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APARECIDA RODRIGUES SILVA DUARTE
MATEMÁTICA E EDUCAÇÃO MATEMÁTICA:
a dinâmica de suas relações ao tempo do Movimento da
Matemática Moderna no Brasil
DOUTORADO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
PUC/SP
São Paulo
2007
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APARECIDA RODRIGUES SILVA DUARTE
MATEMÁTICA E EDUCAÇÃO MATEMÁTICA:
a dinâmica de suas relações ao tempo do Movimento da
Matemática Moderna no Brasil
Tese apresentada à Banca Examinadora da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como
exigência parcial para obtenção do título de Doutor
em Educação Matemática, sob a orientação do
Professor Doutor Wagner Rodrigues Valente.
PUC/SP
São Paulo
2007
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Banca Examinadora
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________________________________________
Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial desta
Tese por processos de fotocopiadoras ou eletrônicos.
_______________________________________ ________________________
Assinatura Local e Data
Ao Paulo, Alexandre, Aninha,
José Rodrigues (in memorian) e
Oranides Aredes,
Com amor e gratidão
.
AGRADECIMENTOS
Profundos agradecimentos ao Professor Doutor Wagner Rodrigues
Valente
, orientador que me acompanha desde as primeiras
jornadas no Mestrado, culminando com a realização deste novo
trabalho. Autêntico pesquisador, que vem prestando inestimáveis
serviços à Educação Matemática, com quem muito aprendi, em
fraterno convívio, deixando-me contaminar pelo espírito da
investigação científica, encontrando nele, ainda, a força
necessária para superar obstáculos, com a certeza de que
manterei sempre viva uma admiração que não se consegue
explicar facilmente, cultivando em mim a memória que só as
grandes lutas em comum são capazes de criar.
Ao
Professor Doutor Ubiratan D’Ambrosio, pela amizade,
incentivo e atenção que sempre teve para comigo e pelo exemplo
de vida, cuja riqueza espiritual faz com que as pessoas que dele
se aproximam sintam-se afetados por sua grandiosidade,
manifestada, paradoxalmente, por uma doce e admirável
simplicidade.
Aos professores doutores
Ubiratan D’Ambrosio, Vincenzo
Bongiovanni
, Neuza Bertoni Pinto, José Manuel Matos, Maria
Cristina Menezes
, André Luís Mattedi Dias, Silvia Dias Alcântara
Machado
, que gentilmente se prontificaram em participar da banca
examinadora, contribuindo com oportunas e relevantes sugestões
para o aprimoramento da pesquisa.
À professora
Doutora Diana Gonçalves Vidal, a quem tributo
especial reconhecimento, considerando suas intervenções
durante a qualificação, esclarecendo pontos cruciais que
permeiam as práticas escolares, alertando para as armadilhas
conceituais, ajudando na melhor compreensão da História
Cultural.
Aos professores Doutores do Programa de Estudos Pós-graduados
em Educação Matemática da PUC/SP
, que jamais pouparam
empenho para a formação de futuros Mestres e Doutores desta
Instituição de Ensino Superior.
Aos professores
Adriana César de Matos Marafon, Alegria Gladys
Chalom
, Anna Franchi, Beatriz D’Ambrosio, Chaim Samuel Hönig,
Circe Mary Silva da Silva
, Eduardo Veloso, Elizabete Zardo
Búrigo
, Elza Gomide, Lourdes de La Rosa Onuchic, Manhúcia
Perelberg Liberman
, Mário Carvalho de Matos, Martha Maria de
Souza Dantas
, Odilon Otavio Luciano, Oscar João Abdounur,
Osvaldo Sangiorgi
, Plínio Castrucci, Renate Watanabe, Rita
Bastos
, Saddo Ag Almouloud, Sônia Igliori, Sonia Maria de
Freitas
, Valdemar Setzer, pela solicitude e desprendimento com
que se dispuseram a prestar colaboração para a realização desta
pesquisa, contribuindo com entrevistas, textos, comentários, etc.
Aos eficientes funcionários do
Museu da Imagem e do Som/SP, do
Arquivo da Escola Politécnica da USP/SP, do MAST/RJ, da
Biblioteca Central da UFBa, da Biblioteca Nacional/RJ, das
bibliotecas do
IME/USP, da Faculdade de Educação da USP/SP,
do
Instituto de Ciências Matemáticas da USP de São Carlos/SP,
das bibliotecas da PUC/SP e da Biblioteca Municipal de Pouso
Alegre/MG
, pelo profissionalismo e recepção que me dispensaram
ao longo desta caminhada.
Aos meus queridos colegas do GHEMAT, verdadeiros
companheiros no apoio para que fosse vencida cada etapa desta
gratificante jornada acadêmica. Agradecimentos especiais ao
Alex, “Anjinhu”, Célia Leme, Cristina Oliveira, Denise Medina,
Elenice
, Flainer, Inara, Liu, Mário, Maryneusa, Marytta, Tana,
Vera Moreno
e Viviane. E também aos colegas: Antonio,
Marilene
, Mônica e Rita.
À
Eliene Barbosa Lima, que foi responsável pela minha
“descoberta” da Bahia, quando ali me dediquei a estudos,
reunindo elementos importantes para este trabalho.
Ao casal
Layse Helena Jacy Monteiro e Nesso, filha e genro de
Luiz Henrique Jacy Monteiro, pelo incentivo, hospitalidade e
calorosa acolhida em sua residência, quando ali complementaram
dados de interesse para esta pesquisa.
Ao
Luiz Henrique Jacy Monteiro Filho, pela amizade e carinho
com que me recebeu, fornecendo elementos que me permitiram
melhor compreender os caminhos trilhados por seu pai.
À senhora Ana Augusta, mãe da Professora Doutora Sandra
Magina
que, pela sua experiência de vida e relacionamento
pessoal com matemáticos portugueses, ajudou-me a obter uma
melhor compreensão do contexto em que um dia atuaram.
À Diretora da
FAFIEP/UNIVÁS/MG, Professora Fafina Vilela de
Souza
, como também aos professores Aline, Benedito, Luis
Felipe
, Luiz Gonzaga, Paulo César e Rosimeire Borges, do
Departamento de Matemática; aos funcionários da secretaria,
especialmente à
Cristina e Janua e aos alunos desta IES, pelo
apoio e compreensão durante essa jornada.
Aos colegas, funcionários e alunos da
Escola Estadual “Dr. José
Marques de Oliveira”
, em especial à diretora Mônica Maria
Mendes
e vice-diretoras Rosa Helena Zampieri e Isméria Barroso
Cintra
e à secretária Maria Alice, pelo auxílio e incentivo
demonstrados nessa caminhada.
Ao
Doutor Dalmo Ribeiro Silva, cujo trabalho perante a
Assembléia Legislativa de Minas Gerais engrandece a população
do Sul de Minas Gerais, sempre incentivando aqueles que atuam
na área da investigação cientifica.
À
Secretaria do Estado da Educação de Minas Gerais, pelo arrojo
nas políticas voltadas à capacitação de seus professores,
refletindo na qualidade de ensino para os mineiros, exemplo para
o Brasil.
Ao
Francisco Olimpio da Silva, pelo auxílio na formatação do
trabalho.
A todos os membros da
família Junho, em especial ao Professor
Mestre Benedito Afonso Pinto Junho
, sua esposa Rita, seus filhos
Camila e Gabriel, e também Dona Tereza, Zezé, Rosângela e
Jorgina. Incluo também Danilo Luiz Pereira, em quem aposto
todas as fichas, dado seu empenho e ânsia pelo saber.
À
minha família, que sempre participou com seu afeto,
entusiasmo, alegria, conselhos e acima de tudo, com seu amor. E
viva o
Serpentário!
À
Tereza, João, Mirna, Lucinha e Fábio, pelo amor, compreensão
e paciência que sempre me devotaram.
À
Ione Tófoli e à família Porto - Antonio, Cida e Laura, pela velha
e duradoura amizade.
À Suzi, cujo sacrifício que lhe foi cobrado pela imposição de minha
ausência, espero que aceite minha eterna gratidão.
Ao
Doutor Gaspar Bustamante e Patrícia Bressanin, pelos
preciosos conselhos, cuidando de minha saúde.
Enfim, a todos que contribuíram para que essa pesquisa se
tornasse realidade.
A Autora
RESUMO
Este trabalho, de natureza histórica, teve como objetivo central investigar a
dinâmica das relações entre Matemática e Educação Matemática. Valendo-nos
de pressupostos metodológicos da História Cultural, a pesquisa desenvolvida
implicou na realização de um estudo da dinâmica das relações entre cultura
acadêmica e cultura escolar no contexto do Movimento da Matemática Moderna
(MMM) no Brasil, nas décadas de 1950 a 1980. Para a análise dessa questão,
tomamos os matemáticos Omar Catunda, Benedito Castrucci e Luiz Henrique
Jacy Monteiro como personagens representativas da comunidade matemática
daquela época, quando tiveram expressivo envolvimento com o MMM.
Procuramos, então, retratar suas produções científicas e propostas para o ensino
da matemática, utilizando como fontes livros didáticos, documentos de arquivos
escolares e de arquivos pessoais, etc. O MMM foi abordado a partir de suas
origens no cenário internacional e da sua inserção na educação nacional. O
trabalho, em suas conclusões, enfatizou como as relações entre matemáticos e o
ensino de matemática transformam-se ao longo do tempo e estão estabelecidas
num determinado período histórico, além disso, na dinâmica dessas relações, a
cultura acadêmica nutre-se da cultura escolar e esta, do mesmo modo, também
se nutre da cultura acadêmica, acarretando uma relação de retro alimentação.
Palavras-chave: Educação Matemática; História da Educação Matemática;
História da Educação Matemática no Brasil.
ABSTRACT
This assignment had as the main objective to investigate the dynamic of
Mathematic and Mathematic Teaching relationship. Based on methodological
presuppositions of Cultural History, the developed research requested the
development of a study about the relationship between the dynamics of the
academic culture and elementary school in the context of Modern Mathematic
Movement (MMM) in Brazil, placed between the 1950 and 1980 decades. For the
analysis of this matter, three characters were considered to be representative
among the mathematic community from that time in reason of their expressive
involvement in the MMM, they were: Omar Catunda, Benedito Castrucci and Luiz
Henrique Jacy Monteiro. Thus, we decided to portray their scientific productions
and proposals related to mathematics teaching, using didactic books, school
document files and personal files, etc., as sources. The MMM was approached
from its origins in the international scenario and from its insertion in the national
education. This assignment emphasized in its conclusions how the relationship
among mathematicians and mathematic teaching changes as time goes by and is
established in a determinate historical period, besides that, in these dynamics
relationships, academic culture feeds itself from elementary school and vice-
verse, causing a backward feeding relationship.
Key words: Mathematic Education; Mathematic Education History, Mathematic
Education History in Brazil.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
APMEP –
Association des Professeurs de Mathématiques de L’Enseignement
Public
CADES – Centro de Aperfeiçoamento e Difusão do Ensino Secundário
CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
CATEC – Centro de Aperfeiçoamento Técnico do Ensino de Ciências
CBEM – Congresso Brasileiro de Ensino da Matemática
CECIBA – Centro de Ensino de Ciências da Bahia
CEMPEM – Centro de Estudos, Memória e Pesquisa em Educação Matemática
CECINE – Centro de Ensino de Ciências no Nordeste
CENP – Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas
CIAEM – Conferência Interamericana de Educação Matemática
CIEM –
Commission Internationale de L’Enseignement Mathématique
CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
CNRS –
Conseil National de la Recherche Scientifique
COGESP – Coordenadoria de Ensino da Grande São Paulo
CTA – Centro Tecnológico da Aeronáutica
DRHU/LC – Departamento de Recursos Humanos Laerte de Carvalho
FFCL – Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras
FFCLUSP – Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São
Paulo
FNFi – Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil
FUNBEC – Fundação Brasileira para o Desenvolvimento do Ensino de Ciências
GEEM – Grupo de Estudos do Ensino da Matemática
GEPEM – Grupo de Ensino e Pesquisa em Educação Matemática
GHEMAT – Grupo de Pesquisa de História da Educação Matemática
GRUEMA – Grupo de Ensino de Matemática Atualizada
IBECC – Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura
ICME –
International Commission on Mathematical Instruction
IMECC – Instituto de Matemática, Estatística e Computação Científica
IMFUFBa – Instituto de Matemática e Física da Universidade Federal da Bahia
IMUK –
Internationale Mathematische Unterrichts Kommission
IREM –
Recherche sur l’Enseignement des Mathématiques
ITA – Instituto Tecnológico da Aeronáutica
KMK – Conferência Permanente de Ministros da Educação
LDB – Lei de Diretrizes e Bases
MAST – Museu de Astronomia e Ciências Afins
MEC – Ministério da Educação e Cultura
MM – Matemática Moderna
MMM – Movimento da Matemática Moderna
NCTM –
National Council of Teachers of Mathematics
NHC – Nova História das Ciências
NSF –
National Science Foundation
OCDE – Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico
OEA – Organização dos Estados Americanos
OECE – Organização Européia de Cooperação Econômica
PRENEM – Programa de Expansão e Melhoria do Ensino
PUC – Pontifícia Universidade Católica
RFA – República Federal Alemã
RDA – República Democrática Alemã
SBEM – Sociedade Brasileira de Educação Matemática
SBM – Sociedade Brasileira de Matemática
SHE/INRP – Serviço de História da Educação do Instituto Nacional de Pesquisa
Pedagógica
SMSP – Sociedade de Matemática de São Paulo
SUDENE – Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste
UFBa – Universidade Federal da Bahia
UFMT – Universidade Federal do Mato Grosso
UFRN – Universidade Federal do Rio Grande do Norte
UICSM
University of Illinois Committee on School Mathematics
UnB – Universidade de Brasília
UNEMAT – Universidade do Mato Grosso
UNESCO –
United Nations Educational, Social and Cultural Organization
UNESP – Universidade Estadual Paulista
UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas
USAID –
United States Agency for International Development
USP – Universidade de São Paulo
SUMÁRIO
CONSIDERAÇÕES INICIAIS ................................................................................... 20
CAPÍTULO 1 ............................................................................................................. 30
PARA UMA NOVA HISTÓRIA DO ENSINO DA MATEMÁTICA NO BRASIL:
algumas considerações teórico-metodológicas ............................................ 30
1.1 O papel do ensino na organização do meio matemático .............................. 34
1.2 Cultura escolar como objeto histórico ........................................................... 39
1.3 Fontes e a escrita da história ........................................................................ 45
CAPÍTULO 2 ............................................................................................................. 48
O NASCIMENTO DA MATEMÁTICA MODERNA ............................................. 48
2.1 As origens da Matemática Moderna ............................................................. 49
2.2 As novas álgebras ........................................................................................ 54
2.3 A escola algébrica alemã .............................................................................. 57
2.4 A “crise dos fundamentos” ............................................................................ 59
2.5 A aritmetização da análise ............................................................................ 61
2.6 As principais correntes filosóficas ................................................................. 63
CAPÍTULO 3 ............................................................................................................. 66
MATEMÁTICOS E AS PROPOSTAS DE INTERNACIONALIZAÇÃO DO
ENSINO DE MATEMÁTICA ............................................................................... 66
3.1 O primeiro movimento internacional de reforma do ensino da Matemática .. 66
3.1.1 Guido Castelnuovo: o ensino como um dever social ou porque um
matemático deve despender seu tempo com o ensino da
matemática ......................................................................................... 69
3.2 Renovação na matemática francesa: o projeto boubarkista ......................... 72
3.2.1 Matemática e ensino de matemática na perspectiva de Jean
Dieudonné ........................................................................................... 81
3.3 A velha matemática sob uma roupagem moderna ........................................ 86
CAPÍTULO 4 ............................................................................................................. 90
O MOVIMENTO DA MATEMÁTICA MODERNA E SUA DIMENSÃO
INTERNACIONAL ............................................................................................... 90
4.1 Movimento da Matemática Moderna na França ............................................ 91
4.2 Movimento da Matemática Moderna na Alemanha ....................................... 95
4.3 O movimento da Matemática Moderna nos Estados Unidos da América ..... 99
4.4 O Movimento da Matemática Moderna na Itália ............................................ 104
4.5 O Movimento da Matemática Moderna na URSS ......................................... 105
4.6 O Movimento da Matemática Moderna na Bélgica ....................................... 107
4.7 A reforma da Matemática Moderna em alguns países: um olhar sobre a
participação de matemáticos e educadores matemáticos ......................... 109
CAPÍTULO 5 ............................................................................................................. 113
SOBRE A PARTICIPAÇÃO DE MATEMÁTICOS NO MOVIMENTO DA
MATEMÁTICA MODERNA NO BRASIL: um panorama de teses e
dissertações ...................................................................................................... 113
5.1 D’AMBROSIO, Beatriz. The Dynamics and consequences of the modern
mathematics reform movement for brazilian mathematics education. Tese
de Doutorado. Indiana University, 1987 ....................................................... 116
5.2 BÜRIGO, E. Z. Movimento da matemática moderna no Brasil: estudo da
ação e do pensamento de educadores matemáticos nos anos 60.
Dissertação de Mestrado em Educação. UFRGS, Porto Alegre, 1989 ........ 122
5.3 SOUZA, Gilda Lúcia Delgado de. Três décadas de educação matemática:
um estudo de caso da Baixada Santista no período de 1953 – 1980.
Dissertação de Mestrado em Educação Matemática. UNESP. Rio Claro,
1998 .............................................................................................................. 127
5.4 VITTI, Catarina Maria. Movimento da Matemática Moderna: Memória,
Vaias e Aplausos. Tese de Doutorado em Educação, Universidade
Metodista de Piracicaba, 1998 ..................................................................... 133
5.5 SOUSA, Maria do Carmo de. A percepção de professores atuantes no
ensino de matemática nas escolas estaduais da delegacia de ensino de
ITU, do movimento matemática moderna e de sua influência no currículo
atual. Dissertação de Mestrado. UNICAMP, Faculdade de Educação,
Campinas, 1999 ............................................................................................ 136
5.6 STEPHAN, Ana Maria. Reflexão histórica sobre o Movimento da
Matemática Moderna em Juiz de Fora. Dissertação de Mestrado.
Universidade Federal de Juiz de Fora, 2000 ................................................ 142
5.7 SOARES, Flávia dos Santos. Movimento da Matemática Moderna no
Brasil: Avanço ou Retrocesso? Dissertação Mestrado em Matemática.
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, 2001 ............................ 146
5.8 BARALDI, Ivete Maria. Catarina Maria. Retraços da Educação Matemática
na Região de Bauru (SP): uma história em construção. Tese de Doutorado
em Educação Matemática. UNESP, Rio Claro, 2003 ................................... 149
5.9 Comentário gerais ......................................................................................... 154
CAPÍTULO 6 ............................................................................................................. 157
A ERA DOS EXTREMOS ................................................................................... 157
6.1 A criação da Universidade de São Paulo ...................................................... 162
6.2 Luigi Fantappiè e o Departamento de Matemática da FFCLUSP ................. 166
CAPÍTULO 7 ............................................................................................................. 171
OMAR CATUNDA, O ENSINO SECUNDÁRIO E O MOVIMENTO DA
MATEMÁTICA MODERNA ................................................................................. 171
7.1 Trajetória Científica e educacional de Omar Catunda .................................. 172
7.2 Omar Catunda e a contratação de professores estrangeiros ....................... 174
7.3 Concursos de Omar Catunda para o Departamento de Matemática ............ 177
7.4 Trilhas de Catunda no Ensino Secundário: idéias e práticas ........................ 181
7.4.1 A aula inaugural de 1945 ..................................................................... 182
7.4.2 Algumas observações .......................................................................... 186
7.4.3 O Boletim da Sociedade de Matemática de São Paulo ....................... 187
7.4.4 Provas e concursos .............................................................................. 190
7.4.5 Participando da revista “Notas de Matemática e Física” ...................... 193
7.4.6 A Portaria 1951: por uma menor quantidade de conteúdos ................ 196
7.4.7 O parecer de 1954 e o Congresso de 1955 ......................................... 201
7.4.8 Participações em Congressos: 1959 ................................................... 203
7.4.9 Participações em Congressos: 1961 ................................................... 204
7.4.10 Participações em Congressos: 1962 ................................................. 206
7.4.11 Participações em Congressos: 1966 ................................................. 209
7.4.12 A participação de Omar Catunda no MMM da Bahia ........................ 211
7.5 Elaborando textos para a promoção do MMM na Bahia ............................... 214
7.5.1 A coleção “Matemática Moderna” ........................................................ 218
7.5.2 Ensino Atualizado da Matemática: curso ginasial, volumes I, II, III e
IV ......................................................................................................... 224
7.5.3 Ensino Atualizado da Matemática: primeiro grau, 5 ª, 6ª, 7ª e 8ª
séries ................................................................................................... 227
7.6 Abaixo Euclides e acima quem? Apropriações efetivadas para a
elaboração de um manual moderno .............................................................. 230
7.7 Omar Catunda e as relações entre a matemática e educação matemática . 234
CAPÍTULO 8 ............................................................................................................. 236
BENEDITO CASTRUCCI, O ENSINO SECUNDÁRIO E O MOVIMENTO DA
MATEMÁTICA MODERNA ................................................................................. 236
8.1 Benedito Castrucci: trajetória de um matemático .......................................... 236
8.2 Na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP: vida acadêmica,
recomendações italianas e avaliações didáticas .......................................... 242
8.3 Giacomo Albanese e o Departamento de Matemática da FFCLUSP ........... 249
8.4 Concursos de Benedito Castrucci para o Departamento de Matemática ..... 252
8.5 O ensino da Geometria no secundário: depoimentos de Castrucci .............. 258
8.6 Participando de Congressos: 1957 ............................................................... 262
8.7 Participando de núcleos de estudos: a formação do GEEM ......................... 265
8.8 Atuando no GEEM: apropriando-se de preceitos modernos para o ensino
secundário .................................................................................................... 267
8.9 Participando de Congresso: 1962 ................................................................. 269
8.10 Elementos de Teoria dos Conjuntos ........................................................... 270
8.11 Participações em Congressos: 1966 ........................................................... 271
8.12 Geometria: curso moderno .......................................................................... 272
8.13 A abordagem da Geometria durante o MMM .............................................. 274
8.14 “Matemáticos são contra Euclides” ............................................................. 280
8.15 Produzindo manual inovador para o ensino da matemática ....................... 284
8.16 As coleções “Matemática: curso moderno”, para o ciclo ginasial ............... 285
8.16.1 O nascimento de uma nova vulgata para o ensino da matemática
moderna .......................................................................................... 286
8.16.2 “Matemática: curso moderno” de Benedito Castrucci e Alcides
Bóscolo: considerações gerais ....................................................... 288
8.17 Castrucci e Bóscolo: sedimentando a nova vulgata ................................... 300
8.18 Benedito Castrucci e as relações entre a matemática e educação
matemática ................................................................................................. 305
CAPÍTULO 9 ............................................................................................................. 308
LUIZ HENRIQUE JACY MONTEIRO, O ENSINO SECUNDÁRIO E O
MOVIMENTO DA MATEMÁTICA MODERNA ................................................... 308
9.1 Correspondências com Catunda ................................................................... 311
9.2 Na Rua Maria Antônia ................................................................................... 313
9.3 Participando dos Colóquios Brasileiros de Matemática ................................ 315
9.4 Organizando eventos, correspondências, revistas, periódicos ..................... 317
9.5 Álgebra Moderna e Álgebra Linear: novos conteúdos para a cadeira de
Complementos de Geometria e Geometria Superior ................................... 322
9.6 As Faculdades de Filosofia na visão de Jacy Monteiro ................................ 325
9.7 Participando das atividades do GEEM .......................................................... 328
9.8 Jacy Monteiro e a Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Rio Claro ... 331
9.9 Jacy Monteiro e a Faculdade de Filosofia Ciências e Letras da
Universidade Católica de Santos .................................................................. 333
9.10 Jacy Monteiro e a Universidade de Brasília ................................................ 334
9.11 Obras Publicadas ........................................................................................ 336
9.12 Publicações no GEEM: “Iniciação às estruturas algébricas” ....................... 336
9.13 Publicações no GEEM: “Polinômios” .......................................................... 337
9.14 Matemática: Curso Moderno, segundo ciclo ............................................... 339
9.15 Curso Moderno de Matemática para a Escola Elementar ........................... 348
9.16 Jacy Monteiro e as relações entre a matemática e educação matemática . 351
CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 355
BIBLIOGRAFIA ........................................................................................................ 369
ANEXO I ................................................................................................................... 395
A COLEÇÃO “MATEMÁTICA MODERNA............................................................ 395
I.1 A Matemática Moderna I ................................................................................ 395
I.2 A Matemática Moderna II ............................................................................... 400
I.3 A Matemática Moderna III .............................................................................. 401
ANEXO II .................................................................................................................. 405
MATEMÁTICA: CURSO MODERNO ....................................................................... 405
Tabela I ............................................................................................................... 405
Tabela II .............................................................................................................. 406
Tabela III ............................................................................................................. 407
Tabela IV ............................................................................................................. 408
ANEXO III ................................................................................................................. 410
O PROGRAMA DA FFCLUSP E AS NOTAS DE AULA DE D’AMBROSIO ........... 410
CRONOLOGIA OMAR CATUNDA ........................................................................... 412
CRONOLOGIA BENEDITO CASTRUCCI ................................................................ 416
CRONOLOGIA LUIZ HENRIQUE JACY MONTEIRO ............................................. 424
GLOSSÁRIO ............................................................................................................. 428
20
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Ao elaborar nossa dissertação de mestrado
1
tivemos a oportunidade de
auxiliar na organização e montagem do Inventário Sumário denominado APER
(Arquivo Pessoal Euclides Roxo). Este inventário foi realizado a partir do acervo
que reúne centenas de documentos do professor de matemática Euclides de
Medeiros Guimarães Roxo (1890-1950), composto de correspondência pessoal,
rascunhos de livros didáticos, propostas de programas de ensino, recortes de
jornal, trechos traduzidos de livros, listas de livros, entre outros.
A análise desses documentos foi condição primordial para a elaboração de
nossa dissertação. Além disso, durante esse período, tivemos oportunidade de
nos inteirar e acompanhar as pesquisas realizadas pelo Grupo de Pesquisa de
História da Educação Matemática no Brasil (GHEMAT)
2
, do qual fazemos parte.
Desse modo, fizemos visitas ao Colégio Pedro II, no Rio de Janeiro, local em que
se encontram as atas de reuniões dos professores da Congregação desse
tradicional estabelecimento de ensino; promovemos ainda visitas à Biblioteca
Nacional do Rio de Janeiro, com a finalidade de consultar jornais e periódicos que
circularam nos tempos da Reforma Francisco Campos.
1
Henri Poincaré e Euclides Roxo: História das relações entre filosofia da matemática e educação
matemática”, Dissertação de Mestrado defendida em 2002, na PUC/SP.
2
Criado em 2000, o GHEMAT encontra-se vinculado ao Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação
Matemática da PUC-SP e é coordenado pelo Prof. Dr. Wagner Rodrigues Valente. Conta, também, com
equipes de pesquisa em diversas instituições brasileiras. O Grupo reúne doutores, doutorandos, mestrandos
e alunos de Iniciação Científica. O GHEMAT desenvolve projetos de pesquisa que abrigam pesquisadores de
vários níveis, engajados na produção de seus pós-doutoramentos, teses, dissertações e monografias
(VALENTE, 2005).
21
Quanto ao tema, o trabalho realizado tratou do estudo das relações que
envolveram uma Filosofia da Matemática e uma Educação Matemática, no Brasil,
na década de 1930.
A Reforma Francisco Campos
3
impôs, para todo o território nacional,
modificações expressivas na estrutura do ensino secundário, visando dar-lhe um
caráter eminentemente educativo, em oposição à finalidade exclusiva de
matrícula aos cursos superiores. Nesse contexto, a Reforma Campos acatou,
integralmente, as idéias modernizadoras propugnadas por Euclides Roxo
referentes ao ensino da Matemática (MIORIM, 1998).
Roxo destacou-se por praticar uma intermediação entre o primário e o
secundário, propondo uma mudança de concepção, com a introdução do aspecto
intuitivo no secundário. Uma preocupação básica que se afigurava era como
trazer o intuitivo para esse grau de ensino. Euclides Roxo viu, nas idéias
pedagógicas do matemático e filósofo Henri Poincaré (1854-1912) – principal
referência tomada por Roxo, no âmbito da Filosofia da Matemática – algumas das
respostas para essa questão.
Assim como Poincaré, as idéias pedagógicas para o ensino secundário
sustentadas pelo matemático Felix Klein (1849-1925) também foram privilegiadas
por Euclides Roxo, vindo a fazer parte do programa de Matemática do Ensino
Médio na década de 1930.
Dessa forma, no trato com matemáticos e suas manifestações sobre o
ensino secundário que exerceram influência efetiva nas propostas pedagógicas
enunciadas por Euclides Roxo, foi possível observar que, nas pesquisas sobre a
História da Educação brasileira, não se encontravam arrolados, sistematizados e
estudados os pensamentos dos matemáticos que eventualmente se relacionavam
com a Educação Matemática de então.
Essa constatação colocou-nos diante de uma situação que nos pareceu
interessante para o estudo das relações entre matemáticos e professores de
3
A partir da Reforma Francisco Campos, o ensino secundário passou a ter apenas a disciplina Matemática,
ao invés da clássica separação em três ramos (Aritmética, Álgebra e Geometria). Além disso, o ensino
secundário passou a ter dois ciclos: um fundamental (5 anos) e outro complementar (2 anos), visando a
preparação para o curso superior e evitando que o ensino secundário permanecesse meramente
propedêutico, isto é, servindo apenas de preliminar para o ensino superior (MIORIM, 1998).
22
Matemática. Pode-se dizer que, de modo mais preciso, remeteu-nos à
possibilidade de estudar a dinâmica de relações existentes entre a produção
Matemática e a Educação Matemática.
Ensina Valente (2001a) que trabalhos sobre a História da Educação
Matemática no Brasil são ainda muito escassos. Para ele, essa área tem
dificuldades quanto às fontes de pesquisa, posto que, no Brasil não se tem uma
tradição na organização sistemática dessas fontes. Estudar a legislação de ensino
não é suficiente para revelar a trajetória do ensino brasileiro. Além de fontes
administrativas e estatísticas, torna-se necessário, também, investigar materiais
que tratam diretamente das práticas em Educação Matemática como cadernos,
provas, artigos de jornais, etc.
Circe Mary S. Silva (2001) também advoga semelhante opinião:
Já apontamos a necessidade de ampliar as pesquisas sobre a
História da Matemática no Brasil. Não numa perspectiva
eurocentrista, valorizando apenas os grandes nomes, as criações,
mas, também, e sobretudo, procurando mostrar as pequenas
contribuições de personagens anônimos e esquecidos, que
desenvolveram suas atividades como educadores, como
professores de Matemática e como pesquisadores e que influíram
nos rumos que a Matemática e a Educação tomaram no País.
Ingressando no doutorado, passamos a participar no projeto “Estudos
sobre a história da educação matemática no Brasil, 1950 – 2000” o qual intenta
analisar historicamente o percurso da educação matemática no Brasil, dos anos
1950 até o final do século XX, a partir da trajetória do matemático e educador
brasileiro Ubiratan D'Ambrosio. Este trabalho está sendo realizado pelo Grupo de
Pesquisa História da Educação Matemática no Brasil – GHEMAT/PUC-SP, tendo
como atividade, dentre outras, organizar os documentos doados pelo professor
Ubiratan D’Ambrosio, com vistas ao seu aproveitamento como fontes de
pesquisa. A organização, catalogação e higienização do material doado pelo
professor D’Ambrosio constituirá o APUA – Arquivo Pessoal Ubiratan D’Ambrosio.
Portanto, na consecução deste trabalho, procuramos tomar como ponto de
partida a análise de alguns documentos contidos no APUA – Arquivo Pessoal
Ubiratan D’Ambrosio, os quais proporcionaram elementos que permitiram, por
23
meio deles, iniciar um mapeamento histórico das relações entre matemáticos
brasileiros e educação matemática. Tal procedimento colaborou para a
localização e análise de trabalhos científicos realizados por matemáticos
brasileiros, bem como textos em que estes matemáticos expõem suas idéias
relativas ao ensino e aprendizagem da Matemática, visando o ensino fundamental
e médio, compreendendo os anos 1950 a 1980.
Não pretendemos, entretanto, relatar ou reduzir a pesquisa a uma simples
biografia de importantes personagens da nossa história, e sim, elaborar uma
análise crítica, sob o ponto de vista de duas perspectivas, quais sejam: uma que
volta seu olhar para o fazer do matemático e, outra, de modo concomitante, que
verifica quando e como este se envolve no processo de ensino e aprendizagem
da Matemática.
Quanto ao período escolhido, primeiro porque, embora se constitua em
uma época de expressiva mudança no cenário educativo nacional, parece haver
necessidade de ampliar pesquisas sobre personagens que contribuíram para
mudanças no processo de ensino e aprendizagem no âmbito da História da
Educação Matemática brasileira. Segundo, no que tange ao ensino da
Matemática, foi ocasião em que o secundário sofre alterações significativas,
impulsionadas entre outras causas, pelo Movimento da Matemática Moderna com
reflexos importantes no Brasil.
Assim, este estudo passou a configurar-se pelo seguinte objetivo: estudar
quais as dinâmicas que envolvem a relação entre matemáticos e professores de
Matemática. De modo específico, considerar as décadas 1950 -1980, analisando
a participação de matemáticos brasileiros no que ficou conhecido como
Movimento Matemática Moderna.
Nesse sentido, buscou-se enfocar trabalhos científicos produzidos por
matemáticos no Brasil durante o MMM, analisando possíveis conexões entre
aquela produção e o ensino da Matemática. Tal procedimento envolveu leitura e
análise de documentos referentes a cientistas e professores da época em
questão, utilizando para tanto, materiais como: livros didáticos, arquivos
escolares, arquivos pessoais de professores, etc.
24
A abordagem deste assunto mostra-se relevante ante à análise de teses e
dissertações, que diretamente tomaram o MMM como tema principal de suas
investigações. Esta análise, realizada em capítulo específico, revelou que esses
estudos são insuficientes para compreender a herança deixada pelo Movimento
nas práticas pedagógicas dos professores de matemática brasileiros. Para
compor o ideário do Movimento, os trabalhos, em geral, preocuparam-se em
explicitar o significado da Matemática Moderna
4
, em relatar o contexto social,
político e econômico da época, em situar os grupos que a difundiram no Brasil,
bem como na apresentação e análise de textos que discutem seu esgotamento
em nível nacional e internacional. Praticamente não incluíram preocupações e
estudos mais detalhados sobre matemáticos no Brasil, os quais retratem suas
produções científicas e suas propostas para o ensino da Matemática. Essa é, no
entanto, a pretensão maior almejada nesta pesquisa.
Contudo, tais observações não impediram que, ao longo do estudo
daqueles trabalhos, aflorassem algumas questões referentes ao papel assumido
pelos matemáticos durante o Movimento, evidenciando o espaço em que se
processará a investigação, possibilitando trazer respostas para uma melhor
compreensão sobre esse assunto.
Para a análise das relações existentes entre educadores matemáticos e
matemáticos fizemos uso de pressupostos metodológicos próprios da História
Cultural, porquanto o trabalho desenvolvido implica diretamente na realização do
estudo da dinâmica que relaciona cultura acadêmica universitária e cultura
escolar. A primeira, aqui entendida como o conjunto de normas e práticas que
professores e estudantes concretizam na universidade, incluindo nele o saber
escolar como uma forma de saber científico, e, portanto, como uma maneira de
expressar normas e práticas científicas de matemáticos e professores
universitários. A segunda, considerada como o conjunto de normas e práticas
estabelecidas por professores e alunos no secundário, lugar em que as práticas
científicas são apropriadas, reelaboradas e reutilizadas.
4
Apesar de examinar mais detalhadamente a Matemática Moderna em momento posterior, é possível dizer
que ela pode ser caracterizada pelo domínio do método estrutural, ou seja, aquele que busca abstrair uma
arquitetura escondida em objetos e teorias e do método axiomático, que por sua vez se caracteriza por uma
série de afirmativas chamadas axiomas, aceitos como verdadeiros e para os quais não se exige prova. A
partir destes, são deduzidos teoremas, por meio de raciocínio puramente lógico (PATRAS, 2001, p. 57-78).
25
Práticas do cotidiano de matemáticos, o modo como estas foram
apropriadas pelo ensino secundário e os procedimentos para fazer uma análise
em profundidade do objeto investigado, procurando explorar todas as
possibilidades interpretativas, exigem embasamentos teórico-metodológicos que
permitam ao historiador mostrar o caminho percorrido. Para tanto, valemo-nos, de
conceitos como apropriação, cultura escolar, táticas e estratégias, descrição
densa, dentre outros, estabelecidos conforme definição dos teóricos Chartier
(1991), Julia (2001), De Certeau (2002) e Geertz (1989), respectivamente.
A partir dessas considerações, nosso estudo buscou constatar como se
processam as práticas do fazer matemático em nossa história cultural, através da
reconstrução de trajetórias de matemáticos, os quais tiveram participação no
ensino da matemática, reveladas pela análise de suas produções envolvendo o
ensino da matemática brasileiro.
Neste aspecto, esforçamo-nos no sentido de responder ao seguinte
questionamento: que estratégias e táticas estão envolvidas na dinâmica de
relacionamento entre as culturas acadêmica e escolar ao tempo do MMM?
Na busca de respostas envolvendo essa problemática, defrontamo-nos
com as seguintes indagações:
Quais foram os principais matemáticos brasileiros que, durante o MMM,
mantiveram alguma preocupação com o ensino secundário?
Qual a formação intelectual e qual a posição social desses matemáticos?
Quais as principais contribuições que podem ser creditadas em favor de
matemáticos que participaram do MMM?
Como educadores matemáticos investiram na escriturística (publicações,
documentos oficiais, participação em congressos, livros etc.) para participarem
desse Movimento?
Uma dificuldade com a qual nos deparamos residiu na identificação e
seleção, dentre os matemáticos da época, daqueles que, de forma intencional,
manifestaram preocupações com o ensino da Matemática, o que exigiu a adoção
26
de critérios adequados para definir e identificar aqueles notoriamente chamados
matemáticos profissionais durante o período escolhido.
A princípio, tomamos como base nomes arrolados no “Manual de História
Matemática” elaborado por Ubiratan D’Ambrosio (2000) considerados como
personagens que se destacaram no desenvolvimento da pesquisa matemática
brasileira. Além da publicação de D’Ambrosio, levamos em conta um relatório
realizado por uma comissão de professores do Setor de Pesquisas Matemáticas
do CNPQ, intitulado “Conclusões e sugestões da comissão reunida pelo setor de
Matemática do CNPQ, para estudar as diversas instituições brasileiras que se
dedicam a esse ramo da ciência” (MAST, 1999). Essa comissão classificou as
instituições matemáticas em três grandes grupos, de acordo com a produção
científica de seus membros, publicada em periódicos de alto nível, arrolando
matemáticos com destacadas atividades nos programas de pesquisa e pós-
graduação. Comparando os nomes citados por D’Ambrosio e os contidos na lista
da comissão do CNPq, prevaleceram os nomes arrolados no estudo de
D’Ambrosio, ainda que não se coadunassem, em sua totalidade, com aqueles
citados pela comissão do CNPq, uma vez que esta tinha por intenção única
estabelecer um critério para concessão de bolsas às instituições que, naquele
momento, participavam ativamente de pesquisas no âmbito da ciência
matemática, não tendo, portanto, o caráter de indicar todos os pesquisadores
atuantes nas instituições.
Mais tarde, ao realizarmos análises de teses e dissertações, tornou-se
possível identificar alguns traços comuns na atuação dos matemáticos durante o
processo de renovação do ensino secundário, das décadas 50, 60 e 70,
permitindo-nos, num primeiro momento, elaborar uma prévia classificação, a qual
aponta alguma regularidade nas práticas dos matemáticos mobilizados pela
reforma, existindo aqueles que:
– se dedicaram a ministrar cursos de formação de professores primários e
secundários nos grupos promotores do Movimento;
– escreviam textos relativos aos conteúdos da Matemática Moderna, tendo
como público-alvo os professores do ensino médio;
27
– se dedicavam a escrever obras referentes aos conteúdos de Matemática
Moderna, destinados aos estudantes do curso secundário;
– se dedicavam a participar de congressos e/ou publicar artigos
defendendo o Movimento, expondo os motivos pelos quais a Matemática
Moderna deveria fazer parte do currículo das escolas elementares;
– fizeram críticas ao Movimento, mostrando-se contrários à reforma.
Confrontando esses dados com a grade inicial de personagens que se
encontram na lista elaborada por D’Ambrosio, observa-se que, no geral, os
matemáticos citados com maior freqüência foram Omar Catunda, Benedito
Castrucci, Luiz Henrique Jacy Monteiro.
Desse modo, como foco para a discussão da dinâmica das relações entre
matemáticos e educação matemática, tomamos Omar Catunda, Benedito
Castrucci, Luiz Henrique Jacy Monteiro como personagens representativos dos
modos de pensar daquele período. Há que se notar, que todos eles eram
professores da Faculdade de Filosofia da Universidade de São Paulo (FFCLUSP),
participaram do Movimento Matemática Moderna, publicaram livros didáticos para
o ensino secundário e superior e tiveram contato com alguns matemáticos do
grupo Bourbaki, durante sua estadia no Brasil. Outrossim, esses matemáticos
eram representativos de ramos da Matemática bem definidos: Omar Catunda era
analista, Benedito Castrucci, geômetra e Luiz Henrique Jacy Monteiro, algebrista.
Todas essas considerações, envolvendo constatações, evidências,
dificuldades e procedimentos metodológicos tomados para o desenvolvimento
desta pesquisa, além de discussões sobre o papel do ensino na organização do
meio matemático, a cultura escolar e fontes para a escrita da história são
discutidas no primeiro capítulo.
O MMM no Brasil assumiu uma dinâmica específica, e, para compreendê-la
necessário se faz discorrer sobre a origem e características da Matemática
Moderna, para, posteriormente, buscar analisar como esta foi apropriada pelo
campo educacional. Assim sendo, o segundo capítulo apresenta uma síntese do
que ficou conhecido por “Matemática Moderna”. Nesse sentido, valemo-nos
especialmente de um estudo realizado por Frédéric Patras (2001), o qual nos
28
remete a reflexões sobre a origem da Matemática Moderna. Nele, destacamos
ainda, o surgimento das novas álgebras, os principais acontecimentos históricos
que motivaram o aparecimento das correntes filosóficas e alguns aspectos sobre
o primeiro movimento internacional de matemática moderna. Segue-se, no
terceiro capítulo, um estudo da trajetória do grupo Bourbaki
5
, ressaltando o
importante papel que o mesmo desempenhou nesse Movimento, uma vez que,
segundo constatações de Patras, a Matemática Moderna foi freqüentemente
identificada com concepções defendidas por Bourbaki. Além disso apresentamos
os pontos de vista dos matemáticos Castelnuovo e Dieudonné sobre o ensino da
Matemática.
O quarto capítulo, como desdobramento do capítulo anterior, traz um breve
panorama sobre a participação de alguns países na realização da reforma da
Matemática Moderna, buscando apontar o verdadeiro papel que a Matemática
desempenhou no ensino de cada nação e no interior de suas instituições, como
França, Itália, Estados Unidos da América, Alemanha, etc., por meio da atuação
dos matemáticos em relação ao ensino de Matemática em todo o mundo, durante
o Movimento.
No quinto capítulo são analisadas teses e dissertações, aquelas que
diretamente tomam o MMM como tema central de suas investigações, focalizando
especialmente, como esses trabalhos discutem a participação de matemáticos no
movimento da matemática moderna no Brasil.
O sexto capítulo procura retratar o Departamento de Matemática da
FFCLUSP, uma vez que os matemáticos escolhidos neste trabalho integravam o
corpo docente daquela instituição, que tinha como uma de suas principais
finalidades preparar uma elite de pesquisadores matemáticos. Ademais, o
capítulo investiga a participação e apropriação das idéias de Bourbaki e de
matemáticos italianos, os quais foram contratados pela Universidade e de que
forma os matemáticos brasileiros se apropriaram dos conhecimentos transmitidos
pelas escolas francesas e italianas.
5
O Grupo Bourbaki começou formar-se na década de 1930. Jean Dieudonné, Jean Delsarte, André Weil e
Alexandre Grothendieck, matemáticos que fizeram parte da liderança do grupo, vieram para São Paulo,
contratados pela FFCLUSP. Aqui orientaram os responsáveis pelas cátedras como também alguns jovens
assistentes (D’AMBROSIO, 2000).
29
No sétimo, oitavo e nono capítulos, aprofundamos a trajetória profissional
dos matemáticos Omar Catunda, Benedito Castrucci e Luiz Henrique Jacy
Monteiro respectivamente, por meio de informações extraídas em obras,
depoimentos e outras publicações destes e de outros autores, quando se procura
compreender como se dá a dinâmica das relações entre matemática e ensino de
matemática.
As considerações finais apontam os resultados obtidos no trabalho de
investigação, que provavelmente farão emergir outras questões, ensejando a
possibilidade de que novas investigações venham a ser realizadas.
30
CAPÍTULO 1
PARA UMA NOVA HISTÓRIA DO ENSINO DA MATEMÁTICA NO
BRASIL: algumas considerações teórico-metodológicas
Recusando-se à uma história essencialmente política e épica, Bloch e
Febvre, na revista Annales, contribuíram para uma mudança expressiva de
enfoque, promovendo a dessacralização da memória dos grandes homens, dos
eventos políticos, militares e diplomáticos, indo em direção à história social,
notadamente voltada para as diferentes dimensões da vida dos homens no
tempo, privilegiando as condições da vida material, as formas de viver, de pensar
e de sentir (BURKE, 1991). Tornou-se inevitável a procura por fontes, muito
diversas daquelas utilizadas por historiadores tradicionais, propondo novos
objetos de investigação e exigindo novas reflexões metodológicas.
A atual historiografia proveniente do movimento iniciado pelos Annales,
expandiu-se e orienta hoje em dia muitos trabalhos, constituindo uma tendência
historiográfica de larga abrangência e reconhecimento, ao vincular-se aos
conceitos antropológicos de cultura. A História Cultural, também chamada de
Nova História Cultural “talvez a principal herdeira da Nova História” tornou-se um
campo academicamente privilegiado e fértil, contribuindo para a renovação da
historiografia ocidental (FONSECA, 2003, p.50).
Nesse contexto, a História da Matemática vem se tornando objeto de
estudo como uma das formas da história das ciências, especificamente na
31
denominada Nova História das Ciências (NHC)
6
, uma das derivações da nova
historiografia. A NHC rejeita a concepção que considera a produção matemática
como que separada a priori, pelo historiador, das condições de sua reprodução,
aqui entendida como operações por meio das quais o sentido é localmente
produzido, sendo parte integrante da atividade de produção/invenção do saber
matemático (VALENTE, 2001b).
A NHC debruça-se sobre novos objetos históricos, procurando evidenciar
aqueles essenciais para a prática científica, o que possibilita uma nova
abordagem para compreensão do significado dos saberes escolares. Nesse
sentido, deve-se levar em conta as reflexões de Pestre (1996, p.37), para quem o
texto científico é um objeto construído segundo regras variáveis no tempo e no
espaço social, sofrendo apropriações, modificações por aqueles que o utilizam. O
estudo da reescritura do texto a que os saberes são submetidos, desde as
cadernetas de laboratório, a correspondência, os croquis, os rascunhos de artigos
até as versões publicadas, os tratados, manuais de cursos, apresentações para
não especialistas e conferências para o grande público, destacam que o status de
evidência e de lógica dos resultados se modifica a cada contexto. Cada
reescritura tem funções múltiplas: heurística, demonstrativa, didática, reflexiva,
filosófica, cujo peso varia segundo os locais e os públicos aos quais se dirige.
Nesse caso, a atividade científica é uma atividade de interpretação e
inovação, com implicações tanto na teoria quanto na prática. Além disso, para
Pestre (1996) os saberes científicos adquirem o caráter universal mediante a
circulação e reutilização em diversos lugares de produção:
Por essa razão, a aparente universalidade dos enunciados
científicos, o fato de que eles sejam descritos como “verdadeiros
em qualquer parte” e compreendidos “nos mesmos tempos” por
todos não pode constituir um bom ponto de partida para uma
análise histórica das ciências. Se os saberes científicos (da
mesma forma que outras formas de saberes) circulam, não é
porque são universais. É porque eles circulam – isto é, porque são
(re)utilizados em outros contextos e um sentido lhes é atribuído
por outros – que eles são descritos como universais... (1996, p.
20).
6
Em síntese, nessa perspectiva, a ciência é vista como algo que se pratica e quem constrói essa prática são
os homens, que dependem de circunstâncias sociais, de uma determinada época. Desta forma, é o sujeito
que constrói o objeto, o objeto não existindo sem o sujeito (PESTRE, 1998).
32
Nessa perspectiva, o saber escolar é visto como uma forma de saber
científico, como um dos modos das práticas científicas se expressarem.
Matemática Escolar é a expressão da própria Matemática no âmbito da escola.
A importância da realização de um mapeamento histórico, com vistas à
compreensão de como as práticas científicas foram ganhando expressão e
universalizando-se, isto é, sendo apropriadas e reelaboradas em diferentes
contextos, em especial ao ensino da Matemática, é assinalada por Valente
(2003a):
Considerando, então, que a produção científica está sempre
envolvida em contextos específicos, responsáveis por seu
desenvolvimento, é parte integrante dessa produção, a sua
reprodução. Assim, o ensino caracteriza-se como uma de suas
modalidades. A análise dessa modalidade de reprodução revela
não somente o caráter importante da transmissão do saber, mas
também o papel que o ensino tem, na própria constituição da
Matemática enquanto ciência.
De modo geral, atualmente, as instituições de ensino superior oferecem
aos interessados em ciência matemática os cursos de Bacharelado (Matemática
e Matemática Aplicada) e Licenciatura. O curso de Licenciatura volta-se,
evidentemente, para a formação do educador, buscando dar preparação
pedagógica àqueles que desejam ser professores. Essa formação permite que
seus membros atuem no ensino básico e superior, em instituições públicas ou
privadas. Já o bacharelado em Matemática visa formar profissionais para a
carreira acadêmica. Muitos egressos do bacharelado prosseguem seus estudos
em programas de pós-graduação, tornando-se, geralmente, pesquisadores e
docentes do Ensino Superior. Nos dias de hoje, os que se tornam cientistas da
matemática perfazem essa trajetória.
Dessa forma, pode-se admitir, como Pestre (1996), que o cientista, aquele
que pratica as ciências, “é alguém que adquiriu uma cultura, que foi formado,
modelado por um certo meio, que foi fabricado no contato com um grupo e com
ele compartilhou atividades – e não uma consciência crítica operante, um puro
sujeito conhecedor”, valendo dizer que os pesquisadores matemáticos, são
partícipes de uma prática social de investigação, isto é, de atividades sociais
realizadas por um conjunto de indivíduos que produzem conhecimentos.
33
Essa linha de entendimento vem ao encontro da posição assumida pelo
pesquisador Antonio Miguel, para quem toda prática social comporta uma
atividade educativa no seu interior, mesmo que de modo difuso ou inconsciente,
pois, a comunidade promotora de uma prática social procura assegurar, de
alguma forma, “as condições de produção e reprodução dos conhecimentos
gerados em seu interior”, evitando-se que essa prática desapareça. Assim sendo,
a produção de conhecimentos educacionais ocorre em todas as práticas sociais,
e portanto, na própria investigação em Matemática [grifo do autor], (2004, p. 83).
Desse modo, sustenta Miguel (2004), a atividade matemática não se
restringe tão somente à produção de conhecimentos matemáticos, realizando,
igualmente, uma atividade educacional, produzindo conhecimentos educacionais,
mesmo que estes últimos não estejam num primeiro plano em relação à sua
atuação, ainda que de modo involuntário ou inconsciente. Por outro lado, não é
menos verdade que os educadores matemáticos também realizam atividade
matemática, produzindo conhecimento matemático, ainda que, também, de modo
não proposital e não associado diretamente à sua atividade predominante.
Em relação a esse assunto, conclui Antonio Miguel:
Podemos dizer, então, que além de um conhecimento
intencionalmente produzido e absolutamente necessário para
uma prática social se constituir e sobreviver, seus promotores
acabam também produzindo outros conhecimentos que, embora
não sejam vistos como tão importantes quanto aqueles
intencionalmente produzidos, são também absolutamente
necessários para que essas práticas se constituam e sobrevivam.
E daí, resguardadas as diferenças, um matemático profissional
não é um não-educador matemático, do mesmo modo que um
educador matemático não é um não-matemático profissional
(2004, p. 84-85).
O debate sobre a redefinição do entendimento do que são práticas
científicas
7
, operada pela Nova História das Ciências, nos dá a possibilidade de
7
O termo “científico” é bastante suspeito nas “Ciências Humanas”. Mas De Certeau não o considera menos
suspeito que nas “Ciências Exatas”. Pode ser definido como a possibilidade de estabelecer um conjunto de
regras que permitam controlar operações destinadas à produção de determinados objetos (DE CERTEAU,
1982, p. 109).
8
Antes da Revolução Francesa (1789-1795), os quadros administrativos franceses eram
indicados pela aristocracia. Com o advento da Revolução, instala-se uma nova relação social, advinda do
moderno conceito de cidadania, gerando novas demandas para a burocracia e a administração pública. Entra
em ação um intenso trabalho educativo e, dentre as intervenções realizadas, criou-se a Escola Politécnica em
1794, com a finalidade de preencher os quadros vagos deixados pela aristocracia, buscando-se a formação
de uma elite para dirigir o país. Dessa forma, conferiu-se à matemática uma situação privilegiada para a
seleção dessas elites dominantes (D’AMBROSIO, 2003).
34
perceber os saberes escolares, e em particular a matemática escolar, como uma
das formas de apropriação e reelaboração da prática matemática, provocando,
por sua vez, uma nova escrita para história da matemática que rejeita o texto
cronológico, recheado de biografias de matemáticos ilustres e suas teorias
desprovidas dos contextos históricos e sociais (VALENTE, 2001a, p. 216).
1.1. O papel do ensino na organização do meio matemático
Os posicionamentos defendidos por Pestre (1996; 1998), Valente (2001a;
2003b) e Miguel (2004), explicitados neste estudo encontram-se, em boa medida,
alinhados com as reflexões do historiador da matemática Bruno Belhoste
manifestadas no artigo “Pour une réévaluation du role de l’enseignement dans
l’histoire des mathématiques”, publicado na “Revue d’histoire des
mathématiques”, 4, 1998; e reproduzido na revista Educação Matemática
Pesquisa nº 1, vol. 4, 2002, do Programa de Estudos Pós-graduados em
Educação Matemática da PUC/SP.
Para Belhoste, o ensino da matemática não se constitui somente numa
fonte em que o historiador de matemática extrai uma documentação ou um
cenário, e sim, também, num elemento por inteiro de sua problemática. Sob essa
perspectiva, propõe uma nova reavaliação do papel do ensino na história da
Matemática, abandonando o posicionamento simplista da maioria dos
historiadores em considerar a comunicação, a transmissão e a vulgarização do
saber matemático como uma atividade secundária e periférica, limitando-se a uma
abordagem do ensino restrita a estudos institucionais, análises de cursos e de
tratados didáticos, biografias de matemáticos, etc.
No entanto, para esse pesquisador francês, raramente os historiadores de
matemática tratam este assunto dando toda a importância que lhe é merecida.
Sob esta indiferença, esconde-se a falsa idéia de que a produção matemática é
inteiramente independente das circunstâncias sociais de uma determinada época.
A rigor, o desenvolvimento da ciência matemática está intimamente ligado ao
próprio ensino da matemática.
35
Nessa linha de entendimento, defende o ponto de vista segundo o qual, de
maneira geral, a maioria das atividades intelectuais encontra-se engajada em
contextos específicos que determinam as condições de seu desenvolvimento.
Conseqüentemente, o estudo da circulação dos textos e das atividades
matemáticas no tempo e no espaço social e geográfico parece-lhe o centro do
trabalho do historiador. Inclui assim, o ensino, pois este se caracteriza como parte
integrante da atividade de produção/invenção do saber matemático. O ensino tem
um papel decisivo não somente na difusão do saber e sua transmissão
generalizada, mas também na constituição da matemática enquanto ciência. Os
historiadores incorreriam em erro se ignorassem a influência do ensino da
matemática na construção dessa ciência.
Na busca da origem da profissionalização do professor de matemática,
Belhoste salienta que nas universidades medievais, o quadrivium, (aritmética,
geometria, música e astronomia) ocupava lugar marginal, desconhecendo-se
quem eram os profissionais que o ensinava aos alunos. Apesar de, no século XIV,
os algarismos e o ábaco serem ensinados por uma comunidade de matemáticos e
professores e de se constatar a existência de escolas onde a aritmética comercial
era ensinada a futuros mercadores, é sobretudo no século XVI, que o ensino
matemático desenvolve-se na Europa. Com a aparição de novas técnicas
militares, em particular a artilharia, a fortificação e a cartografia, também com o
desenvolvimento da marinha de guerra, suscitou-se uma forte demanda na
formação de matemáticos. A necessidade de dominar e transmitir os
conhecimentos matemáticos levou à criação de cadeiras de matemática nas
universidades e nos colégios, muito embora a contribuição desses professores ao
desenvolvimento da matemática tenha sido, em geral, modesta.
Belhoste ressalta que, os matemáticos criadores, aqueles a quem a história
da matemática doou seu nome, foram em sua maioria, homens da corte ou de
gabinete, a serviço de príncipes e depois integraram as instituições acadêmicas.
A grande virada na emergência do estatuto do matemático profissional ocorre no
período entre 1770 e 1820, época em que a pesquisa matemática foi implantada
nas instituições de ensino. Então, uma nova figura emergiu, aquela do
matemático professor, surgindo primeiramente na França e depois em toda a
Europa. Duas razões fundamentais explicam, segundo Belhoste, esta
36
modificação: de um lado os Estados assumem a formação dos especialistas, em
particular os especialistas militares, consagrando a Matemática como disciplina
por excelência, promovendo gradativamente a integração dos mestres de
matemática no sistema de formação de elites administrativas
8
; de outra parte, a
introdução da matemática como elemento fundamental na formação intelectual e
moral no ensino de nível secundário.
No século XVIII, na França, os candidatos à administração do corpo de
artilharia, da engenharia e da marinha militar eram examinados por matemáticos
membros da Academia de Ciências, o que propiciou a criação de preparatórios
nos colégios de elite, abrindo carreiras para os professores de matemática. Em
seguida, as escolas de engenheiros foram abertas, dando o primeiro lugar aos
estudos da matemática. A mais ilustre era a l’École Militaire de Mézière, onde
Gaspard Monge começou ao mesmo tempo sua carreira de professor e
matemático. A l’École Polytechnique, fundada durante a revolução francesa,
herdou a experiência acumulada nestas escolas. O ensino da matemática era
assegurado por grandes matemáticos do momento: Lagrange, Monge, mais tarde
Fourier, Poisson, Cauchy, Liouville e muitos outros. Desse modo, a maioria dos
matemáticos franceses do século XIX foi formada na Escola Politécnica. Os
engenheiros politécnicos eram predominantes (hegemônicos) na Academia de
Ciências e nos altos estabelecimentos parisienses de ensino e de pesquisa,
cabendo à escola normal formar os professores de liceus, ignorando as atividades
de pesquisas, que ficavam a cargo dos politécnicos.
A dominação de politécnicos traduzia-se pelo controle que
exerciam sobre o ensino da matemática no nível secundário e
superior, tanto pela intermediação do exame de admissão da
Escola Politécnica quanto diretamente pelo Conselho de Instrução
Publica e a Inspeção Geral. Foi preciso esperar o
desenvolvimento do ensino superior a partir do final do ano de
1870, para que a situação se transformasse progressivamente: os
professores das novas universidades, formados na maior parte
pela escola normal superior, se impõem progressivamente como
os novos líderes do meio matemático, tanto no ensino como na
pesquisa, enquanto recua a influência dos politécnicos
(BELHOSTE, 1998, p. 294).
37
Prosseguindo em seus comentários sobre o papel dos estabelecimentos de
ensino na organização do meio matemático, o autor observa que não somente as
relações institucionais entre ensino e pesquisa evoluíram consideravelmente entre
o início do século XIX até hoje, como também esta situação se diferencia,
conforme os países e os estabelecimentos. Nos primeiros anos de fundação da
Escola Politécnica, o ensino e a pesquisa encontravam-se associados
organicamente. Lagrange e Monge ao mesmo tempo em que davam suas lições
aos alunos mais avançados, apresentaram trabalhos e resultados inéditos, o
primeiro sobre a teoria das funções analíticas, o segundo sobre a geometria
infinitesimal. Além disso, os próprios alunos eram convidados a fazer pesquisas
originais, produzindo estudos avançados.
A princípio, a Escola Politécnica era um centro de ensino e pesquisa,
porém, aos poucos, perde essa característica, deixando de lado a preocupação
com a pesquisa, priorizando um ensino técnico. As lições passaram a obedecer
estritamente os programas definidos com antecedência.
Nas universidades alemãs, em compensação, a pesquisa era considerada
como uma atividade normal de professores e estudantes mais avançados,
engajados na preparação de um doutorado. Também se desenvolveram no
século XIX as tradições de pesquisa em cada universidade, onde apareceram
matemáticos notáveis: Jacobi em Konigsberg; Weierstrass, Kummer e Kronecker
em Berlim; Gauss, Dirichlet, Riemman e Clebsch em Gottingen. Felix Klein, no
final do século, leva o modelo ao seu apogeu fazendo de Gottingen um centro de
ensino e pesquisa de renome internacional.
Discutindo sobre a contribuição que as atividades didático-pedagógicas
oferecem ao desenvolvimento das práticas matemáticas, Belhoste cita como
exemplo, as práticas relativas à preparação das aulas. O ponto que interessa a
esse historiador diz respeito principalmente à especificidade da aula magistral
como atividade matemática e o que ela implica para o trabalho de pesquisa.
Segundo Belhoste, em geral, o objetivo de um curso é apresentar, do ponto
de vista didático, os resultados já alcançados na teoria, consistindo em colocar
em ordem, clarificar e simplificar esses resultados, ao invés de realizar um
38
trabalho criativo. No entanto, esse trabalho pode chegar, às vezes, à invenção de
novos conceitos, de novos métodos, de novas teorias, e sobretudo, contribuir
poderosamente com a organização do saber matemático. Isso exige do professor
escolher quais os conhecimentos pré-requeridos, quais os essenciais dentre
esses resultados, quais aqueles que são acessórios, aqueles que bastam
reutilizar em exercícios de aplicação. Estas escolhas implicam, com efeito, não
somente numa opinião sobre o valor didático de tal ou qual modo de exposição,
mas também, em uma visão da natureza e da estrutura do saber matemático. Não
raro, anotações de aulas tornaram-se livros-texto, em que novos elementos foram
introduzidos à teoria, a partir do modo de exposição realizada pelo professor, por
meio de seu ensino magistral, conclui Belhoste.
A preparação das aulas é em geral uma atividade solitária, mas sua
redação é freqüentemente coletiva: não somente os professores podem
considerar as observações de seu auditório, mas acontece do professor deixar
para um aluno a redação da publicação, segundo uma prática universitária
comum admitida. Esta colaboração entre professores e alunos na redação das
lições ilustra a dimensão coletiva da atividade didática. Em que medida esta
prática de trabalho passou do ensino para a pesquisa? Responder esta pergunta
contribui, alega Belhoste, para a melhor compreensão da gênese e do
funcionamento das escolas de matemática do séc. XIX e XX. Em sua origem,
exemplifica Belhoste, os seminários matemáticos nas universidades alemãs
funcionavam como uma preparação ao ensino secundário: sob a direção do
professor, os estudantes apresentavam as lições e se criticavam mutuamente.
Mas os assuntos não se limitavam às questões ensinadas no secundário. Os
estudantes deviam também apresentar trabalhos pessoais. O seminário
pedagógico tornou-se dessa maneira, ao mesmo tempo, um seminário de
pesquisa. Jacobi, em colaboração com Franz Neumann, criam o primeiro
seminário de Matemática e Física na Universidade de Köningsberg em 1835. O
modelo se difunde progressivamente para as outras universidades alemãs, como
Friburgo, Göttingen, Munique, Breslau, Heidelberg, Tübingen, Giessen, Berlim,
etc. São esses seminários que dão corpo as diferentes escolas de pesquisa que
caracterizam a atividade matemática na Alemanha no séc. XIX.
39
Nos temas abordados por Belhoste, o ensino ganha fundamental
importância para a História da Matemática delimitando vasto campo de
investigação, “que ultrapassa a história da matemática stricto sensu para tocar a
história das culturas profissionais e das culturas científicas” (BELHOSTE, 1998, p.
302). Há que se levar em conta, enfatiza ainda Belhoste, que matemáticos de
modo geral, são em sua maioria, professores, cujas atividades se dão em nível
escolar universitário. Por essa razão, a sociedade atribui à Matemática o status de
disciplina do ensino e ao profissional da área, o matemático, como uma figura
vinculada ao ensino, muito embora, na visão do próprio matemático, ensinar
matemática não é suficiente para ser digno dessa designação. Seria preciso,
então, produzir matemática, de modo a contribuir para o avanço da ciência.
As análises realizadas por Belhoste, a nosso ver, revestem-se de
fundamental importância para a compreensão do processo de profissionalização
do professor de Matemática, posto que permitem refletir sobre o ensino e as
práticas do fazer matemático e defendem uma nova reavaliação do papel do
ensino na História da Matemática.
1.2. Cultura escolar como objeto histórico
Diante de tais considerações, procuramos analisar o percurso da História
da Educação Matemática brasileiro, à luz da Nova Historiografia das Ciências,
considerando que:
A História da Educação Matemática no Brasil vem sendo muito
pouco estudada, principalmente, sob a perspectiva de sua
inserção na história cultural brasileira. Mesmo dentre os estudos
pautados pela historiografia tradicional, são raros os trabalhos que
se ocuparam do tema. A Educação Matemática, vista como
apropriação cultural, deve lançar mão, muitas vezes, como ensina
a Nova Historiografia das Ciências, de documentos nunca
anteriormente considerados como fontes de pesquisa. Livros
didáticos, arquivos escolares, arquivos pessoais de professores
constituem grande parte dessa documentação. (VALENTE,
2001b).
O conceito de apropriação que norteia esta pesquisa é tomado de Roger
Chartier: “A apropriação, a nosso ver, visa uma história social dos usos e das
40
interpretações, referidas às suas determinações fundamentais e inscritas nas
práticas específicas que as produzem” (1991, p. 177). A idéia de apropriação
assim colocada é central para a História Cultural. Neste novo enfoque, pretende-
se enveredar pelas relações e tensões que as constituem, tomando como ponto
de partida um tema particular, tal como um acontecimento, importante ou obscuro,
um relato de vida, uma rede de práticas específicas. Na análise de textos,
necessário se faz considerar que a leitura é uma prática investida de gestos,
espaços, hábitos. Chartier sustenta que as formas materiais que revestem um
texto também contribuem para dar feição às antecipações do leitor em relação ao
texto e para atrair novos públicos e usos inéditos: “O essencial é, portanto,
compreender como os mesmos textos – sob formas impressas possivelmente
diferentes – podem ser diversamente apreendidos, manipulados e
compreendidos” (1991, p. 177-182).
Desse modo, a Nova História Cultural vem contribuir para a mudança dos
procedimentos na pesquisa de fontes, possibilitando à História uma nova forma
de trabalhar a cultura, entendendo-a “como um conjunto de significados
partilhados e construídos pelo homem para explicar o mundo” (PESAVENTO,
2005, p. 15).
Para De Certeau, ainda que qualquer atividade humana possa ser
considerada como cultura,
... ela não o é necessariamente ou não é ainda forçosamente
reconhecida como tal. Para que haja verdadeiramente cultura, não
basta ser autor de práticas sociais; é preciso que essas práticas
sociais tenham significado para aquele que as realiza. [...] É uma
prática significativa. Ela consiste não em receber, mas em exercer
a ação pela qual cada um marca aquilo que outros lhe dão para
viver e pensar (2003, p. 141-143).
Um pouco mais explícito, Geertz (1989) defende um conceito de cultura
como algo essencialmente interpretativo, um sistema de signos interpretáveis que
podem ser descritos de forma densa. Fazer uma “descrição densa” é investigar
detalhadamente, sob vários aspectos, o significado dos signos dentro de uma
determinada sociedade. Trata-se de analisar em profundidade o objeto
investigado, explorando todas as possibilidades interpretativas por meio de
41
cruzamento com outros elementos. Esse método permite ao historiador mostrar,
com segurança e seriedade, o caminho percorrido.
A História da Educação tem se valido das discussões da Nova História
Cultural, esforçando-se por compreender os processos escolares. Nesse
contexto, o estudo das culturas escolares adquire significativa importância como
objeto de investigação em história, posto que se volta para as práticas cotidianas
instauradas no interior da escola.
A noção de cultura escolar é aqui entendida como define Dominique Julia:
... um conjunto de normas que definem conhecimentos a ensinar e
condutas a inculcar, e um conjunto de práticas que permitem a
transmissão desses conhecimentos e a incorporação desses
comportamentos; normas e práticas coordenadas a finalidades
que podem variar segundo épocas (finalidades religiosas,
sociopolíticas ou simplesmente de socialização). Normas e
práticas não podem ser analisadas sem levar em conta o corpo
profissional dos agentes que são chamados a obedecer a essas
ordens e, portanto, a utilizar dispositivos pedagógicos
encarregados de facilitar sua aplicação, a saber, os professores
primários e os demais professores (2001, p. 10-11).
Analisar as relações existentes entre educadores matemáticos e
matemáticos a partir dos pressupostos metodológicos próprios da Nova História,
implica na realização do estudo da dinâmica que relaciona cultura acadêmica ou
universitária e cultura escolar. A primeira, aqui entendida como o conjunto de
normas e práticas que professores e estudantes concretizam na universidade,
incluindo aí o saber escolar como uma forma de saber científico, e, portanto,
como uma maneira de expressar normas e práticas científicas de matemáticos e
professores universitários
9
. A segunda, considerada como o conjunto de normas
e práticas estabelecidas por professores e alunos no ensino elementar, lugar em
que as práticas científicas são apropriadas, reelaboradas e reutilizadas.
9
Vale lembrar que, a Nova História das Ciências vem procurando redefinir o que são práticas científicas. A
redefinição do entendimento dessas práticas cria a possibilidade de perceber os saberes escolares, e em
particular a Matemática Escolar, como uma das formas de apropriação e reelaboração da prática matemática.
A Nova História das Ciências rejeita as noções passivas de difusão e recepção do saber, buscando
evidenciar, dentre outras coisas, o significado de prática teórica, qual seja, o da dimensão de saber-fazer
inerente ao trabalho matemático-teórico, que repousa sobre um conjunto de procedimentos selecionados,
que, é sempre material e culturalmente situado (PESTRE, apud VALENTE, 2003a). Tradicionalmente, a
teoria associa-se à idéia de verdade e a prática à de eficácia, de uso. Em que medida existe efetivamente
alguma coisa que é de um lado a teoria e de outro, que é prática? Na verdade, a prática se alimenta da teoria
e a teoria se alimenta da prática. Encontra-se aí presente uma relação intrínseca entre esses dois conceitos.
42
Entretanto, a história das práticas culturais “é a mais difícil de se
reconstruir, porque ela não deixa traço: o que é evidente em um dado momento
tem necessidade de ser dito ou escrito?” (JULIA, 2001, p. 11).
Há uma dificuldade, portanto, de se obterem fontes para a escrita da
história. Na medida em que os acontecimentos ocorrem, estes se mostram
evidentes e absolutamente naturais para aqueles sujeitos que os vivenciam,
podendo levá-los a uma omissão quanto à preocupação e cuidado em se
preservar os elementos que possam interessar e servir para a escrita da história.
Todavia, Valente (2003b) chama a atenção para a necessidade de se
realizar um esforço para a busca de traços deixados por cotidianos escolares
passados:
Esses vestígios, por circunstâncias as mais variadas, podem ser
encontrados. Eles compõem um conjunto de produtos da cultura
escolar. Ao lado de toda normatização oficial que regula o
funcionamento das escolas, como leis, decretos etc. há toda uma
série de produções da cultura escolar como livros didáticos,
cadernos de alunos, de professores, diários de classe, provas etc.
São essas as fontes de pesquisa a serem encontradas,
organizadas e inventariadas para fim de estudarmos a trajetória
histórica da matemática escolar. A dificuldade de encontrar tais
produtos da cultura escolar coloca, como se disse, as fontes de
pesquisa como chave para a escrita dessa história. Os cadernos
de alunos de outros tempos, os de professores, as provas, não
estão disponíveis são, em sua época, descartados depois do uso.
Os arquivos das escolas não estão organizados, aliás, seguem
uma legislação que os exclui a cada cinco anos. Os livros
didáticos antigos apresentam dificuldades de serem obtidos pois
tradicionalmente não são pensados como fontes de pesquisa.
Nossos próprios materiais escolares tendem a ser jogados fora
em razão, por exemplo, de espaços cada vez menores nas
moradias.
Dentre os produtos da cultura escolar, destacamos os livros didáticos, os
quais representam uma fonte privilegiada para o estudo da dinâmica das relações
entre cultura acadêmica e cultura escolar, na medida em que, “todo manual está
histórica e geograficamente determinado; é o produto de um grupo social e de
uma determinada época” (CHOPPIN, 2000, p. 16).
43
Nesta perspectiva, podemos considerar que o manual é feito para um
determinado grupo da sociedade e nele estão impressos de modo implícito ou
explícito, os valores desta mesma sociedade, como por exemplo, os conteúdos
relevantes que o educando deva aprender e as competências que ele deva
desenvolver.
Assim, os manuais escolares, juntamente com outras fontes, foram
considerados relevantes para a realização desta pesquisa. A esse respeito, ainda
nos valemos das palavras de Choppin, que assim se manifesta: “somente a
multiplicidade das perspectivas e de idéias permite, em um âmbito globalizador,
tecer os laços indispensáveis para a compreensão de certos fenômenos e de sua
evolução” (CHOPPIN, 2000, p. 117-118).
Dessa maneira, nosso estudo também leva em conta alguns aspectos
sobre os livros didáticos em voga durante o Movimento, procurando verificar como
os matemáticos participaram da produção desses manuais e, ainda, identificar
táticas e estratégias por eles utilizadas nesse ambiente de produção dessas
obras.
Nesse sentido, adotamos nesta investigação, os conceitos de estratégias e
táticas conforme definidas por De Certeau (2002).
Para esse historiador, a estratégia
... postula um lugar capaz de ser circunscrito como um próprio e
portanto capaz de servir de base a uma gestão de suas relações
com uma exterioridade distinta. A nacionalidade política,
econômica ou científica foi construída segundo esse modelo
estratégico [...] as estratégias escondem sob cálculos objetivos a
sua relação com o poder que os sustenta, guardado pelo lugar
próprio ou pela instituição (DE CERTEAU, 2002, p. 46-47).
Enquanto que a tática diz respeito a
... um cálculo que não pode contar com um próprio, nem portanto
com uma fronteira que distingue o outro como totalidade visível. A
tática só tem por lugar o do outro. Ela aí se insinua,
fragmentariamente, sem apreendê-lo por inteiro, sem poder retê-lo
à distância. Ela não dispõe de base onde capitalizar os seus
proveitos, preparar suas expansões e assegurar uma
44
independência em face das circunstâncias (DE CERTEAU, 2002,
p. 46).
Desse modo, as estratégias, com um lugar próprio, encontram-se ligadas
ao poder; enquanto que as táticas, sem possuir um lugar próprio, agem
subrepticiamente, aproveitando-se das oportunidades para manipular e subverter
a ordem estabelecida.
Voltando à definição de apropriação como proposto por Roger Chartier,
destacamos o entendimento de Diana Vidal sobre esse conceito, ao afirmar que
Chartier reconheceu,
de certa forma, o legado ‘certeauniano’, perceptível na remissão
aos usos, que se achegam à dimensão tática da proposta de De
Certeau, envolvendo subversões sutis individuais e coletivas, e às
determinações sociais, que se aproximam do conceito de
estratégia, implicando a incorporação dos dispositivos do poder
em circulação na sociedade [grifo da autora] (VIDAL, 2005, p. 59).
Assim, as estratégias constituem-se num espaço em que transitam os
sujeitos, (matemáticos, professores, educadores). Esse espaço pode ser
entendido como lugar institucional (a escola, a faculdade, por exemplo), lugar
físico (a sala de aula, o livro didático, a carteira do aluno), lugar simbólico (posição
do matemático nas instituições, congressos), lugar teórico (a ciência matemática).
Regidos por regras e normas, “esses lugares pretendiam assegurar a estabilidade
das ações individuais, submetendo-as à observação e controle”. Contrariamente,
as táticas constituem-se em tipos de operações que, tendo apenas o tempo como
aliado, movem-se no interior dos espaços ordenados estrategicamente, raramente
deixando vestígios. Como modelo de apropriação, efetuam um consumo criativo
dos bens culturais, por meio de um fazer que subverte os dispositivos de poder
inscritos nos objetos e lugares (VIDAL, 2005, p. 57-58).
Marta M. C. Carvalho e Maria Rita A. Toledo (2002) advertem que a
distinção analítica entre os conceitos de estratégia e tática é apenas definicional,
ou seja, visa apenas destacar a posição dessas práticas relativamente a um lugar
de poder determinado: enquanto a estratégia é prática cujo exercício se dá a
partir de um lugar de poder, as táticas, (dentre elas as práticas de apropriação)
dão-se sempre em um território que não é o seu:
45
Assim, uma mesma prática pode ser analisada como estratégia e
como apropriação, dependendo de sua posição relativamente a
um lugar de poder determinado. Dar uma aula, por exemplo é
prática que pode ser descrita como estratégia, se o interesse for
analisá-la do ponto de vista dos dispositivos de modelização dos
comportamentos dos alunos nela acionados; a mesma aula pode
também ser descrita como prática de apropriação, se o interesse
for analisá-la do ponto de vista das táticas acionadas pelo
professor para escapar dos constrangimentos impostos, por
exemplo, pelo programa de sua disciplina ou pelas normas
regimentais da escola em que trabalha. Assim, falar em estratégia
e em apropriação não significa propor um modelo de análise da
cultura que estabeleça uma relação bipolarizada entre práticas
definidas pelos dois conceitos.
Estratégias e táticas são conceitos úteis para a compreensão das dinâmicas
de modificações curriculares. A oficialidade das estratégias encontra sempre nas
práticas pedagógicas cotidianas o viés de sua concordância, por intermédio da
leitura que fazem dela: o uso de suas táticas.
1.3. Fontes e a escrita da história
Considerando que durante este estudo utilizamo-nos de documentos
contidos em arquivos privados, dentre eles o Arquivo Pessoal Ubiratan
D’Ambrosio (APUA), Arquivo Pessoal Osvaldo Sangiorgi (APOS), Acervo
Benedito Castrucci e Arquivo Morto da Escola Politécnica de São Paulo, foram
observados alguns cuidados, atentando para os ensinamentos de Prochasson
(1998), para quem o pesquisador, ao descrever a história a que se propõe, deve
equilibrar as conclusões do arquivo pessoal com as fontes administrativas e
estatísticas, e com a história da época, evitando, dessa forma, a segmentação da
história e obtendo uma visão mais geral dos fatos.
O pesquisador deve procurar descobrir os segredos que estão por trás de
cartas e correspondências, cuidando que, nem sempre tais documentos são
reveladores, pois, embora as correspondências pessoais não tenham, a priori, a
intenção de divulgação, existe a possibilidade de que estas tenham sido escritas
com a intenção de que fossem mais tarde divulgadas (PROCHASSON,1998).
46
Buscamos ainda, fazer uma leitura crítica dos documentos que se fizeram
pertinentes, investigando as razões pelas quais estes documentos foram
produzidos, preservados e de que modo interferiram na sociedade em que se
encontram inseridos. Neste caso, utilizamos o termo documento no sentido
empregado por Le Goff:
O documento não é inócuo. É antes de mais nada o resultado de
uma montagem, consciente ou inconsciente, da história, da
época, da sociedade que o produziu, mas também das épocas
sucessivas durante as quais continuou a viver, talvez esquecido,
durante as quais continuou a ser manipulado, ainda que pelo
silêncio. O documento é coisa que fica, que dura, e o testemunho,
o ensinamento (para evocar a etimologia) que ele traz devem ser
em primeiro lugar analisados desmistificando-lhe o seu significado
aparente. O documento é monumento
10
. Resulta do esforço das
sociedades históricas para impor ao futuro – voluntária ou
involuntariamente – determinada imagem de si próprias. (LE
GOFF, 1982).
Cabe ao pesquisador analisar as condições de produção dos documentos,
desestruturando-os com o auxílio de uma crítica histórica. Para que o documento
contribua para uma história total, necessário se faz estudá-lo em conjunto com
outros documentos, sem subestimar o ambiente que o produziu, recorrendo a
documentos iconográficos, provas, que forneçam dados que permitam a
descoberta de fenômenos em situação de modo a transferir o documento do
campo de memória para o da ciência histórica (LE GOFF, 1982).
A esse respeito, De Certeau (1982) assinala que ao proceder a uma
redistribuição dos objetos, obtemos novos objetos. Pelo simples fato de recopiar,
transcrever ou fotografar estes objetos muda-se ao mesmo tempo seu lugar e seu
estatuto. Produzem-se novos documentos.
O estabelecimento de fontes é feito por meio da combinação de um lugar
(um recrutamento, meio econômico, político, cultural, uma profissão), de um
aparelho (arquivos, informações, registros) e de técnicas. Um trabalho é científico,
no sentido observado por De Certeau, quando opera uma ação instauradora, por
10
Para Le Goff, a história é a forma científica da memória coletiva. Os materiais da memória apresentam-se
de duas formas principais: o monumento, aquilo que pode evocar o passado, perpetuar a recordação, por
exemplo, os atos escritos; e os documentos, escolha do historiador, que nos dizeres de Febvre: “tudo o que,
pertencendo ao homem, depende do homem, serve o homem, exprime o homem, demonstra a presença, a
atividade, os gostos e as maneiras de ser do homem.” (LE GOFF, 1982).
47
meio de técnicas transformadoras. Utiliza, de modo diverso, os recursos
conhecidos, iniciando, a partir do modo de utilização das fontes, a escrita de uma
nova história. Assim, De Certeau considera que,
... a título de novas pertinências, constitui como documentos,
utensílios, composições culinárias, cantos, imagens populares,
uma disposição de terrenos, uma topografia urbana, etc. Não se
trata apenas de fazer falar estes ‘imensos setores adormecidos da
documentação’ e dar voz a um silêncio, ou efetividade a um
possível. Significa transformar alguma coisa, que tinha sua
posição e seu papel em alguma outra coisa que funciona
diferentemente [grifo do autor] (1982, p. 82-83).
Em razão de novas intervenções passam a surgir respostas novas. Ainda
assim, adverte De Certeau, prolifera a idéia antiga de que nos arquivos ou
aparelhos já se concentram todas as possíveis respostas.
A periodização (1950 a 1980) estabelecida para o desenvolvimento deste
estudo, possibilitou contar com fontes orais para esta pesquisa, fossem elas
captadas diretamente por esta pesquisadora ou mesmo por meio de depoimentos
prestados a outros pesquisadores. Assim, professores dessa época puderam
ainda ser entrevistados, permitindo, a partir de suas reminiscências, conhecer o
que essas pessoas vivenciaram e experimentaram durante o MMM, o que
possibilitou a obtenção de novos dados, diferentes ou confirmadores daqueles
revelados por documentos escritos até então disponíveis, evidenciando como as
práticas do ensino de Matemática foram efetivadas nas escolas.
A partir dessas considerações, nosso estudo buscou constatar como se
processam as práticas do fazer matemático em nossa história cultural, através da
reconstrução de trajetórias de matemáticos, os quais tiveram participação no
ensino da matemática, reveladas pela análise de suas produções envolvendo o
ensino da matemática brasileiro. Neste aspecto, esforçamo-nos no sentido de
responder ao seguinte questionamento: que estratégias e táticas estão envolvidas
na dinâmica de relacionamento entre as culturas acadêmica e escolar ao tempo
do MMM?
48
CAPÍTULO 2
O NASCIMENTO DA MATEMÁTICA MODERNA
Cesse tudo o que a musa antiga canta.
Que outro valor mais alto se alevanta.
Luis Vaz de Camões
Antes mesmo de entrar na essência do Movimento da Matemática Moderna
(MMM), assunto que será tratado em capítulo posterior, consideramos
conveniente apresentar uma síntese do que ficou conhecido por “Matemática
Moderna”, matéria indispensável, a nosso ver, para auxiliar a compreensão da
História da Educação Matemática no Brasil, no período de 1950 a 1980, época
em que ocorreu o início, consolidação e declínio do MMM em nosso país.
As preocupações, em termos estruturais e axiomáticos, com o
desenvolvimento da Matemática serviram de base para implementação do MMM
em todo o mundo, sendo possível identificar seus sinais também no Brasil, em
meados do século XX. Muito embora tenha laços de dependência com os
propósitos norteadores levados a cabo nos países desenvolvidos, o MMM no
Brasil assume uma dinâmica específica, e, para compreendê-la necessário se faz
discorrer sobre a origem e características da Matemática Moderna, para,
posteriormente, buscar analisar como esta foi apropriada pelo campo
educacional.
49
Nesse sentido, valemo-nos especialmente de um estudo realizado por
Frédéric Patras em sua obra intitulada “La pensée mathématique contemporaine”,
a qual nos remete a reflexões sobre a origem da Matemática Moderna. Nela, o
autor realiza uma análise crítica de suas principais características e o modo como
estas aparecem nos trabalhos de matemáticos dos séculos XVIII e XIX, fazendo
florescer o Movimento da Matemática Moderna no século XX.
Da obra de Patras, interessou-nos especificamente o capítulo III – “As
origens da matemática moderna” e o capítulo V – “A corrente estruturalista”,
tópicos em que o autor analisa a trajetória do Grupo Bourbaki e o importante
papel que este grupo desempenhou no MMM, traçando em seguida, uma análise
crítica do Movimento da Matemática Moderna.
Tomamos o estudo de Patras como equivalente a uma estrutura-mãe,
fazendo uma analogia à organização teórica matemática, de forma que a narrativa
se desenvolva tomando por base seu trabalho como eixo organizador. Há que se
explicitar, ainda, que incorporamos a esse eixo obras de outros autores, não
menos relevantes, cujas críticas forneceram informações complementares sobre o
assunto tratado, com a intenção de que esse capítulo se constitua em um quadro
epistemológico para a análise da Matemática Moderna, principal referência para o
MMM.
2.1. As origens da Matemática Moderna
Não é possível assinalar com precisão o nascimento da Matemática
Moderna, observa Patras, pois o método identificado por moderno pode ser
percebido em trabalhos de matemáticos do século XVII e XVIII, embora essas
idéias ainda estivessem germinando, apresentando-se de forma pontual, a fim de
serem explicitadas, identificadas e organizadas. Somente a partir de 1930, a
teorização do método aflorou em sua totalidade, decorrente dos trabalhos do
Grupo Bourbaki.
Patras inicia o capítulo III, “As origens da matemática moderna”,
caracterizando a Matemática Moderna como aquela dominada, em toda sua
50
universalidade, pelo método transcendental, o qual, por sua vez, é definido pelo
autor como aquele que permite “ir diretamente às noções mais gerais, obtidas de
uma classe de problemas de estruturas típicas e regulares” (2001, p. 58). A
Álgebra foi o elemento motor para a tomada de consciência da necessidade de se
extrair os conceitos universais que emanam dos problemas matemáticos, com o
maior grau de generalização possível.
É o método transcendental que permite extrair conceitos matemáticos
universais os quais “organizam a percepção e a compreensão que um
matemático tem de sua ciência” (PATRAS, 2001, p. 58). O método transcendental
contribui para o alargamento do campo de investigação matemática, uma vez que
as estruturas universais, conceito que fundamenta esse método, consistem em
identificar padrões análogos ocultos em diferentes objetos, operações e métodos
matemáticos. Estas emanam a partir de situações diversas e sem ligação
aparente, permitindo tratar questões relevantes e de domínios distintos,
independentemente da natureza dos objetos observados.
Com o advento das estruturas amplia-se o leque de significados
associados aos objetos matemáticos:
Assim, números, grandezas e figuras, por exemplo, passam a
dividir as atenções com vetores, matrizes, permutações e
proposições, constituindo sistemas caracterizados por
propriedades, por relações.
Posteriormente, os próprios sistemas multiplicam-se,
transfiguram-se, sem perder suas características básicas, suas
propriedades fundamentais. Ocorre, assim, um deslocamento das
atenções, dos objetos, para as relações (PIRES, 2000, p. 99).
Patras (2001) enfatiza ainda que, hoje em dia, para a cultura matemática é
necessário o controle de um número importante de conceitos estruturantes
11
,
embora requeiram uma extensão do conceito de estrutura.
11
O grupo Bourbaki afirma emLes fondements de la mathématique pour le mathématicien”, artigo publicado
em 1949, que a matemática inteira pode ser construída a partir do conceito de estrutura. Exemplificando,
pode-se descrever as propriedades das relações soma e produto para os números reais, os quais estão
inseridas em um estudo geral das estruturas algébricas; pode-se ainda, descrever as propriedades de ordem
dos números reais, como por exemplo, entre dois números reais sempre existe um terceiro; pode-se ainda
descrever as propriedades não dos números reais individuais, mas de sua vizinhança, propriedades essas
que se inserem no estudo geral das estruturas topológicas (ODIFREDDI, 2004, p. 24).
51
Para dar início à sua narrativa, Patras elege o matemático Leibniz, dentre o
extenso rol de matemáticos cujos trabalhos possuem, ainda que pouco explícitos,
características do método transcendental. As obras matemáticas de Leibniz estão
repletas de conceitos originais, os quais trazem toda a universalidade e abstração
desejada, assevera Patras. Leibniz teve a genialidade de compreender o método
transcendental, indo diretamente às noções mais gerais, obtidas de estruturas
típicas e regulares. A esse respeito, Edwards Jr. em sua obra “The historical
development of the Calculus”, comenta que “Leibniz tinha como objetivo constante
a formulação geral dos métodos e algoritmos que poderiam servir para unificar o
tratamento de diversos problemas. Enfatizava as técnicas em geral, que
pudessem ser aplicadas a problemas específicos” (1982, p. 265).
No entanto, Patras (2001) não se aprofunda no estudo da obra de Leibniz,
por avaliar suas idéias como muito avançadas em relação ao nível técnico e
conceitual de sua época, para que pudessem fazer escola.
Assim, Patras debruça-se sobre o trabalho de Carl Friedrich Gauss (1777-
1855), por reconhecer nele o embrião da Matemática Moderna. Apesar disso,
esclarece, é um exemplo longe de ser isolado. Toma esse exemplo por constatar
que há em sua obra “a marca do método estrutural-transcendental”, sendo que
suas idéias sobre o trabalho matemático são próximas daquelas que viria a
defender o grupo Bourbaki.
Os trabalhos de Gauss testemunham sua capacidade de estabelecer
paralelos e ligações entre fenômenos aparentemente distintos. Patras exemplifica
essa aptidão de Gauss de analisar o mesmo problema sob diferentes ângulos e
recorrer, para uma mesma demonstração, a uma variedade de ordens de intuição
(geométrica, analítica, topológica, etc...), em suas provas do Teorema
Fundamental da Álgebra, ocasião em que Gauss apresenta quatro
demonstrações “substancialmente diferentes em sua natureza”
12
(PATRAS, 2001,
p. 59).
12
Teorema Fundamental da Álgebra: “toda equação algébrica de grau n possui pelo menos uma raiz no
corpo dos complexos”. A tese de doutorado de Gauss versou sobre esse teorema, tendo como título
Demonstratio nova theorematis omnem functionem algebraicam rationalem integram unius variabilis in
factores reales primi vel secundi gradus resolvi posse”. Em 1815 apresentou nova demonstração dele e ainda
em 1816 e 1849 mais duas demonstrações (SILVA, 2005).
52
Gauss realizou grande parte do trabalho sobre Teoria dos Números
Complexos. Em carta escrita para um de seus discípulos, Friedrich Bessel (1784-
1846), em 1811, Gauss reivindicou aos números complexos o mesmo direito de
existência que os números reais:
Antes de tudo, a quem deseje introduzir uma nova função em
análise, rogaria uma explicação sobre se lhe interessa sua
aplicação somente a magnitudes reais (valores reais dos
argumentos da função) e contempla os valores imaginários do
argumento só como um estorvo ou se adota o meu princípio
básico de que no domínio das magnitudes, os imaginários
bia1ba hão de ser considerados com os mesmos
direitos que os reais. Não se trata de uma questão de utilidade
prática, senão de que a análise é uma ciência independente que
perderia extraordinariamente em beleza e redondeza se deixasse
de lado as quantidades fictícias, além de que seria necessário, a
cada instante, estabelecer limitações sumamente modestas a
verdades que em outro caso são geralmente válidas (GAUSS,
1900, p. 11, apud SILVA, 2005).
Gauss foi um dos primeiros matemáticos a representar os números
complexos como pontos de um plano, não hesitando em identificar os objetos
matemáticos totalmente distintos de um ponto de vista intuitivo. Esse caso,
observa Patras, exemplifica quando o matemático faz a abstração da natureza
dos objetos e do significado das relações que eles mantêm, enfatizando a forma
de certas relações, sua estrutura, lembrando que a forma das relações entre
objetos é ela própria um objeto de ordem superior.
Um outro traço característico de Gauss era sua preocupação com o rigor
demonstrativo. A preocupação com o rigor vai percorrer todo o século XIX,
conhecendo uma evolução impressionante no decorrer do século XX. Gauss
antecipou notadamente os esforços de Cauchy e de Abel nesse aspecto, ao
desconfiar dos recursos da intuição que não estão apoiados em regras precisas.
No entanto, corre-se o risco de atribuir a Gauss resultados que ele não
conservou em toda sua generalidade:
Há nele, a essência da teoria. Mas, como avaliar o que está
errado: uma linguagem convenientemente desenvolvida para
perceber a natureza exata dos objetos considerados? Sob a
perspectiva transcendental, a identificação precisa dos conceitos
53
tem um papel decisivo, pois ela delimita o terreno sob o qual
diversas teorias poderão ser unificadas. Ela sozinha permite
ressaltar, à partir de elementos específicos os problemas
considerados sobre uma situação matemática dada, o universal
suscetível de ser utilizado em outras situações (PATRAS, 2001,
p. 61).
Atendo-se ao processo de nascimento da Álgebra Moderna, Patras (2001)
detém-se em Évariste Galois (1811-1832), indicando-o como o representante
exemplar da entrada da Matemática na era moderna, devido à sua grande
contribuição, sua situação histórica e também por seu papel de iniciador das
renovações dos métodos algébricos do século XIX.
Sua obra traz, pela primeira vez, de modo explícito, as propriedades mais
importantes da Teoria dos Grupos. No final do século XVIII, pensava-se que para
resolver a equação algébrica de grau n fosse necessário apenas a operação de
extrair suas raízes. Galois determinou com toda generalidade as condições para
que uma equação algébrica seja solúvel por radicais
13
. Para estabelecer sua
teoria, introduziu o conceito de grupo das permutações das soluções, onde, para
permutar elementos de um conjunto basta simplesmente combinar um modo de
lhes dispor. Por exemplo, com três elementos distintos a,b,c é possível efetuar 6
permutações (PEREIRA DA SILVA, 1984). Na teoria de Galois estuda-se o que
acontece a certas expressões formadas a partir das raízes da equação quando as
raízes são permutadas. Galois encontrou, na teoria das permutações, a solução
para o problema da resolução de equações. Dessa forma, deduziu todo um
conjunto de propriedades que definem a percepção do conceito de grupo
14
, cuja
estrutura é a que fundamenta a Álgebra, revelando assim, generalidade e
fecundidade extraordinárias.
Da efêmera vida de Galois, há que se destacar, que antes mesmo de
ingressar para o ensino superior, o mesmo já apresentava produção matemática,
13
A raiz da equação é qualquer número que a satisfaça e, conforme foi demonstrado por Gauss, o número
de raízes de uma equação algébrica é igual ao grau da equação (PEREIRA DA SILVA, 1984).
14
Seja G um conjunto munido de uma operação *. Diz-se que a operação * define uma estrutura de grupo
sobre o conjunto G ou que o conjunto G é um grupo em relação à operação * se, e somente se, são válidos
os seguintes axiomas:
G1: quaisquer que sejam x, y, e z em G, tem-se (x*y) * z = x * (y * z) (propriedade associativa da operação *);
G2: existe em G um elemento e tal que e*x = x = x * e (G2 nos garante a existência do elemento neutro);
G3: para todo x em G existe um elemento x’ em G tal que x’ * x = e = x * x’ (G3 estabelece a existência do
simétrico de cada elemento de G) (MONTEIRO, 1973, p. 154).
54
inclusive com publicação de artigo nos “Annales de Mathématiques Pures et
Appliquées”. Longe de se tratar de um acontecimento isolado, esse episódio
ilustra a existência de produção matemática à margem daquela produzida no
ensino superior, no caso, concretizada por um aluno do Liceu Louis-le-Grand,
candidato à École Polytéchnique. Vê-se dessa forma, como defende Belhoste, “as
práticas de ensino agir sobre e interferir nas práticas de pesquisa” (1998, p. 298).
Para Patras, depois da divulgação das idéias de Galois, a Álgebra tomou
um impulso formidável. Em suas obras já se encontra implícito o conceito de
corpo, que viria a ser definido por Dedekind (1831-1916). Embora a noção de
grupo comutativo
15
estivesse implícita em certos trabalhos de Gauss, Lagrange
ou Abel, Galois foi o primeiro a entrever o alcance do conceito de grupo, abrindo
perspectivas e um novo horizonte de aplicabilidade, concebendo uma
organização dos conceitos algébricos gerais, obtido por abstração a partir de
situações familiares.
Depois de Galois, os matemáticos Grassmann (1809-1877), Cayley (1821-
1895) e Hamilton (1805-1865), destacaram-se por suas contribuições para o
desenvolvimento da Álgebra, posto que, dentre outros, estes matemáticos foram
fundadores da Álgebra Linear e Multilinear Moderna. Entretanto, Patras não se
deteve nesses matemáticos e em suas contribuições, voltando seu olhar para a
obra de Dedekind, justificando que a produção deste matemático marcou o início
da escola algébrica alemã, cujo estudo, sob o ponto de vista Patras, revestiu-se
de maior importância.
Contudo, em que pese o posicionamento de Patras, esta pesquisa, dedicou
espaço para algumas considerações sobre a gênese dessas novas álgebras.
2.2. As novas álgebras
No século XIX, a Álgebra voltou-se para o que se considera hoje em dia a
essência de seu objeto de estudo, as estruturas algébricas por si mesmas. Nesse
15
Se (G,*) é um grupo e se a operação * satisfaz o axioma (lei ou propriedade comutativa) G4: quaisquer que
sejam x e y em G, tem-se x * y = y * x, diremos que G é um grupo comutativo ou abeliano (MONTEIRO,
1973, p. 154).
55
período, romperam-se os padrões clássicos da Álgebra, dedicados à teoria das
equações, em especial a resolução de equações de terceiro e quatro graus, numa
situação relativamente concreta, por meio do emprego de letras para designar as
incógnitas, subentendendo-se que estas letras representavam números (naturais,
inteiros, racionais, etc). A partir de então, a Álgebra direcionou-se para critérios
cada vez mais abstratos, enfatizando o estudo das operações algébricas,
independentemente da natureza dos objetos aos quais elas se aplicam. A
aplicação desses critérios possibilitou a criação de novos entes, ampliando em
grau considerável o campo da álgebra.
Os vetores destacam-se dentre os entes que contribuíram para a criação
de novas álgebras. Embora fossem utilizados, nos fins do século XVII, na
composição de forças e de velocidades pelos tratadistas da mecânica, somente
começou a chamar a atenção dos matemáticos a partir dos trabalhos de Gauss, o
qual utiliza implicitamente a soma vetorial em sua representação geométrica dos
números complexos no plano (BABINI, 1967).
Novos tipos de Álgebra foram estudados por matemáticos como George
Peacock, Augustus De Morgan, George Boole, Arthur Cayley, William Rowan
Hamilton, dentre outros (BOYER, 1996).
George Peacock, tentando esclarecer os fundamentos da Álgebra, publicou
em 1830, a obra intitulada “Treatise on Álgebra”, em que buscou dar à Álgebra
uma estrutura lógica comparável aquela dada à geometria nos “Elementos” de
Euclides. Esta obra marcou o início do pensamento axiomático em Álgebra.
Peacock foi um dos primeiros matemáticos a perceber que um cálculo formal
poderia ser realizado sem considerar a natureza dos entes com os quais se
trabalha, sendo suficiente preocupar-se com as operações entre estes, conforme
regras prefixadas (MILIES, 1987).
O matemático inglês Augustus De Morgan, juntamente com Peacock,
auxiliaram na formação de uma escola inglesa de matemática, auxiliando na
formação da “British Association for the Advancement Science”, em 1831. De
Morgan contribuiu para o desenvolvimento da Álgebra abstrata, embora ainda
utilizasse axiomas abstraídos da Aritmética. Foi o matemático Hamilton que
56
procedeu ao desenvolvimento da Álgebra, independente da experiência
Aritmética.
Hamilton foi um matemático irlandês que se ocupou dos vetores, utilizando
o termo “vetor” com um sentido algébrico moderno, ou seja, como a diferença
entre dois pontos no espaço. Hamilton também criou um sistema de números
complexos de quatro unidades o qual denominou por “quaternions”. De modo
geral, Hamilton tratou os quatérnions como vetores e basicamente mostrou que
formam um espaço vetorial sobre o corpo dos números reais. Definiu a adição de
quatérnions e introduziu a noção de dois tipos de produtos, obtidos multiplicando
um vetor por um escalar ou por outro vetor respectivamente; observando que o
primeiro é associativo, distributivo e comutativo, ao passo que o segundo é
apenas associativo e distributivo. Trata-se do primeiro e único exemplo de corpo
não comutativo no campo dos números reais. Sua principal obra, “Lectures on
quaternions” foi publicada em 1853, dez anos após sua descoberta (BABINI,
1967). Conforme observou Boyer, mais do que o desenvolvimento de um novo
tipo de álgebra, a descoberta revelou a “tremenda liberdade que tem a
matemática de construir álgebras que não precisam satisfazer às restrições
impostas pelas ditas ‘leis fundamentais’”, que até então tinham sido invocadas
sem exceção [grifo do autor] (1996, p. 405).
Depois de Hamilton, outro matemático inglês, Artur Cayley, contribuiu para
o progresso da álgebra no século XIX. Cayley desenvolveu, em 1858, o estudo da
álgebra das matrizes e lhes deu esse nome.
Em meados do século XIX, a álgebra invade o campo da lógica. George
Boole interessou-se pela matemática e lógica. Em 1854, publicou “Investigations
on the laws of Thought”, a qual estabelecia ao mesmo tempo a lógica formal e
uma nova álgebra. A álgebra de Boole é hoje a álgebra dos conjuntos e encontra
aplicações em diversos campos: probabilidades, teoria da informação, análise,
problemas de seguros, etc. (MILIES, 1987).
Após 1870, pode-se assinalar um novo progresso perante a estrutura geral
das álgebras com a obra do matemático americano Benjamin Pierce (1809-1880),
sobre as álgebras lineares associativas. Estabeleceram-se ali os conceitos de
57
elementos nilpotentes e idempotentes, cujo estudo teve início em 1864 e foi
publicado após a morte do autor, em 1881.
Um ano após a descoberta dos quatérnions por Hamilton, em 1844, o
matemático polonês Hermann Günther Grasssmann, publicou a obra denominada
“Teoria da extensão” (Ausdehnungslehre), cujo título referia-se a “uma nova
disciplina matemática exposta e aclarada mediante aplicações”. A maneira
inusitada e excessivamente “filosófica” de apresentação da obra fez com que esta
passasse despercebida pelos matemáticos da época. Somente mais tarde,
quando o autor já havia falecido, reconheceu-se a ampla generalidade e
abstração deste cálculo algébrico-geométrico em um espaço de n dimensões,
com importantes aplicações, onde aparecem conceitos básicos de cálculo vetorial
(BABINI, 1967, p. 35). Seus trabalhos, precursores do primeiro sistema
axiomático completo dos Espaços Vetoriais, guiaram os matemáticos a várias
noções hoje utilizadas na Álgebra Linear (MILIES, 1987, p.18).
As novas álgebras, cujo desenvolvimento se iniciou no século XIX,
mantiveram durante esse século um traço comum com as geometrias não-
euclidianas, posto que nelas se nota a contribuição para a eliminação de
conceitos intuitivos e hábitos mentais ainda arraigados nas idéias matemáticas.
Enquanto que a álgebra liberou-se de sua dependência da aritmética, as
geometrias não-euclidianas fizeram com que os matemáticos percebessem que
as propriedades geométricas não dependiam da intuição espacial ou física dos
entes matemáticos em si.
2.3. A escola algébrica alemã
Dando continuidade à narrativa da trajetória da Matemática Moderna,
Patras considera que, depois de Galois, Grassmann, Cayley e Hamilton
16
, o
grande nome da Álgebra no século XIX foi cronologicamente, Richard
Dedekind.Sua obra marca o início da escola algébrica na Alemanha. O
16
Hermann Grassmann (1809-1877), Arthur Cayley (1821-1895), William Rowan Hamilton (1805-1865).
Fundadores, entre outros, da Álgebra Linear e Multilinear moderna. Apesar de genial, a obra de Grassmann
não teve repercussão na comunidade matemática de sua época. Os trabalhos de Cayley e Hamilton vão no
sentido de um desenvolvimento simbólico da álgebra (PATRAS, 2001, p. 67).
58
pensamento de Dedekind e sua aproximação bastante algébrica dos problemas
aritméticos foram decisivos na constituição da Matemática Moderna.
Dedekind buscou identificar os conceitos ou estruturas que são
subjacentes ao problema dado (seu núcleo algébrico), estruturas que emanam
pouco a pouco e tomam corpo no trabalho de acompanhamento dos objetos
considerados, utilizando um processo semelhante ao de Galois. Seu método é
implícito, colocado em prática sem ser verdadeiramente teorizado.
Sua mais famosa contribuição diz respeito à construção dos números reais
tendo por base a definição de “corte”
17
, procedimento que define um número
irracional, determinado por meio da separação do conjunto dos racionais em dois
subconjuntos, os maiores e os menores que o irracional considerado.
Uma das características que percorre a obra de Dedekind é permitir efetuar
cálculos não mais sobre elementos de um conjunto, mas sobre os próprios
conjuntos (pesquisa de conceitos estruturantes); seu trabalho aparece como
premissa da moderna Teoria dos Conjuntos.
O mais original dos conceitos introduzidos por Dedekind é a noção de
ideal
18
, aduz Patras. Uma de suas características é permitir efetuar cálculos não
mais sobre elementos de um conjunto, mas sobre os conjuntos por ele mesmos.
Os cálculos tradicionais com números são substituídos vantajosamente por
cálculos sobre coleções de objetos.
A contribuição de Dedekind ao nascimento da Matemática Moderna
repousa essencialmente em seus resultados em teoria algébrica dos números. No
entanto, os conceitos introduzidos no trabalho de Dedekind não se organizam
17
Dadas duas classes A e B, A U B = Q e A ŀ B = ĭ Qualquer que seja x ȯ A, y ȯ B, x < y. Um número real
é um corte: Se A possuir um máximo ou B um mínimo, o corte é um número racional; se não possui nem um
nem outro, é irracional (COURANT; ROBBINS, 2000, p. 85).
18
O programa de Álgebra elaborado pela OECE traz a seguinte definição de anéis: “Seja M um conjunto
(contendo pelo menos dois elementos) munido de duas leis de composição, chamadas adição e
multiplicação, totalmente definidas sobre M. Diz-se que M é um anel se (i) M é um grupo comutativo em
relação à adição. (ii) A multiplicação é associativa. (iii) Adição e multiplicação são ligadas entre si pelas leis
de distribuidades: a.(b+c) = a.b + a.c, (b+c).a = b.a + c.a. Dizemos que M é um anel comutativo, se M é um
anel e se a multiplicação é comutativa” (GEEM, 1965, p.120). O conceito de ideal é definido por Monteiro
(1974, p.392) da seguinte forma: “Diz-se que um subconjunto M, de um anel comutativo A (com elemento
unidade, i.é., existe um elemento 1 em A tal que a.1 = a = 1.a), é um ideal de A se, e somente se, são válidas
as seguintes condições: I1: M Ø; I2: quaisquer que sejam a e b em A, se a ȯ M e se b ȯ M, então a-b ȯ M”;
I3: qualquer que seja a em A, se b ȯ M, então a .c ȯ M”.
59
como um conjunto de estruturas algébricas. A idéia de uma hierarquia de
conceitos organizados da Álgebra ainda fica em falta em sua obra.
Em Dedekind aparecem as premissas da moderna Teoria dos Conjuntos,
mas é com Gottlob Frege (1848-1925), que tudo se torna decisivo. Lógico e
matemático alemão, Frege propôs derivar os conceitos da Aritmética dos da
lógica formal. Observou que a Teoria dos Conjuntos parecia servir como
fundamento para a Matemática, porquanto a Aritmética podia ser reduzida à
lógica da Teoria dos Conjuntos.
A idéia de uma hierarquia de conceitos organizados da Álgebra só será
explicitada e aprimorada a partir de 1920, com Emmy Noether e Van der
Waerden.
Emmy Noether contribuiu para a expansão e desenvolvimento de pontos
de vista muito abstratos sobre Álgebra, como a teoria abstrata dos anéis,
influenciada pelos trabalhos de Dedekind. “Tudo está em Dedekind”, afirmava
Noether (PATRAS, 2001, p. 111). Noether deu ao método axiomático
19
um
tratamento diferenciado, convencida de seu papel esclarecedor.
A Idéia revolucionária de trabalhar a Álgebra de modo estrutural se
completou com a obra “Moderne Algebra” de Van der Waerden, em 1930. O
Grupo Bourbaki reconheceu neste trabalho o porta-voz do movimento
estruturalista. Na França, e por muitos matemáticos do mundo, a idéia de
estrutura está ligada ao nome de Bourbaki.
2.4. A “crise dos fundamentos”
Até o século XIX a geometria euclidiana representou o modelo a ser
seguido pelo pensamento científico. Tendo como característica tratar os teoremas
geométricos por meio de um tratamento axiomático, ou seja, sistemático,
19
O método axiomático caracteriza-se por uma série de afirmativas chamadas axiomas, aceitos como
verdadeiros e para os quais não se exige prova. A partir destes, são deduzidos teoremas, por meio de
raciocínio puramente lógico. Se os fatos de um campo científico são colocados em uma determinada ordem
lógica, tal que se possa mostrar que todos decorrem de um certo número de enunciados escolhidos, então se
diz que o campo é apresentado de forma axiomática. O método axiomático é de grande importância, pois
conduz à economia do pensamento. No seu estudo, pode-se tratar das diversas teorias que se enquadram
nesta axiomática, sistematizando-as. É aplicado praticamente em toda a Matemática, sendo uma técnica
básica para esta ciência. (COURANT; ROBBINS, 2000).
60
utilizando-se do método dedutivo, a obra “Elementos” de autoria do grego
Euclides da Alexandria (300 a.C) era a base que fundamentava a matemática.
Euclides escolheu um pequeno número de proposições, ditas primitivas, eram
auto-evidentes, não passíveis de demonstração. A essas premissas denominou-
as “postulados” e "axiomas”. Assim, a matemática encontrava-se fundamentada
na Geometria Euclidiana, considerada por filósofos e matemáticos o mais firme e
confiável dos conhecimentos (DUARTE, 2002).
Seguiu incólume a geometria grega por mais de vinte séculos, até o
advento das geometrias não-euclidianas
20
. Depois desse acontecimento, a
geometria perdeu seu status, a matemática ficou sem uma base norteadora,
promovendo um colapso em sua estrutura, denominado "crise dos fundamentos".
Parecia, aos matemáticos conservadores, que os postulados e teoremas
explicitados por Euclides eram todos verdadeiros e conseqüentemente, as
geometrias não-euclidianas deveriam ser logicamente inconsistentes. De todos os
postulados propostos por Euclides, o 5º é diferenciado, por ser mais complexo
que os enunciados dos outros postulados, não tendo um caráter de verdade
evidente
21
.
O desenvolvimento histórico das Geometrias não-Euclidianas surgiu das
tentativas de “eliminar” o 5º postulado de Euclides. Gauss foi o primeiro
matemático a compreender a irredutibilidade do postulado das paralelas e a
possibilidade das geometrias não-euclidianas. Primeiramente, procurou-se
mostrar que o 5º postulado não era independente dos demais. Os matemáticos
desejavam torná-lo um teorema, deduzindo-o a partir dos quatro primeiros
postulados. Essa idéia mostrou-se impraticável, razão pela qual, tentaram
substituí-lo por outro mais simples e mais evidente, de modo que o antigo
20
Muitos outros matemáticos contribuíram para a descoberta de outras geometrias, sendo destacadas as
Geometrias de Gauss, Lobachewsky, Bolyai e Riemann O matemático russo Nicolai Ivanovich Lobachewsky
(1793-1856), e o matemático húngaro Janos Bolyai (1802-1860), de forma independente, publicaram versões
do mesmo tipo de Geometria, a Hiperbólica, por exemplo, na qual é possível fazer passar mais de uma
paralela a uma reta dada por um ponto que esteja fora da reta. Já na Geometria do alemão Bernhard
Riemann (1826-1866), (Geometria Eliptica), é negada a possibilidade de alongar, arbitrariamente, um dado
segmento, de forma que cada segmento admite um comprimento máximo; por dois pontos pode-se sempre
passar mais de uma reta. (BARKER, 1976, p. 51-52).
21
O 5º postulado pode ser assim enunciado: “Se duas retas, em um mesmo plano, são cortadas por uma
outra reta, e se a soma dos ângulos internos de um lado é menor do que dois retos, então as retas se
encontrarão, se prolongadas suficientemente do lado em que a soma dos ângulos é menor do que dois
ângulos retos” (DAVIS; REUBEN, 1985, p. 251).
61
postulado se tornasse um teorema. Gauss observou a não demonstrabilidade do
5º postulado e a possibilidade da construção de geometrias não-euclidianas.
No entanto, não se conseguira descobrir nas novas geometrias, um par de
teoremas que se contradissessem um ao outro em virtude apenas da forma
lógica. Ou seja, não se conseguira provar que as geometrias não-euclidianas
violavam os requisitos de consistência lógica formal
22
, embora também não se
mostrassem positivamente consistentes
23
.
Entretanto, no século XIX, os padrões de rigor matemático foram se
tornando cada vez mais acentuados, percebendo, na obra “Elementos”, de autoria
de Euclides, inúmeras deficiências de caráter lógico, acarretando a perda da
certeza na geometria euclidiana (BARKER, 1976, p. 54).
Os matemáticos da época passaram então a se preocupar em encontrar
um sistema axiomático capaz de gerar toda a Matemática. Assim, consideraram a
possibilidade da Aritmética servir de fundamentação teórica para sua ciência,
reduzindo a Análise e a Geometria à Aritmética. Neste procedimento, denominado
de aritmetização, busca-se reduzir os conceitos fundamentais de um ramo da
Matemática, com base no conjunto dos números naturais.
2.5. A aritmetização da análise
Dado que a Geometria podia ser reduzida à Análise (Geometria Analítica),
a Aritmética se configuraria como base natural para fundamentar a Matemática.
Os axiomas de Peano, por exprimirem as propriedades essenciais dos números
naturais, foram utilizados por Weierstrass, Dedekind e Cantor
24
, para a
aritmetização da Análise e da Geometria.
22
Um sistema é consistente quando este não encerra nenhum tipo de contradição, isto é, que não se possa
provar uma proposição e ao mesmo tempo sua negação. Um sistema tem consistência relativa quando ele é
consistente a partir de outro sistema, menos suspeito, que também o seja.
23
Sob o ponto de vista da Matemática do século XX, os dois tipos de Geometria são, por vezes, aplicáveis ao
mundo físico, sendo ambas relativamente consistentes. Somente no século XX levantou-se o problema de
saber se a própria Geometria Euclidiana era ou não consistente. Esta pergunta foi feita e respondida pelo
matemático David Hilbert: a Geometria não-Euclidiana é consistente se a Geometria Euclidiana for
consistente (DAVIS; HEUBEN, 1985, p. 263-264).
24
Os alemães Karl T.W. Weierstrass, Richard Dedekind, Georg Cantor, preocupavam-se com a falta de
definição rigorosa da expressão “número real”, fazendo esforços bem sucedidos para fundamentar o cálculo
fora da geometria. Em todos os três métodos criados, usaram algum conjunto infinito de números racionais
para definir um número real (ÁVILA, 1999, p. 43-45).
62
Weierstrass promoveu a efetiva aritmetização da Análise apresentando
uma fundamentação para os números reais sem recorrer a procedimentos que se
valiam da intuição geométrica, como vinha ocorrendo até então. Dedekind
apresentou uma fundamentação para os números reais por meio dos “Cortes de
Dedekind” no conjunto dos números racionais. Já Cantor, definiu os números
reais como classes de equivalência de seqüências de Cauchy de números
racionais. O processo da aritmetização foi utilizado para a realização desses três
processos, acabando por reduzir o conceito essencial de número real, passo a
passo, àquele de número natural. Além disso, foi também necessário introduzir
conjuntos infinitos nos fundamentos da Matemática (MENEGHETTI, 2001, p. 84).
A preocupação de Cantor com o desenvolvimento de uma teoria sobre os
números reais trouxe à baila a questão do infinito em matemática de modo que o
levou a construir uma teoria dos conjuntos. A idéia de infinito, como uma coleção
infinita de objetos sempre causou dificuldades, tanto a matemáticos como a
filósofos, sendo até então reprimida, como mostra a frase pronunciada por Gauss:
“Protesto contra o uso, jamais permitido em matemática, de magnitudes infinitas
como algo completo. O infinito não é senão uma maneira de dizer...”. As palavras
de Gauss assumem o significado de que, quando consideramos qualquer
conjunto finito de números naturais, sempre existe algum número fora desse
conjunto. O infinito expressa, então, a potencialidade dos números, sem,
entretanto, precisar o conceito atual, completo e acabado de infinito. A teoria de
Cantor, no entanto, legislou, hierarquizou e classificou este infinito atual (BABINI,
1967, p. 56). Cantor mostrou que a aritmética do infinito é diferente daquela do
finito e que não é possível aplicar as mesmas leis para ambas.
As descobertas de Cantor causaram grande impacto entre os matemáticos,
cuja preocupação, no século XIX, voltava-se para a questão do rigor na análise e
na geometria. Fundamentar os ramos da matemática era assunto corrente
naquela época.
Uma vez que ocorrera a aritmetização da Análise, Frege observou que a
Teoria dos Conjuntos desenvolvida por George Cantor, parecia servir de modo
adequado como fundamento para a Matemática, porquanto a Aritmética podia ser
reduzida à lógica da Teoria dos Conjuntos – Frege mostrou que os números
63
naturais podiam ser construídos a partir do conjunto vazio – usando-se as
operações da Teoria dos Conjuntos (DAVIS; REUBEN, 1985, p. 373). O
matemático Bertrand Russell foi mais além, pretendendo fundamentar toda a
Matemática por meio da lógica da Teoria dos Conjuntos. Para tanto, fazia-se
necessário uma formulação clara do que seriam as leis da Lógica e definir uma
série de termos-chave da Teoria dos Números de forma a possibilitar que a
Aritmética se tornasse dedutível das leis da Lógica. Necessitava-se, portanto, de
um sistema lógico muito mais potente do que a Lógica tradicional.
Não obstante, foi o próprio Russell quem descobriu que as noções da
Teoria dos Conjuntos podiam conduzir a contradições – chamadas antinomias ou
paradoxos
25
. A descoberta desses paradoxos determinou o que veio a se chamar
“crise dos fundamentos”, pois esta descoberta evidenciou que mesmo os
princípios básicos da Teoria dos Conjuntos podiam esconder contradições.
2.6. As principais correntes filosóficas
Assim, os matemáticos passaram a preocupar-se em encontrar uma base
sólida que viesse a fundamentar sua ciência, buscando uma teoria axiomática
isenta de inconsistências. Voltaram-se para a Aritmética, considerando o conjunto
dos números naturais como um sistema capaz de gerar toda a Matemática. Neste
contexto, a discussão sobre a existência e significação do conceito de número
tiveram papel preponderante, acabando por determinar o aparecimento das três
principais correntes da filosofia da Matemática:
- o logicismo ou platonismo, que considera os objetos matemáticos reais.
Os números existem, mas sua existência é totalmente independente de
nosso conhecimento sobre eles. Considera a lógica como geradora da
matemática;
25
O mais famoso exemplo de antinomia foi inventado pelo próprio Russell. Costa (1977, p. 10) exemplifica:
“Consideremos o conjunto A formado por todos os conjuntos que não pertencem a si mesmo. Pelo princípio
do terceiro excluído, A pertence ou não pertence a A. Suponhamos que A pertence a A; então, como A é o
conjunto de todos os conjuntos que não pertencem a si mesmos, A não pode pertencer a A. Admitamos
então, que A não pertença a A; logo, de acordo com a definição de A, este conjunto deve pertencer a si
mesmo. Há, por conseguinte, contradição”.
64
- o formalismo, que considerava os objetos matemáticos isentos de
qualquer significado, não importando, dessa forma, se os números
existem ou não. Tem como finalidade a eliminação dos poderes da
intuição na fundamentação e elaboração de uma teoria. Sustenta que a
matemática é o estudo dos sistemas simbólicos formais. Seus termos
são meros símbolos, e as afirmações são apenas fórmulas envolvendo
símbolos. Deseja-se, dessa forma, garantir a consistência do sistema
envolvido;
- intuicionismo ou construtivismo, que considerava reais somente os
objetos matemáticos que podem ser construídos. Assim, os números
existem como criações humanas, são construídos pela mente. Defende
que a base da matemática é a intuição, que permite conceber um objeto
após o outro, obtendo-se seqüências infindáveis, a mais conhecida das
quais é a dos números naturais (DUARTE, 2002).
Os diversos problemas apontados na axiomática de Euclides chamavam a
atenção de matemáticos como David Hilbert (1862-1943), Alfred Tarski (1901 -
1983), George David Birkhoff (1884-1944), Moritz Pasch (1843-1930) os quais
apresentaram trabalhos direcionados à compreensão e esclarecimento pleno dos
fundamentos da Geometria Euclidiana.
No início do século XX, o matemático David Hilbert, principal representante
do formalismo, cuja obra “Grundlagen der Geometrie” de 1899, é a mais
conhecida das formulações da Geometria, exercendo maior influência que
qualquer outra sobre o ensino dessa matéria em todos os níveis. O tratamento
dado por Hilbert à Geometria, segundo Howard Fehr, cortou “os últimos laços que
ligavam a Geometria à intuição e foi confirmado o fato de que, no que concerne
aos matemáticos, o formalismo havia obtido uma notável vitória” (1961, p. 6).
Por meio de Hilbert, a Teoria dos Conjuntos recebeu consagração oficial no
1º Congresso Internacional de Matemática, realizado em 1897, em Zurique,
contribuindo decisivamente para a difusão das idéias de Cantor.
65
Em 1900, David Hilbert anunciou, no II Congresso Internacional de
Matemática, realizado em Paris
26
, uma lista de problemas abertos, que serviu
como um dos principais guias para os matemáticos em suas produções científicas
ao longo do século XX. Seu discurso pode ser considerado um manifesto
metodológico da matemática do século XX. Suas idéias foram largamente
difundidas à comunidade matemática.
O discurso proferido por Hilbert deu destaque ao papel dos problemas no
futuro da ciência matemática. São os problemas que animam e dão sentido ao
trabalho dos pesquisadores. Nesse sentido, Hilbert constatou que algumas
questões prosperam, dando origem a novos campos de investigação: “É pela
solução de problemas que aumentam as forças do pesquisador; ele descobre
novos métodos e novas perspectivas e ganha horizontes mais largos e mais
livres” (HILBERT, apud PATRAS, 2001, p. 102).
Nas considerações de Hilbert, a noção de horizonte também teve seu
papel destacado como essencial para o trabalho matemático. Mais do que
encontrar a solução de um problema, o que apaixona o matemático são as
perspectivas, que nelas entrevê uma rede de significados a elucidar e não raro,
direcionam sua pesquisa.
No que concerne ao papel do rigor axiomático, Hilbert contentou-se, em
seu discurso de 1900, em insistir sobre sua universalidade e sua função
esclarecedora. Na sua lista de problemas, o segundo problema preocupa-se com
a questão da consistência axiomática
27
, enquanto que o sexto problema, com a
possibilidade de fundamentar as teorias da física em termos axiomáticos.
O discurso de Hilbert completa-se pelo testemunho de sua convicção
profunda quanto à unidade da Matemática, altamente discutível, segundo Patras
(2001), ao menos no que se refere à possibilidade de sua realização.
26
A partir de 1900, este congresso passou a ser realizado de quatro em quatro anos, com interrupções nesta
regularidade apenas durante as duas guerras mundiais.
27
A consistência axiomática é obtida quando se pode provar que um número determinado de passos lógicos,
derivados de um conjunto de axiomas, não encerra nenhum tipo de contradição.
66
CAPÍTULO 3
MATEMÁTICOS E AS PROPOSTAS DE INTERNACIONALIZAÇÃO
DO ENSINO DE MATEMÁTICA
3.1. O primeiro movimento internacional de reforma do ensino da
matemática
No final do século XIX, surgiram em diversos países europeus, inúmeras
revistas especializadas em matemática, tendo como objetivo publicar os avanços
obtidos nesta ciência. A matemática achava-se então, internacionalizada. Em
conseqüência, em 1897, foi realizado o 1º Congresso Internacional de Matemática
em Zurique e logo após, em 1899, foi criada a revista “L’Enseignement
Mathématique”, pelos matemáticos Henri Fehr e Charles-Ange Laisant, tendo
como objetivo estabelecer contato, troca de informações e comparações entre os
sistemas educacionais dos países (D’AMBROSIO, 2003).
Em paralelo a esse movimento de internacionalização e em meio às
discussões filosóficas sobre como a matemática deveria ser fundamentada, surgiu
também o movimento internacional de reforma do ensino de matemática, durante
o IV Congresso Internacional de Matemática, ocorrido em Roma, em 1908, que
culminou com a criação do IMUK (Internationale Mathematische
Unterrichtskommission), ou CIEM (Commission Internacionale de L’Enseignement
Mathématique), isto é, “Comissão Internacional para o Ensino da Matemática”.
67
Essa iniciativa deveu-se ao matemático americano David Eugene Smith.
Um comitê central composto der três membros, Felix Klein, como presidente,
Alfred George Greenhill, de Londres, na vice-presidência e Henri Fehr, de
Genebra, como secretário, foi incumbido de formar a grande comissão e organizar
os seus trabalhos.
Os relatórios, que os delegados dos diversos países deviam apresentar ao
“Comitê Central”, tinham como escopo responder às seguintes questões: Qual é o
estado atual do ensino da Matemática, do ponto de vista da sua organização, da
sua finalidade e do seu método? Quais as tendências modernas que nele se
fazem sentir? (ROXO, 1930).
A CIEM fazia-se representar em vários países: França, Alemanha,
Inglaterra, Itália e Estados Unidos, tendo como principal objetivo discutir e tentar
solucionar as dificuldades no ensino da Matemática, resultando na primeira
proposta de internacionalização do ensino de Matemática (VALENTE et alli,
2004). Desde então, a revista oficial da CIEM é o “L’Enseignement
Mathématique
28
. Essa revista publicou em 1920 um relatório de encerramento da
CIEM e uma lista completa das publicações desta e das sub-comissões, por onde
se pode avaliar a importância desse movimento internacional, pois nessa lista
figuram 294 relatórios sendo que grande número de outros trabalhos ficaram
inacabados (ROXO, 1930). Henri Fehr dirigiu a revista até 1954, publicando 40
volumes até essa data, denominada primeira série. Em 1955, Jean Karamada
assume a direção da revista e inicia a publicação de uma segunda série de
volumes (RHAM, 1976).
Note-se, portanto, que a preocupação com o ensino de matemática e
mesmo a justificativa para a sua reforma partiu de matemáticos, cujo maior
expoente na problematização do ensino revela-se na pessoa de Felix Klein,
responsável pela defesa de concepções norteadoras da renovação internacional
do ensino secundário de matemática (BRAGA, 2006).
A preocupação de Klein com o ensino de matemática já era conhecida,
uma vez que entre 1900 e 1904, Klein realizou uma série de conferências em
28
A Revista L’Enseignement Mathématique” foi fundada em 1899 por Henri Fehr e Charles A. Laisant
(RHAM, 1976).
68
diversas universidades européias sobre o ensino de matemática, nas quais traçou
as diretivas do movimento renovador, coordenando esforços que atuavam
esparsamente.
Entre 1907 e 1908, Klein publicou a obra “Matemática elementar sob um
ponto de vista superior”, que se converteu em princípios do movimento de
modernização do ensino da matemática secundária do início do século XX.
Apresentada em dois volumes, o primeiro versa sobre aritmética, álgebra e
análise e o segundo, sobre geometria (SANTALÓ, 1979). Nela, Klein propunha
unificar os vários ramos da matemática escolar por meio do conceito de função,
nas suas diversas representações (BRAGA, 2006). Klein ainda defendia a
unificação das diferentes geometrias sob o ponto de vista da teoria dos grupos.
Descrevia a geometria como “o estudo das propriedades das figuras que
permanecem invariantes sob um particular grupo de transformações” (VITTI,
1998, p. 32-33).
Klein insistia sobre a necessidade de que as tendências da matemática
superior, manifestadas no século XIX, fizessem parte da matemática do
secundário, dando-lhe vitalidade. A ordenação da geometria com base na teoria
dos grupos, (funções e representações gráficas) eram propostas defendidas em
sua obra “Programa Erlanger”. O grupo das transformações (rotações, reflexões e
translações) é utilizado para caracterizar a geometria euclidiana, precedido de um
sistema de axiomas que conservam a congruência de triângulos da geometria de
Euclides como fundamentais para o desenvolvimento posterior do estudo (FEHR,
1961).
Várias conferências foram patrocinadas pela CIEM, sob a presidência de
Felix Klein. Estas conferências tiveram lugar em Bruxelas (1910), Milão (1911),
Cambridge (1912) e Paris (1914). Com a primeira Guerra Mundial, as atividades
da Comissão foram paralisadas e retornaram em 1928, assumindo a presidência
David E. Smith, até 1932, quando foi substituído pelo matemático francês Jacques
Hadamard.
As idéias propugnadas por Klein, voltaram à tona durante o segundo
movimento internacional de reforma do ensino da matemática, o MMM, quando
69
novamente os matemáticos reuniram-se para discutir e elaborar um novo
programa de ensino, que buscava diminuir a distância entre a matemática do
ensino superior e a matemática escolar.
3.1.1. Guido Castelnuovo: o ensino como um dever social ou porque um
matemático deve despender seu tempo com o ensino da matemática
Na cidade de Paris, em 4 de abril de 1914, o professor Guido Castelnuovo
(1865-1952)
29
, matemático da Universidade de Roma e membro do CIEM,
proferiu o discurso de abertura da V CIEM.
Felix Klein (1849-1925), então presidente da comissão, não pudera
comparecer ao evento por problemas de saúde, motivo pelo qual Guido
Castelnuovo fora convidado para falar em seu nome. Em seu discurso,
Castelnuovo defendeu a necessidade de alargar os programas e estender a
investigação em escolas de todos os níveis, devido à crescente preocupação com
o ensino de matemática em todo o mundo, denunciada pela quantidade de
relatórios remetidos ao comitê sobre o assunto, totalizando cento e sessenta
fascículos publicados, enviados pelas subcomissões da Europa, América e Japão,
sem contar aqueles que ainda estavam em andamento. Esse número de
publicações provocou, ainda, questionamentos sobre como proceder uma síntese
adequada de todas as informações obtidas, com vistas à próxima conferência,
que seria realizada em Estocolmo
30
.
Os trabalhos da comissão não se limitavam apenas na publicação de
relatórios, observou Castelnuovo. Consistiam também na realização de reuniões
internacionais para discutir sobre assuntos didáticos como: o rigor, o papel da
intuição e da experiência no ensino secundário e da preparação matemática dos
físicos.
A comissão não tinha como propósito reformar radicalmente o ensino de
matemática, nem fazer impingir uma determinada tendência sobre os métodos de
29
Guido Castelnuovo (1865-1952) foi uma das figuras mais representativas da escola geométrica italiana,
juntamente com Federico Enriques e Francesco Severi (SEBASTIÃO SILVA, 1952).
30
O evento não foi realizado em 1916 em Estocolmo como havia sido anunciado, devido à Primeira Guerra
Mundial, sendo apenas retomado a partir de 1928, na cidade de Bolonha, Itália.
70
ensino empregados nos diversos países participantes, posto que cada um deles
tinham suas regras, sabiam avaliar o que seria melhor para suas escolas.
Entretanto, isso não deveria ser empecilho para que as diferentes nações
tomassem conhecimento e aproveitassem de suas experiências em matéria do
ensino de matemática.
O Comitê Central indicou dois temas para serem examinados durante essa
conferência em Paris. Um deles dizia respeito aos resultados obtidos pelos países
participantes pela introdução de elementos do cálculo infinitesimal nas escolas de
ensino médio; o outro assunto tratava de estudar o papel da matemática na
preparação dos futuros engenheiros.
Foi justamente por esse motivo que a escolha do lugar para a reunião
internacional recaiu sobre a França. Castelnuovo recordou aos presentes que, a
partir de 1902, deu início nesse país uma reforma no ensino tradicional
introduzindo noções de derivadas e funções primitivas nos programas dos liceus
franceses. Além dessa experiência, a França dedicou por mais de um século
cuidados assíduos à preparação dos engenheiros, especialmente porque a
colossal da indústria moderna não podia ser mais prevista. A multiplicidade de
escolas do porte da Escola Politécnica e a diversidade de suas organizações
permitiam o fornecimento de objetos de comparação instrutivos. Devia-se,
portanto, examinar qual ponto seria conveniente ensinar aos futuros engenheiros,
se os ramos superiores da matemática pura, ou se era preferível dar uma
educação mais prática, voltada para as ciências e suas aplicações.
O destaque dado à delegação francesa não impedia aos interessados notar
que os problemas do ensino ultrapassam os limites da investigação matemática e
compreende todos os saberes. Castelnuovo buscou apoio nos matemáticos
Monge e Lagrange, os quais procuraram levar seu saber para proveito de todas
as escolas, para defender a propriedade do matemático em se preocupar com o
ensino.
Para Castelnuovo, é um dever social do matemático se importar com o
ensino. “Não devemos facilitar aos nossos semelhantes a aquisição do saber, que
é ao mesmo tempo uma força e uma felicidade?”, questiona. E ainda: “Às vezes
71
nós nos perguntamos se o tempo em que consagramos às questões do ensino
teria sido melhor empregado nas pesquisas científicas. Então respondemos que é
o dever social que nos força à tratar desses problemas”. Além de produzir
conhecimento, sustenta Castelnuovo, cabe ao matemático fazer com que o
indivíduo seja informado de suas investigações “sem demora e desperdício” de
modo que pudesse servir aos propósitos sociais.
Não é suficiente, com efeito, produzir riqueza, deve-se também
fazer com que sua distribuição se faça sem demora e sem
desperdício. Não é, portanto, uma riqueza, mesmo a mais
preciosa das riquezas, aquela que aperfeiçoa nosso orgulho e que
é a fonte de nossas intenções mais puras? (CASTELNUOVO,
1914, p. 191).
Entretanto, as palavras de Castelnuovo, não sugerem caminhos a serem
seguidos, indicando apenas que pretendeu expressar e divulgar suas
preocupações sobre o ensino de Matemática. Não se ocupou, portanto, esse
palestrante em propor métodos de ensino, e tampouco em atribuir para quais
sujeitos seriam mais convenientes. Como empregar as investigações
matemáticas “sem demora e desperdício” ao ensino? Quem estaria apto a
promover essas renovações? Para qual público? São indagações que restaram
em aberto.
Sua fala, própria para aquela ocasião, qual seja, um discurso de abertura
de uma conferência, provavelmente não lhe permitiu fazer uma reflexão mais
minuciosa sobre essas questões, possibilitando apenas o desenvolvimento de
uma idéia geral, pela qual deixou entrever a obrigação moral que o matemático
teria em se preocupar com a sociedade como um todo.
Esse discurso sobre o dever social dos matemáticos parece ter sido
negligenciado anos mais tarde pelos matemáticos do grupo Bourbaki, ao se
posicionarem como uma sociedade secreta e exporem uma matemática voltada
para a máxima abstração, fazendo supor a prática matemática algo asséptico. No
entanto, note-se, o modelo bourbakista prestou-se para justificar a renovação do
ensino, para todas as classes sociais, em diferentes países.
72
3.2. Renovação na Matemática francesa: o projeto bourbakista
Globalmente, em seu conjunto, o pronunciamento de Hilbert durante o II
Congresso de Matemática, em 1900, reflete as convicções do século XX, em
especial a preocupação com a unidade e com o método axiomático, o qual
alcançou alto nível de precisão e desenvolvimento com as obras do Grupo
Bourbaki.
As axiomatizações das diversas teorias matemáticas eram feitas pelo
Grupo Bourbaki por meio da Teoria dos Conjuntos, esta mesma,
convenientemente axiomatizada. Segundo Andre Weil, “axiomatizar uma teoria
matemática, consiste essencialmente em se definir uma espécie de estrutura em
Teoria dos Conjuntos”. Dessa forma, para Bourbaki, o método axiomático é
indissociável do estudo das estruturas. São expressões sinônimas: axiomatizar
uma teoria matemática é definir uma espécie de estrutura [grifo do autor]
(COSTA, 1987, p. 10).
Na França e para muitos matemáticos do mundo todo, a idéia de estrutura
está ligada ao nome de Bourbaki, um dos maiores responsáveis pelo papel
proeminente que essa noção tomou na organização da ciência Matemática atual.
Na terminologia bourbakiana, o termo estrutura corresponde a uma classe
particular de definições de objetos abstratos, tendo em mente que estes objetos
têm um certo número de propriedades características, que poderiam ser
eventualmente exibidas.
Segundo Krause (1987), para o Grupo Bourbaki, os conceitos
estruturantes, ou seja, aquelas estruturas fundamentais (estruturas-mãe), a partir
das quais as demais poderão ser obtidas, são de três espécies:
... algébricas (que introduzem a noção de operação), de ordem
(que introduzem as noções de ordenação) e as topológicas (que
permitem um tratamento de noções tais como limite, continuidade
e vizinhança). Intuitivamente, uma estrutura é constituída por uma
coleção de conjuntos e de relações entre seus elementos. As
relações, ponto de partida para a caracterização de uma estrutura,
podem ser de natureza variada. Para caracterizá-las, utiliza-se a
linguagem de teoria dos conjuntos. [...] As estruturas são
construídas tendo por base a linguagem da teoria dos conjuntos e
fazendo uso das relações e aplicações (KRAUSE, 1987, p. 85-87).
73
Do ponto de vista da história do pensamento, Bourbaki desempenhou um
papel exemplar de catalisador das tendências epistemológicas nascidas do
método axiomático e da reorganização do corpus da matemática fundamental.
Bourbaki havia conseguido dar uma aura indiscutível ao pensamento matemático,
ao procurar o predomínio – o estruturalismo – e uma finalidade – a pesquisa de
uma arquitetura dedutiva e hierarquizada de seus conceitos e resultados.
O Grupo Bourbaki começou a se formar nos anos 1934-1935. Para Patras
(2001), sua história se subdivide em duas épocas: 1934 a 1958 e 1958 a 1980.
No início do século XX, ocorre um declínio nas investigações matemáticas
francesas, que se ressentem pela interrupção provocada pela 1ª Guerra Mundial
(1914-1918). A França se vê desfalcada de matemáticos e alunos nas escolas
superiores. Contrariamente aos alemães, pecaram os franceses em mandar para
a frente de batalha seus expoentes no campo da Matemática, sofrendo
significativas baixas nessa área. Além disso, um financiamento insuficiente para a
pesquisa pós-guerra e um certo autoritarismo do poder científico vigente
concorriam para que os matemáticos franceses ficassem praticamente impedidos
de terem acesso às novas teorias matemáticas
31
, especialmente aquelas
produzidas pela Universidade de Göttingen, local onde se constituiu uma
poderosa escola de Álgebra Moderna, notadamente representada por Hilbert,
Emmy Noether e Bartel van der Waerden.
Apesar das dificuldades em estabelecer contato com a matemática
alemã
32
, um grupo de jovens diplomados pela Escola Normal Superior
ambicionava diminuir a defasagem do ensino francês em relação ao
desenvolvimento da matemática germânica.
31
Nesse período, disputas de ordem política impossibilitavam os matemáticos franceses de apreciar a
vitalidade da escola algébrica alemã. Os principais representantes da matemática francesa, professores
como Émile Picard (1856-1941), Jacques Hadamard (1865-1963), René Baire (1874-1932), Émile Borel
(1871-1956) e Henri Lebesgue (1875-1941), eram analistas, concentrando seus esforços em trabalhos sobre
a teoria das funções. Elie Cartan (1869-1941) foi uma exceção, pois suas pesquisas situavam-se entre a
teoria dos grupos, sistemas de equações diferenciais e geometria, sua obra, posteriormente muito estimada
pelos Bourbakistas, era considerada, entretanto, muito avançada para a época (MASHAAL, 2002, p. 45-48).
32
Somente a partir do 7º Congresso Internacional de Matemáticos, realizado em Bolonha, Itália, em 1928, foi
permitida a presença de matemáticos alemães, oportunizando-se à comunidade matemática travar contato
com as contribuições alemãs, capitaneadas por Hilbert (MASHAAL, 2002, p. 48).
74
Andre Weil, figura central do bourbakismo desde sua criação, foi um dos
primeiros, senão o primeiro a dar o passo inicial. A partir de 1925, inicia uma série
de viagens, tendo oportunidade de encontrar os maiores matemáticos da época.
Esteve na Itália, Alemanha, Escandinávia e Inglaterra. Em Göttingen, em 1926,
iniciou seus estudos sobre Álgebra Moderna, fazendo cursos com Emmy Noether,
que, “por serem menos desordenados, foram mais úteis” (WEIL, 2002, p. 49).
O nascimento do grupo Bourbaki remonta a 1934. Na Universidade de
Strasburgo, André Weil e Henri Cartan estavam encarregados de ministrar o
curso de Cálculo Diferencial e Integral, baseado no “Traté d’Analyse” de Edouard
Goursat, considerado ultrapassado para as conquistas matemáticas da época,
parecendo-lhes cada vez mais inadequado para o ensino. Assim Weil relata, em
suas “Memorias de aprendizaje” a origem do grupo Bourbaki:
Cartan me consultava de vez em quando sobre a melhor maneira
de tratar este ou aquele capítulo do programa; terminei por
apelidar-lhe “o indagador”. [...] Um dia de inverno, no final de
1934, creio ter tido uma idéia luminosa para por fim às
persistentes perguntas de meu companheiro. “Somos cinco ou
seis amigos – lhe disse aproximadamente – encarregados do
mesmo ensino em diversas universidades. Façamos uma reunião,
decidamos isto de uma vez por todas, depois disso me verei
liberado de suas perguntas”. Ignorava que Boubaki acabava de
nascer naquele momento. [grifo do autor] (WEIL, 2002, p. 103).
Bourbaki nasce, pois, de preocupações pedagógicas, evoluindo,
posteriormente, em direção à vontade de se tornar referência, incompatível com
as exigências de um manual de ensino:
Quanto à natureza desse empreendimento, não a tivemos clara
desde o princípio. No começo, nosso objetivo era de alguma
maneira pedagógico; tratava-se de trazer as grandes linhas do
ensino da matemática para o nível da licenciatura. Em seguida,
tratou-se de escrever para esse nível um curso ou tratamento de
análise que substituísse ao Goursat e que servisse de base a
esses ensinos. (WEIL, 2002, p. 103).
Os cursos de análise clássicos, como os de Jordan ou Goursat procuravam
explanar, segundo Weil, “em poucos volumes, tudo o que se supunha que um
aprendiz de matemático deveria saber antes de especializar-se”. Nesse sentido,
75
apenas as preliminares mais indispensáveis da teoria dos
conjuntos e noções algébricas e topológicas requeriam mais que
breves capítulos de introdução. Quando abordamos a tarefa, não
de escrever um tratado sobre cada um destes temas, senão
simplesmente de expô-los com uma suficiente amplitude para não
ter que voltar a eles depois, não nos restou outra alternativa que
ambicionar a idéia de escrever um manual de ensino universitário.
Antes de tudo tratava-se de construir uma base suficientemente
ampla e sólida para suportar todo o essencial das matemáticas
modernas... (WEIL, 2002, p. 110-111).
A lista dos primeiros membros do grupo Bourbaki variava de um autor a
outro, de acordo com os critérios assegurados (assiduidade, longevidade...). Henri
Cartan, Claude Chevalley, Jean Coulomb, Jean Delsarte, Jean Dieudonné,
Charles Ehresmann, Jean Leray, Szolem Mandelbrojt, René de Possel e André
Weil integram o grupo.
No início da década de 1930, o único seminário que os matemáticos
franceses haviam conhecido era aquele oferecido por Hadamard. Em suas
Memórias”, Weil tece alguns comentários sobre o Seminário Hadamard:
Em Paris, quando eu era normalien, e muito depois, não houve
mais do que um, o de Hadamard. No início de curso nos
reuníamos em seu domicílio, na rua Jacques Dolent, em sua
biblioteca, para a distribuição dos trabalhos e estudar. Tratava-se,
em primeiro lugar, de publicações que havia recebido de todas as
partes do mundo ou pelo menos das que lhe haviam parecido
merecedoras de um informe. Ademais, acrescentava títulos
diversos recolhidos aqui e acolá e aceitava de bom grado
trabalhos publicados nos dois ou três últimos anos, embora não
existisse uma norma fixa a respeito. Quanto aos temas, seu
desejo era o de apresentar-nos um panorama o mais extenso
possível das matemáticas contemporâneas; se não o conseguia,
ao menos era o objetivo a que se propunha. Para cada um dos
assuntos que anunciava, buscava um voluntário; às vezes o
expunha brevemente porque tal estudo excitava sua curiosidade.
[...] Entre os colaboradores se encontravam tantos matemáticos
experientes como principiantes... (WEIL, 2002, p. 35-36).
Ao freqüentar as universidades alemãs, Weil e seus companheiros tiveram
a oportunidade de assistir aos seminários alemães, habituais em seu ensino.
Ocorreu-lhes, então, a idéia de organizar um seminário em Paris, como ponto de
partida para as reuniões do grupo. A princípio fora denominado Seminário Julia,
em homenagem ao mais jovem professor da L’École, Gaston Julia. Esse
76
seminário manteve-se até 1939. A cada ano dedicava-se a um tema central:
Grupos e álgebras” em 1933-1934; “Espaços de Hilbert” (1934-1935); “Topologia
(1935-1936); “Obras de Elie Cartan” (1936-1938); “Cálculo das variações” (1938-
1939). O Seminário Julia não resistiu à II Guerra Mundial. Contudo, renasceu em
1948, rebatizado como Seminário Bourbaki (MASHAAL, 2002, p. 105).
A escolha do nome Nicolas Bourbaki, como pseudônimo do grupo de
matemáticos franceses, se faz acompanhar de certo folclore. Uma das versões
para a escolha do nome – existem várias – diz respeito a um episódio datado de
1923, quando calouros da École Normale foram convidados a assistir uma
conferência sobre noções básicas da teoria das funções. Nela, o palestrante
apresenta um extravagante “Teorema de Bourbaki”, deixando o auditório
completamente confuso. Provavelmente, o teorema idealizado na brincadeira leva
o nome do General Charles Bourbaki, participante da guerra franco-proussiana de
1870.
Uma das vantagens para o emprego de um tal pseudônimo, além do
folclore associado à edificação de um mito coletivo, é que permitiu resolver, de
maneira simples, o problema das assinaturas para os fundadores do Bourbaki,
qual seja, assinar um tratado com uma longa lista de nomes, que não eram os
mesmos ao longo dos anos.
Bourbaki, como se denominou oficialmente o grupo a partir do congresso
de fundação em julho de 1935, em Besse-en-Chandesse, (o pré-nome Nicolas só
aparece mais tarde)
33
, articula-se para redigir uma obra coletiva, para combater
as lacunas do ensino universitário francês, em princípio, em menos de um ano.
No entanto, o projeto de Bourbaki revestiu-se de tamanha amplitude e ambição
que a redação de um tratado de Análise não mais satisfazia. Os “Éléments de
mathématique” tornou-se um tratado monumental de matemática. O primeiro
volume apareceu em 1939 e o último data de 1998. Consiste, hoje em dia, em dez
livros, cada um deles, em geral, com vários volumes: Teoria dos conjuntos;
Álgebra; Topologia geral; Funções de uma variável real; Espaços vetoriais
33
As exigências em fornecer uma breve biografia do autor para publicação no “Compte Rendus de
l’Académie des Sciences” fez vir à tona a questão de um pré-nome para Bourbaki. Eveline Weil, mulher de
Andre Weil, batizou-o de Nicolas (MASHAAL, 2002, p. 22).
77
topológicos; Integração; Álgebra comutativa; Variáveis diferenciais e analíticas;
Grupos e álgebras de Lie; Teorias espectrais (MASHAAL, 2002, p. 53-54).
Em suas primeiras reuniões, para a consecução do empreendimento,
Bourbaki decidiu incluir um certo número de noções consideradas essenciais,
limitadas ao estritamente necessário, da Teoria dos Conjuntos, Topologia e
Álgebra Moderna (aos moldes do livro de Van der Waerden), como ferramentas e
conceitos de bases, que denominaram “pacote abstrato”. Já no primeiro
congresso, em Besse-en-Chandesse, começaram a aflorar características
basilares do bourbakismo:
Como o “pacote abstrato” continha as noções necessárias para a
exposição de outros temas previstos, é sobre eles que são
focalizados as primeiras redações de Bourbaki. Durante esse
processo, longo e tortuoso, tendo em vista o modo de trabalho do
grupo e a exigência de unanimidade, a ampliação do “pacote
abstrato” não cessa de crescer, ao mesmo tempo que emergia, no
âmago de Bourbaki, uma certa visão de Matemática, aquela
considerada por eles como um edifício dotado de profunda
unidade, repousando sobre a Teoria dos Conjuntos e
hierarquizada em termos de estrutura abstratas (algébricas,
topológicas, etc., ) [grifos do autor] (MASHAAL, 2002, p. 53).
O método de trabalho do grupo Bourbaki consistia, segundo as
Memorias” de Weil (2002), em designar, dentre os participantes, aquele a ser
encarregado da redação do tema discutido no congresso. Essa primeira redação
era lida e rediscutida novamente em um novo congresso, quando eram feitas
alterações, com maior ou menor profundidade. Não raras vezes, a escrita era
rechaçada em sua totalidade. Era então proposto um novo redator que procedia
segundo as instruções recebidas e o processo terminava quando se obtinha
aceitação unânime dos participantes.
Bourbaki foi responsável pela popularização de algumas notações
universalmente aceitas hoje em dia, como: , e I. Acrescentou a letra Q para
designar o conjunto dos números Racionais. A obra de Bourbaki ainda é
caracterizada por uma terminologia rígida, substituindo a linguagem informal e as
abreviaturas por termos técnicos precisos, empregando um estilo
78
... comumente classificado como muito seco, demasiadamente
rígido em sua organização e de leitura desconfortável, além do
fato de ser um sistema de referência muito pesado de se
manipular. Mas, mais do que um estilo, uma certa evolução havia
sido denunciada: evolução em direção à generalidade e à
abstração por elas mesmas, sem referências aos problemas
fundamentais que deram vida e alma aos matemáticos (PATRAS,
2001, p. 121).
De acordo com Patras (2001), o primeiro período (1938-1958) se concluiu
com a redação de um tratado sobre os fundamentos da Análise moderna. A obra
comporta seis livros: Teoria dos Conjuntos; Álgebra; Topologia geral; Funções de
uma variável real; Espaços vetoriais topológicos e Integração.
Devendo os membros de Bourbaki retirar-se do grupo com a idade de 50
anos, a partir de 1958, uma nova geração vem como substituta. Pierre Cartier,
Samuel Eilenberg, Alexandre Grothendieck, Pierre Samuel e Jean-Pierre Serre,
fizeram parte desse novo grupo.
Naqueles novos tempos, comenta Patras (2001), o estilo axiomático
tornou-se bastante difundido, independente dos manuais de Bourbaki, apesar de
satisfazer as mesmas exigências metodológicas. Exemplo disso são os trabalhos
de Oskar Zariski em Geometria Algébrica, os quais apresentavam com sucesso o
método axiomático-estrutural, herdados da escola algébrica alemã, obtidos à
parte dos empreendimentos bourbakistas. Zariski realizou, desde 1937, a reforma
da Geometria Algébrica no sentido predominante na Álgebra Moderna. O método
bourbakista, uniformemente aceito e reconhecido, tornou-se um sucesso.
Entretanto, ressalta Patras, a originalidade e a especificidade do empreendimento
em nome de Bourbaki e de sua obra também se tornou proporcionalmente
reduzida, à medida que seus membros começaram a publicar individualmente,
diferentes tratados (de topologia algébrica, de álgebra homológica...).
Segundo Patras (2001), uma das exigências do grupo era que cada um de
seus membros aspirasse à universalidade e se interessasse por toda a
Matemática. Entretanto, esse preceito dificilmente poderia prevalecer
uniformemente, pois a extensão dos conhecimentos matemáticos não cessa de
expandir, ameaçando os membros do grupo com a especialização. Assim,
surgiram duas tendências principais: construir fundamentos para os matemáticos
que viriam, ultrapassando conteúdos elementares, continuando a tradição dos
79
primeiros bourbakistas; ou se empenhar na redação de manuais mais
especializados e abandonar o aspecto “Éléments de mathématiques”, ou seja,
rompendo com a tendência planejada pelos iniciantes.
Recorrendo ao testemunho de Armand Borel, Patras comenta sobre a
participação de Alexandre Grothendieck (1928 - ) no grupo Bourbaki. Para Patras,
Grothendieck apresentou-se, nesse momento do percurso bourbakista, como a
pessoa mais abalizada para regenerar o projeto inicial e lhe dar um novo impulso.
“Toda a obra de Grothendieck traz a marca da maior aspiração bourbakista: a
pesquisa do conceito justo, no grau de generalidade otimizada”. Seu programa
preocupava-se em colocar em ordem a Matemática contemporânea, propondo
definir e estruturar os conceitos reguladores da Topologia Algébrica e da
Geometria Diferencial, Analítica e Algébrica. Embora Patras vislumbre na obra de
Grothendieck, o esforço de um homem para conduzir uma reviravolta radical nas
idéias fundamentais da Geometria e da Topologia, seu programa não logrou êxito.
(PATRAS, 2001, p. 125-126).
Além de certa desconfiança provocada pelo gosto imoderado de
Grothendieck para limites extremos de abstração, os membros de Bourbaki
entreviam em sua proposta imenso trabalho a empreender, sem garantia de
sucesso. Desse modo, Bourbaki acabou por empenhar seus esforços em outras
vias, mais modestas e razoáveis, daquelas pretendidas por Grothendieck,
afastando-se assim, da idéia de universalidade pretendida pelos primeiros
bourbakistas. Lançaram três livros: Álgèbre commutative, Groupes et algèbres de
Lie e Théories spectrales. Groupes et algèbres de Lie foi um sucesso, mostrando
que a escolha de temas específicos pode levar a resultados incontestáveis.
Os membros de Bourbaki trabalharam por muito tempo como em uma
sociedade secreta, recusando tornar público seus debates e restringindo suas
tomadas de posição oficial à publicação de textos puramente matemáticos. Dessa
forma, a comunidade Matemática foi privada das reflexões estratégicas e
metodológicas que poderiam ter sido discutidas abertamente. Sem dúvida, infere
Patras (2001), a história os julgará com pouca indulgência, pois a publicidade dos
debates é essencial à vida do pensamento científico.
80
Com exceção do manifesto “L’Arquitecture des matématiques” (1948), cuja
provável autoria é de Dieudonné, publicações regulares sobre Bourbaki
começaram a surgir somente a partir de 1980. O referido manifesto,
freqüentemente citado para contradizer o silêncio de Bourbaki, é relativizado por
Patras por considerá-lo como parte de uma propaganda de Bourbaki, o qual
impunha uma imagem da natureza do bourbakismo que não admitia contradição e
tampouco permitia investigar a existência de diferentes pontos de vista no interior
do grupo (PATRAS, 2001). A atual historiografia empreendeu o estudo dos
documentos disponíveis, fazendo reviver as discussões e polêmicas que agitavam
as reuniões do grupo, mostrando que, longe da imposição de uma imagem
rigorosa e rígida do pensamento matemático, encontrada nas publicações,
tratados matemáticos e notas históricas do grupo Bourbaki, as tomadas de
decisão admitiam a contradição, as escolhas efetuadas pelo grupo eram
alimentadas por intensos debates.
Armand Borel, em artigo de março de 1998, “Twenty-five years with Nicolas
Bourbaki, 1949-1973” insiste vivamente sobre isso e denuncia em particular o
caráter abusivo do subtítulo, “Le choix boubakiste”, uma das obras mais populares
de Dieudonné, considerando-o “extremamente enganoso”. Segundo Borel, os
membros do grupo Bourbaki mantinham intensa conversação durante os
seminários e contribuíam na escolha dos temas das conferências, quando os
tópicos discutidos eram de interesse de pelo menos alguns de seus membros, e,
além disso, muitos outros temas que se mostravam interessantes eram
preteridos. Por outro lado, o seminário não poderia ser visto, como coloca
Dieudonné, na obra supracitada, como um esforço convencionado por Bourbaki
para apresentar um trabalho que abrangesse toda pesquisa recente em
matemática de seu interesse. Tais conclusões são apenas dele, Dieudonné, e não
deveria ser tomada como consenso por Bourbaki, rebate Armand Borel.
André Revuz
34
, corroborando as palavras de Borel, afirma existir “um
profundo dogmatismo em Bourbaki”, porquanto as discussões que faziam parte
da elaboração de seus tratados apresentavam-se sempre sob um mesmo ponto
de vista ainda que, munidos de boas justificativas, “o leitor jamais é convidado a
34
Segundo Mashaal (2002), o matemático André Revuz foi um dos principais incentivadores da reforma da
Matemática Moderna no ensino secundário francês.
81
dividir as dúvidas e hesitações do autor”. Além disso, embora a organização e
pureza lógica imprimam uma beleza austera nos textos de Bourbaki, rendem-lhes
uma abordagem muito difícil: “se seus trabalhos podem servir como referência,
raramente podem ser utilizados para um primeiro contato”, acrescenta Revuz
(1996, p. 74).
Paradoxalmente, a despeito da pretensão de Bourbaki em produzir um
manual didático destinado ao ensino superior, ao mostrar-se como uma
sociedade secreta, o grupo revelou de tal modo um fechamento, dando origem a
uma representação, que contaminou o pensamento didático, qual seja, aquela
que acredita ter existido desde sempre, uma comunidade de matemáticos
produzindo matemática e que, posteriormente essa matemática passaria a ser
consumida pelos professores. Assim, apesar de suas origens escolares, o
bourbakismo realizou historicamente, de modo bem datado, o ideário de uma
comunidade de matemáticos que pensa na produção matemática apartada do
ensino e, ao mesmo tempo, destinada a ser consumida por outras instâncias,
particularmente as educacionais.
3.2.1. Matemática e ensino de matemática na perspectiva de Jean Dieudonné
Neste tópico, apresentamos um breve relato de obras de Jean Dieudonné,
nas quais esse matemático bourbakista emitiu opiniões sobre o ensino de
matemática. Dieudonné dedicou sua obra “Algébre linéaire et geométrie
élementaire” (Paris: Hermann, 1973a) aos professores secundários, aqueles
desejosos de inovação de seus métodos de ensino, e que se sentiam indecisos “a
respeito do que deveriam conter os novos programas e sobre as articulações
tanto internas como em relação aos programas do Ensino Superior”. Para
Dieudonné, o que se ensina nas classes propedêuticas do Ensino Superior
deveria ser um “prolongamento natural” daquilo que o estudante viu no ensino
secundário [grifo do autor] (1973a, p. 7).
Segundo Dieudonné, a Matemática Moderna utiliza-se de novas e potentes
ferramentas, não previstas pela matemática tradicional, graças às quais foi
possível atacar, com sucesso, numerosos problemas que haviam ficado sem
82
solução. Entretanto, constatou, o ensino secundário não sofreu modificações
significativas, encontrando-se bastante afastado do nível das pesquisas
matemáticas contemporâneas. Desse modo, subsistia uma incoerência,
registrada nos programas do ensino secundário, a provocar um distanciamento
entre os métodos e o sentido do ensino de matemática do curso secundário e os
do curso superior:
... o ensino secundário, que por sua própria natureza está
bastante afastado do nível das pesquisas matemáticas
contemporâneas, não tem sofrido modificações, a menos de
alguns acréscimos superficiais, ou seja, consiste essencialmente
da Geometria de Euclides, da Álgebra de Viète e de Descartes, e
nas últimas séries, de um pouco de Cálculo Infinitesimal. Não é,
pois, surpresa, que seja cada vez maior a lacuna entre esse
ensino e o que é ministrado na universidade (DIEUDONNÉ,
1973a, p. 9).
Exemplificou, aludindo que as construções com régua e compasso, as
propriedades como triângulos, quadriláteros, a circunferência e os sistemas de
circunferências e as cônicas, além da trigonometria, eram assuntos
exclusivamente enfocados no secundário e, não chegavam sequer a ser
mencionados na universidade. Para esse autor, não era verdade que a
abordagem de tais temas tradicionais propiciasse aos alunos apreender métodos
de pesquisa e hábitos de raciocínio que lhes seriam úteis futuramente.
Nessa obra, Dieudonné defendeu também a necessidade de ensinar as
crianças a pensar sobre algumas noções previamente escolhidas, muito mais do
que acumular uma série de conhecimentos particulares, “mais ou menos
extravagantes”, com o objetivo de prepará-las para todas as profissões. A técnica
utilizada pelos matemáticos profissionais, em que era freqüente a substituição de
um sistema de axiomas por outro equivalente, porém mais conveniente,
conduzindo a simplificações consideráveis, foi apresentada por Dieudonné como
a ideal para ser implantada no ensino. Assim, uma teoria onde tudo fosse
espontaneamente ordenado em torno de algumas idéias chaves simples seria a
mais vantajosa, uma vez que esta se mostrava fundamental para os estudos
ulteriores (1973a, p. 10).
83
Além da aprendizagem precoce oferecida pelo método moderno, seu
aproveitamento ainda se justificaria, porquanto permitia agrupar teorias
aparentemente bastante diferentes. O ensino tradicional oferecia uma série de
disciplinas, tais como geometria analítica, geometria projetiva, teoria dos números
complexos, trigonometria, etc., que eram apresentadas separadamente e, com
freqüência, ignorando-se totalmente umas às outras e que poderiam ser ensinada
em uma só disciplina, a Álgebra Linear, “uma das teorias mais centrais e mais
eficazes da Matemática contemporânea”. Seria, portanto, de grande interesse
familiarizar os estudantes, o mais cedo possível, com as noções básicas dessa
disciplina, ensinando-lhes a “pensar linearmente” [grifo do autor] (DIEUDONNÉ,
1973a, p. 12).
Desse modo, preconizou Dieudonné, o aluno ingressante no ensino
superior, na área de ciências, deveria trazer como bagagem mínima noções de
Álgebra Linear, motivo pelo qual o livro apresentava uma exposição detalhada
dessa teoria.
Para Dieudonné, o ensino secundário não tinha como objetivo formar
futuros matemáticos, nem mesmo futuros professores de matemática. Era
justamente o ensino tradicional que incentivava esse procedimento, por insistir na
introdução de assuntos que só interessavam aos matemáticos. Uma das
vantagens da Álgebra Linear é que ela permitia apresentar a Geometria
Elementar de maneira rigorosa e sem esforços, ao passo que o estudo axiomático
da Geometria Euclidiana mostrava-se tão complexo e sutil, que eram
apresentados aos alunos nada mais do que “pseudo-raciocínios” (DIEUDONNÉ,
1973a, p. 13).
O autor adotou como critério de elaboração de sua obra desenvolver um
programa destinado aos dois ou três últimos anos do secundário, expondo
somente tópicos que interessavam aos programas universitários, sem, entretanto,
procurar introduzir prematuramente teorias a serem ensinadas no ensino superior.
Procurou limitar-se às idéias que tinham importância não apenas à Matemática
como também à Física teórica, deixando como exercícios as sutilezas que
interessariam exclusivamente aos matemáticos. Resolveu, ainda, não fazer uso
84
de qualquer tipo de figura no texto, deixando para os leitores suprir essa
deficiência.
Dieudonné alegou desconhecer as reações de alunos da faixa etária
compreendida entre 11 a 14 anos, de modo que, ao inserir seu programa, o autor
esbarrou em duas dificuldades.
A primeira referia-se à necessidade de um tratamento axiomático para a
matemática, como ainda, de familiarizar o aluno no trato com algumas noções
abstratas, dentre elas, a de aplicação ou transformação, que, no dizer de
Dieudonné, tratava-se da “pedra angular” de todo o edifício da Matemática
Moderna. Para tanto, sugeriu utilizar o menos possível figuras tradicionais (com
exceção de ponto, reta e plano) em proveito da idéia de transformação
geométrica, a ser ilustrada com inúmeros exemplos. Convinha ainda ensinar os
alunos as construções geométricas, mas fugir, “como se foge da peste”, do uso
dos instrumentos régua e compasso, utilizando outros aparelhos mecânicos como
o pantógrafo, afinógrafo
35
, etc. Dever-se-ia evitar também, pronunciar a palavra
“axiomas” aos alunos, embora aproveitar todas as oportunidades possíveis para
dar exemplos de deduções lógicas, que, mais do que a idéia de axioma, seria o
verdadeiro motor do pensamento matemático [grifo do autor] (DIEUDONNÉ,
1973a, p. 16).
A segunda dificuldade dizia respeito à introdução do Cálculo Infinitesimal o
mais cedo possível, no ensino secundário. Apesar de que a escola francesa já
viesse ministrando rudimentos desse assunto, Dieudonné acreditava que deveria
ser dada maior atenção a esse ensino, posto que engenheiros e físicos
queixavam-se do despreparo com que os estudantes chegavam à universidade,
com relação aos processos elementares do Cálculo Diferencial e Integral, que
deveriam ser oferecidos no secundário de um modo “experimental”, sem
tentativas de tratamento rigoroso, posto que nesse estágio seria mais prejudicial
do que benéfico. Inclusive, sugeriu Dieudonné, dever-se-ia libertar o ensino
secundário de querer deduzir tudo de uma única fonte axiomática, lembrando que
35
Pantógrafo: Instrumento destinado a copiar mecanicamente desenhos, ampliando ou reduzindo figuras
mantendo sempre sua forma. (HOUAISS; VILLAR; FRANCO, 2001, p. 2119).
Afinógrafo: Instrumento utilizado para transcrever figuras planas de forma que em uma direção mantêm-se as
longitudes, mas se diminuem proporcionalmente em outra http://coliman.tripod.com/mate/letraa.htm.
85
o importante seria saber fazer deduções lógicas corretas, a partir de premissas
julgadas mais acessíveis ao ensino. Além disso, propôs que o tempo necessário
para ministrar esse assunto poderia ser obtido a partir “da supressão de muitas
aulas consagradas às ‘construções’ e à ‘resolução de triângulos’ e outras
baboseiras” [grifos do autor] (DIEUDONNÉ, 1973a, p. 18).
Dieudonné finalizou a introdução da aludida obra asseverando ser sua
única intenção fornecer ao futuro investigador um exemplo do que poderia ser
feito para a melhoria do preparo do aluno ingressante no ensino superior,
esperando que o leitor acreditasse não ter o autor qualquer interesse nas
questões do ensino secundário, não tendo conhecimento de quando haveria
reforma e quais seriam as modalidades escolhidas para esse nível de ensino.
A preocupação de Dieudonné com o ensino manifestou-se perante a
escolha dos conteúdos a serem trabalhados, voltada essencialmente aos alunos
ingressantes em ciências exatas do ensino superior. Sua preocupação, portanto,
relacionava-se com a qualidade do ensino de matemática de nível universitário,
de modo a diminuir o “abismo” entre esse ensino e o secundário. Era mister,
então, uma modificação significativa dos conteúdos e métodos do ensino de
matemática no secundário, a fim de compatibilizá-lo com a natureza do ensino
superior de matemática que seria enfrentada posteriormente pelo secundarista.
Embora Dieudonné defendesse uma ênfase na experimentação, mais do
que num tratamento rigoroso no que tange ao Cálculo Infinitesimal no secundário,
e ainda, a supressão da palavra “axioma” no trato com a Geometria, propunha, de
modo adverso, a necessidade de um tratamento axiomático, o aproveitamento de
todas as oportunidades possíveis para dar exemplos de deduções lógicas, posto
que estas representassem “o verdadeiro motor e único motor do pensamento
matemático” (1973a, p. 16).
O método moderno, conforme propugnado por Dieudonné, permitiria
agrupar teorias aparentemente diferentes, por meio da Álgebra Linear. A
introdução da linguagem vetorial e de grupos de transformações elementares,
com definições abstratas de noções e objetos, permitiria uma apresentação
rigorosa e sem esforços.
86
Ademais, conforme também sustentou Dieudonné em “Abregé d’Histoire
des Mathématiques: 1700-1900” (Paris: Hermann, 1986), o fazer matemático,
num primeiro momento, pode ser realizado de forma solitária e isolada. Desse
modo, pode-se pensar numa dissociação entre a produção matemática e seu
ensino. Quando se está produzindo, o matemático trava um diálogo silencioso
consigo próprio, refletindo sobre as hipóteses levantadas, tentando responder aos
questionamentos colocados. Entretanto, o matemático sempre se defrontará com
a necessidade de expor os resultados de suas pesquisas, mesmo que parciais,
perante a comunidade acadêmica, de maneira a receber o reconhecimento,
sugestões e críticas ao estudo apresentado, como igualmente enunciou
Dieudonné. Ora, na medida em que o matemático fica sujeito a essas
considerações e avaliações, estabelece-se aí uma relação que não deixa de ser
pedagógica, não no sentido canônico dessa noção, muito embora seja também
baseada numa exposição calcada no diálogo e debate, em que se busca
esclarecer e convencer seus pares. Cai por terra, desse modo, a separação
estabelecida entre matemáticos e professores de matemática, como apregoada
por Dieudonné.
3.3. A velha matemática sob uma roupagem moderna
A Matemática Moderna foi freqüentemente identificada com a concepção
que Bourbaki tinha, constata Patras; e o Movimento da Matemática Moderna
evidenciou-se como uma época em que se tornou hegemônico um modo de
pensar, o qual sustenta que a matemática tem como ponto de partida, conceitos
precisos e delimitados, plena e claramente definidos, além de proposições e
teoremas explícitos, demonstrados em sua totalidade de forma rigorosa,
apresentados em linguagem única. Essa imagem “um tanto fixa” da matemática
(Patras, 2001, p. 117), faz supor um único modo de fazer matemática, em que,
seu saber, uma vez estabelecido, torna o matemático um mero observador (DE
LORENZO, 1998).
Esse modo de pensar não permite uma reflexão crítica sobre o papel
exercido pelo matemático. No entanto, o ofício de matemático é histórico. Essa
afirmação, postulada por De Lorenzo em suas obras, dentre elas “La matemática:
87
de sus fundamentos y crisis” (1998), pressupõe analisar o fazer matemático,
examinando sua produção. Para esse autor, embora alguns conceitos se
cristalizem no interior de algumas teorias matemáticas, isso não impede que o
saber matemático seja um saber vivo, em constante processo de mutação:
A matemática é um trabalho, um produto e uma produção da
espécie humana, ou melhor, de parte dessa espécie, e, como tal,
com seus trabalhos, suas imperfeições, seus logros, entre os que
se destacam algumas obras principais... (DE LORENZO, 1998, p.
16).
Talvez, infere De Lorenzo, o que permaneça cristalizado sejam alguns
livros-texto, nos quais as definições se apresentam como ponto de partida e
precisão radical. Neles, as demonstrações se revelam “completas” e a estrutura
do texto se mostra de tal forma fechada que acaba por criar a convicção de que
na matemática já não se tem mais nada de novo para ser realizado.
Em geral, os conceitos-núcleo da matemática mostram-se inicialmente
difusos e vão se delimitando, tornando-se precisos, ao longo da atividade prática.
As proposições, muitas vezes, não estão plenamente demonstradas e existem
teoremas que são simplesmente aceitos, porque poucos matemáticos podem
chegar a entender, dominar e controlar sua demonstração
36
; há teoremas que se
demonstram utilizando em cada ocasião conteúdos conceituais diferentes, porque
na prática matemática o que interessa não é o teorema em si,
senão as idéias, analogias e possíveis novos instrumentos
metodológicos e conceituais que podem associar-se a cada uma
das demonstrações do teorema. As disputas entre matemáticos
tem sido e são permanentes, as tentativas de demonstração, não
são rechaçadas, total ou parcialmente, porque os teoremas
estiveram “mal” demonstrados, necessariamente... (DE
LORENZO, 1998, p. 15-16).
36
A afirmação feita por Fermat (1637), de que x
n
+ y
n
= z
n
não tem solução para números inteiros e positivos
quando n>2, é conhecida como “o último teorema de Fermat” e desafiou matemáticos de todo o mundo por
358 anos. A busca pela solução desse teorema fomentou a pesquisa, o estudo e o desenvolvimento da
matemática. Foi demonstrado por Andrew Wiles, em 1997. No entanto, a aceitação da prova é baseada na
autoridade de vários matemáticos. Além disso, segundo o livro “O último teorema de Fermat” de autoria de
Simon Singh, muitos matemáticos deram continuidade aos seus trabalhos aceitando como verdadeira a
Conjectura Taniyama-Shimura”, mesmo sem demonstração, por considerar fortes indícios de sua validade.
Foi a partir da demonstração parcial dessa conjectura que Andrew Wiles conseguiu demonstrar o Teorema
de Fermat. Apenas em 1999, a “Conjectura Taniyama-Shimura” foi demonstrada em sua totalidade pelos
matemáticos Breuil, Conrad, Diamond e Taylor http://www.mat.puc-rio.br/~nicolau/olimp/;
http://ca.wikipedia.org/wiki/Teorema_de_Taniyama-Shimura.
88
Nesse sentido, De Lorenzo exemplifica recorrendo à tarefa empreendida
por Gauss, ao propor quatro demonstrações para o Teorema Fundamental da
Álgebra, já citado anteriormente neste estudo. Um dos objetivos implícitos das
sucessivas demonstrações de Gauss, segundo De Lorenzo, era tentar eliminar a
exigência de irracionais imposta para a solução do teorema ou alcançar a razão
pela qual, caso contrário, não seja possível eliminá-los. Apesar do teorema não
ser puramente algébrico, já que requer a admissão do número irracional – tanto
real quanto complexo – é considerado “fundamental da álgebra”. Assim, na
primeira das demonstrações, Gauss não evita unir a Álgebra e a Geometria num
mesmo processo demonstrativo, culminando com uma demonstração geométrica
intuitiva. Ao relacionar esses dois campos, favorece a construção da Geometria
Algébrica, que se converteria em um dos campos mais fecundos da atividade
matemática (1998, p. 95-96).
Embora constatações como as defendidas por De Lorenzo, de que o
conhecimento matemático não é um produto já acabado, e sim uma prática
dinâmica que se vai transformando, incorporando novas idéias, conceitos,
mecanismos de demonstração, além da necessidade de reorganizar, estruturar
essas idéias; a prática científica tem sido interpretada como vitória de um
reducionismo da Teoria dos Conjuntos, ou seja, todo o fazer matemático encontra
sua expressão em termos de conjuntos. Essa interpretação reducionista, presente
nesse novo modo de fazer matemática, impulsionou a reforma da “Matemática
Moderna” em diversos países... (DE LORENZO, 2005).
Ainda sobre esse novo modo de fazer matemática, vale atentar sobre a
observação de Ubiratan D’Ambrosio. Segundo ele, a Segunda Guerra Mundial
impulsionou sobremaneira o avanço científico e tecnológico, e a matemática,
agregada à nova tecno-ciência e a estratégias políticas, desenvolveu-se
diversamente à matemática tradicional, formal, dominante, embora houvesse um
esforço para inseri-la no formalismo “oficial”.
Surgiram, dentro do próprio ambiente matemático, teorias novas
como a Programação Linear e Dinâmica, Pesquisa Operacional,
Teoria das Comunicações, Informática, Cibernética, Teoria dos
Jogos. Mas não sem certa hesitação quanto à sua aceitação pelos
matemáticos puros, ainda fortemente atrelados à matemática
originada da Mecânica Newtoniana (D’AMBROSIO, 2004, p. 272).
89
D’Ambrosio (2004) vê a obra de Nicolas Bourbaki como uma rejeição a um
novo pensar. Baseada em três pilares sob os quais repousava a ciência dita
“moderna”, qual seja, o determinismo newtoniano, a lógica clássica e os sistemas
formais, Bourbaki resiste a propostas inovadoras como a mecânica quântica e à
relatividade, apoiando-se num estruturalismo que dominou as ciências cognitivas
da época, dando início aos movimentos de renovação no ensino de Matemática,
Física e das Ciências. O que levou D’Ambrosio a enfatizar: “Na verdade,
movimentos para se ensinar o velho com roupas modernas!” (2004, p. 274).
90
CAPÍTULO 4
O MOVIMENTO DA MATEMÁTICA MODERNA E SUA DIMENSÃO
INTERNACIONAL
Nos anos 1960-1970 surgiu forte uma necessidade de reformar o ensino de
Matemática, decorrendo daí um vasto debate sobre o assunto, marcando esse
período como um momento de profunda renovação desse ensino, colocando-o
em lugar de destaque na história do ensino de Matemática do século XX, o que
ocorreu em grande número de países.
A circulação das idéias, em escala internacional, foi intensa. A
intensificação dos debates permite identificar diferentes análises em relação ao
ensino de Matemática em todo o mundo, cuja abrangência internacional
favoreceu reflexões e reformas, apontando o verdadeiro papel que a Matemática
desempenhou no ensino de cada nação e no interior de suas instituições, como
na França, Itália, Estados Unidos da América, Alemanha, União Soviética, etc.
Assim sendo, este capítulo traz um breve panorama sobre a participação
de alguns países na realização da reforma da Matemática Moderna, extraída em
boa medida da obra coletiva intitulada “Les sciences au lycée: un siècle de
reformes des mathemátiques et de la physique en France et à l’étranger”,
organizada pelos historiadores Bruno Belhoste, Hélène Gispert e Nicole Hulin, em
1996. A obra conta com a colaboração de historiadores da educação e da ciência,
além de cientistas, filósofos e educadores, os quais participaram, em janeiro de
91
1994, do Colóquio Internacional “Réformer l’enseignement scientifique: histoire et
problème actuels” organizado pelo Serviço de História da Educação do Instituto
Nacional de Pesquisa Pedagógica (SHE/INRP).
A opção por essa obra assume significativa importância posto que o livro
em questão contém, em boa medida, síntese dos estudos que os autores
participantes do colóquio realizaram sobre o MMM em seus países, quando
discutem o papel exercido pelas nações na realização dessas reformas. Trata-se,
portanto, de uma literatura atualizada sobre o assunto, o que permite obter uma
compreensão geral da dimensão internacional assumida pelo MMM.
As particularidades assumidas pelo Movimento nos diversos países em
que ele se deu, ditadas por problemáticas comuns e diferenças nacionais, fizeram
surgir especificidades históricas, institucionais e culturais ligadas às várias
reformas, cujo teor, debatido pelos teóricos que compõem a obra “Les sciences
au lycée" é objeto de comentários neste capítulo, procurando contribuir para o
alargamento de certas questões no âmbito do Movimento da Matemática Moderna
no Brasil.
4.1. Movimento da Matemática Moderna na França
Em meados dos anos 50, a política educacional francesa preconizava para
o ensino a necessidade de aliar os estudos científicos aos estudos clássicos. Aos
poucos, o prestígio das humanidades clássicas foi declinando, desabando
brutalmente entre 1963 e 1968. Concorreu para precipitar os acontecimentos a
marginalização das línguas clássicas (antigas), sobretudo a língua grega e o
crescimento muito rápido de renovação do ensino superior (BELHOSTE, 1996, p.
27-37).
Nesse período, o ensino superior passou por uma profunda reforma,
provocando a valorização do nível científico em todas as áreas, promovendo a
modernização dos programas da licenciatura em ciências das grandes escolas,
impulsionando o ensino científico nos liceus e colégios, principalmente em relação
à matemática (BELHOSTE, 1996, p. 27-37).
92
Vestígios da renovação do ensino de matemática aparecem no início de
1950. Em 1952, Jean Dieudonné, Gustave Choquet e André Lichneronowicz se
reuniram em Melun, França, com filósofos suíços para discutir os problemas do
ensino de Matemática em classes elementares. A Organização Européia de
Cooperação Econômica (OECE), atual Organização de Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE) deu um impulso decisivo para a
implementação de uma reforma, organizando, dentre outras atividades, o
Colóquio de Royaumont, na França, dirigido pelo matemático Marshall Stone
(1903-1989) da Universidade de Chicago. A conferência internacional reuniu
especialistas de vinte países com o objetivo de promover uma reforma de
conteúdos e métodos do ensino de matemática na escola secundária. Contou
com a presença de Gustave Choquet, o qual apresentou um programa para o
ensino primário e secundário e Jean Dieudonné, que pronunciou o célebre slogan
abaixo Euclides!”, fazendo referência à geometria euclidiana como representante
da matemática clássica.
A reforma da Matemática Moderna na França remonta aos anos 1950, mas
se colocou oficialmente em 1967. Nessa época, o modelo humanista restava
acabado. O ensino secundário estava voltado para uma nova clientela que não se
reconhecia na velha cultura das elites e, ao mesmo tempo, o ensino superior, em
pleno desenvolvimento, exigia de seus futuros estudantes, conhecimentos novos,
particularmente científicos. Nesse contexto, a reforma da Matemática Moderna foi
modelada pelo ensino superior, em função de seus interesses e de suas
preocupações e sem uma visão clara das finalidades próprias do secundário.
(BELHOSTE, 1996, p. 27-37).
A reforma de ensino da matemática não foi propriamente uma reforma
pedagógica, no sentido de que não foi motivada por argumentos pedagógicos,
nem mesmo por instâncias habituais de seus domínios. Ao se decidir pela
reforma, em 1966, Ministro da Educação Christian Fouchet cedeu à pressão da
Sociedade de Matemática Francesa e da Associação dos Professores de
Matemática do Ensino Público (APMEP), que denunciaram a conhecida
defasagem entre o estado atual da pesquisa Matemática e seu ensino,
acrescentando, contudo, um novo aspecto: “se não for feita a reforma em dez
anos, a França será um país subdesenvolvido” (ARMATTE, 1996, p. 79).
93
Deliberadamente, o ministro designou uma elite pedagógica agregada a
especialistas matemáticos. Para presidente do comitê, foi escolhido o matemático
André Lichnerowicz. Essa instância compreendia inicialmente dezessete
membros entre universitários e professores de liceu, dentre os quais, o
matemático Gustave Choquet, o físico Louis Néel, o matemático bourbakista
Pierre Samuel, o matemático Charles Pisot – antigo participante de Bourbaki – e o
matemático André Revuz, um dos principais promotores da reforma (MARSHAAL,
2002).
Assim, em outubro de 1966, a Comissão Lichnerowicz, encarregada pelo
Ministro da Educação de se “debruçar sobre o ensino de Matemática na França,
do maternal à universidade”, afirmava que seu objetivo não era elaborar “uma
reforma definitiva mas uma reforma lenta, de caráter cultural” (TRABAL, 1996, p.
181).
A reforma impulsionada pela Comissão Lichnerowicz apresentava um
caráter ideológico e totalizante, marcado pela posição bourbakista. Cumpre, no
entanto, fazer uma ressalva, no sentido de que André Revuz sustenta que apesar
de Bourbaki ter revificado o ensino universitário francês e ter dado à pesquisa um
impulso decisivo, não direcionou seu trabalho para o ensino em nível de
licenciatura. “É Choquet, que jamais foi Bourbakista, que fez a renovação do
Cálculo Diferencial e Integral em 1954 e cumpriu o projeto de Bourbaki iniciado
em 1934”. E, finalmente, “Bourbaki não estava preocupado ou mesmo se
interessou, ainda que de longe, pelo ensino secundário” (1996, p. 75).
Entretanto, os reformadores interpretaram a posição bourbakista como
fonte para fundamentar a implementação da reforma. Viam, nesse sentido, a
matemática como modelo de todo conhecimento, propício a reconstruir os
diversos domínios do saber ao modo matemático. Nesse sentido, a linguagem
matemática ocuparia um lugar essencial na elaboração do conhecimento. O
ensino da matemática deveria também aprender essa linguagem universal do
conhecimento. Como a matemática era considerada como instrumento essencial
de compreensão e de domínio do mundo, ela deveria ser ensinada a todos e isso
sob uma versão moderna, levando em conta suas estruturas. Essa ideologia de
“matemática para todos” era sustentada pela descoberta da pedagogia científica,
94
que afirmava uma harmonia entre a construção do pensamento da criança e a
Matemática Moderna fundamentada na epistemologia genética de Jean Piaget.
Nessa conjuntura, Piaget elaborou um modelo que acentuava a analogia
entre as estruturas que sustentavam o desenvolvimento dos conhecimentos
matemáticos das crianças e as estruturas matemáticas. As estruturas-mãe de
Bourbaki tornaram-se, desse modo, a marca da estruturas cognitivas profundas. A
aprendizagem da matemática passa, assim, pela aprendizagem das estruturas-
mãe em conformidade com a matemática bourbakista (BKOUCHE, 1996).
Os programas colocados pela reforma se articularam essencialmente sobre
uma ordem estrutural. A matemática unificada a partir de um ponto de vista
estrutural se apoiava sobre a Teoria dos Conjuntos. O ensino secundário
desenvolvia operações sobre conjuntos, relações e aplicações. A exposição se
reduzia, entretanto, à colocação de um vocabulário que se esforçava por ilustrar
exemplos concretos, que eram bem pouco lembrados em conformidade com a
matemática, mas que participavam de universalidade afirmada pela matemática.
A álgebra era privilegiada, na medida em que se presumia ser ela a fundadora da
matemática contemporânea. A noção de lei de composição, em particular a de
grupo, estava subordinada à geometria e à álgebra (BKOUCHE, 1996).
Segundo o historiador Bkouche, o referido programa terminou em fracasso,
que foi diversamente interpretado. Certos reformadores alegaram a falta de
preparação dos professores, embora tenha havido esforços de atualização,
empreendido pelo IREM (Recherche sur l’Enseignement des Mathématiques),
solicitado para acompanhar a reforma. A “Association des Professeurs de
Mathématiques de l’Enseignement Public” rejeitou que a eles fosse atribuída a
responsabilidade pelo fracasso, alegando que houve um apelo ao formalismo
“estéril” para fazer da matemática um instrumento de seleção (BKOUCHE, 1996,
p. 130).
Depois de 1972, toda a imprensa passou a acusar a reforma de não
produzir nada a não ser um sistema cultural de elite. A revista “Impacience”, por
exemplo, dedicou um número especial à Matemática em 1976, fazendo uma dura
crítica ao papel social dos matemáticos, dirigida especialmente sobre a função
95
que ela exerceu na escola: seleção, efeitos de linguagem, perda de sentido,
exclusão, castração... mas especialmente sobre a função que ela exerceu na
sociedade (ARMATTE, 1996).
Há que se considerar, também, o entendimento de Bkouche (1996), para
quem o fracasso da matemática se transformou em um fracasso social: se a
matemática é para todos, aquele que fracassa em matemática é incapaz de
compreender o mundo e, portanto, não faz parte daqueles que possuem seu
saber fundamental.
4.2. Movimento da Matemática Moderna na Alemanha
A reforma e desenvolvimento do ensino da Matemática Moderna na
República Federal Alemã (RFA) ocorreu depois de 1960. Depois da 2ª Guerra
Mundial, o sistema de ensino foi reorganizado na RFA sob o modelo do sistema
existente nos anos 1920, cuja principal característica relacionava-se à
organização tripartida do ensino de nível secundário, com três tipos de escola, em
que os alunos eram encaminhados segundo os resultados obtidos no primário: o
Gymnasium (correspondente ao liceu francês), a Realschule (escola secundária
média) e a Volkschule, posteriormente transformada em Hauptschule (escola
principal, correspondendo a um ensino secundário curto). Havia uma diferença
tanto quantitativa quanto qualitativa entre os saberes oferecidos em cada uma das
partes do ensino secundário (KEITEL, 1996; SCHNEIDER, 1996).
No fim dos anos 60, as tentativas para reformar o ensino de matemática
diziam respeito ao Gymnasium. Os problemas relativos ao ensino de matemática
eram caracterizados por um ensino repetitivo e incoerente das questões
estudadas associadas a uma sobrecarga do programa. Para diminuir essa
sobrecarga, a Conferência Permanente de Ministros da Educação (KMK)
começou a publicar, a partir de 1955, recomendações e instruções para o ensino
de matemática para o Gymnasium. Não se tratava de modernizar, mas de unificar
e reduzir o cânone tradicional de ensino de matemática. Recomendava ainda
introduzir algumas raras questões de Matemática Moderna (do tipo universitário)
mas unicamente nos dois últimos anos de matemática do Gymnasium. A essas
96
instruções, juntou-se, a concepção tradicional de educação (Bildung)
37
de
inspiração cristã-conservadora, que reconhecia um valor menor às ciências,
incluindo a Matemática. Desse modo, a partir de 1961, foram reduzidos os
conteúdos e os horários de matemática e ciências do Gymnasium (KEITEL,
1996).
A partir de 1964, a Volkschule, passa por uma profunda reforma pela
KMK. O ciclo superior da Volkschule foi transformado em Hauptschule. O ensino
da Hauptschule começou a ser conhecido como um ensino moderno, orientado
notadamente para a indústria e ao mundo do trabalho. Procurou-se, dessa forma,
melhorar o recrutamento da Hauptschule, instituindo os dois primeiros anos de
classes específicas para os alunos mais dotados. A escolaridade foi aumentada
em um ou dois anos, mas sem aumento nos programas de Matemática, os quais
enfatizavam a preparação voltada ao mundo do trabalho e aplicação da Aritmética
em contextos diversos da vida social e econômica (KEITEL, 1996).
Somente a partir da publicação, em 1968, das “Recomendações e
instruções para a modernização do ensino de Matemática nas escolas primárias e
secundárias da KMK” uma nova orientação incidiu sobre o ensino de Matemática.
Essa recomendação se inseria no movimento internacional de reforma do ensino
de Matemática. Essa política de reforma repousava sobre certos objetivos gerais.
Tratava de elevar o nível geral de ensino da educação para a maioria da
população, definindo o que deveria ser a formação geral de base na matemática.
Fez mobilizar os recursos intelectuais do conjunto da nação e encorajou os alunos
de origem modesta a possuir estudos superiores. Restituiu a equivalência das
diferentes partes do sistema escolar, permitindo acesso aos estudos superiores e
às universidades a partir de cada filial do sistema. O objetivo último era a melhoria
e elevação do nível científico da matemática ensinada, para harmonizar com o
desenvolvimento do Ensino Superior e a pesquisa matemática.
O ponto crucial da reforma na Alemanha consistiu em considerar
a Matemática escolar como uma unidade, qualquer que fosse o
tipo de escola. Essa novidade se inscrevia numa política que
visava a unificação do conjunto do sistema escolar do ponto de
37
Bildung: princípio segundo o qual a aquisição do saber é indissociável da formação do espírito e mesmo da
pessoa (OTTE, 1993, p. 38).
97
vista dos conteúdos do ensino. A integração das três partes do
ensino secundário não deveria se efetuar para uma reestruturação
do sistema tripartido mas colocou em desenvolvimento um
programa de Matemática global – a matemática para todos! –
comum e unificada (KEITEL, 1996, p. 305).
Ao mesmo tempo, sob um plano mais geral, favorecia a passagem das
classes superiores de ensino secundário, levando ao desenvolvimento do
Gymnasium, prolongando a escolaridade obrigatória até então de 9 ou 10 anos e
propunha, ainda, escolaridades secundárias curtas e longas num mesmo
estabelecimento.
A reforma pretendia não somente modernizar, mas também elevar o nível
do conjunto de matemática escolar depois da escola primária, por meio da
introdução de conceitos básicos da Matemática Moderna tais como conjunto,
relação, grupo; insistindo também para a aquisição de estruturas e métodos da
ciência matemática, como a axiomatização, a dedução, a lógica formal, a
generalização, a abstração e a formalização. A utilização geral da linguagem
formal rigorosa deveria ser o símbolo da reforma, além de empregar termos e
conceitos da Teoria dos Conjuntos nos enunciados e definições e dos teoremas,
como também em toda sorte de demonstrações. E mais, a Teoria dos Conjuntos
penetraria também no ensino primário (KEITEL, 1996).
O sucesso da difusão do novo programa dependeu principalmente da
divulgação comercial dos manuais escolares. Graças a uma ativa propaganda de
reforma, os manuais escolhidos pelos alunos traziam mais leituras e explicações
do que exercícios e problemas. O objetivo não era somente informar os
professores sobre as novas tendências didáticas, mas também facilitar o trabalho
autônomo dos alunos. A escolha dos manuais era livre e os professores e alunos
tinham à sua disposição uma grande variedade de obras contendo abundante
material pedagógico. A passagem das idéias reformadoras na prática escolar não
foi acompanhada de uma vasta renovação pedagógica, nem de algum programa
pedagógico inovador, nem de alguma pesquisa ou de experimentação
pedagógica. Foi uma reforma burocrática, no entender de Christine Keitel (1996),
uma vez que
98
... não foi acompanhada nem por debates públicos, nem por
debates profissionais. As decisões foram tomadas no topo da
hierarquia e falharam ao se dedicar a uma área sem a devida
preparação. Esse procedimento administrativo foi seguido
também de um modelo didático que inspirou o conteúdo da
reforma; é a partir de temas que interessavam aos matemáticos
de nível universitário, de conceitos “necessários” ou
“fundamentais” que as questões e métodos do ensino secundário
foram definidos e selecionados (KEITEL, 1996, p. 308).
Paradoxalmente, observa Keitel, os matemáticos não tiveram um papel
maior na reforma. A maior parte deles considerou que o problema de
modernização se resumia em saber “como ensinar aos jovens as questões e os
fatos mais importantes da matemática de hoje em dia”. Ao considerar, de fato,
que a transformação da matemática em matemática escolar se aplicaria ao
conjunto do curso de matemática, herdeira evidente de concepções que
dominavam o ensino secundário (KEITEL, 1996, p. 308).
Em 1976, a KMK desiste da idéia de introduzir os conceitos e a linguagem
da Teoria dos Conjuntos na escola primária. Essa decisão marcou
simbolicamente o fim do período ativo da reforma. Ao invés de continuar a
consolidar a reforma, escolheu-se abandonar o programa de modernização. Os
programas oficiais passaram por uma nova revisão, para se reaproximarem das
antigas tradições, específicas de cada nível; os editores de manuais voltam ao
modelo tradicional de coleções de problemas para todos os tipos de escolas, o
engajamento de professores em favor da reforma se transformou em rejeição
(KEITEL, 1996). O objetivo ambicioso de combater a lacuna existente entre a
Matemática do secundário e a Matemática da universidade – um dos objetivos do
MMM – foi baseado na introdução de um curso opcional de aperfeiçoamento em
Matemática. Através de uma nova repartição de matérias de ensino nos dois
últimos anos do Gymnasium em 1972, estabeleceu-se cursos de níveis diferentes,
oferecendo a escolha entre um curso de matemática de base e um curso de
matemática especializada. Entretanto, essa última escolha não foi levada em
conta nas notas para o exame final. A Matemática perdeu assim, todo o valor
seletivo no sistema secundário (KEITEL, 1996).
Depois da queda do muro de Berlim em 1990, a Alemanha passou por
uma profunda transformação e confrontou-se com problemas concernentes à
99
unificação dos sistemas escolares do Oeste e do Leste, em particular, o ensino da
matemática. O sistema escolar do Leste foi alinhado ao do ocidente, sendo
restabelecido o sistema tripartido, considerado ultrapassado. O ensino de
matemática que ocupava um lugar notável no antigo sistema da República
Democrática Alemã (RDA), perdeu muito de sua importância. Contudo, ainda hoje
o sistema escolar se ressente das transformações sociais ocorridas no período,
exigindo inevitáveis e novas mudanças no ensino secundário (KEITEL, 1996).
4.3. O Movimento da Matemática Moderna nos Estados Unidos da América
Com o final da II Guerra Mundial, a fragilidade do ensino da matemática
tornou-se evidenciada, exigindo modificações na sociedade de modo que
pudesse acompanhar o rápido desenvolvimento tecnológico. Expandiu-se o
significado da matemática, o que exigiu a constituição de novos grupos de estudo
compostos não somente por profissionais oriundos dos cursos de matemática.
O principal órgão responsável pela elaboração das recomendações
educacionais era o “National Committee on Mathematical Requirements”, ligado à
“Mathematical Association of América. Além disso, o “National Council of
Teachers of América” (NCTM) também apresentou recomendações gerais para o
ensino da matemática, enfatizando a compreensão dos procedimentos e seu
significado, em oposição a um ensino baseado na memória e destreza na
realização de operações (BÚRIGO, 1989).
Os trabalhos desenvolvidos por esses grupos culminaram com o
surgimento, em meados de 1950, do Movimento da Matemática Moderna nos
EUA, tendo sua origem em grande parte vinculada às universidades. Os
matemáticos universitários cuja atenção voltava-se para a Teoria dos Conjuntos e
o método axiomático, lamentavam a ausência de questões de matemática pura
nos programas escolares, considerando, igualmente, que a matemática pura
poderia se transformar em poderosa aliada para a melhoria desses programas. A
reforma visava adaptar os conceitos de Matemática Moderna como base para
alterar os programas de ensino (KILPATRICK, 1996).
100
A preocupação com a melhoria da formação de cientista e técnicos levou à
elaboração de projetos que culminou com a criação do primeiro grupo de
pesquisa, o University of Illinois Committee on School Mathematics (UICSM), em
1951, sob a coordenação do educador matemático Max Beberman, cujo projeto
caracterizava-se pela ênfase à precisão da linguagem, aos conceitos e à
compreensão como base da habilidade matemática (D’AMBROSIO, 1987;
BÚRIGO, 1989).
Em 1958, foi criado o School Mathematics Study Group (SMSG), sob a
liderança de Edward Griffith Begle. Participavam desse grupo, matemáticos,
professores de matemática, educadores, psicólogos e representantes da
comunidade científica e tecnológica, os quais tinham como objetivo maior
escrever livros didáticos da Matemática Moderna para o secundário. O material
produzido foi testado, publicado e traduzido para quinze línguas diferentes. O
SMSG foi indiretamente influenciado pelos trabalhos do grupo Bourbaki
(D’AMBROSIO, 1987).
Tomaram parte na redação dos textos do SMSG cerca de 100 matemáticos
e 100 professores secundaristas, com a finalidade de que os temas tratados
fossem rigorosos tanto do ponto de vista matemático quanto do didático. Durante
o período escolar de 1959/1960, 45 estados americanos receberam os textos e
manuais para professores, numa experiência que envolveu 400 professores e
42.000 alunos. No transcurso desse período, os professores foram assessorados
por matemáticos universitários. Professores, assessores e alguns alunos
avaliaram os materiais recebidos, apresentando suas sugestões e críticas, as
quais foram analisadas por uma equipe de revisão, composta por 50 professores
e 50 matemáticos. Esta equipe realizou diversas alterações, reescrevendo
novamente alguns pontos assinalados como complexos e difíceis pelos alunos.
Entretanto, essas revisões não alteraram a orientação básica dos textos originais
(BROWN, 1963).
Recebendo total apoio do governo e financiamento do NSF, o SMSG
elaborou um conjunto de obras para variados níveis de ensino, iniciando suas
publicações a partir de 1960. Nelas, apresentava novos conteúdos, assim como
modificações na organização e apresentação dos assuntos clássicos. Insistia nas
101
idéias unificadoras, como o estudo das propriedades comuns de todos os
sistemas matemáticos (as estruturas), a Teoria dos Conjuntos (BROWN, 1963).
O SMSG apresentou o estudo da geometria em um curso separado,
iniciando pelo desenvolvimento da percepção do espaço. Algumas vezes,
integravam a geometria dos sólidos com a geometria plana. Freqüentemente
aparecia integrada com a álgebra. Buscava estimular a penetração intuitiva,
insistindo particularmente no enunciado exato das definições e teoremas
(BROWN, 1963).
O SMSG (1960) adotou o tratamento métrico tipo régua-transferidor, no
qual a geometria euclidiana é desenvolvida a partir da noção de número e
baseada em propriedades sugeridas pela régua (graduada) e pelo transferidor.
Este tratamento, reservado ao ensino secundário, foi apropriado de diversas
formulações geométricas desenvolvidas ao longo do tempo, dentre as quais se
destacam aquelas elaboradas por Birkhoff.
Em 1925, Birkhoff elaborou as seguintes propostas para explicar fatos
geométricos ao leitor não especializado:
a) As medidas de distâncias ao longo da reta podem ser
realizadas com a régua.
b) As medidas de ângulos entre retas podem ser realizadas com o
transferidor.
c) Dois pontos estão contidos em uma única reta.
d) O plano é igual e ainda semelhante a si mesmo em todas as
suas partes (COSTA, 1985, p. 37).
Posteriormente, em 1932, propôs um tratamento métrico para a escola
secundária, por meio de um sistema postulacional, em “A set of postulates for
plane geometry, base don scale and protractor”. A partir de 1959, o matemático
Saunders Mac Lane, no artigo “Metric postulates for plane geometry” colocou em
evidência as vantagens do tratamento, alertando matemáticos e professores
universitários. Mac Lane aperfeiçoou o sistema de Birkhoff, mas esse sistema
ainda não se encontrava adequado para o ensino secundário. O SMSG (1960)
apresentou uma variante do sistema numa explicitação compatível com o ensino
básico, utilizando noções geométricas como as medidas de comprimento e de
102
ângulo, de modo simples, procurando retratar de imediato as propriedades
comprovadas no espaço físico (COSTA, 1985).
As iniciativas desenvolvidas nos EUA, em especial aquelas efetuadas pelo
SMSG, inspiraram o GEEM
38
a promover a introdução de novos tópicos no
currículo do ensino secundário, os quais normalmente estavam presentes em
níveis mais avançados: geometria informal, probabilidades, álgebra e teoria dos
números. Os conjuntos aparecem como tema unificador, sendo dada grande
ênfase nas estruturas algébricas.
No começo dos anos 60, vários projetos foram consagrados a uma revisão
do programa do nível secundário
39
norte-americano, e posteriormente,
começaram também a investir no ensino elementar. Inicialmente, a disposição
dos programas voltava-se especialmente para alunos que reuniam potencial de
ingressar na universidade e por conseqüência, aos mais estimulados, mais
inteligentes, mais elegantes. Quando o Governo Federal lançou o programa de
luta contra a pobreza, os alunos considerados desfavorecidos exigiram recursos
para uma reforma de ensino que atendesse a seus interesses. Tratava-se de um
desafio muito mais difícil para os reformadores.
As idéias que pareciam bem encaminhadas para High Schools
dos subúrbios residenciais vizinhos das universidades com
professores entusiasmados e alunos interessados fracassavam
freqüentemente quando eles eram aplicados às escolas menos
favorecidas (KILPATRICK, 1996, p. 253).
As críticas começaram a surgir e um grande número de pais e educadores
passam a acreditar que a Matemática Moderna foi um fracasso. Houve intensa
manifestação em prol do regresso aos currículos e métodos anteriores à reforma,
o chamado “back to basics”, que se tornou expressão corrente nos manuais e nas
instruções oficiais (KILPATRICK, 1996).
38
GEEM: Grupo de Estudos do Ensino da Matemática. Fundado em 1961, tinha como objetivo incentivar o
estudo da Matemática Moderna no Brasil e, uma das principais características do GEEM, foi a de promover
cursos de verão como também seminários e palestras durante o ano letivo, para professores de todo o país e
de outros países da América Latina.
39
Além do UICSM e do SMSG, destacamos os programas desenvolvidos pela Ball State Teacher’r College,
Boston College Mathematics Institute, University of Maryland Mathematics, dentre outros (D’AMBROSIO,
1987).
103
Para Kilpatrick (1969), o Movimento da Matemática Moderna não teve seus
esforços recompensados nos programas americanos, mas de uma forma ou de
outra provocou transformações substanciais na comunidade americana de ensino
de matemática. Em particular, aquelas produzidas nos anos 1970 e 1980, em que
as tentativas para modernizar o ensino do país foram acompanhadas por um
aumento rápido no número de educadores matemáticos e um formidável
desenvolvimento de suas atividades de pesquisa.
Além do mais, a reflexão sobre o ensino de Matemática sofreu um avanço
significativo nos EUA a partir da segunda metade do século XX. Os americanos
participaram ativamente de conferências promovidas pela OECE, em particular
aquelas realizadas pelo CIEM, tanto com a pretensão de se informarem sobre as
transformações do ensino de Matemática no estrangeiro quanto para
apresentarem o que estava sendo feito em seu país. Os professores americanos
de Matemática tiveram um papel dos mais ativos na comunidade internacional
que se organizou depois dos anos 1950.
De acordo com Kilpatrick (1996), o gosto da experimentação nos EUA é
um verniz que esconde um profundo conservadorismo em matéria pedagógica.
Esse conservadorismo tem contribuído para congelar ao longo dos anos as
veleidades dos programas de reforma. O prestigioso “National Advisory
Committee on Mathematical Education” (Comitê Nacional de Consulta para o
Ensino de Matemática) depois de ter examinado o andamento da reforma da
Matemática Moderna, chegou à conclusão que “o impacto real foi modesto com
relação ao que era esperado”, ou seja, a melhoria do ensino por meio da
introdução de noções de Matemática Moderna. Para confirmar suas palavras
Kilpatrick, busca auxílio em Peter Hilton, para quem a Matemática Moderna teria
agradado apenas cerca de 15% dos alunos americanos (1996, p. 255).
As falhas na estrutura dos programas expressos na organização geral dos
cursos e nas práticas de ensino ao longo da história do ensino de Matemática não
marcam o início de uma reforma de ensino. Em compensação, elas assinalam,
desde os primeiros anos do século XX (primeira reforma)
40
a emergência de uma
40
A primeira década do século XX apresentou-se como crucial para discussões sobre o ensino de
Matemática norte-americano. Jacob Willian Albert Young e David Eugene Smith foram os principais nomes
que se consagraram no desenvolvimento da pedagogia Matemática americana.
104
comunidade de educadores em Matemática e nos anos 1955-1970, a
consolidação dessa comunidade (KILPATRICK, 1996).
4.4. O Movimento da Matemática Moderna na Itália
A organização do sistema escolar italiano atual encontra-se dividido em
três níveis: a escola elementar, obrigatória para crianças na idade de 6 a 10 anos,
a escola secundária de primeiro grau, igualmente obrigatória para crianças entre
11 e 14 anos e a escola secundária de segundo grau (escola secundária
superior), para alunos entre 14 e 19 anos, permitindo acesso imediato à todas as
faculdades do país.
Um dos primeiros atos do regime fascista italiano foi realizar uma reforma
global e estrutural da escola secundária italiana, conhecida como Reforma
Gentile, datada de 1923, em homenagem ao filósofo Giovanni Gentile (1875-
1944). Após a II Guerra Mundial, embora não se possa afirmar que fora uma
reforma efetiva em seus quadros – uma vez que os programas antigos foram
conservados – algumas mudanças marcantes se realizaram: a escolaridade
obrigatória para aqueles indivíduos até os 14 anos, a unificação do ensino
secundário de 11 a 14 anos e acesso à universidade para todos os alunos da
escola secundária superior.
A partir dos anos 1950, a Itália começa a participar dos debates sobre a
renovação do ensino de Matemática organizado pela CIAEM, ICMI e OECE,
fazendo-se presente no Congresso de Royaumont em 1959.
Emma Castelnuovo, pesquisadora e educadora matemática italiana, além
de contribuir consideravelmente para a difusão dos novos métodos de ensino na
Itália, os livros que escreveu para alunos de 11 a 14 anos (ensino secundário de
primeiro grau), em conformidade com um método construtivo baseado na
observação do mundo real, era novidade naquela época no panorama italiano.
Foram publicados pela primeira vez em 1949, tendo várias edições. Desse modo,
Castelnuovo contribuiu também para manter contato com o meio internacional,
embora os intercâmbios com outros países tenham sido incipientes. O pouco
105
impacto que a Matemática Moderna exerceu no ensino secundário italiano depois
de 1960 é exemplo dessa escassa interação (FURINGHETTI, 1999).
Entretanto, o ensino primário conheceu algumas tentativas de introdução
da Matemática Moderna, cujos manuais escolares primários se reduziam à
introdução de alguns elementos da Teoria dos Conjuntos – que eram identificados
com a Matemática Moderna – inseridos artificialmente num contexto tradicional e
pelos quais os professores não tinham nenhuma formação.
Já a formação universitária dos professores de Matemática da Escola
Secundária Superior não comportava, nos anos 1960, nenhum elemento de
Matemática Moderna. Fulvia Furinghetti (1996) observa que, somente por volta de
1960 os primeiros cursos de Álgebra Moderna foram introduzidos na universidade
e seria um paradoxo que a Matemática Moderna entrasse na escola secundária,
antes ou ao mesmo tempo, que na universidade.
Em 1975, foram criados os primeiros grupos de pesquisa em Didática da
Matemática com o suporte financeiro do Centro Nacional de Pesquisa. Um dos
primeiros resultados obtidos pelo grupo foi o desenvolvimento de projetos e
produção de manuais para a escola secundária superior. Esses projetos
contribuíram fortemente para orientar as discussões sobre o nível de ensino e o
desgaste dos programas. Traziam novos conteúdos, como noções de
probabilidades; novos métodos, como o ensino por resolução de problemas, uma
visão moderna do problema da axiomatização. No entanto, o ambiente na escola
secundária apresentava-se debilitado, não permitindo a aceitação desses
projetos, apesar do apoio do Ministério da Educação e das contribuições das
iniciativas não governamentais (FURINGHETTI, 1999).
4.5. O Movimento da Matemática Moderna na URSS
Durante a maior parte do período soviético, os programas de ensino de
Matemática não sofreram modificações significativas. O manual de A. P. Kissilev,
por exemplo, publicado em 1892, foi utilizado por mais de 70 anos. Somente nos
anos 1970, uma mudança radical nos programas do ensino secundário foi
106
realizada, tendo como um de seus objetivos a reorganização do ensino de
matemática para acompanhar a evolução da Matemática Moderna.
Uma comissão da Academia de Ciências da URSS e da Academia de
Ciências Pedagógicas reuniu-se, em dezembro de 1964, para definir o conteúdo
dos ensinos escolares, ficando a cargo de Kolmorogov a direção da subcomissão
de Matemática. Um grupo formado por matemáticos profissionais, pedagogos e
professores reuniu-se durante três meses para preparar um projeto de programa
que foi submetido a uma grande discussão e posterior redação em 1967. A
reforma foi aplicada por etapas a partir do ano escolar de 1970-1971. Cada etapa
da reforma do ensino de Matemática foi desenvolvida com participação direta de
Kolmogorov, que praticamente renunciou à pesquisa para se consagrar
inteiramente ao ensino. Um reflexo de suas atividades pedagógicas é encontrado
nos numerosos artigos publicados em jornais e revistas da época, além de
conferências realizadas na Rússia e no exterior para explicar incansavelmente os
objetivos e conteúdos da reforma. Kolmogorov se interessava por outras reformas
de ensino que estavam ocorrendo em outros países estrangeiros, particularmente
na França, para onde se dirigia regularmente (PETROVA, 1996).
A estrutura do curso foi inteiramente modificada. A partir de então, o curso
de Matemática do ensino secundário formaria um conjunto unificado da 1ª à 5ª
série, onde foram introduzidos elementos de Álgebra (números negativos,
notação literal, equações lineares, noções mais simples sobre conjuntos e
operações sobre conjuntos). Da 6ª ao 8ª série dava início ao curso de Álgebra e
geometria, sendo que na 9ª e 10ª série, juntamente com a Álgebra, era
introduzida a Análise. Em Álgebra, foram introduzidas noções de aplicação e
função numérica. Em Geometria, as noções eram aprofundadas e demonstradas
nas séries superiores onde a apresentação era fundamentada na Teoria dos
Conjuntos. Para determinação do volume do cone, pirâmide e esfera, foram
introduzidas noções elementares de integrais. Algumas noções de Lógica como
implicação, equivalência, etc, foram usadas em demonstrações.
O projeto inicial continha outros conteúdos que foram sendo abandonados
em seguida, como noções de grupos, anéis e corpos, elementos de cálculo,
probabilidade e números complexos. Conscientes da dificuldade que apresentava
107
tal programa para a maioria dos alunos, os autores da reforma propuseram tornar
facultativo parte do curso de matemática. Além disso, cientes da necessidade dos
professores em aprender o novo método, os reformadores igualmente atacaram a
formação profissional dos professores (PETROVA, 1996).
A partir da metade dos anos 1970, uma série de críticas contra os
manuais redigidos a partir dos programas de Kolmogorov começou a surgir.
Essas críticas estavam ligadas, em grande medida, à linguagem matemática, que
foi julgada excessivamente formalizada, recheada de definições abstratas e pouco
compreensíveis, muito além do conteúdo real; um número de noções e
propriedades foram suprimidas no curso de Geometria e o tempo dedicado à
resolução de problemas clássicos havia sido reduzido (PETROVA, 1996).
Alguns artigos críticos começam a surgir na imprensa contra a reforma de
Kolmogorov. Essa campanha, como freqüentemente acontecia na URSS,
assumiu a forma de denúncia pública de oposição a Kolmogorov, sob o domínio
pedagógico. Assim, a reforma foi abandonada. O Ministro da Educação recebeu
instruções para revisar imediatamente os conteúdos dos programas de
matemática. Três projetos de programa foram levados à discussão no início de
1979. Segundo Petrova (1996), a análise desses programas mostrou que eles
diferem daquele de Kolmogorov mais pelo conteúdo do que pela maneira de tratar
os temas. Desse modo, o programa dos anos 1980, adotado depois do abandono
da reforma de 1970, conservou ainda os principais elementos do programa de
Kolmogorov.
4.6. O Movimento da Matemática Moderna na Bélgica
O Movimento da Matemática Moderna na Bélgica teve início nos anos
1960. Foi promovido por professores do ensino secundário, integrantes da
Sociedade Belga de Professores de Matemática”. Esses professores
organizaram congressos, publicaram a revista “Mathematica & Paedagogia” e
participaram dos encontros anuais da CIEM os quais forneceram a oportunidade
de fazer contatos internacionais frutíferos para a implementação da reforma da
Matemática Moderna na Bélgica. Willy Serrais, Fréderic Lenger, Louis Jéronnez,
108
foram alguns dos professores que tiveram papel de destaque na organização
desse movimento. Desejosos de lançar novas experiências na Bélgica, Servais e
Lenger buscaram apoio no matemático Georges Papy (1920- ), professor da
Université Libre de Bruxelles, cuja relevante colaboração fez com que a Bélgica
se tornasse o país de vanguarda do movimento.
Desde 1961, os programas modernos foram experimentados nas primeiras
séries do secundário. O dinamismo de Papy suscitou a colaboração dos
professores e imprimiu maior agilidade para a realização da reforma. Em
numerosas ocasiões Papy definiu seu objetivo pedagógico como sendo o de
“ensinar os alunos de hoje em dia, a matemática de hoje em dia”, reconstruída
com esta intenção pela ciência matemática. Tratava-se de fazer uma exposição
da matemática elementar de modo estrutural e coerente, que proporcionasse
acesso o mais rápido possível, às grandes estruturas, em particular, às estruturas
de Espaço Vetorial (NOËL, 1996, p. 320).
Com base nessas idéias, Papy empreendeu efetivamente a reconstrução
da matemática elementar. O resultado, embora inacabado, foi apresentado na
célebre “Mathématique Moderne” volumes 1, 2, 3, 5 e 6, publicados nos anos
1963-1967. Os programas, segundo Noel (1996), eram muito coerentes. Em
particular, o curso de geometria plana, levado a cabo por Papy era rigoroso, muito
elegante, muito econômico, colocando em evidência os resultados considerados
essenciais.
Em 1968, a influência de Georges Papy sobre o Movimento começou a
decair:
Seu estilo, sua recusa de concessões, mesmo sobre detalhes, as
oposições pessoais foram afastando dele alguns de seus
colaboradores que continuaram, entretanto, sua ação de modo
independente. Pelas mesmas razões, Papy não se fez mais
presente nas comissões oficiais que redigiram os programas
definitivos (NOËL, 1996, p. 320-321).
Elaborar um programa e manuais didáticos que estivessem em
conformidade com as idéias inovadoras não era suficiente para garantir o êxito da
reforma do ensino da matemática. Convinha, além disso, assegurar a atualização
109
dos professores. Os cursos de formação de professores foram baseados em dois
componentes: o conteúdo e a metodologia. A quase totalidade dos trabalhos
debruçou-se sobre a matéria a ser ensinada, pois poucos eram os professores
que tinham noções de Álgebra Moderna. Mesmo entre aqueles que possuíam
essas noções, ainda lhes faltava o modo apropriado de como aplicá-las ao estudo
das noções elementares em Geometria, Álgebra e Aritmética (NOËL, 1996).
Modificar os métodos de ensino mostrou-se muito mais difícil do que
modificar as matérias de ensino. Dessa forma, trabalhos enfocando a metodologia
foram quase inexistentes. Assim, a maioria dos professores comunicava a seus
alunos as matérias que eles dominavam pouco, aplicando os mesmos métodos
que sempre haviam aplicado para a Matemática tradicional (NOËL, 1996).
Em relação à pretensão dos reformadores em tornar a matemática mais
agradável para a maioria dos cidadãos, a reforma não cumpriu seu intento.
Contudo, para NOËL (1996), seria um erro falar em fracasso total para a
Matemática Moderna. Depois de 1992, as idéias evoluíram o suficiente para a
composição de um novo programa, que não se constituiu em uma ruptura com os
programas do período da Matemática Moderna, posto que esses foram
absorvidos, eliminando-se os excessos. O curso de Geometria foi completamente
revisto, mas continuou dando lugar à Geometria das Transformações; e
conteúdos de álgebra linear, destacados na reforma da Matemática Moderna,
ainda conservam um lugar importante.
4.7. A reforma da Matemática Moderna: um olhar sobre a participação de
matemáticos e educadores matemáticos
Os artigos sobre reformas de ensino de Matemática Moderna que
compõem a obra “Les science au lycée” revelam uma especial preocupação por
parte dos reformadores com a modernização do ensino superior após a Segunda
Guerra Mundial, cujo incentivo ao avanço científico e tecnológico ali encontrado,
particularmente quanto à ciência matemática, impulsionou os movimentos de
renovação do ensino secundário.
110
Os pesquisadores assinalam a pretensão manifestada por diversos países
em democratizar o ensino secundário, decorrente da expansão econômica a partir
dos anos 50. O crescimento do ensino superior nos países industrializados
estimulou a adoção de critérios para a valorização do ensino científico,
concorrendo para o declínio das humanidades clássicas. Surge a necessidade de
reformar o ensino secundário, procurando adequá-lo à nova realidade do ensino
superior e promover a ampliação das oportunidades de acesso às universidades.
Assim, o lema “Matemática para todos”, é defendido por reformadores da
França e Alemanha. Em outros países, tais como, Estados Unidos, Bélgica e
Itália, o anseio em divulgar a matemática para a maioria dos cidadãos ganhou
significativo interesse por parte dos dirigentes governamentais, estimulando a
revisão de programas de ensino, e mobilizando um grupo de atores constituído
por matemáticos, professores, pedagogos, políticos etc, que, convencidos da
urgência em adequar o ensino secundário aos novos tempos, empenharam-se em
promover a reestruturação do ensino de matemática naquele nível.
A “matemática para todos” também foi objeto de considerações por parte
de Michael Otte (1993), para quem esse assunto pode levar a duas
interpretações. A primeira, diz respeito à uma determinada forma de matemática
que deve ser indistintamente ensinada para todos os indivíduos da sociedade; já
pela segunda, a frase pode expressar a intenção de que para cada indivíduo,
deveria ser acessível ao menos uma forma de matemática. A matemática, na
primeira acepção, se caracteriza pelo domínio referencial de suas afirmações e
pela generalidade de seus conceitos; enquanto que na segunda, a matemática
fica caracterizada pela natureza de sua ligação com a atividade individual e pela
particularidade e concretude de seu modo de proceder.
Para Otte (1993), o MMM advogou um tipo uniforme de matemática no
sentido da primeira interpretação, deduzindo dessa uniformidade do saber, uma
uniformidade na educação, ao defender o estabelecimento de uma escola única
para todos. Uma das causas aventadas para o fracasso do Movimento, reside
justamente no argumento de que nem todos os alunos têm aptidão para uma
matemática científica – entendida aqui como formal, rigorosa e abstrata. Ora, se
não havia essa aptidão generalizada, como levar à frente uma reforma amparada
111
em um idealismo que se sustentava na cientificidade da matemática e na
cientificidade do seu ensino como instrumentos de superação das desvantagens e
desigualdades sociais? Isso permitiu a Otte constatar que hoje em dia, a história
da reforma se apresenta “como uma mudança da concepção da frase
matemática para todos’ da primeira para a segunda das interpretações
mencionadas” [grifo do autor] (p. 32, 1993).
Entretanto, naquela época, os reformadores não poderiam vislumbrar as
conseqüências daquelas propostas de universalização da Matemática, tendo em
vista que o foco das discussões concentrava-se na necessidade de inovação
curricular por meio da adoção de conteúdos da Matemática Moderna, para atingir
aquele objetivo.
As várias análises expressas no “Les science au lycée” permitem verificar,
realmente, que a iniciativa por mudanças foi desencadeada a partir da
insatisfação de matemáticos universitários, os quais denunciavam a ausência de
questões matemáticas mais “modernas” ligadas à Teoria dos Conjuntos e ao
método axiomático, que preparassem os estudantes durante o curso secundário.
Não obstante as afirmações como as de Weil (2002) ou de Revuz (1996)
indiquem patente indiferença de Bourbaki em relação ao ensino secundário, ou,
do mesmo modo, a afirmação de Keitel (1996) ao denunciar o desinteresse dos
matemáticos alemães pela modernização do ensino, os métodos empregados no
fazer matemático, os conteúdos escolhidos para serem abordados, as práticas
utilizadas, deram o tom, indicaram os caminhos para a realização das reformas.
Ainda assim, os matemáticos Andreï Kolmogorov (Rússia), George Papy
(Bélgica) e Edwad G. Begle (EUA) ganharam destaque nas pesquisas realizadas
por representarem lideranças frente às reformas da Matemática Moderna. Na
França, matemáticos como Jean Dieudonné, Gustave Choquet, André
Lichnerowicz, Pierre Samuel, André Revuz, Charles Pisot participaram ativamente
da reforma do ensino secundário, espelhando-se no método bourbakista.
Embora menos numerosos, os matemáticos encontram-se unidos por
práticas profissionais múltiplas, colóquios, júris, teses, revistas, formando um
grupo relativamente coeso. Em 1959, com o apoio da OEEC (Organization for
112
European Economic Cooperation), realizou-se a Conferência de Royaumont na
França, que contou com a participação de matemáticos e educadores
matemáticos de diversos países, cujas delegações deveriam ser compostas por
pessoas de notório saber em suas ocupações. As recomendações da Conferência
de Royaumont incentivaram a colaboração entre diversos países e estimulou a
organização de iniciativas em prol da melhoria do currículo e do ensino da
Matemática.
Entretanto, há que se levar em conta a assertiva de Antoine Prost “Se é
grande o seu prestígio, os sábios, sozinhos, são impotentes. Para atingir seus
fins, eles precisam de aliados” (1996, p. 17). Ou seja, para a realização das
reformas foi necessária uma aliança entre matemáticos, administradores,
professores, políticos e pedagogos, formando um corpo heterogêneo de
reformadores.
Na história das reformas de ensino, a mobilização dos atores e mais ainda,
suas alianças, são fatores decisivos. Além disso, continua Prost, os professores
são atores decisivos da reforma. Para que uma reforma seja duradoura, faz-se
necessário convencê-los de sua necessidade, especialmente porque eles se
deparam, em sala de aula com resistências que não são de todo superadas.
Em relação aos professores, outro aspecto deve ser ressaltado: nem seus
sindicatos, nem suas associações representam, em sua totalidade, os interesses
da classe, não sendo raro, portanto, acontecer uma política cuja adesão não é
completa.
Também o Brasil não ficou imune àquelas preocupações e debates em
torno da reestruturação do ensino de Matemática, os quais serviram de base para
implementação do Movimento da Matemática Moderna no país, a partir da década
de 1960.
113
CAPÍTULO 5
SOBRE A PARTICIPAÇÃO DE MATEMÁTICOS NO MOVIMENTO
DA MATEMÁTICA MODERNA NO BRASIL: um panorama de teses
e dissertações
Retomando o objetivo geral deste trabalho, qual seja, o da investigação da
dinâmica das relações entre matemáticos e educadores matemáticos nas
propostas de ensino de Matemática, defendidas pelo MMM, neste capítulo são
analisadas teses e dissertações, aquelas que diretamente tomam esse
movimento como tema central de suas investigações.
Para tanto, utilizamos como critério básico a leitura dessas pesquisas, em
ordem cronológica, entendendo-se que esse procedimento propicia um maior
conhecimento e convida a uma crítica mais ponderada sobre os trabalhos que
tiveram como finalidade a análise do MMM. Além disso, esses trabalhos foram
realizados em diferentes épocas e lugares e, na medida em que vamos nos
aproximando dos trabalhos mais recentes, observamos que estes vão
acrescentando novos dados, compondo um quadro cada vez mais geral sobre o
Movimento, apresentando documentos já referenciados nos demais, postulando
conclusões às vezes diferenciadas ou mesmo discordantes dos trabalhos
anteriores, como também convergindo para aquelas apresentadas nas
investigações posteriores.
Neste estudo, valemo-nos de parte das teses e dissertações discriminadas
no inventário realizado pelo Grupo de Pesquisa em História da Educação
114
Matemática – GHEMAT, da PUC-SP
41
, a saber: “The Dynamics and
consequences of the modern mathematics reform movement for brazilian
mathematics education”, de Beatriz D’ Ambrósio, 1987; “Movimento da
matemática moderna no Brasil: estudo da ação e do pensamento de educadores
matemáticos nos anos 60”, de Elizabete Zardo Búrigo, 1989; “Três décadas de
educação matemática: um estudo de caso da Baixada Santista no período de
1953-1980”, de Gilda Lucia Delgado de Souza, 1998; “Movimento da matemática
moderna: memória, vaias e aplausos”, de Catarina Maria Vitti, 1998; “A percepção
de professores atuantes no ensino de matemática nas escolas estaduais da
Delegacia de Itu, do movimento da matemática moderna e de sua influência no
currículo atual”, de Maria do Carmo Sousa, 1999; “Reflexão histórica sobre o
Movimento da Matemática Moderna em Juiz de Fora”, de Ana Maria Stephan,
2000; “Movimento Matemática Moderna no Brasil: avanço ou retrocesso?”, de
Flávia Soares dos Santos, 2001 e “Retraços da educação matemática na região
de Bauru (SP): uma história em construção”, de Ivete Maria Baraldi, 2003.
A disposição adotada para a descrição desses trabalhos fez com que, os
assuntos abordados nos primeiros estudos descritos neste capítulo, fossem, em
grande parte, retomados pelos que se seguiram posteriormente. Por esse motivo,
a disposição adotada na narrativa desses trabalhos foi mais alongada para os
primeiros, cujas descrições e explicações fizeram igualmente parte dos demais.
Além disso, estas explicações prestaram-se para o desenvolvimento da própria
tese que ora apresentamos, quando nos valemos destas mesmas explicações
para dar continuidade aos assuntos em pauta.
Apenas a constatação da existência de uma proposta de inovação para o
ensino e de esforços para implantá-la, além de aquilatar o que teria representado
ou nos legado para o futuro, por si só justifica tomar o MMM como objeto de uma
maior investigação histórica. Realizar um estudo histórico, apesar dos trabalhos
que tratam especificamente do MMM, faz-nos lembrar a observação feita por Le
Goff, sobre a necessidade de se questionar a documentação histórica, também
em suas lacunas: “é necessário fazer o inventário dos arquivos do silêncio e fazer
41
O GHEMAT, o banco de teses da CAPES e o inventário realizado pelo CEMPEM, da UNICAMP, apontam
a existência de apenas oito teses e dissertações que tomaram o Movimento da Matemática Moderna por
tema central de pesquisa.
115
a história a partir dos documentos e das ausências de documentos” (1982, p.
103).
Cabe também esclarecer que, neste capítulo, não foram incluídas
dissertações realizadas e publicadas por pesquisadores integrantes do GHEMAT,
do qual fazemos parte. Todas essas investigações, incluindo esta pesquisa,
buscam ir além do ideário do MMM, valendo-se de aportes teórico-metodológicos
que orientam pesquisas dentro da História da Educação, especialmente a de
estudos relativos às questões culturais. O que as diferenciam de nosso trabalho
são justamente o problema de pesquisa e as questões que se propuseram a
responder e, tendo em vista que esses estudos foram desenvolvidos dentro do
mesmo grupo, não buscaram, obviamente, analisar as produções dos
matemáticos Omar Catunda, Benedito Castrucci e Jacy Monteiro e suas relações
com a Educação Matemática durante o MMM.
Os trabalhos do GHEMAT
42
que trataram direta ou indiretamente do MMM
foram os seguintes:
A dissertação “Tempos pré-modernos: a matemática escolar dos anos
1950” de autoria de Alex Sandro Marques (2005), investigou como fora
organizada a matemática escolar do ginásio nos anos 1950, situando-se entre
dois momentos fundamentais da história da educação matemática brasileira: o
nascimento da disciplina matemática, em 1929, e o advento do Movimento da
Matemática Moderna (MMM), no início do decênio de 1960.
Já a dissertação elaborada “A matemática moderna no Brasil: as primeiras
experiências e propostas de seu ensino” de autoria de Rosimeire Aparecida
Soares Borges (2005) teve como objetivo estudar o MMM, a partir da história de
vida do professor Ubiratan D’Ambrosio nos anos de 1957,1959 e 1961.
A pesquisa realizada por Flainer Rosa de Lima (2006), “O Grupo de
Estudos do Ensino da Matemática e a formação de professores durante o
movimento da matemática moderna” voltou-se para o estudo dos cursos
desenvolvidos e realizados pelo GEEM, para os professores de Matemática do
42
As dissertações elaboradas pelo GHEMAT encontram-se disponíveis para pesquisa no site
http://www.pucsp.br/pos/edmat/.
116
Ensino Secundário durante o MMM, por meio da análise de documentos
pertencentes ao Arquivo Pessoal Osvaldo Sangiorgi, principal representante
daquele grupo de estudos.
Finalmente, o trabalho de Mario Nobuyuki Nakashima (2007), denominado
O papel da imprensa no movimento da matemática moderna”, analisou o
tratamento dado pela imprensa ao MMM, buscando nos textos jornalísticos, de
1960-1980, respostas para a seguinte questão de pesquisa: qual o papel da
imprensa no MMM?
Como dissemos, embora estes últimos trabalhos a que nos referimos
linhas acima, sejam objeto de estudos do GHEMAT, não vimos a necessidade de
contemplá-los neste capítulo. Entretanto, ao longo de nossas investigações,
sempre que se fez necessário, cuidamos de mencionar suas análises e
conclusões.
5.1. D’AMBROSIO, Beatriz. The Dynamics and consequences of the modern
mathematics reform movement for brazilian mathematics education.
Tese de Doutorado. Indiana University, 1987.
O estudo realizado por D’Ambrosio teve como propósito descrever a
dinâmica do movimento de reforma da matemática moderna e suas
conseqüências no sistema educacional brasileiro, tratando das razões pelas quais
o tema apresentado é relevante para a Educação Matemática no Brasil.
No capítulo introdutório, a autora buscou identificar e analisar componentes
da dimensão internacional na difusão do conhecimento na área de educação,
tomando como principal questionamento: Quais são os canais pelos quais uma
inovação influencia um grupo de pessoas? D’Ambrosio intentou verificar quais os
mecanismos de transferência foram utilizados para que um projeto sobre a
Matemática Moderna, elaborado em países desenvolvidos, em especial pelos
Estados Unidos da América, fosse adotado no ensino brasileiro.
No segundo capítulo, a autora apresentou uma retrospectiva histórica do
desenvolvimento qualitativo e quantitativo da expansão do sistema educacional
117
brasileiro, tecendo comentários sobre as principais reformas legislativas ocorridas
no país. Ainda nesse capítulo, D’Ambrosio realizou um estudo sobre a dinâmica
da reforma dos EUA, por considerar esse país como guia para a reforma
curricular brasileira.
No terceiro capítulo, D’Ambrosio realizou uma análise do MMM no Brasil,
atendo-se especialmente aos anais de congressos nacionais de Educação
Matemática, ao papel exercido pelo GEEM no Movimento e à implementação e
impacto causado pela da reforma curricular. Para tanto, apoiou-se em entrevistas
realizadas com matemáticos e educadores matemáticos brasileiros, além de
artigos sobre o MMM veiculados em jornais e revistas especializadas, dentre
outros documentos.
Comenta que, em 1955, o Primeiro Congresso Nacional de Educação
Matemática realizou-se em Salvador, Bahia. O programa sugerido no congresso
era basicamente o mesmo que o oficial, com algumas alterações relativas à
mudança de tópicos de um ano para o outro. A autora afirma não haver
evidências de introdução de tópicos da MM no currículo.
Já no Segundo Congresso Nacional, ocorrido em 1957, em Porto Alegre,
aparecem as primeiras manifestações dos participantes em prol da incorporação
de elementos da MM no currículo do ensino secundário. Ubiratan D’Ambrosio
43
sugeriu a introdução do estudo de propriedades de diferentes conjuntos
numéricos e operações de estruturas algébricas, tais como aquelas que podem
ser observadas na Geometria das Transformações, justificando que “as
aquisições mais recentes da Matemática Moderna e da Psicologia não são
consideradas no panorama geral do ensino” (1959, p. 374). O professor Osvaldo
Sangiorgi
44
, recomendou que mudanças relativas à MM no currículo fossem
gradativas, a fim de “evitar malefícios decorrentes de transformações radicais”
(1959, p. 399). A esse respeito, a autora chama a atenção para o fato de que o
programa proposto por Sangiorgi não acolheu nenhuma das novas idéias,
contradizendo sua afirmação de incorporação gradativa das novas idéias.
43
Ubiratan D’Ambrosio defendeu a tese “Considerações sobre o ensino atual da matemática” (1959, p. 373-
378).
44
Osvaldo Sangiorgi apresentou a tese “Matemática clássica ou matemática moderna na elaboração
dos programas do Ensino Secundário?” (1959, p. 398-406).
118
Em 1959, no Rio de Janeiro, aconteceu o Terceiro Congresso Nacional.
Nele, foi sugerido o desenvolvimento de experimentos de implementação da MM
em nível secundário, em algumas escolas brasileiras.
Beatriz D’Ambrosio conta que os anais do Quarto Congresso Nacional
ocorrido em Belém, no ano de 1962, nunca foram publicados. Alguns de seus
artigos foram incluídos nas publicações de Matemática Moderna para o Ensino
Secundário do GEEM, aqueles apresentados pelos seus membros no congresso.
Entre eles, a autora destaca o artigo que propôs requisitos mínimos para o
desenvolvimento de um novo programa no ensino secundário, sendo assim o
primeiro a incorporar a Matemática Moderna no currículo secundário
45
.
Ainda no terceiro capítulo, D’Ambrósio dedicou-se à análise de como se
deu o início do movimento no Brasil. Busca apontar as razões que levaram os
educadores matemáticos a promover mudanças, considerando como fato
importante o movimento mundial na educação, principalmente na França e EUA,
ocorrido no início da década de 1960. Nesse sentido, os intercâmbios de
bolsistas, promovidos por institutos como Instituto Brasileiro de Educação, Ciência
e Cultura (IBECC), Organização dos Estados Americanos (OEA), Organização
das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), etc.,
procedimento comum na época, é considerado um dos canais de transferência de
idéias de um país para outro.
Diferentemente do que ocorrera nos EUA ou na Europa, D’Ambrosio
observou que a liderança do Movimento no Brasil ficou a cargo de professores
secundários, altamente qualificados, diplomados em prestigiosos departamentos,
como a FFCLUSP. Faziam parte de uma elite, numa época em que a maioria dos
professores tinha diploma em outros campos que não a matemática ou vinham de
escolas normais.
Segundo D’Ambrosio, muitos entrevistados afirmaram que o envolvimento
com a Educação Matemática demorou a ganhar respeitabilidade entre
matemáticos. Eles acreditavam que isto apenas ocorreu como conseqüência da
45
O ensino secundário, em conformidade com a Lei 4024 de 1961, estava dividido em duas partes, o ginásio,
correspondente ao período compreendido entre a 5ª a 8ª série do atual ensino fundamental; e o colegial,
correspondente ao atual ensino médio.
119
efetiva participação de proeminentes pesquisadores matemáticos, tal com
Marshall Stone e Jean Dieudonné. Estes dois matemáticos, particularmente,
tiveram forte influência, pois ambos orientaram estudantes brasileiros de
matemática, que posteriormente se tornaram respeitáveis pesquisadores nas
universidades brasileiras.
A autora destacou os seguintes educadores matemáticos que visitaram o
Brasil: Springer (EUA), Ranucci (EUA), Pickert (Alemanha), Felix (França), Papy
(Bélgica), Gattegno (Inglaterra), Dienes (Canadá). Estes professores fizeram
várias palestras no Brasil, especialmente em São Paulo e Rio de Janeiro. O
impacto de suas idéias no currículo foi considerado pelos entrevistados como
altamente relevante para o desenvolvimento do ensino da matemática no Brasil.
Uma vez que os entrevistados eram líderes do Movimento, a autora conclui que
estas idéias foram transferidas para a classe dos professores.
Em suas conclusões, D’Ambrosio observou que o movimento caracterizou-
se por esforços isolados de reforma. Houve pouca comunicação e partilha de
idéias sobre a experiência conduzida. Enquanto as reformas americana e
européia buscavam preparar cientistas e matemáticos por meio da melhoria da
qualidade no ensino, no Brasil dos anos 1960, a reforma mostrou-se inapropriada,
pois, a tentativa foi de expansão do sistema educacional de forma quantitativa,
oferecendo oportunidades educacionais para todas as crianças. Assim, a autora
concluiu que o currículo de matemática deveria ter objetivos e metas apropriados
para cada situação, e ainda, ser diferente daqueles advindos do mundo
industrializado no qual as crianças permanecem dez ou mais anos na escola.
Para a nova proposta, o processo educacional era centrado no aluno. O
papel do professor deveria ser a de orientador de uma aprendizagem voltada para
a descoberta e exploração, substituindo formas autoritárias de exposição do
ensino. No entanto, constatou D’Ambrosio, essas mudanças não ocorreram. Um
dos indicativos foi o fato de que os professores continuavam preocupados em
cumprir o programa estipulado e com a preparação dos alunos para o vestibular.
Desse modo, a memorização continuou a ser o método mais empregado.
A tese defendida por Beatriz D’Ambrosio, além da especial característica
de ser um trabalho pioneiro, destaca-se por fornecer aos pesquisadores um leque
120
de informações sobre o MMM, o qual possibilita os mais diversos
questionamentos, e por sua vez, a abertura de novas pesquisas.
Ao questionar sobre qual o grau de participação dos educadores brasileiros
nos congressos internacionais, quais foram as publicações internacionalmente
distribuídas disponíveis e quais foram as decisões tomadas durante o MMM, suas
análises foram direcionadas para a discussão do currículo e, desse modo, seu
interesse sobre matemáticos e educadores brasileiros não se traduziram em uma
atenção voltada especialmente às relações entre matemáticos e o ensino
secundário de matemática no Brasil.
Relativamente ao primeiro congresso, D’Ambrosio constatou não haver
evidências concretas da introdução de tópicos da MM. No entanto, já se
observava uma forte preocupação com o ensino secundário, preocupação esta
que levou, inclusive, a promover esse congresso, revelando não apenas
apreensão quanto ao andamento do ensino de matemática da escola secundária
como também um esforço para obter mudanças, mesmo que ainda não se
soubesse exatamente qual o caminho a ser seguido, mesmo sem uma posição
efetiva, dirigida para uma reforma sustentada pela ênfase em tópicos da MM.
Nesse caso, para a realização desse primeiro congresso, não se poderia pensar
em influências das idéias renovadoras, incentivadas pelo Movimento que já vinha
ocorrendo nos EUA e em países europeus? Não haveria chegado até o Brasil um
sopro de mudanças, na forma de idéias, materiais, artigos gerados por esses
trabalhos?
Quanto ao segundo congresso, observa-se que Beatriz D’Ambrosio não se
deteve na participação do matemático Benedito Castrucci. Entretanto, Castrucci
substituiu Ubiratan D’Ambrosio no evento, relatando sua tese, uma vez que o
professor D’Ambrosio não pudera comparecer por problemas de saúde.
Tampouco se verifica, nos comentários tecidos aos Congressos de 1959 e
1962, alguma alusão sobre a participação de matemáticos durante o evento.
Conquanto o corpo docente das faculdades de matemática estivesse
envolvido no movimento de reforma, por meio de palestras nos cursos de
formação, as faculdades não exerceram papel de liderança, concluiu D’Ambrosio.
121
Nesse caso, consideramos ser necessário um estudo mais concentrado no papel
exercido pelo corpo docente das faculdades de matemática, em especial, os
matemáticos nesse Movimento.
As entrevistas realizadas por D’Ambrosio evidenciaram a pouca
participação de matemáticos no Movimento. No entanto, por meio das palestras e
seminários promovidos pelo GEEM, explicitados pela autora, verifica-se que
houve uma participação regular de matemáticos pesquisadores de várias
universidades do país. Por toda a agenda de atividades do GEEM, apresentada
no capítulo três, a autora indicou nomes de matemáticos e educadores
matemáticos envolvidos nas atividades do GEEM. Como matemáticos, considerou
aqueles pesquisadores matemáticos que trabalham em instituições de ensino
superior no Brasil. Para distingui-los dos educadores matemáticos, os nomes dos
matemáticos, quando citados, foram marcados com um asterisco. Como
educadores matemáticos, considerou os professores licenciados em faculdades
privadas (D’AMBROSIO, 1987, p. 98).
Para D’Ambrosio, ao promover as inovações curriculares em matemática,
os países em desenvolvimento, de modo geral, ignoraram o fato de que o
sucesso da implementação de novos materiais necessitava de uma mudança na
crença dos professores sobre a aprendizagem e instrução matemática. Segundo
conclui D’Ambrosio, a maioria dos professores acreditava que o professor era o
centro do processo educacional e que a aprendizagem cobrava um árduo
trabalho, envolvendo memorização de informações.
Apesar de mencionar em diversos momentos a participação de
matemáticos no movimento, a tese de D’Ambrosio preocupa-se em apresentar um
panorama geral sobre o MMM, cujos questionamentos não cobravam a
necessidade de um estudo aprofundado sobre a ação dos matemáticos na cultura
escolar. Cabe, entretanto, ressaltar que tal assunto não foi premiado pela autora.
122
5.2. BÚRIGO, E. Z. Movimento da matemática moderna no Brasil: estudo da
ação e do pensamento de educadores matemáticos nos anos 60.
Dissertação de Mestrado em Educação. UFRGS, Porto Alegre, 1989.
A pesquisa realizada por Búrigo teve como objetivo examinar a dinâmica
do MMM no Brasil e as visões produzidas pelos seus protagonistas em relação ao
contexto histórico.
Considerando, como D’Ambrosio (1987), o Estado de São Paulo como
centro irradiador da MM no Brasil, no primeiro capítulo a autora empregou como
metodologia na elaboração de sua dissertação, a coleta de dados relativos ao
Movimento e entrevistas realizadas, em sua maioria, com membros do GEEM, a
saber, os matemáticos: Leopoldo Nachbin; Ubiratan D’Ambrosio; Ruy Madsen A.
Barbosa; Irineu Bicudo; Alésio de Caroli; Benedito Castrucci; e os educadores
matemáticos: Lucília B. Sanches; Dione L. Carvalho; Scipione di P. Neto; Anna
Franchi; Esther Pilar Grossi; Martha Blauth Menezes; Luiz Márcio Imenes;
Osvaldo Sangiorgi e Renate Watanabe.
Muito embora considerasse como as iniciativas mais importantes para a
renovação curricular do ensino aquelas advindas de outras instâncias, no
segundo capítulo, Búrigo dedicou-se ao exame dos três primeiros congressos
nacionais envolvendo o ensino de matemática, por entender que os esforços
realizados pelos congressistas para a melhoria do ensino da Matemática tiveram
continuidade e foram posteriormente incorporados pelo Movimento.
Ao examinar como se organizaram esses congressos, seus temas e
preocupações, a pesquisadora buscou compreender as condições que permitiram
a introdução da proposta da Matemática Moderna no Brasil. Como elemento
comum entre os esforços que deram origem a esses congressos e o MMM,
constatou a disposição de renovação do ensino da matemática a partir da
iniciativa dos professores. Além disso, o processo de valorização do ensino
secundário alcançou seu grau de expressão mais articulado com os Congressos
Nacionais, realizados nos anos de 1955, 1957 e 1959.
123
Para melhor contextualizar o MMM, no terceiro capítulo a autora versou
sobre as relações entre ciência, tecnologia e produção no capitalismo do pós-
guerra.
Búrigo dedicou o quarto capítulo ao estudo do MMM nos EUA e Europa
com o intuito de analisar como propostas internacionais de renovação do ensino
foram apropriadas pelo MMM no Brasil.
A preocupação com a melhoria da formação do cientista e de técnicos
levou à elaboração de projetos que culminaram com a criação de diversos grupos
de pesquisa, iniciados nos anos 50. Búrigo deu destaque ao papel exercido pelos
grupos americanos como NCTM, SMSG, UICSM e grupos de estudos europeus
como o CIEM, OECE e a OCDC.
No quinto capítulo da dissertação, foram examinadas as condições
históricas que permitiram a adoção da MM por educadores brasileiros, quando,
em especial, a autora examinou como São Paulo constituiu-se em um centro
difusor da nova proposta.
Búrigo atribuiu maior importância aos matemáticos na divulgação da MM
do que à presença de pedagogos, psicólogos ou sociólogos. Freqüentemente,
temas relativos à psicologia eram abordados pelo professor Sangiorgi ou
professores secundários sem especialização na área. Nesse sentido, a autora
deu destaque ao curso organizado por Sangiorgi em 1961. De acordo com Búrigo,
o curso oferecia quatro disciplinas, ministradas por Springer (Lógica Matemática),
Jacy Monteiro (Álgebra Linear), Alésio Caroli (Teoria dos Conjuntos) e Sangiorgi
(Práticas de Matemática Moderna). Desse modo, observa-se que a prática
pedagógica ficou a cargo de Sangiorgi, que embora não fosse matemático puro,
tinha sólida formação matemática enquanto que os demais professores eram
matemáticos. Não se faz evidente, portanto, a participação de pedagogos e
psicólogos.
Segundo declarações registradas pela autora, Sangiorgi era “odiado”
pelos matemáticos da USP. No entanto, essas mesmas pessoas que o “odiavam”
beneficiavam-se do acesso que Sangiorgi tinha junto à mídia (BÚRIGO, 1989, p.
111). Ademais, ainda segundo a autora, Sangiorgi exercia papel central na
124
formulação do discurso do GEEM, adaptando a linguagem utilizada para o
contexto brasileiro, além de fazer ligação com os órgãos públicos.
Ainda nesse capítulo, Búrigo reportou-se à necessidade de aprovação dos
matemáticos para que o Movimento ganhasse destaque. Citou, em especial, a
vinda do matemático bourbakista Jean Dieudonné ao Brasil, respeitado
matemático e defensor do Movimento, que proporcionou uma abertura para a
aceitação do MMM pelos matemáticos da USP. E, além disso, conforme
depoimento da educadora Lucília Bechara, havia a necessidade dos professores
fazerem cursos ministrados por matemáticos de renome de modo que pudessem
participar da organização do GEEM ou se candidatar às escolas vocacionais
(BÚRIGO, 1989).
No sexto capítulo, a autora enfocou os processos de expansão e
institucionalização do Movimento, as características que permitiram sua expansão
naquele contexto histórico e o modo como a evolução do Movimento foi
condicionada por esse mesmo contexto.
Ao comentar sobre a participação de Leopoldo Nachbin na organização e
nos trabalhos nas CIAEM, Búrigo constatou que esta se deveu em grande parte, a
uma relação pessoal com o professor Mashall Stone. Havia uma identidade de
propósito entre dois renomados matemáticos, numa posição de destaque dentro
do congresso. Os organismos e agências norte-americanas apoiavam as
conferências interamericanas. Do lado brasileiro, tem-se encabeçando os
comitês, matemáticos como Lindolpho de Carvalho Dias e Leopoldo Nachbin
(BÚRIGO, 1989).
O sétimo capítulo refere-se ao processo de esgotamento do Movimento,
quando a autora analisou a divisão no interior do GEEM, a finalização de seus
trabalhos em 1976 e as críticas oferecidas por matemáticos ao Movimento.
Para investigar o processo de esgotamento do Movimento, Búrigo apoiou-
se nas críticas apresentadas pelos matemáticos Morris Kline e René Thom, como
também em entrevistas realizadas com matemáticos e educadores matemáticos
brasileiros. Destacou, por exemplo, depoimento de Benedito Castrucci, quando
125
este atribuiu como principal causa do “fracasso” do MMM, objeções apontadas
por notáveis matemáticos, tais como Freudenthal e René Thom.
Segundo Búrigo, as críticas mais explícitas relacionadas ao MMM
começaram no Brasil por volta de 1973. O matemático Elon Lages Lima, nesse
mesmo ano, durante o Nono Colóquio Brasileiro de Matemática, apontou o ensino
brasileiro como seguidor de modelos estrangeiros desligados da realidade,
demasiadamente modernos. Já Manfredo do Carmo Perdigão, durante o
Seminário de Ciências e Matemática, também em 1973, atribuiu as distorções e a
má aplicação das idéias modernistas à inexperiência dos protagonistas do
Movimento (BÚRIGO, 1989).
Para a autora, tais críticas fizeram com que o GEEM modificasse os
temas apresentados em seus cursos de férias em 1974, quando foram incluídos
tópicos de Cálculo e Construção dos Números. Cursos de Teoria dos Conjuntos,
Álgebra ou Topologia, antes enfatizados pelo GEEM, dessa vez não foram
contemplados. Além disso, Elon L. Lima foi convidado pelo GEEM para realizar
palestra durante os cursos de férias (BÚRIGO, 1989).
As conclusões da autora são apresentadas no oitavo capítulo.
A autora considerou que o pensamento pedagógico que orientou a ação
dos educadores durante o MMM foi marcado pelo contexto histórico em que
surgiu e se desenvolveu. As razões que estimularam ou levaram educadores
brasileiros a defender mudanças baseadas na Matemática Moderna deveram-se
não só aos elementos de transferência de projetos educacionais gerados em
outros países como também pelo crescimento e modernização da economia
brasileira, aliados ao otimismo acerca das conseqüências sociais da melhoria do
ensino, ao desenvolvimento científico no país, à expansão do ensino secundário e
às preocupações dos educadores quanto à eficácia e deselitização desse ensino.
Para Búrigo, a autoridade que os matemáticos pesquisadores
emprestavam ao Movimento representou uma importante ligação entre o caráter
científico atribuído à proposta da MM e sua aceitação pelos professores. Essa
autoridade era reproduzida pelo GEEM, com a participação de matemáticos como
Omar Catunda e Benedito Castrucci.
126
A legitimação da discussão em torno do ensino da matemática, de sua
constituição em objeto de ação e reflexão consolidou-se com o MMM. Uma das
modificações no panorama de possibilidades atribuído à MM foi a aglutinação de
educadores em torno do Movimento, dispostos a liderar um processo de
renovação do ensino, implicando no surgimento da figura do educador
matemático, consolidada nos anos 70 e 80.
Não houve a preocupação por parte da autora em obter dos entrevistados
uma avaliação ou julgamento da validade do MMM. No entanto, em suas
conclusões, Búrigo selecionou elementos dessa avaliação exteriorizados por
alguns entrevistados. Um deles trata-se do reconhecimento da proposta da MM
como aquela que enfatiza as estruturas e a axiomatização, valorizando o produto
acabado da construção do conhecimento. Um outro, diz respeito ao
reconhecimento de que as soluções para os problemas do ensino não se
restringiam somente ao campo da ciência Matemática, sendo forte tendência na
área da Educação Matemática buscar soluções na área da Metodologia, aliada a
recursos da Psicologia da Aprendizagem.
Em seu estudo, Búrigo buscou verificar as relações entre o pensamento
pedagógico que orientou a ação dos protagonistas e o contexto histórico em que
foram produzidos, com o MMM de âmbito internacional. A esse respeito, nota-se
que a autora procurou responder a uma quantidade respeitável de questões.
Ao comentar sobre a concepção formalista de matemáticos integrantes do
grupo Bourbaki que lecionaram na USP, Búrigo não fez um estudo aprofundado
das apropriações feitas pelos estudantes, futuros matemáticos e educadores
matemáticos, relativamente ao rigor matemático, característico das aulas
ministradas por matemáticos desse grupo.
Além disso, suas conclusões provocaram outros questionamentos, razão
pela qual surgem lacunas que ensejam a possibilidade de uma exploração mais
pormenorizada acerca do papel dos matemáticos em relação ao movimento. Uma
delas consiste na análise de como se processa a ação da cultura matemática na
cultura escolar, levando-se em conta a prática pedagógica, tanto de matemáticos
quanto de professores de matemática, podendo ser verificada através de notas de
127
aula, artigos publicados em periódicos, participação em congressos, entrevistas,
diários de classe, atas, etc.
5.3. SOUZA, Gilda Lúcia Delgado de. Três décadas de educação matemática:
um estudo de caso da Baixada Santista no período de 1953 – 1980.
Dissertação de Mestrado em Educação Matemática. UNESP. Rio Claro,
1998.
Com a pretensão de resgatar a memória da Educação Matemática no
Estado de São Paulo, mais precisamente na cidade de Santos, Gilda Lúcia
Delgado Souza procurou registrar, por meio de entrevistas e documentos, a
atuação de um grupo de professores de matemática vinculados à rede oficial de
ensino nas décadas de 1950, 1960 e 1970.
A dissertação encontra-se subdividida em cinco capítulos. No capítulo zero,
a autora fez uma narrativa de sua trajetória profissional, como professora de
matemática da rede estadual.
A autora comentou ainda, sobre como se deu a mudança da Lei 4024/61
para a Lei 5692/71, o surgimento de órgãos oficiais da Secretaria da Educação do
Estado de São Paulo tais como a Coordenadoria de Ensino da Grande São Paulo
(COGESP), Departamento de Recursos Humanos Laerte de Carvalho (DRHU/LC)
e a Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas (CENP), além de suas
impressões sobre como essas reformas foram sentidas e apreendidas pelos
professores da Baixada Santista.
O capítulo um é dedicado à justificação dos pressupostos teórico-
metodológicos que deram sustentação ao estudo. Como o próprio título sugere,
Cotidiano, memória e história”, a autora procurou destacar como a vida cotidiana
articula-se com a memória e a história. Nesse sentido, optou por analisar a vida
cotidiana, tomando como referência básica a obra “A vida cotidiana” de autoria de
Agnes Heller.
A memória foi igualmente tema privilegiado na pesquisa. Sobre esse
assunto, Souza delineou um painel histórico da memória, subsidiada por Le Goff,
128
atentando para os progressos da memória escrita do século XVI aos dias atuais.
Destacou a fundação da revista “Annales d’Histoire Économique et Sociale” e a
insistência dos historiadores daquela geração em dar uma nova concepção ao
documento, abrangendo não apenas o documento escrito, como também o
ilustrado, transmitido pelo som, pela imagem ou de alguma outra maneira. A
reabilitação da oralidade como fonte de estudos históricos foi sublinhada por
Souza, porquanto sua pesquisa se inscreveu na perspectiva da História Oral.
O capítulo dois é dedicado à explicitação dos procedimentos
metodológicos adotados durante a investigação.
Para operacionalizar a pesquisa, fundamentada nos princípios da História
Oral, Souza recolheu entrevistas de professores de matemática atuantes nas
décadas de 1950 a 1970, ligados à cidade de Santos, cuja atuação teve
repercussão significativa junto à Secretaria da Educação do Estado de São Paulo.
Utilizando-se de um roteiro de entrevistas com perguntas contextualizadas,
embora com a possibilidade de inserir outros questionamentos a partir dos relatos
obtidos, foram entrevistados os professores Maria Lucia Martins Demar Perez,
Maria Luiza Carmo Neves da Silva, Sylvio Andraus, e Almerindo Marques Bastos.
No capítulo três, a autora apresentou, integralmente, as textualizações das
entrevistas realizadas, momento em que buscou “resgatar a memória de um
tempo” (SOUZA, 1998, p. 76).
A primeira textualização apresentada diz respeito ao depoimento dado pela
professora Maria Lúcia Martins Demar Perez.
Licenciada em Matemática pela Faculdade de Filosofia do Instituto Sedes
Sapientiae, Perez destacou alguns de seus professores e as disciplinas
ministradas naquele período: Abrahão de Moraes, em Análise Matemática;
Benedito Castrucci em Geometria Projetiva e Didática da Matemática; Fernando
Furquim de Almeida em Geometria Descritiva.
No início de sua carreira no magistério, a professora Maria Lúcia declarou
que precisava de tempo para estudar, uma vez que “matéria ministrada no
secundário não fora abordada na faculdade”. O professor, naquela época
129
formava-se sem nunca ter entrado em uma sala de aula e o programa do
Segundo Grau não fazia parte daquele visto na faculdade. A esse respeito, Maria
Lúcia conversou com os professores Abraão de Morais e Benedito Castrucci. De
Abrahão de Morais, recebeu a seguinte resposta: “... o importante era aprender a
pensar muito bem e, se tivéssemos uma estrutura mental muito bem feita,
conseguiríamos usá-la em situações diversificadas” (PERES, apud SOUZA, 1998,
p. 81-82).
Em 1960, com o início do MMM, a entrevistada teve oportunidade de
ministrar alguns cursos de MM. Para ela, os professores entendiam por MM
introduzir a Teoria dos Conjuntos, os conceitos de relação e função, como um
acréscimo aos conceitos já conhecidos e não como elementos unificadores da
matemática. Recordou que o professor Alésio João de Caroli, durante os cursos,
“mostrava-se contrário ao fato de se abrir um capítulo especial sobre a Teoria dos
Conjuntos. O importante era usar a linguagem da Teoria dos Conjuntos para
facilitar a assimilação dos conceitos matemáticos” (PERES, apud SOUZA, 1998,
p. 84).
A professora Maria Lúcia participou de um grupo designado pela CENP a
fim de estudar e fornecer subsídios para a implementação do Guia Curricular de
Matemática, sob orientação de Almerindo M. Bastos e Lydia C. Lamparelli, tendo
como assessor de conteúdo Alésio J. de Caroli.
A segunda entrevista textualizada foi a da professora Maria Luiza Carmo
Neves da Silva. Licenciada em Matemática pela Faculdade de Filosofia do
Instituto Sedes Sapientiae, em 1954, destacou, dentre os professores que
ministravam aulas nesse Instituto, os nomes de Fernando Furquim de Almeida,
Benedito Castrucci e Abrahão de Moraes.
A entrevistada teceu comentários sobre um curso de Teoria dos Grupos,
ministrado pelo professor L. H. Jacy Monteiro: “... foi o curso que ele veio ministrar
aos professores daqui de Santos, justamente com a finalidade de ter um grupo
que trabalhasse na Faculdade! Foi fabuloso para mim! Aí eu comecei a enxergar
mais coisas e a ter confiança em trabalhar na Faculdade” (NEVES DA SILVA,
apud SOUZA, 1998, p. 103).
130
A professora Maria Luiza teve participação efetiva para a criação de um
grupo de estudos interessado em reformular o ensino da Matemática, que fora
denominado de GEEM’. Esse grupo teve apoio da Secretaria da Educação, de
diretores de escolas, prefeituras da Baixada Santista, do professor Luiz Carranca,
chefe do Departamento Cultural do jornal “A Tribuna” e ainda, dos professores
Almerindo M. Bastos, Sylvio Andraus, Maria Helena Roxo, dentre outros.
A terceira textualização diz respeito à entrevista realizada com o professor
Sylvio Andraus. Ingressou, em 1949, na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras
da USP, formando-se em 1953.
Segundo Andraus, a equipe de professores do Curso de Matemática era
composta pelos seguintes professores Benedito Castrucci, Rômulo Pieroni,
Fernando Furquim de Almeida, Elza Gomide e André Wataglin Filho, Omar
Catunda, Abrahão de Moraes, Luiz Henrique Jacy Monteiro, Marcelo Damy de
Souza Santos, Edson Farah, Cândido Lima e Silva. O professor Sylvio Andraus
não nomeou os professores que lecionaram no quarto ano. Apenas fez referência
às matérias da área pedagógica, ministradas no último ano, que, segundo ele,
“não eram muito convincentes”, uma vez que não era disponibilizado estágio para
os licenciandos daquela época.
Os cursos e estudos sobre a MM realizados pelos professores da Baixada
Santista começaram a partir do curso realizado pelo GEEM, em 1964. O professor
Luiz Fernandes Carranca se encarregou da vinda do GEEM para fazer
conferências em Santos. Irineu Bicudo, Scipione, Jacy Monteiro, Castrucci e
Sangiorgi foram citados como conferencistas. Além disso, naquela época, foi
realizado um curso de pós-graduação em Santos, sobre Teoria dos Corpos
Comutativos, ministrado pelo professor Jacy Monteiro, nos mesmos moldes como
era oferecido na USP.
A última textualização registra a entrevista realizada com o professor
Almerindo Marques Bastos, formado em 1954, pela FFCLUSP.
Almerindo Bastos iniciou seu relato apontando os professores que mais o
influenciaram durante os anos de graduação. Omar Catunda, Edson Farah,
Abrahão de Morais e Mario Schenberg foram lembrados. Destacou, de modo
131
especial, o professor Jacy Monteiro, observando que “fez falta para as gerações
que vieram depois de nós. Ele tinha uma visão completamente distinta da dos
outros [professores]”, sem, no entanto, esclarecer sobre essa visão diferenciada
[grifo da autora] (BASTOS, apud SOUZA, 1998, p. 147).
Sobre a divisão entre bacharelado e licenciatura na graduação, o professor
Almerindo comentou que, para obtenção do título de bacharel, era necessário
cursar todas as disciplinas dos três primeiros anos, além de escolher, no quarto
ano, duas cadeiras entre todas as disciplinas de todos os cursos da faculdade.
Ainda no quarto ano, eram oferecidas as disciplinas pedagógicas, obrigatórias
para a obtenção do título de licenciado. As matérias pedagógicas oferecidas
eram: Didática Geral, ministrada pelo professor Onofre de Arruda Penteado;
Didática Especial da Matemática, pela professora Berenice Correa Gonçalves e
Psicologia Educacional, pelos professores Arrigo Leonardo Angelini e Noemi da
Silveira Rudolf.
Em 1955, Almerindo Bastos prestou concurso para o magistério público
estadual, tomando posse numa escola em Ibitinga. Nessa cidade, observou que
os professores de Matemática eram todos contratados. O ensino de Matemática
resumia-se em repetir “ipsis literis”, durante a aula, o livro de Osvaldo Sangiorgi.
Segundo Bastos, uma das mais importantes conseqüências do MMM foi a
mudança de enfoque do ensino da Matemática. O Movimento proporcionou uma
mudança de atitude do professor em relação ao aluno, passando a dar maior
importância à atividade do aluno, que anteriormente não era levada em
consideração (BASTOS, apud SOUZA, 1998, p. 167).
Em julho de 1961, Bastos fez um curso promovido pela CADES
46
em
Santos, quando o professor Sangiorgi ministrou Teoria dos Conjuntos e Lógica, o
professor Jacy Monteiro, um curso de Álgebra Moderna e o professor Ruas, um
curso de Prática de Ensino. Para o entrevistado, esse foi o primeiro passo para
46
A Campanha de Aperfeiçoamento e Difusão do Ensino Secundário – CADES, criada pelo governo federal
em 1955, tinha como atribuições a formação de professores, o incentivo à elaboração de material didático, a
assistência pedagógica e administrativa às escolas. Realizava cursos em períodos de férias, destinados a
professores que não tinham o diploma de curso superior, que dava direito a esses professores de realizar os
exames de suficiência para obtenção do registro permanente (BÚRIGO, 1989, p. 37).
132
dar início ao MMM em Santos. Em seguida, vieram os cursos promovidos pelo
jornal “A Tribuna”, por iniciativa do professor Carranca.
Sobre uma possível influência do grupo Bourbaki nos trabalhos
desenvolvidos pelos professores secundaristas, Bastos considerou que foi uma
influência indireta, ocorrida por meio dos professores que ministravam os cursos
de aperfeiçoamento, como por exemplo, o professor Jacy Monteiro. E constatou:
“que eu saiba, quem se interessava pela reforma do ensino secundário, quando
eu estudava na faculdade, era o Catunda, mas não sei por que ele não participou
muito desses movimentos. Mais tarde, na época do GEEM, foi Jacy. Estes foram
os dois que conheci” (BASTOS, apud SOUZA, 1998, p. 193).
Sobre os treinamentos realizados pelo GEEM, o professor Almerindo
Bastos relatou que eram feitos por estágios. O primeiro estágio era constituído por
noções de Teoria dos Conjuntos, Lógica Matemática e aplicações dessas noções
no ensino de matemática. No segundo estágio, era oferecido um curso de Álgebra
Moderna. Noções de Álgebra Linear eram proporcionadas no segundo e terceiro
estágios. Com base nesses cursos, formou-se em Santos uma espécie de sub-
grupo do GEEM, do qual Almerindo Bastos participou ativamente ministrando
cursos e palestras para professores do ensino secundário nesse período.
Além disso, participou, na qualidade de coordenador, da elaboração dos
Guias Curriculares de Matemática e do Projeto de Geometria Experimental
elaborado pelo PRENEM (Programa de Expansão e Melhoria do Ensino Médio)
em conjunto com o IMECC/UNICAMP, em 1974.
No quarto e último capítulo, Souza buscou assinalar o que mudou e o que
permaneceu nas práticas sociais ligadas à educação, por meio das textualizações
focalizadas na dissertação. Delas, a autora deteve-se nos seguintes itens:
formação acadêmica dos entrevistados; a prática docente; projetos e ações
desenvolvidos pelos depoentes e a legislação vigente.
Esse estudo revelou, por meio das textualizações, alguns aspectos
importantes sobre o cotidiano escolar, as práticas utilizadas pelo GEEM, a
participação dos matemáticos durante o Movimento, notadamente, a atuação do
professor Luiz Henrique Jacy Monteiro, cujo nome aparece como um dos seus
133
principais divulgadores. Os depoimentos do professor Sylvio Andraus e Almerindo
Marques Bastos revelam nomes e cursos ministrados pelos professores do Curso
de Matemática da FFCLUSP na década de 50, além de descreverem como era o
ambiente universitário daquela época.
Embora tais depoimentos tenham trazido à tona elementos de grande valia
para o estudo das relações entre matemáticos e educadores matemáticos durante
o MMM, destaco que esses não foram aspectos centrais da dissertação de
Souza.
5.4. VITTI, Catarina Maria. Movimento da Matemática Moderna: Memória,
Vaias e Aplausos. Tese de Doutorado em Educação, Universidade
Metodista de Piracicaba, 1998.
A tese teve como propósito apontar como foi a reação da comunidade de
professores, pesquisadores e educadores envolvidos direta ou indiretamente com
a Educação Matemática e as mudanças incorporadas no ensino, após a
constatação do declínio do MMM. Para justificar seu estudo, Vitti catalogou
trabalhos dedicados ao MMM, observando que, nos anos 80, apenas uma tese de
doutorado, o de Beatriz D’Ambrosio (1987) e uma dissertação de mestrado, a de
Elizabete Z. Búrigo (1989) haviam se debruçado sobre o tema. Em sua busca,
destacou ainda trabalhos de Célia Maria Carolino Pires e Maria Angela Miorim, os
quais trataram indiretamente desse movimento.
No primeiro capítulo, a autora relatou como a matemática se desenvolveu
no século XIX, apresentando uma biografia dos principais matemáticos cujos
trabalhos acabariam por exercer influências no ensino: Gauss, Riemann,
Poincaré, Klein e Hilbert. Pretendeu, ao narrar a vida desses personagens,
mostrar como se envolveram com as primeiras tentativas de reforma do ensino de
matemática, as quais culminaram com o Primeiro Movimento Modernizador do
Ensino da Matemática.
No segundo capítulo, a autora dedicou-se ao estudo da origem e objetivos
do MMM. Fez breve comentário sobre o surgimento do grupo Bourbaki e a
134
realização de duas conferências: a da OECE em Royaumont, em 1959, na França
e a de Dubrovnik, em 1960, na Iugoslávia.
A conferência de Royaumont contou com a presença de Jean Dieudonné.
Em seu pronunciamento, Dieudonné almejou demonstrar o quanto o ensino
secundário era atrasado e antiquado em relação ao superior, tornando-se cada
vez maior o abismo existente entre eles, apesar dos esforços para a incorporação
de tópicos como elementos de Cálculo Diferencial Integral, Álgebra Vetorial e
Geometria Analítica no ensino secundário “sempre relegados a um segundo
plano” (DIEUDONNÉ, apud VITTI, 1998, p. 57).
Vitti também destacou alguns objetivos e propostas apresentadas pelos
países participantes da Conferência de Lima, Peru, ocorrido em 1966,
referenciando-se em Howard Fehr (1969). A autora descreveu os principais
acontecimentos relacionados com o MMM em 29 países participantes da
conferência, como também os procedimentos necessários para alcançar os
objetivos propostos. Verifica-se que nos trabalhos anteriores não aparece
semelhante discussão.
Quanto à participação do Brasil na Conferência de Lima, dentre outras
observações, a autora colocou em evidência a manifestação de Sangiorgi no
sentido de atribuir como principal elemento para o progresso obtido em relação ao
ensino da MM, a participação dos matemáticos no movimento. Vitti reforçou essa
constatação transcrevendo os dizeres de Sangiorgi: “figuram matemáticos das
universidades que propiciam aos futuros professores secundários uma boa
vivência com a matemática atual” (SANGIORGI, apud VITTI, 1998, p. 89).
O “fracasso” do MMM é tratado no capítulo três. Norteando-se
especialmente na obra de Morris Kline “O fracasso da matemática moderna”, Vitti
analisou os principais motivos que contribuíram para o insucesso do Movimento.
Nesse sentido, sublinhou a constatação de Kline quanto à forma como foram
desenvolvidos muitos assuntos em Matemática, ou seja, a partir da imaginação e
criatividade dos pesquisadores e estudiosos em matemática, sem que
mantivessem vínculos com as necessidades reais dos estudantes.
135
O capítulo quatro, intitulado “O sucesso do Movimento da Matemática
Moderna” trata das questões as quais foram incorporadas ao ensino, e que, para
Vitti, são fatores positivos decorrentes do MMM. Dentre eles, destaca-se a
organização da comunidade de pesquisadores em Educação Matemática, a
criação de cursos de pós-graduação em Educação Matemática e o
desenvolvimento de novas tendências no ensino da Matemática, incorporando
tais como História da Matemática, Resolução de Problemas, Etnomatemática e
Modelagem Matemática.
Em conclusão, a autora recapitulou os principais pontos abordados ao
longo do trabalho, reforçando a constatação de elementos positivos importantes
advindos do Movimento, indicando novas propostas e métodos de ensino, em que
a autora propõe sejam voltados efetivamente para a escola, não indo muito além
dos muros escolares, de modo a não se contaminarem com “elementos
estranhos” – sem, no entanto especificá-los – e ainda, considerando a realidade
do país nos quais se pretenda ver instituídos (VITTI, 1998, p. 177).
De imediato, a leitura da tese de Vitti permitiu-nos verificar uma diferença
entre esse estudo e as pesquisas elaboradas por D’Ambrosio e Búrigo, referentes
à descrição realizada pela autora, ainda que de forma sucinta, de como
transcorreu o movimento em diversos países da Europa e América. Em sua
análise, a autora abriu espaço para comentários e citações proferidos por
matemáticos estrangeiros quando expressaram suas idéias relativas ao ensino da
matemática, possibilitando formular alguns questionamentos a partir desses
comentários e citações.
Ao mencionar o relatório elaborado pela Argentina, durante a Conferência
de Lima, Vitti apresentou breve citação de Helmuth Renato Völker, sobre como
deveria ser o professor do futuro: um professor moderno, aquele que, tendo
acesso à matemática moderna, estando adequadamente preparado para ensiná-
la, pensando, portanto, de forma moderna, ou seja estruturada, “poderia continuar
a desenvolver-se por si mesmo” (VOLKER, apud VITTI, 1998, p. 74). Na análise
da obra de Morris Kline, vemos combatida a idéia de Volker e outros educadores,
pela qual a nova matemática seria auto-suficiente ou auto-criadora. Tais
preocupações nos revelam indícios de uma matemática idealizada para atingir o
136
mais alto grau de abstração e pureza, tornando-se “a ciência das ciências”, a qual
se auto-constrói, independente da realidade. A superioridade do currículo da MM
transcenderia não só os currículos tradicionais de matemática como também se
tornaria imprescindível, perpassando todos os outros de quaisquer ciências.
Vitti comentou que a matemática do século XX era caracterizada por sua
generalidade, seu maior grau de abstração e rigor lógico. Por esse motivo, a
matemática identificou-se com a dedução e a estrutura axiomática, garantindo-lhe
em certa medida um caráter de independência perante as outras ciências. Desse
modo, talvez por ser assim caracterizada, os matemáticos atribuíam à matemática
a linguagem comum a todas as ciências. Vitti apresentou uma fala de Stone, a
qual afirma que a matemática é totalmente independente do mundo físico, razão
pela qual estaria dissociada de suas aplicações. Tal posição sugere uma relação
de subordinação da matemática aplicada à matemática pura. Vitti comentou
ainda, que havia uma crença na matemática como sustentáculo para uma cultura
moderna, voltada para a ciência e tecnologia. Pensamos, todavia, existir aí uma
contradição entre aquilo que se acreditava, ou seja, uma cultura moderna voltada
para a ciência e tecnologia, que, a nosso ver, necessitaria de uma matemática
voltada para aplicações, e o desejo de uma matemática abstrata, totalmente
separada do mundo físico, como pleiteava Stone.
Nessa tese, destaque-se ainda, que em nota de rodapé, a autora afirma
não ter tido a pretensão de desenvolver um trabalho sobre a participação dos
matemáticos no movimento deixando esse tema em aberto para outras
pesquisas.
5.5. SOUSA, Maria do Carmo de. A percepção de professores atuantes no
ensino de matemática nas escolas estaduais da delegacia de ensino de
ITU, do movimento matemática moderna e de sua influência no currículo
atual. Dissertação de Mestrado. UNICAMP, Faculdade de Educação,
Campinas, 1999.
Subdividido em cinco capítulos, o trabalho realizado por Sousa pretendeu
investigar a relação existente entre professores atuantes junto à rede pública de
137
escolas pertencentes à Delegacia de Ensino de Itu e o Movimento da Matemática
Moderna.
Para realizá-lo, a autora utilizou-se de entrevistas com oito professores da
região as quais foram gravadas e textualizadas. Procurou destacar a formação
inicial e acadêmica desses professores, focalizando o modo como a vida
estudantil articulava-se com a trajetória profissional.
Assim, no primeiro capítulo, denominado “Justificativa e construção do
problema”, a autora formulou sua questão de pesquisa, ou seja, “qual a
percepção que os professores atuantes têm do Movimento Matemática Moderna e
de sua influência no currículo atual?”, tomando por base o movimento
especificamente curricular e a relação deste com os professores que tiveram sua
trajetória profissional desenvolvida no âmbito das escolas estaduais (1999, p. 17).
Ainda nesse capítulo, autora defendeu que a reforma do MMM foi feita sem
a participação efetiva do professor, tornando-o um mero aplicador do que fora
elaborado pelos especialistas. Bastaria ao professor ser um “técnico do ensino”,
reproduzindo o que está no livro didático ou dos cursos de curta duração, para
reproduzir fielmente o pensamento dos especialistas. Durante a implantação
desse currículo, foram oferecidos estudos relâmpagos dos conceitos que
deveriam ser ensinados. Acreditava-se que, para assegurar a reforma curricular,
bastava uma pequena adaptação do professor, consistindo na simples troca do
livro tradicional pelo novo didático indicado. Desse modo, segundo Sousa, os
professores viram no livro didático o único recurso para entender o que deveriam
aplicar em sala de aula, fazendo sua própria interpretação das idéias presentes
nos textos.
A pesquisadora ressaltou ainda que, a maioria dos livros didáticos de
Matemática que chegavam às mãos dos professores da rede estadual
apresentava concepções fortemente fincadas nas estruturas de ordem e
estruturas algébricas e davam muito mais importância à linguagem matemática
que à construção da elaboração do pensamento matemático pelos alunos.
No segundo capítulo, “Da matemática moderna para o movimento
matemática moderna”, a pesquisadora procurou fazer um estudo mais
138
aprofundado do que representou a Matemática Moderna no século XIX. Mais
especificamente, propôs-se a estudar de que modo a Teoria dos Conjuntos
chegou até os currículos escolares, entendendo que, com essa trajetória, poderia
esclarecer o que os professores pensam hoje em dia sobre o MMM. Como
justificativa, fundamentou-se, dentre outros autores, nas idéias defendidas por
Morris Kline (1976), ao constatar que o novo currículo da Matemática escolar, dos
anos 60-70, trazia englobadas “as antigas matérias: aritmética, álgebra, geometria
euclidiana, trigonometria e os elementos da geometria analítica, denominadas
pelos modernistas de matemática pré-1700” introduzindo como novidade somente
a Teoria dos Conjuntos. Essa teoria dava “à nova matemática mais o ar de ser
sofisticada e adiantada do que por ser útil” (KLINE, apud SOUSA,1999, p. 24).
Em seu trabalho, a autora enfatizou que, em muitos países, dentre eles o
Brasil, procurou-se ensinar a Matemática Moderna a seus estudantes, levando em
conta, além de tópicos da Teoria dos Conjuntos, o programa de Bourbaki: formal,
abstrato e rigoroso, enfatizando a precisão da definição e cuidadoso uso da
linguagem.
Destacou, igualmente, os resultados de pesquisas de Piaget que, na
década de 60, deram o respaldo necessário à Matemática Moderna, “até então
elaborada por matemáticos e não por professores de Matemática”, passando a
refletir no ensino (SOUSA, 1999, p. 33).
Além de se valer do movimento estrutural da Matemática liderado pelo
Grupo Bourbaki e nos resultados obtidos por Piaget na Psicologia, Sousa
considerou fatores políticos envolvendo discussões sobre ciência e tecnologia,
especialmente entre Estados Unidos e União Soviética, os quais propiciaram a
reforma da Matemática Moderna nos Estados Unidos, impulsionando a
comunidade americana a realizar mudanças no currículo da Matemática, de modo
a superar, em curto prazo, os conhecimentos científicos dos russos.
No capítulo três, intitulado “Percepções de professores sobre o Movimento
Matemática Moderna dos anos 60-70” a autora pretendeu retratar os
pensamentos que emergiram dos depoimentos dos professores entrevistados
durante sua pesquisa.
139
As características do ensino apontadas pelos depoentes indicaram que,
nem o MMM, nem as propostas então recentemente implantadas, conseguiram
romper com a metodologia e as estratégias de ensino tradicional das décadas
anteriores. Os professores apegaram-se ao tecnicismo para dar conta de ensinar
um formalismo que era exigido em todas as escolas que aderiram ao novo
currículo. A relação aluno-professor não se modificou; o conteúdo continuou
sendo transmitido pelo professor, que via no livro didático a única forma de
ensinar Matemática. Independentemente das tendências pedagógicas que
estavam em vigor no MMM, o ensino esteve pautado no formalismo e
memorização. O ensino era livresco e, aos estudantes, cabia apenas memorizar
os conteúdos e devolvê-los quando solicitados.
Portanto, concluiu a autora, a inserção de novos conteúdos, como foi o
caso da Teoria dos Conjuntos nas décadas de 60-70, não garantiu mudanças na
prática do professor de Matemática, mostrando que, somente a proposição de
renovação curricular não tem caráter desencadeador de mudanças na prática dos
professores.
O capítulo quatro se intitula “A participação de professores na elaboração e
implantação do currículo brasileiro na década de 70”.
Nesse capítulo, a autora constatou que, apenas parte do professorado
paulista participou ativamente do processo de implantação curricular promovidas
pelo GEEM e pela Secretaria da Educação, ficando a cargo dos professores
universitários a elaboração do novo currículo. Além disso, de modo geral, os
cursos de atualização de professores não possibilitaram o contato desses
profissionais com aspectos conceituais que motivaram a reorganização interna da
Matemática. Pareceu-lhe, também, que um exame atento sobre as dificuldades
enfrentadas por professores e alunos na assimilação dos conceitos do novo
currículo não se fez presente nesses cursos.
Os mentores do movimento eram, em sua maioria, matemáticos; faziam
parte, portanto, de uma classe de profissionais privilegiada quanto ao
entendimento dessa nova Matemática.
140
Entretanto, os professores não tinham formação acadêmica para ensinar
Matemática Moderna, tendo que aprender e interpretar o conteúdo proposto de
forma diferenciada do que ocorrera com os mentores do movimento. Desse modo,
o conhecimento sobre a Teoria dos Conjuntos ficou reduzido, por parte dos
professores, à escrita de uma grande quantidade de símbolos matemáticos.
Perdeu-se a essência filosófica que fundamenta esse conceito, passando o
professor a reproduzir apenas o pensamento matemático sem muita clareza, na
maioria das vezes, sem vida: “O conceito que se originou do pensar no infinito, e
que proporcionou uma nova visão da Matemática, chegou ao ensino com o único
objetivo: substituir idéias por estruturas e pela lógica da axiomatização” (SOUSA,
1999, p. 140).
Provavelmente, observou a autora, esses professores conheceram apenas
fragmentos da Teoria dos Conjuntos, cujos conteúdos foram incorporados no
currículo de maneira não compreensível em sua forma conceitual e foram
ensinados em seu último estágio de abstração, em conformidade com o programa
elaborado por Bourbaki.
Sousa tomou como exemplo a participação do matemático Omar Catunda
no IV Congresso de Ensino da Matemática, realizado em Belém, em 1962. Para
Catunda, fazia-se necessário uma simplificação do entendimento sobre os
conceitos fundamentais da Matemática, atendo-se especialmente aos conjuntos e
estruturas, de modo a garantir a compreensão dos professores do ensino
secundário. Em sua análise, Sousa verificou que Catunda seguiu as diretrizes
propostas pelo novo currículo, dedicando-se especialmente às estruturas
algébricas, apresentando-as por meio de uma listagem de conteúdos.
Esse tratamento levou Sousa a afirmar que a maioria dos cursos de
treinamento de professores em exercício não possibilitou o contato desses
profissionais com os aspectos conceituais que motivaram a reorganização interna
da Matemática, assim como não possibilitaram, na maioria dos países latinos,
maior reflexão, pelo professorado, sobre os reais motivos políticos da
reformulação curricular dos anos 60.
141
O quinto e último capítulo, denominado “Educando o olhar” a pesquisadora
retomou a questão central do estudo e apresentou uma síntese dos principais
resultados obtidos.
Relativamente ao MMM no Brasil, a autora considerou que a popularização
da educação impeliu as escolas a contratar um grande número de estudantes que
cursavam os primeiros anos de graduação para lecionarem no ensino
fundamental e médio. O regime político autoritário dos anos 60-70 proporcionou a
massificação do ensino e o não questionamento da maioria dos professores sobre
a elaboração e implantação do novo currículo. Nesse período, a forma de ensinar
matemática reforçava o formalismo que, aliado ao tecnicismo, atingiu
profundamente a dimensão escolar. Os professores viram no livro didático o
único recurso para entender o que deveriam aplicar em sala de aula, fazendo sua
própria interpretação das idéias presentes nos textos.
Sousa finalizou seu trabalho alegando que, para os professores
entrevistados, o ensino atual pouco se diferencia daquele oferecido nos anos 60-
70, estando a Matemática Moderna ainda presente no currículo da atualidade.
A leitura da dissertação de Sousa permitiu, desde logo, verificar que a
autora direcionou seu trabalho para a análise do MMM a partir das alterações
sofridas pelo currículo, particularmente, da inserção da Teoria dos Conjuntos,
respaldando-se em entrevistas realizadas com professores da rede pública da
região de Itu.
O estudo alertou para a ênfase dada por Omar Catunda às estruturas
algébricas, em seu pronunciamento durante o IV Congresso de Ensino da
Matemática. Além disso, o matemático utilizou-se, como principal método para
defender suas idéias, de uma lista de conteúdos matemáticos a serem
trabalhados no ensino secundário.
Embora a autora traga à tona esses aspectos, não se deteve nos motivos
que levaram Catunda a manifestar-se daquela forma. Sousa limitou-se a discutir
como as colocações desse matemático contribuíram para o formalismo que
predominou no ensino e para a ausência de domínio de conceitos fundamentais
da Matemática.
142
Sousa enfatizou, ainda, a participação de matemáticos na elaboração do
novo currículo, mas, com exceção de Omar Catunda, não fez referência sobre
quais matemáticos brasileiros tiveram atuação destacada na reforma curricular da
Matemática Moderna.
5.6. STEPHAN, Ana Maria. Reflexão histórica sobre o Movimento da
Matemática Moderna em Juiz de Fora. Dissertação de Mestrado.
Universidade Federal de Juiz de Fora, 2000.
O objetivo da pesquisa de Stephan foi compreender como e quando a MM
passa a ser referencial de transformação do ensino de matemática e como e
quando perde esse atributo modernizador. O estudo procurou ainda desvendar a
visão de educação enquanto prática sob regime de opressão militar. A
metodologia empregada no trabalho baseou-se na análise do discurso, a partir de
nove entrevistas, divididas em dois grupos, com professores que lecionaram a
MM, a maioria deles, na cidade de Juiz de Fora, Minas Gerais. O primeiro grupo
foi formado por professores da rede pública estadual durante o MMM; o segundo
grupo foi constituído por professores de matemática que participaram como
líderes locais do Movimento. Sua pesquisa priorizou a década de 1970, ocasião
em que começou a dispersão do Movimento, procurando saber, a partir das
justificativas dadas pelos professores entrevistados, a razão do esvaziamento do
movimento. Privilegiou como referenciais teóricos considerações de Jean Paul
Sartre, Carlo Ginsburg, Michel de Certeau, dentre outros.
No primeiro capítulo, preocupando-se em conhecer quem eram os
professores que exerciam o magistério e de que maneira conduziam esse
processo quando da inserção da MM nas salas de aula de Juiz de Fora, a autora
realizou entrevistas com três professoras da rede pública estadual.
A terceira professora é lembrada como integrante da cúpula do MMM em
Juiz de Fora, participando ativamente de cursos e seminários nas escolas da
região. Para essa professora, a resistência aos pressupostos do MMM advinha da
desinformação dos professores. Mesmo quando os professores aprendizes
compreendiam o que vinha a ser o ensino da MM, esbarravam em outra
143
dificuldade, qual seja, a modificação da prática e da rotina escolar. Para tanto,
constatou a entrevistada, seria necessário que as professoras tivessem um
conteúdo mais aprofundado e vontade de mudar. Para Stephan, seu discurso
apresentava semelhanças com o discurso dos professores entrevistados no
segundo grupo, uma vez que, “mesmo sendo mulher ela trata as demais
professoras como ‘elas’, não como ‘nós’. O termo aparece com mais regularidade
na sua entrevista é ‘eficiente’ e seus derivados” [grifos da autora] (STEPHAN,
2000, p. 50).
Para Stephan, as professoras de matemática são freqüentemente tratadas
como totalidade, sendo colocadas como responsáveis pelas mazelas da
educação, desconsiderando suas histórias de vida, visões de educação e
formação intelectual.
No segundo capítulo, a autora analisou as falas de seis professores de
matemática, os quais se posicionaram como líderes e anunciadores locais dos
benefícios que adviriam com a introdução da MM no Ensino Fundamental e
Médio. O grupo entrevistado foi formado por professores de vários níveis
escolares, inclusive universitários, conhecedores com certa profundidade os
meandros da prática e da burocracia do ensino.
Para esses entrevistados, segundo Stephan, a MM significava a
possibilidade de se utilizar tecnologia avançada, solução para os problemas
decorrentes do subdesenvolvimento. No entanto, “a vontade de reformar nem
sempre é compatível com o poder de reformar”. Apesar dos incentivos, “não
existiram meios de modificar a realidade escolar descompassada em relação ao
que se projetava para ela” (2000, p. 60).
Ao tentar reavaliar o MMM a autora sentiu dificuldade em posicionar o
sentido das alterações ocorridas sob o regime militar e seus aparelhos autoritários
na questão educacional. Os sujeitos entrevistados não assumiram o lado político
do movimento. No entanto, este é destacado justamente pelo fato de não terem
sido feitas referências à vinculação política com os militares. É justamente o
silêncio que o denuncia, constatou a pesquisadora.
144
O autoritarismo externo imposto ao MMM, embora não assinalado pelos
entrevistados, foi uma das causas do insucesso do Movimento, posto que os
entrevistados citam apenas fatores internos, tais como o despreparo dos
professores que não haviam feito cursos, o desinteresse das universidades em
prepará-los, e a falta de recursos para a implantação da reforma, os quais
conduziram à desaceleração prematura do Movimento.
Alguns dos entrevistados admitiram o caráter seletivo do ensino de
matemática. No entanto, para esses professores, adeptos ao MMM, o problema
era resultante da inadequação de alunos e professores e não do método e do
currículo proposto pelo Movimento.
O depoimento desse grupo de entrevistados permitiu à autora concluir que
a opção pela MM deveu-se ao fato de os professores acreditarem que seu ensino
seria capaz de impulsionar o progresso econômico. A inserção de pressupostos
econômicos sustentados pela educação chocava-se com a cultura escolar, tanto
no aspecto organizacional quanto na formação docente e prática do ensino,
resultando em um entrave ao Movimento.
No terceiro capítulo, Stephan procurou estabelecer uma interlocução entre
os grupos entrevistados, as condições históricas e a teorização. Para tanto,
apoiou-se em autores da História da Educação e naqueles que se dedicaram ao
estudo do MMM. Nesse sentido, fundamentou-se na Análise do Discurso, de
modo a ampliar o significado das falas dos professores entrevistados.
Da linguagem das professoras, captada no primeiro grupo de entrevistas, a
autora verificou que a palavra central que emergiu das entrevistas é a palavra
“aluno”. Em contrapartida, o termo mais destacado na fala dos professores líderes
do MMM em Juiz de Fora, participantes do segundo grupo de entrevistas, foi
“matemática”. Assim, por meio de diferentes regularidades, pode perceber a
construção de diferentes visões de educação: de um lado, a formação do aluno
prepondera; de outro, destaca-se o conteúdo, a instrução, enquanto função
educacional. No entanto, embora estabeleçam campos simbólicos conflitantes,
essas visões não são excludentes, concluiu a autora. Porquanto a fala das
145
professoras ligou-se ao cotidiano escolar, Stephan tomou as entrevistadas do
primeiro grupo como autoras e intérpretes do cotidiano escolar.
No quarto capítulo a autora procurou desvelar a teia de significações que
permeavam as entrevistas dos grupos de professores abordados no estudo. A
autora inferiu que os pontos de vista em relação ao ensino de matemática não se
prendiam somente às questões pedagógicas, mas também a uma hierarquia que
existia dentro da própria profissão. Os professores disseminadores das propostas
do Movimento mostraram-se entusiasmados com a MM. Entretanto, os
professores que se limitavam a dar aulas nas escolas públicas não apresentavam
o mesmo nível de entusiasmo, fazendo com que os primeiros os julgassem
despreparados para ensinar os novos conteúdos. A MM mostrou-se, ainda, como
facilitadora para o ensino de matemática. Os professores “entusiasmados” com
esse conteúdo acreditavam no poder que a MM tinha para solucionar não só
problemas relativos à aprendizagem no âmbito escolar, mas de impulsionar as
escolhas racionais nas demais ciências, como também na vida em sociedade.
Stephan, ao analisar a fala dos professores líderes do Movimento em Juiz
de Fora, reconheceu a existência de uma rede de preconceitos, na medida em
que esses professores imputaram os problemas relativos ao Movimento à má
qualidade na formação dos professores da rede pública, denunciando, segundo a
pesquisadora, formas preconceituosas nas relações hierárquicas entre os níveis
de apreensão da MM.
Em suas considerações finais, a partir da análise dos depoimentos, a
autora concebeu o MMM antes como uma experiência interrompida do que como
um fracasso em toda sua extensão. Para Stephan, o Movimento conseguiu
realizar mudanças consideráveis no ensino e essas características, como a
facilidade do ensino, a rapidez do aprendizado e a possibilidade da MM ser
aplicada em várias abordagens pedagógicas são, por exemplo, colocadas como
indícios da aceitação da MM em âmbito escolar.
De todos os trabalhos realizados, o estudo de Stephan traz como elemento
diferenciador a trajetória acadêmica da pesquisadora, cuja formação filia-se à
História da Educação, diferentemente dos demais autores, todos pesquisadores
146
da área da Educação Matemática. Essa distinção imprime ao trabalho da autora
uma forma de escrita (própria dos historiadores) voltada para o jargão corrente na
História, mantendo com os teóricos historiadores e antropólogos uma interlocução
mais profunda e espontânea, devido à sua natural facilidade em transitar pela
historiografia.
Em seus comentários, Stephan chamou a atenção para a lacuna deixada
por Búrigo (1989), qual seja, a ausência de análise das ações dos professores de
escolas públicas. Stephan buscou preencher tal lacuna, na medida em que seu
trabalho incorporou esses sujeitos históricos. Entretanto, convém destacar que,
ambos os trabalhos não priorizaram a participação e a contribuição dos
matemáticos brasileiros como enfoque principal em seus estudos.
5.7. SOARES, Flávia dos Santos. Movimento da Matemática Moderna no
Brasil: Avanço ou Retrocesso? Dissertação Mestrado em Matemática.
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, 2001.
O trabalho buscou assinalar com mais profundidade alguns tópicos já
referidos em teses e dissertações as quais tratam especificamente sobre o MMM,
tais como as atividades do GEEM, como também relatar novos aspectos
relacionados ao movimento, apresentando, de forma detalhada, experiências
realizadas com a Matemática Moderna em três escolas situadas no Estado do Rio
de Janeiro, durante a década de 70.
Para a consecução do estudo, utilizou como fontes, além das teses e
dissertações anteriores à pesquisa, entrevistas com educadores matemáticos
que, de alguma forma, se envolveram com o MMM no Estado do Rio de Janeiro;
artigos de revistas e jornais brasileiros publicados nas décadas de 60 e 70; artigos
de periódicos brasileiros das áreas de Matemática e Educação; artigos de
periódicos estrangeiros da área de Matemática; obras sobre o MMM e temas
correlatos; anais de congressos, anuários, documentos oficiais publicados por
organismos internacionais como a UNESCO e a OEA.
Após o capítulo introdutório, a autora apresentou um breve panorama
político, econômico e educacional do Brasil dos anos 50, 60 e início dos anos 70,
147
abordando, de modo geral, as Leis de Diretrizes e Bases da Educação de 1961 e
1971, a Reforma Universitária de 1968 e algumas de suas conseqüências para o
ensino secundário. Procurou, desse modo, mostrar a forte influência de tais
medidas na elaboração das propostas curriculares lançadas na década de 70.
No terceiro capítulo, Soares deteve-se nas origens do MMM. Comenta
sobre iniciativas de reforma internacionais, a partir da criação do IMUK ou CIEM,
quando se buscava conciliar o ensino das escolas secundárias com o
desenvolvimento científico e tecnológico da época. Apresenta objetivos e
conclusões da Conferência de Royaumont (1959). Dentre as principais
conclusões da conferência, pronunciadas por Howard Fehr, destaca-se aquela
citada no item (i): “é preciso contar com um grupo de peritos composto de
pessoas de distintos países ao que se recomenda a elaboração de programas
detalhados do ensino de matemática para as escolas secundárias” (SOARES,
2001, p. 29). Soares ainda teceu comentários sobre as iniciativas de mudanças
propostas pelos Estados Unidos, Inglaterra, Portugal, Hungria, Holanda, França,
Canadá, Austrália, América do Sul e países árabes.
Para a América do Sul, Soares abordou especialmente a Primeira
Conferência Interamericana sobre Educação Matemática, realizada em Bogotá,
em 1961. Sobre o Brasil, citou, de passagem, a participação de Omar Catunda e
Alfredo Pereira Gomes, mencionando a tese defendida por Catunda, intitulada “A
preparação de professores de matemática no Brasil”. Soares apenas fez menção
aos nomes de Catunda e Alfredo Pereira Gomes, sem apresentar maiores
comentários sobre a participação desses matemáticos no encontro.
Os capítulos quatro e cinco foram dedicados a um estudo aprofundado
sobre o MMM. Nele, Soares elaborou uma síntese sobre os congressos
brasileiros sobre o ensino de matemática (1955 a 1966). Citou o programa de
Matemática aprovado no 1º Congresso de Ensino da Matemática, comentando
sobre as tendências modernas defendidas pelo matemático Felix Klein e pelo
professor Euclides Roxo.
Ao comentar, no capítulo cinco, sobre a Primeira Conferência
Interamericana de Educação Matemática, a autora mencionou uma carta de
148
Marshall Stone, então presidente do comitê, para o professor Alfredo Pereira
Gomes. Esta carta está inserida no artigo “Sobre a reforma do ensino de
matemática no Brasil” de autoria de Stone, publicada pelo Boletim da Sociedade
Paranaense de Matemática, em 1962. Nessa carta, Stone recomenda o
estabelecimento antecipado de um currículo moderno de Matemática, o qual
deveria ser elaborado por professores interessados, tais como Omar Catunda,
Osvaldo Sangiorgi e Martha Dantas (SOARES, 2001, p. 82-83).
Ainda nesse capítulo, Soares narrou as atividades com a Matemática
Moderna realizadas no Colégio São Bento, no Centro Educacional de Niterói e no
Colégio Estadual André Mourois. A implantação da MM nessas escolas alcançou
resultados positivos, embora tenha sido uma experiência de alcance restrito. O
projeto no Colégio Estadual André Mourois continuou por vários anos, graças ao
sucesso alcançado em 1970, quando a escola obteve o menor índice de
reprovação em matemática.
Sobre o Colégio Pedro II, Soares relatou que a instituição resistiu às
propostas inovadoras, apenas começando a implantá-las a partir de 1970.
Segundo depoimento de Vera Rodrigues, Diretora do CPII, a opinião do professor
Haroldo Lisboa da Cunha, catedrático de matemática e chefe do Departamento de
Matemática do Colégio, contribuiu fortemente para essa oposição à introdução da
MM no colégio. Este acreditava que o movimento era um “modismo” e que os
conteúdos apresentados serviam para serem estudados no ensino superior.
No sexto capítulo Soares dedicou-se à análise do denominado “fracasso”
da Matemática Moderna. Como os demais trabalhos já apresentados, ateve-se
principalmente na obra de Morris Kline. Além disso, acrescentou comentários do
professor Manfredo Perdigão do Carmo e Elon Lages Lima, datados de 1973.
Segundo Manfredo P. Carmo, as idéias modernistas colocadas em “mãos
inexperientes” resultaram no caos em que se tornou a matemática do ensino
secundário. Ainda assim, não defendeu a volta ao ensino tradicional. Já o
professor Lima, observou que o exagerado desligamento da realidade e o
excesso no uso da Teoria dos Conjuntos contribuíram para o estado crítico em
que se encontrava o ensino brasileiro de matemática [grifo da autora] (SOARES,
2001, p. 117-118).
149
Concluindo, Soares verificou que “a implantação da Matemática Moderna
como parte do currículo escolar não se mostrou eficaz no combate aos problemas
que o ensino tradicional já apresentava”. As propostas realmente inovadoras,
desenvolvidas pelos grupos de estudos da época não chegaram às salas de aula
e não foram incorporadas aos livros didáticos mais conhecidos. No entanto, “o
Movimento fez com que os professores começassem a refletir mais sobre sua
prática docente e sobre os verdadeiros propósitos do ensino da Matemática”
(SOARES, 2001, p. 142-144).
De todas as teses e dissertações analisadas, o estudo realizado por
Soares é o que apresentou experiências realizadas no Estado do Rio de Janeiro
com a Matemática Moderna, as quais foram iniciativas bem sucedidas, embora
tivessem sofrido solução de continuidade, não sendo assimiladas pelo
Movimento. Nota-se, além disso, que em seu estudo, a pesquisadora procurou
analisar o MMM, destacando em subcapítulos, o papel dos Fundamentos da
Matemática Moderna, da Psicologia, do livro didático, da Álgebra e da Geometria.
Como os demais trabalhos já analisados, o estudo de Soares não
apresenta uma análise específica sobre o papel representado pelos matemáticos,
de como a comunidade matemática se pronunciou durante o Movimento.
5.8. BARALDI, Ivete Maria. Retraços da Educação Matemática na Região de
Bauru (SP): uma história em construção. Tese de Doutorado em
Educação Matemática. UNESP, Rio Claro, 2003.
Esse trabalho teve como principal objetivo responder ao seguinte
questionamento: “Como evidenciou-se, delineou-se, caracterizou-se a formação
do professor de Matemática, nas décadas de 1960 e 1970, em seus variados
aspectos, na região de Bauru?”.
Baraldi apresentou seu estudo em três volumes. O primeiro, “Vozes de
Professores de Matemática Mosaico de Vidas” traz depoimentos de professores
de Matemática da região de Bauru. A seguir, passamos a descrever alguns deles.
150
O primeiro entrevistado foi o professor João Linneu do Amaral Prado.
Durante sua formação, Amaral Prado teve contato direto com professores de
renome na área de Matemática. Fez curso preparatório de matemática no Grêmio
Estudantil da Faculdade de Filosofia da USP, quando eram admitidos alunos com
apenas o ginásio, ou seja, sem o pré-politécnico (correspondente hoje em dia ao
Ensino Médio). Nos anos de 1941 a 1943, já na FFCLUSP, cursou as seguintes
disciplinas ministradas pelos respectivos professores: Análise 1 – Omar Catunda,
Análise 2 – Cândido Lima da Silva Dias, Geometria Projetiva – Giacomo
Albanese, Teoria dos Números – Fernando Furquim de Almeida, Física – Marcelo
Dami de Souza Santos, Cálculo Vetorial e Geometria Analítica – Benedito
Castrucci. Segundo Prado, os professores Omar Catunda e Giacomo Albanese
tinham como assistentes os professores Benedito Castrucci e Edson Farah,
respectivamente.
Amaral Prado relembrou que naquela época não se falava de Álgebra
moderna. Nesse período, a Faculdade oferecia como atividade semanal, reuniões
denominadas “Crítica dos Princípios”, ocasião em que eram debatidos temas
previamente escolhidos, sob a orientação de Giacomo Albanese. Nessa atividade
participavam todos os professores e os alunos. Por intermédio dessas reuniões,
ao discutirem as idéias de Hilbert, o entrevistado passou a se interessar por
Geometria. Em 1944, deixou de freqüentar a faculdade, embora continuando a
lecionar em alguns ginásios de São Caetano e de São Paulo.
Em sua narrativa, fez questão de sublinhar que, Giacomo Albanese
recomendava aos seus alunos para “não perderem tempo com licenciatura”
(PRADO, apud BARALDI, 2003, p.18). Sobre o concurso ao Magistério,
esclareceu:
Nesse concurso, além de uma prova escrita, problemas e teoria,
tive duas exposições orais: uma aula, que era para a avaliação
pedagógica e uma exposição, que era para a avaliação de
conhecimento de um tema sorteado vinte quatro horas antes. [...]
A banca era constituída pelos professores: Benedito Castrucci,
Omar Catunda e Fernando Furquim de Almeida. Fiz a minha
exposição somente para a banca. Os membros da banca
examinadora não eram licenciados em Matemática e, portanto,
não conheciam nada sobre Didática e Pedagogia. A segunda
151
exposição oral consistia em desenvolver para uma classe com
alunos, durante quarenta e cinco minutos, o tema números
complexos. Iniciei a minha aula [...] falando sozinho, pois estava
lecionando para uma classe vazia – era época de férias escolares
(PRADO, apud BARALDI, 2003, p. 18).
Tomou posse como professor secundário no Ginásio Estadual de Jahu.
Ministrou cursos na CADES, nas décadas de 1950 e de 1960, lecionando em São
Carlos, Londrina (Paraná), Ubá (Minas Gerais), Nova Friburgo (Rio de Janeiro).
Na década de 1960, foi convidado para lecionar Álgebra Moderna na
Faculdade de Ciências e Letras de Penápolis. Segundo o entrevistado, falava-se
muito em Matemática Moderna, Teoria dos Conjuntos, Teoria dos Grupos,
assuntos que na sua época de graduação não eram cogitados. As primeiras
noções que teve sobre Teoria dos Grupos foi com o professor Omar Catunda, seu
professor de Análise, porém em suas aulas extras. Posteriormente, adotou o livro
de Álgebra de Jacy Monteiro, que fora seu colega de turma. A coleção de livros
do Grupo Bourbaki, também era prestigiada, especialmente o primeiro volume, de
leitura mais amena, o qual tratava dos fundamentos da Teoria dos Conjuntos.
No início da década de 1970, Prado passou a freqüentar as reuniões
promovidas pelo GEEM, juntamente com o Benedito Castrucci e Renate
Watanabe, cujo marido, Shigeo Watanabe, havia sido seu colega de turma na
faculdade. Prado começou a utilizar livros sob orientação do GEEM, adotando,
por dois ou três anos, os livros de Osvaldo Sangiorgi. Nos encontros, os debates
e cursos enfocavam temas didáticos, além de fazerem análises críticas de livros
didáticos publicados.
Rubens Zapater, terceiro entrevistado, iniciou sua carreira como professor
1958, quando assumiu aulas de Matemática em Iacanga, interior de São Paulo.
No começo de 1960, em Araçatuba, recebeu o registro definitivo para lecionar
Matemática no ginásio, pela CADES.
Na década de 1960, segundo Zapater, os nomes relacionados ao ensino
de Matemática que mais se destacavam eram os de Benedito Castrucci, Scipione
de Pierro Neto, Jacy Monteiro. Após sua formação na CADES, ficou lecionando
no secundário. No ano de 1962, o Estado de São Paulo precisava de novos
152
professores e, então, abriu um concurso para o ingresso no ensino secundário e
normal. Seria sua chance para tornar-se professor efetivo. Nesse concurso,
relembrou Zapater, uma das questões fazia referência à Álgebra Moderna,
assunto que Zapater ainda não dominava.
Zapater participou, em 1959, no Rio de Janeiro, do 3º Congresso do Ensino
de Matemática, e, posteriormente, participou ainda do GEEM. Embora estivesse
no início de sua carreira, sentia que os programas de Matemática eram
inadequados para a faixa etária dos mesmos. Reportando-se mais
especificamente à Matemática Moderna, Zapater considerou que foi implantada
no ensino sem o devido preparo, tanto da clientela como do professor.
A entrevistada seguinte foi Miriam Delmont. Em seu depoimento, relatou
recebeu o registro da CADES para lecionar no primeiro grau em 1960. Em 1962,
prestou o concurso para a cadeira de Matemática. Fez a prova escrita e depois
veio a chamada no Diário Oficial para a leitura da prova. Essa etapa foi realizada
em três dias; a leitura foi feita por uma banca composta por três examinadores.
Em sua banca estavam: Osvaldo Sangiorgi, Benedito Castrucci. Delmont
relembra que, pouco antes do concurso, Sangiorgi havia feito uma reunião com o
grupo e na ocasião havia dito que eles, professores do interior, não teriam muitas
chances porque estava sendo introduzida a Matemática Moderna e só os
professores de São Paulo estavam tendo aulas desse conteúdo. Das três teses
sorteadas por Sangiorgi, duas delas diziam respeito à MM. Delmont conseguiu
discorrer sobre uma das teses, obtendo aprovação no concurso.
Antonio Augusto Del Preti, sétimo entrevistado por Baraldi, relatou que os
autores de livros didáticos que mais se destacavam em sua época foram: Ary
Quintella, Scipione, Castrucci. O depoente conhecia esses professores apenas
pelo nome e pelas suas obras. Em Rio Claro, teve aulas com os professores
Mário Tourasse, Scipione e Ubiratan D’Ambrosio. Teve ainda a oportunidade de
travar contato com os professores Nelson Onuchic, Lourdes Onuchic e o Gilberto
Loibel.
Formou-se em 1965, passando a lecionar em Bauru, onde se tornou um
dos primeiros professores formados em Matemática. Por volta de 1970, começou
153
a lecionar na Fundação Educacional de Bauru, no curso de Ciências. Aposentou-
se nessa Fundação, agora UNESP, em setembro de 1998. Deixou de lecionar no
Estado em 1988, quando a UNESP encampou a Fundação.
O último entrevistado, Milton de Oliveira, efetivando-se como professor em
1960, exercendo essa profissão até 1989, ocasião em que se aposentou pelo
Estado de São Paulo. Segundo Oliveira, a decadência do ensino tornou-se mais
notável no MMM, devido à uma série de imposições, consideradas pelo
entrevistado como descabidas:
Em Matemática, por exemplo, de repente criaram uma tal de
Matemática Moderna e começou-se a ensinar Teoria dos
Conjuntos, não dizendo para que isso servia, ou seja, no primeiro
dia de aula ensinava-se Teoria dos Conjuntos e, em seguida,
voltava-se a ensinar a Matemática tradicional, sem fazer qualquer
ligação entre uma e outra. Isso perdurou por muitos anos e
perdemos muito tempo com essa Matemática Moderna
(OLIVEIRA, apud BARALDI, 2003, p. 101).
O segundo volume da tese, denominado “Vozes da Literatura”, Baraldi fez
um relato sobre aspectos característicos da região de Bauru, em especial a
utilização da ferrovia como meio de transporte nas décadas exploradas, a
formação dos professores de Matemática pela CADES, o Movimento da
Matemática Moderna e a Lei 5.692/71. Utiliza-se, especialmente, nesse volume
dos relatos dos entrevistados, como também trabalhos de Elizabeth Búrigo,
Beatriz D’Ambrosio e Célia Maria Carolino Pires.
O terceiro volume, intitulado “Nossa voz” apresenta o esboço teórico
construído sobre a História Oral e descreve com mais detalhes o objetivo da
pesquisa. Nesse sentido, Thompson, Jouthard, Meihy, Garnica e Freitas são
alguns historiadores destacados pela autora.
A leitura dessa pesquisa permitiu ampliar um pouco mais os aspectos
referentes aos processos educacionais, notadamente aqueles sobre formação de
professores, o funcionamento da escola e os concursos públicos para provimento
do cargo de professor, no período que cobre o MMM.
154
Baraldi procura dar visibilidade aos anseios, sucessos e dificuldades dos
professores do interior paulista em relação aos novos conteúdos e métodos
estabelecidos pelos promotores da reforma. Entretanto, apesar de serem
constatadas, em toda a extensão do trabalho, algumas interferências de
matemáticos no ensino, estas são tratadas de forma implícita, uma vez que não
representavam o centro das atenções da autora.
5.9. Comentários gerais
As teses e dissertações sobre o MMM no Brasil, ao que tudo leva a crer,
são insuficientes para compreender a herança deixada pelo Movimento nas
práticas pedagógicas dos professores de matemática brasileiros. Para compor o
ideário do Movimento, os trabalhos, em geral, preocupam-se em explicitar o
significado da Matemática Moderna, em relatar o contexto social, político e
econômico da época, em situar os grupos que a difundiram no Brasil, bem como
na apresentação e análise de textos que discutem seu “fracasso” nacional e
internacional.
Praticamente não incluem preocupações com a análise das práticas
científicas, de como elas se transformam ao longo do tempo. Essa é, entretanto, a
pretensão maior almejada pelo projeto de pesquisa “Estudos sobre história da
educação matemática no Brasil, 1950-2000”, conduzida pelo GHEMAT/PUC-SP:
Ao focalizar matemáticos e professores de Matemática, com
estudo acurado de sua inserção histórica, teríamos a possibilidade
de enxergar com maior nitidez as práticas do fazer matemático em
nossa história cultural. Isso possibilitaria, também, a análise do
percurso que seguiu a educação matemática em nosso país
(VALENTE, 2003a).
Portanto, a análise das teses e dissertações revela a necessidade de
estudos mais aprofundados sobre as relações entre a cultura matemática e a
cultura escolar, havendo, assim, uma lacuna histórica no que se refere aos rumos
que a Educação Matemática tomou a partir da segunda metade do século XX.
155
Dessa forma, defendemos a necessidade de novos estudos, que venham
enfocar pontos de vista distintos daqueles já investigados. Neste estudo
buscamos identificar influências culturais, trocas entre duas culturas (acadêmico-
matemática e escolar) ao tempo do que ficou conhecido como Movimento da
Matemática Moderna no Brasil.
Cabe também esclarecer que as teses e dissertações mencionadas, de
maneira geral, não tomaram como referência, as bases teóricas adotadas pelo
GHEMAT, e tampouco observaram em seus objetivos, um estudo
especificamente voltado à análise da participação de matemáticos durante o
MMM.
Contudo, tais observações não impediram que, ao longo do estudo
daqueles trabalhos, aflorassem algumas questões referentes ao papel assumido
pelos matemáticos durante o Movimento, evidenciando o espaço em que se
processou a investigação, possibilitando trazer respostas para uma melhor
compreensão sobre esse assunto.
Assim, a análise das teses e dissertações, tornou possível identificar
alguns traços comuns na atuação dos matemáticos durante o processo de
renovação do ensino secundário, das décadas 50, 60 e 70, permitindo-nos
elaborar uma categorização, a qual apontou alguma regularidade nas práticas dos
matemáticos mobilizados pela reforma, existindo aqueles que:
se dedicaram a ministrar cursos de formação de professores primários e
secundários nos grupos promotores do Movimento: Alexandre Martins
Rodrigues, Arago Bacx, Carlos B. Lyra (curso para pais), Alésio de
Caroli, Benedito Castrucci, Leônidas Hegenberg (curso para pais), Luiz
Henrique Jacy Monteiro, Ruy Madsen Barbosa, Omar Catunda, dentre
outros;
escreviam textos relativos os conteúdos da Matemática Moderna, tendo
como público-alvo os professores do ensino médio: Benedito Castrucci;
Ruy Madsen Barbosa, Luiz Henrique Jacy Monteiro, Edson Farah, Alésio
de Caroli, Omar Catunda, dentre outros;
156
se dedicavam à escrever obras referentes aos conteúdos de Matemática
Moderna, destinados aos estudantes do curso secundário: Benedito
Castrucci, Luiz Henrique Jacy Monteiro, Omar Catunda, Edson Farah,
dentre outros;
se dedicavam a participar de congressos e/ou publicar artigos
defendendo o Movimento, expondo os motivos pelos quais a Matemática
Moderna deveria fazer parte do currículo das escolas elementares:
Ubiratan D’Ambrosio, Omar Catunda, Leônidas Hegenberg, Leopoldo
Nachbin, dentre outros;
fizeram críticas ao Movimento, mostrando-se contrários à reforma,
durante sua implantação ou após a constatação de seu esgotamento:
Elza Furtado Gomide, Lindolfo de Carvalho Dias, Manfredo do Carmo
Perdigão, Elon Lages Lima, dentre outros.
Os dados acima permitem verificar que os matemáticos citados com maior
freqüência nas teses e dissertações foram Omar Catunda, Benedito Castrucci e
Luiz Henrique Jacy Monteiro.
Assim sendo, levando em conta que a análise da participação dos
matemáticos brasileiros no MMM é elemento capital para investigar as dinâmicas
de relacionamento entre as culturas acadêmico-matemática e escolar,
destacamos esses matemáticos como um conjunto representativo para o estudo
dessas dinâmicas.
157
CAPÍTULO 6
A ERA DOS EXTREMOS
Em conformidade com Michel de Certeau (1982), toda pesquisa histórica
articula-se num local de produção sócio-econômica, política e cultural. Sua
produção dá-se a partir dos lugares em que o esforço para a interpretação da
história foi engendrado. Pretendendo construir uma narrativa histórica,
assinalamos, a seguir, o ambiente no qual Omar Catunda, Benedito Castrucci e
Luiz Henrique Jacy Monteiro estudaram e posteriormente tornaram-se
professores.
A vida dos brasileiros, com o advento da República, viu-se fortemente
afetada por pressões transformadoras, de tal modo que o período fora
denominado de “a era dos extremos”
47
. De um lado, pressões do mercado
consumidor, de outro, as intervenções das elites dirigentes. Nos anos 30, 40,
tomando como modelo os regimes repressivos que vingavam na Europa, o
governo de Getúlio Vargas (1930-1935) procurou tirar o máximo proveito das
técnicas de propaganda e dos meios de comunicação, especialmente do rádio,
para construir sua base de sustentação política. A população brasileira, em sua
maioria analfabeta, passou a receber fortes estímulos sensoriais das imagens e
dos sons, pela prática inédita do uso de novas tecnologias, que contribuíram
intensamente para mudanças efetivas nos usos e costumes da sociedade. A
introdução da televisão, em 1950, veio consolidar esse quadro, em que as novas
47
Alusão inspirada na “Era dos extremos: o breve século XX: 1914 - 1991” de autoria de Eric J. Hobsbawm
(2001).
158
técnicas, equipamentos e artigos representariam “a vida moderna” (SEVCENKO,
2001).
“A era dos extremos”, em boa medida, traz a marca dos tempos em que
ocorre a substituição da elite no poder, quando caem as oligarquias tradicionais,
fazendo emergir os militares, técnicos diplomados, jovens políticos e industriais.
Tempos de revolução constitucionalista, encabeçada pelo Estado de São Paulo,
em que o rádio aparece como dispositivo tecnológico utilizado em grande escala
para incentivar o povo para comícios e o fluxo de voluntários à frente de combate;
tempos da criação da Universidade de São Paulo e da promulgação de uma nova
Constituição, estabelecendo o ensino primário gratuito e a freqüência obrigatória;
tempos em que, aos poucos, com o fortalecimento das Forças Armadas,
especialmente o Exército, a corrente autoritária foi assumindo a perspectiva
denominada “modernização conservadora”, que vai percorrer toda a era Vargas,
de presidente eleito via voto indireto, a chefe de governo no Estado Novo (1937-
1945). Perpassa, em 1946, nova Constituição e novo presidente, General Dutra,
que novamente passaria, em 1951, a faixa presidencial a Vargas, que
permaneceu até 1954 (FAUSTO, 2002).
Em suas manifestações dirigidas ao povo, o Governo Vargas explicava
suas atitudes para promover a busca da integração nacional, a ordem e a entrada
do Brasil nos tempos modernos. A nação brasileira, impelida a ingressar na era
da industrialização, exigia maior incremento na área da pesquisa científica. O
interesse em promover a industrialização refletiu-se no campo educacional,
manifestando-se este como instrumento modernizador. A criação do Ministério da
Educação e Saúde (1930), a Reforma Francisco Campos (1931), a fundação da
Universidade de São Paulo (1934) e da Universidade do Distrito Federal (1935)
assinalam um processo de estruturação orgânica do ensino nacional. A
promulgação da reforma de ensino, promovida por Gustavo Capanema (1942)
48
,
favoreceu a expansão e transformação do ensino ginasial em escola básica para
todos os ramos de ensino, enquanto que os cursos de grau médio estruturaram-
se em ensino secundário (clássico e científico).
48
Em 1942, a Reforma Capanema deu nova organização ao Ensino Secundário, criando o ginásio (primeiro
ciclo), de quatro anos e os cursos clássico e científico (segundo ciclo ou colegial), de três anos (VALENTE,
2005).
159
O sentido de modernização, nesse período, encontrava-se vinculado à
educação e produtividade. Tratava de tornar o país desenvolvido por meio da
produção tecnológica e a eficácia administrativa do Estado, em que a educação
seria a forma pela qual o Brasil alcançaria o progresso, atuando como promotora
de conhecimentos científicos que fariam crescer a produção tecnológica. Assim,
enquanto o ensino profissional visava a preparação de mão de obra qualificada,
destacando-se por meio da criação do SENAI – Serviço Nacional de
Aprendizagem Industrial e do SENAC – Serviço Nacional de Aprendizagem
Comercial, as escolas secundárias destinavam-se às elites.
Em tempos de Vargas, os reflexos do primeiro movimento internacional de
modernização do ensino da matemática secundária também se fizeram sentir no
Brasil, tendo como conseqüência o surgimento dos novos programas de
Matemática implementados no Colégio Pedro II
49
, a partir de 1929 e pela Reforma
Francisco Campos, em 1931, ambos propostos por Euclides de Medeiros
Guimarães Roxo, e inteiramente aceito pelo Ministério da Educação e Saúde
Pública.
Em seus trabalhos, Euclides Roxo mostrava-se basicamente um defensor
do pensamento de Felix Klein. Foi, desse modo, o primeiro a procurar introduzir
no Brasil, os pontos de vista inseridos no moderno movimento de reforma iniciado
por aquele matemático alemão.
Dentre as instruções pedagógicas para o ensino da Geometria, contidas no
programa de matemática de 1931, destacamos aquela que determinava “salientar
a importância da simetria axial e central, da rotação e translação”, ou seja, a
geometria das transformações, em conformidade com as propostas de Klein
(DUARTE, 2002, p. 149).
49
O Colégio Pedro II foi criado em 1837, sendo a primeira escola secundária pública a apresentar um plano
gradual e integral para o ensino secundário. A partir de sua criação, os alunos eram promovidos por série,
não mais por disciplina. O ensino secundário não era obrigatório, ou seja, não havia necessidade de se
possuir diploma para candidatar-se a uma vaga no ensino superior. Bastava ter idade mínima de 16 anos e
ser aprovado nos exames preparatórios. No entanto, os alunos que chegavam ao final do curso obtinham o
título de bacharel em Letras, além de garantir a matrícula em qualquer ensino superior, sem necessidade de
prestar os exames preparatórios. A partir de 1890, o ensino secundário sofreu modificações significativas,
com a Reforma Benjamin Constant. Por meio dela, foram extintos os exames parcelados, passando-se a
exigir, para o ingresso no curso superior, a realização de estudos regulares nas escolas particulares ou
oficiais e a aprovação nos exames de madureza realizados no Colégio Pedro II, então denominado Ginásio
Nacional, ou nos estabelecimentos de ensino a ele equiparados (DUARTE, 2002).
160
Ao optar por Klein, Euclides Roxo deu ênfase para o ponto de vista
psicológico quanto à metodologia sugerida para o ensino secundário brasileiro,
sendo inovador neste aspecto. Segundo Roxo, a matemática escolar, mais do que
discorrer sobre demonstrações impecáveis sob o ponto de vista do rigor lógico,
deveria dar significado à aprendizagem do aluno, voltando-se, deste modo, para a
compreensão dos conteúdos a serem trabalhados.
A Reforma Francisco Campos impôs, para todo o território nacional,
modificações expressivas na estrutura do ensino secundário, visando dar-lhe um
caráter eminentemente educativo, em oposição à finalidade exclusiva de
matrícula aos cursos superiores.
A partir dos anos 30, com a obrigatoriedade da freqüência a cada uma das
séries do ensino secundário
50
, verificou-se que a expansão desse ensino foi
proporcionalmente maior do que a expansão do ensino primário, ensino superior e
dos ensinos profissionalizantes existentes nesse período.
No entanto, apesar de todo empenho despendido, a escola secundária
continuava sendo um curso para a elite. Em 1951, menos de 6% da população
entre 11 e 17 anos estava matriculada no ensino médio (BÚRIGO, p.30, 1990).
Posteriormente, em meio a grave crise política, Getúlio Vargas comete
suicídio em 1954. Em 1956, foi eleito e chegou ao poder Juscelino Kubitschek
51
,
cujo governo foi marcado por intenso desenvolvimento econômico, traduzido na
época pela expressão “cinqüenta anos de progresso em cinco anos de governo”,
o que caracterizou uma política de nacionalismo desenvolvimentista, que não
impediu, todavia, conspirações para derrubada de seu governo. Na educação,
verificava-se ainda um enorme déficit de escolas de nível secundário
(SKIDMORE, 1996).
50
O período compreendido entre 1925-1930 caracterizou-se por uma época de transição entre o sistema que
permitia eliminar exames para ingresso ao ensino superior sem ter diploma do ensino secundário e aquele
que instituía a seriação obrigatória para o ensino secundário (VALENTE et alli, 2004).
51
Entre o governo Vargas e o de Kubitschek, vigorou o de Café Filho (1954-1955). Juscelino Kubitschek de
Oliveira governou desde 31/01/1956 a 31/01/1961 (BÚRIGO, 1989).
161
No Governo de Kubitschek acentuou-se a implantação da indústria
brasileira, abrindo-se as portas da economia nacional ao capital estrangeiro. As
novas necessidades surgidas pela crescente urbanização vinham acompanhadas
de pressão dos setores médios e populares pelo acesso ao ensino. Foi também
um período marcado pela discussão da necessidade de elaboração de um Plano
Nacional de Educação, que vinha ocorrendo desde 1948 e concretizado em
dezembro de 1961, já no Governo de João Goulart, com a Lei 4024 (Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional). Com a promulgação da LDB, a
estrutura tradicional do ensino pouco foi alterada, ficando o sistema organizado da
seguinte forma: Ensino pré-primário, Ensino primário de 4 anos; Ensino Médio,
subdividido em dois ciclos: o ginasial de 4 anos e o colegial de 3 anos, ambos por
sua vez compreendendo o ensino secundário e o ensino técnico; Ensino Superior,
com a mesma estrutura já estabelecida anteriormente. Embora não oferecesse
um currículo fixo e rígido para toda a Nação, suscitaram novos debates em torno
de currículos e programas do ensino médio, não mais fixados pelo governo
federal, com exceção do estabelecimento de um núcleo comum de matérias,
deixando aos estados e estabelecimentos a possibilidade de anexarem disciplinas
optativas ao currículo mínimo estabelecido pelo Conselho Federal de Educação
(ROMANELLI, 2003).
O governo norte-americano também começou a intervir cada vez mais nos
setores educacionais. Entre 1958 e 1963, professores primários foram
contemplados com bolsas de estudo de um ano para realizar cursos na Indiana
University, por meio do PABAAEE (Programa Brasileiro-Americano de Assistência
ao Ensino Elementar). Em 1957, um convênio previa o aprimoramento de 600
professores do ensino secundário, com bolsa de estudos para a University
Southern Califórnia (ROMANELLI, 2003).
Em 1960, assumiu como presidente eleito Jânio Quadros, num cenário
marcado por um processo de democratização e pela crescente industrialização e
urbanização, desde a queda da ditadura Vargas em 1945. No âmbito
internacional, os conflitos gerados pela Guerra Fria, expressavam o confronto
entre capitalismo e socialismo. Posteriormente, Jânio Quadros renunciou ao cargo
de presidente, assumindo o vice-presidente João Goulart, que foi deposto pelo
Golpe Militar em 1964. O golpe, justificado pela expressão “segurança nacional”
162
inspirada pela Guerra Fria, ditada pelos Estados Unidos, deu sustentação a um
regime que vigorou durante o período compreendido entre 1964 e 1985
(GERMANO, 2005).
A política intervencionista norte-americana intensificou-se a partir do
movimento de 1964, quando foram assinados os “Acordos MEC-USAID”, uma
série de convênios entre o MEC e a Agency for International Development (AID),
com a finalidade de prestar assistência técnica e cooperação financeira por parte
dessa agência à organização do sistema educacional brasileiro. Segundo
Romanelli (2003), a política educacional brasileira teve seu arcabouço e suas
vigas mestras sustentadas nos acordos MEC-USAID
52
, quando foram lançadas
as principais bases das reformas educacionais que se seguiram, como a Lei
5.692, de 11 de agosto de 1971, que fixou as diretrizes e bases para o ensino de
1º e 2º graus
53
, e a Lei 5540 de 28 de novembro de 1968, que fixou normas para
a organização e funcionamento do ensino superior
54
.
É nesse contexto histórico, portanto, que surgiram as principais
modificações no sistema educacional brasileiro. Nele vemos acirrar o debate
sobre os problemas envolvendo o ensino secundário e vemos florescer o
Movimento da Matemática Moderna.
6.1. A criação da Universidade de São Paulo
O Estado de São Paulo, após amargar a derrota provocada pela Revolução
Constitucionalista de 1932, busca destaque no campo intelectual. O governador
Armando de Salles Oliveira (1887-1945), com o apoio de outros intelectuais
52
Segundo Romanelli (2003, p. 213), os acordos firmados atingiram todo o sistema educacional: a) Níveis:
primário, médio e superior; b) Ramos: acadêmico e profissional (com ênfase no primeiro); c) Funcionamento:
1. reestruturação administrativa; 2. planejamento; 3. treinamento de pessoal docente e técnico; d) Controle do
conteúdo geral do ensino através do controle de publicação e distribuição de livros técnicos e didáticos.
53
A educação fundamental e média passou a ter a seguinte estruturação: Ensino de 1º grau, com 8 anos de
duração e destinado à formação da criança e do pré adolescente e Ensino de 2º grau, com 3 ou 4 anos de
duração destinado à formação do adolescente. Algumas das principais inovações propostas nesta lei, são
resumidas por Romanelli: a extensão da obrigatoriedade escolar; a eliminação do dualismo educacional
(ensino secundário x ensino profissional); a profissionalização em nível médio; a cooperação das empresas
na educação; a integração geral do sistema educacional desde o 1º grau ao superior (ROMANELLI, 2003, p.
253).
54
As mudanças na estrutura universitária observam as seguintes características: integração de cursos, áreas
e disciplinas; centralização da coordenação administrativa, didática e de pesquisa; cursos de vários níveis e
de duração diferente; incentivo formal à pesquisa; extinção da cátedra; ampliação da representação nos
órgãos de direção às várias categorias docentes, etc. (ROMANELLI, 2003, p. 229).
163
paulistas como Júlio de Mesquita Filho, Fernando de Azevedo, entre outros,
fizeram brotar a idéia da criação da Universidade de São Paulo. Fernando de
Azevedo, referindo-se à fundação dessa universidade, escreveu em suas
“Histórias da minha vida” (1971, p. 119):
Com Armando Sales, no poder, e Júlio de Mesquita Filho, na
direção d’O Estado de S. Paulo, pareceu-nos ter chegado, afinal,
oportunidade de criar a Universidade de S. Paulo e a Faculdade
de Filosofia, Ciências e Letras que seria integrada no sistema.
Júlio de Mesquita e eu lutávamos por isso desde 1923 (apud
VIDAL, 2000).
Em “Figuras do meu convívio” (1960, p. 98-99), ainda sobre a criação da
USP, lê-se:
Ali é que Júlio de Mesquita Filho e eu, tantas e tantíssimas vezes,
em cerca de 17 anos, sonhamos juntos a criação e, afinal juntos,
projetamos o plano da Universidade de São Paulo, que o seu
eminente fundador pôde, em três anos, pela força de seu espírito
construtivo, transformar na mais fecunda realidade, inaugurando
uma época de pesquisas e rasgando novas perspectivas à
educação nacional. (AZEVEDO, apud VIDAL, 2000).
A Universidade de São Paulo foi concretizada pelo Decreto nº 6.283 de 25
de janeiro de 1934 que, ao mesmo tempo, instituiu a Faculdade de Filosofia,
Ciências e Letras (FFCLUSP), sendo idealizada para ser um centro catalisador
das demais unidades da universidade, na medida em que esta se apresentaria
apta a formar professores e pesquisadores capazes de satisfazer às exigências
da vida moderna.
As tradicionais escolas de Direito, Medicina, Engenharia
55
e Agricultura
eram insuficientes para suprir as necessidades de formação de cientistas e
professores, pois eram direcionadas para a formação de profissionais liberais.
Urgia, pois, a criação de uma Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras que
satisfizesse esses requisitos. Já existiam algumas faculdades de filosofia, como a
55
A Faculdade de Direito foi criada em 1827, a Escola Politécnica em 1893 e a Faculdade de Medicina em
1912 (PIRES, 2006, p. 163).
164
Faculdade de Filosofia de São Bento
56
, que, entretanto, mantinham-se limitadas
ao campo da Filosofia.
Discorrendo sobre a importância da Faculdade de Filosofia, André Dreyfus,
em aula inaugural de 1942, justificou que, a ela estava reservado o papel de
centro de formação de pesquisadores, dedicados às investigações científicas
desinteressadas, aquelas provenientes da ciência pura, responsável, segundo
ele, pela invenção de aparelhos voltados ao bem estar da sociedade moderna:
... o cinema falado e os soros terapêuticos, o automóvel e as
vacinas, o arranha-céu e a quimioterapia, o avião e as regras
dietéticas, o rádio e os animais e plantas selecionados, a
geladeira automática, a vitrola e os transatlânticos, tudo, tudo isso
foi obra da ciência.
É particularmente notável que, na base de quase todas essas e
tantas outras descobertas úteis, estejam pesquisas científicas
desinteressadas, feitas sem nenhuma preocupação de ordem
prática. Pode-se mesmo afirmar: nenhuma grande descoberta
existe que não tenha tido suas raízes em pesquisas de ciência
pura (1939-1949, p. 97).
A FFCLUSP iniciou suas atividades em 11 de março de 1934, sob a
direção do professor Theodoro Augusto Ramos (1895-1935), o qual fora
incumbido pelo Governo do Estado de contratar professores estrangeiros e
nacionais de modo a levar adiante a missão de fazer funcionar a recém-criada
Faculdade, empenhando-se em romper com o regime de improvisações docentes,
buscando renovar e atualizar as práticas educacionais vigentes.
Concebida para ser a célula mater da Universidade, a Faculdade de
Filosofia sofreu severas críticas por parte de educadores positivistas, que
defendiam uma universidade constituída por organismos isolados, prevalecendo
as ciências aplicadas, em conformidade com as escolas politécnicas, faculdades
de medicina, de Direito, etc., já instituídas no país (BASSALO, 2005).
56
Criada em 1908, sob a denominação de Faculdade Livre de Philosophia e Lettras de São Paulo, e em
1940, Faculdade de São Bento. A partir de 1936 sofre ampla remodelação a fim de adequar-se às exigências
das leis que regulamentam o ensino superior. Somente por meio do Decreto nº 6.526, de 12 de novembro de
1940, seus cursos são reconhecidos e passa a denominar-se "Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de
São Bento", organizando-se em quatro seções: Seção de Filosofia (compreendendo o curso de Filosofia);
Seção de Ciências (compreendendo os cursos de Matemática, Física, Geografia e História, Ciências Sociais);
Seção de Letras (compreendendo os cursos de Letras Clássicas, Neo-latinas, Anglo-germânicas); Seção de
Pedagogia (compreendendo os cursos de Pedagogia e Didática) (MUCHAIL, 1992).
165
Segundo o professor Eurípedes Simões de Paula, a escolha pela
contratação de professores estrangeiros deveu-se a uma carência de
“especialistas à altura de uma faculdade de nível superior”, o que provocou um
movimento de oposição à Faculdade promovida por autodidatas, ou aqueles
dispostos a lecionar quatro, cinco ou seis disciplinas diferentes, denominados
ironicamente por Simões de Paula de “especialistas polididáticos” que se sentiam
prejudicados, por terem ficado à margem do processo seletivo para escolha de
professores especialistas (1951, p. 57).
Outros setores da sociedade, também não viam com bons olhos a
Faculdade de Filosofia. A igreja, por exemplo, julgava que essa faculdade era um
antro de ateísmo. Adhemar de Barros, pertencente ao Partido Republicano
Paulista (PRP) e nomeado interventor em 1937, também criticava a criação dessa
faculdade, obra efetivada pela facção rival, o Partido Constitucionalista, ao qual
pertencia Armando de Salles Oliveira.
Em discurso proferido quando paraninfo da turma de 1951 da FFCLUSP,
Eurípedes Simões de Paula desabafou: “Essa luta foi longa. Estivemos
ameaçados de fechamento, por governantes que nada entendiam da necessidade
de pesquisa, nem da formação de um professorado de curso médio de nível
universitário” (ANUÁRIO DA FFCLUSP, 1951, p. 53).
Em depoimento para a Revista Estudos Avançados (1994) Erasmo Garcia
Mendes registra uma provável participação de um matemático italiano em defesa
da manutenção da FFCLUSP:
Assim, a campanha movida por interesses religiosos, políticos ou
subalternos chegou a tal vulto que houve a intenção, por parte do
governo, de extinguir a FFCL. Essa intenção quase chegou a ser
concretizada quando, em uma manhã, do ano de 1938 se não me
engano, o Conselho Universitário da USP reuniu-se na Faculdade
de Direito para discutir a questão. Para essa reunião foram
convidados os Profs. Marcus e Luigi Fantappié. A proposta de se
destruir a FFCL só não teve êxito porque, segundo me contou o
Prof. Marcus, Fantappié emudeceu os conselheiros com uma
brilhante defesa dos objetivos da Faculdade, mostrando que sua
extinção seria um inconcebível retrocesso em termos culturais e
científicos. Assim, o grande matemático italiano salvou a FFCL.
166
Não temos dados que nos permitam afirmar se realmente ocorreu essa
passagem. Entretanto, o que podemos refletir a esse respeito? Além da forte
personalidade de Fantappiè, seu poder de sedução e autoridade que possuía
perante o Conselho Universitário, nesse provável debate, exemplifica a dinâmica
operada no Conselho Universitário, revelando a crença partilhada e coletiva
instaurada nessa instituição, de que a extinção da Faculdade de Filosofia seria
um retrocesso, suplantando outros interesses. Definia-se uma posição entre os
atores, imposta “segundo suas próprias experiências, seus encontros, suas
práticas, e para muitos, segundo suas práticas escolares passadas” (CHARTIER,
2005, p. 26).
Ora, o matemático italiano Luigi Fantappié (1901-1956)
57
, foi um daqueles
professores estrangeiros contratados por Theodoro Ramos, para reger a cadeira
de Análise Matemática da FFCLUSP, permanecendo durante o período
compreendido entre 1934 e 1939.
6.2. Luigi Fantappiè e o Departamento de Matemática da FFCLUSP
Inicialmente, a FFCLUSP compreendia as seguintes seções: Ciências
Matemáticas, Ciências Físicas, Ciências Químicas, Ciências Naturais, Geografia e
História, Ciências Sociais e Políticas, Letras Clássicas e Português e Línguas
Estrangeiras, tendo como finalidades:
a) preparar trabalhadores intelectuais para o exercício de altas
atividades culturais de ordem desinteressada ou técnica;
b) preparar candidatos ao magistério do ensino secundário,
normal e superior;
c) realizar pesquisas nos vários domínios da cultura que
constituem o objeto do seu ensino (ANUÁRIO DA FFCLUSP,
1939-1949, p. 11).
O artigo 10 do Decreto n. 6283 de 25 de janeiro de 1934, que criou a
Universidade de São Paulo rezava que os cursos de licenciatura seriam seriados
57
Luigi Fantappié, a convite de Theodoro Ramos, veio para o Brasil implantar o Departamento de
Matemática da FFCLUSP, permanecendo durante o período compreendido entre 1934 e 1939 (DIAS, 2001,
p. 40).
167
e com duração de três anos, sendo que as matérias da Seção de Ciências
Matemáticas encontravam-se distribuídas da seguinte forma:
1º ano – Geometria (projetiva e analítica), Análise matemática;
2º ano – Análise matemática, Cálculo Vetorial e Elementos de
Geometria Infinitesimal, Física Geral e Experimental;
3º ano – Mecânica Racional e Elementos de Mecânica Celeste,
Física Geral e Experimental, História das Matemáticas (ANUÁRIO
USP, 1936, p. 43).
Apesar de ser concebida com a finalidade de formar cientistas e
aperfeiçoamento de professores do Ensino Secundário e Superior, a formação do
professor ficava a cargo do Instituto de Educação – que a partir de 1938 foi
transformado em Seção de Educação da FFCLUSP – e, somente após os alunos
terem concluído o bacharelado, dedicavam-se às disciplinas pedagógicas (SILVA,
2000). Essa prática continuou até pelo menos meados da década de 50, pois
conforme depoimento de D’Ambrosio (2005), bacharel e licenciado pela
FFCLUSP em 1954, para os alunos do Curso de Matemática, os três primeiros
anos eram dedicados ao bacharelado, sendo que somente no último ano, os
alunos dedicavam-se às disciplinas pedagógicas.
No início, a FFCLUSP teve suas secções espalhadas pela cidade de São
Paulo. Nos dizeres de Eurípedes Simões de Paula:
... fomos expulsos pelos estudantes da Faculdade de Medicina,
fato que revelou ser o espírito universitário pura fantasia. Da
Politécnica, precisamos retirar-nos também. Isso que, naquela
ocasião recebemos tão mal, foi um bem: tivemos de procurar casa
própria. Aí começou uma verdadeira via crucis para a Faculdade.
Mudamos as Letras para a Alameda Glete (depois de passarmos
por um casarão situado no local onde está hoje a Biblioteca
Municipal) e de lá saímos, para dar lugar aos laboratórios de
Ciências Naturais, rumando, em seguida, para o 3º andar do
Instituto de Educação Caetano de Campos, onde permanecemos
por mais de 10 anos. Os cursos de Física e Matemática
espalharam-se também: cada um foi instalado em casas
completamente inadequadas para o ensino. A Faculdade
desagregara-se, mas continuava coesa e unida, pelo espírito
comum de luta de professores e alunos [grifos do autor]
(ANUÁRIO DA FFCLUSP, 1951, p. 53).
168
Especificamente às secções de Matemática e Física, a princípio, até
setembro de 1938, dividiam seus espaços com a Escola Politécnica
58
, quando o
curso de Física acabou por ser instalado em prédio alugado na Avenida
Brigadeiro Luiz Antonio e o de Matemática no terceiro andar da Escola Normal
“Caetano de Campos”, na Praça da República, juntamente com outros cursos.
Saindo do prédio da Praça da República, o curso de Matemática foi instalado no
bairro do Paraíso, à rua Alfredo Élis, em 1942. A etapa seguinte, foi a
transferência para a famosa sede da Faculdade, na rua Maria Antônia, em agosto
de 1949 (DIAS, 1994).
Por intermédio de Theodoro Ramos, o engenheiro Omar Catunda foi
convidado para exercer as funções de professor assistente de Fantappié, na
cadeira de Análise Matemática.
Durante sua permanência na FFCLUSP, a partir de julho de 1934,
Fantappiè dedicou-se a organizar a biblioteca do Departamento de Matemática,
formada com obras doadas pelo governo italiano, bem como outras publicações
com verbas diversas. Como seu assistente, Catunda participou ativamente desse
trabalho. Também ficou incumbido de redigir as apostilas do curso, em número de
nove aulas semanais, além da aplicação e correção das listas de exercícios.
Relembrando Fantappiè, assim se expressou Catunda:
Sua exposição era claríssima e rigorosa, mas o ritmo acelerado
prejudicou a maioria dos estudantes, que faziam o curso de
engenharia. Para mim e para mais seis que se transferiram para o
curso da Faculdade (entre os quais Mario Schemberg e Marcelo
Dammy), ele expôs, no 2º ano, a teoria das funções analíticas e
no 3º ano, a teoria que ele mesmo criara – dos funcionais
analíticos – funcionais cujo argumento variável é uma função
analítica (1985, p. 90).
Fantappiè instituiu o “Seminário Matemático e Físico”, criado em 1935. A
intenção era organizar seminários onde fossem abordadas questões referentes à
Matemática e à Física, que não puderam ser incluídos nos cursos normais. Além
disso, estudantes e professores apresentavam e discutiam trabalhos, por vezes
58
Naquela época, a Escola Politécnica, criada em 1893, funcionava no Edifício Paula Souza, situado na
Praça Cel. Fernando Prestes (SANTOS, 1985).
169
inéditos. Associado ao Seminário, encontrava-se o periódico “Jornal de
Matemática Pura e Aplicada” (D’AMBROSIO, 1999).
Luigi Fantappiè foi o primeiro diretor do “Jornal de Matemática Pura e
Aplicada” da Universidade de São Paulo, lançado em 1936 (primeiro e único
número). Além de Fantappiè, a revista era redigida por Giacomo Albanese e por
Gleb Wataghin. O primeiro fascículo, de junho de 1936, apresentou um resumo de
todas as conferências pronunciadas no “Seminário Matemático e Físico” do ano
de 1935. Luigi Fantappiè contribuiu com dois artigos: “Teoria matemática da luta
pela vida” e “Origem e desenvolvimento da teoria dos funcionais”. Omar Catunda
apresentou, igualmente, dois trabalhos: “Exposição de uma memória de Abel
sobre funções simétricas e teoremas da adição” e “Demonstração do teorema de
Jordan sobre curvas fechadas” (JORNAL DE MATEMÁTICA PURA E APLICADA,
1936).
Segundo Afonso D’Escragnole Taunay, os seminários matemático e físico,
eram realizados em sessões públicas ou abertas, quando vinham à tela dos
debates estudos realizados por pesquisadores nacionais e estrangeiros. “Por
vezes viram-se estas sessões honradas com a presença de verdadeiras
sumidades da ciência universal e de passagem por São Paulo" (ANUÁRIO,1939-
1949, p. 231).
O modo de apresentação e desenvolvimento de seminários já era adotado
na Europa, em países como Itália e Alemanha
59
. Fantappiè visitou a Alemanha
depois de ter recebido o prêmio Volta, concedido pela Real Academia da Itália,
entre 1931 e 1932. Nessa ocasião, entrou em contato com outro meio científico e
pode discutir os resultados originais alcançados em seus trabalhos sobre os
Funcionais Analíticos (LIMA, 2006, p. 28). Havia, portanto, um intercâmbio cultural
entre esses países os quais já tinham costume de realizar seminários, e não raro
apresentavam resultados originais na área de matemática e física.
Em “Souvernirs d’Apprentissage”, Weil lembra que se encontrou diversas
vezes com Fantappiè em Roma, no ano de 1925, e já naquela época portava
distintivo de fascista. Entretanto, apesar de anti-semita, na Itália, Fantappiè, foi
59
Segundo Belhoste (1998), os seminários incorporavam as atividades de diferentes escolas de pesquisa na
Alemanha no séc. XIX.
170
aluno favorito do matemático judeu Vito Volterra, e no Brasil, Omar Catunda, seu
assistente e admirador, era militante comunista (PIRES, 2006, p. 218).
O Curso de Análise de Fantappiè, dado para os alunos da Politécnica e da
Matemática, seguiam o seguinte currículo:
As aulas começaram com um curso de Análise até derivações e
integração de uma variável, equações diferenciais ordinárias e
funções de mais de uma variável (1º ano) mais números reais
(Dedekind, determinantes, matrizes e equações lineares (em
exames – palpite). No 2º ano, integrais múltiplas, séries de
funções e de potências, funções analíticas e estruturas algébricas
pelo livro de Van der Waerden além de seminários. Exames de +
ou – 3 horas individuais. No 3º ano, curso nemográfico (eq. Dif.)
(monográfico). Aulas eram em italiano e as piadas si por quem
entendia (CASTRUCCI, apud PIRES, 2006, p. 218).
Por intermédio de Fantappiè, o professor Omar Catunda obteve bolsa de
estudos do governo italiano, por quatro meses (de novembro de 1938 a março de
1939) na Universidade de Roma, quando acompanhou os cursos de Francesco
Severi e outros mestres.
Em 1939, com o retorno de Fantappiè à Itália, Omar Catunda tornou-se
professor interino de Análise Matemática e diretor do Departamento de
Matemática da FFCLUSP.
O Departamento de Matemática da FFCLUSP, nas primeiras décadas de
sua criação, mostrava-se preocupado, com as teorias matemáticas destinadas
aos alunos, de tal modo que concorressem para a formação de pesquisadores. As
questões pedagógicas eram reservadas para o último ano letivo do curso, ainda
assim facultativamente àqueles que manifestassem tivessem interesse. Dessa
forma, a cultura acadêmica voltava-se para os conteúdos matemáticos, não
apenas pelo que a matemática representava enquanto ciência, mas também por
representar contribuição eficiente à modernidade, cujos ares impregnavam a
comunidade acadêmica e a própria sociedade.
171
CAPÍTULO 7
OMAR CATUNDA, O ENSINO SECUNDÁRIO E O MOVIMENTO DA
MATEMÁTICA MODERNA
A luz, o sol, o ar livre envolvem o sonho do engenheiro.
O engenheiro sonha coisas claras: superfícies, tênis,
um copo de água. O lápis, o esquadro, o papel;
o desenho, o projeto, o número: o engenheiro
pensa o mundo justo, mundo que nenhum
véu encobre.
João Cabral de Melo Neto
Clifford Geertz, em obra intitulada “A interpretação das culturas” (1989),
defende o conceito de cultura como essencialmente semiótico
60
, acreditando que
o homem é um animal amarrado a teias de significados que ele mesmo teceu. A
cultura é o estudo dessas teias, uma ciência interpretativa à procura do
significado. Dessa forma, a antropologia interpretativa é um estudo que pretende
entender “quem as pessoas de uma determinada formação cultural acham que
são, o que elas fazem e por que razões elas crêem que fazem o que fazem”
(GEERTZ, 2001).
Procurando, como solicita Geertz, fazer uma interpretação de um
acontecimento, perscrutando seu significado, tencionamos identificar como o
professor Omar Catunda (1906-1986) concebia as relações entre matemática e
seu ensino, apresentando sua trajetória profissional, tomando como base fontes
60
Semiótica: estudo dos fenômenos culturais considerados como sistemas de significados, incluindo as
práticas sociais, comportamentos, etc., além dos sistemas de comunicação (HOUAISS; VILLAR, 2001, p.
2543).
172
primárias (anuários, revistas) e secundárias, especialmente e suas produções
didáticas.
7.1. Trajetória científica e educacional de Omar Catunda
Omar Catunda nasceu em Santos/SP, no dia 23
de setembro de 1906. Filho do médico Thomaz Catunda
e de Maria Lúcia Verde Catunda, cursou o Grupo Escolar
Cesário Bastos, e, segundo o próprio Catunda, foi um
aluno distraído e displicente. Ao estudar no Liceu
Comercial, já aos doze anos, distinguiu-se em Português
e Matemática; a seguir, cursou as duas últimas séries da
Escola de Comércio José Bonifácio. Em 1922 foi para o
Rio de Janeiro, onde se preparou para os exames
parcelados do Colégio Pedro II, estudando no Curso
Superior de Preparatórios, quando teve oportunidade de
estudar com os professores Antenor Nascentes na disciplina Português e
Sebastião Fontes na de Matemática. Para Catunda, esses dois professores
contribuíram de modo decisivo para sua formação, sendo que as explicações
precisas e claras de Fontes foram responsáveis por incutir nele o senso de rigor
matemático. Os outros exames parcelados foram prestados no Ginásio da Capital
do Estado de São Paulo. Sua preparação constou de estudos auto-didáticos, com
onze horas diárias, com exceção do Latim. Das matérias estudadas, a que mais
lhe agradou foi o estudo da Geometria, tomando como livro-texto a obra
Geometria Elementar” de Comberrousse (CATUNDA, 1985).
Com esse procedimento, obteve o primeiro lugar no exame vestibular da
Escola Politécnica da USP, em 1925. O primeiro ano do curso de engenharia era
chamado Curso Preliminar. Nele, devido ao domínio adquirido sobre a geometria
do espaço, não encontrou dificuldades no estudo da Geometria Descritiva. Na
disciplina “Complementos de Matemática”, teve seus primeiros contatos com o
Cálculo Diferencial Integral, ocasião em que travou contato com o professor
Theodoro Augusto Ramos, que posteriormente orientou seus estudos superiores
em Matemática. Além disso, foi o ganhador do Prêmio Cesário Motta, uma
173
medalha de ouro conferida ao melhor aluno do Curso Preliminar (CATUNDA,
1985).
Conforme se pode observar pelo depoimento oferecido ao Caderno nº 3 do
IFUFBA (1985), a característica que mais impressionou Catunda era o senso de
rigor matemático encontrada nas práticas do professor Sebastião Fontes. Essa
também era uma das características cobradas pelo MMM. Desse modo, é
razoável inferir que o MMM tenha encontrado simpatia por parte do professor
Catunda, vendo nesse movimento a possibilidade de melhoria no ensino
secundário.
Em 1930 formou-se engenheiro e em 1933 candidatou-se à vaga para
ocupar a cadeira nº 3 “Complementos de Geometria Analítica, Nomografia e
Cálculo Diferencial Integral” na Escola Politécnica da USP. José Octávio Monteiro
de Camargo (? – 1963) venceu o concurso, assumindo a cadeira em 1938, após
longa batalha jurídica
61
(LIMA, 2006).
Depois de formado, Catunda foi trabalhar como engenheiro da Prefeitura
de Santos, até que, em 1934, foi contratado pela FFCLUSP como assistente de
Luigi Fantappiè na disciplina Análise Matemática.
Nessa época, segundo seu depoimento, dedicou todo seu esforço ao
ensino e ao aperfeiçoamento das apostilas de análise, que, após acréscimos e
modificações foram publicadas primeiramente sob a forma de fascículos
mimeografados, levando o título “Curso de Análise Matemática”, o que
permaneceu nas diversas edições que se seguiram
62
.
Conforme Catunda, as apostilas de Cálculo e os fascículos do Curso de
Análise Matemática tiveram boa aceitação em todo o Brasil, proporcionando-lhe a
fama de grande matemático (1985, p. 95). Matemáticos como Elza Gomide e
Ubiratan D’Ambrosio atestam que o “Curso de Análise Matemática” foi o primeiro
livro de análise moderna escrito por um brasileiro e foi largamente utilizado nas
61
Para maiores detalhes sobre esse concurso ver a tese de doutorado intitulada “Vocação matemática como
reconhecimento acadêmico” de Adriana C. De Matos Marafon, 2001.
62
As apostilas foram transformadas em livro, dividido em sete partes, cuja primeira edição deu-se em 1952.
A partir de 1962, Catunda modificou esse formato, sintetizando as sete partes em dois volumes (LIMA, 2006).
174
instituições de nível superior brasileiras, por um determinado período (LIMA,
2006).
Omar Catunda ocupou o cargo de professor de Matemática do Colégio
Universitário entre 1934 a 1937. Na década de 1950, encarregou-se de ministrar
curso de férias para professores do ensino secundário e normal do Estado, em
colaboração com a Secretaria da Educação (Anuário da Escola Politécnica,
1951).
Orientado por Fantappiè, Omar Catunda iniciou estudos sobre a Teoria dos
Funcionais Analíticos e posteriormente, entre 1938 e 1939, realizou estudos pós-
graduados na Universidade de Roma, sobre esse mesmo tema. Retornando ao
Brasil, foi nomeado professor interino responsável pela cadeira de Análise
Matemática e Superior, ocupando, ainda, a chefia do Departamento de
Matemática da FFCLUSP.
7.2. Omar Catunda e a contratação de professores estrangeiros
O Decreto nº 7.069 de 1935, em seu art 42, § 1º, rezava que o contrato de
professores nacionais ou estrangeiros deveria ser proposto ao Conselho
Universitário, pelo Conselho Técnico Administrativo e ouvindo-se a Congregação.
Em seu § 2º mencionava que o contrato dependia da aprovação do Governo, e
seria concedido por período máximo de três anos, podendo ser renovado por
igual período a critério da Congregação e aprovação do Conselho Universitário
(PIRES, 2006, p. 265). A procura por professores estrangeiros, devido à 2ª Guerra
Mundial, dar-se-ia especialmente nos Estados Unidos e não na Europa.
As atas de reuniões da Congregação da FFCLUSP revelam como eram
realizadas as discussões para a contratação de professores e também a
importância que Catunda manifestava quanto à contratação desses professores,
escolhendo aqueles de “notório saber”, denominados como “autoridade na
matéria”. Mostra, também, que Catunda mantinha-se atualizado em relação às
pesquisas matemáticas em voga internacionalmente e o empenho na contratação
175
de dois matemáticos, ligados à abordagem axiomático-estrutural, característica da
Matemática Moderna, André Weil e Oscar Zariski.
A Ata da 12ª Reunião da Congregação da FFCLUSP, realizada aos 05 de
março de 1942, tratou da nomeação interina de Cândido Lima da Silva Dias para
a disciplina de Análise Superior; da nomeação interina de Benedito Castrucci para
a Cadeira de Geometria Analítica, Projetiva e Descritiva que ficou vaga devido à
transferência de seu titular, Giacomo Albanese, para a cadeira de Geometria
Superior; e a designação de Fernando Furquim de Almeida para a parte de
Complementos de Matemática da cadeira de “Crítica dos Princípios e
Complementos de Matemática”. Nesta reunião, Omar Catunda tomou a palavra
para enfatizar que a indicação de Candido da Silva Dias era temporária, “foi feita
à vista de não terem ultimadas as providências para contrato de um professor
extrangeiro [sic], o que se deverá dar para o ano próximo” (PIRES, 2006, p. 230).
Apesar da inclusão de professores como Candido Lima da Silva Dias,
Benedito Castrucci, Fernando Furquim de Almeida, a restrição feita por Catunda
recaiu apenas sobre Candido Dias, para a cadeira de Análise Superior, sob a
alegação de que a exigência de um professor estrangeiro estaria ligada à
complexidade da disciplina, além da formação ainda recente de Candido Lima da
Silva Dias.
A Ata da reunião da Congregação de 05 de junho de 1942 mostra a
indicação de Omar Catunda dos nomes de André Weil e Jesse Douglas para
regerem a cadeira de Análise Superior, em conformidade com sugestões de Mario
Schemberg, que se encontrava nos Estados Unidos, havendo ainda a
preocupação de que o professor escolhido pudesse dar suas aulas em francês ou
espanhol (PIRES, 2006, p. 231-232).
A vinda de André Weil para o Brasil aconteceu por intermédio de André
Dreyfus, Diretor da FFCLUSP e presidente da Congregação, que vai para os
Estados Unidos em 1944, a convite da Fundação Rockfeller em viagem de
estudos e intercâmbio universitário. Em lá estando, aproveitou para procurar
professores que pudessem preencher as cadeiras vagas da Faculdade de
Filosofia. Nessa ocasião, Weil encontrava-se refugiado nos Estados Unidos,
176
favorecido por um programa de acolhimento de cientistas franceses e judeus,
financiado pela Fundação Rockefeller e mostrava-se insatisfeito com as
condições de trabalho que lhe foram dispensadas. As posições oferecidas para
Weil estavam muito aquém de sua capacidade (PIRES, 2006). Entre 1943 e 1944,
viu-se lecionando, quatorze horas por semana, Álgebra e Geometria para recrutas
da Army Science Training Program, pouco interessados em matemática. Em
1944, André Weil faz um pedido a Hermann Weyl, nestes termos:
A prostituição consiste em desviar alguma coisa de alto valor para
um uso vil, por razões mercenárias, isto é o que tenho feito nestes
dois anos. Eu anuncio minha decisão de deixar,
independentemente do que acontecer, minha presente posição, e
eu preciso de sua ajuda para obter um meio de subsistência de
minha família (WEIL, 1991, p. 193).
A insatisfação de Weil combinada com a necessidade de contratação de
um matemático para a FFCLCUSP, fez com que Catunda redigisse uma carta
(provavelmente endereçada a Dreyfus) requerendo a aprovação do nome de
André Weil para reger a disciplina de Análise Superior. Parte da carta é lida
perante a Congregação da Faculdade, em 15 de dezembro de 1944:
Fiquei muito apreensivo com o pessimismo demonstrado em sua
carta, a respeito da vinda de André Weil, embora esteja
convencido de seu interesse pelo caso, insisto em lhe pedir por
favor que não deixe escapar esta oportunidade de contratar um
mestre deste quilate. [...] A perda desta oportunidade seria
incrivelmente maior do que pode parecer a primeira vista e tenho
fortes motivos para afirmá-lo (CATUNDA, apud PIRES, 2006, p.
246).
A ata da reunião realizada em 20 de agosto de 1944 apresenta uma
discussão referente a contratos de professores para dar cursos de extensão na
Faculdade de Filosofia. Dentre eles, aparece o nome de Oscar Zariski, cujo valor
foi enaltecido por Dreyfus. O parecer foi votado e aprovado por unanimidade.
(PIRES, 2006, p. 240). Foi aprovada a proposta da realização de um curso de
extensão universitária por um ano de Geometria Algébrica ministrado por Oscar
Zariski, em 15 de dezembro de 1944. Alguns trechos de uma carta de Catunda
encontram-se transcritos nessa ata, revelando os méritos do professor Zariski e
também apresentando apoio à vinda desse professor:
177
O Prof. Zariski é full professor da Universidade John Hopkins e
membro da National Academy of Science. É ainda membro do
“Institute of Advanced Studies” e editor das mais importantes
revistas de matemática dos Estados Unidos: Annals of
Mathematics, American Journal of Mathematics e Transaction of
the American Mathematical Society. Os seus trabalhos versam
todos sobre Geometria Algébrica, sendo que o volume de sua
autoria publicado em 1935, na coleção Ergebnisse der
Mathematischan Wissenchaften é considerado de importância
fundamental no Departamento de Matemática desta universidade,
pois os seus ensinamentos sobre Geometria Algébrica virão
complementar o curso iniciado pelo professor Giacomo Albanese
sobre o mesmo assunto (CATUNDA, 1944, PIRES, 2006, p. 248-
249).
As sugestões de Catunda para a contratação de renomados matemáticos
estrangeiros e que foram acatadas pela Congregação, sugerem a respeitabilidade
de Catunda perante a comunidade acadêmica e, ainda, revelam a necessidade de
poder contar com o prestígio de matemáticos oriundos de outros centros de
produção acadêmico-científica.
7.3. Concursos de Omar Catunda para o Departamento de Matemática
Os concursos para catedráticos na FFCLSP passam a ocorrer a partir de
1937, sendo que o primeiro edital para concurso do Departamento de Matemática
foi para a cadeira de Análise Matemática, em 16 de maio de 1939. Os candidatos
à vaga deveriam entregar na secretaria da faculdade cinqüenta exemplares
impressos de monografia original ainda não publicada com no mínimo cinqüenta
páginas, sobre assunto de livre escolha, relacionada à matéria do concurso
(LIVRO DE CONCURSOS, apud PIRES, 2006, p. 305).
O único candidato à cadeira foi Omar Catunda, que fez sua inscrição em 24
de agosto de 1939, apresentando exemplares mimeografados da tese “Teoria das
formas diferenciais e sua aplicação”. Juntou, além disso, os seguintes trabalhos
de sua autoria:
1) “Sobre as funções ou funções de matrizes”, separata do “Jornal
de Matemática” da Universidade de São Paulo; 2) “Un teorema
sugl’insiemi, Che si reconnette allá teoria dei funzionali analitici”,
separata dos “Rediconti della R. Academia Nazionale Dei Lincei”.
178
Juntou ainda os originais, em italiano, do seu trabalho ainda não
publicado, “Sui sistemi di equazioni alle variazioni totali in piú
funzionali incogniti
63
” (LIVRO DE CONCURSOS I, p. 52, apud
PIRES, 2006, p. 306).
Para compor a banca examinadora desse concurso, foram convidados os
professores Henrique Jorge Guedes e Mario Whaterly, Luigi Fantappiè, Giacomo
Albanese e Gleb Wataghin.
Não se sabe qual o motivo pelo qual o concurso não foi realizado. Segundo
observou Rute Pires (2006), nos livros de concursos não há nenhuma indicação
da razão de sua não realização. Destaca a partida de Fantappiè para a Itália
naquele mesmo ano, devido à guerra. Entretanto, não se pode vincular a viagem
de Fantappiè à não realização do concurso.
O Decreto Estadual nº 12511 de 21 de Janeiro de 1942, em seu artigo 64,
§ 2º, rezava que seria concedido título de doutor a todos os aprovados em
concurso para professor catedrático. Esse foi o caso do matemático Omar
Catunda, que em 1944 tornou-se catedrático de Análise Matemática
64
. As provas
do concurso realizaram-se de 25 a 30 de setembro, quando Omar Catunda
defendeu a tese intitulada “Sobre os fundamentos da teoria dos funcionais
analíticos”, cuja comissão organizadora foi composta pelos professores Paulo de
Menezes Mendes da Rocha e Telêmaco van Langendonck (indicados pelo
Conselho Universitário) e Carlo Tagliacozzo, Achille Bassi e F. M. de Oliveira
Castro (indicados pelo Conselho Técnico-administrativo) (ANUÁRIO DA
FFCLUSP, 1939-1949, p. 383-384).
A ata de 26 de setembro de 1944, constante no Livro de Concursos II, p. 3-
5, relata como foi realizada a prova escrita de Omar Catunda. Primeiramente
encontra-se arrolada uma lista de 20 pontos, da qual fora sorteado o ponto de
número 1, contendo o seguinte enunciado: “Teorema Fundamental da Álgebra e
conseqüências”. A prova teve início às 14 horas e foi concedido ao candidato o
63
O trabalho, “Sui sistemi di equazioni alle variazioni totali in piú funzionali incogniti”, posteriormente foi
publicado nas atas da Reale Accademia d’Italia (DIAS, 2001).
64
Em 1943, pelo decreto nº 13.426, de 23 de junho, foi baixada a regulamentação dos concursos para
professor catedrático e para a livre-docência. Os primeiros concursos sob esse dispositivo legal aconteceram
em 1944 para provimento das Cadeiras de Mecânica Racional e Análise Matemática (ANUÁRIO FFLCUSP,
1939-1949, p. 381).
179
prazo de 5 horas para discorrer sobre o ponto sorteado. A partir das 19 horas, o
presidente da comissão, o professor Paulo de Menezes Mendes da Rocha fez a
recolha das folhas, que levou a rubrica de todos os membros da banca e do
candidato, inclusive.
As folhas recolhidas e rubricadas foram encerradas em envelope
próprio o qual foi selado e rubricado pelos membros da Comissão
e depositado na urna fechada à chave, a qual ficou em poder do
Diretor da Faculdade, em envelope fechado e rubricado por todos
os membros da Comissão Julgadora (LIVRO DE CONCURSOS II,
apud PIRES, 2006, p. 310-311).
A prova didática, do mesmo modo que a escrita, era realizada a partir de
um ponto sorteado de uma lista de 20 pontos. Para esse concurso o ponto
sorteado foi o de número 19, “Função analítica de mais de uma variável. Extensão
do teorema de Cauchy”. O candidato tinha 24 horas para preparar-se para a
preleção, cuja duração regulamentar era de 50 minutos e foi realizada no dia 28
de setembro de 1944 (LIVRO DE CONCURSOS II, apud PIRES, 2006, p. 312).
A defesa de tese foi realizada no dia 29 de setembro de 1944, no salão
nobre da Faculdade, às 8 horas e 45 minutos, versando “Sobre os fundamentos
da teoria dos funcionais analíticos”, sendo o candidato argüido pelos
componentes da banca. (LIVRO DE CONCURSOS II, apud PIRES, 2006, p. 312-
313).
Em 30 de setembro de 1944 teve início, no edifício da Escola Caetano de
Campos, às 8 horas e 30 minutos a avaliação dos títulos apresentados por Omar
Catunda.
Conforme consta na Sexta Ata do Livro de Concursos II, os professores
participantes da banca emitiram seus pareceres em relação aos títulos
apresentados pelo candidato, tecendo comentários sobre a pequena quantidade
de trabalhos apresentados – apenas cinco – a saber: 1) “Sobre as funções ou
funções de matrizes”, publicado no “Jornal de Matemática de São Paulo”, em
1937; 2) “Un teorema sugl’insiemi, Che si reconnette allá teoria dei funzionali
analitici”, separata dos “Rediconti della R. Academia Nazionale Dei Lincei”, em
1939; 3) “Sobre os sistemas de equações de variações totais em mais de um
180
funcional incógnito”, publicado nos “Anais da Academia Brasileira de Ciências, em
1942; 4)“ Um exemplo de sistema autônomo” e 5) “Área de uma superfície curva”.
Entretanto, essa constatação foi suavizada com observações como as que
proferiu Achile Bacci “Nestas circunstâncias evidentemente transitórias, o
examinador acha de seu dever atribuir importância preeminente à qualidade dos
trabalhos científicos tendo a certeza de que, quem já fez bons trabalhos outros
bons poderá fazer no futuro para própria satisfação e para o progresso da ciência”
(BACCI, apud PIRES, 2006, p. 317).
Com relação à qualidade científica dos trabalhos apresentados, os
comentários recaíram sobre as publicações 1, 2 e 3, quando foram unânimes em
afirmar que demonstraram a “capacidade para a pesquisa científica em elevados
campos da Matemática Moderna” (BACCI, apud PIRES, 2006, p. 317), além de
versarem sobre “assuntos originais nos setores mais transcendentais de pesquisa
matemática moderna” (ROCHA, apud PIRES, p. 314).
Finalizando o concurso, ainda no dia 30 de setembro de 1944, às 9h e 15
min, Omar Catunda procedeu a leitura da prova escrita, sendo acompanhado pela
comissão julgadora por meio de projeção ipidiascópica (projetor de imagens). Em
seguida, a comissão reuniu-se em sessão secreta para proceder ao julgamento
da prova.
A partir das 10 h e 45 min, daquele mesmo dia, no salão nobre da
Faculdade, foi realizada a apuração final das notas obtidas por Omar Catunda,
que alcançou as seguintes médias: prof. Paulo de Menezes Mendes da Rocha,
dez; Telêmaco van Langendonck, 9,75; Francisco Mendes de Oliveira Castro,
dez; Carlo Tagliacozzo, 9,75 e Achile Bacci, 9,5. O candidato foi julgado
habilitado, e de acordo com o art. 97 do decreto 13426, indicado para provimento
da cadeira nº VIII, Análise Matemática, como professor catedrático da FFCLUSP
(LIVRO DE CONCURSOS II, apud PIRES, p. 318-319).
Clóvis Pereira da Silva afirma que, no mesmo ano de 1944, Omar Catunda
obteve livre docência. Pires não encontrou nenhuma indicação de recebimento
desse título, assinalando, entretanto, que o decreto 13.426/1943 sobre regimento
de concurso, apresenta na página 18, o artigo 103 que reza: “O candidato
181
habilitado em concurso para cátedra terá direito de livre-docência da mesma”
(2006, p. 320).
O próprio Omar Catunda, em “Depoimento” (1985), esclarece a questão:
“Em 1944, prestei concurso para a cátedra de Análise Matemática, obtendo, com
o título correspondente, os títulos de doutor e de livre-docência, sendo nomeado
para o cargo em 1945”.
Uma conclusão da pesquisadora Pires, que importa ainda destacar é que,
nos estudos de Catunda, até meados da década de 1940, prevalece a temática
sobre a teoria dos funcionais analíticos apresentados por Fantappiè.
7.4. Trilhas de Catunda no Ensino Secundário: idéias e práticas
Foram muitos os caminhos
percorridos por Catunda ao longo de sua
vida profissional. Dentre tantos, destacamos
a seguir, aquelas trilhas que nos interessam
mais de perto para a consecução desse
estudo.
Em 1946, Omar Catunda vai para
Universidade de Princeton, nos Estados
Unidos, com bolsa oferecida pela Fundação
Rockefeller
65
, participando de diversos
cursos, dentre os quais de Emil Artin (1898-
1962), N. Cramer, Heinz Hopf (1894-1971),
Hermann Weyl (1885-1955), John Von Neumann (1903-1957).
Voltando para São Paulo em 1947, engajou-se na campanha em defesa do
petróleo brasileiro, chegando a ser presidente do Centro de Estudos e Defesa do
Petróleo. Foi também candidato a deputado estadual, apoiado pelos comunistas e
petebistas, porém sua candidatura foi impugnada pela justiça eleitoral. Catunda,
65
A partir de 1942, a Fundação Rockefeller voltou sua atenção para a FFCLUSP, auxiliando na compra de
equipamentos para realização de pesquisas em diversos departamentos e subsidiando diversas bolsas de
estudos aos docentes dessa instituição (ANUÁRIO DA FFCLUSP, 1939-1949).
182
embora militante, não se filiou ao Partido Comunista Brasileiro. Criticava o
governo getulista pelo descaso com a educação da maior parte do povo brasileiro,
preocupando-se unicamente com a elite. Para Catunda, o governo havia resolvido
“democratizar o ensino secundário, sem perceber [ou fingindo não perceber] que
não havia material humano, para fazer essa democratização com a necessária
seriedade”. Este seria o motivo pelo qual os estudantes chegavam às
universidades sem o devido preparo. Também defendia maiores investimentos
nos cursos superiores, de modo que formassem profissionais qualificados para
melhorar e ampliar o ensino secundário (CATUNDA, apud LIMA, 2006, p. 39).
Catunda não especificou de que modo poderiam ser aplicados os
investimentos que se destinariam aos cursos superiores. Manter-se-ia a estrutura
estabelecida para o Departamento de Matemática da FFCLUSP, com três anos
destinados ao bacharelado e um ano aos assuntos pedagógicos?
7.4.1. A aula inaugural de 1945
Na qualidade de professor catedrático de matemática, Omar Catunda
proferiu uma aula inaugural no ano de 1945, quando da abertura dos cursos da
Faculdade de Filosofia Ciências e Letras Universidade de São Paulo (FFCLUSP),
intitulada “A posição da matemática na cultura geral”, buscando identificar como
esse matemático concebia, naquele tempo, as relações entre matemática e seu
ensino.
Naquela época, na FFCLUSP, como abertura de cada ano letivo, era
realizada uma solenidade especial, marcada pela presença de autoridades
administrativas e culturais do Estado de São Paulo e da USP, além de
professores, alunos e auxiliares da Faculdade de Filosofia. A celebração consistia
em uma aula inaugural proferida por um professor catedrático, representando um
dos cursos que compunham a faculdade, a convite do Diretor dessa instituição.
Coube ao professor Omar Catunda o privilégio de pronunciar a aula
inaugural do ano de 1945, a convite do professor André Dreyfus, então Diretor da
FFCLUSP, catedrático do Curso de Biologia Geral e doutor em Medicina. A
183
escolha recaiu sobre o nome desse professor de matemática em razão de sua
recente aprovação como professor catedrático da FFCLUSP, conforme ele próprio
esclareceu em seu discurso.
Sob o título “A posição da matemática na cultura geral”, Omar Catunda
discursou ao auditório acadêmico, procurando justificar seu ponto de vista sobre
as finalidades da FFCLUSP, chamando primeiramente a atenção para a forma
como foram estabelecidas as primeiras escolas profissionais, favorecendo
escolas como a de Medicina e de Engenharia, que, não obstante a excelência de
ensino ali ministrado, não estimulava estudos significativos nas áreas como
Letras, História e Filosofia, bem como o hábito da pesquisa científica.
As faculdades de filosofia, ciências e letras apareceram nesse ambiente
como “oásis culturais daquele deserto” embora não tivessem conseguido, até
aquele momento, obter a plena compreensão da sociedade em relação às suas
finalidades e não ter atingido a eficiência desejada, que caracterizariam esses
institutos, constatou Catunda.
Catunda voltou-se para a defesa do que considerou primordial: “a formação
de um meio cultural elevado, em harmonia com sua matéria prima, que é o povo
brasileiro” (CATUNDA, 1945, p. 10). Para esse matemático, a criação das
faculdades de filosofia, ciências e letras influiu diretamente na constituição de um
meio cultural, possibilitando a formação de professores para o ensino secundário,
propiciando aquela harmonização. Seu interesse por esse nível de ensino ficou
expresso nos seguintes termos:
... esta influência se fará sentir, em primeiro lugar pela constante
publicação de novos estudos realizados em nossos laboratórios e
em nossos seminários, assim como em livros e compêndios
elaborados aqui; em segundo lugar, pela formação de um número
cada vez maior de professores secundários, cuja mentalidade
mais esclarecida pelo contacto com um ambiente de estudos
sérios terá, por sua vez, influência cultural e moral sobre os
futuros estudantes; em terceiro lugar, por todos aqueles que tendo
passado por estes bancos escolares e tendo adquirido uma
cultura geral e especializada, resolvam entregar-se a outras
atividades em que possam influir no meio ambiente, como o
jornalismo, o rádio, as letras e as artes em geral, ou a política e
cargos governamentais (CATUNDA, 1945, p. 12).
184
Para a formação de um cidadão culto, seria necessário o desenvolvimento
de um meio cultural no qual a cultura geral fosse mais valorizada do que a
especialização prematura ou o aprendizado de grande número de disciplinas.
Para tanto, Catunda colocava, em primeiro lugar, o estudo da Língua Portuguesa,
o qual deveria ser cultivado não apenas nas aulas específicas, como também em
todas as matérias e nas conversas coloquiais dos alunos. Quanto ao estudo da
Matemática, Catunda posicionou-a em segundo lugar, porquanto o raciocínio
matemático dependeria fundamentalmente de uma clara exposição oral ou
escrita, devendo ser feita, portanto, em linguagem precisa e correta.
Mas, qual a posição que a Matemática deve ocupar no ensino secundário?
Para responder essa questão, Catunda definiu, grosso modo, a Aritmética
como a ciência dos números, a Álgebra como o estudo das relações e algoritmos
e a Geometria, como a ciência da forma e do espaço. Destacou, ainda, que a
Aritmética e a Geometria são fundamentadas na intuição, tendo, dessa forma,
suas origens na pré-história, enquanto a Álgebra é pura criação do espírito
humano, cujos primeiros vestígios datam do século III
66
.
Assim sendo, o ensino da Matemática teria por finalidade máxima, na visão
de Catunda, fazer o aluno passar do estado do pensamento rudimentar do
conhecimento, baseado em regras e definições decoradas, para o estado mais
desenvolvido da capacidade de raciocínio puro, sobre entes abstratos e uma
intuição geométrica especial bastante adiantada. Além disso, dever-se-ia levar em
conta o estágio de desenvolvimento cognitivo do adolescente, sem perder de vista
a questão prática da organização dos programas de ensino. Para a passagem de
um estado para o outro, seria necessário um retorno às bases fundamentais,
eliminando os pontos em que essas bases se apóiam na intuição, até atingir “um
conjunto orgânico de conseqüências lógicas dos postulados fundamentais”
(CATUNDA, 1945, p.19).
Para a Aritmética, Catunda sugeriu que os alunos aprendessem, já desde o
início do curso, a idéia de número como um atributo de um conjunto de objetos,
66
O modo de pensar algébrico aparece em Diophanto da Alexandria, no século III; e a criação da Álgebra
propriamente dita deve-se ao árabe Alchwarizmi, no século IX (CATUNDA, 1945, p. 18).
185
de tal modo que dois conjuntos cujos objetos que estão em
correspondência biunívoca têm sempre o mesmo número, que a
soma de dois números é o número que corresponde ao conjunto
de todos os objetos contidos nos dois conjuntos dados, etc
(CATUNDA, 1945, p. 19-20).
A partir dessa base intuitiva, o professor deveria justificar as propriedades
fundamentais da Aritmética (propriedades comutativa e associativa da adição e da
multiplicação), porquanto essas propriedades, juntamente com a definição de
desigualdade e as operações inversas, constituem a base do raciocínio rigoroso
da Aritmética. As conseqüências das propriedades fundamentais, quais sejam, as
noções de fator, múltiplo, divisibilidade, a teoria do máximo divisor comum, os
números primos, após serem apresentadas de modo intuitivo, deveriam ser dadas
com uma sucessão lógica impecável e demonstradas rigorosamente, sustentou
Catunda.
Para o ensino das noções fundamentais da Geometria, que deveriam ser
introduzidas em consonância com a Aritmética deveriam, igualmente, buscar o
auxílio da intuição, para o estabelecimento de suas propriedades fundamentais.
Para Catunda, o valor cultural dessas noções reside mais no raciocínio
empregado do que nos resultados obtidos, uma vez que, mesmo quando os
resultados do ensino foram esquecidos, restará sempre, como resíduo, uma
capacidade de raciocínio puro, de incalculável riqueza. A compreensão desses
conceitos é fundamental, pois, do contrário,
... se o professor só se preocupa em ensinar com fórmulas e
regras, se o aluno é obrigado a aprender os processos práticos
como quem aprende a lidar com uma ferramenta, que nunca mais
utilizará, então seria melhor que ocupasse esse tempo assim
perdido em coisas mais úteis como jogar futebol, ir ao cinema, ou
namorar, e que o ensino da matemática fosse limitado aos
engenheiros e arquitetos e aos que se destinassem ao estudo das
ciências Matemáticas e Físicas (CATUNDA, 1945, p. 21-22).
Além disso, Catunda defendeu que “a introdução do ensino da Álgebra
deve ser retardada o mais possível, permitindo o desenvolvimento do raciocínio
aritmético e geométrico”, pois a função cultural do raciocínio algébrico só aparece
quando esta perde seu caráter de puro mecanismo. Para a Álgebra, seria
necessário que fosse percebida como um meio eficaz para resolver problemas e
186
não como um mecanismo de resolução de equações e sistemas, que os alunos
decoram e não conseguem compreender as vantagens e sua verdadeira utilidade.
Nesse caso, observou Catunda, o conhecimento dos alunos é limitado a uma
certa prática do algoritmo algébrico, tornando-os incapazes de resolver
geometricamente um problema ou fazer um raciocínio aritmético (CATUNDA,
1945, p. 24).
Finalizando, desde que colocadas em prática essas sugestões,
procedendo-se, portanto, a uma revisão das noções fundamentais, Catunda
preconizava que, ao final do curso secundário, os alunos poderiam estabelecer
para a Geometria e Aritmética, bases lógicas inteiramente independentes do
mundo exterior, dispondo de uma maior acuidade de raciocínio, possibilitando-
lhes a aquisição de uma cultura geral mais elevada.
7.4.2. Algumas observações
Observa-se que, em 1945, Catunda não defendia a unificação dos ramos
da Matemática, quais sejam, a Álgebra, a Geometria e a Aritmética, por
considerar que historicamente a Álgebra surgiu somente a partir do século III,
sugerindo, dessa forma, uma provável inclinação desse matemático pelo
“princípio genético”, consistindo este num modo de exposição dos conhecimentos
segundo a ordem pelos quais foram obtidos pelos seres humanos. Assim, toda
didática se resumiria em “estudar sucessivamente, na ordem cronológica, as
diversas obras originais que contribuíram para o progresso da ciência” (MIGUEL,
1993, p. 41-56).
Catunda preconizava uma formação para o professor de matemática a
partir de uma abordagem dos conteúdos matemáticos. Embora suas sugestões
fossem baseadas preponderantemente na teoria matemática, sem explorar
aspectos pedagógicos inerentes às atividades educacionais, não se afastava,
contudo, das questões de ensino propriamente ditas. Manifestava preocupação
em elevar a cultura geral do povo brasileiro, a partir de sua integração com os
professores oriundos das faculdades de filosofia, ciências e letras recém criadas,
fazendo supor que se tratava de um matemático que não promovia um
187
afastamento ou marginalização da licenciatura, colocando-a em segundo plano.
Ao contrário, percebe-se um esforço em compatibilizar aspectos educacionais
com a pesquisa científica, com reflexos para a cultura geral da população.
Sua visão de mundo tecia uma trama que relacionava ciência, cultura e
educação, de tal forma que a ciência estava umbilicalmente ligada à cultura, como
se pode observar em sua aula inaugural; por sua vez a cultura se relacionava com
a política, estando a serviço da construção de um meio intelectual, profissional;
além da relação mantida entre educação e ciência, em prol de um ideal
civilizatório.
Catunda defendia uma cultura geral como pressuposto de uma cultura
específica, na verdade, não haveria como dissociar uma da outra.
Independentemente do regime político vigente no país, este sempre estaria na
dependência de intelectuais responsáveis pela filosofia de ensino a ser
implantada, valendo dizer, portanto, que tais personagens haveriam de portar
sólida cultura geral, além daquela recomendada, necessária e voltada para o seu
próprio campo de atuação profissional, o que refletiria nas políticas educacionais.
Não se cogitaria de modernidade sem contar com profissionais dotados desse
preparo.
Já em 1945, expressava a intenção de revisar os programas do ensino
secundário de Matemática, de modo que esse ensino atingisse todos os
indivíduos da sociedade brasileira, característica essa que seria enfatizada
posteriormente, durante o Movimento da Matemática Moderna, na década de
1960, sob o lema “matemática para todos”.
7.4.3. O Boletim da Sociedade de Matemática de São Paulo
A Sociedade de Matemática de São Paulo foi criada com o intuito de
“estimular e manter um interesse ativo pela Matemática, incentivar a pesquisa
nesse ramo da ciência e estudar as questões relativas ao seu ensino de grau
secundário e superior”. Assim, em 7 de abril de 1945, foi fundada a Sociedade,
em sessão solene presidida pelo então Diretor da FFCLUSP, André Dreyfus. A
188
primeira diretoria da Sociedade foi eleita pelos sócios fundadores por três anos,
sendo constituída por Omar Catunda, na qualidade de presidente; Candido Lima
da Silva Dias, como vice-presidente; Luiz Henrique Jacy Monteiro, secretário
geral; Francisco Antonio Lacaz Neto, secretário auxiliar; Benedito Castrucci,
tesoureiro e Fernando Furquim de Almeida, como diretor de publicações (Boletim
da SMSP, 1946, 2-5).
Por ocasião da constituição dessa Sociedade, ficou estabelecido por seus
membros que haveria publicação de um boletim oficial denominado “Boletim da
Sociedade de Matemática de São Paulo”. A princípio, o Boletim foi pensado como
meio de divulgação de artigos originais e exposições de caráter didático.
Entretanto, após entendimento com a Fundação Getúlio Vargas, esta se
comprometeu em responder pela publicação do Boletim, bem como distribuir
gratuitamente aos membros da Sociedade as publicações da “Summa Brasiliensis
Mathematicae
67
, proceder ao intercâmbio com revistas estrangeiras e colocar à
disposição cópias de artigos que fossem solicitadas pela Sociedade. Por força
desse convênio, a Sociedade deliberou por reduzir o alcance do Boletim, que
passou “a ter caráter didático e informativo, publicando exposições novas de
assuntos já conhecidos, pequenas notas, etc.” (Boletim da SMSP, 1946, p. 6).
Convém destacar que qualquer trabalho ou comunicação que fossem
apresentados à Sociedade, seriam submetidos à uma apreciação prévia por parte
da Comissão de Redação, formada pelos professores Fernando Furquim de
Almeida, André Weil, Candido Lima da Silva Dias e Jean Dieudonné, os quais
ficaram incumbidos de proferir decisão a respeito de sua eventual publicação,
fosse na íntegra ou mesmo que em resumo, no Boletim ou “Summa Brasiliensis
Mathematicae
Aparentemente, o acordo realizado entre a Sociedade e a Fundação
Getúlio Vargas, procurava delimitar as matérias que seriam objeto de divulgação
por ambas as publicações, ficando reservadas para a “Summa Brasiliensis” textos
de maior complexidade e inéditos.
67
Fundada em 1945, era uma publicação de nível internacional, financiada pelo Instituto Brasileiro de
Educação, Ciência e Cultura, no Rio de Janeiro. Publicou seu último fascículo em 1968 (SILVA, 2003).
189
Os Estatutos da Sociedade de Matemática de São Paulo apontam seu
interesse por assuntos relativos ao ensino secundário expressos no artigo 2º,
capítulo 1: “A Sociedade interessar-se-á, igualmente, pelas questões relativas ao
ensino de Matemática de grau superior e secundário, e promoverá estudos
tendentes ao aperfeiçoamento desse ensino” (Boletim da SMSP, 1946, 9).
Em obediência a esse artigo, na sessão solene realizada em 6 de
dezembro de 1945, Omar Catunda encarregou os professores Francisco Lacaz
Neto, Benedito Castrucci, Furquim de Almeida, Abraão de Moraes e Abrahão Bloh
para:
... estudarem as questões relativas ao ensino secundário da
Matemática. Essa comissão, entrando em entendimentos com a
Diretoria Geral do Ensino e a Sociedade dos Professores
Secundários, realizou durante as férias, um curso especialmente
destinado aos professores secundários que teve ótima acolhida
(Boletim da SMSP, 1946, p. 6).
O Boletim da Sociedade de Matemática de São Paulo, em seu Fascículo 2,
de dezembro de 1946, noticiou que Omar Catunda passou o cargo de presidente
da Sociedade ao vice-presidente, professor Cândido Lima da Silva Dias, uma vez
que havia recebido uma bolsa de estudos da Rockefeller Foundation, indo para a
Universidade de Princeton em setembro daquele mesmo ano. Nesse mesmo
fascículo, encontra-se registrado que a Sociedade enviou para publicação no
Summa Brasiliensis Mathematicae” trabalhos de Oscar Zariski, André Weil,
Fernando Furquim de Almeida e Jean Dieudonné. Informa ainda que houve uma
modificação de orientação por parte da Fundação Getúlio Vargas, o que dificultou
o intercâmbio entre a Sociedade e a Fundação, acarretando na possibilidade do
Boletim ampliar sua atuação, de modo a acolher maior número de trabalhos
originais.
O último volume do Boletim da Sociedade de Matemática de São Paulo foi
publicado em 1966. Em 1968, depois de entendimentos entre a SMSP e o IMPA,
o qual desejava criar uma sociedade de matemática em âmbito nacional, a SMSP
foi extinta, e seu acervo bibliográfico foi incorporado para a biblioteca da
Sociedade Brasileira de Matemática, fundada em 1969 (SILVA, 2001, p. 8).
190
Nos idos de 1949, nova referência sobre a formação de uma comissão de
professores da FFCLUSP para discutir sobre o ensino secundário volta à baila,
desta vez constituída por outros professores, tendo ainda Catunda como
organizador. Não obtivemos outros dados que façam referência a esse assunto.
7.4.4. Provas e concursos
O Jornal Diário da Noite, em 07 de maio de 1949, publicava em destaque a
matéria “Não há opiniões divergentes sobre a decadência do ensino”, cujo título
foi extraído de uma expressão utilizada por Catunda durante uma entrevista,
constando da referida reportagem: “O fato é que não há uma só opinião
divergente sobre a decadência do ensino secundário
68
.
Antes de abordarmos o motivo pelo qual Catunda proferiu esta declaração,
achamos oportuno valer-nos de um “resumo histórico” oferecido pelo professor de
matemática e renomado autor de livros didáticos, Ary Quintela, extraído dos Anais
do III Congresso Brasileiro do Ensino de Matemática, em 1959, que nos permitiu
compreender as razões pelas quais o ensino secundário virou notícia.
Como relatou Ary Quintela, em fins de 1946, os resultados dos concursos
de ingresso para a carreira militar, prestados tanto pelos alunos que concluíram
os quatro anos do Ginásio e inscreveram-se para ingresso nos cursos prévios das
Academias Militares (Escola de Aeronáutica, Escola Naval e Escolas
Preparatórias do Exército), quanto pelos que concluíram os três anos do Curso
Científico e candidatavam-se ao ingresso no primeiro ano das Escolas Superiores
Civis e Militares, foram desastrosos. Essa constatação de tal modo empolgou a
opinião pública, que foi aberto um debate pela imprensa o qual se denominou “A
decadência do ensino secundário”. Ainda segundo Quintela (ANAIS III CBEM,
1959), longos debates públicos foram realizados. Pelo que podemos inferir,
também em 1949, eram destaque nas manchetes de jornais.
68
Na década de 1950, após cursarem quatro anos do ensino primário e realizarem o exame de admissão, os
alunos garantiam seu ingresso no ensino secundário. Com duração de sete anos, o curso secundário
encontrava-se estruturado em dois ciclos: o primeiro, de quatro anos, chamado Ginasial e o segundo, de três
anos, subdividido em Clássico e Científico, conforme previsto na Lei Orgânica do Ensino Secundário
(Reforma Capanema), homologada em 9 de abril de 1942, pelo Decreto-lei nº 4244 (CHAGAS, 1980, p. 115).
191
Assim, Omar Catunda, como presidente da Sociedade de Matemática de
São Paulo e professor de Análise Matemática da FFCLUSP, foi convidado a
pronunciar sua opinião acerca das dificuldades pelas quais passava o ensino
secundário daquela época, em maio de 1949, no Diário da Noite.
Para Catunda, as principais causas que podiam ser atribuídas à propalada
“decadência” do ensino secundário, recaíam sobre o programa exigido, questões
burocráticas das autoridades e a falta de preparo dos professores.
Segundo Catunda, as provas do concurso para professores de matemática
nas escolas oficiais do Estado sugeriam diversos problemas relacionados com o
ensino de Matemática no secundário. Esta constatação levou-o a debater esse
assunto em conferência no Instituto de Engenharia, quando foram sugeridas
reuniões específicas na Sociedade de Matemática para tratar acerca do reflexo
das sucessivas reformas sofridas pelo ensino de Matemática, e ainda, a falta de
orientação apresentada pela maioria dos professores.
Essa preocupação já havia sido enunciada pela Sociedade, informou
Catunda. Uma das medidas tomadas pela Sociedade foi nomear uma comissão
especialmente encarregada de organizar e convocar reuniões para discutir os
problemas do ensino secundário. Participavam dessa comissão, os professores
Osvaldo Sangiorgi, Abraão Bloh e Ester Resnik
69
.
A primeira reunião realizou-se no Instituto de Engenharia, quando se
discutiu, entre outros assuntos, o rendimento do ensino primário. A maioria dos
professores secundários presentes no encontro, julgava que o ensino primário
havia decaído nos últimos anos, como podia ser constatado pelos exames de
admissão ao ginásio
70
, revelando falta de preparo dos candidatos. Aventou-se
que uma das causas desse despreparo estaria no critério utilizado para a
remoção de professores para estabelecimentos mais requisitados, tomando como
base a porcentagem de alunos aprovados pelo professor, o que levaria as escolas
oficiais de ensino primário em facilitar a promoção dos alunos. A matéria
69
Osvaldo Sangiorgi (1921- ), Abrão Bloh e Ester Resnik foram diplomados pela FFCLUSP nas turmas de
matemática de 1941, 1942 e 1947 respectivamente (ANUÁRIO, 1939-1949).
70
Os exames de admissão ao Ginásio compreendiam provas realizadas pelos alunos ao ingresso no ensino
secundário (VALENTE et alli, 2004).
192
jornalística afirmou que os professores presentes ao evento mostraram-se
alarmados com a possibilidade de que esse critério de remoção de professores
passasse a ser utilizado também no ensino secundário.
Nesse sentido, os professores mostraram-se avessos às alterações no que
diziam respeito à remoção, o que nos permite concluir que os professores
secundaristas estavam satisfeitos com as normas vigentes relativamente à
transferência. Atrelar a remoção do professor às aprovações obtidas por seus
alunos, significaria a perda de autoridade? Qual a importância da reprovação para
o professor de matemática? Para que o professor primário fosse removido para
outra escola, mais requisitada, teria que se sujeitar a aprovar alunos que talvez
não estivessem aptos a cursarem a série seguinte, havendo, portanto, um
afrouxamento nas avaliações realizadas, acabando por refletir nos exames de
admissão ao ginásio. Seria uma forma de o governo minimizar as dificuldades
surgidas em relação ao aumento do número de alunos e a escassa quantidade de
professores? Tal medida também faria com que houvesse um aumento do
número de alunos no ensino secundário. Como esse critério poderia agravar
ainda mais a situação do ensino secundário, já considerado, naquela época como
decadente?
Questões como essas exigiam um estudo acurado, “só possível com um
amplo debate sobre o assunto”, alertou Catunda (1949). Apesar das medidas
tomadas pela Sociedade para discutir as deficiências do ensino secundário,
Catunda observou ser indispensável contar com a participação dos professores
nos debates, de maneira que os esforços realizados para melhoria do ensino
surtissem efeito, posto que estes estavam mais diretamente em contato com a
questão. Além disso, a Sociedade pretendia incrementar publicações sobre o
ensino de Matemática em seu Boletim.
Vê-se que as discussões sobre o ensino secundário partiam, num primeiro
momento, de um meio essencialmente composto por matemáticos e que, pouco a
pouco, vai contando com a colaboração de professores prestigiosos. A
participação desses professores no debate acabou vindo ao encontro ao que já
manifestara anteriormente Catunda, quando se mostrou interessado numa ampla
participação de professores secundários nas discussões sobre o ensino.
193
Em conseqüência dos debates públicos conduzidos pelos jornais da época,
por iniciativa do Ministério da Aeronáutica e apoio do Ministério da Educação,
realizou-se em 1951, o primeiro encontro de âmbito nacional entre professores,
denominado de “Conferência Nacional de Estudos sobre a Articulação do Ensino
Médio e Superior”, sediado pelo Instituto Tecnológico da Aeronáutica, em São
José dos Campos/SP (QUINTELA, apud ANAIS III CBEM, 1959).
O evento também é noticiado no Anuário de 1951, confirmando que
ocorreu entre os dias 14 e 21 de junho daquele ano e visou o encontro de
educadores do ensino médio com os de ensino superior, civil e militar, com o
intuito de elevar o nível do ensino médio. Segundo a nota, os temas do conclave
foram analisados por seis sub-comissões que chegaram a conclusões
“verdadeiramente revolucionárias algumas, quer nos métodos, quer na estrutura
básica do ensino médio”. A FFCLUSP enviou como representantes os
professores Paulo Saraiva de Toledo e Benedito Castrucci, os quais participaram
das reuniões sobre o ensino médio de Física e Matemática, respectivamente
(ANUÁRIO, 1951, p. 343). Os dados obtidos não nos permitiram averiguar a
presença de Catunda nessa conferência.
Observa-se um conflito ditado pela preocupação com a qualidade de
ensino, da parte dos professores e as práticas políticas implementadas para a
Educação. Harmonizar esses interesses era a grande questão.
7.4.5. Participando da revista “Notas de Matemática e Física
Por iniciativa dos alunos de Matemática e Física da FFCLUSP, surgiu a
idéia de elaborar uma revista, que contemplasse tanto alunos da graduação
quanto professores secundários. Mais ainda, era ambição dos alunos obterem um
espaço no qual pudessem publicar seus primeiros artigos científicos.
Surge assim, em 1953, a revista “Notas de Matemática e Física”, sob
direção do então aluno da Secção de Matemática Ubiratan D’Ambrosio. Os
estudantes do Departamento de Matemática e Física contaram com ajuda
financeira dos professores da Faculdade de Filosofia. Além da contribuição
194
pecuniária, os professores deram grande apoio aos alunos, formando, inclusive,
seu corpo editorial, constituído pelos professores: Omar Catunda, Edison Farah,
Cândido L. da Silva Dias, Fernando Furquim de Almeida, Benedito Castrucci,
Marcelo Damy S. Santos, Hans Stammreich, David Bohm, Mário Schenberg,
Oscar Sala e Abrahão de Moraes.
O primeiro número das “Notas de Matemática e Física” foi inaugurado com
um artigo de Omar Catunda (1953, p. 05-10), intitulado “O ensino da Matemática
na escola secundária”. Nele, o então professor catedrático de Análise Matemática
da FFCLUSP, faz um estudo sobre o ensino da Matemática no secundário.
A escolha do tema não soa como mera coincidência, carregando com ele a
impressão de que o professor Catunda mantinha o firme propósito de se
preocupar com o nível do ensino secundário, tentando já desde o início da
graduação daqueles alunos, conscientizá-los da importância do assunto tratado.
Pode-se cogitar que em sendo a carreira universitária restrita a um pequeno
número de egressos daquele curso, uma boa parcela daqueles seguiria para o
ensino secundário, quando então, teriam a oportunidade de trabalhar com aquele
seguimento escolar, dotando-o da qualidade pela qual se empenhava Catunda.
Pretendeu contribuir para responder à seguinte questão: Para que serve o
ensino de Matemática? Assim se expressa a esse respeito:
O valor desse estudo reside não na matéria aprendida, mas no
hábito adquirido de um processo de raciocínio puro, universal e
absoluto; a mente que aprendeu uma vez esse processo de
raciocínio, pode esquecer todas as fórmulas, regras e
denominações estudadas, mas saberá, diante de um problema ou
de uma situação real, discernir as premissas, simplificar ou
esquematizar os dados e tirar as conclusões que se impõem, pelo
menos em uma primeira aproximação da realidade (CATUNDA,
1953, p. 6).
Defende, como princípio fundamental, um ensino de Matemática todo
baseado no raciocínio. Afirma, enfaticamente, que a “Matemática é raciocínio”, ou
seja, é o culto ao bom senso, o qual “todo professor dessa matéria deveria ter em
mente”. (CATUNDA, 1953, p. 6). A adoção e fidelidade a esse princípio evitariam,
segundo Catunda, erros comuns que ocorrem nas escolas brasileiras, como o de
195
procurar incutir nos alunos uma variedade de regras e fórmulas sem que os
alunos percebam sua razão de ser.
Em seguida, Catunda fez referências ao ensino da Geometria e Álgebra.
Indica, para essas áreas, alguns procedimentos desejáveis aos professores e
organizadores de programas de Matemática de modo a se obter uma melhoria do
seu ensino no secundário.
Quanto ao ensino da Geometria, precisaria ser introduzido pelas formas
mais elementares e esquemáticas, a partir de exemplos concretos; pois, para
Catunda, é pela observação e pela experiência que melhor se conduz o aluno a
aceitar, os postulados sobre pontos, retas e planos, dos quais se deduzem todas
as outras proposições geométricas. A Geometria, assegura o professor Catunda,
é a área que melhor se presta ao desenvolvimento do raciocínio lógico:
É no estudo da Geometria que tradicionalmente se introduzem
explicitamente as noções lógicas de proposição, teorema,
corolário, hipótese, tese, etc. (...) bem conduzido o ensino, com
constantes referências a exemplos concretos e freqüentes
exemplos de aplicação, como os problemas de construção com
régua e compasso, obtêm-se certamente um desenvolvimento
notável de capacidade de raciocínio. Para isto é porém necessário
que o professor não se restrinja à exigência de regras decoradas
e fórmulas de cálculo de comprimento de segmentos e de áreas
de figuras planas, que só servem para encher a cabeça dos
pobres alunos, e dedique o melhor de seu esforço para conseguir
que os alunos compreendam o desenvolvimento do raciocínio em
todas as fases (CATUNDA, 1953, p. 9).
No que diz respeito à Aritmética, deveria o ensino secundário conservar o
mais possível sua feição concreta, com grande quantidade de exemplos, de modo
a convencer o aluno da necessidade das regras e fórmulas dadas:
Com exemplos concretos, acumulados e repetidos, é
perfeitamente possível ao professor conduzir o raciocínio dos
alunos de modo a fazê-los aceitar como fato evidente por si
mesmo, e não pelo falso princípio do “magister dixit”, a justeza das
regras e fórmulas deduzidas [grifo do autor], (CATUNDA, 1953, p.
8).
Como se pode observar, o primeiro artigo da revista fez referência
justamente ao ensino da Matemática na escola secundária, mostrando uma
196
preocupação por parte de alunos e docentes de nível superior com a melhoria do
ensino de Matemática no secundário. Além disso, o professor Catunda, ao propor
sugestões nas diversas áreas que compõe a Matemática, pareceu buscar
convencer os professores do ensino secundário, a utilizar novos métodos de
ensino, de modo a conduzir ao desenvolvimento do raciocínio “puro, universal e
absoluto” dos alunos em todas as fases.
7.4.6. A Portaria 1951: por uma menor quantidade de conteúdos
O Conselho Diretor da Associação Brasileira de Educação (ABE) solicitou a
um seleto número de professores secundaristas e de escolas superiores que
opinassem sobre o programa do ensino secundário vigente em 1954, sob a
alegação de que em inquéritos promovidos pela imprensa, em pareceres
divulgados de diversas maneiras, sustentava-se que os programas oficiais do
ensino secundário continham demasiado conteúdo, estranho aos interesses dos
adolescentes e acima de suas capacidades.
Novamente convidado a opinar sobre ensino secundário, precisamente
sobre o programa oficial de matemática, Omar Catunda teve seu parecer
publicado na Revista Educação, órgão da ABE, em junho de 1954.
Nessa época, vigorava a Portaria Ministerial nº 966 de 2 de outubro de
1951, complementada pela Portaria nº 1045 de 14 de dezembro de 1951. Tratava-
se de uma legislação que alterou os programas de dezesseis disciplinas do
ensino secundário, anteriormente estabelecidos pela Reforma Capanema de
1942. O novo texto legal estabelecia um programa simplificado, o Programa
Mínimo, que diferia dos anteriores pela menor quantidade de conteúdos, aqueles
considerados essenciais, aos quais as instituições escolares ficaram sujeitas a
executá-los
71
. A esse conjunto de normas passaremos a denominar
simplesmente como “Portaria 1951”
72
.
71
Objetivando completar os programas básicos já estabelecidos pela Portaria 966, o então Ministro da
Educação e Saúde, Simões Filho, expede a Portaria nº 1.045, em 14/12/1951, a qual apresentava programas
analíticos, juntamente com instruções metodológicas concernentes a cada uma das disciplinas que
compunham o ensino secundário daquela época.
72
Maiores detalhes sobre a Portaria 1951, ver a dissertação de mestrado “Tempos pré-modernos: a
matemática escolar dos anos 1950” de Alex Sandro Marques (2005).
197
Contrariamente à Reforma Capanema, a Portaria 1951 previa a elaboração
de instruções metodológicas para acompanhar os novos programas
73
. Os
assuntos deveriam ser ilustrados com aplicações e exemplos, nas primeiras
séries o ensino deveria ter um caráter prático e intuitivo de modo a despertar o
aluno, aos poucos e cuidadosamente, para o método dedutivo, com rigor
moderado.
Mais que a diminuição dos conteúdos, o programa possibilitava a
elaboração de um plano de desenvolvimento mais adequado às especificidades
de cada região, de modo que cada Estado tinha autonomia para elaborar seus
próprios planos, se assim decidissem. Caso contrário, ficariam sujeitos ao plano
preparado pelo Colégio Pedro II, incumbido de elaborar os programas do curso
secundário para esta legislação
74
.
Resumidamente, as instruções metodológicas enfatizavam que: cada
assunto deveria ser ilustrado com aplicações e exemplos; - a unidade matemática
deveria ser posta em evidência; o ensino de matemática nos primeiros anos
deveria ter caráter pratico e intuitivo; dever-se-ia despertar aos poucos e
cuidadosamente o aluno para o método dedutivo; o rigor deve ser moderado
(MARQUES, 2005, p. 60-61).
Como se vê, os debates acerca da metodologia e conteúdos de ensino,
mantinham-se vivos. Nesse sentido, em parecer oferecido ao Conselho Diretor da
ABE, Catunda indicou como principal crítica ao ensino de matemática no
secundário, a sua forma de apresentação, que segundo ele, era excessivamente
formalista. Ao invés de professores, examinadores e fiscais, alunos e seus pais
preocuparem-se com a eficiência real do ensino, qual seja, a formação da cultura
e da personalidade do estudante, os fatores que valorizavam eram os aspectos
73
A Reforma Capanema procurou acatar diferentes sugestões advindas das camadas mais representativas
da sociedade, dentre as quais se destacavam religiosos, militares e educadores como Euclides de Medeiros
Guimarães Roxo. Ao procurar seguir essas sugestões, acabou por gerar um extenso programa. Esses
representantes não chegaram a um acordo quanto às instruções metodológicas, motivo pelo qual a reforma
de 1942 suprimiu recomendações sobre os métodos e processos pedagógicos que deveriam nortear os
professores. Esse assunto é tratado na dissertação de mestrado de autoria de Bruno Alves Dassie (2001), “A
matemática do curso secundário na Reforma Capanema”.
74
A Congregação do Colégio Pedro II foi incumbida de elaborar os programas das diversas disciplinas do
curso secundário para o Programa Mínimo, por meio da Portaria nº 614, de 10 de maio de 1951 (MARQUES,
2005).
198
formais, burocráticos – provas e exercícios corretos, exames bem feitos,
certificados de promoção e diplomas.
Para Catunda, entretanto, era necessário insistir num preceito já acolhido
pela maioria dos pedagogos, mas violado no cotidiano escolar: “O ensino da
matemática no ginásio deve servir para desenvolver a capacidade de raciocínio, e
não para dar ao aluno o conhecimento de regras e fórmulas de aplicação simples
ou imediata”. Ou seja, “em todo o curso secundário não se deve dar nunca uma
regra sem a necessária justificação” (1954, p. 25).
Impunha-se, portanto, a introdução da abstração de forma progressiva,
uma vez que a abstração procura afastar elementos que são acessórios para a
validade do raciocínio matemático.
Seria sempre preferível partir da representação concreta, seja para
números inteiros, seja para as frações, principalmente para estabelecer as
primeiras propriedades. A utilização freqüente de exemplos concretos de
aplicação deveria ir habituando o aluno à noção de número abstrato, seja inteiro
ou fracionário. Também os números reais deveriam ser introduzidos e estudados
com exemplos concretos, isto é:
...como medida de grandezas comensuráveis ou incomensuráveis,
(aliás, estas últimas só deveriam ser introduzidas na Geometria,
na teoria da medida); esta noção de número real como medida
deve ser mantida até o fim do curso secundário, pois a teoria
abstrata dos números reais só tem cabimento num curso superior
(1954, p. 25).
O ensino dos números relativos no primeiro ano do ginásio era, para
Catunda, uma das maiores incoerências do programa, “um dos maiores absurdos
do programa”, pois exigia da parte do aluno um esforço de abstração não
condizente com o estágio de desenvolvimento cognitivo em que ele se
encontrava, incutindo regras que o aluno acabava por decorar sem compreender
a justificativa correspondente. Pela mesma razão, na segunda série ginasial, não
deveria ser introduzido o cálculo literal e o estudo das equações, sem antes se ter
completado o estudo da aritmética (CATUNDA, 1954, p. 27).
199
Quanto à Geometria Elementar Clássica, esta deveria ser ensinada de
modo elementar, mas de forma rigorosa e sistemática, sem reduzi-la a um
formalismo inútil.
Após essa preleção de caráter geral, Catunda sugeriu a retirada de pontos
do programa que revelassem a intenção de ensinar regras práticas e processos
de cálculo que não contribuíssem para o desenvolvimento do raciocínio do
estudante. Em seguida, passou a sugerir modificações específicas no programa,
atendo-se especialmente ao primeiro ciclo, uma vez que, para ele, a diversidade e
complexidade dos assuntos tratados no segundo ciclo cobravam um estudo mais
apurado e um conhecimento mais íntimo do problema.
Para o primeiro ciclo, ofereceu as seguintes sugestões:
a) Na primeira série, insistir muito mais nos problemas das
quatro operações. Suprimir os processos de cálculo abreviado
e divisão aproximada, que o professor poderá dar, querendo,
como curiosidade ou complemento do ensino.
b) Suprimir o ponto I-6. Números relativos.
c) Dar à parte II a ordem mais natural, que é:
1. Múltiplos e divisores. Divisibilidade. Caracteres de
divisibilidade por 10 e suas potências; por 2, 4, 8, 5, 25, 9,
3, 11 (com dedução de todas as regras). Justificação da
“prova dos nove” para as operações elementares.
2. Máximo divisor comum. Algoritmo de Euclides.
Propriedades.
3. Mínimo múltiplo comum. Propriedades relação com o
máximo divisor comum.
4. Números primos entre si. Números compostos e números
primos. Crivo de Erastótenes. Decomposição de um número
em fatores primos. Aplicação à pesquisa do máximo divisor
comum e do mínimo múltiplo comum.
d) Na segunda série, suprimir “expoente zero; expoente
negativo” (ponto I-1).
e) No ponto I-4, suprimir “regra prática para a extração da raiz
cúbica dos números inteiros. Prova”.
f) No ponto I-5, penso que seria preferível suprimir a referência a
grandezas incomensuráveis, e consequentemente a números
irracionais; cujo estudo estaria melhor enquadrado na
Geometria, quando se estuda a teoria da medida.
g) No mesmo I-5, suprimir “números fracionários”.
200
h) No lugar da atual parte I I do programa, continuar na segunda
série com o estudo da Aritmética, segundo a parte I do
programa da 3ª série. Acrescentar: câmbio, divisão
proporcional, regra de sociedade.
i) Dar apenas um início de noções de Álgebra no fim da 2ª série:
números relativos, expressões algébricas (com muitos
exercícios sobre valor numérico) monômios e polinômios, etc.
j) Penso que deveria deixar toda a Geometria plana no quarto
ano, onde seria feito um estudo completo e sistemático dessa
parte da Matemática que é essencial para o curso secundário
e que hoje em dia é a mais sacrificada. Neste caso a Álgebra
ficaria toda na terceira série e mais a pequena parte que
coubesse na segunda, suprimindo-se porém o ponto I-2 do
atual programa da 4ª série, pois o estudo do trinômio é muito
difícil de ser bem compreendido no curso ginasial. Alega-se
comumente que a interrupção do estudo de Álgebra por um
ano leva o aluno a esquecer completamente essa matéria; a
isso posso responder observando que tal alegação procede
efetivamente quando o ensino é formalista (e portanto,
praticamente inútil); se o aluno aprendeu a Álgebra
compreendendo-a efetivamente, ele pode esquecer algumas
regras e fórmulas, mas em pouco tempo de 2º ciclo ele
recuperará todo o conhecimento.
k) No ponto II-10, acrescentar: método dos isoperímetros
(CATUNDA, 1954, p. 26).
Para o segundo ciclo, fez as seguintes recomendações:
a) Antes do estudo dos logaritmos, introduzir: 1) estudo do
trinômio do 2º grau, 2) os expoentes zero, negativos e
fracionários, o cálculo de potências com tais expoentes e os
expoentes irracionais.
b) No estudo da Geometria, suprimir o ponto V-5, ou reduzi-lo ao
estudo das superfícies cilíndricas, cônicas e de revolução.
c) No ponto 8, acrescentar: triângulos esféricos.
d) Transferir o estudo das secções cônicas para a 3ª série, onde
penso que deveria ser restabelecido o estudo elementar de
algumas transformações em Geometria: simetria, homotetia,
semelhança, rotação e translação.
e) Na 3ª série, reduzir ao mínimo a parte II – Noções sobre
derivadas. Suprimir o conceito de função primitiva e de integral
definida (pontos 4 e 5).
f) Simplificar também o estudo das equações algébricas (pontos
4, 5 e 6), acrescentando, porém uma noção sobre a resolução
aproximada das equações (CATUNDA, 1954, p. 27).
201
Finalizando suas observações, Catunda alertava para a necessidade de
aumentar o número de aulas de matemática, sendo que não deveria haver menos
de quatro aulas semanais dessa disciplina e, nos últimos anos, “tanto no primeiro
como no segundo ciclo, devem ser dadas aulas diárias” (1954, p. 27).
Nota-se que o parecer oferecido por Catunda não se contrapunha aos
preceitos constantes nas instruções metodológicas previstas na Portaria 1951
para o ensino de matemática. Também nelas, vê-se assinalada com ênfase, a
necessidade de manter-se um ensino eminentemente prático e intuitivo, não
estabelecendo um rigor exagerado, mesmo no segundo ciclo, de modo que a
explanação da matéria não se tornasse fastidiosa. Além disso, orientavam para
que as passagens de uma afirmativa para outra fossem sempre justificadas, com
todo cuidado.
Diante das recomendações de Catunda, publicadas na revista “Educação”,
como resposta à solicitação da ABE, convida-nos a uma indagação nos seguintes
termos: seriam aquelas recomendações mantidas por Catunda na oportunidade
em que se dedicou a escrever livros didáticos durante o MMM?
7.4.7. O parecer de 1954 e o Congresso de 1955
Em 1955, ocorre o Primeiro Congresso Brasileiro do Ensino de
Matemática, em Salvador, Bahia. Como representantes da Sociedade de
Matemática de São Paulo, compareceram Omar Catunda e Osvaldo Sangiorgi.
Nesse congresso, do mesmo modo como sugeriu Catunda, as teses
apresentadas propuseram alterações que diziam respeito basicamente à ordem
em que esses conteúdos eram apresentados nas séries. A idéia de modificação
do ensino somente suscitou interesse em suprimir ou alterar a ordem dos
conteúdos arrolados no programa, mantendo-se a estrutura da Portaria 1951, de
modo que as instruções metodológicas foram endossadas pelos participantes do
congresso, ou seja, a parte didática continuou condizente com a metodologia
indicada pela portaria.
202
O programa proposto pelo professor Sangiorgi diferiu daquele aprovado
pelo Congresso para Curso Ginasial, apenas no que se referia à trigonometria,
que para Sangiorgi, deveria ser ensinada no 4º ano Ginasial e o Congresso votou
pela sua inclusão na 1ª série do Curso Colegial. Como conseqüência, a
Geometria no Espaço, a qual deveria ser introduzida no 1º ano do Curso Colegial
conforme sugerido na tese de São Paulo, fora colocada no 2º ano na versão final
proposta pelo Congresso, de modo a abranger todos os conteúdos relativos à
Trigonometria na 1ª série, evitando assim, a divisão de seus conteúdos.
Ao confrontarmos as sugestões de Catunda com as sugestões oferecidas
por Sangiorgi no Congresso, verificamos que, apesar de não serem em sua
maioria compatíveis, ainda continuavam sendo relativos à ordem em que esses
conteúdos deveriam ser inseridos no programa. Algumas propostas oferecidas
por Catunda foram seguidas, tanto por Sangiorgi como pelo programa aprovado
pelo congresso, como é o caso da seguinte sugestão: os números relativos serem
suprimidos da 1ª série do ensino ginasial; a sugestão de suprimir o item III da 2ª
série ginasial, qual seja, “Binômio linear; equações e inequações do primeiro grau
com uma incógnita; sistemas lineares com duas incógnitas”, foi recomendado
tanto por Sangiorgi quanto pelos congressistas. Para Catunda, o estudo do
trinômio do 2º grau deveria ser realizado no curso colegial, “pois o estudo do
trinômio é muito difícil de ser bem compreendido no curso ginasial” (1954, p. 26).
Nas conclusões do congresso, relativas aos horários e programas, foi proposto
um estudo particular do estudo do 2º grau, para a 3ª série do Curso Colegial.
Outras sugestões, entretanto, não foram acatadas (1955, p. 34). Uma delas, que
nos chamou atenção, dizia respeito ao restabelecimento do “estudo elementar de
algumas transformações em Geometria: simetria, homotetia, semelhança, rotação
e translação”, já proposto anteriormente na Reforma Capanema Unidade VII, da
3ª série do Programa do Curso Científico e proposto novamente pelo GEEM, em
conformidade com programa proposto pela Organização Européia de Cooperação
Econômica (OECE), publicado pelo GEEM, em seu volume 2, 1965, p. 153.
A década de 50, para o ensino secundário, apresentou-se como um
período de consenso entre os professores, sobre os métodos e conteúdos a
serem ministrados, não havendo por parte dos professores secundaristas
exigências reais de mudanças. Constata-se um descontentamento por parte dos
203
professores em relação ao número de aulas semanais de Matemática previstas
no programa – três aulas semanais – insuficientes para que se cumprisse as
exigências estipuladas pelo Programa Mínimo. A legislação permitia aumentar a
quantidade de aulas desde que o número de horas de toda a grade curricular não
ultrapassasse o máximo previsto pela Reforma Capanema, ou seja, para
aumentar as aulas de uma determinada disciplina, necessariamente deveria haver
redução da carga horária de uma outra (MARQUES, 2005).
O grande mote do Congresso de 1955 foi a preocupação com o
desprestígio da disciplina e a reivindicação para o aumento do número de aulas
de matemática por semana. Segundo Marques (2005), o congresso endossou as
orientações metodológicas propugnadas pela Portaria 1951, enfatizando que a
matemática desempenha um papel preponderante “como objeto de cultura, um
instrumento de trabalho e fator de aperfeiçoamento mental”, sendo, portanto,
disciplina indispensável para a formação do cidadão moderno, devendo ser
destacada no currículo do ensino secundário. (SANGIORGI, 1955, p. 112). Para
implementar o programa, o Congresso “reconhece a necessidade e propõe a
elevação do número de aulas semanais para quatro, no curso de ginásio e cinco
no de colégio” (ANAIS, 1955, p. 19).
A discussão sobre a necessidade de um programa apresentando um rol de
assuntos mínimos permeará os primeiros encontros sobre o ensino de
matemática da década de 1960, incluindo-se os conceitos de conjuntos e
estrutura.
7.4.8. Participações em Congressos: 1959
Em 1959, no III Congresso Brasileiro do Ensino de Matemática, realizado
na cidade do Rio de Janeiro em 20 a 25 de julho, sob o patrocínio da Campanha
de Aperfeiçoamento e Difusão do Ensino Secundário (CADES), cujo principal
objetivo era “estudar os problemas relativos ao ensino da matemática nos cursos
secundário, comercial, industrial, normal e primário” (ANAIS, III CBEM, 1959, p.
13), foi apresentada uma tese intitulada “Sobre uma Revista de Matemática para
o Ensino Médio”, de autoria dos professores Elon Lages Lima e Omar Catunda.
204
Os anais não trazem o texto relativo à tese, mas apresentam as conclusões do
congresso relativas ao assunto, recomendando que fosse criada uma Revista de
Matemática nos moldes apresentados na tese e que fosse constituída uma
comissão integrada pelos professores Omar Catunda, Osvaldo Sangiorgi, Mário
de Oliveira e Martha Blauth Menezes para empreender os trabalhos iniciais da
sua organização (ANAIS III CBEM, 1959, p. 236).
7.4.9. Participações em Congressos: 1961
A fórmula que eu reivindicaria para o Brasil não é
‘abaixo Euclides’ e sim, ao menos Euclides!
Omar Catunda
Com o objetivo de integrar os países das Américas para discutir assuntos
relacionados com a Educação Matemática, em 1961, foi fundado o Comitê
Interamericano de Educação Matemática (CIAEM), tendo como um dos principais
incentivadores Marshall Stone, então Presidente do “International Comittee of
Mathematical Instruction ICMI.
A preocupação de Catunda com o ensino secundário levou-o a participar da
Primeira Conferência Inter-Americana sobre o Ensino de Matemática (I CIAEM),
realizada em Bogotá, Colômbia, de 4 a 9 de dezembro de 1961. Financiada pela
National Science Foundation (NSF) dos Estados Unidos, a I CIAEM contou com a
participação de prestigiosos matemáticos como Marshall Stone dos Estados
Unidos e Gustave Choquet da França.
A I CIAEM teve como principal objetivo divulgar, nos países latino-
americanos o MMM, buscando alcançar junto aos participantes um compromisso
de promoção de mudanças curriculares em seus países, aos moldes do que já
vinha ocorrendo nos Estados Unidos e Europa.
Uma das principais idéias discutidas nessa conferência defendia uma
mudança no ensino da geometria nas escolas secundárias, passando a ser
ensinada sob o ponto de vista da Álgebra Linear, ao invés da Geometria
Euclidiana.
205
O Professor Howard Fehr, dos Estados Unidos, em sua conferência
“Reforma do Ensino da Geometria” apoiou as idéias de Jean Dieudonné,
defendidas na Conferência de Royaumont (1959), sustentando, para a escola
secundária, o ensino dos tópicos principais da geometria euclidiana, que poderia
ser feito em dois ou três meses, dando-lhe, em seguida, um tratamento algébrico,
combinando a Álgebra com a Geometria, levando os estudantes ao estudo dos
espaços vetoriais o quanto antes (RUIZ; BARRANTES,1997).
Entretanto, nesta mesma Conferência, Omar Catunda manifestou-se
contrário à posição de Fehr, no que dizia respeito ao tratamento a ser dado à
Geometria Euclidiana no ensino secundário. Ao proferir sua palestra intitulada “A
preparação de professores de matemática”, parodiou a famosa frase de
Dieudonné, “abaixo Euclides!”, da seguinte maneira: “a fórmula que eu
reivindicaria para o Brasil não é ‘abaixo Euclides’ e sim, ao menos Euclides!”.
Tratava-se de um artigo no qual Catunda expunha a situação do ensino de
matemática no Brasil, destacando aspectos relativos à formação de professores,
quando alertou sobre a escassez de professores graduados, má formação de
professores, dificuldades de assessoramento e capacitação, etc. (RUIZ;
BARRANTES, 1997).
Ao final do evento, várias recomendações foram oferecidas pela CIAEM:
- que a formação dos professores de ensino médio estivesse a cargo das
universidades, sob a influência dos matemáticos mais competentes. Que
a parte pedagógica se limitasse às suas devidas proporções;
- que regularizassem os contatos entre professores secundários e
universitários;
- que se facilitasse a titulação dos professores que estivessem na ativa.
- que fossem estimuladas as realizações de cursos e a criação de
institutos de caráter experimental para serem aplicados os novos
métodos de ensinar matemática.
Solicitava, ainda, que os delegados se empenhassem junto aos governos
de seus países, para que fossem adotadas medidas efetivas para a
implementação da renovação do ensino de matemática no ensino médio, além de
206
incentivar as universidades e institutos formadores de professores para que
capacitassem os futuros professores, em conformidade com as recomendações
indicadas pela Comissão (RUIZ; BARRANTES, 1997).
Como podemos observar nas recomendações oferecidas pela Conferência,
a formação dos professores estaria diretamente vinculada ou sob domínio do que
pensavam os matemáticos, aliás, os mais competentes, implicando dizer que toda
didática poderia ser utilizada, desde que não comprometesse o rigor matemático.
Ainda nesse congresso, nota-se a presença maciça de matemáticos, reunidos a
convite de Mashall Stone, para juntos discutirem questões relativas ao ensino de
matemática. Assim, o Brasil foi representado por uma delegação composta pelos
matemáticos Omar Catunda, Alfredo Pereira Gomes e Leopoldo Nachbin. Vê-se,
desse modo, a importância dada aos matemáticos e pelos matemáticos no
processo de renovação do ensino de matemática.
7.4.10. Participações em Congressos: 1962
Entre 22 e 28 de julho, realizou-se em Belém do Pará o IV Congresso
Brasileiro de Ensino da Matemática, com a participação de delegados de diversas
regiões brasileiras.
A delegação paulista, de acordo com artigo publicado na Folha de São
Paulo em 16 de agosto de 1962, foi representada pelo “professor Catunda e seus
assessores: Osvaldo Sangiorgi, Benedito Castrucci e a professora Lucila Bechara,
secretária da comissão”.
Já o Jornal O Estado de São Paulo, em 30 de junho de 1962, informava o
temário organizado para o IV Congresso:
1. A formação dos professores de matemática e as faculdades de filosofia;
2. O aperfeiçoamento do professor de matemática;
3. Correlação entre o ensino na escola e o currículo das faculdades de
filosofia;
4. Introdução da matemática moderna na escola secundária;
207
5. Experiências realizadas em cursos regulares ou experimentais;
6. Reestruturação do ensino da matemática ante a Lei de Diretrizes e
Bases;
7. Didática da matemática na escola secundária;
8. Verificação da aprendizagem;
9. Liberdade de ensino.
Como se verifica no item 4, a introdução da MM no secundário é colocada
em pauta pelo Congresso, manifestando abertamente a aspiração de levar
adiante um novo programa para a matemática nesse nível de ensino.
Os assuntos relativos à MM ficaram sob a responsabilidade do GEEM de
São Paulo, o qual relatou as experiências realizadas pelo grupo e levou a
proposta “Assuntos mínimos para um moderno programa de matemática para o
ginásio”, previamente aprovado no V Encontro de Mestres em São Paulo
promovido pela CADES e Inspetoria Seccional de São Paulo em 27 e 28 de junho
de 1962 (GEEM, 1962).
O tema já vinha sendo discutido mesmo antes do Encontro de Mestres,
como mostra o Jornal Folha de São Paulo, de 21 de maio de 1962, “Professores
discutem ensino da Matemática Moderna”. Nesse encontro, Catunda presidiu
reunião no GEEM, assessorado por Osvaldo Sangiorgi e realizado nas
dependências da Faculdade de Filosofia da Universidade Mackenzie, com o
objetivo de apresentar relatórios sobre as experiências realizadas e pertinentes à
introdução da Matemática Moderna no ensino secundário. Discutiu-se acerca dos
assuntos mínimos de um programa de matemática para o ginásio, enfatizando os
conceitos de conjuntos e estruturas e de como adequá-los ao programa de
matemática em vista da LDB.
Os “Assuntos mínimos para um moderno programa de matemática para o
ginásio: orientação e sugestões para o seu desenvolvimento” recebeu aprovação
unânime do IV CBEM (GEEM, 1962).
Naquela ocasião, o professor Omar Catunda teve seu trabalho intitulado
“Os conceitos fundamentais da matemática, conjuntos e estruturas” publicado
208
pelo GEEM, na obra “Matemática moderna para o ensino secundário”. Nele,
procurou introduzir as idéias de conjuntos e estruturas, uma vez que estas se
constituem no fundamento da MM. Apresentou, num primeiro subtítulo, as
principais notações e definições matemáticas utilizadas na Teoria dos Conjuntos.
Em seguida, introduz de uma forma simples, a noção de estrutura:
Para que um conjunto possa ser tratado matematicamente, ele
deve ter uma certa “estrutura”. Com este termo se indica um
sistema de relações fundamentais que se verificam entre os seus
elementos e das quais se deduzem outras relações mais
complexas, que são dadas pelos teoremas (CATUNDA, apud
GEEM, 1962, p. 66).
A diferença entre a matemática antiga e moderna também é aventada no
artigo. A esse respeito, Catunda expôs seu ponto de vista, argumentando que na
matemática antiga vigorava a idéia de que os conceitos de número e de ponto
eram conceitos primitivos fundamentais, sendo comum encarar a matemática
como a “ciência da medida ou da quantidade”. Para a MM, entretanto, não
importava a natureza dos elementos do conjunto, uma vez que se dois conjuntos
satisfizessem a um mesmo sistema de relações fundamentais, então satisfariam
também a todos os teoremas que delas decorressem. Assim, na concepção de
Catunda, uma moderna teoria matemática se apresentaria da seguinte forma:
Consideremos um conjunto A (inteiramente indeterminado).
Suponhamos que este conjunto tenha a estrutura E descrita pelo
seguinte sistema de postulados: (a), (b), (c), .... Então, dos
postulados (a) e (b) se deduz o teorema (p). Deste teorema e do
postulado (c), deduz-se outro teorema (q); e assim por diante.
Estabelecida assim a teoria, ela se aplicará a qualquer conjunto
dado por uma outra ciência ou tirado de uma outra teoria
matemática, por meio de definições convenientes (CATUNDA,
apud GEEM, 1962, p. 69-70).
Além disso, prossegue Catunda, um sistema de postulados pode oferecer
tudo o que é necessário para o estudo de um dado conjunto; mas,
freqüentemente estuda-se apenas um aspecto de um conjunto, ou seja, de uma
“uma estrutura”, deixando de lado, para outro estudo, uma outra estrutura, que
pode coexistir com a primeira em um mesmo conjunto. Assim, na MM haveria
uma preocupação menor com a natureza dos elementos estudados e maior com o
tipo de estrutura que caracteriza as relações existentes entre esses elementos.
209
Após fazer referência às estruturas de ordem e algébricas, Catunda
concluiu sua palestra, sem tecer comentários às estruturas topológicas, para não
alongar seu pronunciamento. Antes, porém, comentou sobre a necessidade de se
valorizar e incrementar o uso da linguagem simbólica, uma vez que esta
sintetizaria e reforçaria o âmbito de ação da matemática. Além disso, assinalou
que o movimento de renovação do ensino de matemática estava se processando
no mundo todo, por meio da adoção da linguagem da Teoria dos Conjuntos e o
conceito de estrutura, o que permitiria à ciência matemática ganhar enorme vigor
e possibilidade de aplicação e progresso.
O tema abordado por Catunda no IV CBEM, qual seja, a modernização da
linguagem dos assuntos matemáticos via introdução da Teoria dos Conjuntos e a
utilização das estruturas matemáticas, justamente os assuntos basilares que
deram sustentação ao MMM, aponta para um papel de destaque reservado a
esse matemático nesse Congresso, e desse modo, verifica-se que Catunda
encontrava-se afinado ou recebia com bons olhos os princípios norteadores do
MMM. O tema por ele escolhido para sua exposição reforça essa idéia.
Catunda vai para a Bahia em 1963. Impressionado com a situação do
ensino da Matemática, procurou contribuir para a modernização das atividades
matemáticas na Bahia. Tendo como objetivo melhorar a formação dos
professores, organizou cursos, seminários, palestras e conferências; momentos
nos quais comunicava os resultados de suas pesquisas e estimulava os alunos a
exporem seus próprios trabalhos. Continuou, ao mesmo tempo, participando de
congressos sobre o ensino da matemática.
7.4.11. Participações em Congressos: 1966
O V Congresso Brasileiro do Ensino da Matemática foi realizado no Centro
Técnico da Aeronáutica, em São José dos Campos, São Paulo, de 10 a 15 de
janeiro de 1966, sob a coordenação do Grupo de Estudos do Ensino da
Matemática (GEEM).
Uma das novidades apresentadas nesse congresso dizia respeito à
introdução de uma nova disposição organizacional, fazendo constar algumas
sessões de estudos oferecidas aos participantes, assim então estabelecidas:
210
8 h 9 h 10 m 10 h 20 m
Teoria dos Conjuntos
Prof. Benedito Castrucci
(auditório)
Lógica Matemática
Prof. O. Sangiorgi
(auditório)
Matemática Aplicada
Prof. Ruy M. Barbosa
(auditório)
Tratamento Moderno da
Geometria Analítica
Prof. A. Rodrigues
(sala 2201)
Introdução à Álgebra
Moderna
Prof. I. Bicudo
(sala 2201)
Geometria – Tratamento
Moderno
Prof. O. Catunda
(sala 2201)
Introdução à Análise
Prof. L. Mauro Rocha
(sala 2126)
Técnicas Dedutivas
Prof. L. Hegenberg
(sala 2126)
Conferências
(sala 2126)
Às páginas 33, os Anais do Congresso apresenta o resumo do que fora
tratado na sessão de estudos coordenada por Omar Catunda:
1. Representação dos números na reta, ordenação.
2. Soma de números reais. Vetores. Translação. Soma de vetores.
3. Simetria. Composição de simetrias. Composição de simetria com uma
translação. Grupo de isometrias.
4. Homotetias. Composição de homotetia com translação.
5. Exercícios.
O curso traz uma introdução de Geometria das Transformações, por meio
de um tratamento algébrico.
Após definir medida algébrica, o autor associa números reais a vetores.
Posteriormente, ao somar dois números reais, representados pela soma dos
vetores correspondentes em uma reta, aproveita para definir translação, a
distância entre dois pontos e as propriedades comutativa e associativa. Em
seguida, define simetria e a composição de uma simetria com uma translação,
apresentando as propriedades relativas ao conjunto de todas as translações e
simetrias, mostrando que esse conjunto forma um grupo, não comutativo, até
definir transformação afim, como x o x’ = ax +b, com a z 0. Para interpretar a
multiplicação de números reais, utiliza-se do conceito de homotetia de centro na
origem e razão į: x o x’ = įx, em que x representa um ponto qualquer da reta e į
um número real fixo, į z 0.
211
Ao final do trabalho, nota-se que o curso teve como objetivo a dedução de
três grupos de transformações da reta: o grupo das translações, o grupo das
translações e simetrias e o grupo das translações e homotetias. Esses conteúdos,
em especial os referentes à geometria das transformações, foram destacados nos
livros didáticos escritos de autoria de Martha Maria de Souza Dantas e outros
professores, em que Catunda se apresentava, ora como autor, ora como
organizador.
Ainda em 1966, participou do Congresso Internacional de Matemática,
reunido em Moscou, de 20 a 30 de agosto.
7.4.12. A participação de Omar Catunda no MMM da Bahia
Segundo Clovis Pereira da Silva (2004), na década de 1950, Catunda
fomentou um programa de intercâmbio que procurava estimular jovens docentes
do Departamento de Matemática da FFCLBa para estudos pós-graduados, por
meio de cursos de aperfeiçoamento realizados na FFCLUSP.
Assim, ao conhecer Arlete Cerqueira Lima durante o 1º CBEM, Omar
Catunda convidou-a para estudar em São Paulo, sob sua orientação. Cerqueira
Lima aceitou o convite e foi para São Paulo em 1957, encarregando-se de dar
aulas de exercícios de Cálculo para o primeiro ano da FFCLUSP (CATUNDA,
1985).
Ao voltar para a Bahia, Arlete Cerqueira Lima tomou a iniciativa de solicitar
apoio ao CNPq para a criação de um instituto de matemática, o qual foi fundado
em 1961. O matemático Rubens Gouveia Lintz foi convidado para assumir o
cargo de diretor do novo instituto, permanecendo nele até 1962. (CATUNDA,
1985).
Ao aposentar-se na USP, em 1962, e a convite de Arlete Cerqueira Lima,
Catunda decide por residir em Salvador, assumindo o cargo de Diretor do Instituto
de Matemática e Física no lugar de Rubens Gouveia Lintz, em setembro de 1963.
Pouco antes de tomar posse como Diretor do Instituto, Catunda foi vitimado por
um acidente cerebral, ocasionando a perda de sua capacidade de leitura (alexia
212
parcial), prejudicando suas atividades culturais. Entretanto, continuou exercendo
suas funções de professor e diretor do Instituto de Matemática e Física, cargo que
deixou em 1969.
Durante sua gestão no IMFUFBa, Catunda deparou-se com uma situação
dicotômica, no sentido de que a matemática superior era vista na Escola
Politécnica, com os recursos tradicionais do Cálculo, Geometria Analítica e
Mecânica, oferecidos, segundo ele, em “nível modesto” e sem pretensão de
formar cientistas. Já o curso de matemática apresentava-se bastante deficitário. A
avaliação a que se submetiam era também bastante facilitada. Omar Catunda
insurgiu-se contra esse estado de coisas, procurando desenvolver a pesquisa
científica e melhorar o programa do Curso de Matemática, mesmo enfrentando
dificuldades de ordem econômica e falta de pessoal habilitado para a função
docente. Catunda preocupava-se especialmente com a criação de um núcleo de
pesquisa na universidade:
... o funcionamento normal do Instituto deveria consistir em
observar os melhores elementos graduados em Matemática e em
Física pela Faculdade de Filosofia, encaminhando-os para cursos
superiores até atingirem o nível de trabalhadores científicos de
pesquisa. Mas os alunos graduados pela Faculdade não estavam
em condições de enfrentar estudos superiores e o ambiente
universitário daqueles tempos não oferecia atrativos para a
contratação de outros professores... (CATUNDA, 1985, p. 99).
Enfrentou também críticas de alguns professores da Escola Politécnica os
quais julgavam que o Instituto deveria limitar-se “à formação de professores para
suprir as necessidades das outras unidades, desistindo de ensinar teorias mais
elevadas e principalmente fazer pesquisas”. Predominava a idéia de que a
principal função da universidade era o ensino, sendo a pesquisa uma atividade
opcional, dependendo unicamente das aspirações do professor. O máximo que
conseguiu, segundo seu depoimento, foi a vinda de alguns professores visitantes
e outros que colaboraram em conferências ou mini-cursos, como Marko Svec, da
Eslováquia, Kenichi Shiraiwa do Japão e René Deheuvels, da França.
Paulatinamente, alguns professores e estudantes graduados prestaram exames
de pós-graduação e apresentaram teses, obtendo título de mestre. Catunda foi o
primeiro coordenador do Curso de Mestrado em Matemática da UFBa, iniciado
213
em 1968. Apesar disso, na opinião de Catunda, naqueles tempos, o Instituto não
chegou a constituir um verdadeiro núcleo de pesquisa, conforme havia idealizado
(CATUNDA, 1985, p. 95-99).
Arlete Cerqueira Lima atribui a Catunda uma característica, que para ela
era a maior de todas, qual seja, “sua congruência: a identidade entre o seu
pensamento e o seu discurso. Era o oposto de Talleyrand que dizia que as
palavras foram feitas para esconder o pensamento”. Essa característica gerou
muitos problemas junto à administração do Instituto de Matemática e Física, a tal
ponto de lhe serem negados os pedidos de tempo integral e dedicação exclusiva,
embora, segundo recorda Arlete Cerqueira Lima, fosse um dos primeiros a chegar
na universidade e um dos últimos a sair no expediente de cada dia (LIMA, 1985,
p. 48).
Em 1969, teve início o programa de Mestrado em Ciências do Instituto de
Matemática da UFBa, contando com a participação ativa de Omar Catunda.
Orientou a dissertação de Arlete Cerqueira Lima, intitulada “Equivalência
assintótica de dois sistemas diferenciais”, defendida em dezembro de 1972. No
entanto, a partir dos anos seguintes, Omar Catunda não mais orientou alunos em
programas de pós-graduação, limitando-se em participar de diversas bancas
examinadoras de mestrado na UFBa, entre 1972 a 1976 (SILVA, 2004).
Omar Catunda aposentou-se compulsoriamente em 1976. Durante o
tempo em que militou no ensino e na pesquisa, foi professor de físicos renomados
como: Mário Schemberg, Marcelo Damy, Abraão de Morais, de físicos residentes
em Paris: Jean Meyer e Salmeron e de matemáticos como: Carlos Benjamin
Lyra, Luiz Henrique Jacy Monteiro, Alexandre Rodrigues e Ubiratan D’Ambrosio,
entre muitos outros.
Na FFCLUSP, participou das bancas dos seguintes matemáticos:
- 1942, Candido Lima da Silva Dias (anuário 1939-1949, p. 401)
- 1943, Benedito Castrucci (anuário 1939, p. 402)
- 1950, Elza Furtado Gomide (orientador/Jean Delsarte) Quem realmente
orientou o trabalho de Gomide foi Delsarte, mas para fins legais, foi
Omar Catunda.
214
- 1950, João Batista Castanho
- 1950, Edson Farah (orientador) Título: Sobre a medida de Lebesgue, na
cadeira de Análise Matemática
- 1950, José Severo de Camargo Pereira (doutoramento em Pedagogia)
- 1951, Luiz Henrique Jacy Monteiro
- 1952, Chaim Samuel Hönig
- 1953, Geraldo dos Santos Lima
- 1956, Domingos Pizanelli (orient.)
- 1957, Nelson Onuchic
- 1958, Carlos Benjamin Lyra
- 1960, José Barros Neto
7.5. Elaborando textos para a promoção do MMM na Bahia
Para o ensino secundário, e juntamente com a professora Martha Dantas,
Omar Catunda auxiliou na coordenação de uma equipe de professores do Centro
de Estudos de Ciências da Bahia (CECIBA)
75
. Tencionava-se introduzir a MM no
ensino secundário, por meio do projeto denominado “Desenvolvimento de um
currículo para o ensino atualizado da matemática”, tendo como ambição a
modificação dos programas de matemática, incluindo a linguagem dos conjuntos,
utilizando-se o método axiomático e o estudo das estruturas (DANTAS, 1993, p.
23).
A participação de Omar Catunda no projeto é enfatizada por Dantas, com a
seguinte expressão: “Foi, sem dúvida, com Catunda e por causa de Catunda que
pudemos iniciar a pesquisa do ensino da Matemática no 1º e 2º graus do curso
secundário, tentando casar conteúdo e método” (DANTAS, 1996, p. 125).
75
O Centro de Ensino de Ciências da Bahia foi criado por convênio entre o MEC, a Secretaria da Educação e
a Universidade Federal da Bahia. Teve como primeiro diretor José Walter Bautista Vidal. Martha Maria de
Souza Dantas coordenou o setor de Matemática do CECIBA (DANTAS, 1993, p. 23).
215
Para tanto, esforçavam-se por encontrar um consenso geral sobre os
conceitos a serem introduzidos, levando em consideração as recomendações de
reuniões internacionais e nacionais.
Acreditando ser o despreparo da grande maioria dos professores um dos
motivos da deficiência do ensino da Matemática, a equipe do CECIBA preparou e
realizou cursos de aperfeiçoamento e de estágios para professores de ensino
secundário. Além disso, dedicou-se à redação de textos que tornassem os
programas elaborados exeqüíveis, de modo a viabilizar mudanças no ensino de
matemática, em especial, na elaboração de textos para a implantação do MMM
no Colégio de Aplicação da Universidade da Bahia, a partir de 1966 (DANTAS,
2003, p. 3).
Uma apostila de Lógica elaborada pelo matemático Sebastião Silva e
oferecida à Martha Dantas durante estudos realizados em 1958 em Lisboa,
inspirou Arlete Cerqueira Lima a oferecer cursos de Lógica sob patrocínio da
Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste – SUDENE – o primeiro em
fevereiro de 1964 e o segundo em julho do mesmo ano, com o objetivo de
preparar professores do ensino médio para a atualização do ensino de
matemática no curso secundário. Ainda sob patrocínio da SUDENE, Martha
Dantas ministrou dois cursos básicos para introduzir noções de Teoria dos
Conjuntos, de grupos e espaço vetorial (CIAEM, 2003).
Esses não foram os únicos cursos a serem oferecidos. Em 1966, teve
lugar em Salvador, um curso de verão que se propunha a abordar tópicos de MM.
Sua divulgação alcançou o Estado do Rio Grande do Norte, por meio do Centro
de Ensino de Ciências no Nordeste (CECINE), o qual encaminhou para a UFRN
informações e fichas de inscrição para que professores se inscrevessem (BRITO;
CRUZ; FERREIRA, 2006).
Martha Dantas, em discurso proferido na 2ª CIAEM, em Lima, Peru, no
ano de 1966, relatou que o programa estabelecido para a atualização de
professores secundaristas correspondiam à programação estabelecida pelo
Instituto de Matemática e Física da UFBa e atendia às necessidades de pelo
menos quatro matérias básicas, assim organizadas:
216
Primeiro estágio: elementos de lógica simbólica, introdução à
teoria dos conjuntos, estruturas algébricas fundamentais, noções,
aplicações práticas; segundo estágio: álgebra moderna,
geometria linear plana; terceiro estágio: geometria espacial e
estudo das matrizes; quarto estágio: elementos de topologia,
cálculo integral e diferencial. Cada estágio tem duração mínima
de um mês. Prevê-se pelo menos 64 aulas teórico-práticas bem
como igual número de aulas de estudo dirigido para cada estágio.
Face às condições antiquadas de preparação do instrutor na
Bahia, o primeiro estágio já foi realizado cinco vezes. Os
professores examinados e matrículas no estágio seguinte são
condicionadas à aprovação no anterior. A realização do segundo
estágio está programada para julho de 1967 (DANTAS, apud
CIAEM, 1966, p. 170-171).
Além disso, esses cursos eram realizados em Salvador durante o período
escolar e cada aula vinha acompanhada por uma hora de estudo dirigido, sob a
orientação de um professor universitário. Os professores também faziam exames
semanais, com intuito de verificar se as dificuldades anteriores foram vencidas.
Com relação às experiências realizadas no Colégio de Aplicação da UFBa,
de acordo com Dantas (2003), a partir de 1966, foram bem sucedidas. Isto
porque, segundo seu entendimento, os professores que fizeram parte da
experiência estavam bem preparados e os alunos que dela participaram tinham
condições de suportá-la.
A equipe também preparou um projeto de livros de matemática elementar,
cuja principal característica era uma reforma substancial no ensino da Geometria.
A redação dos novos textos só foi possível porque contaram com a colaboração
de Omar Catunda, “que aceitou, inclusive, a proposta que lhe fizemos de usar, na
abordagem da Geometria, as transformações geométricas, recomendação
centenária – feita por Felix Klein, no século passado”. Esse depoimento tornou
evidente a colaboração de Catunda para a implementação de novos conteúdos e
metodologia para o ensino secundário de matemática (DANTAS, 1993, p. 23-24).
Ainda segundo Dantas, quando iniciaram a elaboração dos textos para
viabilizar o projeto, o grupo se deparou com o seguinte problema: como abordar a
Geometria, seguindo essa linha inovadora? A Geometria Euclidiana, quase havia
desaparecido dos programas do curso secundário e um dos motivos de seu
217
abandono era devido a sua apresentação excessivamente formal. Essa
constatação já era reclamada por Dantas no primeiro CBEM (1955).
Assim, a equipe do CECIBA deduziu que o estudo da Geometria, por meio
das transformações geométricas, permitiria assentar noções abstratas sobre
bases intuitivas mais simples e mais sólidas, facilitando a compreensão e a
demonstração de propriedades que as envolvem. Além disso, possibilitaria o
desenvolvimento da imaginação e a criatividade dos alunos.
E mais, ao admitir a importância dos conceitos de relação e estrutura para
o ensino da matemática, considerados como instrumentos de modernidade, o
grupo divisou um motivo a mais para utilizar as transformações geométricas e
explorar sua riqueza estrutural.
Cientes de que a experiência inovadora exigia atenção redobrada e
constante reavaliação, o grupo de professores engajados no projeto passou a
modificar os textos, em conformidade com a reação dos alunos em sala de aula e
pela análise crítica dessa reação.
Dessa forma, a tendência para a abstração que marcou, inicialmente, as
programações, foi paulatinamente sendo reduzida. “Era preciso eliminar conceitos
muito abstratos para os alunos e encontrar abordagens mais intuitivas para
conceitos que, julgamos, deveriam permanecer” (DANTAS, 2003, p.4).
Segundo Dantas,
... as idéias originais de Catunda não passaram pelo concreto
porque, como bem disse Dienes – famoso pedagogo quando aqui
esteve, Catunda era dos que queimavam a etapa da
concretização. Assim, o algebrismo utilizado, sobretudo na
introdução da geometria e a abstração decorrente da introdução
de conceitos estruturais foram
responsáveis, em parte, pela rejeição
dos livros” (DANTAS, 1993, p. 24).
Mesmo sofrendo alterações, como a adoção de uma linguagem mais
simples, a obra não teve a aceitação esperada pelo grupo.
Em seu depoimento, Catunda indicou os motivos pelos quais acreditava
que seus livros-texto não obtiveram sucesso de vendas, como também procurou
justificar as modificações efetuadas pelo grupo:
218
Infelizmente, os livros foram publicados justamente na época em que o
nível do ensino baixou consideravelmente, dando-se preferência a exposições
extremamente facilitadas e os nossos livros não tiveram aceitação, mesmo depois
que adotamos uma linguagem mais simples, sem, entretanto, abdicar do
raciocínio, que procuramos introduzir paulatinamente (CATUNDA, 1985, p. 101).
Vejamos mais detalhadamente como eram constituídos os livros didáticos
elaborados pela equipe do CECIBA, sob coordenação de Omar Catunda.
7.5.1. A Coleção “Matemática Moderna
Coleção composta por três volumes, sob o título de “Matemática Moderna”,
destinada à primeira, segunda e terceira série ginasial, apresenta-se na forma
mimeografada, tendo sido publicada pelo CECIBA e planejada para auxiliar na
consecução de um programa experimental elaborado por professores de
matemática integrantes daquele centro, sob orientação de Omar Catunda, então
Diretor do Instituto de Matemática e Física da UFBa. Os autores procuraram
seguir as linhas gerais dos programas estipulados pelos reformistas do MMM.
As mudanças ostentadas pelo MMM impulsionaram os autores para a
escrita de um manual didático à altura dos novos tempos. Possivelmente foi um
trabalho pioneiro na Bahia, ao menos na Universidade Federal. No primeiro
volume, os autores alertavam que, embora o livro já tivesse sido experimentado
por dois anos e os resultados obtidos considerados “bastante animadores”, a obra
estava ainda em fase de experimentação, e esperavam que os resultados obtidos
e revisões continuamente realizadas os levassem a um maior aperfeiçoamento.
O quarto volume, planejado para dar seguimento à obra e correspondendo
à quarta série ginasial, não foi encontrado. É possível que não tenha sido
produzido, talvez visando um melhor acabamento e divulgação, cuja continuidade
do trabalho deu-se por meio de uma coleção de livros didáticos, lançada no início
da década de 1970, não mais em caráter experimental, mas de forma abrangente,
com vistas à circulação em todo território nacional.
219
Também foram encontradas duas apostilas de matemática da 1ª série
ginasial, sob o título “Curso experimental segundo os novos métodos de ensino
da Matemática”, datadas de fevereiro de 1966, que possivelmente deram origem
à Coleção “Matemática Moderna”, como pode ser verificado por meio de
comparação dos títulos e subtítulos apresentados nas obras e pelos enunciados,
exemplos e comentários oferecidos, que até onde foi possível averiguar, são
semelhantes, como também pelos os elementos gráficos (caracteres, letras,
símbolos matemáticos, figuras) empregados na elaboração das apostilas. As
apostilas denotam a precariedade da impressão em relação à Coleção
Matemática Moderna, cuja apresentação mostra-se mais sofisticada, desde a
capa – o volume três exibe uma ilustração que lembra a configuração do Teorema
de Tales juntamente com a expressão O(u + v) = Ou + Ov; como também pela
introdução que acompanha cada volume, quando os autores explicitam seus
objetivos e dão breves informações aos leitores, procurando justificar as razões
pelas quais decidiram adotar feições diferenciadas daquelas tradicionais, e que
vinham sendo apresentadas para professores e alunos secundaristas.
O primeiro volume da Coleção “Matemática Moderna” informa, na folha de
rosto que o acompanha, o nome dos autores, o qual leva a assinatura de Martha
Maria de Souza Dantas, Eliana Costa Nogueira e Maria Augusta de Araújo
Moreno. Logo em seguida, em destaque, encontram-se os seguintes dizeres: “sob
orientação de Omar Catunda, Diretor do Instituto de Matemática e Física da
UFBa”.
Comunica ainda, que colaboraram na revisão do trabalho, as professoras
Norma Coelho de Araújo, Eunice da Conceição Guimarães e Neide Clotilde de
Pinho e Souza. A capa e ilustração foi elaborada pela equipe de desenhistas do
departamento Cultural da UFBa, sob a direção de Fernando Fonseca e a
publicação esteve sob a incumbência da Reitoria da UFBa, por intermédio de seu
Departamento Cultural.
O exemplar encontrado não traz a data de sua publicação. Como os
volumes II e III foram publicados em 1968 e 1969, respectivamente, acreditamos
que o primeiro volume tenha sido publicado por volta de 1967.
220
A primeira justificativa dada pelos autores para a elaboração do manual
encontra-se expressa na introdução do primeiro volume da coleção e diz respeito
às modificações que a sociedade daquela época vinha passando. Invocando a
modernidade, a sofisticação tecnológica proporcionada pelos computadores, e
também o desenvolvimento alcançado pela ciência matemática, os autores
reclamavam, para o ensino secundário, uma reestruturação de seus programas e
metodologias, concebidos mais adequados às exigências daqueles tempos
modernos:
A vida contemporânea sofre transformações aceleradas. Estamos
na era da televisão, do piloto automático, dos teleguiados, das
naves espaciais e dos cérebros eletrônicos. [...] A Ciência e a
Técnica estão exigindo, cada vez mais, conhecimentos
matemáticos mais amplos e seguros. Por isso o ensino da
Matemática precisou reformular-se em todos os seus níveis e, há
mais de dez anos, iniciou a sua reestruturação no secundário. Os
alunos precisam aprender melhor e mais rapidamente o que se
lhes ensina (DANTAS, et alli, s/data).
Sugerem também a forma como pretendiam desenvolver os conteúdos,
defendendo uma matemática unificada, em conformidade com as instruções
propugnadas pelos reformadores:
Para alcançar tais objetivos foi preciso modificar os programas e a
apresentação da matéria de modo a tornar coeso e harmonioso o
ensino da Matemática nos diferentes níveis. Se a beleza da
Matemática está na unidade, simplicidade e generalidade, que a
caracterizam, por que não apresentá-la de cedo, com tais
atributos, aos jovens? (DANTAS, et alli, s/data, p. III).
A unificação seria colocada em evidência mantendo os mesmos conceitos
básicos e, sobretudo, a mesma linguagem e terminologia para todos os ramos da
matemática, a partir das idéias fundamentais dos conjuntos e das operações,
amparadas por uma notação mais ampla de símbolos lógicos, de forma a
ressaltar o caráter estrutural da MM (GEEM, 1962).
Além disso, o trabalho tinha como objetivo apresentar, já para o primeiro
ano do Ginásio, uma matemática escolar que pudesse fazer com que os
estudantes participassem de uma universidade renovada. Ou seja, seria um livro
didático com pretensões de unificar os conhecimentos matemáticos do ensino
221
secundário, minorando o “abismo” existente entre a matemática do ensino
secundário e a do ensino superior.
Os dois últimos parágrafos fazem referência ao público ao qual o livro era
destinado, sugerindo que sua divulgação restringia-se ao grupo de professores do
CECIBA, mas com expectativa de uma futura publicação que viesse a atingir um
número maior de professores:
Este livro já foi experimentado dois anos e os resultados que
apresentaremos, em breve, aos professores, são bastante
animadores.
Alguns capítulos podem parecer um pouco sobrecarregados
porque, a nossa preocupação foi, também, algumas vezes, de
sistematizar melhor a matéria; fica, portanto, a cargo do professor,
selecionar o que ele pode exigir do aluno (DANTAS, s/d, p. IV).
Em síntese, para a 1ª série ginasial, a obra procurou alcançar os seguintes
objetivos:
1. Introduzir, na 1ª série ginasial, a linguagem dos conjuntos;
2. Utilizar, efetivamente, tanto quanto possível, essa linguagem;
3. Introduzir o conceito de aplicação e estudar as operações entre
números naturais como aplicações;
4. Seguir, de perto, o programa de Matemática, para a 1ª série
ginasial, apresentado pelo G.E.E.M. (DANTAS, apud V CBEM,
p. 203).
Observa-se todo um cuidado com a apresentação do conteúdo, de modo
que os próprios professores fizessem por compreendê-lo e assimilassem a forma
pela qual deveriam ministrá-lo aos alunos. Outro aspecto a ser observado, é no
sentido de que os autores apropriaram-se das propostas de Papy, algumas delas,
como aquela referente à argola sem o laço para representar a propriedade
reflexiva, encontram-se publicadas nos Anais do V CBEM, de 1966
76
(Ver Anexo
I.1).
Martha Dantas conheceu Papy por ocasião do V CBEM em 1966 e
aproveitou a oportunidade para solicitar-lhe estágio para as professoras do
76
Esses e outros comentários encontram-se publicados nos Anais do V CBEM, em artigo intitulado “Métodos
e técnicas de explicar conceitos novos de matemática no início do curso secundário”, de autoria de George
Papy.
222
CECIBA no Centro Belga de Pedagogia da Matemática, local em que Papy
experimentava seu projeto de implantação da MM no ensino secundário. Papy
ofereceu-lhe duas bolsas de estudos. Dessa forma, as professoras do CECIBA
que foram estagiar no Centro Belga tiveram a oportunidade de observar como
eram apresentados a geometria das transformações, os conceitos de aritmética,
álgebra e geometria afim nos livros-texto elaborados por Papy. Embora o estágio
na Bélgica tivesse sido de grande valia, as professoras estagiárias declararam
que a programação idealizada por Papy não era adequada à realidade dos alunos
secundaristas da Bahia.
Diferentemente do primeiro volume a folha de rosto do manual “Matemática
Moderna II” informa que sua elaboração ficou a cargo das professoras Martha
Maria de Souza Dantas, Eliana Costa Nogueira, Norma Coelho de Araújo, Eunice
da Conceição Guimarães e Neide Clotilde de Pinho e Souza, sob orientação de
Omar Catunda. Assim, as professoras que anteriormente participavam como
colaboradoras são apresentadas como co-autoras. Indica também local e data de
publicação, qual seja, Salvador,1968.
É nesse segundo volume que essa a primeira vez que a palavra “vetor” é
mencionada nessa obra. Vem acompanhada da palavra “translação”, sem a
preocupação de definir vetor, do modo como geralmente se apresenta nos livros.
O termo “translação de vetor a
” mostra-se bastante sofisticado para sua utilização
em manual destinado à segunda série ginasial (Ver Anexo 1.2).
Da mesma forma, ao abordar o conjunto dos números racionais relativos e
sua representação na reta, as autoras definiram uma aplicação f
, em que a cada
número racional x
faz corresponder x + a, sendo a fixo e pertencente ao conjunto
dos números relativos. A esta aplicação denominou-se “translação de vetor a
”.
Em seguida, as autoras mostram que o conjunto das translações de vetor a
é um
grupo abeliano em relação à composição de translações.
Esse assunto é retomado no terceiro volume dessa série.
Ainda no conjunto dos racionais relativos são ressaltadas suas estruturas
de anel comutativo e corpo, relativamente à adição e à multiplicação.
223
Quanto ao terceiro volume, a primeira página desse manual traz as
mesmas informações que a do segundo volume, com exceção da data de
publicação, constando de 1969.
Esse volume inicia-se com a apresentação de noções de Lógica e,
segundo informações as autoras, tendo como objetivo melhor compreender o
método dedutivo, requisito básico utilizado nos capítulos destinados à Geometria.
Em seguida, trata do conjunto dos números reais, quando são trabalhadas
as propriedades relativas a esse conjunto, chegando até a estrutura de corpo em
relação às operações adição e multiplicação.
No sub-capítulo que trata da “Representação dos números reais na reta”,
observamos que parte do texto apresentado foi extraído do Curso de Geometria
dado por Catunda no V CBEM, em 1966. Assim, as autoras utilizam-se de
expressões, símbolos e exemplos de modo idêntico à exposição de Omar
Catunda naquele Congresso, para apresentarem as noções de semi-retas,
segmentos e intervalos.
Após explanarem sobre as operações no conjunto dos números reais e
suas propriedades, conduzem os leitores à constatação de que o conjunto do
reais tem uma estrutura de corpo em relação às operações de adição e
multiplicação.
O Capítulo II do terceiro volume é dedicado ao estudo da reta real,
especialmente à apresentação das translações, simetrias, transformação afim e
homotetias na reta, apropriando-se, em grande medida, do Curso de Geometria
oferecido por Catunda no V CBEM. Nota-se que as autoras procuraram dar um
caráter mais didático à exposição de Catunda, acrescentando exemplos e
exercícios aos conteúdos do livro-texto (Ver Anexo I.3.).
O capítulo III desse livro introduz a estrutura de espaço vetorial do conjunto
de translações no plano. Estudam-se, então, as retas do plano, as semi-retas, os
segmentos e, em seguida, as figuras geométricas que não dependem do conceito
de distância. Em seguida, apresentam noções de base e dimensão de um espaço
vetorial e dependência linear, considerando o espaço afim determinado pelo
224
conjunto dos números reais. Note-se que esta forma de tratamento para a
geometria era defendida por Dieudonné (Ver Anexo I.3.)
Apenas após a exploração dos espaços vetoriais os autores dão início à
parte métrica da geometria elementar. Simetria, ortogonalidade, medidas de
ângulos, a rotação são introduzidas, finalizando com semelhança de figuras,
apresentando um tratamento geométrico em conformidade com as propostas de
Felix Klein.
A introdução constante do manual informa que a geometria afim inserida
nesse terceiro volume foi “projetada pelo Professor Omar Catunda” e por meio
dela, “consegue-se um ensino realmente dinâmico e altamente motivado, quer
pela simplicidade das definições dos conceitos introduzidos, quer pela sua
aplicabilidade imediata ao estudo de outras ciências e mesmo aos cursos
técnicos, quer pela oportunidade que oferece ao aluno para desenvolver a sua
imaginação e capacidade de criação” (DANTAS, et alli, 1969, p. 78).
Informa ainda, que a matéria prevista para a quarta série ginasial seria
composta pela geometria clássica do plano. Contudo, esse volume não foi
encontrado.
7.5.2. Ensino Atualizado da Matemática: curso ginasial, volumes I, II, III e IV
A coleção “Ensino Atualizado da Matemática: curso ginasial” é composta
por quatro volumes, tendo sua segunda edição datada de 1971
77
, sendo
publicada pela EDART – São Paulo Livraria Editora LTDA e impressa pela
Empresa Gráfica da Revista dos Tribunais S. A., também instalada na cidade de
São Paulo, o que patrocinou um sistema de produção editorial que permitiu
tiragens ampliadas, de dimensão nacional e, desse modo, constituindo-se em
nova forma de acesso, uso e circulação desse manual escolar.
Apresenta pequenas alterações em relação à coleção “Matemática
Moderna”, quando se encontram modificados, além do título, capa e folha de
77
A edição consultada é de 1971, 2ª edição, pois não encontramos exemplares da 1ª edição e não pudemos
precisar a data de sua primeira publicação.
225
rosto. O nome de Omar Catunda aparece em destaque em todos os volumes da
coleção, especificando ainda, sua condição de Diretor do Instituto de Matemática
e Física da UFBa, já agora participando como um dos autores, ao invés de
orientador, como ocorria na coleção anterior.
A capa, produzida em papel plastificado, mais resistente ao manuseio e
possibilitando melhor conservação, apresenta caracteres gráficos coloridos e traz
a maior parte do lado direito ocupada por uma ilustração composta por figuras
geométricas planas: o triângulo, o círculo e um retângulo sobrepostos,
diferenciados pela cor, a qual se modifica a cada volume. Ao nosso ver, esses
aspectos ilustrativos permitem uma maior aproximação do leitor, fornecendo-lhe
previamente dados informativos que mostram o apreço dos autores pela
Geometria, e além disso, como lembra Chartier, contribui “amplamente para dar
feição às antecipações do leitor em relação ao texto e para avocar novos públicos
ou usos inéditos” (1981, p. 182).
A autoria do primeiro volume também sofre mudanças, apresentando como
autores os professores Omar Catunda, Martha Maria de Souza Dantas, Eliana
Costa Nogueira, Maria Augusta de Araújo Moreno, Norma Coelho de Araújo,
Eunice da Conceição Guimarães e Neide Clotilde de Pinho
78
. Sua introdução é a
mesma encontrada no “Matemática Moderna I”, com exceção dos dois últimos
parágrafos, que foram suprimidos. Estes faziam referência ao público a quem se
destinava o manual, ou seja, para um grupo restrito de professores, sendo
difundido pelo Departamento Cultural da Reitoria da UFBa, em forma de apostila.
Diversamente, a publicação e divulgação do “Ensino Atualizado da Matemática”,
ficou a cargo de uma editora especializada, proporcionando aumento da oferta
editorial, e, portanto, com possibilidade de alcançar um público maior.
O primeiro volume do manual “Ensino Atualizado da Matemática: curso
ginasial I” difere do “Matemática Moderna I” no item de número 20, do Capítulo IV,
intitulado “Aplicações, da decomposição de um número em fatores primos, aos
múltiplos e divisores”, que, no “Matemática Moderna I” denomina-se “Construção
dos divisores de um número”. Esse item – a construção dos divisores de um
78
Norma C. Araújo, Eunice C. Guimarães e Neide C. de Pinho aparecem no “Matemática Moderna I” como
colaboradoras da primeira revisão.
226
número – aparece inserido como um dos assuntos abordados no tópico 20 do
“Ensino Atualizado de Matemática”.
De resto, os títulos, e a numeração dos capítulos descritos no sumário, são
exatamente iguais aos do “Matemática Moderna I”. Observa-se, entretanto, que o
primeiro volume do “Ensino Atualizado da Matemática” é composto por apenas
seis capítulos, sendo suprimido o último capítulo do “Matemática Moderna I”,
referente ao estudo das principais figuras planas e espaciais, medida de
comprimentos, áreas e volumes. Parte dele, relativo às áreas de figuras planas,
reaparece no IV volume da série.
O manual apresenta, ainda, respostas aos exercícios enunciados.
O aparato didático (explicações, exercícios, exemplos, figuras,
observações, notações, linguagem natural e científica, etc.) são exatamente o
mesmo elaborado para o “Matemática Moderna I”. O manual traz, inclusive, a
mesma sugestão sobre a representação da relação por uma argola, em
conformidade com o procedimento realizado por Papy em seu livro
Mathématique Moderne I”.
O volume dois da série “Ensino Atualizado de Matemática” não apresenta
nenhuma alteração significativa em relação ao seu antecessor, o “Matemática
Moderna II”. Os autores são os mesmos, acrescentando-se agora o nome de
Omar Catunda. O sumário também é composto pelos mesmos conteúdos do
manual anterior, com títulos idênticos. Exceção apenas no Capítulo II, sobre razão
e proporção, em que foi acrescido um novo sub-capítulo, de número 9, intitulado
“Grandezas proporcionais a várias outras” e no capítulo IV, sobre números
racionais relativos, em que foi subtraído o sub-capítulo três, intitulado “valor
absoluto”.
A introdução do volume, contendo justificativas para a elaboração do
manual, os exercícios, exemplos, propriedades, linguagem, figuras mantiveram-se
inalterados.
Já no volume três do “Ensino Atualizado da Matemática”, as alterações
realizadas são ainda menores. Trata-se do mesmo volume do Matemática III,
227
apenas adicionando-se o nome de Omar Catunda como um dos autores.
Introdução e sumário são exatamente iguais. Não há acréscimo ou supressão de
tópicos ou conteúdos.
O volume quatro do “Ensino Atualizado da Matemática” leva a assinatura
de Omar Catunda, Martha Maria de Souza Dantas, Eliana Costa Nogueira, Maria
Augusta de Araújo Moreno, Norma Coelho de Araújo, Eunice da Conceição
Guimarães e Neide Clotilde de Pinho e completa a série para o primeiro ciclo do
curso secundário.
Dando continuidade ao estudo da geometria euclidiana, iniciado no capítulo
“distâncias e polígonos”, do terceiro volume, essa série estuda as propriedades de
círculo, as relações métricas num triângulo e no circulo, dos polígonos regulares e
suas respectivas áreas. Após o estudo da geometria clássica no plano, os autores
introduzem a equação de 2º grau, suas relações entre os coeficientes e as raízes,
sinais das raízes, equações redutíveis ao 2º grau e problemas do 2º grau. Ao final
fazem um estudo simplificado do cálculo de radicais.
Os autores finalizam a introdução do quarto e último volume expressando o
desejo de que os estudantes obtivessem máximo proveito do método estrutural
estabelecido nessa programação para o curso ginasial, porquanto entendiam que
a aplicação desse método proporcionava uma simplificação cada vez maior do
ensino da Matemática. Para aqueles que não pretendiam cursar o colegial,
esperavam a obtenção de capacidade para resolver problemas que surgissem em
suas atividades futuras.
7.5.3. Ensino Atualizado da Matemática: primeiro grau, 5ª, 6ª, 7ª e 8ª séries
Procurando ajustar-se à LDB/1971, Omar Catunda, Martha Maria de Souza
Dantas, Eliana Costa Nogueira, Maria Augusta de Araújo Moreno, Norma Coelho
de Araújo, Eunice da Conceição Guimarães e Neide Clotilde de Pinho lançam
novamente a coleção “Ensino atualizado da matemática”, para 5ª, 6ª, 7ª e 8ª série
do Primeiro Grau. Além da necessária alteração no título, substituindo os termos
228
“curso ginasial” por “primeiro grau”, podemos ainda observar a ocorrência de
outras modificações realizadas pelos autores.
A ilustração que emoldurava a primeira coleção permaneceu, utilizando-se
as mesmas cores, patenteando a importância que os autores dedicaram à
Geometria como informação relevante para o projeto pedagógico do manual. A
apresentação dos conteúdos ganhou nova cor, representado pelos títulos
coloridos na cor vermelha, como também algumas representações figurais.
A contracapa da coleção traz os seguintes dizeres: “obra elaborada pela
equipe de professores do Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura –
IBECC – Secção de São Paulo e da Fundação Brasileira para o desenvolvimento
do Ensino de Ciência e Cultura – FUNBEC”
79
. Além disso, vem acrescida do
logotipo da FUNBEC e arrola os membros de seu conselho científico, indicando,
dessa forma, os financiadores do compêndio.
O verso da capa mostra a ficha catalográfica preparada pelo Centro de
Catalogação-na-fonte, da Câmara Brasileira do Livro de São Paulo. Na folha de
rosto, o nome de Omar Catunda, embora apareça em primeiro lugar seguido pelo
nome de Martha Dantas, não vem destacado nos exemplares da 5ª série, como
no manual anterior, mas volta a apresentar a titulação dos autores nos outros
volumes.
Também nos modos de organização e estruturação da coleção observam-
se alterações significativas.
Exemplificando, a 3ª edição, de 1974, para a 5ª série do primeiro grau não
traz prefácio, apresentando, imediatamente após a folha de rosto, o índice cujos
tópicos já exibem algumas modificações. Para o Capítulo 1, dessa vez intitulado
“Conjuntos, relações e operações” foram acrescidos subtítulos relativos às
operações. Nele, as estruturas ganharam destaque, exibidas em tópico especial.
Quando abordado o conceito de relações, no caso em que um elemento está
79
O Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura (IBECC) foi criado em 1946, vinculado à UNESCO.
Em 1965, o MEC criou seis Centros de Ciências, dentre eles o de Salvador, que funcionavam através de
convênios estabelecidos entre Secretarias de Educação e Universidades. Em 1967, é criada a Fundação
Brasileira para o Desenvolvimento do Ensino de Ciências - FUNBEC, sob a direção do IBECC de São Paulo.
O IBECC propôs a tradução e adaptação de vários materiais didáticos produzidos pelo SMSG. Fundos
provenientes do MEC-USAID foram utilizados para a publicação desses textos por meio da Universidade de
Brasília e da EDART (D’AMBROSIO, 1987).
229
relacionado com ele próprio, a representação é mostrada por uma argola munida
de uma flecha, sendo, portanto, abandonada a notação proposta por Papy em seu
Mathématique moderne I” e também é suprimido o comentário correlato.
No Capítulo 2 suprimiu-se a idéia de número e numeral e, em seu lugar, foi
colocado o tópico relativo à operação adição de números naturais; e o capítulo 3 é
dedicado à operações no sistema decimal ao invés de operações com números
naturais.
Para a 6ª série, cujo tema gira em torno da Aritmética e Álgebra, não se
observam modificações significativas, mantendo-se praticamente sem nenhuma
alteração, conservando os títulos e ordenação dos capítulos e sub-capítulos que
compõe o manual. Entretanto, para a 7ª série, observa-se um reordenamento dos
capítulos, dessa vez contendo apenas dois capítulos, o primeiro relativo à
Geometria afim do plano, e o segundo capítulo dedicado ao estudo da Geometria
Euclidiana.
Em toda a coleção nota-se um aumento na quantidade de exercícios
propostos, por exemplo, no item “associatividade da intersecção e da união”, do
capítulo 1 da 5ª série, aos seis exercícios que compunham a primeira coleção,
foram acrescentados outros, totalizando 16 exercícios, revelando uma maior
ênfase no treinamento para a aprendizagem de novos conceitos.
Além disso, a linguagem natural cedeu mais espaço à linguagem científica.
No volume I, do curso ginasial, a propriedade da relação transitiva é introduzida
considerando-se a relação “nascer no mesmo ano” no conjunto de rapazes de
uma classe mista, da seguinte maneira:
... observa-se, ainda, que se um aluno “nasceu no mesmo ano”
que outro e este “nasceu no mesmo ano” que um terceiro, o
primeiro “nasceu no mesmo ano “ que o terceiro, isto é, se um
aluno está relacionado com outro e este está relacionado com um
terceiro; nesse caso, diz-se que esta relação é transitiva [grifo dos
autores] (CATUNDA et alli, 1971, p. 9).
Na 5ª série da coleção, a propriedade transitiva é desenvolvida fazendo-se
uso do mesmo exemplo, ou seja, a relação “nascer no mesmo ano” no conjunto H
de 6 alunos de uma classe, e vem assim especificada:
230
Viu-se, ainda, que se um mesmo elemento figura em dois pares,
uma vez como segundo elemento e outra como primeiro, por
exemplo, se em (x,y) e (y,z), então os outros elementos desses
dois pares também estão relacionados e na mesma ordem, isto é,
tem-se o par (x,z). Por isso, diz-se que a relação é transitiva.
Pode-se também, escrever: dados x, y, z ȯ H, se x R y e y R z,
então x R z ou, se (x,y), (y,z) ȯ R, então (x,z) ȯ R [grifo dos
autores] (CATUNDA et alli, 1974, p. 24).
Dessa forma, por toda a coleção, observa-se maior ênfase no emprego da
linguagem científica por meio da Teoria dos Conjuntos.
7.6. Abaixo Euclides e acima quem? Apropriações efetivadas para a
elaboração de um manual moderno
Pode-se notar, por meio da análise dos livros didáticos nos quais Catunda
participou como orientador ou como autor, que houve de sua parte uma
apropriação dos conhecimentos e valores que, comunicados por diferentes
escolas matemáticas, contribuíam para com seu trabalho de difusão dos novos
assuntos sob diferentes abordagens em seus livros, apostilas e cursos
ministrados.
Nos dois primeiros volumes do “Matemática Moderna” verifica-se que as
autoras apropriaram-se das idéias reformistas, enfatizando as propriedades
estruturais relativas às operações definidas para os conjuntos numéricos.
Enquanto a Teoria dos Conjuntos e a Álgebra Moderna compareceram nos
livros didáticos do ensino secundário de forma semelhante, segundo uma visão
estruturalista, enfatizando a linguagem matemática e a lógica matemática,
constituindo, assim, o fenômeno da vulgata
80
, a introdução da Geometria
processou-se de forma desigual, não havendo consenso entre os reformadores e
autores sobre qual o tratamento que se mostrasse mais adequado e a ser
adotado nas escolas secundárias. Essa, aliás, é uma discussão que ultrapassou
as fronteiras brasileiras.
80
Segundo André Chervel (1990), o fenômeno da vulgata constitui-se quando os livros didáticos de uma
disciplina, numa determinada época, "dizem a mesma coisa, ou quase isso”, ocorrendo, assim pouca
variação envolvendo produções didáticas diferentes, como conceitos definidos, organização dos capítulos,
terminologia adotada (CHERVEL, 1990, p. 203).
231
As idéias de Klein sobre transformações geométricas reportam-se à
primeira tentativa de modernização do ensino de matemática, processada que foi
no início do século XX e retomada, em parte, por alguns grupos envolvidos com o
MMM
81
. Um tratamento da Geometria utilizando os recursos da Álgebra Linear,
em substituição à Geometria Euclidiana, tradicionalmente ensinada nas escolas,
era inovação defendida por Jean Dieudonné durante o MMM. Gustave Choquet
adotava um tratamento composto por noções de paralelas, perpendicularismo e
distância, de forma a conduzir de maneira “natural e rápida” às estruturas
algébricas do plano e espaço, propondo, assim, uma axiomática combinando
medida e enfoque vetorial, sendo indicado para alunos na faixa dos 15 aos 18
anos. Dieudonné, defensor ardoroso do desenvolvimento da Geometria pela
Álgebra Linear, mostrou-se crítico ao tratamento geométrico proposto por
Choquet, para quem, “a notável engenhosidade de tal sistema é testemunha do
grande talento do autor, mas a meu ver o sistema é totalmente inútil e até nocivo”
(DIEUDONNÉ, apud COSTA, 1985, p. 22).
Como se vê, a complexidade no tratamento do ensino da Geometria,
mereceu destaque nas discussões travadas entre renomados matemáticos e
educadores no mundo inteiro, apontando para a inexistência de um consenso
sobre uma estruturação didática mais conveniente para a implantação das
reformas modernistas.
As implicações que emergiram dessas discussões e conseqüente
surgimento de variadas alternativas para o tratamento da Geometria direcionado a
um tratamento axiomático, com recurso às estruturas algébricas e à Teoria dos
Conjuntos, refletiram na elaboração, pelos professores do CECIBA, de um
programa incluindo a temática das transformações algébricas.
Em “Matemática Moderna III” é destacado o estudo das transformações
geométricas como delineadas por Klein, usando vetores para trabalhar translação
sob um ponto de vista algébrico. No entanto, a Geometria afim é definida como
uma geometria associada a um Espaço Vetorial, tomando os axiomas de um
espaço vetorial, e depois definindo uma soma de um ponto com um vetor, ou seja,
81
Ver, por exemplo, “Abaixo Euclides e acima quem? Uma análise do ensino de geometria nas teses e
dissertações sobre o Movimento da Matemática Moderna no Brasil” (DUARTE; SILVA, 2005).
232
os autores estão trabalhando Geometria afim juntamente com Álgebra Linear,
fazendo uma apropriação da proposta defendida por Jean Dieudonné,
representada por um tratamento de tendência bourbakista. Já no quarto capítulo
desse manual é realizado um estudo voltado para a geometria tradicional, a
Geometria Euclidiana orientando-se, assim, pelas formulações de Hilbert.
Outra variação exibida no volume III do “Matemática Moderna” diz respeito
ao tratamento da axiomática da Teoria dos Conjuntos. O conceito de conjunto e a
relação de pertinência são tratados como conceitos primitivos e vêm acrescidos
de quatro axiomas: da unicidade, da união, da diferença, da existência.
Entretanto, o referido manual didático apresenta um outro tipo de enunciado para
o axioma da existência, pois a linguagem utilizada, qual seja, “existe, pelo menos,
um conjunto”, a qual deixa implícito que esse conjunto é o conjunto vazio, não é a
usual (DANTAS, 1969, p. 10). De modo geral, os tratados trazem o axioma da
existência como primeiro axioma, expressando-se da seguinte forma: “existe o
conjunto vazio”. É possível que esse sistema axiomático tenha sido formulado a
partir da apropriação feita por Martha Dantas de textos de autoria do matemático
português Sebastião e Silva, quando da visita de Martha Dantas ao Instituto de
Alta Cultura de Lisboa. Segundo Dantas, esses textos foram utilizados nos cursos
de atualização para introduzir noções de Teoria dos Conjuntos, de Grupo e de
Espaço Vetorial patrocinados pela SUDENE (DANTAS, 1966).
Na Coleção “Ensino Atualizado da Matemática” para o Primeiro grau dentre
as modificações efetivadas em relação aos outros manuais cumpre destacar a
ênfase na precisão da linguagem científica, que de um lado, foi suprimida a idéia
de numeral, e por outro, acentuou-se o emprego da linguagem dos conjuntos.
Sobre o insucesso das publicações dos manuais, foram duas as
justificativas apresentadas, sendo que para Dantas (1993), o professor Omar
Catunda “queimava etapas”, apresentando conteúdos para alunos do secundário,
numa linguagem sofisticada, resultante de longa manipulação técnica formal,
enquanto que para Omar Catunda (1985), a falta de êxito era atribuída ao
despreparo dos professores ante os novos conteúdos, desconhecendo mesmo a
linguagem e símbolos básicos da Teoria dos Conjuntos, necessários para a
compreensão e escrita dos conceitos matemáticos de uma forma moderna.
233
Ao que tudo indica, é possível pensar que, as duas coisas ocorreram: os
livros abordavam conteúdos matemáticos desconhecidos pela maioria dos
professores e ainda, os autores utilizavam uma linguagem precisa, rigorosa,
abandonando os pontos em que os conceitos fundamentais se apoiavam na
intuição. Desse modo, os professores ofereceram resistência às propostas de
reformulação do ensino, as quais pareceram não vingar no cotidiano escolar, a
não ser em casos isolados quando, excepcionalmente, o ensino pode contar com
a presença de professores engajados no Movimento.
As práticas escolares, por serem práticas culturais, são compartilhadas
pelo grupo de professores e, portanto, fazem sentido para esse grupo. “A cultura
é pública”, destaca Geertz (1989). Assim, quando surge um manual ou guia
curricular apresentando novos conteúdos e/ou métodos para serem utilizados
pelos professores, seu uso vai implicar em alterações nas práticas escolares
vigentes, exigindo transformação da cultura escolar.
Entretanto, cabe destacar que as apropriações feitas pelos professores em
relação aos conteúdos escolares (sejam eles novos ou velhos, conhecidos ou
desconhecidos) são táticas sutis (não têm lugar próprio, não aparecem de pronto)
e, muitas vezes, tornam imperceptíveis as modificações que vão, pouco a pouco,
acontecendo nas práticas escolares, nas maneiras de fazer do cotidiano da
escola, insinuando-se sobre os modos de empregar os recursos disponíveis, e
assim, vão paulatinamente fazendo parte da cultura escolar (DE CERTEAU,
2002).
O número de autores que assinam a obra indica uma harmoniosa ligação
entre professores da escola experimental do Colégio Universitário e o matemático
especialista Diretor do Instituto de Matemática da UFBa, permitindo diálogo entre
aqueles que produzem o manual e os que vão utilizá-lo. As modificações eram
realizadas com base no que se notava em sala de aula, de maneira a permitir
também que os autores pudessem realizar ajustes, adequando os métodos
modificações. Com o aumento do público perde-se esse vínculo, até de
acompanhamento, não só da constatação dos resultados positivos esperados
como também na possibilidade de interferir diante das dificuldades observadas,
que poderiam ser amenizadas em curso de formação, congressos.
234
7.7. Omar Catunda e as relações entre matemática e educação matemática
Dos documentos investigados, das análises realizadas para a construção
da trajetória profissional de Catunda de modo a estabelecer sua trajetória de
apropriação das idéias modernizadoras, salientamos quatro momentos nos quais
se evidenciam:
I. Num primeiro momento, quando Catunda assume como professor
assistente de Fantappié na FFCLUSP, começa a construir sua respeitabilidade
como matemático. Catunda preocupava-se com a educação do povo e com o
desenvolvimento do Brasil. Engajamento político, consciência da necessidade de
medidas que proporcionassem uma melhora do ensino e vontade de colocá-las
em prática, encontram-se presentes em sua personalidade. No entanto, apesar de
ter ministrado aulas no curso universitário e participado de bancas examinadoras
de ingresso ao magistério, suas preocupações não são marcadas pela busca de
soluções, de mudanças significativas para com esse nível de ensino.
II. Num segundo momento, época em que começam a surgir discussões
sobre o ensino da matemática, já reconhecida a autoridade de Catunda como
matemático pela academia, passa a opinar sobre o ensino secundário de
matemática, ainda que se verifique a ausência de uma visão global sobre o
assunto, atendo-se à alterações no programa quanto à ordem dos conteúdos
matemáticos e número de horas disponibilizadas para a disciplina.
III. Um terceiro momento pode ser divisado a partir da participação de
Catunda na primeira Conferência Interamericana, em que, a convite de Marshall
Stone, os matemáticos da ativa assumem a discussão sobre os problemas do
ensino secundário de matemática, propondo que a formação dos professores de
ensino médio estivesse a cargo das universidades, sob a autoridade dos
matemáticos mais competentes, e, além disso, que a parte pedagógica se
limitasse às suas devidas proporções. A autoridade dos matemáticos é que iria
referenciar as mudanças rumo à modernização. Os professores sem
reconhecimento da comunidade de matemáticos não eram considerados
competentes para alterar o ensino de matemática, mesmo porque, muitos deles
não tinham conhecimento dos assuntos concernentes à MM. Assim, como
235
matemático prestigiado, Catunda foi convidado a participar da discussão em
andamento sobre a educação matemática, momento que se defronta com a
produção do saber didático-pedagógico internacional.
Representa um momento de inflexão, em que as novas idéias oferecidas
no debate internacional proporcionaram a Catunda uma tomada de posição
diversa daquela antes defendida.
IV. Como última fase, aquela em que Omar Catunda adere ao movimento
internacional de renovação do ensino da matemática, caracterizado por uma
tendência à forte algebrização em todos os ramos da matemática do secundário.
Cai por terra, sua pregação de buscar primeiro o apoio da intuição para depois a
apresentação formal, ou seja, que a introdução da álgebra deveria ser retardada o
mais possível, permitindo o desenvolvimento do raciocínio aritmético e
geométrico. Assim, continua a opinar na implementação do MMM, mantendo sua
respeitabilidade como matemático.
236
CAPÍTULO 8
BENEDITO CASTRUCCI, O ENSINO SECUNDÁRIO E O
MOVIMENTO DA MATEMÁTICA MODERNA
Bisogna no credere nelle bestialità dei professori
ed anche dei libri; bisogna pensare per sè.
Giacomo Albanese
Apresentamos, neste capítulo, um estudo sobre Benedito Castrucci, o que
defendia para o ensino da Matemática do secundário e sua participação no MMM.
Expomos alguns resultados da pesquisa baseados especificamente em
depoimentos concedidos a investigadores e jornalistas, artigos de revista, anais
de congressos, anuários, notas de aula, livros didáticos e textos diversos
gentilmente cedidos por pesquisadores, professores, como também, nos
elementos encontrados em arquivos como o APOS, APUA, APAF, Arquivo da
Escola Politécnica e bibliotecas. Esperamos que os resultados apontados possam
contribuir para um melhor entendimento do que representou o Movimento da
Matemática Moderna, revelando caminhos a serem percorridos, servindo como
estímulo para novas análises, novas pesquisas e que, dessa maneira, possam
desenvolver e renovar a discussão sobre a dinâmica das relações entre
Matemática e Educação Matemática.
8.1. Benedito Castrucci: Trajetória de um matemático
Benedito Castrucci nasceu em 08 de julho de 1909 na cidade de São
Paulo/SP e faleceu em 02 de janeiro de 1995. Filho de Ângelo Castrucci e Maria
237
Antonia de Jesus Castrucci, casou-se com Ermelinda de Lauro Castrucci, com
quem teve cinco filhos.
Aprovado no exame de admissão com grau 9, é admitido, em 1925
82
, no
Ginásio da Capital
83
. Contava, então, 16 anos de idade. Seu ingresso tardio no
ginásio foi em razão de ter feito, antes, um curso técnico comercial no “Gymnasio
e Academia Comercial Brasil de São Paulo” (VALENTE et alli, 2004).
Sobre seu ingresso no mundo do ensino, em depoimento
concedido à Academia Paulista de Educação, Castrucci recordou
seu antigo professor de Geometria do 4º ano do Ginásio do
Estado, Antonio Silvestre Alves Cruz, que lhe confiou, mediante
convite, a incumbência de repetir o curso de Geometria para os
alunos que precisaram se submeter aos exames de segunda
época. “Como é possível dar aulas aos meus colegas?” Indagou
Castrucci ao professor, que prontamente lhe afiançou: “Você vai
desincumbir-se muito bem dessa tarefa”. O êxito obtido nessa
primeira experiência com o ensino, quando, segundo ele,
também aprendeu muito, fez com que Castrucci passasse a ser
requisitado pelos alunos de anos anteriores, de maneira que
ministrasse aulas particulares de revisão de Geometria e ainda
de algumas outras disciplinas, proporcionando-lhe um interesse
pela Geometria e seu ensino, que o acompanharia durante toda
sua trajetória profissional (CASTRUCCI, 1993).
Assim, aos vinte anos Castrucci era violonista, estudava artes plásticas e
dava aulas de matemática aos colegas.
82
O ano de 1925 é marcado pela Reforma Rocha Vaz, que instituía a seriação e a obrigatoriedade da
freqüência no ensino secundário. Essa reforma e a vida escolar de Benedito Castrucci no ginásio são
tratados em detalhes na dissertação de mestrado “A matemática escolar nos anos 1920: uma análise de suas
disciplinas através das provas dos alunos do Ginásio da Capital do Estado de São Paulo” de Vera Cristina
Machado Santos, 2003 e no livro “O nascimento da matemática do ginásio”, Wagner Rodrigues Valente
(org.), 2004.
83
O Ginásio da Capital foi fundado em 1894, sendo o primeiro colégio seriado e oficial do Estado de São
Paulo equiparado ao Colégio Pedro II. Ao longo dos anos recebeu diversas denominações: Ginásio de São
Paulo, Colégio de São Paulo, Colégio Estadual “Franklin Delano Roosevelt”, Colégio Estadual “Presidente
Roosevelt” e Escola Estadual de 2º grau de São Paulo (VALENTE et alli, 2004). No tempo de Castrucci,
situava-se no edifício da Pinacoteca do Estado (CASTRUCCI, 1955).
238
Juntamente com o sexto e último ano de ginásio, cursou a Escola Normal
do Braz, tornando-se habilitado como professor normalista e, ainda, por ter optado
em fazer todas as matérias oferecidas no curso ginasial, obteve o diploma de
bacharel em ciências e letras (VALENTE et alli, 2004).
Como aluno do Ginásio da Capital, foi agraciado com o prêmio “Antonio
Godoy” em 16 de setembro de 1954, correspondente à turma que se formou em
1930, por ter sido o primeiro aluno durante os seis anos do curso ginasial. O
prêmio Antonio de Godoy foi instituído em 27 de julho de 1905 pelo Dr. Miguel de
Godoy Moreira em homenagem à memória de seu filho, Dr. Antonio de Godoy
Moreira e Costa, para ser conferido anualmente ao aluno que mais se distinguisse
em ciências e letras no Ginásio da Capital (VALENTE et alli, 2004).
Bacharelou-se, em 1935, pela Faculdade de Direito do Largo São
Francisco. Ainda estudante de Direito, foi convidado pelo professor Luiz Pasquale
Filho para lecionar no Ginásio Machado de Assis. Esta escola fundiu-se com o
Ginásio Moura Santos formando o Colégio Paulistano, do qual foi um dos sócios.
Na época, lecionava nos períodos vespertino e noturno, dedicando-se à
Faculdade de Direito pela manhã (CASTRUCCI, 1993). Depois de formado em
Direito, passou a trabalhar no Departamento Jurídico da Secretaria da Fazenda,
sem, no entanto, abandonar o magistério, devotando-se ao ensino de Matemática,
Latim e História. Até 1951 pertenceu ao quadro docente do Colégio Paulistano
(CASTRUCCI, 1982).
Desejou ser juiz, mas sua esposa recusava-se a deixar a cidade de São
Paulo, assim, desistiu dessa idéia e resolveu tornar-se professor
84
. Lecionava
matemática e ao mesmo tempo exercia a advocacia, até que, em 1937, ingressou
na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP, para integrar o quadro dos
alunos do Departamento de Matemática. Desejava melhorar sua cultura
matemática, para tornar-se um professor secundário com sólida formação, “um
bom preparo, eventualmente fazer concurso para colégios do Estado, que eram
as escolas bem remuneradas naquele tempo (CASTRUCCI, 1990).
84
Na lista de alunos matriculados no 1º ano de Doutorado da Faculdade de Direito encontra-se o nome de
Benedito Castrucci, ainda aluno do 5º ano, matriculado condicionalmente (ANUÁRIO DA USP, 1934-1935, p.
348).
239
Em 1939, Castrucci licenciou-se em Ciências Físicas e Ciências
Matemáticas pela FFCLUSP. Neste mesmo ano, por indicação do professor Luigi
Fantappiè, obteve bolsa para estudar na Itália, porém não pode usufruir da bolsa
de estudos que recebera, devido à II Guerra Mundial. A partir de 1940, Benedito
Castrucci foi nomeado assistente de Geometria na cadeira regida pelo professor
Giacomo Albanese.
Doutorou-se, em 1943, com a tese intitulada “Sobre uma nova definição de
cúbica plana”, sob orientação de Albanese. Foi nomeado interinamente, em 1947,
professor de Geometria Analítica e Projetiva da Escola Politécnica da USP, em
substituição a Giacomo Albanese, cargo que exerceu até 1958. Entre 1945 e
1958, Castrucci foi professor de Geometria Projetiva e Geometria Superior da
Faculdade de Filosofia Sedes Sapientiae. Posteriormente, tornou-se catedrático
do IME/USP, onde ministrou cursos de graduação e pós-graduação
(CASTRUCCI, 1989).
O Anuário da FFCLUSP de 1951 revela que Castrucci freqüentou entre os
anos 1940 e 1950 cursos de Gabriele Mammana (1940), Acchile Bassi (1940),
André Weil (1945 a 1947), Oscar Zariski (1945), Jean Dieudonné (1946 a 1947) e
Jean Delsarte (1948 a 1950), versando sobre os seguintes assuntos: Cálculo das
Variações, Topologia Combinatória, Espaços de Hilbert, Topologia Geral,
Geometria Algébrica, Teoria de Galois e Corpos Comutativos, Teoria da
Distribuição de Schwartz e Cálculo Numérico.
As preocupações de Castrucci com o ensino levaram-no a visitar diversos
institutos matemáticos europeus durante sua vida acadêmica: 1952, 1959, 1968 e
1990. Em 1968, foi professor visitante do “Mathematisches Institut da
Universidade Justus Liebig” de Giessen, Alemanha, participando de seminários e
cursos, e ainda, como representante daquele instituto, participou do Congresso de
Geometria, em Oberwohlfach, sul da Alemanha.
240
Em 3 de abril de 1968, Benedito Castrucci escreveu uma carta, endereçada
ao professor Gunther Pickert, agradecendo a atenção dispensada para que
pudesse realizar viagem à Alemanha
85
.
Anexo à carta, encontra-se um questionário que deveria ser preenchido
pelos pesquisadores estrangeiros que pleiteassem visita de estudos na República
Federal Alemã, no qual é solicitada uma descrição de sua formação universitária,
atividades profissionais, lista de publicações científicas, lista das organizações
científicas a que pertence, curriculum vitae e um programa de estudos a ser
realizado durante sua estadia na Alemanha.
Como programa de visitação, Castrucci escreveu a seguinte proposição:
Eu estou interessado em Geometria Projetiva, Fundamentos da
Geometria e o Ensino da Matemática Moderna nos cursos
secundários. Eu vou conhecer os trabalhos e o progresso desses
setores junto à Universidade de Giessen (Prof. G. Pickert)
(CASTRUCCI, 1967).
O programa revela que, além dos interesses direcionados à pesquisa
matemática, o ensino secundário assumia uma posição de relevância para
Castrucci. Assim, segue rumo à Alemanha, em 1968. Ao retornar, pronunciou a
conferência “Atual ensino da Matemática na Alemanha Ocidental”, por ocasião do
sétimo aniversário do GEEM. (FOLHA DE SÃO PAULO, 1968).
Castrucci dominava, além da língua portuguesa, o alemão, o francês, o
italiano e o inglês, conhecia também o latim, o russo, o japonês, o esperanto e o
grego.
Sua preocupação com o ensino levou-o, a partir de 1949, a escrever livros
de Matemática, inicialmente para o Ensino Médio, posteriormente para a
universidade e, com o início da Matemática Moderna, também para o Ensino
Fundamental. Publicou mais de 30 trabalhos, entre livros e apostilas
(CASTRUCCI, 1989).
85
A referida carta contém os seguintes dizeres: “Chère Professeur Dr. G. Pickert. J’ai reçu votre lettre de
27.3.68 et je ne sai pas comme je peux vous remercier par votre attention aux moindres problèmes sur mon
voyage; je regrett sincèrement de vous deranger. Je partirai de S. Paulo le 22.4.68, à 14.20 et selon les
informations de la Lufthansa j’arriverai à Frankfurt le 23.4.68, à 8.40, du matin. Veullez accepter mes cordials
voeux de bonheur. Merci bien. Prof. Benedito Castrucci” (1968).
241
Como docente da FFCLUSP, do mesmo modo como Omar Catunda e Jacy
Monteiro, o professor Benedito Castrucci também incentivou e participou da
realização da revista “Notas de Matemática e Física”. Além de fazer parte de seu
corpo editorial, publicou, no volume de número 2, de outubro/dezembro de 1953,
o artigo intitulado “Nota sobre a congruência de ângulos”, utilizando como
referência obras de geômetras italianos.
Sua adesão ao MMM, rendeu-lhe a publicação de diversas obras, como
“Geometria: curso moderno”, de 1967 a 1969; “Matemática: curso moderno” para
o ciclo ginasial em 1967, juntamente com Alcides Bóscolo, de 1967 a 1968 e “A
conquista da Matemática” em co-autoria com José Ruy Giovanni, em 1971; 1982;
1986. O GEEM publicou, de autoria de Benedito Castrucci as seguintes obras:
Introdução à lógica matemática” (1973) e “Elementos da teoria dos conjuntos
(1967).
Contou, igualmente, com diversos artigos publicados em periódicos
científicos especializados internacionais, inúmeras participações em congressos
nacionais e internacionais, foi eleito membro titular da Academia de Ciências de
São Paulo e da Academia Paulista de Educação. Foi fundador da Sociedade de
Matemática de São Paulo, do Grupo de Estudos do Ensino da Matemática
(GEEM) e da Sociedade Brasileira de Matemática. Pertenceu à Sociedade
Brasileira de Educação Matemática, American Mathematical Society, Circolo
Matemático de Palermo, entre outras sociedades.
Aposentou-se em 1979 pelo IME/USP, mas continuou sua atividade
docente como professor titular do curso de pós-graduação da PUC/SP
(CASTRUCCI, 1989).
Durante sua vida acadêmica, orientou e participou de inúmeras bancas de
mestrado e doutorado, dentre as quais destacamos aquelas em que participou
enquanto professor da USP:
- 1950, Elza Furtado Gomide
- 1950, João Batista Castanho
- 1950, Edson Farah
242
- 1951, Luiz Henrique Jacy Monteiro
- 1951, Osvaldo Sangiorgi (não ocorreu a defesa de tese, mas Castrucci
era o orientador do trabalho)
- 1953, Geraldo dos Santos Lima (orient.)
- 1965, Mário Tourasse Teixeira
8.2. Na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP: vida acadêmica,
recomendações italianas e avaliações didáticas
A maior surpresa de Castrucci ao ingressar na Faculdade de Filosofia
residiu na constatação da diferença entre as práticas dos professores da FFCL e
aquelas exercidas pelos professores da Faculdade de Direito. Naquele tempo, os
catedráticos da Faculdade de Direito eram, no dizer de Castrucci (1990), como
“semi-deuses”. Donos de considerável cultura jurídica, expunham os assuntos do
alto de um oratório, durante mais ou menos sessenta minutos, com poucas
interrupções, sempre de forma eloqüente, acompanhada de reverência e
formalidade irrepreensíveis: “V. Excia. permite um aparte? – Oportunamente dar-
lhe-ei um aparte”, assim é que exemplificou Castrucci, procurando ratificar seu
ponto de vista. Em contrapartida, a postura dos professores italianos da FFCL em
relação aos alunos, ao contrário, era de estreita camaradagem. Os docentes eram
mais acessíveis, e depois das aulas sentavam-se com os alunos para conversar,
davam maior abertura ao diálogo, dispostos a esclarecer possíveis dúvidas
(CASTRUCCI, 1990).
Devido ao seu bom desempenho nos exames do primeiro semestre do
primeiro ano, ou seja, em 1937, Luigi Fantappiè ofereceu-lhe, juntamente com
José Abdelhay, mais tarde professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro,
bolsa de estudos para a Itália. Castrucci não pode aproveitar a oportunidade
oferecida, impedido pela função que exercia junto à Secretaria da Fazenda.
Entretanto, Fantappiè confiou-lhe um comissionamento junto à Faculdade, com
todos os vencimentos, até o final do curso, com uma única condição: que as notas
obtidas não fossem inferiores a sete (CASTRUCCI, 1993).
243
Foi assim que, segundo o próprio Castrucci (1993), passou a ir ao encalço
da “aquisição de conhecimento científico seguro”.
O convívio com os matemáticos italianos Luigi Fantappié e Giacomo
Albanese permitiu a Castrucci observar a diferença de postura e temperamento
desses professores, que foi assim descrita:
... eram assim professores surpreendentes. Os dois professores
de matemática eram bem diferentes como temperamento, porque
o Fantappié era um professor do norte da Itália [...] muito delicado,
atencioso, finíssimo [...]. e o Albanese era da Sicília [...] era aquele
temperamento do sulista da Itália que é explosivo, mas tinha uma
compensação, era brilhantíssimo como professor, tinha facilidade
para falar, exprimia-se muito bem e era uma pessoa curiosa
(CASTRUCCI, apud SILVA, 2000).
Nem mesmo o fato das aulas serem dadas em italiano atrapalhava o
relacionamento entre professores e alunos. Os livros de matemática da época
eram, em sua grande maioria, escritos em italiano também, o que contribuía para
um maior companheirismo e familiaridade com a língua italiana, de modo que,
“alguns alunos esqueciam que estavam fazendo exames no Brasil e respondiam
as questões em italiano”. Além disso, em suas recordações, Castrucci revelou
como os estudantes acompanhavam os cursos e resolviam o problema da
bibliografia:
Os italianos citavam muitos autores alemães e quem sabia
alemão por conhecimento secundário aproveitava. Eu tinha tido
um secundário com quatro anos de alemão e alguns colegas
também, então aproveitávamos esse conhecimento. Quem não
sabia alemão limitava-se aos italianos e franceses, e também
alguns ingleses (CASTRUCCI, 1990).
Na época em que Castrucci era estudante, as aulas eram sempre pela
manhã. Ocupavam a manhã toda e iam até aproximadamente às 14 horas. Os
professores Fantappié e Albanese, geralmente lecionavam durante duas a três
horas seguidas, sem intervalo. Já os professores das aulas de Física, por
exemplo, dividiam esse tempo, ministrando uma a uma hora e meia de aula.
No entanto, mesmo reconhecendo e exaltando o valor das aulas recebidas,
Castrucci salientou que, mais do que o conhecimento científico oferecido, “gravou
244
na memória” os conselhos recebidos dos professores Giacomo Albanese e Luigi
Fantappiè:
Giacomo Albanese, grande matemático e brilhante professor, de
quem fui assistente e orientando na tese de doutoramento, deu-
nos certa vez uma importante advertência e diretriz: “– É preciso
não acreditar nas besteiras dos professores e também dos livros:
é preciso pensar por si mesmo”. Peço licença para repeti-la em
italiano, devido à forte sonoridade. “– Bisogna no credere nelle
bestialità dei professori ed anche dei libri; bisogna pensare per
sè.”
Por outro lado, o Prof. Luigi Fantappiè, tecendo considerações
sobre os cursos de didática, deu a seguinte regra. “– A única
didática que importa é o conhecimento profundo da matéria que
se ensina. Um bom expositor, sem cultura, pode perder gerações,
ao passo que um mau didata, firme nos seus conhecimentos,
beneficiará os alunos respondendo com exatidão às perguntas,
seja na aula, seja fora da sala.” (CASTRUCCI, 1993).
Segundo Castrucci, para alguém se tornar um bom professor, além do
conhecimento profundo dos conteúdos de ensino, era necessário ainda que
tivesse vocação, considerado por ele como “o chamado” e amor para com a
profissão, ou seja, ser dono de um sentimento que o elevasse acima das
ambições materiais, dono de um entusiasmo que despertasse sua criatividade no
desempenho da missão.
Entretanto, havia um outro quesito da qualidade didática o qual Castrucci
julgava não possuir: ser um artista em sala de aula.
Considerava-se um “mau ator”. Para tanto, tomou como exemplo a
apreciação de seu desempenho como professor feita por Malba Tahan (Julio
César de Melo e Souza), para quem Castrucci era o “pior professor” que já vira, o
que, na versão de Castrucci, significava ser um “péssimo ator”. Os motivos da
avaliação proferida por Malba Tahan eram os seguintes: “1) não usar avental; 2)
não usar ponteiro; 3) não saber trabalhar no quadro negro, pois este deve ser
utilizado de modo que coincida o término da preleção com a lousa inteiramente
escrita” (CASTRUCCI, 1993).
Essa avaliação foi resultante de um curso para professores dado por
Castrucci no Rio de Janeiro, durante sua permanência no GEEM. Segundo
245
Castrucci, logo no primeiro dia de aula, percebeu Malba Tahan entre os
participantes, sentado na primeira fila. Segundo Castrucci, a presença do
conhecido professor fê-lo pensar: “... esse meu amigo vai perturbar-me com
perguntas e críticas”. As suspeitas de Castrucci mostraram-se infundadas.
Durante todo o curso, que perdurou por dias, Tahan esteve presente, mostrando-
se “calado e atento, como se fosse um bom e disciplinado aluno”. No entanto,
após a última preleção do curso, Malba Tahan veio cumprimentá-lo e emitiu seu
veredicto sobre a atuação didática de Castrucci: nota zero! (CASTRUCCI, 1993).
Para Castrucci, as duas primeiras alegações apontadas por Tahan eram
fáceis de corrigir, mas a última, foi considerada impossível superar:
... o último, diante da quantidade de assunto e o limite físico do
quadro negro, era e foi sempre impossível para mim. Na
Alemanha, quando fui professor visitante na Universidade Justus
Liebig de Giessen, com surpresa, via a solução, pois lá havia
quadros superpostos: esgotado o primeiro, este subia e
trabalhávamos no segundo e depois um terceiro e a aula ficava
toda escrita e inteiramente à disposição dos alunos (CASTRUCCI,
1993).
O que se pode observar a respeito desse depoimento de Castrucci?
Primeiramente, que reconhecia em Malba Tahan um escritor e educador
matemático renomado e que esse prestígio social conferia-lhe autoridade perante
o público docente presente, deixando o conferencista em situação desconfortável
ante a iminência de prováveis questionamentos ou críticas de Tahan, que lhe
pudessem ser desferidas durante o curso. Diversamente, entretanto, a atitude de
Malba Tahan foi de silêncio e atenção, “como se fosse um bom e disciplinado
aluno”. Podemos inferir, desse modo, que sua concepção do que viria a ser um
bom aluno para Castrucci, resumia-se em ser um estudante que não participa
com questionamentos, dúvidas ou críticas durante a exposição do professor nas
aulas.
Malba Tahan, ao contrário do esperado, não apenas prestou atenção nos
conteúdos apresentados (relativos à matemática moderna), como também na aula
como um todo, desde a vestimenta, não compatível com a autoridade do
professor; o uso do ponteiro, tecnologia disponível e comum na época, auxiliar
para centralizar a atenção da platéia para determinado ponto destacado na
246
preleção; bem como na organização visual referente à distribuição do texto no
quadro negro.
Mas, não é porque alguém é professor que se deve concordar com tudo
que ele diz, nem com tudo o que se encontra nos livros, argumentou Castrucci,
respaldado pelo conselho de Albanese.
A crítica desferida dizia respeito ao papel da didática na formação do
professor, o que equivalia atribuir a Castrucci, segundo seus próprios critérios, a
pecha de não ser um bom artista.
Sobre a qualidade de um professor ser artista, Castrucci parece ter seguido
os conselhos de Fantappié, que imputava ao bom professor a condição de artista,
conforme se expressou Castrucci:
Porque havia um curso de didática da matemática. Tinha didática
geral, psicologia, essas coisas todas e esse curso, Fantappié nos
aconselhou a não fazer: ‘estuda matemática e deixa de lado essas
coisas de didática, porque didática só tem uma regra boa: saber a
matéria. Se souber a matéria, o resto você é um artista. Se for
mau artista, será a vida toda. Se for bom artista, será bom
professor. E o resto põe tudo de lado’. Então, na minha vida,
nunca fiz nenhum curso de didática (CASTRUCCI, 1990).
Para Castrucci não havia necessidade de estudar didática, uma vez que
ser um bom professor seria uma tendência inata do indivíduo, valendo mais a
pena dedicar-se às teorias da ciência matemática.
Além da nítida separação entre os conteúdos específicos e a preparação
pedagógica, especificamente em relação ao Curso de Matemática, torna-se
evidente que este curso, visava, em primeiro lugar, a formação de pesquisadores,
deixando em segundo plano a formação de professores. Silva (2000), buscou
comprovação no depoimento do professor de matemática Benedito Castrucci:
Os que fizeram didática na minha turma foram aqueles que já
estavam excluídos da carreira de professores na Universidade.
Já estavam empurrados para o ensino secundário, foram fazer o
curso, era de um ano. Fazia psicologia educacional, fazia didática
geral, didática especial e mais umas outras coisas. Eu não fiz
essa parte [grifos nossos] (CASTRUCCI, apud SILVA, 2000, p.
14).
247
Nota-se certa carga pejorativa nos dizeres de Castrucci, no sentido de que
aqueles alunos que não tinham tendência para a pesquisa científica e portanto,
não recomendados para uma carreira universitária, a eles restaria a carreira do
magistério junto ao ensino secundário, cujos conteúdos se revestiam de menor
complexidade, bastando-lhes o estudo das disciplinas pedagógicas.
Castrucci tinha experiência autodidata como professor, uma vez que não
teve nenhuma formação pedagógica. Antes mesmo de ingressar no Curso de
Matemática, já lecionava. A sua competência no trato com os conteúdos fazia
dele um bom professor, aos olhos do professor que o indicou. Quando entrou
para a faculdade, sentiu que se tornou um professor pior, do ponto de vista
didático, pois no ginásio dava aula com uma determinada velocidade, com um
tempo de exposição que considerava necessário para a compreensão dos alunos.
No entanto, depois de entrar na faculdade, ouviu o conselho de Albanese, que
dizia: ”não importa a velocidade, importa que o programa tem que ser dado
inteiro”. Assim, Castrucci procurava finalizar o programa, ciente de que “nesse
período eu era um mau professor”, o que, de certo modo não importava, já que
“os alunos eram muito bons e supriam isso estudando” (CASTRUCCI, 1990).
Os dizeres de Castrucci nos permitem entrever um modo de pensar pelo
qual a universidade precisaria contar com bons alunos, o que afastaria a
preocupação com a didática de seus professores. Liberava-os, portanto, da
obrigação de se tornarem “bons atores” ou “artistas”, pois os próprios alunos
supririam esta eventual deficiência, considerando o seu bom desempenho
esperado por seus professores.
Quanto ao convívio com outros estudantes da FFCLUSP, Castrucci relatou
que havia grande camaradagem entre eles, até porque o número de alunos
acabava sendo drasticamente reduzido na passagem do primeiro para o segundo
ano. Em seu depoimento, Castrucci (1990) relatou que sua turma havia começado
com uns vinte alunos aproximadamente e, para o segundo ano, foram promovidos
apenas dois alunos do Curso de Matemática (José Abdelhay e ele, Castrucci) e
mais três ou quatro estudantes do Curso de Física
86
. A situação era agravada
86
Não nos foi possível verificar os dados fornecidos por Castrucci. Mas o Anuário da FFCLUSP (1939-1949)
indica que, para o ano de 1939, o curso de Matemática contava com vinte e quatro alunos no primeiro ano,
nove alunos no segundo e quatro no terceiro e último ano: José Abdelhay, Zillah Barreto de Mesquita,
Benedito Castrucci e Nelson da Silveira Leite.
248
pelo motivo de que reprovação não era por disciplina, pois o aluno ficava
reprovado por ano.
O ponto de encontro preferido da turma era o barzinho da escola, onde se
encontravam para conversar e tomar café. Também freqüentavam livrarias, era
um passeio que sempre faziam. De modo geral os alunos tinham uma condição
econômica razoável. Como o número de alunos era reduzido, geralmente
ganhavam bolsas de estudos que lhes permitiam alimentar-se, pagar uma
pensão. Castrucci, que naquela ocasião achava-se desempregado, ficou
comissionado até o término do curso, com a condição de não tirar nota inferior a
sete.
Havia, de acordo com depoimento de Castrucci (1990), grande distância
entre a formação dos alunos e os conteúdos que os professores pretendiam
ministrar. Assim, paralelamente, os professores ensinavam muitos assuntos
visando minimizar essa distância de modo que os estudantes atingissem o ponto
desejado pelos professores e que se fazia necessário para prosseguir com o
programa. Contavam também com a visita de professores de outras instituições
nacionais e estrangeiras que faziam palestras para os professores e alunos do
curso.
Os professores catedráticos procuravam manter a biblioteca organizada e
atualizada, que além de receber verbas para a compra de livros, contava com o
governo italiano que, em reconhecimento à acolhida oferecida aos professores
italianos, doou à biblioteca um acervo com numerosas obras de matemáticos
italianos. Os professores, em contrapartida, cobravam muitas leituras, muitas
pesquisas. Exemplificando, Castrucci relatou que, para o curso de Análise, no
primeiro ano, os alunos tinham que dar uma aula expositiva sobre determinado
conteúdo do programa e assistir as aulas de exercícios preparadas pelo professor
assistente, quando era resolvida uma série de exercícios relativos ao assunto
tratado. Além disso, eram ainda indicados títulos de livros sobre outros assuntos
que deveriam ser estudados separadamente. No final do semestre os alunos
prestavam exame sobre o assunto explanado, os exercícios e a matéria estudada
à parte. (CASTRUCCI, 1990).
249
No tempo de Castrucci como aluno de graduação, a avaliação principal era
realizada semestralmente, em forma de exame oral com aproximadamente quatro
horas de duração para cada aluno. O nível de exigência era alto, fundado na
memorização, o que, segundo Castrucci era o motivo das elevadas taxas de
retenção:
O exame de avaliação oral exigia bastante memória, não era só
saber a matéria, pois as perguntas não eram metódicas. A pessoa
perguntava: ‘Este teorema, do que consta? Então você respondia.
Em seguida, pedia para demonstrar, às vezes, não. Às vezes
dava um pulo para outra coisa e depois voltava, para ver se você
tinha o domínio geral da matéria toda. Era bastante difícil, aí a
razão da reprovação em massa (CASTRUCCI, 1990).
Após o término da graduação, Benedito Castrucci tornou-se assistente de
Giacomo Albanese, cuja prática acadêmica e conselhos foram apropriados por
Castrucci, como revelam os diversos depoimentos concedidos durante sua
carreira e também podem ser percebidos em seus trabalhos acadêmicos, como
veremos no decorrer deste estudo.
8.3. Giacomo Albanese e o Departamento de Matemática da FFCLUSP
Giacomo Albanese chegou ao Brasil em 1936, tornando-se o segundo
matemático italiano, depois de Fantappié, a exercer atividade docente no
Departamento de Matemática. Albanese foi assessorado, a princípio, por Narcísio
Menciassi Lippi até 1939 e depois por Benedito Castrucci.
Conforme informou Castrucci (1990), o professor distinguia, dentre os
alunos, aquele que tinha possibilidade para prosseguir na carreira de pesquisador
matemático. Após o término do curso, o professor catedrático convidava esse
aluno para ser seu assistente, na época denominado de assistente científico. A
escolha era exclusivamente do professor catedrático e o ordenado, acrescentou
Castrucci, “era muito bom”. Assim também aconteceu com Castrucci, que se
tornou assistente de Albanese e por ele foi orientado em seu doutoramento.
Aprendeu, na lida com alunos e professores da FFCLUSP a fazer pesquisa,
começando por pequenos trabalhos de pesquisa, demonstrando um teorema
250
novo, demonstrando um teorema de forma diferente. Albanese foi seu mentor, em
quem se espelhou para se tornar um profissional matemático.
Como homenagem póstuma ao professor Giacomo Albanese, que falecera
em 08 de junho de 1947, no mesmo ano, Benedito Castrucci publicou um artigo
no Boletim da Sociedade de Matemática de São Paulo, o qual relatou um pouco
da trajetória do matemático Albanese na Itália e durante sua permanência na
FFCLUSP
87
.
A convite de Theodoro Ramos, Albanese veio para o Brasil em 1936, para
reger a cadeira de Geometria na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de São
Paulo, além de reger, também, a cadeira de Geometria Analítica e Projetiva na
Escola Politécnica de São Paulo, permanecendo até abril de 1942, quando voltou
para Pisa devido às circunstâncias internacionais advindas da Segunda Guerra
Mundial. Nesse ínterim, dando continuidade e buscando preservar a tradição
italiana de realização de seminários, organizou um seminário semanal sobre
matemática elementar com a finalidade de minimizar as dificuldades
apresentadas pelos alunos em assuntos básicos necessários para dar andamento
ao programa de matemática.
Retornou ao Brasil em 1946, assumindo a cadeira que deixara em 1942, na
Escola Politécnica.
Além de ser responsável pelas cadeiras de Geometria da FFCL e da
Politécnica da USP, integrava ainda a comissão de redação da “Summa
Brasiliensis Mathematicae”, do Jornal de Matemática Pura e Aplicada da USP e
87
De acordo com o relato de Castrucci, Albanese nasceu em Geraci Siculo, Palermo, em 11 de julho de
1890. Diplomou-se em 1909 no Instituto Físico-Matemático de Palermo, onde deu início aos seus estudos.
Nesse mesmo ano, ingressou na Escola Normal Superior da Real Universidade de Pisa, obtendo
doutoramento em 1913 com distinção e publicação da tese. Foi assistente de Análise Infinitesimal na cadeira
regida pelo professor Ulisse Dini, na Real Universidade de Pisa no período compreendido entre 1913 a 1930.
A partir de 1915, Albanese deu início às suas atividades científicas com a memória: “Sistemi continui di curve
sopra una superfície algébrica”, primeira de uma série de trabalhos matemáticos publicados em anais de
congressos e revistas especializadas da Itália. Após ter combatido na primeira Guerra Mundial, entre 1917 a
1918, foi assistente do professor Francisco Severi na cadeira de Geometria Analítica na Real Universidade de
Pádua. A partir de 1920, tornou-se professor de Análise Algébrica da Real Academia Naval de Livorno e, em
1923 obteve a livre docência na Real Universidade de Pisa, na cadeira de Geometria Projetiva, Analítica e
Descritiva. Em 1927 foi nomeado professor de Geometria Descritiva da Real Universidade de Palermo. Dois
anos depois volta para a Real Universidade de Pisa. A excelência dos trabalhos realizados ao longo de sua
carreira acadêmica fez com que Albanese fosse agraciado com os prêmios Ulisse Dini, Pia Ereditá Lavagna e
Torelli (CASTRUCCI, 1947).
251
foi o primeiro sócio honorário da Sociedade de Matemática de São Paulo
88
.
(CASTRUCCI, 1947, p. 3-5).
Albanese pertenceu a diversas instituições científicas, como o Circolo
Matemático de Palermo, Academia Gioenia de Ciências Naturais de Catânia,
Academia de Lincei, União Matemática Italiana, Conselho Nacional de Pesquisas
(fundado por Marconi), Sociedade de Matemática de São Paulo e Academia
Brasileira de Ciências.
As principais publicações de Albanese, em conformidade com o discurso
proferido por Castrucci foram: Sobre o ensino da Geometria (1936); Apostilas de
Geometria Analítica para a FFCLUSP (1939); Apostilas de Álgebra complementar
(não concluídas), acordadas com o curso dado no Instituto de Pesquisas
Tecnológicas da USP (1946-47) e apostilas de Geometria Projetiva (não
concluídas) para o curso da Escola Politécnica da USP.
Castrucci finalizou sua homenagem a Albanese, assinalando a
compatibilidade entre sensibilidade, magistério e produção científica, estimadas
pelo orador como características imanentes da personalidade daquele
matemático, nos seguintes termos:
A posição do Prof. Giacomo Albanese na escola dos grandes
geômetras italianos é de grande relevo, devido à sua contribuição
fundamental no campo da Geometria Algébrica.
[...] O passamento do ilustre professor encheu de consternação os
meios culturais de São Paulo, onde se fizera muito estimado pelos
discípulos e amigos, quer pelas qualidades de coração, quer pelos
dotes de mestre e cientista (CASTRUCCI, 1947, p. 3-5).
O noticiário publicado no mesmo fascículo do Boletim informa que no
mesmo ano do falecimento do professor Albanese, durante a primeira reunião
solene da Sociedade de Matemática de São Paulo, no dia 31 de maio de 1947,
Albanese pronunciou uma conferência sobre “Singularidades das curvas
algébricas”. Nessa mesma sessão, foram empossados os professores Oscar
Zariski, André Weil e Jean Dieudonné, como sócios honorários da Sociedade.
88
Em sessão solene realizada em 12 de abril de 1946, Omar Catunda, na qualidade de presidente da
Sociedade de Matemática de São Paulo, outorgou o título de sócio honorário ao professor Giacomo Albanese
(Boletim da SMSP, 1946, p. 6).
252
Informa, ainda, que no enterro de Giacomo Albanese, a Sociedade se fez
representar pela sua diretoria, tendo discursado à beira da sepultura o professor
Benedito Castrucci.
Segundo Circe Mary Silva da Silva (2000), durante sua estadia na USP,
Albanese arregimentou uma coleção de obras de matemática, priorizando
especialmente aquelas sobre Geometria Algébrica e disponibilizando-a para
leitura e consulta de alunos e professores. Os matemáticos franceses que mais
tarde também freqüentaram a FFCLUSP, particularmente André Weil e Jean
Dieudonné, muito usufruíram dessa biblioteca.
Ressalte-se ainda que, pouco antes de Albanese ir para a Itália, em abril
de 1942, o recém-formado Benedito Castrucci passou a pertencer ao quadro
docente da Universidade, assumindo a função de professor interino da cadeira de
Geometria Analítica, Projetiva e Descritiva da FFCLUSP.
8.4. Concursos de Benedito Castrucci para o Departamento de Matemática
Durante a sessão do Conselho Universitário de 9 de dezembro de 1941, foi
aprovado o regulamento que estabelecia o processo de doutoramento da
FFCLUSP, o qual foi publicado no Diário Oficial de 4 de janeiro de 1942. As
provas para obtenção do grau de doutor em filosofia, ciências, letras e pedagogia
eram elaboradas sob orientação do professor da cadeira relativa ao assunto e
exame de duas matérias subsidiárias, escolhidas a critério dos cinco professores
indicados pelo orientador e componentes da banca examinadora. De acordo com
o regulamento da Faculdade, os assistentes eram obrigados ao doutoramento
(ANUÁRIO DA FFCLUSP, 1939-1949).
Oficializando esse regulamento, o Decreto Estadual n. 12.511 de 21 de
janeiro de 1942, que “reorganiza a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da
Universidade de São Paulo”, decretou em seu artigo 64:
§1º. Será conferido o diploma de doutor ao bacharel que defender
tese de notável valor, depois de dois anos, pelo menos, de
estudos sob a orientação do professor catedrático da disciplina
sobre que versarem os seus trabalhos, e for aprovado no exame
253
de duas disciplinas subsidiárias da mesma secção ou de secção
afim (SILVA, 2003b, p. 50).
Como assistente de Albanese, impunha-se a Castrucci o doutoramento.
Naquela época, a preparação para o doutorado começava a partir da orientação,
em que conversar, discutir, indicar obras, comentar os trabalhos realizados eram
os procedimentos habituais. Docência e pesquisa caminhavam juntas. Castrucci
era incumbido de lecionar aulas de exercício três vezes por semana, assistir as
aulas teóricas de Albanese e preparar os exercícios de acordo com a exposição
teórica dada. Às vezes Albanese designava seminários em que Castrucci deveria
coordenar, sob a observância atenta de Albanese, que comentava e criticava a
forma de apresentação do assunto tratado. Além disso, Castrucci deveria estudar
à parte os assuntos referentes à tese. Um episódio sobre o modo de orientação
de Albanese é rememorado por Castrucci:
Eu me lembro que ele me deu um assunto, eu desenvolvi, cheguei
ao ponto quase que final. Quando escrevi tudo e entreguei, ele
rasgou e disse: “isso aqui é treino, agora é que eu vou dar um
assunto bom para você fazer a tese”. Aí comecei a trabalhar de
novo (CASTRUCCI, 1990).
Segundo depoimento de Castrucci (1990), em sua época, o aluno
preparava a tese e, pouco antes do término de sua elaboração, recebia dos
professores duas outras matérias, geralmente dois livros, versando sobre temas
fora do currículo, para serem estudadas. Iniciava-se o estudo desses conteúdos
antes mesmo do término da escrita da tese. Em determinada época, a banca era
convocada e examinava oralmente o candidato que recebia, nesse ínterim, uma
determinada nota. Essa nota, enfatizou Castrucci, era eliminatória. Era, portanto,
fundamental. Poucos dias depois, reunia-se novamente uma banca – Castrucci
não esclareceu se era composta pelos mesmos professores da anterior – mas
compunha-se de cinco membros, que procedia a argüição da tese e auferia uma
segunda nota que, reunidas à nota do trabalho escrito, totalizavam três notas, das
quais era extraída uma média, a nota final.
No Anuário 1939-1949 consta que, no ano de 1943, o doutoramento de
Benedito Castrucci, realizou-se em 04 de agosto, quando defendeu a tese “Sobre
uma nova definição de cúbica plana”. Albanese já não se encontrava no Brasil
254
desde abril de 1942. É possível que essa orientação tenha sido concluída à
distância, por correspondência
89
. Fizeram parte da comissão examinadora os
professores Omar Catunda, Fernando Furquim de Almeida, Cândido Lima da
Silva Dias, Gleb Wataghin e Abrahão de Moraes.
Pires (2006) complementa as informações extraídas do Anuário,
comunicando, em conformidade com o Livro de Doutorado I que, em 26 de julho
de 1943 a comissão examinadora deu seu parecer sobre o material entregue por
Castrucci, bem como marcou a data dos exames das matérias subsidiárias para
28 de julho de 1943 e da defesa de tese para 04 de agosto do mesmo ano.
Em 1949, o Departamento de Matemática mudou-se para a Rua Maria
Antonia, 258. O discurso proferido por Plínio Benedito de Lauro Castrucci, durante
a solenidade de doação do acervo de Benedito Castrucci, seu pai, à Biblioteca do
IME, permite-nos ter uma idéia de como eram as instalações físicas do prédio, o
ambiente em que se dava o trabalho diuturno de Castrucci e seus colegas, com
destaque para a presença de Albanese na vida de Benedito Castrucci, registrada
na memória de seu filho:
A menção à Maria Antonia traz-me à lembrança imagens
indeléveis, de meu pai e das origens deste Instituto. Pois, ainda
menino, na década de 40, eu era levado com certa freqüência ao
então Departamento de Matemática, nele se entrava por uma
pequena porta a uns 20 metros do imponente hall do prédio
principal; subindo alguns degraus, havia um intrincado conjunto de
pequenas salas, para 10 ou 12 alunos. Impressionavam-me o
silêncio ambiente e um certo mistério, uma certa parcimônia
verbal dos colegas de meu pai: Omar Catunda, que eu associava
de maneira imprecisa ao título impressionante de ex-engenheiro
projetista de redes de saneamento de Santos, Cândido Lima da
Silva Dias, que eu associava a um desconhecido mundo de
longínqua fazenda, em Mococa... ali também um pouco mais tarde
viria a conhecer Edson Farah; no correr da vida tornaram-se tão
amigos, meu pai e ele, que se referiam mutuamente como irmãos.
E conheci Fernando Furquim de Almeida e outros pioneiros. Mas
só pude realmente aferir sua notáveis competências, na qualidade
de aluno de Física.
89
Clovis Pereira da Silva (2003b) em artigo publicado nos Anais do V Seminário Nacional de História da
Matemática, alega que Albanese orientou a tese para o concurso de cátedra de Castrucci, que foi defendida
em 1951. Há que se observar, entretanto, que Albanese foi para a Itália em 1942 e retornou ao Brasil em
1945, onde faleceu em 1947. Assim, é provável, como sugere Rute da Cunha Pires (2006), que Albanese
tenha orientado, à distância, o doutoramento de Castrucci, cuja defesa deu-se em 1943, ao invés da tese do
concurso à cátedra.
255
Dos professores italianos que vieram fundar o ensino superior de
matemática e física, em 1935 ou 36, Fantappiè, Wattaghin e
Albanese, só me lembro bem do último, o geômetra que orientou
cientificamente meu pai (CASTRUCCI, 2001).
A transferência da maioria dos cursos da FFCLUSP para a Rua Maria
Antonia representou uma experiência de implantação de um campus universitário
no centro da cidade de São Paulo, uma vez que o funcionamento conjunto das
diversas secções propiciou um ambiente universitário de intenso convívio entre
professores e alunos: “Não havia espaço para intransigência e prepotência, não
havia oportunidade para a intolerância se manifestar, o obsoleto não era
defendido por ser mais seguro e o novo não era temido. Esse era o espírito da
Maria Antonia...” (D’AMBROSIO, 1988, p. 64).
É nesse espaço, lugar socialmente destinado à formação de especialistas
e professores, espaço que Castrucci (DE CERTEAU, 2002), doutor em
Geometria, decidiu tornar-se professor catedrático, o que também exigia
aprovação em concurso. Segundo Castrucci (1990), a FFCLUSP determinava que
fossem doutores
90
. Nesse tempo, em alguns departamentos, devido à
concorrência, os professores primeiro faziam livre docência e depois a cátedra
91
.
No caso do Departamento de Matemática, eram apenas três assistentes
doutores
92
, já com publicações e não havia concorrência, pois a exigência do
doutorado impedia candidatos de outras instituições, considerando que havia
insuficiência de doutores na área de matemática. Estavam, de certa forma,
isolados.
90
A princípio, em 1937, enquanto a Faculdade de Filosofia não contava com doutores formados naquela
instituição, a Resolução de 14 de maio de 1937, aprovada pelo Conselho Universitário, determinava a
apresentação de seis exemplares impressos ou datilografados em espaço duplo de uma tese em disciplina
afim, ficando dispensados os candidatos que fossem doutores, os quais deveriam apresentar cinco
exemplares de sua tese de doutoramento (PIRES, 2006, p. 304).
91
O Decreto n. 13.426 de 23 de junho de 1943, regulamentou os concursos para professor catedrático e livre
docente. O primeiro concurso realizado pelo Departamento de Matemática da FFCLUSP sob esse dispositivo
legal foi para provimento da cadeira de Análise Matemática, tendo Omar Catunda como único candidato
inscrito (PIRES, 2006).
92
Castrucci fazia referência a Cândido Lima da Silva Dias, que concorreu para a cadeira de Complementos
de Geometria e Geometria Superior e Fernando Furquim de Almeida, candidato à cadeira de Crítica aos
Princípios e Complementos de Matemática, na mesma época que Castrucci e também exerciam
interinamente as cadeiras pelas quais concorreram (ANUÁRIO DA FFCLUSP, 1951). Cândido Lima da Silva
Dias doutorou-se em 1942, entretanto, não foram encontrados registros sobre possível doutoramento de
Fernando Furquim de Almeida, que no Anuário de 1951, aparece como Licenciado em Ciências Matemáticas.
Apesar disso, como destaca Clóvis Pereira da Silva (2003b), Furquim de Almeida orientou tese de doutorado
de João Batista Castanho, em 1950.
256
Dessa maneira, relembrou Castrucci (1990), Eurípedes Simões de Paula,
então Diretor da Faculdade de Filosofia, solicitou que os professores se
inscrevessem para o concurso de cátedra. O concurso constava de uma prova
escrita, com ponto sorteado do programa. Se a cadeira comportava prova prática,
esta era então realizada, seguindo-se a defesa de tese
93
. Para ser aprovado o
candidato precisava alcançar, no mínimo, nota sete. Caso se apresentasse mais
do que um candidato, aquele que obtivesse maior nota tornava-se catedrático e o
segundo colocado, livre-docente. Ainda, se o professor candidato não fosse
doutor, quando se tornava catedrático, também lhe era creditado o título de
doutor. Este foi o caso, por exemplo, de Omar Catunda, como já abordado
anteriormente. Além disso, salientou Castrucci (1990), “se a gente não tivesse
bons títulos, a norma era a banca reprovar de qualquer maneira. Não davam sete.
Então, quando a gente ia fazer concurso, tínhamos muita publicação”.
Particularmente, Castrucci não ensejou ser livre docente, prestando
concurso para catedrático em 1951. Segundo seu depoimento, o cabedal de
trabalhos publicados permitiu-lhe essa escolha:
Quando era convidado a examinar um concurso de cátedra fora
de São Paulo, eu era convidado por notório saber. Porque não era
titular, nem catedrático. Tudo isso pesava. [...] minha nota de
títulos foi dez. Eu achava muito bom (CASTRUCCI, 1990).
No dia 20 de novembro de 1951, teve início o concurso de provimento da
cadeira de “Geometria Analítica, Projetiva e Descritiva” tendo como candidato
único Benedito Castrucci. Nesta mesma ocasião, iniciaram-se os trabalhos para
provimento das cadeiras “Complementos de Geometria e Geometria Superior” e
“Crítica dos Princípios e Complementos de Matemática”, tendo candidatos os
professores Cândido Lima da Silva Dias e Fernando Furquim de Almeida,
respectivamente. Os trabalhos foram presididos pelo professor Milton da Silva
Rodrigues, contando com os seguintes professores componentes da banca: Omar
Catunda, Edmundo Medeiros Dantas, Cristóvão Colombo dos Santos e Ary
Tithbol Nunes. O ponto sorteado para a prova escrita de Benedito Castrucci
93
Esta afirmação de Castrucci encontra-se em consonância com a ementa do Reitor Jorge Americano,
aprovada pelo Conselho Universitário em 14 de maio de 1937, ficando determinado que a prova prática
somente seria exigida para as cadeiras que a comportassem (LIVRO DE CONCURSOS I, apud PIRES,
2006).
257
versava sobre “Proposição de Staudt e Teorema Fundamental” (ANUÁRIO, 1951,
p. 91-92).
Em 20 de novembro de 1951, às 13 horas, tiveram início os trabalhos dos
concursos para provimento das três cadeiras. Nessa ocasião foi realizada a prova
escrita, cujo tema foi retirado de uma lista de pontos elaborada pela comissão
examinadora. Nesse mesmo dia, a comissão procedeu ao exame e julgamento
dos títulos dos três candidatos, enquanto que a leitura das provas escritas
aconteceu no dia seguinte, às 15 horas, no salão nobre da Faculdade, em sessão
presidida pelo Diretor, professor Eurípedes Simões de Paula.
A prova didática realizou-se no dia 22 de novembro de 1951, às 16 horas,
quando Castrucci dissertou sobre o ponto sorteado “Estudo das quádricas.
Equações reduzidas”.
Para a defesa de tese, realizada em 24 de novembro de 1951, às 14 horas,
Castrucci apresentou o tema “Fundamentos da Geometria Projetiva Finita N-
Dimensional”. Os membros da comissão examinadora argüiram o candidato
obedecendo a seguinte ordem: Cristóvão Colombo dos Santos, Edmundo
Meneses Dantas, Ari Nunes Tithbol, Omar Catunda e Milton da Silva Rodrigues.
(ANUÁRIO DA FFCLUSP, 1951, p. 94-95).
O Anuário de 1951 apresenta um resumo da tese de Castrucci às páginas
95-96, tecendo comentários sobre os resultados originais, generalizando
resultados obtidos pelo matemático Chung Tao Yang e publicados no
Mathematical Institute National University of Chekiang – Hongchow-China, em
1947, para o espaço N-dimensional. Ainda segundo o relatório, o capítulo II da
tese constituiu-se na parte mais importante, pois o autor obtém resultados novos,
e, além disso, as demonstrações de teoremas conhecidos em geral, foram
inteiramente pessoais.
Desse concurso, não se observou efetivo predomínio de estudos e
resultados advindos da escola francesa, mas percebe-se que as referências aos
conteúdos apresentados estão acordados com as da escola italiana (PIRES,
2006).
258
8.5. O ensino da Geometria no secundário: depoimentos de Castrucci
As considerações expostas neste tópico
decorrem, sobretudo, de depoimentos feitos
por Castrucci para pesquisadores, jornais e
revistas. Neles, Castrucci expressou sua
opinião sobre o ensino secundário, dando
destaque especial ao ensino da geometria.
Ao ser indagado sobre o que deveria ser
considerado fundamental no ensino elementar
de matemática, Castrucci (1978), defendeu um
ensino voltado à destreza do cálculo das
principais operações com números inteiros,
frações e números relativos, como também noções práticas de porcentagem,
juros, média, etc. Além disso, ainda para o 1º grau, nas séries mais avançadas,
dever-se-ia introduzir algumas noções de álgebra, noções geométricas do plano,
de modo intuitivo, levando o aluno a obter noções de demonstração.
Para Castrucci, o valor e utilidade do ensino de geometria consistiam em
adquirir uma intuição do espaço e suas figuras. Para o primeiro grau, conhecer as
formas, insistindo na introdução de uma geometria espacial intuitiva, o cubo, o
cilindro, o cone, etc. e, concomitantemente, conhecer algumas figuras planas, por
meio do desenho de triângulos, quadrado, retângulo etc., valendo-se do uso de
instrumentos, como o compasso. Do ponto de vista histórico, esclareceu, a
geometria nasceu da observação, intuição, da experiência. Somente com os
gregos aparece a idéia de demonstração e posteriormente a idéia de vetores.
Esse fato deve ser levado em conta no ensino, uma vez que, “ao que parece, um
homem ao longo de uma vida percorre os mesmos caminhos que a humanidade
percorreu através dos séculos” (CASTRUCCI, 1978, p. 37).
Castrucci (1978) também sugeriu que o processo dedutivo de teoremas
não deveria ser dado de modo algum, no primeiro grau. Somente a partir da 7ª
série, por meio da geometria plana, poderia ser introduzida alguma demonstração
de alguns teoremas que serviriam de modelo, para que o aluno pudesse
259
perceber, pela primeira vez o que vem a ser um raciocínio dedutivo. Para o 2º
grau, durante o estudo da geometria espacial, já se poderia insistir na
demonstração de teoremas, embora em pequeno número, alertava.
Pode-se notar, que Castrucci defendia uma seqüência para o ensino,
sugerindo etapas a serem percorridas, a exemplo do desenvolvimento histórico da
matemática, lembrando o “método genético”, também defendido por Catunda.
Desse modo, ensinar vetores ou noções de álgebra linear no ciclo fundamental,
como proposto durante o MMM, contrariava a posição de ensinar a matemática
sem queimar etapas.
Quanto à utilidade do estudo da geometria, Castrucci analisou a questão
sobre dois aspectos, a serventia da geometria como passagem intermediária para
assuntos futuros e como explicação sobre o valor histórico de determinados
assuntos. Castrucci entendia que, a princípio, no ensino básico, o ensino da
geometria deveria começar pelo estudo das formas, numa visão geométrica, com
muitos exercícios e ensinando a construção de sólidos com cartolinas. Numa
segunda fase, o conteúdo obedeceria a uma programação de geometria plana,
iniciando pelas noções preliminares de ângulo, reta e segmento. Para o ensino de
geometria o ideal seria a utilização do método heurístico, quando os alunos
seriam levados a perceber a validade de uma dada propriedade, por meio de
desenhos. Para tanto, as classes não deveriam ser numerosas, para não haver
perturbações. No segundo grau, os métodos poderiam ser mais expositivos e o
conteúdo mais científico, sem exageros, pois “é preciso lembrar que os alunos
podem se destinar a estudar filosofia ou letras ou artes ou direito e não precisam
ter um excesso de matemática” (1978, p. 38).
Seu depoimento sugere, dessa forma, uma preocupação em ministrar a
matemática para todos, sem focalizar um grupo especial de alunos, aqueles que
se destacam nessa área.
Para o segundo grau, Castrucci considerou que não haveria tanta
dificuldade no tratamento da geometria espacial e a analítica por vetores, embora
fosse necessário “destreza dos professores para ensinar por esse caminho”. Além
disso, acreditava que restaria ainda uma grande quantidade de propriedades
260
geométricas que seria melhor estudada diretamente pelo desenvolvimento
axiomático clássico (1978, p. 39).
Para auxiliar o aluno a desenvolver a intuição, Castrucci (1979) via, na
apresentação da matéria com procedimentos variados, um modo propício para
que o aluno fizesse uso de sua intuição. Esse tratamento permitiria à criança fazer
muitas perguntas, que poderiam ser embaraçosas para o professor com má
formação geométrica, sendo esse um dos motivos pelo qual professores têm
medo de ensinar geometria para alunos de 7ª série. Considerou o método
utilizado por Polya muito interessante, embora salientasse a imposição de se
trabalhar com classes pouco numerosas para manter a disciplina. Comentou
sobre um grupo dirigido por George Springer, utilizando o método de Polya, que
ouviu dizer teria conseguido excelentes resultados, fazendo com que o grupo de
crianças desenvolvesse a capacidade de pesquisar. Quanto à ênfase a ser dada
ao rigor, Castrucci entendia que no ensino, nem sempre as definições e
demonstrações rigorosas podem ser apresentadas, bastando ao aluno perceber e
aceitar como válidas.
Perguntado sobre o que seria essencial para a formação do professor de
Matemática, Castrucci (1978) respondeu ser sempre necessário um bom
conhecimento matemático. O professor secundário deve ter um bom
conhecimento de geometria euclidiana axiomática, questões de geometria não
euclidianas. Deve ter boa formação em álgebra, inclusive linear, e boa formação
de cálculo. Como complemento, ter conhecimentos de história da matemática, um
curso simples de Lógica matemática e noções de Teoria dos Conjuntos, além das
matérias didáticas, as quais devem vir acompanhadas de estágios (treinamento).
Sobre a pesquisa no ensino de matemática, Castrucci entendia que era
esporádica, posto que até naquele momento, década de 1970, não havia cursos
de pós-graduação em ensino de matemática. Defendia a idéia da criação de
mestrado na área de Educação Matemática. Para Castrucci, em linhas gerais,
esse curso deveria contar com 40% a 50% de matérias pedagógicas,
educacionais e psicológicas e o restante seriam dedicados aos estudos no campo
da Topologia, Geometria, Álgebra, sem no entanto, abordar aspectos muito
específicos, próprios de uma pós-graduação em matemática pura.
261
O primeiro fator que afeta o ensino é a preocupação com a urgente
necessidade de suprir a população com uma ampla oferta de escolas, que
possam atender a demanda cobrada pela sociedade:
Nós temos que dar escolas para todos, quando nós aumentamos
o número de elementos que devem ser servidos, que devem ser
instruídos, nós temos dificuldade em arranjar um corpo docente
para toda esta imensa área que cresce rapidamente de ano para
ano, enquanto o corpo docente cresce mais lentamente
(CASTRUCCI, 1978, p. 41).
Outro fator é o econômico, pois o professor, não tendo uma remuneração
condigna, obriga-se a assumir uma quantidade muito grande de aulas,
acarretando em um ensino deficiente.
Os motivos pelos quais Castrucci (1988) disse interessar-se pelo Ensino
Secundário era que, para ele, sem o Ensino Secundário e o Primário, “não
adianta nada o Ensino Superior”. Ou seja, não adiantaria nada esforços para
manter um alto padrão de Ensino Superior, se não houvesse, concomitantemente,
uma preocupação com a excelência de qualidade do ensino primário e
secundário. Seu interesse, portanto, manifestava-se especialmente pela
necessidade em manter-se um Ensino Primário e Secundário de alto nível, como
alicerce insuperável para que também se obtivesse e mantivesse um Ensino
Superior de excelente qualidade. Embora Castrucci destacasse seu interesse pela
matemática secundária, observa-se que por trás de suas observações, deixou
implícita uma preocupação com a qualidade e desenvolvimento do Ensino
Superior: “sempre tive um grande interesse na matemática secundária porque eu
acho que sem o ensino secundário e o primário, não adianta nada o superior, não
é?” (CASTRUCCI, 1988).
Problemas do ensino secundário eram discutidos na década de 1940 e
1950 com participação da Sociedade de Matemática de São Paulo, que
incentivava a formação de grupos de professores dispostos a discutir o assunto.
Assim, Omar Catunda convidou Castrucci para participar dessas discussões em
1945. Em 1951, Castrucci foi convidado para representar o Departamento de
Matemática da FFCLUSP na Conferência Nacional de Estudos sobre a
Articulação do Ensino Médio e Superior.
262
8.6. Participando de Congressos: 1957
De 29 de junho a 4 de julho de 1957 aconteceu em Porto Alegre/RS o II
Congresso Brasileiro do Ensino da Matemática, em que surgem as primeiras
propostas para implementação da MM no ensino secundário. A 2ª Subcomissão,
dedicada às questões relativas ao Ensino Secundário, atuou sob a presidência do
professor Roberto Peixoto e vice-presidência do Irmão Leôncio José. Nela,
Benedito Castrucci apresentou a tese “Sobre o ensino da geometria no ensino
secundário”.
Castrucci (1959) partiu do pressuposto que o ensino secundário é
eminentemente formativo, não tendo por finalidade prover o aluno de uma
bagagem de conhecimentos e sim desenvolver completamente suas faculdades.
Desse modo, Castrucci defendeu a necessidade de reduzir e até mesmo eliminar,
certos assuntos que não têm valor formativo. Não se devia, em sua opinião,
enfatizar assuntos como, por exemplo, limites e derivadas, para não desvirtuar o
objetivo do ensino secundário.
O estudo da Geometria, por outro lado, seria um ramo privilegiado da
matemática para manter o caráter formativo do aluno. Sua finalidade seria “tornar
claro o sentido da precisão matemática e o prazer da descoberta da verdade”
[grifos do autor] (CASTRUCCI, 1959, p. 369).
Aqui vemos o matemático privilegiando uma boa formação inicial,
colocando-a em primeiro plano e reservando o aprofundamento de conteúdos
matemáticos para um momento posterior. O sentido da precisão matemática e o
prazer da descoberta passavam necessariamente pela familiaridade com os
princípios da geometria euclidiana, responsável pela boa formação do aluno
secundarista, verdadeiro pressuposto para vôos mais altos em relação ao
aprendizado da matemática.
Segundo Castrucci, a Geometria tem por objetivo o ensino do pensamento
dedutivo e, portanto, deve ser desenvolvida numa seqüência lógica, sem
necessariamente, demonstrar todas as proposições, pois não podemos esquecer
o aspecto psicológico e pedagógico do aprendizado. Dever-se-ia considerar,
preliminarmente, dois tipos de demonstração: “a experimental, com apelo ao
263
mundo exterior e com uso de nossos sentidos, a lógica, que independe do
universo exterior, apoiada exclusivamente nas definições, postulados e teoremas
anteriores” [grifos do autor] (CASTRUCCI, 1959, p. 370).
Além disso, Castrucci defendia que a beleza da geometria estava em
admitir um mínimo de proposições intuitivas (postulados) conforme estabeleceu
David Hilbert.
A esse respeito, lembramos que Castrucci possua excelente domínio da
axiomática de Hilbert, que aparece de forma fragorosa em seus livros e apostilas.
Por exemplo, nas notas de aula do Curso de especialização da FFCL de Santo
André, para o ano de 1972, Castrucci apresenta um esquema em que evidencia
os planos mais importantes que se encontram relacionados com o plano
euclidiano, apropriando-se da axiomática de Hilbert. Encontra-se explicitada o
plano de incidência, o plano afim, o plano afim desargueano etc. Castrucci seguiu
os preceitos de Hilbert, reorganizando-os de modo que o professor tivesse uma
idéia clara, passo a passo, de como a geometria é construída. Em Hilbert, vê-se
os axiomas de incidência, ordem, congruência, continuidade e paralelismo.
Castrucci coloca-os em outra ordem, plano afim (incidência + ordem), mas em
termos substanciais é o que se encontra em Hilbert (CASTRUCCI, 1972).
Entretanto, para a didática, não se necessita demonstrar o máximo de
propriedades, mas apenas aquelas que forem compatíveis com a idade dos
alunos e sua possibilidade de compreensão. Caso o professor decida pelo uso da
experiência ou pelo raciocínio dedutivo, observou Castrucci, o importante é “não
confundir os tipos de demonstração”, para que, pouco a pouco, o aluno vá
distinguindo claramente os dois tipos de procedimento, (1959, p. 370).
O professor não deve, tampouco, advertiu Castrucci, demonstrar
proposições iniciais que se apresentam espontaneamente ao aluno e são de seu
domínio.
Finalizando, Castrucci conclui sua tese lembrando que “ensinar é uma arte
e não existe o melhor caminho para se ensinar alguma coisa” (1959, p. 372). Se
não existe o melhor caminho, todos os caminhos são, em tese, possíveis de
serem percorridos, e a geometria de Euclides configurava-se como um deles, não
264
havendo razão para descartá-la sob o argumento de que não condizia com a
modernidade, como foi preconizado por alguns reformadores durante o
Movimento.
Da tese de Castrucci, o plenário aprovou a seguinte conclusão:
Ao ser iniciado o estudo da Geometria Dedutiva consideram-se
conhecidos os conceitos e as definições já de posse dos alunos
no estudo dessa Geometria no Curso Primário e nos cursos de
desenho das duas primeiras séries (II CBEM, 1959, p. 372).
Neste mesmo Congresso, o artigo de autoria de Ubiratan D’Ambrosio
intitulado “Considerações sobre o ensino atual da matemática”, foi relatado por
Benedito Castrucci, porquanto D’Ambrosio, então professor da Faculdade de
Filosofia, Ciências e Letras da Universidade Católica de Campinas, não pode
comparecer ao evento por motivos de saúde. Nesse artigo D’Ambrosio tece
considerações sobre o currículo, no qual sugeria a introdução do estudo de
propriedades de diferentes conjuntos numéricos e operações de estruturas
algébricas, tais como aquelas que podem ser observadas na Geometria das
Transformações, justificando que “as aquisições mais recentes da Matemática
Moderna e da Psicologia não são consideradas no panorama geral do ensino”
(1959, p. 374).
Esta foi uma das primeiras manifestações em prol da renovação do ensino
de matemática direcionada para a introdução de conteúdos de MM no secundário,
quando não, a primeira propriamente dita, considerando que as outras propostas
apresentadas, quais sejam, a de Osvaldo Sangiorgi e do Major Jorge Emmanuel
Barbosa
94
, não previam uma sistemática e exemplificação de conteúdos levando
em conta cada uma das séries, como as detalhou D’Ambrosio.
94
Sangiorgi apresentou a tese “Matemática clássica ou matemática moderna na elaboração dos programas
do ensino secundário” e o professor Barbosa o trabalho intitulado “Reflexos do desenvolvimento atual da
matemática no Ensino Secundário”. Osvaldo Sangiorgi, recomendou que mudanças relativas à MM no
currículo fossem gradativas, a fim de “evitar malefícios decorrentes de transformações radicais” (1959, p.
399). A esse respeito, Beatriz D’Ambrosio (1987), chama a atenção para o fato de que o programa proposto
por Sangiorgi não acolheu nenhuma das novas idéias, contradizendo sua afirmação de incorporação
gradativa das novas idéias. Por sua vez, Barbosa defendeu a necessidade de atualização do ensino,
propunha ainda a designação de um grupo de professores para estudo e experimentação de conteúdos de
MM no secundário, mas não propôs um programa como fez D’Ambrosio.
265
Ressalte-se que o artigo de D’Ambrosio, propondo uma “matemática mais
moderna” foi, de certa forma, defendido e aprovado por Benedito Castrucci, uma
vez que este se mostrou solícito em apresentá-lo, não manifestando qualquer
crítica ao trabalho de seu ex-aluno. No mínimo, ao aceitar expor as idéias de
D’Ambrosio, Castrucci deve ter cogitado no sentido de que o pensamento de seu
ex-aluno poderia fomentar discussões e reflexões por parte dos congressistas,
importando dizer que ficariam sujeitas não só a eventuais críticas, como também
poderiam ser aprovadas. Vale dizer, D’Ambrosio estava respaldado pela
autoridade do professor Castrucci.
8.7. Participando de núcleos de estudos: a formação do GEEM
Na década seguinte, o jornal Folha de São Paulo, do dia 11 de outubro de
1960, publicou uma matéria intitulada “Professores de São Paulo visam a reforma
dos programas e métodos do ensino da matemática”, informando aos seus
leitores que havia sido dado início, na cidade de São Paulo, a um movimento de
reforma do ensino da matemática. Trazia como justificativa a verificação de que a
metodologia e conteúdos do ensino da matemática encontravam-se ultrapassados
em vista dos grandes avanços verificados nos estudos matemáticos, sobretudo a
partir dos anos 1950. Ainda segundo a reportagem, esse movimento encontrava-
se organizado em pelo menos três grandes núcleos de estudos. Um deles era
levado a cabo pela FFCLUSP, no Colégio de Aplicação, sendo orientado pelo
professor Benedito Castrucci, do Curso de Matemática e pelo professor Scipione
di Pierro Neto, professor do Colégio de Aplicação daquela instituição de ensino
superior
95
.
Neste mesmo ano, em dezembro de 1960, Castrucci, juntamente com os
professores Onofre de Arruda Penteado Junior, Scipione di Pierro Neto e Geraldo
dos Santos Lima Filho organizou um ciclo de palestras franqueadas aos
95
Outro grupo funcionava na CATEC (Centro de Aperfeiçoamento Técnico do Ensino de Ciências), mantido
pelo IBECC – UNESCO, em colaboração com o Centro de Aperfeiçoamento e Difusão do Ensino Secundário
(CADES). Este grupo visava elaborar cursos intensivos para professores do ensino médio de colégios
particulares e oficiais. Nos cursos eram discutidos métodos e processos para a apreensão da matemática e
também eram construídos materiais didáticos. Outro núcleo estava sob a coordenação da Secretaria da
Educação, sendo coordenado pelo professor Osvaldo Sangiorgi. Mantinha estreito contato com o CATEC e
propunha-se a realizar viagens pelo interior do Estado de São Paulo, ministrando seminários (JORNAL
FOLHA DE SÃO PAULO, 11 out. 1960).
266
professores interessados em melhorar a qualidade do ensino secundário,
realizado no Colégio de Aplicação da Rua Gabriel dos Santos, 34. Naquela
ocasião, Castrucci proferiu palestra intitulada “A idéia de conjunto no ensino
secundário” (Folha de São Paulo, 1960). A preocupação em implementar a
introdução da Teoria dos Conjuntos, portanto, já se apresentava no grupo
encabeçado pela FFCLUSP, em 1960.
O mesmo grupo de professores citados na Folha de São Paulo aparece
novamente, juntamente com o nome de Osvaldo Sangiorgi, em nota introdutória
de um artigo publicado por Ubiratan D’Ambrosio na Revista Atualidades
Pedagógicas no ano de 1961, intitulado “Álgebra moderna e a escola secundária”.
O autor da nota esclareceu que o artigo de D’Ambrosio foi publicado pelo Colégio
de Aplicação da Universidade de São Paulo, e ainda que,
... o presente trabalho do prof. Ubiratan D’Ambrosio nos chama a
atenção, de maneira lúcida, para a imediata necessidade de ser
introduzido o espírito da álgebra moderna nos atuais programas
do ensino secundário. Essas idéias, tão bem desenvolvidas nos
maiores centros modernos de ensino da Matemática, vem sendo
articuladas com entusiasmo e alto senso de responsabilidade
técnica e pedagógica por um grupo de professores universitários
da Universidade de São Paulo (Prof. Onofre de Arruda Penteado
Jr., Benedito Castrucci, Geraldo dos Santos Lima Filho, Scipione
Di Pierro Netto, O. Sangiorgi e outros) (BORGES, 2005, p. xviii).
Segundo Borges (2005)
96
, Ubiratan D’Ambrosio, ao examinar a lista dos
sujeitos referidos na nota introdutória, declarou que
... de todo esse grupo os únicos que estavam fazendo alguma
coisa nessa linha, eram o Sangiorgi e o Castrucci. Eles eram
muito ligados. O Sangiorgi iniciou o negócio da Matemática
Moderna e o Castrucci foi um dos primeiro a dar muito apoio a ele,
etc. E com isso os outros, o Geraldo na sombra de Castrucci, o
Onofre nada a ver com isso e o Scipione quase que numa, não
diria oposição, mas, correndo por fora (D’AMBROSIO, apud
BORGES, 2005, p. 170).
Dessa forma, D’Ambrosio faz sobressair o nome de Castrucci juntamente
com Osvaldo Sangiorgi como um dos principais propulsores do movimento de
reforma da MM.
96
Sobre a participação de Ubiratan D’Ambrosio no MMM ver dissertação de mestrado de Rosimeire
Aparecida Soares Borges (2005).
267
Ainda nos idos de 1960, Osvaldo Sangiorgi viajou para os Estados Unidos
com a finalidade de participar de um seminário de verão na Universidade de
Kansas, ocasião em que veio a conhecer o matemático George Springer que, por
sua vez, veio ao Brasil em 1961, especialmente convidado para lecionar em um
curso de aperfeiçoamento para professores organizado por Sangiorgi, que se
realizou nos meses de agosto e setembro, na Universidade Mackenzie.
Passo decisivo para a criação do GEEM, também em 1961:
Aí o Sangiorgi que era muito entusiasta foi para os Estados
Unidos, [...] ele trouxe para cá o George Springer, que era um
especialista dessa área muito inovadora e o Springer deu um
curso no Mackenzie, que todos nós assistimos, [...] Então eu
embrenhei também nesse movimento, e aí quando o Springer foi
embora nós fundamos um grupo de estudos sobre a matemática e
aí o jeito era fazer reciclagem dos professores (CASTRUCCI,
1988).
A vinda de George Springer foi garantida por um acordo entre a National
Science Foundation, a Secretaria da Educação e o Instituto Mackenzie. O curso,
realizado nos meses de agosto e setembro, contou com a presença de cerca de
25 professores, liberados pela Secretaria da Educação e recebendo uma bolsa de
estudos. Além da disciplina Lógica Matemática, lecionada por Springer, foram
ministradas as disciplinas Álgebra Linear, pelo professor Jacy Monteiro; Teoria
dos Conjuntos pelo professor Alésio de Caroli e Práticas de Matemática Moderna,
pelo professor Sangiorgi (BÚRIGO, 1989).
8.8. Atuando no GEEM: apropriando-se de preceitos modernos para o
ensino secundário
O GEEM foi fundado logo em seguida, em 31 de outubro de 1961. Desde o
princípio, Castrucci aderiu ao MMM, colaborando ativamente com o GEEM, onde
ministrou vários cursos sobre Teoria dos Conjuntos e Lógica, além de Geometria,
ramo em que era especialista e para o qual dedicava a maior parte de suas
pesquisas.
268
Uma justificativa para abraçar a causa do MMM foi dada por Castrucci em
entrevista concedida aos leitores do Jornal Folha de São Paulo, em 6 de fevereiro
de 1965, na matéria intitulada “Matemática Moderna torna o estudo mais
accessível”. Primeiramente, Castrucci fez saber que, uma das qualidades
apontada pelos professores no que dizia respeito ao trabalho renovador no ensino
de matemática, era que este permitia uma maior integração entre diversas
disciplinas. Especificamente, no caso da relação entre as ciências humanas e a
matemática, esta última não pretendia fornecer “os elementos qualitativos dessas
disciplinas, mas sim enriquecer a dimensão quantitativa dos fenômenos por elas
estudados”. Em um segundo momento, o artigo esclarece “Se nenhum outro
resultado fosse obtido pela Matemática Moderna, afirmou o professor Castrucci,
ela já estaria justificada por haver despertado o professor, tornando-o inquieto e
disposto a não fossilizar-se”.
Para Castrucci, o Movimento foi responsável, no mínimo, por fazer nascer
nos professores a preocupação com a forma pela qual se transmitiria a
matemática, independentemente do apego aos conteúdos, de maneira a ser
constantemente repensada a metodologia e o programa relativos ao seu ensino,
ao mesmo tempo que tornaria o professor mais dinâmico.
Ou seja, o motivo maior para a renovação do ensino secundário na forma
proposta pelo MMM, na visão de Castrucci, era a possibilidade de uma maior
comunicação entre as disciplinas, proporcionando aos professores, ao contrário
do que se observava até então, um estímulo capaz de tirá-lo da estagnação,
tornando-o apto para um grau de ensino mais moderno, instigante, vibrante, cheio
de vida.
No ano de 1960, Castrucci, juntamente com outros professores do ensino
superior, também se organizavam para discutir a matemática do ensino
secundário. Portanto, mesmo antes da criação do GEEM, a Teoria dos Conjuntos,
conteúdo que ainda não participava do currículo da escola secundária, já se fazia
presente nas palestras proferidas por Castrucci.
Pelos dados constantes na cronologia apresentada em anexo, pode-se
observar que, a maior parte dos cursos ministrados por Castrucci no GEEM, dizia
269
respeito à Teoria dos Conjuntos. Na impossibilidade de realizar uma exata
verificação da quantidade de assuntos tratados, nos diversos cursos ministrados
por Castrucci junto ao GEEM, podemos inferir, porém, que o professor deu ênfase
ao tema Teoria dos Conjuntos, dedicando-lhe igual ou maior atenção do que
aquela destinada à Geometria, considerando sua condição de reconhecido
geômetra. Além disso, o GEEM publicou, em sua “Série Professor”, de número3,
a obra “Elementos de teoria dos conjuntos” em 1967 e na de número 4,
Introdução à lógica matemática” em 1973, ambas de autoria de Benedito
Castrucci.
8.9. Participando de Congresso: 1962
Castrucci participou do IV CBEM, realizado em Belém, Pará, entre 08 e 14
de julho de 1962, apresentando o artigo “Introdução do estudo algébrico de
sucessões através do espaço vetorial”. Os anais do Quarto Congresso Nacional
nunca foram publicados. Alguns de seus artigos foram incluídos na obra intitulada
Matemática moderna para o ensino secundário”, publicado pelo IBECC e Editora
Universitária da USP, em 1962.
Em seu trabalho, com a finalidade de apresentar um estudo de espaços
vetoriais, para ser trabalhado no curso Colegial, Castrucci toma como exemplo o
tratamento algébrico dado às sucessões (ou seqüências). Para tanto,
primeiramente Castrucci define Espaço Vetorial sobre um conjunto K, munido de
operação produto e operação adição. Em seguida, define sucessão de números
reais, a operação adição para duas sucessões, a sucessão nula e a sucessão
oposta. Define ainda o produto de um número real por uma sucessão. Prova que
a sucessão de números reais é um Espaço Vetorial. Ao finalizar, deixou indicado
que a progressão aritmética trata-se de um Espaço Vetorial sobre R, que é
precisamente um Subespaço do Espaço das sucessões.
Em relação ao aspecto didático, Castrucci fez a seguinte observação:
... achamos mais importante mostrar a estrutura, sem dar-lhe
nome, como, também, deve ser feito em outros casos como o de
grupo, corpo, etc... O nome deve aparecer depois de motivada a
270
estrutura com vários exemplos, como o que apresentamos, ao
qual se podem acrescentar:
a) sucessão de números racionais, que é uma aplicação de N em
Q (corpo dos racionais) e, então, é um espaço vetorial sobre Q,
subespaço do exemplo estudado.
b) sucessão dos números complexos, aplicação de N em C (corpo
dos complexos), que nos dá um espaço vetorial sobre R ou
sobre C (1962, p. 261).
O trabalho de Castrucci, portanto, teve como pretensão ressaltar as
estruturas, mostrando as propriedades comuns das seqüências e das
progressões aritméticas, não interessando dar-lhe um nome, ou seja, não
importando a natureza dos elementos dos conjuntos considerados, e sim, se os
conjuntos satisfaziam ao mesmo sistema de relações fundamentais. Assim, o
tratamento a partir dos Espaços Vetoriais também estava relacionado à
valorização do rigor, da linguagem dos conjuntos e das estruturas matemáticas
como base da unidade matemática.
8.10. Elementos de Teoria dos Conjuntos
Como terceira publicação do GEEM, “Elementos da teoria dos conjuntos
publicada a partir de 1967, teve como objetivo fornecer ao professor secundário
os principais assuntos tratados na Teoria dos Conjuntos, de modo a auxiliá-lo no
desempenho de suas atividades junto aos novos conteúdos e abordagem
presentes no ensino da matemática com o advento da MM.
O destaque especial dado à Teoria dos Conjuntos, justificando a
publicação exclusiva, deveu-se ao papel preponderante que o assunto assumiu
no Movimento, tornando-se base para todos os ramos da Matemática, devido à
sua característica unificadora tanto no que diz respeito à linguagem quanto na
própria teoria matemática.
Benedito Castrucci, autor da obra, apoiou-se especialmente em Bourbaki,
enfatizando, na introdução do livro, que a Teoria dos Conjuntos inaugurou essa
monumental obra francesa, justamente pelo seu atributo unificador, que, junto
com as estruturas, sustentavam a orientação moderna do ensino. Desse modo,
271
afirmou, essas noções básicas acrescidas de uma simbologia atualizada,
deveriam compor os currículos mais elementares de matemática, proporcionando
aos jovens, o mais cedo possível, a percepção da feição unificadora dessa
ciência.
Dentre os diversos livros utilizados para a composição do livro, citados por
Catrucci, encontram-se os de autoria de Lucienne Felix, “Mathématiques
elémentaires”, 1959; OECE, “Programme moderne des mathématiques”, 1962;
Nicholas Bourbaki, “Théorie des ensembles”, 1954 e “Algébre linéaires”, 1955;
Edson Farah, “Teoria dos conjuntos”, 1961; Birkhoff/MacLane, “Modern algebra”,
1944 e Jacy Monteiro, “Álgebra moderna”, 1964.
Em notas complementares, Castrucci empregou algumas noções de lógica,
porquanto considerasse que seus aspectos mais elementares deveriam ser
trazidos ao conhecimento dos alunos, o quanto antes. O capítulo composto pelas
noções de Lógica, juntamente com as notas complementares poderiam ser
deixadas de lado, sem prejuízo para o estudo da Teoria dos Conjuntos.
8.11. Participações em Congressos: 1966
Castrucci também participou do 5º CBEM, realizado na cidade de São José
dos Campos/SP, entre os dias 10 e 15 de janeiro de 1966. A organização desse
congresso ficou a cargo do GEEM, que instituiu a seguinte comissão
organizadora: Alfredo Pereira Gomes, Alcides Bóscolo, Alesio de Caroli, Benedito
Castrucci, Irineu Bicudo, Leônidas Hegenberg, Lucília Bechara, Luiz Henrique
Jacy Monteiro, Osvaldo Sangiorgi e Renate G. Watanabe.
Nesse congresso, o professor Castrucci coordenou a sessão de estudos
sobre Teoria dos Conjuntos. Durante a sessão solene de abertura, o professor
Castrucci fez parte da mesa diretora, sendo apresentado como Presidente do
Conselho Deliberativo do GEEM de São Paulo e representante do Instituto de
Pesquisas Matemáticas da USP (1966, p.20).
O resumo dos cursos apresentados no evento exibe os tópicos trabalhados
por Castrucci:
272
1. Conjuntos, conceito e notação. Subconjuntos. Conjunto das
partes. Conjuntos especiais.
2. Operações entre conjuntos: reunião, intersecção, diferença.
Complementação. Diagramas. Propriedades das operações.
3. Produto Cartesiano. Relações: conceitos, propriedades.
Composição.
4. Aplicações: conceito. Tipos de aplicações.
5. Operações: conceito, propriedades. Principais estruturas
(CBEM V, 1966, p. 31).
Comparando os tópicos apresentados no curso ministrado por Castrucci e
o Sumário da obra publicada “Elementos de teoria dos conjuntos” pelo GEEM,
também de sua autoria, verificamos que os assuntos tratados são os mesmos, na
mesma ordem.
Desse modo, fica sinalizada a preocupação de Castrucci com a
implementação do MMM, voltada de modo enfático para fomentar a introdução da
Teoria dos Conjuntos que, além do mais, ocupava lugar de destaque junto aos
reformadores da época quanto ao secundário. No entanto, seria de se supor que
daria destaque ao ensino da Geometria em conformidade com as prescrições
defendidas pelo MMM, uma vez que sua trajetória acadêmica revela uma
propensão para o estudo, pesquisa e ensino da Geometria.
8.12. Geometria: curso moderno
Em 1968, Benedito Castrucci também publicou,
pela editora Nobel, uma coleção denominada
Geometria: curso moderno”, composta por três
volumes, em substituição ao compêndio “Lições de
geometria elementar”, que, segundo o autor, “durante
muitos anos mereceram a preferência dos estudantes,
o que nos foi provado pelas sucessivas edições”. Não
obstante o sucesso da obra, Castrucci considerou a
necessidade de trazer ao público uma nova coleção,
de modo a acompanhar o movimento de renovação do
273
ensino, que naquela época se achava em pleno andamento no Brasil
(CASTRUCCI, 1969).
A coleção teve como público alvo alunos do Curso Colegial e candidatos
aos exames vestibulares, o que permitia ao autor o uso de uma linguagem mais
formal.
Esses esclarecimentos, que constam do prefácio do primeiro volume de
Geometria: curso moderno”, vêm acompanhados de outras informações, tanto no
que diz respeito ao tratamento destinado aos conteúdos ali contemplados, quanto
ao método empregado:
O nosso trabalho na chamada Matemática Moderna tem sido no
sentido de evolução e não de uma revolução, por isso, achamos
conveniente e útil não alterar a seqüência dos assuntos e
teoremas da Geometria, tratando-os apenas numa nova
linguagem, com base na Teoria dos Conjuntos, pondo em relevo
certos aspectos que constituem uma nova atitude e que nos livros
tradicionais não eram ressaltados [grifos nossos] (CASTRUCCI,
1969).
Ainda nesse prefácio, Castrucci opinou sobre a tentativa de algebrização
da geometria, defendida por renomados matemáticos reformadores:
Há um movimento para a substituição do conteúdo geométrico no
curso colegial e, talvez, no ginasial, por uma algebrização
da
Geometria, tratando-a como um capítulo da Álgebra Linear.
Acreditamos que esta inovação preconizada por grandes
matemáticos não possa ser feita imediatamente, pois a nosso ver
seria, no momento, um passo ousado [grifo do autor]
(CASTRUCCI, 1969).
Note-se que Castrucci referiu-se aos termos de evolução e revolução, o
que nos permite inferir que, ao se falar em evolução, não se prescinde
necessariamente daquilo que até então vigorava, não havendo, portanto, uma
ruptura brusca com os ensinamentos tradicionais, servindo estes até mesmo de
base justificadora do que se pretenderia implantar, ao contrário do se entende por
revolução, esta sim, verdadeiro meio, muitas vezes de se romper com uma dada
situação, impondo-se o novo pelo abandono de velhas práticas.
274
O que seria, então, na fala de Castrucci a evolução e a revolução? A
evolução, para ele, estaria na proposta de manter-se a seqüência dos assuntos e
teoremas da geometria, apresentando-os por meio da linguagem dos Conjuntos.
A introdução de conteúdos de Álgebra Linear no trato da Geometria representava,
todavia, uma ousadia, valendo dizer que tal posicionamento implicava em
verdadeira revolução, porém inoportuna, prematura para aquele momento.
Impunha-se, no seu entender, que se passasse por um processo gradual de
modificações, de modo a se concretizar a reformulação no ensino, como
preconizada por aqueles grandes matemáticos.
Confirmando esse posicionamento, a análise realizada por Leme da Silva e
Oliveira (2006), sobre a escolha de axiomas na construção da geometria,
utilizados por Castrucci nessa obra, vem confirmar esse posicionamento, uma vez
que as autoras constatam que a obra, preservou a Geometria Euclidiana com os
mesmos postulados e teoremas apresentados em seu livro anterior, “Lições de
geometria elementar”, de 1957. A diferença entre os dois livros ficou por conta da
colocação de uma nova linguagem, com base na teoria dos conjuntos, para o
Geometria: curso moderno”, utilizando a axiomática de Hilbert.
8.13. A abordagem da Geometria durante o MMM
O estudo da Geometria, via Transformações Geométricas, é uma
abordagem que possibilita o tratamento da Geometria pelas estruturas algébricas,
consideradas pelo MMM como elemento unificador da Matemática. Entretanto,
não obstante o esforço de renovação sugerido para esse ensino, a Geometria
escolar sofreu um gradual abandono no Brasil, sendo que uma das causas
apontadas para esse abandono diz respeito à proposta defendida durante o MMM
de ser realizado um trabalho com a Geometria sob o enfoque das transformações,
o que levou os professores, que já enfrentavam problemas em relação ao
conhecimento na abordagem tradicional, a encontrar dificuldades ainda maiores
com a proposição de programas nos quais a Geometria era desenvolvida sob o
enfoque das transformações.
275
Beatriz D’Ambrósio (1987), afirma que a Geometria, até a década de 1980,
era relegada para a última parte dos livros didáticos e os tópicos de Geometria
propostos na década de 60, como as Transformações Geométricas, nunca
integraram o currículo. Além disso, apresenta uma agenda de cursos oferecidos
pelo GEEM no período entre 1960 a 1970, na qual permite observar que a
geometria não foi uma área muito discutida, apresentando um número bastante
reduzido de cursos com enfoque na Geometria, se comparado aos demais.
Reduzido também foi o número de matemáticos ou educadores
matemáticos que se dedicaram à Geometria, destacando-se, entre eles, Benedito
Castrucci (DUARTE; SILVA, 2006).
Embora o ensino de Geometria não tenha sido efetivamente integrado ao
currículo, Elisabete Zardo Búrigo (1989), relata que a partir de 1969, vários cursos
organizados pelo GEEM incluíram a temática das Transformações Geométricas.
Comenta ainda, que, em 1965, já era desenvolvida no Ginásio do Brooklin uma
experiência para introduzir novos conceitos de Geometria, como os de
Transformação Geométrica, Isometria e Homotetia.
Uma outra via também defendida pelos reformadores seria dar à
Geometria um tratamento vetorial. Ao ser indagado sobre o que pensava sobre o
ensino da Geometria Euclidiana e Analítica através de vetores, Castrucci (1978)
relembrou que essa idéia surgiu com o advento do MMM, especialmente
preconizada por Dieudonné, para quem a Geometria se fazia de maneira mais
rigorosa por meio de Espaços Vetoriais e devendo ser introduzida já no primeiro
ensino de Geometria plana, no primeiro grau. Continuando, afirmou que Papy
escreveu uma obra sobre geometria plana por meio do estudo de vetores, voltada
para alunos de 13 anos, tendo como conseqüência, o surgimento do estudo da
Geometria Analítica também por meio de vetores, para essa fase de ensino.
O depoimento oral de Castrucci (1988) revela as preocupações dos
educadores com o modo pelo qual a Geometria poderia ser incorporada aos
princípios do MMM:
276
... se nós estávamos fazendo um movimento, em que tudo tinha
que nascer da teoria dos conjuntos e da idéia de estrutura, que
era o princípio geral, então, como a geometria axiomática não está
encaixada nisso, como é que eu vou dizer axiomas, teoremas e
tudo o mais? [...] não é uma estrutura algébrica, não é uma
estrutura topológica, não é uma estrutura de ordem, então, temos
que modificar isso aí. Então, para a geometria ficar coerentemente
dentro dessa linha, em todos os países, se faria a Matemática
Moderna, então estudaram uma maneira de sair disso. Então o
processo foi sair uma geometria também por meio da estrutura
algébrica. Daí fizeram o estudo da geometria, já no ginásio, por
meio de planos vetoriais que é uma estrutura algébrica, então a
geometria é dada, logo no início, vetorialmente, [...], e outro
caminho foi pelos grupos de transformação, também uma
estrutura algébrica, já uma idéia do Klein, mas agora passada a
limpo, não é, poderia funcionar (CASTRUCCI, 1988).
A fala de Castrucci especifica as possíveis aproximações do ensino de
Geometria com as idéias centrais defendidas pelo MMM. Em relação às
estruturas, o matemático constatava as dificuldades encontradas na elaboração
de um curso de Geometria para o ensino secundário apropriando-se dessas
idéias, mas apontou duas tendências pelas quais os reformadores procuraram
enveredar: Espaço Vetorial e Geometria das Transformações.
Ensinar Geometria, em conformidade com os preceitos do MMM revelou-se
frustrante para Castrucci. Segundo seu depoimento, teria encontrado dificuldade
em ministrar cursos de Geometria Vetorial e das Transformações para os
professores. Acostumado a trabalhar com a Geometria axiomática euclidiana, os
resultados insuficientes obtidos nos cursos de formação de professores com a
nova Geometria para o secundário pareceu-lhe responsável pela supressão da
Geometria no secundário. Seu entusiasmo com a Matemática Moderna arrefeceu,
pois não conseguiu fazer com que os professores aceitassem o novo conteúdo de
Geometria. Essa constatação levou Castrucci a considerar que a tentativa de
renovação da Geometria durante o Movimento provocou o desaparecimento do
ensino da Geometria nas escolas. Mais ainda, segundo Castrucci, a não
aceitação da Geometria das Transformações e da Vetorial foi responsável por
deflagrar o “fracasso” do Movimento:
277
E o fracasso para mim foi na Geometria. É aí que começou o
fracasso, porque a Geometria... [...] então resolvemos dar essa
reciclagem também e eu como sou mais da área de geometria,
fiquei encarregado de fazer isso. Então eu dei um curso de planos
vetoriais. E os meus cursos todos tinham muito êxito, muitos
alunos e professores e dessa vez eu fracassei. Quer dizer, os
alunos não reagiram bem, acabaram não fazendo boas provas,
porque nós tínhamos muita avaliação, não é, e eles não se saíram
bem. Então eu disse, será que eu estou ficando mau professor?
Eu não soube apanhar bem a coisa, mas daí tentei mais um outro
curso em um outro lugar, também não funcionou. E os professores
então, aí eles diziam o seguinte, não ensinamos mais geometria,
porque a geometria anterior está errada, eu dizia, não, não está
errada. “Está errada porque não é moderna”. Então ensinamos só
álgebra e conjuntos. E aí ficou aquele impasse, e nós tentamos aí
ensinar... eu também dei um curso de geometria das
transformações, por isometrias, [...], fracasso maior ainda
(CASTRUCCI, 1988).
Castrucci reafirmou o fracasso experimentado ao tentar ensinar vetores
para o ensino secundário, especialmente para o 1º Grau (correspondente à 5ª a
8ª série do Ensino Fundamental), mas para o 2º Grau (Ensino Médio) sua posição
foi mais condescendente. Acreditava, para esse nível de ensino não haver tanta
dificuldade em ensinar Geometria Espacial e a Analítica por vetores, mas antes,
tal prática carecia ser estudada e experimentada. Além disso, dependia ainda da
“destreza” dos professores em ensinar por esse caminho. Entretanto, mesmo
admitindo a possibilidade de êxito em experimentações dessa natureza,
acrescentou: “se bem que eu acho que sempre resta uma grande quantidade de
propriedades geométricas que é melhor se estudar diretamente através do
desenvolvimento clássico axiomático” (CASTRUCCI, 1978).
Ainda sobre esse assunto, Castrucci (1978) acrescentou que essas
tentativas fracassadas provocaram o banimento do ensino de Geometria no
secundário, que se prolongou de tal maneira que se formou toda uma geração
que não aprendeu Geometria. Esta geração, por sua vez, entrou para a
universidade e lá também o ensino da Geometria foi combatido, “a não ser a
Geometria Diferencial e a Geometria Analítica (que, no fundo, uma é Álgebra e a
outra é Cálculo)”. O estudante, já sem o devido preparo no secundário,
igualmente não o adquiriu na universidade. Em conseqüência, ao retornar como
professor no secundário, não tem condições de lecionar Geometria, pois para
278
Castrucci, o professor não se encontraria em condições de responder aos
questionamentos dos alunos.
E, ainda, constatou, essa situação é mundial. Contatos realizados com
colegas estrangeiros durante sua participação no Congresso Internacional de
Educação Matemática ocorrido em 1977 permitiu-lhe verificar que o “fracasso”
nesse tipo de curso foi generalizado. Segundo Castrucci, o ensino via Geometria
das Transformações e da Vetorial para o secundário foi abolida, voltando-se ao
ensino clássico, um pouco mais suave, ou seja com mais apelo à intuição e
menos demonstrações (CASTRUCCI, 1978).
Entretanto, provavelmente, o abandono da Geometria a partir do MMM,
observado por Castrucci, apenas veio intensificar uma prática de não aceitação
da Geometria que já vinha sendo exercida pelos professores anteriormente ao
Movimento. Vale lembrar que, já no 1º Congresso Nacional de Ensino de
Matemática, realizado na cidade de Salvador, Estado da Bahia, em 1955, os
professores congressistas Moura Bastos e Eleonora Ribeiro advertiam sobre a
forma como vinha sendo sacrificado o Curso de Geometria em benefício da
Álgebra em alguns ginásios, chegando mesmo, em alguns deles, os alunos não
verem Geometria durante todo o curso (ANAIS CBEM, 1957). Esta discussão
sobre o quase desaparecimento da Geometria no ensino, voltou a ser motivo de
preocupação, em 1964, para o matemático Omar Catunda, que, juntamente com
a professora Martha Dantas, ao elaborar textos para a atualização do ensino de
Matemática na Bahia de acordo com o MMM, deparou com o problema da
abordagem da Geometria. Assim Dantas se expressa:
Já na década de 50, quando comecei a ensinar no curso
secundário, o abandono da Geometria euclidiana era notório. A
causa maior era, sem dúvida, o despreparo dos professores.
Também a apresentação milenar da Geometria euclidiana não
motivava o seu ensino. Era preciso reapresentá-la com uma nova
roupagem e foi o que fizemos, em 1964 [...]. Das recomendações
de eminentes matemáticos, deduzimos que o estudo da
Geometria, através das transformações geométricas, permite
assentar noções abstratas sobre bases intuitivas mais simples e
mais sólidas, tornando-as compreendidas melhor e facilitando a
demonstração de propriedades que os envolvem (DANTAS, 2002,
p. 4-10).
279
Nesse sentido, o MMM no Brasil, em relação à Geometria, assumiu dois
motivos para efetuar alterações no currículo: uma preocupação com o abandono
da Geometria, realçado em meados da década de 50, e adequação dos
conteúdos matemáticos a um novo padrão de educação, considerado “moderno”
e, portanto, mais eficiente e adequado aos novos tempos.
Castrucci (1988), em sua entrevista à Búrigo, afirmou que o MMM teve seu
início graças à disposição resoluta de matemáticos como Dieudonné e, de igual
maneira, seu término deveu-se às críticas proferidas por matemáticos da
categoria de Hans Freudenthal, Morris Kline, René Thom. Sobre a apreciação de
Thom, observou tratar-se de uma “crítica de um grande matemático, prêmio da
medalha Fields, prêmio internacional”. Observou ainda que, no Brasil, “na
Universidade de São Paulo, no IMPA, no Rio, grandes matemáticos não
concordavam com a Matemática Moderna, em nenhum momento” (CASTRUCCI,
1988). Embora certificasse que o ponto nevrálgico da renovação do ensino era a
Geometria e afirmasse não saber ao certo as causas da propagação do
Movimento, suas alegações encontravam-se marcadas pela presença
dominadora das idéias propaladas por renomados matemáticos. Desse modo,
para Castrucci, a participação e anuência dos matemáticos para modificações no
currículo do ensino secundário foram fatores marcantes e decisivos, tanto no que
dizia respeito à implementação da nova proposta de ensino quanto na rejeição e
crítica às bases em que se assentava. Portanto, na visão de Castrucci, o MMM se
impôs pelos matemáticos e feneceu, também, por eles.
Quanto aos aspectos positivos do MMM, Castrucci considerou que o
Movimento foi muito importante, especialmente porque os professores daquela
época, segundo ele, não se aprimoravam nos estudos, limitando-se a pegar o
livro didático, e “dar mais ou menos o livro até onde sabiam” (CASTRUCCI, 1988).
Os cursos de atualização exerceram papel primordial, pois propiciaram a esses
professores o entusiasmo pela continuação de estudos de conteúdos
matemáticos próprios do Ensino Superior.
Então, com aqueles cursos, como nós cobrávamos nos cursos,
que tinham certificados e que valiam os certificados, inclusive a
Secretaria da Educação aceitava a promoção e esses cursos
eram examinados muito seriamente, com avaliações longas.
280
Avaliação séria e vários professores davam o curso, então eles
passaram a estudar, começaram a gostar. Alguns deles gostaram
tanto que acabaram indo para o curso superior, eles estavam com
a vocação meio escondida, relaxados, sem entusiasmo, se
entusiasmaram indo para o curso superior. Então eu acho que
isso foi um grande valor, quer dizer, um despertar do professor
(CASTRUCCI, 1988).
Entretanto, a preocupação manifestada por Castrucci dizia respeito,
sobretudo, ao entendimento que o professor deveria ter dos conteúdos
matemáticos, sem explorar aspectos didáticos inerentes à prática docente. Sua
preocupação ia até a formação do professor, cabendo a este último “mexer com
os alunos e fazê-los trabalhar”, sustentando a idéia de que naquela época tanto o
ensino público quanto o particular estavam bons. Dessa forma, deixa entrever que
não haveria necessidade de uma preocupação que fosse além da formação dos
professores secundários, confiando na didática que até então era praticada
(CASTRUCCI, 1988).
A memória, “é tocada pelas circunstâncias, como o piano que ‘produz’ sons
aos toques das mãos”, sublinha De Certeau [grifo do autor], (2002; p. 163). O
toque das mãos de Castrucci, em sua tentativa de ensinar Geometria das
Transformações, produziu uma tal sonoridade, que o levou a crer que o abandono
da Geometria foi instaurado a partir do MMM. Tanto assim, que Castrucci (1988)
mostrou-se admirado pela insistência e determinação de Martha Dantas em
continuar ensinando Geometria pelas Transformações Geométricas para o
secundário: “... existem remanescentes da Matemática Moderna na Bahia, existe
a Martha Souza Dantas que ainda acredita que a Matemática Moderna deve ser
ensinada, [...] apresentando resultados da geometria ensinada por
transformações. Só sei que o que ela apresenta lá eu ensino na pós-graduação.
Se os alunos dela de lá aprendem é muito interessante, é excepcional. Mas não
tem mais nada, ninguém mais está ensinando isso”.
8.14. “Matemáticos são contra Euclides”
Com esta manchete, ou com este título chamativo, o Jornal O Estado de
São Paulo de 17 de janeiro de 1967, procurou dar ênfase a uma posição
281
generalizada de questionamento sobre o ensino da Geometria Euclidiana, até
então ministrado nas escolas secundárias.
Conforme a matéria, um grupo de professores estava procurando um modo
de contar aos colegas professores do ciclo secundário, “sem causar escândalo”,
que a Geometria de Euclides “já estava superada”. Esta constatação vinha sendo
discutida e alardeada por matemáticos modernos em diversos congressos de
educação, afirmou o articulista. Justificou suas afirmativas baseando-se nas
palavras do matemático Howard Fehr, para quem “já encerraram, há muito tempo,
todos os tesouros euclidianos num museu, onde o pó da história apagou
imediatamente seu brilho”
97
e também naquelas proferidas por George Papy, que
afirmou, segundo a nota, “o ensino da geometria euclidiana intoxica os jovens e
lhes impossibilita a compreensão dos novos horizontes da matemática moderna”
(O ESTADO DE SÃO PAULO, 1967).
Ainda segundo a matéria jornalística, dentre os professores que aderiram à
renovação do ensino da Geometria, encontrava-se a professora Lucília Bechara,
sendo identificada como “a maior adversária de Euclides”. Em seu depoimento,
Bechara declarou que “o modelo da geometria em bases modernas para o ensino
secundário ainda é o euclidiano, mas a abordagem deve ser feita através de
espaços vetoriais”. Assim, o ensino da Geometria por meio dos Espaços Vetoriais
eliminaria os vícios da Geometria Euclidiana, “cujas estruturas muito rígidas não
abre perspectivas para os estudantes e os impede de maiores compreensões no
curso universitário” (O ESTADO DE SÃO PAULO, 1967).
Uma semana depois, com o título “Matemáticos e Euclides”, o assunto
volta à tona no mesmo jornal, sob a alegação de que a professora Lucília Bechara
“não havia sido muito feliz nas suas declarações, sobre a posição da Matemática
Moderna diante da Geometria Euclidiana”. Assim é que, diante de tantas dúvidas
suscitadas e interpretações errôneas a respeito daqueles comentários proferidos,
97
Essa frase foi proferida por Fehr durante sua conferência na I CIAEM, em Bogotá, Colômbia, 1961.
Entretanto, essa citação feita por Fehr dizia respeito ao ensino de Geometria do curso superior e não ao
ensino secundário, como se poderia pensar. Convém ressaltar, que nessa mesma conferência, Fehr sustenta
que, para o ensino secundário, “o tratamento atual da Geometria de Euclides deve desaparecer. Contribui
pouco para os estudos posteriores e se encontra fora das correntes principais da Matemática”, e ainda que,
“não deveremos permitir jamais que uma dada Geometria domine os programas de ensino e do pensamento
dos homens de forma tal que impeça qualquer mudança, que é exatamente o que a de Euclides tem feito
durante os últimos cem anos” (FEHR, 1961).
282
o que criou certo mal estar entre os estudiosos da matemática do Estado de São
Paulo, e de modo a atender a curiosidade de leitores que estranharam as
afirmações de Bechara, O Jornal O Estado de São Paulo procurou por Benedito
Castrucci, na ocasião Diretor do Departamento de Matemática da FFCLUSP, o
qual emitiu a seguinte opinião:
Como tem havido dúvidas do que consiste a nova formulação do
ensino de Geometria na escola secundária, julgando muitos que
se trata de eliminação da geometria euclidiana, substituídas então,
por outra, naturalmente não euclidiana, devemos esclarecer que
absolutamente não pretendem os reformadores a supressão da
Geometria Euclidiana, que é uma aproximação muito boa para o
mundo físico em que vivemos e satisfatórias para as aplicações
técnicas (CASTRUCCI, 1967).
No entendimento de Castrucci, o ensino da Geometria Euclidiana seria
modificado, introduzindo-se a Álgebra Linear. Mas seria fundamentalmente a
mesma teoria,
Trata-se simplesmente de mudar o método de abordagem,
substituindo-se o ensino da geometria de Euclides pelo processo
axiomático – preconizado por ele mesmo – cuja obra é ainda hoje
base da grande maioria dos livros didáticos, pelo caminho que
pode ser feito por meio da álgebra linear. O livro de G. Papy, que
procura introduzir esse método novo traz, logo no início, um
axioma equivalente ao de Euclides, o que mostra que a geometria
por ele construída é euclidiana (CASTRUCCI, 1967).
Com este novo caminho, ao mesmo tempo em que se obtém os
conhecimentos geométricos por processos algébricos, coloca-se à
disposição do aluno um novo instrumento de útil aplicação nos
estudos futuros da Matemática, que é álgebra linear. Os
matemáticos como Dieudonné que afirmaram “abaixo Euclides”
não se referiram à geometria euclidiana, mas à abolição do ensino
segundo o livro de Euclides (CASTRUCCI, 1967).
Reforça, também, que esse novo método de ensino ainda estava em fase
de experimentação:
No curso ginasial, o problema é didático e de assimilação do novo
processo e isto está em fase de experimentação. Este é o trabalho
que o GEEM, com as devidas precauções, vem realizando com
seus cursos e trabalhos experimentais (CASTRUCCI, 1967).
283
Assim, para Castrucci, deixar de ensinar a Geometria da forma tradicional
não implicava no abandono da Geometria Euclidiana, que permaneceria viva, mas
acrescida da Álgebra Linear, se assim os experimentos comprovassem sua
eficácia para o ensino, ou seja, essa alteração estava condicionada ao sucesso
dos trabalhos e cursos experimentais.
Osvaldo Sangiorgi (1967), na mesma matéria jornalística, também foi
convidado para opinar sobre o assunto. Do mesmo modo que Castrucci,
argumentou que “a glória de Euclides é imorredoura” e os estudiosos, ao
exprimirem-se com ênfase nas novas reconstruções da Geometria Euclidiana
acabam por ser mal interpretados.
Sangiorgi considerou que o tratamento moderno dado à Geometria valia-se
das estruturas que a matemática dispunha naquela época. A estrutura algébrica
de Espaço Vetorial invocada na moderna abordagem da geometria vinha
enriquecendo os trabalhos experimentais de grupos de estudos europeus e
americanos, fixando-se em processos algébricos que aprimoravam o modo de
apresentação dos assuntos pertinentes à Geometria: “uma nova reconstrução de
Geometria Euclidiana com novas ferramentas”. Em continuação, afirmou, no
seguinte tom: “de qualquer maneira não parece haver justificativa que os
conhecimentos geométricos por intermédio de processos algébricos suprima a
geometria euclidiana” (SANGIORGI, 1967).
O pronunciamento de Sangiorgi não deixava de convergir para aquele
manifestado por Castrucci, ao comentar a repercussão da fala de Bechara sobre
o assunto.
Das alegações de Bechara, Castrucci, Sangiorgi e Fehr, podemos perceber
que as discussões giravam em torno da conceituação dessa nova Geometria,
aquela que procurava mesclar a Geometria Euclidiana clássica com a Álgebra
Linear, e conseqüentemente, sobre qual a metodologia mais adequada para
implementá-la nas escolas.
Cumpre, então, verificar qual era a Geometria que Castrucci defendia para
a escola secundária e como era apresentada e trabalhada em suas obras
didáticas, ao tempo da MM. Nesse período, mais precisamente no ano de 1967 e
284
juntamente com o professor Alcides Bóscolo, Castrucci publicou um manual
didático intitulado “Matemática: curso moderno”, para o curso ginasial. Nele,
intentamos verificar como Castrucci se apropriou das recomendações do MMM,
em especial, no que tange à adoção de novos métodos e conteúdos para a
Geometria.
8.15. Produzindo manual inovador para o ensino da matemática
Antes mesmo do advento do MMM, Castrucci já era autor de livros
didáticos do secundário
98
. Suas obras não traziam, ainda, as “vestes modernas”,
abalizadas pelo Movimento.
Em depoimento, contou que, solicitado pelos colegas a escrever livros de
Matemática Moderna, a princípio não se mostrou interessado. Instado a colaborar
com um colega, preocupado com o rigor necessário à elaboração do livro,
Castrucci consentiu em colaborar, escrevendo uma coleção publicada pela FTD
99
,
que, segundo ele, obteve relativo sucesso de vendas:
Depois do GEEM, aí alguns colegas começaram a escrever livros
de Matemática Moderna para o secundário, e eu não estava muito
interessado. Mas aí um colega meu disse, não, ajude a escrever
comigo, porque eu tenho medo na parte rigorosa escapar erro,
então escrevi uma coleção do FDT, mas essa coleção teve êxito,
era um livrinho até muito moderno, tinha muito coisa, e a gente
examinava inclusive estruturas, possíveis estruturas de operação
[...], então era um livro cheio de coisas assim (CASTRUCCI,
1988).
Com o falecimento desse professor, a editora indicou um outro, cujo nome
não foi mencionado e que “nunca esteve no movimento moderno, mas era moço e
ele lecionava com muita tarimba, muito bom professor de matemática”, para
auxiliá-lo na escrita do livro. Segundo Castrucci, o professor cortou quase tudo o
que fora escrito anteriormente, ditado pela sua experiência pedagógica, dentro de
98
Publicou, de 1944 a 1950, pela Editora Brasil, a coleção “Matemática para o curso colegial” juntamente
com João Batista Castanho, Edson Farah e Fernando Furquim de Almeida, (ANUÁRIO da FFCLUSP, 1951,
p. 177).
99
Pelas características descritas, infere-se que Castrucci referia-se à obra “Matemática: curso moderno”,
ciclo ginasial, ao que tudo indica, pelas informações extraídas de seu currículo entre 1967 a 1969, em autoria
com Alcides Bóscolo, que na época da elaboração da coleção era licenciado em Matemática, professor
efetivo por concurso do Magistério Secundário e Normal Oficial do Estado de São Paulo.
285
sua “linha didática”. Quanto mais subtraía os aspectos modernos introduzidos na
primeira coleção, “mais o livro vendia e eu cheguei a ganhar dinheiro com o livro e
o livro está sendo vendido até hoje”
100
(CASTRUCCI, 1988).
Ao mesmo tempo em que deixava aflorar uma certa frustração, exibia um
rasgo de ironia ao procurar evidenciar o enfoque que fora dado à didática em
detrimento da exposição dos conteúdos de Matemática Moderna, Castrucci
compensa esse sentimento, logo a seguir, com a revelação de que, de qualquer
modo, obteve lucro com a venda do livro didático.
8.16. As coleções “Matemática: curso moderno”, para o ciclo ginasial
Como o próprio título deste tópico indica, o termo “as coleções” fazem
referência ao surgimento de duas coleções homônimas para o ensino da
matemática moderna, intituladas “Matemática: curso moderno”. A antecedente, de
autoria de Osvaldo Sangiorgi, cujo primeiro volume foi publicado a partir de 1963
era destinada ao ginásio para uso no ano letivo de 1964, e uma posterior, de
autoria de Benedito Castrucci e Alcides Bóscolo
101
, cuja publicação teve início em
1967, destinava-se, igualmente aos cursos ginasiais.
Antes mesmo de passarmos a analisar como era constituída a nova
coleção didática para o curso ginasial de Castrucci e Bóscolo, consideramos
importante tecer alguns comentários sobre o livro didático de autoria de Sangiorgi,
intitulado “Matemática: curso moderno”, uma vez que essa obra, a partir do MMM,
constituiu-se em referência para outros manuais, os quais passaram a realizar
uma apropriação de suas propostas inovadoras (VALENTE, 2007). Uma de
nossas intenções é verificar em que medida Castrucci e Bóscolo apropriaram-se
dos assuntos presentes na coleção de Sangiorgi. O item a seguir busca
esclarecer os motivos pelos quais tomamos como fonte de análise a coleção
inovadora de Sangiorgi e não outro didático.
100
Tudo leva a crer que o parceiro de Castrucci tenha sido José Ruy Giovanni e a obra “A conquista da
matemática”, que foi reeditada pelo menos três vezes: 1971, 1982 e 1986.
101
Antes do MMM, Castrucci já havia editado, pela Editora Francisco Alves do RJ, uma coleção para o
ginásio, em parceria com Geraldo dos Santos Lima Filho, Doutor em Ciências Matemáticas pela FFCLUSP,
seu assistente na cadeira de Geometria Analítica, Projetiva e Descritiva e colega no Colégio Paulistano.
286
8.16.1. O nascimento de uma nova vulgata para o ensino da matemática
moderna
Com amplo apoio da imprensa, em meados de 1963, para uso no ano
letivo de 1964, a Cia. Editora Nacional lançou para os ginásios, o livro
Matemática: curso moderno”, de autoria de Osvaldo Sangiorgi, com tiragem
inicial, para o volume 1, de 240 mil exemplares. Em seu prefácio, o autor explicou
que o programa desenvolvido na coleção fazia parte dos “Assuntos mínimos para
um moderno programa de matemática para os ginásios” elaborados pelo GEEM e
apresentado no IV CBEM, em 1962, e readaptados no “Curso de treinamento
básico para professores secundários” realizado em Brasília, 1963 (VALENTE,
2007).
A coleção atingiu extraordinário sucesso de vendagem, difundindo-se pelo
Brasil, de modo que, em 1965, “mais de 250 mil novos livros foram editados e
assim, anualmente, o livro com tiragens na casa dos 250 mil exemplares, até
1967, alcançando a sua 10ª edição, como atesta o “Mapa de Edições” da Editora”
[grifos do autor] (VALENTE, 2007).
Um dos fatores que pode justificar tal aceitação e penetração de sua obra,
deriva da constatação de que Sangiorgi já contava com grande prestígio, desde a
década de 1950, como conceituado autor de livros didáticos (VALENTE, 2007).
A partir de 1963, Sangiorgi lançou, então, como se disse, uma nova
coleção, intitulada “Matemática: curso moderno”, que foi pioneira na introdução de
conteúdos da Matemática Moderna e obteve um sucesso editorial maior ainda.
Sangiorgi era renomado professor em escolas de referência, reconhecido
pela sua eficiência como professor particular na preparação de alunos às provas e
exames, ativo participante em congressos nacionais para discussão dos
programas de ensino de matemática e em cursos para professores, com amplo
acesso à imprensa e de reconhecida autoridade matemática devido à sua
formação acadêmica na FFCLUSP.
Dotado dessas qualidades, gozava junto à Cia. Editora Nacional, à classe
professoral e perante as autoridades educacionais responsáveis pela elaboração
287
oficial dos programas, de tal posição de destaque, que lhe possibilitou, inclusive, a
elaboração de um livro didático contendo novas diretrizes para o ensino de
matemática, as quais ainda não dispunham de legislação oficial que lhe dessem
respaldo:
A nova coleção de matemática moderna alterou por completo a
organização do ensino de matemática para o ginásio. Sangiorgi,
ao que tudo indica, traçou uma estratégia para não depender de
portarias ou qualquer outro tipo legislação educacional, de modo a
referenciar o novo programa nacionalmente. Elas, por certo, iriam
se arrastar a um tempo imprevisível (VALENTE, 2007).
Desse modo, os livros didáticos dessa coleção, apresentaram-se como
produtores de significados e posições, que foram posteriormente apropriados não
apenas para a produção de outros livros didáticos como também de programas
curriculares.
Assim, uma nova vulgata (Chervel, 1990) surgiu com a publicação, em
1963, da coleção "Matemática – curso moderno” de autoria de Osvaldo Sangiorgi,
posto que esta se constituiu em fonte de referência para a elaboração de obras
didáticas posteriores.
Contrariamente à constatação de Chervel (1990), no sentido de que há
uma tendência para rejeição de obras inovadoras, pelo fato trazerem, como o
próprio nome diz, inovações, significando estas um rompimento com práticas
didático-pedagogicas já consolidadas, a obra de Sangiorgi, entretanto, como bem
observou Valente (2007), apesar de inovadora, tornou-se um best-seller.
Assim, a coleção elaborada por Sangiorgi traz a marca da modernidade, e
na condição de obra precursora, passou a ser apropriada por outros autores que
procuraram fazer uma releitura da mesma, embora sem alterações significativas,
de tal modo que, a partir da publicação da coleção “Matemática: curso moderno”,
inicia-se uma nova vulgata, quando começaram a ser elaborados novos livros
didáticos tomando como referência a obra inovadora de Sangiorgi.
Passemos, então, a examinar a coleção “Matemática: curso moderno”,
aquela de autoria de Castrucci e Bóscolo, procurando identificar como esses
288
autores se apropriaram das idéias e métodos inovadores presentes no livro
didático de Sangiorgi.
8.16.2. “Matemática: curso moderno” de Benedito Castrucci e Alcides
Bóscolo: considerações gerais
Com o título de “Matemática: curso moderno” Benedito Castrucci e Alcides
Bóscolo deram início, em 1967, à publicação de uma série de livros didáticos pela
Editora FTD e destinados ao ciclo ginasial, em atendimento aos reclames da
reforma do ensino, de acordo com o MMM. Os autores justificaram a posição
assumida alegando que
A modernização do ensino da Matemática que no Brasil, como em
quase todas as partes do mundo, está empolgando todos quantos
possuem uma parcela de responsabilidade na educação dos
jovens é sem dúvida um movimento irreversível que não pode
prescindir da preciosa colaboração dos professores em exercício
(CASTRUCCI, BOSCOLO, 1967).
A primeira edição, do primeiro volume da série, datado de 1967, trazia
como ilustração em sua capa, para todos os volumes da coleção, a representação
de uma correspondência biunívoca entre dois conjuntos por meio de diagramas,
em que os elementos de cada conjunto encontram-se representados por letras
maiúsculas. Somente as cores de fundo das capas foram alteradas, para cada
uma das séries da coleção.
Posteriormente, essa capa foi substituída por outra que trazia a parte
superior ilustrada em fundo branco
102
, com cinco desenhos iguais, de copos
contendo uma flor vermelha dentro de cada um deles. A parte inferior, em fundo
amarelo, trazia o título “Matemática” em caracteres pretos e subtítulo “curso
moderno” em verde, bem como os nomes dos autores e da editora.
102
Somente no primeiro volume (1ª série), da primeira edição, encontramos essa capa ilustrada com copos e
flores. Os outros volumes os quais tivemos acesso já apresentavam capa com a representação de uma
correspondência biunívoca entre elementos de dois conjuntos por meio do Diagrama de Venn.
289
Ilustração idêntica a que aparece na capa dessa edição é encontrada no
capítulo relativo à “Correspondência Biunívoca” do mesmo manual e foi utilizada
para explicar o que vem a ser esse conceito:
“a cada flor corresponde um e um só copo e cada copo é
correspondente de uma e uma só flor”. Diz-se por isso que “o
conjunto de flores e o conjunto de copos d’água foram colocados
em correspondência biunívoca ou correspondência um a um”
[grifos dos autores](CASTRUCCI; BÓSCOLO, p. 16, 1967).
Pode-se concluir, então, que a ilustração com copos e flores que emoldura
a capa do primeiro volume, fazia menção à noção de conjuntos eqüipotentes, ou
seja, em que se verifica a correspondência biunívoca entre os conjuntos.
Inferimos, dessa forma, que as ilustrações contidas em todas as capas,
procuravam evidenciar o destaque que os autores tributaram à modernização por
meio da linguagem da Teoria dos Conjuntos na coleção.
Conforme se encontra mencionado no prefácio, o primeiro volume tinha
como pretensão expor, de modo rigoroso, o programa de matemática vigente, por
intermédio da introdução de recursos modernos, com o intuito de facilitar o ensino
e aprendizagem de matemática. Assim, os autores propuseram-se a apresentar
de modo intuitivo as primeiras noções de conjunto, como também, fazer
sobressair as propriedades estruturais das operações fundamentais no conjunto
dos números naturais e no conjunto dos números racionais. Buscaram,
igualmente, fazer uso de símbolos lógicos utilizados na Teoria dos Conjuntos,
exemplificando, no próprio sumário, os símbolos concernentes à “implicação”
”, e ao da “equivalência”, “ ”. Alertavam ainda aos leitores que, apesar de
conservar, no desenvolvimento do conteúdo, um caráter prático intuitivo,
procuraram substituir, sempre que fosse possível, a simples verificação
experimental das propriedades por um procedimento dedutivo, considerado como
“mais fecundo, iniciando os jovens alunos no estudo lógico que os aguarda nas
series seguintes (CASTRUCCI; BÓSCOLO, 1967)”.
Os títulos dos capítulos, tópicos, algumas ilustrações, assim como algumas
frases ganharam destaque, sendo representadas em caracteres vermelhos. Além
disso, encontram-se centralizados e emoldurados por uma figura retangular,
290
enquanto que alguns subtítulos foram colocados à direita da página, de modo
que, como assuntos basilares, sobressaíssem em relação aos demais conteúdos.
Na contracapa do prefácio, foram acrescentados esclarecimentos a
respeito dos exercícios que compõem a obra, os quais foram apresentados em
duas séries. Assim, de acordo com os autores da obra, a primeira das séries de
exercícios, mais simples, encontra-se exibida imediatamente após a exposição de
cada tópico, de modo que pudesse ser resolvida na própria classe, a critério do
professor. A segunda série de exercícios é apresentada após cada capítulo, e diz
respeito aos diversos assuntos tratados no capítulo, sendo destinada à fixação do
que foi ensinado, sendo acompanhada das respostas dos exercícios. O último
capítulo é composto por problemas com números naturais e decimais, todos com
resposta e, os mais difíceis, também com sugestões para sua resolução.
Em alguns exercícios, aqueles considerados pelos autores como “simples”
e propostos logo após a explanação de determinado conteúdo, encontram-se
delimitados espaços para que os alunos pudessem responder as questões no
próprio manual, desenhando ou preenchendo as lacunas tracejadas para essa
finalidade.
(CASTRUCCI; BÓSCOLO, p 11, 1967).
Como desfecho de alguns capítulos, os autores acrescentaram um tópico
intitulado “Leitura”, quando recorreram à trechos da História da Matemática como
recurso didático para motivar e esclarecer algumas idéias matemáticas
291
exploradas no assunto. Desse modo, a primeira “Leitura” é dedicada a
comentários sobre a vida de Cantor e sua contribuição para a Teoria dos
Conjuntos, abordando especificamente a idéia da correspondência biunívoca.
A modernidade também impunha novas técnicas de comunicação com o
leitor. Novos métodos, novos procedimentos são experimentados, levando em
conta o desenvolvimento cognitivo do aluno. Tais inovações também eram
sentidas no manual didático, o qual trazia uma comunicação inspirada num
diálogo diretamente travado com o aluno. Assim sendo, ao esclarecer sobre as
respostas dos exercícios, os autores advertem:
Daremos a resposta somente daqueles mais difíceis, ou melhor,
daqueles menos fáceis. O mesmo critério será usado nos
capítulos seguintes.
Mas, seja esperto! Não comece a resolução, olhando a resposta
[grifos dos autores] (CASTRUCCI; BÓSCOLO, p. 17, 1967).
O índice foi anexado no final do volume. A tabela I (Anexo II) mostra, à
esquerda, os tópicos constantes no índice para a 1ª série do manual de Castrucci
e Bóscolo, e, à direita, os de Sangiorgi
Procedendo comparação entre os índices da primeira série do livro didático
de Castrucci e Bóscolo e do livro de Sangiorgi, pode-se notar a ocorrência de
supressão de alguns tópicos no livro de Castrucci e Bóscolo, mas pela verificação
dos assuntos e da forma como foram trabalhados dentro dos manuais, pudemos
observar que, a maioria dos tópicos encontrados na obra de Sangiorgi foi
igualmente abordado, utilizando método semelhante, a deste último. Assim, por
exemplo, apesar de não citarem contagem em outras bases (item 1 do primeiro
volume), Castrucci e Bóscolo dedicaram algumas linhas para esse assunto. Não
fizeram, igualmente, uso da expressão “operações inversas”, mas expuseram as
relações equivalentes no interior do livro didático (Ver Anexo II, Tabela I).
Uma das sugestões constantes nos assuntos mínimos propostos pelo
GEEM (1962) recomendava enfatizar a idéia de conjuntos no tratamento dos
números naturais, além de destacar as propriedades estruturais das operações.
No livro didático de Castrucci e Bóscolo, as operações adição e subtração de
292
números naturais foram iniciadas a partir das noções de reunião e intersecção,
utilizando-se a noção de função:
A operação adição encontra-se assim definida:
A operação que a cada par ordenado de números inteiros faz
corresponder a soma do primeiro com o segundo, chama-se
adição
Assim:
(3, 5) 8
o
parcelas adição soma
[grifo dos autores] (CASTRUCCI, BÓSCOLO, 1967, p. 61).
A idéia de função e par ordenado faz-se presente, desse modo, nesse
primeiro volume, embora sem que os autores definissem explicitamente essas
noções.
As propriedades das operações também foram abordadas no manual de
Castrucci e Bóscolo, utilizando-se a notação algébrica, após a verificação de cada
propriedade com a ajuda de números pequenos, com o intuito de esclarecê-las.
Para a propriedade associativa da multiplicação, por exemplo, têm-se:
Numa multiplicação de três fatores, pode-se associar os dois
primeiros ou os dois últimos fatores, indiferentemente.
Assim,
(3x 5) x 10 = 3 x (5 x 10); (8 x 1 ) x 3 = 8 x (1 x 3); ...
De um modo geral:
(a x b) x c = a x (b x c)
quaisquer que sejam os números inteiros a, b e c [grifos dos
autores] (CASTRUCCI, BÓSCOLO, 1967, p. 89).
O segundo volume do “Matemática: curso moderno”, dos autores Castrucci
e Bóscolo também empregaram recursos para acompanhar as inovações
lançadas no primeiro volume, tanto no que dizia respeito à materialidade da obra,
quanto nos recursos metodológicos e inserção de conteúdos, utilizando uma
linguagem fortemente baseada na Teoria dos Conjuntos:
Seguimos a mesma orientação utilizada no 1º volume,
desenvolvendo com simplicidade e clareza os diversos assuntos
constantes de um moderno programa de Matemática para as
escolas de grau médio (CASTRUCCI; BÓSCOLO, 1967).
293
Os assuntos tratados procuravam seguir o programa e as sugestões
expostas pelo GEEM nos “Assuntos mínimos para um moderno programa de
matemática para o ginásio” de 1962.
O que se observa é que Castrucci e Bóscolo promoveram uma alteração
na seqüência de apresentação dos assuntos em relação ao índice apresentado
por Sangiorgi. Assuntos referentes a números proporcionais, regra de três e
porcentagem aparecem em Castrucci e Bóscolo depois de ser estudado o
conjunto dos inteiros relativos. Além disso, no primeiro capítulo, os autores deram
continuidade à apresentação do conjunto dos números racionais, já iniciada na
primeira série. Embora não destacados, conteúdos relativos à Álgebra encontram-
se presentes na coleção: expressões, sentenças abertas, variáveis, conjunto-
universo, conjunto-verdade, importância da linguagem simbólica na resolução de
problemas, fases para a resolução de problemas são alguns tópicos trabalhados
por Castrucci e Bóscolo no interior do livro (Ver Anexo II, Tabela II)
Castrucci e Bóscolo dedicaram à Geometria os volumes 3 e 4, quando
procuraram salientar a dedução a partir de um desenvolvimento de caráter prático
e intuitivo, diferentemente da metodologia utilizada em obras anteriores ao MMM.
O terceiro volume do “Matemática: curso moderno” foi publicado em 1969.
Embora apresentasse os dois primeiros capítulos dedicados à Aritmética, a
ênfase do livro foi dividida em dois temas: a Álgebra (distribuída em nove
capítulos) e a Geometria (distribuída em oito capítulos e um apêndice), sendo que
a Geometria aparece a partir da metade do manual.
Os assuntos do volume 3 das coleções Castrucci/Bóscolo e Sangiorgi
encontram-se discriminados na Tabela III do Anexo II.
Desde o primeiro capítulo do livro de Sangiorgi e a partir do capítulo 3, do
livro de Castrucci e Bóscolo, nota-se que a Álgebra ganhou proeminência, em
conformidade com os preceitos do MMM, já que, o programa de matemática
oficial, anterior ao Movimento (Portaria 966 e 3045 de 1953) não contemplava a
parte algébrica para esta série. Além disso, a Álgebra, nos novos cursos, deveria
ser ensinada de modo que sua estrutura – o seu caráter dedutivo – se tornasse
aparente (GEEM, 1962) (Ver Anexo II, Tabela III).
294
Castrucci e Bóscolo optaram por trabalhar a parte algébrica enfatizando
formas de representação literal, expressões literais; expressões equivalentes, uso
do quantificador universal
, técnicas de fatoração, expressões monômias e
polinômias, operações, produtos notáveis, sistemas de equações, cálculo e
reduções. Deixaram como último capítulo da parte algébrica, um tópico destinado
ao conjunto dos números reais.
Enquanto Sangiorgi iniciou a abordagem do conjunto dos números reais já
no primeiro capítulo, Castrucci e Bóscolo reservaram para esse assunto o capítulo
XI, volume 3, ou seja, o último capítulo. Os autores versaram sobre a ampliação
dos conjuntos numéricos até a obtenção do conjunto dos números reais. Citaram
as relações de igualdade, de ordem e as definições das operações. Quanto às
propriedades relativas a estas definições, apresentaram uma recapitulação
concisa do assunto, em que essas propriedades não são demonstradas e
tampouco são exemplificadas:
Deveríamos agora dar as definições das relações de igualdade,
maior e menor, bem como as definições de soma, produto,
quociente, ..., no conjunto dos números reais.
Entretanto, deixaremos para outra oportunidade, pois entendemos
que tais conceitos fogem à compreensão dos alunos do ciclo
ginasial (CASTRUCCI; BÓSCOLO, 1969, p. 140).
Em seguida, Castrucci e Bóscolo explanaram sobre a correspondência
biunívoca entre o conjunto dos números reais e a reta, fornecendo a
representação geométrica dos números reais. Destacavam a também o fato do
conjunto dos números reais ser denso.
Em relação à Geometria, iniciada no capítulo XII, os autores anunciaram
que tomaram como base a Geometria Euclidiana.
Para desenvolver seu estudo, procuraram fazer uso freqüente da intuição,
mas apresentando os temas numa seqüência lógica. Além disso,
Como entendemos que a parte de Geometria não deve ser
sacrificada, como felizmente sói acontecer, tentamos desenvolvê-
la dentro de um esquema mínimo que pensamos deva ser
integralmente lecionado (CASTRUCCI; BÓSCOLO, 1969).
295
No capítulo XIII, dedicado ao estudo dos ângulos, os autores deram início
ao tratamento dedutivo. Até aquele momento, haviam introduzido vários conceitos
geométricos, ora apresentados intuitivamente, ora por meio de uma definição.
Algumas propriedades geométricas anunciadas foram verificadas intuitivamente,
pela observação e experimentação em figuras:
Também foram enunciadas diversas propriedades geométricas.
Muitas foram verificadas intuitivamente, pela observação e pela
experimentação em figuras; foi o que ocorreu quando concluímos,
por exemplo, que “por dois pontos distintos passa uma e uma só
reta” [grifos dos autores] (CASTRUCCI; BÓSCOLO, 1969, p. 175).
Enquanto algumas outras propriedades
... foram demonstradas, isto é, através de uma seqüência de
afirmações verdadeiras, que exprimem conceitos já conhecidos e
propriedades já verificadas, chegamos à propriedade desejada, ou
seja à conclusão; foi o que ocorreu quando concluímos, por
exemplo, que “dois ângulos opostos pelo vértice são
congruentes”. [grifos dos autores] (CASTRUCCI; BÓSCOLO,
1969, p. 140).
Assim sendo, consideraram os autores que, era chegada a hora de
esclarecer ao leitor sobre a importância e a necessidade das demonstrações em
matemática. Comentários sobre esse assunto foram realizados ao final do
capítulo XIII, com o subtítulo “Postulados e teoremas”, composto dos seguintes
itens: Conceitos geométricos, postulados e teoremas, por que necessitamos de
demonstração em Matemática? Hipótese e tese de um teorema.
A participação do aluno antes da formalização de conceitos, de modo a
torná-lo mais apto à compreensão do desenvolvimento dedutivo, não era
metodologia adotada pelos livros didáticos tradicionais, anteriores ao MMM. A
constatação experimental por meio de exercícios exploratórios, com o uso de
instrumentos tais como compasso, esquadro e transferidor, de modo a levar o
aluno a tirar as conclusões possíveis e justificá-las foi recurso largamente utilizado
na parte dedicada à Geometria. Por exemplo, comparações entre segmentos,
para verificar se são congruentes ou se um deles é maior que outro, são
justificadas por meio do uso do compasso.
296
Exemplificando, vejamos como os autores abordam o caso de congruência
L.A.L. (lado-ângulo-lado). Primeiramente, esse caso de congruência foi expresso
por meio de postulado: “Se dois triângulos têm dois lados e o ângulo em que
estão compreendidos respectivamente congruentes, então, os triângulos são
congruentes”. Em seguida, solicita ao leitor que realize a construção de dois
triângulos ABC e MNO, nas condições do enunciado. E, dando continuidade,
esclarecem:
Por meio de uma régua ou de um compasso, é fácil verificar que,
nessas condições, AC Ł NO.
Portanto, os dois triângulos têm os lados respectivamente
congruentes e, então, são congruentes.
Este caso é indicado pela sigla LAL (lado – ângulo – lado) [grifos
dos autores] (CASTRUCCI; BÓSCOLO, 1969, p. 187-188).
Sobre a definição de ângulo, os autores adotaram a seguinte
apresentação: “Sejam duas semi-retas
OA e OB de mesma origem O não
colineares, isto é, com retas suportes distintas. A figura constituída por duas semi-
retas, de mesma origem e não colineares, chama-se ângulo” [grifos dos autores]
(CASTRUCCI; BÓSCOLO, 1969, p. 140). Trata-se de definição semelhante
aquela adotada por Hilbert:
“Let Į be any arbitrary plane and h, k any two distinct half-rays
lying in Į and emanating from the point O so as to form a part of
two different straight lines. We call the system formed by these two
half-rays h, k an angle and represent it by the symbol <(h,k) or
<(k,h) [grifos do autor] (HILBERT, 1938, p. 13).
Uma das características da geometria axiomática proposta por Hilbert parte
de conceitos não definidos, como ponto, reta e plano, sendo escolhidos
postulados que, a partir deles, são deduzidos os teoremas, sem tomar por base a
noção de medida. Apesar de observarmos em obras de Castrucci uma tendência
a apresentação da geometria pela teoria axiomática de Hilbert
103
, tanto naquelas
dedicadas ao ensino superior como também em “Geometria: curso moderno”,
esta última destinadas aos alunos dos últimos anos do secundário e interessados
103
Fundamentos da geometria: estudo axiomático do plano euclidiano” (1978), “Lições de geometria plana
(1960), “Fundamentos da Geometria” (1972), “Geometria: curso moderno” (1969) são algumas obras de
autoria de Benedito Castrucci que seguem as formulações axiomáticas de Hilbert.
297
em aprovação no vestibular, verifica-se que a teoria axiomática de Hilbert
continua presente na coleção destinada ao ginásio, porém, os autores
acrescentaram outra formulação baseada no tratamento métrico da teoria da
medida.
Os autores recorreram a vários questionamentos como forma de justificar o
primeiro postulado contido em um sistema dedutivo de formulação métrica tipo
régua-transferidor elaborado e recomendado pelo SMSG (1960). que afirma:
“dados dois pontos distintos, existe uma e uma só reta que os contém”
104
. Este
postulado aparece no livro didático da seguinte forma:
Nesse livro didático, após a definição do termo segmento, os autores
introduzem o conceito de medida, da seguinte forma:
104
O postulado acima mencionado refere-se à unicidade da reta por dois pontos distintos, mas não
propriamente da medida, de associar a reta a uma régua, a um sistema de medida. A régua foi usada como
instrumento de verificação experimental, mas poderia ser uma régua sem medida como a de Euclides.
298
Se medirmos um seg AB com uma régua ou com um metro, ou
ainda com outro instrumento próprio, e encontrarmos 6 cm, isto
significa, como sabemos, que a medida do seg AB com a unidade
cm é 6. Fixada uma unidade de medida, fica associado a cada
segmento um e um só numero real positivo, que é a sua medida.
[...] Medida é um número e comprimento não é um número, mas
sim um atributo comum a segmentos congruentes entre si.
Distância: Dados dois pontos M e N, distintos, chama-se
distância geométrica de M a N, o comprimento do segmento MN.
A medida do segmento MN, chama-se distância métrica [grifos
dos autores] (CASTRUCCI; BÓSCOLO, 1969).
Destacam-se dois aspectos em relação à essa explicação. A primeira,
relativa ao instrumento de medição, utilizando régua ou metro, e a outra, o realce
dado ao valor da medida como um número real positivo e a definição de distância.
A forma como foram abordados os conceitos de distância e comprimento
sugere semelhança com as recomendações o SMSG (1960). O “postulado da
distância”, conforme elaborado pelo SMSG, é enunciado da seguinte forma: “a
todo par de pontos distintos corresponde um único número positivo”, o que
permite definir: “A distância entre dois pontos é o número positivo dado pelo
postulado da distância. Se os pontos são P e Q, então a distância é indicada por
PQ” e “a distância AB é chamada comprimento
de AB [grifo do autor] (COSTA,
1985, p. 53).
O modo como outros conceitos geométricos foram abordados também
parecem seguir as explicações gerais explicitadas por Birkhoff e apropriadas pelo
SMSG. Como por exemplo, a utilização do transferidor para medir ângulos, com
acompanhamento da figura do transferidor para maior esclarecimento do leitor.
Entretanto, não há, na coleção elaborada por Castrucci e Bóscolo, qualquer
menção sobre quais autores foram consultados durante a elaboração da obra.
Um outro aspecto que chama a atenção nesse livro didático diz respeito à
inclusão, em forma de apêndice, de um estudo das principais transformações
geométricas no plano. Para tanto, Castrucci e Bóscolo ofereceram a seguinte
explicação: “Há um apêndice, que reputamos importante na orientação moderna,
que é o referente às transformações geométricas do plano, apresentadas de
forma intuitiva. Se possível não deve ser omitido” (CASTRUCCI; BÓSCOLO,
299
1969). Embora considerado importante, não mereceu maiores atenções por parte
dos autores.
O quarto volume da coleção segue a mesma orientação dos três primeiros
volumes, ou seja, a exposição foi feita dentro de um esquema mínimo para que o
livro pudesse ser desenvolvido, mas com o cuidado de não abandonar o rigor
necessário aos conceitos, informaram Castrucci e Bóscolo no prefácio da 2ª
edição. O livro encontra-se dividido em duas partes, a primeira dedicada à
Álgebra e a segunda a Geometria. A Geometria foi tratada rigorosamente, dentro
de uma seqüência dedutiva, embora apresentada com um mínimo de informações
e teoremas demonstrados sobre cada tema.
Os assuntos de que são objeto do quarto volume das coleções
Castrucci/Bóscolo e Sangiorgi acham-se mencionados no Anexo II, Tabela IV.
O capítulo VII do quarto volume foi dedicado ao estudo das funções, que é
realizado por intermédio da correspondência entre conjuntos e auxiliado pelo
recurso visual proporcionado pelo uso do diagrama de Venn nas explicações.
Do mesmo modo que no volume anterior, o apêndice tratou de assuntos
complementares, relativos ao tratamento moderno de semelhança, como
finalização do estudo das transformações planas iniciado no terceiro volume.
Notamos que, embora no sumário do livro de Castrucci e Bóscolo não
estipule detalhadamente os assuntos tratados, ao compararmos com o livro da
mesma série de autoria de Sangiorgi, observamos que seguem praticamente os
mesmos conteúdos, na mesma ordem. Modificações significativas aparecem no
apêndice, quando os autores privilegiaram assuntos diferentes, nas duas
coleções.
Observamos ainda que, nesse último volume de autoria de Castrucci e
Bóscolo, desapareceram os exercícios com lacunas utilizados para que os alunos
pudessem responder no próprio livro. A linguagem também assume um aspecto
mais formal, menos pessoal, sem formulações de questionamentos ou diálogos
com o leitor.
300
De todo modo, segundo os autores, os assuntos tratados em todos os
volumes da coleção procuravam seguir o programa e as sugestões expostas pelo
GEEM nos “assuntos mínimos para um moderno programa de matemática para o
ginásio” de 1962.
8.17. Castrucci e Bóscolo: sedimentando a nova vulgata
Notamos que Castrucci e Bóscolo procuraram seguir os passos de
Sangiorgi: mesmo título, diálogos com o leitor, fizeram uso de recursos visuais por
meio de ilustrações, esquemas gráficos e utilizaram-se da cor para estimular a
aprendizagem dos alunos.
Os tópicos abordados por Sangiorgi, mesmo quando não foram expostos
no índice da coleção didática de Castrucci e Bóscolo, de modo geral, acabaram
por ser explorados no interior da coleção. Pela comparação dos assuntos
tratados, pode-se notar a ocorrência de supressão de alguns tópicos no índice do
livro de Castrucci e Bóscolo, mas, pela verificação dos temas e da forma como
foram trabalhados dentro dos manuais, pudemos observar que, a maioria deles foi
abordada, utilizando metodologia semelhante àquela adotada por Sangiorgi.
Assim, para a primeira série do curso ginasial, Sangiorgi trabalhou as
operações inversas, introduzindo letras e outros símbolos, sendo o mais comum,
“o quadradinho”, denominados por Sangiorgi por “novas estruturas de problemas”,
referindo-se à uma nova forma de colocação de um problema com o auxílio de
figuras como o quadrado (1965, p. 79), elemento desconhecido no qual o aluno
deveria encontrar o valor numérico que substituísse o símbolo, já estabelecendo
condições para a introdução das equações do primeiro grau. Esse método não foi
utilizado por Castrucci e Bóscolo. As dízimas periódicas também não foram
trabalhadas por Castrucci e Bóscolo.
Embora não tenha sido especificado no sumário do primeiro volume,
Castrucci e Bóscolo dedicaram um tópico para o estudo dos números primos e o
processo de decomposição em fatores primos, isto é, a fatoração completa.
301
As duas coleções trabalharam operações definidas nos conjuntos
numéricos fazendo uso de uma notação mais ampla de símbolos lógicos, da idéia
de função e par ordenado. Exibiram ainda as propriedades relativas às
operações, sendo verificadas pelo emprego de exemplos numéricos e procurando
ressaltar o caráter estrutural da MM.
Além disso, do mesmo modo como na coleção de Sangiorgi, as
construções geométricas encontram-se espalhadas pelos capítulos, não
apresentando lugar específico para sua exposição. Outra semelhança observada
nas duas obras refere-se ao espaço reservado às Transformações Lineares. As
duas obras trazem esse estudo em apêndice do volume 3, enquanto que a Teoria
dos Conjuntos e Relações foram incluídas ao longo dos capítulos, não apenas no
terceiro volume como em toda coleção.
Diferença marcante, porém, aparece no assunto destinado ao apêndice do
segundo e quarto volume. Para a segunda série, enquanto Sangiorgi fez uma
exposição sobre os sistemas matemáticos, iniciando pelo estudo das relações
binárias, fazendo uso de grafos para representá-las, e, em seguida, discorrer
sobre as estruturas algébricas (semigrupo, monóide e grupo), Castrucci e Bóscolo
optaram por oferecer aos professores, “uma sugestão para a justificação das
regras dos sinais da adição e da multiplicação no conjunto dos números inteiros”.
Observa-se, porém, que as regras operatórias comentadas no apêndice foram
justificadas por meio de exemplos, levando-se em conta as propriedades
estruturais do conjunto dos números inteiros relativos, mas em momento algum
fizeram menção das estruturas algébricas (CASTRUCCI; BÓSCOLO, 1967). Para
a quarta série, enquanto Sangiorgi privilegiou os temas “Números complexos” e
Mapas topológicos”, esses assuntos não foram considerados por Castrucci e
Bóscolo, que preferiram fazer uma revisão relativa à “Potenciação de números
racionais” e “Expressões polinômias”, além de dar continuidade ao estudo das
transformações do plano iniciado no terceiro volume, agora tratando da
semelhança no plano. Esse procedimento indica que os autores, apesar de
procurarem seguir os preceitos inovadores do Movimento, agiram com mais
cautela, não apresentando a mesma ousadia e a feição moderna oferecidas na
obra de Sangiorgi.
302
Leme da Silva (2007), em artigo que investiga como Osvaldo Sangiorgi,
apropriou-se de idéias e propostas relativas à geometria que circularam durante o
MMM, considerou que a obra de Sangiorgi foi inovadora, cuja diferença
fundamental com os livros tradicionais residiu em uma mudança na maneira como
os conteúdos de Geometria foram introduzidos e abordados. No livro “Matemática
curso moderno”, de Sangiorgi, um dos tópicos mais importantes na programação
referiu-se à construção lógica da Geometria, a partir de um processo de
exploração intuitiva com vistas ao desenvolvimento da Geometria dedutiva.
Do mesmo modo que Sangiorgi, Castrucci e Bóscolo cercaram-se de
cuidados ao iniciar as proposições geométricas, partindo de um processo intuitivo
de observação e exploração para, posteriormente, alguns dos teoremas propostos
serem demonstrados.
As duas coleções fizeram uso do termo “segmentos congruentes”, ao invés
de “segmentos iguais”. Em Castrucci e Bóscolo encontramos a seguinte
observação:
Segmentos congruentes ou segmentos iguais?
Como vimos, segmento é um conjunto de pontos. Ora, dois
conjuntos são iguais quando todos os elementos de um são
também elementos do outro, e no caso de segmentos isso
somente ocorre quando se trata do mesmo segmento.
Portanto, pode-se escrever: AB = AB, mas nunca AB = CD, se AB
e CD forem segmentos distintos, pois neste caso AB e CD são
congruentes e não, iguais [grifos dos autores] (1970, p. 153).
No entanto, não justificam essa alteração pela incorporação da linguagem
da Teoria dos Conjuntos, como fez Sangiorgi:
A fim de precisar a linguagem dos conjuntos que está sendo
usada, não se deve dizer que dois segmentos que possuem a
mesma medida são iguais e, sim, congruentes, pois um segmento
– como um conjunto de pontos – só é igual a si próprio
(SANGIORGI, apud LEME DA SILVA, 2007).
Em todo caso, essa preocupação com o uso preciso dos símbolos e
definições também foi enfatizada nas recomendações do SMSG. Nelas, foi feita
uma diferenciação cuidadosa entre igualdade e congruência, entre segmentos de
303
reta e seu comprimento, entre ângulos e sua medida. Para o SMSG o termo
congruência é cuidadosamente definido e usado cautelosamente (COSTA, 1985).
Inferimos que Castrucci e Bóscolo, ao abordarem o conceito de medida,
provavelmente levaram em conta o manual inovador de Sangiorgi (1966), que por
sua vez parece ter se apropriado das propostas de Birkhoff, expressas nas
recomendações do SMSG. A investigação de Leme da Silva aponta para essa
direção, no tocante à coleção didática de Sangiorgi:
... levantamos a hipótese de que a incorporação do conceito de
medida como um facilitador no estudo da geometria possa estar
ligada à proposta elaborada por Birkhoff e utilizada nos textos
experimentais dos EUA. Dentre eles, o que parece ter tido maior
influência no Brasil é o grupo norte-americano SMSG – School
Mathematics Study Group, iniciado em 1958, que produziu textos
para todos os graus do ensino elementar e secundário (LEME DA
SILVA, 2007).
Em suas considerações sobre a coleção didática de Sangiorgi, Leme da
Silva concluiu que Sangiorgi não assumiu uma postura radical, procurando
incorporar os elementos característicos dos diferentes posicionamentos
defendidos pelos reformadores em relação à Geometria. À Geometria Euclidiana,
dedutiva, acrescentou uma Geometria exploratória. Apesar de não aderir à
Geometria das Transformações, reservou espaço para essa abordagem no
apêndice do volume três. Esses mesmos procedimentos em relação à Geometria
também se encontram presentes na coleção de Castrucci e Bóscolo: a
incorporação do conceito de medida, provavelmente apropriado das
recomendações do SMSG; procuraram partir de uma Geometria experimental
para gradativamente introduzir uma formulação dedutiva de conteúdos da
Geometria Euclidiana. Reservaram, igualmente, espaço para a Geometria das
Transformações nos apêndices dos volumes três e quatro.
Essas discussões acerca do melhor método para ensinar Geometria
também se faziam presentes nas organizações governamentais. A esse respeito,
cumpre destacar a solicitação, feita em 1965, pelo Departamento de Educação do
Estado de São Paulo para que fosse elaborado um documento contendo
sugestões de programa para a cadeira de Matemática por uma comissão
composta por Benedito Castrucci (presidente), Osvaldo Sangiorgi (secretário),
304
Luiz Mauro Rocha, Renate Watanabe e Alcides Bóscolo. Para a terceira série do
curso ginasial, essa comissão sugeriu, relativamente à Geometria: construções
com régua e compasso, transformações geométricas elementares: translação,
rotação e simetria
105
. Entretanto, os membros da comissão divergiram sobre
como deveria ser o ensino da geometria na nova proposta em relação aos
conteúdos. Resta saber, até que ponto Sangiorgi e Castrucci concordaram com a
sugestão final da comissão, uma vez não houve unanimidade entre os
componentes da comissão (MABUCHI, 2000). É possível que seja esse o motivo
pelo qual a Geometria das Transformações aparece como apêndice em ambos os
livros didáticos. Isso de certa forma indica que tanto Castrucci/Bóscolo quanto
Sangiorgi mantiveram uma uniformidade de pensamento, porém divergente de
membros da comissão, os quais pregavam o ensino da Geometria com base nas
Transformações Geométricas, que dessa forma deveria compor o texto principal e
não ficar relegado ao um apêndice, como optaram os autores em seus didáticos.
Outro aspecto a ser destacado diz respeito à alegação de Castrucci,
constante em seu depoimento de 1988, quando disse ter sido convidado pela
editora para elaborar, em parceria com um professor, um livro didático moderno,
na qualidade de assessor daquele professor quanto ao rigor matemático da obra.
É possível, portanto, que as inovações contidas no livro de Castrucci e Bóscolo
tenham sido sugeridas por Bóscolo, cabendo a Castrucci a supervisão
matemática do compêndio, afora emprestar autoridade à obra.
Em nosso entendimento, ambas as coleções mostraram aspectos
inovadores e muitas são as semelhanças entre os livros didáticos quanto ao
tratamento dos assuntos expostos. Ainda assim, foi possível verificar que a obra
de Sangiorgi exibia uma maior quantidade de exemplos, exercícios e ilustrações.
Em Sangiorgi, o diálogo mantido entre o autor e o leitor é mais direto, mais
evocativo, estimulante, manifestando-se em todos os tópicos exibidos. Já no
didático de Castrucci e Bóscolo, apesar de percebermos certa mobilização por
105
Para a terceira série ginasial, Sangiorgi assinala que o programa elaborado estava de acordo com os
Assuntos mínimos” para um moderno programa de Matemática aprovado pelo MEC no Curso de
Treinamento Básico para Professores Secundários, realizado em Brasília, em 1963, e “Sugestões para um
roteiro de programa para a cadeira de matemática” da Secretaria de Educação de São Paulo, publicadas no
Diário Oficial de 19 de janeiro de 1965 (SANGIORGI, 1966).
305
parte dos autores para entabular um diálogo com os leitores, esses convites
mostraram-se tímidos, escassos e esparsos entre os volumes analisados.
Dessa forma, por meio do exame dos procedimentos adotados por
Castrucci e Bóscolo para a elaboração de sua coleção, percebemos movimentos
de apropriação da inovadora obra de autoria de Sangiorgi, tanto no que se refere
à metodologia empregada, quanto na inserção de uma nova programação para o
ensino moderno de matemática.
8.18. Benedito Castrucci e as relações entre a matemática e educação
matemática
Comment construire une axiomatique qui
satisfasse à nos exigences?
Gustave Choquet
Da mesma maneira como evidenciamos fases na trajetória de Omar
Catunda, pontuamos, neste último tópico, momentos significativos da trajetória
profissional de Benedito Castrucci, identificando sua atuação na construção de
formas didáticas para o ensino secundário.
I. Numa primeira fase, após o término da graduação, Benedito Castrucci
tornou-se assistente de Giacomo Albanese, cuja prática acadêmica e conselhos
foram apropriados por Castrucci, e, como bem observou Pires (2006), Castrucci
pouco se deixou envolver pelas idéias bourbakistas, fiel à tradição italiana.
Afeiçoado ao tratamento axiomático para a Geometria segundo Hilbert, trabalhava
com segurança naquela teoria. Desse modo, consideramos que dificilmente iria
abandonar esse sistema para navegar em outros sistemas postulacionais, onde
as demonstrações são diferentes daquelas preconizadas por Hilbert.
Assim, em suas obras sobre Geometria, Castrucci seguia a axiomática de
Hilbert e, durante o MMM, usou abundantemente da Teoria dos Conjuntos,
empregando profusamente a notação simbólica. Tinha excelente domínio da
Lógica e fazia freqüente uso de quantificadores, em obras voltadas para o ensino
secundário. Era a Geometria tradicional com uma nova roupagem, novo
simbolismo. É possível falar em um “planejamento hilbertiano” de ensino de
306
Castrucci, isto é, em uma apropriação do sistema postulacional de Hilbert, em que
procurou dar uma outra conformação mais pormenorizada, mostrando como a
Geometria é construída passo a passo, de modo que pudesse ser aceita pelo
professor secundarista. Nesse sentido, fica patenteada a preocupação de
Castrucci com a implementação do Movimento, voltada enfaticamente para
fomentar a introdução da Teoria dos Conjuntos que, além do mais, ocupava lugar
de destaque junto aos reformadores da época.
Ademais, a presença de Castrucci nos cursos dados pelo GEEM conferia
autoridade matemática ao Movimento, representando uma iniciativa para
alteração das práticas pedagógicas dos professores. Esta autoridade provinha de
sua posição como renomado matemático, posto que figurava como Diretor do
Departamento de Matemática da FFCLUSP, contava com diversas viagens de
estudo ao exterior, possuía diversas publicações em revistas especializadas, além
de participar de bancas examinadoras de concursos para professores do ensino
superior e secundário. Assim, em diversas ocasiões, ocupava lugar de destaque
em congressos, coordenando sessões de estudos, fazendo parte da mesa
diretora como Presidente do Conselho Deliberativo do GEEM e representando o
Instituto de Pesquisas Matemáticas da USP. Nesse aspecto também, representou
importante ligação entre o caráter científico atribuído à proposta da Matemática
Moderna e sua aceitação pelos professores.
II. Num segundo momento, encontramos Castrucci na posição de quem
reconhece que a Geometria moderna idealizada seja por transformações, seja por
Álgebra Linear, defendidos por matemáticos como Klein e Dieudonné não se
impôs. Embora Castrucci tenha tentado ensinar a Geometria das Transformações
ou a Vetorial nos cursos do GEEM, não obteve bom êxito. Contudo, essa
experiência permitiu-lhe concluir que a causa do “fracasso” do Movimento deveu-
se à geometria, quando se buscou introduzir nas escolas a Geometria das
Transformações ou a vetorial, provocando, inclusive, o desaparecimento do
ensino da Geometria nas escolas.
III. Numa terceira etapa, consideramos a produção dos livros didáticos de
Castrucci elaborados em co-autoria com Alcides Bóscolo, quando constatamos
que esses autores se apropriaram de conteúdos e métodos adotados por
307
Sangiorgi, segundo as semelhanças apresentadas pelas respectivas coleções, a
partir de sua confrontação.
Entretanto, a coleção de Sangiorgi obteve estrondoso sucesso, ao contrário
daquela de autoria de Castrucci e Bóscolo, a qual alcançou apenas um relativo
sucesso de vendas. Muitas causas podem ter concorrido para essa diferença.
Afora o ineditismo, o sucesso da obra de Sangiorgi deveu-se à uma melhor
apresentação do livro, com forte apelo gráfico, dotado de ilustrações mais
elaboradas e modernas, além de uma comunicação mais envolvente com o leitor,
instigando-o a responder questões e resolver problemas. Possivelmente,
Sangiorgi dispunha de uma verba maior do que os outros autores, graças ao seu
sucesso editorial anterior, o que lhe proporcionava amplo acesso à editora.
Igualmente, Sangiorgi era comunicativo, pertencia à classe dos professores
secundaristas, estava integrado à cultura deles, o que lhe garantia grande
prestígio e popularidade junto à categoria.
IV. Numa quarta e última fase, destacamos que o livro didático escrito em
co-autoria com outro professor, porém incógnito, não considerado por Castrucci
como um “bom matemático”, foi sucesso de vendas. Isto porque a coleção já não
trazia a idéia central dos reformadores: a unicidade da matemática por meio das
estruturas. Somente a Teoria dos Conjuntos permaneceu, como linguagem
unificadora dessa ciência.
308
CAPÍTULO 9
LUIZ HENRIQUE JACY MONTEIRO, O ENSINO SECUNDÁRIO E O
MOVIMENTO DA MATEMÁTICA MODERNA
“Um esgrimista intelectual do mais alto
nível”. Assim Osvaldo Sangiorgi definiu o
professor e amigo Luiz Henrique Jacy Monteiro,
em discurso inflamado publicado no Jornal “O
Estado de São Paulo”, em 06 de junho de 1975.
Jacy Monteiro havia falecido em 20 de maio
daquele ano.
Jacy Monteiro, como gostava de ser
chamado, nasceu no Rio de Janeiro, em 6 de julho
de 1921, mudando-se para São Paulo com dez
anos de idade, lugar em que iniciou seus estudos
primários. Já naquela época revelava tendência excepcional para com as ciências
exatas, levando seu pai, Ernesto Jacy Monteiro, famoso poliglota e tradutor, a
desejar que se tornasse engenheiro.
Amigos desde a juventude, Osvaldo Sangiorgi freqüentava o casarão em
que a família Monteiro residia, na Vila Galvão, em São Paulo. Juntos,
participavam de torneios de natação e ciclismo, nos quais Jacy Monteiro revelava-
se excelente atleta. Jacy Monteiro era ótimo nadador. Nadava em um lago, nas
309
proximidades da casa na Vila Galvão. A música de Vivaldi e Bach também
comparecia nas horas de descanso, no casarão da vila onde a família residia.
Bons momentos vividos e por isso mesmo relembrados com nostalgia por
Sangiorgi, naquela homenagem póstuma, ligando o sofrimento presente ao
passado alegre e vigoroso da juventude.
Jacy Monteiro casou-se em Martha Anna Dorothea Wallbaum, com quem
teve dois filhos, Luiz Henrique Jacy Monteiro Filho e Layse Helena Jacy Monteiro.
Segundo depoimento de Sangiorgi (1975), Jacy Monteiro não pudera
realizar estudos secundários regulares, devido a constantes mudanças de sua
família, para diferentes lugares. Essa condição, no entanto, não o impediu de ser
aprovado com brilhantismo nos exames de madureza presididos por Martin Egídio
Damy e somente realizados, naquela época, no tradicional Colégio do Estado de
São Paulo.
Sua perseverança permitiu-lhe ingressar no Colégio Universitário da Escola
Politécnica em 1940. Iniciou o curso na Escola Politécnica, mas segundo
depoimento de Jacy Monteiro Filho, seu pai não se adaptou às condições da
escola, devido à própria natureza do curso, que requeria conhecimentos de ordem
técnica, enquanto que Jacy Monteiro inclinava-se para a Lógica e à Matemática
pura. Todavia, o curso permitiu-lhe conhecer o professor Cândido Lima da Silva
Dias, que o incentivou a cursar ciências matemáticas na FFCLUSP (MONTEIRO
FILHO, 2005).
Ingressou na Faculdade de Filosofia em 1941, juntamente com outros
quatorze alunos, e diplomou-se em 1943, na companhia de quatro colegas de
turma. Em 1944, já pertencia ao corpo docente do Departamento de Matemática,
como assistente do professor Cândido Lima da Silva Dias, na disciplina de
Geometria Superior (ANUÁRIO DA FFCLUSP, 1939-1949).
Com a vinda de Oscar Zariski, em 1945, para dar curso de extensão sobre
“Álgebra moderna” e “Introdução à Geometria Algébrica”, Jacy Monteiro foi
contratado como professor auxiliar de ensino, com a incumbência de assistir
aquele professor durante sua estadia no Brasil. Da mesma forma, quando Jean
Dieudonné visitou o Brasil em 1946, para dar curso de “Álgebra moderna” e
310
“Grupos de Galois”, novamente Jacy Monteiro passou a exercer a função de
auxiliar de ensino daquele curso.
Jacy Monteiro possuía prodigiosa memória, além de grande inclinação para
o aprendizado de idiomas. A memória e outras características ligadas à sua
personalidade foram motivos de comentários por parte de Sangiorgi. A esse
respeito, Sangiorgi escreveu:
Aparentemente, Jacy Monteiro se apresentava como fleumático,
introvertido, características que poderiam ser confundidas com
timidez, mas, na verdade, os que dele se aproximavam percebiam
nitidamente seu imenso calor humano, a retidão de seu caráter,
temperados por um fino senso de humor, amparados por
prodigiosa memória. Guardava com jocosa e extrema facilidade
números de telefone e datas importantes de seus amigos.
Lembro-me de certa ocasião, em que não me lembrava do meu
primeiro telefone, da casa em que morei na Vila Mariana. Cinco
anos depois da mudança de casa, Jacy, a um amigável desafio
provocado, reproduziu instantaneamente o número do antigo
telefone (SANGIORGI, 1975).
João Linneu do Amaral Prado, colega de Jacy Monteiro nos tempos em
que estudaram na FFCLUSP, também teceu comentários sobre aquela
excepcional memória:
Numa dessas partidas de xadrez entre Jacy Monteiro e Catunda,
pudemos perceber a agilidade mental de Jacy. Alguém inquiriu
como foi o desenrolar da partida e, então, Jacy recolocou,
imediatamente, todas as pedras nas suas respectivas posições e
em seguida refez toda a partida. [...] O Jacy era uma pessoa
sensacional e com uma memória incomum. Nas aulas, ele
anotava exatamente o que o professor desenvolvia, depois
distribuía para os seus colegas em folhas mimeografadas. Eu e os
demais colegas estudávamos através de seus apontamentos
(PRADO, apud BARALDI, 2000, p. 18-19).
Essa performance permitia a Jacy Monteiro, ao mesmo tempo em que
assistia os cursos dos professores estrangeiros, no caso de Zariski, em inglês, e
de Dieudonné, em francês, fizesse transcrições precisas da aula, traduzindo-a
diretamente para a língua portuguesa. Essas notas de aula proporcionavam aos
estudantes uma melhor compreensão da matéria lecionada que, de modo geral,
era bastante complexa. Posteriormente, Jacy Monteiro elaborou dois trabalhos:
311
Teoria dos Ideais” e “Teoria dos corpos comutativos” volumes I e II, relativos às
notas de aulas do curso do professor Zariski (1945) e Dieudonné (1946)
respectivamente, e que foram publicados pela Sociedade de Matemática de São
Paulo (ANUÁRIO DA FFCLUSP, 1939-1949).
Nesta particular relação entre professor e aluno na redação das lições,
exemplifica a dimensão coletiva da atividade didática, do modo como observou
Belhoste (1998), ao constatar que, apesar da preparação de aulas ser, em geral,
uma atividade solitária, sua redação é freqüentemente coletiva, quando os
professores deixam para um aluno a redação das aulas e, não raro, tais
apontamentos convertem-se em obras didáticas. Da mesma forma, as anotações
de Jacy Monteiro tornaram-se livros-texto, a partir das exposições realizadas por
Dieudonné e Zariski.
9.1. Correspondências com Catunda
Em 14 de setembro de
1946
106
, Omar Catunda escreveu,
da cidade de Miami (EUA), uma
carta para Jacy Monteiro. Nela,
Catunda agradecia a Jacy por
tomar conta da escrituração de
sua contabilidade em relação às
apostilas do Curso de Análise,
uma vez que Jacy ficou
encarregado de ministrar aquele curso. Sua preocupação dizia respeito à compra
e vendas das apostilas, além de despesas, provavelmente relativas à impressão
das mesmas, que estava sob a responsabilidade de um senhor chamado Giorelli.
Nesse sentido, esclareceu, já havia pago previamente Cr$ 4000,00, sendo
combinado que cada página custaria Cr$ 36,00, num total de 250 folhas. Catunda
tinha assuntos com a Livraria Italiana em São Paulo e com a Livraria Boffoni do
Rio de Janeiro. Solicitou também, que Jacy anunciasse a existência, para venda,
106
Essa carta e as demais a que se refere este tópico, foram disponibilizadas pelo Sr. Luiz Henrique Jacy
Monteiro Filho.
312
de nova edição de suas apostilas e que, dissesse a Benedito Castrucci e Edson
Farah, que prometia enviar, até novembro daquele ano, os originais relativos à
sua parte em determinado livro
107
.
Em 24 de fevereiro de 1947, nova missiva de Catunda ao amigo Jacy,
dessa vez de Princeton (EUA). Solicitava notícias do serviço de composição das
apostilas, a cargo de Giorelli e das vendas das mesmas.
Informou, também, sobre o interesse de um professor de matemática
chamado German Ancochea Quevedo, em obter as notas de aulas sobre o curso
que Zariski deu em São Paulo, e que ficavam sob a responsabilidade de Jacy,
considerando que ele as havia redigido.
Outra carta, datada de 15 de abril de 1947, também de Princeton, revelava
que Catunda mostrava-se preocupado com um possível transtorno na vida de
Jacy Monteiro: “Realmente para mim é mais cômodo acreditar que essas
apostilas não lhe estão dando trabalho; mas a consciência sempre me dói um
pouco; em todo o caso, muitíssimo obrigado” (CATUNDA, 1947b).
Na carta, Catunda deixou transparecer a preocupação com a saída de
André Weil da FFCLUSP e a necessidade de contratação de outro matemático do
mesmo porte para suprir o cargo em vias de ficar vago. A preocupação se
justificava pela possibilidade de que a Faculdade viesse a perder em qualidade,
em razão do desfalque em seu corpo docente, trazendo como resultado uma
queda de seu padrão de ensino, até então de excelência, acarretando, por sua
vez, uma perda de terreno por parte do Estado de São Paulo em relação aos
outros estados:
Também estou esperando confirmação da notícia que ouvi por
aqui; de que o Weil vai para Chicago em outubro. Diga ao
Candido que promova logo uma reunião para ver o que sugerem
para substituir. O Albert foi para o Rio, o Stone parece que
também vai para lá, e fala-se que o Von Neumann também. Será
que nós em São Paulo vamos ficar na rabeira? Este último é
107
Ao que tudo indica, trata-se do livro didático “Matemática”, para a 2ª série Colegial, em que Omar Catunda
redigiu o capítulo intitulado “Análise combinatória, binômio de Newton, determinantes e equações lineares”.
Foi publicado em 1948. A coleção, destinada ao curso Colegial, contou com diversos colaboradores: Edson
Farah, Fernando Furquim de Almeida, Benedito Castrucci e João Batista Castanho (ANUÁRIO DA FFCLUSP,
1939-1949, p. 617-118).
313
considerado uma das maiores capacidades que há por aqui. Ouvi
falar de um professor que disse que há três métodos para resolver
uma equação diferencial que não entra nos tipos conhecidos: 1)
por tentativa 2) por aproximação 3) consultando o Von Neumann
(CATUNDA, 1947b).
Realmente, a notícia de Catunda se confirmou. Em 1947, André Weil e
Jean Dieudonné seguem para os Estados Unidos, ocasionando a necessidade de
contratação de outro professor. Quem foi convidado a substituir esses dois
matemáticos bourbakistas foi outro bourbakista: Jean Delsarte, que veio para a
USP em 1948 (ANUÁRIO DA FFCLUSP, 1939-1949). Ademais, os matemáticos
Marshall Stone e Adrien Albert ministraram cursos no Rio de Janeiro na década
de 1940 (SILVA, 2003a).
Como auxiliar de Jean Dieudonné, em 1947, Jacy Monteiro foi
contemplado com uma bolsa de estudos pela Rockefeller Foundation, por
intermédio de Zariski, o qual escolheu os alunos que obtiveram melhor
desempenho em Álgebra para fazerem curso no exterior.
Seguiu, assim, para os Estados Unidos no mês de setembro, indo
primeiramente para a Universidade de Harvard, para acompanhar as aulas dadas
por Oscar Zariski. Em seguida, dirigiu-se à Universidade de Chicago para
acompanhar o curso de Funções Algébricas ministrado por Saunders Maclane.
Jacy Monteiro retornou ao Brasil em março de 1949 e reassumiu suas
funções como assistente de Candido Lima da Silva Dias, na cadeira de
Complementos de Geometria e Geometria Superior, a partir de 02 de maio de
1949 (MONTEIRO FILHO, 2005).
Naquele mesmo ano, em agosto de 1949, o Curso de Matemática da
FFCLUSP mudou-se para a Rua Maria Antonia, o coração da vida intelectual
paulista.
9.2. Na rua Maria Antonia
Com a transferência da FFCLUSP para a rua Maria Antonia, esse local
veio a se tornar palco de acirrados debates políticos, onde entrecruzavam as mais
314
variadas personalidades ligadas às diversas áreas científicas, interagindo
docentes, alunos e funcionários, favorecidos pelo pequeno espaço físico de que
era dotada a instituição, a qual, no dizer do físico José Goldemberg, era
... provavelmente a maior densidade intelectual por metro
quadrado que jamais se reuniu na cidade de São Paulo. Naquelas
instalações acanhadas, em que os professores não tinham salas
para trabalhar, se acotovelavam milhares de alunos e grandes
professores como Fernando Azevedo, Eurípedes Simões de
Paula, Mário Schemberg e outros. Era a proximidade das pessoas
e os encontros no corredor que tornavam altamente interessante o
ambiente que se formou naquele edifício... (1988, p. 155).
O grêmio estudantil, situado bem em frente da entrada do Departamento
de Matemática, era freqüentado por alunos, professores da Faculdade e de outras
faculdades da redondeza ou mesmo do secundário, fascinados com sua
atmosfera. Um lugar com muito barulho, muita fumaça e por isso mesmo com
portas de vidro sempre bem fechadas, lugar de efervescência intelectual e
política, onde se misturavam catedráticos, assistentes e funcionários das mais
diversas especialidades.
Nesse clima, a Faculdade abria-se para receber alunos e professores,
tanto em suas atividades recreativas quanto em seus cursos.
Em geral, os cursos do terceiro e quarto ano do Departamento de
Matemática eram de natureza monográfica, ocasião em que eram oferecidos
estudos de publicações recentes, inovadoras, não raro com a presença de
professores do departamento ou de outros cursos que se beneficiavam dessa
atualização permanente. Nessas aulas,
...era comum um professor abandonar suas notas, normalmente
bem preparadas, e enveredar num processo criativo durante a
aula. Claramente estavam ali porque viviam aquilo que estavam
ensinando, criavam perante seus alunos e, sem acanhamento,
criticavam e anulavam algo que estavam tentando fazer. [...] Uma
pergunta ou um problema proposto a um professor era algo que ia
para casa com ele, e dias, às vezes semanas depois, vinha uma
satisfação, com a solução ou uma confissão de não ter
conseguido. Retomar uma linha de raciocínio uma, duas semanas
depois, era também algo comum. Aula era algo levado a sério,
trazido de casa para a faculdade e da faculdade para casa. Era
um envolvimento total do professor com seus alunos e com sua
315
missão. Docência e pesquisa era algo que se fazia em simbiose
(D’AMBROSIO, 1988b, p. 57).
Os mesmos professores zelosos com a formação matemática dos seus
alunos e com o desenvolvimento de suas pesquisas, também circulavam pelo
grêmio. O número de matemáticos e físicos que freqüentava o grêmio era
considerável e estes se dedicavam ao jogo de xadrez e ao pingue-pongue
(D’AMBROSIO, 1988b). Dentre eles, destacava-se Jacy Monteiro, como uma das
figuras
... mais ativas e queridas, pois, como professor do mais alto
quilate, prestigiava as atividades estudantis, desde a seriedade
com que presidia às eleições, até a participação entusiástica nos
torneios de xadrez e pingue-pongue, modalidades esportivas em
que era mestre e quase sempre saía vitorioso (SANGIORGI,
1975).
Com a vinda da Faculdade para a Rua Maria Antonia e considerando que
nessa instituição também funcionava a Sociedade de Matemática de São Paulo, a
sede desta foi igualmente transferida para as novas instalações da FFCLUSP.
9.3. Participando dos Colóquios Brasileiros de Matemática
Luiz Henrique Jacy Monteiro participou do 1o Colóquio Brasileiro de
Matemática
108
, que foi realizado na cidade mineira de Poços de Caldas, no
período de 1 a 20 de julho de 1957, contando com a participação de 49
professores de nove centros universitários brasileiros. A coordenação do 1
o
CBM
ficou a cargo do professor Chaim S. Hönig.
Naquela ocasião, professores universitários e pesquisadores de
Matemática ministraram cursos intensivos de suas pesquisas, contando com o
patrocínio do CNPq, em colaboração com órgãos similares federais e estaduais,
bem como de universidades brasileiras. Jacy Monteiro deu sua contribuição
ministrando um curso sobre “Teoria de Galois”, o qual foi posteriormente
108
Os Colóquios Brasileiros de Matemática foram realizados em Poços de Caldas até 1985, com exceção do
3º Colóquio, de 1961, realizado na Universidade do Ceará. A partir de 1987, 16º Colóquio, foram transferidos
para o IMPA/RJ (IMPA, 2007).
316
publicado, juntamente com o curso “Teoria dos números algébricos”, de autoria de
Fernando Furquim de Almeida, com financiamento do CNPq.
Já o 5
o
Colóquio Brasileiro de Matemática, igualmente realizado na cidade
de Poços de Caldas/MG, durante o período de 4 a 24 de julho de 1965, foi
coordenado por Jacy Monteiro. Esse encontro contou com 204 participantes,
nacionais e estrangeiros
109
(IMPA, 2007).
Sob a coordenação de Jacy Monteiro, o Colóquio inovou, distinguindo-se
dos demais encontros pela introdução de cursos de Pós-Graduação, com duração
de três semanas, destinados a instrutores e professores de Matemática de
diversas universidades brasileiras, além de cursos de nível avançado, 7
conferências e comunicações sobre resultados de pesquisas. Para os cursos de
Pós-Graduação, foram oferecidos os cursos de “Aplicações da Álgebra Linear à
Geometria Euclidiana” ministrado por Alexandre Augusto Martins Rodrigues e
Tópicos de Análise”, por Carlos Alberto Buarque Borges.
Segundo informações de Alexandre Augusto Martins Rodrigues, contidas
na obra “Álgebra Linear e Geometria Euclidiana” publicada em 1969, “a aplicação
da Álgebra Linear à Geometria facilita a compreensão e o domínio da primeira
teoria. Acreditamos que o emprego generalizado dos métodos da Álgebra Linear
no ensino da Geometria no curso secundário é unicamente uma questão de
tempo”. Ainda segundo o autor, a origem do trabalho encontra-se no curso
desenvolvido na Escola Politécnica de São Paulo em 1959 e 1960. Para o leitor
que desejasse ampliar seus conhecimentos, o autor recomendou o livro de Jean
Dieudonné “Algébre Linéaire et Géométrie Élémentaire” (RODRIGUES, 1969, p.
1-2).
Os cursos avançados oferecidos no Colóquio ficaram a cargo de notáveis
matemáticos: Edwin Spanier, (Universidade da Califórnia), “Teoria da Obstrução”;
Gustave Rabson (ITA), “Probabilidades”; Otto Endler (IMPA/ Universidade de
Bonn) “Teoria de Galois Infinita” e Serge Lang (Universidade de Columbia),
Aproximações Diofantinas”.
109
Segundo informações de Layse Helena Jacy Monteiro, que durante esse Colóquio trabalhou como
secretária, o número de participantes presentes foi de 315. Informa mais, que enquanto seu pai respondeu
pela coordenação, o professor Lindolpho de Carvalho, matemático do IMPA, foi
responsável pela parte
financeira do evento (Depoimento oral, 2007).
317
Jacy Monteiro igualmente participou do 7º Colóquio Brasileiro de
Matemática, realizado em Poços de Caldas/MG de 6 a 26 de julho de 1969. Esse
colóquio foi organizado pelo professor Gilberto Francisco Loibel, contando com a
participação de 312 pessoas inscritas. No 7º Colóquio, Jacy Monteiro ministrou
curso de iniciação científica com o tema “Teoria de Galois” (IMPA, 2007).
Durante esse colóquio, foi fundada a Sociedade Brasileira de Matemática,
onde Jacy Monteiro, além de sócio fundador exerceu as funções de Conselheiro e
Diretor de Publicações.
9.4. Organizando eventos, correspondências, revistas, periódicos ...
Relativamente ao vínculo mantido entre Jacy Monteiro e a Sociedade de
Matemática de São Paulo, antes de sua sede ser instalada na rua Maria Antonia,
cabe esclarecer que esse matemático era responsável pela publicação do boletim
dessa sociedade
110
, figurando como seu Secretário Geral durante o primeiro
mandato da Diretoria (1945-1948), sob a presidência de Omar Catunda.
No exercício daquela função, cabia a Jacy Monteiro as seguintes
atribuições:
a) atender a toda correspondência da Sociedade;
b) substituir o Presidente na falta do Vice-Presidente;
c) proceder nas sessões à leitura do expediente e à
comunicação das ofertas feitas ou recebidas pela Sociedade;
d) redigir e ler as atas das sessões da Sociedade;
e) organizar e manter o arquivo da Sociedade (Boletim da SMSP,
1946, p.12).
Posteriormente, com a eleição de nova diretoria, já estabelecida na rua
Maria Antonia, Jacy Monteiro passou a exercer a função de Diretor de
Publicações, além de participar da Comissão de Redação, composta por
Fernando Furquim de Almeida e Candido Lima da Silva Dias. Nessa nova função,
competia a ele:
110
O Boletim da Sociedade de Matemática de São Paulo publicou seu primeiro volume em 1946 e o último
em 1966 (SILVA, 2003a, p. 135).
318
a) administrar e gerir todas as publicações da Sociedade;
b) atuar como Presidente da Comissão de Redação;
c) indicar, entre os sócios da Sociedade, um ou mais membros
da Comissão de Redação, indicação esta que será submetida
à aprovação da Diretoria;
d) tratar das trocas das publicações (Boletim da SMSP, 1946, p.
12).
Cartões postais de vários países, como Venezuela, Iugoslávia, Romênia e
Japão
111
, da década de 1960, quando Jacy Monteiro já participava do GEEM,
indicam suas relações com matemáticos da época, revelando interesses comuns
entre eles, e assim, ora tratavam sobre artigos a serem publicados no BSMSP, ou
acerca de eventuais necessidades da própria Sociedade, ora a respeito de livros
dos quais necessitavam e, não raro, através dessa troca de correspondências,
mantinham-se informados sobre as atividades acadêmicas que vinham ocorrendo
no Brasil e no exterior.
Além disso, no exame de outros cartões postais, estes indicam um
relacionamento amigável entre Jacy Monteiro e os professores Osvaldo Sangiorgi,
Ubiratan D’Ambrosio, Leopoldo Nachbin, Chaim Hönig, dentre outros.
Artibano Micali, por exemplo, em 16 de julho de 1962, enviou-lhe um postal
de Paris, contendo os seguintes dizeres: “Jacy, Samuel
112
vai lhe mandar um
artigo sobre anéis fatoriais para ser publicado no próximo número BSMSP. O
curso sobre anéis fatoriais está quase pronto. Abraços, Artibano” (MICALI, 1962).
Do mesmo modo, valendo-se de correspondência postal, uma pessoa que
assinava como Nello
113
, também da cidade de Paris, em janeiro de 1963,
indagava-lhe: “Gostaria de saber como vão minhas relações com a SMSP.
Quanto? Quais as últimas publicações? Precisa você ou a SMSP de algo daqui?”
(NELLO, 1963).
111
Esses cartões postais nos foram gentilmente exibidos para consulta por Layse Helena Jacy Monteiro,
durante depoimento oral.
112
É provável que seja o matemático bourbakista Samuel Eilenberg. Trabalhou em diversas universidades
americanas, como Michigan, Princeton, Indiana e Columbia. Publicou trabalhos juntamente com Saunders
MacLane. Realizou conferências na FFCLUSP em 1952 (PIRES, 2006).
113
O prenome da pessoa que assinou como Nello está ilegível. É possível tratar-se do matemático Nelo da
Silva Allan professor da Universidade do Mato Grosso (UNEMAT), orientou diversos trabalhos na
UNICAMP/SP (SILVA, 2003b).
319
Com a extinção da Sociedade de Matemática de São Paulo e a criação da
Sociedade Brasileira de Matemática, em 1969, Jacy Monteiro continuou a
desempenhar funções semelhantes, dessa vez no cargo de editor do boletim.
O traquejo adquirido com as redações e publicações de notas de aulas
ministradas pelos professores estrangeiros que freqüentavam a Faculdade, bem
como por sua administração, organização de eventos científicos, planejamento na
criação de revistas, elaboração e distribuição de periódicos, além da facilidade em
comunicar-se com outras sociedades, das mais diversas partes do mundo, faziam
com que o professor Jacy Monteiro fosse procurado pelos colegas, a fim de
auxiliá-los na agilização da publicação de seus trabalhos ou mesmo
aconselhamento na produção de revistas.
Este foi o caso, por exemplo, de Candido Lima da Silva Dias, ao publicar
sua tese para o provimento da Cadeira X – Complementos de Geometria e
Geometria Superior, assim se expressando: “ao assistente L.H. Jacy Monteiro que
não mediu esforços para que esta tese fosse publicada em tempo útil” (1951, p.
17).
O mesmo pode ser dito em relação à tese apresentada por Chaim Samuel
Hönig, para provimento da Cadeira de Complementos de Matemática:
... ao Dr. Luiz Henrique Jacy Monteiro que reviu conosco a maior
parte do presente trabalho, sugeriu diversas modificações e ao
qual também se deve todo o trabalho de preparação material
desta tese. Sem os esforços e a dedicação do Dr. Luiz Henrique
Jacy Monteiro esta tese não teria ficado pronta em tempo útil
(1959, p. XII).
Na mesma linha dos personagens antecedentes, Jorge Leal Ferreira, editor
geral da Revista Brasileira de Física, ao apresentar o primeiro número da revista,
dedicou as seguintes palavras: “... ao prof. Luiz Henrique Jacy Monteiro, do
Instituto de Matemática e Estatística da USP, por ensinamentos valiosos que me
permitiram enfrentar os problemas iniciais da Revista” (1971, p. 2).
Entre 1953 e 1954, ainda como diretor de publicações da Sociedade de
Matemática de São Paulo, Jacy Monteiro colocou-se à disposição dos alunos para
a elaboração da revista “Notas de Matemática e Física”, uma publicação de
320
iniciativa dos alunos, com suporte técnico-teórico da administração da Faculdade.
Apesar de não ter comparecido com um artigo científico, como outros professores
fizeram, Jacy Monteiro colaborou com a revista cedendo endereços de
instituições no Brasil e no exterior, viabilizando a elaboração e distribuição de
exemplares juntamente com cartões-resposta, que visavam a correspondência
com os leitores e possíveis permutas entre revistas (DUARTE, 2005).
Sua dedicação e inclinação para a elaboração de apostilas, fizeram com
que adquirisse uma máquina de escrever elétrica da marca IBM, dotada de uma
esfera de tipos, que se fazia acompanhar de uma outra esfera com diferentes
tipos de caracteres próprios para a datilografia de símbolos matemáticos que,
para a época, era o que havia de mais sofisticado em termos de equipamento
tecnológico de pequeno porte
114
.
Jacy Monteiro participou ativamente das atividades do GEEM, desde sua
criação, ministrando cursos, publicando livros-texto, sendo, inclusive, responsável
pelo Departamento de Publicações do GEEM. Nesse cargo, competia-lhe gerir
todas as publicações do GEEM e manter as trocas de publicações com todas as
entidades congêneres (ROSA LIMA, 2006, p. v).
Jacy Monteiro também exerceu o papel de consultor da Editora Polígono
S.A.
No caso da Editora Polígono S.A., no ano de 1971, Jacy Monteiro recebeu
uma carta com os seguintes dizeres:
Temos a satisfação de enviar-lhe um exemplar do nosso mais
recente lançamento editorial.
Estamos empenhados na edição de livros Técnicos e Científicos
que proporcionam ao leitor o acesso aos conhecimentos tão
necessários ao bom desenvolvimento profissional.
Ficaremos muito honrados em receber de V. Sª, um parecer e
uma crítica sobre o livro ora enviado, bem como sua avaliação
quanto à possibilidade de ser adotado o ensino da matemática
nele apresentada.
114
Em 1961, a IBM, International Business Machines, lançou a máquina de escrever elétrica com uma esfera,
em que todos os caracteres foram colocados numa só unidade rotativa, eliminando o problema de tipos
encavalados, uma vez que um dos problemas apresentados nas máquinas de escrever comuns era que os
tipos ficavam colados uns nos outros se o datilógrafo batesse depressa (GARCIA, 2007).
321
Ao ensejo, estendemos um convite, para que nos envie sugestões
para futuros lançamentos, agradecendo à atenção dispensada
(SILVA, 1971).
A carta, assinada por Irene da Silva, responsável pelo setor de relações
públicas da editora, não traz dia e mês em que foi elaborada. Por meio dela,
podemos perceber o apreço que a editora devotava aos conhecimentos
matemáticos de Jacy Monteiro, denotando certo prestígio pelo seu caráter
intelectual e revelando, também, mais uma outra faceta profissional especializada
dessa personagem, o que pode indicar outra fonte de renda a par com aquela
proveniente do exercício do magistério e venda de livros.
Ao que parece, e baseados nas informações contidas na tese de Rute
Pires (2006), o matemático Jacy Monteiro não orientou trabalhos de mestrado ou
doutorado, no período 1950-1969. Registra-se apenas, a orientação da
dissertação de mestrado de Marly Mandia, versando sobre “Módulo das
diferenciais e sua aplicação em extensões”, defendida em 15 de agosto de 1974
(SILVA, 2003b) e sua participação na banca de doutoramento de Paulo
Ribenboim, em agosto de 1957 (PIRES, 2007).
Até 1959, L.H. Jacy Monteiro lecionou Álgebra Moderna na Universidade
Mackenzie, recebendo do Centro Acadêmico de Filosofia o título de Sócio
Honorário e o diploma de Honra ao Mérito, “testemunho do seu alto
relacionamento com os estudantes de Matemática e Física daquela Universidade”
(SANGIORGI, 1975).
Jacy Monteiro também exerceu a docência na Escola de Oficiais da Força
Pública do Estado do Alto da Cantareira (Barro Branco). Lá foi professor de
Álgebra e Trigonometria. Sangiorgi também lecionou nessa academia, em
substituição a Jacy Monteiro e ali pôde constatar e testemunhar sobre o alto
apreço que lhe era dispensado por aquela tradicional instituição de ensino militar
(SANGIORGI, 1975).
Monteiro faleceu em 1975, ao ser submetido a uma operação cirúrgica,
quando sofreu um derrame cerebral, motivando seu passamento.
322
9.5. Álgebra moderna e álgebra linear: novos conteúdos para a cadeira de
Complementos de Geometria e Geometria Superior
Em 19 de abril de 1951, Jacy Monteiro defendeu a tese “Sobre as
potências simbólicas de um ideal primo de um anel de polinômios”, cuja banca
examinadora era composta pelos professores Candido Lima da Silva Dias, Omar
Catunda, Benedito Castrucci, Afonso Penteado de Toledo Piza e Leopoldo
Nachbin
115
(ANUÁRIO DA FFCLUSP, 1951). A sessão foi aberta por Candido
Lima da Silva Dias, que passou a palavra ao primeiro argüidor, o professor Afonso
de Toledo Piza. Em seguida, Jacy Monteiro foi argüido pelos professores
Leopoldo Nachbin, Omar Catunda, Benedito Castrucci e Candido da Silva Dias.
Após as argüições, a banca examinadora auferiu a nota máxima ao candidato, por
unanimidade. Como no dia 12 de abril de 1951, data da realização dos exames
das matérias subsidiárias, Álgebra e Geometria projetiva, Jacy Monteiro já havia
obtido dez, foi aprovado com distinção (PIRES, 2006).
Embora Jacy Monteiro tenha sido orientado por Oscar Zariski, oficialmente
consta o nome de Candido Lima da Silva Dias como orientador, conforme
exigência legal (PIRES, 2006).
Comprovando a contribuição de Zariski na orientação da tese, registramos
as palavras do próprio Jacy Monteiro, na introdução do trabalho: “Quero
expressar aqui os meus agradecimentos ao Prof. O. Zariski pela sugestão do
problema acima e pela orientação prestada durante a preparação deste trabalho”.
Além disso, a tese baseou-se, em grande medida, em resultados obtidos por
Oscar Zariski em suas pesquisas (MONTEIRO, 1950).
Conforme pesquisa realizada por Pires (2006), ao buscar verificar como
ocorreram as apropriações efetuadas pelos professores do Curso de Matemática
da FFCLUSP das idéias bourbakistas, a partir 1950, já se podia observar uma
mudança da visão da perspectiva tradicional italiana para a perspectiva
estruturalista bourbakista. Daí por diante, a maioria dos títulos das teses
contemplou assuntos como topologia, álgebra, distribuições, entre outros, os
115
O Anuário da FFCLUSP notificou que deixou de transcrever o resumo da tese de Jacy Monteiro pela
dificuldade de transcrição dos símbolos matemáticos empregados.
323
quais eram privilegiados em cursos e conferências do grupo Bourbaki (PIRES,
2006, p. 341).
A análise dos programas permitiu a Pires (2006) concluir que as cadeiras
Complementos de Geometria” e “Geometria Superior”, foram pouco a pouco se
orientando para a visão bourbakista da matemática, além disso, que o professor
catedrático Candido Lima da Silva Dias e seu assistente Luiz Henrique Jacy
Monteiro, não só se apropriaram das idéias bourbakistas como também as
divulgaram por meio de suas aulas, orientações, cursos, publicações, etc. (2006,
p. 343).
Além de nos valermos de informações extraídas da tese de Pires (2006),
apresentamos os apontamentos escritos por D’Ambrosio em 1952, para o 2º ano
na cadeira Complementos de Geometria e, em 1953, para o 3º ano na cadeira de
Álgebra. Uma vez que as conclusões de Pires amparam-se em grande medida,
no estudo do programa oficial do Curso de Matemática da FFCLUSP, buscamos
verificar, por meio de comparação entre o programa apresentado e as nota de
aulas de Ubiratan D’Ambrosio, se as práticas docentes seguiam efetivamente
aquele programa.
Envolvidas em delicados papéis de seda, já agora amarelados pelo tempo,
essas anotações, em forma de fichamento, foram feitas por D’Ambrosio a partir de
1951, ocasião em que ingressou no primeiro ano do Curso de Matemática da
FFCLUSP. Atualmente essas fichas fazem parte do acervo do APUA.
As anotações contidas na ficha introdutória da cadeira Complementos de
Geometria informam que o curso foi dado pelo professor Candido Lima da Silva
Dias, que adotou a seguinte bibliografia: “Finite Dimensional Vector Spaces”, de
Paul Halmos, 1948; “A Survey of Modern Algebra”, de G. Birkhoff e Saunders
MacLane, 1950; “Algèbre et Analyse Linéaires” de Lichnerowicz, 1947.
Ainda na mesma ficha, Ubiratan D’Ambrosio deixou registrado que as aulas
de Complementos de Matemática foram dadas pelo professor Fernando Furquim
de Almeida no primeiro ano, qual seja, 1951, e que este professor adotou o livro
Modern Algebra” de Van der Waerden, segundo volume, 1949.
324
As anotações realizadas por D’Ambrosio em 1953, para o 3º ano na
disciplina de Álgebra, traz em sua capa as seguintes informações:
Relacionamos, no Anexo III, os assuntos constantes no programa da
FFCLUSP e os principais tópicos abordados em sala de aula, de acordo com as
anotações do professor D’Ambrosio, para a cadeira de Complementos de
Geometria e Geometria Superior.
Pela comparação entre o programa do Curso de Matemática e os assuntos
abordados em sala de aula, constantes nas fichas de Ubiratan D’Ambrosio, nota-
se que Jacy Monteiro e Silva Dias seguiram o programa estipulado pelo curso,
embora não tenham ministrado os últimos tópicos. Tanto na cadeira de
Complementos de Geometria quanto na de Geometria Superior, o conteúdo
programático dizia respeito à Álgebra Linear e Álgebra Moderna, assuntos
adotados sob a perspectiva bourbakista (Ver Anexo III).
Relativamente ao curso de Geometria Superior, conforme se apresenta nas
fichas de D’Ambrosio, o professor Jacy Monteiro, em 1953, seguiu os tópicos
apresentados na obra “Teoria dos corpos comutativos”, primeiro volume, do curso
de extensão ministrado por Jean Dieudonné em 1946. Os tópicos constantes no
programa, a partir da quarta parte, qual seja, “Isomorfismos das extensões
algébricas de um corpo”, diziam respeito ao segundo volume desta mesma obra,
também de autoria de Dieudonné, sendo ambos volumes redigidos por Jacy
Monteiro.
325
Ubiratan D’Ambrosio e Alexandre Rodrigues Martins, em entrevista
concedida à Adriana Marafon (1998), relembraram como era o curso de
Geometria Superior, ministrado por Jacy Monteiro. Segundo a conversação
mantida entre esses dois matemáticos, no terceiro ano começavam os cursos
avançados:
D’Ambrosio: Avançados...O curso de Geometria Superior, que na
verdade era um curso de Álgebra Comutativa.
Martins: Dado pelo Jacy...
D’Ambrosio: Dado pelo Jacy, um grande professor.
Martins: É, um grande professor, um excelente curso. Na verdade
um curso que naquela ocasião teria sido considerado um curso
muito bom em qualquer universidade do mundo.
D’Ambrosio: De pós-graduação. É o livro do Dieudonné.
Martins: Exato, que tinha sido preparado para o Bourbaki. Era
alguma coisa que cientificamente e matematicamente estava bem
avançado em relação ao que existia publicado no mundo.
Assim, confirma-se a conclusão de Pires, quando sustenta a incontestável
apropriação da perspectiva bourbakista efetuada por Jacy Monteiro, além de
divulgá-la em seus trabalhos posteriores.
9.6. As Faculdades de Filosofia na visão de Jacy Monteiro
Como professor da FFCL da Universidade Mackenzie desde 1956, Jacy
Monteiro foi convidado a paraninfar a turma de 1959. Na presença do Magnífico
Reitor Dr. Antonio Luiz Hipólito, do Presidente do Instituto Mackenzie, Dr. Peter
Barker e do Diretor da FFCL do Mackenzie, Dr. Willie Maurer, Jacy Monteiro
pronunciou seu discurso perante professores, alunos e familiares ali presentes.
Dirigindo-se especialmente aos formandos que, a partir daquele momento,
segundo suas próprias palavras, tornaram-se seus colegas de profissão, seu
pronunciamento versou, como tema de reflexão comum, sobre a formação,
objetivos e ideais das Faculdades de Filosofia. Este é o único documento de que
dispomos, no qual temos a oportunidade de tomar conhecimento sobre assuntos
escritos por Jacy Monteiro, os quais diferem da teoria matemática encontrada em
326
suas obras. Reveste-se, pois, esse documento de importância, porquanto
passamos a ter uma noção de algumas de suas idéias sobre o ensino, ao menos
no que tange àquele período.
Assim, para Jacy Monteiro, a racionalização dos diferentes modos de vida,
tão almejada pelas sociedades modernas, só é possível por meio da ciência e das
técnicas que dela derivam, as quais se tornam atuantes nos diversos setores
sociais. Desse modo, os centros de estudos deveriam conscientizar-se da
importância que exercem, uma vez que eram detentores do fator de alteração e
aperfeiçoamento das sociedades modernas.
Essas considerações revelavam o papel fundamental exercido pelas
faculdades de filosofia, especialmente em sociedades como a brasileira, em que o
desenvolvimento científico encontrava-se ainda incipiente.
Para Jacy Monteiro, as Faculdades de Filosofia teriam por função, além de
transmitir conhecimentos já adquiridos, criar condições satisfatórias à produção
de novos conhecimentos, ou seja, não se limitariam a formar apenas professores,
mas também pesquisadores. Enfim, elas deveriam “exprimir o clímax do
desenvolvimento intelectual atingido ela sociedade que a encerra, num dado
momento” (MONTEIRO, 1959).
Não se tratava, entretanto, de relegar a formação de professores a um
segundo plano, uma vez que para Jacy Monteiro exercer o magistério implicava
em responsabilidade tamanha, que não ser restringia a simples transmissão de
conhecimento aprendido, mas na incessante busca de verdades novas:
Poderemos admitir a pesquisa sem o magistério; nunca o
magistério sem pesquisa; senão, o professor se arrisca a parar no
tempo, a perder o contato com as novas realidades e portanto,
condenado a estiolar-se numa cátedra que ele não estará mais
em condições de possuir (MONTEIRO, 1959).
Além disso, carecia observar que a pesquisa não é fruto do isolamento e
sim, de uma instituição organizada, em que forças materiais e intelectuais se
unem e produzem um ambiente propício ao seu aparecimento. Para tanto, seriam
necessários cuidados contínuos para que a pesquisa aconteça. Um deles é o
auxílio financeiro, vital para promover um funcionamento perfeito da instituição.
327
O custeio de bolsas de estudo, o aparelhamento de laboratórios
capazes de atender às reais necessidades de estudo, o
equipamento de bibliotecas especializadas, são fases de
formação de um clima intelectual, que não são possíveis sem a
inversão de grandes somas (MONTEIRO, 1959).
Para Jacy Monteiro, contar com notáveis professores, por si só, também
não serviria para garantir o nível intelectual da faculdade. Mais do que isso, o
conhecimento e experiência desses ilustres mestres deveriam prosseguir além
deles, continuando a obra principiada, numa auto-renovação constante desses
mesmos valores.
Outro aspecto considerado relevante por Jacy Monteiro dizia respeito à
importância de se conseguir um corpo docente com dedicação exclusiva à
Faculdade, especificamente aquela da Universidade Mackenzie, à qual se dirigia,
de modo a garantir a assistência exigida pelo ensino de nível superior.
Finalizando seu discurso, Jacy Monteiro exortou os formandos a não
abandonar os estudos, pois o que aprenderam durante suas vidas acadêmicas
era, em sua opinião, uma pequena parcela e preparação para novos e melhores
estudos.
Sobre esse discurso, pode-se notar que Jacy Monteiro dirigiu-se aos
formandos como colegas, procurando falar, dessa forma, “de igual para igual”, o
que multiplicava as chances de ser ouvido e seguido. Nesse sentido, lembramos
a linguagem utilizada por Sangiorgi, em seus livros didáticos durante o MMM, em
que este autor buscou utilizar uma linguagem menos formal, buscando por esse
processo, estabelecer uma comunicação mais afável com seu leitor, preparando,
assim, o terreno de modo a motivá-lo para uma melhor aceitação quanto aos
conteúdos modernos que estavam sendo apresentados na obra. Esse novo modo
de comunicação representava também a inovação, o moderno.
Além disso, observa-se que Jacy Monteiro (1959), concebia a pesquisa
como condição sine qua non para o exercício do magistério, o qual deveria “ser o
resultado de uma vida dedicada à procura de verdades novas”. Esta posição
converge para os dizeres de Belhoste (1998), quando defende que o ensino tem
um papel decisivo não somente na difusão e transmissão do saber, mas também
328
na constituição da matemática enquanto ciência, posto que, por meio da pesquisa
é possível chegar à invenção de novos conceitos, métodos e teorias, contribuindo,
assim, para a organização do saber matemático.
9.7. Participando das atividades do GEEM
Em outubro de 1961, foi criado o GEEM, cuja proposta era fundamentada
no SMSG, sob a presidência o professor Osvaldo Sangiorgi. Considerado de
utilidade pública pela Lei 2663/63, da Assembléia Legislativa do Estado
(D’AMBROSIO, 1987), tendo como pretensão incentivar, divulgar e atualizar a
matemática, bem como o seu ensino, nos cursos primário, secundário e normal,
principalmente nos estabelecimentos do Estado de São Paulo, através da
cooperação direta da Secretaria dos Negócios da Educação de São Paulo
(GEEM, 1962). A chamada Matemática Moderna chegava,
... a galope, até nós e o GEEM se constituía no primeiro núcleo
brasileiro de professores universitários da USP, U. Mackenzie e U.
Católica, com o objetivo de levar aos professores secundários de
Matemática suas novas mensagens que efervesciam em outros
países, notadamente nos USA, França e Bélgica (SANGIORGI,
1975).
Antes mesmo da criação do grupo, já se observava a participação de Jacy
Monteiro nas reformulações do ensino de matemática na escola brasileira. Sua
presença foi destacada num curso realizado em Santos, em julho de 1961, sob o
patrocínio da CADES, que tinha como propósito apresentar conteúdos de MM aos
professores secundaristas, e dividia-se em três módulos, sendo que Teoria dos
Conjuntos e Lógica foi ministrado por Osvaldo Sangiorgi, Álgebra abstrata pelo
professor George Springer e Álgebra Moderna e Prática de Ensino por Jacy
Monteiro.
No mesmo ano, de 01 de agosto a 30 de setembro, foi realizado o um
Primeiro Curso de Aperfeiçoamento para Professores Secundários de
Matemática, na Universidade do Mackenzie, em São Paulo. Novamente contou
com a coordenação de George Springer, encarregado de ministrar o curso de
Lógica Matemática e Jacy Monteiro, o curso de Álgebra Moderna, que segundo
329
Sangiorgi (1975), “pela primeira vez era oferecido a um grande número de
professores secundários do Estado”.
Os cursos oficiais do GEEM eram oferecidos nos meses de janeiro,
fevereiro e julho de cada ano, na Universidade Mackenzie. Os membros do
GEEM reuniam-se geralmente aos sábados com a finalidade de debater sobre o
ensino da Matemática Moderna, por meio de textos escritos pelos integrantes do
grupo ou pautados em publicações já existentes, como as do SMSG. Também
eram relatadas as atividades que os membros estavam realizando
individualmente, como experimentos com alunos e professores e textos baseados
nessas experiências.
Em agosto, setembro, outubro e novembro de 1963, foram promovidos
diversos cursos pelo GEEM, ministrados por professores do Estado de São Paulo,
dentre eles, Jacy Monteiro, que ministrou, nos dias 21 e 28 de setembro, um
curso de “Iniciação à Álgebra Moderna”. (Jornal A Gazeta, 19 set. 1963).
No aniversário do GEEM, nos dias 19 e 26 de outubro de 1963, em
comemoração do seu primeiro aniversario, foram realizados sessões de estudos e
palestras em que Jacy Monteiro dirigiu o curso referente à álgebra moderna e
Irineu Bicudo as aulas práticas (Jornal O Estado de São Paulo, 17 out. 1963).
Em 1965, ministrou curso de Álgebra Moderna 2, no curso de férias
oferecido de 01 a 13 de fevereiro, com a participação de 400 professores,
“provenientes de todos os estados do Brasil, inclusive do Acre, juntamente com
um representante da Nicarágua e outro da Argentina, registra a maior participação
coletiva de professores de matemática em São Paulo” (Jornal O Estado de São
Paulo, 07 fev. 1965)
A estrutura dos cursos do GEEM era baseada em estágios. Divididos em
estágios, o primeiro voltado para professores de matemática que estavam
iniciando nas novas técnicas de ensino da matemática, e o segundo, no qual Jacy
Monteiro se apresentava como professor-formador, direcionado àqueles que
buscavam se aperfeiçoar nesse campo. Nessa condição, Jacy Monteiro participou
do curso de férias realizado em janeiro de 1967, de 2 a 21 de janeiro, das 8 às 18
horas. (Jornal Folha de São Paulo, 15 jan. 1967). Alguns cursos possuíam três
330
estágios, e no caso do terceiro estagio, era geralmente destinado a palestras,
debates, relatos de experiência dos professores-alunos. As disciplinas eram, de
modo geral, as mesmas do segundo estágio (ROSA LIMA, 2006).
O curso de férias de 1967, de 02 a 21 de janeiro, foi dividido em dois
estágios. Para o primeiro estágio foram oferecidas aulas sobre Teoria dos
Conjuntos, a cargo de Benedito Castrucci e René Charlier e Lógica Matemática
ministrada por Osvaldo Sangiorgi e Lucília Bechara. As sessões de exercícios e
estudos estiveram sob orientação de Clara Betanho Leite, Silvio de Lima
Nepomuceno e Douglas P. Bellomo. Para o segundo estágio, foram ministrados
os cursos de Álgebra Moderna pelo professor Irineu Bicudo; Matrizes, por Jacy
Monteiro; Álgebra Linear, por Carlos Callioli; Topologia, por Albert Hopmannn e
Introdução ao Cálculo, por Alésio de Caroli. As sessões de exercícios e estudos
nesse estágio ficou sob a responsabilidade dos professores Renate Watanabe e
José Bezerra Leite. Além das aulas, ainda ocorreram palestras ministradas por
Omar Catunda sobre Geometria Moderna e Douglas Belluomo, sobre
Probabilidade e Estatística (Jornal Folha de São Paulo, 24 jan. 1967).
Em 14 de abril de 1968, o Jornal “O Estado de São Paulo” publicou que
assumiu a nova diretoria do GEEM, para o biênio 68-69, permanecendo na
presidência o professor Osvaldo Sangiorgi, tendo como vice-presidente Alcides
Bóscolo. Para presidente do Conselho Consultivo, elegeu-se Benedito Castrucci e
para Direção de Publicações, foi reeleito Jacy Monteiro (O Estado de São Paulo,
14 abr. 1968). Ainda no ano de 1968, na qualidade de professor-formador, Jacy
Monteiro ministrou Álgebra Moderna 2, Polinômios e Equações Algébricas (ROSA
LIMA, 2006).
Jacy Monteiro também integrou a comissão central organizadora da 1ª
Olimpíada de Matemática, realizado no Estado de São Paulo, sob os auspícios do
GEEM e colaboração do Serviço do Ensino Secundário e Normal do
Departamento de Educação do Estado de São Paulo. A manchete do Jornal A
Gazeta Esportiva, em 08 de outubro de 1967, assim anunciava: “1ª Olimpíada de
Matemática reúne 100.000 colegiais”. A Olimpíada, que contou com alunos da 1ª
e 2ª séries do ciclo ginasial, tinha como principais objetivos estimular os
estudantes secundários ao estudo da matemática, despertar a atenção das
331
autoridades para a pesquisa e suscitar o interesse pela reestruturação e
modernização do ensino da matemática.
Segundo a matéria jornalística, os trabalhos foram coordenados pelos
professores Alcides Bóscolo e Osvaldo Sangiorgi, assessorados por uma
comissão formada pelos professores Benedito Castrucci, L. H. Jacy Monteiro,
Mário Omura, Renate Watanabe, Clara Betanho Leite, Sílvio de Lima
Nepomuceno, Raquel Geverts, Lucília Bechara, Lafayette de Morais, Aroldo de
Barros Salles e Roberto Antonio Stempniak.
Embora Sangiorgi constasse como um dos principais coordenadores do
evento, não se encontrava em São Paulo naquela ocasião. Um cartão postal
enviado a Jacy Monteiro, em 17 de outubro de 1967, informa que Sangiorgi
estava na cidade de Leningrado. De lá, perguntava ao amigo Jacy: “Muita
novidade? Como foi o final da Olimpíada?”
9.8. Jacy Monteiro e a Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Rio Claro
Reportamo-nos a um dos postais cedidos por Layse Helena Jacy Monteiro
para nossa consulta, conforme já nos referimos neste trabalho, mais
especificamente a um datado de julho de 1962. Este foi remetido da cidade de
Estocolmo e leva a assinatura de “Germano
116
, figurando como destinatário o
professor Jacy Monteiro. Germano informava que tinha participado de um
Simpósio de Matemática em Copenhagem. O postal foi endereçado à Faculdade
de Filosofia de Rio Claro, o que nos fez pressupor que Jacy Monteiro mantinha
certo vínculo profissional com aquela Instituição Superior de Ensino.
Esta informação coincide com os dados encontrados na Introdução da
coleção “Álgebra moderna”, de autoria de Jacy Monteiro, composta por dois
volumes e datada de 1963. Foi redigida com vistas ao estudo da Álgebra Moderna
para o primeiro ano de cursos de matemática de faculdades de filosofia. O autor
informa que a coleção teve sua origem em notas de aula de um curso realizado
116
É possível tratar-se de Germano Braga Rego, diplomado em 1949 em Ciências Matemáticas pela
FFCLUSP, conforme indica o Anuário de 1951.
332
na FFCL de Rio Claro, ministrado pelo professor J. Milano, sob orientação dele,
Jacy Monteiro.
Da conjugação dessas informações, podemos inferir que Jacy Monteiro
deu sua contribuição para o desenvolvimento do Curso de Matemática, junto à
Faculdade de Filosofia de Rio Claro, nos idos de 1962/1963.
Sobre o teor dessa coleção, cabe ainda tecer algumas considerações, que
entendemos necessárias para se verificar o caráter, o nível e objetivos de Jacy
Monteiro, até mesmo em relação ao ensino secundário.
Nesse sentido, verifica-se que o primeiro volume dessa coleção
desenvolve, além de noções da Teoria dos Conjuntos, conteúdos dos números
naturais, números inteiros, anéis e corpos, corpo de frações de um anel de
integridade e anéis e corpos ordenados. O segundo volume compreende os
assuntos sobre corpo dos números reais e corpo dos números complexos, anéis
de polinômios, anéis fatoriais e teoria dos grupos.
O autor chama a atenção para a circunstância de que o assunto se reveste
de grande valia também para conhecimento dos professores secundaristas:
... o presente trabalho será de grande utilidade para um novo
entendimento do ensino da matemática no curso secundário
(entendimento este que já vem se processando atualmente),
encontrando os professores uma nova formulação da Álgebra,
que, com as devidas modificações, poderá ser adaptada e
ministrada nesse nível de ensino (MONTEIRO, 1963).
Ao professor sempre será concedida a faculdade de fazer modificações e
adequações de conteúdos matemáticos que possibilitem sua inserção em
qualquer nível de ensino. Essa apropriação, pelo visto, é concebida por Jacy
Monteiro e revela-se em suas práticas acadêmicas. Além disso, em decorrência
de tal procedimento, pode-se dizer que o matemático, ou seja, aquele
responsável pela pesquisa e produção matemática, nem sempre se encontra à
margem de uma preocupação com o ensino dessa matéria.
333
9.9. Jacy Monteiro e a Faculdade de Filosofia da Universidade Católica de
Santos
Nos anos 1968 e 1969, na cidade de Santos, por meio de convênio firmado
entre a Secretaria de Educação e a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de
Santos foi realizado um curso oferecido pelo GEEM, com o título: “Curso de
Matemática Moderna”, para professores do ensino secundário, sendo ministrado,
entre outros, pelos professores Irineu Bicudo, Scipione di Pierro Netto, Benedito
Castrucci, Osvaldo Sangiorgi e Jacy Monteiro (SOUZA, 1998).
Com as aulas promovidas pelo GEEM na cidade de Santos, um grupo de
participantes cogitou da viabilização de um curso de pós-graduação em
matemática, naquela mesma cidade, pois havia uma dificuldade de locomoção à
cidade universitária para cursá-lo, além de exigir um tempo dispendioso para
cobrir o percurso até a USP.
Esse grupo que era composto entre outros, pelos professores Almerindo
Marques Bastos, Sylvio Andraus, Maria Lúcia Martins Demar Perez, Maria Luiza
Carmo Neves, e Rosa Dias, tomou a iniciativa de implantar um curso de pós-
graduação em Santos. Após obterem autorização do diretor do IMEUSP, na
época o professor Chaim Hönig, para ser criado o curso de pós-graduação que
pretendiam, dirigiram-se à residência de Jacy Monteiro, propondo-lhe, então, que
ministrasse esse curso. Depois de aceitar o convite, Jacy Monteiro se propôs a
ministrar o curso denominado “Teoria dos Grupos Comutativos”, realizado no
prédio da Faculdade de Filosofia da Universidade Católica de Santos, com
duração de 4 meses, nos mesmos moldes da USP (BASTOS, apud SOUZA,
1998).
Almerindo Marques Bastos detalhou a dinâmica pela qual se deram os
primeiros passos direcionados à implantação daquele curso almejado pelo grupo:
Combinamos que ele daria duas aulas todos os sábados. Nos
sábados em que ele não pudesse vir, ele nos avisaria. Nós
pagaríamos duas aulas, mais quatro excedentes pela viagem.
Então ele daria duas e receberia por seis. Era uma forma de
compensá-lo satisfatoriamente, porque o Jacy era um nome
internacional. Ele concordou. Fizemos o curso de Teoria dos
Grupos, aqui em Santos, sem precisar ir à Cidade Universitária.
334
[...] A Teoria dos Grupos que o Jacy deu aqui foi bem pesada. Isso
ocorreu no primeiro semestre de 1971. Nós éramos doze. Eu ia
buscar o Jacy lá na Rodoviária e o levava depois (BASTOS, apud
SOUZA, 1998, p. 184).
Ainda segundo Almerindo Bastos, devido a dificuldades financeiras
enfrentadas pelo grupo, o curso oferecido por Jacy Monteiro acabou sendo
ministrado gratuitamente, “pois o Jacy, de uma lisura impecável, endossou o
cheque e nos deu de presente” (apud SOUZA, 1998, p. 185).
Ao aceitar e oferecer aos professores santistas aquela oportunidade de
atualização de conteúdos matemáticos, por meio da implantação do curso de pós-
graduação naquela cidade, Jacy Monteiro revelava sua conduta de fidelidade aos
princípios que proclamou em seu discurso como paraninfo da turma de 1959 da
Universidade Mackenzie, pois ali defendeu a renovação de uma prática
educacional, como resultado de forças convergentes para a junção do estudo e
da pesquisa, de modo que o professor pudesse aperfeiçoar-se e, ao mesmo
tempo, promover o desenvolvimento da sociedade em que estava inserido. O
tema escolhido para o curso, relativo à Álgebra Moderna, também vem ao
encontro desse posicionamento, pois se tratava de assunto condizente com a
nova matemática a ser ensinada nas escolas secundárias.
Cumpre também destacar que, Jacy Monteiro organizou curso de pós-
graduação, na área de Álgebra, para professores licenciados em Matemática da
cidade de Santos, em 1971 (BASTOS, apud SOUZA, 1998) e da Alta
Sorocabana/SP, a partir de agosto de 1973, para 37 professores matriculados
(FFCLPP, 1973, p. 36). Além disso, em 1973, foi oferecido o primeiro curso de
especialização em Matemática da Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá,
com um quadro docente formado por Osvaldo Sangiorgi, Renate Watanabe,
Paulo Boulos e Jacy Monteiro (UFMT, 2007). Segundo informações de Layse H.
Monteiro (2007), nesse período, Jacy Monteiro visitava a UFMT a cada 15 dias.
9.10. Jacy Monteiro e a Universidade de Brasília
Em 18 de julho de 1962, Jacy Monteiro encontrava-se em Brasília. De lá
escreveu para sua filha informando que “A maior parte do tempo passo na
335
Universidade e no Ministério da Saúde (onde dou as aulas)”. Suas despesas eram
custeadas, segundo se extrai do postal, pela Universidade de Brasília.
(MONTEIRO, 1962a). No dia 21 do mesmo mês, escreveu novamente para Layse
Helena, fazendo constar que estava “no aeroporto esperando o Sangiorgi e Cia.
Matemática” (MONTEIRO, 1962b). Voltou para a cidade de São Paulo no dia 29.
Em 05 de fevereiro de 1964, retornou a Brasília. Dessa cidade, envia
novamente um cartão postal para a filha, informando que recebeu 500.000
cruzeiros
117
pela participação no trabalho que lá executava. Encontrava-se outra
vez em Brasília em 6 de outubro de 1964, quando escreveu outro postal para a
filha: “Por aqui não há tempo para nada de bom: só reuniões e discussões”
(MONTEIRO, 1964b). Os dados contidos nesses postais provocaram alguns
questionamentos, a saber: Que trabalho era esse, que Jacy Monteiro exercia
junto à Universidade de Brasília? O que Sangiorgi e “Companhia Matemática”
foram fazer em Brasília?
Na busca de respostas para essas questões, lembramos que em 1962, o
Departamento de Matemática da Universidade de Brasília iniciou suas atividades.
Em fevereiro daquele ano, sob a coordenação de Leopoldo Nachbin começou a
funcionar o Instituto Central de Matemática da UnB. Esse instituto contava, ainda,
com a colaboração dos matemáticos Djairo Guedes de Figueiredo e Geraldo
Severo de Souza Ávila. Segundo informações de Clóvis Pereira da Silva (2003a),
aos poucos foram sendo agregados outros doutores advindos de instituições da
cidade do Rio de Janeiro e São Paulo. A partir de setembro de 1962, a direção do
Departamento de Matemática da UnB começou a organizar um programa de
Mestrado em Matemática. Os primeiros frutos desse trabalho surgiram em julho
de 1964, quando os alunos Mário Carvalho de Matos e Mauro Bianchini
receberam os primeiros graus de mestre em Ciências Matemáticas concedidos
por uma instituição brasileira.
Entramos em contato com o professor Mário Carvalho de Matos, que nos
garantiu, via correio eletrônico (e-mail), ter tido aulas com Jacy Monteiro no curso
de Mestrado oferecido pela UnB. Segundo esse professor, na UnB, naquela
117
De acordo com a tabela “Salário Mínimo (piso)”, de 24 de fevereiro de 1964 até 01 de março 1965, o
salário mínimo era de 42.000 cruzeiros. 500000 cruzeiros correspondia, portanto, aproximadamente a 12
salários mínimos (AGENDA DO MAGISTRADO, 1997).
336
época, não havia professores especialistas em Álgebra, daí os convites da
diretoria do Departamento de Matemática para Jacy Monteiro ministrar aulas de
Álgebra e Álgebra Linear.
9.11. Obras publicadas
Jacy Monteiro produziu diversos trabalhos, entre os quais citamos “Álgebra
Moderna” vol. I de 1963, e vol. II, de 1964; “Álgebra Linear I”, 6ª ed., de 1969;
“Álgebra Linear II”, 1ª ed., de 1970; “Iniciação às estruturas algébricas”, 1ª ed., de
1968 e 5ª ed., de 1973; “Elementos de álgebra”, 1ª ed., de 1969 e 3ª reimpressão
em 1974, com tiragem de 4000 exemplares. Como observamos, o número de
edições atingido por algumas dessas obras, atestam o sucesso de vendas
alcançado por Jacy Monteiro, ao publicar os cursos que desenvolvia na USP,
tanto no que diz respeito ao tratamento da Álgebra quanto da Álgebra Linear.
Talvez o sucesso obtido com a publicação dessas obras acrescido do fato
de que Jacy Monteiro tinha larga experiência junto a conselhos editoriais, tenha
motivado o autor a aceitar o convite de Sangiorgi para, juntamente com Renate
Watanabe, enveredar-se na escrita de um livro didático destinado ao 2º ciclo em
1970. Sangiorgi, por sua vez, havia alcançado, até então, espetacular sucesso
com seus livros didáticos para o ginásio e, para a elaboração de uma coleção
voltada ao ensino médio, é possível que necessitasse cercar-se de indivíduos de
competência indiscutível na área da ciência matemática. Assim sendo, nas
condições de velhos amigos, colegas no GEEM e afinidades profissionais, tudo
apontava para circunstâncias favoráveis na realização de um livro-texto com ares
modernos.
9.12. Publicações no GEEM: “Iniciação às estruturas algébricas
O GEEM lançou, em 1968, dentro da série “Professor”, volume 6, a obra
Iniciação às estruturas algébricas” de autoria de Jacy Monteiro, dedicado ao 1º e
2º ciclo do curso colegial. Na apresentação do livro, há um agradecimento à
Renate Watanabe, por ter feito a leitura dos originais e incluído sugestões.
337
A obra encontra-se dividida em quatro partes, sendo a primeira destinada
ao estudo das relações, a segunda ao estudo das aplicações, a terceira ao estudo
das operações e suas respectivas propriedades estruturais e a última, aos grupos,
anéis e corpos.
Segundo a apresentação contida na obra, o autor procurou, no capítulo
quatro, enfatizar o tratamento da estrutura de grupo, cujo estudo considerou de
fundamental importância a todo professor secundário de matemática.
Dentre os autores que constam na bibliografia da obra, destacamos
Benedito Castrucci, com os “Elementos de teoria dos conjuntos”, o próprio Jacy
Monteiro, com a obra “Elementos de álgebra” e o programa de autoria do OECE,
Um programa moderno de matemática para o ensino secundário”.
Encontramos dentro do livro, de propriedade de Jacy Monteiro, uma carta
de autoria de Eduardo Sá Pereira, da cidade de Lisboa, que, em 24 de fevereiro
de 1972, assim se refere à obra:
Um livro de estudo, sobretudo para os autodidatas e para os que
hão-de lecionar, é a “Iniciação às estruturas algébricas”, com as
restantes obras da prestantíssima “Série Professor”, constituem
um ‘conjunto’ de inegável mérito.
Este cresceria se, em correspondência, houvesse um ‘livro-do-
mestre’, contendo as recomendações afins e as soluções ou,
apenas, os resultados dos numerosos exercícios propostos,
acompanhados de sugestões que facilitassem o alcançá-los.
Entre os que – creio bem – serão grande número de concordantes
com existência de um tal livro, me conto, pedindo desculpas
imediata se é inoportuna ou descabida a pretensão.
Na esperança de que isso possa vir a acontecer, apresento
respeitosos cumprimentos ao subscrever-me (SÁ PEREIRA,
1972).
9.13. Publicações no GEEM: “Polinômios
Segundo informa a apresentação da obra “Polinômios”, de autoria de Jacy
Monteiro, lançada em 1970, no volume 7 da Série Professor do GEEM, trata-se
de uma publicação que visava dar continuidade à obra “Iniciação às estruturas
338
algébricas”, publicadas no volume 6 e contendo ao todo quatro capítulos. Desse
modo, o livro “Polinômios” contém dois capítulos, iniciando pelo capítulo V, sobre
polinômios e em seguida, capítulo VI, referente à Divisibilidade. Apresenta, ainda,
um apêndice, sobre “Anéis euclidianos”.
Porquanto o capítulo IV promover um estudo comparativo entre
divisibilidade dos números inteiros e a divisibilidade dos polinômios, o autor usou
as páginas de números pares para o estudo da primeira divisibilidade e as
páginas de números ímpares para o estudo da segunda.
Assim, a apresentação da obra traz o seguinte exemplo:
na página 146 na página 147
6.2.2 – Todo número inteiro a, com 1 a ,
pode ser representado de modo único sob a
forma
(11)
s
pppa ...)1(
21
r
Onde cada é um número primo positivo
(logo, o primeiro fator é igual a 1 ou a -1
conforme a > 0 ou a < 0.
i
p
6.2.2 – Todo polinômio não constante
>@
xkf pode ser representado de modo
único sob a forma
(11)
s
ppapf ...
21
Onde cada
i
p
>@
xk é irredutível e unitário e
a é uma constante (logo, a é o coeficiente
dominante de f).
(MONTEIRO, 1970, p. 5,6).
Essa forma de apresentação, embora não revelada pelo autor, indica um
esforço para tornar mais eficiente a compreensão do assunto tratado, no sentido
de que o leitor, por comparação dos itens, poderia fazer uma analogia ao que
provavelmente já seria de seu conhecimento, no caso, a divisibilidade dos
números inteiros e o novo assunto, objeto da obra, a divisibilidade dos polinômios.
A apresentação também ressalta a importância desse assunto para os
professores do ensino do segundo ciclo, uma vez que ela assegura o caráter
estrutural do moderno tratamento da Matemática, como ainda, representa uma
introdução para o estudo das equações algébricas.
339
9.14. Matemática: Curso Moderno, segundo ciclo
Ao caríssimo Jacy
“não retiro nenhuma palavra”
SP. 28/04/66
Osvaldo Sangiorgi
Com esses dizeres Sangiorgi dedicou a Jacy Monteiro um exemplar do
terceiro volume do livro didático “Matemática: curso moderno” para o ginásio, que
acabara de lançar. As palavras de Sangiorgi nos levam a imaginar que Jacy
Monteiro, em algum momento anterior, tenha expressado provável manifestação
de humildade, recusando-se, talvez, por aceitar algum elogio do amigo Sangiorgi,
colocando-se em posição de quem não havia feito por merecer tal tributo.
Sangiorgi, no entanto, aproveitou aquela oportunidade de oferecimento do livro
para ratificar seu pensamento, discordando carinhosa e respeitosamente do
posicionamento de Jacy Monteiro, escrevendo poucas, mas resolutas palavras,
que trazem implicitamente, pelo tom utilizado, profunda demonstração de apreço
àquele a quem oferecia o exemplar, como revelam os dizeres que ocuparam boa
parte de uma das páginas iniciais da obra.
Para uma incursão sobre o que estaria por trás daquela forma de
comunicação, expressa naquela dedicatória, nos apegamos aos ensinamentos
expostos por De Certeau (1982, p. 83), o qual se debruçou sobre o sentido do
fazer do historiador: "Não se trata apenas de fazer falar esses 'imensos setores
adormecidos da documentação' e dar voz a um silêncio, ou efetividade a um
possível. Significa transformar alguma coisa". Posteriormente, complementou:
"um trabalho é científico quando opera uma redistribuição do espaço e consiste,
primordialmente, em se dar um lugar, pelo estabelecimento de fontes – quer dizer,
por uma ação instauradora e por técnicas transformadoras". Entendemos que
para que essa ação se transforme em outro discurso científico, ou num fato
histórico, além de fazer falar os documentos, faz-se necessário dar a essa fala
uma interpretação, uma análise, uma crítica, que modifique o lugar social de onde
se fala, amplie o espaço.
Ler, segundo De Certeau (2002, p. 264), é “peregrinar por um sistema
imposto”, qual seja, o texto, tido aqui como um lugar, constituído num próprio,
num sistema de signos dispostos em determinada ordem. Assim sendo, a
340
comunicação entre Sangiorgi e Jacy Monteiro torna-se significativa,
transformadora, na medida em que deixa transparecer fortes laços de amizade
que uniam o educador matemático Sangiorgi e o matemático Jacy Monteiro.
Destaque-se, que foi um livro didático, o lugar eleito pelo educador matemático
para perpetuar sua mensagem sobre o que pensava a respeito do amigo.
Na condição de amigos de longa data e parceiros nas atividades do GEEM,
Sangiorgi convidou Jacy Monteiro para, juntamente com a professora Renate
Gompertz Watanabe, escrever um livro didático dedicado ao ciclo colegial.
Assim, no dia 15 de janeiro de 1970, a Companhia Editora Nacional lançou
uma carta aberta aos professores de matemática, anunciando que estaria
lançando o livro didático “Matemática: Curso Moderno, 2º Ciclo”, volume 1, de
autoria dos professores L.H. Jacy Monteiro, Osvaldo Sangiorgi e Renate G.
Watanabe. O compêndio, distribuído inicialmente em caráter preliminar, pretendia
atender especialmente:
a) à urgência de sua elaboração para aproveitamento ainda no
ano letivo de 1970;
b) à importância do conhecimento de opiniões e de sugestões de
professores que, adotando o livro, poderão, com sua vivência
no ensino, contribuir para melhor aproveitamento da edição
definitiva (COMPANHIA EDITORA NACIONAL, 1970).
Tratava-se, pois, de uma edição preliminar e, ainda segundo a nota, uma
inovação editorial no Brasil, a exemplo do que já vinha ocorrendo nos Estados
Unidos, de modo a reunir subsídios para que a edição definitiva, programada para
1971, fosse publicada sem pequenos defeitos de forma e conteúdo, inevitáveis
em primeiras edições, além de prevenir sobre modificações que continuavam a
ocorrer na organização curricular dos cursos colegiais.
Quanto ao livro didático em si, visava, fundamentalmente, introduzir na
literatura matemática uma nova perspectiva na formação cientifica moderna dos
alunos do 2º ciclo, procurando implantar um novo grau de rigor, perante às
exigências das escolas superiores, aos estudantes egressos dos cursos de 1º
ciclo e desejosos de continuar seus estudos.
341
O anúncio daquele lançamento também prenunciava o sucesso de vendas
do novo livro didático, sustentando-se na longa experiência dos autores no
magistério brasileiro e nos seus contínuos trabalhos ligados ao ensino da
matemática. Além disso, em nota da editora constante da edição preliminar,
menciona-se que a idéia de elaborar o livro didático surgiu a partir de insistentes
pedidos de numerosos professores, os quais aguardavam uma publicação de um
compêndio de nível colegial de Matemática Moderna, que atendesse, assim, a
reformulação do ensino conforme vinha sendo implementada.
Sangiorgi, naquela altura, já se encontrava numa posição destacada junto
à Cia. Editora Nacional, mantendo também boas relações com professores,
órgãos públicos e imprensa. Diante do inegável sucesso de vendagem do livro
didático para o ginásio enfocando a Matemática Moderna, era seu desejo dar
continuidade à coleção, escrevendo uma outra dedicada ao colegial.
Para a empreitada, Sangiorgi convidou os amigos e ativos participantes do
GEEM, Luiz Henrique Jacy Monteiro e Renate Watanabe, ambos com titulação
em matemática pura, sendo que Watanabe obteve o título de Mestre em
Matemática pela Universidade Illinois, nos Estados Unidos (WATANABE, 2007).
Para a escrita da coleção, Watanabe lembra que:
No que se refere à Matemática, tínhamos conhecimentos
suficientes, provenientes de anos de estudos.
Em relação à Matemática Moderna:
Professor Jacy havia traduzido o livro “Um programme moderne
de mathématiques pour l´enseignement secondaire” O.E.C.E., que
foi publicado pelo GEEM. Eu havia ficado um ano em Illinois onde
mantive contato com o UICSM. No Brasil, os livros do SMSG já
haviam sido traduzidos. A convite do GEEM, estiveram no Brasil
professores dos Estados Unidos e da Europa envolvidos no
ensino da Matemática Moderna. Assim, tínhamos várias fontes
para tomar conhecimento do que vinha acontecendo mundo afora.
Além disso, ainda segundo informações fornecidas por Watanabe (2007),
os autores escreviam, liam tudo o que era escrito e se reuniam freqüentemente
para discutir juntos os manuscritos. Foi, de acordo com Watanabe, uma coleção
escrita a seis mãos.
342
A edição preliminar apresenta-se impressa de
forma simples, aparentando uma apostila
mimeografada. Na capa, plastificada, imperam tons de
verde, encontrando-se ainda ilustrada por
representações figurais composta por gráficos e
diagramas. Todos os textos e ilustrações empregados
no interior da obra foram impressos em cor preta,
denotando também, o caráter experimental e transitório
daquela edição-piloto.
Quanto aos lançamentos posteriores, de caráter definitivo, estes
apresentam uma produção mais elaborada. A capa, igualmente plastificada, em
tons de amarelo para a primeira série e verde para a segunda série, apresentam a
mesma ilustração, composta por um círculo contendo em seu interior outros
círculos e semicírculos. Os caracteres que compõem o texto interno da coleção
são menores do que aqueles utilizados para a edição preliminar, fazendo com que
a espessura do livro da primeira série seja menor do que aquela da edição-piloto.
A abordagem utilizada pelos autores pressupõe uma preocupação em
produzir um texto priorizando a linguagem matemática de forma rigorosa, em que
os conceitos são abordados com profundidade, conforme a própria divulgação
promovida pela editora.
Ainda sobre a organização do grupo para a feitura do livro, segundo
entrevista de Renate Watanabe concedida aos professores Wagner Rodrigues
Valente e Antonio José Lopes Bigode (fev. 2007), havia uma divisão de conteúdos
previamente estipulada. Cabia ao professor Jacy Monteiro a escrita da parte
relativa aos Conjuntos; a Sangiorgi, Geometria e a Watanabe, Progressão
Aritmética, Progressão Geométrica e Trigonometria. Essas partes referem-se ao
primeiro volume da série que, relativamente à edição preliminar, apresenta-se
distribuída da seguinte maneira:
1. Conjuntos
2. Relações
3. Aplicações
343
4. Progressões Aritméticas e Geométricas
5. Funções Circulares (ou Trigonométricas)
6. Resolução de Triângulos
7. O Sistema Geométrico [[, , , d, D]
8. Pontos, Retas e Planos no Espaço
[
9. Paralelismo e Perpendicularismo no Espaço
Testes de Vestibulares – 1967, 1968 e 1969 (MONTEIRO;
SANGIORGI; WATANABE, 1970, p. 7).
Em relação às outras edições, 2ª e 3ª edições, ambas de 1972, e portanto,
após a Lei nº. 5.692/71, (Lei de Diretrizes e Bases), por meio de comparação dos
Sumários apresentados, observa-se que a única modificação efetuada diz
respeito aos Testes de Vestibulares, constantes na edição preliminar e que foram
suprimidos nas edições posteriores.
Observando o programa proposto pela OECE para o segundo ciclo, que,
conforme declarou Watanabe foi um dos textos utilizados como parâmetro para a
escrita da obra, notamos que, para o primeiro ano, os autores seguem o
programa nos quesitos relativos a conjuntos, aplicações, relações (apresentando
noção de equivalência e de ordem). Além disso, o programa da OECE para o
primeiro ano, sugere somente uma introdução ao estudo da Teoria dos Conjuntos,
deixando a extensão do assunto para ser realizada no terceiro ano. Os autores,
no entanto, optaram por apresentar de uma única vez, o conteúdo da Teoria dos
Conjuntos, englobando os assuntos estipulados para o terceiro ano.
Entretanto, quanto às solicitações mais veementes da O.E.C.E,
relativamente à conceituação e desenvolvimento da teoria dos grupos, anéis e
corpos, não foram trabalhadas, nem ao menos foram sequer citadas. A sugestão
da introdução à teoria dos vetores e números complexos igualmente não foram
abordados.
Pode-se constatar a apropriação realizada pelos autores de postulados
enunciados por Moise & Downs, mais precisamente o postulado da distância
(indicado por D) e o postulado da régua (indicado por R):
344
No estudo axiomático que estamos fazendo, todos os fatos
relacionados com a distância entre dois pontos serão organizados
a partir de dois postulados (indicados pelas letras D, inicial da
palavra distância, e R, inicial da palavra régua) (MONTEIRO,
SANGIORGI, WATANABE, 1970, p. 317).
Assim, a geometria apresentada no primeiro volume da coleção utiliza-se
do conceito de distância, postulado da distância e postulado da régua, como
descritos na obra de Moise & Downs. O postulado da régua é enunciado da
seguinte forma pelos autores:
R – Postulado da régua
Os pontos de uma reta podem ser postos em correspondência
com os números reais de tal forma que:
R.1 A cada ponto da reta corresponde um e somente um número
real
R.2 A cada número real corresponde um e somente um ponto da
reta
R.3 A distância entre dois pontos é o valor absoluto da diferença
dos números reais correspondentes.
Este postulado é denominado postulado da régua porque
proporciona uma régua infinita que, colocada sobre qualquer reta,
permite determinar a distância entre dois pontos quaisquer [grifos
dos autores] (MONTEIRO, SANGIORGI, WATANABE, 1970, p.
319-320).
Comparando as duas obras, pode-se dizer que é praticamente o mesmo
texto do exemplar americano, com exceção de algumas palavras, que em nada
alteram o significado das afirmativas
118
.
Para as outras edições do primeiro volume, (2ª e 3ª edição), os autores
procederam a algumas modificações. Uma delas foi a inclusão de exercícios
resolvidos e a eliminação dos testes de vestibulares. O enunciado do postulado
da régua, por exemplo, foi modificado, ficando assim expresso:
118
O postulado da régua encontra-se enunciado da seguinte forma na obra de Moise & Downs “Os pontos de
uma reta podem ser postos em correspondência com os números reais, de tal modo que (1) a cada ponto da
reta corresponde exatamente um número real; (2) a cada número real corresponde exatamente a um ponto
da reta; e (3) a distância entre dois pontos quaisquer é o valor absoluto da diferença dos números
correspondentes. Chamamos esse postulado de Postulado da Régua, porque seu efeito é nos fornecer uma
régua infinita que pode ser colocada em toda reta e usada para medir a distância entre dois pontos” (1971, p.
30).
345
Consideremos uma reta r qualquer, e o conjunto R dos números
reais. Vale o seguinte postulado:
Existe uma aplicação bijetora f de r em R, tal que se P e Q são
dois pontos quaisquer de r, temos:
PQ)Q(f)P(f
Este postulado é denominado postulado da régua porque
proporciona uma régua infinita que, colocada sobre qualquer reta,
permite determinar a distância entre dois pontos quaisquer [grifos
dos autores] (MONTEIRO, SANGIORGI, WATANABE, 1972, p.
208).
O tratamento dado à definição do postulado da régua nesta edição é feito
pela representação algébrica de funções. A linguagem tornou-se mais simbólica,
exigindo do leitor, para entendimento do postulado, recorrer à noção de função,
explicitada no capítulo III, diferentemente daquela definida na edição anterior, em
que o postulado é explicado por meio de uma linguagem corrente, mais próxima
do aluno.
Quanto ao segundo volume, o sumário apresenta os seguintes tópicos:
- Matrizes;
- Sistemas Lineares e Determinantes;
- Análise Combinatória
- Probabilidade;
- Sólidos Geométricos;
Respostas (MONTEIRO; SANGIORGI; WATANABE, 1973, p. 7).
Observamos que, em relação ao programa sugerido pela O.E.C.E.,
somente os conteúdos relativos à Análise Combinatória e Probabilidade foram
contemplados pelos autores. Divisibilidade; anéis de polinômios, grupos
(isomorfismos e homomorfismos), estrutura axiomática do conjunto dos números
reais, assuntos que constam na lista da O.E.C.E. para o segundo ano, não foram
trabalhados.
E ainda, quanto à Geometria, nota-se que os autores não atenderam as
solicitações propostas pela O.E.C.E., cuja forma de desenvolvimento dos
assuntos sugere o emprego de métodos algébricos para a resolução de
problemas geométricos, enfatizando o estudo dos grupos de transformações e
346
dos vetores. Logo na introdução do segundo volume, datado de 1973, lêem-se os
seguintes dizeres, relativos ao tratamento dado à Geometria:
Todos sabem que o estudo da Geometria está em fase de
transição. Também no Brasil se registra uma insatisfação com o
tratamento clássico (axiomática de Hilbert). Por outro lado
considera-se um tanto prematuro apresentar neste Volume o
tratamento da Geometria com as ferramentas propiciadas pela
Álgebra Linear. Nestas condições, ficamos ainda com o
tratamento clássico, embora em ‘embalagem moderna’ e bem
atenuado com novas informações [grifos dos autores]
(MONTEIRO; SANGIORGI; WATANABE, 1973, p. 5).
O segundo volume do livro apresenta a bibliografia utilizada. Dentre eles,
destacamos o livro “Geometria Moderna” de Edwin. E. Moise e Floyd. L. Downs
Jr. (1971), traduzido por Renate Watanabe e Dorival Melo, confirmando a
incorporação do conceito de medida, apropriado da obra de Moise & Downs que,
por sua vez, alegam terem sido “fortemente influenciados pelo texto chamado
Geometria, escrito pelo School Mathematics Study Group (SMSG) [grifos dos
autores] (MOISE; DOWNS Jr, Prefácio, 1971).
Segundo Valente (2007), nos finais da década de sessenta, o MMM
apresentava os primeiros sinais de enfraquecimento, já não contava tanto com o
apoio resoluto da imprensa. Surgiram também outras coleções didáticas, que
igualmente disputavam o mercado editorial. Esses foram alguns dos motivos
pelos quais a coleção para o 2º. Ciclo parece não ter tido vida longa.
Posteriormente, em 1975, Sangiorgi deixou a co-autoria e a obra foi
interrompida sem que, dessa forma, tenha sido publicado o terceiro e último
volume. Uma nova coleção veio substituir aquela, ficando sua autoria a cargo dos
professores Jacy Monteiro, Renate Watanabe e Paulo Boulos. Neste mesmo ano,
Jacy Monteiro veio a falecer. A coleção continuou levando apenas os nomes de
Renate Watanabe e Paulo Boulos, o que nos leva a supor que Jacy Monteiro teve
pouca ou nenhuma participação nas reformulações sofridas pela obra, após a
retirada de Sangiorgi.
Abaixo reproduzimos o prefácio escrito por Sangiorgi em 1975, para o
primeiro volume do livro “Matemática” de autoria de Monteiro, Boulos e Watanabe:
347
A Matemática, considerada, com muita propriedade, eixo-
metodológico de todos os ramos do conhecimento humano,
conseguiu, por parte dos autores, um tratamento correto e
simples, capaz de atrair os jovens estudantes do ensino do 2º
grau, mesmo aqueles que não se destinam especificamente ao
ensino secundário. Nada de tratamento exageradamente rigoroso
com a intenção de agradar tão somente aos matemáticos
profissionais e sim, dentro de uma linguagem clara e certa, a
preocupação de atender às reais necessidades de conhecimento
científico exigidas pelos atuais alunos.
Assim, foi abandonado o mito da “precisão de linguagem”, quando
se tratava de esclarecer conceitos que pediam forte apelo à
intuição e nunca a um rigor desmedido. Por exemplo, os autores
não hesitaram em falar de funções que “pegam” números e os
“levam” de um conjunto para outro; de números “imensamente
grandes”; de gráficos de funções crescentes que “sobem”; de
pontos que “andam” sobre uma circunferência e assim por diante.
Mais ainda: há uma didática do essencial, caracterizando certas
partes do livro, quando oferece ao estudante a oportunidade de
observar certas situações, fazendo-o trabalhar com exemplos
concretos e deixando-o através de suas próprias reflexões, extrair
conclusões, mesmo sabendo que ele pode errar. Mas, cometer
erros e verificar resultados é parte integrante do aprendizado que,
com um aluno motivado, tem na Matemática um forte aliado [grifos
do autor] (SANGIORGI, 1975, Prefácio).
As palavras de Sangiorgi deixam transparecer uma anuência quanto à
“vulgarização” da linguagem matemática, com o objetivo de facilitar uma melhor
compreensão do conteúdo, pois, para ele, nem sempre aquilo que possa agradar
o matemático profissional, como por exemplo a fidelidade ao rigor matemático, é
condizente com a expectativa seja do professor ou mesmo do aluno. Nesse
sentido, com os elogios à obra por parte de Sangiorgi, denota-se, até pelo
currículo de seus autores, que os mesmos mostraram desprendimento ao
patrocinarem uma flexibilidade em relação a uma linguagem até então praticada
no livro didático anterior, além de visar um trabalho voltado para a essência do
conhecimento matemático, em detrimento de uma apresentação integral do
programa, buscando atrair e impulsionar o leitor para uma maior interação com a
proposta oferecida, ensejando uma eficaz compreensão da ciência matemática.
Assim, ao optarem por uma linguagem mais simples, fizeram justamente o
contrário do que aquela empregada na oportunidade em que modificaram o
enunciado do postulado da régua, quando aderiram a uma linguagem matemática
348
formal. Note-se, por exemplo que, nesse novo compêndio, os autores nem ao
menos mencionaram explicitamente o postulado da régua.
As palavras de Sangiorgi sinalizam para o advento de um novo modo de
pensar o ensino da Matemática, não mais enfatizando as estruturas e o rigor da
linguagem matemática. Tempos de Matemática Moderna sendo deixados para
trás. Novos tempos inaugurando novas metodologias e privilegiando outros
conteúdos.
9.15. Curso Moderno de Matemática para a Escola Elementar
Lucília Bechara, Manhúcia Perelberg Liberman e Anna Franchi
119
professoras de matemática atuantes no GEEM, lançaram uma coleção intitulada
Curso Moderno de Matemática para a Escola Elementar”, destinado aos cursos
primários. A partir da Lei nº 5.692/71, que estabeleceu a escola fundamental de
oito anos – o Ensino de 1º Grau –, as autoras sentiram-se compelidas a dar
continuidade à coleção didática já elaborada para as quatro primeiras séries
iniciais, tornando-a completa para o ensino de 1º grau.
Para a elaboração dos volumes destinados às 5ª, 6ª, 7ª e 8ª séries, as
autoras Lucília Bechara Sanchez
120
e Manhúcia Liberman sentiram necessidade
de ampliar a equipe, que passou a contar a presença de Anna Averbuch e Franca
Cohen Gottlieb, recebendo o grupo a denominação de GRUEMA – Grupo de
Ensino de Matemática Atualizada. A obra, intitulada “Curso moderno de
matemática para o ensino de primeiro grau” foi publicada pela Companhia Editora
Nacional, a partir de 1972.
Em nota destinada aos professores, as autoras esclarecem que, antes de
ser lançado, cada volume foi experimentado em algumas escolas do Estado do
Rio de Janeiro e do Estado de São Paulo, onde professores e orientadores
acompanhavam e verificavam os resultados obtidos com sua utilização,
apresentando êxito ao final.
119
Anna Franchi somente colaborou como autora nos três primeiros volumes dessa coleção (BECHARA,
LIBERMAN, 1969).
120
Lucília Bechara passou a assinar Sanchez, a partir da publicação do 5º volume da série.
349
Informam ainda que, coube às autoras, o trabalho de elaboração de textos,
experimentação e controle de resultados, e a L. H. Jacy Monteiro, “os trabalhos
de supervisão e revisão de conteúdo, a fim de que a preocupação com a
linguagem adequada ao nível dos alunos não sacrifique a precisão de conceitos,
para que os alunos não sejam mais tarde forçados a destruir para construir”
(AVERBUCH et alli, 1974).
Como se vê, Luiz Henrique Jacy Monteiro assumiu a supervisão e revisão
dos conteúdos matemáticos da coleção. Quanto ao resultado final da obra,
recorremos às análises efetuadas por Maria Ângela Miorim, que assim se
expressa:
Apesar de utilizar a linguagem matemática de forma rigorosa
sempre que necessário, percebe-se a preocupação das autoras
em produzir um texto que não priorize tal linguagem.
Isso, no entanto, não significa que os conceitos abordados não
sejam tratados com profundidade. Ao contrário, é perceptível a
preocupação com a apresentação, especialmente através de
questionamentos, rigorosa dos conceitos (MIORIM, 2005)
Em toda a coleção foram introduzidas histórias em quadrinhos, com a
intenção de motivar os alunos para os assuntos a serem abordados e, segundo
Franca Gottlieb, de modo que a
... história em quadrinhos era a parte que queríamos dar como
teoria mas não queríamos dar com a profundidade, e com a
propriedade de linguagem, que tem que ser dada, porque não se
pode escrever errado. E fazíamos duas crianças conversando
entre si, sobre aquilo, com linguajar de criança (apud SOARES,
2001, p. 61).
A coleção se fazia acompanhar de uma edição do professor em que, além
de oferecer as respostas dos exercícios propostos na obra, apresentava seus
objetivos educacionais, instrucionais, estratégias e outras observações de ordem
didática, além de sugestão de programação da matéria, separada por bimestre e
com sugestões de provas.
Para a 5ª série, sob a denominação “Temas de recordação” as autoras
introduziram um tópico sobre simbologia matemática, múltiplos e divisores, curvas
e regiões e medidas de ângulos, como pré-requisitos para o estudo das noções
350
de conjuntos, relações e sistema de numeração, temas trabalhados nesse volume
(AVERBUCH et alli, 1974).
Nas operações no conjunto dos números naturais, as autoras utilizaram-se
fartamente da Teoria dos Conjuntos. Para a adição de números naturais,
relacionam a soma dos números naturais e reunião dos conjuntos, da seguinte
forma:
DE UM MODO GERAL
Para determinar a soma de dois números naturais a e b,
construímos um conjunto A com a elementos e um conjunto B
com b elementos, com A e B disjuntos.
A soma de a e b será o número de elementos do conjunto-reunião
A U B.
Se n(a) = a, n(B) = b e n(A ŀ B) = 0, então n(A U B) = n(A) + n(B)
= a + b (AVERBUCH et alli, 1974, p. 105).
No livro do professor, as autoras advertiram que as conclusões e
generalizações enunciadas sob a denominação “De um modo geral”, tiveram
como objetivo dar uma oportunidade de aprimoramento aos alunos mais
interessados no aprendizado da matemática. Nessas sessões, portanto, as
autoras fizeram uso freqüente da linguagem matemática formal, e, apesar de não
dispensarem o rigor matemático em toda a obra, procuraram trabalhar os
assuntos matemáticos, estabelecendo com o leitor uma conversação coloquial, de
modo a fazê-lo chegar “por si a algumas conclusões que possibilitem o
desenvolvimento do seu raciocínio (AVERBUCH et alli, 1974, p. VIII).
Também para a 5ª, foram trabalhadas as noções de produto cartesiano,
funções e funções bijetoras, além das propriedades das operações no conjunto
dos números naturais.
Na 7ª série (1975), um dos objetivos instrucionais apresentados dizia
respeito ao conceito de grupo. Assim, as autoras pretenderam levar os alunos a
reconhecer quando um conjunto (finito ou infinito) munido de determinada
operação é um grupo, de modo que a formalização desse conceito viesse a
facilitar a prática da resolução de equações. Também é nesta série que o estudo
da simetria foi apresentado, com a intenção de desenvolver o domínio do espaço
351
ligado aos movimentos de uma figura plana no espaço e, igualmente, estudar a
Geometria através das transformações geométricas.
Em 1975, a coleção ainda não tinha todos os seus volumes publicados. O
volume 8 da coleção, correspondente à 8ª serie, ainda estava no prelo.
Entretanto, naquela época, apesar do MMM já dar sinais de esgotamento,
notamos que o GRUEMA ainda levava em conta as recomendações da
Matemática Moderna.
Constata-se, igualmente, que na elaboração da obra, havia uma
preocupação das autoras com a linguagem matemática, fosse ela formal ou
coloquial, procurando sempre manter uma apresentação rigorosa dos conceitos.
Nesse sentido, a participação de Jacy Monteiro, na qualidade de supervisor e
revisor dos conteúdos abordados, mostrou-se fundamental para garantir e manter
aquela precisão dos conceitos.
Verifica-se assim, uma conjugação eficaz entre a supervisão e revisão da
linguagem rigorosa utilizada na coleção, a cargo do matemático Jacy Monteiro, e
a experiência pedagógica das autoras, depreendendo-se, portanto, que Jacy
Monteiro soube transigir com uma certa modificação da linguagem, sempre que
fosse necessário, sem contudo, dispensar o rigor.
9.16. Jacy Monteiro e as relações entre a matemática e educação
matemática.
Nesta última sessão, procuramos sintetizar os principais aspectos
percebidos e discutidos durante o capítulo, de maneira a estabelecer as relações
entre o matemático Jacy Monteiro e a educação matemática.
De modo recorrente ao que já fora realizado nos capítulos em que nos
detivemos nas trajetórias de Catunda e Castrucci, valemo-nos de uma
apresentação subdividida em fases, as quais não obedecem, necessariamente, a
uma ordem cronológica. O sentido de optarmos por uma divisão em fases, é que
ela faz nascer a possibilidade de se aclarar e comparar as práticas levadas a
cabo por esses matemáticos.
352
Numa primeira fase, voltamos nosso olhar para Jacy Monteiro como
professor assistente de Oskar Zariski e Jean Dieudonné, matemáticos afinados
com a perspectiva bourbakista. Ao confrontar as conclusões de Pires (2006) e as
notas de aula de Ubiratan D’Ambrosio, destacamos a apropriação feita por Jacy
Monteiro dos métodos e conteúdos adotados por Bourbaki, servindo-se deles
para a consecução de suas aulas na FFCLUSP.
A preocupação de Dieudonné voltava-se para a escolha dos conteúdos que
deveriam ser ensinados no secundário e, de forma específica, aos alunos com
inclinação para as ciências exatas. Nesse caso, o secundário deveria
proporcionar a tais alunos, conteúdos da MM, em especial a Álgebra Linear,
dando-lhes tratamento axiomático rigoroso. Jacy Monteiro, por sua vez,
considerava a pesquisa prerrogativa não apenas dos matemáticos, mas também
dos professores, de modo que a sociedade viesse a beneficiar-se dessa prática
alcançando o desenvolvimento próprio de uma sociedade moderna.
As estruturas algébricas, distinguidas por Bourbaki como uma das
“estruturas-mãe”, responsáveis pela organização da ciência matemática, teve em
Jacy Monteiro um dos principais difusores. Jacy Monteiro voltou-se para a
pesquisa e ensino da Álgebra Moderna e Álgebra Linear, cujos tópicos foram por
ele abordados, tanto em cursos de pós-graduação quanto em cursos destinados à
graduação e de formação de professores.
Em outra etapa, vimos que as anotações elaboradas por Jacy Monteiro
durante as aulas de Zariski e Dieudonné tornaram-se obras didáticas para o
ensino superior. A partir do êxito obtido na elaboração e divulgação dessas
apostilas, especializou-se na produção e publicação de apostilas, quando
buscava suprir as necessidades de textos científicos dos graduandos. Para tanto,
mantinha contato com matemáticos do Brasil e do exterior, para tratar sobre obras
a serem publicadas no Boletim da SMSP ou, ainda, para o planejamento de
revistas, elaboração e distribuição de periódicos, compra de livros para a
biblioteca e organização de eventos científicos. Auxiliava na preparação de
trabalhos de outros colegas, destacando-se também o fato de que, durante o
Movimento, foi responsável pelo Departamento de Publicações do GEEM.
353
Numa terceira fase, vemos Jacy Monteiro como autor de uma coleção de
livros didáticos para o 2º ciclo, juntamente com Osvaldo Sangiorgi e Renate
Watanabe. Para a Geometria, os autores utilizaram-se da obra “Geometria
Moderna” dos autores Moise & Downs, não incorporando as ferramentas
propiciadas pela Álgebra Linear.
Observou-se, no entanto, que relativamente aos conteúdos envolvendo
conjuntos, relações e aplicações, que os autores procuraram atender às
recomendações da OECE, e, segundo Watanabe, estes conteúdos foram,
justamente, aqueles elaborados por Jacy Monteiro. Apesar disso, ao optar por
apresentar toda a Teoria dos Conjuntos, no primeiro ano, Jacy Monteiro não
acompanhou as propostas da OECE, no sentido de ser trabalhada apenas a
introdução no primeiro ano, deixando o restante para o último. A ênfase dada para
a “precisão da linguagem” constituiu-se na tônica dessa parte do livro, exatamente
como preconizava Dieudonné.
Em uma última e quarta fase, encontramos Jacy Monteiro como supervisor
e revisor de livros didáticos de 5ª a 8ª séries do “Curso moderno de matemática
para o ensino de primeiro grau”. A preocupação das autoras dessa obra, nesse
caso, era com uma apresentação rigorosa da matemática e, ao mesmo tempo,
sem priorizar a linguagem formal, procurando oferecer uma linguagem adequada
para os alunos daquelas séries.
Verifica-se assim, uma conjugação eficaz entre a supervisão e revisão da
linguagem rigorosa utilizada na coleção, a cargo do matemático Jacy Monteiro, e
a experiência pedagógica das autoras, depreendendo-se, portanto, que Jacy
Monteiro soube transigir com uma certa modificação da linguagem, sempre que
fosse necessário, sem contudo, dispensar o rigor.
Resumidamente, assim podem ser apontadas as atividades com as quais o
professor Jacy Monteiro esteve envolvido durante toda sua vida profissional:
organização de revistas; participação na elaboração de material gráfico;
catalogação de artigos e periódicos; correspondências com universidades,
matemáticos e editoras; supervisão e elaboração de livros didáticos para o ensino
secundário e superior e ainda, docência em cursos de nível superior e de
354
formação de professores, como revelado por fontes diversas, dentre elas,
professores e alunos, testemunhas de sua atuação.
Nesse universo de trabalho, Jacy encontrava-se numa posição estratégica
que lhe possibilitava colocar em pleno vigor as propostas do movimento da MM.
Nos cursos do GEEM, e em outros cursos, Jacy Monteiro foi um dos principais
representantes daqueles que se dedicavam à Álgebra Moderna, área da
matemática na qual era especialista. Ademais, a Álgebra Moderna, não se
incompatibilizava com os preceitos defendidos pelo MMM, provável razão de seu
engajamento no Movimento, permitindo-lhe trabalhar no desenvolvimento e
divulgação da Álgebra Moderna, posto que suas competências o recomendavam
para tanto.
355
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Pretendendo contribuir para a escrita da História da Educação Matemática
brasileira, esta pesquisa teve como objetivo central estudar as dinâmicas que
envolvem as relações entre Matemática e Educação Matemática durante o MMM.
Em nosso trabalho, procuramos historicizar as relações entre matemáticos
e educadores matemáticos, ou seja, consideramos que essas relações se
transformam ao longo do tempo e estão estabelecidas num determinado período
histórico. O período em que nos concentramos para levar à frente nossa
investigação é aquele de vigência do MMM, delimitando-a geograficamente no
Brasil.
Nesse sentido buscamos estudar as relações entre essas comunidades, do
matemático e daquele que ensina matemática. Essa investigação nos impulsionou
na direção de buscar respostas para as seguintes indagações: qual é a dinâmica
dessas duas comunidades ao tempo do MMM? E como isso se estabeleceu?
Para encontrar respostas a tais indagações, empreendemos uma certa
regressão, procurando caracterizar o próprio tempo que se tomou como
referência, qual seja, o período em que vigorou o MMM em relação a
determinados períodos anteriores a ele. Procedemos então, a um relato sobre a
origem e características da Matemática Moderna, destacando o surgimento das
novas álgebras, o aparecimento das correntes filosóficas e alguns aspectos sobre
o primeiro movimento internacional de reforma do ensino da Matemática. Em
seguida, apresentamos uma breve síntese sobre a trajetória do grupo Bourbaki,
considerando a relevância alcançada por esse grupo durante o MMM. Nessa
356
regressão, buscamos informações que pudessem nos auxiliar na compreensão da
dinâmica dessas relações antes mesmo do Movimento. Esta conduta se prestou
para aprofundar o debate de como historicamente os matemáticos levantam a
preocupação de discutir o ensino de Matemática.
Dessa forma, levamos em conta que o ofício do matemático se transforma
ao longo do tempo, tendo em vista, por exemplo, que o modo de produção
matemática do século XVII é diferente do modo como se produzia matemática no
século dezenove e certamente foi diferente de como se produziu matemática no
século XX, sendo certo dizer que esse ofício é histórico, pressupondo uma análise
de seu fazer matemático, por meio do exame de sua produção (LORENZO,
1988).
Nesse fazer matemático, revelado pelo exame de sua produção, constata-
se que os matemáticos são partícipes de uma prática social de investigação, qual
seja, a pesquisa acadêmica (PESTRE, 1996), que, entretanto, traz em seu cerne
uma prática educativa, mesmo que de modo difuso ou inconsciente, vale dizer,
por meio de táticas, de forma a assegurar “as condições de produção e
reprodução dos conhecimentos gerados em seu interior”, evitando-se que essa
prática de investigação desapareça (MIGUEL, 2004, p. 83). Na verdade, há uma
relação de retro alimentação entre teoria matemática e prática educativa.
Essas relações compatibilizam-se com as análises realizadas por Belhoste
(1998), para quem o desenvolvimento da ciência matemática está intimamente
ligado ao próprio ensino da matemática. Logo, podemos afirmar que são
históricas as relações estabelecidas entre os matemáticos e o ensino de
Matemática e, portanto, estão sujeitas a transformações ao longo do tempo.
Para discutir o ensino de Matemática, do ponto de vista dos matemáticos,
detivemo-nos no pronunciamento de Castelnuovo (1914), durante a CIEM de
1914, quando expôs suas idéias sobre os motivos pelos quais o matemático
deveria preocupar-se com o ensino de matemática. Para Castelnuovo, tratava-se
de um dever social do matemático, cabendo a ele informar à sociedade sobre o
andamento de suas investigações científicas, “sem demora e desperdício”, de
357
modo que estas investigações pudessem servir aos propósitos e expectativas
sociais.
Em seguida, voltamo-nos para as idéias propugnadas por Jean Dieudonné
(1973a), o qual advogava uma modificação significativa dos conteúdos e métodos
do ensino de Matemática no secundário, a fim de diminuir o “abismo” existente
entre ensino de Matemática de nível universitário e o ensino secundário. Sua
preocupação, portanto, relacionava-se com a qualidade do ensino de matemática
de nível superior. Para Dieudonné, o aluno ingressante no ensino superior, na
área de ciências, deveria trazer como bagagem mínima noções de Álgebra
Linear.
Como pudemos observar, as posições de Castelnuovo (1914) e Dieudonné
(1973 a) diferenciam-se na medida em que Castelnuovo dirigia seu olhar para o
dever social do matemático visando a melhoria da sociedade como um todo,
enquanto que Dieudonné enfatizava a necessidade de se introduzir conteúdos
modernos de Matemática no ensino secundário, de modo a obter um melhor nível
dos alunos ingressantes no ensino superior, na área de exatas.
Destacamos, além disso, o pensamento de Catunda que, em 1945,
defendia uma formação para o professor de matemática a partir de uma
abordagem dos conteúdos matemáticos, sem entretanto, afastar-se totalmente
dos aspectos pedagógicos. Manifestava preocupação em elevar a cultura geral do
povo brasileiro, a partir de sua integração com os professores oriundos das
faculdades de filosofia, ciências e letras, recém criadas, procurando compatibilizar
aspectos educacionais com a pesquisa científica, com reflexos para a cultura
geral da população. Nesse sentido, os pensamentos de Catunda coadunavam-se
com aqueles sustentados por Castelnuovo. Ademais, expressava intenção de
revisar os programas do ensino secundário de Matemática, de modo que esse
ensino atingisse todos os indivíduos da sociedade brasileira. Essa posição,
porém, aproximava-se daquela defendida por alguns reformadores durante o
MMM, sob a bandeira “matemática para todos”, em que, na década de 1950,
matemáticos e educadores matemáticos, de diversos países, manifestaram a
pretensão de democratizar o ensino secundário.
358
Essa diversidade de posições expressas por matemáticos de épocas
distintas, como assinalada por Castelnuovo, Dieudonné e Catunda, exemplifica
como as relações entre matemáticos e o ensino de matemática se transformam
ao longo do tempo e estão estabelecidas num determinado período histórico.
Utilizando-nos de aportes teóricos dos quais se vale a História Cultural,
prosseguimos na investigação estudo da dinâmica das relações entre matemática
e educação matemática, o que implicou na realização de um estudo das relações
entre cultura acadêmica e cultura escolar durante esse Movimento.
Para tanto, lançamos mão da categoria cultura escolar, apropriando-nos
daquela definida por Dominique Julia (2001), que vem subsidiando diversas
análises no campo da História da Educação.
Outras categorias que igualmente serviram de subsídios para a escrita
deste estudo foram os conceitos de estratégia e tática tomados em conformidade
com De Certeau (2002), as quais nos inspiraram a elaborar o questionamento
basilar que direcionou esta investigação, qual seja, quais estratégias e táticas
estavam envolvidas na dinâmica de relacionamento entre cultura acadêmica e
escolar ao tempo do MMM?
Outras questões também se fizeram presentes e motivaram este estudo:
Quais os principais matemáticos brasileiros que, durante o MMM
mantiveram alguma preocupação com o ensino secundário?
Qual a formação intelectual e qual a posição social desses matemáticos?
Quais as principais contribuições que podem ser creditadas em favor de
matemáticos que participaram do MMM?
Como matemáticos investiram na escriturística (publicações, documentos
oficiais, participação em congressos, livros etc.) para participarem desse
Movimento?
Em relação às últimas indagações, todas como resultado do
desdobramento da questão principal da pesquisa, cumpre esclarecer que, muitos
foram os matemáticos brasileiros que se dedicaram ao ensino secundário. Dentre
359
eles, nossa escolha recaiu sobre Omar Catunda, Benedito Castrucci e Luiz
Henrique Jacy Monteiro, porquanto consideramos como elementos de destaque e
representativos da comunidade matemática daquela época, quando tiveram
expressivo envolvimento com a reforma da MM. Assim, quanto à formação
intelectual, posição social e principais contribuições desses matemáticos, nos
capítulos que tratam especificamente sobre essas personagens, estes aspectos
foram explorados, descritos e podem ser também observados através da consulta
às cronologias que seguem anexas.
Quanto a responder sobre como matemáticos investiram na escriturística
ao tempo do MMM, o esforço nesse sentido revestiu-se de maior complexidade,
justamente porque nas práticas utilizadas pelos matemáticos para a elaboração
de textos que trataram do ensino secundário, vemos entrelaçadas táticas e
estratégias que, somente aos poucos algumas delas foram sendo percebidas e
identificadas, na medida em que se desenvolviam as atividades de leitura e
reflexão, provocadas pelas fontes obtidas no decorrer da elaboração da tese.
A adesão ao MMM, rendeu a Catunda, Castrucci e Jacy Monteiro
publicações compostas de diversas obras didáticas tanto para o ensino superior
quanto ao secundário.
Mesmo antes do Movimento, esses matemáticos já se dedicavam à escrita
de artigos, livros, apostilas, notas de aula, publicações em revistas, etc., cujas
produções eram freqüentes, embora a maioria delas voltadas para o público
universitário, sendo algumas publicadas em periódicos científicos especializados.
Assim, Catunda e Castrucci já contavam com a experiência de autores de livros
didáticos para o ensino secundário anteriormente ao MMM. Catunda e Castrucci
assinavam como co-autores da coleção “Matemática” para o curso colegial, na
década de 1940, sendo que Benedito Castrucci também escreveu o compêndio
Lições de geometria elementar”, em 1952, igualmente destinado ao curso
colegial, além de outros trabalhos. Do mesmo modo, também assinaram artigos
na Revista “Notas de Matemática e Física”, sendo que Catunda inaugurou aquela
revista com a palestra “A matemática no ensino secundário”. Já Castrucci
pronunciou-se sobre o tema “Nota sobre a congruência de ângulos”, utilizando
como referência obras de geômetras italianos. Embora Jacy Monteiro não tenha
360
apresentado trabalho nessa revista, colaborou na consecução e divulgação,
favorecendo a distribuição de exemplares para diversas instituições de ensino.
Em tempos de MM, foram publicados pelo GEEM, na Série Professor, as
obras “Elementos da teoria dos conjuntos” (1967) e “Introdução à lógica
matemática” (1973) de autoria de Benedito Castrucci; “Introdução às estruturas
algébricas” (1968) e “Polinômios” (1970), ambas de autoria de Jacy Monteiro. Não
obstante Catunda não tenha publicado livros na série Professor, assinou, todavia,
o artigo “Os conceitos fundamentais da matemática: conjuntos e estruturas”,
publicado na obra coletiva “Matemática moderna para o ensino primário”, também
integrante da série Professor, em 1962.
Além disso, verificamos que esses matemáticos, sujeitos de nosso estudo,
também expuseram artigos em congressos, seminários e revistas especializadas
em educação, expressando posições em defesa do Movimento ou tratando
diretamente de conteúdos da Matemática Moderna.
Analisando obras escritas em conjunto com educadores matemáticos
durante o Movimento, pudemos verificar que todos eles foram convidados por
esses educadores de maneira a participarem como autores de livros-texto para o
secundário. Ademais, Omar Catunda e Jacy Monteiro, além de autores, também
exerceram a função de supervisores e revisores de obras didáticas.
A participação efetiva na escriturística e ainda na supervisão e revisão dos
conteúdos, expressas nos livros didáticos e outras publicações, foram por nós
consideradas como estratégias utilizadas por esses matemáticos, auxiliando,
dessa forma, na inserção de conteúdos de MM no ensino secundário.
Mas, quais foram as táticas que puderam ser reveladas através desta
pesquisa, quanto às atividades de Catunda, Castrucci e Jacy, ao enveredarem
pelo caminho da escrita de obras didáticas para o secundário?
Para tratar de responder esse questionamento, recorremos ao conceito de
apropriação na acepção de Chartier (1991) e, por conseqüência, de Michel de
Certeau (2002), ao fazer referência às táticas como modelo de apropriação, as
361
quais efetuam um consumo criativo dos bens culturais, por meio de um fazer que
subverte os dispositivos de poder inscritos nos objetos e lugares.
No caso de Catunda, para o ensino secundário, vimos que, em seu
depoimento sobre o programa para esse grau de ensino, vigente em 1954, esse
matemático defendeu o restabelecimento de um estudo elementar de algumas
transformações em Geometria: simetria, homotetia, semelhança, rotação e
translação, o qual já havia sido recomendado por Felix Klein por ocasião do
Primeiro Movimento Internacional de Reforma do Ensino da Matemática e
também preconizado por Euclides Roxo.
Em 1966, durante o 5º CBEM, pronunciou-se sobre o “Tratamento moderno
da geometria”, defendendo a introdução de conteúdos referentes à Geometria das
Transformações como um tratamento eficiente para o ensino da Geometria no
secundário.
Entretanto, na elaboração de livros didáticos por iniciativa do CECIBA,
destacamos a obra “Matemática Moderna III” (1969), cuja introdução enfatiza que
a Geometria Afim nela inserida foi elaborada por Omar Catunda. Num primeiro
momento, o estudo da Geometria baseou-se nas transformações geométricas
como delineadas por Felix Klein. Na mesma obra, no capítulo seguinte, Catunda
introduziu o seu estudo utilizando-se de recursos da Álgebra Linear, baseados
nos vetores e espaços vetoriais, numa provável apropriação da proposta
defendida por Jean Dieudonné, representada por um tratamento de tendência
bourbakista. Já no quarto capítulo desse manual foi realizado um estudo voltado
para a Geometria tradicional, a Geometria Euclidiana orientada pelas formulações
de David Hilbert.
Esses posicionamentos aparentemente contraditórios, pois não refletem
uma abordagem homogênea dirigida ao ensino da Geometria, podem ser
concebidos como uma tática do matemático para, ao mesmo tempo em que
praticava a inserção de “tratamentos” modernos (Geometria das Transformações
e Geometria com Álgebra Linear) não renunciava, contudo, à Geometria
tradicional desenvolvida no capítulo IV do “Matemática Moderna III”. Ao fazer uma
provável apropriação das geometrias trabalhadas por Hilbert, Klein e Dieudonné,
362
de modo a oferecer uma gama de alternativas para a compreensão desse ramo
da matemática, Catunda acabou por estabelecer uma nova forma de exposição
didática.
Relativamente a Benedito Castrucci, como constatado por Pires (2006) e
Leme da Silva & Oliveira (2006), esse matemático, enquanto assinava sozinho
sua obras didáticas, permaneceu fiel aos preceitos da Geometria Euclidiana
tradicional em conformidade com o tratamento axiomático de David Hilbert, dando
especial atenção à linguagem da Teoria dos Conjuntos. Pudemos constatar que a
modernidade, na concepção de Castrucci, dizia respeito à adoção de uma nova
linguagem, baseada na Teoria dos Conjuntos. Inferimos então, que uma de suas
táticas para o seu trânsito junto ao ensino secundário, deu-se por meio da escrita
de obras publicadas pelo GEEM e da coleção “Geometria: curso moderno” (1969),
nas quais enfatizava a linguagem daquela teoria como linguagem unificadora da
matemática, sem, no entanto, abrir mão da Geometria tradicional, indo desse
modo, contrariamente às prescrições do Movimento, que preconizava a adoção
da Geometria via Álgebra Linear ou a Geometria das Transformações.
Quando Castrucci aliou-se ao professor Alcides Bóscolo para escrever a
obra “Matemática: curso moderno”, a partir de 1967, nossa investigação apurou
que o livro não obteve a aceitação esperada em termos de vendagem, muito
embora os autores tivessem se apropriado de obra homônima, de autoria de
Osvaldo Sangiorgi (1963), reconhecido best seller. Essa apropriação do livro de
Sangiorgi revela-se como outra tática de Castrucci, porém, a nosso ver, para
alcançar sucesso de vendas, e como meio de inserir-se no ambiente do ensino
secundário.
Posteriormente, Castrucci elaborou outro livro didático, em co-autoria com
um professor não identificado, que atingiu, segundo ele, estrondoso sucesso de
vendas. Essa coleção, ainda conforme depoimento de Castrucci, já não
apresentava a idéia central dos reformadores, qual seja, a unicidade da
matemática por meio das estruturas. Os conteúdos modernos foram subtraídos
pelo professor co-autor, permanecendo na obra apenas a Teoria dos Conjuntos
como linguagem unificadora dessa ciência.
363
Neste caso, podemos também aventar outra tática de Castrucci, traduzida
no consentimento em subtrair conteúdos relativos à MM, mesmo sendo ele um
dos principais representantes do GEEM e portanto, defensor do Movimento.
No que tange à prática de produção de livros daquele anônimo professor
que escreveu em co-autoria com Castrucci, podemos tecer algumas
considerações e apontar uma de suas táticas.
Conforme entendimento de Geertz (1989), a cultura, compartilhada por um
determinado grupo, é permeada por códigos que permitem que este grupo se
entenda. É, portanto, pública. O professor não nominado, mas citado por
Castrucci, pertencia à comunidade escolar e suas práticas, seus códigos eram
entendidos por ela. Este professor, protegido à sombra da fama e respeitabilidade
do matemático Castrucci, interferiu no texto didático com o olhar do
funcionamento de sua aula, agindo de acordo com os códigos da cultura escolar
vigente. Com a memória de suas práticas, fez uma apropriação da nova
matemática, revelada mais próxima do professorado, acarretando grande
aceitação e um sucesso de vendas perante o público docente. Táticas como
essas, promovidas pelos professores, em um movimento silencioso, sem revolta,
aos poucos foram agindo sub-repticiamente, alterando a renovação do ensino, a
ponto de se notar, com o tempo, apenas vestígios da presença da Matemática
Moderna no secundário, fazendo crer, para muitos matemáticos como Castrucci,
no fracasso do Movimento. Assim, matemáticos falam de “fracasso”, pois não
vêem seu ideário inserido diretamente nas escolas, não contam com apropriações
realizadas pelos professores e pelos manuais didáticos elaborados a partir do
livro didático inovador.
Quanto ao matemático Luiz Henrique Jacy Monteiro, destacamos
primeiramente que ele não se utilizou, em momento algum, dos recursos
propiciados pela mídia para defender seus pontos de vista em relação ao ensino,
seja o superior ou mesmo o secundário. Suas obras tratavam eminentemente de
conteúdos próprios da ciência matemática, notadamente em relação aos temas
da Álgebra Moderna e Álgebra Linear.
364
No entanto, Jacy Monteiro aceitou e constantemente se envolveu com
supervisão, revisão de livros didáticos e exerceu consultoria junto a uma editora
especializada em obras didáticas, na área de matemática. Realçamos que, no
transcurso do MMM, Jacy Monteiro atuou como supervisor e revisor da coleção
Curso moderno de matemática para o ensino de primeiro grau”.
No exercício daquela supervisão, revisão e mesmo consultoria, foi possível
identificar uma de suas táticas, na medida em que esta prática permitia-lhe sugerir
correções, supressões, vetar partes ou mesmo toda a obra que lhe era submetida
à apreciação. O mercado editorial contaria com obras sob o aval de Jacy Monteiro
ou mesmo com modificações que trariam implicitamente sua visão sobre o que
seria importante para o ensino naquele momento.
A experiência adquirida por Jacy Monteiro na elaboração de anotações de
aulas na FFCLUSP, nascida de sua convivência com renomados professores de
matemática, contribuiu para lhe dar o cabedal necessário, de forma a colocar-se à
frente daquelas atribuições correspondentes à revisão, supervisão e consultoria
sobre obras didática de matemática, em vias de serem lançadas pelo mercado
editorial.
Em conformidade com Belhoste (1998), as anotações de aulas, durante um
curso magistral, freqüentemente tornavam-se livros-texto, em que novos
elementos iam sendo introduzidos à teoria, a partir do modo de exposição
realizado pelo matemático. Comprovando estas colocações, vimos que as
anotações de Jacy Monteiro tomadas de aulas de Dieudonné e Zarisky tornaram-
se livros-texto. Tinham, portanto, uma função pedagógica, isto porque, auxiliavam
os estudantes na compreensão daquilo que era transmitido por aqueles
matemáticos. Jacy Monteiro estava sendo preparado para ser matemático e
mesmo assim, durante sua formação, sentia necessidade de lançar mão do
recurso consistente da elaboração de notas de aula. Ainda que os cursos da
FFCLUSP previssem matérias pedagógicas facultativas somente no último ano,
os apontamentos de Monteiro revelam uma necessidade e o reconhecimento de
sua parte, de que tais anotações representavam uma ferramenta pedagógica à
disposição dos estudantes. Ou seja, Jacy Monteiro fazia uma apropriação dos
conhecimentos transmitidos pelos professores e colocava-os a serviço dos
365
estudantes. A circunstância dessas anotações terem sido posteriormente
publicadas, comprova que a tática representada por sua apropriação revelou-se
eficiente, conforme os resultados colhidos, ou seja, Jacy Monteiro ganhou
notoriedade no meio acadêmico, em especial junto a Dieudonné e Zariski, até
porque beneficiados por aquela iniciativa. A tática empregada permitiu, portanto,
difundir as questões envolvendo a estrutura do saber matemático sob ótica de
Dieudonné e Zariski, exemplificando como o desenvolvimento da ciência
matemática encontra-se ligado ao próprio ensino da Matemática.
Paradoxalmente, as matérias teóricas, de modo geral, são vistas como
desvinculadas do processo de ensino-aprendizagem. Esse tipo de concepção
encontrava-se presente dentro da própria matriz curricular da FFCLUSP, em que
disciplinas matemáticas eram ministradas nos três primeiros anos do curso de
Matemática e as disciplinas pedagógicas, facultativas, eram oferecidas no último
ano. Essa concepção, articulada dentro da universidade, fazia parte da cultura
acadêmica, opondo teoria matemática e prática educativa sem a percepção de
que ambas não se desvinculam.
Além disso, segundo De Certeau (2003), para que haja verdadeiramente
cultura, não basta ser autor de práticas sociais; é preciso que essas práticas
sociais tenham significado para aquele que as realiza. Concluímos que, Jacy
Monteiro fez apropriação de métodos e conteúdos adotados por Bourbaki,
presentes nas teorias expostas por Dieudonné e Zariski, servindo-se deles para a
consecução de suas aulas na FFCLUSP e, posteriormente, nas atividades
realizadas, dentre elas, suas publicações perante o GEEM. Desse modo, essas
práticas tinham significado para esse matemático, tanto no que dizia respeito ao
seu envolvimento com a cultura acadêmica quanto com a cultura escolar, ao
divulgar a Álgebra Moderna em cursos e livros didáticos para o secundário.
Em nosso estudo, as categorias táticas e estratégias adquiriram especial
relevância, na medida em que permitiram analisar as relações existentes entre
cultura acadêmica e cultura escolar.
As práticas escolares, por serem práticas culturais, são compartilhadas
pelo grupo de professores e, portanto, fazem sentido para esse mesmo grupo.
366
Assim, quando surge um manual ou guia curricular apresentando novos
conteúdos e/ou métodos para serem utilizados pelos professores, seu uso implica
numa tendência de alteração nas práticas escolares vigentes, exigindo
transformação da cultura escolar.
Assim, as estratégias estabelecidas com a introdução de conteúdos da MM
exigiram dos professores uma implementação rápida e eficaz, que só podia ser
cumprida por parte dos professores, no cotidiano de suas práticas, por meio da
utilização de táticas, numa ação de astúcia que priorizava a metodologia,
concebida como uma maneira de fazer própria do cotidiano escolar, em
detrimento dos conteúdos respaldados nas teorias, por eles pouco conhecidas,
impostas pelas estratégias implementadas pelos promotores da modernização da
educação. Por outro lado, táticas também foram utilizadas pelos matemáticos
promotores da reforma em suas produções didáticas, como observado pelo
conjunto das ações praticadas pelos matemáticos Catunda, Castrucci e Jacy
Monteiro.
Com relação aos professores autores de livros didáticos, verificamos que
parcela deles recorreu ao auxílio de matemáticos para supervisionar suas obras
ou mesmo contou com matemáticos como co-autores, aproveitando-se dentre
outras qualidades, do renome e respeitabilidade de que gozavam esses
matemáticos, que além de emprestarem credibilidade ao livro didático, geravam a
expectativa de uma melhor divulgação daquela obra. De um lado, os matemáticos
participavam da elaboração dos textos, especialmente revisando os conteúdos
matemáticos; de outro, os professores tomavam parte na elaboração dessas
obras, apropriando-se da MM, levando em conta suas práticas de sala de aula,
em conformidade com a cultura escolar.
Essa relação permitiu a abertura de um novo mercado de trabalho para os
matemáticos brasileiros, na medida em que foram chamados a contribuir como
autores ou supervisores de livros didáticos. Esta ampliação do mercado de
trabalho favorecendo a classe dos matemáticos, decorreu da necessidade dos
professores, na elaboração de seus manuais didáticos, de proceder a inserção de
conteúdos de MM, o que exigia contar com a assessoria daqueles matemáticos. A
exploração desse novo filão, possibilitava aos matemáticos, além de ganhos
367
pecuniários, obter reconhecimento no âmbito da cultura escolar. Nota-se, desse
modo, que nessas relações não preponderavam apenas elementos políticos ou
ideológicos, havendo também motivações pessoais e econômicas.
No estudo das relações entre Matemática e seu ensino, envolvendo as
personagens Catunda, Castrucci e Jacy Monteiro, pudemos identificar a
preocupação desses matemáticos com o que representava a Matemática e seu
ensino para o desenvolvimento da sociedade.
Na “matematica para todos”, partia-se do pressuposto existente na época
do MMM, que para o desenvolvimento de uma sociedade moderna, esta
dependeria de conhecimentos científicos, que pudessem concorrer em favor do
crescimento da produção tecnológica. Nesse sentido, a matemática cumpriria um
papel fundamental, pensada como sustentáculo para os demais campos do saber
e instrumento essencial para compreensão e domínio do mundo. Portanto, a
matemática deveria ser ensinada a todos e isso sob uma versão moderna, por
meio da adoção da linguagem da Teoria dos Conjuntos e o conceito de estrutura,
o que permitiria à ciência matemática ganhar enorme vigor e possibilidade de
aplicação e progresso.
Catunda, Castrucci e Jacy Monteiro expressaram de modo explícito essa
preocupação. Catunda em seu pronunciamento sobre a posição da matemática
na cultura geral, durante a aula inaugural de 1945. Castrucci, em sua entrevista
datada de 1978, demonstrou preocupação em ministrar a matemática para todos,
sem focalizar necessariamente alunos que se destacavam na área da
matemática. Jacy Monteiro em seu discurso como paraninfo na Universidade
Mackenzie, em 1956, apontou a importância da formação de professores
pesquisadores, para promover a melhoria da sociedade.
Da mesma forma que os reformadores de outros países, é também no
contexto de uma “matemática para todos”, que Catunda, Castrucci e Jacy
Monteiro, cada um a seu modo, abraçaram a tese de uma urgente reestruturação
do ensino secundário, procurando adequá-lo aos novos tempos.
Cumpre destacar que, os professores de matemática estrangeiros, durante
a permanência na FFCLUSP, utilizaram-se de estratégias em relação aos
368
matemáticos brasileiros, que por sua vez, durante o MMM, usaram de estratégias
em relação aos professores de matemática. Contudo, considerando que
estratégias são indissociáveis de táticas, implica dizer que, os matemáticos
estrangeiros também utilizaram táticas ao trabalharem na formação dos
matemáticos brasileiros, que por sua vez, empregaram táticas quando, no
Movimento, envolveram-se com professores de matemática.
Assim, para implementar uma “matemática para todos”, esses matemáticos
brasileiros fizeram uso de estratégias, objetivando maior difusão dos conteúdos
de matemática moderna, e, consequentemente, também se valeram de táticas, na
medida em que consentiram em fazer concessões didáticas durante a elaboração
de livros didáticos em co-autoria com professores, embora sem renunciar ao rigor
matemático.
Na dinâmica dessas relações, a cultura acadêmica nutre-se da cultura
escolar e, esta do mesmo modo, também se nutre da cultura acadêmica. Há,
portanto, uma relação de retro alimentação.
Nessa dinâmica, constatou-se que os matemáticos envolvidos com o
MMM, mantinham um clima de confiança no sentido de poder oferecer um nível
de ensino de melhor qualidade aos acadêmicos, e, como conseqüência, para
aqueles que eventualmente viessem a dedicar-se à carreira do ensino secundário,
concorrendo assim, para um aprimoramento dos alunos secundaristas, que, por
sua vez, ao galgarem o status de universitários, estariam aptos a manter ou
aprimorar o padrão do ensino superior que lhes seria oferecido, criando por esse
processo um “círculo virtuoso”, o qual atenderia, não só as expectativas e
necessidades da academia, como também as da própria sociedade em que
estava inserida, permitindo a esta sociedade amplo acesso a novas tecnologias,
preparando-a para os novos tempos, tempos modernos.
369
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395
ANEXO I
A COLEÇÃO “MATEMÁTICA MODERNA
I. 1. Matemática Moderna I
O volume “Matemática Moderna I” encontra-se subdividido em sete
capítulos, a saber:
Capítulo I: Conjuntos e relações;
Capítulo II: Número e numeral; sistemas de numeração; bases;
Capítulo III: Operações com números naturais; propriedades estruturais;
Capítulo IV: Divisibilidade; múltiplos comuns e divisores comuns; números
primos; fatoração;
Capítulo V: Frações;
Capítulo VI: Números decimais;
Capítulo VII: Estudo intuitivo das principais figuras planas e espaciais;
medida de seus comprimentos, áreas e volumes.
Para melhor ilustrar os métodos utilizados pelos professores do CECIBA
visando atingir os objetivos enumerados, apresentamos alguns tópicos por eles
trabalhados, aqueles considerados mais representativos das inovações advindas
pela introdução da MM nos currículos.
No Capítulo I, dedicado ao desenvolvimento de conceitos fundamentais de
conjunto e relações, os autores parecem seguir as recomendações encontradas
396
no “Comentário I” do programa de Álgebra elaborado pela OECE
121
. Senão,
vejamos: a comissão de professores da OECE sugeria que, os alunos, por
esforço próprio, adquirissem uma compreensão da noção de conjunto, por meio
de exemplos encontrados em seu cotidiano, de modo que:
Com a ajuda constante dos estudantes, inúmeras aplicações
serão descobertas: o conjunto de alunos na classe, o conjunto dos
dedos da mão, o conjunto das flores de um ramalhete, o conjunto
das casas da região, os aviões de uma esquadrilha, as letras de
uma palavra, os verbos, os selos de uma coleção, etc... (GEEM,
1965, p. 10-11).
O convite aos alunos no sentido de ajudarem, de modo que novas
aplicações sejam descobertas, deixa implícita a preocupação com a idéia da
pesquisa, preconizada como pré-requisito para a melhoria do curso superior,
pressupondo a participação do aluno, abrindo, assim, as portas para que a
universidade pudesse contar com pessoas mais qualificadas, trazendo consigo
um eficaz interesse pela investigação científica.
Nesse sentido, o livro didático “Matemática Moderna I” inicia seu primeiro
capítulo da seguinte maneira:
1. Noção de conjunto
Uma fila de carteiras,
as flores de um jarro,
as casas de uma rua,
São coleções ou conjuntos
de carteiras, flores e casas,
respectivamente.
Outros exemplos:
1) Os alunos de uma classe.
2) As classes de um Colégio.
3) Os dedos da mão.
4) Os aviões de uma esquadrilha.
5) Uma pilha de livros.
6) Os mapas da classe.
7) As letras de uma palavra.
8) As árvores de um pomar.
121
Obra elaborada com incentivo da OECE (Organização Européia de Cooperação Econômica), sob o título
Um programme moderne de mathématiques pour l’enseignement secondaire”, traduzida por Jacy Monteiro e
publicada pelo GEEM na série Professor nº 2, em 1965. Elaborada por um “grupo de peritos”, composto por
“professores de matemática das universidades, das escolas secundárias e das instituições encarregadas de
formar os professores do ensino secundário” de diversos países europeus, encarregada de organizar um
quadro sinótico do conjunto das matérias a ser tratado no ensino secundário de matemática, indicando e
justificando diferentes formas de tratar as questões expostas (GEEM, 1965, p. 1).
397
9) Os jogadores de um time [grifos das autoras] (DANTAS, et
alli, s/d, p. 1).
Verifica-se, portanto, que alguns dos exemplos citados pelo grupo da
OECE, são utilizados pelos autores do manual. Além disso, outras sugestões são
acatadas, como a abundante utilização de representação em diagrama
122
, para
possibilitar a visualização das operações com conjuntos, suas relações e
aplicações.
No item 8, destinado a apresentação da idéia de relação, o manual didático
utiliza-se de flechas para representar as propriedades das relações (reflexiva,
simétrica e transitiva). Para representar a propriedade reflexiva, os autores
adotaram a figura de uma argola, sem a adição de uma flecha.
O uso da figura da argola para representar a propriedade reflexiva é
sugerida por George Papy, segundo o qual, ambas as convenções (por meio de
uma argola ou laço, podendo vir acrescentada ou não por uma flecha) são
aceitáveis “mas é divertido observar que em classes onde uma flecha é
adicionada ao laço, essa flecha, como um órgão sem função, se atrofia e
eventualmente desaparece” (PAPY, apud ANAIS V CBEM, 1966, p. 94).
E E
Relativamente à relação reflexiva, encontramos no “Matemática Moderna I
o seguinte comentário: “No caso em que um elemento está relacionado com ele
próprio, é suficiente representar a relação por uma argola, como faz o Prof. Papy
no seu livro ‘Mathématique Moderne I’“ (DANTAS et alli, s/d, p. 12).
Esse comentário indica que esse manual não era dedicado especialmente
ao uso dos alunos e sim dos professores, pois, crianças entre 10 e 11 anos
122
A representação de conjuntos por partes do plano é chamada de diagrama. Tem a vantagem intuitiva da
visualização das propriedades. No caso em que se usa somente círculos, os diagramas são chamados de
Euler ou de Venn. Os diagramas foram introduzidos pela primeira vez por Euler em “Cartas a uma princesa
da Alemanha” (1770-1772), para explicar algumas proposições lógicas. Em 1880, John Venn propôs nova
forma de diagramas circulares em seu livro Symbolic Logic”, dando uma interpretação com maiores recursos
(CASTRUCCI, 1967, p. 37-47).
398
dificilmente teriam acesso ao livro mencionado
123
, de autoria de George Papy,
encontrando, também, uma provável dificuldade de leitura de um texto escrito em
francês. Entretanto, a leitura do texto, até aquele momento, sugeria que a
linguagem utilizada pelos autores para as lições ali ministradas destinava-se aos
alunos, mas ao se reportar ao autor francês e sua obra, pudemos inferir que a
apostila destinava-se, na verdade, aos professores, que em tese, teriam alguma
familiaridade com Papy.
Após a apresentação da noção intuitiva de conjuntos, são introduzidas as
operações entre conjuntos como também são trabalhadas as propriedades de
reflexão, simetria, transitividade, associatividade, comutatividade, recorrendo, a
cada etapa, a exemplos para melhor compreensão do assunto e dos exercícios.
O Capítulo III trata das operações com números naturais e suas
propriedades estruturais. Para a adição, encontra-se a seguinte definição:
Pode-se dizer, também, que a adição de dois números naturais é
uma aplicação N x N (N cartesiano N) sobre N, isto é, a aplicação
que a cada par (a, b) de números naturais faz corresponder sua
soma a + b.
Em símbolos, tem-se
F: N x N ĺ N;
(a, b) ĺ a + b,
com a ɽ N; b ɽ N e a + b ɽ N.
Exemplo:
(2,3) 5
(0,0) 0
(1,8) 9
(0,6) 6
(4,5)
(7,3) 10
(9,9) 18
onde 2 + 3 = 5, 0 + 0 = 0, 0 + 6 = 6, 1 + 8 = 9, 4 + 5 = 9,
7 + 3 = 10, 9 + 9 = 18
123
Mathematique Moderne I”, de George Papy, edição Didier – Bruxelles – Paris, 1963.
399
Como, quaisquer que sejam os números naturais a
e b, existe
sempre um número natural c
tal que
a + b = c,
diz-se que o conjunto dos números naturais é fechado
em relação
à adição [grifos das autoras] (DANTAS, s/d, p. 42-43).
Em seguida, os autores explanam sobre as propriedades da adição, quais
sejam, comutativa, associativa e a existência do elemento neutro, permitindo-lhes
explicar o porquê da regra prática da adição, já estudada no ensino primário:
2ª) Efetuar:
5490 + 213 + 1145 + 8.
Aplicando-se as propriedades associativa e comutativa da adição,
tem-se,
5490 + 213 + 1145 + 8 =
= (5000 + 400 + 90) + (200 + 10 + 3) + (1000 + 100 + 40 + 5) + 8 =
= (5000 + 1000) + (400 + 200 + 100) + (90 + 10 + 40) + (3 + 5 + 8) =
= 6000 + 700 + (140) + (16) =
= 6000 + 700 + (100 + 40) + (10 + 6) =
= 6000 + (700 + 100) + (40 + 10) + 6 =
= 6000 + 800 + 50 + 6 =
= 6856.
Dispositivo prático:
5490
213
1145
8
6856
[...]
Observação importante
:
Como se viu, o conjunto dos números naturais é fechado
, em
relação à adição, e, além disso, esta operação goza da
propriedade associativa
. Nestas condições, diz-se que o conjunto
dos números naturais tem a estrutura de monóide
124
em relação à
adição [grifos das autoras] (DANTAS, s/d, p. 46-48).
Da mesma forma, são realizados os estudos das outras operações com
números naturais (subtração, multiplicação e divisão), buscando fundamentar o
estudo dessas operações com as respectivas propriedades estruturais, por meio
da Teoria dos Conjuntos.
124
Uma operação (*) define em um conjunto A uma estrutura de monóide se e somente se é associativa e
existe elemento neutro. Ou seja, para quaisquer a, b, c pertencentes a A, tem-se (a*b)*c = a* (b*c) e existe e
pertencente a A, de modo que, para qualquer a pertencente a A, a*e=e*a=a (CASTRUCCI, 1967, p. 102).
400
Em seguida, o primeiro volume, apresenta o conjunto dos números
racionais absolutos, suas operações e as propriedades estruturais relativas a
essas operações. De modo geral, nesse manual, são ressaltadas as estruturas
monóide e grupo.
I. 2. Matemática Moderna II
Os capítulos seguem a seguinte disposição:
Capítulo I: Raiz quadrada;
Capítulo II: Razão e proporção;
Capítulo III: Números inteiros relativos;
Capítulo IV: Números racionais relativos;
Capítulo V: Equação do 1º grau com uma incógnita;
Capítulo VI: Inequações do 1º grau com uma incógnita;
Capítulo VII: sistemas de equações do 1º grau com duas incógnitas.
Dando continuidade às operações no conjunto dos números racionais, o
segundo livro da série apresenta a operação radiciação e aplicações.
Visando a ampliação sucessiva dos campos numéricos, são introduzidos o
conjunto dos números inteiros, suas operações e propriedades, destacando a
estrutura de anel, como se pode verificar pela seguinte nota:
Observação importante:
Como se viu, o conjunto, Z, dos números inteiros relativos tem
uma estrutura
de grupo abeliano, em relação à adição e, além
disso, a multiplicação goza da propriedade associativa
e da
propriedade distributiva em relação à adição. Nestas condições,
diz-se que o conjunto dos números inteiros relativos tem uma
estrutura
de anel,emrelação às operações de adição e
multiplicação
.
Além disso, como a multiplicação goza, também, da propriedade
comutativa
, diz-se que o conjunto dos números inteiros relativos é
um anel
comutativo [grifo das autoras] (DANTAS et alli, 1968, p.
109).
No tópico destinado aos números inteiros relativos, encontra-se definida
uma aplicação denominada “translação de vetor a
”, do seguinte modo:
401
Seja f
a aplicação que a cada número inteiro relativo, x, faz
corresponder x+a, sendo a ɽ Z, e a fixo.
Em símbolos tem-se: f: Z Z
x x + a
Essa aplicação, interpretada, facilmente, na reta, chama-se
translação
de vetor a [grifo das autoras] (DANTAS et alli, 1968, p.
109).
I. 3. Matemática Moderna III
Destinado à terceira série ginasial, “Matemática Moderna III”, os assuntos
nele tratados seguem a seguinte divisão:
Noções de lógica;
Capítulo I: Números reais;
Capítulo II: Reta;
Capítulo III: Geometria afim no plano;
Capítulo IV: Geometria euclidiana: distâncias e polígonos.
Definindo como “axiomática da teoria” o conjunto de conceitos primitivos e
postulados, exemplifica com a “axiomática da teoria dos conjuntos” na qual o
conceito de conjunto e o de relação de pertinência de um elemento a um
conjunto, ou seja, a relação x ȯ A, em que A é um conjunto, são admitidos como
conceitos primitivos. Admitem também como proposições primitivas os seguintes
axiomas:
1. Axioma de unicidade
.ABeBABA
2. Axioma
de união
Dados dois conjuntos quaisquer, A e B, existe um conjunto
AUB, chamado união, cujos elementos são todos os elementos
de A e todos os elementos de B, e somente esses.
3. Axioma
da diferença
Dados dois conjuntos quaisquer, A e B, existe um conjunto A \
B, cujos elementos são os que pertencem a A e não pertencem
a B, e somente esses.
4. Axioma
de existência
Existe, pelo menos, um conjunto (DANTAS, et alli, 1969, p. 10).
402
Aos axiomas são acrescidas as seguintes observações:
1ª) Não é necessário supor um axioma para a intersecção, pois é
fácil verificar que
A ŀ B = A \ (A \ B),
Ou seja, a intersecção pode ser definida em termos de
diferença.
2ª) A existência do conjunto vazio está garantida pelos axiomas 3.
e 4.
De fato, pelo axioma 4, existe, pelo menos, um conjunto; seja
A esse conjunto; pelo axioma 3., tem-se A \ A = Ø .
3ª) Qualquer outra propriedade da teoria dos conjuntos resulta dos
quatro axiomas enunciados acima e constitui o que se chamou
um teorema (DANTAS, et alli, 1969, p. 10-11).
O livro também traz definida uma translação de vetor v, de modo que, a
cada ponto P pertencente a uma reta r, faz corresponder um ponto Q pertencente
a r. O vetor v, que leva P em Q é indicado por v = QP e vem acompanhado da
seguinte representação figural:
P v Q r
Acompanha, igualmente, a seguinte definição:
... dado o ponto P e a translação de vetor v, o ponto Q obtido de
P, por esta translação, diz-se transformado
de P pela translação
dada, e indica-se por
Q = P + v.
Se a reta está referida a dois pontos O e U, correspondentes aos
números 0 e 1, respectivamente, então, cada ponto da reta é
representado por um número real, e ao vetor v
corresponde,
também um número real de tal modo que se v é a diferença entre
dois pontos, Q e P, por exemplo, de abscissas y
e x,
respectivamente, então, ao vetor v
, corresponde o número real
x
y
D
[grifos das autoras] (DANTAS et alli, 1969, p. 42-43).
Em seguida, as autoras denominam o número real Į como “valor algébrico
do vetor v” sendo que módulo do vetor v, indicado por
PQouv
, é a
distância entre os pontos P e Q. Desse modo, é fixado o sistema de referência,
em que as translações de uma reta, sobre si mesma, representam números reais.
403
No Capítulo III, denominado “Geometria afim no plano
125
”, as autoras
retomam os principais tópicos apresentados no capítulo anterior, especialmente
ao que se refere à correspondência de cada número real a um vetor e à
correspondência de cada vetor a uma translação da reta sobre si mesma, de
modo que, passou-se a designar cada translação pelo próprio vetor.
Essas noções serviram para fundamentar o sub-capítulo “Translações no
plano”, em que se encontram definidas a soma de um ponto com um vetor e a
diferença de pontos, de forma que, em seguida, são descritas as propriedades
relativas a conjunto qualquer de vetores, indicado por V, numeradas de 1 a 10, de
modo a evidenciar que formam um Espaço Vetorial:
P
1
: O conjunto V é fechado em relação à adição, isto é, a dois
vetores quaisquer, u
e v, de V, corresponde o vetor u + v;
P
2
: u + v = v + u (propriedade comutativa);
P
3
: (u + v) + w = u + (v + w) (propriedade associativa);
P
4
: existe elemento neutro, isto é, existe o vetor nulo, 0,
(translação identidade) tal que 0 + u = u + 0 = u, qualquer que
seja u
;
P
5
: existe o oposto –u, de u, tal que u + (-u) = -u + u = 0, qualquer
que seja -u
;
Vue
O
, corresponde Vu
O
;P
6
: a
P
7
: 1 . u = u;
P
8
: uu .)(
P
O
P
O
;
P
9
: uuu
E
D
E
D
)( ;
P
10
: vuvu
D
D
D
)( .
Um conjunto como esse conjunto V, que goza dessas
propriedades, de (P
1
a P
10
) diz-se um espaço vetorial [grifos das
autoras] (DANTAS et alli, 1969, p. 78).
Nessas condições, as autoras passam a considerar um conjunto de pontos
denominados por E, o qual associado ao Espaço Vetorial V, satisfazem as
seguintes propriedades:
1ª) Dois pontos P e Q de E, determinam um vetor v, de V, que se
designa por v = P – Q e se chama vetor
translação de Q a P;
2ª) Dado um ponto Q, de E, e um vetor u
, de V, fica determinado
um ponto P de E,
P = Q + u,
que se diz obtido de Q pela translação u
.
125
Ao conjunto de propriedades da geometria euclidiana que não dependem da noção de distância é
denominado geometria afim (RODRIGUES, 1969).
404
3ª) Dado um ponto P, de E, e dois vetores u e v, de V, tem-se
P + (u + v) = (P + u) + v [grifos das autoras] (DANTAS et alli,
1969, p. 78).
Dessa maneira, o conjunto de pontos E é chamado de espaço afim,
associado ao Espaço Vetorial V. Seus elementos são chamados de pontos e,
qualquer subconjunto de pontos do espaço afim é denominado de figura nesse
espaço (DANTAS, et alli, 1969, p. 78).
O manual também apresenta noções de Base e Dimensão de um Espaço
Vetorial e Dependência Linear, considerando o espaço afim determinado pelo
conjunto dos números reais. Enfatiza-se especialmente a estrutura de espaço
vetorial do conjunto das translações no plano. A partir dessas definições e
considerações, o manual passou a realizar o estudo,
... das coordenadas cartesianas ligadas a um sistema de
referência constituído por um ponto O e dois vetores não paralelos
u e v (sistema Ouv). Estudam, então, as retas do plano, as semi-
retas, os segmentos, as figuras geométricas que não dependem
do conceito de distância, isto é, que são conceitos afins: semi-
planos, faixas, semi-faixas, ângulos, triângulos, paralelogramos,
trapézios e quadriláteros convexos em geral (DANTAS, et alli,
1969, p. IV).
Somente após a exploração da parte de espaços vetorial e afim de duas
dimensões, inicia-se a parte métrica da Geometria elementar, ou seja, a
Geometria Euclidiana: triângulo isósceles, bissetriz, etc...
405
ANEXO II
MATEMÁTICA: CURSO MODERNO
Tabela I
Matemática: curso moderno
V. 1 (Castrucci; Bóscolo)
Matemática: curso moderno
V. 1 (Sangiorgi)
I. Conjuntos; o conceito de número; a sucessão
dos números inteiros naturais; Sistema de
numeração decimal.
II. Adição; subtração; multiplicação; divisão;
potenciação; raiz quadrada; expressões
aritméticas.
1. Noções de conjunto; operações com
conjuntos; relações;
2. número natural; numerais de um número –
sistemas de numeração – bases;
3. operações (operações inversas) com os
números naturais – propriedades
estruturais;
III. Divisibilidade; máximo divisor comum;
mínimo múltiplo comum.
4. divisibilidade – múltiplos e divisores;
números primos; fatoração completa;
IV. Os números racionais; operações com
números racionais; representação decimal dos
números racionais.
5. conjunto dos números racionais; números
fracionários – operações (operações inversas);
propriedades estruturais;
V. Medidas de comprimento; medidas de
superfície; áreas de figuras planas; volume dos
corpos; volumes dos sólidos geométricos;
medidas de massa; medidas não-decimais.
6. estudo intuitivo das principais figuras
geométricas planas e espaciais – sistemas de
medidas: decimal e não decimais.
406
Tabela II
Matemática: curso moderno
V. 2 (Castrucci; Bóscolo)
Matemática: curso moderno
V. 2 (Sangiorgi)
1. Conceito de número racional absoluto;
novo conjunto numérico Q; igualdade e
desigualdade de números racionais;
operações com números racionais;
propriedades estruturais; teste de
recapitulação.
Razões; aplicações; razões especiais:
velocidade..; proporções; propriedades;
proporções especiais; médias, ... ,
transformações; segmentos proporcionais;
por cento; porcentagem; teste de
recapitulação.
I. Potenciação e radiciação (no conjunto dos
números racionais)
II. Extração da raiz quadrada (no conjunto dos
números racionais)
2. Números proporcionais; problemas com
novas estruturas; grandezas proporcionais;
regra de três (R3S, R3C); juros simples,
desconto; câmbio; teste de recapitulação.
III. O conjunto dos números inteiros relativos.
IV. Adição e subtração.
V. Multiplicação e divisão.
VI. Potenciação e extração da raiz quadrada.
VII. O conjunto dos números racionais relativos.
3. números inteiros relativos; conjunto Z;
operações com conjuntos; estrutura de
ordem; valor absoluto; operações com
números inteiros relativos; adição;
propriedades estruturais; divisão;
potenciação; técnicas de cálculo; radiciação;
conceito de número racional relativo; conjunto
Q; operações; propriedades estruturais; teste
de recapitulação.
VIII. Equações do 1º grau com uma variável.
IX. Problemas do 1º grau.
X. Inequações.
XI. Sistemas de equações simultâneas.
XII. Razões e proporções.
XIII. Razões entre grandezas.
XIV. Regra de três simples. Porcentagem.
XV. Exercícios de recapitulação.
4. Moderno tratamento da álgebra;
sentenças e expressões; sentenças abertas;
variáveis; conjunto-universo (U); conjunto-
verdade (V), equações e inequações –
equações do primeiro grau; resolução de
equações no Q; princípios fundamentais;
técnicas; novas técnicas operatórias;
quantificadores; identidade; inequações do
primeiro grau; inequações simultâneas;
relações binárias; sentenças abertas com
duas variáveis; sistema de equações
simultâneas; técnicas de substituição;
adição e comparação; discussão.
Apêndice (CASTRUCCI; BÓSCOLO, 1967, p.
290).
Apêndice: lembrando relações; Lembrando
sentenças abertas;sistemas matemáticos
(SANGIORGI, 1969).
407
Tabela III
Matemática: curso moderno
V. 3 (Castrucci; Bóscolo)
Matemática: curso moderno
V. 3 (Sangiorgi)
I – Regra de três composta. Juros
Simples.
II – números proporcionais e médias.
III – Cálculo literal : expressões iguais,
quantificador universal, simplificação de
expressões literais.
IV – Expressões monômias
V – Expressões polinômias; operações,
VI – Produtos notáveis. Fatoração.
VII – Frações algébricas
VIII – Simplificação de expressões
literais. Verificação de identidades.
IX – Equações fracionárias. Equações
literais.
X – Sistemas de equações simultâneas.
XI - Números reais
1 – Números reais; estrutura de corpo
- Números racionais, números irracionais, números
reais, reta real; operações no conjunto IR, adição e
multiplicação; estrutura de corpo, potenciação e
radiciação.
2 – Cálculo algébrico; estudo dos polinômios
- Expressões literais; operações em IR, expressões
equivalentes, uso do quantificador
, têrmos
semelhantes, expressões literais, cálculo com têrmos
semelhantes; reduções; técnicas para o cálculo
algébrico, técnicas usuais na multiplicação; “produtos
notáveis”, técnicas de fatoração, técnicas de simplificar
expressões; complementação do estudo das equações,
inequações e sistemas do primeiro grau; equações e
inequações com uma variável, redutíveis ao primeiro
grau, sistemas de equações simultâneas; tratamento
elementar moderno dos polinômios; conceito de
polinômio em uma variável, igualdade de polinômios,
operações com polinômios; estrutura de anel.
XII – Semi-Retas. Segmentos de retas.
XIII – Ângulos
XIV – Triângulos
XV – Perpendicularismo e paralelismo
XVI – Soma das medidas dos ângulos
internos de um triângulo
XVII – Quadriláteros. Polígonos.
XVIII – Circunferência
XIX – Exercícios de Geometria
APÊNDICE. Transformações do plano
(CASTRUCCI; BÓSCOLO, 1969, p.298).
3 – Estudo das figuras geométricas.
- Objetivos da geometria, figuras geométricas planas;
curvas fechadas simples, um pouco de topologia;
relações e operações com conjuntos de pontos no
plano, estrutura de ordem; relação … estar entre…,
semi-reta; segmento de reta; semi-plano, medida de
segmentos; segmentos congruentes; conceito de
ângulo, medida de ângulos; ângulos congruentes,
ângulos complementares; ângulos suplementares;
práticas demonstrativas, ângulos formados por duas
retas coplanares e uma transversal.
4 – Estudo dos polígonos e da circunferência.
- Conceito de polígono; diagonais, estudo dos triângulos,
congruência de triângulos; construção lógica da
Geometria, da necessidade de provas, Postulados e
Teoremas da Geometria em estudo, primeiros teoremas;
forma “se-então”, como efetuar uma demonstração
logicamente, teorema recíproco de outro teorema,
método indireto na demonstração de um teorema,
alguns teoremas fundamentais: sobre triângulos, sobre
retas paralelas, sobre ângulos, sobre polígonos
convexos; quadriláteros: paralelogramo; teoremas
fundamentais, trapézios; teoremas fundamentais;
circunferência; teoremas fundamentais, círculo ou disco
fechado; propriedades das cordas, posições relativas de
duas circunferências, posições relativas da reta e
circunferência, arcos de circunferência; medida,
propriedades fundamentais entre arcos e cordas,
ângulos relacionados com arcos; medidas, polígonos
inscritos e circunscritos a uma circunferência.
APÊNDICE – Transformações geométricas.
- Grupo das translações, grupo das rotações e simetrias
(SANGIORGI, 1966).
408
Tabela IV
Matemática: Curso Moderno
(V. 4 Castrucci; Bóscolo)
Matemática: curso moderno
V. 4 (Sangiorgi)
I – Cálculo com radicais. Potência com
expoente fracionário.
II – Equações do segundo grau.
III – Relações entre os coeficientes e as raízes.
IV – Equações redutíveis ao segundo grau.
V – Sistemas simples do segundo grau.
Problemas do segundo grau.
VI – Sistemas de coordenadas.
1. Números reais: práticas com números
irracionais
- Cálculo com radicais;
- Transformação de radicais;
- Operações combinadas;
- Casos simples de racionalização
- Equações do segundo grau;
- Como resolver;
- Discussão;
- Relações entre coeficientes e as raízes;
- Conseqüências;
- Equações biquadradas;
- Equações irracionais
- Sistemas simples do segundo grau;
- problemas do segundo grau.
Números reais: práticas com números
irracionais
- Cálculo com radicais;
- Transformação de radicais;
- Operações combinadas;
- Casos simples de racionalização
- Equações do segundo grau;
- Como resolver;
- Discussão;
- Relações entre coeficientes e as raízes;
- Conseqüências;
- Equações biquadradas;
- Equações irracionais
- Sistemas simples do segundo grau;
- problemas do segundo grau.
VII – Funções.
VIII – A função binômio do primeiro grau.
IX – A função trinômio do segundo grau.
X – Inequação do segundo grau.
2. Funções
- Conceito de função;
- Domínio e conjunto-imagem;
- Funções definidas por sentenças matemáticas
(equações);
- Coordenadas cartesianas no plano;
- Gráficos das funções definidas por equações;
- Funções lineares (afins), gráfico;
- Iniciação à Geometria Analítica;
- Gráficos de inequações do primeiro grau;
- Função trinômio do segundo grau, gráfico;
- Estudo algébrico, aplicações;
- Inequações do segundo grau.
409
XI – Segmentos proporcionais.
XII – Semelhança de polígonos.
XIII – Relações métricas no triângulo
retângulo.
XIV – Relações métricas num triângulo
qualquer e na circunferência.
XV – Polígonos regulares.
XVI – Medida da circunferência.
XVII – Áreas de figuras planas.
3.Semelhança
- Razão e proporção de segmentos;
- Feixe de paralelas: Teorema de Tales;
- Semelhança como correspondência;
- Semelhança de triângulos e de polígonos
- Similitude central ou homotetia;
- Razões trigonométricas de ângulos agudos;
- Relações métricas no triângulo retângulo;
- Teorema de Pitágoras;
- Relações métricas num triângulo qualquer;
- Relações métricas no círculo;
- Polígonos regulares;
- Relações métricas nos polígonos regulares;
- Medidas da circunferência;
- Cálculo do ʌ.
APÊNDICE
- Revisão;
- Posição de um número em relação às raízes
do trinômio;
- Semelhança no plano.
(CASTRUCCI; BÓSCOLO, 1970, p.283).
4. APÊNDICE
- Números complexos;
- Área de regiões planas; práticas usuais;
- Mapas topológicos.
(SANGIORGI, 1971).
410
ANEXO III
O PROGRAMA DA FFCLUSP E AS NOTAS DE AULA DE
D’AMBROSIO
PROGRAMA DA
FFCLUSP (1953)
NOTAS DE AULA DE D’AMBROSIO (1952)
2.º ano 2º ano
COMPLEMENTOS DE GEOMETRIA COMPLEMENTOS DE GEOMETRIA
(ESPAÇOS VETORIAIS)
Prof. Cândido Lima da Silva Dias
1 - Espaço vectorial. Definição de
dependência linear. Base. Dimensão
de um espaço vectorial. Espaços
vectoriais isomorfos. Sub-espaço e
espaço vectorial quociente. Espaço
vectorial dual. Reflexividade dos
espaços vectoriais de dimensão finita.
Soma direta.
Vetor; espaço vetorial; dependência linear;
combinação linear; base; dimensão;
isomorfismo; subsepaço vetorial; itersecção
de subespaço; geração; soma de
subespaço; soma direta de subespaço;
dimensão da soma direta; forma linear;
espaço dual; forma bilinear fundamental;
dual de dual; isomorfismo canônico;
espaços reflexivos; anuladores; soma
direta.
2 - Transformações lineares sôbre um
espaço vectorial. Matrizes. Operações
sôbre matrizes. Determinantes.
Estrutura de uma transformação linear
qualquer. Forma canônica de Jordan.
Transformações lineares de um espaço em
outro; transformação inversa; matriz
associada a uma transformação linear;
redução completa de uma transformação;
transformação idempotente; involução;
sistemas lineares; característica; forma
canônica de uma matriz ou de Jordan.
3 - Espaço vectorial normado. Espaço
vectorial euclideano e unitário. Base
ortonormal. Formas bilinear,
quadrática, hermitiana e suas
reduções.
Espaço vetorial normado. Espaço vetorial
completo. Transformações lineares
definidas num espaço normado;
continuidade de um transformação;
transformação linear limitada; rotação.
4 - Álgebra. Definição e exemplos.
Álgebra de Grassmann. definição e
construção. Formas de grau p.
Determinante. Aplicações das álgebras
de Grassmann ao estudo dos sub-
espaços de um espaço vectorial.
411
3.º ano (1953) 3º ANO (1953)
GEOMETRIA SUPERIOR (Álgebra) GEOMETRIA SUPERIOR (Álgebra)
Prof. L. H. Jacy Monteiro
Teoria dos corpos comutativos.
I - Noções preliminares sôbre a teoria dos
grupos, anéis e corpos.
1 - Grupos; sub-grupos normais; grupos,
quocientes; homomorfismos.
Grupos; grupo finito; relações de
equivalência; classes de equivalência;
partição; subgrupo normal; grupos
quocientes; homomorfismos.
2 - Anéis; sub-anéis; ideais; anéis
quocientes; homomorfismos; ideais
primos e maximais.
Anéis; subaneis; ideais; anéis quocientes;
homomorfismos; ideais primos e maximais.
3 - Corpos; sub-corpos; corpo de
quocientes de um campo de
integridade; Característica de um
corpo, corpo primo.
Corpos; subcorpos; homomorfismo de um
corpo; corpo de frações de um campo de
integridade; característica de um corpo;
corpo primo.
II – Anéis de polinômios.
1 - Álgebras; bases de uma álgebra. Espaços vetoriais; subespaço vetorial;
álgebras ou sistemas hipercomplexos;
exemplos de álgebras.
2 - Anéis de polinômios; corpo de frações
de um anel de polinômios; estrutura do
anel de polinômios de uma in-
determinada.
Anéis de polinômios; anel de polinômios
com um número qualquer de
indeterminadas; estrutura do anel de
polinômios com uma indeterminada; função
polinômio;corpo de frações racionais.
III - Estudo geral das extensões de um
corpo.
1 - Extensões algébricas; propriedades.
2 - Extensões transcendentes: famílias
algèbricamente livres; extensões
transcendentes puras; teoremas de
Steinitz, bases de transcendência.
3 - Extensões algébricas algèbricamente
fechadas.
Extensões algébricas e transcendentes;
elementos algébricos; transitividade das
extensões algébricas; extensões
transcendentes; bases de transcendência;
corpos algebricamente fechados; teorema
de Steinitz; prolongamento de um
isomorfismo.
IV - Isomorfismos das extensões algébricas
de um corpo.
1 - Isomorfismos relativos; propriedades.
2 - Extensões separáveis
3 - Extensões inseparáveis; extensões
radiciais.
V - Extensões normais e teoria de Galois.
1 - Extensões normais; propriedades.
2 - Teoria de Galois.
VI – Aplicações da teoria de Galois.
1 - Funções simétricas.
2 - Raízes da unidade: raízes primitivas;
polinômios ciclotômicos.
3 - Corpos finitos.
4 - Extensões cíclicas.
5 - Resolução das equações algébricas
pela teoria de Galois:
6 - Grupos resolúveis; resolução de
equações algébricas por radicais;
equação de divisão da circunferência;
teorema de Ruffini-Abel; equações do
segundo, terceiro e quarto graus;
construções pela régua e compasso.
412
CRONOLOGIA OMAR CATUNDA
1906 – Nasceu Omar Catunda, em 23 de setembro, na cidade de Santos.
1925 – Ingressou na Escola Politécnica da USP. Recebeu o prêmio Cesário
Motta.
1930 – Formou-se engenheiro pela Escola Politécnica da USP. Foi orador de sua
turma.
1933 – Candidatou-se à vaga para ocupar a cadeira de “Complementos de
Geometria Analítica, Nomografia e Cálculo Diferencial Integral” na Escola
Politécnica da USP. José Octávio Monteiro de Camargo venceu o concurso.
1934 – A convite de Theodoro Ramos, Catunda passou a trabalhar como
assistente de Luigi Fantappiè na FFCLUSP.
1938/1939 – Catunda estudou quatro meses com Francesco Severi, na
Universidade de Roma.
1939 – Omar Catunda foi nomeado professor interino de Análise Matemática e
Chefe do Departamento de Matemática da FFCLUSP.
1942 – Tornou-se professor interino da cadeira de Geometria Superior e
Complementos de Geometria.
1942 – Publica o trabalho “Sobre os sistemas de equações de variações totais em
mais de um funcional incógnito” nos Anais da Academia Brasileira de Ciências, t.
XIV.
1944 – Catunda tornou-se catedrático de Análise Matemática na FFCLUSP.
1945 – Catunda é eleito presidente da Sociedade de Matemática de São Paulo.
1946 – Em setembro, Catunda segue para a Universidade de Princeton agraciado
com bolsa de estudos da Fundação Rockefeller e lá permanece até 1947.
413
1946 – É publicado, na “Summa Brasiliensis Mathematicae”, vol. 1, fasc. 2, seu
trabalho “Sobre uma modificação da fórmula de Cauchy”.
1947 – Redigiu apostila do curso sobre “Equações Diferenciais”, desenvolvido em
Princeton pelo professor Richard Bellman.
1948 – Publicado o livro didático “Matemática” para a 2ª série Colegial – Catunda
escreveu o capítulo sobre Análise Combinatória, Determinantes e Equações
Lineares.
1948 – Participou da banca examinadora do concurso para ingresso no magistério
do Estado de São Paulo (BARALDI, 2003).
1949 – Catunda é nomeado presidente da banca examinadora para o segundo
concurso de ingresso para o magistério secundário.
1951 – É encarregado de ministrar curso de férias para professores do ensino
secundário e normal do Estado, realizados em colaboração com a Secretaria de
Educação.
1957 – Participação no primeiro “Colloquium Brasileiro de Matemática” em Poços
de Caldas/MG, apresentando a conferência “Estudo dos pontos singulares das
equações diferenciais sobre a esfera”.
1957 – Omar Catunda supervisiona textos elaborados pela professora Marta
Dantas para Matemática Moderna. Cursos dados no CECIBA – Centro de Ensino
de Ciências da Bahia - Colégio de Aplicação da UFBA (depoimento de Dantas no
V Seminário Nacional de História da Matemática, Rio Claro, UNESP, 13-16 abril,
2003.
1959 – Membro da comissão organizadora do segundo “Colloquium Brasileiro de
Matemática” em Poços de Caldas/MG, ministrando um curso sobre “Superfícies
de Riemman” e uma conferência intitulada “Introdução aos debates sobre o
ensino de matemática nas escolas superiores”.
1959 – III Congresso Brasileiro do Ensino da Matemática, realizado no Rio de
Janeiro, de 20 a 25 de julho. Catunda apresentou tese intitulada “Sobre uma
Revista de Matemática para o Ensino Médio”, juntamente com o professor Elon
Lages Lima.
1960 – Realiza a conferência “Sistemas diferenciais lineares e problemas
assintóticos” no ITA.
1961 – Catunda participou da I Conferência Interamericana de Educação
Matemática em Bogotá.
1962 – Catunda presidiu reunião no GEEM, assessorado por Osvaldo Sangiorgi.
Foi realizada na Faculdade de Filosofia da Universidade Mackenzie, com o
objetivo de apresentar relatórios das experiências realizadas sobre a introdução
da Matemática Moderna no ensino secundário. Discutiu-se sobre os assuntos
mínimos de um programa de matemática para o ginásio, enfatizando os conceitos
de conjuntos e estruturas e de como adequá-lo ao programa de matemática em
414
vista da LDB. Jornal Folha de São Paulo, 21/05/1962, “Professores discutem
ensino da Matemática Moderna”.
1962 – Catunda apresentou trabalho “Conceitos fundamentais da matemática:
conjuntos e estruturas”, no IV Congresso Brasileiro do Ensino da Matemática
realizado no Pará, de 22 a 26 de julho.
1962 – Aposentou-se do cargo de professor do IMEUSP.
1963 – Seguiu de mudança para Salvador/Ba, assumindo o cargo de Diretor do
Instituto de Matemática e Física da Universidade Federal da Bahia.
1964 – Realização da Comissão Interamericana de Educação Matemática CIAEM
na Guanabara, no qual destacamos a participação de convidados como:
Lindolpho de Carvalho Dias do IMPA e Osvaldo Sangiorgi do GEEM. Jornal O
Estado de São Paulo, 27/12/1964, “Apresentadas as conclusões pela reunião de
Educação Matemática
1966 – Realizou-se a II Conferência Interamericana de Educação Matemática em
Lima, de 10 a 15 de janeiro. Catunda coordenou uma sessão de estudo sobre
Geometria: Um tratamento moderno”.
1966 – Iniciou a elaboração de um projeto de livros didáticos, juntamente com um
grupo de professoras lideradas por Martha de Souza Dantas.
1966 – Reportagem sobre Congresso Internacional de Matemática ocorrido em
Moscou, de 13 a 26 de agosto de 1966 destaca a presença dos matemáticos
brasileiros Omar Catunda, Alexandre Martins Rodrigues, Maurício Peixoto,
Constantino de Barros e Ubiratan D’Ambrosio. Jornal folha de São Paulo,
18/09/1966, “URSS dá medalha a matemáticos dos EUA”.
1967 – Omar Catunda participou do curso do GEEM como professor convidado
para dar conferências especiais sobre o ensino moderno da Geometria. Jornal
Folha de São Paulo, 15/01/1967, “Renovação da Matemática”.
1967 – Jornal do Centro de Treinamento para Professores de Ciências informou
que foram organizadas sessões de estudos sobre o ensino moderno de
Geometria a cargo de Omar Catunda, no GEEM, de 2 a 21 de janeiro de 1967.
Jornal do CECISP, julho de 1967, “Matemática Moderna”.
1969 – Com a extinção do Instituto de Matemática e Física, deixa de exercer a
função de diretor, passando a trabalhar como professor do Instituto de
Matemática da Universidade Federal da Bahia.
1969 – Por intermédio de Catunda, em convênio assinado com a UNESCO, o
Instituto recebeu dois matemáticos G. Adler, da Hungria e M. Svec, da
Eslováquia, para ministrar conferências e cursos.
1976 – Ao atingir 70 anos, foi aposentado compulsoriamente pela UFBa.
1979 – Participou da 5ª Conferência Interamericana de Educação Matemática, na
qualidade de presidente de honra. Apresentou trabalho em mesa redonda
415
juntamente com Martha Dantas, sob o título de “Ensino da geometria baseado em
transformações”.
1981 – Proferiu palestra intitulada “Ciência e Jornalismo” na reunião da SBPC em
Salvador.
1981 – A biblioteca do IMUFBa foi denominada “Biblioteca Professor Omar
Catunda”.
1986 – Recebeu o diploma de Professor Emérito da Universidade Federal da
Bahia.
1986 – Omar Catunda faleceu no dia 11 de agosto, em Salvador, Bahia.
416
CRONOLOGIA BENEDITO CASTRUCCI
1909 – Nasceu Benedito Castrucci, em 08 de julho, na cidade de São Paulo/SP.
1923 – Cursou o 1º ano Comercial do Internato e Externato Modelo, sendo
promovido para o 2º ano.
1925 – Ingressou no Ginásio da Capital de São Paulo.
1931 – Ingressou na Escola Normal do Brás. Tornou-se professor e sócio do
Colégio Paulistano, permanecendo até 1951.
1932 – Participou da Revolução Constitucionalista de 1932, pelo Batalhão Borba
Gato, durante a qual foi ferido e condecorado.
1935 – Bacharelou-se em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito
da USP (CASTRUCCI, 1982).
1937 – Ingressou na FFCLUSP, sub-secção de Ciências Matemáticas (ANUÁRIO
DA FFCLUSP, 1939-1949, p. 726).
1939 – Licenciou-se em Ciências Físicas e Ciências Matemáticas pela FFCLUSP
(ANUÁRIO DA FFCLUSP 1939-1949, p.168-169). Obteve ainda, bolsa de estudos
para a Itália, por indicação de Luigi Fantappiè, mas não pode usá-la devido à
guerra (CASTRUCCI, 1982; 1989).
1940 – Tornou-se professor assistente da FFCLUSP, permanecendo até 1943.
1942 – Benedito Castrucci aparece como assistente, juntamente com Narcísio
Menciassi Luppi, de Giacomo Albanese no curso de Geometria.
1942 – Castrucci assume a cadeira de Geometria Analítica, Projetiva e Descritiva
na FFCLUSP, como professor interino.
1943 – Doutorou-se, com distinção, defendendo a tese “Sobre uma nova definição
de cúbica plana” em 04 de agosto, participaram da banca examinadora os
professores Omar Catunda, Fernando Furquim de Almeida, Cândido Lima da
Silva Dias, Gleb Wataghin e Abraão de Moraes (ANUÁRIO DA FFCLUSP 1939-
1949, p.402).
417
1943 – Realizou-se o primeiro concurso de ingresso ao Ministério Secundário.
Castrucci integrou a banca examinadora juntamente com Fernando Furquim de
Almeida.
1943 – Publicou o artigo “Sobre uma geração de uma curva plana de terceira
ordem segundo o tipo Staudtiano” nos Anais da Academia Brasileira de Ciências,
t. XV (ANUÁRIO da FFCLUSP, 1951, p. 176).
1944 – Foi contratado como professor da FFCLUSP, permanecendo até 1951
(CASTRUCCI, 1982).
1944 – Publicou apostila de Matemática Financeira (ANUÁRIO da FFCLUSP,
1951, p. 176).
1944 – Publicou apostila de Geometria Analítica (ANUÁRIO da FFCLUSP, 1939-
1949, p. 618).
1944 – Publicou o livro didático “Matemática para o curso colegial”, 3 v, em
colaboração com Edson Farah e J. B. Castanho e Fernando Furquim de Almeida,
pela Editora Brasil, São Paulo, de 1944 a 1950 (ANUÁRIO da FFCLUSP, 1951, p.
177).
1945 – Tornou-se professor catedrático da Faculdade de Economia Trinta de
Outubro, exercendo a função até 1952 (CASTRUCCI, 1982).
1945 – Tornou-se professor Titular da Faculdade de Filosofia Sedes Sapientiae
da PUC, exercendo a função até 1957 (CASTRUCCI, 1982).
1946 – Publicou apostila de Trigonometria (ANUÁRIO da FFCLUSP, 1939-1949,
p. 618).
1947 – Foi contratado para reger, interinamente, a partir de 11 de junho, aulas de
Geometria Analítica e Projetiva na Escola Politécnica em substituição a Giacomo
Albanese, permanecendo até 1958 (CASTRUCCI, 1982).
1947 – Publicou o artigo intitulado “Prof. Giacomo Albanese” no Boletim da
Sociedade de Matemática de São Paulo. Vol. 2 n.1, p.1-5, jun., 1947.
1947 – Realizou conferências intituladas “Equivalência de polígonos” e “Medidas
de circunferência” no Curso de Férias da Universidade de São Paulo (ANUÁRIO
da FFCLUSP, 1939-1949, p. 618).
1948 – Em substituição ao professor Cândido L. S. Dias, que foi estudar nos
Estados Unidos, Benedito Castrucci começou a lecionar Complementos de
Geometria na FFCLUSP.
1948 – Publicou apostila do Curso de Geometria Projetiva (ANUÁRIO da
FFCLUSP, 1951, p. 177).
1948 – Apresentou o trabalho intitulado “O ensino da matemática o curso
secundário” no III Congresso Nacional de Estabelecimentos Particulares de
Ensino em São Paulo (ANUÁRIO da FFCLUSP, 1951, p. 177).
418
1948 – Participou da banca examinadora do concurso para ingresso no magistério
do Estado de São Paulo (BARALDI, 2003)
1949 – Publicou obra intitulada “Curso de Geometria Analítica’, 2 volumes,
(ANUÁRIO da FFCLUSP, 1951, p. 177).
1949 – Publicou apostila de Espaços Vetoriais (ANUÁRIO da FFCLUSP, 1939-
1949, p. 619).
1949 – Apresentou trabalho intitulado “Sobre a congruência na geometria
euclidiana” publicado nos Anais da Faculdade de Filosofia Sedes Sapientiae –
1948 -1949 (ANUÁRIO da FFCLUSP, 1939-1949, p. 619).
1949 – Apresentou o trabalho intitulado “A matemática no ensino secundário” no
IV Congresso Nacional de Estabelecimentos Particulares de Ensino em São
Paulo.
1950 – Apresentou nota sobre “Cálculo da ordem do grupo de homografias do
espaço n-dimensional sobre o corpo de ordem q = p
n
” e uma palestra sobre o
Ensino da Matemática” no Congresso da Sociedade Brasileira para o Progresso
da Ciência, realizado em Curitiba, de 6 a 12 de novembro.
1950 – Publicou o artigo “Considerações sobre o teorema de Euler” na revista
Cultus, ano II, n. 5 (ANUÁRIO da FFCLUSP, 1951, p. 177).
1951 – Participou das reuniões sobre o ensino médio de Matemática durante a
Primeira Conferência Nacional de Estudos sobre a Articulação do Ensino Médio e
Superior, ocorrido no Instituto Tecnológico da Aeronáutica, entre os dias 14 e 21
de junho (ANUÁRIO da FFCLUSP, 1951,p.343).
1951 – Tornou-se professor catedrático da FFCLUSP, defendendo a tese
Fundamentos da geometria projetiva finita n-dimensional” no concurso para a
cátedra de Geometria Analítica, Projetiva e Descritiva, permanecendo até 1970
(ANUÁRIO da FFCLUSP, 1951, P. 91).
1951 – Publicou os artigos “Cálculo da ordem do grupo de homografias do espaço
n-dimensional sobre o corpo de ordem q = p
n
” e “Sobre o método de Denise-
Gastão Gomes”, ambos no Boletim da Sociedade de Matemática de São Paulo, v.
4, fasc.1.
1951 – Proferiu conferência intitulada “Geometria Projetiva Finita” na Faculdade
Nacional de Filosofia da Universidade de Belo Horizonte. Também participou da
banca examinadora no concurso para professor de Geometria Descritiva na
Escola Nacional de Minas de Ouro Preto (ANUÁRIO da FFCLUSP, 1951, p. 308-
309).
1951 / 1952 – Publicou o artigo “Postulados de Thomsen para a geometria
elementar e a geometria absoluta de Bachmann”, na Separata do Anuário da
Faculdade de Filosofia “Sedes Sapientiae” da Universidade Católica de São
Paulo, p. 90-96.
419
1952 – É apresentado como catedrático da cadeira de Geometria Analítica,
Projetiva e Descritiva, tendo como assistente Geraldo dos Santos Lima Filho
(ANUÁRIO da FFCLUSP, 1952 apud PIRES, 2006, p. 286-288).
1952 – Apresentou artigo intitulado “Problemas de Geometria Finita” durante
congresso da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, realizado em
Porto Alegre, entre 3 e 11 de novembro de 1952 (Anuário 1952 apud PIRES,
2006, p. 286-288).
1952 – Publicou trabalho intitulado “Fundamentos da Geometria Projetiva Finita
N-dimensional sobre um corpo finito de ordem p
n
” no Boletim da Sociedade de
Matemática de São Paulo (CASTRUCCI, 1989).
1952 – Ato de 04 de dezembro, do Governador do Estado, autorizando
afastamento da FFCL e da Escola Politécnica da USP, por três meses, a fim de,
sem prejuízo dos vencimentos e demais vantagens, realizar excursão cultural com
o objetivo de visitar, na Europa, alguns institutos matemáticos (DIÁRIO OFICIAL
DO ESTADO DE SÃO PAULO, 06 dez. 1952)
1952 – Publicou o livro “Lições de Geometria Elementar” (ANUÁRIO da FFCLUSP
1952 apud PIRES, 2006, p. 286-288).
1954 – Recebeu o “Prêmio Antonio de Godoy” pelas notas alcançadas durante o
curso de Ciências e Letras no Ginásio da Capital de São Paulo em 1930.
1954 – Publicou o artigo intitulado “Equivalência entre postulados de sentido e
separação” no Anuário da Faculdade de Filosofia Sedes Sapientia (CASTRUCCI,
1989).
1955 – Proferi palestra intitulada “Cândido Gonçalves Gomide”, na Sociedade de
Matemática de São Paulo em 16 de dezembro.
1957 – Publica o artigo “Sobre o ensino da geometria no curso secundário” na
Revista de Pedagogia. V.3 n.6. jul./dez., 1957.
1957 – Participou de uma comissão de professores encarregada de estabelecer,
num prazo de quinze dias, planos para a instalação de classes suplementares e
especiais de nível secundário, para alunos de reconhecida inteligência, visando
propiciar a criação de uma elite científica, conforme resolução n. 876, de 24 de
dezembro de 1957, do Governo do Estado de São Paulo. A comissão era pelos
professores Paulo Sawaya, Osvaldo Sangiorgi, Antonio Brito da Cunha, Rômulo
Pieroni, Benedito Castrucci, Luiz Roberto Moraes Pitombo e Isaias Raw. (APOS,
OS.I.2, 0017).
1958/1959 – Publicou o artigo “A continuidade na Geometria”. Separata do
Anuário da Faculdade de Filosofia “Sedes Sapientiae” da Universidade Católica
de São Paulo, nº 16, p. 69-74.
1959 – Realizou viagem de estudos para a Inglaterra, freqüentando o Imperial
College de Londres, visitou ainda, institutos de matemática da França, Itália,
Alemanha, Bélgica e Holanda (CASTRUCCI, 1982).
420
1960 – Castrucci, juntamente com os professores Onofre de Arruda Penteado
Junior, Scipione di Pierro Neto e Geraldo dos Santos Lima Filho organizaram um
ciclo de palestras franqueadas aos interessados, no Colégio de Aplicação da Rua
Gabriel dos Santos, 34. Na ocasião, proferiu palestra intitulada “A idéia de
conjunto no ensino secundário”, Folha de São Paulo, 16/12/1960, “Seminários de
Matemática”.
1961 – Realizou conferência intitulada “Ciência e cultura” em comemoração do
cinqüentenário do Colégio Dante Alighieri (CASTRUCCI, 1989).
1961 – Publicou o artigo “On the axioms of incidence” nos Anais da Sociedade
Paranaense de Matemática (CASTRUCCI, 1989).
1962 – Castrucci apresentou trabalho no IV Congresso Brasileiro do Ensino da
Matemática realizado no Pará. Jornal Folha de São Paulo, 18/08/1962,
Congresso de Matemática”.
1963 – Benedito Castrucci ministrou aula de Teoria dos Conjuntos em curso de
férias promovido pelo GEEM. Jornal Folha de São Paulo, 19/02/1963,
Matemática Moderna atraiu 120 professores secundários”.
1963 – Castrucci ministrou curso de aperfeiçoamento promovido pelo GEEM.
Jornal Folha de São Paulo, 12/07/1963, “Verdadeira revolução vai sofrer o ensino
de Matemática”.
1963 – Castrucci ministrou curso “Formação dos conceitos em Geometria
(Choquet)” promovido pelo GEEM. Jornal Folha de São Paulo, 12/09/1963,
Matemática Moderna”.
1963 – Castrucci pronunciou a conferência “Centenário da morte do brasileiro
Joaquim Gomes de Souza” em 20 de outubro, na Universidade do Mackenzie, por
ocasião do segundo aniversário do GEEM. Folha de São Paulo, 27/10/1963,
Matemática Moderna”.
1964 – Castrucci ministrou curso “Teoria dos conjuntos”, durante curso realizado
em Santos, em março de 1964. Jornal “A Tribuna”, 04/03/1964, “Introdução à
Matemática Moderna”.
1964 – Castrucci apresenta, durante a primeira quinzena de julho, na TV Cultura,
curso de férias pela televisão, juntamente com Osvaldo Sangiorgi e Lucília
Bechara. Ministrou curso sobre Teoria dos Conjuntos. Jornal Diário de São Paulo,
01/07/1964, “Curso de férias pela televisão”.
1964 – Castrucci pronunciou a conferência “Comemoração do Centenário da
morte de George Boole” por ocasião do terceiro aniversário do GEEM. Folha de
São Paulo, 27/10/1964, “Matemática Moderna faz 3 anos com reunião”.
1964 – Jornal anuncia que Castrucci ministraria curso “Teoria dos conjuntos
promovido pelo GEEM de 1 a 23 de fevereiro de 1965. Jornal O Estado de São
Paulo, 27/12/1964, “Reuniões”.
421
1965 – Jornal anuncia que Castrucci ministrou curso de férias promovido pelo
GEEM. Jornal O Estado de São Paulo, 07/02/1965, “Matemática Moderna reúne
400 professores”. Neste curso Castrucci ministrou a disciplina Teoria dos
Conjuntos (OS.T.0342).
1965 – Castrucci esclareceu em entrevista, os motivos pelos quais defendia o
MMM. Folha de São Paulo, 06/02/1965, “Matemática Moderna torna o estudo
mais accessível”.
1965 – Castrucci aparece em lista de professores encarregados para dar cursos
pelo GEEM. O Estado de São Paulo, 12/02/1965, “Professores aprendem
Matemática Moderna”.
1965 – Reportagem apresenta comentários sobre a obra “Teoria dos Conjuntos
de autoria de Benedito Castrucci. Jornal O Estado de São Paulo, 10/05/1965.
GEEM trabalha pela matemática”.
1965 – Jornal anuncia que Castrucci ministraria curso de Geometria promovido
pelo GEEM. Jornal Folha de São Paulo, 25/05/1965, “Matemática Moderna já tem
programa feito para maio”.
1966 – Participou do V Congresso Brasileiro do Ensino de Matemática, no Centro
Técnico da Aeronáutica no ITA, em São José dos Campos/SP, de 10 a 15 de
janeiro.
1966 – Jornal anuncia que Castrucci ministraria palestra “Geometria na
interpretação de Choquet” no dia 25/06/1966 no GEEM. Jornal Folha de São
Paulo, 17/06/1966, “Reunião amanhã de Matemática Moderna”.
1966 – Em comemoração ao 5º aniversário das atividades do GEEM, foi lançado
as bases para a primeira Olimpíada Ginasiana de Matemática Moderna. Castrucci
lembrou, na reportagem, que a Rússia já adotava aquela prática, “onde os
professores preparam suas equipes de alunos para disputar com outros”.
1967 – Castrucci consta na lista de professores participantes do GEEM. Jornal
Folha de São Paulo, 15/01/1967, “Renovação da Matemática”.
1967 – Castrucci ministrou curso sobre “Teoria dos Conjuntos” no GEEM. Jornal
O Estado de São Paulo, 22/01/67. “Encerrado curso de Matemática Moderna”.
1967 – Jornal do Centro de Treinamento para Professores de Ciências informou
que Castrucci ministrou curso sobre Teoria dos conjuntos, no GEEM, de 2 a 21 de
janeiro de 1967. Jornal do CECISP, julho de 1967, “Matemática Moderna”.
1967 – Jornal anunciou que Castrucci ministraria curso intitulado “Transformações
Geométricas Planas”, no dia 17 de junho de 1967. Jornal Folha de São Paulo,
14/06/1967, “GEEM promove sábado duas sessões”.
1967 – Em julho de 1967, representantes do GEEM, Bechara, Castrucci e
Watanabe participaram do 6
o
Colóquio Brasileiro de Matemática, ocorrido em
Poços de Caldas (D’AMBROSIO, 1987).
422
1967 – Castrucci integrou a comissão central organizadora da 1ª Olimpíada de
Matemática. Jornal A Gazeta Esportiva, 08/10/1967, “1ª Olimpíada de Matemática
reúne 100000 colegiais”.
1968 – Viajou para a Alemanha, como professor visitante da Universidade Justus
Liebig de Giessen (CASTRUCCI, 1982).
1968 – Castrucci pronunciou a conferência “Atual ensino da Matemática na
Alemanha Ocidental”, por ocasião do sétimo aniversário do GEEM. Folha de São
Paulo, 24/10/1968, “GEEM comemora 7 anos de atividades”.
1969 – Publicou o artigo “Um teorema sobre ordenação de pontos de uma reta
no Boletim de Matemática, Estatística e Física da Faculdade de Filosofia,
Ciências e Letras de Araraquara (CASTRUCCI, 1989).
1970 – Tornou-se professor do Instituto de Matemática e Estatística da USP
(CASTRUCCI, 1982).
1971 – Participa do “1º Encontro Pedagógico sobre o Ensino da Matemática” na
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Rio Claro, ocorrido entre os dias 03 e
06 de novembro. Apresentou um trabalho denominado “Isometria plana a partir
das simetrias” no dia 03, das 10:30 às 12:00 horas.
1973 – Castrucci foi encarregado de ministrar um curso de férias pelo GEEM, de
08 a 20 de janeiro, de atualização de professores de matemática do 1º grau com
formação universitária em matemática, abordando o tema “Transformações
Geométricas”.
1974 – Tornou-se professor do Curso de Pós-graduação da Faculdade de
Filosofia, Ciências e Letras da Fundação Santo André, a partir de julho de 1974
(CASTRUCCI, 1982).
1975 – Castrucci de extensão universitária sobre Geometria realizado no GEEM
de 20 a 31 de janeiro.
1975 – O GEEM oferecia curso de férias em janeiro para candidatos ao curso de
magistério em matemática. Benedito Castrucci foi um dos professores
conferencistas. Folha de São Paulo, 07/12/1975, “Nas férias, estudo da
matemática”.
1986 – Publicou o artigo “Um modelo de plano Desargueano de ordem 81” no
Boletim da Sociedade Paranaense de Matemática, em abril, em colaboração com
Sílvia Maria Ferreira Ramos (CASTRUCCI, 1989).
1986 – Publicou o artigo “Um modelo de plano finito não-desargueano de ordem
27” no Boletim da Sociedade Paranaense de Matemática, em outubro, em
colaboração com Sílvia Maria Ferreira Ramos (CASTRUCCI, 1989).
1986 – Tornou-se professor titular do Programa de Estudos Pós-graduados e do
Curso de Matemática da PUC/SP (CASTRUCCI, 1996).
423
1987 – Realizou mini-curso sobre ensino de frações, no I Encontro Nacional de
Educação Matemática (ENEM) no mês de fevereiro, em São Paulo (CASTRUCCI,
1989).
1987 – Pronunciou palestra sobre “Filosofia subjacente na metodologia do Ensino
da Matemática” em Estação-Ciências, São Paulo (CASTRUCCI, 1989).
1988 – Pronunciou palestra sobre “Filosofia subjacente na metodologia do Ensino
da Matemática”, com novos enfoques, no II Encontro Nacional de Educação
Matemática (ENEM) no mês de janeiro, no Paraná (CASTRUCCI, 1989).
1989 – Realizou conferência sobre “Tópicos da história da geometria: os três
problemas clássicos gregos” durante o 6º Simpósio de Geometria Descritiva e
Desenho Técnico, de 12 a 15 de outubro, no Embu/SP (CASTRUCCI, 1989).
1990 – Participou de congresso sobre o ensino de matemática em Sevilha,
apresentando a comunicação “Sobre o pentagrama de Pitágoras como motivação
histórica para diversas aulas de 2ºgrau, no campo da Geometria”, realizado entre
os dias 23 e 29 de setembro.
1990 – Apresentou trabalho sobre “Sistema axiomático do Espaço de Möbius e
sua consistência” no Encontro de Geometria da Universidade de Giessen.
1995 – Benedito Castrucci faleceu em 02 de janeiro de 1995, em São Paulo/SP.
424
CRONOLOGIA LUIZ HENRIQUE JACY
MONTEIRO
1921 – Nasceu, no Rio de Janeiro, em 06 de julho, Luiz Henrique Jacy Monteiro.
1944 – Tornou-se assistente de Candido L. S. Dias na cadeira de Complementos
de Geometria e Geometria Superior.
1945 – Jacy Monteiro escreveu “Teoria dos Ideais” Notas de aulas do Curso do
Professor Oscar Zariski (Anuário da FFCLUSP, 1939-1949, p. 619).
1945 – O professor Oscar Zariski, neste mesmo ano, foi convidado para dar um
curso de extensão sobre “Álgebra Moderna e Introdução à Geometria Aplicada”,
tendo como auxiliar de ensino contratado Luiz Henrique Jacy Monteiro (Anuário
da FFCLUSP, 1939-1949).
1945 – Jacy Monteiro escreveu “Teoria da dimensão” tradução de Notas de aula
do Curso do Professor Oscar Zariski (Biblioteca IMEUSP).
1946 – Jean Dieudonné foi contratado em maio de 1946, pelo processo nº
8121/45, permanecendo na faculdade até novembro de 1947 (PIRES, 2006).
1946 – Jean Dieudonné deu curso intitulado “Álgebra Moderna e Grupos de
Galois”. Tem como auxiliar de ensino L. H. Jacy Monteiro.
1946 – Jean Dieudonné realizou o curso de extensão universitária “Teoria dos
Corpos Comutativos” vol. II e “Teoria de Galois”. Notas de aulas elaboradas por
Jacy Monteiro. A obra foi publicada em 1947, pela Sociedade de Matemática de
São Paulo.
1946 – Jean Dieudonné realizou o curso de extensão universitária “Teoria dos
Corpos Comutativos” vol. III e “Corpos ordenados e teoria das avaliações”. Notas
de aulas elaboradas por Jacy Monteiro (Anuário da FFCLUSP, 1939-1949, p.
619). A obra foi publicada em 1947, pela Sociedade de Matemática de São Paulo
e 1958, com financiamento do Conselho Nacional de Pesquisa.
425
1947 – Dieudonné deu curso intitulado “Topologia Plana” e Jacy Monteiro, em
setembro, foi para os Estados Unidos em setembro, com bolsa da Rockefeller
Fondation.
1947 – Jacy Monteiro publicou, no Boletim da Sociedade de Matemática de São
Paulo, o trabalho “Derivações de um corpo” vol. 2, fasc. 2º.
1948 – Jean Delsarte é contratado como professor visitante em substituição à
Weil e Dieudonné que partiram para os Estados Unidos.
1949 – Jacy Monteiro, retornando dos Estados Unidos reassumiu sua função
como assistente na cadeira de Complementos de Geometria e Geometria
Superior.
1956 – Ministrou curso de férias para professores secundaristas, promovido pela
Secretaria de Educação de São Paulo (ANDRAUS, apud SOUZA, 1998).
1957 – Participação no Primeiro Colóquio Brasileiro de Matemática em Poços de
Caldas, fez parte da comissão organizadora, coordenada pelo professor Chain
Honig. Ministrou o curso intitulado “Teoria de Galois”, posteriormente publicado
pelo Conselho Nacional de Pesquisas.
1959 – Publicou o primeiro volume de “Álgebra linear” pela FFCLUSP, 221p.
1959 – Como professor da Universidade Mackenzie, foi convidado para paraninfar
a turma da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade Mackenzie.
1961 – Participou de um curso de férias na Universidade Federal da Bahia, no
mês de fevereiro.
1961 – Participou de um colóquio de matemática em Fortaleza/Ce, no mês de
junho.
1961 – Participou do primeiro curso de férias relativo à Álgebra Moderna,
financiado pela CADES, em Santos/SP, no mês de julho (BASTOS, apud SOUZA,
1998).
1961 – Participou de 1 de agosto a 30 de setembro de 1961 do “Curso de
especialização em matemática para professores secundários” na Universidade do
Mackenzie/SP. (SANGIORGI, 1975)
1962 – Participou de um curso em Brasília/DF, no mês de julho.
1962 – Jacy Monteiro participou da I Semana da Matemática, promovida pela
FFCL São Bento, no Centro de Estudos Físicos e Matemáticos, de 22 a 27 de
outubro de 1962. Jornal Folha de São Paulo, 20/10/1962, “I Semana da
Matemática
1963 – Nota de jornal informa que a primeira publicação do GEEM, “Matemática
Moderna para o ensino secundário” já se encontrava à venda, no Departamento
de Publicações, com o professor Jacy Monteiro. Jornal Folha de São Paulo,
05/05/1963, “Introdução da geometria na escola secundária”.
426
1963 – Jacy Monteiro ministrou curso de aperfeiçoamento promovido pelo GEEM.
Jornal Folha de São Paulo, 12/07/1963, “Verdadeira revolução vai sofrer o ensino
de Matemática”.
1963 – Jacy Monteiro ministrou curso “Iniciação à Álgebra Moderna” promovido
pelo GEEM. Jornal Folha de São Paulo, 12/09/1963, “Matemática Moderna”.
1963 – Reportagem anunciou que Jacy Monteiro ministrará curso sobre “Iniciação
à Álgebra Moderna” promovido pelo GEEM, de 19 a 26/10/1963. O Estado de São
Paulo, 17/10/1965, “Matemática Moderna”. De 19 a 26 de outubro Jacy Monteiro
participou das comemorações do aniversário do GEEM, ministrando o primeiro
curso do evento, sobre Álgebra Moderna.
1964 – Escreveu “Álgebra Multilinear” tradução de notas de aula do bourbakista
Jean-Louis Koszul (Biblioteca IMEUSP).
1964 – Foi para Brasília/DF, onde permaneceu de 05/02/64 a 04/03/64. Retornou
em 06/10/64.
1964 – Jacy Monteiro foi um dos professores a ministrar o curso “Prática do
Ensino do 1º Grau”, durante curso realizado em Santos, em de março de 1964.
Jornal “A Tribuna”, 04/03/1964, “Introdução à Matemática Moderna”.
1964 – Jornal anuncia que Castrucci ministraria curso “Álgebra Moderna
promovido pelo GEEM de 1 a 23 de fevereiro de 1965. Jornal O Estado de São
Paulo, 27/12/1964, “Reuniões”.
1965 – Jacy Monteiro ministrou curso de férias promovido pelo GEEM, no mês de
fevereiro (ROSA LIMA, 2006).
1965 – Jacy Monteiro, na qualidade de diretor de publicações do GEEM, informou
que, além de muitos trabalhos mimeografados, que se encontram à disposição
dos professores, o grupo publicou, em colaboração com o IBECC, em 1962,
Matemática Moderna para o Ensino Secundário”, que naquela ocasião se achava
esgotado. Folha de São Paulo, 06/02/1965, “Matemática Moderna torna o estudo
mais accessível”.
1965 – Jacy Monteiro, na qualidade de diretor de publicações do GEEM, informou
que, em breve estaria destinando uma série de publicações para o ensino
primário. Jacy Monteiro também encontra-se em lista de professores
encarregados de dar cursos pelo GEEM. Jornal O Estado de São Paulo,
12/02/1965, “Professores aprendem Matemática Moderna”.
1965 – Reportagem apresenta comentários sobre tradução realizada por Jacy
Monteiro da obra “Un programme moderne pour l’enseignement secondaire”.
Jornal O Estado de São Paulo, 10/05/1965. “GEEM trabalha pela matemática”.
1965 – Jornal anuncia que Jacy Monteiro ministrou curso de férias promovido pelo
GEEM. Jornal O Estado de São Paulo, 07/02/1965, “Matemática Moderna reúne
400 professores”.
427
1965 – Informações sobre o V Colóquio Brasileiro de Matemática, que realizou-se
em Poços de Caldas, de 4 a 24 de julho, eram obtidas no Departamento de
Matemática da FFCLUSP com o professor Jacy Monteiro, coordenador do evento.
Jornal Folha de São Paulo, 17/06/1965, “Realiza-se em julho o Colóquio de
Matemática”.
1967 – Jacy Monteiro consta na lista de professores participantes do GEEM.
Jornal Folha de São Paulo, 15/01/1967, “Renovação da Matemática”.
1967 – Jacy Monteiro ministrou curso sobre “Matrizes” no GEEM. Jornal O Estado
de São Paulo, 22/01/67. “Encerrado curso de Matemática Moderna”.
1967 – Jornal do Centro de Treinamento para Professores de Ciências informou
que Jacy Monteiro ministrou curso sobre Matrizes, no GEEM, de 2 a 21 de janeiro
de 1967. Jornal do CECISP, julho de 1967, “Matemática Moderna”.
1967 – Jacy Monteiro integrou a comissão central organizadora da 1ª Olimpíada
de Matemática. Jornal A Gazeta Esportiva, 08/10/1967, “1ª Olimpíada de
Matemática reúne 100000 colegiais”.
1968 – Jacy Monteiro consta na lista de professores participantes do GEEM.
Jornal O Estado de São Paulo, 10/01/1968, “Mestres se aperfeiçoam”.
1968 – Jacy Monteiro consta como 2º tesoureiro na nova diretoria do GEEM.
Jornal O Estado de São Paulo, 14/04/1968, “Nova diretoria do GEEM”.
1969 – Participou do Sétimo Colóquio Brasileiro de Matemática, com curso de
iniciação científica intitulado “Teoria de Galois”. em Poços de Caldas, Minas
Gerais, de 6 a 26 de julho de 1969, coordenado pelo professor Gilberto Francisco
Loibel. Contou com 312 participantes.
1972 – Participou da Reunião Regional da Sociedade Brasileira de Matemática,
organizada pelo professor Gilberto Francisco Loibel, de 29 de abril a 1º de maio,
em Jacarezinho/SP. Apresentou conferência intitulada “Construções geométricas”
(SBM, 1972, v. 3, n. 1).
1974 – Em agosto, por intermédio de Jacy Monteiro, a USP ofereceu curso de
pós-graduação na área de Álgebra para professores licenciados em Matemática
da Alta Sorocabana (Boletim da FFCL Presidente Prudente, 1973).
1974 – Ministrou cursos, a cada 15 dias, em Cuiabá/MT e também em Presidente
Prudente/SP.
1975 – Jacy Monteiro participou da organização do X Colóquio de Matemática,
auxiliando nas correspondências com matemáticos estrangeiros.
1975 – Nota de falecimento assinada por Osvaldo Sangiorgi, comunicando
falecimento de Jacy Monteiro em 20 de maio de 1975. Jornal O Estado de São
Paulo, 06/06/1975, “Luiz Henrique Jacy Monteiro, grande matemático”.
428
GLOSSÁRIO
ABEL, Niels Henrik (1802-1829). Matemático norueguês, um dos legisladores da
análise com Gauss e Cauchy (PATRAS. 2001, p. 61).
ALLAN, Nelo da Silva, professor da Universidade do Mato Grosso (UNEMAT),
orientou diversos trabalhos na UNICAMP/SP (SILVA, 2003b).
EUCLIDES (360 a.C. — 295 a.C.) foi professor, matemático e escritor. Autor da
obra “Os elementos”, contendo 13 volumes escritos em grego. A obra cobria toda
a aritmética, álgebra e geometria conhecida até então no mundo grego.
AVERBUCH, Anna (1924-2004) fez licenciatura e bacharelado em matemática
pela FNFi. Professora de Didática especial de Matemática no Colégio de
Aplicação da Universidade do Brasil. Em 1976, ajudou a fundar o Grupo de
Ensino e Pesquisa em Educação Matemática – GEPEM. Foi ainda uma das
fundadoras da Sociedade Brasileira de Educação Matemática – SBEM
(FAINGUELERNT; GOTTLIEB, 2004).
AZEVEDO, Fernando de (1874-1974), redator e primeiro signatário do Manifesto
dos Pioneiros da Educação Nova, em que se lançaram as bases e as diretrizes de
uma nova política de educação. Um dos fundadores da USP, participando como
relator da comissão encarregada de sua redação final do decreto-lei de 25 janeiro
de 1934. Chefiou, até 1961, o Departamento de Sociologia e Antropologia da
FFCL, criado em 1948. Em 17 de junho de 1941 foi nomeado Diretor da
FFCLUSP, exonerando-se em 02 de junho de 1943 (VIDAL, 2000).
BECHARA, Lucilia. É licenciada em Matemática pela Faculdade de Filosofia,
Ciências e Letras da Universidade de Campinas. Participou ativamente do GEEM
Na década de 1960, como supervisora da área de matemática junto ao Serviço de
Ensino Vocacional (SEV), coordenou um curso de aperfeiçoamento no Ginásio
Vocacional do Brooklin, juntamente com os professores Dorival Antonio de Mello
e Renate Watanabe, patrocinado pelo Ministério de Educação e Cultura. É autora
de diversos livros didáticos, dentre eles, “Matemática moderna para a escola
elementar” em co-autoria com Manhúcia P. Liberman e Anna Franchi.
BEGLE, Edward Griffith (1914-1978). Matemático especialista em Topologia,
trabalhou nas universidades de Princeton, Michigan e Yale. Autor da obra “The
429
vietoris mapping Theorem for Bicompact Spaces II” (1950). Em 1951, foi eleito
secretário da Sociedade Americana de Matemática, posição que ocupou por 6
anos. Em 1958, tornou-se diretor do SMSG, permanecendo no cargo até 1972.
Em conseqüência de seu interesse pela educação matemática, com o passar do
tempo, acabou por dedicar-se exclusivamente à essa área.
BELHOSTE, Bruno (1952- ), professor de História Contemporânea da
Universidade de Paris X – Nanterre, onde ensina História das Ciências e das
Técnicas. Pesquisador associado ao Serviço de História da Educação (SHE).
BIRKHOFF, George David (1884-1944). Freqüentou Harvard e a Universidade de
Chicago, onde se doutorou em 1907 com uma dissertação sobre as equações
diferenciais. A maior parte de sua obra foi escrita em Harvard, onde se tornou
catedrático em 1919. Suas maiores contribuições ocorreram no campo dos
sistemas dinâmicos e equações diferenciais.
BOOLE, George (1815-1864), matemático inglês, nasceu em 2 de novembro de
1815 em Lincoln, Inglaterra. Interessou-se pela matemática e lógica. Em 1854,
publicou “An Investigations into the Laws of Thought”, onde definiu as teorias
matemáticas da lógica e da probabilidade estabelecendo ao mesmo tempo a
lógica formal e uma nova álgebra. Deu inicio a álgebra da lógica conhecida como
Álgebra Booleana, que é muito aplicada na computação (MILIES, 1987).
BOREL, Armand (1923-2003), professor permanente em Princeton de 1957 a
1993. Publicou trabalos em Topologia Algébrica e Teoria dos Grupos de Lie,
dentre outros (WIKIPEDIA, 2005).
BOULOS, Paulo, é doutor em Matemática pela USP, foi professor da Escola
Politécnica da USP, do IMEUSP e da Universidade Estadual de Campinas. Autor
de diversos livros didáticos.
CANTOR, Georg (1845-1918), um matemático alemão de origem russa conhecido
por ter criado a moderna Teoria dos Conjuntos. Foi a partir desta teoria que
chegou ao conceito de número transfinito, incluindo as classes numéricas dos
cardinais e ordinais, estabelecendo a diferença entre estes dois conceitos que
colocam novos problemas quando se referem a conjuntos infinitos.
CAUCHY, Augustin-Louis (1789-1857). Matemático francês, um dos mestres da
análise e do rigor (PATRAS. 2001, p. 61).
CAYLEY, Arthur (1821-1895), nasceu em 16 de agosto de 1821 em Richmond,
Inglaterra. Em 1843 trabalhou fundamentalmente em álgebra, mas, também
trabalhou em geometrias não-euclideanas e geometria n-dimensional, usando
determinantes inspirou-se nas idéias sobre determinantes. Definiu e iniciou o
estudo da álgebra das matrizes. Ele é considerado, juntamente com o matemático
James Joseph Sylvester (1814-1897), o fundador da teoria dos invariantes.
(BOYER, 1996).
CHOQUET, Gustave (1915- ?). Matemático dedicado à área de Análise.
Contribuiu para a renovação do ensino secundário e universitário francês. Não
fazia parte do grupo Bourbaki, apesar de considerar que a maior parte da
430
Matemática francesa de sua geração adquiriu cultura matemática graças à
Bourbaki, criticava o dogmatismo apresentado em seus trabalhos: “as definições e
os teoremas de base são tomados sem justificação e sem uma apresentação
heurística” (MARSHAAL, 2002, p. 131).
D’AMBROSIO, Ubiratan. Natural de São Paulo, obteve grau de licenciatura e
bacharelado em Matemática pela FFCLUSP em 1954, grau de doutor em
Matemática pela Escola de Engenharia de São Carlos em 1963, defendendo a
Tese “Superfícies paramétricas generalizadas e conjuntos de perímetro finito”,
sob orientação do Dr. Jaurés P. Ceccone e pós-doutorado na Brown University
em 1965. Em 1970 recebeu convite para participar do projeto CPS-BAMAKO da
UNESCO. D’Ambrosio foi presidente do CIAEM no período de 1979 a 1987 e
vice-presidente do ICMI de 1979 a 1984. Em 1979, participou do Pugwash
Conference, México. É fundador da Sociedade Latinoamerica de História da
Ciência e da Tecnologia/SLAHCT e da Sociedade Brasileira de História da
Ciência. Em 1984, fez a Conferência de abertura no ICME-5, em Adelaide,
Austrália, cujo tema versou sobre Etnomatemática. Em 1987, participou da
Fundação da Universidade Holística Internacional/Universidade da Paz/UNIPAZ,
Brasília. Nesse mesmo ano tornou-se Presidente da Sociedade Brasileira de
História da Ciência. Em 1988, tornou-se membro do Comitê Internacional de
História da Matemática. Em 1999 fundou a Sociedade Brasileira de História da
Matemática. Foi homenageado, em 2001, com a Medalha Kenneth O. May, pelo
International Comittee of History of Mathematics. Em 2005, recebeu a medalha
Félix Klein, atribuída pelo Comitê Internacional de Instrução Matemática (ICMI).
Hoje D’Ambrosio é professor professor titular da cadeira de Tópicos de História e
Filosofia da Matemática do Programa de Estudos Pós-graduados da PUC-SP.
DANTAS, Martha Maria de Souza. Licenciada e bacharel pela Faculdade de
Filosofia da Universidade Federal da Bahia, em 1948. Considerada a principal
idealizadora do I Congresso Nacional de Ensino da Matemática. Para Dantas, o
congresso foi referência fundamental para o processo de fundação do Instituto de
Matemática e Física, uma vez que nele se conheceram o professor Omar
Catunda e Arlete Cerqueira Lima, principal articuladora da fundação do Instituto
(DANTAS, 2002, p. 4-10).
DE MORGAN, Augustus (1806-1871), nasceu em Madura, Índia. Foi um
matemático e lógico britânico, sendo o primeiro a introduzir o termo e tornar
rigorosa a idéia de indução matemática. Foi o primeiro presidente da Sociedade
de Matemática de Londres. Os estudos de lógica que começaram na primeira
metade do século XIX deveu-se quase que inteiramente aos trabalhos de De
Morgan e Geoge Boole (WIKIPÉDIA, 2007).
DEDEKIND, Richard (1831-1916). Matemático alemão. Um dos fundadores da
Álgebra e da Geometria Algébrica moderna (PATRAS, 2001, p. 67).
DIAS, Cândido Lima da Silva (1913-1998), nasceu em Mococa/SP, formou-se em
Matemática pela FFCLUSP em 1936. Foi assistente de Luigi Fantappié. Entre
1948 e 1949 estudou na Universidade de Harvard e em Princeton. Apresentou,
em 1951, a tese para provimento da Cadeira de Geometria e Geometria Superior
intitulada “Espaços vetoriais topológicos e sua aplicação nos espaços funcionais
analíticos” (DIAS, 1951)
431
DIEUDONNÉ, Jean-Alexandre (1906-1992) um dos fundadores do grupo
Bourbaki, passou muitos anos como professor visitante em universidades do
mundo inteiro, inclusive na FFCLUSP, durante o período 1946-1947. Foi professor
emérito de matemática na Universidade de Nice, França. Estudou na Escola
Normal Superior em Paris, recebendo seu doutorado em ciências matemáticas
em 1931. Assumiu cargos nas universidades de Rennes (1933-27), Nancy (1937-
52), Northwestern University (1953-1959) e no Institut des Hautes Études
Scientifique, Paris (1959-1964). Foi Decano da Faculdade de Ciências de Nice de
1965 até 1968 e retirou-se em 1970. Foi presidente da Sociedade Matemática da
França em 1964-1965 e foi eleito para a Academia Francesa de Ciências em
1968. Autor de diversos artigos e publicou livros de Análise, Álgebra Linear e
Geometria, dentre outros, suas pesquisas incluem polinômios e funções de uma
variável complexa, espaços vetoriais topológicos e grupos de Lie. (AMERICAN
SCIENTIST, 1973b).
DREYFUS, André (1897-1952), um dos fundadores da FFCLUSP. Doutor em
Medicina, professor catedrático de Biologia Geral. Foi diretor da FFCLUSP
(CUNHA, 1994).
FEHR, Howard, professor da Columbia University Teachers College, presidente
do NCTM no período de 1956 – 1958.
LIMA FILHO, Geraldo dos Santos. Iniciou seus estudos em 1944, bacharelou-se
em 1946 e licenciou-se em 1947. Tornou-se posteriormente, professor assistente
de Benedito Castrucci, na cadeira de Geometria Analítica, Projetiva e Descritiva
(ANUÁRIO DA FFCLUSP, 1939-1949; 1951).
FONTES, Sebastião Corrêa (1884-1943). Coronel do exército, professor
catedrático da Escola Militar e proprietário e diretor geral do Instituto Superior de
Preparatórios (VALENTE et. alli, 2004).
FRANCHI Anna é licenciada em matemática pela Faculdade de Filosofia,
Ciências e Letras da Universidade de São Paulo, foi coordenadora de matemática
do Grupo Escolar Experimental “Dr. Edmundo de Carvalho”, professora do Curso
do Programa de Estudos Pós-graduados da PUC/SP, integrou o GEEM e é autora
de diversos livros didáticos (BECHARA, LIBERMAN, FRANCHI, 1968).
FREGE Gottlob (1848-1925), lógico e matemático alemão, propôs derivar os
conceitos da aritmética dos da lógica formal. No entanto sua proposta teve fraca
receptividade até despertar o interesse de Russell, no começo do século XX
(BOYER,1996, p. 414-415).
GALOIS, Evariste (1811-1832), nasceu em Bourg-la-Reine, França. Em 1828,
matriculou-se na classe de Matemáticas Especiais de Louis-Paul Émile Richard,
com a finalidade de ingressar na Escola Politécnica. Entretanto, não conseguiu
lograr êxito. Nessa ocasião, Galois leu trabalhos de Lagrange, Gauss, Cauchy e
Abel, publicando seu primeiro artigo em 1829, intitulado “Demonstration d’um
théorème sur les fractions continues periodiques”, nos Annales de Mathématiques
Pures et Appliquées, tomo XIX, n. 10 (1828-1829), p. 294-301. É também
provável que as idéias originais sobre a teoria das equações algébricas tenham
sido concebidas nessa época. Em 29 de maio de 1832, Évariste Galois morreu
432
vitimado por um duelo com dois franceses, antes de completar 21 anos
(PEREIRA DA SILVA, 1984).
GAUSS, Carl Friedrich (1777-1855), matemático universalista alemão, é
considerado um dos maiores matemáticos de todos os tempos. Autor da obra
Disquisitiones Arithmeticae, clássico da literatura matemática, defendeu seu
doutorado na Universidade de Helmstedt, sob a orientação de Johann Friedrich
Pfaff (1765-1825) em 1799 (SILVA, 2005).
GOLDEMBERG José (1928- ). Bacharel em Ciências pela FFCLUSP, professor
titular do Instituto de Física. Foi reitor da USP de 1986 a 1990 e Ministro da
Educação de agosto de 1991 a agosto de 1992. Autor de diversos livros
publicados sobre física nuclear e energia (GOLDEMBERG, 1988, p. 155).
GOTTLIEB, Franca Cohen. Possui graduação em Matemática pela Universidade
Federal do Rio de Janeiro (1946) e doutorado em Matemática pela Universidade
de Lisboa (1968). Tem experiência na área de Matemática, com ênfase em
Álgebra, atuando também em Lógica Matemática.
http://lattes.cnpq.br/4630331741825977.
GRASSMANN Hermann Günther (1809-1877), nasceu Szczecin, Polônia. Além
de matemático era teólogo e linguista. Aos 53 anos de idade, desiludido com o
escasso êxito de seus trabalhos matemáticos, dedicou-se ao estudo do sânscrito.
Sua obra matemática mais importante é de 1844, denominada “Teoria da
extensão” (Ausdelhnungslehre), ainda que seu título completo referia-se a “uma
nova disciplina matemática exposta e aclarada mediante aplicações”. A maneira
inusitada e excessivamente “filosófica” de apresentação da obra fez com que
passasse despercebida pelos matemáticos da época. Somente mais tarde,
quando o autor já havia falecido, reconheceu-se a ampla generalidade e
abstração deste cálculo algébrico-geométrico em um espaço de n dimensões,
com importantes aplicações, onde aparecem conceitos básicos de cálculo vetorial
(WIKIPÉDIA, 2007).
GROTHENDIECK, Alexandre, matemático ganhador do prêmio Fields em 1966,
durante o Congresso Internacional dos Matemáticos em Moscou (SILVA, 2003).
Seu livro básico “Espaces vectoriels topologiques” foi publicado em São Paulo,
em 1954. Posteriormente tornou-se fascículo dos “Éléments” de Bourbaki
(D’AMBROSIO, 1999).
HADAMARD, Jacques Salomon (1865-1963) foi um dos matemáticos franceses
mais influentes da virada do século XIX e XX. Hadamard trabalhou em domínios
da matemática como Teoria dos Números e Cálculo das Variações. Autor do livro
Psicologia da invenção matemática” (WIKIPEDIA, 2005). Hadamard visitou o
Brasil em 1924 (D’AMBROSIO, 1999).
HAMILTON William Rowan (1805-1865), nasceu em Dublin, Irlanda, em 4 de
agosto. Dedicou sua vida ao desenvolvimento da teoria dos quatérnios. Em 1853
publicou sua “Lectures on Quaternions” e em 1866 editou-se em forma póstuma
um trabalho de dois volumes intitulado “Elements of Quaternions” (MILIES, 1987).
433
HILBERT, David (1862-1943), nasceu em Königsberg, Prússia. Sua obra
Grundlagen der Geometrie (Fundamentos da Geometria) exerceu forte influência
sobre a matemática do século XX, justamente por seu esforço em dar uma base
puramente axiomática para a Aritmética (BOYER, 1996, p. 425-426). No 2º
Congresso Internacional de Matemática realizado em Paris, em 1900, apresentou
uma contribuição intitulada “Problemas matemáticos” quando propôs uma lista de
23 problemas, envolvendo questões centrais da Matemática, os quais se
encontravam ainda sem solução. Com exceção de alguns problemas relativos à
teoria dos números, todos foram resolvidos (D’AMBRÓSIO, 2000).
HÖNIG Chaim Samuel, apresentou, em 1952 a tese de doutoramento intitulada
Sobre um método de refinamento de topologias” e para concurso de provimento
de cátedra na cadeira de Complementos e Matemática, em 1959, a tese “Sobre
uma generalização dos números reais e sua aplicação na classificação dos
grupos sem torção” (HÖNIG, 1959).
KLEIN, Felix (1849-1925) matemático da Universidade de Göttingen, fez com que
esta universidade se tornasse o principal centro de estudos de matemática em
todo o mundo, durante o tempo em que lá permaneceu. Sua obra “Erlanger
Programm” pode ser ainda hoje percebida em quase todo tratado de geometria
moderno. Preocupou-se com o ensino da matemática, exercendo forte influência
nos meios pedagógicos. Segundo Beltrão (2001), o professor Euclides Roxo foi
fortemente influenciado por suas idéias pedagógicas contidas no “Elementar
Mathematik von höheren Standpunkte aus” (Matemática Elementar sob o Ponto
de Vista Avançado”. Trad. R. Fontanilla, Göttingen, 1908.
KOLMOGOROV, Andreï Kikolaïevitch (1903-1987) foi o principal responsável pela
reforma da Matemática Moderna na URSS.
LAGRANGE, Joseph Louis (1736-1813). Matemático franco-italiano. Célebre,
entre outros, por seus trabalhos em mecânica (PATRAS, 2001, p. 62).
LEIBNIZ, Gottfried Willhelm (1646-1716) Desejava reduzir as dimensões lógicas a
uma forma sistemática, desenvolvendo uma característica universal, que servisse
como uma espécie de Álgebra da Lógica, sugestão esta que foi reavivada apenas
no século XIX (BOYER, 1996).
LIBERMAN, Manhúcia Perelberg é licenciada em matemática pela Faculdade
Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil. Foi supervisora de matemática do
Curso Primário do Ginásio Experimental I. L Peretz. Foi responsável pela parte de
matemática, junto ao grupo que elaborou o programa para as escolas primárias
do Estado de São Paulo (BECHARA; LIBERMAN; FRANCHI, 1968). Ministrou
aulas no Curso de Admissão promovido pela TV Cultura, participou da preparação
das provas de matemática para o exame unificado de admissão ao ginásio em
1965, para o Estado de São Paulo. Escreveu algumas publicações para o GEEM
(LIBERMAN, 2006).
LICHNEROWICZ, André (1915-1998) foi presidente da Sociedade de Matemática
da França, professor da Faculdade de Ciências de Paris e do Colégio da França e
participante de várias instâncias do CNRS. Representou a instância de pesquisa e
ensino superior que faria a reforma do secundário (ARMATTE, 1996, p. 77-88).
434
LIMA, Arlete Cerqueira, professora aposentada do Instituto de Matemática da
UFBa, foi uma das fundadoras do Instituto de Matemática e Física e Diretora do
Instituto de Física da Universidade Federal da Bahia. (LIMA, 1985).
LINTZ, Rubens Gouveia, foi o primeiro diretor do Instituto de Matemática e Física
da Universidade da Bahia, criado em 1961, durante a gestão do reitor Edgard
Santos, o qual incumbiu a professora Arlete Cerqueira Lima juntamente com o
físico Ramiro de Porto Alegre Muniz de organizarem o projeto de criação do
Instituto.
MALBA TAHAN ou Julio César de Melo e Souza, (1895-1974), foi professor
catedrático do Colégio Pedro II, professor emérito da Faculdade Nacional de
Educação, da Escola Normal da Universidade do Brasil e do Instituto da Escola
Normal. Autor de diversas obras didáticas, sendo a mais conhecida “O homem
que calculava”, traduzida para diversos idiomas. Maiores detalhes de sua
trajetória profissional ver a dissertação de mestrado intitulada “Do menino ‘Julinho
a ‘Malba Tahan’: uma viagem pelo oásis do ensino da matemática” de Cristiane
Coppe de Oliveira (2001).
MARCUS, Ernst Gustav Gotthelf (1893-1968), nasceu em Berlim. Foi contratado
para lecionar Zoologia na FFCLUSP (MENDES, 1994).
MESQUITA FILHO, Júlio de (1892- 1969). Foi diretor do Jornal “O Estado de São
Paulo”. Participou ativamente da Revolução de 1932 e da fundação da USP.
Membro da Academia Paulista de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico de
São Paulo e da Sociedade Paulista de Escritores.
MICALI, Artibano, doutor em ciências matemáticas pela FFCLUSP em 1965,
sendo orientado por Benedito Castrucci. Posteriormente, orientou a tese de
doutorado da professora Sílvia Dias de Alcântara Machado, pela PUC/SP (SILVA,
2003b).
MONGE, Gaspard (1746-1818), tornou-se professor na École de Méziéres,
defendeu a construção de instituições de ensino mais avançadas, sendo sua
participação essencial para criação da L’École Polytecnique. A École Normale foi
criada nesta época e Monge lá também foi professor entre 1794 e 1795, quando
publicou sua “Géometrie descriptive” (BOYER, 1996, p. 327-328).
NASCENTES, Antenor de Veras (1876-1972), filólogo, lingüista e catedrático do
Colégio Pedro II.
NOETHER, Emmy (1988-1935) matemática alemã. É costume apontar seu artigo
Ideal theory in rings” de 1921 como a origem abstrata dos anéis.
OLIVEIRA, Armado de Salles (1887-1945), foi governador do Estado de São
Paulo nos anos de 1935 e 1936; diretor do Jornal O Estado de São Paulo entre
1915 e 1938 e interventor Federal no Estado de São Paulo entre 1930 a 1938.
PAPY, George (1920- ), educador matemático belga, foi presidente do Centro
Belga de Pedagogia da Matemática, professor da Universidade Livre de Bruxelas
e presidente da CIAEM. Direcionou seu trabalho para a melhoria da matemática
escolar de modo a integrá-la àquela ensinada na universidade, desenvolvendo um
435
programa rigoroso, com enfoque em Espaços Vetoriais e Geometria das
Transformações (D’AMBROSIO, B. 1987, p. 78).
PASCH, Moritz (1843-1930), matemático alemão, completou seu Ph.D. na
Universidade de Breslau, aos 22 anos. Interessou-se pelos fundamentos da
geometria, sendo o primeiro a dar uma formulação satisfatória à Geometria
euclidiana.
PATRAS, Fréderic, pesquisador do CNRS (Conseil National Recherche
Sciéntifique), responsável pela equipe de Álgebra e Topologia. Matemático da
Universidade de Nice-Sophia Antipolis, França, mesma instituição em que Jean
Dieudonné (1906-1992) trabalhou e desenvolveu seus estudos.
PAULA, Eurípedes Simões de. Professor catedrático de Historia da Civilização
Antiga e Medieval da FFCLUSP, diplomado pela turma de 1936, tornando-se
diretor dessa Faculdade na década de 1950 (ANUÁRIO DA FFCLUSP, 1951).
PEACOCK George (1791-1858), matemático inglês graduado e professor em
Cambridge e um dos fundadores da Analytical Society. Foi de grande importância
na reforma da matemática inglesa, especialmente no que se refere à Álgebra.
Autor da obra “Treatise on Algebra”, sugeria que os símbolos para objetos na
Álgebra não precisavam indicar números (BOYER, 1996).
PEANO Giuseppe (1858-1935), tem seu nome associado com os axiomas de
Peano. Quais sejam: a) zero é um número; b) se a é um número, o sucessor de a
também é um número; c) zero não é sucessor de ninguém; d) dois números cujos
sucessores são iguais são eles próprios iguais; e) se um conjunto S de números
contém o zero e também o sucessor de todo número de S, então todo número
está em S. Este último item é o conhecido axioma da indução. Os axiomas de
Peano, formulados em 1889, representam notável tentativa de reduzir a Aritmética
a um puro simbolismo formal (BOYER, 1996, p. 415).
PENTEADO, Onofre de Arruda, foi professor catedrático da cadeira de Didática
Geral e Especial da FFCLUSP, entre 1930 a 1950.
PIAGET, Jean (1896-1980), foi o teórico da epistemologia genética, ou seja, um
setor da psicologia que estuda as estruturas lógicas da mente e os processos
cognitivos através dos quais elas amadurecem. Estudou as etapas sucessivas de
evolução e as estruturas que correspondem a cada uma delas, bem como a
maturação cognitiva em relação a conceitos científicos específicos, como espaço,
tempo, movimento, força, número, etc. (CAMBI, 1999, p. 609).
PIERRO NETO, Scipione di. Ingressou em 1947, na FFCLUSP, finalizando seu
curso em 1952. Autor de diversos livros didáticos de matemática.
POINCARÉ, Henri (1854-1912), filósofo e matemático universalista, publicou
cerca de 500 trabalhos, principalmente em áreas da Matemática e da Física. Sua
Analysis situs” marca o início do estudo sistematizado de Topologia. A
conferência “Les définitions générales em mathématiques”, pronunciada no
Museu Pedagógico de Paris e publicada na revista “L’Enseignement
Mathématique” em 1904, é uma das principais referência tomadas por Euclides
436
Roxo para tratar da incompreensão manifestada pela maioria dos alunos em
relação à ciência Matemática (DUARTE, 2002).
RAMOS, Theodoro Augusto, obteve grau de doutor em Ciências Físicas e
Matemáticas pela Escola Politécnica do Rio de Janeiro, em 1918, com a tese
intitulada “Sobre as funções das variáveis reais”. Auxiliou a Comissão
Organizadora que fundou a Universidade de São Paulo, em 1934. Publicou
trabalhos científicos em Análise, Geometria, Física Matemática, Engenharia, etc.
(SILVA, 2003, p. 124).
ROXO, Euclides de Medeiros Guimarães (1890-1950), foi professor de
matemática do Colégio Pedro II e diretor no período de 1925-1935, principal
responsável pela proposta modernizadora do ensino de matemática
fundamentando-se nas idéias pedagógicas de Felix Klein, assessor direto dos
ministros Francisco Campos e Gustavo Capanema nas reformas de ensino e
autor de inúmeros livros didáticos de matemática.
RIEMANN, Georg Friedrich Bernhard (1826 - 1866), foi um matemático alemão
que fez contribuições importantes para a Análise e a Geometria Diferencial,
algumas das quais abriram caminho para o desenvolvimento da relatividade geral,
mais tarde. O seu nome está ligado à função zeta, à integral de Riemann, ao lema
de Riemann, à dobra de Riemann e às superfícies de Riemann.
RUSSELL, Bertrand (1872-1970) e WHITEHEAD, Alfred North (1861-1947), na
obra Principia Mathematica entregaram-se à tarefa de estabelecer
minuciosamente que as leis da Aritmética e toda a matemática dos números,
relacionam-se às leis da lógica. Não se tratava, entretanto, da lógica aristotélica.
Exigia-se um sistema lógico mais potente, de modo que Russell, Whitehead e
igualmente Frege, contribuíram, em larga escala, para a elaboração das leis da
lógica moderna (BARKER, 1976, p. 107).
SANGIORGI, Osvaldo, nasceu em São Paulo, no ano de 1924. Iniciou suas
atividades de professor de Matemática em 1944, aposentando-se em 1994. Atuou
como coordenador do G.E.E.M. desde sua fundação. Foi professor da
Universidade Mackenzie. Somente em 1990 torna-se professor titular da
Universidade de São Paulo. Sua formação era a de licenciado em Física, pela
USP, em 1943. Surge como autor de destaque na publicação de livros didáticos a
partir da década de 1950 (BARALDI, 2003).
SEVERI, Francesco (1879-1961), nasceu em em Arezzo, Itália. Formou-se em
engenharia na Universidade de Torino. Atuou especialmente nas áreas de
Geometria e Análise. Autor do livro “Lezioni di Analisi”, utilizado por Fantappiè em
suas aulas na USP (LIMA, 2006).
STONE, Marshall (1903- ). Matemático americano, obteve o título de doutor em
1926 na Universidade de Harvard. Foi professor nas universidades de Harvard,
Columbia, Yale e se radicou em Chicago desde 1946, como diretor do
Departamento de Matemática. Sua obra científica abarca os domínios variados da
matemática, desde Lógica à Física Quântica, recebendo importantes distinções
científicas. Interessou-se pelo problema do ensino da matemática e contribuiu
para impulsionar o movimento de modernização (PAPY, 1971).
437
TARSKI, Alfred (1901-1983), matemático polonês. Dedicou estudos sobre
Álgebra, Lógica Algébrica, Lógica Matemática, entre outras áreas.
VARGAS, Getúlio Dornelles (1883-1954), nasceu em São Borja (RS) aos 19 de
abril de 1883. Foi chefe do governo provisório depois da Revolução de 30,
presidente eleito em 1934, até 1937 quando da implantação do Estado Novo. Foi
deposto em 1945, voltando à presidência em 1951. Faleceu em 24 de agosto.
WAERDEN, Bartel Van der (1903-1996), nasceu em Zurich, Suíça. Seu trabalho
mais famoso, “Modern Algebra” publicado em 1930, relata a álgebra desenvolvida
por Hilbert, Noether e Dedekind, representando os maiores avanços teóricos da
época. Com seu trabalho, se impôs a idéia e a terminologia das estruturas,
mesmo que ainda desprovida de todo conteúdo explicito (PATRAS, 2001).
WATAGHIN, Gleb (1899-1986). Físico de origem russa, naturalizou-se italiano e
veio de Turim para o Brasil, a convite de Theodoro Ramos, em 1934, para exercer
a função de professor na área de Física, sendo inicialmente contatado para a
cadeira de Física Geral e Experimental e Física Teórica na FFCLUSP. Também
foi professor de Mecânica Racional e Mecânica Celeste e Física Superior
(ANUÁRIO DA FFCLUSP 1939-1949).
WATANABE, Renate Gompertz, nasceu em Krefeld, Alemanha. Naturalizou-se
brasileira em 1953. Graduou-se em Matemática pela PUC-SP, em 1952. Obteve o
título de Mestre em Matemática pela Universidade Illinois, nos Estados Unidos.
Ministrou vários cursos de atualização para professores no GEEM. Escreveu
diversos livros e traduziu vários outros. Atualmente, desde 1982, participa do
Comitê Editorial da Revista do Professor de Matemática, e é professora titular da
Universidade Presbiteriana Mackenzie (BARALDI, 2003).
WEIERTRASS, Karl Wilhelm Theodor (1815 - 1897), matemático alemão,
professor na Universidade de Berlim. Seu trabalho forneceu as bases da Teoria
das Funções Analíticas. Weierstrass foi um pioneiro da moderna Análise
Matemática. Foi o mentor da matemática Sofia Vasilyevna Kovalevskaja.
WEIL, Andre (1906-1998), considerado como um dos mais brilhantes
matemáticos do século XX, foi aluno da Escola Normal Superior, doutor em
Ciências em 1928. Professor nas Universidades de Aligarh (Índia), Strasburgo,
São Paulo, Chicago e do Instituto de Estudos Avançados de Princeton. Obteve o
prêmio Wolf em 1979 (WEIL, 2002).
ZARISKI, Oscar (1899-1986), nasceu na Rússia, estudou na Universidade de
Kiev. Em 1920 estabeleceu-se em Roma, onde tornou-se discípulo da Escola
Italiana de Geometria Algébrica, estudando com matemáticos como Guido
Castelnuovo, Federico Enriques e Francisco Severi. Foi contratado pela USP, na
década de 60, juntamente com Grothendieck e Jean Delsart (D’AMBROSIO,
1999). Luiz Henrique Jacy Monteiro (1918-1975), obteve grau de doutor em
Ciências pela FFCLUSP em 1950, com a tese “Sobre as potências simbólicas de
um ideal primo de um anel de polinômios”, sob a orientação de Oscar Zariski.
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