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idéia do Sr. E. de Girardin, no seu livro de Estudos dramáticos, – aquele
Jacques que veio dar o quarto desenlace ao romance dos amores cobiçosos
de um estranho pela mulher casada (após Rousseau que o findara com a
morte de Júlia de Woldemar, Goethe com o suicídio de Werther, Dumas com
o assassinato de Adèle e a devoção de Antony – o bastardo) com a morte
voluntária do marido, Aí (sic) nesses volumes o casamento é um escárnio.
Que importa Simon finde por um casamento nem mais nem menos que um
conto de Perrault ou de M
me
d'Aulnoy, como o diz espirituosamente M
me
Dudevant, e no André o pleito não vá mais pelo amor conjugal que pelo
adúltero? que importa? já
não é bastante ir contra o casamento, igualar-lhe o
sacrossanto com o amor adúltero? (AZEVEDO, 2000, p. 664-665, grifo do
autor).
Assim, como é possível notar na citação anterior, a concordância de Álvares de
Azevedo em relação à autora, e às temáticas desenvolvidas por ela, vai até certo ponto. Ele
questiona, embora tente entender que George Sand seja contra o matrimônio
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. Todavia, para
ele, colocar o “amor adúltero”
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em seus romances já é algo diferente, para não dizer
inaceitável. Nesse sentido, o poeta ainda carrega traços morais fortes, mesmo dizendo que o
que Sand escreve não o deixa “arrepiado”.
Álvares de Azevedo tenta justificar que o fim da poesia é a beleza, assim, como
pontuara no prefácio em O Conde Lopo que “o fim da poesia é o belo” (AZEVEDO, 2002, p.
369), e, desde que o escritor não “enxurde no lodo da obscenidade”
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, não há motivo para
temer. Por assim dizer, o poeta, mesmo sendo reacionário, busca amenizar seu
conservadorismo ao afirmar que se há traços de inspiração de poemas como os “Don Juan” e
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É interessante notar a postura de George Sand, na “carta à senhorita Leroyer de Chantepie”, frente ao
casamento: “Senhorita [...] Detalhes da existência apenas se me apresentam como romances mais ou menos
felizes que conduzem todos a uma conclusão geral: a sociedade deve ser reformada de cima abaixo. Parece-me
que ela se dá à mais cruel desordem e entre todas as iniqüidades consagradas no seu interior, a mais destacada
parece-me ser as relações de homens e mulheres as quais estão estabelecidas de modo injusto e absurdo. Daí que
não possa aconselhar ninguém a ingressar no casamento, sancionado pela lei civil que continua a sustentar a
dependência, inferioridade e nulidade social da mulher. Passei dez anos em reflexão a respeito deste tema e, após
ter me perguntado porque todos os amores neste mundo, legitimados ou não pela sociedade, eram mais ou menos
infelizes, quaisquer que fossem as qualidades e virtudes das almas neste modo associadas, estou
convencida da
impossibilidade radical da felicidade perfeita e do amor ideal, em condições de desigualdade, inferioridade e de
dependência de um sexo em relação a outro. Seja pela lei, seja por uma moralidade universalmente reconhecida,
seja pela opinião ou pelo preconceito, permanece o fato de que a mulher, tendo se entregado ao
homem está
agrilhoada ou na condição de réu. Agora, a senhorita me pergunta se pode ser feliz através do amor e do
casamento. Não creio que a senhorita será
feliz através de qualquer dos
dois,
disso estou convencida. Porém, se
a senhorita me pergunta em que outras condições a felicidade da mulher pode ser encontrada, dir-lhe-ia que sou
incapaz de despedaçar e remodelar toda a sociedade inteiramente e, bem sabendo que ela durará muito além da
nossa própria breve estada neste mundo, devo colocar a felicidade das mulheres em um futuro no qual
firmemente acredito, no qual deveremos voltar a melhores condições na vida humana, no seio de uma sociedade
mais iluminada, na qual nossas intenções serão melhores compreendidas e nossa dignidade melhor estabelecida”.
Disponível em <htpp:www.velhosamigos.com.br/Coletânea/coletanea22.html>. Acesso em 02/10/2006 às 23:40.
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A respeito do adultério, Azevedo também se põe contrário a ele, (ou pelo menos nos faz acreditar nisso), numa
carta enviada a seu amigo Silva Nunes, de 27 de agosto de 1848, em que o escritor afirma que o poema Parisina
“é uma das obras mais imorais de Byron, pois é uma madrasta adúltera com seu enteado que ele pinta com as
cores mais românticas possíveis” (AZEVEDO, 2000, p. 808).
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Azevedo, pelo que demonstra, não é a favor da vertente erótica na literatura de autoria feminina.