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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA POLÍTICA
MARIA SALETE SOUZA DE AMORIM
CULTURA POLÍTICA E DECISÃO ELEITORAL
NO OESTE DO PARANÁ
Porto Alegre
2006
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15
MARIA SALETE SOUZA DE AMORIM
CULTURA POLÍTICA E DECISÃO ELEITORAL
NO OESTE DO PARANÁ
Tese apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Ciência Política da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
como requisito parcial para obtenção do grau
de Doutor em Ciência Política
Orientador: Prof. Dr. Marcello Baquero
Porto Alegre
2006
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MARIA SALETE SOUZA DE AMORIM
CULTURA POLÍTICA E DECISÃO ELEITORAL
NO OESTE DO PARANÁ
Tese apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Ciência Política da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
como requisito parcial para obtenção do grau
de Doutor em Ciência Política
Aprovada em Novembro de 2006.
BANCA EXAMINADORA
Dr. Marcello Baquero – Orientador / UFRGS
Dr. Eduardo Andrés Vizer – Universidade de Buenos Aires
Dra. Rute Vivian Baquero – Universidade do Vale do Rio dos Sinos
Dr. Everton Rodrigo Santos – Centro Universitário FEEVALE
Dra. Jussara Reis Prá – Universidade Federal do Rio Grande do Sul
17
AGRADECIMENTOS
Agradeço ao professor Marcello Baquero pela amizade, orientação e contribuições neste
processo de aprendizagem e na produção deste trabalho.
Agradeço aos amigos e amigas do NIEM/NUPESAL da UFGRS, núcleos de pesquisa
coordenados pelos professores Marcello Baquero e Jussara Reis Prá, pelos momentos de
discussões e debates que possibilitaram a compreensão e a vivência do capital social.
Agradeço aos eleitores de Toledo que se dispuseram a contribuir com meu trabalho,
concedendo entrevistas.
Agradeço a Unioeste pela liberação e apoio, que possibilitou minha qualificação docente com
dedicação total. Agradeço especialmente a Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação e a
Divisão de Capacitação Docente, na pessoa de Sônia Lemanski, que sempre atenciosa, me
informava dos trâmites burocráticos da instituição.
Agradeço a minha família e aos meus amigos pela paciência, pelo carinho, apoio e estímulo
recebido, sobretudo nestes últimos anos de estudo e conclusão da tese.
18
RESUMO
Na área da Ciência Política, estudos sobre o comportamento político e eleitoral, sob
diferentes perspectivas analíticas, permitem verificar um conjunto de variáveis e indicadores
que elucidam aspectos da cultura política e do processo de construção democrática. O
objetivo da presente tese é compreender a lógica do comportamento político de Toledo, PR, a
partir da identificação das percepções, motivações e atitudes dos cidadãos em relação à
política e às instituições democráticas. Os dados examinados, oriundos de pesquisas
realizadas na região, evidenciam um cenário de ceticismo e de decepção frente à atuação dos
políticos e do desempenho socioeconômico do regime democrático. Observou-se uma
tendência do voto personalista em detrimento do voto programático/partidário, especialmente
entre eleitores que expressaram baixos níveis de interesse por política, de confiança
institucional e de participação política. O argumento é de que a personalização do poder e
práticas como o clientelismo, o nepotismo e a corrupção estão enraizados na cultura política
brasileira, apesar dos avanços na institucionalização de procedimentos poliárquicos.
Palavras-Chave: Democracia, cultura política, decisão eleitoral, comportamento político,
personalismo, clientelismo.
19
ABSTRACT
In the area of political science, research on political and electoral behavior from
different theoretical perspectives allows us to examine several variables and empirical
indicators that enlighten political culture aspects as well as a deep understanding of the
democratic construction process. The main objective of this dissertation is to understand the
underlying logic of political behavior in Toledo –Parana- Brazil, based upon the analysis of
perceptions, motivations and attitudes of citizens in regards to politics and political
democratic institutions. The data examined through research conducted in this State show a
context where cynicism and deception with politicians and government’s socio-economic
performance prevail. The results also indicated a personalistic tendency to vote instead of a
programmatic-partisan vote, especially among electors that showed low levels of political
interest, as well as reduced indices of institutional trust and political participation. The main
argument oft this study is that the personalization of political power and practices such as
clientelism, nepotism and corruption are rooted in the Brazilian political culture, in spite of
advances in the poliarquical formal democratic procedures.
Key Words: Democracy, political culture, electoral decision, political behavior, personalism,
clientelism.
20
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1. Apoio e Satisfação com a Democracia....................................................................36
Gráfico 2. Nível de Escolarização da Amostra.......................................................................123
Gráfico 3 Sexo por Grau de Escolaridade..............................................................................124
Gráfico 4.Faixa Etária do Eleitorado......................................................................................125
Gráfico 5. Situação Profissional da Amostra..........................................................................126
Gráfico 6. Renda Familiar da Amostra...................................................................................127
Gráfico 7. Interesse por Política..............................................................................................130
Gráfico 8. Opinião sobre as coligações partidárias.................................................................132
Gráfico 9. Opinião sobre Reforma Agrária.............................................................................134
Gráfico 10. Opinião sobre a crise no setor agrícola................................................................135
Gráfico 11. Opinião sobre o combate ao tráfico de drogas.....................................................137
Gráfico 12. Avaliação dos Serviços Públicos.........................................................................139
Gráfico 13. Avaliação da atuação dos políticos......................................................................143
Gráfico 14. Participação Política e Social em Toledo.............................................................145
Gráfico 15. Decisão do voto em Toledo.................................................................................155
Gráfico 16. Principais Fatores na Escolha Eleitoral................................................................158
Gráfico 17. Intenção de Voto para Governador......................................................................161
21
LISTA DE QUADROS
Quadro 1. Principais Teses do Comportamento Eleitoral no Brasil.........................................19
Quadro 2. Estabelecimentos de Ensino em Toledo (1948-1987)..............................................93
Quadro 3. Indústrias Comunitárias de Toledo (1946-1959)...................................................101
Quadro 4. Estrutura Demográfica do Município de Toledo...................................................103
Quadro 5. Quadro Partidário no Paraná e no Município de Toledo (1947-2004)...................116
Quadro 6. Percepção dos toledanos a respeito da democracia................................................181
Quadro 7. Percepção dos toledanos sobre corrupção, nepotismo e clientelismo....................191
22
LISTA DE TABELAS
Tabela 1. Confiança nas Instituições – América Latina............................................................37
Tabela 2. Valor Adicionado por Setor da Economia................................................................99
Tabela 3. Distribuição Populacional por Sexo........................................................................122
Tabela 4. Confiança nas Instituições – Toledo.......................................................................142
Tabela 5. Avaliação da atuação dos políticos.........................................................................142
Tabela 6. Preferência Partidária em Toledo............................................................................160
Tabela 7. Resultado das Eleições para Governador................................................................162
Tabela 8. Preferência Partidária x Intenção de Voto...............................................................163
Tabela 9. Interesse por política x Conhecimento sobre interesses defendidos pelos
candidatos................................................................................................................................165
Tabela 10. Escolaridade x Decisão do Voto...........................................................................168
Tabela 11. Interesse por política x Decisão do Voto..............................................................169
Tabela 12. Confiança Institucional x Participação Política....................................................170
Tabela 13. Participação Política x Decisão do Voto...............................................................172
23
LISTA DE MAPAS
Mapa 1. Configuração Municipal do Paraná (1954).................................................................95
Mapa 2. Mapa Político da Região Oeste do Paraná..................................................................96
Mapa 3: Mapa Político de Toledo – PR..................................................................................104
24
LISTA DE ABREVIATURAS
ACIT – Associação Comercial e Industrial de Toledo
ADVT – Associação dos Deficientes Visuais de Toledo
APA – Associação Promocional de Assistência aos Idosos
ARENA – Aliança Renovadora Nacional
CPI – Comissão Parlamentar de Inquérito
ESEB – Estudo Eleitoral Brasileiro
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IDH – Índice de Desenvolvimento Humano
IPARDES – Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social
MDB – Movimento Democrático Brasileiro
MST – Movimento dos Trabalhadores Sem Terra
ONG – Organização Não Governamental
PDC – Partido Democrata Cristão
PDT – Partido Democrático Trabalhista
PFL – Partido da Frente Liberal
PL – Partido Liberal
PMDB – Partido do Movimento Democrático Brasileiro
PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
PPB – Partido Progressista Brasileiro
PP – Partido Progressista
PR – Partido Republicano
PRP – Partido da Representação Popular
PSD – Partido Social Democrático
PSDB – Partido da Social Democracia Brasileira
PT – Partido dos Trabalhadores
PTB – Partido Trabalhista Brasileiro
PTN – Partido Trabalhista Nacional
TRE/PR – Tribunal Regional Eleitoral do Paraná
TSE – Tribunal Superior Eleitoral
UDN – União Democrática Nacional
25
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................14
1.1 TEMA DA PESQUISA......................................................................................................15
1.2 CONTEXTUALIZAÇÃO DO PROBLEMA.....................................................................21
1.3 OBJETIVOS DA PESQUISA............................................................................................23
1.4 HIPÓTESES DO TRABALHO..........................................................................................24
1.5 ASPECTOS METODOLÓGICOS.....................................................................................24
1.6 ESTRUTURA DO TRABALHO........................................................................................30
2 CULTURA POLÍTICA E ALCANCES DA DEMOCRACIA........................................32
2.1 DEMOCRACIA NO CONTEXTO LATINO-AMERICANO...........................................33
2.2 NOVAS FORMAS DE PARTICIPAÇÃO POLÍTICA......................................................43
2.3 RELEVÂNCIA E ATUALIDADE DO CONCEITO DE CULTURA POLÍTICA...........49
2.4 ARTICULAÇÃO TEÓRICA NA ANÁLISE DO COMPORTAMENTO POLÍTICO .....58
3 FENÔMENO CLIENTELISTA NAS CONFIGURAÇÕES POLÍTICAS.....................64
3.1 CLIENTELISMO POLÍTICO NAS SOCIEDADES CONTEMPORÂNEAS..................65
3.2 PERSONALISMO E CLIENTELISMO NA POLÍTICA BRASILEIRA..........................70
3.3 CLIENTELISMO E NOVAS FORMAS DE INTERMEDIAÇÃO DE INTERESSES.....84
4 ASPECTOS DO SISTEMA POLÍTICO TOLEDANO....................................................88
4.1 DETERMINANTES HISTÓRICOS DO OESTE DO PARANÁ......................................89
4.2 DETERMINANTES SOCIOECONÔMICOS DO OESTE DO PARANÁ.......................98
4.3 DINÂMICA POLÍTICA E PODER LOCAL EM TOLEDO...........................................107
4.4 TENDÊNCIAS DO QUADRO PARTIDÁRIO EM TOLEDO (1952 a 2004)................113
5 CARACTERIZAÇÃO DA CULTURA POLÍTICA DE TOLEDO..............................121
5.1 PERFIL SÓCIO-DEMOGRÁFICO DA AMOSTRA......................................................122
5.2 INTERESSE POR POLÍTICA..........................................................................................128
5.3 CONFIANÇA NAS INSTITUIÇÕES POLÍTICAS.........................................................140
5.4 NÍVEIS DE PARTICIPAÇÃO POLÍTICA......................................................................144
6 COMPORTAMENTO POLÍTICO E DECISÃO ELEITORAL..................................152
6.1 FATORES NA ESCOLHA ELEITORAL........................................................................153
6.2 PREFERÊNCIA PARTIDÁRIA E MOTIVAÇÃO PARA O VOTO..............................159
6.3 A LÓGICA DO COMPORTAMENTO ELEITORAL EM TOLEDO............................167
26
7 CLIENTELISMO E NEPOTISMO NA PERCEPÇAO DOS TOLEDANOS.............175
7.1 DESENVOLVIMENTO DA PESQUISA QUALITATIVA............................................176
7.2 A VISÃO DE DEMOCRACIA DOS CIDADÃOS TOLEDANOS.................................179
7.3 PERCEPÇÃO DOS TOLEDANOS SOBRE A POLÍTICA LOCAL..............................188
8 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................202
REFERÊNCIAS......................................................................................................................209
APÊNDICE A – QUESTIONÁRIO APLICADO..................................................................221
APÊNDICE B – CONSTRUÇÃO DE ÍNDICES...................................................................229
APÊNDICE C – ROTEIRO PARA ENTREVISTA...............................................................234
APÊNDICE D – QUADRO PARTIDÁRIO: CÂMARA MUNICIPAL................................236
ANEXO A – DADOS DO CENSO DEMOCRÁFICO/2000.................................................238
27
1 INTRODUÇÃO
Há um reconhecimento por parte da Ciência Política contemporânea de que valores
culturais são elementos importantes na análise do comportamento político e na compreensão
do funcionamento das instituições democráticas. Os estudos de cultura política, introduzidos
na década de 60, surgem na América Latina com a redemocratização possibilitando examinar
como as pessoas internalizam, decodificam e constroem suas representações em relação à
política e aos princípios democráticos. Esse debate torna-se profícuo na medida em que se
reconhece que, além das instituições, os aspectos culturais contribuem para o fortalecimento
democrático. Dessa forma, verifica-se que essas duas dimensões não são mutuamente
excludentes, pelo contrário, são complementares.
Nessa perspectiva, as pesquisas de opinião permitem avaliar os padrões atitudinais dos
cidadãos em relação à democracia e captar os veis de satisfação com o funcionamento das
instituições políticas. Sabe-se, por exemplo, que percentuais significativos da população
evidenciam apoio à democracia, porém, ao mesmo tempo revelam altos índices de
insatisfação com o desempenho socioeconômico do regime. Tais atitudes decorrem do
aumento da pobreza e da exclusão social, bem como da crescente onda de denúncias de
corrupção nos governos, o que contribui para o distanciamento e o descrédito dos cidadãos em
relação à política.
No caso do Brasil, esse cenário de crise política e econômica tem gerado desconfiança
e mal-estar das pessoas em relação à esfera política, abrindo espaço para a manutenção de
elementos tradicionais no regime democrático, tais como clientelismo, nepotismo e
personalismo. Alterar esse quadro, de modo a garantir maior estabilidade e legitimidade à
democracia requer mudanças na cultura política brasileira. Nesse sentido, parte-se do
pressuposto de que os valores, atitudes e comportamentos participativos são essenciais na
construção de uma cultura política democrática e no fortalecimento das instituições políticas.
28
1.1 TEMA DA PESQUISA
Existe vasta literatura sobre comportamento político e eleitoral no Brasil que, sob
diferentes perspectivas e enfoques, busca explicar as motivações para o voto, analisar os
principais fatores da decisão eleitoral e avaliar as atitudes, crenças e opiniões dos cidadãos em
relação à política. A Ciência Política brasileira tem incorporado em suas análises as principais
vertentes teóricas da literatura internacional representadas pelas correntes sociológica,
psicossociológica e teoria da escolha racional
1
.
A perspectiva sociológica propõe analisar o comportamento eleitoral a partir de fatores
histórico-estruturais e econômicos que, por sua vez, determinam as preferências partidárias
dos eleitores. A participação eleitoral e as decisões individuais passam a ser compreendidas
dentro dos contextos sociais nos quais os eleitores estão inseridos. De acordo com Castro
(1994, p. 65),
a hipótese mais geral que orienta este tipo de estudo é que processos sociais
amplos, como o avanço do capitalismo, são acompanhados por mudanças
estruturais importantes, como a industrialização e a urbanização, que
possibilitam a manifestação das clivagens sociais no apoio de camadas do
eleitorado – classes sociais ou estratos diferentes – a determinados partidos e
candidatos.
Os primeiros estudos sobre comportamento eleitoral no Brasil se inserem nessa
perspectiva de análise e estabelecem uma associação entre classe social e voto, considerando
que a posição que os indivíduos ocupam na estrutura social explica suas preferências
eleitorais e partidárias (SIMÃO, 1956; SOARES, 2001 [1973]; REIS, 1978). Gláucio Soares
(2001) argumenta que o legado marxista muito influenciou as pesquisas de cunho sociológico
daquele período e que a teoria das classes sociais em muito contribuiu para explicar o
1
Para uma revisão das principais teses do comportamento eleitoral, ver os trabalhos de Figueiredo (1991);
Castro (1994); Radmann (2001); Carreirão (2002).
29
comportamento político dos cidadãos. De acordo com o autor, “o que se demonstrou é que,
naquele momento e naquele contexto, a situação de classe e a consciência de classe
condicionavam – quase determinando – as ideologias, as preferências partidárias, a intenção
de voto” (SOARES, 2001, p. 237).
Um dos limites analíticos dessa corrente é de que a explicação do voto baseia-se
apenas em categorias globais e estruturais. As mudanças ocorridas no cenário político e
econômico nas décadas de 1970 e 1980 se configuram numa reestruturação e diluição das
identidades de classe nas sociedades complexas, de modo que a associação entre classe social
e identidade partidária perde a força explicativa. A decisão eleitoral passa a ser analisada mais
pela identificação com os candidatos e com os issues relevantes conjunturalmente do que pela
identidade partidária (CASTRO, 1994; BAQUERO, 1997).
Uma outra abordagem bastante utilizada pelos pesquisadores brasileiros é a teoria da
escolha racional, que propõe explicar o comportamento eleitoral a partir do pressuposto da
racionalidade dos indivíduos. De acordo com essa perspectiva, o voto é uma ação
instrumental e estratégica que deve trazer maiores benefícios para o eleitor, indivíduo com
capacidade de pensar e agir logicamente, de analisar e interpretar a realidade e de estabelecer
comparações, guiado por um padrão de comportamento (DOWNS, 1999; FIGUEIREDO,
1991). Os eleitores votam no partido político que acredita estar mais próximo de suas
posições e que, na sua avaliação lhe trará maiores benefícios. Ao propor a identificação
partidária como fator explicativo do voto, a teoria da escolha racional afirma que não se trata
de uma adesão afetiva, mas racional.
As críticas dirigidas à teoria da escolha racional se referem à formação de preferências
e à adoção de esquemas simplistas na explicação dos fenômenos sociais e políticos. Os
indivíduos, necessariamente, não verificam continuamente a racionalidade de suas ações,
fazendo isto apenas quando confrontados com conseqüências não intencionais. Dessa forma,
30
autores argumentam que a ação dos indivíduos deve ser compreendida a partir do contexto
estrutural e cultural no qual estão inseridos, pois os custos e benefícios não são calculados no
vazio, mas definidos pelas possibilidades culturais (RENNÓ, 1999; BAERT, 2005; HALL e
TAYLOR, 2005).
Além de considerar a situação socioeconômica do eleitor, a perspectiva
psicossociológica introduz na análise do comportamento eleitoral fatores de nível micro e
aspectos psicológicos, como as percepções, valores, crenças, atitudes e motivações dos
indivíduos. Lavareda (1999), utilizando-se de resultados eleitorais agregados e dados de
pesquisas de opinião referentes aos pleitos realizados no período de 1945 a 1964, argumenta
que a congruência entre identificação partidária e intenção de voto varia em função da cultura
política e de fatores do quadro legal-institucional vigente. De acordo com o autor, a “análise
evidencia o fato de que um processo de consolidação do sistema partidário, em termos de seus
vínculos psicológicos com o eleitorado, estava em marcha pelo menos nos últimos anos
daquela fase republicana” (LAVAREDA, 1999, p. 181).
Um dos pressupostos da corrente psicossociológica é o de que as preferências
partidárias, estabelecidas a partir de laços afetivos e ideológicos, correspondem à escolha
eleitoral. Contudo, pesquisas evidenciam baixo grau de informação e de estruturação
ideológica do eleitorado, e o predomínio do voto personalista sobre o voto partidário
(CASTRO, 1994; BAQUERO, 1997; RADMANN, 2001).
Observa-se que a identificação partidária, sob diferentes aspectos, predomina como
fator explicativo do voto para as três perspectivas de análise. A corrente sociológica aborda a
questão da preferência partidária como fruto das interações sociais e da relação entre posição
social e partidos políticos. A teoria da escolha racional argumenta que a adesão partidária é
racional e tem como objetivo diminuir os custos de aquisição e processamento de informações
políticas, necessárias para decidir o voto. A corrente psicossociológica parte do pressuposto
31
que a identificação partidária baseia-se em laços afetivos e psicológicos, fruto do processo de
socialização política ocorrido desde a infância. O declínio da importância dos partidos
políticos, especialmente na América Latina, compromete o poder explicativo das três
perspectivas analíticas, indicando a necessidade de incorporar um conjunto de fatores e
condicionantes na análise do comportamento político e da decisão eleitoral.
Um dos argumentos para o declínio da identificação partidária é a expansão dos meios
de comunicação nos processos políticos e eleitorais e o conseqüente fortalecimento dos
vínculos diretos entre candidatos e eleitores. A escolha eleitoral pauta-se numa relação de
confiança com os políticos e de identificação pessoal (MANIN, 1995; MAINWARING,
2001). Outra vertente de análise sugere que o declínio dos partidos está associado ao processo
de modernização contemporânea e à institucionalização de valores pós-materialistas
(DALTON, 2000; INGLEHART, 2002). Essa tese não se aplica ao contexto latino-americano,
cuja base material não foi resolvida, como, por exemplo, a satisfação das necessidades mais
elementares do ser humano: alimentação, habitação, saúde e educação.
A seguir, apresenta-se um quadro sintético das principais teses do comportamento
eleitoral no Brasil, tendo como base alguns estudos realizados sobre essa temática. Busca-se
destacar a perspectiva adotada, as evidências e os resultados encontrados, bem como as
lacunas apontadas pela literatura corrente. Dessa forma, pretende-se situar a presente tese em
um quadro teórico, expondo as categorias analíticas adotadas neste trabalho.
32
QUADRO 1
Principais Teses do Comportamento Eleitoral no Brasil
Autor Perspectiva
Teórica
Hipóteses Pesquisa empírica Evidências
Apontadas
Lacunas
Fábio W.
Reis (org.)
1978
Perspectiva
sociológica
Existe uma
correlação entre a
decisão do voto e a
identificação
partidária, sendo
que esta é definida
pela classe social
e/ou pelo contexto
social no qual o
indivíduo está
inserido.
Pesquisa empírica
realizada por ocasião
das eleições
municipais de 1976
em 4 cidades de porte
médio: Presidente
Prudente, SP; Caxias
do Sul, RS; Niterói,
RJ; Juiz de Fora, MG.
Existem diferentes
lógicas que
estruturam o voto
dentro de diferentes
contextos sócio-
econômicos. Os
autores encontraram
correlações positivas
entre preferência
partidária e
indicadores de
posição social.
A associação entre
classe social e
identificação
partidária pressupõe
consciência de classe
e ideologia, dois
fatores que perderam
a força diante da
reestruturação sócio-
econômica das
sociedades
contemporâneas.
Marcus
Figueiredo
(1991)
Teoria da Escolha
Racional
A decisão
individual de abster-
se ou participar
como eleitor tem
um fundamento
racional,
dissolvendo com
isso, o paradoxo da
participação.
Com base na teoria
dos jogos, o autor
constitui um quadro
com as possibilidades
decisórias decorrentes
da interação de três
variáveis:
preferências
eleitorais, chances de
vitória entre os
candidatos, e as
expectativas de cada
eleitor sobre o
comportamento dos
demais.
A incerteza sobre os
resultados eleitorais
estimula a
participação dos
cidadãos no
processo político.
Estes, guiados por
comportamentos
racionais avaliam
um conjunto de
preferências,
visando selecionar
aquela que oferecerá
maiores benefícios.
Além de fazer
deduções sobre as
preferências
partidárias
utilizando-se apenas
dos resultados
eleitorais, este
trabalho falha ao
tentar explicar os
fenômenos sociais a
partir de indivíduos
isolados e autônomos
em relação aos
contextos sociais
(Castro, 1994).
André
Singer
(2000)
Perspectiva
Psicossociológica
A identificação
ideológica é um dos
principais fatores na
escolha eleitoral. A
autolocalização no
espectro direita-
esquerda associa-se
a um sistema de
crenças e imagens
políticas do eleitor.
Utilização de dados
de três pesquisas
realizadas no âmbito
do Projeto "Cultura
Política e
Consolidaçao
Democrática no
Brasil", patrocinada
pelo consórcio entre o
Instituto DataFolha,
Cedec e USP, em
1989 e 1994.
Analisando as
eleições
presidenciais de
1989 e 1994, o autor
afirma que o
eleitorado se
posicionou mais ao
centro, inclinando-se
à direita no espectro
ideológico e votou
no candidato que
lhes pareceu ser o
"defensor do povo".
Para uma parcela
significativa do
eleitorado, os termos
"esquerda" e
"direita" não possui
nenhum significado
político. Pesquisas
mostram um eleitor
mais pragmático e
menos ideológico na
escolha de seus
candidatos (Baquero,
1997).
Mônica
Castro
(1994)
Articulação entre a
perspectiva
sociológica,
psicossociológica
e teoria da escolha
racional.
O comportamento
eleitoral é resultado
de uma rede
complexa de
condicionantes. As
escolhas eleitorais
se dão em função de
atributos sociais
(dimensão macro) e
de características
políticas, como
interesse,
envolvimento e
informação política
(dimensão micro).
Utilização de um
survey nacional,
realizado pelo
Instituto Vox Populi,
e um survey realizado
em Belo Horizonte
pelo Departamento de
Ciência Política da
FAFICH/UFMG,
meses antes das
eleições de 1989.
Os dados sugerem
que a sofisticação
política é uma
variável importante
na estruturação
ideológica dos
eleitores. O voto dos
mais sofisticados é
orientado por
preferências
partidárias e
ideológicas.
O ponto crítico do
trabalho é em relação
à forma diferenciada
com que a autora
analisa a relação de
causalidade entre
sofisticação política,
racionalidade e
intenção de voto
(Carreirão, 2002).
Quadro elaborado pela autora.
33
As pesquisas referenciadas no Quadro 1 revelam a importância da temática para a
Ciência Política e mostram a pertinência da realização de abordagens que levem em conta um
conjunto de variáveis e indicadores que permitam análises contextualizadas e articuladas
sobre o comportamento político e eleitoral. Há diversos estudos que articulam diferentes
perspectivas teóricas tendo em vista construir um modelo analítico mais complexo sobre
comportamento político. Mônica Castro (1994) considera as dimensões macro (características
sócio-econômicas e políticas) e micro (interesse, envolvimento e informação política) em sua
análise sobre o comportamento eleitoral brasileiro. Por sua vez, Lúcio Rennó (1999) propõe
uma abordagem que articula a teoria da escolha racional com a teoria da cultura política,
combinando o estudo de valores e crenças associado à racionalidade dos indivíduos, que
traçam planos coerentes, visando maximizar preferências e minimizar custos. O autor busca
entender o comportamento político através da ação individual, configurada e orientada por
arranjos institucionais e culturais.
Os estudos de cultura política destacam a importância da matriz histórico-cultural dos
países latino-americanos na análise do comportamento político e da institucionalização da
democracia. A vertente teórica adotada neste trabalho propõe articular a perspectiva
psicossociológica e a teoria da cultura política, com o objetivo de explicar a lógica do
comportamento político no município de Toledo, Paraná, tendo em vista avaliar as crenças,
atitudes, motivações e percepções dos indivíduos em relação à política e às instituições
democráticas. A análise do comportamento político-eleitoral em um contexto local e sob a
perspectiva da cultura política mostra-se relevante para compreender os meandros da
democracia, tendo como base a formação de valores, normas e atitudes políticas dos cidadãos
frente a política local e nacional.
O trabalho pretende contribuir teoricamente para o debate sobre a democracia no
Brasil, propondo uma abordagem sinérgica que pondera a importância do desempenho das
34
instituições democráticas e os aspectos da cultura política no fortalecimento dessas
instituições. Parte-se do pressuposto de que a confiança institucional e a participação política
são importantes indicadores da cultura política democrática. A temática justifica-se e mostra-
se pertinente pela contribuição a novos estudos sobre comportamento político e eleitoral em
contexto regional tendo em vista a escassa produção sobre o tema no âmbito dos municípios
do Oeste paranaense.
1.2 CONTEXTUALIZAÇÃO DO PROBLEMA
A investigação social e a construção do conhecimento na área das Ciências Sociais
implicam na contextualização do problema de pesquisa e na determinação de sua relevância.
Contexto e metagenda são definidos por Brunner e Sunkel (1993, p. 20) como um “conjunto
de condições mais gerais que marcam a orientação de uma sociedade através de seu sistema
político, a organização e funcionamento de sua economia e as idéias, crenças e valores
predominantes em sua cultura”. A metagenda, tema-foco em torno do qual se estruturam,
ordenam e expressam os assuntos de interesse público, opera como um marco de significação
e identificação do objeto de pesquisa e das temáticas relevantes a serem estudadas.
De acordo com os autores, contexto e metagenda contribuem para definir as instâncias
diretoras, capazes de incidir decisivamente na condução da sociedade para enfrentar e resolver
os problemas derivados da metagenda pública (BRUNNER e SUNKEL, 1993). No caso do
Brasil, o combate à corrupção foi a principal metagenda do governo Collor. Para o governo
Fernando Henrique, foi o combate à inflação, ao passo que o combate à fome tornou-se a
principal metagenda do governo Lula. A presente pesquisa se insere na metagenda da
desconfiança, do individualismo e do personalismo político, marcada pelo contexto de uma
35
democracia formal de caráter excludente e pela baixa participação e envolvimento político
dos cidadãos.
Os estudos sobre o comportamento político do ponto de vista espacial são relevantes
para compreender e caracterizar os aspectos do sistema político mais amplo e as relações de
poder que se estabelecem entre a esfera municipal, estadual e federal. Recentes pesquisas
mostram que a política no Estado do Paraná, especialmente nos pequenos municípios,
configura-se pela ênfase na política local, no clientelismo e no personalismo como
mecanismos de sustentação política. A continuidade de padrões tradicionais nas relações de
poder imprime um caráter personalista à política municipal, marcada por uma matriz
histórico-estrutural conservadora e autoritária (NAZZARI, 2002; OLIVEIRA, R., 2001).
A esse respeito, Roberto DaMatta (1993) argumenta que a naturalização desses
elementos tradicionais no processo político brasileiro está relacionada a questões culturais e
históricas, o que nos diferencia de muitos outros países. As relações pessoais recebem mais
peso e importância do que as leis e as normas, contribuindo para reforçar o familismo e o
patrimonialismo nas relações público-privado. De acordo com o autor, esse cenário favorece a
continuidade de um Estado extremamente autoritário e perverso do ponto de vista da cultura
política democrática (DAMATTA, 1993).
O processo de ocupação da região Oeste do Paraná, marcado pela presença de famílias
tradicionais no domínio do poder político e econômico, produz uma dinâmica política
submetida a uma lógica ditada pelas lideranças locais, percebidas como os donos do poder e
da municipalidade. Observa-se que o personalismo e o clientelismo vigoram com relativa
força no processo político dos municípios do Oeste Paranaense, gerando uma incongruência
entre atitudes e valores democráticos e um distanciamento entre cidadãos e instituições
políticas. Nesse contexto, busca-se compreender a lógica do comportamento político no
município de Toledo a partir da investigação das seguintes questões:
36
1) Qual o impacto das práticas clientelistas e das relações personalistas no
comportamento político dos toledanos?
2) Os índices de baixa participação verificados no país e no Estado do Paraná encontram
correspondência com aqueles encontrados no município de Toledo?
3) Qual a relação entre conhecimento, informação e interesse político e os níveis de
participação política do eleitorado?
4) De que forma os indicadores de confiança contribuem para o fortalecimento da
política local e das instituições democráticas?
1.3 OBJETIVOS DA PESQUISA
O objetivo geral desta tese é compreender a lógica do comportamento político no
município de Toledo, a partir da identificação das percepções, motivações e atitudes dos
toledanos em relação ao processo político, tendo como base a abordagem psicossociológica e
a teoria da cultura política.
A pesquisa pretende alcançar cinco objetivos específicos:
a) Analisar o perfil do eleitorado e o nível de participação política dos cidadãos nos
canais formais e informais da política local;
b) Analisar os traços do personalismo e do clientelismo presentes na região Oeste do
Paraná e seu impacto no comportamento político dos eleitores;
c) Verificar o quadro partidário predominante no período de 1952 a 2004 no Estado e nos
municípios do Oeste paranaense;
37
d) Relacionar as variáveis da cultura política com os dados agregados eleitorais,
buscando compreender a lógica eleitoral na região;
e) Verificar se os dados encontrados no município de Toledo corroboram com dados de
pesquisas nacionais no tocante ao comportamento eleitoral.
1.4 HIPÓTESES DO TRABALHO
Com base em pesquisa empírica, busca-se testar três hipóteses sobre o comportamento
político no âmbito do município de Toledo:
Hipótese 1: Quanto maior a escolaridade e o interesse por política, menor a
probabilidade do voto personalista sobrepor-se ao voto programático/partidário.
Hipótese 2: Quanto maior a descrença e a desconfiança dos cidadãos nas instituições
democráticas, menor a sua participação política.
Hipótese 3: Quanto mais baixa a participação política do eleitorado, maior o
predomínio do voto personalista.
1.5 ASPECTOS METODOLÓGICOS
O estudo do comportamento político e dos valores intrínsecos à esfera política
favorece o surgimento da pesquisa empírica e sistemática na área da Ciência Política,
especialmente a partir da década de 1960. Os valores culturais, as crenças e hábitos tornam-se
fatores analíticos importantes na explicação dos fenômenos sociais e políticos, e as
regularidades do comportamento político passam a ser testadas empiricamente através de
38
técnicas quantitativas. De acordo com Easton (1968, p. 46), a "abordagem do comportamento
representa o início de uma fase de teorização nas ciências sociais como um todo, associada,
no entanto, aos princípios e métodos da ciência empírica". Os estudos de cultura política,
utilizando-se da pesquisa comparada e da estatística, permitem a operacionalização dos
conceitos e a construção de teorias, bem como modelos explicativos a respeito do
funcionamento das instituições políticas e das estruturas de poder (ALMOND e VERBA,
1965; EASTON, 1968).
Em seu estudo The Civic Culture: political attitudes and democracy in five nations,
Gabriel Almond e Sidney Verba (1965), comparam as diferenças entre cinco democracias
contemporâneas e vislumbram um conjunto de atitudes que teoricamente favorecem a
participação política e a estabilidade democrática, evidenciando uma congruência entre
padrões de atitudes e qualidades do sistema político. O estudo da cultura cívica mostra que a
educação é uma importante variável na formação de atitudes políticas nos países estudados.
Uma das principais contribuições dos autores para a Ciência Política é a incorporação das
variáveis institucionais e culturais como intervenientes das variáveis histórico-estruturais, via
política comparada.
Um dos pressupostos fundamentais dessa abordagem é a possibilidade de comparar
sistemas políticos, independentemente das diferenças culturais, históricas e políticas das
nações. A comparação pode ser feita a partir da maximização das diferenças para comparar
semelhanças ou da maximização das semelhanças para encontrar diferenças. A pesquisa
comparada permite conhecer os diferentes sistemas políticos e examinar o impacto destas
diferenças sobre outros fenômenos sociais observados dentro destes sistemas. Dessa forma, a
meta da pesquisa é confirmar afirmações gerais sobre o comportamento político, em um dado
contexto, num determinado espaço e tempo (PRZEWORSKI e TEUNE, 1970).
39
A técnica de levantamento de dados - survey - passa a ser amplamente utilizada nos
estudos de cultura política e do comportamento eleitoral. As opiniões colhidas em uma
amostra representativa permitem, dentro de uma margem de erro, generalizar os resultados
para o conjunto da população. A coleta e a quantificação dos dados se tornam fontes
permanentes de informação ao serem transformadas em códigos e analisadas estatisticamente.
A pesquisa de survey permite descrever e explicar a distribuição de traços, atributos, atitudes
e comportamentos de determinada nação, além de possibilitar o estabelecimento de
comparações com outras nações e sistemas políticos. A pesquisa quantitativa remete à idéia
de causalidade entre variáveis, com ênfase na objetividade, validade e construção de teorias
(BAQUERO, R., BAQUERO, M. e GONÇALVES, 1995).
A amostragem refere-se à coleta de dados relativos a alguns elementos da população
que poderão proporcionar informações relevantes sobre toda a população. Existem dois tipos
de amostragem na pesquisa quantitativa: a probabilística e a não-probabilística, utilizadas de
acordo com o tipo de pesquisa a ser desenvolvida. O princípio básico da amostragem
probabilística é a aleatoriedade, que garante a todos os membros da população igual
oportunidade de serem incluídos na amostra. A amostragem estratificada e por conglomerados
em múltiplas etapas é a mais utilizada nas pesquisas de opinião pública. Na amostragem não-
probabilística, a amostra não é aleatória e se dá com base no conhecimento que o pesquisador
tem da população. A seleção de amostra por quotas é a forma mais usual de amostragem não-
probabilística. Neste caso, são consideradas várias características da população, em geral as
sócio-demográficas, e amostradas proporcionalmente ao número da população (SELLTIZ et
al, 1967; BABBIE, 2001).
As abordagens teórico-metodológicas da corrente psicossociológica e da teoria da
cultura política utilizam as técnicas da pesquisa quantitativa, assim como as técnicas da
pesquisa qualitativa, tendo em vista serem complementares entre si e coerentes com os seus
40
pressupostos epistemológicos. Dessa forma, o estudo desenvolvido nesta tese propõe a
combinação do método quantitativo e qualitativo, visando compreender a cultura política e a
dinâmica do comportamento político dos toledanos, por diferentes fontes de informação.
Para a pesquisa quantitativa são utilizados dados de survey provenientes de pesquisa
realizada no município de Toledo em 2002, nos meses que antecederam as eleições para
Presidente da República e para Governador do Estado. A pesquisa intitulada “Comportamento
Político e Decisão Eleitoral no Oeste do Paraná”, teve como objetivo compreender a
complexa rede de determinantes que envolvem a decisão eleitoral no município de Toledo
2
.
Na ocasião, foi constituída uma amostra não-probabilística de 300 eleitores, residentes na área
urbana do município, com idade acima de 16 anos, e estratificada por bairro e sexo, segundo
dados do Censo Demográfico de 2000. Dessa forma, os 21 bairros cadastrados pelo IBGE
foram incluídos na amostra e a população masculina e feminina distribuída proporcionalmente
ao número da população por bairro/sexo levantada pelo IBGE (ver Anexo A).
O questionário, composto de 26 questões fechadas e 2 questões abertas, buscou sondar
variáveis relacionadas às características sócio-demográficas, interesse por política, preferência
partidária, decisão do voto, fatores na escolha eleitoral, intenção de voto para governador e
para presidente, confiança nas instituições políticas e participação política dos cidadãos (ver
Apêndice A). O instrumento foi construído a partir de duas pesquisas realizadas em 1989,
uma pelo Instituto DataFolha/CEDEC sobre Cultura Política, aplicada em todo o Brasil, e
outra pelo Departamento de Ciência Política da UFMG sobre as Eleições Presidenciais,
aplicada em Belo Horizonte, MG.
O programa Statistical Package for Social Science - SPSS permitiu a distribuição de
freqüências, o cruzamento de variáveis e a avaliação do grau de associação entre elas. Para a
2
O banco de dados está disponível no Núcleo de Documentação e Pesquisa da Universidade Estadual do Oeste
do Paraná (Unioeste), Campus de Toledo, no software Statistical Package for Social Science - SPSS, o qual
permite a descrição de freqüências e o cruzamento de variáveis.
41
construção do índice de interesse por política foram utilizadas quatro variáveis que avaliam o
interesse dos cidadãos por informações políticas e o seu envolvimento político. A correlação
entre essas variáveis foi identificada através de análise fatorial (ver Apêndice B).
Para a pesquisa qualitativa, foram realizadas entrevistas semi-estruturadas, no primeiro
semestre de 2006, no referido município, com o objetivo de explorar as diferentes opiniões e
pontos de vista dos cidadãos sobre a política nacional e local, e aprofundar aspectos da cultura
política encontrados na pesquisa quantitativa, especialmente em relação ao clientelismo,
personalismo, nepotismo e corrupção - categorias analíticas vigentes na democracia brasileira.
Utilizou-se de roteiro flexível visando favorecer o diálogo entre entrevistador e entrevistado
(ver Apêndice C).
Ser eleitor e morador do município de Toledo foi o critério utilizado para a seleção dos
entrevistados. A primeira etapa consistiu no levantamento de movimentos sociais, associações
e ONG’s atuantes no município, dos partidos predominantes no cenário político local, dos
meios de comunicação e das igrejas presentes na região. O objetivo era entrevistar eleitores
com diferentes características e inseridos em diferentes campos de atuação, de modo a captar
a diversidade de opiniões e percepções sobre a política e as instituições democráticas.
A segunda etapa – escolha dos entrevistados – apoiou-se no “sistema de rede”, o qual
busca indivíduos-chave que disponham de informações sobre determinado segmento social e
que indiquem pessoas, como a técnica da bola de neve, em que os participantes sugerem
outros participantes para serem entrevistados. No caso dos vereadores, a seleção se deu
proporcionalmente ao número de partidos políticos presentes na Câmara Municipal. Tendo
em vista que a pesquisa qualitativa privilegia mais a qualidade da informação do que o
número de entrevistados que compartilham tais informações, foram entrevistados 20
toledanos inseridos nos diferentes segmentos sociais: seis (6) representantes da política local,
42
quatro (4) eleitores e dez (10) representantes da sociedade civil (ONG’s, Sindicatos, Meios de
Comunicação, Igrejas, Associações).
A entrevista semi-estruturada está entre as técnicas de pesquisa qualitativa mais
utilizada nas Ciências Sociais, pois fornecem dados básicos para o desenvolvimento e a
compreensão das relações sociais, como fatos, idéias, crenças, opiniões, sentimentos e
comportamentos, contribuindo para elucidar condições estruturais, sistemas de valores,
representações sociais e culturais, de modo a refletir as interações e relações sociais e políticas
existentes na sociedade. A realização de entrevistas em profundidade contribui para elucidar o
processo de formação da opinião e da tomada de decisões. De acordo com Minayo (2004), a
entrevista refere-se a uma situação de interação entre entrevistado e entrevistador,
favorecendo a descrição dos fenômenos sociais, assim como uma compreensão detalhada das
crenças, atitudes, valores e motivações, em relação aos comportamentos das pessoas em
contextos sociais específicos.
A fim de desenvolver a análise proposta, utiliza-se, portanto, da abordagem quali-
quantitativa por permitir a construção de indicadores e índices fundamentados na percepção
dos atores sociais. Os fenômenos políticos e sociais podem ser analisados em toda a sua
complexidade, se tais métodos e técnicas de pesquisa estiverem integradas num mesmo
projeto, fruto de uma triangulação metodológica (MINAYO, 2004). O período diferenciado
na realização das pesquisas contribuiu para melhor avaliar a matriz histórico-estrutural da
cultura política toledana, que se mantém ao longo dos anos.
Finalmente, além dos dados primários, a pesquisa utiliza-se de resultados eleitorais
fornecidos pelo Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE/PR), dados da pesquisa do
Estudo Eleitoral Brasileiro (ESEB) fornecidos pelo Centro de Estudos de Opinião Pública
(CESOP/UNICAMP), e dados de pesquisa sobre o perfil dos municípios brasileiros obtidos
junto ao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
43
1.5 ESTRUTURA DO TRABALHO
No capítulo introdutório são apresentados o tema, a contextualização do problema, os
objetivos e as hipóteses, bem como os aspectos metodológicos da pesquisa.
No Capítulo 2, são abordados os referenciais teóricos que norteiam essa tese. Procede-
se a uma discussão sobre o significado de democracia e sobre a relevância e atualidade do
conceito de cultura política na análise do comportamento político.
O Capítulo 3 discute os fundamentos do clientelismo e do personalismo político nas
sociedades contemporâneas e a sua incidência na política brasileira. Objetiva analisar,
também, as práticas clientelistas que insistem em permanecer dentro das novas formas de
intermediação de interesses.
No Capítulo 4, analisam-se os determinantes históricos e socioeconômicos do Oeste
do Paraná, situando política, econômica e geograficamente o município de Toledo. Dada a
importância de estudos sobre comportamento político em contexto regional, busca-se
caracterizar a política local, abordando aspectos do sistema político municipal e as tendências
do quadro partidário configuradas na região.
No Capítulo 5, utilizam-se dados de um survey realizado em 2002 no município de
Toledo, com o objetivo de caracterizar a cultura política toledana. É desenvolvida análise
descritiva das variáveis sócio-demográficas e das variáveis atitudinais relativas à participação
política e à confiança nas instituições democráticas.
Com base nos dados quantitativos e qualitativos, o Capítulo 6 analisa os principais
fatores da escolha eleitoral e a da motivação do voto. Busca-se testar as três hipóteses da tese,
de modo a compreender a lógica do comportamento eleitoral que se configura em Toledo.
44
No Capítulo 7 examinam-se quais as concepções dos toledanos sobre a democracia e
sobre o poder político no âmbito nacional e municipal. Abordam-se as percepções dos
cidadãos sobre a política local, especialmente sobre as temáticas da corrupção, do nepotismo e
do clientelismo.
Por fim, o Capítulo 8 apresenta as principais proposições sustentadas pelos dados e as
considerações finais sobre o presente estudo. Busca-se apontar novas perspectivas de pesquisa
para a região Oeste do Paraná, tendo em vista contribuir com outros estudos sobre
comportamento político no contexto regional.
45
2 CULTURA POLÍTICA E ALCANCES DA DEMOCRACIA
Este capítulo tem por objetivo discutir conceitos teóricos que norteiam a análise do
comportamento político. O texto está estruturado de modo a pontuar, inicialmente, o debate
sobre o significado da democracia no contexto brasileiro. Pesquisas indicam que o sentimento
favorável à democracia e a predisposição atitudinal à participação não têm se materializado
em comportamentos participativos, evidenciando ambigüidades da cultura política e uma
incongruência entre atitude e comportamento democrático.
A seguir, examinam-se as novas formas de participação política nas democracias
contemporâneas. Dentro desse marco de análise, situam-se autores que argumentam que, a
despeito do declínio da participação política convencional, surgem novas institucionalidades
as quais visam promover a cidadania e a inclusão social.
A terceira seção situa os parâmetros da perspectiva teórica de cultura política. Sua
relevância consiste em aferir atitudes, valores, normas e crenças que, internalizados,
traduzem-se em comportamentos no processo de construção democrática. Argumenta-se que a
cultura política é uma variável importante que contribui para compreender a estabilidade e as
mudanças dos sistemas políticos.
Por fim, busca-se articular os pressupostos teóricos da abordagem psicossociológica e
da cultura política visando construir uma explicação mais ampla e consistente da lógica do
comportamento político. Trata-se de abordar a temática tendo em vista os aspectos histórico-
estruturais, institucionais e atitudinais, avaliando as ações das pessoas em relação à política.
46
2.1 DEMOCRACIA NO CONTEXTO LATINO-AMERICANO
A democracia representativa, ao estabelecer o princípio dos direitos, da liberdade, da
igualdade e da representação política, via procedimentos e regras democráticas, revela-se o
paradigma predominante de governo nas sociedades contemporâneas. Segundo essa
perspectiva, a democracia caracteriza-se pela contínua responsividade do governo às
demandas e preferências de seus cidadãos, expressas por meio da participação eleitoral e da
contestação pública. "Para suscitar adesão e participação, a democracia tem de gerar
resultados substantivos, ela deve oferecer a todas as forças políticas relevantes oportunidades
reais de melhorar suas condições de bem-estar material” (PRZEWORSKI, 1994, p. 54). Dessa
forma, a participação política dos cidadãos deverá ser motivada pelos resultados sociais,
políticos e econômicos gerados pelo regime democrático.
Nessa perspectiva, Robert Dahl (1997; 2001) refere-se à democracia como uma
poliarquia, um sistema político que garante direitos civis e políticos a todos os cidadãos,
considerados politicamente iguais. Entre esses direitos cabe destacar o de votar em eleições
livres, o de candidatar-se a cargos públicos, o de exercer oposição ao governo, o de participar
de organizações políticas, o de manifestar-se publicamente, o de ler e ouvir opiniões
divergentes sobre questões políticas. Como pré-requisitos para o bom funcionamento de uma
poliarquia, o autor argumenta que deve haver consenso sobre as regras do jogo democrático e
sobre as opções políticas, e legitimidade da atividade política. A democracia é, portanto, um
sistema político que deve promover o consenso, a moderação, a estabilidade política e a paz
social.
Dessa forma, a abordagem institucionalista, pautada nos pressupostos da teoria da
escolha racional, compreende a origem e a manutenção das instituições políticas como um
acordo voluntário firmado entre os atores interessados. Estes, guiados por comportamentos
47
racionais e estratégicos, avaliam um conjunto de preferências e escolhas, de modo
inteiramente utilitário, escolhendo aquela que lhes oferecerá maiores benefícios. Nessa
perspectiva, a democracia é definida como um conjunto de regras procedimentais que visa
selecionar um governo e gerar resultados que decorrem de negociações entre as forças
políticas, as quais competem entre si dentro de estruturas institucionais, em intervalos
periódicos, resultando na vitória de uns e na derrota de outros (PRZEWORSKI, 1994;
DOWNS, 1999).
Desse ponto de vista, os partidos políticos são instituições fundamentais para o
funcionamento da democracia, não apenas por se constituírem em canais de representação e
de mediação entre cidadãos e Estado, mas por se constituírem em atores de intervenção na
arena decisória e governamental. Segundo Wanderley Guilherme dos Santos (1985), os
partidos adquirem a supremacia, o oligopólio e a universalidade da representação em meados
do século XIX, caracterizado como o “século de Michels” em virtude da consolidação de
burocracias especializadas na arena democrática. A extensão do sufrágio eleitoral e a
nacionalização da disputa política efetiva-se com o processo de industrialização e
urbanização, caracterizando o apogeu dos partidos políticos. De acordo com o autor, o
surgimento de novos movimentos sociais marca a quebra do oligopólio da representação
partidária como forma exclusiva da participação política.
De acordo com pesquisas realizadas na América Latina, não há um consenso sobre o
significado de democracia, concebida como a melhor forma de governo. Em termos políticos
e ideais, a democracia é vista como um conjunto de instituições, normas e práticas que visa o
desenvolvimento humano e a liberdade política. Em termos sociais, a democracia é
compreendida como um regime que visa potencializar não apenas a liberdade política, mas a
igualdade socioeconômica entre os cidadãos. Contudo, a democratização na América Latina
opera em um contexto de elevada exclusão e desigualdade social, não permitindo a
48
consolidação de uma sociedade democrática. Entre as condições que obstaculizam o
desenvolvimento da democratização, Barreda e Costafreda (2004) apontam duas: os graves
problemas econômicos e sociais na região, e a prevalência de uma institucionalidade informal
que constrange a democracia.
Nesse contexto, os latino-americanos mostram-se insatisfeitos com o funcionamento
da democracia e com a atuação dos partidos políticos. Verifica-se um ceticismo em relação às
instituições políticas, o que não é exclusivo desses países (BAQUERO, 2000; ALCÂNTARA,
2001). Dados da Pesquisa Mundial de Valores (World Values Survey), coordenada por Ronald
Inglehart, evidenciam o sistemático declínio dos partidos políticos, o descrédito e a
desconfiança nas instituições democráticas em diversas democracias ocidentais. Mas, em
contrapartida, cresce o interesse dos cidadãos pelos direitos humanos, pela questão ambiental
e pela qualidade de vida, confirmando uma mudança efetiva nos padrões de participação
política, expressa pela adesão e apoio aos novos movimentos sociais (INGLEHART, 2002).
No entanto, o que ocorre nas democracias latino-americanas é o afastamento dos cidadãos da
esfera política, tanto do nível formal como informal, devido ao déficit democrático entendido
aqui como a queda da qualidade de vida e a negligência com a dimensão social.
Nesse sentido, além da dimensão procedimental, que é parte essencial na construção
democrática, é necessário incorporar normas democráticas e uma base normativa de apoio ao
sistema político. Na acepção de David Easton (1968) o apoio difuso, baseado em laços de
lealdade e afeição, envolve atitudes relacionadas com a aprovação das características
essenciais do sistema político, e o apoio específico relaciona-se com o grau de satisfação dos
cidadãos com o desempenho dos políticos e dos governantes. O autor argumenta que a
ausência de respostas do sistema político (outputs) às demandas da população (inputs)
compromete a estabilidade e a legitimidade do regime democrático.
49
Em relação ao apoio e a satisfação dos cidadãos latino-americanos com a democracia,
dados de pesquisa revelam que o Brasil é um dos países com menores percentuais de apoio e
de satisfação com o regime democrático.
Gráfico 1
Apoio e Satisfação com a Democracia (%)
37
21
47
25
52
25
55
26
65
33
0
10
20
30
40
50
60
70
Brasil Equador Bolívia Peru Argentina
Apoio ao Regime
Democrático
Satisfação com a
Democracia
n = 18.522
Fonte: Latinobarômetro, 2002
De acordo com os dados do Gráfico 1, verifica-se que a maioria da população prefere
a democracia a qualquer outro tipo de regime. Contudo, o apoio e a adesão aos princípios
democráticos convivem com um alto índice de insatisfação com o desempenho do regime,
contribuindo para o surgimento de novos ciclos de protestos na região
3
. Entre os países
mencionados, o Brasil é aquele que apresenta o menor percentual de apoio e de satisfação
com a democracia. Entre os 17 países estudados pelo Latinobarômetro, a média calculada para
o período de 1996-2002 referente ao apoio à democracia é de 56%, e de satisfação com o
sistema político é de apenas 33%. A pesquisa revela que a percepção dos cidadãos a respeito
3
Nos últimos anos ocorreram inúmeros protestos no Equador, na Bolívia e no Peru, resultando, em alguns casos,
na derrubada de presidentes.
50
da situação política e econômica do regime afeta o grau de confiança que estes depositam nas
instituições democráticas (ZOVATTO, 2002).
A confiança institucional é um dos indicadores mais importantes do estágio da
construção democrática e da dimensão da legitimidade do sistema político. Através dos dados,
é possível perceber a evolução dos níveis de confiança na região.
Tabela 1
Confiança nas Instituições Latino-Americanas
(Média para 17 países, 1996-2002)
1996 1997 1998 1999 / 2000 2001 2002
Média
1996-2002
Igreja 72 77 78 74 76 71 75
Televisão 50 46 45 42 49 45 46
Forças Armadas 42 42 38 43 38 38 40
Polícia 30 36 38 36 30 33 34
Presidente nd 39 32 39 30 25 33
Poder Judiciário 33 36 32 34 27 25 31
Congresso 27 36 27 28 24 23 27
Partidos Políticos 20 28 21 20 19 14 20
Fonte: Latinobarômetro (elaborado por Zovatto, 2002)
De acordo com os dados da Tabela 1, verifica-se que o Congresso e os partidos
políticos são as instituições de menor prestígio entre os cidadãos, recebendo o menor
percentual de confiança nos últimos anos. Avalia-se que o fenômeno da desconfiança nas
sociedades latino-americanas, em grande parte, está associado ao funcionamento das
instituições políticas. Em um contexto onde mais de 40% vive abaixo da linha da pobreza, o
desempenho socioeconômico do regime democrático tem particular importância. Zovatto
(2002) argumenta que a democracia precisa recuperar níveis aceitáveis de apoio, de
participação e de confiança nas instituições políticas, de modo a gerar uma cultura política
democrática que enfrente a crise de governabilidade e instabilidade, gerada pela incapacidade
51
de resposta governamental às demandas da sociedade civil, que tem predominado nos países
da América Latina.
Assim, o que desafia a consolidação democrática nesses países são os crescentes
níveis de pobreza e exclusão social, que contribuem para o distanciamento e o descrédito dos
cidadãos em relação às instituições políticas. O relatório divulgado pelo Programa das Nações
Unidas para o Desenvolvimento (PNUD, 2004) destaca dois desafios para a democracia na
região: 1) encontrar soluções políticas a seus problemas sociais, buscando formas alternativas
de participação política e de controle do poder público; e 2) encontrar soluções para a
desigualdade social e pobreza buscando alcançar uma cidadania de alta intensidade
4
.
A pesquisa do PNUD reconhece que a debilidade da democracia latino-americana não
está associada a questões institucionais, mas a processos de exclusão social, a crises de
governabilidade e a baixos índices de confiança no sistema político, que colocam em risco a
estabilidade do regime democrático. “Instituições políticas que perdem credibilidade e a
persistência das situações de pobreza e exclusão social constituem um cenário complexo que
torna as democracias vulneráveis frente à ingerência dos poderes fáticos” (PNUD, 2004, p.
175). Poderes esses, representados pelas famílias tradicionais, grupos econômicos e meios de
comunicação, que influenciam e intervêm diretamente nas decisões governamentais.
A indiferença e a desconfiança em relação às instituições políticas, captadas pelas
pesquisas de opinião, refletem a decepção dos cidadãos frente aos graves problemas sociais,
ao aumento da pobreza, à má qualidade dos servos públicos, à ineficácia dos partidos e dos
governos em responderem às demandas sociais e ao aumento da corrupção. O Índice de
4
A intensidade da cidadania é avaliada pelo exercício dos direitos políticos e pelo acesso aos direitos sociais
(PNUD, 2004).
52
Percepções de Corrupção, publicado em 2002 pela Transparência Internacional, indica que a
América do Sul é uma das regiões do mundo com maior incidência de práticas de corrupção
5
.
Na mesma linha de análise, recentes estudos apontam que a crescente desvalorização
das instituições poliárquicas se caracteriza por um processo de desconsolidação das
democracias latino-americanas. Sánchez-Parga (2004, p. 69) argumenta:
Podría objetarse que el concepto de desconsolidación no posee suficiente
pertinencia para significar los procesos de desinstitucionalización de la
democracia, pues democracias que nunca llegaron a consolidarse mal
podrían desconsolidarse. A tal objeción cabe argüir que la transición
democrática supone una inicial institucionalización de prácticas,
procedimientos, organismos y ordenamientos políticos; las elecciones, por
ejemplo, confieren a los ciudadanos la capacidad de elegir y legitimar a sus
representantes y gobernantes; éstos a su vez en base a leyes adquieren el
poder de implementar políticas con efectos en la sociedad; la misma relación
entre poderes del Estado (ejecutivo, legislativo y judicial) se encuentra
normalizada y ordenada en base a principios, leyes y procedimientos
constitucionales.
Segundo o autor, há três fatores que impedem a institucionalização da democracia no
contexto latino-americano. O primeiro refere-se ao presidencialismo e à personalização do
poder, caracterizada pela ênfase no poder pessoal do presidente à revelia das instituições
políticas e sociais. O segundo refere-se à crise de representação política, que se agrava com o
predomínio do voto personalista em detrimento do voto partidário. Além de enfraquecer as
instituições políticas, o personalismo e o clientelismo transformam as políticas públicas em
interesses particularistas. O terceiro fator destacado pelo autor relaciona-se com a cultura
política latino-americana, em que as orientações e atitudes autoritárias arraigadas
historicamente funcionam como obstáculos para a consolidação do regime democrático
(SANCHÉZ-PARGA, 2004).
5
Relatório divulgado no site: http://www.transparency.org
53
Já argumentava O’Donnell (1991), sobre as “novas democracias” latino-americanas,
que são marcadas pela continuidade de práticas e comportamentos autoritários e
caracterizadas como “democracias delegativas”. A delegação de poder é atribuída à presença
de um sistema multipartidário fragmentado, de uma cultura política pouco democrática, de um
presidencialismo plebiscitário, com alta personalização e concentração de poder, e de
crescentes desigualdades sociais na América Latina.
Na mesma linha de argumentação, Weffort (1992) sugere que a democracia política
não se consolidará num quadro de extrema desigualdade social, mas pela constituição de uma
democracia social com o fim do “sistema dual”, composto por integrados e marginalizados.
De acordo com Weffort (1992, p. 23), os marginalizados "são livres para participar das
eleições e, na realidade, a maioria o faz. Não são marginalizados por nenhum tipo de restrição
institucional, mas pelas próprias condições sociais, políticas e culturais em que vivem e que
os transformam em massas amorfas". Segundo o autor, a democracia social pressupõe uma
sociedade integrada que promova a distribuição de renda e de poder entre os cidadãos. Desse
ponto de vista, a igualdade social e a participação política são componentes essenciais na vida
democrática e na construção de uma sociedade capaz de romper com a situação de pobreza e
de exclusão social vivenciada nas democracias latino-americanas.
Uma das fontes da crise de governabilidade, segundo Santos (1993, p. 79), encontra-se
no “híbrido institucional que associa uma morfologia poliárquica a um hobbesianismo social
pré-participatório e estatofóbico”. As funções básicas de uma poliarquia, como a segurança, a
proteção e a justiça, não chegam a alcançar extensão necessária no universo social de países
como o Brasil. De acordo com o autor, os brasileiros expressam uma tendência a combinar
adesão à democracia com atitudes de desconfiança e de pouca predisposição à participação
política, colocando em questão a legitimidade e a estabilidade do regime democrático.
54
Este ponto, no entanto, não é consensual, pois pesquisas realizadas no Brasil sobre a
transição democrática revelam que, apesar da decepção dos cidadãos com as instituições
políticas, existe uma base de adesão aos princípios normativos da democracia, uma “reserva”
preliminar de legitimidade democrática. Na avaliação de José Álvaro Moisés (1995), o
desencanto e a desconfiança gerada pelo impacto das avaliações negativas dos mecanismos de
input e output pode acirrar a crise de legitimidade comprometendo essa base de apoio à
democracia.
O paradoxo da legitimidade democrática, no Brasil, consiste, portanto em
que perversões do passado, isto é, vícios políticos herdados do autoritarismo,
persistem no presente, ameaçando virtudes novas como a tendência de
valorizar e de viver a democracia. Do ponto de vista da consolidação
democrática, a questão crucial converte-se, então, em saber se esse círculo
vicioso pode, de algum modo, ser rompido (MOISÉS, 1995, p. 269).
Dessa forma, Moisés (1995) argumenta que esse círculo vicioso será rompido
mediante mudanças efetivas na cultura política dos brasileiros, pois o apoio dos cidadãos aos
procedimentos e regras democráticas e a predisposição em participar existem. O autor verifica
que as transformações políticas, econômicas e sociais do Brasil nos anos 1990, possibilitaram
a formação de uma opinião pública mais atenta aos processos políticos e o surgimento de
diferentes subculturas políticas. O autor afirma que a construção de uma cultura política
democrática é tão importante quanto a institucionalização dos mecanismos de representação e
de controle público das ações governamentais.
No que diz respeito a procedimentos, parte da literatura especializada trata a
consolidação democrática em termos de um maior ou menor grau de institucionalidade
formal, atentando para a existência de eleições periódicas, livres e transparentes, acesso a
informações políticas e garantia de liberdade e direitos políticos (SARTORI, 1994; BOBBIO,
2000). Esta perspectiva negligencia ou esquece que a base material também é fundamental no
55
processo de solidificação democrática. Do ponto de vista da dimensão social e da qualidade
da democracia, por exemplo, três questões devem ser respondidas:
1) Se, de fato, todos os membros da poliarquia são politicamente iguais e
qualificados para participar do processo decisório, porque os interesses sociais não
têm igual representação na gestão pública? Há um número bastante significativo
de cidadãos excluídos do pleno exercício da cidadania, entre os quais mulheres,
negros, homossexuais, pessoas com necessidades especiais, pobres e miseráveis.
2) As instituições políticas são capazes de consolidar processos democráticos, com a
permanência do personalismo, do clientelismo, do nepotismo e da corrupção na
política? Esses elementos muitas vezes são considerados naturalizados e inerentes
ao processo político.
3) As crenças e os valores políticos têm sido levados em consideração no
fortalecimento das instituições poliárquicas? As pesquisas de opinião realizadas
em vários países do mundo revelam altos índices de desconfiança e descrença dos
cidadãos nas instituições democráticas.
Há o reconhecimento, por parte da Ciência Política, de que as crenças e os valores
culturais são importantes para compreender o sistema político. A própria abordagem
institucionalista admite que as crenças individuais influenciam as ações coletivas e, com isso,
a estrutura e o funcionamento das instituições e sistemas políticos. De acordo com Dahl
(1997), quanto maior a crença na legitimidade das instituições políticas de um país, maiores
as chances de consolidar uma poliarquia. As crenças sobre a eficácia governamental são
influenciadas pela performance do governo, esta refletida pelos êxitos ou fracassos em seu
desempenho.
56
De fato, atualmente, instituições e cultura caminham e evoluem paralelamente.
Instituições eficientes geram comportamentos cívicos, os quais, por sua vez, passam a cobrar
maior eficiência dessas instituições. Entender o sistema político democrático consiste em
verificar atitudes individuais e coletivas de seus membros em relação às instituições políticas,
de forma a compreender o funcionamento das estruturas formais de governo, dos partidos
políticos, das estruturas de poder e de influência, das normas, dos modelos de comunicação e
interação entre Estado e sociedade.
Esse debate evidencia que a democracia não é algo que possa ser atingido com a
simples adoção de leis e normas, mas depende de uma base normativa de apoio dos cidadãos
nas instituições políticas. A mudança atitudinal dos atores políticos e a formação de uma
cultura política compatível com os valores democráticos são de fundamental importância para
promover a organização social e a legitimidade do sistema político. A confiança e a
participação política são importantes indicadores da cultura política democrática. Decorre
desses elementos a necessidade de examinar a forma como o processo de participação vem se
modificando nas últimas décadas. Dessa forma, na próxima seção, serão discutidas as novas
modalidades de participação política nas democracias contemporâneas diante do declínio da
participação dos cidadãos nos canais formais e institucionais da política.
2.2 NOVAS FORMAS DE PARTICIPAÇÃO POLÍTICA
A participação política caracteriza-se pela ação exercida pelos cidadãos no sentido de
influenciar o processo político e eleitoral. Trata-se de ações coletivas ou individuais, de apoio
ou de pressão, que são direcionadas a selecionar governos e a influenciar as decisões tomadas
por eles. Os primeiros estudos se restringiam a analisar os indicadores de participação política
57
convencional, que incluem o ato de votar em eleições, plebiscitos e referendos, de participar
de partidos e de campanhas políticas, e de contatar representantes eleitos na busca de solução
para os problemas coletivos ou individuais. Tais pesquisas, tendo como referência os
contextos norte-americano e europeu, defendiam a tese de que quanto maior o
desenvolvimento econômico, mais ampla e efetiva a participação política da população
(SELIGSON e BOOTH, 1976).
Pesquisadores sugerem que a participação política, especialmente nos países em
desenvolvimento, deve ser analisada dentro de outra perspectiva que não a econômica.
Argumentam que as atividades consideradas não-convencionais, como participar de protestos
e manifestações, devem ser incorporadas como indicadores de envolvimento político. De
acordo com Baquero (1981, p. 32), “qualquer definição de participação política não pode
excluir passeatas, greves, protestos e demonstrações, já que estas atividades, da mesma forma
que as atividades convencionais, visam a influenciar as autoridades governamentais”.
Do ponto de vista institucionalista, a realização de eleições livres, com a participação
dos cidadãos no processo eleitoral, é suficiente para constituir governos representativos.
Estes, por sua vez, deverão adotar políticas e decisões em prol do bem comum. Se,
porventura, os governos eleitos cumprirem suas promessas como um investimento de
credibilidade ou mudarem suas plataformas políticas em virtude de circunstâncias adversas,
estarão agindo no melhor interesse do eleitorado. De qualquer forma, não há nenhum
mecanismo institucional que os obrigue a manterem-se fiéis às plataformas de campanha e às
preferências do eleitorado.
O mecanismo de fiscalização e controle das ações governamentais, que se dá por meio
das eleições, é o único instrumento de controle “vertical” de accountability. Os eleitores têm
apenas um instrumento nas mãos: selecionar políticas e políticos, cobrando a
responsabilização de suas ações com a prestação de contas. Contudo, os políticos têm metas,
58
interesses, valores e empreendem ações que os cidadãos não conseguem ver e monitorar. Se
os cidadãos não têm informações suficientes para avaliar o governo, o mecanismo de
accountability mostra-se limitado e insuficiente para assegurar a representação e o controle
sobre os políticos (PRZEWORSKI, STOKES e MANIN, 1999).
A participação política não convencional, caracterizada por ações e atividades fora dos
canais formais e da arena institucional, tem por objetivo exercer pressão sobre as políticas
governamentais. As manifestações e protestos, petições encaminhadas a órgãos públicos,
doação de dinheiro para ONG’s, boicotes de produtos em supermercados, participação em
movimentos feministas, ambientalistas e de defesa dos direitos humanos são algumas das
ações apontadas pela literatura como novas formas de participação e de ativismo político
(TEORELL, TORCAL e MONTERO, 2003; NORRIS, 2003).
Os modos de participação política têm sido enfatizados sob diferentes aspectos,
segundo o tipo de perspectiva adotado na compreensão da democracia. A perspectiva liberal-
conservadora compreende a democracia não como uma forma de vida participativa, mas como
um conjunto de instituições e mecanismos que garantem aos indivíduos a possibilidade de
realizar seus interesses com a mínima interferência no processo político. Segundo essa
abordagem, os cidadãos mostram-se apáticos, desinformados dos assuntos políticos e
desmotivados a participar. Os autores dessa corrente enfatizam a participação eleitoral como a
forma mais convencional de envolvimento cívico e argumentam que o equilíbrio entre a
participação moderada e a apatia produz governabilidade, ao passo que a participação política
ampliada acarreta sobrecarga do sistema político, gerando a sua instabilidade (CROZIER,
HUNTINGTON e WATANUKI, 1975; DOWNS, 1999).
Uma outra perspectiva, de cunho democrático-participativo, compreende a democracia
não apenas como um conjunto de regras e instituições, mas como um conjunto de práticas
participativas que promovem a cidadania, a cooperação, a confiança e o desenvolvimento de
59
valores e hábitos democráticos. Os autores dessa corrente defendem que a competência cívica
e a eficácia política, conceitos que se referem ao sentimento de competência para influenciar e
participar no processo decisório são componentes chave do engajamento político (ALMOND
e VERBA, 1965; PUTNAM, 2002).
Recentes estudos avaliam as experiências do ativismo político que incorporam novas
formas de expressão política, mobilização e envolvimento político. Pipa Norris (2003) destaca
duas dimensões do ativismo político: repertórios de ação política e agências de ativismo
político. Com relação à primeira dimensão, existe uma distinção entre as ações cidadãs
orientadas, aquelas direcionadas para eleições e partidos, e entre os repertórios de causas
orientadas, cujo foco de atenção recai sobre questões específicas e interesses políticos. A
autora argumenta que os novos movimentos sociais combinam ações estratégicas com
repertórios tradicionais, pois lutam por questões específicas dentro e fora da arena
institucional.
As agências de ativismo político são estruturas organizacionais através das quais
pessoas mobilizam-se para expressão política. Partidos políticos, igrejas, associações,
cooperativas e sindicatos podem ser classificados como agências tradicionais. Os movimentos
de defesa dos direitos humanos, movimentos de mulheres, movimentos ambientalistas e as
ONG’s são considerados agências modernas. Essas últimas são caracterizadas pela rede
descentralizada de comunicação entre as coalizões horizontais e verticais das estruturas
organizacionais. De acordo com Norris (2003), analisar a participação sob o prisma apenas
das agências tradicionais proporciona uma perspectiva parcial do envolvimento cívico e
político dos cidadãos.
Os dados encontrados na pesquisa de Norris (2003) mostram que os indivíduos mais
engajados no repertório de causas orientadas são aqueles que dispõem de altos níveis
educacionais e de renda, além de um forte senso de eficácia política. Em termos das agências
60
de ativismo político, a pesquisa confirma baixos índices de participação política,
especialmente entre os mais jovens. A geração dos mais velhos mostra-se propensa a
participar das agências tradicionais, como associações voluntárias, partidos políticos e igrejas,
ao passo que a geração mais jovem tende a se engajar nos novos movimentos sociais,
especialmente aqueles relacionados com meio ambiente ou com questões humanitárias. A
autora argumenta que a falta de motivação e engajamento dos jovens relaciona-se ao
desencantamento com a democracia e com os canais formais de participação.
As novas formas de participação caracterizam-se por abandonar as estruturas
organizacionais tradicionais em favor de estruturas mais flexíveis e horizontais. As
mobilizações como abaixo-assinados, petições, participação em protestos, manifestações e
boicotes ocorrem de maneira espontânea e não movidas por estruturas ideológicas. Apesar de
serem vistas como coletivas, as ações possuem um caráter individualizado. No caso de
petições ou boicotes, por exemplo, os cidadãos podem desempenhar ações políticas em sua
casa através da internet ou diretamente nos supermercados. Isso requer sofisticação
intelectual, política e econômica dos participantes, o que reduz a participação a uma pequena
parcela da população.
Pontualmente, no caso da América Latina, os movimentos sociais apresentam-se como
uma nova forma política de intervenção social. Com o papel de promover a inclusão social
através da ampliação dos direitos civis, políticos e sociais, exigem maior eficácia e
transparência das ações governamentais. Na medida em que buscam contemplar os interesses
sociais diversos, contribuem para a criação de uma nova gramática social e política - capaz de
mudar as relações de gênero, de raça e de etnia -, articulada a uma nova institucionalidade que
vislumbre novas formas de participação e promoção da cidadania (SANTOS, 2002).
Essa nova institucionalidade se estabelece, também, pelo fato de que a crise
econômica vivenciada pelos países latino-americanos aponta para um quadro de agravamento
61
da pobreza e da exclusão social. Nesse cenário de insatisfação e desconfiança política, emerge
uma onda de conflitos sociais e de protestos políticos, marcados por seu caráter defensivo e
reativo. De acordo com Sánchez-Parga (2005), esse novo ciclo de protestos politiza os
movimentos sociais, colocando em evidência o crescente déficit cívico e o contraditório
fenômeno da participação política: forças sociais enfrentando as forças políticas,
especialmente os partidos políticos e o governo. Os movimentos sociais se mobilizam
reativamente e adotam formas de protesto, empreendendo uma crescente politização frente a
um sistema incapaz de representar seus interesses e reivindicações.
La exclusión social en la actualidad, las más profunda y violenta, es la que se
opera no ya al nivel de la distribución de la riqueza sino de su misma
producción. Es esta exclusión del trabajo la que provoca una nueva forma de
lucha social: el ciclo político de la protesta. Son las nuevas fuerzas e
intereses excluyentes en la sociedad actual y no la pobreza los que
desencadenan todas las formas de movilización contestatarias y
protestatarias en el mundo. El carácter específicamente reactivo de la
protesta sólo puede tener como antagonista una fuerza proactiva, la de la
exclusión, la de la marginalización del mercado en una "sociedad de
mercado", no la pobreza (SÁNCHEZ-PARGA, 2005).
Os protestos políticos, os bloqueios de trânsito e as invasões de propriedades privadas
são formas de ação coletiva que expressam desobediência civil e insatisfação com o
funcionamento das instituições democráticas. Reduzir as desigualdades sociais exige políticas
que combinem democracia com justiça social, especialmente no tocante à redistribuição de
renda. A experiência de auto-gestão comunitária na Villa El Salvador, no Peru, é um exemplo
importante no combate à pobreza. Fundada em 1971 por 200 famílias pobres, atualmente a
Villa conta com 300.000 pessoas organizadas pelo CUAVES - Comunidade Urbana
Autogestionária de Villa El Salvador -, um modelo de gestão participativa que se propõe
alcançar um Plano de Desenvolvimento Integral e solucionar os problemas coletivos.
Torna-se importante valorizar ações e experiências que visem o fortalecimento das
instituições democráticas e da sociedade civil, que fomentem a participação, a cooperação e a
62
confiança mútua entre os cidadãos. Uma cultura política democrática requer um conjunto de
valores, princípios e atitudes que respaldem as instituições políticas, tornando-as estáveis e
efetivas. Esse tema será abordado na seção seguinte.
2.3 RELEVÂNCIA E ATUALIDADE DO CONCEITO DE CULTURA POLÍTICA
No âmbito das Ciências Sociais, o conceito de cultura caracteriza-se por ser complexo
e polissêmico. Parte da literatura sustenta que fatores econômicos e institucionais são
suficientes para gerar uma explicação convincente da dinâmica das democracias, sem que seja
necessário recorrer à cultura. Constatam que traços culturais e religiosos dominantes têm
pouca importância para analisar a durabilidade das democracias (PRZEWORSKI, CHEIBUB
e LIMONGI, 2004). Nessa perspectiva, a democracia é resultado de um equilíbrio entre as
diferentes forças políticas, que aceitam o veredicto das urnas e as regras do jogo político. De
outro lado, há vasta literatura que sustenta que instituições e procedimentos não são
suficientes para se alcançar a estabilidade de um regime democrático, tendo em vista a
relevância das crenças e valores democráticos na consolidação da democracia (INGLEHART,
1988; MOISÉS, 1995; BAQUERO, 1999).
No Brasil, a estreita relação entre cultura e estrutura sempre suscitou polêmica. Nos
anos 1930 e posteriormente nos anos 1960 a preocupação com o nacionalismo e com a
identidade nacional predominou entre os intelectuais, considerados porta-vozes e intérpretes
da ideologia nacionalista. Na busca por uma sociedade integrada cultural e politicamente,
julgava-se necessário construir uma “cultura nacional”, homogênea e consensual, que
permitisse a identificação dos indivíduos com símbolos, imagens e mitos nacionais
(BARBALHO, 1998). O principal pressuposto era de que as crenças e os valores culturais
63
representavam importantes elementos na configuração da identidade nacional e na sustentação
de um sistema político.
Os estudos de caráter nacional detinham-se a verificar as características, traços e
atributos de uma nação e a analisar a cultura como elemento unificador desta nação. Os
estudos de cultura política, por sua vez, introduzem o conceito de subculturas, buscando
verificar a relação entre os traços culturais de um povo e o seu sistema político. Através de
pesquisa empírica e da operacionalização dos conceitos propostos, tais estudos ampliaram a
perspectiva analítica iniciada pelos estudos de caráter nacional (SOUZA, 1989).
Os precursores dos estudos de cultura política, Gabriel Almond e Sidney Verba (1965)
introduzem a estatística na pesquisa comparada, permitindo a observação de determinadas
regularidades e a comparação de sistemas políticos, independentemente de suas diferenças
culturais ou políticas. A pesquisa empírica realizada nos Estados Unidos, Grã-Bretanha,
Alemanha, Itália e México, nos anos 1960, teve como objetivo caracterizar o sistema político
democrático e verificar atitudes e valores compatíveis com a estabilidade e a legitimidade do
regime. Os autores avaliam a estabilidade democrática a partir do grau de institucionalização
dos procedimentos democráticos, de participação política e de confiança dos cidadãos nas
instituições políticas.
A obra The Civic Culture (ALMOND e VERBA, 1965) emerge da confluência de
várias correntes de pensamento: estudos de opinião pública, teoria macro-sociológica,
psicologia social e técnica amostral de survey, refletindo preocupações da época com a
estabilidade democrática, em um contexto de modernização política. Influenciados pelas
categorias parsonianas e weberianas de ação social, os autores definem cultura política como
o padrão de atitudes e orientações políticas dos cidadãos em relação ao sistema político,
internalizadas na dimensão cognitiva, afetiva e avaliativa.
64
A cultura política, fruto da conexão entre políticas micros (motivações e atitudes dos
indivíduos) e macros (estruturas e funções do sistema político), configura-se em três tipos
ideais: 1) cultura política paroquial, caracterizada pela ausência de consciência política e de
expectativas em relação ao sistema político; 2) cultura política moderada, aquela em que os
membros têm consciência do sistema político, mas não estão dispostos a participar e 3)
cultura política participante, caracterizada pela presença de cidadãos conscientes, ligados
afetivamente ao sistema político e com capacidade avaliativa, propensos à participação
política. De acordo com Almond e Verba (1965), cada tipo de sistema político – tradicional,
autoritário e democrático – tem uma forma de cultura congruente com sua própria estrutura.
O estudo empírico encontrou correlações entre o senso de competência política e o
apoio positivo ao sistema político, entre confiança interpessoal e participação política. A
cultura cívica, abordada pelos autores como cultura política democrática, é considerada como
requisito básico para a institucionalização e a estabilidade da democracia. Trata-se de uma
cultura política mista e balanceada, em que os indivíduos participam do processo político com
passividade e deferência à autoridade. Nesse caso, a cultura cívica é resultado da combinação
entre a orientação política tradicional e a orientação moderna de participação. Na pesquisa são
encontradas culturas políticas mistas dentro da política interna de cada país, revelando
aspectos de heterogeneidade cultural e dinâmica histórica diferentes (ALMOND e VERBA,
1965).
Esse conceito gerou controvérsias na comunidade acadêmica, especialmente em
relação à perspectiva histórica adotada e aos parâmetros estabelecidos na interpretação dos
dados. A coletânea The Civic Culture Revisited, publicada 20 anos depois, oferece uma
revisão crítica dos pressupostos teóricos apresentados por Almond e Verba nos anos 1960. De
acordo com Carole Pateman (1989), não há uma explicação convincente a respeito da relação
entre o padrão de atitudes e a estrutura política das democracias. Ao associarem a cultura
65
cívica ao paradigma liberal de democracia e conceberem os países industrializados -
particularmente os Estados Unidos e a Inglaterra - como modelos de democracias estáveis,
Almond e Verba restringiram toda e qualquer análise dentro desse parâmetro.
Um dos argumentos de Pateman (1989) a respeito da obra em questão é de que a teoria
liberal obscurece a mútua interação entre cultura e estrutura política, especialmente quando as
diferenças socioeconômicas são tratadas como irrelevantes, e não confrontadas com a
estrutura política das nações. A autora alega também que o parâmetro utilizado não encontrou
formas análogas em países emergentes que garantissem a construção de um sistema político
baseado nos moldes defendidos pelos autores da cultura cívica.
Em resposta às críticas, Almond (1989) admite que o modelo de cultura cívica é
baseado na teoria política liberal, mas justifica que os modelos culturais específicos foram
analisados dentro do marco histórico particular de cada nação. Argumenta que a cultura
política foi tratada como variável dependente e independente, dentro de um modelo de
causalidade recíproca, no qual cultura, economia e política exercem influências mútuas,
excluindo o determinismo cultural de abordagens anteriores. O autor reconhece que a cultura
política é uma plástica com muitas variáveis e que responde rapidamente pelas mudanças
estruturais.
No caso da ex-Alemanha Federal, por exemplo, esta foi considerada pelos estudos de
Almond e Verba como uma cultura cívica “súdita”, não participativa e antidemocrática.
Atualmente, há no país um forte sentimento de eficácia política subjetiva; os cidadãos se
sentem capazes de influir ativamente no processo político (MOISÉS, 1995). A interação entre
o comportamento e o funcionamento das instituições políticas implica em processos de
socialização e ressocialização política, ocorrida ao longo da vida adulta. Dessa forma, a
cultura política tem sido revalorizada dentro da política comparada como um elemento
imprescindível para analisar as mudanças na política. A experiência mostra que os valores vão
66
mudando, e surgem novos elementos que modificam estrutural e conjunturalmente a cultura
política e o comportamento político dos cidadãos (MADUEÑO, 1999).
Revisando as categorias conceituais da cultura política, Luis Madueño (1999) destaca
quatro premissas: a) toda cultura política possui uma identidade relacional dentro de uma
totalidade histórica; b) possui uma lógica estrutural própria; c) é parte de uma estrutura que
marca a rede de relações entre economia e política; e d) é um conceito histórico. Define
cultura política como
contexto onde encontramos um conjunto de significados tecidos pelo homem
e pelas instituições, onde os atores individuais e coletivos se reconhecem
mutuamente e reproduzem as ações sociais e políticas sobre a base de
crenças, hábitos e rituais, convertendo-se estas em regularidades de ação
onde restabelece força a dimensão tempo e espaço (MADUEÑO, 1999, p.
124)
.
De acordo com o autor, cultura política possui um conjunto de potencialidades capaz
de introduzir ferramentas de análise na medida em que surgem outros fenômenos, produto das
mudanças da época.
Em artigo recente, Almond (2001) tamm destaca que as mudanças demográficas, o
crescimento econômico, a expansão da educação e da mídia têm transformado as atitudes e os
processos políticos nas sociedades contemporâneas. Defende que a cultura política é
componente integral da ação política e que as mudanças políticas são resultantes de mudanças
estruturais. Exemplos citados pelo autor se referem ao realinhamento partidário e à
transformação do sistema partidário nas sociedades industriais avançadas, que se dão em
resposta às mudanças sócio-culturais; ao surgimento de novos movimentos sociais, tanto da
esquerda quanto da direita, fruto da polarização partidária e do declínio do poder dos partidos;
e à emergência de movimentos antigovernamentais, movida pela descentralização da
autoridade, desburocratização e privatização do Estado. O autor sugere que é preciso levar em
67
consideração as tendências do contexto internacional na explicação das transformações da
cultura política e das instituições nacionais (ALMOND, 2001).
A crítica aos pressupostos políticos e teóricos da obra The Civic Culture compromete a
sua capacidade explicativa, mas não invalida o conceito de cultura política e o emprego de
técnicas de survey na aferição da opinião pública e da percepção dos cidadãos em relação ao
sistema político. Com os processos de redemocratização, renasce o interesse acadêmico pelos
estudos de cultura política. Assim, pesquisadores atualizam e reafirmam a cultura política
como categoria analítica importante na compreensão dos fenômenos políticos e sociais.
De acordo com Dalton (2000), a onda de democratização nos anos 1990, ocorrida nos
países da Europa Oriental, Ásia, África e América Latina, transformou os sistemas políticos e
o papel dos cidadãos nas novas democracias. Estas mudanças produzem incertezas sobre os
padrões formais de democracia, criando um novo dinamismo, que precisa ser incorporado nos
estudos sobre comportamento político. A crise e o desgaste das instituições e dos atores
políticos na América Latina, propicia uma transformação da cultura política e o rompimento
com algumas estruturas tradicionais da política.
Diversas pesquisas, realizadas no mundo inteiro, têm acompanhado transformações da
cultura política e, conseqüentemente, do comportamento dos cidadãos em relação ao sistema
político
6
. Ronald Inglehart (1988; 2002) analisa a relação entre atitudes políticas e
estabilidade democrática a partir de dados da Pesquisa Mundial de Valores (World Values
Survey), que inclui 65 nações, 75% da população mundial. A partir dessas pesquisas foi
possível elaborar indicadores de cultura cívica: 1) confiança interpessoal e institucional; 2)
satisfação com a democracia; 3) participação política. O autor defende que a modernização e
o desenvolvimento econômico favorece mudanças culturais que ajudam a estabilizar a
6
Existem vários surveys institucionalizados como o Eurobarômetro, o World Values Surveys (WVSs), o
Latinobarômetro, o Latin American Public Opinion Project (LAPOP).
68
democracia e a aumentar a confiança interpessoal, a tolerância e a participação no processo
decisório. Inglehart aponta que os fatores econômicos constituem apenas parte da explicação
do fenômeno, e que a dimensão político-cultural exerce um papel decisivo na explicação dos
comportamentos políticos.
Na mesma linha de argumentação, Robert Putnam (2002), na obra Comunidade e
Democracia, utilizando-se de pesquisa empírica, analisa a reforma institucional realizada na
Itália nos últimos 20 anos e sustenta que as tradições culturais são resistentes e moldam o
comportamento político e econômico das sociedades. Ponderando o Índice de Desempenho
Institucional, que avalia a continuidade administrativa, as deliberações sobre as políticas e sua
implementação e o grau de satisfação do eleitorado em relação ao governo, o autor verifica a
relação entre o desempenho do governo regional com o caráter cívico da vida social e política
das regiões Norte e Sul da Itália.
Mitchell Seligson coordena uma série de estudos sobre valores e atitudes dos cidadãos
em diversos países latino-americanos. As pesquisas empíricas desenvolvidas pelo Latin
American Public Opinion Project (LAPOP) permitem um estudo cada vez mais sistemático e
comparativo da cultura política latino-americana. Segundo relatórios divulgados, os dados
mostram uma perspectiva mais dinâmica a respeito dos determinantes de apoio ao sistema
democrático, e uma forte relação entre o desempenho do governo e as opiniões dos cidadãos
acerca do sistema político
7
.
As características da cultura política latino-americana apresentam diferentes nuances
em cada um dos países. Roderic Camp (2001), juntamente com outros pesquisadores, realizou
pesquisas no México, Costa Rica e Chile, com o objetivo de analisar as percepções dos
cidadãos a respeito da democracia. Costa Rica foi selecionado por ser considerado o país mais
“democrático”, cuja ênfase recai no pluralismo governamental e na política eleitoral. O
7
Publicações dos relatórios de pesquisa estão disponíveis no http://sitemason.vanderbilt.edu/lapop.
69
México, por ser um dos países menos avançado institucionalmente para democracia, além da
proximidade com os Estados Unidos. O Chile foi incluído por oferecer um interessante estudo
de caso sobre as mudanças entre influências democráticas e autoritárias. Os legados do
militarismo e autoritarismo mantiveram-se institucionalizados, apesar da efetivação
democrática no Chile.
A pesquisa destaca a importância dos valores culturais na explicação do
comportamento político e encontra relações significativas entre a maneira como os cidadãos
percebem a democracia e a sua prática política. Os dados mostram que a maneira como os
latino-americanos concebem a democracia difere da visão dos cidadãos norte-americanos. O
que mais distingue a versão de democracia latino-americana é sua ênfase na igualdade social e
econômica. Contudo, os dados sugerem que não há um consenso sobre o significado de
democracia entre os latino-americanos. Os costa-riquenhos vêem a democracia como garantia
da liberdade política aos cidadãos. Os mexicanos e os chilenos vêem a democracia mais em
termos sociais do que políticos. Mas, no geral, a expectativa é o alcance da igualdade
socioeconômica entre os cidadãos (CAMP, 2001).
No contexto equatoriano, Bustamante (1996) argumenta que existe uma difundida
crença de que as instituições políticas não funcionam em razão de sua incapacidade em
responder às demandas da sociedade. De acordo com o autor, a cultura política funciona como
um conjunto de regras e operações bem definidas (programas operacionais ou algoritmos),
que permite aos sujeitos inventar e criar respostas adequadas a circunstâncias novas ou a
problemas inéditos. Segundo o autor, é preciso criatividade para enfrentar a crise de
instabilidade política vivenciada no país.
No caso da experiência brasileira, esta tem demonstrado que a democratização é, antes
de tudo, um processo positivo de criação institucional e de reconstrução da sociedade civil.
Lamounier e Souza (1991) avaliam que as atitudes dos brasileiros para com a democracia
70
mudaram de forma positiva e substancial, contribuindo para a transformação da cultura
política, tornando-a mais democrática. A perspectiva de cultura política adotada pelos autores
enfatiza os aspectos institucionais, alegando que a legitimidade e a estabilidade do sistema
político depende da estrutura institucional e da confiança dos cidadãos no processo eleitoral e
no sistema de competição partidária.
Da mesma forma, instituições ineficientes contribuem negativamente para a
institucionalização da democracia, na medida em que estimulam atitudes contrárias às práticas
típicas de um regime democrático. Rennó (1999) propõe articular os pressupostos da teoria da
escolha racional e da cultura política, visando construir um modelo analítico mais complexo
sobre comportamento político. O autor argumenta que, ao combinar
o estudo dos valores, crenças e conhecimentos do indivíduo – que
constituem o contexto cultural que o cerca - e o papel das instituições
formais nesse ambiente, com a suposição de que as pessoas agem
racionalmente, ou seja, apresentam razões para desenvolver certa atividade,
possuem planos coerentes e visam maximizar preferências e minimizar
custos, pode-se amenizar as dificuldades de uma abordagem exclusivamente
racionalista e ampliar a capacidade explicativa da perspectiva culturalista
(RENNÓ, 1999, p. 105).
A pesquisa realizada no Distrito Federal indica um contexto cultural caracterizado pela
lógica da desconfiança e por um comportamento orientado pela informalidade. As
predisposições dos cidadãos demonstram uma descrença generalizada nas instituições
políticas e nos atores democráticos, contribuindo para o seu afastamento da esfera pública
(RENNÓ, 1999).
A institucionalidade informal, na América Latina, tem se caracterizado pela presença
do clientelismo nos processos políticos e reside fundamentalmente em uma cultura
patrimonialista, na qual se concebe a política como uma extensão do espaço privado que
permite satisfazer interesses particulares. O clientelismo reflete a relação política vertical e
desigual vivida na região, contribuindo para reforçar essa situação. Tendo em vista as
71
debilidades do desempenho institucional, Barreda e Costafreda (2004) destacam o surgimento
de propostas de reformas institucionais no contexto latino-americano. Entretanto, os autores
destacam que: 1) toda estratégia de reforma institucional que pretenda ser efetiva tem que ter
um caráter integral; 2) não basta mudar o desenho das instituições políticas, mas é necessário
mudar também a cultura política de uma sociedade.
A relevância do conceito de cultura política está em fornecer ferramentas de análise na
explicação das predisposições e comportamentos políticos dos cidadãos. Enquanto conceito
histórico e estrutural, a cultura política é uma variável importante que contribui para
compreender a estabilidade e as mudanças dos sistemas políticos. Dessa forma, as pesquisas
de opinião são fundamentais para avaliar crenças e atitudes políticas dos cidadãos em relação
às instituições e à legitimidade do sistema político.
A maneira como as pessoas internalizam normas, crenças e valores políticos é
relevante para compreender o seu comportamento político e eleitoral, pois o padrão
comportamental se constitui a partir de ações individuais e também de identidade coletiva. Na
seção seguinte serão analisadas as contribuições da teoria da cultura política e da abordagem
psicossociológica na análise do comportamento político.
2.4 ARTICULAÇÃO TEÓRICA NA ANÁLISE DO COMPORTAMENTO
POLÍTICO
Esta tese propõe articular os pressupostos teóricos da abordagem psicossociológica e
da cultura política visando construir uma explicação mais ampla e consistente da lógica do
comportamento político. A proximidade dessas duas perspectivas analíticas contribui para
72
compreender a configuração dos contextos cultural e institucional, bem como o conjunto de
fatores que influenciam o comportamento político e a decisão eleitoral.
Trata-se de abordar a temática tendo em vista os aspectos histórico-estruturais e
institucionais referente às normas e procedimentos democráticos, a dimensão atitudinal,
relativa às orientações e predisposições políticas, e a dimensão comportamental, no tocante às
ações dos indivíduos em relação à política (MOISÉS, 1995; RENNÓ, 1999; BAQUERO,
2000). Compreender o processo e a estrutura das escolhas políticas inclui captar as atitudes
dos cidadãos, condicionadas por um componente prescritivo (normas e valores) e por um
componente cognitivo (percepções, crenças e expectativas). Desse ponto de vista, as
disposições políticas subjetivas e as alternativas políticas objetivas são aspectos da mesma
realidade.
A preocupação inicial dos estudos do comportamento eleitoral no Brasil consiste em
verificar a hipótese de que a identificação partidária, fruto das interações sociais vividas no
interior de uma classe social e reflexo das condições socioeconômicas, é o fator explicativo
mais importante da decisão eleitoral (REIS, 1978; SOARES, 2001). A vertente
psicossociológica propõe ampliar essa abordagem, introduzindo na análise as variáveis
psicológicas que se consolidam através do processo de socialização política, processo pelo
qual as atitudes e valores políticos adquiridos durante a infância são mantidos ou
transformados na fase adulta, influenciando o comportamento político dos indivíduos e
definindo o seu papel no sistema político (ALMOND e POWELL, 1972).
As pesquisas sobre socialização política, iniciadas nos anos 1950 nos Estados Unidos
e impulsionadas no Brasil a partir dos anos 1980, caracterizam a socialização como um
processo permanente, resultante do conjunto das experiências vivenciadas pelos indivíduos,
desde a infância até a fase adulta, especialmente na família, na escola e nos grupos de
referência. “Agindo, reagindo e interagindo social e politicamente, a partir de uma base
73
psicológica formada e com categorias normativas razoavelmente consolidadas, o indivíduo
sempre articulará da mesma maneira suas respostas a diferentes contextos” (FIGUEIREDO,
1991, p. 21).
O termo socialização política é comumente usado para designar a internalização de
valores e a formação das atitudes políticas dos indivíduos. Trata-se de um processo de
“transmissão e aquisição das idéias, das crenças, dos valores, das atitudes e dos
comportamentos em relação às múltiplas manifestações do poder” (SOUZA, 1986, p. 74). A
família, primeira estrutura de socialização encontrada pelo indivíduo, tem desempenhado
importante papel na socialização política, contribuindo para a formação de opiniões e atitudes
em relação ao poder e à autoridade. Na escola os cidadãos têm a oportunidade de adquirir
conhecimento, ampliar experiências de participação e desenvolver uma consciência geral do
ambiente social.
Entre os agentes de socialização política, cabe destacar ainda os partidos políticos e os
meios de comunicação de massa, que exercem influência significativa na estruturação de
opiniões e atitudes políticas dos cidadãos nas sociedades contemporâneas. Em relação aos
partidos políticos, considerados agentes importantes na formação das atitudes políticas dos
cidadãos, Almond e Powell (1972) argumentam que os mesmos podem atuar de duas
maneiras: reforçando a cultura política vigente ou alterando os padrões político-culturais de
determinada sociedade.
Há que se destacar que a educação cívica, alcançada através de processos educativos
formais e informais, e de informações obtidas via meios de comunicação, partidos políticos e
organizações sociais, é central para a construção da cidadania e indispensável ao pleno
funcionamento da democracia. A educação que se realiza num processo de ação-reflexão
contribui para o desenvolvimento pessoal e comunitário das pessoas, favorecendo uma
74
socialização política voltada para a construção de uma cultura política democrática
(BAQUERO e HAMMES, 2006).
Entretanto, pesquisas mostram que efetivamente a confiança e a participação não estão
sendo favorecidas pelo processo de socialização vigente, especialmente entre os jovens. O
argumento é o de que as agências socializadoras sofrem o impacto das novas tecnologias e da
conjuntura trazida pela globalização, caracterizada pelo individualismo, consumismo e
incerteza em relação ao futuro (NAZZARI, 2006). Desse ponto de vista, como entender o
papel das crenças e dos valores na revitalização dos espaços democráticos e da participação
política?
Estudos realizados nessa perspectiva enfatizam a importância da dimensão simbólica
na configuração dos fenômenos políticos. Philip Converse (1964), em um dos seus mais
influentes trabalhos, define o sistema de crenças como um conjunto de idéias e atitudes cujos
elementos são limitados por algumas formas de coerção, mas que possuem extensão e
centralidade para objetos políticos. O sistema de crenças estruturado é avaliado a partir do
grau de centralidade que os temas da agenda pública têm na vida cotidiana do cidadão e do
grau de motivação para a política que os indivíduos desenvolvem.
Em pesquisa realizada nos Estados Unidos, o autor analisou a dimensão ideológica de
decisão das massas, classificando as respostas em “níveis de conceitualização” da política. No
primeiro nível, chamado ideológico, foram colocados aqueles respondentes que confiaram em
dimensões conceituais abstratas como critério de avaliação dos significados políticos. No
segundo nível, quase-ideológico, estão os respondentes que mencionaram tal dimensão, mas
de maneira periférica. No terceiro nível situam-se os respondentes que avaliaram partidos e
candidatos em termos de sua expectativa, de seu interesse de grupo. O quarto nível, chamado
natureza dos tempos, inclui os respondentes que avaliaram partidos e candidatos a partir das
circunstâncias gerais da política. E no último nível, categorizado como sem conteúdo político,
75
estão aqueles que expressaram lealdade por um partido ou por outro, mas admitiram não
conhecer as propostas que estes defendem (CONVERSE, 1964).
A análise do autor demonstrou que o sistema de crenças das massas não é tão
estruturado quanto o da elite. Há uma maior coerência entre as idéias e as atitudes dos
eleitores sofisticados e uma inconsistência nas crenças de massa. O argumento é de que o
cidadão comum não consegue ver os eventos políticos em sua totalidade e “tem dificuldade
em relacionar aspectos mais concretos da vida cotidiana e de assuntos públicos com valores
mais gerais” (RENNÓ, 2001, p. 86).
Com o objetivo de estudar o comportamento eleitoral dos porto-alegrenses, Baquero e
Sisson Filho (1985) utilizam o referencial teórico de Philip Converse. Os resultados da
pesquisa encontraram certa equivalência com os dados obtidos por Converse nos Estados
Unidos, com exceção do terceiro nível, interesse de grupo, cujos percentuais alcançados nos
Estados Unidos (42%) é quase o dobro em relação a Porto Alegre (21,4%). O estrato que se
destaca em Porto Alegre é o “sem conteúdo político”, que alcançou 37% contra 18%
encontrados entre os eleitores norte-americanos. Segundo os autores, as diferenças
encontradas nos sistemas de crenças da população são decorrentes dos níveis de sofisticação
intelectual dos indivíduos. Observou-se que quanto menor a instrumentalização dos eleitores
na compreensão política, mais baixo o interesse em participar de atividades políticas. Os
dados indicam que, para a maioria dos eleitores, a participação política se esgota no ato de
votar (BAQUERO e SISSON FILHO, 1985).
Abordagens dessa natureza revelam o importante papel das crenças e dos valores no
comportamento político dos cidadãos. Quanto maior a credibilidade nas instituições políticas
e a presença do sentimento de eficácia política, maior o envolvimento e a participação política
da população. O cidadão que se sente competente para participar e influenciar na política
expressa adesão aos valores associados ao regime democrático, tais como a confiança nas
76
instituições, a cooperação e a solidariedade. O desenvolvimento da cidadania ou competência
cívica, por meio da transmissão de conhecimentos, da internalização de valores e da
predisposição de habilidades para o bem comum da sociedade, é componente-chave do
engajamento cívico.
Pesquisas de opinião revelam ausência de competência cívica, baixos níveis de
participação política e de confiança nas instituições democráticas, contribuindo para reforçar
padrões clientelistas e personalistas da política brasileira (NAZZARI, 2002; BAQUERO,
1997). No capítulo seguinte serão discutidas as configurações do clientelismo no contexto das
democracias contemporâneas, avaliando em que medida essa institucionalidade política
informal constrange a democracia.
77
3 FENÔMENO CLIENTELISTA NAS CONFIGURAÇÕES POLÍTICAS
A noção de clientelismo indica relações de personalização, reciprocidade e
dependência entre indivíduos que dispõem de recursos materiais e simbólicos de valor
desigual, tendo em vista a troca de bens e serviços. Aparece originalmente nos estudos da
antropologia social, por volta dos anos 50, designando um sistema de trocas interpessoais e
assimétricas. As pesquisas permitem descrever as relações de dominação nas sociedades
rurais e a estrutura do poder tradicional, que se mantém em uma conjuntura dinâmica de
transformação e de modernização política.
Com a modernização, os partidos políticos passam a intermediar o acesso às políticas e
aos recursos públicos, a determinar mobilizações eleitorais, organização do poder e
constituição de redes de clientelas. O clientelismo urbano configura-se num sistema baseado
na distribuição de favores, segundo critérios particularistas, em detrimento do universalismo
de procedimentos e pautado no intercâmbio estabelecido entre candidato e eleitor.
O objetivo deste capítulo é discutir o referencial teórico e os fundamentos do
clientelismo nas sociedades contemporâneas e a sua formatação na democracia brasileira. O
texto divide-se em três seções. A primeira analisa diferentes abordagens do clientelismo
político no contexto da modernização política destacadas pela literatura corrente. A segunda
seção aborda o personalismo e o clientelismo no contexto brasileiro, retomando autores
clássicos e referenciando autores contemporâneos. Na terceira seção, discutem-se o
clientelismo e as novas formas de intermediação de interesses, destacando as redes
clientelistas como mecanismo de controle das organizações sociais.
78
3.1 CLIENTELISMO POLÍTICO NAS SOCIEDADES CONTEMPORÂNEAS
No âmbito da Ciência Política, as pesquisas buscam examinar a forma como as
relações clientelistas incidem na estruturação dos partidos políticos e do Estado. É por
intermédio dos partidos que os indivíduos alcançam os recursos públicos e estabelecem o seu
tipo de envolvimento político. O sufrágio eleitoral e o desenvolvimento de sistemas
partidários conduzem a uma sistematização das práticas clientelistas, que se consolidam como
o principal meio de reprodução e de adaptação das formas tradicionais de poder às novas
atividades políticas nas sociedades contemporâneas. A mediação clientelista obedece, nesse
sentido, à lógica da ausência de uma racionalidade estatal e à permanência da política
clientelar, como resultado da apropriação de certos grupos sociais surgidos com a
modernização política (BRIQUET, 1998).
As razões para a permanência do clientelismo no contexto de modernização política e
a maneira como este incide na formatação das relações sociais e políticas são avaliadas pela
literatura a partir de diferentes fatores. A democracia e as instituições políticas fortalecem as
relações clientelistas, especialmente através das eleições. A troca de favores por lealdade
política encerra um conjunto de crenças, valores e hábitos que se fundem em profundas raízes
históricas. Trata-se de uma relação pessoal, assimétrica e informal, pautada na amizade,
gratidão, reconhecimento e lealdade.
Recentes estudos analisam o clientelismo como um fenômeno moderno de caráter
estrutural presente em todos os países do mundo e endógeno às instituições políticas. De
acordo com Bahia (2003, p. 105), o clientelismo “se enraiza intrinsecamente na hierarquia
inerente a toda organização. Não constitui por isso só um resíduo da sociedade tradicional, um
corpo estranho na sociedade do capitalismo”, mas é resultado da modernização política.
Ainda que produza desequilíbrios e assimetrias nas relações de poder, o clientelismo, de
79
acordo com essa perspectiva, não é considerado um fenômeno negativo, mas sim um
fenômeno constitutivo da ordem política institucional e intrínseco ao sistema político,
indispensável à integração política das populações marginalizadas e excluídas. Desse ponto de
vista, as trocas políticas envolvem um jogo de recompensas e custos de caráter assimétrico,
em que se ganha de um lado influência e prestígio e de outro, gratidão, confiança e lealdade
(BAHIA, 2003).
Na mesma linha de argumentação, Fabiano Santos (1995) justifica a produção de leis
de tipo clientelista a partir de um modelo baseado na teoria da escolha racional. O argumento
é de que a Transferência de Recursos Concentrada (TRC) é predominante em todo e qualquer
parlamento, de modo que “os deputados preferem legislar de maneira clientelista porque é
racional fazê-lo” (SANTOS, 1995, p. 106). Independentemente do partido ao qual estão
filiados, eles produzem leis que concebem benefícios concentrados e impõem custos à
sociedade como um todo. O modelo permite avaliar que os parlamentares, de diferentes
partidos políticos, monopolizam recursos e os trocam de forma particularista e clientelística.
“Há condições favoráveis para constituição de um oligopólio partidário e estadual atuando na
distribuição de recursos públicos de forma concentrada” (SANTOS, 1995, p. 133).
Na análise de Massun (2006), as redes clientelistas atravessam as forças políticas
independentemente de sua posição ideológica, ou seja, não são tributárias de uma forma
ideológica específica. Contudo, o autor argumenta que o neoliberalismo favorece o
estabelecimento dessas redes:
Los mismos mediadores que en la década del noventa defendiam las
privatizaciones diciendo que mejoraríam los servicios públicos que recebiam
sus clientes, y permitirían reducir el déficit del Estado en provecho de la
ayuda social, son lo que una década después hablan de la “nefasta década
neoliberal” (MASSUN, 2006, p. 37).
80
Dessa forma, a implantação do Estado mínimo, com um modelo que gera altos níveis
de exclusão social, contribui para a permanência do clientelismo nas sociedades
contemporâneas. Quanto maiores os níveis de pobreza e desigualdade social, maior a
necessidade de assistência social e de financiamentos de políticas públicas. E quanto maiores
são os recursos que o Estado destina à assistência social mais poderosa a rede clientelista.
Essa situação se agrava com a dependência socioeconômica gerada por tais políticas. Como
enfatiza Massun (2006, p .42):
Sin embargo, tampoco podemos dejar de ver que una asistencia social que
prioriza el satisfacer necesidades inmediatas, portergando la reinserción
laboral o la educación de los jóvenes, es responsable de perpetuar el sistema
de social-dependencia.
Assim, o clientelismo se nutre das necessidades não satisfeitas e das demandas sociais
não atendidas. A pobreza é vista como inevitável e os planos assistenciais, exaltados como
único foco de atenção pelos discursos políticos. Além de gerar dependência do Estado, a
relação clientelar neutraliza qualquer tentativa de democratização, controle e participação na
gestão pública.
O clientelismo fornece um meio de extrair benefícios tangíveis de um sistema que
geralmente favorece os ricos, numa sociedade em que a extensão dos direitos civis é lenta. Por
sua vez, a situação de pobreza e exclusão social vivenciada pelo país e amenizada por
programas sociais paternalistas e compensatórios tem contribuído para manter esse círculo
vicioso do sistema político: uma sociedade desigual permeada de práticas clientelistas. De
acordo com Avelino Filho (1994, p. 240),
A condição de aguda marginalidade econômica e social que caracteriza a
maioria da população faz acreditar que eventuais mudanças introduzidas na
legislação eleitoral e partidária seguramente não provocarão transformação
imediata dos eleitores “de clientela” em eleitores “ideológicos”, clássica
ilusão do liberalismo brasileiro.
81
Uma outra perspectiva analítica interpreta o fenômeno do clientelismo como
decorrente do processo histórico e cultural da sociedade, que favorece a permanência de laços
pessoais de dependência. De acordo com essa vertente, o clientelismo não responde ao
modelo racional-legal da atividade política, é antes visto como prática desviante e ilegítima,
como um obstáculo à modernização política, à racionalidade burocrática e à impessoalidade
das relações (LEAL, 1978; FAORO, 1979; DINIZ, 1982). O caráter e a influência de valores,
hábitos, costumes e tradições culturais, históricas e ideológicas constrangem, modificam ou
intensificam o fenômeno do clientelismo. O clientelismo enfatiza o particularismo,
desmobiliza a sociedade civil e impede que a população pressione o Estado. Além disso, é
associado a uma distribuição pouco igualitária e democrática dos recursos disponíveis e à
ausência de um sistema de acesso aos recursos sociais autônomo e independente.
Ambas as perspectivas analíticas concordam que as relações clientelistas se
estabelecem sobre uma estrutura social e política muito desigual, que mantém dependência
entre os atores políticos. A base do clientelismo continua inalterada com a modernização
política e, por sua vez, a democratização, longe de eliminar o clientelismo, assegurou a
proliferação de acordos de base clientelista. Desse modo, o clientelismo político
contemporâneo baseia-se numa seletiva e personalizada troca de voto por bens, serviços e
empregos.
A discussão conceitual sobre o clientelismo relaciona dois importantes conceitos:
“patronagem” e “máquinas políticas”. Patronagem refere-se ao uso ou distribuição de recursos
do Estado com a finalidade de obter vantagens políticas. Abrange empregos, verbas do setor
público, serviços, contratos, concessões e investimentos estatais como garantia de votos e de
apoio político (MAINWARING, 2001). A patronagem constitui a base de sustentação de
muitas carreiras políticas, em que inúmeros cargos públicos preenchidos por nomeação –
“cargos de confiança” – são moeda de troca nesse processo de barganha política.
82
O clientelismo moderno configura-se num sistema de patronagem baseado na
distribuição de favores e proteção, através de uma ação combinada envolvendo governo e
máquina partidária. Robert Gay (1998) argumenta que está cada vez mais difícil para os atores
políticos criarem um senso de lealdade junto ao eleitorado sem esse expediente e, ao mesmo
tempo, conseguirem disfarçar a efetiva compra de votos. Dessa forma, patronagem é a
essência do clientelismo político, que mina qualquer tentativa de estabelecer programas
baseados sobre princípios do universalismo.
A literatura utiliza o termo “máquinas políticas” para caracterizar as organizações
político-partidárias de cunho clientelista que surgem da incapacidade das instituições políticas
em atender as demandas sociais. Trata-se de um sistema centralizado de prestação de serviços
que distribui recursos públicos, segundo critérios particularistas, a diferentes tipos de
clientelas, permitindo às populações excluídas serem integradas ao sistema político, através
do acesso aos serviços e aos recursos sociais (DINIZ, 1982; AVELINO FILHO, 1994). De
acordo com Eli Diniz (1982, p. 42):
O intercâmbio de favores é o elemento central em todos os exemplos de
clientelismo, sob suas diferentes formas. Porém, nas máquinas, os vínculos
de patronagem estão integrados num sistema que pode atingir alto grau de
organização e de centralização, contando com uma hierarquia de quadros
profissionais, sob a supervisão de uma cúpula, que coordena as várias
atividades e os diferentes interesses envolvidos. É, portanto, a escala e a
estabilidade da organização que distinguem a máquina de outras
modalidades de relações clientelistas vinculando políticos particulares a suas
bases eleitorais, tão comuns, tanto nos centros urbanos, quanto nas áreas
rurais.
A autora argumenta que o encaminhamento de demandas transforma-se na expectativa
de obtenção de um favor, reforçando a lógica da deferência e da influência pessoal, e
consolidando relações que se baseiam em fortes elementos de desigualdade e assimetria de
poder. Há uma prevalência de critérios particularistas sobre critérios universalistas na
alocação e distribuição de benefícios entre os atores solicitantes. Portanto, o clientelismo
83
representa um importante mecanismo de controle social em benefício de uma dada
constelação de interesses dominantes (DINIZ, 1982).
Na mesma linha de argumentação, Fernández (2002) define clientelismo como uma
relação pessoal de intercâmbio que se estabelece de forma voluntária e legítima. A autora
distingue três tipos de clientelismo: eleitoral, de partido e burocrático. No clientelismo
eleitoral, o intercâmbio se dá entre candidato, partido e eleitor. O conteúdo é o voto, dado por
uma parte, e as políticas públicas, concedidas pela outra parte. Cada político intercambia seu
poder com outros políticos de maneira que se configuram centros de decisão onde se
estabelecem o clientelismo burocrático e o partidário.
Nesse sentido, os partidos políticos desempenham um papel central no clientelismo
moderno, pois é por seu intermédio que os indivíduos têm acesso às instituições estatais e aos
recursos públicos. Relações clientelistas, assimétricas, personalizadas e verticais passam a
determinar mobilizações eleitorais, organização do poder local e a constituição de redes de
clientelas. Passam também a constituírem-se em prática comum no exercício do poder
político. Contudo, pela perspectiva da cultura política e do capital social, essas práticas
representam anomalias do ponto de vista democrático e se associam a relações sociais
tradicionais e a contextos de crescente pobreza e desigualdade social. A próxima seção analisa
a maneira como o clientelismo ocorre no interior das instituições políticas brasileiras,
destacando autores que trabalham com a vertente histórico-estrutural.
3.2 PERSONALISMO E CLIENTELISMO NA POLÍTICA BRASILEIRA
A Ciência Política aborda o fenômeno do patrimonialismo, do coronelismo, do
personalismo e do clientelismo sob diferentes perspectivas analíticas, com o objetivo de
84
verificar o impacto desses elementos na configuração do sistema político brasileiro, da cultura
política e das relações sociais no Brasil. Baseado nesses estudos, o principal argumento dessa
seção é o de que essas assimetrias de poder se expressam nos processos de desenvolvimento
econômico, social e político sob a forma da exclusão social, do autoritarismo e da
permanência de valores e atitudes tradicionais, o que dificulta o estabelecimento e o
funcionamento de um sistema político democrático-liberal.
A análise do caso brasileiro permite ressaltar três elementos principais que constituem
a relação de clientela eleitoral: a confiança, a troca interpessoal desigual e a tutela sobre o
sufrágio. As especificidades do clientelismo brasileiro devem-se à sua histórica passagem do
clientelismo tradicional rural a um clientelismo urbano, concorrencial e eleitoral. Em todo
caso, as relações de clientela continuam a repousar sobre uma estrutura social e política muito
desigual e dependente.
As relações clientelistas modernas ocorrem dentro de um contexto que combina
democracia com exclusão social e se caracterizam por serem pessoais, desiguais, dependentes
e verticais. Os políticos conservam o controle e a distribuição de recursos do Estado através
da vitória eleitoral. Em estudo sobre as relações de clientela nas favelas do Rio de Janeiro,
Camille Goirand (1998) mostra que as trocas eleitorais constituem instrumentos de satisfação
de demandas, condicionadas por ambigüidades que foram identificadas nas falas dos
entrevistados e que dizem respeito à rejeição da política formal e aos acordos estabelecidos
entre os diferentes atores políticos.
Diversas pesquisas têm mostrado que a evolução histórica do Brasil e a forma como as
instituições se estabelecem favorecem a manutenção de traços tradicionais da política,
indicando a relevância de se analisar como os cidadãos têm internalizado esses elementos na
estruturação dos seus sistemas de crenças.
85
Dentro dessa linha de argumentação, destacam-se os trabalhos de Sérgio Buarque de
Holanda (1991) e de Raymundo Faoro (1979), que relacionam a presença de elementos
tradicionais na política a questões históricas e culturais. De acordo com os autores, a herança
ibérica e as raízes históricas do clientelismo e do personalismo diferenciam o Brasil de muitos
outros países. A história política brasileira caracteriza-se pelo predomínio de vínculos
pessoais e de sentimentos particularistas dentro de uma concepção familista-patriarcal, onde
os detentores das posições públicas eram incapazes de compreender a distinção entre os
domínios do privado e do público.
Nem mesmo o processo de urbanização e industrialização resultou numa
transformação profunda e estrutural das relações entre o domínio rural e o urbano. Foram
mantidos os fundamentos tradicionais e os traços arcaicos herdados da colonização
portuguesa e do Império. Essa relação assimétrica, que postula a cordialidade, a hospitalidade
e a generosidade, características do “homem cordial” brasileiro, se sobrepôs a um
ordenamento impessoal, que caracteriza o Estado burocrático, constituindo elementos
estruturadores de uma cultura política clientelista (HOLANDA, 1991). O autor citado observa
que tais características, como a cultura da personalidade, a ênfase no particularismo, a
frouxidão da estrutura social e das instituições políticas e a falta de hierarquia e de
organização são próprias da cultura ibérica, se comparada a das demais nações européias.
Holanda (1991) afirma que, enquanto os fundamentos personalistas permanecerem em
nossa vida política e social e enquanto não forem revogados os traços da velha ordem colonial
e patriarcal na política brasileira, com todas as conseqüências morais, sociais e políticas que
eles acarretam, não haverá democracia possível. O comportamento social e político, baseado
em laços pessoais e diretos, constitui obstáculos à aplicação das normas de justiça e a
quaisquer prescrições legais.
86
Nessa perspectiva, Raymundo Faoro (1979), em sua obra Os Donos do Poder,
publicada no final dos anos 1950, analisa o patrimonialismo como o principal eixo da cultura
política brasileira e argumenta que, com a implantação do capitalismo, surge um Estado de
natureza patrimonial, cuja estrutura estamental gera uma elite dissociada da nação: o
patronato político brasileiro – donos do poder –, que age tendo em vista os interesses
particulares do estamento burocrático. Segundo o autor, essa estrutura política e social tem
permanecido na política brasileira ao longo da formação do Estado Ibérico português até o
Estado Novo. O patrimonialismo, cuja legitimidade assenta no tradicionalismo, floresce numa
estrutura social e política que concentra o poder de uma minoria capaz de controlar e infundir
padrões de conduta a uma maioria, e que tem uma permanência secular na história política
brasileira. Não se distingue, muitas vezes, do clientelismo e do nepotismo por se referir a
situações em que políticos utilizam recursos públicos para fins privados, privilegiando
familiares, amigos e sua clientela política, ao invés de distribuí-los conforme critérios
universalistas e impessoais.
A respeito do tipo de dominação patrimonial no Brasil, Rubens Goyatá Campante
(2004), argumenta que a tese de Faoro é aceita nos termos do argumento da herança lusa,
reforçada pelo processo de Independência brasileira. Entretanto, há discordâncias sobre a
existência de estamentos, tanto no setor latifundiário quanto na burocracia brasileira. Essas
contradições e ambigüidades caracterizam o sistema como patrimonial-burocrático. De acordo
com o autor, o Estado brasileiro tem um caráter modernizador na medida em que convive com
autoridades patriarcais e, ao mesmo tempo, consegue expandir a burocratização e a
racionalização sobre a sociedade. Ao contrário de Faoro, que enfatiza o caráter centralizador e
estamental da burocracia imperial, Campante (2004) desenvolve o argumento de que a
burocracia patrimonial, além de favorecer os latifundiários, foi vetor da racionalização
progressiva da esfera pública.
87
A noção de burocracia patrimonial foi desenvolvida por Fernando Uricoechea (1978),
que aponta para um construto híbrido de dois princípios reguladores opostos: de um lado, a
autoridade racional, representada pela burocracia do Estado; e de outro, a autoridade
tradicional, caracterizada pelo aparato administrativo controlado patrimonialmente pelas
classes locais, que exercem pressão sobre a prebendalização de cargos. Ainda que o
prebendalismo de cargos tenha retardado a mudança da administração patrimonial para a
burocrática, é possível vislumbrar os novos padrões de apropriação de cargos públicos nos
períodos mais recentes da história.
De acordo com o referido autor, a Guarda Nacional, ao estabelecer a mediação entre o
centro e a periferia, acomodando interesses entre senhores de terra e o príncipe, tornou
possível a dominação patrimonial, durante o século XIX, e a criação de um Estado
burocrático moderno no Brasil. O fato de tal ordem burocrática ser permeada de valores
políticos tradicionais contribuiu para enfraquecer o processo de eliminação do particularismo
e da arbitrariedade das estruturas patrimoniais do Estado. “É justamente nessa coexistência
antagônica e conflitante de formas tradicionais e racionais, de patrimonialismo e burocracia,
que repousa um dos traços mais peculiares de organização institucional da comunidade
política brasileira do século XIX” (URICHOECHEA, 1978, p. 302).
Se numa base patrimonial a família patriarcal era responsável pela apropriação da
coisa pública, atualmente os partidos políticos são elementos-chave na apropriação de cargos
numa base racional burocrática. Esse hibridismo justifica, em parte, o caráter permanente da
representação hierárquica e autoritária na política brasileira. Com a institucionalização da
política partidária, organiza-se um sistema político pautado em relações clientelistas. De
acordo com o autor,
É possível desvendar um padrão muito esquemático: quanto mais nos
deslocarmos para a periferia e períodos remotos do Império, mais teremos o
parentesco como a estrutura definitiva para esteriotipar as chances de
apropriação de cargos públicos numa base patrimonial, e quanto mais nos
88
movermos para o centro e para os períodos mais recentes da história, mais
serão as estruturas de partidos essenciais para esteriotipar as chances de
apropriação de cargos numa base racional burocrática (URICOECHEA,
1978, p.116).
Na medida em que a apropriação do cargo se dá via burocracia local, o
patrimonialismo dá lugar ao coronelismo, uma forma peculiar de manifestação do poder
privado dentro de uma extensa rede de clientelas. O coronelismo surge com o recuo do
patrimonialismo e com o avanço da burocracia. Trata-se de um fenômeno característico do
regime republicano, que se insere dentro da estrutura patrimonial e que influencia toda a vida
política do país. Apesar da passagem do Império à República, a estrutura econômica e política
persistia no país. Assim, o momento da eleição não se configura como a escolha de
candidatos, mas apenas como o momento da barganha e da reciprocidade, quando o eleitor dá
seu voto porque já recebeu algum benefício ou espera recebê-lo. De acordo com Queiroz
(1976, p. 113),
a extensão do direito de voto às classes populares não tivera, pois, outro
efeito senão aumentar o número de eleitores rurais às ordens de determinado
mandão político; como podiam os agregados discordar dele se nem tinham a
cultura necessária para formar opinião própria, nem podiam se manifestar
em oposição aos fazendeiros sem perder o único amparo que possuíam?
A obra de Victor Nunes Leal (1978), publicada no final dos anos 1940, Coronelismo,
Enxada e Voto, analisa o fenômeno do coronelismo a partir da organização agrária do Brasil,
uma estrutura que mantém laços de dependência entre a população rural e os chefes locais,
conhecidos como coronéis. Segundo o autor, não é possível compreender o fenômeno sem
referência à estrutura agrária, que favorece as manifestações de poder privado no interior do
Brasil. Leal define o coronelismo como um “compromisso, uma troca de proveitos entre o
poder público, progressivamente fortalecido, e a decadente influência social dos chefes locais,
notadamente os senhores de terras” (LEAL, 1978, p. 20).
89
A existência de estruturas oligárquicas e de personalização do poder, como o
mandonismo, o filhotismo, o falseamento do voto e a desorganização dos serviços públicos
locais são características do sistema coronelista. Os coronéis prestavam favores pessoais de
toda ordem, desde arranjar empregos até redigir cartas e recibos. O “voto de cabresto”, como
ficou conhecido no período, caracterizava-se pelo controle exercido pelo coronel sobre o voto
dos eleitores da localidade. Os coronéis, por sua vez, recebiam do governo estadual dinheiro e
favores em geral. Esse favoritismo contribuiu para a desorganização da administração
municipal e para o aumento da corrupção eleitoral. “A corrupção eleitoral tem sido um dos
mais notórios e enraizados flagelos do regime representativo no Brasil” (LEAL, 1978, p. 240).
O autor argumenta que o declínio do coronelismo se deve à crescente industrialização, ao
aumento do eleitorado urbano e à expansão dos meios de comunicação e dos transportes. A
estrutura agrária no Brasil, contudo, manteve-se intacta.
No coronelismo os clientes demonstravam lealdade, obediência, reconhecimento, e os
patrões reafirmavam seu dom de proteção. Espelhando o paradigma familiar, a troca de
lealdade e obediência por proteção e favores constituía a matriz das relações sociais entre
clientes e patrões, recriada quase indefinidamente entre os vários estratos sociais. A cada
voto, pedido de emprego, concessão de um favor, cada um reconhecia sua posição de inferior
ou superior, dependendo da situação.
José Murilo de Carvalho (1997), em sua análise sobre o mandonismo, o coronelismo e
o clientelismo, chama a atenção para a imprecisão e inconsistência com que, muitas vezes, a
literatura trata tais conceitos. Segundo o autor, cada um deles envolve a idéia de diacronia, de
processo e de dinamismo. Por exemplo, o patrimonialismo diz respeito a uma situação em que
os governantes tratam o Estado como propriedade deles. Os políticos não fazem distinção
entre o que é público e o que é privado. O mandonismo refere-se à existência local de
estruturas oligárquicas e personalizadas de poder. Trata-se de uma característica da política
90
tradicional. Por sua vez, o coronelismo é um sistema político nacional, característico do
período republicano, baseado em barganhas entre o governo e os coronéis; portanto, um
fenômeno datado historicamente e que envolve relações de troca de natureza personalista e
clientelista.
Como enfatiza Kerbauy (2000, p. 14), a passagem de uma sociedade rural para uma
sociedade urbana não foi suficiente para eliminar o tradicionalismo e o coronelismo, mas
foram “os efeitos das mudanças institucionais sobre as transformações urbanas que criaram
condições políticas propícias ao desaparecimento do coronelismo, enquanto prática de poder
local”. Com o fim dos coronéis, não houve, contudo, a extinção das clientelas, sobressaindo o
fenômeno do clientelismo, em que se estabelecem novas mediações entre o município, o
estado e a federação.
O clientelismo é entendido, então, como um fenômeno muito mais amplo, que
perpassa toda a história política do país e que envolve a concessão de benefícios públicos
entre atores políticos. O clientelismo se amplia com o fim do coronelismo, quando a relação
passa a ser diretamente entre políticos e setores da população, sem a intermediação do
“coronel”, que gradativamente perde a capacidade de controlar os votos da população. De
acordo com Carvalho (1997, p.233), o clientelismo “indica um tipo de relação entre atores
políticos que envolve concessão de benefícios públicos, na forma de empregos, benefícios
fiscais, isenções, em troca de apoio político, sobretudo na forma de voto”. No coronelismo, o
emprego público é visto como um importante instrumento de dominação, mas com o
clientelismo adquire importância como fonte de renda.
O clientelismo é analisado por Edson Nunes (1999) como um dos traços da política
brasileira e como uma das “gramáticas políticas” que tem moldado a história e as relações
políticas do país. O autor define o clientelismo como um sistema de trocas generalizadas e
pessoais, caracterizado por situações que envolvem combinações de desigualdade e assimetria
91
de poder. Constitui-se numa gramática personalista, baseada em relações pessoais,
institucionalizadas e hierárquicas. Tais relações tornaram-se cruciais para a obtenção de
favores políticos, de forma que as instituições formais do Estado permaneceram impregnadas
por este processo. O autor argumenta que o
universalismo de procedimentos e o insulamento burocrático são muitas
vezes percebidos como formas apropriadas de contrabalançar o clientelismo.
O universalismo de procedimentos, baseado nas normas de impersonalismo,
direitos iguais perante a lei, e checks and balances, poderia refrear e desafiar
os favores pessoais. De outro lado, o insulamento burocrático é percebido
como uma estratégia para contornar o clientelismo através da criação de
ilhas de racionalidade e de especialização técnica (NUNES, 1999, p.33).
De acordo com Nunes (1999), o clientelismo constitui uma alternativa à presença
difusa das estruturas do Estado e uma gramática para as relações sociais. As relações pessoais
e hierárquicas são cruciais para tudo, desde obter um emprego, até licenciar um automóvel.
Os brasileiros enaltecem o “jeitinho” e a autoridade pessoal como mecanismos para regular
relações sociais.
Trata-se de um fenômeno político moderno, caracterizado por relações verticais e
assimétricas entre atores políticos, que envolve a concessão de benefícios públicos em troca
de apoio político. O patron é o ator que tem contato com o mundo exterior e comando sobre
recursos públicos, dos quais dependem os clientes. O clientelismo repousa num conjunto de
redes personalistas que se estendem aos partidos políticos e a toda organização, dando
impulso ao aparecimento de novos políticos e novas lideranças. As instituições formais do
Estado ficaram impregnadas por este processo de trocas de favores (NUNES, 1999).
Nessa perspectiva, Eli Diniz (1982) mostra que o clientelismo político mantém-se
fortemente enraizado nos centros urbanos do país, entre eles São Paulo, com o malufismo, e
92
no Rio de Janeiro, com o chaguismo
8
. A autora argumenta que os estudos sobre o clientelismo
nas décadas de 1950 e 1960 enfatizavam as relações pessoais e diretas entre atores individuais
dentro de contextos rurais. Ela se propõe a analisar as práticas clientelistas que se fortalecem
no contexto urbano. O MDB, considerado um partido de oposição nacional, no Rio de Janeiro
transforma-se numa máquina política
9
e numa complexa estrutura clientelista, envolvendo
várias instâncias do poder local. “As práticas clientelistas evoluiriam inseridas numa
organização complexa, a máquina chaguista, articulando várias redes de clientelas
estruturadas em torno de políticos com larga experiência em suas respectivas áreas de
atuação” (DINIZ, 1982, p. 213).
A autora constata em sua pesquisa dois importantes elementos: 1) o voto rural é mais
propenso ao personalismo e ao clientelismo, o que não significa que o voto urbano esteja
isento, como foi o caso do Rio de Janeiro; 2) o MDB, considerado um partido de oposição ao
nível nacional, tornou-se no Rio de Janeiro um partido clientelista. Segundo Diniz (1982), os
partidos programáticos se diferenciam das máquinas políticas por aderirem a princípios e
propósitos mais amplos, embora essas organizações não estejam isentas de buscarem
vantagens pessoais e partidárias. Entretanto, nas organizações programático-ideológicas, o
proselitismo político tem um peso maior do que o clientelismo, revelando a importância de
um sistema partidário sólido.
O voto clientelista, baseado em relações pessoais e orientado numa perspectiva de
ganhos e benefícios imediatos, difere do voto ideológico, que implica orientações menos
particularistas, calcadas em identificações partidárias e programáticas. Entretanto, a pesquisa
de Diniz aponta que a identificação partidária e o voto clientelista não são dimensões
8
Paulo Maluf (ARENA), em São Paulo e Chagas Freitas (MDB), no Rio de Janeiro.
9
Diniz utiliza-se do conceito de James Wilson, que define máquina política como a organização partidária que
se utiliza do poder e da influência política para fornecer bens e serviços a sua base eleitoral (DINIZ, 1982, p. 27).
93
antagônicas do comportamento eleitoral. O voto partidário não é indicador de consistência
ideológica, mas se pode esperar maior resistência ao apelo clientelista. O clientelismo
decresce na medida em que a identificação partidária associa-se à orientação de caráter
ideológico e programático (DINIZ, 1982). A crescente desmoralização dos partidos políticos,
a proliferação de legendas e candidatos e a desconfiança dos eleitores em relação à política e
às instituições democráticas tornam cada vez mais distante a institucionalização do voto
partidário e ideológico.
O sistema eleitoral, portanto, é outro fator apontado pela literatura como sendo
motivador da informalidade da prática política no país. David Samuels (1997) analisa a
política eleitoral do Brasil a partir do sistema de representação proporcional com listas
abertas, alegando que este tipo de sistema eleitoral é mais centrado no candidato do que nos
partidos
10
. Uma vez eleitos, os políticos são pouco controlados pelos partidos e gozam de total
autonomia para migrar de um partido para outro, com muita liberdade e facilidade. Contudo, o
autor argumenta que, se por um lado o sistema eleitoral brasileiro gera incentivos para o
personalismo e o individualismo; de outro, promove a valorização das legendas partidárias,
especialmente daqueles partidos que não dispõem de recursos para patronagem, como alguns
partidos de esquerda.
Estudos sobre os partidos políticos no Brasil indicam que a fragilidade e a baixa
institucionalização do sistema partidário é conseqüência das condições históricas do seu
surgimento (SOUZA, 1976 e 1988; KINZO, 1993; MAINWARING, 2001). Tais análises
procuram justificar as razões para essa fragilidade à luz da estrutura estatal e do papel
predominante do Estado na organização e na articulação de interesses. A preocupação central
desses estudos é compreender em que medida os partidos políticos interferem no processo
10
Os partidos apresentam uma lista de candidatos, sem definir a ordem de preferência; cada eleitor dá seu voto
para um candidato ou partido; as cadeiras obtidas pelo partido são ocupadas pelos candidatos mais votados.
94
decisório governamental e qual tem sido o seu papel no fortalecimento do regime democrático
brasileiro.
Numa perspectiva normativo-teórica, os partidos políticos são organizações que atuam
no mercado eleitoral e que estabelecem relações com o eleitorado, com o parlamento e com o
governo, e têm sido considerados instituições fundamentais nas democracias contemporâneas,
na medida em que representam, articulam interesses, mobilizam eleitorados, estruturam o
voto, organizam as demandas da população, formam governos, ocupam cargos políticos,
produzem e viabilizam a implementação de políticas públicas, formam opinião pública e
estabelecem mediação entre governo e população. Apesar de mostrarem-se coesos e
programáticos, os partidos políticos ainda “formam um sistema frágil na função
governamental, decisória e na representação de interesses da maioria da população” (SOUZA,
1988, p. 593).
Segundo esses estudos, a baixa institucionalização do sistema partidário brasileiro está
associada a elementos tradicionais da política que perpassam o processo democrático, como o
corporativismo, o clientelismo, a estrutura centralizada do Estado, a oligarquização do jogo
político e a conseqüente ausência de participação política. Mainwaring (2001) identifica o
clientelismo, o patrimonialismo, a corrupção e o nepotismo como fatores do declínio da
identificação partidária; pois, além de enfraquecerem as instituições políticas democráticas,
transformam as políticas sociais em interesses particularistas. Pessoas e grupos recorrem a
recursos e favores através de redes de clientelas, fora dos canais formais de representação,
enfraquecendo sobremaneira as instituições políticas. Segundo o autor:
Conseguir um empréstimo bancário, ganhar um contrato com uma empresa
estatal e tirar tíquetes para receber leite gratuito quase sempre requerem o
prestígio de um político. Uma vaga na creche ou na escola pública, inscrição
para uma casa popular, acesso a serviços médicos, benefícios de
aposentadoria e bolsas de estudo igualmente dependem dos préstimos de
políticos. Até os programas de assistência a gestantes, crianças pobres e
vacinação em massa são usados com fins políticos. Em troca desses serviços
95
e benefícios, os políticos esperam a fidelidade, os votos e as contribuições
financeiras daqueles a quem ajudam (MAINWARING, 2001, p. 231).
A análise de Mainwaring (2001) sobre o sistema partidário brasileiro mostra-se
bastante pessimista. Argumenta que a migração e a baixa fidelidade partidária, conjugadas
com alta autonomia dos políticos, não contribuem para a institucionalização das organizações
partidárias. Segundo o autor, esse quadro favorece o surgimento de partidos descentralizados,
indisciplinados e individualistas, do tipo “catch-all”, que não criam raízes na sociedade e
nem favorecem uma identificação partidária sólida e estável. O autor afirma que o declínio da
identificação partidária e o crescimento da volatilidade eleitoral são elementos que influem
diretamente na instabilidade do sistema partidário. Mesmo manifestando preferências
partidárias durante o processo eleitoral, não se pode afirmar que o eleitorado criou raízes
estáveis com os partidos.
A redução da importância das organizações partidárias, segundo Baquero (1999), está
associada ao voto personalista, que se consubstancia no atendimento de demandas de uma
base eleitoral, no individualismo das campanhas eleitorais e na concepção de mandato como
propriedade individual. De acordo com o autor:
As instituições são dominadas pelas elites tradicionais ou por personalidades
fortes que reduzem as possibilidades de circulação de lideranças. As disputas
eleitorais, portanto, não poderiam ser baseadas em outros valores senão nos
do personalismo e da demagogia. Assim, os partidos naturalmente não são
vistos como eficientes mediadores de interesses da sociedade civil e
tampouco detém índices significativos de identificação partidária
(BAQUERO, 1999, p. 18).
Abordagens dessa natureza atribuem a permanência de fatores estruturais, como o
populismo e o personalismo no processo político, à ausência de uma estrutura sólida de
partidos. Baquero (1999) argumenta que o personalismo, o clientelismo, o nepotismo e a
corrupção existem em todos os países do mundo. Entretanto, no Brasil, eles formatam as
relações sociais e políticas incidindo diretamente nas estruturas do Estado, desvalorizando as
96
instituições políticas e comprometendo o regime democrático. As mudanças sociais e políticas
ocorridas nos últimos anos têm alterado os pontos de referência dos eleitores, o que exige da
Ciência Política novas pesquisas e perspectivas de análise.
Os estudos sobre o sistema partidário brasileiro aqui referenciados constatam que a
histórica fragilidade dos partidos políticos favoreceu a institucionalização de uma política
personalista. Os partidos políticos, especialmente os conservadores, apresentam baixos níveis
de disciplina partidária e utilizam-se do personalismo e do clientelismo em sua atuação
política. Em recente pesquisa sobre os partidos conservadores, Mainwaring, Meneguello e
Power (2000) enfatizam que estes têm suas bases sociais nos pequenos municípios, onde há
maior predomínio de práticas clientelistas.
De acordo com os autores, os partidos conservadores foram identificados no
Congresso segundo critério programático: com base na avaliação das votações em plenário e
em pesquisa de opinião realizada entre os parlamentares. O Partido da Frente Liberal (PFL), o
Partido Progressista Brasileiro (PPB, hoje PP) e o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB),
juntamente com mais 11 partidos menores com representação no Congresso, foram
classificados como partidos conservadores
11
. Esses partidos tendem a apoiar posições
autoritárias e defendem algumas políticas militares, como a recusa em reconhecer os abusos
contra os direitos humanos do regime anterior, o crescimento econômico em detrimento da
distribuição, o enxugamento do Estado em favor do capital estrangeiro, a redução dos gastos
públicos e a privatização. Os simpatizantes dos partidos conservadores provêm de três
categorias: estão entre os respondentes mais velhos (faixa etária), estão entre os residentes de
municípios pequenos (tamanho do município) e estão entre as regiões mais pobres (região).
Os meios para a construção desta base populista residem no personalismo e no clientelismo, e
11
Na ocasião da pesquisa dos autores, os partidos menores que possuíam pelo menos um membro no Congresso
ou um governador eram os seguintes: PMB, PMN, PSC, PSL, PST, PTR, PL, PRN, PRONA, PRP, PSD. O
PMDB e o PSDB, apesar do seu perfil conservador, não são considerados partidos de direita.
97
o sucesso dos partidos conservadores tem se fundamentado na sua capacidade de dominar os
pequenos municípios, especialmente nas regiões menos desenvolvidas do país
(MAINWARING, MENEGUELLO e POWER, 2000).
As pesquisas examinadas nesta seção mostram que a evolução histórica do Brasil e a
forma como as instituições se estabeleceram no país têm favorecido a manutenção de traços
tradicionais da política, indicando a relevância de se analisar o reflexo desses elementos no
processo político atual. Reaparecem sob novas denominações, mas são tributários de uma
matriz histórico-cultural que continua vigente nas relações sociais. Assim, conceitos como
patrimonialismo, personalismo e clientelismo, ainda que sob novas denominações
(neopatrimonialismo, neopersonalimo, neoclientelismo), continuam a incidir na configuração
das relações sociais e no funcionamento das instituições políticas democráticas. As pessoas
não acreditam nas instituições e buscam soluções individuais. A institucionalização de
práticas clientelistas se intensifica no âmbito da política formal, e estas se reproduzem no
interior das organizações populares. Este aspecto será tratado a seguir.
3.3 CLIENTELISMO E NOVAS FORMAS DE INTERMEDIAÇÃO DE
INTERESSES
Diversos autores têm enfatizado que práticas como o populismo, o personalismo e o
clientelismo se configuram no processo democrático, até mesmo no âmbito de experiências de
democracia participativa. Por um lado, a constituição de uma cultura política democrática é
atribuída aos novos movimentos sociais e às novas formas de intermediação de interesses,
como o Orçamento Participativo e os Conselhos Municipais, entre outros. De outro lado,
essas novas institucionalidades acabam mantendo as formas de clientelismo como um
98
mecanismo da mobilização política que serve aos interesses das elites políticas e de grupos
particulares. Segundo D’Avila Filho, Jorge e Coelho (2004, p. 5),
o clientelismo se apresenta como estratégia moderna de obtenção de
benefícios por parte dos atores sociais minimamente organizados e desejosos
de auferir determinados benefícios, os clientes, com os mandatários
legítimos da gestão dos benefícios patrimoniais, materiais ou simbólicos,
seus patronus.
Em pesquisa realizada nos municípios de Petrópolis e Niterói, Rio de Janeiro, os
autores referenciados constatam que os experimentos participativos na gestão pública não
produzem autonomia em relação ao poder público, tampouco alteram o cálculo político das
lideranças comunitárias. Trata-se apenas de uma coextensividade entre a ampliação de
mecanismos democráticos e trocas políticas assimétrico-clientelistas. Os autores defendem
que, sob determinadas condições, o clientelismo pode ser encarado como uma alternativa
popular legítima para a obtenção de benefícios.
Na mesma linha de argumentação, o estudo de Edinara de Andrade (2005) sobre o
Orçamento Participativo (OP) afirma que o clientelismo contemporâneo, ao contrário do
tradicional, exibe aspectos relacionais e hierárquicos, assim como elementos de identidade e
organização coletiva. De acordo com a autora,
o OP cria um sistema de incentivo à participação de lideranças comunitárias
que, por sua vez, precisam da presença de suas bases de apoio, que devem
ser ampliadas constantemente para garantir a obtenção dos benefícios, como
também para referendar o papel da liderança. Como em qualquer
comunidade a competição interna entre as lideranças locais acontece com
freqüência levando as mesmas a constantes disputas de prestígio e posição
dentro de suas áreas de influência (ANDRADE, 2005, p. 225).
A pesquisa realizada entre os delegados do Orçamento Participativo em Porto Alegre,
RS, e em Blumenau, SC, mostra que existe espaço para manobras e lutas por direitos
particulares, ainda que não sejam de indivíduos, mas de grupos, evidenciando o caráter
99
estrutural do clientelismo contemporâneo e endógeno ao funcionamento das organizações
políticas e sociais. A autora conclui que, tendo em vista a cultura política de sujeição e
deferência da população brasileira, a proposta do Orçamento Participativo tem seu alcance
limitado na mudança de atitudes e comportamentos dos cidadãos envolvidos no processo.
A proposta das novas formas de intermediação de interesses, fundada no pressuposto
da horizontalidade, da transparência e da descentralização, deveria superar as práticas
clientelistas pautadas em relações verticais, assimétricas e hierárquicas, responsáveis pela
fragmentação da participação política. Tal horizontalização seria viabilizada por formatos de
representação política cuja eficácia depende da qualidade das experiências locais de
democracia participativa.
Em estudo sobre o Orçamento Participativo em duas cidades brasileiras, Boschi (2004)
já encontrara resultados semelhantes aos de Andrade (2005). “Em seu formato atual, o OP
tem sido ‘capturado’ por agentes políticos com maior capacidade de mobilizar recursos,
reproduzindo em seu âmbito ações políticas de corte clientelista” (BOSCHI, 2004).
Dessa forma, o Orçamento Participativo, que vislumbrava ser um instrumento de
controle social e de combate ao clientelismo, favorecendo uma participação mais direta da
população na implementação dos investimentos aprovados e na cobrança e responsabilização
dos governantes em relação ao desempenho político e econômico do regime democrático, tem
sido alvo de críticas por reproduzir em seu âmbito as práticas clientelistas que se propôs a
combater. Segundo alguns analistas, para neutralizar a tendência clientelista do OP e demais
iniciativas desse porte, é preciso gerar uma cultura política democrática e estoques de capital
social, instaurando práticas e estruturas horizontais que reduzam o impacto das relações
assimétricas e desiguais. Ao invés de suplantar e erradicar o clientelismo, o Orçamento
Participativo acabou por incorporá-lo em seus processos, revelando ser um elemento
persistente, mesmo num contexto inclusivo e democrático (BOSCHI, 2004).
100
No tocante aos movimentos sociais, o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra
(MST) é uma instância de intermediação de interesses bastante estudada. Eliane Brenneisen
(2002) busca analisar as relações de dominação e poder que se reproduzem no interior dos
assentamentos rurais. Sua pesquisa mostra que “um fator a considerar na compreensão das
relações de poder nos assentamentos rurais é a coexistência de determinadas práticas
clientelistas e a busca de novas relações sociais mais democráticas e igualitárias que têm sido
empreendidas pelos movimentos sociais” (BRENNEISEN, 2002, p. 256).
Segundo a autora, os agricultores vêem as lideranças do MST como “patrões”, aqueles
que estão à frente das cooperativas e controlam os recursos daí advindos, reproduzindo-se no
interior do próprio movimento relações autoritárias e clientelistas. Brenneisen (2002)
argumenta que qualquer projeto construído verticalmente está fadado ao fracasso em termos
democráticos. A participação dos envolvidos deve ser efetiva na construção de novas
perspectivas de desenvolvimento rural.
Nesse contexto, o desafio brasileiro aponta para a construção de instituições
independentes e autônomas, eficientes e centradas no caráter social do compromisso
democrático. Essa perspectiva demanda a efetivação de políticas que envolvam redes de
solidariedade e garanta uma maior participação das organizações sociais na elaboração e no
controle das políticas públicas.
A discussão sobre o clientelismo no âmbito das novas institucionalidades será
retomada no capítulo 7, quando serão analisadas as percepções dos toledanos sobre as
temáticas da corrupção, do clientelismo e do nepotismo, elementos que convivem no interior
do processo político democrático. A compreensão da política local é relevante para
contextualizar as raízes históricas do estabelecimento do personalismo e do clientelismo no
município de Toledo. No capítulo seguinte, serão analisadas as características do poder local e
as relações configuradas ao longo do processo histórico na região.
101
4 ASPECTOS DO SISTEMA POLÍTICO TOLEDANO
Este capítulo tem como objetivo analisar as relações de poder que se configuraram ao
longo do processo histórico que se delineou na região Oeste do Paraná. Caracterizar o
processo histórico que deu origem à formação de valores, normas e atitudes que norteiam o
comportamento político toledano é, sem dúvida, fundamental para compreender a cultura
política que se configurou nesta sociedade.
A análise se divide em quatro seções. Na primeira delas, faz-se um resgate histórico da
recente colonização da região e seus desdobramentos no campo político, social e econômico.
No que se refere ao Estado do Paraná, diversos autores destacam as especificidades de sua
formação histórica, tanto do ponto de vista econômico, como político e cultural. A segunda
seção aborda as atuais características socioeconômicas do município de Toledo, que se
caracteriza pela agroindústria e agropecuária. A base econômica do município está centrada
no setor primário, seguido do setor secundário.
Na terceira seção, procede-se a uma discussão sobre a política local, abordando
aspectos do sistema político municipal. A história política de Toledo, marcada pelo domínio
do poder político e econômico de determinadas lideranças, imprimiu uma dinâmica política
peculiar à localidade. Os estudos de poder local referenciados nesta seção elucidam
características comuns de cidades de pequeno e médio porte, tais como conservadorismo,
personalismo e clientelismo.
Finalmente, na quarta seção, examinam-se o cenário eleitoral e o quadro partidário
predominante nesta cidade entre os anos de 1952 a 2004. Observa-se que a configuração
partidária municipal acompanha, em vários momentos, a política estadual, ainda que as
legendas partidárias possuam diferenças políticas e ideológicas diferenciadas no âmbito
regional.
102
4.1 DETERMINANTES HISTÓRICOS DO OESTE DO PARANÁ
O processo de ocupação e povoamento das regiões Oeste e Sudoeste do Paraná
resultou da colonização patrocinada pelos governos federal e estadual e, sobretudo, pela
iniciativa privada, representada pelas companhias colonizadoras. Esse processo, sem dúvida,
contribuiu para definir as características sociais, políticas e econômicas dessas regiões. Inicia-
se nos anos 1920 e intensifica-se na década de 1950, com a corrente migratória de
descendentes de alemães e italianos oriundos de Santa Catarina e Rio Grande do Sul, que,
expelidos de suas terras agrícolas pelo minifúndio, são atraídos pela fertilidade dos solos
paranaenses.
Entre os anos 1920 e 1930, o ciclo da madeira se consolida como a principal atividade
econômica da região Oeste do Paraná, com destaque para o pinheiro (Araucaria angustifolia).
Antes da chegada dos colonizadores, a região era constituída de mata nativa e habitada por
índios Guarani e Kaingang, que ao longo da história foram expropriados de seus territórios e
confinados em limitadas áreas indígenas. A região era ocupada também por paraguaios e
argentinos, que, através de companhias colonizadoras estrangeiras, exploravam a madeira e a
erva-mate, abundantes na região.
Com a política nacionalista do Governo Vargas, as propriedades territoriais ocupadas
por essas companhias foram desapropriadas e vendidas a companhias brasileiras. O principal
objetivo era colonizar as terras devolutas e de antigas concessões no Oeste e Sudoeste do
Paraná, garantindo assim os limites da fronteira internacional
12
. Tal processo é marcado por
12
Em 1943, o governo Vargas busca garantir maior centralização do poder através da criação de cinco
territórios, entre eles o Território Federal do Iguaçu, que incorporava o Oeste de Santa Catarina e o Sudoeste e
Oeste do Paraná. O mesmo foi extinto pela Assembléia Nacional Constituinte de 1946, como resultado de um
processo político multipartidário e de redemocratização em curso no país (Oliveira, 2003).
103
conflitos de terras e problemas jurídicos em razão da falta de regularização da posse da terra
daqueles que ali se encontravam. Em toda a região, especialmente em Capanema, Francisco
Beltrão, Pato Branco, Cascavel e Guaíra, muitas famílias de posseiros foram retiradas de suas
terras de forma violenta e agressiva.
Intrusos e grileiros, via de regra, com o concurso de jagunços, pistoleiros de
ofício, intranqüilizavam sitiantes e posseiros, obrigados também, muitas
vezes, a reagir à bala, de sorte que os capítulos da história da ocupação das
terras do Paraná moderno, foram escritos com fogo e sangue (BALHANA,
MACHADO e WESTPHALEN, 1969, p. 232).
Esses conflitos assumem maiores proporções nos municípios do Paraná onde a luta
pela terra intensifica-se entre pequenos agricultores e grandes fazendeiros e empresas
colonizadoras, que compravam grandes propriedades de terras, tendo em vista projetos de
colonização. Entre as companhias colonizadoras, cabe destacar a Industrial Madeireira
Colonizadora Rio Paraná S.A. – Colonizadora Maripá –, que em 1946 comprou, de uma
companhia imobiliária inglesa, a “Fazenda Britânia”, localizada às margens do Rio Paraná,
atual cidade de Toledo. As principais fontes de renda da Colonizadora provinham da madeira,
da venda de terras e da inversão de capitais nas indústrias locais. Com a extração e a
exportação de madeiras, a Colonizadora Maripá adquiriu recursos para iniciar os
investimentos na infra-estrutura e implementar a ocupação e a colonização da região
(MULLER, 1986). A compra e a venda de terras intensifica-se nos anos 1950 e torna-se o
grande negócio das empresas colonizadoras brasileiras. De acordo com a historiografia
oficial:
Iniciados os trabalhos da Maripá, com a instalação dos escritórios centrais e
de uma serraria junto ao arroio Toledo, foram medidos e demarcados os
lotes, abertas as picadas e estradas, reservadas as áreas para a cidade de
Toledo e mais 13 núcleos urbanos, após o que foram abertas as vendas de
terras, em lotes rurais e lotes urbanos. (BALHANA, MACHADO e
WESTPHALEN, 1969, p. 219)
104
Em 1951 a maior parte das terras demarcadas no Oeste do Paraná se encontrava
vendida e, no mesmo ano, o Governador do Estado, Bento Munhoz da Rocha Neto, criou os
municípios de Toledo, Cascavel e Guaíra, desmembrando-os de Foz do Iguaçu. Oficialmente,
Toledo foi instalado como município em 14/12/1952. Nesse período, a Colonizadora Maripá
passa a utilizar-se amplamente da mão-de-obra paraguaia e indígena, que, apesar de estar
presente na região desde os primórdios, não foi contemplada no projeto colonizador. Os
índios Guarani foram expropriados de grande parte de seus territórios, sendo confinados em
limitadas glebas de terras, onde vivem atualmente em condições de miséria.
Parte da historiografia relativa ao Oeste paranaense situa os colonizadores no papel de
pioneiros, desbravadores e porta-vozes do progresso, excluindo a possibilidade de que outros
sujeitos tenham compartilhado de sua estruturação. Segundo pesquisa de Sara Ribeiro (2002),
os grupos sociais que se instalaram na região, provenientes do Rio Grande do Sul e Santa
Catarina, ignoraram a presença de outros que ali habitavam e apresentaram-se como os
estabelecidos, ou seja, como indivíduos e grupos que ocupam posições de poder e que forjam,
por meio dos mais variados artifícios, uma identidade regional nitidamente
excludente, que denega a existência de qualquer outro segmento
populacional, o que aponta para a relevância de trazer à tona a história de um
povo, até então, supostamente sem história. (RIBEIRO, 2002, p. 22)
Dessa forma, a história política de Toledo se insere em um contexto mais amplo da
política nacional, marcada pelo nacionalismo, ocupação de territórios e defesa das fronteiras
brasileiras, possibilitando compreender as características sociais, econômicas e políticas da
região Oeste do Paraná. As famílias dos colonizadores que dominaram a história política
municipal, através da ocupação de cargos públicos, mantêm-se hoje no cenário político local.
Em levantamento realizado no ano de 1956, no município de Toledo, 10 anos após a
sua fundação, foi possível avaliar os aspectos demográficos, as condições de vida da
105
população, a agricultura, a educação, a religião e a vida cultural
13
. Na ocasião da pesquisa, a
população era estimada em 9.945 habitantes, sendo constituída de 99% de indivíduos de cor
branca e apenas 1% de mestiços (mulatos, paraguaios, índios), percentuais atribuídos à
migração de indivíduos de descendência alemã e italiana, oriundos dos Estados do Rio
Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. A população, predominantemente rural, era
distribuída geograficamente da seguinte forma: zona rural, com 58,4%; zona urbana, com
27,3% e zona suburbana, com 14,3% do total (OBERG, 1960). Dentre os entrevistados, 59%
eram católicos e 41%, protestantes (luteranos e batistas). Inicialmente, a Colonizadora Maripá
procurou atrair descendentes de italianos para povoar Toledo, entre os quais, a maioria
católica. Posteriormente, quando a direção da colonizadora passou para Willy Barth,
descendente de alemão, foram atraídos para a região descendentes de alemães, em sua maioria
luteranos.
Com relação às condições de vida da população, a pesquisa indicou ausência de
saneamento básico e má qualidade da água. Atualmente, a Companhia de Saneamento do
Estado do Paraná – SANEPAR –, fornece água potável para 94,6% das unidades residenciais
de Toledo. Os serviços de saneamento ainda estão inadequados em relação à coleta de esgoto
e tratamento final de resíduos. No tocante à questão educacional, a taxa de alfabetização no
município era de 88%, um percentual que reflete até hoje uma boa posição do IDH (OBERG,
1960).
13
Foram entrevistadas 1.024 pessoas, distribuídas nas áreas urbana, suburbana e rural, dentre as quais 52%
homens e 48% mulheres.
106
Quadro 2
Estabelecimentos de Ensino em Toledo e seus distritos (1948-1987)
Escola 1948 1953 1956 1969 1972 1974 1980 1987
Particular 01 01 02 06 11 10 12 14
Pública - 18 38 93 139 159 134 138
Total 01 19 40 99 150 169 146 152
Fontes: Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado de Toledo, Secretaria Municipal de Educação.
Núcleo Regional de Educação, Kalervo Oberg (citado por Silva, Bragagnollo e Maciel, 1988).
De acordo com o Quadro 2, observa-se um aumento crescente no número de escolas
públicas e particulares ao longo dos anos. O primeiro estabelecimento de ensino foi criado em
1948 pelas Irmãs da Congregação São Vicente de Paulo, com ensino pré-escolar e ensino
fundamental. A primeira escola municipal foi inaugurada em 1953, e no mesmo ano foram
inauguradas 18 escolas no total, e em 1956 começou a se formar a rede de ensino público
estadual. De acordo com dados fornecidos pela Secretaria Municipal de Educação, existem
hoje no município 40 escolas municipais, 30 estaduais, 12 da rede privada e 4 universidades
14
.
O acelerado desenvolvimento socioeconômico de Toledo, a partir da década de 1970,
e o intensivo movimento migratório de jovens para cursar o ensino superior incentivou as
lideranças locais a fundar uma faculdade. A Faculdade de Ciências Humanas “Arnaldo
Busato” – FACITOL –, criada em 1980 e mantida pela Fundação Municipal de Ensino
Superior de Toledo – FUMEST –, deu origem à Universidade Estadual do Oeste do Paraná –
UNIOESTE –, fundada em 1987, e que hoje está presente em cinco municípios: Toledo,
Cascavel, Marechal Cândido Rondon, Foz do Iguaçu e Francisco Beltrão. No Campus de
Toledo, funcionam atualmente oito cursos: Ciências Econômicas, Ciências Sociais,
Engenharia de Pesca, Engenharia Química, Química, Filosofia, Secretariado Executivo
Bilíngüe e Serviço Social. É a única universidade pública no município e reúne cerca de 1.554
14
Informações disponível no site: http://www.toledo.pr.gov/educacao
107
alunos entre os cursos de graduação e pós-graduação. Além do crescente aumento das escolas
públicas e privadas na região, surgiram, nos últimos anos, instituições de ensino superior
particulares como a UNIPAR, a FASUL e a PUC, que juntamente com a UNIOESTE
consolidam o município como pólo regional universitário.
Entre os anos 1950 e 1970, surgem cerca de 65% dos atuais municípios do Paraná. O
surgimento de novas municipalidades está muito relacionado a interesses políticos e eleitorais
e ao crescimento urbano e industrial. Isso se reflete nas disputas partidárias, que passam a ter
relação direta com a criação de diretórios municipais. Exemplo disso é o Partido Republicano,
do qual destaca-se Bento Munhoz da Rocha Neto, eleito governador em 1950 (CODATO,
2006). Durante o Regime Militar, contudo, houve uma estagnação no processo de criação de
municípios, pois naquele período o país vivia o auge da centralização do poder. O Mapa 1
ilustra a configuração dos municípios paranaenses no ano de 1954, quando Toledo, Cascavel e
Guaíra já haviam sido desmembrados de Foz de Iguaçu.
108
MAPA 1
Configuração Municipal do Paraná – 1954
De acordo com relatório divulgado pelo IBGE sobre o Perfil dos Municípios
Brasileiros (2001), com a redemocratização e com a Constituição de 1988, que restabelece o
pacto federativo e uma maior descentralização do poder, o número de municípios volta a
crescer significativamente, estimulando a emancipação e a formação de novos municípios. O
Estado do Paraná conta hoje com 399 municípios, entre os quais, 50 localizam-se na região
Oeste do Paraná, como mostra o Mapa 2.
109
MAPA 2: Mapa Político da Região Oeste do Paraná
Fonte: Secretaria de Tecnologia e Informação, 2002.
110
A Associação dos Municípios do Oeste do Paraná (AMOP) foi criada em 1969, com a
finalidade de promover o desenvolvimento econômico, social e administrativo dos municípios
de sua área de abrangência, através da ampliação e do fortalecimento da capacidade
administrativa e da promoção de instrumentos de cooperação entre os municípios e com os
governos federal e estadual. Mantém programas e iniciativas em defesa do municipalismo e
dos interesses dos 50 municípios da região Oeste do Paraná e é a entidade que agrega e
representa as forças da sociedade organizada regional
15
.
O Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social (IPARDES, 2003a),
em estudo sobre a tipologia dos municípios paranaenses, categorizou os municípios em
grupos de diferentes graus de desenvolvimento a partir de indicadores socioeconômicos e
demográficos:
1) Baixo: 57 municípios, que se concentram basicamente na região central do Estado;
2) Médio-Baixo: encontram-se 90 municípios espalhados em todas as regiões do Estado;
3) Médio: 120 municípios que se caracterizam por uma posição intermediária em relação
aos demais grupos;
4) Médio-Alto: encontram-se 100 municípios, que se caracterizam por serem mais ricos,
mais urbanos, apesar de sua economia ser voltada para a agricultura (Toledo foi
situado nesta categoria);
5) Alto: 31 municípios que formam o menor dos agrupamentos e os mais ricos e
densamente povoados do Estado.
Os municípios, pela própria dinâmica da ocupação territorial, passam por um processo
no qual o papel desempenhado pelo poder público local ganha maior relevância, em que suas
atribuições e responsabilidades são mais intensas e substanciais. Há um crescente dinamismo
do ponto de vista demográfico, cultural e econômico (IBGE, 2001). Na próxima seção, serão
15
Informações disponíveis no site http://www.amop.org.br
111
verificados os aspectos socioeconômicos da região Oeste do Paraná, buscando situar Toledo
nesse processo.
4.2 DETERMINANTES SOCIOECONÔMICOS DO OESTE DO PARANÁ
A condição de grande produtor de café assegurou ao Paraná uma participação decisiva
na economia brasileira nos anos 1950, de modo que a região Norte do Estado caracteriza-se,
até hoje, pela economia cafeeira. As regiões Sudoeste e Oeste são marcadas pelo predomínio
da agricultura e da agropecuária, com destaque para o cultivo de cereais e para a criação de
suínos. O processo de industrialização no Paraná coincide com a intensificação das políticas
imigratórias e com o auge do ciclo da erva-mate, que representou um dos mais importantes
ciclos econômicos do Estado, ao lado da extração de madeiras.
Nos anos 1970, a produção de soja no Estado passa de 24% para 40% do total da
produção nacional. Os efeitos da cultura da soja sobre a urbanização e a industrialização
paranaense foram enormes. Os governos estaduais do período incentivaram o crescimento da
agroindústria, buscando unir o setor primário com a crescente mecanização agrícola, o que
demandava o aumento da concentração da propriedade de terra para a utilização de modernas
técnicas agrícolas. Essa busca de incrementar o setor primário com a mecanização agrícola
caracteriza-se por uma modernização conservadora, garantindo ao Paraná um lugar de
destaque na exportação de grãos (OLIVEIRA, D., 2001; IPARDES, 1989). Com a
mecanização agrícola, surge a necessidade de comercializar o produto em larga escala. Em
1970, foi fundada a COOPAGRO – Cooperativa Agropecuária Mista do Oeste Ltda –, que,
além do armazenamento e comercialização da soja, trigo e feijão, prestava assistência técnica
e financeira aos filiados.
112
De acordo com pesquisa desenvolvida pelo Instituto Paranaense de Desenvolvimento
Econômico e Social (IPARDES, 2003c), embora a expansão do pólo automotivo e a moderna
agroindústria assegurem dinamismo à indústria paranaense, os segmentos responsáveis pela
geração de emprego e renda de regiões do interior do Estado são os tradicionais, como os
segmentos de vestuário e de mobiliário, carnes e madeira. “Tais características têm delineado
uma nova dinâmica regional, com ganhos de representatividade dessas atividades,
principalmente por serem absorvedoras de conhecimento e mão-de-obra especializada”
(IPARDES, 2003c).
O Paraná possui o 5
o
maior PIB do Brasil, com R$ 108,2 bilhões de reais,
representando 6,4% do PIB nacional para o ano de 2003. Cerca de 15% do PIB paranaense
provém da agricultura. Outros 40% vêm da indústria, e os restantes 45% vêm do setor
terciário. A Tabela a seguir ilustra alguns indicadores para o Estado do Paraná e para Toledo.
Tabela 2
Valor Adicionado por Setor da Economia (%)
1993 1995 1998
Paraná Toledo Paraná Toledo Paraná Toledo
Primário 10 17 16 32 16 35
Secundário 54 52 49 40 47 38
Terciário 36 32 35 28 37 27
Fonte: SEFA/CAE/FPM/ Secretaria da Fazenda do Município
Em relação ao valor adicionado por setor da economia, a Tabela 2 mostra que a
expansão do pólo industrial no município de Toledo teve seu reflexo em 1993, quando este
apresentou um percentual de 52% no setor secundário, aproximando-se do percentual de
industrialização de todo o Estado do Paraná. A base econômica do município está centrada no
setor primário, que representa, em média, 70% da renda do município, e seu crescimento foi
acompanhado pelos demais setores.
113
Cidades como Cascavel, Toledo, Foz do Iguaçu e Marechal Cândido Rondon,
apresentam-se hoje como centros regionais por excelência na Região Oeste do Paraná. A
mecanização da agricultura tornou a região uma referência em produtividade nas culturas de
exportação, principalmente soja, milho e trigo. Há uma dinâmica própria, responsável pela
atual configuração da economia da região, voltada à agropecuária e à agroindústria, cadeias
produtivas que estão sendo tratadas como agronegócio.
O município de Toledo se desenvolveu com base na economia extrativista da madeira
e da erva-mate, e ocupa lugar de destaque na produção de cereais e criação de suínos na
região. A agricultura, especialmente com a produção de soja, trigo, milho e mandioca,
vinculada à agroindústria, tornou-se a principal fonte de renda do município. As atividades
industriais de Toledo têm predominância no setor de carnes – está entre os maiores produtores
agropecuários do Estado – que, através da empresa Sadia S.A., frigorífico instalado na região
desde 1964, agrega valor às carnes de suínos e aves com várias atividades industriais.
A grande virada na estrutura organizacional e produtiva dos municípios de Cascavel e
Toledo ocorreu a partir da década de 1970, quando se incorporaram ao projeto de
mecanização do campo, denominado Revolução Verde. A adoção de máquinas para o
trabalho agrícola introduziu mudanças na estrutura da propriedade agrária, dentre elas a
concentração fundiária para se obter os níveis de produtividade exigidos pela competitividade
do mercado agrícola. A concentração da propriedade agrária para a cultura extensiva e
mecanizada da soja e do milho impeliu à expansão das atividades econômicas desenvolvidas
nas áreas urbanas desses municípios (BIDARRA, 2004).
Dessa forma, diante da evasão rural provocada pela modernização agrícola e da falta
de emprego na cidade, foram criadas as indústrias comunitárias de Toledo. A Associação
Comercial e Industrial de Toledo – ACIT –, com apoio dos órgãos públicos e do Centro de
Assistência Gerencial – CEAG –, iniciou um processo de criação de indústrias, na medida em
114
que novas necessidades iam surgindo. Assim foram criados o Empório Toledo Ltda e o
Frigorífico Pioneiro S/A, para oferecer melhores condições de atendimento à crescente
população toledana. O Quadro 3 ilustra o desenvolvimento da pequena e média empresa na
região.
Quadro 3
Indústrias Comunitárias de Toledo (1946-1959)
EMPRESA ACIONISTAS EMPREGOS MATÉRIA-PRIMA RAMO
OESTPORT 350 40 MADEIRA PORTAS
TOLEDO S/A PA 230 - - MERC. FINANC.
FERTIOESTE 203 40 AVIÁRIO ADUBO ORG.
INCASA 129 78 COURO CALÇADOS
INDUSCOURO 111 20 COURO VEST.COURO
INCOPESA 110 109 COURO CURTUME
INCOELHOS 90 20 COELHOS ABAT/CURTUME
CIDOSA 36 4 COMESTÍVEIS DOCES
INCALSE 29 24 COURO CALÇADOS
INBRINQUEDOS 22 11 MADEIRA BRINQUEDOS
INCOBOLAS 13 9 COURO BOLAS
INDUSFADOS 12 5 COURO/CORVIN ESTOF./TAPEÇ.
ONDINA 5 14 POLIETILENO EMBALAGENS
MESSINA 5 10 COURO CALÇADOS
BOMPIEL 3 10 COURO CALÇADOS
BRELU MALHAS 3 6 FIO DE ALGODÃO MALHARIA
DALGRAN 2 3 PAPEL BOBINAS/BEM.
BLIGE 2 8 TECIDOS ROUPAS
Fonte: www.acit.org.br
Na ocasião, as indústrias comunitárias, através da geração de empregos, da
qualificação de pessoal e de mão-de-obra, da ampliação de crédito, da criação de cooperativas
e associações, exerceram forte influência sobre o desenvolvimento socioeconômico de
Toledo. Na avaliação de Heis (1985), a origem das indústrias comunitárias de Toledo deveu-
se ao espírito comunitário, à solidariedade, à necessidade de busca de soluções, aliadas à
confiança nas lideranças locais. Dados de pesquisa analisados nos capítulos seguintes indicam
que esses valores não se consolidaram na região.
115
Este rápido processo de urbanização da região é reflexo de uma acelerada
modernização da agricultura que liberou mão-de-obra para o setor urbano. Portanto, o
aumento demográfico acompanha a expansão das atividades econômicas da região. A região
Oeste do Paraná possui uma área total de 22.840 km², equivalente a 11,74% da área total do
Estado, que é de 199.281,70 km², e uma população de 1.164.272 habitantes, posicionando-se
entre as maiores densidades demográficas do Paraná, com 47,22 habitantes por km² (IBGE,
2002). A partir dos anos 1980, com o processo de industrialização e com a mecanização da
lavoura, ocorre um acentuado êxodo rural no município de Toledo, e o número da população
urbana ultrapassa o da população rural. De acordo com o Censo Demográfico realizado em
2000, Toledo contava com uma população de 98.200 habitantes, como mostra o Quadro 4.
116
Quadro 4
Estrutura Demográfica – Município de Toledo
Distribuição da População Urbana e Rural
Ano Urbana Rural Total
1956 2.720 7.225 9.945
1960 5.926 19.033 24.959
1970 14.986 53.899 68.885
1980 42.994 38.288 81.282
1991 72.402 22.477 94.879
1996 76.125 14.292 90.417
1997* -- -- 93.756
1998* -- -- 96.659
1999* -- -- 99.387
2000 85.920 12.280 98.200
2001* -- -- 99.655
2002* -- -- 100.715
Fonte: IBGE - Censo 2000
- Dados estimados pelo IBGE.
117
No período de 1956 a 2002, a população do município de Toledo praticamente
triplicou, sendo que, de 1956 a 1980, o aumento é acelerado e, a partir de 1991, a taxa de
crescimento se estabiliza, como observado no Quadro 4. Até os anos 1980, Toledo possuía 13
distritos: Dez de Maio, Novo Sarandi, Vila Nova, Dois Irmãos, São Miguel, Ouro Verde, Luz
Marina, São Pedro, São Francisco, São Luis do Oeste, Vila Ipiranga, São Sebastião e Novo
Sobradinho. Atualmente, Toledo conta com nove distritos, como mostra o Mapa 3.
MAPA 3: Mapa político de Toledo - PR
118
Segundo dados estimados pelo IBGE, a população do município de Toledo é de
aproximadamente 100 mil habitantes, dos quais cerca de 87% vivem na área urbana do
município. Analisando a distribuição da população por sexo, a diferença percentual entre
homens (49%) e mulheres (51%) é de apenas 2% do número total, proporção esta considerada
característica de áreas de colonização recente. Em 2000, segundo dados do Atlas do
Desenvolvimento Humano no Brasil
16
, 66% da população do município de Toledo se situava
numa faixa etária entre 15 a 64 anos, 29% possuíam menos de 15 anos e 5% mais de 65 anos
de idade. Quanto ao nível educacional, no período de 1991-2000, a taxa de analfabetismo
entre a população jovem (7 a 24 anos) decresceu de 15% para 5% e, entre a população adulta
(25 anos ou mais), a média de anos de estudos subiu de 4 para 6 anos.
Com relação ao Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), Toledo apresentava um
IDH de 0,827 em 2000. Elaborado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
(PNUD), o IDH é um dos instrumentos de medida mais difundidos que sintetiza o
desenvolvimento humano de uma região. Resulta da média aritmética de três índices, que
captam renda (avaliada pelo Produto Interno Bruto); longevidade (esperança de vida ao
nascer) e escolaridade (avaliada pelas taxas de alfabetização e de matrículas).
Tais indicadores, no entanto, nem sempre revelam as características contraditórias
presentes no Estado e nos municípios, como, por exemplo, a convivência de padrões do
desenvolvimento humano com a persistência da pobreza e das desigualdades sociais. Do
ponto de vista da estrutura social, as desigualdades permanecem sem alteração. De acordo
com o Diagnóstico Social e Econômico divulgado pelo IPARDES (2003b),
16
O Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil dispõe de um banco de dados com informações sócio-
econômicas sobre os 5.507 municípios do país, os 26 Estados e o Distrito Federal.
119
a contradição entre a exuberância produtiva e a iniqüidade social tem raiz,
fundamentalmente, na estrutura fundiária concentrada, que foi agravada pelo
processo de modernização, denominado “modernização conservadora”
justamente por não resolver, mas, ao contrário reforçar as desigualdades na
distribuição de terra
.
De fato, o processo de desenvolvimento é muito mais amplo e complexo do que
qualquer medida sumária poderia captar. Apontando as limitações do IDH, José Eli da Veiga
(2005) argumenta:
Mesmo que se considere inevitável a ausência de outras dimensões do
desenvolvimento para as quais ainda não há disponibilidade de indicadores
tão cômodos – como a ambiental, a cívica ou a cultural -, é duvidoso que
seja essa média aritmética a que melhor revele o grau de desenvolvimento
atingido por uma determinada coletividade. Ao contrário, é mais razoável
supor que o cerne da questão esteja justamente no possível descompasso
entre o nível de renda obtido por determinada comunidade e o padrão social
que conseguiu atingir, mesmo que revelado apenas pela escolaridade e
longevidade (Veiga, 2005, p. 88).
Essa observação indica que as políticas públicas devem se direcionar no sentido de
qualificar o atendimento às demandas sociais, criando condições de emprego e renda, assim
como o acesso aos direitos sociais. O uso de medidas objetivas e quantificáveis é válido
quando permite a elaboração de projetos e propostas que envolvam a participação de amplos
setores da população
17
. Dessa forma, a seção seguinte analisa as configurações do poder local
e suas implicações nos processos políticos decisórios.
17
Outros índices como o Índice de Condições de Vida (ICV) e o Índice de Qualidade de Vida (IQV), avaliam
aspectos objetivos e subjetivos da qualidade de vida, incluindo indicadores de trabalho, segurança, moradia,
serviços de saúde e educação, qualidade do ar, lazer e serviços de transporte.
120
4.3 DINÂMICA POLÍTICA E PODER LOCAL EM TOLEDO
Os estudos de poder local mostram-se relevantes na análise e compreensão dos
aspectos do sistema político mais amplo. Certas características similares encontradas nestes
estudos podem contribuir para caracterizar a dinâmica do sistema político em geral. Nos
estudos de comunidade, a noção de política local refere-se às normas, às instituições e ao
comportamento político de âmbito regional. Nessas análises, ainda há pouco destaque para o
papel do governo municipal enquanto “espaço político institucional em que se expressam a
representação, a aliança, o confronto e a disputa de interesses, de forças e de organizações
sociais que marcam e moldam o território político local, dentro do contexto regional e
nacional” (KERBAUY, 2000, p. 28).
Nesta seção, busca-se verificar como a política de Toledo relaciona-se com a política
estadual e nacional e quais as características e metas daqueles que dominam o poder local.
Para pautar a discussão, são referidos alguns estudos que abordam o tema na perspectiva da
cultura política e destacam a presença de traços tradicionais da política, como o clientelismo e
o personalismo no processo político local.
Os autores Richard Fagen e Willian Tuohy (1972), ao analisar Jalapa, a segunda maior
cidade no Estado de Veracruz, México, buscam explorar as características da política
mexicana a partir da vida política nesta cidade. A pesquisa, de cunho quantitativo, procurou
sondar as opiniões dos jalapenhos sobre a política, o governo e a atuação dos cidadãos
enquanto atores políticos. Os dados revelam duas características da política local: a
participação limitada e o predomínio do personalismo nos processos de decisão política. Os
jalapenhos, além de expressarem ceticismo em relação à política, sentem-se impotentes em
interferir ou afetar as decisões políticas locais.
121
A busca de soluções para resolver os problemas locais em Jalapa se dá de forma
individual e baseada em relações afetivas, através de amigos, parentes ou compadres que têm
melhores conexões com as autoridades políticas. Quando indagados sobre os direitos das
minorias e sobre os grupos de oposição, os valores da democracia procedimental não se
sustentam. A apatia, o sentimento de impotência e a indiferença para com as práticas
democráticas formam a textura dominante das orientações políticas dos cidadãos em Jalapa
(FAGEN e TUOHY, 1972).
No contexto brasileiro, o estudo de Beatriz Bilac sobre o município de Rio Claro
aponta características semelhantes às de Japala. Como diversas localidades brasileiras, Rio
Claro foi governado por chefes políticos locais que formavam uma oligarquia regional com
estreitos laços econômicos e de parentesco. Com o processo de industrialização e
urbanização, surgem novos atores políticos, o que não significou o afastamento da elite
política tradicional, a qual mantém influência, ainda que indireta, no processo político local. O
estudo reflete elementos do processo político mais amplo, caracterizando aspectos da
sociedade brasileira, dos quais uma política elitista, ainda fechada à participação das classes
populares na política (BILAC, 1997).
O estudo de Monica Hass (2001) busca identificar em que medida os elementos
político-partidários estaduais e nacionais interferem na questão do poder local. Segundo a
autora, as transformações econômicas e o processo de redemocratização nos anos 1940
ocasionaram mudanças significativas na estrutura política de Chapecó, SC. Os políticos
tradicionais, representantes do Partido Social Democrático (PSD), apesar de perderem espaço
para os partidários da União Democrática Nacional (UDN) e do Partido Trabalhista Brasileiro
(PTB), continuaram a dominar o cenário político ao longo do período de 1947 a 1965. Um
dos fatores para o continuísmo das elites tradicionais é o controle dos cargos públicos e dos
122
votos, através da prática clientelista, estratégia política adotada para a manutenção do poder
local.
Nessa perspectiva, Maria Teresa Kerbauy (2000) ao analisar a questão do poder local,
destaca alguns elementos tradicionais intrínsecos a ele, como o coronelismo e o clientelismo.
Ela concentrou o estudo no interior do Estado de São Paulo, examinando as mudanças
institucionais ocorridas no período de 1964-82. A autora enfatiza que
a morte dos coronéis não significa o fim do clientelismo enquanto tal, assim
como a modernização não significa a implantação da racionalidade
burocrática e a ideologização da política. Permanece o clientelismo, como
forma de controle social, para reduzir as pressões grupais, que se
configuram, em muitos casos, em situações de conflito (KERBAUY, 2000,
p. 144).
O clientelismo permanece num contexto de desenvolvimento e de mudanças
institucionais. Contudo, as novas relações políticas não implicaram no estabelecimento de
políticas baseadas em critérios de natureza universalista. As abordagens dos estudos aqui
referenciados se aproximam teoricamente por destacarem a política elitista e a participação
limitada; o personalismo e as práticas clientelistas como mecanismos e instrumentos do poder
local.
No caso de Toledo, objeto desta pesquisa, estes aspectos mencionados encontram-se
impregnados no processo político municipal. Analisando a história política municipal,
observa-se que os governos têm se configurado em espaços para a prática do clientelismo e do
personalismo. As elites políticas locais, ao se apropriarem do poder, não fazem a distinção
entre o público e o privado, e naturalizam esse tipo de prática. Ao longo dos anos, os cargos
públicos foram ocupados pelos sócios da Colonizadora Maripá, determinando o perfil social e
profissional (empresários, comerciantes, médicos e advogados) dos primeiros prefeitos e
vereadores de Toledo. Esse fato evidencia a influência e a força da empresa colonizadora
sobre toda a região (NIEDERAUER, 2004).
123
O médico Ernesto Dall'Oglio foi eleito prefeito nas primeiras eleições municipais de
1952 pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). Teve o apoio do Partido Republicano (PR) e
do Partido Libertador (PL). A forte liderança exercida por Willy Barth, um dos representantes
do PL em Toledo, determinou o resultado das eleições. “A partir daí, sempre que se
avizinhava uma eleição, lá vinha uma procissão de candidatos e chefes políticos em busca do
apoio de Willy Barth. Traziam propostas de toda natureza para Toledo, a serem negociadas
em troca de votos” (NIEDERAUER, 2004, p. 351), afirma, com naturalidade, um dos
membros da Colonizadora Maripá e ex-vereador de Toledo. Segundo este mesmo autor, as
frases mais comuns entre os eleitores eram: “Voto no homem; não voto em partido” ou “Meu
partido é Toledo; voto em Toledo”. Em outras palavras, “votar em Toledo” significava votar
nos líderes políticos tradicionais.
A primeira Câmara Municipal foi composta por 9 vereadores, eleitos pelo PR e pelo
PL, partidos de pouca expressão no âmbito estadual e nacional. A citação dos nomes a seguir
busca evidenciar o perfil conservador e tradicional da política toledana, de modo que o poder
local concentrava-se nos mesmos nomes e/ou sobrenomes pertencentes à elite política.
Para vereadores foram eleitos, pelo PR: José Ayres da Silva, contador; e pelo
PL: Guerino Antonio Viccari, construtor de estradas da Maripá; Clécio
Zenni, subgerente da Agro Industrial do Prata Ltda.; Ondy Helio Niederauer,
contador e procurador da Maripá; Leopoldo João Schmidt, motorista;
Rubens Stresser, engenheiro agrônomo; Alcebíades Formighieri, funcionário
no setor de madeiras da Maripá; Waldi Winter, corretor de terras em Mal.
Cândido Rondon; e Willibaldo Finkler, agricultor, no Anjico, atual Dez de
Maio. (NIEDERAUER, 2004, p.350)
Nesse período, foram criados no município de Toledo os diretórios partidários do
Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), da União Democrática Nacional (UDN), do Partido
Social Democrático (PSD) e do Partido de Representação Popular (PRP). Constata-se que a
organização partidária, liderada pelas elites políticas locais, estava isenta de qualquer
significado ideológico. “Os pioneiros, em seus depoimentos, fazem questão de afirmar,
124
entretanto, que a adoção de legendas partidárias significava tão somente uma tática e uma
necessidade, objetivando benefícios para a região. Inexistia qualquer interesse substancial por
esse ou aquele partido” (SILVA, BRAGAGNOLLO e MACIEL, 1988, p. 315).
Analisando as relações de poder no Paraná, Ricardo Costa de Oliveira (2001) endossa
essa discussão, afirmando que o conjunto de famílias tradicionais, inseridas na classe
dominante, atravessa os séculos com um projeto hegemônico de dominação e reprodução do
poder político no Paraná. A classe dominante paranaense se caracteriza por padrões de
continuidades históricas, expressivas na posse do poder político, principalmente por parte dos
grupos familiares tão antigos quanto o Paraná. O domínio do poder local era determinado pela
posição social e da posse de terras e, ao mesmo tempo, “herdado” pelos membros das famílias
dominantes.
A análise de Gláucio Soares (2001) sobre essa temática indica que a elite dominante
aceitava a liderança política como algo natural. A orientação era particularista, influenciada
por relações interpessoais, em contraposição a orientações universalistas e ideológicas. O
município era dominado por mais de uma família e uma dessas famílias,
geralmente se associava à UDN e a outra ao PSD, mas algumas vezes elas se
aborreciam com as decisões nacionais ou estaduais do partido e
simplesmente escolhiam, entre outros partidos, um rótulo conveniente pra
continuar com a mesma política tradicional de família (SOARES, 2001, p.
276).
Essas famílias tradicionais estão presentes na política eleitoral de Toledo desde os
primeiros anos de sua existência. Como já mencionado, o primeiro prefeito do município foi
Ernesto Dall'Oglio, eleito pelo PTB, para o período de 1953-1956. Sua forte presença na
política local o conduz, mais tarde, ao cargo de deputado estadual e deputado federal.
Também apoiado pela Colonizadora Maripá, o empresário Egon Pudell, foi eleito pelo PSD
para a gestão de 1957-1960. Posteriormente exerce o mandato de deputado estadual por duas
legislaturas. No final dos anos 1950, Willy Barth filia-se ao PTB e assume a prefeitura em
125
1960. Com seu falecimento em 1962, realizam-se novas eleições, e Ernesto Dall'Oglio é eleito
para continuar o mandato até 1964.
A partir de Emenda Constitucional, realiza-se em outubro do mesmo ano a primeira
eleição para vice-prefeito, sendo eleito José Ivo da Rocha. No período de 1965-1968, o
médico Avelino Campagnolo assume a prefeitura pela UDN e tenta dar um caráter mais
popular à administração. No pleito de 1968, a segunda vitória de Egon Pudell pela ARENA é
contestada pelo candidato concorrente, que denuncia fraudes na contagem de votos. Na
ocasião, Pudell assumiu a prefeitura sem maiores problemas. No período de 1973-1976, o
advogado Wilson Carlos Kuhn, assume a prefeitura pela ARENA, e em 1973 cria a Secretaria
Municipal de Cultura e a Casa de Cultura de Toledo.
Duílio Genari, que já havia sido vereador duas vezes pelo PSD, é eleito prefeito em
1977 pela ARENA e seu mandato é prorrogado até 1982. Foi deputado estadual pelo Partido
da Frente Liberal (PFL) e atualmente é filiado ao Partido Progressista (PP). Em 1982, Albino
Corazza Neto é eleito pelo Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), que, além
de eleger o prefeito de Toledo, elege a maioria dos vereadores. Em 1988, Luiz Alberto de
Araújo foi eleito pelo PMDB para assumir a prefeitura. Em 1992 foi eleito Albino Corraza,
pelo PMDB, e em 1996 Derli Donin assume a prefeitura pelo PPB, sendo reeleito em 2000.
Em 2004 foi eleito José Carlos Schiavinato, pelo PP. O quadro partidário e a relação dos
prefeitos de Toledo serão apresentados na seção seguinte.
A dinâmica da política local mostra-se submetida a uma lógica própria, marcada pelo
continuísmo de lideranças que se percebem como os donos do poder e da municipalidade. “A
cultura política tradicional, o poder local tradicional, cumprem papel conservador e defensivo
dirigido a manter as assimetrias e os relacionamentos de subalternidade. Transformar esta
cultura e lógica autoritária de poder vai levar muito tempo” (JARA, 1997, p. 231). Como se
verificou nessa seção, a ascendência das lideranças pessoais sobre os partidos políticos
126
imprime um caráter personalista à política toledana, configurando-se no município uma
política marcada por uma matriz histórico-estrutural conservadora e autoritária, alheia à
participação política popular e aos partidos políticos.
A próxima seção analisa a configuração política do quadro partidário no período que
compreende a fundação do município até o ano de 2004. Tem como objetivo verificar a
permanência de lideranças políticas locais e de determinados partidos políticos na política
toledana.
4.4 TENDÊNCIAS DO QUADRO PARTIDÁRIO EM TOLEDO (1952-2004)
A partir da literatura consultada sobre os partidos políticos no Paraná, busca-se
destacar dois importantes aspectos do sistema político. Em primeiro lugar, verifica-se que os
partidos nacionais têm força e peso diferenciados nos diversos estados e municipalidades.
Apesar de existir certo intercâmbio entre os interesses regionais e nacionais, os interesses
partidários regionais nem sempre coincidem com aqueles dos partidos no plano nacional.
Um segundo aspecto é referente ao alto grau de autonomia dos parlamentares em
relação aos partidos políticos, que tem sido reforçada pela incisiva força política dos
governadores na configuração do quadro partidário e eleitoral paranaense. Os governadores
detêm grande peso no processo de formulação de políticas públicas em seus governos,
possuem capacidade de eleger e/ou cooptar uma substancial base parlamentar de apoio, tanto
em nível federal quanto estadual, e exercem influência decisiva na eleição da maioria dos
prefeitos de seus estados (OLIVEIRA, R., 2001; LEPRE, 2000).
A análise de Mario Sergio Lepre (2000) sobre as migrações partidárias na Assembléia
Legislativa do Paraná mostra que o sistema partidário paranaense, ao ficar à mercê de
127
conjunturas, resultou em diversas redefinições partidárias, acarretando significativas
mudanças no quadro partidário estadual. “Alguns partidos tiveram representação na
Assembléia Legislativa sem que para isto tivessem sido escolhidos pelo eleitor. Por outro
lado, alguns partidos foram escolhidos pelo eleitor, mas simplesmente desapareceram do
Parlamento” (LEPRE, 2000, p. 95).
Esse foi o caso do Partido Democrático Trabalhista (PDT), que nacionalmente apoiou
Brizola nas eleições presidenciais de 1994, ao passo que no Paraná apoiou o candidato
Fernando Henrique Cardoso, do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB). Com a
saída do governador Jaime Lerner do PDT, em 1997, este se transformou, naquele momento,
em um partido sem expressão no Paraná, e o PFL, por sua vez, novo partido de filiação do
governador, passou a contar com a maior bancada da Assembléia.
Na legislatura iniciada em 1995, tanto o crescimento do PSDB, com a
entrada de Álvaro Dias, como seu posterior esvaziamento, com as
incertezas a respeito da viabilidade do partido, e o crescimento
exagerado do PFL, com a entrada do governador Jaime Lerner,
realizaram-se no período intereleições, mudando o quadro partidário a
despeito do eleitor (LEPRE, 2000, p. 67).
Os partidos políticos de pouca expressão nacional tornam-se relevantes no Paraná por
estarem associados a grandes figuras personalistas, como foi o caso do Partido da
Representação Popular (PRP), ligado à figura de Plínio Salgado; do Partido Democrata
Cristão (PDC), ligado ao nome de Ney Braga; e do Partido Trabalhista Nacional (PTN),
ligado ao nome de Paulo Pimentel.
Nesse sentido, o período da redemocratização não significou a derrota das forças
conservadoras e tradicionais do Estado Novo, e muito menos rompeu com a gramática
personalista do clientelismo. O Partido Social Democrático (PSD), constituído em torno de
prefeitos e interventores, permaneceu como o maior partido até 1964. O Partido Trabalhista
Brasileiro (PTB), também nascido do centralismo do Estado Novo, foi marcado por estilos
128
personalistas, começando com Getúlio Vargas e terminando com João Goulart e Brizola. A
União Democrática Nacional (UDN) abrigava setores da oligarquia que se opunham a Vargas.
Dentre os pequenos, o Partido Republicano (PR) tinha sua principal base em Minas Gerais, e
o Partido Libertador (PL) era mais centralizado no Rio Grande do Sul (MAINWARING,
MENEGUELLO e POWER, 2000; NUNES, 1999).
O Quadro a seguir ilustra a composição partidária no Estado do Paraná e no município
de Toledo para o período de 1947-2004.
129
Quadro 5
Quadro Partidário no Estado do Paraná e no Município de Toledo (1947-2004)
Estado do Paraná
Município de Toledo
Gestão Governadores Partido Gestão Prefeitos Partido
1947-1951 Moysés Lupion PSD - - -
1951-1955 Bento Munhoz PR 1952-1956 Ernesto Dall'Oglio PTB
1956-1961 Moysés Lupion PSD 1956-1960 Egon Pudell PSD
1961-1965 Ney Braga PDC 1960-1964 Willy Barth PTB
1966-1971 Paulo Pimentel PTN 1964-1968 Avelino Campagnolo UDN
1971-1975 Parigot de Souza ARENA 1968-1972 Egon Pudell ARENA
1975-1979 Jayme Canet Jr. ARENA 1972-1976 Wilson Carlos Jun ARENA
1979-1982 Ney Braga ARENA 1976-1982 Duílio Genari ARENA
1983-1986 José Richa PMDB 1982-1988 Albino Corazza Neto PMDB
1987-1991 Álvaro Dias PMDB 1988-1992 Luiz Alberto de Araújo PMDB
1991-1994 Roberto Requião PMDB 1992-1996 Albino Corazza Neto PDT
1994-1998 Jaime Lerner PDT 1996-2000 Derli Antonio Donin PPB
1998-2002 Jaime Lerner PFL 2000-2004 Derli Antonio Donin PPB
2002-2006 Roberto Requião PMDB 2004-2008 José Carlos Schiavinato PP
Fonte: Quadro elaborado pela autora a partir do TRE/PR e da Prefeitura Municipal de Toledo
130
Observa-se no Quadro 5 que a configuração partidária municipal, de certo modo,
acompanha a política estadual. Esta, por sua vez, busca sintonia com a política nacional, ainda
que as legendas partidárias possuam lógicas diferenciadas no âmbito regional. A ARENA
nasceu forte no Paraná, sob a liderança de Ney Braga
18
. Fazendo uma análise histórica dos
resultados eleitorais nas eleições para governador do Paraná e para prefeito de Toledo,
constata-se o predomínio do voto arenista no período de 1968 a 1982. Em pesquisa sobre o
bipartidarismo no Paraná, Alcântara (2004) constatou que, nas eleições municipais, o
MDB esteve sempre num processo de crescimento, quando se analisam os
resultados eleitorais em número de votos. Os partidos se estruturaram nos
níveis nacional, estadual e local, ganhando feições políticas definidas de
situação e oposição, porém os militares não estavam ainda preparados para
deixar o poder e assumir o jogo democrático. Em sua defesa, o governo
extinguiu os dois partidos e possibilitou a volta do pluripartidarismo, visando
consolidar um partido governista ainda forte e fragmentar a oposição, que
estava em ascensão (ALCÂNTARA, 2004, p. 249).
Nos anos 1980, acompanhando a política nacional, o PMDB cria no Paraná uma base
partidária forte e coesa que lhe garante hegemonia para o executivo estadual, prefeituras e
legislativos. O poder político paranaense busca, em determinados momentos, estruturar a sua
política em relação à situação nacional, mantendo uma sintonia com a ordem nacional
dominante, seja para manter ou mudar as formas de status quo da elite política. O quadro
partidário paranaense tem se configurado a partir de determinadas lideranças políticas em
ascensão ao longo da história política do Paraná.
Em recente trabalho, Emerson Cervi (2004), a partir dos resultados eleitorais dos
pleitos para o executivo do Paraná, busca identificar alterações no comportamento do eleitor
nas diferentes regiões do Estado, demonstrando a existência de uma volatilidade eleitoral
18
Nesse processo de centralização, Ney Braga conseguiu aglutinar o PTB, PDC, UDN, PTN e PSD para
organizar a ARENA no Paraná.
131
significativa nas duas eleições vencidas por Jaime Lerner, que obteve melhor desempenho
eleitoral no interior do Estado.
De acordo com o autor, analisando o desempenho eleitoral dos candidatos ao governo
em 1998 em função do IDH municipal, a inversão do comportamento eleitoral fica ainda mais
evidente. Lerner foi o mais votado em 74% dos municípios com IDH muito baixo; e em
apenas 44% dos municípios com IDH alto. Roberto Requião conseguiu ser o mais votado em
56% dos municípios com IDH alto, tendo sido derrotado entre os municípios com IDH de
médio a muito baixo. Uma explicação possível para as mudanças no comportamento eleitoral
do paranaense nas eleições de 1994 e 1998 pode ser identificada na dependência dos
municípios pequenos e pobres do poder público (CERVI, 2004).
Nas duas eleições, os candidatos do governo tiveram melhor desempenho no interior
do Estado, onde está o eleitorado rural.
Essa hipótese remete necessariamente à idéia do clientelismo e da
intervenção direta do poder público em favor de determinado candidato em
um processo eleitoral. Assim, as populações de municípios menores e mais
pobres estariam mais sujeitas à influência de investimentos diretos do poder
público na definição do voto do que os eleitores de municípios grandes e
médios (CERVI, 2004).
Nessa hipótese deve ser considerado que o clientelismo tem se reproduzido inclusive
nos municípios de médio e grande porte, como a forma que a classe política e a sociedade do
século XX encontraram para enfrentar a crise e os conflitos sociais, suscitados pela
incapacidade do Estado em atender as demandas da população. Estabeleceu-se uma relação de
dependência entre as autoridades políticas e os beneficiados com bens e serviços, financiados
com recursos públicos, em troca de voto e apoio político. Sem dúvida, a prática clientelista
predomina nos pequenos municípios, em que a personalização, a reciprocidade e a
dependência, traços constitutivos da relação de clientela, estão presentes na elite política local,
e os laços e as relações pessoais tornam-se mais diretas e operacionalizáveis.
132
Observando a política local do município de Toledo, pode-se destacar dois aspectos: o
predomínio de partidos conservadores ao longo das gestões municipais e a presença dos
“fundadores” da cidade e seus descendentes no domínio da política local, como verificado no
Quadro 5. Em relação às últimas eleições, o PPB (atual PP) governa o município por três
mandatos consecutivos. José Carlos Schiavinato, o sucessor de Derli Donin nas eleições de
2004, contou com o apoio dos seguintes partidos: PSDB, PFL, PRP e PTB.
Em debate veiculado na TV Tarobá, retransmissora da Rede Bandeirantes de
Televisão, em setembro de 2004, os candidatos a prefeito de Toledo, Antônio Ballottin, pelo
PL, Beto Lunitti, pelo PMDB, Luis Camarão, pelo PSB, e José Carlos Schiavinato, pelo PP,
falaram sobre suas propostas para resolver os principais problemas de Toledo nas áreas da
saúde, educação, habitação, planejamento e desenvolvimento.
José Carlos Schiavinato é engenheiro e atua na área de planejamento nas
administrações municipais há 25 anos. Em sua fala, ele menciona o apoio que recebeu do
Prefeito Derli Donin e dos deputados da região, Duílio Genari e Dilceu Sperafico, todos
filiados ao PP. O candidato prometeu, durante o debate, a construção de creches, a
implantação de um showroom do setor da indústria de confecção e a criação da Secretaria de
Atendimento à Mulher. Ressaltou contar com o apoio dos vereadores para a implementação
de seu plano de governo.
Nós entendemos hoje da necessidade de fazer com que esse
desenvolvimento seja constante, sempre forte e firme com você junto com a
gente. Toledo tem se desenvolvido de uma maneira muito satisfatória, os
dados está aí. Nós sabemos da evolução e vamos fazer um investimento forte
no setor industrial, vamos investir muito na pessoa, vamos criar a secretaria
de atendimento à mulher. Vamos fazer com que haja uma valorização do
servidor público municipal porque ele tem prestado um bom trabalho à nossa
comunidade. Vamos fazer com que as ações envolvendo nossos vereadores,
que estarão conosco, vereadores que a gente conhece e que vocês os ajude
também, para que a gente consiga contar com a participação dos nossos
vereadores nessa determinação do futuro (
Schiavinato em debate na TV
Tarobá, 2004).
133
O candidato da oposição, Beto Lunitti (PMDB) propôs o orçamento participativo
como forma de acabar com o clientelismo e o nepotismo da política local. Durante o debate, o
candidato denunciou os abusos da prefeitura em relação à contratação de 168 cargos de
confiança.
Na verdade, quando nós formos prefeito isso vai acabar. Nós vamos reduzir
os cargos de confiança e nós teremos pessoas de confiança, técnicas, porque
os amiguinhos do prefeito, do churrasco, não terá. Vai ter gente competente
recebendo valores que merecem, e nós vamos economizar esses 30 milhões
gastos em 8 anos e aplicar na saúde e educação, porque nós vamos respeitar
o dinheiro público do orçamento do município, com o próprio orçamento
participativo. Portanto, amigo contribuinte de Toledo, estando na prefeitura
essa festa vai acabar (Lunitti em debate na TV Tarobá, 2004).
Em todo o debate, os demais candidatos também fizeram críticas à atual
administração, especialmente em relação ao déficit habitacional, à falta de centros de
atendimento à saúde 24 horas nos bairros carentes do município, ao desemprego e geração de
renda e à falta de apoio à pequena e média empresa. Nenhum dos candidatos destacou o IDH
de Toledo, que, apesar de favorável, não consegue captar toda a complexidade da realidade
econômica e social da localidade. José Carlos Schiavinato, candidato do PP, venceu as
eleições com 46,44% dos votos e o candidato Beto Lunitti, do PMDB, ficou em segundo lugar
com 43,69% dos votos.
Dessa forma, a análise do processo histórico do Oeste paranaense elucida importantes
aspectos políticos, econômicos e sociais, mostrando-se relevante para compreender a
formação de valores, normas e atitudes dos cidadãos frente à política local e nacional. A
caracterização dos fatores histórico-estruturais permite verificar a configuração da cultura
política toledana, discussão que será feita no capítulo seguinte.
134
5 CARACTERIZAÇÃO DA CULTURA POLÍTICA DE TOLEDO
Este capítulo tem por objetivo caracterizar a cultura política de Toledo a partir da
compreensão de como as pessoas internalizam valores e crenças em relação à política e como
esses valores se traduzem em atitudes e comportamentos no âmbito da participação
democrática. O contexto histórico e político da região e as opiniões dos eleitores expressas em
pesquisa realizada em 2002 fornecem subsídios importantes sobre as percepções, atitudes e
comportamento político dos toledanos.
Em primeiro lugar, é desenvolvida análise descritiva das variáveis que identificam o
perfil sócio-demográfico da amostra. Trata-se de um eleitorado com baixo nível de
escolaridade e baixo poder aquisitivo, cuja maior concentração está na faixa entre 30 e 40
anos. Na seção seguinte, são analisadas as percepções em relação ao interesse por política e as
opiniões dos entrevistados sobre temas relevantes para a região, como reforma agrária,
combate ao tráfico de drogas, crise do setor agrícola e avaliação dos serviços públicos. Com
relação a este último, a saúde e a segurança pública foram as áreas avaliadas como as mais
precárias dentre os serviços públicos oferecidos pela administração municipal.
Na terceira seção, analisam-se os índices de confiança nas instituições políticas e o
tipo de avaliação que os eleitores fazem em relação à atuação dos políticos. Com as crescentes
denúncias de corrupção no governo e diante da pobreza e das desigualdades sociais, torna-se
cada vez mais freqüente uma avaliação negativa do desempenho dos políticos. E, por fim, na
quarta seção, retoma-se a discussão sobre a participação política, a partir da análise dos níveis
de participação política e social verificados no município de Toledo.
135
5.1 PERFIL SÓCIO-DEMOGRÁFICO DA AMOSTRA
A pesquisa quantitativa foi realizada no período de setembro/outubro de 2002, nos 21
bairros do município de Toledo, durante campanha eleitoral para Presidente da República e
Governador do Estado. A amostra é não-probabilística, constituída por 300 eleitores
residentes na área urbana do município, 48% homens e 52% mulheres, os quais se aproximam
dos percentuais encontrados na distribuição populacional realizada pelo Censo Demográfico
(IBGE, 2000) e dos percentuais de eleitores registrados no Tribunal Regional Eleitoral do
Paraná (TRE/PR), conforme dados da Tabela 3.
Tabela 3
Distribuição Populacional por Sexo (%)
Município de Toledo
IBGE 2000 TRE 2000 Amostra 2002
N % N % n %
Masculino
48.529 49 33590 50 143 48
Feminino
49.651 51 33154 50 157 52
Não informado
- - 199 - - -
Total 98.200 100 66.943 100 300 100
Fontes: IBGE, TRE/PR e Pesquisa Comportamento Político e Decisão Eleitoral, Toledo.
De acordo com os dados da Tabela 3, verifica-se uma distribuição populacional por
gênero, sem grandes diferenças de percentuais. No que se refere ao nível educacional, o IBGE
(2000) aponta a taxa de alfabetização do município de Toledo como uma das melhores entre
os municípios do Oeste paranaense (92%). Entretanto, os níveis de escolarização no
município mostram-se baixos, segundo dados do TRE/PR. A soma dos percentuais das
categorias “analfabeto”, “lê e escreve” e “ensino fundamental (incompleto/ completo)”, chega
a 68% entre os eleitores no município de Toledo. Quando os dados do TRE/PR são
136
comparados com os dados da amostra, os resultados são similares, conforme mostra o Gráfico
2.
Gráfico 2
Nível de Escolarização da Amostra (%)
7
30
63
0
10
20
30
40
50
60
70
Baixo Médio Alto
n = 300
Fonte: Pesquisa Comportamento Político e Decisão Eleitoral, Toledo, 2002.
No que se refere aos níveis de escolarização da amostra, categorizados como baixo,
médio e alto, predomina o baixo nível educacional entre os toledanos. Como observado no
Gráfico 2, há uma parcela de 6% que nunca freqüentou escola e de 57% que cursaram o
ensino fundamental (completo ou incompleto), totalizando 63%. Apenas 30% dos
entrevistados possuem o ensino médio (completo ou incompleto) e 7% cursaram o ensino
superior (completo ou incompleto). Ao introduzir a variável “sexo” no cruzamento com
escolaridade, os resultados mostram diferenças significativas.
137
Gráfico 3
Sexo por Grau de Escolaridade (%)
8
27
12
2
9
24
13
3
3
25
16
4
3
32
15
2
0
5
10
15
20
25
30
35
Masculino Feminino Masculino Feminino
Dados de Toledo e da Amostra
Nunca frequentou
Ensino Fundamental (I/C)
Ensino Médio (I/C)
Ensino Superior (I/C)
n = 300 – I (Incompleto) e C (Completo)
Fontes: TRE/PR 2000 e Pesquisa Comportamento Político e Decisão Eleitoral, Toledo, 2002.
Embora questionável a qualidade do processo educativo formal, os estudos de cultura
política constatam que o acesso a níveis mais altos de escolaridade influencia a forma como
os eleitores percebem o sistema político, possibilitando ampliar o interesse e a participação
política (ALMOND e VERBA, 1965; INGLEHART, 2002). Conforme dados do Gráfico 3, a
distribuição do eleitorado por sexo e escolaridade indica que a baixa escolaridade dos
toledanos é predominante entre homens e mulheres, apresentando diferenças mínimas entre os
dados do TRE/PR e os da amostra. A pesquisa revela que a escolaridade das mulheres é mais
baixa entre os segmentos “donas de casa” e “desempregadas”.
A despeito das mudanças ocorridas no final da década de 1970, com a entrada das
mulheres no sistema educacional e no mercado de trabalho, a eqüidade de gênero ainda não
foi plenamente alcançada. Contudo, tais mudanças encontram ressonância nos indicadores de
participação e na presença das mulheres na política, especialmente na política partidária e nos
canais institucionais criados para promover a cidadania feminina (AVELAR, 1989; PRÁ,
2001). Segundo o Censo do Legislativo realizado pelo Interlegis
19
, atuam hoje no Congresso
42 Deputadas Federais, representando 8% do total e 10 Senadoras, totalizando 12%. Foram
19
http://www.interlegis.org.br . Acesso em 14/07/2006.
138
eleitas na ocasião das eleições de 2002 para as Assembléias Legislativas Estaduais 148
Deputadas, um dado significativo, mas não satisfatório em termos de representação. No
Estado do Paraná, dentre os 399 municípios, apenas 20 deles são administrados por prefeitas,
o que expressa um desafio à efetiva participação feminina na política local.
A idade é outro parâmetro importante sobre o qual se pode fazer comparações entre o
eleitorado da amostra e aquele cadastrado no TRE/PR. No que se refere à composição do
eleitorado toledano por faixa etária, observam-se flutuações interessantes.
Gráfico 4
Faixa Etária do Eleitorado (%)
18
15
15
9
27
22
18
24
11
10
7
15
4
5
0
5
10
15
20
25
30
16 a
23
24 a
29
30 a
39
40 a
49
50 a
59
60 a
69
70 ou
m
ais
Toledo
Amostra
n = 300
Fontes: TRE/PR 2000 e Pesquisa Comportamento Político e Decisão Eleitoral, Toledo, 2002.
De acordo com os dados oficiais de 2000, os eleitores de Toledo se localizavam nas
faixas etárias entre 30 e 39 anos e entre 40 e 49 anos, como observado no Gráfico 4. Na
pesquisa realizada em 2002, no referido município, um número maior de eleitores nessas
faixas etárias se dispôs a responder o questionário, o que refletiu uma média de idade da
amostra de 42 anos. Não há diferenças significativas de média de idade entre homens e
mulheres.
139
Quando questionados sobre sua situação profissional, os entrevistados dividiram-se em
cinco segmentos sociais: empregados, donas de casa, aposentados, desempregados e
estudantes, como mostra o Gráfico 5.
Gráfico 5
Situação Profissional da Amostra (%)
46
26
18
6
4
Empregados
Donas de casa
Aposentados
Desempregados
Estudantes
n = 300
Fonte: Pesquisa Comportamento Político e Decisão Eleitoral, Toledo, 2002.
Entre os empregados, na ocasião da pesquisa, 46% dos entrevistados eram
assalariados, autônomos, profissionais liberais, empresários, agricultores e funcionários
públicos. Foram entrevistados também aposentados, desempregados, donas de casa e
estudantes, como se observa no Gráfico 5. Segundo relatório divulgado pelo Instituto
Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social (IPARDES, 2003a), a distribuição
setorial de ocupação no Paraná, no período 1992-2001, apresentou um relativo crescimento
em relação à prestação de serviços e ao comércio de mercadorias. Entretanto, a indústria, que
recebeu expressivos investimentos nos anos 1990, não tem gerado empregos no Estado. A
flexibilização do mercado de trabalho e o não cumprimento das normas trabalhistas
contribuem para agravar o déficit de trabalho decente.
Em relação à renda familiar da amostra, a próxima variável a ser analisada, constata-se
uma pirâmide no poder aquisitivo da população, como ilustra o Gráfico 6.
140
Gráfico 6
Renda Familiar da Amostra (%)
27
41
32
0
20
40
60
80
100
Acima de 5 Sarios
Mínimos
Entre 3 e 5 Sarios
Mínimos
Até 3 Sarios
Mínimos
n = 299
Fonte: Pesquisa Comportamento Político e Decisão Eleitoral, Toledo, 2002
A renda familiar da amostra, representada no Gráfico 6, evidencia a má distribuição de
renda entre os eleitores. Na base há uma parcela de famílias que vivem com uma renda
familiar de até três salários mínimos. Esse percentual, somado ao das famílias que vivem com
uma renda de até cinco salários mínimos, chega a 68% do total. No topo, há uma minoria de
famílias, que vivem com uma renda familiar acima de cinco salários mínimos. De acordo com
os dados da pesquisa, na maioria dos casos, duas ou mais pessoas contribuem com essa renda.
O levantamento realizado pelo IPARDES (2003a) indica que 19% da população ocupada no
Paraná recebiam em 2001 até um salário mínimo, revelando que a pobreza é uma condição
que atravessa o próprio mercado de trabalho e contribui para gerar o subemprego e aumentar
o desemprego. A desigualdade socioeconômica do país e do Estado do Paraná tem seus
reflexos no município de Toledo.
A distribuição sócio-demográfica da amostra, no que diz respeito às variáveis sexo,
idade, escolaridade e renda, se aproxima dos parâmetros do Censo Demográfico (IBGE) e das
características do eleitorado registradas pelo Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE/PR).
Trata-se de um eleitorado com baixo nível de escolaridade, baixo poder aquisitivo e
relativamente jovem. Na próxima seção, examinam-se as variáveis atitudinais, o que
141
possibilita conhecer e analisar valores, crenças e atitudes dos toledanos para com o sistema
democrático. Verificar-se-ão os níveis de interesse por política em relação ao processo
eleitoral, avaliação de desempenho da administração pública, e opiniões referentes a temas
debatidos na região, como reforma agrária e combate ao tráfico de drogas.
5.2 INTERESSE POR POLÍTICA
De acordo com os estudos de cultura política, o conhecimento e a informação que os
cidadãos têm da política influenciam, sobremaneira, suas opiniões, suas atitudes e
comportamentos em relação à democracia e às instituições políticas. A pesquisa realizada em
Toledo mostra que a televisão e o rádio são os meios de comunicação mais usados pelos
entrevistados para acompanhar as notícias políticas do país. Como sustenta Bourdieu (1997),
a televisão é um instrumento que possibilita atingir a todos, pois se constitui em espaço
público onde grande parte do jogo político acontece, principalmente nos períodos eleitorais. O
desenvolvimento dos meios de comunicação de massa, particularmente o rádio e a televisão,
imprimiu um novo ritmo aos processos políticos e sociais. Uma de suas maiores
conseqüências foi a de aproximar o candidato da realidade cotidiana de seu eleitorado,
minimizando o papel do partido nessa mediação. As tradicionais fontes de socialização
política e de obtenção de informação, como a família, o trabalho, as orientações da igreja e
sindicatos, cedem cada vez mais espaço para noticiários, debates e propaganda eleitoral
gratuita, transmitidos pelos meios de comunicação.
Revigorado pelo marketing político, o horário eleitoral gratuito possibilita o acesso de
todos os candidatos à televisão e ao rádio, configurando-se em uma importante fonte de
informação sobre suas idéias e propostas políticas. Ao mesmo tempo em que democratiza a
142
campanha, o horário eleitoral gratuito favorece uma crescente personalização da competição
eleitoral em detrimento dos partidos políticos, especialmente quando a imagem e as
características pessoais do candidato passam a ser elementos decisivos do voto (AMORIM,
1998; FONTOURA, 2000). O marketing político centra-se na imagem dos candidatos e dos
partidos políticos, nos aspectos psicológicos dos eleitores e no acompanhamento de todo
processo eleitoral, conforme os objetivos pretendidos.
Dada a sua centralidade, diversos estudos analisam o papel dos meios de comunicação
nos processos políticos e eleitorais, avaliando o seu caráter investigativo e o tipo de cobertura
dispensada à política e às instituições democráticas (MENEGUELLO e RIBEIRO, 2002). Em
recente pesquisa, Vera Chaia (2004) analisa a relação entre a imprensa e a Câmara Municipal
de São Paulo, dando destaque para a cobertura da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito
sobre a “Máfia dos Fiscais”, feita por jornais da capital paulistana. De acordo com a autora, a
mídia impressa, composta por jornais de grande tiragem e ampla repercussão junto à opinião
pública, constitui-se em fonte geradora de sistemas de representação da realidade, ganhando
significado no âmbito das conjunturas e das disputas políticas.
As informações que os cidadãos obtêm da política nacional e local, seja através dos
meios de comunicação ou através de conversas na família e no trabalho, contribuem para
aferir o interesse por política.
143
Gráfico 7
Interesse por política (%)
34
33
31
20
0
10
20
30
40
50
60
Você tem o hábito de:
Assistir ao Horio
Eleitoral Gratuito
Conversar sobre
política com outras
pessoas
Ler ou Assistir o
noticrio sobre
política
Tentar convencer
amigos a votarem nos
seus candidatos
n = 300 – Respostas “SIM”. Os demais percentuais somam as respostas “Raramente” e “Não
Fonte: Pesquisa Comportamento Político e Decisão Eleitoral, Toledo, 2002.
No Gráfico 7, verifica-se que o interesse por informações políticas é baixo entre os
eleitores de Toledo. Apenas 34% confirmam que assistem o horário eleitoral gratuito, 33%
alegam conversar sobre política com amigos e parentes e 31% dos entrevistados têm o hábito
de assistir ou ler noticiário sobre política. Nota-se também baixo envolvimento com
campanhas eleitorais. Entre os entrevistados, apenas 20% afirmam que já tentaram convencer
amigos a votarem nos candidatos que escolherem.
Esses baixos índices de interesse por informações políticas expressam o ceticismo dos
cidadãos em relação às instituições democráticas e em relação aos próprios meios de
comunicação. Fruto desse ceticismo, materializado no baixo interesse por política, os dados
também evidenciaram que a confiança é mínima. Por exemplo, quando se compara a
confiança na televisão com a confiança nos partidos políticos, essas duas entidades não são
vistas com credibilidade por 92% dos eleitores” (Pouca e Nenhuma Confiança). Dadas essas
condições do eleitorado, como este poderia ser classificado?
Em relação a essa questão, um conceito bastante utilizado na análise do
comportamento eleitoral é o conceito de sofisticação política, que propõe avaliar o interesse
por política, o conhecimento da política, o envolvimento político e a capacidade de
144
conceituação política dos cidadãos. Entre as variáveis explicativas do comportamento eleitoral
brasileiro, Mônica Castro (1994) destaca a sofisticação política e a preferência partidária,
buscando articular os fatores macro-estruturais (características sócio-demográficas, atributos e
experiências sociais) e os fatores de tipo micro (opiniões, atitudes, interesse, envolvimento
político) na explicação do voto. De acordo com a autora (1994, p. 141),
os dados reforçam a hipótese de que eleitores que vivem em contextos
estruturais diversos fazem escolhas diferentes em função de seus graus de
interesse, de informação e de envolvimento no processo político – fatores
indicados pelas variáveis sofisticação política e presença ou ausência de
preferência partidária.
Tendo em vista que nesta pesquisa não foi possível avaliar o grau de sofisticação
política do eleitorado, em detrimento da ausência de variáveis específicas no questionário que
pudessem dar conta da dimensão desse conceito, foi criado o índice de interesse por política,
utilizando questões que avaliam a exposição aos meios de comunicação e o envolvimento dos
cidadãos com a política (ver Apêndice B). O objetivo foi facilitar a realização de cruzamentos
com outras variáveis.
Para fins de análise da sofisticação política do eleitorado, procedeu-se a uma série de
questões, debatidas no cenário político nacional e local, referentes às coligações partidárias, à
política de combate ao tráfico de drogas, à reforma agrária e aos problemas enfrentados pelos
produtores da região.
Naquela ocasião, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) determinou que as novas regras
de coligação partidária seriam obrigatórias em 2002, ano eleitoral. A medida obriga os
partidos políticos a repetirem nos Estados as alianças firmadas durante a campanha eleitoral
em âmbito nacional. De um lado, os defensores da chamada “verticalização” alegam que a
medida disciplina os partidos políticos a serem mais fiéis aos seus princípios ideológicos. De
outro lado, os críticos da medida argumentam que a restrição reduz a autonomia dos partidos
145
e ignora as especificidades do contexto político local. O Gráfico 8 mostra as respostas a esta
questão.
Gráfico 8
Opinião sobre as novas regras de coligação partidária (%)
21
44
36
0 1020304050
Medida
inconstitucional
Medida correta
Não Sabe
n = 298
Fonte: Pesquisa Comportamento Político e Decisão Eleitoral, Toledo, 2002.
De acordo com os dados do Gráfico 8, essa medida foi considerada correta por 44%
dos entrevistados, sob o argumento de que firmar alianças entre partidos da mesma posição
ideológica e programática poderia favorecer o sistema partidário. Para 21% dos respondentes
trata-se de uma medida inconstitucional, por propor mudanças na legislação a menos de um
ano antes das eleições. Chama a atenção o percentual de 36% que não souberam responder a
questão, seja por desinformação ou pela complexidade do tema. Observa-se, portanto, que
apenas parte dos entrevistados acompanhou os debates sobre esse tema.
A polêmica sobre o fim ou a manutenção da verticalização envolve a interpretação
do que seja circunscrição, que em 1998 foi entendida como Estado e em 2002, como
território nacional. De acordo com o artigo 6º da Lei n. 9.504/97, “é facultado aos partidos
políticos, dentro da mesma circunscrição, celebrar coligações para eleição majoritária,
proporcional, ou para ambas, podendo, neste último caso, formar-se mais de uma coligação
para a eleição proporcional dentre os partidos que integram a coligação para o pleito
majoritário”. Para atenuar a divergência, o TSE decidiu que o partido que não lançasse ou
146
apoiasse um candidato à Presidência em 2002 poderia se coligar com qualquer outro nos
Estados.
Em março de 2006, o Congresso aprovou uma Emenda Constitucional que assegura
aos partidos políticos autonomia para definir os critérios de suas coligações eleitorais, sem
obrigatoriedade de vinculação entre as candidaturas em âmbito nacional, estadual, distrital
ou municipal (EC nº 52/06). Por sua vez, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do
Brasil (OAB) protocolou a Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) de número 3685,
sustentando que o fim da verticalização não poderia ter vigência para as eleições de 2006,
tendo em vista que mudanças na legislação eleitoral só podem ser efetivadas até, no
máximo, um ano antes do pleito. Diante do impasse, o Supremo Tribunal Federal (STF)
decidiu pela manutenção da verticalização para as eleições de 2006.
Para ser profícuo, esse debate deve aliar novos critérios éticos de se fazer política,
visando enfrentar o ceticismo e a indiferença da maioria da população. Mais importante do
que discutir a formalidade das alianças é discutir a qualidade dos programas partidários e o
envolvimento dos candidatos com propostas que visem a participação da sociedade civil.
Nesse contexto, quaisquer que sejam as regras estabelecidas, a discussão deve se pautar nos
reais avanços da democracia, e não necessariamente na defesa dos interesses de partidos e
candidatos. Talvez isso explique a porcentagem significativa de respondentes que não
souberam responder a pergunta.
Em relação ao contexto local, os entrevistados opinaram sobre a atual política de
combate ao tráfico de drogas, sobre a reforma agrária e sobre a crise no setor agrícola. A
questão agrária no Paraná é marcada pelo processo de ocupação das terras desde a década de
1920. Os problemas foram acentuados com a construção da Usina Hidrelétrica de Itaipu,
instalada nos anos 1980. A inundação das terras agrícolas e a conseqüente expulsão dos
agricultores dessas terras propiciaram no Paraná um movimento de ação pela reforma agrária,
147
que se fortaleceu com a criação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST –,
fundado em janeiro de 1984, na cidade de Cascavel, por ocasião do Primeiro Encontro
Nacional do MST. Entre as suas principais reivindicações, estão o assentamento das famílias
acampadas e a concessão de créditos para possibilitar a produção das famílias assentadas
(BRENNEISEN, 2002).
Levando-se em conta esse cenário, foi questionada a opinião dos toledanos sobre a
política de reforma agrária no país, como mostra o Gráfico 9.
Gráfico 9
Opinião sobre Reforma Agrária (%)
43
23
15
14
5
0
10
20
30
40
50
A favor somente nas
terras improdutivas
A favor nas grandes
propriedades
A favor somente nas
terras do governo
Contra Reforma
Agria
NS/NR
n = 300
Fonte: Pesquisa Comportamento Político e Decisão Eleitoral, Toledo, 2002
Os dados do Gráfico 9 evidenciam que apenas 14% dos entrevistados são contrários a
qualquer projeto de reforma agrária. Os demais são favoráveis à reforma agrária, desde que
seja realizada somente nas terras improdutivas (43%) ou que ocorra somente nas terras do
governo (15%). Há ainda aqueles que apóiam a realização da reforma agrária em todas as
grandes propriedades (23%). Tais dados corroboram com resultados de pesquisas de opinião
pública realizadas nos últimos anos, as quais indicam que grande parte da população brasileira
considera o MST um movimento legítimo e é favorável à reforma agrária, porém não apóia
148
diretamente iniciativas que a viabilizem, seja porque não a considera uma prioridade absoluta,
seja porque não tem uma idéia clara do que seja uma reforma agrária (Comparato, 2003).
A atividade agrícola em pequenas e médias propriedades é predominante na região
Oeste Paranaense. A principal fonte de renda do Município de Toledo é derivada da
agricultura, e a maioria de seus produtos está vinculada à agroindústria. Segundo a Secretaria
Municipal de Agricultura, Toledo possui 5.282 propriedades rurais integradas ao sistema de
microbacias de conservação de solos, perfazendo 120.534,2 hectares. Entre as reivindicações
desse setor, estão a falta de uma política agrícola, baixos preços pagos aos produtores rurais,
prejuízos causados pelas oscilações do câmbio e das frustrações de safras. Nesse contexto,
torna-se relevante avaliar como os toledanos se posicionam em relação à crise do setor
agrícola (Gráfico 10).
Gráfico 10
Opinião sobre a crise no setor agrícola (%)
51
23
14
7
5
0
10
20
30
40
50
60
Investir em programas de incentivo
/subsídios, financiamentos
Estabelecer tabela de preços/
fiscalizar
Acabar com atravessadores /
intermedrios
Criar associações, cooperativas,
feiras
Baixar impostos /baixar preços ao
produtor e consumidor
n = 267
Fonte: Pesquisa Comportamento Político e Decisão Eleitoral, Toledo, 2002
P27. Aqui na região existe o problema de desvalorização do produto em relação ao valor de
revenda no mercado. Na sua opinião, quais as medidas que o governo deveria tomar para
solucionar essa questão? (Resposta Espontânea).
Foi solicitado aos entrevistados que opinassem sobre o problema da desvalorização do
produto agrícola, que atinge produtores e consumidores. As respostas foram distribuídas em
149
cinco categorias, visando sintetizar todas as opiniões. Os dados do Gráfico 10 mostram que
para 51% dos entrevistados o governo deveria baixar as taxas de juros nos empréstimos
agrícolas e implementar programas de incentivo e de apoio ao produtor como uma forma de
sanar o problema. Para 23% é preciso estabelecer uma tabela de preços mínimos e fiscalizá-la.
Outros 14% argumentam que para alcançar comercialização do produto a preços justos é
preciso acabar com os atravessadores e intermediários. E 7% dos entrevistados atribuem
importância à organização dos agricultores em cooperativas e associações para possibilitar a
venda do produto direto ao consumidor.
O Paraná é responsável por um quarto da produção nacional de grãos. A estiagem no
Sul do país nos dois últimos anos provocou diminuição da safra, ocasionando prejuízos para o
setor agrícola. Os produtores rurais reivindicam junto ao governo federal providências
emergenciais, como a ampliação do prazo de pagamento dos financiamentos, disponibilização
de recursos para cooperativas e abertura de novas linhas de crédito (IPARDES, 2003c).
Em maio de 2006, produtores rurais fizeram manifestações e bloqueios em rodovias
estaduais e federais, com o objetivo de cobrar do governo mudanças nas políticas agrícola e
cambial, e renegociação das dívidas. O ministro da agricultura, Roberto Rodrigues, afirmou
que o Plano Safra 2006/07 irá garantir a liberação de R$ 60 bilhões para o setor, ampliar o
crédito e reduzir as taxas de juros (Gazeta de Toledo, 26/05/2006). O presidente do Sindicato
Rural de Toledo, em seu depoimento, alega que o setor agrícola ainda está muito
desorganizado e pouco afeito a mobilizações. “Nós já estamos vendo hoje as mobilizações,
como aconteceu agora, praticamente era inédito antes, mas agora nós já conseguimos trazer
um número muito expressivo de agricultores nesse movimento, mas isso não é fácil, mas já
conseguimos mobilizar bastante gente” (Entrevista realizada em maio de 2006).
Nesse contexto, a conjuntura do setor agrícola e a crise econômica intensificam a
marginalização de segmentos sociais e, conseqüentemente, potencializam os índices de
150
criminalidade, contrabando e tráfico de drogas, especialmente na fronteira com o Paraguai. A
este respeito, foi solicitado aos entrevistados que opinassem sobre a atual política de combate
ao tráfico de drogas na região, como mostra o Gráfico a seguir.
Gráfico 11
Opinião sobre o combate ao tráfico de drogas (%)
30
20
18
12
11
5
4
0
5
10
15
20
25
30
Aumentar sarios e equipar a
polícia para evitar corrupção
Aumentar policiamento nas ruas,
nas escolas
Aumentar fiscalização nas
fronteiras
Criar leis mais severas, medidas
mais duras (pena de morte)
Investir na educaçao, em
empregos e em campanhas
Governo está sendo eficaz no
combate
Liberar o consumo de drogas
n = 278
Fonte: Pesquisa Comportamento Político e Decisão Eleitoral, Toledo, 2002
P28. Na sua opinião, o governo está sendo eficaz no combate ao tráfico de drogas?
Quais as medidas que poderiam ser tomadas para resolver o problema? (Resposta
espontânea).
As respostas foram categorizadas em oito dimensões, de modo a resgatar a diversidade
das opiniões sobre a temática. Entre as medidas mencionadas pelos entrevistados, destaca-se a
cobrança por mais eficiência e menos corrupção na polícia. Os dados do Gráfico 11 mostram
que apenas 5% acreditam na eficácia do governo no combate ao tráfico; 30% argumentam que
para acabar com a corrupção é preciso aumentar o salário dos policiais e dar-lhes melhores
condições de trabalho. Para 20% a prioridade é aumentar o policiamento nas ruas e nas
escolas, seguido de 18% que acreditam que é preciso uma fiscalização mais ostensiva nas
fronteiras. Cerca de 12% defendem a aplicação de leis mais severas e medidas mais duras,
como a prisão perpétua e a pena de morte. Para 11% um maior investimento na educação e
oportunidades de emprego seria a melhor forma de resolver o problema.
151
O projeto de lei nº 7.134 de 2002 atualiza a legislação brasileira em vigor há três
décadas (lei 6.368/76). Destaca-se a criação de dispositivos para interditar o dinheiro dos
narcotraficantes e a fixação de novas penas para os financiadores do crime organizado. Muda
também a qualificação do viciado, que passa a ser tratado como doente/dependente, e não
mais como criminoso. A prevenção ao uso de drogas passa a ser matéria obrigatória do
currículo do ensino fundamental e médio e programa obrigatório nas políticas públicas,
inclusive com a responsabilização penal e administrativa dos servidores públicos que não o
implantarem devidamente.
Constatou-se, nessa análise de dados, que, apesar do baixo interesse por política, parte
dos entrevistados acompanha notícias e fatos referentes a questões pontuais, avalia o
desempenho dos políticos e se posiciona a favor de mudanças efetivas na legislação e na
prática cotidiana, porém não mostra motivação para se envolver em atividades que tentem
sanar este problema. Como enfatiza Almond e Verba (1965), uma das características da
cultura política da sujeição é o fato de que as pessoas sabem o que acontece na esfera política,
mas não se sentem estimuladas a participar e a intervir. Há uma ausência do sentimento da
competência cívica e da eficácia política.
Considerando que a qualidade de vida relaciona-se diretamente com a qualidade da
democracia e esta com a satisfação dos cidadãos em relação à atuação das instituições
políticas, a pesquisa examinou como os toledanos avaliam os serviços públicos oferecidos
pela administração municipal. O Gráfico 12 mostra as opiniões dos toledanos sobre essa
questão.
152
Gráfico 12
Avaliação dos Serviços Públicos (%)
72
67
54
45
34
0
20
40
60
80
Boa (%)
Saneamento Básico
Educão
Transporte
Saúde
Segurança Pública
n = 294
Fonte: Pesquisa Comportamento Político e Decisão Eleitoral, Toledo, 2002.
Observa-se no Gráfico 12 que 72% dos entrevistados estão satisfeitos com os serviços
de saneamento básico, 67% avaliam a educação no município como boa e 54% mostram-se
satisfeitos com o transporte público. Contudo, verifica-se que 55% dos entrevistados estão
insatisfeitos com a área da saúde e 66% com a segurança pública, como já constatado nos
dados sobre a avaliação da política de combate ao tráfico de drogas na região. A população
pede mais policiamento, mais eficiência da polícia e menos corrupção. O medo e a
insegurança e a precariedade no atendimento à saúde comprometem sobremaneira a qualidade
de vida dos toledanos.
De acordo com o relatório divulgado pelo Programa das Nações Unidas, Toledo é um
dos municípios que apresenta os melhores indicadores socioeconômicos, expressos por um
Índice de Desenvolvimento Humano de 0,827 (PNUD, 2000). Se, por um lado, qualidade de
vida diz respeito à satisfação das necessidades mais elementares do ser humano, como
alimentação, água potável, habitação, trabalho, educação, saúde e lazer, de outro lado, trata-se
de um conceito polissêmico que compreende também felicidade, prosperidade, realização e
confiança. Qualidade de vida significa todo esse conjunto de benefícios como um bem
individual e coletivo, de modo que a própria sociedade define e mobiliza o padrão de
153
qualidade de vida que norteia o desenvolvimento sustentável e a melhoria das condições de
vida da população (MINAYO, HARTZ e BUSS, 2005). Nesse sentido, o processo de
desenvolvimento é muito mais amplo e complexo do que qualquer medida sumária poderia
captar. Pode ser visto como um processo de expansão das liberdades substantivas, que exige
redistribuição de renda e políticas que estimulem o crescimento econômico com justiça social.
Analistas argumentam que o desenvolvimento sustentável está intrinsecamente associado à
redução da pobreza e das desigualdades sociais (Sen, 2000; Sachs, 2004).
Pesquisas realizadas em Porto Alegre, Montevidéu e Santiago do Chile buscaram
verificar como as pessoas percebem os problemas ambientais e qual o seu envolvimento na
resolução destes problemas que afetam diretamente a qualidade de vida da população. Os
dados sugerem que a percepção dos cidadãos em relação à questão ambiental varia em função
do seu interesse e de sua participação política. A grande maioria dos entrevistados vê a
questão da seca e da contaminação atmosférica como fenômenos da natureza, eximindo o
governo e a própria sociedade de qualquer responsabilidade (AMORIM, s/d).
Os dados examinados até aqui sugerem a necessidade de investigar a maneira como os
cidadãos percebem as instituições democráticas e como avaliam o desempenho dos políticos.
A seção seguinte analisa os níveis de confiança institucional entre os toledanos
5.3 CONFIANÇA NAS INSTITUIÇÕES POLÍTICAS
O fenômeno da confiança assume maior relevância na Ciência Política nas últimas
décadas, sob o aspecto de ser propulsora de capital social e de uma cultura política
democrática. A confiança em instituições baseia-se no fato de os cidadãos compartilharem
uma perspectiva comum relativa ao pertencimento à comunidade política, favorecendo uma
154
avaliação de desempenho das instituições democráticas e dos seus gestores e administradores.
Segundo Moisés (2005), é preciso compreender a relação entre confiança interpessoal,
confiança política, competência cívica, capital social, associativismo, e dimensões afins de
cultura política.
Estudos produzidos nos últimos anos revelam que a confiança é um componente
básico do capital social, que, sob a forma de regras de reciprocidade e participação cívica,
favorece a cooperação e a solidariedade social. O conceito de capital social visa potencializar
a participação cidadã e capacitar os indivíduos para incidir de forma protagônica nos
processos políticos, propondo saídas e alternativas criativas à crise política e social (Baquero,
2006).
Nessa direção, Nazzari (2002) argumenta que as principais variáveis de capital social,
como confiança, cooperação e participação não estão sendo favorecidas pelo processo de
socialização política vigente, contribuindo para o desenvolvimento de atitudes de apatia e
indiferença em relação à política. Em estudo sobre a socialização política dos jovens
paranaenses, a autora constatou que os mesmos carecem de valores democráticos, como
confiança nas pessoas e nas instituições. Os resultados da pesquisa mostram que a descrença
nos partidos e nos políticos é expressiva, e os fatores determinantes estão associados ao não
cumprimento de promessas e às denúncias de corrupção. De acordo com Nazzari (2002, p.
195) faltam aos jovens “crenças em alguns valores democráticos fundamentais, como
confiança nas pessoas e instituições, mais acentuadas nos valores transmitidos pela escola que
pela família”. Esse padrão de desconfiança, também se observa em Toledo, conforme dados
da Tabela 4.
155
Tabela 4
Confiança nas Instituições (%)
Qual o grau de sua confiança em relação a:
Muita Pouca Nenhuma Total
Televisão 8 59 33 100
Partidos Políticos 8 60 32 100
Ministros do Governo 11 63 26 100
Deputados e Senadores 13 61 26 100
Sindicatos 15 57 28 100
Polícia 24 63 13 100
Tribunais de Justiça 26 59 15 100
Igrejas 58 35 7 100
Cientistas e Professores 65 32 3 100
n = 300
Fonte: Pesquisa Comportamento Político e Decisão Eleitoral, Toledo, 2002.
Os dados da Tabela 4 corroboram com dados de pesquisas nacionais e estaduais,
revelando que a maioria dos toledanos deposita pouca confiança nas instituições políticas.
Apenas 8% afirmam confiar nos partidos políticos e os demais expressam pouca ou nenhuma
confiança. Da mesma forma, 13% dos entrevistados alegam confiar nos deputados e
senadores. Os entrevistados argumentam que os políticos não cumprem suas funções de
representar e mediar os interesses sociais, e que a maioria destes visa enriquecer à custa do
dinheiro público e arrumar a vida de amigos e parentes, como mostram os dados da Tabela 5 e
do Gráfico 13.
Tabela 5
Avaliação da Atuação dos Políticos
Na sua opinião, os políticos cumprem as funções de fazer leis e fiscalizar o uso
do dinheiro público? (%)
Sim Não Um pouco Não Sabe Total
Vereadores 18 27 43 12 100
Deputados Estaduais 17 18 50 15 100
Deputados Federais e Senadores 16 18 47 19 100
n = 300
Fonte: Pesquisa Comportamento Político e Decisão Eleitoral, Toledo, 2002.
156
Observa-se na Tabela 5 que não chega a 20% o percentual daqueles que acreditam que
os políticos cumprem suas funções. Por outro lado, há um percentual significativo de eleitores
que não sabem se os políticos cumprem ou não sua função, seja porque não fiscalizam, seja
porque a maioria nem lembra em quem votou. Embora os percentuais de avaliação sobre a
atuação dos vereadores sejam maiores em relação aos demais, os entrevistados também não
souberam avaliar o trabalho dos deputados estaduais, apesar da proximidade com o seu
cotidiano.
Gráfico 13
Avaliação da Atuação dos Políticos (%)
58
20
13
7
2
0
10
20
30
40
50
60
Na sua opinião, os políticos procuram:
Enriquecer a custa do
dinheiro público
Arrumar a vida de amigos e
parentes
Cumprir o programa de
governo
Defender propostas de bem-
estar social para todos
Defender os interesses dos
eleitores
n = 300
Fonte: Pesquisa Comportamento Político e Decisão Eleitoral, Toledo, 2002
Depreende-se dos dados do Gráfico 13 uma avaliação negativa sobre o desempenho
dos políticos. Apenas 13% afirmam que os políticos buscam cumprir o programa e 7% alegam
que os políticos defendem propostas de bem-estar para todos. Dentre os entrevistados, 2%
acreditam que seus interesses estejam sendo defendidos pelos políticos. A opinião da maioria
é de que os políticos procuram enriquecer à custa do dinheiro público (58%). Essa postura
pode ser justificada pelas demandas não atendidas e pelas inúmeras denúncias de corrupção
na política nos últimos anos. Outros 20% acreditam que os políticos buscam arrumar a vida de
amigos e parentes. Nesse contexto, o nepotismo, definido como a concessão de benefícios e
cargos públicos a parentes, reflete uma das formas mais “puras” de corrupção na política e
157
está presente hoje nas três esferas de poder: Executivo, Legislativo e Judiciário (BEZERRA,
1995).
Os resultados apresentados pela pesquisa elucidam um paradoxo. De um lado, os
cidadãos expressam falta de credibilidade no Estado e na classe política, o que compromete
sua motivação em participar nos processos decisórios. De outro lado, esperam do governo a
resolução dos problemas socioeconômicos e, para tanto, transferem toda a responsabilidade a
um líder, uma personalidade política escolhida pelo voto.
Esses indicadores de desconfiança institucional convergem com resultados de
pesquisas realizadas no âmbito da América Latina que constatam a existência de uma cultura
política latino-americana híbrida e contraditória, na qual convivem elementos autoritários e
democráticos. Dessa forma, as instituições democráticas são permeadas por uma cultura
política orientada pelo individualismo, passividade, indiferença e desconfiança, que mantém a
democracia em um estado permanente de instabilidade (BAQUERO, 2000; SCHMIDT,
2001). Diante da desconfiança em relação aos partidos políticos, os cidadãos se afastam da
esfera política, refletindo em baixos índices de participação, dados que serão analisados na
próxima seção.
5.4 NÍVEIS DE PARTICIPAÇÃO POLÍTICA
Os estudos sobre participação política mostram que há uma mobilização para o voto,
uma das mais clássicas formas de participação e expressão política. Ainda que o voto não
fosse obrigatório, 58% dos entrevistados afirmam que votariam nas próximas eleições.
Contudo, os índices de participação política no município de Toledo são bastante baixos,
158
refletindo a desconfiança e a insatisfação dos cidadãos em relação ao desempenho do regime
democrático, como mostra o Gráfico a seguir.
Gráfico 14
Participação Política e Social em Toledo (%)
Você tem o hábito de participar de:
69
26
13
8
7
6
5
0 1020304050607080
Associações de Moradores
Partidos Políticos
Greves
Manifestações Públicas
Sindicatos
Abaixo-Assinados
Igrejas
n = 300
Fonte: Pesquisa Comportamento Político e Decisão Eleitoral, Toledo, 2002
Embora a região Oeste paranaense tenha sido palco de significativas mobilizações no
final dos anos 1970 e início dos anos 1980, pode-se depreender dos dados apresentados no
Gráfico 14 que há pouca predisposição dos cidadãos toledanos para participar, tanto em
atividades políticas consideradas convencionais (partidos políticos e campanhas eleitorais),
como daquelas de caráter reivindicatório, como protestos e manifestações públicas,
consideradas não convencionais. Cabe destacar que em 1983 foi constituído o Conselho
Comunitário de Toledo, integrado por representantes de associação de moradores e amigos de
bairro, partidos políticos e entidades sociais e profissionais, além de autoridades ligadas ao
Poder Executivo, Legislativo e Judiciário. Um dos objetivos era contribuir para uma proposta
orçamentária do Município e na estruturação de uma administração pública aberta e
participativa (SILVA; BRAGAGNOLLO e MACIEL, 1988). Contudo, observa-se nos dados
do Gráfico 14 que, atualmente, apenas 5% dos entrevistados participam de associações de
moradores e 6% de partidos políticos.
159
Entre os novos espaços de participação, estão os conselhos gestores municipais, cujo
objetivo é a descentralização político-decisória na formulação de políticas públicas, controle,
gestão e transparência nas ações. No município de Toledo existem 12 conselhos ativos: de
saúde, da comissão do trabalho, da assistência social, do Fundef, do trânsito, do
desenvolvimento rural, tutelar, dos direitos da criança e do adolescente, da alimentação
escolar, Paraná 12 meses, do meio ambiente, e comunitário de segurança. Estudos sobre os
conselhos na região Oeste paranaense mostram que o funcionamento do conselho municipal
de assistência social em Toledo é recente e, portanto, a participação é ainda bastante
incipiente. Trata-se de “uma outra modalidade de organização de relações políticas que, em
menos de uma década, gerou um novo ciclo de aprendizagem responsável pelas mudanças no
movimento de proposição e de definição da Política de Assistência Social” (BIDARRA,
2004).
O levantamento realizado no município, em 1956, já apontava o parco envolvimento
político dos cidadãos nas decisões de interesse público
20
. Os toledanos atribuíram, na ocasião,
a responsabilidade dos problemas sociais às lideranças locais, revelando pouca predisposição
para participar das decisões políticas.
A conclusão a que se chega, pelas respostas dadas, com respeito aos
problemas da comunidade e sua resolução, é de que o povo está interessado
neles, mas acha que as autoridades constituídas e os líderes reconhecidos são
os responsáveis pela iniciativa das ações. Uma vez dado o impulso inicial,
acham que devem participar dos trabalhos, se necessário. Interagem sempre
dentro do princípio de seguir um líder (OBERG, p. 113).
Nazzari (2002) atribui a baixa participação política dos paranaenses, especialmente
dos adolescentes, à cultura política personalista e autoritária que se configurou no Estado.
Segundo a autora, os paranaenses são pouco orientados e motivados para atitudes
20
Na pesquisa realizada por OBERG (1960) no município de Toledo, foi selecionada uma amostra sistemática
de 18 segmentos urbanos, 9 suburbanos e 10 segmentos na zona rural, num total de 1024 pessoas.
160
participativas pelas estruturas socializadoras (escola e família), que restringem e limitam a
participação dos adolescentes nos processos de decisão. A análise histórica do Oeste do
Paraná mostra que, desde cedo, os paranaenses convivem com relações paternalistas e
exercem atividades políticas por meio de relações pessoais e de troca de favores.
A respeito dessa temática, Baquero e Prá (1995) analisam os padrões de participação
política e verificam que há relativa participação dos cidadãos nas atividades políticas
tradicionais: votar em eleições, pertencer a um partido político, discutir política. Entretanto,
em relação às atividades políticas “não convencionais”, como protestos, passeatas,
manifestos, os níveis de participação política revelam-se baixos. Os autores classificam a
ausência de participação política em quatro categorias: 1) apatia ou falta de interesse pela
política; 2) cinismo ou suspeita em relação à política; 3) alienação e indiferença em relação à
política; e 4) anomia ou perda de valores e de vontade de participar.
O pressuposto é de que quanto maior a participação política, maior a probabilidade de
se efetivar uma política que garanta direitos de cidadania, oportunidades de trabalho e renda,
melhoria da qualidade de vida e eqüidade social. Participar é uma forma de exercer os direitos
sociais e políticos garantidos pela Constituição. Segundo Relatório divulgado pela Rede
Interamericana para a Democracia,
participar es ser parte, tener parte, tomar parte, y esto implica tres
condiciones básicas: involucramiento, compromiso y sentido de identidad.
La participación tiene como fin influir, pero influir en los procesos de toma
de decisiones que de alguna manera se vinculan con los intereses de los
participantes y los recursos que la sociedad dispone para ello (RID, 2005).
A participação ativa dos cidadãos nos processos políticos, sociais e comunitários
configura-se numa participação cidadã e tem como objetivo influenciar as decisões que
contemplem os interesses sociais e o exercício da cidadania.
O Índice de Participação Cidadã é um instrumento orientado à avaliação periódica e
sistemática dos níveis de participação na América Latina, e elaborado a partir de três
161
indicadores: 1) participação direta, através dos canais formais e informais da política,
incluindo partidos políticos, reuniões políticas, entidades sindicais, religiosas e comunitárias;
2) participação através da opinião pública, que envolve envio de artigos ou cartas a meios de
comunicação a fim de expressar opiniões e reivindicações, fazer denúncias ou tentar
solucionar problemas individuais ou coletivos; e 3) participação eleitoral, avaliada pela
predisposição dos cidadãos a participar de eleições e referendos, de partidos políticos e
audiências públicas
21
.
Estudos mostram que as motivações e atitudes dos eleitores estão diretamente
relacionadas com a intensidade da participação política. O argumento de Putnam (2002) é de
que o funcionamento da democracia é condicionado pela existência de vida associativa,
pautada na confiança interpessoal, interesse político e participação política dos cidadãos. A
participação política nas regiões de baixa vida associativa é permeada pela prática do
clientelismo e do personalismo, e não por compromissos programáticos.
Dentro desse marco de análise, situam-se autores que argumentam que o declínio da
participação tradicional e o aumento da desconfiança nas instituições políticas não devem ser
vistos como uma ameaça à estabilidade democrática, pois não têm necessariamente um efeito
negativo no sistema político. Os baixos índices de participação política verificados nas
sociedades contemporâneas são decorrentes dos processos de pós-modernização e
conseqüente transformação global e estrutural dos padrões dos valores nas sociedades
ocidentais, que têm contribuído para o surgimento de cidadãos mais críticos e abertos às
novas formas de participação política. Para esses autores, a institucionalização de valores pós-
materialistas e a ampliação do repertório de participação política são fundamentais para o
fortalecimento da democracia (INGLEHART, 1988; STOLLE e HOOGHE, 2004;).
21
De acordo com o Relatório Regional, divulgado em setembro de 2005, o Índice de Participação Cidadã (IPC)
para a região foi de 5,1%, calculado a partir dos indicadores de participação eleitoral (7,9%), de participação
opinativa (3,1%) e de participação direta (4,0%).
162
Abordagens dessa natureza se distanciam um pouco da realidade brasileira, cujos
valores pós-materialistas estão longe de se efetivar. Por sua vez, o declínio da participação e o
aumento do ceticismo, no caso do Brasil, constituem ameaça à estabilidade democrática.
Diante da expansão da pobreza e das desigualdades sociais, associada a uma crise política
vivenciada pelo país, vem ocorrendo um processo de desconsolidação democrática e de
desinstitucionalização dos direitos, impossibilitando a construção de uma cidadania
participativa. O ceticismo e o afastamento dos cidadãos da esfera da política comprometem
atitudes e comportamentos favoráveis à participação, cooperação, confiança interpessoal e de
apoio ao regime democrático. As crescentes desigualdades sociais indicam a necessidade de
se efetivar uma política que garanta oportunidades de trabalho e renda, melhoria da qualidade
de vida e eqüidade social.
Trazendo essa discussão para o município de Toledo observa-se que, apesar dos
baixos índices, os toledanos consideram importante a participação da população nas decisões
políticas. Dessa forma, entender a baixa participação política dos cidadãos envolve
compreender as crenças e valores em relação à política e às instituições democráticas e os
motivos para os baixos estoques de capital social.
A pesquisa qualitativa revela que a maioria dos entrevistados defende que os cidadãos
deveriam participar mais dos conselhos, das associações e grupos sociais existentes no
município, além de participar das audiências públicas e das sessões semanais da Câmara
Municipal. Uma eleitora argumenta que nos anos 1980 houve um momento de maior
participação em Toledo.
Acho que até um tempo atrás a gente via uma participação maior das
pessoas. (....) Na década de 80 aqui mesmo em Toledo você tinha um
processo de participação popular bastante importante, com a criação de
associações de moradores e sindicatos, e outras entidades de mulheres,
inclusive, e havia até um Conselho Comunitário que discutia questões
relativas ao município, a questão do orçamento participativo, que já tinha
isso aqui, então tudo isso se perdeu... Se você procurar hoje aqui sindicatos,
entidades, associações de moradores, que praticamente poucas funcionam, e
163
que as pessoas vão e discutem as coisas, se mobilizam, então,
enfraquecimento meio geral. A participação perdeu bastante. (Entrevista
com eleitora de Toledo, 47 anos, concedida em maio de 2006).
Tais comentários servem para ilustrar a discussão teórica até aqui desenvolvida sobre a
participação política. O argumento de um vereador explicita também os motivos para a baixa
participação dos toledanos.
A população, infelizmente, eu não sei se por descrédito da própria política,
que infelizmente escândalos, escândalos, a população parece, podia ser o
contrário, cada vez menos tem participado.A exemplo a gente faz audiência,
vai numa reunião, é pouca a participação do povo, quando é um tema
específico ela aparece, mas para discutir liberdade, democracia, discutir
direitos das pessoas, a gente vê que poucas vezes ela deixa de sair da frente
da televisão para ir discutir esses assuntos. (...) Como envolver as pessoas
para saírem as ruas para pressionar os governos pra ter melhor educação, por
exemplo? Mais creche para mulheres irem trabalhar, a questão do emprego,
então eu diria que a educação hoje é o primordial, mas a falta de
participação... eu não sei se tudo o que está aí leva a essa descrença, isso já
não é feito dessa forma para que não haja mobilização e aí para se manejar
tudo... (Entrevista com vereador do PMDB, em maio de 2006).
A perspectiva aqui adotada defende que a participação da população constitui um
pressuposto decisivo para o fortalecimento das instituições democráticas e das organizações
sociais, que propiciam à população possibilidades de se pronunciar e de ser incluída nos
processos políticos. Torna-se necessário buscar formas alternativas de participação política,
com objetivo de alcançar uma cidadania ativa e efetiva.
Esta seção buscou identificar a maneira como os cidadãos percebem o funcionamento
da democracia e como atuam em relação aos canais de participação política. O conjunto de
dados examinados evidenciou uma predisposição positiva entre os cidadãos para participar,
especialmente dos canais informais da política. No entanto, em termos comportamentais foi
constatada uma baixa participação, o que assinala uma cultura política marcada pela
incongruência entre as atitudes e o comportamento político. Os resultados apresentados pela
pesquisa alertam para um quadro de baixa participação política e de insatisfação com o
desempenho governamental.
164
Um dos desafios da democracia brasileira consiste em solidificar um sistema político
pautado no desenvolvimento de uma cidadania política e social e consolidar uma cultura
política democrática, baseada na participação, na confiança recíproca e na solidariedade
social. Trata-se de resgatar os cidadãos para a esfera da política, incentivando-os a participar e
a fiscalizar as ações governamentais, de maneira a contribuir para uma melhor qualidade da
democracia. Para avaliar se os cidadãos toledanos estão aptos para esta tarefa cívica, o
próximo capítulo examina o seu comportamento eleitoral.
165
6 COMPORTAMENTO POLÍTICO E DECISÃO ELEITORAL
Os primeiros estudos sobre comportamento eleitoral no Brasil se inserem dentro da
perspectiva sociológica, cuja suposição básica é a de que os fatores socioeconômicos e a
posição que os indivíduos ocupam na estrutura social influenciam na decisão do voto. De fato,
são fatores importantes a serem considerados. Contudo, não suficientes para explicar o
comportamento eleitoral. A vertente psicossociológica propõe ampliar essa abordagem,
introduzindo na análise aspectos psicológicos, tais como as percepções, valores, crenças e
atitudes dos indivíduos. O principal argumento dessa corrente é o de que as preferências
partidárias se dão a partir de laços afetivos e ideológicos, e não necessariamente a partir das
interações sociais ou da racionalidade das escolhas eleitorais. Diante do fato de que não há um
único fator a influenciar o voto, mas um conjunto de variáveis que deve ser levado em conta,
tais estudos revelam a importância de uma análise sinérgica no estudo do comportamento
político dos cidadãos.
Utilizando-se de dados das pesquisas quantitativa e qualitativa, este capítulo tem por
objetivo analisar o comportamento político e a decisão eleitoral dos toledanos. Divide-se em
três seções. A primeira discute os principais fatores na escolha eleitoral. Verifica-se que os
dados da pesquisa realizada em Toledo corroboram dados de pesquisas nacionais, no tocante
ao voto personalista. Na segunda seção, consideram-se os aspectos relativos à preferência
partidária e sua relação com a intenção de voto expressa pelo eleitor. Os dados revelam uma
incoerência entre a intenção de voto e a preferência partidária expressas pelos eleitores, e um
conhecimento limitado sobre os interesses defendidos pelos candidatos. Por fim, na terceira
seção, discute-se a lógica do comportamento eleitoral em Toledo, a partir da verificação das
hipóteses propostas nesse trabalho.
166
6.1 FATORES NA ESCOLHA ELEITORAL
As democracias contemporâneas vivenciam um processo de personalização da
política, com impactos diferenciados em cada contexto. Trata-se de um fenômeno presente em
sistemas políticos institucionalizados e pouco institucionalizados, cujas personalidades,
independentemente de partidos e preferências programáticas, têm uma influência considerável
nas campanhas eleitorais. De acordo com pesquisas realizadas na América Latina, nos últimos
anos, cerca de 70% dos eleitores votam na pessoa do candidato, não se baseando em critérios
objetivos, como a plataforma do partido político ou as propostas dos candidatos. Dessa forma,
a identificação partidária ocorre muito mais em função da relação que se estabelece entre
candidatos e eleitores do que propriamente de uma identificação com as propostas dos
partidos (BAQUERO, 2000).
Pontualmente, no caso do Brasil, a explicação para o personalismo político deve ser
buscada na história e nos elementos da cultura política brasileira, responsáveis pela
configuração do sistema de crenças da sociedade, entendido aqui como um conjunto de idéias
e atitudes que influenciam o processo político decisório. Na avaliação de Borba (2005),
compreender a cultura política e os impactos da ideologia autoritária no Brasil permite uma
análise mais profunda do comportamento político e eleitoral. Segundo o autor, “a conjugação
de cidadãos pouco sofisticados com a constante difusão de ideologias antidemocráticas foi o
elemento central da formação da cultura política brasileira, permitindo que o personalismo
constituísse a base histórica de estruturação do comportamento eleitoral” (BORBA, 2005, p.
164). A cultura política brasileira tem sido, portanto, marcada por elementos tradicionais
como o personalismo, o clientelismo, o patrimonialismo e o populismo.
Em seu trabalho sobre o populismo, Weffort (1989) analisa o fenômeno sob três
prismas: como expressão do poder político no período Vargas, como expressão das
167
debilidades das instituições políticas e como expressão da emergência de classes populares no
jogo político. De acordo com o autor, a
opção eleitoral tem sido decisiva como meio de expressão, embora não
envolva de modo profundo o conjunto da personalidade social e política do
eleitor enquanto membro de uma classe. Pelo contrário, na ausência de
partidos eficientes, o sufrágio tende a transformar a relação política numa
relação de indivíduos (WEFFORT, 1989, p. 19).
Tratava-se de uma expressão política popular individualizada através do sufrágio,
revelando duas características da política brasileira: a hipertrofia dos executivos e o elevado
grau de personalização do poder governamental. O populismo expressava, portanto, um
Estado forte e personalista, aliado a uma legislação social e liderança carismática. Para
Weffort (1989), o populismo foi o produto de um longo processo de transformação da
sociedade brasileira que se apresentava como estilo de governo e política de massas.
Nesse período, a política estadual do Paraná, reflexo da política nacional, configura-se
a partir da nacionalização dos partidos políticos, tendo como tônica a personificação do poder.
Em estudo sobre o personalismo político nos anos 50, Codato (2006) mostra que as
características personalistas no Paraná indicam os limites da institucionalização da
participação política. A participação “de cima para baixo” será a condição histórica da política
populista. De acordo com o autor,
A expectativa dos segmentos sociais que optaram pelas terras paranaenses
para estabelecerem seus negócios, ligaram-se à agricultura, direta ou
indiretamente. Os interesses vinculados à agricultura tiveram que se
organizar para ver garantido o direito à legitimação da propriedade da terra.
O acesso à estrutura administrativa do Estado – secretarias, diretorias, etc –
se deu a partir da existência dela em localidades fora da capital, onde já
estavam estabelecidas as ramificações da rede de poder legislativo e
judiciário, seja nos diretórios dos partidos políticos ou nas instâncias
judiciais maiores ou menores, como as delegacias da polícia civil. O que
aconteceu nas pequenas localidades muito distantes da capital e com
pouquíssima infra-estrutura é que o cidadão comum, necessariamente ou via
de regra, ficou dependente da rede pessoal do governador, instalada e
adaptada segundo o partido e os coligados da ocasião (CODATO, 2006).
168
A participação política encontrava-se associada à emergência dos planos sociais e
econômicos do Estado, e a sua institucionalização tornava-se frágil diante do político
personalista. O poder personalizado, sobrepondo-se à representação partidária e contrapondo-
se à democracia, influenciou a configuração da cultura política paranaense.
Na mesma linha de argumentação, Nazzari (2002, p. 91) aponta que a “estrutura
estatal centralizadora inviabilizou a institucionalização dos partidos que, operavam de
maneira dispersa e sem legitimidade no seu papel de instituição política e, estimulou o
clientelismo, a deslealdade e o populismo como orientação política”. De certo modo, o
(neo)populismo continua presente na política brasileira, pois preserva resquícios da
dependência de lideranças fortes e ausência de instituições que de fato representem os
interesses sociais de maneira universal, e não particularista e personalista.
Pesquisas realizadas no município de Toledo em 2002, de cunho quantitativo, e em
2006, de cunho qualitativo, mostram que a escolha eleitoral no Oeste do Paraná ocorre muito
mais pela identificação com a pessoa do candidato do que pela preferência partidária ou
programática. O Gráfico 15 ilustra este fenômeno.
Gráfico 15
Decisão do Voto em Toledo (%)
64
28
5
3
0
20
40
60
80
Identificacão com o
candidato
Identificacão com o
programa
Resultados de
pesquisas eleitorais
Identificacão com o
partido
n = 293
Fonte: Pesquisa Comportamento Político e Decisão Eleitoral, Toledo, 2002.
169
Depreende-se dos dados do Gráfico 15 que 64% dos entrevistados decidem o seu voto
guiados pela identificação direta com o candidato, ao passo que 28% dos respondentes
decidem seu voto pela identificação com o programa e apenas 3%, pela identificação com o
partido político. Tal constatação é reforçada pela fala de um vereador, que salienta ser a
pessoa do candidato um dos fatores que mais pesam na escolha eleitoral no município:
Eu vou falar por mim, que sou vereador aqui em Toledo, eu nasci e me criei
no meio das comunidades, das associações de bairro, entidades como escola,
igreja, essas coisas, né?. Então as pessoas vão porque me conhecem, o meu
trabalho, não pelo meu partido, muitos nem querem saber qual é meu
partido. Então as pessoas ainda votam, estão votando pela pessoa. Mas aí
você vai pros países mais desenvolvidos, mais... com partidos políticos mais
sérios, tem menos partidos e as pessoas votam no partido, né? Porque sabem
que os partidos vão escolher depois as pessoas certas para administrar o setor
pelo qual estão se candidatando, né? (Entrevista com vereador do PP,
concedida em maio de 2006).
Os estudos e pesquisas analisados nesta tese, a respeito da participação política no
Brasil, constataram que não há uma tradição de votar nos partidos políticos. A conseqüência,
portanto, é um personalismo predominante na dinâmica política brasileira que se reproduz ao
longo dos anos. Estudo desenvolvido por David Samuels (1997) mostra que o próprio sistema
eleitoral brasileiro gera incentivos para o personalismo na competição por votos, ao mesmo
tempo em que oferece estratégias de valorização da legenda partidária. O autor analisa o
incentivo ao individualismo e ao clientelismo, a partir da representação proporcional de listas
abertas, presente no formato institucional do sistema eleitoral.
O depoimento do presidente do Sindicato Rural de Toledo ilustra essa argumentação,
ao atribuir o predomínio do voto personalista às fragilidades do sistema partidário e às
práticas clientelistas presentes na região.
Aqui nós ainda avaliamos a pessoa. Aqui nós não temos partidos ainda com
uma linha de pensamento. A gente vê claramente em todas as eleições que
passaram, a pessoa que se elege, às vezes, na oposição, depois ele já passa
apoiando o governo para ter os benefícios pra se reeleger de novo. Então
ainda nós não temos partidos com idéias fixas e representantes desse partido
que realmente fazem o que foi prometido em campanha. E outro fator que eu
170
acho lamentável, é a população que ainda fica esperando Papai Noel. Acha
que um candidato vai se eleger e resolver o problema dele. Então eu vou
votar para tal pessoa porque ele vai me ajudar nisso, vai me ajudar naquilo.
Isso, não tem como acontecer. O governo vai ter que fazer leis que atenda a
toda população e não a uma pessoa. Então, muitos votam achando que vai ter
benefícios próprios e depois se decepciona com o candidato porque ele não
vai cumprir, mas é muito claro que ele não vai cumprir (Entrevista com
presidente do Sindicato Rural, concedida em maio de 2006).
Os vínculos personalistas entre eleitores e candidatos tendem a ser mais fortes onde as
raízes partidárias na sociedade são mais fracas. Em sistemas fluidos, os partidos possuem
recursos precários e, muitas vezes, representam veículos personalistas. Observa-se, desse
modo, um personalismo persistente na dinâmica política paranaense que se reforça
mutuamente entre representantes e representados. Os baixos níveis de confiança nas
instituições políticas, a escolha eleitoral pautada em atributos pessoais dos candidatos e a
baixa participação política fortalecem o personalismo, que se mantém predominante nos
processos políticos decisórios.
Estudos realizados na década de 1980, no Sul do país, captaram o personalismo como
o elemento catalisador do voto nas eleições de 1982 em Porto Alegre (SILVA, 1984). De
acordo com a referida pesquisa, 65% dos entrevistados declararam ser a pessoa do candidato o
fator mais importante na decisão do voto. Apenas 28% afirmaram sua orientação pelo partido.
A análise dos dados mostra que em todas as variáveis sócio-demográficas (sexo, idade,
escolaridade e renda) há uma orientação personalista do voto, apenas sugerindo que, na
medida que a renda aumenta, ocorre uma tendência a considerar o partido mais importante.
Independentemente das condições socioeconômicas, o eleitorado encontra na figura do
candidato o critério básico na determinação do voto.
Esse fato reforça a importância da imagem e das características pessoais dos
candidatos na escolha eleitoral. A esse respeito, Carreirão (2002) propõe um modelo
explicativo do voto a partir de quatro variáveis: as imagens políticas dos candidatos; a
avaliação do desempenho do governo; a avaliação das características pessoais dos candidatos
171
e o grau de escolaridade do eleitor, tomado como indicador de sofisticação política. A
imagem política está relacionada aos interesses sociais que o eleitor julga que os candidatos
defendem, sendo construída pelos meios de comunicação e pelo marketing político. Com
relação à avaliação de desempenho, o autor mostra que o eleitor tende a votar no candidato do
governo quando a economia dá indicativos de estabilidade. No que se refere à avaliação das
qualidades pessoais dos candidatos, o eleitor baseia-se numa avaliação retrospectiva,
valorizando os atributos pessoais como experiência, honestidade e credibilidade, como mostra
o Gráfico 16.
Gráfico 16
Principais fatores na escolha eleitoral (%)
56
16
11
11
6
0
10
20
30
40
50
60
Competência Experiência Honestidade Cumprir
promessas
Outros
N = 287
Fonte: Pesquisa Comportamento Político e Decisão Eleitoral, Toledo, 2002.
Na pesquisa realizada em Toledo, foi solicitado aos respondentes que elencassem os
principais fatores na escolha eleitoral. Os dados do Gráfico 16 indicam que, para 56% dos
entrevistados, a competência é o fator mais importante da escolha eleitoral. Essa competência
é avaliada, muitas vezes, pela experiência que o candidato tem no campo da política (16%).
Outros dois atributos citados dizem respeito à honestidade e ao cumprimento de promessas
(11%).
172
Nessa linha de estudos, pesquisa realizada no Rio Grande do Sul mostra que as
orientações dos eleitores tornaram-se mais pragmáticas e menos ideológicas na escolha dos
candidatos. A decisão do voto tem se pautado mais numa avaliação da administração e dos
atributos pessoais dos candidatos como honestidade, competência e capacidade
administrativa. Baquero (1997) argumenta que o crescimento do Partido dos Trabalhadores
(PT) nas eleições de 1996, em Porto Alegre, por exemplo, não significou um realinhamento
ideológico ou partidário, mas um novo padrão de comportamento eleitoral, a partir de critérios
pragmáticos e estratégicos. A disseminação do voto baseado nas características pessoais dos
candidatos revela a força do personalismo e a fraqueza das instituições partidárias. Quando
não há laços entre eleitores e partidos, construídos por vínculos programáticos ou ideológicos,
a personalidade dos candidatos tem fundamental importância na escolha eleitoral. Na seção
seguinte, analisam-se aspectos relativos à preferência partidária, relacionando-a com a
intenção de voto expressa pelo eleitor.
6.2 PREFERÊNCIA PARTIDÁRIA E MOTIVAÇÃO PARA O VOTO
Do ponto de vista institucional, as instituições políticas são chave no processo de
mediação política. Contudo, os partidos políticos, que tradicionalmente apresentavam-se
como organizações políticas catalisadoras da participação e estabeleciam uma conexão entre
cidadãos e sistema político, estão sendo confrontados pelo rápido declínio da identificação
partidária em diversos países. Esta tendência antipartidária e antiparticipativa contribui para
debilitar a legitimidade dos partidos como canais de participação e de representação. De
acordo com Águila (2004), esse fato remete à compreensão que se tem de democracia: “um
conjunto de instituições e mecanismos que garantem a cada indivíduo a possibilidade de
173
realizar seus interesses sem interferência ou com o mínimo de interferência possível”. Dessa
forma, os partidos políticos seriam máquinas, não de participação, mas de articulação e
agregação de interesses.
Numa outra linha de argumentação, Mônica Castro (1994), em sua pesquisa sobre o
comportamento eleitoral, constatou que as opiniões e a intenção de voto dos eleitores se
relacionam diretamente com suas escolhas eleitorais e com sua preferência partidária.
Aplicando questões semelhantes na pesquisa em Toledo, e cruzando as variáveis “preferência
partidária” e “intenção de voto para governador”, foram obtidos resultados diferentes dos da
pesquisa de Castro. Os dados fornecem evidências de uma identificação partidária incipiente,
fruto de uma relação entre eleitores e candidatos, e não necessariamente de uma identificação
partidária e ideológica.
Tabela 6
Preferência Partidária em Toledo
Preferência Partidária n %
PT 76 25,3
PMDB 29 9,7
PDT 27 9,0
PSDB 24 8,0
PPB 6 2,0
PTB 6 2,0
PFL 5 1,7
PPS 4 1,3
Outros (PDC, PL, PRN, PSB, PSD, PSTU) 11 3,4
Não tem preferência 112 37,3
Total 300 100
Fonte: Pesquisa Comportamento Político e Decisão Eleitoral, Toledo, 2002.
De acordo com a Tabela 6, 63% dos entrevistados expressaram ter preferência por
algum partido político. O maior percentual foi para o Partido dos Trabalhadores (PT), com
25%. Contudo, essa preferência não se expressa em votos para o partido no município, que na
174
ocasião tinha apenas dois vereadores na Câmara Municipal. Por outro lado, o PPB (atual PP),
partido que se mantém na prefeitura por três administrações seguidas, recebe 2% da
preferência do eleitor. Isso revela que o voto conservador tende a ser mais individualista e em
função da pessoa do candidato, e não necessariamente do partido ao qual ele está vinculado.
Essa incoerência se repetirá nas eleições para o governo do Estado, quando analisadas as
intenções de voto em relação à preferência partidária.
Gráfico 17
Intenção de Voto para Governador (estimulada) %
24
4
0,7
0,4
54
12
0,4 0,4
5
0
10
20
30
40
50
60
Álvaro Dias - PDT
Roberto Requião - PMDB
Roque Zimmermann - PT
Carlos Alberto Richa - PSDB
Rubens Bueno - PPS
Benedito da Silva - PMN
Achiles Batista - PTC
Giovani Gionedis - PSC
Voto Nulo/Branco
n = 257
Fonte: Pesquisa Comportamento Político e Decisão Eleitoral, Toledo, 2002.
Observa-se, nos dados do Gráfico 17, que Álvaro Dias, candidato pelo PDT, estava à
frente na preferência do eleitorado toledano nas eleições em 2002. As pesquisas de opinião
divulgadas pela mídia indicavam a vitória do candidato para diversos municípios do Paraná.
No segundo turno, Roberto Requião, candidato pelo PMDB, assume um forte discurso de
oposição, tanto no plano estadual quanto federal. Decidiu declarar apoio à candidatura de Lula
à presidência da República, desde o primeiro turno, à revelia do PMDB, que estava apoiando
José Serra, candidato do PSDB, o que contribuiu para que subisse nas pesquisas de opinião.
175
Tabela 7
RESULTADO DAS ELEIÇÕES PARA GOVERNADOR
Apuração Final em Toledo
Candidato Votação % comparec. % válidos
15 ROBERTO REQUIÃO 27.956 48,78% 54,05%
12 ALVARO DIAS 23.762 41,47% 45,95%
VOTOS EM BRANCO 1.213 2,12% 2,35%
VOTOS NULOS 4.375 7,63% 8,46%
Fonte: Tribunal Superior Eleitoral, Tribunal Regional Eleitoral - PR
No primeiro turno das eleições, Álvaro Dias alcançou 1.615.954 votos (31%) contra
1.347.289 de Roberto Requião (26%). No segundo turno, Requião venceu no Estado com
2.681.811 sufrágios (55%) contra 2.180.922 de Álvaro Dias (45%). Conforme dados da
Tabela 7, no município de Toledo, Requião venceu com 54% dos votos válidos, contrariando
pesquisas de opinião pública realizadas na região. As intenções de voto no momento da
pesquisa foram muito distintas do resultado eleitoral. Em sua trajetória política, Roberto
Requião sempre foi partidário do PMDB. Elegeu-se para deputado estadual em 1981 e em
1985 elegeu-se prefeito de Curitiba. Em 1991 sucedeu Álvaro Dias no governo do Estado e
em 1994 se elegeu senador. Nas eleições de outubro de 2006, reelegeu-se ao governo do
Estado do Paraná.
176
Tabela 8
Preferência Partidária x Intenção de Voto para Governador (%)
Álvaro Dias
(PDT)
Roberto Requião
(PMDB)
Padre Roque
(PT)
Outros Total
PDT 69% [18] 19% [5] 8% [2] 4% [1] 100%
PMDB 45% [13] 41% [12] 7% [2] 7% [2] 100%
PT 41% [29] 22% [15] 30% [21] 7% [5] 100%
Sem Preferência
Partidária
59% [78] 22% [29] 5% [6] 14% [19] 100%
n = 257 – χ
2
=38,646 / p. < .01, .05
22
Fonte: Pesquisa Comportamento Político e Decisão Eleitoral, Toledo, 2002.
Os dados da Tabela 8 mostram que o cruzamento das variáveis “preferência
partidária” e “intenção de voto” evidencia incoerências entre o partido de escolha do eleitor e
a sua intenção de voto. Verifica-se que, dentre aqueles que declararam preferência partidária
pelo PDT, 69% votariam em Álvaro Dias, candidato do PDT na ocasião. Dos demais, 19%
votariam em Requião e 8%, em Padre Roque. Esse dado mostra certa coerência entre
preferência partidária e voto. Entretanto, entre aqueles que declararam preferência pelo
PMDB, 41% votariam em Requião, candidato do PMDB, 45% votariam em Álvaro Dias e
7%, em Padre Roque. Por sua vez, aqueles que declararam preferência pelo PT, apenas 30%
votariam em Padre Roque, candidato do partido. Os demais, 41% votariam em Álvaro Dias e
21% em Requião. Esse dado revela uma maior inconsistência entre identificação partidária e
intenção de voto. Com relação àqueles sem preferência partidária, 59% declararam votar em
Álvaro Dias e 22% em Requião, ambos candidatos finalistas para o 2
o
Turno das eleições.
Observa-se que a identificação partidária não é um bom preditor do voto em Toledo, nem
mesmo para aqueles que manifestaram preferência por algum partido.
22
O teste do Qui-quadrado ( χ
2
) é o teste estatístico que permite testar a significância da associação entre duas
variáveis qualitativas. Ele mede a distância entre as freqüências observadas e as freqüências esperadas. O nível
de significância (p) quando menor que 0.01 e 0.05, indica forte associação entre as variáveis.
177
A análise de Sartori (1982) pode elucidar essa questão. O autor distingue três
conceitos na explicação da escolha eleitoral: voto por questão, voto por identificação
partidária e voto por imagem. Os partidos aparecem associados a um conjunto de questões
(issues), e o voto, nesse caso, se dá pela identificação com propostas relacionadas com os
programas partidários. A identificação partidária pode ser considerada forte ou fraca. Será
forte quando eleitores votam sempre no mesmo candidato ou partido, e fraca quando eleitores
mudam sua opção com mais freqüência, são mais instáveis em suas escolhas. As imagens
partidárias, diferentemente da identificação partidária, são as representações que os eleitores
têm dos partidos políticos e de conceitos como “esquerda” e “direita”, que descrevem
abstrações da ideologia política. Pode acontecer de várias pessoas se identificarem com o
mesmo partido, e suas representações sobre ele serem diferentes (SARTORI, 1982).
A contribuição de Sartori (1982) para a análise do caso brasileiro é o voto por imagem,
que, a despeito da desestruturação cognitiva do eleitorado, é explicativo da dinâmica
partidária. Estudos mostram que os issues não são fatores explicativos para o voto no contexto
brasileiro, da mesma forma que a identificação partidária não se constitui numa variável
explicativa para a decisão da maioria do eleitorado. A pesquisa de Castro (1994) verifica que
o voto baseado na imagem difusa de um partido não representa um voto ideológico nem
partidário. De acordo com a autora,
O voto de parte substancial dos setores populares urbanos, ao se basear em
imagens vagas dos partidos e candidatos, pode ser ainda interpretado como
um voto personalista, não partidário, de apoio a líderes carismáticos; pode
expressar a persistência da mobilização de tipo populista, que é considerada
manipulação das massas pelos líderes políticos e forma não-ideológica de
manifestação das aspirações populares (CASTRO, 1994, p. 100).
No que diz respeito à imagem dos candidatos e à opção eleitoral, Castro (1994) mostra
que quanto maior o grau de sofisticação política do eleitorado, maior a percepção e o
178
conhecimento que se tem dos interesses defendidos pelos candidatos. Assim, argumenta a
autora:
Sofisticação política implica percepção de contraste maior entre os
candidatos, em termos dos interesses sociais que eles estariam defendendo.
Entre os eleitores politicamente sofisticados, Lula e Brizola eram percebidos
como do lado dos pobres e dos trabalhadores, Covas como o candidato do
centro e Collor e Afif como do lado dos ricos e da elite. Sofisticação baixa
implica mais dificuldade para localizar os candidatos, ou uma imagem
distorcida, do ponto de vista do eleitor informado, da posição dos candidatos
(CASTRO, 1994, p. 202).
De acordo com a referida autora, quanto menor o grau de sofisticação política, maior a
probabilidade de os eleitores localizarem de forma equivocada as posições dos candidatos.
Pontualmente, no caso do município de Toledo, a pesquisa procurou investigar se a imagem
que os eleitores têm dos candidatos relaciona-se aos interesses sociais que eles defendem e
representam. Quando indagados sobre quais os interesses que cada candidato defende, chama
a atenção o elevado percentual de respostas “Não Sabe”, especialmente em relação ao
candidato do PT, como observado na Tabela 9.
Tabela 9
Interesse por política x Conhecimento sobre interesses defendidos pelos candidatos
Interesses defendidos pelos candidatos
23
(%)
Álvaro Dias (PDT) Roberto Requião (PMDB) Padre Roque (PT)
Interesse
por
Política
Respondeu
à questão
Não
Sabe
Total Respondeu
à questão
Não
Sabe
Total Respondeu
à questão
Não
Sabe
Total
Baixo 68 32 100 56 44 100 24 76 100
Médio 81 19 100 66 34 100 35 65 100
Alto 81 19 100 75 25 100 48 52 100
n = 300 – Níveis de significância p <.05
Fonte: Pesquisa Comportamento Político e Decisão Eleitoral, Toledo, 2002.
23
A pergunta foi a seguinte: P20. Quais os interesses que os candidatos ao governo do Estado do Paraná
defendem em suas propostas? (Marcar apenas uma opção): “Dos trabalhadores”, “Dos grandes empresários”,
“dos grandes proprietários rurais”, “Interesses próprios”, “Dos pequenos agricultores”, “Outros”, “Não Sabe”.
179
Os dados da Tabela 9 revelam que, quanto mais baixo o interesse por política, maior o
percentual de respostas “Não Sabe”. Verifica-se que, entre os eleitores de baixo interesse por
política, 76% alegam desconhecer quais os interesses defendidos por Padre Roque, candidato
do PT nas eleições de 2002 ao governo do Estado, ao passo que 44% desconhecem os
interesses defendidos por Requião, candidato do PMDB, e 32% afirmam não saber quais os
interesses defendidos por Álvaro Dias, candidato pelo PDT. Se, por um lado, os eleitores
argumentam que a honestidade, a competência, a experiência e o cumprimento de promessas
são fatores importantes na escolha eleitoral, por outro lado, mostram desconhecimento dos
interesses defendidos pelos candidatos em questão.
Os dados indicam que a maior parte dos entrevistados não tem informações suficientes
sobre os interesses e as posições políticas defendidas pelos candidatos. Dessa forma, os
eleitores tendem a votar orientados pelas imagens que têm e que mais se aproximam de suas
próprias posições e interesses. Há uma tendência a atribuir suas opiniões aos partidos com os
quais se identificam ou com os candidatos que escolheram.
Outras pesquisas realizadas no Sul do país também apontam para os atributos morais e
competência administrativa como determinantes do voto (HASS E WERLANG, 2003). Desse
ponto de vista, o que tem predominado na escolha eleitoral é o personalismo político, o voto
na imagem de um candidato confiável e competente. A imagem partidária tem sido construída
através do horário eleitoral gratuito, da participação em debates, em programas e entrevistas
realizadas com os candidatos ao longo da campanha. De acordo com os autores acima
referidos (2003, p. 23),
o cidadão, no seu imaginário, quer um político honesto e competente, que
administre bem os recursos públicos; que se preocupe em governar para o
bem da comunidade e não esteja em busca de benesses pessoais e de seus
apadrinhados políticos, sucateando as administrações públicas, como temos
visto a cada quatro anos, quando novos prefeitos assumem as prefeituras.
180
Os eleitores manifestam sua preferência por potenciais administradores que projetam
uma imagem de ação e competência. Dessa forma, a imagem do candidato ganha cada vez
mais relevância no mundo da política. Para tanto, o candidato utiliza-se amplamente das
técnicas do marketing político e da mídia televisiva para realçar suas qualidades e aptidões
pessoais. A centralidade da mídia nas campanhas eleitorais favorece o contato direto entre
candidato e eleitores, dispensando a intermediação partidária e uma abordagem que privilegie
idéias e projetos.
Uma eleição sempre se caracteriza por um determinado contexto, o que torna um
desafio avaliar o peso relativo de cada elemento na decisão do voto e verificar padrões de
comportamento eleitoral. Na seção seguinte, busca-se aprofundar essa questão, verificando a
lógica do comportamento eleitoral no município de Toledo.
6.3 A LÓGICA DO COMPORTAMENTO ELEITORAL EM TOLEDO
Os estudos de cultura política mostram que a educação é uma importante variável na
formação de atitudes políticas. A escolaridade e o interesse por política são tomados aqui
como indicadores de sofisticação política do eleitorado. Essa seção tem por objetivo verificar
as hipóteses propostas nesse trabalho, tendo como base os dados da pesquisa quantitativa
realizada em 2002 no município de Toledo, análise esta que será complementada com
informações fornecidas pela pesquisa qualitativa realizada no referido município, em maio de
2006. Uma das hipóteses que norteiam esse trabalho propõe testar a existência de correlação
entre o grau de escolaridade e interesse por política e a decisão do voto.
181
Tabela 10
Escolaridade x Decisão do voto
Decisão do Voto
Escolaridade
Voto Personalista Voto Programático/ Partidário
Total
Baixa 76% [129] 24% [40] 100% [169]
Média 60% [52] 40% [35] 100% [87]
Alta 29% [06] 71% [15] 100% [21]
Total
67% [187] 33% [90] 100% [277]
n = 277 - χ
2
=22,888 / p. < .01, .05
Fonte: Pesquisa Comportamento Político e Decisão Eleitoral, Toledo, 2002.
A análise dos dados mostrou que em todas as variáveis sócio-demográficas há uma
orientação para o voto personalista, apenas sugerindo que, na medida em que a escolaridade
aumenta, cresce o percentual da identificação programática e partidária entre os eleitores,
assim como o voto personalista é maior entre aqueles de baixa escolaridade, como observado
no Tabela 10.
Em relação aos dados da pesquisa qualitativa, constata-se também uma tendência entre
os eleitores a votarem pela pessoa do candidato, em detrimento dos partidos. A despeito disso,
o jornalista da Gazeta de Toledo analisa da seguinte forma:
Hoje a situação está tão complicada. Porque uma época você escolhia pelo
partido, eu lembro da época da Arena e MDB, você escolhia um partido e
enfim ia votar num candidato que você julgava mais qualificado. O partido
que você escolhia. Hoje virou uma salada de frutas. Você fica perdido,
desorientado, o executivo também tá dominando demais o legislativo, hoje a
gente tá verificando isso em todos os níveis, se elege, de repente o cidadão,
especialmente do legislativo não cumpre a sua função. Até se tem
comentado a respeito dos legislativos municipais, as cadeiras foram
suprimidas, foram diminuídas, mas a gente vê o seguinte, que ao longo da
história no caso nosso aqui de Toledo se tiver 19 cadeiras o prefeito vai ter
maioria, se tiver 15 vai ter, se tiver 7 vai ter, eu não vejo necessidade.(...)
Hoje o que a gente observa é pra fazer carreira na política, entra e não sai
mais. Então isso desanima a gente.
O argumento é de que os partidos políticos têm perdido a capacidade de construir
identidades coletivas baseadas em propostas ideológicas. Qual a diferença entre os partidos?
Quais interesses estes representam? Na opinião dos entrevistados, “todos os políticos são
iguais”, pois parecem fazer o mesmo discurso e terem a mesma prática. Os toledanos
182
expressaram muita decepção e insatisfação com a atual política do presidente Lula e com o
PT, um partido que prometia, em tempos passados, combater a corrupção. A fala de uma
eleitora expressa bem essa questão: “Eu me decepcionei muito com a política, eu não acredito
no que eles falam, no último caso, eu voto no candidato menos pior”.
Além da escolaridade, o que norteia o grau de sofisticação política do eleitorado é o
interesse por política, próxima variável a ser analisada.
Tabela 11
Interesse por política x Decisão do voto (%)
Decisão do Voto
Interesse por política
Voto Personalista Voto Programático/Partidário
Total
Baixo 80% [85] 20% [21] 100% [106]
Médio 60% [68] 40% [45] 100% [113]
Alto 59% [34] 41% [24] 100% [58]
Total
67% [187] 33% [90] 100% [277]
n = 277 - χ
2
=12,628 / p. < .01, .05
Fonte: Pesquisa Comportamento Político e Decisão Eleitoral, Toledo, 2002.
Os dados da Tabela 11 indicam que quanto menor o interesse e o grau de informação
política, maior é a orientação pelo voto personalista. Observa-se uma relação significativa
entre o grau de interesse por política e a decisão do voto. Entre aqueles que expressam um
baixo interesse por política, 80% afirmam decidir seu voto pela identificação com a pessoa do
candidato. Entre aqueles que expressam alto interesse por política, 41% são motivados pelo
conteúdo programático dos partidos, contra 59% que afirmam decidir seu voto em bases
personalistas. Portanto, uma parcela do eleitorado decide o seu voto a partir da avaliação dos
atributos pessoais dos candidatos, como competência, honestidade, experiência.
O interesse por política, verificado a partir da freqüência com que as pessoas se
informam e conversam sobre assuntos políticos, está muito associado à confiança depositada
nas instituições e, por sua vez, relacionado ao envolvimento cívico das pessoas. Dessa forma,
183
a segunda hipótese a ser testada se refere à probabilidade da crença e da confiança dos
cidadãos nas instituições democráticas influenciarem no grau de sua participação política.
Tabela 12
Confiança Institucional x Participação Política (%)
Participa de Partidos Políticos
Confiança em Partidos Políticos Sim Não Total
Confia Muito/Pouco 20% [05] 80% [20] 100% [25]
Não Confia 04% [12] 96% [263] 100% [275]
Total 06% [17] 94% [283] 100% [300]
n = 300 - χ
2
=10,482 / p. < .01, .05
Fonte: Pesquisa Comportamento Político e Decisão Eleitoral, Toledo, 2002.
Os dados da Tabela 12 sugerem que quanto maior a descrença e a desconfiança dos
cidadãos nas instituições democráticas, menor a sua participação política. Observa-se que
entre aqueles que não confiam nos partidos, 96% não participam de atividades ligadas a
partidos políticos. Um dado lógico e coerente. Contudo, mesmo entre aqueles que depositam
alguma confiança nas instituições políticas, é alto o percentual de não participação.
A descrença nas instituições políticas e a baixa participação se devem a várias causas.
Além do fraco desempenho econômico, as democracias contemporâneas foram assoladas por
denúncias de corrupção. Os casos envolvem chefes de governo, parlamentares, prefeitos,
vereadores e autoridades jurídicas. Na avaliação de Power e Jamison (2005), a democracia
passou a ser associada à corrupção na maioria dos países latino-americanos.
No começo dos anos 1990, os presidentes Fernando Collor de Mello (Brasil)
e Carlos Andrés Pérez (Venezuela) sofreram processos de impeachment e
foram tirados do cargo por má conduta oficial. Escândalos posteriores
fizeram manchetes mundiais, como o esquema de propinas de Salinas no
México, o escândalo da extorsão que levou à derrubada de Fujimori do Peru
e o caso do financiamento de campanha envolvendo Menem na Argentina
(POWER; JAMISON, 2005, p. 77)
.
De acordo com os autores, há um sentimento de antipolítica e uma tentativa de escapar
da identificação com a classe política e com os partidos tradicionais. Esse ceticismo em
184
relação às instituições políticas revela um sentimento de desencanto com a democracia,
especialmente em relação à economia, à ética e à área social (POWER e JAMISON, 2005).
Os dados da pesquisa qualitativa confirmam que o ceticismo verificado em Toledo é
fruto da decepção gerada pelas denúncias de corrupção e pelas demandas sociais não
atendidas. Além disso, a descrença nos partidos políticos faz parte de um processo histórico-
estrutural que envolve práticas como o clientelismo, o nepotismo e a própria corrupção, que
corroem e desvalorizam as instituições democráticas e fomentam a apatia e a desconfiança
dos cidadãos em relação à política e aos políticos.
Segundo Baquero (2004), a descrença nos partidos políticos, pontos de referência para
a construção de identidades coletivas, favorece o desvio das relações sociais em uma
dimensão terciária, em que se estabelecem relações diretas entre o cidadão e o Estado.
Os déficits democráticos criados pelo funcionamento deficiente das
instituições convencionais da democracia representativa têm produzido
orientações nos cidadãos de repúdio à forma como se pratica a política
atualmente, levantando a necessidade de criar mecanismos societários de
fiscalização dos gestores e instituições políticas (BAQUERO, 2004).
O argumento do autor é de que a confiança nas instituições políticas é uma dimensão
atitudinal fundamental para o fortalecimento da democracia. Representa também incentivo à
participação política e à promoção de capital social, produzido como conseqüência da
experiência política e da informação dentro de uma rede de relações sociais. Nesse sentido, o
capital social estimula e facilita a cooperação e se constitui num recurso coletivo que
influencia positivamente o desenvolvimento e a construção da cidadania (BAQUERO, 2004).
A terceira hipótese visa explicar o comportamento eleitoral, que diz respeito à
influência ou não da participação política na decisão do voto.
185
Tabela 13
Participação Política x Decisão do Voto (%)
Motivação da Decisão do Voto
Participa de Partidos Políticos Voto Personalista Voto Programático/Partidário Total
Sim 47% (07) 53% (08) 100% (15)
Não 69% (180) 31% (82) 100% (262)
Total 67% (187) 33% (90) 100% (277)
n = 277 - χ
2
=3,141 / p. < .01, .07
Fonte: Pesquisa Comportamento Político e Decisão Eleitoral, Toledo, 2002.
A análise dos dados sugere que o voto personalista é mais alto entre aqueles que não
participam, tanto em atividades políticas formais como informais. Assim, na Tabela 13, é
significativo que 69% dos entrevistados que não participam de partidos políticos votam
orientados pela pessoa do candidato. Outras pesquisas mostram que a participação em
organizações e instituições sociais e políticas desempenham um papel decisivo no tipo de
escolha eleitoral, de modo que ela influenciará tanto a maneira pela qual o eleitor percebe a
estrutura social e se situa nela, como a preferência partidária que ele desenvolve (BAQUERO,
2004).
Os cidadãos mostram-se mais dispostos a participar quando acreditam que suas ações
e seus objetivos serão alcançados. Nessas circunstâncias, cabe perguntar: qual o locus da
participação política? As respostas podem variar, indicando uma lista aleatória, como a vida
pública, as eleições, a política institucional, os negócios públicos, a decisão política. A
variação na resposta indica, em geral, os modelos de democracia que cada cidadão tem. De
modo que para uns bastaria que a população votasse e fosse politicamente bem informada,
enquanto para outros seria necessário que o cidadão tivesse oportunidades de deliberação no
que se refere às políticas adotadas pelo Estado.
Na opinião dos toledanos, a participação da população na política é fundamental para
resolver os problemas do país. A maioria deles se refere apenas à participação eleitoral.
Alguns destacam outros canais de participação, como indica a fala de um vereador:
186
Eu acho que temos muitos espaços hoje. Não tenho dúvidas que houve um
avanço com a Constituição de 1988, que rompia com o modelo ditatorial,
permitiu que houvesse a criação institucional de algumas instituições, de
algumas possibilidades de participação popular. Conselhos, por exemplo, os
vários conselhos, de saúde, de educação, de trabalho... criou-se, portanto,
várias possibilidades de participação popular. Enfim, a participação no
movimento sindical que hoje sofre um refluxo, o movimento sindical briga
meramente hoje pela manutenção dos empregos e não mais por melhorias,
avanços na questão do trabalho, mas ainda é um espaço que possibilita a
participação das pessoas (Entrevista com vereador do PT, concedida em
maio de 2006).
Da mesma forma, o diretor de uma ONG argumenta que algumas pessoas até
participam, mas não sabem exatamente o papel e o poder dessa participação nas decisões
políticas.
As pessoas têm participado, o problema é justamente a cultura política.
Então as pessoas são convidadas a participar, elas vão nesses conselhos,
nessas conferências, elas participam, mas elas estão realmente assim ...,
participam mas elas não têm consciência ainda, elas não sabem exatamente
qual o papel que elas precisam desempenhar nesse lugar, nesse aspecto,
então as pessoas por mais que elas queiram ou participam, elas ainda não
sabem realmente o papel e o poder que elas têm dessa participação. Então
sempre tem por trás disso as pessoas manipulando, supervisionando aquilo
em benefício de algum grupo ou de algum segmento político (Diretor da
Associação Promocional de Assistência aos Idosos - APA, em entrevista
concedida em maio de 2006).
Os conselhos municipais, apesar de serem um dos canais de participação da sociedade
na gestão pública, juntamente com o legislativo local, constituem, muitas vezes, um apêndice
do poder executivo, o que contribui para a permanência do círculo vicioso da política local,
regida pelo clientelismo, mandonismo e personalismo. Para romper com esse tipo de
“democracia inercial”, é preciso uma participação política de caráter protagônico que
consolide, de fato, atitudes e comportamentos democráticos (BAQUERO, 2006).
Desse ponto de vista, a participação deve forjar cidadãos comprometidos com o
processo democrático, capazes de realizar cobrança e fiscalização das ações governamentais,
e maior fortalecimento e legitimidade da democracia. Assim argumenta Águila (2004):
187
A participação criará melhores cidadãos e, quem sabe, simplesmente
melhores indivíduos. Os obrigará a traduzir em termos públicos seus desejos
e aspirações, incentivará a empatia e a solidariedade, os forçará a argumentar
racionalmente ante seus iguais e a compartilhar responsavelmente as
conseqüências (boas e más) das decisões. E estes efeitos benéficos da
participação se conjugam com a idéia de que a democracia e suas práticas,
longe de entrar em conflito com a perspectiva liberal, são o componente
indispensável para o desenvolvimento da autonomia individual que
presumivelmente aquelas instituições querem proteger
.
O conjunto de dados analisados nessa seção sugere que a lógica do comportamento
eleitoral em Toledo se dá em função do personalismo. Foi possível observar que o voto se dá
muito mais em função da pessoa do candidato do que em função do partido político,
especialmente entre aqueles que demonstraram baixo interesse por política, desconfiança e
ceticismo em relação às instituições e baixa participação política. A insatisfação com o
desempenho socioeconômico do regime democrático, juntamente com a decepção frente às
crescentes denúncias de corrupção no governo, tem minado a confiança dos cidadãos nas
instituições democráticas e, conseqüentemente, desmotivado a participação política nos canais
formais e informais.
No próximo capítulo, serão aprofundados aspectos da cultura política toledana, com
base nas entrevistas em profundidade, com o objetivo de compreender como as pessoas desta
cidade paranaense constroem suas representações a respeito da política, pontualmente em
relação à corrupção, ao nepotismo e ao clientelismo. Torna-se relevante analisar, portanto, as
opiniões dos cidadãos sobre essa problemática, na medida em que esses fatores incidem
negativamente na construção de uma cultura política democrática no município.
188
7 CLIENTELISMO E NEPOTISMO NA PERCEPÇAO DOS TOLEDANOS
Esse capítulo tem por objetivo aprofundar a análise da cultura política toledana a partir
de informações obtidas na pesquisa qualitativa realizada no município de Toledo, em maio de
2006, tendo em vista compreender as orientações políticas, expressas através das opiniões,
crenças, valores, atitudes e percepções dos cidadãos sobre a democracia e sobre a
permanência de práticas políticas tradicionais na política contemporânea, tais como o
nepotismo, o clientelismo e a corrupção.
Argumenta-se que a manutenção de tais práticas incide de forma negativa no processo
democrático brasileiro. As pessoas que não acreditam mais nas instituições políticas buscam
soluções individuais para os problemas sociais, recorrendo a favores de redes de clientelas. Os
políticos, por sua vez, transformam as políticas sociais em interesses particularistas, por
intermédio dos partidos políticos, institucionalizando essas práticas. A corrupção, o nepotismo
e o clientelismo ocorrem dentro de um contexto que combina democracia com exclusão social
e se caracterizam por se pautar em relações pessoais, desiguais, assimétricas e verticais.
O capítulo se divide em três seções. A primeira busca contextualizar o
desenvolvimento da pesquisa qualitativa, apresentando o perfil dos entrevistados e a proposta
de análise para os dados. Na segunda seção, faz-se uma descrição analítica das percepções dos
toledanos a respeito da democracia, dos principais problemas do país e sobre quem detém o
poder na atual conjuntura. E, na terceira seção, aborda-se a visão dos toledanos sobre a
política local, especialmente em relação à corrupção, nepotismo e clientelismo.
189
7.1 DESENVOLVIMENTO DA PESQUISA QUALITATIVA
A pesquisa qualitativa foi desenvolvida entre membros da elite política local, da
sociedade civil e de eleitores desvinculados de organizações sociais. As entrevistas, realizadas
no primeiro semestre de 2006 de acordo com a disponibilidade dos sujeitos selecionados,
tiveram a duração média de 30 minutos cada e foram gravadas na íntegra com a devida
permissão dos entrevistados. Quanto ao local das entrevistas, estas foram realizadas nas
residências dos eleitores, nos gabinetes dos vereadores, nas secretarias das igrejas, nos
escritórios dos sindicatos, nas salas de diretoria de coordenadores e presidentes de
associações.
Utilizou-se de um roteiro flexível como norteador da entrevista, de modo a favorecer o
diálogo com o entrevistado e possibilitando aprofundar aspectos importantes para a
compreensão de suas opiniões e sentimentos sobre questões referentes à democracia, à
corrupção, ao personalismo, ao nepotismo e ao clientelismo. O primeiro critério usado para a
seleção dos entrevistados foi o fato de ser eleitor e morador do município de Toledo. Com o
objetivo de abordar diferentes opiniões e perspectivas sobre a política local, foram
entrevistados 20 toledanos, inseridos em diferentes segmentos sociais. No caso dos
vereadores, a seleção se deu a partir do número de partidos representados na Câmara
Municipal. A escolha dos demais entrevistados apoiou-se em indicações feitas por lideranças
de organizações presentes na região, de modo que, na medida em que prosseguiam as
entrevistas, eram sugeridos outros nomes para serem entrevistados.
Participaram da pesquisa cinco mulheres e quinze homens, dos quais onze possuem o
ensino superior, sete possuem o ensino médio e dois, o ensino fundamental. Observa-se que,
ao entrevistar eleitores de diferentes segmentos sociais, a amostra da pesquisa qualitativa
apresentou níveis de escolaridade mais alta do que aquela da pesquisa quantitativa. Para
190
facilitar a análise dos dados, os entrevistados foram distribuídos em três categorias: elite
política, sociedade civil e eleitores. A composição da Câmara Municipal é
predominantemente masculina, verificando-se o mesmo nos legislativos estadual e federal.
Assim, a única vereadora de Toledo foi entrevistada. Dos seis vereadores entrevistados, três
são do Partido Progressista (PP), dois do Partido do Movimento Democrático Brasileiro
(PMDB), e um do Partido dos Trabalhadores (PT), componentes da elite política local.
Com relação à categoria “sociedade civil”, foram entrevistadas dez pessoas, um
representante de cada entidade atuante no município: o presidente da Associação Comercial e
Industrial de Toledo (ACIT), o presidente do Sindicato Rural de Toledo, uma representante da
Direção Executiva do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Toledo, o diretor da Gazeta de
Toledo, um radialista da Rádio União, o diretor da Associação Promocional de Assistência
aos Idosos (APA), o presidente da Associação dos Deficientes Visuais de Toledo (ADVT), a
coordenadora da Casa de Maria, o Pastor da Igreja de Confissão Luterana no Brasil e o Padre
da Catedral de Toledo. Foram entrevistados ainda quatro eleitores, duas mulheres e dois
homens.
O material coletado foi lido e sistematizado com a finalidade de captar o teor mais
significativo dentre as respostas dos entrevistados, explorando-se também as diferenças
percebidas entre as falas. Buscou-se, dessa forma, uma apreensão global dos depoimentos em
seu aspecto dinâmico e interativo e, a partir de então, uma identificação de temas abordados
durante as entrevistas. Esta etapa permitiu organizar e sintetizar as categorias de análise,
possibilitando ordená-las conforme quadros que serão apresentados nos itens 7.2 e 7.3.
Para fins de análise de dados procedeu-se a uma análise de conteúdo dos depoimentos
colhidos durante as entrevistas. Para tanto, toma-se como referência a análise de conteúdo
proposta por Bardin (1977), que consiste em um
191
conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por
procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das
mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de
conhecimentos relativos às condições de produção / recepção (variáveis
inferidas) destas mensagens (BARDIN, 1977, p. 42).
Para Bardin (1977), a análise de conteúdo abrange as iniciativas de explicitação,
sistematização e expressão do conteúdo de mensagens, com a finalidade de se efetuarem
deduções lógicas e justificadas a respeito da origem dessas mensagens. De acordo com a
autora, é preciso organizar a análise em três etapas fundamentais: 1) a pré-análise – fase de
organização e sistematização das idéias; 2) a exploração do material – fase que consiste na
codificação do material; e 3) o tratamento dos resultados obtidos – fase de análise dos dados,
inferência e interpretação.
A interpretação inferencial é utilizada tanto na investigação quantitativa, a partir das
freqüências que ilustram certas características da amostra, como na investigação qualitativa,
através da observação da presença ou ausência de uma dada característica num determinado
fragmento da mensagem. É a fase da reflexão e do aprofundamento do material empírico, da
análise propriamente dita. A fim de desenvolver a análise proposta, utilizam-se conceitos
básicos das teorias que alimentam o conteúdo das mensagens e leva-se em conta o contexto
político e econômico no qual se realiza a pesquisa.
Nesse sentido, cabe mencionar dois eventos que ocorreram na região na ocasião da
pesquisa. O primeiro é em relação à manifestação de produtores rurais, que realizaram
bloqueios nas principais rodovias da região, chamando atenção para o novo Plano Safra 2006-
2007, que seria divulgado naquela semana. Entre as reivindicações estavam a ampliação do
crédito aos agricultores e a redução das taxas de juros cobradas. Esse fato afetou diretamente
os Sindicatos Rurais, os comerciantes e os agricultores de Toledo.
O segundo evento diz respeito ao debate ocorrido na Câmara Municipal em torno de
um projeto contra o nepotismo. Na sessão ordinária realizada em maio de 2006, a proposta foi
192
arquivada por seis votos contrários a cinco votos a favor. Em seus argumentos, todos os
vereadores mostraram-se contrários ao nepotismo. Contudo, os vereadores da situação
votaram contra a proposta apresentada pelos da oposição por dois motivos. Primeiro, a
mudança não deveria ser feita por lei ordinária, mas por emenda à Lei Orgânica do Município.
Além disso, era preciso aguardar a aprovação de lei contra o nepotismo nos âmbitos estadual
e federal, para que o município pudesse se adequar a tal lei.
Três meses depois, o Ministério Público entrou com uma ação solicitando a
exoneração dos parentes do prefeito José Carlos Schiavinato (PP), que tem mulher, cunhada e
irmão em cargos de confiança. Este, por sua vez, enviou para a Câmara um projeto de sua
autoria que regulamenta a prática da contratação de parentes para cargos públicos, que foi
aprovado pelo legislativo em agosto de 2006
24
. A questão do nepotismo no município será
tratada mais adiante.
Na seção seguinte, abordam-se as percepções dos toledanos a respeito da democracia e
dos principais problemas vivenciados pelo país, assim como suas opiniões sobre quem detém
mais poder na atual conjuntura política. Subsidiam a análise autores já referenciados nos
capítulos teóricos.
7.2 A VISÃO DE DEMOCRACIA DOS CIDADÃOS TOLEDANOS
Pesquisas realizadas na América Latina revelam que não há um consenso sobre o
significado de democracia. Contudo, ela tem sido considerada como a melhor forma de
governo. Os dados mostram que não apenas as bases formais e institucionais da política, mas
os traços sócio-culturais estão enraizados na concepção de democracia latino-americana.
24
Informações disponíveis no site: http://canais.ondarpc.com.br/noticias/parana
193
Dessa forma, compreende-se democracia como um conjunto de instituições políticas, normas
e procedimentos que visa assegurar a liberdade, a igualdade e os direitos políticos, civis e
sociais dos indivíduos. É importante salientar que as desigualdades sociais e a pobreza
moldam as visões de democracia dos latino-americanos (CAMP, 2001). Portanto, as
dimensões social, política, econômica e cultural fazem parte do processo de construção
democrática.
O grande desafio da democracia no Brasil é estabelecer um conjunto de instituições
autônomas, eficientes e centradas no caráter social do compromisso democrático. A plena
democratização deve preencher o hiato entre a igualdade proposta pelo regime político e a
desigualdade material que produz incessantemente a pobreza e a miséria do povo brasileiro.
Dessa forma, o fortalecimento democrático conta com o desenvolvimento integral da
cidadania, o que implica o pleno exercício dos direitos dos cidadãos. De acordo com o
relatório das Nações Unidas,
Para enfrentar os déficits de nossas democracias, faz falta o poder
democrático. Isto é, a capacidade de atuar de modo efetivo em relação aos
problemas para expandir a cidadania. Para construir esse poder é
indispensável a política. Porém é preciso que a política seja relevante, que
proponha caminhos para abordar os temas centrais da sociedade, que sejam
explorados com firmeza pelos líderes e cidadãos e os sustente com a
idoneidade dos instrumentos para a ação coletiva, entre os quais os partidos
políticos são atores centrais, mas não os únicos (PNUD, 2004, p. 181).
A noção de cidadania remete à cristalização dos direitos civis, políticos e sociais,
caracterizando uma situação de inclusão e de pertencimento dos cidadãos à comunidade
política. Embora os cidadãos tenham o direito formal de se organizar, de expressar livremente
suas opiniões e interesses, de participar das decisões políticas, questiona-se a ausência de
condições favoráveis para estimular tal participação. Os cidadãos, muitas vezes, por não se
sentirem pertencentes ao sistema político, permanecem passivos e apáticos, desenvolvendo
suas atividades cotidianas à margem dos canais de participação democrática (COHN, 2000).
194
Os dados da pesquisa qualitativa, ao examinarem a maneira como os toledanos
percebem a democracia e as relações de poder, revelam uma ligação entre a sua concepção de
democracia e a sua prática política. Para melhor compreender as orientações políticas
cognitivas, afetivas e avaliativas dos cidadãos, tanto em relação à democracia e a seus
principais problemas, como sobre quem detém mais poder na atual conjuntura política,
elaborou-se uma síntese das entrevistas realizadas junto aos toledanos, conforme mostra o
Quadro 6.
Quadro 6
Percepção dos toledanos a respeito da democracia
Concepção de Democracia Principal Problema do Brasil Quem detém o poder
Elite
Política
- Possibilidade de maior
participação popular;
- Participação eleitoral;
- Liberdade de expressão;
- Liberdade de escolha;
- Dar direito a todos
- Enormes desigualdades
sociais;
- Falta de reforma política;
- Corrupção;
- Desemprego;
- Problemas sociais;
- Educação
- Grandes Empresários;
- Imprensa
- Mídia
- Executivo
Sociedade
Civil
- Liberdade de expressão;
- Participação da comunidade
nas decisões;
- Liberdade com
responsabilidade;
- Possibilidade de discutir;
- Jogo político em que os
organizados vencem;
- Participação da sociedade
- Espaço para participação;
- Participação consciente do
povo.
- Corrupção;
- Educação;
- Falta de um projeto
nacional;
- Segmentação de concepções;
- Falta de democracia;
- Falta a reforma do judiciário
e a reforma trabalhista e
tributária.
- Poder econômico
(multinacionais);
- Executivo nacional;
- Mídia;
- Bancos
- Banqueiros;
- Empresários
Eleitores
- Um grande absurdo;
- Direito de opinar;
- Sistema político justo que
produz injustiças;
- Ter direitos respeitados.
- Preços altos devido ao dólar;
- Desvio de verbas públicas;
- Violência
- Desemprego
- Mídia
- Grandes empresários;
- Banqueiros
- Não são os políticos
Fonte: Quadro elaborado pela autora a partir das entrevistas realizadas em Toledo, 2006.
195
Observa-se no Quadro 6 concepções de democracia que destacam a liberdade de
escolha, liberdade de opinião e de participação como valores políticos fundamentais. Os
representantes da elite política enfatizam mais a perspectiva procedimental da democracia,
como a participação eleitoral. Os eleitores, por sua vez, expressam insatisfação com o regime
democrático, sustentando que a democracia deveria ser um sistema político que, de fato,
assegurasse direitos políticos e sociais. Os membros da sociedade civil possuem uma visão
mais ampliada da participação política. Acreditam que a democracia é a garantia de liberdades
e direitos que devem ser assegurados através da cobrança e de um maior envolvimento da
sociedade nas decisões políticas, conforme explicita a coordenadora de uma ONG:
Eu entendo por democracia a participação consciente do povo, das pessoas,
nos processos gerais de uma comunidade. A participação consciente e não
somente o voto. O voto é uma única coisa, mais importante do que o voto é
realmente a consciência pessoal e política daquilo que está acontecendo ao
redor. É compreender o que leu, é analisar o que ouviu, para mim isso é que
é democracia. (Coordenadora Casa de Maria em entrevista concedida em
maio de 2006).
A idéia de que deveria haver maior participação dos cidadãos nas decisões
governamentais surge na década de 1960, com os movimentos estudantis e comunitários que
passaram a exercer pressões políticas. A participação restrita, limitada pelo processo eleitoral,
e a apatia do eleitorado tinham uma função positiva de amortecer conflitos e a sobrecarga do
sistema político. No modelo de democracia participativa, no qual figuram autores como
Macpherson (1978) e Pateman (1992), a participação se torna um componente essencial na
vida democrática.
Como enfatiza Pateman (1992), a democracia participativa promove o
desenvolvimento humano, aumenta o senso de eficácia política, diminui o distanciamento dos
centros de poder e contribui para a formação de cidadãos ativos. Por sua vez, Macpherson
(1978) destaca dois requisitos para se chegar a uma democracia participativa: mudança na
consciência do povo e diminuição da desigualdade social e econômica. O autor questiona:
196
como alcançar maior participação sem uma mudança prévia na consciência do povo e nas
condições de desigualdade social? Como efetivar mudanças na consciência do povo e nas
condições de desigualdade sem um prévio aumento da participação? Como sair desse círculo
vicioso? Segundo o autor, o que se observa é uma consciência cada vez maior para os custos
da apatia política, especialmente em relação às questões da poluição do ar, da água e da terra.
Nessa perspectiva, Macpherson (1978) propõe um modelo que concilia a democracia
participativa com a estrutura da democracia representativa. Dessa maneira, a democracia
participativa (direta) acaba configurando-se dentro da estrutura do governo e dos partidos
políticos, como, por exemplo, os Conselhos Municipais e o Orçamento Participativo. De
acordo com as respostas dos entrevistados, observa-se que a concepção de participação
relaciona-se mais com os canais formais da política do que com os movimentos sociais e
demais organizações não convencionais.
Observa-se que nem todos os indivíduos se interessam em participar dos processos
decisórios de modo ativo. A despeito disso, Robert Dahl (1981) categoriza os indivíduos em
quatro estratos diferentes: os apolíticos, os políticos, aqueles que buscam o poder, e aqueles
que detém o poder. De acordo com o autor, há um número considerável de cidadãos
desinteressados pela política, que não esperam resultados com sua participação ou que não
sentem competência e confiança na eficácia de sua ação. Por outro lado, há uma minoria que
busca informação e se interessa por política. Acredita que sua participação pode alterar os
resultados e as decisões políticas, de modo que os sentimentos de autoconfiança e de eficácia
pessoal estão associados ao alto grau de participação. Dentro do estrato político, há um
substrato de indivíduos que buscam o poder. Seja para alcançar o bem comum ou buscar
vantagens pessoais. Alcançar o poder depende dos recursos utilizados e da eficiência com que
esses recursos foram empregados, portanto, é razoável admitir que aqueles que tem mais
recursos conseguirão mais poder (DAHL, 1981).
197
No caso do Brasil, os movimentos e organizações sociais apresentam-se como uma
nova forma de intervenção social. Possuem o papel de promover a inclusão social, a cidadania
e a transformação de práticas arraigadas na sociedade que impedem a afirmação e o
reconhecimento dos direitos. As novas formas de participação caracterizam-se por serem mais
flexíveis e horizontais e por exigirem maior eficácia e transparência das ações
governamentais.
Em relação aos principais problemas do Brasil, a corrupção e a desigualdade social
foram apontadas pelos entrevistados como os maiores problemas. Membros da elite política e
da sociedade civil indicam também a falta de uma reforma política, debate que foi
impulsionado em meados da década de 1980 e intensificou-se nos anos 1990, com o
estabelecimento de novos arranjos institucionais. Entre as inovações, encontram-se novas
regras eleitorais, a cláusula de barreira (restrição à representação no Congresso de partidos de
pequeno peso eleitoral) e a limitação da prerrogativa do presidente editar medidas provisórias.
Valendo para as eleições de 2006, a Resolução 22.261/2006, parágrafo 4
o
, proíbe a confecção,
a utilização e a distribuição de camisetas, chaveiros, bonés, brindes, cestas básicas ou
quaisquer outros bens ou materiais que possam proporcionar vantagem ao eleitor. Segundo
alguns vereadores:
Agora com essa questão de responsabilizar o candidato pela campanha
e não mais o tesoureiro, e de todas as doações terem que ser feitas em
cheque nominal tenho certeza absoluta de que isso vai diminuir, não
que vai terminar, mas vai diminuir sensivelmente o caixa 2. (Vereador
do PMDB em entrevista concedida em maio de 2006)
É difícil dizer que essa democracia é a melhor que nós temos...
tamanha a burocracia de um país. Hoje nós estamos próximos de 14
mil leis ordinárias federais e aí mais um contexto de leis
complementares à Constituição, leis delegadas, decretos e tantas
novas, que a democracia se perde no meio de turbulência de leis.
(Vereador do PP em entrevista concedida em maio de 2006)
198
De acordo com pesquisa, realizada pelo Instituto de Estudos Avançados da
Universidade de São Paulo, em que foram construídos cenários político-institucionais para o
Brasil até o ano de 2.022, o projeto da Comissão Especial de Reforma Política propõe a
discussão de cinco áreas:
1. a adulteração dos resultados eleitorais pelas coligações partidárias nas
eleições legislativas; 2. o enfraquecimento dos partidos políticos pelo voto
extremamente personalizado; 3. o custo crescente das campanhas eleitorais e
a dependência do candidato em relação a grupos de interesse para o
financiamento das campanhas; 4. um sistema partidário excessivamente
fragmentado; 5.as trocas de partido, pelas quais as bancadas partidárias
mudam de tamanho durante uma legislatura. (LAMOUNIER e SOUZA,
2006).
Apesar de todo o esforço em aperfeiçoar a democracia via institucionalização de leis e
regras, observa-se que elas não são suficientes para realizar mudanças efetivas nas práticas
políticas, especialmente em relação ao personalismo, à corrupção e ao clientelismo. A
democracia não é exclusivamente procedimento, mas substância, portanto, além da dimensão
política, as dimensões social, econômica e cultural devem ser levadas em conta no processo
de construção democrática. Não basta mudar o desenho das instituições políticas, é preciso
transformar também a cultura política em questão.
A análise dos depoimentos indica que os eleitores estão extremamente frustrados com
as constantes denúncias de desvio de verbas públicas. As leis que proíbem a corrupção
existem, contudo não são suficientes para inibir e combater tal prática. Parte dos entrevistados
afirma que se trata de uma questão cultural e histórica, que precisa ser combatida através do
Ministério Público, que tem desempenhado um papel importante nesse processo, assim como
pela punição através das urnas.
Questionados a respeito de quem tem mais poder no país, os entrevistados destacaram
a mídia, os grandes empresários e os banqueiros, como observado no Quadro 6. Com exceção
199
dos eleitores, os membros da elite política e da sociedade civil apontaram também o executivo
como detentor do poder no país.
O conceito de poder é fundamental para a análise política e está relacionado ao
processo de decisões, que supõe formulação e aplicação de políticas. Segundo Lasswell e
Kaplan (1963), poder é um valor deferencial, relacionado ao status, à honra e ao prestígio,
que pode ser descrito em termos de seu peso, escopo e domínio. O peso é determinado pelo
grau de participação no processo de decisão, seu escopo consiste de valores controlados pela
forma como o poder é exercido, e o domínio refere-se às pessoas sobre as quais se exerce o
poder. Assim, o poder político é uma forma complexa que pressupõe outras formas de poder.
Weber (1993), fazendo uma análise do poder, alega que este se exerce com base no
critério da tradição, do carisma e da racionalidade. Nessa perspectiva, o poder brotado da
submissão ao carisma pessoal do político conduz a uma obediência não por costume ou
devido a uma lei, mas pela confiança e fé depositada nele, o que torna o homem político “por
vocação”. Na dominação política baseada na burocracia racional-legal, “a obediência funda-
se, antes, em duas espécies de motivos que se relacionam a interesses pessoais: retribuição
material e prestígio social” (WEBER, 1993, p. 59). Segundo o autor, há duas maneiras de
fazer política. Ou se vive “para” a política ou se vive “da” política. Pela fala de um vereador,
é possível identificar a perspectiva weberiana sobre os “políticos profissionais”.
Muitos exercem o cargo político pra fazer política na essência, só vivendo
disso, outros, são muitos representantes que são eleitos pelo povo, estão aí
para defender os interesses da sociedade, os interesses do povo, não fazem
da política uma profissão e aí eu acho que o verdadeiro político tem que se
destacar disto, aquele que faz a política só voltada pra si, e não para o
outrem, e aquele político que não está aí ligando para o seu salário, está aí
ligando para trabalhar em favor da sociedade, em favor do seu povo
(Vereador do PP em entrevista concedida em maio de 2006).
O político que vive profissionalmente da política transforma os partidos em “máquinas
políticas”, visando conquistar votos e bases de sustentação política. Em troca de apoio, o
200
político dispõe de toda ajuda pública que tem ao seu alcance, buscando atender as
necessidades e as demandas de suas clientelas. Além do controle dos recursos estratégicos, o
político profissional utiliza-se amplamente dos meios de comunicação, que passam a ter um
papel cada vez mais decisivo nos processos políticos e eleitorais.
Recentes pesquisas indicam que a mídia, especialmente a televisão, exerce influência
na dinâmica política na medida em que fornece enquadramentos para a interpretação dos
eventos políticos. O impacto da mídia é avaliado através de estudos de recepção, que
verificam como as pessoas escolhem o que vão consumir nos diversos meios de comunicação
e como percebem as informações recebidas. Alguns autores argumentam que, mesmo
filtrando e processando as informações, as pessoas dependem consideravelmente dos recursos
de informação do sistema da mídia. “A televisão influencia o processo eleitoral e as decisões
do governo, dada a centralidade do poder da imagem nos processos políticos e uma
conseqüente alteração de como ‘ser político’ e de como gerir a política” (MENEGUELLO e
RIBEIRO, 2002). De outro lado, há uma vinculação histórica das concessões de radiodifusão
com as elites políticas regionais e locais. Segundo Venício Lima (1998), apesar de ser vedada
pela legislação nacional, a propriedade de emissoras de rádio e televisão por parte de políticos
é um fenômeno no Brasil
25
.
Paralelamente ao poder da mídia, situa-se o poder econômico, também mencionado
pela maioria dos entrevistados. A opinião dos toledanos indica que são os grandes
empresários, os banqueiros e as multinacionais que detêm mais poder no Brasil hoje. Como
enfatiza Paul Singer (2006), os países em desenvolvimento se submetem aos critérios dos
detentores de capitais para serem parte do mundo globalizado. Assim argumenta o autor:
25
Pesquisas revelam que pelo menos 51 deputados e 27 senadores são proprietários de veículos de comunicação,
diretamente ou por meio de parentes.
201
Estes critérios são: manter plena liberdade de movimento para os capitais,
assegurar o equilíbrio orçamentário e a estabilidade dos preços, deixar o
câmbio flutuar mas dentro de limites pré-fixados, liberar o mercado de
trabalho de restrições à livre contratação e entregar à iniciativa privada a
prestação de serviços públicos, da telefonia ao seguro saúde e ao seguro
social. Os governos neoliberais almejam cumprir tais objetivos por
convicção e acreditam que merecem a preferência do capital globalizado.
A situação de dependência reflete a impotência dos Estados nacionais face ao capital
globalizado e altamente concentrado, de modo que as grandes potências econômicas dispõem
de algum controle sobre a taxa de juros e sobre o crédito bancário, condicionando a
movimentação dos capitais privados. A atual política econômica mantém a dependência da
economia brasileira, visando a obtenção das divisas necessárias através da contenção dos
gastos públicos e do aumento das exportações. O resultado é o crescente empobrecimento da
população e da exclusão social.
Além do poder econômico e da mídia, na opinião dos entrevistados, o poder tamm é
exercido pelo Executivo nacional, no qual, frente ao cenário de corrupção política e de
conseqüente desgaste institucional, as formas personalistas e populistas de mobilização de
poder são revigoradas. Na próxima seção, busca-se verificar como a naturalização da
corrupção, do nepotismo e do clientelismo incide na democracia e como essas práticas são
avaliadas pelos toledanos.
7.3 PERCEPÇÕES DOS TOLEDANOS SOBRE A POLÍTICA LOCAL
Esta seção corresponde a uma discussão sobre os conceitos de corrupção, nepotismo e
clientelismo à luz do depoimento dos entrevistados. A partir de uma síntese das entrevistas em
relação a essa temática, busca-se analisar a percepção dos cidadãos a respeito da política local
202
e nacional. Na análise de dados, constatou-se que um dos principais problemas do país, do
ponto de vista dos toledanos, é a corrupção.
A definição de corrupção está centrada na idéia de bem público. Grosso modo, o
desvio de recursos públicos para fins privados se configura como prática corrupta. A
persistência e o caráter da corrupção sugerem que ela não pode ser tratada separadamente da
questão histórica e cultural dos países. Pesquisas indicam que a corrupção não é um problema
exclusivo dos países em desenvolvimento. Entretanto, apontam forte relação entre corrupção,
desigualdade e pobreza. Quanto pior a posição de um país no índice de corrupção, maior é a
probabilidade de que tenha um alto coeficiente de Gini (medida de desigualdade social). De
acordo com Lipset e Lenz (2002), a variável renda per capita está fortemente associada à
corrupção. Nessa perspectiva, os países ricos e mais desenvolvidos economicamente são os
menos corruptos politicamente. O argumento é de que a manutenção de esquemas de
corrupção inviabiliza investimentos em países mais corruptos do que em países menos
corruptos, fazendo com que investidores prefiram investir nestes, não naqueles.
O Índice de Percepção da Corrupção (IPC) da ONG Transparência Internacional é a
mais conhecida e conceituada medida de corrupção. Este índice composto, resultante da
combinação de sondagens conduzidas por organizações independentes, compara vários países
quanto à percepção social da existência de corrupção. Os autores Power e Gonzalez (2006),
utilizando-se de índices internacionais e de classificações de corrupção, além de indicadores
culturais gerados por pesquisas de opinião pública, analisam a relação entre corrupção e
cultura política.
Para medir a corrupção, utilizamos a edição 2000 do Corruption Perceptions
Index (CPI) produzido pela Transparência Internacional (TI), uma
organização não-governamental que monitora a corrupção no mundo. O CPI
é uma ‘pesquisa de pesquisas’ que mede a percepção do grau de corrupção
em 90 países, aferido por empresários, analistas de risco e o público em
geral. (POWER e GONZALEZ, 2006)
203
A hipótese dos autores é a de que os cidadãos que apresentam orientações não-cívicas
serão mais tolerantes às práticas corruptas do que aqueles que apresentam orientações cívicas
(confiança interpessoal, associativismo, cooperação e engajamento cívico).
Pontualmente, no caso brasileiro, o Estado possui uma configuração na qual estão
presentes princípios norteadores de ações que se fundam na lógica das relações pessoais, de
amizade, de lealdade e de reciprocidade. Segundo Bezerra (1995, p. 178), “a obtenção de
recursos materiais e institucionais do Estado de forma corrupta, funda-se em relações de
patronagem, amizade, parentesco, e mecanismos sociais como a troca de favores, presentes e
procedimentos regulares da administração pública mais amplos da sociedade brasileira”. Tais
práticas, incorporadas ao modo de atuar do Estado, contribuem para criar e consolidar
relações caracterizadas pela assimetria e dependência.
O quadro a seguir mostra uma síntese das entrevistas realizadas junto a eleitores,
políticos e representantes da sociedade civil a respeito da corrupção, do nepotismo e
clientelismo presentes na política brasileira.
204
Quadro 7
Percepção dos toledanos sobre corrupção, nepotismo e clientelismo
Corrupção Nepotismo Clientelismo
Elite
Política
- Sociedade tem que cobrar
resultados das CPI’s.
- Corrupção é um problema
endêmico no Brasil.
- Onde há recursos, há
corrupção.
- CPI’s não condenam
ninguém. Cabe ao Ministério
Público.
- A mídia é fundamental na
divulgação da corrupção.
- Contração deve se dar via
concurso público.
- O nepotismo é um atraso, é
preciso mudar.
- Favorável ao nepotismo,
sem abusos.
- O nepotismo precisa ser
disciplinado por norma
constitucional.
- A sociedade deve
fiscalizar para que isso
não aconteça.
- É uma forma terrível
de fazer política.
- É um círculo vicioso
que envolve os poderes
executivo e legislativo.
- O clientelismo é
proibido por lei.
- Enquanto houver
pobres, haverá
clientelismo.
Sociedade
Civil
- A corrupção está instalada
em todos os pontos. Está
presente nos três poderes.
Como controlá-la?
- CPI’s são mecanismos
políticos. Falta punição.
- Corrupção está se tornando
uma cultura: “quem rouba é
esperto”. “é preciso levar
vantagem em tudo”.
- Nepotismo é um absurdo.
Gera frustração e descrença
no processo democrático.
- Contrário ao nepotismo.
Contratação deve ser via
concurso público.
- Favorável ao nepotismo,
sem abusos. Contratação pelo
critério da competência.
- Eleitor que vende seu
voto não tem direito a
cobrar nada do político.
- Prática comum em
Toledo.
- É algo sem controle.
- O cidadão vai fazer
campanha calculando o
que vai ganhar.
- É uma coisa antiga que
permanece com uma
voracidade cada vez
maior.
Eleitores
- Problema de difícil solução.
Não tem controle.
- Há uma cultura da
corrupção.
- O Ministério Público e as
CPI’s desempenham
importante papel no combate
à corrupção.
- É preciso leis mais
rigorosas para punir
corruptos.
- Nepotismo é uma coisa
grave e errada. Não tem
justificativa nenhuma.
- Por uma questão ética, quem
está num cargo público não
deveria empregar parentes.
- Contrário ao nepotismo.
- Contrário ao
clientelismo. Não se
pode vender o voto.
- A situação de pobreza
e a natureza do caráter
explicam a permanência
do clientelismo.
- Difícil fiscalizar essa
prática. É preciso leis
mais rigorosas.
Fonte: Quadro elaborado pela autora a partir das entrevistas realizadas em Toledo, 2006
A opinião dos toledanos em relação à corrupção vai ao encontro dessas reflexões
teóricas, como observado no Quadro 7. “A corrupção é um problema endêmico aqui no
205
Brasil”, afirma um vereador do PT. Trata-se de um problema de difícil solução, pois está
presente em todos os espaços políticos e sociais. “A sociedade deve cobrar mais transparência
dos políticos”, defende a vereadora do PMDB. Os entrevistados reconhecem a importância da
Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), mas chamam a atenção para a impunidade que se
cristaliza no país. Há muitos acordos entre os políticos que investigam os denunciados. “Os
políticos roubam bilhões, como o caso Lalau, e ficam passando a mão na cabeça, alisando, e
tudo acaba em pizza. Tem que mudar a lei, ser rigorosa, acho que tem que mudar”, afirma
uma eleitora. “É preciso acabar com a impunidade”, endossa o radialista da Rádio União:
Na verdade, todas as ferramentas disponíveis pelo processo democrático
devem ser utilizadas, mas nada vai ser mais ... mais ... causará um impacto
maior assim pra sociedade, vai mostrar que realmente que alguma coisa está
sendo feita em relação a isso, quando começar a acontecer as punições, as
penalidades pra quem cometeu as infrações, então eu acho que o Ministério
Público, os promotores novos, dessa nova geração, eles vem muito com esse
pensamento, né? (Radialista em entrevista concedida em maio 2006).
As denúncias de corrupção colocam em jogo a reputação e a confiança naquele que
desempenha a atividade política. Ao estudar a corrupção, pesquisadores têm abordado o
conceito de capital social (confiança interpessoal e institucional), demonstrando que quando
os cidadãos não confiam no Estado buscam alternativas como suborno e outros
comportamentos corruptos (PUTNAM, 2002; POWER e GONZALEZ, 2006). Uma das
hipóteses dos autores citados é a de que quanto maior a confiança, maior o compromisso dos
cidadãos com normas universalistas e coletivas.
Diante disso, como combater as práticas de corrupção? Nos regimes democráticos, a
corrupção atinge dois de seus princípios centrais: o da transparência e o da representação.
Portanto, é imprescindível a prestação de contas das ações dos políticos ao público, a
instituição de órgãos públicos para combater ações arbitrárias e práticas de corrupção, além
do monitoramento e avaliação de políticas públicas, ampliando a transparência e o controle
social.
206
Dados de pesquisa do Estudo Eleitoral Brasileiro (ESEB, 2002), realizada pelo
CESOP/UNICAMP em várias cidades brasileiras, indicam que grande parte dos cidadãos não
concorda com o uso do cargo público em prol de interesses particulares
26
. Para a maioria dos
entrevistados, o uso do cargo político para obtenção de ganhos privados, favorecimento e
benefício próprio é uma atitude condenável. Esse dado indica que há uma concepção clara de
que a corrupção política é prejudicial à democracia, e que os cidadãos podem expressar sua
discordância através da accountability vertical (via eleições). Entretanto, na prática, falta
accountability horizontal, entendida por O’Donnell (1998) como agências estatais com direito
e poder legal, dispostas e capacitadas para fiscalizar e, se necessário, punir, seja devido a uma
usurpação ilegal ou em razão da corrupção e de vantagens ilícitas que uma autoridade pública
obtém para si ou para outrem.
A corrupção, quando naturalizada e considerada intrínseca ao processo político, é
tolerada e vista como algo que não se pode mudar. Nessa lógica, instituições públicas passam
a ser utilizadas com a finalidade de retribuir favores pessoais e obter benefícios e privilégios.
Nessa concepção, a corrupção é encarada como um intercâmbio e um constante processo de
“trocas” entre pessoas.
Outro tema relevante examinado no Quadro 7 diz respeito ao nepotismo, conceito que
envolve o favorecimento de parentes e amigos na contratação de empregos públicos. Este está
diretamente associado à corrupção e ao clientelismo. Segundo estudo de Santos e Cardoso
(2006), a história da formação do serviço público no Brasil foi marcada pela ausência de
critérios meritocráticos e pela recorrência do nepotismo e do clientelismo, vícios da política
tradicional, que têm sobrevivido e resistido a tentativas sucessivas de limitação. De acordo
com os autores,
26
A questão apresentada foi a seguinte: Se alguém é eleito para um cargo público deve usar o cargo como se
fosse sua propriedade particular em seu benefício? – Discorda muito; Discorda um pouco; Concorda Muito;
Concorda um pouco. N=2.410.
207
As tentativas de fixas regras limitadoras do exercício desses cargos por meio
de sua vinculação a carreiras ou ao sistema de mérito foram ora tímidas, ora
inefetivas, pela própria ausência de servidores com o perfil necessário para
poderem prover a Administração de quadros capazes de garantir a
continuidade administrativa e refrear a tendência ao clientelismo (SANTOS
e CARDOSO, 2006).
A prática de contratar parentes é comum no Congresso Nacional, nas Assembléias
Legislativas e nas Câmaras Municipais. Numa demonstração de que essa prática está
profundamente imbricada na mentalidade política, a Câmara dos Deputados rejeitou em
Plenário, em março de 2000, durante votação em primeiro turno da Proposta de Emenda
Constitucional (PEC), a vedação ao nepotismo. Embora a maioria dos deputados tenha votado
pela manutenção do texto, não foram alcançados votos necessários para sua aprovação.
Trata-se da PEC de número 334/96, que prevê a proibição de contratação, pela
autoridade pública, em cargos de confiança (sem concurso) de cônjuge, pais, filhos, sogros ou
quaisquer parentes consangüíneos, ou por adoção ou afinidade, até o terceiro grau, nos
âmbitos do Executivo, Legislativo, Judiciário e do Ministério Público, nos níveis federal,
estadual e municipal. A proposta veta o nepotismo também em serviços terceirizados e em
prestadoras de serviço por meio de concessões e proíbe o nepotismo cruzado ou triangular,
quando duas ou três autoridades trocam nomeações de seus parentes. Obriga que 100% das
funções de confiança sejam preenchidas por funcionários de carreira. A obrigação vale
também para 85% dos cargos de direção e chefia e 50% dos cargos de assessoramento, exceto
para gabinetes parlamentares.
A exemplo do que ocorreu no Judiciário paranaense, que aplicou a Resolução do
Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e exonerou 110 parentes de magistrados, a Assembléia
Legislativa do Paraná instalou comissão especial para analisar o projeto de Emenda à
Constituição do Estado que proíbe a prática do nepotismo no Paraná (Proposição nº 40/05).
Pela proposta
208
fica vedada a nomeação, para cargos em comissão, do cônjuge ou parente
consangüíneo, por afinidade e civil, em linha reta ou colateral até o terceiro
grau, respectivamente, de deputados, no âmbito da Assembléia Legislativa;
de conselheiros do Tribunal de Contas, no Tribunal de Contas; do
governador e dos secretários de Estado, no âmbito do Poder Executivo e
Legislativo Estadual; de desembargadores, no âmbito do Poder Judiciário,
dos promotores e procuradores de Justiça no âmbito do Ministério Público
Estadual.
Na primeira votação, 40 deputados haviam aprovado a emenda do deputado Tadeu
Veneri (PT). Na segunda votação (abril de 2006), contudo, alguns deputados mudaram de
opinião e outros não apareceram no plenário na hora da votação, e a emenda não foi aprovada,
recebendo apenas 29 votos, quando precisava de 33
27
.
Pontualmente, no caso do município de Toledo, o projeto de lei que previa o fim do
nepotismo foi arquivado em maio de 2006. Por sua vez, a Câmara aprovou, três meses depois,
projeto de lei que legaliza o nepotismo. O projeto, enviado pelo prefeito de Toledo, José
Carlos Schiavinato (PP), regulamenta a contratação de parentes de políticos para cargos de
confiança. A emenda determina que o número seja de sete parentes em 2007 e vá regredindo
para quatro em 2008 e apenas dois em 2009, quando Schiavinato não será mais o prefeito. A
votação foi realizada sob protestos dos moradores da cidade. Um dos argumentos
apresentados pela oposição foi em relação ao montante que a administração gastará neste ano
só com salários de parentes: R$ 2 milhões. O nepotismo já é amparado por lei em três
municípios paranaenses. Depois de Cascavel, município vizinho, que regulamentou essa
prática em março deste ano, as Câmaras Municipais de Toledo e Guarapuava também
aprovaram leis semelhantes
28
.
Com base nos dados da pesquisa qualitativa, entre os vereadores entrevistados, três
mostraram-se totalmente contrários ao nepotismo e três, favoráveis a ele, desde que
27
Informações disponíveis no site http://canais.ondarpc.com.br/noticias/parana
28
Informações disponíveis no site http://canais.ondarpc.com.br/noticias/parana.
209
regulamentado e disciplinado por lei, para evitar abusos. Na opinião destes últimos, um dos
critérios para a contratação de parentes seria a competência. Desse modo, são favoráveis à sua
continuidade, com algumas limitações constitucionais, que deverão ser feitas em âmbito
federal e estadual, para que os municípios possam se adaptar a elas. Assim, argumenta um
vereador do PP:
O nepotismo precisa se disciplinado por uma norma constitucional, porque
ele está inserido no texto da administração pública. E a administração
pública é norma constitucional, então tem que ser regulamentado por norma
e eu quero crer que deve aí pelo menos limitar qual o percentual sobre os
cargos de comissão que possam ser parentes do executivo ou de quem quer
que seja.
Os vereadores de oposição mostraram-se totalmente contrários ao nepotismo e
favoráveis às contratações via concurso público. As opiniões entre os membros da sociedade
civil se dividem. O presidente do Sindicato Rural de Toledo afirma que não é contra o
nepotismo. Da mesma forma, o pastor diz que não se pode radicalizar. “Por que não
aproveitar três ou quatro pessoas da família?” O padre acredita que se deve contratar parentes
apenas se houver competência para assumir o cargo. Mas, na opinião da maioria dos
entrevistados, é preciso acabar com o nepotismo. “As pessoas devem trabalhar nos lugares
públicos via concurso”, afirma a coordenadora da Casa de Maria.
O depoimento do diretor de uma ONG destaca que o nepotismo é prática comum em
Toledo:
Ao nível de município, existe aqui uma questão assim, que vem desde a
colonização do Oeste. Então existem os grupos que se privilegiaram desde a
colonização e que se estabeleceram aqui, e esses grupos usam muito essa
questão de usar o meio rural, a agricultura como instrumento fundamental de
mobilização. Então os agricultores são uma massa de manobra de um grupo
que está no poder há muito tempo aqui na região. Então mesmo que as
pessoas vivam no campo, mas a influência deles é muito grande, porque eles
têm muito capital, então esse grupo consegue mobilizar. E alguns
empresários, que nem na cidade existem alguns segmentos que quando
pende pra um lado eles investem, eles conseguem muito e depois é lógica
que as administrações tem que retribuir aquilo que foi colocado antes. Então
é aquela troca de favores que é o clientelismo, né? Olha eu vou investir na
tua campanha, vou investir em você, mas depois você vai trabalhar pra mim.
210
Isso sem dúvida ainda continua acontecendo. Acho que com o
amadurecimento, essa caminhada que a gente já vai tendo, afinal de contas
não somos tão bebês mais, democraticamente, mas a gente tem muito que
aprender a caminhar ainda.
(Entrevista com diretor da APA, concedida em
maio de 2006)
Com relação aos eleitores entrevistados, todos se mostraram contrários ao nepotismo.
“O nepotismo não tem justificativa nenhuma. O público se esfacela quando práticas como o
nepotismo são feitas”, alega um eleitor. A contratação de parentes nos três poderes é um
assunto que tem mobilizado vários setores da sociedade civil. A opinião pública se mostra
indignada em relação a essa prática. Contudo, projetos contrários ao nepotismo estão sendo
arquivados ou não aprovados pelos parlamentares. No caso do Paraná, o candidato à reeleição
ao governo, Roberto Requião, afirmou que, se fosse reeleito, manteria seus parentes em
cargos públicos. A convicção da legitimidade do nepotismo é sua maior garantia de sobrevida,
verdadeiro traço cultural de nossa sociedade.
Sobre essa temática, Roberto DaMatta (1993) argumenta que a força do familismo e a
importância das relações pessoais são proporcionais à ausência de confiança na vida pública.
Segundo o autor, a presença permanente e naturalizada do nepotismo e do clientelismo no
processo político e eleitoral brasileiro estão relacionados a problemas culturais e históricos,
entre os quais o autor destaca quatro: 1) no Brasil, a persistência do clientelismo e do
personalismo tem raízes históricas e nos diferencia de muitos outros países; 2) a força do
familismo e do espaço social da casa é diretamente proporcional à ausência de confiança na
vida pública; 3) as relações pessoais têm muito mais peso e importância do que as leis e
normas; e 4) as tradições jurídica e política são altamente centralizadoras. Portanto, esse
quadro favorece a continuidade de um Estado extremamente autoritário e perverso do ponto
de vista da cultura política democrática (DAMATTA, 1993).
211
Nessa discussão, Elisa Reis (1995) resgata o conceito de “familismo amoral”, de
Banfield
29
, que corresponde a um ethos preso à lógica familista privada, o qual exclui
qualquer tipo de solidariedade social fora do círculo familiar. Segundo a autora, “a situação
retratada por Banfield sugere que uma falta de confiança generalizada levava os membros da
comunidade a considerar o recuo para a esfera privada como sua escolha mais racional”
(REIS, 1995, p. 37). Ao analisar as implicações do “familismo amoral” em sociedades que se
caracterizam por estruturas de elevada desigualdade, Reis constata que as formas extremadas
de desigualdade social presentes na América Latina explicam a dificuldade em estabelecer
confiança interpessoal e solidariedade social, uma vez que “agudas disparidades nas
experiências de vida geram diferenças tão grandes nas orientações cognitivas que sentimentos
de pertencimento simplesmente não podem se fixar” (REIS, 1995, p. 46).
Paralelamente à corrupção e ao nepotismo, o clientelismo está presente em todos os
países do mundo, sendo sua ocorrência maior nos países em desenvolvimento. A percepção
dos toledanos a respeito dessa prática pode se analisada sob dois ângulos: na perspectiva do
político e na visão dos eleitores. Os vínculos dos parlamentares com seus municípios e a
manutenção de suas redes políticas locais ocupam lugar de destaque nas variáveis essenciais
para a compreensão da dinâmica política no âmbito federal. Vereadores entrevistados
analisam o clientelismo da seguinte forma:
Para nós, que vivemos na vida política institucional fica muito claro isso,
quando se aproxima o período eleitoral, quer dizer, a Câmara municipal,
espaço pouco visitado pelos eleitores no geral, as nossas sessões, as nossas
discussões que fazemos (...) não têm a observação e o acompanhamento da
população. No entanto, no período eleitoral, a transformação é visível, os
corredores viram verdadeiros pontos de parada da população, onde parece
que todos os problemas do mundo aparecem naquele momento: é a luz que
está sendo cortada, a água que já foi cortada, é o aluguel que está atrasado, é
a comida que acabou e precisa de uma cesta básica, portanto, é uma situação,
é um enraizamento desse olhar para a política, é um período de negociação,
29
A obra The Moral Basis of a Backward Society, de 1958, de Banfield, descreve o “familismo amoral” como
um fenômeno que ocorre em um pequeno povoado rural do Sul da Itália. Trata-se de uma situação em que a
solidariedade social e o sentimento de pertencimento não se prolongam além do ambiente familiar (REIS, 1995).
212
abriu-se o período de negociação. Então o candidato precisa do voto e
aqueles que estão lá certamente vão se recandidatar, precisam do voto e eu
vou lá colocar minhas demandas individuais e imediatas para que eles
resolvam e eu troque pelo voto, então é muito claro isso, é óbvio que muitos,
a grande maioria, eu diria, se aproveitam disso, a grande maioria dos
vereadores e certamente dos deputados e de outros políticos de outras esferas
se aproveitam disso, porque está em desespero. (Vereador do PT em
entrevista concedida em maio de 2006)
Outro vereador se diz totalmente contrário à prática do clientelismo e alega que, em
vez de trocar favor por voto, o candidato deveria incentivar o eleitor a buscar seus direitos nas
políticas públicas: “Mas é óbvio que sou totalmente contra essa história de clientelismo, isso é
uma outra coisa que... o candidato deve ensinar os caminhos, os direitos que tem o cidadão, e
não ele prestar favor. Que infelizmente é isso que a gente tem visto” (Vereador do PMDB).
De acordo com o radialista da Rádio União, o clientelismo é um problema histórico,
que ocorre devido ao assistencialismo, segmentação de setores e favorecimento de
determinados grupos. A fim de ilustrar uma situação, foi solicitado ao presidente da ADVT
que respondesse a seguinte questão: “Se, por acaso, um candidato lhe oferecesse um
computador ou um emprego, em troca do voto, você aceitaria, votaria nesse candidato ou não
aceitaria e denunciaria. Qual seria sua postura?”
Olha, mas é complicado essa questão, viu? Porque se eu te explico assim,
por exemplo, eu não aceitaria, né? Mas, e se você está numa situação
precária? Aí você vai aceitar por questões de falta de políticas públicas, de
ações voltadas pra pessoa, né? Então é complicadíssimo essa sua questão. Se
eu estou numa situação beneficiada, das ações desenvolvidas para minha
subsistência, é lógico que eu não vou aceitar, né? Agora se eu estou numa
situação realmente complicada, de sobrevivência, não tenho como me
manter, e a pessoa vem e me oferece um cargo desse daí, aí eu vou aceitar,
porque eu to precisando, né? Então dentro desse processo aí, fica difícil te
responder. Nesse sentido, é bem complexo... na verdade, igual eu falei pra ti,
é complexo responder a pergunta, mas é assim, eu não aceitaria porque eu
não concordo com a idéia desses políticos aí, então se você entrar lá porque
você recebeu um cargo e tal e você ganhar isso e aquilo outro, e ficar
subordinado a eles, e não ter condição de desenvolver nada, aí não dá. Eu
gosto de estar sempre atuando, desenvolvendo sempre alguma atividade,
sempre mobilizando, né? (Presidente da ADVT em entrevista concedida em
maio de 2006)
213
O depoimento revela que o clientelismo se nutre das necessidades insatisfeitas da
população, funcionando como um instrumento de dominação e de continuidade no poder.
Questionada sobre a atitude que teria se abordada por um político com proposta de emprego
ou cesta básica em troca do voto, uma eleitora, totalmente contrária ao clientelismo,
respondeu que aceitaria, mas não votaria no candidato. “Não votaria nele porque são tudo
mentiroso mesmo. Porque eu sei que ele tá comprando o voto”. Se as práticas clientelistas se
justificam, em grande parte, pela situação de pobreza e desemprego, elas também se devem à
cultura política conservadora e de sujeição, em que os indivíduos têm consciência do sistema
político, mas não estão dispostos a se envolver e participar.
As opiniões muitas vezes são capazes de revelar atitudes e ações das pessoas.
Observa-se, em alguns casos, uma incoerência entre atitude e comportamento. As atitudes
políticas resultam da combinação de valores e crenças sobre eventos e fenômenos políticos.
Essas atitudes constituem um conjunto de predisposições e permitem apreender as
percepções, convicções e valores dos cidadãos em relação à política. Elas orientam o
comportamento e têm um componente cognitivo – estrutura de conhecimentos ou de crenças
compartilhadas com outras pessoas –, que possibilita ao indivíduo organizar e hierarquizar as
informações recebidas. Atitudes e crenças são, assim, assumidas como eventos reguladores do
comportamento de indivíduos e grupos.
Os dados do Estudo Eleitoral Brasileiro (ESEB, 2002) servem mais uma vez para
ilustrar a incongruência entre atitude e comportamento político. Foi solicitado aos
entrevistados que opinassem sobre situações hipotéticas em relação às práticas clientelistas,
propostas que ocorrem com relativa freqüência no período eleitoral.
Mais da metade dos entrevistados defendem que a família pobre não deveria trocar seu
voto por uma cesta básica. Contudo, mais de 80% acreditam que esta família aceitará a cesta
básica em troca de seu voto, muito provavelmente por causa da situação de pobreza em que
214
ela se encontra. Segundo Baquero (s/d), dentro da perspectiva da teoria da cultura política, é
essencial estabelecer a diferença entre atitudes e comportamento. Embora existam
predisposições contrárias ao clientelismo, quando se analisa o comportamento dos cidadãos, a
evidência sugere que este não apresenta coerência em relação à atitude. É o que se denomina
diferencial semântico.
Os dados examinados até aqui permitem identificar elementos importantes da cultura
política toledana e da dinâmica política local. A democracia, para a maioria dos entrevistados,
é concebida como um espaço para a participação política. Uma participação que ainda não se
efetivou na prática ao nível comportamental. As opiniões dos cidadãos denotam percepções
conscientes do processo político e uma vontade de construir uma cultura política democrática
no município e no país. Contudo, do ponto de vista comportamental, há pouco envolvimento e
participação política, e a ausência de confiança nas instituições compromete a legitimidade do
sistema político e contribui para a permanência de práticas políticas como a corrupção, o
nepotismo e o clientelismo, que inibem a consolidação de valores democráticos.
215
8 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta tese examinou as configurações do comportamento político de Toledo (PR),
buscando caracterizar a cultura política toledana a partir da compreensão de como as pessoas
internalizam valores relativos ao campo da política, e como esses valores se traduzem em
atitudes e comportamentos no processo de construção democrática.
A abordagem foi realizada dentro da perspectiva teórica da cultura política e da
corrente psicossociológica, possibilitando examinar as crenças, atitudes, motivações e
comportamentos dos cidadãos em relação aos políticos e às instituições democráticas, bem
como compreender a lógica do comportamento político no município.
A pesquisa destaca a importância dos valores culturais na explicação do
comportamento político, sem deixar de valorizar os aspectos histórico-estruturais e
institucionais, condicionados por componentes prescritivos e cognitivos. Considera-se que a
maneira como as pessoas internalizam normas, crenças e valores políticos influencia o seu
comportamento político. Há um consenso contemporâneo em relação ao fato de que a
construção democrática também depende do desenvolvimento de uma base normativa de
apoio aos valores democráticos. Dessa forma, a atualidade do conceito de cultura política está
em fornecer ferramentas de análise na explicação das predisposições e comportamentos
políticos dos cidadãos. A literatura referenciada no decorrer do trabalho teve como objetivo
respaldar esse tipo de abordagem.
A relevância da temática e a escassa produção de estudos dessa natureza no âmbito
dos municípios do Oeste paranaense foram propulsores para a realização dessa pesquisa.
Propor a “cidade” como unidade de análise possibilita avaliar melhor a qualidade da
democracia, tanto do ponto de vista da política formal, como das dimensões econômica e
social. Os estudos de poder local possibilitam a compreensão dos aspectos do sistema político
216
mais amplo, especialmente em relação às estratégias adotadas para a manutenção do poder e
das práticas políticas tradicionais. Concentrar o estudo do comportamento político no âmbito
municipal, situando a análise numa região específica, permitiu repensar esses elementos
tradicionais como definidores do poder local.
Neste contexto, esta tese buscou explicar as motivações para o voto, os principais
fatores da decisão eleitoral e os aspectos da cultura política toledana. A fim de desenvolver a
análise e responder as questões apresentadas, foram utilizados dados de pesquisa realizada em
Toledo por ocasião das eleições presidenciais de 2002. Esses dados foram complementados
por pesquisa qualitativa realizada posteriormente, em 2006. Dessa forma, foi possível
alcançar os objetivos propostos nesta tese e verificar as hipóteses do trabalho. Os resultados
da pesquisa permitem identificar elementos importantes da cultura política toledana e da
dinâmica política local.
O conjunto de dados examinados evidencia um eleitorado com baixo nível de
escolaridade, baixo poder aquisitivo e relativamente jovem. Do ponto de vista atitudinal, os
toledanos apresentam baixo interesse por política, baixos níveis de participação política e de
confiança nas instituições. Verificou-se que o ceticismo e o afastamento dos cidadãos da
esfera da política comprometem atitudes e comportamentos favoráveis à participação e à
cooperação. Sair desse círculo vicioso para um círculo virtuoso, no qual a credibilidade nas
instituições políticas e o sentimento de eficácia política favoreçam o aumento da participação
política, é o grande desafio da democracia brasileira.
Os resultados da pesquisa mostram que a descrença dos cidadãos nas instituições
políticas é expressiva. Os fatores determinantes para essa descrença estão associados ao não
cumprimento das funções de representar e mediar os interesses sociais e às crescentes
denúncias de corrupção na esfera política. Os toledanos expressam uma avaliação bastante
negativa em relação à atuação e ao desempenho dos políticos. Segundo os entrevistados, a
217
maioria dos políticos procura enriquecer à custa do dinheiro público e arrumar a vida de
amigos e parentes.
De fato, o clientelismo, o nepotismo e a corrupção são práticas comuns no exercício
do poder político que funcionam como obstáculos à consolidação dos valores democráticos.
Trata-se de práticas que perpassam toda a história política do país e envolvem recursos
públicos e relações verticais, assimétricas e personalizadas. São tão arraigadas historicamente
que se reproduzem até mesmo no interior das organizações sociais, espaços abertos para a
participação e inclusão.
Ao analisar a história política do município, foi possível observar que os governos
municipais, ao longo dos anos, têm se configurado em espaços para essas práticas
tradicionais. A ascendência de lideranças pessoais sobre os partidos políticos imprime um
caráter personalista à política toledana, marcada por uma cultura política conservadora e
autoritária. A crescente desmoralização dos partidos políticos e a desconfiança gerada em
relação à política favorecem a institucionalização do voto personalista.
Na ausência de vínculos partidários, programáticos e ideológicos, os atributos pessoais
dos candidatos têm fundamental importância na escolha eleitoral. Dessa forma, os eleitores
tendem a votar orientados pela pessoa do candidato em detrimento dos partidos políticos. A
explicação para o predomínio de vínculos pessoais e de sentimentos particularistas e
individualistas deve ser buscada na matriz histórico-estrutural da cultura política brasileira,
caracterizada por relações assimétricas, verticais e dependentes. O argumento é de que a
personalização do poder e o clientelismo estão relacionados a fatores de natureza histórica e
cultural que incidem diretamente na forma como os cidadãos se posicionam em relação à
política.
Uma das hipóteses que norteou este trabalho propôs testar a existência de correlação
entre os níveis de interesse por política e a decisão do voto. Os dados indicaram uma relação
218
significativa entre essas duas variáveis. Observa-se uma maior orientação personalista do voto
na medida em que decrescem o interesse e o grau de informação política do eleitorado.
Os dados analisados também confirmam a hipótese de que a confiança é um
importante indicador de participação política. Os níveis de participação mostraram-se mais
baixos entre aqueles que afirmaram não confiar nas instituições políticas. Por sua vez,
observou-se que a participação, tanto em atividades políticas formais como informais,
influencia no tipo de escolha eleitoral. Os dados sugerem que o voto personalista é maior
entre aqueles que não participam.
A partir dos aportes teóricos e dos dados, constatou-se uma tendência ao voto
personalista na lógica do comportamento político toledano, especialmente entre aqueles que
demonstraram baixos índices de interesse, de confiança e de participação política.
Com base nesses resultados, buscou-se aprofundar a maneira como os cidadãos
percebem a democracia e a prática política local. Para a maioria dos toledanos, a liberdade de
escolha, a liberdade de opinião e a possibilidade de participação política constituem valores
democráticos fundamentais. De maneira geral, a democracia é concebida como um conjunto
de regras e instituições e como um espaço para a participação política. E, de fato, o conjunto
de dados examinados evidenciou uma predisposição positiva para a participação. Entretanto,
do ponto de vista comportamental, tal participação não se efetiva na prática.
A análise dos dados mostrou também que, a despeito do baixo interesse por política, as
pessoas foram capazes de se posicionar frente a problemas pontuais, avaliar o desempenho
dos políticos e opinar sobre as práticas políticas cotidianas. Contudo, não mostraram
motivação para se envolver em atividades que possam sanar os problemas mencionados e nem
transformar as práticas que desgastam a democracia. Essa é uma das características da cultura
política toledana: as pessoas pouco se interessam em buscar informações sobre o que acontece
219
na política e não se sentem estimuladas a participar e a intervir. Há uma ausência do
sentimento de competência cívica e de eficácia política.
Em relação aos baixos índices de participação política, cabe salientar que a forma
como os cidadãos percebem a política local e nacional, muito contribui para o seu afastamento
da esfera política. Há uma crescente insatisfação com o funcionamento das instituições
políticas e uma decepção com o desempenho socioeconômico do regime democrático. O
acirramento da pobreza e da exclusão social, de um lado, e o enriquecimento ilícito de
políticos via desvio de recursos públicos, de outro, propicia um cenário de descrença,
favorecendo a existência de práticas pouco democráticas, baseadas em princípios
particularistas e individualistas.
O clientelismo, por exemplo, se nutre das necessidades insatisfeitas da população,
funcionando como um instrumento de dominação e continuidade de poder. Caracteriza-se
pela prevalência de critérios particularistas sobre critérios universalistas na alocação de
recursos e benefícios públicos. As relações de clientela se mantêm num contexto que combina
democracia com exclusão social e se constituem numa alternativa à presença difusa das
estruturas do Estado.
A pesquisa captou predisposições contrárias às práticas clientelistas entre os toledanos.
Contudo, mediante suposta proposta de troca do voto por emprego ou cesta básica, as ações
dos cidadãos mostraram-se positivas e favoráveis a ela, legitimando tais práticas. Observou-se
um diferencial semântico entre atitudes e comportamento político das pessoas.
De modo geral, ficou evidenciado que a existência do personalismo, do clientelismo,
do nepotismo e da corrupção na política contemporânea tem um impacto direto no
comportamento político dos cidadãos. Estas práticas se caracterizam por envolverem relações
pessoais e hierárquicas, por formatarem as relações políticas e sociais e desvalorizarem as
instituições políticas, comprometendo o regime democrático.
220
Dessa forma, os dados examinados nesta tese sinalizam para a persistência de valores
culturais e de determinadas práticas políticas que impedem a construção de uma cultura
política participativa e democrática. A negligência da dimensão social, a má qualidade dos
serviços públicos, a ineficácia dos partidos e dos governos em responderem às demandas da
sociedade civil corroboram para um déficit democrático. Os baixos níveis de confiança nas
instituições revelam que a adesão e o apoio difuso aos princípios democráticos, associados a
um alto índice de insatisfação com a democracia, não são capazes de legitimá-la.
Esses indicadores convergem para resultados de pesquisas, realizadas em âmbito
nacional, que constatam a existência de uma cultura política híbrida e contraditória, em que
convivem elementos autoritários e democráticos. Uma cultura política orientada pelo
individualismo, passividade, indiferença e desconfiança, que pouco contribui para a
estabilidade e legitimidade da democracia. Esse hibridismo é fruto da ambigüidade da própria
democracia, que mantém elementos políticos tradicionais dentro das formas e ações políticas
modernas.
A mudança atitudinal dos cidadãos e a formação de uma cultura política compatível
com os valores democráticos são de fundamental importância para promover a organização
social e a legitimidade do sistema político. Existe evidência de que, em contextos onde há
mobilização, confiança e cooperação entre as pessoas, há maior envolvimento cívico e maior
participação política. Pesquisas e autores referenciados nesta tese demonstram isso.
Verifica-se que os estudos de cultura política nos países americanos, europeus e latino-
americanos tornaram-se mais sistemáticos nos últimos anos. Pode-se encontrar também
pesquisas relativas aos Estados brasileiros. Entretanto, no âmbito dos municípios, ainda são
bastante escassos os estudos de cultura política. Nesse sentido, retomar o universo municipal a
partir de novos pressupostos possibilita uma melhor compreensão das decisões políticas e das
relações de poder entre as esferas federal, estadual e municipal.
221
Esta tese pretendeu contribuir para o debate acerca da democracia e das práticas
políticas localizadas em contexto regional e para a ampliação de estudos sobre personalismo e
clientelismo, fenômenos que permanecem na política contemporânea. O trabalho limita-se
pela ausência de indicadores que pudessem avaliar outros aspectos da cultura política, tais
como os níveis de confiança interpessoal e o processo de socialização política do eleitorado.
A internalização de valores e a formação de atitudes políticas são resultantes do conjunto das
experiências vivenciadas pelos indivíduos, desde a infância até a fase adulta. Analisar este
processo permite compreender, de maneira mais aprofundada, o comportamento político dos
cidadãos.
O esforço aqui empreendido pode ser visto como uma das primeiras tentativas de
detectar tendências do comportamento político entre os toledanos. Sugere-se a realização de
novas pesquisas na região, no sentido de ampliar o alcance empírico e teórico do
comportamento político na região. Pesquisas que permitam observar regularidades e padrões
de atitudes e comportamentos no âmbito da política. Pesquisas que investiguem diferenças e
semelhanças entre os municípios de pequeno, médio e grande porte, fornecendo, assim,
elementos de comparação entre o Oeste paranaense e as demais regiões do Estado. E,
finalmente, sugere-se a realização de pesquisas de caráter mais propositivo e de incidência na
realidade, na perspectiva da construção de uma cultura política democrática e da constituição
de capital social.
222
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234
APÊNDICE A
QUESTIONÁRIO APLICADO
235
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ – UNIOESTE
Campus de Toledo
Curso de Ciências Sociais
Coordenadora do Projeto: Prof. Maria Salete Souza de Amorim
ELEIÇÕES ESTADUAIS NO PARANÁ – 2002
DIA MÊS ANO
DATA DA ENTREVISTA
No. DO QUESTIONÁRIO: __________
ENTREVISTADOR: _____________________________________________________
BOM DIA/ BOA TARDE. Eu sou da Unioeste, aluna(o) do Curso de Ciências Sociais. Você
poderia me responder uma pesquisa sobre as eleições? (Leva cerca de 10 minutos).
Filtro: Você mora em casa ou está de passagem?
Você é eleitor da cidade de Toledo?
(Caso não more no domicílio ou não seja eleitor de Toledo não aplique o questionário.
Verifique se há alguém na casa que possa dar entrevista).
SEXO IDADE:
1. Masculino ______ 1. 16 ou 17 anos
2. Feminino (anote)
P1. Você é brasileiro nato?
1. Sim
2. Não (Anote o país de origem: ___________________)
P2. Há quanto tempo mora aqui em Toledo? _________ anos
(Escreva “01” se for até um ano)
P3. Até que ano freqüentou escola?
01. Nunca freqüentou
02. Ensino Fundamental incompleto
03. Ensino Fundamental completo (1
o
. grau)
04. Ensino Médio incompleto
05. Ensino Médio completo (2
o
. grau)
06. Superior incompleto
07. Superior completo (Qual curso? ________________________)
08. Pós-graduação (Em que área? _________________________)
88. NS
99. NR
Endereço completo:
236
P4. Atualmente qual é a sua ocupação principal?
1. Está trabalhando (Qual a função que exerce? _________________________)
2. É dona de casa
3. É aposentado
4. Está desempregado
5. Só estuda
6. Outros (Especificar: ___________________________________)
8. NS
9. NR
P5. Qual é a sua renda familiar?
1. Até 1 salário mínimo
2. De 1 a 2 salários mínimos
3. De 3 a 4 salários mínimos
4. De 4 a 5 salários mínimos
5. De 5 a 6 salários mínimos
6. Acima de 6 salários mínimos
8.NS
9.NR
P6. Quantas pessoas contribuem com a renda familiar?
1. 1 pessoa
2. 2 pessoas
3. 3 pessoas
4. 4 pessoas
5. Mais de 4 pessoas
P7. Participa de algum grupo social?
Sindicato (Qual? _______________________________)
Partido Político (Qual? __________________________)
Associação de Moradores (Qual? _____________________________)
Igreja (Qual? _____________________________________)
Outros (Especificar: ________________________________)
Não participa
P8. O que você acha dos serviços públicos aqui em seu bairro/cidade?
A . Assistência médica
1. Boa
2. Mais ou menos 8. NS
3. Ruim 9. NR
B. Segurança Pública/ Policiamento
1. Boa
2. Mais ou menos 8. NS
3. Ruim 9. NR
C. Transporte Coletivo
1. Boa
2. Mais ou menos 8. NS
3. Ruim 9. NR
D. Fornecimento de água/ serviços de esgoto
1. Boa
2. Mais ou menos 8. NS
3. Ruim 9. NR
E. Qualidade da Educação
1. Boa
2. Mais ou menos 8. NS
3. Ruim 9. NR
237
P9. Você é filiado a algum partido?
1. Sim Qual? ___________
2. Não
P10. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) estabeleceu que as coligações partidárias firmadas
em nível nacional deverão ser as mesmas nos Estados. Na sua opinião:
1. Essa medida é inconstitucional pois causou mudanças na lei eleitoral um ano antes do
pleito.
2. Essa medida é correta e favorece alianças de maior proximidade ideológica entre os
partidos.
3. Outros: (Especificar: __________________________________________________)
8. NS
9 NR
P11. Qual é seu partido de preferência? (MOSTRAR RELAÇÃO DOS PARTIDOS)
11. PPB
12. PDT
13. PT
14. PTB
15. PMDB
17. PDC
22. PL
25. PFL
33. PMN
36. PRN
40. PSB
41. PSD
43. PV
45. PSDB
46. PTN
47. PNAB
56. PRONA
65. PC do B
OUTROS? _______________________
P12. Se o voto não fosse obrigatório, você votaria para presidente e para governador na
eleição de 6 de outubro?
1. Sim
2. Não
8. NS
9. NR
P13. A decisão do seu voto tem sido motivada mais pela:
( ) identificação com a pessoa do candidato (simpatia/confiança)
( ) identificação com o partido do candidato
( ) identificação com o programa do candidato
( ) pelo resultado das pesquisas eleitorais
( ) Outros (Especificar: ___________________________________________________)
P14. Quais os 3 fatores mais importantes que você considera na escolha de um candidato ou
partido? (Espontânea)
1. Competência
2. Experiência
3. Cumprir promessas
4. Honestidade
5. Coragem
6. Inteligência
7. Outros (Especificar: ______________________________________)
8. NS / 9. NR
238
P15. Nas eleições municipais de 2000, em quem você votou para prefeito?
1. Derli Antonio Donin (coligação: PPB, PSDB, PL, PPS, PFL, PSB)
2. Luis Adalberto Pagnussatt (coligação: PDT, PMDB, PT)
3. OUTRO? _______________
8. NS
9. NR
P16. Em quem você pretende votar para presidente da República em 6 de outubro de 2002?
(Resposta espontânea): _______________________________________
P17. Se a eleição para presidente da República fosse hoje, em qual destes candidatos você
votaria? (MOSTRAR A RELAÇÃO DOS CANDIDATOS / MARCAR APENAS UMA
OPÇÃO)
1. Antony Garotinho - PSB
2. Ciro Gomes – PPS
3. José Serra - PSDB
4. Luiz Inácio Lula da Silva - PT
5.
6.
7.
8. Voto em branco
9. Voto nulo
8. NS
9. NR
P18. Em quem você pretende votar para governador do Estado do Paraná em 6 de outubro?
(Resposta espontânea): _______________________________________
P19. Se a eleição para governador do Estado fosse hoje, em qual destes candidatos você
votaria? (MOSTRAR A RELAÇÃO DOS CANDIDATOS / MARCAR APENAS UMA
OPÇÃO)
1. Achiles Batista Ferreira Jr. - PTC
2. Álvaro Dias - PDT
3. Benedito da Silva - PMN
4. Carlos Alberto Richa (Beto Richa) - PSDB
5. Cirus Itibere da Cunha - PSD
6. Claudemir Figueiredo Pessoa - PSTU
7. Giovani Gionedis - PSC
8. Jamil Nakad - PRTB
9. José Gladston Bispo - PRONA
10. Roberto Requião - PMDB
11. Roque Zimmermann - PT
12. Rubens Bueno - PPS
13. Severino Nunes de Araújo - PSB
14. Voto em Branco
15. Voto Nulo
88. NS / 99. NR
239
P20.Quais os interesses que os candidatos ao governo do Estado do Paraná defendem em suas
propostas? (MARCAR APENAS UMA OPÇÃO)
Trabalhadores Grandes
Empresários
Grandes
Proprietários
Rurais
Interesses
próprios
Pequenos
Agricultores
Outros
(Especificar)
Não
Sabe
Álvaro Dias
Beto Richa
Roberto
Requião
Padre Roque
Rubens
Bueno
Outro
(especificar)
P21. Qual o grau de sua confiança em relação a:
P22. Os vereadores, deputados e senadores têm como principais funções fazer leis e fiscalizar
o uso do dinheiro público. Na sua opinião, os vereadores da sua cidade cumprem essa função?
E os deputados da Assembléia do Estado? E os deputados e senadores do Congresso
Nacional?
1. Sindicatos 1. Muita
2. Pouca
3. Nenhuma
2. Partidos 1. Muita
2. Pouca
3. Nenhuma
3. Televisão 1. Muita
2. Pouca
3. Nenhuma
4. Igrejas 1. Muita
2. Pouca
3. Nenhuma
5. Polícia 1. Muita
2. Pouca
3. Nenhuma
6. Cientistas e Professores 1. Muita
2. Pouca
3. Nenhuma
7. Deputados e Senadores 1. Muita
2. Pouca
3. Nenhuma
7. Tribunais de Justiça 1. Muita
2. Pouca
3. Nenhuma
8. Ministros do Governo 1. Muita
2. Pouca
3. Nenhuma
SIM NÃO UM POUCO NÃO SABE
Vereadores 1 2 3 4
Deputados Estaduais 1 2 3 4
Deputados Federais e Senadores 1 2 3 4
240
P23. Na sua opinião os políticos brasileiros procuram, em 1
o
lugar: (Marcar apenas uma
opção)
1. Defender os interesses dos eleitores
2. Enriquecer a custa do dinheiro público
3. Cumprir o programa de governo
4. Arrumar a vida dos amigos e parentes
5. Defender propostas de bem-estar social para todos
6. Outras respostas: _______________________________________________________
8. NS
9. NR
P24. Você acompanha as notícias políticas do país por quais veículos de comunicação?
(espontânea)
1. Pela TV
2. Pelo rádio
3. Pelos jornais
4. Por revistas
5. Parentes
6. Amigos
7. Vizinhos
8. Colegas de trabalho
9. Outras formas: _____________
P25. Você tem o hábito de:
SIM NÃO RARAMENTE
Ler ou assistir o noticiário sobre política? 1 2 3
Assistir propaganda política eleitoral?
Conversar sobre política com outras pessoas? 1 2 3
Tentar convencer amigos a votarem nos candidatos
que acha bom?
1 2 3
Freqüentar reuniões de associações para resolver
problemas do seu bairro ou da sua cidade?
1 2 3
Freqüentar reuniões de partidos políticos? 1 2 3
Assinar manifestos de protesto ou de reivindicações? 1 2 3
Participar de manifestações a favor ou contra o
governo?
1 2 3
Participar de greves? 1 2 3
Outra atividade política?
(SE SIM: QUAL: ___________________
1 2 3
P26. Sobre a reforma agrária, qual é a afirmação que você mais concorda:
1. É a favor de uma reforma agrária em todas as grandes propriedades do país
2. É a favor de uma reforma agrária só nas grandes propriedades improdutivas
3. É a favor de uma reforma agrária só nas terras do governo
4. É contra qualquer projeto de reforma agrária.
8. NS
9. NR
241
P27. Aqui na região existe o problema de desvalorização do produto (direto do produtor) em
relação ao valor de revenda no mercado. Na sua opinião, quais as medidas que o governo
deveria tomar para solucionar essa questão? (Resposta espontânea)
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
P28. Na sua opinião, o governo está sendo eficaz no combate ao trafico de drogas? Quais as
medidas que poderiam ser tomadas para resolver o problema?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
ENCERRE A ENTREVISTA E AGRADEÇA
OBSERVAÇÕES DO ENTREVISTADOR: ANOTE SEM PERGUNTAR
Tempo gasto com a entrevista: ________________
Cor do entrevistado:
1. Branco
2. Negro
3. Amarelo (oriental, japonês, chinês...)
4. Pardo (mulato, mestiço)
A residência do entrevistado é:
1. Luxo
2. De boa qualidade
3. Modesta
4. Pobre
5. Muito pobre
Em que medida o entrevistado foi sincero, interessado e capaz de compreender as perguntas
formuladas? (Dê notas de 1 (baixíssimo grau) a 10 (grau máximo)
NOTA
A. Grau de sinceridade
B. Grau de interesse
C. Grau de compreensão
242
APÊNDICE B
CONSTRUÇÃO DE ÍNDICES
243
Análise Fatorial e Construção de Índices
Para a construção de índices, foi realizada análise fatorial, aplicada em sua modalidade
de rotação Varimax, a qual maximiza a variação entre um conjunto de variáveis.
O interesse por política foi medido através de quatro perguntas:
P25. Você tem o hábito de?
P25a. Ler ou assistir o noticiário sobre política?
P25b. Assistir propaganda política eleitoral?
P25c. Conversar sobre política com outras pessoas?
P25d. Tentar convencer amigos a votarem nos candidatos que acha bom?
As respostas alternativas eram: “Sim”, “Raramente” e “Não”. Para efeito de construção do
índice avaliativo de interesse por política, as respostas receberam pesos diferenciados e
apenas foram considerados os entrevistados que responderam a todas a essas questões.
A escala foi construída pelo seguinte procedimento:
O somatório das respostas “Sim” foi multiplicado pelo somatório das respostas “Raramente” e
dividido pelo número total de respostas das quatro variáveis selecionadas. Para obter as três
categorias “Baixo”, “Médio” e “Alto”, o resultado foi dividido por dois.
0,00 – 0,33 = Baixo Interesse
0,34 – 0,67 = Médio Interesse
0,68 – 1,00 = Alto Interesse
244
Total Variance Explained
2,668 26,680 26,680 2,668 26,680 26,680 2,077 20,772 20,772
1,813 18,132 44,812 1,813 18,132 44,812 1,968 19,681 40,453
1,374 13,737 58,549 1,374 13,737 58,549 1,810 18,096 58,549
,957 9,566 68,115
,794 7,938 76,053
,728 7,281 83,334
,616 6,164 89,498
,528 5,282 94,780
,435 4,354 99,134
8,664E-02 ,866 100,000
Component
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
Total % of Variance Cumulative % Total % of Variance Cumulative % Total % of Variance Cumulative %
Initial Eigenvalues Extraction Sums of Squared Loadings Rotation Sums of Squared Loadings
Extraction Method: Principal Component Analysis.
Análise Fatorial com rotação Varimax
Índices Variáveis Fator 1 Fator 2 Fator 3
Você tem o hábito de ler ou assistir o noticiário sobre
política?
,744
Você em o hábito de assistir propaganda política
eleitoral?
,706
Você tem o hábito de conversar sobre política com
outras pessoas?
,681
Interesse por
política
Você tem o hábito de convencer amigos a votarem
nos candidatos que acha bom?
,560
Você participa de partidos políticos? ,923
É filiado a algum partido político? ,940
Participação
Política
Convencional
Você freqüenta reuniões de partidos políticos? ,489
Você tem o hábito de assinar manifestações de
protestos?
,618
Você tem o hábito de participar de manifestações a
favor ou contra o governo?
,834
Participação
Política Não
Convencional
Você tem o hábito de participar de greves? ,800
Peso de inclusão de variável: 0,40
Eigenvalues = 1
245
Frequency Table
Escala Interesse por política
31 10,3 10,3 10,3
29 9,7 9,7 20,0
58 19,3 19,3 39,3
38 12,7 12,7 52,0
48 16,0 16,0 68,0
33 11,0 11,0 79,0
30 10,0 10,0 89,0
15 5,0 5,0 94,0
18 6,0 6,0 100,0
300 100,0 100,0
,00
,13
,25
,38
,50
,63
,75
,88
1,00
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Índice Interesse por Política
118 39,3 39,3 39,3
119 39,7 39,7 79,0
63 21,0 21,0 100,0
300 100,0 100,0
Baixo
Médio
Alto
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Escala Participação Política Convencional
259 86,3 86,3 86,3
12 4,0 4,0 90,3
12 4,0 4,0 94,3
7 2,3 2,3 96,7
2 ,7 ,7 97,3
8 2,7 2,7 100,0
300 100,0 100,0
,17
,33
,50
,67
,83
1,00
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
246
Índice Participação Política Convencional
271 90,3 90,3 90,3
19 6,3 6,3 96,7
10 3,3 3,3 100,0
300 100,0 100,0
Baixo
Médio
Alto
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Escala Participação Política Não Convencional
156 52,0 52,0 52,0
42 14,0 14,0 66,0
57 19,0 19,0 85,0
11 3,7 3,7 88,7
23 7,7 7,7 96,3
3 1,0 1,0 97,3
8 2,7 2,7 100,0
300 100,0 100,0
,00
,17
,33
,50
,67
,83
1,00
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Índice Participação Política Não Convencional
255 85,0 85,0 85,0
34 11,3 11,3 96,3
11 3,7 3,7 100,0
300 100,0 100,0
Baixo
Médio
Alto
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
247
APÊNDICE C
ROTEIRO PARA ENTREVISTA
248
ROTEIRO PARA ENTREVISTA
Apresentação da pesquisadora: Professora da Unioeste, do curso de Ciências Sociais do
Campus de Toledo, doutoranda em Ciência Política pela URFGS.
Objetivos da pesquisa: Identificar as percepções, motivações e orientações políticas dos
cidadãos em relação à política e às instituições democráticas.
Gostaria de conversar sobre alguns temas políticos e peço que o(a) sr(a) fique bem à vontade
em responder as questões. Se me permitir, vou gravar a entrevista. Seu nome não será citado
no trabalho.
Dados Sócio-Demográficos
(anotar informações sobre: Sexo / Escolaridade / Situação profissional)
Área de Atuação: política, movimentos sociais, associações, Ong’s, Igrejas, meios de
comunicação.
Concepção de Democracia
1. Eu gostaria de começar a entrevista perguntando o que o(a) Sr(a) entende por democracia?
2. O(a) sr(a) diria que o Brasil se encaixa nessa definição de democracia?
3. Na sua opinião, qual o principal problema do Brasil hoje?
Participação Política
4. Na sua avaliação, é importante a participação da população na política?
Personalismo
5. O(a) Sr(a) acha que as instituições políticas (o Congresso, os partidos), estão cumprindo a
sua função de representar os interesses dos cidadãos?
6. Em relação às eleições, o que considera mais importante na hora de votar: a pessoa do
candidato, o partido político ou as propostas defendidas por ele?
Nepotismo, Clientelismo e Corrupção
7. A corrupção, o nepotismo e o clientelismo são questões muito debatidas no cenário político
nacional. Temos acompanhado muitas denúncias de corrupção na política nos últimos anos.
O(a) Sr(a) consegue vislumbrar outros instrumentos, além das CPI’s, que possam coibir as
práticas corruptas?
8. A questão do nepotismo também está sendo bastante debatida. O(a) sr(a) sabe o que é
nepotismo? O(a) Sr(a) é a favor ou contra a contratação de parentes pelas administrações
públicas?
9. E a respeito do clientelismo? Qual sua opinião sobre a concessão de benefícios públicos em
troca do voto? Conhece alguma situação que caracterize essa prática?
249
APÊNDICE D
QUADRO PARTIDÁRIO – CÂMARA MUNICICPAL DE TOLEDO
250
Quadro Partidário – Câmara Municipal de Toledo (1952-1982)
Partidos 1952-56 1956-60 1960-64 1964-68 1968-72 1972-76 1976-82
PL 8
PR 1 2
PTB 3 4 1
PSD 3 2 5
UDN 1 3
PDC 2
PRP 1
ARENA 7 5 6
MDB 2 4 3
TOTAL 9 9 9 9 9 9 9
Fonte: Quadro elaborado pela autora.
Quadro Partidário – Câmara Municipal de Toledo (1982-2008)
Partidos 1982-88 1988-92 1992-96 1996-00 2000-04 2004-08
PMDB 8 5 4 1 1 3
PDS 5 7 1
PTB 1 1
PDT 3 7 4 2
PFL 1 2 1 2 1
PT 1 2 2 2
PRN
PPB / PP 1 6 7 5
PSDB 3 2
PPS 1
TOTAL 13 17 17 17 17 11
Fonte: Quadro elaborado pela autora
251
ANEXO A
DADOS DO CENSO DEMOGRÁFICO/2000
252
253
Mapa dos Bairros de Toledo
Livros Grátis
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