação e os valores e acontecimentos vivificados
no seio social, sob pena de se tornar
letra morta
, sem utilidade e eficácia, como,
aliás, ocorreu com o regramento estampado no inc. IV do Art. 219 do Código Civil
de 1916, cujo conteúdo estava a considerar erro essencial sobre a pessoa do
cônjuge, apto a ensejar a anulação do matrimônio, o defloramento da mulher,
ignorado pelo marido.
Embora seu rechaço da codificação civil somente tenha sido
expressamente levado a efeito com a edição da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de
2002, a verdade é que há muito o dispositivo em comento não galgava eficácia
dentro do ordenamento juríd
ico pátrio, pois não tinha mais ressonância dentro dos
valores e das expectativas sociais afetas ao desenrolar do século XX e
respectivas conquistas e evoluções do pensamento e da cultura dos cidadãos
brasileiros, ainda mais ao se levar em consideração os
novos ditames
legitimamente impostos pela ordem constitucional inaugurada em 1988.
Partindo
-
se das linhas conceituais acima mencionadas, pode
-
se ter a
idéia de que qualquer
sistema
se caracteriza pela existência de um conjunto de
5
5
5
5
elementos e pela conseqüe
nte necessidade de ordenação e de relação destes,
formando, assim, um todo unitário e harmônico.
Tércio Sampaio Ferraz Júnior
52
menciona que todo sistema possui um
repertório e uma estrutura. Utilizando
-
se de seu exemplo, tem
-
se a apresentação
de um conjun
to de elementos formado por carteiras, giz, apagador, mesa do
professor, quadro
-
negro, etc.: se tais elementos (repertório) estiverem conjugados
e ordenados de modo a constituírem uma sala de aula (estrutura), temos um
sistema, do contrário, não!
Os siste
mas abertos representam uma decorrência da premissa
anterior, caracterizando
-
se por um processo de intercâmbio infinito com seu
ambiente, que correspondem a outros sistemas, e, quando o intercâmbio
cessa, o sistema se desintegra, isto é, perde suas fontes
de energia. E as
funções de um sistema dependem de sua estrutura por serem esses sistemas
interdependentes, na medida que suas funções se contraem ou expandem,
sua estrutura acompanha.
No que se refere à análise do sistema jurídico, tem
-
se que Giovani
Ago
stini Saavedra, ao analisar as teorias defendidas por Jürgen Habermas,
Robert Alexy, Ronald Dworkin e Niklas Luhmann, entende que existem
indícios de que, na sociedade moderna, sua atuação se dá nos moldes de
um sistema operacionalmente fechado, haja vista
que os diferentes estudos
afetos à chamada argumentação jurídica estariam a reforçar tal fenômeno,
pois atestam que, cada vez mais, o direito se autoproduz, a partir de seu
próprio código.
53
Noutro giro verbal, e acompanhando o pensamento de André Trindad
e,
tem
-
se que:
52
FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio.
Teoria da norma jurídica
. 3ª ed. Rio de Janeiro:
Forense, 1997, p. 33.
53
SAAVEDRA, Giovani Agostini.
Jurisdição e democracia
: uma análise a partir das teorias de
Jürgen Habermas, Robert Alexy, Ronald Dworkin e Niklas Luhmann. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2006, p. 149.
5
5
6
6
[...] o sistema jurídico, sob a ótica da autopoiese, e seguindo os
ditames dessa, pode ser considerado como um sistema ao
mesmo tempo aberto e fechado. Aberto às influências do meio
externo que passam pelo processo de seleção realizado pelo
código direito/não direito, juridicizando os elementos do meio que
passam a integrar sua estrutura e servem de aparato para a
manutenção da sua auto
-
referencialidade. Fechado no sentido de
auto
-
referencialidade operativa, isso é, o direito se auto
-
regula
a
través da sua identidade (código binário).
54
Nesse aspecto, importante se faz mencionar as ressalvas apresentadas
por Habermas, no sentido de que:
[...] os atos de adaptação, exigidos do sistema jurídico por uma
sociedade cada vez mais complexa, impõem a
adoção de um
novo estilo cognitivo, isto é, de uma prática de decisão mais
flexível, sensível ao contexto e disposta a aprender [...]. Tudo
indica que o conceito de autonomia sistêmica, apesar de sua
referência empírica, nada tem a ver com a intuição norma
tiva que
ligamos à ‘autonomia do direito’. Consideramos que a prática de
decisão judicial é independente, porém, somente na medida em
que os programas jurídicos do legislador não ferem o núcleo moral
do formalismo jurídico e, em segundo lugar, na medida as
considerações políticas e morais, que se introduzem
inevitavelmente na jurisdição, são fundamentadas, não se
limitando a simples racionalizações de interesses juridicamente
irrelevantes. Max Weber tinha razão: somente se levarmos em
conta a racionalidade
que habita no próprio direito, poderemos
assegurar a independência do sistema jurídico. No entanto, como
direito também se relaciona internamente com a política e com a
moral, a racionalidade do direito não pode ser questão exclusiva
do direito.
55
Sendo o
Direito um sistema aberto cognitivamente, cujo meio é a
sociedade e com esta está em constante interação, tem
-
se que os princípios de
direito refletem, em última análise, determinados valores e distorções que
compõem a complexidade do sistema social inform
adores de sua estrutura
normativa.
Assim, em uma perspectiva global, os princípios refletem os elementos
(valores) emitidos pela Sociedade ao Direito, bem como um padrão de relações
54
TRINDADE, André.
Os direitos fundamentais em uma perspectiva autopoiética
. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 123
-
124.
55
HABERMAS, Jürgen.
Direito e d
emocracia
: entre facticidade e validade. Rio de Janeiro:
Tempo Brasileiro, 1997, tomo II, p. 226
-
230.
5
5
7
7
estabelecidas entre o conteúdo de suas normas internas, a partir da integ
ração
deste elemento valorativo emitido pela Sociedade.
Em um sistema aberto, mas operacionalmente fechado, a dinamicidade e
a complexidade internas lhe conferem a propriedade de se readaptar em função
de uma alteração de alguma relação, ocasionada pela i
ntrodução de um elemento
externo novo (que até pode ser de cunho moral) ou pela modificação de algum
elemento interno (por isso são chamados de sistemas adaptativos ou de
organização).
Para haver inferência se determinado ordenamento jurídico caracteriza
-
se
como sistema, mister a indagação no sentido de obter informação se as normas a
tal pertencentes guardam relacionamento de coerência entre si, bem como em
que condições se entremostra possível essa relação.
Nesse passo, Emanuel Carlos Dantas de Assis de
ixou assentado:
As normas jurídicas nunca existem isoladas. Sempre se
encontram ao lado de outras, formando todas o que se denomina
ordenamento jurídico. Assim, o ordenamento jurídico pode ser
visto inicialmente como um conjunto de normas. Tal conjunto,
t
odavia, é especial, uma vez que não é simplesmente a união
ou
um amontoado
de normas, uma ao lado das outras,
independentes e sem guardarem relações entre si. Pelo contrário:
o ordenamento jurídico é um sistema, em que as normas estão
relacionadas entr
e si, e que também possui unidade e
completude.
56
O sistema jurídico, por assim dizer, se caracteriza não só pela reunião de
regras e princípios, mas, principalmente, pelo fato de a referida união dar
-
se de
maneira lógica e hierarquizada, tornando possível
a compatibilidade existencial de
todas as suas normas, de modo que a aplicação de uma não exclua o campo de
atuação e eficácia da outra ou, como bem ensina André Ramos Tavares: “Não se
pode compreender o Direito como mero somatório de regras avulsas, prod
uto de
56
ASSIS, Emanuel Carlos Dantas de.
Sistema constitucional tributário
. Curitiba: Juruá, 2001,
p. 61.
5
5
8
8
atos de vontade, ou mera concatenação de formulas verbais articuladas entre
si”.
57
A partir do momento em que se tem como inconteste a idéia de que a
família necessita de especial proteção do Estado, dúvidas não pairam sobre a
necessidade de ser criada uma gama de normas afetas ao atingimento do referido
desiderato.
Além do mais, não se pode olvidar que as relações familiares, permeadas
que estão pelos sentimentos e paixões humanas, apresentam uma série de
intempéries, peculiaridades e particularida
des que, efetivamente, estão a
demandar uma regulamentação normativa específica e condizente com tais
condições.
Desta feita, não se entremostra razoável imaginar que as relações
familiares poderiam ser norteadas pelos regramentos condizentes com o campo
das obrigações, mais especialmente no que diz respeito às chamadas sociedades
civis, cuja dogmática foi por muito tempo aplicada na solução de conflitos
envolvendo relacionamentos que até então se chamavam de
concubinato
(hoje
união estável
) e, em alguns c
asos, infelizmente, tem valia para o deslinde de
direitos envolvendo uniões homoafetivas.
Todas essas modificações, atendendo à realidade social brasileira, têm
como fundamento, o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana,
enunciado no inc. III do Art. 1º da Constituição Federal de 1988, que foi elevado à
condição de superprincípio da República Federativa do Brasil.
O princípio da dignidade da pessoa humana impõe ao Estado especial
proteção à família, independentemente da sua espécie, como também o respeito
a cada partícipe dos agrupamentos familiares: cônjuges ou companheiros, filhos,
idosos, dentre outros.
57
TAVARES, André Ramos.
Tratado da argüição de preceit
o fundamental
: lei nº 9.868/99 e
lei nº 9.882/99. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 102.
5
5
9
9
A família, tradicionalmente reconhecida como organismo natural e social,
assume formas diversas que nos conduzem a admitir a sua caracter
ização como
base cultural da sociedade
.
Descortina
-
se, assim, uma completa reformulação do Direito de Família,
não só no Brasil, após a Constituição de 1988, mas em todos os países.
Indiscutivelmente, ao se fazer à opção (correta) de que a família é a ba
se
da sociedade, tem
-
se que todos os acontecimentos nela verificados galgam o
patamar de relevância jurídica, fazendo com que seu conjunto protetivo fosse
tratado de modo muito especial, como visto, pelo legislador constituinte,
outorgando
-
lhe natureza fun
damental, emergindo daí sua inexorável condição de
cláusula pétrea, restando, assim, integralmente salva de qualquer possibilidade
de diminuição ou exclusão de nosso sistema jurídico, a teor, inclusive, do quanto
positivado no § 4º do Art. 60 da CF/88.
Fo
i-
se o tempo em que as normas constitucionais eram tidas como meros
vetores, de caráter exortativo aos governantes e governados, cujo cumprimento
ficava relegado a conceitos perigosos e duvidosos, como vontade política,
oportunidade e conveniência, sem qualquer responsabilidade ou vinculação, nas
hipóteses de descumprimento, do agente que obteve a legitimidade popular para
gerir a chamada
coisa pública
e os interesses de todo uma sociedade, visando o
atingimento do chamado
bem comum
.
58
Aduz Lenio Luiz Streck, nesse sentido, que:
[...] a dimensão política da Constituição não é uma dimensão
separada, mas, sim, o ponto de estofo em que convergem as
dimensões democrática (formação da unidade política), a liberal
(coordenação e limitação do poder estatal) e a so
cial
(configuração social das condições de
vida) daquilo que se pode
58
LIMA, Fernando Machado da Silva.
Jurisdição constitucional e controle do poder
: é
efetiva a Constituição brasileira? São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 214: “Na
v
erdade, a Constituição deve ser respeitada pelo Governo e hoje está definitivamente
superada a idéia de que ela seria um simples enunciado de princípios políticos, que serviriam
apenas como diretivas que o legislador iria aos poucos concretizando, de forma
mais ou
menos discricionária”.
6
6
0
0
denominar de ‘essência’ do constitucionalismo do segundo pós
-
guerra. Portanto, nenhuma das funções pode ser entendida
isoladamente. É exatamente por isto que Hans Peter Schneider
vai diz
er que a Constituição é direito político: do, sobre e para o
político.
59
Em face dos ideais adotados quando da eclosão da Lei de Outubro, a
clássica dicotomia distinguindo a existência de disciplinas jurídicas públicas e
privadas ficou realmente para trás, sendo muito difícil, hodiernamente, vislumbrar
-
se algum conteúdo jurídico que, ao menos, indiretamente, não tenha
desdobramento e efeitos de natureza coletiva.
A esse processo, nominou
-
se de constitucionalização do direito privado e,
por via de conseqüên
cia, desaguou na constitucionalização de todo o direito de
família pátrio, até porque, não se pode deslembrar que o Estado brasileiro
outorgou especial proteção ao referido agrupamento social, como facilmente se
identifica pelo conteúdo explícito do
caput
Art. 226 da Lei de Outubro.
60
2.6
A Família como Objeto de Normatização Constitucional
A família sempre foi vista como uma instituição de caráter eminentemente
privado, de modo que a intervenção estatal restava, em regra, expressamente
proibida.
Entrem
entes, ao se fazer a opção de colocar a família como base da
sociedade, o constituinte pátrio, com acerto, alocou as principais regras protetivas
da referida instituição no seio do texto constitucional, de modo que, embora ainda
se lhe reconheça um núcleo
de atividades intrinsecamente privadas, existe a
59
STRECK, Lenio Luiz. A baixa constitucionalidade e a inefetividade dos direitos fundamentais
-
sociais em terra
brasilis
. In:
Revista brasileira de direito constitucional
, nº 04. São Paulo:
RBDC, jul./dez. 2004, p. 272.
60
SIL
VA, José Afonso da.
Comentário contextual à Constituição
. 2ª ed. São Paulo:
Malheiros, 2006, p. 851: “A família é afirmada como a base da sociedade e tem especial
proteção do Estado, mediante assistência na pessoa de cada um dos que a integram e
criação de
mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações”.
6
6
1
1
necessidade, dentro de certos limites, da participação do Estado para a sua
sedimentação, proteção e concretização.
61
Por outras palavras, Sumaya Saady Morhy Pereira salienta:
[...] para compreender a tutel
a dos direitos fundamentais nas relações
familiares, como em qualquer relação entre sujeitos privados, torna
-
se
necessário identificar a nova conformação que esses direitos
assumiram a partir do Estado Social de direito, superando a sua
concepção originári
a no Estado Liberal [...]. Somente a partir da
superação do modelo liberal de família, no Estado Social de Direito, é
que se pode identificar a proteção da família como uma exigência
constitucional que se justifica pela necessidade de proteção das
pessoas
que integram as comunidades familiares. Um Estado que abre
mão de qualquer controle sobre a vida familiar, em nome da proteção
do espaço privado da família, pode incorrer na perpetuação de
opressões e desiguldades, fugindo da postura que lhe é exigida fren
te
aos direitos fundamentais, já que, superada a concepção liberal, como
vimos, o Estado passa a ser devedor não apenas de postura negativa
(não
-
intromissão), mas também de postura positiva, titular do dever de
proteção integral dos direitos fundamentais.
62
Ao se trazerem para o texto constitucional questões de relevo como a igualdade
entre todos os filhos, independentemente da origem, a igualdade de direitos entre homens e
mulheres, mormente no que diz respeito à condução e à consecução dos destinos de uma
determinada entidade familiar, dentre outros, acabou por se proteger tais direitos, com o
manto indelével da cláusula pétrea, vez que dizem respeito ao arcabouço de regras
jusfudamentais inerentes ao ser humano, daí porque jamais poderão ser retiradas de
nosso
ordenamento, prestigiando
-
se, também, o princípio do não
-
retrocesso.
63
61
FACHIN, 1999, p. 294: “Do ponto de vista das fontes formais, relevante foi a migração
operada do Código Civil à Constituição. O sistema clássico originário do Código Civil
brasileiro é uma
página que na história antecede o Direito Constitucional da Família, um
campo de saber que rompe as fronteiras tradicionais do público (tendo espaço para um
Estado forte quando os desiguais e fracos dele necessitam para seus direitos fundamentais) e
do pri
vado (tendo os horizontes abertos para um Estado fraco que permite aos indivíduos e a
coletividade a realização pessoal e social de suas aspirações)”.
62
PEREIRA, Sumaya Saady Morhy.
Direitos fundamentais e relações familiares
. Porto
Alegre: Livraria do Adv
ogado, 2007, p. 113.
63
DIAS; PEREIRA, 2002, p. 27: “A Constituição Federal de 1988, num único dispositivo,
espancou séculos de hipocrisia e preconceito. Instaurou a igualdade entre o homem e a
mulher e esgarçou o conceito de família, passando a proteger de
forma igualitária todos os
seus membros. Estendeu igual proteção à família constituída pelo casamento, bem como à
união estável entre homem e a mulher e à comunidade formada por qualquer dos pais e seus
descendentes. Consagrou a igualdade dos filhos, havi
dos ou não do casamento, ou por
adoção, garantindo
-
lhes os mesmos direitos e qualificações. Essas profundas modificações
acabaram derrogando inúmeros dispositivos da legislação então em vigor, por não
recepcionados pelo novo sistema jurídico. Após a Constituição Federal, o Código Civil perdeu
o papel de lei fundamental do direito de família”.
6
6
2
2
Outrossim, embora seja inquestionável a importância da referida mudança
de contexto jurídico das regras de direito de família, não se pode perder de vista o
alerta feito por Fachin e Ruzyk:
Não basta, por certo, pelo simples desvio do enfoque de modelos
codificados para modelos constitucionalizados. O que se deve é
examinar as possibilidades concretas de que o Direito Civil atenda
a uma racionalidade emancipatória da pessoa humana
que não se
esgote no texto positivado, mas que permita, na porosidade de um
sistema aberto, proteger o sujeito de necessidades em suas
relações concretas, independente da existência de modelos
jurídicos. O modelo é instrumento, e não um fim em si mesmo. Po
r
isso, ele não deve esgotar as possibilidades do jurídico, sob pena
de o direito se afastar cada vez mais das demandas impostas pela
realidade dos fatos.
64
Nesse sentido, interessante, também, a ponderação levada a efeito por
Paulo Luiz Netto Lobo:
Em su
ma, para fazer sentido, a publicização deve ser entendida
como o processo de intervenção legislativa infraconstitucional, ao
passo que a constitucionalização tem por fito submeter o direito
positivo aos fundamentos de validade constitucionalmente
estabelec
idos. Enquanto o primeiro fenômeno é de discutível
pertinência, o segundo é imprescindível para a compreensão do
moderno direito civil.
65
Necessário se faz abordagem referente ao caminho evolutivo
percorrido pelo Direito de Família dentro do ordenamento ju
rídico pátrio, no
plano constitucional, sendo certo que será procedida à abordagem referente ao
caminho evolutivo percorrido pelo Direito de Família dentro do ordenamento
jurídico pátrio.
(i)
Constituição
de
1824
: no âmbito da Constituição de 1824, a únic
a
referência à família correspondia à
Família Imperial
, que vinha tratada ao longo
dos Arts. 105 a 115 da apontada Constituição, sendo certo que, no período
constitucional em comentário observava
-
se uma inegável e inafastável influência
64
FACHIN, 1999, p.
102.
65
LÔBO, P. L. N. Constitucionalização do direito civil. In:
Revista de informação legislativa
,
ano 36, nº 141. Brasília: Nacional, jan./mar. 19
99, p. 101.
6
6
3
3
da religião sobre o tema objeto de estudo, especificamente da
Católica Apostólica
Romana
que era a religião oficial do Estado.
Assim, pode
-
se dizer que a ausência de referência à família no texto
constitucional senão apenas à
Família Imperial
, acarretava a relegação do
trat
amento da questão ao Direito Canônico, estabelecendo, desta feita,
praticamente um monopólio da religião nesse particular. Essa é a conclusão que
se extrai da leitura dos Arts. 106
66
e 179, inc. V,
67
daquela Constituição.
(ii)
Constituição
de
1891
: buscando dissociar
-
se da Igreja, numa evidente
tentativa de fortificação do Estado, fez
-
se uma referência indireta à família no bojo
da Constituição de 1891 através da alusão ao casamento, que, até então, era a
única forma conhecida de família constituída.
É o qu
e se observa da redação atribuída ao § 4º do Art. 72, segundo o
qual “[...] a Republica só reconhece o casamento civil, cuja celebração será
gratuita”.
(iii)
Constituição
de
1934
: a Constituição de 1934 preocupou
-
se mais com
o aspecto formal representado pelas regras de celebração do casamento do que
com o substancial, evidenciado na proteção propriamente dita da família, na
medida em que os Arts. 144 a 146 apenas davam conta da indissolubilidade do
casamento e das formalidades de segurança para o seu surg
imento, em que pese
uma certa reaproximação com as religiões por meio do reconhecimento de efeitos
civis ao casamento religioso quando da observação dos expedientes previstos na
lei civil.
É o que se vê de parte do Art. 146:
66
Art. 106: O Herdeiro presumptivo, em completando quatorze annos de idade, prestará nas
mãos do Presidente do Senado, reunidas as duas Câmaras, o seguinte Juramento
Juro
manter a Religião Catholica Apostólica Romana, observar a Constituição Política da Nação
Brazileira, e ser obediente ás Leis, e ao Imperador.
67
Art. 179: A inviolabilidade dos Direitos Civil, e Políticos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por
base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constitui
ção do
Imperio, pela maneira seguinte: [...] V
ninguém póde ser perseguido por motivo de Religião,
uma vez que respeite a do Estado, e não offenda a Moral Publica.
6
6
4
4
Art. 146: O casamento perante
ministro de qualquer confissão
religiosa, cujo rito não contrarie a ordem publica ou os bons
costumes, produzirá, todavia, os mesmos effeitos que o
casamento civil, desde que perante a autoridade civil, na
habilitação dos nubentes, na verificação dos imped
imentos e no
processo de opposição, sejam observadas as disposições da lei
civil e seja elle inscripto no Registro Civil.
É a primeira ocasião, também, em que se destina um Capítulo da
Constituição
ainda que composto por poucas disposições (Arts. 144 a
147)
para o tratamento da família, e, igualmente, faz
-
se referência expressa ao
reconhecimento de filhos, não obstante a discriminação ainda reinante e que se
percebe facilmente só da visualização da existência de dois conceitos de filhos:
naturais e leg
ítimos.
Dispunha o Art. 147 da Constituição que “[...] o reconhecimento dos filhos
naturaes será isento de quaesquer sellos ou emolumentos, e a herança, que lhes
caiba, ficará sujeita a impostos iguaes aos que recaiam sobre a dos filhos
legítimos”.
Por f
im, destaque
-
se que, sem maiores rodeios, fez
-
se expressa
referência ao casamento como única maneira de constituição da família, ao
assinalar
-
se no
caput
do Art. 144 que “[...] a família, constituída pelo casamento
indissolúvel, está sob a proteção especia
l do Estado”.
(iv)
Constituição
de
1937
: de inspiração nazista e fascista, a Constituição
de 1937 ainda manteve um Capítulo para o tratamento da família, composto pelos
Arts. 124 a 127, convindo assinalar, todavia, que ela inaugurou uma nova etapa
de preo
cupação do Estado com a família, na medida em que mesmo timidamente
passou a incluir o próprio Estado como uma espécie de obrigado subsidiário
embora não tão obrigado assim com a educação da prole.
Nessa toada, dispunha o Art. 125 da Constituição: “[...
] a educação da
prole é o primeiro dever e o direito natural dos pais. O Estado não será estranho a
esse dever, colaborando, de maneira principal ou subsidiária, para facilitar a sua
execução ou suprir as deficiências e lacunas da educação particular”.
6
6
5
5
Tam
bém se percebe nessa Constituição uma preocupação do Estado
com uma política favorável à expansão da população, haja vista que rezava a
segunda parte do Art. 124 que “[...] às famílias numerosas serão atribuídas
compensações na proporção dos seus encargos”
.
(v)
Constituição
de
1946
: de origem democrática, a Constituição de
1946, não obstante tenha continuado a trilhar o caminho do monopólio do
casamento como forma de constituição de família (Art. 163 e respectivos
parágrafos), abordou no Art. 164: “[...] é
obrigatória, em todo o território
nacional, a assistência à maternidade, à infância e à adolescência. A lei
instituirá o amparo às famílias de prole numerosa”, pretendendo com isso
ao
que tudo indica
trazer um maior e mais efetivo compromisso do Estad
o com a
população no que diz respeito aos meios e recursos necessários ao sadio
desenvolvimento da família.
Também foi nessa Constituição que, no pertinente ao direito
sucessório, ofereceu
-
se um tratamento mais benéfico aos nacionais que se
encontrassem n
a condição de herdeiros de estrangeiros, uma vez que o Art.
165 dispôs: “[...] a vocação para suceder em bens de estrangeiro existente no
Brasil será regulada pela lei brasileira e em benefícios do cônjuge ou de filhos
brasileiros, sempre que lhes não seja
mais favorável à lei nacional do
de
cujus
”.
(vi)
Constituição
de
1967
: de caráter ditatorial, a Constituição de 1967
tratou de maneira conjunta a família, a educação e a cultura, fazendo
-
o através
dos Arts. 166 a 172 que compunham um único título.
Sem alterações dignas de nota no que pertine à família propriamente dita,
manteve
-
se o monopólio do casamento e a previsão de que caberia a lei instituir a
assistência à maternidade, à infância e à adolescência, não se perdendo de vista
o importante comentário tecido por Roberto Magalhães:
[...] estabelecendo a indissolubilidade do vínculo matrimonial, tem
-
se por mantido o desquite como única forma de dissolução da
sociedade conjugal sem rompimento daquele vínculo.
6
6
6
6
Conseguintemente, fechou
-
se, uma vez mais, a v
ia reformista
para a implantação do divórcio a vinculo no Brasil.
68
(vii)
Constituição
de
1969
: de índole indiscutivelmente ditatorial, a
Constituição de 1969
ou apenas Emenda como preferem alguns juristas
,
seguiu exatamente o mesmo vezo de sua antecessora; todavia, verdade seja dita,
foi no âmbito da sua vigência que surgiu o inegável benefício à sociedade
representado pelo divórcio, isso através da Emenda Constitucional nº 09 de
28/06/77.
Assim é que, através do surgimento do direito ao divórcio inau
gurou
-
se
uma nova fase no âmbito da família, na qual já não mais se via a família apenas e
tão
-
somente pela ótica do casamento, que, como se disse, por não mais ser
indissolúvel, já não mais era tido como única forma de constituição de família.
No Brasil,
as regras básicas de proteção da entidade familiar, como se
verá, foram bruscamente deslocadas do âmbito privado para se transformarem
em verdadeiros e indeléveis dogmas constitucionais, devendo
-
se fazer coro a
Fachin no sentido de que:
[...] o ente fami
liar não é mais uma única definição. A família se
torna plural. Há realmente uma passagem intimamente ligada às
modificações políticas, sociais e econômicas. Da superação do
antigo modelo da ‘grande
-
família’, na qual avultava o caráter
patriarcal e hierarq
uizado da família, uma unidade centrada no
casamento, nasce a família moderna, com a progressiva
eliminação da hierarquia, emergindo uma restrita liberdade de
escolha; o casamento fica dissociado da legitimidade dos filhos.
Começam a dominar as relações de
afeto, de solidariedade e de
cooperação.
69
Dentro do campo do Direito de Família são percebidas e sentidas
alterações de grande profundidade, tais como:
numerus apertus
para a
consideração, formação e proteção das entidades familiares (§ 3º, Art. 226, CF)
,
igualdade entre os cônjuges (§ 5º, Art. 226, CF), igualdade entre filhos (§ 6º, Art.
68
MAGALHÃES, Roberto.
A Constituição Federal de 1967 comentada
. Rio de Janeiro: José
Konfi
no Editor, 1967, tomo I, p. 524.
69
FACHIN, 1999, p. 289
-
290.
6
6
7
7
227, CF), surgimento de novas entidades familiares, além daquela oriunda do
casamento, etc., culminando no que se denominou
constitucionalização do direito
civil
, como v
isto em tópico próprio.
É que, como dito alhures, a Constituição de 1988 alterou bruscamente o
ordenamento jurídico pátrio ao trazer para o plano positivo as novas formas de
família já reconhecidas pela sociedade, dentre elas, a união estável (§ 3º, Art.
226, CF) e a família monoparental (§ 4º, Art. 226, CF).
Observe
-
se que a Constituição de 1988 fez constar do próprio texto
constitucional a possibilidade de o casamento civil “[...] ser dissolvido pelo
divórcio, após prévia separação judicial por mais de
um ano nos casos expressos
em lei, ou comprovada separação de fato por mais de dois anos” (§ 6º, Art. 226,
CF), afastando com isso qualquer resistência que ainda eventualmente existisse
quanto à probabilidade da dissolução do casamento e do encerramento do
seu
monopólio injustificável como única forma de constituição de família.
Também foi a partir do vigente ordenamento constitucional que se
manifestou preocupação maior com o planejamento familiar, na medida em que,
através da expressa referência aos princípios da dignidade da pessoa humana e
da paternidade responsável, deu
-
se conta de que tal “[...] é livre decisão do casal,
competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o
exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições
oficiais ou privadas” (§ 7º, Art. 226, CF), e, bem assim, com o afastamento das
violências perpetradas no ambiente familiar, já que se fez previsão de que “[...] o
Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos
que a
integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações”
(§ 8º, Art. 226, CF).
Por fim, registre
-
se que a Constituição de 1988 inaugurou uma etapa de
inquestionável fortificação da família, na medida em que assinalou a
respo
nsabilidade solidária dela própria, da sociedade e do Estado no que diz
respeito aos direitos da criança, do adolescente e do idoso, os quais justamente
representam os pontos de tensão para o fortalecimento da própria família tida
6
6
8
8
como a base da sociedade
e detentora de especial proteção do Estado, como
pode ser facilmente evidenciado através dos comandos normativos oriundos do
caput
do Art. 226 e dos Arts. 227 a 230 do referido texto magno.
Conforme facilmente se verifica do
caput
do Art. 226 da Constitui
ção,
repita
-
se, a família constitui a célula básica da sociedade e é o alicerce de toda a
organização social, daí porque cabe ao Estado destinar
-
lhe proteção especial.
Nessa linha de princípios, é evidente que o Direito de Família
Contemporâneo tem como p
reocupação central a pessoa humana
e não os
bens eventualmente amealhados durante sua composição e vigência, como, aliás,
era escopo primaz da codificação anterior
, de modo que, deixando de lado o
interesse exclusivamente particular, as normas que vers
am sobre ele têm
natureza jurídica marcadamente pública.
70
Assim é que, ressalvadas certas peculiaridades nas quais
excepcionalmente se vê uma razoável margem de atuação do princípio da
autonomia da vontade, como sói acontecer em matéria de regime de bens,
as
normas decorrentes do Direito de Família são, em sua maioria, cogentes, e,
portanto, de ordem pública, não admitindo, por conseguinte, renúncia e
disposição por quem quer que seja.
Assim, tal fenômeno (constitucionalização do Direito Civil), como dito
anteriormente, ocorreu com a promulgação da Constituição de 1988, pois, a
mesma alterou, bruscamente, todo o ordenamento jurídico pátrio, visto que trouxe
ao plano positivo a igualdade entre homens e mulheres, reconheceu como
entidade familiar a união entre pessoas de sexo diferentes e não casadas, acabou
com a distinção existente entre filhos, dentre outros inúmeros casos.
Em verdade, depois da eclosão da Carta Magna de 1988, todo o
ordenamento jurídico e toda a atividade normativa ficaram, irrefragavelm
ente,
70
LOTUFO, Renan (coord).
Direito civil constitucional
: caderno 01. São Paulo: Max Limonad,
1999, p. 09: “[...] com o advento da nossa Constituição de 1988, tivemos um choque de
perplexidade no in
ício, quer por sua abrangência, que por passar a disciplinar diretamente
matéria que até então era exclusiva do Código Civil”.
6
6
9
9
condicionados à observação e ao cumprimento aos princípios fundamentais (Art.
1º, CF) e dos objetivos fundamentais (Art. 3º, CF) por ela traçados.
71
Entretanto, é preciso que se esclareça que o atingimento desse patamar
foi demorado, valendo rememora
r, por oportuno, que até mesmo no valioso
campo dos chamados
direitos individuais
oriundos das Constituições americana e
francesa somente foram ganhar força e destaque dentro do mundo jurídico depois
do término da Segunda Guerra Mundial, e, por via de cons
eqüência, a maioria
dos textos constitucionais deixou de apresentar conteúdo meramente de
estruturação do Estado para galgar maior abrangência e amplitude, não se
olvidando que todas essas transformações constitucionais acabaram precipitando
a necessidade
de alteração de nossa legislação civil (1916), situação essa que
veio a definitivamente se concretizar, do ponto de vista jurídico
-
positivo, com a
entrada em vigor do novo Código Civil (Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002).
71
FACHIN, Luiz Edson.
Repensando fundamentos do direito civil brasileiro
contemporâneo
. 2ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2000, p.
10
-
11.
7
7
0
0
3
3
A
A
N
N
A
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T
T
U
U
R
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D
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A
F
F
A
A
M
M
Í
Í
L
L
I
I
A
A
Dentro daquilo que se pretende demonstrar e concluir por intermédio do
presente trabalho, mister se faz explanar, ainda que rapidamente, sobre a
importância e, principalmente, sobre a supremacia que as normas constitucionais
det
êm em relação a todas as demais que complementam e formam, juntamente
com elas, um determinado sistema jurídico.
Atualmente, o fenômeno de observância constitucional se entremostra tão
intenso e indissociável da atuação do intérprete do direito, que o res
peito que deve ser
devotado aos direitos fundamentais,
ad exemplum
, deixou de ser encarado apenas e
tão
-
somente no aspecto vertical (Estado x particular), adentrando a seara horizontal,
ou seja, a relação existente também no âmbito entre particulares,
72
o q
ue, salvo
equívoco, demonstra uma imperiosa necessidade de mudança de mentalidade
daqueles que se propuseram a seguir a nobre e dificultosa trilha jurídica.
Procurar
-
se
-
á demonstrar, também, diante desse inexorável processo de
constitucionalização do dire
ito de família, quais os vetores basilares que passaram a
informá
-
lo e integrá
-
lo, servindo de esteio para sua aplicação do ponto de vista
prático, ou seja, na solução dos problemas e conflitos que lhe são inerentes.
Feitas tais constatações e, diante da
inegável importância de referido acervo jurídico
-
protetivo aos cidadãos, passar
-
se
-
á a demonstrar que, diante das diretrizes constitucionais
encampadas em 1988, a família goza de inegável fundamentalidade na vida dos cidadãos
brasileiros, de modo que, o di
reito em pauta, sempre que possível, deve ser vivificado,
fomentado e concretizado, sob pena de, em assim não agindo, permitir
-
se
-
á a busca pela
responsabilização estatal, por tão grave e nefasta omissão em seu mister de atuação.
72
ANDRADE, José Carlos Vieira de.
Os direitos fundamentais na Constituição portuguesa
de 1976
. 2ª ed. Coimbra: Almedina, 2001, p. 254
-
255: “[...] transposição directa dos direitos
fundamentais, enquanto direitos subjectivos, para as relações particulares quando se trata de
situações em que pessoas coletivas (ou excepcionalmente indivíduos) disponham de
poder
especial
de caráter privado sobre (outros) indivíduos. Em tais casos, estamos perante
relações de poder
e não relações entre iguais
e justif
ica
-
se a protecção da liberdade dos
homens comuns que estejam em posição de vulnerabilidade”.
7
7
1
1
3.1
A Constitucionalização
do Direito Privado
Fala
-
se muito, nos dias de hoje, sobre a ocorrência de um processo jurídico
denominado
constitucionalização do direito civil
ou
civilização do direito constitucional
.
73
Esse fenômeno teve maior incidência, em nosso País, com a promulg
ação da
Constituição de 1988, tendo em vista ter ela alterado bruscamente todo o modo de
interpretação e aplicação do corpo normativo de nosso ordenamento jurídico, mormente no
que diz respeito ao Direito Civil, uma vez que trouxe ao plano positivo
-
constit
ucional a
exigência de observância da função social da propriedade, do contrato e dos negócios
jurídicos em geral; a igualdade entre homens e mulheres, o alargamento das hipóteses de
reconhecimento de entidades familiares além daquela de índole matrimonial
, o rechaço da
distinção existente entre filhos de origens diferentes, dentre outros inúmeros casos.
E dentro do que já foi visto anteriormente, não se pode deslembrar que a
existência de um sistema jurídico uno e não
-
completo está a demandar,
necessariam
ente, sua complementação e construção no dia
-
a
-
dia, com especial
respeito e integração principiológica da Constituição Federal, eis seu inegável e
inquestionável valor supremo
-
hierárquico, o qual conforma e ordena todas as
normas positivas que são emanadas
abaixo de si, como é o caso do Direito
Privado e, em especial para o presente estudo, do Direito Civil.
74
Em verdade, depois da eclosão da Magna Carta de 1988, todo o ordenamento
jurídico e toda atividade legislativa ficaram, de maneira irrefragável, cond
icionados à
observação e ao cumprimento dos princípios fundamentais (Art. 1º, CF) e dos objetivos
fundamentais (Art. 3º, CF) por ela traçados, não se perdendo de vista, nesse particular,
a escorreita advertência traçada por Ana Maria D’Ávila Lopes:
73
CANOTILHO, Joaquim José Gomes. Civilização do direito constitucional ou
constitucionalização do direito civil?. In:
Direito constitucional
: estudos em homenagem
a
Paulo Bonavides, RT nº 254:13, 2006, p. 108
-
115.
74
VENCELAU, Rose Melo.
O elo perdido da filiação
: entre a verdade jurídica, biológica e
afetiva no estabelecimento do vínculo paterno
-
filial. Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p. 38: “[...]
a noção de ordena
mento como sistema é fundamental para o entendimento da chamada
constitucionalização do Direito Civil. Não de qualquer sistema, mas daquele sistema unitário,
não completo, porém, completável e aberto. Ter o ordenamento brasileiro como um sistema
assim, significa que o Direito Civil pode e deve manter
-
se atual”.
7
7
2
2
[...] a
importância dos mecanismos de proteção dos direitos
fundamentais perante o poder legislar é inquestionável, na medida
em que permite a conservação do princípio da dignidade humana
contido em cada direito fundamental, reafirmando
-
se, assim, que o
centro e
fim de toda atividade deve ser o ser humano.
75
Não se pode olvidar, entretanto, que, depois de passados mais de dezoito
anos da promulgação da Lei de Outubro, não obstante as vozes intensas e
candentes que continuam a soçobrar a supremacia de tal corpo de
lei em relação
a todos os demais existentes, a verdade é que, no dia
-
a
-
dia, se percebe
claramente a dificuldade que o
operador do direito
possui em emprestar
efetiva
eficácia aos dogmas basilares de natureza principiológica, em detrimento da
suposta segura
nça jurídica externada pela existência de uma positivação
infraconstitucional expressa e específica sobre um determinado tema.
76
Entrementes, inegável se apresenta a assertiva de que, paulatinamente, como
se fosse uma mudança no melhor estilo aluviônico, o
s caracteres que antes
informavam o ordenamento jurídico pátrio, em razão da citada Constituição, foram
consubstancial e profundamente alterados, não se vislumbrando mais uma exata e
perceptível linha divisória conceitual entre aquilo que se convencionou c
hamar de
direitos privados ou particulares
e de
direitos públicos ou coletivos
, sendo ela
sobrevivente apenas para fins e efeitos didáticos em nossos cursos de Bacharelado.
Essa alteração se deu, principalmente, em razão de o centro do sentido
jurídico ter passado a ser, efetivamente, o ser humano e sua devida proteção, até
porque não se pode negar a assertiva de que toda relação jurídica se estabelece
entre pessoas, os chamados
sujeitos de direito
(ativo e passivo).
77
75
LOPES, Ana Maria D’Ávila. Os direitos fundamentais como limites ao poder de legislar
.
Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2001, p. 198.
76
TEPEDINO, Gustavo. Normas constitucionais e relaçõe
s de direito civil na experiência brasileira.
In:
Temas de direito civil
. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, tomo II, p. 25: “Mostra
-se de evidência
intuitiva o equívoco de tal concepção, ainda hoje difusamente adotada no Brasil, que acaba por
relegar a norma
constitucional, situada no vértice do sistema, a elemento de integração
subsidiário, aplicável apenas na ausência de norma ordinária específica e após terem sido
frustradas as tentativas, pelo intérprete, de fazer uso da analogia e de regra consuetudinária
. O
entendimento mostra
-
se, no entanto, bastante coerente com a lógica do individualismo
oitocentista, sendo indiscutível o papel predominante que o Código Civil desempenhava como
referência normativa exclusiva no âmbito das relações de direito privado”.
77
Ibidem, p. 27: “[...] o Direito das Coisas é ramo do Direito Civil que regula as relações jurídicas
reais, entendidas estas como as que se estabelecem entre o titular de uma coisa e a
sociedade em geral”.
7
7
3
3
Atualmente o significado utilizado par
a o vocábulo pessoa aponta para
assentar o ser humano como o valor
-
fonte do qual emanam todos os outros
valores objetivos, daí porque, sendo ele o destinatário final de toda e qualquer
norma, juridicamente a expressão
pessoa
há de ser entendida como a enti
dade
dotada de personalidade à qual o ordenamento jurídico confere direitos e
obrigações.
78
Conforme asseveram os juristas Gustavo Tepedino, Heloísa Helena
Barboza e Maria Celina Bodin de Moraes:
[...] volta
-
se o ordenamento não mais para o ‘indivíduo’,
a
bstratamente considerado, mas para a tutela da pessoa humana
nas concretas e diferenciadas relações jurídicas em que se insere,
como forma de assegurar os princípios constitucionais da
solidariedade social (Art. 3º, inc. III) e da igualdade substancial
(Ar
t. 3º, inc. IV). Nessa perspectiva merece proteção especial do
ordenamento a criança e o adolescente (Lei nº 8.069/90), o
consumidor (Lei nº 8.078/90) e assim por diante.
79
E isso é tão verdadeiro e real que, hodiernamente, um Estado só pode ser
reconhecid
o, de maneira efetiva, Constitucional e Democrático, se a pessoa
enquanto indivíduo e coletividade
for considerada o fim último de sua atuação,
ou seja, o alfa e ômega da proteção e da regulamentação conferida pelo
respectivo ordenamento jurídico em qu
estão.
80
Para Ana Luiza Maia Navares, com apoio nos ensinamentos do mestre
italiano Vicenzo Sacalisi:
[...] a pessoa, que a Constituição eleva a valor de vértice do
ordenamento, não é mais o sujeito de direito codificado, formalista
e abstrato, apreciável
somente em termos
patrimoniais e mais
78
Ibidem, mesma página.
79
BARBOZA, Heloisa Helena; MORAES, Maria Celina Bodin de; TEPEDINO, Gustavo.
Código
civil interpretado conforme a Constituição da república
. Rio de Janeiro: Renovar, 2004.
vol. I, p. 03.
80
LÓBO, 1999, p. 152: “O desafio que se coloca ao jurista e ao direito é a capacidade de ver a
pessoa humana em toda a sua dimensão ontológica e não como simples e abstrato sujeito de
relação jurídica. A pessoa humana deve ser colocada como centro das destinações jurídicas,
valorando
-
se o ser e não o ter, isto é, sendo medida da propriedade, que passa a ter função
complementar”.
7
7
4
4
propriamente econômico
-
produtivos, mas sim o sujeito histórico
-
real, considerado na multiplicidade de suas explicações e
manifestações ativas, como também em suas variadas e diversas
necessidades, interesses, exigênc
ias, qualidades individuais,
condições econômicas, posições sociais e, como tal, devendo ser
considerado como portador de valores essenciais (dignidade,
segurança, igualdade, liberdade) e fundamentais instâncias de
promoção e desenvolvimento da pessoa (saú
de, trabalho,
educação).
81
Assim, irrefragável a assertiva de que a Constituição de 1988, ao erigir a
proteção da dignidade da pessoa humana como vetor fundamental da República
Federativa do Brasil, acabou por extirpar do complexo jurídico que lhe é inferi
or
hierarquicamente toda e qualquer norma que disponha em sentido contrário ou se
mostre apta a produzir efeitos em sentido oposto ao do mandamento basilar.
82
Nesse ponto, tem
-
se que o antigo Código Civil sofreu bruscas mudanças
na forma de interpretação d
e seus dispositivos até então vigentes, bem como
tantos outros foram tidos por não
-
recepcionados, tais como aqueles que
sufragavam a superioridade do homem sobre a mulher e a possibilidade de
discriminação quanto ao exercício de direitos no que se referia
à origem da
filiação ou prole.
Conclui Tepedino:
[...] reconhecendo embora a existência dos mencionados
universos legislativos setoriais, é de se buscar a unidade do
sistema, deslocando
para a tábua axiológica da Constituição da
81
NEVARES, Ana Luiza Maia.
A tutela sucessória do cônjuge e do companheiro na
legalidade constitucional
. Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p. 189.
82
LÔBO, 1999, p. 25
-
26: “Enquanto perduraram as condições de sobrevivência do Est
ado
Liberal, principalmente no século XIX (no Brasil, até à Constituição social de 1934), os
códigos civis desempenharam funções relevantes que os mantiveram como o núcleo do
direito positivo. Para Francisco Amaral, que perfilha a tese da descodificação, o
conjunto de
valores e idéias que formaram o caldo de cultura dos grandes códigos encontra
-
se superado,
nomeadamente suas funções políticas, filosóficas e técnicas. Desaparecendo essas funções
prestantes, os códigos tornaram
-
se obsoletos e constituem óbice
s ao desenvolvimento do
direito civil. Com efeito, a incompatibilidade do Código Civil com a ideologia
constitucionalmente estabelecida não recomenda sua continuidade. A complexidade da vida
contemporânea, por outro lado, não condiz com a rigidez de suas regras, sendo exigente de
minicodificações multidisciplinares, congregando temas interdependentes que não
conseguem estar subordinados ao exclusivo campo do direito civil. São dessa natureza os
novos direitos, como o direito do consumidor, o direito do meio ambiente, o direito da criança
e do adolescente”.
7
7
5
5
República o ponto de ref
erência antes localizado no Código Civil.
Se o Código Civil mostra
-
se incapaz
até mesmo por sua posição
hierárquica
de informar, com princípios estáveis, as regras
contidas nos diversos estatutos, não parece haver dúvida que o
texto constitucional pode
rá fazê
-
lo, já que o constituinte,
deliberadamente, através de princípios e normas, interveio nas
relações de direito privado, determinando, conseguintemente, os
critérios interpretativos de cada uma das leis especiais. Recupera
-
se, assim, o universo desfe
ito, reunificando
-
se o sistema.
83
A supremacia da Constituição e de suas normas, dentro de um
determinado sistema jurídico, é inegável, não existindo controvérsias sérias nesse
sentido. Desta feita, mister se faz, num breve relato, trazer à tona o processo
de
surgimento e de criação da
Lex Mater
, bem como o alcance, a eficácia e a
aplicabilidade de suas normas.
Primeiramente, há que se destacar que o conceito de poder constituinte
84
nasce com o surgimento das transformações ocorridas quando se observa
alter
ação no comumente denominado pacto social, exprimindo, assim, a vontade
política dessa mesma sociedade, a qual se exterioriza através da promulgação de
uma Constituição.
O grande idealizador deste conceito foi o abade francês Emmanuel
Sieyès que, poucos m
eses antes da eclosão da Revolução Francesa, publicou
panfleto denominado
Que é o terceiro estado?
, cujo documento acabou por
representar verdadeiro manifesto das reivindicações burguesas contra os
privilégios deferidos ao clero e à nobreza, bem como ao ab
solutismo que lhes era
imposto por tais castas, buscando, fora do ordenamento jurídico da época, que se
apresentava injusto, um direito superior, que permitisse ao povo, autoconstituir
-
se
e fomentar a renovação da ordem jurídica malsinada.
83
BARBOZA; MORAES; TEPEDINO, 2004, vol. I, p. 13.
84
GUSMÃO, Hugo César de. Poder constituinte: uma categoria ainda válida em nossos dias?
In:
Revista brasileira de direito constitucional
, vol. 06. São Paul
o: Revista dos Tribunais,
jul./dez. 2005, p. 99: “Poder Constituinte é um fenômeno jurídico
-
político cuja manifestação
resulta na criação da Constituição. O caráter bi
-
dimensional não deve passar desapercebido.
É uma categoria de máxima relevância para o d
ireito e para a teoria política, e pode ser
analisada sob ambas as perspectivas. Para o Direito Constitucional, sua relevância reside no
fato de que dele se deduz a espinha dorsal do constitucionalismo contemporâneo. Elementos
tão comuns ao âmbito deste ra
mo dogmático do Direito, como o princípio da supremacia da
Constituição, e a rigidez constitucional, que rege a reforma da Constituição, têm nesta
categoria a sua condição de validade”.
7
7
6
6
A titularidade d
o legítimo poder constituinte pertence, ou ao menos
deveria pertencer, ao povo, que, dentro do sistema vigente hodiernamente, o
delega a representantes especialmente eleitos para exercê
-
lo em seu nome,
donde se conclui que quem acaba exteriorizando
-
o é a d
enominada Assembléia
Nacional Constituinte.
85
Feitas tais considerações introdutórias, mister se faz tecer comentários
acerca do constitucionalismo no Brasil e sua importância diante da promulgação
da atual Constituição Federal. Vejamos a seguir.
A histór
ia do constitucionalismo brasileiro, em regra, demonstra uma certa
prevalência e preferência pela aplicação de textos normativos afetos aos Códigos
àqueles concernentes e ínsitos à própria Lei Maior, no que se refere à solução
dos conflitos de interesses e
ventualmente surgidos e colocados à apreciação do
Poder Judiciário e da Administração Pública de um modo geral.
Isso, a grosso modo, pode ser debitado em desfavor do regime militar
que se instaurou a partir de 1964, pois um de seus escopos foi o de
desman
telar, por completo, as chamadas
ciências humanas
, situação essa
que, apesar de inúmeros esforços, perdura até os dias de hoje em nosso País,
na exata medida em que se percebe que o próprio aluno, não raras vezes,
acaba dando mais relevo a matérias outras,
do que ao aprendizado do direito
constitucional em si.
Mas, mesmo a par de tantas dificuldades, percebe
-
se, ainda que de modo
paulatino, a ocorrência de uma tentativa de mudança em relação a esse
panorama de desprezo constitucional, apresentando
-
se, assi
m, uma reviravolta
dentro da mentalidade jurídica pátria, fenômeno concretizado e catapultado pelas
novas e firmes diretrizes apresentadas pela Constituição de 1988, que, como é
sabido, espraiarm seus basilares efeitos em todos os ramos da Ciência Positiva
85
SIEYÈS, Emmanuel Joseph.
A constituinte burguesa
. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1997, p.
115: “É necessário compreender, antes de tudo, qual é o objetivo ou o fim da Assembléia
representativa de uma nação: não pode ser diferente do que a própria nação se proporia se
pudesse se reunir e deliberar no mesmo lugar”.
7
7
7
7
do Direito, não havendo como dissociar sua imbricação das situações relacionais
do dia
-
a
-
dia, seja em qual área ou matéria tais se apresentarem.
Enfim, o Direito Constitucional
86
ganhou novo fôlego e nova roupagem,
servindo, inegável e realmente, de parâm
etro hierárquico e conformador dos
demais ramos jurídicos existentes.
Desta feita, e utilizando
-
se dos argumentos acima apresentados, verifica
-
se, com solar clareza, que o Direito Constitucional representa a principal vertente
da ordem jurídica de um Esta
do, inserido como tal dentro do Direito Público
(coletividade), desdobrando seus efeitos para a estruturação do Poder, cedendo
-
lhe os contornos de atuação e os limites de sua atividade, valendo ressaltar, nas
precisas palavras de André Ramos Tavares, que tal ramo do Direito tem sido “[...]
desde o final do século XX, o berço natural de positivação dos direitos
humanos”.
87
Irreprochável, assim, sua magnitude e sua importância dentro do seio
social.
Cumpre esclarecer, também, que toda a regulamentação afeta
ao Direito
Constitucional se encontrará positivada, como mencionado no pórtico deste
capítulo, num corpo legislativo denominado
Constituição
.
O termo
constituição
encontra nascedouro no Direito Romano, mais
precisamente da expressão
constitutiones princip
um
, o qual se relacionava,
apenas e tão
-
somente, a meros atos normativos proferidos pelo Imperador e que
ostentavam condição de lei, não guardando, assim, qualquer similitude com a
definição hoje utilizada.
86
MIRANDA,
Jorge.
Teoria do Estado e da Constituição
. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p.
02: “[...] o Direito Constitucional é a parcela da ordem jurídica que rege o próprio Estado
enquanto comunidade e enquanto poder. É o conjunto de normas (disposições e princípios)
que recortam o contexto jurídico correspondente à comunidade política como um todo e aí
situam os indivíduos e os grupos uns em face dos outros e frente ao Estado
-
poder e que, ao
mesmo tempo, definem a titularidade do poder, os modos de formação e manifes
tação da
vontade política, os órgãos de que esta carece e os atos em que se concretiza”.
87
TAVARES, André Ramos.
Curso de direito constitucional
. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 16.
7
7
8
8
Para que se possa ter uma correta visão do modern
o conceito de
constituição, mister se faz revolver ao passado e buscar nas raízes históricas da
Antiguidade, os fecundos ensinamentos proferidos pelo filósofo grego Aristóteles,
que, em sua até hoje festejada obra denominada
A política
, já deixava assentad
a
a existência de leis que tinham por escopo a organização e a formação do próprio
poder, as quais, por evidente, se diferenciavam de outras de natureza comezinha.
Vale lembrar que tão sábio pensamento somente veio a ser reconhecido e
valorizado com o adv
ento do Liberalismo, no século XVIII, mais precisamente pela
Europa Ocidental, cujo fito era delimitar o poder, asseverando a existência de leis
que lhe seriam prístinas e superiores, passando, a partir deste momento, a ser o
termo
constituição
utilizado p
ara designar o primeiro documento jurídico do
Estado,
id est
, o corpo de regras que definia a organização fundamental desse
mesmo Estado, visando garantir os direitos do homem e o desenvolvimento
sustentável da sociedade.
Surgia a primeira polêmica em relação à conceituação do que seria
Constituição e as dificuldades que os operadores do direito teriam para
concatená
-
la de maneira escorreita.
Nesse particular, vale trazer à baila o pensamento do ilustre jurista
Konrad Hesse:
[...] essa questão não pode r
esolver
-
se recorrendo a um conceito
de Constituição consolidado ou, quando menos, majoritariamente
admitido. Pois a teoria atual do Direito Constitucional, por mais
que se encontrem amplas coincidências, não tem chegado a
aclarar o conceito e a qualidade d
a Constituição ao ponto de se
alcançar o consenso de uma opinião dominante. A compreensão,
em cada caso, implícito do Estado e das Constituições atuais e,
com freqüência, algo mais pressuposto do que algo explicitamente
fundamentado.
88
Em sentido amplo, o
vocábulo
constituição
foge totalmente ao campo
jurídico, significando a estrutura particular de qualquer coisa.
88
HESSE, Konrad.
A força normativa da Constituição
. Porto Alegre: Sergio Anto
nio Fabris
Editor, 1991, p. 04.
7
7
9
9
Através da referida conceituação, todo e qualquer ente tem a sua própria
constituição
, podendo ser citado o exemplo do insigne Michel Temer, qua
ndo
menciona a possibilidade de examinar
-
se uma poltrona e descrever a sua
estrutura, o seu ser, indicando
-
se, dessa maneira, os componentes da aludida
peça, os quais, somados, constituem a unidade.
89
A conceituação em sentido material, apesar de com ele m
anter uma certa
relação, ainda refoge ao ordenamento jurídico, pois contempla o universo do ser,
e não do dever
-
ser, do qual o Direito faz parte.
90
Em verdade, reporta
-
se à somatória das variantes políticas, econômicas,
ideológicas, dentre outras, que consubstanciam a realidade social de um
determinado ente Estatal, apresentando a sua peculiar maneira de ser.
Em sentido substancial, já se percebe um maior conteúdo normativo do
termo
constituição
, passando este a representar um conjunto de regras ou
princípios que têm por pálio a fomentação da estrutura do Estado, a organização
dos seus órgãos supremos, bem como a definição de suas respectivas
competências.
Em outras palavras, a palavra
constituição
passa a exalar o odor de
complexo de normas jurídicas fund
amentais, escritas ou não, hábeis a gizar as
vigas mestras de um determinado ordenamento jurídico, estudando
-
se as
relações jurídicas mínimas para a existência de um Estado e, principalmente, para
89
TEMER, Michel.
Elementos de direito constitucional
. 18ª ed. rev. e ampl. São Paulo:
Malheiros, 2002, p. 19.
90
KELSEN, Hans.
Teoria pura do direito
. Tradução de João Baptista Machado. 6. ed. São
Paulo: Martins Fontes, 2000,
p. 06: “’Norma’ é o sentido de um ato através do qual uma
conduta é prescrita, permitida, ou, especialmente, facultada, no sentido de adjudicada à
competência de alguém. Neste ponto importa salientar que a norma, como o sentido
específico de um ato intenc
ional dirigido à conduta de outrem, é qualquer coisa de diferente
do ato de vontade cujo sentido ela constitui. Na verdade, a norma é um dever
-
ser e o ato de
vontade de que ela constituiu o sentido é um ser. Por isso, a situação fática perante a qual
nos e
ncontramos na hipótese de tal ato tem de ser descrita pelo enunciado seguinte: um
indivíduo quer que o outro se conduza de determinada maneira. A primeira parte refere
-
se a
um ser, o ser fático do ato de vontade; a segunda parte refere
-
se a um dever
-
ser, a
uma
norma como sentido do ato. Por isso, não é correto dizer, como muitas vezes se diz, que o
dever de um indivíduo fazer algo nada mais significa senão que um outro indivíduo quer algo
o que equivaleria a dizer que o enunciado de um dever
-
ser se deixa
reconduzir ao
enunciado de um ser”.
8
8
0
0
imantar as garantias e os direitos intrínsecos e inerentes à condição humana dos
componentes que o formam.
O sentido formal traz em seu bojo característica diametralmente oposta
àquela externada pelo substancial, definindo
constituição
como sendo a reunião
de normas legislativas diferentes daquelas de natureza nã
o basilar, em razão de
as primeiras serem confeccionadas diante de um processo legislativo mais
dificultoso, formal, árduo e solene, somando
-
se a tais dificuldades a criação de
um órgão com função especial de elaborá
-
la (Assembléia Constituinte).
O objeti
vo da Constituição formal é apenas e tão
-
somente a existência de
um texto regularmente aprovado pela força soberana do Estado e que lhe confere
a estrutura e declina os direitos fundamentais dos seus cidadãos.
Modernamente, e adotando a conceituação estabelecida por Luiz Alberto
David Araujo e Vidal Serrano Nunes Júnior, pode
-
se definir Constituição como:
[...] a organização sistemática dos elementos constitutivos do
Estado, através da qual se definem a forma e a estrutura deste, o
sistema de governo, a d
ivisão e o funcionamento dos poderes, o
modelo econômico e os direitos, deveres e garantias
fundamentais, sendo que qualquer outra matéria que for agregada
a ela será considerada formalmente constitucional.
91
Como bem se observa em razão das argumentações
até agora
levantadas, tem
-
se que a Constituição não é
e nem poderia ser
uma lei
qualquer, daí porque afirmar
-
se, com toda certeza, que tal jamais poderá ser
revogada, mas apenas alterada, uma vez que, como dito anteriormente, se
apresenta como legislaç
ão hierarquicamente superior: é a lei fundamental,
nuclear e básica de uma sociedade politicamente organizada.
92
91
ARAUJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano.
Curso de direito
constitucional
. 4ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 03.
92
NALINI, José Renato.
Constituição e Estado democrático
. Coordenação Hélio Bicudo. São
Paulo: FTD, 1997, p. 37: “[...] o princípio da supremacia constitucional significa encontrar
-
se a
Constituição no vértice do sistema normativo. Ela é o fundamento de validade de todas as
demais normas, pois estabelece em seu corpo a forma pel
a qual a normatividade
infraconstitucional será produzida. Todas as demais leis e atos normativos são
hierarquicamente inferiores à Constituição. E se com ela incompatíveis, não têm lugar no
sistema jurídico, por não haver possibilidade de coexistência ent
re a Constituição e norma
inconstitucional”.
8
8
1
1
O princípio da supremacia da Constituição é decorrência lógica de sua
própria origem, haja vista que deriva do chamado Poder Constituinte Origin
ário, o
qual apresenta natureza quase absoluta,
93
além de seu inegável caráter de
rigidez, sobrepondo
-
se, assim, em relação às demais espécies normativas
existentes, sendo, portando, de observância obrigatória.
Em prossecução, pode
-
se afirmar que, em razão
do denominado
princípio
da supremacia da Constituição
, definido este como “[...] a particular relação de
superioridade e subordinação em que se encontram as normas dentro de um
ordenamento jurídico determinado”,
94
as normas constitucionais possuem grau
hie
rárquico mais elevado que as demais, sendo, por lógico, o ápice de todo o
conjunto jurídico vigente.
Qualquer regramento normativo criado ao arrepio e à inobservância dos
preceitos basilares ali existentes será inconstitucional e, por via de conseqüência,
alijado do respectivo sistema.
95
No que concerne à importância de explicar a preponderância das normas
constitucionais sobre as demais, é preciso acentuar, também, e nos precisos
dizeres de André Ramos Tavares:
93
MIRANDA, Jorge.
Manual de direito constitucional
: Constituição e inconstitucionalidade. 3ª
ed. rev. Coimbra: Coimbra, 1996. tomo II, p. 86: “Daqui não decorrer, porém, que o poder
constituinte equivalha a poder soberano absoluto e que signifique capacidade de emprestar à
Constituição todo e qualquer conteúdo, sem atender a quaisquer princípios, valores e
condições. Não é um poder soberano absoluto
tal como o povo não dispõe de um poder
absoluto sobre a Consti
tuição
e isso tanto à luz de uma visão jusnaturalista ou na
perspectiva da localização histórica concreta em que se tem de pronunciar o órgão nele
investido
aqui trata ele da legitimidade, conforme José Eduardo Faria. O poder constituinte
está sujeitos
a limites”.
94
SLAIBI FILHO, Nagib.
Ação declaratória de constitucionalidade
. 2ª ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2000, p. 39.
95
NINO, Carlos Santiago.
Fundamentos de derecho constitucional: analisis filosófico,
jurídico y politológico de la práctica constituci
onal
. Buenos Aires: Astrea, 2000, p. 25:
Decir que una norma es válida, en este sentido, quiere decir que la norma debe ser aplicada
y observada, que tiene fuerza obligatoria, que sirve de razón para justificar una acción o
decisión. Veamos, entonces, hasta qué punto la Constitucion concebida como práctica social
de reconocimiento es relevante para fundamentar la validez de las demás normas del sistema
jurídico. Este punto es sumamente importante porque encierra la respuesta más generalizada
entre juristas
, jueces y filósofos acerca de la relevancia de la Constitución para el
razonamiento práctico. Por ejemplo, el juez Marshall en el famoso caso norteamericano
‘Marbury v. Madison’, que estableció el control judicial de constitucionalidad, sostenía que la
Co
nstitución no es sólo la ley suprema sino que sirve también para establecer cuáles otras
leyes son obligatorias para los jueces
”.
8
8
2
2
[...] a disposição hierárquica cumpre a impo
rtante função de
conferir coerência e coesão ao ordenamento estatal. A
Constituição é o patamar último de determinado ordenamento
positivo, com o que a importância em seu cumprimento se exige
com mais intensidade do que aquela normalmente exigida para os
d
emais textos normativos.
96
Está mais do que na hora de o aplicador do Direito fazer valer, no plano
concreto, a inegável superioridade hierárquica da Constituição,
97
de modo que
seus atos, condutas e interpretações estejam, o mais próximo possível, das
dire
trizes encampadas pela República a partir de 05 de outubro de 1988.
98
Passando
-
se, agora, a examinar a aplicabilidade das normas
constitucionais e, mais detalhadamente as condições concretas dessa aplicação,
surgem questionamentos acerca da sua aptidão, po
r si só, para a produção de
todos os efeitos almejados pelo legislador constituinte ou, ao reverso, se para o
alcance do referido desiderato, necessária se faz a regulamentação
infraconstitucional, com capacidade de clarificar e impor seu verdadeiro sentid
o,
circunstância essa que importa, sobremaneira, para o desenvolvimento da
temática proposta neste trabalho.
Em apertada síntese, excetuando
-
se as normas de aplicabilidade direta e
eficácia imediata e aquelas de aplicabilidade plena e eficácia restringíve
l, inegável
se coloca a necessidade de elaboração de uma legislação infraconstitucional
96
TAVARES, 2001, p. 72.
97
FERRARI, Regina Maria Macedo Nery.
Normas constitucionais programáticas
:
normatividade, operatividad
e e efetividade. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 76:
“[...] as normas constitucionais limitam os poderes públicos, que só podem agir como e
quando elas determinam, e mais, disciplinam como e por quem vão ser elaboradas as demais
normas. Esses li
mites que restringem a ação dos poderes estatais garantem o Estado de
Direito, atuando, principalmente, no que diz respeito aos direitos e garantias fundamentais.
Assim, qualquer norma, seja de direito público, seja de direito privado, deve estar adequada
às normas constitucionais e isto no sentido de não poder contrariá
-
las, sob pena de ser
declarada inconstitucional pelo Poder Judiciário”.
98
ZOLLINGER, Márcia.
Proteção processual aos direitos fundamentais
. Salvador: Podivm,
2006, p. 47: “Ressalte
-
se, por
fim, que também na seara procedimental e organizatória da
dimensão jurídico
-
objetiva apresenta
-
se o problema acerca da possibilidade de inferir
-
se
direitos subjetivos individuais a partir dos deveres do Estado de estruturar organizações e
procedimentos par
a a proteção de direitos fundamentais. No que diz respeito ao dever do juiz
de promover uma interpretação e aplicação das normas procedimentais de acordo com a
Constituição e com os direitos fundamentais, não há dificuldades em afirmar uma
correspondente s
ubjetivização que pode ser enfeixada na forma geral de um direito à
proteção jurídica efetiva”.
8
8
3
3
ulterior,
99
a fim de que sejam corretamente regulamentados os mecanismos de
real efetivação e alcance dos demais tipos normativos basilares (normas
constitucionais de ef
icácia limitada ou não bastantes em si).
100
Noutro giro verbal, pode
-
se afirmar que nesta categoria:
[...] incluem
-
se todas as normas que, desde a entrada em vigor da
constituição, produzem todos os seus efeitos essenciais (ou têm
possibilidade de produzi
-
los), todos os objetivos visados pelo
legislador constituinte, porque este criou, desde logo, uma
normatividade para isso suficiente, incidindo direta e
imediatamente sobre a matéria que lhes constitui objeto.
101
Em relação a tais normas, faz
-
se imperioso d
estacar sua eficácia direta e
plena enquanto o legislador ordinário não confeccionar a competente normação
restritiva, seu poder e capacidade de lidar com os interesses contidos em si mesmas.
Outrossim, as normas constitucionais de eficácia contida admite
m, não
quanto à sua aplicabilidade, mas quanto ao cerceamento de sua aplicação e
eficácia, a edição de legislação reguladora ou explicativa. Nas palavras de José
Afonso da Silva, as normas constitucionais de eficácia contida também “[...]
incidem imediatam
ente e produzem (ou podem produzir) todos os efeitos
queridos, mas prevêem meios ou conceitos que permitem manter sua eficácia
contida em certos limites, dadas certas circunstâncias”.
102
Ao contrário daquelas de eficácia contível, a quase totalidade das nor
mas
de eficácia limitada não traz,
de per si
, poder normativo que autorize sua
99
Curso de direito constitucional
. 11ª ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2001, p.
224: “[...] incidem diretamente sobre os interesses a que o consti
tuinte quis dar expressão
normativa. São de aplicabilidade imediata, porque dotadas de todos os meios e elementos
necessários à sua executoriedade. No dizer clássico, são auto
-
aplicáveis. As condições
gerais, para essa aplicabilidade, são a existência apen
as do aparato jurisdicional, o que
significa: aplicam
-
se só pelo fato de serem normas jurídicas, que pressupõem, no caso, a
existência do Estado e de seus órgãos”.
100
SILVA, José Afonso da.
Aplicabilidade das normas constitucionais
. 3ª ed. 3. tirag. São
Pau
lo: Malheiros, 1999, p. 81
-
82: “[...] a eficácia de certas normas constitucionais não se
manifesta na plenitude dos efeitos jurídicos pretendidos pelo constituinte enquanto não se
admitir uma normação jurídica ordinária ou complementar executória, prevista
ou requerida”.
101
Ididem, p. 82.
102
Ibidem, mesma página.
8
8
4
4
aplicação imediata. Por conseguinte, a consecução da referida complementação
capaz de avalizar sua aplicação foi deixada para o legislador ordinário.
Em relação às normas aqui
em apreço, deve
-
se ater àquelas de princípio
institutivo, as quais tiveram a estrutura e atribuições delineadas pelo legislador
constituinte (órgãos, entidades ou institutos), mas que são submetidas ao legislador
infraconstitucional, mediante a edição de lei própria, a estruturação definitiva.
Entrementes, embora se verifique, como visto, a necessidade de que o
legislador infraconstitucional deva proceder à regulamentação de um determinado
direito apresentado pela Constituição, a verdade é que sua omissão acarretará ao
destinatário o seu pleno exercício, como se dá, nos dias atuais, com o direito de
greve do servidor público e a reforma agrária.
Fica patente, assim, que, embora o texto constitucional não tenha feito
referência expressa como o fez a Constit
uição Portuguesa, a verdade é que
nosso sistema jurídico contempla o chamado
direito de resistência
, ou seja, o
cidadão tem o direito de resistir a normas manifestamente incompatíveis com a
Carta Política, bem como tem o direito de resistir em face da omis
são da
concretização de seus paradigmas e de suas diretrizes.
Todavia, já está bastante sedimentada a assertiva de que toda e qualquer
norma constitucional é dotada de eficácia, pois, não seria lógico, do ponto de vista
jurídico, que a Lei Suprema de uma sociedade politicamente organizada
contivesse regramentos e princípios não dotados de juridicidade, circunstância
essa que leva à conclusão de que até mesmo as chamadas normas
constitucionais programáticas
não obstante na maioria das vezes apenas
indicarem um esquema de atuação para os órgãos públicos existentes
possuem
caráter preceptivo como quaisquer outras.
103
103
CANOTILHO, 1999, p. 1.162: “[...] existem, é certo, normas
-
fim, normas
-
tarefa, normas
-
programa que impõem uma actividade e dirigem materialmente a concretização
constitucional. O sentido destas nor
mas não é, porém, o assinalado pela doutrina tradicional:
simples programas, exortações morais, declarações, sentenças políticas, aforismos políticos,
promessas, apelos ao legislador, programas futuros, juridicamente desprovidos de qualquer
vinculatividade
. Às normas programáticas é reconhecido hoje um valor jurídico
constitucionalmente idêntico ao dos restantes preceitos da constituição”.
8
8
5
5
Assim, no que diz respeito às normas programáticas oriundas da
Constituição, sua importância e relevância repousam na indicação do caminho a
se
r seguido e de que forma pretende
-
se atingi
-
lo, voltando
-
se para a ordem
jurídico
-
política nacional e, em especial, a justiça social, situação essa que não
lhe retira o caráter imperativo e obrigatório de suas observâncias.
104
Nesse diapasão, e ao comentar
a questão atinente à problemática da
eficácia das normas constitucionais programáticas, Luís Roberto Barroso
pondera:
De regra, como qualquer outra norma, elas contêm um
mandamento, uma prescrição, uma ordem, com força jurídica e
não apenas moral. Logo, a
sua não observância há de deflagrar
um mecanismo próprio de coação, de cumprimento forçado, apto
a garantir
-
lhe a imperatividade, inclusive pelo estabelecimento das
conseqüências da insubmissão ao seu comando. As disposições
constitucionais não são apenas
normas jurídicas, como têm um
caráter hierarquicamente superior, não obstante a paradoxal
equivocidade que longamente campeou nesta matéria,
considerando
-
se prescrições desprovidas de sanção, mero ideário
jurídico.
105
Percebe
-
se, para logo, que as normas constitucionais de eficácia limitada
ou reduzida são as que: “[...] não produzem, com a simples entrada em vigor,
todos os seus efeitos essenciais, porque o legislador constituinte, por qualquer
motivo, não estabeleceu, sobre a matéria, uma normatividade para isso bastante,
deixando essa tarefa ao legislador ordinário ou a outro órgão do Estado”.
106
104
FERRARI, 2001, p. 188: “Quando se fala em normas que impõe fins, tarefas, programas, que
impõem uma atividade, tais n
ormas vinculam positivamente a todos os órgãos do Poder
Público, tanto o Legislativo como o Executivo e o Judiciário, que devem considerá
-
las como
‘diretivas materiais permanentes’, representando um limite positivo e negativo de atuação o
que pode dar ense
jo à caracterização de uma inconstitucionalidade, em relação aos atos que
as contrariem, mas é importante registrar que a consagração dos direitos sociais crias
barreiras defensivas do indivíduo perante a dominação econômica de outros indivíduos.
Assim, en
quanto os direitos individuais ‘interditam ao Estado o amesquinhamento do corpo
social que deprimam economicamente ou que releguem ao abandono indivíduos menos
favorecidos pela fortuna’. O Estado, nessa nova realidade, de simples árbitro da paz, da
ordem e
da segurança, passa a buscar o bem
-
estar coletivo dentro de uma nova visão de
Estado, mediante a estatuição do salário mínimo, do direito de greve, da repressão do abuso
do poder econômico, da previdência social e onde a propriedade privada, a livre iniciativa, a
ação econômica dos empreendedores passam a ter que observar um objetivo comum”.
105
BARROSO, Luís Roberto.
O direito constitucional e a efetividade de suas normas
: limites
e possibilidades da Constituição brasileira. Rio de Janeiro: Renovar, 1990, p
. 72.
106
SILVA, 1999, p. 82
-
83.
8
8
6
6
Em continuidade,
é consabido que a norma jurídica
107
é o imperativo
autorizante de conteúdo sancionatório, possuindo as seguintes características:
utilidade, brevida
de, clareza, precisão, honestidade, justiça e possibilidade.
A natureza jurídica da norma advém da autoridade competente para a sua
edição, desde que regular e integralmente obedecidos os trâmites legislativos
necessários para a sua constitucionalidade e
legalidade.
A finalidade da norma jurídica é atingir a ordenação social, baseando
-
se,
para tanto, nas diretrizes constitucionais relativas à dignidade humana, à
solidariedade social, à erradicação da pobreza, dentre outras.
Todavia, é sabido que não bast
a apenas a edição de normas jurídicas
para que toda a sorte de conflitos sociais seja resolvida.
Existem ocasiões em que o juiz não encontra, na legislação escrita,
norma jurídica correspondente ao problema concreto que lhe foi submetido, e,
mesmo assim,
não poderá deixar de resolver o conflito de interesses colocado em
suas mãos, devendo, então, utilizar
-
se do quanto positivado no Art. 4º da LICC:
“Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os
costumes e os princípios gerais
do direito” e no Art. 126 do CPC: “O juiz não se
exime de sentenciar ou de despachar alegando lacuna ou obscuridade da lei. No
julgamento da lide caber
-
lhe
-
á aplicar as normas legais; não as havendo,
recorrerá à analogia, aos costumes e aos princípios ger
ais do direito”.
A omissão mencionada no artigo de regência, em verdade, significa que a
lei, fruto do pensamento e da atividade humanas, poderá apresentar alguma
lacuna, alguma imperfeição, situação, aliás, inevitável em qualquer ordenamento
jurídico, po
is, não há como o legislador, por mais competente e dedicado que
107
Cf. MUSSO, Enrico Spagna. Diritto costituzionale
. Roma: LTEE, 2005, p. 37: “
In realtà, per
tale metodo, la norma risulta quale un iceberg del quale per valutare esattamente la parte
emergente occorre necessariamente analizzare anche la parte sottostante; e, pertanto, in via
d’integrazione rispetto ai canoni tradizionali, l’interpretazione deve riguardare non il solo
disposto normativo emergente ed i suoi legami «orizzontalli» com l’ordinamento giuridico di
cui fa parte, ma l
’intero dato sociale di cui la norma stessa è espressione
”.
8
8
7
7
seja, prever todas as hipóteses referentes às relações entre as pessoas, entre os
indivíduos e, conseqüentemente, aos conflitos de interesses que de tais podem
advir.
No silêncio, na omissão
, deve o juiz, como já dito, valer
-
se dos
mecanismos oferecidos pelo referido Art. 4º da LICC e, também, pelo Art. 126 da
lei de ritos civis.
Navegando
-
se nessas águas, o juiz, sempre que possível, tenta adequar
uma norma geral e abstrata a um caso especí
fico e concreto, sendo certo que,
dentro de um silogismo, a norma funciona como premissa maior e a hipótese
sub
judice
, como premissa menor, decorrendo da conjugação de tais fatores,
inevitavelmente, uma solução.
Assim, se a regra prescreve que alcança a
maioridade civil aquele que
completa 18 (dezoito) anos, e, no caso concreto, demonstra
-
se que o autor da
ação já atingiu referido lapso temporal, a conclusão que nasce é a de que ele é
maior de idade, podendo realizar todos os atos concernentes a esse fato
r.
Entrementes, existem situações em que a norma jurídica não possui a
clareza necessária, trazendo, inclusive, expressões de difícil conceituação ou de
natureza muito ampla e de caráter inegavelmente subjetivo, tais como:
bem
comum
,
negligência
,
boa
-
,
preceito fundamental
,
dignidade
, etc., sendo
imprescindível a busca do conteúdo exato do texto legal pelo intérprete, a fim de
que não haja prejuízo na concretização e na aplicação de um determinado direito
previsto e albergado no texto constitucional.
Na
s referidas circunstâncias, necessário se faz um esforço maior do
intérprete do direito, devendo ele realizar operações que visem imprimir um
conteúdo lógico para a aplicação do direito posto. Tais operações fazem parte
daquilo que se convencionou denomina
r de interpretação.
De acordo com a definição apresentada pelo Minidicionário Houaiss, tem
-
se que o ato de interpretação diz respeito à determinação do significado de algo,
8
8
8
8
determinação esta exarada a partir de um ponto de vista ou um entendimento ou
julg
amento pessoal.
108
Todavia, no âmbito jurídico, o vocábulo, segundo Pedro Nunes, assume
aspecto mais científico e apurado, representando o método pelo qual o
hermeneuta (intérprete) procura apreender o pensamento do legislador, expresso
na norma
sub examine
, e, em seguida, explica a sua verdadeira inteligência, o
seu justo e conveniente sentido técnico
-
jurídico.
109
O texto constitucional não foge dessa imperiosa necessidade
interpretativa.
Registre
-
se a advertência de Jorge Miranda:
[...] há sempre que inte
rpretar a Constituição como há sempre que
interpretar a lei. Só através dessa tarefa se passa da leitura política,
ideológica ou simplesmente empírica para a leitura jurídica do texto
constitucional, seja ele qual for. Só através dela, a partir da letra, m
as
sem se parar na letra, se encontra a norma ou o sentido da norma.
Não é possível a aplicação sem interpretação, tal como esta só faz
pleno sentido posta ao serviço da aplicação.
110
A interpretação das normas da Constituição exige do operador do Direito
u
ma sensibilidade capaz de levá
-
lo à essência dos dogmas e compreender as
disposições fundamentais contidas em seu bojo, atentando para o próprio sentido
que o constituinte atribuiu às palavras do Texto Maior, sem deixar de lado as
condições sociais, econôm
icas e políticas existentes no momento em que se
pretende chegar ao sentido dos preceitos supremos, buscando, ao final, sua
aplicação ao caso concreto, a fim de que, com efetividade, seja solucionada,
satisfatoriamente, a controvérsia outrora surgida.
Par
a a corrente interpretativista, os juízes, ao procederem à interpretação
da Constituição, devem limitá
-
la à captação do sentido dos preceitos e dogmas
108
Cf. p. 255, notas 1, 1.1 e 2.
109
NUNES, Pedro.
Dicionário de tecnologia jurídica
. São Paulo: Forense, 2001, tomo II, p.
743.
110
MIRANDA, 2002, p. 448.
8
8
9
9
nela inseridos, ou, quando muito, naqueles claramente implícitos, uma vez que
ela se assenta no postulado do princípio democrático, através do qual tem
-
se que
a decisão judicial não pode e não deve substituir a decisão político
-
legislativa da
maioria democrática.
111
No que se refere à chamada interpretação literal, tem
-
se:
[...] essa teoria propõe que aos ter
mos de uma lei se atribua aquilo
que melhor chamaríamos de seu significado contextual, isto é, só
significado que lhes atribuiríamos se não dispuséssemos de
nenhuma informação especial sobre o contexto de seu uso ou as
intenções do autor.
112
Já, quanto à no
minada interpretação sistemática, verifica
-
se a
necessidade de um modelo de interpretação operativa dentro do contexto
funcional do direito que proporciona, também, fatores relevantes sobre a
aplicação de regras.
Por fim, no que diz respeito à interpretaç
ão histórica, levam
-
se em conta
os momentos que antecederam e forjaram a criação de um determinado modelo
jurídico ou de um determinado texto normativo.
Apesar de a questão relativa ao denominado
método justo de
interpretação
ser uma das mais controvertid
as e espinhosas dentro do
juspublicismo, tem
-
se que, nos dias de hoje, a interpretação das normas
constitucionais caracteriza
-
se como um conjunto de métodos desenvolvidos pela
doutrina e pela jurisprudência com fulcro em critérios ou premissas diferentes,
mas, geralmente, que se complementam.
113
111
Cf. PASSOS, José Joaquim Calmon de.
Direito
, poder, justiça e processo
: julgando os que
nos julgam. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 71: “Enunciar o Direito democraticamente
reclama o prévio de sua produção mediante um processo (legislativo) democraticamente
estruturado, o que exige organização política (democraticamente) adequada. Aplicar o Direito,
por seu turno, impõe não só a organização política (democrática) adequada da função
jurisdicional, mas igualmente o processo jurisdicional (democrático) adequado”.
112
DWORKIN, Ronald.
O império do direi
to
. São Paulo: Martins Fontes, 1999, p. 22.
113
Sob esse aspecto, importante a demonstração alcançada na monografia elaborada por
Soraya Regina Gasparetto Lunardi, intitulada
A interpretação legislativa e o mito da
neutralidade na jurisprudência
, no sentido
de que o STF, ao proferir voto nos autos de
processo que analisava a competência para o processo e julgamento de queixa
-
crime contra
Ministro de Estado que, tendo deixado o cargo, se tornou Governador de Estado
-
membro, se
valeu, ao mesmo tempo, de vários métodos interpretativos, o que caracteriza a dificuldade de
adoção de modelo único para a solução de conflitos.
9
9
0
0
Todavia, não há como se esquivar de importante mecanismo
hermenêutico, denominado de
interpretação conforme a Constituição
, o qual
acaba se constituindo num instrumento de fundamental relevância para a
constitucionali
zação dos textos normativos infraconstitucionais.
114
De acordo com o referido princípio, percebe
-
se que o intérprete, ao
deparar
-
se com normas de caráter polissêmico, deverá priorizar interpretação que
outorgue sentido à norma, em conformidade com os princí
pios e as regras
emanadas de uma determinada Constituição.
Sobre o chamado método de interpretação conforme a Constituição,
115
interessante trazer à baila a esclarecedora manifestação do constitucionalista
gaúcho Paulo Bonavides, para quem:
A aplicação des
se método parte, por conseguinte, da presunção de
que toda lei é constitucional, adotando
-
se ao mesmo passo o princípio
de que em caso de dúvida a lei será interpretada ‘conforme a
Constituição’. Deriva outrossim do emprego de tal método a
consideração de
que não se deve interpretar isoladamente uma norma
constitucional, bem como decisões fundamentais do constituinte, que
não podem ficar ignorados, cumprindo levá
-
los na devida conta por
ensejo da operação interpretativa, de modo a fazer a regra que se vai
i
nterpretar adequada a esses princípios ou decisões. Daqui resulta
que o intérprete não perderá de vista o fato de que a Constituição
representa um todo ou uma unidade e, mais do que isso, um sistema
de valor.
116
Justifica
-
se a interpretação conforme a Const
ituição pela inegável e
precípua necessidade de implantação da justiça constitucional por intermédio da
Lex Legum
,
117
servindo, inclusive, para preencher eventuais lacunas que existam
114
STRECK, Lenio Luiz.
Jurisdição constitucional e hermenêutica
. 2ª ed. rev. e ampl. Rio de
Janeiro: Forense, 2005, p. 573.
115
Impende ressaltar qu
e o tema em questão já foi objeto de apreciação pelo Supremo Tribunal
Federal quando do julgamento da Representação nº 1.417
-
7/DF.
116
BONAVIDES, Paulo.
Curso de direito constitucional
. 11ª ed. rev. atual. e ampl. São Paulo:
Malheiros, 2001, p. 474.
117
KELSEN
, Hans.
Jurisdição constitucional
. Tradução de Sérgio Sérvulo da Cunha. São
Paulo: Martins Fontes da Justiça, 1998, p. 123
-
124: “A garantia jurisdicional da Constituição
a jurisdição constitucional
é um elemento do sistema de medidas técnicas que têm por fim
garantir o exercício regular das funções estatais. Essas funções também têm um caráter
jurídico: elas consistem em atos jurídicos. São atos de criação do direito, isto é, de normas
jurídicas, ou atos de execução do direito criado, isto é, de normas jurídicas já estabelecidas.
Por conseguinte, costumam
-
se distinguir as funções estatais em legislação e execução, que
se opõem assim como a criação ou a produção do direito considerado como simples
reprodução”.
9
9
1
1
no ordenamento jurídico,
118
cuja caracterização pode dar
-
se pela analogia, p
ela
redução ou, ainda, por derivação das premissas normativas constantes da própria
Constituição.
119
Em suma, e como decorrência da presunção de constitucionalidade dos
atos legislativos, havendo possibilidade de múltiplas interpretações de um
determinado d
ispositivo, deve
-
se escolher aquela que mantenha harmonia com a
Carta Magna, ainda que não seja a que com mais evidência resulte da leitura do
texto.
O princípio da interpretação conforme tem como desdobramento,
além da eleição de uma linha interpretativa
, a exclusão expressa de outras
possíveis que conduzam a resultado antagônico àquele estampado na
Constituição.
Inocêncio Mártires Coelho, com a propriedade que lhe é peculiar,
assevera que a interpretação conforme:
[...] ao recomendar
nisso se resume
o princípio
que os
aplicadores da constituição, em face de normas
infraconstitucionais de múltiplos significados, escolham o sentido
que as torne constitucionais e não aquele que resulte na sua
declaração de inconstitucionalidade, esse cânone interpretat
ivo ao
mesmo tempo que valoriza o trabalho interpretativo, aproveitando
ou conservando as leis, previne o surgimento de conflitos, que se
tornariam crescentemente perigosos caso os juízes, sem o devido
cuidado, se pudessem invalidar os atos legislativos.
120
118
TREMPS, Pablo Perez,
La justicia constituci
onal en la actualidad: especial referencia a
América Latina
.
In:
Revista brasileira de direito constitucional
, vol 01.
Madri: DTC, jan./jun.
2003, p. 31: “
Como es sabido, la justicia constitucional, en especial en su diseño kelseniano,
surge ante una situa
ción de crisis de la idea de constitución, como un mecanismo más para
afianzar y garantizar los principios y valores constitucionales, y muy significativamente los
derechos fundamentales
”.
119
MENDES, Gilmar Ferreira.
Direitos fundamentais e controle de cons
titucionalidade
. 3ª
ed. rev. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 275: “[...] ainda que se não possa negar a
semelhança dessas categorias e a proximidade do resultado prático de sua utilização, é certo
que, enquanto, na interpretação conforme a Constituiçã
o, se tem, dogmaticamente, a
declaração de que uma lei é constitucional com a interpretação que lhe é conferida pelo órgão
judicial, constata
-
se, na declaração de nulidade sem redução de texto, a expressa exclusão,
por inconstitucionalidade, de determinada
s hipóteses de aplicação (
Anwendungsfälle
) do
programa normativo sem que se produza alteração expressa do texto legal”.
120
COELHO, Inocêncio Mártires.
Interpretação constitucional
. 2ª ed. ver. e aum. Porto Alegre:
Sergio Antonio Fabris Editor, 2003, p. 137
-
138.
9
9
2
2
Fica nítida, assim, dentro de certos limites, a importância de o operador
do Direito valer
-
se do princípio da interpretação conforme a Constituição, quando
da análise de textos infraconstitucionais, no afã de que seja mantida a coesão e a
unidade do siste
ma, fomentando
-
se, cada vez mais, a segurança jurídica que
deve nortear as soluções de conflitos envolvendo os jurisdicionados e, por via
reflexa, todos os cidadãos.
Valendo
-
se do quanto exposto nos parágrafos antecedentes e
transportando a temática para
o objeto de estudo deste trabalho, não se pode
afastar a assertiva de que é preciso repensar o Direito Civil à luz inexorável e
indelével dos ditames basilares impostos pelo constituinte de 1988, sob pena de,
em assim não agindo, estar
-
se, injustamente, di
vorciando
-
se dos novos valores
sociais e relegando o ser humano, a pessoa, a um segundo e desprezível plano, o
que se cumpre a todo custo evitar.
121
-
122
Nesse sentido, como conclusão exposta em palestra realizada no VI
Simpósio Nacional de Direito Constitucio
nal realizado em Curitiba no ano de
2004, Fachin salienta com o brilhantismo de sempre:
[...] da morte por asfixia se salvou o Direito Civil contemporâneo
ao abrir
-
se para além do neo
-
exegese. Do Direito formal chegou
-
se à legalidade constitucional. Nada
obstante, de modo diferente
dos civilistas tradicionais, o Direito Civil brasileiro contemporâneo
tomou como norma vinculante os princípios constitucionais. Foi à
fonte do novo constitucionalismo. O inverso também impende ser
verdadeiro, para evitar que o Código Civil seja citado como
sinônimo de Direito Civil, ou para os menos avisados que tomam o
121
Ibidem,
p. 46: “Dada a supremacia da Constituição, deve
-
se dizer, desde logo, que o novo
Código Civil há de ser aplicado à luz das regras e princípios da lei maior, rejeitando
-
se o que
nele se mostrar incompatível com as normas constitucionais ou nã
o comportar leituras de
adequação, no amplo espectro do que, modernamente, tem sido entendido como
interpretação conformadora. Noutras palavras, atentos às velhas regras de bom aviso
preceitos que traduzem o senso comum dos juristas no âmbito do controle
de
constitucionalidade
devem os nossos operadores jurídicos partir da idéia de que esse
Código, no todo, como em suas partes, não agride nem pretendeu agredir a Constituição; em
caso de dúvida, decidir pela constitucionalidade de seus preceitos; e, afin
al, tendo de
escolher entre distintas interpretações, optar por aquela que além de se mostrar compatível
com a Constituição, realize melhor ou mais intensamente as decisões do legislador
constitucional”.
122
Ibidem, p. 54: “[...] não se pode, pois, entender
o Direito Civil
em suas vigas fundamentais: o
contrato, a propriedade e a família
sem o necessário suporte lógico do Direito
Constitucional. Um se prende ao outro como corpo e alma [...]”.
9
9
3
3
pretérito como presente, e ao fazerem caricatura do passado
estão se projetando no objeto do que perdeu sentido. É preciso ir
mais longe. Navegar outros mares e
captar o ‘direito vivente’,
evitando construir o futuro com a sombra do que passou.
123
Em resumo, escorreita a lição propagada por Paulo Luiz Netto Lobo:
[...] na atualidade, não se cuida de buscar a demarcação dos
espaços distintos e até contrapostos. An
tes havia a disjunção;
hoje, a unidade hermenêutica, tendo a Constituição como ápice
conformador da elaboração e aplicação da legislação civil. A
mudança de atitude é substancial: deve o jurista interpretar o
Código Civil segundo a Constituição e não a Con
stituição,
segundo o Código, como ocorria com freqüência (e ainda
ocorre).
124
Vale deixar registrado, por oportuno, que o Supremo Tribunal Federal,
quando do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.324
-
7/DF,
reconheceu, por unanimidade, que no pedido contido no bojo de ação que visa o
controle abstrato de constitucionalidade pode ser formulado exigência no sentido
de que determinado dispositivo de lei infraconstitucional venha a,
obrigatoriamente, sofrer interpretação conforme.
3.2
Princípi
os Constitucionais Aplicáveis ao Direito de Família
Princípios constitucionais são os valores da sociedade em um
determinado momento e contexto, transpostos para o texto maior, revelando,
por conseguinte, as decisões políticas fundamentais com forte carg
a
ideológica.
Nesse particular, é inconcebível a existência de princípios neutros.
123
Palestra de Luiz Edson Fachin no VI Simpósio Nacional de Dire
ito Constitucional. O texto
reproduz em síntese as idéias expostas no 9ª Conferência do VI Simpósio Nacional de Direito
Constitucional, promovido pela Academia Brasileira de Direito Constitucional. Curitiba, 04 à
07/10/2004. Foi mantida a estrutura da expo
sição oral, sem adaptação às fontes e a outros
recursos mais afetos à sistematização escrita, conforme explica nota de rodapé inserta no
site
<
http://200.160.20.172/revista_on_line/artigo%2022.pdf>. Acesso em: 13 fev. 2007.
124
Disponível em: <
http://jus2.uo
l.com.br/doutrina/texto.asp?id=507>. Acesso em: 19 fev. 2007.
9
9
4
4
Em outras palavras, a ideologia deve espelhar a realidade social
vivenciada pela população que, como adrede mencionado, irá caracterizar e
enriquecer os princípios.
Incont
roverso se apresenta que os princípios constitucionais funcionam como
verdadeiras e indispensáveis diretrizes do sistema jurídico, conferindo-
lhe, portanto, estrutura e
coesão, até porque, como bem deixou assentado de há muito Vicente Ráo, sua ignorância
[...] quando não induz a erro, leva à criação de rábulas em lugar de juristas”.
125
Pela importância que lhe cabe, vale rememorar, nesta oportunidade, a
profícua lição propagada por Celso Antônio Bandeira de Mello:
[...] violar um princípio é muito mais gra
ve que transgredir uma
norma qualquer. A desatenção ao princípio implica ofensa não
apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o
sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou de
inconstitucionalidade, conforme o escalão do prin
cípio atingido,
porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão
de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu
arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra. Isto porque,
com ofendê
-
lo, abatem
-
se as vigas que o sustêm e al
ui
-
se toda a
estrutura neles esforçada.
126
Antes de propriamente iniciar o estudo dos princípios constitucionais afetos ao
Direito de Família, é preciso que seja sucintamente demonstrado o árduo caminho
evolutivo decorrido desde seus primórdios como meros a
xiomas jurídicos até serem
considerados elementos que: “[...] encabeçam o sistema, guiam e fundamentam todas
as demais normas que a ordem jurídica institui e, finalmente, tendem a exercitar
aquela função axiológica em novos conceitos de sua relevância”.
127
A primeira teoria sobre a existência ou não de juridicidade em relação aos
princípios foi formulada pelos chamados jusnaturalistas, segundo a qual aqueles seriam
simples ideais inspiradores de justiça, servindo mais como conselhos do que como
125
RAÓ, Vicente.
O direito e a vida dos direitos
. 5ª ed. anotada e atualizada por Ovídio Rocha
Barros Sandoval. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 48.
126
MELLO, Celso Antônio Bandeira de.
Curso de direito administrativo
. 9ª ed. rev. atual. e
ampl. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 772.
127
BONAVIDES, 2001, p. 263.
9
9
5
5
normas impera
tivas e eficazes. Não se pode olvidar, ainda, que tal relutância se baseou,
para alguns, na questão relativa à amplitude de seu conteúdo e na ausência de sanção.
Em outras palavras, “[...] eram os princípios qualificados como meras
exortações, preceitos de ordem moral ou política, mas não verdadeiros comandos
de Direito”.
128
Em um segundo momento, na fase juspositivista, os princípios passaram
à condição de fonte normativa subsidiária da lei, somente sendo utilizados em
casos de omissão ou lacuna, num verda
deiro papel de elemento integrador do
sistema jurídico e tendo presença constante na legislação codificada.
Entretanto, considerar o princípio apenas como um derivado e subsidiário
da lei
situação esta registrada de maneira expressa no Art. 4º da Lei de
Introdução ao Código Civil, o qual trata da questão relativa à integração das
normas jurídicas
acabou tornando precária sua força normativa, pois, como já
dito, sua vazão somente ocorria diante da ausência de outro meio legal para o
deslinde de uma determinada controvérsia, ou, nos dizeres de Paulo Bonavides,
“[...] o juspositivismo, ao fazer dos princípios na ordem constitucional meras
pautas programáticas supralegais, tem assinalado, via de regra, a sua carência de
normatividade, estabelecendo, portant
o, a sua irrelevância jurídica”.
129
A terceira e última fase, conhecida como pós
-
positivismo e inaugurada
nas últimas décadas do século passado, operou o passamento dos princípios da
alçada
jusprivativa
(códigos) para a seara
juspública
, os quais tomaram as
sento
nos mais diversos textos constitucionais e foram reconhecidos como espécie do
gênero norma, situação esta que lhes conferiu o papel de viga
-
mestra necessária
e responsável pela formação e pelo atingimento da finalidade do próprio
ordenamento.
De fat
o:
128
ROTHENBURG, Walter Claudius.
Princípios constitucionais
. 2ª tirag. (com acréscimo)
Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2003
, p. 13.
129
BONAVIDES, 2001, p. 236.
9
9
6
6
[...] é na idade do pós
-
positivismo que tanto a doutrina do Direito
Natural com a do velho positivismo ortodoxo vêm abaixo, sofrendo
golpes profundos e crítica lacerante, provenientes de uma reação
intelectual implacável, capitaneada sobretudo por Dwork
in, jurista
de Harvard. Sua obra tem valiosamente contribuído para traçar e
caracterizar o ângulo novo de normatividade definitiva
reconhecida aos princípios.
130
Nessa esteira de silogismo, os princípios constitucionais são aqueles
fundamentais do Estado de
Direito,
131
agora alçapremados à categoria superior
do ordenamento jurídico, merecendo especial destaque em decorrência da
presença cada vez maior de constituições rígidas.
Noutro giro verbal, temos que: “[...] as novas Constituições promulgadas
acentuam a
hegemonia axiológica dos princípios, convertidos em pedestal
normativo sobre o qual assenta todo o edifício jurídico dos novos sistemas
constitucionais”.
132
Por derradeiro, também deve
-
se deitar especial atenção à escorreita
orientação expendida pelo feste
jado constitucionalista Eros Roberto Grau, segundo:
[...] a importância dos princípios ‘positivados’ ou positivos
abandono, como se vê, o uso da expressão ‘princípios jurídicos
que constituem regras jurídicas’
e dos princípios gerais do direito
é extr
ema. Tamanha que, da inserção deles no nível
constitucional resulta, nitidamente, a ordenação dos preceitos
constitucionais segundo uma estrutura hierarquizada. Isso, no
sentido de que a interpretação das regras contempladas na
Constituição é determinada p
elos princípios.
133
Nesse mesmo diapasão, sintetiza, por sua vez, o não menos ilustre Celso
Bastos: “[...] os princípios constitucionais são metas que podem e devem entrar a
qualquer momento no discurso legitimador do Direito”.
134
130
Ibidem, p. 237.
131
ROCHA, Carmem Lúcia Antunes.
Princípios constitucionais da administração pública
.
Belo Horizonte: Del Rey, 1994, p. 28.
132
BONAVIDES, 2001, p. 237.
133
GRAU, Eros Roberto.
A ordem econômica na Constitui
ção de 1988
: interpretação e crítica.
5ª ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 80.
134
BASTOS, Celso.
Hermenêutica e interpretação constitucional
. São Paulo: Celso Bastos
Editor, 1997, p. 136.
9
9
7
7
Conforme destacado anteriorm
ente, os princípios possuem, assim
como as regras, inegável força normativa, diferenciando
-
se destas últimas,
dentre outros, pelo alto grau de generalidade, pela natureza, pela
formalidade, pela incidência, pela função e pela diferenciação global. Nesse
se
ntido, importante, também, conferir o pensamento de Willis Santiago
Guerra Filho.
135
Realmente:
[...] tanto as regras como os princípios são normas porque ambos
dizem o que deve ser. Ambos podem ser formulados com a ajuda
das expressões deônticas básicas d
o mandamento, da permissão
e da proibição. Os princípios, tal como as regras, são razões de
um tipo muito diferente. A distinção entre regras e princípios é,
pois, uma distinção entre dois tipos de normas.
136
Para o mestre luso Canotilho,
137
a classificação d
os princípios se
espraia nas seguintes espécies ou categorias, a saber:
princípios jurídicos
fundamentais
, aqueles que antes de serem princípios específicos do Direito
Constitucional, princípios gerais de Direito;
princípios constitucionais
impositivos
, aq
ueles que, como a própria nomenclatura explicita, impõem ao
Estado, em destaque ao legislador, a efetivação de fins e a consecução de
tarefas; e,
princípios
-
garantia
, aqueles mais específicos e com maior poder
135
GUERRA FILHO, Willis Santiago.
Processo constitucional e direitos
fundamentais
. 2ª ed.
rev. e ampl. São Paulo: Celso Bastos Editor, 2001, p. 55: “Uma constatação que se faz
absolutamente necessária, no que toca a natureza diversa de regras e princípios, dá
-
se
quando ocorre um choque entre suas disposições. Assim, caso sejam duas regras que dispõe
diferentemente sobre uma mesma situação ocorre um excesso normativo, uma antinomia
jurídica, que deve ser afastada com base em critérios que, em geral, são fornecidos pelo
próprio ordenamento jurídico, para que se mantenha sua un
idade e coerência. Essa, aliás,
são exigências que se pode fazer decorrer da própria isonomia, com seu imperativo de que
se regule igualmente situações idênticas. Já com os princípios tudo se passa de modo
diferente, pois eles, na medida em que não disciplinam nenhuma situação jurídica específica,
considerados da forma abstrata como se apresentam para nós, no texto constitucional, não
entram em choque diretamente, são compatíveis (ou ‘compatibilizáveis’) uns com os outros.
Contudo, ao procurarmos solucionar
um caso, logo se percebe que esses princípios se
acham em um estado de tensão conflitiva, ou mesmo, em rota de colisão. A decisão tomada,
em tais casos, sempre irá privilegiar um (ou alguns) dos princípios, em detrimento de outro
(s), embora todos eles se
mantenham íntegros em sua validade e apenas diminuídos
circunstancial e pontualmente, em sua eficácia”.
136
ALEXY, Robert.
Teoria de los derechos fundamentales
. Madri: Centro de Estúdios
Constitucionales, 1993, p. 525.
137
CANOTILHO, 1999, p. 1.122.
9
9
8
8
normativo, situação essa que chega a aproximá
-
los das regras, exemplo: o da
inocência, o do juiz natural, etc.
138
Os princípios constitucionais devem ser interpretados conforme a concepção
sistêmica do ordenamento jurídico em que inseridos, de maneira concatenada,
enquanto mandamentos nucleares, ordena
ndo
-
se sistematicamente, a fim de que
sejam devidamente estabelecidas as operações de concordância prática entre eles.
Essas breves considerações são de suma importância para a conclusão a
que se pretende chegar com a elaboração do presente trabalho.
3.
2.1
Princípio da proteção da dignidade humana
Neste momento, a fim de se dar início à abordagem do tema a ser
desenvolvido neste subitem, mister se faz volver à origem histórica do princípio
constitucional que diz respeito à dignidade humana, e, para tan
to, passa
-
se a
discorrer acerca dos conceitos de dignidade e de pessoa.
O primeiro termo tem seu nascedouro no antigo vocábulo latino
dignitas
,
significando, dentre outros, respeitabilidade, consideração, estima. Já aqueloutro,
também de origem latina, ad
vém da expressão
per
-
sonare
, referente às máscaras
teatrais utilizadas para a difusão da voz dos atores, passando, ao depois, a servir
a designação da própria personagem representada.
139
138
BARROSO
, Luís Roberto.
Interpretação e aplicação da Constituição
: fundamentos de uma
dogmática constitucional transformadora. São Paulo: Saraiva, 1996, passim. Luís Roberto
Barroso, atentando
-
se para o grau de importância e sua respectiva abrangência, diferenciou
os princípios constitucionais da seguinte maneira:
princípios fundamentais
, são aqueles
atinentes a estrutura do Estado, ex.: o princípio republicano, o do Estado democrático de
direito, o presidencialista etc; princípios constitucionais gerais
, são aquel
es onde denota
-
se
equivalência com os princípios
-
garantia tratados por Canotilho, ex.: o da legalidade, o da
isonomia, o do juiz natural etc;
princípios setoriais ou especiais
, são aqueles que formam um
conjunto determinado e restrito a certo tema, capítulo ou título da Constituição, podendo ser
um delineamento dos princípios gerais
ex.: legalidade tributária ou legalidade penal
, ou,
são autônomos, relativos à Administração pública (exemplo: o da legalidade administrativa, o
da moralidade etc), relativo
s à organização dos Poderes (ex.: o da publicidade e da
motivação das decisões judiciais e administrativas, o da subordinação das Forças Armadas
ao poder civil etc), dentre outros.
139
ALVES, Cleber Francisco.
O princípio constitucional da dignidade da pesso
a humana
: o
enfoque da doutrina social da Igreja. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 109
-
111.
9
9
9
9
Assim, e mantendo nosso pensamento no tempo pretérito, tem
-
se que a
con
ceituação de dignidade e de pessoa, tais como aquelas conhecidas hodiernamente,
não se faziam presentes, sendo certo que para a filosofia grega o homem não passava de
um animal político ou social, tendo sua vida vinculada à própria vida do Estado.
Os conc
eitos
sub studio
somente começaram a galgar paragens mais férteis
com o advento do Cristianismo, cujo pensamento baseado na fraternidade compeliu a
humanidade a uma mudança de mentalidade e de valores, objetivando o atingimento da
igualdade entre todos os
homens e a abolição da escravatura
empreitada esta iniciada
ainda no final do Império Romano, com a proibição de crueldades aos escravos imposta
pelo Imperador Constantino, referendada, tempos depois, pelo triunfo dos movimentos
abolicionistas do século
XIX e do principiar do século XX.
Naquela ocasião, o conceito de pessoa sofreu uma profunda transformação e passou
a designar um ente humano capaz de adquirir direitos e contrair obrigações, focado em si
mesmo, e não mais na vida do Estado, ressaltando, d
essa maneira, a própria dignidade da
pessoa através da afirmação de direitos específicos do indivíduo diante do Estado.
Nestes tempos modernos, a tendência traçada nos ordenamentos
jurídicos está alicerçada no reconhecimento do ser humano como o centro e
o fim
do Direito. Esse posicionamento, impulsionado após as Grandes Guerras que
assolaram a Europa no século passado, em especial no tocante à barbárie nazi
-
fascista, repousa na eleição da dignidade da pessoa humana como o valor
básico, central e precípuo
do Estado Democrático de Direito, haja vista que de
nada adiantaria falar
-
se em democracia
140
e em direito diante da ausência de
instrumentos que viessem proteger e consagrar a célula
mater
da sociedade.
O postulado da dignidade humana, em virtude da forte
carga de abstração
que encerra, não tem alcançado, quanto ao campo de sua atuação objetiva,
140
MORAIS, José Luiz Bolzan de.
A subjetividade do tempo
: uma perspectiva transdisciplinar
do direito e da democracia. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998, p. 106: “A democracia
como vir
-a-
ser cotidiano precisa estabelecer vínculos fortes com a vida; é um estado de
compromisso daqueles que participam deste processo. Presupõe a concentração, num
mesmo plano, de uma comunidade normativamente regulada, estabelecida
, a partir de um
modelo de ação comunicativa onde nenhum dos seus membros esteja à mercê de um
processo de violência institucionalizado nacisisticamente, sequer de uma racionalidade
onipotente, dominada por alguns”.
1
1
0
0
0
0
unanimidade entre os autores, muito embora se deva, de logo, ressaltar que as
múltiplas opiniões se apresentam harmônicas e complementares.
Para o jurista espanhol
Jesús González Pérez, “[...]
la dignidad de la
persona es, pues, el rango de la persona como tal
”,
141
reconhecendo na dignidade
pessoal a prerrogativa de todo ser humano em ser respeitado como pessoa, de
não ser prejudicado em sua existência (a vida, o corpo e a saúde) e de fruir de um
âmbito existencial próprio.
Convém apresentar, também, a escorreita ilação formulada por Luiz
Antônio Rizzatto Nunes, para quem:
[...] está mais do que na hora de o operador do Direito passar a gerir
sua atuação social pauta
do no princípio fundamental estampado no
Texto Constitucional. Aliás, é um verdadeiro supraprincípio
constitucional que ilumina todos os demais princípios e normas
constitucionais e infraconstitucionais. E por isso não pode o Princípio
da Dignidade da Pess
oa Humana ser desconsiderado em nenhum ato
de interpretação, aplicação ou criação de normas jurídicas.
142
A interferência constitucional do princípio fundamental da dignidade da
pessoa humana acaba irradiando dentro da ordem jurídica brasileira efeitos nos
seguintes pontos: a) reverência à igualdade entre os homens (Art. 5º, inc. I, CF); b)
impedimento à consideração do ser humano como objeto, degradando
-
se a sua
condição de pessoa, a implicar na observância de prerrogativas de direito e processo
penal, na l
imitação da autonomia da vontade e no respeito aos direitos da
personalidade, entre os quais estão inseridas as restrições à manipulação genética
do homem; c) garantia de um patamar existencial mínimo; e, d) impossibilidade de a
orientação sexual do indiví
duo ser vista como critério de discriminação.
Parece ser incontroversa a assertiva de que o Direito, enquanto meio
regulamentador do comportamento humano, deve sempre, sob pena da completa
e irrestrita perda de sua eficácia, acompanhar a evolução do meio
social em que
inserido, possuindo, assim, um caráter manifestamente dinâmico, pois, dinâmica,
141
PÉREZ, Jesús González. La dignidad de
la persona
.
Madri: Civitas, 1986,
p. 24.
142
NUNES, Luiz Antonio Rizzatto.
O princípio constitucional da dignidade da pessoa
humana
: doutrina e jurisprudência. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 50
-
51.
1
1
0
0
1
1
frise
-
se, é a modificação dos conceitos, dogmas, condutas, posturas e anseios
adotados pelos mais diversos tipos de sociedades existentes.
Nesta quadra, e como j
á salientado anteriormente, tem
-
se que hodiernamente a
pessoa humana foi elevada a elemento indispensável e inseparável da concepção e da
fomentação de um verdadeiro Estado Constitucional Democrático, na medida em que se
percebeu que de nada adiantaria a c
onsagração pelo ente estatal de direitos e garantias, de
isonomia, de liberdade, etc., se não conseguir ele prover a existência digna do indivíduo que o
forma, e tanto isso é verdade que a quase totalidade dos textos basilares proclamados pelos
demais país
es observa, de maneira positiva, a necessidade de proteção da dignidade da
pessoa humana, não se olvidando, ainda, que o ordenamento jurídico pátrio elevou a questão
a princípio fundamental da República, disso resultando que a mesma foi corretamente
alçapr
emada à condição de “[...] primeiro fundamento de todo o sistema constitucional posto e
o último arcabouço da guarida dos direitos individuais”.
143
Em assim sendo, tudo o que mais existe em nível de direitos e garantias
fundamentais se entremostra como real
e secundário desdobramento da
efetivação, no mundo concreto, do princípio fundamental da dignidade humana,
valendo salientar, por oportuno, que:
[...] toda e qualquer ação do ente estatal deve ser avaliada, sob pena
de inconstitucional e de violar a dignidade da pessoa humana, tendo
em vista se cada pessoa é tomada como fim em si mesmo ou como
instrumento, como meio para outros objetivos. Ela é, assim,
paradigma avaliativo de cada ação do Poder Público e um dos
elementos imprescindíveis de atuação do Esta
do brasileiro.
144
Ao que parece, então, atualmente tem
-
se que todos aqueles que se debruçam
sobre o Direito não podem mais nortear seus pensamentos e caminhos sem antes
analisar se a proposição em questão está de acordo com o postulado da dignidade da
pesso
a humana, o qual que se transformou na pedra de toque de todo o sistema
jurídico
-
constitucional brasileiro, não podendo, assim, ser desrespeitado por quem
quer que seja, mormente pelo Poder Público que tem a obrigação precípua de zelar e
fazer cumprir os d
itames da Constituição Federal em vigência.
143
Ibidem, p. 45.
144
SANTOS, Fernando Ferreira dos.
Princípio co
nstitucional da dignidade da pessoa
humana
. Fortaleza: Celso Bastos Editor, 1999, p. 92.
1
1
0
0
2
2
Isso vale, inequívoca e especialmente, também para o Direito de Família.
3.2.2
Princípio da igualdade entre homens e mulheres na condução da
entidade familiar
A confirmação e a ratificação da dignidade da pes
soa humana, como
demonstrado, impende em observar
-
se o homem como o centro do universo
jurídico, de modo que a irradiação de seus efeitos pela ordem jurídica não há de
se verificar, a princípio, de modo diverso a quem quer que seja, independente de
sua con
dição social, sexual, racional, racial, familiar, etc.
Nessa trilha de silogismo, denotam-
se duas importantes conseqüências: a de que a
igualdade entre os homens representa obrigação imposta aos poderes públicos, tanto no que
concerne à elaboração da regra de direito (igualdade na lei) quanto
e principalmente
em
relação à sua aplicação (igualdade perante a lei), devendo
-
se ressaltar que o reclamo de
tratamento isonômico não exclui a possibilidade de discriminação, mas sim, a de que esta se
processe de
maneira injustificada e desarrazoada, como bem alinhavou Celso Antônio
Bandeira de Mello,
145
em excelente monografia,
corroborado pelos doutos ensinamentos
proferidos por Carmem Lúcia Antunes Rocha.
146
Em segundo lugar, emerge a consideração da pessoa humana como um
conceito dotado de universalidade, não se podendo admitir, então, qualquer
diferenciação de direitos entre nacionais e estrangeiros, salvo quanto àqueles
vinculados ao exercício da cidadania, devendo
-
se entender o
caput
do Art. 5º da
Lei Maior, de
sorte que a titularidade dos direitos que apresenta se volte a todos
aqueles que se encontrem vinculados à ordem jurídica brasileira, deles não se
podendo privar o alienígena só pelo fato de não residir em terras nacionais.
Aliás, nesse ponto, merece tran
scrição a opinião abalizada dos juristas
Luiz Alberto David Araujo e Vidal Serrano Nunes Júnior, para os quais:
145
MELLO, Celso Antônio Bandeira.
O conteúdo jurídico do princípio da igualdade
. 2ª ed.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 1984, p. 49.
146
ROCHA, Carmem Lúcia Antunes.
O
princípio constitucional da igualdade
. Belo Horizonte:
Ler, 1990, p. 39
-
40.
1
1
0
0
3
3
[...] os direitos fundamentais têm um forte sentido de proteção do
ser humano, e mesmo o próprio
caput
do Art. 5º faz advertência
de que essa proteção realiza
-
se ‘sem distinção de qualquer
natureza’. Logo, a interpretação sistemática e finalística do texto
constitucional não deixa dúvidas de que os direitos fundamentais
destinam
-
se a todos os indivíduos, independentemente de sua
nacionalidade ou s
ituação no Brasil. Assim, um turista (estrangeiro
não residente) que seja vítima de uma arbitrariedade policial, por
evidente, poderá utilizar
-
se do
habeas corpus
para proteger o seu
direito de locomoção.
147
Ainda, sobre o mesmo aspecto, deve ser posta em d
estaque a ressalva
de que os direitos incutidos no Art. 5º da
Lex Mater
que demandam a
característica de ser cidadão,
verbi gratia
, a propositura de ação popular, somente
poderão ser exercidos pelos brasileiros.
No tocante à falta de diferenciação de dire
itos entre nacionais e
estrangeiros, observada a ressalva lançada, está a merecer destaque a decisão
prolatada em 30 de setembro de 1995 pelo Tribunal Constitucional Espanhol, em
que o referido órgão judicial entendeu que os direitos pertencentes à pessoa,
enquanto tal, não abrangem somente os espanhóis, mas, igualmente, os
estrangeiros e que tais direitos, como frisado na anterior deliberação de 23 de
novembro de 1984, são aqueles imprescindíveis à garantia da dignidade da
pessoa humana.
O princípio em te
la, por óbvio, acabou produzindo seus efeitos no campo
do Direito de Família, haja vista ter revogado toda a regulamentação que norteava
referida instituição quando da promulgação e égide do Código Civil de 1916, ao
estabelecer a igualdade entre os cônjuge
s e companheiros, a igualdade de
direitos e qualificações dos filhos independentemente da natureza da filiação (Art.
227, § 6º, CF/88), dentre outras novidades, sendo certo, aliás, que, para muitos
doutrinadores de escol, esta última é considerada a princi
pal e radical modificação
havida.
Dessa forma, não mais se permite a interpretação de normas relativas à
filiação que possam revelar qualquer resíduo de desigualdade de tratamento aos
147
ARAUJO; NUNES JÚNIOR, 2001, p. 87.
1
1
0
0
4
4
filhos, independentemente de sua origem, desaparecendo os efeitos juríd
icos
diferenciados nas relações pessoais e patrimoniais que outrora infelizmente
existiram.
É preciso que se diga que a isonomia em discussão, a par da ampliação
do rol de entidades familiares contemplado pelo texto constitucional, está a
determinar, não
obstante as diferenciações de origem e formação de cada uma
delas, que a proteção conferida pelo Estado seja deferida de modo exatamente
idêntico.
Com isso, está a se dizer que não existe, dentro do ordenamento jurídico
brasileiro, qualquer possibilidade
de hierarquização entre as espécies de
entidades familiares exemplificativamente existentes, ou seja, não é defeso
interpretar
-
se o Art. 226 da Constituição Federal e seus respectivos parágrafos no
sentido de se concretizar a existência de famílias de vári
as classes ou castas,
sobrepujantes umas às outras.
Porém, necessário se faz o alerta proferido por Rosana Amara Girardi
Fachin:
[...] esta realidade revela uma radical alteração de percurso diante
do padrão estabelecido pelo legislador de 1916, que tomo
u como
modelo os casamentos formalizados, muito embora as raízes
históricas do Brasil Colônia indicassem, já naquela época, a
presença de uma pluralidade de uniões fáticas. O reconhecimento
dos novos papéis e funções dentro da família, ora marcado, ao
meno
s no texto constitucional, pelo princípio da igualdade, requer
mecanismo de atuação para sua efetiva implementação,
especialmente do Poder Judiciário.
148
A igualdade trouxe para dentro do seio familiar uma reafirmação e uma
reformulação da necessidade do respeito e da assistência mútua entre homens e
mulheres enquanto membros de suas respectivas entidades familiares, haja vista
não existir a preponderância do pensamento de um sobre outro tanto no que se
refere à administração da célula em si, dos bens patrim
oniais que a compõem,
148
FACHIN, 2001, p. 138.
1
1
0
0
5
5
quanto ao exercício do poder familiar (poder parental) quando da existência de
prole comum.
Assim, sem sombra de dúvidas, tem
-
se que tanto no pormenor referente à
condução dos destinos da família quanto na particularidade representad
a pela
condição de filho, o princípio da igualdade traz a regra segundo a qual não mais
se admitem discriminações, de maneira que o casal é quem decidirá em conjunto
pelos caminhos a serem trilhados pela família, e a condição de filho, por si só,
impede o
tratamento diferenciado com justificativa na sua origem.
No que tange ao tema específico de estudo, afirma a advogada gaúcha
Mônica Guazzelli Estrougo:
[...] deve
-
se reconhecer que a consolidação da igualdade como
direito fundamental constitui verdadeira
conquista do Direito [...].
Na família, o advento da igualdade foi causa determinante para o
avanço das relações familiares, tanto entre os cônjuges ou
companheiros, quanto entre pais e filhos.
149
Aliás, não se pode deslembrar que a concretização da iguald
ade é
preponderante para o escorreito desenvolvimento de qualquer organização social,
quanto mais para a célula base dela própria.
3.2.3
Princípio da afetividade
O princípio da afetividade diz respeito à demonstração de que a
constituição de toda e qua
lquer entidade familiar tem como razão única e
precípua a afeição havida entre os indivíduos, de forma que a inexistência de tal
sentimento sempre habilita e conduz ao encerramento da união, pois,
evidentemente, sem comunhão de vida representada por respei
to e carinho
mútuos não há família.
149
ESTROUGO, Mônica Guazzelli. O princípio da igualdade aplicado à família. In: MADALENO,
Rolf Hassen; WELTER, Belmiro P
edro (coords.).
Direitos fundamentais do direito de
família
. São Paulo: Renovar, 2002, p. 321.
1
1
0
0
6
6
Em suma, a
affectio
é a
ratio
única de todas as entidades familiares e
também das relações de filiação.
De acordo com Silvana Maria Carbonera:
[...] a partir do momento em que o sujeito passou a ocupar uma
posição cent
ral, era esperado que novos elementos ingressassem
na esfera jurídica. E foi o que se observou em relação ao afeto. A
vontade de estar e permanecer junto a outra pessoa revelou
-
se
um elemento de grande importância tanto na constituição de uma
família, assi
m como em sua dissolução. As pessoas passaram a
se preocupar mais com o que sentiam do que com adequação de
seus atos ao modelo jurídico.
150
Chegou
-
se à conclusão, de maneira inexorável, de que a união entre
pessoas, com o escopo de formar uma entidade familiar (qualquer que seja sua
denominação) e de conquistar objetivos em comum, está intrinsecamente ligada à
questão do sentimento de afeição, de amor que liga tais agentes, merecendo ele
ser, então, jurisdicizado.
Aliás, é através do importante papel do afeto que se chegou à conclusão
de que o casamento,
ad exemplum
, não poderia manter
-
se indissolúvel e
inquebrantável, haja vista que, do ponto de vista da aplicação da razoabilidade
jurídica, não mais se verificava espaço para a existência de uma imposição d
e
índole constitucional que estava a exigir a manutenção de uma sociedade familiar
cujo amor e afeto ruíram há tempos, impingindo eternamente àqueles agentes a
pecha do fracasso e a impossibilidade de lhes permitir um novo recomeço, oxalá
mais feliz que o anterior.
151
Não se pode perder de vista, como bem lembra Diogo Leite de Campos,
que “[...] a lei quer que os cônjuges estejam sempre em condições de pôr termo a
uma relação conjugal inviável”.
152
150
CARBONERA, Silvana Maria. O papel jurídico do afeto nas relações familiares.
In: FACHIN,
Luiz Edson.
Repensando fundamentos do direito civil brasileiro contemp
orâneo
. São
Paulo: LTr, 2000, p. 297.
151
OLIVEIRA, José Sebastião de.
Fundamentos constitucionais do direito de família
. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 239: “A efetividade é instrumento ou de manutenção da
união familiar ou de seu esfacelamento diante da constatação, pelos membros da família, de
que entres eles já não mais existe força suficiente para manter unidos os laços da união”.
152
CAMPOS, Diogo Leite de.
Lições de direito de família e das sucessões
. Coimbra:
Almedina, 1997, p. 285.
1
1
0
0
7
7
Nesse sentido, a precisa lição de Luiz Edson Fachin:
[...] um
a história construída a quatro mãos tende ao sentido da
permanência. Todavia a liberdade de casar convive com o
espelho invertido da mesma liberdade, a de não permanecer
casado. Chega
-
se, assim, por diversas vias, ao fim da sociedade
conjugal. Dissolve
-
se
o casamento. A sentença executa os efeitos
da dissolução. Término do projeto parental. Um pouso, não raro,
marcado pelos solavancos da turbulência.
153
Embora, inafastável seja a altercação no sentido de que a lei não tenha,
por óbvio, força suficiente para
criar um sentimento, pode elegê
-
lo como
amálgama, como alicerce para determinado instituto, ainda mais dentro do Direito
de Família, no qual as relações são extremamente permeadas por feixes
emocionais, afetivos e amorosos, enfim, passionais, normatizando,
então, seus
fundamentos.
154
Nessa esteira de pensamento, Sérgio Gischkow Pereira pondera, com a
perspicácia de sempre, que não será:
[...] logo no direito de família que deixará o valor jurídico do amor
de merecer especial apreço. O significado, o sentido
, a razão de
ser, o valor de uma união entre duas ou mais pessoas é posto e
subsiste em função da afeição que as vincula. Corolários desta
asserção consistem em repelir o despotismo masculino; em
vislumbrar na família um grupo fundado na mútua afeição, mai
s do
que pela autoridade marital ou de quem quer que seja; em reduzir
os fatores organizacionais e hierárquicos na estrutura familiar; em
fomentar a liberdade e a igualdade nas interações familiares.
155
Os fundamentos da afetividade estão assegurados em vár
ios
dispositivos do texto constitucional, podendo
-
se citar, a título exemplificativo,
os Arts. 226, § 4º (a comunidade formada por qualquer dos pais e seus
descendentes, incluindo
-
se os adotivos, tem a mesma dignidade de família
153
FACHIN
, 1999, p. 169.
154
BARROS, Sérgio Resende. A tutela constitucional do afeto. In: PEREIRA, Rodrigo da Cunha.
Família e dignidade humana
. Anais do V Congresso Brasileiro de Direito de Família, 2005,
p. 889: “Em suma: a realização da personalidade humana segundo os padrões da dignidade
já alcançados na atualidade histórica da civilização é o princípio e o fim da tutela
constitucional do afeto”.
155
PEREIRA, Sérgio Gischkow.
Estudos de direito de família
. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2004, p. 26.
1
1
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8
8
constitucionalmente protegi
da), 227,
caput
(o direito à convivência familiar, e
não a origem genética, constitui prioridade absoluta da criança e do
adolescente), § 5º (a adoção, como escolha afetiva, alçou
-
se integralmente ao
plano da igualdade de direitos), § 6º (todos os filhos s
ão iguais,
independentemente de sua origem), dentre outros.
José Sebastião de Oliveira sintetiza a questão, aduzindo:
[...] a afetividade não foi esquecida pelo constituinte. Ao mesmo
tempo em que estabeleceu como princípio constitucional do direito
de f
amília a obrigação de os pais assistirem, criarem e educarem
os filhos menores, determinou, com a mesma intensidade e
obrigação de os filhos maiores ajudarem e ampararem os pais na
velhice, carência ou enfermidade (Art. 229, CF). Foi mais longe:
demonstran
do os valores humanitários de nossos dias,
estabeleceu como dever de todas as espécies de família o
amparo aos idosos (não só aos parentes, mas a qualquer idoso),
assegurando sua integração na comunidade, defendendo sua
dignidade e bem
-
estar e garantindo
-
l
hes o direito a uma vida sadia
(Art. 230,
caput
, CF).
156
Assim, e respeitando os caracteres subjetivos que são ínsitos a família,
houve por bem o legislador, acertadamente, em transformá
-
los em diretrizes
legislativas para sua melhor proteção.
3.2.4
Princ
ípio da liberdade e do livre planejamento familiar
A liberdade é um eterno conquistar, ampliada na mesma medida em que
cresce o domínio do homem sobre a natureza e as relações sociais desenvolvidas
com outros homens, almejando, por fim, a própria expansão da personalidade do
indivíduo.
157
Na Declaração de 1789, conceituou
-
se o termo como:
156
OLIVEIRA
, 2002, p. 238.
157
SILVA, José Afonso da.
Curso de direito constitucional positivo
. 12ª ed. rev. São Paulo:
Malheiros, 1996, p. 234.
1
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9
9
[...] poder fazer tudo o que não prejudique a outrem: assim, o
exercício dos direitos naturais do homem não tem outros limites
senão os que asseguram aos demais membros d
a sociedade o
gozo dos mesmos direitos. Esses limites somente a lei poderá
determinar, aditando que A lei não pode proibir senão as ações
nocivas à sociedade.
Entretanto, a conceituação apresentada pelo jurista José Afonso da Silva
mostra
-
se mais consentâ
nea com os objetivos deste compilado, ao deixar
expresso que a “[...] liberdade consiste na possibilidade de coordenação
consciente dos meios necessários à realização da felicidade pessoal”.
158
Em prosseguimento e pela propriedade da lição, útil transcrever
o
conceito proposto pelo citado constitucionalista:
Nessa noção, encontramos todos os elementos objetivos e
subjetivos necessários à idéia de liberdade; é poder de atuação
sem deixar de ser resistência à opressão; não se dirige contra,
mas em busca, em p
erseguição de alguma coisa, que é a
felicidade pessoal, que é subjetiva e circunstancial, pondo a
liberdade, pelo seu fim, em harmonia com a consciência de cada
um, com o interesse do agente. Tudo que impedir aquela
possibilidade de coordenação dos meios é
contrário à liberdade. E
aqui, aquele sentido histórico da liberdade se insere na sua
acepção jurídico
-
política. Assim, por exemplo, deixar o povo na
ignorância, na falta de escola, é negar
-
lhe a possibilidade de
coordenação consciente daqueles meios; opr
imir o homem, o
povo, é retirar
-
lhe aquela possibilidade etc. Desse modo, também,
na medida em que se desenvolve o conhecimento, se fornecem
informações ao povo, mais se amplia a sua liberdade com abrir
maiores possibilidades de coordenação de meios necess
ários à
expansão da personalidade de cada um.
159
Em epítome, a liberdade, na medida em que se amplia, é um autêntico
estado de propiciar ao homem completa efetivação da sua personalidade,
necessariamente transpondo os mais diversos obstáculos que se interpõ
em em
seu caminho.
Inegavelmente, a liberdade é um dos parâmetros principiológicos do
direito de família, na exata medida em que existe uma considerável margem de
158
Ibidem, p. 236.
159
Ibidem, mesma página.
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discricionariade no que se refere à formação da referida entidade, mormente no
que diz respe
ito à escolha dos parceiros, da forma de constituição da prole, do
regime patrimonial, etc.
O direito de liberdade também espraia efeitos no campo protetivo do
direito à privacidade e à intimidade, pertencentes e inerentes ao indivíduo, sendo
decorrência lógica da implementação do princípio constitucional da proteção da
dignidade humana, eis que tanto a vida privada por envolver todos os
relacionamentos da pessoa, inclusive seus objetivos, suas aspirações e seus
desejos, quanto à intimidade em razão de cir
cundar as relações subjetivas e de
trato íntimo da pessoa humana, suas relações familiares e de amizade, fazem
parte de sua estrutura.
160
Sob esse aspecto e tendo ligação com a temática ora desenvolvida,
interessante o caso concreto narrado por Amitai Etzio
ni.
161
Nos Estados Unidos, por volta de 1990
tendo em vista o crime sexual a
que fora submetida a criança Megan Kanka, de New Jersey
o clamor popular
levou diversos Estados a promulgarem leis, nominadas
Megan’s Laws
, que
obrigavam as pessoas que haviam cometido abusos sexuais e, frise
-
se, já
cumprido suas penas, a se registrarem perante as autoridades locais.
160
ARAUJO; NUNES JÚNIOR, 2001, p. 103
-
104: “[...] a vida social do indivíduo se div
ide em duas
esferas: a pública e a privada. Por privacidade, de conseguinte, deve
-
se entender os níveis de
relacionamento social que o indivíduo habitualmente mantém oculto ao público em geral, dentre
eles: a vida familiar, as aventuras amorosas, o lazer e o segredo dos negócios. Assim, dentro
dessa esfera teríamos demarcado o território próprio da privacidade. Entretanto, como se disse,
no território da privacidade é que se desenvolvem, por exemplo, as relações conjugais, as
relações entre pai e filho, irm
ãos, namorados etc., que são peculiarizadas exatamente pela
interpessoalidade. Assim, havendo mais de uma pessoa envolvida, existe, por evidente, espaço
para a violação de direitos, e é nessa porção dos relacionamentos sociais
a chamada ‘tirania da
vida
privada’
que ganha importância o conceito de intimidade. A privacidade resguarda o
indivíduo da publicidade. Entretanto, qual seria a proteção jurídica individual em face de abusos
cometidos dentro da esfera privada? Exatamente o direito de intimidade. E
m resumo, a conclusão
que se extrai do texto constitucional é que a vida social dos indivíduos não possui somente dois
espaços, o público e o privado, pois neste se opera nova subdivisão, entre a intimidade e a
privacidade propriamente dita. Poderíamos ilu
strar a vida social como um grande círculo, dentro
do qual um menor, o da privacidade, em cujo interior seria aposto um ainda mais constrito e
impenetrável, o da intimidade. Assim, o conceito de intimidade tem valor exatamente quando
oposto ao da privacida
de, pois, se se cogita da tirania da vida privada, aduz
-
se exatamente à
tirania da violação da intimidade, como, por exemplo, o pai que devassa o diário da filha
adolescente ou viola o sigilo das suas comunicações”.
161
ETZIONI, Amitai.
The limits of privacy. New York: Basic Books, 1999, p. 43
-
74.
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1
1
1
Posteriormente, em 1994, o Congresso encorajou o restante dos Estados
a promulgarem leis no mesmo sentido.
Assim, em algumas localidades a polícia
notifica a comunidade de que o
novo vizinho já cometeu alguma espécie de abuso, em outras é tornado público o
endereço do ofensor sexual e, ainda, outras requerem amostras de sangue,
cabelo ou saliva para criar um banco de dados de DNA, para ser utilizado
em
futuras investigações de casos dessa jaez.
Poucos crimes aterrorizam mais os pais do que o abuso sexual de seus
filhos, contudo, vozes foram levantadas no sentido de defenderem os direitos
básicos dos ofensores sexuais, clamando que, sob o prisma cons
titucional, a
obrigação delineada em tais diplomas legais acarreta uma dupla punição pelo
mesmo delito: eis que o registro e a notificação à comunidade constituem ambas
formas de punição, em especial para aqueles criminosos que estavam cumprindo
sua pena o
u que já a haviam cumprido; ofendem o devido processo legal: não
oportunizando ao acusado a possibilidade sequer de ser ouvido quando deixa de
se registrar e tampouco existe uma notificação prévia; e, por fim, os críticos
argumentam que tais leis impõem um
a pena cruel e desumana.
Para as Cortes americanas, o fim precípuo das
Megan’s Laws
é proteger
a comunidade ao invés de constituir punição adicional ou desproporcional ao
crime praticado, embora tenham aceitado que no caso de descumprimento dos
ditames da
legislação específica os acusados deveriam ser previamente
notificados e ouvidos judicialmente.
Aqui, à evidência, a balança do Direito deverá sopesar sobre um de seus
pratos o bem comum da coletividade e a proteção de suas crianças e, de outro,
os direi
tos inalienáveis à privacidade e à dignidade dos ofensores sexuais que já
adimpliram seu débito para com a sociedade que, ao que nos parece, necessitam
mais de ajuda do que uma punição adicional.
Em continuidade, como corolário e desdobramento do princípi
o da
liberdade, encontra
-
se o vetor referente ao livre planejamento familiar.
1
1
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2
2
De acordo com a norma insculpida no § 6º do Art. 226 da Constituição Federal,
tem
-
se que fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade
responsável, o plan
ejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado
propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada
qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas.
No plano infraconstitucional, foi editada e promulgada a Lei nº 9.263, de
12 de janeiro de 1996, prevendo e reafirmando o planejamento familiar como
sendo um direito de todo cidadão, e não apenas do casal.
Assim, pode
-
se definir planejamento familiar como o conjunto de ações de
regulaç
ão da fecundidade que garanta direitos iguais de constituição, limitação ou
aumento da prole pela mulher, pelo homem, ou pelo casal,
162
não se perdendo de
162
PAGNAN, Rogério.
Justiça de SP aceita feto como autor de ação: O Órgão Especial do TJ
(Tribunal de Justiça) de São Paulo reconheceu o direito de um feto de entrar com uma ação
judicial para garantir o atendimento
médico da mãe. Nem o TJ
-
SP nem o STJ (Superior Tribunal
de Justiça) têm conhecimento de casos semelhantes.
A decisão pioneira ocorreu em três
agravos de instrumento movidos pela Defensoria Pública de São Paulo em favor de presas
grávidas da Cadeia Pública de São Bernardo do Campo que necessitavam de exames de pré
-
natal adequados. Outros cinco aguardam julgamento. A defensoria recorreu ao TJ após o juiz
de primeira instância de São Bernardo negar o recebimento da ação com o feto figurando como
autor, o chamado pólo ativo. A ação, segundo o magistrado, deveria ser apresentada no nome
dos pais. ‘Eleito o nascituro para integrar o pólo ativo da ação, não poderia o juiz determinar a
emenda da inicial por entender impossível a figuração do feto como autor em qualq
uer espécie
de demanda. Isso porque, segunda a jurisprudência, pode o feto, devidamente representado,
desde o momento da concepção, ainda que desprovido de personalidade jurídica, pleitear
judicialmente seus direitos’, diz trecho do acórdão relatado pelo d
esembargador José Cardinale,
em que também participaram os desembargadores Canguçu de Almeida (presidente) e Sidnei
Beneti. A decisão, segundo especialistas ouvidos pela Folha, abre um precedente importante,
pois estende ao feto os mesmos direitos de uma criança. ‘O que o desembargador fez foi criar
um mecanismo que estende ao titular de direito, o nascituro, devidamente representado pela
mãe, seus direitos garantidos judicialmente’, disse o presidente da OAB (Ordem dos Advogados
do Brasil) de São Paulo, Lu
iz Flávio Borges D'Urso. Ainda conforme os especialistas, essa
decisão burla o entendimento da área cível, que considera a pessoa como personalidade
jurídica após o nascimento com vida, usando a própria Constituição. Para o responsável pelas
ações, o defensor Marcelo Carneiro Novaes, a precedência criada com a decisão do tribunal é
o fato mais comemorado neste momento, já que os autores da ação já nasceram e não
puderam se beneficiar do entendimento do TJ. Novaes utilizou os fetos nas ações porque
preferiu
usar o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), no Juizado da Criança e do
Adolescente, já que ele tem definições claras de proteção à criança, a principal beneficiada com
o pré
-
natal bem
-
feito. Ele disse que poderia tentar o atendimento às presas pelo
âmbito
administrativo ou na área cível, mas as chances seriam menores. ‘As chances de vitórias com o
ECA seriam melhores porque existe o princípio da proteção legal’. Segundo Novaes, em
pesquisa feita pela Defensoria foi encontrado no Brasil apenas um caso
anterior em que a
Justiça considerou o feto como pólo ativo, mas em uma ação de verificação de paternidade. O
caso também foi julgado pelo TJ. Fonte:
Folha Online
. Disponível em:
<
http://www.mp.sp.gov.br/pls/portal/PORTAL.wwv_media.show?p_id=1184506&p_set
tingssetid
=11257&p_s ettingssiteid=0&p_siteid=118&p_type=basetext&p_textid=1184507
>. Acesso em:
12 nov. 2005.
1
1
1
1
3
3
vista que ao Estado cabe a promoção de ações preventivas e educativas para
esse planejamento, e a gara
ntia do acesso igualitário a informações, meios,
métodos e técnicas disponíveis para a regulação da fecundidade.
Para Lydia Neves Bastos Telles Nunes:
[...] com tranqüilidade, pode
-
se afirmar que o planejamento
familiar, como previsto, por primeiro no te
xto constitucional e
repetido agora na nova Lei Civil, com fundamento no princípio da
dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, deve
ser exercido, conscientemente, objetivando melhorar a qualidade
de vida do cidadão brasileiro, buscando o be
m-
estar e educação
para os filhos. Portanto, as medidas a serem tomadas são as
destinadas a evitar a gravidez indesejada, ou ‘fora de época’, e
estabelecer o ‘tamanho’ da família de acordo com as
possibilidades financeiras do casal.
163
Todavia, não se pode
perder de vista que o planejamento familiar e a
paternidade somente terão condições de serem exercidas de forma efetivamente
responsável, quando o Estado compreender, realmente, a extensão e a
importância da convivência familiar e comunitária apresentado n
o bojo dos
direitos constitucionais fundamentais.
3.2.5
Princípio da pluralidade familiar
O chamado princípio da pluralidade familiar se encontra devidamente
encartado nos §§ 3º e 4º do Art. 226 da Constituição Federal, na exata medida em
que referidos
dispositivos basilares quebraram a primazia e o monopólio de que
sempre desfrutou o casamento como única forma de formação de família, surgindo,
assim, entidades familiares derivadas da união estável e da monoparentalidade.
Foi justamente em razão dessa quebra de
exclusividade familiar
que hoje
se reconhece a possibilidade de formação de entidades da mesma natureza
163
NUNES, Lydia Neves Bastos Telles.
Regimes matrimoniais de bens
.
Leme: J. H. Mizuno,
2005, p. 33.
1
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1
4
4
formadas por pessoas do mesmo sexo, as chamadas
uniões homoafetivas
,
mesmo não havendo normatização específica que regulamente tal assunto.
O
corre, porém, que o operador do direito não se pode furtar à análise de
caso concreto pelo simples fato de não
-
existência de uma lei que regulamente
uma situação específica, uma vez que o sistema jurídico lhe outorga totais e
irrestritas condições para que
a omissão legislativa não venha a prejudicar o
cidadão, o jurisdicionado.
Deve ele, então, interpretar e integrar as normas constitucionais e
infraconstitucionais já existentes, a fim apresentar à problemática uma solução
justa e adequada, mesmo porque,
como bem salienta Rui Geraldo Camargo
Viana:
[...] o devenir jurídico da família parece caminhar para a disciplina
dos fatos correntes; questiona
-
se o direito familial moralista, com
regras orientadoras e pedagógicas, devendo tender o legislador,
em matér
ia de relações privadas, para uma absoluta neutralidade,
limitando
-
se o Direito a conformar
-
se aos fatos revelados pelos
costumes, daí que não pode fechar seus olhos, o legislador, à
realidade que se mostra e clama pelo acesso à legalidade.
164
A
partir do a
dvento da Constituição Federal de 1988, toda a atividade
estatal, seja ela legislativa, administrativa ou judiciária está adstrita e
vinculada à obediência máxima e irrestrita ao já por vezes mencionado
princípio basilar da proteção da dignidade da pessoa
humana,
165
sendo certo
que, nesse diapasão, difícil se sustenta a defesa de que um homossexual não
estaria juridicamente apto a constituir uma família ou a receber a proteção
estatal sobre seu envolvimento afetivo com outrem, pois o rol apresentado
pelo Art.
226 da
Lex Major
jamais poderá ser considerado taxativo, mas sim,
exemplificativo, não nos sendo possível,
permissa venia
, concordar com a
afirmação levada a cabo, nesse particular, por Débora Vanessa Caús
164
VIANA, Rui Geraldo Camargo (org.).
Temas atua
is de direito civil na Constituição Federal
.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 38.
165
ZOLLINGER, 2006, p. 61: “Os direitos fundamentais acerca da estrutura normativa básica do
Estado e da sociedade, positivadas na Constituição, retiram
-
se da esfera
de livre
disponibilidade dos poderes públicos, vinculando
-
os positiva e negativamente”.
1
1
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5
5
Brandão, para quem “[...] acredita
-
se carecer de
fundamento jurídico a
afirmação que diz que se pode considerar as parcerias homossexuais como
uma entidade familiar”.
166
Com todo o respeito que deve ser devotado ao entendimento esposado
pela nobre jurista, a verdade é que, ao se seguir o delineamento traç
ado pelo
princípio fundamental da dignidade humana, não há como conceber a ausência
ou a carência de fundamento jurídico para o legítimo amparo das denominadas
parcerias homoafetivas enquanto reais entidades familiares, na medida em que
o suporte jurídico
para tanto se encontra positivado no próprio Texto
Constitucional vigente
norma de inegável supremacia hierárquica, ponto de
partida e de obediência para todos os demais regramentos jurídicos existentes
e por existirem.
Ademais, não se pode olvidar que,
pela importância que lhe cabe em
decorrência da dignidade humana, o tão propagado princípio da isonomia (direito
fundamental, e, portanto, norma constitucional de eficácia plena) também
empresta suporte de constitucionalidade, legitimidade e legalidade ao
reconhecimento das uniões entre pessoas do mesmo sexo como entidades
familiares, tendo em vista que, conforme já declinado, a orientação sexual, por si
só, não pode e jamais poderá ser considerada e utilizada como fator de
descrímen entre cidadãos heteros
sexuais e homossexuais.
Valendo
-
se da moderna roupagem que deve ser emprestada à
família
,
considerando esta como um legítimo espaço de preservação e tutela da
dignidade da pessoa humana, não parece ser possível o não
-
reconhecimento
da parceria homossexual
formada pela junção de valores, pensamentos e
afetividade como entidade familiar, pois seria aceitar a nefasta idéia da
existência de cidadãos brasileiros de primeira e de segunda escala, o que se
cumpre a todo custo evitar.
Imperativo salientar também:
166
Ibidem, p. 87.
1
1
1
1
6
6
El derecho, como és lógico, no puede cerrar los ojos a la
existência de determinados hechos sociales que reclaman uma
tutela jurídica, bien porque responden a uma legítima demanda,
producto de um cambio de mentalidad que há consolidado
determinados comport
amientos; bien porque su no regulación
contribuye a la persistência de situaciones que aparecen como
injustas em la percepción de la sociedad. Pero en ambos os
casos, el Legislador debe ser muy cuidadoso a la hora de tomar
posiciones cuando hay debates doc
trinales abiertos, evitando que
la positivación normativa esté demasiado condicionada por
presupuestos ideológicos o políticos
.
167
A título de confirmação da importância do princípio da pluralidade familiar,
pode
-
se citar a existência das famílias
anaparent
al
e
eudemonista
, defendidas por
Maria Berenice Dias
168
e as chamadas
famílias simultâneas
, cujo fenômeno e
conseqüências jurídicas foram brillantemente explanadas por Carlos Eduardo
Pianovski Ruzyk.
169
Aliás, sobre a questão da proteção jurídica das famílias
simultâneas,
interessante trazer à colação recente julgamento proferido no âmbito da Oitava
Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, na exata medida em
que restou ali assentado e reconhecido pelo Desembargador José Ataídes
Siqueira Trinda
de, a possibilidade de se manter uma união estável paralela ao
casamento e daí se extraírem conseqüências jurídico
-
protetivas.
170
Importante, também, transcrever texto da lavra de Luiz Edson Fachin,
171
constante do acervo de artigos do
site
do Instituto Brasileiro de Direito de Família,
na medida em que ali se apresenta a discussão do reconhecimento do vínculo
familiar fundado na amizade, demonstrando
-
se, uma vez mais, a impossibilidade
de se considerar referido fenômeno como conceito fechado ou
numerus clausu
s
.
Vejamos:
167
FERNÁNDEZ, Pedro A. Talavera.
Fundamentos para el reconocimiento jurídico de las
uniones homosexuales
: propuestas de regulación en España
.
Madri: SP
Ed, 1999, p. 18.
168
DIAS; PEREIRA, 2002, p. 37
-
49.
169
RUZYK, Carlos Eduardo Pianovcki.
Famílias simultâneas
: da unidade codificada à
pluralidade constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, passim.
170
Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/versao_impressao
.html
>. Acesso em: 11 jan. 2007.
171
Disponível em: <
http://www.ibdfam.com.br/public/artigos.aspx?codigo=59
>. Acesso em: 13
jan. 2007.
1
1
1
1
7
7
A família constitui um corpo que se reconhece no tempo. Uma
agregação histórica e cultural como espaço de poder, de laços e de
liberdade. Uma aliança composta para representar harmonia e
paradoxos. Uma agremiação destinatária de projetos e de
discursos,
especialmente da alocução normativa, junção que encarna o elo
entre o direito, a família e a sociedade. É uma arena na qual tudo
está sempre para ser dito, o que reconstrói, no presente, os limites
do passado sob as vestes da modernidade, e proj
eta para o futuro as
interrogações próprias do destino que se quer ver prometido. Eles
foram felizes para sempre era o dístico que encimava o brasão dos
enlaces. Mais tarde apreende
-
se que seja infinito enquanto dure. E
nos dias correntes assume
-
se que viv
eram felizes por um certo
tempo. Sustenta
-
se uma concepção plural e aberta de família que,
de algum modo, conforte, agasalhe e dê abrigo durante o trânsito da
jornada de cada um e de todos coletivamente. Nela se ambiciona
todo o desfrute possível sem perder a percepção poética da própria
existência. Anda
-
se, pois, no equilíbrio da corda bamba do
impossível. A esperança é a alavanca que nos sustenta contra as
adversidades. Não será precisamente de códigos que esse porvir
reclama e sim da superação dos algori
tmos que querem,
preventivamente, explicar e conter a vida. Superar uma percepção
fundamentalista da família na estrutura que simplifica o bem e o mal.
A família é mais que essa dualidade, é ambivalente, é complexa e
sem polarizações. Uma das propostas é e
dificar a família da amizade
como vínculo. Propomos a família cidadã pela ternura e pelo afeto.
Abrir espaço para o reconhecimento da inclusão na cidadania da
amizade, que é, quem sabe, o que mais nos resta no tempo da
intolerância. Quiçá na família se vej
a o que Cícero viu na amizade:
Quem olha para um amigo verdadeiro vê nele, por assim dizer, uma
imagem (exempla) de si mesmo. É por isso que os amigos, ainda
que ausentes, estão presentes; ainda que pobres, têm abundância,
ainda que fracos, são fortes e, o
que é mais difícil de dizer, ainda que
mortos, estão vivos.
Em Portugal, atentando
-
se para os fenômenos que envolvem o chamado
contrato de gestão
e sua dificuldade de aceitação nos dias atuais, Guilherme
Freire Falcão de Oliveira afirma:
Não sigo a máxi
ma extrema de que ‘só não é natural o que não se
pode fazer’, e não espero que a gestação para outrem se venha a
tornar um sucesso generalizado. Mas não será muito
surpreendente que a razão humana vá reconhecendo, aqui ou
acolá, algumas vantagens na utiliz
ação do processo, para depois
uma tolerância insuspeitada acabar por admiti
-
lo, num ou noutro
caso. Para já, a gestação para outrem é considerada um
fenómeno perturbante demais para ser bem aceite. Assim
e por
enquanto
não é legítimo emendar esse velho
emblema da nossa
cultura afectiva
‘Mãe há só uma!’.
172
172
OLIVEIRA, Guilherme Freire Falcão de.
Mãe só há duas
: o contrato de gestação. Coimbra:
Coimbra, 1992, p. 98
-
99.
1
1
1
1
8
8
Em resumo, o que fica claro em relação ao tema ora em discussão, diz
respeito ao fato de que, em face da natureza, da essência da própria família,
incompossível se mostra, validamente, que referido g
rupo social venha a ser
enclausurado por definições estatais limitadoras, taxativas e estáticas, valendo
destacar, uma vez mais, que não foi esse, por óvio, o objetivo do legislador
constituinte quando da confecção da atual Carta Política.
3.3
O
Status
J
usfundante do Direito à Família
3.3.1
Considerações gerais acerca dos direitos fundamentais
Como é consabido, antes do advento da Constituição de 1988 e do conseqüente
surgimento, nos dizeres de Carlos Ayres de Britto,
173
do Estado de Justiça ou Estado
H
olístico, haja vista a inequívoca incidência do aumento da sedimentação dos postulados
basilares e do processo de dogmatização de temas e assuntos que, até então, eram
claramente relegados aos textos normativos infraconstitucionais, o Brasil experimentou,
por décadas, os dissabores de um período ditatorial e absolutista, remarcado pela
constante ofensa aos valores mais caros aos cidadãos brasileiros.
Prova do quanto acima salientado está sobejamente materializada nos doze
artigos que acabaram compondo o fu
nesto Ato Institucional nº 05, de 13 de
dezembro de 1968, que, dentre outros achaques, positivava: (i) a possibilidade de o
Presidente da Republica, ao seu talante e alvedrio, decretar o recesso do Congresso
Nacional, das Assembléias Legislativas e das Câmaras dos Vereadores, recebendo,
por via de conseqüência, imediata autorização para legislar em todas as matérias
cuja competência dantes pertenciam, legitimamente às citadas Casas de Leis; (ii) o
alargamento das hipóteses de decretação de intervenção nos E
stados e Municípios;
(iii) a possibilidade de suspensão, ouvido o Conselho de Segurança Nacional, dos
direitos políticos de quaisquer cidadãos pelo prazo de 10 (dez) anos, bem como
proceder à cassação de mandatos eletivos federais, estaduais e municipais;
(iv) a
impossibilidade de acesso ao Judiciário nos casos de aplicação de medidas de
173
BRITTO,
Carlos Ayres.
Teoria da Constituição
. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 210.
1
1
1
1
9
9
segurança pelo Ministro de Estado da Justiça; (v) suspensão das garantias
constitucionais ou legais de vitaliciedade, inamovibilidade e estabilidade; (vi) a
suspensão da ga
rantia de
habeas corpus
nos casos de crimes políticos, contra a
segurança nacional, a ordem econômica e social e a economia popular; e, (vii) a
exclusão de qualquer apreciação judicial dos atos praticados de acordo com o AI5 e
seus respectivos complementos
e efeitos.
Comentando os anos de chumbo, e traçando contornos característicos
gerais afetos a períodos ditatoriais, o sociólogo Luciano Martins afirma:
[...] é pela utilização da força que o regime autoritário, primeiro, se
constitui pela ocupação do po
der e, em seguida, o mantém pelo
uso do arbítrio e da repressão. Despossuindo, em decorrência, os
indivíduos em sociedade de sua capacidade de escolha e de sua
capacidade de ação política. Isto se realiza, concretamente, na
medida em que essas duas capacid
ades do indivíduo
que
integram o domínio de sua liberdade
são circunscritas ao âmbito
de esferas arbitrariamente traçadas pelo poder autoritário e na
medida em que a transgressão dessas esferas é punida pela
repressão.
174
No que se refere aos direitos f
undamentais, inegavelmente a Constituição
Federal de 1988 foi o primeiro diploma supremo que os tratou com a devida
dignidade e relevância, circunstância essa que já se verifica, inclusive, pela
colocação topográfica galgada na Lei de Outubro, aparecendo l
ogo após do
Preâmbulo e dos Princípios Fundamentais.
Percebem
-
se mudanças também no que se refere à nomenclatura adotada, bem
como na grande vazão que foi concedida à positivação dos direitos fundamentais sociais, os
quais, dantes, se encontravam relegado
s ao Capítulo da ordem econômica.
175
174
MARTINS, Luciano.
A geração AI
-
5 e maio de 68
: duas manifestações intransitivas. Rio de
Janeiro: Argumento, 2004, p. 29.
175
SILVA, Gustavo Just da Costa.
Os limites da reforma c
onstitucional
. Rio de Janeiro:
Renovar, 2000, p. 129
-
130: “A linguagem utilizada pelo constituinte mostra
-
se perfeitamente
justificada quando se compreende que a dualidade básica entre direitos individuais
e
sociais
nada tem a ver com a titularidade, remetendo na verdade à vinculação de uns e de outros a
diferentes estágios da formação do
ethos
constitucional. A consagração positiva dos direitos
de liberdade
e por isso é que podem ser chamados de individuais
cunhou, mais
caracteristicamente do que qualq
uer outro elemento estrutural das constituições liberais, o
Estado moderno com a marca da ética individualista. E era a fixação de uma relação entre o
Estado e o
indivíduo
e primordialmente ao estabelecimento de um
status
de autonomia
deste perante aquel
e
que deveria servir, em última análise, a própria constituição, conforme
a concebeu o liberalismo político”.
1
1
2
2
0
0
Luiz Alberto David Araujo e Vidal Serrano Nunes Júnior
176
dividem os
direitos e garantias fundamentais, em consonância com a Constituição Federal de
1988, apresentando
-
os em Capítulos, a saber: I
Dos Direitos e Deveres
In
dividuais e Coletivos; II
Dos Direitos Sociais; III
Da Nacionalidade; IV
Dos
Direitos Políticos e V
Dos partidos Políticos, salientando
-
se que a expressão
direitos e garantias fundamentais
é gênero, enquanto que os temas capitulados
são espécies de
ste.
Há que se ressaltar, ainda, que, além da amplitude que fora concedida ao
tema pelos inúmeros incisos dos Arts. 5º e 7º, as mais significativas e importantes
mudanças encontram
-
se registradas nos §§ 1º e 2º do citado Art. 5º
que
concedem aplicação e eficácia imediata aos direitos fundamentais, deixando claro
que tais estão espraiados por todo o bojo constitucional, não se encontrando,
portanto, enclausurados nessa ou naquela parte específica
177
e no § 4º do Art.
60
cujo dispositivo outorgou indelév
el proteção, na exata medida em que
petrificou os direitos e garantias fundamentais, tornando
-
os incompossíveis de
serem reptados ou alterados pela prática de Emenda.
Navegando
-
se nessas águas, importante trazer à lume a preciosa
ponderação levada a efeit
o por Ingo Wolfgang Sarlet, no sentido de que:
[...] sendo correta a premissa de que os direitos fundamentais
constituem
ainda que com intensidade variável
explicitações
da dignidade da pessoa, por via de conseqüência e, ao menos em
princípio, em cada
direito fundamental se faz presente um
conteúdo ou, pelo menos, alguma proteção da dignidade da
pessoa.
178
Inegável, assim, o
status
jurídico próprio e diferenciado concedido pela
Constituição Federal de 1988 aos direitos fundamentais, como, aliás, de há m
uito
176
ARAUJO; NUNES JÚNIOR, 2001, p. 78.
177
PETTERLE, Selma Rodrigues.
O direito fundamental à identidade genética na
Constituição brasileira
. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 92: “Pode
-
se, então,
afirmar que o sistema de direitos fundamentais não está enclausurado, nem vendado, que o
sistema de direitos fundamentais está aberto e respira novos ares, e isso não por mero
capricho, mas porque
seria ilusório imaginar que o rol elencado pudesse prever todos os
direitos a merecer proteção constitucional”.
178
SARLET, Ingo Wolfgang.
Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na
Constituição Federal de 1988
. Porto Alegre: Livraria do Advogado
, 2002, p. 87.
1
1
2
2
1
1
se almejava nesse País,
179
direitos fundamentais estes que, modernamente, se
apresentam positivados pela necessidade de efetivação das necessidades
humanas como seu elemento mais determinante.
180
Cumpre esclarecer que, por opção didático
-
doutrinária, no
pertinente à
classificação das diversas normas constitucionais existentes, o presente trabalho
houve por bem adotar a sistemática utilizada pelo abalizado jurista luso J. J.
Gomes Canotilho, para quem, pedagogicamente, as referidas espécies
normativas se b
ifurcam em regras jurídico
-
organizatórias e regras jurídico
-
materiais.
181
As regras jurídico
-
organizatórias, aquelas que basicamente disciplinam a
regulamentação do Estado, subdividem
-
se em
normas constitucionais de
competência
,
normas constitucionais de cr
iação de órgãos
, e
normas
constitucionais de procedimento
.
Em contrapartida, as denominadas regras jurídico
-
materiais apresentam
-
se como aquelas afetas aos limites e às ações estatais relacionadas aos
cidadãos, abrangendo, outrossim, as
normas constitucio
nais de direitos
179
STRECK, Lenio Luiz.
Hermenêutica jurídica e(m) crise
: uma exploração hermenêutica da
construção do Direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004, p. 163
-
164: “Percebemos
(compreendemos) a Constituição ‘como’ Constituição quando a confr
ontamos com a sociedade
para qual é dirigida; compreendemos a Constituição ‘como’ Constituição quando examinamos os
dispositivos que determinam o resgate das promessas da modernidade e quando, através de
nossa consciência acerca dos efeitos que a história
tem sobre nós (
Wirkungsgeschichtliches
Bewuβtsein
), damo
-
nos conta da ausência de justiça social (cujo comando de resgate está no
texto constitucional); compreendemos a Constituição ‘como’ Constituição quando constatamos
que os direitos fundamentais
-
sociai
s somente foram integrados ao texto constitucional pela exata
razão de que a imensa maioria da população não os têm; compreendemos que a Constituição é,
também, desse modo, a própria ineficácia da inexpressiva maioria de seus dispositivos (que é,
finalment
e, o retrato da própria realidade social); [...]. Isto significa dizer que uma ‘baixa
compreensão’ acerca do sentido da Constituição
naquilo que ela significa no âmbito do Estado
Democrático de Direito
inexoravelmente acarretará uma ‘baixa aplicação’,
com efetivo prejuízo
para a concretização dos direitos fundamentais
-
sociais. As condições de possibilidades para que
o intérprete possa compreender um texto implicam (sempre e inexoravelmente) a existência de
uma pré
-
compreensão (seus pré
-
juízos) acerca da
totalidade (que a sua linguagem lhe possibilita)
do sistema jurídico
-
político
-
social”.
180
TRINDADE, 2007, p. 136: “A adoção das necessidades humanas como elemento
deterninante dos Direitos Fundamentais propicia uma maior segurança ao próprio sistema de
con
trole social. Esse fato deriva da manutenção do ser em seu meio como elemento
centralizador das relações sociais. As necessidades humanas são imutáveis. O que muda
são as formas como essas necessidades são expressas no meio social”.
181
CANOTILHO, 1999, p. 1
.093
-
1.099.
1
1
2
2
2
2
fundamentais
,
normas constitucionais de garantias institucionais
,
normas
constitucionais determinadoras de fins e tarefas do Estado
e
normas
constitucionais impositivas
.
Feitas tais considerações introdutórias, passa
-
se à análise mais
det
alhada das chamadas regras jurídico
-
materiais, quais sejam, aquelas
relativas aos
direitos fundamentais
, tendo em vista que seu conteúdo
normativo se entremostra inteiramente aplicável ao tema principal em
discussão.
Assim, é de primordial importância def
inir que tais normas
compreendem todos os preceitos referentes à constituição, ao reconhecimento
e à garantia dos direitos fundamentais dos cidadãos, interpretando
-
se estes
como sendo os “[...] princípios que resumem a concepção do mundo e
informam a ideol
ogia política de cada ordenamento jurídico”,
182
servindo, ainda,
de reserva para “[...] designar, no nível do direito positivo, aquelas
prerrogativas e instituições que ele concretiza em garantias de uma
convivência digna, livre e igual de todas as pessoas”.
183
-
184
Neste contexto, cabe alinhavar também que, em razão da magnitude e da
importância que devem ser obrigatoriamente emprestadas aos regramentos
constitucionais existentes
mormente aqueles de especial relevância para o
sistema jurídico, sejam eles explí
citos ou não
a Carta de 1988 houve por bem
dogmatizar inovação relativa ao controle concentrado de constitucionalidade,
positivando no § 1º de seu Art. 102 a possibilidade de aforamento da nominada
argüição de descumprimento de preceito fundamental.
185
182
SILVA, 1996, p. 176
-
177.
183
Ibidem, p. 176
-
177.
184
Ibidem, p. 177: “No qualificativo fundamentais acha
-
se a indicação de que se trata de
situações jurídicas sem as quais a pessoa humana não se realiza, não convive e, às vezes,
nem mesmo sobrevi
ve; fundamentais do homem no sentido de que todos, por igual, devem
ser, não apenas formalmente reconhecidos, mas concreta e materialmente efetivados.
Direitos fundamentais do homem significa direitos fundamentais da pessoa humana ou
direitos humanos funda
mentais”.
185
TAVARES, 2001, p. 122: “[...] traduz
-
se, mais precisamente, na somatória entre, de uma
parte, parcela dos próprios princípios constitucionais (já que nem todos eles são preceitos
fundamentais), bem como, de outra parte, das regras cardeais de um sistema constitucional,
constituídas essencialmente, pelo conjunto normativo assecuratório dos direitos humanos”.
1
1
2
2
3
3
De
acordo com a definição apresentada no
Dicionário de tecnologia
jurídica
elaborado por Pedro Nunes,
186
tem
-
se que direito fundamental é todo
aquele do qual os demais nascem ou derivam.
Pela definição acima apresentada, conclui
-
se,
ab initio
, que os direitos
fundamentais gozam de um caráter de indispensabilidade, de essencialidade
dentro do sistema jurídico, uma vez que, sem eles, os demais sequer existiriam
ou, ao menos, não teriam sentido ou, gozariam de eficácia, em existindo, haja
vista que dizem respeito
ao mínimo essencial de proteção para se possa
qualificar, verdadeiramente, de digna, a vida do cidadão brasileiro.
Além das características normalmente afetas aos direitos fundamentais,
tais como inalienabilidade, imprescritibilidade e irrenunciabilidade,
Carlos Weis
187
aponta, em acréscimo, os seguintes atributos: (i) inerência; (ii) universalidade; (iii)
indivisibilidade e interdependência; e, (iv) transnacionalidade.
Aponta
-
se para a existência de duas dimensões em relação ao direito
fundamental: uma de
natureza subjetiva e outra, objetiva, sendo que a primeira
está sopesada num ponto de vista individualista, referentes aos atributos vitais do
indivíduo, tais como a própria liberdade, suas relações sociais e a forma de
participação política, dentre outros
.
Outrossim, se, como visto, de um lado os direitos fundamentais se
imbricam numa relação vertical (indivíduo/Estado),
188
de outro, pertencem e são
186
NUNES, 2001, tomo I, p. 502.
187
WEIS, Carlos.
Direitos humanos contemporâneos
. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 109
-
122.
188
ANDRADE, 2001, p. 146: “A atribuição dos direitos fundamentais pressupõe agora também o
valor da solidariedade, isto é, da responsabilidade comunitáriados indivíduos: descobre
-
se a
dimensão participativa, incluindo no âmbito dos direitos as actuações individuais de caráter
político; acentua
-
se a dimensão social, ao ligar a garantia do gozo dos direitos por todos à
necessidade de uma intervenção colectiva reguladora e prestadora que crie as condições
gerais do seu exercício efectivo […] não se trata somente de negar o caráter
absoluto e
incondicional dos direitos individuais, possibilitando o seu condicionamento e até a sua
restrição para salvaguarda de interesses da comunidade ou dos direitos dos outros. A
objetivação dos direitos vai além da possibilidade de compressão que r
esulta do seu
enquadramento social, atinge
-
os na sua interioridade, já que a dimensão objectiva também
pode contribuir para definir (delimitar) à partida a extensão e o alcance do conteúdo que, por
interpretação dos preceitos constitucionais, lhes deve ser
atribuído”.
1
1
2
2
4
4
afetos a toda sociedade e aos valores e princípios que a norteiam, constituindo
-
se, assim, em elementos essen
ciais da ordem político
-
jurídico geral.
No que pertine à questão da nomenclatura, tem
-
se que, para fazer
referência aos direitos relativos à pessoa, têm sido usadas, indistintamente, as
expressões direitos humanos, direitos do homem e direitos fundamentai
s.
189
Embora doutrinadores de escol coloquem em segundo plano a questão
afeta à denominação dos direitos em estudo, certo é que a expressão
direitos
fundamentais
acaba por refletir, de maneira mais precisa, a positivação dos
direitos humanos, tanto é assim
que a doutrina contemporânea vem dando
preferência ao seu uso, quando deseja fazer alusão àqueles direitos positivados
numa Constituição de determinado Estado.
190
Afinal, se é certo que a expressão
direitos fundamentais
não tem o
cunho histórico e jusnatura
lista da expressão
direitos humanos
, também é
evidente que essa não contém o sentido mais interno e positivado daquela. Ou
seja, a depender da ótica de observação, deve prevalecer o emprego de uma
ou outra.
191
Todavia, não obstante a nomenclatura que venha
a ser utilizada para tal
designação, dúvidas não existem em relação a fato de que, todo Estado que se
diz constitucional e democrático, tem o precípuo dever de efetivar e concretizar o
conteúdo essencial dos direitos fundamentais, sob pena de ser responsab
ilizado
por tão grave omissão em relação a sua função basilar.
189
CANOTILHO, 1999, p. 369: “As expressões ‘direitos do homem’ e ‘direitos fundamentais’ são
freqüentemente utilizadas como sinônimas. Segundo sua origem e significado poderíamos
distingui
-
las da seguinte maneira: direitos do homem são direitos válidos para todos os povos
e em todos os tempos (dimensão jusnaturalista
universalista); direitos fundamentais são os
direitos do homem, jurídico
-
institucionalmente garantidos e limitados espacio
-
temporalmente”.
190
ARAUJO; NUNES JÚNIOR, 2001, p. 108: “P
rimeiro, pela sua abrangência [...] o termo
fundamental destaca a imprescindibilidade desses direitos à condição humana [...] também é
a mais recomendável por razões pragmáticas: é a utilizada pelo nosso ordenamento jurídico
positivo (Título II da CF)”.
191
CANOTILHO, 1999, p. 369: “As expressões ‘direitos do homem’ e ‘direitos fundamentais’ são
freqüentemente utilizadas como sinônimas. Segundo sua origem e significado poderíamos
distingui
-
las da seguinte maneira: direitos do homem são direitos válidos para todos os povos
e em todos os tempos (dimensão jusnaturalista
universalista); direitos fundamentais são os
direitos do homem, jurídico
-
institucionalmente garantidos e limitados espacio
-
temporalmente”.
1
1
2
2
5
5
3.3.2
Escorço histórico
-
dimensional
Para Manoel Gonçalves Ferreira Filho, as fontes e os precedentes dos
direitos fundamentais remontam à Antiguidade clássica que criou a idéia de
direitos of
ertados pelos deuses.
192
Para Jorge Miranda, Luiz Alberto David de Araujo e Vidal Serrano Nunes
Junior, o cristianismo é o marco inicial, na medida em que essa doutrina religiosa
elevava o homem à situação de semelhança a Deus e, por conseguinte, a um
novo
patamar de dignidade.
193
Fábio Konder Comparato aponta que, após o abandono das mitologias, é
com os pensadores dos séculos VII a II a.C. que se desenvolvem os fundamentos
para a afirmação da existência de direitos universais da pessoa humana: “[...] é a
pa
rtir do período axial que o ser humano passa a ser considerado, pela primeira
vez na História, em sua igualdade essencial, como ser dotado de liberdade e
razão, não obstante as múltiplas diferenças”.
194
Frente a essas ideologias, o Código de Hamurabi (1690
a.C.), a Lei das
Doze Tábuas,
195
os forais e as cartas de franquia são os primeiros registros de
direitos fundamentais em documentos escritos, em que pesem estes últimos
tratarem mais propriamente de direitos de comunidades locais ou de
corporações.
196
192
A propósito, Manoel Gonçalves Ferreira Filho chega a
citar a Antígona
,de Sófocles e
De
legibus
, de Cícero. FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves.
Direitos humanos
fundamentais
. 4ª ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 09.
193
MIRANDA, 1996, tomo II, p. 17 e ARAUJO; NUNES JÚNIOR, 2001, p. 80.
194
COMPARATO, Fábio Kon
der.
A afirmação histórica dos direitos humanos
. 2ª ed. rev. e
ampl. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 08
-
11.
195
Segundo Alexandre de Mores, a Lei das Doze Tábuas pode ser considerada como a origem
dos textos escritos a consagrar direitos de liberdade, proprieda
de e direitos próprios dos
cidadãos. MORAES, Alexandre de.
Direitos humanos fundamentais
: teoria geral,
comentários aos Arts. 1º a 5º da Constituição da república federativa do Brasil, doutrina e
jurisprudência. São Paulo: Atlas, 1998, p. 25.
196
FERREIRA FI
LHO, 2000, p. 11: “Em toda a Europa encontram
-
se exemplos, não do registro
de direitos do Homem, mas de direitos das comunidades locais, ou de corporações, por meio
de forais ou cartas de franquia. Nestes, eu os senhores feudais, mormente os reis,
outorgav
am, inscreviam
-
se direitos próprios e peculiares aos membros do grupo
direitos
fundamentais, sem dúvida
para que, por todo o sempre, fossem conhecidos e respeitados”.
1
1
2
2
6
6
A tais
documentos e com maior repercussão, se sucedeu a Magna Carta
de 1215, tida como elemento essencial, não apenas da origem dos direitos
fundamentais, mas também de todo o constitucionalismo.
A propósito desse marco histórico de sumo relevo, Manoel Gonçalves
Ferreira Filho preleciona:
Se essa Carta, por um lado, não se preocupa com os direitos do
Homem, mas sim com os direitos dos ingleses, decorrentes da
imemorial ‘
law of the land
’, por outro, ela consiste na enumeração
de prerrogativas garantidas a todos o
s súditos da monarquia. Tal
reconhecimento de direitos importa numa clara limitação de poder,
inclusive com a definição de garantias específicas em caso de
violação dos mesmos.
197
Canotilho, de outro lado, esclarece que a Magna Carta não tratava do
estabele
cimento escrito dos direitos fundamentais:
[...] mas da afirmação de direitos corporativos da aristocracia
feudal em face de seu suserano. A finalidade da ‘Magna Carta’
era, pois, o estabelecimento de um modus vivendi entre o rei e
os barões, e consistia
fundamentalmente no reconhecimento
de certos direitos de supremacia ao rei, em troca de certos
direitos de liberdade testamentais consagrados nas cartas de
franquia.
198
Todavia, considera
-
se, em termos gerais, o principal representante deste
momento o crist
ianismo, que serviu de vigoroso meio divulgador dos ideais de
igualdade, pregando a congregação entre os homens, independentemente de
origem, raça e sexo.
Vale mencionar, em continuidade, que os séculos XVII e XVIII foram
marcados pela ascensão das teorias contratualistas, defendidas, entre outros, por
John Locke, caracterizadas pelo pensamento de que os soberanos deveriam
exercer sua autoridade com submissão ao direito natural, havendo,
conseqüentemente, a primazia do indivíduo sobre o Estado.
197
Ibidem, p. 11
-
12.
198
CANOTILHO, 1999, p. 358.
1
1
2
2
7
7
José Carlos
Vieira de Andrade
199
assevera que, após este período, o
fortalecimento dos direitos fundamentais deu
-
se através das revoluções liberais,
citando, como exemplos, a Declaração de Direitos da Virgínia, em 1776, a
Declaração de Independência dos Estados Unidos
da América e a Constituição
americana, respectivamente em 1776 e 1787.
E, malgrado as Declarações de Direitos terem exercido papel de forte
relevo na história dos direitos humanos, é o constitucionalismo que se alça ao
patamar de terceira grande pedra ang
ular dessa origem e evolução.
O constitucionalismo é tido como o movimento para a inclusão de um rol
mínimo de direitos nas Constituições escritas.
As Constituições Francesas de 1791 e 1793, a Constituição Espanhola de
1812, bem como a Constituição Portu
guesa de 1822, foram os primeiros
resultados concretos desse movimento. Nada obstante, foi a Constituição Belga
de 1831 que exerceu papel inaugural no cenário europeu sob a ótica de reservar
Capítulo próprio aos direitos fundamentais.
Não se perdendo de vista a advertência de Bobbio, no sentido de que os
direitos do homem, por mais fundamentais que sejam, “[...] são direitos históricos,
ou seja, nascidos em certas circunstâncias, caracterizados por lutas em defesa de
novas liberdades contra velhos poderes, e nascidos de modo gradual, não todos
de uma vez e nem de uma vez por todas”,
200
a doutrina constitucional apresenta
as seguintes fases afetas aos direitos fundamentais,
201
a saber:
199
ANDRADE, 2001, p. 43: “Os direitos fundamentais triunfaram nos fins do século XVIII com as
revoluções liberais. Apareceram, por isso, fundamentalmente, como liberdades, esferas de
autonomia dos indivíduos em face do poder do Estado, a quem se exige que se abstenha,
quanto possível, de se int
rometer na vida social. São liberdades sem mais, puras autonomias
sem condicionamentos de fim ou de função, responsabilidades privadas num espaço auto
-
determinado [...]. O liberalismo pressupõe o indivíduo como ponto de partida. Por isso, explica
contratua
lmente a sociedade e o Estado [...]”.
200
BOBBIO, Norberto.
A era dos direitos
. Rio de Janeiro: Campus, 1992, p. 05.
201
SAMPAIO, José Adércio Leite.
Direitos fundamentais
. Belo Horizonte: Del Rey, 2004
,
p.
310: “A classificação geracional tem o mérito de nos mostrar em forma simples e didática um
resumo da história dos direitos, mas peça se for tomada a fundo e a sério feito
compartimentalização estanque, misturando estruturas e funcionalidades em uma mesma
categoria”.
1
1
2
2
8
8
a)
primeira
dimensão
: corresponde aos chamados direitos individuais
(indispen
sáveis à pessoa humana), constituindo
-
se como limites impostos à
atuação do Estado, ou, melhor dizendo, como prestação negativa, um não fazer
por parte do Estado.
Os direitos fundamentais de primeira dimensão correspondem,
perfeitamente, às demais denomin
ações de
liberdades públicas
,
direitos
individuais
,
direitos civis e políticos
e, até mesmo, de
direitos subjetivos públicos
.
Interessante também saber que supostamente o primeiro direito
fundamental surgido foi, segundo Kriele, o de proteção contra prisã
o arbitrária
(
habeas corpus
) e, já, segundo Jellinek, o de liberdade religiosa.
202
Em suma, são direitos de cunho negativo, que representam um dever de
abstenção do Estado e, por conseguinte, um direito de resistência do homem
diante daquele.
b)
segunda
di
mensão
: a segunda dimensão dos direitos fundamentais se
aporta no reconhecimento dos direitos sociais, visando, assim, ao oferecimento de
meios materiais indispensáveis à efetivação e à concretização dos direitos individuais.
São, na essência, resultantes
da necessidade superveniente de os
indivíduos não apenas se protegerem contra o Estado, mas também de passarem
a deter uma lista de prestações exigíveis do próprio Estado, até mesmo para que
pudessem exercitar os direitos de liberdades públicas.
Por outr
as palavras, significam uma prestação positiva, um fazer do
Estado em prol daqueles que se encontram desfavorecidos e desguarnecidos
pela ordem econômica e social, podendo
-
se citar como marco constitucional de
surgimento dos direitos de segunda dimensão as pioneiras experiências mexicana
(em 1917) e alemã (em 1919), inserindo
-
se no que se entende por
constitucionalismo social.
202
TAVARES, 2002, p. 369 e nota de rodapé
nº 43.
1
1
2
2
9
9
Nesse particular, importante se faz transcrever o escorreito raciocínio
talhado por José Luiz Quadros de Magalhães:
[...] os direit
os sociais são essenciais para os direitos políticos,
pois será através da educação que se chegará à participação
consciente da população, o que implica também necessariamente
ao direito individual à livre formação de consciência e à liberdade
de expressão
e informação. Os direitos econômicos, da mesma
forma colaboram para o desenvolvimento e a efetivação de
participação popular através de uma democracia econômica.
203
c)
terceira
dimensão
: são direitos de terceira dimensão
204
os
denominados direitos difusos e
coletivos, como os direitos do consumidor,
das crianças e dos adolescentes, o direito ambiental, percebendo
-
se, então,
uma preocupação em relação aos direitos de pessoas coletivamente
consideradas.
Os direitos fundamentais de terceira dimensão surgem após
a Segunda
Guerra Mundial
205
e, conjuntamente aos de primeira e segunda dimensões,
completam o triplo ideário da Revolução Francesa.
Compreendem os denominados direitos de solidariedade ou
fraternidade e, embora pouco consenso exista sobre a respectiva natu
reza
jurídica e sua extensão, englobam o direito à paz, o direito ao
desenvolvimento, o direito ao meio ambiente e o direito ao patrimônio comum
da humanidade.
Segundo André Ramos Tavares, direitos de terceira dimensão são os
denominados direitos coletivo
s
206
e, na mesma linha, Ingo Wolfgang Sarlet
leciona:
203
MAGALHÃES, José Luiz Quadro de (coord.).
Pacto federativo
. Belo Horizonte:
Mandamentos, 2000, p. 44.
204
CANOTILHO, 1999, p. 362: “[...] Em terceiro lugar, não se trata apenas de direitos com um
suporte coletivo
o direito dos povos, o direito da humanidade. Neste sentido se fala de
solidary rights
, de direitos de solidariedade, sendo certo que a solidariedade já era uma
dimensão ineliminável dos direitos econômicos, sociais e culturais”.
205
Karel Vasak foi o primeiro a abordar essa espécie de direitos fundamentais, conforme relata
Manoel Gonçalves Ferreira Filho. FERREIRA FILHO, 2000, p. 58 e nota de rodapé nº 03.
206
TAVARES, 2002, p. 371.
1
1
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3
0
0
A nota distintiva destes direitos da terceira dimensão reside
basicamente na sua titularidade coletiva, muitas vezes indefinida e
indeterminável, o que se revela, a título de exemplo,
especialmente no dir
eito ao meio ambiente e qualidade de vida, o
qual, em que pese ficar reservada sua dimensão individual,
reclama novas técnicas de garantia e proteção.
Luiz Alberto David Araujo e Vidal Serrano Nunes Junior não acreditam
que os direitos coletivos, tal como
definidos pelo Código de Defesa do
Consumidor, correspondam a uma só determinada dimensão de direitos
fundamentais, visto que são assim denominados por distinta espécie de
classificação. Propugnam, sim, que tal dimensão parte da ótica “[...] do ser
humano
relacional, em conjunção com o próximo, sem fronteiras físicas ou
econômicas”.
207
Por sua vez, José Joaquim Gomes Canotilho pondera crítica sobre a
compreensão desses direitos no seguinte sentido:
[...] em terceiro lugar, não se trata apenas de direitos c
om um
suporte coletivo
o direito dos povos, o direito da humanidade.
Neste sentido se fala de solidary rights, de direitos de
solidariedade, sendo certo que a solidariedade já era uma
dimensão ineliminável dos direitos econômicos, sociais e
culturais.
208
Cumpre ressaltar, ainda, que alguns autores acrescentam o direito à
autodeterminação dos povos e o direito à comunicação dentre o rol dos direitos
fundamentais de terceira geração.
Muitos desses direitos de terceira dimensão estão mais especificados em
do
cumentos internacionais, sendo possível apontar previsão expressa na
Constituição vigente apenas do direito de comunicação, no Art. 5º, incs. XIV e
XXXIII, bem como do direito ao meio ambiente sadio e ecologicamente
equilibrado, no Art. 225. Já como garant
ia desse último, também possível
enumerar a ação civil pública, no Art. 129, inc. III e a ação popular no Art. 5º, inc.
LXXIII.
207
ARAUJO; NUNES JÚNIOR, 2001, p. 116.
208
CANOTILHO, 1999, p. 362.
1
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3
1
1
André Ramos Tavares pondera:
[...] tem
-
se falado, recentemente, em direitos humanos de quarta
dimensão, entre os quais se compr
eenderiam os direitos das
minorias, cuja proteção é de enorme importância na verificação do
nível democrático de um país. Paulo Bonavides apresenta essa
dimensão dos direitos humanos como composta pelo direito à
democracia, o direito ao pluralismo e o dire
ito à informação.
209
José Adércio Leite Sampaio,
210
dentre outros doutrinadores, já aponta
para a existência de uma quinta dimensão, cumprindo esclarecer que, para o
desenvolvimento do tema afeto ao presente trabalho serão utilizadas as três
primeiras e cláss
icas divisões dos direitos humanos fundamentais, não se
adentrando, assim, em discussões sobre a existência ou a pertinência das
demais.
3.3.3
Extensão e limites
Conforme salienta Luis Aguiar de Luque:
[...]
el concepto de limites es inherente al conc
epto de derecho y
que, en el conjunto del sistema juridico, las diferentes situaciones
de derecho deben necesariamente limitarse reciprocamente, a fin
de que puedan coexistir en una comunidad civil bien ordenada
.
211
Tomando por base a lição acima apontada,
tem
-
se que, mesmo no
âmbito dos direitos fundamentais, uma vez que tais são, no comum das
209
TAVARES, 2002, p. 371
-
372.
210
SAMPAIO, 2004, p.
302: “Como o sistema de direitos anda a incorporar os anseios e
necessidades humanas que se apresentam com o tempo, há quem fale já de uma quinta
geração de direitos humanos com múltiplas interpretações. Tehrarian (1997 a e b) diz sobre
‘direitos ainda a
serem desenvolvidos e articulados’, mas que tratam do cuidado, da
compaixão e amor por todas as formas de vida [...]. Para Marzoki (2003), tais direitos seriam
direitos oriundos de respostas À dominação biofísica que impõe uma visão única do
predicado ‘ani
mal’ do homem [...]. Essa visão de complementariedade é encontrada também
em Lebech (2000), todavia em relação ao direito à vida sob os desafios das novas
tecnologias, derivando então um direito à identidade individual, ao patrimônio genético e à
proteção
contra o abuso de técnicas de clonagem”.
211
LUQUE, Luis Aguiar de.
Los limites de los derechos fundamentales
. In:
Revista del centro
de estudios constitucionales, nº 14. Madri: DTC, jan./abr. 1993, p. 14.
1
1
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3
2
2
vezes, veiculados por normas (princípios e regras), existirá a necessidade,
em situações específicas, de se impor limitação ao seu exercício, de modo
que se garanta,
inclusive, a sua própria efetividade, por mais paradoxal que
seja.
212
Aliás, do ponto de vista histórico, necessário se faz uma digressão no
sentido de lembrar a possibilidade de se estabelecerem limites ao exercício dos
direitos tidos como fundamentais, nã
o apenas para se permitir a coexistência
entre eles, mas também para proteger as estruturas sociais e a ordem pública,
como bem demonstra a redação emprestada ao Art. 4º da Declaração de Direitos
de 1789, a saber: “O exercício dos direitos naturais de cada
homem não tem mais
limites que os que asseguram aos demais membros da sociedade o gozo destes
mesmos direitos”.
Em tempos mais atuais,
ad exemplum
, tem
-
se a positivação do Art. 18, 2
e 3, da Constituição portuguesa. Observe
-
se:
Art. 18: [...]
2. A lei s
ó pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos
casos expressamente previstos na Constituição, devendo as
restrições limitar
-
se ao necessário para salvaguardar outros
direitos ou interesses constitucionalmente protegidos.
3. A lei restritiva de d
ireitos, liberdades e garantias têm de revestir
carácter geral e abstracto e não podem ter efeito retroactivo nem
diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos
preceitos constitucionais.
Consoante as ponderações de Gomes Canotilho e Vital More
ira, só se
pode falar em restrições ao exercício de um direito, depois de estar delineado o
212
ECHEVARRIA, Juan Jose Solozabal.
La teoria de los
derechos fundamentales
. In:
Revista
de estudios politicos (nueva epoca)
, nº. 71, jan./mar. 1991, p. 98: “
En primer lugar, del
caracter universal o general de los derechos fundamentales, cuyo disfrute simultaneo es
imposible sin la ordenación, de indudable
alcance restrictivo, de su ejercicio. La titularidad
universal de los derechos fundamentales implica ya, evidentemente, una primera limitación de
los mismos, en la medida en que tales derechos reconocidos a todos han de poder ser
ejercido simultaneamente t
ambién por todos. La limitación de los derechos fundamentales
puede derivarse, en segundo lugar, de la necesaria coexistencia de los mismos entre sí o con
otros bienes jurídicos constitucionalmente protegidos, pues, como veremos, los conflictos que
surjan
entre ellos no se resolverán de ordinario con la afirmación de la prevalencia
incondicionada o absoluta de alguno sobre los demás, sino con la afirmación de la vigencia
debilitada de todos
”.
1
1
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3
3
3
correlato conteúdo essencial, isto é, o conteúdo essencial restringe a liberdade de
conformação do próprio legislador.
213
Sob o mesmo aspecto, Gilmar Ferreira Mendes
ressalta a controvérsia
entre as teorias interna e externa, na medida em que, ao se adotar a primeira
delas, eventuais limitações veiculadas pela própria Constituição deverão ser tidas,
na verdade, como a própria definição do direito.
214
Partindo desse pre
ssuposto, a identificação do conteúdo essencial dos
direitos fundamentais variará, então, conforme o ordenamento constitucional
analisado e a teoria doutrinária adotada.
Diante deste quadro de garantia, os direitos fundamentais carecem de
uma ampla proteç
ão e aplicação, não se devendo cogitar sua limitação, senão em
casos e situações de extrema necessidade e excepcionalidade.
Um limite imposto a um direito fundamental é considerado, neste prisma,
uma negação a uma garantia fundamental, inviabilizando o ex
ercício de uma
possibilidade assegurada.
Para que tal postura possa ser validamente adotada, Villaverde
Menéndez
215
elenca quais seriam os três elementos que definem tecnicamente
um limite a um direito fundamental. Para ele, tais elementos seriam seu caráte
r
externo, sua projeção sobre o objeto do direito fundamental e a necessidade que
a própria Constituição concede ao poder público para limitar direitos
fundamentais.
Importante, porém, a ressalva feita por Gilmar Ferreira Mendes a respeito
da limitação do
s direitos fundamentais:
213
CANOTILHO, José Joaquim Gomes; MOREIRA, Vital.
Constituição da
república
portuguesa anotada
. 4ª ed. rev. Coimbra: Coimbra, 2007. vol. I, p. 149 e ss.
214
MENDES, 2004, p. 28 e nota de rodapé nº 115.
215
CORRAL, Benito Aláez; FREIJEDO, Francisco J. Bastida; LINERA, Miguel Angel Presno
et al
.
Teoría general de los derechos
fundamentales en la Constitución española de 1978
.
Porto Alegre: Tecnos, 2004, p. 120.
1
1
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3
4
4
Da análise dos direitos individuais pode
-
se extrair a conclusão
errônea de que direitos, liberdades, poderes e garantias são
passíveis de limitação ou restrição. É preciso não perder de vista,
porém, que tais restrições são limitad
as. Cogita
-
se aqui dos
chamados limites imanentes ou ‘limites dos limites’, que balizam a
ação do legislador quando restringe direitos individuais. Esses
limites, que decorrem da própria Constituição, referem
-
se tanto à
necessidade de proteção de um núcleo
essencial do direito
fundamental quanto à clareza, determinação, generalidade e
proporcionalidade das restrições impostas.
216
A noção de conteúdo essencial, a par das peculiaridades de cada
ordenamento, pode ser analisada sob duas diferentes teorias aponta
das por
Alexy.
217
A teoria objetiva propugna que a proteção dos direitos fundamentais se
verifica sobre o instituto, e não sobre a figura singular de cada indivíduo em
especial.
De outro lado, o caráter dos direitos fundamentais como direitos
individuais atua em prestígio para haver, ao menos, coexistência de uma teoria
subjetiva.
218
Essa teoria veda a supressão de direito subjetivo determinado e pode
ser subdividida em teoria absoluta e teoria relativa.
Segundo a teoria subjetiva absoluta, existe um núcleo
de cada direito
fundamental que, em nenhuma hipótese, pode ser afetado. Já, conforme a teoria
subjetiva relativa,
219
o conteúdo essencial é aquele resultante de uma
ponderação, de sorte que as restrições propostas pela aplicação do princípio da
proporcionali
dade não lesionam o conteúdo essencial a não ser na hipótese
particular de não deixarem nada de direito fundamental.
Enfim, cabe inferir que a importância de opção por uma das teorias se
demonstra irretorquível pelas distintas conseqüências jurídicas a se
extrair: (i)
caso se adote a teoria relativa, o conteúdo essencial dos direitos fundamentais
216
MENDES, 2004, p. 41.
217
ALEXY, 1993, p. 287 e ss.
218
Ibidem, p. 288 e nota de rodapé nº 45.
219
Ibidem, mesma página e nota de rodapé nº 46.
1
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5
não será predeterminado para todos os casos de modo definitivo, mas sim em
função dos interesses em presença no caso concreto; (ii) de outro lado, se
empregada al
udida teoria absoluta, o conteúdo essencial será pensado com
independência da casuística, ou seja, com validade uniforme frente a qualquer
direito ou interesse em conflito.
Em relação a esta essencialidade, Ana Maria D’Avila Lopes afirma:
[...] a garanti
a do conteúdo essencial é concebida como um
limite à atividade limitadora dos direitos fundamentais, isto é,
como o ‘limite dos limites’. O conteúdo essencial atua como
uma fronteira que o legislador não pode ultrapassar,
delimitando o espaço que não pode
ser ‘invadido’ por uma lei
sob o risco de ser declarada inconstitucional. Por isso é que a
garantia do conteúdo essencial é o limite dos limites, indicando
um limite além do qual não é possível a atividade limitadora dos
direitos fundamentais.
220
Suas idéia
s não diferem, em essência, das propostas formuladas por
Menéndez,
221
que discorreu sobre este conflito, a quem ele apresenta como
sendo uma situação enganosa, uma vez que, para ele, este conflito de direitos
não passa de uma falsa aparência.
A proposta par
a a resolução deste aparente conflito de direitos está na
aplicação do princípio da proporcionalidade, aliada de primeira hora da aplicação
da ponderação de bens, mencionada por Gilmar Ferreira Mendes em sua obra
Hermenêutica constitucional e direitos fund
amentais
.
222
Daniel Sarmento:
220
LOPES, 2001, p. 194.
221
CORRA
L; FREIJEDO; LINERA, 2004, p. 124:
“[...]
el limite al derecho fundamental preterido
em el aparente conflicto no emana del resultado de uma previa ponderación de bienes, sino
que precede a toda ponderación, porque para resolver la colisión, primero hay que
delimitar el
derecho fundamental y aplicarle sus limites, fijando así el âmbito de su protección. Como se
vê, es uma cuestión de interpretación (delimitacion/limitación) de los derechos fundamentales
y especialmente de interpretación/aplicación de sus limites y no de ponderación de los valores
que encarnam
”.
222
MENDES, Gilmar Ferreira.
Hermenêutica constitucional e direitos fundamentais
. Brasília:
Brasília Jurídica, 2000, p. 285.
1
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6
6
Conforme a doutrina mais autorizada, o princípio da
proporcionalidade é passível de divisão em três subprincípios: (a)
da adequação, que exige que as medidas adotadas tenham
aptidão para conduzir aos resultados almejados pelo l
egislador;
(b) da necessidade, que impõe ao legislador que, entre vários
meios aptos ao atingimento de determinados fins, opte sempre
pelo menos gravoso; (c) da proporcionalidade em sentido estrito,
que preconiza a ponderação entre os efeitos positivos da
norma e
os ônus que ela acarreta aos seus destinatários. Assim, para
conformar
-
se ao princípio da proporcionalidade, uma norma
jurídica deverá, a um só tempo, ser apta para os fins a que se
destina, ser a menos gravosa possível para que se logrem tais
fins
, e causar benefícios superiores às desvantagens que
proporciona.
223
Não obstante todas as ponderações feitas no transcorrer deste tópico,
conclusão inexorável que se apresenta é o fato de que “[...] nenhuma restrição de
direito fundamental poderá ser desproporcional e/ou afetar o núcleo essencial do
direito objeto da restrição”.
224
3.3.4
A família como direito fundamental
A família como
locus
especial de afeto, guarida e carinho, torna
-
se (e
sempre foi) palco inegável, em condições ideais, para o desenvol
vimento de todo
e qualquer ser humano (independente de raça, credo, origem), fazendo parte,
assim, de um atributo intrínseco do próprio homem, galgando fundamentalidade
na sua existência.
Devida a importância com que foram tratados, tem
-
se que os direitos
fundamentais podem ser considerados elementos de identidade e de
continuidade do próprio texto constitucional, conforme, aliás, salienta Gilmar
Ferreira Mendes, na obra denominada
Direitos fundamentais e controle de
constitucionalidade
.
223
SARMENTO, Daniel. Os princípios constitucionais e a ponderação de bens. In:
TORRES,
Ricardo Lobo (org.).
Teoria dos direitos fundamentais
. 2ª ed. rev. e atual. Rio de Janeiro:
Renovar, 2001, p. 57.
224
SARLET, Ingo Wolfgang.
A eficácia dos direitos fundamentais
. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2001, p. 120 e nota de rodapé nº 22
5.
1
1
3
3
7
7
O citado constitucionalista pondera que não cabe somente ao legislador a
precípua, necessária e indispensável tarefa de realização dos direitos
fundamentais, haja vista que, como não poderia deixar de ser, os demais órgãos
estatais, com poder normatizante extra ou judicial,
também têm referido dever
entre suas atribuições.
Noutro giro verbal, e confirmando o escorreito pensamento transcrito no
parágrafo anterior, necessário fazer coro às palavras de Ana Maria D’Ávila Lopes,
para quem:
[...] a obrigação de respeitar os dire
itos fundamentais significa a
proibição de violar os interesses dos particulares. Esta obrigação
de garantir os direitos fundamentais consiste no dever dos órgãos
estatais de eliminar todo perigo e de destruir qualquer obstáculo
que possa ameaçar a realiza
ção dos interesses protegidos por
esses direitos.
225
Diante de tal quadro, embora não fique apenas adstrito a tal, denota
-
se, com solar clareza, que uma das precípuas finalidades dos direitos
fundamentais é o de outorgar eficaz e real concreção ao postulado
estrutural
da República Federativa do Brasil, a saber: a proteção da dignidade da
pessoa humana.
Em continuidade, e usando
-
se uma vez mais as lições de Gilmar Ferreira
Mendes,
226
podem
-
se citar as seguintes funções em relação aos direitos
fundamentais: (i) defesa, (ii) proteção de institutos jurídicos, (iii) garantia positiva
do exercício de liberdades, e, (iv) concretizador dos direitos às pretensões
positivas.
No que diz respeito à primeira função
direitos de defesa
, há que se
ponderar que tal deside
rato confere ao cidadão proteção em relação a atos
estatais que venham ou acabem, injusta e ilegitimamente, interferindo em sua
liberdade.
225
LOPES, 2001, p. 107.
226
MENDES, 2004, p. 03 e ss.
1
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8
O malferimento dessa seara protetiva confere, imediatamente, ao lesado
a possibilidade de buscar pretensões de abstenção, de revogação, de anulação,
de consideração e de proteção.
Ao se proceder a análise dos direitos fundamentais sob o aspecto de
normas de proteção de institutos jurídicos, verifica
-
se a existência, imposto pela
Constituição Federal, de um plexo normati
vo atinente a caracterizar e proteger
situações como a propriedade, a herança, o casamento e, indispensavelmente, a
família, não se perdendo de vista que, em casos que tais:
[...] a atuação do legislador revela
-
se indispensável para a própria
concretizaçã
o do direito. Pode
-
se ter aqui um autêntico dever
constitucional de legislar (
Verfassungsauftrag
), que obriga o
legislador a expedir atos normativos ‘conformadores’ e
concretizadores de alguns direitos.
227
Num terceiro enfoque, têm
-
se os direitos fundamenta
is como instrumentos
garantidores, positivamente, do exercício das liberdades pelo cidadão, o que
significa, em síntese, a obrigação estatal em envidar todos os esforços
necessários para colocar à disposição desse mesmo cidadão, as ferramentas de
natureza
jurídica e material, incluindo
-
se em tal a edição de atos de índole
legislativa, se preciso for.
Nas palavras de Gilmar Mendes, tem
-
se:
[...] os direitos a prestações encontraram uma receptividade sem
precedentes no constitucionalismo pátrio, resultando,
inclusive, na
abertura de um Capítulo especialmente dedicado aos direitos
sociais no catálogo dos direitos e garantias fundamentais. Além
disso, verifica
-
se que mesmo em outras partes do texto
constitucional encontra
-
se uma variada gama de direitos a
pres
tações. Nesse contexto, limitando
-
nos, aqui, aos direitos
fundamentais, basta uma breve referência aos exemplos do Art.
17, § 3º, da Constituição Federal (direito dos partidos políticos a
recursos do fundo partidário), bem como do Art. 5º, inc. XXXV e
LXXI
V (acesso à Justiça e assistência jurídica integral e
gratuita).
228
227
Ibidem, p. 05 e ss.
228
Ibidem, p. 09 e ss.
1
1
3
3
9
9
O início da solução deste aparente problema está na identificação da
extensão dos efeitos dos direitos fundamentais, narrada, com clareza, por Jorge
Novais:
Na medida em que consubstanciam
uma ordem objectiva ou
sistema de valores que resultam de uma decisão constitucional,
as normas de direitos fundamentais tem uma força conformadora,
potencialmente expansiva a toda a ordem jurídica, que dirige ao
poder político, à Administração, ao legisl
ador e ao poder judicial
impulsos e directvas de actuação [...]. Os direitos fundamentais
relevam aqui, não apenas enquanto máximas de interpretação de
todo o direito processual em conformidade à Constituição, mas
também constituindo, eles próprios, garant
ias constitucionais com
uma dimensão procedimental intrínseca que pode assumir relevo
especial em alguns deles
seja porque sua concretização é
essencialmente dependente do procedimento, ameaçada pelo
procedimento ou mesmo constituída pelo procedimento (c
omo no
caso dos direitos fundamentais enquanto direitos processuais, ou
seja enquanto garantias instrumentais ou processuais de reforço
ou realização de outros direitos fundamentais materiais)
, mas
que está presente em todos os direitos fundamentais, na
medida
em que para todos eles seja possível sustentar uma pretensão de
efectiva tutela jurídica que não pode, no Estado de Direito de
nossos dias, prescindir de um procedimento.
229
A preocupação com a proteção da dignidade da pessoa humana começou
a ganhar
espaço com o surgimento do Cristianismo, e construiu, através dos
tempos, a importância que hoje desfruta no seio do ordenamento jurídico mundial
vigente, devendo
-
se ressaltar, por oportuno, que uma das primeiras tentativas de
se elevar o ser humano à dogm
a constitucional surgiu com a eclosão da
Constituição da República italiana de 27 de dezembro de 1947, eis que no intróito
do seu Art. 3º, dentro do âmbito dos Princípios Fundamentais, restou consignado
que “[...] todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a
lei”.
Todavia, a doutrina atribui o pioneirismo de tal iniciativa como sendo
pertencente à Lei Fundamental de Bonn, de 23 de maio de 1949, responsável por
solenizar, no seu Art. 1.1., a seguinte altercação: “
A dignidade do home
m é
intangível. Os poderes públicos estão obrigados a respeitá
-
la e protegê
-
la
”. É
229
NOVAIS, Jorge.
As restrições aos direitos fundamentais não expressamente
autorizadas pela Constituição
. Coimbra: Coimbra, 2003, p. 80.
1
1
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0
0
inegável que a afirmação acima encontrou sua fonte de inspiração na Declaração
Universal dos Direitos Humanos, aprovada pela Assembléia Geral das Nações
Unidas de 10 de deze
mbro de 1948, sem deslembrar o respeito aos direitos
naturais, inalienáveis e sagrados do homem, propugnados pelos revolucionários
franceses através da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 26 de
agosto de 1789.
Compactuando com a mesma linha
de raciocínio, correspondente aos
princípios fundamentais, a Carta Magna Portuguesa promulgada em 1976
estabeleceu logo no seu Art. 1º: “Portugal é uma República soberana, baseada,
entre outros valores na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e
e
mpenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária”. De igual
modo, a Constituição Espanhola em seu Art. 10.1, cuja eclosão se deu depois da
esmorecida do regime franquista, assim expressa: “A dignidade da pessoa, os
direitos invioláveis que
lhe são inerentes, o livre desenvolvimento da
personalidade, o respeito pela lei e pelos direitos dos outros são fundamentos da
ordem política e da paz social”.
Curiosamente, na França, país sempre na vanguarda da proteção dos
direitos individuais, o prin
cípio em estudo não vem disciplinado no Texto
Constitucional de 1958, sendo que sua aplicação decorre do exercício de
hermenêutica desenvolvido pelo Conselho Constitucional, o qual, desde 1994,
vem defendendo que a dignidade da pessoa humana constitui prin
cípio
constitucional.
A extirpação do regime comunista do leste europeu trouxe profundas
mudanças nas constituições dos países que outrora se filiaram a essa forma de
governo totalitária, passando, então, a cultuar e a cultivar entre as suas diretrizes
a
dignidade do ser humano, como bem demonstram a Constituição da República
da Croácia, de 22 de dezembro de 1990 (Art. 25); o Preâmbulo da Constituição da
Bulgária, de 12 de julho de 1991; a Constituição da Romênia, de 08 de dezembro
de 1991 (Art. 1º); a Lei
Constitucional da República da Letônia, de 10 de
dezembro de 1991 (Art. 1º); Constituição da República Eslovena, de 23 de
dezembro de 1991 (Art. 21); a Constituição da República da Estônia, de 28 de
1
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1
1
junho de 1992 (Art. 10º); a Constituição da República da
Lituânia, de 25 de
outubro de 1992 (Art. 21); a Constituição da República Eslovaca, de 1º de
setembro de 1992 (Art. 12); o Preâmbulo da Constituição da República Tcheca,
de 16 de dezembro de 1992, e a Constituição da Federação da Rússia, de 12 de
dezembro
de 1993 (Art. 21).
230
Mister se faz salientar que, mesmo em países que legitimam a execução
de um condenado como forma de aplicação das sanções estatais criminais
exigidas pela sociedade (pena de morte), a dignidade da pessoa humana está
presente. A Suprema Corte Norte
-
Americana, por exemplo, considerou atentatório
a essa mesma dignidade alguns tipos de execução, devendo, nesse particular,
ser destacado o Caso Campbell v. Wood, no qual o referido órgão constitucional:
[...] reconheceu que a morte por enfor
camento constitui prática
atentatória à dignidade da pessoa humana, notadamente, pelo
fato de infligir
ao menos em relação aos outros meios utilizados
(injeção letal e eletrocutamento)
sofrimento desnecessário ao
sentenciado, já que constatada a possib
ilidade maior de uma
postergação do estado de inconsciência e morte, com risco de
asfixia lenta e até mesmo de decapitação parcial ou total,
verificada em diversos casos.
231
Não comungando com o entendimento que legitima a execução de
indivíduos como forma
de atuação repressiva estatal, Ingo Wolfgang Sarlet diz,
sabiamente, que:
[...] não restam dúvidas de que a dignidade da pessoa humana
engloba necessariamente o respeito e a proteção da integridade
física do indivíduo, do que decorrem a proibição da pena
de
morte, da tortura, das penas de cunho corporal, utilização da
pessoa humana para experiências científicas, estabelecimento de
normas para os transplantes de órgãos.
232
A verdade é que o princípio da dignidade da pessoa humana irradia seus
efeitos nas mai
s diversas situações e ocasiões em que o homem está presente,
como no contexto em estudo.
230
Exemplificação extraída de artigo subscrito por Edílson Pereira Nobre Júnior.
231
SARLET, 2001, p. 56
-
57.
232
Ibidem, p. 59 e nota de rodapé nº 82.
1
1
4
4
2
2
Impertinente seria olvidar a evidência de que “[...] todos os direitos e
garantias fundamentais encontram seu fundamento direto, imediato e igual na
dignidade da pessoa humana [...]”, e bem assim que “[...] os direitos e garantias
fundamentais podem, com efeito, ainda que de modo e intensidade variáveis, ser
reconduzidos de alguma forma à noção de dignidade da pessoa humana”.
233
Dignidade humana que, por ser o valor
-
fon
te de nossa Constituição
Federal,
234
um superprincípio constitucional,
235
ou um verdadeiro axioma da
civilização ocidental,
236
não poderia deixar de alcançar todos os setores da ordem
jurídica, como quer Maria Celina Bodin de Moraes.
Objetiva
-
se com isso, enfat
izar que a dignidade humana, antes de se
espraiar por todas as demais normas constitucionais
e mesmo pelas demais
normas do ordenamento jurídico, alcança os direitos fundamentais, dentre os
quais, os direitos individuais, ora especificamente estudados.
Não se tentará, aqui, esboçar um estudo sobre o conceito material de
normas de direitos fundamentais, como sinaliza Ingo Sarlet,
237
mesmo porque não
é esse o propósito do trabalho.
Por outro lado, há de ficar bem claro que, no constitucionalismo brasileiro,
a dignidade da pessoa humana configura pressuposto indissociável ao estudo dos
direitos e garantias individuais e, pelo menos, parte do núcleo essencial desses
direitos imune a restrições.
233
SARLET, 2001, p. 83
-
84. Mister se atentar para a circunstância que reforça nossa separação
entre individuais e fundamentais: o autor do texto ora utilizado, sem mencionar explicitamente
a que direitos se refere, enaltece que
por conta do princípio da dignidade da pessoa
humana
“pelo menos os direitos e garantias fundamentais diretamente fundados na
dignidade da pessoa podem e de
vem ser reconhecidos a todos, independentemente de sua
nacionalidade, excepcionando
-
se, à evidência, aqueles direitos cuja titularidade depende de
circunstâncias específicas e que, de regra, nem mesmo todos os nacionais de um
determinado Estado podem exercer, como ocorre especialmente com os direitos políticos ou
mesmo com os direitos dos trabalhadores”
(SARLET, 2001, p. 98).
É de se ver, assim, que o
autor parece aderir, nesse ponto, à primazia da proteção aos direitos individuais, separando
-
os dos polític
os e sociais.
234
Ibidem, p. 82.
235
ROCHA, 1990, p. 10.
236
BARCELLOS, Ana Paula de.
A eficácia jurídica dos princípios constitucionais
: o princípio
da dignidade da pessoa humana. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 103
-
104.
237
SARLET, 2001, p. 101.
1
1
4
4
3
3
De certo, alguns doutrinadores chegam a identificar o conteúdo da
dignidade da pessoa humana com o núcleo essencial dos direitos
fundamentais, razão pela qual a menção destacada desse princípio já se
justificaria.
Em sentido contrário, é também bem verdade que a doutrina majoritária
aponta para a existência de alguns di
reitos fundamentais com núcleo essencial
desprovido de conteúdo em dignidade e para os riscos de uma identidade
absoluta resultar em esvaziamento dessa garantia contra reformas legislativas e
interpretações judiciais restritivas.
238
Mesmo assim, veja
-
se que
Ingo Wolfgang Sarlet acrescenta a importância
desse princípio fundamental em termos de complementação e, quando possível,
também de composição do correlato conteúdo com o núcleo essencial dos
direitos fundamentais:
O conteúdo em dignidade da pessoa human
a acaba por ser
identificado como constituindo o núcleo essencial dos direitos
fundamentais, ou pela circunstância de
mesmo não aceita tal
identificação
se considerar que pelo menos (e sempre) o
conteúdo em dignidade da pessoa em cada direito fundament
al
encontra
-
se imune a restrições.
239
Portanto, é evidente que a dignidade da pessoa humana exerce papel de
suma relevância na análise concreta da extensão dos direitos fundamentais
individuais, seja porque haveria identidade absoluta com o respectivo conte
údo
essencial de cada qual, seja porque configuraria, pelo menos, elemento
complementar e parte integrante desse mesmo conteúdo.
Em suma, tem
-
se que a dignidade humana confere unidade de sentido à
Constituição e ao sistema de direitos fundamentais.
238
Ibidem, p. 1
19
-
120 e nota de rodapé nº 227.
239
Ibidem, p. 120
-
121. Confira, ainda, nota de rodapé nº 229, na qual cita o entendimento de H.
Scholler (O princípio da proporcionalidade no direito constitucional e administrativo da
Alemanha
) e de Daniel Sarmento (
A ponder
ação de interesses na Constituição sobre a
desproporcionalidade de uma restrição a direitos fundamentais
)
que mesmo sendo
adequada e necessária
implicar ofensa à dignidade da pessoa humana.
1
1
4
4
4
4
Nesse
contexto, inegável, também, sua importância no que diz respeito
ao fomento, ao fortalecimento e à concretização da personalidade dos indivíduos
que a constituem, mormente das crianças e dos adolescentes que dela fazem
parte, emergindo daí a opção de o legi
slador constituinte outorgar
-
lhes, com
status
jusfundamental, o direito de convivência familiar e comunitária.
A fundamentalidade da família passa, assim, pela consecução e pelo
desenvolvimento dos direitos da personalidade de seus membros.
Nesse compass
o, é possível se fazer a separação dos diversos direitos
subjetivos pertencentes ao homem em duas grandes matizes, a saber: aqueles
que são destacáveis da pessoa de seu titular (propriedade, crédito, etc.) e
aqueles que não podem ser separados do ser humano, estando a ele ligados de
maneira perpétua e permanente (vida, liberdade física e intelectual, nome, corpo,
imagem, honra), sendo estes últimos chamados direitos da personalidade.
240
Em consonância com o pensamento de Karl Larenz, tem
-
se que:
[...] o con
ceito de direito da personalidade não foi obtido na
Jurisprudência recente prescindindo das distinções de diferentes
direitos da personalidade e tendo fixado o que é comum a todos,
mas através da elaboração do específico conteúdo de sentido de
um tal direi
to e da sua função ao serviço de valores humanos.
241
Consagrando as determinações contidas na Constituição Federal, tem
-
se
que o novel Código Civil, inovando em relação à codificação civil pretérita, trouxe
Capítulo específico consagrado aos direitos da per
sonalidade, deixando, de lado,
240
CUNHA, Paulo Ferreira da. Direitos de personalidade, figuras próximas e figuras longínquas.
In: SARLET, Ingo Wolfgang (org.).
Jurisdição e direitos fundamentais
. Porto Alegre: s.e.,
2006, vol. I, tomo I, p. 183: “Em suma: continuamos a pensar que os direitos da personalidade
são a manifestação privatística de direitos fundamentais, e que estes não são apenas a sua
versão publicística, mas, ao invés, de entre todos, os Direitos fundamentais, em geral
independentemente de atinências aparentemente mais publicísticas ou privatísticas. O facto
de vincularem entidades p
úblicas e privadas (Art. 18º, nº 01 da Constituição da República
Portuguesa) parece
-
nos cabalmente esclarecer que não se limitam ao direito público, ou às
relações em que um dos sujeitos seja público. Também valem nas relações totalmente
inter
pares
,
inter
cives
. Além disso, há direitos fundamentais de pessoas colectivas e
organizações”.
241
LARENZ, Karl.
Metodologia da ciência do direito
. 3ª ed. Lisboa: Fundação Calouste
Gulbenkian, 1997, p. 687.
1
1
4
4
5
5
a característica predominantemente patrimonial de outrora, dando fiel
cumprimento ao postulado fundamental de dignificação do homem.
Decorrência congênita da recognição jurídica da dignidade da pessoa
humana é a proteção dos direitos da personalidade, vez que estes, conforme nos
ensina Elimar Szaniawski, representam o
conjunto de caracteres do próprio
indivíduo; consiste na parte intrínseca da pessoa humana
,
242
tornando
-
se, assim,
o conteúdo mínimo imprescindível da esfera jurí
dica de cada pessoa, tendo
relação com a vida, família, saúde, integridade física, honra, liberdades física e
psicológica, nome, imagem e reserva sobre a privacidade e intimidade.
Nesse passo, pode
-
se conceituar os direitos da personalidade como
sendo aqu
eles direitos que têm por objeto os atributos físicos, psíquicos e morais
da pessoa em si e em suas projeções sociais.
Os direitos da personalidade se caracterizam pela natureza
extrapatrimonial, embora seu maltrato possa implicar reflexos econômicos; são
absolutos, com eficácia
erga omnes
, pois o seu respeito é imposto a todos
(Estado e particulares); são irrenunciáveis, não podendo o titular dele abdicar;
intransmissíveis, restando inválida a sua cessão a outrem, mediante ato gratuito
ou oneroso; são imp
rescritíveis, uma vez que o transcurso do tempo, sem o seu
uso pelo titular, não lhe acarreta a extinção.
De tais características, duas delas guardam íntima vinculação ao tema
sob enfoque, a irrenunciabilidade e a intransmissibilidade, uma vez que impedem
que a vontade do titular possa legitimar o desrespeito à condição humana do
indivíduo, ou seja, não há como fazer ou obrigar a pessoa vir a renunciar ao seu
intrínseco direito de convivência familiar e comunitária.
Isso não significa que tornem, de todo,
irrelevante o consentimento nessa
seara; apenas limitam a liberdade de sua manifestação quando contrária à ordem
pública.
242
SZANIAWSKI, Elimar.
Direitos de personalidade e sua tutela
.
São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1993, p. 35
1
1
4
4
6
6
De nenhuma valia se afigura o consenso capaz de importar na supressão
do bem da vida, mas é admissível, observados certos parâmetros, uma limitação
voluntária do direito à integridade física, a exemplo do que se vê no
consentimento para intervenções médicas (dispensável em casos de estado de
necessidade), submissão à operação plástica de cunho estético, participação em
jogos esportivos violentos, etc.
Vale acrescentar, também, que a observância das conseqüências
jurídicas decorrentes dos direitos de personalidade é imprescindível ao respeito
da dignidade do ser humano, porquanto a sua idealização, com ênfase para a
jurisprudência alemã,
formada depois da segunda conflagração mundial, teve em
mira evitar que o indivíduo fosse submetido a qualquer sorte de menosprezo, quer
pelo Estado ou pelos demais indivíduos.
Desta maneira, indissociável se mostra o direito fundamental à família
como o
desenvolvimento dos não menos fundamentais direitos da personalidade.
Obtempera, com muita propriedade, Pietro Perlingieri, destacando seu
caráter manifestamente fundamental e indissociável da condição humana:
[...] a família como formação social, como
‘sociedade natural’, é
garantida pela Constituição (Art. 29, § 1º) não como portadora de
um interesse superior e superindividual, mas, sim, em função da
realização das exigências humanas, como lugar onde se
desenvolve a pessoa (Art. 2º, Const.). A família
é valor
constitucionalmente garantido nos limites de sua conformação e
de não contraditoriedade aos valores que caracterizam as
relações civis, especialmente a dignidade humana: ainda que
diversas possam ser suas modalidades de organização, ela é
finalizad
a à educação e a promoção daqueles que a ela
pertencem.
243
Embora comentando diretrizes positivadas na Constituição da Itália, a
verdade é que as afirmações lançadas no parágrafo anterior se amoldam como
luva aos princípios basilares estampados na Lei de Ou
tubro, até porque, de um
243
PIERLINGIERI, Pietro.
Perfis do direito do civil
: introdução ao direito civil constitucional.
São Paulo: Renovar, 2005, p. 243
-
244.
1
1
4
4
7
7
modo geral, tais assertivas se mostram irretocáveis em qualquer parte do
mundo.
De fato, não há como se negar que é por intermédio da família que o ser
humano busca e atinge a satisfação de suas necessidades básicas, mormente
aque
las afetas à própria sobrevivência e à formação de seu caráter, que o
legislador constituinte, em 1988, lhe reservou especial atenção constitucional.
244
É preciso que se diga, também, que os comentos em destaque, diante da
importância do tema
família
ultrap
assam, em muito, a questão jurídica, haja vista que
dizem respeito à própria essência de criação e de desenvolvimento do ser humano.
A família, dentro de seus padrões normais de amor e respeito, é fonte
eterna de elementos indispensáveis às citadas criação e desenvolvimento do ser
que nasce, tais como, carinho, segurança, amparo, aconselhamento.
Dentro do contexto atual, não se pode negar que a família ostenta a
importantíssima e inafastável função de servir de esteio à promoção da dignidade
da pessoa hum
ana,
245
emergindo daí que a necessidade de se tutelar
constitucionalmente referido grupamento social consiste no fato de que serve ela
de instrumento, como dito anteriormente, de desenvolvimento, estruturação e
sustento dos personagens que a formam.
246
244
PEREIRA, Rodrigo da Cunha.
Princípios fundamentais norteadores do direito
de família
.
Belo Horizonte: Del Rey, 2006,
p. 182: “Sem dúvida, a família é o lugar privilegiado de
realização da pessoa, pois é o lócus onde ela inicia seu desenvolvimento pessoal, seu
processo de socialização, onde vive as primeiras lições de cidadania e
uma experiência
pioneira de inclusão no laço familiar, a qual se reportará, mais tarde para os laços sociais”.
245
GARCIA, Maria. O direito à família. In: FIGUEIREDO, Marcelo; PONTES FILHO, Valmir.
Estudos de direito público em homenagem a Celso Antônio Ban
deira de Mello
. São
Paulo: Malheiros, 2006, p. 463: “O direito à família não somente adentra ao rol dos direitos
humanos, senão que se revela instrumento da realização de todos os direitos enumerados no
Art. 227 da Constituição e os demais deles decorrentes circundantes da dignidade da pessoa,
princípio fundamental do Estado (Art. 1º, inc. III)”.
246
PEREIRA, 2007, p. 523: “A exata compreensão da tutela constitucional da família e a
justificativa da intervenção do Estado na comunidade familiar não podem se sa
tisfazer tão
-
somente com a afirmação da necessidade de tutela da pessoa sem que se enfrente o
problema de delinear qual o papel global da pessoa na família, isto é, o problema de definir
de que forma a pessoa se apresenta na família sendo titular de direit
os
principalmente do
direito à sua própria realização pessoal
e simultaneamente co
-
responsável (solidariamente)
pela construção de um ‘lugar
-
comunidade’ onde também se respeite o desenvolvimento da
personalidade dos outros integrantes da mesma comunidade, tornando efetivamente possível
a vontade espontânea de plena comunhão de sentimentos, de vida e de história”.
1
1
4
4
8
8
Assim,
é a própria Constituição Federal quem determina e concebe a
família como sendo um direito fundamental
247
inerente e afeto a todo e qualquer
ser humano, haja vista ter consagrado, expressamente, ser ela a base da
sociedade, galgando especial proteção do Estado.
Isso é tão verdadeiro e real, conforme já havia apontado Rui
Carvalho Piva
248
e além do quanto positivado em seu Capítulo VII, que o
tema envolvendo o vocábulo
família
aparece inúmeras vezes durante o bojo
do texto constitucional, mais especificamente em
24 (vinte e quatro)
oportunidades.
A fundamentalidade do direito de ser ter uma família ganha espaço nas
três dimensões mais consagradas e utilizadas em estudos que tais.
249
Isso porque, no que diz respeito aos direitos fundamentais de primeira
dimensão,
tem
-
se sua caracterização pela não intervenção estatal em
determinados aspectos do indivíduo e da sociedade que ele compõem, ficando
caracterizado pela palavra
liberdade
.
Nesse eito, pode
-
se citar, como exemplo, a liberdade que é conferida às
pessoas de e
scolherem aquel’outras para a formação de uma determinada
247
PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Família, direitos humanos, psicanálise e inclusão social. In:
GROENINGA, Giselle Câmara; CUNHA, Rodrigo da Cunha
(coords.).
Direito de família e
psicanálise
: rumo a uma nova epistemologia. Rio de Janeiro: Imago, 2003, p. 156: “O Direito
de família é o mais humano de todos os ramos do direito. Em razão disso, e também pelo
sentido ideológico e histórico das exclusões,
é que se torna imperativo pensar o Direito de
Família na contemporaneidade com a ajuda e pelo ângulo dos Direitos Humanos, cujas bases
e ingredientes estão, também, diretamente relacionados à noção de Cidadania”.
248
PIVA, Rui Carvalho.
A legitimidade ativa
da família na tutela de interesses difusos
. Tese
(Doutorado em Direito). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2003, p. 142 e ss.
249
Disponívem em: <
http://www.srbarros.com.br/artigos.php?textlD=85
>. Acesso em: 12 mar.
2007:
“Quando se pensa em di
reitos humanos fundamentais, o que primeiro vem à mente é o
direito à vida. Mas não se pode pensar a vida humana sem pensar a família. Uma implica a
outra, necessariamente, e por isso que o direito à vida implica o direito à família, fundando
-
o
como o mais
fundamental dos direitos familiais. Outros direitos humanos fundamentais
também se ligam à família. A liberdade, a igualdade, a fraternidade, a solidariedade, a
segurança, o trabalho, a saúde, a educação e, enfim, a própria felicidade humana e tantos
outr
os valores que são objeto de direitos humanos fundamentais e operacionais, todos eles
se ligam ao direito à família e se realizam mais efetivamente no lar [...]. Por fim, não há
esquecer que, por ser direito da humanidade, o direito à família e com ele os
direitos
humanos da família são verdadeiros direitos difusos, que não podem ser negados a nenhum
sujeito humano. Não comportam, nem suportam discriminação”.
1
1
4
4
9
9
entidade familiar, a liberdade de planejar o número de membros que referida
entidade terá, dentre outras situações.
No que se refere aos direitos fundamentais de segunda dimensão,
caracterizados estes pela palavra igualdade, em seu sentido substancial, tem
-
se
que a concessão de direitos sociais interligados, umbilicalmente, à família, são:
saúde, educação, moradia, etc.
A terceira dimensão está lastreada na tutela de interesses coletivos
250
(supraind
ividuais, transindividuais ou metaindividuais),
251
cuja atuação se
desdobra em três espécies, a saber: (i) interesses difusos; (ii) interesses coletivos
strictu sensu
; e, (iii) interesses individuais homogêneos.
A propósito de tão importante ligação com os
direitos humanos de terceira
dimensão, tem
-
se a firme proposta defendida por Rui Carvalho Piva, em tese de
doutoramento, no sentido de que a entidade familiar possui, pela relevância e
característica que lhe são peculiares, legitimidade para propor ação ci
vil pública,
defendendo
-
se, assim, de atos, comissivos ou omissivos, que entenda contrários
aos seus direitos e interesses difusos.
252
A evidência mostra ser a família quem oferece o melhor quadro emocional
e moral para uma criança ou jovem adquirir um padrão de referência, uma forma
de agir e interpretar os acontecimentos que lhes cercam, tomando, assim,
decisões corretas e pertinentes com o seu normal desenvolvimento e com o
atingimento de uma qualidade de vida digna.
253
250
MANCUSO, Rodolfo de Camargo.
Ação civil pública
. 6ª ed. rev. e atual. São Paulo: Revista
dos Trib
unais, 1999, p. 65: Para o autor são aqueles que “[...] depassam a esfera de atuação
dos indivíduos isoladamente considerados, para surpreendê
-
los em sua dimensão coletiva”.
251
Existem, atualmente, 04 propostas de codificação da tutela coletiva: uma da Professora Ada,
Código Modelo para Ibero
-
América, Projeto da UERJ e da Estácio de Sá, e um de Antônio
Gidi. Nos quatro projetos já há consagração do controle jurisdicional (embora projetos, são
fontes de estudo do direito coletivo).
252
PIVA, 2003, p. 249: “[...
] a legitimidade da família para a defesa de interesses difusos
representará uma nova aliança familiar, uma aproximação solidária capaz de identificar
naquela que tomar a iniciativa, por exemplo, de propor uma ação civil pública, uma aliada que
não compart
ilha da vergonhosa pouca efetividade de direitos difusos constitucionalmente
assegurados”.
253
LINHARES, Paulo Afonso.
Direitos fundamentais e qualidade de vida
. São Paulo: Iglu,
2002, p. 144: “A qualidade de vida é uma categoria suficientemente ampla para a
branger
todos os direitos fundamentais da terceira geração já identificados e, quiçá, muito dos que
nem sequer ainda foram plenamente caracterizados”.
1
1
5
5
0
0
Embora a família, sozinha, não tenha
como garantir o resultado
mencionado no parágrafo anterior, sem sombra de dúvidas, serve de
esteio e conforto para o encaminhamento das escolhas que a vida impõe
a toda e qualquer pessoa, principalmente em relação àquelas que se
encontram em estágio de for
mação ou, em outras palavras, confere a
pessoa a chance de optar, com qualidade, por aquilo que entenda ser
mais pertinente à sua vida.
Se é verdade que a família por si só e dependente de suas
características não está apta a garantir, integralmente, qual
idade de vida aos
elementos que lhe integram, não menos verdade é o fato de que o indivíduo
suprimido de tal convivência, por mais que seja escorreito, não a atingirá, em
hipótese alguma.
254
De acordo com João Baptista Herkenhoff:
Vemos a família como a de
positária da vida. A família serve à
vida, quando gera e educa, numa atmosfera de segurança e amor.
A família serve à vida, quando gera na alma, trazendo ao convívio
do amor o filho adotivo. A família serve à vida, quando se amplia
no acolhimento de pais,
avós, parentes, agregados. A família
serve à vida, mas, mesmo assim, há partilha e comunhão, na
doação recíproca entre os cônjuges e na abertura para o mundo.
Não é o vínculo formalmente legal ou sacramental que estabelece
a família. A família é estabeleci
da pelo amor.
255
Solapar
-
se da criança e do adolescente seu direito fundamental de
convivência familiar e comunitária, sem que lhe seja estabelecido um contraponto
para mitigação da referida problemática, acarreta, como dito, a perda de uma
chance, a qual é
passível de ser tutelada e, ao menos, mitigada no campo
jurisdicional.
Isso porque, como direito fundamental que é, devem ser outorgadas, pelo
Estado, todas as condições mínimas para que os cidadãos tenham plenas
254
FACHIN, 2001, p. 144: “Aí se evidenciam os desafios que reclamam um novo olhar para o
Direito de Famíli
a, voltado para a efetividade material dos direitos fundamentais, assentados
na dimensão pessoal, superando a conotação patrimonializada das relações familiares”.
255
HERKENHOFF, João Baptista.
Justiça, direito do povo
. Rio de Janeiro: Thex, 2000, p. 80.
1
1
5
5
1
1
condições de vivificar referido grupament
o social, devendo ser ele
responsabilizado em caso de omissão ou deficiência de atuação, como será mais
bem detalhado no último capítulo deste trabalho.
A proteção efetiva do direito fundamental material exige
determinado procedimento que o garanta e o co
ncretize, sob pena de se
tornar letra morta dentro do ordenamento jurídico vigente, o que se cumpre
a todo custo evitar.
Deveras, de nada adiantaria o texto constitucional garantir a todo cidadão
brasileiro o direito de ir e vir dentro do território nacio
nal, senão tivesse
disponibilizado, com o mesmo
status
jurídico
-
fundamental, uma garantia à sua
concretização, qual seja, o
habeas corpus
.
256
Trazendo a discussão acima para o campo da família, tem
-
se de
que nada adiantaria resguardar o livre planejamento f
amiliar, senão fosse
garantida, aos membros de uma determinada entidade familiar que
optaram por ter filhos, assistência pré e pós
-
natal gratuitos, na rede
pública hospitalar.
É o que Sergio Rezende de Barros denomina de direitos fundamentais
propriamente
ditos e direitos fundamentais operacionais.
257
256
C
ORRÊA, Plínio de Oliveira.
Liberdade individual nos países do Mercosul
. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 1998, p. 122: “[...] o sistema brasileiro estabeleceu, clara e
induvidosamente, o controle jurisdicional da prisão, assegurando plena garantia ao in
divíduo,
como, aliás, recomendam os Organismos Internacionais, que defendem o respeito aos
direitos humanos para todos, indistintamente”.
257
Disponível em: <
http://
www.srbarros.com.br/artigos.php?textID=85
>. Acesso em: 03 fev.
2007:
Há quem separe direitos humanos de direitos fundamentais. Mas não é de ser aceito
esse entendimento de que os direitos humanos e os direitos fundamentais constituem dois
institutos jurídicos distintos. Essa separa
ção retira humanidade do fundamental e
fundamentalidade do humano, ao passo que na realidade do mundo jurídico o que se verifica
é que, contrariando essa dissociação doutrinária, os direitos humanos se associam, ora como
direitos mais fundamentais, ora como direitos mais operacionais, colocando em ação um só e
mesmo instituto para atender a uma só e mesma finalidade: realizar o ser humano em todos
os indivíduos humanos, nas condições de dignidade próprias de cada época da história da
sua civilização. Em ver
dade, não só realizar, mas também garantir a humanidade assim
realizada. Para essa finalidade maior se faz presente nos diversos ramos do Direito
e,
também, no direito de família
o desdobramento dos direitos humanos em fundamentais e
operacionais. O qu
e leva a perguntar qual é no direito de família o direito humano
fundamental de todos os outros. A resposta é uma só: é o próprio
direito à família
”.
1
1
5
5
2
2
Fica claro, assim, que, para cada direito fundamental material, deve existir
um correspondente direito fundamental procedimental, isto é, o cidadão que é
lesado ou se encontra na iminência de ser lesado num dir
eito fundamental que lhe
é ínsito, tem direito a procedimentos judiciais que venham a concretizar,
efetivamente, a reparação da referida lesão ou a sustação imediata daquela,
afastando
-
se, por via de conseqüência, eventual e inconstitucional déficit de
pro
teção.
Em outras palavras, tem o jurisdicionado, direito fundamental à proteção
jurídica efetiva, cuja proteção deverá ser balizada diante da observação de dois
inafastáveis parâmetros, a saber: (i) proibição da insuficiência; e, (ii) proibição do
excesso
.
Nesse passo, e fazendo coro a Sumaya Saady Morthy Pereira, tem
-
se
que:
[...] diante da realidade sócio
-
econômica da esmagadora maioria
da população brasileira é inconcebível qualquer interpretação das
normas constitucionais de proteção à família que ex
ima o Estado
de seus deveres de garantia e promoção dos direitos
fundamentais, afastando
-
o de seus objetivos fundamentais,
enunciados no Art. 3º da Constituição Federal, dentre eles o de
erradicar a pobreza, reduzir as desigualdades sociais e promover
o be
m de todos.
258
Concluindo, em sendo a família um direito fundamental do indivíduo, caso
os princípios, regras e situações que dela derivam acabem, ainda que por via
reflexa, atingindo, também, um grau (variante) de fundamentalidade, devem assim
mesmo ser tr
atados, protegidos e efetivados.
Noutro giro verbal, se a família tem
status
jusfundamental, tem
-
se que, em
desdobramento, o direito à convivência familiar afeta a crianças e adolescentes
ostenta a mesma natureza jusfundante, sob pena de, em assim não se
compreendendo, descaracterizar, por completo, a referida fundamentalidade do
258
PEREIRA, 2007, p. 542.
1
1
5
5
3
3
grupo social em estudo, o que, nem de longe, foi a motivação que norteou a
positivação do Capítulo VII da Constituição Federal promulgada em 05 de outubro
de 1988.
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I
A
A
O direito à família, como visto, é um direito de natureza jusfundamental e,
como tal, diz respeito à própria essência do ser humano, não podendo,
ou ao
menos, não devendo dele ser dissociado.
Nesse passo, não se pode privar nossas crianças e adolescentes de que
desfrutem a convivência familiar e, quando tal não se mostra efetivamente
possível, devem ser disponibilizados meios que venham a mitigar a
problemática,
de modo que novas famílias surjam no futuro.
Infelizmente o que se vê no
mundo dos fatos
é algo completamente
divorciado do objetivo protecional desejado pelo legislador constituinte, na medida
em que se percebe o atroz aumento de atos infracionais cometidos por menores,
da prostituição e do trabalho infantis, da evasão escolar, da desnutrição, dos
abandonos moral e intelectual, dentre outros inúmeros males que os assolam e
solapam as oportunidades de desenvolvimento digno, os quais, indiscu
tivelmente,
acabam voltando
-
se contra a própria sociedade que os gerou.
Embora, em tese, gozem de prioridade absoluta, o que se observa, muitas
das vezes, é o descaso do Estado para com nossas crianças e adolescentes,
principalmente na sua qualidade de ad
ministrador, de gestor e de executor da coisa
pública, na exata medida em que prestigia suas áreas de atuação mais preocupado
com o pleito eleitoral que se avizinha do que com os efeitos sociais que poderão ser
realmente experimentados pelos cidadãos brasi
leiros.
O problema de efetivação da proteção e da prioridade dos direitos da
criança e do adolescente remonta de há muito no Brasil, como bem nos ilustra
Vera Jofily:
1
1
5
5
5
5
[...] a criança brasileira pode ter sido objeto da caridade cristã dos
reis de Portugal
projetada no dever de assistência aos menores
abandonados, ao que se imagina, desde o apossamento da
Colônia. Contudo agravou
-
se esta situação de abandono,
porquanto no século XVII a Metrópole deixara à Colônia a
responsabilidade de prover a salvação daque
les inocentes. Desde
então teve início o aniquilamento da criança brasileira, a despeito
dos alertas, das declarações de autoridades constituídas, das
campanhas, das orações, de tudo o mais que deve ter sido dito e
escrito sobre a premente necessidade de se assistir ao menor.
259
E, ao se aniquilar a criança brasileira, se está, também, aniquilando o
texto constitucional e, principalmente, o futuro de nosso País, pois, como bem
salienta Ricardo Nery Falbo:
[...] inúmeras investigações antropológicas e sociol
ógicas,
orientadas pelo método funcionalista, demonstram o caráter
universal da família como instituição voltada para satisfazer
necessidades de cuidado e de educação em relação ao universo
infanto
-
juvenil. A satisfação destas necessidades garante a
sobrev
ivência física e material de seus sujeitos e a formação
social de seus hábitos e comportamentos. Assim, a família, como
grupo social composto de partes inter
-
relacionadas e
interdependentes, preenche, de modo a garantir a vida social do
grupo, a função de
socializar e de manter sua prole até a fase
adulta [...].
260
As crianças e adolescentes, pelo fato de ainda não apresentarem
desenvolvimento suficiente para efetuar(em) participação exclusiva e livre dentro
da sociedade, necessitam de especiais e particular
es instrumentos de proteção
dos seus direitos e interesses, cujo ponto de equilíbrio passa, necessariamente,
pela participação na vida familiar e comunitária ou, ao menos, de que lhe sejam
disponibilizados, quando tal não se mostra possível do ponto de vis
ta prático,
mecanismos de mitigação em relação a tal desiderato, a fim de que se tornem
adultos aptos e proveitosos ao convívio social.
Dentro do panorama brasileiro, verifica
-
se a existência de uma rede
normativa avançada e especializada no que se refere à positivação de tais direitos
259
JOFILY, Vera.
Patrimônio primordial
: extinção da criança rejeitada no Brasil
reversão do
processo. Rio de Janeiro
: Lumen Juris, 2006,
p. 11.
260
FALBO, Ricardo Nery.
Natureza do conhecimento jurídico
: generalidade e especificidade
no direito da criança e do adolescente. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2002, p.
96.
1
1
5
5
6
6
e na proteção de tais interesses, destacando
-
se, à luz do texto constitucional, a
edição do chamado
Estatuto da Criança e do Adolescente
, cujo diploma, do ponto
de vista técnico, é considerado um dos mais avançados do mundo,
trazendo,
inclusive, uma série de diretrizes visando sua efetivação, as quais, infelizmente,
não vêm sendo aplicadas a contento pelo Estado brasileiro.
Não de pode deixar correr ao largo, também, a importância do Ministério
Público na aplicação, manutenção e concretização dos direitos pertencentes às
nossas crianças e adolescentes, haja vista que, por força constitucional, referida
instituição desfruta papel preponderante e inafastável no cumprimento e no
atingimento do referido objetivo.
Para que se chegue a um melhor e maior nível de concretização do direito
fundamental dos infantes às convivências familiar e comunitária, impostergável se
faz a participação fiscalizatória do Ministério Público, o mesmo se dizendo da
necessidade de sua atuação como órgão independente e autônomo, a buscar a
implementação das políticas públicas necessárias, bem como a responsabilização
dos agentes públicos e políticos, pelos meios administrativos e processuais
próprios, quando a conduta por estes apresentada se divorcia dos
princípios e
objetivos fundamentais de nossa República.
De outro vértice, é cediço que o tema em comento (crianças e
adolescentes), não se restringe apenas à seara brasileira, sendo uma
preocupação de âmbito internacional, mostrando
-
se relevante, para o
correto
desenvolvimento deste trabalho, também se levar a efeito uma breve explanação
em relação aos mecanismos de proteção colocados à disposição dos
interessados em tal cenário.
Em continuidade, tem
-
se que a Constituição Federal de 1998 foi
clara e espe
cífica em determinar, no
caput
de seu Art. 227, que é dever da
família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente,
com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à
educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura,
à dignidade, ao
respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de
1
1
5
5
7
7
colocá
-
los a salvo de toda forma de negligência, discriminação,
exploração, violência, crueldade e opressão.
Para Cenise Monte Vicente, do Departamento de Psicologia e
Educação
da USP
Campus de Ribeirão de Preto;
[...] o bebê, ao ser concebido, já pertence a uma rede familiar, que
compreende o pai e a mãe e seus respectivos grupos familiares.
Ao pertencer a estes grupos, também já está estabelecido quem
são os outros
e o universo de escolhas amorosas e interdições às
quais estará sujeito, de acordo com a cultura onde ele está
inserido. Cada criança recebe um nome próprio e um sobrenome
que indicam esta pertinência. Sua constituição enquanto ser social
e enquanto indiví
duo, ao ser nomeado, inclui imediata e
intrinsecamente uma família, toda a rede de parentesco ao qual
estará vinculado.
261
Em verdade, ao tratar
-
se de temas tão importantes como aqueles
elencados no dispositivo constitucional de regência, necessário se faz
que, no
plano concreto, verifique
-
se o que o Direito Alemão nominou de
Wirkung der
Grundrechte im Privatrecht
, ou seja, a eficácia dos direitos fundamentais dentro
do direito privado.
Nesse eito, não há dúvidas de que o instituto da adoção se amolda
perf
eitamente como instrumento de fomento, concretização e eficácia dos direitos
fundamentais de crianças e adolescentes, na exata medida em que acaba por
propiciar convivências familiar e comunitária a quem, pelos infortúnios da vida,
não as detinha até então
.
Entretanto, se de um lado o instituto da adoção se mostra como
formidável instrumento de concretização à convivência familiar e comunitária
dos infantes desafortunados, tem
-
se que, de outro vértice, o Estado não pode
impor referido procedimento ao cidad
ão, por motivos que nos parecem óbvios
e, inclusive, por força do próprio vetor constitucional do livre planejamento
familiar.
261
VICEN
TE, Cenise Monte. O direito à convivência familiar e comunitária: uma política de
manutenção do vínculo
. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 47
-
48.
1
1
5
5
8
8
Assim, necessário se faz, também, e, a par do dever de fomentação do
referido instituto, que outras medidas sejam adotadas pelo E
stado de modo a,
pelo menos, minimizar os nefastos efeitos sentidos pelas crianças e adolescentes
que se encontram despidos da oportunidade de desfrutar o afeto familiar e o
comunitário, circunstância essa que, na prática, se entremostra muito rarefeita e
desprovida de efetividade.
Indispensável se faz a correta destinação e aplicação dos recursos
públicos específicos, a fim de que tais crianças e adolescentes tenham,
efetivamente, assegurados o direito à educação e ao trabalho, de modo que
atinjam um dign
o patamar de inserção social, podendo, no futuro, formar a família
que, outrora, não tiveram e possam colaborar, proficuamente, com a comunidade
em que vivem.
De acordo com o Art. 3º da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990:
Art. 3º: A criança e o adolesc
ente gozam de todos os direitos
fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da
proteção integral de que trata esta Lei, assegurando
-
se
-
lhes, por
lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim
de lhes facultar o desenvolviment
o físico, mental, moral, espiritual
e social, em condições de liberdade e dignidade.
Para que se compreenda corretamente a compostura do tema em debate,
necessário se faz estabelecer os parâmetros que envolvem a definição legal do
que, juridicamente, sign
ifica ser criança e adolescente para fins de proteção
estatal.
Nesse sentido, irretocável a descrição do pensamento de Noemi Friske
Momberger:
Para proteger os interesses das crianças e adolescentes é
necessário que se atente para diversas fases físicas
e psíquicas
pelas quais passam as crianças e adolescentes, para que as
medidas de proteção sejam adequadas e de acordo com os
estágios de desenvolvimento em que as crianças e adolescentes
se encontram. O assunto relativo à idade foi observado na
legislação
, pois o ECA, Art. 2º, assim define: são consideradas
crianças as pessoas até 12 anos de idade incompletos, e
1
1
5
5
9
9
adolescente aquelas pessoas entre 12 e 18 anos de idade. Esta
classificação é devida às diversas fases de desenvolvimento físico
e mental das cria
nças e dos adolescentes.
262
As diretrizes constitucionais e infraconstitucionais envolvendo crianças e
adolescentes sempre são enfrentadas de modo a proteger e preservar seus interesses,
tendo em conta que tais pessoas devem, realmente, ser encaradas como o
diamante bruto
a ser lapidado para o prosseguimento do desenvolvimento do Estado em que vivem.
Noutro giro verbal, deixar correr ao largo a proteção legal dos interesses
da criança e do adolescente é proscrever e acelerar o fim de um País que se julga
co
nstitucional e democrático e que tem esperanças de um amanhã melhor para
seus cidadãos.
263
É fingir que a dimensão subjetiva da dignidade humana não existe e que os
direitos fundamentais apenas dizem respeito a sonhos e ideais, cujo alcance se espera
um dia
atingir, mas, sem qualquer vinculação ou obrigação estatal verdadeiras.
É tornar letra morta a Constituição, bem como a prescrição, nela
inspirada, trazida pelo Art. 4º do ECA: “É dever da família, da comunidade, da
sociedade em geral e do Poder Público
assegurar, com absoluta prioridade, a
efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao
esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à
liberdade e à convivência familiar e comunitária”, não se perdendo de vista que,
de acordo com o Art. 7º do referido diploma de lei: “A criança e o adolescente têm
direito a proteção à vida e a saúde, mediante a efetivação de políticas sociais
262
MOMBERGERR, Noemi Friske.
A publicidade dirigida às crianças e adolescentes
:
regulamentações e rest
rições. Porto Alegre: Memória Jurídica, 2002, p. 44
-
45.
263
Segundo a lição do insigne jurista Paulo Lúcio Nogueira, quanto à matéria em evidência, tem
-
se que: “Como direitos fundamentais de qualquer pessoa hão que se colocar em evidência os
direitos à vida
e a saúde, pois, como diz o ditado, ‘a vida é realmente o único bem que a
pessoa tem’, já que os demais virão por acréscimo. Mas, é de se ter presente também que a
vida sem saúde constitui um grande sacrifício para a pessoa. Assim, nada mais justo do que
a
vida e a saúde serem considerados direitos fundamentais da criança e do adolescente, que
estão em fase de desenvolvimento e que merecem proteção especial da família, da
comunidade e do Poder Público, devendo este criar programas assistenciais que permitam
o
nascimento e o desenvolvimento harmonioso, em condições dignas de existência,
assegurando à gestante, à parturiente e à nutriz ou mulher que amamenta todas as condições
necessárias”.
NOGUEIRA, Paulo Lúcio.
Estatuto da criança e do adolescente
. 4ª ed. re
v.
aum. e atual. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 233.
1
1
6
6
0
0
públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmo
nioso,
em condições dignas de existência”.
O que se busca, em resumo, é que a Constituição seja efetivamente efetiva (a
redundância aqui se faz necessária), pois, atualmente, de certeza basilar mesmo,
somente o fato de Brasília ser a capital do Brasil (Ar
t. 18, § 1º) e do Colégio Pedro II,
com sede na cidade do Rio de Janeiro, ter sido mantido na órbita federal (Art. 242, §
2º), salvo raras exceções, pois, na precisa lição de Clèmerson Melin Clève:
[...] o Estado é uma realidade instrumental [...]. Todos
os poderes
do Estado, ou melhor, todos os órgãos constitucionais, têm por
finalidade buscar a plena satisfação dos direitos fundamentais.
Quando o Estado se desvia disso ele está, do ponto de vista
político, se deslegitimando, e do ponto de vista jurídico,
se
desconstitucionalizando.
264
Nesse passo, ao se efetivarem os direitos e os interesses de crianças e
adolescentes, estar
-
se
-
ão efetivando e fortificando suas respectivas entidades
familiares, o que, por sua vez, dentro de um benéfico círculo vicioso, ret
ornará em
força e segurança para tais infantes, numa ciranda protetiva que irradiará, com
toda certeza, efeitos sadios para toda a sociedade brasileira.
265
4.1
A Proteção de Crianças e Adolescentes no Plano Jurídico
Constitucional Brasileiro Anterior a 198
8
É sabido que muitas foram as lutas travadas e as dificuldades superadas
para que, ao menos do ponto de vista da positivação jurídica, se reconhecessem,
com a dignidade merecida, os direitos de crianças e adolescentes.
264
CLÈVE, Clèmerson Melin.
O controle de constitucionalidade e a efetividade dos direitos
fundamentais
, apud, SAMPAIO, José Adércio Leite.
Direitos fundamentais
. Belo Horizonte:
Del Rey, 2004, p. 388.
265
LUC
ARELLI, Maria Virginia Galvão Paiva. Repensando o direito de família, à luz dos direitos
constitucionais fundamentais. In: SILVA, Roberto B. Dias da.
Direito constitucional
: temas
atuais
homenagem à professora Leda Pereira da Mota). São Paulo: Revista do
s Tribunais,
2004, p. 140: “Aplicar às relações familiares, quaisquer que sejam elas, os direitos
fundamentais constitui
-
se em um direito/dever do legislador pátrio, bem como do intérprete da
lei. Incorporar esses novos paradigmas significa romper com a do
gmática vigente, de cunho
moralista e patriarcal, buscando uma nova realidade, calcada no afeto e na subjetividade”.
1
1
6
6
1
1
Enfim, para que os sujeitos de dir
eito em questão fossem, efetivamente,
reconhecidos como pessoas dignas de respeito e merecedoras de ampla e
específica proteção jurídico
-
constitucional, muito se suportou, se engoliu, se
machucou e se silenciou.
Todavia, como bem assevera Andréa Rodrigues Amin:
[...] vivemos um momento sem igual no plano do direito infanto
-
juvenil. Crianças e adolescentes são sujeitos de direito,
beneficiários da doutrina da proteção integral. Mas não podemos
olvidar que o presente é produto da soma de erros e acertos
viv
idos no passado. Conhecer o passado é um importante
instrumento para entendermos melhor o presente e construirmos o
futuro.
266
Desta feita, necessárias se fazem breves digressões e incursões sobre a
evolução e o desenvolvimento da normatização protetiva afe
ta às crianças e
adolescentes, primeiramente dentro de um panorama geral, para, posteriormente,
traçar
-
se o caminho seguido pelo ordenamento jurídico brasileiro.
Vejamos.
Na chamada Idade Antiga, dando
-
se destaque para Roma, tem
-
se que
crianças e adolesc
entes não desfrutavam o exercício de direitos, sendo tratados
como propriedade paterna, haja vista que o pai dispunha da possibilidade de
decidir entre a vida e a morte de sua prole.
Já, na Grécia, especialmente em Esparta, os pais transferiam para o
Esta
do a criação de seus filhos, a fim de que eles se tornassem guerreiros, ideal
máxima daquela imortal sociedade.
Na antiguidade, a condenação à morte de crianças doentes, deficientes
ou com má
-
formação era prática corriqueira e comum.
266
AMIN, Andréa Rodrigues. Evolução histórica do direito da criança e do adolescente. In:
MACIEL, Kátia Regina Ferreira Lobo Andrade.
Curso
de direito da criança e do
adolescente
: aspectos teóricos e práticos. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 03.
1
1
6
6
2
2
Em relação à Idade Mé
dia, vale destacar que, com o avanço do
cristianismo, começou a se vislumbrar o deferimento de direitos a crianças e
adolescentes, desde que, evidentemente, tais tivessem nascido sob o manto
matrimonial, eis que, do contrário, continuavam relegados à marge
m do Direito,
situação essa que, aliás, perdurou por muito tempo, espraiando seus nefastos
efeitos na ordem jurídica brasileira, inclusive.
Após o advento das duas grandes guerras mundiais, o cenário
internacional voltou o olhar, definitivamente, para a necessidade de regras firmes
e aplicáveis a todos os ordenamentos jurídicos democráticos no que pertine ao
tema da proteção dos direitos humanos, cuja normatização obviamente,
contemplou, os interesses de crianças e adolescentes.
No Brasil, o plano evoluti
vo da conquista da proteção integral e da
prioridade absoluta foi marcado por diversas lutas, como bem se verifica pelos
acontecimentos abaixo narrados.
Selma Regina Aragão e Angelo Luis de Sousa Vargas, citando lição de
Lima, mencionam:
[...] a criança,
no Brasil, sempre foi relegada a um segundo plano
pelas elites brasileiras. Em 1693, o então Governador Antonio
Paes de Sande, da Bahia, alertou El
-
Rei para o problema das
crianças abandonadas (‘desvalidas’ ou ‘expostas’, segundo
expressão da época). A Ca
rta Régia de 12 de dezembro de 1693
ordenou que as crianças fossem alimentadas pelos bens do
Conselho do Reino. A ordem não foi cumprida: a Câmara alegou
falta de recursos.
267
Na primeira Constituição Brasileira, qual seja, a de 1824, tem
-
se que a
única
fam
ília
ali efetivamente retratada e que mereceu especial atenção do
legislador constituinte foi a
família imperial
, mais precisamente no que se refere
ao conjunto normativo compreendido entre os Arts. 105 a 115 do aludido texto
basilar, destacando
-
se que a t
emática envolvia, em primazia, regras para a
267
ARAGÃO, Selma Regina; VARGAS, Angelo Luis de Sousa.
O estatuto da criança e do
adolescente em face do novo código civil
. São Paulo: Atlas,
2002, p. 03.
1
1
6
6
3
3
proteção e a determinação do sucessor do trono, valendo, a título exemplificativo,
mencionar o conteúdo do Art. 109, a saber: “A Assembléa assignará tambem
alimentos Principe Imperial, e aos demais Principes, de
sde que nascerem. Os
alimentos dados aos Principes cessarão somente, quando elles sahirem para f’óra
do Império”.
Saliente
-
se, a título de informação, que, no plano infraconstitucional,
vigiam as chamadas Ordenações do Reino, de modo que era permitido ao
pai,
para garantir a educação do filho, castigá
-
lo, não se considerando ilícito ou
antijurídico o fato de o infante falecer em decorrência do exercício do referido
direito
paterno.
Interessante, também, as disposições penais envolvendo a idade para a
apli
cação de sanções aos menores, contidas nas Ordenações Filipinas,
268
no
Código Criminal do Império de 1830
269
e no Decreto nº 847, de 11 de outubro de
1890 (Código Penal dos Estados Unidos do Brasil).
270
Nos dizeres de João Batista Costa Saraiva:
Enquanto no Br
asil vigorava o Código Penal de 1830 e travava
-
se
a luta abolicionista, tomava força nos Estados Unidos, onde mais
tarde veio germinar a idéia de um Direito de Menores, o
movimento feminista. Todas estas manifestações estão inseridas
268
“TÍTULO CXXXV:
Quando os menores serão punidos por os delictos, que fizerem
.
Quando algum homem, ou mulher, que passar de vinte annos, commetter qualquer delicto,
dar
-
se
-
lhe
-
ha a pena total, que lhe seria dada, se de vinte e cinco annos passasse. E se fôr
de idade de dezasete annos até vinte, ficará em arbitrio dos Julgadores dar
-
lhe a pena total,
ou diminuir
-
lha. E em este caso olhará o Julgador o modo, com que o delicto foi commettido,
e as circunstâncias delle, e a pessôa do menor; e se o achar em tanta malicia, que lhe pareça
que merece total pena, dar
-
lhe
-
há, postoque seja de morte natural. E parecendo
-
lhe que não
a merece, poder
-
lha
-
há diminuir, segundo a qualidade, ou simpleza, com que achar, que o
delicto foi commettido. E quando o del
inqüente fôr menor de dezasete annos cumpridos,
postoque o delicto mereça morte natural, em nenhum caso lhe será dada, mas ficará em
arbitrio do Julgador dar
-
lhe outra menor pena. E não sendo o delicto tal, em que caiba pena
de morte natural, se guardará a
disposição do Direito Commum”.
269
Art. 10: Tambem não se julgaráõ criminosos: § 1º
Os menores de quatorze annos
Art. 13: Se se provar que os menores de quatorze annos, que tiverem commettido crimes,
obrárão com discernimento, deveráõ ser recolhidos ás c
asas de correcção, pelo tempo que
ao juiz parecer, comtanto que o recolhimento não exceda a idade de dezesete annos.
270
Art. 27: Não são criminosos: § 1º
Os menores de nove annos completos; §2º
Os maiores
de nove e os menores de 14, que obrarem sem disc
ernimento; [...].
1
1
6
6
4
4
no contexto de afirmaç
ão dos direitos humanos, onde também se
situa o direito da infância.
271
Tomada por muitos como um dos pontos de partida no que se refere à
positivação de direitos da infância, não obstante sua manifesta perversidade aos
olhos atuais, tem
-
se a edição, em 187
1, da conhecida
Lei do Ventre Livre
(Lei nº
2.040, de 28 de setembro de 1871), cujo diploma declarava de condição livre os
filhos de mulher escrava que nascessem sob a égide da referida lei, libertava os
escravos da nação e outros, estabelecendo providênci
as sobre a criação e
tratamento daqueles filhos menores e sobre a libertação anual de escravos.
De igual forma à anterior, a Constituição Republicana de 1891 também se
furtou a trazer em seu bojo dispositivos que regulassem os direitos das crianças e
dos
adolescentes de modo específico, razão pela qual sua eventual proteção era
relegada ao critério geral estampado em seu Art. 72.
No intuito de contextualizar o início do período republicano brasileiro no
que se refere ao direito de crianças e adolescentes, com o momento vivenciado
no mundo, invoca
-
se uma vez mais o magistério de João Batista Costa Saraiva:
De importância tão grande quanto a marcha das mulheres
operárias [...], como marco do Direito da Mulher, foi, para o Direito
da Criança, o chamado Caso
Marie Anne. O episódio, informado
na história como precedente histórico pelos direitos da infância
nos Tribunais no mundo, remonta ao ano de 1896, final da última
década do século XIX. A menina de nove anos sofria intensos
maus
-
tratos impostos pelos pais,
fato que chegou ao
conhecimento público na Nova Iorque daquela época. Como para
o Direito Civil do século XIX, como vimos, não havia distinção
entre uma criança e um cachorro, ao menos do ponto de vista da
responsabilidade civil, o certo é que os pais julg
avam
-
se donos
dos filhos e que poderia educá
-
los como lhes aprouvesse. O
castigo físico
até hoje utilizado por alguns
era visto como
método educativo e sendo as crianças
como os animais
propriedade de seus donos, no caso os pais, poderiam ser
educa
das da forma que entendessem. A situação se tornou de tal
modo insuportável que o caso chegou aos Tribunais. Quem entrou
em juízo para defender os
direitos de Marie Anne e afastá
-
la de
271
SARAIVA, João Batista Costa.
Adolescente em conflito com a lei
: da indiferença à proteção
integral
uma abordagem sobre a responsabilidade penal juvenil. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2005, p. 29.
1
1
6
6
5
5
seus agressores? A Sociedade Protetora dos Animais de Nova
Iorque. Pod
eria não existir uma entidade preocupada com os
direitos da criança, mas já existiam uma entidade protetora dos
animais. Argumentou a entidade que se aquela criança fosse um
cachorro, um gato ou um cavalo, que estivesse submetida àquele
tratamento, teria e
la legitimidade para agir e então, com maior
razão, tratando
-
se de um ser humano. Instalou
-
se uma nova era
no Direito. A criança que, no início do século XIX era tratada como
‘coisa’, passou a reclamar ao menos condição de objeto da
proteção do Estado. Est
ava nascendo o Direito de Menores. Este
caso, quando foi registrado o primeiro processo judicial efetivo
tendo como causa maus
-
tratos causados a uma menina de nove
anos de idade pelos seus próprios pais, originou, de membros
daquela sociedade protetora dos
animais, o surgimento da
primeira liga de proteção à infância, Save the Children of World,
que se tornou um organismo internacional. Já em 1899, ao apagar
das luzes do século XIX, instalava
-
se no Estado Americano de
Illinois o Primeiro Tribunal de Menores do mundo.
272
Voltando
-
se os olhos para o Brasil, durante referido período, faz
-
se
relevante mencionar a edição da Lei nº 2.992/15, a qual modificou os Arts. 266,
277 e 278 do Código Penal (decreto do governo provisório 847, de 11/10/90),
tratando da corrup
ção de menores, dos crimes contra a segurança da honra e
honestidade das famílias e do ultraje público ao pudor.
Importante mencionar, também, que, durante o governo do Presidente
Arthur Bernardes, foi editado o Decreto nº 12.272, de 20 de dezembro de 192
3,
cujo diploma inaugurou a regulamentação, em nosso ordenamento, da assistência
e proteção dos menores abandonados e delinqüentes.
Por intermédio do Decreto nº 16.273, também de 20 de dezembro de
1923, foi criado no Brasil o primeiro juízo de menores, no Rio de Janeiro (à época
Distrito Federal), embora, em nível mundial, tem
-
se que o prístino Tribunal de
Menores surgiu, em 1899, nos Estados Unidos, cujos passos foram seguidos por
inúmeros outros países, a saber: Inglaterra (1905), Alemanha (1908) Portuga
l e
Hungria (1911), França (1912), Argentina (1921), Japão (1922), Espanha (1924),
México (1927) e Chile (1928).
273
272
Ibidem, p. 33
-
34.
273
Disponível e
m: <
http://www.mp.rs.gov.br/infancia/doutrina/id186.htm
>. Acesso em: 12 dez.
2006.
1
1
6
6
6
6
No governo de Washington Luís procedeu
-
se à consolidação das leis de
proteção e assistência aos menores, editando
-
se, assim, o Decreto nº 17.9
43
-
A e,
por intermédio do referido diploma legislativo, foi criado o primeiro Código de
Menores do Brasil, mais conhecido pela alcunha de
Código Mello Mattos
.
Inaugurando uma nota etapa na ordem jurídica pátria, a Constituição de
1934 apresenta título esp
ecífico sobre a família e a educação, explicitando no
caput
de seu Art. 144 que a família se encontrava sob especial proteção estatal, a
despeito do fato de o referido grupamento social formar
-
se apenas e tão
-
somente
quando da realização do ato matrimonial
, que era indissolúvel.
Importante destacar, também, que trazia a isenção de custas ou
emolumentos no que se refere ao ato de reconhecimento dos até então
chamados
filhos naturais
, mencionando, inclusive, que, em razão dos impostos
afetos a eventual heran
ça, sua fixação se daria de igual modo aos
filhos
legítimos
(Art. 147). Eclodia, timidamente, o embrião da igualdade entre todos
os filhos, cujo nascimento, efetivamente, só se daria no longínquo 05 de
outubro de 1988.
Por fim, cumpre salientar que, em seu Art. 149, restou estabelecido que a
educação era um direito de todos, devendo ser promovida pela família e pelo
Estado, visando ao atingimento de eficientes fatores da vida moral e econômica
do próprio País, além de buscar o desenvolvimento de um espírit
o brasileiro e
uma consciência de solidariedade humana.
A chamada
Constituição Polaca
, uma vez que claramente inspirada nos
idéias nazi
-
fascistas vigentes à época, manteve a apresentação de tópico próprio
para a família, delineando estar ela sob a especial proteção do Estado, trazendo
importante disposição no sentido de que a educação integral da prole é o primeiro
dever e o direito natural dos pais. O Estado não será estranho a esse dever,
colaborando, de maneira principal ou subsidiária, para facilitar a
sua execução ou
suprir as deficiências e lacunas da educação particular.
Mister rememorar, também, o conteúdo de seu Art. 127:
1
1
6
6
7
7
[...] infância e a juventude devem ser objeto de cuidados e
garantias especiais por parte do Estado, que tomará todas as
medida
s destinadas à assegurar
-
lhes condições físicas e morais
de vida sã e de harmonioso desenvolvimento das suas
faculdades. O abandono moral, intelectual ou físico da infância e
da juventude importará falta grave dos responsáveis por sua
guarda e educação, e
creia ao Estado o dever de provê
-
las de
conforto e dos cuidados indispensáveis à sua preservação física e
moral. Aos pais miseráveis assiste o direito de invocar o auxílio e
proteção do Estado para a subsistência e educação de sua prole.
Em seu Art. 129,
ficam ainda mais explícitas as preocupações e as
responsabilidades estatais pela concretização da proteção dos direitos inerentes à
infância e à juventude, mormente no que diz respeito à educação, haja vista que
imputa “[...] a Nação, aos Estados e aos Municípios assegurar, pela fundação de
instituições pública de ensino em todos os seus graus, a possibilidade de receber
uma educação adequada às suas faculdades, aptidões e tendências vocacionais”.
Em tal período, mister destacar a promulgação do atual Códi
go Penal
Brasileiro, estabelecendo a maioridade penal aos 18 anos completos, bem como
do Decreto
-
Lei nº 3.799, de 05 de novembro de 1941, que transformou o antigo
Instituto Sete de Setembro no Serviço de Assistência do Menor (SAM),
outorgando condições de atendimento aos menos afortunados, cujos dispositivos,
posteriormente, foram redesenhados pelo Decreto
-
Lei nº 6.865/44.
Juntamente com a de 1988, tem
-
se que a Constituição de 1946 é
considerada uma das mais democráticas que o Brasil já apresentou, sendo c
erto
que em seu corpo foi mantida a especial proteção estatal à família (Art. 163).
Por força de seu Art. 164, determinou
-
se que: “[...] é obrigatória, em todo
território nacional, à assistência à maternidade, à infância e à adolescência. A lei
instituirá
o amparo das famílias de prole numerosa”, não se olvidando, ainda, que
em seu Art. 166 estabeleceu
-
se que “[...] a educação é direito de todos e será
dada no lar e na escola. Deve inspirar
-
se nos princípios de liberdade e nos ideais
de solidariedade human
a”.
Aliás, é preciso que se diga que a preocupação com a necessidade de
educação a crianças e adolescentes era tão clara que o legislador constituinte
1
1
6
6
8
8
impôs às pessoas jurídicas de direito público interno a responsabilidade de
aplicação anual, nunca menos
de vinte por cento da renda aferida com a
arrecadação dos impostos, no afã de que fosse levada a efeito a manutenção e o
desenvolvimento do ensino (Art. 169).
Digno de nota, do ponto de vista infraconstitucional, fazer
-
se menção à
edição da
Lei nº
259/48
, que autorizava a abertura, pelo Ministério da Justiça e
Negócios Interiores, de crédito especial para atender ao pagamento de despesas
com a internação de menores.
Em continuidade, tem
-
se a
Lei nº 282/48
, que reorganizou o
Departamento Nacional da Criança do Ministério da Educação e Saúde, bem
como a
L
ei nº 2.252/54
, que dispôs sobre a corrupção de menores, tendo caráter
de legislação complementar ao código penal.
No âmbito assistencial e de proteção, relevante, também, a edição da
Lei
nº 3.771/60, que autorizou o Poder Executivo a abrir, pelo Ministério da Saúde,
crédito especial de Cr$ 20.000.000,00 (vinte milhoes de cruzeiros),
como auxílio à
associação de assistência à criança defeituosa e da
Lei nº 4.404/64
, que dispôs
sobre a nacionalidade de menor es
trangeiro residente no país filho de pais
estrangeiros naturalizados brasileiros e aqui domiciliados.
Durante o governo de Castello Branco, em razão das severas críticas que
estava recebendo, o Serviço de Assistência do Menor acabou sendo substituído,
por
intermédio da Lei nº 4.513/64, pela Fundação Nacional do Bem
-
Estar do
Menor, mais conhecida como FUNABEM (tendo como órgão executor regional a
FEBEM), devendo a nova entidade pautar sua atuação de acordo com as
diretrizes lançadas na PNBEM (Política Nacio
nal do Bem
-
Estar do Menor).
Em 1965, surgem as
Leis nº 4.655/65
, que dispôs sobre a legitimidade
adotiva, a adoção judicial de m
enor e a
nº 4.884/65
, que concedeu à Fundação
Nacional do Bem
-
estar do Menor (FUNABEM) o auxílio de Cr$ 6.000.000.000,00
(seis bi
lhoes de cruzeiros), autorizando a abertura de crédito especial para
atender a essa finalidade.
1
1
6
6
9
9
No ano seguinte, tem
-
se a edição da
Lei nº 5.145/66
, que dispôs sobre a
naturalização dos filhos menores nascidos antes da naturalização dos pais,
modificando os Arts. 3º, 4º e 8º da Lei nº 818, de 18/09/49 e revogando a Lei nº
4.404, de 14/09/64.
De modo mais frio e formalista, a Consti
tuição de 1967, outorgada à luz
turva e densa dos esquecíveis anos de chumbo, manteve a família sob a proteção
dos Poderes Públicos, a assistência à maternidade, à infância e à adolescência
(Art. 167) e a educação como direito de todos (Art. 168).
Nesse p
asso, surge a
Lei nº 5.258/67
, que dispôs sobre medidas
aplicáveis aos menores de 18 anos pela prática de infrações penais. Já,
a
Lei nº
5.267/67
acabou por proibir a exibição de
trailers
de filme impróprios para
crianças, nos espetáculos para menores.
Po
r intermédio da
Lei nº 5.274/67
, criou
-
se o salário
-
mínimo de menores,
devendo
-
se destacar, pela importância que desfruta até os dias de hoje, a eclosão
da
Lei nº 5.478/68
, a qual dispôs sobre ação de alimentos.
A
Lei nº 5.507/68
veio estabelecer prioridade para matrícula nos
estabelecimentos de ensino público de curso médio e dispôs sobre a concessão
de bolsas de estudo para os f
ilhos de ex
-
combatentes e órfãos menores carentes
de recursos.
Com o advento da Emenda Constitucional nº 01, de 17 de outubro de
1969, reformou
-
se o texto basilar anterior, sendo por muitos considerado, em
razão de tal fato, verdadeira Constituição.
A de
speito de tal discussão, a verdade é que, em seu Art. 175, manteve
-
se a especial proteção estatal à família, sendo que, no Art. 176, consignou
-
se que
a educação era direito de todos, mas inspirada no
princípio da unidade nacional
,
reforçando seu conteúdo m
anifestamente militaresco e absolutista.
Em 21 de outubro de 1969 foi aprovado Decreto
-
Lei nº 1.004, por
intermédio do qual se apresentava à sociedade brasileira um novo Código Penal,
1
1
7
7
0
0
cuja previsão de vigência inicialmente se daria, por força de seu Art. 407, no dia
1º de janeiro de 1970.
Nesse novo
codex
criminal, a questão da inimputabilidade penal vinha centrada
dentro de um sistema biopsicológico, haja vista que o menor entre 16 (dezesseis) e 18
(dezoito) anos responderia penalmente, se ficasse demons
trado que tinha
desenvolvimento psicológico suficiente para compreender a ilicitude de seu ato, tendo a
pena diminuída de um terço até metade daquela estabelecida originalmente.
274
O curioso é que o aludido diploma de lei não chegou a entrar em vigor,
tendo
em vista que, por diversas vezes, sua
vacatio legis
foi prorrogada para, ao
depois, acabar sendo revogado pelo Poder Legislativo.
Digno de nota, ainda, o Decreto
-
lei nº 1.001/69 (Código Penal Militar),
tendo em vista que, em seu Art. 50, fixava a imputab
ilidade aos 16 (dezesseis)
anos, cujo dispositivo somente deixou de ter vigência e eficácia quando da
promulgação da Lei de Outubro, uma vez que não logrou ser recepcionado diante
da redação emprestada ao Art. 228 do referido texto constitucional.
Ressalt
e
-
se que, com a edição da
Lei nº 5.582/70
, foi alterado o Art. 16 do
Decreto
-
Lei nº 3.200, de 19/04/41, que dispunha sobre a org
anização e proteção da
família, sendo certo que, no concernente a
Lei nº 5.675/71, deu
-
se nova redação ao
Art. 77, do Decreto nº 5.083, de 01/12/26, que instituiu o Código de Menores.
Já, a
Lei nº 6.037/74
estendeu às Fundações Nacional e Estaduais do
Bem
-
Estar
do Menor, a isenção de que tratava a Lei nº 3.577, de 04/07/59
(desobrigação da taxa de contribuição de previdência dos institutos e caixas de
aposentadoria), enquanto a
Lei nº 6.086/74
dispôs, novamente, sobre o salário
-
mínimo dos menores.
274
Art. 33: O menor de dezoito anos é inimputável salvo se, já tendo completado dezesseis
anos, revela suficiente desenvolvimento psíquico para entender o caráter ilícito do
fato e
determinar
-
se de acôrdo com êste entendimento. Neste caso, a pena aplicável é diminuída de
um terço até a metade. (Menores).
Art. 34: Os menores de dezesseis anos, bem como os menores de dezoito e maiores de
dezesseis inimputáveis, ficam sujeitos à
s medidas educativas, curativas ou disciplinares
determinadas em legislação especial.
1
1
7
7
1
1
Nesse período, o que se pode mencionar como digno de nota foi a
eclosão da Emenda Constitucional nº 09, de 28 de junho de 1977, por intermédio
da qual, finalmente, se quebrou a indissolubilidade do casamento, permitindo
-
se,
assim, a legitimidade dos institutos da separação e do divórcio, os quais foram
regulamentados pela Lei nº 6.515/77.
Diploma legislativo antecessor do atual Estatuto da Crian
ça e do
Adolescente, a Lei nº 6.697, de 10 de outubro de 1979, instituiu o Código de
Menores, manifestamente inspirada na chamada
doutrina da situação irregular
, a
qual pugnava que o infante era objeto da norma jurídica a partir do momento em
que se conver
tia em estado de patologia social, referindo
-
se, basicamente, à
situação de punição da delinqüência juvenil e não, concomitantemente, ao menos,
de sua correção e inserção comunitária.
Por fim, deve ser ressaltado o advento das Leis n
os
7.209/84, que deu
n
ova redação à Parte Geral do Código Penal, mantendo, por política criminal, a
inimputabilidade aos menores de 18 (dezoito) anos e 7.644/87, que
dispôs sobre
a regulamentação da atividade de mãe social, encontrando
-
se ainda em vigência,
embora não desfrutan
do a eficácia e efetividade merecidas.
A partir de 05 de outubro de 1988, os direitos de crianças e adolescentes,
no Brasil, sofreriam uma radical e intensa transformação; deixar
-
se
-
ia de lado a
obtusa doutrina da situação irregular para adotar
-
se a escor
reita tese da proteção
integral, ingressando
-
se, assim, num caminho sem volta, no que diz respeito a
fixação e à proteção (ao menos positiva) dos direitos fundamentais de nossos
infantes.
4.2
A Proteção de Crianças e Adolescentes na Constituição
Brasilei
ra de 1988
A Constituição Federal demonstrando, como visto, a importância do tema
em enfoque, houve por bem dedicar o Capítulo VII de seu Título VIII à família, à
1
1
7
7
2
2
criança, ao adolescente e ao idoso, oferecendo
-
lhes preciosos e fundamentais
dispositivos.
A seu turno, tem
-
se que o Art. 24, inc. XV, da Constituição Federal
estabelece, concorrentemente, ser da União Federal, dos Estados e do Distrito
Federal, a competência para legislar sobre proteção à infância e à juventude.
Abre a positivação sobre a infâ
ncia e juventude, consagrando
-
lhes o
direito fundamental à convivência familiar e comunitária, deixando indene de
dúvidas que crianças e adolescentes gozam de prioridade absoluta e proteção
integral, restando vedada qualquer forma de negligência, discrimin
ação,
exploração, violência, crueldade e opressão, sendo dever da família, do Estado e
da sociedade a concretização e o respeito do referido postulado constitucional
(Art. 227,
caput
).
O § 1º do referido dispositivo basilar incumbe ao Estado promover
prog
ramas de assistência integral à saúde da criança e do adolescente,
permitindo a participação, em tal mister, de entidades não governamentais,
devendo se fiar, também, nos seguintes preceitos: (i) aplicação de percentual dos
recursos públicos destinados à s
aúde na assistência materno
-
infantil; e, (ii)
criação de programas de prevenção e atendimento especializado aos portadores
de deficiência física, sensorial ou mental, bem como de integração social do
adolescente portador de deficiência, mediante o treiname
nto para o trabalho e a
convivência, e a facilitação do acesso aos bens e serviços coletivos, com a
eliminação de preconceitos e obstáculos arquitetônicos.
A Constituição Federal estabelece, ainda, uma série de aspectos que
devem ser obrigatoriamente obse
rvados, uma vez que dizem respeito ao direito
de proteção especial que devem desfrutar pessoas em condição peculiar de
desenvolvimento (Art. 227, § 3º e incisos.).
Assim, atinge
-
se a idade mínima para admissão em atividades laborais,
em composição com os
preceitos compreendidos no Art. 7º, inc. XXXIII, aos 14
(quatorze) anos, garantindo
-
se
-
lhes os direitos trabalhistas e previdenciários daí
decorrentes, e não se poderá obstar o acesso à escola por parte do trabalhador
adolescente.
1
1
7
7
3
3
É garantido, à criança e
ao adolescente, o pleno e formal conhecimento
da atribuição de ato infracional, igualdade na relação processual e defesa técnica
por profissional habilitado, além da obediência aos princípios da brevidade,
excepcionalidade e respeito à condição peculiar de
pessoa em desenvolvimento,
quando da aplicação de qualquer medida privativa de liberdade.
Garante
-
se a criação de programas de prevenção e atendimento
especializado à criança e ao adolescente dependente de entorpecentes, bem como o
estímulo do Poder Públ
ico, por intermédio da assistência jurídica, incentivos fiscais e
subsídios, a recepção, sob a forma de guarda de criança ou adolescente órfão ou
abandonado, sendo certo que, nos moldes do § 4º do Art. 227, a lei punirá o abuso, a
violência e a exploração
sexual dirigida contra os infantes.
O instituto da adoção ganha especial destaque no § 5º do Art. 227, na
exata medida em que deve ser ela assistida pelo Poder Público, abrindo
-
se a
possibilidade, dentro dos casos e condições previamente estabelecidos, de
sua
efetivação por parte de estrangeiros.
Entrementes, o ponto de maior relevo apresentado pelo texto
constitucional de 1988 refere
-
se à inserção, no § 6º de seu Art. 227, do já
mencionado
princípio da igualdade entre todos os filhos
, cujo postulado foi
repetido pelo Art. 1.596 do CC, a saber: “[...] os filhos, havidos ou não da relação
de casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas
quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação”.
A filiação é a maior acepçã
o de parentesco existente, na medida em que,
tanto do ponto de vista legal quanto do ponto de vista afetivo, traduz a máxima
proximidade entre duas pessoas, pouco importando se essa ligação tem caráter
biológico, civil ou social.
A seu turno, saliente
-
se
que, tecnicamente, a expressão
genitores
indica
filiação biológica, enquanto que
pais
refere
-
se à filiação socioafetiva, até mesmo
em adesão à máxima de que pais são os que criam e não necessariamente os
que geram.
1
1
7
7
4
4
Nesse eito, interessante o magistério de
Leila Donizetti:
[...] a noção de família mudou nos últimos anos em razão das
diversas transformações ocorridas na sociedade. O modelo
patriarcal existente no início do século XX, calcado na
funcionalização do matrimônio, deu lugar às famílias plurais
for
madas por pai ou mãe e seus filhos, por tios e sobrinhos, por
avós e netos, por casais homossexuais, e assim por diante, numa
diversidade tal que evidencia o verdadeiro papel da família, qual
seja: o de amparar moral, psíquico e economicamente os
membros q
ue a compõem [...]. O critério afetivo, portanto, adquire
relevância para a identificação da filiação, uma vez que a
paternidade biológica não consegue substituir a convivência
necessária para a construção permanente dos laços afetivos. A
filiação, vista n
esse enfoque, passa a assumir nova feição
diferenciada daquela oriunda do critério jurídico e/ou biológico. A
filiação chamada sociológica, que responde pelo critério afetivo, é
marcada por um conjunto de atos de afeição e solidariedade que
demonstram clar
amente a existência de um vínculo de filiação
entre filho
-
pai
-
mãe.
275
Há quem sustente
e com toda razão
, que a previsão da imprescritibilidade da
Ação Negatória de Paternidade
acaba por colidir com a tão conhecida teoria da
filiação
sócio-
afetiva
ou c
omo preferem alguns,
desbiologização da paternidade
, na medida em
que a permissão indiscriminada de, a qualquer tempo, poder se lançar mão da aludida
ação, desmerece, por completo, toda uma série de acontecimentos fáticos vivenciados
pelos sujeitos envol
vidos na questão, causando, assim, insegurança jurídica.
Nessa esteira de silogismo não parece adequada a alteração legislativa em
comentário, que
não obstante tenha vindo consolidar o pensamento dos tribunais
fez tábula rasa do conceito sociológico de filiação, que se preocupa mais com o
aspecto humano do que técnico da questão em estudo, pois inequivocamente a
relação filial está mais ligada por atitudes do que propriamente por genética.
276
275
DONIZETTI, Leila.
Filiação socioafetiva e direito à identidade genética
. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2001, p. 37.
276
MAIDANA, Jédison Daltrozo. O fenômeno da pater
nidade socioafetiva: a filiação e a
revolução da genética. In:
Revista brasileira de direito de família
, nº 24. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2007, p. 50
-
79: “[...] ser pai, ou mãe, na complexidade que esses termos
comportam, será sempre aquele ou aquela que, desejando ter um filho, acolhem em seu seio
o novo ser, providenciando
-
lhe a criação, o bem
-
estar e os cuidados que o ser humano
requer para o seu desenvolvimento e para a construção da sua individualidade e de seu
caráter. Aquele se dispõe a assum
ir, espontaneamente, a paternidade de uma criança,
levando ela ou não a sua carga genética, demonstra, por si só, consideração e preocupação
com o seu desenvolvimento. Será que, posteriormente, seria justo, sem a análise de outras
circunstâncias, desconsid
erar um vínculo dessa grandeza por uma simples divergência
genética?”.
1
1
7
7
5
5
De acordo com o §7º do Art. 227 da Constituição Federal, o ate
ndimento dos
direitos da criança e do adolescente deverá levar em consideração as formas de
arrecadação e a organização das ações governamentais na área da assistência
social previstas em seu Art. 204. Isso porque, a assistência social trazida pela Lei de
Outubro tem por objetivos, dentre outros, o de proteger à família, à maternidade, à
infância, à adolescência e à velhice, bem como o amparo aos infantes carentes.
O Art. 229 da
Lex Mater
apresenta direitos e deveres fundamentais afetos
ao
status
jurídico
de filho, eis que, se de um lado coloca a obrigação dos pais em
assistir, criar e educar os filhos menores, de outro, determina que os filhos
maiores ajudem e amparem seus pais na velhice, carência ou enfermidade.
No plano infraconstitucional, devem ser d
estacados os seguintes
diplomas legislativos, dentre outros promulgados:
A Lei nº 7.644, de 18 de dezembro de 1987, cujo diploma veio a
regulamentar a atividade da chamada
mãe social
nas instituições sem finalidade
lucrativa ou de utilidade pública de ass
istência ao menor abandonado que
funcionam no sistema de casas
-
lares.
A Lei nº 7.853/89 tratou sobre o apoio às pessoas portadoras de deficiência,
sua integração social, sobre a Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa
Portadora de Deficiência (CO
RDE), bem como instituiu a tutela jurisdicional de
interesses coletivos ou difusos dessas pessoas, disciplinando a atuação do Ministério
Público, definindo crimes, além de outras providências.
De relevo também, a edição do Decreto nº 99.710/90, cujo diplo
ma veio a
ratificar a Convenção Internacional de Direitos da Criança, aprovada pela ONU
em 1989, dispondo que todas as ações relativas a infantes levadas a efeito por
instituições públicas ou privadas deverão considerar, sempre, o princípio do
melhor inter
esse da criança e do adolescente.
A
Lei nº 8.069/00 dispôs sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente,
regulamentando, assim, as determinações constitucionais afetas, principalmente,
aos Arts. 227 e 228, cuja análise será realizada em tópico próprio.
1
1
7
7
6
6
Em continuidade, tem
-
se a edição da Lei nº 8.242/91
, que criou o
Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA).
Inspirada na legislação cubana e da ex
-
União Soviética, institui
-
se no
Brasil, por intermédio da Lei nº 8.560/92 a chamada
averiguação o
ficiosa da
paternidade
, disciplinando o
caput
de seu Art. 2º que, na ocasião do registro de
menor apenas com maternidade definida, o oficial do Registro Civil deve remeter
certidão ao juiz dando conta “[...] do registro e o nome e prenome, profissão,
ident
idade e residência do suposto pai, a fim de ser averiguada oficiosamente a
procedência da alegação”.
Tal procedimento é uma tentativa extrajudicial prevista pela lei para que a
pessoa indicada como pai reconheça espontaneamente a paternidade, evitando
-
se,
assim, maiores constrangimentos e dissabores tanto a ele quanto ao próprio menor.
Segue daí que o juiz determinará a notificação do suposto pai,
independentemente do seu estado civil, para que se manifeste sobre a
paternidade que lhe é atribuída (§ 1º),
ocasião em que a diligência poderá ser
efetivada em segredo de justiça (§ 2º).
Na hipótese de o averiguado confirmar expressamente a paternidade que
lhe foi atribuída, será lavrado termo de reconhecimento especificamente para
esse fim, realizando
-
se o com
petente registro (§ 3º), não sendo demais destacar:
[...] se o suposto pai não atender no prazo de 30 (trinta) dias a
notificação judicial, ou negar a alegada paternidade, o juiz
remeterá os autos ao representante do Ministério Público para que
intente, havendo elementos suficientes, a ação de investigação de
paternidade (§ 4º) e que a iniciativa conferida ao Ministério Público
não impede a quem tenha legítimo interesse de intentar
investigação, visando a obter o pretendido reconhecimento da
paternidade (§
5º).
A
Lei nº 8.642/93
dispôs sobre a instituição do Programa Nacional de
Atenção Integral à Criança e ao Adolescente (PRONAICA), enq
uanto que o
Decreto nº 1.056/94, regulamentou a forma de atuação dos órgãos do Poder
Executivo em face do referido PRONAICA.
1
1
7
7
7
7
As condutas que caracterizam crimes de tortura, estabelecendo dosimetria de
pena variável entre 02 (dois) a 08 (oito) anos de reclu
são foram definidas pela Lei nº
9.455/97, salientando, no inc. II do § 4º de seu Art. 1º, que referida punição será
aumentada de um sexto até um terço, quando o ilícito penal for desferido contra criança,
gestante, portador de deficiência, adolescente ou m
aior de 60 (sessenta) anos.
De seu turno, a
Lei nº 9.533/97 autorizou o Poder Executivo a conceder
apoio financeiro aos municípios que
instituírem programas de garantia de renda
mínima associados a ações socioeducativas.
Com a promulgação da
Lei nº 9.970/00
, instituiu
-
se o dia 18 de maio como
sendo o dia nacional de combate ao abuso e à exploração sexual de crianças e
adolescentes, , enquanto que, por intermédio do Decreto nº 3.597/00, foi promulgada, no
Brasil, a Convenção nº 182 e a Recomendação nº 190 da Organização
Internacional do
Trabalho (OIT) sobre a proibição das piores formas de trabalho infantil e a ação imediata
para sua eliminação, concluídas em Genebra, em 17 de junho de 1999.
A Lei nº 10.097/2000, alterando a CLT, regulamentou a aprendizagem,
admitindo,
entre outros, que organizações não governamentais possam
profissionalizar o adolescente, além das instituições do Sistema “S“ (Senai,Senac,
Senar, Senart).
277
Em 2001, dá
-
se destaque às Leis n
os
10.219
, que criou o programa
nacional de renda mínima vinculada à educação (bolsa escola) e
10.288, que
alterou a Consolidação das Leis do Trabalho, dispondo sobre o
jus postulandi
, a
assistência judiciária e a representação dos menores no foro trabalhista.
No ano de 2002, via edição da Lei nº 10.421/02, estendeu
-
se à mãe
adotiva
o direito à licença
-
maternidade e ao salário
-
maternidade, alterando
-
se,
assim, a Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto
-
Lei nº 5.452,
de 1º de maio de 1943, bem como a Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991.
277
Por determinação constitucional (Emenda nº 20/98 ), alterando o inc. XXXIII do Art. 7º proibiu
o trabalho noturno,perigoso ou insalubre a menores de 18 anos e de qualquer trabalho a
m
enores de 16 anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de 14 ( quatorze ) anos.
1
1
7
7
8
8
Necessário citar a eclosão da Le
i nº 10.741/03, mais conhecida
como
Estatuto do Idoso
, prestigiando
-
se, assim, o postulado basilar
inserto no Art. 230 da Lei de Outubro, além do diploma
nº 11.104/05
,
que dispôs sobre a obrigatoriedade de instalação de brinquedotecas nas
unidades de saúde que ofereçam atendimento pediátrico em regime de
internação.
A
Lei nº 11.114/05, que alterou os Arts. 6º, 30, 32 e 87, da Lei nº 9.394,
de 20 de dezembro de 1996, com o objetivo de tornar obrigatório o início do
ensino fundamental aos seis anos de idade e
a 11.259/05
, que acrescentou
dispositivo à Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (ECA), para determinar
investigação imediata em caso de desapareciment
o de criança ou adolescente,
também merecem registro.
Por fim, em 2006, tem
-
se a edição das
Leis nº 11.265/06
, que
regulamentou a comer
cialização de alimentos para lactentes e crianças de
primeira infância e também a de produtos de puericultura correlatos e a
11.340/06,
278
que criou mecanismos para coibir a violência doméstica e
familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do Art. 226 da
Constituição
Federal
, da convenção sobre a eliminação de todas as formas de
discriminação contra as mulheres e da convenção interamericana para
prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher; dispondo, també
m,
sobre a criação dos juizados de violência doméstica e familiar contra a
mulher, além de alterar os Códigos de Penal e de Processo Penal e a lei de
execução penal.
278
CUNHA, Rogério Sanches; PINTO, Ronaldo Batista.
Violência doméstica
: lei Maria
da Penha (lei nº 11.340/2006) comentada artigo por artigo. São Paulo: Revista dos
Tribunais
, 2007, p. 11: “Tão logo editada a Lei nº 11.340, de 07 de agosto de 2006,
ela passou a ser conhecida como Lei Maria da Penha, embora em seu texto
e nem
poderia ser diferente
não seja feita qualquer alusão a tal denominação. O motivo
que levou a lei a
ser ‘batizada’ com esse nome, pelo qual, irreversivelmente,
passará a ser conhecida, remonta ao ano de 1983. No dia 29 de maio desse ano, na
cidade de Fortaleza, no Estado do Ceará, a farmacêutica Maria da Penha Maia
Fernandes, enquanto dormia, foi atingid
a por um tiro de espingarda desferido por
seu então marido, o economista Marco Antônio Heredia Viveiros, colombiano de
origem e naturalizado brasileiro. Em razão desse tiro, que atingiu a vítima em sua
coluna, destruindo a terceira e a quarta vértebras, su
portou lesões que a deixaram
paraplégica”.
1
1
7
7
9
9
4.3
Considerações Acerca do Estatuto da Criança e do
Adolescente e sua Repercussão no Plan
o Jurídico
Infraconstitucional
Invocando os novos tempos trazidos pela Lei de Outubro, salienta Andréa
Rodrigues Amin:
[...] o novo perfil social almejado pelo legislador constitucional não
poderia deixar intocado o sistema jurídico da criança e do
adol
escente, restrito aos ‘menores’ em abandono ou estado de
delinqüência. E, de fato, não o fez. A intensa mobilização de
organizações populares nacionais e de atores da área da infância
e juventude, acrescida da pressão de organismos internacionais,
como o U
NICEF, foram essenciais para que o legislador
constitucional se tornasse sensível a uma causa já reconhecida
como primordial em diversos documentos internacionais como a
Declaração de Genebra, de 1924; a Declaração Universal dos
Direitos Humanos das Nações
Unidas (Paris, 1948); a Convenção
Americana Sobre os Direitos Humanos (Pacto de São José da
Costa Rica, 1969) e Regras Mínimas das Nações Unidas para a
Administração da Justiça da Infância e da Juventude
Regras
Mínimas de Beijing (Res. nº 40/33 da Assem
bléia
-
Geral, de
29/11/85). A nova ordem rompeu, assim, com o já consolidado
modelo de situação irregular e adotou a doutrina da proteção
integral.
279
Some
-
se ao quanto asseverado acima, a valiosa informação trazida por
Karyna Batista Sposato:
[...] a parti
r de 1985, no bojo da convenção constituinte, o
movimento de luta pelos direitos da infância reuniu 250 mil
assinaturas e articulou
-
se em torno de duas emendas à
Constituição. Seu resultado foi a introdução de princípios básicos
de proteção e garantia de d
ireitos da criança e do adolescente no
texto constitucional de 1988. As reivindicações da Campanha
Criança e Constituinte traduziam em exata medida a necessidade
de substituição do paradigma tutelar pelo garantista, com
incidência em todas as políticas de
atenção à infância e à
juventude, inclusive para os infratores. Tal introdução
correspondia ao consenso na comunidade internacional acerca da
necessidade de políticas especiais para a infância e adolescência
e ao que posteriormente se constituiu nos princí
pios inaugurados
279
AMIN, 2000, p. 09.
1
1
8
8
0
0
pela Convenção Internacional das Nações Unidas sobre os
Direitos da Criança.
280
Diante de tantas pressões, inegável se fazia uma verdadeira revolução na
sistemática normativa afeta aos menores, tornando
-
a mais protetiva, eficaz e
abrangente
, ou seja, a serviço e à disposição de todas as crianças e adolescentes
de nosso País.
Noutro giro verbal, urgia alterar o enfoque da legislação menorista,
deixando
-
se de lado a principiologia da doutrina da situação irregular para
assumir a moderna e ava
nçada situação de prioridade absoluta e de proteção
integral,
281
situação essa que foi devidamente alcançada com o advento do texto
constitucional de 1988, mais precisamente no que diz respeito aos seus Arts. 227
e 228.
É nesse contexto que vem à luz a Lei
nº 8.069, de 13 de setembro de
1990, alcunhada de
Estatuto da Criança e do Adolescente
.
O Estatuto da Criança e do Adolescente, ratificando a necessidade de
concretização e outorga de direitos fundamentais gerais, bem como aqueles
inerentes às condições dos infantes que se encontram sob a sua égide, converte
-
se em verdadeiro microssistema jurídico, emergindo daí sua inegável e
indispensável importância para o atingimento dos ideais constitucionais
proclamados em 05 de outubro de 1988.
Diz
-
se no parágrafo
anterior sobre a necessidade de concretização e
outorga não só dos direitos fundamentais gerais, mas também daqueles de índole
especial, isto é, correspondentes às peculiares condições de desenvolvimento em
que se encontram crianças e adolescentes de um mo
do geral.
280
SPOSATO, Karyna Batista.
O direito penal juvenil
. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 55
-
56.
281
Ibidem, p. 51: “O que significa ‘proteção integral’? Quer dizer amparo completo, não só da
criança e
do adolescente, sob o ponto de vista material e espiritual, como também a sua
salvaguarda desde o momento da concepção, zelando pela assistência à saúde e bem
-
estar
da gestante e da família, natural ou substituta da qual irá fazer parte. Mas tem também out
ro
sentido do ponto de vista estritamente legal: é que toda a matéria passará a ficar subordinada
aos dispositivos do Estatuto, como de resto se deduz do último de seus artigos, o de nº 267”.
1
1
8
8
1
1
Nos dizeres de João Batista Costa Saraiva:
O ECA se assenta no princípio de que todas as crianças e
adolescentes, sem distinção, desfrutam dos mesmos direitos e
sujeitam
-
se a obrigações compatíveis com a peculiar condição de
desenvolvimento que
desfrutam, rompendo, definitivamente, com
a idéia até então vigente de que os Juizados de Menores seriam
uma justiça para os pobres, na medida em que na doutrina da
situação irregular se constatava que para os bem
-
nascidos, a
legislação baseada naquele pri
mado era absolutamente
indiferente.
282
Nesse diapasão, e embora exista inegável direito à divulgação de
informações que se apresentem relevantes à correta explanação dos fatos
para a sociedade, é necessário ponderar valores quando a questão envolve
notícias
referentes a crianças e adolescentes, a fim de que tais não acabem
expostos de maneira danosa, ainda mais quando se trata de apuração de ato
infracional supostamente por eles cometidos, pois, como salienta Ana Lúcia
Menezes Vieira:
[...] a exposição do a
dolescente infrator à opinião pública, além de
prejudicar sua reintegração social, pode ocasionar, de maneira
irreversível, um grave prejuízo à sua imagem, intimidade e
formação da personalidade. Imprescindível, portanto, que na
apuração do ato infracional
atribuído ao adolescente seja ele
protegido contra a interferência da imprensa.
283
Nesse sentido, tem
-
se a positivação da regra insculpida no Art. 143 do
Estatuto da Criança e do Adolescente.
284
O artigo de referência diz respeito à salvaguarda de eventual
difamação
que venha a manchar, para sempre, sua honra, proibindo termos, atos,
despachos, decisões, acórdãos, relatórios, votos ou quaisquer manifestações
judiciais, policiais ou administrativas que acabem mencionando ou contendo
282
SARAIVA, 2005, p. 73.
283
VIEIRA, Ana Lúcia Menezes.
Processo penal e mídia
. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2005, p. 253.
284
Art. 143: É vedada a divulgação de atos judiciais, policiais e administrativos que digam
respeito a crianças e adolescentes a que se atribua autoria de ato infracional. Parágrafo único
Qualqu
er notícia a respeito do fato não poderá identificar a criança ou adolescente,
vedando
-
se fotografia, referência a nome, apelido, filiação, parentesco e residência.
1
1
8
8
2
2
referência a crianças e ad
olescentes, mesmo que tal fato se dê para esclarecer
que não foram eles os autores do ilícito em profusão.
Entrementes, os meios de comunicação não são impedidos de tornar
pública a notícia de eventual ato infracional supostamente praticado por um
menor,
desde que, evidentemente, se cerquem das cautelas jurídicas elencadas
no parágrafo único do dispositivo de regência.
Quando se verifica o descumprimento das recomendações, ou seja, se
percebe a prática de atos consistentes em divulgar fatos ou documentos
pertinentes a atos infracionais sem que exista a necessária autorização para tanto
ou fotografias e ilustrações referentes ao caso, tem
-
se a imediata incidência da
norma repressiva estampada no Art. do 247 do ECA.
285
Mesmo com tais diretrizes e reprimendas:
[...] não raramente a mídia comete ilegalidades identificando, de
alguma forma, o menor. Ao transmitir imagem dos adolescentes
envolvidos em atos ilícitos
não obstante o faça maquiada com
tarjas pretas nos olhos e utilize
-
se dos mais variados recursos
tecnológicos para dificultar a identificação deles
publica as
iniciais do nome, apelidos, endereços dos pais, elementos que,
indiretamente, levam à identificação do infrator. Aqueles meios
dissimulatórios, por conseguinte, nem sempre são eficazes para
ev
itar a exposição pública do menor envolvido em atos ilícitos,
pois outros dados, de uma forma ou de outra, acabam burlando a
proibição legal.
286
Essa situação somente poderá ser resolvida diante de uma atuação firme dos
meios de comunicação, no sentido de q
ue assumam parcela da responsabilidade que
285
Art. 247: Divulgar, total ou parcialmente, sem autorização devida, por qualquer meio de
comunicação, nome, ato ou documento de procedimento policial, administrativo ou judicial
relativo à criança ou ao adolescente a que se atribua ato infracional: Pena
multa de três a
vinte salários de referência, aplicando
-
se o dobro em caso de reincidência
. § 1º
Incorre na
mesma pena quem exibe, total ou parcialmente, fotografia de criança ou adolescente
envolvido em ato infracional, ou qualquer ilustração que lhe diga respeito ou se refira a atos
que lhe sejam atribuídos, de forma a permitir sua identificação, direta ou indiretamente. § 2º
Se o fato for praticado por órgão de imprensa ou emissora de rádio ou televisão, além da
pena prevista neste artigo, autoridade judiciária poderá determinar a apreensão da publicação
ou a suspensão da programação da e
missora até por dois dias, bem como da publicação do
periódico até por dois números.
286
VIEIRA, 2005, p. 256.
1
1
8
8
3
3
lhes é ínsita, diante da função constitucional e social que desempenham perante todos
ou, como bem adverte Guilherme Döring Cunha Pereira:
[...] do ponto de vista ético, o fim da imprensa é o de ser
instrumento d
o aperfeiçoamento humano, aliás fim comum de toda
a organização e de toda a atividade verdadeiramente humanas,
mas fim que deva ser atingido de modo específico e adequado a
cada organização e na cada atividade [...]. É patente a influência
profundamente po
sitiva na sociedade que pode derivar de um
adequado cumprimento da sua atividade material específica. Dar
satisfação às necessidades fundamentais de informação,
formação, entretenimento etc., não de um determinado indivíduo,
mas de toda uma coletividade, é
, em si mesmo, e
independentemente de qualquer ulterior esforço, uma contribuição
decisiva para o bem comum.
287
Nesse caminho, caem muito a propósito os sábios comentos proferidos por Ester
Kosovski, da Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio d
e Janeiro:
Rios de tinta já foram consumidos e ainda o serão, questionando e
avaliando o poder, a influência, a interferência da mídia na era da
eletrônica e da instantaneidade
e portanto a sua
responsabilidade social. O papel da imprensa (termo usado n
o
sentido lato) numa democracia e sua relação com a violência e a
criminalidade constituem temas para inúmeros seminários,
debates, palestras, pesquisas, com as mais diversas conclusões
que, em comum, constatam a sua força e importância crescente
no mundo
contemporâneo. As notícias recebidas através da mídia
eletrônica no exato momento em que acontecem (a transmissão
da CPI da corrupção, por exemplo) despertam emoções e
sentimentos variados e são apresentadas, selecionadas e
comentadas
a posteriori
pelos jo
rnais e periódicos, cada um à sua
feição, sendo consumidos por público mais reduzido, servindo de
fonte permanente de referência futura. A mobilização, o impacto, a
solidariedade ou até pânico que uma imagem forte pode causar
(crianças esquálidas e famélic
as; uma ave encharcada de óleo no
mar; as vítimas da guerra fraticida na Bósnia; o aperto de mão de
Arafat e Rabin; a fragilidade esperançosa de Betinho) são
exemplos marcantes, emblemáticos, como as imagens da chacina
da Candelária, dos presos do Carandir
u, dos Ianomâmis, da
favela do Acari, logo substituídas por outras na eterna tentativa,
sempre renovada, de superar o seu próprio impacto. É desta força
que advém a responsabilidade para com a sociedade (‘responsa’:
‘resposta’), o que inclui respeito para
com a cidadania. A
responsabilidade não pode ser delegada, segundo os cânones da
administração; delega
-
se autoridade
a responsabilidade é
287
PEREIRA, Guilherme Döring Cunha Pereira.
Liberdade e responsabilidade dos neios de
comunicação
. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 33 e 36.
1
1
8
8
4
4
compartilhada. E acaba a mídia sendo responsabilizada por
tudo.
288
Outra situação digna de nota e devidamente retrata
da pelo Estatuto da
Criança e do Adolescente, diz respeito ao seu Art. 27, por intermédio do qual se
assegura o direito personalíssimo de reconhecimento do estado de filiação, o qual
pode ocorrer de três maneiras: (i) voluntária; (ii) administrativa; e, (i
ii) compulsória
ou judicial, não se perdendo de vista a necessidade, nesse particular, de
interação da legislação específica com aquela afeta ao novel Código Civil, a fim
de que se busque a concreção da máxima eficiência no que se refere à proteção
de tais
direitos e interesses.
A ordenamento jurídico elenca hipóteses nas quais há presunção
de filiação, sendo tais hodiernamente encaradas como de natureza
iuris
tantum
.
Referidas presunções encontram
-
se estabelecidas pelos Arts. 1.597 e
1.598 do Código Civi
l: (i)
180
dias
após
a
convivência
conjugal
: disciplina o inc. I
do Art. 1.597 que, nos nascimentos ocorridos 180 dias após a convivência
conjugal, há presunção de filiação decorrente do casamento; (ii)
300
dias
da
dissolução
da
sociedade
conjugal
: destaca
o inc. II do Art. 1.597 que, nos
nascimentos ocorridos dentro do lapso temporal que vai até 300 dias após a
dissolução da sociedade conjugal, seja esta última decorrente da separação,
nulidade ou anulação do casamento, mantém
-
se a presunção de filiação
de
corrente do casamento; (iii)
Novas
núpcias
: dispõe o Art. 1.598 do Código Civil
que o nascimento de filho da mulher que contraiu novas núpcias anteriormente ao
esvaimento dos 300 dias a que alude o inc. II do dispositivo legal acima
mencionado, faz surgir a presunção de que a filiação pertence ao primeiro marido,
ou, ocorrendo o nascimento após tal lapso temporal e desde que já decorrido o
prazo descrito no inc. I do aludido dispositivo legal, a presunção recairá no
segundo marido. Destaque
-
se que não faz qualquer sentido a restrição contida no
Art. 1.598 relativamente à referência única feita ao caso de falecimento, pois as
288
KOSOVSKI, Éster.
Ética na comunicação
. São Paulo: Àtica, 2000, p. 25.
1
1
8
8
5
5
presunções
iuris tantum
estabelecidas na lei haverão de existir também nas
hipóteses de nulidade e anulação do casamento quando não tiv
er sido observada
a regra inserta no inc. II do Art. 1.523 do mesmo
codex
; (iv)
Fecundação
artificial
homóloga
: diz respeito às fecundações que se valem de material genético apenas
do casal, sendo certo que o inc. III do Art. 1.597 determina a presunção de filiação
daquele que se originou do apontado tipo de fecundação mesmo que o
nascimento se dê após o falecimento do marido; e, (v)
Fecundação
artificial
heteróloga
: diz respeito à utilização de material genético de pessoa
ou pessoas
(duas
homem e mulhe
r)
estranha ao casal. Saliente
-
se que o inc. V do Art.
1.597 parece considerar apenas a hipótese da utilização de material genético
masculino de terceiro, daí porque condiciona a presunção à autorização do
marido da consorte inseminada. Todavia, à luz do
princípio constitucional da
igualdade não se pode divisar diferenças
in casu
, uma vez que espelham
situações iguais, disso resultando, conseqüentemente, a total possibilidade de
utilização também de material genético feminino de terceiro mediante a
autori
zação da esposa.
A discussão outrora estabelecida quanto à possibilidade do
reconhecimento de filhos havidos fora do casamento já havia deixado de ter a sua
importância quando da superveniência da Constituição Federal de 1988, que,
pretendendo afastar da
pessoa dos filhos os prejuízos que a eles sempre eram
debitados por conta de condutas que não lhes eram imputáveis, equiparou em
direitos todos os filhos independentemente de suas origens, conforme bem se vê
da regra contida no § 6º do Art. 227 da Lei Maio
r.
Nessa linha de princípios, o legislador infraconstitucional cuidou de
movimentar
-
se no sentido de estabelecer certos critérios para o
reconhecimento da filiação fora do casamento, o que culminou no surgimento
do
caput
Art. 26 do ECA (Lei nº 8.069/90),
segundo o qual “[...] os filhos
havidos fora do casamento poderão ser reconhecidos pelos pais, conjunta ou
separadamente, no próprio termo de nascimento, por testamento, mediante
escritura ou outro documento particular, qualquer que seja a origem da
filiaç
ão”, e, posteriormente, da Lei nº 8.560/92 com dispositivo similar, qual
seja, o representado pelo seu Art. 2º.
1
1
8
8
6
6
Seguindo esse mesmo diapasão, a novel legislação civil também
autorizou no bojo do seu Art. 1.607 a possibilidade de reconhecimento da filiação
mesmo fora do casamento, cujos critérios, obviamente, continuam a ser os
mesmos estabelecidos na citada Lei nº 8.560/92, nunca sendo demais assinalar
que a maior preocupação do legislador sempre foi a paternidade,
289
já que, no
comum das vezes, a maternidade
resta bem definida.
Desse modo, a regra expressa no Art. 1.607 do Código Civil é
endereçada ao reconhecimento voluntário da paternidade fora do casamento de
filhos que possuam a maternidade definida de mães que não se encontram
sujeitas à incidência das
regras constantes do Art. 1.597 do mesmo
codex
, sob
pena de inoportuno e inseguro afastamento das presunções ali estabelecidas.
Outrossim, impende alinhavar que afora a advertência acima formulada
acerca da exegese oriunda do Art. 1.597, nas demais hipóteses, isto é, onde não
se comportem as presunções oriundas da lei, mesmo havendo casamento em
curso o reconhecimento voluntário da paternidade ainda indefinida poderá ser
alcançado. Por fim, nunca é demais assinalar que o reconhecimento voluntário da
matern
idade também se mostra possível, desde que, obviamente, no registro
pertinente inexista a indicação de genitora daquele que se pretende reconhecer.
No que concerne ao reconhecimento compulsório, tem
-
se a possibilidade
de manejo da ação de filiação, mais c
onhecida como
Ação de Investigação de
Paternidade
, na qual o filho postula a admissão da paternidade que ainda resta
duvidosa em seu registro de nascimento por conta dessa ausência da indicação
do nome do genitor, ou mesmo a desconstituição desse vínculo ali apontado por
não ser ele verdadeiro.
Destaque
-
se que, mais adequada se mostra a utilização do termo
Ação
de Reconhecimento de Filiação
, uma vez que também é possível a perseguição
289
CICU, Antonio.
La filiación
. Madri: Revista de Derecho Privado, 1930, p. 16: “
Como hecho
natural la filiación existe siempre en todos los individuos: se es siempre hijo de un padre y de
un
a madre. No así jurídicamente. El derecho necesita asegurarse primeramente de la
paternidad o maternidad para reconocer efectos jurídicos comprobación. Y a veces, aun
comprobada, no siempre el derecho reconoce la cualidad de padre o de hijo
”.
1
1
8
8
7
7
da precisa definição da maternidade pelo filho assim interessado, como s
e daria
com as hipóteses de troca de bebês em maternidade.
A ação de reconhecimento de filiação é imprescritível, não apenas em
decorrência da máxima de que as ações declaratórias não prescrevem porque
relacionadas apenas à declaração, mas sim e principalmente em decorrência da
sua condição de ação de estado ligada aos direitos da personalidade. Destaca
-
se,
outrossim, que o próprio legislador se incumbiu de indicar a imprescritibilidade da
mesma ao assinalar no Art. 27 da Lei nº 8.069/90: “[...] o reconhec
imento do
estado de filiação é direito personalíssimo, indisponível e imprescritível, podendo
ser exercido contra os pais ou seus herdeiros, sem qualquer restrição, observado
o segredo de justiça” e no
caput
do Art. 1.606 do Código Civil que “[...] a ação
de
prova de filiação compete ao filho, enquanto viver, passando aos herdeiros, se ele
morrer menor ou incapaz”.
De acordo com a exegese oriunda dos dispositivos legais acima
transcritos a
Ação de Reconhecimento de Filiação
é personalíssima, de modo que
ap
enas ao filho é dada a sua postulação e não propriamente aos demais
herdeiros deste. Segue daí que, a rigor, o falecimento do filho implica na
impossibilidade da dedução do pleito, já que a lei somente a ele legitima a adoção
da aludida providência.
Em qu
e pese o encaixe da
Ação de Reconhecimento de Filiação
como
personalíssima, que a rigor demandaria a sua extinção mesmo após a sua
iniciação pelo respectivo legitimado, a verdade é que, reconhecendo o inegável
interesse dos herdeiros do titular da legitima
ção
que podem ser tanto de caráter
material (sucessório) quanto moral
, o legislador houve por bem legitimar os
aludidos sucessores apenas e tão
-
somente após o passamento do filho caso ele
morra menor ou incapaz (Art. 1.606,
caput
, CC).
Em continuidade
, importante frisar o conteúdo do Art. 148, parágrafo
único, alínea ‘
g
’, cujo dispositivo determina a competência concorrente da Justiça
da Infância e Juventude para conhecer a ação de alimentos quando se tratar de
criança e adolescente que se enquadrem nas hipóteses do Art. 98 do ECA.
1
1
8
8
8
8
Vale lembrar que a ação de alimentos poderá ser proposta contra os
parentes da criança ou adolescente por iniciativa do MP (Art. 201, inc. III, ECA) ou
do
curador especial
(parágrafo único do Art. 142 do ECA ou Art. 9
o
do CPC
)
sempre que os interesses destes colidirem com os de seus pais ou responsável,
bem como no que se refere aos chamados “interesses individuais indisponíveis”,
há legitimidade do MP (Art. 201, inc. III, ECA), sem prejuízo de sua atuação
custus legis
quando
a ação for da iniciativa do Curador Especial exercido pela
Defensoria Pública ou por Curador Dativo.
Relativamente ao conceito de alimentos, tem
-
se que duas definições
podem ser formuladas: uma restrita e outra ampla.
Pela primeira, correspondem os alime
ntos às prestações mensais
destinadas a suprir as necessidades vitais a que estão obrigadas
determinadas pessoas em relação a outras que não conseguem provê
-
las
com as suas próprias forças. Já, a segunda, traz apenas o acréscimo de que
tais prestações não
se destinam apenas a servir às necessidades vitais,
mas também a manter a condição social e moral das pessoas que a eles
têm direito.
Sobre o tema, assinala Carlos Roberto Gonçalves:
[...] o vocábulo ‘alimentos’ tem, todavia, conotação muito mais
ampla d
o que na linguagem comum, não se limitando ao
necessário para o sustento de uma pessoa. Nele se compreende
não só a obrigação de prestá
-
los, como também o conteúdo da
obrigação a ser prestada. A aludida expressão tem, no campo do
direito, uma acepção técni
ca de larga abrangência,
compreendendo não só o indispensável ao sustento, como
também o necessário à manutenção da condição social e moral
do alimentado.
290
Esses também, desde há muito, são os preciosos ensinamentos do
saudoso Orlando Gomes:
290
GONÇALVES,
Carlos Roberto.
Direito civil brasileiro
: direito de família. São Paulo: Saraiva,
2005, vol. VI, p. 440.
1
1
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8
9
9
Alimentos são
prestações com as quais podem ser satisfeitas as
necessidades vitais de quem não pode provê
-
las por si. A
expressão designa medidas diversas. Ora significa aquilo que é
estritamente necessário à vida de uma pessoa, compreendendo,
tão
-
sòmente, a alimentaçã
o, a cura, o vestuário e a habitação, ora
abrange outras necessidades compreendidas as intelectuais e
morais, variando conforme a posição social da pessoa
necessitada.
291
Como se pôde visualizar a partir do próprio conceito, não é outro o fim dos
alimentos
senão o de fornecer às pessoas a que têm direito o recurso indispensável
à subsistência de suas necessidades vitais, ou, também aqueles que possam
assegurar, com dignidade, a manutenção do padrão de vida a que pertençam.
Assim, a finalidade dos alimentos
é assistencial, ou seja, de socorro
àqueles que não têm condições de prover as suas próprias necessidades.
Tanto isso é verdadeiro e real, que Silvio Rodrigues argumenta:
[...] quando se fala em alimentos fala
-
se no direito de exigi
-
los e
na obrigação de
prestá
-
los, marcando, desse modo, o caráter
assistencial do instituto. Em Roma chamavam
-
no officium pietatis,
idéia que aproxima a obrigação alimentar da noção de caridade. É
óbvio, entretanto, que, desde o instante em que o legislador deu
ação ao aliment
ário para exigir o socorro, surgiu para o
alimentante uma obrigação de caráter estritamente jurídico, e não
apenas moral.
292
Em que pese à particularidade de que o Direito de Família como um todo
em certas passagens pareça dar guarida a questões de conteúdo
meramente
patrimonial, quando, por exemplo, trata do regime de bens e da administração de
bens de menores, não há dúvida de que há prevalecimento das regras de ordem
pública, de caráter, portanto, extrapatrimonial.
Todavia, se é verdade que há priorizaçã
o das normas cogentes, não
menos verdade é que há certa margem de disposição quanto à questão
patrimonial imbricada no bojo do Direito de Família.
291
GOMES, Orlando.
Direito de família
. Rio de Janeiro: Forense, 1968, p. 323.
292
RODRIGUES, Sílvio.
Direito civil
: direito de família. 27ª ed. São Paulo:
Saraiva, 2002, vol.
VI, p. 419.
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1
9
9
0
0
Como nem poderia deixar de ser, assim também o é no âmbito dos
alimentos, pois ao mesmo passo que se observam
regramentos nos quais a
questão patrimonial é de somenos importância
haja vista a priorização do direito
pessoal
, vêem
-
se igualmente preocupações nitidamente voltadas para direito
patrimonial, daí a razão de a doutrina atribuir aos alimentos uma natureza jurídica
mista, isto é, tanto com conteúdo patrimonial quanto com finalidade pessoal.
Carlos Roberto Gonçalves assim se manifesta sobre o ponto em
discussão:
O estado tem interesse direto no cumprimento das normas que
impõem a obrigação legal de alim
entos, pois a inobservância ao
seu comando aumenta o número de pessoas carentes e
desprotegidas, que devem, em consequência, ser por ele
amparadas. Daí a razão por que as aludidas normas são
consideradas de ordem pública, inderrogáveis por convenção
entre
os particulares e impostas por meio de violenta sanção,
como a pena de prisão a que está sujeito o infrator [...]. No tocante
à natureza jurídica do direito à prestação de alimentos, embora
alguns autores o considerem direito pessoal extrapatrimonial, e
ou
tros, simplesmente direito patrimonial, prepondera o
entendimento daqueles que, como Orlando Gomes, atribuem
-
lhe
natureza mista, qualificando
-
o como um direito de conteúdo
patrimonial e finalidade pessoal.
293
Relativamente ao compromisso com o pagamento e a
o direito ao
recebimento de alimentos, importa considerá
-
los sob dois fundamentos jurídicos
diferentes: dever de sustento e obrigação alimentar.
Há dever de sustento quando se toma como ponto de partida o núcleo
familiar, balizado, portanto, por aquilo que se intitula célula familiar, formada em
regra pelos pais e filhos, seja tal círculo decorrente ou não do casamento, já que a
união estável também a caracteriza, assim como a família monoparental, que é
aquela tradicionalmente formada por apenas um dos pa
is juntamente com os
filhos, de forma que tal dever alcança pais e filhos, cônjuges e companheiros.
Segue daí que o dever de sustento decorre do dever familiar (ligado por
uma célula familiar), razão pela qual ele traz inclusive uma característica de
293
GONÇALVES, 2005, vol. VI, p. 441
-
442.
1
1
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9
1
1
temp
orariedade, tendo em vista que entre pais e filhos ele existirá apenas e tão
-
somente enquanto durar o poder familiar, e entre cônjuges e companheiros
enquanto houver a vinculação jurídica que os une, qual seja, o casamento e o
companheirismo, respectivamen
te.
Por assim ser, é no âmbito do dever de sustento que se pode pensar em
manutenção do
status
social, pois, de acordo com o que já se teve oportunidade
de destacar, a questão envolta ao derredor da conservação do padrão de vida
cinge
-
se ao núcleo familia
r por excelência, afastando, desta feita, em regra os
demais parentes que não fazem parte da célula familiar.
Alinhave
-
se, conforme dito, que os cônjuges e os companheiros têm uns
para com os outros dever de sustento, uma vez que são os responsáveis pela
condução da vida do núcleo familiar enquanto portadores de direitos e deveres
em igualdade de condições, responsabilidade essa que cessa entre eles
mas
continua em relação aos filhos
a partir da ocasião em que não houver mais
vinculação familiar que os una, disso resultando, conseqüentemente, na perfeita
possibilidade de renúncia dos alimentos tanto no momento da separação judicial
quanto na oportunidade da extinção judicial da união estável, de acordo com o
que será estudado em tópico mais à frente.
A
o derradeiro, destaque
-
se que é o dever de sustento que dá direito ao
alimentante de perseguir alimentos civis ou côngruos.
Diversamente do que ocorre com o dever de sustento, fala
-
se em
obrigação alimentar não com supedâneo em dever familiar, mas sim com
espeque no princípio da solidariedade familiar.
Assim, há obrigação familiar entre pais e filhos maiores ou emancipados;
entre ascendentes e descendentes sem limitação de graus e entre os primeiros
colaterais (colaterais em segundo grau
irmãos), observ
adas as regras
estatuídas nos Arts. 1.697 e 1.698 do Código Civil.
Se a obrigação alimentar não decorre do dever de sustento, mas sim e
tão
-
somente da solidariedade familiar, é evidente que, baseando
-
se nela, o
1
1
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9
2
2
alimentando poderá postular apenas os alimentos naturais ou necessários, isto é,
aqueles indispensáveis a sua sobrevivência na sociedade da qual faz parte.
294
Pelo quanto narrado, denota
-
se, com solar clareza, a existência de uma
tutela jurisdicional diferenciada quando o assunto diz respeito aos di
reitos e
interesses de crianças e adolescentes.
Tanto isso é verdade, que os incs. III e IV do Art. 201 da Lei nº 8.069/90
permitem, ao Ministério Público, efetuar a defesa de interesses individuais de
crianças e adolescentes, circunstância essa que foi d
efinitivamente confirmada
com o advento das Leis n
os
8.560/92 (investigação de paternidade) e 9.394/96
(diretrizes e bases da educação).
Nesse sentido, interessante o esclarecimento levado a efeito por Sérgio
Shimura:
Sobreveio o Estatuto da Criança e do
Adolescente (Lei nº
8.069/90) que, além de tratar da tutela de seus interesses difusos
e coletivos, expressamente autorizou o Ministério Público a zelar
por interesses puramente individuais (Art. 201, incs. III e IV), em
atendimento aos princípios da prio
ridade absoluta e da
proteção
294
GOMES, 1968, p. 325: “Cumpre estabelecer uma distinção de capital importância para a
delimitação do assunto, distinção indispensável à exata fixação do conceito de obrigação
alimentar. Não se deve, realmente, confundir tal obrigação com certos deveres familiares, de
sustento, assistência e socorro, como os que tem o marido em relação à mulher e os pais
para com os filhos menores
deveres que devem ser cumpridos incondicionalmente. A
obrigação alimentar ‘stricto sensu’ tem pressupostos que a diferenciam nitidamente de tais
deveres. Como se verá mais largamente linhas adiante, a obrigação alimentar, ao contrário
dêsses deveres familiares, é recíproca, depende das possibilidades do deve
dor e sòmente se
torna exigível se o credor potencial estiver inequìvocamente necessitado. Não obstante, o
dever de sustento que incumbe ao marido toma a feição de obrigação alimentar, embora
irregular, quando a sociedade conjugal se dissolve pelo desquite
, ocorrendo a mesma
desfiguração em relação aos filhos do casal desavindo. No rigor dos princípios, não se
configura nesses casos uma obrigação alimentar pròpriamente dita, mas, para certos efeitos,
os deveres de sustento, assistência e socorro adquirem o
mesmo caráter. Por obrigação
alimentar deve entender
-
se, em suma, a que é imposta pela lei a certas pessoas ligadas pelo
vínculo de família, que estejam em determinadas condições, consistindo na prestação do
necessário ao sustento de quem o necessita, sem que o direito correspondente seja correlato
a um dever inerente ao estado de cônjuge ou de pai. O fundamento da obrigação alimentar
encontra
-
se no princípio da solidariedade familiar. Embora se tenha fortalecido ùltimamente a
convicção de que incumbe ao Es
tado aparar aquêles que, não podendo prover à própria
subsistência, por enfermidade ou por outro motivo justo necessitam de ajuda e amparo,
persiste a consciência de que devem ser chamados a cumpri
-
la, se não a satisfazem
espontâneamente, aquêles que perte
ncem ao mesmo grupo familiar”.
1
1
9
9
3
3
integral, considerando a qualidade do direito e não a quantidade
de pessoas envolvidas (Art. 227, CF; Arts. 1º a 4º, ECA).
295
Assim, fica claro que, além das situações que envolvem a necessidade de
perquirição e atingimento de
tutela coletiva, visando à defesa de direitos
metaindividuais dos infantes, abriu
-
se a importante possibilidade, embora
excepcional, de o Ministério Público promover a concretização da chamada
tutela
sócio
-
individual
.
Por fim, destaque
-
se a existência da
tutela sócio
-
educativa que,
nas palavras de Paulo Afonso Garrido de Paula, diz respeito “[...] à
apreciação da pretensão sócio
-
educativa do Estado, deduzida em razão da
prática de ato infracional, conduta descrita na lei penal como crime ou
contravenção”.
296
4.4
Princípios Aplicáveis à Proteção de Crianças e
Adolescentes
4.4.1
Princípio da proteção integral e da prioridade absoluta
Como visto acima, tem
-
se que, com o advento da Constituição de
1988, houve a substituição da doutrina da situação irregula
r pela doutrina da
prioridade absoluta e proteção integral de crianças e adolescentes,
circunstância essa que foi amplamente referendada pelo Estatuto da Criança
e do Adolescente.
Explica o doutrinador Roberto João Elias: “[...] pode
-
se definir a
proteção
integral como sendo o fornecimento, à criança e ao adolescente, de
295
SHIMURA, Sérgio.
Tutela coletiva e sua efetividade
. São Paulo: Atlas, 2000, p. 39.
296
PAULA, Paulo Afonso Garrido de.
Direito da criança e do adolescente e tutela
jurisdicional diferenciada
. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2002, p. 91.
1
1
9
9
4
4
toda a assistência necessária ao pleno desenvolvimento de sua
personalidade”.
297
Como sabido, a Constituição Federal (Art. 227,
caput
), e o Estatuto da
Criança e do Adolescente (Art. 1º) ad
otaram o princípio da proteção integral,
também denominado como doutrina da proteção integral.
Com efeito, o texto constitucional atribui à família, à sociedade e ao
Estado o dever de assegurar, à criança e ao adolescente, com absoluta
prioridade, o direi
to à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à
convivência familiar e comunitária, além de colocá
-
los a salvo de toda forma de
negligência, discriminação, exploração, viol
ência, crueldade e opressão (CF,
Art. 227,
caput
).
A doutrina da proteção integral, inovadora e substitutiva da doutrina da
situação irregular, está prevista nas legislações aplicáveis à criança e ao
adolescente, sendo de relevo o dispostos nos Arts. 227
a 229 da Constituição
Federal.
Referida doutrina foi expressamente abraçada pelo Art. 1º da Lei nº
8.069/90, com a seguinte redação: “Esta lei dispõe sobre a proteção integral à
criança e ao adolescente”.
Na obra
Estatuto da criança e do adolescente anot
ado
, de Jurandir
Norberto Marçura, Munir Cury e Paulo Afonso Garrido de Paulo encontram
-
se os
seguintes comentários ao artigo retromencionado:
O Estatuto perfilha a doutrina da proteção integral, baseada no
reconhecimento de direitos especiais e específic
os de
todas as
297
ELIAS,
Direitos fundamentais da criança e do adolescente
. São Paulo: Saraiva, 2005, p.
02.
1
1
9
9
5
5
crianças e adolescentes, decorrentes da condição peculiar de
pessoas em desenvolvimento, em consonância com a Convenção
sobre os Direitos da Criança, adotada pela Assembléia Geral das
Nações Unidas, em 20/11/89, e assinada pelo Governo bras
ileiro
em 26/01/90, cujo texto foi aprovado pelo Decreto
-
Legislativo nº
29, de 14/09/90, e promulgado pelo Decreto Presidencial nº
99.710, de 21/11/90.
298
Tal doutrina impõe tratamento protetivo às crianças e aos adolescentes,
incumbência não só da família,
mas também da comunidade, da sociedade em
geral e do Poder Público, devendo assegurar
-
lhes, “[...] com absoluta prioridade, a
efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao
lazer, à profissionalização, à cultura, à digni
dade, ao respeito, à liberdade e à
convivência familiar e comunitária” (Art. 4º, do ECA).
Nota
-
se, pelo disposto nos Arts. 3º, 4º e 5º, o alcance do princípio ou
doutrina da proteção integral, ou, por outras palavras, a sua dimensão, a gama de
direitos es
pecificamente tutelados em prol da criança e do adolescente, não se
limitando a proteção ao direito à vida, mas a todos os direitos e aspectos
considerados indispensáveis ao desenvolvimento da criança e do adolescente,
daí a denominação proteção integral.
Pode
-
se afirmar que os princípios em referência constituem a
base de sustentação de todo o micro
-
sistema normativo da Infância e
Juventude, funcionamento como princípios de gerenciamento ou de
gestão dos direitos e deveres que são ínsitos às pessoas que s
e
encontram em tais situações.
Conseqüentemente, os princípios em estudo não podem ser ignorados na
interpretação das normas jurídicas e nos julgamentos das causas da seara da
Infância e Juventude, sob pena de aniquilamento dos dispositivos acima
expostos
, que lhes conferem existência jurídica e, via de conseqüência,
malferimento direto ao texto constitucional.
298
CURY, Munir; MARÇURA, Jurandir Norberto; PAULO, Paulo Afonso Garrido de.
Estatuto da
criança e do adolescente anotado
. São Paulo: Revista dos Tribu
nais, 1991, p. 13.
1
1
9
9
6
6
Necessária a transcrição da lição da professora Ana Maria Moreira
Marchesan:
Discorrendo sobre o tema, o insigne MAURO CAPPELLETTI,
após acentuar
a possibilidade de o Judiciário atuar para coibir
incorreções praticadas pelos membros dos outros poderes,
afirma a relevância da atuação desse poder para colaborar com
a identificação do interesse público e garantia de que esse seja
realmente alcançado. P
artindo
-
se da premissa de que nenhuma
lesão ou ameaça de lesão a direito (individual, coletivo, difuso,
público ou privado) não seja passível de apreciação pelo Poder
Judiciário, resta concluir que também a discricionariedade
administrativa está sujeita ao
controle jurisdicional [...]. O fato
de o princípio da PRIORIDADE ABSOLUTA encontrar assento
constitucional denota seu sentido norteador, verdadeira super
-
norma a orientar a execução e a aplicação das leis, bem como
a feitura de diplomas de inferior hiera
rquia, tudo dentro da mais
estrita legalidade. Na discussão sobre a implementação dos
bens
-
interesses previstos pelo Estatuto da Criança e do
Adolescente JAMAIS pode ser denegada qualquer pretensão
deduzida em juízo sob o argumento de que o administrador
p
úblico tem o discricionário ‘poder’ de eleger prioridades e
estabelecer oportunidades, já que a Constituição Federal, em
seu Art. 227, ampliada pelo Art. 4º do ECA, não estabelece
qualquer hierarquia entre os direitos ali reconhecidos como
prioritários.
299
Assim, em se levando em consideração a importância dos princípios
descritos neste tópico, bem como a extensão de seus núcleos materiais, denota
-
se a obrigatoriedade estatal no que se refere à concretização e ao asseguramento
do direito fundamental de convi
vência familiar e comunitária afeto às nossas
crianças e adolescentes.
4.4.2
Princípio do melhor interesse da criança e do adolescente
Em matéria de infância e juventude, como não poderia deixar de ser, tem
-
se que o fim último a ser almejado e buscado,
diz respeito, justamente, a proteção
299
MARCHESAN, Ana Maria Moreira. O princípio da prioridade absoluta aos direitos da criança
e do adolescente e a discricionariedade administrativa. In: Revista do Ministério Público do
Estado do Rio Grande do Sul
, nº 44. Rio Grande do Sul
: FESMP/RS, 2001, p. 220.
1
1
9
9
7
7
dos próprios infantes, disponibilizando
-
lhes o direito que lhes pertence de acordo
com seus interesses e não de terceiros.
Assinala Rodrigo da Cunha Pereira que:
[...] o Princípio do Melhor Interesse da Criança e do
Adolescente
tem sua raízes na mudança havida na estrutura familiar nos
últimos tempos, através da qual ela despojou
-
se de sua função
econômica para ser um núcleo de companheirismo e afetividade,
‘locus do amor, sonho, afeto e companheirismo’. A família,
en
quanto instituição, perdeu seu valor intrínseco. A falsa paz
doméstica não tinha mais que ser preservada. A família passou a
valer somente enquanto fosse veiculadora da valorização do
sujeito e da dignidade de todos os seus membros. Diante desta
quadro, o
menor ganha destaque especial no ambiente familiar,
em razão de ainda não ter alcançado maturidade suficiente para
conduzir a própria vida sozinho. Precisa dos pais
ou de alguém
que exerça a função materna e paterna
para lhe conduzir ao
exercício de su
a autonomia.
300
Uma das claras diretrizes que deriva, diretamente, do princípio do melhor
interesse da criança e do adolescente, diz respeito à chamada
paternidade
responsável
, por intermédio da qual o legislador colocou à disposição dos
interessados divers
as espécies de presunções de filiação, bem como
mecanismos processuais de atingimento do vínculo parental que lhes foram
injustamente subtraídos ou negados por quem de direito.
Exemplo disso diz respeito à denominada
averiguação oficiosa da
paternidade
, p
rocesso de natureza administrativa trazido à tona pela eclosão da
Lei nº 8.560/92, cujo diploma, em menor intensidade, tentou acompanhar
sistemática similar vigente em Cuba.
Disciplina o
caput
Art. 2º da Lei nº 8.560/92 que, na ocasião do registro de
meno
r apenas com maternidade definida, isto é, no qual o registro é efetivado
pela mãe não casada sem a presença do pai, o oficial do Registro Civil deve
remeter certidão ao juiz dando conta “[...] do registro e o nome e prenome,
300
PEREIRA, 2006, p. 126
-
127.
1
1
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8
8
profissão, identidade e residê
ncia do suposto pai, a fim de ser averiguada
oficiosamente a procedência da alegação”.
Tal procedimento é uma tentativa extrajudicial prevista pela lei para que a
pessoa indicada como pai reconheça espontaneamente a paternidade, evitando
-
se, assim, maiore
s constrangimentos e dissabores tanto a ele quanto ao próprio
menor.
Segue daí que o juiz determinará a notificação do suposto pai
independentemente do seu estado civil para que ele se manifeste sobre a
paternidade que lhe é atribuída (§ 1º), ocasião em que, se for o caso, a diligência
será efetivada em segredo de justiça (§ 2º), com o providenciamento do
competente registro ou caso o suposto pai confirme expressamente a paternidade
em termo de reconhecimento que será lavrado especificamente para esse fim
3º), nunca sendo demais destacar: “[...] se o suposto pai não atender no prazo de
30 (trinta) dias a notificação judicial, ou negar a alegada paternidade, o juiz
remeterá os autos ao representante do Ministério Público para que intente,
havendo elemento
s suficientes, a ação de investigação de paternidade” (§ 4º) e
que “[...] a iniciativa conferida ao Ministério Público não impede a quem tenha
legítimo interesse de intentar investigação, visando a obter o pretendido
reconhecimento da paternidade” (§ 5º).
Outro elemento corolário do princípio em estudo encontra
-
se positivado
no Estatuto da Criança e do Adolescente, quando disciplina os regramentos
inerentes ao instituto da adoção, mais precisamente em seus Arts. 43 e 45, § 2º, a
saber: “[...] a adoção será
deferida quando apresentar reais vantagens para o
adotando e fundar
-
se em motivos legítimos”; e, “em se tratando de adotando
maior de doze anos de idade, será necessário também o seu consentimento”.
Sob a ótica constitucional, Luis Roberto Barroso asseve
ra:
O princípio do melhor interesse da criança tem suas origens na
Declaração Universal dos Direitos da Criança, adotada pela
Organização das Nações Unidas, ainda em 1959. Também a
Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San
1
1
9
9
9
9
José da Costa Ric
a, de 1969), ratificada pelo Brasil em 1992
(Decreto nº 678/92), faz referência ao dever da família, da
sociedade e do Estado de dar proteção especial à criança e do
adolescente. A Convenção Internacional de Direitos da Criança,
aprovada pela ONU em 1989 e
ratificada pelo Brasil pelo
Decreto 99710/90, dispõe que todas as ações relativas a
crianças levadas a efeito por instituições públicas ou privadas
deverão considerar, ‘primordialmente, o melhor interesse da
criança’. O antigo Código de Menores já veicula
va a idéia do
melhor interesse através da chamada ‘regra de ouro’ do Direito
Menorista (Art. 5º daquela lei), segundo a qual o superior
interesse do menor sobrelevaria qualquer bem ou interesse
juridicamente tutelado [...]. De toda sorte, a Constituição
of
erece parâmetros: o melhor interesse do menor consistirá na
solução que mais eficientemente realize seus direitos
fundamentais, nos quais estão incluídos, educação, cultura,
profissionalização e convivência familiar.
301
Desta feita, e de acordo com o quanto
estabelecido quando da
Convenção Internacional dos Direitos da Criança, da ONU, de 1989 (cujo
tratado passou a integrar o direito interno brasileiro por força de sua
promulgação mediante o Decreto n. 99.710 de 1990), tem
-
se que o princípio
em tela, como n
ão poderia deixar de ser, determina absoluta obediência
àquilo que melhor interessa e se compraz com os direitos da criança e do
adolescente.
4.4.3
Princípio do poder familiar
Tratado na Constituição Federal de 1988 na primeira parte do
caput
de
seu Art. 229 e ao longo dos Arts. 1.630 a 1.638 do Código Civil, e, bem assim, em
meio aos Arts. 21 a 24 e 155 a 163 do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei
nº 8.069/90), o hoje conhecido poder familiar representa instituto de fundamental
importância para o
adequado desenvolvimento da família.
Traçando a origem e o histórico do instituto em questão, pondera Sílvio de
Salvo Venosa:
301
BARROSO, 1996, p. 23
-
25.
2
2
0
0
0
0
[...] em Roma, o pátrio poder tem uma conotação eminentemente
religiosa: o pater familias é o condutor da religião doméstica, o
que explica seu aparente excesso de rigor. O pai romano não
apenas conduzia a religião, como todo o grupo familiar, que podia
ser numeroso, com muitos agregados e escravos. Sua autoridade
era fundamental, portanto, para manter unido e sólido o grupo
como c
élula importante do Estado. De fato, sua autoridade não
tinha limites e, com freqüência, os textos referem
-
se ao direito de
vida e morte com relação aos membros de seu clã, aí incluídos os
filhos, embora a história não noticie que chegasse a este
extremo.
302
Percebe
-
se, assim, uma grande oscilação do instituto desde a sua origem
até os presentes dias, isso porque o que antes representava um inegável direito
do respectivo titular agora passa a ser dever inerente à denominada paternidade
responsável (Art. 226,
§ 7º, CF), até por conta dos imperativos constitucionais
estampados no
caput
do Art. 227 e no Art. 229 da Constituição Federal.
Conceituando o poder familiar, assinala Caio Mário da Silva Pereira que o
mesmo trata
-
se do “[...] complexo de direitos e deve
res quanto à pessoa e bens
do filho, exercidos pelos pais na mais estrita colaboração, e em igualdade de
condições”.
303
Não diverge do conceito em tela a doutrina costarricense, pois Geraldo
Trejos, nos idos de 1977, proclamava: “[...]
la autoridad parental
se otorga a los
padres para que protejan al hijo menor en su salud, su seguridad, y su moralidad.
Por ello, su ejercicio confiere los derechos e impone los deberes de educar,
guardar, vigilar y, en forma moderada, corregir al hijo
”.
304
Não obstante a preci
são e abrangência inquestionáveis dos conceitos
acima mencionados, a verdade é que diante da própria evolução do instituto
em referência parece ser mais apropriado apenas inverter
-
se a ordem
estabelecida pelos insignes juristas relativamente às expressões
direitos
e
302
VENOSA, Sílvio de Salvo.
Direito civil
: direito de família. 16ª ed. São Paulo: Atlas, 2005, vol.
VI, p. 334
-
335.
303
PEREIRA, Caio Mário da Silva.
Responsabilidade civil
. 8ª
ed. rev. e atual. Rio de Janeiro:
Forense, 1998, p. 421.
304
TREJOS, Geraldo.
Introduccion al derecho de familia costarricense
.
San José da Costa
Rica: Juricentro S.A., 1977, p. 129.
2
2
0
0
1
1
deveres
, de molde a trazer a referência feita a essa última antes da alusão
àqueloutra, acrescentando
-
se, outrossim, a peculiaridade de que o aludido
complexo perdura apenas e tão
-
somente enquanto houver menoridade do filho
(Art. 1.630, CC e Art
. 2º, ECA).
Assim, ter
-
se
-
ia que o poder familiar seria o complexo de deveres e
direitos em relação aos filhos menores e aos seus respectivos bens, exercidos
conjuntamente pelos pais em igualdade de condições.
Ora, presentemente já não mais se discute qu
e o poder familiar reclama
muito mais compromissos dos seus respectivos titulares do que lhes outorgam
direitos, tanto que é comum dirigir
-
se a estes últimos como sendo apenas e tão
-
somente co
-
respectivos necessários ao adimplemento dos deveres ínsitos à
p
aternidade responsável.
Tanto assim o é que, inclusive, malgrado a evolução da terminologia de
pátrio poder
para
poder familiar
, há quem saliente
e com toda razão
que
melhor teria andado o legislador se tivesse deixado de lado a expressão
poder
para s
ubstituí
-
la por
autoridade
, haja vista que esta última mais se amolda à
legitimidade de que se precisa para ascender sobre os indivíduos cuja condução
da vida pretende
-
se levar adiante com correção e dignidade.
305
E exatamente por essa razão que Paulo Luiz
Netto Lobo esclarece:
[...] o poder familiar, sendo menos poder e mais dever,
converteu
-
se em múnus, concebido como encargo legalmente
atribuído a alguém, em virtude de certas circunstâncias, a que
não se pode fugir. O poder familiar dos pais é ônus que a
sociedade organizada a eles atribui, em virtude da circunstância
da parentalidade, no interesse dos filhos. O exercício do múnus
não é livre, mas necessário no interesse de outrem. É, como diz
Pietro Perlingieri, ‘um verdadeiro ofício, uma situação direit
o
-
dever; como fundamento da atribuição dos poderes existe o
dever de exercê
-
los’.
306
305
COMEL, Denise Damo.
Do poder familiar
. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2003, p. 141
-
143.
306
Ibidem, p. 144.
2
2
0
0
2
2
É irrenunciável o poder familiar porque em hipótese alguma se permite
que os responsáveis livrem
-
se dos encargos a ele correspondentes segundo os
seus exclusivos arbítrios.
A indivisibilidade do poder familiar vem caracterizada pelo pormenor de
que seu exercício pressupõe unidade de desígnios, ou seja, reclama o
compromisso dos responsáveis pela condução da vida do menor, daí porque até
nas situações que envolvam casais que
não coabitam há de se ter em mente a
necessidade de que devem eles adimplir para com os encargos decorrentes da
paternidade responsável, fazendo
-
se, portanto, sempre presentes na vida do
menor cuja vida deve ser conduzida dentro da mais absoluta e eficaz
participação
compromissada dos respectivos pais.
Entrevistos nos dispositivos legais representados pela primeira parte
do Art. 229 da Constituição Federal, pelo inc. I do Art. 1.634 do Código Civil
e pelo Art. 22 do Estatuto da Criança e do Adolescente, t
ais atributos dizem
respeito ao compromisso que os pais têm de conduzir os filhos a uma
adequada formação, disso resultando, conseqüentemente, na necessidade
de direção da criação e da educação dos mesmos de maneira a oportunizar
-
lhes acesso às informações
indispensáveis a uma sadia qualidade de vida,
cujo alcançamento indubitavelmente demanda o fornecimento dos víveres
relacionados ao desenvolvimento físico e principalmente psicológico do
menor.
A seu turno, convém registrar que, do ponto de vista técnico
, há de se
estabelecerem diferenças de significados entre as expressões
criação
e
educação
, pois enquanto a primeira se refere ao que se costuma dizer no
jargão popular
berço
isto é, as orientações recebidas em casa dos pais
acerca do modo adequado de co
mportar
-
se perante a família e a sociedade
como um todo
a segunda diz respeito à educação oficial que recebe
fiscalização direta do Estado e que tem como objetivo fundamental o preparo
das pessoas para o exercício da cidadania, e, bem assim, a qualificaç
ão para
o trabalho, nos exatos termos do que preconiza a regra explicitada no Art.
205 da Constituição Federal.
2
2
0
0
3
3
Nesse diapasão, aliás, bem se vê que o próprio legislador constituinte
preferiu desmembrar certos conceitos em outros mais novos e mais específi
cos
vislumbrando a destinação de melhores cuidados às crianças e aos
adolescentes, daí porque ponderou no
caput
do Art. 227 da Constituição
Federal que:
Art. 227: [...] é dever da família, da sociedade e do Estado
assegurar à criança e ao adolescente, com
absoluta prioridade, o
direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade
e à convivência familiar e comunitária, além de colocá
-
los a salvo
de toda forma de negligência, di
scriminação, exploração,
violência, crueldade e opressão.
Bem sintetizando a questão em estudo, ensina J. M. de Carvalho Santos
que:
Pessoas absolutamente incapazes. Essas não têm intervenção
nos atos jurídicos, não tomam parte direta no negócio, sendo
s
ubstituídas por seus representantes. Será nulo o ato se houver a
intervenção direta daqueles [...]. Pessoas relativamente
incapazes. Essas intervêm no ato jurídico, assistidas ou
autorizadas, porém, pelos seus pais ou tutores. Não são
representadas, como s
e diz neste artigo, mas apenas assistidas
ou autorizadas.
307
Nessa altura, implica destacar que, no âmbito da representação,
apenas os pais manifestam vontade, embora o façam em nome dos filhos,
enquanto que, na assistência, os filhos também manifestam vont
ade direta,
possuindo, portanto, relativa legitimação das suas manifestações perante
terceiros. Essa é a razão,
ad exemplum
, que afasta a necessidade da
assinatura do menor de 16 anos de idade nos negócios jurídicos que sejam
realizados em seu nome pelos s
eus respectivos pais, e exige
-
a naqueloutros
nos quais ele já conte com no mínimo 16 anos completos. Na primeira
hipótese, dá
-
se a representação, na segunda, identifica
-
se a assistência (Art.
1.634, inc. V, CC).
307
SANTOS, J. M. de Carvalho.
Código civil brasileiro interpretado
: parte geral. São Paulo:
Livraria Freitas Bastos, 1982, vol. II, p. 281
-
282.
2
2
0
0
4
4
4.4.4
Princípio da não
-
discriminação ou da i
gualdade entre todos os filhos
Considerado por muitos doutrinadores como sendo a mais radical e
importante inovação constitucional dentro do Direito de Família, tem
-
se que a
positivação do princípio da não
-
discriminação da filiação se encontra alicerçada
no § 6º do Art. 227, cujo regramento basilar dispõe: “Os filhos, havidos ou não da
relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações,
proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação”.
Já, Clóvis Beviláqua
assinalava:
O Código Civil de 1916 estabelecia distinção entre filhos legítimos
e ilegítimos. Filhos legítimos eram os nascidos de casal unido
pelos laços do casamento. Quando os filhos não procedessem de
justas núpcias, isto é, quando não houvesse casam
ento entre os
genitores, se diziam ilegítimos. Os filhos ilegítimos classificavam
-
se em naturais e espúrios. Eram havidos como naturais (
naturalis
tantum
) quando nascidos de homem e mulher entre os quais não
existisse impedimento matrimonial (
ex soluto et
soluta
); espúrios,
quando nascidos de homem e mulher impedidos de se casarem
na época da concepção. Se o impedimento decorresse de
parentesco próximo dos genitores, ou de afinidade, conforme
enumeração constante do Art. 183, nº I a V, do Código Civil de
19
16, os filhos eram havidos como incestuosos; se o impedimento
se relacionasse com a existência de casamento anterior de um
dos genitores com outra pessoa e violação, destarte, do dever de
fidelidade, os filhos eram tidos como adulterinos. Referentemente
ao
s filhos incestuosos e adulterinos, excluía
-
os o Código, de modo
expresso, do reconhecimento (Art. 358). Assim dispondo,
almejava suprimir, tanto quanto possível, todo o traço do delito,
sepultar no olvido o adultério e o incesto, destruindo
-
lhe mesmo a
pr
ópria memória.
308
Só da observação das expressões utilizadas em tempos pretéritos
exsurge induvidosa a inequívoca discriminação que se destinava aos filhos, uma
vez que ilegítimo, espúrio, adulterino e incestuoso não são expressões dignas de
serem endereçad
as aos filhos, até porque não são eles os responsáveis pelo
surgimento da filiação nas condições a que cada uma das aludidas classificações
pretendia deixar registrado, mas unicamente os respectivos pais.
308
BEVILÁQUA, Clóvis.
Curso de direito civil
: direito de família. São Paulo: Saraiva, 2005, vol.
II, p. 301
-
302.
2
2
0
0
5
5
Como prova disso, importante trazer
-
se à tona o mag
istério de Antão de
Moraes, que nos idos de 1948, ao emitir parecer a um consulente, asseverou:
Hoje, já não se discute ser dominante a doutrina de que o
reconhecimento indireto é válido, desde que seja evidente a
vontade de estabelecer o laço da filiação
. Êste assunto ficou
perfeitamente elucidado pelo professor SORIANO DE SOUZA
NETTO (Cf. CARVALHO SANTOS, comentário ao Art. 357, nº 03).
Tão pouco existem formas sacramentais. Patenteado o intuito de
reconhecer, qualquer meio é suficiente para prová
-
lo, co
m a única
restrição de constar de uma das formas admitidas: têrmo de
nascimento, escritura pública ou testamento.
309
A discussão outrora estabelecida quanto à possibilidade do
reconhecimento de filhos havidos fora do casamento já havia deixado de ter a sua
importância quando da superveniência da Constituição Federal de 1988, que
pretendendo afastar da pessoa dos filhos os prejuízos que a eles sempre eram
debitados por conta de condutas que não lhes eram imputáveis, equiparou em
direitos todos os filhos independentemente de suas origens, conforme bem se vê
da regra contida no § 6º do Art. 227 da Lei Maior.
Nessa linha de princípios, o legislador infraconstitucional cuidou de
movimentar
-
se no sentido de estabelecer certos critérios para o reconhecimento
da fil
iação fora do casamento, o que culminou no surgimento do
caput
Art. 26 do
ECA (Lei nº 8.069/90), segundo o qual “Os filhos havidos fora do casamento
poderão ser reconhecidos pelos pais, conjunta ou separadamente, no próprio
termo de nascimento, por testame
nto, mediante escritura ou outro documento
particular, qualquer que seja a origem da filiação”, e, posteriormente, da Lei nº
8.560/92 com dispositivo similar, qual seja, o representado pelo seu Art. 2º.
Seguindo esse mesmo diapasão, a novel legislação civ
il também
autorizou no bojo do seu Art. 1.607 a possibilidade de reconhecimento da filiação
mesmo fora do casamento, cujos critérios, obviamente, continuam a ser os
mesmos estabelecidos na citada Lei nº 8.560/92, nunca sendo demais assinalar
309
MORAES, Antão de.
Problemas e negócios jurídicos
. São Paulo: Max Limonad, 1948, vol.
I, p. 322.
2
2
0
0
6
6
que a maior pr
eocupação do legislador sempre foi a paternidade, já que no
comum das vezes a maternidade resta bem definida.
Desse modo, a regra expressa no Art. 1.607 do Código Civil é
endereçada ao reconhecimento voluntário da paternidade fora do casamento de
filhos q
ue possuam a maternidade definida de mães que não se encontram
sujeitas à incidência das regras constantes do Art. 1.597 do mesmo
codex
, sob
pena de inoportuno e inseguro afastamento das presunções ali estabelecidas.
Outrossim, impende alinhavar que afora
a advertência acima formulada
acerca da exegese oriunda do Art. 1.597, nas demais hipóteses, isto é, onde não
comporte as presunções oriundas da lei, mesmo havendo casamento em curso o
reconhecimento voluntário da paternidade ainda indefinida poderá ser a
lcançado.
Por fim, nunca é demais assinalar que o reconhecimento voluntário da
maternidade também se mostra possível, desde que, obviamente, no registro
pertinente inexista a indicação de genitora daquele que se pretende reconhecer.
Aliás, como bem alert
a Maria Berenice Dias:
[...] negar a realidade, não reconhecer direitos, só tem uma triste
seqüela: os filhos são deixados à mercê da sorte, sem qualquer
proteção jurídica. Livrar os pais da responsabilidade pela guarda,
educação e sustento da criança é d
eixá
-
la em total desamparo. Há
que se reconhecer como atual e adequada a observação de Clóvis
Beviláqua ao visualizar um misto de cinismo e de iniqüidade,
chamando de absurda e injusta a regra do Código Civil de 1916, que
negava reconhecimento aos filhos adulterinos e incestuosos.
310
Exemplo claro do acima exposto, tem
-
se que depois da Constituição de
1988, não há mais filho adotivo, mas adoção, entendida como meio para filiação,
que é única.
Assim, trazendo uma nova referência ao Direito de Família, até di
ante da
necessidade de adaptação da legislação infraconstitucional ao vigente
310
DIAS, 2002, p. 395.
2
2
0
0
7
7
ordenamento constitucional, ao tratar das relações de parentesco, o novo Código
Civil aboliu as encontradiças expressões de outrora relacionadas às evidentes
discriminações injustas até então utilizadas pela lei, daí porque, além da retirada
do antigo Capítulo III (Arts. 352 a 354), no qual se se tratava
Da Legitimação
,
substituíram
-
se as expressões equivocadas que enunciavam os outros Capítulos,
de maneira que, mantendo o Capítul
o I com a mesmíssima referência
(
Disposições Gerais
), transmudou os demais, sendo certo que o Capítulo II
passou a denominar
-
se apenas
Da Filiação
(e não mais
Da Filiação Legítima
), o
Capítulo III (anterior Capítulo IV) modificou
-
se de
Do Reconhecimento do
s Filhos
Ilegítimos
para somente
Do Reconhecimento dos Filhos
, manteve
-
se o Capítulo
IV (anterior Capítulo V) com a mesma referência
Da Adoção
, e, por fim, alterou
-
se
o enunciado do Capítulo V (anterior Capítulo VI) de
Do Pátrio Poder
para
Do
Poder Familia
r
.
Assim é que as expressões pretéritas que possuíam carga discriminatória
foram abolidas, culminando, desta feita, na substituição delas por referências
mais adequadas à realidade da sociedade constitucional contemporânea, razão
pela qual se entremostra
pertinente aludir
-
se à antiga
filiação legítima
como
simplesmente
filiação matrimonial
, à legitimação como
matrimonialização
e aos
filhos ilegítimos como filhos
não
-
matrimoniais
, não pretendendo com isso
estabelecer diferenciações qualitativas
até porque
a Constituição proíbe
expressamente tal prática ao assinalar no § 6º do seu Art. 227 que “Os filhos,
havidos ou não da relação de parentesco, ou por adoção, terão os mesmos
direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativ
as
à filiação”
, mas apenas e tão
-
somente compreender a transição implementada
no Direito de Família.
4.4.5
Princípio da condição peculiar da pessoa em desenvolvimento
O princípio em comento encontra
-
se retratado no Art. 6º da Lei nº
8.069/90, na exata medida em que restou positivado que: “Na interpretação desta
Lei levar
-
se
-
ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem
2
2
0
0
8
8
comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da
criança e do adolescente como p
essoas em desenvolvimento”.
Referido vetor tem por escopo velar pela concretização da passagem do
estado de criança e adolescente para o de adulto socialmente adaptado, até
porque pelo fato de referir
-
se à pessoa que ainda não se encontra solidamente
form
ada e cônscia da plenitude e dos efeitos de seus atos, o sistema legal
consagra referida proteção, sendo importante trazer à lume a ponderação de
Arminda Aberastury: “[...] as modificações psicológicas que se produzem neste
período, e que são correlatas de
modificações corporais, levam a uma nova
relação com os pais e com o mundo”.
311
Essa situação inclusive se refletiu na atuação do legislador constituinte no
momento de fixar a idade mínima para que a pessoa pudesse responder
criminalmente por seus atos, circunstância essa que foi positivada no Art. 228 da
Constituição Federal, mais precisamente deixando
-
se claro que são inimputáveis
os menores de dezoito anos.
Isso não significa dizer que o legislador constituinte teria optado pela total
impunidade de crianças e adolescentes que acabassem cometendo atos contrários
às leis em vigor. Em verdade, em levando corretamente em consideração a condição
peculiar de pessoas em desenvolvimento, plasmou
-
se no referido dispositivo basilar
que os infantes que viessem a de
linqüir seriam submetidos às normas da legislação
especial,
in casu
, o Estatuto da Criança e do Adolescente.
E, a par das discussões que se colocam hoje em dia sobre a necessidade
de se alterar a idade de responsabilização penal,
312
verifica
-
se o correto
en
tendimento no sentido de que o conteúdo apresentado pelo citado Art. 228
estaria integralmente protegido de
ataque
, via emenda constitucional, tendo em
vista fazer parte do núcleo constitucional material intangível, ou seja, possui
inequívoca natureza jurídica de cláusula pétrea.
311
ABERASTURY, Arminda.
Adolescência
. Porto Alegre: Artes Médicas, 1980, p. 24.
312
Disponível em: <
http
://br.news.yahoo.com/s/reuters/070426/man/man_pol_reduc_maior_pol
>.
Acesso em: 12 abr. 2007.
2
2
0
0
9
9
Nas palavras de Luiz Alberto David Araujo:
[...] o Art. 228 da Constituição Federal se encontra no grupo
petrificado, ou seja, que não admite mudança por emenda
constitucional. Se o artigo quinto tratou da liberdade individual, se
tratou da disciplina da privação de liberdade, o fato de o Art. 228
estar deslocado do artigo quinto, em nada altera a sua situação de
imutabilidade. A interpretação sistemática leva a inclusão da regra
do Art. 228 nos direitos e garantias individuais, co
mo forma de
proteção. E, como há capítulo próprio da criança e do
adolescente, nada mais correto do que a regra estar inserida no
seu capítulo específico, embora se constitua em extensão das
regras contidas no Art. 5º, objeto da imutabilidade.
313
Nesse diap
asão, é por intermédio de tal princípio que se explica a
questão da inimputabilidade de crianças e a adolescentes, haja vista que o
legislador entendeu por bem que até os 12 (doze) anos incompletos a eventual
realização de infração penal não pode levar seu
agente a sofrer a aplicação de
medidas coercitivas em sentido próprio, aplicando
-
se, então, as chamadas
medidas protetivas
apresentadas pela própria Lei nº 8.069/90, em seu Art. 101, a
saber: (i) encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de
r
esponsabilidade; (ii) orientação, apoio e acompanhamento temporários; (iii)
matrícula e freqüência obrigatória em estabelecimento oficial de ensino
fundamental; (iv) inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família,
à criança e ao adolescen
te; (v) requisição de tratamento médico, psicológico ou
psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial; (vi) inclusão em programa
oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e
toxicômanos; (vii) abrigo em entidades; e, (viii) colocação em família substituta.
No que se refere aos adolescentes, tem
-
se que, além das medidas
elencadas no Art. 101 do ECA, são aplicáveis, cumulativamente, medidas de
natureza socioeducativa, tais como: advertência; obrigação de reparar o dano;
pre
stação de serviços à comunidade; liberdade assistida; inserção em regime de
semiliberdade; e, internação em estabelecimento educacional, devendo levar
-
se
313
ARAUJO, Luiz Alberto David. A impossibilidade de alteração do Art. 228 da Constituição
Federal: a busca dos ideais constituintes e seus valores democráticos. In:
BIERRENBACH,
Maria Ignês; CRISÓSTOMO, Eliana Cristina R. Taveira; NUNES, Irineide da Costa e Silva
et
al
(orgs.).
A razão da idade
: mitos e verdades. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p.
134.
2
2
1
1
0
0
em consideração a capacidade de que dispõe o agente em cumprir tais
determinações, as circunstâncias e
gravidade da ilicitude, sendo vedada a
imposição de trabalhos forçados, como bem se verifica por intermédio da redação
emprestada ao Art. 112 do referido
codex
.
Não se deve perder de vista que também as normas procedimentais
de índole semelhante às de na
tureza penal apresentadas pela Lei nº
8.069/90 deverão receber interpretação condizente com as diretrizes e os
apontamentos constitucionais existentes, pois, como bem salienta Ana
Paula Motta Costa:
[...] o Processo deve refletir as bases do regime democr
ático e ser
o microcosmos do Estado Democrático de Direito, com liberdade,
igualdade e participação, em clima de legalidade e
responsabilidade. No caso do Estatuto da Criança e do
Adolescente, o respeito ao devido processo é um instrumento de
garantia da a
plicação da Lei especial, de acordo com sua
concepção doutrinária, pois é uma forma de efetivar
-
se o modelo
previsto de ‘direito penal mínimo’ nela contido. No decorrer do rito
processsual, é possível buscar a efetivação das garantias
individuais que estão
previstas no ordenamento jurídico, todas, as
quais, de origem constitucional.
314
Dentro do contexto principiológico em comento, faz
-
se relevante
mencionar a proibição estatutária de que os adolescentes venham a cumprir as
medidas socioeducativas que lhes foram impostas em estabelecimentos
congêneres destinados a adultos, como bem determinam os Arts. 123 e 185 da
citada Lei nº 8.069/90, cujo fundamento de validade, sem sombra de dúvidas,
está ligado ao direito fundamental estampado no inc. XLVIII, do Art. 5º
, da
Constituição Federal que dispõe: “[...] a pena será cumprida em
estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o
sexo do apenado”.
Karyna Batista Sposato, ao comentar o princípio da condição peculiar de
pessoa em desenvolvi
mento, assinala:
314
COSTA, Ana Paula Motta.
As garantias processuais e o di
reito penal juvenil como limite
na aplicação da medida socioeducativa de internação
. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2005, p. 97.
2
2
1
1
1
1
Seu significado é tremendamente importante, na medida em que
supera a categoria da menoridade e, por conseguinte, a
desqualificação de crianças e adolescentes como seres inferiores.
O conteúdo inovador está no reconhecimento de uma igualda
de
essencial de toda a pessoa humana, decorrente de sua dignidade.
E a dignidade, por sua vez, exige a titularidade de direitos e
deveres. Esse reconhecimento pela nova normativa da criança e
do adolescente reforça que toda pessoa, enquanto viva, encontra
-
se em permanente desenvolvimento de sua personalidade, porém
na infância e na adolescência tal desenvolvimento é mais intenso
e, portanto, peculiar. O estágio especial do desenvolvimento da
personalidade não implica total desresponsabilização, mas sim a
pe
rcepção inequívoca de diferentes níveis de desenvolvimento e,
assim sendo, de diferenciados níveis de responsabilidade.
315
Assim, necessariamente, o aplicador do direito deve interpretar o sistema
jurídico vigente, incluindo
-
se aí, as questões de imposição
de penas e restrição de
direitos, de modo compatível com a condição peculiar de pessoa em
desenvolvimento referente a crianças e adolescentes, a fim de que tais não
venham a ser julgadas ou interpretadas com o mesmo rigorismo que deve ser
imposto aos adult
os.
4.5
O Ministério Público e seu Papel Fundamental na Proteção
dos Direitos de Crianças e Adolescentes
Nos precisos termos do
caput
do Art. 127 da Constituição Federal, tem
-
se
que: “O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função
ju
risdicional do Estado, incumbindo
-
lhe a defesa da ordem jurídica, do regime
democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”.
A instituição ministerial compreende o Ministério Público da União
(subdividido em Ministério Público Federal, M
inistério Público do Trabalho,
Ministério Público Militar e Ministério Público do Distrito Federal e Territórios) e
o Ministério Público dos Estados, a teor do quanto positivado no Art. 129 da
CF/88.
315
SPOSATO, 2005, p. 105.
2
2
1
1
2
2
Insta acentuar, por oportuno, que a própria Constituição
Federal deixou claro que
compete ao Ministério Público, em todas as suas esferas, zelar pelo efetivo respeito dos
Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados a partir de
outubro de 1988, promovendo as medidas necessárias
à sua garantia.
Percebe
-
se, a olhos vistos, que, a cada dia, aumenta a fundamentalidade
e relevância da atuação do Ministério Público na defesa impostergável dos
interesses de nossa sociedade, principalmente no que diz respeito à proteção dos
direitos hu
manos.
Nesse sentido, importante a explicação propagada por Arthur Pinto Filho,
para quem:
[...] buscando manter o equilíbrio após o encerramento do seu
trabalho, o constituinte necessitava encontrar uma instituição que
pudesse fazer valer a Constituição por inteiro. Uma instituição que
tivesse um quadro de profissionais com bom preparo e que,
embora dentro do aparelho do Estado, fosse um braço da
sociedade. E que tivesse a missão central de ser o agente
vivificador da Constituição em seu todo. Assim, o M
inistério
Público também é guardião da Constituição, mas não no sentido
gizado ao Supremo Tribunal Federal. Este tem a tarefa explícita
de dizer quais as normas infraconstitucionais que agridem a
Constituição
e que, portanto, deverão ser retiradas do
ord
enamento jurídico
e quais as que estão compatíveis com o
texto maior. A natureza da função ministerial é completamente
diversa: é o guardião ativo das leis. Cabe a ele buscar fazer valer
todos os direitos e garantias estabelecidos na Constituição
exigind
o o respeito total e completo ao texto constitucional. E,
como visto, por conta da desigualdade cruel da sociedade
brasileira, caberá a ele a tarefa maior de fazer valer os direitos e
interesses que não tem articulação política e força para tanto,
porque n
ão; e razoável a Constituição vale em parte, porque isto,
só por si, quebra o equilíbrio pelo Constituinte.
316
A mídia impressa e falada nos apresenta uma série de situações
envolvendo a investigação e a punição de agentes que optaram por trilhar o
tortuoso
e odioso caminho da malversação do dinheiro público e do desrespeito
das leis vigentes.
316
PINTO FILHO, Arthur. Constituição, classes sociais e Ministério Público. In: FERRAZ, Antonio
Au
gusto Mello de (coord.)
.
Ministério Público
: instituição e processo. São Paulo: Atlas, 2002,
p. 83.
2
2
1
1
3
3
Essa situação de controle não seria possível sem a firme e autônoma
intervenção do Ministério Público em casos que tais, mostrando que, com a
derrocada do regime milit
ar inaugurado em 1964, a instituição saiu de um plano
de participação social secundária, para se firmar como um firme e indelével
bastião de defesa da moralidade pública, da democracia, dos direitos humanos e
de cumprimento da Lei Constitucional.
Jorge Al
berto de Oliveira Marum, categoricamente, afirma:
[...] a Constituição de 1988 marca o reencontro da sociedade
brasileira, e particularmente do Ministério Público, com a
democracia e os direitos humanos. A instituição também se
democratizou e tem voltado
progressivamente sua atuação para a
defesa dos direitos fundamentais consagrados na Constituição.
317
Não se pode negar a inafastável importância da instituição
Ministério
Público
no que se refere à proteção, manutenção e concretização dos direitos
constituc
ionais afetos às nossas crianças e adolescentes, até mesmo porque, foi
a própria Lei de Outubro que lhe outorgou tão relevante função.
No intuito de retratar e explicitar o importante papel de defesa exercido
pelo Ministério Público no que se refere à proteção dos direitos fundamentais de
crianças e adolescentes, em especial no que se refere à necessidade de
convivência familiar, mister se faz trazer a lume parte das razões de apelação da
lavra de Lucas Pimentel de Oliveira, promotor de justiça da Vara da
Infância e da
Juventude da Comarca de Bauru, Estado de São Paulo, que, ao pedir a revisão
da sentença monocrática que extinguiu, sem julgamento de mérito, pleito de
adoção unilateral por homem casado por ausência de amparo legal, assim se
manifestou:
[...
] na realidade não há vedação expressa dos pedidos aduzidos
pelo apelante, tanto que nenhum foi citado na sentença e já foi
deferida adoção em caso idêntico, conforme julgados citados na
obra de Paulo Lúcio
Nogueira (RT nº 481:96 e 475:96, in ‘Estatuto
317
MARUM, Jorge Alberto de Oliveira.
Ministério Público e direitos humanos
.
Campinas:
Bookseller, 2006, p. 427.
2
2
1
1
4
4
da
Criança e do Adolescente Comentado’, Saraiva, 1991, p. 57).
Ausente a vedação expressa, não poderia o processo ser extinto
sem julgamento de mérito, mormente se aplicado o princípio da
proteção integral. Ora, o apelante sempre tratou os menores
Bruno e Ra
fael como seus filhos, conferindo
-
lhes atenção, carinho
e suporte material para que tivessem uma vida saudável,
cumprindo, assim, os deveres que os pais biológicos se
recusaram a adimplir, dando efetividade aos preceitos normativos
acima citados. Se assim
tem sido desde o nascimento dos
adotandos, com a ciência e a concordância da mãe que,
consigne
-
se, nunca foi afastada do convívio dos filhos, por que
negar a invocada tutela jurídica, que atenderá aos superiores
interesses dos menores e a ninguém lesará? P
or que negar a
Bruno e a Rafael o direito de ter um pai no sentido jurídico do
termo, se já o têm na vida real? Deferir a adoção pleiteada
representará a efetividade do princípio da proteção integral. A
negativa da adoção, ao contrário, representará a excl
usão da
tutela jurídica das crianças/adotandas.
318
O Egrégio Tribunal de Justiça,
319
valendo
-
se dos princípios constitucionais
aplicáveis a casos semelhantes, reconheceu e fez valer a adoção pleiteada e
injustamente negada pelo Juízo monocrático, uma vez que
completamente
divorciado da atuação jurisdicional protetiva afeta a crianças e adolescentes,
restando assim ementado o referido
decisum
:
APELAÇÃO CÍVEL
Ação de adoção unilateral de duas crianças
cumulada com pedido de desconstituição de poder familiar.
Processo extinto, sem julgamento de mérito, por impossibilidade
jurídica do pedido. Apelações interpostas pela mãe biológica das
crianças e pelo autor da demanda visando à adoção, por este, dos
menores. Reais vantagens para os adotandos demonstradas no
cur
so da instrução, com amparo em motivos legítimos. Interesse
dos infantes que se sobrepõem a quaisquer outros. Recursos
providos, com a determinação de se proceder às necessárias
consignações, nos termos do Estatuto da Criança e do
Adolescente.
Outro caso
digno de nota, diz respeito ao acordo recentemente firmado
pelo Ministério Público Federal em São Paulo com a MTV, a Sony Music e a
BMG, visando à não mais exibição e execução da música de autoria da banda
gaúcha Bidê ou Balde, intitulada
E por que não?
, t
endo em vista que, em seu
conteúdo, fazia expressa e explícita menção à pedofilia, o que, por óbvio, estava
318
Vara da Infância e Juventude da Comarca de Bauru/SP, Processo nº 2.213/03.
319
Apelação Cível nº 141.091.0/3, Comarca de Bauru, Relator: Desembargador Jarbas Mazzoni,
j. 22/01/07, v.u.
2
2
1
1
5
5
a contrariar, sobremaneira, os ditames protetivos impostos tanto pela Constituição
da República quando pelo Estatuto da Criança e do Adolescente.
P
or intermédio do Procurador Regional dos Direitos do Cidadão Sergio
Suiama, a MTV acabou se comprometendo, também, a exibir, por 60 (sessenta)
vezes, durante o período compreendido entre 02 de janeiro a 30 de março de
2006, o filme
Exploração sexual
, produ
zido pela Itaipu Binacional, a pedido da
Coordenadoria Nacional do Programa de Controle de Abuso à Exploração Sexual
de Crianças e Adolescentes, mantido pelo Governo Federal, sendo certo que
referida composição foi devidamente informada nos autos da ação c
ivil pública
movida pelo MPF/RS, cujo pedido visada, igualmente, à proibição de execução e
exibição da referida música.
Não se pode deixar de mencionar que, a teor do quanto decidido pelo
Supremo Tribunal Federal, toda a vez que a Administração, em qualqu
er esfera
de atuação, deixar de atentar para a adoção de políticas públicas que envolvam a
concretização de direitos fundamentais, como é a natureza do tema em comento,
pode o Poder Judiciário, excepcionalmente, resolver a problemática omissiva,
intervindo
ativamente, circunstância essa que, dentro das funções consentâneas
à finalidade do Ministério Público, abre a possibilidade de os valorosos
representantes da instituição utilizarem da ação civil pública para o saneamento e
a efetivação de direitos afetos a crianças e adolescentes que, porventura, tenham
sido postergados ou relegados ao esquecimento.
Noutras palavras, tem
-
se que:
[...] a efetividade dos direitos fundamentais a prestações está
intimamente relacionada as políticas públicas, uma vez que é p
or
meio delas que o Estado cumpre com o seu dever de proporcionar
condições materiais mínimas que visam a garantir a dignidade de
seus particulares [...]. Não há dúvidas de que a atribuição de
formular e implementar políticas públicas não se inclui,
ordina
riamente, no âmbito das funções institucionais do Poder
Judiciário, pois tal encargo é dirigido, primariamente, aos Poderes
Legislativo e Executivo. Tal incumbência, no entanto,
excepcionalmente poderá ser atribuída ao Poder Judiciário, que
pode exercer co
ntrole jurisdicional em torno de políticas públicas
quando os órgãos estatais competentes descumprirem os
encargos político
-
jurídicos relativos à eficácia e integridade de
2
2
1
1
6
6
direitos fundamentais, ainda que a referida efetividade esteja
ligada a normas de co
nteúdo programático, não havendo que se
falar, em princípio, em impossibilidade jurídica do pedido em sede
de ação civil pública.
320
A legitimidade ministerial para o manejo da ação civil pública em casos
tais resta indene de dúvidas ao se proceder atenta leitura da ementa paradigma
referente ao julgamento do Recurso Especial nº 718.203/SP, na qual, sob a batuta
do Ministro Luiz Fux, o Superior Tribunal de Justiça deixou assente:
ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
LEGITIMATIO AD CAUSAM
DO P
ARQUET
.
ART. 127 DA CF/88.
ARTS. 7º, 200 E 201 DA LEI Nº 8.069/90. DIREITO À CRECHE
EXTENSIVO AOS MENORES DE ZERO A SEIS ANOS. NORMA
CONSTITUCIONAL REPRODUZIDA NO ART. 54 DO ESTATUTO
DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. NORMA DEFINIDORA DE
DIREITOS E NÃO PROGRAMÁT
ICA. EXIGIBILIDADE EM JUÍZO.
INTERESSE TRANSINDIVIDUAL ATINENTE ÀS CRIANÇAS
SITUADAS NESSA FAIXA ETÁRIA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
CABIMENTO E PROCEDÊNCIA.
321
Cabe destacar, ainda, que a necessidade e a importância de intervenção
da instituição ministerial na defesa dos direitos afetos a crianças e adolescentes
não é um fenômeno exclusivamente brasileiro, podendo
-
se citar, a título de
exemplo do quanto asseverado, comentário proferido por Gonçalo de Melo
Breyner, Procurador da República Portuguesa, no sentido que:
[...] o MP é um dos principais actores no processo de instrução
recolha de elementos
e na própria fase da decisão, perante
situações de desprotecção que exigem, cada vez mais e com a
maior celeridade, a adopção das medidas mais adequadas. Essa
interv
enção do MP, a meu ver deve desenvolver
-
se,
necessariamente, em duas vertentes: 1
a vertente social e 2
a
vertente jurídica.
322
De se notar, por oportuno, que a Lei nº 8.069/90, por intermédio da
redação emprestada aos inc. III e IV de seu Art. 201, dei
xou, indene de dúvidas,
320
Disponível em: <
http://www.juristas.com.br/colunistas/impressao.jsp?idColista=38&ia=124>.
Acesso em: 12 jan. 2007.
321
STJ, REsp. nº 718.203/SP, 1ª Turma, Relator: Ministro Luiz Fux, j. 06/12/05, v.u.
322
BREYNER, Gonçalo de Melo. O Ministério Público e a protecção das crianças e jovens. In:
Direito tutelar de menores
. Coimbra: Coimbra, 2002, p. 59.
2
2
1
1
7
7
que compete ao Ministério Público, também, promover e acompanhar as ações de
alimentos e os procedimentos de suspensão e destituição do pátrio poder,
323
nomeação e remoção de tutores, curadores e guardiães, bem como oficiar em
todos o
s demais procedimentos da competência da Justiça da Infância e da
Juventude, além de promover, de ofício ou por solicitação dos interessados, a
especialização e a inscrição da hipoteca legal e a prestação de contas dos
tutores, curadores e quaisquer admini
stradores de bens de crianças e
adolescentes nas hipóteses de seu Art. 98.
Nesse sentido, caem muito a propósito as palavras de Galdino Augusto
Coelho Bordallo:
[...] devemos ressaltar haver uma amplitude no rol dos direitos a
serem defendidos pelo Minis
tério Público, pois não fica restrito aos
direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos, possuindo,
também, atribuição para a defesa dos direitos puramente
individuais. Esta afirmação resta comprovada pela simples leitura
do Art. 201, incs. III (que
dispõe sobre a legitimidade para a
propositura de ação de alimentos), VIII (que trata da legitimidade
para propositura de medidas judiciais e extrajudiciais cabíveis
para o respeito dos direitos e garantias legais assegurados à
crianças e adolescentes) e
IX (legitimidade para impetrar
mandado de segurança).
324
Assim, diante de qualquer ângulo do qual se aprecie o campo de
atuação do Ministério Público, verifica
-
se que sua presença é
absolutamente indispensável à concretização, à manutenção e à proteção
dos
direitos e interesses de crianças e adolescentes em nosso País, cuja
forma e liberdades de agir, enquanto instituição, ganham elogios em todo o
mundo.
325
323
Atual
poder familiar
por força da alteração levada a efeito pelo novel CC.
324
BORDALLO, Galdino Augusto Coelho. Ministério Público. In: MACIEL, Kátia Regina Ferreira
Lobo Andrade.
Curso de direito da criança e do adolescente
: aspectos teóricos e práticos.
São Paulo: Atlas, 200
1, p. 400.
325
Mauro Cappelletti ,apud,
A defesa dos interesses difusos em juízo
: meio ambiente,
consumidor, patrimônio cultural, patrimônio público e outros interesses. 19ª ed. rev. atual.
ampl. e atual.
São Paulo: Saraiva, 2006
, p. 196: “[...] verdadeirame
nte uma das coisas mais
surpreendentes constatadas neste minha visita é a característica única do Ministério Público
brasileiro
normalmente, em todos os países que conheço, França, Alemanha, Itália etc., o
Ministério Público tende a ser um organismo buro
cratizado e portanto muito lento, sem
motivação bastante para assumir outra e grave atribuição, sobretudo no campo penal, como é
essa dos novos conflitos mencionados, no campo econômico e social”.
2
2
1
1
8
8
4.6
O Direito Fundamental de Crianças e Adolescentes à
Convivência Familiar e Comunitária
De acordo co
m Wilson Donizeti Liberati: “A família é o primeiro agente
socializador do ser humano. A falta de afeto e de amor da família gravará para
sempre seu futuro”.
326
Para Maria Cristina Cereser Pezzella e Fernanda Pappen da Silva:
[...] família, até hoje consid
erada por muitos como a célula
fundamental da sociedade, é o refúgio onde o indivíduo recebe
seu primeiro sustento e assistência, podendo expressar
-
se de
maneira mais autêntica. Nela, harmonizam
-
se a independência e
a liberdade do indivíduo com a união est
rita e solidariedade
familiar, de onde se produz o equilíbrio entre os sentimentos e a
racionalidade do indivíduo, entre o inconsciente e o seu
consciente. É na família que o indivíduo ensaia seus primeiros
passos para viver em sociedade com os seus semelh
antes,
refreando seu egoísmo e os seus caprichos, conciliando os seus
propósitos e interesses com os dos outros, experimentando
sentimentos de altruísmo e de singularidade. Nela se realiza o
princípio fundamental do grupo, que é a continuidade social.
327
Gu
stavo Ferraz de Campos Mônaco afirma:
[...] o grupamento familiar é, segundo a unanimidade dos autores
contemporâneos, o sistema natural mais importante na
contemporaneidade para o desenvolvimento dos indivíduos,
constituindo espaço privilegiado de suprim
ento de suas
necessidades e no qual os projetos e sonhos de felicidade
comuns podem se realizar mais facilmente. A Declaração
Universal dos Direitos da Criança reconhece que o amor e a
compreensão são essenciais na formação harmoniosa da
personalidade indi
vidual, afirmando que é na família que a criança
deve, tanto quanto possível, crescer e se transformar em um
cidadão cônscio de seu papel na sociedade. Isso inclui, ainda, o
dever de manutenção material por todas as formas até o
326
LIBERATI, Wilson Donizeti.
Comentários ao estatuto da cri
ança e do adolescente
. 9ª ed.
rev. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 24.
327
PEZZELLA, Maria Cristina Cereses; SILVA, Fernanda Pappen. Os seres sujeitos de direitos
em família. In: COPETTI, André; ROCHA, Leonel Severo; STRECK, Lenio Luiz (orgs.).
Consti
tuição, sistemas sociais e hermenêutica
. São Paulo: Atlas, 2001, p. 209
-
210.
2
2
1
1
9
9
implemento da idade de 18 a
nos, que tem
-
se estendido até o
término dos estudos universitários na maioria dos países.
328
Assim, quando se remete à família a função socializadora, está se
querendo dizer que, em seu seio, permite
-
se à criança experimentar um processo
de adaptação com o
meio em que vive e, principalmente, desfrutar afeto, amor e
carinho de seus pais e familiares.
Dentro desse processo, e em condições normais, a família é responsável
pela lapidação da
pedra bruta
de modo a recepcioná
-
la, protegê
-
la e devolvê
-
la
ao meio, j
á devidamente adaptada e moldada para o normal e harmonioso
convívio em sociedade.
Cláudia Maria da Silva assevera:
A crucial importância do exame dos fundamentos das relações e
dos vínculos familiares radica na circunstância de que é no seio
deste grupo
que o indivíduo nasce e se desenvolve, moldando sua
personalidade ao mesmo tempo em que se integra ao meio social.
Durante toda a sua vida, é na família que o individuo encontra
conforto e refúgio para sua convivência.
329
Toda criança e todo adolescente,
330
como expressamente dispõe o texto
constitucional, têm o direito fundamental à convivência familiar e comunitária e,
em ostentando natureza fundamental, seu exercício e sua efetivação são
prioritários e impostergáveis, não se olvidando a responsabilidade es
tatal da
própria família e da sociedade para o atingimento do referido desiderato.
Todavia, como bem ressalta Adélia Moreira Pessoa:
328
MONACO, 2005, p. 250
-
251.
329
SILVA, Cláudia Maria da. Direito de família. In:
Revista brasileira de direito de família
, nº
24. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 122.
330
PEREIRA, Tânia da Silva.
Direito da criança e do adolescente
: uma proposta
interdisciplinar. Rio de Janeiro: Renovar, 1996, p. 54: “A adolescência se apresenta como
fase peculiar no desenvolvimento do ser humano, marcado por modificações físicas
profundas
correlatas às mudanças psicológicas, caracterizadas, sobretudo, pela instabilidade
emocional. O tema central da adolescência é a descoberta de si mesmo. Nesta fase registra
-
se geralmente um período de intranqüilidade que é difícil de avaliar: na maioria do
s casos se
trata de um sintoma de um processo de maturação, levando ao autoconhecimento mais
profundo. O indivíduo começa a conhecer a si próprio”.
2
2
2
2
0
0
E o direito fundamental de crianças e adolescentes à
convivência familiar? O Estatuto da Criança e do Adolescente,
na este
ira do Art. 227 da CF e dos instrumentos internacionais
dos Direitos da Criança, ao adotar a doutrina de proteção
integral, voltada para a garantia dos direitos das crianças e
adolescentes, estabeleceu como fundamental o direito à
convivência familiar [...
] Apesar de constitucionalmente
assegurado, deixa de ser implementado [...].
331
Socorrendo
-
nos, novamente, do Minidicionário Houaiss, necessária a
análise dos vocábulos
convivência
e
convívio
, os quais apresentam
significado referente a contato, coexistênci
a harmoniosa, relação quotidiana,
familiaridade, conviver. O dicionário Aurélio traz que convivência “[...] é o
ato ou efeito de conviver; familiaridade; relações íntimas; trato diário”.
332
a definição de conviver é “[...] viver em comum; ter familiaridad
e,
convivência”.
333
Transportando tais significados para o mundo jurídico, pode
-
se afirmar
que referido direito diz respeito à precípua e indispensável necessidade de que
crianças e adolescentes, diante de sua condição peculiar de pessoas em
desenvolvimento
, convivam, de maneira harmônica, com seus pais e familiares,
inserindo
-
se, também, dentro de tal contexto seu importante relacionamento com
os demais pares sociais, isto é, com os demais indivíduos que formam a
comunidade em que vivem.
O direito fundamen
tal disperso à convivência familiar e comunitária
pertencente a crianças e adolescentes foi positivado pelo texto constitucional em
seu Art. 227, recebendo referendos infraconstitucionais por parte da Lei nº
8.069/90, mais precisamente nos Arts. 4º, 16, in
c. V e 19 a 52, exortando a
indispensabilidade de que tais sujeitos desfrutem e tenham a criação e a
educação dentro do seio familiar correspondente.
Como bem salienta Kátia Regina Ferreira Lobo Andrade Maciel:
331
Adélio Moreira Pessoa, apud, ibidem, p. 110.
332
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda.
Pequeno dicionário br
asileiro da língua
portuguesa
. São Paulo: Fronteira, 2002, p. 325.
333
Ibidem, mesma página.
2
2
2
2
1
1
[...] a convivência em família constitui
-
se
em porto seguro para a
integridade física e emocional de toda a criança e todo
adolescente. Ser criado e educado junto aos pais biológicos ou
adotivos deve representar para o menor de 18 anos estar
integrado a um núcleo de amor, respeito e proteção.
334
Ou,
ainda, e nos dizeres de Tarcísio José Martins Costa, tem
-
se que a
convivência familiar diz respeito a uma necessidade vital dos infantes,
equiparando
-
o ao direito fundamental à vida, inclusive.
335
Em comentário à legislação portuguesa, Edmundo Martinho tece
importantes considerações sobre o tema em estudo, as quais encontram plena
ressonância e aplicabilidade em nossa realidade jurídica:
A aproximação estratégica ao desenvolvimento do país não pode,
sob pena de hipotecar a sua dimensão mais significativa, d
eixar
de privilegiar os terrenos de construção da cidadania em todos os
momentos da vida dos cidadãos [...]. Pensar hoje o sistema de
protecção de crianças e jovens, em que as Leis recentemente
aprovadas se constituem como peças centrais de definição e
cla
rificação de responsabilidades, é cada vez mais um exercício
conjugado de reflexão sobre o sistema de protecção social no seu
conjunto. Não espanta, por isso, que possamos afirmar sem
hesitações que não é possível modernizar e tornar mais eficaz o
modelo d
e protecção de crianças e jovens fora de um quadro em
que se tornem mais sólidos os instrumentos de capacitação
pessoal e social das famílias para o exercício integral da sua
função integradora e agregadora.
336
Não se perca de vista, pela importância que de
sfruta, que dada a
circunstância de as normas que regem o Direito de Família serem de natureza
cogente, isto é, não poderem ser afastadas pela autonomia da vontade dos agentes
(senão apenas e tão
-
somente dentro das alternativas previstas expressamente na l
ei),
diz
-
se que uma de suas principais características reside na preocupação com o
asseguramento de um mínimo de garantias para a sua fortificação, disso resultando,
conseqüentemente, numa sensível presença do Estado nesse particular.
334
MACIEL, 2000, p. 69.
335
COSTA, Tarcísio José Martins.
Estatuto da criança e do adolescente comentado
. São
Paulo: LTr, 2003, p. 38.
336
MARTINHO, Edmundo. A família, a
s respostas sociais e as parcerias. In: OLIVEIRA,
Guilherme de (coord.).
Direito tutelar de menores
: o sistema em mudança. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2002, p. 41
-
42.
2
2
2
2
2
2
Essa situação cogente
no aspecto normativo induz, uma vez mais, à
inafastável atuação do Estado em prol da consecução e da concretização do
direito de crianças e adolescentes, cujo desiderato obrigatoriamente perpassa
pela fortificação do papel da convivência familiar, tendo em vista que a família é o
lugar privilegiado à realização de trocas afetivas e de transferência ou
transmissão de valores, cujos valores acabarão por moldar a personalidade e o
caráter do ser que se encontra em peculiar condição de desenvolvimento.
337
E iss
o é tão verdadeiro e real, que a própria Psicologia deixa bem clara a
importância da família para o desenvolvimento adequado e digno do infante, uma vez que a
considera o primeiro referencial com que o novo ser tem contato e do qual depende.
De acordo com o pediatra e psicanilsta britânico Donald Woods Winnicott,
cada ser humano traz inato um potencial para amadurecer e integrar
-
se; porém, o fato
de essa tendência ser inata não garante que ela realmente vá ocorrer, pois, para tanto,
depende de um ambiente
facilitador que forneça cuidados suficientemente bons,
sendo que, no início, esse ambiente é representado pela mãe. É importante ressaltar
que esses cuidados dependem da necessidade de cada criança, pois cada ser
humano responderá ao ambiente de forma própria, apresentando, a cada momento,
condições, potencialidades e dificuldades diferentes.
Para Maria Ivone Accioly Lins:
Para Winnicott, as doenças psíquicas, particularmente as mais
graves, tinham a ver com perturbações que ocorreram durante as
fases ini
ciais da formação do psiquismo, quando o meio ambiente
da criança é constituído pelas relações familiares. Admitindo que
cada indivíduo tem uma experiência singular de seu ambiente
devido a fatores pessoais, insiste na idéia de que um ambiente
real, experi
mentado como facilitador é requisito indispensável ao
desenvolvimento saudável das potencialidades do indivíduo. Este
ambiente é inicialmente a mãe, ou quem exerça sua função
entendida como: segurar o bebê
no início literalmente e, cada
vez mais, no sent
ido figurado de apoio psicológico; manuseá
-
lo,
através dos cuidados necessários a sua sobrevivência, e
apresentar
-
lhe o mundo em pequenas doses. Inicialmente, diz
Winnicott, a mãe exprime seu amor através dos cuidados físicos,
337
LEANDRO, Armando Gomes. Protecção dos direitos da criança em Portugal. In:
Direit
os das
crianças
. Rio de Janeiro: FDR, 2007, p. 110.
2
2
2
2
3
3
procurando adaptar
-
se realmen
te de maneira ativa e criativa às
necessidades do seu filho.
338
Já Isabel Cristina Gomes e Maria Lucia de Souza Campos Paiva
asseveram:
Ao longo da obra de Winnicott percebemos a importância que ele
dedica à família, colocando
-
a como o centro formador da
s
ociedade e da cultura, bem como do desenvolvimento individual,
e mais especificamente, do conceito de maturidade emocional
como sinônimo de saúde mental. O autor chega a ser bastante
enfático quando literalmente afirma que ‘[...] não seria possível ao
indi
víduo atingir a maturidade emocional fora do contexto famíliar
[...]’ (Winnicott, 1997, p. 129). Um conceito central na teoria
winnicottiana é o de holding ou cuidado materno. Nele o autor
enfatiza a importância da mãe (e da família) como modelos de
transi
ção para a entrada do indivíduo num círculo social imediato
e ir caminhando para círculos cada vez mais amplos, como a
política, a religião e a própria sociedade. Em
Preocupação
materna primária
, Winnicott (1956/2000) define um estado muito
especial da mãe
devotada perante as necessidades do bebê, e
estabelece as bases de um ambiente externo suficientemente
acolhedor para o mesmo se desenvolver.
339
Como visto no capítulo anterior, a real eficácia de um direito fundamental
propriamente dito está a depender da eficácia de um direito fundamental
operacional.
De nada adiantaria, do ponto de vista prático, estabelecer
-
se,
constitucionalmente, o direito fundamental de crianças e adolescentes à
convivência familiar e comunitária, se não lhes fossem outorgados instr
umentos
aptos a atingir o referido desiderato, nunca se perdendo de vista a aplicação,
conjunta, do princípio da proteção integral, como bem se observa da redação
emprestada aos Arts. 86 a 97 da Lei nº 8.069/90.
Para Márcio Thadeu Silva Marques:
338
LINS, Maria Ivone Accioly. In: GUIMARÃES, M.Antonio Chagas; PODKAMENI, Angela B.
(orgs.)
Winnicott na PUC
: 100 anos de um analista criativo. Rio de Janeiro: NAU, 1997, p.
13
-
22.
339
Disponível em: <
http:/
/www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&2&lnddfserpt&nrm=isso>.
Acesso em: 12 set. 2006.
2
2
2
2
4
4
[...] a g
arantia de direitos é linha da Política de Atendimento
prevista para implementar a doutrina da proteção integral, de
acordo com os Arts. 86 e 87 do ECA, envolvendo, ainda, as
políticas sociais básicas (saúde, educação, alimentação,
habitação, esporte, laze
r, cultura e profissionalização) e as
políticas de proteção especial (atendimentos a vulnerabilidade por
ameaças ou violações a direitos de crianças/adolescentes, como
drogadictos, portadores de necessidades especiais e vítimas de
violência.
340
Em assim sen
do, começa
-
se com a ação articulada do governo, de forma
conjunta e em todas as suas esferas e níveis, e da sociedade, exigindo
-
se que
referidos agentes se pautem por linhas de ação que venham a abarcar políticas
sociais básicas; políticas e programas de assistência social, em caráter supletivo,
para aqueles que dele necessitem; serviços especiais de prevenção e
atendimento médico e psicossocial às vítimas de negligência, maus
-
tratos,
exploração, abuso, crueldade e opressão; serviço de identificação e de
lo
calização de pais, responsável, crianças e adolescentes desaparecidos; e,
proteção jurídico
-
social por entidades de defesa dos direitos da criança e do
adolescente.
Por sua vez, o Art. 88 da Lei nº 8.069/90 traça as diretrizes da referida
política, pugnan
do pela municipalização do atendimento; pela criação de
conselhos municipais, estaduais e nacional dos direitos da criança e do
adolescente, órgãos deliberativos e controladores das ações em todos os
níveis, assegurada a participação popular paritária por
meio de organizações
representativas, segundo leis federais, estaduais e municipais; pela criação e
manutenção de programas específicos, observada a descentralização político
-
administrativa; pela manutenção de fundos nacional, estaduais e municipais
vincul
ados aos respectivos conselhos dos direitos das crianças e do
adolescente; pela integração operacional de órgãos do Judiciário, Ministério
Público, Defensoria, Segurança Pública e Assistência Social,
preferencialmente em um mesmo local, para efeito de agil
ização do
atendimento inicial a adolescente a quem se atribua autoria de ato infracional;
340
MARQUES, Márcio Thadeu Silva. Sistema de garantia de direitos da infância e da juventude.
In: LIBERATI, Wilson Donizeti (org.).
Direito à educação
: uma questão
de justiça. São Paulo:
Malheiros, 2003, p. 21.
2
2
2
2
5
5
e, pela mobilização da opinião pública no sentido da indispensável participação
dos diversos segmentos da sociedade.
Como consabido, é no Município que o cidadão des
envolve, com maior
intensidade, seus direitos e exerce seus deveres, situação essa que, via de
conseqüência, não se entremostra diferente quando o tema envolve crianças e
adolescentes, emergindo daí que, para a real efetivação dos interesses dos
referidos
infantes, a verdade é que há a necessidade de se fortalecer, estrutural e
economicamente, os entes federados em comento, sob pena de a sua
preconização constitucional também se tornar letra morta, o que se cumpre a todo
custo evitar.
Assim, devem os munic
ípios, pautando e observando as normas
gerais de política nacional de atendimento dos direitos infanto
-
juvenis
estabelecidas pelo CONANDA,
341
atuar de modo a preservar, com
efetividade, os direitos e interesses de crianças e adolescentes, pois, como
bem pond
era Andréa Rodrigues Amin “[...] risco social ou familiar em que se
encontram crianças e adolescentes são mazelas produzidas pelo meio onde
vivem. Cabe, portanto, ao meio resolvê
-
las e, principalmente, evitá
-
las.
Mutatis mutandi é o mesmo que princípio da
responsabilidade civil: aquele
que causa o dano deve repará
-
lo”.
342
Segundo Wilson Donizeti Liberati:
O segredo operacional da aplicabilidade dessas diretrizes de
atendimento está na participação comunitária, formada pelos
diversos segmentos da sociedade (
Art. 88, inc. VI). A opinião
pública deve ser conscientizada e esclarecida dos problemas que
envolvem crianças e adolescentes. Deve tomar posição, com
urgência, para descobrir os meios necessários para enfrentá
-
los,
levantando recursos e aplicando
-
os às so
luções encontradas em
harmonia com os órgãos governamentais e não
-
governamentais.
343
341
Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.242/91).
342
AMIN, 2000, p. 33.
343
LIBERATI, Wilson Donizeti.
Comentários ao estatuto da criança e do adolescente
. 9ª ed.
rev. e ampl. São Pa
ulo: Malheiros, 2006, p. 75.
2
2
2
2
6
6
O direito fundamental em questão pode concretizar
-
se por intermédio da
família natural ou, não sendo possível, por meio da família substituta e suas
espécies: guarda, tutel
a, curatela e adoção, institutos que serão mais bem
trabalhados nos tópicos abaixo.
Todavia, cumpre desde já deixar assentado que, em se somando a verba
constitucional com os dispositivos elencados na Lei nº 8.069/90, chega
-
se à
inafastável conclusão de q
ue a política de prevenção em relação aos direitos e
interesses de crianças e adolescentes se dá sob dois enfoques, a saber: o
primeiro, de natureza geral, diz respeito à concretização e aplicação de medidas
que, efetivamente, garantam os direitos fundamentais dos infantes,
344
que evitem
a desintegração da comunidade familiar, enquanto que, no segundo, a
preocupação gira em torno de preservá
-
los de ambientes perniciosos ou que
sejam contrários à sua condição peculiar de desenvolvimento, não se perdendo
de vis
ta, em acréscimo, a necessidade de medidas sócio
-
educativas objetivando
a reeducação dos menores infratores.
De qualquer modo, é preciso que fique absolutamente claro que, nos
exatos moldes do Art. 73 da legislação estatutária, a inobservância das normas
de
prevenção importará em responsabilidade da pessoa física ou jurídica. Enquadra
-
se no conceito de pessoa jurídica o Estado, emergindo daí que a ineficácia de sua
atuação no que diz respeito à consecução dos direitos e interesses de crianças e
adolescente
s, ou seja, seu descumprimento no que tange às citadas normas de
prevenção, acabará por acarretar sua responsabilização, responsabilização essa
que é o tema central deste estudo, a qual será mais bem explicitada no próximo e
último capítulo deste trabalho.
344
GALINDO, Bruno.
Direitos fundamentais
: análise da sua concretização constitucional.
Curitiba: Juruá, 2006, p. 221
-
222: “Antes de a norma de direito fundamental ser realizada no
plano social, ela deve ser realizável, deve ter
plena potencialidade de realização, e isso diz
respeito à eficácia, mais especificamente àquilo que denominamos eficácia ótima da norma.
Aliás, a plenitude de realização da norma constitucional também se dá, na maioria das vezes,
de forma proporcional ao g
rau de eficácia da mesma. Se dotada de eficácia ótima, sua
potencialidade é plena; se de eficácia parcial, a potencialidade é reduzida; se a norma é
ineficaz, tal potencialidade é praticamente inexistente. A idéia de eficácia, portanto, está
igualmente vin
culada à realzação dos direitos fundamentais, pois sem eficácia, não há como
se falar em efetividade e realização desses direitos. Só que a eficácia diz respeito à
potencialidade, ao passo que a efetividade é ligada à realização mesma dos direitos contidos
na norma constitucional”.
2
2
2
2
7
7
4.6.1
A família natural
Não se pode olvidar que o vocábulo
família
apresenta, dentro da ótica
jurídica, diversas significações: (i) amplíssima: abrange todos os indivíduos
ligados pelo vínculo da consangüinidade e afinidade, incluindo estranhos.
Exemplo
s: Art. 1.412, § 2º, CC e Art. 24 da Lei nº 1.711/52; (ii) lata: restringe
-
se
aos cônjuges e seus filhos, parentes da linha reta ou colateral, afins e naturais.
Exemplos: Arts. 1.591 e ss. do CC; Decreto
-
Lei nº 3.200/41 e Lei nº 883/49; (iii)
restrita: com
preende, unicamente, os cônjuges ou conviventes e a prole.
Exemplos: Arts. 1.567 e 1.716 do CC; (iv) alimentar: consideram
-
se família:
ascendentes, descendentes e irmãos. Exemplos: Arts. 1.694 e 1.697 do CC; (v)
autoridade: pais e filhos; (vi) fiscal: para
efeito de imposto de renda, a família
reduz
-
se aos cônjuges, filhos menores, maiores inválidos ou que freqüentam a
universidade à custa dos pais, até a idade de 24 anos, filhas solteiras e
ascendente inválido que viva sob a dependência do contribuinte, fi
lho que não
more com o contribuinte, se pensionado em razão de condenação judicial; e, (vii)
previdenciário: a família compreende o casal, filhos até 18 anos, filhas solteiras e
companheiro do trabalhador. Exemplo: Art. 217 da Lei nº 8.112/90.
De acordo c
om a exegese contida no Art. 25 do Estatuto da Criança e do
Adolescente, entende
-
se por família natural o agrupamento social composto pelos
pais ou quaisquer deles e seus descendentes.
Navegando
-
se nessas águas, e levando
-
se em consideração o princípio
do
pluralismo consagrado pelo texto constitucional de 1988, a chamada
família
natural
pode surgir por todos os meios que tenham eficácia de fomentar, vivificar
e caracterizar uma determinada comunidade como sendo entidade familiar,
podendo
-
se destacar, nessa
toada, o casamento, a união estável, a família
monoparental, a união homoafetiva, dentre outras possibilidades.
Não obstante as discussões envoltas ao derredor do tema em comentário,
a verdade é que o casamento possui natureza jurídica híbrida, na medida em que
mescla regras relacionadas à vontade do indivíduo (contrato), e, bem assim,
outras de ordem pública (instituto).
2
2
2
2
8
8
Desta feita, malgrado no âmbito do casamento em certas ocasiões se dê
liberdade aos cônjuges
a exemplo do que ocorre com o próprio in
ício do
casamento dependente que é totalmente do consentimento deles, e, igualmente,
em regra a escolha do regime de casamento
, certo é que essa liberdade é
evidentemente controlada de perto pela lei, sem que haja a possibilidade de
disposição quanto aos
caminhos já previamente traçados pelo ordenamento
jurídico, daí porque, inclusive, mesmo que os nubentes pretendam afastar os
direitos e deveres decorrentes do casamento isso não poderá ser alcançado, pois,
uma vez contraído o matrimônio, tais característ
icas exsurgem de modo
imperativo.
Essa é a razão de atribuir
-
se ao casamento uma natureza jurídica
híbrida, haja vista que nele existem regras ligadas à autonomia da vontade e
outras imperativas, relativamente às quais não se permite qualquer margem de
es
colha.
O casamento, contrato especialíssimo, cerca
-
se de absoluta solenidade,
ou seja, de regramentos de segurança justamente para possibilitar aos indivíduos
que se unirão em matrimônio, a manifestação de consentimento verdadeiro, sem
margens a quaisquer
dúvidas.
Assim, induvidoso é que o casamento é contrato que possui característica
marcantemente solene, no qual a lei estabelece todos os passos para a sua
existência, validade e eficácia.
Destaque
-
se que, pormenor interessante referente à solenidade do
casamento, é aquele relacionado à correção e validade do conhecido
casamento
coletivo
de que se vale o Poder Público para regularizar a situação de casais
interessados na concretização do matrimônio, mas que em decorrência das
inúmeras burocracias peculiares ao instituto, acabam por a ele não aderir.
Segue daí que, longe de afastar a característica de solenidade
que,
como se disse, é indispensável para a existência, validade e eficácia do
casamento
, os aludidos
casamentos coletivos
não a dispensam; mu
ito pelo
2
2
2
2
9
9
contrário, atestam
-
na até mesmo pela presença efetiva do Poder Público que
chama para si diretamente a responsabilidade de tomar todas as providências
necessárias à ultimação do matrimônio, facilitando, assim, aos diretamente
interessados no casam
ento, a sua concretização.
Desta forma, também os
casamentos coletivos
são solenes, sendo certo
que o Poder Público apenas se arvora de procurador dos casais interessados no
matrimônio tomando todas as providências solenes que o envolvem.
Não obstante as
interessantíssimas e relevantes discussões que giram
em torno da possibilidade de surgimento de entidades familiares compostas entre
pessoas do mesmo sexo, balizada na premissa da proteção efetiva também da
família homoafetiva, a verdade é que ainda preva
lece a característica da
diversidade de sexos no âmbito do casamento, peculiaridade essa, inclusive, tida
como necessária à sua própria existência.
Desse modo, presentemente inexiste casamento de pessoas do mesmo
sexo, na linha, aliás, do que esclarecem a
s exegeses oriundas dos Arts. 1.514,
1.517 e 1.565 do Código Civil, indicativas de que o casamento está a depender da
união entre homem e mulher.
No que diz respeito à união estável,
345
em total referendo às diretrizes
constitucionais vigentes, o Art. 1.723 do Código Civil pondera que referida
entidade familiar consubstancia
-
se na união havida entre homem e mulher
representada pela convivência pública como se casados fossem, portanto, onde
seja possível reconhecer comunhão de vida.
Destaque
-
se que, embora a
lei não faça qualquer exigência quanto a
prazo mínimo de convivência para o reconhecimento da união estável, a verdade
é que o requisito tempo mostra
-
se importante para a sua caracterização, haja
345
“Agora, dizei
-
me: que é que vedes quando vedes um homem e uma mulher, reunidos sob o
mesmo teto, em torno de um pequenino ser, que é fruto do seu amor? Vereis uma família.
Passou por lá o juiz, com sua lei, ou o padre, com o se
u sacramento? Que importa isto? O
acidente convencional não tem força para apagar o fato natural”. PEREIRA, Virgílio de Sá.
Direito de família
. 2ª ed. Rio de Janeiro: Livraria Freitas Bastos, 1959, p. 09.
2
2
3
3
0
0
vista o condicionamento feito pelo Art. 1.723 quanto à nece
ssidade de a
convivência ser contínua e duradoura.
Esclarece o § 1º do Art. 1.723 do Código Civil que o reconhecimento da
união estável depende da inexistência dos impedimentos a que alude o Art. 1.521
do mesmo
codex
, que se trata dos conhecidos impedimen
tos matrimoniais, não
se aplicando, entretanto, àquele constante do inc. VI caso haja separação de fato
ou judicial.
Demais disso, releva ponderar que as causas suspensivas previstas no
Art. 1.523 do Código Civil não impedem o reconhecimento da união está
vel, de
acordo com o que se observa da regra incrustada no § 2º do Art. 1.723 do Código
Civil.
À união estável aplicam
-
se os mesmíssimos regramentos observados
no âmbito do casamento no que tange às relações pessoais, de maneira que,
a exemplo do que ocor
re com os cônjuges, os companheiros têm deveres uns
para com os outros de lealdade, respeito, assistência e de guarda, sustento e
educação dos filhos, na linha da disciplina contida no Art. 1.724 do Código
Civil.
No que diz respeito à família monoparental, entidade formada por um dos
genitores e seus descendentes, conforme definição constitucional, alguns
delineamentos doutrinários se apresentam, ampliando o conceito, incluindo
-
se
nele a situação de um irmão mais velho que cuida dos mais novos (todos órfão
s),
a do viúvo que cuida dos filhos do leito anterior do cônjuge falecido, a do avô que
cuida dos netos, entre outros (caso Cássia Eller).
4.6.2
A possibilidade e as formas de colocação em família substituta
Antes de adentrar
-
se especificamente ao estudo dos institutos da guarda,
da tutela e da curatela, convém esclarecer que eles fazem parte do chamado
2
2
3
3
1
1
Direito Assistencial, na exata medida em que, como bem leciona Roberto Senise
Lisboa, “[...] quando não houver a possibilidade do exercício do poder familiar,
será necessária a utilização de institutos de assistência, que se destinam a suprir
a ausência do titular do munus aludido”.
346
É bem verdade que a tutela foi criada com o escopo fundamental de
efetuar a proteção e a administração dos bens do menor c
ujo poder familiar se
entremostre ausente, valendo, nesse passo, trazer à colação o enfoque
defendido por Sílvio Rodrigues, para quem “[...] o legislador de 1916, ao cuidar
da tutela, preocupou
-
se, principalmente com o órfão rico, pois ao disciplinar o
tem
a teve em vista, em primeiro lugar, a preservação dos seus bens; aliás, dos
quarenta artigos consagrados ao assunto, apenas um se refere ao menor
abandonado”.
347
Todavia, com o advento do Estatuto da Criança e do Adolescente o
quadro modificou
-
se pela filosofia que emergiu de seu conteúdo, de maneira que
o enfoque repassado ao instituto deu um caráter de proteção à personalidade da
criança e do adolescente, haja vista que a preocupação passou a ser o menor
desprovido de recursos econômicos e/ou morais.
Ness
a esteira de silogismo, passa
-
se a análise, primeiramente, do
instituto da guarda, para, ao depois, cuidar
-
se daqueloutros alusivos à tutela, à
curatela e, excepcionalmente, à mãe social.
4.6.2.1
Guarda
Na linha do que preceitua o
caput
do Art. 33 da L
ei nº 8.069/90, a guarda
corresponde ao encargo civil que obriga a pessoa que a aceita a prestar
assistência material, moral e educacional à criança e ao adolescente.
346
LISBOA, Roberto Senise.
Manual elementar de direi
to civil
. Rio de Janeiro: Renovar, 2004,
p. 164.
347
RODRIGUES, 2002, vol. VI, p. 435
-
436.
2
2
3
3
2
2
Tem ela como escopo regularizar a posse de fato da criança ou do
adolescente, procedendo
-
se à sua acolhida em uma família substituta quando
abandonados ou órfãos.
Vale esclarecer que uma vez deferida, a guarda confere, ao guardião, o
direito de opor
-
se a terceiros, incluindo
-
se nessa situação os próprios pais.
Todavia, é preciso salientar qu
e a guarda não confere ao guardião
poderes de administração dos bens da criança ou do adolescente, embora lhe
possa ser deferido o poder de representação para a prática de atos determinados.
A concessão da guarda independe da suspensão ou da perda do pode
r
familiar, sendo revogável a qualquer tempo, como bem se depreende da redação
inserta no Art. 35 do referido diploma legal.
Ao derradeiro, vale destacar que o procedimento judicial respeitante ao
processo de guarda pode ser amigável ou litigioso, isto é,
os pais podem
concordar ou não com a entrega do filho ao terceiro que dele pretende ser
guardião.
4.6.2.2
Tutela e curatela
O instituto da tutela se revela como sendo um complexo de direitos e
obrigações outorgados pela legislação a um terceiro para proteção do menor que
não se encontra sob a égide do poder familiar, inclusive, mediante a
administração dos bens eventualmente pertencentes ao menor.
Para Maria Helena Diniz a tutela:
[...] é um instituto de caráter assistencial, que tem por escopo
subst
ituir o poder familiar. Protege o menor não emancipado e
seus bens, se seus pais faleceram, foram declarados ausentes,
suspensos ou destituídos do poder familiar (NCC, Art. 1.728, incs.
I e II; Lei nº 8.069/90, Arts. 165 a 170), dando
-
lhes assistência e
2
2
3
3
3
3
re
presentação na órbita jurídica, ao investir pessoa idônea nos
poderes imprescindíveis para tanto.
348
Importante se faz também trazer à colação a escorreita definição
defendida pelo idealizador do Código Civil de 1916, o inesquecível Clóvis
Beviláqua, para quem “[...] a tutela é o encargo civil, conferido a alguém pela lei,
ou em virtude de suas disposições, para que administre seus bens, proteja e dirija
a pessoa do menor, que não se acha sob a autoridade de seu pai ou de sua
mãe”.
349
Diante de tal quadro, o
Art. 1.728 do Código Civil assim verbera: “Os
filhos menores são postos em tutela: I
com o falecimento dos pais, ou sendo
estes julgados ausentes; II
em caso de os pais decaírem do poder familiar”.
Nesse passo, o novel dispositivo em questão acabou po
r trazer uma
mudança significativa em relação ao regramento anterior (Art. 406, CC de 1916),
na medida em que substituiu a expressão
pátrio poder
para o
poder familiar
,
respeitando, assim, a igualdade entre homens e mulheres trazida pela
Constituição Feder
al de 1988, afastando
-
se, assim, definitivamente a idéia da
prevalência da figura paterna na designação e no comando dos destinos da
sociedade familiar.
De outro lado é preciso que se esclareça que não obstante a nova
roupagem emprestada ao instituto pelo
já mencionado Estatuto da Criança e do
Adolescente, a verdade é que ambos os diplomas legislativos são absolutamente
compatíveis, pois, como bem preconiza o Art. 36 do ECA, a tutela será deferida
nos termos da legislação civil em vigor.
Importante salien
tar, também, que a existência da tutela pressupõe
obrigatoriamente a suspensão ou a perda do chamado poder familiar, não
havendo espaço para a convivência conjunta de tais institutos.
348
DINIZ, Maria Helena.
Lei de introdução ao código civil brasileiro interpretada
. 2ª ed.
atual. e aum. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 496.
349
BEVILÁQUA, 2005, vol. II, p.
310.
2
2
3
3
4
4
O instituto da curatela assume um caráter suplementar em relação ao
pode
r familiar, tendo por escopo o exercício da atividade assecuratória dos
interesses pessoais e econômicos do incapaz por motivos diversos da idade
cronológica, sendo certo que, de igual modo, a tutela tem caráter protetivo da
personalidade do curatelado.
M
elhor elucidando a questão e com a precisão que lhe é peculiar, salienta
Maria Helena Diniz que a “[...] curatela é o encargo público, cometido, por lei, a
alguém, para reger e defender a pessoa e administrar os bens de maiores, que,
por si sós, não estão
em condições de fazê
-
lo, em razão de enfermidade ou
deficiência mental”.
350
Todavia, diferem
-
se os apontados institutos na medida em que a tutela
objetiva a proteção do menor sobre o qual não se opera o exercício do poder
familiar, enquanto que a curatela d
estina
-
se a sujeitos maiores de idade, não
obstante ela alcance, em situações excepcionais, os menores, tal como ocorre
com a nomeação de curador ao ventre (nascituro).
4.6.2.3
Adoção
De acordo com o catedrático buenoairense G. A. Borda, “[...]
los
ant
ecedentes históricos de la adopción se pierden en la más remota antigüedad.
Motivos religiosos dieron vida e vigor a la institución; las familias sin descendencia
incorporaban a su seno a personas que pudieran perpetuar el culto doméstico.
Algunos pesajes
bíblicos demuestran su práctica entre judios y egípcios (Gênesis,
XLVIII, 5; Êxodo, II, 10)
”,
351
sendo certo que somente em Roma, em face do
Código Justiniano, o instituto assumiu feições de natureza jurídica, subdividindo
-
se em
adoptio minus quam plena
(ado
ção simples) e
adoptio plena
(adoção
plena).
350
DINIZ, 1996, p. 524.
351
BORDA, Guillermo A.
Tratado de derecho civil
: familia II. 9ª ed. ampl e atual. Buenos Aires:
Editorial Perrot, 1993, p. 91.
2
2
3
3
5
5
Foi, por intermédio da promulgação do Código Civil de 1916, em seus
Arts. 368 a 376, que o instituto da adoção adentrou no ordenamento jurídico de
nosso País, embora, verdade seja dita, não se vislumbravam, naqu
ela época,
contornos sólidos em razão da novidade que representava.
Ao depois, surgiu a Lei nº 3.133/57, que fracassou em sua tentativa de
modernizar a adoção, sendo substituída, então, pela Lei nº 4.655/65, corrigindo
-
se
problemas anteriores e instituind
o
-
se a chamada legitimação adotiva.
352
Ato contínuo do necessário e indispensável processo de evolução
legislativa, tem
-
se o advento do Código de Menores (Lei nº 6.697/79), cujo mérito
foi o de iniciar e deitar raízes na necessidade de proteção integral do
menor sem
família, pensamento esse que foi definitivamente encapado pela Constituição
Federal de 1988, nascendo o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº
8.069/90), no afã de procurar atingir a meta final da evolução que, ainda, continua
em marcha em
razão das mais diversas experiências empíricas vividas no seio
social.
353
Diante da superveniência do Código Civil atual, muito se discute acerca
da revogação ou não dos dispositivos referentes à adoção constantes do Estatuto
da Criança e do Adolescente, haja vista a peculiaridade de que a novel legislação,
ao traçar regras para a adoção de menores, não revogou expressamente a
apontada lei especial, como estaria a exigir o Art. 9º da Lei Complementar
95/98.
354
Todavia, seja como for, a verdade é que, ressalva
das algumas hipóteses
excepcionais,
nas quais se mostra justificável a conclusão de que houve
revogação tácita de alguns artigos do ECA
, o adequado é concluir
-
se pela
352
BAHIA, Claudio José Amaral Bahia; SANTOS, Caio Augusto Silva dos. Da possibilidade de
adoção após o
falecimento do adotante sem que este tenha iniciado o procedimento judicial.
In: PEREIRA, Tânia da Silva Pereira e Rodrigo da Cunha (coord.).
A ética da convivência
familiar
: sua efetividade no cotidiano dos tribunais. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 46
5-
494.
353
Ibidem, mesmas páginas.
354
Com a redação que lhe foi emprestada pela Lei Complementar nº 107, de 26 de abril de
2001.
2
2
3
3
6
6
vigência concomitante e compatível da Lei nº 8.069/90 no pormenor referente à
adoção
de menores de 18 anos, não havendo mais que se falar, no entanto, na
admissão da ressalva contida na parte final do Art. 40 da legislação especial, que
implica numa evidente intromissão na sistemática prevista para a adoção
daqueles que já não mais se encontram na condição de adolescentes, sendo de
pouca importância o fato de estes se encontrarem sob anterior guarda ou tutela
dos pretendentes.
Embora, parafraseando
-
se Paulo Luiz Netto Lobo, depois da Constituição
de 1988, não há mais filho adotivo, mas ado
ção, entendida como meio para se
atingir a filiação, que é única, a verdade é que, para efeito didático, torna
-
se
importante esclarecer como tal se processa até a sua respectiva ultimação, não
se podendo deslembrar, por oportuno, que a grandeza e a importâ
ncia do instituto
ora em comento estão materializados no
status
constitucional que lhe foi
emprestado pela Lei de Outubro, por intermédio do dogma positivado no § 5º de
seu Art. 227, a saber: “A adoção será assistida pelo Poder Público, na forma da
lei, qu
e estabelecerá casos e condições de sua efetivação por parte de
estrangeiros”.
Diversamente do que ocorria na legislação pretérita, a capacidade para
adotar surge a partir dos dezoito anos de idade, conforme estatuído no
caput
do
Art. 1.618 do Código Civi
l. Segue daí que não há mais que se falar na atribuição
de capacidade apenas àqueles que contam com mais de trinta (Art. 368,
caput
,
CC/16) ou mais de vinte e um anos (Art. 42,
caput
, Lei nº 8.069/90).
Observe
-
se que, não obstante a ausência de revogação expressa do Art.
42 do Estatuto da Criança e do Adolescente, a verdade é que outra conclusão
não parece lógica senão aquela que nos conduz à admissão da revogação tácita,
isso porque o Código Civil representa um novo referencial de justiça que
teoricamente
traduz a atual vontade da sociedade vigente.
Dispõem o Art. 1.621 do Código Civil e Art. 45 da Lei nº 8.069/90 que,
para o deferimento da adoção de menor, é necessário o consentimento dos pais
do adotando ou dos seus respectivos representantes legais na
ausência
2
2
3
3
7
7
daqueles, como também da concordância do próprio adotando, caso ele já se
encontre na condição de adolescente, isto é, com mais de 12 anos de idade.
Entretanto, obviamente, dispensa
-
se o consentimento dos pais nas
situações em que eles sejam desc
onhecidos ou mesmo tenham sido destituídos
do poder familiar; igual solução deverá ser seguida no caso de infante exposto,
com pais desaparecidos sem nomeação de tutor, ou órfão não reclamado por
qualquer parente por mais de um ano (Art. 1.624, CC).
Obser
ve
-
se que, embora o § 2º do Art. 1.621 do Código Civil faça menção
à possibilidade da revogação do consentimento dado pelos pais ou pelos
representantes legais à adoção até a publicação da sentença constitutiva da
mesma, a verdade é que, se isso vier a oco
rrer, não se poderá pensar pura e
simplesmente na impossibilidade da adoção, mas somente numa análise ainda
mais pormenorizada da conveniência da transferência definitiva do menor à
família dos adotantes. Ao final, prepondere
-
se que, em sendo maior de idad
e, ao
adotando cabe externar o consentimento e não aos seus pais.
Em se tratando de adoção efetivada por duas pessoas conjuntamente,
além dos requisitos constantes do Art. 1.622, devem os adotantes demonstrar a
estabilidade da família, daí porque haverá d
e se perquirir ao derredor das
condições familiares em que vivem os pretendentes, na linha dos ensinamentos
desde há muito traçados pelo § 2º do Art. 42 da Lei nº 8.069/90.
Tanto o Código Civil (Art. 1.619) quanto o ECA (Art. 42, § 3º) exigem que
o adotante seja pelo menos 16 anos mais velho do que o adotando, sendo certo
que não nos parece correto exigir essa diferença a maior unicamente em relação
a um dos adotantes no caso de a adoção ser implementada por mais de uma
pessoa, como sói acontecer com pesso
as casadas ou que vivam em união
estável, embora a maioria da abalizada doutrina aponte para outro sentido, ou
seja, pela desnecessidade de atingimento dúplice de tal requisito.
A regra estabelecida, no
caput
e no parágrafo único do Art. 1.623 do
Código C
ivil, acabou por abolir a forma de adoção por escritura pública
2
2
3
3
8
8
anteriormente autorizada pelo Art. 375 do Código Civil de 1916, daí porque, de
agora em diante, somente haverá que se falar em adoção precedida de
procedimento judicial onde se perquira, inclusive, acerca do efetivo benefício para
o adotando (Art. 1.625, CC).
Nesse ponto, houve unificação de procedimentos, haja vista que o ECA já
dava conta de necessidade de procedimento judicial para o deferimento de
adoção (Art. 47, ECA), vedando, inclusive, o exercício da mesma por procuração
(Art. 39, parágrafo único, Lei nº 8.069/90). Aliás, essa é a razão da previsão legal
segundo a qual a adoção somente haverá de ser deferida se constituir efetivo
benefício ao adotando (Art. 1.625, CC; e Art. 43, ECA).
Uma vez definida a imprescindibilidade de processo judicial para a
adoção tanto de menor quanto de maior de idade, certo é que a sentença
constitutiva pertinente surtirá os seus efeitos a partir do respectivo trânsito em
julgado, sendo possível a retroação
à data do óbito do adotante nos casos em
que este vier a falecer no curso do procedimento da adoção, tudo como
minudentemente explicitado na primeira parte do Art. 1.628 do Código Civil e no §
5º do Art. 42 e § 6º do Art. 47 do ECA, destacando
-
se que, nes
sa última hipótese,
qual seja, a que produz efeitos desde a data do falecimento do adotante,
denomina
-
se
post mortem
.
Ao que tudo indica com espeque na teoria da filiação sócio
-
afetiva,
existem precedentes judiciais
355
que reconhecem a possibilidade do defe
rimento
de adoção mesmo àqueles indivíduos já falecidos que não tiveram oportunidade
de chegar a deduzir propriamente pleito judicial nesse sentido. É a intitulada
adoção póstuma.
Por assim ser, embora não se divise vontade, e, evidentemente,
direitos, da
quele que já faleceu
na medida em que o
de cujus
não mais é
sujeito de direito
, a verdade é que o evidente interesse do pretenso
adotando que seja detentor da posse do estado de filho habilita
-
nos a concluir
355
REsp. nº 457.635
-
PB.
2
2
3
3
9
9
pela total correção da utilização de pleito
judicial para o reconhecimento de
adoção póstuma.
Assinale
-
se que, em ações dessa jaez, diante da inexistência das
pessoas dos adotantes, parece ser de todo conveniente a citação dos parentes
eventualmente conhecidos deles para responder ao indicado pleit
o judicial, ou,
então, caso eles também inexistam ou não se tenha notícia deles, havendo
interesse patrimonial em discussão oportunizar ao Estado o oferecimento de
resposta, sem prejuízo de, em ambas as situações, assegurar
-
se a presença do
Ministério Públ
ico na condição de fiscal da lei.
Deferida a adoção, há integração total do agora adotado à família do
adotante, desligando
-
o, conseqüentemente, dos parentes anteriores, salvo no que
tange aos impedimentos matrimoniais que ainda são mantidos, sendo certo,
outrossim, que, no caso de adoção levada a efeito por um dos cônjuges ou
companheiros em relação ao filho apenas do outro, por óbvio, não há
desligamento dos vínculos parentais decorrentes da relação filial havida com
aquele que continuará como genitor no
registro pertinente, na exata esteira de
silogismo contida no
caput
e parágrafo único do Art. 1.626 e na segunda parte do
Art. 1.628, todos do Código Civil, e, bem assim, no Art. 41 e respectivos §§ do
ECA.
O desligamento do adotado com a sua família ant
erior se mostra tão
evidente, que a lei permite a alteração não apenas do seu nome, como, também,
do seu prenome caso seja ele menor (Art. 1.627, CC; e Art. 47, § 5º, ECA), tanto
que já assinalava o ECA sobre a irrevogabilidade da adoção (Art. 48) e a
impo
ssibilidade de restabelecimento dos laços de parentesco com a família
originária do adotado em caso de falecimento dos adotantes (Art. 49).
A decisão que deferir a adoção determinará a expedição de mandado
para o cancelamento do registro original do adota
do e a conseqüente
formalização de um novo, do qual não poderão constar quaisquer observações
que impliquem na identificação pública da adoção, não obstante a assertiva de
que mediante autorização judicial específica poderão ser fornecidas certidões
2
2
4
4
0
0
dando
conta da adoção para a salvaguarda de direitos (Art. 47, §§ 1º a 4º, ECA),
até porque, como se viu anteriormente, mantêm
-
se os impedimentos matrimoniais
em relação à família de origem.
Registre
-
se que, embora o vigente Código Civil já não mais faça alusão
à possibilidade de desligamento da adoção em decorrência de manifestação de
vontade do adotado quando da cessação da sua incapacidade civil
como era
permitido no ordenamento anterior, conforme a disciplina contida no Art. 373
do Código de 1916
, com su
pedâneo no melhor interesse do incapaz e no
princípio da segurança jurídica, parece ser de todo conveniente crer na
existência de um direito do adotado em saber sobre a origem de sua filiação,
daí porque é possível pensar
-
se na possibilidade da desconstitu
ição da adoção
através da aplicação analógica do regramento estatuído no Art. 1.614 do
Código Civil.
É de se concluir que, diante do severo acontecimento representado
pelo desligamento dos laços de parentesco com a família originária
o que
implica na pe
rda de base jurídica para pleito de alimentos e de partilha de bens
em razão de eventual abertura de sucessão dos parentes anteriores
, no caso
específico da adoção de menores, é conveniente que se dê ao adotado a
possibilidade de afastar essa ação apenas
nos quatro anos que se seguirem à
cessação da sua incapacidade, devendo
-
se pensar, desta feita, em um dever
dos pais adotivos de levar ao conhecimento do filho adotado a origem da sua
filiação, inclusive mediante a criação por parte do legislador de um de
ver do
Oficial do Registro Civil de comunicar
-
lhe essa sua condição quando da
cessação da sua incapacidade.
Passados os quatro anos previstos no Art. 1.614 do Código Civil
ou
outro que o legislador defina para o caso em comentário
não mais se poderá
p
ermitir o pleito do filho relacionado ao afastamento da filiação.
A partir de então, quando muito e em tese, poderá ele tão
-
somente
deduzir pleito judicial de reconhecimento de origem genética, haja vista que
“[...] a identidade genética da pessoa humana,
base biológica da identidade
2
2
4
4
1
1
pessoal, é uma das manifestações essenciais da complexa personalidade
humana”.
356
Diz
-
se que, em tese, é possível o pleito de reconhecimento de origem
genética, haja vista que não é adequado oportunizar
-
se a descoberta em
refer
ência nas situações que envolvam doadores de material genético
acobertados pelo sigilo, a não ser nas hipóteses em que referida informação se
mostra indispensável para evitarem
-
se uniões matrimoniais ou convivenciais entre
pessoas impedidas para tanto por
força da exegese contida no Art. 1.521 do
CC/2002, o que, sem dúvida alguma, está a exigir o compromisso do legislador
para a adoção de providências claras e efetivas em relação à questão objeto de
comentário.
No que diz respeito à adoção de menor, discip
lina o ECA, no Art. 46,
que deve ser ela precedida de estágio de convivência entre os envolvidos,
durante um prazo que venha a ser estabelecido pela autoridade judiciária em
decorrência das peculiaridades do caso (
caput
), sendo certo que tal requisito
pode
rá ser dispensado caso o adotando não tenha mais de um ano de idade,
ou, qualquer que seja a sua idade, já se encontre sob a companhia do
adotante durante tempo suficiente para a averiguação da conveniência do
deferimento da adoção (§ 1º), nunca sendo dema
is assinalar que, em se
tratando de adoção por estrangeiro, o estágio de convivência é obrigatório, e
de no mínimo de quinze dias para crianças até dois anos e de trinta dias,
acima dessa idade (§ 2º).
Vislumbrando facilitar o procedimento da
adoptio
de m
enores, e, bem
assim, criar até mesmo um sistema de preferência do exercício dela por
nacionais, determinou o ECA, em seu Art. 50, que a autoridade judiciária
competente mantivesse um cadastro de crianças e adolescentes para potencial
adoção e outro de pes
soas interessados em exercê
-
la (
caput
), cadastros esses
cuja inscrição somente deve ser deferida após prévia consulta aos órgãos
técnicos competentes e a oitiva do Ministério Público (§ 1º), sendo certo que não
356
PETTERLE, 2007, p. 92
-
93.
2
2
4
4
2
2
será deferida inscrição aos interessados que
revelem incompatibilidade com a
natureza da adoção ou não ofereçam ambiente familiar adequado (§ 2º).
Relegando a lei especial a questão relativa à adoção por estrangeiro,
enquanto a mesma não sobrevier no caso de maiores, parece não haver
inconvenientes
na aplicação analógica das regras já estabelecidas na Lei nº
8.069/90, quais sejam, aquelas previstas em seus Arts. 51 e 52.
Segue daí que o candidato estrangeiro a adotante deverá comprovar
mediante documento expedido pela autoridade competente do seu domicílio a sua
habilitação à adoção segundo as leis do seu país, apresentando, inclusive, estudo
psicossocial elaborado por agência especializada e credenciada no seu país (Art.
51, § 1º), permitindo
-
se à autoridade judiciária, de ofício ou a requerimento d
o
Ministério Público, exigir do candidato a apresentação do texto pertinente à
legislação estrangeira com a prova da sua vigência (§ 2º).
Observe
-
se que os documentos em língua estrangeira deverão ser
juntados aos autos do processo respectivo devidamente
autenticados pela
autoridade consular
com a observação da legislação pertinente
acompanhados da competente tradução feita por tradutor público juramentado (§
3º). A seu turno, assinale
-
se que somente será permitida a saída do adotando do
território nac
ional após a consumação da adoção (§ 4º), nunca sendo demais
rememorar que, no curso do processo nesse caso, o estágio de convivência é
obrigatório (Art. 46, § 2º). Ao fim, alinhave
-
se que o Art. 52 do ECA dá
-
nos conta
de que a adoção internacional poderá vir a ser condicionada à elaboração de um
estudo prévio a cargo de comissão estadual judiciária de adoção.
4.6.2.4
A mãe social
Embora referido instituto não configure, tecnicamente, uma forma de
família substituta propriamente dita, mister tecerem
-
se
comentários acerca da Lei
nº 7.644, de 18 de dezembro de 1987, cujo diploma veio a regulamentar a
2
2
4
4
3
3
atividade da chamada
mãe social
nas instituições sem finalidade lucrativa ou de
utilidade pública de assistência ao menor abandonado que funcionam no sistema
de casas
-
lares.
Para Paulo Lúcio Nogueira,
357
mãe social é aquela que se dedica à
assistência ao menor abandonado dentro do sistema de casas
-
lares, sendo que
estas quando agrupadas, formam uma aldeia assistencial ou vila de menores.
As casas
-
lares se carac
terizam por serem unidades residenciais, aldeias
assistenciais ou vilas de menores que, sob a responsabilidade da mãe social,
venham a abrigar até 10 (dez) infantes, sendo atribuição da referida instituição a
fixação dos limites de idade dos agentes que ficarão sob sua égide.
No que se refere a jovens com mais de treze anos de idade, as
instituições deverão, além das casas
-
lares, manter
casas da juventude
, a fim de
encaminhá
-
los ao ensino profissionalizante.
Destaque
-
se que, de acordo com a redação imposta ao § 3º do Art. 3º do
referido diploma legislativo, os menores residentes nas casas
-
lares e nas casas
da juventude, para fins e efeitos dos benefícios previdenciários, são considerados
dependentes da mãe social a que foram confiados pela instituição empr
egadora.
As candidatas interessadas em se tornarem mães sociais deverão
submeter
-
se à seleção e serem aprovadas nos treinamentos e estágios
específicos exigidos pela aludida lei, sendo necessário, ainda, preencher as
seguintes condições: (i) idade mínima de 25 (vinte e cinco) anos; (ii) boa sanidade
física e mental; (iii) curso de primeiro grau ou equivalente; (iv) boa conduta social;
e, (v) aprovação em teste psicológico específico.
A pessoa que se tornar
mãe social
terá as seguintes atribuições: (i)
pro
piciar o surgimento de condições próprias de uma família, orientando e
assistindo os menores colocados sob seus cuidados; (ii) administrar o lar,
357
NOGUEIRA, 1998, passim.
2
2
4
4
4
4
realizando e organizando as tarefas a ele pertinentes; (iii) dedicar
-
se, com
exclusividade, aos menores e à ca
sa
-
lar que lhes forem confiados; e, (iv)
enquanto no desempenho de suas funções, deverá residir, juntamente com os
menores que lhe forem confiados, na casa
-
lar que lhe for destinada.
De outra banda, restam assegurados à mãe social anotação em Carteira
de
Trabalho e Previdência Social; remuneração, em valor não inferior ao salário
mínimo, repouso semanal remunerado de 24 (vinte e quatro) horas consecutivas;
apoio técnico, administrativo e financeiro no desempenho de suas funções; 30
(trinta) dias de férias anuais remuneradas nos termos do que dispõe o Capítulo IV
da CLT; benefícios e serviços previdenciários, inclusive, em caso de acidente de
trabalho, na qualidade de segurada obrigatória; gratificação natalina ou décimo
terceiro salário; e, FGTS ou indeniza
ção, nos termos da legislação pertinente.
Como, em verdade, se trata de verdadeiro vínculo laborativo, a mãe social
que não cumprir corretamente com suas atribuições poderá sofrer as sanções
normais estabelecidas pela legislação obreira, especificamente n
o que diz
respeito à aplicação de penas de advertência, suspensão e demissão (com ou
sem justa causa e respectivas conseqüências).
Cabe frisar que, em conformidade com o quanto disposto no Art. 15 da
citada Lei nº 7.644, de 18 de dezembro de 1987, as casa
s
-
lares e as aldeias
assistenciais serão mantidas exclusivamente com rendas próprias, doações,
legados, contribuições e subvenções de entidades públicas ou privadas, sendo
defesa à aplicação de tais verbas em outras atividades que não estejam insertas
em s
eu rol de objetivos.
A fiscalização das normativas que compõem o diploma legislativo em estudo
foi relegada a cargo dos Ministérios do Trabalho e da Previdência e Assistência Social,
competindo à justiça obreira dirimir as controvérsias entre empregado e
empregador,
haja vista que, como dito, trata
-
se de legítima relação laboral.
Cabe ressaltar que não se pode confundir o conceito de
mãe social
com o
de
mãe crecheira
, eis que, na primeira hipótese, como visto, a admissão se dá
2
2
4
4
5
5
depois de seleção e treinamento, por contrato especial, com o objetivo de prestar
labor em
casas
-
lares
, enquanto na segunda situação, trata
-
se de atividade
voluntária, de caráter social e sem qualquer dependência econômica ou
subordinação a uma determinada instituição.
Não obstante
a assertiva de se tratar de relação de emprego, as
mães sociais
acabam estabelecendo uma relação de afeição com seus
filhos
,
358
de modo que estes têm mitigada a danosa ausência de convivência
familiar, recebendo, ainda que por poucos momentos, o carinho e o
amor
que até então não tiveram a chance de desfrutar, sendo certo que existe
projeto de lei de autoria do deputado Nelson Pellegrino,
359
visando a
instituição da atividade de
pai social
, entendendo
-
o como aquele que se
dedica à assistência ao menor abandonad
o, dentro do sistema de casa
-
lar,
juntamente com a mãe social.
4.6.3
Elementos de concreção e complementação do direito fundamental à
convivência familiar e comunitária: direito à vida, à saúde, à
educação, ao pleno emprego, à cultura, ao esporte e ao la
zer
Gabriel Chalita, com a autoridade que lhe é peculiar, assevera:
358
Nesse sentido, vale conferir a reportagem que segue
: “
A história de Beatriz
. A mineira
Beatriz tem 32 anos e é mãe social há três anos. Atualmente, mora na Aldeia Infantil SOS de
Rio Bonito, na zona sul de São Paulo. Ela se interessou por essa profissão quando fazia
trabalhos voluntários e uma amiga falou
sobre a Aldeia. ‘É muito diferente do que eu
esperava’, ela conta. ‘Não é fácil prepará
-
los, cada um tem uma personalidade diferente’. E
completa: ‘Eu tenho que ser mãe, mas sou profissional ao mesmo tempo, tenho regras a
cumprir, preciso educá
-
los, orient
á-
los’.
Beatriz tem uma rotina normal como qualquer mãe.
Acorda cedo, prepara o café, chama as crianças que estudam de manhã e leva os menores
para a escola. Depois volta para a casa, organiza as tarefas diárias, prepara o almoço e leva
para a escola as crianças que estudam no período da tarde. É uma rotina corrida. As crianças
e adolescentes da casa também têm obrigações. Arrumar seus quartos e ajudar a manter a
casa organizada são algumas delas. Para recarregar a bateria, Beatriz, assim como todas as
outr
as mães dos condomínios, tem folgas semanais e é substituída por ‘tias’ que cuidam de
tudo na sua ausência. ‘Quando fico fora, sinto falta deles’, ela diz. Entre as crianças que hoje
moram com Beatriz estão a adolescente Aline, de 13 anos, Juliana, 8, Higo
r, 5, e Kaíque, 8.
Ela conta que muitas das crianças acabam chamando
-
a de tia, pois têm pais biológicos vivos
fora da Aldeia, mas mesmo assim ela os vê como se fossem seus filhos”. Disponível em:
<
http://www.mulher.terra.com.br/interna.html>. Acesso em: 13
nov. 2005.
359
PL nº 2.971/04.
2
2
4
4
6
6
[...] a criança, a infância, os primeiros gracejos comemorados pela
família ansiosa. É o primeiro neto ou o primeiro filho, ou o caçula
não importa. É menino ou menina
agora não há mai
s surpresa,
já se sabe antes. De qualquer forma, a preparação, o amparo dos
entes queridos e o carinho são essenciais para o desenvolvimento
saudável desse novo ser que veio ao mundo. Pena que isso seja
privilégio de alguns. A grande maioria se encontra à
margem, são
os frutos do relento, da pobreza, da miséria. É o oitavo ou nono
filho de quem não ouviu falar em preservativos, de quem não sabe
o que está fazendo. E aí surge um novo ser sem o devido
respeito, sem a necessária festa de quem vem para ficar. A
família
é essencial para que a criança ganhe confiança, para que se sinta
valorizada, para que se sinta assistida.
360
Desta feita, e não obstante o fato da fundamentalidade do direito de
convivência familiar e comunitária às crianças e adolescentes, a verd
ade é que
referido
jus
, para galgar um patamar máximo de eficácia, deve ser
complementado com a implementação de outros mecanismos jusfundantes, cuja
interação é por demais manifesta e indissociável.
É o que se passará a explanar.
Como visto, o Estado Co
ntemporâneo, amoldando
-
se à precípua
necessidade de que o decantado princípio constitucional da isonomia também
fosse vislumbrado e, principalmente, concretizado no âmbito material, acabou,
ainda que excepcionalmente, dogmatizando a possibilidade de interv
enção
pública nas mais diversas relação vivificadas em nosso quotidiano, de modo a
garantir a todos os cidadãos, sem exceção, um patrimônio jurídico mínimo,
id est
,
um núcleo intangível de proteções que, em sendo efetivadas, garantem a toda e
qualquer pess
oa as condições mínimas para um desenvolvimento digno, nos
moldes do inc. III do Art. 1º da Lei de Outubro.
Nesse eito, fica claramente demonstrada a necessidade de o Estado, a
teor do quanto positivado na Constituição Federal, garantir que, no plano
conc
reto, o direito à igualdade seja fomentado sem distinção, pois, como é
sabido, depois do período afeto à Revolução Industrial, o que se verificou foi a
existência de condições desproporcionais e desumanas nas condições de
360
CHALITA, Gabriel.
Educação
: a solução está no afeto. São Paulo: Gente, 2001, p. 25
-
26.
2
2
4
4
7
7
trabalho, saúde e educação, dentro
outros setores, caracterizando, assim, que
somente possuíam direitos aqueles que detinham poder econômico para invocá
-
los.
Restou claro, então, que apenas as liberdades públicas invocadas quando
da Revolução Francesa não eram mais suficientes para efetiv
ar uma sociedade
livre, justa e solidária. Era preciso algo mais, pois como bem assevera Luiza
Cristina Fonseca Frischeisen, tem
-
se que:
[...] a ordem social constitucional estabelece obrigações para o
Estado, mas também para toda a coletividade. Orienta
a
administração na implementação das políticas públicas
necessárias ao efetivo exercício dos direitos sociais, fixando
pontos que não podem ser descumpridos e tampouco
modificados, sob pena de inconstitucionalidade ou ilegalidade,
resguardando o cidadão, o
ferecendo
-
lhe garantia quanto à
omissão do Estado.
361
E foi esse exatamente o vetor seguido, com mais eficácia, pela
Constituição Federal de 1988 ao traçar, em seu Art. 3º, os chamados objetivos
fundamentais da República Federativa do Brasil, além de, nesse
contexto,
positivar os chamados direitos sociais (Arts. 6º e 7º), cuja arco protetivo
caracteriza
-
se pela formação de um conjunto de situações em que a presença e a
intervenção estatal se impõe, sob pena de, em assim não agindo, não se
outorgam, na prátic
a, direitos subjetivos fundamentais aos cidadãos de nosso
País, tais como educação, saúde, trabalho, moradia, lazer, segurança,
previdência social, proteção à maternidade e à infância, assistência aos
desamparados dentre outros.
Nos precisos dizeres de Andreas J. Krell, percebe
-
se, com clareza solar,
que:
[...] os Direitos Fundamentais Sociais não são direitos contra o
Estado, mas sim direitos através do Estado, exigindo do poder
público certas prestações materiais. São os Direitos Fundamentais
361
FRISCHEISEN, Luiza Cristina Fonseca.
Políticas públicas
: a responsabilidade do
administrador e do Ministério Público. São Paulo:
Max Li
monad, 2000, p. 36
-
37.
2
2
4
4
8
8
do homem
-
social dentro de um modelo de Estado que tende cada
vez mais a ser social, dando prevalência aos interesses coletivos
antes que os individuais. O Estado, mediante leis parlamentares,
atos administrativos e a criação real de instalações de serviços
públicos
, deve definir, executar e implementar, conforme as
circunstâncias, as chamadas ‘políticas sociais’ (de educação,
saúde, assistência, previdência, trabalho, habitação) que facultem
o gozo efetivo dos direitos constitucionalmente protegidos.
362
O que se veri
fica do exposto acima, em linhas gerais, é o direito indelével de
o cidadão obter do Estado, prestações positivas, as quais, pela importância,
ultrapassam o campo da mera discricionariedade administrativa para uma inafastável
vinculação de índole e força c
onstitucionais, de modo que as pautas de atuação
governamental estabelecidas no próprio seio da Lei de Outubro jamais poderão ser
relegadas a conceitos de oportunidade ou conveniência do agente público, eis que
não podem transformar
-
se em mero jogo de pala
vras, pois, como visto, são
indispensáveis à manutenção do
status
de dignidade da pessoa humana.
Nas palavras do catedrático colombiano Rodolfo Arango:
[...] a questão de se devem as justiças constitucionais reconhecer
direitos fundamentais sociais, nome
adamente direitos à
alimentação, abrigo, saúde, educação ou segurança social é
especialmente importante para uma análise da relação entre
justiça constitucional e democracia. Os direitos sociais são a
pedra fundamental da delimitação entre as decisões
cons
titucionais e a política, uma vez que seu reconhecimento
judicial afeta tanto a política econômica, como a competência
legislativa.
363
Segundo o eminente Rodolfo de Camargo Mancuso: “[...] os direitos
subjetivos compreendem posições de vantagem, privilégios
, prerrogativas, que,
uma vez integradas ao patrimônio de seu titular, passam a beneficiar de uma
tutela especial do Estado”. E complementa: “[...] quando tais prerrogativas se
estabelecem em forma de créditos formados contra ou em face do Estado, tomam
a
designação de direitos subjetivos públicos”.
364
362
KRELL, Andréas J.
Direitos sociais e controle judicial no Brasil e na Alemanha
. Porto
Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2002, p. 19
-
20.
363
Rodolfo Arango, apud, ibidem, p. 20.
364
MANCUSO, Rodolfo de Camargo.
Ação popular
. 3ª ed.
rev. atual. e ampl. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1998, p. 123.
2
2
4
4
9
9
Os direitos sociais têm por finalidade a melhoria das condições de vida
dos cidadãos tidos como hipossuficientes, no afã de se atingir a tão sonhada
igualdade social.
Positivada no Art. 5º da Lei Magna, a vida
se apresenta, indubitavelmente,
como o bem mais importante e precioso pertencente ao ser humano, constituindo
sua própria essência e verdadeiro pré
-
requisito para o exercício de qualquer outro
direito.
Não obstante a importância que ostenta, tem
-
se que d
ireito à vida não é
absoluto, ou seja, nem sempre será de todo inviolável.
De fato, existirão situações excepcionais em que se permite sua
mitigação, como, por exemplo, a possibilidade de aplicação da pena de morte em
casos de guerra, de abortamento quand
o a gravidez colocar em risco a vida da
gestante ou for fruto de estupro, de realização de transplantes de órgãos quando
se constatar a falência ou a inexistência de atividade cerebral, legítima defesa,
dentre outras.
No entanto, não pairam dúvidas a resp
eito do fato de o direito à vida ser
amplamente protegido e reverenciado pela maioria dos sistemas constitucionais
vigentes, embora não se possa afirmar qual o exato momento em que referidos
ordenamentos iniciam sua ação protetiva, haja vista existirem div
ersas teorias
visando explicar a partir de que ponto se pode considerar um ser humano vivo,
não se podendo olvidar, entretanto, que em regra geral, o parâmetro inaugural é
de natureza biológica.
Valendo
-
nos da classificação trazida à baila por André Ramos
Tavares,
na obra denominada
Curso de direito constitucional
, tem
-
se como principais
pensamentos, a saber: (i)
teoria da concepção
, que tem como principal expoente
a Igreja Católica, que defende a existência da vida humana desde o momento da
concepção; (ii
)
teoria da nidação
, cujos defensores somente reconhecem a
existência de vida humana quando da fixação do óvulo no útero; (iii)
teoria da
implantação do sistema nervoso
, que está a exigir o surgimento dos rudimentos
2
2
5
5
0
0
do que futuramente será o sistema nervoso central, devendo ser ressaltado que,
para os adeptos de tal corrente, não basta; e, (iv)
teoria dos sinais
eletroencefálicos
, que leva em consideração o início da atividade elétrica no
cérebro.
365
Entrementes, e ainda que exista divergência em face de qua
l momento a
vida se inicia e se dá o
start
jurídico à sua proteção, deve referido direito ser
consagrado
urbi et orbi
.
Some
-
se a isso o fato de que, hodiernamente, em face da consideração
do ser humano como começo, meio e fim do Estado e de suas respectiv
as
atividades, não basta assegurar
-
se o direito à existência pura e simplesmente,
deve
-
se garantir uma qualificadora para tão importante fato, qual seja, que a vida
seja completamente revestida de dignidade.
Em continuidade, a fim de que a vida seja reves
tida com a dignidade
mencionada no final do parágrafo anterior, necessária se faz a concessão de
saúde de qualidade aos cidadãos, mormente em se tratando de crianças e
adolescentes, eis que como vista se encontram em peculiar condição de
desenvolvimento, e
stando mais sujeitos, assim, às intempéries do quotidiano.
366
A Constituição Federal, em seu Art. 196, dispõe:
Art. 196: A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido
mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do
risco de doença
e de outros agravos e ao acesso universal e
365
TAVARES, 2002, p. 388.
366
"O direito à saúde
além de qualificar
-
se como direito fundamental que assiste a todas as
pessoas
representa conseqüência constitucional indissociável do dire
ito à vida. O Poder
Público, qualquer que seja a esfera institucional de sua atuação no plano da organização
federativa brasileira, não pode mostrar
-
se indiferente ao problema da saúde da população,
sob pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em
grave comportamento
inconstitucional [...]. O reconhecimento judicial da validade jurídica de programas de
distribuição gratuita de medicamentos a pessoas carentes, inclusive àquelas portadoras do
vírus HIV/AIDS, dá efetividade a preceitos fundamentais da Constituição da República (Arts.
5º,
caput
, e 196) e representa, na concreção do seu alcance, um gesto reverente e solidário
de apreço à vida e à saúde das pessoas, especialmente daquelas que nada têm e nada
possuem, a não ser a consciência de sua própria humanidade e de sua essencial dignidade”
(
RE. nº 271.286
-
AgR
, Rel.
Min. Celso de Mello, DJ 24/11/00).
No mesmo sentido:
RE nº
393.175
, Rel. Min. Celso de Mello, Informativo nº 414.
2
2
5
5
1
1
igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e
recuperação.
De seu turno, tem
-
se que o
caput
do Art. 11 da Lei nº 8.069 prescreve: “É
assegurado atendimento médico à criança e ao adolescente, at
ravés do Sistema
Único de Saúde, garantindo o acesso universal e igualitário às ações e serviços
para promoção, proteção e recuperação da saúde”, não se deslembrando que se
o infante portador de necessidades especiais deverá receber tratamento
especializad
o (§ 1º), sendo de responsabilidade do Poder Público fornecer,
gratuitamente, os medicamentos, próteses e outros recursos relativos ao
tratamento, habilitação ou reabilitação daqueles que necessitarem.
Vale trazer à tona, nesta oportunidade, o firme e esc
orreito
posicionamento assumido pelo insigne Ministro José Delgado:
[
...] divaga o Estado ora recorrido ao sustentar que a concessão
da segurança, no presente caso, implicaria na ‘desestabilização’
do Estado de Direito e ‘inconstitucionalizaria’ a previsã
o
orçamentária do ente público (fls. 116/121). É inadmissível
também o argumento desenvolvido no sentido de que foi em
virtude do fato da recorrente não ter se apresentado perante órgão
de saúde pública para colocar
-
se à disposição de uma nova
avaliação mé
dica que não recebeu o tratamento almejado, o que,
conseqüentemente, revestiu de legalidade o ato negativo da
autoridade coatora. A eventual ausência de cumprimento de uma
formalidade burocrática exigida não pode ser óbice suficiente para
impedir a concess
ão da medida buscada pela impetrante porque
não retira, de forma alguma, a gravidade e a urgência da sua
situação: a busca para garantia do maior de todos os bens, que é
a própria vida. Despicienda, ainda, de quaisquer comentários a
discussão a respeito de
ser ou não a regra dos Arts. 6º e 196 da
CF/88, normas programáticas ou de eficácia imediata. Nenhuma
regra hermenêutica pode sobrepor
-
se ao princípio maior
estabelecido, em 1988, pela Constituição Brasileira, de que ‘a
saúde é direito de todos e dever do Estado’ (Art. 196).
367
Firme também, nesse sentido, o posicionamento adotado pelo
Desembargador Luiz Felipe Brasil Santos, quando do julgamento de reexame
necessário afeto a ação civil pública que visava o fornecimento de insulina à
criança portadora de di
abete, a saber:
367
STJ, Recurso em Mandado de Segurança nº 11.183/PR, 1ª Turma, Relator: Ministro José
Delgado, DJU 04/09/00, j. 22
/08/00, v.u.
2
2
5
5
2
2
[...] o direito à saúde, superdireito de matriz constitucional, há de
ser assegurado, com absoluta prioridade às crianças e aos
adolescentes e é dever do Estado (União, Estados e Municípios)
como corolário do direito à vida e do princípio d
a dignidade
humana. Direito fundamental que é, tem eficácia plena e
aplicabilidade imediata, como se infere do § 1º do Art. 5º da
Constituição Federal.
368
Mas, não é só!
Assim, sem sombra de dúvidas, se coloca como de importância primaz o
fornecimento de e
ducação de qualidade às crianças e adolescentes, de modo
que, com o conhecimento recebido nos bancos escolares, tenham condições de
apresentar desenvolvimento digno e apto a lhes conceder oportunidades de
inclusão no meio social, inserindo
-
se a expectativa
de que venham eles a
construir uma nova família, além de fortalecerem os laços daquela a que
inicialmente pertencem.
Com muita propriedade José Adriano Souto de Moura, Procurador
-
Geral
Adjunto e Membro do Conselho Consultivo da PGR, afirma:
[...] dada a
sua idade, o menor apresenta uma personalidade em
formação, não consolidada. Se durante esse processo evolutivo é
adoptado um comportamento que fere valores essenciais à
convivência social, como tal, integrou, então a ilicitude típica
funcionará como um a
larme, ou sinal, de que algo está a correr
mal naquele processo de construção da personalidade. A
condição de menor é a de alguém em fase de intensa
aprendizagem. A aprendizagem é
-
o também para ‘viver em
interacção’. O menor vai ser actor social. Ora, essa
qualidade
implica a observância de certas normas de conduta, pelo que
deve ser auxiliado, em primeiro lugar, para que as conheça e, em
segundo lugar, para que as observe. Se educar não é,
obviamente, fornecer informação, e antes proporcionar o
desenvolvim
ento harmónico de uma personalidade, então, numa
meta final que é a existência de condições de felicidade, importa
antes do mais favorecer um equilíbrio [...]. Educar é educar para
viver em sociedade, e não está preparado para viver em
sociedade quem não o
bserva as condições mínimas de
subsistência e funcionamento da sociedade.
369
368
TJRS, AP/Reexame Necessário nº 70014608657, 7ª Câmara Cível, j. 03/05/06, v.u.
369
MOURA, José Adriano Souto de. A tutela educativa: factores de legitimação e objectivos. In:
Direito tutelar de menores
. Coimbra: Coimbra, 2002, p. 117
-
118.
2
2
5
5
3
3
Assim, resta indene de questionamentos hoje que o acesso à educação de
qualidade galgou patamar de direito fundamental, tendo sido retratado em diversos
diplomas legais e, com aind
a mais importância e preocupação, no próprio bojo da Lei
de Outubro, como bem demonstram seus Arts. 6º, 205, 206, 208, 211 e 212.
De acordo com Murillo José Digiácomo, ao:
[
...] analisarmos o Art. 227 da CF de 1988, veremos que um dos
direitos fundamenta
is expressamente assegurados a crianças e
adolescentes com a mais absoluta prioridade é justamente o
direito à educação. Mais do que um direito fundamental de toda
criança e adolescente, no entanto, o direito à educação se
constitui num verdadeiro direito
natural inerente à pessoa humana,
sejam quais forem sua idade ou sua condição social.
370
Além de objeto da Constituição Federal, documento máximo de uma
sociedade politicamente organizada, inúmeros outros diplomas se reportam à
importante temática em apreço
, citando
-
se, a título de exemplo, as diretrizes e
bases para a educação (Lei nº 9.394/96) e o próprio Estatuto da Criança e do
Adolescente (Lei nº 8.069/90).
Não se perca de vista, ainda, que o tema também é alvo de disciplina nas
Leis estaduais e nas le
is de organização interna dos municípios.
O tema da educação é de tal magnitude que há lei nacional específica com quase
uma centena de artigos determinando
apenas
as diretrizes e bases para a educação. Esse
diploma, restou materializado pela edição da Le
i nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996,
fazendo plena e equívoca ao dever do Estado para com a educação.
A preferência constitucional pelo ensino público importa em que o Estado venha
a organizar sistemas de ensino, de modo a cumprir o respectivo dever com a educação.
O dever estatal com a educação implica a União, os Estados, o Distrito
Federal e os Municípios. Desta feita, a cada ano, destina
-
se a União um mínimo de
370
DI
GIÁCOMO, Murillo José.
Instrumentos jurídicos para garantia do direito à educação.
In:
LIBERATI, Wilson Donizeti (org.).
Direito à educação
: uma questão de justiça. São Paulo:
Malheiros, 2003, p. 277.
2
2
5
5
4
4
dezoito por cento da receita de impostos, e aos Estados e Municípios, cada um, pelo
menos
, vinte e cinco por cento da receita de impostos.
371
Nesses passos, interessante o julgamento do Agravo Regimental no
Recurso Extraordinário nº 436.996
-
6/SP, onde o Ministro Celso de Mello deixou
assente de dúvidas que:
[...] o alto significado social e o
irrecusável valor constitucional de
que se reveste o direito à educação infantil
ainda mais se
considerado em face do dever que incumbe, ao Poder Público, de
torná
-
lo real, mediante concreta efetivação da garantia de
‘atendimento em creche e pré
-
escola à
s crianças de zero a seis
anos de idade (CF, Art. 208, inc. IV)
não podem ser
menosprezados pelo Estado, ‘obrigado a proporcionar a
concretização da educação infantil em sua área de competência’
(WILSON DONIZETI LIBERATI, Conteúdo material do direito à
e
ducação escolar. In:
Direito à educação: uma questão de justiça
,
p. 236/238, item nº 3.5, 2004, Malheiros), sob pena de grave e
injusta frustração de um inafastável compromisso constitucional,
que tem, no aparelho estatal, o seu precípuo destinatário.
372
O
Art. 7º, inc.
XXXIII da Constituição estabelece a “[...] proibição de trabalho
noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito anos e de qualquer trabalho a
menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos”.
Em face
da promulgação da Emenda Constitucional nº 20, de 15/12/98, a
idade mínima para o menor poder trabalhar saltou dos quatorze para os
dezesseis anos de idade.
No plano infraconstitucional, tem
-
se que a Consolidação das Leis do
Trabalho disciplina a atividad
e obreira do menor em seus Arts. 402 a 441.
Em consonância com o quanto positivado na Lei de Outubro, a CLT veda o labor
de menores de 16 anos de idade, salvo na condição de aprendiz, a partir dos 14 anos.
371
ATIQUE, Andraci Lucas Veltroni.
Federação e competênc
ia para legislar
: estudo de um
caso. Bauru: EDITE, 2006, p. 194: “É ponto pacífico que a educação é competência precípua
do Estado Federal, entenda
-
se aí todos os seus entes: União, Estados, Distrito Federal e
Municípios. Cabe a ele a superior tarefa de cr
iar condições, estabelecer e regulamentar os
mecanismos de transferência cultural, de especialização de hierarquias, de formas de
conhecimento socialmente úteis, de domínio das técnicas de ação social, enfim de todo este
universo cultural que constitui o conjunto dos conhecimentos que o homem moderno domina”.
372
Diário da Justiça de 03/02/06.
2
2
5
5
5
5
Até os 18 anos, o menor depende de autorização de
seu responsável
legal para contratar trabalho; após tal idade, passa a lhe ser lícito contratar
diretamente, adquirindo, portanto, plena capacidade trabalhista.
É vedado o trabalho do menor nos seguintes casos: a) serviços noturnos (Art.
404, CLT); b) lo
cais insalubres, perigosos ou prejudiciais à sua moralidade (Art. 405);
c) trabalho em ruas, praças e logradouros públicos, salvo mediante prévia autorização
do Juiz de Menores, que verificará se o menor é arrimo de família e se a ocupação não
prejudicará
sua formação moral (Art. 405, § 2º).
O Tribunal Superior do Trabalho editou o Enunciado nº 134 que estabelece:
“Salário. Menor não aprendiz. Ao menor não aprendiz é devido salário mínimo
integral” e o Supremo Tribunal Federal editou, no mesmo sentido, a S
úmula nº 205,
segundo o qual “[...] tem direito a salário integral menor não sujeito a aprendizagem
metódica”. Ao menor é lícito firmar recibos de salário (Art. 439, CLT).
As férias dos empregados menores submetem
-
se às mesmas regras do
adulto, mas não po
derão ser concedidas fracionadamente (Art. 134, § 2º, CLT).
A Lei nº 8.069/90 considera aprendizagem a “[...] formação técnico
-
profissional
ministrada segundo as diretrizes e bases da legislação e educação em vigor”.
O Art. 66 do Estatuto da Criança e do
Adolescente determina que o trabalho do
adolescente portador de necessidades especiais também deverá gozar de proteção.
Inegável, assim, que educação e trabalho andam de mãos dadas no que
concerne ao desenvolvimento digno e a correta inserção social de c
rianças e
adolescentes, pois como bem ressalta Andraci Lucas Veltroni Atique:
[...] educar só tem sentido se for para desenvolver a pessoa,
preparando
-
a adequadamente, para o exercício da cidadania.
Evidentemente que qualificar a pessoa para o trabalho é também uma
finalidade da educação, e esta só tem razão de ser, se for capaz de
elevar o ser humano, se lhe permitir uma vida digna, se for apta a
libertar da escravidão da miséria e da perversa desigualdade de
classes que tem imperado ao longo dos anos em
nosso país.
373
373
ATIQUE, 2006, p. 194.
2
2
5
5
6
6
Ainda que vistos por muitos como tendo caráter secundário, com o
que,
permissa
venia
, não se concorda, o direito de crianças e adolescentes à
cultura, ao esporte e ao lazer se entremostram indispensáveis para o seu
desenvolvimento adequado e
digno, circunstância essa que, mesmo por via
reflexa, acaba fortalecendo e concretizando a convivência familiar e
comunitária.
Isso porque, quando se fala em direito à cultura, fala
-
se em oportunizar a
criança e o adolescente, condições reais de estímulo
do pensamento, de contato
com os costumes e as tradições da comunidade em que vive, do aprendizado
sobre outros povos, enfim, possibilita
-
lhes conhecer os caminhos percorridos pela
evolução do homem nos seus mais diversos sentidos e valores.
No que tange
ao esporte, tem
-
se que referido direito se lastreia no
fato de que, por seu intermédio, crianças e adolescentes terão oportunidade
de desenvolver e de aperfeiçoar, corretamente, suas habilidades motoras,
não se perdendo de vista que a realização de exercíc
ios, além de propiciar
uma carreira aos infantes, é instrumento essencial à manutenção da própria
saúde.
Por fim, o direito ao lazer encontra
-
se intimamente ligado à observância
do princípio da condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, na exata
medi
da em que a própria Lei nº 8.069/90 assegura, com
status
fundamental, que
toda criança tem o direito de brincar, de se divertir, seja com pais e familiares,
seja com os amigos que vai formando ao longo de sua caminhada, sendo de
muita valia o alerta de And
réa Rodrigues Amin:
[...] o lazer envolve entretenimento, diversão, importantes
ingredientes para a felicidade, antídoto da depressão. Na escola é
obrigatório o recesso, o chamado recreio, momento de
descontração no qual os alunos descansam a mente e se i
nter
-
relacionam. Em casa, a família deve reservar algum tempo para
que a criança brinque e possa de fato ser criança, afastando o
adulto em miniatura exigido pela sociedade moderna.
374
374
AMIN, 2000, p. 64.
2
2
5
5
7
7
É bem verdade que tanto o Estado quanto a família e a sociedade
devem ze
lar e fiscalizar a efetivação correta dos referidos direitos
fundamentais sociais, a qual perpassa pela proibição e pelo afastamento de
crianças e adolescentes de ambientes e espetáculos que lhes sejam nocivos
ou prejudiciais ao seu desenvolvimento, bem co
mo de programas de
comunicação que venham a antecipar situações que somente mais tarde
aconteceriam de modo natural ou que coloquem em xeque os valores
condizentes com a probidade que o ser humano deve ostentar consigo mesmo
e com os outros que o cercam.
Navegando
-
se nessas águas, o que se dessume do quanto exposto
nos tópicos anteriores, consiste no fato de que, em se tratando de direito
fundamental
prima facie
, como é a hipótese de convivência familiar e
comunitária, não pode o Estado se furtar ao atingi
mento de tal desiderato,
devendo, assim, colocar instrumentos aptos à sua concreção.
Assim, deve o Estado buscar sua concretização e
complementação, dando efetiva prioridade na aplicação das verbas
orçamentárias inerentes à condição peculiar de crianças e
adolescentes,
destinando suas energias para que as pessoas em tal estágio de
desenvolvimento tenham acesso a uma vida digna, a um atendimento
médico
-
hospitalar condizente, a uma educação de qualidade, a uma
atividade profissional digna e razoavelmente ren
tável, à cultura, ao
esporte e ao lazer, de modo que consigam uma melhor condição de
inserção do seio social em que vivem.
Com essas realizações, a Constituição não será mais usada como
mero instrumento de retórica vazia, mas sim, como verdadeiro document
o
político fundamental de concreção de vida digna para todos os cidadãos
brasileiros, sem distinções de quaisquer naturezas.
Seria, enfim, o Brasil um autêntico Estado Constitucional Social,
visando, verdadeiramente, ao bem
-
estar de seus convivas.
2
2
5
5
8
8
4.7
Bre
ves Considerações e Citações Acerca da Proteção de
Crianças e Adolescentes no Plano Internacional
Obviamente, como a necessidade de efetivação de proteção dos direitos
de crianças e adolescentes não é uma preocupação somente de nosso País,
existe, por conseguinte, no meio internacional, uma série de instrumentos afetos a
casos similares.
É evidente que todo e qualquer tratado que vise à proteção dos direitos
do ser humano, acaba por espraiar seus efeitos para crianças e adolescentes.
Ocorre que, em razão
das situações de peculiaridade que tais pessoas em
formação apresenta, necessária se fez, também, a edição de proteção específica
respeitando, justamente, essa dita singularidade.
Nesse sentido a lição propagada por Gustavo Ferraz de Campos Mônaco,
na ex
ata medida em que assevera que:
[...] no que concerne aos direitos das crianças, enquanto dirigidos
a um grupo socialmente diferenciado e que se encontra em
posição de menos valia, a sociedade internacional acaba por
considerá
-
los um conjunto de direitos
que pretende garantir e
proteger esse grupo, de forma, a progressivamente, implementar
uma correta equalização quando em comparação com os adultos,
grupo social do qual as crianças tendem a fazer parte integrante,
num futuro mais ou menos próximo.
375
Dentro
desse contexto, um dos primeiros documentos internacionais
relativos à proteção dos direitos humanos data de 1948, mais precisamente
quando da realização da IX Conferência Internacional dos Estados Americanos,
realizada em Bogotá, na Colômbia.
Cabe ressa
ltar a importância da chamada
Declaração dos Direitos da
Criança
, adotada, em 20 de novembro de 1959, pela Assembléia Geral da
Organização das Nações Unidas, cujo texto apresenta dez princípios a serem
375
MONACO, 2005, p. 148.
2
2
5
5
9
9
respeitados no afã de serem devidamente resguardadas, no plano internacional,
as necessidades especiais que as crianças possuem em razão de sua falta de
maturidade física e intelectual, bem como imprescindibilidade de proteção jurídica
apropriada antes e depois de seu nascimento.
Reafirmando os ideais acima traçados, mister se faz trazer à lume a parte
final constante do Preâmbulo do referido documento internacional, a saber:
Assim, a Assembléia Geral proclama a presente Declaração dos
Direitos das Criança, a fim de que tenha uma infância feliz, e
possa goza
r, em seu próprio benefício e no da sociedade, os
direitos e liberdades aqui enunciados e apela que os pais, os
homens e as mulheres em sua qualidade de indivíduos, e as
organizações voluntárias, as autoridades locais e os governos
nacionais reconheçam ess
es direitos e se empenhem pela sua
observância mediante medidas legislativas e de outra natureza,
progressivamente instituídas, de conformidade com os seguintes
princípios: [...].
Em 1966, com a promulgação dos Pactos de Direitos Civis e
Políticos e de Di
reitos Econômicos, Sociais e Culturais, restou garantido,
no âmbito internacional, proteção especial estatal à família, com destaque
no sentido de que a referida proteção deveria ser ainda mais intensa
naquela em que o núcleo familiar apresentava, em seu s
eio, crianças e
adolescentes.
Importante destacar que a Convenção Internacional dos Direitos da
Criança, realizada pela ONU, no ano de 1989, passou a integrar o direito interno
brasileiro por força de sua promulgação mediante o Decreto nº 99.710/90.
Basi
camente, este estabeleceu a necessidade de respeito aos direitos
nela enunciados, e o asseguramento de sua aplicação a cada criança sujeita
à sua jurisdição, sem distinção alguma, ou seja, independentemente de raça,
cor, sexo, idioma, crença, opinião polít
ica ou de outra índole, origem nacional,
étnica ou social, posição econômica, deficiências físicas, nascimento ou
qualquer outra condição própria da criança, de seus pais ou de seus
representantes legais.
2
2
6
6
0
0
Ademais, deverão os nominados
Estados Partes
tomar
todas as medidas
apropriadas para assegurar a proteção da criança contra toda forma de
discriminação ou castigo por causa da condição, das atividades, das opiniões
manifestadas ou das crenças de seus pais, representantes legais ou familiares,
bem como que
todas as ações relativas às crianças, levadas a efeito por
autoridades administrativas ou órgãos legislativos, considerem, primordialmente,
seu interesse maior.
Os Estados, dentre eles o Brasil, se comprometem a assegurar à criança
a proteção e o cuidado
necessários ao seu bem
-
estar, levando em consideração
os direitos e deveres de seus pais, tutores ou outras pessoas responsáveis por
ela perante a lei e, com essa finalidade, tomarão todas as medidas legislativas e
administrativas adequadas, certificando
-
s
e, ainda, que as instituições, os serviços
e os estabelecimentos encarregados do cuidado ou de sua proteção cumpram
com os padrões estabelecidos pelas autoridades competentes, especialmente no
que diz respeito à sua segurança e à sua saúde, ao número e à c
ompetência de
seu pessoal e à existência de supervisão adequada.
Por fim, destaque
-
se que os Estados Partes deverão adotar todas as
medidas administrativas, legislativas e de outra índole com vistas à
implementação dos direitos reconhecidos na aludida Con
venção. Com relação
aos direitos econômicos, sociais e culturais, os Estados Partes adotarão essas
medidas utilizando ao máximo os recursos disponíveis e, quando necessário,
dentro de um quadro de cooperação internacional.
No Brasil, a assunção e a ratifi
cação do referido Tratado vieram com o
advento da Lei nº 8.069/90, mais conhecida como Estatuto da Criança e do
Adolescente (ECA), cujo corpo normativo é considerado por especialistas do
mundo inteiro como sendo um dos mais perfeitos e completos já existen
tes sobre
o assunto.
Noutro giro verbal, deixar correr ao largo a proteção legal dos interesses
da criança e do adolescente e proscrever e acelerar o fim de um País que se julga
democrático e que tem esperanças de um amanhã melhor para seus cidadãos.
2
2
6
6
1
1
Pedr
o Puentes Rozo menciona:
[...]
solo a partir de los años 60 aparecen en Colombia las
primeras intenciones políticas para que el Estado le brinde a los
menores una maior y mejor atención. En 1968 se crea il Instituto
Colombiano de Bienestar Familiar. En 19
89 se expide el Código
del Menor, en el cual se definen los derechos fundamentales del
menor, en 1990 se crea el Comité Interinstitucional para la
defensa, proteción y promoción de los derechos humanos y de la
juventud, la mujer e la familia. Este pequeño
esbozo histórico
puede demostrar un interes y avance en la implementacion de las
políticas y la legislación sobre la niñez y la juventud, pero,
lamentablemente, si hacemos un análisis critico de la ejecución de
las políticas sobre la infancia se tiene que
reconocer que no há
sido eficaz como lo demuestra un estúdio de la UNICEF (1994)
denominado El nino en Colombia
.
376
Ainda no que se refere à proteção dos direitos e interesses afetos a
crianças e adolescentes no plano internacional, mister se faz uma breve
exposição, a título de ilustração, de sua positivação constitucional em alguns dos
países que compõem os continentes americano e europeu.
4.7.1
América do Sul
4.7.1.1
Constituição da Argentina
Art. 75, 23:
Corresponde al Congreso:
[...]
Legislar y pr
omover
medidas de acción positiva que garanticen la igualdad real de
oportunidades y de trato, y el pleno goce y ejercicio de los
derechos reconocidos por esta Constitución y por los tratados
internacionales vigentes sobre derechos humanos, en particular
r
especto de los niños, las mujeres, los ancianos y las personas
con discapacidad. Dictar un régimen de seguridad social especial
e integral en protección del niño en situacion de desamparo,
desde el embarazo hasta la finalizacion del periodo de enseñanza
el
emental, y de la madre durante el embarazo y el tiempo de
lactancia.
376
ROZO, Pedro Puentes.
Dimensiones psicosociales y su relacion con la aplicacion de la
justicia en
Colombia
.
In: BRITO, Leila Maria Torraca de (org.). Temas de psicologia jurídica
.
4ª ed. São Paulo: Relume Dumará, 1999, p. 46
-
47.
2
2
6
6
2
2
4.7.1.2
Constituição da Bolívia
Art. 8º, 6:
Deberes Fundamentales Toda persona tiene los
siguientes deberes fundamentales: e) De asistir, alimentar y
educar a sus hijos menores de edad
, así como de proteger y
socorrer a sus padres cuando se hallen en situación de
enfermedad, miseria o desamparo.
Art. 197, I:
Patria potestad y tutela. I. La autoridad del padre y de
la madre, así como la tutela, se establecen en interés de los hijos,
de
los menores y de los inhabilitados, en armonía con los
intereses de la familia y de la sociedad. La adopción y las
instituciones afines a ella se organizarán igualmente en beneficio
de los menores
.
Art. 199:
El Estado protegerá la salud física, mental y m
oral de la
infancia, y defenderá los derechos del niño al hogar y a la
educación. Un código especial regulará la protección del menor en
armonía con la legislación general
.
4.7.1.3
Constituição da Colômbia
Art. 44:
Son derechos fundamentales de los niñ
os: la vida, la
integridad física, la salud y la seguridad social, la alimentación
equilibrada, su nombre y nacionalidad, tener una familia y no ser
separados de ella, el cuidado y amor, la educación y la cultura, la
recreación y la libre expresión de su o
pinión. Serán protegidos
contra toda forma de abandono, violencia física o moral,
secuestro, venta, abuso sexual, explotación laboral o económica y
trabajos riesgosos. Gozarán también de los demás derechos
consagrados en la Constitución, en las leyes y en
los tratados
internacionales ratificados por Colombia. La familia, la sociedad y
el Estado tienen la obligación de asistir y proteger al niño para
garantizar su desarrollo armónico e integral y el ejercicio pleno de
sus derechos. Cualquier persona puede ex
igir de la autoridad
competente su cumplimiento y la sanción de los infractores. Los
derechos de los niños prevalecen sobre los derechos de los
demás
.
Art. 45:
El adolescente tiene derecho a la protección y a la
formación integral. El Estado y la sociedad
garantizan la
participación activa de los jóvenes en los organismos públicos y
privados que tengan a cargo la protección, educación y progreso
de la juventud.
2
2
6
6
3
3
Art. 50:
Todo niño menor de un año que no esté cubierto por algún
tipo de protección o de seguri
dad social, tendrá derecho a recibir
atención gratuita en todas las instituciones de salud que reciban
aportes del Estado. La ley reglamentará la matéria
.
Art. 53:
El Congreso expedirá el estatuto del trabajo. La ley
correspondiente tendrá en cuenta por l
o menos los siguientes
principios mínimos fundamentales:
[...]
protección especial a la
mujer, a la maternidad y al trabajador menor de edad
.
4.7.1.4
Constituição do Equador
Art. 23, 2:
Sin perjuicio de los derechos establecidos en esta
Constitución y
en los instrumentos internacionales vigentes, el
Estado reconocerá y garantizará a las personas los siguientes: 2.
El Estado adoptará las medidas necesarias para prevenir, eliminar
y sancionar, en especial, la violencia contra los niños,
adolescentes, las
mujeres y personas de la tercera edad
.
Art. 47:
En el ámbito público y privado recibirán atención
prioritaria, preferente y especializada los niños y adolescentes, las
mujeres embarazadas, las personas con discapacidad, las que
adolecen de enfermedades ca
tastróficas de alta complejidad y las
de la tercera edad. Del mismo modo, se atenderá a las personas
en situación de riesgo y víctimas de violencia doméstica, maltrato
infantil, desastres naturales o antropogénicos
.
Art. 48:
Será obligación del Estado, la
sociedad y la familia,
promover con máxima prioridad el desarrollo integral de niños y
adolescentes y asegurar el ejercicio pleno de sus derechos. En
todos los casos se aplicará el principio del interés superior de los
niños, y sus derechos prevalecerán s
obre los de los demás.
Art. 49:
Los niños y adolescentes gozarán de los derechos
comunes al ser humano, además de los específicos de su edad.
El Estado les asegurará y garantizará el derecho a la vida, desde
su concepción; a la integridad física y psíquic
a; a su identidad,
nombre y ciudadanía; a la salud integral y nutrición; a la educación
y cultura, al deporte y recreación; a la seguridad social, a tener
una familia y disfrutar de la convivencia familiar y comunitaria; a la
participación social, al respe
to a su libertad y dignidad, y a ser
consultados en los asuntos que les afecten. El Estado garantizará
su libertad de expresión y asociación, el funcionamiento libre de
los consejos estudiantiles y demás formas asociativas, de
conformidad con la ley
.
2
2
6
6
4
4
Art.
50:
El Estado adoptará las medidas que aseguren a los niños y
adolescentes las siguientes garantías: Atención prioritaria para los
menores de seis años que garantice nutrición, salud, educación y
cuidado diario. Protección especial en el trabajo, y contra
la
explotación económica en condiciones laborales peligrosas, que
perjudiquen su educación o sean nocivas para su salud o su
desarrollo personal. Atención preferente para su plena integración
social, a los que tengan discapacidad. Protección contra el tráf
ico de
menores, pornografía, prostitución, explotación sexual, uso de
estupefacientes, sustancias psicotrópicas y consumo de bebidas
alcohólicas. Prevención y atención contra el maltrato, negligencia,
discriminación y violencia. Atención prioritaria en casos de desastres
y conflictos armados. Protección frente a la influencia de programas o
mensajes nocivos que se difundan a través de cualquier medio, y
que promuevan la violencia, la discriminación racial o de género, o la
adopción de falsos valores
.
Art.
51:
Los menores de dieciocho años estarán sujetos a la
legislación de menores y a una administración de justicia
especializada en la Función Judicial. Los niños y adolescentes
tendrán derecho a que se respeten sus garantías constitucionales
.
Art. 52:
El E
stado organizará un sistema nacional descentralizado
de protección integral para la niñez y la adolescencia, encargado
de asegurar el ejercicio y garantía de sus derechos. Su órgano
rector de carácter nacional se integrará paritariamente entre
Estado y soc
iedad civil y será competente para la definición de
políticas. Formarán parte de este sistema las entidades públicas y
privadas. Los gobiernos seccionales formularán políticas locales y
destinarán recursos preferentes para servicios y programas
orientados
a niños y adolescentes
.
4.7.1.5
Constituição do Paraguai
Art. 54:
La familia, la sociedad y el Estado tienen la obligación de
garantizar al niño su desarrollo armónico e integral, así como el
ejercicio pleno de sus derechos protegiéndolo contra el aban
dono,
la desnutrición, la violencia, el abuso, el tráfico y la explotación.
Cualquier persona puede exigir a la autoridad competente el
cumplimiento de tales garantías y la sanción de los infractores
.
4.7.1.6
Constituição do Uruguai
Art. 41:
El cuidado
y educación de los hijos para que éstos
alcancen su plena capacidad corporal, intelectual y social, es un
2
2
6
6
5
5
deber y un derecho de los padres. Quienes tengan a su cargo
numerosa prole tienen derecho a auxilios compensatorios,
siempre que los necesiten. La le
y dispondrá las medidas
necesarias para que la infancia y juventud sean protegidas contra
el abandono corporal, intelectual o moral de sus padres o tutores,
así como contra la explotación y el abuso
.
4.7.1.7
Constituição da Venezuela
Art. 75: Los niños
, niñas y adolescentes tienen derecho a vivir, ser
criados o criadas y a desarrollarse en el seno de su familia de
origen. Cuando ello sea imposible o contrario a su interés
superior, tendrán derecho a una familia sustituta, de conformidad
con la ley. La a
dopción tiene efectos similares a la filiación y se
establece siempre en beneficio del adoptado o la adoptada, de
conformidad con la ley. La adopción internacional es subsidiaria
de la nacional
.
Art. 78:
Los niños, niñas y adolescentes son sujetos plenos
de
derecho y estarán protegidos por la legislación, órganos y
tribunales especializados, los cuales respetarán, garantizarán y
desarrollarán los contenidos de esta Constitución, la Convención
sobre los Derechos del Niño y demás tratados internacionales que
en esta materia haya suscrito y ratificado la República. El Estado,
las familias y la sociedad asegurarán, con prioridad absoluta,
protección integral, para lo cual se tomará en cuenta su interés
superior en las decisiones y acciones que les conciernan. E
l
Estado promoverá su incorporación progresiva a la ciudadanía
activa, y un ente rector nacional dirigirá las políticas para la
protección integral de los niños, niñas y adolescentes
.
Art. 79
Los jóvenes y las jóvenes tienen el derecho y el deber de
ser s
ujetos activos del proceso de desarrollo. El Estado, con la
participación solidaria de las familias y la sociedad, creará
oportunidades para estimular su tránsito productivo hacia la vida
adulta y en particular la capacitación y el acceso al primer empleo,
de conformidad con la ley
.
4.7.2
Américas Central e do Norte
4.7.2.1
Constituição da Costa Rica
Art. 51:
La familia, como elemento natural y fundamento de la
sociedad, tiene derecho a la protección especial del Estado.
2
2
6
6
6
6
Igualmente tendrán derecho a e
sa protección la madre, el niño, el
anciano y el enfermo desvalido
.
Art. 55:
La protección especial de la madre y del menor estará a
cargo de una institución autónoma denominada Patronato
Nacional de la Infancia, con la colaboración de las otras
instituciones del Estado
.
4.7.2.2
Constituição de Cuba
Art. 40:
La niñez y la juventud disfrutan de particular protección
por parte del Estado y la sociedad. La familia, la escuela, los
órganos estatales y las organizaciones de masas y sociales tienen
el deber
de prestar especial atención a la formación integral de la
niñez y la juventud
.
4.7.2.3
Constituição de El Salvador
Art. 34:
Todo menor tiene derecho a vivir en condiciones familiares
y ambientales que le permitan su desarrollo integral, para lo cual
t
endrá la protección del Estado. La ley determinará los deberes
del Estado y creará las instituciones para la protección de la
maternidad y de la infância
.
4.7.2.4
Constituição da Guatemala
Art. 51:
El Estado protegerá la salud física, mental y moral de
los
menores de edad y de los ancianos. Les garantizará su derecho a
la alimentación, salud, educación y seguridad y previsión social
.
4.7.2.5
Constituição de Honduras
Art. 75:
La Ley que regule la emisión del pensamiento, podrá
establecer censura prev
ia, para proteger los valores éticos y
2
2
6
6
7
7
culturales de la sociedad, así como los derechos de las personas,
especialmente de la infancia, de la adolescencia y de la juventud
.
Art. 111:
La familia, el matrimonio, la maternidad y la infancia
están bajo la prot
ección del Estado
.
Art. 119:
El Estado tiene la obligación de proteger a la infancia.
Los niños gozarán de la protección prevista en los acuerdos
internacionales que velan por sus derechos. Las leyes de
protección a la infancia son de orden público y los
establecimientos oficiales destinados a dicho fin tiene carácter de
centros de asistencia social
.
Art. 120:
Los menores de edad, deficientes física o mentalmente,
los de conducta irregular, los huérfanos y los abandonados, están
sometidos a una legislació
n especial de rehabilitación, vigilancia y
protección según el caso
.
Art. 121:
Los padres están obligados a alimentar, asistir y educar a
sus hijos durante la minoría de edad, y en los demás casos en que
legalmente proceda. El Estado brindará especial pro
tección a los
menores cuyos padres o tutores estén imposibilitados
económicamente para proveer a su crianza y educación. Estos
padres o tutores gozarán de preferencia, para el desempeño de
cargos públicos en iguales circunstancias de idoneidad
.
4.7.2.6
Constituição de Nicarágua
Art. 71:
La niñez goza de protección especial y de todos los
derechos de su condición requiere, por lo cual tiene plena vigencia
la Convención Internacional de los Derechos del Niño y la Niña.
*Artículo reformado por Ley nº 192 d
e 1995.
Art. 76:
El Estado creará programas y desarrollará centros
especiales para velar por los menores; éstos tienen derecho a las
medidas de prevención, protección y educación que su condición
requiere, por parte de su familia, de la sociedad y el Esta
do.
4.7.2.7
Constituição do Panamá
Art. 55:
La patria potestad es el conjunto de deberes y derechos
que tienen los padres en relación con los hijos. Los padres están
obligados a alimentar, educar y proteger a sus hijos para que
2
2
6
6
8
8
obtengan una buena crian
za y un adecuado desarrollo físico y
espiritual, y éstos a respetarlos y asistirlos. La ley regulará el
ejercicio de la patria potestad de acuerdo con el interés social y el
beneficio de los hijos
.
Art. 58:
El Estado velará por el mejoramiento social y ec
onómico
de la familia y organizará el patrimonio familiar determinando la
naturaleza y cuantía de los bienes que deben constituirlo, sobre la
base de que es inalienable e inembargable
.
Art. 59:
El Estado creará un organismo destinado a proteger la
familia
con el fin de: 2
-
Institucionalizar la educación de los
párvulos en centros especializados para atender aquéllos cuyos
padres o tutores así lo soliciten. 3
-
Proteger a los menores y
ancianos, y custodiar y readaptar socialmente a los abandonados,
desampar
ados, en peligro moral o con desajustes de conducta. La
ley organizará y determinará el funcionamiento de la jurisdicción
especial de menores la cual, entre otras funciones, conocerá
sobre la investigación de la paternidad, el abandono de familia y
los pro
blemas de conducta juvenil
.
4.7.2.8
Constituição da República Dominicana
Art. 8º:
Se reconoce como finalidad principal del Estado la
protección efectiva de los derechos de la persona humana y el
mantenimiento de los medios que le permitan perfeccionars
e
progresivamente dentro de un orden de libertad individual y de
justicia social, compatible con el orden público, el bienestar
general y los derechos de todos. Para garantizar la realización de
esos fines se fijan las siguientes normas: 15. Con el fin de
robustecer su estabilidad y bienestar, su vida moral, religiosa y
cultural, la familia recibirá del Estado la más amplia protección
posible. El Estado tomará las medidas de higiene y de otro género
tendientes a evitar en lo posible la mortalidad infantil y
a obtener el
sano desarrollo de los niños
.
4.7.3
Europa
4.7.3.1
Lei Fundamental da República Federal Alemã
Art. 6º, 3: As crianças não podem ser separadas de suas famílias
contra a vontade dos encarregados da sua educação, a não ser
2
2
6
6
9
9
em virtude de um
a lei, em caso de insuficiência económica destes
ou quando as crianças corram o risco de abandono por outros
motivos.
Art. 34: Se um funcionário, no exercício de uma cargo público que
lhe foi confiado, infringir em relação a terceiros os deveres que o
car
go lhe impõe, a responsabilidade recai, em princípio, sobre o
Estado ou a pessoa colectiva ao serviço da qual se encontra. No
caso de dolo ou negligência grave, é também responsável o titular
do cargo. A via dos tribunais ordinários não deve ser excluída p
ara
o pedido de indemnização ou para acção de recurso.
4.7.3.2
Lei Constitucional Federal Austríaca
Art. 23º, 1: A Federação, os Estados, os distritos, os municípios e
as restantes instituições de Direito Público respondem pelos
danos e prejuízos que t
enham causado injustificadamente a
terceiros as pessoas que, ao actuarem enquanto órgãos seus no
cumprimento das leis, tenham incorrido em comportamento ilícito.
4.7.3.3
Constituição do Reino da Bélgica
Art. 22: Todos têm direito ao respeito pela sua v
ida privada e
familiar, excepto nos casos e nas condições fixados pela lei [...].
Art. 23, 5: Todos têm direito de viver segundo os ditames da
dignidade humana [...]. Estes direito incluem, notadamente: [...] o
direito ao desenvolvimento cultural e social
.
4.7.3.4
Lei Fundamental sobre a Forma do Governo Filandês
Art. 5: Todos os cidadãos filandeses são iguais perante a lei [...]. A
criança será considerada como pessoa em pé de igualdade e terá
direito, conforme o seu grau de desenvolvimento, a partici
par nas
decisões sobre questões que pessoalmente a afectem.
2
2
7
7
0
0
Art. 15a: Quem não tiver possibilidade de alcançar recursos que
permitam viver condignamente terá direito a um montante mínimo
garantido de recursos e assistência. Será garantido a todos, por
lei,
o direito a receber subsídios nos casos de desemprego,
doença, incapacidade laboral e velhice, bem como parto e perda
do sustento da família, Os poderes públicos assegurarão a todos,
através de normas estabelecidas em lei, os serviços sociais e
sanitários
suficientes e garantirão, da mesma forma, a protecção
da saúde da população. O Estado prestará igualmente apoio à
família e a quem seja responsável pela assistência à criança, para
que aquela tenha a possibilidade de assegurar o seu bem
-
estar e
o desenvol
vimento de sua personalidade. Os poderes públicos
garantirão o direito de todas as pessoas à habitação e apoiarão os
esforços na aquisição da sua própria habitação.
4.7.3.5
Constituição da República da Grécia
Art. 5, 1: Todos têm o direito de desenvolv
er livremente a sua
personalidade e de participar da vida social, económica e política
do país, desde que não atentem contra os direitos de outrém ou
aos bons costumes, nem violem a Constituição.
Art. 21, 1, 2 e 3: A família, enquanto fundamento e suporte
do
progresso da nação, bem como o casamento, a maternidade e a
infância, encontram
-
se sob a protecção do Estado. As famílias
numerosas, os inválidos de guerra ou de paz, as vítimas de
guerra, as viúvas e os órfãos de guerra, bem como todos os que
sofrem d
e uma doença incurável, física ou mental, têm direito a
cuidados especiais por parte do Estado. O Estado zela pela saúde
dos cidadão e toma medidas especiais para a protecção da
juventude, da terceira idade e dos inválidos, bem como para a
assistência aos
indigentes.
4.7.3.6
Constituição da República da Irlanda
Art. 40, 1: “Enquanto pessoas humanas, todos os cidadãos são
iguais perante a lei. Isto não significa que o Estado, no seu
ordenamento, não tome em consideração as diferenças de
capacidade física
e moral e de função social”.
Art. 41, 1, 1º e 2º: O Estado reconhece a família como o grupo
primário, natural e fundamental da sociedade e como uma
2
2
7
7
1
1
instituição moral com direitos inalienáveis e imprescritíveis,
anteriores e superiores a qualquer lei posi
tiva. Como tal, o Estado
garante a protecção da constituição e da autoridade da família,
base necessária à ordem social e indispensável para o bem
-
estar
da Nação e do Estado.
4.7.3.7
Constituição da República da Itália
Art. 31: A República favorece, co
m medidas económicas e outros
meios, a formação da família e o cumprimento das respectivas
obrigações, nomeadamente no que diz respeito às famílias
numerosas. Protege a maternidade, a infância e a juventude,
apoiando as instituições necessárias a este fim.
4.7.3.8
Constituição do Grão
-
Ducado do Luxemburgo
Art. 11, 3: O Estado garante os direitos naturais da pessoa
humana e da família.
4.7.3.9
Constituição do Reino dos Países Baixos
Art. 22, 3: Os poderes públicos criarão as condições propícias ao
de
senvolvimento social e cultura, bem como a organização do
tempo livre.
4.7.3.10
Portugal
Com relação a Portugal, necessário se faz comentários mais
aprofundados, tendo em vista que, inegavelmente, seu texto constitucional serviu
de inspiração à criação
da Constituição Brasileira de 1988.
2
2
7
7
2
2
Vejamos.
A Constituição Portuguesa de 1976 é mais explícita e contundente
do que a Brasileira no que se refere ao tema objeto de estudo neste
trabalho, circunstância essa que fica evidente já pela leitura do item 1 de
seu Art. 36, a saber: “Todos têm o direito de constituir família e de contrair
casamento em condições de plena igualdade”, sendo certo que nos dizeres
de Canotilho e Vital Moreira tal dispositivo reconhece a família como
instituição em si mesma, apresentan
do
-
se como repositório típico de
garantias constitucionais, emergindo daí sua impossibilidade legal de ser
suprimida ou desqualificada.
377
De solar clareza a redação da norma basilar em discussão, haja vista
reconhecer, de um único viés, a importância e o d
ireito fundamental de todo o
cidadão em constituir uma família, dentro de um plano isonômico, restando nítido
que se o Estado se omitir ou falhar na concretização de tal desiderato, a citada
igualdade se mostrará aquebrantada, devendo o ente público ser
re
sponsabilizado pelos danos e prejuízos ocasionados em decorrência do não
cumprimento de um dever que lhe era inerente e inafastável.
Nesse passo, dignos de nota, também, dentro do Capítulo II
378
da
Constituição de Portugal, perfeitamente nominado de
direito
s e deveres sociais
, o
que deixa insta a noção de responsabilidade, os Arts. 67 (família), 68 (paternidade
e maternidade), 69 (infância) e 70 (juventude).
Dispõe o Art. 67, 1, da CPR:
A família, como elemento fundamental da sociedade, tem direito à
prote
cção da sociedade e do Estado e à efectivação de todas as
condições que permitam a realização pessoal de seus membros.
Já, o Art. 68, 1 e 2, apresenta a seguinte redação:
377
CANOTILHO; MOREIRA, 2007, vol. I, p. 561.
378
Numeração do capítulo de acordo com a LC nº 01/82.
2
2
7
7
3
3
Os pais e as mães têm direito à protecção da sociedade e do
Estado na realização da
sua insubstituível acção em relação aos
filhos, nomeadamente quanto à sua educação, com garantia da
realização profissional e de participação na vida cívica do país. A
maternidade e a paternidade são valores sociais eminentes.
Por sua vez, tem
-
se que o Ar
t. 69, 1 e 2, prescreve que:
As crianças têm direito à protecção da sociedade e do Estado,
com vista ao seu desenvolvimento integral, especialmente contra
todas as formas de abandono, de discirminação e de opressão e
contra o exercício abusivo da autorida
de na família e nas demais
instituições. O Estado assegura especial protecção às crianças
órfãs, abandonadas ou por qualquer forma privadas de um
ambiente familiar normal.
Ao derradeiro, transcreve o Art. 70, 1, 2 e 3:
Os jovens gozam de protecção especi
al para efectivação dos seus
direitos económicos, sociais e culturais, nomeadamente: a) no
ensino, na formação profissional e na cultura; b) no acesso ao
primeiro emprego, no trabalho e na segurança social; c) no acesso
à habitação; d) na educação física e
no desporto; e) no
aproveitamento dos tempos livres. A política de juventude deverá
ter como objectivos prioritários o desenvolvimento da
personalidade dos jovens, a criação de condições para a sua
efectiva integração na vida activa, o gosto pela criação
livre e o
sentido de serviço à comunidade. O Estado, em colaboração com
as famílias, as escolas, as empresas, as organizações de
moradores, as associações e fundações de fins culturais e as
colectividades de cultura e recreio, fomenta e apoia as
organizaçõ
es juvenis na prossecução daqueles objectivos, bem
como o intercâmbio internacional da juventude.
Ensinam Canotilho e Vital Moreira:
A protecção da família significa, desde logo e em primeiro lugar,
protecção da unidade da família (cfr. AcsTC n
os
829/96
e 323/04).
A manifestação mais relevante desta idéia é o direito à
convivência, ou seja, o direito dos membros do agregado familiar
a viverem juntos. Este direito (que, aliás, comporta uma dimensão
negativa, como direito a não serem impedidos de se juntare
m)
exige a realização das condições que permitam a convivência,
sobretudo dos cônjuges. Ele assume particular relevância no caso
dos emigrantes, mas tem incidência noutros domínios (serviço
militar, estabelecimentos prisionais, etc.) e reclama medidas que
permitam a reunião familiar ou previnam a separação de seus
2
2
7
7
4
4
membros (v.g., preferência conjugal na colocação profissional,
etc.).
379
No plano da responsabilidade estatal, interessante se apresenta a
disposição prescrita no Art. 22 da Lei Fundamental Portugu
esa, a saber:
Art. 22: O Estado e as demais entidades públicas são civilmente
responsáveis, em forma solidária com os titulares dos seus
órgãos, funcionários ou agentes, por acções ou omissões
praticadas no exercício de suas funções e por causa desse
exer
cício, de que resulte violação dos direitos, liberdades e
garantias ou prejuízo para outrem.
Como se observa por intermédio da exaustiva, mas necessária,
transcrição dos dispositivos constitucionais acima elencados, percebe
-
se, com
solar clareza, que a pr
eocupação com o destino e a proteção dos direitos e
interesses de crianças e adolescentes é uma constante dentre os países que
compõem as Américas e a Europa, não sendo, assim, previlégio do Brasil a sua
positivação com
status
fundamental.
379
CANOTILHO; MOREIRA, 2007,
vol. I, p. 857
-
858.
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M
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N
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T
T
Á
Á
R
R
I
I
A
A
Com fundamento nas premissas transcritas nos tópicos anteriores e na
assertiva afeta à necessidade de efetivação
do direito fundamental de nossas
crianças e adolescentes à convivência familiar e comunitária, chega
-
se a este
capítulo com a missão de demonstrar que o Estado responde pelos danos
causados pela sua inércia ou omissão no que se refere ao desiderato em
questão.
É bem verdade, e não se desconhece isso, que existem situações em que
foge do controle do Estado a mantença ou a recolocação do infante proscrito num
novo seio familiar; porém, quando tal não se mostrar possível de cumprimento,
continua sendo dever e
statal colocar à disposição dos interessados instrumentos
aptos e eficazes a mitigar referida situação, de modo a prestigiar, realmente, o
princípio da igualdade encartado no
caput
do Art. 5º da Lei de Outubro.
Isso porque a inércia e a omissão estatais a
cima apontadas, seja num ou
noutro caso, acabarão por redundar num ilícito efeito, qual seja, o de retirar da
criança e do adolescente expurgados da convivência familiar e comunitária a
possibilidade de um desenvolvimento mais afetuoso e digno, abrindo
-
lhe
s, assim,
o caminho para invocar a tutela jurisdicional no sentido de pleitear indenização
embasada na teoria de responsabilidade civil denominada de
perda de uma
chance
.
Conforme já visto anteriormente, tem
-
se que o
caput
do Art. 226 da
Constituição Fede
ral deixou assente de dúvidas de que “A família, base da
sociedade, tem especial proteção do Estado”.
2
2
7
7
6
6
A especial proteção retratada pelo texto constitucional, diante de seu
status
fundamental, deve ser encarada pelo Estado como uma determinação
administrat
iva de natureza vinculada, de modo a lhe obrigar a atuar em prol do
bem
-
estar da família e de seus convivas, estabelecendo, efetivamente, a
prioridade que a referida proteção requer e necessita.
Assim, e a despeito da inequívoca existência de dificuldades
, não pode o
Estado recuar ou se furtar ao dever de colocar à disposição dos menos
afortunados, mecanismos e condições que tenham, com eficácia, o condão de
minorar os problemas relativos à referida ausência, sob pena de ser
responsabilizado pela inconstit
ucional omissão em seu agir.
Essa obrigatoriedade e necessidade de atuações estatais ativas, de modo
a assegurar a concretização das diretrizes normativas de proteção à família,
incluindo
-
se aí, obviamente, a proteção de crianças e adolescentes, não pode
ser
confundida com a vedação, também de natureza constitucional, de que a ninguém
é dado interferir nos rumos e nos destinos desejados e traçados por uma
determinada entidade familiar.
Importante se faz a transcrição da explanação exarada pela Procuradora
da República no Tribunal de Família e Menores de Lisboa, Carla Fonseca, no
sentido de que:
[...] se hoje é um dado pacificamente aceite do ponto de vista
ideológico que o Estado intervenha na família, do ponto de vista
da prática concreta essa intervençã
o é ainda,
incompreensivelmente, objecto de tibieza, de bloqueios e de
confusão de conceitos que não são confundíveis: intervenção, que
implica a capacidade de decisão oportuna; e invasão, que resulta
uma intromissão sem decisão oportuna, inútil”.
380
De out
ro lado, tem
-
se que a sociedade, em razão de sua ínsita
responsabilidade, tem se esforçado na tentativa de minimizar o problema afeto a
crianças e adolescentes, pois, além de contribuir para tanto com o adimplemento
380
FONSECA, Carla. A protecção das crianças e jovens: factores de legitimação e objectivos. In:
Direito tutelar de menores
. Coimbra: Coimbra, 2002, p. 09.
2
2
7
7
7
7
de tributos, acaba, dentro daquilo que s
e convencionou chamar
-
se de
terceiro
setor
, aglutinando
-
se em Organizações Não
-
Governamentais (ONG’s), em
Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP’s) e congêneres,
assumindo, por conseguinte, muitas das lacunas de atuação deixadas ao lar
go
pelo Estado.
Pode
-
se citar, como exemplo do quanto asseverado, a criação do
programa denominado
Criança Esperança
, realizado no Brasil em conjunto com a
UNICEF, não se olvidando, também, da possibilidade de as pessoas físicas e
jurídicas destinarem um
determinado percentual do Imposto de Renda à
realização de projetos que venham a beneficiar infantes abandonados.
Entrementes, tal participação social não pode servir, como infelizmente
serve, de escudo para que o Estado se furte ao cumprimento do dever
f
undamental que lhe é ínsito e inafastável, de modo que a atuação de seus
agentes, tanto na esfera administrativa quanto na esfera legislativa, repita
-
se, é
de natureza manifestamente vinculada, emergindo daí que, nas situações em que
se mostrarem omissos n
o que se refere à concretização de tal obrigação, abre
-
se
oportunidade para que a função judiciária compareça e venha a sanar o grave
problema.
Assim, cumpre esclarecer, por oportuno, que é plenamente possível ao
nobre Poder Judiciário efetuar a sindicânc
ia de atos da natureza do ora em
comento, pois, como já deixou salientado em outras oportunidades o Excelso
Supremo Tribunal Federal, por intermédio da batuta do preclaro Ministro Celso de
Mello:
[...] é preciso ressaltar, neste ponto, que a atividade est
atal,
qualquer que seja o domínio institucional de sua incidência, está
necessariamente subordinada à observância de parâmetros ético
-
jurídicos que se refletem na consagração constitucional do
princípio da moralidade administrativa. É por essa razão que o
princípio constitucional da moralidade administrativa, ao impor
limitações ao exercício do poder estatal, legitima o controle
jurisdicional de todos os atos do Poder Público que transgridam os
valores éticos que devem pautar o comportamento dos órgãos e
ag
entes governamentais [...]. Impõe
-
se ressaltar, por necessário,
que a possibilidade jurídica de fiscalização jurisdicional dos atos
2
2
7
7
8
8
estatais,
mesmo
daqueles
de
caráter
discricionário
, desde que
praticados com inobservância do interesse público ou com
desre
speito aos princípios que condicionam a atividade do Estado,
tem sido reconhecida pela jurisprudência dos Tribunais (RDA
89/134), notadamente a deste Supremo Tribunal Federal (RTJ nº
153/1022
-
1032, 1030, Rel.
Min. Marco Aurélio).
381
Nesse passo, o que se pu
gna não é a ingerência de um Poder sobre
outro, mas sim de que os atos praticados pelas funções administrativa e
legislativa respeitem as determinações e recomendações constitucionais
aplicáveis à espécie, bem como os direitos fundamentais de seus cidadãos
, o
que, evidentemente, só poderá ser definitivamente conseguido com a firme
interveniência judicial, como bem vaticina o insigne jurista Caio Tácito, para quem:
[...] se inexiste o motivo, ou se dele o administrador extraiu
conseqüências incompatíveis co
m o princípio de direito aplicado, o
ato será nulo por violação da legalidade. Não somente o erro de
direito, como o erro de fato autorizam a anulação jurisdicional do
ato administrativo. Negar ao juiz a verificação objetiva da matéria
de fato, quando infl
uente na formação do ato administrativo, será
converter o Poder Judiciário em mero endossante da autoridade
administrativa, substituir o controle da legalidade por um processo
de referenda extrínseco.
382
Vale rememorar, nesse sentido, o escorreito posiciona
mento propagado
por García de Enterría, para quem:
[...]
el control de la discrecionalid por los principios generales hace
al juez administrativo atenerse a su más estricta función de
defensor del orden jurídico. Hay que decir que en parte alguma del
Orde
namiento la apelación a los principios generales es más
necesaria que en el Derecho Administrativo. El Derecho
Administrativo es el campo más fértil de la legislación contingente
y ocasional, de las normas parciales y fugazes; sobre lo cual
tendremos más t
arde ocasión de reflexionar. Ante ello no hay la
menor posibilidad de una jurisprudencia y de una ciencia
estrictamente exegética, ni por verdadera reducción al absurdo,
por inesperado ‘embarras de richesse’, es posible sostener que el
Derecho Administrati
vo sea la suma de todo ese conjunto
inacabable de normas en perpetuo fieri, cuyas notorias y graves
deficiencias no alcanzan a compensarse (antes bien, resultan
381
STF, ADIN nº 2.661
-
5, MA, Tribunal Pleno, Relator: Ministro Celso de Mello, j. 05/06/02, DJU
12/06/02, v.u.
382
TÁCITO, Caio.
Direito administrativo
.
3ª ed. São Paulo: Jurídica, 2005, p. 60.
2
2
7
7
9
9
potenciadas) por la agrupación o reunión de todas ellas. Más que
parte alguna resulta aquí evi
dente que sin un esqueleto de
principios generales capaz de insertar y articular en un sistema
operante y fluido ese caótico y nunca reposado agregado de
normas, el Derecho Administrativo, ni como ordenación a aplicar,
ni como realidad a comprender, ni, co
nsecuentemente, como
ciencia sería posible
.
383
José Celso de Mello Filho afirma:
[...] o estudo da organização estatal repousa, basicamente, na
análise do fenômeno do poder. A questão do Estado é, por
essência, a questão do poder. Não se pode conceber a ex
istência
do Estado sem a presença do poder. Com o surgimento do Estado
Moderno, nos séculos XV e XVI, inicia
-
se o processo de
institucionalização do poder, que deste elimina o caráter pessoal e
patrimonial. O poder estatal, em sua concepção primeira, depoi
s
superada pela evolução histórica do processo de governo, era
visto como pertencente ao Príncipe, ao Soberano, aos
Governantes. Essa patrimonialização do poder, que o reduzia a
uma dimensão meramente pessoal de seu exercente, configurou
prática medieval o
rdinária. É o período histórico em que se deu o
exercício difuso do poder. Lentamente, contudo, despersonaliza
-
se o poder, cuja prática é deferida a órgãos e instituições criados
e aparelhados para esse fim. Para GERGES BURDEAU, em
lapidar observação, o Es
tado é o poder institucionalizado. Esse
momento, de radicais transformações, sobrevém com o
Renascimento, em plena Idade Moderna. Outro passo, de grande
importância, traduziu
-
se no processo de racionalização do poder,
que evidenciou a sistematização, em ba
ses jurídicas, da vontade
social de instituir limitações e controles sobre o exercício dessa
suprema prerrogativa estatal. O poder absoluto, exercido pelo
Estado sem quaisquer restrições, inviabiliza, numa comunidade
estatal concreta, a prática efetiva das
liberdades públicas. A
sujeição do poder estatal a regras jurídicas preestabelecidas pela
sociedade civil é conseqüência necessária da técnica da
racionalização, que visa, em última análise, por meio de
mecanismos de controle, a impedir, no processo gover
namental, o
abuso do poder.
384
Ademais, ainda que se pudesse argumentar que os atos praticados pela
Administração Pública
sobretudo em se tratando de políticas públicas voltadas à
defesa dos direitos e interesses de crianças e adolescentes
tenham nature
za
meramente discricionária, tal situação em nada muda a viabilidade de sindicância
383
ENTERRÍA, Eduardo García de. La lucha vontra las inmunidades del poder
.
Madri: Civitas,
2005, p. 44
-
45.
384
MELLO FILHO, José Celso de.
Const
ituiçã
o Federal anotada
. 2ª ed. ampl. São Paulo:
Saraiva, 1986, p. 21.
2
2
8
8
0
0
judicial, haja vista que a própria
Lex Legum
preconiza o princípio da
inafastabilidade do Judiciário.
385
5.1
O Estado e seu Dever Inafastável de Concretização do
Direito Fu
ndamental à Convivência Familiar e Comunitária
de Crianças e Adolescentes
Como já visto alhures, a ordem constitucional inaugurada em 05 de
outubro de 1988 implantou uma nova visão no que se refere à atuação estatal,
principalmente no que pertine à concr
etização e à efetivação de direitos
fundamentais afetos aos seus cidadãos, incluindo
-
se em tal rol, por óbvio, aqueles
genérica e especificamente pertencentes às crianças e aos adolescentes.
Desta feita, não se vislumbra, salvo melhor juízo, qualquer poss
ibilidade
de redução no que se refere ao dever estatal de garantir a concretização do
direito de convivência familiar e comunitária pertencente a crianças e
adolescentes, na exata medida em que tal se mostra essencial e fundamental ao
desenvolvimento digno
e escorreito dos referidos infantes, até porque, como bem
ilustra Luiz Edson Fachin:
[...] o homem é histórico, tem de contruir
-
se a si mesmo, colocado
entre outros homens e os objetos, condicionado pelo passado e
projetando
-
se para o futuro. O ser human
o só pode ser
apreendido em sua dimensão coexistencial, uma vez que a vida
sem os outros nada mais do que uma abstração, afastada da
realidade. Existir é, pois, estar no mundo justamente com os
outros e com as coisas.
386
De fato, a partir do referido marco
histórico não mais se aceita, ou, pelo
menos, não mais se deveria aceitar a possibilidade de se relegar ao descaso os
385
TJRN, Apelação em Mandado de Segurança nº 1.422, Relator: Desembargador Seabra
Fagundes: “O exercício da função ou cargo de qualquer autoridade não pode e nem deve ser
exercido arbitrariame
nte, ultrapassando os pressupostos legais que lhes cumpre obedecer.
Por conseguinte, quando a autoridade entende agir daquele modo, cabe à Justiça lhe corrigir
os desmandos e amparar aqueles que foram atingidos pela violência, pela arbitrariedade”.
386
FACHI
N, Luiz Edson.
Estatuto jurídico do patrimônio mínimo
. 2ª ed. atual. Rio de Janeiro:
Renovar, 2006, p. 45
-
46.
2
2
8
8
1
1
princípios e objetivos fundamentais encampados pela Lei Política no momento de
interpretação e de aplicação da norma jurídica ao caso conc
reto, isto é, na
solução dos conflitos de interesses vivenciados em nosso meio social,
387
a fim de
que se mantenha em prestígio, também, o vetor maior da dignidade humana.
388
A concreção dos princípios e objetivos fundamentais da República
perpassa, sem sombra de dúvidas, pela necessidade de que seja verificada, no
meio social, a vivificação do princípio da igualdade, mormente no que diz respeito
ao deferimento das condições mínimas de subsistência física e psicológica aos
cidadãos que formam o Estado brasilei
ro, circunstância essa que vem ao
encontro do postulado mor da dignidade humana, razão pela qual, em análise ao
citado vetor, afirma Jussara Maria Moreno Jacintho:
[...] a dignidade, em relação a todos os direitos, assume a função de
norte, de fronteira ou de alicerce na concretização de todo e qualquer
direito. Muitas vezes tais direitos são concretizações mediatas e
remotas do princípio da dignidade humana, cuja materialização deve
ser sempre considerada através da realização próxima da dignidade
humana,
aqui considerada como padrão ético máximo.
389
Há que se ressaltar, ainda, que a adoção de políticas públicas referentes
ao atingimento e concretização dos citados princípios e objetivos fundamentais da
República não se reveste de caráter discricionário,
390
m
as sim de natureza
387
MOREIRA, Helena Delgado Ramos Fialho.
Poder judiciário no Brasil
: crise de eficiência.
Curitiba: Juruá, 2004, p. 21: “A falha dos mecanismos estatais em assegurar uma prestação
segura e eficiente de serviços judiciais, no entanto, a par de não espelhar uma realidade
propriamente nova, vem agora ganhando um especial relevo que não apenas a torna ma
questão extremamente atual, como traduz
-
se em um r
eflexo positivo de uma progressiva
conscientização social, na medida em que a cobrança pela realização do
justo
é um anseio
próprio da cidadania”.
388
BOGNETTI, Giovanni; COTTA, Sergio; FERRI, Giovanni Battista
et al
.
Diritti fondamentali
dell’uomo
. Roma: Gi
uffrè, 1977, p. 78
-
79: “
È questo valore della persona umana e il suo
modo di essere che è inviolabile; immutabilmente inviolabile perché immutabile è il ruolo che
l’uomo svolge in rerum natura
”.
389
JACINTHO, Jussara Maria Moreno.
Dignidade humana
: princípio
constitucional. Curitiba:
Juruá, 2004, p. 138.
390
ANTUNES, Luís Felipe Colaço.
Para um direito administrativo de garantia do cidadão e
da administração: tradição e reforma
. Coimbra: Almedina, 2000, p. 95
-
96: “Se à
Admonistração caberá sempre, em respeito à sua liberdade e autonomia, o poder de emanar
a decisão, já não nos repugna que ao juiz caiba a responsabilidade de eleger, de acordo com
o paradigma normativo previamente elaborado, a norma aplicável ao caso concreto, sendo
certo que, no âmbito da discric
ionariedade, o controlo jurisdicional não incide sobre o uso do
poder, mas, diferentemente, sobre o conteúdo do exercício do poder administrativo, isto é,
sobre o modo como vem exercitado”.
2
2
8
8
2
2
jurídica de ato administrativo vinculado, não podendo o agente público e/ou
político, por via de conseqüência, se furtar ao cumprimento de tal desiderato, sob
pena de ser responsabilizado pela referida omissão.
391
Isso porque resta indene
de dúvidas o fato de que a criação,
implementação e execução das políticas públicas não pode ficar aos exclusivos
alvedrio e talante de nossos governantes, na exata medida que, por tratarem de
direitos fundamentais, não há como se tolerar a inércia e a om
issão do Poder
Público em casos tais, pois, se assim fosse possível, estar
-
se
-
ia reduzindo tão
importante conteúdo constitucional a mero e inaceitável exercício de retórica, o
que acabaria por redundar no mais completo e irrestrito obstáculo ao exercício d
e
prerrogativas que são inerentes à simples e indispensável condição de cidadão,
até porque, como bem salienta Fernando Facury Scaff, “[...] as lesões não são
distribuídas de forma igual por todos e o Estado não é (mais) Zeus atirando raios
sobre todos os
mortais, como na época de sua irresponsabilidade. Ele deve ser
responsabilizado pelos atos que comete”.
392
Noutro giro verbal, sem a efetivação das chamadas políticas públicas não se
verifica, no plano da concreção, a dignidade da pessoa humana e sem a veri
ficação da
dignidade da pessoa humana não se tem absolutamente nada, quanto mais dentro de
um Estado que se julga Constitucional e Democrático, valendo acrescentar, por
oportuno, a profícua lição encampada por Rogério Gesta Leal:
[...] a administração púb
lica de demandas sociais precisa ser,
primeiro, compreendida a partir de uma nova perspectiva teórico
-
social, viabilizadora de uma racionalidade civilizatória e complexa
de inclusão e compromisso comunitário; segundo, precisa ser
391
FIGUEIREDO, Ivanilda.
Políticas públicas e a realização dos dire
itos sociais
. Porto
Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2006, p. 165
-
166: “A crescente importância dada à
concretização dos direitos sociais alçou as políticas públicas a objeto de estudo dos juristas.
Se, antes, a crítica das políticas públicas residia
tão somente entre as preocupações de
sociólogos e, especialmente, de cientistas políticos. Nos tempos atuais, quando as
Constituições (vide os seguintes artigos da Carta brasileira: 3º, 6º, 7º, 129 (inc. III) e as
disposições da Ordem Social da Carta brasi
leira) e a Normativa Internacional, (veja
-
se a
Convenção do Milênio) ocupam
-
se não só em enunciar os direitos sociais, mas também em
impor metas e desígnios para assegurar a efetividade dos mesmos, passou
-
se
gradativamente a exigir a imersão dos juristas n
a aferição da adequação do desenho dos
programas de ação governamental às normas jurídicas, em especial, à Constituição”.
392
SCAFF, Fernando Facuri.
Responsabilidade civil no Estado intervencionista
. 2ª ed. rev. e
ampl. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 261
.
2
2
8
8
3
3
vista como espaço permanen
te de controle e participação social
no âmbito da gestão dos interesses públicos.
393
De acordo com a Constituição Federal e com o Estatuto da Criança e do
Adolescente, o Estado deve priorizar políticas públicas que venham ao encontro
da efetivação dos direi
tos e interesses dos infantes, o que, sem sombra de
dúvidas, perpassa pela questão da fortificação do seio familiar, o que redunda no
integral cumprimento do comando impresso no
caput
do Art. 226 da referida Lei
de Outubro.
Inegavelmente, a concreção do d
ireito fundamental de convivência
familiar e comunitária a crianças e adolescentes diz respeito, também, à imediata
e correta adoção das políticas públicas condizentes com a envergadura e a
importância da questão, de modo que se saia do papel e se chegue à
ação, razão
pela qual não é permitido ao Estado deixar correr ao largo seu dever de
concreção em relação a tais atitudes e deveres que, em verdade, lhe são
intrínsecos e inafastáveis.
394
Noutro giro verbal e de acordo com Cezar Luiz Pasold, “[...] o Estado
tem a obrigação de executar, respeitando, valorizando e envolvendo seu
SUJEITO, atendendo o seu OBJETO e realizando seus OBJETIVOS, sempre
com a prevalência do social e privilegiando os Valores fundamentais do Ser
Humano”.
395
393
LEAL, Rogério Gesta.
Estado, administração pública e sociedade
: novos paradigmas.
Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006, p. 57.
394
Nesse diapasão, tem
-
se o escorreito posicionamento de Cristina Queiroz, no sentido que “[...]
os direitos fundamentais são ‘direitos constitucionalmente garantidos’ (
verfassungsgesetzliche
gewährleistete Rechte
), que não devem, em primeira linha, ser compreendidos numa
dimensão ‘técnica’ de limitação ao poder do Estado. Devem, antes, serem compreendidos e
inteligidos como
elementos definidores e legitimadores de toda a ordem jurídica positiva.
Proclamam uma ‘cultura jurídica’ e ‘política’ determinada
numa palavra, um concreto e
objetivo ‘sistema de valores’. A constituição é desde então percebida não apenas como
‘ordem
-
qu
adro’ para a ação (
Rahmenordnung
), que o legislador se vê obrigado a respeitar,
mas, ainda, como base e fundamento de toda a ordem jurídica. Um ‘sistema de valores’
constituído não apenas com base nos ‘direitos fundamentais’, mas ainda noutros princípios
constitucionais, como o princípio do ‘Estado de Direito’ ou o princípio do ‘Estado Social’. Esse
elemento de sociabilidade aponta para uma intervenção estadual não apenas como ‘limite’,
mas ainda como ‘fim’ ou ‘tarefa público
-
estadual’, ordenando concretos ‘deveres de proteção’
(
Schutzpflichte
) a cargo do Estado”.
395
PASOLD, Cesar Luiz.
Função social do Estado contemporâneo
. 3ª ed. rev. atual e ampl.
Florianópolis: OAB/SC, 2003, p. 92
-
93.
2
2
8
8
4
4
Obviamente que a concreção dos direitos fundamentais pelo Estado não é
tarefa das mais simples e muito menos das mais fáceis, haja vista a ocorrência de
uma série de fatores que acabam servindo de entrave ao atingimento do referido
desiderato, tais como: pluralidade social, conflitos de
interesses dos mais diversos
setores, escassez das finanças públicas, malversação do dinheiro público, excesso
de burocracia nos trâmites administrativos, lentidão na solução das demandas
propostas perante o Poder Judiciário, dentre tantos outros males.
396
Nesse passo, tem
-
se, acertadamente, que em Direito nada pode ser
considerado de modo absoluto, sob pena de ser tornarem válidas as palavras
imortalizadas pelo jurisconsulto Cícero no sentido de que
o excesso de justiça
sempre acarreta injustiça
.
Entretan
to, há que se registrar, mesmo diante da necessidade de
observância do citado princípio, que não está permitido ao Estado valer
-
se de
conduta que acabe por gerar omissão ou grave ofensa aos direitos fundamentais
condizentes ao mínimo existencial do indivíduo, sob a argumentação da escassez
de recursos, ainda mais ao se levar em consideração que tal posicionamento nem
sempre corresponde à realidade dos fatos,
397
de modo que, nesses casos e sem
396
AMARAL, Gustavo.
Direito, escassez e escolha
: em busca de critérios j
urídicos para lidar
com a escassez de recursos e as decisões trágicas. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 37
-
39:
“[...] imaginar que não haja escolhas trágicas, que não haja escassez, que o Estado possa
sempre prover as necessidades nos parece uma questão d
e fé, no sentido de que lhe dá o
escritor aos Hebreus: a certeza de coisas que se esperam, a convicção de fatos que não se
vêem, ou numa negação total aos direitos individuais. Se o Estado está obrigado a sempre ter
recursos para prestar as utilidades que
lhe são demandadas, há que se reconhecer o direito
de obter esses recursos. Mas seja no campo da receita pública, seja no campo da própria
contenção de gastos, há direitos individuais, como as garantias tributárias, a vedação ao
confisco, o direito à perce
pção dos vencimentos e dos proventos. Indo um pouco além, se
poderia dizer que a Constituição não faz distinção entre doenças, e, assim, os que
necessitam de transplante têm o direito de obter o tratamento eficaz, o transplante. Mas como
o Estado poderá ob
ter os meios sem ser, novamente, da sociedade através da retirada de
órgãos daqueles que estão com morte cerebral diagnosticada?”.
397
CLÈVE, 2004, p. 222: “[...] há determinados direitos fundamentais sociais de caráter
prestacional que apresentam uma dimensão subjetiva frágil. Outros, desde logo, apresentam
-
se com uma dimensão subjetiva forte. E é por isso que a doutrina contempla, ainda, uma
outra distinção, envolvendo os direitos prestacionais originários e direitos prestacionais
derivados. Os direitos pre
stacionais originários seriam aqueles que permitem desde logo ao
intérprete encontrar na disposição constitucional uma dimensão subjetiva forte. Portanto, são
direitos desde logo usufruíveis pelo cidadão e que, por isso, podem, mesmo sem
regulamentação, ser reclamados perante o Poder Judiciário. Outros, ao contrário, são direitos
prestacionais derivados, porque no campo constitucional, produzem uma dimensão subjetiva
fraca, que demanda portanto atuação do legislador”.
2
2
8
8
5
5
qualquer infringência à separação dos Poderes, deverá ser invocada
a tutela
jurisdicional, a fim de que se conceda ao cidadão prejudicado intervir no ilícito,
recebendo a prestação positiva (
Teilhaberecthe
) que lhe foi injustamente
obliterada.
Isso porque, no Brasil, virou moda referir
-
se à ausência de recursos
financeiros toda vez que a prestação positiva, embora de natureza fundamental e
indispensável, não se apresente como um bom
cabo eleitoral
do agente público
que deve executá
-
la.
Todavia, todos os dias, a sociedade é inundada por denúncias e
informações que os repr
esentantes populares malversam, constantemente, as
finanças públicas, como bem ilustram os exemplos afetos as Comissões
Parlamentares de Inquérito que apuraram as ilicitudes alcunhadas de
mensalão
e
sanguessugas
, e a sorrateira tentativa de majoração dos
v
encimentos dos parlamentares em patamar de 91%, enquanto que, para se
aumentar o salário mínimo em R$ 30,00 (trinta reais), precisou
-
se de uma força
de Hércules, não se deslembrando, infelizmente, que tais atitudes estão longe
de serem inéditas.
398
Para o mal, parece
-
nos que sempre há dinheiro.
De fato, a discussão que se coloca como maior bloqueio para a
intervenção judiciária em casos tais, em face da propalada escassez de recursos
financeiros e das conseqüências orçamentárias que o ente estatal poderá
ex
perimentar, diz respeito à necessidade de adoção da teoria nominada de
reserva do possível
.
398
TORRES, Ricardo Lobo (org.).
O orçame
nto na Constituição
. Rio de Janeiro: Renovar,
1995, p. 35: “Os tristes episódios de corrupção ocorridos em 1993, apurados pela CPI do
Congresso Nacional, têm que levar à retomada da consciência ética neste País com relação
ao dinheiro público e ao orçament
o. Mas a ética no orçamento não se exaure nos trabalhos
da CPI, posto que o caso da corrupção é de polícia, de aplicação do Código Penal, e não
simplesmente de sanção moral. É forçoso reconhecer que a problemática da falta de ética na
elaboração do orçamen
to brasileiro é muito mais ampla e profunda e deriva sobretudo do
abandono da idéia de justiça. Não basta que o orçamento seja juridicamente correto,
elaborado de acordo com as regras constitucionais; é necessário que seja eticamente justo”.
2
2
8
8
6
6
Isso porque é inegável que a consecução, a concretização e a satisfação
dos direitos fundamentais de prestação, como visto, está a demandar, não raras
vezes, a disp
onibilização de meios materiais, os quais têm por característica a
finitude, trazendo consigo a problemática da escassez.
Gustavo Amaral, traduzindo o pensamento de Jon Elster, pondera:
[...] dizer que um bem é escasso significa que não há o suficiente
p
ara satisfazer a todos. A escassez pode ser, em maior ou menor
grau, natural, quase
-
natural, ou artificial. A escassez natural
severa aparece quando não há nada que alguém possa fazer para
aumentar a oferta. Pinturas de Rembrandt são um exemplo. A
escassez
natural suave ocorre quando não há nada que se possa
fazer para aumentar a oferta a ponto de atender a todos. As
reservas de petróleo são um exemplo, a disponibilização de
órgãos de cadáveres para transplante é outra. A escassez quase
-
natural ocorre quand
o a oferta pode ser aumentada, talvez a
ponto de satisfação, apenas por condutas não coativas dos
cidadãos. A oferta de crianças para adoção e de esperma para
inseminação artificial são exemplos. A escassez artificial surge
nas hipóteses em que o governo pode, se assim decidir, tornar o
bem acessível a todos, a ponto da satisfação. A dispensa do
serviço militar e a oferta de vagas em jardim da infância são
exemplos.
399
É evidente que a questão de concretização de direitos fundamentais (e,
aliás, de qualquer
direito) implica, necessariamente, que o Estado detenha em
seu poder saldo pecuniário suficiente a tal desiderato, de modo que não há como
se desprender a análise do tema central deste trabalho, com o estudo, ainda que
resumido, da função orçamentária em n
osso sistema jurídico.
Como bem salientou Luhmann, citado por Ricardo Lobo Torres, o
dinheiro “[...] é um símbolo genérico que permite a comunicação conducente à
satisfação das necessidades”, ocupando “um lugar aberto para os direitos
fundamentais”.
400
Con
siderando
-
se a existência de limitações de ordem econômica e
financeira à efetivação dos direitos sociais, passou
-
se a sustentar, como dito, que
399
AMARAL, 2001
, p. 133
-
134.
400
TORRES, 1995, p. 277.
2
2
8
8
7
7
estes estariam condicionados ao que se convencionou chamar de reserva do
possível.
A chamada
reserva do possív
el
, diz respeito a um conceito originário da
Alemanha, baseado em paradigmática decisão da Corte Constitucional Federal,
no julgamento de famoso caso (BverfGE nº 33, S. 333)
,
em que havia, por parte
de um determinado cidadão, a pretensão de ingresso no ensino superior público,
embora não existissem vagas suficientes, com espeque na garantia da Lei
Federal alemã de liberdade de escolha da profissão.
Assim, firmou
-
se posicionamento naquele tribunal constitucional no
sentido de que o indivíduo só pode requerer do Estado uma prestação que se dê
nos limites do razoável, ou seja, naquela que atenda aos requisitos objetivos para
sua fruição.
Tomando por base referida explicação, e embora resida, primariamente,
nos Poderes Legislativo e Executivo, a prerrogativa d
e formular e executar
políticas públicas, revela
-
se possível, no entanto, ao Poder Judiciário, determinar,
ainda que em bases excepcionais, sejam estas implementadas pelos órgãos
estatais inadimplentes, cuja omissão
por importar em descumprimento dos
enc
argos político
-
jurídicos que sobre eles incidem em caráter mandatório
mostra
-
se apta a comprometer a eficácia e a integridade de direitos sócias e
culturais impregnados de estrutura constitucional.
Vale lembrar aqui, o posicionamento do Supremo Tribunal Federal sobre
o tema em debate, traduzido pelo luzeiro voto da lavra do Ministro Celso de Mello,
quando do julgamento da ADPF 45 MC/DF,
401
no qual se deixou assente de
dúvidas de que:
[...] a meta central das Constituições modernas, e da Carta de
1988 em p
articular, pode ser resumida, como já exposto, na
promoção do bem
-
estar do homem, cujo ponto de partida está em
assegurar as condições de sua
própria dignidade, que inclui, além
401
Decisão publicada no DJU de 04/05/04.
2
2
8
8
8
8
da proteção dos direitos individuais, condições materiais mínimas
de existênc
ia. Ao apurar os elementos fundamentais dessa
dignidade (o mínimo existencial), estar
-
se
-
ão estabelecendo
exatamente os alvos prioritários dos gastos públicos. Apenas
depois de atingi
-
los é que se poderá discutir, relativamente aos
recursos remanescentes,
em que outros projetos se deverá
investir. O mínimo existencial, como se vê, associado ao
estabelecimento de prioridades orçamentárias, é capaz de
conviver produtivamente com a reserva do possível.
Em verdade, mormente em países de natureza periférica, co
mo o Brasil,
quando se verificar, no que se refere à realização dos direitos fundamentais
sociais, um embate entre os princípios da reserva do possível e do mínimo vital,
deve se dar mais vazão a este último, haja vista que, em se procedendo à
ponderação d
e tais, chega
-
se à inexorável conclusão de que é melhor prestigiar
-
se a dignidade do indivíduo do que a tábua orçamentária do Estado ou, como diz
Alexy, “[...] direitos individuais podem ter mais pesos que as razões da política
financeira”.
402
A referida po
nderação entre os vetores acima mencionados deve ser
levada a efeito considerando
-
se os princípios da razoabilidade e da
proporcionalidade.
403
No que tange aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade,
404
necessário se faz mencionar que em razão da
tênue linha que os separa e da
inegável interdependência da aplicação ao caso concreto, alguns doutrinadores
402
THEODORO, Marcelo Antonio.
Direitos fundamentais & sua concretização
. Curitiba:
Juruá, 2006, p. 121.
403
MEDAUR, Odete.
Direito administrativo moderno
. 6ª ed. rev. e atual. São P
aulo: Revista
dos Tribunais, 2002, p. 158.
404
Ibidem, mesma página: “Alguns autores pátrios separam proporcionalidade e razoabilidade. A
esta atribuem o sentido de coerência lógica nas decisões e medidas administrativas, o
sentido de adequação entre meios e
fins. À proporcionalidade associam um sentido de
amplitude ou intensidade nas medidas adotadas, sobretudo nas restritivas e sancionadoras.
No direito estrangeiro, o ordenamento norte
-
americano e o argentino, por exemplo, operam
com a razoabilidade. Os ord
enamentos europeus, sobretudo alemão e francês, utilizam o
princípio da proporcionalidade. A Corte de Justiça da União Européia afirmou como princípio
comunitário da proporcionalidade. Parece melhor englobar no princípio da proporcionalidade
o sentido de r
azoabilidade. O princípio da proporcionalidade consiste, principalmente, no
dever de não serem impostas, aos indivíduos em geral, obrigações, restrições ou sanções em
medida superior àquela estritamente necessária ao atendimento do interesse público,
segun
do critério de razoável adequação dos meios aos fins. Aplica
-
se a todas as atuações
administrativas para que sejam tomadas decisões equilibradas, refletidas, com avaliação
adequada da relação custo
-
benefício, aí incluído o custo social”.
2
2
8
8
9
9
não fazem distinção entre os termos, empregando
-
os de maneira conjunta, sob a
alcunha de princípio da proporcionalidade.
Inescondível se mostra o fato de que o princípio da razoabilidade guarda
estreita relação com o postulado atinente ao devido processo legal no que tange
ao aspecto substancial (material) deste último, em razão de previsão expressa
contida na
Magna Charta Libertatum
, outorgada no l
ongínquo 15 de junho de
1215 por intermédio do conhecidíssimo João Sem
-
Terra, a qual se encontra em
vigor até os dias atuais.
405
O direito fundamental à convivência familiar e comunitária, bem como o
acesso a instrumentos que mitiguem tal impossibilidade de
concreção, fazem
parte do chamado
mínimo vital
, tendo prevalência, assim, sobre
a reserva do
possível
.
Pelo quanto visto anteriormente, tais situações se coadunam com a
natureza e com a extensão protetiva e de aplicabilidade imediata, eis que
apresentam
caráter prestacional de dimensão subjetiva forte, razão pela qual, em
tais hipóteses, é plenamente cabível a intervenção judicial positiva quando a
omissão estatal na sua consecução se fizer presente.
Reforce
-
se que, em casos tais, a intervenção do Judici
ário em face da
omissão inconstitucional das demais esferas do Poder, em muitas das vezes, se
converte no último bastião e na última saída para amenizar a sofrida situação das
classes menos abastecidas de nosso País, que buscavam na atuação política de
seu
s representantes a possibilidade de bem
-
estar e foram frustrados pela inércia
social que tomou conta de nossas autoridades.
405
Item 12: A não s
er para resgate da nossa pessoa, para armar cavaleiro o nosso filho mais
velho e para celebrar, mas uma única vez, o casamento de nossa filha mais velha; e esses
tributos não excederão limites razoáveis. De igual maneira se procederá quanto aos impostos
da
cidade de Londres. Item 20: A multa a ser paga por um homem livre, pela prática de um
pequeno delito, será proporcional à gravidade do delito; e pela prática de um crime será
proporcional ao horror deste, sem prejuízo do necessário à subsistência e posição do infrator
(contenementum); a mesma regra valerá para as multas a aplicar a um comerciante e a um
vilão, ressalvando
-
se para aquele a sua mercadoria e para esse a sua lavoura; e, em todos
os casos, as multas serão fixadas por um júri de vizinhos honesto
s.
2
2
9
9
0
0
Essa também parece ser a visão do Supremo Tribunal Federal, haja vista
que seu Pleno deliberou no sentido de que:
[...] o desrespei
to à Constituição tanto pode ocorrer mediante ação
estatal quanto mediante inércia governamental. A situação de
inconstitucionalidade pode derivar de um comportamento ativo do
Pode Público, que age ou edita normas em desacordo com o que
dispõe a Constituiç
ão, ofendendo
-
lhe, assim, os preceitos e os
princípios que nela se acham consignados. Essa conduta estatal,
que importa em um facere (atuação positiva), gera a
inconstitucionalidade por ação. Se o Estado deixa de adotar as
medidas necessárias à realização
concreta dos preceitos da
Constituição, em ordem a torná
-
los efetivos, operantes e
exeqüíveis, abstendo
-
se, em conseqüência, de cumprir o dever de
prestação que a Constituição lhe impôs, incidirá em violação
negativa do texto constitucional. Desse non face
re ou non
praestare, resultará a inconstitucionalidade por omissão, que pode
ser total, quando é nenhuma a providência tomada, ou parcial,
quando é insuficiente a medida efetivada pelo Poder Público. A
omissão do Estado
que deixa de cumprir, em maior ou
menor
extensão, a imposição ditada pelo texto constitucional
qualifica
-
se como comportamento revestido de maior gravidade político
-
jurídica, eis que, mediante inércia, o Poder Público também
desrespeita a Constituição, também ofende direitos que nela se
fundam e também impede, por ausência de medidas
concretizadoras, a própria aplicabilidade dos postulados e dos
princípios da Lei Fundamental.
406
Esclarecedora, também, a decisão proferida no âmbito do Tribunal
Constitucional Português, Acórdão nº 509/2002/T
. Const.
Processo nº
768/02.
407
O caso submetido ao Tribunal Constitucional Luso subsumia
-
se à
apreciação da constitucionalidade ou não do surgimento ao mundo jurídico
do Art. 4º, nº 01, do Decreto da Assembléia da República nº 18/IX, requerida
pelo Presi
dente da República no uso de suas atribuições, cujo diploma tinha
por escopo proceder à revogação do
rendimento mínimo garantido
previsto
pela Lei nº 19
-
A/96, de 29 de junho, bem como a criação do
rendimento
social de inserção
, sendo certo que a diferença
entre uma e outra situação,
residia no fato de que, na norma que se pretendia revogar, encontrava
-
se
406
STF, Pleno, Relator:Ministro Celso de Mello, RTJ nº 185, p. 794
-
796.
407
Diário da República
I Série A, nº 36, de 12/02/03, p. 905
-
917.
2
2
9
9
1
1
reconhecido que a titularidade do direito à prestação de rendimento mínimo
se encontrava afeta aos indivíduos com idade igual ou superior a 18
(dezoito) an
os, ao passo que a lei nova concedia o direito à prestação de
rendimento social de inserção apenas às pessoas com idade igual ou
superior a 25 (vinte e cinco) anos.
Noutro giro verbal, tem
-
se que a discussão acerca da
compatibilidade da nova lei em relação ao texto constitucional residia em
saber
-
se se a decantada restrição objetiva no que se refere à titularidade do
direito em tela se mostrava possível diante da necessidade de observância
de suas normas e princípios, salientando
-
se que, por maioria de vot
os, o
Tribunal Constitucional Português houve por bem decretar a
inconstitucionalidade do dispositivo do novel diploma, por entender que a
alteração restritiva alinhavada no parágrafo anterior consistia numa
violação, num malferimento, ao direito inerente
a todo cidadão, ainda mais
ao se atentar para a peculiar condição das pessoas legitimadas a tal
pretensão, de resguardo de um mínimo de existência condigna inerente ao
princípio do respeito à dignidade humana, afastando, por conseguinte, a
aplicação enclau
surante do princípio da reserva do possível.
De mais a mais, cabe ressaltar, por oportuno, que o
tipo de escassez
aqui
representado, adotando
-
se a classificação já exposta de Elster, é artificial, ou
seja, o Estado, em querendo, tem condições de tornar o
bem da Cida em
discussão acessível a todos, a ponta da satisfação.
Não socorre o Estado o argumento de que, supostamente, não
haveria dinheiro para a execução das políticas públicas outrora assumidas,
na exata medida em que foi o próprio Estado, por inter
médio de maus
administradores e pela malversação de verbas públicas, quem deu causa à
referida ausência.
Assim, deve ser aplicado o vetusto brocado latino
nemo potest venire
contra factum proprium
, isto é, ao Estado não é dado se opor a fato que ele
2
2
9
9
2
2
mesmo
deu causa. É a chamada proibição de comportamento contraditório,
408
cujo postulado está embasado no princípio e na necessidade de tutela da
confiança, não se deslembrando, como bem informa Fredie Didier Júnior, que:
[...] a teoria do direito civil vem pass
ando por mudanças muito
profundas, notamente após a percepção de que o direito civil deve
ser estudado e aplicado à luz do texto constitucional. Não
bastasse isso, a nova doutrina civilista vem afirmando a
necessidade de emprestar, ao conteúdo das normas j
urídicas
civis, um sentido que resgate o papel da ética no Direito.
Manifestação clara desta tendência é a consagração, em nível de
direito positivo, da cláusula geral boa
-
fé objetiva, norma de
conteúdo aberto, que deve orientar as relações contratuais. A
cláusula geral da boa
-
fé objetiva está em consonância com o
princípio da solidariedade, objetivo fundamental da República (Art.
3º, inc. I, CF/88), e tem profundo conteúdo ético. O conteúdo
desta cláusula é, como se disse, aberto. Um dos seus aspectos,
que
também vem sendo resgatado neste estádio do
desenvolvimento da teoria do direito civil, é a proibição do venire
contra factum proprium (a proibição de comportamento
contraditório), princípio cujo valor que o inspira é proteção da
confiança nas relações pe
ssoais.
409
Não se nega que a adoção de políticas públicas não se apresenta como
algo de fácil implantação e que tenha o condão de produzir todos os seus efeitos
de uma hora para outra, mas, não se pode deslembrar que tais se constituem em
dever do Estado, n
a exata medida em que se convertem em valioso e
indispensável instrumento de mitigação das desigualdades materiais
apresentadas em nossa sociedade, emergindo, daí, que tem ele a inafastável e
fundamental obrigação de prover o mínimo existencial do cidadão, não podendo
408
SCHREIBER, Elisabeth.
Os direitos fundamentais da criança na violência intrafamiliar
.
Porto Alegre: Ricardo Lenz Editor, 2001, p. 202: “Ao tratar do fundamento normativo do nemo
potest venire contra factum proprium, sustentou
-
se sua inserção no âmbito da cláusula geral
de boa
-
fé objetiva, suscitando
-
se, então, a questão da sua aplicabilidade a relações de direito
púb
lico. Afirmou
-
se que a boa
-
fé objetiva, como expressão e valores constitucionais, deve se
aplicar a toda espécie de relações. Não obstante, mesmo aqueles que restringem a
aplicabilidade da boa
-
fé objetiva às relações privadas, devem admitir a incidência do princípio
da proibição de comportamento contraditório em relações de direito público, seja como
expressão de institutos verdadeiramente publicísticos (como a moralidade administrativa e a
igualdade dos administrados em face da Administração Pública) ou como resultado da direta
aplicação do valor constitucional da solidariedade social. A análise de casos mostra que a
tudo isto se conforma a nossa jurisprudência”.
409
DIDIER Júnior, Fredie. Alguns aspectos da aplicação da proibição do venire contra factum
prop
rium
no processo civil. In: FARIAS, Cristiano Chaves de.
Leituras complementares de
direito civil
: o direito civil
-
constitucional em concreto. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2005, p. 199.
2
2
9
9
3
3
para se eximir de tal mister, invocar a doutrina da reserva do possível, cabendo,
repita
-
se, ao Judiciário a total liberdade de corrigir referida distorção.
410
Assim, verifica
-
se, para logo, que a matéria orçamentária tem manifesta
imbricação c
om a consecução dos direitos fundamentais, haja vista que é o
próprio texto maior quem explicita os vetores afetos ao equilíbrio orçamentário, à
distribuição de competências, à criação e cobrança de tributos, à realização de
gastos, exigindo controle periódico por parte do Legislativo, das Cortes de Contas
(e da sociedade como um todo), além de estabelecer os parâmetros que devem
ser observados à correta redistribuição de rendas (Arts. 165 a 169, 70 a 75, 99 e
31, CF).
411
Atualmente o orçamento espelha toda
a vida financeira de uma Nação,
vertendo
-
se em um importante instrumento dinâmico do Estado a orientar sua
atuação sobre a economia.
Orçamento Público deve levar em conta os interesses da sociedade,
refletindo o plano de ação governamental.
Denise Auad informa:
[...] a análise do orçamento brasileiro, no entanto, ainda não é
uma tarefa simples, haja vista que, para sua formulação, é
utilizada uma linguagem técnica de difícil compreensão pelo
cidadão comum. Esse fato é desabonador para a transparência
dos
gastos públicos e até mesmo atentatório a um ideal de Estado
Democrático de Direito. Quanto mais transparente for a
elaboração do orçamento, maior o número de canais
de
fiscalização que poderão ser criados pela sociedade civil.
410
SCHIER, Adriana da Costa Ricardo.
A participação popular na adm
inistração pública
: o
direito de reclamação. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 77: “[...] é, pois, em torno dos
direitos fundamentais e, notadamente, da dignidade humana, que gira a Administração
Pública. Supera
-
se, então, qualquer idéia que busque vincular esta atuação administrativa em
torno do Estado, como entidade abstrata e amorfa. Passa
-
se, portanto, a conceber
-
se, com a
CF/88, um processo singular de ‘personalização do Direito Administrativo’, entendido, agora,
como disciplina que deve voltar
-
se ao h
omem, ao cidadão, e não ao Estado justificado por si
mesmo, enquanto estrutura”.
411
TORRES, 1995, p. 02: “[...] todas as decisões fundamentais das políticas públicas passam
necessariamente pelo orçamento, embora não seja ele o responsável pelos resultados q
ue
venham a ser alcançados na realidade social”. É a dinâmica apresentada pelo Estado Fiscal
Social: um eterno cotejo entre o Estado de Impostos e o Estado de Prestações.
2
2
9
9
4
4
A arrecadação da pecúnia n
ecessária para a efetivação dos referidos
direitos fundamentais passa, indiscutivelmente, pelo recolhimento regular e
adequado dos tributos devidos pelos cidadãos nas mais diversas atividades e
negócios da vida, não se perdendo de vista, ainda, que os valo
res auferidos
sejam corretamente aplicados por quem de direito, isto é, pela Administração
Pública como um todo,
412
sempre em respeito às diretrizes antecipadamente
previstas pelo texto constitucional.
Na precisa lição de Fernando Facury Scaff:
[...] os ga
stos públicos não permitem que o legislador, e muito
menos o administrador, realizem gastos de acordo com suas livres
consciência, de forma desvinculada aos objetivos impostos pela
Carta, especialmente em seu Art. 3º [...]. A aplicação dos direitos
fundame
ntais sociais decorre da necessidade de dotar esta
parcela da população excluída para o exercício de suas
capacidades (Amartya Sen) ou, por outras palavras, de condições
para realizar a liberdade real a fim de pode gozar da liberdade
jurídica (Robert Alexy
). Sem tais condições reais (fáticas) para o
exercício da liberdade jurídica, esta se tornará letra morta. A
Teoria da Reserva do Possível é condicionada pelas
disponibilidades orçamentárias, porém os legisladores não
possuem ampla Liberdade de Conformação
, pois estão vinculados
ao Princípio da Supremacia Constitucional, devendo implementar
os objetivos estabelecidos na Constituição de 1988, que se
encontram no Art. 3º, dentre outras normas
-
objetivo [...]. Tal
procedimento não implica em judicialização da p
olítica ou ativismo
judicial, pois se trata apenas da aplicação da Constituição
brasileira.
413
Tomando como base a especial proteção da família concedida
constitucionalmente, tem
-
se que a assistência pré e pós
-
natal, o direito à
educação, ao atingimento do
primeiro emprego, ao aprendizado cultural, dentre
outras tantas situações, são garantias fundamentais que, para sua efetiva, real e
concreta implantação, necessitam de dinheiro, de investimento por parte do
412
GOLDSCHMIDT, Fabio Brun.
O princípio do não
-
confisco no direito tributário
. São Pa
ulo:
Revista dos Tribunais, 2006, p. 111: “[...] é pressuposto à existência do Estado e pilar de
sustentação do direito de propriedade. E, sendo inafastável, cumpre ao Estado unicamente
dar conformação, regramento formal e meios de defesa aos contribuintes
, pois sem que haja
uma relação juridicamente determinada entre o dever de contribuir e os direitos de quem
contribui (regras de tributação) torna
-
se impossível falar em Estado Democrático de Direito”.
413
SCAFF, Fernando Facury. Reserva do possível, mínimo
existencial e direitos humanos. In:
Verba juris
: anuário da pós
-
graduação em direito, vol. 04, nº 04. São Paulo: Fredys Orlando
Sorto, jan./dez. 2005, p. 92
-
102.
2
2
9
9
5
5
Estado, uma vez que resta patente que a sociedade, sozinha, não consegue dar
conta de tão imensa e importante demanda.
414
Nesse eito, e preocupando
-
se com a concretização dos direitos de
crianças e adolescentes e com a execução de políticas públicas de atendimento
em casos tais, tem
-
se que no inc. IV do A
rt. 88 da Lei nº 8.069/90 (ECA)
determinou
-
se a “[...] manutenção de fundos nacional, estaduais e municipais
vinculados aos respectivos conselhos dos direitos da criança e do adolescente”.
As políticas públicas que envolvam direitos de crianças e de adole
scente
desfrutam, assim, de prioridade orçamentária.
Ao se efetuar acurada análise do texto constitucional, denota
-
se, com
clareza solar, que existem muitos pontos de contato entre o fenômeno tributário
denominado de
orçamento
e os direitos de crianças e
de adolescentes, citando
-
se, como exemplo do quanto dito, as normas basilares estampadas nos Arts. 31
(fiscalização orçamentária dos municípios), 70 a 75 (normas sobre o controle da
execução orçamentária), 165 a 169 (dos orçamentos) e 227 (capítulo da orde
m
social), da Lei de Outubro.
Também no Estatuto da Criança e do Adolescente, como visto,
apresentam
-
se normas nitidamente de caráter orçamentário, a saber: Arts. 4º,
parágrafo único, alínea ‘
d
’; 88, inc. IV; 96; 134, parágrafo único; 136, inc. IX; 148,
i
nc. IV; 150; 201, inc. V; 201, inc. § 5º, aliena ‘
c
’; 214 e 260.
No que pertine ao tema em comento, necessário se faz destacar o Art. 71
da Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964, haja vista que o referido dispositivo de
regência trata dos chamados
fundos especiais
, assim caracterizados: “[...]
constitui fundo especial o produto de receitas especificadas que, por lei, se
414
NABAIS, José Casalta.
O dever fundamental de pagar impostos
. Coimbra: Almedina, 2004,
p. 679
: “[...] como dever fundamental, o imposto não pode ser encarado nem como um mero
poder para o estado, nem como um mero sacrifício para os cidadãos, constituindo antes o
contributo indispensável a uma vida em comunidade organizada em estado fiscal. Um tipo
de
estado que na subsidiariedade da sua própria acção (económico
-
social) e no primado da
autorresponsabilidade dos cidadãos pelo seu sustento o seu verdadeiro suporte. Daí que não
se possa falar num (pretenso) direito fundamental a não pagar impostos”.
2
2
9
9
6
6
vinculam à realização de determinados objetivos ou serviços, facultada a adoção
de normas peculiares de aplicação”, não se perdendo de vist
a que o fundamento
de validade se encontra na dicção do Art. 167, inc. IX, da Constituição Federal.
Existem os fundos para a infância e adolescência e para a manutenção e
desenvolvimento do ensino fundamental e de valorização do magistério.
415
Em resumo, f
azendo coro a Luiz Emygdio F. da Rosa Júnior:
Não é preciso chamar a atenção para a importância do orçamento
na vida política e administrativa do país como plano das suas
necessidades monetárias, em um determinado período de tempo,
aprovado e decretado pe
lo Poder Legislativo como seu órgão de
representação popular. Assim, o orçamento exerce grande
influência na vida do Estado, pois se for deficiente, ou mal
elaborado, produzirá reflexos negativos na tarefa da consecução
de suas finalidades.
416
Não de pode n
egar que, atualmente e principalmente em países que
enfrentam grandes e graves problemas sociais, como no caso brasileiro, o papel
do Estado não poderá ser relegado ao de mero espectador dos acontecimentos,
fiando
-
se, para isso, meramente na concessão, aos seus cidadãos, da chamada
igualdade formal, ou seja, na premissa de que, do ponto de vista abstrato,
genérico e frio dos textos normativos existentes, todos são iguais, sem qualquer
espécie de distinção ou discriminação.
É preciso intervir.
415
FERRARI, Regina Maria Macedo Nery.
Direito municipal
. 2ª ed. rev. atual. e ampl. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 194: “[...] para cumprir
-
se essa determinação
constitucional, os recursos para atendimento de programas suplementares provêm de font
es
diferentes: a alimentação e a assistência à saúde, de contribuições e outros recursos
orçamentários, e o material escolar e transporte, de recursos provenientes de impostos. É
importante considerar que a atividade financeira do Estado consiste na obtenç
ão de recursos,
na sua guarda e gestão ao final na sua aplicação, não se incluindo tal atividade para fins
últimos do Estado, porém, para realizá
-
la, é necessário um suporte financeiro, isto é, que haja
recursos econômicos para implementação de seus objeti
vos, o que faz surgir uma série de
atividades desenvolvidas pelo ente estatal destinadas a arrecadar meios e direcioná
-
los para
concretização de seus fins, de forma a custear a sua manutenção e funcionamento do
Estado”.
416
ROSA JÚNIOR., Luiz Emygdiio F. da.
Manual de direito financeiro & tributário
. São Paulo:
Jurídica, 2005, p. 65.
2
2
9
9
7
7
Necessário se
faz, assim, que a isonomia atinja um patamar mínimo de
materialidade e substancialidade.
417
Em outras palavras, a igualdade deve espraiar seus benéficos efeitos de
modo concreto, atingindo em cheio determinado seio social e trazendo, por via de
conseqüênci
a, efetiva e visível melhora nas condições de vida dos cidadãos que o
formam e nele convivem, até porque, como bem salienta Patrícia Uliano Effting
Zoch de Moura, “[...] percebe
-
se que, além de uma conotação individualista de
igualdade de tratamento, o pri
ncípio da igualdade busca, como os direitos sociais,
uma igualização dos homens num contexto social, pois se vive num mundo de
diferenciações flagrantes: as discriminações”.
418
Entrementes, embora irrefutáveis os avanços já conquistados, a verdade
é que ain
da falta muito para o atingimento do referido desiderato da igualdade
substancial, a par dos esforços hercúleos que têm sido levados a efeito pelos
aplicadores e defensores do direito contemporâneo, moderno e condizente com a
realidade social vivenciada nu
ma determinada comuna.
A chamada igualdade no texto de lei não resolve o problema de sua
concreção no plano prático, razão pela qual há a necessidade de o Estado, além
da sociedade com um todo, sair de sua condição de inércia para fomentar e, na
medida do
possível, eliminar, do plano real, as situações diferenciadas de
efetivação dos direitos que são consentâneos a todo e qualquer cidadão,
417
ARAUJO, Luiz Alberto David. Acesso ao emprego: discriminação em razão da deficiência
o
acesso ao emprego e a proteção processual em defesa da igualdade
. In: ROMAR, Carla
Tere
sa Martins; SOUSA, Otávio Augusto Reis (coords.).
Temas relevantes de direito
material e processual do tarabalho
. São Paulo: Nova Arte, 2003, p. 75: “A Constituição de
1988 cuidou de garantir o direito à igualdade de forma ampla. Resguardou o princípio
iso
nômico, quer em seu aspecto formal, quer em seu aspecto material. Quanto a este, cuidou
de, por diversas oportunidades, garantir aqueles que necesstivam de proteção especial,
traçando diretrizes relevadas através de uma política governamental de apoio, que
r em
relação à garantia de situações privilegiadas, decorrentes da ausência de igualdade, quer em
relação a determinadas prerogativas que seriam indispensáveis para certas tarefas
constitucionais. O legislador constitucional, assim, através dessa ruptura a
parente do
princípio da igualdade, trata de restabelecê
-
lo. Há inúmeros casos no texto constitucional,
como o da gestante (Art. 7º, inc. XVIII), dos índios (Art. 231), da criança e do adolescente
(Art. 227), além da questão das pessoas portadoras de defici
ência”.
418
MOURA, Patrícia Uliano Effting Zoch de.
A finalidade do princípio da igualdade
: a
nivelação social
interpretação dos atos de igualar. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris
Editor, 2005, p. 72.
2
2
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9
8
8
mormente aqueles de índole fundamental, como, aliás, é o caso da convivência
comunitária e familiar afeta a crianças e
adolescentes.
Obviamente que a existência de uma escorreita e dinâmica gama
legislativa é sempre benéfica, mas tal produção jamais poderá ser tomada ou
entendida como suficiente para a resolução dos problemas sociais existentes num
determinado Estado.
A
concessão de direitos via positivação efetivamente se faz
necessária, mas indispensável, também, que tal concessão se concretize,
ou seja, atinja o patamar da eficácia e da efetividade, nunca se perdendo de
vista os ideais constitucionais almejados com o
advento da Lei de Outubro,
mormente aqueles grafados, com letras maiúsculas, em seu Art. 3º, não por
acaso nominados de objetivos fundamentais da República Federativa do
Brasil.
De mais a mais, não se pode deslembrar que a irrazoável explosão
quantitativa
de normas sempre acaba trazendo problemas no campo da
aplicação, pois, nos dizeres de José Eduardo Faria:
[...] do mesmo modo que sempre ocorre com a inflação
econômica, essa desenfreada e desordenada produção
legislativa, chamada por alguns autores ‘ano
mia jurídica’ e de
‘explosão legal’, também costuma encurtar horizontes decisórios,
acirrar conflitos, inviabilizar o cálculo racional e, por fim,
disseminar uma insegurança generalizada na vida sócio
-
política e
no mundo dos negócios. Se, no âmbito da econ
omia, a inflação
liquida com a reciprocidade de expectativas inerente às bases
contratuais e demais alicerces do mercado, no universo do direito
positivo ela implode os marcos normativos fundamentais da vida
social; impede a certeza jurídica; e ainda acaba
contribuindo para
reduzir a pó direitos conquistados de modo legítimo. Nas duas
inflações o resultado termina sendo basicamente o mesmo: as
relações permanentes entre os agentes produtivos e os sujeitos
de direito tendem a se dar m termos cada mais desord
enados e
imprecisos, e não institucionalmente balizados, a ponto de, numa
situação extrema, tornarem
-
se praticamente desprovidas de
sentido.
419
419
FARIA, José Eduardo.
O direito na economia globaliz
ada
. São Paulo: Malheiros, 2004, p.
128
-
129.
2
2
9
9
9
9
Seguindo
-
se tal linha de raciocínio, tem
-
se que o problema da eficácia
prática do ordenamento jurídico não se res
olve pela edição desenfreada de textos
normativos infraconstitucionais, cuja produção, muitas das vezes, sob paixões
momentâneas, despe
-
se, assim, da necessária análise de coerência,
conveniência e oportunidade e, principalmente, sem o cotejo com o resto d
o
sistema positivo vigente, cria desagradáveis casos de antinomia, o que em nada
resolve ou contribui para a mitigação do problema da exclusão de direitos em
nosso País.
A questão da eficácia, além da existência normativa positiva, resolve
-
se
com a materi
alização, no plano concreto, dos direitos outorgados e conquistados
pelos cidadãos de um Estado, ou seja, com menos retórica e mais ação estatal,
obedecendo
-
se, com rigor britânico, ao quanto plasmado no bojo do texto
constitucional.
Deve o aparelho estat
al sair do
berço esplêndido
no qual se encontra
deitado, participando e intervindo ativamente no meio social, toda vez que tal
atitude se mostrar preponderante e indispensável à garantia dos direitos de seus
cidadãos.
Aliás, caem muito a propósito, os alertas sobre o perigo da retórica feitos
por José Ortega y Gasset:
[...] quando uma realidade humana cumpriu sua história,
naufragou e morreu, as ondas a cospem nas costas da retórica
onde, cadáver, sobrevive longamente. A retórica é o cemitério das
realida
des humanas; quando muito, seu hospital de inválidos. Na
realidade sobrevive seu nome que, mesmo sendo apenas palavra,
é, no final das contas, nada menos que palavra, e conserva
sempre algo de poder mágico.
420
É exatamente sob esse enfoque que se encaixa o
tema principal do
presente trabalho, na exata medida em que fica absolutamente claro, do ponto de
vista concreto, que não obstante a importância do deferimento constitucional à
420
GASSET, José Ortega y.
A rebelião das massas
. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p.
151.
3
3
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0
0
0
convivência familiar e comunitária, necessária se faz a aplicação quotidiana da Lei
de Outubro, até porque:
[...] não pode converter
-
se em promessa constitucional
inconseqüente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas
expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de
maneira ilegítima, o cumprimento de seu impost
ergável dever, por
um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que
determina a própria Lei Fundamental do Estado.
421
Assim, e a par das dificuldades reais acima elencadas, a verdade é que tais
não podem servir de escudo para que o Estado se desv
ie dos compromissos
assumidos quando da promulgação da atual Constituição, Lei Política esta que,
como bem salienta Luiz Alberto David Araujo, converteu
-
se em verdadeiro
instrumento de materialização dos anseios de um povo até então oprimido pelo
regime mi
litar que a antecedeu, ou seja, tornou
-
se um instrumento de pleno resgate
da cidadania pertencente a todos os componentes da sociedade brasileira.
422
E suma, tem
-
se que o estatuto constitucional brasileiro, dentro do seu inegável
caráter democrático, confer
iu a possibilidade de responsabilização patrimonial direta do
Estado e de suas respectivas entidades públicas quando, em sua ação ou omissão,
causar danos aos seus cidadãos, alquebrando, por via de conseqüência, o inexorável
postulado da isonomia,
423
o que se cumpre a todo custo evitar.
424
421
RTJ nº 175, p. 1212
-
1213.
422
ARAUJO, Luiz Alberto David. Formas da participação popular na gestão da coisa pública. In:
M
ARTINS, Ives Gandra da Silva; MENDES, Gilmar Ferreira; TAVARES, André Ramos
(coords.).
Lições de direito constitucional em homenagem ao jurista Celso Bastos
. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 645.
423
NEME, Eliana Franco (coord.).
Ações afirmativas
e inclusão social
. Bauru: EDITE, 2005, p 311
-
312: “[...] é evidente que a atividade estatal é necessária na medida em que a colocação dos
cidadãos no ‘estado de natureza’, distancia
-
se do ideal de igualdade formal e material pretendido por
todas as declara
ções de direito e constituições democráticas. Sendo assim, alguns valores podem
ser albergados como valores comuns ao projeto de inclusão, por serem independentes de carga
filosófica ou política, podem ser utilizados em qualquer estado que tenha por objeti
vo diminuir ou, ao
menos, minimizar os efeitos do tratamento desigual até aqui perpetrado”.
424
“Embora resida, primariamente, nos Poderes Legislativo e Executivo, a prerrogativa de
formular e executar políticas públicas, revela
-
se possível, no entanto, ao P
oder Judiciário,
determinar, ainda que em bases excepcionais, especialmente nas hipóteses de políticas
públicas definidas pela própria Constituição, sejam estas implementadas pelos órgãos
estatais inadimplentes, cuja omissão
por importar em descumpriment
o dos encargos
político
-
jurídicos que sobre eles incidem em caráter mandatório
mostra
-
se apta a
comprometer a eficácia e a integridade de direitos sociais e culturais impregnados de estatura
constitucional. A questão pertinente à ‘reserva do possível’" (
RE nº 436.996
-
AgR
, Relator:
Ministro Celso de Mello, DJ 03/02/06).
3
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1
1
Essa, aliás, é a dicção imposta pelo § 6º do Art. 37 da Constituição
Federal.
Conforme visto, não pode o Estado furtar
-
se ou desvencilhar
-
se do dever
fundamental de colocar em prática o cumprimento e a execução das garantias
afetas aos princípios fundamentais estampados na Lei da República, bem como
no que se refere ao atingimento dos objetivos fundamentais também ali previstos.
Nesse passo, toda vez que o Estado deixa de cumprir com aquilo que é
inerente à sua essência, pod
e e deve ser responsabilizado por tais omissões ou
descumprimentos.
425
Tal responsabilização também pode e deve atingir o agente público que
deixa de observar o estrito cumprimento dos princípios e objetivos fundamentais
de nossa República.
426
Assim, e no qu
e pertine à tese desenvolvida no presente trabalho, toda
vez que não se consiga fomentar o direito fundamental de nossas crianças e
adolescentes, no que se refere à convivência familiar e comunitária,
427
bem como
não se tenham colocado à disposição dos inter
essados mecanismos alternativos
425
Como ainda ensina Herkenhoff, as pessoas têm uma digni
dade humana que tem que ser
reverenciada. O Direito não pode ser instrumento legitimador da exploração do homem pelo
homem. Direito que legitima a espoliação não é Direito, mas corrupção do Direito.
426
“A Carta Federal, ao proclamar os direitos e deveres in
dividuais e coletivos, enunciou
preceitos básicos, cuja compreensão é essencial à caracterização da ordem democrática
como um regime do poder visível. O modelo político
-
jurídico, plasmado na nova ordem
constitucional, rejeita o poder que oculta e não toler
a o poder que se oculta. Com essa
vedação, pretendeu o constituinte tornar efetivamente legítima, em face dos destinatários do
poder, a prática das instituições do Estado [...]” (RTJ nº 162/805
-
806, Relator p/ o acórdão
Ministro: Celso de Mello, Pleno).
427
AUAD, Denise. O abuso do poder público em face do direito de prioridade absoluta da criança
e do adolescente. In:
O abuso do poder do Estado
. Rio de Janeiro: Arte Jurídica, 2000, p.
21: “Determina a Constituição Federal Brasileira em seu Art. 227 que ‘é de
ver da família, da
sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o
direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à
dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá
-
los
a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e
opressão’. A Constituição é enfática e não se contenta em dizer apenas prioridade, vai mais
além, e determina expressamente qu
e tal prioridade tem o caráter de ser absoluta. Se tal
determinação é fruto do próprio texto constitucional, isso significa que é um mandamento que
vincula todas as demais normas infraconstitucionais de nosso ordenamento jurídico por um
princípio de hermen
êutica e de lógica. Em conseqüência, todos os operadores do Direito
devem obedecer esse princípio”.
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3
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2
que possam mitigar tão importante ausência, pode e deve ser responsabilizado o
Estado (e seus agentes) por tal omissão de índole constitucional, eis que, no
mínimo, retirou dos infantes desafortunados a chance de dias melhor
es.
A perda dessa chance (de dias melhores) não pode, em hipótese alguma,
ficar sem reparação, deixando
-
se de lado o pragmatismo liberal que tanto imantou
a atividade estatal, a fim de que se possa dar vazão à busca e ao atingimento do
que os doutrinadores nominam de
justiça social
.
428
Começa
-
se a perceber a necessidade de que, para a manutenção do ideal
da isonomia lançado em 1789, o Estado deve, em situações determinadas e
essenciais, intervir no meio social em que estabelecido, somando
-
se a isso a
precípua urgência de que os atos proferidos e levados a efeito pela Administração
Pública sejam mais bem fiscalizados e controlados, em face da enorme diversidade
de serviços públicos necessários à consecução da atividade estatal.
429
O Estado Social Constitucional caracteriza
-
se pela necessidade precípua
de observância, respeito, concretização e aplicação das idéias contidas no corpo
jurídico
-
político fundamental de uma sociedade, deixando assente, também, que
os representantes escolhidos para gerir o Poder Públic
o, em qualquer de suas
funções, não possuem a prerrogativa de se furtarem ao cumprimento de referidas
opções de consecução e desenvolvimento das políticas relativas à fomentação da
proteção da dignidade, da isonomia e dos direitos sociais.
428
MORAIS, José Luis Bolzan; STRECK, Lenio Luiz de. Ciência política & teoria do Estado
. 5ª
ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006, p. 45: “No fim do século, um fato
novo foi injetado na filosofia
-
política liberal. Era a justiça social, antes referida, vista como
necessidade de apoiar os indivíduos
estes não mais percebidos como seres isolados, mas
agora componentes de determinadas coleti
vidades, o que lhes dava certas identidades
próprias e expressava interesses comuns
de uma outra forma quando da sua autoconfiança
e iniciativa não podiam mais dar
-
lhes proteção ou quando o mercado não mostrava a
flexibilidade ou a sensibilidade que era suposto demonstrar na satisfação de suas
necessidades básicas”.
429
SCHIER, 2002, p. 97
-
98: “[...] esta forma de controle dos atos administrativos foi aperfeiçoada
com o advento do Estado Democrático e Social. Com efeito, a necessidade de prestação de
uma ma
ior gama de serviços públicos pelo Estado (intervencionismo estatal), aliada à
preocupação de garantir os valores democráticos na esfera da Administração Pública, tornou
essencial o controle dos atos administrativos em todas as suas fases de execução,
dete
rminando, portanto, a procedimentalização do agir administrativo. Interessante, ainda, a
observar que através do procedimento permite
-
se a participação do cidadão na fase de
elaboração do ato administrativo”.
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3
3
Sobre o tema ora
em enfoque, indispensável trazer
-
se à lume o
posicionamento dos abalizados doutrinadores espanhóis Francisco J. Bastida
Freijedo, Ignacio Villaverde Menéndez, Paloma Requejo Rodríguez, Miguel Angel
Presno Linera, Benito Aláez Corral e Ignacio Fernández Sarasola, no sentido de
que:
Del outro lado de la relación subjetiva que establecen las normas
de derechos fundamentales se encuentran los sujetos que se ven
obligados por los mandatos, permisos o prohibiciones a cuyo
través aquéllas garantinzan el âmbito d
e libertad iusfundamental
[...]
. En el plano de la organización interna del aparato del Estado,
se há pasado de la inicial vinculación sólo de la Administración
pública, propia de un Estado en el que la Constitución no ocupa
una auténtica posición de supremacía respecto de la Ley, a la
sujeción del Gobierno, que se plasma en el control jurisdiccional
de sus actos por vulneración de los derechos fundamentales [Art.
2º LJCA], con la consiguiente exclusión del concepto de acto
político o de gobierno. De igual forma, también há pasado a estar
obligado por los derechos fundamentales el Parlamento
.
430
A preocupação do Estado Social Constitucional, ainda mais dentro de
um patamar basilar de natureza dirigente
431
como no caso brasileiro, deve ser
fulcrada, indispensave
lmente, na concretização dos direitos fundamentais
pertencentes a todos os seus cidadãos, de modo a remarcar a assertiva de
que a isonomia não é quimera ou sonho, mas sim finalidade primaz do ente
estatal.
432
430
CORRAL; FREIJEDO; LINERA, 2004, p. 98
-
99.
431
A
dverte Lenio Luiz Streck, com a argúcia que lhe é peculiar, que “[...] toda essa discussão
repercute na concepção que temos acerca do papel da Constituição em países periféricos,
que denomina ‘países de modernidade tardia’. Penso que não há dúvidas de que
a
Constituição do Brasil é nitidamente dirigente, exsurgindo, daí, a necessidade de superar as
generalidades próprias de uma teoria geral do constitucionalismo, traçando as diretrizes para
albergar as especificidades de um país periférico como o Brasil. Ne
sse sentido, a lição de
Bercovici, que aponta a fixação dos objetivos da República (Art. 3º) como vetores desse
dirigismo, que têm a função, entre outras, de identificação do regime constitucional vigente,
ou seja, fazem parte da fórmula política do Estado, que o individualiza, pois esta diz respeito
ao tipo de Estado, ao regime político, aos valores inspirados do ordenamento, aos fins do
Estado, etc.”
(STRECK, 2004, p. 111
-
112).
432
BAUMAN, Zygmunt.
Vidas desperdiçadas
. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2004, p. 111
-
112: “O ‘Estado Social’, esse coroar da longa história da democracia européia e até há pouco
tempo sua forma dominante, hoje recua. Ele baseava sua legitimidade e suas exigência de
lealdade e obediência da parte de seus cidadãos na promessa de g
aranti
-
los e defendê
-
los
da redundância, exclusão e rejeição e também dos golpes aleatórios do destino
de estar
destinado ao ‘refugo humano’ em razão de inadequações ou desgraças individuais. Em suma,
na promessa de inserir convicção e segurança em vidas que, sem isso, são governadas pelo
caos e pela contingência. Se indivíduos infelizes tropeçam e caem, haverá alguém por perto
pronto a segurar suas mãos e ajudá
-
los a se erguer outra vez”.
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4
4
Desta forma, percebe
-
se, claramente, que os Poder
es Públicos, seja qual
área de atuação for, estão intrinsecamente ligados e destinados ao irrestrito
cumprimento e à irrestrita observância dos direitos fundamentais apresentados
pela Lei Constitucional, de modo que não se vislumbram mais hoje, parâmetros
que possam, legitimamente, afastar o Estado de tal mister, sendo certo que o
afastamento da referida determinação importará em responsabilização do Estado
e de seus agentes.
No que se refere à determinação da responsabilidade estatal quando, por
sua omissão, não se verifica o necessário atingimento, concretização e respeito
dos princípios e dos objetivos fundamentais de nossa República, pode
-
se aplicar
o chamado princípio do terceiro excluído.
Alaôr Caffé Alves vaticina:
[...] o princípio do terceiro exc
luído
princípio de alternativa lógica
complementar do princípio da contradição, do ponto de vista [a]
ontológico formula
-
se assim: ‘uma coisa é ou não é, não há termo
médio’, isto é, que seja e ao mesmo tempo não seja, ferindo o
princípio da contradiçã
o. Ou uma coisa existe ou não existe,
exclui
-
se a possibilidade de que possa existir e ao mesmo tempo
não existir. Isto é impensável, portanto, é um absurdo. Do ponto
de vista [b] lógico, a respeito de uma determinada proposição,
podemos dizer que ela é ve
rdadeira ou falsa, excluindo, por
impensável, a hipótese de que seja ao mesmo tempo verdadeira e
falsa. Do ponto vista da predicação lógica, temos, por exemplo: ‘o
sangue humano ou é vermelho ou não é; não pode ser ele ao
mesmo tempo vermelho e não vermelh
o’. Assim, o sangue
humano pode ser vermelho (1ª hipótese), ou não ser vermelho (2ª
hipótese), mas não pode ser ao mesmo tempo vermelho e não
vermelho, sob a mesma relação (3ª hipótese, a excluída
necessariamente). Nesse sentido, a última hipótese é impens
ável;
é impossível logicamente, não existe tal hipótese. Exclui
-
se esta
terceira hipótese.
433
Transportando
-
se a elucidativa explicação para o tópico em comento,
tem
-
se a possibilidade de existência de verdade em relação a uma, de duas
premissas: (i) o Esta
do é responsável pelo atingimento e cumprimento dos
433
ALVES, Alaôr Caffé.
Lógica
: pensamento formal e argumentação. 3ª ed. São Paulo: Quartier
Latin, 2003, p. 153
-
154.
3
3
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0
5
5
princípios e objetivos fundamentais da República, ou, (ii) o Estado não é
responsável pelo atingimento e cumprimento dos princípios e objetivos
fundamentais da República. Não há espaço, assim, para uma te
rceira afirmação
diferente das duas outrora elencadas.
Assim, uma delas há que ser necessariamente verdadeira e a outra
necessariamente falsa.
Ao se efetuar a análise de toda a sistemática que norteou (e ainda
norteia) a criação e a aplicação do texto co
nstitucional atual, não há como se fugir
da eleição de verdade constante da primeira premissa, a saber: o Estado é
responsável pelo atingimento e cumprimento dos princípios e objetivos
fundamentais da República.
Entretanto, a par das dificuldades existent
es e uma vez que o Brasil
adotou a erradicação desses males como objetivo fundamental da República, a
verdade é que inconteste se verifica o fato de que o Estado tem o dever
fundamental e inafastável de fazer concretizar os princípios e objetivos da
Repúbl
ica estampados no seio do texto constitucional.
Interessante a afirmação perpetrada por António José Avelãs Nunes, no
sentido de que a problemática afeta à erradicação da pobreza, da fome, da
miséria, da exclusão, males da era globalizada, passa, obrigato
riamente, pela
concessão efetiva de direitos, por parte do Estado, ao cidadão.
434
Essa é a visão da atividade estatal que gostaria de se retomar e essa
retomada perpassa, sem sombra de dúvidas, pela concretização do direito
434
NUNES, Antônio José Avelãs.
Neoliberalismo & direitos humanos
. Rio de Janeiro:
Renovar, 2003, p. 116: “Hoje sabemos que o conhecido aumento do número de famintos não
apaga a certeza que temos de que a nos
sa capacidade de produzir alimentos
e mesmo a
produção efectiva de alimentos
é superior às necessidades da humanidade. Se a fome
existe (e até vai aumentando), não é porque os meios naturais, humanos e técnicos
disponíveis não permitam a produção de al
imentos suficientes para alimentar todos os
habitantes do nosso planeta. O problema é outro. E Amartya Sem identifica
-
o com rigor: o
facto de haver pessoas que passem fome
e que morrem de fome
, apesar da abundância
de bens (ou pelo menos da existência de bens em quantidade suficiente), só pode explicar
-
se
pela falta de direitos e não pela escassez de bens. O problema fundamental é o da
organização da sociedade”.
3
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6
6
fundamental à família e à respons
abilização do ente público quando tal não se
consegue realizar no plano fático, tolhendo, no mínimo, uma chance de que os
desafortunados infantes atinjam um melhor e digno patamar de igualdade e
interação social.
Até porque, se é verdade que a família é o
locus
privilegiado para o
desenvolvimento afetuoso e seguro do ser humano, não menos verdade é o fato
de que o Estado é o
locus
privilegiado de emanação da normatividade protetiva
dos direitos fundamentais dos indivíduos e da sociedade.
435
5.2
O Reflexo I
lícito da Omissão Estatal em Relação ao Dever
de Concretização do Direito Fundamental de Convivência
Familiar e Comunitária de Crianças e Adolescentes: A
Responsabilidade pela Perda de uma Chance
5.2.1
Considerações gerais acerca da teoria da perda de um
a chance
Para que se chegue à conclusão de que o Estado responde, quando
omisso, em relação ao seu dever de concretização do direito fundamental de
convivência comunitária de crianças e adolescentes, mister se faz a correta
identificação da ocorrência do
ilícito, do prejuízo ou do dano infligido em casos
tais.
A seu turno, convém assinalar que, modernamente, muito se discute
acerca da desvinculação do dano como elemento necessário à
caracterização do ato ilícito, na medida em que se sustenta que a
partic
ularização deste último pode dar
-
se sem que ocorra aquele, o que nos
parece de todo acertado.
435
MORAIS; STRECK, 2006, p. 21.
3
3
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0
7
7
Assim, é importante fazer
-
se interpretação no sentido de encarar o dano
como elemento necessário apenas à indenização e não à caracterização do ilícito,
sob pena de concluir
-
se, erroneamente, que a violação a um direito, por si só, não
seria motivação suficiente para o indivíduo socorrer
-
se do Poder Judiciário,
justamente para evitar o dano que poderá vir a ocorrer no caso de não
afastamento do ilícito.
É que, pen
samento em sentido contrário, levar
-
nos
-
ia à erronia de
sustentar
-
se a imperativa necessidade da ocorrência de efetiva lesão ao
patrimônio jurídico do indivíduo
seja do ponto de vista material ou imaterial
para a incursão do Estado
-
juiz na questão, per
mitindo
-
se, conseqüentemente, a
este último omitir
-
se quanto ao seu dever de pacificação dos conflitos sociais, pois
muito mais importante ao jurisdicionado é o evitamento do dano em si do que o
seu afastamento depois de ocorrido, principalmente porque existem violações a
direitos impossíveis de serem totalmente afastadas (apagadas).
É, aliás, o caso específico da não
-
concretização do direito fundamental de
convivência familiar e comunitária.
Por fim, registre
-
se que a simples violação de um direito, aind
a que
inexista dano propriamente dito a ser indenizado, parece ser suficiente à
responsabilização do violador pelo pagamento de verba indenitária como
medida pedagógica para que não mais incorra no mesmo ilícito, a exemplo
da fundamentação que supedaneia o
deferimento de indenização por dano
moral.
No que se refere à problemática em estudo, e diante da importância
familiar para o correto desenvolvimento moral e psíquico de crianças e
adolescentes demonstrada nos capítulos anteriores, vislumbra
-
se na hipóte
se a
possibilidade de aplicação da teoria da perda de uma chance.
A teoria da perda de uma chance (
perte d’une chance
) surgiu na França,
a partir da década de 60, e foi criada, primeiramente, com vistas à atividade
médica.
3
3
0
0
8
8
Desenvolveu
-
se em função da difí
cil comprovação dos elementos
formadores da responsabilidade do profissional, sendo chamada de
teoria da
perda de uma chance de cura ou de sobrevivência
.
Nesse sentido, elucidativa a explicação levada a efeito por Miguel Kfouri
Neto:
A jurisprudência fra
ncesa tem adotado, a partir de 1965, em casos
de danos corporais indenizáveis, para proteger a vítima e obviar
incovenientes na formação da culpa, a teoria da perda de uma
chance de sobrevivência ou de cura. O elemento prejudicial que
determina a indenizaç
ão é a perda de uma chance de resultado
favorável no tratamento [...]. Em síntese, admite
-
se que a culpa do
médico comprometeu as chances de vida e a integridade do
paciente. Pouco importa que o juiz não esteja convencido de que
a culpa causou o dano. É su
ficiente uma dúvida. Os tribunais
podem admitir a relação de causalidade entre culpa e dano, pois
que a culpa é precisamente não ter dado todas as oportunidades
(‘chances’) ao doente. Milita a presunção de culpa contra o
médico.
436
A teoria sobre a perda de
uma chance de há muito vem sendo
discutida pelos catedráticos brasileiros, embora apenas há pouco tempo
tenha sido empregada com mais constância e segurança por nossos
Sodalícios de Justiça.
Assim, é preciso que se diga que o catedrático Agostinho Alvim,
nos
idos de 1950, já delineava a aplicação, no Brasil, da citada teoria francesa,
indicando como exemplo de sua utilização a circunstância de o advogado
perder o prazo para a interposição do recurso pertinente contra decisão
desfavorável ao seu cliente, a
inda que a matéria em discussão apresentasse
pouca probabilidade de ser revertida pelo Tribunal, afirmando: “A possibilidade
e talvez a probabilidade de ganhar a causa em segunda instância constitua
uma
chance
, uma oportunidade, em elemento ativo a repercu
tir,
favoravelmente, no seu patrimônio [...]”.
437
436
NETO, Miguel Kfouri.
Responsabilidade civil do médico
. 3ª e
d. rev. ampl. e atual. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, p. 52
-
53.
437
ALVIM, Agostinho.
Da inexecução das obrigações e suas conseqüências
. 3ª ed. atual.
São Paulo: Jurídica e Universitária, 1965, p. 190
-
193.
3
3
0
0
9
9
Nesse mesmo sentido se manifesta José de Aguiar Dias:
Magistrado bisonho, confortado por acórdão do 1º Tribunal de
Alçada do Rio de Janeiro, com votos vencidos que lhe salvaram a
eminente reputação, decidiu
que o advogado não é responsável
pela perda de prazo, em recurso de reclamação trabalhista,
porque este fato não constituía dano, só verificável se o resultado
do recurso fosse certo. Confundiram
-
se an debeatur e quantum
debeatur, por má informação sobre o
conceito de dano. Sem
dúvida que este deve ser certo e provado desde logo na ação.
Mas o dano, na espécie, era a perda de um direito, o de ver a
causa julgada na instância superior. Se a vitória não podia ser
afirmada, também o insucesso não podia.
438
Para
Caio Mário da Silva Pereira:
É claro, então, que se a ação se fundar em mero dano hipotético,
não cabe reparação. Mas esta será devida se se considerar,
dentro da idéia de perda de uma oportunidade (perte d’une
chance) e puder situar
-
se a certeza do dano
. Daí dizer Yves
Chartier que a reparação da perda de uma chance repousa em
uma probabilidade e uma certeza; que a chance seria realizada, e
que a vantagem perdida resultaria em prejuízo.
439
Em tempos mais recentes, interessante, também, o posicionamento de
Antonio Jeová Santos:
[...] coloca
-
se a perda da chance, considerada como a frustração
de uma oportunidade em que seria obtido um benefício, caso não
houvesse o corte abrupto em decorrência de um ato ilícito. A
oportunidade que é frustrada não é o benfíc
io aguardado, mas a
simples probabilidade de que esse benefício surgiria, se não
houvesse um corte no modo de viver da vítima.
440
Para Sergio Cavalieri Filho:
[...] a doutrina francesa, aplicada com freqüência pelos nossos
Tribunais, fala na perda de uma c
hance (perte d’une chance) nos
casos em que o ato ilícito
tira da vítima a oportunidade de obter
438
DIAS, José de Aguiar.
Da responsabilidad
e civil
. 7ª ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Forense,
1983, vol. I, p. 308.
439
PEREIRA, 1998, p. 42.
440
SANTOS, Antonio Jeová.
Dano moral indenizável
. 2ª ed. rev. atual. e ampl. São Paulo:
Lejus, 1999, p. 110.
3
3
1
1
0
0
uma situação futura melhor, como progredir na carreira artística ou
no trabalho, arrumar um novo emprego, deixar de ganhar uma
causa pela falha do advogado et
c. É preciso, todavia, que se trate
de uma chance real e séria, que proporcione ao lesado efetivas
condições pessoais de concorrer à situação futura esperada.
441
Sílvio de Salvo Venosa, contudo, traz exemplo de perda da chance que é,
inclusive, indenizável
hodiernamente:
Quando nossos tribunais indenizam a morte do filho menor com
pensão para os pais até quando esse atingiria 25 anos de idade,
por exemplo, é porque presumem que nessa idade se casaria,
constituiria família própria e deixaria a casa paterna,
não mais
concorrendo para as despesas do lar. Essa modalidade de
reparação de dano é aplicação da teoria da perda da chance.
No mesmo sentido, e ao fazerem comentário acerca do Art. 402 do atual
Código Civil, afirmam Gustavo Tepedino, Heloisa Helena Barbo
za e Maria Celina
Bodin de Moraes:
Se a chance de fato existia, foi considerada séria e a conduta
culposa do agente impediu que ela se verificasse, é certo que a
vantagem esperada está perdido e disso resulta, segundo a
doutrina mais recente, um dano emer
gente, passível de
indenização. Certo não é o bom êxito que a chance descortina,
ainda que extremamente provável. Certa é a chance em obtê
-
lo, o
que por si só constituían um ativo, às vezes importante, no
patrimônio de quem a perdeu. Por força do princípio
da plena
reparação de danos, que deve nortear a responsabilidade civil, a
indenização da chance em si considerada já vem sendo admitida
pelos tribunais pátrios.
442
Para Fernando Noronha:
Quando se fala em chance, estamos perante situações em que
está em c
urso um processo que propicia a uma pessoa a
oportunidade de vir a obter no futuro algo benéfico. Quando se
fala em perda de chances, para efeitos de responsabilidade civil, é
porque esse processo foi interrompido por um determinado fato
antijurídico e, po
r isso, a oportunidade ficou irremediavelmente
destruída. Nestes casos, a chance que foi
perdida pode ter
-
se
441
CAVALIERI FILHO, Sergio.
Programa de responsabi
lidade civil
. 6ª ed. rev. aum. e atual.
São Paulo: Malheiros, 2006, p. 97
-
98.
442
BARBOZA; MORAES; TEPEDINO, 2004, vol. I, p. 727.
3
3
1
1
1
1
traduzido tanto na frustração da oportunidade de obter uma
vantagem, que por isso nunca mais poderá acontecer, como na
frustração da oportunidade
de evitar um dano, que por isso depois
se verificou. No primeiro caso, em que houve a interrupção de um
processo vantajoso que estava em curso, podemos falar em
frustração da chance de obter uma vantagem futura; no segundo,
em que não houve interrupção de
um processo danoso em curso,
falar
-
se
-
á em frustração da chance de evitar um dano
efetivamente acontecido (e em que, portanto, temos um dano
presente). Essa perda de chance, em si mesma, caracteriza um
dano que será reparável quando estiverem reunidos os d
emais
pressupostos da responsabilidade civil; em especial, será exigida
culpa do agente quando a hipótese for de responsabilidade
subjetiva e prescindir
-
se
-
á dela quando a responsabilidade for
objetiva.
443
No mais completo estudo nacional sobre tal questão,
Rafael Pettefi da
Silva, anuncia:
Quando falamos da palavra chance, imediatamente lembramos
uma situação indefinida, uma probabilidade ou o acaso. Nossa
vida está repleta de situações aleatórias e que possuem apenas
uma probabilidade de acontecer, como n
o caso de conseguir um
emprego, ganhar uma partida de tênis ou obter lucros na
realização de um contrato. Entretanto o modo como o mundo
jurídico tenta regular este tipo de situação nunca se deu de
maneira harmoniosa.
444
Relativamente recente no Brasil, a perda da chance está ligada à idéia de
dano, como forma de aferição do mesmo, para efeitos de ressarcimento.
É considerada uma terceira espécie de dano patrimonial, vista como um
intermediário entre o conceito de dano emergente e o de lucro cessante.
O da
no patrimonial, para efeitos de indenização, deve ser atual e certo,
de forma a facilitar o cálculo dos valores devidos a título de perdas e danos.
A perda da chance, contudo, é teoria utilizada para calcular a indenização
por dano material quando há um dano atual, porém incerto, dito
dano hipotético
, o
443
NORONHA, Fernando.
Direito das obrigações
. 2ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva,
2007, p. 669
-
670.
444
SILVA, Rafael Peteffi
da.
Responsabilidade civil pela perda de uma chance
: uma análise
comparativa. São Paulo: Jurídico Atlas, 2007, p. 33.
3
3
1
1
2
2
qual necessitará de um juízo de valor para a aferição do
quantum
devido a título
de indenização. O que se analisa é a potencialidade de uma perda, não o que a
vítima realmente perdeu (dano emergente) ou efe
tivamente deixou de ganhar
(lucro cessante).
Vale ressaltar ainda que, quando da indenização patrimonial sob o prisma
da perda de oportunidade, o que se deve levar em conta para a fixação do
quantum
é a chance em si, e não o que a vítima poderia ter receb
ido; não se pode
tencionar cobrir o eventual benefício perdido.
Quando se fala na indenização de um dano hipotético, incerto, muitas
críticas são feitas pelos doutrinadores, seja em função da fixação do
quantum
da
reparação, ou justamente da incerteza de
um dano caracterizado como
patrimonial
.
Perda de uma chance representa a possibilidade de ser indenizado o “[...]
dano causado quando a vítima vê frustrada, por um ato de terceiro, uma
expectativa séria e provável, no sentido de obter um benefício ou de e
vitar uma
perda que a ameaça”.
445
Sérgio Severo, a respeito da indenização pela perda de uma chance,
pondera, com inteira pertinência: “[...] é essencial que a mesma seja ‘plausível e
não aponte uma simples quimera’, como ensina Le Tourneau”. E, adiante, re
força:
[...] esta chance deveria ser séria e viável [...]. Portanto, a chance
deve ser considerável e não meramente eventual. O montante
indenizatório também não deve ser correspondente ao total do
benefício que possivelmente ocorreria ou das perdas que
p
oderiam ser evitadas. Na estipulação de tal montante, deve ser
levada em conta a probabilidade de que tal sucedesse, sendo
indenizado o percentual de que foi privada a vítima, ou seja, ‘o juiz
apreciará, então, não o valor global dos ganhos ou perdas, mas
a
proporção deste valor que em concreto representa a frustração da
chance, que é atribuível ao agente segundo as circunstâncias do
caso.
446
445
SEVERO, Sérgio.
Os danos extrapatrimoniais
. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 11.
446
Ibidem, p. 13
-
14.
3
3
1
1
3
3
Importante a afirmação levada a efeito por um dos maiores estudiosos do
tema, o italiano Giovanni Pacchioni, no senti
do de que “[...]
una semplice
possibilita, una chance, ha certo un valore sociale notevole
[...]”.
447
Sérgio Savi aponta que os requisitos para a adoção da teoria da perda de
uma chance no Brasil dizem respeito a três fatores, a saber: (i) a cláusula geral
de
responsabilidade civil como cláusula aberta; (ii) o princípio da reparação integral
dos danos; e, (iii) a evolução da responsabilidade civil
do ato ilícito ao dano
injusto.
A primeira circunstância apresenta a disposição contida nos Arts.
186 e 927 d
o novel Código Civil, alertando para o fato de que, em tais
dispositivos, não cuidou, acertadamente, o legislador de fixar um conceito
ou quais modalidades de dano estariam inseridas no dever de reparar, de
modo que estariam aptos a referendar a aplicação
da teoria em estudo,
asseverando:
[...] não há, a nosso sentir, no Código Civil Brasileiro em vigor,
qualquer entrave à indenização das chances perdidas. Pelo
contrário, uma interpretação sistemática das regras sobre a
responsabilidade civil traçadas pelo
legislador pátrio nos leva a
acreditar que as chances perdidas, desde que sérias, deverão ser
sempre indenizadas quando restar provado o nexo causal entre a
atitude do ofensor e a perda da chance.
448
Em continuidade, aponta o citado autor, como sustentácul
o da existência,
ainda que implícita, do princípio da reparação integral dos danos, o conteúdo
normativo inserto no Art. 402 do Código Civil, no sentido de que “[...] salvo as
exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor,
ab
rangem, além do que efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de
lucrar”, mencionando, ainda, que referido vetor há que servir de esteio ao
intérprete quando este perquirir ao derredor daquilo que deve ou não ser alvo de
reparação no âmbito da respon
sabilidade civil.
447
Ibidem, p. 01.
448
SAVI, Sérgio.
Respo
nsabilidade civil por perda de uma chance
. São Paulo: Jurídico Atlas,
2006, p. 86.
3
3
1
1
4
4
Importante ponderar que, no seu entendimento
do qual comungamos
,
o princípio da reparação integral dos danos se apresenta como decorrência lógica
dos postulados constitucionais fundamentais da proteção da dignidade humana
(Art. 1º, in
c. III) e da necessidade de construção de uma sociedade brasileira livre,
justa e solidária (Art. 3º, inc. I).
449
Por último, trata da evolução da responsabilidade civil, cujo nascedouro
se deu em torno do elemento culpa, de modo que só de vislumbrava, no i
nício,
sua faceta subjetiva.
A modalidade subjetiva trata da responsabilidade cujo reconhecimento
depende de haver, no mínimo, culpa do agente violador do direito alheio, de modo
que, para a sua verificação, entremostra
-
se imprescindível a averiguação da
atitude levada a efeito pelo indivíduo apontado como infrator.
Assim, se a violação do direito eclodiu de conduta negligente, imprudente
ou imperita do agente, exsurgirá sua responsabilidade civil junto à vítima.
Destaque
-
se que, a presença de dolo por
parte do infrator igualmente dá
ensejo à eclosão de sua responsabilidade civil, pois, indubitavelmente, se é
responsável aquele que agiu sem a intenção de violar direito alheio, assim
também o é aqueloutro que almejou o alcançamento de tal desiderato.
450
449
Ibidem, p. 87
-
88: “Esta ‘absorção’ do Princípio da reparação integral dos danos pela
Constituição Federal pode parecer, à primeira vista, desprovida de eficácia prática. T
odavia,
por constar do texto constitucional, permitirá sua mais fácil aplicação, já que a Constituição
Federal, como sabemos, está no ápice do sistema e deve nortear sempre a atividade do
intérprete”.
450
PEREIRA, 1998, p. 29
-
30: “[...] a essência da respons
abilidade subjetiva vai assentar,
fundamentalmente, na pesquisa ou indagação de como o comportamento contribui para o
prejuízo sofrido pela vítima. Assim procedendo, não considera apto a gerar o efeito
ressarcitório um fato humano qualquer. Somente será ge
rador daquele efeito uma
determinada conduta, que a ordem jurídica reveste de certos requisitos ou de certas
características. Assim considerando, a teoria da responsabilidade subjetiva erige em
pressuposto da obrigação de indenizar, ou de reparar o dano, o
comportamento culposo do
agente, ou simplesmente a sua culpa, abrangendo no seu contexto a culpa propriamente dita
e o dolo do agente. Ao determinar o fundamento da responsabilidade civil na doutrina
subjetiva, os autores como Demogue, Ripert, De Page a e
ncaram sob ângulo sociológico.
Nesta visada, cada um suportará os ganhos e as perdas de suas atividades, salvo se na
origem do dano ocorrer uma ‘culpa’. Esta teoria é baseada no princípio da ‘autonomia da
vontade’. Em consequência ‘ninguém deve nada a ning
uém’. Se ocorre um dano, a vítima,
eleita pela sorte, sofrê
-
lo
-
á a seu cargo, ‘a menos que demonstre uma culpa, uma vez que a
culpabilidade, não podendo ser presumida, deve ser provada. A doutrina contrasta com a do
risco, que repousa exclusivamente sobre
a idéia econômica do proveito’”.
3
3
1
1
5
5
Co
m o passar do tempo, verificou
-
se que a responsabilização por danos
não poderia mais ficar adstrita à comprovação do elemento culpa, surgindo,
então, a chamada responsabilidade objetiva.
A modalidade objetiva refere
-
se à responsabilidade cujo reconhecimen
to
independe da análise da culpa do agente
e, obviamente, também do dolo
, na
medida em que há dispensa da lei da necessidade de apreciação da conduta do
indivíduo apontado como responsável pelo direito violado.
Observe
-
se que, a rigor, não se poderá f
alar, portanto, na existência
propriamente de um agente violador, mas apenas e tão
-
somente na existência de
um responsável pelo direito violado por atitude que não se caracteriza como
culposa porque não impregnada de qualquer negligência, imprudência ou
im
perícia.
Aqui, exige
-
se apenas um comportamento para que se possa considerar
o seu autor como responsável civil pela violação de direito que dessa atitude
eclodiu, mesmo que o aludido modo de agir encontre total respaldo na legislação.
Não se pode perder
de vista, também, o giro conceitual que sofreu o
instituto da responsabilidade, na exata medida em que o ato ilícito deixou de ser
a
menina dos olhos
, deslocando
-
se, assim, a preocupação à proteção da vítima de
um dano injusto.
Sérgio Savi:
Esta nova fo
rma de análise das regras de responsabilidade civil
acaba por concretizar a dogmática jurídica principiológica, pois
permitirá que, diante de um caso concreto, o aplicador do direito
pondere os interesses em jogo e, a partir dos valores expressos
na Consti
tuição Federal, decida quem deve arcar com a
responsabilização pelos prejuízos. A Responsabilidade Civil
focada no dano injusto permite, portanto, que as situações
subjetivas sejam analisadas em conjunto e não mais
isoladamente, como ocorria antes da inter
pretação dos institutos
de Direito Civil à luz da Constituição, o que permitirá a mais
efetiva realização de justiça. A perda de uma chance, por sua vez,
na grande maioria dos casos será considerada um dano injusto e,
assim, passível de indenização. Ou sej
a, a modificação do foco da
3
3
1
1
6
6
responsabilidade civil, acaba por servir como mais um fundamento
para a indenização desta espécie de dano.
451
Nossos Pretórios já vêm reconhecendo a possibilidade jurídica do pedido
indenitário fulcrado na teoria da perda de uma
chance, podendo
-
se citar, nesse
particular, o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, quando dos
julgamentos do AG nº 272.635/RJ, RESP nº 57.529/DF e RESP nº 788.549/BA.
5.2.2
A aplicação da teoria da responsabilidade por perda de uma chance
como
corolário do direito fundamental à proteção jurídica efetiva à
convivência familiar e comunitária de crianças e adolescentes: a
quebra da isonomia como fator de embasamento à responsabilidade
estatal
Como visto anteriormente, tem
-
se como irrefragável a
assertiva de que,
por força constitucional, o Estado deve outorgar especial proteção à família, bem
como, em se tratando de direitos e interesses afetos a crianças e adolescentes,
aplicar os princípios da prioridade absoluta e da proteção integral, quando
da
condução jurídica de seus destinos.
Para Eduardo Espínola:
[...] o amor dos pais aos filhos e o destes aos pais continua a ser
cultivado e observado com toda a dedicação e carinho. A família,
principalmente em seu círculo restrito, cada vez mais se im
põe ao
espírito da coletividade, como base sólida da sociedade, a
inspiradora das virtudes cívicas, o mais puro esteio da
organização estatal. Daí o reconhecimento, as garantias e favores
que lhe tributam as mais modernas Constituições Políticas.
452
Em cons
onância com a gama protetiva acima retratada e, também por
ordem constitucional, outorgou
-
se a crianças e adolescentes, dentre outros e com
451
SAVI, 2006, p. 98
-
99.
452
ESPÍNOLA, Eduardo.
A família no direito civil brasileiro
.
Campinas: Bookseller, 2001, p.
28.
3
3
1
1
7
7
status
jusfundante, o direito de convivência familiar e comunitária, de modo que
se existe a concessão de um direito
, inegável a existência, em contrapartida, de
uma garantia efetiva que o assegure, projeta, repare e concretize.
Grosso modo, vale repisar que de nada adiantaria afirmar
-
se no texto
basilar que é direito de todos ir e ver dentro do território nacional se,
de outro
lado, não se verificasse a existência da garantia fundamental
453
de impetração de
habeas corpus
, a fim de prevenir ou corrigir eventuais abusos ou violações em
relação ao citado direito de liberdade de locomoção.
Desta feita, e voltando
-
se os olho
s novamente à temática que inspirou a
realização do presente trabalho, tem
-
se que, se a Constituição Federal
assegurou, com caráter de norma fundamental, o direito à convivência familiar e
comunitária a crianças e adolescentes, devem, necessariamente, exis
tir
mecanismos aptos a ensejar a pronta defesa, a concretização e a reparação em
casos de malferimento ao exercício do aludido direito.
Entretanto, o que se observa na prática, é a ausência de positivação
específica no que se refere às hipóteses de violaç
ão do referido direito
fundamental dos infantes, emergindo daí a necessidade de se buscar, via
integração do ordenamento jurídico, meios que possam suprir, a contento, tal
lacuna, a fim de que os prejudicados possam encontrar, nas instâncias próprias, a
re
sponsabilização, a cessação e a reparação da violação que lhes foi
injustamente impingida.
Na seara repressiva, ou seja, depois de ocorrida a violação do direito
de convivência familiar e comunitária, tem
-
se a total possibilidade de que os
agentes prejudi
cados busquem a responsabilização do Estado pelo
descumprimento de um dever (obrigação) que lhe era inerente e inafastável,
surgindo, com plena viabilidade, a aplicação judicial da teoria da perda de uma
453
DIMOULIS, Dimitri; MARTINS, Leonardo.
Manual de introdução ao estudo do direito
. 2ª
ed. rev. atual. e
ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 80: “As garantias
fundamentais correspondem às disposições constitucionais que não enunciam direitos, mas
objetivam previnir e/ou corrigir uma violação de direitos”.
3
3
1
1
8
8
chance, cujos caracteres gerais foram explanados no
item imediatamente
anterior ao presente.
De fato.
Ab initio
, e de acordo com a lição propagada por Sergio Cavalieri Filho,
necessário se faz a correta distinção entre obrigação e responsabilidade, cuja
diferenciação, nos dizeres do aludido jurista, assim
se consubstanciam:
Embora não seja comum nos autores, é importante distinguir a
obrigação da responsabilidade. Obrigação é sempre um dever
jurídico originário; responsabilidade é um dever jurídico sucessivo,
conseqüente à violação do primeiro. Se alguém
se compromete a
prestar serviços profissionais a outrem, assume uma obrigação, um
dever jurídico originário. Se não cumprir a obrigação (deixar de
prestar serviços), violará o dever jurídico originário, surgindo daí a
responsabilidade, o dever de compor o
prejuízo causado pelo não
cumprimento da obrigação. Em síntese, em toda obrigação há um
dever jurídico originário, enquanto que na responsabilidade há um
dever jurídico sucessivo. Daí a feliz imagem de Larenz ao dizer que
‘a responsabilidade é a sombra da
obrigação’. Assim, como não há
sombra sem corpo físico, também não há responsabilidade sem a
correspondente obrigação. Sempre que quisermos saber quem é o
responsável teremos que identificar aquele a quem a lei imputou a
obrigação, porque ninguém poderá se
r responsabilizado por nada
sem ter violado dever jurídico preexistente.
454
Em continuidade, para que se possa aplicar a teoria da perda de uma
chance em casos de violação ou malferimento ao direito fundamental à
convivência familiar e comunitária de crianç
as e adolescentes, mister se faz,
corretamente, identificar quem detém o dever, a obrigação de concretizá
-
lo e
respeitá
-
lo para que, ao depois, se possa perseguir, com segurança, a devida
responsabilização pela verificação do ilícito.
Na hipótese em estud
o, surge, com clareza solar, que a obrigação pela
consecução do mencionado direito fundamental recai sobre o Estado, ou seja,
sobre a União Federal, os Estados
-
membros, o Distrito Federal e os Municípios,
nos exatos termos dos Arts. 226 e 227 da Constituiç
ão Federal, referendados pelo
Art. 70 do Estatuto da Criança e do Adolescente.
454
CAVALIERI FILHO, 2006, p. 24.
3
3
1
1
9
9
Assim, uma vez respondida a pergunta, necessária se faz uma breve
explanação, no intuito de identificar
-
se a materialização do regime jurídico de
responsabilização estatal no Brasil, em face do quanto positivado no § 6º do Art.
37 da Constituição Federal, que assim dispõe:
Art. 37: A administração pública direta e indireta de qualquer dos
Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios obedecerá aos princípio
s da legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também,
ao seguinte:
[...]
§ 6º
As pessoas jurídicas de direito público e as de direito
privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos
danos que seus agentes, nessa qual
idade, causarem a terceiros,
assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos
de dolo ou culpa [...].
Por intermédio da leitura do dispositivo basilar referenciado no parágrafo
anterior, tem
-
se claro que, nas hipóteses em que a apuração env
olver atos ou
condutas lesivas e/ou ilícitas perpetradas por pessoas jurídicas de direito público
(União Federal, Estados, Distrito Federal e Municípios), bem como por pessoas
jurídicas de direito privado que se encontrem na qualidade de prestadoras de
ser
viços públicos, a responsabilidade será de natureza objetiva, ou seja,
prescinde
-
se do elemento culpa, atendendo
-
se, para sua devida concretização,
apenas e tão
-
somente a demonstração do nexo de causalidade entre o evento e o
prejuízo alegado pelo agente q
ue o sofreu.
De acordo com a interpretação emprestada por Celso Antônio Bandeira
de Mello ao conteúdo normativo constitucional de regência, verifica
-
se que as
pessoas que ensejam a responsabilização estatal:
[...] são todas aquelas que
em qualquer níve
l de escalão
tomam decisões ou realizam atividades da alçada do Estado,
prepostas que estão ao desempenho de um mister público
(jurídico ou material), isto é, havido pelo Estado como pertinente a
si próprio. Nesta qualidade ingressam desde as mais altas
autoridades até os mais modestos trabalhadores que atuam pelo
aparelho estatal. Ademais, para fins de responsabilidade
subsidiária do Estado, incluem
-
se, também, as demais pessoas
jurídicas de Direito Público auxiliares do Estado, bem como
quaisquer outras
, inclusive de Direito Privado, que, inobstante
alheias à sua estrutura orgânica central, desempenham
3
3
2
2
0
0
cometimentos estatais sob concessão ou delegação explícitas
(concessionários de serviço público e delegados de função
pública) ou implícitas (sociedades m
istas e empresas do Estado
em geral, quando no desempenho de serviço público
propriamente dito). Isto porque não faria sentido que o Estado se
esquivasse a responder subsidiariamente
ou seja, depois de
exaustas as forças da pessoa alheia à sua intimidade
estrutural
se a atividade lesiva só foi possível porque o Estado lhe colocou
em mãos o desempenho da atividade exclusivamente pública
geradora do dano.
455
A responsabilidade estatal, todavia, galgou muitas conquistas até atingir o
estágio atual, passando
, inegavelmente, por uma gradual e surpreendente evolução,
sendo certo que o direito francês teve contribuição de suma importância, devido à
construção jurisprudencial que se deu nesse país, através do Conselho de Estado.
Na análise de Rômulo Ferreira Nunes:
[...] não se pode desprezar que a idéia de justiça social foi
fundamental para a evolução dessa responsabilização, como se
reporta Louis Trobatas: ‘O desenvolvimento da responsabilidade
do Poder Público, produto de um trabalho da doutrina e da
jurispr
udência, justifica
-
se por considerações de justiça e
solidariedade social: não é justo deixar a cargo de uma pessoa o
dano causado pelo funcionamento do serviço público, que, por
definição, traz proveito a toda coletividade. A idéia de um direito
social, o
desejo de defender o indivíduo isolado, isto é, o fraco,
que determinaram esta evolução, e seus resultados, até o
presente, mostraram
-
se generosos e conformes ao advento de
uma justiça social melhor’.
456
No desenvolvimento da responsabilidade estatal surgi
ram três teorias, a
saber: a Teoria da Irresponsabilidade do Estado, a Teoria Civilista e a Teoria
Publicista. Cabe ressaltar que durante a evolução dessas teorias, umas não
sucederam às outras, ao contrário, o mundo jurídico verificou a coexistência
progr
essiva das mesmas.
455
MELLO,
1997, p. 938
-
939.
456
Le dévéloppemnt de la responsabilité de la puissance publique, produit d’un long travail de la
doctrine e de la jurisprudence, se justifie par des considérations de justice et de solidariété
sociale; il n’est pas juste de laisser à la
charge d’une personne le dommage causé par le
fonctionnement d’un service public dont profite, par définition, toute la collectivité. C’est I’idée
d’un droit social, le désir de défendre I’individu isolé, c’está
-
dire le faible, Qui ont déterminé
cette évolution, et ses résultats ont été tenus, jusqu’à présent, pour généreux et conformes à
l’avenement d’une justice sociale meilleure
”.
3
3
2
2
1
1
Originariamente vigia o princípio da irresponsabilidade estatal, no qual
não se concebia qualquer tipo de reparação de danos causados pelo Poder
Público a quem quer seja.
Os Estados Absolutistas pregavam que possíveis erros da Administr
ação
constituiriam um risco que todos deveriam correr, ou seja, o erro do Estado era
um erro de todos. Assim sendo, entendia
-
se que o Estado era a expressão da Lei
e do Direito e jamais poderia violar uma lei, redundando na fórmula
the King can
do no wrong
(o rei não erra). Esse princípio abrangia também os altos
funcionários que representavam o Estado.
Afirmavam, ainda, ser o Estado dotado de soberania e que não poderia
ser colocado no mesmo nível do servidor e que os atos atentatórios à lei seriam
imputa
dos ao funcionário, e nunca ao Estado.
Concluindo, existia a irresponsabilidade plena do Estado e, por outro lado
a responsabilidade do funcionário quando o ato lesivo pudesse ser atribuído
diretamente a ele.
Como não poderia ser diferente, a teoria da i
rresponsabilidade do Estado
não resistiu à evolução social e, por evidências, encontra
-
se inteiramente
ultrapassada.
A partir do século XIX, começa a ser reconhecida a possibilidade da culpa
estatal pelos atos de gestão. O Estado passou a ser visto como p
essoa revestida
de personalidade com capacidade de adquirir direitos e contrair obrigações. Desta
forma, a teoria da irresponsabilidade começa a ser superada.
Para efeito de responsabilidade do Estado, distinguia
-
se: (i) quando agia
soberanamente, usando seu poder de império, não havia equiparação à pessoa
jurídica de direito privado e, conseqüentemente, não poderia ser
responsabilizado; e, (ii) quando a atividade se equiparasse aos particulares, o
Estado praticava ato de gestão, e estava sujeito a reparar
os atos lesivos
causados por seus prepostos.
3
3
2
2
2
2
Já no final do século XIX, a teoria civilista declinou, uma vez que se
constatou que essa separação de atos tornou
-
se impossível de ser aplicada aos
casos concretos, diante da dificuldade de distinguir quando o
Estado atuava
soberanamente e quando atuava equiparado ao particular.
Nesse diapasão, surge a responsabilidade subjetiva do Estado, baseada
exclusivamente na culpa. O Estado seria responsabilizado se houvesse culpa (em
sentido amplo) do agente, preposto
ou funcionário
culpa indireta (
in eligendo
e
in vigilando
).
Para que o Estado respondesse pelos danos, incumbia ao particular
prejudicado provar a ilicitude perpetrada pelo agente público.
Com a dificuldade de se demonstrar a culpa do Estado, frustrava
-
se a
obrigação deste reparar o dano causado pelo seu agente. Assim sendo, a matéria
evoluiu no sentido de que os princípios a serem observados deveriam ser de
Direito Público, e não de Direito Privado.
O advento do célebre caso
Blanco
457
foi fundamental pa
ra o
reconhecimento dos princípios do Direito Público, bem como, na seara norte
-
americana, o julgamento Greenman v. Yuba Power Products, ocorrido no início da
década de 1960, como explana Fábio Luiz Gomes:
O precedente jurisprudencial que nos Estados Unid
os origina a
doutrina da responsabilidade sem culpa é o caso Greenman v.
Yuba Power Products, de 1962. Neste caso, a parte foi a juízo
buscando a reparação dos danos sofridos em razão de uma lesão
causada em seu rosto, fruto de um pedaço de madeira que se
desprendeu da máquina pertencente a um conjunto de carpintaria
que lhe foi oferecido pela vendedora Yuba Power Products. Em
que pese não tenha havido culpa da vendedora, restando
comprovado que o ato se deveu ao uso normal do equipamento,
houve a responsab
ilização da empresa.
458
457
“Agnés Blanco, ao atravessar uma rua na cidade francesa de Bordeux, foi atropelada por um
vagonete da Cia. Nacional de Manu
fatura de Fumo, que lhe estraçalhou a perna. Seus pais
acionaram o Estado pleiteando indenização. Suscitado conflito de Atribuições, o Tribunal de
Conflitos declarou que a controvérsia deveria ser julgada pelo Tribunal Administrativo, porque
se tratava de
apreciar a responsabilidade surgida do funcionamento de serviço público”.
458
GOMES, Fábio Luiz.
Responsabilidade objetiva e antecipação de tutela
: a superação do
paradigma da modernidade. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 175.
3
3
2
2
3
3
Celso Antônio Bandeira de Mello lembra que quando adotada a
responsabilidade do Estado, sua tendência foi expandir
-
se cada vez mais, de tal
sorte que “[...] evolui de uma responsabilidade subjetiva, isto é, baseada na culpa,
para uma
responsabilidade objetiva, vale dizer, ancorada na simples relação de
causa e efeito entre o comportamento administrativo e o evento danoso”.
459
Desta forma, com o intuito de solucionar a questão, surgiram as teorias da
culpa do serviço (ou administrativa,
ou falta de serviço), e do risco, que abrange
as teorias do risco administrativo e do risco integral, sendo todas oriundas da
responsabilidade objetiva do Estado, mas com fundamentos diversos.
Esta teoria traz a idéia de responsabilidade do Estado não pe
la culpa do
funcionário que exerce atividade pública, indagando
-
se apenas acerca da falta
objetiva do serviço, ou seja, quando o serviço não funcionava, funcionava mal ou
funcionava tardiamente.
Então, independe a falha do agente, pois existindo má presta
ção do
serviço que ocasione danos a terceiros, existe a obrigação de o Estado indenizar.
Desta forma, cabe ao prejudicado provar a falta ou deficiência do serviço público.
A teoria em debate caracteriza
-
se como responsabilidade objetiva, embasada na
idéia
da desnecessidade do elemento culpa para configurar a responsabilidade.
A obrigação de ressarcir o dano prescinde do elemento subjetivo, para se
concentrar no elemento objetivo representado pelo nexo de causalidade entre a
ação e o dano.
De oportuno frisar que não há como carrear para o Poder Público os ônus
de todos os males suportados pelas sociedades, pois devem existir limites do
dever de vigilância por parte do Estado.
A teoria do risco administrativo e a teoria do risco integral podem ser
consider
adas espécies do mesmo gênero, mas a primeira admite causas
excludentes de responsabilidade, não ocorrendo o mesmo com a segunda.
459
MELLO, 1997, p. 438
.
3
3
2
2
4
4
Através desta teoria (responsabilidade objetiva do Estado), a obrigação
do Estado em recompor os danos surge no momento em que
se vislumbra o nexo
causal entre o dano e o ato lesivo.
Desta forma, não se cogita em demonstrar culpa do agente, pois basta
que o prejudicado demonstre o prejuízo que seja atribuído à Administração.
Em contraposição, cabe ao Estado, portanto, provar qu
e não causou dano
ou que a culpa cabe a vítima para livrar
-
se da obrigação indenitária.
Conforme a teoria ora estudada, a responsabilidade da Administração é
admitida em qualquer caso, desde que haja o nexo causal entre o dano e o ato,
mesmo que resulte d
e culpa ou dolo da própria vítima, não se admitindo
excludente de responsabilidade.
Essa teoria foi considerada por Hely Lopes Meirelles como:
[...] modalidade extremada da doutrina do risco administrativo,
abandonada na prática, por conduzir ao abuso e
à iniquidade
social. Por essa fórmula radical, à Administração ficaria obrigada a
indenizar todo e qualquer dano suportado por terceiros, ainda que
resulte da culpa ou dolo da vítima. Daí por que foi acoimada de
‘brutal’, pelas graves conseqüências que hav
eria de produzir se
aplicada na sua inteireza. Essa teoria jamais foi acolhida entre
nós, embora haja quem sustente sua admissibilidade no texto
Constitucional da República.
460
No ordenamento jurídico brasileiro ocorreu alternação entre as doutrinas
subjeti
va e objetiva da responsabilidade civil da Administração com o decurso do
tempo.
O Art. 179, inc.
XXIX, da Constituição Federal de 1824, abaixo descrito
in
verbis
, estabelecia a responsabilidade dos empregados públicos pelos abusos e
omissões praticados n
o exercício de suas funções, salvo no que respeitava ao
Imperador, que gozava do privilégio da irresponsabilidade (Art. 99,
in verbis
).
460
MEIRELLES, Hely Lopes.
Direito administrativo brasileiro
. 34ª ed. São Paulo: Malheiros,
2005, p. 558.
3
3
2
2
5
5
Art. 179: A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Políticos dos
Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a se
gurança
individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do
Império, pela maneira seguinte: [...]
XXIX
os Empregados Publicos são estrictamente responsaveis
pelos abusos, e omissões praticados no exercicio das suas
funcções, e por não fazerem e
ffectivamente responsaveis aos
seus subalternos.
Art. 99: A Pessoa do Imperador é inviolavel, e Sagrada: Elle não
está sujeito a responsabilidade alguma.
A Constituição Republicana de 1891 previa comandos tendentes à
responsabilização dos funcionários públicos pelos abusos e omissões praticados
no desempenho de suas atribuições ou quando fossem indulgentes com seus
subalternos, conforme o descrito no Art. 82.
Nesse caso, não era defeso a solidariedade do Estado no ressarcimento
do dano. Vejamos a redação do mencionado dispositivo legal,
in verbis
:
Art. 82: Os funccionarios publicos são estrictamente
responsaveis pelos abusos e omissões em que incorrerem no
exercicio de seus cargos, assim como pela indulgencia, ou
negligencia em não responsabilizarem effe
ctivamente os seus
subalternos.
Simultaneamente à disposição constitucional citada, vigoravam leis e
decretos tornando manifesta a responsabilidade da Fazenda Pública por atos
lesivos praticados por seus agentes.
Então, através do liberalismo, foi introd
uzida a responsabilidade civil do
Estado pelos atos de seus agentes, caracterizada pela assunção dessa
responsabilização em todos os níveis de atividades e identificada com a chamada
culpa do preposto, prevista no Art. 15 do Código Civil. Vejamos, novament
e, a
redação do mencionado artigo,
in verbis
: “As pessoas jurídicas de direito público
são civilmente responsáveis por atos dos seus representantes que nessa
qualidade causem danos a terceiros, procedendo de modo contrário ao direito ou
3
3
2
2
6
6
faltando o dever prescrito por lei, salvo o direito regressivo contra os causadores
do dano”.
A imprecisão legislativa, todavia, propiciou vasta divergência na
interpretação do citado artigo.
Entenderam alguns juristas, conforme o texto da lei, que havia a
possibilidade da
aplicação da teoria do risco.
A esse respeito Alvino Lima sustenta: “O Código Civil Brasileiro seguindo
a tradição de nosso direito, não se afastou da teoria da culpa, como princípio
genérico regulador da responsabilidade extracontratual”,
461
enquanto que,
de
outro vértice, Ulderico Pires dos Santos ponderava:
Os Arts. 15 do Código Civil e 107 da Constituição Federal
aí estão e não autorizam discussão alguma a esse
respeito, isto é, de que elas respondem sempre pelos
danos provenientes de seus agentes, fun
cionários ou
prepostos quando estes, no exercício de seus misteres,
violam direitos. Somente numa hipótese poderão se livrar
do ressarcimento: é no caso de resultar insofismavelmente
comprovado que a provocadora do evento foi única e
exclusivamente a vítim
a.
462
Vigia, entre nós, a doutrina da culpa subjetiva, superada com o advento
da Magna Carta de 1946, a qual, em seu Art. 194, recepcionou a teoria objetiva
do risco administrativo, revogando em parte o Art. 15 do Código Civil. É o
entendimento dos consagra
dos juristas Aguiar Dias, Seabra Fagundes e Hely
Lopes Meirelles.
Em contraposição, encontra
-
se o pensamento abalizado dos não
menos famosos Themístocles Cavalcanti, Pontes de Miranda, Alfredo de
461
Alvino Lima, apud, OLIVEIRA, Josivaldo Félix de.
A responsabilidade do Estado por ato
lícito
. São Paulo: Jurídica, 2001, p. 59.
462
SANTOS, Ulderico P
ires dos.
A responsabilidade civil na doutrina e na jurisprudência
.
Rio de Janeiro: Forense, 1984, p. 595.
3
3
2
2
7
7
Almeida Paiva entre outros. Observe
-
se a redação do mencion
ado artigo
constitucional,
in verbis
:
Art. 194: As pessoas jurídicas de direito público interno são
civilmente responsáveis pelos danos que os seus funcionários,
nessa qualidade, causem a terceiros. Parágrafo único. Caber
-
lhes
-
á ação regressiva contra os
funcionários causadores do
dano, quando tiver havido culpa dêstes.
A teoria da responsabilidade objetiva também foi tratada na Constituição
Federal de 1967, em seu Art. 105, bem como na Constituição de 1969, no Art.
107.
Descrever
-
se
-
ão então os artigos
acima mencionados,
in verbis
:
Art. 105 da CF/67: As pessoas jurídicas de direito público
respondem pelos danos que os seus funcionários, nessa
qualidade, causem a terceiros. Parágrafo único. Caberá ação
regressiva contra o funcionário responsável, nos cas
os de culpa
ou dôlo.
Art. 107 da CF/69: As pessoas jurídicas de direito público
responderão pelos danos que seus funcionários, nessa qualidade,
causarem a terceiros. Parágrafo único. Caberá ação regressiva
contra o funcionário responsável, nos casos de cu
lpa ou dolo.
Nada melhor do que fazer eclodir a firme orientação jurisprudencial
emanada do Excelso Supremo Tribunal Federal:
Responsabilidade Civil do Estado. Art. 107 da Constituição.
Assentada no risco administrativo, independe da prova de culpa.
Bast
a
que
o
lesado
demonstre
o
nexo
causal
entre
o
fato
e
dano.
Recurso conhecido e provido (STF, 2ª Turma, Recurso
Extraordinário nº 116.333
RJ, j. 30/06/88, v.u., Relator Ministro
Carlos Madeira, com destaques nossos).
Neste caminhar, finalmente chega
-
se
à atual Constituição Federal de
1988, que, no § 6º do Art. 37, prevê,
in verbis
:
Art. 37, § 6º: As pessoas jurídicas de direito público e as de direito
privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos
3
3
2
2
8
8
danos que seus agentes, nessa qualidade, cau
sarem a terceiros,
assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos
de dolo ou culpa.
O dogma adrede ventilado faz alusão à denominada Teoria do Risco
Administrativo, a qual postula que qualquer ato praticado pela administração
que vier a c
ausar dano a terceiro deve ser integralmente indenizado, haja
vista que a responsabilidade civil do Estado e dos prestadores de serviços
públicos é de natureza objetiva, ou seja, não há necessidade de que o
praticante do ato malsinado tenha agido com culpa
ou dolo, bastando
somente a existência da relação de causa e efeito entre a ação ou omissão
estatais e o dano sofrido.
Assim sendo, seguindo as linhas traçadas pelas últimas Constituições,
bem como pela Constituição Federal em vigor desde 1988, tem
-
se qu
e o
legislador pátrio manteve a responsabilidade objetiva da Administração, sob a
modalidade do risco administrativo, modalidade essa perfeitamente aplicável à
problemática em estudo, não se perdendo de vista a vetusta afirmação de há
muito perpetrada por
Onofre Mendes Júnior: “[...] tôda lesão partida do Estado,
por seus representantes ou prepostos, a um legítimo direito individual, não afeta
sòmente o bem de um, mas o de todos, ou da coletividade”.
463
Entrementes, a preponderância pela adoção da teoria da
responsabilidade objetiva não afasta a possibilidade de, em casos específicos, de
o Estado responder subjetivamente pelos danos causados a outrem, mormente
no que diz respeito às chamadas condutas omissivas,
id est
, nas hipóteses em
que o órgão estatal possui uma determinada obrigação, porém, o serviço não foi
realizado, foi efetuado intempestivamente ou, ainda, foi, mas não a contento,
encontrando
-
se despido de qualquer eficácia.
Trata
-
se da responsabilidade cujo reconhecimento depende da presença
de, no
mínimo, culpa do agente violador do direito alheio, de modo que, para a
463
MENDES JÚNIOR, Onofre.
Direito administrativo
. 2ª ed. rev. e aum. Belo Horizonte:
Bernardo Álvares, 1961, vol.
I
, p. 314.
3
3
2
2
9
9
sua verificação, entremostra
-
se imprescindível a averiguação da atitude levada a
efeito pelo indivíduo apontado como infrator.
Assim, se a violação do direito eclodiu de conduta negli
gente,
imprudente ou imperita do agente, exsurgirá sua responsabilidade civil junto à
vítima.
Destaque
-
se que a presença de dolo por parte do infrator
igualmente dá ensejo à eclosão de sua responsabilidade civil, pois,
indubitavelmente, se é responsável a
quele que agiu sem a intenção de
violar direito alheio, assim também o é aqueloutro que almejou o
alcançamento de tal desiderato.
A respeito do assunto, Caio Mário da Silva Pereira leciona:
[...] a essência da responsabilidade subjetiva vai assentar,
fun
damentalmente, na pesquisa ou indagação de como o
comportamento contribui para o prejuízo sofrido pela vítima. Assim
procedendo, não considera apto a gerar o efeito ressarcitório um
fato humano qualquer. Somente será gerador daquele efeito uma
determinada
conduta, que a ordem jurídica reveste de certos
requisitos ou de certas características. Assim considerando, a
teoria da responsabilidade subjetiva erige em pressuposto da
obrigação de indenizar, ou de reparar o dano, o comportamento
culposo do agente, ou
simplesmente a sua culpa, abrangendo no
seu contexto a culpa propriamente dita e o dolo do agente. Ao
determinar o fundamento da responsabilidade civil na doutrina
subjetiva, os autores como Demogue, Ripert, De Page a encaram
sob ângulo sociológico. Nesta
visada, cada um suportará os
ganhos e as perdas de suas atividades, salvo se na origem do
dano ocorrer uma ‘culpa’. Esta teoria é baseada no princípio da
‘autonomia da vontade’. Em consequência ‘ninguém deve nada a
ninguém’. Se ocorre um dano, a vítima, el
eita pela sorte, sofrê
-
lo
-
á
a seu cargo, ‘a menos que demonstre uma culpa, uma vez que a
culpabilidade, não podendo ser presumida, deve ser provada. A
doutrina contrasta com a do risco, que repousa exclusivamente
sobre a idéia econômica do proveito’ (De Pa
ge,
Traité
, vol. II, nº
930; Demogue,
Obligations
, vol. III, nº 277; Ripert,
La Regle
Morale dans les Obligations Civiles
).
464
São os pressupostos da responsabilidade subjetiva:
464
PEREIRA, 1998, p. 29
-
30
.
3
3
3
3
0
0
a)
ação
ou
omissão
do
agente
: por ação ou omissão do agente há de se
entender a
conduta por ele efetivamente tomada, isto é, o agir positiva ou
negativamente segundo o seu próprio querer, ainda que a atitude almejada não
seja propriamente o fim que acabou sendo alcançado, daí porque a culpa mostra
-
se como elemento suficiente para o r
econhecimento do elemento em comentário.
Observe
-
se que a ação ou omissão de que ora se cogita diz respeito
àquela contrária ao ordenamento jurídico, ou seja, que não encontra respaldo na
legislação vigente. Outrossim, nunca é demais ressaltar que existem
situações
nas quais a conduta de terceiro acarreta a responsabilidade de indivíduos que a
rigor não agiram ou deixaram de agir diretamente.
É o que ocorre com as pessoas a que alude o Art. 932 do Código Civil,
cuja responsabilidade decorre do dever legal de vigilância que a lei faz questão de
ressaltar.
b)
culpa
do
agente
: como já anteriormente exposto, no âmbito da
responsabilidade subjetiva há de se perscrutar acerca da conduta do agente, seja
no aspecto comissivo ou omissivo, nunca se olvidando, evide
ntemente, que a
presença do dolo
que, como se viu, é mais do que culpa
, é mais do que
suficiente à admissão da presença do pressuposto em comentário.
Todavia, seja como for, a verdade é que basta a presença de quaisquer
das modalidades de culpa acima
mencionadas
negligência, imprudência ou
imperícia
para o integral cumprimento do pressuposto em comentário.
c)
dano
: o presente pressuposto refere
-
se a toda lesão a direito, seja ela
de ordem patrimonial ou exclusivamente moral, sendo certo que nenhum
a
discussão hoje mais remanesce quanto à indenizabilidade da última, até por conta
da redação atribuída à parte final do Art. 186 do Código Civil, daí porque se
mostram desnecessários maiores comentários acerca de tal possibilidade, já
incontroversa, diga
-
se
en passant
, desde o novo ordenamento constitucional em
decorrência das determinações constantes dos incs. V e X do Art. 5º da
Constituição Federal.
3
3
3
3
1
1
d)
relação
de
causalidade
: corresponde à relação causal, isto é, à
causa e
feito
entre a conduta do agent
e e a conseqüente ocorrência do dano
ou da
simples violação do direito para aqueles que dispensam a necessidade da
presença do dano para a caracterização do ilícito.
Assim, o dano (ou violação) deve ter decorrido de ação ou omissão
voluntária imputável
ao agente, ou, ao menos, de sua responsabilidade em razão
de determinação legal, como ocorre nas situações previstas no Art. 932 do NCC.
Assim, e depois de verificado qual o
modus operandi
de responsabilização
estatal pela violação de uma obrigação que lh
e era ínsita, em caso o direito
fundamental à convivência familiar e comunitária de crianças e adolescentes, passa
-
se a conjugar que referida demonstração é totalmente compatível com a aplicação
da já por vezes mencionada teoria da perda de uma chance.
Po
is bem.
Consoante a própria expressão utilizada no
caput
do Art. 1º da
Constituição Federal, tem
-
se como inconteste que o Brasil adotou, como forma de
governo, o modelo republicano, emergindo daí importantes considerações
jurídicas, não se perdendo de vis
ta, entretanto, que o citado modelo foi adotado
em nosso País desde o ano de 1889, momento em que se verificou a derrocada
do regime monárquico até então comandado pelo imperador Dom Pedro II.
Embora o princípio republicano
465
desfrute de inegável importância dentro
do arcabouço jurídico brasileiro, a verdade é que o mesmo não se constitui em
465
AGRA, Walber de Moura.
Republicanismo
. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005, p. 109:
“Ultimamente, os princípios defendidos pelo Republicanismo passam por um processo de releitura
para serem utilizados contra as múltiplas crises que afligem a sociedade. Esses princípios são
dinâmicos, podendo se ajustar tanto a uma estrutura econômica capitalista quanto a uma
estrutura econômica socialista. Inexiste a implementação de uma política deniminada republicana,
composta de medidas detalhadas que precisam s
er realizadas. Seu conteúdo é principiológico,
orientando de maneira genérica as diretrizes firmadas pelos agentes públicos. Seus valores
tencionam influenciar as formas de organização política para garantir uma lliberdade
substancialista aos homens, solta
ndo
-
os das amarras impostas pela dominação existente em
amplos setores da sociedade. A recuperação de alguns conceitos chave do Republicanismo, além
de ajudarem na manutenção da estabilidade social e aprimorarem o regime democrático,
contribuem para que o Estado possa da melhor forma possível realizar suas finalidades, que em
última consideração consiste em proporcionar à população uma vida digna, com a garantia de que
não terão sua liberdade mitigada por atos arbitrários”.
3
3
3
3
2
2
cláusula pétrea, o que, em tese, estaria a permitir sua exclusão ou alteração via
emenda constitucional, como, aliás, se verificou, no plano concreto, com a
realização
de plebiscito nesse sentido em 1993.
Ensina Roque Antonio Carrazza:
O que podemos dizer, em termos genéricos, é que, numa
República, o Estado, longe de ser o senhor dos cidadãos, é o
protetor supremo de seus interesses materiais e morais. Sua
existência
não representa risco para as pessoas, mas um
verdadeiro penhor de suas liberdades.
466
Desta feita, inegável a assertiva de que a República foi erigida no Brasil como
forma de contraponto e de mudança em relação ao governo que até então vigia
(monarquia), pa
ssando a concentração do poder de uma só pessoa para a coletividade,
para o povo, por intermédio de representantes legitimamente eleitos por essa mesma
coletividade e até mesmo diretamente em determinadas e específicas situações.
Assim, e de acordo com os
ensinamentos de Adriano Pilatti, verifica
-
se
que a República tem por escopo ser
o governo de muitos
, caracterizando
-
se por
um feixe de atributos mínimos que constituem a riqueza de sua transposição
como princípio fundamental positivado, a saber:
[...]
afirmação radical de uma concepção igualitária de bem
público, cujo titular e destinatário é o povo, compreendido como
multidão de cidadãos livres, porque iguais em direitos (e não de
súditos segregados com base em discriminações odiosas de
linhagem, das q
uais decorrem privilégios transmissíveis por
hereditariedade, e outras superstições do mesmo naipe);
rigorosa distinção entre o patrimônio público (que pertence
coletivamente à multidão
-
cidadã e não pode sofrer apropriação
particular por quem quer que seja) e o patrimônio privado dos
governantes; distinção esta, que deve nortear a atuação de todos
os agentes estatais, sobretudo quando traduzida em atos de
gestão da coisa pública, impondo
-
lhe os deveres inarredáveis de
impessoalidade e de prestação de cont
as;
eletividade dos
governantes (ao menos, enquanto houver governantes e
governados [...]), mormente do chefe do Estado, temporariedade
dos seus mandatos, e conseqüente periodicidade das eleições;
possibilidade de responsabilização político
-
jurídica de
todos os
466
CARRAZZA, Roque Antonio.
Curso
de direito constitucional tributário
. 19ª ed. rev. ampl. e
atual. São Paulo: Malheiros Editores, 2004, p. 48.
3
3
3
3
3
3
agentes públicos, sem exceção, pela prática de atos lesivos ao
bem público.
467
Desta feita, e depois de visualizadas as noções gerais afetas ao princípio
constitucional republicano, encontra
-
se porto seguro para estabelecer sua
definição.
A expre
ssão
República
, como bem salienta Roque Antonio Carrazza,
468
diz respeito à forma de governo em que os detentores do poder político exercem
-
no em caráter eletivo, representativo, transitório e com responsabilidade.
Outro dado atrelado à aplicação do princíp
io republicano inegavelmente
diz respeito à questão do tratamento isonômico dos cidadãos que se encontram
sob a sua égide e proteção.
A questão afeta à isonomia é fonte de aplicação e inspiração para todas
as áreas jurídicas existentes, servindo de corolá
rio e agindo como irreprochável
desdobramento do princípio fundamental da dignidade da pessoa humana,
regularmente dogmatizado no inc. III do Art. 1º da
Lex Legum
.
Assim, tem
-
se que a necessidade de tratamento isonômico entre
cidadãos se entremostra de ob
servância obrigatória, na exata medida em
que, numa sociedade dita republicana, não mais se toleram diferenciações
ou privilégios calcados na posição social (ou qualquer outro fator de
discriminação) ocupada por um determinado indivíduo ou grupo de
indivíd
uos.
Nesse caminho, não se verificam espaços para aceitação de
diferenciações entre pessoas que se desenvolveram dentro de seio familiar
estruturado daquelas outras que assim não puderam crescer, em face da
omissão estatal no que tange ao seu dever de con
creção do direito
467
PILATTI, Adriano.
Cadernos de soluções constitucionais
. São Paulo: ABDC, 2005, vol. I,
p. 13
-
14.
468
CARRAZZA, 2004,
p. 48.
3
3
3
3
4
4
fundamental de convivência familiar e comunitária afeto as nossas crianças e
adolescentes.
A lei não deve ser fonte de privilégios ou perseguições, mas sim,
instrumento regulador da vida social que necessita tratar eqüitativamente todos
os
cidadãos, sendo esse o conteúdo político
-
ideológico absorvido pelo princípio da
isonomia.
469
Para Aristóteles, a igualdade consiste em tratar igualmente os iguais e
desigualmente os desiguais.
Hans Kelsen afirma:
A igualdade dos sujeitos na ordenação j
urídica, garantida pela
Constituição, não significa que estes devam ser tratados de
maneira idêntica nas normas e em particular nas leis expedidas
com base na Constituição. A igualdade assim entendida não é
concebível: seria absurdo impor a todos os indiví
duos exatamente
as mesmas obrigações ou lhes conferir exatamente os mesmos
direitos sem fazer distinção alguma entre eles, como, por
exemplo, entre crianças e adultos, indivíduos mentalmente sadios
e alienados, homens e mulheres.
Observa
-
se, assim, que o
princípio da igualdade estabelece como função
precípua da lei proibir tratamento desigual às pessoas que ostentam o mesmo
status
jurídico.
Presume
-
se, dessa maneira, que as pessoas não podem ser legalmente
desequiparadas em razão da raça, do sexo ou da co
nvicção religiosa (
caput
do
Art. 5º da CF).
O que a ordem jurídica pretende firmar, por meio do princípio da
igualdade, é a impossibilidade de desequiparações fortuitas e injustificadas.
469
LOPES, Maurício Anto
nio Ribeiro.
Ética e administração pública
. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1993, p. 21: “O exercício do Poder do Estado, para que este não se transforme no
Leviatã, para que o Príncipe não possa dispor das coisas segundo seus interesses pessoais,
para q
ue a Liberdade não precise ser resgatada através de constantes revoluções, para que
a Democracia seja a única forma aceitável de governo, só pode ser concebido dentro do
âmbito de profundo e sincero respeito aos padrões éticos da moral aristotélica”.
3
3
3
3
5
5
O reconhecimento das diferenciações, sem quebra da isonomia,
deve ob
servar os seguintes critérios: (i) o elemento tomado como fator
de desigualação; (ii) a correlação lógica abstrata existente entre o fator
erigido em critério de discrímen e a disparidade estabelecida no
tratamento diversificado; e, (iii) a consonância des
ta correlação lógica
com os interesses absorvidos no sistema constitucional e destarte,
jurídico.
Só com a conjugação desses três aspectos é que se permite a análise
correta do problema.
A igualdade é princípio que visa teoricamente duplo objetivo: de um
lado propiciar garantia individual contra perseguições e, de outro, tolher
favoritismos.
É preciso que haja uma correlação lógica entre o critério desigualador e
a desigualdade de tratamento, não bastando apenas a existência de
pressupostos fatídicos div
ersos para que a lei distinga situações sem ofensa à
isonomia.
Dessa forma, a isonomia se consagra como o maior dos princípios
garantidores dos direitos individuais.
A presunção genérica e absoluta é a da igualdade, porque a Lei Maior o
impõe. Uma vez ed
itada a lei, surgem as distinções por ela formuladas em
consideração à diversidade das situações.
Por fim, vale lembrar que a própria Constituição Federal de
1988, por intermédio de seu Art. 19, põe a termo qualquer objeção em
relação ao quanto acima asse
verado, na exata medida em que
determinou, expressamente, a proibição de que a atuação dos entes
federados venha a criar distinções entre brasileiros ou preferências
entre si e, como bem alinhavou Luiz Alberto David Araujo, “[...] os
objetivos do estado br
asileiro estão claros e bem determinados. A
3
3
3
3
6
6
administração pública tem que seguir esses objetivos. Toda vez que a
administração não atentar a esses objetivos, ela estará agindo de
forma inconstitucional”.
470
O Estado, ao não concretizar o direito fundamental à convivência familiar
e comunitária, sem sombra de dúvidas, estabelece ilícita diferenciação em relação
aos infantes que tiveram a sorte de ter uma família estruturada daqueles que
assim não conseguiram, encontrando
-
se os efeitos da citada diferenciação,
infelizmente, espraiados nos mais diversos campos (educação, saúde, moradia,
vestuário, etc.), solapando
-
lhes a indispensável oportunidade de um
desenvolvimento escorreito e digno.
Ademais, a própria Lei nº 8.069/90, em plena consonância com a verba
cons
titucional, determinou, em seu Art. 70, que a responsabilidade no que tange à
prevenção à ocorrência de ameaça ou à violação dos direitos e interesses de
crianças e adolescentes é de todos.
Dentro da acepção do vocábulo
todos
não há como se excluir a
resp
onsabilidade do Estado nesse particular.
471
A confirmação do quanto acima asseverado, ainda que de maneira
analógica, encontra
-
se demonstrada por intermédio do posicionamento de nossos
Egrégios Pretórios, como se passará a evidenciar.
470
ARA
UJO, 2004, p. 650.
471
MARTINS, Daniele Comin.
Estatuto da criança e do adolescente & política de
atendimento
. São Paulo: Atlas, 2002, p. 73: “Os Direitos da Criança e Adolescente
previstos no Estatuto correspondem a uma obrigação daqueles sujeitos elencados
no
Art. 227, da Constituição Federal: família, sociedade e Estado, sendo permitido a este
último admitir a participação de entidade não
-
governamentais, ratificado pelo Art. 4º do
ECA. Pelo descumprimento de uma obrigação em relação à infância e adolescênc
ia,
tais sujeitos (individual e solidariamente, conforme o caso) que ficaram legalmente
obrigados serão responsabilizados por seus atos. Tal responsabilização será
decorrente de atos comissivos ou omissivos, ‘por falta ou insuficiência da oferta de
prestaç
ões’, conforme ensina Mancuso, de todos aqueles legitimados passivamente,
inclusive coobrigados solidariamente, a teor do Art. 70, do ECA. Assim,
responsabilizam
-
se conforme suas obrigações: pais, tutores, entidades de atendimento
governamentais ou não
-
gov
ernamentais e o próprio Estado”.
3
3
3
3
7
7
(i) O Tribunal de Just
iça do Estado de São Paulo, ao proferir
julgamento nos autos da apelação cível com revisão nº 553.468
-
5/1
-
00,
oriunda da Comarca de Bauru, reconheceu a responsabilidade linear dos
entes federados no que concerne à concreta aplicação do Art. 196 da
Constitu
ição Federal de 1988, como se observa pelo conteúdo da respectiva
ementa:
APELAÇÃO
Mandado de Segurança
Determinação ao
Estado para que forneça medicamentos específicos ao
impetrante
Sentença procedente
Reexame necessário
considero interposto, Lei
nº 1.533/51
Pretensão
pode
ser
dirigida
em
face
da
União,
Estado
ou
Município
Atribuições
solidárias
Indisponibilidade do direito à saúde
Norma
constitucional que impõe ao Estado a assistência à saúde dos
cidadãos, independente da burocracia estat
al
Prova de que é
portador de moléstia grave (dispinéia enfisêmica pulmonar
crônica)
Recursos desprovidos.
472
(ii) Nessa mesma toada, o Superior Tribunal de Justiça, também em
relação à temática constitucional e indisponível da saúde, reconheceu quando
do
julgamento do agravo de instrumento nº 713.004/SC, que referida
responsabilidade é de natureza genérica, abrangendo, assim, todos os entes
federados:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO.
AUSÊNCIA DE OMISSÃO OU CONTRADIÇÃO NO ACÓRDÃO
A QUO
. FORNECIM
ENTO DE MEDICAMENTOS. SUS.
OBRIGAÇÃO DE FAZER.
LEGITIMIDADE
PASSIVA
DA
UNIÃO,
DO
ESTADO
E
DO
MUNICÍPIO
. 1. Afronta ao Art.
535, incs. I e II, do CPC não
-
configurada. O aresto vergastado
analisou todos os pontos relevantes ao desate da
controvérsia. Desnces
seário exigir da Corte de origem que se
pronuncie explicitamente acerca de todos os argumentos
levantados pela parte, sobretudo quando não possuem o
condão de alterar o entendimento aplicável à espécie. 2.
A
CF/88
erige
a
saúde
como
um
direito
de
todos
e
dever
do
Estado
(Art. 196).
Daí
a
seguinte
conclusão
: é
obrigação
do
Estado
, no
sentido
genérico
(
União
,
Estados
,
Distrito
Federal
e
Municípios
), assegurar às pessoas desprovidas de recursos
financeiros o acesso à medicação necessária para a cura de
suas ma
zelas, em especial, as mais graves. Sendo o SUS
composto pela União, Estados e Municípios, impõe
-
se a
472
TJSP, 2.ª Câmara de Direito Público, Relator: Desembargador Samuel Junior, j. 16/01/07,
v.u., com grifos nossos.
3
3
3
3
8
8
solidariedade dos três entes federativos no pólo passivo da
demanda. 3. Agravo de instrumento não
-
provido.
473
(iii) Por fim, e com idêntico posicinamento,
resta apresentar o aresto
formalizado no âmbito da Corte Suprema quando do julgamento do Recurso
Extraordinário nº 195.192
-
5/RGS, a saber:
MANDADO DE SEGURANÇA
ADEQUAÇÃO
INC. LXIX, DO
ART. 5º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Uma vez assentado
no acórdão prof
erido o concurso da primeira condição da ação
mandamental
direito líquido e certo
descabe concluir pela
transgressão ao inc. LXIX do Art. 5º da Constituição Federal.
SAÚDE
AQUISIÇÃO E FORNECIMENTO DE
MEDICAMENTOS
DOENÇA RARA.
Incumbe
ao
Estado
(
gênero
)
proporcionar
meios
visando
alcançar
a
saúde
,
especialmente
quando
envolvida
criança
e
adolescente
.
O
Sistema
Único
de
Saúde
torna
a
responsabilidade
linear
alcançando
a
União
,
os
Estados
,
o
Distrito
Federal
e
os
Municípios
.
474
Como se tais decisões não
bastassem por si mesmas, tem
-
se que o
próprio Estado reconheceu a responsabilidade solidária no que tange ao direito
fundamental objeto deste estudo quando, no final de 2006, houve por bem em
lançar o denominado
Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defe
sa do Direito
de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária
, aprovado
pelos conselhos nacionais de Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) e
de Assistência Social (CNAS), sendo certo que a União, os Estados, o Distrito
Federal e os
Municípios terão de definir ações para garantir o direito de crianças e
adolescentes à convivência com seus familiares e sua comunidade, possuindo,
assim, responsabilidades compartilhadas para colocar em prática as ações
definidas no aludido plano naciona
l.
Dentro da perspectiva plasmada no Plano Nacional, a criança e o
adolescente devem ser vistos de forma indissociável do seu contexto sócio
-
familiar e comunitário, emergindo, daí, que o Estado, em qualquer de suas
formas, deve prestar o devido apoio à fa
mília de origem, para que esta possa
desempenhar adequadamente o seu papel na proteção e cuidado dos filhos.
473
Relator: Ministro José Delgado, j. 10/02/06, com grifos nossos.
474
STF, 2ª Turma, Relator: Ministro Marco Aurélio, j. 22/02/00, v.u., com destaques nossos.
3
3
3
3
9
9
Noutro giro verbal, tem
-
se que seu escopo é fazer valer o direito
fundamental de crianças e adolescentes crescerem e serem educados no seio de
uma
família e de uma comunidade, priorizando, assim, a recuperação do
ambiente familiar, haja vista que a retirada do infante de sua célula é a situação
mais extremada, que, sempre que possível, deve ser contornada com ações e
políticas voltadas ao apoio à pró
pria família ou a busca de alternativas como as
denominadas
famílias acolhedoras
.
As diretrizes que foram traçadas no citado Plano são as seguintes: (i)
c
entralidade da família nas políticas públicas; (ii) p
rimazia da responsabilidade do
Estado no fomento
de políticas integradas de apoio à família;
(iii)
r
econhecimento
das competências da família na sua organização interna e na superação de suas
dificuldades; (iv) respeito à diversidade étnico
-
cultural, à identidade e orientação
sexuais, à eqüidade de gêne
ro e às particularidades das condições físicas,
sensoriais e mentais; (v) fortalecimento da autonomia da criança, do adolescente
e do jovem adulto na elaboração do seu projeto de vida; (vi) garantia dos
princípios de excepcionalidade e provisoriedade dos P
rogramas de Famílias
Acolhedoras e de Acolhimento Institucional de crianças e de adolescentes; (vii)
reordenamento dos programas de Acolhimento Institucional Adoção centrada no
interesse da criança e do adolescente; e, (viii) controle social das políticas
públicas.
O
Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças
e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária
, apresenta os seguintes
objetivos gerais:
475
a) ampliar, articular e integrar as diversas políticas, programas, projetos,
s
erviços e ações de apoio sócio
-
familiar para a promoção, proteção e defesa do
direito de crianças e adolescentes à convivência familiar e comunitária;
b) difundir uma cultura de promoção, proteção e defesa do direito à
convivência familiar e comunitária,
em suas mais variadas formas, extensiva a
475
Disponível em: <
http://www.mds.gov.br/arquivos/plano
-
nacional
-
defende
-a-
convivencio.html
>.
Acesso em: 12 jan. 2007.
3
3
4
4
0
0
todas as crianças e adolescentes, com ênfase no fortalecimento ou resgate de
vínculos com suas famílias de origem;
c) proporcionar, por meio de apoio psicossocial adequado, a manutenção
da criança ou adolescente em seu ambiente familiar e comunitário, considerando
os recursos e potencialidades da família natural, da família extensa e da rede
social de apoio;
d) fomentar a implementação de Programas de Famílias Acolhedoras,
como alternativa de acolhimento a criança
s e adolescentes que necessitam ser
temporariamente afastados da família de origem, atendendo aos princípios de
excepcionalidade e de provisoriedade, estabelecidos pelo Estatuto da Criança e
do Adolescente, bem como assegurando parâmetros técnicos de quali
dade no
atendimento e acompanhamento às famílias acolhedoras, às famílias de origem,
às crianças e aos adolescentes;
e) assegurar que o Acolhimento Institucional seja efetivamente utilizado
como medida de caráter excepcional e provisório, proporcionando a
tendimento
individualizado, de qualidade e em pequenos grupos, bem como proceder ao
reordenamento institucional das entidades para que sejam adequadas aos
princípios, diretrizes e procedimentos estabelecidos no ECA;
f) fomentar a implementação de programa
s para promoção da
autonomia do adolescente e/ou jovem egressos de programas de
acolhimento, desenvolvendo parâmetros para a sua organização,
monitoramento e avaliação;
g) aprimorar os procedimentos de adoção nacional e internacional, visando:
a) estimula
r, no País, as adoções de crianças e adolescentes que, por
circunstâncias diversas, têm sido preteridos pelos adotantes
crianças maiores e
adolescentes, com deficiência, com necessidades específicas de saúde,
afrodescendentes ou pertencentes a minorias é
tnicas, dentre outros; b) investir
para que todos os processos de adoção no País ocorram em consonância com os
procedimentos legais previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente; e c)
3
3
4
4
1
1
garantir que
a adoção internacional ocorra somente quando esgotadas
todas as
tentativas de adoção em território nacional, sendo, nestes casos, priorizados os
países que ratificaram a Convenção de Haia;
h) assegurar estratégias e ações que favoreçam os mecanismos de
controle social e a mobilização da opinião pública na per
spectiva da
implementação do Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de
Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária;
i) aprimorar e integrar mecanismos para o co
-
financiamento, pela União,
Estados, Distrito Federal e Municípios, das ações previstas no Plano Nacional de
Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes à
Convivência Familiar e Comunitária, tendo como referência a absoluta prioridade
definida no Art. 227 da Constituição Federal de 1988 e no Art. 4º do Estatuto da
Criança e do Adolescente.
Não se perca de vista, também, que com a eclosão da Emenda
Constitucional nº 53, de 19 de dezembro de 2006, estabeleceu
-
se, dentre outros,
que são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais a assistência gr
atuita aos
filhos e dependentes desde o nascimento até 05 (cinco) anos de idade em
creches e pré
-
escolas; leis complementares fixarão normas de cooperação entre
a União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, tendo em vista o
equilíbrio do desenv
olvimento e do bem
-
estar em âmbito nacional; compete aos
Municípios, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado,
programas de educação infantil e de ensino fundamental; o dever do Estado com
a educação será efetivado, também, mediante a garantia de educação infantil, em
creche e pré
-
escola, às crianças até 05 (cinco) anos de idade.
Assim, em tais situações, a exemplo do que se argumentou
anteriormente, não há como se afastar a responsabilidade estatal pelos danos
ocasionados aos titulares d
o direito fundamental em apreço, pois, do contrário,
perder
-
se
-
ia a crença de que o texto constitucional, efetivamente, é o berço
seguro à albergada daquilo que é mais caro e essencial para os cidadãos
brasileiros, isto é, o conjunto inatacável e inarredáv
el de garantias mínimas à
3
3
4
4
2
2
consecução do postulado da proteção da dignidade humana, postulado este,
frise
-
se, grafado com letras maiúsculas no inc. III do Art. 1º da Lei de Outubro.
É de se ponderar, também, que o malferimento do citado direito
fundamental
de convivência familiar e comunitária, como conseqüência
inequívoca da injusta desigualdade que provoca, está a afetar, também, o pleno
exercício da cidadania por parte daqueles que acabaram sendo prejudicados pela
ineficência estatal no cumprimento de um
a obrigação que, como visto, lhe era
ínsita e inafastável.
Inegavelmente, a pessoa que necessita se preocupar com a ausência de
sua família, com a ausência de comida, com a ausência de trabalho, com a
ausência de saúde e higiene, com a ausência de educaçã
o, com a ausência de
água encanada, com a ausência de carinho e afeto, enfim, com a ausência dos
elementos básicos que integram o conceito mediano de vida digna, não possui
condição de se ambientar e de se preocupar com os rumos ou com os destinos
do País.
Como explicar a quem não tem o que comer, o significado do sistema
proporcional que rege a eleição de parlamentares no Brasil e pedir,
encarecidamente, que seu voto seja livre e consciente?
Para Ana Maria D’Ávila Lopes:
[...] a concepção de cidadania c
omo um direito que demanda a
participação de seu titular na vida em sociedade está presente na
Constituição Federal Brasileira de 1988. Com efeito, no parágrafo
único do Art. 1º define
-
se a democracia brasileira como uma
democracia semi
-
direta, ou seja, co
mo uma democracia
representativa com mecanismos de participação direta.
476
Por muito tempo o conceito de cidadania esteve preso à questão de sua
legitimidade de participação no processo eleitoral (capacidade ativa e passiva ao
476
LOPES, Ana Maria D’Ávila.
Constituição e democracia
: estudos em homenagem ao
Professor
José Joaquim Gomes Canotilho. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 25.
3
3
4
4
3
3
sufrágio), ou seja, dizia resp
eito apenas e tão
-
somente à possibilidade de
exercício pleno dos direitos políticos, como bem demonstra a redação
apresentada pelo Art. 5º do Decreto
-
Lei nº 201/67, cujo dispositivo permite o
direito de levar a efeito, perante a Câmara Municipal competente
, denúncia em
relação a alcaides e/ou edis.
Atualmente, o que se verifica é um processo sem volta de alargamento
desse conceito, no afã de que, além de nele se incluir a questão do exercício dos
direitos políticos, também seja verificada sua participação efetiva na vida social,
nas discussões e diretrizes governamentais e, principalmente, no que diz respeito
à concretização das proteções e das garantias que lhe são ínsitas diante de sua
condição humana.
Nesse eito, ensina José Alfredo de Oliveira Baracho:
[...] o conceito de cidadão e cidadania vem adquirindo
particularidades, que não se esgotam na compreensão de ser
cidadão aquele que participa dos negócios da cidade. Os homens
passaram da situação de sujeitos para a de cidadãos, sendo que, na
França, so
mente em 1830 a palavra ‘sujeito’ desapareceu dos
documentos oficiais. O cidadão, no dizer de Philippe Ardant,
introduziu com ele a democracia; não há cidadãos sem democracia
ou democracia sem cidadãos. O cidadão não aparece de um
momento para o outro, nos
Estados Unidos em 1776, ou em Paris
em 1789. Em séculos precedentes, em determinadas sociedades, as
pessoas adquirem progressivamente os componentes de certo
estatuto, que limita o posicionamento do poder: os do diálogo, os da
participação e sobretudo os
da proteção contra o arbítrio.
Consolidam
-
se, em certas ocasiões, os processos concretos por
meio dos quais o cidadão participa do poder.
477
Viriato Soromenho
-
Marques afirma:
[...] a Revolução Americana teve uma repercussão enorme nas
lutas políticas, trav
adas um pouco por toda a parte, pela conquista
dos direitos da cidadania. A própria eclosão, alguns anos depois
da Revolução Francesa, não vem enfraquecer, antes corroborar
esta tese.
478
477
BARACHO, José Alfredo de Oliveira.
Teoria geral da cidadania
: a plenitude da cidadania e
as garantias processuais constitucionais. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 01.
478
SOROMENHO
-
MARQUES,
Viriato.
A era da cidadania
. Mem Martins: Biblioteca
Universitária, 1996, p. 192.
3
3
4
4
4
4
A cidadania está a exigir que seja possibilitada ao cidadão plena
part
icipação nas decisões e nos acontecimentos que envolvem os atos
promovidos pela Administração Pública, sendo certo que o próprio texto
constitucional outorgou
-
lhe instrumentos para o cumprimento do referido
desiderato, podendo
-
se citar, como exemplos, o vo
to direto (cidadão
eleitor), o serviço público via concurso (cidadão agente do poder), a
delegação de serviços públicos a particulares, mediante concessão,
permissão e autorização (cidadão colaborador na gestão privado de
interesses públicos) e, ainda, nas
hipóteses de subscrição do particular de
ações de sociedade de economia mista, no exercício de funções e cargos
honoríficos, no trabalho afeto à defesa civil e na composição dos
conselhos ou colegiados afetos aos órgãos públicos (cidadão veículo
permanent
e do exercício do direito).
Há que se destacar, ainda, a participação do cidadão como censor, ou
seja, como agente legitimado a exercer diretamente o controle das atividades do
Poder Público, como se verifica com o direito de petição (Art. 5º, inc. XXXIV,
CF),
com a possibilidade de ajuizamento de ação popular (Art. 5º, inc. LXXIII, CF), com
o direito de informação (Art. 5º, inc. XXXIII, CF), com o direito de resistência
(implícito na CF), dentre outros.
Em síntese, cabe trazer à lume a lição de Paulo Ferreira da Cunha:
Os desafios que se nos colocam à Cidadania já não podem ser
resolvidos com o direito de olhos fechados
veja
-
se, por exemplo,
o problema do terrorismo, do crime organizado, da violência
urbana generalizada (guerra civil urbana se fala já)
, ou a questão
dos sem
-
terra
mas com uma abordagem inter
-
pluri
-
multi
-
disciplinar, que compreenda um direito de olhos bem abertos às
realidades e aos problemas sociais [...]. Contra muitas doenças
culturais
não apenas brasileiras, aliás
que diagnostic
a Énio
Resende, o remédio é, sem dúvida, a Cidadania. E a nova
cidadania está aí, despontando: não engravatada e neo
-
liberal,
desprezando, como se foram espúrias, as condições concretas da
liberdade, mas convocando até novas formas de intervenção, e
dinamizando a própria cultura.
479
479
CUNHA, Paulo Ferreira da.
A Constituição viva
: cidadania e direitos humanos. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2007, p. 61.
3
3
4
4
5
5
Não se pode perder de vista que o exercício da cidadania, nos novos
moldes trazidos pela Lei de Outubro, está intrinsecamente ligado com a questão
da proteção da dignidade humana.
Percebe
-
se, para logo, que da albergada constitu
cional da dignidade
da pessoa humana resulta também a obrigação de o Estado garantir ao
indivíduo um patamar mínimo de recursos, capaz de prover
-
lhe a subsistência
e de sua família.
Na Alemanha, passou
-
se a entender que o Art. 1.1 da Lei Fundamental
de 19
49 impunha, além da perspectiva de o indivíduo não ser arbitrariamente
tratado, um respeito cada vez maior pela sua sobrevivência.
Assim, de acordo com tal preceito, afigura
-
se inadmissível que o
administrado seja despojado dos recursos indispensáveis à e
xistência digna,
de sorte que a intervenção estatal na propriedade, pela via fiscal ou não, não
deverá alcançar patamares capazes de privá
-
lo dos meios mais elementares
de subsistência. De modo igual, o citado Art. 1.1 traduz, em detrimento dos
poderes púb
licos, a obrigação adicional de prover ao cidadão um mínimo
existencial.
Nestas terras, o cenário descortinado pelo Art. 1º, inc. III, da Constituição
Federal, não é diverso. A privação da propriedade, por ato emanado do Estado,
subordina
-
se à observância
de interesse público, previsto no ordenamento
jurídico, com a garantia ao particular de indenização prévia (Art. 5º, inc. XXIV,
CF). A obrigação do administrado de contribuir para os encargos coletivos guarda
vinculação ao parâmetro da não
-
imposição de tributo com efeito de confisco (Art.
150, inc. IV, CF).
De outra banda, o direito à existência digna não é assegurado apenas
pela não
-
abstenção do Estado em afetar a esfera patrimonial das pessoas sob a
sua autoridade. Passa também pelo cumprimento de prest
ações positivas. Não foi
à toa que a Lei Fundamental Brasileira impôs, ao Estado e à sociedade, a
realização de ações integradas para a implementação da seguridade social (Art.
3
3
4
4
6
6
194 da CF), destinada a garantir a prestação dos direitos inerentes à saúde, à
previdência e à assistência social.
Ao Estado cabe organizar e manter o sistema previdenciário, com vistas a
suprir os rendimentos do trabalhador por ocasião das contingências da vida
gregária (Art. 201 da CF), englobando cobertura dos eventos de doença,
invalidez, morte e idade avançada; proteção à maternidade, especialmente à
gestante; proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário;
salário
-
família e auxílio
-
reclusão para os dependentes do trabalhador de baixa
renda; pensão por morte.
De
igual maneira, àqueles não filiados à previdência social, incumbe
-
se
ao aparato estatal a prestação de assistência social quando necessitarem (Art.
203 da CF), consistindo nas seguintes obrigações: proteção à família, à
maternidade, à infância, à adolescê
ncia e à velhice; amparo às crianças e aos
adolescentes carentes; promoção da integração ao mercado de trabalho;
habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiências, com sua
integração à vida em comunidade; garantia de um salário mínimo de be
nefício
mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção ou de tê
-
la provida por sua família (esta
última garantia foi regulamentada com a Lei nº 8.742/93).
Não se pode deslembrar, ainda, as ações no campo da saúde, realizadas
mediante políticas sociais e econômicas que colimem a redução dos riscos de
doença e de outros agravos, garantindo
-
se o acesso universal igualitário às ações
e serviços para sua promoção, proteção e recuperação (Art. 1
96).
Os parâmetros protetivos não se exaurem na província das relações
Estado
indivíduo. Absolutamente não. Avançam suas fronteiras, de sorte a
evitar o empobrecimento sem causa por ato atribuível ao particular. Dois
exemplos constitucionais centram
-
se
no rol do Art. 7º, incs. I a XXXIV, da Lei
Maior, estabelecendo a porção mínima de direitos assegurados ao empregado,
urbano ou rural e respeito à defesa do consumidor nos vínculos contratuais de
massa (Art. 5º, inc.
XXXII, e Art. 170, inc.
V). Mas não é s
ó! O Art. 170,
caput
, da
3
3
4
4
7
7
Lei Máxima, ao fincar as pilastras em que se ancora a ordem econômica,
consistentes no concerto entre a valorização do trabalho humano e a livre
iniciativa, assinala como finalidade a garantia de que todos tenham uma
existência dig
na, em compasso com os ditames da justiça social.
Feitas essas considerações, realçando o caráter de princípio fundamental
fruído pela dignidade da pessoa humana, há de se notar que o mais importante,
tanto aqui quanto nos demais tópicos analisados, é a atuação do preceito como
diretriz hermenêutica.
Nesse sentido, são dignas de destaque algumas manifestações da
jurisprudência brasileira.
Inicialmente, não se pode deixar de mencionar o brilhante aresto do
Excelso Supremo Tribunal Federal no HC nº 45.232.
480
No referido
writ
constitucional, questionou
-
se a recepção do Art. 48 do Decreto
-
Lei nº 314/67,
então Lei de Segurança Nacional, que, em havendo flagrante delito ou o
recebimento da denúncia, encontrava
-
se prevista, em detrimento do preso
provisório ou de
nunciado, a suspensão do exercício da profissão, do emprego em
entidade privada ou do cargo ou função na administração pública, direta e
indireta.
Concedendo a ordem, a Excelsa Corte ressaltou a posição de
antagonismo constitucional do dispositivo legal, cuja execução o remédio heróico
buscava evitar, contrariando o direito à vida, enunciado no Art. 150,
caput
, da
Constituição de 1967.
O voto do eminente relator, ministro Themístocles Brandão Cavalcanti,
que foi acompanhado pelos seus pares, enfatizou que
o ato de impedir o
desempenho de uma atividade profissional, que permita ao indivíduo obter os
meios de subsistência, é o mesmo que lhe tirar um pouco de sua vida, porque
esta não prescinde de meios materiais para a sua proteção.
480
STF, Pleno, Relator: Ministro Themistocles Cavalcanti, j. 17/06/68, m.v., p. 02228.
3
3
4
4
8
8
Embora não concluindo pelo dever do Estado em proporcionar recursos
ao indivíduo, sustentou que aquele não pode, sem que haja uma decisão judicial
legítima, privar alguém do exercício de atividade lícita, partindo da premissa de
que a vida não constitui apenas um conjunto de funçõ
es resistentes à morte, mas,
numa perspectiva mais ampla, a afirmação positiva das condições voltadas a
assegurar à pessoa, bem como à sua família, os recursos indispensáveis à sua
subsistência.
Somente ficou incólume à eiva de incompatibilidade vertical
a previsão de
suspensão do exercício de cargo ou função pública, tendo em vista que a
legislação de regência assegurava, em casos que tais, a percepção pelo servidor
de uma parte de seus vencimentos.
É certo que, no voto
-
condutor do julgado, não recebeu m
enção a
expressão
dignidade da pessoa humana
, até porque ainda não havia sido ela
explicitamente incorporada ao constitucionalismo pátrio.
No entanto, pode
-
se, com certeza, frisar que a veneração ao princípio não
passou despercebida.
Outras remissões pre
torianas extremamente ligadas com a proteção da
dignidade humana podem ser invocadas.
Ei
-
las: a concessão de mandado de segurança para liberar cruzados
novos retidos, permitindo que o impetrante pudesse utilizar os ativos financeiros
de sua propriedade a
fim de conjurar grave enfermidade de sua mãe;
desconsideração, para fins de renda mensal vitalícia à mulher casada, da
percepção de aposentadoria do marido em valor um pouco superior ao mínimo
legal; deferimento de aposentadoria por invalidez, denegada pel
a não
-
comprovação de carência, em favor de segurado que deixara de continuar sua
atividade laborativa em virtude de enfermidade que o acometeu; mantença de
liminar que determinou o restabelecimento de benefício suprimido na via
administrativa, a partir de
mera suspeita de fraude; confirmação de decisão
interlocutória que determinou o pagamento parcelado de dívida previdenciária em
3
3
4
4
9
9
benefício de segurado em estado de saúde grave, sem a necessidade de
expedição de precatório, e, mais recentemente, iniciativa do Poder Executivo em
promover o pagamento das diferenças oriundas do Fundo de Garantia por Tempo
de Serviço (F.G.T.S.) aos idosos e portadores de moléstias graves.
Sintetizando o tema em apreço, dispõe Sarlet:
[...] assume particular relevância a constat
ação de que a
dignidade da pessoa humana é simultaneamente limite e tarefa
dos poderes estatais e, no nosso sentir, da comunidade em geral,
de todos e de cada um, condição dúplice esta que também aponta
para uma paralela e conexa dimensão defensiva e prest
acional da
dignidade. Como limite, a dignidade implica não apenas que a
pessoa não pode ser reduzida à condição de mero objeto da ação
própria e de terceiros, mas também o fato de que a dignidade gera
direitos fundamentais (negativos) contra atos que viole
m ou a
exponham a graves ameaças. Como tarefa, da previsão
constitucional (explícita ou implícita) da dignidade da pessoa
humana, dela decorrem deveres concretos de tutela por parte dos
órgãos estatais, no sentido de proteger a dignidade de todos,
assegura
ndo
-
lhe também por meio de medidas positivas
(prestações) o devido respeito e promoção.
481
Eduardo Appio, inspirado em Ronaldo Guimarães Gouvêa, afirma que as
chamadas políticas públicas:
[...] consistem em instrumentos estatais de intervenção na
economia
e na vida privada, consoante limitações e imposições
previstas na própria Constituição, visando assegurar as condições
necessárias para a consecução de seus objetivos, o que demanda
uma combinação de vontade política e conhecimento técnico.
482
Como bem ilus
tra Sérgio Savi, “[...] inúmeras são as situações na vida
cotidiana em que, tendo em vista o ato ofensivo de uma pessoa, alguém se vê
privado da oportunidade de obter uma determinada vantagem ou de evitar um
prejuízo”,
483
situação que, com as devidas adaptaç
ões, se amolda perfeitamente a
hipótese de não
-
concreção do direito fundamental à convivência familiar e
comunitária pertencente a crianças e adolescentes.
481
SARLET, 2002, p. 32.
482
APPIO, Eduardo.
Controle judicial das políticas públicas
. Curitiba: Juruá, 2005, p. 143
-
144.
483
SAVI, 2006, p. 01.
3
3
5
5
0
0
Isso porque, e de acordo com as explanações levadas a efeito no capítulo
anterior, se o Estado não tem como determinar que todo infante abandonado seja
imediatamente recolocado numa família substituta, é seu dever, por intermédio da
consecução de outros direitos fundamentais de índole social, fazer com que a
especial proteção a que alude o
caput
do Art.
266 da Constituição Federal
realmente aconteça.
De fato, quando o Estado outorga condições dignas e adequadas de
saúde, educação e trabalho, por exemplo, com toda certeza está, também,
propiciando a fortificação do seio familiar e possibilitando que o inf
ante tenha um
desenvolvimento que lhe outorgue chance de participar da vida em comunidade,
preparando
-
o à formação de sua própria sua família.
Assim, em sendo levadas a efeito as políticas públicas condizentes, o
planejamento tributário e a execução adequ
ada do orçamento estatal, enfim,
concretizando
-
se os princípios da prioridade absoluta e da proteção integral de
crianças e adolescentes, estará, sem sombra de dúvidas, tornando real o
postulando fundamental da convivência familiar e comunitária.
Entremen
tes, é sabido que, em inúmeras vezes, os controles normais à
execução dos direitos fundamentais se entremostram ineficazes, circunstância
essa que retira, por completo, dos infantes desprovidos de família, a oportunidade
de com ela se desenvolverem e ating
irem o patamar de dignidade preconizado
pelo texto constitucional.
Como dito linhas atrás, não se ignora o fato de que a convivência familiar
e comunitária, por si só, não conduz, com plena segurança, a conclusão de que o
infante irá trilhar um caminho di
gno quando do atingimento da idade adulta;
porém, de outro vértice, nos dá a plena certeza de que a ausência do citado
direito fundamental, além de colocar em frangalhos o princípio da isonomia, põe
por terra a oportunidade de que tal agente consiga o desi
derato almejado.
Noutro giro verbal, a exclusão da convivência familiar e comunitária retira
da criança e do adolescente qualquer direito de escolha, impondo
-
lhes, salvo
3
3
5
5
1
1
raras exceções, o tortuoso caminho do abandono, da falta de carinho, da
criminalidade
, da marginalidade, da opressão, enfim, da mais completa e irrestrita
ausência de dignidade humana.
Em continuidade, quando o ser humano é desprovido de tratamento
condizente com sua dignidade, passa ele, inexoravelmente, a agir como se
bicho
fosse, circu
nstância essa que, infelizmente, sossobra nos tratamentos dados no
sistema prisional, na procura de restos de alimentos em lata de lixo, na violência
inespurgável que toma conta de nossa sociedade como um todo.
Infelizmente, o que se percebe é um processo
intenso de desumanização
da pessoa, da perda pelo respeito de sua essência, da banalização e da
facilidade com que, hoje em dia, se extirpa uma vida.
Tais circunstâncias perpassam, sem sombra de dúvidas e em muitas das
vezes, pela ausência de convivência
familiar e comunitária.
Ademais, some
-
se a isso a ineficácia de concreção dos direitos
fundamentais sociais a que alude o Art. 6º da Constituição da República, os quais,
como visto no capítulo anterior, se constituem em verdadeiros instrumentos de
comple
mentação do direito fundamental à convivência familiar e comunitária.
De acordo com estudo realizado por
Enid Rocha Andrade da Silva e
Simone Gueresi de Mello:
A extinção das agências federais LBA e Fundação Centro
Brasileiro para a Infância e a Adolescê
ncia (FCBIA) fez com que
as atribuições institucionais relativas à infância e à adolescência
fossem redirecionadas para outros órgãos. As ações relacionadas
a suporte, promoção e articulação para a efetivação dos direitos
da criança e do adolescente, confo
rme previsto no ECA, foram
assumidas pela área governamental voltada para defesa e
promoção dos direitos humanos, hoje SEDH. As ações referentes
à execução do atendimento em instituições, bem como ao suporte
técnico e financeiro para os programas na área d
a infância e da
adolescência, foram assumidas pela pasta governamental
responsável pela Política Nacional de Assistência Social,
atualmente a Secretaria de Assistência Social do Ministério do
Desenvolvimento Social e Combate à Fome. No tocante ao
3
3
5
5
2
2
atendimen
to a crianças e adolescentes em situação de abandono
e vítimas de maus
-
tratos e/ou violência, as ações são realizadas
de forma integrada pelas áreas de direitos humanos e de
assistência social do governo federal.
484
Conforme dados obtidos pelo Instituto Bra
sileiro de Geografia e
Estatística, os quais estão abaixo reproduzidos, encontrando
-
se à disposição em
seu sítio na
internet
,
485
verifica
-
se, com solar clareza, que a citada ineficácia dos
direitos fundamentais sociais age, de modo implacável, na estruturaçã
o e
manutenção da família brasileira, situação essa que, por motivos que nos
parecem óbvios, apresenta reflexo direto nos direitos e interesses de crianças e
adolescentes.
Em se procedendo a atenta análise dos gráficos ali expostos, infere
-
se
que, no Bras
il, vivam aproximadamente 61 milhões de crianças e adolescentes,
assim distribuídos: (i) 23,1 milhões têm de 0 a 06 anos; (ii) 27,2 milhões, de 07 a
14 anos; e, (iii) 10,7 milhões, de 15 a 17 anos. A maioria dos infantes reside em
área urbanas.
Dignos de
consideração, também, os estudos levados a efeito pela
UNICEF, cuja instituição tomou como parâmetro analítico a Amostra do Censo
Demográfico 2000, realizada pelo já mencionado Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística.
Por intermédio do referido es
tudo, percebe
-
se a importância que a
UNICEF outorga no que diz respeito à necessidade de convivência familiar e
comunitária de crianças e adolescentes, defendendo, inclusive, que pelo menos
até atingir 03 (três) anos de idade o infante esteja sob os cuidad
os e a companhia
dos pais.
Evidencia
-
se pelo resultado do trabalho de coleta de dados que a
ausência de condições básicas de vida à família afeta e ceifa diretamente a
possibilidade de que os infantes tenham a oportunidade de galgar melhores
484
Disponível em: <http://www.ipea.gov.br>. Acesso em: 12 dez. 2006.
485
Disponí
vel em: <http://www.ibge.gov.br/home>. Acesso em: 15 dez. 2006.
3
3
5
5
3
3
condições de
vida, emergindo, daí, que as citadas condições básicas dizem
respeito, diretamente, à concreção dos direitos fundamentais sociais, de modo
que tal omissão tem e deve ser reparada pelo Estado, eis que, por tal fato,
manifestamente se descuidou do seu dever
de respeito e obediência irrestritas
aos princípios e objetivos fundamentais encampados pela Lei de Outubro.
É exatamente nesse contexto que surge a possibilidade de aplicação
concreta da teoria da perda de uma chance com o objetivo de responsabilizar o
E
stado pela inépcia e inércia no que diz respeito à efetivação dos direitos
intrínsecos a crianças e adolescentes.
Como dito, tem
-
se que a teoria da responsabilidade por perda de uma
chance se amolda à questão da efetiva proteção do direito fundamental à
c
onvivência familiar e comunitária de crianças e adolescentes, na exata medida
em que se é verdade que não há como se ter certeza de que o infante privado de
tal direito teria se tornado apto a conviver digna e harmoniosamente em
sociedade, não menos verdad
e é o fato de que, em não tendo tal direito, com toda
certeza, foi
-
lhe subtraída ilicitamente pelo Estado referida chance, o que não
poderá ficar sem a devida reparação.
5.2.3
O dano moral
É preciso que fique claro que o pedido veiculado no bojo dos
in
strumentos processuais que serão mencionados no último capítulo, diz
respeito à possibilidade de os agentes prejudicados pela citada omissão
estatal reivindicarem indenização pecuniária sob a rubrica dos chamados
danos morais.
Isso porque, como visto, para as demais espécies indenizatórias, ou seja,
para as necessidades outras dos prejudicados, já se encontram expressamente
presentes em textos, e, de maneira satisfatória, os meios adequados ao
atingimento de tais desideratos.
3
3
5
5
4
4
De outro vértice, e como salienta Eduardo Kraemer:
[...] não há, em princípio, qualquer restrição para os danos morais
atingirem também as relações do Estado com os cidadãos. Cria
-
se para o Estado o dever de ser responsável por eventuais danos
qualificados como morais. Importante é pr
eservar a eventual
reparação de ilícitos. Neste sentido Augustin A. Gordillo revela a
possibilidade de caracterização do dano moral em decorrência da
atividade estatal. Gordillo exige a ocorrência de efetivo dano
material, circunstância já rejeitada alhure
s. Exigir o efetivo dano
material objetivando a caracterização do dano moral ocasiona a
perda de seus fundamentos. Em muitas oportunidades a atividade
estatal produz danos meramente patrimoniais. Em algumas
hipóteses especiais, contudo, logra gerar danos e
xclusivamente
morais. O exame há de ser tópico, não havendo condições de
estabelecer uma regra geral, abstrata capaz de abarcar todas as
hipóteses.
486
Tal explicação se faz indispensável, a fim de que se evite processo
desnecessário, pautado por inaceitável
bis in idem
.
Maria E. Rovira Suerio:
[...]
uno de los problemas más fascinantes en materia de
responsabilidad civil, a nuestro juicio, lo constituye, precisamente,
el reconocimiento y justificación de los daños inferidos al
patrimonio moral de una perso
na, porque el dano en sentido
jurídico no puede quedar reducido hoy al menoscabo de intereses
economicamente valorables
.
487
A problemática do cabimento ou não de verba indenitária referente ao
dano moral se constituiu em verdadeira
vexata quaestio
no direit
o brasileiro,
definitivamente expungida com o advento da Lei Maior promulgada em 05 de
outubro de 1988.
Porém, mesmo antes do advento da
Lex Mater
, o ordenamento jurídico
vigente no país, ainda que timidamente, já previa a possibilidade de indenização a
486
KRAEMER, Eduardo.
A responsabilidade do Estado e do magistrado em decorrência da
deficiente prestação jurisdicional
. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004, p. 107.
487
SUERIO, Maria E. Rovi
ra.
La responsabilidad civil derivada de los daños ocasionados al
derecho al honor, a la intimidad personal y familiar y a la propria imagen
.
Barcelona:
Cedecs, 1999
, p. 242.
3
3
5
5
5
5
t
al título, como facilmente se depreende através da leitura das normas contidas
nos Arts. 76
488
e 159
489
do antigo diploma material civil.
Deveras, defendiam os contrários ao deferimento do
pateme d’animo
que
seria imoral a conversão de uma lesão de ordem subj
etiva em pecúnia,
preferindo, assim, a não
-
aplicação de tal instituto e, via de conseqüência,
deixando decorrer
in albis
qualquer possibilidade de imposição de condenação.
Para Clóvis Beviláqua:
O interesse moral justifica a ação para defendê
-
lo ou resta
urá
-
lo, é
claro que tal interesse é indenizável, ainda que o bem moral não
se exprima em dinheiro. É por uma necessidade de nossos meios
humanos, sempre insuficientes, e, não raro, grosseiros, que o
direito se vê forçado a aceitar que se computem em dinhei
ro o
interesse de afeição e os outros interesses morais.
490
Outrossim, como já dito acima, quaisquer oposições que existiam
contra o princípio da reparabilidade do dano moral puro, caíram por terra
com a promulgação da Lei Constitucional de 1988, mais preci
samente com a
eclosão dos incs. V e X do Art. 5º, contido no Título II, Capítulo I, onde
declarados os Direitos e Garantias Fundamentais,
491
não se perdendo de
vista que, atualmente, o Código Civil, em seu Art. 186, restou consignado
que “Aquele que, por açã
o ou omissão voluntária, negligência ou
imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que
exclusivamente moral, comete ato ilícito”.
Somado este fato com o esforço hercúleo de estudiosos, doutrinadores,
juristas, advogados e membros do Poder Judiciário, valendo citar neste momento
488
Art. 76: Para propor ou contestar uma ação, é necessário ter legítimo interesse
econômico, ou
moral. Parágrafo único. O interesse moral só autoriza a ação quando toque diretamente ao
autor, ou à sua família.
489
Art. 159: Aquele que por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar
direito, ou causar prejuízo a outrem,
fica obrigado a reparar o dano.
490
BEVILÁQUA, 2005, vol. II, p. 256.
491
Art. 5º, inc. V
É assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da
indenização por dano moral, material ou à imagem.
Art. 5º, inc. X
São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas,
assegurado o direito de indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.
3
3
5
5
6
6
dois dos maiores defensores do instituto, quais sejam, Wilson Melo da Silva e
Carlos Alberto Bittar, conquistou
-
se, definitivamente, a aplicação de condenação
em hipóteses que venham a ferir a esfera moral do ofendido
, culminando com a
elaboração da Súmula nº 37, do Egrégio Superior Tribunal de Justiça.
Verifica
-
se, então, que a natureza jurídica do dano moral é a de
compensar ao lesado o constrangimento sofrido, e, ao mesmo passo, inibir o
lesante a fim de que este não volte a cometer o ato ilícito reprimido, daí porque o
ofendido pode pleitear indenização pecuniária em razão da
concuss pain
sofrida,
funcionando como um lenitivo que atenua em parte as conseqüências do prejuízo
sofrido, sempre na tentativa de superar o déficit emocional acarretado pelo dano
inconseqüentemente propalado.
Ultrapassadas as considerações feitas sobre a natureza jurídica do dever
indenitário do dano moral, necessário se faz tecer alguns comentários em relação
à quantificação do chamado
dano
da dor
.
Em verdade, é consabido que a legislação pátria não a regula de forma
certa e precisa; entrementes, mesmo se deparando com tal omissão, o juiz jamais
poderá deixar de decidir tal questão,
492
pois, do contrário, estaria negando a
aplicação da tutela jurisdicional constitucionalmente garantida àqueles que batem
às portas do nobre Poder Judiciário, aplicando
-
se, para tanto, a analogia, os usos
e costumes, e os princípios gerais do direito.
Nesse diapasão, Carlos Alberto Bittar declara:
Em caso de fix
ação do quantum como reparação do dano moral, a
determinação do valor há que se fazer através da verba dotada de
carga impositiva, em função das possibilidades do lesante, e das
condições do lesado, e sempre à luz das circunstâncias fáticas,
como se vem ob
servando na jurisprudência, a fim de que ganhe
efetividade na prática, o caráter inibidor do sancionamento.
492
PORTANOVA, Rui.
Motivações ideológicas da sentença
. 5ª ed. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2003, p. 121: “Ao j
urista (em geral) e ao juiz (em particular), contudo, é exigido
comprometimento com seu tempo. Ao juiz, dada a relevância de exercício de poder em uma
sociedade em crise, exige
-
se visão das múltiplas causas (visão totalizadora) que
influenciaram os conflitos postos em juízo”.
3
3
5
5
7
7
O deferimento de tal rubrica indenitária é perfeitamente compatível com a
situação de infante injustamente privado de seu direito fundamental à con
vivência
familiar e comunitária, até mesmo porque, como bem alinhava Luiz Alberto David
Araujo:
[...] é inegável que o conceito moderno de cidadania passa por
uma atuação forte do Poder Judiciário no sentido de efetivação
dos direitos individuais e coleti
vos. Não se admite, no Estado
Moderno, o alijamento das minorias, mas sim sua integração
social, dentro de um ajuste democrático.
493
Aliás, se é possível a fixação de indenização por danos morais ao nascituro,
cujos alfarábios jurídicos ainda discutem, de m
aneira acirra, se a tais agentes
espraiam
-
se os efeitos da personalidade jurídica, como bem ilustram as decisões
materializadas no âmbito do Superior Tribunal de Justiça por intermédio dos
Recursos Especiais n
os
399.028/SP, 472.276/SP e 637.332/SP, o que s
e dizer dessa
mesma rubrica no que diz respeito à violações acometidas em relação aos indeléveis
direitos e interesses das crianças e adolescentes aqui retratados.
Por outro lado, ainda hoje subsiste delicada questão, qual seja, a da
valoração da condenaç
ão que deverá ser imposta ao infrator, eis que, neste
ponto, não existem critérios objetivo
-
legais que possam aclarar o problema.
Mas, mesmo assim, não poderá o Estado
-
Juiz escusar
-
se de prestar a
tutela jurisdicional invocada alegando
omissis legis
, deve
ndo, então, invocar a
norma inserta no Art. 4º, da Lei de Introdução ao Código Civil, que dispõe que:
“Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os
costumes e os princípios gerais do direito”.
Diante deste impasse, a doutrina e a jurisprudência relegaram essa árdua
e espinhosa missão ao alto critério do magistrado que, analisando as
circunstâncias apresentadas no caso concreto e os parâmetros trazidos pelas
partes durante o
iter
processual, deverá proceder à fixação do
quant
um
satis
devido à vítima.
493
ARAUJO, 2003, p. 86.
3
3
5
5
8
8
Dentre os parâmetros que podem ajudar na elaboração da convicção do
Juiz, estão a repercussão social do fato, a gravidade da lesão e a capacidade
econômica das partes envolvidas.
A propósito da prova do dano moral, impende consid
erar que a
sistemática adotada pelo nosso ordenamento jurídico preceitua que ela se
satisfaz com
a demonstração da ocorrência do ato ilícito que originou a
ofensa extrapatrimonial
, ou seja, a força probante do ato ilícito gera presunção
juris tantum
de oco
rrência de danos morais, até porque seria de todo impossível
carrear aos autos os sofrimentos injustamente impingidos à vítima sob a forma de
provas documentais.
Assim, tem
-
se que o sistema jurídico brasileiro posiciona
-
se remansoso
quanto à desnecessidade de prova em concreto dos danos morais,
tendo como
bastante para aflorar o direito à indenização, a demonstração do ato ilícito
em si
, como se pode inferir da jurisprudência a seguir colacionada:
Dano moral. Prova da efetiva ocorrência do dano.
Desnecess
idade. Presunção
juris tantum
. Precedentes
jurisprudenciais (TJSP, Ap. Cível nº 52.076
-
4
-
SP, 7ª Câmara de
Direito Privado, Rel. Rebouças de Carvalho, j. 29/07/99).
Estando comprovado o fato não é preciso a prova do dano moral
(STJ, AGA nº 250722/SP, 3ª Tu
rma, Rel. Carlos Alberto Menezes
Direito, j. 19/11/99, DJ 07/02/00, p. 163).
A prova do fato que gerou lesão à reputação da pessoa jurídica é
suficiente para a indenização do dano moral (STJ, REsp. nº
169030/RJ, 3ª Turma, Rel. Ari Pargendler, j. 22/10/01,
DJ
04/02/02, p. 344).
Como se verifica, os prejuízos
extrapatrimoniais
suportados pela vítima
independem de prova material para emergir o direito à reparação moral, bastando
a comprovação da prática antijurídica perpetrada pelos ofensores, de modo que
o restam mais espaços para divagações outras nesse particular.
Tudo isso mensurado, poderá o ínclito Julgador fixar a indenização
pertinente, sendo inquestionável que ela deverá ter grandeza tal que, a par de
3
3
5
5
9
9
lenir a dor amargada pela vítima, sirva de exe
mplo a retumbar perenemente na
consciência do lesionador, evitando que reincida na conduta.
Não pode, é óbvio, ser tamanha que implique enriquecimento sem causa
da vítima e nem pequena a tal ponto que não afete o patrimônio do agente ou não
lhe abale a se
nsação de impunidade ou esta lhe crie. A esse propósito, é digno de
citação que está em trâmite na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº
7.124/02, iniciado e aprovado no Senado Federal sob o nº 150/99, que dispõe
sobre o dano moral e sua reparação, cujo
teor normativo não discrepa do que
antes se argumentou. Veja
-
se:
Art. 1º: Constitui dano moral a ação ou omissão que ofenda o
patrimônio moral da pessoa física ou jurídica, e dos entes
políticos, ainda que não atinja o seu conceito na coletividade.
Art.
2º: São bens juridicamente tutelados por esta Lei inerentes à
pessoa física: o nome, a honra, a fama, a imagem, a intimidade, a
credibilidade, a respeitabilidade, a liberdade de ação, a auto
-
estima e o respeito próprio.
[...]
Art. 7º: Ao apreciar o pedido,
o juiz considerará o teor do bem
jurídico tutelado, os reflexos pessoais e sociais da ação ou
omissão, a possibilidade de superação física ou psicológica, assim
como a extensão e duração dos efeitos da ofensa.
§ 1º
Se julgar procedente o pedido, o juiz
fixará a indenização a
ser paga, a cada um dos ofendidos, em um dos seguintes níveis:
I
ofensa de natureza leve: até R$ 20.000,00 (vinte mil reais);
II
ofensa de natureza média: de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) a
R$ 90.000,00 (noventa mil reais);
III
ofensa de natureza grave: de R$ 90.000,00 (noventa mil
reais) a R$ 180.000,00 (cento e oitenta mil reais).
§ 2º
Na fixação do valor da indenização, o juiz levará em conta,
ainda, a situação social, política e econômica das pessoas
envolvidas, as condiç
ões em que ocorreu a ofensa ou o prejuízo
moral, a intensidade do sofrimento ou humilhação, o grau de dolo
ou culpa, a existência de retratação espontânea, o esforço efetivo
para minimizar a ofensa ou lesão e o perdão, tácito ou expresso.
Entrementes, e v
alendo
-
nos da analogia, poder
-
se
-
ia utilizar como
parâmetro indenitário, a já citada Lei nº 9.140, de 04 de dezembro de 1995, por
intermédio da qual se reconheceu como mortas pessoas desaparecidas em razão
de participação, ou acusação de participação em atividades políticas, no período
de 02 de setembro de 1961 a 15 de agosto de 1979, mais precisamente no que
se refere à forma pela qual é fixada a indenização em casos tais, como bem
explicita seu Art. 11.
3
3
6
6
0
0
Vejamos.
Art. 11: A indenização, a título reparatór
io, consistirá no
pagamento de valor único igual a R$ 3.000,00 (três mil reais)
multiplicado pelo número de anos correspondentes à expectativa
de sobrevivência do desaparecido, levando
-
se em consideração a
idade à época do desaparecimento e os critérios e
valores
traduzidos na tabela constante do Anexo II desta Lei.
§ 1º
Em nenhuma hipótese o valor da indenização será inferior a
R$ 100.000,00 (cem mil reais).
§ 2º
A indenização será concedida mediante decreto do
Presidente da República, após parecer fav
orável da Comissão
Especial criada por esta Lei.
De outro vértice, embora inegável a responsabilização estatal pelo
adimplemento da rubrica ora em apreço, a verdade é que a fixação da
indenização correspondente também deverá levar em consideração os princ
ípios
da proporcionalidade e da razoabilidade, de modo que a persecução de um direito
não se transforme em algo repugnante do ponto de vista social, a teor do que vem
acontecendo em relação às concessões administrativas de reparação econômica
dos chamados
anistiados políticos
, como bem ressaltou o Ministro Gilmar Ferreira
Mendes, quando proferiu voto nos autos do Recurso Extraordinário nº 313.915
-
1/RN:
A situação do estado brasileiro está mais para a Índia do que para
os Estados Unidos da América do Norte,
o padrão não deve ser
aquele da nação mais abastada do mundo. Não se deve esquecer
que a responsabilidade do Estado funda
-
se no rateio entre os
cidadãos, pelo risco da atividade estatal (fls. 165/166). Evidente,
na espécie, a ausência de elementos para in
firmar a conclusão
das instâncias ordinárias. A propósito, ressalte
-
se que a imprensa
tem
-
se referido, com alguma insistência, a dois casos, nos quais a
concessão de indenização avaliada em milhões de reais constitui,
certamente, uma inversão absoluta entr
e o interesse público e o
privilégio privado. No primeiro, o ex
-
piloto da VARIG, José
Caetano Lavorato Alves, por anos presidente do Sindicato
Nacional dos Aeronautas, conseguiu obter pensão da ordem de
R$ 19,0 mil mensais, além da parcela retroativa da in
denização de
R$ 2,54 milhões. No segundo, o jornalista Carlos Heitor Cony
obteve, igualmente, indenização de cerca de R$ 1,5 milhão. Em
ambos os casos, em nome da reparação por atos praticados nos
tempos da ditadura militar, imputa
-
se ao Estado uma
respons
abilidade que se concretiza em indenizações milionárias a
serem arcadas pelos cofres públicos. Diante do absurdo aqui
relatado, a indenização assegurada à recorrida não se afigura
desarrazoada. É verdade que, nos dois casos aqui referidos, tem
-
3
3
6
6
1
1
se exemplo d
e verdadeira distorção ou patologia, que muito se
aproxima de um
estelionato
(contra os cofres públicos)
pela via
administrativa
. Nestes termos, não conheço do recurso
extraordinário, nos termos do voto do Relator.
A idéia, sem sombra de dúvidas, passa ao
largo da banalização da
atividade jurisdicional, de maneira irresponsável e indiscriminada; o objetivo
primordial e central, mercê da reponsabilização estatal pela não
-
concretização do
direito fundamental de convivência familiar e comunitária de crianças
e
adolescentes, se transveste na precípua necessidade de real eficácia dos
postulados constitucionais proclamados pela Lei Maior de 1988, bem como, e
principalmente, a escorreita materialização do postulado da dignidade humana,
vetor principal da República
brasileira.
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R
R
O processo civil clássico, por influência da Revolução Francesa, foi
conc
ebido como meio de atuação neutra por parte do Poder Judiciário.
Assim, ao magistrado competia apenas dizer a lei, ou seja, simplesmente
atuar de acordo com a vontade do legislador, neutralizando seu convencimento
diante do caso concreto.
O juiz exercia
mero poder declaratório, limitando
-
se a dizer o direito
aplicado à lide, como bem ilustra o pensamento de Montesquieu, na célebre
obra
O espírito das leis
, a saber: “[...] se os tribunais não devem ser fixos,
devem
-
no os julgamentos. A tal ponto que não se
jam estes jamais senão um
texto preciso da lei. Fossem eles a opinião particular dos Juízes, e viver
-
se
-
ia
na sociedade sem se saber precisamente quais os compromissos
assumidos”.
494
Com a evolução do direito processual, o juiz deixa de ser apenas a
boca
da
lei
(
bouche de la loi
), de
apenas dizer a lei, para ter liberdade, dentro de
parâmetros de razoabilidade e proporcionalidade, de interpretar a norma e decidir
o caso concreto de acordo com o seu livre convencimento.
495
494
MONTESQUIEU.
O espírito das leis
. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 170.
495
PORTANOVA, 2003, p. 136
-
137: “Não há temer pela subjetividade nesta nova mentalidade
de ver o Direito. A subjetividade do juiz é algo infastável em qualquer julgamento e ao mesmo
tempo condição de liberdade de todos, por isso essencial como garantia de autêntica
moralidade (FREITAS, 1989, p. 52). Este julgar criador e compromeitdo não transmuda o juiz
em legislador nem lhe retira as condições de imparcialidade diante dos sujeitos litigantes. Não
será o juiz um legislador porque se manterá sempre apegado à solução dos casos
concretizados em juízo. O juiz não dirá comandos abstratos e genéricos. Pelo contrário, se
manterá nos limites
sub s
pecie jurisdictionis
”.
3
3
6
6
3
3
Essa evolução, sem sombra de dúvidas, perpassa pela adoção da teoria
substantiva da Constituição, preconizada por Dworkin, por intermédio da qual se
outorgam ao Judiciário, em especial ao Tribunal Supremo, o poder e a
legitimidade de afirmar os valores afetos a moralidade pública, característicos dos
direitos fundamentais individuais.
496
Conforme lição de Cláudio Ari Mello:
[...] a premissa inicial de Dworkin é de que a teoria constitucional
americana não se resume a uma simples teoria majoritária da
democracia. A Constituição foi projetada par
a proteger os cidadãos
individuais e os grupos minoritários contra decisões da maioria, ainda
quando a maioria aja convencida de estar promovendo o interesse
geral. Os direitos dos cidadãos individuais e dos grupos minoritários
estão tutelados por meio de
cláusulas vagas, que necessitam de
uma operação interpretativa ou de construção. Não há dúvida de que
essa interpretação é competência dos tribunais, segundo a doutrina
formulada desde Madison v. Madison.
497
No Brasil, cumpre destacar que um dos maiores def
ensores da teoria
substantiva da Constituição é Lenio Luiz Streck, cujo autor também salienta a
precípua necessidade de o Poder Judiciário sair do seu estado de inércia, no afã
de que os ideais fundamentais da Lei de Outubro sejam efetivamente
assegurados
aos cidadãos brasileiros, sem distinção.
De acordo com o citado autor:
[...] no paradigma instituído pelo Estado Democrático de Direito,
parece não restar dúvidas de que houve uma alteração
substancial no papel a ser desempenhado pelas Constituições.
Seu
s textos possuem determinações de agor; suas normas
possuem eficácia, já não mais sendo lícito desclassificar os
sentidos exsurgentes desse plus normativo representado pela
idéia de que a Constituição constitui
-
a
-
ação do Estado [...]. Mais
ainda, é preciso
ter claro que o paradigma do Estado Democrático
de Direito liga
-
se inexoravelmente à função transformadora que o
Direito assume. Da idéia de Direito como
ordenação a até mesmo
496
STRECK, 2004, p. 162
-
163: “Em síntese, a corrente substancialista entende que, mais do que
equilibrar e harmonizar os demais Poderes, o Judiciário deveria assumir o papel de um
intérprete que põe em evidência, inclusive contra maiorias eventuais, a vontade geral implícita
no direito positivo, especialmente nos textos constitucionais, e nos princípios selecionados
como de valor permanente na sua cultura de origem e na do Ocidente”.
497
MELLO, Cláudio Ari.
Democracia constitucional e di
reitos fundamentais
. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2004, p. 91
-
92.
3
3
6
6
4
4
de promoção, exsurge um papel para o Direito que vai muito além
da Constituiçã
o enquanto mero instrumento para a aferição da
parametricidade formal. Isto, a toda evidência, demandou um novo
tipo de concepção acerca da jurisdição constitucional,
representada pela instituição de tribunais constitucionais, também
conhecidos como tribun
ais ad hoc, aptos a instrumentalizar e dar
guarida à materialidade dos textos constitucionais.
498
A evolução do direito conduziu a doutrina a repensar o direito
processual no que tange à sua efetividade, mormente, no que se refere ao
seu reconhecimento como
instrumento necessário, diante do monopólio
estatal na solução de conflitos, à proteção dos direitos fundamentais dos
jurisdicionados.
Marinoni, comentando a evolução pela qual passou (e ainda passa) o
direito processual e a concessão de tutela jurisdici
onal efetiva, assevera:
Note
-
se, em primeiro lugar, que o direito à tutela jurisdicional
efetiva tem relação com a possibilidade de participação, e por isso
pressupõe um direito à participação (o Teilhaberechte dos
alemães). Nessa linha, a necessidade de
participação fez
Canotilho relacionar o procedimento coletivo com o direito a um
procedimento justo do procedimento capaz de conferir a
possibilidade de participação para a proteção dos direitos
fundamentais e para a reivindicação dos direitos sociais [...
]. Isso
quer dizer que o direito à proteção dos direitos fundamentais tem
como corolário o direito à preordenação das técnicas adequadas à
efetividade da tutela jurisdicional, as quais são mais do que
respostas do Estado ao seu dever de proteção [...]. Ess
a
prestação do juiz, assim como a lei, também pode significar, em
alguns casos, concretização do dever de proteção do Estado em
face dos direitos fundamentais [...]. De modo que a resposta do
juiz não é apenas uma forma de dar proteção aos direitos
fundame
ntais, mas sim uma maneira de se conferir tutela efetiva a
toda e qualquer situação de direito substancial, inclusive aos
direitos fundamentais que não requerem proteção, mas somente
prestações fáticas do Estado (prestações em sentido estrito ou
prestações sociais).
499
Para a tutela dos novos direitos, mostra
-
se insuficiente à classificação
trinária original, especialmente quando se pretende tutelar direitos não
-
498
STRECK, 2004, p. 103.
499
MARINONI, Luiz Guilherme.
Técnica processual e tutela dos direitos
. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2004, p. 185
-
187.
3
3
6
6
5
5
patrimoniais, como, por exemplo, os interesses de crianças e adolescentes, o
meio ambiente e os d
ireitos do consumidor.
Os novos direitos reclamam, também, a necessidade de um provimento
rápido, a fim de evitar o dano e remover o ilícito.
As técnicas processuais devem ser analisadas de acordo com os
princípios fundamentais ditados pela Constituição
de 1988.
Assim é que se deve garantir o acesso à justiça
no sentido de se prestar
efetivamente à atividade jurisdicional.
A existência de procedimentos especiais deve levar em conta a
possibilidade de maior efetividade na tutela do direito material, se
ja com a
restrição da cognição na vertical ou horizontal, permitindo ao juiz a celeridade e
maior efetividade na prestação jurisdicional.
A evolução do pensamento trouxe à sociedade os ideais de proteção a
determinados bens que, embora não tenham propried
ade exclusiva, dizem
respeito ao bem
-
estar de toda a sociedade.
Assim, os direitos transindividuais e individuais homogêneos exigiram a
criação de mecanismos para legitimar a proteção a esses novos direitos.
Instituir a possibilidade da tutela de direito
s individuais de origem
comum, por meio de uma única ação deferida a um ente idôneo e capaz é
fundamental para que o ordenamento jurídico não se transforme em letra
morta.
500
500
ENGELMANN, Wilson.
Direito natural,
ética e hermenêutica
. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2007, p. 246: “Uma das formas de enfrentar e adaptar a concepção do Direito
exigida pelos novos tempos está vinculada ao seu conceito. Vale dizer, o paradigma do
positivismo jurídico
especialment
e na sua vertente legalista
onde a lei é a única fonte do
Direito, precisa ser revisado. Uma das possibilidades é considerar o Direito como um conjunto
de normas jurídicas, onde cabem as regras e os princípios. Esses, ao seu turno, são uma
porta aberta p
ara a incorporação de valores e da exigência da justiça no ordenamento
jurídico, especialmente a contemplação e proteção dos direitos humanos”.
3
3
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A reestruturação dos conceitos de legitimidade para a causa e de coisa
julgada mate
rial não possui relação apenas com a necessidade de proteção dos
direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos, mas também com a
necessidade de participação dos cidadãos na reivindicação desses direitos.
Após a Lei da Ação Civil Pública e o CDC ins
tituiu
-
se no direito brasileiro
um completo e eficaz sistema para a proteção dos direitos difusos, coletivos e
individuais homogêneos.
Os Arts. 84 do CDC e 461 do CPC instituíram regras permitindo que o juiz
impusesse um fazer ou um não
-
fazer mediante ordem sob pena de multa ou por
meio de medidas executivas
as chamadas
medidas necessárias
, em decisão
interlocutória (tutela antecipada) ou na sentença, sem a necessidade de ação de
execução.
Se as tutelas dos direitos (necessidades no plano do direito m
aterial) são
diversas, as técnicas processuais devem a elas se adaptar. O procedimento, a
sentença e os meios executivos, justamente por isso, não são neutros às tutelas
(ou ao direito material), e, por esse motivo, não podem ser pensados à sua
distância.
Com a evolução do Estado e do próprio direito, surgem novos direitos
tuteláveis que reclamam não a reparação pelo equivalente, mas sim a remoção
do ato ilícito, a fim de se evitar o dano.
Importante a lição propagada por Marcia Zollinger:
A doutrina atu
almente compartilha o entendimento de que os
direitos fundamentais apresentam duas dimensões
subjetiva e
objetiva
sendo está última especificamente importante para o
desenvolvimento da categoria ‘deveres de proteção’ a partir da
qual intentar
-
se
-
á comp
reender a proteção preventiva de direitos
fundamentais [...]. A teoria do dever de proteção, ensejada pela
perspectiva objetiva, vem impor ao Estado o dever de proteção
dos direitos fundamentais contra agressões e ameaças provindas
de terceiros, ou seja, e
xtrapola
-
se a concepção tradicional de
abstenção do Estado para concebê
-
lo também como obrigado a
proteger e a promover efetivamente e positivamente os direitos
3
3
6
6
7
7
fundamentais [...]. Esse dever de proteção dirige
-
se às atividades
legislativa, administrativa
e jurisdicional do Estado. O legislador
deve editar normas, inclusive penais e processuais, que
dispensem tutela especificamente preventiva aos direitos
fundamentais. À administração, por sua vez, incumbe agir
materialmente prevenindo e reparando lesões pe
rpetradas por
particulares contra os direitos fundamentais. Por fim, o Poder
Judiciário tem o dever de, na prestação da tutela jurisdicional,
adotar exegese normativa mais consentânea com a Constituição e
que confira maior efetividade às disposições de dir
eitos
fundamentais, bem como exercer o dever de correção e
aperfeiçoamento da legislação quando se trata de proteger os
direitos fundamentais. Assim, o Estado deve assegurar em toda a
sua atuação uma proteção ampla e efetiva aos direitos
fundamentais.
501
Se
ndo assim, com a proteção conferida pelo direito material a direitos que
merecem o amparo específico, especialmente aos difusos e coletivos, necessária
à construção dogmática de tutelas capazes de inibir a prática delitiva e não
somente tendentes a reparar
o dano.
502
6.1
O Controle de Constitucionalidade
Como bem destaca o catedrático italiano Emílio Santoro:
[...] a atribuição do controle de constitucionalidade das leis a um
órgão jurisdiconal especial não pode ser considerada um ponto de
chegada na tra
jetória do Estado de Direito: é somente uma etapa
num itinerário. A estrada que o Estado de Direito percorreu, de
pari passu com o progressivo fortalecimento do papel das Cortes
constitucionais, é marcada, como destacou Pizzorno, pelo
reconhecimento do pap
el dos juízes na criação das normas, pela
crescente tendência dos órgãos legislativos e administrativos em
lhes delegar delicadas decisões jurisdicionais, e pela ampliação
do acesso aos cidadãos à justiça, para resolver controvérsias que
501
ZOLLINGER, 2006, p. 37
-
42.
502
MANCUSO, Rodolfo de Camargo.
Jurisdição coletiva e coisa julgada
: teoria geral da
s
ações coletivas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 71
-
72: “O acesso à Justiça de
tantos direitos de nova geração, que se diriam dessubstantivados, porque indivisíveis e não
apropriáveis por um titular isolado e exclusivo, vai pondo em evidência a estruturação de um
processo civil coletivo, cuja tônica se desloca para a finalidade da satisfação dos justos
anseios da coletividade, em contrposição ao clássico desiderato de atendimento a direitos
subjetivos individuais contrariados ou insatisfeitos”.
3
3
6
6
8
8
tradicionalmente e
ram solucionadas por autoridades sociais ou
administrativas.
503
O controle difuso da constitucionalidade corresponde a uma tradição
republicana que atravessa os séculos, tendo
-
se iniciado no Brasil com a
Constituição de 1891, e possui como um dos seus maior
es defensores Rui
Barbosa.
À época em que implementado o aludido controle, almejou
-
se, através da
criação de um tribunal federal, qual seja, o Supremo Tribunal Federal, a
edificação de um sistema no qual fosse possível, ao menos, sujeitar a última
palavra
sobre a interpretação da lei federal como um todo
aí incluídas,
obviamente, as normas e regras constitucionais
ao mencionado sodalício, que,
então, cumulava as funções de
pacificador
das interpretações das leis destinadas
a toda a nação.
Todavia, nad
a obstante à inspiração buscada na sistemática prevalecente
nos Estados Unidos da América, a verdade é que o sistema jurídico aqui
implementado na instalação da República (Constituição de 1891) distanciou
-
se
sobremaneira de sua fonte inspiradora, pois, enquanto lá vigia
e ainda vige
o
sistema jurídico do
Common Law
, no qual impera a força vinculante das decisões
tomadas pela
Supreme Court
nos casos concretos (
stare decisis
), que servirão de
norte a ser seguido pelas demais instâncias do Poder Judiciário
no exercício da
aplicação da lei em situações semelhantes
daí porque se fala na força dos
precedentes
, aqui as decisões do Supremo não possuíam qualquer efeito
erga
omnes
.
Como bem esclarece Anna Cândida da Cunha Ferraz:
[...] o estabelecimento de f
reios e contrapesos serve ao fim
inspirador do princípio
limitação do poder
constituindo,
portanto, antes instrumento jurídico
-
institucional que visa a
impedir que um poder se sobreponha ao outro, do que a
503
SANTORO, Emílio.
Estado de Direito e interpretação
: por uma concepção jusrealista e
antiformalista do Estado de direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005, p. 115.
3
3
6
6
9
9
propiciar a interferência, sobretudo política,
de um poder sobre
o outro.
504
Já, a partir da Constituição de 1934,
505
o controle da constitucionalidade,
que era realizado apenas de forma casuística, mereceu um certo aprimoramento,
na medida em que passou a contar com a interveniência do Senado, que, após
devidamente comunicado pelo Supremo Tribunal Federal relativamente a
julgamento onde se havia declarado a inconstitucionalidade de lei, suspendia a
execução da mesma.
Assim, enquanto a decisão do Supremo Tribunal Federal gerava efeitos
ex tunc
, mas apenas entre os participantes da ação no âmbito da qual havia sido
declarada a inconstitucionalidade, a providência tomada pelo Senado de
suspender a execução da lei produzia efeitos apenas
ex nunc
, mas ao menos
erga omnes
, ou seja, destinada a toda a sociedade
.
Na vigência da Constituição de 1934, estava estabelecida, também, uma
forma de controle de constitucionalidade espelhada numa ação denominada
ação
direita interventiva
, destinada à regulação de situações específicas em que se
cogitava da quebra do princ
ípio federativo, que era afastada por meio da
intervenção da União nos Estados.
D
o ponto de vista democrático, tem
-
se que a Constituição de 1937
representou inegável retrocesso, em virtude de seu manifesto caráter
autoritário, sendo certo que, no pertinen
te ao controle de
504
FERRAZ, Anna Candida da Cunha.
Processos informais de mudança da Constituição
.
S
ão Paulo: Max Limonad, 1986, p. 13.
505
STRECK, 2004, p. 438: “Uma das inovações da Constituição de 1934
que se insere mais
especificamente nos limites desta abordagem
está exatamente no papel atribuído ao
Senado no âmbito do controle difuso de constitucionalidade. Com efeito, é pelo texto de 1934
que começa a ser resolvido o problema da ausência do efeito
erga omnes
inexistente na
Constituição de 1891. Assim, em face do Art. 91, inc. IV, da citada Carta, o Supremo Tribunal
Federal, depois que, em sede de
recurso extraordinário ou em julgamento originário,
declarasse a inconstitucionalidade de ato normativo, deveria comunicar o Senado, ao qual
competia suspender a execução da lei. Com isto
inter partes
o efeito era
ex tunc
; para o
restante da sociedade, de
sde que suspensa a execução do ato normativo pelo Senado, o
efeito era
ex nunc
e
erga omnes
. Dito de outro modo, enquanto o Supremo Tribunal não
mandasse ao Senado a lei declarada inconstitucional e o Senado não suspendesse a
execução desta, qualquer juiz
ou tribunal poderia continuar a aplicá
-
la”.
3
3
7
7
0
0
constitucionalidade, restou mantida a modalidade difusa, agora sem
remessa ao Senado, não se perdendo de vista o fato de que mesmo o
Supremo considerando determinada lei inconstitucional, podia o Presidente
da República, em entendendo que
referida norma se mostrasse relevante e
necessária ao bem
-
estar do povo, à promoção ou à defesa do interesse
nacional de alta monta, enviá
-
la, novamente, ao Poder Legislativo, o qual,
pelo voto de 2/3 dos parlamentares, em cada uma das Casas, derrubaria a
decisão do Supremo.
Com a promulgação da Constituição de 1946, o panorama do controle da
constitucionalidade não se modificou, de modo que permaneceram as mesmas
regras previstas no ordenamento pretérito, o que foi objeto de alteração com a
superveniênci
a do golpe militar de 1964.
É que, por meio da Emenda Constitucional 16, de 26 de outubro de
1965, implementou
-
se uma forma de controle concentrado da
constitucionalidade das leis por meio da instituição de representação contra
inconstitucionalidade de le
i ou ato de natureza normativa, federal ou estadual,
encaminhada pelo Procurador
-
Geral da República ao Supremo Tribunal
Federal, cuja decisão passou a gerar efeitos em relação à coletividade como
um todo.
Com o endurecimento do regime militar em 1967, sur
giram os Atos
Institucionais que, nada obstante à manutenção da via concentrada de controle de
constitucionalidade das leis mencionada no parágrafo anterior, acabaram por
deixar unicamente sob o controle do Executivo Federal a possibilidade de
discussão dos temas tratados nos referenciados Atos Institucionais, sendo certo
que, em 1969, também por Ato Institucional, passou
-
se a admitir o controle da
constitucionalidade de lei municipal pelos Tribunais de Justiça dos Estados
quando da violação de princípios s
ensíveis, permitindo
-
se, inclusive, a
intervenção dos Estados nos Municípios.
Em razão da transição do regime militar para o democrático, por obra da
Constituição que culminou no vigente ordenamento, novos ventos se sopraram
3
3
7
7
1
1
sobre a questão envolta ao der
redor do controle da constitucionalidade das leis,
conforme se verá mais adiante.
506
Até 1965 vigorava no Brasil o controle difuso de constitucionalidade. O
controle concentrado fora introduzido no ordenamento jurídico pátrio através da
emenda constituciona
l nº 16, conforme vimos alhures.
A Lei nº 9.868/99 estabeleceu o processo e o procedimento das ações diretas
de inconstitucionalidade e das ações declaratórias de constitucionalidade. Essa lei,
meramente ordinária, apresenta
-
se como algo novo no direito p
átrio, haja vista trazer em
seu bojo a especificação e o funcionamento da jurisdição constitucional.
Ocorre que a Constituição não tratou da competência para legislar sobre
a jurisdição constitucional, o que acarretaria vício formal ao texto em apreço, an
te
a falta de legitimidade.
Isso decorre, em especial, das questões extremadas que a referida norma
vem a tratar, tais como o efeito avocatório, a interpretação conforme a
Constituição, a nulidade parcial sem redução de texto, entre outros, o que nos
leva
a considerar que a mesma não poderia vir arraigada na mera competência
processual estatuída no Art. 22 da Constituição Federal.
6.2
O Controle Concentrado de Constitucionalidade
Conforme ensina Luiz Alberto David Araujo:
A Constituição Federal de 198
8 manteve o sistema concentrado,
optando pela ação direta de inconstitucionalidade, que já reinava
em nosso ordenamento. Trouxe, na alinea ‘
a
’,
do inc. I, do Art. 102,
506
ALVIM, Arruda. A declaração concentrada de constitucionalidade pelo STF e os limites
impostos à ação civil pública e ao Código de Proteção e Defesa do Consumidor. In: MAZZEI,
Rodrigo; NOLASCO, Rita Dias.
Proces
so civil coletivo
. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2005, p. 484: “A competência do Supremo Tribunal Federal (tal como prevista no Art. 102, inc.
I, letra ‘
a
’, CF) para declarar a inconstitucionalidade de lei federal é exclusiva e nenhum outro
órgão judic
iário do país a tem em identidade de condições”.
3
3
7
7
2
2
a competência do Supremo Tribunal Federal para apreciar a
matéria. A grande novidade fo
i o aumento dos legimitados para a
propositura da ação. Ao lado desse instrumento, havia a previsão
de outro, colocado originalmente pelo constituinte de 1988: a
argüição de descumprimento de preceito fundamental,
instrumento que aguardava a legislação ord
inária para a sua
implementação. A Constituição de 1998 cuidou de anunciar que
haveria uma argüição de descumprimento de preceito
fundamental a ser ajuizada perante o Supremo Tribunal Federal,
nos termos da lei. Portanto, a norma de eficácia limitada (na
c
lassificação de José Afonso da Silva) deixava a sua criação para
a lei posterior, o que só veio a ocorrer em 1999, pela Lei 9.882,
como já acima mencionado. Portanto, o quadro original de 1988
era composto de dois instrumentos: o primeiro, a ação direta de
inconstitucionalidade, efetivado, que era utilizado desde logo, com
a instrumentalização do Regimento Interno do Supremo Tribunal
Federal, que lhe servia de suporte processual. E um outro
instrumento, a argüição de descumprimento de preceito
fundamental,
que aguardava a disciplina pela lei ordinária.
507
Não se pode perder de vista, ainda, o surgimento,
a posteriori
, da ação
declaratória de constitucionalidade, cujo instrumento abstrato foi juridicamente
implantado no bojo da Emenda Constitucional nº 03, de 18 de março de 1993.
Conforme ensina Luís Roberto Barroso:
[...] a função jurisdicional, como regra geral, destina
-
se a solucionar
conflitos de interesses, a julgar uma controvérsia entre as partes que
possuem pretensões antagônicas. O controle de consti
tucionalidade
por ação direta ou por via principal, conquanto também seja
jurisdicional, é um exercício atípico da jurisdição, porque nele não há
um litígio ou situação concreta a ser solucionada mediante a aplicação
da lei pelo órgão julgador. Seu objeto
é um pronunciamento acerca da
própria lei. Diz
-
se que o controle é em tese ou abstrato porque não há
um caso concreto subjacente à manifestação judicial. A ação direta
destina
-
se à proteção do próprio ordenamento, evitando a presença
de um elemento não har
mônico, incompatível com a Constituição.
Trata
-
se de processo objetivo, sem partes, que não se presta à tutela
de direitos subjetivos, de situações jurídicas individuais. No caso
específico da inconstitucionalidade por omissão, a declaração é
igualmente em
tese, em pronunciamento no qual se reconhece a
inércia ilegítima do órgão encarregado de editar a norma exigida pelo
ordenamento.
508
507
ARAUJO, Luiz Alberto David. Controle concentrado da constitucionalidade e segurança
jurídica no sistema brasileiro. In: BRITO FILHO, José Claudio Monteiro de; MAUÉS, Antonio
G. Moreira; SCAFF, Fernando Fac
ury (coords.).
Direitos fundamentais & relações sociais
no mundo contemporâneo
. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 242.
508
BARROSO, Luís Roberto.
O controle de constitucionalidade no direito brasileiro
. São
Paulo: Saraiva, 2004, p. 113
-
114.
3
3
7
7
3
3
No que se refere à proteção e à concretização do direito fundamental à
convivência familiar e comunitária de crianças e ado
lescentes, tem
-
se que, dentro
do plano preventivo, o controle de constitucionalidade concentrada se entremostra
como importante instrumento de expurgo de normas que venham a atentar contra
o referido direito.
A proteção que aqui se verifica, por óbivo, nã
o diz respeito a um caso
concreto em si, mas dirige
-
se ao combate de determinado dispositivo de lei que
venha a atentar contra as garantias estampadas pelo legislador constituinte
originário na Lei de Outubro.
6.2.1
A ação direta de inconstitucionalidade
A ação direta de inconstitucionalidade compreende duas modalidades.
A modalidade
genérica
é destinada à decretação abstrata de
inconstitucionalidade de ato normativo federal ou estadual em face da
Constituição Federal, delegando
-
se esse mesmo poder aos
Estados Membros,
cujos tribunais são competentes para julgar a inconstitucionalidade da lei estadual
ou municipal em face da Constituição do Estado.
Seus efeitos são
erga omnes
e
ex tunc
, sendo legitimados para sua
propositura, na esfera federal, as autoridades e entidades elencadas no Art. 103
da CF e na estadual, aqueles que as respectivas constituições designarem.
A ação direta de inconstitucionalidade admite pedido liminar, não
dispensando votação em plenário com, no mínimo, oito Ministros e
quorum
d
e
maioria absoluta, o mesmo exigido para votação do mérito da ação.
Situação interessante em relação a ADIN, merecedora de registro, dá
-
se
quanto a possibilidade do Procurador da República, mesmo sendo autor da ação,
3
3
7
7
4
4
opinar por sua improcedência. Diz
-
se i
nteressante, pois a ADIN não admite
desistência após ajuizada.
É possível, por força do disposto no Art. 7º, § 2º, da Lei nº 9.868/99, a
manifestação acerca do mérito da ação, por parte de órgãos ou instituições
interessadas em seu julgamento.
Quanto ao
objeto da ação direta de inconstitucionalidade, o STF não
admite a apreciação de inconstitucionalidade meramente reflexa, assim, o ato
normativo considerado inconstitucional deve sofrer uma confrontação direta com o
texto constitucional.
Neste mesmo conte
xto, uma norma declarada constitucional pode ser
submetida novamente ao crivo de constitucionalidade no caso de haver
mudança no conteúdo da Constituição ou da norma objeto do controle, de
modo a concluir
-
se que a nova apreciação possa ser mais adequada ao
momento atual.
A Lei nº 9.868/99 institucionalizou os mecanismos da interpretação
conforme a Constituição e a nulidade parcial sem redução de texto como formas
de controle abstrato da constitucionalidade.
A interpretação, conforme a Constituição, consti
tui
-
se em mecanismo de
fundamental importância para a devida estruturação hierárquica dos textos
normativos infraconstitucionais, apresentando as seguintes modalidades:
509
(i)
Interpretação conforme com redução de texto: trata da declaração da
inconstitucion
alidade de qualquer expressão e, a partir daí, se expurga do texto
impugnado tal expressão, de modo que o texto reduzido se torne compatível com
a Constituição Federal;
510
(ii) interpretação conforme sem redução do texto,
conferindo à norma impugnada uma determinada interpretação que lhe reserve a
509
CANOTI
LHO; MOREIRA, 2007, vol. I, p. 857
-
858, passim.
510
ADIN nº 1.127
-
8, quando o STF suspendeu a eficácia da expressão ou desacato, disposta no
Art. 7º, § 2º, do Estatuto da OAB, concedendo à imunidade material dos advogados uma
interpretação conforme o Art. 13
3 da CF.
3
3
7
7
5
5
constitucionalidade: tem vasão quando não se pode extirpar a parte ou expressão
da norma impugnada, razão pela qual se outorga interpretação de acordo com a
Lei Maior;
511
e, (iii) interpretação conforme sem redução do
texto, excluindo da
norma impugnada uma interpretação que lhe acarretaria a insconstitucionalidade:
por tal método, exclui
-
se da norma impugnada uma interpretação incompatível
com a Constituição Federal.
512
Sua acepção indica que uma lei não deve ser consi
derada
inconstitucional quando for plausível emprestar
-
lhe interpretação em
consonância com a Constituição Federal. Esse fator extremamente relevante
deve condicionar a apreciação de constitucionalidade por parte dos órgãos
judicantes.
No campo da operaci
onalidade do direito, quando a parte pleitear
interpretação conforme a Constituição
que detém força de verdadeiro princípio
de determinado texto normativo, e neste quesito não for atendido, já estará apto a
interpor recurso extraordinário constituciona
l.
Com a institucionalização da interpretação conforme a Constituição e a
nulidade parcial sem redução de texto, o Poder Legislativo admite que o Judiciário
pode exercer atividade de adaptação de sentido aos textos legislativos.
E daí decorrente o mais r
elevante fator da interpretação conforme a
Constituição e da nulidade parcial sem redução de texto: a não mais vinculação
do julgador constitucional à figura de mero legislador negativo, com função única
de mantença ou expunção de texto do ordenamento, med
iante declaração de
constitucionalidade ou inconstitucionalidade.
511
ADIN nº 1.150
-
2/RS, quando o STF declarou que o Art. 276, §§ 2
o
, 3
o
, 4
o
, da Lei nº 10.098 do
RGS, só são constitucionais se interpretados com a exclusão de sua aplicação às funções e
empregos relativos a servidores celetistas que não se submeteram ao concurso disposto no
Art. 37, inc. II, da CF e § 1
o
do Art. 19 da ADCT.
512
ADIN nº 1.600
-
8/UF, quando o STF deferiu parcialmente o pedido de medida cautelar para,
sem redução de texto e conferindo interpretação conforme à Constituição, excluir, do Art
. 90
da Lei nº 9.099, com efeito
ex tunc
, o sentido que impeça a aplicação de normas de direito
penal com conteúdo mais favorável ao réu, aos processos penais com instrução iniciada à
época da vigência da Lei nº 9.099.
3
3
7
7
6
6
Abrem
-
se, assim, ante a interpretação conforme a Constituição e a
nulidade parcial sem redução de texto, múltiplos leques interpretativos ao
julgador constitucional, sem que ele, contudo, se
ja adjetivado de legislador
positivo.
Na medida em que um texto somente é válido se estiver em conformidade
com a Constituição, tem
-
se no texto constitucional, entendido em sua
materialidade, o horizonte do sentido que servirá para a conformação
hermenêut
ica. Em sendo a Constituição entendida como um
constituir
, os textos
infraconstitucionais necessariamente necessitam passar por esse banho de
imersão constitucional.
A morte da tese tradicional de separação dos poderes implica o abandono
da tese dos tribu
nais constitucionais como legisladores negativos.
Importa afirmar, por necessário, muito embora deveras parecidas em
virtude de apresentarem
-
se como decisões constitucionais interpretativas, a
interpretação conforme a Constituição e a nulidade parcial sem redução de texto
não são institutos idênticos.
Na interpretação conforme a Constituição se tem a declaração de que
uma mandamento legal é constitucional com a interpretação que lhe deu o órgão
judicial.
Já, na nulidade parcial sem redução de texto, ocor
re, por
inconstitucionalidade, a exclusão de determinada hipótese de aplicação sem que
se opere modificação no texto normativo.
Nos termos do Art. 28, parágrafo único da Lei nº 9.868:
Art. 28: A declaração de constitucionalidade ou de
inconstitucionalida
de, inclusive a interpretação conforme a
Constituição e a declaração parcial de inconstitucionalidade sem
redução de texto, têm eficácia contra todos e efeito vinculante em
3
3
7
7
7
7
relação aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública
federal, estadual
e municipal.
É importante frisar que por intermédio da Emenda Constitucional nº
45/2004, emprestou
-
se nova redação ao § 2º do Art. 102 da Lei Maior, de modo
que a questão do efeito vinculante, no que se refere a ação direta de
inconstitucionalidade, galgo
u, finalmente, abrigo constitucional.
Ademais, cumpre esclarecer que referida emenda trouxe outras
alterações sobre o tema vinculante, como bem salienta Roger Stiefelmann Leal:
Mais recentemente, porém, a Emenda Constitucional nº 45/04 deu
nova redação a
o § 2º do Art. 102 da Constituição, modificando
novamente o regime jurídico do efeito vinculante. A Emenda, de
um lado, consagrou, em âmbito constitucional, a sua extensão à
ação direta de inconstitucionalidade. Modificou, de outro lado, a
definição consti
tucional dos órgãos e entidades que se submetem
ao efeito vinculante na ação declaratória de constitucionalidade.
Nos termos da Emenda nº 45/04, as decisões de mérito proferidas
em ambas as ações (ação direta de inconstitucionalidade e ação
declaratória de
constitucionalidade) passam a produzir efeito
vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à
administração pública direta e indireta, em todas as esferas da
federação. Substituiu
-
se, no caso da ação declaratória de
constitucionalidade, o
Poder Executivo pela administração pública,
aproximando
-
se da redação adotada pela Lei nº 9.868/99.
513
No que concerne à nulidade parcial sem redução de texto, o efeito
vinculante também não se apresenta adequado.
Se a nulidade parcial sem redução de texto diz respeito à procedência em
parte da inconstitucionalidade proposta, apenas poderá ser vinculante o sentido
que é retido no sistema.
Assim como não pode haver efeito vinculante em decisão que rejeite uma
ADIN, também não pode haver efeito vinculante relativo à parte residual do texto
que não foi declarada inconstitucional. Somente em relação ao sentido que foi
expurgado do sistema poderá se pensar em efeito vinculante.
513
LEAL, Roger Stiefelmann.
O efeito v
inculante na jurisdição constitucional
. São Paulo:
Saraiva, 2006, p. 142
-
143.
3
3
7
7
8
8
O controle difuso de constitucionalidade, como já destacado no tópico
pertinente, é competência de todos os juízos e tribunais.
Nessa esteira, nada há que impeça qualquer esfera do Poder Judicante a
efetivar o controle de constitucionalidade através da interpretação conforme a
Constituição bem como a nulidade parcial sem redução de texto.
Todavia, no que concerne ao controle concentrado, a interpretação
conforme a Constituição e a nulidade parcial sem redução de texto só podem ser
aplicadas, por motivos próprios de competência, pelo Supremo Tribunal Federal
guardião da Constituição Fede
ral
e pelos Tribunais de Justiça dos Estados
que exercem o controle de constitucionalidade da legislação estadual e municipal
em face da Constituição Estadual.
A declaração do Supremo Tribunal Federal quanto à inconstitucionalidade
de lei ou ato norma
tivo produz efeitos desde o início da vigência da regra
inconstitucional, pois a infringência à Lei Maior sempre existiu
ex tunc
.
O Art. 27 da Lei nº 9.868 outorga ao STF a possibilidade de atribuir, em
relação à declaração de inconstitucionalidade, efe
itos
ex nunc
, ou, ainda, restringir os
efeitos da decisão de modo que a aludida declaração só tenha eficácia a partir de
seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado.
Para tanto, devem estar patentes razões de segurança jurídica ou d
e
excepcional interesse social, operando
-
se a aprovação mediante o voto de dois
terços dos membros do Pretório.
Com a superveniência de um novo ordenamento constitucional, ocorre o
fenômeno da recepção, no qual os diplomas normativos até então vigentes sã
o
aceitos ou não pela nova ordem constitucional. Esta sistemática decorre da
hierarquia própria que detém as normas de índole constitucional.
Na seara relativa ao controle da constitucionalidade das leis e atos
normativos, não é possível combater a legislação pretérita através de ação direita
3
3
7
7
9
9
de inconstitucionalidade, simplesmente por não se cogitar em
inconstitucionalidade de dispositivos revogados pelo novo texto constitucional,
sendo viável apenas o controle difuso.
Contudo, a partir do advento da Lei
nº 9.882, essa apreciação pode ser
feita através da argüição de descumprimento de preceito fundamental, quando
relevante o fundamento da controvérsia sobre lei ou ato normativo de qualquer
esfera da federação, mesmo os anteriores à Constituição vigente.
A
argüição de descumprimento de preceito fundamental é modalidade de
controle concentrado de constitucionalidade, o que conduz uma discussão nessa
seara aos efeitos próprios de uma ação direta de inconstitucionalidade.
A Constituição Federal é passível de
alteração nos termos do
procedimento previsto em seu Art. 60.
Todavia, em seu bojo existem núcleos imutáveis, denominados cláusulas
pétreas, não podendo ser emendados em razão de constituírem, aos olhos do
constituinte originário, bases do sistema constit
ucional pátrio.
Certo é, ainda, que as cláusulas pétreas apresentam
-
se de forma
explícita, a exemplo do que ocorre com o Art. 60, § 4º da Constituição brasileira
vigente, bem como outras que se apresentam implícitas, cuja própria sistemática
constituciona
l conduz à sua inalterabilidade.
Assim, o poder de emenda não encontra competência plena para alterar o
texto constitucional, encontrando intransponíveis obstáculos ao seu mister no seio
do próprio texto constitucional.
Em razão desses fatores limitativo
s, explícitos e implícitos no texto
constitucional, as emendas à Constituição estão sujeitas, como qualquer outro
preceito normativo
exceção feita, por óbvio, às normas constitucionais
originárias
ao controle de constitucionalidade tanto pela via difusa quanto pela
concentrada.
3
3
8
8
0
0
O Art. 5º, § 2º da Constituição brasileira estabelece que os direitos e
garantias nela previstos não excluem outros versados em tratados internacionais
dos quais o país seja signatário, desde que não contrários à sistemática loca
l.
Os tratados internacionais, quando ratificados soberanamente pelo parlamento
brasileiro, ingressam no sistema jurídico pátrio com gabarito de norma constitucional.
Recentemente foi aprovada a Emenda Constitucional nº 45, na qual se
estabeleceu que aos tratados e convenções internacionais ratificados pelo Brasil
por intermédio de três quintos dos votos dos respectivos membros pela Casa do
Congresso Nacional, lhes serão atribuídos o mesmo
status
jurídico de que gozam
as Emendas Constitucionais, equiparan
do
-
se, assim, a elas.
Sói acrescentar, por oportuno, que no julgamento da ADIN nº 595/ES e
sob a regência do Ministro Celso de Mello, a Corte Suprema acabou por fixar a
existência de dois elementos essenciais para se levar a cabo o controle de
constitucio
nalidade, a saber: (i) elemento temporal (para sua configuração mister
se faz necessário a constatação se o padrão em cotejo, supostamente malferido,
ainda se encontra em vigência); e, (ii) elemento conceitual (diz respeito à
determinação da própria idéia
de Constituição, à identificação do que seja seu
parâmetro de constitucionalidade).
Assim, quadram aqui, alguns esclarecimentos sobre o denominado
bloco
de constitucionalidade
,
514
por meio do qual, no Brasil, se adotou a idéia de
514
CANOTILHO, 1999, p. 811/812: “Todos os actos normativos devem estar em conformidade
com a Constituição (Art. 3º/3). Significa isto que os actos legislativos e restantes actos
n
ormativos devem estar subordinados, formal, procedimental e substancialmente, ao
parâmetro constitucional. Mas qual é o estalão normativo de acordo com o qual se deve
controlar a conformidade dos actos normativos? As respostas a este problema oscilam
funda
mentalmente entre duas posições: (1) o parâmetro constitucional equivale à constituição
escrita ou leis com valor constitucional formal, e daí que a conformidade dos actos normativos
só possa ser aferida, sob o ponto de vista da sua constitucionalidade ou inconstitucionalidade,
segundo as normas e princípios escritos da constituição (ou de outras leis formalmente
constitucionais); (2) o parâmetro constitucional é a ordem constitucional global, e, por isso, o
juízo de legitimidade constitucional dos actos normativos deve fazer
-
se não apenas segundo
as normas e princípios escritos das leis constitucionais, mas também tendo em conta
princípios não escritos integrantes da ordem constitucional global. Na perspectiva (1), o
parâmetro da constitucionalidade (=norma
s de referência, bloco de constitucionalidade)
reduz
-
se às normas e princípios da constituição e das leis com valor constitucional; para a
posição (2), o parâmetro constitucional é mais vasto do que as normas e princípios
constantes das leis constitucionai
s escritas, devendo alargar
-
se, pelo menos, aos princípios
reclamados pelo ‘espírito’ ou pelos ‘valores’ que informam a ordem constitucional global”.
3
3
8
8
1
1
supremacia formal da Constituição, lastreada nos postulados da rigidez basilar e
na indispensável obediência aos princípios que dela decorrem.
Não se perca de vista, ainda, que com a eclosão da Emenda nº 45/04,
mais precisamente no que se refere ao §3º do Art. 5° da CF/88, verifico
u
-
se uma
ampliação do conceito de bloco de constitucionalidade, abragendo, agora, normas
formal e materialmente constitucionais, como, por exemplo, os tratados
internacionais de direitos humanos que, aprovados pela nova sistemática,
apresentam
status
jurídicos equivalente ao das emendas constitucionais.
515
Sobre o tema em comento, interessante, uma vez mais, trazer a tona o
posicionamento do Ministro Celso de Mello, quando do julgamento da aludida
ADIN nº 595/ES:
Não foi por outra razão que o Supremo Tribun
al Federal, certa
vez, e para além de uma perspectiva meramente reducionista,
veio a proclamar
distanciando
-
se, então, das exigências
inerentes ao positivismo jurídico
que a Constituição da
República, muito mais do que o conjunto de normas e princípios
nela formalmente positivados, há de ser também entendida em
função do próprio espírito que a anima, afastando
-
se, desse
modo, de uma concepção impregnada de evidente minimalismo
conceitual (RTJ nº 71/289, 292
RTJ nº 77/657). É por tal motivo
que os trat
adistas
consoante observa JORGE XIFRA HERAS
(
Curso de Derecho Constitucional
, p. 43)
, em vez de formularem
um conceito único de Constituição, costumam referir
-
se a uma
pluralidade de acepções, dando ensejo à elaboração teórica do
conceito de bloco de c
onstitucionalidade (ou de parâmetro
constitucional), cujo significado
revestido de maior ou de menor
abrangência material
projeta
-
se, tal seja o sentido que se lhe dê,
para além da totalidade das regras constitucionais meramente
escritas e dos princípi
os contemplados, explicita ou
implicitamente, no corpo normativo da própria Constituição formal,
chegando, até mesmo, a compreender normas de caráter
infraconstitucional, desde que vocacionadas a desenvolver, em
toda a sua plenitude, a eficácia dos postula
dos e dos preceitos
inscritos
na Lei Fundamental, viabilizando, desse modo, e em
515
LENZA, Pedro.
Direito constitucional esquematizado
. 10ª ed. rev. atual. e ampl. São
Paulo: Método, 2006,
p. 129: “Com o advento da EC nº 45/2004 pode
-
se afirmar ter havido
ampliação do ‘bloco de constitucionalidade’ na medida em que se passa a ter um novo
parâmetro (norma formal e materialmente constitucional), qual seja, nos termos do Art. 5º, §
3º, os trat
ados internacionais e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem
aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos
dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais”.
3
3
8
8
2
2
função de perspectivas conceituais mais amplas, a concretização
da idéia de ordem constitucional global. Sob tal perspectiva, que
acolhe conceitos múltiplos de Constituição,
pluraliza
-
se a noção
mesma de constitucionalidade / inconstitucionalidade, em
decorrência de formulações teóricas, matizadas por visões
jurídicas e ideológicas distintas, que culminam por determinar
quer elastecendo
-
as, quer restringindo
-
as
as próprias
referências paradigmáticas conformadoras do significado e do
conteúdo material inerentes à Carta Política.
E na qualidade de normas constitucionais, passam a ser fundamento de
validade para outras normas, propiciando o controle de constitucionalidade dos
preceitos infraconstitucionais que com ela não se coadunem.
Quanto ao controle da constitucionalidade das leis estrangeiras, parte da
doutrina defende que, a elas, deve
-
se aplicar a sistemática de controle de
constitucionalidade própria de sua origem.
P
ara escorreita interpretação, deve iniciar
-
se a partir do princípio de que
nenhum tribunal pode aplicar sob sua jurisdição leis estrangeiras contrárias à sua
Constituição, pois essa convivência apresenta
-
se insustentável.
Convém destacar que o controle de
constitucionalidade pode operar
-
se em face
tanto da Constituição do país de origem quanto em relação à Constituição brasileira.
Por óbvio, a análise da constitucionalidade da lei alienígena perante a
Constituição do país de origem só pode ser levada a ca
bo caso existam, naquele
território, meios de controle de constitucionalidade.
Os Tribunais de Justiça dos Estados são competentes para processar e
julgar confronto de lei estadual com o texto da Constituição Estadual, em
autêntica hipótese de controle concentrado de constitucionalidade.
A mesma hipótese de controle concentrado de constitucionalidade observa
-
se no caso de lei municipal contrariar dispositivo da Constituição Estadual.
Os Tribunais de Justiça Estaduais exerceram seu poder de decisão
própri
o através do voto da maioria absoluta de seus Desembargadores, através
3
3
8
8
3
3
do Tribunal Pleno ou do Órgão Especial, nos termos em que definir de regimento
interno.
Caso a incompatibilidade opere
-
se entre a lei municipal e as regras
estatuídas na Constituição F
ederal que não foram repetidas na Constituição
Estadual, inexiste previsão legal para apreciação a cargo do Supremo Tribunal
Federal pela via concentrada.
Nesse caso específico, há a possibilidade, deveras remota, de se questionar a
constitucionalidade do
dispositivo municipal através de argüição de descumprimento
de preceito fundamental da Constituição Federal, nos termos da Lei nº 9.882, desde
que a hipótese se encaixe em uma de suas previsões de cabimento.
Impende notar, ainda, que as normas de repetição obrigatória que foram
reproduzidas no texto da Constituição Estadual, e mesmo aquelas que não foram
reproduzidas, mas que nela deveriam constar por obrigatórias, quando violadas
por lei municipal, igualmente legitimam os Tribunais de Justiça Estaduais a
o
controle concentrado da constitucionalidade.
Todavia, não será toda e qualquer matéria repetida no texto da
Constituição Estadual que, quando violada por lei estadual ou municipal, ensejará
a possibilidade do controle da constitucionalidade pela via concentrada perante o
pertinente Tribunal de Justiça.
O intérprete deve buscar a razão da repetição, pois inexistindo justificativa
para tanto, os Tribunais Estaduais, para o julgamento dessa específica questão,
não poderão ser considerados legítimos.
As de
cisões em sede de Ação Direta de Inconstitucionalidade de preceito
constitucional estadual são passíveis de recurso extraordinário perante o
Supremo Tribunal Federal.
Relativamente à violação de regras constitucionais implementadas por lei
estadual, é possível cogitar
-
se de duas ADIns, uma perante o Supremo Tribunal
3
3
8
8
4
4
Federal e outra perante o respectivo Tribunal Estadual, de modo a implicar na
perda do objeto da última no caso de o STF decidir pela inconstitucionalidade da
lei.
O mesmo, contudo, não pode s
er dito no caso da declaração de
constitucionalidade, que habilitará o Tribunal Estadual a decidir a ADIN que por lá
tramita apenas de acordo com os preceitos constitucionais estaduais, pois, em
relação aos comandos obrigatórios oriundos da Constituição Fe
deral
permanecerá o caráter vinculativo.
Em havendo a decisão de procedência da ADIN estadual, a mesma
implica na retirada do texto normativo do ordenamento estadual ou municipal,
gerando efeitos
ex tunc
e
erga omnes
na jurisdição do Estado
-
membro.
Nesse
caso, não é mais possível falar
-
se na reapreciação da matéria no
caso de lei estadual pelo Supremo Tribunal Federal, seja pela via difusa ou
concentrada, não se esquecendo apenas da possibilidade de argüição de
descumprimento de preceito fundamental relat
ivamente a ato normativo estadual ou
municipal, cuja competência extrapola a alçada do Tribunal de Justiça Estadual.
Há de se observar, ainda, que o trânsito em julgado da decisão de
improcedência proferida na ADIN estadual promovida em relação à lei esta
dual ou
municipal violadora das normas constitucionais federais de repetição obrigatória ou
daquelas simplesmente repetidas na Constituição Estadual, apesar de gerar efeitos
erga omnes
na jurisdição do Estado
-
Membro, não retira do Supremo Tribunal
Federal
a possibilidade de exercitar o controle da constitucionalidade pela via difusa
ou concentrada, essa última na hipótese exclusiva de lei estadual violadora.
6.2.2
A ação declaratória de constitucionalidade
É sabido que, com a constante mudança da socied
ade, alteram
-
se também
os perfis dos conflitos de interesse até então existentes, cuja problemática foi
3
3
8
8
5
5
observada pelo atual texto constitucional na medida em que em seu bojo foram
inseridas, na categoria de direitos fundamentais, novas modalidades de prot
eção aos
jurisdicionados como,
ad exemplum
, o mandado de segurança coletivo.
De outro vértice, se antigamente a sociedade dependia estritamente do
legislador para ver fomentar os direitos que lhe eram inerentes, temos que nos
dias de hoje tal responsabili
dade recai sobre o Poder Judiciário.
Assim é que o ordenamento jurídico pátrio permite aos jurisdicionados
promover a provocação do Judiciário valendo
-
se de instrumentos processuais
voltados para a tutela de interesses coletivos, difusos e individuais hom
ogêneos.
Instrumentos estes capazes de assegurar o amplo acesso à Justiça e de permitir
que uma única decisão judicial gere efeitos sobre um certo número de pessoas,
premiando a celeridade e economia processuais.
516
De outra parte, os posicionamentos desenc
ontrados emitidos pelos
nossos Tribunais acerca da mesma temática, além de trazerem intranqüilidade à
população, ferem, muitas das vezes, o princípio da isonomia. O certo é que nossa
sociedade necessita de meios hábeis para harmonizar as decisões judiciais
, ainda
mais quando se adotam os sistemas difuso e concentrado de fiscalização da
constitucionalidade.
Nesse ponto, a declaração de inconstitucionalidade emanada pelo
Supremo Tribunal Federal, em ação direta, resolve em definitivo determinada
questão e ba
rra incontáveis ações individuais.
Atentos a tal problemática, os juristas Ives Gandra Martins e Gilmar
Ferreira Mendes realizaram criterioso estudo e, a partir do mesmo, acabou sendo
516
ARENHART,
Sérgio Cruz. As ações coletivas e o controle das políticas públicas pelo poder
judiciário. In: MAZZEI, Rodrigo; NOLASCO, Rita Dias.
Processo civil coletivo
. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2005, p. 504 “Não há dúvida de que as demandas coletivas têm,
pau
latinamente, ganhado espaço no cenário jurídico nacional. Em que pesem alguns
percalços
apresentados tanto pela jurisprudência como por inovações legislativas recentes
que buscam diminuir a eficácia, o cabimento ou a utilização das ações coletivas, são
freqüentes, na atualidade, as ações que questionam interesses que afetam toda a
coletividade”.
3
3
8
8
6
6
apresentada a proposta de Emenda Constitucional que recebeu o número 3
e
instituiu a ação declaratória de constitucionalidade.
A princípio, a referida ação declaratória não foi bem recebida, sofrendo
críticas de inconstitucionalidade e inocuidade, porém, o Supremo Tribunal
Federal, em questão de ordem suscitada na Ação Direta de Constitucionalidade
nº 1
-
1
-
DF, pronunciou
-
se pela sua constitucionalidade.
Em um primeiro momento, pode parecer que uma ação tendente a
declarar a constitucionalidade de uma lei não tenha razão de ser, uma vez que a
constitucionalidade da lei é presu
mida.
No entanto, no sistema pátrio que admite a fiscalização da
constitucionalidade de forma concentrada e difusa, o fim precípuo da referida
ação é levar ao Supremo Tribunal Federal uma lei ou ato normativo federal sobre
o qual paire dúvida acerca de su
a constitucionalidade, para que, assim, seja
proferida decisão definitiva com eficácia
erga omnes
e efeito vinculante,
promovendo a guarda do direito constitucional objetivo e trazendo segurança
jurídica para os cidadãos brasileiros.
A princípio, grande p
arte dos juristas vislumbrou a existência de vícios que
comprometeriam a legitimidade da ação declaratória de constitucionalidade, dentre os
quais pode
-
se citar a ofensa aos princípios do devido processo legal, da ampla defesa,
do contraditório e da dupla
instância de julgamento. Além da violação a estes princípios,
prejudica
-
se o acesso do cidadão ao Poder Judiciário, impedindo
-
o de invocar a
proteção jurisdicional por inviabilizar o controle difuso da constitucionalidade.
Ora, na verdade as falhas apontadas não desqualificam a ação de
constitucionalidade como meio de fiscalização constitucional até mesmo porque
os legitimados do Art. 103 da Constituição Federal podem promover ação direta
de inconstitucionalidade da mesma norma.
Ademais, o próprio Supremo
Tribunal Federal poderá vir a conhecer,
através de distintas ações, outros posicionamentos acerca da constitucionalidade
da mesma norma.
3
3
8
8
7
7
Outrossim, não há também ofensa aos princípios do contraditório, da
ampla defesa e do devido processo legal pelo fato de impedir os jurisdicionados
de poderem exercitar o controle difuso. Ocorre que, para a mantença dos
controles difuso e concentrado entremostra
-
se necessária a possibilidade de a
Suprema Corte declarar, com efeitos
erga omnes
, a constitucionalidade ou a
i
nconstitucionalidade de determinada norma.
Em conclusão, constata
-
se que a ação declaratória de
constitucionalidade, tanto quanto a ação direta de inconstitucionalidade, fazem
parte do controle concentrado de constitucionalidade dos atos normativos,
perfa
zendo processos objetivos, posição, aliás, defendida pelo Ministro Moreira
Alves.
517
Na verdade, a ação declaratória de constitucionalidade não é novidade
em nosso sistema jurídico, isso porque, a própria ação de inconstitucionalidade é
também uma ação de c
onstitucionalidade, já que naquela o Supremo Tribunal
Federal tanto poderá declarar a constitucionalidade quanto a inconstitucionalidade
do ato normativo reptado.
Aliás, durante certo tempo, aceitou
-
se que o Procurador
-
Geral da
República propusesse repres
entação interventiva ou representação de
inconstitucionalidade com parecer contrário, buscando, com maior celeridade, o
reconhecimento judicial de legitimidade de determinada norma, que, de outra
forma, tomaria longos anos para ser apreciada em definitivo.
Nesse passo, o próprio Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal,
com vigência em 1970, tratava expressamente dessa possibilidade em seu Art.
174, § 1º Atualmente, apesar da possibilidade de encaminhamento da
representação com parecer contrário ter s
ido suprimida daquele Regimento
Interno, Art. 169, § 1º, o fato é que o Procurador
-
Geral continuou a oferecer as
representações de inconstitucionalidade, manifestando
-
se, por fim, muitas vezes
em favor da constitucionalidade da norma.
517
Ação Declaratória de Constitucionalidade, questão de ordem nº 1
-
DF.
3
3
8
8
8
8
Entretanto, tal posic
ionamento fora revisto
518
e apenas o Procurador
-
Geral pode apresentar ação direta de inconstitucionalidade ofertando, em sua
manifestação, parecer contrário, sendo, contudo, tal caminho vedado aos demais
legitimados elencados no Art. 103 da Constituição Fede
ral.
A avocatória surgiu no direito brasileiro com a Emenda
Constitucional nº 07, de 13/04/77, outorgando ao Supremo Tribunal
Federal competência para julgar causas processadas perante quaisquer
juízos ou tribunais, quando houver imediato perigo de grave
lesão à ordem,
à saúde, à segurança ou às finanças públicas, para que pudesse
suspender os efeitos da decisão proferida e para que lhe fosse devolvido o
conhecimento integral da lide.
519
Até há pouco tempo, em 1991, cogitou
-
se sobre o retorno da avocatória
ao sistema jurídico brasileiro. Ocorre que tal medida fora insuperavelmente
manchada pelo regime autoritário, tendo em vista seu aspecto eminentemente
político de suspender decisões jurídicas.
Dessa forma, as vantagens da ação de constitucionalidade sobre
a
avocatória são inegáveis, já que o Supremo Tribunal Federal somente será
provocado, de forma abstrata, para decidir acerca de questão de
constitucionalidade pertinente, não havendo que se falar em argumentos políticos,
mas sim, jurídicos.
Ademais, na a
nálise de caso concreto, caberá ao próprio juízo
competente solucioná
-
la, sem a interferência da Suprema Corte, devendo
apenas ser observada a decisão proferida sobre a questão constitucional em
abstrato.
A legitimidade ativa para a propositura da ação de
claratória de
constitucionalidade, a par do quanto estabelecido pela Emenda Constitucional nº
518
Representação nº 1.349, Relator: Ministro Aldir Passarinho.
519
Constituição Federal de 19
67/69, Art. 119, inc. I, alínea ‘
o
’.
3
3
8
8
9
9
45, restou idêntica àquela estabelecida para a ação direta de
inconstitucionalidade.
A ação declaratória de constitucionalidade tem por objeto apenas as
leis ou
os atos normativos federais, ao passo que a ação direta de
inconstitucionalidade pode ser proposta contra lei ou ato normativo federal ou
estadual em face da Constituição Federal, diferenciação que se mostra
arbitrária.
Ora, pela sistemática atual, o Governador do Estado fica impossibilitado
de buscar o Judiciário caso detenha interesse na declaração da
constitucionalidade de uma norma estadual em face da Carta Magna. Entretanto,
com exceção dos atos e leis estaduais, todos os atos normativos que desafiam
impugnação por via direta de inconstitucionalidade podem ser objeto da ação de
constitucionalidade.
A petição inicial da ação declaratória de constitucionalidade deverá,
necessariamente, indicar o dispositivo da lei ou do ato normativo ferretado, os
funda
mentos jurídicos da impugnação, o pedido, com suas especificações, além
da comprovação da existência de controvérsia judicial relevante acerca da
aplicação da disposição objeto da medida,
520
uma vez que a Suprema Corte não
é órgão consultivo, devendo solucionar as controvérsias apresentadas, ainda que
de forma abstrata.
De outro modo, a mera demonstração de entendimentos
divergentes sobre a constitucionalidade de determinada norma não
autoriza o intento da ação em apreço; faz
-
se necessária a demonstração
de
divergência judicial que, não demonstrada, obsta o prosseguimento da
demanda na Excelsa Corte, conforme bem salientou o respeitado Ministro
Moreira Alves, quando da apresentação de seu voto no julgamento da
Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 1
-
1,
Distrito Federal,
restando consignado que:
520
Lei nº 9.868 de 10/11/99, Art. 14, inc. III.
3
3
9
9
0
0
[...] esta Corte, no julgamento do incidente de
inconstitucionalidade da Emenda Constitucional nº 3/93 que
instituiu a presente ação declaratória de constitucionalidade,
estabeleceu, como uma das condições dessa a
ção, a
necessidade de demonstração da existência de controvérsia
judicial séria sobre a norma ou as normas cuja declaração de
constitucionalidade é pretendida. Assim sendo, a delimitação do
objeto da ação declaratória de constitucionalidade não se
adstring
e aos limites do objeto fixado pelo autor, mas estes estão
sujeitos ainda aos lindes da controvérsia judicial que o autor tem
que demonstrar.
521
Anteriormente à assunção da Lei nº 9.868/99, muito se discutiu acerca da
possibilidade ou não de concessão de li
minar na ação declaratória de
constitucionalidade.
De fato, altercavam aqueles que se mostravam contrários a tal desiderato
que se a Suprema Corte viesse realmente a conceder liminar em ação
declaratória de constitucionalidade estaria perpetrando uma repe
tição inútil, na
medida que se estaria afirmando aquilo que já é presumido, ou seja, a
constitucionalidade e a legalidade da lei ou ato normativo.
Entrementes, e depois de detida e acurada análise sobre a
problemática em questão, parece restar indene de d
úvidas tanto a
possibilidade como a necessidade, em certos casos, de concessão de liminar
em ação declaratória de constitucionalidade não podendo, portanto, o
Supremo Tribunal Federal se furtar à apreciação de pleitos nesse sentido,
valendo, por oportuno,
trazer à tona a abalizada lição proferida pelo insigne
Gilmar Ferreira Mendes, para quem deve a mesma ser concedida “[...] a fim
de evitar o agravamento do estado de insegurança ou se incerteza jurídica
que se pretende eliminar”.
522
Atualmente, referida discussão não mais se entremostra pertinente tendo
em vista que a já citada Lei nº 9.868/99 acabou por admitir expressamente a
521
Ação declaratória de constitucionalidade nº 1
-1-
DF.
522
Ação Declaratória de Constitucionalidade. Coord. Ives Gandra Martins, 2ª. Tiragem. São
BASTOS, Celso Ribeiro; MARTIN
S, Ives Gandra.
Comentários à Constituição do Brasil
.
São Paulo: Saraiva, 1992, vol. III, p. 88.
3
3
9
9
1
1
concessão de medida liminar na ação declaratória de constitucionalidade,
dispondo, no
caput
de seu Art. 21, que:
Art. 21: O Supremo
Tribunal Federal, por decisão da maioria
absoluta de seus membros, poderá deferir pedido de medida
cautelar na ação declaratória de constitucionalidade, consistente
na determinação de que os juízes e os Tribunais suspendam o
julgamento dos processos que e
nvolvam a aplicação da lei ou do
ato normativo objeto da ação até seu julgamento definitivo.
Em assim sendo, e concedida a medida liminar vindicada, a Suprema
Corte deverá publicar a parte dispositiva da referida decisão, dentre 10 (dez)
dias, em seção es
pecial do Diário Oficial da União, sendo certo que o
julgamento da ação declaratória de constitucionalidade deverá ocorrer dentre
180 (cento e oitenta) dias, sob pena de perda da eficácia da mesma, nos
precisos moldes do quanto estatuído no parágrafo único
do referendado Art. 21
da Lei nº 9.868/99.
O procedimento disciplinador da ação direta de
inconstitucionalidade e da ação declaratória de constitucionalidade passou
a ser regulado com a edição da Lei nº 9.868 de 10 de novembro de 1999,
que trata do proce
ssamento e do julgamento das referidas ações perante o
Excelso Supremo Tribunal Federal. Até então, o procedimento observado
era, no que cabia, o mesmo utilizado para a tramitação da ação de
inconstitucionalidade.
Deveras, a Lei nº 9.868/99 trouxe, em seus Arts. 14 a 20, o procedimento
para o correto processamento da ação declaratória de constitucionalidade, cuja
dogmática não poderá ser ofendida, sob pena de não
-
conhecimento e de não
admissibilidade da mesma pelo Supremo Tribunal Federal.
Julgada procede
nte a ação de constitucionalidade, a manifestação
jurisdicional implicará na declaração de constitucionalidade do ato normativo,
embora a rejeição da medida redunde, via de conseqüência, na declaração da
inconstitucionalidade da norma objeto da demanda.
3
3
9
9
2
2
As
sim é que, tanto no caso de procedência como no de improcedência,
ainda que parcial, a decisão proferida produz efeito
erga omnes
, que irá vincular
todos os demais órgãos do Poder Judiciário e da Administração Pública, direta e
indireta, e, em princípio,
e
x tunc
.
Imperativo se faz destacar que a decisão proferida tanto na ação busca a
confirmação da constitucionalidade quanto na ação direta de inconstitucionalidade
é declaratória de um estado preexistente.
6.2.3
A ADIN por omissão
A omissão legislativa
constitucional e o seu controle, em especial no
tocante às normas de eficácia limitada e aplicabilidade mediata ou indireta
que
clamam por normatização posterior capazes de assegurar os resultados
pretendidos pelo legislador constituinte
, é problema v
ivo na atual ordem
constitucional. Isso porque, não seria crível conceber que uma Constituição, sem
a eficácia jurídica de suas normas, atenderia às aspirações da sociedade no seio
da qual fora concebida.
Para haver prosseguimento, necessário proceder
-
se
à conceituação de
Constituição e para o tema
sub studio
amolda
-
se com perfeição o escólio do
jurista Konrad Hesse, para quem “[...] a resposta sobre o significado da
Constituição depende, assim, da tarefa que se pretende resolver com o conceito
eventualmen
te desenvolvido”.
523
Resulta daí que a Constituição é uma obra aberta, incompleta, porém,
que não deixa de prescrever o que não pode permanecer aberto. Entretanto, tal
abertura não resvala na diminuição ou até mesmo na dissolução da força
normativa dos preceitos encartados no Texto Magno.
523
Konrad Hesse, apud,
PIOVESAN, Flávia.
Proteção judicial contra omissões legislativas
.
São Paulo: Revista dos Tribunais: 1995, p. 20.
3
3
9
9
3
3
O controle da inconstitucionalidade por omissão, recentemente introduzido no
sistema jurídico brasileiro, inserto no Art. 103, §2º da Lei Maior, tem por escopo efetivar
a vontade do legislador constituinte, isto é, toda norma constitucional deverá ter
eficácia plena, sendo que aqueles preceitos que necessitam de regulamentação
legislativa não poderão deixar de ser invocados por uma falta do legislador.
Os legitimados para promoverem a ação de inconstitucionalidade por
omiss
ão são os mesmos que detêm a autorização para propor a ação direta de
inconstitucionalidade, ressaltando que a competência originária para a apreciação
também é da Excelsa Corte, Art. 102, inc. I, alínea ‘
a
’, por analogia. Após a
declaração de inconstituci
onalidade por omissão será promovida a cientificação
ao Poder, o qual deverá tomar as providências omitidas que couberem.
A menos que as providências reclamadas sejam da esfera do Poder
Legislativo, a ciência será dada sem fixação de prazo, mas, estiverem
no âmbito
de órgãos administrativos, quaisquer deles, a ordem judicial fixará prazo de 30
dias para que sejam tomadas as medidas cabíveis, admitindo
-
se
responsabilização se não forem ultimadas no prazo fixado.
Outrossim, não há garantia de que o Poder Legislativo irá atuar e sanar a
omissão, nem mesmo existe como imputar sanção pelo descumprimento ao
comportamento inconstitucional desse Poder, aumentando
-
se sua
discricionariedade, e, por isso, não é cabível a concessão de medida liminar na
ação direta de
inconstitucionalidade por omissão.
Quanto aos entes elencados no Art. 103, incs. I a X da Carta Política, fiscais da
Constituição, não lhes é exigida a comprovação de interesse jurídico específico, no
âmbito processual. Contudo, o Supremo Tribunal Federal
entende que o interesse
jurídico deve existir, deve haver uma relação de pertinência entre a norma impugnada e
o interesse da classe. A já por vezes citada constitucionalista Flávia C. Piovesan acredita
ser esta uma interpretação restritiva, “[...] conver
tendo a interpretação da lei conforme a
Constituição, em interpretação da Constituição conforme a lei”.
524
524
PIOVESAN, 1995, p. 102
.
3
3
9
9
4
4
Desta feita, patente a omissão, entremostra
-
se perfeitamente cabível uma ação de
perdas e danos contra a pessoa jurídica de direito público responsável
por tal, não sendo,
porém, essa responsabilização a característica do controle da constitucionalidade, eis que, o
que se almeja, de fato, é efetivamente eliminar a inconstitucionalidade para assegurar a
supremacia da Constituição Federal e seu efetivo cum
primento.
Por essa razão, caberá ao Supremo Tribunal, por analogia, afastar a
inconstitucionalidade por omissão, só que, em prol do princípio da separação dos
poderes, a Corte Excelsa não vem suprindo a omissão, comprometendo, via de
conseqüência, o princ
ípio da prevalência da Constituição.
Flávia Piovesan, em sua obra, filia
-
se à corrente que milita a favor da
fixação de um prazo para que o legislador omisso supra a omissão reptada, e, se
mesmo assim nenhuma providência for adotada, o Supremo, dependendo
do
caso
sub examine
, disporá normativamente acerca da matéria, de forma
provisória, até que o legislador elabore a norma regulamentadora.
Tal proceder, ao nosso ver, estaria a viabilizar o preceito constitucional e, ao
mesmo tempo, conciliaria o princípio político da autonomia do legislador com o princípio
da aplicabilidade imediata das normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais.
6.2.4
A argüição de descumprimento de preceito fundamental
A Constituição Federal de 1988, através do Art. 10
2, § 1º, trouxe ao
ordenamento jurídico pátrio uma inovação, qual seja, a argüição de
descumprimento de preceito fundamental com apreciação reservada ao Supremo
Tribunal Federal, na forma estabelecida posteriormente pela Lei nº 9.882, de 03
de dezembro de
1999, ou seja, depois de decorridos mais de 10 (dez) anos de
sua inserção na seara basilar brasileira.
Ao referir
-
se a preceito fundamental, o legislador constituinte procurou
incluir as vigas mestras da nossa Constituição, dos quais se podem enumerar os
princípios fundamentais (Arts. 1º a 4º), os direitos e garantias fundamentais (Art.
3
3
9
9
5
5
5º), os princípios da administração pública (Art. 37) e os princípios constitucionais
sensíveis (Art. 60, § 4º, incs. I a IV), sendo que destes podem decorrer outros.
Não
menos certo nos parece que o que hoje merece a denominação de
preceito fundamental pode vir a ter sua densidade normativa sensivelmente
diminuída. Nessa esteira de silogismo, o que não é considerado preceito
fundamental pode vir a sê
-
lo, eis que a Lei Maio
r não pode permanecer rígida
perante as mudanças e a evolução da sociedade.
É importante destacar que os legisladores alienígenas já previram tal
espécie de recurso constitucional, que vem sendo utilizado nos países de origem
para prestarem com mais eficácia a tutela jurisdicional constitucional.
A título de exemplificação, pode
-
se citar, dentre outros, o recurso
constitucional austríaco, surgido em 1867 no Império, na Lei do Tribunal
Constitucional que, posteriormente, veio a integrar a Constituição de 1
820.
Já, na Alemanha, verifica
-
se a existência do
agravo constitucional
ou
queixa constitucional
,
525
com utilização excepcional por qualquer pessoa que se
sinta violada pelo poder público em seus direitos fundamentais, de larga utilização
para atacar decisões judiciais perante o Tribunal Constitucional Federal.
Ainda, no ordenamento jurídico espanhol, a Constituição de 1978
assegurou o
recurso de amparo
(Art. 161.1, b, e 162.1, b), anteriormente previsto
na Constituição de 1931 (Art. 121), inspirada na Lei
Fundamental mexicana de
1917 (Art. 107). O
amparo
é um procedimento especial que visa à proteção dos
direitos fundamentais e as liberdades públicas reconhecidas pela Constituição,
podendo ser interposto por qualquer pessoa, inclusive pelo Defensor do Povo
e
pelo Ministério Público, desde que esgotadas, previamente, as vias judiciais.
A ação de argüição de descumprimento de preceito fundamental tem por
finalidade precípua evitar ou reparar lesão aos já mencionados preceitos
525
Verfassungsbeschwerde
, prevista na Lei de 17/04/51.
3
3
9
9
6
6
fundamentais, como, aliás, vem es
tampada na última parte do
caput
do Art. 1º da Lei
nº 9.882, de 3 de dezembro de 1999, devendo ser intentada perante a Corte Excelsa.
Em outras palavras, e como bem ilustram os constitucionalistas Celso
Ribeiro Bastos e Alexis Galiás de Souza Vargas, a aç
ão
sub studio
:
[...] demonstra o papel que o veículo processual visa cumprir, que
é o de proteger a Nação das situações que violentam aquilo que
lhe é mais sagrado, e que há de mais valoroso no seu sistema
jurídico. Não é a lesão a qualquer norma formalme
nte
constitucional que poderá ensejar a argüição. Haverão de ser
levados em conta os preceitos maiores da Carta Política, que, por
não estarem definidos na legislação em comento, demandarão um
trabalho doutrinário e jurisprudencial.
526
É sabido que o contro
le da constitucionalidade no sistema jurídico
brasileiro comporta duas vias, duas maneiras distintas de se obter o mesmo
desiderato, a saber: a concentrada e a difusa, caracterizando
-
se assim a
implementação de forma mista de defesa do Texto Magno.
Todavi
a, no controle concentrado somente poderá se perquirir ao
derredor de problemas de constitucionalidade que envolvam leis ou atos
normativos emanados das esferas federal ou estadual, sendo certo que a
jurisprudência pátria restringiu tal conceito a tão
-
some
nte os atos denominados
primários,
id est
, aqueles que emanam diretamente da Carta Política.
Já, no que tange ao controle difuso, a grande dificuldade apresentada é o
infinito número de decisões divergentes que poderão aflorar sobre a mesma
problemática constitucional, situação esta que poderia, em determinados casos,
fazer reinar a insegurança jurídica para os jurisdicionados o que, por motivos que
nos parecem óbvios, se cumpre a todo custo evitar.
Em meio a esse aparente limbo surgiu a ação de argüição
de descumprimento
de preceito fundamental, a qual, se corretamente utilizada, acabará se tornando mais um
firme passo na trilha ao respeito à cidadania a ao Estado de Direito, eis que sua amplitude
526
BASTOS, Celso Ribeiro; VARGAS, Alexis Galiás de Souza. Argüição de descumprimento de
preceito fundamental. In:
Revista de direito constitucional e internacional
, ano VIII, nº 30.
São Paulo: Revista
dos Tribunais, jan./mar. 2000, p. 68.
3
3
9
9
7
7
permite a análise de atos não legislativos e de atos munic
ipais, afastando
-
se, assim,
qualquer interpretação no sentido de delimitar os atos albergados pela referida
actio
, tal
qual ocorreu com a ação direta de inconstitucionalidade.
Como bem mencionado pelos juristas Celso Ribeiro Bastos e Alexis
Galiás de Souz
a Vargas, a ação de descumprimento de preceito fundamental:
[...] vem a preencher uma lacuna que se fazia sentir no ordenamento
jurídico pátrio, pois cria uma ponte entre o sistema difuso e o
concentrado, uma vez que a decisão proferida incidirá sobre os
diversos
processos em curso. Com isso, permite
-
se antecipar o deslinde de uma
questão jurídica que percorreria a ‘via crucis’ do sistema difuso para
chegar ao Supremo Tribunal Federal, para então, após decisão
definitiva, ser a mesma comunicada ao Senado F
ederal, que poderá
suspender a eficácia da lei impugnada, para só então cessarem os
efeitos da lei ou ato normativo inconstitucional. Através dos mecanismos
da lei ora estudada, permite
-
se que sejam integrados os dois sistemas
de controle, conferindo mais
racionalidade e coerência ao sistema, uma
vez que se permite decidir com eficácia
erga omnes
, incidindo
diretamente sobre os processos em curso [...].
527
Desta feita, é inequívoco que a ação de argüição de preceito fundamental
constitui
-
se em mais uma forma
de controle concentrado de constitucionalidade,
tendo incidência sobre atos normativos ou não emanados do poder público,
incluindo
-
se, aí, todos os órgãos federativos (Federal, Estadual e Municipal).
Todavia, importante se faz a advertência proclamada po
r André Ramos
Tavares, no sentido de que:
[...] é preciso também afastar a possibilidade de que ‘preceito
fundamental’ seja toda e qualquer norma contida na Lei Fundamental.
Se, teoricamente, essa construção é admissível, o mesmo não ocorre
quanto ao vige
nte sistema constitucional. É que se assim fosse, então
tornar
-
se
-
ia repetitiva a parte final do § 1º do Art. 102 quando se refere a
preceito fundamental decorrente desta Constituição.
528
A legitimidade ativa para a propositura da ação de argüição de
descum
primento de preceito fundamental é a mesma relativa à incoação da ação
direta de constitucionalidade, que se encontra descrita nos incisos do Art. 103 da
Constituição, referendado no inc. I do Art. 2º da Lei nº 9.882, de 03/12/99, a saber:
527
Ibidem, p. 70
-
71.
528
TAVARES, 2001, p. 121.
3
3
9
9
8
8
Art. 103: [...].
I
o Presidente da República;
II
a Mesa do Senado Federal;
III
a Mesa da Câmara dos Deputados;
IV
a Mesa de Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do
Distrito Federal (alterado pela EC nº 45/04
STF já admitia mesmo
antes da EC);
V
o G
overnador de Estado ou do Distrito Federal (alterado pela EC
45/04
STF já admitia mesmo antes da EC);
VI
o Procurador
-
Geral da República;
VII
Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;
VIII
Partido Político com representação no Congresso Na
cional; e,
IX
Confederação Sindical ou Entidade de Classe de âmbito
nacional.
Sói acrescentar, também, que se aplicam aqui, sobre tais entes
legitimados para deflagrar o controle concentrado perante o Supremo Tribunal
Federal, os requisitos concernentes
à já mencionada ação direta de
inconstitucionalidade, inclusive no que se refere à criação jurisprudencial
denominada
pertinência temática
.
Imperativo se faz destacar que o projeto original, mais precisamente o inc. II do
Art. 2º, da referida lei, estava
a permitir a legitimação para o aforamento do pleito de
argüição de descumprimento de preceito fundamental a qualquer pessoa lesada ou
ameaçada por ato do poder público, mas, no entanto, foi vetado pelo Presidente da
República sob o pálio de que estaria a
propalar o inchamento de demandas postas à
douta apreciação da Corte Suprema, perdendo
-
se grande oportunidade de concretizar a
referida
actio
como verdadeiro meio para o pleno exercício da cidadania.
DECISÃO:
Vistos. Trata
-
se de
argüição de descumpriment
o de
preceito fundamental
,
com pedido liminar
, proposta por
FÁBIO
MONTEIRO DE BARROS FILHO
, com fundamento no Art. 102, §
1º, da Constituição Federal e na Lei nº 9.882/99, na qual requer ‘a
intervenção do STF, na qualidade de guardião da Constituição e
do
Estado de Direito, na forma da Lei 9.882, com a concessão de
medida liminar’ visando à ‘
a) Suspensão do bloqueio de bens
do requerente e suas empresas, para que possa desenvolver
suas atividades, se necessário for para que o mesmo ofereça
garantia real nos
autos da ação civil pública proporcional a
sua responsabilidade
’ (fls. 12/13), bem como ‘
b) Suspender a
sentença falimentar da CONSTRUTORA IKAL LTDA., até ao
final da ação civil pública, em face da indisponibilidade de
seus bens, créditos e valores deposi
tados em conta corrente’
(fl. 13). Autos conclusos nesta data. Decido. A argüição de
descumprimento de preceito fundamental poderá ser proposta
pelos legitimados para a ação direta de inconstitucionalidade (Lei
nº 9.882/99, Art. 2º, inc. I), mas qualquer i
nteressado poderá
3
3
9
9
9
9
solicitar ao Procurador
-
Geral da República a propositura da
argüição (Art. 2º, § 1º). Assim posta a questão, porque o autor não
é titular da
legitimatio ad causam
ativa, nego seguimento ao
pedido e determino o seu arquivamento. Publique
-s
e. Brasília, 30
de janeiro de 2001. Ministro
CARLOS VELLOSO
Presidente.
Vale ressaltar, por oportuno, que mecanismo parecido ao ora em estudo
já fez parte de nosso ordenamento constitucional, na Carta Magna Imperial de
1824, a qual estabelecia nas suas
Disposições Geraes e Garantias dos Direitos
Civis e Políticos dos Cidadãos Brasileiros
, Art. 179, inc. XXX: “Todo o Cidadão
poderá apresentar por escripto ao Poder Legislativo e ao Executivo, reclamações,
queixas ou petições, e até expor qualquer infração
da Constituição, requerendo
perante a competente Auctoridade a effectiva responsabilidade dos infratores”.
Ao derradeiro e socorrendo
-
nos nos ensinamentos proferidos pela insigne
jurista Maria Garcia:
[...] a conclusão, inevitável, de todo o exposto é de
que a
regulamentação do dispositivo constitucional não atendeu a sua
finalidade a qual decorre da estrutura sistêmica da Constituição, dos
seus pressupostos, da sua tessitura, do seu espírito, enfim, pois desde
logo não convence que, nesse dispositivo, a
Constituição viesse
apenas estabelecer uma outra forma de controle da
constitucionalidade e pelos mesmos autores da ação direta.
529
A peça inicial da ação de argüição deve conter o preceito fundamental
que se reputa violado, a indicação do ato reptado, a pr
ova da violação do
preceito, o pedido e a demonstração de controvérsia judicial relevante quanto à
aplicação do preceito que se considera violado, se for o caso.
O Relator poderá indeferir liminarmente a petição inicial, quando não for o
caso de descumpri
mento do preceito fundamental alegado, quando faltar algum
dos requisitos previstos na Lei ou se for declarada inepta. A decisão prolatada
desafia o recurso de agravo, no prazo de cinco dias.
A Lei nº 9.882/99 traz, também, em seu bojo, a possibilidade de
concessão de medida liminar, por meio de decisão da maioria absoluta dos
ministros da Suprema Corte, sendo que o relator poderá, ainda, conceder tal
529
BASTOS; VARGAS, 2001, p. 104.
4
4
0
0
0
0
medida
ad referendum
do Tribunal Pleno, no caso de extrema urgência ou perigo
de grave lesão, ou, ainda, e
m período de recesso.
Superada tal fase inicial, às autoridades responsáveis pelo ato reptado
serão solicitadas informações, que deverão ser prestadas no prazo de dez dias.
Em prosseguimento, o relator poderá ouvir as partes, requisitar outras
informaçõe
s, bem como designar perito para emitir parecer sobre o tema.
Ademais, objetivando o esclarecimento da questão suscitada e visando à
formação da convicção dos magistrados, há a possibilidade de convocação de
pessoas com experiência e autoridade na matéria para discorrer sobre a questão em
audiência pública, não se olvidando a necessidade de ouvir o representante do MP,
nos moldes preconizados pelo parágrafo único, do Art. 7º, da Lei nº 9.882).
Após, o relator pedirá dia para a audiência de julgamento, qu
e deverá
contar com, pelo menos, dois terços dos ministros na respectiva sessão,
salientando
-
se que o
decisum
não admite a interposição de qualquer espécie de
recurso, até mesmo da ação rescisória.
A decisão proferida em sede de ação de argüição de descum
primento de
preceito fundamental possui, como dito linhas atrás, eficácia
erga omnes
e efeito
vinculante em relação ao Poder Público, mas foi atribuído à Suprema Corte, tendo
em vista razões de segurança jurídica o excepcional interesse social, por maioria
de 2/3, estabelecer que só tenha eficácia a partir do trânsito em julgado ou do
momento que venha a ser fixado.
Nessa esteira de pensamento, pode
-
se concluir que a irradiação de efeitos
contra todos, bem como a eficácia vinculante da decisão prolatada pe
lo Excelso
Supremo Tribunal Federal terá, sem sombra de dúvidas, inegável serventia, ainda
mais ao se levar em consideração que quando o aludido
decisum
pôr a termo
problemática basilar a respeito de lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal
inse
rindo
-
se, aí, aqueles anteriores ao vigente Texto Constitucional.
Conforme leciona Zeno Veloso:
4
4
0
0
1
1
[...] o problema da constitucionalidade, com fundamento relevante,
fica logo solucionado e a definição dada pelo Supremo Tribunal
impõe
-
se a todos, evitando qu
e dúvidas e intranqüilidades
persistam. Isto é bom para a racionalização dos processos e para
a estabilidade jurídica.
530
Em primeiro lugar, a ação de argüição de descumprimento de preceito
fundamental possui objeto muito mais abrangente que aquele afeto à ação direta de
inconstitucionalidade, vez que não se recolhem apenas atos normativos federais e
estaduais, podendo, então, atingir atos municipais, sejam eles normativos ou não.
Outra diferença latente consiste no fato de que a ação em comento
necessita d
a demonstração de confronto com preceito fundamental, enquanto que
na ADIn qualquer norma poderá ser utilizada para o seu aforamento, situação
esta que tende, definitivamente, em trasmudar o Supremo Tribunal Federal em
verdadeira Corte Constitucional.
Fin
almente, diferem
-
se as ações no que tange à possibilidade de a
decisão liminar proferida em sede de argüição de descumprimento estancar os
feitos em curso.
O Supremo Tribunal Federal acabou por discutir a aplicação do princípio
da subsidiariedade, quando do julgamento da ADPF nº 76/TO, sendo certo que o
Ministro Gilmar Ferreira Mendes assim ponderou:
Nesse particular, o desenvolvimento do princípio da
subsidiariedade, ou da idéia da inexistência de outro meio eficaz,
dependerá da interpretação que o STF v
enha a dar à lei. A esse
respeito, destaque
-
se que a Lei nº 9.882/1999 impõe que a
argüição de descumprimento de preceito fundamental somente
será admitida se não houver outro meio eficaz de sanar a
lesividade (Art. 4º, § 1º). À primeira vista, poderia par
ecer que
somente na hipótese de absoluta inexistência de qualquer outro
meio eficaz para afastar a eventual lesão poder
-
se
-
ia manejar, de
forma útil, a argüição de descumprimento de preceito
fundamental. É fácil ver que uma leitura excessivamente literal
d
essa disposição, que tenta introduzir entre nós o princípio da
subsidiariedade vigente no direito alemão (recurso constitucional)
e no direito espanhol (recurso
de amparo), acabaria por retirar
530
VELOSO, Zeno.
Controle jurisdicional de constitucionalidade
. 2ª ed. rev. atual. e ampl.
Belo Horizonte: Del Rey, 2000, p. 308.
4
4
0
0
2
2
desse instituto qualquer significado prático. De uma perspect
iva
estritamente subjetiva, a ação somente poderia ser proposta se já
se tivesse verificado a exaustão de todos os meios eficazes de
afastar a lesão no âmbito judicial. Uma leitura mais cuidadosa há
de revelar, porém, que na análise sobre a eficácia da pro
teção de
preceito fundamental nesse processo deve predominar um
enfoque objetivo ou de proteção da ordem constitucional objetiva.
Em outros termos, o princípio da subsidiariedade
inexistência de
outro meio eficaz de sanar a lesão
, contido no § 1º do Ar
t. 4º da
Lei nº 9.882/1999, há de ser compreendido no contexto da ordem
constitucional global. Nesse sentido, caso se considere o caráter
enfaticamente objetivo do instituto (o que resulta, inclusive, da
legitimação ativa), meio eficaz de sanar a lesão par
ece ser aquele
apto a solver a controvérsia constitucional relevante de forma
ampla, geral e imediata. No direito alemão, a
Verfassungsbeschwerde (recurso constitucional) está submetida
ao dever de exaurimento das instâncias ordinárias. Todavia, a
Corte Co
nstitucional pode decidir de imediato um recurso
constitucional, caso se demonstre que a questão é de interesse
geral ou se demonstrado que o requerente poderia sofrer grave
lesão caso recorresse à via ordinária (Lei Orgânica do Tribunal, §
90, II).
6.2.
5
A ação direta interventiva
A outra modalidade de ação direta, designada
interventiva
, pode ser
federal, cuja legitimidade compete ao Procurador
-
Geral da República e a
competência para julgamento cabe ao STF, ou estadual, proposta pelo
Procurador
-
Geral
de Justiça perante o Tribunal de Justiça estadual.
Destina
-
se a promover a intervenção federal no Estado
-
Membro ou do
Estado
-
Membro em município sob sua jurisdição e visa, precipuamente, à solução
de uma controvérsia que envolve a União e o Estado
-
Membro
ou este e o
Município, cujo assunto será melhor tratado em tópico próprio.
A Constituição Federal de 1988 é clara ao preconizar, no
caput
de seu
Art. 1º, que o Brasil é uma federação, solidificando a importância de tal
determinação ao considerá
-
la como cl
áusula pétrea, haja vista a expressa
proibição, no campo das emendas constitucionais, de deliberação de proposta
tendente a abolir a forma federativa de Estado (cf. Art. 60, § 4º, inc. I, CF).
4
4
0
0
3
3
O Federalismo encontra sua origem histórica a partir da proclam
ação da
independência das 13 colônias inglesas que deram origem aos Estados Unidos
da América.
De fato, afirma Celso Ribeiro Bastos:
[...] quando se criou a primeira Federação conhecida, a
americana, o que se tratou de resolver na época era o problema
re
sultante da convivência entre si das 13 colônias inglesas
tornadas Estados independentes e desejosas de adotarem uma
forma de poder político unificado. De outra parte, não queriam
perder a independência, a individualidade, a liberdade e a
soberania que tin
ham acabado de conquistar.
531
Navegando
-
se nessas águas, pode
-
se definir uma Federação como
sendo a aliança de vários Estados para a formação de um Estado único, em que
as unidades federadas preservam parte de sua autonomia política, enquanto a
soberania é
transferida para o Estado Federal. O federalismo possibilita a
coexistência de diferentes coletividades políticas dentro de um Estado único,
havendo diversas esferas de atribuições fixadas na própria Constituição entre a
União e os Estados Federados.
Dian
te do que fora exposto no tópico acima, é possível afirmar
-
se que
dentro do conceito de federalismo reside um forte conteúdo extremamente
autonomista, sendo este, talvez, o característico mais marcante.
Em outras palavras, a autonomia assegura aos membros
da
Federação o relacionamento entre as vontades parciais de cada um
com a vontade central, revelando
-
se ela, segundo Michel Temer, por
intermédio de uma atividade política descentralizadora, lecionando que
descentralizar implica a retirada de competências
de um centro para
transferi
-
las a outro, passando elas a ser próprias do novo centro. “Se
se fala em descentralização administrativa quer
-
se significar a
existência de novos centros administrativos independentes de outros.
531
BASTOS, Celso Ribeiro.
Curso de direito constitucional
. 14ª ed. São Paulo: Saraiva, 1992,
p. 246.
4
4
0
0
4
4
Se a referência é descentralizaç
ão política, os novos centros terão
capacidade política”.
532
Assim, para que a aludida descentralização política possa realmente ser
efetivada e externar a autonomia dos Estados Federados, mister se faz a divisão
de competências entre as vontades de tais en
tes e a vontade do ente central,
sendo certo que tal matéria deve, necessariamente, ser determinada pelo Texto
Constitucional, tornando
-
se, então, parte de sua essência, uma vez que, do
contrário, ou seja, se determinada através de legislação ordinária, a
alteração
seria de fácil execução, tornando o pacto federativo extremamente frágil, o que
vem de encontro com o seu objetivo.
Entrementes, sabe
-
se que não basta uma perfeita divisão de competência
entre entes federados, fazendo
-
se necessário, também, que
lhes sejam
outorgadas rendas suficientes para a consecução dos projetos e das tarefas
atinentes a tais competências, haja vista que sem o devido suporte financeiro a
tão propalada autonomia federativa ficará apenas no
papel
sem qualquer
aplicação no campo
prático.
Em relação ao tema
sub studio
, Manoel Gonçalves Ferreira Filho
alterca:
[...] a existência real da autonomia depende da previsão de
recursos, suficientes e não sujeitos a condições, para que os
Estados possam desempenhar suas atribuições. Claro
que tais
recursos hão de ser correlativos à extensão dessas atribuições.
Se insuficientes ou sujeitos a condições, a autonomia dos
Estados
-
membros só existirão no papel em que estiver escrita a
Constituição. Daí o chamado problema da repartição de rendas.
533
Certo é que aos Estados Federados é assegurada a auto
-
organização,
desde que obedecidos determinados princípios insertos na Lei Maior, no dizer de
José Afonso da Silva “[...] a auto
-
organização é, pelo visto, o primeiro elemento da
532
TEMER, 2002, p. 55
-
56.
533
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves.
Curso de direito constitucional
. 21ª ed. rev. e ampl.
São Paulo: Saraiva, 1994, p. 44.
4
4
0
0
5
5
autonomia estadual e s
e concretiza na capacidade de dar
-
se a própria
Consituição”
534
.
Dessa forma, o Estado
-
membro tem a possibilidade de eleger suas
autoridades, compondo um Poder Legislativo próprio e com a incumbência de
ditar suas normas, bem como um Poder Judiciário respons
ável pela prestação da
tutela jurisdicional no tocante a matérias estaduais.
Ainda, o pacto federativo deverá estar expressamente consignado como
cláusula pétrea de uma Constituição, sendo que esta deve ser escrita e rígida de
forma a impedir a saída de q
ualquer dos Estados ou até mesmo a dissolução da
união.
Neste ponto, destaca
-
se que a referida indissolubilidade, prescrita na
Lei Maior, é outro elemento diferenciador do Estado Federal, de outra parte,
a Confederação, cuja criação vem embasada em um Tra
tado, sendo
formada por Estados soberanos, o que lhe permite o desligamento de
qualquer um deles.
Outro dos característicos do Federalismo é a representação das vontades
dos Estados na consecução da vontade geral, criando
-
se, para tanto, um Poder
Legislat
ivo bicameral. Assim é que há uma casa representativa do povo dos
Estados e outra, com representantes dos Estados federados, nominada Senado
Federal.
Fundado na isonomia que deve prevalecer entre os entes federados, com
respeito ao poder central e entre s
i, cada um dos Estados deve exercitar a
vontade parcial com o mesmo número de Senadores, sob pena de infringir tal
princípio.
Necessário se faz, também, a presença de um órgão
que não faça parte
do poder central, tampouco dos Estados federados
, perten
cente ao Poder
534
SILVA, 1996, p. 51
2.
4
4
0
0
6
6
Judiciário Federal e capaz de manter o pacto federativo, para que, em caso de
dúvidas ou ataques à forma federativa possa dizer o direito.
Via de conseqüência, ao proferir suas decisões, o Poder Judiciário fará
valer a Constituição, restabe
lecendo o necessário equilíbrio entre os poderes,
minando as dúvidas relativas ao exercício das competências e garantindo o
cumprimento do pacto federal.
Por fim, objetivando a manutenção da federação frente a graves ameaças,
encontra
-
se o remédio jurídic
o da intervenção federal, em que a União,
representando todos os outros Estados
-
membros, afasta de forma temporária todas
ou algumas das prerrogativas inerentes à autonomia do Estado submetido ao
processo interventivo, não passando, em última análise, de i
nstrumento da vontade
dos Estados federados lesados com uma determinada situação verificada.
Nesse aspecto, a União decreta a intervenção federal no Estado em que
está ocorrendo a situação reprimível, fazendo prevalecer as vontades parciais dos
demais Estados, representada agora pela vontade federal, até a cessação dos
motivos autorizadores do ato.
Nos dizeres de Luís Roberto Barroso:
A intervenção federal consiste em mecanismo excepcional de
limitação da autonomia do Estado
-
membro. Destina
-
se ela à
pres
ervação da soberania nacional, do pacto federativo e dos
princípios constitucionais sobre os quais se erige o Estado
Democrático de Direito. Não se trata, por evidente, de
providência rotineira nem está sujeita a juízos políticos
arbitrários. Medida extrem
a, exige a presença de elementos
materiais inequívocos e a observância de requisitos formais para
que possa ser legitimamente decretada. Somente caberá a
intervenção nas hipóteses taxativas previstas na Constituição,
enunciadas no Art. 34.
535
Surge, nesse c
ontexto, a denominada ação direta interventiva, cujo
nascedouro se deu por intermédio da Constituição de 1934, traduzindo
-
se na
535
BARROSO, 2004, p. 249.
4
4
0
0
7
7
primeira hipótese de controle de constitucionalidade em nosso País e não se
perdendo de vista que referida previsão constitucional foi mantida nas Cartas de
1946, 1967, 1969 e 1988 (combinação de seus Arts. 34 e 36).
A competência para apreciação da ação direta interventiva recai sobre o Supremo
Tribunal Federal, sendo certo que a legitimação ativa foi outorgada, com exclusividade
, ao
Procurador
-
Geral da República, enquanto que a legitimação passiva, de sua vez, é
imputada ao ente da federação sobre o qual paira a acusação de malferimento aos
princípios sensíveis encartados no inc. VII do Art. 34 da Carta de Outubro.
Por intermédi
o da referida
actio
, busca
-
se declaração do Supremo Tribunal
Federal em relação à ocorrência ou não de desculprimento dos citados princípios
constitucionais sensíveis por parte de um dos Estados
-
membros, materializando
-
se,
na prática, em litígio entre a União e uma determinada entidade federada, não se
olvidando que a procedência do pedido implicará, no caso de manutenção do ato
inquinado de vício, a intervenção, ato este de natureza administrativa.
A Lei nº 4.337, de 1º de junho de 1964, recepcionada pela
Constituição de 1988
em sua quase totalidade, dispõe sobre o procedimento afeto à ação direta interventiva, o
que não dispensa a aplicação, conjunta, do Regimento Interno do Supremo Tribunal
Federal, mais precisamente no que se refere às disposições conti
das nos Arts. 175,
parágrafo único e 350, inc. IV, esclarecendo
-
se que, pela própria natureza, não se
vislumbra a possibilidade de concessão de medida cautelar em casos tais.
No campo subjetivo, os efeitos da decisão proferida em sede de ação
direta inter
ventiva são de natureza vinculada, ou seja, apresentam inegável
caráter mandamental; na seara objetiva, é preciso que fique claro que eventual
procedência do pedido interventivo, por si só, não acarreta o expurgo do ato que
originou referida representação.
A eficácia da decisão, em regra, é
ex nunc
.
536
536
Ibidem, p. 262: “Caso a intervenção se limite à sustação do ato impugnado, o natural será que
a medida tenha eficácia
ex tunc
, em consonância com o entendimento, amplamente
majoritário no direito brasileiro, de que os atos inc
osntitucionais são nulos”.
4
4
0
0
8
8
6.2.6
A súmula vinculante
Uma das grandes novidades trazidas pela eclosão da Emenda
Constitucional nº 45/2004 foi a implemenação da chamada
súmula vinculante
,
instrumento afeto ao processo constitucional nascido com o claro e nítido objetivo
de fomentar, o princípio da segurança jurídica, além de servir de alternativa para
desvencilhar o abarrotado Poder Judiciário de causas repetitivas, cujo resultado,
não obstante a relutância de alguns
mormente em se tratando de Administração
Pública
já é de há muito consabido.
Não se perdendo de vista o importante alerta levado a efeito por Luiz
Alberto David Araujo:
Demonstrada a linha firme e estável de acúmulo de poder, não
haveria dúvida de que e Emenda n. 45 tra
ria a Súmula vinculante,
como forma de implantar o pensamento determinante pelo
Supremo Tribunal Federal. O Art. 103
-
A cuidou de implementar a
criação da súmula vinculante. Passamos da surpreendente (pois
surpreendeu e espantou a todos) Emenda Constitucional nº 03/93,
que implantou o efeito vinculante para a Súmula vinculante, quase
como uma passagem natural de exercício de poder.
537
Levanta
-
se discussão no sentido de que o instituto da súmula vinculante
tem inspiração ou, ao menos, laços de semelhança com o
s denominados
assentos afetos ao sistema jurídico português, os quais são exarados no âmbito
do Supremo Tribunal de Justiça, mais precisamente por intermédio de seu pleno.
Por sua vez, tais assentos seriam descendentes daqueloutros anteriormente
previstos
na Segunda Ordenação e, ao depois, nas Ordenações Filipinas e em
outras legislações exparsas.
Nesse particular, importante citar a evolução histórica dos assentos
traçada no âmbito do Tribunal Constitucional Português quando da prolação do
acórdão nº 810/93,
ipsis verbis
:
537
ARAUJO, Luiz Alberto David. O acúmulo de poder do Supremo Tribunal Federal e o controle
concentrado de constitucionalidade. In: COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda; LIMA,
Martonio Mont’Alverne Barreto Lima (orgs.).
Diálogos constitucionais
: direito, neolibralismo
e desenvolvimento em países periféricos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 342.
4
4
0
0
9
9
O perfil de tal síntese poderá assim ser delineado:
(a)
Os assentos
da Casa da Suplicação constituíam interpretação autêntica das
leis e tinha força legislativa;
(b)
Desde a sua instituição em 1832,
até a entrada em vigor do Decreto nº 12
.353, de 22 de Setembro
de 1926, o Supremo Tribunal de Justiça não dispunha de
competência para proferir assentos, mas tão somente para
uniformizar a jurisprudência, através da interpretação e aplicação
da lei nos casos concretos que lhe eram submetidos;
(
c)
O Art.
66º deste último diploma instituiu um recurso inominado de
uniformização de jurisprudência para o pleno do Supremo Tribunal
de Justiça;
(d)
A jurisprudência estabelecida por estes acórdãos
era obrigatória para os tribunais inferiores e para o Sup
remo
Tribunal de Justiça enquanto não fosse alterada por outro acórdão
da mesma proveniência;
(e)
Apesar de o Decreto nº 12.353 não
atribuir, explícita ou implícitamente, a estes acórdãos a
designação de
assentos
, o Supremo Tribunal de Justiça assim
passou
a chamá
-
los a partir de Dezembro de 1927;
(f)
O Código
de Processo Civil de 1939 consagrou a denominação de assentos
para os acórdãos proferidos pelo pleno do Supremo Tribunal de
Justiça, mantendo no mais o regime do Decreto nº 12.353;
(g)
O
Código de Pro
cesso Civil de 1961, eliminou a faculdade de
alteração dos assentos pelo próprio Supremo Tribunal de Justiça;
(h)
O Art. 2º do Código Civil de 1967, veiio atribuir à doutrina
fixada pelos assentos força obrigatória geral;
(i)
O Decreto
-
Lei nº
47.690, de 11
de maio de 1967, na redação dada ao Art. 769, nº
02, do Código de Processo Civil, eliminou a referência que ali se
fazia a respeito da eficácia dos assentos.
538
Feitas tais digressões, voltemo
-
nos a positivação da súmula vinculante no
Brasil.
De fato, ins
eriu
-
se no bojo do texto constitucional o novel Art. 103
-
A,
apresentando a seguinte redação:
Art. 103
-
A: O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por
provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros,
após reiteradas decisões sobre matér
ia constitucional, aprovar
súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá
efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder
Judiciário e à Administração Pública direta e indireta, nas esferas
federal, estadual e municipal, bem como
proceder à sua revisão
ou cancelamento, na forma estabelecida em lei.
§ 1º
A súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a
eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja
controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a
ad
ministração pública que acarrete grave insegurança jurídica e
relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica.
538
Tribunal Constitucional Português, 1ª seção, Processo nº 474/88, Relator: Conselheiro
Monteiro Diniz.
4
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0
§ 2º
Sem prejuízo do que vier a ser estabelecido em lei, a
aprovação, revisão ou cancelamento de súmula poderá ser
provocada por a
queles que podem propor a ação direta de
inconstitucionalidade.
§ 3º
Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a
súmula aplicável ou que indevidamente a aplicar, caberá
reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando
-
a
procedente, anu
lará o ato administrativo ou cassará a decisão
judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou
sem a aplicação da súmula, conforme o caso.
De acordo com a própria dicção do dispositivo constitucional de regência,
tem
-
se que foi editada,
recentemente, a Lei nº 11.417, de 19 de dezembro de
2006, com o fito de proceder à devida regulamentação do novel instituto, sendo
relevante a análise feita por André Ramos Tavares, no sentido de que:
[...] esse mecanismo fica mais claro no caso do contro
le de
constitucionalidade. Assim, quando o STF, por reiteradas decisões
concretas (em RE, v.g.), houver reconhecido a
inconstitucionalidade de norma, essas decisões justificarão a
edição de uma súmula de caráter abstrato (não vinculado aos
casos concretos,
como as decisões anteriores), geral, vinculante e
de aplicação futura (e não imediata, como eram as decisões
concretas que permitiram a deflagração do processo de
formulação da súmula vinculante). Opera
-
se, aqui, a ponte entre o
controle difuso
-
concreto e o controle abstrato concentrado.
539
Em resumo, tem
-
se que a súmula vinculante tem como características
principais, adotando
-
se,
in tottum
, a operacionalização levada a efeito por Luiz
Alberto David Araujo e Vidal Serrano Nunes Júnior
540
: (i) adoção de ofício
ou por
provocação, apresentando
-
se como legitimados para tanto aqueles que forem
indicados por lei e os legitimados para a propositura da ação direta de
inconstitucionalidade; (ii) aprovação por dois terços dos componentes da Corte
Suprema; (iii) necessid
ade de que a adoção da súmula seja antecedida de
reiteradas decisões sobre a matéria pelo STF; (iv) efeito vinculante em relação
aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração direta e indireta de
todas as esferas da federação; (v) escopo de definir a validade, a interpretação e
a eficácia das normas determinadas, sobre as quais recaia controvérsia atual
539
TAVARES, André Ramos.
No
va lei da súmula vinculante
: estudos e comentários à lei nº
11.417, de 19/12/06. São Paulo: Método, 2007, p. 14.
540
ARAUJO; NUNES JÚNIOR, 2001, p. 392
-
393.
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1
1
entre os órgãos judicantes ou entre tais e administração pública, cuja divergência
venha a gerar grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos
sobre idêntica problemática; (vi) revisão de ofício ou por provocação pelos
legitimados; e, (vii) reclamação ao STF nas hipóteses em que a decisão judicial
ou o ato administrativo vier a contrariá
-
la ou a aplicá
-
la indevidamente.
6.3
O C
ontrole Difuso
Embora desfrute de inegável importância dentro do sistema consitucional
brasileiro, a verdade é que, diante das inúmeras interpretações levadas a efeito
pelo Supremo Tribunal Federal quando da apreciação de casos tais, o controle
concentra
do acabou por ser demais restrito, o que, evidentemente, dificulta a
eficaz aplicação pretendida pelo legislador originário quando da elaboração e
promulgação da Carta de Outubro.
De fato, em estudo sobre o tema, Luiz Alberto David Araujo ponderou:
Talve
z preocupado com a avalanche de processos que iriam
chegar ao Supremo Tribunal Federal, este tratou de implementar
uma política restritiva de acesso ao processo de controle de
constitucionalidade concentrada. O alcance democrático da
norma, portanto, foi s
endo reduzido pela jurisprudência da Corte
Suprema [...]. O sonho de termos um controle de
constitucionalidade mais efetivo, mais alargado, começou a sofrer,
desta forma, um encolhimento pela jurisprudência restrita do
Supremo Tribunal Federal.
541
Assim, a
par das dificuldades restritivas acima apontadas, materializadas,
ad exemplum
, na existência de autores universais e autores especiais ao manejo
da via concentrada, acrescendo
-
se o fato de que, como visto, por intermédio da
referida via não se pode abrir d
iscussão ao derredor de direitos subjetivos, de
direitos individuais, enfim, da anállise de casos concretos, resta claro que, no
pertinente à necessidade de reparação pelo malferimento do direito fundamental à
541
ARAUJO, 2006, p. 242.
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2
2
convivência familiar e comunitária de crianças e adolescentes, ou seja, no âmbito
repressivo, melhor se coaduna a utilização do controle difuso da
constitucionalidade, o qual se verifica em qualquer sede jurisdicional e
independentemente do veículo processo manejado.
Vejamos.
A teoria constitucional brasileira nasce com a Constituição republicana de
1891.
O sistema de controle difuso da constitucionalidade, que leva em
consideração a inconstitucionalidade da lei em relação a determinado caso concreto,
vigora no Brasil também desde a Constituição de
1891, restando demarcado no Art.
59, incisos e § 1º, alíneas ‘
a
’ e ‘
b
’ e Art. 60 daquele texto constitucional.
De inspiração norte
-
americana, o sistema brasileiro de controle concreto de
constitucionalidade apresenta, até os dias atuais, divergência com a
quele modelo no
que tange aos seus efeitos. Enquanto da sistemática alienígena promanam efeitos
erga omnes
, os efeitos terrenos restringem
-
se à relação processual.
O problema dos efeitos restritos às partes no controle difuso de
constitucionalidade começo
u a ser resolvido a partir da Constituição de 1934,
quando o Senado Federal, na qualidade de Poder Coordenador, passou a ter
competência para suspender a execução da lei julgada inconstitucional pelo
Supremo Tribunal Federal em sede de Recurso Extraordinár
io.
Além disso, a Constituição de 1934 trouxe em seu bojo um
meio termo
entre o controle difuso e o controle concentrado de constitucionalidade, ao estatuir
a figura da ação interventiva, proposta pelo Procurador
-
Geral da República
perante o STF.
Esta aç
ão visava averiguar a constitucionalidade de lei federal interventiva
a ser aplicada em Estados nos quais não estivessem sendo observados os
chamados princípios constitucionais sensíveis.
4
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3
3
Contudo, o texto constitucional seguinte
Constituição de 1937
em
condenável retrocesso, acabou com a suspensão da execução outorgada ao
Senado Federal em caso de lei considerada inconstitucional pelo STF em controle
difuso. E, não bastasse, conferiu ao Presidente da República a faculdade de
submeter novamente à aprecia
ção do Parlamento a lei considerada
inconstitucional, tornando a decisão do STF sem efeito.
Felizmente, a Constituição de 1946 retomou as bases estatuídas pelo
texto de 1934. Diferença básica, porém, operou
-
se em relação à ação
interventiva, devendo a lei
estadual violadora dos princípios sensíveis ser
submetida à apreciação do STF, pelo Procurador
-
Geral da República, ao contrário
do ocorrido sob a égide do texto de 1934, onde o preceito de intervenção é que
era apreciado pelo Pretório.
Após o golpe militar de 1964, através da Emenda Constitucional nº 16, de
26 de novembro de 1965, fora introduzido o controle concentrado de
constitucionalidade, de iniciativa privativa do Procurador
-
Geral da República,
visando evitar que juízes democráticos obstaculizassem ações ditatoriais.
A Constituição de 1967 manteve o controle da constitucionalidade nos
moldes anteriores, inclusive o controle concentrado proveniente da EC nº 16/65,
ocorrendo o mesmo com a EC nº 1/69, que, como uma das únicas inovações,
estabeleceu o juízo de constitucionalidade de lei municipal violadora de princípios
sensíveis, com finalidade interventiva, a ser feito pelo Tribunal de Justiça do
Estado.
A Constituição de 1988 manteve o controle misto de constitucionalidade,
agregando apenas a ação de inconstitucionalidade por omissão, permanecendo o
controle difuso com remessa ao Senado Federal para suspensão da execução da
lei.
A questão de inconstitucionalidade em controle difuso pode ser suscitada
pelas partes, pelo Ministério Público ou de ofício
pelo Juiz ou órgão fracionário,
sempre que a matéria tiver relação com o objeto da demanda.
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1
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4
No controle difuso de constitucionalidade exercido pelo juízo singular, o
magistrado deixa de aplicar o texto normativo reputado inconstitucional. No
âmbito dos tr
ibunais, esse controle opera
-
se através de incidente de
inconstitucionalidade, quando o órgão fracionário suspende o processo e remete
a questão constitucional à apreciação do Órgão Especial, que, por maioria
absoluta, pode declarar inconstitucional a lei.
Essa declaração, todavia, terá
efeitos restritos à lide.
A Resolução do Senado Federal que suspende a executoriedade de lei,
julgada inconstitucional em controle difuso de constitucionalidade, opera efeitos
ex nunc
.
Entende
-
se que, caso se operassem efe
itos
ex tunc
, inexistiria diferença
entre os efeitos da declaração de inconstitucionalidade via controle difuso e via
controle concentrado.
O Supremo Tribunal Federal não tem admitido a interposição de recurso
extraordinário por violação de princípio jurí
dico
direito adquirido, ato jurídico
perfeito
sob o argumento de que se trata de
inconstitucionalidade reflexa
.
Contudo, não somente a violação de preceito explícito conduz a um juízo
de inconstitucionalidade. Partindo do princípio de que a vigência d
e uma lei é
secundária em relação à sua validade, e essa validade somente pode ser aferida
a partir de sua conformidade com o texto constitucional, qualquer texto normativo
deve passar pelo crivo da constitucionalidade.
Nestes termos, ganham relevância os
princípios da proporcionalidade
e razoabilidade, que nada mais são do que o juízo de adequação entre os
meios e os fins da norma, evitando, assim, situações abusivas contra os
princípios constitucionais.
O fundamento constitucional dos princípios da razo
abilidade e
proporcionalidade se confunde com os princípios da dignidade da pessoa
humana, da proibição de excesso, da proibição do desvio da finalidade da lei, da
4
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1
5
5
reserva legal, assim, todos os princípios que estão umbilicalmente vinculados aos
direitos f
undamentais.
A afronta à razoabilidade ou proporcionalidade não se constitui em
fundamento isolado de recurso constitucional, pois o Art. 102, inc. III, letra
a
exige
que se decline o dispositivo constitucional violado. Assim, é importante vincular os
pri
ncípios em causa com os atributivos de direitos fundamentais expressamente
previstos.
Impende notar que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento de ações
diretas de inconstitucionalidade e em outros feitos, faz uso dos princípios da
proporcionalidade e d
a razoabilidade. Deveria, então, permitir que os recursos
constitucionais fossem deduzidos com base tão
-
somente na violação de tais
princípios, do mesmo modo que deveria ser lícito deduzir ação direta de
inconstitucionalidade com base nos princípios, sem necessidade de explicitar os
dispositivos constitucionais maculados.
Da mesma forma, não raras vezes, decisões de tribunais extrapolam o
princípio da razoabilidade, e os recursos são fadados ao insucesso em razão da
dificuldade de enquadramento da situação
em determinado dispositivo da
Constituição.
Os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, mesmo não inscritos
expressamente na Constituição, devem servir como parâmetros de conformação
para os textos normativos infraconstitucionais.
Sendo dever do
s tribunais e juízes aplicar a Constituição, não é
prerrogativa apenas do Supremo Tribunal Federal o manejo dos princípios não
explicitados formalmente na lei maior. A mesma filtragem constitucional que é
feita no confronto de um texto normativo infraconst
itucional com um preceito da
Constituição deve ser feita a partir da principiologia.
Em outras palavras, todos os órgãos jurisdicionais devem aplicar os
princípios em sede de controle difuso.
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6
Não só apenas através do recurso extraordinário o Supremo Trib
unal
Federal exerce o controle difuso de constitucionalidade.
Além dessa hipótese, verifica
-
se a apreciação concreta da
constitucionalidade também em relação às competências originárias do Pretório
Excelso, bem como os recursos ordinários decididos em úni
ca instância pelos
tribunais superiores.
6.4
A Ação Civil Pública, o Mandado de Injunção e a Ação de
Conhecimento Condenatória como Meios Processuais Aptos
a Decretar a Responsabilização do Estado pela Omissão
Quanto ao Direito Fundamental à Convivência
Familiar e
Comunitária de Crianças e Adolescentes no Plano Concreto
Como é cediço, tem
-
se que inúmeros são os veículos processuais afetos
a defesa da Constituição e dos direitos de um modo geral.
Todavia, em razão da matéria retratada neste trabalho, qu
al seja, a
responsabilização estatal pela não
-
concretização do direito fundamental à
convivência familiar, necessária a eleição dos instrumentos que se mostram mais
idôneos ao atingimento do referido desiderato.
Assim, e embora importantes também na defesa de direitos fundamentais,
a verdade é que o mandado de segurança e a ação popular não comportam
condições repressivas a reparar a lesão em razão da ausência de convivência
familiar e comunitária de crianças e adolescentes.
Isso porque, como é sabido, o
mandado de segurança não se presta a
fins indenizatórios, servindo para a prevenção ou estancamento de ataque a
direito líquido e certo, cuja definição não se enquadra perfeitamente ao deslinde
do tema em apreço, não se olvidando, ainda, que o procedimento
ali afeto é por
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1
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7
demais expedito, o que, também, estaria a contribuir contrariamente a solução da
aludida problemática.
Já, no que concerne a ação polular, tem
-
se que sua finalidade melhor se
coaduna, diante de sua inegável natureza de instituto processual constitucional,
com a realização do direito à proteção do patrimônio público, daí por que se optou
pela ação civil pública, pelo mandado de injunção e pela ação de conhecimento
condenatória, como sendo os instrumentos que se amoldam, com mais
propriedade
e intensidade, à resolução da responsabilização estatal e seu
conseqüente dever de reparação, quando da ausência de convivência familiar e
comunitária pertencente a crianças e adolescentes.
6.4.1
A ação civil pública
A Lei nº 7.347/85 (também conhecida como Lei da Ação Civil Pública)
conceitua a ação civil pública como sendo o pedido de prestação jurisdicional
para defesa de interesses difusos ou coletivos, que pode ser proposto pelo
Ministério Público, pela União, pelo Estado, pelos Municípios, pelas
associações e
outros legitimados nela relacionados.
Como visto, a ação civil pública faz parte dos instrumentos processuais
afetos à busca da tutela coletiva, não se perdendo de vista que, em se
procedendo a devida combinação dos regramentos contidos nas
Leis nº 7.347/85,
4.717/65, 8.069/90 com aquele afeto ao Art. 117 do Código de Defesa do
Consumidor, estar
-
se
-
á diante do que a doutrina convenciou nominar de
microssistema processual coletivo
, sendo certo que, nesse aspecto, o Código de
Processo Civil funciona apenas e tão
-
somente como fonte subsidiária.
A Lei da Ação Civil Pública tem como objeto a defesa do meio ambiente;
do consumidor; dos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e
paisagístico (patrimônio cultural); de qualqu
er outro interesse difuso ou coletivo;
da ordem econômica e da economia popular; e, da ordem urbanística (Art. 1º).
4
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8
8
No contexto, importante o alerta levado a efeito por Cassio Scarpinella
Bueno:
Ora, dirá alguém, ações individuais são possíveis. O parágra
fo
único do Art. 1º da Lei nº 7.347/85 não as proíbe. Concordo. Sem
dúvida que elas são possíveis. Mas quem tem medo de algumas
poucas ações individualmente ajuizadas? Qual a consciência
individual que o povo brasileiro tem de seus direitos
constitucionalm
ente assegurados? Qual a efetividade dos
mecanismos jurisdicionais de asseguramento e reconhecimento
desses mesmos direitos individualmente? A razão de ser das
ações coletivas, friso este ponto, é justamente afastar essas
dúvidas quanto o exercício e à efe
tividade da cidadania. São
verdadeiros veículos de realização do direito material mesmo para
aqueles que nem sequer conhecem esses direitos ou, se
conhecem, não têm a menor condição, por diversas questões, de
ir ao Poder Judiciário para exigir seu cumprime
nto. As ações
coletivas, graças a seus idealizadores nacionais, bem que
poderiam ser chamadas de programa ‘cidadania mil’. Por força do
dispositivo em comento, no entanto, é melhor que sejam
identificadas por ‘cidadania zero’.
542
Conforme visto, a terceira
dimensão dos direitos fundamentais encontra
-
se lastreada na tutela de interesses coletivos
543
(supraindividuais, transindividuais
ou metaindividuais),
544
cuja atuação se desdobra em três espécies, a saber: (i)
interesses difusos; (ii) interesses coletivos
stri
ctu sensu
; e, (iii) interesses
individuais homogêneos.
545
542
BUENO, Cassio Scarpinella.
O poder público em juízo. 3ª ed. rev. e atual. S
ão Paulo:
Saraiva, 2005, p. 151.
543
MANCUSO, 2007, p. 65: Para o autor são aqueles que “[...] depassam a esfera de atuação
dos indivíduos isoladamente considerados, para surpreendê
-
los em sua dimensão coletiva”.
544
Existem, atualmente, 04 propostas de codificação da tutela coletiva: uma da Professora Ada;
Código Modelo para Ibero
-
América, Projeto da UERJ; da Estácio de Sá; e, um de Antônio
Gidi. Nos quatro projetos já há consagração do controle jurisdicional (embora projetos, são
fontes de estudo do direito
coletivo).
545
CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant.
Acesso à justiça
. Porto Alegre: Sergio Antonio
Fabris Editor, 1998, p. 10
-
11: “[...] à medida que as sociedades do laissez
-
faire cresceram em
tamanho e complexidade, o conceito de direitos humanos começou a s
ofrer uma
transformação radical. A partir do momento em que as ações e os relacionamentos
assumiram, cada vez mais, caráter mais coletivo que individual, as sociedades modernas
necessariamente deixaram para trás a visão individualista dos direitos, refleti
da nas
‘declarações de direitos’ típicas dos séculos dezoito e dezenove. O movimento fez
-
se no
sentido de reconhecer os direitos e deveres sociais dos governos, comunidades, associações
e indivíduos. Esses novos direitos humanos exemplificados pelo preâmbu
lo da Constituição
Francesa de 1946, são, antes de tudo, os necessários para tornar efetivos, quer dizer,
realmente acessíveis a todos, os direitos antes proclamados. Entre esses direitos garantidos
nas modernas constituições estão os direitos ao trabalho, à saúde, à segurança material e à
educação. Tornou
-
se lugar comum observar que a atuação positiva do Estado é necessária
para assegurar o gozo de todos os direitos sociais básicos”.
4
4
1
1
9
9
Em razão da grande importância do tema e também pelo fato de eventual
dificuldade do aplicador do direito em identificar e delimitar a conceituação de
cada uma das espécies citadas linhas atrás, o que
poderia causar prejudicial
divergência interpretativa, houve por bem o legislador ordinário em apresentar, no
próprio diploma legislativo, as definições pertinentes, como facilmente se observa
da redação emprestada ao Art. 81 da Lei nº 8.078/90 e seus res
pectivos incisos.
Assim, tem
-
se que os interesses difusos são aqueles de natureza
transindividual, indivisíveis, cujos titulares são pessoas indeterminadas que se
encontram ligadas apenas por circunstâncias fáticas (inc. I); os interesses
coletivos em sen
tido estrito são aqueles, também de natureza transindividual e
indivisíveis, cuja titularidade pertence a um determinado grupo, categoria ou
classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por intermédio de
uma relação jurídica (inc. II); e, os
interesses individuais homogêneos, entendidos
estes como sendo os decorrentes de origem comum (inc. III).
De outro vértice, uma vez identificadas as subdivisões dos direitos
metaindividuais, cumpre esclarecer que um dos instrumentos processuais
colocados
à disposição dos ofendidos em casos que tais, diz respeito à chamada
ação civil pública, regulada pela Lei nº 7.347/85, não se olvidando dos
importantes conceitos jurídicos trazidos pelas Leis n
os
7.853/89 (defesa dos
interesses transindividuais das pesso
as portadoras de deficiência), 7.913/89
(defesa coletiva dos investidores do mercado de valores mobiliários), 8.069/90
(estatuto da criança e do adolescente), 8.078/90 (código de defesa do
consumidor), 8.429/92 (improbidade administrativa), 8.625/93 (lei o
rgânica
nacional do ministério público).
Os textos de lei acima citados, capitaneados, por óbvio, pela Lei de
Outubro, acabam por formar um sistema de tutela coletiva que se complementa e
completa, cujo fenômeno a doutrina convencionou em nominar de “prin
cípio da
perfeita integração”.
Em continuidade, e utilizando
-
se como parâmetro a ação civil pública,
mister se faz a análise de como se dá a legitimação dos respectivos atuantes,
4
4
2
2
0
0
nunca se perdendo de vista que o fenômeno processual da legitimidade das
par
tes ou
ad causam,
positivada no Art. 3º da lei de ritos, é uma das
condições da ação, necessária para que o juiz profira um julgamento de
mérito, valendo rememorar o conceito lançado pelo saudoso Alfredo Buzaid,
que houve por bem em caracterizá
-
la como sen
do
a pertinência subjetiva da
ação
.
546
A questão da legitimidade também se bifurca em três situações
diferentes, a saber: (i) legitimação ordinária; (ii) legitimação extraordinária; e, (iii)
legitimação ordinária autônoma.
Em continuidade, pode
-
se definir
a legitimação ordinária como a
postulação em juízo que se faz em nome próprio, visando a defesa de interesse
próprio.
No que diz respeito à legitimação extraordinária, a postulação se dá em
nome próprio, mas em defesa de interesse alheio ou, nas palavras
de Fredie
Didier, “[...] na legitimação extraordinária confere
-
se a alguém o direito de
conduzir processo que versa sobre direito do qual não é titular ou do qual não
é titular exclusivo”.
547
Por fim, tem
-
se a chamada legitimação ordinária autônoma,
548
por
in
termédio da qual o agente postula, em nome próprio, a defesa de interesse que
é, ao mesmo tempo, próprio e alheio.
Sobre o tema em enfoque, interessante o posicionamento adotado por
Nelson Nery Júnior, no sentido que uma:
546
BUZAID, Alfredo.
Do agravo de petição no sistema do Código de Processo
Civil
. São
Paulo: Saraiva, 1956, p. 89.
547
DIDIER. Fredie.
Curso de direito processual civil
: processo coletivo. Salvador: Podium,
2007, p. 191.
548
ABELHA, Marcelo.
Ação civil pública e meio ambiente
. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p.
59: “Assim, preferimos
dizer que a legitimidade é autônoma, um
tertium genus
, e que,
aprioristicamente, não deve ser classificada como ordinária ou extraordinária. Não é ordinária
porque o atingido da coisa julgada não é o titular do direito de ação [...]. Não é extraordinária
n
os moldes clássicos porque não se identifica o substituído e, portanto, não se sabe quando
seria ordinária”.
4
4
2
2
1
1
[...] parcela da doutrina ainda insiste em explicar o fenômeno da
tutela jurisdicional dos interesses e direitos difusos pelos
esquemas ortodoxos do processo civil. Tenta
-
se justificar a
legitimação do Ministério Público, por exemplo, como
extraordinária, identificando
-
a com o fenômeno da
substituição
processual. Na verdade o problema não deve ser entendido
segunda as regras de legitimação para a causa com as
inconvenientes vinculações com a titularidade do direito material
invocado em juízo, mas sim à luz do que na Alemanha se
denomina de
legitimação autônoma para a condução do processo
(selbständige Proze
βf
ührungsbefugnis), instituto destinado a fazer
valer em juízo os direitos difusos, sem que se tenha de recorrer
aos mecanismos de direito material para explicar referida
legitimação.
549
C
omungando do mesmo entendimento, tem
-
se a lição de Celso Antonio
Pacheco Fiorillo:
[...] vale frisar a necessidade de construção dogmática acerca da
legitimidade para a defesa de direitos supra
-
individuais.
Descabido analisar esse fenômeno à luz do ortodo
xo sistema
processual civil, que trata, em seu Art. 6º, da legitimação ordinária
e extraordinária, resolvendo a questão na seara dos conflitos
privados. Em se tratando de conflitos coletivos lato sensu, é
correto que os entes legitimados para a propositura
da ação civil
pública são responsáveis pela condução do processo e não
desempenham a figura que muitos chamam de substituto
processual. Com isso, observamos uma superação da dicotomia
legitimação ordinária/extraordinária, passando a conceituar o
fenômeno
como uma legitimação autônoma para a condução do
processo. Por outro lado, não se pode perder de vista que,
estando envolvidos direitos individuais homogêneos, o fenômeno
que se verifica é de legitimação extraordinária. A referida
legitimação é concorrente
e disjuntiva. Isso significa que cada um
dos co
-
legitimados pode, sozinho, promover a ação coletiva, sem
que seja necessária anuência ou autorização dos demais.
550
No que diz respeito à ação civil pública, são legitimados:
551
Ministério
Público (I); (II) Def
ensoria Pública;
552
(III) União, Estados, Municípios, Distrito
Federal (IV); autarquia, fundação, empresa pública ou sociedade de economia
549
NERY JUNIOR, Nelson.
Princípios do processo civil na Constituição Federal
. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2005, p. 116.
550
FIORILLO, Celso Anto
nio Pacheco.
Curso de direito ambiental brasileiro
. São Paulo:
Saraiva, 2000, p. 231
-
232.
551
Analogicamente às associações civis, podem os sindicatos mover ações para a defesa dos
interesses de seus associados (inc.
III do Art. 8º a CF).
No mais, como a lei
não distingue, em
tese, tanto as fundações públicas quanto as privadas podem mover ações civis públicas.
552
Inclusão levada a efeito por intermédio da edição da Lei nº 11.448, de 15 de janeiro de 2007.
4
4
2
2
2
2
mista (V); a associação que, concomitantemente, esteja constituída há pelo
menos um ano nos termos da lei civil e inclu
a, entre suas finalidades
institucionais, a proteção ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem econômica,
à livre concorrência ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e
paisagístico.
Por fim, no que diz respeito ao indivíduo, certo é que
ele poderá ser
litisconsorte ativo numa ação civil pública se, na qualidade de cidadão, puder
ajuizar ação popular com pedido idêntico e, caso já tiver ingressado com ação
para a defesa de seus direitos, terá ele que suspender sua ação individual e
interv
ir na outra, situação essa que agirá como assistente litisconsorcial (Arts. 94
e 104 do CDC).
Em tese, qualquer pessoa é legitimada passiva para a ação civil pública.
Entretanto, o Ministério Público e a coletividade não podem ser réus na ação civil
públi
ca, nem contra eles cabe reconvenção, salvo em casos de embargos à
execução, de terceiro ou ação rescisória. Já, o Estado pode ser réu na ação civil
pública.
Desta feita, na defesa dos interesses transindividuais dos lesados, por
meio das ações civis públ
icas, admite
-
se, em tese, qualquer pedido com qualquer
rito (procedimento ordinário ou sumário
Arts. 83, 90 e 110 do CDC c/c Art. 21 da
LACP).
Os interesses da família e, especificamente, de crianças e adolescentes
se encaixam, a teor das definições acima apresentadas e, com mais propriedade,
nos característicos afetos à tutela dos interesses difusos e à tutela dos direitos
individuais homogêneos, podendo, assim, ser defendidos por quaisquer
instrumentos processuais que lhe são pertinentes, mormente no que diz respeito
à já citada ação civil pública, não se perdendo de vista, todavia, a importante
advertência exarada por Patricia Miranda Pizzol:
[...] a lesão a um determinado direito ou interesse pode gerar
pretensão de natureza difusa, coletiva ou indiv
idual homogênea,
conforme se verifique, no caso concreto, a presença dos
4
4
2
2
3
3
elementos que identificam cada uma das hipóteses legais, ou
seja, é a pretensão deduzida em juízo que irá indicar a categoria
de direito ou interesse violado e, conseqüentemente, o
pr
ocedimento a ser adotado em cada caso.
553
A pertinência do manejo da ação civil pública na defesa dos direitos e
interesses de crianças e adolescentes resta indene de dúvidas ao se verificar a
disposição contida no Art. 224 da Lei nº 8.069/90, a saber: “Apl
icam
-
se
subsidiariamente, no que couber, as disposições da Lei nº 7.347, de 24 de julho
de 1985”.
Segundo Gilberto Schäfer:
O controle difuso é feito em um processo no qual se discute um
determinado bem da vida. Permite
-
se que qualquer pessoa
discuta a i
nconstitucionalidade de uma lei que lhe atinja. O juiz de
primeiro grau resolve a questão como se fosse uma questão de
direito qualquer, embora o faça de forma prejudicial. Nos
Tribunais, é formado o incidente de constitucionalidade, que
vincula o órgão fr
acionário. Ao entregar a prestação jurisdicional,
nos instrumentos de tutela coletiva como a Ação Civil Pública ou
ação coletiva para a defesa do consumidor, pode o Estado
-
julgador, declarar, incidentalmente, a inconstitucionalidade de
normas. O controle d
ifuso é anterior, cronologicamente, ao próprio
controle abstrato, e fazê
-
lo não significa usurpar a competência do
Supremo ou do Tribunal de Justiça. Não se pode negar a
realização desse controle em qualquer ação, sob pena de deixar
de realizar o princípio
constitucional de realizar o controle
difuso.
554
Não se pode olvidar, por outro lado, que a ação civil pública se
entremostra como instrumento apto a defender direitos individuais homogêneos,
de modo que teriam tanto o Ministério Público quanto as associaç
ões plena
liberdade e legitimidade para aforarem demanda com o escopo de exigir a
efetivação do direito fundamental de conviviência familiar e comunitária de
crianças e adolescentes, bem como, em caso de sua não
-
concretização face à
omissão e à ineficiênci
a estatais, o de reclamar a indenização pertinente pelo
descumprimento de um dever que, como visto, lhe era ínsito e inafastável.
553
PIZZOL, Patrícia Miranda.
Liquidação nas ações colet
ivas
. São Paulo: Lejus, 1998, p. 124.
554
SCHÄFER, Gilberto.
Ação civil pública e controle de constitucionalidade
. Porto Alegre:
Sergio Antonio Fabris Editor, 2002, p. 117.
4
4
2
2
4
4
Assim, tanto o representante do
parquet
quanto uma associação
responsável por um grupo determinado de crianças carentes, por e
xemplo, teriam
total legitimidade para manejar a ação civil pública, visando à extirpação da
omissão inconstitucional e sua respectiva e devida reparação.
Nessa situação, a defesa dos infantes teria guarida na tutela dos
chamados interesses individuais homogêneos, ou seja, são aqueles pertencentes
a grupo, categoria ou classe de pessoas determinadas ou determináveis, que
compartilhem prejuízos divisíveis, de origem comum, normalmente das mesmas
circunstâncias de fato, a teor do quando positivado no já menc
ionado inc. III do
parágrafo único do Art. 83 do Código de Defesa do Consumidor.
De outro vértice, e de acordo com a dicção apresentada pelo Art. 1º da
Lei nº 7.347/85, regem
-
se pelas disposições do referido diploma, sem prejuízo da
ação popular, as ações
de responsabilidade por danos morais e patrimoniais
causados, o que também está a comprovar sua viabilidade em relação ao
deslinde da problemática em apreço.
A coisa julgada em casos que envolvem tutela de interesses individuais
homogêneos, como no exemplo em comento, se norteia pela disposição contida
no Art. 103, incs. I e II, do Código de Defesa do Consumidor, valendo ressaltar as
palavras de José Rogério Cruz e Tucci, que:
[...] extraem
-
se, desse regramento, as seguintes hipóteses: a)
sentença de pro
cedência do pedido: eficácia da sentença e
extensão da coisa julgada a todos os titulares de direitos
homgêneos; b) sentença de improcedência do pedido: b.1)
limitação da coisa julgada apenas entre as partes, obstando o
ajuizamento de novas demandas coleti
vas, por qualquer outro
legitimado; b.2) todos os membros do grupo, titulares de direitos
subjetivos divisíveis, não são atingidos pelo julgamento
desfavorável e, por esse motivo, podem, na posição de terceiros,
propor ações individuais.
555
A sentença de pr
ocedência da ação civil pública poderá ser liquidada
ou executada por qualquer co
-
legitimado ativo, pois o título ali formado não
555
CRUZ E TUCCI, José Rogério.
Limites subjetivos da eficácia da sentença e da coisa
j
ulgada civil
. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 320.
4
4
2
2
5
5
beneficia o autor da ação de conhecimento, mas sim toda a coletividade
lesada.
Quanto ao indivíduo, em sendo matéria versada sobre interesses difusos,
em regra, não poderá executar o julgado coletivo, salvo se, na qualidade de
cidadão, puder fazer idêntico pedido por meio de ação popular.
Em matéria de interesses individuais homogêneos ou coletivos, a
sentença admite liquidação ou execução individual ou coletiva. Se os indivíduos
não a promoverem no prazo de um ano, caberão liquidação e execução coletivas
(Art. 98 e 100 do CDC).
Se ajuizadas, as liquidações e execuções individuais correrão em autos à
parte, e não dentro dos aut
os do processo coletivo, para não tumultuá
-
lo, até
porque haverá necessidade de prova de fatos individuais.
Assim, em sendo procedente o pedido realizado pela referida associação
responsável por um determinado grupo de crianças sem família, com o respecti
vo
trânsito em julgado, tem
-
se que, a par do quanto positivado no Art. 15 da LACP, o
referido órgão de classe teria a chamada legitimidade natural para propor a
execução do julgado, não se perdendo de vista que:
[...] durante o prazo de sessenta dias após
o trânsito em julgado,
apenas ela poderá promover a execução, com o que nesse
período sua legitimação é exclusiva. Se, entretanto, decorrerem
os sessenta dias, e a associação não promover a execução, a lei
passa a permitir a legitimação especial, atribuin
do ao Ministério
Público e outros legitimados a deflagração. Ao mesmo tempo, a
legitimação se transforma em concorrente, eis que diversos os
habilitados para a execução.
556
Já, em matéria de ação civil pública, o processo de execução pode ser de
qualquer es
pécie:
a) execução por obrigação de fazer ou não fazer (Art. 3º da LACP);
556
CARVALHO FILHO, José dos Santos.
Ação civil pública
: comentários por artigo. 6ª ed. rev.
ampl. e atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. 404.
4
4
2
2
6
6
b) execução por quantia certa contra devedor solvente ou insolvente (Art.
3º da LACP).
c) execução individual ou coletiva (Arts. 98 e 100 do CDC).
No que se refere ao tema em deba
te, tem
-
se que a execução será
intentada contra a Fazenda Pública, de modo que será por quantia certa e, salvo
se tratar de obrigação de natureza alimentar de pequeno valor, estará adistrita a
cumprimento nos moldes do Art. 100 da Constituição Federal.
En
tretanto, e não obstante a importância do aludido instrumento
processual na defesa de interesses de natureza coletiva, caem muito a propósito
as advertências feitas por Luiz Alberto David Araujo, quando do estudo da
aplicação e da efetividade da ação civil
pública no que se refere à defesa dos
direitos e interesses de pessoas portadoras de deficiência, cujo tema se mostra
similiar ao ora discutido.
São suas palavras:
Não basta, portanto, que haja o instrumental processual para a
defesa desse grupo de pess
oas. É preciso que seus agentes,
contemplados como legitimados pela Lei da Ação Civil Pública,
saibam retirar dos dispositivos constitucionais sentidos largos,
progressistas, que demonstrem o avanço social pretendido pelo
Constituinte de 1988 e, infelizmen
te, reduzidos pela
jurisprudência. A fórmula proposta é apenas um canal, uma
pequena trilha que pode ser erguida por aqueles que pretendem
cumprir o mandamento previsto no artigo terceiro, inc. I (construir
uma sociedade livre, justa e solidária) e no inc.
IV (promover o
bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade
e quaisquer outras formas de discriminação). Fica, portanto, a
notícia de que houve um grande avanço com a legitimação do
Ministério Público e das associações para o ajuizamen
to da ação
civil pública. E que nesse período foram propostas inúmeras
ações, levando o Poder Judiciário a apreciar questões de grande
importância para a efetividade dos direitos das pessoas
portadoras de deficiência. No entanto, sem uma interpretação
mais
efetiva, menos restritiva do texto constitucional não
conseguiremos cumprir os mandamentos de efetividade
constantes na Constituição Federal de 1988.
557
557
ARAUJO, Luiz Alberto David. A defesa coleti
va das pessoas portadoras de deficiência. In:
MAZZEI, Rodrigo; NOLASCO, Rita Dias.
Processo civil coletivo
. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2005, p. 649.
4
4
2
2
7
7
Assim, e não obstante o inegável avanço verificado no que concerne ao
manejo da ação civil pública no B
rasil, a verdade é que tal utilização ainda não
alcançou os patamares de sucesso almejados com sua criação, emergindo, daí, a
importância de se estudar outros veículos processuais que também possam servir
de supedâneo a responsabilização estatal nos casos de ausência de convivência
familiar e comunitária.
6.4.2
O mandado de injunção
A Lei Política de 1988, objetivando conceder às normas constitucionais
eficácia plena para sua efetiva aplicação, criou o mandado de injunção,
558
ao lado
do controle de incons
titucionalidade por omissão, sendo ele aplicado quando
faltar norma regulamentadora que torne inviável o exercício de direitos e
liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à
soberania e à cidadania, conforme se infere pela redação emprestada ao seu Art.
5º, inc. LXXI.
Qualquer pessoa poderá propô
-
lo, tendo como conseqüência a
declaração judicial do direito requerido e tornando viável o exercício dos direitos
constitucionais previstos, muito embora ainda não exista a correspon
dente norma
regulamentadora.
Conforme ensina Bedaque:
[...] o objetivo dessa via processual é conferir atuação à norma
constitucional programática, ante a omissão do poder
regulamentador. A finalidade é, pois, tornar viável o exercício de
direito estabel
ecido na Constituição, possibilitando ao indivíduo o
pleno gozo de seus direitos e conferindo
eficácia à regra
558
STRENGER, Irineu.
Mandado de injunção
. São Paulo: Forense Universitária, 1998, p. 14:
“Em termos j
urídicos a injunção pode ser definida como ordem com a qual o juiz impõe uma
obrigação de fazer ou de não cumprir um ato determinado, cuja violação constitui em
atentado ao direito. Fale
-
se, assim, de ‘
prohibition
’ ou ‘
restrictive injunction
’, está última
determinando a obrigação de fazer ou não fazer”.
4
4
2
2
8
8
constitucional. Nessa medida, ao conceder a ordem, deve o
órgãojurisdicional competente, além de formular a regra jurídica,
suprindo a lacuna do ordenamento, aplicá
-
la à situação da vida
descrita pelo impetrante. Tal conclusão visa a conferir efetividade
ao mandado de injunção, previsto em sede constitucional
exatamente para tornar viável o exercício de direitos ou garantias,
exercício, esse, obst
ado pela injustificável inércia daqueles que
deveriam criar a norma regulamentadora.
559
Difere da inconstitucionalidade por omissão, vez que esta simplesmente
dá ciência da omissão ao Poder competente para a adoção de providências
cabíveis.
Sob tal prisma, a falta de norma regulamentadora equivale a dizer que há
omissão de medida para tornar efetiva a norma constitucional.
Portanto, norma regulamentadora significa toda e qualquer medida que
torne efetiva a norma constitucional, como leis complementares, re
soluções,
portarias, leis ordinárias, decretos, dentre outros, incluindo
-
se, via reflexa, o ato
administrativo e o ato material, devendo ser admitido o mandado de injunção
quando se tratar de normas programáticas referidas aos Poderes Públicos.
Apresenta
-
se, também, cabível o mandado de injunção quando a omissão
legislativa for parcial
verdadeira deficiência ou insuficiência da atividade
legislativa, principalmente quando essa deficiência acarretar afronta ao princípio
da isonomia.
Entretanto, se a norm
a regulamentadora for inconstitucional, há
divergências quanto ao cabimento da ação constitucional em apreço,
equiparando
-
se a essa situação a ausência de norma regulamentadora pela
ineficácia de regra de direito contrária à Constituição, admitindo
-
se, por assim
dizer, o mandado de injunção, cabendo ao impetrante argüir a
inconstitucionalidade e, por isso, a ineficácia da norma regulamentadora (posição
igualmente defendida por Roque Antonio Carrazza).
559
BEDAQUE, José Roberto dos Santos.
Direito e processo
: influência do direito material sobre
o processo. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 1995, p. 124
-
125.
4
4
2
2
9
9
Porém, para outros juristas, lançando mão de um raciocínio jurídico mais
estrito e menos teleológico, o mandado de injunção seria incabível.
Para o Supremo Tribunal Federal, em havendo lei preexistente não há
omissão, devendo
-
se, primeiro, requerer a inconstitucionalidade da referida norma
e, ao depois, impetr
ar
-
se o mandado de injunção.
No relativo à inviabilidade do exercício de direitos e liberdades
constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à
cidadania, o cabimento do mandado de injunção está adstrito à falta de norma
regu
lamentadora. Assim, o objeto do mandado de injunção corresponde: “a) a
todo e qualquer direito e liberdade constitucional e b) a toda e qualquer
prerrogativa inerente à nacionalidade, à soberania e à cidadania, cujo exercício
estiver obstado por faltar nor
ma regulamentadora”.
560
Concluindo
-
se tal parte, não caberá mandado de injunção quando se
tratar de norma jurídica auto
-
aplicável, como bem tem entendido o Supremo
Tribunal Federal.
Assim, o mandado de injunção tem como finalidade conferir imediata
viabili
dade ao exercício de direitos, liberdades e prerrogativas constitucionais,
tolhido por falta de regulamentação, sendo ele, então, um verdadeiro instrumento
de realização do princípio da aplicabilidade imediata das normas definidoras dos
direitos e garantia
s fundamentais.
É uma garantia auto
-
aplicável e enquanto não instituído um
procedimento específico adota
-
se o do mandado de segurança no que couber,
conforme determinou o Supremo, no que foi seguido pelo Superior Tribunal de
Justiça.
A legitimidade ativa
de impetrar o mandado de injunção é de qualquer
interessado.
560
PIOVESAN,
1995, p. 122.
4
4
3
3
0
0
É possível, inclusive, para a jurista Flávia C. Piovesan, a impetração de
mandado de injunção coletivo em defesa dos direitos coletivos da categoria, mas
não em relação a direito difuso (o Supr
emo admitiu o mandado de injunção
coletivo por sindicato, por analogia).
No aspecto da legitimidade passiva, recai
-
se sobre a parte privada
ou pública que viria a suportar o ônus de eventual concessão da injunção,
isto é, recai sobre o ente cuja atuação é
necessária para viabilizar o
exercício do direito e não sobre a autoridade competente para a
elaboração.
Quanto aos efeitos da decisão do mandado de injunção, faz
-
se imperioso
que se destaquem três das teses contidas na obra de Flávia Piovesan:
a)
elabo
rar norma regulamentadora ausente =
pretende que, no mandado
de injunção, elabore
-
se a regulamentação faltante, provendo a omissão do
legislador. Tal tese não pode ser admitida, porque se estaria convertendo o
mandado de injunção em mecanismo de tutela de
direito objetivo. O Poder
Judiciário não poderia elaborar norma legal, abstrata e genérica frente à
apreciação de um caso concreto, visto que o que se pleiteia é o reparo de direito
subjetivo, sendo que, para tanto, a ação de inconstitucionalidade por omis
são é o
instrumento possível.
Por conseguinte, o mandado de injunção somente é interpretado em
face do direito subjetivo, além do que, atribuir
-
se ao Poder Judiciário o
exercício de normatizar abstrata e genericamente, afronta o princípio da
separação dos
poderes, pois tal é atividade típica da seara do Poder
Legislativo.
b)
declarar a inconstitucionalidade da omissão e cientificar o órgão
competente para que o mesmo tome as providências cabíveis
= a autora entende
ser tal posição também inadmissível, por
que o mandado de injunção teria
finalidade idêntica à da ação direta de inconstitucionalidade por omissão, não se
justificando a existência de 02 instrumentos idênticos. Como se admitir a
4
4
3
3
1
1
legitimidade ativa limitada em um, e depois no outro determinar a am
pla
legitimidade ativa, se os dois apresentam os mesmo efeitos?
Ainda assim, a orientação da Corte Suprema tem sido neste sentido:
Logo, na interpretação do Supremo Tribunal Federal o Mandado
de injunção é ação que visa obter do Poder Judiciário a
declar
ação de inconstitucionalidade por omissão, se estiver
caracteriza da mora em regulamentar por parte do Poder, órgão,
entidade ou autoridade de que ela depende, com a finalidade de
que se lhe dê ciência dessa declaração para que adote as
providências necess
árias.
561
Entretanto, no julgamento do MI nº 232
-
1 o STF declarou estado de mora
do Congresso Nacional e fixou 06 meses de prazo para que a norma
regulamentadora fosse elaborada e, transcorrido o prazo sem que se legislasse, o
impetrante poderia usufruir o
direito pleiteado.
É um precedente inédito que conferiu ao mandado de injunção a exata
função delineada na Constituição, recuperando ele a sua função de mecanismo
válido na tutela de direitos fundamentais.
Já, no MI nº 283
-
5, o STF, além de declarar a mo
ra e comunicá
-
la ao
Congresso Nacional, bem como ao Presidente da República, determinou o prazo de
45 dias para a elaboração da norma faltante, com mais 15 dias para a sanção
presidencial. Decretou, ainda, que se decorrido tal prazo sem que a providência
necessária fosse tomada, caberia ao impetrante o direito de pleitear, por via
processual adequada, reparação constitucional devida pelas perdas e danos que se
apresentassem. Avisou, por fim que, com a sentença de condenação proferida, lei
superveniente nã
o prejudicaria a coisa julgada, mas também esta não impediria o
impetrante de conseguir da lei posterior os benefícios que lhe fossem favoráveis.
Neste caso, o impetrante não obteve no STF a concretização efetiva de
seu direito, já que o Supremo não torno
u viável, de imediato, o exercício desse
561
Ibidem, p. 134.
4
4
3
3
2
2
direito constitucional, mas declarou reconhecida a faculdade de se obter contra a
União sentença líquida de condenação à reparação de danos.
c)
tornar viável, em caso concreto, o exercício de direito, liberdade ou
prerrogativa constitucional que se encontra tolhido por ausência de norma
regulamentadora
= a autora entende ser esta a interpretação mais ajustada ao
mandado de injunção.
Sob o pálio de tal tese, o mandado de injunção é efetivamente um
instrumento apto a viabilizar o exercício de direitos, liberdades ou prerrogativas
constitucionais que se encontram tolhidos por ausência de norma
regulamentadora.
O mandado de injunção estaria conferindo ao direito, eficácia que se
encontrava paralisada. Para a autora est
a é a finalidade do mandado de
injunção:
[...] investir concretamente o impetrante em seus direitos, impondo
ao impetrado o cumprimento efetivo de norma constitucional,
segundo um mandamento judicial, que empresta eficácia e
concreção à norma constitucion
al dependente de
regulamentação.
562
Desta forma, o Poder Judiciário cria normas jurídicas individuais válidas
para o caso concreto, preenchendo lacunas, mas não a eliminando do
ordenamento jurídico, porque esta tarefa, de regra, é do Poder Legislativo. Para
tanto, o juiz deverá revelar normas implícitas do sistema jurídico e recorrer às
demais fontes do sistema, tais como a analogia, princípios gerais, usos e
costumes e a eqüidade, como preceituam os Arts. 4º e 5º da Lei de Introdução ao
Código Civil.
Ainda
, o Poder Judiciário exercitará uma interpretação criativa de modo a
satisfazer concretamente o direito constitucional do impetrante, sendo este ato
interpretativo vinculante, obrigatório e criador de direito.
562
Ibidem, p
. 140.
4
4
3
3
3
3
É um real dever jurisdicional com fundamento n
o princípio da
aplicabilidade imediata das normas definidoras dos direitos e garantias
fundamentais e no princípio da proibição do
non liquet
, que impõe a
obrigatoriedade da decisão.
Ora, claros restaram os pressupostos do mandado de injunção: a)
ausência
de norma regulamentadora; b) inviabilidade do exercício de direitos e
liberdades constitucionais e prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania
e à cidadania.
Quanto à origem do mandado de injunção não há harmonia, uns o vêem
como peculiar e singular, outros vêem sua origem no Direito americano, inglês ou
alemão. Existem medidas com o mesmo nome no Direito inglês (
writ of injunction
)
e no italiano (
ingiunzione
), mas em ambos os casos as características são
diferentes do instrumento brasileiro.
Jo
sé Afonso da Silva crê que o mandado de injunção surgiu na Inglaterra
no final do século XIV tendo como base o juízo de eqüidade, mas sua fonte mais
próxima seria o
writ of injunction
do Direito norte
-
americano. Em verdade, o
mandado de injunção não tem precedentes nem no direito nacional nem no direito
estrangeiro.
Não caberá mandado de injunção quando ocorrer edição de
norma superveniente ao pedido, ou para declaração judicial de vacância
de cargo ou para compelir o Presidente a iniciar o procedimento pa
ra
provê
-
lo, nem para equiparação de vencimentos no âmbito da
Administração Pública, e, obviamente, quando o direito alegado não tiver
base constitucional.
Determinado está que a injunção não é ação de cognição com
finalidade de estabilizar direito dito i
ncerto e que, embora a autoridade se
recuse a aplicar norma auto
-
aplicável, esta não perde tal qualidade. Até
porque, se não há lacuna não é caso de mandado de injunção, mas sim, de
mandado de segurança.
4
4
3
3
4
4
Finalmente o Supremo decidiu que se a Mensagem for e
ncaminhada ao
Congresso, com projeto de lei, ou, se o projeto de lei já tiver sido apresentado na
Câmara ou no Senado, descabe o Mandado de Injunção.
A aplicação do mandado de injunção como meio de responsabilizar o
Estado, em seu viés legislativo, nas hi
póteses de não
-
concretização do direito
fundamental de convivência familiar e comunitária a crianças e adolescentes se
entremostra de todo viável, nunca se perdendo de vista, nas palavras da
pedagoga Sandra Mári Córdova D’Agostini, que:
[...] depois de qu
inhentos anos de opressão e desleixo, vive
-
se
ainda a impregnação geral da grave marca cultural das ações
seculares equivocadas, solidificadas e enraizadas profundamente
na sociedade mundial e brasileira. Isto posto, o maior desafio hoje
é apagar quinhento
s anos de injustiças perpetradas contra
crianças e adolescentes, construir e alavancar a nova consciência
cidadã.
563
É verdade que, num primeiro momento e pela sua natureza jurídica,
poder
-
se
-
ia raciocinar em sentido inverso, na medida em que existe uma sér
ie de
textos normativos, inclusive de índole constitucional, que trata do referido assunto,
dando
-
se mais enfoque, pelo tema retratado no presente trabalho, ao
caput
do
Art. 227 da Lei de Outubro.
Todavia, ao se proceder a análise mais acurada do próprio
sistema
normativo afeto à proteção dos direitos de crianças e adolescentes, percebe
-
se a
omissão legislativa no que pertine à consecução do direito fundamental de
convivência familiar e comunitário, o que não se vislumbra em relação às outras
situações jus
fundantes retratadas no dispositivo constitucional de regência.
Prova
-
se:
(i) direito à vida: criminalização do aborto, salvaguarda dos direitos do
nascituro, dentre outras inúmeras situações.
563
D’AGOSTINI, Sandra Mári Córdova. Adolescente em conflito com a lei & a realidade
. São
Paulo: Jurídica, 2001, p. 124.
4
4
3
3
5
5
(ii) direito à saúde: a teor do Art. 196 da Constituição Fede
ral, devidamente
esmiuçado, no que tange aos interesses de crianças e adolescentes pela Lei nº
8.069/90, verifica
-
se uma eficácia normativa razoavelmente satisfatória, eis que,
tomando
-
se por base o exemplo citado no capítulo anterior, o Poder Judiciário,
nos
casos de omissão estatal, tem determinado a entrega de medicamento ou a
realização do tratamento de que a pessoa precise à manutenção do seu
status quo
.
(iii) direito à alimentação: existência de lei especial, com ritualísitca
própria, possibilitando
aquele que necessita buscar os alimentos condizentes à
sua sobrevivência daquele que tem o dever jurídico de provê
-
los, não se
olvidando que, quando não verifiada a prova pré
-
constituída de filiação, por
exemplo, tem
-
se a total viabilidade de albergada do
pleito alimentar via medida
cautelar, nos precisos termos da lei adjetiva civil.
(iv) direito à educação: no que pertine ao direito à educação também se
vislumbra uma vastíssima gama legislativa que, quando descumprida, vem sendo
corrigida firmemente pelo
Poder Judiciário, seja em sede de ação civil pública,
seja em sede de mandado de segurança.
(v) direito à profissionalização: proteção contra a discriminação no
trabalho, idade mínima, vedação ao menor de 18 (dezoito) anos ao exercício de
trabalho noturno, insalubre ou perigoso, valendo ressaltar, por oportuno, a lição
de Grasiele Augusta Ferreira Nascimento:
Os contratos de trabalho realizados em desrespeito às proibições
constitucionais, notadamente quanto à idade mínima do prestador
dos serviços e ao
trabalho realizado por menores de 18 (dezoito)
anos em locais insalubres, perigosos e noturnos, são nulos de
pleno direito. Contudo, como asseveram Orlando Gomes e Elson
Gottsschalk, opinião com a qual concordamos, ‘em Direito do
Trabalho, a regra há de se
r a irretroatividade das nulidades. O
contrato nulo produz efeitos até a data em que for decretada a
nulidade’. Portanto, mesmo sendo nulo o contrato de trabalho,
todos os direitos trabalhistas serão devidos à criança ou ao
adolescente trabalhador, até a d
eclaração da ilicitude
contratual.
564
564
NASCIMENTO, Grasiele Augusta Ferreira.
A educação e o trabalho do adolescente
. Rio de
Janeiro: Forense, 2003, p. 23.
4
4
3
3
6
6
(vi) direito à liberdade: o direito à liberdade foi amplamente garantido pelo
texto constitucional, de modo que crianças e adolescentes não são imputáveis
criminalmente. Sofrem assim, as medidas sócioeducativas, apresen
tando tempo
máximo de segregação, quando tal ato for necessário à preservação do próprio
infante que acabou por delinqüir.
Nem se diga, ainda, que o fato de o Art. 70 da Lei nº 8.069/90 determinar
que a responsabilidade quanto à prevenção da ocorrência de
ameaça ou violação
dos direitos da criança e do adolescente seja de todos (Estado, sociedade e
família, valendo
-
nos de uma interpretação conforme), estaria a demonstrar a
norma regulamentadora para o normal exercício do direito fundamental constante
do
ca
put
do Art. 227 da Constituição Federal, na exata medida em que, a par da
certeza de responsabilização, não se mostram os meios, os instrumentos e os
procedimentos que devem ser utilizados pelo prejudicado no que se refere ao
atingimento do referido deside
rato.
A omissão,
permissa venia
, é patente e inequívoca. Sendo, assim,
mostra
-
se apta a ser prontamente corrigida pela via da injunção, a fim de que seja
outorgada eficácia à disposição constitucional fundamental em apreço.
Lenio Luiz Streck:
O conteúdo
da decisão deve(ria), em nosso sistema jurídico,
consistir na outorga direta do direito pleiteado pelo cidadão. Ou
seja, na falta de regulamentação de um dispositivo
constitucional que contenha a gama de direitos alcançados pelo
mandado de injunção, dever
ia o Poder Judiciário, como se
legislador fosse, conceder o direito para aquele caso concreto
[...]. Não é temerário afirmar, neste ponto, que se está diante de
um paradoxo, representado pelo fato de o instrumento jurídico
forjado pelo constituinte para da
r eficácia às normas
constitucionais ter sido tornado ineficaz pelo Poder Judiciário.
Em outras palavras, o mandado de injunção, instituto que
representa bem a tese do deslocamento da esfera da tensão
dos Poderes Executivo e Legislativo para a justiça
cons
titucional
típica do Estado Democrático de Direito
,
acabou sendo transformado em mais uma das (tantas) normas
sem eficácia no texto constitucional.
565
565
STRECK, 2
005, p. 536
-
538.
4
4
3
3
7
7
É consabido que, quando o Juiz se depara com uma situação fática para
solucionar, procura dentro do or
denamento jurídico vigente a lei que melhor se
aplica ao caso concreto.
Assim,
ad exeumplum
, quando o Código Civil determina que na sucessão
legítima de regra os descendentes herdam em primeiro lugar
nunca se
esquecendo da hipótese da concorrência com o
cônjuge sobrevivente que poderá
existir
(Art. 1.829, inc. I, NCC); sendo João filho de Paulo, morto este, aquele
será seu herdeiro universal em inexistindo testamento.
Ocorre, como anteriormente declinado, que existem ocasiões em que o
Juiz não encontr
a na legislação escrita norma jurídica correspondente ao
problema concreto que lhe foi submetido, e, mesmo assim, não poderá deixar de
proferir julgamento, devendo, então, utilizar
-
se do norte traçado pelo Art. 4º da
LICC, segundo o qual “Quando a lei for
omissa, o juiz decidirá o caso de acordo
com a analogia, os costumes e os princípios gerais do direito”.
A omissão mencionada no dispositivo legal acima identificado, em
verdade, significa que a lei apresenta uma lacuna, ou seja, uma imperfeição,
situação
, aliás, inevitável em qualquer ordenamento jurídico, pois, não há como o
legislador, por mais competente e dedicado que seja, prever todas as hipóteses
possíveis de ocorrer nas mais variadas relações mantidas entre os indivíduos, daí
porque, na omissão, d
eve o Juiz, como já dito, valer
-
se dos mecanismos
oferecidos pelo Art. 4º da LICC, mormente aquele afeto ao instituto da analogia.
O julgamento por analogia significa a aplicação nas hipóteses
semelhantes das soluções oferecidas pelo legislador em casos a
nálogos,
norteando
-
se pelo pensamento de que, se a lei disciplinou de determinada
maneira uma relação jurídica, deve, por igual razão, disciplinar do mesmo modo
uma outra relação semelhante (
ubi eadem ratio, idem jus
= onde houver a mesma
razão, o mesmo de
ve ser o direito).
Os requisitos essenciais para a aplicação da analogia são: ausência de
previsão legal do caso em exame; relação de semelhança do caso analisado com
4
4
3
3
8
8
a situação positivada; e, elemento de ligação essencial entre o caso analisado e a
situa
ção positivada.
Conforme bem elucida Carlos Augusto Alcântara Machado:
[...] no campo de proteção do direito tutelado pelo mandado de
injunção, o impetrante deverá demonstrar que a Constituição
outorgou
-
lhe o direito subjetivo abstratamente (titularidade
de
direito, garantia e prerrogativas
nacionalidade, soberania e
cidadania) e seu exercício vem sendo obstado pela omissão
(situação de
vacuum juris
), em razão da falta de norma
regulamentadora.
566
Nem se diga de outro vértice que pelo só fato de o
caput
do Art. 227 da
Lei de Outubro caracterizar
-
se como direito fundamental disperso, o que, por
força do quanto estatuído no § 1º do Art. 5º do citado corpo constitucional, cairia
por terra a possibilidade e a viabilidade do manejo da injunção, haja vista que
é
inegável assertiva no sentido de que, mesmo em apresentando natureza
jusfundante, determinados direitos demandam, para um melhor aperfeiçoamento,
de agasalho legislativo, como ocorre no caso da hipótese matriz deste trabalho
(convivência familiar e comun
itária).
Aliás, tal quadro foi devidamente reconhecido no âmbito do Supremo
Tribunal Federal quando do julgamento da Questão de Ordem afeta ao Mandado
de Injunção nº 107/DF, sob a relatoria do então Ministro Moreira Alves.
Como bem salienta Samantha Chan
tal Dobrowolski:
Tarefa central da dogmática jurídica é a justificação de pontos de
vista normativos, ou seja, é explicitar porque é racional e razoável
aceitar uma determinada norma jurídica como parte de
determinado ordenamento jurídico válido [...]. Do
ponto social, a
interpretação jurídica se singulariza pelas razões nas quais se
baseia ou pode se basear, isto é, pela sua justificação. A
natureza última de suas razões é aquilo que os juristas costumam
chamar de fontes do Direito. São as fontes de que
o Direito
emana. Cumprem um papel essencial na
interpretação jurídica,
566
MACHADO, Carlos Augusto Alcântara.
Mandado de injunção
: um instrumento de efetividade
da Constituição. 2ª ed. São Paulo: Jurídico Atlas, 2004, p. 75.
4
4
3
3
9
9
porque, somente através de sua utilização (ao menos, de uma
delas), é que se pode atribuir e reconhecer a natureza jurídica de
uma interpretação. As fontes do Direito são as ‘cláusulas
pétreas’
do pensamento jurídico, pois se se perderem, este perderá o
controle sobre si mesmo.
567
Também sob esse aspecto, a analogia, se apresenta passível de
utilização para suprir a lacuna legislativa na matéria fundamental aqui gizada, na
exata medida e
m que tal instituto é manifestamente fonte do direito.
Nesses termos, em razão da proximidade que apresentam as situações
em cotejo, poder
-
se
-
ia utilizar como paradigma legislativo, por analogia, a Lei nº
9.140, de 04 de dezembro de 1995, cujo diploma aca
bou por reconhecer como
mortas pessoas desaparecidas em razão de participação, ou acusação de
participação, em atividades políticas, no período de 02 de setembro de 1961 a 15
de agosto de 1979, bem como abriu a possibilidade de concessão de indenização
à f
amília de pessoa desaparecida ou morta em razão de participação ou
acusação de participação em atividades políticas durante o citado lapso temporal.
Aliás, é preciso que se rememore que procedimento similar vem sendo
adotado no que diz respeito à discussão ao derredor do direito de greve dos
funcionários públicos, vez que, até a presente data, não foi editada lei
regulamentando a referida situação, conforme determinado pela Constituição de
1988, podendo o Tribunal dar ciência ao Poder Legislativo da omissã
o normativa,
no afã de que tal ilicitude venha a ser sanada, constituindo o Estado em mora
para fins de indenização, conforme decidido no MI 283/DF:
MI 283 / DF
Mandado de Injunção
Relator:Ministro Sepulveda
Pertence
Publicação: DJ 14/11/91
Julgam
ento: 20/03/91
Tribunal Pleno
Ementa: Mandado de injunção: mora legislativa
na edição da lei necessária ao gozo do direito a reparação
econômica contra a União, outorgado pelo Art. 8º, § 3º, ADCT:
deferimento parcial, com estabelecimento de prazo para
a
purgação da mora e, caso subsista a lacuna, facultando o titular
do direito obstado a obter, em juízo, contra a União, sentença
liquida de indenização por perdas e danos. 1. O STF admite
não
obstante a natureza mandamental do mandado de
injunção (MI
567
DOBROWOLSKI, Samantha Chantal.
A justificação do direito e sua adequação social
:
uma
abordagem a partir da teoria de Aulis Aarnio. São Paulo: Ediouro, 2005, p. 77
-
80.
4
4
4
4
0
0
107
QO)
que, no pedido constitutivo ou condenatório,
formulado pelo impetrante, mas, de atendimento impossível, se
contém o pedido, de atendimento possível, de declaração de
inconstitucionalidade da omissão normativa, com ciência ao órgão
competente par
a que a supra (cf. Mandados de Injunção n
os
168,
107 e 232). 2. A norma constitucional invocada (ADCT, Art. 8º, §
‘Aos cidadãos que foram impedidos de exercer, na vida civil,
atividade profissional especifica, em decorrência das Portarias
Reservadas d
o Ministério da Aeronáutica nº S
-
50
-
GM5, de 19 de
junho de 1964, e n. S
-
285
-
GM5 será concedida reparação
econômica, na forma que dispuser lei de iniciativa do Congresso
Nacional e a entrar em vigor no prazo de doze meses a contar da
promulgação da Constitu
ição’
vencido o prazo nela previsto,
legitima o beneficiário da reparação mandada conceder a impetrar
mandado de injunção, dada a existência, no caso, de um direito
subjetivo constitucional de exercício obstado pela omissão
legislativa denunciada. 3. Se
o sujeito passivo do direito
constitucional obstado e a entidade estatal a qual igualmente se
deva imputar a mora legislativa que obsta ao seu exercício, e
dado ao Judiciário, ao deferir a injunção, somar, aos seus efeitos
mandamentais típicos, o proviment
o necessário a acautelar o
interessado contra a eventualidade de não se ultimar o processo
legislativo, no prazo razoável que fixar, de modo a facultar
-
lhe,
quanto possível, a satisfação provisória do seu direito. 4.
Premissas, de que resultam, na espécie,
o deferimento do
mandado de injunção para: a) declarar em mora o legislador com
relação a ordem de legislar contida no Art. 8º, § 3º, ADCT,
comunicando
-
o ao Congresso Nacional e a Presidência da
Republica; b) assinar o prazo de 45 dias, mais 15 dias para
a
sanção presidencial, a fim de que se ultime o processo legislativo
da lei reclamada; c) se ultrapassado o prazo acima, sem que
esteja promulgada a lei, reconhecer ao impetrante a faculdade de
obter, contra a União, pela via processual adequada, sentença
liquida de condenação a reparação constitucional devida, pelas
perdas e danos que se arbitrem; d) declarar que, prolatada a
condenação, a superveniência de lei não prejudicara a coisa
julgada, que, entretanto, não impedira o impetrante de obter os
benefíci
os da lei posterior, nos pontos em que lhe for mais
favorável.
As hipóteses ficaram ainda mais similares com o advento da Emenda
Constitucional nº 19/98, de modo que não se vislumbra,
permissa venia
, qualquer
obstáculo em se emprestar a Lei nº 7.783/89, q
ue dispõe sobre o exercício do
direito de greve no âmbito privado, como sendo a lei específica exigida inc. VII do
Art. 37 da Constituição Federal, como bem salienta Augusto Jorge:
Diante da lacuna fomentada pela inércia do Poder Executivo que
tem a exclu
sividade no encaminhamento de leis que se referem
ao servidor público e, considerando o fenômeno da recepção da
atual Lei de Greve pela nova Emenda Constitucional nº 19, cabe
4
4
4
4
1
1
ao intérprete, pelo menos até que sobrevenha lei específica, dar a
máxima efetivi
dade à norma constitucional mediante a integração
do sistema pela interpretação analógica, pois se trata de direito
constitucional fundamental que não pode ser postergado ou
negado pela mora do devedor ou por violação de direitos
constitucionais fundada na
falta de norma regulamentadora [...].
Cumpre verificar que o Art. 16, da Lei nº 7.783/89, está revogado
em razão da eficácia revogativa ou eficácia negativa, que também
é desobstrutiva, pois a norma constitucional traçou novo esquema
dependente para a sua
atuação, ou seja, a exigência de uma lei
ordinária normativa, diferente do sistema anterior o qual remetia à
lei complementar, implicando dizer que, enquanto não for editada
lei específica que regule a greve no setor público, o direito de
exercê
-
la é livr
e e soberana esbarrando
-
se apenas nos excessos
não permitido por lei correlata. Desse comento pode
-
se afirmar
que a Lei nº 7.783/89 foi recepcionada em parte podendo ser
aplicada, no que couber, aos servidores públicos porque está em
perfeita compatibilida
de vertical
-
formal
-
material com o texto
Constitucional. Operou
-
se o chamado fenômeno da eficácia
construtiva da norma constitucional visto que a Lei nº 7.783/89,
que trata do direito de greve na iniciativa privada, recebeu da
Carta Política um novo element
o revigorador que a valoriza para a
ordem jurídica nascente. Dispensável o apelo de futura
interferência do legislador para a elaboração urgente ou o
aperfeiçoamento da aplicabilidade da norma constitucional que
consagra o direito de greve pelo servidor pú
blico. Não havendo lei
ordinária reguladora, especifica, da greve dos servidores públicos
civis opera
-
se o instituto da analogia para os limites do direito de
greve e, até mesmo sua proibição em certos casos, para algumas
categorias específicas de funcioná
rios públicos, justificados não
em razão do status do servidor, mas em decorrência da natureza
dos serviços prestados que são públicas, essenciais, inadiáveis,
imantados pelo princípio da predominância do interesse geral. É
sabido que os serviços essenciais à comunidade, tanto podem ser
prestados pelos trabalhadores do setor privado quanto do setor
público, cuja abstenção não pode causar aos outros interesses
tutelados constitucionalmente, como aqueles possuidores de
caráter de segurança, saúde, vida, integ
ridade física e liberdades
dos indivíduos, prejuízos. Não se justifica, assim, o tratamento
diferenciado ou separado. Onde há a mesma razão igual deve ser
a regulamentação e solução.
568
Desta feita, escorreita a aplicação analógica, via mandado de injunção,
da
Lei nº 7.783/89, como forma de preenchimento da lacuna estatal em face da
ausência de regulamentação do direito fundamental de greve afeto aos servidores
públicos em nosso País, não se perdendo de de vista que, segundo Luiz Alberto
David Araujo e Vidal
Serrano Nunes Júnior:
568
JORGE, Carlos Augusto.
A greve do servidor público federal
. Disponível em:
<
http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=5018>. Acesso em: 12 dez. 2006.
4
4
4
4
2
2
Pode
-
se afirmar que o mandado de injunção é um meio de
controle difuso da inconstitucionalidade por omissão, pois, por
meio dele, num caso concreto, qualquer um pode despertar a
atuação do Poder Judiciário para suprir inércia do legi
slador
infraconstitucional.
569
Aliás, é preciso que se diga, ainda, que o Supremo Tribunal Federal
poderá sedimentar, de forma definitiva, tal pensamento no próximo dia 12 de abril,
quando o Pleno julgará o mandado de injunção nº 670, ajuizado pelo Sindicat
o
dos Servidores Policiais Civis do Espírito Santo, vez que há uma tendência de os
ministros votarem favoravelmente a tese de que enquanto não for aprovada no
Congresso uma lei que regulamente o direito de greve no serviço público, valem
para o funcionalis
mo as mesmas regras que regem as paralisações dos
trabalhadores da iniciativa privada, ou seja, aplicar
-
se
-
ão as regras fixadas pela
Lei nº 7.783/89.
570
A esse respeito Sergio Reginaldo Bacha assevera:
Também é certo, quanto ao conteúdo do decisum em ação
de
mandado de injunção, ser inter partes, pois não fará coisa julgada
erga omnes. As razões são óbvias, dadas as peculiaridades
especiais de cada caso concreto levado à apreciação do
Judiciário. Só as pessoas que ocupam o pólo ativo e que
compõem a lide é
que se beneficiarão da sentença,
descaracterizando
-
a da eventualidade de vir a produzir efeitos
erga omnes
.
571
Finalize
-
se a questão com as profundas palavras de Canotilho:
Se o mandado de injunção puder, mesmo modestamente, limitar a
arrogante discriciona
riedade dos órgãos normativos, que ficam
calados quando a sua obrigação jurídico
-
constitucional era vasar
em moldes normativos regras actuativas de direitos e liberdades
constitucionais; se, por outro lado, através de uma vigilância
judicial, se conseguir
chegar a protecção jurídica sem lacunas; se,
através de pressões jurídicas e políticas, se começar a destruir o
‘rochedo de bronze’ da incensurabilidade do silêncio, então o
mandado de injunção logrará seus objectivos.
569
ARAUJO; NUNES JÚN
IOR, 2001, p. 138.
570
Disponível em: <
http://josiasdesouza.folha.blog.uol.com.br/index.html
>. Acesso em: 07 jan.
2007.
571
BACHA, Sergio Reginaldo.
Mandado de injunção
.
Belo Horizonte: Del Rey, 1998, p. 86
-
87.
4
4
4
4
3
3
E nossas crianças e adolescentes tam
bém.
6.4.3
A ação de conhecimento condenatória
Jurisdição é a função estatal exercida com exclusividade pelo Poder
Judiciário, consistente na aplicação de normas da ordem jurídica a um caso
concreto, com a conseqüente solução do litígio. É o poder de j
ulgar um caso
concreto, de acordo com o ordenamento jurídico, por meio do processo.
É sabido que, a partir do momento em que a Constituição de 1988 a
inseriu como direito fundamental, incompossível se entremostra delimitar a
incidência da cláusula pétrea referente à inafastabilidade do controle judicial.
Assim, toda vez que o jurisdicionado se encontrar na iminência de
experimentar ou tiver experimentado lesão a direito que entenda lhe pertencer,
pode invocar a tutela jurisdicional correspondente, não se
podendo excluir de tais
hipóteses, por óbvio, questões que envolvam a má atuação estatal no que diz
respeito à concretização e à manutenção do direito fundamental de convivência
familiar e comunitária de crianças e adolescentes.
Nesse ponto, caem muito a
propósito as palavras proferidas por Paulo
Magalhães da Costa Coelho, para quem:
[...] em face dos novos caminhos do Constitucionalismo e do
tratamento que nossa Constituição Federal dá à questão, não
cabe mais vislumbrá
-
la em termos acanhados.
O Art. 5º,
inc.
XXXV, da Constituição Federal dispõe que nenhuma lesão a
direito pode ser subtraída a apreciação do Poder Judiciário,
acolhendo de modo absolutamente amplo e não restritivo a
inafastabilidade da jurisdição. Somente, portanto, a própria
Constituição é
quem poderia dispor eventuais restrições ao
ilimitado exercício da jurisdição. E não dispõe.
572
Diante do comando constitucional em testilha, não pode o Poder
Judiciário, embora isso seja menos espinhoso e mais cômodo, furtar
-
se à
572
COELHO, Paulo Magalhães da Costa.
Controle juri
sdicional da administração pública
.
São Paulo: Saraiva, 2002, p. 182.
4
4
4
4
4
4
apreciação de questões en
volvendo decisões ou omissões administrativas, sob o
pálio de sua suposta natureza
política
e de que não poderá subverter o conteúdo
ali apresentado em face da tripartição das funções do Poder.
Pelo contrário!
Nesse ponto, elucidativa se apresenta a liçã
o do ministro Celso de
Mello:
[...] desde que se recorre ao judiciário alegando que um direito
individual foi lesado por ato de outro poder, cabe
-
lhe examinar se
esse direito existe e se foi lesado. Eximir
-
se comodamente com a
escusa de tratar
-
se de ato p
olítico, seria fugir ao dever que a
Constiuição lhe impõe, máxime após ter ela inscrito entre as
garantias fundamentais, como nenhuma outra antes fizera, o
princípio de que nem a lei poderá excluir do poder judiciário
qualquer lesão de direito individual.
573
Nesse contexto, e como guardião da Constituição e das leis vigentes e
como último bastião de guarida dos direitos individuais e coletivos, deverá o
Judiciário analisar a lesão que lhe foi endereçada e, em percebendo que a
atividade estatal foi levada a efeito em desacordo com os elementos norteadores
aplicáveis à espécie, tem por obrigação declarar sua inconsistência.
É exatamente essa a atitude esperada pela coletividade, a qual é a real
detentora do poder dentro do regime republicano brasileiro.
Aliás
, Geraldo Ataliba, com a peculiar maestria de sempre, asseverava:
[...] a eficácia do princípio republicano, com todas as suas
exigências, tem, no nosso sistema, as mais robustas garantias. E
tais garantias são, em última instância, do povo, que verá
obje
tivamente dotados de condições de imparcialidade,
independência, impessoalidade e desassombro os agentes
políticos e judiciais de cujas funções depende o funcionamento
correto do regime, republicanamente erigido pelos cidadãos, para
sua própria proteção contra os desmandos do poder.
574
573
STJ, Recurso em Mandado de Segurança nº 10.222
AM.
574
ATALIBA, Geraldo.
República e Constituição
. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 106.
4
4
4
4
5
5
Em verdade, e como bem verbera o já mencionado jurista Paulo
Magalhães da Costa Coelho:
[...] se o ranço autoritário de alguns e a ignorância de outros não
conseguem fazer ver com clareza a questão, compete ao Poder
Judiciári
o afirmar com coragem que qualquer nicho de poder
imune a controle é absolutamente incompatível com a essência do
regime democrático
-
republicano, cabendo recordar a assertiva do
Ministro Celso de Mello no julgamento do MS nº 31.564
-
0, para
quem ‘a necessid
ade de controlar o poder constitui exigência
essencial para a preservação da ordem democrática’.
Evidentemente que o Poder Judiciário não mais pode enfrentar
essa importante questão de maneira tímida como tem feito,
cabendo ressaltar que a prática dos dito
s atos interna corporis não
dispensa à obrigatoriedade às formalidades e aos ritos previstos
para sua edição, à Constituição e a toda sua principiologia.
575
Proibir o acesso ao Judiciário é fazer tábula rasa a garantia
expressamente traçada pela Lei de Outu
bro, que teve por escopo reforçar a
concretização dos ideais democráticos que ressonaram (e continuam ressonando)
por nosso país depois da derrocada do regime de exceção que vigia até outrora,
fomentando inequívoca proteção ao cidadão contra possíveis arbi
trariedades
levadas a efeito pelos Poderes constituídos.
De acordo com Seabra Fagundes:
Os atos administrativos se põem diante do Poder Judiciário, quer
por meio de remédio processuais especialmente destinados a
esse fim, quer pelas ações comuns utilizáv
eis, ocasionalmente, na
apreciação jurisdicional das relações entre Administração e
indivíduo. Em geral, as ações comuns se aplicam ao ajuizamento
de relações jurídicas, em que, não obstante ser parte a
Administração Pública, o ato administrativo a submete
r-
se ao
exame do Judiciário se identifica, pelo conteúdo, com os atos
jurídicos privados. Há, porém, casos excepcionais em que, não
obstante se identificarem as relações jurídicas, nas quais seja
parte a Administração, com relações em que seja parte o
indi
víduo, prefere o legislador adotar ações especialmente
destinadas a ajuizá
-
las. É o que ocorre com o direito creditório
oriundo de tributo, para cuja cobrança existe a ação executiva
fiscal. Tendo em vista a legislação processual no seu conjunto,
pode
-
se e
stabelecer, como critério prático (alterável em face de
casos concretos) para distinguir os casos de emprego dos meios
575
COELHO, 2002, p. 141.
4
4
4
4
6
6
comuns dos de uso de meios extraordinários, o seguinte: o
uso dos remédios comuns tem lugar sempre que, para ajuizar
situação contencios
a, relacionada com o ato administrativo,
não estiver previsto em remédio extraordinário, e, em algumas
hipóteses, ainda que o esteja, desde que se adote a ação de
rito ordinário. Aferir
-
se
-
á do emprego das ações comuns por
exclusão dos remédios especiais.
Desde que se configure,
pelas relações entre administrado e Administração Pública,
situação contenciosa, para cujo ajuizamento não haja ação
especial prevista nas leis do processo, recorrer
-
se
-
á à ação
adaptável ao caso, dentre as diversas instituídas na
l
egislação.
576
Diante da dificuldade de manejo das ações e procedimentos
anteriormente declinados, abre
-
se a possibilidade de que a busca pela
indenização fundada na teoria da perda de uma chance, ocasionada em face da
omissão ou ineficácia estatal na concre
tização do direito fundamental à
convivência familiar e comunitária de crianças e adolescentes, se dê por
intermédio da interposição de simples ação de conhecimento condenatória, cuja
reparação estará sedimentada nos danos morais e psicológicos acarretados
pela
desídia em comento, não se perdendo de vista a altercação de André Ramos
Tavares: “[...] não há como negar que toda uma gama de direitos subjetivos de
nítida índole constitucional restou amesquinhada e, presentemente, encontra
-
se
ainda sem solução ou
resposta do Judiciário e, especialmente, do Supremo
Tribunal da Nação”.
577
Para Marcelo José Magalhães Bonicio:
[...] o acesso à justiça é incondicionado, ou seja, todos têm o
direito de ingressar em juízo e movimentar o Poder Judiciário,
porém, o direito
a uma sentença de mérito, que é a perspectiva
processual da garantia de acesso à justiça, ao seu turno, precisa
superar alguns obstáculos antes de ser conferido e, dentre estes
obstáculos, está a exigência de que as condições da ação estejam
presentes.
578
576
FAGUNDES, M. Sea
bra.
O controle dos atos administrativos pelo poder judiciário
. 7ª ed.
Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 281
-
282.
577
TAVARES, André Ramos.
Direito constitucional brasileiro concretizado
:
hard cases
e
soluções juridicamente adequadas. São Paulo: Método, 200
6, p. 236.
578
BONICIO, Marcelo José Magalhães.
Proporcionalidade e processo
: a garantia
constitucional da proporcionalidade, a legitimação do processo civil e o controle das decisões
judiciais. São Paulo: Atlas, 2006, p. 70.
4
4
4
4
7
7
As condições para a propositura da ação estão bem nítidas na hipótese
em discussão.
O interesse de agir é manifesto, pois de acordo com Salvatore Satta,
referida condição diz respeito a:
[...] uma disposição portanto objetiva oriunda de um fato, em
senti
do amplo lesivo do direito, não se podendo obviar senão
através do processo e intervenção do juiz. Se tal não sucedesse,
não se teria utilidade prática do exercício da jurisdição e por
conseguinte não se cogitaria de ação (‘
point d’interêt, point
d’action
) (Cf.
Direito processual civil
. 7ª ed. São Paulo: Borsoi,
1973, p. 168).
A criança e o adolescente que não tenham experimentado a oportunidade
de convivência familiar e comunitária por omissão estatal, inegavelmente,
sofreram lesão a direito fundamental que lhes era garantido constitucionalmente,
emergindo, daí, a total pertinência do interesse em agir na esfera processual.
Não há como esquivar
-
se do fato de que o Estado interage
intensamente com a sociedade, brotando daí o constante aumento de suas
área
s de atuação, o que, por via oblíqua, eleva o número de atos praticados no
sentido de atender aos interesses postos sob sua égide, a ponto de Trujillo
mencionar, com ênfase, que:
[...] diante dessa realidade social, sendo inconteste a participação
do Esta
do em todos os seguimentos da sociedade, a noção de
responsabilidade pública sofreu considerável desenvolvimento
com constante alargamento, motivando a desvinculação da
responsabilidade individual do agente público e adquirindo, por
conseqüência, caráter m
ais objetivo, tornando mais claras as
hipóteses de responsabilidade estatal, a reparação decorrentes de
atos lícitos, por risco e também pelo fato das coisas.
579
Portanto, em tema de responsabilização do Estado por ato lícito teremos,
necessariamente, a con
jugação entre o ato lícito e o dano, no qual o primeiro
corresponde à ação e o segundo aos resultados negativos, aos prejuízos, sendo
579
OLIVEIRA, 2001, p. 94.
4
4
4
4
8
8
necessário e suficiente que se demonstre o nexo de causalidade entre o ato
administrativo e o prejuízo causado.
No intuit
o de corroborar a tese aqui esposada, nada melhor do que trazer
à lume, a
per assertionem excellentis doctoris
, aqui representada pelos ilustres
processualistas José Frederico Marques, por primeiro, e Nélson Nery Júnior e
Rosa Maria Andrade Nery, ao depois
, os quais deixaram assentado:
Existe, portanto, o interesse de agir quando, configurado o litígio,
a providência jurisdicional é cabível à situação concreta da lide, de
modo que o pedido apresentado ao juiz traduza formulação
adequada à satisfação do int
eresse contrariado, não atendido, ou
tornado incerto. Há, assim, o interesse de agir sempre que a
pretensão ajuizada, por ter fundamento razoável, se apresente
viável no plano objetivo. Interesse de agir significa existência de
pretensão objetivamente razo
ável (Cf.
Manual de direito
processual civil
. São Paulo: Saraiva, 2005, vol. I, p. 157
-
158).
Existe interesse processual quando a parte tem necessidade de ir
a juízo para alcançar a tutela pretendida e, ainda, quando essa
tutela jurisdicional pode trazer
-
lhe alguma utilidade do ponto de
vista prático. Movendo a ação errada ou utilizando
-
se de
procedimento incorreto, o provimento jurisdicional não lhe será
útil, razão pela qual a inadequação procedimental acarreta a
inexistência de interesse processual. Se
a parte possui, a seu
favor, cheque com eficácia executiva, deverá promover sua
cobrança pela via da ação de execução. Ao revés, se ajuizar ação
de cobrança pelo rito comum, de conhecimento, portanto, não terá
preenchido a condição da ação interesse proces
sual, devendo o
magistrado extinguir o processo sem julgamento do mérito. Isto
porque, com a ação de conhecimento, poderia obter sentença
condenatória (título executivo judicial, CPC, Art. 584, inc. I), que
lhe será inútil, pois já possui título executivo
extrajudicial (CPC,
Art. 585, inc. I) com a mesma força e eficácia da sentença
condenatória (Cf.
Código de processo civil comentado e
legislação processual civil extravagante em vigor
. 3ª ed. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 532, item 13).
No qu
e pertine à possibilidade jurídica do pedido, verifica
-
se, para logo, o
cumprimento de tal condição, haja vista o amplo reconhecimento doutrinário e
jurisprudencial em relação à teoria da perda de uma chance, teoria essa, como
visto, passível de aplicação
às hipóteses de indenização pela não
-
concretização
estatal do direito fundamental de convivência familiar e comunitária afeto à
crianças e adolescentes.
4
4
4
4
9
9
Tal requisito indispensável também se encontra reforçado pelo fato de a
Lei de Outubro, por intermédio
da absorção da Emenda Constitucional nº 19, de
05 de junho de 1998, apresentar, no
caput
de seu Art. 37, o princípio fundamental
da eficiência.
Não se perca de vista que a possibilidade jurídica do pedido em casos
tais se estriba, também, no princípio constitucional implícito no Brasil afeto ao
direito de resistência, cujo conceito pode ser tirado por empréstimo do Art. 21 da
Lei Fundamental de Portugal, com as suas devidas adaptações.
No que se refere à determinação da legitimidade, tem
-
se que o agente q
ue
demonstrar que não desfrutou da convivência familiar e comunitária ou, em tendo
desfrutado, tal desiderato se deu de maneira incompleta, será apto a figurar no pólo ativo
da referida demanda,
580
sendo o Estado chamado para figurar no pólo passivo, tendo e
m
vista que é de sua responsabilidade a realização do referido mister constitucional.
Desse modo, o direito indenitário aqui discutido em nada guarda relação com o
sistema de assistência social trazido pela Lei de Outubro e, em especial, no que se refere
ao quanto plasmado nos incs. I e II de seu Art. 203, bem como em relação às leis de
índole infraconstitucional de números 8.742/93, 10.698/03, 10.835/04 e 10.836/04.
Explica
-
se.
No que se refere à Lei nº 8.742, de 07 de dezembro de 1993, cujo
diploma nor
mativo dispõe sobre a organização da assistência social, tem
-
se que,
muito embora seja um dos objetivos ali traçados a proteção à família e o amparo
às crianças e adolescentes carentes, a situação retratada não exclui ou substitui o
pleito indenitário que ora se defende.
Ademais, não se pode olvidar de que o sistema de Seguridade Social atual, que
tem como objetivos o bem
-
estar e a justiça sociais, instituiu a Assistência para amparar
580
ALVI
M, Thereza.
O direito processual de estar me juízo
. São Paulo: Revista dos Tribunais,
1996, p. 13: “No campo do direito material, a capacidade ou personalidade é abrangente de
todos, eis que todos podem ter direitos ou assumir obrigações, mesmo que não pos
sam
exercê
-
los por si, devendo a capacidade, nessas hipóteses, ser integrada”.
4
4
5
5
0
0
os incapazes de se manterem, premiando e atendendo ao princípio da digni
dade da
pessoa humana. Em sendo assim, a limitação de tais direitos pela norma
infraconstitucional, com a imposição de um critério único de constatação, está
claramente subvertendo a vontade do legislador constituinte.
Outrossim, está a merecer destaque q
ue, para a determinação da
capacidade financeira da família do deficiente devem ser sopesados não somente
o critério da divisão
per capita
do salário mínimo, como quis o legislador federal,
mas também os demais elementos que possam comprovar o estado de pe
núria
experimentado por aquele que almeja a concessão da ajuda assistencial.
No mesmo sentido, também a Lei nº 10.698, de 13 de junho de 2003, que criou
o Plano Nacional de Acesso à Alimentação (PNAA), visando ao combate da fome e à
promoção da segurança
alimentar e nutricional, de modo a disponibilizar benefícios à
unidade familiar que apresente renda
per capita
inferior a meio salário mínimo.
Em continuidade, tem
-
se a Lei nº 10.835, de 08 de janeiro de 2004, a qual
institui a renda básica de cidadania,
bem como a Lei nº 10.836, de 09 de janeiro
de 2004, que criou o Bolsa Família, cujos diplomas de lei não têm identificação
com a natureza jurídica do pedido indenitário baseado na perda de uma chance,
pois está ligado, diretamente, com a reparação dos dano
s morais oriundos da
ausência ou da falta de efetivação do direito fundamental de convivência familiar e
comunitária de crianças e adolescentes.
Outro assunto importante de ser levado em consideração se refere ao
fenômeno da prescrição. Seria o direito em
tela imprescritível?
Embora, a ausência de convivência familiar e comunitária possa guardar alguma
relação com as chamadas
ações de estado
, as quais, em regra, são imprescritíveis, a
verdade é que, em se tratando de direito indenitário, ou seja, de natur
eza patrimonial,
verifica
-
se a incidência do lapso prescricional, a teor do que ocorre, por exemplo, com as
prestações alimentícias em atraso
581
e com a chamada petição de herança.
581
Essa é conclusão que se extrai da regra contida no § 2º do Art. 206 do Código Civil, segundo
a qual prescreve “[...] em dois anos, a pretensão para haver prestações alimentares, a partir
da data em que se vencerem”, nunca sendo demais relembrar que outrora o prazo
prescricional respectivo era de cinco anos (Art. 178, § 10, inc. I, CC/16).
4
4
5
5
1
1
Nesse passo, não há como se perder de vista, nesse particular, o que preceitu
a a
norma inserida no Art. 1º, do Decreto nº 20.910, de 06 de janeiro de 1932, a saber:
Art. 1º: As dívidas passivas da União, dos Estados e dos
Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a
Fazenda federa, estadual ou municipal, seja qua
l for a sua
natureza, prescrevem em 5 (cinco) anos, contados da data do ato
ou fato do qual se originarem.
Todavia, e seguindo
-
se os preciosos ensinamentos de José Joaquim
Gomes Canotilho:
O homem necessita de uma certa segurança para conduzir,
planifica
r e conformar autônoma e responsavelmente a sua vida.
Por isso, desde cedo se considerou como elementos constitutivos
do Estado de Direito o princípio da segurança jurídica e o princípio
da confiança do cidadão [...]. Os princípios da protecção da
confianç
a e da segurança jurídica podem formular
-
se assim: o
cidadão deve poder confiar em que aos seus actos ou às decisões
públicas incidentes sobre os seus direitos, posições jurídicas e
relações, praticados ou tomados de acordo com as normas
jurídicas vigentes
, se ligam os efeitos jurídicos duradouros,
previstos e calculados com base nessas mesmas normas.
582
Em consonância com os conceitos acima invocados, Miguel Reale indica que “[...] a
idéia de justiça liga
-se intimamente a idéia de ordem. No próprio conceito
de justiça é inerente
uma ordem, que não pode deixar de ser reconhecida como valor mais urgente, o que está na
raiz da escala axiológica, mas é degrau indispensável a qualquer aperfeiçoamento ético”.
583
Assim, há que se fazer uma interpretação teleológica
do dispositivo em
comento, uma vez que nas comumente chamadas relações jurídicas de trato
sucessivo em que a Fazenda Pública figure como devedora, quando não houver
sido negado o próprio direito reclamado, a prescrição atinge apenas as
prestações vencidas
antes do qüinquênio anterior à propositura da ação.
E isso é tão verdadeiro e real, que o intérprete máximo das questões federais em
nosso país, qual seja, o Augusto Superior Tribunal de Justiça, após proferir inúmeras decisões
582
CANOTILHO, 1999, p. 375 e 377
-
378.
583
REALE, Miguel.
Filosofia do direito
. 17ª ed. São Pa
ulo: Saraiva, 1996, p. 47.
4
4
5
5
2
2
em casos em tudo similares
ao ora em estudo, acabou por editar a Súmula nº 85,
ad litteram
:
“Nas relações jurídicas de trato sucessivo em que a Fazenda Pública figure como devedora,
quando não tiver sido negado o próprio direito reclamado, a prescrição atinge apenas as
prestações ve
ncidas antes do quinquenio anterior à propositura da ação”.
Tal posicionamento se encontra solidificado na mais autorizada jurisprudência.
584
584
ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. PRESTAÇÃO DE
TRATO SUCESSIVO. SÚMULA Nº 85/STJ.
MILITAR DA AERONÁUTICA. PROMOÇÃO. DIREITO
ASSEGURADO.
Nas ações postulatórias de direitos de prestação continuada, em que
a lesão
decorre de omissão da Administração, a prescrição quinquenal não atinge o fundo do direito,
mas apenas as parcelas não reclamadas no quinquenio antecedente à propositura do pedido.
Incidência da Súmula nº 85, do STJ.
A legislação regente assegura
aos sargentos taifeiros da
Aeronáutica o direito de ascender até a graduação de Suboficial, desde que atendidas as exigências
legais, sendo irrelevante a falta de estágio de aperfeiçoamento, não realizado por inércia da
Administração. Recurso especial não
conhecido” (Superior Tribunal de Justiça, 6ª Turma, Recurso
Especial nº 191.388/RS, Relator: Ministro Vicente Leal, j. 21/09/99, decisão unânime, publicada no
DJU de 08/11/99, p. 102, com destaques nossos).
“ADMINISTRATIVO. VIÚVAS. POLICIAIS MILITARES. EQ
UIPARAÇÃO. SERVIDORES ATIVOS.
LEI ESTADUAL Nº 11.535/89. INDENIZAÇÃO DE REPRESENTAÇÃO.
PRESCRIÇÃO DO FUNDO
DO DIREITO. INOCORRÊNCIA. ART. 1º, DO DECRETO Nº 20.910/32. APLICAÇÃO DA SÚMULA
Nº 85
STJ.
1
O direito à percepção da indenização de representaçã
o foi deferido às recorridas á
guisa de isonomia, razão pela qual somente a partir da edição do Art. 40, § 5º, da Constituição Federal
é que surgiu o direito ao referido adicional.
Assim, não tendo sido negado, de forma inequívoca, o
direito pleiteado, não
há se falar em prescrição do fundo do direito, consoante preceitua a
Súmula nº 85
-
STJ. Precedente da Corte.
2
Recurso especial não conhecido” (Superior Tribunal de
Justiça, 6ª Turma, Recurso Especial nº 192.135/CE, Relator: Ministro Fernando Gonçalves,
j. 14/09/99,
decisão unânime, publicada no DJU de 04/10/99, p. 118, com destaques nossos).
“ADMINISTRATIVO E PREVIDENCIÁRIO. EX
-
COMABATENTE MARÍTIMO. PENSÃO.
PRESCRIÇÃO PARCIAL.
Em se tratando de pedido de retificação da renda mensal inicial, com
o pagamento de diferenças, a prescrição é parcial, consoante Súmula nº 85
-
STJ.
Recurso
conhecido mas desprovido” (Superior Tribunal de Justiça, 5ª Turma, Recurso Especial nº 189.586/RN,
Relator: Ministro Gilson Dipp, j. 02/09/99, decisão unânime, publicada no DJU
de 04/10/99, p. 89, com
destaques nossos).
“PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO DO DISTRITO FEDERAL.
REAJUSTE SALARIAL. IPC DE MARÇO DE 1990
84,32%. PALNO COLLOR. PRESCRIÇÃO DO
FUNDO DE DIREITO. NÃO OCORRÊNCIA. SÚMULA nº 85/STJ. 1. Sendo
relação jurídica de trato
sucessivo, cujo direito postulado em juízo não foi inequivocamente negado pela Administração,
a
prescrição atinge apenas as parcelas vencidas anteriormente ao quinquenio legal precedente
ao ajuizamento da ação. Incidência da Súmu
la nº 85
-
STJ.
2. Pacificado pela Terceira Seção do
STJ o entendimento de que a Lei 8.030/90 não é aplicável aos servidores remunerados pelo Distrito
Federal, sendo
-
lhes devido o reajuste do IPC 84,32%, de março de 1990
Plano Collor, vez que
regidos pel
a Lei Distrital nº. 38/89, somente revogada pela Lei Distrital nº 117/90, quando já
incorporado ao patrimônio daqueles. Precedentes. 3. Recurso não conhecido” (Superior Tribunal de
Justiça, 5ª Turma, Recurso Especial nº 219.091/DF, Relator: Ministro Édson
Vidigal, j. 02/09./9,
decisão unânime, publicada no DJU de 27/09/99, p. 118, com destaques nossos).
“ADMINISTRATIVO. SERVIDORES DO DISTRITO FEDERAL. IPC DE MARÇO DE 1990 (84,32%).
PRESCRIÇÃO DO FUNDO DO DIREITO. NÃO OCORRÊNCIA. 1
Firmou
-
se a jurisprudência do
STF no sentido da existência de direito adquirido dos servidores públicos do Distrito Federal ao
reajuste de 84,32% (IPC de março de 1990), razão pela qual, não se há falar em prescrição do fundo
do direito, pois, incorporado o referido percentual a
o vencimento,
o lapso prescricional se renova a
cada mês, se erigindo, portanto, em prestação de trato sucessivo. Aplicação da Súmula nº 85
-
STJ.
2
Recurso conhecido” (Superior Tribunal de Justiça, 6ª Turma, Recurso Especial nº
208.359/DF, Relator: Minist
ro Fernando Gonçalves, j. 15/06/99, decisão unânime, publicada no DJU
de 28/06/99, p. 179, com destaques nossos).
4
4
5
5
3
3
Nesse diapasão, a prescrição somente poderá atingir direitos dos
jurisdicionados referentes aos cincos anos anterio
res ao ajuizamento da
respectiva demanda e não em todo e qualquer direito a ela pertencente.
Conquanto tenha
-
se afirmado que o Estado é parte legítima para figurar
no pólo passivo da referida contenda (como das outras declinadas nos tópicos
antecedentes),
resta ponderar qual (ou quais) braço (s) público (s) responde (m)
pela indenização perseguida pelas pessoas que, em face da omissão ilícita, não
tiveram ou foram prejudicados na concreção e na realização de seu inafastável
direito à convivência familiar e
comunitária.
Ao se levar em conta a dicção estampada tanto no texto constitucional
quanto no Estatuto da Criança e do Adolescente, tem
-
se que, a princípio, a
responsabilidade no que se refere ao citado direito fundamental recai sobre
todos os entes feder
ados, sem exceção, visto que onde o legislador
constituinte originário não restringiu não é dado ao intérprete restringir,
cabendo a escolha, assim, ao interessado, não se confundindo referida
função com aquela de natureza concorrente, inserta no Art. 24,
inc. XV, da
Lei de Outubro,
585
uma vez que esta se refere à produção legislativa apenas e
tão
-
somente.
No que diz respeito ao juízo competente à apreciação da ação
indenitária, a questão deve levar em consideração os seguintes aspectos: (i)
se proposta por
pessoa que se enquadre nas condições e na faixa etária de
abrangência da Lei. 8.069/90, a Vara da Infância e Juventude se
entremostra competente à apreciação do aludido pedido; e, (ii) em se
tratando de prejudicados que já atingiram a maioridade, a competê
ncia
levará em conta a localidade e ente federado colocado no pólo passivo, de
modo que a
actio
poderá ser proposta perante a Justiça Federal, perante as
Varas especializadas da Fazenda Pública e da Família e Sucessões ou, até
mesmo, perante a Justiça Comu
m.
585
Art. 24, inc. XV (competência concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal para
legislar sobre proteção à infância e à juventude)
.
4
4
5
5
4
4
De outra medida, não se pode olvidar, ainda, que o postulante deve
juntar, à sua petição inicial,
586
os documentos indispensáveis à instrução da
mesma, invocando a responsabilização objetiva do Estado, obedecendo
-
se,
também, as determinações contidas nos
Arts. 282 e 283 da lei de ritos civis.
587
A demora na entrega da prestação jurisdicional,
588
-
589
sem sombra de
dúvidas, converte
-
se hoje numa das mais atuais e polêmicas questões
enfrentadas pelos operadores do direito no ordenamento jurídico brasileiro, a
pont
o, inclusive, de ter sido objeto de emenda constitucional,
590
a fim de que
fosse acrescido, ao Art. 5º da Lei de Outubro, o inc. LXXVIII, com os seguintes
dizeres: “[...] a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a
razoável duração do pro
cesso e os meios que garantam a celeridade de sua
tramitação”.
Como bem obtempera Walter Claudius Rothenburg:
[...] a ‘razoável duração do processo e os meios que garantam a
celeridade de sua tramitação’, assegurados tanto no âmbito
judicial quanto admin
istrativo, passam a ser expressamente
586
CASTRO, Artur Anselmo de.
Lições de processo civil
. Coimbra: Almedina, 1967. vol. III, p.
307: “A petição inicial vem a ser o articulado em que o demandante propõe a acção,
deduzindo certa pretensão de tutela jurisdicional, com a menção do direito a tu
telar e os
fundamentos respectivos. A sua importância é basilar, quer porque sem a petição não pode
haver processo uma vez que a concesão da tutela jurisdicional não é oficiosa (
supra
, nº 84,
b
e
d
), quer porque através dela tomará o réu conhecimento do co
nteúdo preciso do pedido
contra ele formulado”.
587
Ibidem, p. 216: “A petição inicial será instruída com os documentos em que o autor fundar o
pedido. Na falta deles poderá o juiz indeferir, de plano, a inicial ou, a requerimento do réu,
absolvê
-
lo da instâ
ncia [...]. Entre esses documentos, convém distinguir os substanciais e os
fundamentais. Substanciais, os que a lei exige expressamente como condição da propositura
da demanda, ou constitutivos da própria relação fundamental em lide, como, por exemplo, a
c
ertidão de casamento realizado há mais de dois anos, nas ações de desquite por mútuo
consentimento; o contrato social ou estatutos, nas ações de dissolução e liquidação das
sociedades; a letra de câmbio, cheque ou nota promissória, nos executivos cambiais.
Fundamentais, os em que apóiam e fundam os pedidos do autor, ou, como os define Jorge
Americano: documentos comprobatórios de fatos cuja omissão tornaria a inicial inepta”.
588
BASTOS; VARGAS, 2001, p. 59: “A lentidão da justiça é um fator agonizante para o
s que
esperam uma decisão. Estrangula pois, os canais de acesso à justiça, diminuindo seu valor
perante o jurisdicionado, que prefere ter sua litigiosidade contida, quando não a soluciona por
seus próprios meios, a ter de recorrer à Justiça e enfrentar sua
deficiência e a própria
ansiedade. Em contrapartida, fere substancialmente o dispositivo constitucional do devido
processo legal”.
589
CASTRO, 1967, vol. III, p. 203: “[...] o processo deve dispor de instrumentos adequados a
todos os direitos; o resultado
da demanda deve assegurar ao vitorioso a utilidade necessária
com o mínimo de esforço e gasto”.
590
Emenda Constitucional nº 45, de 08 de dezembro de 2004.
4
4
5
5
5
5
previstos como direito fundamental. Inclui
-
se mais um inciso
(LXXVIII) no extenso rol do Art. 5.° da Constituição.
591
Não se pode deslembrar que um dos mecanismos condizentes que a
determinação constitucional supra, nas
cido com as mudanças processuais
introduzidas em nosso ordenamento jurídico a partir do ano de 1992, diz respeito
ao instituto da antecipação da tutela, o qual acabou por culminar com a
possibilidade, desde de que devidamente preenchidos os requisitos lega
is, de
concessão de antecipação do provimento jurisdicional invocado pela parte
interessada, a fim de que este se torne realmente útil ao fim colimado.
Assim o é porque, diante de cada caso concreto, a demora para a
prestação jurisdicional invocada pode a
carretar ao litigante dano irreversível e,
quando finalmente for concedida, já terá ela se tornado inócua e ineficaz ao fim
adredemente pretendido.
Eis a redação dada ao Art. 273 do Código de Processo Civil, após o
advento da Lei nº 8.952, de 13 de dezembro de 1994:
Art. 273: O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total
ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial,
desde que, existindo prova inequívoca, se convença da
verossimilhança da alegação e:
I
haja fundado receio
de dano irreparável ou de difícil reparação;
ou,
II
fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o
manifesto propósito protelatório do réu.
Da leitura do dispositivo de regência tem
-
se que deverá o magistrado
conceder a antecipação da tutela jur
isdicional toda vez que vislumbrar a ocorrência
de dano irreparável ou de difícil reparação, ou ainda, quando o réu abusar de seu
direito de defesa através de atos intencionalmente procrastinatórios.
A condição
sine qua non
traçada no inc. I, do Art. 273,
do Código de
Processo Civil se faz por demais presente em casos tais, autorizando, assim, o
591
ROTHENBURG, 2003, p. 257.
4
4
5
5
6
6
seu deferimento, pois a não concessão da antecipação da tutela jurisdicional
propiciará a concretização de dano irreparável ou de difícil reparação, posto que o
di
reito à convivência familiar e comunitária de crianças e adolescentes tem
manifesta e inafastável natureza fundamental, não podendo ficar relegado aos
dissabores da morosidade da máquina judicial.
Como visto ao longo deste arrazoado, tem
-
se que o caminho
a ser
perseguido visando à concretização dos preceitos fundamentais estampados na
Constituição de 1998 é longo, incerto e espinhoso.
Todavia, não se pode mais conceber ou deixar correr ao largo a
necessidade de responsabilização estatal nas situações em que, por sua omissão
ou ineficiência, não foi possível a concretização do direito fundamental à
convivência familiar e comunitária de crianças e adolescentes, a fim de que,
efetivamente, se venha a prestigiar o mandamento isonômico material, inserto no
capu
t
do Art. 5º da Carta de Outubro.
4
4
5
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C
C
O
O
N
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C
C
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U
S
S
Õ
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E
E
S
S
1)
Depois de realizada análise não tão profunda quanto se gostaria, da
temática envolvendo a intrincada questão relativa ao dever estatal de
concretização do direito fundamental de convivên
cia comunitária e familiar a
crianças e adolescentes, o que se almejou foi propiciar uma maior abertura com
relação aos meios colocados à disposição dos interessados, a fim de que estes,
efetivamente, possam ver reparado ou, ao menos, mitigado referido pre
juízo.
2)
Ao se efetuar a análise do moderno conceito de Estado em vigência,
bem como de toda a sistemática que norteou (e ainda norteia) a criação e a
aplicação do texto constitucional atual, não há como se fugir da eleição de
verdade constante do fato d
e que é ele responsável pelo atingimento e
cumprimento dos princípios e objetivos fundamentais da República.
3)
Reforce
-
se: a par das dificuldades existentes e uma vez que o Brasil
adotou a erradicação desses males como trilha fundamental da República, a
verdade é que inconteste se verifica o fato de que o Estado tem o dever
fundamental e inafastável de fazer concretizar os princípios e objetivos da
República estampados no seio do texto constitucional.
4)
Não se pode negar a força hierárquica superior que
possuem as
normas constitucionais e, no âmbito destas, a importância e a amplitude daqueles
regramentos basilares destinados à garantia dos chamados
direitos humanos
fundamentais
, verificando
-
se, em tal particular, que estes, com o advento da Carta
Magna
de 1988, passaram a ter eficácia plena e aplicação imediata, sempre no
sentido de valorização humana e na busca incansável do pleno desenvolvimento
da cidadania.
5)
A viga
-
mestra do ordenamento jurídico
-
constitucional brasileiro é o
princípio fundamental
da dignidade da pessoa humana, encartado no inc. III do
Art. 1º da
Lex Major
, elevando a pessoa, o ser humano, independentemente de
4
4
5
5
8
8
qualquer característica individual, à condição de elemento imprescindível e
indispensável à fomentação de um verdadeiro Esta
do Constitucional Democrático,
derramando, ainda, seus efeitos perante princípios outros, de assaz importância
na preservação e no atingimento de tal desiderato, como, por exemplo, o princípio
da isonomia cravado no
caput
do Art. 5º do referido compêndio b
asilar.
6)
O pretendido tratamento isonômico só é possível de ser atingido a
partir do momento em que o Estado deixar sua habitual neutralidade, propiciando
medidas práticas que venham a fomentar a concretização e a materialização da
igualdade constitucio
nal no dia
-
a
-
dia, quiçá por intermédio das denominadas
ações afirmativas ou por qualquer outro meio que tenha por escopo erradicar a
nefasta presença da discriminação e do preconceito até hoje presentes em casos
tais, prestigiando
-
se o direito de convivênc
ia familiar que é essencial ao digno
desenvolvimento dos infantes.
7)
Reforce
-
se que o Poder Público, seja qual área e esfera de atuação for,
está intrinsecamente ligado e destinado ao irrestrito cumprimento e a irrestrita
observância dos direitos fundamentais apresentados pela Carta Constitucional, de
modo que não se vislumbra mais hoje, parâmetros que possam, legitimamente,
afastar o Estado de tal mister, sendo certo que o afastamento da referida
determinação importará na sua responsabilização e na de se
us agentes.
8)
A inércia e a omissão estatais acima apontadas sempre acabarão por
redundar num ilícito efeito, qual seja, o de retirar dos cidadãos o exercício de
direitos que lhe são fundamentais e, no tema em comento, retirar da criança e do
adolescente
expurgados da convivência familiar e comunitária a possibilidade de
um desenvolvimento afetuoso e digno, abrindo
-
lhe, assim, o caminho para pleitear
indenização embasada na teoria de responsabilidade civil denominada de
perda
de uma chance
.
9)
A sociedad
e, em razão de sua ínsita responsabilidade, tem se
esforçado na tentativa de minimizar o problema afeto a crianças e adolescentes,
pois, além de contribuir para tanto com o adimplemento de tributos, acaba, dentro
daquilo que se convencionou chamar
-
se de
te
rceiro setor
, aglutinando
-
se em
4
4
5
5
9
9
Organizações Não
-
Governamentais (ONG’s), em Organizações da Sociedade
Civil de Interesse Público (OSCIP’s), assumindo, assim, muitas das lacunas de
atuação deixadas ao largo pelo Estado; todavia, tal atuação, embora benéfica
,
não se mostra suficiente e apta para deixar correr ao largo a responsabilidade
estatal sobre o assunto.
10)
É inegável que a consecução, a concretização e a satisfação dos
direitos fundamentais, principalmente aqueles tidos como sendo de prestação,
está
a demandar, não raras vezes, a disponibilização de meios materiais, os quais
têm por característica serem finitos, trazendo consigo a problemática da
escassez, emergindo daí, necessariamente, que o Estado detenha em seu poder
saldo pecuniário suficiente a
tal desiderato; porém, a suposta ausência de
dinheiro não poderá ser invocada como excludente de atuação e de
responsabilização no que se refere ao compromisso assumido no texto
constitucional vigente.
11)
O Estado, ao não concretizar o direito fundament
al à convivência
familiar e comunitária, sem sombra de dúvidas, estabelece ilícita diferenciação em
relação aos infantes que tiveram a sorte de ter uma família estruturada daqueles
que assim não conseguiram, cujos efeitos da citada diferenciação se encontr
am,
infelizmente, espraiados nos mais diversos campos (educação, saúde, moradia,
vestuário, etc.), solapando
-
lhes a indispensável oportunidade de um
desenvolvimento escorreito e digno, o que não se mostra lícito dentro da
sistemática constitucional em vigê
ncia.
12)
O direito fundamental à convivência familiar e comunitária, bem como o
efetivo acesso a instrumentos que mitiguem tal impossibilidade de concreção, faz
parte do chamado
mínimo vital
, ou seja, faz parte de um núcleo material
indispensável e intan
gível, derivado da própria condição humana, de modo que toda
a vez que o Estado deixa de cumprir com aquilo que é inerente a essência do
homem, pode e deve ser responsabilizado por tais omissões ou descumprimentos.
13)
Toda vez que não se consiga fomentar
o direito fundamental de
nossas crianças e adolescentes no que se refere à convivência familiar e
4
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6
0
0
comunitária, bem como não se tenham colocado a disposição dos interessados
mecanismos alternativos que possam mitigar tão importante ausência, o Estado
(e se
us agentes) deve ser responsabilizado por tal omissão, de índole
constitucional, eis que, no mínimo, retirou dos infantes desafortunados a chance
de dias melhores, o que se cumpriria a todo custo evitar.
14)
A exclusão da convivência familiar e comunitária retira da criança e do
adolescente qualquer direito de escolha, impondo
-
lhes, salvo raras exceções, o
tortuoso caminho do abandono, da falta de carinho, da criminalidade, da
marginalidade, da opressão, enfim, da mais completa e irrestrita ausência de
dignidade humana.
15)
Reforce
-
se que, em casos tais, a intervenção do Judiciário se
converte no último bastião e na última saída para amenizar a sofrida situação das
classes menos abastecidas de nosso País, que buscavam na atuação política de
seus representa
ntes a possibilidade de bem
-
estar e foram frustrados pela inércia
social que tomou conta de nossas autoridades.
16)
Um dos caminhos judiciais que pode ser seguido, nessas hipóteses,
se encontra presente na Lei nº 7.347/85 (também conhecida como Lei da Açã
o
Civil Pública), na exata medida em que permite, por intermédio do referido veículo
processual, que seja levado a efeito pedido de prestação jurisdicional visando à
defesa de interesses difusos ou coletivos, o que, sem sombra de dúvidas, traz
mais força e
facilidade ao atingimento do objetivo ou da reparação perseguida
pelos prejudicados.
17)
A aplicação do mandado de injunção como meio de responsabilizar o
Estado, em seu viés legislativo, nas hipóteses de não
-
concretização do direito
fundamental de convivência familiar e comunitária a crianças e adolescentes se
entremostra, também, de todo viável, na exata medida em que não se percebe no
ordenamento jurídico em voga, texto legislativo apto a referendar os caminhos da
citada responsabilização estatal pelo
malferimento em discussão.
18)
Abre
-
se, ainda, a possibilidade, fulcrada na teoria da perda de uma
chance, que aquele que não teve concretizado seu direito fundamental de
4
4
6
6
1
1
convivência familiar e comunitária por força de omissão ou inércia estatais,
ingress
e com ação de conhecimento condenatória visando à reparação, pelo
Estado, dos danos morais e psicológicos que lhe foram injustamente impingidos
em razão do ilícito constitucional em tela.
19)
Por fim, a problemática em discussão somente terá a possibilidade de
galgar solução juridicamente adequada, a partir do momento em que se
emprestar, verdadeiramente, eficácia aos comandos constitucionais existentes,
mormente aqueles de natureza fundamental, como é o caso do direito de
convivência familiar e comunitári
a pertencente as nossas crianças e
adolescentes, pois, do contrário, teremos, apenas e tão
-
somente, mero exercício
de vã retórica.
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