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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP
CHRISTIANE PAES SILVA
SOBRE A CRÍTICA CINEMATOGRÁFICA BRASILEIRA
Análise da produção periódica nos últimos cinco anos
Programa de Comunicação e Semiótica
PUC-SP
São Paulo – 2007
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP
CHRISTIANE PAES SILVA
SOBRE A CRÍTICA CINEMATOGRÁFICA BRASILEIRA
Análise da produção periódica nos últimos cinco anos
Dissertação apresentada à Banca Examinadora
da Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, como exigência parcial para obtenção
do título de MESTRE em Comunicação e
Semiótica, sob a orientação da Profa. Doutora
Leda Tenório da Motta.
Programa de Comunicação e Semiótica
PUC-SP
São Paulo – 2007
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP
CHRISTIANE PAES SILVA
SOBRE A CRÍTICA CINEMATOGRÁFICA BRASILEIRA
Análise da produção periódica nos últimos cinco anos
Programa de Comunicação e Semiótica
Banca Examinadora
______________________________________
______________________________________
______________________________________
São Paulo – 2007
“Você faz com que eu, no papel de espectador, de
criança – pois é como criança que se assiste a um
filme - tenha vontade de acompanhar suas idéias e,
com isso, vá descobrindo a mim mesmo... Também
não suporto quem despreza o próprio trabalho. Vi
recentemente um filme que mostrava tanto
desprezo, que também eu, como espectador, me
senti desprezado”
1
1
Wim Wenders, cineasta, em entrevista com Jean-Luc Godard publicada no jornal alemão Süddeutsche
Zeitung e reproduzida no caderno Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo, em 30 de janeiro de 1991.
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente à professora Leda Tenório da Motta, que orientou esta
dissertação com paciência, generosidade e competência;
Aos meus pais, por terem me conduzido até aqui e pelo imenso suporte na pesquisa e
realização deste trabalho. Esta dissertação não existira sem a ajuda de vocês. Palavras
não bastam;
Ao meu irmão, pela preocupação e cuidado. Sempre pronto a resolver problemas
técnicos e pela criatividade em achar soluções;
A todos os amigos, por acreditarem no meu potencial e estarem presentes todo o tempo,
mesmo à distância;
Ao Marcio, por ter sido incansável na companhia e cuidado que me prestou durante
estes dois anos. Sua dedicação e carinho estarão sempre em meu coração. E pelas
tabelinhas.
RESUMO
Tendo por objeto a crítica cinematográfica publicada em jornais diários de
diferentes cidades brasileiras, o presente trabalho está voltado para um exame das
relações entre o crítico jornalista e seus leitores e, mais especificamente, para a questão
da formação do gosto do leitor.O corpus da pesquisa é constituído por uma seleção de
peças críticas de autoria de Luiz Zanin Oricchio, de O Estado de S. Paulo, Jaime
Biaggio, de O Globo, Tiago Faria, do jornal Correio Braziliense e Inácio Araújo, da
Folha de São Paulo, publicadas no período de janeiro de 2000 a dezembro de 2005.
O trabalho teve como fundamentação teórica a definição de crítica tal como
formulado por Bento Prado Junior, o conceito de esfera pública defendido por Jürgen
Habermas, o conjunto de teorias estéticas descritos por Jean-Yves Tadíe e as teorias
estéticas e semióticas formuladas por Roland Barthes e Yuri Lotman.
Metodologicamente foi feito um exame valorativo dos trabalhos críticos selecionados.
Para a determinação do corpus foi utilizado o método de amostragem proporcional
estratificada. Sua análise constituiu a identificação dos elementos estruturais do texto e
a sua relação com os aspectos gerais do discurso, além dos critérios utilizados pelos
críticos para confeccioná-los.
A análise do material permitiu-nos chegar aos seguintes resultados:
enriquecimento cultural do leitor. A hipótese com que trabalhamos é que o exame da
cobertura de cinema dos grandes jornais pode trazer chaves para a compreensão dos
processos de circulação de informações culturais e da formação do gosto do leitor, a
partir do qual se poderá chegar ao eixo central do projeto: responder se as críticas estão
preocupadas em, mais que fazer um juízo de valor sobre a obra, contribuir na formação
do espectador/ leitor.
Palavras chave: crítica, jornalismo cultural, esfera pública
ABSTRACT
Having as object the cinematographic criticism published in different daily
newspaper of different Brazilian cities, this work is focused on an exam of the relation
between critic jornalist and their readers and, more specifically, on the reader’s cultural
enhancement. The corpus is constituted by in a selection of critic reviews of Luiz Zanin
Oricchio, from O Estado de S. Paulo, Jaime Biaggio, from O Globo, Tiago Faria, from
Correio Braziliense and Inácio Araújo, from Folha de São Paulo published between
january 2000 and december 2005. The research had as theoretical explanation the critic
definition as proposed by Bento Prado Junior, the concept of public sphere such as
defended by Jürgen Habermas, the aesthetic theories described by Jean-Yves Tadíe and
the semioptics theories formulated for Roland Barthes and Yuri Lotman. Concerning
the methodology, was made a valorative examination of the selected critics’ work. The
corpus was gotten using the estratified proportional sampling’ method. Its analysis
constituted the identification of the structural elements of the text and its relation with
the general aspects of the speech, beyond the judgment used for the critics to make
them. The analysis of the material allowed us to arrive at the following results: cultural
enrichment of the reader. The hypothesis with that we work is that the examination of
the film covering by newspaper can bring keys for the understanding of the processes of
circulation of cultural information and of the formation of the taste of the reader, from
which if it will be able to arrive at this work’s main axis: answer if the criticism are
worried in, more than make a judgment of film values, to contribute in the audience’s
cultural formation
Key words: criticism, cultural journalism, public sphere
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 1
1. QUESTÕES DA CRÍTICA 4
1.1 Definições possíveis da crítica 4
1.2 Origens da crítica 7
1.3 A Esfera Pública Burguesa e o nascimento da crítica cultural moderna 8
1.3.1 Formalismo russo 15
1.3.2 Crítica alemã 16
1.3.3 Crítica da consciência 17
1.3.4 Crítica do imaginário 18
1.3.5 Crítica psicanalista 19
1.3.6 Sociologia da literatura 20
1.3.7 Dívidas da crítica para com a lingüística 21
1.3.8 Semiótica da literatura 22
1.4 A tarefa crítica no âmbito do jornalismo 24
2. A CRÍTICA COMO JORNALISMO CULTURAL NO BRASIL 26
2.1 Evolução da linguagem crítica no jornal: do rodapé à industria cultural 26
2.2 Cinema como objeto da crítica jornalística 31
2.1 Evolução da linguagem crítica no jornal: do rodapé à industria cultural 26
2.3 A crítica cinematográfica no Brasil 34
2.4 Lugares do crítico, lugares do espectador e lugares do leitor 41
3. CINEMA E SIGNIFICAÇÃO 44
4. EXAME DOS CASOS 47
4.1 Tiago Faria 47
4.2 Jaime Biaggio 54
4.3 Inácio Araújo 60
4.4 Luiz Zanin Oricchio 66
CONCLUSÃO 71
BIBLIOGRAFIA 74
ANEXOS 80
APÊNDICE 91
1
INTRODUÇÃO
Acredito que seja importante iniciar esta introdução explicando o caminho que
me trouxe a este trabalho em torno de crítica e de críticos. Embora possa parecer
dispensável, tal exposição esclarece o motivo principal desta tese: a crítica
cinematográfica dos jornais diários cumpre seu papel de enriquecer culturalmente o
leitor? Anos atrás, ainda antes de me formar jornalista, já se discutia a “crise” que a
crítica cultural da atualidade sofria. Os estudos feitos durante a faculdade e os anos de
profissão me permitiram levantar questões que acabaram sendo desenvolvidas na
presente dissertação.
Numa leitura acurada do histórico crítico me pareceu que a crítica, na verdade,
sempre esteve em crise, que em todas as épocas houve um certo saudosismo e uma
espécie de repúdio quanto aos novos meios de produção do texto crítico. No caso da
crítica impressa recente, seu discurso enxuto, híbrido e ágil muitas vezes é tido como
raso. E, de fato, por vezes o é. Mas mesmo rápida e transitória ela busca a profundidade,
ir além do óbvio. Respeitadas suas especificidades – tão distante e ao mesmo tempo tão
próxima do texto acadêmico – o fato é que o debate nas universidades sobre a crítica de
mídia impressa é ainda escasso e as questões a serem discutidas se avolumam. Qual a
função da crítica cultural? Que papel ela tem sobre o público? Sua função mediadora
com os leitores é realmente necessária? Qual é o compromisso social desta crítica?
Essas perguntas me acompanharam até a retomada dos estudos acadêmicos, já
agora aluna do programa de pós-graduados da PUC-SP, que me permitiram aprofundar,
revisar e ampliar a construção do pensamento crítico em suas múltiplas manifestações e
mídias. Percebi também que grandes trabalhos dão conta da crítica literária, da
linguagem do jornalismo cultural, mas pouca literatura se tem do que – para mim – é a
mais deliciosa, mal-vista e talvez mais acompanhada das críticas publicadas em jornais:
a que se detém sobre o cinema. Parto do pressuposto de que o exame da cobertura de
cinema dos grandes jornais pode trazer parâmetros para a compreensão dos processos de
circulação de informações culturais e da formação do gosto do leitor. Ao estabelecer-se
progressivamente como espaço para a informação e enriquecimento do leitor a respeito
do cinema, o jornal atualiza a modalidade crítica que vinha se consolidando desde o
século XIX que acompanhava as atividades culturais. Nesse processo, os periódicos
2
foram configurando linguagens para a divulgação de cinema num veículo geral, que
exploraremos no decorrer do trabalho.
Para isso a pesquisa requeria um corpus bastante vasto
1
. Como é fácil perceber,
cobrir todos os textos produzidos no Brasil demandaria um esforço superior às
condições e tempo disponíveis, além do conhecimento seguro necessário para tal tarefa.
Portanto, redimensionei o projeto para a época que mais me fascina: a atualidade.
Assim, reduzi o corpus para os jornais de maior circulação e adicionei o principal jornal
da minha cidade natal, Brasília. Deste modo, investigarei os textos de Luiz Zanin
Oricchio, de O Estado de S. Paulo, Jaime Biaggio, de O Globo, Tiago Faria, do jornal
Correio Braziliense e Inácio Araújo, da Folha de São Paulo publicados durante o
período de janeiro de 2000 a dezembro de 2005. A relação de todas as críticas
publicadas e respectivas datas de veiculação pode ser conferida nas Tabelas de 2 a 7,
que consta dos anexos.
A proposta deste trabalho implica um mapeamento das leituras valorativas das
críticas, o que requer a determinação de uma amostragem significativa dentro do
universo total de críticas publicadas ao longo desses anos estabelecidos acima. Optamos
por uma amostragem proporcional estratificada
2
. Esta técnica é utilizada quando a
população total (no caso, os textos críticos) se apresenta de forma heterogênea e divida
em estratos (quantidades diferentes de críticas ao longo dos anos). Neste caso, o sorteio
dos elementos da amostragem é feito no âmbito desses estratos (os anos). Sorteiam-se
então aleatoriamente elementos equivalentes a 10% do valor total daquele estrato, sendo
proporcional ao tamanho da quantidade total de cada grupo. Por se tratar de um corpus
que exige valores absolutos, sempre que o resultado da amostra possuir unidades igual a
zero ou valores na casa decimal – posto que seria incoerente analisar meia crítica ou
crítica e meia – o número total de textos analisados dentro deste estrato será
arredondado para mais. Vejamos um exemplo prático feito com as críticas de Inácio
Araújo:
Tabela 1 – Demonstrativo da amostragem proporcional estratificada aplicado aos textos
de Inácio Araújo, 2000 – 2005
1
BARBETTA, Pedro Alberto. Estatística Aplicada às Ciências Sociais. Florianópolis: Editora UFSC,
1994
.
2
Sobre os métodos de amostragens aqui descritos, ver BARBETTA, Pedro Alberto. Estatística Aplicada
às Ciências Sociais. Florianópolis: Editora UFSC, 1994.
3
ANOS
INÁCIO
ARAÚJO
10% AMOSTRA
2005 28 2,8 3
2004 13 1,3 1
2003 6 0,7 1
2002 4 0,4 1
2001 12 1,2 1
2000 2 0,2 1
TOTAL
GERAL 65 6,5 7
Ao escolher a crítica cinematográfica como tema desta dissertação, os referidos
jornais impuseram-se a mim, de saída, por várias razões. A principal é a a longa
trajetória destes periódicos no âmbito da cultura brasileira e seu alto grau de circulação,
que atinge parte considerável das camadas alta e média do país. Além disso, a data a
partir do qual examinaremos mais de perto o corpus, 2001, permite uma leitura de certa
forma unificada da contribuição da crítica destes periódicos na área de difusão cultural –
especificamente da divulgação cinematográfica – de nosso tempo. Tendo em vista de se
tratarem (os referidos jornais) de formadores de opinião de magnitude.
É importante frisar que um corpus tão restrito não permite resultados definitivos
sobre a totalidade da produção crítica nacional deste período, no entanto criam-se
condições para abrir novas possibilidades de análise dessa produção. Posto, o corpus e o
questionamento deste trabalho, é chegado o momento de encerrar esta introdução. Creio
que a produção crítica – em especial a cinematográfica – produzida pela imprensa
nacional está viva e em processo, reiterando seu compromisso de esclarecer o
espectador. Esta dissertação se interessa a expor esta condição e propor caminhos que
contribuam para sua perpetuação e ampliação de horizontes, sem pretender soluções
definitivas para uma crítica sempre em crise e transição.
4
1. QUESTÕES DA CRÍTICA
1.1 Definições possíveis da crítica
A prudência pede que se comece por perguntar o que é a crítica. Embora a
definição não seja o cerne deste trabalho este é um conceito imprescindível para analisar
o objeto que a tese se propõe. De fato, grandes estudiosos já se debruçaram sobre esta
questão e – como ficará visível mais adiante – nunca se chegou a um consenso. Na
verdade, parece que a crítica sempre esteve em crise. Embora a definição dos teóricos
por vezes se mostre contraditória é possível perceber um denominador comum entre os
autores, uma característica que unem opiniões tão divergentes. E é ela que foi escolhida
para guiar este trabalho.
Inicio esta dissertação falando de crise e escolha quando em Notas Musicais: do
barroco ao jazz Arthur Nestrovski esclarece que a palavra crítica vem,
etimologicamente, do grego “krinein”, que significa quebrar. Segundo ele “a mesma
palavra está na raiz de “crise”, por exemplo. E a crítica, nalguma medida, faz o mesmo:
quebra uma obra em pedaços, pondo em crise a idéia que se faz dela” (p. 10). Crítica,
crise e critério têm em comum a mesma etimologia. Acontece que, de modo geral, as
pessoas vêem a palavra crítica como algo ruim, depreciativo, devido ao significado que
ganhou com o tempo de “fazer pouco caso”, “recriminar” ou “falar mal”. Com isso
perde-se de vista este sentido primeiro de crítica, este vocábulo original que nos sinaliza
que existe uma escolha nela e – não somente isso – há na crítica também criação. Pois
criticar é ir além do objeto analisado, “é entrar na crise. É propor critérios que antes não
existiam” (RIBEIRO, 2000 P. 31).
Outra característica que contribuiu para alterar o sentido estrito do termo é a
idéia – muitas vezes reforçada pelos próprios profissionais – de que a crítica cultural
tenta dar o “veredicto definitivo” sobre uma determinada obra. Por outro lado, se
considerarmos que o objeto da crítica não é o mundo, a realidade, mas o discurso do
autor sobre o mundo, a crítica pode ser descrita como discurso sobre um discurso; “uma
linguagem segunda ou metalinguagem, que se exerce sobre uma linguagem primeira
(ou linguagem-objeto)” como define Roland Barthes no livro Crítica e Verdade. É
importante notar que sob esse prisma quebra-se a idéia do texto crítico como verdade
5
última sobre a obra, posto que “se a crítica é apenas uma metalinguagem, isto quer dizer
que sua tarefa não é absolutamente descobrir ‘verdades’, mas somente ‘validades’”
(2003, p. 160-161).
Ao acompanhar o autor pelas páginas deste livro percebemos que é recorrente
essa afirmação de que não é tarefa da crítica apontar algo ininteligível e secreto que
passaria despercebido aos – se podemos classificar assim –leigos. “O crítico não pode
pretender ‘traduzir’ a obra, sobretudo de modo mais claro, pois não há nada mais claro
do que a obra” (p. 221). Mas se é verdade que nada é mais claro que a obra, Barthes
afirma algumas páginas adiante que ela não se encerra em si mesma, e assim o autor se
aproxima daquilo que adotamos como crítica aqui, que é trazer o novo, posto que “é
estéril reduzir a obra à pura explicitação, pois então não há imediatamente mais nada a
dizer, e a função da obra não pode ser a de fechar os lábios dos que a lêem”, de modo
que “o sentido que ela [a crítica]
3
dá de pleno direito à obra não é mais, finalmente, do
que um novo florescer dos símbolos que fazem a obra” (p. 216).
Segundo Barthes, a atividade crítica deve contar com duas espécies de relações:
a relação da linguagem crítica com a do autor observado e a relação dessa linguagem-
objeto com o mundo. O que nos remete ao sentido estrito do termo citado no início
deste capítulo, que é propor conceitos que antes não existiam. É trazer o novo.
Outra questão interessante sobre a tarefa crítica é abordada por Bento Prado
Junior no ensaio A Sereia Desmistificada. Para além do seu brilhante trabalho sobre
Roberto Schwarz, ele traz à baila uma questão que está diretamente relacionada com a
problemática deste trabalho: a crítica como forma de combater a leitura passiva de
consumo. Embora “a simples leitura já alarga o horizonte da experiência e multiplica o
conhecimento que o leitor tem de si mesmo” (2000, p. 132), por vezes o expectador
(posto que aceitamos aqui que este processo pode ocorrer em todas as artes) fica
estagnado no fascínio que a obra lhe proporciona. “Mas a crítica é mais ambiciosa: ela
quer saber por que é a obra, assim, capaz de revelação (...). A crítica é, portanto,
produção de conhecimento: não o registro de um dado até então ignorado, mas a
reestruturação das categorias até então correntes, que foram fulminadas pelo curto-
circuito da experiência da leitura” (idem). Por mais que, como disse Barthes, a obra seja
clara em si mesma, a crítica descobre naquela seu tema central e com ela forma um
3
Comentário meu
6
discurso que habita no que Bento Prado Jr chama de “intervalo” entre a crítica que a
obra faz do mundo e a crítica que o mundo faz da obra.
É verdade que este aspecto positivo da crítica se perdeu porque a crítica cultural
praticada nos jornais diários da atualidade, de modo geral, não se preocupa com a
descrição formal do objeto, seu discurso é pouco esclarecedor e o crítico acaba
assumindo o papel de prestador de serviços, posto que não consegue desautomatizar a
nossa resposta ao objeto. Mas em que tal pese este argumento para a crise, há uns bons
decênios já é declarada esta falência de análise em função da propaganda. Adorno já a
apontava em 1949:
Os críticos profissionais eram, sobretudo,
“informantes”: orientavam sobre o mercado dos
produtos espirituais. Alcançavam ocasionalmente
com isso uma visão mais profunda da questão,
permanecendo, contudo, sempre também como
agentes do comércio, em consonância, se não com
seus produtos individuais, com a esfera do
comércio enquanto tal (1998, p. 08).
Ao tentar definir o que é a crítica os autores tendem a convergir para um mesmo
ponto: a análise da obra. Contudo este termo tende a sugerir uma “análise do conteúdo”.
Mas no caso de peças culturais que são percebidas pelo contato direto com os órgãos
dos sentidos só se chega à substância, ao sentido profundo da obra contemplando sua
forma. No caso específico do cinema a análise da obra cinematográfica perpassa o
escrutínio dos movimentos de câmera, da montagem quadro a quadro, da fotografia etc.
Muitas vezes este tipo de análise serve para dar à obra o estatuto de genial ou, ao
contrário de descartável. Mas no limite este julgamento, o número de estrelinhas
dedicado ao filme, o “gostei” ou “não gostei” não tem importância. Porque a crítica
serve de fato para que o expectador preste mais atenção ao que está vendo, para
enriquecê-lo culturalmente, tendo em vista que abre espaço à troca de novas idéias. A
partir daí, mesmo que o leitor concorde ou não com a crítica, sua experiência com a arte
já terá se tornado mais profunda. E contestar o crítico, afinal, faz parte do processo da
vida intelectual e da função social da crítica, como afirma Terry Eagleton:
Todo julgamento é concebido com vistas a um
determinado público, e a comunicação com o
leitor é parte integrante do sistema. Através de sua
relação com o público leitor, a crítica perde seu
7
caráter privado. Abre-se ao debate, tenta
convencer, convida à contradição. Torna-se parte
do intercâmbio público de opiniões. (1991, p. 4)
1.2 Origens da crítica
Embora creia que tenha ficado clara a definição de crítica de que me valerei
nesta dissertação, as definições podem parecer tendenciosas ao convergirem sempre
para seu papel cultural junto ao leitor. Do meu ponto de vista, somente uma reflexão
sobre a evolução da crítica concomitante à evolução das próprias artes permitirá
esclarecer em definitivo seu papel de enriquecimento do leitor. Contudo, não há um
consenso sobre o seu surgimento, mas alguns autores defendem que a crítica cultural
começou na Grécia, berço de toda a cultural ocidental. Para os críticos americanos
William Kurtz Wimsatt Jr e Cleanth Brooks, por exemplo, os primeiros a adotarem uma
postura do que concebemos como crítico foram os primitivos poetas gregos. Segundo
eles, os poetas comumente emitiam opiniões sobre seu ofício e, inclusive, essas opiniões
formavam parte da mensagem de seus poemas. O primeiro crítico teria sido então
Homero, posto que quando dá início aos seus poemas épicos com uma invocação da
Musa “ele apresenta, afinal, uma teoria sobre seus poemas: a de que eles são escritos, ou
deveriam ser escritos, graças ao auxílio da inspiração divina, idéia que tem
desempenhado um papel considerável na subseqüente história da poética” (1957, p.13).
Mas há consenso dos autores sobre a importância primordial de Platão. Dentre
as obras do filósofo analisadas cabe aqui mencionar os questionamentos abordados no
Íon. O texto nos é apresentado como um diálogo entre o mestre de Platão, Sócrates e o
rapsodo Íon. Wimsatt Jr e Brooks apontam a importância do caráter crítico desta obra
quando, tentando conhecer os “segredos profissionais” de Íon, Sócrates faz os seguintes
questionamentos: o que nos diz a poesia? Qual a origem das faculdades do poeta? E
qual a relação entre o ponto de partida do poeta e a natureza daquilo que, na realidade,
diz? Os autores acrescentam que ao final o texto se estabelecem dois princípios: “I) ser
capaz de compor poesia não é a mesma coisa que ser capaz de dar uma explicação
racional dela; II) o objetivo da poesia não é formular afirmações de caráter científico”
(p. 19). Embora a teorização de Platão não se aprofunde, o primeiro princípio descrito
no Íon é uma espécie de protótipo do questionamento que perpassa toda a história da
8
teoria literária: é necessário que aqueles capazes de dar explicação racional (não seriam
os críticos?) à poesia se distanciem dela para explicá-la?
Em Métodos da Crítica Literária, Enrique Anderson Imbert faz um belo resumo
do que propõe ser o surgimento da crítica e seu desenvolvimento até o século XX.
Embora não iremos detalhar sua linha do tempo cabe aqui sua afirmação de que a crítica
floresce e decai ao longo da História juntamente com o crescimento e decadência da
literatura. De fato, ela conta que mal surgiu a literatura e “já houve quem a passasse pela
peneira” (1971, p. 71), de modo que, assim como Wimsatt Jr e Brooks, também ele
remete a origem da crítica aos gregos. Mas além de caminhar juntamente com a
literatura, percebe-se também que para Imbert a crítica avança, aprofunda e até mesmo
adapta-se à medida que a literatura evolui. Eis alguns
trechos que ilustram sua afirmação:
No século XVII, o centro da crítica
desloca-se da Itália para a França. Típico do
gosto neoclássico, não original, foi Boileau (1636-
1711). Propõe-se ensinar aos poetas as regras
racionais. Com a razão descobre-se a verdade
natural, e a verdade é beleza. Os clássicos
fiseram-no e por isso devemos estudá-los. Isto é,
tem que se seguir os clássicos, porque eles usaram
o bom-senso, tal como Boileau entende” (p. 75)
Por meados do século XVIII, os sistemas
clássicos começam a desmoronar-se – é quando a
Retórica se desacredita definitivamente – e vai
avultando uma crítica capaz de se ajustar à
realidade imediata: Vico Lessing. Pouco a pouco
os olhos da crítica educam-se para perceber o
histórico. Repele-se a teoria da imitação, das
regras e dos gêneros e, em troca,, está-se atento à
expressão das emoções e das idéias gerais que
podem extrair-se de cada obra (p. 76)
Noutras partes, Imbert sugere que a crítica vai além da literatura, a repele,
contrapõe ou mesmo flerta com outro tipo de estética literária que ainda não se firmou:
No século XIX, os românticos declaram
guerra à formulas fixas e firmam alianças com as
forças da sociedade, da vida, do sentimento e da
fantasia. Em França, o Romantismo foi mais
polêmico. Por exemplo: para Victor Hugo (1802-
1885), a literatura desenvolve-se dentro da
sociedade e seria absurdo que homens de hoje
imitassem regras e modelos de ontem. Uma vez
que a personalidade histórica mudou, a arte deve
também mudar, e é o gênio livre quem promove a
9
mudança. Em seguida, veio a reacção. Quis-se
explicar a literatura. Saint-Beuve (1804-1869)
propôs-se compreender o escritor como homeme
dentro do seu grupo social, antes de julgar a sua
obra, e daí o seu método biográfico
(p. 77-78).
Durante o Renascimento, por outro lado, a crítica adquire autonomia, embora
houvesse uma exaltação exagerada à linguagem aristocrática e um menosprezo à
popular. Com o alvorecer do Romantismo, atém-se à expressão das emoções e idéias
gerais que pode-se extrair de cada obra em detrimento da imitação às regras clássicas.
No Naturalismo, qualquer obra apreciada era considerada um produto determinado pelo
meio e pela época. Já o Parnasianismo, o Simbolismo e o Realismo contribuíram para
abrir os horizontes e as possibilidades da crítica, incorporando-a à história das idéias no
século XIX. No século XX, diferentemente da crítica novecentista – muito consciente
da sua expansão geográfica – os movimentos críticos são antes internacionais. Se
nascem num país, logo tornam-se globalizados.
A literatura foi também mãe da crítica cultural moderna e, em especial da crítica
publicada na imprensa diária. Segundo Terry Eagleton, a literatura é a base de
sustentação da crítica moderna por ter sido instrumento de aquisição de amor-próprio e
de articulação ao movimento de emancipação da classe média contra o Estado
absolutista no século XVIII. O moderno conceito de crítica literária se manifestou
primeiramente na Inglaterra, estando estreitamente ligado à ascensão da esfera pública
burguesa. Ele conta que, nos cafés da época, suspendia-se o status de tal modo que as
pessoas se reuniam para discutir como iguais: “(...) foi através delas, as pessoas, que
começou a formar-se uma opinião pública, a qual, a partir daí, teve de ser levada em
consideração.”
1.3 A Esfera Pública Burguesa e o nascimento da crítica cultural
moderna
Antes de nos reportarmos ao lugar da crítica discutida por Eagleton devemos nos
debruçar sobre o conceito de esfera pública burguesa que perpassa toda a sua teoria e
que foi primeiramente desenvolvido por Jürgen Habermas. Para o filósofo alemão, a
burguesia das sociedades européias do século XVII criou um espaço discursivo para
10
lutar contra o regime absolutista vigente. É nesse espaço que surge a esfera pública
burguesa
4
. Ele concebe a esfera pública burguesa como um espaço social democrático
onde os donos dos meios de produção dos séculos XVII e XVIII discutiam “as leis do
intercâmbio de mercadorias e do trabalho social” (2003, p. 42). Habermas dedica
também especial atenção ao que chamou de esfera pública literária – que mais tarde
daria origem à esfera pública política. Embora pareça estranho que a esfera pública não
tenha se manifestado primeiramente como função política, torna-se clara essa dinâmica
ao perceber que as pessoas privadas contestassem antes o poder público nos espaços
culturais, que são as instituições primeiras de antítese política à corte.
Os salões, teatros e cafés da época serviam como local de debate sobre os
costumes e valores da alta burguesia, ainda fora do âmbito normativo imposto pelo
Estado. Embora estes locais fossem privados – freqüentados apenas pela camada culta
da burguesia, artistas e nobreza esclarecida, ou seja, destinatários, consumidores e
críticos de arte – suspendia-se o status e todos ali podiam igualmente manifestar suas
opiniões, exercendo a crítica de forma coletiva. Contudo, o filósofo esclarece que a
prática não era assim tão utópica, embora cumprisse seu papel:
Não que se deva crer que, com os cafés, os
salões e as associações tal concepção de ‘público’
tenha sido efetivamente concretizada; mas, com
eles, ela foi institucionalizada enquanto idéia e,
com isso, colocada como reivindicação objetiva e,
nessa medida, ainda que não tenha se tornado
realidade, foi, no entanto, eficaz
(2003, p. 52).
Isso se explica pelo próprio desenvolvimento do capitalismo, em cujos
primórdios as autoridades do poder inflexionavam a crítica às artes e filosofia. E é para
confrontar o Estado absolutista que nasce a moderna crítica européia. Eagleton esclarece
que o debate literário e conseqüente reflexão crítica surgiu primeiro na Inglaterra porque
a sociedade cortesã – que tradicionalmente ditava o gosto cultural – também mantinha
negócios com a burguesia emergente, ao contrário da França, por exemplo. O número
de cafés e seus freqüentadores era vasto e para manter o círculo coeso surge os jornais
Spectator, de Addison e Tatler, de Steele, onde começou a se formar uma “opinião
4
Sobre este assunto, devemos nos reportar à idéia formulada por Hannah Arendt, segundo a qual a esfera
pública pode ser entendida como lugar do comum, um espaço de aparência, ou seja, tudo o que, através
de ampla divulgação, torna-se conhecido por todos. Para Arendt, a aparição pública é a condição básica
para a consolidação desse espaço comum. É nessa esfera que os fatos, as opiniões, os argumentos e as
pessoas emergem da obscuridade da esfera privada e adquirem interesse público (2003, p. 59).
11
pública” que não podia mais ser ignorada. Contudo, o conteúdo publicado não se
caracterizava como crítica profissional e tinha como tema a si próprio:
O Tatler e o Spectator são projetos de uma
política cultural burguesa cuja linguagem
abrangente e sutilmente homogeneizadora é capaz
de abarcar a arte, a ética, a religião, a filosofia e a
vida cotidiana: não se cogita, aqui, de uma
resposta “crítico-literária” que não seja
inteiramente determinada por toda uma ideologia
social e cultural. A esta altura, a crítica não é
ainda “literária”, mas sim “cultural”: o exame
dos textos literários é um momento relativamente
marginal de um empreendimento mais amplo, que
explora as atitudes para com os criados e as
normas de cortesia, o status das mulheres, as
afeições familiares, a pureza da língua inglesa, a
natureza do amor conjugal, a psicologia dos
sentimentos e as normas relativas à toalete
(1991,
p.13).
Embora a literatura tenha sido o grande expoente dessa transformação foi na
música que, de fato, deu-se o surgimento do público enquanto tal. Até o final do século
XVIII ela ainda era ligada ao serviço religioso e às festas da corte, de modo que os
burgueses quase não tinham oportunidade de ouvir música. Até que os collegia musica
se estabelecem com “sociedades públicas de concerto” (HABERMAS, 2003, p.55) e
ingressos passam a ser cobrados, transformando a música em mercadoria. Deste modo
pela primeira vez qualquer um podia ouvir concertos, conquanto houvesse formação
cultural e dinheiro para tanto. Mas além do caráter mercadológico das obras de arte é o
florescimento da autonomia criativa dos artistas em relação aos critérios de gosto
determinados pela corte que o momento histórico proporciona. O século do triunfo da
Razão é também o século desprovido de regras no mundo da arte. Ao mesmo tempo em
que o autor pode exprimir sua sensibilidade livremente nas páginas, partituras e telas, o
surgimento deste público diverso e amplo em si mesmo põe fim ao gosto único e
monótono até então, e o “espectador, ainda marcado por normas cada vez mais
obsoletas, não sabe mais como apreciar aquilo que vê. Ele tem dificuldade em deixar
crescer em si mesmo uma liberdade de julgamento até agora não experimentada,
procura ainda as muletas de um critério socialmente aceito no qual se fiar”
(LEENHARDT, 2000, p. 20). É para fazer a agora necessária mediação entre as obras
culturais e o público que surge, então, a crítica profissional.
12
O novo ofício ganha o nome de “árbitro das artes”, e, embora mantivesse um
caráter amador já, manifestava semelhanças com os profissionais contemporâneos:
quem as exercia não era especialista e tinha consciência de se dirigir a um público
heterogêneo. Quando, mais tarde, as revistas, então manuscritas, tornam-se periódicos
impressos, passam a ser o que Habermas chama de “instrumentos publicitários” (2003,
p. 58) deste tipo de crítica. Nesse espaço de imprensa opinativa predominava
basicamente o que o filósofo alemão chama de “jornalismo literário”. É o tempo dos
escritores, e os periódicos se tornam comumente meio de luta político-partidária da
aristocracia endinheirada e a geração de lucros com a venda de notícias fica em segundo
plano: “a imprensa opinativa está (...), como instituição do público debatedor,
basicamente preocupada em afirmar a função crítica dele; por isso, só secundariamente
é que aí é investido capital, caso isso ocorra, para obter um retorno lucrativo” (2003, p.
216).
A crítica assume então um caráter de explícita discórdia política ao invés de
consonância cultural e os jornais tendem a discorrer sobre obras que possibilitam
comentários ideológicos correspondentes à posição defendida pelo veículo em questão.
Para Eagleton é este contexto que permite o aparecimento, no início do século seguinte,
do assim chamado “sábio”. “O sábio não mantém mais uma relação de interlocução
imparcial com seu público leitor (...), a posição do crítico é agora transcendental, seus
pronunciamentos são dogmáticos e se autovalidam, sua postura diante da vida social é
distante e insensível” (1991, p. 33). Outros dois novos fatores de destaque se impõem a
este novo momento da imprensa: a redação e o artigo de fundo. A combinação destes
dois fatores catalisou a consolidação editorial das empresas jornalísticas e,
consequentemente, o aparecimento de redações autônomas e profissionalizadas.
Mas é somente com o estabelecimento do estado burguês de direito, que os
jornais podem abandonar o caráter político e assumir o de empresa comercial. Torna-se
comum a venda de espaço para anúncios e já na metade do século muitos jornais eram
organizados como sociedades anônimas. Neste momento o chamado “modelo de
comunicação original da esfera pública” perde espaço para a “imprensa de massa”. O
jornalismo se separa da literatura e a elaboração de notícias ganham prioridade ao invés
do artigo de fundo e instala-se a propaganda com o propósito de vendas no lugar da
antiga publicidade que pretendia esclarecer. Habermas chama-nos a atenção, também,
para o fato de, ao se tornar uma empresa capitalista, a imprensa se tornar manipulada:
13
desde que a venda da parte redacional está em
correlação com a venda da parte de anúncios, a
imprensa, que até então fora instituição de pessoas
privadas enquanto público, torna-se instituição de
determinados membros do público enquanto
pessoas privadas – ou seja, pórtico de entrada de
privilegiados interesses privados na esfera pública
(2003, p. 218).
Essa dicotomia entre emitir juízos em favor da maioria ou de alguns poucos se
reflete também em outra categoria de profissional que aparece no século XIX: o
“homem de letras”. Como seus precursores do séc. XVIII, o “homem de letras” é dotado
de um saber genérico ao invés de ser especialista em uma categoria artística. Na
verdade o conhecimento diverso é antes uma necessidade, posto que o crescimento de
leitores de jornais impossibilitasse que as redações mantivessem apenas profissionais
especialistas em uma única área do saber. Diante de uma atmosfera intelectual que se
caracteriza “por uma profunda confusão e insegurança ideológica” cabia a este crítico
“deslindar as complexidades da transformação econômica, social e religiosa; sua função
era explicar e controlar tal transformação, tanto quanto refleti-la, tornando-a assim
menos amedrontadora em termos ideológicos” (EAGLETON, 1991, p. 40).
O público leitor do século XIX é confuso e suas desigualdades culturais latentes.
Sob a imperativa força do mercado o “homem de letras” passa, pouco a pouco, a perder
o caráter de mediador entre a obra e o público para se tornar um “vendedor das coisas
do intelecto” (p. 43). É neste ponto que a crítica dos periódicos perde espaço e sua
importância teórica. Por fim, se sua função adquirira um caráter muito mais de guia e
confortador do público-leitor então a literatura estava ela própria mais habilitada para
cumprir esse papel. Este tipo de texto indispôs os escritores com essa nova modalidade
crítica. Deste modo, os escritores puseram-se a praticar uma anti-crítica que julgavam
ser mais eficiente, devido à sua ligação com o próprio criador.
Contrariamente aos críticos de profissão,
que pretendem analisar e classificar a obra
segundo princípios implícitos, pretensamente
objetivos e universais, os escritores estabelecem e
assumem pessoalmente os princípios que regem
seus julgamentos de valor. Os autores escolhidos
por eles são, ao mesmo tempo, a fonte e a
confirmação desses princípios. Note-se que a
crítica praticada pelos escritores é uma crítica
positiva, nunca negativa; eles só falam longamente
de autores “eleitos”
(PERRONE-MOISÉS,
1998, p. 144).
14
Com as novas mídias do século XX (televisão, rádio, cinema falado) a esfera
publica se amplia, perde vitalidade, “se torna uma corte, perante cujo público o
prestígio é encenado – ao invés de nele desenvolver-se a crítica.” (2003, p. 235) O que
ocorre agora é que ao invés de ver a imprensa intermediando a opinião pública, passa-se
a ver uma opinião (não) pública ser cunhada primeiro através dos media.
Em seu livro A crítica literária no século XX, Jean-Yves Tadié destaca três tipos
de crítica do século passado com base nos trabalhos de Albert Thibaudet: a crítica dos
artistas, a “crítica falada” (ou de imprensa) e a “crítica profissional”, mas para este
trabalho focaremos apenas os dois últimos tipos relacionados. A denominação a esses
dois tipos de crítica desperta, de pronto, estranhamento ao assumir que uma seria
profissional e outra não. Mas Tadié logo se antecipa e explica que a “crítica falada”
refere-se à conversação, diários e correspondências e que “não é mais nos salões que
comentamos o livro do dia, mas, sim, no jornal, que é, em si mesmo e exatamente o
livro do dia”, enquanto que a “crítica profissional” era aquela praticada pelos
professores “que não alcançavam êxito no jornalismo”, posto que é esta é uma profissão
“que nem todos os críticos sabem desempenhar” (1992, p. 10).
Ainda sobre a crítica de imprensa, o autor observa, sabiamente, que boa parte
das obras que passarão pelo crivo dos profissionais é constituída de lançamentos ao
invés dos grandes clássicos e que, “sabem eles muito bem”, estão condenados ao
esquecimento. Como conseqüência o tempo para análise e feitura do texto (e muitas
vezes para a leitura da própria obra) é exíguo e incompleto, e mesmo as críticas
elaboradas com critério e desvelo acabam tendo o mesmo fim da obra analisada: o
desaparecimento.
Mas é sobre a “crítica profissional” que a obra de Tádie mais se detém. Ele
explica que o trabalho feito dentro das academias possui duas vantagens – das quais
tendo a concordar – em relação aos outros dois tipos de crítica: “a primeira consiste em
preservar todo o passado da literatura, a segunda, em proporcionar descrição e
interpretação que o conhecimento não só dos textos de sua época, mas também das
ciências humanas, torna mais precisa, mais técnica, mais científica” (p. 13). Mas então
por que ela ganha espaço neste trabalho? Porque, como ficará claro na segunda parte da
dissertação, os jornais e as universidades conversaram ao longo dos anos, influenciando
o conteúdo da crítica praticada nos periódicos. Um breve resumo das principais
correntes críticas do século XX e que ainda hoje se reflete nos textos críticos dos jornais
é mister para análise mais profunda dos textos hoje publicados na imprensa diária.
15
Contudo, é preciso reforçar que a pontuação que se fará é mais um sintético recorte das
principais correntes críticas do século passado. O que significa (e desde já peço
desculpas) forçadas omissões e simplificações de nomes, obras e circunstâncias.
1.3.1 Formalismo russo
Esta corrente crítica se desenvolveu na Rússia durante a Primeira Guerra
Mundial, tendo sido desmobilizada nos anos de 1930 pela ditadura stalinista. No
inverno de 1914-1915 é fundado por estudantes o círculo lingüístico de Moscou, com a
intenção de promover a lingüística e a poética. Tadié explica que o trabalho dos
formalistas só passa a ser conhecido no ocidente na década de 1950 quando Victor
Erlich publica Russian Formalism, mas na República Tcheca houve grande repercussão.
O Círculo de Praga foi criado em outubro de 1926 pelo professor Vilém Mathesius e
contava como seus principais expoentes os tchecos Mukarovski, Truka e Havranek e os
russos Jacobson e Trubetzkoy.
O autor acredita que o formalismo russo é “a escola possivelmente mais
inovadora do século XX” (p. 17). Foram eles os responsáveis pela renovação da crítica
dos textos literários, defendendo um método de análise das linguagens literária e poética
em si, ao invés de adotar uma abordagem histórico-cultural. Para os formalistas, o
estudo literário não deveria ter como base outras ciências (como a filologia ou a
antropologia), mas sim uma disciplina de métodos próprios, defendendo que todos os
todos os elementos da obra são formais e participam no efeito artístico: métrica, enredo,
composição etc.
Muitos desses temas eram inovadores, como as noções de fábula e enredo como
indispensável nos procedimentos do texto em prosa, enunciados por Tomachevski: “a
fábula é o conjunto dos movimentos ‘em sucessão cronológica e de causa a efeito’, o
enredo, o conjunto dos motivos segundo a ordem em que aparecem na obra e, portanto,
‘uma construção totalmente artística’” (p. 23); a teoria das funções da linguagem
(referencial, poética, fática) de Roman Jakobson e o estudo do romance, que conheceu
importante contribuição de Boris Eikhenbaum em seu Teoria da Literatura.
16
1.3.2 Crítica alemã
Esta escola, desenvolvida a partir de 1915, também estava preocupada com a
forma. Foi desenvolvida dentro mesmo das universidades. Aqui destacaremos dois de
seus principais teóricos. O primeiro, Erich Auerbach era professor da Universidade de
Marburg quando foi demitido, em 1936 pelo regime nazista. Exilado em Istambul,
tornou-se professor de línguas românicas e publicou sua obra maior: Mímesis. Sem
nenhuma biblioteca ou acervo que pudesse consultar, os textos analisados em Mímesis
eram resultado de documentos curtos de segunda mão escolhidos ao acaso a serem
confrontados entre si. Nesta obra, o filólogo alemão tem como objeto central “a
interpretação do real por meio da representação” de textos europeus redigidos em
línguas latinas (TADIÉ, 1992, p. 61). Embora a obra acabe por tratar da totalidade do
destino humano, da natureza das coisas; ele o faz através de palavras e trechos literários.
Trabalhando com um corpus imenso (que vai da Bíblia, Homero e até mesmo
Virgínia Woolf) Auerbach propõe interpretar o modo como a realidade foi representada
pela literatura ocidental. Mímesis é um “repositório de análise estilística, segundo a
moderna conceituação e técnica de origem alemã, em que, da ordem sintática e
estilística, e do plano rítmico e lógico, se deduz a idéia que o autor faz da realidade
exterior” (COUTINHO, 1975, p. 37). Em 1947, já nos Estados Unidos, Auerbach torna-
se professor na Universidade de Pensilvânia. Posteriormente lecionou em Yale até sua
morte em 1957.
Dentro deste espírito de crítica renovada encontra-se o segundo scholar Ernst
Robert Curtius, que dedicou parte considerável de sua obra à França. A base de seu
pensamento é a idéia de totalidade, que assunto de sua obra maior: A literatura européia
e a Idade Média latina. Tadié explica que seu método de análise consistia em
“comparar as diversas literaturas, lançando mão dos métodos históricos e filosóficos”
(p. 57). Deste modo, Curtius mostrava como o mundo antigo caminhou num fluxo
contínuo em direção ao mundo moderno e, em particular no âmbito literário, como a
literatura romana contribuiu para a formação das literaturas vernáculas. Curtius era
antinazista e sua A literatura européia e a Idade Média latina é ao mesmo tempo
manifesto literário e político, onde o autor mostra como os livros podem ser o
nascedouro do verdadeiro humanismo, conservando a cultura ocidental.
17
1.3.3 Crítica da consciência
Situada entre o pensamento alemão e francês, a também chamada Escola de
Genebra prima pelo retorno à consciência do autor, ou melhor, do autor enquanto um
homem em seu drama pessoal e sua figura insubstituível. Fundada involuntariamente
por Marcel Raymond, essa corrente não continha membros apenas suíços e por vezes
abarcava diferentes obras e idéias. Segundo Tadié, Raymond possuía uma “inquietude
metafísica” (p.80) e sentia-se compelido muito mais à Geitegeschichte que pela análise
da forma.
Talvez Raymond e os outros membros da escola concordassem com Oscar
Wilde que dizia “a crítica é a única forma civilizada de autobiografia” (procurar
referencia). Pelo menos o sentido que Tadié nos dá acerca dos de Raymond e sua obra é
similar à máxima ao descrever Jean-Jacques Rousseau – A busca do eu e o devaneio.
Segundo ele, Raymond escolheu o autor estudado por possuírem similitudes.
trata-se de uma crítica de identificação; as
palavras do escritor permitem ao crítico
reconstituir sua experiência central e seus
desenvolvimentos: a divagação contemplativa, a
poesia da prosa tornam-se as do próprio
Raymond; como habitado por seu mestre, ele vê o
mundo com seus olhos
(P. 82).
Outro grande representante desta corrente é o belga Georges Poulet, que foi
professor em Edimburgo, na Johns Hopkins University em Baltimore, Zurique e, ao
final, lecionou em Nice. Tadié define o livro A consciência crítica de Poulet como ao
mesmo tempo “panorama e manifesto” desta escola. Seu método crítico compreendia
em acompanhar o que ele chamava de três níveis da obra literária: a consciência do
escritor entrega-se aos objetos; num segundo nível, ela os ultrapassa para apoderar-se de
si mesma; enfim há o ponto em que a consciência nada mais reflete, onde, sempre na
obra e, portanto, acima dela, contenta-se em existir. Deste modo, Poulet acreditava que
a compreensão da obra dependia que sua consciência crítica compartilhasse a
consciência da obra.
18
1.3.4 Crítica do imaginário
Aqui não é mais a consciência do autor que é explorada, mas sim a psicologia da
imaginação. Desenvolvida por Gaston Bachelard (1884-1962), a crítica do imaginário
subverteu os métodos da crítica francesa e inspirou o que viria a ser conhecido como
Nova Crítica. Contudo, esteve sempre à margem das correntes críticas e teve pouco
reconhecimento fora da França. De fato, Roland Barthes foi um dos poucos a conferir
crédito ao seu trabalho nas páginas de seu já mencionado Crítica e Verdade: “seguindo
as deformações dinâmicas da imagem em numerosos poetas, Gaston Bachelard fundou
uma verdadeira escola crítica, tão rica que se pode dizer que a crítica francesa é,
atualmente, sobre sua forma mais desabrochada, de inspiração bachelardiana.” (2003, p.
158).
Sem grandes pretensões de fundar uma escola, a corrente se inicia em 1938 com
o livro A psicanálise do fogo. Intervalo entre o epistemológico e o poético, a idéia de
Bachelard nesta obra era “descobrir a ação de valores inconscientes na própria base de
conhecimento empírico e científico” (p. 114). Isto é, um esforço metódico da
compreensão das valorizações afetivas da matéria, um exame das condições do
devaneio, buscando a ação dos valores inconscientes, na base do conhecimento
empírico e científico. Deste modo, esta primeira obra prepara instrumentos para o que o
autor chama de “crítica literária objetiva”.
O método bachelardiano – utilizando-se de arquétipos junguianos e dos quatro
elementos de Aristóteles (terra, fogo, água e ar) – estabelecia a imagem como objeto de
seu estudo e definia que ela era, no texto, um vestígio da função do irreal; predecessor
da percepção e, portanto, não uma reprodução da realidade. Bachelard revela o quanto
as imagens do elemento fogo perduram na ciência e na poética. Mais tarde investigará
nos livros dos poetas as imagens da água, da terra e do ar como origens arquetípicas
materiais, reveladoras da imaginação poética, enquanto instância material, dinâmica e
criadora.
19
1.3.5 Crítica psicanalítica
Diferentemente dos membros da escola anterior – que não se aliavam aos
fundadores da psicanálise para analisar o imaginário – a crítica de índole psicanalista se
vale profundamente de seus conceitos para estudar as obras literárias. Em 1929 Charles
Baudouin publica Psicanálise da arte, que pretende encontrar semelhanças entre
literatura e os complexos. Após uma explanação das teorias freudianas, o autor se detém
sobre o complexo de Édipo: ele aponta sua presença em obras com temas como o pai-
tirano de Guilherme Tell ou na culpa que domina Don Juan.
O narcisismo e a volta ao seio materno compõem o segundo tema de Baudouin.
O autor toma como exemplo as obras de Tolstoi, no qual vários de seus personagens
possuíam traços de seu narcisismo, de modo que “os heróis de Tolstoi – especialmente
aqueles nos quais se projetou com maior intensidade – não podem analisar seus
sentimentos amorosos sem concluir que ali só existe o ardil do eu” (p. 147). A
psicanálise da literatura escapa da regressão e atinge o profundo cerne da obra literária
através da vivência dos complexos do autor, mas também das derivações e sublimações.
A segunda parte desta importante obra trata de um aspecto até então pouco
explorado pela crítica: a reação do leitor. Tadié explica que “os leitores realizam por
meio da obra suas tendências inconscientes, projetam nela seus conflitos e sua solução”
(p. 149). Ou seja: a literatura promove no seu expectador a vivência do imaginário
projetada no real. Através das palavras, a obra se comunica com o leitor e o “faz
sonhar”. Contudo, essa comunicação não é perfeita, posto que acontece no primitivo de
cada um, no inconsciente coletivo.
Mas seria possível aplicar as idéias de Freud exclusivamente à obra, de modo
que o “inconsciente do texto” seja único e não convergente com o do escritor? Marthe
Robert acredita que sim. Seu livro de maior destaque, Romance das origens e origens
do romance, mostra como o pensamento freudiano pode ser aplicado a todo um gênero
literário que não somente uma única obra. Isso tudo sem recorrer à biografia ou
inconsciente do escritor. A base de seu trabalho é uma descoberta de Freud publicada
em 1909 chamada O romance familiar dos neuróticos, que estabelecia o seguinte:
uma forma de ficção elementar, consciente
na criança, inconsciente no adulto normal e tenaz
em numerosos casos de neuroses, cuja estrutura
contém sempre o mesmo cenário, os mesmos
20
personagens, o mesmo assunto, e que está ligada
ao “próprio princípio da imaginação”. A criança,
decepcionada com os pais que adorava no início e
expulsa do paraíso, considera-se “encontrada, ou
adotada”: tendo perdido seus pais nobres, sente-se
abandonada por seus pais “plebeus”, a criança
está, então ‘sozinha diante de dois casais
antitéticos que engloba na mesma veneração e no
mesmo ressentimento’. A descoberta da
sexualidade permite, numa segunda etapa, que a
criança fantasie apenas sobre o pai, rei e
quimérico, permanecendo a mãe plebéia e
próxima. O primeiro estágio é o da “criança
encontrada”, o segundo, o da bastarda. Esse
primeiro argumento permite definir o conjunto dos
romances, porque revela ‘a origem psíquica do
gênero’ e porque ele “é o próprio gênero”.
(TADIÉ’, p. 160)
Eis aí as duas grandes maneiras de se fazer um romance, segundo Robert: o
bastardo realista que confronta o mundo ou o da criança realista que foge do combate
por falta de ferramentas ou conhecimento para tal.
1.3.6 Sociologia da literatura
Embora a sociologia da literatura seja uma corrente do século XX, suas origens
remontam ao século XIX, onde críticos como Madame de Staël e filósofos como Marx
já analisavam as relações entre literatura e sociedade. Mas é em 1920 que Georg Lukacs
publica seu primeiro trabalho de teoria literária conhecido como A teoria do romance.
Sob grande influencia do pensamento hegeliano, já neste primeiro livro Lukacs descreve
que a evolução social e a evolução literária caminham lado a lado. De modo geral, suas
obras gravitam em torno dos estudos sobre o romance histórico. Tadié explica que, para
Lukacs, este gênero representava a sensação de incompletude da burguesia, onde “os
personagens desenvolvem-se não segundo a vontade do autor, mas segundo ‘a dialética
interna de sua existência social e psicológica’” (p.167). Sua metodologia aparece
claramente descrita no prefácio de 1960 de seu O romance histórico, onde ele postula:
“a busca da ação recíproca entre o desenvolvimento econômico e social e a concepção
do mundo e a forma artística que dela resultam (...) são uma contribuição preliminar
tanto à estética marxista quanto ao modo materialista de tratar a história literária”
21
(TADIÉ, p.168). É também nele – que é seu ultimo livro – que Lukacs descrevia o
caráter revolucionário das obras de Honoré de Balzac e Sir Walter Scott. Segundo ele,
ambos os autores possuíam apurado senso crítico por causa de suas oposições à
ascensão da burguesia.
Outro expoente desta corrente é o teórico marxista Lucien Goldmann. Seu
método é descrito em seu livro Pesquisas dialéticas, de 1959, e se manterá durante toda
sua obra. Ele postula que
para o materialismo histórico, o elemento
essencial no estudo da criação literária reside no
fato de a literatura e a filosofia serem, em plano
diversos, expressões de uma visão do mundo e de
as visões do mundo não serem fatos individuais,
mas, sim, sociais
(GOLDMANN citado por
TADIÉ, p. 173)
Contudo, antes de estabelecer relações entre as obras e as conjunturas eclasses
sociais, Goldmann afirma que é preciso compreender o seu significado próprio. Mais
que isso, o scholar acredita que o valor estético é ainda o critério fundamental da
análise, em detrimento à historia de vida e intenções do escritor. Portanto, o escrutínio
não parte desses últimos aspectos, posto que são incompletos e o crítico nunca
conseguiu de fato pensar ou sentir como os autores por ele analisados. Tadié
complementa, ao final, que para Goldmann o escritor de talento é aquele que “só tem
necessidade de exprimir intenções e seus sentimentos para dizer, ao mesmo tempo, o
que é essencial à sua época e às transformações por que passa” (p. 174).
1.3.7 Dívidas da Crítica para com a Lingüística
Émile Benveniste é o primeiro dos lingüistas que destacaremos. Lingüista
estruturalista francês, Benveniste começou seus estudos com Antoine Meillet, ex-aluno
de Saussure. Seus fundamentos, publicados em Problemas de lingüística geral, de 1966,
davam conta de que “a língua constitui um sistema no qual todas as partes são unidas
por um intercâmbio de solidariedade e dependência. Esse sistema organiza unidades,
que são os signos articulados, diferenciando-se e delimitando-se mutuamente” (p. 194).
Tadié esclarece que substituindo a palavra “língua” por “obra literária” teremos aí um
22
método claramente aplicável à literatura. Em outro artigo, intitulado As relações dos
tempos no verbo francês, Benveniste propõe uma nova partilha das formas da
linguagem em história e discurso.
A história comporta a narrativa do que aconteceu no passado e no qual o locutor
não intervém. Sua enunciação é marcada pelas formas negativas e “campo de expressão
temporal”. A primeira “só emprega ‘formas da terceira pessoa’, enquanto o aparelho
formal do discurso é, ao contrário, marcado pelo emprego da relação entre o eu e o tu
(p. 195). A segunda pode se manifestar no passado simples, no imperfeito, no mais que
perfeito e no “tempo periférico de futuro”. Já o discurso é “apenas enunciação,
supondo-se um locutor e um ouvinte e, junto ao primeiro, a intenção de influenciar o
outro de alguma maneira” (idem). Esta distinção teve forte influência sobre a crítica
literária, que entende a literatura como linguagem carregada de múltiplos sentidos.
1.3.8 Semiótica da literatura
A definição mais comum de semiótica é a que evoca uma ciência dos signos.
Contudo, seus ramos e metodologias são os mais diversos e, no caso de sua aplicação
literária, atendo-se às obras literárias de maior importância – método que me parece ser
o mais prudente e sigo a seguir. Eis os principais membros destacados elo autor:
Brilhante crítico e semiólogo francês já citado diversas vezes neste trabalho,
Roland Barthes publica em 1964 Elementos da semiologia (Tadié assume a expressão
como o equivalente saussureano de “semiótica”), uma classificação dos conceitos
tomados de Jakobson, Martinet, Saussure e Hjemslev. Nele, Barthes destaca quatro
categorias: Língua e Palavra, Significado e Significante, Sistema e Sintagma, Denotação
e Conotação. Adefinição dessas categorias se apresentam de maneira muito clara nas
palavras de Tadié, que possibilitará sua melhor compreensão. Citemos, pois, a longa
explicação:
A primeira divisão reaparece sob a forma
Código/ Mensagem (Jakobson); esta categoria é
aplicável a todos os sistemas de significação; é o
“essencial da análise lingüística”. A segunda
dupla, Significado e Significante, é segundo
Saussure, o componente do signo; Barthes aí
introduziu o princípio, ressaltado por Martinet, da
23
“dupla articulação”, que separa as “unidades
significativas” (palavras ou “monemas”, cada
qual dotada de um sentido) e as ‘unidades
distintivas’ (sons e fonemas). Ligaremos os
significantes ao plano da expressão e os
significados ao plano do conteúdo, tendo cada um
desses planos, segundo Hjemslev, forma e
substância. A forma de expressão é, por exemplo, a
sintaxe; sua substancia, os fonemas; a forma do
conteúdo organiza os significados entre si, sua
substância concerne aos aspectos emotivos,
ideológicos, o sentido do significado. O significado
não é uma coisa, mas, sim, uma “representação
física da coisa”. A significação é “o ato que une
significante e significado”, constituindo, assim, o
signo.
A terceira dupla, Sintagma e Sistema,
corresponde aos dois eixos da linguagem. O
primeiro é o dos sintagmas, “combinação de
signos”, que, na linguagem, é “linear e
irreversível”. O segundo é aquele das associações,
hoje denominado “paradigmático” e chamado por
Barthes de “sistemático”. Reconhecemos a
contigüidade e a similaridade de Jakobson, às
quais correspondem a metonímia e a metáfora. A
disposição dos termos do campo associativo ou
paradigmático chama-se “oposição”. Finalmente,
Denotação e Conotação supõe, segundo Hjemslev,
que o conjunto do sistema Expressão/ Conteúdo, já
descrito, funciona como “expressão ou significante
de um segundo sistema”: o primeiro é, nesse caso,
“o plano de denotação”; o segundo, “o plano de
conotação”. A literatura é exemplo de conotação,
um dos corpus aos quais se prenderá o semiólogo,
do interior, após o ter escolhido “amplo”,
“homogêneo”, “sincrônico”
(p. 222).
Já em S/Z, de 1970, Barthes postula uma semiótica narrativa que modifica
alguns elementos da obra citada anteriormente, mas agora sem o pressuposto de haver
uma hierarquia. Mas talvez o que há de mais interessante a mencionar aqui sobre a obra
de Barthes é que pode ser observado no já citado Crítica e Verdade, que é, para ele, a
crítica também passível do modelo semiótico, posto que “a obra constitui um ‘sistema
de sentidos’, que permanece ‘irrealizado caso todas as palavras não possam ser
colocadas em lugar perceptível’” (p. 224).
Outro expoente da semiótica da literatura foi A. Julien Greimas. Segundo ele a
estrutura mínima de qualquer significação se define pela presença de dois termos e da
relação que os liga; de modo que a relação pressupõe a percepção. Para construir o
sentido, a semiótica de Greimas compreende o seu plano de conteúdo como um
24
“percurso gerativo do sentindo” que envolve três etapas. A primeira, chamada nível
fundamental, trata as estruturas fundamentais mais simples e abstratas, onde a
significação surge em oposição à semântica mínima. A segunda, chamada nível
narrativo, organiza a narrativa do pressuposto do sujeito. A terceira etapa consiste o
nível do discurso, no qual a narrativa é assumida pelo sujeito da enunciação. Tadié
explica, ainda, que Greimas pretende uma “sintaxe elementar” e um modelo da
significação literária. A semiótica greimasiana não é estática e definitiva, seu modelo
sintático inicial serve para toda descrição de sentido, mas é aberta a aperfeiçoar-se.
1.4 A tarefa critica no âmbito do jornalismo
É dessa dicotomia entre academia e jornalismo que se originaram os cadernos
culturais da contemporaneidade, noticiosos e, porque não dizer, ensaísticos. Contudo,
há pouca literatura sobre o assunto e o descontentamento abrange boa parte dos
trabalhos. Além disso, grande parte dos autores concorda em que não há mais crítica
nos jornais (em especial a imprensa brasileira). Muitos classificam elementos que toda
crítica deve portar e ambicionar e que os periódicos atuais não comportam. Aqui cabe o
lúcido comentário de Imbert (1986) – em que esta dissertação se apóia – no sentido de
que qualquer classificação é insuficiente e pode implicar estagnação das idéias e
conceitos: “Não há um tipo de crítica que seja superior ao outro (...). Haveria antes que
falar em críticos superficiais e críticos profundos” (p. 159).
Discute-se muito quais as funções atribuídas ao ato crítico. Uma delas dá conta
de que a crítica cultural não é nem subjetiva, nem partidária, nem impressionista.
Longe de subtraí-la aos ditames do gosto, desejar que a crítica assuma ares de total
objetividade me parece aquele tipo de crítica que Roland Barthes menciona em suas
Mitologias como “Nem-Nem
5
. Pois se ao longo do desenvolvimento da imprensa a
crítica cultural sempre apresentou esse hibridismo de linguagem, recusar este inegável
juízo e engajamento em defesa da objetividade é atrasado e impossível.
Há aí também outro aspecto a ser considerado. Esse clamor por uma crítica
pretensamente objetiva acaba por reduzir a obra – além do trocadilho – em um simples
5
Sobre o assunto, ver BARTHES, 2003, p. 145-148
25
objeto dado à percepção que estaria sujeito à estatutos e métodos muito bem definidos.
Mas a arte contemporânea (e aqui creio que posso englobar todas elas) nega-se a ser
subserviente a todo tipo de regra objetivante que acabaria por ameaçar toda a
potencialidade da obra a ser apreciada pelo expectador.
E que melhor resposta teríamos a esta querela senão as palavras de Oscar Wilde
que faz coro às já citadas palavras de Bento Prado Jr. quando diz que “a crítica, na sua
elevada forma, na forma perfeita, é essencialmente subjetiva; busca revelar o próprio
segredo e não o segredo de outrem: serve-se da arte não pela deterioração, mas pela
emoção” (1994, p.119). O que se deve esperar do crítico é a profunda argumentação e
defesa de suas escolhas, não apenas uma apresentação formal do objeto cultural tratado.
Este é dever da reportagem.
Mas se a crítica é uma atividade profundamente ligada à existência histórica e na
subjetividade de quem a exerce, sua tarefa é também adequar à linguagem de seu tempo
a linguagem de autores de épocas passadas, revisitando obras que muitas vezes
carregam sobre si uma aura de indiscutibilidade. Aqui cabe aos críticos fazer como
(novamente) Barthes, que enterra a intocabilidade da tragédia raciniana mantida há
mais de duzentos anos
6
. O valor das obras atemporais (como a de Racine) é mutante e
consiste em mobilizar, renovar e até mesmo atualizar a tradição literária. E é tarefa da
crítica acompanhar este pêndulo e abrir de modo criativo novas dimensões destas obras,
proporcionando ao leitor contato com esse espaço novo e único, de modo que ele possa
retornar à obra com mais liberdade que antes.
E mais: arrisco-me a dizer que parte do que imortaliza certas obras é exatamente
sua capacidade de responder ao crítico. Esta estranheza da obra – muitas vezes
incompreendida pelo crítico – é que alimenta o debate em torno de si. E quando outro
crítico, anos, décadas ou séculos depois, confrontar o antecessor forma-se um diálogo
coletivo e social da obra. Uma crítica passional e destrutiva não vai conseguir “matar”
uma grande obra. Por outro lado, uma crítica violenta que hoje é considerada
iconoclasta pode ser na verdade a crítica “maior”, que não olha uma obra com
reverência e tradicionalismo, mas força-a a superar-se e reinventar-se perenemente.
A rigor, tudo que permeia a obra pode ser utilizado como ferramenta para sua
compreensão. E para isso os críticos por vezes utilizam informações exteriores à obra ou
mesmo examinam o contexto no qual ela se insere para sua exegese. Muitos críticos
6
Idem, p. 98-100.
26
modernos examinam a personalidade ou histórico do autor para o julgamento da peça
cultural. Mais do que isso: o crítico por vezes utiliza como método campos da ciência
muito diversos como a psicanálise, sociologia, etc. Mas a incorporação de princípios de
outras áreas do conhecimento não significa diminuição ou desvirtuação da crítica. Ao
contrário: “a crítica é o exame e o julgamento da obra. Para isso, que se use tudo o que
estiver à disposição, inclusive os dados da psicologia e da biografia do autor. Tudo o
que for útil à compreensão da obra, que é a finalidade última da análise crítica”
(COUTINHO, 1975, p. 21).
Todos esses aspectos contribuem para a tarefa crítica, mas ou é uma questão
totalmente interna às academias – e de pouco valor prático – ou faz parte dos melindres
da indústria cultural. Mas se crítica é uma quebra nos valores da obra propondo idéias
novas ao leitor, então sua tarefa e relevância primeira é de ordem social e não
metodológica (?). E aqui voltamos à tensão descrita por Terry Eagleton e concordo com
o autor quando ela afirma que a tarefa da crítica cultural contemporânea na verdade
continua sendo a mesma da crítica dos salões ingleses. Mas ao invés de combater um
regime político repressivo, o crítico deve resistir à dominação dos bens de consumo, de
modo a reverter a leitura passiva e desautomatizar a relação do expectador com a arte.
2. A CRÍTICA COMO JORNALISMO CULTURAL NO BRASIL
2.1 Evolução da linguagem crítica no jornal: do rodapé à indústria
cultural
Como vimos, as preocupações com o estado da crítica cultural já aparecem
desde seu início, sendo retomadas de tempos em tempos com outras roupagens. De
todo modo fica claro que, sejam quais forem os pontos de vista adotados, todos
parecem considerar este debate inesgotável. A história da crítica cultural – em especial
a crítica literária – foi permeada pelo surgimento dos jornais e sua presença foi sempre
constante nas páginas da imprensa. Mas há muitos tipos de jornalismo cultural. Críticas
em revistas semanais especializadas, suplementos literários, críticas em blogs na
internet e nos jornais diários. A crítica hoje é democrática, dá conta de um número
27
infindo de produtos culturais e, de modo geral, usam de uma linguagem múltipla. Por
isso, cabe aqui outro aspecto da evolução crítica cultural dos jornais diários que não
somente seu caráter histórico e social, que é o experimentalismo e o hibridismo da sua
linguagem, capitais para sua transformação paradigmática e mesmo definição da tarefa
que esta crítica deve desempenhar.
O crítico que escreve em jornais diários se vê permanentemente entre a
contradição da linguagem ligeira que reage ao imediato da notícia e a linguagem
literária que preza pela reflexão e pela permanência. As raízes deste flerte de
linguagens têm início em solo nacional quando o jornalismo cultural atravessou o
Atlântico e passou a rechear os folhetins.
Os folhetins tratavam de “variedades”, com repertórios mais próximos do dia-a-
dia dos leitores em textos opinativos e de verve literária, em contraste com a noção de
notícia e reportagem que começava a se estruturar. Esse espaço ganha força ao longo
dos anos e torna-se famoso por publicar em suas páginas importantes romances,
selando assim um novo tipo de linguagem, um caminho do meio entre informação e
ficção. De fato, é também aí que nasce a divisão até hoje comum nos cadernos culturais
entre a abordagem opinativa e literária, mais próxima do texto ensaístico e universitário
e a abordagem factual dos acontecimentos. “Historicamente, a diferenciação entre
jornalismo informativo e jornalismo opinativo emerge da necessidade sociopolítica de
distinguir os fatos (news/histories) das suas versões (comments)” (MELO, 1994, p. 38)
Neste período, equivalente à segunda metade do século XIX, os jornais e
revistas abriam espaço aos intelectuais para a análise estética – às vezes remunerada –
no campo da música, literatura e artes plásticas. A imprensa é influenciada pela
literatura e os periódicos muitas vezes se tornaram a principal fonte de renda dos
escritores e críticos literários do país. Entre os colaboradores assíduos encontramos
nomes como Lima Barreto, José de Alencar e também o grande crítico e escritor
nacional: Machado de Assis
7
.
O Brasil distanciava-se do modelo
português e buscava consolidar uma identidade
nacional. Para alcançar esse propósito, a
literatura exercia um papel determinante,
sobretudo para uma comunidade letrada restrita,
porém representativa, da elite intelectual do país
(ZANCHETTA, 2004, p. 43)
7
Um bom trabalho sobre o escritor e o papel de sua obra na formação cultural do leitor foi feita por
Jayme Eduardo Loureiro em sua dissertação de mestrado O papel da crítica jornalística e da ficção na
educação do leitor: Machado de Assis e a reforma do gosto literário. (PUC-SP, 2003)
28
O jornalismo era pobre em material noticioso e sobrava debate sobre as artes e
editoriais políticos. Mas com a modernização da sociedade no século XX os jornais
também se transformaram. Os folhetins evoluíram para um jornalismo caracterizado
pelo predomínio do relato objetivo dos fatos. As redações passam a dar mais espaço
aos críticos profissionais que se ocupam da análise da análise forma das obras mas
também a repercutir o impacto da cena cultural na vida cotidiana.
O crítico que surge da efervescência
modernista dos inícios do século XX, na profusão
de revistas e jornais, é mais incisivo e informativo,
menos moralista e meditativo. No entanto,
continua a exercer uma influencia determinante, a
servir de referência não apenas para leitores mas
também artistas e intelectuais de outras áreas
(PIZA, 2003, P. 20)
Aqui é preciso fazer uma pausa e voltar os olhos para os Estados Unidos, onde
também emergiam críticos-repórteres. Neste contexto, surge em 1925 a revista The New
Yorker que tornou-se referência para publicações no mundo inteiro. Foi nela que
germinou o que viria a ser new journalism ou jornalismo literário. O jornalismo literário
utilizava técnicas e recursos literários como longos diálogos ou monólogos e descrições
detalhadas. Com o passar do tempo, passam a coexistir no mesmo espaço reportagens,
ensaios, entrevistas e perfis. De fato, os primórdios do século XX são marcados por uma
mudança na linguagem do jornalismo cultural.
Na década de 1930, o jornalismo atinge escala industrial. Atividades culturais
são vistas pela lógica do produto, e passam a seguir as leis do mercado. A análise ganha
um caráter popular e passa por um processo de simplificação, enquanto a crítica
acadêmica perde espaço nesse jornalismo moderno que emergia principalmente do pós-
guerra. É neste período que os hábitos de consumo das camadas mais abastadas se
diversifica. Concomitantemente, música popular e cinema – manifestações típicas de
seu tempo – tornam-se merecedoras da atenção desse público, até então mais voltado
para a literatura e arte erudita. Catalisado pelo rápido crescimento da indústria de bens
culturais e do público consumidor, o jornalismo cultural abandona o caráter
majoritariamente opinativo pelo informativo. É neste momento que o já citado
Habermas chama a atenção para o advento da indústria da comunicação em seu
Mudança Estrutural da Esfera Pública. Os “homens de letras” são substituídos pelos
29
homens de marketing e passa a fazer parte do corpo do texto estratégias para promover
determinado produto como se fosse notícia de interesse público.
Acontece que, enquanto os intelectuais se recusavam a fazer concessões à
simplificação e à generalização pretendidas, os editores culturais achavam
indispensável ampliar o raio de influência da crítica de arte, tornando-a acessível ao
público sedento por produtos culturais. O resultado: muitos intelectuais se refugiaram
nos periódicos especializados ou veículos restritos ao segmento universitário. Como
conseqüência, os vinte anos seguintes dos jornais brasileiros foram marcados pela
chamada crítica de rodapé. Segundo Flora Süssekind, isso significa uma crítica ligada
fundamentalmente à não-especialização da maior parte dos que se dedicam a ela e que
lhe traz, quando nada, três características
formais bem nítidas: a oscilação entre a crônica e o
noticiário puro e simples, o cultivo da eloqüência,
já que se tratava de convencer rápido leitores e
antagonistas, e a adaptação às exigências (...) e ao
ritmo industrial da imprensa
(p. 15).
Contudo a evolução do período não é tão simples assim. A autora assinala uma
aproximação entre a universidade e os jornais, com os periódicos abrindo espaço aos
acadêmicos no que hoje convencionamos chamar de segundos cadernos. A introdução
desses cadernos especializados acirrou a querela da linguagem do jornalismo cultural,
onde as matérias de caráter informativo e não especializado ocupavam as páginas
diárias e o texto opinativo e acadêmico predominava nos suplementos semanais.
Destacam-se nesse período nomes como Antonio Candido, Nelson Werneck Sodré e
Álvaro Lins, para citar alguns. Todos neste mesmo espaço que é o jornal, palco das
grandes polêmicas e conflitos entre os “homens de letra” e os críticos universitários da
metade do século.
Longe das redações começava a se forjar um outro texto, agora universitário,
que marcaria a produção dos anos 60 e 70. Produzida por uma geração de críticos
formados pelas faculdades de Filosofia de São Paulo e do Rio de Janeiro, fundadas em
meados da década de 30, interessados na pesquisa acadêmica, esta nova crítica criou
tensão com o modelo vigente. “Colaboradores habituais das páginas de cultura da
imprensa, acabariam por minar, aos poucos, a autoridade dos que até então nelas
pontificavam” (SÜSSEKIND, 1993, p. 17).
Em conseqüência, muitos suplementos deixam de circular, como foi o caso do
Suplemento Literário de O Estado de São Paulo, dirigido por Décio Almeida Prado de
30
1956 a 1967. Os “críticos-cronistas” não tardaram, então, a questionar o jargão
especializado, enciclopédico, técnico, que alegavam ser distantes do público leitor.
Presos à “linguagem jornalística” os jornais passaram a ser menos freqüentados pelos
críticos-scholars. Entretanto Süssekind alerta que, com o desenvolvimento da
teorização, surge um terceiro modelo crítico neste período: o crítico-teórico, que tem
“como marca distintiva indescartável a auto-reflexão” (p. 30). As obras de Roberto
Schwarz, Luiz Costa Lima e Haroldo de Campos figuram entre bons exemplos deste
novo personagem para a autora.
O jornalismo cultural ressentia-se também das novas tecnologias que interferiam
em seu conteúdo e linguagem. Até este momento a crítica cultural era toda construída
em torno do texto escrito. A visibilidade técnica impõe-se como padrão e o fascínio da
linguagem ágil e imagética da televisão passa a orientar o jornalismo cultural impresso.
A aparência da página torna-se decisiva, o que significou – no caso das editorias de
cultura – um número cada vez maior de novos projetos gráficos que primam pelo uso
de cores e elaboradas fotografias.
A partir dos anos de 1980 percebe-se o crescimento do mercado editorial, muito
mais preocupado com a publicidade que a crítica. Süssekind considera que esse
fenômeno “desestimula uma reflexão crítica mais atenta, já que o interesse primordial é
vender livros, não analisá-los, estimula, por sua vez, nova ampliação do espaço para
(...) a notícia, para um aumento sobretudo comercial do livro” (p. 32). É neste contexto
de efetiva difusão de livros e expansão do público-leitor que é possível compreender
plenamente o progressivo declínio da esfera pública literária. Os cadernos culturais
tornam-se promotores de produtos culturais. Neste contexto, dilui-se a função da crítica
cultural como modeladora de opinião estética exercida pelos periódicos.
Os cadernos culturais hoje são pautados, em sua maioria, pelos lançamentos de
grandes premiações de cinema ou temporadas de shows. Para favorecer a leitura rápida
criou-se o jornalismo de serviço, onde roteiros de consulta rápida com as famosas
estrelinhas “guiam” o leitor de jornal sobre o que deve ver, ouvir ou ir. Mas nem por
isso o diálogo entre a imprensa e as universidades cessou. De fato, a crítica atual possui
um duplo pertencimento: Muitos acadêmicos, fora dos muros da universidade,
publicam seus textos assiduamente nos jornais, como é o caso de Ismail Xavier.
Paralelamente, muito jornalistas passaram a lecionar, como é o caso do já citado aqui
Marcelo Coelho, professor nas faculdades Cásper Líbero. Dentro das páginas de jornal
da pós-modernidade, a presença da atualidade é fundamental na linguagem crítica.
31
Além do senso de urgência, cabe a ela interpretar o sentido mais amplo da cultura. Na
esteira da simplificação e da necessidade informativa da linguagem do jornalismo
cultural que se formou ao longo dos anos deixo aqui as palavras de Arthut Nestrovski
do livro que compila suas belas críticas musicais publicadas no referido jornal e que
não deixa de ser um dos pontos que este trabalho pretende descobrir:
E num momento como este, em que a
universidade parece ter perdido boa parte do
engajamento que já teve, o jornalismo cultural
pode, quem sabe, assumir um papel mais
relevante. Desde que não perca o sentido de
contexto, a crítica pode vestir, também, o manto da
pedagogia. Simplesmente situar um leitor na
floresta de nomes e correntes já seria uma ajuda
considerável
(p. 11).
2.2 Cinema como objeto da crítica jornalística
A crítica cinematográfica na imprensa contribuiu para a criação de um espaço
específico de aparência social, a partir das convergências e antinomias peculiares aos
diversos fatores que compõem o fazer crítico, visto que cada um constitui um campo de
disputas particular, com sua natureza própria, seus interesses, suas estratégias. Assim
podemos dizer que cada uma dessas modalidades críticas contribui para a formação de
microesferas públicas, nas quais a disputa de poder e publicidade ocorre de forma
estritamente localizada, dependendo, na maioria dos casos, do prestígio do próprio
veículo ou do crítico em si.
Um dos fatores determinantes do texto crítico final é o grande número de fitas
lançadas semanalmente, que supera em muito a capacidade do cinéfilo de acompanhar e
saber tudo sobre os filmes disponíveis. Assim, caberia ao jornalismo cultural – em
especial a crítica – “filtrar” toda essa informação para que ela possa ser transmitida ao
público de forma eficiente. Um aspecto que influencia nessa “filtragem” é quando um
filme entra na pauta de discussões dos principais meios de comunicação (mass media).
Ou seja, um filme muito esperado ou que gera polêmica certamente será um forte
candidato a ser alvo de discussões em revistas, jornais, televisão e internet. Isso remete
ao conceito de agenda-setting referido por Mauro Wolf.
32
Segundo ele, o agenda-setting defende que os mass media não têm o poder de
persuadir, de influir diretamente no pensamento do indivíduo, apenas apresentam ao
público uma lista daquilo sobre que é necessário ter uma opinião e discutir. Ou seja, os
mass media não dizem como uma pessoa vai pensar, mas “têm, no entanto, uma
capacidade espantosa para dizer aos seus próprios leitores sobre que temas devem
pensar qualquer coisa” (2001, p. 145).
Por outro lado, o tamanho e a qualidade dos textos, especialmente destes que
anunciam um lançamento, por vezes geram uma distorção dos limites conceituais no
jornalismo cultural. A princípio tudo o que o periódico publica é fato cultural, então o
que é de fato noticiável nas editorias de cultura com relação à sétima arte? De acordo
com Daniel Piza (2003) essa diferença vem diminuindo a cada dia, com os textos sendo
restritos às informações mais superficiais. Ficamos sabendo tudo sobre o orçamento
gasto, o caso extra-conjugal do galã durante as filmagens, a clássica reportagem sobre
efeitos especiais e todo tipo de curiosidades. E, apenas em um quadrinho no pé da
página, achamos o mais importante: a crítica tecendo considerações sobre a obra em si.
O que seria notícia e objeto de análise com mais acuidade se transforma, desde o
início, em consagração do que será o sucesso da temporada, o blockbuster. Para
Marcelo Coelho essas “notícias” supostamente recebem destaque porque são do
“interesse do público”. Porém o que está sendo atendido, na verdade, é “interesse do
mercado”. O autor explica que o grande público tem mais interesse em assistir Matrix,
por exemplo, do que um filme iraniano. Contudo, isso não significa que tem interesse
por ler “tudo” sobre a produção e lucros obtidos pelo filme norte-americano. A rigor,
este tipo de matéria interessaria mais ao acionista do estúdio, ao exibidor do filme que
ao expectador comum. “Não se fala mais o que é bom para a sociedade, só se fala no
que é bom para o mercado; não há mais cidadãos, classes, países, só o Mercado, com M
maiúsculo” (2000, p. 90).
José Marques de Melo situa esse conceito a partir da premissa de que a produção de
críticas pelo jornalismo cultural compreende múltiplas facetas, tanto do ponto de vista
da linha editorial de cada periódico, como do próprio exercício da crítica. Como
enfatiza o autor, é preciso antes observar as condições em que o jornalismo opera e seu
funcionamento institucional e mercadológico. Como as críticas passaram a ser a grande
fonte de referência dos produtos culturais para o público, dar ênfase a essas obras
“constitui fonte segura de receita publicitária” (1994, p. 134).
33
Do ponto de vista conjuntural, as crises econômicas que o país enfrenta afetam
diretamente o exercício da crítica, que cede lugar para notícias sobre a própria crise.
Neste caso, o espaço prioritário passa a ser sempre aquele destinado à publicidade em
detrimento dos espaços para a reflexão crítica.
O jornalismo tem necessidade de “vender”, de
apresentar resultados comerciais na venda avulsa
de publicações, na venda de assinaturas, na
conquista de índices de audiência na mídia
eletrônica – o que influencia fortemente os
conteúdos tratados por ele e pode levar ao
espetaculoso, ao sensacional, ao apelativo
(PRIOLI, 2000, p. 81)
Outro problema comum que interfere na qualidade das críticas é a relação do
crítico com o artista. Devido ao problema financeiro comum nas redações, o jornalista
encarregado das críticas culturais por vezes é repórter também. Como destaca Daniel
Piza, em determinados meios culturais brasileiros – como o teatro – talvez por serem
pequenos e de difícil sobrevivência, a relação com a crítica limita-se a “incorporá-la” ou
“rejeitá-la in limine.” (2003 p. 78) No caso do cinema, esta relação por vezes fica
abalada devido ao ego de cineastas e atores que se sentem particularmente ofendidos
com o texto publicado, negando-se, em outras ocasiões, a concederem entrevistas e
informações ao jornalista.
O mesmo autor descreve outro problema comum referente a esta relação,
principalmente no Brasil. Nossa cultura hipervaloriza os laços afetivos e ainda há muito
espírito de “compadrio” ou “clubismo” na mentalidade nacional, sendo comum que o
jornalista se deixe envolver – de modo genuíno ou não – e perca parte da clareza sobre
essas relações. Aqui reina a máxima de José Marques de Melo (1994, p. 134): “para os
amigos muitas vezes a tolerância; para os antipáticos, ou desafetos, a severidade
absoluta”. Nas palavras de Piza, “esse talvez seja o maior desafio do jornalista cultural
brasileiro, além da resignação diante da grandiosidade da industria cultural, de seu
sistema de celebridades e mega orçamentos.” (2003, p. 92)
34
2.3 A crítica cinematográfica no Brasil
A crítica de cinema no país é marcada por uma longa trajetória que teve início
em meados do século XIX, quando foram registradas as primeiras publicações. Dentre
elas estava O Paiz. Publicado pelo crítico teatral Arthur de Azevedo em 1897, o
periódico trazia comentários sobre os filmes que eram exibidos nas casas teatrais da
época. Para Ruy Gardnier, a constante preocupação com o comentário desses filmes faz
de Arthur Azevedo o “primeiro crítico brasileiro”.
Olavo Bilac foi responsável pela primeira investida de um intelectual brasileiro
na direção do cinema. Em 1904 publicou na revista Kosmos um texto que falava sobre a
revolução que o cinematógrafo (equipamento utilizado para rodar e projetar filmes)
poderia provocar. No texto, Bilac diz que é “o livro do futuro, para ensinar as
populações (...) é o cinema”. Ainda no primeiro decênio do século XX é lançada em
1913 a revista Cinema – impressa em Paris – primeiro periódico nacional a conter
comentários sobre filmes. Rudá Andrade conta, em seu. Cronologia da cultura
cinematográfica no Brasil, que a publicação apenas seis meses, depois se transformando
em Cine-theatro, que circulou por mais um ano. As outras revistas da época apenas
exibiam fotos e textos de divulgação.
Embora a divulgação cinematográfica tenha começado nos jornais como os
textos de Manuel Cravo Jr. no Correio da Manhã eram as revistas ilustradas que
desempenhavam um debate mais apurado em torno da sétima arte em tempos de cinema
mudo no país. Grande expoente dessas publicações é a Cinearte, publicada
originalmente no ano de 1926 por Adhemar Gonzaga e Mário Behring. No editorial do
primeiro exemplar, publicado no dia 3 de março, os fundadores declaravam que o
objetivo da revista era formar mentalidades cinematográficas:
Pugnamos sempre pelo saneamento dos
programas oferecidos ao público. Nosso zelo
jamais se arrefeceu nem arrefecerá nesse sentido.
Tal a razão da nossa seção de crítica, tão
malsinada pelos que não enxergam, pelos que não
compreendem o alto escopo que visamos,
mantendo um estudo, algo severo às vezes, sobre o
que nos oferecem importadores de filmes, agências
das produtoras e por fim os exibidores.
8
8
Revista Cinearte, Rio de Janeiro, 3 de março de 1926, n° 1, p. 3.
35
Segundo Gardnier, a trajetória da Cinearte é um dos fenômenos mais complexos
e mal estudados da história do cinema brasileiro. Isso porque ao mesmo tempo em que
se autodefinia como o “natural intermediário” do público com Hollywood foi também a
“primeira (e desde seus números iniciais) a realizar uma campanha combativa em favor
do cinema nacional, mostrando uma nítida vontade de ação prática e local”. De acordo
com Ruy Gardnier, este pensamento nacionalista culminou com a criação dos estúdios
da Cinédia, fundados por Gonzaga. A revista foi editada até 1942.
De fato, o cinema foi um dos pólos de irradiação cultural na década de 30,
influenciando inclusive a linguagem visual dos veículos. Para Maria Celeste Mira,
grande parte das publicações que se desenvolveram no país a partir de então tem relação
com a sétima arte. Juntamente com as histórias em quadrinhos,
eles concretizam a busca, há muito iniciada
pelas diferentes técnicas de ilustração e pela
fotografia, de fixar e reproduzir imagem. Através
da sua decomposição em quadros, conseguem
criar a ilusão de movimento no papel ou na tela,
dando origem a uma nova linguagem
(2001, p.
28)
É também na década de 1930 que surge no Brasil o primeiro crítico diário de
cinema. Pedro Lima escrevia regularmente para jornais da época. Seu trabalho fez com
que ele fosse ao mesmo tempo temido e admirado por sua posição. A figura do crítico
de cinema tal como é entendida hoje, afirma o mesmo autor, ficou consolidada com o
trabalho de Pedro Lima.
O amor romântico, selado com o beijo no happy end das grandes produções
hollywoodianas de 1940 foi responsável pelo que Mira chamou de “cinematografização
do cotidiano” e revistas especializadas no tema.. A de maior circulação era a
Cinelândia, mas havia também a Cinemim, Filmelândia e Cena Muda, publicada desde
os anos 20. Além disso, periódicos de interesse geral como Revista da Semana e O
Cruzeiro também passaram a ter sessões regulares sobre cinema. “Fora do espaço
específico, o cinema fornecia os temas, viessem eles dos próprios filmes ou da vida dos
astros. Figuras-modelo, eles dominavam desde as reportagens até as seções de
aconselhamento amoroso, moda, beleza, saúde e decoração” (p. 32).
Nos jornais diários, na década de 1940 começa a escrever no Correio da Manhã
Antonio Moniz Viana, importante crítico da imprensa diária. Sua escrita peculiar,
com
muitas idiossincrasias, como odiar a chanchada e o Buñuel mexicano até adorar William
36
Wyler trouxe a Moniz Viana o status de intelectual do cinema. Escreveu por 28 anos no
Correio, só terminando sua coluna com o fim do jornal.
De caráter anti-americanista – em tempos de intensificação da Guerra Fria –
surge a revista Fundamentos, editada ao longo de pouco mais de seis anos, entre 1948 e
1954. Monteiro Lobato fundou o periódico e editou o número inicial, mas morreu antes
de sair o segundo número. A revista contava com a colaboração de jovens de esquerda,
que davam o necessário tom crítico à temática cinematográfica. Para Afrânio Mendes
Catani, a análise da produção crítica de cinema da Fundamentos colaborou
“decisivamente para o conhecimento de como uma parcela da crítica escrevia, debatia,
militava e estudava o cinema (nacional e estrangeiro) no Brasil entre o final dos anos 40
e meados da década seguinte” (2003, p. 95). De fato, o autor salienta o forte
alinhamento stalinista que a revista manteve ao longo da sua trajetória. O autor destaca
que essa postura pode ser observada no dossiê publicando em janeiro de 1950 sob o
nome “O 70° aniversário do Generalíssimo Stálin” ou mesmo no editorial de abril de
1953 que acompanhava o clássico retrato do líder russo pintado por Candido Portinari.
A crítica cinematográfica brasileira foi relativamente rica na década de 1950.
Neste período tem início um forte sentimento pró-cinema nacional, estimulado
principalmente pelas experiências de cinema industrial no país, com a Cia
Cinematográfica Vera Cruz à frente dessas realizações. Arthur Autran nota que neste
período as vertentes críticas podem ser divididas em cinco: os “velhos críticos”, os
“católicos”, os que não eram propriamente críticos, os “esteticistas” e os “críticos-
históricos” (os dois últimos tomados da classificação feita por Fábio Lucas na Revista
de Cinema, vol. III, n° 18, Belo Horizonte, set. 1955).
Por “velhos críticos” o autor entende aqueles ainda muito ligados ao cinema
mudo. Os “católicos” eram um grupo extremamente atuante e organizado, formado por
padres à frente de cineclubes e revistas especializadas como a mineira Revista de
Cultura Cinematográfica. Os não críticos cumpriam um papel que se assemelha à
assessoria de imprensa, escrevendo a mando das distribuidoras algo muitas vezes
semelhante a realeases. Porque esses últimos são grupos pouco representativos, Autran
se detém verdadeiramente nos “críticos-históricos” e “esteticistas”. Estes outros viam no
cinema uma realidade artística regida por leis peculiares, e não o ligavam a outros
gêneros de arte, nem os seus conceitos. Segundo o autor, eles correspondiam à vertente
crítica dominante, ocupando espaço nas publicações mais influentes e principais
37
organizações e cinematecas do país. Dentre seus expoentes encontra-se Moniz Vianna
no Correio da Manhã e Almeida Salles n’ O Estado de S. Paulo.
Já os “críticos-históricos” – Alex Viany aqui incluído – se preocupavam com a
mensagem implícita e explicita dos filmes. Já estes preferiam a produção
cinematográfica nacional e publicavam seus textos em periódicos de pouca
expressividade. O convívio entre os dois grupos era desarmonioso e conflitivo, onde
ambos tentavam indicar qual era o “verdadeiro cinema”.
A configuração das colunas, veiculadas
por órgãos de imprensa, em arena ára a luta pela
primazia no meio da crítica cinematográfica
tendia a manter os “esteticistas” como pólo
dominante e os “críticos-históricos” como pólo
dominado. Afinal, não apenas os principais órgãos
de imprensa tinham, em geral, críticos
“esteticistas”, mas ainda a instabilidade dos
“críticos-históricos” era maior devido às ameaças
do comércio cinematográfico e à discordância
ideológica em relação às direções das publicações.
Não é casual o fato desses críticos ficarem
restritos aos órgãos de menor destaque
(p. 126-
128)
Em meio à disputa entre essas vertentes críticas é realizada no Museu de Arte
Moderna de São Paulo, em 1952, a primeira retrospectiva do cinema brasileiro que,
como afirma Ruy Gardnier, é considerada “um marco pioneiro dos estudos históricos
sobre o cinema nacional”. Palco precioso para a crítica da época foi também a já citada
Revista de Cinema. Lançada em Belo Horizonte em abril de 1954, fruto de Jacques do
Prado Brandão, Cyro Siqueira e Guy de Almeida
9
o periódico era, nas palavras de Jean-
Claude Bernardet (1994), dedicada a uma revisão do método crítico, sendo “um dos
mais importantes focos da reflexão crítica no Brasil, voltada para o neo-realismo e os
teóricos italianos” (p. 69). No mesmo ano Alex Viany
10
, grande disseminador do
pensamento cinematográfico de viés marxista, publica na Revista de Cinema artigo
intitulado “O realismo socialista no cinema e a revisão do método crítico”. Embora
imbuído do espírito nacionalista da época, o crítico atenta para a necessidade – segundo
Arthur Autran no ensaio intitulado “Alex Viany e Guido Aristarco: um caso das idéias
fora do lugar” – de modernização do pensamento sobre cinema no Brasil.:
9
Sobre o percurso histórico da Revista de Cinema ver ANDRADE, cf. op cit.
10
Sobre Alex Viany, cf. AUTRAN, Arthur . Alex Viany: crítico e historiador. São
Paulo : Perspectiva, 2003.
38
O crítico brasileiro, ao defender que as
“doutrinas filosóficas e política” devem
subordinar a compreensão estética, está
remetendo, de forma redutora, à oposição que
Guido Aristaco classifica como fundamental entre
a estética baseada na filosofia idealista e a estética
baseada no materialismo dialético. Esta redução
deve-se ao stalinismo, ainda um referencial forte
(2003, p. 102).
Outro grande nome deste período é Walter da Silveira. Crítico de A Tarde e do
Diário da Bahia, funda em 1956 o Clube de Cinema, que será elemento aglutinador
para o surgimento de discussões sobre cinema na Bahia. Também foi considerado como
o guru de Glauber Rocha e um dos mais acurados críticos do cinema nacional. Em 1960
Glauber Rocha publica no suplemento literário do Jornal do Brasil uma série de artigos
que tentam dar conta do nascimento de um novo cinema no Brasil. O cineasta enuncia
diversos postulados do cinema novo, entre os quais "uma câmara na mão, uma idéia na
cabeça". Dois anos depois o Cinema Novo mal explodia nas telas e Alex Viany, que
Gardnier aponta como um dos críticos mais atentos ao cinema brasileiro, publicava na
revista Senhor o primeiro artigo a tentar dar conta da jovem geração de realizadores que
surgia: Cinema Novo, Ano 1. Em 1965, o mesmo Viany retomava as questões da ruptura
estética do grupo em outro artigo, O Velho e o Novo.
Na década seguinte a fundação da revista Filme Cultura, em 1966, proporcionou
campo para debates estéticos e, aos poucos, foi se tornando exclusivamente sobre
cinema brasileiro. A revista foi perdendo fôlego durante a década de 80 e em 1987 foi
tirada de circulação. O espaço para as críticas de cinema tornou-se quase inexistente a
partir de então. A análise estética dos filmes passou a existir somente nas faculdades de
comunicação e nos raros textos publicados em alguns jornais.
Em 1986, afirma Gardnier, o jornalista Rogério Durst desenvolve um estilo de
texto que até hoje é seguido por quem escreve sobre cinema nos jornais e revistas do
país: poucas ambições críticas, escrita descontraída, texto curtíssimo, preferência acima
de tudo pelo entretenimento.
Contudo, antes do fim da revista Filme Cultura, o Folhetim da Folha de S.
Paulo, principal suplemento cultural na grande imprensa dos anos 80, toma o cinema
como importante área de reflexão. O suplemento tentou atualizar o debate sobre a
realização cinematográfica, traduziu manifestos, abriu espaço para intervenções de
39
diretores e publicou edições especiais sobre Jean-Luc Godard, Sergei Mikhailovich
Eisenstein, Wim Wenders, entre outros.
Embora esta cronologia seja importante para o entendimento da história da
crítica de cinema no Brasil, é impossível pensar no assunto sem citar o nome de Paulo
Emilio Sales Gomes. Rudá Andrade destaca como início da respeitada trajetória
intelectual do crítico a fundação, em agosto de 1940, do Clube de Cinema de São Paulo
na faculdade de Filosofia da USP. Juntamente a Décio de Almeida Prado, Cícero
Cristiano de Souza e Lourival Gomes Machado, Paulo Emilio levou à academia
paulistana o que havia de melhor no cineclubismo brasileiro, com a apresentação de dez
filmes clássicos e debates com nomes importantes como Lima Barreto, Jean Mogué,
Oswald de Andrade, Ruy Coelho e Roger Bastide. Com o fechamento do clube no ano
seguinte pelo Departamento Estadual de Imprensa e Propaganda (D.E.I.P), o grupo
passou a fazer exibições clandestinas “nas residências de Sales Gomes e Lourival
Gomes Machado” (p. 10).
Em maio do mesmo ano surge a importante revista Clima – criada por um grupo
de universitários no âmbito do qual despontou Antonio Cândido e Paulo Emílio fazia-se
responsável pela seção dedicada ao cinema. O primeiro número da revista obteve
repercussão imediata. Seus mil exemplares se esgotaram rapidamente, feito que só se
repetiria na edição de número 13. Os textos de Paulo Emílio em Clima trouxe inovações
na percepção do cinema e no modo de abordá-los, como por exemplo ensaios de mais
de 12 páginas da revista dedicados a um determinado filme. “Pode-se compreender
facilmente o choque produzido pela crítica de Paulo, comparando-a com as notas das
revistas especializadas ou as duas colunas de menos de um palmo dos diários”
(SOUZA, 2002, p. 166). José Inácio de Melo Souza continua apontando no mesmo livro
quatro características comuns nos textos do crítico: a “pedagogia do olhar”, o histórico
cinematográfico, a importância do diretor (num tempo onde o produtor era o verdadeiro
dirigente) e a definição do “específico fílmico” – posição inaugurada por Paulo Emilio.
Uma nota do autor merece destaque: segundo ele, Paulo Emílio acreditava que
era preciso assistir a um filme várias vezes para escapar dos melindres da impressão e
de fato chegar ao profundo da obra.
O objetivo era desarmar o olhar do hábito
para construir uma percepção do filme como um
objeto artístico (a acusação mais comum entre a
crítica inovadora desse período era a de que o
espectador assistia aos filmes de forma alienada,
40
como algo desopilante, digamos, após um dia de
trabalho).
(p. 168)
Fica evidente que, ao contrario das imposições trazudas pela indústria
cinematográfica da contemporaneidade, Paulo Emilio apontava seu exame crítico para
filmes suscetíveis de motivar um debate em no plano da mobilização social.
Depois desta importante participação na revista Clima, o crítico parte para a
Europa em 1946, vivendo sobretudo na França, onde, por dez anos, aprofundou seus
estudos de cinema. De fato, Bernardet sugere que a literatura cinematográfica francesa
influenciou consideravelmente a formação e o texto de Paulo Emilio Sales Gomes, em
especial os Cahiers du Cinema. “Paulo Emilio remete não só aos Cahiers du Cinema, a
revista mais citada, mas também a Positif, Arts, que publicava Truffaut, e a Esprit, com
a qual colaborava André Bazin, que deixou em Paulo Emilio marca indelével” (p. 119).
Em 1956 Paulo Emilio retorna ao país e passa a publicar os seus escritos no
“Suplemento Literário” de O Estado de São Paulo num total de 290, como aponta Melo
Souza. Ali, os ensaios de Paulo Emilio “eram os mais aguardados entre os de cinema.
Antonio Candido destacou não só a importância do que era dito, como também o valor
como prosa, como vivacidade de expressão, dificilmente igualáveis” (p. 436). No ano
seguinte o crítico publica em Paris o livro Jean Vigo, conseqüência de suas pesquisas no
Velho Mundo. Em 1958 o livro recebeu o prêmio Armand Tullier de melhor livro de
cinema. Considerado por muitos o pai da crítica cinematográfica brasileira, Paulo
Emilio apresenta na primeira Convenção Nacional da Crítica Cinematográfica –
realizada em 1960, em São Paulo – as teses Ideologia da crítica cinematográfica e o
problema do diálogo e Uma situação colonial?. Este último causou impacto no
encontro e torna-se ponto crucial de sua obra mais famosa, Trajetória no
subdesenvolvimento. De fato, sua direção intelectual e teses deram o tom da convenção.
A partir daí a crítica de cinema brasileira atingiu a maturidade e se revelou um
instrumento privilegiado de interpretação da vida social. Em Trajetória no
subdesenvolvimento Paulo Emilio examina as condições de possibilidade dessa arte no
Brasil do atraso e suas realizações mais reveladoras. Uma tentativa pioneira de analisar
o cinema nacional como fenômeno que não escapa a uma tradição nacional coagulada
no atraso.
Além deste livro, Paulo Emílio esteve à frente do ambicioso projeto de se criar
uma escola de cinema no país. Juntamente com Jean-Claude Bernadet e Nelson Pereira
dos Santos, Paulo Emílio funda em 1965 o curso de cinema na Universidade de Brasília,
41
experiência pioneira no Brasil. Contudo, desde o ano da fundação da UnB Paulo Emilio
lecionava como professor-assistente no Instituto Central de Artes. Mesmo sem o
impacto da invasão de 1968, em 9 de abril de 1964 a universidade foi cercada e 13
professores foram detidos pela polícia. Dois dias depois o conselho diretor da Fundação
Universidade de Brasília foi demitido. Segundo Melo Souza, embora Paulo Emilio não
figurasse entre eles a invasão teve forte impacto no ano seguinte, quando a UnB
novamente foi alvo de repressão após a admissão de um professor cassado pela
Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Como resposta os estudantes entraram em greve, alguns professores foram
demitidos e outros tiveram o contrato rescindido. A situação chegou ao limite no dia 24
de outubro de 1965, quando professores decidiram fazer uma demissão coletiva.
Restaram apenas 26 docentes na UnB. Todo o curso de cinema se demitiu, levando
Paulo Emilio a abandonar a capital. Por esses e outros aspectos, Paulo Emílio é
considerado um dos nomes mais importantes no campo da crítica de cinema brasileira.
2.4 Lugares do crítico, lugares do espectador e lugares do leitor
Emerge como fator fundamental para a percepção da cobertura dada aos filmes a
noção da intencionalidade presente nas decisões sobre como noticiar, criticar, levar ao
público o “fato” em curso. A escolha da forma, da linguagem, da estética, os efeitos a
provocar
Jacques Leenhardt afirma que somente com o aparecimento do poeta Charles
Baudelaire e sua nova estratégia de linguagem, no século XIX, a crítica de arte coloca
claramente seu papel como mediadora entre o público e o artista, uma vez que o
espectador tinha “dificuldade em deixar crescer em si mesmo uma liberdade de
julgamento até agora não experimentada”, procurando ainda as “muletas” de um critério
socialmente aceito no qual acreditar (2000, p. 20). Deste modo, o texto crítico
funcionaria como uma “escola do ver” para o público que é “relativamente cego” ao que
se passa na obra.
Com o advento do cinema, tudo mudou. A sétima arte foi, como citado
anteriormente por Mira, o ponto de partida para a etapa visual dos mass media e ponto
importante no papel destes como transformadores do social. É neste contexto que entra
42
a relação entre a crítica cinematográfica e o público. Contudo, antes de analisar a
relação entre eles, é necessário considerar a relação do público e do crítico
(separadamente) com o filme em si.
Creio que não seja errado dizer que, dentre todas as formas de arte, o cinema é a
que, de fato, dá ao espectador a impressão de viva realidade. Diferentemente do teatro,
da apreciação visual dos quadros ou da leitura de um romance, o filme instaura no
expectador um processo participativo tanto perceptivo quanto emotivo, conquistando
diretamente a sua credibilidade. Em relação a este modo particular do cinema em ser
crível, Christian Metz
11
confere ao movimento das imagens esta impressão, que gera no
expectador um índice
12
de realidade pictórica e uma sensação de corporalidade aos
objetos em cena.
O cinema trouxe tudo isto de uma vez só, e
– suplemento inesperado – não é apenas uma
reprodução qualquer, plausível, do movimento,
que vimos aparecer, mas o próprio movimento com
toda a sua realidade. Enfiem, suprema inversão,
são imagens, aquelas mesmas da fotografia, que
foram animadas por um movimento tão real, que
lhes conferiu um poder de convicção inédito (...).
O “segredo” do cinema é também isto: injetar na
irrealidade da imagem a realidade do movimento
e, assim, atualizar o imaginário a um grau nunca
dantes alcançado
(p. 28).
Mas para criar tal verossimilhança o cineasta faz uso consciente de imagens
escolhidas propositalmente e ordenadas numa certa seqüência também com o propósito
de criar esta “impressão de realidade”. Mas para perceber estas filigranas é preciso saber
como o filme se constrói. A percepção destes artifícios e o desmascaramento das
analogias acabam sendo prazer – e dever – do crítico, enquanto o público espectador
porta-se como Wim Wenders na citação que abre esta dissertação. Aqui cabe a
afirmação de Flávio Ahmed, no qual o lugar do espectador comum de cinema é, em
certa medida, de recusa-crítica, “o lugar do analisando que vai realizar na imagem
cinematográfica (...) uma leitura é íntima e modestamente subjetiva” (1994, p. 70),
porque ele não possui o conhecimento e as ferramentas para tanto. Por outro lado, o
autor explica que isso não significa passividade. Afinal, muitos filmes produzidos para
11
Cf. principalmente o primeiro capítulo de A significação no cinema. São Paulo: Perspectiva, 2006.
12
A palavra é usada aqui no sentido reproduzido no Dicionário de Semiótica de GREIMAS, A.J;
COUTÉS, J: “índice deve ser entendido, em sentido muito mais amplo, como ‘um fato imediatamente
perceptível, que nos faz conhecer uma coisa a propósito de outra que não o é’”.
43
um determinado tipo de público, com todos os clichês correspondentes, são fracassos de
bilheteria.
Pode-se pensar assim que o melhor lugar do crítico é sempre além do lugar do
espectador (posto que pressupõe critérios para um julgamento formal da obra). Essa
perspectiva destrói, como vimos, qualquer pretensão de neutralidade na análise do
produto cultural. Sendo assim, a abordagem do crítico é, quando muito, objetiva, porém
nunca neutra. Desse modo, um filme que pelos seus recursos de linguagem cause
estranhamento no espectador comum provavelmente não causará o mesmo efeito no
crítico. Isso porque o crítico será logo descolado da posição de espectador para buscar
na sua cultura cinematográfica uma equivalência teórica capaz de classificar o que foi
reproduzido na tela.
Desse modo, podemos concluir confirmando que a crítica estabelece, sim, uma
relação entre estes dois sujeitos: o emissor (crítico) e o receptor (espectador-leitor).
Como afirma a professora de comunicação e artes Maria Aparecida Baccega, “o
universo de cada indivíduo, seja no pólo da emissão, seja no da recepção, é formado
pelo diálogo entre esses discursos, nos quais seu cotidiano está inserido” (2000, p. 39).
É o crítico, munido das características apontadas acima, que vai produzir o
discurso a ser transmitido em seu texto e, do outro lado, o leitor irá “recebê-la” de
acordo com o seu universo. Para que isso ocorra, o crítico utilizará vários recursos
lingüísticos, como a manipulação, a intertextualidade, os estereótipos e até mesmo o
silêncio de modo que o receptor organize/reorganize a percepção que tem do filme,
muitas vezes descobrindo nuances na obra que antes nem imaginava serem possíveis.
Aqueles que comumente atacam a crítica cinematográfica costumam dizer que o
crítico é um sujeito invejoso por se tratar de um cineasta fracassado ou que exalta uma
película porque se identifica com o autor e na verdade se apodera de sua obra. Creio que
qualquer tentativa de definir o crítico é abstrata e infrutífera, já que, de modo geral, tudo
que o leitor sabe dele são seus textos e nada sobre a pessoa concreta. Talvez a única
psicologia válida seja aquela que Roland Barthes fez em seu O prazer do texto. Segundo
ele, o crítico seria um fetichista, que se deleita em espiar o filme. E seus leitores,
atraídos por seu texto, talvez possuam o perverso (perverso?) prazer em espiar o crítico
no ato de espiar o filme, neste duplo e circular ciclo de voyeurismo que se unem no
prazer que é um só: apreciar um bom filme.
Ora, uma vez que é o crítico quem tem o conhecimento, o espaço e as técnicas
necessárias para analisar uma película qualquer, e dado o fato de que essa crítica
44
produzirá (ou não) uma alteração do ponto de vista do leitor, cabe perguntar qual a
direção dessa mudança. O ideal seria que o próprio leitor elaborasse sua relação com o
filme. Isto é, não deveria tirar seu poder de reflexão ou mesmo de decidir se vale a pena
ou não ver o filme.
3. CINEMA E SIGNIFICAÇÃO
Antes de inicarmos a análise das peças selecionadas procuraremos examinar,
mesmo que em linhas gerais, a questão do tratamento do cinema pela palavra, com a
finalidade de tradução de seu sentido, apreensão de sua natureza e descrição de seus
efeitos. Ao contrário da filosofia ou da literatura, que se desenvolveram a partir da
língua falada ou escrita – a mesma pelo qual o homem se integra com o mundo que o
circunda – o cinema nasceu mudo, pura imagem, afirmando-se como uma linguagem
particular e autônoma para consolidar-se como linguagem construída, com sintaxe
própria que busca criar uma ilusão de “verdade” posta na tela. Esta mensagem que o
cinema quer evocar no espectador é da ordem dos sentidos.
Como vimos até aqui, o cinema já foi objeto de reflexão para filósofos,
acadêmicos, jornalistas e tem passado por uma renovação nas abordagens de sua
natureza específica a partir dos progressos realizados no âmbito da lingüística e das
teorias semióticas. Postulada a idéia de linguagem como um sistema de signos,
autônomo e organizado, criou-se um sistema geral de signos com base no modelo
lingüístico, a partir do qual os diversos conjuntos de significantes poderiam ser
estudados como semióticas particulares, pela mediação da linguagem.
Contudo, tal procedimento não se deve apenas à precedência da lingüística numa
tentativa de criação de uma semiologia geral, mas também dos inúmeros
questionamentos da estética contemporânea em saber se a arte em geral e o cinema
especificamente pode ser considerado como linguagem e que só pode ser respondido
pela disciplina capaz de fornecer uma definição da linguagem e seus elementos
constitutivos.
Assim é que o cinema, como diz o já citado Christian Metz, nasceu da união de
várias formas de expressão constituídas de leis próprias (a palavra, a imagem, a
música...) mas que na tela são compostas de modo a constituir um dizer, uma
mensagem:
45
A palavra linguagem tem diversos
sentidos, restritos e menos restritos, e todos são de
alguma forma justificados. Essa abundância
polissêmica se verifica – na nossa cara – em duas
direções: certos sistemas (e até os mais inumanos)
serão denominados “linguagens” se sua estrutura
formal assemelhar-se à de nossas línguas: tais
como a linguagem do xadrez (que interessava
tanto Saussure), a linguagem binária usada pelas
máquinas. No outro pólo, tudo aquilo que fala do
homem ao homemj (nem que seja do modo menos
organizado e menos lingüístico possível) é intuito
como “linguagem”: trata-se então da linguagem
das flores, da pintura, e até do silêncio. O campo
semântico da palavra linguagem parece organizar-
se em torno destes dois eixos. (...) É levando em
conta esse estado dos usos, que nem sempre
possibilita se restringir aos sentidos que
gostaríamos fossem precisos, que nos parece
viável considerar o cinema como linguagem
(p.
82)
Deste modo, as relações entre cinema e linguagem foram renovadas e as diversas
vertentes da semiótica e da lingüística tentam dar conta de todas as nuances e formas da
produção de sentido e marcas discursivas do cinema. Mas como se há de ensinar aos
milhões de espectadores – posto que o cinema é uma arte das massas – a compreender a
sua linguagem? Para isso as tentativas de formular uma disciplina que tratasse do
cinema como um sistema de signos ocupa-se em comparar as estruturas
cinematográficas com a linguagem natural, de modo a compreender a sua essência
artística.
A primeira dificuldade surge quando indagamos a quê corresponde, na
linguagem verbal, à narratividade no cinema. Uma das mais importantes formulações
neste sentido foi feita por Metz. Ele explica que uma narração tem começo e fim, ou
seja, constitui uma seqüência temporal de acontecimentos ordenados. No caso do
cinema a narração utiliza seqüências de imagens como veículo. Yuri Lotman em seu
Estética e Semiótica do Cinema explica que existem no caso cinematográfico dois tipos
de narração. A primeira é constituída por uma sucessão de imagens. É a reunião dessa
cadeia de planos numa seqüência com sentido que forma a narrativa. A segunda é a
transformação de imagens que constituem um mesmo plano, como por exemplo um
close-up no rosto do ator onde sua face permanece imóvel, mas vemos as modificações
em seu rosto ocorrerem enquanto ele mexe a boca para falar.
Uma coisa é importante: na reunião de
planos diferentes, um elemento distintivo repete-se,
46
e na transformação de um mesmo plano, este
torna-se a própria base de diferença. No primeiro
caso manifesta-se a tendência para as bruscas
aproximações semânticas; no segundo, a tendência
para a microanálise semântica, para a
dissociação.
O primeiro tipo é característico de um
cinema marcadamente de montagem. Ele pôs a
tônica no problema da estrutura do mundo e
constrói-se como um sistema de passagens por
saltos, de um nó de composição para outro.
O segundo tipo tende para uma narrativa
contínua, que imita o fluxo natural da vida. No
primeiro caso, o realizador dá-nos uma
“gramática da realidade” e deixa-nos ser nós
próprios a descobrir os textos da vida que ilustram
o seu modelo. No segundo caso, dá-nos os textos e
entrega-nos a tarefa de extrair deles a “estrutura
gramatical”. Contudo, à parte os filmes puramente
experimentais, só pode existir predominância de
uma ou outra destas tendências, mas nunca uma
expressão total de uma delas, na medida em que
são como inimigos que precisam um do outro.
(1978, p. 114-115)
Apesar de um pouco longa, esta citação foi necessária devido às pertinentes
questões aí colocadas e que podem esclarecer um pouco mais como se dá a descrição
semiótica da narração. Mas além da descrição técnica de como a narração é construída e
montada pelo cineasta, cabe analisar como ela é percebida pelo espectador. Chegamos
assim novamente às postulações de Metz que dedicou parte de seu livro questões muito
elucidativas em torno desta questão. Para o autor tudo se dá como se “uma espécie de
corrente de indução relacionasse apesar de tudo as imagens entre si, como se estivesse
além das forças do espírito humano recusar um ‘fio’ assim que duas imagens se
sucedem” (p. 62).
Mas a questão da narração fílmica não soluciona a questão da significação. Para
isso é necessário orientar-se pela concepção semiótica da conotação e a semiótica da
denotação. Segundo o autor, no campo de conotação estamos mais perto do “cinema
enquanto arte” (p. 116). Leva-se em consideração a expressividade cinematográfica,
como os movimentos de câmera, iluminação etc. que constroem um determinado estilo
ou gênero (como o western, o filme noir...), a atmosfera poética etc. Enquanto que no
campo da denotação percebe-se aquilo que as imagens e o som reproduzem
literalmente, como os ruídos que a faixa sonora reproduz.
47
Tudo o que é percebido durante a projeção do filme e toca o espectador possui
uma significação. Como funciona este mecanismo de ação é o que constitui a essência
da análise da significação fílmica. E são estes fatores que exercem sobre o espectador
uma ação complexa que pode simplesmente causar-lhe estranhamento ou mesmo
reestruturar sua personalidade.
A evolução recente dos estudos sobre a significação fílmica vem favorecendo a
pesquisa etnográfica, o questionamento e a experimentação desse sistema. Esses estudos
teóricos têm sido fundamentais na compreensão dos processos produtivos e perceptivos
do cinema em todas as áreas. A palavra “crítica” vê, pois, aliada ao grande
desenvolvimento das ciências da linguagem, procurando traduzir a significação fílmica,
acompanhando os processos de produção, análise e recepção dos filmes e, muitas vezes,
comparando com outras linguagens (música, literatura etc.).
Ao lidarmos com a crítica cinematográfica nos jornais diários estaremos, sem
dúvida, tratando de um texto mais ligeiro mas nem por isso menor ou de menos impacto
sobre a formação estética do leitor. É um gênero analítico que dá conta de um tipo de
arte com alto poder simbólico. Ao crítico cabe, então, instaurar uma esfera pública de
apreciação cultural, desempenhando importante papel no enriquecimento do leitor.
4. EXAME DE CASOS
4.1 Tiago Faria
O próprio percurso traçado por Tiago Faria no Correio Braziliense é o de
crescimento crítico. Tiago é um crítico muito novo – tem apenas 28 anos – e cobria
originalmente a editoria de Cidades. Como sempre quis migrar para a de Cultura, foi
convencendo aos poucos os colegas a publicarem seus textos, até finalmente conquistar
o espaço de crítico de cultural (ele cobre também música e teatro). Isso explica a
diferença numérica de textos de sua autoria entre 2003 e 2004
13
.
13
Ver Tabela 7 – Relação comparativa de todos os textos publicados por crítico e filmes, 2000 – 2005.
48
Antes de entrarmos nas críticas em si é preciso reiterar que Faria ainda ocupa o
cargo de repórter, cobrindo o Festival Internacional de Cinema de Brasília (FIC
Brasília) e, por vezes, entrevistando elenco, diretores e produtores para matérias que são
veiculadas independentemente da crítica que será escrita posteriormente. Por vezes,
como salientamos no capítulo 2, diante de uma crítica negativa, cineastas se negam a
dar entrevistas posteriormente ou mesmo passam a ligar para a redação “cobrando” do
crítico que adiante desde já o que ele achou do filme. Às vezes, a influência é de outro
nível.
É esta influência na construção – de que aqui damos aqui apenas um exemplo
entre muitos – da crítica que acompanharemos na publicação que dá conte do filme Dois
Filhos de Francisco. Antes mesmo da publicação da crítica, datada de 19 de agosto de
2005, o jornal Correio Braziliense já havia publicado uma matérias escrita por Tiago
Faria em maio do ano anterior e outra apenas doze dias antes da crítica ser veiculada.
Um ano antes de o filme ser lançado Tiago Faria foi a Pirenópolis – cidade próxima a
Brasília que serviu de locação ao filme – para acompanhar as filmagens. Lá, teve acesso
ao roteiro da cena que seria gravada naquele dia, conversou com a população local,
atores e diretor. Já nesta ocasião o cineasta Breno Silveira define a quem o filme é
dirigido
“Queremos mostrar um lado do Brasil que
as pessoas à vezes têm vergonha de ver. A idéia é
derrubar preconceitos”, explica Breno Silveira, no
intervalo. “Esse não é um filme só para fãs. É
mundial”, continua. (
FARIA, Tiago. Cinema ao
vivo. Correio Braziliense, Caderno C, Brasília,
20/05/2004.)
Na reportagem seguinte, Tiago viajou a São Paulo a convite da produção da
película – a matéria deixa isso evidente – para entrevistar novamente o cineasta, que
reitera que se trata de um filme “para todos”:
O mais curioso é que 2 Filhos de
Francisco não foi concebido como um “filme para
fãs”, mas sim como um veículo para chegar a um
público maior. “Vou ficar muito triste se esse filme
acabar restrito ao público que gosta de música
sertaneja. Ele passa uma mensagem para todos os
públicos, de todas as idades. É uma história
universal”, diz Breno
O diretor assume que não tinha muito
contato com o estilo musical antes de fazer o filme
49
– mas, que hoje, é conhecido como o “sertanejo
carioca”. “Nunca tive preconceitos com música,
mas eu sempre tinha minhas referências. O filme
passa um pouco o que eu senti com a descoberta
dessa música. Nossa cultura tem uma verdade
muito grande. Sou um apaixonado pelo Brasil”,
diz. (
FARIA, Tiago. Cinema sertanejo
brasileiro. Correio Braziliense, Caderno C,
Brasília, 07/08/ 2005.)
Para fechar este exame comparativo, vejamos por fim algumas passagens do
crítico sobre Dois Filhos de Francisco, em que endossa aliás as expressões do próprio
diretor a respeito do caráter universal da história:
Na estréia em direção de longas-
metragens, o carioca Breno Silveira acertou no
efeito surpresa. Conseguiu imprimir tom universal
a um filão da música popular normalmente
relegado às estantes do “mau gosto”, cultural.
Cuidadoso na composição de biografia cartesiana,
mas com potencial para emocionar grandes
platéias, o filme que estréia hoje em Brasília
periga ganhar a simpatia até de quem mantém
distância de calças de couro e refrões
esganiçados. (
FARIA, Tiago. Um filme
popular. Correio Braziliense, Fim de Semana,
Brasília, 19/08/2005.)
Ainda que possa parecer que Tiago Faria tenha “comprado” o argumento do
diretor, não é isso que se depreende do restante do texto:
Uma saída que Breno Silveira encontra
para driblar a resistência de parte do público é
manter o foco no drama familiar que une
Francisco (Ângelo Antônio), a mulher Helena
(Dira Paes) e os filhos. A transformação de Zezé e
Luciano emótimos vendedores de discos fica
apenas sugerida pela trama, que não se alonga
para além do sucesso É o amor. (idem)
Embora o fato de ser também repórter a principio pareça uma desvantagem, é
uma ocupação que pode beneficiar a prática do texto crítico. O caráter informativo e em
formato de pirâmide invertida, comentado em capítulo anterior, torna a feitura da crítica
mais clara, de ritmo fluente, evita a prolixidade e promove um texto sintético, tão
importante no contexto atual, onde o espaço para a crítica é tão exíguo. Eis um exemplo
de uma das críticas de Tiago Faria que combina esses aspectos:
50
Contada duas vezes, a piada talvez não
faça tanto efeito. Mas a premissa de Adaptção,
absurda de tão criativa, é daquelas que conseguem
soar inteligentes de imediato. No filme, um
roteirista angustiado tenta adaptar um livro sobre
flores (Te Orchid Thief, que realmente existe) para
o cinema. Em momento alto de desespero, ele
decide se incluir no filme. Essa é a história da
criação do filme Adaptação. E esta é a história do
filme Adaptação. Eis a idéia. (
FARIA, Tiago.
Direção tímida e final capenga. Correio
Braziliense, Caderno C, Brasília, 27/02/2003.)
Percebe-se aí o emprego de determinadas técnicas jornalísticas que tornam a
composição do texto uma importante ferramenta informativa. O primeiro parágrafo já
qualifica o filme “premissa absurda de tão criativa”. Ele constrói o relato a partir da
combinação de um conjunto de dados que são transmitidos abertamente, e continua com
a descrição do enredo, atraindo o leitor para seguir adiante. Além disso, informa que o
livro que deu origem a toda a trama de fato pode ser encontrado nas livrarias.
Por outro lado, os textos do primeiro ano carregam – até demais – esse aspecto
de reportagem: encontra-se neste período o predomínio da descrição formal dos filmes,
parafraseando o que foi visto na tela. Vejamos aqui o que diz o crítico mais adiante
sobre o mesmo filme:
O protagonista de Adaptação é, pois,
Charlie Kaufman. Um homem tenso, bem acima do
peso, neurótico e quase careca. Mas também um
homem que conseguiu respeito em Hollywood
depois de ter escrito o elogiado Quero Ser
JohnMalkovich. É, ainda, um homem que luta para
escrever textos relevantes, profundos, artísticos –
mas que se vê em briga contra as simplificações
típicas da indústria de cinema. (...) A idéia fica
mais evidente quando, na tela, é revelado que
Charlie tem um irmão gêmeo. Donald, seu oposto,
escreve sem muito esforço um filme de suspense
esquemático – e patético – sobre serual killers.
Resta a Charlie descobrir alguns segredos sobre a
vida da escritora Susan Orlean. (idem)
Essas mesmas observações se aplicam a textos que vão até meados de 2004,
como o que analisa o filme Shrek 2. Este caso particular – que se trata de uma
superprodução hollywoodiana – conta também com aqueles dados referentes ao custo
do filme, já citados por Daniel Pizza. Vejamos um recorte do texto:
Shrek 2 é especialmente bem-sucedido. Até
agora, o filme rendeu pouco mais de 350 milhões
51
de dólares nos cinemas dos Estados Unidos –
desde já, a maior bilheteria de animação de todos
os tempos no país, à frente de Procurando Nemo.
E ainda demonstrou provas de prestígio ao ter
conseguido, tal como o primeiro episódio, uma
brecha dente os selecionados para a mostra
competitiva do Festival de Cannes. (
FARIA,
Tiago. Um ogro em Hollywood. Correio
Braziliense, Fim de Semana, Brasília,
18/06/2004.)
Será que, mais que um indicador do mérito que o produtor cultural gostaria de
ver impresso no jornal, a menção à presença do filme em Cannes não seria – além de
uma ação valorativa da película – uma indicação ao leitor de que é uma obra
merecedora de atenção? Mesmo que se trate apenas de descrição, Flavio Aguiar faz um
alerta no sentido de que esta não é uma operação passiva. É com elementos da paráfrase
que o leitor – candidato a crítico – começa a definir o seu próprio perfil. “Ou seja, diz
para o leitor – o futuro, que ele almeja conquistar e convencê-lo de sua leitura -, quem
ele é, de que ponto de vista ele lê, o que o atraiu e o que valorizou naquela obra” (p. 21).
De fato, é a descrição do enredo o início do percurso da visualização mais particular do
filme.
Parece-me aqui que há algo de importante em jogo. Ao descrever o relato
fílmico o crítico assume um papel de “narrador”. Tiago Faria parece perceber isso e,
como veremos adiante, parte para um diálogo com o leitor de modo a “educá-lo”. Nesse
sentido, é preciso estabelecer antes que tipo de “narrador” ele é. Num primeiro
momento, como vimos, o crítico é apenas uma espécie de testemunha que nos conta a
história do filme. Com o tempo, ele adota estratégia e toma um caráter onisciente. Ele
conhece o diretor, sabe o que ele pensa, sabe exatamente o que queria fazer e sabe que
recursos ele utilizou para conseguir o efeito pretendido. Examinemos um momento no
texto que expressa com clareza esta atitude:
Gus Van Sant é daqueles poucos cineastas
que tratam o universo adolescente com a
proprierdade de quem compartilha com os
personagens, em tempo real, experiências e
descobertas. Não é visão paternalista ou
professoral, nem tem a pose de sujeito que é dono
de todas as resposttas para todos os problemas
teen. Mesmo ingênuos ou cheios de pequenas
imperfeições, filmes como Gênio indomável ou
Garotos de programa já revelavam um diretor
capaz de tratar com cumplicidade temas que
normalmente resvalam em moralismo (à Larry
52
Clark) ou em brincadeira rasa, inofensiva – e aí
inclua um pacotão de comédias de grandes
estúdios hollywoodianos. Mas é em Elefante que
Van Sant vai fundo: transformaem grande arte a
intenção de enxergar complexidade onde muios
encontram um arsenal de estereótipos e de
explicações furadas. (
FARIA, Tiago. O mistério
da violência. Correio Braziliense, Fim de
Semana, Brasília, 04/06/2004.)
Dessa perspectiva, é o próprio crítico quem conduz o leitor em direção ao
julgamento crítico. Mas o papel de narrador não se estabelece sozinho. É preciso
ressaltar que Faria comenta – muitas vezes de maneira incisiva – as obras:
Mas a premissa de Adaptação, absurda de
tão criativa, é daquelas que conseguem soar
inteligentes de imediato.
(FARIA, Tiago.
Direção tímida e final capenga. Correio
Braziliense, Caderno C, Brasília, 27/02/2003.)
Quando filma cenas de carnificina, apela
para a rebuscada beleza estética que sai da
brutalidade e que, até por isso, soa artificial e
incoerente com o tema do filme. (
FARIA, Tiago.
Ecos do conflito. Correio Braziliense, Fim de
Semana, Brasília, 13/02/2004.)
Crash serve como terapia de crupo. Mas
como discussão madura sobre crise de valores
norte-americana? Aí, se assemelha àquele
programa de auditório cujas discussões
esquentadas desaparecem da memória nos créditos
finais. (
FARIA, Tiago. Mundo cruel. Correio
Braziliense, Fim de Semana, Brasília,
28/10/2005.)
Outros trechos poderiam ser inseridos aqui, mas estes três exemplos me parecem
representativos da posição que ele assume diante das obras. Nesse contexto, vale
observar também que Faria abandona a verve dita imparcial do texto de reportagem,
avaliando de maneira clara, tanto positiva quanto negativamente, os filmes tratados.
Mas se ele é testemunha da história do filme é, também, espectador-narrador
altamente qualificado, posto que tem autoridade para publicar críticas a respeito. Aqui é
necessário retomar o foco para o leitor. Depois de ter percorrido este caminho de
descrição e, posteriormente, de julgamento crítico, o leitor torna-se qualificado para a
53
apreciação crítica. A partir daí percebe-se uma relação outra com o público. É como se
Tiago escrevesse para um leitor mais qualificado, que mesmo quando o filme criticado
não possui um “valor” tão alto o crítico encontra brechas para lhe sugerir melhores
opções, ou que a apreciação fílmica vale à pena pela experiência do novo.
O que o ator, o diretor e a atriz
coadjuvante esquecem é que exercícios de gênero
podem muito bem fazer diferença quando se
preocupam com detalhes – quando, em meio ao
esquema estanque de dramaturgia, revelam uma
situação inusitada aqui, um personagem curioso
ali, uma atuação surpreendente, um desfecho que
desvia um pouco daquilo que se espera ou –
melhor – uma direção que compensa qualquer
sensação de “jogo dos sete erros” com estilo e
timing. Com pouco de sorte, pode até sair um
Quatro casamentos e um funeral, um Abaixo o
amor (
FARIA,Tiago. Cartilha do Amor.
Correio Braziliense, Fim de Semana, Brasília,
18/02/2005.)
A composição dos personagens
secundários é quase pueril – o protagonista se
relaciona com mulher forte, é atormentado por um
policial estraga-prazeres que o persegue com
insistência vingativa, é hostilizado pelos colegas
de trabalho – e os diálogos crus-como-a-vida são
a deixa para alguns momentos constrangedores.
Traços que quase empurram O lenhador para o
vão do amadorismo. Mas não tem tanta
importância: na ressaca do Oscar, esse é o tipo de
precariedade que até faz bem (
FARIA,Tiago.
Difícil recomeço. Correio Braziliense, Fim de
Semana, Brasília, 04/03/2005.)
A diagramação das páginas parece reforçar essa idéia. No caso do Correio
Braziliense
14
, a importância imagética na significação final do texto é exemplar, em
consonância com aquele que Buitoni se refere ao dizer que “um discurso crítico
contemporâneo, mesmo na transitoriedade do formato jornalístico, precisa cruzar
linguagem verbal e linguagem virtual” (p. 68). Há sempre uma grande foto que
conversa com o texto e as famigeradas estrelinhas, que indicam se deve-se ou não
assistir ao filme. Portanto, se o leitor “atreve-se” a ler o texto crítico é porque de fato
quer comungar das questões críticas e instrui-se sobre a obra.
14
Sobre a reforma visual do Correio Braziliense, ver NOBLAT, Ricardo. A arte de fazer um jornal
diário. São Paulo: Contexto, 2003.
54
4.2 Jaime Biaggio
Assim como no caso de Tiago Faria, percebemos nas publicações de Jaime
Biaggio a construção e o crescimento paulatinos de um texto crítico total. Contudo, se
no Correio Braziliense observamos uma queda do caráter objetivo e jornalístico em
detrimento de uma evolução da análise, o mesmo não ocorre em O Globo. Aqui
entramos numa outra esfera, onde flui mais naturalmente a conversa entre crítico leitor
em detrimento do caráter impositivo e “cheio de razão” que os críticos de modo geral
tendem a passar.
O foco central em torno do qual gira o texto do início do ano 2000 é o leitor e
isso, parece, significa para Biaggio definir a que público o filme se propõe. Como
explicação, vale a pena reproduzir a crítica sobre Alta Fidelidade:
Este periga ser um dos grandes filmes cult
do festival. É feito de matéria-prima fartamente
disponível no repertório sentimental do público de
20-e-poucos a 30-e-muitos: rompimentos
traumáticos, tilt existencial, reavaliação do
prontuário amoroso e paliativos que ajudam a
encarar tais crises sem chutar cães e velhinhas na
rua (
BIAGGIO, Jaime. Crescendo e
aprendendo. O Globo, Rio Show, Rio de
Janeiro, 06/10/2000.)
Mais do que isso, o crítico parece estabelecer a quem exatamente a película vai
agradar, como se a experiência fílmica do espectador seguisse num plano cartesiano no
qual ele não pode ser surpreendido caso não pertença às “categorias populacionais” que
o filme propõe alcançar. Vejamos como isso fica explícito mais adiante nesta mesma
publicação:
O filme de Stephen Frears tem apelo ainda
mais forte para um subgrupo específico, aquele
cujo paliativo oficial é um mar de CDs e LPs. (...)
Quem passou dos 40 já deixou tudo isso para trás
(assim se espera, senão é caso para psiquiatra) e,
dependendo do humor em que estiver, poderá
achar o filme uma besteira. De certa forma, é. Mas
crescer envolve fazer besteira, tentar consertar as
besteiras passadas. E não é qualquer outro o
assunto dessa história
(idem)
O esquemismo se repete mesmo quando dá conta de histórias que, segundo ele,
agradam “a todos”:
55
Há de tudo para todos na história do
fotógrafo (James Stewart) que aproveita sua
temporada de descanso forçado após um acidente
para bisbilhotar a vizinhança e acaba por
descobrir e investigar um assassinato ocorrido no
prédio em frente. Truffaultzetes podem se deliciar
com a recriação na tela da própria experiência
cinematográfica (que acaba sendo interativa, no
fim das contas), com o estudo do voyeurismo em
oposição à comunhão sexual (não é cabecice, não:
pode reparar que Stewart foge de Grace Kelly o
filme inteiro).
E, enquanto isso, o seu Osías se diverte
com as historinhas que se passam na tela (ou
melhor, nos apartamentos que o personagem
espiona), acompanha atento a trama criminal e a
brincadeira d detetive dos protagonistas, sua frio
no fim, um daqueles momentos que valeram a
Hitchcock o epíteto de Mestre do Suspense.
Quando a sessão acaba, todo mundo sai do cinema
igualmente feliz e satisfeito (
BIAGGIO, Jaime.
Cinema para todos. O Globo, Rio Show, Rio
de Janeiro, 17/11/2000.)
O critério de análise de Jaime Biaggio acaba s baseando em motivos extra-
fílmicos. Parece que o que mais lhe interessa é discorrer sobre o gênero que agrada a
determinado público. Mas se até aqui o texto não se detém sobre a forma, o crítico
conquista os leitores utilizando-se de linguagem simples, direta, em tom mais solto e
coloquial. Além de evocar o leitor todo o tempo.
Ante a reduzir a questão como conseqüência do comportamento despojado dos
cariocas, estas expressões funcionam como um recurso estilístico utilizado para entrar
em consonância com o leitor. Para maior clareza do argumento, as palavras que
constituem este efeito serão grifadas por mim nas citações que se seguem:
Mas se manifestou através de passagens
cansativas nas quais se irrompe a história
fantasiosa da criatura que está matando os
camponeses na província de Gevaudan para
contextualizá-la no cenário sócio-político da
França pré-Revolução. Não é assim. Primeiro se
faz a pipoca; o bacon e o queijinho são fritados à
parte (
BIAGGIO, Jaime. Pipoca gordurosa. O
Globo, Rio Show, Rio de Janeiro, 14/06/2002.)
Ali, “Aquarela do Brasil” dava o tom da
farsasócio-política hiperexpressionista onde um
pequeno queria ser herói e morria como mártir.
(...) neste contexto, afinal, o desejo de Célio de
56
ficar bem com todo mundo, pobres sofridos e ex-
amigo rico FDP, é o velho “acender a vela para
Deus e para o diabo” (
BIAGGIO, Jaime.
Mistérios da fé. O Globo, Rio Show, Rio de
Janeiro, 10/09/2004.)
Foi Spielberg quem fez um filme de
Kubrick, ou foi Kubrick que sempre teve em mente
um filme de Sipielberg? Qual o segredo de
Tostines? Bem, dane-se. (
BIAGGIO, Jaime. Um
Conto de fadas e robôs. O Globo, Rio Show,
Rio de Janeiro, 07/09/2001.)
Vá preparado, portanto. A primeira parte,
que registra o início da ocupação nazista na
Polônia, o confinamento de judeus em guetos e a
posterior transferência da maior parte deles para
campos de extermínio, bate sem anestesia no
público (
BIAGGIO, Jaime. Um sobrevivente
conta sua história. O Globo, Segundo Caderno,
Rio de Janeiro, 09/10/2002.)
Nascido do acaso, o filme é grato a ele, e
aceita sugestões (as sugestões, viu, você aí do
outro lado do jornal?) para complementá-lo. No
início, que havia era o piloto de uma série de TV,
que a ABC achou meio esquisito e recusou. Sem
grilos: passado um ano, Lynch filmou mais 45
minutos à guisa de conclusão e reinventou o
material como filme. Só que, na verdade, o epílogo
só lança elementos para que VOCÊ os misture e
tire SUA conclusão. Pouco se explica, nem tudo se
entende, muito se cogita (
BIAGGIO, Jaime.
Abra a sua guarda. O Globo, Rio Show, Rio de
Janeiro, 19/04/2002.)
Nas duas ultimas citações, quando o crítico se reporta diretamente ao leitor,
há dois fatores a serem observados. Primeiro, o uso do verbo “ir” no imperativo
remete à prescrição. O que – antes de ser configurado como ordem – funciona como
convite para viver a experiência cinematográfica. Em segundo lugar, o uso dos
pronomes, ademais, em letras garrafais (o que cria um efeito mais uma vez
prescritivo), funciona como maneira de transportar o leitor para dentro da vivência
do texto e, consequentemente, guia sua relação em direção ao filme.
O caso de Cidade dos Sonhos é igualmente exemplar também para um novo
rumo que a crítica de Jaime Biaggio começa a traçar: a descrição formal da
57
narrativa/enredo. Contudo, Biaggio nunca estabelece qual a “verdade” do filme
tratado, nem mesmo as questões em que quer se deter. Seu texto funciona como um
acendedor da curiosidade do leitor. Nota-se uma preferência por discorrer sobre os
elementos do filme que afetam o sentir do espectador, cativando o leitor a assistir a
película. Cabe a este, dali em diante, dar conta da sua experiência profunda com o
cinema e, por conta própria, definir qual seria essa “verdade” fílmica. A crítica de
Biaggio é mais um farol que cartilha.
A partir de 2002 já é possível notar um tempo maior dedicado à técnica
cinematográfica, em especial um aspecto fundamental na construção daquilo que um
dia será chamado de filme: a produção. Aspecto pouco explorado pelos outros
críticos a serem observados nessa dissertação:
Ou seja, trata-se de Dogma ilegítimo, pois
quebra a regra fundamental, a que proíbe egotrips
em nome do manifesto. Certo? Errado. Nem
ausência de assinatura impede filme de olhar na
direção do umbigo de quem fez, nem foi intenção
de Alan e Jennifer ostentar selo de autenticidade.
Só aproveitar a liberdade criativa do baixo
orçamento, do vídeo digital, e da produção em
regime de mutirão para rodar um despretensioso
balanço emocional de vários personagens – e,
provavelmente, dos próprios mentores do projeto
(
BIAGGIO, Jaime. Quem precisa de dogmas?
O Globo, Rio Show, Rio de Janeiro,
10/05/2002.)
Mas se até aqui os elementos formais do cinema foram abordados
timidademente pelo crítico, é mais quando do uso de recursos puramente jornalísticos
que ele deixa o leitor verdadeiramente a par dos aspectos formais do filme. É nas
reportagens opinativas que Biaggio informa, através das palavras dos próprios cineastas,
como se constrói um filme. A matéria a seguir, incluída para pertencer a esta análise,
evidencia que, quando emite o fazer técnico através dos entrevistados, o crítico tira o
leitor de seu comodismo habitual e traz à baila questões até então desconhecidas ao
grande público:
– Guel (Arraes, co-roteirista) me mandou
um e-mail nesse dia, perguntando o que eu achava
de fazer um filme a partir do meu conto. Eu já
tinha feito “Lisbela e o prisioneiro” com ele e a
Paula (Lavigne, produtora) para a Foz, que
também botou pilha – diz Furtado, co-roteirista do
filme dirigido por Arraes, que teve mais de dois
milhões de espectadores em 2003. – A partir daí,
58
foi tudo rápido. Em abril e maio, fizemos a pré-
produção, em junho e julho, as filmagens, entre
agosto e novembro, a montagem.
Pode parecer corrido. Mas, segundo ele,
não foi.
– Cada filme tem seu ritmo. Levei um ano
montando “O homem que copiava” e não dava
para ser menos que isso. Nesse caso, foi o tempo
exato que esse filme precisava. Não houve
correria.
Mais conhecido longa de Furtado, “O
homem que copiava” é um filme de estrutura
intrincada. “Meu tio matou um cara” (...) é bem
mais simples. Não só em termos de estrutura, mas
também de produção. Até por isso, o anunciado
orçamento de R$ 4 milhões espanta: o filme
aparenta ser mais barato que isso.
– 4 milhões no total, inclui a verba de
lançamento – esclarece o diretor, enumerando
outros motivos que levam o filme a ser mais caro
do que aparenta. (...) Usamos uma câmera
Panavision, a mais cara que já usei. O filme foi
inteiramente finalizado em digital e transposto de
volta para película, o que encarece muito.
Em “O homem que copiava”, cenas
especificas, nas quais havia superposição de
efeito, como animação, haviam passado pelo
mesmo processo. No caso de “Meu tio matou um
cara”, foi o filme todo.
– Fizemos isso par ter uma unidade de
imagem, um controle de cor (
BIAGGIO, Jaime.
Furtado quer roubar a atenção do público. O
Globo, Segundo Caderno, Rio de Janeiro,
23/12/2004.)
Creio que é possível pensar que Jaime Biaggio deposita na função social da
crítica em promover o debate a chave para a formação cultural de seu leitor. Diria
mesmo que deposita grande confiança nesse procedimento, nunca encerrando as
questões, deixando a cargo do público extrair suas próprias conclusões através da
experiência cinematográfica.
A crítica, claro, continua a ser a espinha dorsal de seu trabalho. Mas ele não se
inibe em unir a linguagem crítica à linguagem jornalística para desempenhar a questão
social relevante á crítica, elevando a análise subjetiva ao debate público de opiniões,
incluindo novos temas à discussão. Para finalizar, eis aqui uma última citação, tão
representativa do percurso crítico de Biaggio que tentamos demonstrar:
Nessas duas semanas, em que já foi visto
por mais de 600 mil pessoas, “Closer”, adaptação
da peça de mesmo nome de Patrick Marber (já
59
encenada no Brasil), tem seduzido parte da platéia
na mesma proporção em que repele outra parte. As
razões par aisso podem ser de ordem estética. Há
um certo formalismo, herança da origem teatral,
que tanto confere personalidade ao filme quanto o
engessa às vezes. Ou até pode ser mero ruído na
comunicação, expectativa errada. (...) Mas o
trunfo/problema potencial mais óbvio é a acidez do
texto no que se refere ao falar de sexo (e só falar;
não há uma cena de suadouro a dois), sem poupar
o ouvido do espectador de palavrões.
A – É um filme altamente sacana sem
sacanagem – define o empresário Ricardo Amaral,
um os que nem amaram e nem odiaram. – Faz um
pouco um lugar-comum de tramas a que você já
está acostumado. Às vezes, é um pouco cansativo.
Mas todo lugar que eu vou as pessoas estão
discutindo o filme.
(...) – Luiz Carlos Ritter, empresário que
gostou do filme a ponto de achá-lo superior à peça
arrisca uma explicação semelhante, que passa pela
questão do mal-entendido, do vamos-ver-aquele-
filme-com-a-Julia-Roberts. Só que, para ele, o
sintoma é não o riso frouxo, mas a ausência dele.
– O Mike Nichols é um exímio diretor de
atores. Ele conseguiu talvez a melhor
interpretação da carreira de Julia Roberts. Ela é
uma espécie de Doris Day dos anos 90. As pessoas
esperam um certo tipo de filme dela, e a crueza
sexual do texto choca alguns. Tem gente que não
dá um sorriso o filme todo e reclama na saída. (...)
Contudo, Hector Babenco,diretor da
montagem teatral estrelada por Renata Sorrah,
José Mayer, Marcos Ricca Guta Stresser, fica
uma sensação de vazio bem menor do que deveria
ter ficado. Segundo ele, o problema maior é o fim
do filme.
– No fim da peça, fica uma grande
amargura. O filme procura estabelecer algo mais
próximo de um final feliz – diz Babenco (ele
aponta os porquês e os ondes disso, mas esses
detalhes, reproduzidos aqui, estragariam o fim do
filme – Devem ter pagp um bom dinheiro ao
Patrick Marber, e ele aceitou fazer as mudanças.
Claro que é um filme muito bem cuidado, mas a
peça é mais contundente (
BIAGGIO, Jaime.
Todos falam de sexo; logo falam sobre Closer.
O Globo, Segundo Caderno, Rio de Janeiro,
05/02/2005)
60
4.3 Inácio Araújo
Inácio Araújo escreve há mais de vinte anos na Folha de S. Paulo, mas nunca foi
jornalista. Diferentemente de Tiago Faria, Araújo já possui um aparato teórico bem
definido com sólidos conhecimentos do que poderíamos chamar de “disciplinas”
cinematográficas. Foi assistente de direção de Ozualdo Candeias no filme A Herança,
em 1970 e nos seis anos seguintes montou treze longas-metragens. A lista de incursões
no fazer cinematográfico se estende, mas creio que ficou claro que Inácio Araújo fala
com maior conhecimento de causa. É daqueles casos em que se torna crítico por um
mero acaso.
Seu conhecimento das escolas de cinema das escolas de cinema e percepção do
estilo próprio de certos cineastas pode ser claramente percebido em seus textos. Vejam-
se os extratos de textos a seguir:
O nome nouvelle vague (onda nova) não
veio do cinema, mas do jornalismo, e designava a
rápida mudança de costumes que se esboçava na
França na segunda metade dos anos 50.
O que o cinema fez foi, de certa forma,
cristalizar essa onda jovem, que apontava para
uma oposição clara entre o mundo dos adultos e o
dos jovens.
Nesse sentido, “Os incompreendidos”
talvez seja o filme que melhor representa a
primeira fase da nouvelle vague.
Em primeiro lugar, porque marcava a
estréia no longa-metragem de François Truffaut, o
mais polêmico dos jovens críticos franceses da
época, que desde o início da década invectivavam
o cinema do realismo psicológico que, segundo
eles, representava o triunfo acabado do
academismo.
Em segundo lugar, porque esse filme
rompeu a barreira da “classe cinematográfica”
francesa para ser o primeiro filme da nova
corrente a representar a França no Festival de
Cannes (o que na época era bem importante)
(
ARAUJO, Inácio. Filme é clássico moderno
com pertinência certeira. Folha de S. Paulo,
Ilustrada, São Paulo, 20/04/2001.
)
O tempo sempre foi uma preocupação
essencial para Jim Jarmusch, cuja carreira
começou marcada por longos planos-seqüência
separados por “fades” (escurecimento seguido de
61
clareamento da imagem), Sobretudo agora, na
maturidade, e quando trata de um velho Don Juan,
na pessoa de Don (Bill Murray) (
ARAUJO,
Inácio. Jarmusch cria Don Juan ocupado com
seu próprio vazio. Folha de S. Paulo, Ilustrada,
São Paulo, 25/11/2005.)
Na maior parte dos filmes de Babenco, não
existe reivindicação de um posto de vista. Tudo se
passa como se as imagens exprimisses a mias pura
e completa verdade.
Trata-se de um cinema clássico em sura
retórica. Mas esse cinema clássico que
conhecemos dá conta de um mundo que aspira ao
equilíbrio, é estilisticamente discreto. É um cinema
que nunca se estabeleceu no Brasil.
A maior, talvez única exceção é Hector
Babenco, que soube ambientar essa retórica nas
condições hostis de um país subdesenvolvido,
cheio de desigualdades (
ARAUJO, Inácio.
Massacre parece colado a filme. Folha de S.
Paulo, Ilustrada, São Paulo, 11/04/2003.)
Acompanhando o histórico das críticas de Inácio Araújo na Folha percebe-se
que é freqüente os textos começarem com estes dizeres. Contudo, talvez a valorização
técnica tão marcada em seus textos seja herança do pensamento teórico, absorvido por
Araújo, que fervilhava no momento em que ele desenvolvia estudo acadêmico na
França nos anos 70. Era o auge do pensamento estruturalista e da inflexão da
semiologia sobre a nova crítica.
Mas o crítico não fica preso ao cânone cinematográfico, está atendo à finalidade
estética e prática dos filmes da indústria cultural. Ao invés de repelir ou rechaçar este
tipo de produção, Inácio Araújo é daqueles que a compreendem e sabem expor sua
função e reconhecer quando cumpre seu papel de puro entretenimento – quando é o caso
– ou de destacar sua incompetência:
“Tróia” está na tradição do “digest”:
diante de um original inimitável, o que importa
não é a parcela da obra de Homero que foi
prostituída para que daí saísse um filme. Importa é
o que o filme faz, reiterando-a do convívio
exclusivo dos freqüentadores de biblioteca e, de
certo modo, democratizando-a (
ARAÚJO Inácio.
Seqüências realistas democratizam Ilíada.
Folha de S.Paulo, Ilustrada, São Paulo,
14/05/2004.)
62
Segundo afiança o material de imprensa
de “Em Busca da “Terra do Nunca”, o diretor
estava em busca de algo mágico quando...”. Eis
um texto de divulgação verdadeiro, pois parece
que todo mundo anda em busca de algo mágico no
cinema americano.
O que não é de se estranhar, pois nos
últimos 25 ou 30 anos de indústria cultural
triunfante, o que nos tem sido servido senão
variações infinitas da idéia de que todo homem, no
fundo, não passa de uma criança. (...) Em resumo:
Depp sobra no papel. Se sobra, é porque ao filme
falta algo. E não é magia. É o desejo de ser mais
que um bem cultural facilmente comercializável
(
ARAÚJO Inácio. Talento de Johnny Depp
sobra em filme sentimentalista. Folha de S.
Paulo, Ilustrada, São Paulo, 04/02/2005.)
Nota-se que a questão da utilidade ou inutilidade dos blockbusters não passa ao
largo da análise do crítico. Ele sabe que mesmo este tipo de película requer um savoir-
faire. Não seria errado dizer que ele sabe que as películas que visam uma enormidade de
espectadores vai inevitavelmente ser vista, independente de seu juízo. De modo que é
válido aceitar esta verdade e debatê-la dentro de seus próprios paradigmas.
Mas longe da resignação quanto ao modus operandi cinematográfico – ele sabe
que o cinema é uma arte de massa e, portanto, carrega em si uma função comercial –
Inácio Araújo indica ao seu leitor de que há, sim, alternativa ao puro entretenimento.
Observe os apontamentos que faz sobre Os Incompreendidos:
O cinema de Truffaut foi comercial até o
fim de sua vida – no sentido mais elevado dessa
palavra. Seu desejo de falar a um público amplo
nunca se confundiu com a necessidade de agradar
ao espectador (
ARAUJO, Inácio. Filme é
clássico moderno com pertinência certeira.
Folha de S. Paulo, Ilustrada, São Paulo,
20/04/2001.
)
É notável como crítico se não ocupa simplesmente com a finalidade estética das
obras em si mesmas, Confrontando os filmes com a realidade que conversam,
representam e estão inseridos:
De todas as falsas questões que pode
suscitar “Eu Tu Eles”, a mais insidiosa diz
respeito à representação do Nordeste. Seria justo
condená-lo por não apresentar um “Nordeste
verdadeiro”, por evitar qualquer ênfase no
miserabilismo? Certamente que não. Este não é
um filme sobre o Nordeste. A história poderia se
63
passar ali, no Pantanal, no Jardim Ângela ou na
Patagônia.
Mas o sertão nordestino não é também um
lugar aleatório. Nós o associamos facilmente a um
certo primitivismo, que torna a situação mais
paradoxal: naquilo que imaginamos como um
paraíso machista e pouco cultivado, a façanha da
protagonista, ao impor o desejo feminino sobre o
masculino, tem algo de épico (
ARAÚJO, Inácio.
Filme entroniza desejo feminino no sertão
machista. Folha de S. Paulo, Ilustrada, São
Paulo, 18/08/2000.)
E que dizer dos filmes de outras épocas ou daqueles que configuram estilo
“clássico”? O exame dessas obras passa por aquela atualização que Barthes
preconizava, lembrada no capítulo anterior. Voltemos ao texto sobre Carandiru. Até
aqui vimos que Inácio Araújo domina o conhecimento sobre a trajetória fílmica do
diretor Hector Babenco. Mas seguindo adiante ele explicita como a narrativa produz
menos efeito nos dias de hoje. Para isso recordaremos todo o trecho:
Trata-se de um cinema clássico em sua
retórica. Mas esse cinema clássico que
conhecemos dá conta de um mundo que aspira ao
equilíbrio, é esteticamente discreto. É um cinema
que nunca se estabeleceu de todo no Brasil.
A maior, talvez única exceção é Hector
Babenco, que soube ambientar essa retórica nas
condições hostis de um país subdesenvolvido,
cheio de desigualdades.
No fim dos anos 70, Babenco instaurou seu
classicismo particular e bem-sucedido, em filmes
como “Pixote” e “Lúcio Flávio”. Ali, esse
narrador onisciente já não representa um conjunto
da sociedade, mas algo como nossa consciência
progressista e democrática. A “sociedade civil”,
no que tem de melhor. A questão que “Carandiru”
obriga a formular é: Será que essa adaptação, que
tão bem serviu em tempos de autoritarismo, se
agüenta em tempos mais democráticos? A minha
resposta é: na medida em que se apega à formula
que funcionou bem em tempos idos, “Carandiru”
resvala por vezes no academicismo. (
ARAUJO,
Inácio. Massacre parece colado a filme. Folha
de S. Paulo, Ilustrada, São Paulo, 11/04/2003.)
Isso não significa que os filmes não possam ter temas atemporais. Mas que isso:
seus raciocínios podem ser de muita pertinência na atualidade. Cabe ao crítico apontar a
pertinência dessa discussão. Um momento da crítica de A Batalha de Argel expressa
com clareza as preocupações do crítico em cumprir esta função, conduzindo o leitor a
64
um olhar criterioso sobre a História (com H maiúsculo) e os problemas políticos deste
início de século:
Pontecorvo, verdade seja dita, não está
preocupado em denegrir os gauleses. Seu negócio
é demonstrar que o colonialismo é uma instituição
historicamente destinada à derrota. Hoje, qualquer
um se acha no direito de desfazer do determinismo
histórico dos marxistas, mas o fato é que a coisa
deu certinho no caso do colonialismo.
As revoltas nacionais, na Ásia e na África,
venceram os colonialistas no pós-Segunda Guerra
– França, Inglaterra, Portugal tiveram, cada qual
a seu tempo, de enfiar o rabo entre as pernas e
deixar suas colônias.
(...) De certa forma, o raciocínio do filme
era: se funciona com o colonialismo, funciona com
o resto também. Sabemos que a segunda parte do
postulado – aquela que estava nas entrelinhas,
referente à conquista do poder pelo proletariado –
nunca foi por diante. Mas o filme permaneceu,
apesar disso, íntegro, como expressão da luta por
Argel tal como vista pelos argelinos (pois o filme é
uma produção argelina), mediada por um diretor
italiano e esquerdista.
Íntegro, ou seja: nesse momento em que os
EUA sofrem o diabo no Iraque, “A Batalha de
Argel” oferece uma analogia no mínimo sedutora,
em sua força didática: ocupar o país dos outros
não dá pé. É, de resto, documento de um época em
que a transformação do mundo era uma ambição
de esquerda e o cinema era a grande arte do
século 20.
Ambos – cinema e esquerda – sonhavam
alto, eventualmente juntos. Restou “A Batalha de
Argel” como exemplo desse espetáculo político
feito de imagens grandiosas e raciocínios
sofisticados, ainda que talvez enganosos
(
ARAÚJO, Inácio. Pontecorvo constrói libelo
anticolonialista. Folha de S. Paulo, Ilustrada,
São Paulo, 02/09/2005.)
Embora longa, a citação é necessária para demonstrar como Inácio Araújo vai
além do objeto analisado, envolvendo-o na leitura de aspectos da realidade. De modo
que ele mesmo, enquanto crítico, torna-se interprete do mundo. Mas tendo em vista que
ele domina questões ligadas às técnicas cinematográficas, que tipo de diálogo é possível
ao crítico estabelecer com o leitor. Quê se pode dizer de seu público?
Os juízos e emblemas do crítico são sintéticos e economizam na argumentação,
pressupondo um leitor bem informado mas também curioso, e mais que isso aberto,
65
disposto a ir atrás das pontas que ficam propositalmente soltas. Eis aqui um (de vários
possíveis) exemplo tácito do diálogo que ele quer traçar com o leitor para além da
crítica cinematográfica dos periódicos:
Truffaut aprendera com o cinema
americano, assim como o coloquialismo, a
necessidade de observar o mundo sem a mediação
de um aparato intelectual. Antes de ser bom ou
mau, o mundo é o que é – postulado realista que
cada um dos fundadores da nouvelle vague
desenvolveria à sua maneira e que não vinha
apenas dos americanos, mas sobretudo da teoria
realista de André Bazin (
ARAUJO, Inácio.
Filme é clássico moderno com pertinência
certeira. Folha de S. Paulo, Ilustrada, São
Paulo, 20/04/2001.
)
Percebemos nesse extrato que Inácio Araújo não sente necessidade de
contextualizar quem é Bazin. Creio que nesse caso se pode conjecturar em torno de duas
alternativas: ou pressupõe-se que o leitor saiba que André Bazin
15
foi um teórico do
cinema de grande influência, com textos publicados em revistas francesas como
L`Esprit, L`Ecran Française, La Révue du Cinema. Foi também um dos fundadores dos
Cahiers du Cinema, considerado um dos “mentores” deste movimento cinematográfico
conhecido como nouvelle vague. Ou espera-se que, terminada a leitura do jornal, ele
procure aprender quem foi o teórico. Esta última alternativa traz em si um outro
desdobramento: uma vez apreendido este novo conhecimento o leitor revista o texto e o
filme, criando um movimento circular no qual o leitor parte da crítica em busca de
outros fundamentos. Uma vez dotado desta nova percepção volta ao debate, agora
contribuindo com seu adquirido olhar crítico.
Um passo importante a essa altura é perceber que esse olhar crítico vai além dos
cadernos culturais. E talvez este seja um projeto consciente do crítico. Inácio Araújo há
nove anos ministra aulas sobre história e linguagem do cinema e mantém um blog
16
na
internet onde a caixa de comentários está à disposição deste leitor pronto a desafiar a
própria opinião e experimentar o novo além das páginas da imprensa.
15
Sobre Bazin, ver XAVIER, Ismail (org.) A experiência do cinema. Rio de Janeiro: Graal, 1991,
REISZ, K e MILLAR, G. A técnica da montagem cinematográfica. Rio de Janeiro: EMBRAFILME/
Civilização Brasileira, 1978 e ANDREW, Dudley. As principais teorias do cinema. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar, 1976.
16
< http://cantodoinacio.blogspot.com>
66
4.4 Luiz Zanin Oricchio
De todos os críticos que acompanhamos até aqui Luiz Zanin Oricchio é o que
possui o texto mais constante no decorrer do período coberto nesta dissertação. O século
XX impôs à crítica um caráter mais analítico e interpretativo em detrimento do
julgamento e da valoração. Neste contexto, creio que podemos iniciar a exposição desta
unidade crítica que Oricchio pratica observando como ele costuma ver os filmes como
reflexo da realidade. Vejamos quando se trata de questões referentes à sociedade
brasileira:
Sob um ar mal disfarçado de deboche, o
filme põe em cena personagens anônimos da cena
social brasileira – as empregadas ditas
domésticas, aquelas que “fazem parte da família”,
e em geral moram com os patrões nos cubículos a
elas atribuídos pelo s arquitetos da classe média.
Enfim, a idéia de resgatar socialmente
“invisíveis” seria boa, não fossem alguns detalhes
digamos assim, estranhos (...)
Como um sintoma, este viés aparece
justamente naquilo que falta ao enredo. As
domésticas de Meirelles e Olival vivem num mundo
aparentemente sem patrões. Quer dizer, a outra
parte da equação está ausente, o que é um
excelente recurso para esconder eventuais
conflitos e desavenças. (...)
Se contrastes sociais no Brasil não são
propriamente uma novidade da última década do
século, agora eles se tornaram mais explícitos.
São, por assim dizer, mais visíveis a olhos nus.
Mais intoleráveis, provavelmente geradores de
violência em níveis nunca antes alcançados. De
modo que seria espantoso se o cinema, mesmo em
época pouco propícia à reflexão política, deixasse
escapar esse “gancho” temático (
ORICCHIO,
Luiz Zanin. Domésticas ou a arte do conflito
invisível. O Estado de S. Paulo, Caderno 2,
São Paulo, 06/05/2001.)
Seria possível que o filme fosse observado somente pelos elementos técnicos
que o compõe, a atuação dos atores etc. Mas desde o início Oricchio o confronta com a
realidade que ele tenta representar. Fica claro que algo está truncado. Para ele, falta o
conflito que existe no tema tratado. Mas então, onde isso foi feito de maneira acertada?
Ele continua elencando exemplos:
67
Em O Primeiro Dia, uma moça de classe
média, vivendo seu desespero amoroso, une-se a
um marginal num improvável relacionamento no
reveillon do milênio. Em 16060, uma série de
equívocos leva uma família de miseráveis a
conviver com um clã de afluentes – com
conseqüências funestas para ambos os lados, mas
de forma assimétrica. Quando Nascem os Anjos
monta seu encontro trágico entre classes com a
história do assalto em que tudo dá errado e
seqüestrados e seqüestradores vêem-se obrigados
a conviver durante algum tempo sob o mesmo teto.
Cronicamente Inviável joga num campo mais
amplo. Coloca em cena diversos estratos sociais,
cuja interação é mediada pela mais absoluta falta
de ética, de parte a parte.
Cada um desses filmes debruça-se à sua
maneira sobre o mesmo real dado, a desarmonia
do tecido social brasileiro. Seria simplificador
invocar uma rápida psicologia de autor para
explicar as diferentes maneira como cada qual
interpreta, analisa, sente e assimila esse fenômeno.
No entanto, esses filmes filtram o fenômeno de
maneiras distintas, refletindo o arco ideológico
que orienta seus autores. Este arco vai do
reformismo de cunho humanista (Quando Nascem
os Anjos e O Primeiro Dia), passa pelo niilismo de
Cronicamente Inviável e chega ao cinismo
conservador de 16060
. (idem)
Aqui, vemos que mesmo quando o filme é vazio ao tentar analisar a sociedade
que reflete o crítico contorna este problema. Mesmo que o filme não trate desta questão.
Como podemos perceber, ele descreve uma série de películas que o fazem. Além disso,
expõe a vertente ideológica que perpassa cada um, dando ao leitor a possibilidade de
conhecer outras obras pertinentes sobre o tema mal explorado. De modo que quando a
crítica se abre para outros assuntos que não necessariamente aqueles que dão conta do
objeto de sua análise, ganha o leito, que pode perceber algo ainda não visto.
Na segunda citação, que consideramos longa demais para não perder o sentido,
percebemos que o problema não é somente de esvaziamento ideológico, mas também do
conteúdo dramático. De maneira concisa e didática , o crítico consegue mostrar como
isso acontece e dá a entender que a indústria cinematográfica subestima o espectador
(coisa que ele não o faz):
O esvaziamento é de outra ordem. Aquiles
teria tudo para ser um herói complexo. Afinal, sua
situação diante da guerra é ambígua. Ele não tem
o desejo de vingança de Menelau, nem a vontade
68
de poder de Agamenon. Quer se bater pela glória,
para que seu nome não sejalevado pelo pó do
tempo e ressoe através dos milênios, como
profetiza sua mãe, Tétis (Julie Christie, ótima),
numa das melhores cenas do filme. Nela, Tétis
pondera que uma vida pacífica, junto a filhos e
netos conduz ao esquecimento. Na batalha está a
glória, talvez a imortalidade na memória dos
homens, mas o preço que se paga é a morte,
provavelmente a morte prematura. Esse sentido
trágico dos gregos passa pelo filme como uma
chispa, talvez para não chamuscar demais o que os
estúdios supõem ser a percepção do espectador
médio. Talvez porque essa alusão atemporal de
Tétis pudesse soar como um comentário sobre a
vontade de poder americana e seu desejo de
intervir em todo o planeta.
Além do mais, o próprio enredo já fornece,
de graça a injunções políticas para quem se
dispuser a percebê-las. O estopim da guerra seria
Helena (Diane Krujer, beldade alemã que antes
trabalhava como modelo), que, casada com
Menelau (Brendan Gleeson) se apaixona pelo
troiano Paris (Orlando Bloom). E foge com ele.
Menelau, em seu desejo de vingança, pede ajuda a
seu irmão Agamenon (Brian Cox), rei dos gregos,
que vê no affair uma excelente oportunidade para
declarar guerra a Tróia e assim aumentar seu
poder na região. Esse jogo de manipulação – no
qual milhares de pessoas perdem a vida – fica
sempre em segundo plano. Mais uma vez ele seria
demasiado explicito como comentário sobre o que
acontece, não no mundo antigo, povoado de heróis
e deuses, mas no nosso mundo de hoje, prozaico e
desencantado (
ORICCHIO, Luiz Zanin. Tróia
traz heróis para um mundo desencantado. O
Estado de S. Paulo, Caderno 2, São Paulo,
14/05/2004.)
Verificada a possibilidade de, mesmo tratando de uma crítica de arte das massas,
propor novos conhecimentos de modo atraente ao leitor, resta ainda a questão de como
relacionar enriquecimento cultural quando se critica um filme culturalmente “vazio”.
Neste terreno estéril Oricchio mostra que é, sim, possível dialogar com o leitor acerca
da realidade que nos cerca tendo como ponto de partida numa obra apenas “comercial”.
Primeiro o crítico descreve a trama inicial da película:
Digamos que Tudo para Ficar com Ele é
uma comédia romântica moderninha e pode-se
pensar que o essencial está dito. (...)Cameron
interpreta a demolidora Christina Walters.
Devoradora de homens, acredita que não se deve
69
perder tempo procurando o amor perfeito. Vale
mais contar com aquilo, ou aquele, que está ao
alcance. (...) Quando Jane sofre uma desilusão
amorosa, Courtney e Christina resolvem levá-la a
uma festinha pra animá-la. Ela se anima até
demais, mas o embalo repercute mais na vida de
Christina. É que ela conhece lá o bonitão Peter
(Thomas Jane) e fica caída por ele. (
ORICCHIO,
Luiz Zanin. O medo de amar em comédia
romântica. O Estado de S. Paulo, Caderno 2,
São Paulo, 23/08/2002.)
Daí em diante ele narra “o resto das peripécias” e parece-nos que nada mais há
que acrescentar ao texto. Mas Oricchio parece perceber na personagem um tipo de
comportamento contemporâneo que merece ser estudado. Creio mesmo que o mérito
seja do crítico, pois, como ele deixa transparecer mais adiante, esta “questão de fundo”
apenas “pode ter sido sacada” pela roteirista. Eis os comentários quanto à personagem
principal da trama:
Christina Walters, a protagonista, é no
fundo, uma mulher travada. Sob a fachada liberal,
levemente promíscua, há uma garota insegura, que
morre de medo de encontrar um grande amor,
entregar-se a ele e sofrer uma desilusão. Por isso
vai hesitar tanto antes de apaixonar-se por Peter.
A paixão implica uma perda de controle sobre si
mesma e isso vai contra a ideologia moderna que
prega a autonomia absoluta do ser humano. Somos
felizes na proporção em que não dependemos de
ninguém. O outro é um ser perigoso em potencial e
só existe na medida em que podemos usá-lo e
descartá-lo em seguida. Essa fantasia de
independência psicológica está inscrita no coração
ideológico da América.
Pelo menos é o que sustenta um
especialista na matéria, o sociólogo italiano
Francesco Alberoni, autor de livros interessantes
sobre o amor. Vários deles estão disponíveis em
português, como Enamoramento e Amor, O
Erotismo, Vôo Nupcial e A Amizade, todos
editados pela Rocco
(idem)
Sob a máscara da análise da personagem abre-se toda uma discussão sobre o
comportamento atual em relação ao amor. Aqui é digno de menção que Oricchio sabe
do que fala. A crítico estudou psicologia na Universidade de São Paulo – USP, de modo
que, mesmo usando o trabalho de Alberoni como meio, o crédito para a articulação do
texto é seu. Acompanhemos agora a conclusão do texto:
70
Diz o sociólogo: “O terror da fusão é o
terror de se perder, o medo da paizão. É uma fobia
americana, que decorre da cultura anglo-saxã do
self-control”.
É o medo de perder a sua individualidade
que leva Christina a hesitar diante do amor que
sente por Peter. Nesse sentido, se tomarmos ao pé
da letra as conclusos da roteirista Nancy Pimental,
levadas á tela por Roger Kumble, as moças
americanas parecem menos predispostas ao ato
amoroso do que os rapazes. Mas não precisamos
de nada disso para nos divertirmos
moderadamente
(ibidem)
A frase que encerra o texto explicita que o crítico estava ciente de todas as
questões abordadas na publicação não diziam necessariamente respeito à proposta do
filme. Mas isso não significa que não possa ser o ponto de partida para dialogar com o
leitor sobre questões relevantes sobre modos de interação com o mundo. Mas do que
enriquecer culturalmente o leitor, o texto de Oricchio simboliza o respeito por sua
inteligência.
71
CONCLUSÃO
Recapitulamos aqui os passos do presente trabalho. Estabelecemos o início da
crítica já no âmbito da literatura e a importância da crítica literária na formação da
crítica modernas tal como ainda a praticamos. Da crítica autoritária e conservadora do
século XVII, passando pela luta contra o Estado e o dogma do século XVIII até o
estabelecimento, no século seguinte de sua independência e de seus meios, a crítica
sempre se confrontou com a arte.
O conceito chave neste momento do trabalho é o de “esfera pública”
desenvolvido, como vimos, por Jürgen Habermas. Ele serviu de apoio para analisarmos
o desenvolvimento do debate público de opiniões, aqui tomado como a conseqüência da
própria atividade crítica dos jornais.
Postas essas premissas, nos deparamos finalmente com as principais escolas
críticas do século XX. O exame do trabalho destas grandes linhas levanta questões
fundamentais sobre a literatura, poética, lingüística etc, que se refletem também no que
tange ao cinema. Muitas dessas reflexões tornaram-se essenciais para compreender
especificidades dos signos cinematográficos, como visto no terceiro capítulo.
A primeira parte deste trabalho teve como propósito, portanto, expor de forma
coerente as bases da tarefa crítica, tarefa essa que se dá – também – pela ação da crítica
cinematográfica dos jornais diários no enriquecimento cultural do leitor.
Posteriormente examinamos a linguagem que a crítica assume no âmbito do
jornalismo cultural. “Jornalismo cultural” já é uma expressão contraditória
conceitualmente, posto que o jornalismo dá conta do imediato, da reação aos fatos
cotidianos. Cabe à cultura a noção de costumes e idéias comuns à sociedade, juntamente
com a noção de identidade.
O jornalismo cultural se dedicaria, então, à avaliação de idéias, arte e valores,
assim como espaço de consolidação e quebra de antigos e novos valores. Mesmo assim,
há pelo menos meio século discute-se a “crise” da crítica cultural. Foi necessário,
portanto, acompanhar sua evolução no contexto nacional para percebermos que, ao
invés de entrar em decadência, ela se adequou às transformações instrumentais exigidas
com a profissionalização dentro das redações cada vez mais informativas.
A crítica continuou sendo a espinha dorsal do jornalismo cultural tanto nos
jornais quanto nas revistas. Ela pode ser encontrada em diversos formatos e nos mais
72
variado veículos, como ficou claro ao examinarmos especificamente a crítica
cinematográfica feita no Brasil.
Mas dentre as várias questões que os estudos teóricos acerca da crítica cultural
suscitaram, pouco foi feito para esclarecer os objetivos da crítica cinematográfica tal
como é exercida nos jornais. Na verdade, o exame da crítica dos periódicos, quando
inserido num contexto filosófico, - feito prioritariamente dentro dos muros acadêmicos
– tende a ser vista como uma ferramenta menor.
E é aqui que todos os questionamentos e conceitos vistos até agora adquirem
sentido. Munidos dessas informações é que podemos avaliar se a crítica cinematográfica
publicada em nossos jornais cumpre, atualmente, a função de educar esteticamente seu
leitor. Para esta análise, realizou-se o exame de um corpus constituído pelos textos de
Luiz Zanin Oricchio, de O Estado de S. Paulo, Jaime Biaggio, de O Globo, Tiago Faria,
do jornal Correio Braziliense e Inácio Araújo, da Folha de São Paulo publicas entre o
dia 1° de janeiro de 2000 a 31 de desembro de 2005.
Mas se todo recorte cronológico é uma decisão arbitrária, o recorte aqui
escolhido também o é. Esta dissertação examinou o periodo que, nos pareceu, suscita os
maiores desafios para esta atividade tão antiga como a civiçização ocidental: a
atualidade.
Seria uma tarefa grande demais dar conta de todos os textos produzidos pelos
autores selecionados, no período que cobrimos. Por isso, pautamo-nos pelo método
conhecido como de amostragem proporcional estratificada, que nos confere um
percentual representativo da totalidade das críticas. Na prática, isso significou tomar 46
críticas e 3 reportagens utilizadas para comparação.
As críticas aqui reunidas servem para exemplicircar procedimentos e estratégias
adotadas por cada um dos críticos no intuito de dialogar com o leitor no período em
questão. O método seguido aqui contém,portanto, muito de indutivo (e intuitivo). Como
ressaltamos anteriormente, a dissertação não teve o trabalho de contestar se os textos
publicados nos jornais durante estes cinco anos – e aqui analisados – podem ser
definidos como crítica ou não. Assumimos que, se são publicadas sob a rubrica da
crítica, são textos de crítica.
Nossa intenção foi a de identificar se elas cumprem o papel de despertar o leitor
para algo ainda não conhecido, experimentado, visto.
O que ficou claro, terminada a nossa jornada, é que cada um dos críticos, de
modo mais ou menos eficiente, pretende primeiramente instruir culturalmente o leitor.
73
Para isso eles utilizam de descrições formais do fazer cinematográfico, situam o leitor
quanto ao percurso realizado pelo cineasta dentro de suas obras (muitos recorrem a um
único tema que se repete, sendo tratado por um prisma diferente a cada filme), expõe o
argumento que move o enredo sem deixar de apontar a conversa que muitas vezes a
película faz om a realidade no auql está inserida.
Não se pode negar, entretanto, que muitas vezes os críticos adotam determinados
critérios estéticos que se manifestarão como valoração de certos tipos de filme em
detrimento de outros. Mas suas colocações deixaram claro que, de modo geral, esta
escolha não impede o reconhecimento de que as obras rejeitadas cumpriram o efeito que
a que se propuseram.
Ao contrário, os textos observados mostram que os críticos não pretendem
simplesmente orientar o leitor, mas visam, princicalmente, estabelcer critérios que
possam nortear a ação seguinte do leitor: buscar conhecimento para além dos jornais,
em outras leituras, comparando teorias e, futuramente, formulando seus próprios
conceitos a serem nocamente discutidos na esfera pública.
Aqui somos novamente levados a perguntar: será que o público se aproveita do
enriquecimento fornecido pelos jornais e sai dotado de maior formação estética desta
experiência? Será que o leitor participa da produção crítica desses profissionais através
dos canais abertos para uma correspondência com eles? É dificil encontrar instrumentos
teóricos que dêem conta desta questão. A resposta fica em aberto.
Outro ponto que merece ser investigado num trabalho futuro é a das relações que
se estabelecem entre a página diagramada e o texto crítico. E relação da crítica com
outras críticas, reportagens e publicidade que disputam lugar dentro da página. A
discussão desses postos exigiria mais algumas dezenas de páginas e um conhecimento
teórico que ainda não possuo.
Além disso, acredito que a tentativa de resposta definitiva – e isso vale para as
conclusões aqui expostas – seria imprudente como avaliação feita do que ainda está em
processo.Não é esta a pretensão deste trabalho. Ademais, creio que o objetivo último
dos estudos teóricos e dissertações sejam, no limite, apresentar problemas e suscitar o
debate, deixando a cargo do tempo o papel de decidir a permanência nos caminhos
apontados.
74
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80
ANEXOS
Tabela 2 – Relação dos textos publicados por crítico e filmes, 2000.
Críticos
FILMES
Jaime
Biaggio
Inácio
Araújo
Luiz Zanin
Oricchio
Tiago Faria
2000
A Essência da Paixão 13/10.
A Menina da Baía dos Anjos 30/06.
A Musa 14/07.
A Quinta Estação 04/08.
Alta Fidelidade 06/10.
Billy Elliot 15/10.
Claire Dolan 01/10.
Dominação 29/12.
Enfermeira Betty 08/10.
Eu Tu Eles 15/08.
Gente da Sicilia 29/09.
Heróis Fora de Órbita 18/08.
Intrigas 03/11.
Janela Indiscreta 17/11.
Louise – Take 2 02/07.
Medo e Delírio 11/02.
Missão Impossível 2 23´06. 22/06.
Morcegos 06/06.
Ninguém Escreve ao Coronel 08/09.
O Patriota 21/07.
Os 5 Sentidos 15/09.
Paixões Paralelas 26/08.
Pokemom 21/07.
Regras do Jogo 08/09.
Santitos 11/08.
Sexo Pudor e Lágrimas 24/11.
Shaft 10/11.
Sob a Luz da Fama 27/10.
South Park – Maior, Melhor e sem Cortes 25/08.
Tolerância 10/11.
Um Estranho Chamado Elvis 23/06.
Zona de Conflito 28/07.
TOTAL DE CRÍTICAS 31 2 0 0
81
Tabela 3 – Relação dos textos publicados por crítico e filmes, 2001.
Críticos
FILMES
Jaime
Biaggio
Inácio
Araújo
Luiz Zanin
Oricchio
Tiago Faria
2001
A Corrente do Bem 22/03.
A Espinha do Diabo 12/10. 12/10.
A Grande Ilusão 24/08.
A História Real 06/10.
A Partilha 08/06.
A Questão Meridional 21/12.
A.I. – Inteligência Artificial 07/09.
Antes do Amanhecer 16/03.
Apocalypse Now 27/11.
As Coisas Simples da Vida 02/08.
Beatles – Os Reis do Iê-Iê 02/02.
Cecil Bem Demente 13/04.
Código Desconhecido 25/05.
Domésticas 06/05.
Dona Flor e seus Dois Maridos 30/11.
Enfermeira Betty 14/09.
Eu Tu Eles 18/08.
Harry Potter e a Pedra Filosofal 23/11.
Hedwig – Rock, Amor e Traição 16/11.
Mater Dei 16/11.
Memento 31/08.
Memórias Póstumas 16/08.
Meu Melhor Inimigo 02/03.
Mickey Olhos Azuis 28/01.
Monstros S.A. 07/12,
14/12
Na Teia da Aranha 15/06.1
No Olho da Rua 11/11.
O Alfaiate do Panamá 24/08.
O Capitão Corelli 09/11.
O Casamento de Louise 24/08.
O Céu pode Esperar 24/08.
O Estranho 12/04.
O Fim do Mundo 07/09.
O Lixo e a Fúria 23/11.
O Pacto dos Lobos 14/06.
O Retorno da Múmia 18/05.
O Senhor dos Anéis 31/12.
O Sonho de Rose 10/08.
O Tigre e o Dragão 16/02.
82
Os Incompreendidos 20/04.
Parque dos Dinossauros 3 20/07.
Passageiros 07/09.
Pearl Harbor 29/12.
Planeta dos Macacos 03/08.
Rios Vermelhos 25/05.
Sob a Areia 21/12.
Sob Suspeita 28/04.
Tabu 13/07.
Tenha Fé 09/06.
Tudo Bem, Até Logo
02/11.
Xuxa e os Duendes
14/12.
TOTAL DE CRÍTICAS
34 12 6 0
Tabela 3 – Relação dos textos publicados por crítico e filmes, 2002.
Críticos
FILMES
Jaime
Biaggio
Luiz Inácio
Araújo
Luiz Zanin
Oricchio
Tiago Faria
2002
11 de Setembro 11/10.
8 Mulheres 12/07.
A Agenda 04/10.
A Garota do Rio 08/11.
A Língua das Mariposas 12/07.
A Soma de Todos os Medos 14/06.
Água Quente sob uma Ponte Vermelha 15/11.
Aniversário de Casamento 10/05.
As Três Marias 05/08.
Até o Fim 17/05.
Avassaladoras 01/02.
Beijando Jéssica Stein 26/07.
Bellini e a Esfinge 01/03.
Betty Fisher e Outras Histórias 27/12.
Botin de Guerra 27/09.
Casamento Grego 08/11.
Charlotte Gray – Uma Paixão Sem
Fronteiras
19/04.
Cidade dos Sonhos 19/04,
04/05
Crimes em Primeiro Grau 01/05.
Crossroads – Amigas para Sempre 24/05.
Dia de Treinamento 15/03.
Dívida de Sangue 08/11.
83
Domingo Sangrento 22/11.
Dragão Vermelho 01/11.
Edifício Master 22/11.
Elogio ao Amor 03/05.
Exílio no Iraque 26/10.
Falcão Negro em Perigo 08/03.
Fale com Ela 01/11.
Fora de Controle 04/10.
Harry Poter e Câmara Secreta 22/11.
Hollywood Hong Kong 03/10.
Homens de Preto II 12/07.
Houve Uma Vez Dois Verões 06/09.
Iris 17/05.
Italiano para Principiantes 12/04.
Jason X 11/01.
Jogo de Espiões 19/07.
Jogo dos Espíritos 28/06.
Kate & Leopold 14/06.
K-Pax – O Caminho da Luz 12/04.
Lara 08/11. 08/11.
Lilo & Stitch 28/06.
Marido Barra Limpa 23/09.
Meu Primeiro Homem 02/10.
Neve pra Cachorro 26/07.
O Amor é Cego 08/02.
O Filho da Noiva 22/11.
O Homem que não Estava Lá 01/03.
O Pacto dos Lobos 14/06.
O Pianista 09/10.
O Poder vai dançar
25/01.
O Príncipe 09/08.
O Quarto do Pânico 07/07.
O Sobrevivente 29/03.
Os Atores 20/09.
Paraíso 18/10.
Penalidade Máxima 10/05.
Pequenos Espiões 2 – A Ilha dos Sonhos
Perdidos
01/11.
Por um Sentido na Vida 18/10.
Possessão 11/10.
Quando Éramos Reis 11/10.
Quanto Mais Quente Melhor 30/05. 31/05.
Santa Maradona 08/10.
Senhor dos Anéis – A Sociedade do Anel 27/12. 02/01.
Sexy Beast 15/03.
Sonhos Tropicais 26/04.
Spider 06/10.
84
Spirit – O Corcel Indomável 05/07.
Trapaceiros 11/01. 11/01.
Tudo para Ficar com Ele 23/08.
Um Amor de Borges 05/07.
Um Casamento à Indiana 24/05.
Uma Mente Brilhante 15/02.
Uma Onda no Ar 25/10.
Vanilla Sky 25/01.
Vida que Segue 15/11.
Viva São João 14/06.
Zico 25/10.
TOTAL DE CRÍTICAS 63 4 17
0
Tabela 4 – Relação dos textos publicados por crítico e filmes, 2003.
Críticos
FILMES
Jaime
Biaggio
Inácio
Araújo
Luiz Zanin
Oricchio
Tiago Faria
2003
007 Um Novo Dia para Morrer 10/01. 10/01.
8 Mile – Rua das Ilusões 21/03.
A Estranha Família de Igby 10/10.
A Viagem de Chihiro 07/07.
Adaptação 21/02. 27/02.
Adeus, Lênin 25/12. 26/12.
Amor à Segunda Vista 25/04.
Amores Parisienses
10/01.
As Confissões de Schmidt 21/03.
As Horas 28/02,
07/03
26/02.
As Invasões Bárbaras 19/11.
Bianca 12/12.
Carandiru 11/04. 11/04. 11/04.
Chegadas e Partidas 17/01.
Cidade de Deus 14/06.
Coisas Belas e Sujas 05/12.
Como Perder um Homem em 10 dias 25/04.
Conto de Outono 25/04.
Deus é Brasileiro 31/01.
Didi – O Cupido Trapalhão 24/06,
27/06
Dirigindo no Escuro 08/06.
Dois Perdidos Numa Noite Suja 02/04,
12/04
85
Durval Discos 18/04.
Encontro de Amor 25/04.
Era uma vez no México 31/10.
Femme Fatale 24/01.
Frida 04/04. 04/04.
Full Frontal 28/03.
Garotas do ABC 24/11.
Ghosts of the Abyss 29/06.
Harmada 09/12.
Lisbela e o Prisioneiro 22/08.
Longe do Paraiso 04/07.
Madame Satã 18/02.
Maria Mãe do Filho de Deus 23/10.
Matrix Reloaded 22/05.
Maus Hábitos 07/02.
Minha Noite com Ela 16/05.
O Chamado 31/01.
O Exterminador do Futuro 3 03/07,
30/07
Extermínio 25/07.
O Homem que Copiava 13/06.
O Homem sem Passado 28/02.
O Pianista 07/03. 07/03.
O Que Elas Querem 17/01.
O Que Fazer em Caso de Incêndio 20/06.
O Senhor dos Anéis : O Retorno do Rei 26/12.
O Tango e o Assassino 19/12.
O Tempo de Cada Um 11/07.
O Último Beijo 25/04. 01/02.
Prenda-me se For Capaz 21/02.
Quem Sabe? 14/02.
Recém Casados 11/04,
25/04
Simplesmente Amor 05/12,
22/12
Sobre Meninos e Lobos 05/12.
Solaris 28/03.
Spider 03/01.
Tainá – Uma Aventura na Amazônia 03/01,
11/12
Tiros em Columbine 17/04.
X- Mem 2 02/05.
TOTAL DE CRÍTICAS 48 6 15 7
Tabela 5 – Relação dos textos publicados por crítico e filmes, 2004.
86
Críticos
FILMES
Jaime
Biaggio
Luiz Inácio
Araújo
Luiz Zanin
Oricchio
Tiago Faria
2004
500 Almas 26/11.
A Dona da História 01/10.
A Paixão de Cristo 19/03.
A Trapaça
30/05.
A Vila 03/09. 08/09.
A Voz do Coração 15/10.
Alexandria... Nova York 28/10.
Amém 15/01.
Apaixonados 17/01.
Ararat 30/04.
As Bicicletas de Belleville 16/04.
As Vidas de Maria 21/11.
Atlântico Negro – Na Rota dos Orixás 24/01.
Balzac e a Costureirinha Chinesa
23/07.
Benjamim 04/04.
Cazuza – O Tempo não Pára 11/06.
Chuva de Verão
23/04.
Cine Gibi – O Filme 09/07.
Cold Mountain 13/02.
De Corpo e Alma
28/05.
De Passagem
30/04.
Diários de Motocicleta 24/05.
Duplex 19/04.
Elefante 04/06.
Em Nome de Deus 16/01.
Encontros e Desencontros 23/01.
Espelho d’Água
09/07.
Estranhas Ligações 06/08.
Filme de Amor 28/05.
Fim do Século – A História dos Ramones 06/10.
Geração Roubada 20/02.
Histórias Mínimas 02/07.
Kill Bill 2 08/10.
Laurel Canyon – Rua das Tentações 16/04.
Lugares Comuns 02/07.
Má Educação 12/11.
Matadores de Velhinha 02/07.
Mestre dos Mares – O Lado Mais Distante
do Mundo
19/02.
Minha Mãe Gosta de Mulher 06/08.
87
Na Captura dos Friedmans 12/03. 12/03.
Neste Mundo 24/12. 24/12.
Nossa Música 08/10.
O Abraço Partido 31/12.
O Pagamento 12/03.
O Pântano 16/07. 08/10.
O Prisioneiro da Grade de Ferro 04/06.
O Retorno 08/10.
O Tango e o Assassino 09/01.
O Último Samurai 13/07.
Olga 26/08.
Papai Noel às Avessas 17/12.
Passagem Azul 01/10.
Peixe Grande e Suas Histórias Maravilhosas 20/02.
Peões 28/11.
Por um Triz 05/03.
Primavera, Verão, Outono, Inverno ... e
Primavera
24/09.
Redentor 10/09.
Rei Arthur 17/09.
Revelações 30/01. 17/02.
Roubando Vidas 09/04.
Santa Menina 29/09.
Shrek 2 18/06.
Slogans
21/05.
Sob a Névoa da Guerra 02/10.
Sob o Domínio do Mal
12/11.
Tróia 14/05. 14/05.
Xuxu
07/05.
TOTAL DE CRÍTICAS 12 13 19 31
Tabela 6 – Relação dos textos publicados por crítico e filmes, 2005.
Críticos
FILMES
Jaime
Biaggio
Inácio
Araújo
Luiz Zanin
Oricchio
Tiago Faria
2005
2 Filhos de Francisco
31/07.
19/08.
500 Almas 13/12.
A Batalha de Argel 02/09.
A Casa dos Bebês 08/01.
A Cidade dos Sonhos 26/04.
A Fantástica Fábrica de Chocolate 22/07.
A Feiticeira 30/09.
À Margem da Imagem 24/11.
88
A Menina Santa 11/08. 12/08.
A noiva-cadáver 21/10.
A Passagem 30/12.
A Queda – As Últimas Horas de Hitler 06/05. 06/05.
A Terra do Nunca 04/02. 04/02.
A Vida é um Sopro 22/11., 24/11.
A Vida Marinha com Steve Zissou 19/08.
Achados e Perdidos 26/09.
Água Negra 12/08.
Alexandre 14/01.
Amaldiçoados 15/07. 15/07.
Ama-me Como Sou 02/09.
Apenas um Beijo 23/12. 23/12.
As Filhas do Vento 14/10.
As Vidas de Maria 22/10.
Átila 19/08.
Be Cool – O Outro Nome do Jogo 15/04.
Bom Dia , Noite 29/04. 29/04.
Cabra-cega 15/04. 14/04.
Caiu do Céu 08/07.
Carga Explosiva 2 21/10.
Cidade de Deus 26/11.
Clean 17/06. 05/08.
Closer 05/02.
Confidências Muito Íntimas 21/01.
Contracorrente 30/09.
Corações e Mentes 24/06.
Crash – No Limite 28/10.
Crime Delicado 27/10.
Crime Perpeito 02/10.
Entrando Numa Fria Maior Ainda 28/01.
Eterno Amor 25/02.
Família Rodante 09/12.
Flores Partidas 25/11.
Fora do Mapa 11/11.
Garganta Profunda 29/7.
Guerra dos Mundos 29/06.
Harmada 19/06. 26/08.
Herói 25/03.
Hitch – Conselheiro Amoroso 18/02.
Hora de Voltar 22/04.
Hotel Huanda 18/08.
Irmãos 27/05.
Jogo Subterrâneo 31/03. 01/04, 03/04
King Kong 16/12.
Madagascar 24/06.
89
Mandadayo 17/01.
Manderlay 11/11.
Mar Adentro 18/02. 18/02.
Marcas da Violência 23/11. 11/11.
Memória do Saqueio 25/08.
Mercador de Veneza 04/11.
Mergulho Radical 12/11.
Mondovino 06/05.
Morro da Conceição 13/12.
Ninguém Pode Saber 16/04.1 21/04. 10/06.
O Agente da Estação 12/03.
O Amigo da minha Amiga 23/07.
O Aviador 11/02.
O Cachorro 03/06.
O Casamento de Romeu e Julieta 09/03, 18/03
O Casamento Perfeito 25/02.
O Coronel e o Lobisomem 07/10. 07/10.
O Diabo a Quatro 14/07. 12/08.
O Exorcismo de Emily Rose 02/12.
O Filho de Chucky 14/01.
O Fim e o Princípio 18/11.
O Homem das Novidades 01/07.
O Invasor 27/10.
O Jardineiro Fiel 13/10. 14/10.
O Lenhador 04/03.
O Milagre de Berna 28/01.
O Senhor das Armas 15/10.
O Último Mitterrand 11/11.
O Veneno da Madrugada 28/11.
Old Boy 13/05.
Os Irmãos Grimm 07/10. 07/10.
Os Matadores 27/10.
Quanto Vale ou é por Quilo? 24/06.
Quem Somos Nós? 18/11.
Querida Wendy 02/12.
Reis e Rainha 09/12.
Robôs 18/03.
Rocinha 13/07.
Sin City 18/07.
Soldado de Deus 25/11.
Stars Wars – Episódio III – A Vingança dos
Sith
16/01.
Tainá 2 07/01.
Terra dos Mortos 23/07.
The Corporation 16/12.
Um Filme Falado 22/04.
Uma Mulher Contra Hitler 29/10.
Uma Vida Iluminada 02/02. 18/11.
90
Viagem ao Princípio do Mundo 17/01.
Vida de Menina 30/09. 30/09.
Violação de Privacidade 08/04.
Vozes Inocentes 08/04.
TOTAL DE CRÍTICAS 24 28 28 49
Tabela 7 – Relação comparativa de todos os textos publicados por crítico e filmes, 2000
– 2005.
ANOS
JAIME
BIAGGIO
ÍNÁCIO
ARAÚJO
LUIZ
ZANIN
TIAGO
FARIA
2005
24 28 28 49
2004
12 13 19 31
2003
48 6 15 7
2002
63 4 17 --
2001
34 12 6 --
2000
31 2 -- --
TOTAL GERAL
212 65 85 87
91
Gráfico 1 – Demonstrativo da evolução anual de todos os textos publicados por crítico,
2000 – 2005.
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
2000 2001 2002 2003 2004 2005
Jaime Biaggio
Inácio Araújo
Luiz Zanin
Tiago Faria