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ANA CAROLINA ROSSI BARRETO
AS OBRIGAÇÕES ACESSÓRIAS NA PREVIDÊNCIA SOCIAL BRASILEIRA
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO EM DIREITO DAS RELAÇÕES SOCIAIS
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC – SP
2007
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2
ANA CAROLINA ROSSI BARRETO
AS OBRIGAÇÕES ACESSÓRIAS NA PREVIDÊNCIA SOCIAL BRASILEIRA
Dissertação apresentada à Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo para
obtenção do título de Mestre em Direito do curso
de Pós Graduação Stricto Sensu - área de
concentração Direito das Relações Sociais.
Orientador: Professor Doutor Wagner Balera
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC – SP
2007
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3
BANCA EXAMINADORA
_____________________________________
_____________________________________
_____________________________________
4
Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a
reprodução total ou parcial desta Dissertação por processos de
fotocopiadoras ou eletrônicos.
_
___________________________________ São Paulo, 29/08/2007.
5
“Toda a sabedoria vem do Senhor Deus,
e com Ele esteve sempre e existe antes
de todos os séculos.”
ECLESIÁSTICO, 1,1-2
6
Aos meus pais, José Luis e Maria Alice.
7
AGRADECIMENTOS
Este trabalho é fruto da amizade, que no início, era única, nascida na
juventude. Hoje, em virtude do estudo e da paixão pelo Direito, solidificou-se e,
graças à minha grande amiga Luana multiplicou-se.
Por esta razão, não posso deixar de manifestar meus sinceros
agradecimentos à Dra. Marta Gueller, Dr. Daisson Portanova e ao meu orientador,
Professor Wagner Balera, a quem agradeço pela confiança e estímulo para o
trabalho frente ao avanço do Direito Social .
Obrigada ao colega Fabio Zambitte Ibrahim, pela colaboração nas pesquisas,
e pelo auxílio nas discussões acerca da matéria aqui tratada.
Obrigada também aos meus amigos: Lauro, Vanessa, Daniella, Luís, Rafael,
e aos colegas de mestrado, pelo constante apoio, cooperação e incentivo.
Por fim, agradeço aos meus pais, ao meu irmão Luís Gustavo, e ao Gilberto,
a eles sou grata por toda compreensão, pelo carinho e pelo amor recebido.
8
RESUMO
O presente trabalho tem o intuito de apresentar as obrigações acessórias
previstas na legislação previdenciária; estabelecer sua finalidade, justificar seu
conceito, e demonstrar sua importância no âmbito da Previdência Social Brasileira.
Pretende ademais demonstrar que com Constituição Federal de 1988 - em que se
abandonou uma concepção de Constituição voltada para o Estado e passou-se a
adotar uma Constituição dirigida para a Sociedade – e aqui, especificamente no que
atine às obrigações acessórias, deu-se margem ao nascimento de múltiplos efeitos,
dentre eles a exigência de estas atendam ao seu conteúdo finalístico, qual seja, o
“interesse da arrecadação ou da fiscalização”.Quanto ao seu conceito e delimitação,
verifica-se a existência de conflitos na doutrina acerca de sua nomenclatura, modo
de os valores e princípios trazidos pela Constituição Federal de 1988, que em sua
aplicação possibilitam dar efetividade ao cumprimento e desenvolvimento dos
programas de proteção social. Para tanto, buscando melhor situar o leitor dentro
deste universo, primeiramente encontra-se o estudo do financiamento da
Seguridade Social Brasileira, o conceito e características das contribuições sociais à
ele destinada, bem como a composição de sua relação jurídica
9
ABSTRACT
This paper has the intention of presenting the accessory obligations
provisioned by the social security legislation; to establish their purpose, justify their
concepts, and to demonstrate their importance within the scope of the Brazilian social
security. It also intends to demonstrate that, with the Federal Constitution of 1988 –
abandoning the adoption of the concept of a Constitution directed to the state –
adopting a Constitution directed to Society – and here, specifically regarding
accessory obligations, there was the emergence of multiple effects, among them the
requirement that these meet their finality content, which is, the “interest of the tax
collection or of the inspecting authorities”.Regarding their concept and delimitation, it
can be seen that there are conflicts in the doctrine on nomenclature, so that the
values and principles brought by the Federal Constitution of 1988, which in their
force, allow imparting effectiveness to the compliance and development of the social
protection programs. For this, seeking to improve the reader’s understanding within
this universe, first there is a study of the financing of the Brazilian Social Security, the
concept and the features of the social contributions directed to it, as well as the
composition of its legal relation.
Key Words: Social Security, Financing, legal relation, accessory obligations
10
INTRODUÇÃO....................................................................................
13
CAPÍTULO 1 -CONCEITOS FUNDAMENTAIS……………………….
16
1.1. Linguagem e conhecimento...............................................
16
1.2. O termo "direito" e suas diversas acepções............................
19
1.3. Direito positivo e ciência do Direito...................................
21
1.3.1. O direito positivo como sistema de linguagem
prescritiva.....................................................................
22
1.3.2. A ciência do Direito como sistema de linguagem
descritiva.............................................................................
25
1.4. A norma jurídica.................................................................
26
1.4.1. A norma jurídica tributária.....................................
31
1.4.2. Conceito de tributo......................................................
32
1.4.3.Conceito legal de tributo........................................
34
1.4.4. Normas gerais de direito tributário.........................
37
1.5. O Direito e o seu modo de produção...............................
39
1.6. A noção do ordenamento jurídico como sistema..............
47
CAPÍTULO 2 - OS TRIBUTOS E SUAS ESPÉCIES....................
51
2.1 A classificação constitucional dos tributos .........................
51
2.1.2. Divergências da doutrina nacional........................
54
2.2. Impostos...........................................................................
60
2.3. Taxas..............................................................................
63
2.3.1. Conceito de taxa..................................................
63
2.3.2. Taxas de serviço....................................................
66
2.3.3. Taxas de polícia......................................................
67
2.4. Contribuição de melhoria..................................................
68
2.5. Empréstimo compulsório....................................................
70
2.6. Contribuições....................................................................
73
2.6.1. Contribuições sociais...........................................
75
2.6.1.1.Contribuições sociais gerais.....................
76
SUMÁRIO
11
2.6.1.2.Contribuições sociais para o
financiamento da seguridade social.....................
77
2.6.2. Contribuições de intervenção no domínio
econômico........................................................................
79
2.6.3. Contribuições corporativas.................................
80
2.6.4. Contribuição de iluminação pública.......................
81
CAPÍTULO 3 - DO FINANCIAMENTO DA SEGURIDADE
SOCIAL.............................................................................................
83
3.1. A Seguridade Social..........................................................
83
3.2. Sistemas de Financiamento da Seguridade Social……….
85
3. 3. Classificação dos Sistemas de Financiamento…………..
86
3.3.1. Sistema não contributivo…………………………….
86
3.3.2. Sistemas Contributivos………………………………
87
3.3.2.1. Sistema de Repartição…………………….
88
3.3.2.2. Sistema de Capitalização…………………
89
3.3.2.3. Sistema Misto………………………………
90
3.4. Do Regime de Financiamento da Seguridade Social .......
92
3.4.1. Base legal……………………………………………..
92
3.4.2. O Regime do Sistema de Financiamento
Brasileiro..........................................................................
94
3.5 Diretrizes do Regime Financeiro........................................
97
3.5.1 Contribuições Sociais – Receitas............................
97
3.6. Princípios relativos ao custeio da Seguridade Social........
100
3.6.1. Equidade na participação no custeio......................
101
3.6.2. Diversidade na base de financiamento..................
102
3.6.3. Equilíbrio Financeiro e atuarial...............................
102
3.7. Relação jurídica de custeio do sistema de seguridade
social brasileiro.........................................................................
104
3.7.1 Conceito..................................................................
104
3.7.2. Características........................................................
106
3.7.3 Os Componentes da Relação Jurídica de
Financiamento..................................................................
106
12
3.7.4 Teoria Escisionista e Teoria Unitária da relação
jurídica previdenciária.......................................................
108
CAPÍTULO 4 - OBRIGAÇÕES PREVIDENCÁRIAS..........................
111
4.1. As obrigações acessórias e o custeio da seguridade
social........................................................................................
113
4.2. A Questão Terminológica..................................................
114
4.3. Sobre a Teoria Geral do Direito........................................
118
4.4. AS OBRIGAÇÕES ACESSÓRIAS PERTINENTES À
PREVIDÊNCIA SOCIAL ..........................................................
120
4.4.1. Elaboração da Folha de pagamento......................
127
4.4.2.Lançamento dos fatos geradores das
contribuições ...................................................................
130
4.4.3. Dever de prestar informações................................
133
4.4.4. Encaminhamento da GPS pela empresa ao
sindicato da categoria profissional...................................
136
4.4.5. Dever de afixar Guia da Previdência Social no
quadro de horários...........................................................
138
4.4.5.1. Conservação da escrita contábil...............
139
4.4.6. Dever de comunicação dos municípios..................
140
4.4.7. Dever do Registrador Civil de Pessoas Naturais
em comunicar óbitos ao Instituto Nacional do Seguro
Social...............................................................................
141
4.4.8. Informações mensais através da Guia de
Recolhimento do Fundo de Garantia por Tempo de
Serviço e Informações à Previdência Social....................
142
4.4.9. Emissão, guarda, impressão e entrega do Perfil
Profissiográfico Previdenciário – PPP...............................
144
4.4.10.
Conseqüências
descumprimento das obrigações
acessórias..........................................................................
147
CONCLUSÃO.....................................................................................
154
13
INTRODUÇÃO
O Código Tributário Nacional classifica a obrigação tributária em duas
espécies, pelo critério do objeto da prestação, em principal e acessória. Para cada
espécie de obrigação, identifica um fato gerador, indicando o momento de sua
ocorrência.
Nas disposições acerca da obrigação tributária, artigo 113 e parágrafos,
aponta o Código Tributário Nacional o momento do nascimento do vínculo jurídico
obrigacional,estabelecendo explícita simetria entre a verificação do fato gerador e o
surgimento da obrigação principal.
Contrariamente, a regra de simetria utilizada para definir o momento do
surgimento da obrigação principal não é observada em relação à obrigação
acessória, cujo nascimento, na letra do §2º do art. 113, advém da legislação
tributária.
A peculiaridade constatada na redação do §2º do artigo 113 do Código
Tributário Nacional suscita calorosos debates acadêmicos, exsurgindo o
questionamento acerca da necessidade da configuração de um fato capaz de atrair
a incidência da norma tributária, dando origem à obrigação acessória.
O fenômeno acima descrito não se restringe à seara tributária. Todos os
BIBLIOGRAFIA……………………………………………………………. 156
14
direitos e deveres jurídicos são conseqüências da incidência de uma determinada
norma, que atua quando ocorre concretamente a situação hipotética que descreve.
É a conseqüência do princípio constitucional da legalidade, inserto no artigo 5º, II:
“ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de
lei”.
A norma previdenciária, geral e abstrata, como qualquer norma, deve
preexistir à obrigatoriedade de sua observância, por obediência aos princípios da
legalidade e da irretroatividade. Inserta no ordenamento jurídico, está apta a produzir
efeitos concretos, uma vez que o sujeito ao qual se dirige coloque-se na situação por
ela descrita capaz de desencadear aqueles efeitos.
Justamente em vista desse fenômeno, qual seja, previsão legal; fato-
incidência; obrigação, observado na generalidade das relações jurídicas cogentes,
estabelecidas independentemente da vontade do sujeito passivo estar dirigida a sua
conformação, tal como ocorre na seara tributária, constata-se que, tanto quanto para
o surgimento da obrigação principal, faz-se necessária a previsão de um fato, uma
situação sobre a qual a norma incida e dê origem à obrigação acessória.
É certo que a obrigação acessória, por seu caráter instrumental, prestando-se
a auxiliar a execução das atividades arrecadadora e fiscalizadora dos entes
tributantes, não necessariamente ligada a uma obrigação principal, por vezes
reveste-se de peculiaridades que parecem, num primeiro momento, negar a
existência de fato que a origine. Assim ocorre com a obrigação de declarar-se isento
perante a atual Secretaria da Receita Federal do Brasil. O sujeito passivo, em tese,
15
não se colocou em situação que desencadeasse os efeitos da norma, mas está,
ainda assim, obrigado ao seu cumprimento.
Porém, o exemplo acima não excepciona o que fora afirmado: toda obrigação
tem um fato gerador descrito anteriormente em norma legal. O sujeito passivo da
obrigação acessória de prestar declaração de isento, embora não esteja vinculado a
nenhuma obrigação principal, deve colaborar para o desempenho da atividade
fiscalizadora e arrecadadora do Estado.
A seguir, o presente trabalho possui o intuito de demonstrar utilizando-se dos
conceitos sobre a linguagem, o conhecimento, o conceito de Direito e norma jurídica
para estudar as obrigações acessórias previstas na legislação, bem como a
aplicação das sanções quando de seu descumprimento a partir do financiamento da
Seguridade Social, através das contribuições sociais, suas características e relação
jurídica.
Por fim, verificaremos sua fundamental importância como valioso instrumento
de auxílio do Estado para melhor consecução dos objetivos da Seguridade Social –
promover os valores do bem estar e justiça sociais, estes igualmente previstos na
Constituição Federal
16
CAPÍTULO 1
CONCEITOS FUNDAMENTAIS
1. Linguagem e conhecimento
Sem linguagem não há conhecimento, muito menos a transmissão dele, que é
fator relevante para o desenvolvimento de qualquer sociedade, por mais primitiva
que seja.
Conforme anota Paulo de Barros de Carvalho
1
, conhecer é saber
“proposições sobre”. E, sem linguagem, em quaisquer de suas formas, o
conhecimento não se manifesta.
Todo o conhecimento que a civilização tem hoje é resultado da sedimentação
adquirida através das diversas gerações. E a sua transmissão se fez, sem dúvida
alguma, por meio da linguagem, em diferentes dimensões (escrita, falada, gestual).
Esse maior grau de desenvolvimento de seu sistema de linguagem permitiu
ao homo sapiens uma melhor adaptação ao ambiente, resultando, por exemplo, na
produção de ferramentas mais elaboradas, de armas eficientes, tudo como
conseqüência da troca de conhecimento entre seus membros, que, inclusive, pôde
ser transmitido às gerações que se seguiram.
1
CARVALHO, Paulo de Barros. IPI – Comentários sobre as Regras Gerais de Interpretação da
Tabela NBM/SH (TIPI/TAB). Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo: Dialética, nº. 12, p.42.
17
O exemplo dá conta da importância da linguagem para o desenvolvimento da
sociedade e da ciência. Afinal, ela, em suas variadas formas, é o único meio de
transmissão de conhecimento.
Para a ciência é diferente. Ela existe na linguagem. O conhecimento que dela
advém somente pela linguagem pode ser transmitido. Paulo de Barros Carvalho
2
exemplifica com perfeição a importância da linguagem para o conhecimento:
Conheço determinado objeto na maneira em que posso expedir enunciados
sobre ele, de tal arte que o conhecimento, neste caso, se manifesta pela linguagem,
mediante proposições descritivas ou indicativas.
Por outro lado, a cada momento se confirma a natureza da linguagem como
constitutiva de nossa realidade. Já L. Wittgenstein afirmava, na proposição 5.6, do
“Tractatus Lógico-Philosophicuus”, que “os limites da minha linguagem são os limites
do meu mundo”, que, dito de outro modo, pode significar: meu mundo vai até aonde
for minha linguagem. E a experiência o comprova: olhando para uma folha de
laranjeira, um botânico seria capaz de escrever laudas, relatando a “realidade” que
se vê, ao passo que o leigo ficaria limitado a poucas linhas. Dirigindo o olhar para
uma radiografia de pulmão, o médico poderia secar múltiplas e importantes
informações, enquanto o advogado, tanto no primeiro caso como neste último, ver-
se-ia compelido a oferecer registros ligeiros e superficiais. Por seu turno,
examinando um fragmento do Texto Constitucional brasileiro, um engenheiro não
lograria mais do que extrair uma mensagem adstrita à fórmula literal utilizada pelo
legislador, enquanto o bacharel em Direito estaria em condições para desenvolver
2
Revista Dialética de Direito Tributário, nº. 12: p. 23/60.
18
uma análise ampla, contextual, trazendo à tona normas implícitas, identificando
valores e apontando princípios que também não tem forma expressa.
Logo, indaga-se: Por que uns tem acesso a esses campos e outros não? Por
que alguns ingressam em certos setores do mundo, ao mesmo tempo em que outros
se acham absolutamente impedidos de fazê-lo? A resposta é uma só, a realidade do
Botânico em relação à Botânica, é bem mais abrangente do que outros profissionais,
mesmo ocorrendo com a realidade do médico, do engenheiro e do bacharel em
Direito, ainda, qual fator determinou que essas realidades se expandissem, dilatando
o domínio dos respectivos conhecimentos? A linguagem ou a morada do ser, como
proclamou Heidegger.
O texto demonstra a importância da linguagem para a transmissão do
conhecimento entre os indivíduos e para captação da realidade que nos cerca.
Vistas desse modo, as adversas áreas do conhecimento, por exemplo, a Medicina, a
Botânica, a Biologia, o Direito, a Política etc., são estratos próprios de linguagem. E,
consequentemente, o estudo dessas matérias tem como objetivo conhecer esses
estratos específicos de linguagem.
Por aí se vê que o conceito de linguagem não se confunde com o de língua. A
Medicina não muda porque seus conceitos e regras estão vertidos no inglês ou no
português. O conhecimento é um só. A linguagem é apenas um sistema específico
de manifestação da língua.
Então, pode-se definir língua como o sistema convencional de signos em
vigor numa determinada comunidade social. É um dos vários instrumentos de
comunicação utilizados por seus membros. Tem aqui a acepção de idioma, como o
português, o inglês, o italiano, etc. Em síntese, a língua é uma forma de
19
comunicação. É uma instituição social, objeto cultura, e se mostra resistente a
tentativas isoladas de modificação pelos indivíduos.
Linguagem é o termo mais abrangente, significando a capacidade de
comunicação do ser humano por intermédio de signos cujo conjunto
sistematizado é a língua.
O sistema jurídico se constitui na linguagem. O direito positivo, como se
verá adiante é um estrato de linguagem que tem como função regular a conduta
do homem em sociedade. Por sua vez, a ciência do Direito é outro estrato de
linguagem, que procura descrever o seu objeto - o direito positivo.
A língua, como sistema de linguagem, tem suas próprias normas, que
procuram, assim, alcançar a uniformidade e a correção no uso das palavras, de
modo a preservar seus significados.
1.2. O termo "direito" e suas diversas acepções
Toda a linguagem que pretenda ser científica necessita passar pelo
processo de elucidação. Assim, as palavras ou as expressões que possuam
diversas acepções devem ser utilizadas com a precisa indicação de seu
significado no contexto. Isso evita problemas inerentes à linguagem natural,
como a ambigüidade ou a falta de nexo entre o texto e o contexto.
Esses problemas, embora não sejam tão graves na linguagem natural,
devem ser evitados num discurso científico, no qual não se admitem
ambigüidades, daí a necessidade de adoção daquele procedimento.
20
As palavras, em princípio, podem ser classificadas em duas classes:
unívocas e plurívocas. À primeira delas pertencem aquelas que possuem um
único significado. Na segunda classe encontram-se as que têm mais de um
significado. Estas últimas, por sua vez, podem ser equívocas, quando seus
significados não condizem uns com os outros, ou análogas, quando os
significados guardam semelhança entre si.
A palavra "direito" é plurívoca, isto é, apresenta uma pluralidade de
sentidos, circunstância que exige a indicação da acepção em que se utiliza o
termo.
Confira-se, a respeito, a lição do Professor MARCUS CUDIO
ACQUAVIVA,
3
verbis:
(...) A palavra direito significaria remotamente, portanto, guiar,
conduzir. Entretanto, se a etimologia da palavra parece ser a que foi
exposta, as acepções da palavra direito variam grandemente. A palavra
direito apresenta acepções várias, embora análogas. O direito pode
ser definido à luz de cada uma das acepções do vocábulo. O
conceito de direito é amplo, e quanto maior for a extensão de um
conceito, menor será sua compreensão. A palavra direito, então, é
uma palavra plurívoco-análoga. Tem uma pluralidade de conceitos
análogos, não unívocos.
Comum é o uso do termo "direito" no sentido de justiça ou como sinônimo
da expressão direito subjetivo. A adjetivação é também artifício regularmente
utilizado para definir em que acepção se utiliza o termo. Assim, fala-se, por
exemplo, em direito natural, em oposição à idéia de direito positivo; direito
objetivo; direito público; direito privado; direito civil; direito constitucional; direito
3
Dicionário Jurídico Brasileiro Acquaviva, p.524.
21
processual civil; direito penal; direito processual penal; direito comercial etc., cada
uma dessas expressões com um significado, um conceito próprio.
4
Enfim, inúmeras são as acepções da palavra "direito", sem importar o uso
do termo, isolado ou composto.
Dentre os significados possíveis, interessa-nos neste momento apenas o
de direito como Direito positivo e como ciência do Direito.
1.3. Direito positivo e ciência do Direito
Direito positivo e ciência do Direito constituem dois sistemas de linguagem
diferentes, duas realidades distintas. E fixar essa distinção é muito importante,
pois somente através dela será possível evitar a confusão de propriedades
inerentes a cada um desses dois sistemas, dificuldade presente na doutrina e na
jurisprudência, e que muitas vezes prejudica a análise do objeto em estudo. Daí, a
arguta advertência de PAULO DE BARROS CARVALHO
5
que assim apresenta as
peculiaridades de cada um desses corpos de linguagem:
Muita diferença existe entre a realidade do direito positivo e a da
Ciência do Direito. São dois mundos que não se confundem, apresentando
peculiaridades tais que nos levam a uma consideração própria e
exclusiva. São dois corpos de linguagem, dois discursos lingüísticos,
cada qual portador de um tipo de organização lógica e de funções
4
Além dos significados de "direito positivo" e de "ciência do direito", o Novo Aulio culo XXI: O
Dicionário da Língua Portuguesa aponta, no verbete "direito", outros inúmeros significados, dentre
eles destacam-se: lado do corpo humano, "4 - que segue sempre a mesma direção; reto, direto; 5.
que não é curvo. 6. Aprumado, ereto; 7. Íntegro, probo, justo, honrado. 8. Leal, franco, sincero... 9.
Aquilo que é justo, reto ou conforme a lei; 10. Faculdade legal de praticar ou deixar de praticar
um ato. 11. Prerrogativa que alguém possui, de exigir de outrem a prática ou abstenção de certos
atos, ou o respeito a situações que lhe aproveitam. 12. Faculdade concedida pela lei; poder legítimo
(...) 19. O lado principal, ou mais perfeito, de um objeto, de um tecido, etc. (em oposição ao avesso)
(...)".
5
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 16ª ed. São Paulo: Saraiva, 2004, pp. 1-
2.
22
semânticas e pragmáticas diversas.
Os autores, de um modo geral, não se têm preocupado devidamente
com as sensíveis e profundas dessemelhanças entre as duas regiões
do conhecimento jurídico, o que explica, até certo ponto, a enorme
confusão de conceitos e a dificuldade em definir qualquer um daqueles
setores sem utilizar notações ou propriedades do outro. São comuns,
nesse sentido, definições de ramos do Direito que começam por
referências ao conjunto de regras jurídicas e terminam com
alusões a princípios e composições que a Ciência desenvolveu a
partir da análise do direito positivo.
É dessa distinção que se cuidará nos dois tópicos seguintes.
1.3.1. O direito positivo como sistema de linguagem
prescritiva
Direito positivo é o conjunto de normas que pautam a vida social de
determinado povo, dentro de certo período de tempo, num dado território.
6
Consiste num corpo de linguagem prescritiva, isto é, numa linguagem
que procura compor o comportamento do homem em determinado grupo social
e, como tal, expressa-se através de signos (sinais gráficos, palavras escritas
ou faladas), cada um deles com determinado significado. O sujeito depara-se
com o signo e produz, em seu intelecto, a respectiva significação, de acordo
com suas influências culturais (sempre com correlação ao significado). Esses são
os vértices do triângulo semiótico (signo, significado e significação).
Signo consiste na unidade de um sistema que permite a comunicação inter-
humana. É um ente que tem status lógico de relação. Nele se associam um suporte
físico, um significado e uma significação.
6
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Vol. I, 13ª ed. Rio de Janeiro: Forense,
23
O suporte físico consiste na própria palavra (falada ou escrita) que como tal,
refere-se a algo do mundo exterior ou interior, que é seu significado e suscita em
nossa mente uma noção, idéia ou conceito, que chamamos de
significação.
Como exemplo, pode-se citar a palavra "papagaio". Quando o receptor se
depara com o suporte físico - no caso, a palavra escrita num texto qualquer, logo
lhe vem à mente a imagem, por associação, de uma determinada ave que ele já
tenha visto ou com a qual tenha convivido. Essa é a significação, ou seja, a
interpretação que o receptor dá ao estímulo que lhe provoca o suporte físico. O
significado, por sua vez, é o conceito fixado no dicionário da respectiva língua para a
palavra "papagaio": "designação comum a várias escies de psitaciformes,
psitacídeos, esp. do gênero Amazona, com 11 espécies brasileiras, às quais, por via
de regra, imitam bem a voz humana".
Essa estrutura não se modifica na linguagem prescritiva, inerente ao direito
positivo. É dos textos de lei (constituição federal, leis complementares, leis
ordinárias, etc.), dos suportes físicos (signos) que o intérprete construirá a
respectiva significação, ou seja, o comando completo de sentido (hipótese -
conseqüência). Esses textos formam enunciados prescritivos, entendidos
como “o produto da atividade psicofísica de enunciação”
7
.
Entretanto, conforme anota o Professor PAULO DE BARROS CARVALHO,
8
os enunciados prescritivos não se confundem com as normas jurídicas. O
1991, p. 6.
7
CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Fundamentos Jurídicos da Incidência. 1ª ed. São
Paulo: Saraiva, 1998, p. 19 ss.
8
CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Fundamentos Jurídicos da Incidência. 1ª ed. São
Paulo: Saraiva, 1998, p. 19 ss.
24
enunciado se apresenta "como um conjunto de fonemas ou de grafemas que,
obedecendo a regras gramaticais de determinado idioma, consubstancia a
mensagem expedida pelo sujeito emissor para ser recebida pelo destinatário, no
contexto da comunicação".
É a partir desses enunciados prescritivos que o intérprete constrói as
proposições (significações) que regulam a conduta humana no seio da sociedade.
Quase sempre, o intérprete, na busca da perfeita recepção dessa
mensagem positivada (norma jurídica), deverá examinar diversos enunciados,
muitas vezes em diplomas bem diferentes daqueles que examina. Portanto, é
comum a construção de uma norma jurídica por meio de diversos enunciados
prescritivos.
Então, a completa captação da norma jurídica pode exigir a
interpretação de vários artigos de um mesmo texto de lei ou de vários
diplomas de diferentes hierarquias.
Esse corpo de linguagem prescritiva - o direito positivo - é regido por uma
lógica própria (a lógica deôntica) e seus enunciados sujeitam-se aos valores de
validade ou não-validade.
É essa linguagem prescritiva que permite ao direito positivo moldar o
comportamento humano no meio social, pois tem como função alterar o
ambiente com o qual se relaciona e, ainda, como destinatário, o homem e sua
conduta dentro da sociedade. Daí a exata afirmação de LOURIVAL
VILANOVA:
9
"Altera-se o mundo físico mediante o trabalho e a tecnologia, que
9
VILANOVA, Lourival. As estruturas lógicas e o sistema do direito positivo, p. 3 ss.
25
a potência em resultados. E altera-se o mundo social mediante a linguagem das
normas, uma classe da qual é a linguagem das normas do Direito".
Isso porque o direito positivo não é o único sistema de normas. Como
exemplo, cite-se a moral, que também regula a conduta humana dentro da ordem
social, mas com operações e características diferentes do sistema judico.
1.3.2. A ciência do Direito como sistema de linguagem descritiva
Nessa linha, norma jurídica pode ser definida como a unidade mínima de
manifestação do direito positivo.
10
É a ordem, o comando, a prescrição em seu
sentido mínimo completo. Ela é estruturada em sua forma lógica em um juízo
hipotético condicional, ou seja, dada determinada hipótese, instala-se a
conseqüência prescrita.
LOURIVAL VILANOVA
11
ensina que "por conhecimento jurídico entende-se
qualquer espécie de saber que se dirija ao direito com pretensão cognoscente".
Daí poder tal conhecimento ser qualificado como histórico, antropológico-social,
sociológico ou filosófico.
Mas a ciência do Direito constitui o conhecimento dogmático. E, nela, o
estudioso, seja ele o jurista, o advogado ou o juiz, deve verificar quais as normas
em vigor que incidem sobre uma determinada categoria de fatos, sem se
importar com as causas históricas ou sociológicas que intervieram na criação do
direito.
E o mesmo autor termina por definir Direito Tributário positivo como "o ramo
10
Paulo de Barros Carvalho, Direito Tributário: Fundamentos Jurídicos da Incidência, p.38.
26
didaticamente autônomo do direito, integrado pelo conjunto das proposições jurídico-
normativas que correspondam, direta ou indiretamente, à instituão, arrecadação e
fiscalização de tributos".
12
Esse conceito demonstra que o eminente mestre, no que é
acompanhado pela melhor doutrina, afasta a autonomia científica desse ramo do
direito.
À ciência do Direito Tributário, por sua vez, compete descrever esse objeto,
formulando proposições declarativas acerca de seus elementos e do modo como
eles se relacionam, por meio da linguagem que lhe é inerente, qual seja, a
linguagem descritiva.
1.4. A norma jurídica
Como já foi dito, a norma jurídica pode ser entendida como a significação
que se obtém da leitura dos textos do direito positivo.
Na estrutura triádica (suporte físico, significado e significação), estudada no
item 3.1, a norma jurídica aparece como produto final daquele processo. O
sujeito receptor, partindo de estímulos produzidos pelo suporte físico (que pode
ser um texto impresso no papel ou uma mensagem sonora, por exemplo), a ele
associa idéias ou conceitos, e, daí, formula um jzo, o qual se revela como uma
proposição. Esse juízo consiste exatamente na norma jurídica.
A norma jurídica tem como objetivo moldar a conduta humana. E a
linguagem prescritiva, como meio transmissor de seu comando, atende à lógica
11
As estruturas lógicas e o sistema do direito positivo, p.22
27
deôntica, que trabalha com os operadores permitido, obrigatório e proibido, os
quais não têm comportamento idêntico ao de seus correspondentes da lógica
acética, quais sejam, possível, necessário e impossível, respectivamente. Nesse
sentido é a lição de ECHAVE, URQUIJO e GUIBOURG
13
a seguir transcrita:
Sin embargo, el comportamiento de los operadores deónticos no es
idêntico al de los correspondientes aléticos. Los operadores `M'
y`N' nos servían para calificar proposiciones que describían
estados de cosas. Vale Ia pena preguntarse quê califican los
operadores deónticos: cuáles son las `cosas' de Ias que decimos
que son obligatorias, permitidas o prohibidas. Hay una respuesta
plausible: son las conductas. De ellas predicamos la obligatoriedad,
Ia permisión o la prohibición.
Asi, a diferencia de los operadores aléticos que afectan a
descripciones de estados de cosas en general, los operadores
deónticos son menos ambiciosos: sólo afectan a descripciones
de ciertos estados de cosas: las conductas o acciones.
Então, numa outra linha de raciocínio, não é exagero definir norma
jurídica como a unidade mínima de manifestação do direito positivo,
consistindo em uma ordem, em um comando diante de determinada hipótese. E aí
se pergunta: a quem é dirigida essa ordem? Na verdade, o ordenamento jurídico
tem um modo próprio de operar. Esse comando fica em estado latente, isto é, a
norma jurídica não consiste numa ordem generalizada, que obrigue a todos,
inadvertidamente. Ninguém é obrigado a obedecer a todos os milhões de normas
jurídicas em vigor em determinado território. Uma pessoa somente terá sua
conduta regrada quando colhida pela hipótese legal, porque toda norma
jurídica tem em sua estrutura três elementos, quais sejam, hipótese,
mandamento e sanção, e "acontecido o fato previsto na hipótese da lei
12
Paulo Barros de Carvalho, Curso de Direito Tributário, p.15.
28
(hipótese legal), o mandamento, que era virtual, passa a ser atual e se torna
atuante, produtivo dos seus efeitos próprios: exigir inexoravelmente (tomar
obrigatórios) certos comportamentos, de determinadas pessoas".
14
Eis aí a estrutura da norma jurídica: "Se A então deve ser B. " Onde "A" é
a hipótese (ou antecedente) e "B" o mandamento (ou conseqüente). Essa
estrutura kelseniana afasta qualquer consideração de valor sobre o dever ser,
retirando-lhe o caráter axiológico e voltando-se à lógica deôndica, em
contraposição à lógica apofântica, de origem aristotélica.
15
Estamos, então,
diante da subsunção do fato à norma, assim descrita por LOURIVAL
VILANOVA:
Ora, a proposição normativa universal que encontramos no Direito
positivo é válida antes de qualquer confirmação empírica no caso
concreto. Ela delineia previamente um conjunto (de sujeitos, fatos ou
atos), cujos elementos devem pertencer ao conjunto se satisfazem
requisitos ou propriedades de antemão estatuídas: "qualquer que
seja o x que tenha a nota P, deve pertencer ao conjunto A". A
proposição normativa universal é válida desde o momento que foi
posta segundo o procedimento (normativamente) estabelecido pelo
sistema jurídico - na lei, em sentido formal ou orgânico, depois da
votação pelo órgão legislativo, e da sanção, promulgação e publicação
pelo órgão executivo.
Formalmente, da universal normativa, por substituição das variáveis
pelas constantes componentes de um universo dado (o conjunto de
sujeitos, fatos e atos), saca-se a proposição normativa individual
(R. Schreiber, Logik dês Rechts, págs. 6770), o que é processo
lógico paralelo ao processo que se emprega nas proposições
indicativas ou descritivas. Mas, no mundo do Direito, a proposição
que recolhe o caso concreto discrepante do tipo normativo é
proposão descritiva de um estado-de-coisas (de conduta que, de fato,
descumpre o juridicamente estatuído); todavia tal proposição descritiva
não pode invalidar proposição deôntica ou prescritiva. A verdade da
proposição empírico-descritiva, não-confirmatória do que deve ser, deixa
intata a validade da proposição universal normativa.
16
13
Delia Teresa Echave; Maria Eugenia Urquijo e Ricardo A. Guiborg, Lógica, Proposición y Norma,
p.120-121.
14
ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência Tributária. 6ª ed. 4ª tir. São Paulo: Malheiros Editores,
2002, p.65.
15
MARQUES, Márcio Severo. Classificação Constitucional dos Tributos. São Paulo: Max Limonad,
2000, p.64.
16
Estruturas Lógicas e Sistemas de Direito, p.60-61.
29
No entanto, tudo depende da combinação de dois fatores: de normas que
tenham tais situações como conteúdo, qualificando-as juridicamente e conferindo-
lhes determinadas conseqüências; e da atuação do intérprete, porquanto "é o
homem que movimenta as estruturas do direito, sacando de normas gerais e
abstratas outras gerais e abstratas, gerais e concretas, individuais e abstratas e
individuais e concretas, para disciplinar juridicamente os comportamentos
intersubjetivos",
17
por meio do processo de positivação, que consiste no avanço
do sistema jurídico em direção ao comportamento das pessoas, desde a edição
de normas gerais e abstratas até as individuais e concretas. Afinal, nas palavras do
Professor PAULO DE BARROS CARVALHO,
18
"não se dará a incidência se não
houver um ser humano fazendo a subsunção e promovendo a implicação que o
preceito normativo determina", porque "as normas não incidem por força própria."
A norma jurídica é, portanto, o resultado de um esquema de
interpretação, pois a qualidade do evento externo ao sistema jurídico somente será
definida, dentro dele, por meio de uma norma do próprio sistema, que o colhe no
ambiente e o importa com um determinado significado objetivo. A propósito, cabe
ressaltar a doutrina de HANS KELSEN:
19
O fato externo que, de conformidade com o seu significado objetivo,
constitui um ato jurídico (lícito ou ilícito), processando-se no espaço e
no tempo, é, por isso mesmo, um evento sensorialmente perceptível,
uma parcela da natureza, determinada, como tal, pela lei da
causalidade. Simplesmente, este evento como tal, como elemento do
sistema da natureza, não constitui objeto de um conhecimento
especificamente jurídico - não é, pura e simplesmente, algo jurídico. O
que transforma este fato num ato jurídico (lícito ou ilícito) não é a sua
17
Paulo de Barros Carvalho, Direito Tributário – Fundamentos Jurídicos da Incidência, p.34.
18
Ibidem, p.9.
19
KELSEN, Hanz. Teoria Pura do Direito. p.4.
30
facticidade, não é o seu ser natural, isto é, o seu ser tal como
determinado pela lei da causalidade e encerrado no sistema da
natureza, mas o sentido objetivo que está ligado a esse ato, a
significação que ele possui. O sentido jurídico específico, a sua
particular significação jurídica, recebe-a o fato em questão por
intermédio de uma norma que a ele se refere com o seu
conteúdo, que lhe empesta a significação jurídica, por forma que o ato
pode ser interpretado segundo esta norma. A norma funciona
como esquema de interpretação. Por outras palavras: o juízo em que
se enuncia que um ato de conduta humana constitui um ato jurídico
(ou antijurídico) é o resultado de uma interpretação específica, a
saber, de uma interpretação normativa.
É a norma jurídica que dá a determinado fato a qualificação de
"jurídico", impingindo ao evento determinada conseqüência. A enchente do
leito de um rio (evento da natureza) num lugar desabitado não traz nenhuma
conseqüência jurídica, porque não há norma qualificando esse fato como
jurídico. É fato externo ao sistema jurídico, sobre o qual não incide nenhuma
norma, tendo em vista que o direito tem como fim moldar condutas humanas.
Contudo, se o mesmo evento ocorrer no leito do Rio Tietê, na cidade
de São Paulo, muitas serão as conseqüências jurídicas, devido a um
determinado número de normas que colhem o fato (que não deixou de ser um
evento da natureza) e o qualificam como jurídico. Desse fato, portanto, pode
advir, por exemplo, a responsabilidade do Estado por eventuais danos aos
proprietários dos imóveis adjacentes ao leito do rio ou a punição de algum
agente público, que porventura tenha se omitido na sua função de prevenir ou
minimizar os efeitos da enchente.
Quando tais fatos podem afetar a vida do ser humano e suas relações,
o Direito, como sistema, reage. O ritmo acelerado da evolução tecnológica que
o mundo tem assistido nos dá inúmeros exemplos disso, basta recordar a
proibição de aparelhos celulares e outros intentos no interior de aeronaves civis
31
durante vôos regulares. Essa norma, ao menos no Brasil, foi editada após a
constatão de que tais aparelhos (assim como outros, que emitem ondas
eletromagnéticas, assim como DVD's portáteis e notebooks) podem interferir nos
instrumentos de navegação de forma acentuada, com a possibilidade, ainda que
remota, de causar graves acidentes aéreos. É o Direito reagindo ao ambiente
externo, no caso, o sistema social.
É importante desde já fixar que o Direito, como sistema, interage com o
ambiente externo (a sociedade), procurando moldar a conduta humana, atribuindo
direitos e conferindo deveres às pessoas de acordo com as necessidades
desse ambiente.
1.4.1. A norma jurídica tributária
A norma jurídica tributária tem a mesma estrutura de qualquer outra norma.
Porém, a sua hipótese vai colher uma classe de fatos e imputar lhes uma
conseqüência específica. É a norma que se qualifica pelo seguinte comando:
entregar determinada importância de dinheiro ao Estado. Mas não só por ele,
como se verá adiante.
No ponto, vale a ressalva feita por GERALDO ATALIBA,
20
in verbis:
É evidente que não identifica a norma tributária o seu comando,
porque outros casos há, de situações não tributárias, em que o
comando é também esse, como em todas as situações em que alguém
lhe cause (ao estado) dano e seja obrigado a indenização; ou de quem
lhe adquire um bem ao serviço contratualmente e deva proceder ao
respectivo pagamento; de quem, por infringir uma disposição legal, se
torne devedor de multa.
20
Hipótese de Incidência Tributária, p.52/53
32
Para ser possível isolar a norma tributária, mister se faz excluir, de um
lado, as situações contratuais, cuja hipótese se perfaz pelo decisivo
concurso da vontade livre das partes e, de outro lado, a sanção por ato
ilícito, configuradora da multa, ou da obrigação de indenizar.
Em suma: se a norma jurídica tem a seguinte estrutura: 1) hipótese, 2)
mandamento, 3) sanção, só é obrigação triburia a que nasce por
força do (2) mandamento. Aquelas obrigações pecuniárias que
decorrem da (3) sanção, não são tributárias.
Da passagem percebe-se, prima facie, a necessidade de se conhecer o
conceito de tributo para clarificar a visualização da norma jurídica tributária.
O tópico seguinte tem como objeto, exatamente, o conceito de tributo
consagrado pelo direito positivo brasileiro.
1.4.2. Conceito de tributo
Esse conceito é fundamental para o nosso estudo, pois com base nele se forma
toda uma gama de conceitos derivados, que ajudam a delimitar o direito tributário e a
defini-lo como o conjunto de normas jurídicas que emulam a tributação.
Em nosso ordenamento, o conceito de tributo é definido implicitamente na
Constituição. Nenhuma lei pode modificá-lo, seja aumentando, seja reduzindo seus
limites. Se o fizer, o legislador infraconstitucional estará extrapolando sua
competência, o que deixará o produto final de seu trabalho - a lei - em confronto direto
com a Constituição Federal.
Entretanto, antes de fixar o conceito, é preciso registrar que a palavra "tributo"
possui diversas acepções no âmbito da língua portuguesa, entre as quais as mais
comuns são as seguintes: a) tributo como prestação pecuniária compulsória devida ao
poder público, sinônimo de imposto; b) tributo como o pagamento que um Estado é
33
forçado a fazer a outro; c) tributo como uma inconveniência ou privação associada a
determinada circunstância (A perda de privacidade é o tributo que se paga à fama.); d)
tributo como homenagem, preito (seus ex-alunos prestaram-lhe um tributo póstumo).
21
A definição da letra "a" é a que mais se aproxima do conceito de tributo no
direito positivo brasileiro. Contudo, várias são as acepções do termo, tanto no âmbito
do ordenamento jurídico pátrio como no da ciência do direito.
O professor PAULO DE BARROS CARVALHO
22
noticia o uso do termo em
seis significações diversas pelos textos do direito positivo, pela doutrina e pela
jurisprudência, são elas: a) tributo como quantia em dinheiro; b) tributo como
prestação correspondente ao dever jurídico; c) tributo como direito subjetivo de
que é titular o sujeito ativo; d) tributo como relação jurídica triburia; e) tributo
como norma jurídica tributária; f) tributo como norma, fato e relação jurídica.
Portanto, o conceito de tributo pode variar, de acordo com a ênfase que o
seu autor dá a cada um daqueles aspectos.
GERALDO ATALIBA,
23
por exemplo, conceitua tributo como "obrigação
jurídica pecuniária, ex lege, que se não constitui em sanção de ato ilícito, cujo
sujeito ativo é uma pessoa pública (ou delegado por lei desta), e cujo sujeito
passivo é alguém nessa situação posto pela vontade da lei, obedecidos os
desígnios constitucionais (explícitos ou implícitos)".
A doutrina predominante não destoa dessa noção, conforme se vê na
definição adotada por LUCIANO AMARO:
24
"Tributo é a prestação pecuniária não
21
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Aurélio Século XXI: o Dicionário da Língua Portuguesa.
3ª ed., ver. e ampl. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999.
22
Curso de Direito Tributário, p.19.
23
Hipótese de Incidência Tributária, p.34.
24
AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 12ª ed., ver. e atual. São Paulo: Saraiva. 2006, p.25.
34
sancionatória de ato ilícito instituída em lei e devida ao Estado ou a entidades não
estatais de fins de interesse público".
1.4.3.Conceito legal de tributo
Além do conceito implícito de tributo presente na Constituição Federal, que
pode ser extraído do conjunto de todas as espécies tributárias nela discriminadas,
existe um outro, explícito, no Código Tributário Nacional, que o define nos
seguintes termos:
Art. 3º - Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda
ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de
ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade
administrativa plenamente vinculada.
Embora a doutrina, de forma geral, lance severas críticas à atitude do
legislador em se ocupar de conceitos jurídicos,
25
afirmando que tal função é
inerente aos juristas e não ao Poder Legislativo, não comungamos, data venia,
desse entendimento.
Primeiramente, deve-se ressaltar que o importante, para o cientista do
25
Confira-se, a título de exemplo, a lição GERALDO ATALIBA: "Evidentemente, não é função de lei
nenhuma formular conceitos teóricos. O art. 3° do C.T.N. é mero precepto didactico, como o
qualificaria o eminente mestre espanhol Sainz de Bujanda. Por outro lado, o conceito de tributo é
constitucional. Nenhuma lei pode alargá-lo, reduzi-lo ou modificá-lo. É que ele é conceito-chave para
demarcação das competências legislativas e balizador do `regime tributário', conjunto de
princípios e regras constitucionais de proteção do contribuinte contra o chamado `poder
tributário', exercido, nas respectivas faixas delimitadas de competências, por União, Estados e
Municípios. Daí o despropósito dessa `definição' legal, cuja admissão é perigosa, por
potencialmente danosa aos direitos constitucionais dos contribuintes. Direitos constitucionalmente
pressupostos ou definidos não podem ser `redefinidos' por lei. Admiti-lo é consentir que as
demarcações constitucionais corram o risco de ter sua eficácia comprometida"(in Hitese de
Incidência Tributária, p. 32). LUCIANO AMARO não destoa dessa idéia, in verbis: "Definir e
classificar os institutos do direito é tarefa da doutrina" (in Direito Tributário, p. 19).
35
direito, é analisar o direito positivo da forma como está posto e, nesse contexto,
desvendar qual o real alcance de um conceito legal dentro do sistema a que
pertence.
Então, o objeto da análise do jurista deve ser a conformação do conceito
legal com o conceito constitucional de tributo. Somente se ele estiver de acordo
com esse último, será válido. E, nesse caso, o legislador infraconstitucional
apenas terá explicitado o conteúdo da norma constitucional, até então implícito.
Além disso, nem sempre todos os elementos de uma norma judica
estão em um mesmo artigo de lei. Como já fixado anteriormente, a norma,
como resultado de uma operação lógica consubstanciada na interpretação,
muitas vezes traduz a combinação de vários dispositivos de lei, de um mesmo
diploma ou de diplomas diversos, sem importar a hierarquia entre eles. Essa,
aliás, é uma das conseqüências de uma visão sistêmica do ordenamento jurídico.
Ao que tudo indica, o art. 3° do Código Tributário Nacional é elemento
essencial à construção da norma jurídica pelo intérprete. É voltado, portanto, num
primeiro plano, ao aplicador da lei, mas também ao legislador ordinário,
que nunca poderá ignorar aquele conceito, muito menos tentar alterá-lo, sob
pena de violar uma norma geral, que somente pode ser modificada por lei
complementar, nos termos do art. 146 da Constituição Federal. No caso,
entendemos que, atualmente, nem mesmo por lei complementar é possível
modificar o conteúdo do artigo em questão, uma vez que ele apenas traduz o
conceito de tributo implícito na Constituição, conforme assevera a doutrina, in
verbis:
O conceito legal, in casu, coincide com o doutrinário, que deve ser
extraído do direito positivo (no caso, o constitucional, já que tributo é
36
conceito constitucional) (...).
26
Desse modo, alterar o art. 3° do Código Tributário Nacional significaria
alterar o próprio conceito de tributo consagrado na Constituição Federal. É
admissível, porém, que, uma vez mantida a mesma estrutura desse conceito,
possa haver alguma modificação, desde que disso não decorra uma idéia de
tributo diversa daquela fixada pela Constituição Federal.
Assim, registre-se a cautela de considerar o conceito legal de tributo
como o vigente em nosso sistema jurídico somente enquanto ele revelar o
real conteúdo da Constituição Federal, porque é nela que ele reside, embora não
esteja explícito no texto.
1.4.4. Normas gerais de direito tributário
O alerta lançado no último parágrafo é importante, pois a própria
Constituição Federal de 1988, em seu art. 146, III, "a", parece desmentir a
conclusão ali esposada, confira-se:
Art. 146. Compete à lei complementar:
III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária,
especialmente sobre:
a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos
impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos
geradores, bases de cálculo e contribuintes; (O destaque não consta do
original).
Realmente, conforme anota o professor ROQUE ANTONIO CARRAZZA,
27
26
Geraldo Ataliba, Hipótese de Incidência Tributária, p. 33.
37
esse artigo parece permitir ao legislador complementar a possibilidade de alterar
os arquétipos
28
dos tributos discriminados na Constituição Federal, e, por
conseqüência, o próprio conceito de tributo.
Entretanto, em nosso sistema jurídico, isso não é possível
29
, apesar de
aparentemente permitido pelo art. 146, III, "a", da Carta Política, como demonstra o
professor já citado, no seguinte trecho, in verbis:
Mas, deixando de lado estas questões menores, que poderíamos
chamar de "redacionais" (e, portanto, superáveis pela interpretação
sistemática), o fato é que, analisando o art. 146, da CF, alguns
estudiosos já proclamaram que, agora, a União, por meio de lei
complementar, pode alterar o rígido esquema de repartição das
compencias triburias das pessoas poticas e, mais do que isto,
pode condicionar a validade de suas leis.
Deveras, a Constituição, em seu art. 146, aparentemente
contradiz o que escrevemos ao longo deste livro. Entendemos,
porém, que tal contradição não é real.
Ab initio, insistimos que a Constituição deve ser interpretada com
vistas largas, justamente para que desapareçam as aparentes
contradições de seus dispositivos, quando considerados em
estado de isolamento. Exige-se, assim, a concordância de cada
um de seus artigos com os princípios informadores, com as
normas estruturais, de nosso ordenamento jurídico. 35
E, adiante, o autor conclui:
27
CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 19ª ed. São Paulo:
Malheiros, 2003, p. 801.
28
Ibidem, p.448.
29
PAULO DE BARROS CARVALHO também tece críticas ao art. 146 da Constituição Federal, nos
seguintes termos: "Não pretendemos exagerar na crítica à sensibilidade do constituinte de 1988, mas
a forma escolhida para verter o comando do art. 146 sacode as estruturas do sistema, mexem com
seus fundamentos e provoca fenda preocupante na racionalidade que ele, sistema, deve ostentar.
Em poucas palavras, preceituou o legislador constitucional que toda a matéria da legislação tributária
está contida no âmbito de competência da lei complementar. Aquilo que não cair na vala explícita da
sua especialidade' caberá, certamente, no domínio da implicitude de sua 'generalidade'. Que
assunto poderia escapar de poderes tão amplos? Eis aí o aplicador do direito novamente atônito!
Pensará: como é excêntrico o legislador da Constituição! Demora-se por delinear, pleno de cuidados,
as faixas de competência da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e, de
entremeio, toma tudo aquilo supérfluo, na medida em que põe nas mãos do legislador
complementar a iniciativa de regrar os mesmos assuntos, fazendo-o pelo gênero ou por algumas
espécies que lhe aprouve consignar, esquecendo-se de que as eleitas, como as demais
espécies, estão contidas no conjunto que representa o gênero" (Curso de Direito Tributário, p. 203).
'' Roque Antonio Carrazza, Curso de Direito Constitucional Tributário, p. 801.
38
Para bem entendermos este art. 146, temos, pois, que partir das
premissas de que o Brasil é uma Federação (art. 1° da CF), em
que os Estados, os Municípios e o Distrito Federal desfrutam de
ampla autonomia político-administrativa (arts. 18, 25, 29, 30 e 32 da
CF), legislando, concorrentemente, inclusive em matéria tributária.
Também não podemos ignorar o art. 24, § 1°, da Lei Suprema, que
permite que a União, "no âmbito da legislação concorrente"
estabeleça normas gerais. Ora, normas gerais são justamente as
que valem para todas as pessoas políticas, aí incluídas a própria
Uno. Nunca normas peculiares, que só valham para os Estados, os
Municípios ou o Distrito Federal.
Observamos que o inc. Ill do art. 146 da CF (cabe à lei
complementar: (...) estabelecer normas gerais em matéria de
legislação tributária, especialmente sobre: a) definição de tributos e de
suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados
nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de
cálculo e contribuintes; (...) não autoriza a lei complementar a modificar
a norma-padrão de "incidência" (a "regra-matriz", o "arquétipo
genérico") dos tributos. De fato, ela foi constitucionalmente traçada e,
por isso mesmo, não poderá ter seus confins alterados pela lei em
foco.
30
E não é possível ao legislador complementar alterar os arquétipos
dos tributos discriminados na Constituão Federal, e, por conseqüência, o
próprio conceito de tributo alí implícito, porque o conteúdo das normas
gerais de Direito Tributário é específico e bem delimitado no texto
constitucional, dividindo-se em duas classes: a) a primeira comporta as
em as dispõem sobre conflitos de competência entre as pessoas políticas
de direito público interno; b) a segunda é composta pelas normas que
regulam as Imitações constitucionais ao poder de tributar.
31
Portanto, o art. 146, III, com suas alíneas, não autoriza o legislador
complementar a redesenhar os tributos insertos na Constituição, alterando
seus contornos até alcançar o ponto de redesenhar o conceito de tributo
consagrado pelo texto constitucional.
30
Ibidem, pp. 804-805.
31
Paulo de Barros Carvalho, Curso de Direito Tributário, p. 210.
39
1.5. O Direito e o seu modo de produção
Antes de prosseguir neste trabalho, deve-se frisar a importância da teoria
desenvolvida por NIKLAS LUHMANN, teórico da segunda metade do culo XX,
sobre a interação entre o sistema do direito positivo e os outros sistemas
sociais.
32
Não é o objetivo deste trabalho enveredar pela teoria dos sistemas, mas
apenas deixar assentadas as principais bases do pensamento de LUHMANN, que,
entendemos, ao lado da teoria positivista de KELSEN, será importante para
nossas futuras conclusões.
Assim, na concepção do professor da Universidade de Bielefeld,
diferenciação social e formação de sistema o as características básicas da
sociedade moderna, o que significa, também, que a teoria dos sistemas e a
teoria da sociedade são mutuamente dependentes. Nesse contexto, a sociedade
não é a soma de todas as interações presentes, mas um sistema de uma ordem
maior, de tipo diferente, determinada pela diferenciação entre sistema e ambiente.
Sustenta, também, que não é possível observar a sociedade de em
ponto externo a ela. A ciência e a sociedade são uma expressão de uma
32
Luhmann teve origem numa família de classe média. Nasceu na Alemanha em 8 de dezembro de
1927. Entre 1946 e 1949 estudou direito em Friburgo, depois ingressou no serviço público e
trabalhou por dez anos como advogado especializado em direto administrativo em Hanover. Em
1962, ganhou uma bolsa de estudos para estudar em Harvard, onde conheceu Talcott
Parsons, o precursor da teoria dos sistemas. Em 1968 foi convidado para lecionar sociologia na
então recémcriada universidade de Bielefeld, onde trabalhou até se aposentar. Apesar de possuir
formação jurídica, seu grande campo de estudo foi a Sociologia. Dentre imeras obras
escreveu A ciência da sociedade; A economia da sociedade; A arte da sociedade, O direito da
sociedade; A política da sociedade; A religião da sociedade; Sistemas sociais: esboço de uma
teoria geral e, ainda, A sociedade da sociedade. As obras citadas são apenas algumas da imensa
contribuição doutrinária do professor de Bielefeld. Interessante notar que, quando indagado acerca de
qual seria seu objeto de pesquisa na Universidade de Bielefeld, sua resposta foi a seguinte: "A teoria da
sociedade moderna. Duração: 30 anos; sem custos". E, realmente, ele não mediu esforços para
cumprir esse objetivo. Afinal, em dezembro de 1998, quando faleceu, sua obra contava com mais de
40
mesma realidade. É aí que sua teoria tece críticas à sociologia clássica do
conhecimento, pois, segundo ele, não existe uma hipotética inteligência livre, que
não está sujeita a nenhuma distorção devido a interesses ou ideologias.
LUHMANN dá um enfoque especial às diferenças. Substitui, assim, o
conceito de sujeito e passa a trabalhar com a distinção sistema/ambiente.
Ele vê a sociedade como um complexo encadeamento de subsistemas,
quais sejam: Religião, Economia, Direito, Política, Educação, etc. E, com o
passar do tempo, outros sistemas vão ganhando autonomia e a sociedade
aumenta, por conseguinte, em complexidade.
Falar de sistemas quer dizer estabelecer uma diferença: aquela entre
sistema e ambiente. E na teoria luhmaniana tudo que não pertence a um
determinado sistema é percebido por esse mesmo sistema como ambiente.
Logo, esse "ambiente" pode ser um outro sistema, diverso do primeiro.
Assevera que a sociedade é constituída por comunicação, e os
subsistemas que a compõem, entre eles o sistema jurídico, tem suas próprias
formas de comunicação, no caso desse último, a norma jurídica.
Ele adota uma metodologia multidisciplinar, o que lhe permite importar
conceitos de outras ciências para explicar sua teoria, como autoreferência e
autopoiesis (este importado da biologia, conforme se verá adiante), e, até mesmo,
conceitos provenientes da cibernética.
Assim, com alto grau de abstração e complexidade, ele desenvolve a teoria
dos sistemas sociais "autopoiéticos". O termo sinalizado pelas aspas empresta
14.000 páginas publicadas, reunidas em mais ou menos 700 publicões traduzidas para o inglês,
41
aos sistemas sociais (entre eles o Direito) o conceito de autopoiésis desenvolvido
pelos biólogos MATURANA e VARELA para o exame dos sistemas biológicos.
33
Na
biologia, esses sistemas são auto-referenciais, ou seja, organizados e reproduzidos
por meio da circulação interna de elementos entes ao próprio sistema. A tese dos
biólogos citados fixa que os sistemas ares possuem todos os elementos
necessários para o desempenho de suas funções fundamentais, inclusive auto-
reprodução. Eles lidam, assim, com um conceito de sistema operativamente
fechado, auto-referencial e autopoiético, mas ao mesmo tempo aberto
cognitivamente, na medida em que interage com o ambiente em que se encontra.
Na teoria de LUHMANN e TEUBNER o direito não funciona de forma diferente
daqueles sistemas, constituindo-se, também, num sistema auto-referencial e
autopoiético,
34
isto é, que se recria todo tempo, por meio de suas próprias
operações, desde que provocado pelo ambiente em que se encontra.
Por ter uma específica forma de operar, o sistema acaba reduzindo a
francês, italiano, japonês, russo, chinês e o português.
33
No ponto, vale observar a lição do professor MARCELO NEVES: "O conceito de autopoiese tem sua
origem na teoria biológica de Maturana e Varela. Etimologicamente, a palavra deriva do grego autos
(`por si próprio') e poiesis ('criação', `produção'). Significa inicialmente que o respectivo sistema é
construído pelos próprios componentes que ele constrói. Definem-se então os sistemas vivos como
máquinas autopoiéticas: uma rede de processos de produção, transformação e destruição de
componentes que, através de suas interações e transformações, regeneram e realizam
continuamente essa mesma rede de processos, constituindo-a como unidade concreta no espaço em
que se encontram, ao especificarem-lhe o domínio topológico de realização. Trata-se, portanto, de
sistemas homeostáticos, caracterizados pelo fechamento na produção e reprodução dos elementos."
(in Entre Têmis e Leviatã: uma relação difícil, p. 60/61).
34
No entanto, é preciso destacar que a concepção luhmanniana de autopoiese não é idêntica à de
Maturana, conforme ensina MARCELO NEVES: "A recepção do conceito de autopoise nas ciências
sociais foi proposta por Luhmann, tendo tido ampla ressonância. A concepção luhmanniana da
autopoiese afasta-se do modelo biológico de Maturana, na medida em que nela se distinguem os
sistemas constituintes de sentido (psíquicos e sociais) dos sistemas não constituintes de sentido
(orgânicos e neurofisiológicos). Na teoria biológica da autopoiese, há, segundo Luhmann, uma
concepção radical do fechamento, visto que, para a produção das relações entre sistema e
ambiente, é exigido um observador fora do sistema, ou seja, um outro sistema. (op. cit. p. 61).
42
complexidade inerente ao ambiente. Mas, embora operativamente fechado, o
sistema troca informações com o ambiente, sofrendo certa influência dele, por
meio de pontes (os chamados acoplamentos estruturais) que, ao mesmo tempo,
separam sistema e ambiente e filtram essa fluência de informações. Isto é, o
sistema sofre irritações do ambiente, mas com base em suas próprias operações a
elas responde, em seu próprio ritmo, adaptando-se a esse ambiente. Em relação ao
ponto, destaque-se a seguinte passagem:
Aliás, foi por virtude de análises propiciadas pela Ciência dos Signos
que os juristas refizeram seus conceitos a propósito do tormentoso
problema do fechamento do sistema. Hoje, a resposta pode ser imediata: o
ordenamento é fechado, em termos sintáticos, mas aberto nos níveis
semântico e pragmático, o que permite comprovação no breve exame de
algumas palavras bem conhecidas, como "adultério", "tributo", "mulher
honesta", "matrimônio" etc., expressões do discurso jurídico que
experimentaram sensíveis alterações semânticas, nos tempos
atuais.
35
Como cada sistema tem sua própria forma de operar, os que implicam
respostas em velocidades diferentes, podem concluir que os sistemas, vistos
isoladamente, possuem o seu próprio "tempo", entendido o termo entre aspas
como a velocidade de processamento das operações internas.
Isso significa que as respostas às informações provenientes do ambiente
podem não ser imediatas, principalmente no que concerne ao direito positivo, que
tem uma forma própria de operar (característica de qualquer sistema), a qual,
normalmente, é lenta nas respostas às informações provenientes do sistema
35
Paulo de Barros Carvalho, IPI - Comentários sobre as Regras Gerais de interpretação da Tabela
NBM/SH (TIPI/TAB) in Revista Dialética de Direito Triburio, n° 12, p. 48.
43
social (composto por seus diversos subsistemas - Potica, Religo,
Economia, etc.).
Como exemplo, temos o Código Civil de 1916, que, apesar do
aumento de complexidade por que passaram as relões nele reguladas,
sobreviveu até o ano de 2002, quando entrou em vigor um novo código. Nesse
sentido, vejamos a lição de PAULO DE BARROS CARVALHO:
36
Há, necessariamente, um intervalo entre a realidade social, constituída
pela linguagem natural, e a realidade jurídica, constituída pela
linguagem do direito positivo. Isso porque esta última se constrói a
partir da primeira, assumindo a feição de uma linguagem de segundo
grau, com rigoroso processo seletivo, seja na absorção dos fatos
que hospeda em suas hipóteses, seja pela ação deôntica de seus
operadores, realizando o código binário lícito/ilícito. O espaço que se
entrepõe é inevitável, consignando-o Pontes na distinção "suporte
físico/suporte jurídico".
Um ordenamento que não preveja certas situações; que contemple
insuficientemente os fatos sociais; não pode pretender realizar os
valores que se propõe. Daí o esforço de atualização das autoridades
legislativas, premidas pela pressão popular, amparadas pela lão dos
doutos, atentas nas manifestações do Poder Judiciário. É o direito
procurando acompanhar, a seu modo, a dinâmica e palpitante
velocidade das mutações sociais, adaptando-se às novas
circunstâncias e mantendo, por esse meio, íntegros seus objetivos
finais.
É curioso notar que o direito positivo, sendo, como é, um subsistema
do sistema social total, mesmo que paralisado no campo da produção
legislativa, equivale a dizer, ainda que suas normas gerais e abstratas
permaneçam imutáveis, sem qualquer atualização de forma, continua
em movimentação, alterando-se no tempo, o quadro de suas
significações.
LUHMANN afirma que o sistema jurídico se auto-reproduz por eventos legais e
só por eventos legais.
37
Não há a possibilidade de o ambiente externo produzir
diretamente o direito. Essa noção não destoa daquela fixada por KELSEN, no
sentido de que uma norma só pertence a uma ordem jurídica porque é
36
Ibidem, p.49.
37
EL Derecho de Ia Sociedad, passim
44
estabelecida em conformidade com uma outra norma dessa mesma ordem
jurídica.
38
Ora, dizer que o sistema jurídico se auto-reproduz ou que somente uma norma
pode gerar outra norma, é a mesma coisa. Eis aí um importante ponto de aproximação
das duas teorias. E isso se dá porque ambas tem como objetivo purificar seus objetos
de análise. Nesse contexto, a autopoiése jurídica não traz grandes inovações
para a ciência do Direito moderna, conforme acentua CRISTIANO
CARVALHO
39
, mas corrobora a idéia positivista de KELSEN, a ela somando
aspectos importantes. No ponto, vejamos o seguinte trecho:
Primero, pues, se hace necesario aclarar quê es lo que debe
observarse (aunque se pretenda investigar las interdependências
entre sistema y entorno). Por operativamente clausurados deben
definirse los sistemas que, para la produccion de sus propias
operaciones, se remiten a la red de sus propias operaciones y
en este sentido se reproducen a sí mismos. Con una
formulación un poco más libre se podría decir: el sistema debe
presuponerse a si mismo, para poner en marcha mediante
operaciones suyas su propia reproducción en el tiempo; o con otras
palabras: el sistema produce operaciones propias anticipando y
recurriendo a operaciones proprias y, de esta manera, determina
quê es lo que pertence al sistema y quê al entorno.
40
Nessa ótica, a evolução dos sistemas jurídicos não é vista como um
produto da interferência direta dos sistemas social e político, o que
equivaleria, para LUHMANN, a uma corrupção do código do ordenamento
38
Teoria Pura do Direito, passim
39
CARVALHO, Cristiano. Teoria do Sistema Jurídico - direito, economia, tributação. 1ª ed. São
Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 132.
40
LUHMANN, Niklas. El Derecho de la Sociedad. Tradução de Javier Torres Nafarrere, com
colaboração de Brunhilde Erker, Silvia Pappe e Luis Felipe Segura. 1ª ed. Em espanhol. Universidad
Iberoamericana, 2002, pp. 99-100.
45
jurídico (lícito/ilícito)
41
, mas apenas resultaria de um estímulo proveniente desses
sistemas.
Contudo, deve-se ter em mente que não são quaisquer interesses sociais
que desencadeiam mudanças no Direito por meio do processo legislativo, mas
apenas aqueles refletidos por pressões sociais provenientes de grupos que se
mostram capazes de influenciar os agentes políticos competentes para atuar
naquele processo.
Logo, através dessa autoprodução o sistema ganha em operacionalidade,
como decorrência de seu fechamento operativo. Isso significa completude,
coerência e precisão internas, traduzindo: ordenamento.
42
A visão do direito como sistema autopoiético é assim sintetizada por
CRISTIANO CARVALHO:
43
O direito é um sistema de comunicação, o que significa: uma
tecnologia que consiste em produção de mensagens imperativas,
com o fim de motivar condutas intersubjetivas, em direção à
consecução de valores consagrados pelo próprio direito.
Luhmann e Teubner afirmam categoricamente a autopoiese do
sistema jurídico. Assim, o sistema jurídico é fechado
operacionalmente, ou normativamente, e aberto cognitivamente, i.e,
aberto às mensagens do ambiente, o que é condição do seu
processo autopoiético.
A conseqüência da autopoiese para o domínio jurídico é a consagração
da sua autonomia sistêmica, em relação aos demais sistemas sociais.
Dessa forma, não se pode falar em manipulação econômica ou política
do direito. Atos econômicos ou atos políticos não fazem atos jurídicos.
O sistema jurídico não tem outputs; a influência dos demais sistemas
não é direta ao sistema judico. Pode, quando muito, "estimular"
modificações neste.
41
Por exemplo, quando o juiz decide a causa, não com base em fundamentos jurídicos, postos
pelo direito positivo, mas por fundamentos fixados em outro sistema. No caso, os fatores econômicos
são fixados como razões de decidir a causa. No entanto, se não houver uma norma qualificando
determinados valores econômicos também como valores jurídicos a sentença traduzirá
verdadeira corrupção de código do sistema jurídico.
42
Celso Fernandes Campilongo, Direito e Democracia, p. 79
43
Teoria do Sistema Jurídico - direito, economia, tributação, p. 130.
46
Nessa esteira, os sistemas se relacionam por meio de irritações
mútuas, que provocam reações dentro de cada um deles, reações
operadas por formas próprias e internas, devido ao fechamento
operacional. Logo, o é possível a um determinado subsistema social atuar
sobre outro sistema, interferindo nele por meio de suas próprias fórmulas sintáticas.
Eis aí a importância do fechamento operativo do sistema, assim explicada por
CELSO FERNANDES CAMPILONGO
44
, verbis:
Por que o fechamento operacional é tão importante para a concepção
luhmaniana de sistema? Porque a unidade do sistema é produzida por
esse fechamento. E quem observa essa unidade? O próprio sistema.
Segundo Luhmann, os problemas de abertura e fechamento do sistema
não podem ser respondidos em termos causais ou a partir do
esquema "input/output". A clássica contraposão entre sistemas
abertos e fechados perde sentido nesse contexto. Fechamento
operacional não é sinônimo de irrelevância do ambiente ou de
isolamento causal. Por isso, paradoxalmente, o fechamento
operativo de um sistema é condição para sua própria abertura.
Conseqüentemente, o direito, como sistema autopoiético, não sofre as
influências de outros sistemas de forma direta, mas sim responde a estímulos
deles, com velocidade e operações próprias.
1.6. A noção do ordenamento jurídico como sistema
De tudo o que foi exposto até agora, dúvidas não existem sobre o fato de que o
direito positivo brasileiro, assim como qualquer outro ordenamento jurídico,
47
constitui um sistema fechado operativamente, qualidade que lhe confere unidade.
Onde há a idéia de direito ou de qualquer outro sistema normativo, desde os
tempos mais remotos da história da civilização, verifica-se a necessidade de os
estudiosos conferirem a tais objetos uma certa ordenação.
No direito positivo, essa noção é fundamental, sob pena de seu conjunto
de normas revelar apenas um amontoado de regras impossíveis de serem
entendidas, de coexistirem ou mesmo de serem aplicadas. Por essa razão, entre
elas sempre deve existir uma relação coerente de coordenação ou subordinação.
Assim, "enquanto conjunto de enunciados prescritivos que se projetam sobre
a região das condutas inter-humanas, o direito posto há de ter em mínimo de
racionalidade para ser recepcionado pelos sujeitos destinatários, circunstância
que lhe garante, desde logo, a condição de sistema."
45
Eis aí a noção de sistema, que pode ser conceituado como "o
,
conjunto
ordenado de elementos que se relacionam entre si, de forma coerente, segundo um
postulado de unidade".
46
Somente a partir dessa idéia é que se toma possível conformar as
incompatibilidades porventura encontradas entre as normas, porquanto, uma
vez vistas como partes de um sistema, elas devem, necessariamente, ser
compatibilizadas. Caso isso não seja possível, em razão da noção de sistema,
uma das normas em conflito (ou até mesmo as duas) deve ser eliminada. Nesse
sentido, vale destacar a lição de MÁRCIO SEVERO MARQUES, in verbis:
44
CAMPILONGO, Celso Fernandes. Política, Sistema Jurídico e Decisão Judicial. 1ª ed. São Paulo: Max
Limonad, 2002, p.67.
45
Paulo de Barros Carvalho, Fundamentos Jurídicos de Incidência, p.39
46
Márcio Severo Marques, Classificação Constitucional dos Tributos, p.23
48
De fato, o ordenamento positivo não deve admitir a incompatibilidade
entre suas normas, por força da coerência ínsita à idéia de
sistema. E essa coerência consiste na inexistência de antinomias
ou, por outro lado, na impossibilidade da coexistência de normas que
sejam entre si incompatíveis. Essa necessidade de coerência, como
ensina o jusfilósofo
47
italiano, decorre de uma norma implícita, em
todo o ordenamento, segundo a qual "duas normas incompatíveis (ou
antinômicas) não podem ser ambas válidas, mas somente uma delas
pode (mas não necessariamente deve) fazer parte do referido
ordenamento; ou, dito de outra forma, a compatibilidade de uma norma
com seu ordenamento (isto é, com todas as outras normas) é condição
necessária para sua validade”.
Revela-se, assim, a coerência, como primeira característica
necessária do ordenamento jurídico ou sistema do direito
positivo. Mas observe-se que esta coerência diz respeito à
necessidade da conformação de uma norma jurídica ao seu
fundamento de validade (harmonia), sem ignorar a possibilidade da
coexistência de normas incompatíveis, de mesma hierarquia.
48
TÉRCIO SAMPAIO FERRAZ JR
49
. define sistema como "um conjunto de
objetos e seus atributos (repertório do sistema), mais as relações entre eles, conforme
certas regras (estrutura do sistema). Os objetos são os componentes do sistema,
especificados pelos seus atributos, e as relações dão o sentido de coesão ao
sistema". E, adiante, sustenta, in verbis:
O sistema normativo judico é do tipo aberto, estando em relação de
importação e exportação de informações com outros sistemas (o dos
conflitos sociais, políticos, religiosos, etc), sendo ele próprio parte do
subsistema jurídico (que não se reduz a normas, mas incorpora outros modos
discursivos).
50
Do excerto percebe-se que o autor comunga da noção do direito positivo como
um sistema em permanente troca de informações com o ambiente, acompanhando,
senão em sua totalidade, pelo menos em parte a teoria desenvolvida por NIKLAS
47
O texto refere-se a Noberto Bobbio.
48
Classificação Constitucional dos Tributos, p. 30
49
FERRAZ JR, Tércio Sampaio. Teoria da Norma Jurídica. 4ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p.
140.
50
Ibidem, p.141.
49
LUHMANN, resumida no item anterior.
No decorrer deste trabalho sempre estará presente a idéia do positivo visto
como um sistema inserido em algo maior (o sistema social), que o engloba,
reagindo às influências advindas desse ambiente externo com operações próprias,
representadas pela criação de normas jurídicas que visam interferir nas condutas
humanas, numa tentativa de conformá-las aos valores tidos pela sociedade, e por isso
consagrados no direito positivo como fundamentais.
50
CAPÍTULO 2
OS TRIBUTOS E SUAS ESPÉCIES
2.1. A classificação constitucional dos tributos
Tormentoso é o debate acerca da classificação constitucional dos tributos. A
doutrina não é uníssona sobre o tema, principalmente porque classificar requer
certa arbitrariedade na escolha dos critérios utilizados pelo estudioso.
51
Não é objeto do presente trabalho dissertar sobre o tema de modo a
tentar defender o acerto de uma determinada classificação em detrimento de
outras. Contudo, é necessário que se acolha uma dentre as diversas
classificações desenvolvidas pela doutrina nacional, pois, no nosso
entendimento, essa escolha interfere em várias conclusões acerca do sistema
tributário atualmente em vigor.
Como é a Constituição Federal que define quais são as espécies
tributárias, é a partir do seu texto que se deve extrair uma classificação. Nesse
ponto não há discórdia entre os doutrinadores nacionais. Daí a alusão comum na
doutrina contemporânea à classificação constitucional dos tributos, porquanto é
51
Luciano AMARO assim aborda a questão: "É óbvio que a eleição de mais de uma variável irá tornar
mais complexo o trabalho de classificação, pois a pluralidade de características utilizadas e formar
múltiplas combinações. Isso faz a classificação depender de certo grau de arbítrio do classificador. Mas o
arbítrio está presente nas várias classificações de tributos apresentadas pela doutrina, uma vez que
cada autor sempre elege (ou seja, `arbitra') uma ou mais caractesticas das diversas figuras para poder
classificá-las" (in Direito Tributário Brasileiro, p. 69)
51
na Carta Magna que se encontram os seus arquétipos.
52
À doutrina cabe, usando de uma linguagem descritiva, tentar desvendar
qual é a classificação adotada por determinado sistema. Assim, cada classificação
varia em razão do objeto sob análise (a ordem jurídica) e dos cririos adotados
pelo estudioso. Assim, "classificar é distribuir em classes; é dividir os termos
segundo a ordem da extensão ou, para dizer de modo mais preciso, é separar
objetos em classes de acordo com as semelhanças que entre eles existam,
mantendo-os em posições fixas e exatamente determinadas com relação às
demais classes".
53
No Brasil a classificação das espécies tributárias ganha importância na
medida em que a forma de Estado adotada pela Constituição é a federativa, porque
"fosse o Brasil um Estado unitário o trabalho de dividir os tributos em espécies e
subespécies seria, provavelmente, inócuo, já que a função de criá-los
pertenceria a um único Órgão Central que, obedecidos alguns poucos
postulados, quase tudo poderia, em matéria de tributação".
54
É a forma federativa de Estado que proporciona a divisão do poder de
tributar, atribuindo, assim, competências tributárias aos diversos entes políticos. Daí
a importância de classificar as diversas espécies de tributos de forma coerente e
útil ao operador do direito, tendo em vista, ainda, a peculiaridade de nossa
federação, na qual, por exemplo, o Município e o Distrito Federal são entes
políticos autônomos e, por isso, recebem da Constituição Federal, juntamente
com os Estados-membros e a União, parcelas do poder de tributar. Afinal, os
52
Roque Antonio Carrazza, Curso de Direito Constitucional Tributário, p. 448.
53
Paulo de Barros Carvalho, in "IPI - Comentários sobre as Regras Gerais de Interpretação da Tabela
NBM/SH (TIPI/TAB)", Revista Dialética de Direito Tributário, n. 12, p. 42 e ss.
54
`Roque Antonio Carrazza, Curso de Direito Constitucional Tributário, p. 458.
52
entes da federação, em razão do atributo da autonomia, deverão,
obviamente, estar munidos de recursos financeiros. Portanto, sobreleva-se
outro ponto que corrobora a importância da exata classificação das espécies
tributária, pois que irá refletir diretamente na repartição de competências.
55
A classificação dos tributos é importante, ainda, na medida em que
cada espécie tributária está submetida a regimes jurídicos diferentes, que
importam também em diferentes efeitos, conforme ensina GERALDO ATALIBA,
56
verbis:
O próprio sistema constitucional adota uma classificação dos tributos e
faz derivarem conseqüências do discernimento que estabelece entre
as espécies e subespécies tributárias. Isto é: o texto constitucional
consagra uma determinada classificação e atribui regimes jurídicos
diferentes a serem aplicados às espécies tributárias. No próprio
texto constitucional eso princípios e regras diferentes, e
peculiares, aplicáveis em exclusividade - e relevantes efeitos - às
diversas escies e subespécies de tributos.
Conforme um tributo se configure como inserto numa ou noutra
categoria, as conseqüências serão diferentes. No Brasil, é de
fundamental importância proceder com rigor na tarefa de identificar as
peculiaridades de cada espécie, porque a rigidez do sistema
constitucional tributário fulmina de nulidade qualquer exação não
obediente rigorosamente aos moldes constitucionais estritos.
Ocorre, porém, que ao analisar o direito posto, a doutrina nacional diverge
acerca da classificação adotada pelo legislador constituinte.
2.1.2. Divergências da doutrina nacional
55
Sobre o tema, vale transcrever as lições de ESTEVÃO HORVATH: "no Brasil, em face da rígida
repartição de competências tributárias, decorrente do princípio federativo, é imprescrindível distinguir-
se as espécies tributárias.
Duas razões principais levam-nos a essa conclusão. A primeira delas deriva da necessidade de se
averiguar a que pessoa política pertence determinada exação tributária. Em segundo lugar, dadas
as características de cada tributo, afirmadas constitucionalmente, dever-se-á buscar saber se
aquele tributo foi validamente instituído, seguindo as diretrizes da Constituição, que funcionam
como forma de verificar a obediência aos direitos fundamentais do cidadão, no caso referentes à
matéria tributária" (in Curso de iniciação em Direito Tributário, p.38
56
Hipótese de Incidência Tributária, p. 124.
53
Apesar de a doutrina coincidir no ponto em que a taxionomia dos tributos deve
ser extraída da Constituição, não é unânime, porém, quanto aos critérios utilizados
e acaba, por fim, construindo classificações diversas quanto às espécies tributárias.
Há, nesse ponto, três grupos que merecem destaque: a) corrente bipartida:
classifica os tributos em vinculados e não-vinculados; b) corrente tricotômica:
segue a tipologia do art. 145, da CF e divide os tributos em impostos, taxas e
contribuições de melhoria; c) corrente quinquipartida (à qual nos filiamos): que
classifica os tributos em cinco classes, quais sejam, impostos, taxas, contribuições
de melhoria, contribuições e empréstimos compulsórios.
A primeira corrente, defendida principalmente por GERALDO ATALIBA,
divide os tributos em duas escies, conforme sejam ou o vinculados à
descrição de uma atuação estatal. Com esse escopo, analisa o aspecto material
da hipótese de incidência da regra matriz. Assim, são tributos vinculados aqueles
cuja hipótese de incidência descreve uma atuação estatal (taxas e contribuições
de melhoria); e não-vinculados aqueles cuja hipótese de incidência descreve um fato
qualquer, que não uma atuação estatal (impostos).
Já os partidários da corrente tripartida ou tricotômica não divergem da
bipartida quanto à existência de tributos vinculados e não vinculados, mas
defendem uma classificação dos tributos com base no artigo 145 da Constituição
Federal. Restringem, pois, as espécies tributárias àquelas previstas nessa norma
constitucional, quais sejam, impostos, taxas e contribuão de melhoria. Para
tanto, assinalam que o constituinte baseou-se no critério de correlacionamento
entre a materialidade da hipótese de incidência e a base de cálculo.
57
57
Pertinente, nesse ponto, as observações traçadas por PAULO DE BARROS CARVALHO: "Não é
54
A esse entendimento filiam-se os professores Paulo de Barros Carvalho,
Roque Antonio Carrazza, Sacha Calmon Navarro Coelho, Aires Fernandino
Barreto, Alfredo Augusto Becker e Rubens Gomes de Sousa.
58
Para a classificação tripartida dos tributos, qualquer outra exação, como,
por exemplo, os empréstimos compulsórios e as diversas modalidades de
contribuições (previstas nos arts. 148, 149 e 195 da CF), podem ser
perfeitamente enquadrados em uma daquelas três espécies, bastando, para
tanto, a análise de suas respectivas hipóteses de incidência e bases de cálculo
Data maxima venia, não comungamos dessa idéia. Na esteira do que
defende JOSÉ EDUARDO SOARES DE MELO
59
, não discordamos que os tributos
têm, como característica básica, serem vinculados ou não vinculados. Afinal,
conforme bem observa ESTEVÃO HORVATH, "o critério da vinculabilidade ou não
do fato tributário a uma atuação do Estado é imprescindível para classificar os
tributos, porém não mais suficiente”
60
. Entendemos, assim, que outros critérios
devem ser utilizados para a classificação das espécies tributárias, todos
encontrados também nas normas constitucionais.
suficiente a descrição hipotética do fato jurídico tributário para que conheçamos a planta
fundamental do tributo. É preciso que examinemos, antes de mais nada por imposição
hierárquica, a base de cálculo, a fim de que a natureza particular do gravame se apresente na
complexidade de seu esquematismo formal. É o que preceitua o constituinte brasileiro no art. 145, §
2°: `As taxas não poderão ter base de cálculo própria de impostos'. E, mais adiante, no art. 154: `A
União poderá instituir: I- mediante lei complementar, impostos não previstos no artigo anterior,
desde que sejam não-cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dos
discriminados nesta Constituição'. (...) faz-se mister analisarmos a hipótese de incidência e a base
de cálculo para que possamos ingressar na intimidade estrutural da figura tributária, não
bastando, para tanto, a singela verificação do fato gerador, como ingenuamente supôs o
legislador do nosso Código Tributário, ao indicar, no art. 4°, que a natureza jurídica específica do
tributo é determinada pelo fato gerador da respectiva obrigação... Por certo, tomada a sentença
(CTN, art. 4°) como verdadeira, não encontraríamos método para diferençar impostos de impostos e
desses as taxas, entregando-nos, imbeles, aos desacertos assíduos do político" (in Curso de
Direito Tributário, pp. 27-29).
58
Márcio Severo Marques, Classificação Constitucional dos Tributos, p. 133.
59
MELO, José Eduardo Soares de. Curso de Direito Tributário. 5ª ed. São Paulo: Dialética, 2004, p.
118.
55
Seguindo essa linha, a parte da doutrina que acolhe a divisão
pentapartida dos tributos leva em conta, além dos critérios supramencionados, o
destino da arrecadação dos tributos e a previsão de restituição do montante
arrecadado ao contribuinte.
E o faz com fulcro na Constituição Federal, que prevê tais
características como integrantes do regime jurídico de outras espécies
tributárias, funcionando como parâmetro válido para o exercício legítimo da
competência tributária.
61
Não se nega, portanto que "a Constituição de 1988, no que se refere à
classificação dos tributos, espelhou-se, basicamente, na classificação proposta
pela Ciência das Finanças
62
. Como já dito, não se vislumbra nenhum equívoco
em se utilizar essa confluência de ciências, afinal, "classificar é necessário, e se
a destinação integra o regime jurídico específico do tributo (ou seja, é um dado
juridicizado), não se pode negar que se trata de um critério (jurídico) hábil à
especificação do tributo, ou seja, idôneo para particularizar uma espécie
tributária, distinta de outras".
63
Comungam dessa idéia os professores Luciano Amaro, Márcio Severo
Marques, José Eduardo Soares de Melo, Estevão Horvath, entre outros.
Essa corrente, portanto, não se fixa unicamente no art. 145 da Carta
Magna, mas também em outros dispositivos do texto constitucional, entre
60
Curso de iniciação em Direito Tributário. p. 38
61
É elucidativo, nesse ponto, o exemplo de LUCIANO AMARO: "Se a União instituir tributo sobre o faturamento
das empresas, sem especificar a destinação exigida pelo art. 195 da Constituição, a exação (ainda que
apelidada de contribuição) será inconstitucional, entre outras possíveis razões pela invasão de competência dos Estados ou
dos Municípios (conforme se trate de faturamento de mercadorias ou de serviços). Outro exemplo: se a União, sem
explicitar na lei (complementar) uma das destinações referidas no art. 148 da Constituição, instituir
empréstimo compulsório, este será inconstitucional" (in Direito Tributário Brasileiro, p. 77-78.).
62
Estevão Horvath, Curso de Iniciação em Direito Tributário, p. 49.
56
eles os artigos 148 e 149. Assim, já se pode perceber que, para a corrente
pentapartida, o empréstimo compulsório e as contribuições, ao lado dos
impostos, taxas e contribuições de melhoria, são também espécies autônomas
de tributos e, como tal, sujeitam-se a específicos e distintos regimes jurídicos.
MÁRCIO SEVERO MARQUES,
64
seguindo essa linha de raciocínio,
fundamenta:
Deveras, a existência de prescrições constitucionais dessa natureza
(determinando a destinação específica para o produto de arrecadação
de determinados tributos e - em determinados casos - a própria
restituição do respectivo montante ao contribuinte), inseridas pelas
próprias normas de estrutura que fundamentam o tributo, exige
meditação a respeito da adoção de novos critérios, a serem
conjugados àquele critério magistralmente exposto e difundido pelo
professor Geraldo Ataliba, para a classificação dos tributos.
65
Dessa sorte, o autor, ao defender a classificação pentapartida dos
tributos, distingue três critérios diferenciadores, todos extraídos do texto da
Constituição
66
:
a) primeiro critério: exigência constitucional de previsão legal de
vinculação entre a materialidade do antecedente normativo e uma atividade
estatal referida ao contribuinte; b) segundo critério: exigência constitucional de
previsão legal de destinação específica para o produto de arrecadação; c)
terceiro critério: exigência constitucional de previsão legal de restituição do
montante arrecadado ao contribuinte, ao cabo de determinado período.
Da conjugação desses três critérios é possível identificar as cinco espécies
tributárias autorizadas no texto constitucional.
63
Luciano Amaro, Direito Tributário Brasileiro, p. 78.
64
Classificação Constitucional dos Tributos, passim
65
Márcio Severo Marques, Classificação Constitucional dos Tributos, p. 219.
66
Ibidem, p. 225.
57
Comungamos desse entendimento, pois as contribuições e os
empréstimos compulsórios têm características tão peculiares, conforme se
demonstrará a seguir, que não se poderia, com a devida vênia, pretender
defini-los ou incluí-los como espécie de imposto ou taxa.
Ora, invocando os questionamentos de ESTEVÃO HORVATH: "Se as
contribuições e os empréstimos compulsórios têm tantas e tão importantes
características que os separam dos impostos, das taxas e das contribuições de
melhoria, por que não reconhecer que são espécies diferentes de tributos? São os
elementos de uma determinada ciência que devem se encaixar numa
classificação ou é a classificação que deve procurar contemplar todos os
elementos existentes?"
67
Nessa mesma linha é a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal,
que, ao julgar o RE n° 146.733/SP,
68
cujo Relator foi o Ministro Moreira
Alves, consignou que cinco são as espécies tributárias previstas em nosso
ordenamento jurídico, verbis:
Sendo, pois, a contribuição instituída pela Lei 7.689/88
67
Comenta, ainda, esse ilustre professor a história do ornitorrinco, em relação ao qual a ciência, ao
descobri-lo, não sabia como o enquadrar nas classificações então existentes, como se a pretender
fingir com que o animal não existisse, em vez de alterar a classificação até então vigente (Curso de
iniciação em Direito Tributário, p. 47).
De fato, não se pode negar a dificuldade dos estudiosos de criarem novos conceitos. Há, por certo, a
tendência de o processo de conhecimento se realizar através da analogia. Reagimos, sempre, por
aproximação. Buscamos o estoque de conteúdo já por nós conhecido, lançando mão de
características semelhantes entre o novo e o anterior e, por aproximação, classificamos o novo a
partir de referências já existentes, muitas vezes alterando a realidade para conseguir, enfim,
enquadrá-lo entre as descrições já disponíveis em nossa cultura. Ora, não se deve temer a fuga de
uma conceituação preestabelecida para criar uma definição própria. Deve-se, sem dúvida,
acrescentar novas características aos conceitos originais ou, então, criar novos conceitos, critérios e
classificações.
68
Acórdão publicado no Diário de Justiça da União, em 06/11/1992
Sobre esse tema interessante conferir a obra de UMBERTO ECO: Kant e o ornitorrinco (Record,
1998).
58
verdadeiramente contribuição social destinada ao financiamento da
seguridade social, com base no inciso 1 do artigo 195 da Carta Magna,
segue-se a questão de saber se essa contribuição tem, ou não, natureza
tributária em face dos preceitos constitucionais em vigor. Perante a
Constituição de 1988, não tenho dúvida em manifestar-me
afirmativamente. De efeito, a par das três modalidades de tributos
(os impostos, as taxas e as contribuições de melhoria) a que se refere o
artigo 145 para declarar que são competentes para instituí-los a
Uno, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, os artigos 148 e
149 aludem a duas outras modalidades tributárias, para cuja
instituição só a União é competente: o empréstimo compulsório e as
contribuições sociais, inclusive as de intervenção no domínio
econômico e de interesse das categorias profissionais e econômicas.
Portanto, a classificação aqui adotada segue não só parte respeitável
da doutrina nacional, como também a jurisprudência assentada pela mais alta Corte
de Justiça do País.
Nos tópicos seguintes, trataremos sucintamente de cada uma dessas
espécies tributárias, que são as únicas previstas por nosso sistema jurídico,
tendo como substrato a classificação pentapartida dos tributos.
2.2. Impostos
Para aqueles que adotam a classificação pentapartida dos tributos, apenas a
identificação de seu fato gerador e da base de cálculo de uma determinada
exação não é suficiente, em muitos casos, para distinguir uma escie triburia
de outra. Nesse caso, outros critérios, conforme visto, são necessários para
definir a natureza jurídica, como, por exemplo, a destinação do produto de sua
59
arrecadação.
69
Sob esse prisma, pode-se, de início, fixar que os impostos constituem
espécie tributária cujo produto da arrecadação, como regra, não está vinculado a
nenhuma destinação específica (como ocorre nas contribuições do art. 149, da
Constituição Federal). Em outras palavras, a receita advinda dos impostos
mantém, embora não exclusivamente, os servosblicos indiviveis, prestados
uti universi (indistintamente a toda coletividade, quer pague impostos ou não).
O enfoque, portanto, é feito sob o ponto de vista econômico tão-somente,
pois importante esclarecer que, juridicamente falando, todos os tipos de tributo têm
a mesma importância.
Assim, são exemplos de comportamentos do contribuinte aptos a ensejar
impostos: auferir renda, vender mercadorias, importar, exportar etc. E de situações
jurídicas: ser proprietário de veículo automotor, ser proprietário de imóvel urbano,
ser herdeiro etc.
É a Constituição Federal que autoriza a tributação sobre esses fatos,
dentre outros, e distribui entre a União, os Estados-membros, os Munipios e o
Distrito Federal, o poder para instituir impostos sobre aqueles comportamentos ou
sobre aquelas situações jurídicas (arts. 153, 155 e 156).
Nota-se que todas as situações previstas na Constituição Federal que
autorizam a lei a adotá-las como hipóteses de incidência dos impostos são
69
É o que ocorre, por exemplo, com alguns impostos em face de determinadas contribuições sociais. Muitas
vezes, não é possível diferenciá-los pela análise isolada de suas hipóteses de incidência e bases de cálculo,
sendo necessário verificar a existência de uma outra norma jurídica que vincule a aplicação do produto
arrecadado com determinada finalidade. É exatamente a presença ou não dessa determinação que irá definir se
a exação em análise consiste num imposto ou numa contribuição.
60
circunstâncias da vida privada, que se limitam à esfera pessoal do contribuinte. A
hipótese de incidência e a base de cálculo dessa espécie de tributo não podem
levar em conta nenhuma atuação do poder público em relação ao contribuinte. É
esse o comando presente na Constituição, segundo os arquétipos de impostos
nela constituídos.
Percebe-se, também, que o conteúdo dessas situações revela sempre a
capacidade econômica das pessoas que as realizam. Conforme asseverado
por GERALDO ATALIBA, "esse fato é indicativo da capacidade contributiva de
alguém que será, precisamente, posto na posição de sujeito passivo"
70
. Tais
fatos, situações, comportamentos ou circunstâncias do sujeito passivo, que
revelam sua capacidade contributiva são denominados, por ALFREDO
AUGUSTO BECKER, fatos-signos presuntivos de riqueza.
A capacidade contributiva, como princípio informador dos impostos, está
consagrada no art. 145, § 1°, da Constituição Federal.
71
O princípio funciona, portanto, como um freio, um limite ao poder de
tributar do Estado, por meio dos impostos, uma vez que não há uma atividade
daquele direta ou indiretamente referida ao contribuinte que possa funcionar de
parâmetro para a fixação do montante das materialidades indicadas pela
Constituição a serem tributadas.
O princípio da capacidade contributiva é também o caminho para que a
70
Geraldo Ataliba, Hipótese de Incidência Tributária, p. 137
71
O art. 145, § 1°, da CF, contém, na verdade, duas normas jurídicas radicalmente distintas,
porque, após consagrar o princípio da capacidade contributiva na graduação dos impostos, dispõe
acerca da administração tributária dispondo ser a ela "facultado (...), especialmente para conferir
efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o
patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte". ROQUE ANTONIO
CARRAZZA aponta a falta de técnica do legislador constituinte que "aglutinou, num mesmo
61
tributação por meio de impostos atenda a outro princípio, de maior
importância em nosso sistema, que é o da isonomia. Extrai-se desse
dispositivo uma norma de justiça fiscal, pois quem tem maior riqueza pode, em
tese, pagar mais impostos.
Nota-se, portanto, o quanto estão ligadas a capacidade contributiva e a
pessoalidade, características que deverão, sempre que possível, ser observadas
pelo legislador quando for descrever as hipóteses de incidência e as bases de cálculo
dos impostos.
Por fim, podemos identificar os impostos fixando que são tributos "em
relação aos quais não há exigência constitucional de previsão legal (i) de
vinculação da materialidade do antecedente normativo ao exercício de uma
atividade estatal referida ao contribuinte, nem tampouco (ii) de destinação
específica para o produto de sua arrecadação, que, pelo contrário, é
expressamente vedada".
72
2.3. Taxas
A taxa é modalidade de tributo que provoca muita divergência entre os
estudiosos. A controvérsia surge logo na sua conceituação, como também em
relação à destinação do produto da arrecadação (se está ou não vinculada ao
custeio da despesa que o Estado tem com a atividade referida ao contribuinte).
Isso ocorre, também, porque o conceito jurídico de taxa sofreu por muitas
vezes a influência da ciência das finanças, na qual ele se confunde com o de
dispositivo, duas normas jurídicas radicalmente distintas" (in Curso de Direito Constitucional
62
preço.
Vale lembrar, de pronto, que as taxas, na qualidade de espécie tributária,
estão sujeitas aos princípios constitucionais que informam a tributação, tais
como a estrita legalidade, igualdade etc
73
.
2.3.1.Conceito de taxa
Na doutrina, encontramos os seguintes conceitos: "Taxa é o tributo
vinculado cuja hipótese de incidência consiste numa atuação estatal direta e
imediatamente referida ao obrigado"
74
(Geraldo Ataliba e Roque Antonio Carrazza);
"Taxas são tributos que se caracterizam por apresentarem, na hipótese da
norma, a descrição de um fato revelador de uma atividade estatal, direta e
especificadamente dirigida ao contribuinte" (Paulo de Barros Carvalho);
75
"Taxa, em síntese, é espécie de tributo cujo fato gerador é o exercício regular
do poder de polícia, ou o serviço público, prestado ou posto à disposição do
contribuinte" (Hugo de Brito Machado),
76
e, por fim,
Tributário, p. 76).
72
Márcio Severo Marques, Classificação Constitucional dos Tributos, p. 167
73
Há quem sustente que o princípio da anterioridade não se adequa ao perfil jurídico das taxas.
Confira-se, a prosito, o escólio de FÁBIO BARBALHO LEITE, sustentando a tese de que é
impraticável a observância desse princípio diante do cânone da retributividade: "Imagine-se,
então, a hipótese de instituição de um novo serviço público pelo legislador ordinário (...) Imagine-se
ainda que este serviço há de ser remunerado. Pergunta-se: a imposição da taxa deverá esperar o
exercício seguinte para se fazer efetiva? Por óbvio, não! Do contrário, ter-se-ia um lapso de
tempo em que o serviço, sendo efetivamente prestado, sairia gratuito, contrariamente à decisão
legislativa. Ou seja: instituído um novo serviço público, específico e divisível, e prevista sua
remuneração, esta (cuja natureza é tributária, uma taxa) incidirá e será exigida desde o início da
implementação da referida atividade" (in Direito Tributário Constitucional, p. 214).
74
Hipótese de Incidência Tributária e Curso de Direito Constitucional Tributário, passim.
75
Curso de Direito Tributário, pp. 38-39
76
Ibidem, p. 362
63
"As taxas são tributos cujo fato gerador é configurado por uma atuação
estatal específica, referível ao contribuinte, que pode consistir; a) no exercício
regular do poder de polícia ou b) na prestação ao contribuinte, ou colocação à
disposição deste, de serviço público específico e divisível" (Luciano Amaro).
77
Como se vê, todas essas definições não destoam em seu núcleo e mantêm
um traço comum: nelas está sempre presente o elemento hipótese de incidência ou
suas expressões equivalentes, quais sejam, 'fato gerador ", "hipótese da norma" etc.
Fixa-se a doutrina na descrição hipotética do fato, para daí delimitar o tributo.
E, por fim, temos a Constituição Federal,que, no que tocante às taxas, alude
à base de cálculo como critério diferenciador, ao menos em relação aos impostos,
quando dispõe que as taxas não poderão ter base de cálculo própria de impostos
(CF, art. 145, § 2°), critério esse não utilizado em relação às contribuições.
78
Portanto, a nosso ver, evidencia-se que o constituinte inseriu a base de cálculo
no arquétipo das taxas.
Quanto ao perfil constitucional das taxas, o art. 145, II, da Constituição
Federal, dispõe, em síntese, que as taxas poderão ser instituídas em razão do
exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de
serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a
sua disposição.
77
Direito Tributário Brasileiro, p. 30
78
As contribuições, por exemplo, são espécie de tributo que podem ter a mesma hipótese de
incidência ou a mesma base de cálculo dos impostos, conforme já decidido pelo STF no RE n°
228.321/RS, relatado pelo Min. Carlos Veloso. Confira-se o seguinte trecho do acórdão: "A
uma, porque, tem-se, no caso, uma contribuição. Quando do julgamento dos RREE
177.137/RS e 165.939/RS, por mim relatados, sustentamos a tese no sentido de que, tratando-
se de contribuição, a Constituição não proíbe a coincidência de sua base de cálculo com a do
imposto, o que é vedado relativamente às taxas" (o destaque não consta do original) (STF -
Plenário - DJ 30/05/2003).
64
Do próprio conceito constitucional de taxa decorre a idéia de que "é preciso
que o Estado faça algo em favor do contribuinte, para dele poder exigir, de
modo válido, esta particular espécie tributária".
79
Isso porque, conforme leciona
MÁRCIO SEVERO MARQUES,
80
o aspecto material da hipótese de incidência das
taxas pode se referir a três fatos distintos: a) utilizar serviços públicos (específicos
e divisíveis); b) tê-los à disposição; c) sujeitar-se ao exercício do poder de
polícia.
É, portanto, a taxa, um tributo vinculado. Als, essa é, embora não seja a
única, uma das diferenças entre essa espécie tributária e os impostos, os
quais não são vinculados a uma atividade específica do Estado. Portanto,
conforme assevera LUCIANO AMARO, "o fato gerador da taxa não é um fato do
contribuinte, mas um fato do Estado. O Estado exerce determinada atividade e,
por isso, cobra a taxa da pessoa a quem aproveita aquela atividade".
81
Então, de acordo com seu aspecto material, as taxas poderão ser (i) taxas
de serviço ou (i i) taxas de polícia.
82
2.3.2. Taxas de serviço
79
Roque Antonio Carrazza, Curso de Direito Constitucional Tributário, p. 469
80
Direito Tributário Brasileiro, p. 31
81
Márcio Severo Marques, Classificação Constitucional dos Tributos, p. 174
82
ROQUE ANTONIO CARRAZZA bem observa que outras modalidades de taxa, encontráveis no
Direito Comparado, são inconstitucionais em nosso País. É o caso da taxa de uso, taxa de obra,
taxa de pavimentação, etc. Assinala, ainda, que, enquanto a Constituição autorizou as pessoas
políticas a criarem taxas de serviço e polícia, por outro lado, proibiu-as de instituir essas outras
modalidades de taxas (in Curso de Direito Constitucional Tributário, p. 477 usque 478).
65
As taxas de serviço são instituídas em razão da utilização
83
efetiva ou
potencial de serviços públicos divisíveis e específicos, prestados ou postos à
disposição do contribuinte.
São exemplos de serviços públicos específicos e divisíveis: o
fornecimento de água, de certidões, de transporte coletivo, de telefone, etc.
Menciona, ainda, o texto constitucional, que a utilização potencial do serviço
também enseja a instituição de taxa. Assim, a cobrança da taxa está autorizada
não só quando o contribuinte efetivamente usufrui do serviço prestado, mas
também quando tem esse serviço à sua disposição, embora não o utilize.
Enfim, a tributação por taxas pode ocorrer pela utilização efetiva de serviços
públicos prestados ao contribuinte (taxa de serviço fruído) ou pela utilização
potencial de serviços postos à sua disposição (taxa de serviço fruível).
84
Ademais, imperioso esclarecer ser obrigatório ao particular o uso de
servos que envolvam o interesse público ou, em outras palavras, é
compulsório porque o seu o-uso pode vir a prejudicar a ordem ou o bem-estar
público.
2.3.3. Taxas de polícia
Extrai-se, também, do conceito constitucional que as taxas poderão ter por
hipótese de incidência o poder de polícia exercido pelo Estado.
83
Vale ressaltar, nesse ponto, a perspicaz observação de FÁBIO BARBALHO LEITE: "Literalmente,
está escrito utilização de serviço público, e não prestação de serviço público, contudo, constituem as
expressões duas formas de referir a mesma realidade, conforme apenas as distintas posições dos
sujeitos na relação fáctica: o contribuinte paga a taxa pela utilização do serviço; o Estado exige a
taxa pela prestação do serviço" (in Direito Tributário Constitucional - Temas 1, p. 181.).
66
Para o Direito Tributário, o conceito de poder de polícia deve ser tomado
de forma estrita, consoante se extrai do art. 78, do Código Tributário Nacional,
que considera poder de polícia "a atividade da administração pública que,
limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato
ou abstenção de fato, em razão de interesse público (...)."
Ora, sendo a taxa tributo vinculado a uma atividade estatal diretamente
dirigida ao contribuinte, já se afasta, de plano, a possibilidade de instituição das
taxas em razão de atos abstratos do Poder Público, não referíveis a um único
indivíduo, quais sejam, edição de leis, decretos ou regulamentos.
As taxas de polícia, portanto, somente poderão ser cobradas em razão de
atos efetivos do Poder Público. "O que enseja tal cobrança é o desempenho
efetivo da atividade dirigida ao administrado".
85
Assim, essas atividades efetivamente desempenhadas pelo Estado podem
consistir em exames, vistorias perícias, verificações, avaliações, cálculos, que
servem de fulcro a concessão de licenças, autorizações, permissões, alvarás
etc.
86
Nesse contexto, a base de cálculo da taxa de polícia terá como limite
quantitativo essas atividades do Estado, necessárias à expedição desses atos
de polícia.
84
Sobre a possibilidade de existir no Brasil a taxa de serviço fruído e a taxa de serviço fruível,
ver: Curso de Direito Constitucional Tributário, ROQUE ANTONIO CARRAZZA,p.475.
85
ROQUE ANTONIO CARRAZZA, Curso de Direito Tributário Constitucional, p. 473
86
O Supremo Tribunal Federal considera como efetivo exercício do poder de polícia a existência de
órgão competente, estruturado, que exerça regularmente a atividade de polícia. É assente, nessa
Corte, o entendimento de que a efetividade do exercício do poder de polícia não depende apenas
da realização de vistorias e diligências locais, dispensando, assim, o método de fiscalização
porta a porta, compreendendo, também, os atos necessários à averiguação da conformação da
atividade desempenhada pelo contribuinte com o interesse público. Nessa linha, a Suprema Corte
julgou constitucionais as taxas municipais de renovação anual de licença para localização e
funcionamento de estabelecimentos comerciais e similares, a taxa de controle e fiscalização
Ambiental (TUA, instituída pela Lei n° 10.165/2000), a taxa de fiscalização dos mercados de
títulos e valores mobiliários (Súmula n° 665/STF), entre outras. Sobre o tema, conferir os seguintes
julgados: RE 115.213, RE 198.904, RE 354.280, RE 416.601 etc.
67
2.4. Contribuição de melhoria
A contribuição de melhoria é tributo vinculado a uma atividade estatal
(realização de uma obra pública que desencadeia a valorização de imóveis
adjacentes). É o meio que a Constituição Federal encontrou para permitir a
transferência, aos cofresblicos, da valorização imobilria causada por obras
públicas.
Portanto, não é um fato qualquer, desvinculado da atuação estatal, que
dá ensejo à contribuição de melhoria. Isso já é suficiente para diferenciá-la dos
impostos.
Além disso, não se confunde com as taxas, apesar de, como aquelas,
pertencer à classe dos tributos vinculados (a uma atuação do Estado). A diferença
entre essas duas espécies tributárias começa na própria divergência entre as
respectivas hipóteses de incidência. Nas taxas, a há é a atividade exercida pelo
Estado referida ao contribuinte. Na contribuição de melhoria, é o beneficio por
ele auferido, em decorrência da atividade - obra pública - realizada pelo Estado.
87
Assim, a obra pública que dê causa a valorização imobiliária não pode dar
origem a uma taxa, mas apenas à contribuição de melhoria. A atuação do
Estado que faz nascer uma taxa pode ser somente a prestação de um servo
público divisível (ou a sua disponibilidade) ou o exercício do poder de
polícia.
Não é o fato de se realizar uma obra pública que dá ensejo à
87
rcio Severo Marques, Classificação Constitucional dos Tributos, p. 184.
68
contribuição de melhoria, mas sim a valorização experimentada no imóvel dela
decorrente. Existe aí, portanto, uma relação de causalidade imprescindível para a
caracterização do tributo.
A grandeza a ser mensurada, como deixa evidente a atual Constituição
Federal, ainda que de forma implícita, é a mais-valia (melhoria) resultante da obra
pública. Assim, somente a obra pública que resulte em valorização imobiliária
pode ensejar a cobrança dessa exação.
Portanto, são características da contribuição de melhoria: "são tributos em
relação aos quais (i) há exigência constitucional de previsão legal de vinculação
da materialidade do antecedente normativo (hipótese tributária) ao exercício de
uma atividade estatal referida ao contribuinte (tributos vinculados, na
linguagem do professor Geraldo Ataliba); e(ü) não há exigência constitucional de
previsão legal de destinação específica para o produto de sua arrecadação".
88
2.5. Empréstimo compulsório
Embora já praticamente sedimentada na doutrina sua índole tributária,
89
muitos doutrinadores não o consideram como uma espécie autônoma de tributo
e preferem incluí-lo numa daquelas três classes do art. 145 (impostos, taxas ou
88
Márcio Severo Marques, Classificação Constitucional dos Tributos, p. 186
89
Confira-se a doutrina de PAULO DE BARROS CARVALHO: "Nunca será demasiado reafirmar a
índole tributária dos empréstimos compulsórios: satisfazem, plenamente, as cláusulas que compõem
a redação do art. 3° do Código Tributário Nacional, tido como expressão eloqüente daquilo que o
próprio sistema jurídico brasileiro entende por `tributo', de nada importando o plus representado pela
necessidade de restituição, ínsita ao conceito de `empréstimo', porque bem sabemos que o nome
atribuído à figura ou o destino que se dê ao produto de arrecadação nada acrescem à natureza
jurídica do tributo (CTN, art. 4°)" (Curso de Direito Tributário, pp. 3233). Nesse mesmo sentido, JO
EDUARDO SOARES DE MELO relembra que "há muito encontra superada a Súmula n° 418 do STF
(`O empréstimo compulsório não é tributo e sua arrecadação não está sujeita à exigência
constitucional da prévia autorização orçamentária') ... Pleno, RE 111.954-3-PR, rel. Min. Oscar
Correa, Sessão de 1°.6.88, unânime, Lex JSTF v. 118, out. 1988, pp.184-205" (Curso de Direito
Tributário, p. 72).
69
contribuição de melhoria), como conseqüência de sua filiação à corrente tripartida
de classificação dos tributos.
Para ilustrar essa idéia, é providencial a lição de PAULO DE BARROS
CARVALH0
90
, ao tratar do empréstimo compulsório, verbis:
Tais exações poderão revestir qualquer das formas que correspondem
às espécies do gênero tributo. Para reconhecê-las como imposto, taxa ou
contribuição de melhoria, basta aplicar o operativo critério constitucional
representado pelo binômio hipótese de incidência/base de cálculo.
Por outro lado, a classificação que adotamos neste trabalho
(pentapartida) não reduz o empréstimo compulsório a uma daquelas três
categorias, pois esse tributo está sujeito a um regime constitucional específico,
diverso de todos os demais, que se referem às outras espécies tributárias
(impostos, taxas, contribuição de melhoria e contribuições). Trata-se, no nosso
ponto de vista, de espécie tributária autônoma, dadas as suas características
peculiares, quais sejam, vinculação do produto arrecadado e restituição do valor
pago ao contribuinte.
A Constituição Federal prevê duas hipóteses distintas que autorizam a
instituição, pela União somente (competência exclusiva), do empréstimo
compulsório: a) para atender a despesas extraordinárias, resultantes de
calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência; b) no caso de
investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional
(atendido o princípio da anterioridade nesta última hipótese).
91
90
Curso de Direito Tributário, p. 33.
91
não se deve esquecer que com a edição do art. 148 da Constituição Federal, restaram revogados
os inciso 1 a III do art. 15 do Código Tributário Nacional que, em obediência à anterior ordem
constitucional, arrolava as situações em que o empréstimo compulsório poderia ser exigido. “De
70
Na verdade, o teor do dispositivo constitucional deixa transparecer que três
são as situações em que pode ser validamente instituído o empréstimo compulsório:
duas contidas no inciso I do art. 148 e uma, no inciso II.
No inciso I temos a previsão do empréstimo compulsório para atender a
despesas extraordinárias, que podem decorrer de calamidade pública ou de guerra
externa (ou sua iminência).
O inciso II cuida da necessidade de se realizar investimento público de
caráter urgente e de relevante interesse nacional. Portanto, além do caráter urgente,
o investimento público deverá ter necessariamente "relevante interesse nacional".
Entendemos que essa previsão deriva da competência exclusiva da União
para a instituição desse tributo. Assim, não cabe a ela - União - instituir o tributo
para atender a interesses regionais ou locais. Para esse fim, a Constituição Federal
consagra outros caminhos.
A Carta Magna, por sua vez, não deixa dúvidas de que se trata de um
tributo restituível. Extrai-se essa idéia da combinação das hipóteses que
autorizam a instituição dessa espécie tributária com o seu próprio nome.
Afinal, o termo "empréstimo", utilizado pelo legislador para compor o
nome desse tributo, já expressa um campo de significação do qual não pode o
intérprete escapar: "operação pela qual uma pessoa obtém de outrem objetos,
bens ou recursos financeiros, sob condição de restituí-los após certo prazo mediante
pagamento de juros ou não".
92
fato, o legislador constituinte de 1988 avocou para si a definição daquelas situações autorizadoras
da exigência tributária” (Arma Emilia Cordelli Alves, Curso de iniciação em Direito Tributário, p. 238)
92
Grande Enciclopédia Larousse Cultural. São Paulo: Nova Cultural, 1995, Vol. 09, p. 2083.
71
Entretanto, desse significado deve-se apenas extrair a idéia de restituição,
pois, conforme ensina ROQUE ANTONIO CARRAZZA,
93
0
empréstimo
compulsório é tributo, não se confundindo com outras figuras jurídicas, como o
mútuo ou o empréstimo público, espécies de contrato, um civil outro
administrativo.
Assim, o empréstimo compulsório não surge de um acordo de vontade,
mas sim da lei complementar instituída pela União.
2.6. Contribuições
Como adeptos da divisão pentapartida dos tributos, entendemos que as
contribuições constituem espécie tributária autônoma. Entretanto, esse tema é rico
em controvérsias, como é usual em todos os temas que se referem à classificação
tributária.
Parte da doutrina afirma serem as contribuições tributos que ora se
apresentam com características de impostos, ora de taxa; mas perfilhamos do
entendimento daqueles outros que defendem ser as contribuições espécie
tributária com características específicas.
Isso porque as contribuições apresentam regime jurídico especial, distinto das
demais espécies tributárias. Conforme analisa JOSÉ EDUARDO SOARES DE
93
Curso de Direito Constitucional Tributário, pp. 505 usque 507.
72
MELO, "a indicação contida na Constituição (art. 145) de que tributos são
"impostos, taxas e contribuição de melhoria", reiterando vetusta disposição do
CTN (art. 5°), por si só é insuficiente para esgotar a questão, uma vez que
também se revestem de natureza tributária as contribuições genéricas (...)
como as contribuições destinadas à 'seguridade social' (...)"
94
Umas das peculiaridades dessa exação é a exigência constitucional de
destinação específica do produto da arrecadação. Ou seja, as leis que instituírem
as contribuições deverão, sob pena de inconstitucionalidade, prever que o
produto arrecadado terá de atender a determinada finalidade. Conforme
assinalado por FABIANA DEL PADRE TOMÉ "embora não vá integrar a regra-
matriz de incidência tributária, a destinação legal do produto arrecadado é
requisito imposto pela norma constitucional de produção normativa tributária, no
que diz respeito à instituição de contribuições. Tal caracter é, portanto,
essencial para identificar a espécie em comento."
95
Essa característica é o traço que distingue as contribuições dos impostos
96
e das contribuições de melhoria. Já no tocante aos empréstimos compulsórios, a
destinação legal do produto arrecadado é uma semelhança que o aproxima das
contribuições, entretanto, com elas não se confunde, em razão da exigência
constitucional (em relação aos empréstimos compulsórios) de previo legal de
restituição do montante arrecadado ao contribuinte, ao fim de determinado período.
Das taxas elas diferem porque não há exigência constitucional de
previsão legal de vinculação direta entre a materialidade do antecedente
94
Curso de Direito Tributário, p. 75
95
Curso de Iniciação em Direito Tributário, p. 189
96
A destinação legal do produto arrecadado é vedada nos impostos, a teor do art. 167, IV, da
Constituição Federal.
73
normativo e uma atividade estatal referida ao contribuinte.
97
Precisa, no ponto, é a lição de LUCIANO AMARO, verbis:
Um terceiro grupo de tributos é composto pelas exações cuja tônica
não está nem no objetivo de custear as funções gerais e indivisíveis
do Estado (como ocorre com os impostos) nem numa utilidade divisível
produzida pelo Estado e fruível pelo indivíduo (como ocorre com os
tributos conhecidos como taxa, pedágio e contribuição de melhoria,
que reunimos no segundo grupo).
A característica peculiar do regime jurídico deste terceiro grupo de
exações está na destinação a determinada atividade, exercitável por
entidade estatal ou paraestatal, ou por entidade não estatal
reconhecida pelo Estado como necessária ou útil à realização de uma
função de interesse público.
98
(Os destaques constam do original)
A divisibilidade da atividade estatal e a sua referibilidade ao
contribuinte são dados acidentais, que podem estar presentes nas
contribuições, mas não as caracterizam, pois, conforme dissemos, o que
realmente as diferencia das demais espécies tributárias é a previsão legal de
destinação específica do produto arrecadado, com a finalidade de custear a
atuação do Estado em determinadas áreas.
Apresentadas, ainda que laconicamente, as principais características das
contribuições, utilizamos a definição de GERALDO ATALIBA como auxílio para
conceituar essa espécie tributária: "Contribuição é o tributo vinculado cuja
hipótese de incidência consiste numa atuação estatal indireta imediatamente
(mediante uma circunstância intermediária) referida ao obrigado."
99
As
contribuições dividem-se em quatro subespécies, "que se distinguem umas das
97
Essa vinculação é indireta, conforme leciona HUGO DE BRITO MACHADO SEGUNDO, verbis:
"Como conclusão do que até aqui foi dito, podemos firmar que as contribuições são espécie
tributária autônoma, que se distingue por visar ao atendimento de uma finalidade
constitucionalmente determinada, ligada ao prestígio de direitos fundamentais de segunda ou
terceira dimensões, e que é exigida de contribuintes situados em grupo relacionado com essa
finalidade, tendo por suporte fático situação também a ela indiretamente vinculada" (in
Contribuições e Federalismo, p. 96 - o destaque não consta do original)
98
Direito Tributário Brasileiro, p. 84
99
Hipótese de Incidência Tributária, p.152
74
outras pela finalidade a cujo atendimento se destinam",
100
todas previstas nos artigos
149 e 149-A, da Constituição Federal: a) contribuições sociais; b) contribuições de
interveão no domínio econômico; c) contribuições de interesse de categorias
profissionais ou econômicas; d) contribuições para o custeio do serviço de iluminação
pública.
2.6.1.Contribuições sociais
As contribuições sociais podem ser divididas, ainda, em duas
subespécies: a) contribuições sociais gerais (CF, art. 149, caput), que se
destinam ao financiamento da atuação do Estado nas áreas de cunho social; b)
contribuições de seguridade social (CF, arts. 149, §1° e 195).
2.6.1.1. Contribuições sociais gerais
Compete exclusivamente à União instituir as contribuições ordem social
(CF, Título VIII), que tem como base o primado do trabalho e como objetivo o
bem-estar e a justiça sociais (CF, art. 193).
O Título VIII da Constituição, que trata da Ordem Social, abrange a
seguridade social (Capítulo II), a educação, a cultura e o desporto (Capítulo III),
a ciência e tecnologia (Capítulo IV), a comunicação social (Capítulo V), o meio
ambiente (Capítulo VI), a família, a criança, o adolescente e o idoso (Capítulo
VII); os índios (Capítulo VIII).
Essas contribuições sociais, previstas no art. 149, caput, da Carta Magna,
100
Direito Tributário Brasileiro, p. 56
75
têm como finalidade custear a atuação do Estado nessas áreas, de forma a
instrumentalizar "a atuação da União (ou dos demais entes públicos, na
específica situação prevista no § 1° do art. 149, renumerado pela EC n. 33/2001,
com a redação da EC n. 41/2003) no setor da ordem social.
101
Exemplo dessa espécie é a contribuição ao salário-educação,
102
prevista
no art. 212, § 5°, da Constituição Federal, como fonte adicional de
financiamento do ensino fundamental público.
103
Entendemos, também, que a esse rol podem ser incluídas as
contribuições destinadas ao custeio de serviços sociais autônomos (SESC,
SESI, SENAI), pois eles atuam nas áreas de educação e aperfeiçoamento
profissional. Além disso, o art. 240 da Constituição Federal dispõe expressamente
que essas contribuições não se destinam à seguridade social.
104
.
, contudo, quem as classifique como contribuições do interesse de
categorias profissionais ou econômicas
105
.
2.6.1.2. Contribuições sociais para o financiamento da
seguridade social
As contribuições de seguridade social, ao lado de outros recursos,
provenientes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios (CF,
101
Ibidem, p. 53
102
SEGUNDO, Hugo de Brito Machado. Contribuições e Federalismo. São Paulo: Dialética, 2005, p. 99.
103
O Supremo Tribunal Federal editou a Súmula n° 732 (aprovada na Sessão Plenária de 26/11/2003 e publicada
no DJ de 09/12/2003), na qual fixa a constitucionalidade da contribuição do salário-educação, nos seguintes
termos: "É constitucional a cobrança da contribuição do salário-educação, seja sob a Carta de 1969, seja sob a
Constituição Federal de 1988, e no regime da Lei 9424/1996".
104
Confira-se o teor do dispositivo citado: "Art. 240. Ficam ressalvadas do disposto o art. 195 as
atuais contribuições compulsórias dos empregadores sobre a folha de salários, destinadas às
entidades privadas de serviço social e de formação profissional vinculadas ao sistema sindical
76
art. 195)
106
, têm como finalidade o financiamento da seguridade social.
107
O art. 149, § 1°, da Carta Magna, autoriza, de forma excepcional, os
Estados, o Distrito Federal e os Municípios a instituírem contribuições de
seguridade social, cobráveis de seus funcionários, para o custeio, em beneficio
destes, de planos de previdência social.
Portanto, em relação às contribuições para o custeio de planos
previdenciários, não há competência exclusiva da União, pois os outros entes da
Federação também podem instituí-las para viabilizar os planos de previdência
de seus funcionários.
Todavia, em relação a todas as outras contribuições sociais, a
compencia é exclusiva. Sobre a seguridade social, é importante notar que o
rol do art. 195 não é exaustivo, diante do disposto no seu § 4°
108
que
permite ao legislador ordinário instituir outras fontes de custeio, seja para
garantir a manutenção dos benefícios ou a própria expansão da seguridade
social, desde que obedecidos os limites do art. 154, 1, da Carta Magna,
conforme leciona
PAULO DE BARROS CARVALHO,
109
verbis:
Apenas as contribuições para a seguridade social encontram, na
105
Roque Antonio Carrazza, Curso de Direito Constitucional Tributário, p. 535
106
Confira-se o texto do caput do art. 195 da Constituição Federal: "A seguridade social será
financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos
provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das
seguintes contribuições sociais".
107
A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes
Públicos e da sociedade, destinados a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à
assistência social. (CF, art. 194).
108
Eis o teor do dispositivo: "Art. 195. (...) § 4°. A lei poderá instituir outras fontes destinadas a
garantir a manutenção ou expansão da seguridade social, obedecido o disposto no art. 154, 1"
109
Curso de Direito Tributário, p. 45.
77
Carta Magna, disciplina exaustiva das suas hipóteses de
incidência, exigindo, para criação de novas materialidades, estrita
observância aos requisitos impostos ao exercício da compencia
residual: instituição mediante lei complementar, não-cumulatividade
e hipótese de incidência e base de cálculo diversos dos discriminados
na Constituição (art. 195, § 4°).
Isso, no entanto, não implica plena liberdade do legislador para
escolher as situações que irão figurar na hipótese da regra-
matriz desses tributos. Como assevera Fabiana Del Padre Tomé, a
análise sistemática do texto constitucional impõe ao legislador
ordinário da União o dever de respeitar a competência atribuída aos
Estados, Distrito Federal e Municípios, bem como os direitos
fundamentais dos contribuintes, erigidos nos princípios
constitucionais em geral e, mais especificamente, nos princípios
constitucionais tributários.
São exemplos de contribuições de seguridade social a COFINS, a
Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL, a Contribuão sobre a
Receita dos Concursos de Prognósticos, a Contribuição sobre a Folha de
Salários devida, tanto pelo empregador como pelo empregado, além da
controvertida CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentações
Financeiras), prevista inicialmente pela Emenda Constitucional n° 12/96, que
acrescentou o art. 74 ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias
110
.
2.6.2. Contribuições de intervenção no domínio econômico
O texto original da Constituição Federal apenas indicava o aspecto
finalístico dessas exações, que é custear a atuação da União no donio
110
A CPMF tinha, inicialmente, o produto de sua arrecadação destinado a financiar as ações e
serviços de saúde, por meio do Fundo Nacional de Saúde, conforme dispunha o art. 74, § 3°, do
ADCT. A atual CPMF, incluída no ADCT, no art. 84, pela EC n° 37/2002, prevê a destinação do produto
de arrecadação não somente para o Fundo Nacional de Saúde, mas o divide entre aquele fundo, o
custeio da previdência social (já previsto pela EC n° 21/99), e o Fundo de Combate e Erradicação
da Pobreza, previsto nos arts. 80 e 81 do ADCT. Apesar de intitulada como "provisória", essa
contribuição tem sido prevista em nosso sistema desde a promulgação da EC n° 12/1996.
Recentemente, a EC n° 42/2003 acrescentou o art. 90 ao ADCT, o qual prorroga a exincia da CPMF
até 31 de dezembro de 2007, com alíquota fixa de trinta e oito centésimos por cento. O§ l° desse
dispositivo prorrogou, também, a vigência da Lei 9.3111/96, que institui e disciplina a cobrança desse
tributo.
78
econômico.
Entretanto, com o advento das Emendas Constitucionais n°s 33/01 e 42/03, a
Constituição passou a estabelecer as materialidades possíveis para a tributação
por meio dessas contribuições, também chamadas pela doutrina de contribuições
interventivas.
A Emenda Constitucional n° 33/O1 acrescentou o § 2° ao art. 149, e o §
ao art. 177, os quais passaram a prever a possibilidade de incincia dessa
subespécie de contribuição na importação de petróleo e seus derivados, gás
natural e seus derivados e álcool combustível. A Emenda Constitucional n°
42/03, novamente, alterou a redação do § 2°, do art. 149, tornando-o mais
abrangente, já que passou a estabelecer a possibilidade de incidência das
contribuições de intervenção no domínio econômico sobre a importação de
produtos estrangeiros ou serviços.
Contudo, apesar da indicação dessas materialidades pelo texto
constitucional, a doutrina tem entendido que "qualquer fato com conteúdo
econômico poderá ser utilizado para integrar o critério material da norma
padrão de incidência das contribuições interventivas".
111
2.6.3.Contribuições corporativas
As contribuições no interesse de categorias profissionais ou econômicas,
também conhecidas por contribuições corporativas, destinam-se ao custeio das
atividades fiscalizadoras e representativas de categorias econômicas ou
111
Matheus Barreto Dantas, As Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico em face da
79
profissionais que exerçam funções legalmente reputadas como de interesse
público.
112
São exemplos dessa categoria as contribuições destinadas aos conselhos
fiscalizadores de profissões regulamentadas (OAB, CREA, CRM, CRO).
113
Há ainda outro exemplo de contribuição corporativa, a contribuição sindical
(art. 8°, inciso IV, in fine, da Constituição Federal), que não deve ser confundida
com a contribuição confederativa, também prevista no mesmo inciso, mas que
sequer é tributo.
A hipótese de incidência dessas exações consiste no exercício, pelo
contribuinte, de determinada atividade profissional ou econômica, "a que se
atrelam as funções (de interesse público) exercidas pela entidade credora das
contribuições (fiscalização, representatividade, defesa de interesses etc.)"
114
2.6.4.Contribuição de iluminação pública
Não vamos adentrar, neste momento, na discussão que assola a doutrina
acerca da constitucionalidade da Emenda Constitucional 39/2002, que, alterando
o texto magno, introduziu essa nova subespécie de contribuição ao ordenamento
jurídico pátrio.
Importa salientar que essa contribuição, de competência do Distrito Federal
e dos Municípios, tem como finalidade específica custear o serviço de iluminação
Emenda Constitucional 42/03, Questões Controvertidas em Matéria Tributária, p. 508.
112
Luciano Amaro, Direito Tributário Brasileiro, p. 55.
113
ALEXANDRINO, Marcelo e PAULO, Vicente. Direito Tributário na Constituição e no STF – Teoria e
Jurisprudência. 11ª ed. Niterói: Impetus, 2006, p.62.
114
Ibidem, mesma página
80
pública.
Sobre o tema, assim se manifesta o Professor PAULO DE BARROS
CARVALHO,
115
verbis:
O constituinte derivado ampliou o rol de competências tributárias, criando
nova modalidade de contribuição. Ao fazer uso dessa faculdade, o
legislador ordinário deverá observar os limites impostos pelo Texto
Supremo, respeitando as materialidades cuja competência para
tributar pertence aos demais entes federativos e observando os princípios
que regem a tributação no ordenamento jurídico brasileiro.
LUCIANO AMARO assevera que iluminação pública "não é serviço a que
pudesse ser atrelada a figura de taxa, dado que não é divisível",
116
daí a
previsão constitucional dessa figura como contribuição, criada no intuito de
propiciar uma nova fonte de receita aos Municípios e ao Distrito Federal para
custear esse serviço.
O produto da arrecadação, por sua vez, está vinculado a uma destinação
específica (custear os serviços de iluminação pública, prestados pelos
Municípios e pelo Distrito Federal), característica, aliás, presente em todas as
contribuições.
A lei ordinária é o instrumento correto para que as pessoas políticas
competentes instituam essa exação, pois a Constituição Federal, em seu art. 146,
III, "a", apenas exige a edição de lei complementar para: "definição de tributos e
de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta
Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes".
115
Curso de Direito Tributário, p. 45
116
Direito Tributário Brasileiro, p. 56
81
CAPÍTULO 3
DO FINANCIAMENTO DA SEGURIDADE SOCIAL
3.1. A Seguridade Social
Não há como se olvidar que a Carta Magna de 1988 pode ser considerada
como garantidora e promotora dos Direitos Sociais, onde encontramos em seu título
VIII, art. 194 caput, o conceito de Seguridade Social. Deste, constatamos que o
direito do cidadão à previdência, saúde e assistência, é a contrapartida mínima que
o Estado deve conferir a todo e qualquer cidadão, sem distinção, uma vez
observados os preceitos legais.
Impossível negar que após o advento da Constituição da República,
sobreveio considerado aumento na expansão da cobertura dos riscos sociais
117
, ou
seja, com o aumento da população atendida e conseqüentemente aumento de
gastos para os integrantes do sistema.
Logo, compreende-se a Seguridade Social ser composta sob a tríade da
Previdência, da Saúde e Assistência Social, cuja organização deve observar os
117
LEITE, João Antônio G. Pereira, explica que: “O risco social se define pela garantia, pela causa e
pelo efeito”, sendo “mais exato definir risco segundo seus efeitos, ou seja, pelo comprometimento do
grupo social, pelo desencadear de conseqüências que se expandem do indivíduo, à família, à
empresa (...)”. In Curso Elementar de Direito Previdenciário, São Paulo, Ed. LTr, 1977, p. 43 e 44.
82
princípios e diretrizes elencados no parágrafo único do artigo 194 da Constituição
Federal.
A saúde, cuja previsão constitucional está sob regramento do artigo 196 da
Constituição Federal de 1988 em apertada síntese, determina que as atividades a
ela concernentes são de relevância pública e sua organização obedecerá aos
princípios e diretrizes do acesso universal e igualitário, do provimento das ações e
dos serviços através de redes regionais, hierarquizadas e integradas por um sistema
único e descentralizado, com atendimento integral, contando ainda com a
participação da iniciativa privada, ou seja, sua execução pode ser feita por
particulares – pessoas físicas ou jurídicas de direito privado.
A Previdência Social possui como objetivo assegurar aos seus beneficiários,
meios indispensáveis de manutenção caso sejam estes afetados por razão de
incapacidade ao trabalho, idade avançada, tempo de contribuição, desemprego
involuntário, encargos familiares, reclusão ou morte. Para tanto, conta com a
estrutura do Instituto Nacional do Seguro Social – autarquia federal que providencia
o cadastramento de seus integrantes e a concessão de benefícios.
Já a assistência social cuida de políticas sociais cujo objetivo é atender as
necessidades básicas do ser humano, através da proteção à família, à maternidade,
à infância, adolescência, idade avançada, das pessoas portadoras de necessidades
especiais, entre outras.
Assim, após delinear o arquétipo da Seguridade Social, a Constituição Cidadã
cuida de traçar o seu esquema de financiamento para consecução dos diversos
83
programas de proteção social nela delimitados. Diante da previsão constitucional
expressa, seguida de todas as suas recentes alterações, inequívoco está o
chamamento de toda a sociedade para o seu financiamento, ou em melhor
expressão, custeio.
Temos assim, o atendimento ao princípio da solidariedade social, que se dá
entre as gerações de sujeitos protegidos e onde encontramos a cooperação dos
particulares com o poder público, interagindo para a busca do bem estar e justiça
social.
3.2. Sistemas de Financiamento da Seguridade Social
Quando um sistema previdenciário é organizado, modelado, um dos pontos
principais a ser definido é o método com o qual será financiado. Não é uma tarefa
simples, visto que há diferentes métodos e resultados a serem obtidos com a
utilização de cada um, no entanto, verifica-se que geralmente o método utilizado é
baseado em razões históricas, culturais e por fim, técnicas.
Podemos conceituar método de financiamento como o arranjo que permitirá a
existência de um fluxo de recursos para fazer face às despesas (com benefícios e
possivelmente com a administração) do sistema, à medida que essas ocorram. Em
outras palavras, refere-se ao mecanismo que determina o valor e a periodicidade
das contribuições ao sistema.
118
118
Matemática atuarial de sistemas da previdência. Brasília: 2002. Pág. 23.
84
Qualquer método de financiamento busca alcançar um equilíbrio entre
receitas e despesas, sem necessariamente igualar as contribuições com as
despesas correntes, que são apenas um dos caminhos para isto.
3. 3. Classificação dos Sistemas de Financiamento
Os sistemas podem ser classificados em contributivos e não contributivos, ou
seja, em relação ao custeio, de acordo com a fonte de arrecadação da receita
necessária ao desempenho da política de proteção social.
3.3.1. Sistema não contributivo
O sistema não contributivo baseia-se não na arrecadação de um tributo
específico, mas sim da destinação de parcela da arrecadação tributária geral, de
modo que os contribuintes do regime não são identificáveis, já que qualquer pessoa
que tenha pagado tributo ao Estado estaria indiretamente contribuindo para a
Previdência Social.
Armando de Oliveira Assis
119
, no texto: Em busca de uma concepção
moderna de "Risco Social", afirma:
“Na aplicação do conceito que vimos defendendo, a condição nele
implícita de participarem do sistema de seguridade social todos os
cidadãos, sem exceção, permitiria, o que seria quiçá mais
apropriado, a adoção de um método de financiamento mais simples.
119
Em busca de uma concepção moderna de "risco social".
85
O esquema se resumiria, enfim, em determinar a percentagem da
produção nacional suficiente a garantir o “padrão mínimo de bem
estar” àqueles que estivessem impossibilitados de consegui-lo por
seu próprio esforço. Abriríamos mão com isso, de cálculos
exaustivos, destinados a encadear de geração a geração o custeio
do seguro social. Afinal de contas, a economia nacional é uma só,
devendo dela participar tanto os ativos como os inativos.”
Verificamos pela citação acima que o autor tem uma visão interessante de um
sistema de financiamento baseado no sistema não-contributivo e que idealiza este
sistema para o Brasil, no entanto, seria esse o sistema mais adequado às nossas
necessidades? Não é o intuito do presente questionamento encontrar solução
pronta, mas sim questionar todos os sistemas para que através destes, possamos
entender os sistemas possíveis, bem como suas vantagens e desvantagens.
3.3.2. Sistemas Contributivos
O sistema contributivo baseia-se na arrecadação de recursos financeiros por
meio de aportes diferenciados dos tributos em geral, sendo que as pessoas
legalmente designadas são obrigadas a contribuir para o sistema. Entre as pessoas
designadas podem estar os beneficiários, e as pessoas naturais ou jurídicas,
pertencentes à sociedade. É, portanto o sistema embasado nas contribuições
sociais.
86
Contribuições sociais são aquelas destinadas exclusivamente a servir de base
financeira para as prestações previdenciárias
120
. No sistema brasileiro, no entanto,
servem também para o financiamento da assistência e saúde pública.
Os sistemas contributivos são divididos em repartição e capitalização em
virtude da forma como os recursos obtidos são utilizados.
3.3.2.1. Sistema de Repartição
No sistema de repartição, as contribuições sociais são destinadas a um fundo
único, do qual são retirados os recursos para a concessão de benefícios a qualquer
beneficiário que esteja amparado pela norma previdenciária, ou seja, a participação
do segurado continua sendo importante, mas a ausência de contribuição em
determinado patamar não lhe retira o direito a benefícios e serviços, salvo nas
hipóteses em que se lhe exige alguma carência.
121
Podemos afirmar que tal sistema se baseia no ideal da solidariedade, em que
cabe à geração atual de trabalhadores em atividade garantir o pagamento dos
benefícios dos atuais inativos, algo lançado no plano Beveridge (Inglaterra) e
utilizado até hoje na maior parte dos sistemas previdenciários do mundo.
A jurista Célia Ópice Carbone
122
, afirma que:
120
Direito previdenciário brasileiro. Rio de Janeiro: 1997. Pág. 240.
121
Manual de Direito Previdenciário. São Paulo: 2002. Pág. 43.
122
Seguridade Social no Brasil: ficção ou realidade? São Paulo : Atlas, 1994. pág.114-115
87
“...o financiamento por cotização foi e ainda é a técnica mais
utilizada para as prestações em espécie, coexistindo com uma
tendência de crescimento de outras fontes de recursos, como é o
caso dos impostos e taxas utilizados no financiamento das
prestações familiares, assistência médica e pensões para categorias
não cobertas pelo sistema de seguro, havendo também, na maioria
destes países, aportes do Estado através do Orçamento Geral.
Em decorrência da própria evolução do regime da Seguridade Social
nos países industrializados, houve uma mudança no peso relativo da
contribuição imposta aos assalariados, sendo que depois da II
Guerra Mundial, vários países progressivamente foram suprimindo a
cotização do assalariado e a carga correspondente foi sendo
transferida, ao menos em parte, para o empregador. Ao mesmo
tempo que certos tipos de benefícios continuaram sendo
tradicionalmente financiados sem a contribuição do trabalhador
assalariado como é o caso das prestações relativas ao acidente de
trabalho e doença profissional e nestes casos o ônus é dos
empregadores. No caso dos benefícios familiares, continuaram a ser
financiados pelos empregadores e o poder público conjuntamente;
enquanto outros tipos de benefícios para a maioria destes países e
regimes, uma vez que são caracterizados como demanda dos
trabalhadores, como por exemplo as pensões e auxílios-doença,
maternidade e desemprego, constatou-se que no nível geral a
cotização do empregador tendeu a ser progressivamente maior que
a do trabalhador.”
Assim, verifica-se que a repartição dos encargos entre empregador e
empregado passou a ter uma importância relativa e em certos países chegou a
regredir dando lugar a novas formas de financiamento, no entanto, para o conjunto
de países que adotaram o modelo alemão, ainda é forte tal influência no
financiamento do seguros sociais, sendo que as cotizações profissionais nesses
países ainda têm um papel preponderante.
3.3.2.2. Sistema de Capitalização
88
Neste tipo de sistema, há normas que estabelecem como contribuição social,
a cotização de cada indivíduo, não como vimos acima na repartição, mas de modo
que a contribuição individual, ou coletiva de um determinado grupo de indivíduos,
tenha lastro suficiente para cobrir as necessidades previdenciárias dos seus
integrantes. É o modelo adotado nos planos individuais de previdência privada.
Neste sistema, a participação do Estado é mínima, e a do empregador vai
variar de acordo com a normatização de cada sistema, o essencial é que a
contribuição do próprio segurado, deverá cumprir o número de cotas ou o valor
estabelecido para garantir a proteção pelo sistema para si e seus dependentes.
Assim, conceituamos o regime de capitalização como sendo aquele
sustentado num sistema de cobertura de riscos presentes e futuros, mediante a
constituição de reservas financeiras e ou investimentos de qualquer natureza,
decorrentes das contribuições dos empregados, dos empregadores e do Estado, de
tal sorte que o bolo formado ao longo do tempo produza rendimentos,
compatibilizando os princípios da maior rentabilidade e do menor risco, capazes de
sustentar os benefícios prometidos.
123
3.3.2.3. Sistema Misto
O sistema misto caracteriza-se por ser baseado em parte com o produto do
capital investido e a outra com o resultado das contribuições correntes.
123
A Previdência Social do Regime Geral na Constituição Brasileira. São Paulo: 2001. Pág. 110/111.
89
Portanto, forçoso concluir no presente estudo a existência de dois tipos de
sistemas previdenciários, os contributivos e os não contributivos. Os sistemas mais
comumente utilizados são os contributivos, que se basearam no modelo de
financiamento alemão e inglês.
No Brasil, vigora o sistema contributivo de repartição, financiado por toda a
sociedade e pelo Estado, baseando-se no ideal de solidariedade.
O aumento da expectativa de vida gera um aumento de custo imediato para
este sistema de financiamento, sendo que no Brasil, uma das medidas adotadas
para melhorar essa questão foi a adoção do fator previdenciário
124
como
componente do cálculo para o benefício da aposentadoria.
Após este breve estudo, conclui-se que o regime misto pode ser considerado
como o mais adequado para o nosso sistema, isto porque compatibiliza a
estabilidade da capitalização com a imediatidade da repartição, no entanto, nossa
Constituição prevê o regime de repartição como em vigor no país, visto ser o Brasil
um país carente de recursos e que deve prezar então pela solidariedade social.
124
O Fator previdenciário foi instituído pela Lei n.° 9876/99, trata-se de fórmula que leva em conta a
idade, a expectativa de sobrevida e o tempo de contribuição de um segurado, através da qual
podemos calcular o valor do benefício a ser recebido quando da solicitação da aposentadoria.
90
Um importante passo é o princípio da diversidade da base de financiamento,
que prevê não apenas um tipo de contribuição, mas diversos tipos, proporcionando
um melhor aproveitamento da arrecadação e um avanço no futuro do
financiamento, visto que o mercado informal hoje responde por mais da metade
dos trabalhadores no país. Algo importante é buscar meios que simplifiquem e
desburocratizem as contribuições da previdência.
A fiscalização também deve ser reforçada com vistas a diminuir as fraudes
existentes e com isso aumentar a receita orçamentária da seguridade social.
Impondo medidas eficazes e diminuindo desvios de recursos podemos crer
que a Seguridade Social ainda tem solução, necessita apenas de modernização e
adequação ao presente e futuro, o que deve ocorrer sempre em todos os ramos do
direito, visto que a sociedade evolui e se modifica e assim também deve ser o
direito.
3.4. Do Regime de Financiamento da Seguridade Social
No financiamento da seguridade social brasileira, verifica-se continuar
presente resquícios do esquema de financiamento fundado na técnica do seguro,
instituído por Otto Von Bismarck na Alemanha, onde respondem pelo custeio do
91
programa, os trabalhadores, as empresas e o Estado, correspondendo esta
modalidade de financiamento à conhecida forma tríplice ou tripartite de custeio.
3.4.1. Base legal
A Constituição Federal traz em seu artigo 195, as definições básicas acerca
do financiamento da seguridade social, conforme transcrito abaixo:
“Art. 195 - A seguridade social será financiada por toda a sociedade,
de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos
provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:
I - do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na
forma da lei, incidentes sobre: (Alterado pela EC-000.020-1998)
a) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou
creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço,
mesmo sem vínculo empregatício;
b) a receita ou o faturamento;
c) o lucro;
II - do trabalhador e dos demais segurados da previdência social,
não incidindo contribuição sobre aposentadoria e pensão
concedidas pelo regime geral de previdência social de que trata o
Art. 201; (Alterado pela EC-000.020-1998)
III - sobre a receita de concursos de prognósticos;
IV - do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei
a ele equiparar. (Alterado pela EC-000.042-2003)”.
Na legislação ordinária, a Lei n.° 8212/91, dispõe a respeito do financiamento:
“Art. 10. A Seguridade Social será financiada por toda
sociedade, de forma direta e indireta, nos termos do Art. 195
da Constituição Federal e desta Lei, mediante recursos
provenientes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos
Municípios e de contribuições sociais.
Art. 11. No âmbito federal, o orçamento da Seguridade Social
é composto das seguintes receitas:
92
I - receitas da União;
II - receitas das contribuições sociais;
III - receitas de outras fontes.
Parágrafo único. Constituem contribuições sociais:
a) as das empresas, incidentes sobre a remuneração paga ou
creditada aos segurados a seu serviço;
b) as dos empregadores domésticos;
c) as dos trabalhadores, incidentes sobre o seu salário-de-
contribuição;
d) as das empresas, incidentes sobre faturamento e lucro;
e) as incidentes sobre a receita de concursos de
prognósticos.”
Desta forma, observamos que o legislador clama a participação de toda a
sociedade, quer de forma direta ou indireta para a colaboração no custeio da
Seguridade Social, conforme a seguir melhor será explicitado.
3.4.2. O Regime do Sistema de Financiamento Brasileiro
O sistema de financiamento brasileiro se dá pelo regime contributivo de
repartição genericamente, ou seja, encontramos o governo e toda a sociedade,
contribuindo para o Sistema, ressaltando ainda que outras fontes de custeio poderão
ser criadas (art. 154, I, CF/88).
Este sistema conta com contribuições individuais vertidas para um único
fundo, diferente do sistema não contributivo, no qual os recursos necessários são
retirados diretamente do orçamento do Estado, que obtém receita através da
arrecadação de recursos.
O modelo brasileiro caracteriza-se pela responsabilidade de todos na
proteção de todos, sendo a sociedade responsável pelo custeio do sistema e
cobertura da assistência aos desamparados.
93
Cabe salientar ainda que o sistema brasileiro preveja a compulsoriedade da
contribuição, porém estes podem sim os contribuintes estar isentos ou optarem,
quando a lei assim permitir, por uma contribuição menor ou maior.
Segundo dispõe a Constituição Federal acrescida da Lei n.° 8212/91 que
dispõe sobre e o Plano de Custeio, a Seguridade será financiada por toda a
sociedade, de forma direta, que são as contribuições sociais (dos trabalhadores,
das empresas, dos empregadores domésticos e as incidentes sobre a receita de
concurso de prognósticos) e forma indireta (recursos oriundos do poder público), e
outras fontes (art. 27 da Lei n.° 8212/91).
Atualmente, as contribuições sociais são arrecadadas pela Secretaria da
Receita Federal do Brasil – Lei n.°11.457de 16.03.2007, fruto das reformas
administrativas iniciadas em governos anteriores, tem-se visto uma busca frenética
pela maior eficiência da Administração Pública, a ponto do tema ser transmudado
em princípio constitucional pela Emenda n.º 19/98.
Neste contexto, assume especial relevância a unificação do fisco federal,
eliminando-se as redundâncias administrativas e permitindo um agir conjunto na
busca da plena garantia da arrecadação federal. Daí a importância do tema proposto
– a criação da “Super Receita”, como tem sido chamada pelos meios de
comunicação social a Secretaria da Receita Federal do Brasil, originária da fusão
das Secretarias de Receita Federal e Receita Previdenciária.
94
A distribuição dos recursos entre os três setores (saúde, previdência e
assistência social), depende de um planejamento, que consiste no Plano Plurianual
de Investimentos, e na Lei de Diretrizes Orçamentárias, que nada mais é do que
“plano plurianual da seguridade social, desdobrado ano a ano”.
Portanto, o modelo do regime financeiro do sistema de seguridade social
brasileiro é o do seguro social, de solidariedade entre gerações.
Almansa Pastor
125
define o seguro social como seguro obrigatório, de origem
legal, geridos por entes públicos, e destinados especificamente a proteger
necessidades sociais derivadas de risco que afetam os indivíduos determinados
legalmente.
Ao seguro social aplicam-se as regras do seguro privado (existe a figura do
segurador que visa lucro, premio é único, mesmo que parcelado e única também é a
reparação) e do mutualismo (a clientela é pré-definida, o premio é sucessivo, a
reparação se dá através de prestações e não existe a figura do segurador e nem
lucro, pois a finalidade é social, é fundamental a contribuição), porém, em razão da
amplitude da cobertura e do atendimento, socorre-se de contribuições do Estado e
das empresas.
125
ALMANSA PASTOR, Jose Manuel. Derecho de la Seguridad Social. 2. ed. Madrid: Ed. Tecnos,
1977. p. 111-112.
95
Assim, por se tratar de um seguro, é evidente a necessidade de equilíbrio
financeiro e atuarial, expressamente mencionado no texto constitucional, trazido pela
Emenda Constitucional n°. 20, de 15/12/98, art. 201, caput.
Por equilíbrio financeiro entende-se literalmente a idéia de que receita seja
suficiente para garantir as obrigações assumidas; por equilíbrio atuarial,
compreende-se as idéias matemáticas (taxa de contribuição, experiência de risco,
expectativa de média de vida, tábuas biométricas, margem de erro, variações etc.) e
as relações biométricas, para se fazer uma estimativa das obrigações em face do
comportamento da massa e o nível de contribuição e do beneficio.
O Plano de Custeio da Seguridade Social, Lei n.° 8.212/91, em seu artigo 96
traz expressa a determinação quanto a necessidade de se buscar o equilíbrio
técnico financeiro, ao determinar que: “O Poder Executivo enviará ao Congresso
Nacional, anualmente, acompanhando a proposta Orçamentária da Seguridade
Social, projeções atuariais relativas à Seguridade Social, abrangendo um horizonte
temporal de, no mínimo, 20 (vinte) anos, considerando hipóteses alternativas quanto
às variáveis demográficas, econômicas e institucionais relevantes.
3.5 Diretrizes do Regime Financeiro
3.5.1 Contribuições Sociais – Receitas
96
A Emenda Constitucional n°. 20, de 1998, acrescentou ao elenco das fontes
de custeio, ao lado daquele controvertido vocábulo "faturamento" o termo "receita" e
ampliou a incidência sobre a remuneração que, em razão da interpretação restritiva
da expressão "folha de salários" tivera reduzida sua importância.
Há cunho doutrinário no preceito didático que vinha estampada no antigo
Regulamento do Regime da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n.° 72.771,
de setembro de 1973, cuja definição precisa de Plano de Custeio se acha grafada
nestes termos:
Art.273 - O Plano de Custeio consistirá em um conteúdo de normas
e previsões de despesas e receitas estabelecidas com base em
avaliações atuariais e destinadas à planificação econômica do
regime e seu conseqüente equilíbrio técnico-financeiro.
Há dupla dimensão na diretriz em estudo. Tanto se pode falar na diversidade
objetiva (atinente aos fatos sobre os quais incidirão as contribuições) quanto em
diversidade subjetiva (relativa a pessoas naturais ou jurídicas chamadas a verter
contribuições sociais).
Conforme já discorrido, a Constituição Federal, em seu artigo 195
estabeleceu as fontes de custeio da seguridade, que, pela amplitude do sistema,
certamente serão insuficientes no futuro, razão pela qual o constituinte já possibilitou
a ampliação dessas fontes de financiamento - parágrafo 4º
126
, impondo, porém, a
limitação do art. 154, I, da CF.
126
Art. 195 § 4º CF/88 - A lei poderá instituir outras fontes destinadas a garantir a manutenção ou a
expansão da seguridade, obedecido o disposto no artigo 154, I.”
97
Logo, conclui-se que o esquema engendrado pelo legislador é
suficientemente amplo para admitir variadas formas de participação no custeio.
Diante do acima exposto, temos que o Orçamento da Seguridade Social tem
receita própria que não se confunde com a receita tributaria federal, vide §1º do art.
195 da CF/88. Elas são destinadas exclusivamente para as prestações da
Seguridade Social nas áreas da Saúde Pública, Previdência Social e Assistência
Social, obedecida a Lei de Diretrizes Orçamentárias – LDO.
Apesar da existência de receita própria com destinação especifica, ainda
assim, o legislador possibilitou o desvio de parte da receita para outras finalidades.
É o que dispõe o art. 17 da Lei n.° 8.212/91 que permite que as contribuições
das empresas incidentes sobre o faturamento e o lucro (art. 11, parágrafo único,
alínea d), possam ser utilizadas para pagamento dos encargos previdenciários da
União, e, também para financiamento das despesas com pessoal e administração
geral do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS.
E, antes da Emenda Constitucional n.° 20 de 1998, também poderiam ser
incluídas neste rol, as contribuições incidentes sobre a folha de salários e pagas
pelos trabalhadores.
Visando “estancar esta sangria da seguridade”, a referida emenda
acrescentou o inciso XI ao art. 167, vedando a utilização das contribuições sociais
98
oriundas da folha de salário e da contribuição do trabalhador, para outro fim que não
seja o pagamento de benefícios.
As contribuições sociais estão elencadas nos Capítulos II a VIII, artigos 16 a
27, da Lei n.° 8212/91, e sinteticamente, são as seguintes:
a) Contribuição da União;
b) Contribuição dos Segurados – empregado, empregado doméstico,
trabalhador avulso, contribuinte individual e facultativo;
c) Contribuição da Empresa;
d) Contribuição do Produtor Rural e do Pescador;
e) Contribuição sobre a receita de Concursos de Prognósticos;
f) Outras receitas constituídas através das (I) multas, atualização monetária
e os juros moratórios; (II) remuneração recebida por serviços de
arrecadação, fiscalização e cobrança prestados a terceiros; (III) receitas
provenientes de prestação de outros serviços e de fornecimento ou
arrendamento de bens; (IV) demais receitas patrimoniais, industriais e
financeiras; (V) 50% (cinqüenta por cento) dos valores obtidos em
decorrência da apreensão efetuada por tráfico ilícito de entorpecentes e
drogas; (VI) 40% do resultado dos leilões dos bens apreendidos pelo
Departamento da Receita Federal – atual Secretaria da Receita Federal do
Brasil; (VII) outras receitas previstas em legislação específica e por fim,
(VIII) o repasse de 50% (cinqüenta por cento) do valor do prêmio recolhido
pelas companhias seguradoras que mantêm o seguro obrigatório de danos
pessoais causados por veículos automotores de vias terrestres.
99
3.6 . Princípios relativos ao custeio da Seguridade Social
Toda legislação pertinente à Seguridade Social deve ser interpretada segundo
a perspectiva construída pelos princípios, valores e diretrizes fixados pela Carta
Magna, sendo estas, a base do sistema jurídico, e revelam a finalidade a ser
perseguida pelos aplicadores da lei.
Pode-se dizer então, que afrontar um princípio é atacar todo o sistema
previamente constituído.
E assim temos como princípios que atendem ao custeio da Seguridade
Social, os princípios da equidade na forma da participação no custeio, e a
diversidade da base de financiamento.
3.6.1. Equidade na participação no custeio
Diz o referido preceito que esta participação deve ser eqüitativa entre os
contribuintes, na conformidade da respectiva posição em que ocupam na sociedade,
clama pela isonomia entre os contribuintes, onde a capacidade econômica de cada
contribuinte deve ser um fator determinante da sua contribuição. Exige por exemplo,
que quanto maior o risco social da atividade do contribuinte, maior deve ser o seu
encargo para o financiamento da Seguridade Social.
100
Equidade pode ser entendida pelo valor da igualdade, porém preservando a
diferença existente entre os sujeitos de uma determinada coletividade, no presente
caso, os contribuintes para a Seguridade Social.
Este princípio pode ser considerado como desdobramento do princípio da
capacidade contributiva, em atendimento aos comandos estampados nos artigos 5
caput e 145 parágrafo 1 da Constituição Cidadã.
3.6.2. Diversidade na base de financiamento
Exige a diversificação das bases de financiamento da Seguridade Social,
havendo uma ampliação qualitativa e quantitativa das diversas fontes de
financiamento.
Pode assumir caráter objetivo, quando que se refere aos fatos geradores da
obrigação de pagar contribuições sociais – por exemplo, as incidentes sobre a folha
de salários, sobre o faturamento, lucro entre outras; e também subjetivo, ao tratar
daqueles que devem participar de seu financiamento, ou seja, os contribuintes, que
assumem as mais diversas modalidades.
101
Este princípio merece observação especial do legislador, que tem o dever de
otimizar recursos para a Seguridade Social, pois diversificando as fontes de
financiamento, maior será a estabilidade financeira do sistema.
3.6.3. Equilíbrio Financeiro e atuarial
Devemos ainda observar a proteção do equilíbrio financeiro e atuarial do
sistema, e aqui encontramos a “regra da contrapartida”, denominação fornecida pelo
Professor Wagner Balera, e prevista no artigo 195, § 5º da Constituição Federal, nos
seguintes termos:
Art. 195
(...)
§ 5º Nenhum benefício ou serviço da seguridade social poderá ser
criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de
custeio total.
O constituinte não indicou a preexistência do custeio, também conhecido por
“regra da contrapartida”, também como Princípio da Seguridade Social.
O professor Wagner Balera
127
explica a regra da contrapartida afirmando que
esta refere-se a intelecção da relação entre contribuição e prestação, funcionando
como: “limitação constitucional contra abusos que o poder legislativo, seduzido pela
demagogia (notadamente nos anos eleitorais, viesse a cometer mediante a criação
de prestações que não tivessem previsão das respectivas receitas de cobertura”
tornando assim COMPULSÓRIO o equilíbrio entre contribuições e prestações.
127
Noções Preliminares de Direito Previdenciário, São Paulo, Quartier Latin, 2004 p.123
102
Isto significa que o legislador pode criar, majorar ou estender as prestações.
Mas, só terão validade constitucional se houver expressa previsão legal das fontes
de custeio de tais novas prestações. Desta forma, há um maior equilíbrio nas
finanças da Seguridade, pois cada despesa encontra-se atrelada a determinada
receita e vice-versa.
Também não devemos esquecer que a contribuição social submete-se a uma
anterioridade especial, trata-se do princípio da anterioridade nonagesimal onde a
exigência tributária pode verificar-se depois de decorridos noventa dias da data da
publicação da lei que houver instituído ou modificado tal contribuição, diferentemente
da anterioridade tributária, que exige a espera do próximo exercício financeiro para
poder ser cobrada.
3.7. Relação jurídica de custeio do sistema de seguridade social
brasileiro
3.7.1 Conceito
Conceituar “relação jurídica” faz parte da essência do Direito. Todas as
relações formadas do ponto de vista do direito positivo, integram o conceito de
relações jurídicas. Logo, podemos considerar que as relações jurídicas nada mais
são do que relações qualificadas pelas normas jurídicas pertencentes ao
ordenamento.
103
Como se verifica, antes de adentrarmos a todas as peculiaridades referentes
ao conceito de relação jurídica, é preciso considerar que esta existe a partir de uma
norma jurídica.
A norma jurídica traz toda uma estrutura lógica, sendo constituída por um
antecedente e um conseqüente, unidos através de um termo que os relaciona. No
antecedente da norma encontramos: (i) critério material; (ii) critério temporal e por
fim o (iii) critério espacial. E no conseqüente da norma: (i) critério pessoal e (ii)
critério quantitativo.
Para melhor compreensão trazemos o conceito de Lourival Vilanova:
"As relações jurídicas, como tais, são típicas do mundo jurídico. Mas,
num grau de abstração, são relações... São estruturas formais,
compondo-se de um termo antecedente (ou termo referente) e de outro
termo conseqüente (ou termo relato) e, ainda, de uma espécie de
operador: o operador relacionante... Qualquer que seja o universo de
objetos e de fatos pode ser traduzido numa linguagem em cujo nível
os objetos e os fatos são postos em tópicos de termos antecedentes e
termos conseqüentes, unidos por termos relacionantes. Causas e
efeitos, meios e fins, fatos jurídicos e conseqüências jurídicas,
reduzidos todos a estruturas formais, revelam que são relações. Cada
subuniverso de objetos dá sua concreção empírica às estruturas
formais."
128
E, nas palavras do Professor Wagner Balera e Cristiane Miziara Mussi:
129
“Ao conceituar o fato, foram estabelecidos critérios para identificá-lo.
Assim, surgiram os seguintes critérios: material, temporal, espacial
128
Estruturas lógicas e sistema do direito positivo, p. 70.
129
BALERA .Wagner; Cristiane Miziara Mussi. Direito Previdenciário para provas e concursos, p.68-
70.
104
(presentes no antecedente normativo) e quantitativo e pessoal
(presentes no conseqüente normativo)”.
“(...) Critério material: por meio do critério material pode-se
identificar o comportamento subjetivo capaz de dar nascimento a
uma relação jurídica. Este critério é sempre representado por verbo
e complemento. Exemplo: auferir + lucro.
Saliente-se que este comportamento é condicionado por
circunstâncias de espaço e de tempo (critérios espacial e temporal).
Critério temporal: Define-se o critério temporal da hipótese de
incidência como o momento em que se deve reputar realizado o fato
imponível capaz de dar nascimento à obrigação tributária.
Critério espacial: O critério espacial identifica o local em que o fato
descrito na hipótese de incidência deve ocorrer, para dar
nascimento à obrigação tributária.
Critério pessoal do conseqüente:
a) Sujeito ativo: é aquele que na relação jurídica é o titular do direito
subjetivo de haver para si a prestação advinda da relação jurídica.
b) Sujeito passivo: é o devedor da obrigação tributária, ora na
qualidade de contribuinte, ora na qualidade de responsável.
Critério quantitativo: expressa a exata quantia devida a título de
tributo. É formado pela base de cálculo e pela alíquota.
a) Base de cálculo: é representada pela grandeza econômica ou
numérica sobre a qual se aplica a alíquota para obter o quantum a
pagar.
b) Alíquota: é a “quota, fração ou parte que o Estado chama para si,
do valor dimensível (base de cálculo) manifestado pelo fato jurídico
tributário”.
3.7.2. Características
Toda relação jurídica possui as seguintes características:
a) ESTRUTURA LÓGICA, em que a matéria é dada pelas variáveis
existentes e a relação é conferida pelas constantes. Forma um vínculo lógico entre
as proposições;
105
b) UNIVERSAL, já que não depende de campo particularizado do
conhecimento.
c) ASSIMETRIA, já que apresenta forma não simétrica (proporcional) entre
as partes.
d) TRANSITIVIDADE, já que a relação jurídica possui um caráter transitório.
e) Cria um VÍNCULO RELACIONAL, que liga o sujeito ativo ao passivo
através de um objeto.’
3.7.3 Os Componentes da Relação Jurídica de Financiamento
Como é sabido, toda relação jurídica pressupõe de um sujeito ativo, que é o
titular do direito subjetivo de exigir certa prestação, sujeito passivo, aquele que tem o
dever jurídico de cumprir a obrigação conforme previsão normativa e por fim um
objeto, ou seja, a conduta exigida do devedor que poderá ser traduzida em uma
prestação de fazer ou não fazer.
No custeio da Seguridade Social, encontramos o Poder Público, representado
pela União hoje através da Secretaria da Receita Federal do Brasil e o sujeito
passivo - pessoas obrigadas a cumprirem a obrigação principal e acessória:
contribuinte ou responsável que pode ser o trabalhador, o empregador ou o gestor
de concurso de prognósticos.
Segundo Almansa Pastor:
“…cuando el Estado intervencionista remodela las técnicas del
seguro privado, instaurando los seguros sociales como
106
instrumentos específicos de protección encuentra la primera
dificultad en la incapacidad contributiva de los propios
asegurados y beneficiários, los trabajadores por cuenta ajena.
Precisa, entonces, recurrir a la contribución empresarial,
justificada mediante la responsabilización por los riesgos de los
trabajadores a su servido”
130
.
Neste passo, serão encontradas situações em que os empresários e os
trabalhadores contribuem conjuntamente, o que ocorre no Sistema de Seguridade
Social, e situações em que os empresários contribuem sozinhos ou que os
trabalhadores contribuem com exclusividade. Estes dois últimos casos referem-se a
situações especiais.
3.7.4 Teoria Escisionista e Teoria Unitária da relação jurídica
previdenciária
Sobre a matéria em comento, encontramos na doutrina duas teorias que
tratam acerca da relação jurídica previdenciária: a Teoria Escisionista e a Teoria
Unitária. Ademais, os sujeitos jurídicos da relação de custeio não são
necessariamente os mesmos sujeitos da relação de proteção.
A Teoria Escisionista nasceu em confronto com a tradicional Teoria Unitária
ou da Relação Bilateral, a qual se alicerçava nos pressupostos jurídicos do seguro
privado.
131
130
Direito da Seguridade Social, p. 276. Tradução: Quando o estado intervencionista remodela as
técnicas do seguro privado, instaurando os seguros sociais como instrumentos específicos de
proteção, encontra a primeira barreira na incapacidade contributiva dos próprios segurados e
beneficiários, os trabalhadores. Precisa, então, recorrer à contribuição empresarial, justificada
mediante a responsabilidade pelos riscos dos trabalhadores a seu serviço.
131
BERBEL, Fábio Lopes Vilela, Teoria Geral da Previdência Social, São Paulo, Quartier Latin, p. 141
107
A base teórica do escisionismo é a compreensão do fenômeno previdenciário
a partir de várias relações jurídicas distintas e autônomas.
132
Para melhor elucidação, divide-se a relação jurídica previdenciária na seara
do benefício e do custeio, onde encontramos na relação jurídica de benefício a figura
dos segurados ou dependentes na posição de sujeito ativo, e como sujeito passivo a
União, representada através da Secretaria da Receita Previdenciária
133
.
Na Relação Jurídica de Proteção ou de Benefício encontramos na qualidade
de sujeito ativo o segurado ou dependentes, ou seja, na condição de poder exigir do
sujeito passivo, a autarquia previdenciária – Instituto Nacional do Seguro Social, a
concessão do benefício ou serviço a ele assegurado.
Já na Relação Jurídica de Custeio encontramos na qualidade de sujeito ativo
o Poder Público através da Secretaria da Receita Federal do Brasil, e como Sujeito
Passivo (pessoas obrigadas a cumprirem a obrigação principal e os deveres
instrumentais) o contribuinte ou responsável que pode ser o trabalhador, o
empregador ou o gestor de concurso de prognósticos.
Ademais, podemos encontrar nas relações previdenciárias pelo menos duas
relações distintas, sendo autônomas e unilaterais, diante da ausência de
sinalagmatismo. Segundo José Monteiro de Macêdo
134
: “(...) o direito ás prestações
previdenciárias não está de nenhum modo ligado ou condicionado ao pagamento de
contribuição previdenciária (...)”.
132
Idem
108
E continua: “(...) o direito de o ente previdenciário exigir o pagamento de
contribuição também não está vinculado à comprovação de que se desincumbiu
efetivamente do encargo de prover a proteção previdenciária”.
As relações ora em debate, por fim, distinguem-se em relação jurídica de
proteção e relação jurídica de custeio.
Já para a Teoria Unitária ou da Relação Bilateral, existe o chamado
sinalagmatismo, que por sua vez pressupõe a concessão simultânea de direitos e
deveres entre os sujeitos que compõem a relação jurídica. Apenas uma relação
jurídica é encontrada na relação previdenciária, caracterizada pela unilateralidade e
bilateralidade da mesma.
Podemos representar essa teoria da seguinte forma: a relação jurídica
previdenciária compreende a “soma” da relação jurídica de benefício e da relação
jurídica de contribuição, sendo estas analisadas como um conceito unitário,
formando por fim uma única relação.
Assim: há a contribuição, e em dado e incerto tempo a ocorrência da
contingência social, e, por conseguinte, a concessão da proteção.
A Teoria Escisionista vem contrariar a Teoria Unitária ou da Relação Bilateral
até então defendida ao se tratar da relação jurídica previdenciária. “Tal situação
comporta compreensão diferenciada acerca da dinâmica do relacionamento entre os
134
Da relação jurídica previdenciária no âmbito do Regime Geral de Previdência Social. In: Revista de
Previdência Social n. 276, p. 983.
109
sujeitos envolvidos, impondo a compreensão ímpar dos elementos que compõem a
dinâmica previdenciária”
135
.
CAPÍTULO 4
OBRIGAÇÕES PREVIDENCÁRIAS
Através do estudo da relação jurídica de custeio da Seguridade Social,
podemos distinguir duas modalidades de obrigação – a principal e a acessória,
ambas imprescindíveis para a manutenção sadia do sistema.
135
BERBEL, Fábio Lopes Vilela, Teoria Geral da Previdência Social, São Paulo, Quartier Latin, p.146
e 147.
110
O contribuinte individual possui o dever de recolher a contribuição devida à
previdência social, já a empresa tem dupla função: a de contribuir e a de descontar
as contribuições devidas pelos seus empregados.
Deste fato, teremos que toda empresa terá obrigações, tanto no sentido de
verter valores ao sistema - contribuição (obrigação principal), quanto no sentido de
realizar ou deixar de realizar determinados atos para o fiel cumprimento dos seus
deveres perante o Sistema de Seguridade Social (obrigações acessórias).
De acordo com o artigo 113 do Código Tributário Nacional, a obrigação
tributária é principal ou acessória.
A obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador, tem por objeto
o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se juntamente com o
crédito dela decorrente.
A obrigação acessória decorre da legislação tributária e tem por objeto as
prestações, positivas ou negativas, nela previstas no interesse da arrecadação ou da
fiscalização dos tributos. A inobservância de seu cumprimento, converte-se em
obrigação principal relativamente a penalidade pecuniária.
Cabe ainda mencionar os artigos 114 e 115 do Código Tributário Nacional:
”Art. 114. Fato gerador da obrigação principal é a situação definida
em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência”.
“Art. 115. Fato gerador da obrigação acessória é qualquer situação
que, na forma da legislação aplicável, impõe a prática ou a
abstenção de ato que não configure obrigação principal”.
111
No direito tributário, o acessório não segue o principal como ocorre no direito
civil. A obrigação principal se refere ao tributo em si, enquanto que a obrigação
acessória diz respeito à instrumentalidade (exemplo: apresentar a declaração de
rendimentos, preencher determinada guia de recolhimento etc.).
Assim, o sujeito que aufere lucro, nos termos da legislação previdenciária,
deve pagar contribuição sobre o lucro (obrigação principal), assim como comunicar à
Secretaria da Receita Federal do Brasil, o lucro obtido no ano calendário – lucro real
(obrigação acessória). No que se refere à obrigação tributária, tanto podem coexistir
obrigação principal e obrigação acessória como também só uma delas pode ser
aplicável a determinado sujeito de direito.
Concluindo, encontramos: a obrigação principal (no presente caso, tratamos
das contribuições sociais), como obrigação de custeio do sistema e a obrigação
acessória, também conhecida por dever instrumental, que correspondem aos
instrumentos que comprovam se a relação jurídica existe e se foi cumprida
corretamente.
4.1. As obrigações acessórias e o custeio da seguridade social
Como já vimos, a relação obrigacional jurídico-tributária inaugura-se com a
ocorrência de fato concreto no mundo fenomênico, desde que venha a se adequar à
descrição hipotética prevista em lei como condição necessária e suficiente para o
surgimento da obrigação tributária.
112
De acordo com o Código Tributário Nacional, a obrigação surgida pode ser de
natureza principal ou acessória. A dinâmica de constituição da relação obrigacional
tributária seria válida tanto para as obrigações tributárias ditas principais como as
acessórias, somente alterando-se o objeto – a obrigação tributária principal seria
uma obrigação de dar, enquanto as acessórias seriam obrigações de fazer, não
fazer ou tolerar. In verbis:
Art. 113. A obrigação tributária é principal ou acessória.
§ 1º A obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador,
tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e
extingue-se juntamente com o crédito dela decorrente.
§ 2º A obrigação acessória decorre da legislação tributária e tem por
objeto as prestações, positivas ou negativas, nela previstas no
interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos.
§ 3º A obrigação acessória, pelo simples fato da sua inobservância,
converte-se em obrigação principal relativamente à penalidade
pecuniária.
De acordo com Rubens Gomes de Sousa, a obrigação pode ser definida
como o “poder jurídico por força do qual uma pessoa (sujeito ativo) pode exigir de
outra (sujeito passivo) uma prestação positiva ou negativa (objeto da obrigação) em
virtude de uma circunstância reconhecida pelo direito como produzindo aquele efeito
(causa da obrigação)”. De acordo com este mesmo Autor, ao buscar adequar esta
definição genérica ao subsistema tributário, define obrigação tributária como o
“poder jurídico por força do qual o Estado (sujeito ativo) pode exigir de um particular
(sujeito passivo) uma prestação positiva ou negativa (objeto da obrigação) nas
condições definidas pela lei tributária (causa da obrigação)”. Afirma o Autor que esta
definição abrange tanto a obrigação tributária principal como a acessória
136
.
136
SOUSA, Rubens Gomes. Compêndio de Legislação Tributária. Rio: Edições Financeiras S.A.
1952, p.57 58.
113
As chamadas “obrigações acessórias” visam então fornecer ao fisco o
material necessário para identificar a ocorrência do fato imponível e fixar o tributo
devido. Ressalte-se que, não obstante o Código Tributário Nacional fixar que tais
obrigações são decorrentes da “legislação”, é evidente que, em razão do princípio
constitucional da legalidade, somente a lei poderá criar obrigações acessórias.
4.2. A Questão Terminológica
Segundo segmento autorizado da doutrina, as chamadas “obrigações
acessórias”, não seriam nem obrigações, nem acessórias. Seriam, em verdade,
mera relação jurídica secundária, de caráter administrativo, fundamentado no poder
de polícia estatal.
Não seriam obrigações devido à ausência da patrimonialidade, isto é, o
vínculo econômico que deve existir subjacente à obrigação de dar, fazer ou não-
fazer.
Nas “obrigações acessórias”, não haveria este liame, pois o que a lei impõe
são, em verdade, meros deveres administrativos que visam evidenciar o
recolhimento dos tributos devidos, além de permitir a exata quantificação do
quantum debeatur.
114
Nos dizeres do professor Paulo de Barros Carvalho
137
:
“As relações jurídicas secundárias, que muitas vezes são
simultâneas à obrigação tributária, mas que nada tem de
similaridade com o vínculo obrigacional, são meros deveres de
direito administrativo, não atendendo quer ao requisito da
transitoriedade, quer ao do conteúdo econômico. (...) Ademais, é
destituído de caráter patrimonial.”
E ainda
138
:
“Não poderia o legislador tributário denominar de obrigação
acessória os deveres de fazer ou não fazer, sem cunho pecuniário
(como escriturar livros, emitir documentos, tolerar fiscalizações,
prestar declarações, etc.) uma vez que a estimabilidade patrimonial
é essencial às obrigações. Sendo assim, as obrigações acessórias
não seriam obrigações propriamente ditas, mas meros “deveres
formais”.
Neste mesmo sentido é o posicionamento de Marco Aurélio Greco
139
:
“Obrigação é o vínculo jurídico pelo qual o credor pode exigir do
devedor um certo comportamento. Tem cunho patrimonial e caráter
transitório. Patrimonialidade é a possibilidade de avaliação ou de
transformação em valores numéricos do conteúdo de uma
prestação. Transitoriedade é a vocação para desaparecer que tem o
vínculo, uma vez executado o comportamento. Só teremos
obrigação se encontrarmos todos os elementos reunidos, caso
contrário tratar-se á de outro instituto.”
Nas obrigações de fazer ou não-fazer, a patrimonialidade evidencia-se
especialmente pelo seu não-cumprimento, quando há seu dimensionamento por
137
Revista de Direito Público, jul/set de 1971, RT, p. 384
138
Obrigação Tributária, in Comentários ao Código Tributário Nacional, São Paulo, Bushatsky, 1977
p. 124-125
139
Cadernos de Direito Tributário – RDP, 22 , 1972 – RT p.344.
115
meio de perdas e danos. No caso das “obrigações tributárias acessórias”, ainda que
se reconheça o dever de fazer, não-fazer ou tolerar, não haveria esta conversão, já
que do seu descumprimento gera o direito a cobrança de multa, esta, mera
penalidade administrativa.
Apesar da discussão acima, o termo “obrigações acessórias” é
expressamente previsto no CTN, no art. 113, § 2º, segundo se afirma, por influência
de Rubens Gomes de Sousa
140
, como inclusive visto no item anterior.
Porém, conforme já visto, de acordo com Paulo de Barros Carvalho, a
denominação adequada seria a de deveres instrumentais ou formais. Relembramos
que este mesmo autor lembra que, além da patrimonialidade (a priori inexistente nos
deveres instrumentais), outra característica das obrigações em geral, também
faltante nos deveres formais, seria a temporalidade, já que a obrigação nasce com
evidente vocação de ser extinta
141
.
Não há consenso sobre a matéria, sendo igualmente relevante a teoria de
Souto Maior, que questiona esta abordagem da matéria, externando seu ponto de
vista no sentido da necessidade do intérprete adequar sua pré-compreensão sobre o
tema de acordo com o direito positivo – a concepção de “obrigação” na teoria geral
do direito nem sempre corresponderá a sua definição no direito posto. Da mesma
140
Cf. TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 11ª edição. Rio: Renovar,
1993, p. 236.
141
CARVALHO, Paulo de Barros. A Relação Jurídica Tributária e as Impropriamente Chamadas
Obrigações Acessórias. in Revista de Direito Público, 17, 381-386, 1971. Sobre o requisito da
transitoriedade das obrigações, o Autor reviu seu entendimento posteriormente, fixando somente
como necessária a característica da patrimonialidade (Teoria da Norma Tributária, p. 150 e 151).
116
forma, aponta que toda obrigação acessória, ainda que indiretamente, possui
conteúdo patrimonial, devido aos custos para sua efetivação pelo sujeito passivo
142
.
Da mesma forma, Maurício Zockun afirma que o CTN veicula dispositivo que
permite desconstituir a teoria de que a patrimonialidade é inerente a qualquer
obrigação, admitindo-se então no direito positivo (e não na teoria geral do direito) a
existência de obrigações não-patrimoniais
143
. Por isso defende a adoção da
terminologia obrigações tributárias instrumentais.
Para Ives Gandra da Silva Martins, os deveres instrumentais são sim
obrigações (de fazer ou não fazer), mas não de natureza tributária. Ou seja, seriam
obrigações de natureza administrativa com o propósito de evidenciar a existência da
verdadeira obrigação tributária, que seria somente a principal. Neste contexto
haveria a chamada dicotomia da obrigação tributária – a principal, com evidente teor
patrimonial, e a acessória, sem este conteúdo
144
.
Da mesma forma, para este segmento, a qualificação como “acessória” é
questionável, sendo este equívoco até mesmo mais evidente do que a pretensa
qualificação do dever instrumental como obrigação (que pode ainda ser justificado
devido pela patrimonialidade indireta dos deveres instrumentais).
142
BORGES, José Souto Maior. Em Socorro da Obrigação Tributária: Nova Abordagem
Epistemológica, in Tratado de Direito Constitucional Tributário (Coord.: Heleno Taveira Tôrres). São
Paulo: Saraiva, 2005, p. 65 a 84.
143
ZOCKUN. Maurício. Regime Jurídico da Obrigação Tributária Acessória. São Paulo: Malheiros,
2005, p. 85.
144
MARTINS, Ives Gandra da Silva. Teoria da Imposição Tributária. 2ª edição. São Paulo: LTr, 1998,
p. 98.
117
Com entendimento diverso, Hugo de Brito Machado tenta justificar a dicção
do Código Tributário Nacional, afirmando que a “crítica não é procedente. É fruto de
uma visão privatista, inteiramente inadmissível em face do Código Tributário
Nacional, em cujo contexto o adjetivo acessória, que qualifica essas obrigações, tem
sentido inteiramente distinto daquele do Direito Privado. (...) em Direito Tributário, as
obrigações acessórias não precisariam existir se não existissem as obrigações
principais. São acessórias, pois, neste sentido”.
145
A pretensa qualificação de “acessória”, nos termos do CTN, simplesmente
visa expressar a existência destes deveres como um ônus instrumental imposto ao
sujeito passivo de modo a garantir-se à fiscalização meios para certificar-se do
cumprimento das ditas “obrigações principais”, ou seja, o recolhimento de tributos e
penalidades. Não é, de fato, terminologia das mais felizes, pois induz o intérprete a
erro.
4.3. Sobre a Teoria Geral do Direito
No presente estudo, para uma melhor abordagem da discussão acima
trazida, utilizaremos como “fonte” para justificação do posicionamento adotado a
compreensão do signo através da Teoria Geral do Direito.
José Souto Maior Borges esclarece que: “os problemas verbais não devem, é
certo, prevalecer sobre os problemas reais. É a partir da opção por um dos
significados emprestados ao qualitativo geral da teoria, porém que será possível
delimitar seu âmbito de investigação.”
146
145
MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 88 e 89.
146
BORGES, José Souto Maior. Obrigação Tributária (uma introdução metodológica. São Paulo:
Malheiros, 1984, p. 25 e 26
118
Justifica-se a utilização desta disciplina jurídica, pois ao longo das pesquisas,
constatou-se que o mesmo termo – obrigação – é utilizado em várias categorias
jurídicas, possuindo, por conseqüência, um significado para cada qual.
Por esta razão, a Teoria Geral do Direito prescinde tanto da pesquisa – pois
envolve um processo de generalização, via espécie para gênero.
Para melhor compreensão, a relação entre a Teoria Geral do Direito e as
disciplinas jurídicas particulares é como uma relação entre continente (o ser formal
da Teoria Geral do Direito) e o conteúdo (o âmbito de validade de certas normas, tal
como descrito pela dogmática jurídica). É pois, um relacionamento entre disciplinas
jurídicas diversas pelo seu objeto.
Desta forma, por ocupar-se de categorias jurídicas fundamentais o objeto da
Teoria Geral do Direito é, pois, definir formalmente certos conceitos fundamentais da
ciência jurídica, tais como o de sujeito de direito, capacidade, competência, dever,
responsabilidade, etc..
A relação entre obrigação e dever jurídico não é uma relação entre espécie e
gênero, mas uma relação entre forma e conteúdo
Porque o dever é uma categoria formal, estudada pela Teoria Geral do direito
e a obrigação uma categoria dogmática, estudada pelas disciplinas jurídicas
particulares. Daí a possibilidade de falar-se, com pertinência ao objeto de estudo;
119
obrigações de Direito Civil, Comercial, Tributário, etc.. E aqui também das
obrigações de Direito Previdenciário.
O autor, portanto, conclui que por esta razão simplesmente não há atributos
“essenciais” da obrigação (...) ao contrário, atributos da obrigação são os que
estiverem contemplados na norma construída como obrigacional.
Assim, uma vez esclarecida a metodologia utilizada, continuaremos o
presente estudo tratando agora das obrigações acessórias previdenciárias.
4.4. AS OBRIGAÇÕES ACESSÓRIAS PERTINENTES À PREVIDÊNCIA
SOCIAL
São obrigações acessórias
as prestações positivas ou negativas no
interesse da
fiscalização
e também da arrecadação. Como já analisamos
anteriormente, igualmente são denominadas de “deveres instrumentais”, porém no
presente estudo serão denominadas apenas e especificamente de obrigações
acessórias, pois mesmo que parte da doutrina não a reconheça, utilizando-se do
argumento de que esta possa ser exigida independente do cumprimento da
obrigação principal, deve-se observar que esta é de fundamental importância para
o controle daquela.
O que importa demonstrar é que seu caráter acessório é reconhecido
mesmo que se encontre certa situação de imunidade ou isenção, pois mesmo nos
deparando com estes, é por muitas vezes em decorrência destas situações que
120
são exigidas, pois deve-se ter o controle das hipóteses de incidências que
implicariam na cobrança da contribuição social.
Em outras situações, como veremos a diante, é exigida para se verificar o
correto recolhimento da obrigação principal, ou seja, é utilizada pelo Poder Público
para o controle do fiel cumprimento do pagamento do tributo efetuado pelo
contribuinte, deve ser ainda de interesse prioritário por parte da arrecadação e
fiscalização.
As obrigações acessórias no custeio previdenciário, estão majoritariamente
ligadas à área contábil, ou seja, são encontradas nos lançamentos de pagamentos
na contabilidade, na elaboração de folhas de pagamento, na escrituração de todos
os livros contábeis obrigatórios etc.
Estão previstas no artigo 32 da Lei n.º 8.212/91 e nos artigos 225 a 228 do
Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n.º 3.048/99, e de
absoluta utilidade para verificação da condição de regularidade ou irregularidade do
sujeito passivo perante o fisco.
Através da leitura dos artigos em comento, pode-se afirmar que as obrigações
acessórias concernentes à Seguridade Social, são divididas em (i) gerais, ou seja,
aquelas referentes ao dever do sujeito passivo em prestar esclarecimentos e
informações (vide artigo 33 parágrafo 1°da Lei 8212/1991), e (ii) específicas da
empresa, onde encontramos por exemplo a obrigação de preparar folha de
121
pagamento, de manter arquivados seus documentos (vide artigo 32, inciso I e
parágrafo único do mesmo diploma legal), entre outras.
De acordo com o artigo 32 da Lei n.° 8.212/91, encontramos:
“Art. 32. A empresa é também obrigada a:
I - preparar folhas-de-pagamento das remunerações pagas ou
creditadas a todos os segurados a seu serviço, de acordo com os
padrões e normas estabelecidos pelo órgão competente da
Seguridade Social;
II - lançar mensalmente em títulos próprios de sua contabilidade, de
forma discriminada, os fatos geradores de todas as contribuições, o
montante das quantias descontadas, as contribuições da empresa e
os totais recolhidos;
III - prestar ao Instituto Nacional do Seguro Social-INSS e ao
Departamento da Receita Federal-DRF todas as informações
cadastrais, financeiras e contábeis de interesse dos mesmos, na
forma por eles estabelecida, bem como os esclarecimentos
necessários à fiscalização.
IV - informar mensalmente ao Instituto Nacional do Seguro Social-
INSS, por intermédio de documento a ser definido em regulamento,
dados relacionados aos fatos geradores de contribuição
previdenciária e outras informações de interesse do INSS”.
E no Decreto 3048/99 estão previstas:
Art. 225. A empresa é também obrigada a:
I - preparar folha de pagamento da remuneração paga, devida ou
creditada a todos os segurados a seu serviço, devendo manter, em
cada estabelecimento, uma via da respectiva folha e recibos de
pagamentos;
II - lançar mensalmente em títulos próprios de sua contabilidade, de
forma discriminada, os fatos geradores de todas as contribuições, o
montante das quantias descontadas, as contribuições da empresa e
os totais recolhidos;
III - prestar ao Instituto Nacional do Seguro Social e à Secretaria da
Receita Federal todas as informações cadastrais, financeiras e
contábeis de interesse dos mesmos, na forma por eles
estabelecida, bem como os esclarecimentos necessários à
fiscalização;
IV - informar mensalmente ao Instituto Nacional do Seguro Social,
por intermédio da Guia de Recolhimento do Fundo de Garantia do
Tempo de Serviço e Informações à Previdência Social, na forma por
ele estabelecida, dados cadastrais, todos os fatos geradores de
contribuição previdenciária e outras informações de interesse
daquele Instituto;
122
V - encaminhar ao sindicato representativo da categoria profissional
mais numerosa entre seus empregados, até o dia dez de cada mês,
cópia da Guia da Previdência Social relativamente à competência
anterior; e
VI - afixar cópia da Guia da Previdência Social, relativamente à
competência anterior, durante o período de um mês, no quadro de
horário de que trata o art. 74 da Consolidação das Leis do Trabalho.
§ 1º As informações prestadas na Guia de Recolhimento do Fundo
de Garantia do Tempo de Serviço e Informações à Previdência
Social servirão como base de cálculo das contribuições arrecadadas
pelo Instituto Nacional do Seguro Social, comporão a base de dados
para fins de cálculo e concessão dos benefícios previdenciários,
bem como constituir-se-ão em termo de confissão de dívida, na
hipótese do não-recolhimento.
§ 2º
A entrega da Guia de Recolhimento do Fundo de Garantia do
Tempo de Serviço e Informações à Previdência Social deverá ser
efetuada na rede bancária, conforme estabelecido pelo Ministério da
Previdência e Assistência Social, até o dia sete do mês seguinte
àquele a que se referirem as informações. (Redação dada pelo
Decreto nº 3.265, de 1999)
§ 3º A Guia de Recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de
Serviço e Informações à Previdência Social é exigida relativamente
a fatos geradores ocorridos a partir de janeiro de 1999.
§ 4º
O preenchimento, as informações prestadas e a entrega da
Guia de Recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço
e Informações à Previdência Social são de inteira responsabilidade
da empresa.
§ 5º
A empresa deverá manter à disposição da fiscalização,
durante dez anos, os documentos comprobatórios do cumprimento
das obrigações referidas neste artigo, observados o disposto no §
22 e as normas estabelecidas pelos órgãos competentes. (Redação
dada pelo Decreto nº 4.729, de 2003)
§ 6º O Instituto Nacional do Seguro Social e a Caixa Econômica
Federal estabelecerão normas para disciplinar a entrega da Guia de
Recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e
Informações à Previdência Social, nos casos de rescisão contratual.
§ 7º
A comprovação dos pagamentos de benefícios reembolsados à
empresa também deve ser mantida à disposição da fiscalização
durante dez anos.
§ 8º
O disposto neste artigo aplica-se, no que couber, aos demais
contribuintes e ao adquirente, consignatário ou cooperativa, sub-
rogados na forma deste Regulamento.
§ 9º
A folha de pagamento de que trata o inciso I do caput,
elaborada mensalmente, de forma coletiva por estabelecimento da
empresa, por obra de construção civil e por tomador de serviços,
com a correspondente totalização, deverá:
123
I - discriminar o nome dos segurados, indicando cargo, função ou
serviço prestado;
II - agrupar os segurados por categoria, assim entendido: segurado
empregado, trabalhador avulso, contribuinte individual; (Redação
dada pelo Decreto nº 3.265, de 1999)
III - destacar o nome das seguradas em gozo de salário-
maternidade;
IV - destacar as parcelas integrantes e não integrantes da
remuneração e os descontos legais; e
V - indicar o número de quotas de salário-família atribuídas a cada
segurado empregado ou trabalhador avulso.
§ 10. No que se refere ao trabalhador portuário avulso, o órgão
gestor de mão-de-obra elaborará a folha de pagamento por navio,
mantendo-a disponível para uso da fiscalização do Instituto
Nacional do Seguro Social, indicando o operador portuário e os
trabalhadores que participaram da operação, detalhando, com
relação aos últimos:
I - os correspondentes números de registro ou cadastro no órgão
gestor de mão-de-obra;
II - o cargo, função ou serviço prestado;
III - os turnos em que trabalharam; e
IV - as remunerações pagas, devidas ou creditadas a cada um dos
trabalhadores e a correspondente totalização.
§ 11. No que se refere ao parágrafo anterior, o órgão gestor de
mão-de-obra consolidará as folhas de pagamento relativas às
operações concluídas no mês anterior por operador portuário e por
trabalhador portuário avulso, indicando, com relação a estes, os
respectivos números de registro ou cadastro, as datas dos turnos
trabalhados, as importâncias pagas e os valores das contribuições
previdenciárias retidas.
§ 12. Para efeito de observância do limite máximo da contribuição
do segurado trabalhador avulso, de que trata o art. 198, o órgão
gestor de mão-de-obra manterá resumo mensal e acumulado, por
trabalhador portuário avulso, dos valores totais das férias, do
décimo terceiro salário e das contribuições previdenciárias retidas.
§ 13. Os lançamentos de que trata o inciso II do caput, devidamente
escriturados nos livros Diário e Razão, serão exigidos pela
fiscalização após noventa dias contados da ocorrência dos fatos
geradores das contribuições, devendo, obrigatoriamente:
I - atender ao princípio contábil do regime de competência; e
II - registrar, em contas individualizadas, todos os fatos geradores
de contribuições previdenciárias de forma a identificar, clara e
precisamente, as rubricas integrantes e não integrantes do salário-
de-contribuição, bem como as contribuições descontadas do
124
segurado, as da empresa e os totais recolhidos, por
estabelecimento da empresa, por obra de construção civil e por
tomador de serviços.
§ 14. A empresa deverá manter à disposição da fiscalização os
códigos ou abreviaturas que identifiquem as respectivas rubricas
utilizadas na elaboração da folha de pagamento, bem como os
utilizados na escrituração contábil.
§ 15. A exigência prevista no inciso II do caput não desobriga a
empresa do cumprimento das demais normas legais e
regulamentares referentes à escrituração contábil.
§ 16. São desobrigadas de apresentação de escrituração contábil:
(Redação dada pelo Decreto nº 3.265, de 1999)
I - o pequeno comerciante, nas condições estabelecidas pelo
Decreto-lei nº
486, de 3 de março de 1969, e seu Regulamento;
II - a pessoa jurídica tributada com base no lucro presumido, de
acordo com a legislação tributária federal, desde que mantenha a
escrituração do Livro Caixa e Livro de Registro de Inventário; e
III - a pessoa jurídica que optar pela inscrição no Sistema Integrado
de Pagamento de Impostos e Contribuições das Microempresas e
Empresas de Pequeno Porte, desde que mantenha escrituração do
Livro Caixa e Livro de Registro de Inventário.
§ 17. A empresa, agência ou sucursal estabelecida no exterior
deverá apresentar os documentos comprobatórios do cumprimento
das obrigações referidas neste artigo à sua congênere no Brasil,
observada a solidariedade de que trata o art. 222.
§ 18. Para o cumprimento do disposto no inciso V do caput serão
observadas as seguintes situações:
I - caso a empresa possua mais de um estabelecimento localizado
em base geográfica diversa, a cópia da Guia da Previdência Social
será encaminhada ao sindicato representativo da categoria
profissional mais numerosa entre os empregados de cada
estabelecimento;
II - a empresa que recolher suas contribuições em mais de uma
Guia da Previdência Social encaminhará cópia de todas as guias;
III - a remessa poderá ser efetuada por qualquer meio que garanta
a reprodução integral do documento, cabendo à empresa manter,
em seus arquivos, prova do recebimento pelo sindicato; e
IV - cabe à empresa a comprovação, perante a fiscalização do
Instituto Nacional do Seguro Social, do cumprimento de sua
obrigação frente ao sindicato.
§ 19. O órgão gestor de mão-de-obra deverá, quando exigido pela
fiscalização do Instituto Nacional do Seguro Social, exibir as listas
de escalação diária dos trabalhadores portuários avulsos, por
operador portuário e por navio.
125
§ 20. Caberá exclusivamente ao órgão gestor de mão-de-obra a
responsabilidade pela exatidão dos dados lançados nas listas
diárias referidas no parágrafo anterior.
§ 21. Fica dispensado do cumprimento do disposto nos incisos V e
VI do caput o contribuinte individual, em relação a segurado que lhe
presta serviço. (Redação dada pelo Decreto nº 3.265, de 1999)
§ 22 A empresa que utiliza sistema de processamento eletrônico
de dados para o registro de negócios e atividades econômicas,
escrituração de livros ou produção de documentos de natureza
contábil, fiscal, trabalhista e previdenciária é obrigada a arquivar e
conservar, devidamente certificados, os respectivos sistemas e
arquivos, em meio digital ou assemelhado, durante dez anos, à
disposição da fiscalização. (Incluído pelo Decreto nº 4.729, de 2003)
§ 23. A cooperativa de trabalho e a pessoa jurídica são obrigadas
a efetuar a inscrição no Instituto Nacional do Seguro Social dos
seus cooperados e contratados, respectivamente, como
contribuintes individuais, se ainda não inscritos. (Incluído pelo
Decreto nº 4.729, de 2003)
Art. 226. O Município, por intermédio do órgão competente,
fornecerá ao Instituto Nacional do Seguro Social, para fins de
fiscalização, mensalmente, relação de todos os alvarás para
construção civil e documentos de "habite-se" concedidos, de acordo
com critérios estabelecidos pelo referido Instituto.
§ 1º
A relação a que se refere o caput será encaminhada ao INSS
até o dia dez do mês seguinte àquele a que se referirem os
documentos.(Redação dada pelo Decreto nº 4.032, de 2001)
§ 2º O encaminhamento da relação fora do prazo ou a sua falta e a
apresentação com incorreções ou omissões sujeitará o dirigente do
órgão municipal à penalidade prevista na alínea "f" do inciso I do art.
283.
Art. 227. As instituições financeiras mencionadas no inciso V do
caput do art. 257 ficam obrigadas a verificar, por meio da internet, a
autenticidade da Certidão Negativa de Débito - CND apresentadas
pelas empresas com as quais tenham efetuado operações de
crédito com recursos ali referidos, conforme especificação técnica a
ser definida pelo Instituto Nacional do Seguro Social. (Redação
dada pelo Decreto nº 4.729, de 2003)
Art. 228. O titular de cartório de registro civil e de pessoas naturais
fica obrigado a comunicar, até o dia dez de cada mês, na forma
estabelecida pelo Instituto Nacional do Seguro Social, o registro dos
óbitos ocorridos no mês imediatamente anterior, devendo da
comunicação constar o nome, a filiação, a data e o local de
nascimento da pessoa falecida.
Parágrafo único. No caso de não haver sido registrado nenhum
óbito, deverá o titular do cartório comunicar esse fato ao Instituto
Nacional do Seguro Social, no prazo estipulado no caput.
126
E, detalhadamente, são elas:
4.4.1. Elaboração da Folha de pagamento
Preparar folha de
pagamento da remuneração paga, devida ou
creditada
a todos os
segurados a
seu serviço, devendo manter, em cada
estabelecimento, uma
via
da
respectiva
folha
e recibos de pagamentos.
A folha de
pagamento
deve ser feita mensalmente, de forma
coletiva,
por
estabelecimento da empresa, por obra de construção civil e
por tomador
de serviços, e com sua correspondente totalização.
Deverá também
discriminar o nome
dos
segurados,
indicando
cargo,
função ou
serviço prestado,
agrupando os
segurados por categoria, ou seja,
segurado empregado, trabalhador avulso, contribuinte individual.
Por exemplo, se a empresa
possui três estabelecimentos distintos,
cada um deles deve possuir sua folha de pagamento, relacionando os
segurados
que prestaram serviços, evidenciando todos os valores pagos a
estes.
Aqui, importante ressaltar que somente os segurados empregado,
trabalhador
avulso,
contribuinte individual podem figurar numa folha de
127
pagamento de empresa. Os demais, empregado doméstico, segurado especial e
segurado facultativo, não têm essa
possibilidade.
A folha
ainda
deve
destacar o nome
das seguradas em gozo de salário-
maternidade,
pois tais
valores,
integram o
salário-de-contribuição, e ainda
permite
à fiscalização verificar se e s t e s estão sendo
corretamente pagos às
seguradas.
Também deve-se destacar na folha as
parcelas integrantes e
não
integrantes da remuneração e
os
descontos legais,
de modo que a fiscalização
possa verificar se, de fato, aquela parcela realmente integra ou não
o
salário-
de-contribuição, além
de
indicar o número
de
quotas
de
salário-família
atribuídas
a
cada segurado empregado ou trabalhador
avulso, para verificar se
as mesmas estão sendo corretamente pagas.
Com advento da Lei nº. 10.666/2003, a partir de 1º de abril de 2003, passou a
ser da empresa contratante a obrigação de descontar e recolher, juntamente com as
contribuições a seu cargo, as contribuições devidas pelo contribuinte individual a seu
serviço.
Será de responsabilidade da empresa ou equiparada contratante e da
cooperativa de trabalho a inscrição do Regime Geral da Previdência Social dos seus
cooperados ou contribuintes individuais contratados, respectivamente, caso estes
não comprovem sua inscrição na data de admissão na cooperativa ou da
contratação da empresa.
128
A empresa que remunerar contribuinte individual deverá fornecer-lhe
comprovante de pagamento com identificação completa da empresa (razão social,
número de inscrição no CNPJ, endereço e telefone), no valor da remuneração paga,
do desconto da contribuição social efetuada.
O comprovante de pagamento é documento hábil para demonstração da
tributação sofrida em determinada competência, com finalidade de se evitar o
recolhimento acima do limite máximo do salário-de-contribuição, por ocasião da
prestação de serviços para outras empresas na mesma competência.
Não existe modelo oficial do comprovante de pagamento a contribuinte
individual, mas uma vez formalizado deverá ser emitido em 2 vias, uma para ser
arquivada na empresa, outra para ser entregue ao prestador de serviços.
Caso a contratante e o contribuinte individual pactuem o pagamento da
remuneração para competência posterior à da prestação de serviços, o comprovante
poderá ser fornecido a título de “remuneração devida”, apesar de não haver previsão
expressa para isso, uma vez que será considerada como competência àquela em
que a empresa ou a equiparada contratante for obrigada a reconhecer contabilmente
a despesa ou o dispêndio.
A lei n.º 10.666/2003 também modificou o recolhimento previdenciário dos
contribuintes individuais, dentre os quais destacamos o cooperado, que a partir de 1º
de abril de 2003 passou a sofrer o desconto da contribuição social no valor da
129
remuneração a ele distribuída ou creditada, em decorrência de serviços prestados a
terceiros por intermédio da cooperativa.
Dessa forma, para esses contribuintes, ficou extinta a arrecadação por meio
de carnê individual, dando-se por encerrada, inclusive, a escala transitória de
salário-base.
Quando o serviço for prestado a empresas não isentas do encargo patronal, o
desconto será de 11% do valor da remuneração creditada ou repassada ao
cooperado, em razão da dedução prevista no 4º do art. 30 da Lei n.º 8.212 de 1991.
Caso a prestação se dê a entidades beneficentes de assistência social
isentas das contribuições patronas ou a pessoas físicas, o desconto será de 20% do
valor da remuneração creditada ou repassada ao cooperado.
No que
se
refere ao trabalhador
portuário avulso,
o órgão gestor de mão
de obra (OGMO) elaborará a folha de pagamento
por
navio, mantendo-a
disponível para uso da fiscalização, indicando o operador portuário e os
trabalhadores que participaram da operação, detalhando,
com
relação
aos
últimos: os correspondentes números
de registro ou cadastro no OGMO; o cargo,
função ou serviço
prestado;
os
turnos em
que trabalharam; e
as remunerações
pagas, devidas ou creditadas a cada
um
dos trabalhadores e
a
correspondente totalização.
Para os avulsos terrestres, estes entram na folha de pagamento da
130
empresa tomadora de serviços,
junto com seus empregados e contribuintes
individuais.
4.4.2. Lançamento dos fatos geradores das contribuições
Lançar mensalmente
em
títulos próprios de sua
contabilidade,
de forma
discriminada, os fatos geradores de todas as
contribuições, o montante das
quantias descontadas, as contribuições da empresa
e os totais
recolhidos.
Cabe à empresa efetivamente
incluir
na
folha
de
pagamento
todos
os
valores
pagos
a
seus segurados, todavia, não
é
isso que
em algumas
situações, infelizmente é
comum a fiscalização encontrar valores que
tenham sido pagos “por
fora” aos empregados ou ainda aquelas que
“camuflam” o salário-de-contribuição com nomes de outras verbas que por sua vez
não possuam natureza salarial, mas que são creditadas freqüentemente aos
empregados.
Como exemplo
, uma
empresa p o d e perfeitamente pagar, além dos
salários de seus empregados,
o
aluguel dos imóveis de seus supervisores e
gerentes. Muito provavelmente esta empresa não irá
colocar
tais valores na
folha de
pagamento, mas deveria, pois estes são componentes
do
salário-de-
contribuição do empregado.
Outro exemplo é o empregado que
tem carro à
disposição (não
para
o
trabalho, mas sim
pelo
trabalho). Tal
benesse não
é usualmente
espelhada na
folha de pagamento, mas
também de
veria. Por esta razão, cabe ao auditor
-fiscal
131
localizá-lo
na contabilidade
e cobrar os valores
devidos.
Naturalmente, os
lançamentos contábeis devem ser escriturados nos livros
Diário e Razão
147
, sendo
exigidos pela fiscalização após noventa dias
contados
da ocorrência
dos fatos
geradores das contribuições. Ou seja, o
salário que
foi
pago
hoje deve já estar escriturado na contabilidade
em
90 dias.
Igualmente, como
não poderia deixar
de ser, a contabilidade
deve
atender ao princípio
contábil do regime de competência; e
registrar, em contas
individualizadas, todos os fatos geradores de contribuições previdenciárias
de
forma a identificar, clara e
precisamente, as
rubricas integrantes e
não
integrantes
do
salário-de-contribuição, bem como as contribuições descontadas
do segurado, as
da empresa e os totais recolhidos,
por
estabelecimento da
empresa, por obra de construção civil e
por
tomador de serviços.
As empresas
também deverão manter à disposição da fiscalização
os
códigos ou abreviaturas que identifiquem as respectivas
rubricas utilizadas
na
elaboração da folha de pagamento, bem como os utilizados na escrituração
contábil.
Aqui, ainda devemos ressaltar que estão desobrigados de
apresentação
de
escrituração contábil:
147
O Livro Diário, como o próprio nome expressa, é utilizado para o registro diário, na seqüência, por
ordem de acontecimento (ordem cronológica) de todos os fatos que vierem a ocorrer na empresa. O
fato a ressaltar é que devido a sua escrituração ser efetuada pela ordem cronológica, embaralha as
contas, dificultando, com isso, o exame individualizado das mesmas.Já o Livro Razão, apesar de ser
tido como facultativo, é muito importante para o sistema contábil. É exigido das empresas cuja
tributação do Imposto de Renda seja com base no Lucro Real. O Livro Razão, na verdade, é mais
conhecido como “Fichas “Razão”.
132
(a)
-
o pequeno comerciante, nas condições estabelecidas pelo
Decreto-lei nº
486,de 3 de março de 1969, e seu Regulamento
(note-se que após o novo
Código Civil, a expressão correta é
pequeno empresário);
(b)
-
a pessoa
jurídica tributada com base no lucro
presumido, de acordo com
a legislação
tributária federal, desde
que
mantenha a escrituração do Livro Caixa e Livro de Registro
de Inventário;
e
(c)
-
a pessoa jurídica que optar pela
inscrição no Sistema
Integrado de Pagamento de Impostos
e Contribuições das
Microempresas e Empresas de Pequeno
Porte,
desde
que
mantenha
escrituração do Livro Caixa e Livro
de
Registro de
Inventário.
Por fim,
a empresa
que utiliza sistema de processamento
eletrônico de
dados para
o
registro
de
negócios e atividades
econômicas, escrituração de
livros
ou
prodão de documentos de natureza contábil, fiscal,
trabalhista e
previdenciária
é obrigada a arquivar
e
conservar, devidamente certificados, os
respectivos
sistemas e arquivos, em meio digital ou assemelhado,
durante dez
anos, à disposição da fiscalização. (Incluído pelo
Decreto nº 4.729, de 9.6.2003).
4.4.3. Dever de prestar informações
Prestar a Secretaria da Receita Federal do Brasil
todas as informações
cadastrais, financeiras e contábeis de interesse dos
mesmos,
na forma por eles
estabelecida,
bem
como
os
esclarecimentos necessários à fiscalização.
As empresas possuem o dever de informar todos os fatos geradores na folha
de pagamento
e de sua contabilidade,
para que
o auditor tenha todas as
133
informações
necessárias
e verificar
para a quantificação do valor devido.
Infelizmente, é possível encontrar empresas
que visando sonegar
contribuição
podem, perfeitamente, preparar uma folha de pagamento e
contabilidade
fora da realidade, com
valores
inferiores ao que é efetivamente
pago.
Nestas
hipóteses, o Auditor Fiscal pode utilizar-se de mecanismos
outros,
como a
solicitação
de informação de todo tipo,
como
inquirir diretamente
empregados, verificando
se os mesmos
estão na folha de
pagamento, se a
remuneração lá contida é real,
por exemplo
.
O tempo urge. Cada vez mais o homem depende do uso dos meios
tecnológicos em suas atividades diárias. Raras são as empresas que não se utilizam
de sistemas de processamentos eletrônico de dados para registro de negócios e
atividades econômicas ou financeiras, escrituração de livros ou produção de
documentos de natureza contábil, fiscal, trabalhista e previdenciária.
Padronizam-se os arquivos, a formatação e os sistemas para facilitar a
fiscalização e, porque não dizer, para que estes sirvam como meio de prova em
nossos tribunais.
A padronização exigida pela Lei n.º 10.666/2003 é obrigatória a partir de 1º de
junho de 2003 e está disciplinada pela Portaria INSS/Direp n.º 42, de 24 de junho de
2003.
134
Para os períodos anteriores a 1º de julho de 2003, será facultada a
apresentação dos arquivos digitais na forma estipulada pela aludida portaria.
Caso a empresa não se utilize de sistemas de processamento, não estará
imbuída do cumprimento da obrigação em discussão.
Nos termos da Portaria do INSS/Direp nº 41/2003, os arquivos digitais
poderão ser entregues nos seguintes meios:
- disquete, padrão PC-IBM, FAT-12 (1,44 MB);
- CD, padrão de gravação ISSO-9660 (600MB);
- conexão em rede local (LAN), desde que haja compatibilidade de protocolos,
utilitários e recursos tecnológicos;
- transmissão direta entre computadores, desde que haja compatibilidade de
protocolos, utilitários e recursos tecnológicos;
- em outro meio físico, desde que aceito pelo Auditor Fiscal.
A partir de 1º de abril de 2004, o prazo de apresentação dos arquivos digitais
constará do termo de Intimação para apresentação de documentos (TIAD), e não
mais de exatos 20 dias, como consta na revogada IN nº 89/2003.
135
A Diretoria da então Receita Previdenciária (Direp) estabeleceu a forma de
apresentação, a documentação de acompanhamento e as especificações técnicas
dos arquivos digitais, por meio da Portaria INSS/Direp nº 42, de 24 de junho de
2003, que entrou em vigor na data de sua publicação (30.06.2003) e revogou a
Portaria INSS/Dirar nº 21, de 28 de março de 2003.
4.4.4. Encaminhamento da GPS pela empresa ao sindicato da
categoria profissional
Encaminhar ao sindicato representativo da categoria profissional mais
numerosa
entre
seus empregados, até
o dia
dez de cada
mês,
cópia
da
Guia da
Previdência Social relativamente à competência anterior.
O propósito desta obrigação acessória é possibilitar aos sindicatos que
exerçam
algum
controle
sobre
os recolhimentos da empresa para a
previdência social.
Como o sindicato deve tutelar
os
interesses de seus integrantes,
incluindo a previdência social, a falta de recolhimento, como prejudica o
sistema protetivo, igualmente prejudica o trabalhador, e
por isso o
sindicato
pode
mesmo oferecer
denúncia a Secretaria da Receita Previdenciária se o
recolhimento
não
estiver adequado.
Como a guia de recolhimento é enviada ao sindicato representativo da
categoria mais numerosa da empresa, este tem uma razoável idéia do
quantitativo
de
empregados
na mesma,
além
de ter
uma idéia aproximada do valor
136
da folha de pagamento.
Por
esta razão,
pode o sindicato facilmente identificar
indícios de sonegação caso a empresa
possua mais de um estabelecimento
localizado em
base geográfica
diversa (diferentes Municípios, por exemplo),
p o i s a cópia da Guia da
Previdência Social será encaminhada ao
sindicato
representativo da categoria profissional
mais
numerosa
entre os
empregados de cada estabelecimento.
Se
a empresa recolhe suas contribuições em mais de uma Guia da
Previdência
Social, deve encaminhar cópia
de todas
as guias. A remessa das
cópias poderá
ser efetuada
por qualquer meio que garanta a
reprodução integral
do documento, cabendo à empresa manter, em seus arquivos, prova
do
recebimento
pelo sindicato.
Isto é, cabe à
empresa
a comprovação, perante a
fiscalização, do
cumprimento
de
sua obrigação
frente ao sindicato.
Por isso
a
empresa deve ter cuidado
com
o meio escolhido para
a
remessa das cópias
das guias.
Evidenciando
falha de recolhimento ou
qualquer outro problema, os
sindicatos
poderão
apresentar denúncia
contra a empresa,
nas seguintes
hipóteses:
I
-
falta de
envio
da Guia da Previdência Social
para o sindicato;
II
-
não afixação da Guia da Previdência Social no quadro de horário;
III
existência de evidentes indícios de recolhimento a menor das
contribuições devidas, constatados pela
comparação com dados
137
disponíveis
sobre
quantidade de empregados e de
rescisões de contrato de
trabalho homologadas pelo sindicato.
As denúncias formuladas
pelos sindicatos deverão identificar com
precisão
a empresa
infratora
e
serão encaminhadas por seu
representante legal,
especificando
nome, número no Cadastro Nacional
da Pessoa
Jurídica e
endereço da empresa denunciada, o item infringido e outros elementos
indispensáveis à análise dos
fatos.
4.4.5. Dever de afixar Guia da Previdência Social no quadro de
horários
Afixar cópia da Guia da Previdência Social, relativamente à competência
anterior, durante
o período
de
um
mês,
no quadro de horário
de que trata o art.
74 da Consolidação das Leis do Trabalho.
O artigo
74 da CLT, como dito anteriormente,
trata
do quadro de
horário,
prevendo que o “horário do trabalho constará
de quadro, organizado conforme
modelo
expedido
pelo Ministro do Trabalho, Industria e Comercio,
e afixado
em
lugar bem visível. Esse quadro
será discriminativo no
caso de não ser o horário
único para todos os empregados de uma mesma seção ou
turma”.
Neste mesmo quadro, a empresa
deverá fixar uma cópia da GPS
recolhida. A idéia é que os próprios empregados possam, também, efetuar
138
um controle sobre o recolhimento previdenciário da empresa.
Além disso, a empresa deve encaminhar ao sindicato representativo da
categoria profissional mais numerosa entre seus empregados, até o dia 10 de cada
mês, cópia da Guia da Previdência Social (GPS) relativamente à competência
anterior; e afixar cópia desta mesma guia, durante o período de um mês, no quadro
de horário de que trata o artigo 74 da Consolidação das Leis do Trabalho
148
.
Está
dispensado
desta obrigação acessória, assim como a anterior
(remessa
da GPS para
o sindicato), o
contribuinte individual, em
relação ao
segurado que lhe presta serviço, pois é equiparado
à
empresa,
e por esta
razão também é responsável pelos recolhimentos previdenciários (vide artigo 22 da
lei 8212/91).
4.4.5.1. Conservação da escrita contábil
Apesar de a legislação previdenciária referir-se com freqüência ao período de
10 (dez) anos para conservação da escrita contábil, não há tempo certo para sua
manutenção. Como se sabe, prazos prescricionais, referentes a créditos já
constituídos, podem ser interrompidos, sendo, portanto, o período de cobrança
passível de expansão por várias décadas.
148
“Art. 74. O horário do trabalho constará de quadro, organizado conforme modelo expedido pelo
ministro do Trabalho e afixado em lugar bem visível. Esse quadro será discriminativo no caso de não
ser o horário único para todos os empregados de uma mesma seção ou turma.
§ 1º O horário de trabalho será anotado em registro de empregados com a indicação de acordos ou
contratos coletivos porventura celebrados.
§ 2º Para os estabelecimentos de mais de dez trabalhadores será obrigatória a anotação da hora de
entrada e de saída, em registro manual, mecânico ou eletrônico, conforme instruções a serem
expedidas pelo Ministério do Trabalho, devendo haver pré-assinalação do período de repouso.
139
Também a empresa que utiliza sistema de processamento eletrônico de
dados para o registro de negócios e atividades econômicas, escrituração de livros ou
produção de documentos de natureza contábil, fiscal, trabalhista e previdenciária é
obrigada a arquivar e conservar, devidamente certificados, os respectivos sistemas e
arquivos, em meio digital ou assemelhado, durante 10 (dez) anos, à disposição da
fiscalização (art. 8º da Lei no 10.666/03). Aqui também é criticável a previsão do
prazo decenal – deveria a Lei somente determinar a conservação dos arquivos,
enquanto não se der a prescrição dos créditos envolvidos.
Deve-se frizar que o pequeno empresário (artigo 970, Lei n.° 10.406/2002); a
pessoa jurídica tributada com base no lucro presumido, se acordo com a legislação
tributária federal, desde que mantenha a escrituração do Livro Caixa e Livro de
Registro de Inventário, e, neste mesmo termo, a pessoa jurídica que optar pela
inscrição no Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e Contribuições das
Microempresas e Empresas de Pequeno Porte.
4.4.6. Dever de comunicação dos municípios
Comunicação dos
Municípios de alvarás para construção civil e documentos
de habite-se concedidos.
O Município,
como se sabe, pode
perfeitamente ser
enquadrado como
§ 3º Se o trabalho for executado fora do estabelecimento, o horário dos empregados constará,
explicitamente, de ficha ou papeleta em seu poder, sem prejuízo do que dispõe o § 1º deste artigo.”
140
empresa para fins previdenciários, e deve, se
for o caso, cumprir todas as
obrigações previdenciárias, incluindo as acessórias.
Todavia, temos aqui uma
obrigação exclusiva dos Municípios,
independente das
demais.
Por intermédio do órgão competente, este ente federativo deve fornecer a
fiscalização, mensalmente, até o dia 10 do mês seguinte àquele a que se referirem
os documentos, relação de todos os alvarás para construção civil e documentos de
“habite-se” concedidos. Originalmente, a lei previa a obrigatoriedade de os
municípios concederem alvará somente após a inscrição da obra no INSS e a
concessão do “habite-se” somente após a obtenção da certidão negativa de débito –
CND. Todavia, a Lei nº 9.476, de 23/07/97, trouxe a regra atual, evidentemente
inferior à antiga. De qualquer forma, a CND será exigida no momento da averbação
do imóvel no Registro Geral de Imóveis – RGI.
A intenção é a de que uma
obra de construção civil não
se inicia por si só,
ou seja,
naquele local
mão-de-obra, e que em
geral,
é remunerada. Logo, se
mão-de-obra
remunerada, sabe-se que haverá contribuição social a
ser
recolhida.
Da mesma
forma, se alguém pede habite-se ao Município, é sinal que
uma
obra
foi
feita.
Se
foi, certamente temos contribuição devida.
Se o
Município
comunica
a concessão do habite-se para
determinada obra, a Secretaria da
Receita Federal do Brasil irá verificar se
o
recolhimento foi feito.
Caso não tenha
sido, fará a cobrança
sobre
a cobrança mediante
aferição.
141
4.4.7. Dever do Registrador Civil de Pessoas Naturais em
comunicar óbitos ao Instituto Nacional do Seguro Social
Trata-se da comunicação dos
óbitos
pelo Cartório (Registrador Civil de
Pessoas Naturais) ao
Instituto Nacional do Seguro Social.
O titular de cartório de registro civil e de pessoas naturais é obrigado a
comunicar, até o dia dez de cada mês, o registro dos óbitos ocorridos no mês
imediatamente anterior, devendo da comunicação constar o nome, a filiação, a data
e o local de nascimento da pessoa falecida. No caso de não haver sido registrado
nenhum óbito, a comunicação ainda assim será feita.
É evidente o propósito do legislador no controle da concessão e do
pagamento dos benefícios, pois se chegar a informação enviada pelo cartório e
que determinado segurado
faleceu,
a autarquia deve cancelar o benefício,
evitando que alguém o receba em seu lugar.
4.4.8. Informações mensais através da Guia de Recolhimento do
Fundo de Garantia por Tempo de Serviço e Informações à Previdência Social
Informar
mensalmente ao INSS e
SRFB,
por intermédio da
Guia
de
Recolhimento
do Fundo de Garantia do Tempo
de
Serviço
e
Informações
à
Previdência
Social -
GFIP,
na
forma
estabelecida,
dados
cadastrais,
todos
os
fatos geradores
de contribuição previdenciária e outras informações de
142
interesse; (vide
Manual da GFIP aprovado pela IN MPS/SRP n.° 11, de 25/04/2006),
cujo objetivo principal é abastecer o CNIS (Cadastro Nacional de Informações
Sociais) com as informações relativas aos segurados da previdência social, criou-se
um documento no qual as empresas informam dados de todos os segurados que lhe
prestem serviço, tais como nome, remuneração, categoria (empregado, avulso etc.),
exposição a agentes nocivos entre outros.
Tal base de dados irá facilitar a concessão de benefícios, pois todas as
informações relativas ao segurado já constarão do CNIS, podendo-se identificar de
pronto seu status de segurado e o cumprimento de determinados requisitos, como,
por exemplo, carência.
Esta sistemática de concessão de benefícios, conhecida como inversão
do
ônus
da prova, já foi
implantada pela Lei
n.
10.403/02
(ver art.
29-A da Lei n.
8213/91).
E, para
evitar o custo extra para o Poder Público
e
para as empresas, de
terem de trabalhar com mais um documento, optou-se
por transformar uma
guia
existente, para
também
atender aos
interesses da
previdência.
Foi o que
aconteceu. O governo
federal
alterou a guia de recolhimento do FGTS para,
além de continuar cumprindo essa função, prestar também
informações
à
previdência social
.
Para a Previdência Social, a
GFIP é
mera obrigação acessória, sendo
que o recolhimento previdenciário continua sendo feito em GPS
(guia
de
recolhimento da previdência).
143
Além
deste objetivo, a GFIP também é documento utilizado como confissão
de dívida por parte da empresa, pois esta informará todas os valores pagos
aos trabalhadores
que lhe prestaram serviço, informando, inclusive, o valor
total devido. De posse destas informações, a União poderá inscrever, de
imediato, os valores declarados em GFIP na dívida ativa, passando a fase de
execução, se necessário (art.
32, IV da Lei n° 8.212/91, acrescentado pela
Lei
nº 9.528, de 10.12.97).
Vejam então que
a GFIP é documento de extrema relevância tanto para o
custeio previdenciário
como
para
o benefício, e
por isso a
legislação traz
pesadas multas
para as empresas que não fazem a
GFIP ou não a preenchem
corretamente.
4.4.9. Emissão, guarda, impressão e entrega do Perfil
Profissiográfico Previdenciário – PPP
Considera-se Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), segundo o Decreto
nº. 4.032/2001, que acresceu o 8º ao art. 68 do Regulamento da Previdência Social
(RPS), aprovado pelo decreto nº. 3.048/1999, o documento histórico-laboral do
trabalhador, segundo modelo instituído pelo Instituto Nacional do Seguro Social,
que, entre outras informações, deve conter registros ambientais, resultados de
monitoração biológica e dados administrativos.
144
O Perfil Profissiográfico Previdenciário tem a finalidade de demonstrar as
condições para habilitação de aposentadoria especial, fornecer informações
estatísticas, para desenvolvimento de vigilância sanitária e epidemiológica, bem
como definição de políticas em saúde coletiva, e prover a empresa de documentos a
serem utilizados em eventuais ações judiciais.
Conforme o art. 148 da IN nº 95 do INSS, a partir de 1º de janeiro de 2004, a
empresa ou equiparada à empresa deverá elaborar Perfil Profissiográfico
Previdenciário, conforme Anexo XV, de forma individualizada para seus
empregados, trabalhadores avulsos e cooperados, que laborem expostos a agentes
nocivos químicos, físicos, biológicos ou associados de agentes prejudiciais a saúde
ou a integridade física, considerados para fins de concessão de aposentadoria
especial, ainda que não presentes os requisitos para a concessão desse benefício,
seja pela eficácia dos equipamentos de proteção, coletivos ou individuais, seja por
não se caracterizar a permanência.
O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) será emitido:
- pela empresa empregadora, no caso de empregado;
- pela cooperativa de trabalho ou de produção, no caso de cooperado filiado;
- pelo OGMO, no caso de trabalhador avulso portuário;
- pelo sindicato da categoria, no caso de trabalhador avulso não portuário.
145
Deverá ser atualizado pelo menos uma vez ao ano, ou em prazo inferior
quando houver alteração que implique em mudança das informações contidas nas
suas seções, ser elaborado e mantido atualizado no computador dos responsáveis
por essa obrigação, e deve ser impresso nas seguintes situações:
- por ocasião da rescisão do contrato de trabalho ou da desfiliação da
cooperativa, sindicato ou OGMO, em duas vias, com fornecimento de uma das vias
para o trabalhador, mediante recibo;
- para fins de análise de benefícios por incapacidade, a partir de 1º de janeiro
de 2004, quando solicitado pelo INSS;
- para simples conferência por parte do trabalhador, pelo menos uma vez ao
ano, por ocasião da avaliação global anual do Programa de Prevenção de Riscos
ambientais (PPRA), até que seja implantado o PPP em meio magnético pela
Previdência Social;
- quando solicitado pelas autoridades competentes.
O Perfil Profissiográfico Previdenciário e a comprovação de sua entrega ao
trabalhador, na rescisão de contrato de trabalho ou da desfiliação da cooperativa,
sindicato ou OGMO, deverão ser mantidos na empresa por vinte anos.
146
O descumprimento das obrigações anteriores sujeitará o infrator à pena de
multa variável de R$ 991,03 (novecentos e noventa e um reais e três centavos) a R$
99.102,12 (noventa e nove mil cento e dois reais e doze centavos), conforme a
gravidade da infração.
4.4.10.
Conseqüências
descumprimento das obrigações
acessórias
A lei dispõe sobre o descumprimento através dos parágrafos 4 a 11 do artigo
32 da Lei 8212/1991. Deve-se salientar que a não cumprimento da obrigação
acessória, pode acarretar na imposição de uma penalidade administrativa,
geralmente multa, mas nunca, jamais acarretará no pagamento de uma contribuição
social.
O que pode acontecer é, o fato do contribuinte prestar informação através da
GFIP e não efetuar o recolhimento devido. Uma vez analisado o caso concreto e
constatada a dívida, poderá o Auditor Fiscal inscrever o débito em dívida ativa,
iniciando-se a execução fiscal. Tudo isso porque a GFIP serviu como documento
para que a empresa confessasse sua dívida.
Estabelece o parágrafo 4° do artigo em comento:
147
§ 4º A não apresentação do documento previsto no inciso IV,
independentemente do recolhimento da contribuição, sujeitará o infrator à pena
administrativa correspondente a multa variável equivalente a um multiplicador sobre
o valor mínimo previsto no art. 92, em função do número de segurados, conforme
quadro a seguir: (Incluído pela Lei 9.528, de 10.12.97)
0 a 5 segurados ½ valor mínimo
6 a 15 segurados 1 x o valor mínimo
16 a 50 segurados 2 x o valor mínimo
51 a 100 segurados 5 x o valor mínimo
101 a 500 segurados 10 x o valor mínimo
501 a 1000 segurados 20 x o valor mínimo
1001 a 5000 segurados 35 x o valor mínimo
Acima de 5000 segurados 50 x o valor mínimo
§ 5º A apresentação do documento com dados não correspondentes aos fatos
geradores sujeitará o infrator à pena administrativa correspondente à multa de cem
148
por cento do valor devido relativo à contribuição não declarada, limitada aos valores
previstos no parágrafo anterior. (Incluído pela Lei 9.528, de 10.12.97)
§ 6º A apresentação do documento com erro de preenchimento nos dados
não relacionados aos fatos geradores sujeitará o infrator à pena administrativa de
cinco por cento do valor mínimo previsto no art. 92, por campo com informações
inexatas, incompletas ou omissas, limitadas aos valores previstos no § 4º
. (Incluído
pela Lei 9.528, de 10.12.97)
§ 7º A multa de que trata o § 4º sofrerá acréscimo de cinco por cento por mês
calendário ou fração, a partir do mês seguinte àquele em que o documento deveria
ter sido entregue. (Incluído pela Lei 9.528, de 10.12.97)
§ 8º O valor mínimo a que se refere o § 4º será o vigente na data da lavratura
do auto-de-infração. (Incluído pela Lei 9.528, de 10.12.97)
§ 9º A empresa deverá apresentar o documento a que se refere o inciso IV,
mesmo quando não ocorrerem fatos geradores de contribuição previdenciária, sob
pena da multa prevista no § 4º. (Incluído pela Lei 9.528, de 10.12.97)
149
§ 10. O descumprimento do disposto no inciso IV é condição impeditiva para
expedição da prova de inexistência de débito para com o Instituto Nacional do
Seguro Social-INSS. (Incluído pela Lei 9.528, de 10.12.97)
§ 11. Os documentos comprobatórios do cumprimento das obrigações de que
trata este artigo devem ficar arquivados na empresa durante dez anos, à disposição
da fiscalização. (Incluído pela Lei 9.528, de 10.12.97)
Para melhor elucidação, utilizaremos como regra as disposições legais
acima colacionadas:
A não apresentação da GFIP, independentemente do recolhimento da
contribuição, sujeitará o infrator à pena administrativa correspondente à multa
variável equivalente
a um multiplicador
sobre o
valor mínimo de
multa da regra
geral
de infrações (que ainda
estudaremos, atualmente em R$ 1.156,95),
em
função do número de
segurados, conforme
quadro trazido pela legislação acima
colacionada. Note-se
que
a
imposição de multa independe
se a
empresa recolheu
ou não suas
contribuições, logo, neste caso, trata-se apenas do descumprimento
da obrigação acessória prevista na norma legal.
Se a empresa
também deixou de recolher as contribuições devidas,
arcará
com juros e
multa
de mora
em razão
disso. Deve-se ressaltar que não
há qualquer ligação com
a multa
por descumprimento
de obrigação acessória, pois
possuem fatos geradores distintos.
150
Outra forma de sofrer penalidade quanto a não entrega da GFIP
é
a referente
à apresentação do
documento com dados não correspondentes
aos fatos
geradores, sujeitando
o infrator
à pena correspondente à multa
de 100% do valor
devido relativo à
contribuiçãoo
declarada ou do
valor que
seria devido
se não
houvesse isenção ou substituição, quando se tratar de infração cometida
por
pessoa jurídica de
direito
privado beneficente de assistência social
em gozo de
isenção das contribuições previdenciárias ou
por empresa
cujas contribuições
incidentes sobre os respectivos fatos geradores tenham sido substituídas por
outras, limitada aos valores previstos no quadro anterior.
Em suma, suponha-se que
uma empresa
entregue a
GFIP
, mas omite
fato
gerador de contribuição.
Por exemplo,
ao invés
de
informar as remunerações
dos
empregados
que
ganham R$
5.000,00,
informou
em
GFIP que seria R$
500,00, por erro de preenchimento.
Ora,
se a empresa informou remuneração à
menor, está omitindo fato
gerador.
Ademais, o
fato
de
ter informado o fato gerador a menor, por engano, ou
seja, sem
dolo
é irrelevante, pois a responsabilidade por infrações,
em regra,
é
objetiva.
E o valor da multa será o valor da contribuição que foi omitida,
indiretamente omitida
pela omissão dos
fatos geradores.
Se, por exemplo, a
empresa
indiretamente omitiu uma
contribuição de R$ 1.000,00
em razão do erro
de preenchimento das remunerações,
será este
o valor da
multa.
151
Outro ponto que merece destaque interessante é quando a empresa, erra no
preenchimento da GFIP, mas faz o recolhimento corretamente. Neste caso, mesmo
assim, há a aplicação da multa, pois conforme já ressaltado anteriormente trata-se
aqui do descumprimento de obrigação acessória.
Agora, s
e a empresa, além de prestar informações errôneas em GFIP,
também recolher a menor na Guia da Previdência Social - GPS terá de pagar
esta diferença
com juros e multa de mora, pois não se pode confundir a
obrigação principal do tributo com
a obrigação acessória. Porém, não se pode
deixar de esclarecer que os valores estabelecidos para a primeira regra servem de
“teto” para o caso ora em comento.
Se a empresa entrega a GFIP, mas desta vez
com
erro de
preenchimento
nos
dados não relacionados aos fatos geradores, por exemplo,
comete erro no campo de informação da data de nascimento do
segurado,
estará
sujeita à pena
administrativa de 5% do valor
mínimo previsto
no
art. 92 da
Lei
8.212/91, por
campo
com informações
inexatas, incompletas
ou omissas,
limitadas
aos valores previstos no quadro acima.
Ainda sobre GFIP, a empresa deverá apresentar a mesma, até mesmo
quando não ocorrer fatos geradores de contribuição previdenciária.
A
falta
de
entrega
da
GFIP
é
condição impeditiva para
expedição
da
prova de inexistência de débito
(CND). Como o documento é de extrema
relevância para a previdência,
a
sua não entrega impede até mesmo
a emissão
152
de Certidão Negativa de Débito – (CND). Assim estabelece a Constituição Federal
em seu parágrafo
3.º do art. 195, que não poderão contratar com o Poder Público
as pessoas que com ele possuam débito.
“Art.195.
§3.º. A pessoa jurídica em débito com o sistema da seguridade social, como
estabelecido em lei, não poderá contratar com o Poder Público nem dele receber
benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios”.
Os documentos comprobatórios da entrega da GFIP devem ficar
arquivados
na empresa durante dez anos, à disposição da fiscalização.
A entrega da Guia de Recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de
Serviço e Informações à Previdência Social deverá ser efetuada na rede
bancária, até o dia
sete do mês seguinte
àquele a que se
referirem
as
informações (que é
o prazo de recolhimento
do
FGTS).
A Guia
de
Recolhimento do Fundo
de Garantia do Tempo
de Serviço e
Informações à
Previdência Social
é exigida relativamente a
fatos geradores
ocorridos a partir de janeiro de 1999.
Art. 52. À empresa em débito para com a Seguridade Social é
proibido:
I - distribuir bonificação ou dividendo a acionista;
II - dar ou atribuir cota ou participação nos lucros a sócio-cotista,
diretor ou outro membro de órgão dirigente, fiscal ou consultivo,
ainda que a título de adiantamento.
Parágrafo único. A infração do disposto neste artigo sujeita o
153
responsável à multa de 50% (cinqüenta por cento) das quantias que
tiverem sido pagas ou creditadas a partir da data do evento,
atualizadas na forma prevista no Art. 34.
Diante do exposto, e, por todas as regras acima colacionadas, pode-se
verificar a importância da obrigação acessória para a Previdência Social, uma vez
que esta possui papel de extrema importância, fundamental para que se tenha um
melhor e mais ágil sistema de fiscalização e arrecadação das contribuições, para
que o fim maior estabelecido pela Carta Magna em seu Título VII – o bem estar e
justiça sociais.
CONCLUSÃO
Temos que a relação jurídica estabelece o modo de comportamento das
pessoas nas relações intersubjetivas, concluindo-se, deste modo, seja este, o único
meio de o que o Estado dispõe para a concretização e o atendimento de seus
objetivos trazidos pela Carta maior. E assim o faz utilizando-se da ciência do Direito,
cujo principal objetivo é regular essa convivência social.
Nota-se que inclusive no âmbito das obrigações acessórias previdenciárias, o
vínculo existente entre o Estado e as partes não é uma relação de poder, mas sim
uma relação jurídica de natureza obrigacional, no qual irá posteriormente traduzir-se
como um dos principais instrumentos para a efetivação do objeto fundamental do
Direito Previdenciário, que é a proteção do risco social.
Este vínculo, nasce da ocorrência de um fato típico e jurídico previsto em lei,
que se traduz no fato gerador. Surge, portanto, uma obrigação.
154
A obrigação dos sujeitos passivos aqui estudados, é a de prestar informações
ou pagar uma penalidade pecuniária, que encontram-se validamente existentes no
mundo fenomênico quando ocorrer o fato gerador da obrigação.
Em breve síntese, temos que a obrigação tributária é o vínculo jurídico entre o
Estado (sujeito ativo) e o contribuinte (sujeito passivo), pelo qual aquele tem o direito
subjetivo de exigir deste o pagamento de um tributo ou de penalidade pecuniária por
descumprimento de norma tributária. A obrigação pode ser principal ou acessória. A
primeira surge com a ocorrência do fato gerador, e tem por objeto o pagamento de
tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se com o crédito dela decorrente; a
segunda decorre da própria legislação tributária e tem por objeto as prestações,
positivas ou negativas, nela previstas no interesse da arrecadação ou da fiscalização
dos tributos. A obrigação acessória, pelo simples fato da sua inobservância,
converte-se em obrigação principal quanto à penalidade pecuniária.
As obrigações tributárias acessórias são exigidas pelo sujeito ativo com o
intuito de assegurar o interesse da arrecadação dos tributos e também para facilitar
a atividade de fiscalização no sujeito passivo.
Estas obrigações não estão relacionadas, no sentido de dependência, com
uma determinada obrigação principal, podendo existir independentemente desta.
Servem para viabilizar o cumprimento de possíveis obrigações principais de outros
tributos, como por exemplo, na emissão de uma nota fiscal de uma operação isenta
de ICMS, é exigida a emissão porque se presta para controlar contabilmente sua
receita para repercussão em outros tributos, como as contribuições ao PIS e a
COFINS e para o Imposto de Renda e a CSLL.
Esta independência e a questão terminológica de obrigação gera conflitos
doutrinários dos civilistas em face do Código Tributário Nacional, pois em Direito
Tributário esta obrigação nem sempre é acessória seguindo caminho diverso da
obrigação principal, contrariando a regra civilista "accessorium sequitur suum
principale".
155
Assim, deve ser distinguido o termo obrigação acessória na concepção da
doutrina privatista, da obrigação acessória do Código Tributário Nacional, e neste
estudo, conseqüentemente na legislação previdenciária.
Vale acrescentar que a obrigação acessória decorre da legislação tributária,
abrangendo assim normas infralegais, como os decretos, com o intuito de
regulamentar as leis instituidoras dos tributos pelos entes federados.
Então, o interesse público que legitima a exigência de obrigações tributárias
acessórias é aquele estritamente relacionado à fiscalização ou à arrecadação de
tributos. Tudo aquilo que não atender a esse comando, estará inquinado do
insanável vício da nulidade.
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