Download PDF
ads:
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
SUELY DOMINGUES ROMERO HAUSER
A TRANSIÇÃO DA 4ª PARA A 5ª SÉRIE
DO ENSINO FUNDAMENTAL:
UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
(1987-2004)
MESTRADO EM
PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO
SÃO PAULO
2007
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
I
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
SUELY DOMINGUES ROMERO HAUSER
A TRANSIÇÃO DA 4ª PARA A 5ª SÉRIE
DO ENSINO FUNDAMENTAL:
UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
(1987-2004)
MESTRADO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO
Dissertação apresentada à Banca Examinadora
da Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, como exigência parcial para obtenção
do título de MESTRE em Psicologia da
Educação, sob a orientação da profª.dra. Maria
Regina Maluf.
SÃO PAULO
2007
ads:
II
BANCA EXAMINADORA
____________________________________________
_
____________________________________________
_
_____________________________________________
_
III
AGRADECIMENTOS
No momento de conclusão deste trabalho, expresso o meu reconhecimento a todos
aqueles que colaboraram direta ou indiretamente para que ele chegasse a termo.
A Deus, fonte de inspiração, força, coragem e confiança.
A minhas filhas trigêmeas, Clara, Ana Luísa e Isabel, geradas e nascidas durante a
execução desta pesquisa.
Ao meu marido, Carlos, por ser meu grande incentivador, parceiro e confidente
em todos esses anos.
A minha orientadora professora Maria Regina Maluf, pela generosidade, pela
empatia, pela colaboração. Minha eterna gratidão pelo carinho e pelos ensinamentos.
Às professoras Abigail Alvarenga Mahoney e Regina Mary César Reis pelas
contribuições que possibilitaram um redirecionamento desta pesquisa.
À Secretaria de Educação do Estado de São Paulo, pelo projeto Bolsa Mestrado,
benefício que tornou possível esta pesquisa.
A todos os colegas de turma pelas trocas de experiência. Em especial, à minha
amiga Margarete, parceira de bons e maus momentos divididos durante este curso.
.
IV
Sumário
INTRODUÇÃO 1
1. A TRANSIÇÃO ESCOLAR DA 4ª PARA A 5ª SÉRIE 13
2. PROBLEMAS E OBJETIVOS 22
3. MÉTODO 24
3.1. Tipo de material e fontes 24
3.2. Procedimentos de coleta de dados 25
3.3. Procedimentos de análise de dados 27
4. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS: o que “dizem” as pesquisas sobre o
tema da transição da 4ª para a 5ª série. 28
4.1. Síntese dos resultados obtidos 46
4.2. Conclusões 54
REFERÊNCIAS BIBLIOGFICAS 59
V
Resumo
HAUSER, Suely Domingues Romero. A transição da 4ª para a 5ª série do Ensino
Fundamental: uma revisão bibliográfica (1987-2004). Dissertação de Mestrado apresentad
a
como exigência parcial para obtenção do grau de Mestre em Psicologia da Educação no
curso de Pós-Graduação Stricto Sensu da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
PUC-SP, 2007.
Esta pesquisa teve como objetivo principal analisar
a
produção científica nacional sobre o tema da transição escolar
da 4ª para a 5ª série expressa em trabalhos de dissertações d
e
mestrado e teses de doutorado. Foram objetivos específicos d
a
pesquisa, identificar e analisar a quantidade e a temporalidade
das produções, o nível de formação dos pesquisadores, as
regiões do país e as instituições em que os estudos tivera
m
origem. Foi feito um levantamento na base de dados d
a
CAPES, onde constam trabalhos defendidos de 1987 a 2004.
As palavras-chave utilizadas foram: 5ª série, quinta série, 5ª +
série, passagem da 4ª para a 5ª série, unidocência e
pluridocência, ensino fundamental, transição. Fora
encontradas 14 dissertações de mestrado e duas teses de
doutorado. Os trabalhos completos foram lidos e analisados
com base em critérios definidos pelo pesquisador; em alguns
casos em que esse acesso não foi possível, a análise
considerou o resumo disponível no portal da base de dados.
Os resultados desta pesquisa demonstraram que a escola de
ensino fundamental ainda convive com o problema da ruptur
a
ou descontinuidade entre a 4ª e a 5ª série. No entanto, os
problemas existentes no cotidiano escolar dessas séries,
apesar de evidentes, parecem ser pouco discutidos pelos
professores e outros agentes escolares. A passagem da 4ª par
a
a 5ª série continua sendo um salto para o desconhecido, pois
os alunos são portadores de expectativas e medos que ne
m
sempre são tratados pelos agentes escolares. Para os
professores, trata-se de uma série com muitos desafios. As
mudanças e diferenças pedagógicas entre as duas séries
denunciam a fragilidade na estrutura de ensino cuj
a
organização parece falha e pouco condizente com as
determinações legais.
UNITERMOS: 5ª série; quinta série passagem da 4ª para 5ª série;
unidocência/pluridocência, Ensino Fundamenta transição.
;
l;
VI
SUMMARY
HAUSER, Suely Domingues Romero. The Elementary School transition from 4th to 5t
h
grade: a bibliographical summary. (1987-2004)
The following research mainly aims the analysis of the national scientific
production regarding the issue of the scholastic transition from 4
th
to 5
t
h
grade presented through Masters dissertations and Doctoral theses. More
specifically aimed was the identification and analysis of the quantity and
length of time as per productions, the graduate level of researchers,
regions in the country and institutions where studies originated.
Information was collected through the data base of CAPES, whereas
defended works from 1987 to 2004 were found. Key words used were: 5
t
h
grade, fifth grade, 5th + grade, transition from 4th to 5th grade, one
teacher per grade and diversified teachers per grade, elementary school,
transition. 14 Masters dissertations and 2 Doctoral theses were found.
The complete works were read and analyzed based on criteria defined by
the researcher; and in some cases in which this access was not possible,
the analysis considered the available summary in the data base portal.
The result of this research demonstrated that the elementary school still
deals with the problem of a break or discontinuity between 4
th
and 5
th
grade. Moreover, the existing problems regarding the scholastic day-to-
day of these grades, although evident, are barely discussed by teachers
and other scholastic agents. The transition from 4
th
to 5
th
grade continues
being a leap to the unknown, as students take with them expectations and
fears rarely treated by scholastic agents. Teachers are therefore faced with
numerous challenges. Changes and pedagogical differences between the
two grades denounce the fragile aspect found in the educational structure,
which appears faulty and not in line with legal determinations.
WORD-KEY: 5
th
grade, fifth grade; transi n from 4th to 5th grade; one teacher per
grade and diversified teachers per grade; elem ntary school, transition.
tio
e
1
Introdução
O tema da pesquisa que está sendo apresentada aborda a questão da transição
escolar de alunos de 4ª para a 5ª série do Ensino Fundamental. Essa transição a que me
refiro se caracteriza como um fenômeno educacional que vem carregado de mudanças
pedagógicas que podem exigir desses alunos uma adaptação mais ou menos tranqüila, se
considerarmos a rede de ensino e o contexto em que esses alunos estão inseridos.
Transição que pode se constituir em um problema para alunos de escolas da rede privada
quanto para os de escola da rede pública, mas também pode ser superado em ambas,
dependendo do tipo de trabalho pedagógico realizado.
Com base em minha prática pedagógica como professora de Língua Portuguesa na
rede pública e na rede privada, acredito que essa transição quase sempre vem envolvida
em medos e insegurança. Isso porque os alunos, ao chegarem à 5ª série, deparam-se com
muitos desafios: novas situações pedagógicas, maior número de professores, mais
exigências e cobranças etc. Entendo que, mais do que uma simples mudança de série, da
4ª para a 5ª série, essa transição revela, na prática, a fragilidade da estrutura educacional
que não atende às necessidades de adaptação desses alunos à nova série e ainda reforça a
idéia de descontinuidade entre essas duas séries.
O próprio MEC (Ministério da Educação e do Desporto), quando da elaboração
dos Parâmetros Curriculares Nacionais, reconheceu a existência de uma ruptura
desastrosa entre a 4ª e a 5ª série, afirmando a existência de uma relação direta dessa com a
repetência e a evasão.
2
Apesar de relevante, a revisão bibliográfica revelou que o tema da transição da 4ª
para a 5ª série tem sido diluído nas pesquisas sobre essas séries. Isso equivale a dizer que,
considerando a periodicidade analisada, o número de pesquisas que tratam da transição
escolar entre essas duas séries do Ensino Fundamental está diminuindo, ocorrendo anos
em que nenhuma pesquisa sobre o tema foi feita. Possivelmente, essa diluição tenha
relação direta com a emergência de outros problemas existentes na escola de Ensino
Fundamental.
O meu interesse por esse tema decorre da minha experiência como professora na
rede pública estadual desde 1992 e de uma constante preocupação com os efeitos dessa
transição no processo pedagógico. Nessa trajetória profissional que dura até hoje, passei
de professora contratada a concursada. E, enquanto contratada, minha condição na
atribuição de aulas realizada no início de cada ano letivo levava-me a “escolher” essas
turmas e séries deixadas pelos professores efetivos. O que no começo da carreira era falta
de opção tornou-se uma paixão.
Retomando minha trajetória, em 1994, já no final da gestão do então governador
do Estado Luiz Antônio Fleury Filho (1991-1994), iniciou nas escolas estaduais um
projeto denominado Escola Padrão, que visava à implantação de laboratórios, bibliotecas,
um professor coordenador pedagógico (PCP) por escola e horário de trabalho pedagógico
(HTP), período em que os professores estariam reunidos nas escolas para a preparação de
atividades, sendo para isso remunerados. No entanto, ao final do mandato desse
governador, o projeto tinha sido implantado em apenas 30% das escolas da rede.
3
A escola em que eu trabalhava participou desse projeto, e a diretora à época me
escolheu para assumir a função de coordenadora pedagógica. Em 1996, já na gestão do
governador Mário Covas, o projeto de Escola Padrão foi extinto, mas a função de
professor coordenador pedagógico continuou existindo, só que o acesso à função passou a
ser realizado via concurso interno elaborado por cada Delegacia de Ensino, hoje nomeada
Diretoria de Ensino.
Assim, em 1996, aprovada no referido concurso interno e aceita pelo Conselho de
Escola, dei continuidade ao trabalho como coordenadora nessa mesma escola até o final
do ano letivo de 1998, quando pedi desistência e voltei à função de professora de Língua
Portuguesa, a qual exerço até hoje. Depois de aceita pelo Conselho de Escola, tive de
optar entre a coordenação do diurno, que comportava um trabalho com professores de 1ª a
4ª série, os de 5ª a 8ª série e os de Ensino Médio, ou a do noturno, que teria somente
professores especialistas (da 5ª a 3ª série do Ensino Médio). Mas antes que fizesse minha
própria escolha, fui orientada a assumir a coordenação do período noturno.
Essa orientação dada pela vice-diretora e acatada por mim tem relação direta com
este trabalho de pesquisa e justifica esta introdução. A vice-diretora, que, por muitos anos,
fora diretora nessa escola, conhecia muito bem as relações de poder e força existentes
entre os professores. E, considerando esse conhecimento, ela acreditava que eu correria o
risco de não ser aceita pelas professoras polivalentes, isto é, aquelas que lecionavam
várias disciplinas para turmas de 1ª a 4ª série. O motivo da possível rejeição estava
relacionado ao fato de eu ser professora “especialista”, ou seja, lecionar uma ou duas
4
disciplinas afins para turmas de 5ª série em diante e não ter nenhum conhecimento mais
específico sobre o trabalho pedagógico realizado pelas professoras de 1ª a 4ª série.
Era fato também que eu não trabalharia só com essas professoras. No período
diurno, a escola oferecia também as demais séries do Ensino Fundamental (5ª a 8ª série) e
do Ensino Médio (1ª a 3ª série). Mas a resistência maior viria, certamente, desse grupo
muito bem-articulado e influente.
Por causa da pouca idade e inexperiência no magistério, fui facilmente convencida
a abrir mão da coordenação do diurno e assumir a do noturno. Também enfrentei
resistência por parte dos professores do noturno que me consideravam muito jovem e sem
experiência na educação para coordenar um grupo. Repensando hoje, acredito que essa
inexperiência, embora não tenha permitido todos os avanços desejados, foi, em parte,
superada por um forte idealismo, próprio daqueles que acreditam em seus sonhos e
desconhecem todos os perigos e artimanhas.
Após tantos anos na carreira e na rede estadual, tenho consciência dos muitos erros
cometidos, dos inúmeros desafios enfrentados e nem sempre superados. Mas, não posso
negar que essa experiência foi muito rica para mim, pois alterou em muitos aspectos
minha prática em sala de aula e me fez compreender um pouco melhor as relações entre as
pessoas dentro da escola, o cotidiano quase sempre árduo de alunos e professores e o
processo de ensino-aprendizagem.
5
Evidentemente, uma experiência tão particular não representa uma verdade
absoluta em toda a rede estadual, mas pode apontar que, de alguma forma e por alguns
motivos, os professores de 1ª a 4ª série e os de 5ª a 8ª série, bem como os de Ensino
Médio não executam um trabalho pedagógico integrado por causa das formações e
práticas docentes bem distintas. Duas realidades, duas escolas, dois mundos distantes.
A meu ver, um fato parece ter favorecido ainda mais esse distanciamento entre
esses professores da rede estadual paulista, causando impactos profundos também em
alunos e em suas famílias. Trata-se da Reorganização das Escolas da Rede Estadual,
implantada a partir do ano de 1996 em todo o Estado e que acabou incidindo na separação
dos alunos em prédios distintos. Assim, alunos de 1ª a 4ª série foram alocados em um
prédio; os de 5ª a 8ª série em outro; e, em alguns casos, os do Ensino Médio em outro,
ainda.
Essa reorganização veio como proposta no projeto “MUDAR PARA
MELHORAR: uma escola para a criança e outra para o adolescente”, veiculada para a
comunidade em forma de cartilha expedida pela Secretaria de Estado da Educação (SEE-
SP) e que trazia como argumento a necessidade de adequação das escolas, visando às
especificidades de cada faixa etária.
Além disso, conforme lembra Sabino (1999), à época, a secretária de Educação,
Teresa Roserley Neubauer, justificou que essa reorganização das escolas decorria da
urgência de se racionalizarem os recursos físicos, humanos e materiais e, sobretudo, da
necessidade de se rever o modelo pedagógico aplicado na rede. Ainda de acordo com o
6
texto publicado no Diário Oficial, tal medida “visava à revolução na produtividade dos
recursos públicos, que em última instância, deverá culminar na melhoria da qualidade do
ensino.” (D.O.E.; Sec. I , São Paulo. 105(56) de 23/03/1995, p. 08)
A pesquisa realizada por Nery (2000, p. 9, 19, 20) confirma que os objetivos dessa
reforma centravam-se na racionalização dos recursos públicos, expressa pela contenção
dos gastos públicos, uma vez que não se supunha aumento de verbas para a educação,
mas, sim, a realocação de recursos que, segundo a então secretária, eram mal gerenciados,
logo, desperdiçados; na descentralização no oferecimento do ensino público cujo objetivo
principal era a municipalização de parte do Ensino Fundamental (1ª a 4ª série) e na
desconcentração da administração que previa a implantação de um novo sistema de
gerenciamento e controle das escolas, no qual as DE (Diretorias de Ensino) passariam a
ser órgão intermediário entre a escola e a SEE-SP (Secretaria de Educação do Estado de
São Paulo) e os diretores deveriam ser capacitados para um melhor gerenciamento
escolar.
Nery afirma também como uma das principais características desse projeto a
separação entre 1ª a 4ª série e 5ª a 8ª série, apartando, assim, crianças e adolescentes. Tal
decisão pautava-se no fato de que o agrupamento de alunos e professores de 1ª a 8ª série
em único prédio não assegurou a eficácia pretendida quanto à racionalização e otimização
dos recursos humanos e materiais, a qualidade no atendimento às necessidades específicas
de aprendizagem dos alunos e as melhorias nas condições de trabalho do corpo docente.
7
Segundo Nery (2000), a sociedade civil reagiu com cautela a essas propostas,
sobretudo em relação à separação entre as escolas do Ensino Fundamental, e inúmeras
manifestações tomaram espaço na mídia e movimentos de pais, alunos e entidades
representativas dos professores se fizeram ouvir. Em sua pesquisa, esse autor apontou
alguns motivos para essas manifestações. A maioria das famílias indicava que a separação
das escolas traria sérias dificuldades por causa do acesso dificultado pelo aumento da
distância entre a moradia das crianças e as escolas, o que obrigaria os alunos a usarem
transporte, gerando um custo a mais para as famílias, e, além disso, alguns irmãos, que
iam e voltavam juntos da mesma escola, seriam separados.
Já os professores apontavam outras preocupações. Uma delas dizia respeito à
adaptação dos alunos que fossem da 4ª para a 5ª série que, além da mudança do número de
professores, teriam de conviver em um ambiente novo, não só em relação ao prédio
escolar, mas numa nova realidade, com outros colegas, com outro diretor, outros
inspetores e, às vezes, em outro bairro.
Além dessa preocupação, os professores alegavam que essa reorganização traria
muitas demissões, fato esse que se concretizou, uma vez que a reforma previa fechamento
de escolas e de salas de aulas e diminuição da carga horária diária das várias disciplinas
que compunham o Ensino Fundamental. Segundo o Sindicato dos Professores do Ensino
Oficial do Estado de São Paulo, APEOESP, essa reorganização acarretou cerca de 40 mil
demissões de professores entre os anos de 1995 e 1999. E o fator que mais contribuiu para
essas demissões foi justamente essa diminuição da carga horária. As escolas que
8
trabalhavam, no período diurno, com seis aulas diárias passaram a ter cinco e; no período
noturno, as cinco aulas foram reduzidas para quatro.
Ainda que a reestruturação tenha sido mantida, alguns aspectos dela foram
alterados. A Secretaria da Educação do Estado de São Paulo (SEE-SP), em atendimento às
exigências de atualização das normas que regulamentam a organização e o funcionamento
das escolas na rede pública estadual, previstas na Lei de Diretrizes e Bases nº. 9.394/96,
apresentou, em 15 de janeiro de 1998, a Resolução nº. 4, que dispunha sobre a
composição curricular e a organização escolar.
Com ela, a duração das aulas foi unificada em cinqüenta minutos, o currículo foi
reorganizado e a carga horária das disciplinas alterada. Além dessa medida, a SEE-SP
encaminhou ao Legislativo o Novo Plano de Carreira do Magistério, que foi aprovado
pela Assembléia Legislativa em 26 de dezembro de 1997. Apesar de todas essas medidas,
a ineficiência do sistema permanecia nos dados de evasão e repetência dos alunos e nos
gastos inúteis que se tornaram públicos de acordo com o Diário Oficial do Estado de São
Paulo.
“ ... em 1992, no ensino fundamental e médio, as perdas alcançaram 1.476.000
alunos, o que representa cerca de 25% do total de alunos matriculados na rede. Se
lembrarmos que cada aluno custa, em média, U$$ 200 para o Estado, o número
acima representa um desperdício da ordem de U$$ 324.720.000.” (D.O.E. Sec. I,
São Paulo. 105(56) de 23/03/1995, p.8)
E, mais uma vez, na tentativa de sanar esses problemas, a Secretaria de Educação
instituiu algumas medidas que visavam, ainda que de forma camuflada, à regularização do
fluxo escolar, o que causou indignação entre os professores. É o caso do regime de
Progressão Continuada aplicado às séries do Ensino Fundamental, o qual tem sido, até
9
hoje, interpretado como promoção automática por muitos professores e alunos; da extinta
Recuperação em Férias, que era realizada nas três últimas semanas de janeiro e oferecida
em caráter voluntário aos alunos encaminhados para uma escola-pólo.
Poderia também citar como outra medida criada para regularizar o fluxo escolar a
criação das Classes de Aceleração. Embora não tenha sido oferecida a todas as escolas, as
informações obtidas com alguns professores revelam que tanto o material oferecido
quanto a assessoria dados pela Diretoria de Ensino eram de qualidade e dignos de elogios,
mas o pouco tempo para a realização do trabalho, que se configurou um entrave, lembrava
mais um curso de supletivo.
Considerando minha experiência nessa rede, acredito que nenhuma dessas ações
resolveu efetivamente o problema da ruptura que se dá na transição da 4ª para a 5ª série.
Antes, penso que essa reorganização distanciou ainda mais os dois grupos de professores,
os de 1ª a 4ª série e os de 5ª a 8ª série, cujos saberes restringem-se ao próprio grupo.
Em conformidade com Truzzi (2001), os saberes dos professores de 1ª a 4ª série
são diferentes daqueles dos professores especialistas (5ª a 8ª série), e essas diferenças
dificultaram a integração que se desejava e se constituíram em promotores de ruptura
entre a 4ª e a 5ª série quando da reestruturação das escolas.
Para Silva (1999), a inexistência de uma troca pedagógica entre os dois grupos de
professores deve-se à predominância do aspecto da organização formal sobre a
10
pedagógica, que muito contribuiu para que as ações fossem desagregadas e
desagregadoras.
No entanto, desde a Lei de Diretrizes e Bases nº. 5.692/71, o ensino de 1º grau,
hoje denominado de Ensino Fundamental, é considerado contínuo, de oito anos com
obrigatoriedade para todos os cidadãos de sete a catorze anos. Dessa forma, ficaram
extintas as denominações “primário” e “ginásio”, bem como o “diploma” do Curso
Primário e o Exame de Admissão usado até então como instrumento de seleção para a
continuidade dos estudos a partir da 4ª série. Com isso, na teoria, sugere-se um ensino sem
fronteiras, sem dicotomia entre as duas etapas do ensino de 1º grau.
Para Domingues (1985), pode-se negar a existência dessa instituição escolar
contínua seja pela estrutura, pelos professores, pelo ritual pedagógico desenvolvido por
eles e pelo tratamento dispensado aos alunos. A respeito disso, Silva afirma que “essa
ruptura é uma fronteira ou uma forma de independência relativa entre as duas etapas do
Ensino Fundamental e, nos limites da 4ª e 5ª série, não se percebe que uma sucede a
outra”. (SILVA, 1999, p. 22)
Em relação à organização do ensino em ciclos na rede estadual, a problemática da
ruptura entre a 4ª e a 5ª série tornou-se mais evidente, pois não foram adotadas as tais
providências que garantissem a continuidade de um ciclo para o outro. Isso porque,
segundo LOPES (2006), a adoção dos ciclos depende de uma série de fatores, tais como
conjunturas administrativas, pedagógicas, infra-estruturais, especificidades dos contextos
escolares etc.
11
Além disso, Sousa (2000) afirma que esse regime ou sistema de ciclos requer uma
resignificação do processo de avaliação da aprendizagem dos alunos, demandando que o
professor trate o conhecimento como processo e com real acompanhamento dos alunos e
não sirva ao sistema educacional como uma forma de agilizar o fluxo escolar.
O problema também pode ser visto por outro ângulo. A reorganização do Ensino
Fundamental, a implantação do regime de progressão continuada e a organização dos
ciclos foram ações pensadas por especialistas nem sempre familiarizados com a realidade
do dia-a-dia das escolas públicas e não contaram com a participação dos professores.
Antes, colocou-os como meros executores. E resultados satisfatórios não podem ser
obtidos sem o envolvimento real de seus “protagonistas”, no caso, professores e alunos.
Embora considere relevantes todos esses aspectos citados, meu problema de
pesquisa não diz respeito a essas ações derivadas das políticas educacionais para o Ensino
Fundamental. Meu interesse consiste em saber como a questão da transição da 4ª para
a 5ª série tem sido estudada pelos pesquisadores nos trabalhos científicos, no caso,
dissertações de mestrado e teses de doutorado.
Assim, com o presente trabalho pretendo lançar um olhar sobre o tema da
transição, obedecendo às seguintes etapas. Na introdução, descrevo minha trajetória
profissional como ponto de partida para o interesse pelo tema, considerando a transição da
4ª para a 5ª série um período de mudanças de toda ordem, quer para o aluno, quer para o
professor, quer para a escola como um todo. Isso porque a transição entre essas séries está
inserida num contexto ainda maior, que é a organização estrutural da rede pública estadual
12
paulista que não prevê condições particulares para esses alunos e professores. Antes,
considera o Ensino Fundamental como um todo, único em oito anos, sem perceber a
ruptura existente entre os dois momentos: 1ª a 4ª série e 5ª a 8ª série. No capítulo 1, a
transição escolar da 4ª para a 5ª série é analisada sob vários aspectos. Desde a questão
legal, que determina o Ensino Fundamental em oito anos contínuos, mas mascara ou
desconsidera a ruptura evidente que se dá nessa passagem da 4ª para a 5ª série, até as
circunstâncias em que se dá essa transição: a mudança da unidocência para a
pluridocência, as novas exigências pedagógicas, a relação entre professor e aluno na 5ª
série, entre outros. No capítulo 2, apresento os objetivos gerais e específicos desta
pesquisa de caráter bibliográfico. No capítulo 3, todo o caminho metodológico é
percorrido desde a origem da bibliografia de apoio, da formação do corpus da pesquisa até
o delineamento e procedimentos de obtenção dos dados e de análise destes. O capítulo 4
trata as idéias centrais de cada trabalho que constituiu o material desta pesquisa, bem
como os resultados e análise destes. No capítulo 5 são apresentadas as conclusões.
13
1. A transição escolar da 4ª para a 5ª série
Toda e qualquer transição prevê mudanças e requer adaptações. De acordo com o
dicionário Aurélio (1988, p. 644-645), a palavra transição, entre outros significados, pode
ser entendida como a mudança de uma fase para a outra num sistema.
Na estrutura escolar, que é também considerada um sistema já que as partes
encontram-se coordenadas entre si e funcionam de forma organizada, os alunos passam
por períodos de transições. A começar pela passagem da Educação Infantil para a 1ª série
do Ensino Fundamental, depois da 8ª série para o Ensino Médio e, por fim, do 3º ano do
Ensino Médio para o Ensino Superior.
Em todas essas transições, a mudança de nível ou modalidade de ensino preexiste.
No entanto, a transição da 4ª para a 5ª série, a que me refiro nesta pesquisa, deveria se
caracterizar mais como uma passagem dentro de um mesmo nível de ensino do que uma
transição propriamente dita, considerando o sentido etimológico dessa palavra. Mas, na
prática, o termo que melhor exprime essa passagem é mesmo transição, marcada por uma
ruptura que parece ser responsável, entre outras coisas, pela reprovação ou pela evasão
escolar.
Lourencetti (1999) afirma, em sua pesquisa, que a passagem da 4ª para a 5ª série
apresenta características diferentes da passagem para outras séries e que, por isso, é
preciso atentar às condições peculiares desses alunos, pois as conseqüências dessa
14
passagem se refletirão no dia-a-dia dessa série e, possivelmente, nas séries restantes do
Ensino Fundamental.
Essa ruptura ou descontinuidade parece já ter sido reconhecida em documentos
oficiais e gerou uma publicação no D.O.E. (Diário Oficial do Estado de São Paulo), em
05/12/1995, onde se afirma:
“ ... quanto às reprovações na quinta-série, é preciso ter presente que este é um
momento de passagem em pelos desacertos apontados pelas pesquisas e sua análise
de causas, observa-se que os professores não estão e não são preparados para lidar
com essa passagem. O espírito de continuidade não foi alcançado ainda pela maioria
dos professores. Falta uma concepção orientadora do que deve ser um ensino
fundamental de oito anos.” (D.O.E., 1995, p.14)
O aluno concluinte da 4ª série que ingressa na 5ª série, independentemente da rede
de ensino ao qual pertence, sente de imediato algumas diferenças entre essas duas séries,
ou seja, percebe que não se trata apenas de uma passagem, ainda que não as compreenda.
Com base em minha prática, considero que, ao enfocar especificamente a
passagem da 4ª para a 5ª série, vários fatores interferem no desempenho dos alunos e, por
isso, justifica-se um olhar mais atento sobre seu cotidiano escolar, uma vez que a 5ª série
representa uma ruptura na vida desse aluno.
Em algumas escolas privadas, a própria organização curricular permite ao aluno a
experiência com a pluridocência antes da chegada à 5ª série. Mas, de uma forma geral e
sobretudo na rede pública paulista, seja ela municipal ou estadual, os alunos vêm a ter
essa experiência a partir da 5ª série.
15
Dias-da-Silva (1997), em sua pesquisa sobre a passagem da 4ª para a 5ª série,
afirma que é bastante comum o argumento recorrente sobre a alteração do número de
professores e/ou a fragmentação entre as disciplinas quando se discute o fracasso escolar
nas 5ª séries. Isso porque, segundo essa autora, por trás do número de professores está o
tipo de trabalho que concretizam, seus objetivos, seus conteúdos e seus fundamentos.
A mudança da unidocência para a pluridocência em si é um aspecto que requer do
aluno uma adaptação mais ou menos imediata, já que ele estará às voltas com muitos
professores entrando e saindo da sala de aula no intervalo médio de cinqüenta minutos. E
cedo perceberá que cada um desses profissionais tem personalidades distintas. E mais do
que isso, a experiência pluridocente revela a heterogeneidade didática desses professores,
levando os alunos a freqüentes e inevitáveis comparações.
Dias-da-Silva (1997) constatou também alguns aspectos da 5ª série que podem
explicar melhor essa transição e a conseqüente ruptura percebida nessa série. Para ela, a
dinâmica da 5ª série requer dos professores uma postura didática diferente daquela da
professora da 4ª série. Muitos professores entram e saem de salas e turmas diferentes, dão
suas aulas, cumprem seus programas e, quase sempre, não lhes sobra tempo de saber o
nome de todos os alunos ao longo do ano. Por conta disso, no início do ano letivo, é
comum os alunos de 5ª série sentirem certo saudosismo pela série e, principalmente, pela
professora anterior.
A flexibilidade de horário da professora de 4ª série favorece uma rotina de aula
mais próxima do aluno. Na 5ª série e a partir dela, é comum os professores apresentarem
16
variações de procedimentos e condutas, além da ausência de um trabalho coletivo,
evidenciada pela falta de integração entre as disciplinas e programas escolares. Além
disso, existe um distanciamento maior entre o professor de 5ª série e os alunos. Na 4ª
série, as trocas afetivas são favorecidas pelas conversas da professora com os alunos,
garantidas pelo tempo maior de permanência em sala de aula, nas correções dos cadernos
de tarefas, na apresentação das atividades de classe.
Outro dado importante a ser observado é a mudança de condição do aluno de 5ª
série. Os alunos da 4ª série, geralmente, são considerados “mais maduros e mais velhos
da escola, uma vez que estudam numa unidade ou escola onde ocorre a divisão ou
separação de alunos. Mesmo nas escolas particulares, é comum encontrarmos prédios
destinados a alunos de 1ª a 4ª série enquanto os de 5ª série em diante freqüentam outra
unidade. Esse fato de serem “os mais velhos” conferia-lhes certo “status de autoridade”
em relação aos alunos mais novos. Quando vão para a 5ª série, além da própria mudança
de prédio, eles serão considerados os mais jovens e “imaturos” da escola.
Apesar dessas contingências, com o tempo, esses alunos vão se adaptando à 5ª
série. Dias-da-Silva (1997) afirma que esses alunos vão se sentindo mais “soltos” na nova
situação, pois o medo e a insegurança do início passam a dar lugar a certa liberdade que
eles percebem ter com alguns professores e em alguns momentos, como por exemplo, no
intervalo entre as trocas de aulas. Entre uma aula e outra, quase sempre, ocorre a troca de
professores, e até a chegada do próximo professor, em geral, os alunos permanecem
sozinhos em suas classes. Esse momento revela-se oportuno para brincadeiras, saídas das
17
salas para os corredores, quando as inspetoras não estão vigiando, caracterizando uma
liberdade que antes eles não tinham com a professora da 4ª série.
Outra constatação feita por Dias-da-Silva (1997) refere-se à escolha, nem sempre
voluntária, dos professores pela 5ª série. Na rede pública, por exemplo, muitos professores
são levados pelo próprio sistema de atribuição de aulas a assumirem essa série, que nem
sempre é de sua preferência ou para a qual eles têm menos habilidade. Vale lembrar que
os diretores das escolas públicas possuem autonomia para atribuir as aulas e classes para
os professores, buscando a melhor adequação possível. No entanto, muitos desses
diretores não interferem nessas escolhas.
Com base em minha experiência concomitante em uma escola da rede privada,
percebi nesta a existência de uma preocupação pedagógica em adequar os professores às
séries com as quais eles tinham mais experiência, habilidade ou até mesmo preferência em
trabalhar, aumentando, com isso, as chances de êxito e satisfação desses profissionais.
A 5ª série revela novas exigências para esses alunos. Enquanto a professora de 4ª
série exigia do aluno um caderno bem feito, com letra bonita, capricho, muitos professores
da 5ª série querem que esses alunos sejam menos dependentes em suas ações e nem todos
exigem do aluno esses cuidados. No entanto, o aluno de 5ª série ainda sente necessidade
de aprovação do professor na realização das tarefas e, por essa razão, constantemente pede
a atenção do professor nas tarefas cotidianas de sala de aula, comportamento esse que,
com o passar do tempo, irá cessando ou se modificando. Essa necessidade de aprovação
relaciona-se à busca de instruções detalhadas e seguras sobre como executar as atividades
18
propostas assim como fazia a professora da 4ª série. Na 5ª série e a partir dela, muitas
vezes, essas instruções são dadas de forma generalizada aos alunos. O resultado é que
muitos alunos entendem e fazem, outros não entendem e perguntam novamente e outros,
ainda, não entendem e não têm coragem de perguntar novamente o que era para ser feito.
Além disso, essa falta de instruções detalhadas pode gerar as típicas perguntas de
“5ª série”: “é pra pular linha?”; “quantas linhas podem ser puladas?”; “é pra copiar o que
está na lousa?”; “é pra copiar com lápis ou com caneta?” etc. Essas e outras perguntas
incomodam muitos professores e são entendidas como imaturidade e resquícios de hábitos
da 4ª série.
Trata-se de uma série marcada por imposições e contradições para o aluno. Além
disso, a estrutura curricular na 5ª série sofre mudanças bruscas, caracterizadas pela
angústia do tempo e a quantidade, incidindo, muitas vezes, na queda do rendimento
escolar dos alunos da 5ª série. Dias-da-Silva (1997) observou que as queixas mais comuns
feitas nas primeiras reuniões com os pais desses alunos são relativas à queda no
rendimento. Muitos pais consideram essa série muito difícil para seus filhos e contam com
a colaboração do professor nessa transição.
Leite (1999) ressalta a necessidade de se garantir a continuidade na transição entre
a 4ª e a 5ª série e aponta dois grandes problemas capazes de interferir negativamente no
processo de ensino-aprendizagem dos alunos de 5ª série e, conseqüentemente, no
rendimento escolar destes: a estrutura e organização do sistema. As políticas educacionais
oficiais, por exemplo, nem sempre consideram a diversidade da escola, a situação
19
funcional do professor, a política salarial, a organização das turmas etc. Quanto à ordem
intra-escolar, por exemplo, a falta de seqüência intra e entre séries, a estrutura e
organização do currículo da escola, as exigências em relação ao cumprimento do
programa, as condições infra-estruturais inadequadas de trabalho na escola etc.
A análise da literatura sobre o tema leva à constatação de que é desejável que o
professor tenha uma atuação diferenciada ao trabalhar com os alunos de 5ª série. Segundo
Leite, as ações docentes devem ser guiadas pelo repertório inicial desses alunos e pelos
objetivos que se pretender atingir na série. Além disso, cabe aos professores organizarem
e orientarem suas práticas em função do comportamento dos alunos.
Considerando esses dois aspectos como parâmetros, Lopes (2006, p. 39-40),
sugeriu algumas orientações básicas para a atuação docente junto aos alunos de 5ª série:
Orientar os alunos quanto aos aspectos da estrutura e dinâmica da aula e da escola
(objetivos, procedimentos, normas, regras, posturas e atitudes esperadas);
Orientar os alunos quanto à organização acadêmica e pessoal (calendário escolar,
horário e cronograma das disciplinas, seqüência da aula, materiais didáticos, cadernos,
livros etc.);
Fornecer instruções no início e, se necessário, durante a realização de atividades;
Utilizar procedimentos e recursos de ensino (atividades em sala e extraclasse)
variados para desenvolver conteúdos/assuntos;
Acompanhar o desempenho dos alunos durante o processo de ensino, identificando
suas aprendizagens e dificuldades;
20
Dar devolutiva (feedback) aos alunos durante a realização de atividades e lhes
proporcionar formas para acompanhar o próprio desempenho, isto é, conseqüenciar as
suas ações, preferencialmente, reforçando-as positivamente, evitando o uso de punições;
Avaliar se os objetivos foram atingidos;
Avaliar sua atuação, observando o próprio comportamento ao ensinar, a maneira
como interage com os alunos em sala de aula e em outros ambientes da escola.
Todos esses aspectos relacionados à transição da 4ª para a 5ª série não encerram a
problemática. Antes, torna evidente uma realidade que, muitas vezes, é camuflada ou
confundida com outros problemas mais emergentes da escola, sobretudo, a pública.
Talvez possa parecer que o tema dessa transição esteja esgotado ou ultrapassado,
sobretudo porque a escola pública não convive mais com o “fantasma” da retenção na 5ª
série. No entanto, penso que a escassez de trabalhos científicos sobre esse tema tenha
outros motivos além deste. Espero, ao longo desta pesquisa, conhecer outros aspectos da
ruptura entre a 4ª e a 5ª série e, quem sabe, entender por que o tema desperta pouco
interesse nos pesquisadores, sabendo que a problemática persiste nas escolas e salas de
aulas.
De qualquer forma, acredito que a escola de Ensino Fundamental e,
principalmente, a 5ª série apresenta-se como um campo fértil para qualquer pesquisador,
seja pelos desafios e dilemas que ela impõe aos professores e demais funcionários da
escola, seja pelas dificuldades enfrentadas pelos alunos que chegam a essa série com
tantas expectativas e medos, seja pelo impacto que essa transição da 4ª para a 5ª série
provoca na família do aluno etc. Além dessas questões, entendo que outras relações
21
precisam ser estudadas, problemas precisam ser superados, sendo a questão da transição
da 4ª para a 5ª série um desses desafios
.
22
2. Problema e objetivos
Esta pesquisa de caráter bibliográfico tem por objetivo a busca pela identificação
de pesquisas já realizadas sobre o tema da transição da 4ª para a 5ª série, além de ser um
estudo para a verificação da produção científica na área.
De acordo com Gil (2002), esse tipo de pesquisa utiliza-se fundamentalmente das
contribuições dos diversos autores sobre determinado assunto para analisar as variadas
posições acerca de um problema ou tema. Segundo esse autor, sua maior vantagem reside
no fato de permitir ao pesquisador a cobertura de uma gama de fenômenos muito mais
ampla do que aquela que poderia diretamente junto aos sujeitos.
Além disso, é interessante saber como estão sendo conduzidos os trabalhos a
respeito da transição da 4ª para a 5ª série, quais os temas mais debatidos pelos autores
nesses trabalhos, o que tem sido relevante, o que falta discutir etc. Segundo Pacheco
(2003), analisar e avaliar o que se produz e quais os meios utilizados para sua
comunicação têm sido objeto de estudo de diferentes pesquisadores em distintas áreas do
conhecimento. Dessa forma, esse tipo de pesquisa permite mapear, entre outros aspectos,
o nível de conhecimento alcançado, tipo de informação que tem sido alvo da maior
atenção dos pesquisadores, as tendências etc.
23
É, portanto, o objetivo geral desta pesquisa:
Analisar a produção científica nacional sobre o tema da transição
escolar da 4ª para a 5ª série expressa em trabalhos de dissertações de
mestrado e teses de doutorado.
Além do objetivo geral, foram determinados os seguintes objetivos específicos:
Identificar os problemas de pesquisa mais estudados nesses trabalhos;
Identificar os sujeitos das pesquisas;
Analisar as produções sobre a transição da 4ª para a 5ª série, considerando
quantidade e temporalidade;
Identificar o nível de formação dos pesquisadores (mestrado ou
doutorado);
Identificar as regiões do país onde os trabalhos foram realizados;
Identificar as instituições onde esses trabalhos foram realizados;
Caracterizar o detalhamento da pesquisa (abordagem metodológica e
procedimentos de pesquisa);
Analisar os resultados e/ou conclusões apontados nas pesquisas realizadas.
24
3. Método
3.1. Tipo de material e fontes
O corpus de análise desta pesquisa constituiu-se de trabalhos encontrados na base
de dados da CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior),
onde constam resumos de trabalhos defendidos e publicados a partir de 1987.
O acesso foi feito a partir da busca virtual no Banco de Teses que faz parte do
Portal de Periódicos da Capes/MEC disponível em:
<http://servicos.capes.gov.br/capesdw>. “Acesso entre janeiro e julho de 2006”. Nele se
encontram informações sobre teses e dissertações defendidas junto a programas de pós-
graduação do país a partir de 1987. Desta busca resultaram catorze dissertações de
mestrado e duas teses de doutorado arroladas a partir das palavras-chave: 5ª série, quinta
série, 5ª + série, passagem da 4ª para a 5ª série, unidocência e pluridocência, ensino
fundamental, transição.
No entanto, uma tese, a de Domingues (1985), é anterior ao período definido para
esta pesquisa (1987-2004) e, por isso, não foi computada nos dados. Assim, o corpus da
pesquisa ficou constituído de catorze dissertações de mestrado e uma tese de doutorado.
A escolha por essa fonte de dados deve-se ao fato de se entender que esses são
alguns dos produtos que expressam o avanço do conhecimento em nosso meio. Além
disso, esta pesquisa considerou também algumas referências bibliográficas e citações
encontradas nos trabalhos pesquisados. A análise crítica desse material deverá permitir
25
algumas conclusões sobre o tema da transição da 4ª para a 5ª série, além de apontar como
ele tem sido tratado nesses trabalhos e o que ainda falta ser estudado sobre o tema.
3.2. Procedimentos de coleta de dados
Com relação aos procedimentos metodológicos requeridos para a elaboração desta
pesquisa, seguem algumas especificações sobre cada uma das etapas cumpridas. Um
primeiro passo foi o levantamento bibliográfico sobre o tema da transição escolar entre a
4ª e a 5ª série. Para isso, algumas leituras foram importantes no planejamento e condução
deste trabalho; outras serviram como contexto para a tomada de decisões e para a
identificação de lacunas existentes na literatura, garantindo a relevância da pesquisa.
De acordo com Luna (2003), a pesquisa visa à produção de um conhecimento
novo, relevante teórica e socialmente e fidedigno. Assim, um segundo passo foi a
determinação do corpus da pesquisa, ou seja, o que realmente entraria como material de
análise. Inicialmente, a idéia era analisar dissertações de mestrado, teses de doutorado e
artigos publicados em periódicos científicos.
No entanto, uma pesquisa inicial junto aos bancos de dados disponíveis (Biblioteca
Virtual de Psicologia; LILACS [Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciência da
Saúde]; e SCIELO [Scientific Eletronic Library Online]) evidenciou a não existência de
artigos que tratassem especificamente da transição escolar da 4ª para a 5ª série.
Esse fato determinou uma mudança de estratégia de pesquisa e, por fim, o corpus
da pesquisa ficou reduzido às dissertações e às teses encontradas no Banco de Teses da
26
Capes. O critério de periodicidade (1987 a 2004) foi também determinado pelos resumos
registrados nesse banco de teses, onde são encontrados trabalhos defendidos de 1987 a
2004.
Como resultado natural das etapas anteriores, o próximo passo foi a determinação
do problema de pesquisa e da metodologia mais adequada para a obtenção das
informações necessárias para resolvê-lo. Dessa forma, os títulos e resumos dos trabalhos
informados nesse banco de teses foram selecionados de acordo com a adequação ao tema
e problema de pesquisa e incluídos no possível corpus da pesquisa.
No entanto, tenho de manifestar como dificuldade a insuficiência de informações
contidas nos resumos desses trabalhos aos quais não tive acesso em tempo hábil. Em
concordância com Witter (2005), os programas de pós-graduação e de outras instituições
de pesquisa deveriam ficar mais atentos, por exemplo, à qualidade dos resumos remetidos.
Alguns resumos são incompletos, mal elaborados e mesmo mal escritos.
Como as leituras dos resumos foram insuficientes, e não me possibilitariam uma
visão ampla das pesquisas realizadas, optei por ler integralmente todos os quinze
trabalhos. No entanto, três dessas pesquisas não foram obtidas a tempo junto às
bibliotecas de origem. Desses três trabalhos, considerei como fonte de informação os
resumos encontrados no banco de teses, apesar da limitação destes. Após a leitura de cada
trabalho, elaborei resenhas descritivas que se constituíram no meu material de análise.
27
Apesar da periodicidade da pesquisa ser a partir de 1987, uma tese de doutorado,
defendida em 1985, sobre a transição da 4ª para a 5ª série foi encontrada no acervo da
Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Dada a importância desse
trabalho para esta pesquisa, não pude excluí-lo. Ele se encontra citado nas referências
bibliográficas e no capítulo de resultados a título de informação.
3.3. Procedimentos de análise de dados
Para analisar os dados coletados a partir das leituras dos trabalhos e/ou dos
resumos destes, um corpus de pesquisa foi formado com as resenhas que foram sendo
feitas após cada leitura. De posse desse material e dos objetivos inicialmente traçados para
esta pesquisa, os resultados foram sendo analisados a partir das semelhanças e diferenças
de pontos de vista, dos aspectos comuns sobre a transição e a ruptura entre a 4ª e a 5ª
série.
O olhar de cada pesquisador sobre o mesmo tema proporcionou uma visão mais
ampla dos problemas vivenciados pelos professores e alunos na 5ª série e um “diálogo”
bem interessante entre os autores. Os caminhos e descaminhos possíveis, as sugestões
foram sendo captadas e os resultados discutidos no conjunto desses trabalhos. Era como se
esta pesquisa estivesse sendo feita a várias mãos, com múltiplos olhares, com diferentes
sujeitos e em lugares distintos. No entanto, todos os resultados apontavam os mesmos
problemas. Essa possibilidade de troca e diálogo entre todos os trabalhos e seus
pesquisadores serviu de base de análise desses dados coletados.
28
4. Análise e discussão dos resultados: o que “dizem” as pesquisas sobre o tema
da transição da 4ª para a 5ª série.
Este capítulo tem como objetivo apresentar os principais aspectos apontados nos
trabalhos pesquisados entre os anos de 1987 a 2004 sobre o tema da transição escolar da
4ª para a 5ª série e discuti-los.
Em ordem cronológica, os autores das pesquisas analisadas foram Campitelli
(1989), Dias-da-Silva (1992), Ferrari (1996), Almeida (1996), Lourencetti (1999), Silva
(1999), Sabino (1999), Alves (1999), Lourenço (2000), Bossa (2000), Rangel (2001),
Santana (2001), Truzzi (2001), Araújo (2003) e Puchalski (2004).
O trabalho de Domingues (1985), a princípio, não faz parte do corpus desta
pesquisa, se considerado o período determinado para a revisão bibliográfica (1987-2004).
No entanto, dada a importância de seu trabalho e dos resultados nele obtidos, o mesmo
não pode ser desprezado. Por isso, a título de conhecimento, ele será descrito neste
capítulo, mas não computado nos resultados e discussões desta pesquisa.
Domingues (1985) tomou como base estudos que demonstraram serem as
expectativas uma variável importante no desempenho de alunos e professores. Nesse
sentido, analisou as expectativas de nove professores, sendo dois de 5ª série e sete de 4ª
série, além dos cento e quatorze alunos de 4ª e de 5ª série sobre o papel de ambos nessas
duas séries. Também procurou saber quais mudanças esses alunos enfrentavam na
transição entre essas séries. Os dados obtidos evidenciaram que a 4ª e a 5ª série se
29
constituem em duas realidades distintas, seja pelo ritmo de desenvolvimento mais lento na
4ª série e mais acelerado na 5ª série, seja pelo fato desses professores considerarem que os
alunos na 5ª série apresentam uma queda no rendimento e uma diminuição na atenção às
aulas, além de se tornarem mais indisciplinados. Para esses professores, esses
comportamentos decorrem do aumento no número de professores na 5ª série e,
conseqüentemente, do aumento na quantidade de lição a ser estudada. No entanto, a autora
questionou se essas mudanças não seriam, na verdade, decorrentes das diferenças de
estrutura existentes entre essas duas séries. Dentre essas diferenças, estaria o fato de a
escola, “ao abrir as portas” para os alunos de 5ª série, modificar rapidamente suas
expectativas em relação a alguns comportamentos de alunos de 4ª série. Além disso,
poderiam ocorrer diferenças de expectativas entre professores de 4ª e 5ª séries quanto ao
papel do aluno e também uma falta de consenso entre as expectativas que o aluno de 5ª
série tem em relação ao próprio papel e as expectativas que o professor de 5ª série tem em
relação a ele. Ela destacou ainda alguns fatores que poderiam interferir no desempenho do
aluno de 5ª série: mudanças estruturais, a interação com mais professores e não mais com
um; o fato de eles se depararem com um conjunto de matérias e conteúdos novos. A
autora ainda levantou como hipóteses alguns aspectos importantes dessa transição.
Segundo ela, a escola de 1º grau (hoje Ensino Fundamental) cobra dos alunos de 5ª série
papéis diferentes dos que vinham desempenhando durante as quatro primeiras séries, e
essa cobrança está baseada nas expectativas de que a 5ª série dá início à segunda fase do
1ª grau e se constitui uma nova etapa escolar para o indivíduo. Ao apresentar um volume
significativo de dados, esta pesquisa demonstrou que existe uma falta de coerência entre a
expectativa dos alunos de 4ª série ao chegarem na 5ª série e também uma falta de
consenso entre professores e alunos quanto ao papel de aluno, seja no final da 4ª série, no
30
início e no final da 5ª série. Além disso, os resultados apontaram que a rápida passagem
da 4ª para a 5ª série pode levar o aluno a enfrentar situações divergentes para as quais ele
não está preparado. Em suas conclusões, a autora afirma o ensino de 1º grau determinado
em lei para ser contínuo e único nos oito anos de duração, mas, na prática, não ocorre
dessa forma, seja pela estrutura, pelos professores e pelo ritual pedagógico desenvolvido
por eles e pelo tratamento dispensado aos alunos. Assim, continuam a existir duas
realidades distintas: a 1ª e a 2ª fase do 1º grau. Segundo ela, o desconhecimento das
dificuldades que os alunos enfrentam ao chegarem na 5ª série leva a escola a não tomar
providências a fim de minimizar essas dificuldades que podem contribuir para os altos
índices de evasão e retenção verificados na 5ª série.
O trabalho de Campitelli (1989) foi um dos quais não tive acesso a tempo de
terminar esta pesquisa. Tomei como base o resumo encontrado no banco de teses.
Infelizmente, a falta de informações básicas sobre o trabalho realizado impossibilitou
qualquer análise sobre ele. Segundo o que consta no resumo, essa pesquisa de natureza
qualitativa trata da transição entre os dois ciclos do primeiro grau (Ensino Fundamental),
considerando as implicações psicossociais, pedagógicas e técnico-administrativas e os
diversos níveis e fatores que interagem neste processo.
Dias-da-Silva (1992), em sua tese de doutorado, teve como objetivo captar os
fundamentos e especificidades que sustentam o fazer docente cotidiano dos professores de
5ª série. Para isso, numa abordagem etnográfica, a autora realizou um trabalho de campo
em duas escolas públicas estaduais (uma no centro e outra na periferia) na região de
Araraquara, com duas turmas de 5ª séries, com seus alunos, professores, funcionários,
31
diretores e pais. Este estudo incluiu prioritariamente observações sistemáticas e contínuas
em sala de aula, na sala dos professores, reuniões de pais, festas juninas e recreios,
incluindo participação em conselho de classe e série e atividades extra-escolares. Foram
realizadas entrevistas informais com os professores e as crianças ao longo de um semestre.
Para os alunos, foi solicitada, ainda, uma redação específica sobre as diferenças e
semelhanças entre a 4ª e a 5ª série. Os resultados apontaram que o saber docente parece
assentado em valores e crenças simbolicamente imprescindíveis, mas, muitas vezes, com
concepções frágeis para a afirmação do trabalho e do papel dos professores. Em relação à
escola de 1º grau, a organização didática parece cristalizar o fazer docente ao negar tempo
e condições para que o pedagógico seja efetivado. Esse fazer docente, geralmente, ocorre
de forma pragmática, pouco crítica e/ou criativa. No entanto, os professores trabalham
apesar dos dilemas cotidianos que confrontam o papel e a função que se atribuem a esses
profissionais que convivem com conflitos e com a impotência no seu cotidiano. Além
disso, evidencia-se uma ruptura entre a 4ª e a 5ª série como uma passagem sem rito, já que
não há sinais de mudança, seja para professores, seja para alunos. No entanto, essa
passagem explicita-se nos diferentes saberes e fazeres implicados no cotidiano das
professoras “primárias” (1ª a 4ª série) e “secundárias” (5ª a 8ª série). Em suas conclusões,
a autora aponta que o fazer docente bem-sucedido parece ser aquele em que o professor
reconhece as contradições vividas no cotidiano escolar e detecta as incongruências entre o
que fazem e as pistas dadas pela classe; é capaz de tomar essas evidências como base para
reflexão crítica e alteração do seu saber e fazer docentes, superando o impasse e a
impotência implicados em dilemas para transformar crítica e simultaneamente sua
concepção e ação. Segundo ela, qualquer tentativa de transformar a escola e seu cotidiano
deve reconhecer e respeitar a “voz do professor” para que esse se expresse, já que ele só
32
mudará sua ação ou fazer caso o novo seja coerente com seu referencial e traga a ele
conseqüências desejáveis para seu trabalho.
Ferrari (1996) objetivou, em seu trabalho, a identificação das percepções que os
professores têm das necessidades de seus alunos de 5ª série e como esses procuram lidar
com elas nas situações em sala de aula. Sua hipótese era a de que os professores de 5ª
série não tinham um bom relacionamento com seus alunos e tinham dificuldades em
manter um diálogo que não se traduzisse em cobranças e lições de moral e que as
interações eram formais em sua maioria. Para isso, realizou a pesquisa em uma escola
pública municipal com seis professores de 5ª série, e o instrumento utilizado para a coleta
de dados foi a entrevista. Os resultados apontaram que, embora os professores
identifiquem algumas necessidades desses alunos, nem todos lidam adequadamente com
elas e, por isso, não conseguem satisfazê-las de forma a contribuir para o desenvolvimento
afetivo, cognitivo e motor dos alunos que estão sob sua responsabilidade. Dentre essas
necessidades identificadas estão: atenção, carinho, contato físico, ser ouvido, rebeldia,
motivar-se pelo conteúdo, participar da aula, limite, disciplinar, aprender, ser responsável
pelo material escolar, pertencer a um grupo social, compreensão, afeto, sentir-se útil, ter
pré-requisitos, segurança, questionar, participar do processo de elaboração disciplinar, ter
conteúdo interessante e adequado, maior proximidade com o professor, oposição, respeito
às suas condições de vida e suas possibilidades, de não se sentir diferente dos outros em
relação às suas condições existenciais, contar com a disponibilidade do professor, de
gostar da matéria e de ter uma escola profissionalizante. Os dados obtidos apontaram que
alguns professores em suas práticas mantêm uma relação de autoritarismo e
distanciamento do aluno, mas alguns procuram perceber com mais atenção o jovem que
33
está à sua frente. Tomando como referencial teórico as idéias de Henry Wallon, ela afirma
que o professor tem um papel de destaque na atividade educativa e deve usá-lo de forma a
efetivar a satisfação das necessidades que o jovem de 5ª série tem de respeito, justiça,
aventura, reciprocidade, conhecimento, movimento, participação e oposição. Em
contrapartida, o professor não deve esquecer ou negligenciar suas próprias necessidades
sob o risco de não atingir o prazer de ensinar, condição indispensável para uma efetiva
aprendizagem. E conclui que a ação pedagógica só se completa ao contemplar as
necessidades do aluno e do professor, parceiros que são da relação pedagógica.
Almeida (1996), em sua pesquisa, preocupou-se em decodificar a mensagem da
criança da 4ª e 5ª série contida nos textos livres criados por elas em resposta a duas
indagações. Essa pesquisa, no entanto, teve origem em uma anterior realizada pela
pesquisadora em 1984 com alunos das mesmas séries, o que deu a esse trabalho um
caráter de pareamento e um aspecto longitudinal. Em ambas as pesquisas, o aluno da 4ª
série foi questionado sobre qual era sua expectativa em relação à 5ª série, e ao aluno já da
5ª série como era a vivência dele nessa série. Os resultados demonstraram que, para a
“criança”, as esperanças, as ansiedades, as angústias, os encantos e os desencantos da 5ª
série são iguais nas duas pesquisas, apesar do intervalo de tempo entre uma e outra (1984
e 1995). Para essa criança, a 5ª série apresenta-se como uma ardilosa armadilha e acena
com novidades curriculares como medida de crescimento. Segundo a autora, fatores de
exclusão preexistem e contribuem para o fracasso escolar nessa série. Dentre eles, a
estrutura atual de ensino público, que separa alunos de idades e séries em prédios
diferentes, dando um aspecto retrospectivo de ruptura a essa transição da 4ª para a 5ª série,
algo semelhante à divisão física anterior à lei nº. 5.692/71. Entre esses fatores está o
34
ensino massificado nas escolas públicas, com classes superlotadas, jornada docente árdua
e sofrida, favorecendo a falta de sensibilidade, de amor e de fantasia nas escolas. Para a
autora, esses fatores não podem ser responsabilizados diretamente pelo fracasso escolar,
mas podem ser excludentes ou não dependendo do tratamento pedagógico que lhes é
dado.
Lourencetti (1999) pretendeu, nessa pesquisa, conhecer quais eram as dificuldades
e/ou dilemas que os professores vivenciavam numa sala de 5ª série e como percebiam ou
enfrentavam essas situações. Para isso, a autora entrevistou duas professoras de 5ª série e
aplicou um questionário a uma turma da mesma série. Os resultados confirmaram a
existência de dificuldades vividas por professores nas turmas de 5ª série e apontaram
como problemas: o comportamento inadequado dos alunos com relação às regras
escolares, o fato de a 5ª série parecer um dilema para os professores por causa das suas
características muito particulares, o programa, que parece não atender ao ritmo dos
alunos, o não-domínio de conteúdo por parte de alguns professores, que acomodados não
encaram a mudança como uma necessidade ou mesmo um desafio a ser enfrentado e
superado, e a indisciplina que, mais do que valorizada, é necessária. Na ótica desses
professores, a 5ª série diferencia-se das outras séries por ser considerada a mais difícil e
problemática para a consecução do trabalho docente e dos objetivos de ensino. Além
disso, apresentam dilemas que impedem a atuação desses profissionais em sala de aula. A
autora ainda pesquisou outros trabalhos relacionados à 5ª série, e estes apontaram outros
aspectos que caracterizaram a passagem da 4ª para a 5ª série. Entre esses aspectos estão: o
aumento do número de professores, os diferentes tipos de aula ministrados por cada
professor, o tempo de duração de cada aula, as exigências de cada professor, a ausência de
35
integração entre professores da 4ª e da 5ª série, as expectativas que os professores têm dos
alunos quando estes chegam à 5ª série, o tratamento diferente que os alunos recebem na 4ª
e na 5ª série, o relacionamento professor-aluno, a idade dos alunos etc. Esses dados
demonstraram que a passagem da 4ª para a 5ª série apresenta características próprias, o
que a difere da passagem para outras séries, e que a ruptura entre a 4ª e a 5ª série parece
estar relacionada ao que ocorre dentro da sala de aula, ou seja, diretamente ligada ao
trabalho docente.
Silva (1999), apoiada nos conceitos do Materialismo Histórico para a compreensão
da relação entre teoria e prática docente, teve como problema de pesquisa saber as
características do trabalho pedagógico nos componentes curriculares de Estudos Sociais
e/ou Geografia e que fatores presentes nesse trabalho evidenciavam a ruptura no processo
de ensino-aprendizagem entre a 4ª e a 5ª série do Ensino Fundamental. Para isso,
entrevistou seis professores de 4ª série e suas respectivas turmas e seis professores de 5ª
série e suas respectivas turmas, num total de 352 alunos. Seu trabalho considerou as
formas de organização do trabalho pedagógico desenvolvido em seis escolas públicas,
sendo três municipais e três estaduais na região de Campinas. A partir das intenções
expressas em planejamentos e aspectos observados no cotidiano das ações em sala de
aula, foram considerados aqueles que se constituíam em promotores da ruptura. Os dados
obtidos demonstraram que a ruptura existente nos limites da 4ª para a 5ª série constitui-se
uma fronteira entre as duas etapas do Ensino Fundamental, pois não se percebe que uma
sucede a outra, sendo esse o principal fator que faz da 5ª série um salto no desconhecido,
uma transição difícil. Além disso, a autora afirma que, pelo fato de não existir uma
integração entre os professores dessas duas séries, os rituais de passagem da 4ª para a 5ª
36
série continuam inflexíveis. Essas “marcas da transição” de uma série para outra situam-se
justamente nos conteúdos que são selecionados para uma e para outra série, bem como na
forma de desenvolvê-los, e que ambos se constituem em obstáculos a uma passagem “não
percebida”. Além desses, outros aspectos dessa transição foram observados. Por exemplo,
o ritmo mais lento na 4ª série, sem atropelo do tempo, pelo fato de ser conduzido por uma
única professora e uma tendência a diferenciar qualitativamente o aluno dessas duas
séries. Isso equivale a dizer que ao aluno da 5ª série é cobrada maior independência na
realização das atividades, sendo que os professores passam a contar com isso para o
desenvolvimento dos conteúdos; a existência de um exercício constante de controle
disciplinar na 5ª série, que já começa com a “conferência” de presenças/ausências como
um ritual autoritário. Assim, segundo a autora, a relação professor-aluno é um fator de
diferenciação entre essa e a 4ª série, pois na 4ª série estão mais evidentes e presentes as
manifestações de afetividade. A autora aponta também a descontinuidade curricular entre
as duas séries e afirma que esta decorre de ações pedagógicas isoladas de professores. E
sintetiza que essas ações isoladas entre professores de 4ª e de 5ª série cristalizam a ruptura
no processo de ensino-aprendizagem porque derivam de um sistema que considera uma
organização que “separa os tempos da mesma forma que separa as ações e seus agentes”.
(SILVA, 1999, p. 165)
Sabino (1999) afirma, em sua pesquisa, que a 5ª série apresenta-se como um
“enigma” a ser desvendado por todos na escola e destaca um mote de que essa série é uma
ponte pênsil mal-ancorada, uma vez que os comportamentos e as atitudes desses alunos
provocavam reclamações vindas não só de professores, mas de inspetores e serventes da
escola. Partindo disso, a autora pretendeu pesquisar as causas que interferiam ou
37
contribuíam para o desencanto, a agressividade, a falta de respeito e o fracasso escolar
desses alunos e, ao mesmo tempo, identificar atitudes que contribuiriam para a criação
dessas atitudes consideradas indesejáveis. Para tanto, entrevistou 24 alunos de 5ª série, um
pai de aluno, a diretora, professores de 5ª série e inspetores de uma escola pública. Os
resultados obtidos apontaram que é preciso compreender a dinâmica da 5ª série atual,
partindo do entendimento da situação após a reorganização do ensino público no Estado
de São Paulo, que separou alunos de 1ª a 4ª e os de 5ª série em diante em prédios
diferentes. Além disso, os resultados revelaram a existência de um sentimento de
marginalidade nos alunos, seja em relação aos professores, seja ao sistema que os abriga.
Segundo a autora, a escola não está conseguindo acompanhar as mudanças céleres da
sociedade nem correspondendo aos seus objetivos no que se refere ao seu papel de
formadora do homem e do cidadão. Em suas palavras, “a escola perdeu o bonde da
história, uma vez que, nascida para oferecer o saber elaborado, não oferece hoje nem
conteúdo e nem formação”. (SABINO, p. 128) A autora ainda levanta outros aspectos
dessa transição. Para ela, a família parece estar divorciada e descompromissada com o
dia-a-dia de seus filhos na escola, fazendo com que a escola assuma um papel mais social
do que educacional. Quanto aos alunos da 5ª série, eles não são mais os mesmos que
cursavam a 4ª série. Passaram por uma metamorfose biológica que os faz sofrer angústias
e incertezas em busca do novo eu. Psicologicamente afetados e socialmente mais
cobrados, eles não sabem como se comportar, já que deles são exigidas coisas das quais
ele não sabe. A sala de aula parece hostil e desorganizada e a falta de materiais didáticos
compromete a qualidade do ensino. Além disso, a metodologia usada em sala de aula
parece reduzir-se à exposição oral dos conteúdos e ao uso da lousa, gerando monotonia e
postura passiva nos alunos. Observa-se uma falta de interesse em aprender em decorrência
38
da falta de habilidade do professor em ensinar. Tanto professores quanto alunos sentem-se
esmagados por um sistema que, embora possibilite a escolarização, impede a ambos de
dar e receber um ensino de qualidade.
Alves (1999) teve por objetivo de pesquisa a identificação das percepções que os
pais têm dos seus filhos/alunos na passagem da 4ª para a 5ª série e o impacto que essa causa
na família. Sua experiência como coordenadora pedagógica e psicóloga escolar apontou a
preocupação de muitos pais em relação a essa transição. Para ela, muitos pais apresentam
dificuldades para lidar com seus filhos nessa fase que, embora transitória, é marcada por
outras mudanças além das escolares. Nesse período, o aluno entra na puberdade, e
mudanças físicas, fisiológicas, psíquicas e sociais são percebidas.
Os resultados obtidos em entrevistas com 32 alunos de 5ª série (uma turma), duas
professoras de 5ª série e três mães de alunos apontaram que a família percebe uma
mudança nessa passagem da 4ª para a 5ª série como uma ruptura e detecta as possíveis
mudanças pedagógicas e delas se queixa. Assim, a entrada na 5ª série é mais uma das
mudanças a que esse aluno está sujeito. Ele passa a conviver com um maior número de
professores numa relação mais distante, passa a ser considerado o mais imaturo em relação
às séries subseqüentes quando antes era o mais maduro em relação às séries iniciais. Em
relação a essa transição, a autora cita a existência de uma ruptura no Ensino Fundamental
entre a 4ª e a 5ª série. Para ela, a presença de denominações como “primário” e “ginásio
na fala de pais, alunos e professores confirmam a percepção deles em relação a essa
separação entre as duas fases escolares. A autora sintetiza os principais dados da pesquisa,
afirmando que essa passagem constitui um momento de mudança, de ruptura e vem
39
acompanhada de expectativas e de medo para o aluno. No entanto, a visão que ele tem da 5ª
série não é própria, mas resulta daquela que os pais e professores lhe transmitem. Os
resultados da pesquisa apontam que as maiores dificuldades na 5ª série são o maior número
de professores e de disciplinas cujos conteúdos são diferentes e sem a seqüência necessária.
A superação do medo é feita pela adaptação do aluno após o primeiro bimestre quando ele
percebe que as mudanças ocorreram, mas que estas podem ser acompanhadas por ele. Já os
professores têm dificuldades de lidar com os alunos da 5ª série, seja pelos hábitos e atitudes
trazidos da 4ª série, seja pela falta de preparo na sua própria formação, que os levam ao
desconhecimento do trabalho pedagógico realizado até ali, causando uma ruptura nessa
prática, dificultando o desempenho do aluno e preocupando a família. Essas dificuldades
refletem-se na sala de aula, levando o professor de 5ª série a culpar, por desconhecimento, a
professora da 4ª série, aumentando a distância que separa esses dois grupos de professores.
No entanto, alguns professores conscientes de sua responsabilidade estão buscando
soluções para facilitar seu trabalho e fazer a integração com as séries iniciais a fim de
facilitar a adaptação do aluno. A família, foco central dessa pesquisa, também percebe a
ruptura e sente os impactos como conseqüência das mudanças ocorridas com os alunos e
professores e na estrutura do curso, constituindo o fato em um rito de passagem. Mas a
superação não é total, pois as mudanças continuam a acontecer, agora por conta da
mudança do comportamento do adolescente. Mesmo assim, a família busca se adaptar a fim
de minimizar a angústia que toma conta de seus membros. Essas conclusões sugerem à
escola uma reflexão de sua prática pedagógica e de seu currículo, além da conscientização
do corpo docente por meio de estudos periódicos, da qualidade de suas relações, sejam
entre si, com os alunos ou com a família, visando suavizar o impacto causado e auxiliando
na adaptação desses alunos.
40
Lourenço (2000) inicia sua pesquisa tendo como ponto de partida os altos índices
de fracasso escolar na 5ª série e as dificuldades dos professores em trabalhar com essa
série. Para isso, procurou identificar em entrevistas com quatro professores considerados
bem-sucedidos com essa série as especificidades no trabalho realizado e as fontes desse
saber docente. Os resultados indicaram a existência de um mal-estar docente mesmo entre
os professores considerados de sucesso, e sentimentos de impotência e desilusão diante da
realidade escolar do século XXI. Além disso, os dados apontam que esses professores
reconhecem a existência de especificidades relacionadas aos problemas e às dificuldades
dos alunos em relação à 5ª série e a necessidade de adaptação tanto do aluno quanto do
professor. Embora eles a considerem uma série “complicada” para trabalhar, como as
pesquisas já têm apontado, esses professores têm um concepção diferente sobre os alunos,
pois reconhecem que são crianças, dependentes e que estão em fase de adaptação.
Reconhecem também que esses alunos precisam de orientação para se familiarizar com as
regras escolares, para organizar seus cadernos e seu horário de aulas com todas as
matérias e professores, a fim de buscar a maturidade desejada por todos os professores. A
análise dos resultados apontou que a forma de os professores interpretarem as diferenças e
dificuldades da 5ª série e seus alunos parece se relacionar diretamente com a preferência
que têm em trabalhar nessa série, com os “olhares” diferentes e a identificação com a
faixa etária dos alunos. A 5ª série parece ser uma série na qual o professor se sente
realizado, tanto pessoal como profissionalmente, pelos seus resultados que são mais
observáveis. E, ao fazer um balanço final dessas especificidades da 5ª série, a autora
afirma a existência de dois grandes princípios de ação na prática pedagógica que norteiam
os procedimentos e/ou atitudes profissionais apontados pelos professores entrevistados
como provocadores do sucesso com as 5ª séries: a) ter paciência/dar tempo para o aluno
41
aprender e b) conhecer o aluno/partir do que o aluno sabe. A autora destaca que uma
possível semelhança com a professora da 4ª série pode ser um perfil de bom professor
para a 5ª série, apesar de uma crítica velada ao trabalho realizado pelas professoras
primárias. Esse perfil de bom professor engloba aspectos relacionados à interação
instrucional dos alunos, tais como o uso de vocabulário acessível ao aluno, a forma de
conduzir a atividade, o aproveitamento das contribuições das crianças, o compromisso dos
professores com a tarefa de ensinar e uma preocupação com o aspecto social no sentido de
“fazer algo por essas crianças”, revelando a “identificação do ensino como uma missão”.
Bossa (2000) teve como objetivos, em sua pesquisa, verificar a percepção do aluno
adolescente na passagem da 4ª para a 5ª série; analisar os aspectos envolvidos na mudança
para a puberdade e adolescência; identificar a visão dos pais e professores nessa
passagem; e entender como se dá a organização escolar na 4ª e na 5ª série. Os dados
obtidos em entrevistas com três alunas de uma escola particular e seus respectivos pais e
professores demonstraram que a 5ª série apresenta uma estrutura curricular caracterizada
pela angústia do tempo e quantidade de conteúdo programado a ser cumprido. Além disso,
o trabalho realizado pelo professor da 4ª série é visto como inadequado e sem
aprofundamento para uma continuidade na 5ª série. Há também uma desconsideração dos
conhecimentos já adquiridos pelo aluno em séries anteriores, reforçando a idéia de uma
ruptura na vida escolar desse aluno a partir de seu ingresso na 5ª série. Essa fase de
transição representada pelos aspectos de desenvolvimento físico e psíquico, mas também
pelo ingresso na 5ª série, é identificada pelos pais e professores como a “série mais difícil”
com imposições e contradições ao aluno. Assim, a autora sintetiza as idéias centrais da
pesquisa, afirmando que para os pais é necessária melhor compreensão sobre a relação
42
entre as dificuldades vividas na escola e o momento de vida dos adolescentes, assim como
a repercussão desse momento em suas próprias vidas. Já quanto ao professor, cabe
interpretar as demandas dos adolescentes e priorizá-las, além de perceber seus próprios
limites para que aceite os dos alunos. Trabalhar o desenvolvimento pessoal e social dos
jovens facilita o crescimento do próprio educador. Deve-se estabelecer entre o professor e
aluno uma relação de reciprocidade e empatia, fazendo do diálogo um método de trabalho
adequado. Em relação ao aluno, é necessário que ele seja auxiliado na compreensão desse
momento de vida ainda na 4ª série, de forma que a vivência dos conflitos que estão por vir
não seja uma surpresa, já que o ingresso na adolescência é difícil por si só, e frente à
inadequação da escola torna-se mais doloroso.
Rangel (2001) pretendeu identificar pontos relevantes no momento da transição da
unidocência para a pluridocência em classes de 4ª para a 5ª série do Ensino Fundamental e
investigar a prática docente na perspectiva da transição uni/pluridocência a fim de se
construir um referencial teórico pedagógico capaz de contribuir para minimizar, tanto para
o professor como para o aluno, os conflitos desse momento escolar. Para isso, a autora
entrevistou dez professores e dez alunos de 5ª série e os dados obtidos apontaram que o
aluno recém-chegado à 5ª série acostumado à unidocência tem expectativas quanto à
pluridocência como se ela constituísse uma extensão do currículo por atividades. Além
disso, ele espera, nessa nova série, encontrar professores que o tratem em sua
individualidade e que reúnam qualidades que possibilitem o estabelecimento de relações
de afetividade e empatia, facilitando sua adaptação à nova realidade que desconhece,
como horários, livros didáticos, tarefas, provas, disciplinas específicas, professores.
Quanto aos professores pluridocentes, estes mostram que esperam os alunos com um
43
pensamento já estereotipado sobre eles, não se legitimam professores de 5ª série e sentem
dificuldade em entender e administrar esse momento de transição, o que os leva a uma
prática docente por vezes distante da necessidade do aluno nesse momento de sua
escolaridade.
Truzzi (2001) centrou sua preocupação, nessa pesquisa, em compreender melhor
como os professores de 4ª e os de 5ª série de escolas públicas analisam/interpretam a
problemática da ruptura entre essas duas séries do Ensino Fundamental quanto à questão
da leitura e da escrita e ainda teve como objetivo investigar como esses professores
avaliam, caracterizam ou interpretam as habilidades e/ou dificuldades de seus alunos. Os
dados obtidos em entrevistas com quatro professoras de 4ª série e seis de 5ª série, com
pelo menos dez anos de experiência no magistério, sugeriram diferenças na concepção do
papel docente e de alfabetização entre os professores desses dois segmentos do Ensino
Fundamental. De um lado, as professoras de 5ª série entrevistadas denunciaram que os
quatro anos anteriores dos alunos não são suficientes para que eles aprendam a ler e
escrever e que, ao chegarem à 5ª série, são promovidos pela progressão continuada. Além
disso, essa denúncia sugere que pode ocorrer um afrouxamento das exigências acadêmicas
para os alunos de Ensino Fundamental. Na opinião das professoras de 4ª série, os
professores de 5ª série ignoram o que o aluno já sabe, desrespeitam seu universo, não
fazem um trabalho de base que verificaria o processo da criança e parecem mais rotular os
alunos pelo não aprender do que tentar interpretar ou analisar suas dificuldades. Além
disso, apontaram uma rigidez no tempo das atividades escolares, bem como o imediatismo
ou o descompromisso desses professores com o processo. Em relação à ruptura entre as
duas séries, os resultados da pesquisa demonstraram que as mudanças ocorridas na
44
estrutura do ensino brasileiro nos últimos anos contribuíram para esse distanciamento
entre essas séries e “que se trata de uma realidade imposta e historicamente construída
num país com inaceitáveis índices de fracasso escolar”. (AZANHA
1
, 1987)
O trabalho de Santana (2001) foi considerado apenas pelo que foi apontado no
resumo constante no banco de teses. Segundo informações lá expressas, a autora parte do
pressuposto de que a 5ª série da escola pública vive uma crise evidente e que esse quadro
precisa ser revertido. Para isso, traçou como objetivo examinar e/ou clarear aspectos
relevantes dessa crise que vive o aluno da 5ª série e que, conseqüentemente, incidem no
seu desempenho e no processo ensino-aprendizagem. Além disso, analisou fatores que
contribuem para o insucesso do processo ensino-aprendizagem na 5ª série do Ensino
Fundamental na escola pública: o fazer pedagógico, a relação do aluno com os diferentes
segmentos da escola, professor, diretor, vice-diretor e colegas no cotidiano escolar; a
superlotação das classes e a construção da nova identidade do aluno da 5ª série, as
relações interpessoais na sala de aula, a problemática do excesso de alunos por sala e a
forma como se dá a construção da identidade desse aluno. Os sujeitos envolvidos nessa
pesquisa foram alunos e professores da 5ª série, diretor e vices-diretores de um colégio do
sul da Bahia. Por meio dos dados, constatou-se uma crise na 5ª série do Ensino
Fundamental estudada e a urgente necessidade de reorientação da prática pedagógica, a
melhoria na relação entre os educandos, e deles com os professores, diretor e vices-
diretores; a melhoria da distribuição de alunos por turma e da atenção à construção da
identidade do aluno da 5ª série. Nesse sentido, a autora apresenta sugestões para
1
AZANHA, J.M.P. Educação: alguns escritos. São Paulo: Editora Nacional, 1987.
45
subsidiar uma ação pedagógica que possa sensibilizar o professor e as entidades
educacionais para reverter o quadro da 5ª série na escola pública.
O trabalho de Araújo (2003) também não pôde ser consultado a tempo para esta
pesquisa, o que impossibilitou qualquer análise sobre ele. Para tanto, tomei como base as
informações presentes no resumo encontrado no banco de teses onde consta que nesse
estudo são descritas e analisadas as manifestações de duas professoras sobre os conteúdos
essenciais de Matemática na passagem da 4ª para a 5ª série. Os dados coletados em
entrevistas, conversas informais e em duas provas apontaram a necessidade de explicitar
os diferentes valores que permeiam a criação de currículos de Matemática para a escola
assim como a escolha de conteúdos pelo professor.
Puchalski (2004) teve por objetivo analisar a ruptura e a passagem entre a 4ª e a 5ª
série do Ensino Fundamental e suas conseqüências para professores e alunos. Para isso,
numa visão retrospectiva, analisou as LDBs (Leis de Diretrizes e Bases) a fim de entender
o percurso e as intenções da educação brasileira, bem como os papéis de todos os
envolvidos no processo (professor, currículo e passagem da 4ª para a 5ª série). Os sujeitos
da pesquisa foram alunos dessas duas séries de uma escola particular de São Paulo,
envolvidos num projeto de interdisciplinaridade. Segundo ele, historicamente, a ruptura
entre as duas séries é mantida pelo próprio sistema educacional como uma passagem sem
ponte. Sistema esse que, com resquícios do tecnicismo, leva as escolas a não saberem
administrar as dificuldades de adaptação desses alunos. No entanto, outros problemas
existentes também em outras séries do Ensino Fundamental são agravados na 5ª série: a
46
indisciplina dos alunos, a aprovação automática, classes superlotadas e professores mal
remunerados.
4.1. Síntese dos resultados obtidos
Em síntese, os resultados dos trabalhos lidos e analisados serão retomados a partir
dos objetivos específicos definidos nesta pesquisa. Em relação aos sujeitos envolvidos nas
pesquisas sobre a transição escolar da 4ª para a 5ª série, pode-se afirmar que os
professores de 5ª série foram os mais “ouvidos” em entrevistas estruturadas ou observados
em suas práticas em sala de aula. Como alerta Dias-da-Silva “o reconhecimento e o
respeito pela voz do professor é pressuposto indiscutível em qualquer tentativa
conseqüente de transformar a escola”. (DIAS-DA-SILVA, 1992, p. 200-201) Em raros
trabalhos, os professores da 4ª série também foram entrevistados e seus relatos
comparados aos dos professores da 5ª série.
De acordo com Dias-da-Silva (1992), o saber docente parece assentado em valores
e crenças, e, por isso, ouvir o que o professor tem a dizer parece importante, uma vez que
ele é sujeito da prática pedagógica, aquele que centraliza o saber na escola e mediatiza a
relação do aluno com o sistema social. Sua importância é fundamental para a revitalização
da escola.
Em muitas dessas pesquisas, os alunos também da 5ª série tiveram “voz” em
entrevistas, desenhos ou redações induzidas nos quais relataram ou revelaram suas
expectativas ou vivências nesse processo de transição escolar. No entanto, as entrevistas
47
com eles tinham uma intenção analógica com as dos professores. Em nenhum trabalho
analisado, o aluno apareceu sozinho como sujeito da pesquisa.
Outros agentes escolares como diretores, vices-diretores, coordenadores
pedagógicos e inspetores também apareceram como sujeitos da pesquisa, mas com menor
expressividade. Em raras pesquisas, os pais foram entrevistados e apontaram seus dilemas,
revelando os impactos dessa transição escolar na família.
Em relação aos problemas de pesquisa mais comuns, os resultados mostraram
grande interesse dos pesquisadores em também ouvir os professores e alunos para
entender o cotidiano escolar de uma 5ª série. Alguns trabalhos tiveram por objetivo
conhecer as expectativas de professores e alunos nessa transição escolar, saber dos
dilemas e conflitos vivenciados por esses sujeitos e como lidavam com esse cotidiano
difícil. Desses relatos foram levantadas causas dos problemas mais comuns e algumas
sugestões para minimizar os conflitos tidos como próprios da 5ª série.
Entre esses conflitos diários vividos, a indisciplina foi o problema mais apontado
por professores da 5ª série. Para estes, os alunos vindos da 4ª série sentem-se muito livres
e soltos na 5ª série, o que os faz mais indisciplinados. Por não terem mais a vigilância de
uma única professora como acontecia na 4ª série, muitos alunos comportam-se como se
não tivessem limites. Na verdade, desconhecem as regras escolares dessa nova escola e
percebem cedo a heterogeneidade didática e pessoal entre seus novos professores. Assim,
vão descobrindo que há professores que lhes dão maior ou menor liberdade em sala de
aula e com os quais se relacionam melhor ou pior.
48
Alguns autores defendem que o reconhecimento das particularidades que envolvem
a 5ª série por parte dos professores e da escola como um todo é uma das condições para
um trabalho bem-sucedido. Entre esses autores, Sabino (2000) teve clara intenção de
identificar as particularidades desse fazer docente. Os resultados obtidos demonstraram a
existência de dois princípios de ação na prática pedagógica que norteia os procedimentos
e/ou atitudes profissionais apontados pelos professores considerados de sucesso nessa
série: ter paciência/dar tempo para o aluno aprender e conhecer o aluno, partindo do que
ele sabe.
Além disso, a autora destaca a existência de uma relação direta entre a forma como
o professor lida com as diferenças e dificuldades da 5ª série e seus alunos e a preferência
que tem em trabalhar com essa série. Alguns professores afirmaram se sentirem realizados
pessoal e profissionalmente com seu trabalho nessa série, já que os resultados obtidos são
mais observáveis.
Silva (1999) aponta um possível perfil de bom professor de 5ª série. Segundo ela, a
semelhança com a professora da 4ª série seria aceitável, pois significaria a existência de
aspectos relacionados à interação instrucional dos alunos, tais como o uso de vocabulário
acessível ao aluno, a forma de conduzir a atividade, o aproveitamento das contribuições
dos alunos em sala de aula, o compromisso dos professores com a tarefa de ensinar e uma
preocupação com o aspecto social no sentido de “fazer algo por essas crianças”.
Infelizmente, os resultados das pesquisas apontaram que a realidade é outra. Muitos
professores assumem as aulas nessas turmas por falta de opção. Não têm o perfil desejado
e nem preferência por essa série.
49
Esse fato explica alguns conflitos existentes entre professores e alunos nessa série.
Para alguns autores, o professor que leciona na 5ª série deveria conhecer melhor sua
dinâmica e o caminho percorrido por esse aluno para chegar até ela. Essa condição pode
facilitar e melhorar as relações que serão estabelecidas na sala de aula.
Em todas as pesquisas analisadas, os professores que lecionam para as 5ª séries
reconheceram as diferenças pedagógicas entre a 4ª e a 5ª série, mas nem todos sabem lidar
com elas. Alguns professores desconhecem a trajetória do aluno até a 5ª série, bem como
seu repertório até ali. Quase sempre ignoram os conhecimentos trazidos por esses alunos e
as expectativas trazidas por estes.
Esse descompasso é sentido pelos alunos que, nas entrevistas, queixaram-se da
falta de coerência entre suas expectativas e a realidade encontrada na 5ª série. Alguns
demonstraram um desencanto profundo e amargo por causa das maiores exigências e do
menor envolvimento afetivo com os professores. Em algumas pesquisas, como a de
Rangel (2001), os resultados apontaram que esse aluno espera encontrar professores que o
tratem com individualidade e que reúnam qualidades que possibilitem o estabelecimento
de relações de afetividade e empatia, facilitando sua adaptação à nova realidade, a qual
desconhece, como horários específicos para professores e disciplinas, material a ser
levado para a escola etc.
Considerando a existência de expectativas trazidas pelos alunos em relação à 5ª
série, algumas pesquisas demonstraram preocupação em analisar as diferenças entre
50
expectativas pré-concebidas e a realidade. Conforme Silva (1999), essas expectativas
reforçam a idéia de ruptura existente nos limites da 4ª para a série. Uma ruptura que
se constitui em fronteira entre as duas etapas do Ensino Fundamental, pois não se percebe
que uma sucede a outra, sendo esse o principal fator que faz da 5ª série um salto no
desconhecido.
A falta de integração entre as duas etapas do Ensino Fundamental, que era para ser
contínuo, revela-se na rotina da sala de aula e nas relações estabelecidas entre professores
e alunos. Se a transição entre a 4ª e a 5ª série não é preocupação constante entre os
professores e demais agentes escolares, seus efeitos são vividos diariamente.
Entre esses efeitos estão os aspectos mais comuns apontados em quase todas as
pesquisas analisadas: o ritmo de aula e ensino mais lento na 4ª série sem a rigidez e o
atropelo do tempo como acontece na 5ª série; a cobrança de maior independência dos
alunos na realização das atividades; a presença do autoritarismo na relação professor-
aluno, evidenciando um distanciamento entre ambos; maior número de professores e de
disciplinas cujos conteúdos quase sempre não apresentam seqüência.
Sobre essa falta de seqüência, Silva (1999) afirma que essa descontinuidade
curricular entre a 4ª e a 5ª série decorre de ações pedagógicas isoladas de professores. E
essas ações cristalizam a ruptura no processo de ensino aprendizagem porque derivam de
um sistema que considera uma organização que “separa os tempos da mesma forma que
separa ações e seus agentes”. (SILVA, 1999, p. 165)
51
Os resultados das pesquisas apontaram que o aluno que chega à 5ª série traz
consigo medos e angústias em relação a essa série. Muitos medos adquiridos ou impostos
pelos pais e pelas professoras anteriores transformam a 5ª série num mito. Mito esse que
também persiste entre alguns professores. Em sua pesquisa, Rangel (2001) destacou que
muitos professores de 5ª série esperam os alunos com um pensamento estereotipado, não
se legitimam professores de 5ª série e sentem dificuldade em entender e administrar esse
momento de transição, levando-os a uma prática docente distante da necessidade e da
realidade do aluno.
Quanto ao nível de formação dos pesquisadores desses trabalhos, os resultados
demonstraram que quase todas as produções científicas sobre o tema da transição escolar
entre a 4ª e a 5ª série foram desenvolvidas em trabalhos de mestrado (n=13), sendo apenas
um (n=01) em nível de doutorado.
52
Em relação à quantidade e temporalidade, os resultados apontaram que a produção
sobre o tema não é vasta, mas é mantida regularidade em termos quantitativos. No
entanto, há intervalos de tempo entre um trabalho e outro como se pode ver no quadro
abaixo:
Ano de
produção
quantidade
1987 0
1988 0
1989 1
1990 0
1991 0
1992 1
1993 0
1994 0
1995 0
1996 2
1997 0
1998 0
1999 4
2000 2
2001 3
2002 0
2003 1
2004 1
(Distribuição da produção científica por ano de publicação.)
Analisando as regiões do país onde essas produções foram feitas, tem-se o Estado
de São Paulo como líder das pesquisas sobre o tema (n=10), enquanto quatro outros
Estados (Paraná, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e Bahia) empataram em número de
produção (n=01).
Ainda nessa perspectiva de distribuição, observou-se o desempenho de cada
universidade vinculada ao Banco de Teses da CAPES. Os dados mostraram que existe
uma diferença pouco significativa na freqüência das produções desenvolvidas entre as
53
universidades particulares e públicas sobre esse tema. Entre as universidades particulares
destacaram-se: PUC-SP (n=02); Universidade Presbiteriana Mackenzie (n=01);
Universidade São Marcos (n=01); Universidade da Cidade de São Paulo (n=01); PUCC
(n=01); PUC-RJ (n=01); e PUC-RS (n=01). Já as públicas foram: UNESP-Araraquara
(n=02); USP (n=01); UNICAMP (n=01); UFPR (n=01); e UFBA (n=01).
Considerando o detalhamento das pesquisas, a análise feita demonstrou que a
maioria dos trabalhos realizados apresentou metodologia de pesquisa qualitativa visto
terem um caráter exploratório, o que possibilitou a emersão de aspectos subjetivos, algo
muito comum em produções que pretendem buscar as percepções e o entendimento sobre
a natureza de uma questão. Considerando as possibilidades de abordagem oferecidas por
esse tipo de pesquisa, o estudo de caso e a etnografia foram os mais empregados nesses
trabalhos. Como também costuma ocorrer em pesquisas dessa natureza, a entrevista foi o
principal meio de coleta de dados desses sujeitos. Essas entrevistas seguiram um roteiro
semi-estruturado com a finalidade de “dar voz” aos sujeitos. No entanto, alguns
pesquisadores optaram pela técnica (naturalista) de observação do cotidiano escolar como
suporte aos relatos coletados. Questionários (com questões abertas e fechadas) foram
também aplicados aos sujeitos. Em relação à origem do problema de pesquisa ou do tema,
alguns autores desenvolveram seus trabalhos partindo de hipóteses originadas de suas
práticas e/ou trajetórias pessoais e profissionais. Em menor quantidade, algumas
produções foram realizadas por pareamento de pesquisas já elaboradas pelo próprio autor
ou por outros autores. Em relação ao referencial e/ou concepção teórica, a maioria dos
trabalhos
analisados não se pautou em teoria específica. Entretanto, em menor quantidade,
alguns trabalhos tiveram contribuição de teóricos como Henry Wallon; fundamentos do
54
Materialismo Histórico para a compreensão da relação entre teoria e prática docente;
conceitos das Representações Sociais para entendimento dos discursos dos sujeitos e suas
crenças; e Teoria do Papel,
concepção essa que considera a existência de papéis e
expectativas prescritas e concebidas que norteiam o indivíduo num determinado contexto.
4.2. Conclusões
Neste momento de conclusão desta pesquisa em que muitas perguntas foram
respondidas, outras indagações sobrepõem-se à própria pesquisa, sugerindo a
continuidade dos estudos sobre o tema da transição escolar da 4ª para a 5ª série. As
análises realizadas possibilitaram que algumas afirmações fossem feitas e muitas dúvidas
fossem levantadas. Uma dessas afirmações é a de que a quantidade de trabalhos
desenvolvidos sobre o tema parecem insuficientes para dar conta de tantas questões que
ainda se colocam na 5ª série e, mais precisamente, nessa transição, que se estabelece numa
ruptura ou descontinuidade pouco pensada e discutida no cotidiano escolar.
O diálogo travado entre os autores das pesquisas tornou-se possível por causa da
natureza de uma pesquisa bibliográfica como esta. Diferentes realidades e sujeitos e
problemas semelhantes, senão iguais. Os resultados de alguns trabalhos demonstraram que
a escola de Ensino Fundamental, antigo 1º grau, ainda convive de forma velada com o
problema da transição de alunos da 4ª que chegam à 5ª série com tantas expectativas.
Esses alunos vêem-se perdidos diante do grande número de mudanças que vão além das
pedagógicas ou didáticas e que denunciam a fragilidade na estrutura de ensino cuja
organização parece falha e pouco condizente com as determinações legais ou com o que
55
as pesquisas sobre educação apontam como caminhos viáveis. Antes, essa escola parece
andar na contramão dos avanços desejáveis.
Esse retrocesso da escola de Ensino Fundamental ou mesmo sua estagnação no que
diz respeito sobre a transição entre a 4ª e a 5ª série ficou evidente nas pesquisas
analisadas. Isso porque trabalhos desenvolvidos na década de 1980 já apontavam a ruptura
entre os dois ciclos como um dos vilões do fracasso escolar nas 5ª séries, manifesto pela
repetência ou pela evasão escolar. Ainda no início do século XXI, o problema da
descontinuidade entre essas duas séries permanece. No entanto, de uma maneira mais
sutil, por isso talvez menos discutida.
Possivelmente, o problema do fracasso nessa série continue, mas seus efeitos terão
sido abrandados (ou seria ocultados?) pela implantação da progressão continuada que, na
prática, minimizou os efeitos da retenção na 5ª série e a evasão escolar. Evasão essa que
parece ter deixado de ser um problema nessa série ou que passa a ter outros determinantes
que nem sempre a escola atribui para si.
Muitos trabalhos analisados reafirmaram a problemática da ruptura, suas causas e
conseqüências para alunos e professores. Alguns autores, como é o caso de Dias-da-Silva
(1992), souberam descrever fotograficamente as contradições presentes numa turma de 5ª
série e o cotidiano de seus alunos e professores. Uma série que concretiza mudanças e
dilemas, medos e expectativas num clima nem sempre amistoso, com personagens que
nem sempre se conhecem e se respeitam.
56
Trata-se de uma série que revela toda e qualquer discrepância por negar a
continuidade apregoada pelos sistemas educacionais que teimam em afirmar que entre a 4ª
e a 5ª série ocorre uma mera passagem de uma série para outra num mesmo ciclo. Não tão
simples assim. Essa série denuncia os entraves de um sistema que afasta professores de 1ª
a 4ª série ao colocá-los em prédios distintos, que não recupera os conteúdos aprendidos
até a 4ª série e obriga alunos a revisarem tudo como se fossem assuntos novos.
Professores de 4ª série desconhecem os conteúdos que seus alunos aprenderão na 5ª série
assim como os professores da 5ª série desconhecem o que seus novos alunos viram e
como viram até então. Um descompasso didático que pode gerar atrasos e desmotivação.
De acordo com Dias-da-Silva (1992), a distância entre a concepção e a prática
docente é uma característica que se particulariza na 5ª série, já que nela essa distância
parece maior. Essa distância concretiza-se nas amarras que impedem um fazer docente
mais eficaz. Os resultados de alguns trabalhos apontaram que muitos professores de 5ª
série convivem com a ditadura do tempo e do livro didático. Tempo esse que pode obrigar
os professores a correrem com a matéria em detrimento do aprendizado de seus alunos. O
livro didático, que pode aprisionar professores, impondo-lhes limites aos programas e às
aulas.
Ao realizar uma pesquisa de natureza bibliográfica e ler trabalhos de outros
pesquisadores interessados na problemática da ruptura entre a 4ª e a 5ª série, pude refletir
sobre minha prática como professora dessa série há muitos anos e me certificar de que
esse tema ainda exige estudos por causa da escassez ou insuficiência de trabalhos. Outros
problemas ainda persistem nas salas de aulas dessa série e exigem soluções e sugestões
57
vindas de todo e qualquer interessado na escola de Ensino Fundamental e em seu
cotidiano.
Problemas tão antigos somam-se aos novos e avolumam de conflitos uma fase
escolar em que tantas mudanças acontecem simultaneamente na vida desses alunos. Uma
transição que deveria acontecer de uma forma mais tranqüila, sem tantos mitos, sem
medos, com mais respeito, com mais orientações e maior acolhimento por parte da escola
como um todo. No entanto, as análises dos trabalhos evidenciaram a falta de pesquisas de
intervenção ou pesquisa-ação que se propusessem a testar soluções para as dificuldades já
identificadas nessa transição.
O grande questionamento que me faço neste momento é sobre a direção que a
escola de Ensino Fundamental está tomando. Para onde seguem seus professores e alunos
que parecem não se encontrar em nenhum momento do processo além daquele mero
convívio diário nas salas de aulas, muitas vezes, desgastante.
Por que caminhos percorrerão nossos alunos com a implantação da Lei nº.
10.172/2001 que amplia o Ensino Fundamental de oito para nove anos? Essa lei ainda em
implantação em municípios e Estados não chegou à rede pública paulista. Mas e quando
chegar? Que implicações poderá trazer para o ensino? E a 5ª série? Deixará de ser a série
que concretiza tantos desafios para professores e alunos ao deixar de ser a série de
transição escolar? Será que esses desafios serão adiados para a 6ª série? Ou nessa
reestruturação do ensino em nove anos está previsto o fim dessa ruptura ou
descontinuidade?
58
Como já afirmei anteriormente, neste momento de conclusão de trabalho, tantas
dúvidas aparecem. No entanto, desejo que, com o passar do tempo e com essas mudanças
que estão se anunciando, o tema desta pesquisa torne-se obsoleto e que a transição deixe
de ser um problema para ser uma passagem natural entre séries. E que, diferentemente do
que vem ocorrendo há três décadas, a 5ª série deixe de ser um desafio para professores e
alunos para ser mais uma no conjunto do Ensino Fundamental. No entanto, essa certeza só
virá com o tempo e com a realização de trabalhos de intervenção.
59
Referências Bibliográficas
ALMEIDA, L. M. C. Ensino Fundamental 5ª série – amargo encanto. 1996. 222 p. Dissertação
(Mestrado em Educação: Supervisão e Currículo). Programa de Estudos Pós-Graduados em
Educação: Supervisão e Currículo. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP.
ALVES, E. H. C. M. A percepção da família no impacto do ritual de passagem da 4ª para a 5ª
série do ensino fundamental: um estudo de caso. 1999. 211 p. Dissertação (Mestrado em Artes e
História da Cultura). Universidade Presbiteriana Mackenzie.
ARAÚJO, A. M. A passagem da 4ª para a 5ª série: o que pensam professores dessas séries sobre
os conteúdos essenciais da matemática. 2003. 219 p. Dissertação (Mestrado em Educação).
Universidade Federal do Paraná - UFPR.
BOSSA, R. A passagem da 4ª para a 5ª série do ensino fundamental na percepção do aluno, de
seus pais e de seus professores. 2000. 88 p. Dissertação (Mestrado em Psicologia). Universidade
São Marcos, São Paulo.
BRASIL. Ministério de Educação e Cultura. Secretaria de Ensino Fundamental. Parâmetros
Curriculares Nacionais. Introdução. Brasília: MEC/SEF, 1998.
BRASIL. LDB 9394/96. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Brasília.
CAMPITELLI, T. C. M. Da 4ª para a 5ª série do 1º grau: uma passagem refletida pelos diretores
de escolas. 1989. 168 p. Dissertação (Educação). Pontifícia Universidade Católica do Rio de
Janeiro – PUC-RJ.
60
DIAS-DA-SILVA, M.H.G.F. Passagem sem rito: as 5ª séries e seus professores. Campinas:
Papirus, 1997. Série Pedagógica.
______ O professor como sujeito do fazer docente: a prática pedagógica nas quintas séries. 1992.
Tese (Doutorado em Educação). Universidade de São Paulo – USP- São Paulo.
DOMINGUES, M. H. M. S. A escola de 1º grau: passagem da 4ª para a 5ª série. 1985. Tese
(Doutorado em Educação). Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação: Psicologia da
Educação. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP.
FERRARI, S.C. Necessidades dos alunos de 5ª série – segundo seus professores. 1996. 150 p.
Dissertação (Mestrado em Psicologia da Educação). Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo – PUC-SP.
GIL, A.C. Como elaborar projetos de pesquisa. 4 ed. São Paulo: Atlas, 2002.
LEITE, M. I. P. de A. Méritos e pecados do ciclo no ensino fundamental: análise da implantação
do ciclo de aprendizagem nas escolas da rede municipal de Vitória da Conquista-BA, 1999. 272
p. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais). Programa de Estudos Pós-Graduados em
Ciências Sociais. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP.
LOPES, A. L. Um olhar sobre a 5ª série do Ensino Fundamental: reflexões acerca das práticas
educativas e da formação docente, 2006. 178 p. Tese (Doutorado em Educação). Programa de
Estudos Pós-Graduados em Educação: Psicologia da Educação. Pontifícia Universidade Católica
de São Paulo – PUC-SP.
LOURENCETTI, G. C. Procurando dar sentido às práticas pedagógicas na 5ª série: analisando
dificuldades e/ou dilemas de professores. 1999. Dissertação (Mestrado em Educação Especial).
Universidade Estadual Paulista – UNESP - São Carlos.
61
LOURENÇO, M. A. S. Os professores e as quintas séries: procurando especificidades. 2000. 157
p. Dissertação (Mestrado em Educação Escolar). Universidade Estadual Paulista – UNESP-
Araraquara.
LUNA, S. V. Planejamento de pesquisa. São Paulo: Educ, 2003, p. 15.
NERY, V.E. Os efeitos da reorganização do ensino fundamental em São Paulo no trabalho
docente e nas estratégias familiares (1995-1998). 2000. 88 p. Dissertação (Mestrado em
Educação). Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação: História, Política, Sociedade.
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP.
PACHECO, E. M. C. Produção Científica em avaliação psicológica: a análise dos periódicos
brasileiros (1997-2002). 2003. Tese de Doutorado. Pontifícia Universidade Católica de
Campinas, Campinas.
PUCHALSKI A. Da 4ª para a 5ª série do ensino fundamental: uma questão (ainda) sem solução.
2004. 134 p. Dissertação (Mestrado em Educação). Universidade Cidade de São Paulo –
UNICID.
RANGEL, Z. A. O processo de transição da unidocência para a pluridocência em classes de 4ª
para a 5ª série do Ensino Fundamental: olhando a realidade e apontando caminhos, 2001. 89 p.
Dissertação (Mestrado em Educação). Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul –
PUC-RS.
SABINO, M. C. M. Um olhar sobre a 5ª série do ensino fundamental. 1999. 120 p. Dissertação
(Mestrado em Educação). Pontifícia Universidade Católica de Campinas -PUCC.
SANTANA, T. M. A crise da 5ª série: aspectos significativos em um colégio do Sul da Bahia.
2001. 197 p. Dissertação (Educação). Universidade Federal da Bahia - UFBA.
62
SILVA, A. M. R. Dos Estudos Sociais da 4ª série e a Geografia da 5ª série: polemizando sobre
a descontinuidade a partir da vivência de ensinar à vivência de ensinar a ensinar. 1999. 174 p.
Dissertação (Geociências). Universidade Estadual Paulista – Unicamp, Campinas- SP
SOUSA, S. M. Z. L. A avaliação na organização do ensino em ciclos: In: KRASILCHIK,
Myriam (org.). USP fala de educação. São Paulo: FEUSP, 2000.
TRUZZI, E.A. Eles são analfabetos, como posso ensiná-los? A ruptura entre a 4ª para a 5ª série e
seus professores. 2001. 246 p. Dissertação (Mestrado em Educação Escolar). Universidade
Estadual Paulista - UNESP, Araraquara.
WITTER, C. Produção Científica e Educação: análise de um periódico nacional. In: Witter,
Geraldina P. Metaciência e Psicologia. 1 ed. Campinas: Alínea, 2005. p. 199-215.
WITTER, G. P.; M. F. A. Velhice no Banco de Teses da CAPES (2000-2001). In: Witter,
Geraldina P. (org.) Metaciência e Psicologia. 1 ed. Campinas: Alínea, 2005. p. 171-184.
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo