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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ
CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO PARA A
CIÊNCIA E O ENSINO DE MATEMÁTICA
MARISA INÊS BILTHAUER
IMAGENS E ARGUMENTOS ECOLÓGICOS NOS LIVROS DIDÁTICOS:
QUE EDUCAÇÃO AMBIENTAL É CONSTRUÍDA?
MARINGÁ-PR
2007
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2
MARISA INÊS BILTHAUER
IMAGENS E ARGUMENTOS ECOLÓGICOS NOS LIVROS DIDÁTICOS:
QUE EDUCAÇÃO AMBIENTAL É CONSTRUÍDA?
Dissertação de Mestrado apresentado ao Programa
de Pós-Graduação em Educação para a Ciência e o
Ensino de Matemática da Universidade Estadual
de Maringá, para a obtenção do título de Mestre.
Orientadora: Profª. Drª. Luzia Marta Bellini
MARINGÁ
2007
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MARISA INÊS BILTHAUER
IMAGENS E ARGUMENTOS ECOLÓGICOS NOS LIVROS DIDÁTICOS:
QUE EDUCAÇÃO AMBIENTAL É CONSTRUÍDA?
Dissertação de Mestrado apresentado ao Programa
de Pós-Graduação em Educação para a Ciência e o
Ensino de Matemática da Universidade Estadual
de Maringá, para a obtenção do título de Mestre.
Aprovado em
BANCA EXAMINADORA
Profª. Drª. Luzia Marta Bellini
Universidade Estadual de Maringá – UEM
Profª Drª Regina Maria Pavanello
Universidade Estadual de Maringá – UEM
Prof. Dr. Jozimar Paes de Almeida
Universidade Estadual de Londrina - UEL
4
Dedico este trabalho
pelo incentivo, apoio e compreensão
a minha família, especialmente a
minha filha Ana Caroline, a minha
mãe Marlene e meu irmão Claudemir.
aos colegas de trabalho e amigos:
Damasceno Lúcia Inês, Nilva e
Raquel.
5
AGRADECIMENTOS
À Profª Drª Luzia Marta Bellini, a Marta, a quem eu muito admiro e considero
uma verdadeira “mestre”, tanto na Educação, como na vida. Agradeço por sua
orientação e pelas lições de vida que me deu.
À minha família, pelo apoio, compreensão, incentivo e paciência demonstrados no
decorrer dessa caminhada.
Aos professores, colegas e funcionários do Programa de Mestrado em Educação
para o Ensino de Ciências e Matemática, pela oportunidade oferecida, ensinamentos
e trocas de experiências.
A todos os amigos e colegas de trabalho do Núcleo Regional de Educação de
Paranavaí, principalmente, a Profª Sueli Alves Batista da Silva e a Profª Elga de
Souza Machado, pela compreensão e incentivo, e especialmente aos amigos
Damasceno, Lúcia Inês, Nilva e Raquel, da Coordenação Regional de Tecnologia
na Educação – CRTE, pelas vezes que se desdobraram para suprir minha ausência.
A todos os que direta ou indiretamente contribuíram para este trabalho.
6
RESUMO
Esta dissertação teve como objetivo analisar as analogias e metáforas de 12 livros
didáticos acerca de Ecologia e Educação Ambiental; 4 livros de a 4ª séries do
Ensino Fundamental; 4 livros de a 8 séries do Ensino Fundamental e 4 livros do
Ensino Médio. Metodologicamente realizamos o exame retórico dos temas ecologia e
educação ambiental incluindo as ilustrações presentes nos livros. Como conclusão
obtivemos: a) as metáforas harmonia e equilíbrio da natureza conferem às coleções
analisadas concepções errôneas de ecossistema e ambiente; b) as metáforas população,
comunidade, a noção de ecossistema, nicho, habitat, rede, teia são reduzidas à analogia
de indivíduo, contradizendo o conceito de ecologia e ecossistema que tratam de
dinâmicas populacionais e não individuais.
Palavras-chave: Ecologia, Educação Ambiental, livro didático, metáfora, analogia.
7
ABSTRACT
This dissertation has as objective to analyze the analogies and metaphors of 12 books
concerning Ecology and Ambient Education; 4 books from 1
st
to 4
th
series of the
elementary school; 4 books from 5
th
to 8
th
also of the elementary school and 4 books
from the secondary school. Methodologically we carry through the rhetorical
examination of the subjects ecology and ambient education including illustrations gifts
in those books. As conclusion we got: a) the metaphors harmony and balance of the
nature confer to the analyzed collections of books wrong conceptions of ecosystem
and environment; b) the metaphors population, community, the ecosystem notion,
niche, habitat, net, web are reduced to the individual analogy, having contradicted the
concept of ecology and ecosystem that deal with population and not individual
dynamic.
Key words: Ecology, Ambient Education, didactical book, metaphor, analogy.
8
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura A. Figura A: Evolução – Metáfora “escada” ............................................... 24
Figura B: Evolução – Metáfora “árvore” ................................................................. 24
Figura 1: Corte de madeira – PA.............................................................................. 54
Figura 2. Peixes Mortos na Represa Billings – SP................................................... 54
Figura 3. O lixo e a poluição do solo ....................................................................... 55
Figura 4. Onde vivem os animais?........................................................................... 56
Figura 5. A Terra – O lugar de todos ....................................................................... 57
Figura 6. Planeta bebê ............................................................................................. 57
Figura 7: Caverna – um ecossistema........................................................................ 58
Figura 8.1: A ecologia ............................................................................................. 59
Figura 8.2: Efeito dominó ........................................................................................ 59
Figura 9. Transmitindo Energia ............................................................................... 60
Figura 10. Pirâmide de energia ................................................................................ 61
Figura 11. Pirâmide de números .............................................................................. 61
Figura 12. Cadeia alimentar em espiral ................................................................... 62
Figura 13. Teias alimentares .................................................................................... 63
Figura 14. Terra com “Band-aid” ............................................................................ 63
Figura 15: Amor à Terra... ... amor à vida ............................................................ 64
Figura 16. O que é a hipótese Gaia? ........................................................................ 65
Figura 17. Indo ao médico ....................................................................................... 66
Figura 18. Planeta saudável ..................................................................................... 66
Figura 19. Equilíbrio Ecológico .............................................................................. 66
Figura 20. Fases da vida .......................................................................................... 67
9
Figura 21. A caminho de uma reconciliação entre o ser humano e a natureza ....... 68
Figura 22. Níveis de organização dos seres vivos ................................................... 68
Figura 23.1. A dinâmica das comunidades: sucessão ecológica ............................. 69
Figura 23.2. Esquema de sucessão secundária em um campo abandonado ............ 70
Figura 24.1. Conceitos básicos em Ecologia ........................................................... 71
Figura 24.2. Conceitos básicos em Ecologia ........................................................... 71
Figura 25. Habitat e Nicho ecológico ...................................................................... 72
Figura 26. Níveis de Organização da vida no ecossistema do recife ...................... 72
Figura: 27. Sucessão primária e sucessão secundária ............................................. 73
Figura: 28. Representação esquemática em um campo de cultivo abandonado ..... 73
Figura: 29. A hipótese Gaia ..................................................................................... 74
Figura: 30. Os níveis de organização em ecologia .................................................. 74
10
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ................................................................................................ 11
I. METODOLOGIA ............................................................................................. 14
II. O PAPEL DAS METÁFORAS E ANALOGIAS NA COMUNICAÇÃO....... 19
2.1. As figuras de retórica: linguagens e processos cognitivos................................ 21
III. ECOLOGIA, MEIO AMBIENTE E EDUCAÇÃO AMBIENTAL:
HISTÓRIA E CONSTITUIÇÃO TERMINOLÓGICA.................................... 26
3.1 Os níveis de Organização em Ecologia: a terminologia científica atual:
Desta história da ecologia o que temos hoje para a ecologia? ......................... 41
3.2 Meio Ambiente e Educação Ambiental: história das terminologias................. 45
IV AS MÉTAFORAS E ANALOGIAS UTILIZADAS EM ECOLOGIA,
MEIO AMBIENTE E EDUCAÇÃO AMBIENTAL NOS LIVROS
DIDÁTICOS DE CIÊNCIAS E BIOLOGIA.................................................... 53
V. CONCLUSÃO .................................................................................................. 76
REFERÊNCIAS .............................................................................................. 77
11
INTRODUÇÃO
Um dos instrumentos da argumentação é o que expõe a
metáfora, ou metáforas, que nucleiam, condensam,
significados de uma teoria [...] (MAZZOTTI, 2000, p. 56).
Nosso objeto de estudo são os sentidos que as analogias e as metáforas dão aos
argumentos presentes nos livros didáticos de ciências quanto aos temas Educação
Ambiental e Ecologia.
A efetivação do exame dos argumentos e das imagens dos livros foi feita sob a teoria
da argumentação e de aspectos da linguagem como as figuras de retórica de Olivier
Reboul (1975; 2004), Paula Contenças (1999), George Lakoff e Mark Johnson (2002)
e Phillippe Breton (2003). Com os estudos destes autores pudemos compreender o
processo da comunicação dos livros didáticos. Para isso, analisamos as figuras e textos
contidos nos capítulos de Ecologia/Educação Ambiental/Meio Ambiente de 12 livros
didáticos, 8 de ciências, do ensino fundamental e 4 de biologia, do ensino médio.
Para elaborar este trabalho de dissertação, propusemo-nos a examinar os argumentos,
incluindo aí, as imagens utilizadas nos livros didáticos de Ciências e Biologia para
compreender como os conhecimentos de Educação Ambiental/Ecologia chegam aos
nossos alunos. Para nortear esse exame delimitamos nossos problemas de pesquisa em:
Quais o as analogias e as metáforas dos livros didáticos para o ensino da Educação
Ambiental? As imagens (fotografias, desenhos e pinturas) utilizadas nos livros
didáticos aproximam ou afastam o leitor/auditório da Ecologia/Educação Ambiental?
O trabalho exposto aqui, do ponto de vista metodológico, consiste no levantamento
bibliográfico para a fundamentação do trabalho, na seleção de diferentes livros
12
didáticos utilizados nas escolas públicas e privadas do Paraná e nos recortes de textos e
imagens dos capítulos que abordam educação ambiental e/ou ecologia.
Justificamos esta pesquisa tendo em vista que, nas últimas décadas, nosso planeta vem
sofrendo contínuas agressões e destruição dos recursos naturais, tais como: diminuição
da água potável, aquecimento global, alterações climáticas, poluição da água, do ar e
do solo, desmatamentos e outras formas de devastação. E, a partir da década de 60 do
século XX, ampliaram-se as informações pela mídia impressa, televisiva e meios
escolares acerca dos problemas ocasionados pelos impactos ambientais e sobre a
importância da preservação do meio ambiente.
A mídia, o professor e/ou o livro didático quase sempre tratam de Educação Ambiental
e Ecologia explorando analogias como “a Terra está doente”, “está em perigo” e
“temos que salvá-la”.
Os textos didáticos, por sua vez, procuram adesão ao problema da preservação do
planeta, uma vez que os impactos ambientais, no mundo todo, agravam-se. Ao fazer
isso, os textos didáticos utilizam metáforas, recurso de linguagem, e, também, de
pensamento (MAZZOTTI, 2005). Dessa maneira, a comunicação do conhecimento
cientifico para a criança, muitas vezes, é simplificada; os conhecimentos ambientais
são apresentados em uma linguagem reducionista mudando o sentido dos temas.
Para Mazzotti (2005, p.5):
[...] a compreensão dos processos envolvidos nos problemas ambientais
exige um forte aparato conceitual que se desenvolveu pela constituição da
Ecologia, originada na Fitogeografia e que, hoje, abrange um conjunto de
disciplinas que têm em comum um certo modelo sistêmico das interações
ambientais. Este modelo incorpora a dinâmica ou processos que se definem
por meio de equilíbrio instáveis que podem ser estudados por meio da teoria
dos sistemas dinâmicos. E assim, ao tentar resumir e simplificá-los, se perde
13
uma rica gama de processos e interações que estão inseridas nesses
conceitos.
Compreender o que o autor de livro didático quer comunicar é fundamental para o
professor e alunos, pois “aceitar um argumento é partilhar a opinião da qual este
argumento é a apresentação e, por detrás dele, os valores, pontos de vista, a autoridade
e até as novidades que fundamentam esta opinião” e mais ainda, “a argumentação leva
à mudança, ela é uma mudança em ação, que implica pouco a pouco a integralidade da
pessoa e que vai condicionar seu futuro” (BRETON, 2003, p. 176).
Sem vida a dimensão ambiental impõe-se na organização do ensino em
todos os níveis, pois seu desconhecimento tem produzido as crises
ambientais que vivemos. Para tal é preciso que os estudantes aprendam
corretamente os modelos utilizados pelas ciências que buscam explicar as
relações entre os seres orgânicos e inorgânicos, particularmente as referentes
à produção de valores de uso para os homens [...] (MAZZOTTI, 2005, p.15).
Desse modo, nesta dissertação, apresentamos as sessões organizadas da seguinte
forma: na sessão, “Metodologia” na qual apresentamos o percurso metodológico
deste trabalho. Na 2ª sessão, “O papel das metáforas e analogias na comunicação”,
apresentamos as dimensões teóricas para a análise dos livros didáticos; na sessão
“Ecologia, Meio Ambiente e Educação Ambiental: história e constituição
terminológica”, demonstramos alguns aspectos das analogias e metáforas da ciência
Ecologia; na sessão, analisamos as analogias e as metáforas presentes nos livros
didáticos e na 5ª sessão, nossas considerações finais.
14
I. METODOLOGIA
Toda prática envolve uma forma de atividade cognitiva.[...] No
saber se inscrevem, se articulam e se expressam processos
ecológicos e culturais, econômicos e tecnológicos. Ao mesmo
tempo, o saber gera sentidos que mobilizam os atores sociais a
tomar posições diante do mundo, definir suas identidades e
projetar suas utopias (LEFF, 2005, p. 279).
A análise das metáforas do discurso do Livro Didático tem como objetivo estudar os
diferentes sentidos que adquire a comunicação na escola via os textos didáticos. Este
estudo o das metáforas e analogias faz parte da análise retórica de acordo com
Olivier Reboul (1975; 2004), Paula Contenças (1999), George Lakoff e Mark Johnson
(2002) e Phillippe Breton (2003).
Do ponto de vista metodológico nossa pesquisa é qualitativa e recorremos à técnica da
análise do discurso conforme descrevem Bauer e Gaskell, (2002). Conforme os
autores:
A análise de discurso é um nome dado a uma variedade de diferentes
enfoques no estudo de textos, desenvolvida a partir de diferentes traduções
teóricas e diversos tratamentos em diferentes disciplinas. Estritamente
falando não existe uma única “análise de discurso”, mas muitos estilos
diferentes de análise, e todas reivindicam o nome. O que estas perspectivas
partilham é uma rejeição da noção realista de que a linguagem é
simplesmente um meio de neutro de refletir, ou descrever o mundo, e uma
convicção da importância central do discurso na construção da vida social
(BAUER; GASKELL, 2002, p. 244).
Tomando como aporte teórico Olivier Reboul (2004), Paula Contenças (1990) e
George Lakoff e Marc Johnson (2002), Breton (2003), selecionamos os textos dos
livros didáticos escolhidos. Após a seleção dos excertos, marcamos as definições dos
conceitos de ecossistema, hábitat, nicho, cadeia alimentar, população, comunidade,
biosfera e a partir deste material examinou-se cada analogia levando em conta as
definições advindas dos textos científicos sobre a história dos conceitos da ecologia.
15
As etapas metodológicas para o desenvolvimento da investigação proposta foram:
1º) Levantamento dos estudos sobre a História das Ciências Ecológicas e a Teoria da
Argumentação e dos estudos aplicados.
2 º) Seleção dos livros didáticos utilizados em escolas e colégios da rede estadual de
ensino do Estado do Paraná, na cidade de Paranavaí.
3 º) Exame das imagens e argumentos ecológicos e das lições ambientais apresentados
nos itens de Educação Ambiental dos livros selecionados.
4º) Análise dos argumentos presentes nas definições de ecossistema, população,
comunidade, biosfera, hábitat, nicho ecológico, cadeia e teia alimentar em teorias
ecológicas por meio das obras de ACOT (1990), DROUIN (1991) e ODUM (1977)
comparando as metáforas científicas com as dos livros didáticos.
O critério para a seleção dos livros foi a presença destes no Programa Nacional do
Livro Didático (PNLD) e Programa Nacional do Livro para o Ensino Médio
(PNLEM), ambos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).
Dessa maneira, escolhemos a coleção para o Ensino Fundamental e os 3 livros
didáticos do Ensino Médio, como recomendadas. Além de serem livros didáticos
recentes, aprovados pelo PNLD 2006 e PNLEM 2007, os livros escolhidos são
adotados pelas escolas e colégios municipais e estaduais do Município de Paranavaí-
Pr. Os livros de a série são adotados em 22 escolas municipais, das quais 19 são
urbanas e 3 são rurais; os de a 8ª série são utilizados em 10 escolas e colégios
estaduais e os de Ensino Médio, em 8 colégios estaduais.
16
Agrupamos os Livros Didáticos em três categorias: os livros de 1ª a série, com
noções básicas; de a que se destinam à introdução de conceitos ecológicos e/ou
ambientais e os livros didáticos de Ensino Médio que apresentam noções mais
complexas do tema.
Foram examinadas: a) 2 coleções de Ensino Fundamental: 4 livros de 1ª a 4ª série; 4 de
5ª a 8ª série.
A coleção de Ciências - Vitória Regia, a séries, de Samuel Ramos Lago e Erica
Meirelles, da IBEP, 2001, é recomendada pelo guia do PNLD (2004, p. 196-199) por
conter uma proposta pedagógica bem definida, boa qualidade das ilustrações, conteúdo
adequado e correto que, em conjunto com atividades diversificadas, propostas de
experimentos, possibilidades de discussões e debates, permitem um bom trabalho
pedagógico.
A obra utiliza uma grande quantidade de ilustrações que, em geral, são de qualidade
gráfica boa e contribuem significativamente para o aprendizado. De acordo com sua
proposta pedagógica, a coleção utiliza figuras diversificadas que reproduzem ou
complementam informações do texto escrito, explicam elementos do dia-a-dia ou
ainda fatos e fenômenos. Algumas figuras não apresentam, de maneira conveniente, a
noção de escala e proporção. O professor deve intervir a fim de evitar compreensões
equivocadas dos alunos.
A coleção Ciências, de Cecília Valle, da Editora Positivo, 2004, composta por quatro
livros: o de 5ª série, Terra e Universo; o de 6ª série, Vida e Ambiente; o de 7ª série, Ser
Humano e Saúde e o de série, Tecnologia e Sociedade. Esta coleção se destaca,
segundo o guia PNLD (2005, p. 18-26), pela preocupação em resgatar os
conhecimentos prévios dos alunos, por apresentar conteúdos adequados a cada uma
das séries, abordagem conceitual correta, linguagem clara, simples e gramaticalmente
17
correta e textos, figuras, fotografias e esquemas que permitem uma leitura agradável
aos alunos. muitas ilustrações de qualidade. As fotografias e imagens são claras e
bem impressas. O professor deverá ter em mente que a idéia de dimensão e escala em
Ciências é fundamental para a compreensão de alguns conceitos.
b) 4 livros de Ensino Médio: 2 livros de volume único e 2 livro de uma coleção de 3
volumes.
O livro de Biologia volume 3, de José Mariano Amabis e Gilberto Rodrigues
Martho, Moderna, 2005, se destaca, segundo o PNLEM (2007, p. 59-68), pelo volume
de informações que vão além dos limites do esperado para o ensino médio. A obra
apresenta um bom projeto gráfico, é ilustrada com esquemas, gráficos, fotografias e
micrografias. Em geral, nas legendas das ilustrações referências apropriadas ao
tamanho e escala das estruturas representadas.
A obra Biologia volume único, de Sônia Lopes e Sergio Rosso, Saraiva, 2005 se
mostra, conforme o PNLEM (2007, p. 77-86), conceitualmente correta, com textos
claros e bem redigidos. As ilustrações, com algumas exceções, são de boa qualidade e
trazem créditos, indicações de escalas e ressalvas quanto ao uso de cores-fantasia.
Contudo, segundo o guia do PNLEM, a obra apresenta alguns problemas conceituais
nas áreas de genética, evolução e biologia celular e molecular.
De acordo com o PNLEM (2007, p. 43-58), o livro Biologia volume único, de
Augusto Adolfo, Marcos Crozetta e Samuel Lago, IBEP, 2005, apresenta textos com o
mérito de não exagerar na quantidade de informações. Porém, esses livros não estão
livres de imprecisões. Entre os pontos positivos da obra destaca-se o tratamento
contextualizado que é dado à Biologia e às atividades propostas, que são bem
diversificadas; valoriza a experimentação, o trabalho em grupo e contribui para a
prática investigativa. No entanto, conforme o guia do PNLEM, alguns conceitos
18
centrais da ecologia, como ecossistema, nicho, interações ecológicas e teias
alimentares são imprecisos. Isso compromete um aprendizado adequado dessa área da
Biologia, que, por sinal, recebe pouca ênfase na obra.
Quanto às ilustrações, de acordo com o PNLEM, embora várias sejam pertinentes,
claras e precisas, outras não contribuem para o enriquecimento do texto, ou
apresentam imprecisões. Em alguns pontos há divergência entre o que a figura mostra
e o que a legenda indica; outras figuras ilustram estruturas com imprecisão, não
contribuindo para sua compreensão adequada. Algumas ilustrações não mantêm as
proporções adequadas entre as partes e nenhuma ressalva a esse respeito é feita.
No livro Biologia Volume 3, de César da Silva Júnior e Sezar Sasson, Saraiva, 2005,
as característica positivas, segundo o PNLEM (2007, p. 51-58), são os textos com
observações, relatos históricos ou estudos de caso que contextualizam o conhecimento
e provocam a reflexão. O guia considera os textos bem equilibrados com relação ao
aprofundamento e à abrangência dos temas. O conteúdo é atualizado e integrado à
realidade brasileira, possibilitando conexões com temas do nosso cotidiano.
Além disso, a obra apresenta também uma diversidade de exercícios para estimular o
raciocínio e a discussão. Uma das lacunas do livro é a escassez de atividades práticas
como experimentos, práticas, excursões, entre outros. Quanto às ilustrações, as figuras
e tabelas são claras, de fácil interpretação e leitura. Elas complementam os textos de
maneira muito eficiente e auxiliam os professores na ilustração de conceitos,
fenômenos e organismos.
19
II. O PAPEL DAS METÁFORAS E ANALOGIAS NA COMUNICAÇÃO
A metáfora, que é uma elipse da analogia, pode ser um
argumento quando ela serve para convencer [...] (BRETON,
2003, p. 133).
O ser humano pratica a argumentação “desde o momento em que se comunica”
(BRETON, 2003, p. 23). Ou seja, “a partir do momento em que têm opiniões, crenças,
valores e tenta fazer com que os outros partilhem destas crenças e valores”, a
comunicação. Isto é, “desde sempre, na medida em que o homem se identifica, ao
contrário dos animais, com uma palavra, com um ponto de vista próprio sobre o
mundo no qual ele vive” (BRETON, 2003, p. 23).
Para Breton (2003, p. 7) a argumentação é uma das ações humanas que têm como
objetivo convencer e obter que uma pessoa, um auditório, um público adotem
determinado comportamento ou que eles compartilhem de determinada opinião. É
acionar um raciocínio em uma situação de comunicação.
Para que haja uma situação de argumentação, é necessária a existência de um emissor
ou orador (ethos), uma mensagem (logos) e um receptor (pathos). Dessa forma, em
uma situação argumentativa, sempre temos a interação “emissor mensagem
receptor”. O “orador” é aquele que dispõe de uma opinião, e a comunica ao auditório,
para que este dela partilhe. O “argumento” defendido pelo orador é opinião exposta
para convencer na forma de um raciocínio argumentativo e pode ser apresentado por
escrito (bilhete, carta, livro, mensagem eletrônica), pela palavra (rádio ou televisão),
pela imagem, entre outros. O “auditório” pode ser uma pessoa, um público ou até
mesmo, o próprio orador quando ele procura se “auto-convencer” (BRETON, 2003,
p.29).
20
Argumentar, segundo Breton (2003), é escolher os aspectos de uma opinião que a
tornarão mais aceitável para um determinado público, ou seja, transformar a opinião
em um argumento de acordo com aquele auditório em particular.
No caso dos livros didáticos, estão presentes as dimensões ethos/orador quando a
forma impressa é destinada à leitura e condução do professor e dos alunos em sala de
aula; e a dimensão logos quando neles estão os “conteúdos” ou conhecimentos que
guiarão as aulas do professor aos seus alunos.
Para ser um bom orador, além de saber falar, ler e interpretar, é necessário saber
identificar também o que está implícito no discurso do outro, detectar o que o outro
quer expressar, os seus argumentos, seus desejos, crenças, valores e saber contra
argumentar. Ou seja, para ser persuasivo o orador deve, antes, compreender o seu
público, aquele que lhe faz face, captar a força da retórica dele, bem como seus pontos
fracos (REBOUL, 2004, p. XIX).
Reboul (2004, p. XIV), define a retórica como a arte de ganhar a adesão intelectual do
público apenas com o uso da argumentação, de persuadir pelo discurso, entendido
como toda a produção verbal, escrita ou oral, constituída por uma frase ou por uma
seqüência de frases que tenha começo e fim e apresente certa unidade de sentido.
Desse modo, o processo de argumentação requer o estabelecimento do contraditório,
da exposição dos enunciados favoráveis e desfavoráveis ao caso, mostrando que
determinados enunciados são ou mais adequados ou completamente adequados ao
objeto (MAZZOTTI; OLIVEIRA, 2000, p. 9).
Há, segundo Reboul (2004, p. XVIII a XXII), as quatro funções da retórica: a
persuasiva, a hermenêutica, a heurística e a pedagógica. A pedagógica é a que mais
21
nos interessa, pois está relacionada à como “ensinar a compor um segundo plano, a
encadear os argumentos de modo coerente e eficaz, a cuidar do estilo, a encontrar as
construções apropriadas, a falar distintamente [...]” (REBOUL, 2004, p. XXII).
Na educação a linguagem tem um papel fundamental, pois o professor com auxilio de
recursos didáticos, como o próprio livro didático, faz a contextualização e
comunicação do conhecimento científico ao conhecimento escolar. E para facilitar sua
comunicação e a aprendizagem de seus alunos, usa diferentes argumentos e figuras de
linguagem, como a metáfora.
2.1. As figuras de retórica: linguagens e processos cognitivos
Lakoff e Johnson (2002), atribuem à metáfora um importante papel cognitivo, pois são
por meio de metáforas que compreendemos o mundo, a cultura e nós mesmos, ou seja,
“muitos conceitos básicos, como tempo, quantidade, estado, ação, etc., além de
conceitos emocionais, como amor e raiva, são compreendidos metaforicamente”
(LAKOFF; JOHNSON, 2002, p. 22). Para esses autores, as metáforas estão presentes
intensamente em nossa vida cotidiana, tanto na linguagem, como nos nossos
pensamentos e ações.
As imagens, assim como os textos, também podem ser consideradas metáforas, pois
segundo JOLY (1996, p. 9), “comunicam e transmitem mensagens”, dessa forma
possuem uma rica capacidade cognitiva e suas análises são primordiais na função
pedagógica (JOLY, 1996).
Nos livros didáticos de ciências e biologia, de acordo com Mazzotti e Oliveira (2000,
p.9), as metáforas são utilizadas pelos autores não somente como figuras de linguagem
ou de estilo, para meramente embelezar ou emocionar o leitor, mas com função
cognitiva. Ou seja, com o objetivo de assimilar e acomodar algo novo em esquemas ou
22
estruturas cognitivas anteriores. O processo pelo qual se assimila algo novo apóia-se
na analogia; daí as metáforas serem consideradas “analogias condensadas”.
Mazzotti e Oliveira (2000, p. 25), tratando da metáfora dizem que:
[...] A metaforização é então, o mesmo que predicação, e a sua figura é a
metáfora. Esta foi considerada uma figura argumentativa, ou cognitiva, que
condensa uma analogia. Dissemos que o exame da analogia condensada na
metáfora permite tanto a sua compreensão quanto a sua crítica. Mas ainda,
afirmamos que os modelos usuais nas ciências são metáforas, as quais
permitem uma simulação de processos investigados em cada ciência.
Mazzotti (2005), tratando do livro didático, diz que Comenius chamou-o de a
“partitura do professor”. Os livros didáticos foram elaborados visando “ensinar tudo a
todos”. Desta forma, os livros didáticos deveriam conter os modelos conceituais
básicos das ciências para facilitar a comunicação dos conhecimentos científicos aos
alunos, uma vez que seria impossível produzir livros didáticos com todos os
conhecimentos científicos e os percalços, erros e acertos de sua construção histórica.
Nesse percurso, os livros escolares seriam compêndios científicos que trariam
modelos, definições e proposições científicas aos alunos. Mas, como alerta Mazzotti
(2005), esses livros, ao longo de sua história, fizeram um caminho bem mais curto em
direção às ciências, tornaram-se resumidos e os modelos apresentados ficaram bem
distantes dos modelos dos cientistas.
Contenças (1999) aponta alguns caminhos que levaram os livros a se tornarem
compêndios tão resumidos: a) o fato de os livros didáticos serem escritos por pessoas
desligadas das ciências; b) os recursos lingüísticos utilizados pelos autores são
distantes dos recursos dos cientistas devido a recontextualização do conhecimento
científico em escolar; c) a retórica forçada dos livros didáticos, obrigados a serem mais
“pedagógicos”.
23
No livro A Eficácia da Metáfora, Contenças (1999) trata das metáforas que constituem
as teorias científicas da genética. Quando esses conhecimentos são contextualizados ao
conhecimento escolar, as metáforas são modificadas, pois se crê que, assim mudadas,
facilitem ao aluno a compreensão do modelo conceitual da ciência genética.
Entretanto, diz Contenças (1999), neste caso, os argumentos científicos ao se tornarem
argumentos didáticos, passam por um processo de mudança, ou como chama a autora,
“retórica forçada”. Isso ocorre porque, para a autora, os argumentos são elaborados em
um nível que visa mais entusiasmar, interessar e persuadir o aluno do que introduzi-los
em uma ciência.
Do ponto de vista político, Marlene Mazzotti (2005) aponta que o livro didático leva o
professor a optar pelos textos dos livros escolares devido a uma sobrecarga em sua
jornada de trabalho. O professor, muitas vezes, se sem o tempo necessário para
preparar aulas mais práticas e dinâmicas e opta pelo uso do livro didático, pois este
traz o conteúdo pronto e o exime da tarefa da pesquisar, em diferentes meios, um texto
ou uma atividade mais adequada e prazerosa ao aluno.
[...] se por um lado o livro didático facilita o trabalho do professor, por outro
lado estreita cada vez mais o seu campo de decisão e controle de seu próprio
trabalho, pois cabe-lhe cada vez menos decidir sobre o quê e como ensinar
uma vez que tais elementos já estão determinados no livro didático [...]
(MAZZOTTI, 1986, p. 12).
Um exemplo, examinado por Bellini (2006), é a metáfora “escada”, que os livros
didáticos utilizam ao tratar da evolução do Homo sapiens. A autora analisou 12 livros
didáticos e, em todos os textos examinados, prevalece a metáfora “escada” com um
hominídeo atrás do outro. No entanto, a metáfora mais adequada, mais próxima das
descobertas científicas é a metáfora “árvore”, a metáfora elaborada por Darwin e
aceita pelos cientistas, pois esta se aproxima mais das descobertas sseis feitas pelos
biólogos e paleontólogos. Ou seja, vários fósseis hominídeos datam da mesma época;
não se sucederam uns após os outros.
24
Figura A. Evolução – Metáfora “escada” Figura B. Evolução – Metáfora “árvore”
Fonte: O conceito de Evolução nos livros didáticos: avaliação metodológica.
Para a autora, os livros didáticos analisados, ao tratarem do tema evolução com a
metáfora escada, cedem o lugar do conceito de evolução à idéia de criacionismo,
perdendo seu sentido original, dado por Darwin e biólogos do século XX.
Mazzotti (2005), também mostra em seu artigo Elementos para a Introdução da
Dimensão Ambiental na Educação Escolar Grau, como a noção de equilíbrio,
analogia comumente utilizada nas lições didáticas de ecologia e educação ambiental,
não corresponde ao modelo científico da dinâmica de um ecossistema.
[...] A idéia de equilíbrio, hoje, é assumida como sendo a do equilíbrio
instável, de auto-regulação instável que tende desaparecer para se instalar
outro equilíbrio instável. Não haveria, assim, harmonia preestabelecida e sim
um processo de equilibração que tendencialmente caminha para a ruptura
que resulte em um novo processo de equilibração. O ritmo e a escala do
processo tornam-se objetos centrais das investigações. Se e quando se
assimila o equilíbrio instável à harmonia (pré ou pós) chega-se à noção
valorativa da permanência do existente como algo desejável, ou seja,
assume-se que a mudança, a transformação é algo indesejável sob todo os
pontos de vista. Coloca-se, pois, o problema ético, logo, político, da gestão
do mundo (cosmos) que classicamente tem sido apresentado, no Ocidente,
como o “direito do homem interferir nas coisas de Deus”. Emerge, dessa
maneira, a ideologia da Natureza Sagrada, do retorno ao Paraíso Perdido,
etc” (MAZZOTTI, 2005, p. 99).
Acot (1990), Bellini (2005) e Mazzotti (2005) alertam que a noção de equilíbrio é
usada por muitos ambientalistas para se referir a um ambiente; mas para os ecólogos,
25
os ecossistemas são sistemas instáveis; nesse sentido, não atingem o equilíbrio
ecológico.
Como vemos, no processo de recontextualização do conhecimento científico ao
escolar, as metáforas e/ou analogias podem ganhar outros sentidos, sentidos diferentes
das teorias cientificas. Apesar dos estudos promissores envolvendo o uso da linguagem
metafórica na Educação em Ciências, é preciso tomar cuidado com suas limitações
para não cometer certos erros conceituais e/ou se afastar da teoria científica que se está
estudando.
26
III. ECOLOGIA, MEIO AMBIENTE E EDUCAÇÃO AMBIENTAL:
HISTÓRIA E CONSTITUIÇÃO TERMINOLÓGICA
[...] uma teoria que coordene contribuições de diversas outras
e de maneira a estabelecer um sistema inteligível do
realizado, pode vir a estabelecer uma teoria interdisciplinar
[...] (MAZZOTTI, 2000, p. 77)
O termo "ecologia" do grego oikos, casa, e logos, ciência, foi criado em 1866, com a
grafia “oecologia”, pelo biólogo alemão Ernst Haeckel para designar “a ciência da
economia, dos hábitos, do modo de vida, das relações vitais externas dos organismos”
(ACOT, 1990, p. 27). Haeckel descreveu o mundo vivo com a metáfora CASA,
COMUNIDADE, na qual cada espécie tem um papel a desempenhar na economia
global.
No mesmo período histórico, outros termos surgiram concorrendo com o termo
ecologia, como, por exemplo, o termo mesologia ou teoria dos meios, criado por
Louis-Adolphe Bertillon e o de hexicologia, formado pelo grego hexis (estado,
condição), este último proposto pelo inglês Mivart, em 1880 (DROUIN, 1990, p. 18).
Para Acot (1990, p. 27), a expressão “ecologia” significa “ciência do habitat”. Trata-se
do radical indo-europeu weik, do qual deriva o oîkos. Para Acot (1990, p. 27) “indica
uma unidade social imediatamente superior à casa do chefe de família”. Mais tarde,
para os ecólogos, a ecologia foi chamada a ciência das comunidades” (ACOT, 1990,
p. 27, destaque em itálico feito pelo autor). A metáfora CASA ou COMUNIDADE
ganhou lugar na teoria ecológica.
Acot (1990) considera que Haeckel apresentou, no segundo volume da publicação
Generelle Morphologie der Organismen, uma definição mais apropriada ao termo
Ecologia, pois esta abarca com amplitude as interações ecológicas: “Por ecologia
27
entendemos a totalidade da ciência das relações do organismo com o meio ambiente,
compreendendo, no sentido lato, todas as condições de existência” (ACOT, 1990, p.
27).
Em 1868, Haeckel redefiniu o termo Ecologia pela terceira vez; tentou ligar os
conhecimentos da biogeografia aos conhecimentos da economia da natureza.
A ecologia ou distribuição geográfica dos organismos é [...] a ciência do
conjunto das relações dos organismos com o mundo exterior ao ambiente,
com as condições orgânicas da existência; o que se chamou de economia da
natureza, as mútuas relações de todos os organismos vivos num único e
mesmo lugar, sua adaptação ao meio que os cerca, sua transformação pela
luta para viverem, sobretudo os fenômenos do parasitismo, etc. (HAECKEL
apud ACOT, 1990, p. 27-28).
Em janeiro de 1869, segundo Acot (1990), durante uma conferência proferida na
Universidade de Jena, Haeckel apresentou outra definição semelhante a anterior,
porém fazendo clara referência ao darwinismo:
Por ecologia, entendemos o corpo do saber concernente à economia da
natureza o estudo de todas as relações do animal com seu meio ambiente
inorgânico e orgânico; isso inclui, antes de mais nada, as relações amigáveis
ou hostis com os animais e as plantas com as quais entre, direta ou
indiretamente, em contato numa palavra, a ecologia é o estudo dessas
inter-relações complexas às quais Darwin se refere pela expressão de
condições da luta pela existência (ACOT, 1990, p. 28).
E, finalmente, em 1874, o conceito de ecologia foi publicado na Anthopogénie, por
Haeckel como:
O conjunto das relações tão variadas dos animais e das plantas, de suas
relações com o mundo externo, os fatos tão interessantes do parasitismo, da
vida em família, dos cuidados com a ninhada e com o socialismo, etc., tudo
isso não poderia ser explicado simples e naturalmente senão pela teoria da
adaptação e da hereditariedade (ACOT, 1990, p. 28).
Acot (1990, p.28) destaca que essas cinco definições de Haeckel ressaltam que “o
conceito haeckeliano de ‘ecologia’, pelo menos em parte, constituiu-se no quadro
28
cientifico e ideológico da economia da natureza, dos equilíbrios naturais e da
adaptação dos seres vivos às suas condições de existência”.
Do final do século XIX ao início do século XX, alguns naturalistas empregaram o
termo oecologiapara nomear a geografia botânica que estudava relações das plantas
com o seu meio (DROIUN, 1990). Um desses trabalhos de destaque, segundo Drouin
(1990, p. 18), foi o do botânico dinamarquês Eugene Warming que, em 1895, utilizou
o termo ecologia no Oecology of plants.
O termo ecologia, da metade do século XIX ao século XX, passou a se referir à
adaptação dos seres vivos e aos estudos de todos os grupos vivos aquáticos ou
terrestres. Como disse Odum (1977, p. 22), é mais moderno “definir a Ecologia como
o estudo da estrutura e função da Natureza”. No entanto, deve ficar claro que o
homem faz parte dessa Natureza, assim como todos os outros seres vivos (ODUM,
1977).
Segundo Acot (1990, p. 7), o termo “ecologia” tornou-se mais popular no início da
década de 70, após o acidente da maré negra”, causada pelo petroleiro Torrey
Canyon, na França, em 1967, e pelas lutas pela preservação do Parque da Vanoise
contra a atividade imobiliária local. Essas duas ocorrências geraram dois grandes
movimentos ambientalistas e houve uma popularização da natureza e o do
esgotamento dos recursos naturais” ACOT (1990, p. 7).
Atualmente, a palavra Ecologia é usada para indicar uma disciplina científica
desenvolvida em ambiente acadêmico e, também, como afirma Acot (1990), para
identificar um vasto e diversificado movimento social, que dependendo do lugar e da
situação, pode ganhar características de um movimento popular, com objetivos
ideológicos e políticos. Assim, a ecologia científica “mantém fatalmente uma relação
ambivalente com o movimento social que tem o mesmo nome e que a segue como uma
29
sombra” (DROUIN, 1990, p. 19). Os ecólogos, cientistas formados e praticantes da
ecologia científica, procuram se distinguir dos ecologistas que praticam a ecologia
como movimento em defesa do meio ambiente, conhecido como ecologismo
(DROIUN, 1990).
Acot (1990, p. 1) ressalta que a preocupação do ecólogo deve ser a de “propor leis de
estruturação e de funcionamento das comunidades de organismos em relação com seu
meio ambiente”. Cabe-lhe, então, competência para os estudos de impacto ambiental,
proteção de espécies ameaçadas, gestão da caça ou dos recursos hídricos, entre outras
funções (ACOT, 1990).
Para a comunidade de não cientistas, a distinção entre a ecologia científica e o
ecologismo foi realçada com a publicação, em 1983, no Petit Laroussse illustré, da
ecologia como o “estudo científico das relações dos seres vivos com o seu meio
natural”, e do “ecologismo” como a “defesa do meio natural, proteção do meio
ambiente” (DROUIN, 1990, p. 19).
Drouin (1990) assinalou que, na passagem do culo XIX ao XX, o termo “meio
ambiente” ainda estava sendo elaborado como termo da área ambiental. Em 1927,
Vidal de la Blache apresenta-o como o equivalente inglês da palavra meio”, mas é
somente no final da cada de 60 que este se tornou conhecido no seu sentido atual.
No Nouveau Petit Larousse illustré, a palavra ecologia foi publicada, em 1956, como
“parte da biologia natural que estuda as relações dos seres vivos com o seu meio
natural”. Em 1961 surgiu, de fato, o termo “meio ambiente”. Em 1976, esse mesmo
dicionário, apresentou um artigo de ecologia semelhante ao da edição de 1956, porém
mais completo, ou seja, como “Estudo científico das relações dos seres vivos com o
seu meio natural”. Uma segunda definição foi acrescentada “Defesa dos meios natural,
proteção do meio ambiente” (DROUIN, 1990, p. 18).
30
É difícil definir uma data exata para o início dos estudos de ecologia, pois, segundo
Drouin (1990, p.28), a ecologia possui uma pré-história, formada pelo conjunto dos
enunciados que, embora produzidos antes de ela ser constituída, tratam de realidades
empíricas que hoje entrariam no seu campo”. Existem inumeráveis anotações nas
obras de filósofos, médicos, agrônomos e mesmo de poetas que relatam as tradições e
práticas de nossos antepassados em relação à natureza.
Muito antes de alguém se definir como “ecólogo” ou como “ecologista”,
silvicultores e agrônomos, naturalistas e geógrafos, veterinários e médicos
preocuparam-se com as relações entre os seres vivos e os seus meios, e antes
mesmo da existência de qualquer dessas profissões, lenhadores, cultivadores,
pastores, caçadores, pescadores acumularam, ao percorrerem ou trabalharem
as paisagens, uma memória dos seus gestos, que podemos ler como um saber
ecológico (DROUIN, 1990, p. 19).
Hipócrates
1
(460 a 377 a.C.) em sua obra Dos ares, das águas, dos lugares,
apresentava observações e reflexões sobre a influência do meio sobre a saúde e as
doenças, que culminaram posteriormente no movimento higienista dos séculos XVII e
XIV (DROUIN, 1990). Também Platão
2
(428/427 a 347 a.C.) em seu diálogo Critias
relata as características da paisagem de Ática
3
, com suas grandes árvores e destaca a
presença de nascentes de água nos locais onde eram construídos os santuários
(DROUIN, 1990).
Drouin (1990) comenta que Cícero
4
(106 a 43 a.C.), ao expor “para uso do público
latino as idéias da filosofia estóica, indicava a associação entre a pinha marinha, um
grande molusco bivalve, e o pinnoptero, um pequeno crustáceo” (DROUIN, 1990, p.
28).
1
Hipócrates (c.460-c.377 a.C.). Médico grego. Figura símbolo das ciências curativas. Usou a análise clínica como fonte de informação e
recusou as interpretações mágicas e religiosas das doenças (BARSA, 1998).
2
Platão (c.428-c.348 a.C.). Filósofo grego. Um dos pensadores mais influentes de todos os tempos. Estabeleceu com Sócrates e Aristóteles
as bases da filosofia ocidental (BARSA, 1998).
3
Ática. Península da Grécia, banhada pelo mar Egeu e pelos golfos de Corinto e Sarônico, onde está situada a capital Atenas. Agricultura,
pecuária, mineração, mármore (BARSA, 1998).
4
Cícero (106-43 a.C.). Político e escritor romano. O maior de todos os oradores da Roma antiga uniu filosofia e ação política em defesa dos
princípios republicanos (BARSA, 1998).
31
Como vemos, os antigos também se preocupavam com a vegetação, principalmente os
antigos agrônomos, que registravam numerosas observações sobre esta. Entre eles,
está Virgílio
5
(70 a.C. a 19 a.C), que trata de forma poética as árvores e arbustos em
seu livro II de Geórgicas (DROUIN, 1990).
Uma das obras mais rias sobre a Natureza, de acordo com Acot (1990), foi o tratado
de zoologia Historia animallum, escrito por Aristóteles em 335 a.C. Este filósofo
descreveu aproximadamente 300 espécies de vertebrados (DURRELL, 1989),
principalmente nos livros VIII e IX, nos quais enumerou “os diferentes modos de vida
dos animais” (ACOT, 1990, p. 2).
Os estudos de Aristóteles sobre os animais na Grécia antiga foram as bases para os
trabalhos de Plínio
6
, o Velho, em Roma. Plínio em sua Historia naturalis, 75 d.C., fez
importantes observações zoológicas, embora tenha incluído animais místicos como
“cavalos alados, unicórnios e sereias” (DURRELL, 1989, p. 11).
Após Plínio, o Velho e durante dezesseis séculos, a história natural pouco progrediu
(ACOT, 1990). Nesse período, os jardins zoológicos existentes estavam nas mãos da
nobreza, que os conservavam sem nenhuma preocupação científica. Os livros de
história natural, até os séculos XVI e XVII, uniam os herbários e bestiários, e
mesclavam o uso de plantas medicinais com magia (DURRELL, 1989).
Talvez devamos ver nessa interrupção muito longa uma conseqüência do
fato de que, durante a Antiguidade tardia e o período medieval, a medicina, a
botânica medicinal, a “história natural” e as metafísicas da Alma se situam
no campo coberto por um pensamento aristotélico cristianizado, cujo
finalismo e providencialismo não favorecem o questionamento das relações
entre seres vivos, e entre seres vivos e meios externos (ACOT, 1990, p. 4).
5
Virgílio (70-19 a.C.). Públio Virgílio Marão, poeta latino. Mais importante poeta de língua latina, autor de versos de nobre melancolia e
incomparável beleza (BARSA, 1998).
6
Plínio, o Velho (23-79). Escritor romano, também conhecido como Plínio o Naturalista. Deixou obra fundamental para o saber científico
até a Idade Média (BARSA, 1998).
32
Somente após os avanços do Renascimento
7
e da obra de Galileu
8
, no início do século
XVI, as observações da natureza aprimoraram-se. Ocorreu uma sucessiva mudança nas
atitudes dos estudiosos: passou-se de uma visão ingênua para outra, de caráter mais
científico. Os antigos bestiários e herbários foram substituídos por livros de história
natural (DURRELL, 1989).
Com as navegações e a descoberta dos novos continentes, um grande mero de
espécies foi descoberto pelos viajantes e naturalistas. Estes exploravam cada dia mais
o mundo, descobrindo um mero maior de animais e plantas, o que dificultava sua
contagem e organização. Isso fez com que os naturalistas percebessem a necessidade
de um sistema de classificação dos seres vivos (DURRELL, 1989).
Lineu (1707 a 1778), botânico e médico sueco, professor de Upsala
9
, criou um sistema
complexo de classificação e nomenclatura científica dos seres vivos, denominado
Sistema Binomial. Este sistema foi aperfeiçoado no decorrer dos últimos anos e é
utilizado até hoje (SOARES, 2005). Esse sistema foi publicado no Systema Naturae,
lançado em 1735. Apresentou as regras para classificar e denominar animais e plantas,
que estabeleceu as regras modernas de classificação
10
adotadas até a atualidade, em
sua 10ª edição, em 1758.
O “sistema sexual” de Lineu recuou no fim do século XVIII com a concorrência do
método das famílias naturais, cujo método é o de agrupar em uma mesma família as
plantas mais semelhantes, mesmo que para isso seja necessário recorrer a diversos
critérios (DROUIN, 1990). As características ou caracteres de uma planta estão
7
Movimento cultural que se iniciou na Itália e se propagou pela Europa nos séculos XV e XVI. Por extensão, período da civilização
ocidental marcado pela volta à antiguidade clássica (BARSA, 1998).
8
Galileu (1564-1642). Galileu Galilei, físico e astrônomo italiano. Inaugurou nova fase na história da ciência ao defender o racionalismo
matemático como base do pensamento científico (BARSA, 1998).
9
Cidade da Suécia, capital do condado de mesmo nome, a 66km de Estocolmo (BARSA, 1998).
10
Regras essas que foram confirmadas somente em 1898, no I Congresso Internacional de Nomenclatura Científica, n Hungria e reafirmadas
posteriormente, em 1927, em outro congresso (SOARES, 2005).
A classificação sistemática do reino vegetal proposta por Lineu era baseada no número dos órgãos sexuais da flor, e por recorrer a esse único
critério, era de fácil utilização. No entanto, frequentemente, plantas com um mesmo número de estamenhas
10
eram reunidas numa mesma
classe, o que tornava o método um tanto artificial (DROUIN, 1990).
A criação do “método natural” presente na obra dos botânicos franceses Bernard de Jussieu, Michel Adanson e Antonio-Laurent de
Jussie.Este último dedicou a Linné o livro Genera plantarum (1789), considerado sua obra mais importante (DROUIN, 1990).
33
sempre constantes no interior de uma família, podendo-se assim, de acordo com os
diferentes caracteres, estabelecer uma hierarquia de critérios de classificação e formar
novas famílias, nas quais possa se abranger todos os “gêneros de plantas”, sem correr o
risco de aproximações ou separações arbitrárias (DROUIN, 1990, p. 30).
O sistema de classificação de Lineu foi abandonado, mas a sua nomenclatura foi
mantida
11
. Os estudos de Lineu foram importantes, pois trouxeram o conceito de
“economia da natureza”
12
.
Em 1749, Lineu definiu “economia da natureza” como “a
muito sábia disposição dos seres naturais, instituída pelo supremo Criador, segundo a
qual aqueles se orientam para fins comuns e têm funções recíprocas” (DROUIN, 1990,
p. 34).
A metáfora de economia da natureza, que se constituiu em uma noção da obra
linneana, assegurou múltiplas funções. Garantiu a complementaridade dos diferentes
subdivisões da história natural e favoreceu a comunicação dos conhecimentos entre
eles. Evidenciou a importância social do naturalista, explorador dos recursos não
utilizados. Apoiando a teologia, justificou a crença num Deus criador que nada fez em
vão e, e assim, reforçou o preceito da história natural. (DROUIN, 1990, p. 36).
Para Drouin (1990, p. 36), Lineu estava “simplesmente convencido que a história
natural é útil à sociedade porque revela a utilidade das coisas aparentemente inúteis, e
está não menos convencido que essa utilidade universal é a marca de fabrico do
Criador”.
11
Segundo Drouin (1990), “classificar espécies é uma coisa, nomeá-las é outra. Antes de Lineu, os nomes das plantas eram frases que
procuravam definir a planta. Variavam de um autor para ouro e o seu uso era logicamente incomodo. Num primeiro tempo, Lineu começou
por estabelecer regras de determinação para reconhecer os gêneros, depois as espécies e aplicou-as a todas as espécies vegetais e também
animais de que podia ter conhecimento. Deu a cada espécie um nome de gênero que ela partilhava com as espécies vizinhas e uma frase
que permitia “especificá-a”. Até aí, definira cada espécie, um pouco como o tinham feito os seus predecessores, mas não a nomeara. Só num
segundo tempo é que foi levado, por razões essencialmente pedagógicas, a dissociar o nome e a descrição e a criar os “binomes” que cada
espécie atribuem um adjetivo ou um substantivo específico que se segue ao nome genérico”. [...](DROUIN, 1990, p. 31).
12
Naturalista preocupado com teologia, Lineu constata a existência de um sistema da Natureza que preside às inter-relações especificas e
que, como teólogo, designa uma origem e uma finalidade divinas para esse sistema: “Tudo o que cai sob nossos sentidos, tudo o que se
apresenta ao nosso espírito e que merece ser observado, por sua disposição, concorre para manifestar a glória de Deus, isto é, para produzir o
fim que Deus quis como finalidade última de todas as suas obras” (ACOT, 1990, p. 5).
34
A metáfora da economia da natureza, de acordo com Drouin (1990, p. 39), se dividiu
em três partes: 1) a interdependência das espécies; 2) a circulação dos elementos; 3) a
localização das espécies.
Para J. Bernardin de Saint-Pierre (1983), a metáfora HARMONIA, não deixou de ser,
conforme Drouin (1990, p.40), “um avatar da teologia natural, um avatar dominado
pela idéia de uma harmonia perfeita na qual o mínimo elemento tem a sua
importância”.
Para Drouin (1990, p. 40):
A harmonia deste globo seria em parte destruída, talvez inteiramente, se
suprimisse nem que fosse o mais pequeno genro de plantas; porque a sua
destruição deixaria sem verdura um certo espaço de terreno e sem comida a
espécie de inseto que encontra a sua vida: a sua destruição arrastaria a
perda da espécie de ave que com ele alimenta os seus filhotes; e assim até ao
infinito (DROUIN, 1990, p. 40).
Drouin (1990, p. 42), afirma que as metáforas HARMONIA, REDE E CADEIA
ALIMENTAR interessaram a Lavoisier. Ele as utilizou para resumir a “maravilhosa
circulação entre os três reinos” em um de seus últimos escritos:
Os vegetais colhem no ar que os rodeia, na água e, em geral, no reino
mineral os materiais necessários à sua organização. Os animais alimentam-se
ou dos vegetais ou de outros animais que se alimentaram eles próprios de
vegetais, de maneira que as matérias que os formam são sempre, em última
análise, extraídas do ar e do reino mineral. Em fim, a fermentação, a
putrefação e a combustão devolvem continuamente ao ar da atmosfera e ao
reino mineral os elementos que os vegetais e os animais lhes tomaram
(DROUIN, 1990, p. 42)
13
.
13
“Este texto servia de introdução a um projeto de prêmio que deveria ser proposto pela Academia das Ciências para o ano de 1794. De fato,
a Academia será suprimida em Agosto de 1793 e só viria a ser restabelecida sob o nome de Instituto em 1795, tendo Lavoisier sido entretanto
guilhotina. Este prêmio devia recompensar a comunicação que melhor explicasse o papel do fígado na economia animal” (DROUIN, 1990, p.
42).
35
Outro estudioso dessas relações entre animais e plantas foi J. Thurmann. Ele trouxe a
noção de biodiversidade ao declarar:
A flora de um país e a sua vegetação são duas coisas diferentes que não
devem confundir: a primeira prende-se sobretudo com o número das formas
vegetais distintas que ali se observam, a segunda com as suas proporções e
associações” [...] A vegetação pode ser luxuriante e a flora pobre, o solo
estéril e a flora rica (DROUIN, 1990, p. 55).
Com Humboldt o estudo da vegetação ampliou-se. Ele definiu a vegetação em um
sistema explicativo global: os parâmetros físicos (temperatura, umidade, etc.)
determinados por elementos espaciais (altitude, latitude, etc.), estabelecem as
características da vegetação que, em seguida, influem sobre os animais e os homens.
Esta cadeia causal relevaria uma visão bastante mecanicista se Humboldt não tivesse
levado em conta a atividade do homem que introduz espécies vegetais, utiliza-as e
modificam, desse modo, as paisagens ecológicas (DROUIN, 1990, p. 57).
Humboldt usou a metáfora ASSOCIAÇÃO de vegetais para compor seu modelo de
paisagem ecológica. Para Humboldt, conforme Drouin (1990), a morfologia individual
do vegetal e o modo de agrupamento das plantas determinam a fisiologia da paisagem.
Humboldt observou que certos vegetais cresciam “isolados e esparsos”, enquanto que
outros cresciam agrupados. A partir desta constatação, Humboldt utilizou a palavra
associação, que posteriormente foi empregada com freqüência na história da geografia
botânica. A geografia botânica, segundo Humboldt, “considera os vegetais de acordo
com as relações da sua associação local nos diferentes climas” (DROUIN, 1990). Um
exemplo, são as “estevas”
14
constituídas pela associação” de duas espécies do gênero
Érica e de dois liquens (DROUIN, 1990). Dessa forma a palavra “associação”
representa “a idéia de um agrupamento, especialmente limitado, definido pela co-
presença de varias espécies” (DROUIN, 1990, p. 60).
14
Esteva. Planta arbustiva da família das cistáceas (Cistus ladaniferus), originária da região mediterrânea. Produz o ládano, resina aromática
de largo uso em perfumaria (BARSA, 1998).
36
Outro estudo muito importante para a constituição da ecologia foi o de Warming,
estudioso do século XIX. Este enfatizou a metáfora COMUNIDADE, que passou a ser
um conceito do campo da ecologia.
Warming, professor em Copenhagem, começou a sua carreira científica graças a um
estudo da vegetação brasileira. Publicou, em 1895, uma obra na qual realizou uma
perfeita articulação entre a geografia botânica e a ecologia, diferenciando dois tipos de
geografia das plantas, uma “florística” e a outra “ecológica”, definindo esta última
como:
A ecologia procura: 1º) determinar quais são as espécies que se encontram
geralmente associadas nos mesmos hábitats (estações). [...] 2º) traçar a
fisionomia da vegetação e da paisagem. (...) 3º) responder às seguintes
questões: - por que tem cada espécie um comportamento e um habitat que
lhe são próprios? por que se agrupam as espécies em comunidades? por
que têm elas uma fisionomia característica? (...) 4º) estudar os problemas
respeitantes à economia das plantas, as suas exigências face ao meio e os
processos que usam para tirar partido das condições ambientais e adaptar
para esse fim a sua estrutura interna e externa e a sua forma geral (DROUIN,
1990, p. 61).
Na constituição da ecologia, com Warming e o botânico Candolle, surgiu a noção de
NICHO como referente ao lugar de uma espécie, seu comportamento, seus recursos.
Não significou lugar de indivíduos ou mesmo a subconjuntos da espécie. [...]”
(DROUIN, 1990, p. 62).
Augustin-Pyramus de Candolle, segundo Drouin (1990), foi um dos naturalistas que
mais contribuiu para o nascimento da geografia botânica. Este estudioso, apesar de ter
conhecido toda a Europa, desenvolveu a maioria de suas atividades botânicas em
gabinetes de história natural e jardins botânicos, tendo, como materiais, plantas em
cultura e folhas de herbário.
37
De acordo com Drouin (1990, p. 62) foi no Diccionaire dês sciences naturelles, em
1820, que Candolle expôs de forma mais completa, o problema a respeito dos “fatores
que atuam sobre a repartição das diferentes espécies vegetais, depois das estações, ou
seja, dos meios onde se encontram, finalmente das habitações, a saber, as regiões onde
elas crescem naturalmente. [...]” (DROUIN, 1990).
Após ter demonstrado a “influência da temperatura e a dos outros fatores físicos para a
ecologia”, Candolle destacou que esses não são os únicos fatores responsáveis pela
repartição das espécies no planeta, pois, segundo o autor, mesmo em duas regiões com
condições semelhantes de temperatura, altitude, solo e umidade, mas situadas em
regiões diferentes, como a Europa e a América do Sul, existem espécies com
características bem diferentes, apesar das características climáticas das regiões serem
muito parecidas (DROUIN, 1990).
Como afirma Drouin (1990, p. 64), Candolle, no fim do século XIX, estudando a
botânica do ponto de vista de sua geografia, também contribuiu para a Ecologia.
Segundo Drouin (1990, p. 54), ele demonstrou que:
As semelhanças entre espécies vizinhas não o menos espantosas que as
diferenças entre espécies afastadas. Os animais e as plantas da América do
Sul equatorial têm mais afinidade com as da América do Sul temperada do
que com as da África.
Para Candolle, existia um “elo orgânico íntimo e profundo” entre as produções de um
mesmo continente, constituído pelo caráter hereditário. Ou seja:
[...] a afinidade entre as espécies de uma região biogeográfica explicar-se-ia
por uma comunidade de origem e as diferenças provêm, sobretudo da
seleção natural que, em meios diferentes, favoreceu variações diferentes. A
fauna e a flora das ilhas, porque são ao mesmo tempo próximas e diferentes
das do continente, ilustrariam claramente este processo (DROUIN, 1990, p.
64-65).
38
Desse modo, a Ecologia pôde formular os conceitos de formação e associação vegetal
(DROUIN, 1990). Em 1915, como afirma Drouin (1990, p. 75) o conceito de
associação vegetal foi definido por Braun-Blanquet como “[...] um agrupamento
vegetal mais ou menos estável e em equilíbrio com o meio ambiente, caracterizado por
uma composição florística determinada na qual certos elementos exclusivos ou quase
(espécies características) revelam pela sua presença uma ecologia particular e
autônoma”.
Droiun (1990) chama a atenção, também, para o neologismo “biosfera”, proposto por
Eduard Suess, em 1875. Na obra A Face da Terra, Drouin (1990, p. 69) cita Suess:
É a Lamarck e a Darwin que devemos o fato de termos chegado a esta
concepção (da solidariedade de toda a vida). Ora, agora que o caminho está
aberto, este ponto de vista não nos aparece de partida comum, fisiológico,
ao qual esses grandes sábios nos reconduziram. Ele implica a noção de uma
Biosfera, que marca à vida o seu lugar por cima da Litosfera e que, aliás, só
envolve a vida no nosso planeta, com as condições de temperatura, de
constituição química, etc., que ela supõe e excluindo todas as especulações
sobre os processos vitais eventualmente sediados noutros corpos celestes.
Destas condições resulta que a biosfera é um fenômeno limitado não no
espaço, mas também no tempo.
A idéia de biosfera segue-se a de biocenose de Mobius para designar o conjunto das
espécies em um mesmo meio partilhando e concorrendo pelos mesmos alimentos
(DROUIN, 1990).
Nas primeiras décadas do século XX, a Ecologia conheceu mais avanços. Para Tansley
a Ecologia como ciência era uma realidade complexa que surgiu pela “justaposição e
interação dos seus componentes” (DROUIN, 1990, p. 77).
No século XX, a Ecologia reformulou muitos conceitos com o estudo das sucessões de
Frederic E. Clements (1874-1926), ecologista americano. Clements foi pioneiro na
utilização do quadrado para estudar e identificar as diferentes espécies que constituem
39
uma comunidade. Ao estudar toda a vegetação de uma determinada área nas pradarias
do Nebraska, Clements afirmou que, em cada zona geográfica, as plantas sucedem-se
umas às outras em certa seqüência, desenvolvendo-se até chegar à “vegetação clímax”
específica daquela zona (POLLOCK, 1994, p.34).
Em 1916, em sua obra Plant sucession, Clements propôs um sistema global de
descrição e de interpretação aplicável a todas as formações vegetais. Destacou a
dinâmica característica da vegetação que, partindo de um substrato nu, acabava por um
processo de sucessão de estádios, num estádio último ou clímax. Este termo tinha
sido utilizado por Cowles, mas Clements fez dele um conceito central da teoria
ecológica. Fez, também, do termo comunidade vegetal, um conceito próximo a um
“superorganismo que nasce, vive e se desenvolve e cujas diferentes espécies não são
mais que componentes ou inter-relações” (DROUIN, 1990, p. 76).
Mais tarde, outro ecólogo inglês, Arthur Tansley (1871-1955) retomou, de acordo com
Drouin (1990), o inventário conceitual de Clements que englobava os conceitos de
comunidade vegetal, de clima e de sucessão de Clements. Mas, ao contrário de
Clementes e seus discípulos, tomou a noção de comunidade biótica incluindo todos os
seres vivos de uma mesma região. Propôs a noção de sistema ecológico, de
ecossistema como compreendendo os organismos e os fatores físicos dos meios, e
esclareceu que o termo sistema foi proposto no sentido em que se emprega em física.
O ecossistema poderia assim ter lugar numa escala dos sistemas que iria do
átomo ao universo. Tais sistemas, que isolamos pelo pensamento, encaixam-
se de fato uns nos outros, sobrepõem-se, interactuam entre eles, de modo que
o seu isolamento é “em parte factício”. Certos deles - é o caso dos
ecossistemas são por natureza mais isolados, mais autônomos que outros,
mas apresentam todos uma organização que é o resultado inevitável das
interações e por conseqüência dos ajustamentos mútuos entre os seus
componentes” (DROUIN, 1990, p. 77).
Tansley foi um dos primeiros botânicos a estudar comunidades de plantas usando
métodos de amostragem semelhantes aos desenvolvidos por Frederic Clementes. Ele
40
defendeu uma abordagem ecológica da botânica, contribuindo para a formação da
Sociedade Ecológica Britânica, em 1913, a primeira desse tipo em todo o mundo.
Tansley dizia que era insensato explorar e depredar o ambiente e tornou-se uma figura
de destaque no movimento conservacionista.
O encontro da teoria de Tansley com os estudos das populações animais e a da
aproximação energética, constituiu-se em uma teoria dos ecossistemas (DROUIN,
1990, p. 78).
Outro ecólogo, Charles Elton, adaptou com cautela, a teoria de Clements à ecologia
animal. Publicou, em 1927, a obra Animal Ecology”, em que tratou da comunidade
animal elaborando conceitos de cadeia alimentar e de pirâmide dos números. Para
designar o lugar que uma espécie ocupa na comunidade animal, definiu a noção de
nicho ecológico, que representa o conjunto das relações que ela mantém com a sua
alimentação e com os seus inimigos (DROUIN, 1990, p. 82).
Após Tansley, Eugene P. Odum elaborou a noção de “sistemas de acesso” à ecologia.
Para isso criou a idéia dos ecossistemas como fluxos de energia que partiam da
produção primária. Usou uma metáfora da economia, FLUXOS de energia e
desenvolveu modelos matemáticos de sistemas naturais, apresentados no livro
“Environmont, power and society” (Ambiente, poder e sociedade), de 1971. Defendia
que a ciência pode encontrar soluções para a diminuição das fontes de energia
(POLLOCK, 1994, p. 9).
[...] Em princípio, o conceito de população aplica-se tanto a uma espécie
vegetal como a uma espécie animal, tal como o conceito de “comunidade”
deveria incluir todos os organismos de um mesmo meio. [...] (DROUIN,
1990, p. 81).
41
Outra noção fundamental para a ecologia foi a de ciclo trófico (food cycle) de
Lindeman. Este conceito liga os produtores (vegetais), os consumidores (herbívoros e
carnívoros) e os decompositores, garantindo, por meio da alternância da vida e da
morte, a circulação da matéria. A energia recebida do sol, captada pela fotossíntese, é
transferida das plantas para os herbívoros e, destes, para os carnívoros, de tal sorte que
é possível calcular para cada nível uma taxa de rendimento energético. A
produtividade do ecossistema lacustre é o motor de uma dinâmica interna que o leva
pela acumulação de matéria orgânica ao envelhecimento, à transformação em
turfeira
15
e depois em floresta (DROUIN, 1990, p. 85).
3.1 Os níveis de Organização em Ecologia: a terminologia científica atual.
Desta história da ecologia, o que temos hoje para a ecologia?
Para Odum (1977, p. 24), uma maneira de delimitar o campo da Ecologia e distingui-la
de outras áreas é considerar o conceito de níveis de organização. Pode-se, assim:
[...] visualizar uma espécie de “espectro biológico” como protoplasma,
células, tecidos, órgãos, sistemas de órgãos, organismos, populações,
comunidades, ecossistemas e biosfera. A Ecologia trata, principalmente, dos
quatro últimos níveis, isto é, dos níveis para além do organismo individual.
Em ecologia, o termo população, originalmente cunhado para significar um
grupo de pessoas, é ampliado para incluir grupos de indivíduos de uma dada
espécie de organismo. Da mesma forma, comunidade no sentido ecológico
(às vezes designada como comunidade biótica) inclui todas as populações de
uma dada área. As comunidades e o ambiente inerte funcionam em conjunto
como um sistema ecológico ou ecossistema. Ecossistema é essencialmente
um termo mais técnico para “natureza”. Finalmente, a porção da Terra na
qual os ecossistemas podem operar, isto é, o ar e a água, biologicamente
habitados, recebe o nome de biosfera.
Para Drouin (1990, p. 87), a ecologia se apresenta esquematizada em três níveis de
organização, “cada um dos quais se define por um nível de integração”. Drouin (1990)
enfatiza as metáforas POPULAÇÃO, POVOAMENTO E CONCORRÊNCIA (da
economia):
15
Vegetação, em geral xeromorfa, que se desenvolve sobre turfa. A turfeira alta consta de musgos e abriga outras plantas, chegando a formar
uma floresta especial; a turfeira baixa compõe-se, sobretudo, de ciperáceas, mas inclui gramíneas e outros vegetais (BARSA, 1998).
42
O primeiro vel é o da população, conjunto de indivíduos de uma mesma
espécie num mesmo meio. Fala-se assim de uma população de Carpas ou de
Faias. É um campo de pesquisa muito marcado pela genética e pelas teorias
da evolução e engloba em particular os problemas de seleção, de adaptação,
de aparecimento de novas espécies. Para o segundo nível, utiliza-se o termo
fluido, mas cômodo, de povoamento, quer dizer de um conjunto de
populações que têm laços entre si, por exemplo, todos os peixes de uma
lagoa (Carpas, Lúcius, etc.) ou todas as árvores de uma floresta (Carvalhos,
Faias, Cárpeas, etc). É geralmente neste quadro que são abordadas as
relações entre espécies: predação, parasitismo, concorrência, partilha de
recursos, etc. Os ecossistemas representam o terceiro nível no qual se
encaixam os dois anteriores. Encontramos não o estudo dos fluxos de
matéria e de energia, mas também as controvérsias em torno dos conceitos
introduzidos pela ecologia americana sobre a evolução “espontânea” dos
meios naturais: sucessão, clímax. [...] Os ecossistemas encaixam-se,
acavalam-se, sobrepõem-se. A sua delimitação espacial não é
problemática, como é muitas vezes arbitrária (DROUIN,1990, p. 87).
Uma unidade reconhecível da Natureza, como um lago ou uma floresta, segundo
Odum (1977, p.28), é composta por dois componentes bióticos: um componente
(metáfora industrial) autotrófico
16
,
capaz de fixar energia luminosa e fabricar alimentos
a partir de substâncias inorgânicas simples e, um segundo componente, heterotrófico
17
,
que utiliza, rearranja e decompõe os materiais complexos sintetizados pelos autótrofos.
Estes dois componentes funcionais se sobrepõem com o maior metabolismo do
autotrófico ocorrendo no estrato superior, no qual a energia luminosa está disponível, e
a atividade heterotrófica, mais intensa, processando-se onde a matéria orgânica se
acumula nos solos e sedimentos (ODUM, 1977).
Para Odum (1977, p.28) é interessante reconhecer quatro constituintes estruturais
compondo o ecossistema: substâncias abióticas, elementos básicos e compostos do
meio; produtores, os organismos autotróficos, principalmente as plantas verdes; os
grandes consumidores ou macroconsumidores, organismos heterotróficos,
principalmente animais, que ingerem outros organismos ou determinada matéria
orgânica; os decompositores ou microconsumidores (também chamados sapróbios ou
saprófitas), organismos heterótrofos, principalmente as bactérias e fungos, que
16
Autotrófico significa “alimenta-se por si só” (ODUM, 1977, p.28).
17
Heterotrófico significa “alimentar-se dos outros” (ODUM, 1977, p.28).
43
decompõem os componentes complexos do protoplasma morto, absorvem alguns dos
produtos da decomposição e libertam substâncias simples utilizáveis pelos produtores.
Deste modo, todos os organismos, plantas ou animais precisam de energia ou matéria
do meio ambiente para sobreviver. Por isso, a vida de cada organismo afeta a dos
demais. A vida de todos os organismos depende de fatores do meio ambiente, como
luz, temperatura, substâncias químicas e nutrientes e, o mais importante, água
(POLLOCK, 1994, p. 6).
A estrutura de um ecossistema precisa ser pensada por vários ângulos se
quisermos entender a interligação da estrutura e função dos seres. O arranjo
produtor-consumidor constitui um tipo de estrutura chamada de estrutura
trófica (trófica = alimentar), cada nível “alimentar” é conhecido como vel
trófico. A quantidade de substância viva nos diferentes níveis tróficos ou
numa população é conhecida como produto em , termo que se aplica às
plantas e aos animais. O produto em pode ser expresso em termos de
número por unidade de área ou em termos de biomassa, isto é, massa
orgânica. A biomassa pode ser expressa como peso fresco, peso seco, peso
seco livre de minerais, peso em carbono, calorias, ou qualquer outra unidade
que possa ser útil para fins comparativos. O produto em não representa
somente a energia potencial como também pode exercer importante papel
como tampão contra oscilações físicas e ainda constituir um habitat, ou
espaço de vida para muitos organismos. Assim, as árvores de uma floresta
não somente representam energia, fornecendo alimento ou combustível,
como modificam o clima e fornecem abrigo para aves e homens (ODUM,
1977, p. 30).
A quantidade e a distribuição, tanto das substâncias inorgânicas como dos materiais
orgânicos presentes na biomassa ou no ambiente, constitui um fator importante em
qualquer ecossistema. Podemos chamar isso de estrutura bioquímica. Por exemplo, a
quantidade de clorofila por unidade de área de terra ou de superfície de água e a
quantidade de material orgânico dissolvido na água, constituem dois itens de grande
interesse ecológico, como veremos. Outro aspecto de grande importância é a estrutura
em espécies do ecossistema. A estrutura em espécies não inclui somente o número e
tipos de espécies presentes, porém também a diversidade das espécies – isto é, a
relação entre as espécies e meros de indivíduos ou biomassa e a dispersão (arranjo
espacial) dos indivíduos de cada espécie, que estão presentes na comunidade (ODUM,
1977, p. 30).
44
Quanto maior e mais diversificado o ecossistema, tanto mais estável ele poderá ser, e
tanto mais independente será (num sentido relativo) dos ecossistemas adjacentes.
Assim, um lago como um todo, é mais auto-suficiente que uma parte deste mesmo
lago; porém, podemos considerar, para finalidade de estudo, uma parte do lago como
um ecossistema (ODUM, 1977, p. 31).
Os ecólogos usam o termo habitat para designar o lugar onde o organismo vive e o
termo nicho ecológico para designar o papel que o organismo exerce no ecossistema.
Odum afirma que se pode usar a metáfora “endereço” para se referir ao habitat e
“profissão” para se referir ao nicho ecológico (ODUM, 1977, p. 51).
A palavra "nicho" (do italiano antigo nicho significa, originalmente, uma cavidade ou
vão na parede onde se coloca uma estátua ou imagem). Por extensão, o termo "nicho"
transmite a noção de um "ambiente escondido", que inspirou o conceito de nicho
ecológico, desenvolvido pelo ecólogo norte-americano C. Elton, no final da década de
1920. [...] (POLLOCK, 1994, p. 30).
O conceito nicho foi redefinido por Elton como a capacidade que a tem a espécie para
usar os recursos para a sua sobrevivência e o modo como convive com outras espécies
no mesmo espaço. A observação da natureza e experiências de laboratório levou à
descoberta de que a maior parte das espécies ocupa nichos ecológicos diferentes;
acredita-se que para evitar a competição entre espécies entra em competição direta,
uma delas inevitavelmente será extinta ou terá de procurar outro nicho ecológico
(POLLOCK, 1994, p. 30).
O homem certamente tem exercido, conforme Odum (1977), uma grande influência
nos componentes taxionômicos de muitos ecossistemas, pois frequentemente remove
ou introduz espécies. Pode-se, de acordo com Odum (1977), imaginar este resultado
como uma espécie de intervenção cirúrgica no ecossistema. Algumas vezes esta
45
operação é planejada, mas em outras é acidental ou inadvertida. “A alteração envolve a
substituição de uma espécie por outra no mesmo nicho, o efeito total sobre o
funcionamento pode não ser grande. No entanto, em muitos casos, graves
desequilíbrios ecológicos surgem em detrimento do homem” (ODUM, 1977, p. 51).
3.2 Meio Ambiente e Educação Ambiental: história das terminologias
A história da Educação Ambiental iniciou-se na década de 60 com a publicação do
livro de Rachel Carson, “A Primavera Silenciosa”. Neste livro, a autora descreveu os
inúmeros impactos ambientais no planeta e alertou para a destruição irreversível de
muitos ecossistemas. Avisou sobre “a ameaça de uma ‘primavera silenciosa’ em que
os pássaros emudeceram para sempre, envenenados pelos inseticidas espalhados
abundantemente sobre as culturas” (DROUIN, 1990, p. 165).
O alerta de Carson foi dado nas décadas importantes que culminaram nas revoluções
de costumes, marcado nos EUA, pelo movimento hippie, pela descoberta dos
anticoncepcionais, pelo rock-and-roll e pelas reivindicações das necessidades básicas
de sobrevivência, como saúde e educação, e a diminuição da fome e miséria de seus
povos (GONÇALVES, 2005, p. 10-11).
Assim, a década de 1960 marcou o início do movimento ecológico no conjunto dos
movimentos sociais e políticos e pela crítica, principalmente dos jovens, ao estilo de
vida e valores da uma sociedade extremamente consumista. Nesse contexto histórico-
cultural, nascem as preocupações com natureza (termo utilizado nessa época) com
lutas em torno de diversas questões, tais como: extinção das espécies, desmatamento,
poluição do ar e da água, erosão, uso de agrotóxicos, guerra nuclear, entre outras
(GONÇALVES, 2005, p. 12).
46
Nesse contexto, entidades, grupos e políticas governamentais começaram a preocupar-
se com a educação ambiental. Surgiu, assim, em 1968, na Grã Bretanha, o Conselho
para a Educação Ambiental e, na França e nos países rdicos foram aprovadas
intervenções na política educacional que introduziriam a educação ambiental no
currículo escolar. A Unesco recomendava inserir os aspectos sociais, culturais e
econômicos no estudo biofísico do meio ambiente.
Nos anos 70, no auge da crise econômica mundial, a preocupação com o ambiente
apareceu em nível mundial, devido aos altos índices de poluição e de devastação dos
recursos naturais, que comprometeriam a qualidade de vida da população mundial.
Segundo Amaral (2005, p.4), “o grande desafio da educação ambiental era refletir
sobre seus objetivos, e superar a incompatibilidade da realidade escolar com o meio
social para adequar-se à era da industrialização”.
Em 1972, em Estocolmo, é realizada a Conferência das Nações Unidas sobre o
Ambiente Humano, com as discussões sobre a questão do meio ambiente ou
questão ambiental”, de forte cunho político. Esta Conferência convocou a sociedade
mundial a repensar a sua postura ecológica frente a sua relação de interdependência
com a natureza e estabeleceu vinte e três princípios de importância vital para o
processo de conscientização universal sobre o tema, entre eles, o Princípio da
Educação Ambiental
18
(LEONARDI, 1997, p. 392).
A criação do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente - PNUMA
19
,
em
1973, fortaleceu a necessidade da educação ambiental em todas as atividades exercidas
pelos organismos internacionais. Em 1975, em Belgrado, foi lançado o Programa
Internacional de Educação Ambiental. E, em 1977, em Tbilissi, é realizada a
18
Princípio 19 – A Educação em assuntos ambientais, para as gerações jovens bem como para os adultos e com ênfase aos menos
favorecidos é essencial para ampliar as bases de uma opinião esclarecida e de uma condutas responsável por parte de indivíduos, empresas e
comunidades quanto à proteção e melhoria do meio ambiente em sua plena dimensão humana. É igualmente essencial que os veículos de
comunicação de massa não evitem contribuir para a deteriorização do meio ambiente como, pelo contrário, disseminem informações de
caráter educativo sobre a necessidade de proteger e melhorar o meio ambiente de modo a possibilitar o desenvolvimento do homem em todos
os sentidos (DIAS, 2004, p. 372).
19
Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente - PNUMA - foi criado em 1973 para coordenar as ações internacionais de proteção ao
meio ambiente e de desenvolvimento sustentável (LEONARDI, 1997, p. 393).
47
conferência Intergovernamental de Educação Ambiental, em que foram estabelecidas
metas e ações para a realização da educação ambiental em todas as sociedades do
planeta (LEONARDI, 1997, p. 393).
A partir da Conferência de Estocolmo, iniciou-se uma série de estudos e debates que
culminaram na Conferência das Nações Unidas sobre Meio ambiente e
Desenvolvimento (Eco-92) ou UNCED (Rio 92), um fórum global, com a elaboração
do Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade
Global. Criaram-se novos conceitos, entre eles, os de desenvolvimento sustentávele
ecodesenvolvimento”. O documento é composto por quinze princípios, entre eles, o
da Educação Ambiental
20
.
A consciência de que o meio ambiente é uma responsabilidade vital coletiva
ratifica o pressuposto de que a crise ecológica decorre fundamentalmente da
ação do homem. Portanto, o princípio fundamental para uma estratégia
educativa sustentável deverá considerar a ética da responsabilidade e isto
requer uma nova postura teórico-metodológica (AMARAL, 2005, p. 5).
No Brasil, o movimento ecológico tem início na década de 1970, em meio a um
regime de ditadura que se impunha principalmente sobre o movimento estudantil e o
sindical. Nesse contexto histórico-cultural, a preocupação ecológica no Brasil, nasceu
ligada às preocupações de âmbito social. No entanto, a partir dos anos 80 é que a
Educação Ambiental configurou-se como uma prática educativa que cresceu junto aos
novos movimentos sociais e da abertura política proporcionada pelo diálogo entre
militares, intelectuais e cientistas, estimulados pela estratégia da realização de
seminários e conferências ambientais que catalisavam esses apoios e participações.
Mas foi somente após os anos 90 que os movimentos populares e sindicais
incorporaram as lutas ambientais ao campo político na luta pela sustentabilidade, pelos
20
A educação ambiental deve ser crítica e inovadora, seja na modalidade formal, não-formal. Ela é tanto individual como coletiva. Não é
neutra; é um ato político, voltado para a transformação social (LEONARDI, 1997, p. 394).
A educação ambiental deve buscar uma perspectiva holística, relacionando homem, natureza e universo, e também ser interdisciplinar. Além
disso, deve buscar a solidariedade, igualdade e respeito através de formas democráticas de atuação, bem como promover o diálogo
(LEONARDI, 1997, p. 394).
A educação ambiental deve valorizar as diversas culturas, etnias e sociedades, principalmente aquelas dos povos tradicionais (LEONARDI,
1997, p. 394).
48
chamados conflitos socioambientais, que evidenciaram o conflito de interesses em
torno do ambiente
21
.
A partir da segunda metade do século para cá, surgiram novas leis ambientais. Mas
somente nos últimos cinqüenta anos, é que a educação ambiental no Brasil, começou a
ganhar uma legislação própria e estruturada.
A Lei 6.938/81 dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, constitui o
Sistema Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA
22
, cria o Conselho Nacional do
Meio Ambiente - CONAMA
23
e institui o Cadastro Técnico Federal de Atividades e
Instrumentos de Defesa Ambiental (ROCCO, 2002, p.85).
A constituição de 1988 estabeleceu a exigência da prática da educação ambiental,
tanto no nível federal, quanto no estadual e no municipal e consagrou um capítulo
exclusivo para o tema meio ambiente, alterando conceitos da doutrina penal brasileira.
Um deles é o de que não somente a pessoa física deveria ser punida por crimes
ambientais, passando também a pessoa jurídica a ser responsabilizada pelos atos.
Somente dez anos depois da constituição é que surge a Lei 9.605/98, que
regulamentou o dano ambiental.
A Constituição Federal Brasileira de 1988 previu, em seu artigo 225:
21
Segundo Rocco (2002, p. 11), desde a época do Brasil Colônia elas vem sendo editadas. Em 1602 foi regulamentada a pesca da baleia.
Três anos depois, eram estabelecidas condições para a exploração do pau-brasil. Até a Proclamação da Republica ainda foram editadas
diversas normas, como a que proibia o corte de árvores de mangue (1760) e a que declarava como propriedade da Coroa Portuguesa a
vegetação marginal ao mar e aos rios que desembocavam no mar. sob o regime republicano, normas envolvendo questões ambientais
começam a surgir no Código Civil Brasileiro (1916) que, entretanto, encarna um conceito ilimitado da propriedade privada. Com a
constituição de 1934, surgem os três primeiros códigos ecológicos: o Código das Águas, o Florestal e o de Mineração. Em 1940, o então
novo Código Penal também incorpora a aplicação de penas a condutas lesivas ao meio ambiente, mas ainda sob a ótica da saúde pública
(ROCCO, 2002, p. 11).
22
Sistema Nacional do Meio Ambiente SISNAMA é constituído pelos órgãos e entidades da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos
Territórios e dos Municípios, bem como as fundações instituídas pelo Poder Público, responsáveis pela proteção e melhoria da qualidade
ambiental (ROCCO, 2002, p. 87).
23
Conselho Nacional do Meio Ambiente CONAMA , com a função de assistir o Presidente da República na formulação de diretrizes da
Política Nacional do Meio Ambiente (ROCCO, 2002, p. 87)
49
Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de seu
uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao
Poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as
presentes e futuras gerações (ROCCO, 2002, p. 36).
E prescreve no parágrafo 1º, VI, a necessidade de “promover a Educação Embiental
em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio
ambiente”.
A Lei Maior, a Lei 9795, de 27 de abril de 1999, dispõe sobre a Educação Embiental e
institui a Política Nacional de Educação Ambiental. Segundo essa lei:
Entendem-se por Educação Embiental os processos por meio dos quais o
indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos,
habilidades, atitudes e competências voltadas para a preservação do meio
ambiente, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida
e sua sustentabilidade (ROCCO, 2002, p. 225).
E, ao mesmo tempo em que se institui a Política Nacional de Educação Ambiental, faz
referência aos princípios básicos da educação ambiental, atribui incumbências ao
Poder Público, às instituições educativas, aos órgãos integrantes do SISNAMA, aos
meios de comunicação em massa, às empresas, entidades de classe, instituições
públicas e privadas, bem assim à sociedade como um todo, além do que fixar os
objetivos fundamentais a serem buscados. Reconhece a educação ambiental como um
componente essencial da educação nacional, estabelecendo que deverá estar presente
de forma articulada, em todos os níveis e modalidades do processo educativo, em
caráter formal e o-formal”e ser desenvolvida como uma prática educativa
integrada, contínua e permanente”, não podendo ser implantada “como disciplina
específica do currículo de ensino”, devido a abrangência da dimensão ambiental no
ensino (ROCCO, 2002, 225-226).
As lutas pela Educação Ambiental levaram à constituição de um campo teórico de
muitas idéias e propostas de ação. Neste campo, reconhecem-se diferenças teóricas
50
entre os diversos autores. Para Vasconcellos (1997), as práticas educativas
possibilitam nossa reflexão sobre nossa vida local e planetária.
A escola, nesse contexto, é um ambiente privilegiado, afirma Dias (2004), pois
promove atividades que propiciam essa reflexão, quando desenvolve atividades de sala
de aula e atividades de campo, com ações orientadas em projetos e em processos de
participação que levem à autoconfiança, às atitudes positivas e ao comprometimento
pessoal com a proteção ambiental elaborados de modo interdisciplinar.
A Educação Ambiental, afirma Ruy (2004), pode até mesmo transcender o ambiente
escolar, com ações que atinjam o bairro ou a comunidade onde a escola está inserida.
Os alunos, professores e funcionários se tornam multiplicadores potenciais de
informações e atividades relacionadas à Educação Ambiental executadas na escola.
Para Nascimento (2001, p. 3), a concepção de Educação Ambiental de autores como
Grün (1996), Levi (1995) e Cascino (1999) mostram uma visão de ambiente
harmônico, ou seja, estabelecem que a principal tarefa da Educação Ambiental é
promover o retorno dos valores que regem o agir humano em sua relação harmoniosa
com a natureza. A natureza é descrita como harmônica e a intervenção humana cria o
desequilíbrio.
MAZZOTTI (2005, p.9), analisando diferentes produções em Educação Ambiental
apontou duas metáforas que coordenam e condensam o discurso ambientalista: a do
CICLO DO TEMPO
e a da
SETA DO TEMPO
.
No primeiro discurso, a metáfora CICLO DO TEMPO afirma que as sociedades
humanas são diferentes entre si e, portanto, não como estabelecer hierarquias. No
segundo discurso, a metáfora SETA DO TEMPO indica a idéia de que o
51
desenvolvimento em direção a uma sociedade ambientalmente sustentável com base
em alguma tecnologia apropriada ao meio: a que apresente maior produtividade do que
a das sociedades arcaicas. As duas metáforas, segundo Gould (1991), fazem uma
comparação ao organismo: o CICLO DO TEMPO é uma analogia com a circulação
sanguínea e a SETA DO TEMPO, com o crescimento. Para Mazzotti (2005), estas
duas metáforas conferem certa instabilidade ao discurso ambientalista, pois ora se
proclama a “volta à simplicidade natural”, ora se afirma a necessidade de tecnologias
que superem a baixa produtividade e o desperdício para melhor atender as
necessidades humanas, consideradas estas apenas por seus aspectos vitais.
O que Mazzotti (2005) afirma é que existem três formas de Representação Social do
problema ambiental no Brasil:
A representação de “problema ambiental” coordena-se e condensa-se na
metáfora:
ENFERMIDADE
ou
DOENÇA
. problema ambiental quando ocorre
um desequilíbrio do meio, assim como a doença é um desequilíbrio do corpo
saudável. Por este núcleo argumentativo a sociedade atual é artificial, logo
não pode ser equilibrada, uma vez que o equilíbrio é próprio do natural
(saúde/saudável), que é o oposto do artificial. Desta representação emerge a
busca dos meios que permitam a superação (cura) do desequilíbrio, que se
apresenta na forma de uma política para a instauração de uma nova
sociedade: a sustentável (MAZZOTTI, 2005, p.6).
Para Mazzotti (2005, p. 3) a concepção de equilíbrio ambiental é sustentada pela
metáfora organicista que considera os problemas ambientais como ENFERMIDADES.
Isso sugere que os ambientalistas apresentam-se como MÉDICOS ou TERAPEUTAS
que prescrevem os meios para CURAR A SOCIEDADE DOENTE. Os ambientalistas,
diz Mazzotti (2005), se apresentam como porta-vozes da Natureza e, propõem-se a
dirigir ou governar a sociedade pelo controle afetivo e cognitivo dos professores e
estudantes. Olivier Reboul (1975, p. 90), chama esse processo de slogans-argumentos,
pois tentam nos convencer “naquilo que mais nos toca ao coração”.
Outro problema advindo dessa metáfora é que ela opera com as noções de amor e
aliança entre os seres humanos, bem como entre os homens e a natureza. No lugar de
52
discutir as relações ecossistêmicas, parte-se para uma “ideologia ecologista” ou a um
“retorno ao sagrado” na qual a natureza é o valor supremo (ACOT, 1990, p. 173).
Como os professores nem sempre compreendem o caráter metafórico do discurso da
Educação Ambiental e nem seu limites ao se tratar dos problemas ambientais, é
possível que a Educação Ambiental esteja sendo apresentada de modo a afastar os
alunos de seus significados e não de chamá-los à adesão aos conhecimentos
ambientais. Ou, ainda, que os alunos fiquem estabelecidos em um patamar do senso
comum não avançando para conhecimentos científicos.
53
IV. AS MÉTAFORAS E ANALOGIAS UTILIZADAS EM ECOLOGIA,
MEIO AMBIENTE E EDUCAÇÃO AMBIENTAL NOS LIVROS
DIDÁTICOS DE CIÊNCIAS E BIOLOGIA
Se existe uma articulação entre imagem e conhecimento na
educação em biologia, talvez tenhamos que admitir que as
imagens possam modificar a maneira de conhecer de uma
determinada área de conhecimento e reconhecer que a imagem
pode ter uma influência importante na prática e na reflexão
educativas [...] (BRUZZO, 2004, p. 1375).
Os Livros Didáticos de Ciências e Biologia trazem na sessão de Educação Ambiental
um apelo geral à arrumação do Planeta Terra; apelo para que o planeta seja “curado”
dos males ambientais. Vamos apresentar, de modo geral, como aparece o argumento
central dos livros chamando-nos a pensar a Educação Ambiental.
Para a análise dos textos selecionados trabalharemos, sobretudo, com os estudos de
Mazzotti (2005), ao qual nos referimos nesta dissertação, acerca das três metáforas
mais recorrentes nos textos de EA: a da seta do tempo, do ciclo do tempo e da
enfermidade. Encontramos a metáfora “enfermidade” nos textos selecionados,
sobretudo, nas imagens que os livros veiculam sobre o planeta Terra. Como sabemos
não se trata de cuidar do planeta com um curativo, mas com políticas ambientais
adequadas aos impactos produzidos no planeta. E, também, é preciso reconhecer que
os impactos são produzidos pelas relações de produção capitalistas e não pelo Homem.
Vamos apresentar as imagens e as considerações sobre suas analogias pedagógicas.
Iniciamos pelo livro de Ciências, da Série da Coleção Vitória Régia, de Samuel
Ramos Lago e Erica Meirelles, da IBEP (2001, p. 141), pela figura 1. Nesta imagem, o
homem é definido como parte integrante da natureza que deve ser amada e
protegida. Mas, o homem da figura é ou não parte da natureza, no caso, da árvore que
foi cortada? O que é natureza? Quem protege o homem? Quem protege a árvore?
Imagem e textos são confusos; contradizem-se.
54
Figura 1: Corte de madeira – PA.
Fonte: Ciências – 1ª Série - Coleção Vitória Régia, p. 141
Na figura 2, a seguir, da página 146 do mesmo livro de Lago e Meirelles, o tema
natureza é iniciado pela definição de animais. Para isso, os autores recorrem à
metáfora harmonia. O animal, as plantas e o homem têm de viver harmoniosamente.
Porém, a noção de harmonia para descrever o processo dos sistemas biológicos, como
apontou Mazzotti (2005), é oposta à de equilíbrio dinâmico como apontamos na sessão
3. Em harmonia, os ecossistemas cessariam seu movimento e vida. Harmonia é uma
concepção inadequada para explicitar o complexo comportamento dos ecossistemas.
Figura 2. Peixes Mortos na Represa Billings – SP.
Fonte: Ciências – 1ª Série - Coleção Vitória Régia, p. 146
55
Na figura 3, o homem é, para Lago e Meirelles (2001, p. 175), imagem “O lixo e a
poluição do solo”, um homem genérico, que destrói a natureza. Mais uma vez a
imagem do homem sugere alguém que não destrói a natureza, e, sim, um homem
pobre, de uma classe social que não consome; a imagem contradiz o texto escrito. Ou
seja, os homens o iguais como espécie, mas são desiguais econômica e
politicamente. O homem que aparece na imagem é um homem sem emprego formal,
expondo-se aos riscos do lixo.
Figura 3. O lixo e a poluição do solo.
Fonte: Ciências – 1ª Série - Coleção Vitória Régia, p. 175
Na figura 4, vê-se a referência ao local onde os animais vivem. Trata-se do mesmo
livro de Lago e Meirelles (2001, p. 181). A indicação, na figura, do animal e um lugar
não constitui a noção de habitat e alimentação. Lago e Meirelles apenas indicam uma
classificação de animais de fácil localização e de animais escondidos; animais que
vivem em horta, vasos, no solo; animais domésticos, noturnos. As imagens não ligam
o animal ao seu entorno, um problema típico das ilustrações de livros, principalmente
nas séries iniciais. Nesse caso, a imagem chama o aluno para conhecer os habitats dos
56
animais, mas estes não são apontados os animais e sua relação com o meio onde
vivem.
Figura 4. Onde vivem os animais?
Fonte: Ciências – 1ª Série - Coleção Vitória Régia, p. 181
Na figura 5, do livro da 2ª Série da mesma coleção de Lago e Meirelles (2001, p. 22), a
vida no planeta Terra é definida na fina “casquinha” que é a biosfera. A Terra é “casa”
do homem e de todos os seres vivos. Em um ciclo contínuo tudo se renova.
Novamente tem-se a noção de harmonia completada pelas analogias de casa,
casquinha. Na mesma figura 5, a segunda imagem como referência ao aquecimento
global e à destruição do planeta mostrando o planeta sobre as chamas de uma fogueira.
O texto diz: “Só pessoas loucas põem fogo na própria casa”. Será que somos todos
loucos? Quem são os loucos? As crianças que lêem o livro? Os adultos? Que adultos?
Todos?
57
Figura 5. A Terra – O lugar de todos
Fonte: Ciências – 2ª Série - Coleção Vitória Régia, p. 22
Na figura 6, Lago e Meirelles (2001, p. 215) utilizam a metáfora bebê para dar a noção
de planeta jovem. O Planeta é bebê. Ou seja, apesar de a Terra ser um planeta
relativamente jovem e a vida mais, recente ainda, principalmente a humana, já estamos
destruindo o planeta que habitamos. A imagem trabalha com três tempos: o geológico,
o histórico, biológico e o humano. São quatro escalas de tempo. Escala astronômica, a
biológica, a histórica e a de um humano. Qual é a escala que os autores querem
discutir? É adequado trabalhar com a metáfora bebê e quatro escalas de tempo? Para
nós, a imagem é inadequada por indicar um tempo para descrever quatro outras noções
de tempo.
Figura 6. Planeta bebê.
Fonte: Ciências – 2ª Série - Coleção Vitória Régia, p. 215
58
Na figura 7, Lago e Meirelles (2001, p. 134), livro da 3ª série, os autores ilustram o
“ecossistema caverna”. Para isto, apresentam elementos sem proporção; a imagem fica
fora dos limites importantes de escala e do processo das redes ecológicas.
Figura 7: Caverna – um ecossistema.
Fonte: Ciências – 3ª Série - Coleção Vitória Régia, p. 41.
Nas figuras 8.1 e 8.2, Lago e Meirelles (2001, p. 44 e 45) livro da série, apresentam
a noção de ecologia pela analogia da classificação. Comparam os elementos da
natureza às peças de dominó que tem que se encaixar de maneira harmoniosa. O
dominó é um jogo em que as peças são encaixadas linearmente. Dessa forma, essa
analogia distorce o conceito de ecologia propondo suplementar a noção por algo bem
conhecido pelos estudantes, o jogo de dominó. Porém, no jogo cada parte formada é
uma seqüência de peças e no processo evolutivo, as mudanças não são nem
seqüenciais (não um propósito divino indicando a seqüência de formação do
mundo) nem previstas antes como no jogo. o acaso e a necessidade agindo na
evolução das espécies. A idéia dos autores converge com a idéia criacionista ou do
design inteligente.
59
Figura 8.1: A ecologia Figura 8.2: Efeito dominó
Fonte: Ciências – 3ª Série - Coleção Vitória Régia, p. 44-45.
Na figura 9, para tratar do conceito de energia, Lago e Meirelles (2001, p. 88) mostram
a imagem de uma corrente com cada elo representando um nível trófico da cadeia
alimentar , de modo que no entrelaçar desses elos, tem-se a idéia da transposição de
energia de um nível para o outro, ou seja, da interdependência dos seres vivos. Esta
imagem indica que de cada ser vivo se encontra preso ao outro quanto à sua
alimentação, enquanto, cientificamente, cada organismo não tem uma única opção de
alimento ou é consumido por um único predador. Ou seja, existe um conjunto de inter-
relações alimentares entre os seres vivos que formam uma teia alimentar.
60
Figura 9. Transmitindo Energia.
Fonte: Ciências – 3ª Série - Coleção Vitória Régia, p. 88
Na figura 10 e 11, de Lago e Meirelles (2001, p. 92,94) as pirâmides de energia e de
números apresentadas, representam os seres vivos pela metáfora escada.
Uma pirâmide de energia deve mostrar a quantidade de energia química potencial
disponível trófico de um ecossistema. A base representa o nível trófico dos produtores.
Nas figuras são representados os níveis tróficos dos consumidores primários,
secundários e, de modo sucessivo, os outros níveis. A largura de cada escala da
pirâmide representa a quantidade de energia presente na matéria orgânica disponível
para o nível trófico seguinte. A pirâmide de números é indicada para representar a
quantidade de indivíduos existentes em cada nível da cadeia alimentar.
Na figura 10, cada ser vivo da pirâmide parece aguardar o momento adequado para
devorar o ser do nível trófico inferior. O tamanduá, por exemplo, tenta alcançar de seu
nível “mais elevado” da pirâmide, utilizando sua língua comprida, a “imensa” formiga
do nível trófico “inferior”. Na figura 11, Lago e Meirelles apresentam uma ilustração
61
com os seres vivos “presos” na pirâmide, fazendo analogia com caixas onde os
animais ficam presos, retirando a dinâmica das espécies em seus habitats.
Figura 10. Pirâmide de energia.
Fonte: Ciências – 3ª Série - Coleção Vitória Régia, p. 92
Figura 11. Pirâmide de números.
Fonte: Ciências – 3ª Série - Coleção Vitória Régia, p. 94
62
Na figura 12, Lago e Meirelles (2001, p. 95) apresentam uma ilustração de uma cadeia
alimentar em espiral. Essa analogia leva à compreensão de ciclo interminável, no qual
cada elemento está interligado necessariamente ao outro sem outras opções de
alimento, novamente sem indicar a dinâmica das espécies e suas populações. Ou seja,
sem indicar que as espécies podem adaptar-se a outros habitats.
Figura 12. Cadeia alimentar em espiral.
Fonte: Ciências – 3ª Série - Coleção Vitória Régia, p. 95
Na figura 13, o mesmo livro, da mesma série (2001, p. 96), um exercício para a
criança analisar a rede energética com a analogia de TEIA representando as inter-
relações alimentares de alguns seres vivos.
63
Figura 13. Teias alimentares.
Fonte: Ciências – 3ª Série - Coleção Vitória Régia, p. 96
Na figura 14, do livro Ciências Coleção Vitória Régia, série (2001, p. 65), o
curativo no planeta Terra protegido reforça a idéia de que a Terra está doente e precisa
ser curada. Essa imagem do planeta doente, precisando de cuidados urgentes, nos leva
a pensar a Educação Ambiental como a medicina necessária, como a disciplina que
terá seus médicos e seu meio de curar o planeta, como apontou Mazzotti (2005) em
seu artigo Educação Ambiental em busca do “paraíso perdido”.
Figura 14. Terra com “Band-aid”.
Fonte: Ciências – 4ª Série - Coleção Vitória Régia, p. 65.
64
Essa metáfora como descreve Mazzotti (2005, p. 4) é uma das mais estranhas à ciência
e à ecologia; é a presença de um “neocientismo”, ou seja, de um pensamento escolar
que se pretende científico para explicitar os impactos ecológicos. Impactos não são
doenças que se curam com band aids. Impactos de ecossistemas são resultados de
políticas (públicas ou privadas) na condução de um país (hidrelétricas, habitação,
urbanização etc).
Na figura 15, Lago e Meirelles (2001, p. 119) apelam à responsabilidade do homem
em proteger o planeta Terra. Clamam pelo sentimento do amor, à necessidade de amar
o planeta. Os autores chamam à responsabilidade humana com o seguinte slogan:
“Amor à Terra... ...amor à Vida”. As dimensões científicas ficam sem debate. Basta o
amor ao planeta. Haverá elaboração de sentimento construtivo sem explicações
racionais, científicas acerca do funcionamento biológico, geológico do planeta?
Figura 15: Amor à Terra... ... amor à vida.
Fonte: Ciências – 4ª Série - Coleção Vitória Régia, p.119.
Na ilustração a seguir, figura 15, a mesma noção de harmonia é apresentada na página
121, do mesmo livro, ao tratar da hipótese Gaia, também denominada de “Mãe Terra”,
65
de James Lovelock. Segundo Lago e Meirelles (2001), essa metáfora compara a Terra
à um organismo vivo e apresenta todos os mecanismos de auto-regulação necessários
para manter o equilíbrio e a harmonia no planeta. Portanto, qualquer alteração desse
mecanismo leva ao desequilíbrio, ou até mesmo, a destruição do planeta. Sabemos, no
entanto, que o conceito de harmonia induz a não pensar em equilíbrio dinâmico, ou
seja, relações ecológicas de equilíbrio e desequilíbrio ecológico.
Figura 16. O que é a hipótese Gaia?
Fonte: Ciências – 4ª Série - Coleção Vitória Régia, p.121
As mesmas noções de harmonia e de planeta doente são reforçadas nas páginas 122 e
123, do mesmo livro (figuras 17 e 18). Lago e Meirelles apresentam as analogias do
Planeta “doente” indo ao médico, e os cientistas e ambientalistas, sendo denominados
aqui, de “clínicos gerais”. Estes, ao realizarem suas pesquisas, buscam “remédios”
adequados para curar as doenças da Terra. Essas “doenças” são as causas dos impactos
ambientais. Essas analogias despojam a ciência de seu conteúdo racional, resultados de
anos de estudo, de observação, de formulação de hipóteses, de experimentação.
66
Figura 17. Indo ao médico. Figura 18. Planeta saudável.
Fonte: Ciências – 4ª Série - Coleção Vitória Régia, p.122.-123
Na figura 19, ilustração do livro de Ciências Terra e Universo, série, de Cecília
Valle, Positivo (2004, p. 75), aparece a noção de equilíbrio/harmonia relacionada à
“rotina” dos seres vivos. Não fica claro ao leitor que existe uma dinâmica populacional
que se altera sob a influência de diversos fatores como doenças, alterações climáticas,
diminuição ou aumento da taxa de fecundidade, entre outros. De acordo com esses
fatores, em determinadas épocas, a população pode diminuir até quase desaparecer, ou
o contrário, se reproduzir até constituir uma superpopulação.
Figura 19. Equilíbrio Ecológico.
Fonte: Terra e Universo. 5ª Série, p.65
67
Na figura 20, Cecília Valle no livro Ciências, Vida e Ambiente, Série Positivo
(2004, p. 11), faz analogia utilizando-se das fases de um indivíduo humano, da
juventude à velhice, aos outros seres vivos e ao ambiente. Essa analogia do indivíduo à
de população e ambiente, despreza a dinâmica das espécies e das populações. Um
indivíduo não pode representar a sua população; é parte de uma espécie, com suas
características, habitat, nicho, comunidade e população.
Figura 20. Fases da vida.
Fonte: Vida e Ambiente - 6ª Série, p.11
A figura 21 do livro Biologia - Volume Único, de Sônia Lopes e Sergio Rosso (2005,
p. 540), o tema Ecologia é explorado na última unidade da obra, a unidade 7, capítulo
38, Ecologia: introdução, fluxo de energia e ciclo da matéria. Os autores apresentam a
noção de harmonia homem/natureza ao escrever que o estudo da Ecologia é cada vez
mais importante devido a interferência humana sobre os ecossistemas. Esta idéia é
reforçada no texto A caminho de uma reconciliação entre o ser humano e a natureza
do livro. Mais uma vez a analogia da dinâmica dos seres vivos com a noção de
harmonia substitui a idéia de equilíbrio dinâmico nos ecossistemas.
68
Figura 21. A caminho de uma reconciliação entre o ser humano e a natureza.
Fonte: Biologia - Volume Único, p. 540
No mesmo capítulo do livro, figura 22, Sônia Lopes e Sergio Rosso (2005, p. 541)
inserem fotografias para ilustrar os níveis de organização dos seres vivos, de
organismo ao ecossistema.
Figura 22. Níveis de organização dos seres vivos.
Fonte: Biologia - Volume Único, p. 541
Todos os conceitos ecológicos são representados em uma única ilustração. Na tentativa
de fazer a comunicação de todo conhecimento cientifico, simplifica a apresentação dos
conhecimentos ambientais utilizando uma linguagem reducionista, que muda o sentido
69
dos conceitos de espécie, população, habitat, nicho e ecossistema por nós trabalhados
no capítulo 3.
Na página 566 desse mesmo livro, figuras 23.1 e 23.2, no capitulo Sucessão ecológica
e principais ecossistemas, os autores abordam a dinâmica das comunidades e a
sucessão ecológica. O texto e as figuras presentes nesta página e na seguinte
apresentam e ilustram os conceitos de comunidade, sucessão, espécie pioneira, estágio
e clímax. No entanto, não explicitação do significado de espécie pioneira; as idéias
de sucessão, estágio e clímax da teoria de Clements, do início do século XIX, descritas
no capítulo 3, não são adequadas às florestas tropicais e/ou aos ecossistemas que não
sejam os de clima temperado.
Figura 23.1. A dinâmica das comunidades: sucessão ecológica.
Fonte: Biologia - Volume Único, p. 541.
70
Figura 23.2. Esquema de sucessão secundária em um campo abandonado.
Fonte: Biologia - Volume Único, p. 541
No livro Biologia, Volume Único, da Coleção Vitória-Régia, de Augusto Adolfo,
Marcos Crozeta e Samuel Lago, IBEP (2005, p. 14-15), figuras 24.1 e 24.2, os
conceitos de Ecologia são introduzidos no início da obra, na unidade 2. Os autores
apresentam os conceitos básicos de Ecologia, ou seja, os níveis de organização dos
seres vivos. A metáfora população é representada como o conjunto de determinada
espécie; mas o conjunto de espécies interagindo com outras, com o alimento, com seu
predador. O que seriam 20 mil ratos vivendo em uma cidade? Seriam um conjunto da
determinada espécie de rato interagindo com homens, outros animais urbanos, com
seus predadores, adoecendo ou proliferando em uma determinada área em um certo
período.
Todas as ilustrações levam à definições que não contemplam a dinâmica do
ecossistema, as analogias, as relações de energia, de alimento, sobrevivência, entre
outras.
71
Figura 24. 1. Conceitos básicos em Ecologia.
Fonte: Biologia: Volume Único, da Coleção Vitória-Régia, p. 14-15.
Figura 24.2. Conceitos básicos em Ecologia.
Fonte: Biologia: Volume Único, da Coleção Vitória-Régia, p. 14-15.
72
Os autores aproximam-se das analogias feitas por Odum, porém usam analogias de
“endereço” para habitat e nicho como “profissão”. Ao fazê-lo desse modo, os autores
retiram a noção de diversidade e dinâmica ambiental, na qual várias espécies podem
ter o mesmo “habitat” ou “endereço e/ou o mesmo nicho ou “profissão”.
Figura 25. Habitat e Nicho ecológico.
Fonte: Biologia: Volume Único, da Coleção Vitória-Régia, p. 16.
O livro Biologia das Populações, de José Mariano Amabis e Gilberto Rodrigues
Martho, Moderna (2004), volume 3, figura 26, ilustra o conceito de ecossistema com a
foto de um recife submerso e, ao lado, esquematiza os níveis de organização dos seres
vivos de organismo a ecossistema. Os conceitos ecológicos são representados em uma
única ilustração, numa linguagem reducionista que muda o sentido dos conceitos de
espécie, população, habitat, nicho e ecossistema.
Figura 26. Níveis de Organização da vida no ecossistema do recife.
Fonte: Biologia V. 3 – Biologia das Populações, p. 292.
73
No mesmo livro, José Mariano Amabis e Gilberto Rodrigues Martho (p. 361-362),
figuras 27 e 28, representam esquematicamente os conceitos de sucessão ecológica
primária e secundária, por meio de dunas de areia e de um campo de cultivo
abandonado. No entanto, não fica claro que a idéia de sucessão, estágio e clímax da
teoria de Clements, do começo do século XIX, como nos referimos no capítulo 3, é
adequada somente aos ecossistemas de clima temperado e não aos ecossistemas e
florestas do clima tropical.
Figura: 27. Sucessão primária e sucessão secundária.
Figura: 28. Representação
Fonte: Biologia V. 3 – Biologia das Populações, p. 361-362.
esquemática em um
campo
de cultivo abandonado.
Para iniciar a unidade Ecologia e apresentar os conceitos sobre Ecossistemas,César da
Silva Junior e Sezar Sasson (2005, p. 302-303) , no livro Biologia Volume 3
série, figura 29, fazem analogia do funcionamento da Terra pela harmonia no texto
denominado A hipótese Gaia.
74
Figura: 29. A hipótese Gaia.
Fonte: Biologia – Volume 3 – 3ª série, p. 302.
No mesmo livro, os autores apresentam uma ilustração acerca dos níveis de
organização dos seres vivos de organismo ao ecossistema, figura 30. Ao representar
todos os conceitos em uma única ilustração, os autores retiram a dinâmica
populacional, numa analogia de um indivíduo com uma população.
Figura: 30. Os níveis de organização em ecologia.
Fonte: Biologia – Volume 3 – 3ª série, p. 305.
75
Como vemos as analogias e metáforas nos livros didáticos analisados retiram as
dimensões da ecologia científica recontextualizando-as em uma dimensão cientificista,
ou seja, tiram, sobretudo, a idéia da dinâmica das redes energéticas entre os seres
vivos. As representações da ecologia ficam fundamentadas na noção de harmonia; a
única noção que, de fato, não há em nenhuma lição da ecologia científica.
76
V. CONCLUSÃO
Podemos concluir que o uso de analogias é um recurso interessante no ensino de
Ciências, pois aproxima conceitos abstratos às situações concretas. As coleções
analisadas fazem uso de analogias e metáforas. Contudo, em alguns casos, essas
analogias são impróprias, tanto quando apresentadas em textos, quanto em ilustrações.
Predominam as metáforas harmonia e equilíbrio, embora outras também sejam
utilizadas, como as de endereço, profissão, rede ou teia, comunidade e população.
As metáforas harmonia e equilíbrio conferem às coleções analisadas concepções
errôneas de ecossistema e ambiente. Não pode haver equilíbrio ou harmonia em um
ecossistema; se houver o ecossistema desaparecerá. Outro problema científico surge
no uso da noção de indivíduo (mesmo quando se referem à população, comunidade ou
ecossistema) como análogo ao conceito de população. População refere-se à espécie e,
nesse sentido, um indivíduo é representante da espécie.
Também temos ilustrações que se referem desequilíbrio da natureza provocado pela
ação do homem em busca de produzir lucros, ou seja, devido à exploração econômica,
mas aí, também se restringem ao homem no singular, deixando as relações sociais de
lado.
Mazzotti (2005, p.15) defende a necessidade de se “constituir uma ação que conduza a
propor uma educação ambiental sustentada nas ciências, não em representações
míticas ou místicas agenciadas por metáforas organicistas”. Essas metáforas
desempenham na aprendizagem um caminho que leva ao cientismo, ou seja, os
professores e alunos permanecem na base intuitiva das relações ecológicas. Não levam
às novas metodologias, nem experimentações básicas sobre o tema, nem às
observações. Compromete-se, assim, a formação científica dos alunos.
77
REFERÊNCIAS
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Espaço Acadêmico. Universidade Estácio de Sá, Rio de Janeiro, nº 47, Abr. 2005.
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______, Luzia Marta. Educação Ambiental: referenciais para a prática política e
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