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Em suas leituras, vários autores ingleses aparecem entre seus favoritos, como
Shakespeare, Milton, Matthew Arnold, Francis Bacon, Robert Browning, Charles
Dickens, para citar alguns. Além disso, Pessoa produziu extensa obra escrita em inglês:
os “35 sonnets” em 1912 ou 1913, que só seriam publicados em 1918 e que,
curiosamente, segundo o próprio Pessoa, foram uma tentativa de escrever à maneira de
Shakespeare; o poema “Antinuous”, de 1915; “Inscriptions”, datado de 1920; e
“Epithalamium” de 1913. Esses poemas foram reunidos sob o título de English poems I,
II e III. Mais tarde, na revista inglesa The Athenaeum, Pessoa publicaria o poema
“Meantime” aos 30 de janeiro de 1920. Seu heterônimo, Thomas Crosse, traduziu para
o inglês alguns poemas de O Guardador de Rebanhos (The Keeper of Sheep), além de
ter escrito um longo prefácio sobre essa obra.
Outro ponto que confirma o débito pessoano para com a cultura inglesa é o fato
de, em sua carreira literária, ele jamais haver desistido de se apresentar como poeta
inglês, tendo, inclusive, retirado o acento circunflexo que originalmente havia em seu
nome – Pessôa – com o objetivo de torná-lo mais “cosmopolita”. Em março de 1923,
publicou, em Portugal, na Revista Contemporânea, o poema “Spell”. Álvaro de
Campos, um dos heterônimos que mais se aproxima do poeta ‘ele-mesmo’, ‘fez seus
estudos de engenharia em “Glasgow”, e a Ode Triunfal, talvez o seu poema mais
eminentemente inspirado em Whitman, foi escrito em “Londres”.
Mesmo em seu último suspiro, pouco antes de morrer, Fernando Pessoa pediu
uma folha de papel para escrever suas últimas palavras. Não foi a língua portuguesa a
escolhida para esse momento de despedida, mas sim, mais uma vez, a língua inglesa,
que havia iniciado seu caminho literário e que agora o fechava com a frase: “I know not
what tomorrow will bring”
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. Referir-se-ia o poeta ao futuro de sua obra, à repercussão
de seus poemas no mundo que os recebeu durante sua vida de forma tímida e pouco
acolhedora? Ou, ainda, questionava ele o destino de sua alma após a passagem para o
outro lado, uma problemática metafísica tantas vezes presente em sua produção
literária? Seja qual for sua verdadeira indagação, não teria sido ele inconscientemente
inspirado pelos sintagmas que adornam a parte final do longo poema de Whitman, The
Sleepers
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, cujo tema – a noite – tanto se aproxima da indefinição da morte? “I know not
how I came of you, and I know not where I go with you…”
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Não sei o que trará o amanhã
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Os Adormecidos
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Não sei como vim de você, nem sei aonde vou com você...
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