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THAIS PAULINA GRALIK
AS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS NO ENSINO DE ARTES VISUAIS
NA PERSPECTIVA DOS ESTUDOS DA CULTURA VISUAL
FLORIANÓPOLIS - SC
2007
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UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA – UDESC
CENTRO DE ARTES – CEART
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARTES VISUAIS
THAIS PAULINA GRALIK
AS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS NO ENSINO DE ARTES VISUAIS
NA PERSPECTIVA DOS ESTUDOS DA CULTURA VISUAL
FLORIANÓPOLIS – SC
2007
Dissertação de Mestrado
elaborada
junto ao Programa de Pós-
Graduação
em Artes Visuais do CEART/UDESC,
para obtenção do título de Mestre em
Artes Visuais.
Orientadora: Prof.ª Dr.
ª Teresinha S.
Franz
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2
THAIS PAULINA GRALIK
AS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS NO ENSINO DAS ARTES VISUAIS
NA PERSPECTIVA DOS ESTUDOS DA CULTURA VISUAL
Dissertação de Mestrado elaborada junto ao Programa de Pós-Graduação em Artes
Visuais do CEART/UDESC, para obtenção do título de Mestre em Artes Visuais, na
linha de pesquisa Ensino das Artes Visuais.
Banca examinadora:
Orientador: ___________________________________________________
Prof.ª Dr.ª Teresinha Sueli Franz (CEART/UDESC)
Membro: ____________________________________________________
Prof.ª Dr.ª Neli Klix Freitas (CEART/UDESC)
Membro: _____________________________________________________
Prof.ª Dr.ª Ana Maria P. Liblik (UFPR)
Florianópolis, 16 de agosto de 2007.
3
Dedico este trabalho a Deus e a minha
mãe, por sua generosidade, diplomacia e
inteligência peculiares, que me fazem crer
que tudo é possível de ser realizado.
4
AGRADECIMENTOS
A Deus, em primeiro lugar e a Roselis, mãe e companheira, pelo seu apoio,
incentivo e muitas colaborações que recebi nesta caminhada, tendo a graça de
poder contar com sua presença e paciência em todos os momentos, difíceis ou
alegres, que jamais poderei agradecer suficientemente.
Aos professores do mestrado, em especial, à Dr.ª Sandra R. Ramalho, pelo
respeito e admiração que sinto por sua capacidade, profissionalismo e devoção ao
ensino, que me proporcionaram um sério aprendizado, conquistando meu coração,
transformando este mestrado em algo muito especial para mim. À Dr.ª Yara R.
Guasque, por seu brilho intelectual e por ter-me proporcionado um reencontro com a
arte e as novas tecnologias, plantando sementinhas.
Aos professores que ministraram os Seminários Temáticos intensivos, Dr.
Sérgio Basbaum, por sua dedicação e Dr.ª Analice D. Pillar, pela oportunidade de ter
compartilhado sua luz e seu amor contagiante pelo ensino da Arte.
Aos membros da Banca, Dr.ª Neli K. Freitas, que contribuiu na área de
Metodologia de Pesquisa, com seu bom senso e sobretudo por seu apoio e carinho.
À Dr.ª Ana M.ª Petraitis Liblik por suas prestimosas colaborações, leituras e pelo
prazer que proporcionou em me dedicar seu tempo. Meu muito obrigado por
aceitarem o convite.
À UDESC e ao CEART, que promoveram um excelente trabalho de direção e
coordenação, através dos professores Dr. Antonio Vargas e Dr.ª Regina Melim. À
Dr.ª MLucia B. Duarte e aos demais professores do mestrado e funcionários do
CEART sempre solícitos e prestativos. Meu agradecimento especial à Sandra Lima
Siggelkow, por ter encontrado em sua pessoa uma rara devoção ao trabalho,
atenção e amizade, graças a quem nada me faltou neste mestrado, apesar de meu ir
e vir de um Estado à outro.
5
A todos os colegas do mestrado de Florianópolis, que embora o tempo e a
distância não favorecessem mais encontros, contribuíram de diversas formas para
realizar este trajeto, especialmente àqueles com quem convivi de forma mais
próxima e se transformaram em amizades: Silvia G., Sandra F., Alessandra K., M.ª
da Glória e Tambi, a qual se tornou uma amiga e companheira de muitas horas.
Aos professores de Curitiba que participaram com seus depoimentos, sem os
quais este trabalho não teria sido possível, meu reconhecimento por sua boa
vontade. Também meu agradecimento às escolas que participaram deste trabalho, à
Gibiteca da Fundação Cultural e ao Solar do Rosário de Curitiba.
A minhas queridas irmãs, sobrinhos, amigos e colegas professoras dos
grupos Arte na Escola, UFPR e FAP que, de uma forma ou de outra, também
contribuíram para que eu pudesse concretizar esta etapa de minha vida.
Aos professores e pesquisadores da Universidade de Barcelona, Dr.
Fernando Hernández e Dr.ª Joana M.ª Sancho, que ministraram o Seminário de
Supervisão no Programa de Pós-Graduação – Mestrado em Artes Visuais.
À professora Dr.ª Teresinha Sueli Franz, por suas ricas orientações e que
participou deste trabalho com correções, “dicas”, contribuições teóricas e rigor
acadêmico necessário para um sério trabalho de dissertação.
6
[...] como aponta Mitchell (2000, p. 210),
[...] o gênio e a obra-prima não
desaparecerão do contexto da cultura
visual, mas o status, o poder e as formas
de prazer que nos proporcionam tornar-
se-ão mais objetos de investigação do
que um ‘mantra a ser entoado
ritualisticamente em frente a monumentos
inquestionáveis’.
Fernando Hernández (2007, p. 52)
Figura 1 - Maurício de Souza. Mônica Lisa,1989.
7
RESUMO
Na presente pesquisa investigamos como os professores compreendem a
Arte Seqüencial/histórias em quadrinhos no ensino de Artes Visuais. A análise de
dados segue a perspectiva da educação para a compreensão da Cultura Visual e da
Pedagogia Crítica da Arte. Durante muitas décadas, as HQs causaram polêmicas e
não eram admitidas nas escolas. Foi somente a partir de 1970 que começaram a ser
incluídas no currículo escolar. Na pós-modernidade o campo da arte se amplia, e o
ensino de Arte passa a enfatizar o estudo das artes eruditas e artes populares sem
fazer distinções, assim como a reclamar por um vínculo entre o cotidiano das
imagens de crianças e adolescentes e a educação escolar. Observando a relação
escola e quadrinhos, notamos que as HQs raramente são incluídas como conteúdo
de estudos no ensino de Artes Visuais, ou são estudadas de maneira superficial.
Paradoxalmente, são amiúde utilizadas no ensino de Língua Portuguesa, pelo
caráter narrativo visual de sua linguagem. Dentro da temática abordada, as HQs são
consideradas um importante objeto de estudos, seja como Arte Seqüencial, seja
como elemento presente no cotidiano dos estudantes. Essas questões nos levaram
a este estudo investigativo buscando analisar a relação existente entre as HQs e o
ensino de Artes Visuais. Para esta pesquisa, realizamos 20 entrevistas com
professores do ensino fundamental na cidade de Curitiba/PR, encontrando
evidências de que se atribui pouca importância para as HQs como objeto de estudo
crítico e que estas não são seriamente consideradas em relação a outros conteúdos.
Ao final, apresentamos uma proposta educativa para interpretação de imagens de
HQs, com o objetivo de incentivar a análise e a reflexão crítica em contextos de
ensino de Artes Visuais. Esperamos que os resultados deste trabalho possam
contribuir para uma reflexão do professor de Arte sobre o uso de HQs como objeto
de ensino. Se abordados na perspectiva da Cultura Visual, os quadrinhos podem ser
elos entre o universo visual cotidiano e a educação escolar, favorecendo a
compreensão mais consciente dos estudantes sobre o mundo e sobre si mesmos,
levando à revisão da função crítica da educação, no ensino de Arte, que vem sendo
relegada em favor da informação e instrução.
Palavras-chave: Histórias em Quadrinhos; Pedagogia Crítica; Cultura Visual
8
ABSTRACT
In the present research we investigate how teachers understand the
Sequential Art/comic books in the education of Visual Arts. The data analysis follows
the perspective of the education to the understanding of the Visual Culture and the
Critical Pedagogy of Art. During many decades, comics caused controversies and
were not accepted in schools. It was only from 1970 that comics started to be
included in the school curriculum. In post-modernity the field of the art has increased,
and the teaching started to emphasize the study of the classical arts as well as the
popular arts without distinctions, and at the same time demanding a relationship
between the children’s and adolescents’ everyday images and the school education.
Observing the relationship school and comics, it is noticed that comics are rarely
included in the contents of the Visual Arts studies, or only superficially touched.
Paradoxically they are often used in the teaching of Portuguese, because of the
narrative-visual character of its language. Within the approached subject, comics are
considered an important aspect to be studied as Sequential Arts as well as an
element present in students’ everyday life. These issues have leaded us to this
investigating study trying to analyze the relationship between comics and Visual Arts.
For this research, we interviewed 20 school teachers in the city of Curitiba/PR, and
we found out evidences that little importance is given to comics as an object of critical
study and that they are not taken seriously comparing to other contents. Finally we
present an educational proposition for the interpretation of the comics images, having
as objective to motivate the analysis and critical reflection in the context of the
teaching of Visual Arts. We hope that the results of this study will contribute to the
reflection of the teacher of art on the use of comics as a teaching device. If taken
from the perspective of Visual Culture, comics can become a link between the
everyday visual universe and the school education, favoring students’ conscious
comprehension of the world and of themselves, leading to the revision of the critical
function of education in the teaching of Arts, which has been relegated in favor of
information and instruction.
Key words: Comic Books; Critical Pedagogy; Visual Culture
9
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1– Maurício de Souza. Mônica Lisa,1989 ......................................................06
Figura 2 – Thais Gralik. O personagem Clara e o Gato Felizardo, 2002...................23
Figura 3 – Thais Gralik. O personagem Francisco, 2002..........................................24
Figura 4 – Ziraldo. Página dupla da história O Menino Quadradinho. p. 4-5.............30
Figura 5 – Ziraldo. Página dupla da história O Menino Quadradinho. p. 6-7.............30
Figura 6 Trechos da história Loja Proibida, publicada na Revista Disney Explora,
jun. 1999. p. 24-27 ....................................................................................................39
Figura 7 Trechos da história Loja Proibida, publicada na Revista Disney Explora,
jun. 1999. p. 29-30 ....................................................................................................40
Figura 8 – Julian Beever. Batman and Robin to the Rescue, s.d..............................58
Figura 9 Falas do personagem Loki sobre o Capitão América. Imagem da Revista
Heróis Renascem Vingadores, n. 1, dez.,1998. Não paginada.................................81
Figura 10 O pioneiro Yellow Kid. “O Menino Amarelo, que não falava por balões,
mas em textos escritos na roupa.” Imagem da Revista Nova Escola, abr.,1998.......83
Figura 11– Mônica no Nascimento de Vênus, 1992. Releitura de Maurício de Souza,
baseada na obra Nascimento de Vênus, de Sandro Botticelli. Acrílica s/tela 106 x
145,5 cm .................................................................................................................124
Figura 12 Imagem da Revista Heróis Renascem Vingadores, n. 5 abr., 1999. Não
paginada .................................................................................................................180
10
LISTA DE QUADROS E TABELAS
Quadro 1 – Roteiro de entrevista semi-estruturada para o estudo exploratório........96
Quadro 2 – Escolas em que os professores entrevistados lecionam......................102
Quadro 3 – Formação e perfil dos professores de Arte entrevistados ....................103
Quadro 4 – Formação e perfil dos professores de outras disciplinas entrevistados......
................................................................................................................................103
Quadro 5 Roteiro base para entrevista e categorias de análise Arte (e outras
disciplinas)...............................................................................................................107
Quadro 6 Roteiro base para a entrevista e categorias de análise selecionadas de
início para Português, Ciências e Matemática ........................................................107
Quadro 7 – Síntese das respostas – entrevistas nº
s
1, 2, 3 e 4 ..............................108
Quadro 8 – Síntese das respostas – entrevistas nº
s
5, 6, 7 e 8..............................108
Quadro 9 – Síntese das respostas – entrevistas nº
s
9, 10, 11 e 12........................109
Quadro 10 – Síntese das respostas – entrevistas nº
s
13, 14, 15 e 16 ....................109
Quadro 11 – Síntese das respostas – entrevistas nº
s
17A, 17B, 18A, 18B, 19 e 20.....
................................................................................................................................110
Quadro 12 – Categoria 1 - Trabalho com Imagens - referente à pergunta 1
– Arte ......
................................................................................................................................111
Quadro 13 – Categoria 1 - Trabalho com Imagens - referente à pergunta 1 –
Português, Ciências e Matemática..........................................................................111
Quadro 14 Categoria 2 - Tipos de Imagens que o Professor Trabalha - referente à
pergunta 2 – Arte.....................................................................................................112
Quadro 15 Categoria 2 - Tipos de Imagens que o Professor Trabalha - referente à
pergunta 2 – Português, Ciências, Matemática.......................................................112
Quadro 16 – Categoria - Leituras de Imagem – Arte........................................113-114
11
Quadro 17 – Categoria - Leituras de Imagem – Português..............................114-115
Quadro 18 Categoria 3 - Trabalho com Histórias em Quadrinhos - referente à
pergunta 3 – Arte.....................................................................................................129
Quadro 19 Categoria 3 - Trabalho com Histórias em Quadrinhos - referente à
pergunta 3 – Português, Ciências e Matemática..............................................129-130
Quadro 20 Categoria 4 - Desenvolvimento das Atividades sobre Quadrinhos -
referente à pergunta 4 – Arte ...........................................................................130-131
Quadro 21 Categoria 4 - Desenvolvimento das Atividades sobre Quadrinhos -
referente à pergunta 4 – Português, Ciências e Matemática ...........................131-132
Quadro 22 – Categoria 5 - Critérios Utilizados para a Escolha de Histórias em
Quadrinhos - referente à pergunta 5 – Arte......................................................132-133
Quadro 23 – Categoria 5 - Critérios Utilizados para a Escolha de Histórias em
Quadrinhos - referente à pergunta 5 – Português, Ciências e Matemática.............133
Quadro 24 – Categoria - Professores que não Trabalham com HQs ou Utilizam como
Recurso DidáticoArte ..........................................................................................134
Quadro 25 – Categoria - Professores que não Trabalham com HQs ou Utilizam como
Recurso Didático - Português, Ciências e Matemática ...........................................134
Quadro 26 Etapas de trabalho e avaliação no instrumento de mediação e análise
crítica.......................................................................................................................178
Quadro 27 – Níveis de compreensão, segundo Franz (2003a)...............................186
Tabela 1 – Freqüência de alunos e alunas na Gibiteca ..........................................206
Tabela 2 – Freqüência de alunos e alunas no Solar do Rosário.............................206
12
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
CEART – Centro de Artes - UDESC
CEFET/PR – Centro Federal de Educação Tecnológica do Paraná
DBAE – Discipline Based Art Education
ECA/USP – Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo
EJA – Educação de Jovens e Adultos
FAP – Faculdade de Artes do Paraná
HQs – Histórias em Quadrinhos
LDBEN – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
MEC – Ministério da Educação e Cultura
PCN – Parâmetros Curriculares Nacionais
SEED/PR – Secretaria de Estado de Educação do Paraná
UDESC – Universidade do Estado de Santa Catarina
UFPR – Universidade Federal do Paraná
13
SUMÁRIO
RESUMO...................................................................................................................07
ABSTRACT...............................................................................................................08
INTRODUÇÃO..........................................................................................................15
CAPÍTULO I .............................................................................................................20
1.1 O LUGAR DE QUEM FALA.................................................................................21
1.2 PROBLEMA DE PESQUISA..............................................................................27
1.2.1 Tema e objetivos da pesquisa..........................................................................36
1.3 JUSTIFICATIVA ..................................................................................................37
CAPÍTULO II ............................................................................................................44
2.1 CONCEITUALIZAÇÕES E TENDÊNCIAS DO ENSINO DE ARTES VISUAIS ...45
2.1.1 A década de 1980 e posteriores.......................................................................50
2.1.2 Arte-educação na pós-modernidade ................................................................54
2.2 AS ABORDAGENS SOCIOCULTURAIS EM ARTES VISUAIS ..........................59
2.2.1 A Cultura Visual como um campo de estudos.................................................60
2.2.1.1 A educação para a compreensão crítica da Cultura Visual...........................64
2.2.2 A Pedagogia Crítica da Arte............................................................................69
2.2.2.1 As teorias feministas e as abordagens socioculturais..................................74
2.2.2.2 A Antropologia como fundamento das abordagens socioculturais..............78
2.2.3 Introdução à história das histórias em quadrinhos ..........................................82
CAPÍTULO III ...........................................................................................................87
3.1 METODOLOGIA.................................................................................................88
3.2 ESTUTO EXPLORATÓRIO.................................................................................95
3.2.1 Roteiro base e esboço de categorias de análise............................................. 96
14
3.2.2 Síntese dos resultados obtidos no estudo exploratório................................... 96
3.3 ESTUDO EMPÍRICO...........................................................................................99
3.3.1 Perfil das escolas e dos professores entrevistados...................................... 102
3.3.2 Roteiro base e categorias de análise ........................................................... 106
3.3.3 Análise de dados......................................................................................... 107
3.3.3.1 Quadros síntese de respostas................................................................... 108
3.3.4 Categorias 1 e 2 .......................................................................................... 110
3.3.4.1 Outras categorias identificadas nas respostas dos entrevistados............. 113
3.3.4.2 Descrição e interpretação de dados: categorias 1 e 2 .............................. 115
3.3.4.3 Interpretação e avaliação crítica: categorias 1e 2 ..................................... 117
3.3.5 Categorias 3, 4 e 5.........................................................................................129
3.3.5.1 Outras categorias identificadas nas respostas dos entrevistados...............133
3.3.5.2 Descrição e interpretação de dados: categorias 3, 4 e 5.............................135
3.3.5.3 Interpretação e avaliação crítica: categorias 3, 4 e 5 ..................................137
3.3.6 Conseqüências do estudo para o ensino de Artes Visuais.............................170
3.4 PROPOSTA DE INTERPRETAÇÃO E ANÁLISE CRÍTICA DE IMAGENS DE
HQS PARA O ENSINO DE ARTES VISUAIS ....................................................... 175
3.4.1 O significado do Instrumento de Mediação e Análise Crítica de imagens.... 176
3.4.2 Procedimentos na proposta de trabalho com o Instrumento de Mediação... 177
3.4.2.1 A imagem: Heróis Renascem Vingadores................................................. 178
3.4.3 Âmbitos de compreensão............................................................................. 181
3.4.4 A avaliação e as compreensões................................................................... 186
3.4.4.1 Avaliação inicial, avaliação de processo e avaliação final......................... 187
CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................. 189
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................................... 196
APÊNDICE............................................................................................................ 205
APÊNDICE A – Relação entre freqüência e gênero nos cursos de HQs da Gibiteca e
Solar do Rosário......................................................................................................206
APENDICE B Modelos de autorização utilizados para entrevistas no estudo
exploratório e estudo empírico................................................................................207
APÊNDICE C Amostras de entrevistas realizadas no estudo exploratório e estudo
empírico ..................................................................................................................208
APÊNDICE D – Sinopse da mini-série Heróis Renascem Vingadores....................212
15
INTRODUÇÃO
Esta pesquisa tem origem em uma trajetória que passa por experiências
pessoais, que vão desde o envolvimento com a Arte Seqüencial/histórias em
quadrinhos por meio de ilustrações e a criação de tiras humorísticas até a prática de
ensino de Artes Visuais em escolas públicas.
No início do primeiro capítulo, citamos os motivos que levaram a este estudo
investigativo através de um relato pessoal O Lugar de Quem Fala narrando
brevemente nossa aproximação com essa arte. Em seguida, delimitamos o problema
de pesquisa, citando ainda outros motivos que se fundamentam em abordagens e
teóricos que também justificam o presente trabalho.
Um dos motivos que levou a questionamentos, originando esta pesquisa, é o
fato de que nas escolas, “os ventos sopram” principalmente em direção às obras e
aos artistas consagrados, que quase sempre são colocados como único conteúdo
no ensino de Arte
1
, desmerecendo outras linguagens visuais que também poderiam
ser significativas. Nas escolas onde trabalhamos, encontramos práticas superficiais
para ensinar sobre histórias em quadrinhos, que se restringiam a poucos elementos
dessa linguagem. Outro motivo relacionava-se à quantidade e diversidade de
conteúdos implícitos nessas histórias. O universo das HQs oferece uma imensa
variedade de histórias e é necessário saber selecionar temas que contenham valor
intrínseco e que sejam significativos para ampliar o conhecimento dos alunos. Tais
escolhas podem ser particularmente difíceis, principalmente para aqueles que têm
pouco contato com as HQs.
Como decorrência do trabalho prático de criação, e de observações feitas
sobre a diversidade de conteúdos nas produções da área dos quadrinhos
2
, surgiram
questionamentos a respeito de como as pessoas lêem e interpretam as imagens.
1
Conforme os PCNs/97 (v. 6, p.19), utilizamos neste trabalho a grafia Arte, “quando se trata de área
curricular [...] e nos demais casos, arte.”
2
Histórias em quadrinhos.
16
Este assunto mais tarde viemos a saber era também objeto de estudos da Prof.ª Dr.ª
Teresinha S. Franz. As teorias de Franz
3
são esclarecedoras neste sentido as
pessoas não compreendem as imagens da mesma maneira e podem revelar
diferentes níveis de complexidade de compreensão, que vão desde os mais
ingênuos até os mais complexos, críticos e elaborados. Essas teorias, são
abordadas dentro da temática sobre a Cultura Visual
4
no segundo e terceiro
capítulos e formam parte das bases para a fundamentação teórica deste estudo.
Talvez em decorrência de sua própria história, a Arte Seqüencial/HQs vem
sendo pouco valorizada em relação a outros conteúdos no ensino de Artes Visuais.
Décadas atrás, as histórias em quadrinhos causaram muitas polêmicas e não eram
admitidas nas discussões do ensino acadêmico (EISNER, 1989). Somente a partir
de 1970, segundo Quella-Guyot (1994) e Rama e Vergueiro (2004) é que deixariam
de ser rejeitadas pelas escolas e outros países passariam a incluí-las em seu
currículo escolar. No Brasil, as HQs passaram a contar com recomendação do MEC,
nos Parâmetros Curriculares Nacionais,
5
em 1997/98.
Segundo Quella-Guyot (1994), as HQs entraram nas escolas, como
decoração para exercícios gramaticais e mediante o desejo de ensinar a língua.
Hoje, muitas disciplinas se utilizam largamente delas para ensinar suas matérias,
enquanto o ensino de Artes Visuais deixa de explorar esse modo de expressão
artística. Nem todos os cursos de licenciatura em Artes Visuais, oferecem suporte
para que professores trabalhem com essa linguagem. Atualmente, os cursos
enfatizam o preparo de sujeitos para a produção artística consagrada. Embora
haja também uma preocupação com as demais imagens do cotidiano, no ensino de
hisrias em quadrinhos, a tendência denota superficialidade.
Por outro lado, quando se trata de abordar histórias em quadrinhos, aparecem
sempre duplicidades ou contradições: são consideradas um perigo para alguns, mas
muito válida para outros. Pesquisando acerca da existência de teses e dissertações
na área de Artes Visuais, encontramos maior produção acadêmica sobre quadrinhos
em Educação, Letras e Comunicação. Um dos trabalhos encontrados nessa
pesquisa, sobre as tiras humorísticas de Maurício de Souza, pertencente a Giovana
Scareli (2003) aluna do curso de Pedagogia, cita que as HQs, ou as tiras
3
Franz (2000, 2001, 2003a, 2003b, 2003c, 2003d, 2005a, 2005b).
4
Hernández (1998, 2000, 2001, 2003a, 2005, 2006, 2007).
5
Ver PCN/1997, vol. 2, Português, 1ª a 4ª series, p. 37, 42 e 82 e PCN, vol. 6, Arte, 1997/98.
17
humorísticas, muitas vezes são utilizadas por professores apenas como um recurso
didático e em seguida são descartadas.
Os teóricos atuais da Educação enfatizam que o ensino de Arte deve estar
conectado com a arte pós-moderna sem fronteiras e a necessidade crítica e plural
da educação contemporânea. Nota-se hoje uma tendência crescente para estudos
de imagens e outros artefatos da cultura visual, devido a sua importância como
mediadores de significados. As HQs incluem-se nesse contexto, pois são uma arte
popular amplamente conhecida e exercem fascínio natural sobre o público infantil e
juvenil.
No modernismo havia uma concepção de arte baseada em padrões estéticos
universais. Segundo Mason (2001), hoje critica-se o projeto estético moderno, que
se baseia em distinções estilísticas entre as Belas Artes e a arte popular. Nesse
sentido, as diretrizes curriculares para o ensino fundamental de Educação Artística
da SEED/PR (2004/2005), destacam que necessidade de valorização de
diferentes culturas e de combater visões excludentes que perpetuam hierarquias
entre Belas Artes ou artes eruditas e artes do povo ou menores, considerando
ambas como importantes fontes geradoras de significado para a compreensão do
mundo.
Em teoria, o professor de Artes Visuais deveria ser mais bem habilitado para
trabalhar com as possibilidades da Arte Seqüencial. Mas considerando a história
conturbada entre HQs e Educação, percebemos a necessidade de questioná-las
segundo as perspectivas dos professores. Surge então, a necessidade de investigar
as relações dessa linguagem com o ensino de Artes Visuais, tentando responder a
principal pergunta que guia esta pesquisa:
Como os professores de ensino fundamental se relacionam com a Arte
Seqüencial/histórias em quadrinhos no ensino de Artes Visuais?
O segundo capítulo trata da revisão bibliográfica sobre o marco teórico.
Compreende as teorias do ensino de Arte, as abordagens socioculturais e estudos
sobre quadrinhos, que fundamentam o estudo empírico e a análise dos dados. Esse
capítulo inclui as conceitualizações e tendências do ensino de Artes Visuais,
iniciando por um breve histórico a as tendências atuais. O texto aborda
principalmente as teorias da Cultura Visual, educação para a compreensão crítica da
arte, Pedagogia Crítica e histórias em quadrinhos.
18
As abordagens socioculturais dão ênfase às transformações na arte e na
sociedade contemporâneas que levam à necessidade de propostas educativas mais
críticas e atentas à vida social, apontando para o desafio de contribuir para a
construção crítica da realidade sociocultural (RICHTER, 2004; FRANZ, 2004).
Para os teóricos
6
que seguem essas abordagens, a arte é uma representação
complexa que traz consigo contradições inerentes à sociedade e à cultura na qual foi
produzida. Nessas teorias, considera-se a arte como uma representação
sociocultural e a identificação e compreensão de seu contexto de origem como
fundamentais para sua interpretação. As HQs por vezes trazem conteúdos
contraditórios e dentro dessa linha de pensamento não podem ser vistas apenas
como desenhos, pois envolvem idéias, conceitos, valores, ideologias e crenças.
No terceiro capítulo, abordamos a metodologia empregada para o estudo
investigativo, incluindo uma síntese dos resultados obtidos no estudo exploratório.
Nas tendências atuais em educação destaca-se sobretudo, a necessidade e o
papel fundamental do professor para atuar como um mediador entre a compreensão
dos alunos, suas experiências e as imagens (FRANZ
7
; HERNÁNDEZ, 1998, 2000,
2007; CORRÊA, 2004, 2005). O professor não somente assume-se como
profissional, mas como aprendiz e pesquisador. Devido a sua importância nesse
processo, deu-se prioridade para investigar através de entrevistas, como estes
compreendem e utilizam as HQs no ensino fundamental. Segundo Franz (2000),
Demo (2000) e Duarte (2005), a entrevista é uma fonte de acesso ao mundo de
conceitos e significados e práticas individuais. Detectar pontos positivos ou
negativos, concepções, práticas ultrapassadas ou diferenciadas colaboram para
realizar uma reflexão crítica sobre o ensino de histórias em quadrinhos. Conforme
Demo (2000), somente conhecendo uma realidade em profundidade é que se pode
falar e atuar com segurança sobre ela.
Na primeira fase de investigação, realizamos um estudo com alunos da
Gibiteca, em Curitiba/PR, que trouxe evidências sobre o problema de pesquisa, bem
como demonstrou aspectos sociais da arte dos quadrinhos indicando diferenças e
6
Freedman (2000, 2001); Mason (2001); Pollock (2003); Chalmers (2003); Mirzoeff (2003); Efland,
Freedman, Sthur (2003); Efland (2005); Steinberg e Kincheloe (2004); Richter (2004); Corrêa (2004,
2005); Franz (2000, 2001, 2003a, 2003b, 2003c, 2003d, 2004, 2005a, 2005b); Hernández (1998,
2000, 2001, 2003a, 2005, 2006, 2007).
7
Franz, idem.
19
preferências decorrentes de gênero, levantando novas questões que podem ser
investigadas futuramente.
O estudo empírico propriamente dito, consiste em 20 entrevistas semi-
estruturadas individuais com professores de Arte e outras disciplinas, analisadas do
ponto de vista da teoria da educação para a compreensão da Cultura Visual,
Pedagogia Crítica e estudos sobre HQs. Trata-se de uma pesquisa qualitativa
interpretativa crítica. A análise de dados, orienta-se pelas dimensões da crítica
educativa explicitadas por Elliot Eisner (1998) e estrutura-se deste modo, em
descrição, interpretação e avaliação crítica.
Com base nesta análise, apresentam-se as conseqüências deste estudo para
o ensino de Artes Visuais, desejando que os resultados também possam contribuir
para a reflexão de outros professores desta área. A análise revela práticas
pedagógicas que em sua maioria concebem as histórias em quadrinhos apenas
como trabalhos manuais, em geral padronizadas e destituídas de senso crítico.
Denotam valorizar a cultura local, mas mantêm uma posição passiva e à parte dos
processos globalizantes e hegemônicos das indústrias culturais, demonstrando a
necessidade de estabelecimento de pontos de contato que articulem entre
especificidades locais e códigos dominantes da arte dos quadrinhos, dentro de uma
postura crítica e reflexiva.
Nesse mesmo capítulo, ao final, incluímos uma proposta de trabalho para
mediação e análise crítica de imagens de histórias em quadrinhos, que associa
estudos da Pedagogia Crítica, com estudos da Cultura Visual e Educação, segundo
Hernández (1998, 2000, 2001, 2003a, 2007), Franz (2003a) e outros teóricos. Não
se pretende alcançar originalidade nesta proposta, uma vez que tem por base um
instrumento de análise de imagens, criado por Franz em 2003, para a compreensão
crítica de obras de arte. Mas tem importância para este estudo, ligado a um ensino
que pretende auxiliar alunos e professores a irem além da simples reprodução
mecânica e leituras acríticas de histórias em quadrinhos.
Por fim, este é um trabalho que convida para uma reflexão dos professores de
Artes Visuais, sobre suas próprias práticas pedagógicas no que se refere ao ensino
de histórias em quadrinhos, considerando sua importância como agentes que
contribuem para a configuração deste ensino.
.
20
CAPÍTULO I
21
1.1 O LUGAR DE QUEM FALA
Como professora, comecei lecionando Artes Plásticas e Música em uma
escola de educação complementar. Dos diversos estágios que realizei em escolas
particulares e públicas, aquele que fiz em 1984, em uma escola do Estado, no bairro
do Ahú, em Curitiba, para mim foi dos mais significativos. Consistiu em ensinar
desenho animado e montar pequenos filmes de animação com os alunos, com o
apoio da Cinemateca do Museu Guido Viaro. Por outro lado, a gravura envolveu-me
bastante e, durante algum tempo, pude me dedicar a ela, sendo que logo depois
entrei para o mercado de trabalho, em agência de propaganda, e mais tarde,
trabalhando em jornal com arte final e diagramações.
Depois de alguns anos de permanência no jornal, saí com a intenção de voltar
para a gravura. Mas alguma coisa havia mudado: pintar quadros ou fazer gravuras
não fazia mais sentido. Uma fala do Prof. Dr. Emílio Burucua, em um colóquio
realizado na UDESC em 2006, sobre o processo que possibilitou a passagem da
pintura à arte contemporânea, pode ilustrar meu pensamento e essa passagem da
minha vida: “a pintura não pode mais voltar a suas fontes” (informação verbal)
8
.
Pintar também foi algo que me pareceu uma forma de arte que havia esgotado seu
tempo, já o desenho, nunca deixou de fazer parte de minha vida.
Como eu tinha mais contato com as dias, o caminho mais natural foi o de
me ligar à área de comunicação visual. Passei a realizar muitos trabalhos de criação,
a ilustrar e criar personagens. A Escola de Dança onde uma de minhas irmãs
leciona, produz em média três espetáculos por ano. Minha ligação com a escola
permitiu-me a criação desde material gráfico para eventos, até a produção de
adereços e cenários para os espetáculos de Ballet Clássico e Ritmos Modernos.
Esta ligação indireta com a educação acontecia também com minha outra irmã que
8
BURUCUA, José Emílio. A iconografia de Ulisses, releituras moderna e contemporâneas do
personagem. In: I Colóquio Estadual de História, Teoria e Crítica da Arte. A Obra de Arte e Leitura
de Imagens. Florianópolis, UDESC, jun. de 2006.
22
trabalhava no ensino fundamental em escola particular, produzindo interações sobre
assuntos e problemas de ensino. Uma das observações que fazíamos era sobre o
excesso de conteúdos que se cobra para ensinar e aprender, em função da
concorrência das escolas particulares, para estar no topo dos escores do vestibular.
Isso aliado ao excesso de informação promovida pelas mídias, gera um stress muito
grande entre os professores e os alunos.
Os comentários sobre os problemas das escolas e ilustrações recentes que
eu havia realizado para profissionais da comunicação e da educação, convergiram
para a produção de tiras humorísticas destinadas ao público infanto-juvenil. Essa
produção não poderia ser apenas espontânea, no sentido de uma expressão livre
para dizer tudo o que se pensa, como defendem artistas que trabalham
fundamentados pela idéia de que não pode haver censura de espécie alguma para a
expressão artística, seja qual for o meio. É muito comum, encontrar produções
justificadas com base nesse pensamento, que trazem críticas e protestos sem
reflexão. Como por exemplo, os que surgiram dentro do lema criado na década de
1970, pelos quadrinhos underground. Naquela época, os quadrinhos, a fim de se
oporem aos valores dominantes, procuravam celebrar o sexo e as drogas (SILVA,
2002). A fim de legitimar seu perfil transgressivo, “o lema era a total espontaneidade,
não se deixando afetar por qualquer espécie de código de ética oficial.” (SILVA,
2002, p. 21). Até nossos dias essas propostas alcançam repercussão.
Ligada ao processo de criação, havia uma preocupação com relação à
qualidade das imagens recebidas diariamente, nem sempre agradáveis e muitas
vezes banalizadas. Em geral, o artista de HQs ou tiras humorísticas, faz seu trabalho
e lhe ocorre uma comunicação com o leitor. Mas não é comum a preocupação do
artista com os efeitos nos âmbitos social ou individual que suas imagens possam
causar. Para representar suas idéias, alguns fazem uso da linguagem de modo
radical, a fim de chamar a atenção do leitor. Nisso está a preocupação pelo sucesso
da produção e não com os efeitos que possa produzir. Para isso, o artista não poupa
o leitor, que, por sua vez, pode possuir ou não capacidade crítica.
Comecei a questionar as preferências em torno do lado degradante do humor.
Observava que algumas pessoas apreciavam tiras humorísticas ou HQs, sem critério
algum. Compartilhava do pensamento de Saliba (in MATTAR, 2003, p. 171),
segundo o qual, em nossa época, uma “dificuldade, cada vez maior, de definir e
diferenciar o ‘riso bom’ do ‘riso mau’.” Segundo ele, nos desenhos de humor, os
23
níveis de crueldade duplicaram desde os tempos do “Amigo da Onça”. Tornou-se
uma preocupação sobre o modo como as pessoas lêem e interpretam as imagens e
como isso estaria relacionado com sua forma de pensar e atuar em função de suas
concepções. Se, de fato, as imagens que recebemos diariamente, em seu conjunto,
ou isoladas, ficam gravadas, mesmo que parcialmente em nossas mentes,
influenciando nosso inconsciente, devemos preocupar-nos com a qualidade, com os
modos de compreender essas imagens e com seus possíveis efeitos no leitor.
Assim, minha própria produção de tiras humorísticas deveria estar de acordo
com estes pressupostos: produzir algo que não fizesse uso de recursos agressivos
ou humilhantes e, ao mesmo tempo, tivesse um toque de humor. Cada tirinha
9
produzida transformou-se em um exercício dentro desta perspectiva. A escolha dos
personagens foi decidida em função desta concepção (Figuras 2 e 3).
Pouco tempo depois de começar a produzir tiras humorísticas, vi-me
novamente às voltas com o ensino de Arte. Para proporcionar um ensino atualizado
e adequado para meus alunos, pesquisava sobre os conteúdos e sobre o modo de
aplicá-los. Isso estava muito relacionado com o grau de envolvimento que poderia
haver entre eles e as tarefas propostas. Nas escolas públicas, muitos alunos
freqüentam a escola apenas como obrigação e até para se alimentar. Este e outros
motivos causam desinteresse dos alunos pelo aprendizado e também acabam
afetando os professores. Por isso, a cada aula, havia necessidade de modificações
nos conteúdos ou nos recursos didáticos, a fim de adequar ao contexto.
Minha experiência com a arte dos quadrinhos poderia ser bastante útil nas
escolas, ensinando muitas técnicas de desenho para os alunos. Porém, à medida
9
Tira humorística.
Figura 2 – Thais Gralik. Tira humorística. O personagem Clara e o Gato Felizardo, 2002.
24
Figura 3 – Thais Gralik. O personagem Francisco, 2002.
que nos aproximamos do universo das HQs, descobrimos que é um universo
extremamente abrangente e existe uma imensa variedade de publicações. Suas
histórias, tanto podem ser boas, ruins, “inocentes” ou não. As HQs não constituem
apenas desenhos, nelas estão envolvidos idéias, conceitos, crenças e valores. Por
essa razão, a mim não satisfazia a idéia de apenas transmitir habilidades técnicas.
Creio que todo o conhecimento, matéria ou conteúdo que se ensina, deve implicar
uma reflexão do professor e, se possível, dos alunos. É como diz Paulo Freire (1997,
p. 37), “transformar a experiência educativa em puro treinamento técnico é
amesquinhar o que há de fundamentalmente humano no exercício educativo.”
A quantidade e a diversidade de conteúdos fazia com que me preocupasse
em saber como os alunos poderiam aprender a interpretar e não somente reproduzir
mecanicamente ou consumir HQs. Sempre acreditei na responsabilidade social
daquele que ensina, mas o que eu observava nas escolas fez com que tais
preocupações acabassem se estendendo a outros professores.
Um exemplo de Quella-Guyot (1994) mostra algumas preocupações que
podem ocorrer quando se pensa em ensinar sobre HQs nas escolas. O desenhista
Giraud e o especialista Moliterni criaram, na década de 1970, em Vincennes, na
França, um ensino prático de HQs. A. Roux, então, escreveu uma obra chamada La
bande dessinée peut être éducative (L’École, 1970), em que esse autor “se colocava
o problema de apresentar a HQ à escola, mas não a escola à HQ. Em outras
palavras, que atitude se deveria ter diante dessa literatura: ensinar com ela, ensinar
por meio dela ou simplesmente ensiná-la?” (QUELLA-GUYOT, 1994, p. 43).
O caso mostrado por esse autor ilustra como as HQs geraram polêmicas,
quando se pensou em trabalhar com elas nas escolas. Ainda hoje existem críticos de
arte mantêm preconceito com relação a esta arte.
A questão da diversidade, também esbarrava com o problema da escolha de
25
imagens decorrente da abrangência do extenso campo em Artes Visuais. Para
alguns professores é motivo de preocupação. Porém, muitas vezes, essas escolhas
são arbitrárias. Conforme Almeida (1999, p. 73) assinala, hoje é importante que o
professor fique “atento às imagens consumidas por seus alunos, resgatando na
cultura da imagem o que é relevante para a formação do indivíduo.”
Como tinha a idéia de ensinar Arte Seqüencial em algumas turmas,
interessava-me sobre o modo pelo qual os professores ensinavam sobre quadrinhos
em suas aulas. Em certa ocasião, em um dos colégios
10
em que eu lecionava, pude
verificar que a Arte Seqüencial era ministrada somente nas séries. O conteúdo
teórico, era restrito a apenas duas ou três frases e depois disso, a atividade
relacionada resumia-se a solicitar ao aluno para fazer uma história em quadrinhos.
Por outro lado, havia um trabalho sempre em torno das mesmas obras de arte.
Em outra escola
11
em que eu também trabalhava, a preocupação dos
professores de Arte era a de ensinar a fazer “releituras de obras de arte”. Entretanto,
uma das professoras regentes do ensino de a que pude observar,
freqüentemente fazia uso de HQs para ensinar Português. Os alunos de vez em
quando desenhavam histórias, a fim de aplicar os conteúdos ensinados pela
professora regente. A decoração da sala ficava sob sua responsabilidade, assim
como a decoração das outras salas, ficava a cargo das outras professoras regentes.
Nas salas, a decoração era sempre substituída em função dos conteúdos de
Português, de datas e de outros assuntos com muitos Mickeys, Minies, Mônicas,
Bidus e Snoopys mimeografados, pintados em série pelos alunos, que se
substituíam a fim de “dar um ar sempre renovado”, demonstrando o que eles
estavam estudando. Tudo isso refletia uma boa intenção dos professores regentes,
mas também revelava uma atitude acrítica diante dessas imagens.
Com relação a estes assuntos, havia indiferença por parte dos professores de
Arte. No planejamento da disciplina, eram incluídos apenas os principais
movimentos artísticos, obras e artistas já consagrados. Outras manifestações
artísticas, como cinema, propaganda e histórias em quadrinhos, não eram incluídos.
Haveria preconceito com relação às histórias em quadrinhos também entre os
professores? Assuntos relacionados à Cultura Visual, pareciam não ser
considerados importantes. Isso fez com que a preocupação anterior existente com
10
Escola Pública de 1º e 2º grau, no Bairro de Santa Felicidade em Curitiba, 2003.
11
Escola Pública de 1º e 2º grau, na Cidade Industrial de Curitiba, 2003.
26
as pessoas a respeito das imagens fora da escola, viesse cada vez mais à tona,
estendendo-se aos professores. Passei a questionar essas leituras e a preocupar-
me também com aqueles que trabalhavam com histórias em quadrinhos em sala de
aula. Quais seriam os critérios, que encontravam para a escolha de suas imagens?
Considerando também os hábitos dos alunos, o que poderia ser adquirido e
transmitido em virtude de suas escolhas?
Essas questões geraram este estudo, com a finalidade de analisar mais
profundamente práticas de ensino ligadas à Arte Seqüencial, de modo que aqueles
que trabalham com HQs nas escolas também possam fazer uma reflexão a respeito.
27
1.2 PROBLEMA DE PESQUISA
O ensino contemporâneo de Arte volta-se principalmente para o fazer e o
pensar artísticos, bem como a contextualização histórica, mas continua centrando-se
em obras de arte consideradas como "universais, estáveis e únicas." (HERNANDEZ,
2000, p. 46). Entretanto, há muito mais do que isso. Não podemos mover-nos
apenas em direção ao passado ao selecionar os conteúdos nas aulas de Artes
Visuais. É preciso pensar no futuro e, principalmente, no presente. O campo das
Artes Visuais é extenso e atualmente amplia-se para além de suas fronteiras.
Nosso cotidiano está cada vez mais repleto de imagens das mídias e novas
tecnologias, que atuam em nossa mente, mediante o cinema, a televisão, a Internet
e os meios impressos. A imensa quantidade e a velocidade com que estas imagens
são veiculadas faz com que aprendamos por meio delas inconscientemente
(BARBOSA, 2003). Para Stuart Hall (apud GIROUX, 2003), as mídias e as novas
tecnologias moldam o significado e o comportamento humanos e regulam nossas
práticas sociais a todo instante. As imagens massificadas preenchem nossa vida a
tal ponto, que condicionam nossos mais íntimos desejos e percepções.
Ilustrações e Arte Seqüencial são muito comuns e largamente consumidas
em nossa sociedade. Crianças e adolescentes têm acesso diário à cultura das
mídias, nas quais estas artes estão presentes e, segundo Hernández (2000), muitas
vezes sem o reconhecer, fazem uso de valores, crenças e significações que as
mídias veiculam, para dar sentido ao mundo em que vivem. Diante das
transformações na sociedade contemporânea e das relações que se produzem,
surgem novas perguntas entre os educadores. Como mediar as experiências que as
crianças e os adolescentes têm com as mídias, quando se quer que aprendam
também a interpretar e não apenas consumir ou “apreciar”?
Conforme Ramalho (2006), se considerarmos o universo das imagens, desde
o início de sua história até nossos dias, é um campo imenso. Nós, professores,
ficamos aturdidos quando temos que selecionar imagens. As HQs de maneira
28
semelhante, oferecem uma diversidade muito grande de histórias e constituem um
universo extremamente abrangente. O uso do off-set, a partir de 1965, ampliou
sobremaneira as possibilidades de publicação de HQs (SILVA, 2002). À grande
quantidade de publicações corresponde outra de variedades de conceitos, idéias,
valores e crenças dos quais HQs são portadoras. Dentro deste universo, é
necessário saber selecionar temas que contenham valor intrínseco e que sejam
significativos para ampliar o conhecimento dos alunos. Para aqueles que estão
pouco familiarizados ou têm a intenção de trabalhar com esta arte de maneira mais
ampla, essas escolhas podem ser particularmente difíceis. É da competência do
professor selecionar dentro desse universo e auxiliar para que os próprios alunos
aprendam a selecionar e a interpretar criticamente essas imagens.
Entretanto, quando os professores ensinam Artes Visuais nas escolas, as
HQs, parecem ser colocadas como menos importantes. As histórias em quadrinhos,
particularmente, durante muito tempo, foram consideradas como indignas de estudo
acadêmico. O exemplo de Quella-Guyot (1994), que citamos anteriormente,
demonstra como as HQs geravam preocupações entre teóricos e educadores, que
se perguntavam que atitude deveriam tomar diante das HQs.
Hoje, os quadrinhos são uma arte oficialmente reconhecida, porém os
debates em torno delas geralmente são polêmicos. Em décadas anteriores, códigos
de ética foram elaborados em muitos países temerosos da expansão dos comics
americanos. A fim de regular a produção de HQs, a Itália, em 1938, criou uma lei de
censura e normas a que os editores deveriam obedecer, a qual repercutiu em muitos
países. No Brasil, em 1948 a Associação Brasileira de Educadores criou um código
de ética e, em 1956, segundo Scareli (2003) a Secretaria da Educação e Cultura da
Prefeitura de São Paulo elaborou um parecer que proibiu a entrada de histórias em
quadrinhos nos parques infantis e nas bibliotecas do município.
Ainda existem artistas e críticos de arte que demonstram preocupação ou até
preconceito com relação à arte dos quadrinhos. Em uma reportagem
12
sobre uma
mostra de Roy Lichtenstein, que permaneceria no Museu Oscar Niemeyer, de
dezembro de 2005 a março de 2006, o crítico de arte Agnaldo Farias, declarou:
A partir de imagens vulgares e banais, extraídas de cartuns, histórias em
quadrinhos e anúncios publicitários, Lichtenstein demonstrou que as
12
Artigo publicitário sem assinatura. Pop arte no Mon. Revista View, Curitiba, n. 62, p.18-20, dez.
2005.
29
imagens veiculadas pelos canais de comunicação de massa são
meticulosamente produzidas com a finalidade de esvaziar o pensamento,
rebaixar a leitura e a escrita, transformar a fala numa forma de expressão
repleta de gírias e balbucios sem sentido.
Ziraldo é um artista que demonstra preocupações, embora sob outras formas.
Hoje com mais de 70 anos, é autor de desenhos de humor, tiras humorísticas e
histórias em quadrinhos. Na história O Menino Quadradinho, que foi editada em
1989 pela Editora Melhoramentos, quase dez anos depois de ter criado O Menino
Maluquinho, em 1980, Ziraldo o demonstra. Esta história revela a preocupação com
a importância que se ao visual em relação às palavras, mediante os problemas
do personagem um menino preso por atrativos formais das HQs e indiferente à
leitura das palavras.
Em um trabalho de leitura de imagem
13
, realizado sobre algumas imagens
dessa obra, pudemos analisar mais profundamente como o autor fez para dizê-lo. A
história é dividida em duas partes: uma construída por imagens e outra por palavras.
Na primeira parte, usando metalinguagem, Ziraldo constrói sua narrativa e
coloca o leitor diante de um duplo cenário representando uma história em
quadrinhos (Figuras 4 e 5). O duplo cenário – um alegre colorido e ensolarado – com
o menino por trás das “grades” de uma janela, que também representam os espaços
em branco dos quadrinhos; e outro, que representa o verso deste cenário, ou o que
“há por trás” das histórias em quadrinhos. No cenário do verso, o autor representa os
múltiplos caminhos que o menino pode percorrer com sua imaginação. Aludindo aos
mistérios da mente humana, tal como os níveis de pensamento que podem estar em
planos elevados, mas também descer a níveis que não se revelam.
A imagem sugere que o leitor observe os diferentes caminhos que o menino
com sua imaginação e liberdade pode percorrer. Uma liberdade que pode estar
limitada pelo próprio espaço físico dos quadrinhos ou pelo excesso de atração que o
menino possa sentir pelas imagens das histórias em quadrinhos tornando-o preso.
Sugere, ainda, que entrando neste universo, o menino pode “sair de cena”, como
forma de escapismo e experiência de prazer, fugir, esconder-se, deixar a mente
vagar por muitos caminhos, mergulhado em fantasias. Na segunda parte da história,
as palavras tornam-se as protagonistas para demonstrar sua importância nas
histórias em quadrinhos.
13
Artigo realizado durante o Curso de Mestrado em Artes Visuais. UDESC, 2º sem. de 2005.
30
Porém, como explica Ramalho (2006, p. 6), não a configuração, “mas o
conceito de arte também muda ao longo do tempo e do espaço [...] além dos modos
de ver.” Conforme Franz (2001, p. 15), o conceito sobre o que é arte mudou muitas
vezes no decorrer da história.” Segundo essas autoras, muitas imagens antigas que
classificamos como arte hoje, não eram consideradas como tal no contexto de sua
criação. Para Ramalho (2006, p. 6),
Figura 4 – Ziraldo. Página dupla da história O Menino Quadradinho. p. 4-5.
Figura 5 – Ziraldo. Página dupla da história O Menino Quadradinho. p. 6-7.
31
o tempo, somado a questões culturais complexas, acaba transformando
imagens religiosas, ou imagens míticas, histórias em quadrinhos, ou
imagens puramente informativas, como os cartazes de Toulouse-Lautrec
em obras de arte.
Outro trecho da reportagem
14
citada ilustra essa mudança de conceito,
quando menciona que Lichtenstein e outros artistas, após a Segunda Guerra,
“defendiam uma arte que deveria comunicar-se com o público com símbolos
retirados do imaginário popular e recusavam a separação entre arte/vida.”
Lichtenstein questionava o próprio conceito de arte na era da reprodução de massa,
segundo a curadora da mostra “Vida Animada”, de Roy Lichtenstein, Lisa Phillips
15
.
Conforme teóricos da educação, a arte-educação também é modelada pelo
mundo da arte (HERNÁNDEZ, 2001; BRENT WILSON, 2005b; EFLAND, 2003,
2005). Assim, pressupõe-se que este ensino deveria estar conectado com o
pensamento da arte pós-moderna. O modernismo havia estabelecido padrões
morais, políticos, intelectuais e estéticos que os pós-modernistas questionam,
contrapondo-se às produções instituídas pela História da Arte oficial, reconhecendo
a arte elaborada por diferentes grupos e minorias culturais. Segundo Mason (2001)
criticou-se o projeto estético moderno, porque se baseava em distinções estilísticas
entre a arte erudita e a arte popular. Na opinião de Chalmers (2003, p. 143),
os educadores artísticos hão de reconhecer que todas as culturas possuem
definições de qualidade e que os membros de todos os grupos podem
encontrar, dentro do mundo artístico de cada um deles, exemplos de obras
excelentes, medíocres ou pobres (tradução nossa).
O projeto pós-moderno busca alcançar uma forma mais democrática em arte
educação (FREEDMAN, 2000) incluindo a arte das minorias e reconhecendo o valor
de outras culturas, assim como um novo gosto pela variedade e pluralidade
(CHALMERS, 2003). Mas nem sempre o que acontece nas mudanças educativas e
no mundo da arte, se reflete imediatamente nas escolas ou nas práticas que os
professores utilizam para ensinar. Assim como artistas e críticos de arte, nossas
práticas ligadas às histórias em quadrinhos, ainda podem (ou não) estar
impregnadas ou manter resquícios de antigos preconceitos. Ou, como diz Efland
(2003), podem estar ainda apegadas à modernidade.
14
Artigo publicitário sem assinatura. Pop arte no Mon. Revista View, Curitiba, n. 62, p.18-20, dez.
2005.
15
Ibid. Ver também o site: <http://www.museuoscarniemeyer.org.br/exposicoes/roy.htm>. Acesso em:
5 jul. 2006.
32
As tendências educativas atuais enfatizam a necessidade de valorizar as
diferentes culturas e a arte popular. Em 1998, nos PCNs a pluralização das culturas
já constava nos temas transversais, como forma de inclusão, propondo a valorização
de outras culturas e manifestações artísticas. Mas a própria SEED/PR, em 2004-
2005, por intermédio de sua equipe técnico-pedagógica, ao traçar as diretrizes
curriculares
16
para o ensino fundamental de Educação Artística, entre outros
aspectos, destaca ainda a “necessidade de desmistificação da arte erudita em
relação à arte popular considerando ambas como referenciais culturais importantes
para a compreensão do mundo.” (SEED/PR, 2004-2005, p. 1). As histórias em
quadrinhos são uma arte popular. Também fazem parte desse processo.
Nem todos os cursos de licenciatura
17
em Artes Visuais dão suporte para que
os professores trabalhem com estas linguagens. Costumam voltar-se mais para as
artes tradicionais, para as obras dos museus e para artistas consagrados, embora
as tendências pedagógicas atuais afirmem uma preocupação para que haja preparo
dos indivíduos para a análise crítica também das imagens presentes no cotidiano.
Aqui se encontra um paradoxo. Ao mesmo tempo que se consome mais as
produções realizadas pelas mídias no dia-a-dia e que existe também uma
preocupação de pais e professores quanto aos conteúdos que veiculam, podemos
dizer que Arte Seqüencial/HQs são estudadas com seriedade ou dentro de uma
disciplina que permita estudos mais aprofundados desta linguagem? Como são
realizadas as atividades com histórias em quadrinhos nas escolas? São atividades
livres ou contextualizadas? Promovem conhecimentos significativos em Arte?
preocupação real com relação a conceitos, valores, crenças e ideologias que podem
estar envolvidos nas produções encontradas em histórias em quadrinhos? Os
professores se preparam, ou pesquisam para a realização dessas atividades?
Segundo Hernández (2000), com freqüência, se fazem atividades na escola
que não refletem sobre os valores que as histórias da indústria cultural veicula.
Hoje a atenção das investigações parece estar mais voltada para a televisão
e para as novas tecnologias, dando a impressão de que as HQs deixaram de existir
16
As diretrizes curriculares da SEED/PR, para o ensino fundamental de Educação Artística da rede
estadual, estão disponíveis em:
<http://www.seed.pr.gov.br/portals/portal/diretrizes/dir_ef_educart.pdf>. Acesso em: 10 jul. 2006.
17
A UFPR, por exemplo, oferecia a disciplina Técnicas de Estruturação da Imagem Seqüenciada que
englobava assuntos da Arte Seqüencial (cinema, quadrinhos, fotonovela, incluindo sua história), mas
que existiu apenas de 1982 a 1994, segundo as Resoluções 85/94 e 60/02 do CEPE (Conselho
de Ensino e Pesquisa) e informações do secretário deste curso, colhidas em março de 2006.
33
entre as outras mídias. Mas na realidade exercem um papel significativo dentro do
universo visual. De um lado, muitas crianças e adolescentes lêem menos em função
da TV. Por outro lado, influência de desenhos animados e histórias em
quadrinhos americanas e japonesas nas produções dos alunos. Além de manter
relações muito próximas com o cinema e os desenhos animados, as HQs vêm
formando novos leitores e novos mercados, como os Mangás por exemplo, que se
desenvolveram e se espalharam pelo mundo e também no Brasil (LUYTEN, 2000).
poucos trabalhos acadêmicos
18
em torno da Arte Seqüencial/HQs e
existem poucas análises em torno dessas imagens no ensino de Artes Visuais,
embora estas sejam mais conhecidas das crianças e adolescentes do que a arte
tradicional. Embora sem ter formação artística, ou estudos da linguagem visual,
professores de outras disciplinas utilizam tirinhas, cartuns, HQs, para ministrar suas
matérias, tanto para ensinar seus conteúdos, quanto para que o aluno "crie", usando
a linguagem dos quadrinhos.
Antes rejeitadas pela escola, a partir da década de 1970, em muitos países,
os órgãos de educação passaram a incluir histórias em quadrinhos no currículo
escolar, “supondo seu estudo uma revalorização oficial.” (QUELLA-GUYOT, 1994, p.
43). Com o pretexto de facilitar uma série de aquisições, os quadrinhos passaram a
entrar nas escolas como um método milagroso. Uma das razões para isso era o fato
de que as HQs facilitavam intercâmbios entre professores e alunos e atraíam alunos
para exercícios gramaticais (QUELLA-GUYOT, 1994).
Desde que as HQs comprovaram sua eficácia para o auxílio no aprendizado
da leitura, os professores de Língua Portuguesa utilizam amplamente essa
linguagem, enquanto os professores de Arte trabalham muito menos com essa arte.
Para o ensino de Artes Visuais, as HQs têm importância principalmente pelas
18
Até o momento de realizar esta pesquisa, encontramos uma série de monografias sobre histórias
em quadrinhos, mas poucas teses ou dissertações vinculadas ao ensino de Artes Visuais. De três
bibliotecas pesquisadas em Curitiba/PR, a biblioteca da FAP, foi onde encontramos o maior número
de monografias nesta área. “A psicomotricidade em quadrinhos” (1980), “Explorando os recursos
expressivos de Will Eisner (2001), “Uma linguagem híbrida dos quadrinhos (2002)”, foram algumas,
dentre outras monografias, encontradas na FAP no primeiro semestre de 2006, mas não foram
encontradas teses ou dissertações nesta biblioteca neste período. Algumas bibliotecas digitais,
também foram pesquisadas: Biblioteca Digital da UNICAMP: http://libdigi.unicamp.br; Biblioteca Digital
de Teses e Dissertações da USP: http://www.teses.usp.br; Biblioteca Digital da UFRGS:
http://www.biblioteca.ufrgs.br/bibliotecadigital. Nessa busca, até onde pudemos avançar, constatamos
um maior número de teses e dissertações relacionadas a outras disciplinas, principalmente Língua
Portuguesa e Pedagogia, que em geral abordam o uso das HQs como ferramenta para o aprendizado
da leitura.
34
imagens que veiculam e, o que essas imagens representam, tem interesse relevante
para esta disciplina, bem como, para o campo da Cultura Visual e da Educação.
Em sua pesquisa, Scareli (2003, p. 1) observou que “a presença de
quadrinhos em livros didáticos é uma constante”, e muitos professores fazem uso
deles como recurso didático para atrair as crianças ou para introduzir o tema da
aula, mas em ambos os casos, os quadrinhos são abandonados logo em seguida.
Podemos desta forma considerar as histórias em quadrinhos apenas como
acessório pedagógico? Será que os professores de Arte concordam com isso?
No Brasil, o emprego das histórias em quadrinhos passou a ser reconhecido
pela LDB (Lei de Diretrizes e Bases) e pelos PCNs. No volume 6 (1997, p. 62 e 63),
dedicado ao ensino de Arte de a série, sugere que as Artes Visuais no fazer
dos alunos e como objeto de apreciação (observação, experimentação e leitura)
além das artes tradicionais pintura, gravura, ou escultura, deve incluir também
outras, como o vídeo, a fotografia e histórias em quadrinhos
19
. Segundo M.ª C. R.
Pereira, coordenadora geral dos PCNs (apud SERPA e ALENCAR, 1998), por
associarem imagem e texto, as histórias em quadrinhos, passaram a ser
consideradas como meio para auxiliar crianças a aprender a ler e escrever. Assim, o
MEC/1997 passou a recomendar o uso das HQs nas escolas. Esta recomendação
consta no volume 2 dos PCNs pertencentes ao ensino de Língua Portuguesa
20
.
O risco que se corre em usar histórias em quadrinhos apenas como recurso
para ensinar assuntos variados como a “descoberta da música [...] ou da
jardinagem” é o de vulgarizar mais ainda seus objetos (QUELLA-GUYOT, 1994,
p.45). Isso pode acentuar a idéia de que é uma subliteratura, ao invés de se
incentivar a criação artística de qualidade e a interpretação crítica de conteúdo das
HQs.
Quando crianças ou adolescentes trabalham histórias em quadrinhos junto a
professores de outras disciplinas, estão aplicando conhecimentos da área do ensino
de Artes Visuais. Os professores de outras disciplinas irão trabalhar dentro de suas
19
Nos PCNs (1998, vol. 6, a séries, p. 66-67), recomenda-se que o aluno deve realizar a
produção, o conhecimento e a leitura das formas visuais, aprendendo a analisá-las criticamente “em
diversos meios de comunicação da imagem: fotografia, cartaz, televisão, vídeo, histórias em
quadrinhos [...] etc.”
20
Os PCNs (1997, vol. 2, a séries, p. 42), consideram que para “aprender a ler, é preciso
interagir com a diversidade de textos escritos [...]” e que algumas situações favorecem o aprendizado
da leitura e da escrita quando o aluno ainda não sabe ler e escrever. Entre as diversas opções
adequadas para o trabalho com a linguagem escrita, tais como textos de jornais, revistas e
suplementos infantis, notícias, resenhas, classificados, anúncios, slogans, cartazes, folhetos, etc.,
citam também os quadrinhos (ver também PCN/97, p. 82).
35
áreas. O estudante poderia estar aplicando o que aprendeu em Arte. Mas crianças
não fazem estas conexões sozinhas.
A Arte Seqüencial/HQs necessita ser estudada dentro de uma disciplina
apropriada a sua linguagem. Os estudantes podem apresentar dificuldades para
realizar trabalhos práticos de histórias em quadrinhos por não terem desenvolvido a
prática do desenho, da composição ou por não terem desenvolvido habilidade
técnica, por falta de idéias ou pela incapacidade para representar suas idéias. O
professor de Arte poderia estar mais bem preparado para intervir e auxiliar. Nesse
contexto, o ensino de Arte é o que está em melhor posição para isso. Tanto pode
desenvolver seu aprendizado para a linguagem gráfica dos quadrinhos, quanto o
aprendizado para a interpretação e a compreensão crítica.
Supomos que o professor de Artes Visuais deveria estar mais habilitado para
trabalhos interdisciplinares e em melhor posição para trabalhar com essas
linguagens junto aos alunos, respeitando seu desenvolvimento e auxiliando para
uma compreensão mais consciente das imagens.
Tratando de assuntos relacionados à revisão do sentido do saber escolar,
Hernández (1998, p. 73) destaca a importância da “compreensão da realidade
pessoal e cultural de professores e alunos”, citando René Zaggo, que afirma:
Quando estamos diante de um fato complexo e contraditório, tendemos a
decompô-lo em elementos a fim de eliminar o contraditório. Esse modo de
proceder, clássico, supõe que explicar seja reduzir. O método de Wallon
(esse é seu legado [...]) consiste em instalar-se no centro da contradição:
em saber de onde esta procede, para onde vai e qual é sua finalidade.
Para nossas preocupações, essas considerações também são importantes.
Levando em conta as contradições polêmicas na história das HQs e as
necessidades da sociedade contemporânea dentro da problemática do tema de
pesquisa, que se questionar a realidade das HQs segundo a perspectiva dos
professores. Nós os educadores, podemos estar sujeitos a crenças, concepções e
valores ultrapassados que não atendem às necessidades da educação atual, o que
nos leva à pergunta principal que guia esta pesquisa:
Como os professores de ensino fundamental se relacionam com a Arte
Seqüencial/histórias em quadrinhos no ensino de Artes Visuais?
36
Esta pergunta problema, vai ao encontro dos interesses daqueles que atuam
no cotidiano do ensino de Artes Visuais. Cabe refletir então, sobre qual atitude os
professores tomam diante das HQs. Ensinam com ela? Por meio dela? Como a
ensinam? Implica tentar compreender o que os professores pensam sobre as HQs
no ensino escolar.
1.2.1 Tema e objetivos da pesquisa
O problema parte da suposição de que há despreparo e preconceito com
relação à Arte Seqüencial/histórias em quadrinhos no ensino de Artes Visuais.
Conforme Riviere (apud SANCHO, 1997-1998), os processos de mudança são
lentos. Assim como podemos encontrar críticos e artistas que seguem pensando
segundo crenças ultrapassadas, as práticas de ensino de HQs nas escolas podem
refletir o mesmo. Por isso, vemos a necessidade de realizar estudos sobre essa
questão, a fim de obter dados para uma reflexão mais aprofundada, desejando que
esses dados contribuam para a elaboração de proposta educativa atualizada para a
compreensão crítica da linguagem dos quadrinhos.
Fica deste modo caracterizado o tema de pesquisa, ou seja, a relação entre
as HQs e o ensino das Artes Visuais. Para a delimitação do universo de pesquisa,
restringimos o estudo aos professores de ensino fundamental em escolas de
Curitiba/PR, com o objetivo principal de investigar como estes docentes
compreendem e utilizam as histórias em quadrinhos, analisando essas práticas e as
conseqüências dessas compreensões para o ensino de Artes Visuais.
Seguem naturalmente, objetivos específicos relacionados, como levantar
dados concretos sobre a situação da Arte Seqüencial/histórias em quadrinhos no
ensino fundamental, examinando o que é enfatizado ou realizado neste ensino.
Analisar esses dados dentro da fundamentação teórica deste estudo, isto é, na
perspectiva das teorias da Cultura Visual e desenvolver proposta de trabalho para
realizar estudos de imagens dos quadrinhos para os professores de Artes Visuais do
ensino fundamental.
37
1.3 JUSTIFICATIVA
O que está em questão para pais, educadores e
outras pessoas, é a maneira como a cultura,
particularmente a cultura da mídia, tornou-se uma
força educacional substancial, senão a principal, na
regulação de significados, de valores e gostos, que
estabelecem as normas e convenções que oferecem
e legitimam determinadas posições do sujeito.
GIROUX, 2003
Como exposto na situação problema, segundo Scareli (2003), os quadrinhos
são uma constante nos livros didáticos e amplamente utilizados por outros
professores, enquanto o ensino de Artes Visuais parece deixar de lado
oportunidades para explorar um modo de expressão que lhe é próprio e particular.
As causas para isso podem ser várias. Eisner (1989, p. 5), que ministrou aulas na
Escola de Artes Visuais, de Nova York, comenta:
Por motivos que têm muito a ver com o uso e a temática, a Arte Seqüencial
tem sido geralmente ignorada como forma digna de discussão acadêmica.
Embora cada um dos seus elementos mais importantes, tais como design, o
desenho, o cartum e a criação escrita, tenham merecido consideração
acadêmica isoladamente, esta combinação única tem recebido um espaço
bem pequeno (se é que tem recebido algum) no currículo literário e artístico.
Creio que tanto o profissional como o crítico são responsáveis por isso.
Segundo Dowing (2002, p. 214), HQs são muitas vezes desconsideradas "por
sua aparente falta de seriedade e tidas às vezes como um emblema de decadência
e perigo cultural.” Apesar disso, tornaram-se populares nas décadas de 1960 e 70 e
se transformaram em força significativa entre adultos jovens em muitos países.
Segundo esse autor, muitas produções de histórias em quadrinhos, não giram em
38
torno de temas radicais. A maioria transmite os mesmos valores que as outras
mídias, “embora como os jogos de vídeo e de computador, alguns sejam bem mais
descaradamente violentos, sexistas e etnocêntricos que a maior parte da mídia
convencional.” (DOWING, 2002, p. 214).
Hoje vivemos uma época na qual nos deparamos com crianças, jovens e
adultos cada vez mais interessados nos meios visuais e acostumados às linguagens
permissivas das mídias, que acatam passivamente. Exemplos de fatores que podem
influenciar, inibindo ou desenvolvendo a capacidade criadora do aluno (e do ser
humano em geral), encontramos em Babin (1989, p. 30):
É essa espécie de passividade que precisamos assinalar. Ela não vem do
fato de se assistir à televisão ou de se estar exposto a mil mídias, mas
talvez do fato e do poder de impacto dessas mídias e da sociedade que as
mantém ser forte demais para a subjetividade das crianças.
As mídias se transformaram nos educadores do público, mediando
representações "que jogam com as fantasias, os medos ou os fantasmas."
(HERNANDEZ, 2000, p. xi). Para Steinberg e Kincheloe (apud HERNANDEZ, 2001),
produz-se uma distância cada vez maior entre a pedagogia cultural, que é produzida
pelas dias e a pedagogia escolar. O que significa que uma diferença entre
como a "escola educa e como educam os meios da cultura popular." (HERNANDEZ,
2001, p. 2).
Podemos observar como a cultura da dia regula significados que
determinam normas sociais na relação gênero e HQs, pelo fato de que, durante
muito tempo, as histórias em quadrinhos foram mais consumidas pelo sexo
masculino. Em finais dos anos 50, os quadrinhos eram criados em estilo
sensacionalista e "num formato adequado para leitores adolescentes do sexo
masculino, que eram o pão com manteiga do mercado." (McCLOUD, 2006, p. 27).
Pode-se perceber como as pessoas do sexo feminino se posicionaram com relação
às histórias em quadrinhos, durante aquela época, senão até hoje, mediante alguns
trechos da história Loja Proibida com a personagem Pepper Ann, publicada pela
revista Disney Explora, em junho de 1999 (Figuras 6 e 7).
39
Figura 5
Trechos da História
Loja Proibida
, publicada na Revista
Disney Explora
, jun. 1999.
Figura 6 -Trechos da história Loja Proibida, publicada na Revista Disney Explora, jun. 1999. p. 24-27.
40
Este exemplo demonstra como as dias são capazes de determinar o
pensamento e a atitude das pessoas. É uma referência aparentemente simples, mas
mostra também parte das idéias que influenciaram na formação do pensamento de
adultos e adolescentes de hoje e quanto o estudo destas imagens pode auxiliar a
compreender o meio em que vivemos.
Figura 7 – Trechos da história Loja Proibida, publicada na Revista Disney Explora, jun. 1999. p. 29-30.
41
As mídias não somente podem influenciar na construção das identidades
como podem definir a identidade "como sendo do sexo masculino, feminino, pessoa
branca, negra; cidadã ou não cidadã" e ainda, o significado da infância, do passado,
da verdade ou protagonismo social. (GIROUX, 2003, p. 128).
As mídias, as novas tecnologias, os meios de informação e a comunicação
estão engendrando profundas transformações nas subjetividades. Uma maneira de
compreender as mudanças que repercutem na educação é estudar o universo visual
com o qual crianças e adolescentes se relacionam “e as formas de apropriação [...]
que fazem deste universo visual.” (HERNANDEZ, 2001, p. 2, tradução nossa).
Nas últimas décadas, vivemos uma inevitável sensação de crise na
sociedade, na cultura, na escola e nas práticas docentes. Efland (2005) detecta
áreas que estão afetando e irão afetar a arte-educação nos próximos anos. Uma
delas é o surgimento de um mercado cultural internacional. Segundo esse autor, as
nações não podem evitar que a nova cultura popular internacional se espalhe e seja
difundida pelo marketing de massas. Mas o excesso de violência, sexismo e
produções voltadas para a formação de consumidores, bem como a formação de
indústrias culturais homogeneizadoras, levanta questões pertinentes e a
necessidade de novas propostas e práticas para o ensino de Artes Visuais.
As imagens da Arte Seqüencial encontradas nas mídias (meios impressos,
televisão, cinema e Internet), além de distrair e entreter, trazem referências estéticas
derivadas do desenho, da pintura e do design; elas contêm códigos culturais, valores
e significações complexas. O estudo destas imagens pode proporcionar
oportunidades antes ignoradas pelos professores no ensino de Artes Visuais.
Hernández (2000, p. ix) faz considerações importantes relacionadas ao
problema exposto. Para ele, “vincular experiências educativas com as
representações da realidade que constroem de si mesmos e do meio, com a pressão
dos meios e da indústria do consumo [...]”, significa colaborar para que as pessoas
possam interpretar criticamente o mundo do qual fazem parte como sujeitos, e sejam
capazes de dar respostas ao que acontece no mundo em que vivem.
Conforme Hernández (apud FRANZ, 2003a, p. 16), a escola deve ser uma
facilitadora da “construção das subjetividades, para as crianças e adolescentes que
se socorrem nela”, auxiliando para que se sintam seguros para atuar e transformar
sua própria vida. O que nos leva a crer que devemos atuar dentro de propostas
pedagógicas, que incentivem a produção de histórias em quadrinhos, voltadas para
42
o ensinamento artístico e estético, mas que ao mesmo tempo incentivem a análise e
a reflexão crítica, como forma de favorecer a construção de conhecimentos e para
que os professores possam auxiliar os estudantes a construir referências para
interpretar o que as mídias apresentam. Além do incentivo à leitura, o estudo das
HQs pode auxiliar na reflexão sobre os processos hegemônicos globalizadores que
aniquilam a diversidade e provocam a perda de nossos referenciais culturais.
Sobre a experiência estética, Ferraz e Fusari (1993, p. 23) citam Thomas
Munro, para quem “a experiência estética não é necessariamente derivada da arte”,
lembrando que outras experiências estéticas, além daquelas que encontramos
em obras de arte eruditas. HQs também podem promover experiências neste
sentido, pois o desenvolvimento estético se mediante um exercício constante de
discriminação a respeito das qualidades perceptuais das imagens” da percepção e
da composição. (MUNRO, apud FERRAZ e FUSARI, 1993, p. 23).
A realização de atividades com histórias em quadrinhos, além de desenvolver
as habilidades do desenho e da composição, estimulam a capacidade da
representação de idéias e situações. Portanto, nas aulas de Arte, não se justifica
excluir ou incluir precariamente certos modos de expressão, como a Arte
Seqüencial, que está intimamente ligada a outros meios de comunicação e à
experiência estética. Mas incluí-la de maneira que se possa compreender melhor
essa linguagem, também no sentido de promover a educação para a compreensão
crítica deste universo.
Fazer um recorte dentro de um campo extenso como o das Artes Visuais e
tratar exclusivamente da Arte Seqüencial/histórias em quadrinhos, avaliando nossas
práticas, pode contribuir para o desenvolvimento de um aspecto específico, deste
ensino, tornando-o cada vez mais completo e significativo.
As mudanças nos conceitos sobre a arte dos quadrinhos, a ampla divulgação
através das tecnologias digitais atraindo novos leitores e formação de indústrias
culturais globalizantes, outrossim, justificam a realização desta pesquisa, a fim de
fazer análise e reflexão sobre o ensino relacionado às HQs.
Segundo Sancho e Hernández (1997), Elliot Eisner (1998), e Gómez (2001),
fazer reflexão e análise crítica sobre as práticas ligadas a essa arte exige uma
investigação próxima desse ensino em seu dia-a-dia. Investigar o modo como os
professores compreendem a Arte Seqüencial/HQs no ensino de Artes Visuais, pode
revelar concepções, preconceitos, tendências, visões, práticas utilizadas, e
43
dificuldades, permitindo realizar uma análise reflexiva mais próxima da realidade do
ensino das HQs no dia de hoje. Pode igualmente contribuir para detectar pontos
positivos ou negativos, desvendando elementos que necessitem ser trabalhados ou
transformados em função das necessidades do ensino atual.
Um estudo sobre as histórias em quadrinhos no ensino de Artes Visuais,
dentro da perspectiva da Cultura Visual associado à Pedagogia Crítica, pode ser útil
para fundamentar a construção de proposta para leituras mais críticas e conscientes
associadas às imagens dessa arte e outras imagens semelhantes. Espera-se desse
modo contribuir nas reflexões sobre as práticas contemporâneas do ensino de Artes
Visuais.
44
CAPÍTULO II
45
2.1 CONCEITUALIZAÇÕES E TENDÊNCIAS DO ENSINO DE ARTES VISUAIS
Ensinar inexiste sem aprender e vice-versa e foi
aprendendo socialmente que, historicamente,
mulheres e homens descobriram que era possível
ensinar. Foi assim, socialmente aprendendo, que ao
longo dos tempos, mulheres e homens perceberam
que era posvel depois, preciso trabalhar maneiras,
caminhos, métodos de ensinar.
PAULO FREIRE,1997
Encontramos na educação várias tendências filosóficas que orientam as
práticas educativas, as quais se vinculam à pedagogia ou teoria da educação que,
por sua vez, estão impregnadas de concepções ideológicas e políticas. A Arte na
educação, desde o início de sua história vem atendendo a diferentes finalidades em
razão das transformações ocorridas na sociedade, nas políticas, nas visões e nas
concepções da arte e de seu ensino. A cada mudança, surgem novas denominações
para este ensino, as quais correspondem a novas posturas pedagógicas referentes
ao saber arte e ser professor de Arte. De acordo com Hernández (2000), as
mudanças na denominação não ocorrem por acaso e correspondem a novas formas
de compreender, ordenar e interpretar a realidade, ou seja, refletem ideologias.
O desenho, a educação estética, os trabalhos manuais, a expressão
plástica, a educação visual e plástica, não são meras mudanças de rótulos,
mas respondem a mudanças nas representações que refletem estratégias
de legitimação que podem mediar essa matéria curricular. (Hernández,
2000, p. 70).
Conforme o destacamos
21
, o próprio conceito da arte também muda e tem
sido interpretado de diferentes maneiras: “arte como técnica, materiais artísticos,
lazer, processo intuitivo, liberação de impulsos reprimidos, expressão, linguagem,
comunicação.” (FUSARI e FERRAZ, 1992, p. 18). Para Barbosa (2005b), em função
21
Item 1.3 - Problema de Pesquisa.
46
das concepções e finalidades adotadas, a arte na educação assume diferentes
sentidos: arte como preparação para o trabalho, como solução criadora de
problemas, como expressão criadora, como disciplina, como cognição e como
cultura visual.
De acordo com Fusari e Ferraz (1992), existe uma tendência idealista liberal
na educação de característica pouco crítica, que tende a crer que, a educação
sozinha, pode garantir a construção de uma sociedade mais justa e democrática.
Para essas autoras, essa tendência inclui a Pedagogia Tradicional, a Pedagogia
Nova e a Pedagogia Tecnicista.
Na Europa, em fins do século XIX, o ensino artístico enfatizava o desenho
ligado ao interesse pelo enriquecimento dos países e às influências das idéias
liberais e positivistas (BARBOSA, 1978). Procurando atender às demandas da
expansão industrial, o desenho era ensinado com a finalidade de preparar operários
para o trabalho nas fábricas e serviços artesanais ornamentação, decoração e
manufaturas. Segundo Ferraz e Fusari (1993), o Brasil seguia os modelos europeus
e tal como na Europa, o desenho, aqui era considerado a base de todas as artes. No
ensino de Arte, no caso, desenho, predominava a Pedagogia Tradicional.
Na Pedagogia Tradicional, a relação professor-aluno é vertical e ao primeiro
compete informar e conduzir seus alunos. Em todos os campos do saber, a
Pedagogia Tradicional dava ênfase aos modelos. Nas aulas de arte, predominava a
teoria mimética que considerava importante a cópia como treino para a observação.
O aprendizado se fazia mediante cópias do natural” e de modelos” que os alunos
deveriam imitar. Conforme Fusari e Ferraz (1992), essa atitude implicava a adoção
de padrões de beleza de produtos arsticos, seres ou pessoas. As cópias deveriam
ser produções realistas ou idealistas. Práticas educacionais baseadas nessa
concepção, mantêm-se vivas até os dias de hoje.
Nas primeiras décadas do século XX, no Brasil, esse ensino ainda
predominou entre as classes para as quais o desenho era considerado útil para o
trabalho. Entre os anos de 1930 e 1970, conforme Fusari e Ferraz (1992), enfatizava
o desenho do natural, o desenho decorativo, o desenho pedagógico e o desenho
geométrico. Nos anos 50, ainda predominava uma visão utilitarista da arte. Além de
desenho, o currículo escolar passou a incluir Música, Canto e Trabalhos Manuais.
Os exercícios ainda eram baseados em modelos convencionais e o ensino técnico.
Valorizavam-se principalmente as habilidades manuais e os “dons artísticos”.
47
Entre os anos 20 e 70, o ensino ligado às artes, passou por outras
experiências, sustentadas pela estética modernista e as tendências pedagógicas e
psicológicas que marcaram o período. Nessa época, ainda não havia uma disciplina
que contemplasse o ensino de Arte nas escolas de ensino fundamental. No século
XX, segundo Fusari e Ferraz (1992), além dos movimentos filosóficos e estudos da
psicologia cognitiva e da psicanálise, o ensino superior artístico, também sofreu
influências da Gestalt .
A Pedagogia Nova surgiria em finais do século XIX, na Europa e nos Estados
Unidos. No Brasil, começaria a despontar em torno de 1930. Também conhecido por
escolanovismo ou Escola Nova, este movimento contrapôs-se à educação
tradicional, considerando menos significativa a estruturação racional e lógica dos
conhecimentos. Conforme Fusari e Ferraz (1992), o movimento propunha
experiências cognitivas que deveriam ocorrer de maneira progressiva, levando em
conta os interesses dos alunos. Os seguidores da Escola Nova abraçaram as idéias
de Dewey, para quem a aprendizagem deveria ocorrer a partir de um problema de
interesse dos alunos, desenvolvendo experiências para que aprendessem fazendo.
Tal movimento caracterizou-se principalmente pela ruptura com as “cópias de
modelos”, valorizando os processos criativos, provocando um deslocamento nas
práticas de ensino. Da centralização no professor como transmissor de conteúdos,
passou a centrar-se no aluno e em sua criação, enfatizando a criatividade e a
espontaneidade. Conforme Fusari e Ferraz (1992), a concepção estética passou a
ser proveniente de experiências individuais da percepção, com base na Psicologia
Cognitiva e de estéticas de expressão criadoras apoiadas pela Psicanálise.
A arte como expressão criadora surge com o início do modernismo e teve
como patrono Franz Cizek, que levou intelectuais a se interessarem pela produção
artística de crianças. Lowenfeld, influenciado pelas teorias de Freud, abordava a arte
como meio para se compreender o desenvolvimento individual em suas diferentes
fases e como desenvolvimento da consciência estética e criadora do aluno (FUSARI
e FERRAZ, 1992).
Augusto Rodrigues foi grande divulgador das teorias da educação pela arte,
de Herbert Read, criando em 1948 a Escolinha de Arte do Brasil, no Rio de Janeiro.
As escolinhas de arte, como eram chamadas, proliferaram, valorizando a arte infantil
no Brasil e enfatizando principalmente a concepção de arte como expressão e
liberdade criadoras.
48
Depois dos anos 60, entretanto, a prática da livre-expressão firmada pela
tendência escolanovista, acarretou em um ensino livre e descompromissado, “onde
tudo era permitido” (FUSARI e FERRAZ, 1992, p. 35) gerando um esvaziamento de
conteúdos e preconceitos com relação ao ensino ligado à arte.
Nessa época, segundo Fusari e Ferraz (1992), a Pedagogia Tecnicista
surgiria nos Estados Unidos, quando o mercado tecnológico em expansão
necessitava de profissionais habilitados, e a educação era considerada insuficiente
para essa demanda. No Brasil, foi introduzida entre 1960 e 1970. Inicialmente, tinha
por objetivo a melhora da eficiência na escola e a preparação de indivíduos mais
competentes e produtivos, que deveriam estar aptos para a sociedade industrial.
Na década de 70, sob a influência da Pedagogia Nova e principalmente da
Tecnicista, foi implantada no Brasil a Lei 5.692/71 que introduzia e tornava
obrigatória a disciplina Educação Artística, no currículo escolar, o que significou um
avanço para o ensino de Arte, que até então não tinha amparo legal.
Os cursos de formação de professores da então chamada Educação Artística,
foram criados em regime de urgência, no intuito de atender à lei. Nos primeiros anos
de implantação, eram de curta duração e abrangiam todas as linguagens artísticas
Música, Teatro, Dança e Artes Plásticas. Tinham pouca fundamentação teórico-
metodológica sobre o ensino e a aprendizagem em Arte. Estavam mais voltados
para o desenvolvimento de técnicas artísticas, bem como enfatizavam a criatividade
e a livre expressão artísticas.
Como assinalam Fusari e Ferraz (1992), a educação de tendência Liberal
idealista, recebeu influências das três pedagogias Tradicional, Nova e Tecnicista.
Conforme essas autoras, o ensino de Arte até década de 90, vinha apresentando
imbricadas essas práticas, em maior ou menor grau.
Os problemas da Educação Artística baseada no laissez-faire começaram a
levantar questionamentos e outras tendências começaram a ter origem neste
cenário. Desde os anos 60, também surge uma tendência mais crítica, realista e
progressista, mobilizando novas propostas pedagógicas em busca de soluções para
a baixa qualidade do ensino público. Essa tendência reúne as pedagogias
Libertadora, Libertária e Histórico-Crítica, que recebem influências das teorias
críticas. A Pedagogia Libertadora, representada principalmente por Paulo Freire,
preocupa-se em compreender e solucionar problemas com a intenção de obter
melhora das práticas sociais. A Pedagogia Libertária valoriza mais as experiências
49
educativas independentes e de autogestão, livre de amarras sociais. A Histórico-
Crítica, também chamada Crítico-Social dos Conteúdos, ou ainda Sociopolítica,
segundo Fusari e Ferraz (1992), surge mais tarde, em inícios dos anos 80. Tem em
comum com a Pedagogia Libertadora o pensamento de revalorização da escola
como parte integrante da totalidade social.
Na concepção crítica, o professor como mediador é uma presença
insubstituível para relações pedagógicas que trabalha experiências pouco
elaboradas dos alunos, reavaliando experiências e preparando para que exerçam
uma cidadania consciente, crítica e participante, o que significa realizar ações que
propiciem transformações na prática (FUSARI e FERRAZ, 1992).
Ainda na década de 1960, surgiram autores defendendo um ensino
“contextualista”. Segundo Richter (in CORRÊA, 2004), esse grupo contestava as
visões essencialistas da arte, defendendo a idéia de que a arte deveria ser estudada
tomando-se como referência seu contexto cultural de origem, fundamentando-se em
conhecimentos antropológicos e sociológicos que também contemplassem o
contexto social e cultural dos alunos.
O ensino de Arte com ênfase na livre-expressão acabou gerando um
esvaziamento conteudístico”. Surgiu, então, um movimento nos Estados Unidos, na
década de 1960, que desejava a volta dos conteúdos para as aulas de Arte. Essa
idéia concretizou-se na década seguinte, com o surgimento do Discipline Based Art
Education, o DBAE
22
. Ana Mae Barbosa sistematizou idéias baseada nas
concepções do DBAE através da Proposta Triangular, no final dos anos oitenta e
início da década de 1990.
A Proposta Triangular significou uma valorização da disciplina como área de
conhecimentos, com conteúdos próprios referentes à História da Arte, à estética e
introduzindo a “leitura da imagem” no ensino de Arte. Desde então, os professores
passaram a utilizar uma abordagem que envolve a apreciação, a História da Arte e a
produção artística, interrelacionados. Ao mesmo tempo, buscou-se romper com o
preconceito referente à arte-educação
23
como sinônimo de arte apenas para
crianças e adolescentes.
22
Discipline Based Art Education. O DBAE corresponde à Educação Artística com base em
disciplinas: produção de arte, História da Arte, crítica e estética (BARBOSA, 1991).
23
Segundo Barbosa (1991), a expressão “arte-educação” também havia servido para identificar uma
posição de vanguarda contra a Educação Artística que foi oficializada com a Lei 5.692/71 através do
acordo MEC-USAID.
50
Em sua análise histórica da arte-educação, Eisner (apud BARBOSA, 2005b,
p. 17) considera a livre-expressão como a visão “mais fortemente implantada no
imaginário popular.” Porém no Brasil a abordagem que mais se impõe, segundo
Barbosa (2005b), é a que considera a educação estética como semelhante à
educação intelectual, ou como cognição. Em Arte, o aprendizado nessa abordagem
é visto como diretamente ligado ao desenvolvimento do processo de percepção e
capacidade de observação. Conforme Barbosa (2005b, p. 17) é uma visão na qual
se afirma "a eficiência da arte para desenvolver formas sutis de pensar, diferenciar,
comparar, generalizar, interpretar, conceber possibilidades, construir, formular
hipóteses e decifrar metáforas.”
2.1.1 A década de 1980 e posteriores
A década de 1980 viu surgir uma maior politização dos arte-educadores,
decorrente do nascimento de diversas associações, coincidindo com o
revigoramento das idéias de Paulo Freire, que "voltou ao Brasil em 1980."
(BARBOSA, 2005b, p. 15). A formação e o conhecimento em arte-educação,
entretanto, ainda deixavam a desejar, pois havia poucos programas de pesquisa e
de aperfeiçoamento para os profissionais da área.
Nessa década, “o ensino da arte começa a ser repensado em novas bases
conceituais e revisado quanto a sua relação com as pesquisas contemporâneas em
Arte." (PILLAR, 1999, p. 11). O processo de democratização vivido pelo país nesse
período, bem como a criação de programas, festivais e novas linhas de pesquisa e
pós-graduação aliadas a participações dos professores nas associações
contribuíram para este avanço.
Esse movimento foi se transformando em rejeição ao ensino polivalente,
trazendo reivindicações por um ensino mais especializado. Em Educação Artística
e/ou arte-educação, uma das finalidades principais era o desenvolvimento da
criatividade. Com o desejo de redenominar esta área do currículo para “Ensino de
Arte”, a criatividade e a expressão individuais, associadas à idéia de originalidade e
pureza, foram aos poucos sendo questionadas. Alguns arte-educadores passaram a
51
desenvolver propostas que tornassem o ensino e a formação de professores de Arte
mais eficazes e significativos, tentando superar um ensino no qual não havia
compromisso com as linguagens específicas da arte.
As primeiras tentativas para incluir imagens no ensino de Arte, segundo
Barbosa (1991), foram amplamente rejeitadas. Mas a Proposta Triangular,
sistematizada por essa autora, mediante leituras de imagens contextualizadas, logo
se tornou uma das propostas mais difundidas nas escolas.
Conforme Barbosa (1991), o primeiro programa a conectar a análise da obra
de arte, além de outras imagens, com a História da Arte, associado a trabalho
prático, foi o Festival de Campos de Jordão, em São Paulo, em 1983. Segundo essa
autora, no festival, os cursos se baseavam na decodificação do meio ambiente
estético, de composições musicais populares, pintores, grupos de dança, etc., e se
voltavam para a decifração de imagens da TV, da arte xerox, de pinturas e
esculturas da arte moderna brasileira. Essa idéia teve continuidade na Secretaria de
Educação de São Paulo, em cursos na Universidade de São Paulo.
Em 1987, Barbosa (1991) deu início a um programa no Museu de Arte
Contemporânea (MAC/USP), associando trabalho prático, História da Arte e leitura
de imagem. Nessa proposta de leitura, a idéia é construir uma metalinguagem da
imagem, falando sobre a pintura em outros discursos: verbais, silenciosos ou
gráficos. Segundo Barbosa (1991), a metodologia empregada para a leitura pode ser
estética, semiológica, iconológica ou ainda outra, conforme o conhecimento do
professor. A Proposta Triangular não trabalha com uma concepção linear de História
da Arte, mas contextualizando a obra de arte no tempo a partir de cada obra
examinada, fazendo conexões com outras obras e outras manifestações culturais.
Em 1986
24
, surgiram políticas contrárias ao ensino da Arte nas escolas,
abrindo a novas discussões sobre um eventual caráter de não obrigatoriedade desse
ensino. Mas, a despeito disso, nas últimas décadas, Arte vem alcançando maior
consolidação e consciência como disciplina necessária no currículo e uma melhora
significativa na qualidade do ensino da Arte no Brasil (BARBOSA, 2005b).
24
Segundo Barbosa (1991), em 1986, o Conselho Federal de Educação não incluiu a Educação
Artística entre as disciplinas básicas, colocando-a em parágrafo separado, no qual se mencionava
sua exigência. Na interpretação da lei, o resultado foi que a grande maioria das escolas particulares
passou a desconsiderar a disciplina, eliminando-a do currículo.
52
A LDBEN 9.394/96 trouxe importantes alterações para a educação básica,
com o artigo 26
25
, uma vez que põe fim às discussões sobre a obrigatoriedade ou
não da arte no currículo escolar. Na lei anterior, a Educação Artística, era
considerada como mera atividade. Com o Parecer CNE/CEB 22/2005, aprovado
em outubro de 2005, a retificação do termo “Educação Artística” por “Arte”,
preconizada pela lei 9.394/96, efetivou-se, entendida a arte não mais como
atividade, mas como forma de conhecimento.
O cenário que chega ao final dos anos 90 mobiliza diferentes tendências no
ensino de Arte. Nas décadas anteriores, muitas pesquisas se desenvolveram sobre
a arte e a aprendizagem da arte, que contribuíram com novos dados para as
propostas pedagógicas, acarretando o aumento de importância tanto para os
conteúdos quanto para os processos de aprendizagem.
Conforme Pillar (1999), na década de 1970 havia surgido uma série de
pesquisas sobre a leitura e a compreensão de imagens. Feldman, Parsons, Gardner
Housen e Perkins, estão entre os autores que estudam a compreensão. Os estudos
de Parsons, para Hernández (2001), embora ainda presos às proposições da
modernidade e a referências estéticas de base formalista, foram os que motivaram
pesquisas posteriores e atuais sobre os estágios e usos de compreensão dos
indivíduos acerca das obras de arte. Segundo Hernández (2000), Vygotsky tem
papel fundamental para essas pesquisas, à medida que destaca a importância das
relações sociais no desenvolvimento das atividades mentais e das funções que
desempenham papel estratégico na forma com que a mente se relaciona com a
informação, transformando-a em conhecimento pessoal.
Concomitantemente a esses acontecimentos, que não ocorrem em uma
ordem única, nos Estados Unidos surge uma concepção mais radical da Pedagogia
Crítica. O movimento iniciou-se com uma "minoria dentro da comunidade
acadêmica" mas que constituía uma presença crescente nas academias.
(McLAREN, 1997, p. 192). Considerando que a cultura está sempre implicada em
relações de poder, práticas sociais e favorecimento de formas de conhecimento, a
Pedagogia Crítica também busca pela maior consciência sobre os fatores
socioculturais nas produções dos significados, influenciando as propostas
pedagógicas e tendências atuais no ensino de Arte.
25
Art. 26 § 2º. “O ensino da arte constituirá componente curricular obrigatório, nos diversos níveis da
educação básica, de forma a promover o desenvolvimento cultural dos alunos.”
53
No Brasil, conforme os PCNs de 1998, as propostas que mais se destacam
são as que se afirmam por sua abrangência e que interferem na melhoria da
aprendizagem e do ensino de Arte. Essas propostas, segundo os PCNs (1998, vol. 6
p. 28) “não propõe apenas códigos hegemônicos, mas também a apreciação de
valores de múltiplas culturas, do meio ambiente imediato e do cotidiano.” Segundo
Richter (in CORRÊA, 2004, p. 142), embora o multiculturalismo tenha sido “uma
constante em debates e encontros sobre ensino de Arte, desde os anos 80”,
somente com sua inclusão nos PCNs/98, com a denominação de “pluralidade
cultural” é que o tema passou a ser mais amplamente discutido no Brasil.
A crítica ao ensino da livre-expressão, o recurso à contextualização, o uso de
diferentes imagens provenientes tanto de fontes diversas quanto de matrizes
culturais distintas, para Nascimento (2006), parecem ser o ponto de confluência ou
continuidade discursiva entre Proposta Triangular, a perspectiva Intercultural
26
, e a
Cultura Visual.
Essas propostas também chamadas s-modernas, ora convergem e se
imbricam, apresentando idéias em comum, ora se confrontam e divergem em seus
pontos de vista. A Proposta Triangular questiona o repertório artístico e estético
limitado das camadas que não têm acesso à arte e ao museu, originado pelas
diferenças sociais. A interculturalidade, defensora das estéticas do cotidiano,
enfatiza a valorização dos fazeres cotidianos e a interação com valores e artefatos
produzidos pertencentes a diferentes culturas. A Cultura Visual considera as
imagens como representações sociais e questiona o papel que exercem na
construção das identidades. Considera que a arte é uma manifestação cultural e que
as representações são mediadoras de significados em cada época e cultura. A
finalidade principal dessa proposta é promover a interpretação e a compreensão
crítica desses significados.
Para Nascimento (2006, p. 4), a Proposta Triangular e a Intercultural têm em
comum o questionamento sobre o monoculturalismo na educação e na arte, os
estereótipos e a indiferença cultural.” Porém, estudos na perspectiva da Cultura
Visual também questionam os currículos hegemônicos que excluem outras formas
26
Conforme Richter (In: CORRÊA, 2004, p. 141), “o termo ‘pluralidade cultural’ tem sido utilizado, no
Brasil, como sinônimo de ‘multiculturalidade’ ou ‘diversidade cultural’, indicando as múltiplas culturas
hoje presentes nas sociedades complexas. É, no entanto, a denominação ‘multicultural’ que se
encontra consagrada na literatura internacional.” Porém, segundo essa autora, atualmente o termo
“interculturalidade” vem substituindo o termo “multicultural” em função do sentido de inter-relação e
reciprocidade entre culturas com códigos culturais diferentes.
54
de saber (HERNÁNDEZ, 1998, 2001, 2007) e investigam imagens e temas
vinculados a “situações de diferença de poder (racismo, etnicidade, desigualdades
sociais, gênero, saber, olhar).” (HERNÁNDEZ, in FRANZ, 2003a, p. 12).
Os teóricos da Cultura Visual consideram que vivemos em uma época na qual
o visual adquire maior importância tanto no conhecimento, como em muitas formas
de entretenimento. Por isso, esse campo de estudos, além da arte tradicional, inclui
objetos e artefatos visuais além dos considerados como arte. A proposta da Cultura
Visual busca estar conectada com as demandas da sociedade contemporânea.
A Proposta Triangular, encontra-se bastante difundida entre os arte-
educadores. Como vimos, essa proposta postula a necessidade da apreciação de
obras de arte, da história e do fazer artístico (BARBOSA, 1991). A perspectiva
intercultural assume diferentes feições. Tanto o meio é importante, como fonte de
conhecimento no qual podem estabelecer-se diálogos estéticos e artísticos, quanto
amplia a discussão sobre as diferentes culturas. Trabalha questões sobre
etnocentrismo, estereótipos, preconceitos, discriminação, racismo e tem por objetivo
promover o entendimento entre grupos culturais. A Cultura Visual, segundo
Hernández (2000, 2007) busca exemplos na cultura visual que nos cerca, com a
finalidade de interpretá-los, a partir de diferentes pontos de vista, a fim de favorecer
a tomada de consciência dos alunos sobre si mesmos e sobre o mundo do qual
fazem parte. O professor assume o papel de mediador e tem a função de auxiliar os
alunos a compreenderem a realidade, examinando os fenômenos que os rodeiam de
maneira questionadora.
2.1.2 Arte-educação na pós-modernidade
A arte-educação, até inícios do século XXI, esteve fortemente baseada em
crenças modernistas sobre a arte. Conforme Efland (2003) e Brent Wilson (in
BARBOSA, 2005b), as idéias modernistas sobre a natureza da arte, seu papel na
cultura e na sociedade, assim como a concepção de criatividade e originalidade é
que determinavam o currículo artístico.
“Mas agora o clima do mundo da arte mudou.” (WILSON in BARBOSA,
2005b, p. 82). Os teóricos sustentam que entramos em um novo período cultural. A
55
arte-educação, hoje denominada ensino da Arte, mudou bastante desde as
primeiras décadas do pós-modernismo. A busca insaciável pelo novo ligado à noção
de avanço progressivo e da concepção de arte como algo separado do mundo social
passaram a ser questionadas por críticos e historiadores da arte.
Para Efland (2005), a transição do modernismo para o pós-modernismo, o
aparecimento de um mercado cultural internacional e a situação do mundo após a
Guerra Fria são questões importantes que atuam com impacto e provocam
transformações que afetam e afetarão o cenário da educação no futuro.
O modernismo, transportou para a arte as qualidades da abstração e pureza
formais, que tendiam a excluir qualquer referência externa, criando assim o mito da
arte independente e auto-referente. As obras de arte eram consideradas como
resultado de práticas individuais que somente poucos gênios possuíam talento para
expressar. A arte tornou-se um domínio cognitivo separado, logo era ensinada como
algo isolado do mundo e sem relação com a história e com o mundo social. As
qualidades das obras existiam em virtude de suas relações internas e podiam ser
compreendidas apenas pelos olhos. Segundo Parsons (1999), qualquer coisa
cultural, ou que precisava ser aprendida verbalmente, era considerada como
estritamente irrelevante. Em conseqüência, a meta em arte-educação foi a de
desenvolver o aprendizado da percepção estética. “A visão contemporânea, em
contraste, entende que uma obra de arte pode ser constituída por dois tipos de
coisas: por suas qualidades estritamente estéticas e por um conhecimento de seu
contexto.” (PARSONS, 1999).
A estética modernista fixou um conjunto universal de elementos e princípios
que eram tomados como modelos no ensino de Arte. Apenas os cânones ocidentais
de código dominante passaram a ser aceitos como a melhor arte e tudo o que não
estivesse de acordo com estes princípios, era considerado como de menor valor.
Dessa forma, o modernismo transformou a arte em um “projeto elitista” que
enfatizava uma separação entre a arte erudita e a cultura popular (EFLAND, 2005).
Esse pensamento acarretou em padronização e homogeneização nos currículos e
apenas determinados tipos de arte eram consideradas como conteúdo digno de
estudo acadêmico. Segundo Chalmers (2003), isso refletiu também em uma
configuração etnocêntrica e egocêntrica nos currículos do ensino de Artes e boa
parte do pensamento artístico, encobrindo interesses colonialistas, raciais, estruturas
classistas e diferenças hierárquicas entre os gêneros.
56
"Desde os anos 50 - década em que por convenção se encerra o
modernismo" (GADOTTI, 2002, p. 310), com a entrada das sociedades na era pós-
industrial e as culturas na idade pós-moderna, ocorrem modificações profundas
causadas pelo impacto das transformações tecnológicas na própria ciência, na
sociedade e na arte. O cenário pós-moderno, muito mais informatizado gera crises e
mudanças nos conceitos e discursos modernos, com suas pretensões atemporais e
universalizantes, impondo sérias reflexões sobre a diversidade e identidade
culturais, globalização e questões político-sociais.
A ampla divulgação da cultura popular por meio de marketing dos meios de
informação e comunicação, vem sendo uma das principais preocupações de teóricos
e críticos pós-modernos. Para Efland (2005), trata-se de um fenômeno semelhante à
modernidade ocidental, que alimentado por forças econômicas mais fortes que o
Ocidente - um novo mercado cultural internacional que se impõe às demais culturas
através do marketing de massas das mídias e novas tecnologias, unindo o mundo
todo, levando à uniformização e homogeneização. Enquanto isso ocorre, as pessoas
correm o risco de perder suas identidades culturais tradicionais (EFLAND, 2005).
Ao lado desse processo rumo à homogeneização cultural, o colapso da URSS
e desintegração do comunismo cedem lugar a conflitos e contradições em áreas
abandonadas que deixaram de ter interesse para EUA e Rússia, no início da década
de 1990. Sem a antiga bipolaridade, no mundo pós-Guerra Fria surgem atores locais
agindo sem qualquer regulação externa ou interna, criando o que Lellouche (apud
VIANNA, 2005) designa de “mundo à deriva”, uma desordem entre as nações, que
clama por um novo equilíbrio mundial. Essa desordem, segundo Efland (2005, p.
180), causa o que presenciamos hoje, “uma retribalização de grande parte da
humanidade por meio da guerra e do derramamento de sangue [...]” que opõe
cultura contra cultura, pessoas contra pessoas, tribos contra tribos.
Como assinala Barber (apud EFLAND, 2005), os conflitos gerados pelas
culturas, contra qualquer cooperação social, contrastam com as forças econômicas
do mercado cultural internacional, que pressiona as nações a virarem um mesmo
parque temático. Para Barber (apud EFLAND, 2005 p. 181) “entre a Babel e a
Disneylândia”, o planeta se desfaz e ao mesmo tempo, tenta recompor-se.
Esse cenário dá impulso à crítica cultural pós-moderna dirigida à cultura
ocidental, fazendo surgir na Educação, uma Pedagogia Crítica mais radical, que
questiona as limitações do modernismo, sob a forma de argumentos às vezes
57
identificados como “feminismo, teoria marxista, hermenêutica e multiculturalismo.”
(EFLAND, 2005, p. 175). Diante das desilusões causadas pela modernidade,
segundo Gadotti (2002, p. 311-312), critica-se o racionalismo que levou à
desumanização, pretendendo “resgatar a unidade entre história e sujeito que foi
perdida durante as operações modernizadoras da cultura e da educação”,
defendendo a igualdade social para os diferentes grupos étnicos e raciais.
Uma das finalidades principais, no ensino de Arte, passa a ser alcançar uma
educação mais democrática, considerando que uma forma de atingir esse objetivo é
contribuir para a compreensão do mundo social e cultural no qual os indivíduos
vivem. Uma educação democrática e pós-modernista, para Freedman (2000, p. 325,
tradução nossa), fundamenta-se em quatro idéias principais:
a) uma ampliação do domínio da arte-educação; b) uma mudança na ênfase
do ensino formalista para a construção do conhecimento; c) a importância
do contexto social para tal construção e d) uma nova definição e ênfase na
crítica.
No pós-modernismo as fronteiras entre as formas de arte eruditas e não-
eruditas desaparecem (EFLAND, 2005). Com a sensação de esgotamento estilístico
do movimento modernista, Efland (2003, p. 14) assinala que a corrente crítica, “vem
ganhando influência entre os artistas provocando um deslocamento cultural.”
Desde o início da década de 1990, a arte mostra “uma série de mudanças
que antes se percebiam como incipientes.” (HERNÁNDEZ, 2001, p. 3). Desde então,
denota a dependência cada vez maior da cultura, das novas tecnologias e das
formas de visualidade geradas por esses meios. Surgem os produtos híbridos, novas
dinâmicas de produção, utilização e manipulação de imagens preexistentes (MELLO,
2003). Reaparece também o realismo. Porém, conforme Efland (2005, p. 179), de
maneira diferente do realismo tradicional, amiúde emprega o imaginário da
propaganda e do comércio e “gira em torno de símbolos sociais e culturais.” Um
exemplo desse emprego de imagens da propaganda e imagens da cultura popular,
pode se ver em Julian Beever, um artista inglês que mantém seus trabalhos na
Internet (Figura 8).
58
Figura 8 – Julian Beever. Batman and Robin to the Rescue
27
, s.d.
Como destaca Efland (2003, p. 17, tradução nossa), “os artistas pós-
modernos se apropriam de imagens e formas de épocas e lugares distintos,
incorporam elementos de representação em sua obra, e, freqüentemente,
mensagens socialmente comprometidas.” Tanto artistas como críticos tornam-se
mais propensos a criar e interpretar as obras a partir de seu contexto de origem.
A ampliação do campo das artes e dissolução de fronteiras entre arte erudita
e artes populares, bem como grande parte do material imagético produzido pelas
mídias atuando com impacto na subjetividade e identidade, trazem questões
pertinentes para a revisão de conceitos no ensino de Arte, transformando em desafio
a construção de propostas comprometidas com a contemporaneidade e a realidade
social. Nesse contexto, surge a emergência de um novo campo de estudos
denominado como o campo da Cultura Visual, identificado por Julie Matthew (apud
HERNÁNDEZ, 2007, p. 22) como resposta frente à necessidade de “investigar e
analisar uma cultura dominada por imagens.” Hoje, uma das propostas mais
divulgadas, os estudos da Cultura Visual giram em torno das artes, das mídias e da
vida cotidiana.
27
Imagem disponível em <http://users.skynet.be/J.Beever/>. Acesso em: 16 set. 2006.
59
2.2 AS ABORDAGENS SOCIOCULTURAIS EM ARTES VISUAIS
As teorias sobre a Cultura Visual, Pedagogia Crítica da Arte e Educação,
abordagens consideradas socioculturais, fundamentam este estudo. Na presente
pesquisa, dentro da perspectiva da Cultura Visual, é particularmente importante a
relação entre este campo e a Pedagogia Crítica, assim como a Antropologia que
fundamenta ambas as abordagens.
Em sentido genérico, a abordagem sociocultural, é interacionista e considera
o homem e o mundo conjuntamente, porém dando ênfase ao sujeito como
elaborador do conhecimento. O trabalho de Paulo Freire inspira essa tendência no
Brasil. Segundo Freire (1979, 1997), o desenvolvimento da consciência crítica pode
tornar o sujeito cada vez mais capaz de sua práxis, libertando-o e tornando-o apto
para responder aos desafios provocados por seu mundo. Essa abordagem vem ao
encontro das necessidades do ensino de Arte, que hoje se depara com o desafio de
contribuir para a construção crítica da realidade social por meio da educação para a
liberdade (RICHTER, in CORRÊA, 2004; FRANZ, 2004).
As transformações na sociedade e na cultura levantaram aspectos sociais
antes ignorados pela arte-educação, bem como apontam a importância do visual na
sociedade contemporânea e, naturalmente, a necessidade de propostas mais
conectadas com os problemas da atualidade. Desde que a imagem passou a ser
fundamental como fonte de informação e conhecimento no ensino de Arte, outras
questões começaram a ser evidenciadas e maior preocupação com as relações
entre pessoas e seus contextos sociais e culturais singulares.
Segundo Meneses (2003), desde a década de 60, a Antropologia tem dado
origem ao reconhecimento de uma dimensão da cultura associada à visualidade.
Nas últimas décadas, segundo esse autor (2003, p. 15)
28
, têm surgido propostas que
28
Segundo Meneses (2003, p. 16), a formação do que se chama hoje Antropologia Visual surgiu
mediante o reconhecimento do potencial informativo das fontes visuais que gerou a consciência de
sua natureza discursiva. Com isso, os objetivos desse novo campo de estudos - produção, circulação
e consumo das imagens incluíram a interação entre o observador e o observado.” Dessa forma,
60
procuram entender as imagens como objetos que participam das relações sociais e
“para o entendimento da arte como agency, em sua capacidade de produzir efeitos,
produzir e sustentar formas de sociabilidade.”
Para os teóricos
29
, que adotam a concepção de ensino pós-moderno, a arte é
considerada como uma representação social e como uma forma de produção ou
reprodução cultural destinada a criar símbolos de uma realidade comum. Para esses
autores, a obra de arte como prática sociocultural traz consigo contradições
inerentes à sociedade e à cultura na qual foi gerada e aceita.
2.2.1 A Cultura Visual como um campo de estudos
As teorias de Hernández
30
sobre a Cultura Visual, são as que mais
contribuem para esta pesquisa, uma vez que valorizam práticas e concepções de
ensino de Artes Visuais relacionadas às HQs.
A Cultura Visual, segundo Hernández (2006), é um campo que emerge de
diversas disciplinas e da história cultural da arte. Pode-se pensar este campo como
formado pelas “formas culturais vinculadas ao olhar e que denominamos como
práticas de ‘visualidade’; e o estudo de um amplo aspecto de artefatos visuais que
vão mais além dos recolhidos [...] nas instituições de arte.” (HERNÁNDEZ, 2006, p.
5). Não se trata, portanto, de um campo que se refere apenas a uma série de
objetos. No ensino de Arte, a Cultura Visual, leva em conta que,
como educadores do campo das artes visuais, estamos relacionados com
artefatos que são, em primeiro lugar, significativamente representações
visuais e, em segundo lugar, que constituem posições e discursos, através
de atitudes, crenças e valores, o que quer dizer que mediam significações
culturais. (HERNDEZ, 2006, p. 5, tradução nossa).
conforme Meneses (2003. p. 16-17), “aos estudos de manifestações ‘imagéticas’ da cultura se
acrescentou a necessidade de compreender os mecanismos variadamente localizados de produção
de sentido sentido dialógico, portanto socialmente construído e mutável e não pré-formado ou
imanente a fonte visual.”
29
Geertz (1997); Cary (1998); Freedman (2000, 2001); Mason (2001); Chalmers (2003); Mirzoeff
(2003); Efland, Freedman, Sthur (2003); Richter (2004); Efland (2005); Corrêa (2004, 2005) Franz
(2000, 2001, 2003a, 2003b, 2003c, 2003d, 2004, 2005a, 2005b); Hernández (1998, 2000, 2001,
2003a, 2005, 2006, 2007).
30
Hernández , idem.
61
Para construir interpretações sobre as manifestações do visual, conforme
Hernández (2006), não é possível ficar apenas com a História da Arte, a estética ou
a semiótica. Para isso, a Cultura Visual nutre-se principalmente da teoria crítica, dos
estudos culturais, do feminismo, da psicanálise, da lingüística, da teoria literária, da
fenomenologia, da antropologia e dos estudos dos meios, a fim de poder explorar,
mediante o visual, "a dimensão social do olhar." (HERNANDEZ, 2000, p. 24). Dentro
dessa perspectiva, é possível estabelecer nexos entre problemas, lugares e tempos
com a finalidade de opor-se ao potencial etnocentrista e unidirecional de enfoques
ainda presentes.
Para Mirzoeff (2003), a história intelectual que separa termos entre alta cultura
e cultura popular cria um difícil legado para os estudos sobre a Cultura Visual. O
papel que desempenham todas as variedades culturais é demasiado complexo e
demasiado importante para ficar reduzido a estes termos.” (MIRZOEFF, 2003, p.33,
tradução nossa). Conforme Hernández (2000, p. 84), “desde a metade do século
passado foram fixadas as premissas reguladoras dos fundamentos do ensino da arte
nas quais se pode observar uma separação entre a cultura popular, o gênio
individual e os valores oficiais.”
Ao invés de dividir a Cultura Visual em partes opostas, Mirzoeff (2003) prefere
considerar e examinar o modo como a trajetória do visual tem dado lugar à aparição
do visual no mundo contemporâneo. Hernández (2006) considera que suas teorias
sobre a Cultura Visual estão próximas ao projeto de Mirzoeff (2003) que explora o
modo “como a visualidade chega a desempenhar um papel tão relevante na vida
moderna [...] que se projeta nas trajetórias que conduzem ao estudo das formas da
visualidade contemporânea.” (HERNÁNDEZ, 2006, p. 6).
Para Mirzoeff (2003, p. 34), as partes constituintes da Cultura Visual o
estão definidas pelo meio [televisão, Internet, ou cinema], “mas pela interação entre
o espectador e o que ele olha e observa, o que pode definir-se como acontecimento
visual.” (tradução nossa). A Cultura Visual, segundo esse autor, interessa-se pelos
acontecimentos visuais nos quais o consumidor busca a informação, o significado ou
o prazer conectados com a tecnologia visual. Abrange desde a pintura a óleo, a
televisão até a Internet, enfocando os momentos nos quais o visual se transforma
em lugar de debate e lugar de interação social e de definição de classe, gênero ou
identidade. É um campo novo, segundo Mirzoeff (2003, p. 24-27), porque centra-se
no visual “como um lugar em que se criam e discutem os significados.” O autor
62
explica que, assim como os estudos culturais procuram “compreender de que
maneira os indivíduos buscam o sentido do consumo da cultura de massas, a cultura
visual dá prioridade à experiência cotidiana do visual”. Nesse sentido, a cultura
visual também “está ligada à crise da informação e à sobrecarga do visual no
cotidiano.”
Para Mirzoeff (apud HERNÁNDEZ, 2006, p. 19-20) o hiper-estímulo da cultura
visual satura o campo do visual, “um processo que continuamente falha enquanto
aprendemos a ver e conectar cada vez mais depressa.” A Cultura Visual é um
campo mutante em constante formação dos meios e dos usos e apropriações.
Mirzoeff (2003) busca interpretar o processo de visualização cada vez mais
crescente e radical da contemporaneidade, e como no contexto da modernidade a
visualidade ajudou a fixar maneiras de ver, dizer, agir e fazer. Para esse autor (apud
HERNÁNDEZ, 2006), a condição da imagem na s-modernidade, devido à
circulação global é mais que um problema local.
A noção de Cultura Visual, dentro do enfoque de Hernández (2000) define-se
como o conjunto de valores, crenças e significados que as crianças e adolescentes
em geral, mesmo sem o reconhecer, utilizam para dar sentido às coisas vividas em
seu mundo. Esta noção de cultura está relacionada a visualidade que torna possível
modelar comportamentos e identidades: vídeo games, filmes, desenhos animados,
revistas, propagandas e outras formas possíveis.
No campo da Cultura Visual, “é possível organizar [...] propostas
transdisciplinares, a partir de problemas que vão além de uma disciplina e que são
reflexos das mudanças” que se produzem na sociedade. (HERNÁNDEZ, 2000, p. ix).
Essas propostas sobretudo, permitem interpretar e construir experiências educativas
vinculadas às representações que as crianças e adolescentes constroem de si e do
meio e que são influenciadas pela indústria do consumo, relacionando a construção
do conhecimento com a sociedade da informação e a comunicação com o que se
aprende na escola.
Na obra Cultura Visual, Mudança Educativa e Projetos de Trabalho (2000),
Hernández faz uma crítica a algumas práticas utilizadas pelos professores que usam
obras de arte apenas para ensinar elementos da linguagem visual. Algumas dessas
formas de ensino, denominadas por Hernández de racionalidade eclética, encaram
alunos apenas como consumidores de imagens. Na opinião desse autor, dizer que
63
estamos na cultura da imagem mas ensinar com estratégias dos anos 20 ou 60 é
uma contradição que reduz o conhecimento a fragmentos disciplinares.
Cada concepção de ensino da Arte, segundo Hernández (2000), tem uma
forma de argumento utilizada para justificar sua presença no currículo, denominada
por ele de “racionalidade”. Conforme esse autor, existem as racionalidades:
industrial, histórica, forasteira, moral, expressiva, cognitiva, criativa, comunicativa,
interdisciplinar e a racionalidade cultural.
Cabe lembrar dentro deste tópico que, para Hernández (2000, p. 45), "a
racionalidade cultural considera que a arte é uma manifestação cultural e que os
artistas realizam representações mediadoras de significados em cada época e
cultura.” Conforme assinala, essa forma de racionalidade coloca-se diante da
“racionalidade comunicativa” concepção que considera importante que os alunos
aprendam a ler e produzir imagens, pelo fato de que vivemos uma cultura dominada
pela imagem. Nesta abordagem, conceitos da semiótica e da linguagem formal são
os fundamentos.
A racionalidade cultural, segundo Hernández (2000, p. 46), se encontra
também presente nos Parâmetros Curriculares Nacionais Brasileiros em que
consideram o “‘objeto artístico’ como produção cultural”, tendência que participa das
revisões sobre o status da arte e o papel que exercem as imagens na construção
das representações sociais na pós-modernidade.
Conforme Hernández (2000), a concepção de educação baseada na
percepção de imagens
31
enfatiza as propriedades visuais da obra ou das imagens e
são propostas que em geral, tendem a considerar as propriedades visuais da obra
de arte, como universais, estáveis e únicas. Centrar-se na percepção, para
Hernández (2000, p. 46), “significa estabelecer uma clara distinção entre as
qualidades estéticas” e outras características não visíveis na obra.
Essa concepção da arte, baseada no comportamento perceptivo, conforme
Parsons (apud HERNÁNDEZ, 2000, p. 46), surgiu de uma “confluência de idéias,
correntes e propostas que afetam diversos campos de conhecimento” e que coincide
31
A educação baseada na percepção das imagens é o eixo que segundo Hernández (2000, p. 46),
“articula os conteúdos do Programa Curricular Espanhol.” Os PCNs/1997-98 brasileiros, embora
enfatizem a importância para a compreensão das diferentes culturas, interpretação e
contextualização, também dão igual importância à linguagem visual e a percepção. No volume 6 -
Arte, dedicado à 1ª a e os PCNs de 5ª a séries (1998, p. 64) destacam que “o desenvolvimento
do aluno nas linguagens visuais requer, então, a aprendizagem de técnicas, procedimentos,
informações sobre história da arte, artistas e sobre as relações culturais e sociais envolvidas na
experiência de fazer e apreciar arte.”
64
com o interesse pela chamada “revolução cognitiva”, promovido pelas teorias de
desenvolvimento de Piaget, com as correntes formalistas da arte.
Os fundamentos dessa concepção, de acordo com Hernández (2000), têm
por base, as idéias modernas sobre arte que propunham a necessidade de explorar
o meio visual reduzindo-o a suas características formais
32
.
2.2.1.1 A educação para a compreensão crítica da Cultura Visual
Diante dessa última concepção, surge a necessidade da educação para a
compreensão da Cultura Visual. Para Bruner (1991, apud HERNÁNDEZ, 2000) esta
tendência se define “como de volta ao significado”, preocupando-se mais com a
interpretação do discurso e menos com as regras da linguagem. Centra-se na
compreensão dos fenômenos artísticos, não apenas dos que favorecem uma
experiência estética, dirigindo-se mais para a interpretação do que para a
percepção, enfatizando o contexto como eixo principal.
Essa tendência, de acordo com Hernández (2000), reivindica a interpretação
como conteúdo central para as propostas em arte-educação. Nesse enfoque, a
interpretação une e vincula dois processos: o visual e o verbal. O que se pretende é
estabelecer relações e conexões entre as produções culturais e a compreensão das
representações que qualquer pessoa ou grupo cultural elabora.
Para Hernández (2000, p. 49), trata-se de ir além de “o quê” são as coisas e
“começar-se a estabelecer os ‘porquês’ dessas representações, aquilo que mostram
e o que excluem” e os valores que consagram.
No processo para a compreensão, segundo Parsons (apud HERNÁNDEZ,
2000), a linguagem ocupa o papel de mediadora e estabelece marcos de
compreensão, por meio de comparação, geração e interpretação de significados
sobre meios verbais e visuais. Palavras e imagens interagem produzindo contextos
de interpretação e redes de múltiplos significados.
Conforme Franz (2003a, p. 129), um deslocamento da preocupação com
as regras da linguagem para a interpretação do discurso. Segundo essa autora, “a
32
O crítico de arte Clemente Greemberg teve grande influência na divulgação dessa corrente, como
mentor do movimento abstrato (HERNÁNDEZ, 2000).
65
compreensão toma o lugar da experiência estética e supõe relacionar a biografia de
cada um com os artefatos visuais, com os objetos artísticos.” Este deslocamento,
para Franz (2003a), é o que possibilita expandir o conhecimento base dos alunos, e
desenvolver estratégias para que continuem aprendendo, favorecendo também uma
atitude reconstrutiva ao promover uma autoconsciência da própria experiência em
relação à obra ou imagem.
Para Hernández (2000), esse enfoque exige especial atenção em como os
alunos (ou outras pessoas) modificam, ou levam adiante, suas compreensões sobre
o significado das obras e representações visuais em estudo. Esse caminho oferece
alternativas para que os alunos aprendam a “avaliar, selecionar e interpretar a
avalanche de informações que recebem todos os dias.” (HERNÁNDEZ, 2000, p. 50).
Na proposta da educação para a compreensão crítica da Cultura Visual, o
objeto de estudo são as diferentes manifestações da Cultura Visual e não apenas
objetos considerados canônicos, mas também aqueles produzidos no presente e no
passado, bem como os que estão vinculados à própria cultura e às de outrem.
A proposta da compreensão crítica da Cultura Visual significa, em primeiro
lugar, reconhecer que convivemos com uma imensa variedade de imagens; em
segundo, aproximar-se dos objetos visuais, deixando de lado as crenças sobre os
valores estéticos determinados como universais. Essa postura ajuda a entender
como certas representações contribuem para fixar visões sobre a realidade e as
identidades.
Prestar atenção à compreensão da cultura visual implica aproximar-se de
todas as imagens (sem os limites demarcados pelos critérios de um gosto
mais ou menos oficializado) e estudar a capacidade de todas as culturas
para produzi-las no passado e no presente com a finalidade de conhecer
seus significados e como afetam nossas ‘visões’ sobre nós mesmos e sobre
o universo visual em que estamos imersos. (HERNÁNDEZ, 2000, p. 51).
Esse olhar sobre os objetos envolve considerar a arte como um fenômeno
complexo e também levar em conta sua história, localizando seu contexto de origem
e sobretudo que a arte atua como um mediador cultural.
O significado da função mediadora da arte, na teoria de Hernández (2000, p.
52), é derivado da idéia de Vygostsky que “pressupõe que o ‘signo é possuidor de
significado’.”
66
Hernández considera que a arte, os objetos e os meios da Cultura Visual,
contribuem para que os indivíduos fixem suas representações sobre si, sobre o
mundo e sobe seus modos de pensar. A cultura
cumpre a função de manufaturar as experiências dos seres humanos
mediante a produção de significados visuais, sonoros, estéticos [...]. Esses
significados [...] contribuem para a construção da consciência individual e
social pela incorporação dos índices visuais com valor simbólico produzidos
por grupos diferentes [...] nos processos de intercâmbio social.
(HERNÁNDEZ, 2000, p. 52).
Hernández enfatiza que a Cultura Visual, os objetos e a arte não existem
independentes de um meio em que os seres humanos se valem dos significados
para construir sua subjetividade e sua vida mental. A construção da identidade é
modelada segundo a maneira pela qual os indivíduos fazem uso dos significados e
recursos encontrados em seu ambiente sociocultural.
“Os signos e símbolos são o veículo de significado e ocupam um papel na
vida da sociedade”; é ela quem lhes vida. (HERNÁNDEZ, 2000, p. 53). Para esse
autor, isso implica a construção e a desconstrução dos sistemas simbólicos
mediante os quais os indivíduos e grupos dotam de sentido as coisas ou os fatos em
seu entorno. Assim, para Hernández (2000) e Franz (2003a), os estudos da arte e
da Cultura Visual não devem ser realizados tanto como signos cujos significados
devem ser identificados, mas de considerar a arte ou os artefatos como formas de
pensamento, ou como um idioma que deva ser interpretado, a fim de encontrar o
significado das coisas a partir da vida que os rodeia.
Hernández (2000, p. 53) argumenta ainda que “a variedade das expressões
artísticas corresponde à variedade de concepções que os indivíduos têm sobre o
que são as coisas” o que o leva a dizer que as obras artísticas e os elementos da
Cultura Visual o, portanto, objetos que levam a refletir sobre as formas de
pensamento que as geraram. Estudar uma manifestação artística de outra época ou
outra cultura, nessa perspectiva supõe uma compreensão mais profunda do que
permanecer ligado somente ao visual. Para Geertz (1997, apud HERNÁNDEZ, 2000,
p. 53), a cultura “seria a construção e participação dos indivíduos num sistema geral
de formas simbólicas, e o que denominamos arte seria uma parte dessa cultura.” Os
conceitos de Geertz levam esse autor a considerar que
67
a arte e a cultura visual atuam como mediadores de significados; o
significado pode ser interpretado e construído; os objetos artísticos se
produzem num contexto de relação entre quem os realiza e o mundo; os
artefatos visuais podem informar àqueles que os vêem sobre eles mesmos e
sobre temas relevantes sobre o mundo. (HERNÁNDEZ, 2000, p. 54).
Para ele, a elaboração da realidade não é somente um processo individual.
As inserções do indivíduo em categorias sociais e culturais e grupos distintos
incidem na elaboração da realidade tanto individual como a elaboração da realidade
pelos grupos, que compartilham as mesmas visões e interpretações dos
acontecimentos, que têm a ver com as compreensões relacionadas à Cultura Visual.
Nas pesquisas sobre a compreensão, a psicologia construtivista, segundo
Hernández (2000, p. 54), trata-se de
compreender as funções mentais de ordem superior em termos de processo
de construção simbólica (Bruner, 1991; Prawat, 1993). Essas funções
desempenham um papel estratégico na forma como a mente se relaciona
com a informação e em como, mediante processos de interação social, vai
transformando-a em conhecimento pessoal. (KOROSCIK, 1992; EFLAND,
1993, 1996).
Vygotsky inspira essa abordagem que, segundo o autor citado, destaca o
papel das relações sociais no desenvolvimento das atividades mentais complexas, e
também da internalização, transferência e a zona de desenvolvimento proximal nos
processos da construção do conhecimento.
Seguindo essa proposição, na educação para a compreensão, a
aprendizagem tem por objetivo estabelecer processos de inferência e transferência
entre os conhecimentos adquiridos e novos problemas ou situações colocados
para quem aprende. Boix Mansilla (apud HERNÁNDEZ, 2000, p. 55) destaca que um
dos objetivos da educação para a compreensão “é que os estudantes sejam
capazes de transferir o que aprendem para outras situações e problemas.” Conforme
Prawat (apud HERNÁNDEZ, 2000), a capacidade de transferência está ligada a dois
fatores: à organização mental do conhecimento e ao nível de autoconsciência que o
sujeito possui de seu próprio conhecimento.
Na perspectiva de Hernández (apud FRANZ, 2003a, p.135), as imagens
devem ser abordadas “de maneira interdisciplinar, baseando-se nas características
evolutivas dos estudantes, estabelecendo conexões interculturais e partindo de uma
posição crítica social.” As relações entre os saberes (interdisciplinaridade) favorecem
o desenvolvimento de um conhecimento crítico e a realização de produções nos
68
quais esse conhecimento se projete em novas produções simbólicas”.
(HERNÁNDEZ, 2000, p. 56).
Esse mesmo autor questiona o currículo organizado em compartimentos que
exclui outras formas de saber, e assinala a necessidade de propostas
interdisciplinares que possam ir além de conteúdos considerados como estáveis e
universais. O objetivo principal da proposta da Cultura Visual é promover a educação
para a compreensão crítica, com base no pensamento do visual como mediador de
significados e na interpretação como meio para favorecer o conhecimento.
Segundo Franz (2003a), a compreensão crítica da arte na perspectiva da
Cultura Visual exige o domínio de diferentes âmbitos que transpassam as disciplinas
escolares e vão além, em direção ao universo pessoal e social dos estudantes. Para
compreender a arte, segundo essa autora, é necessário uma profunda imersão no
contexto sociocultural da obra de arte ou da imagem em estudo. Mas isso por si
não basta. Conforme Franz (2003a), educar para a compreensão crítica da arte
exige conhecimentos relacionados a como se ensina e como se aprende,
denominado âmbito pedagógico. Para Franz (2003a), é necessário saber relacionar
conhecimentos de caráter histórico, estético, artístico e antropológico com a vida
social e pessoal dos educandos, fazendo como quer o ensino da pós-modernidade,
de modo reflexivo e crítico. Segundo essa autora, esta é uma maneira de abordar
conhecimentos em Artes Visuais que não passa pela simples identificação de
elementos da linguagem visual e do essencialismo estético.
Franz (2003a), assinala que esse processo nos situa na teoria crítica, à
medida que acontece uma tomada de consciência de cada um para construir a
relação entre sua própria identidade e as representações sobre o mundo. Essa
atitude favorece a auto-reflexão sobre os processos de influências, sobre si e sobre
o meio.
Educar para a compreensão crítica das imagens, segundo Hernández (2000),
supõe que os estudantes adquiram as destrezas que lhes permitam ir além do
mundo tal como estão acostumados a percebê-lo. À medida que o refazemos e o
renomeamos, damos-lhe novo sentido. A interpretação tem papel fundamental nesse
processo, participando de um diálogo que permite a construção do conhecimento
por meio de ações e comentários. Facilita-se “a aprendizagem a partir do
estabelecimento de relações entre imagens e seus contextos de produção”.
(HERNÁNDEZ, in FRANZ, 2003a, p. 11).
69
Esses autores enfatizam a importância da problematização na educação para
a compreensão. Ensinar a fazer perguntas é uma estratégia para favorecer a
compreensão dos processos e significados da Cultura Visual. Mas, para isso,
segundo Hernández (2000, p. 50), é necessário que elas estejam vinculadas a uma
"reflexão crítica sobre as diferentes tradições históricas, filosóficas e culturais que
serviram de guia para construir ‘representações’ mediadoras de significados em
diferentes momentos e lugares” da história.
O “Ensino para a Compreensão”, segundo Franz (2003a), teve entre seus
principais investigadores, Perkins, Gardner e Victor Perrone. Esses pesquisadores
partiram das idéias de Dewey, segundo o qual estabelecer relações é fundamental
para o processo do conhecimento. Dewey reivindicava uma educação que
integrasse conteúdos escolares com a vida cotidiana e via na educação um caminho
de crescimento e desenvolvimento autônomos. Considerava a experiência como
conhecimento. Bruner, herdeiro de suas idéias, segundo Wiske (apud FRANZ,2003a
p.161), “propunha uma aproximação à aprendizagem reflexiva que estabelecesse
conexões sólidas com a vida das crianças.” A educação pós-moderna retoma esses
conceitos e amplia a noção de experiência.
Conforme Franz (2003a, p. 162), nem sempre conseguimos fazer com que os
alunos atinjam um nível desejável de compreensão “apenas estudando a imagem
em si.” De acordo com essa pesquisadora, ensinar a fazer perguntas e a
problematizar em torno de uma questão em estudo é o caminho que leva à
compreensão das obras. Para Franz (2003a), ensinar a fazer perguntas sobre obras
e imagens da cultura visual é uma maneira de introduzir os alunos em investigações
críticas, examinar e aprender a observar atentamente. Esse processo os leva a
refletir e a interpretar de modo mais profundo e significativo.
2.2.2 A Pedagogia Crítica da Arte
Denominada também por nova sociologia da educação” ou “teoria crítica da
educação”, segundo McLaren (1997), a Pedagogia Crítica teve origem na Escola de
Frankfurt de Teoria Crítica, iniciada antes da Segunda Guerra Mundial, na
Alemanha. Nos Estados Unidos, essa escola atualmente segue com novas
70
pesquisas sociais e vem influenciando inúmeras disciplinas, “tais como a crítica
literária, a antropologia, a sociologia e a teoria educacional.” (McLAREN, 1997, p.
191). Conforme esse autor, a Pedagogia Crítica vem conquistando novos avanços
na teoria social e desenvolvendo novas categorias de investigação e metodologias.
Para Santaella (2002), a teoria crítica criou o conceito de indústria cultural, e
essa é uma das suas questões originárias. Conforme essa autora, os filósofos da
escola de Frankfurt criaram em meados dos anos 40 este conceito, desmistificando
a idéia acalentada pela sociologia funcionalista, das mídias como ferramentas da
democracia moderna.
Na educação, segundo McLaren (1997), a Pedagogia Crítica examina a
escola em seus contextos históricos, considerando que são “parte do tecido social e
político existente que caracteriza a sociedade dominante” (MCLAREN 1997, p. 191),
contrapondo-se às análises positivistas, não históricas e despolitizadas. Investiga e
desafia o poder que a escola representa em nossa vida política e cultural.
Os teóricos educacionais críticos consideram as escolas não apenas como
locais de instrução, mas também locais onde coexistem uma heterogeneidade de
formas ideológicas e sociais que estão em incessante luta pelo poder (McLAREN,
1997). No enfoque crítico, a escolarização é uma forma de política cultural e é
sempre uma forma de introdução, preparação e legitimação de formas particulares
da vida social. A Pedagogia Crítica é revolucionária e fundamentalmente aberta a
mudanças, e um de seus objetivos principais é fortalecer as minorias e transformar
desigualdades e injustiças sociais (McLAREN, 1997; CARY, 1998; FREIRE, 1979,
1997; GIROUX, 1997, 2003; POLLOCK, 2003).
No pensamento de McLaren (1997), a escola deve trazer a vida de fora para
dentro dela, com toda a sua dinâmica e suas contradições, no sentido de considerar
suas dimensões econômicas de classe, relações de poder e gênero. As teorias de
McLaren (1997) são, em grande parte, influenciadas pelo teórico Henry Giroux. Este
e Paulo Freire, são teóricos que têm grande importância para a Pedagogia Crítica.
Giroux (1997, 2003) contribui para a Pedagogia Crítica com sua crítica ao
sistema educacional e cultural influenciado pelas indústrias culturais norte-
americanas. Para Paulo Freire (1979, 1997), frente às alienações culturais vividas
pela sociedade, o profissional de educação deve estar engajado em promover a
ação e a reflexão críticas. Paulo Freire (1979, 1997) acredita na educação para o
desenvolvimento da consciência crítica como instrumento de transformação. Esse
71
desenvolvimento somente se faz mediante um processo educativo, do qual o aluno
deve participar ativamente. Um dos saberes fundamentais para a prática educativa
crítica, na opinião de Paulo Freire (1997, p. 99) é o despertar da “necessária
promoção da curiosidade espontânea para a curiosidade epistemológica.” Inspirado
em Paulo Freire, Giroux (1997, 2003) dedica-se a questões relacionadas à
escolarização, práticas pedagógicas e à cultura das mídias.
Giroux (1997) afirma que existem formas de regulação, nas práticas
pedagógicas que estão relacionadas com tecnologias de poder, as quais não estão
interessadas na aprendizagem para o desenvolvimento da consciência crítica.
Independente disso, para esse autor, as escolas não são neutras. Nos modelos
pedagógicos sempre “forças que trabalham ativamente para produzir
subjetividades que, consciente ou inconscientemente, manifestam um <<sentido>>
particular de mundo.” (GIROUX, 1997, p. 137, tradução nossa).
Dentre as práticas que Giroux (1997) analisa, ele destaca aquelas que são
caracterizadas por um discurso que chama de gestão e controle. Nesses modelos
pedagógicos, há uma visão de cultura e conhecimento que são tratados como
“pacotes modelo,” e os estudantes devem dominar habilidades e formas de
conhecimento. Mas não se menciona a eles, como se relaciona o currículo com os
interesses que representa. Nessa perspectiva, os estudantes constituem um corpo
unitário. O corpo de conhecimentos é distribuído igualmente, independente das
diferenças ou interesses. Esses modelos em geral, segundo Giroux (1997) não
contribuem para uma boa relação entre professores e alunos.
A cultura popular, de acordo com esse autor (2003), por intermédio das
mídias e das novas tecnologias, age como máquina de ensinar, sobre o modo como
se definem as identidades, bem como define o significado da infância e outras
convenções sociais. Grande parte do que as crianças e os adolescentes aprendem
hoje em dia é apresentado pelas elites empresariais. A indústria da propaganda e a
cultura das mídias, basicamente, visam ensinar crianças e adolescentes a serem
consumidores. Sobre o mundo Disney, o autor comenta que
a máquina da fantasia comercial da Disney utiliza a inocência como uma
imagem representacional para infantilizar os próprios adultos aos quais ela é
dirigida. O apelo à fantasia no mundo perfeitamente desenhado da Disney
funciona para incapacitar a imaginação em vez de liberá-la. (GIROUX, 2003,
p.130).
72
Giroux (2003) explica que na paisagem perfeita da Disney, “o pessoal” e o
“empresarial” se misturam propositalmente. Evitando e aliviando adultos e crianças
de terem que fazer suas próprias escolhas, o mundo Disney edita para eles os
conflitos, a política e as contradições. “Dentro desse contexto, o protagonismo crítico
é substituído pelo planejamento empresarial.” (GIROUX, 2003, p. 130). Com
freqüência, por meio dessa pedagogia pública o consumo se transforma em
única forma de cidadania a ser oferecida às crianças, e a democracia é
privatizada por uma ênfase no individualismo egoísta, nos baixos níveis de
participação na vida política e numa diminuição da importância das esferas
públicas não-mercantilizadas. (GIROUX, 2003, p. 132).
Para Giroux (2003), as pessoas fazem mediações e conferem diferentes
significados ao que vêem, compram, vestem e consomem. Mas para que não fiquem
apenas no “reconhecimento”, o autor assinala que é importante uma pedagogia que
desafie os diversos significados e versões de senso comum que os estudantes e
outras pessoas trazem sobre a cultura em suas diferentes manifestações.
Na análise que Giroux (1997, p. 140) faz das práticas pedagógicas que não
despertam interesse nos alunos e reproduzem um sistema que alimenta a violência
no espaço escolar, um dos motivos para o insucesso destas práticas, também está
no fato de que “mostram escassa relação com o cotidiano e a realidade dos alunos”.
Esta é uma das razões que, para Hernández (1998, p. 51), traz a necessidade
de elaborar estratégias “para explorar as diferentes parcelas da realidade e da
experiência dos próprios alunos” e para que aprendam a relacionar os saberes
escolares com outras situações.
Para Hernández (2000, p. 61), das novas correntes didáticas que surgiram
principalmente a partir do começo da década de 1980, “foi a ‘perspectiva crítica’ a
que trouxe ‘novas preocupações sobre o ‘quê’ e o ‘para quê’ da educação’.”
Para saber como a Pedagogia Crítica vem ganhando corpo, no entanto, é
preciso voltar aos anos 60. Como recorda Tomaz Silva (2003), essa foi uma década
de grandes transformações no mundo e na cultura. Foi a partir daí que a Pedagogia
foi se consolidando na educação. Segundo esse autor, nessa época aconteceram: o
movimento de independência das antigas colônias européias, os protestos
estudantis na França, o movimento dos direitos civis nos Estados Unidos, os
protestos contra a guerra do Vietnã, os movimentos da contracultura, o movimento
73
feminista, a liberação sexual, as lutas contra a ditadura militar no Brasil e outros. Não
por coincidência, também foi nessa década que se colocou em xeque a estrutura da
educação tradicional.
Como vimos anteriormente,
33
Efland (2003, 2005) é de opinião que essas
transformações na sociedade e na cultura, ligadas à crítica cultural pós-moderna em
resposta ao modernismo, é que propiciaram o nascimento da Pedagogia Crítica.
Diante dessas transformações, Efland (2005) assinala que a Pedagogia Crítica
assume formas como o feminismo, multiculturalismo e outras que buscam por uma
educação mais democrática.
Com freqüência, a Pedagogia Crítica “questiona as suposições e premissas
do modernismo.” (EFLAND 2005, p. 175). A crítica pós-modernista às questões da
modernidade tem conseqüências enormes e polêmicas para o ensino de Arte.
O pós-modernismo, de acordo com Cary (1998), no ensino de Arte, surgiu
como paradigma no qual o conhecimento é subjetivo e socialmente construído. Em
sintonia com o paradigma pós-modernista, a Pedagogia Crítica da Arte “aceita a
realidade e o conhecimento como construções sociais [e] reconhece a relação entre
poder e conhecimento e aqui, entre poder e valor artístico.” (CARY, 1998, p. 337-
338). A Pedagogia Crítica da Arte, entende que a arte opera dentro de um contexto
social e deve estar comprometida [...] com essa ligação ao invés de seguir o mito
modernista da arte independente auto-referente; isolada do mundo, da história e das
interações humanas.” (CARY, 1998, p. 326).
Cary (1998) assinala, que a arte pós-moderna e a Pedagogia Crítica, fazem
parte de uma ecologia sociocultural, na qual a conectividade tem um papel
fundamental. Na sociedade contemporânea, a troca e a informação se fazem de
maneira interconectada e estão em contínua renovação. Para Franz (2004),
decorrente da globalização, na qual o cruzamento local e global é praticado no dia-a-
dia, também surgem conflitos de tentativas de diálogo. Tais problemas são levados
em conta no movimento para a reconstrução social e a educação pós-modernista,
que, segundo Franz (2004, p. 2), deve estar conectada com o resto da vida, mas
“sem limites entre a arte e seu contexto social de origem”, enfatizando a habilidade
de compreensão e interpretação críticas da arte como principal resultado de ensino.
Princípio que para Efland (apud FRANZ, 2004, p. 3) “é válido tanto para a arte
33
Item 2.1.2 – Arte-educação na pós-modernidade.
74
erudita quanto para as tendências e impactos da cultura popular e da arte do
cotidiano.”
Para a Pedagogia Crítica da Arte, como recorda Cary (1998), é fundamental
abraçar o mundo da arte contemporânea, explorar e entender o pós-modernismo
como um paradigma cultural e como um movimento da arte associado ao ensino da
Arte. A Pedagogia Crítica, visa entender as limitações modernistas que
desvalorizavam e separavam o ensino da Arte do mundo social. Esta separação é
um dos questionamentos pelos quais passam as mudanças reivindicadas pela
Pedagogia Crítica da Arte. Na opinião de Cary (1998) o fato de o ensino da Arte
manter-se centrado em idéias modernistas e dissociado do mundo social é motivo
para que esse ensino não seja considerado como uma das principais disciplinas. A
Pedagogia Crítica não quase nada na arte e no ensino de Arte, “sem estabelecer
vínculos com os discursos sociais, políticos e ideológicos do mundo da arte
contemporânea” (CARY, 1998, p. 336) e considera que as pessoas criam significados
mediante a esfera social.
2.2.2.1 As teorias feministas e as abordagens socioculturais
A Pedagogia Crítica e as teorias feministas, coincidem na consideração de
que as mídias exercem um papel fundamental na criação de significados,
comportamentos e práticas sociais. Nessa perspectiva, as HQs são vistas como um
fenômeno sociocultural.
As teorias feministas têm interesse para as questões socioculturais da arte
porque estão relacionadas ao estudo da problemática da diferença nas artes e da
formação do pensamento patriarcal e falocêntrico na história. Por conseqüência, têm
importância para esta pesquisa, que se realiza com base na Pedagogia Crítica e na
Cultura Visual. Contudo, por encontrarmos poucos teóricos que tratam da relação
arte e gênero, aborda-se aqui principalmente as teorias de Pollock (2003) para fins
de introdução nesta problemática, que por sua relevância mereceria estudos mais
aprofundados.
Conforme Pollock (2003), no modernismo, legendas canônicas da criatividade
masculino-ocidental tornaram-se sinônimos de arte, pura e simplesmente. Na
75
história dos quadrinhos uma linha de pensamento próxima inclui questões ainda
mais polêmicas. Segundo Quella-Quyot (1994, p. 107) “entre a falta de mulheres e o
excesso de sexualidade, a HQ nem sempre conseguiu encontrar o equilíbrio” e, por
isso, os quadrinhos foram rejeitados por muitos educadores e feministas. E, apesar
de o número de artistas femininas autoras de HQs ter aumentado, ainda hoje,
constituem-se em minoria.
Nos histórias em quadrinhos, jargões e cânones muitas vezes se repetem. Ao
abordar as imagens, estas teorias sugerem examinar os pensamentos artísticos que
mascaram interesses raciais, classistas e que promovem diferenças hierárquicas
entre os gêneros, questionando os significados de símbolos e signos, lembrando
que são produtos da sociedade. Diante da fragmentação que apresentavam os
estudos da modernidade, na educação pós-moderna, Freedman (2001) sugere
também incluir considerações e explicações das razões pelas quais os historiadores
da arte se interessaram no passado por determinados artistas e objetos. A partir daí,
os estudantes podem desenvolver métodos de crítica que lhes sejam úteis para
interpretar.
A História da Arte, segundo Griselda Pollock (2003), esconde uma tradição
seletiva, uma versão canônica como História da Arte única. Para essa autora, as
questões sobre as mulheres nas artes são assuntos que necessitam ser explorados,
dada a formação dos discursos configurados sob leis fálicas. A pluralização das
histórias da arte é significativa porque pode promover uma abertura do campo além
da interpretação histórica tradicional e seletiva.
O conhecimento formas nas relações de poder e está impregnado de
interesses políticos, ideológicos e psicológicos. Por esta razão, Pollock (2003) é de
opinião que a necessidade de investigações ao redor da globalização e das
diferenças culturais é inquestionável. Os discursos privilegiados da arte têm servido
a finalidades simbólicas, que disseminam conceitos de eurocentrismo e supremacia
masculina. A História da Arte que estabeleceu legendas canônicas de criatividade
cristã masculina ocidental e se tornou sinônimo de arte, segundo Pollock (2003), é
uma versão do passado que serve para consolidar o gênero como uma linha central
do poder, de um lado, e de outro, serve como marca de exclusão e desvalorização,
ignorando a arte de quase todas as mulheres que participam de atividades criativas.
O trabalho da teoria feminista não é somente a restituição de artistas
mulheres às histórias oficiais da arte, mas também de incluir outras contribuições e
76
reconhecer o significado das diferenças sexuais e outros jogos sociais
econômicos, ideológicos, semióticos e psicológicos.
Apesar da pressão de teóricos mais novos para tentar suprimir ou ridicularizar
as intervenções feministas na História, segundo Pollock (2003, p. xxii), o
pensamento e as teorias de “Einstein, Saussure, Freud, Lévi-Strauss, Barthes,
Derrida, Lacan, Lyotard, Adorno, Benjamin, Klein, Arendt, Merleau-Ponty, Foucault,
Bal” permitiram uma abertura para as intervenções feministas e transformações no
campo da prática artística e domínio estético.
Para Swain (2001), que pesquisa as representações sociais nas revistas,
algumas transformações ocorreram em diversos setores da sociedade, graças aos
movimentos feministas. No entanto, segundo Faludi
34
(apud SWAIN, 2001, p. 13),
essas mudanças têm visto seu grau de dinamismo e alcance de mudanças reduzido
“ou mesmo regredido na medida em que as transformações não atingem as
representações de gênero que constituem os corpos humanos em modelos de ser.”
As pesquisas realizadas por Swain (2001, p. 14) levam-na a dizer que o
discurso das mídias “em seu dialogismo com o rumor social decreta o fim do
feminismo, o campo conotativo do que é dito e do dizível indica a recuperação e/ou
atualização de representações binárias excludentes e hierarquizadas sob novas
roupagens.” Todavia mulheres e homens continuam a ocupar lugares demarcados
tradicionalmente, segundo suas “naturezas” as mesmas “naturezas”
desconstruídas pelo feminismo contemporâneo.
Pollock (2003) assinala que o desafio feminista não se limita ao trabalho
histórico da arte, e os deslocamentos ocorrem em todas as práticas acadêmicas.
Segundo essa autora, os interesses de gênero não revelados dos historiadores da
arte são apenas um ponto de partida inicial para essas teorias, que na realidade
reivindicam um deslocamento mais profundo na recognição, na auto-transformação
e na culturalidade. A finalidade é provocar um deslocamento de muitas bases de
nossos pensamentos e sistemas de conhecimento para um reconhecimento polido
mas político do poder, do eurocentrismo ou universalização falocêntrica
heteronormativa, que exclui todo aquele que não seja branco, cristão e europeu.
Como explica essa autora, as intervenções feministas nas artes são uma redefinição
dos objetos que estudamos e das teorias e métodos com os quais lemos as práticas
34
FALUDI, S. Backlash. La guerre froide contre les femmes. Paris: Des femmes, 1991.
77
artísticas/culturais, de maneira que possamos examinar seu lugar na esfera
ampliada das artes e das humanidades.
Conforme Pollock (2003), a História da Arte confina a arte aos museus e aos
colecionadores. Em geral, curadores evitam o confronto com as intervenções
feministas ou a sexualidade e as classes culturais comuns e outras diferenças, com
o artista herói a idealização do eu masculino. As teorias feministas demonstram
que é necessário intervir e reposicionar os estudos das Artes Visuais, sugerindo que
estes sejam configurados complexamente mediante um duplo eixo da História e sua
localização sociocultural. “Os cânones”, argumenta Pollock (2003, p. xxx), têm sido
mantidos no lugar, não por preconceito ou por ignorância [...] mas por uma estrutura
psico-fantasmática mais profunda do desejo e narcisismo masculino”, que
contribuem para a produção e perpetualização de uma hierarquização de gênero.
Na opinião dessa autora, devemos sair dessa infância intelectual para poder
estudar a arte e os artistas de maneira não mítica, reconhecendo a diversidade das
culturas e desejando o conhecimento de grupos diferentes resistindo a qualquer idéia
de separação ou categorização, a fim de produzir transformações nas percepções e
desejos.
Conforme Said (apud POLLOCK, 2003, p. 1, tradução nossa), “o que nós
aprendemos sobre o mundo e seus povos é modelado ideologicamente em
conformidade com a ordem social dentro da qual é produzida.” Da mesma forma, os
estudos sobre as mulheres têm sido feitos em conformidade com o sistema que
sustenta a dominação masculina. No início, a História da Arte feminista se fez dentro
dos mesmos protocolos, mas logo percebeu-se que isso poderia reproduzir e fixar o
status normativo da arte e dos artistas masculinos, de maneira que a História da Arte
feminista não poderia ficar amarrada às categorias da História da Arte já pré-
estabelecidas. A História da Arte tradicional dá a entender que não existem mulheres
artistas significativas, uma vez que não possuem “a chama inata do gênio (o falo),
que é propriedade natural dos homens.” (POLLOCK, 2003, p. 2).
Para Linda Nochlin (apud POLLOCK, 2003, p. 3), isso demonstra a
necessidade de uma crítica feminista da disciplina
que possa detectar limitações culturais-ideológicas, a fim de revelar não
meramente polarizações e inadequações com respeito às questões sobre
artistas mulheres, mas na formulação de questões cruciais da disciplina
como um todo (tradução nossa).
78
As teorias de Marx, para Pollock (2003), permitem repensar uma análise social
da cultura. Na totalidade das forças sociais, cada força tem suas próprias condições
de existência, mas são distintas das outras no todo. Cada uma é mediada pela outra,
não pode existir sozinha. Na arte, para Marx (apud POLLOCK, 2003, p. 4, tradução
nossa) a produção de um objeto gera e condiciona seus consumos e vice-versa: “[...]
A produção cria não somente um objeto para o sujeito, mas também um sujeito para
o objeto [...].” Isto revela a maneira como somos ensinados a apreciar os artistas, a
qualidade das suas obras e os objetos da arte.
Para Willians (apud POLLOCK, 2003, p. 6) os estudos não devem cair no
engano de que as convenções artísticas sejam ordens separadas de outras
instituições, quer sejam sociais quer políticas. Política, arte, ciência, religião, assim
como a vida são categorias consideradas absolutas, mas que pertencem a um
mundo inteiro e interativo de relações. Diante disso, os estudos da arte sob a
perspectiva das teorias feministas vêem a arte como uma prática social que
compreende a totalidade de muitas relações, nas quais não devem ser suprimidas
relações importantes para que não resultem em estudos parciais e fragmentados.
2.2.2.2 A Antropologia como fundamento das abordagens socioculturais
O campo da Cultura Visual, segundo Hernández (2000) e Franz (2003a,
2004), pode ser fundamentado no conceito de arte de Geertz. Para esse autor, a
arte é um sistema particular de formas simbólicas, porque participa de um sistema
geral chamado cultura, e a teoria da arte é ao mesmo tempo uma teoria da cultura e
não um empreendimento autônomo. Desde que o pensamento pós-modernista
passa a estar associado ao ensino de Artes Visuais, enfatiza-se a importância da
compreensão crítica dos “códigos simbólicos e convenções culturais que circulam
nos contextos de origem da obra.” (FRANZ, 2004, p. 3).
Para entender as questões da arte e da pluralidade cultural consideradas na
Pedagogia Crítica e nos estudos sobre a Cultura Visual, é preciso compreender a
noção de cultura do ponto de vista antropológico. A visão de cultura como civilização
amplamente difundida, conforme Richter (in CORRÊA, 2004), foi construída,
progressivamente, durante o século XIX. Essa idéia de civilização, no início do
79
século XX, era entendida como um processo que deveria ser atingido pelos não-
civilizados. Essa visão etnocêntrica foi revisada e perdeu o sentido na
contemporaneidade, pois passou-se a entender que “as sociedades [...] antes
consideradas como primitivas ou exóticas, também possuíam uma lógica interna,
com outras formas de representação, outras idealidades, outras formas de vida
social.” (RICHTER, in CORRÊA, 2004, p. 142-143). Na opinião de Barbosa (1998) e
Richter (2004), a visão atual sobre outras culturas mostra que muito que se ver
no universo do outro. O olhar sobre outras culturas pode dizer muito sobre nós
mesmos e enriquecer nossa visão de mundo. Para Richer (in CORRÊA, 2004, p.
143), “a cultura vem sendo entendida como um código simbólico, que possui
dinâmica e coerência internas”, assim como contradições inerentes à sociedade com
a qual se relaciona. Segundo Thomaz Ribeiro (apud RICHTER, 2004, p. 143), a
cultura é um fenômeno que
se refere à capacidade que os seres humanos têm de dar significado às
suas ações e ao mundo que as rodeia. [...] é compartilhada pelos indivíduos
de um determinado grupo, não se referindo pois a um fenômeno individual;
por outro lado, cada grupo de seres humanos, em diferentes épocas e
lugares, diferentes significados a coisas e passagens da vida
aparentemente semelhantes.
Em qualquer sociedade, “a definição de arte, nunca é totalmente intra-
estética; na verdade, na maioria das sociedades ela só é marginalmente intra-
estética.” (GEERTZ, 1997, p. 146). Todavia, como observa esse autor, falar sobre
arte não é uma coisa fácil, e diante do fenômeno estético, seja qual for a forma sob a
qual se apresente, existe a dificuldade de como associá-lo a outras formas de
atividade social ou como incorporá-lo a um modo específico de vida. Essa
incorporação esse processo de atribuir significado aos objetos da arte, segundo
Geertz (1997), é sempre um processo local. Para ele, assim como os objetivos de
um pintor não estão separados de sua pintura, a arte não está separada do contexto
e das demais expressões humanas e dos modelos de vida a que está conectada.
“Os meios através dos quais a arte se expressa e o sentimento pela vida que os
estimula são inseparáveis.” (GEERTZ, 1997, p. 148). Como Geertz enfatiza, outros
tipos de discurso que derivam de interesses culturais se conectam e se congregam
ao redor da arte, integrando tudo à dinâmica e experiência da vida humana. Não se
80
pode compreender os significados dos objetos estéticos se não os relacionamos
com a vida social.
Silva (2002), que analisa quadrinhos da década de 1980, pode dar-nos um
exemplo radical para compreender a relação que tem um grupo com a vida e a arte
que representa. Para ele, pensar em quadrinhos requer primeiro pensar a respeito
de seu público, e nos tipos de relação social o envolvem. Silva (2002, p. 11) afirma
que as histórias em quadrinhos têm uma relação muito forte com seu público e
trazem consigo uma marca bem forte que é o fato de serem um produto com
identidade de cultura de massa. Essa característica traz várias implicações
para o seu entendimento, tais como o tipo de relação que mantêm com seu
público, seu processo de produção, distribuição, consumo, fruição. É a partir
desse parâmetro de cultura de massa que os quadrinhos devem ser
compreendidos em nossa sociedade. Mas, por outro lado, compreendê-los
nessa perspectiva pode induzir a erro, como o de se generalizar o mesmo
tratamento a tipos diferentes de produtos. Apesar de serem cultura de
massa, há especificidades que os diferenciam em vários níveis.
Nem sempre as HQs são dirigidas para um grande público indistintamente e
não são consumidas da mesma forma. Elas possuem hoje uma grande diversidade,
e uma tendência crescente para maior segmentação de seu público, devido à
busca por opções diferenciadas (SILVA, 2002; VERGUEIRO, 2006).
Conforme Silva (2002), alguns quadrinhos nacionais produzidos na década de
1980, eram destinados a um público específico. Não mostravam uma realidade
privilegiada pelas criações tradicionais. Nessa época, observou-se uma proliferação
até então nunca vista no mercado nacional de quadrinhos. Surgiram revistas que
exploravam as idéias da contracultura dos anos 60 ou a ideologia punk dos anos 70.
Conforme esse autor, nesse período, houve uma proliferação de “tribos urbanas”
invadindo os grandes centros urbanos. Concomitantemente ao surgimento de tribos
punk é que nasceram essas revistas.
Na metade dos anos 80, foi criada uma revista chamada Chiclete com
Banana”, que Silva (2002) analisa. Havia uma afinidade grande entre o público leitor
jovem urbano e essa revista, que o levaram a pesquisar porque havia essa relação.
Silva (2002) observou que, na “Chiclete com Banana” havia uma seção de cartas
através da qual seu autor mantinha uma relação com seu público. “A seção de
cartas foi um mecanismo de sedução através do qual o autor aos poucos foi
delimitando um público e elaborando mensagens para ele.” (SILVA, 2002, p. 13).
Nessa revista surgiram personagens que alcançaram repercussão considerável
81
Figura 9 – Falas do personagem Loki sobre o Capitão América. Imagem da Revista Heróis Renascem
Vingadores, n. 1, dez. 1998. Não paginada.
entre essas tribos, mostrando a relação que Geertz (1997) enfatiza entre a
experiência dos diferentes grupos e a arte. “Bob Cuspe é uma personagem punk,
criada por Angeli, que expressava fielmente as idéias da tribo punk.(SILVA, 2002,
p. 12).
Da mesma forma, as HQs da série Heróis Renascem Vingadores
35
,
elaboradas por artistas norte-americanos, refletem a cultura e a visão de mundo
desse povo. Analisando as falas dos personagens e suas características, pode-se
perceber a relação entre os conceitos de vida de uma sociedade, o que pensam de
si e de outrem (Figura 9).
Para Geertz (1997), a preocupação estética surge em conseqüência de uma
sensibilidade que participa da totalidade da vida e está relacionada ao próprio
significado das coisas. A formação da sensibilidade está ligada à própria vida social
e à vida coletiva e é tão profunda quanto ela. A conexão entre a arte e a vida
coletiva não está em um plano instrumental e sim em um plano semiótico, que
Geertz chama de estético, por razões teóricas.
Para esse autor, os elementos constitutivos da arte, sinais e símbolos,
materializam uma forma de viver e transpõem um modo específico de pensar para
os objetos, tornando-o visível. Sinais ou elementos simbólicos têm uma “conexão
ideacional e não mecânica com a sociedade em que se apresentam.” (GEERTZ,
35
Série da Marvel Entertainment Group, publicada sob licença no Brasil pela Editora Abril, de
dezembro 1998 a janeiro de 1999.
82
1997, p. 150) e são conceitos que buscam um lugar para si próprio em meio a outros
semelhantes. As representações são visões de mundo e estão relacionadas com a
cultura na qual foram geradas refletindo conceitos subjacentes à vida social.
2.2.3 Introdução à história das histórias em quadrinhos
Antes de falar de histórias em quadrinhos, é importante definir e conhecer um
pouco sobre desenhos de humor. Conforme Carvalho (2006), quem não está
acostumado com eles, confunde facilmente as diferentes formas artísticas de humor
gráfico. Como assinala Quella-Guyot (1994), é muito comum ouvirmos alguém
chamar as histórias em quadrinhos de gênero”, quando se trata na realidade de um
meio de expressão que permite abordar diversos gêneros reconhecidos, tais como
aventura, humor, ficção, policial e outros.
Para Quella-Guyot (1994, p. 64), a história em quadrinhos é “[...] uma arte
narrativa que sugere o desenrolar de uma ficção por meio de uma sucessão de
imagens fixas (em oposição ao desenho animado) e organizadas em seqüências
(em oposição ao desenho humorístico) [...].” A definição que parece ser a mais
aceita entre os teóricos é a de Will Eisner (1989, p. 5), para quem as histórias em
quadrinhos são uma “Arte Seqüencial [...] um veículo de expressão criativa [...] uma
forma artística e literária que lida com a disposição de figuras ou imagens e palavras
para narrar uma história ou dramatizar uma idéia.”
A caricatura é o desenho que pelo traço e detalhes, acentua ou revela
aspectos caricatos da pessoa ou fato e que mantém as características próximas do
original para que haja referenciais na identificação. Segundo Carvalho (2006), tem
sua origem no século XVIII e inicialmente designava outros desenhos que
exageravam e não apenas pessoas. A charge, para alguns teóricos, nasceu da
caricatura. O termo “vem da palavra francesa [...] traduzida como ‘tensão’, ‘exagero’
ou ‘ataque’.” (CARVALHO, 2006, p. 16). A charge costuma estar ligada aos
costumes de uma época ou região e comunica acontecimentos do dia-a-dia por
intermédio de personagens reconhecíveis localmente. Em geral, satiriza um fato
específico, político ou de conhecimento público, apresentado em um único quadro.
No Brasil, por vezes, a cena é dividida em dois ou mais quadros.
83
O cartum, ou cartoon (termo inglês), como também é chamado, caracteriza-se
por apresentar um humor universal, podendo ser reconhecido por qualquer pessoa
em qualquer lugar do mundo. É usado para expressar críticas políticas, esportivas,
religiosas ou sociais. Diferencia-se das HQs e tiras humorísticas por não ter
personagens fixos. As tiras humorísticas, ao contrário, possuem personagens fixos.
Para Carvalho (2006, p. 19), elas podem ser consideradas a origem das HQs, “pois
estas, afinal, são uma evolução das tiras”, e era desta forma que eram publicadas de
início nos jornais. Aos poucos foram ampliando seu espaço e passaram a ser
produzidas em seqüências mais longas.
Quando surgiram exatamente as histórias em quadrinhos, ou quando foi feita
a primeira HQs, ao certo ninguém sabe. Conforme Carvalho (2006, p. 23), esta é
“uma tarefa difícil e subjetiva.” Segundo esse autor, alguns defendem que a primeira
HQ, foi criada por Ângelo Agostini, um ítalo-brasileiro, em 1869, com a história As
Aventuras de Nhô Quim. Os norte-americanos, por sua vez, afirmam que é seu o
pioneirismo, através da publicação do personagem Yellow Kid nos jornais de Nova
York, por Richard Outcaut, em 1895. Para Quella Guyot (1994, p. 60), Yellow Kid,
fundou a HQ como arte narrativa de massa.” (Figura 10).
Figura 10 – O pioneiro Yellow Kid. “O Menino Amarelo, que não falava por balões, mas em textos
escritos na roupa.” Imagem da Revista Nova Escola, abr. de 1998
36
.
Muito antes disso, no entanto, no Oriente, segundo Carvalho (2006), se
faziam histórias em quadrinhos, os Mangás, como os japoneses costumam chamar
essa arte, desde o século XVIII. Alguns teóricos vão mais longe e costumam buscar
36
In: SERPA, Dagmar; ALENCAR, Marcelo. As boas lições que aparecem nos gibis. Revista Nova
Escola, abr. 1998. Versão on-line. Disponível em: <http://www.ensino.net/novaescola/111_abr
98/html/repcapa.htm>. Acesso em: 25 jul. 2006.
84
as raízes das HQs, na Pré-história e na herança do passado, das artes narrativo-
figurativas, que contribuíram para a evolução da linguagem dos quadrinhos
(LUYTEN, 2000). Em todo o caso, como diz Quella-Guyot (1994, p. 59), “parece bem
indispensável considerar as histórias em imagens do século XIX, como ancestrais
diretas das histórias em quadrinhos.”
Segundo Quella-Guyot (1994), as primeiras histórias em quadrinhos eram
estáticas e o texto era uma simples legenda. Mas na realidade, segundo esse autor,
a relação entre palavras e imagens constitui uma história nada simplista, que
remonta à Antigüidade, quando as primeiras palavras eram figuras estilizadas até as
histórias em imagens graças às quais se prepara a arte das histórias em
quadrinhos para o século XX. Rodolphe Toffer apresentou, no século XIX, a primeira
combinação interdependente de palavras e imagens, criando uma linguagem
bastante próxima à dos quadrinhos de hoje.
Nas histórias com imagens, segundo Quella-Guyot (1994), na primeira etapa,
o texto supera a imagem, é preponderante e auto-suficiente. Os desenhos apenas
ilustram frases ou situações evocadas, e a imagem não passa de uma concessão
aos analfabetos e às crianças. O texto literário não fazia referência ao desenho. A
imagem por sua vez, servia de explicação ou de descrição.
Aos poucos, o texto consente em dialogar e delegar parte de seu poder ao
desenho. Certas informações passam a ser gráficas, fazendo com que o texto perca
a autonomia. “Melhor que isso, a imagem se encarrega dos detalhes picantes que o
texto não menciona” (QUELLA-GUYOT, 1994, p. 68), fazendo surgir a noção de
complementaridade entre texto e desenho. Ambos passam a manter relações
lúdicas. Deste ponto em diante tornam-se, um para o outro, indissociáveis.
“Legenda, balão e imagem vão doravante guerrear. Nascida na Europa
literária e burguesa em que a arte do discurso tem primazia, a história em
quadrinhos” não passava inicialmente de simples seqüências de imagens
legendadas, com tímidas aparições de onomatopéias e interjeições. (QUELLA-
GUYOT, 1994, p. 68). Mais tarde surgiam textos-comentário que se instalaram nos
cantos dos quadros, tomando parte do espaço reservado ao desenho. Para Quella-
Guyot (1994), essa foi a primeira brecha que levou ao balão.
Os primeiros balões eram tão malfeitos e informes que assustavam e
amedrontavam os educadores, que logo pensaram que as crianças não iriam gostar
de ler. De imediato, as HQs americanas desfizeram os balões e mantiveram o texto
85
abaixo do desenho. Contudo, o texto se incorporaria cada vez mais à margem, e o
uso do balão levaria os autores a encurtarem os textos e a refinarem seus desenhos,
fazendo com que as HQs atingissem plena forma narrativa com um conjunto cada
vez mais eficaz. Para McCloud (2005), o balão de fala constitui, hoje, o ícone
cinestético mais complexo e versátil usado pelas histórias em quadrinhos. Dentro e
fora dele, letras fazem esforço contínuo procurando captar a essência do som.
Nos quadrinhos, os sons são representações exclusivamente visuais.
Segundo Quella-Guyot (1994), como as imagens das HQs são fixas; para
dinamizarem as imagens, os artistas contemporâneos criaram ideogramas para dar
vida às imagens estáticas. Os ideogramas surgiram para conferir a visualização do
som e do movimento, aos quais se acrescentou a função de dar vida às
representações psicológicas dos personagens. A sonorização das HQs, hoje, não se
limita a falas e comentários, mas inclui os ruídos da vida e os “sons selvagens”. Por
magia da palavra escrita ou desenhada mostram a imagem do som. A economia
de meios é inversamente proporcional às informações fornecidas. Para Quella-Guyot
(1994, p. 87), “a reificação do som misturada à realidade desenhada é uma audácia
que é justo reconhecer à HQ.”
Entre os anos 1965 e 1990, as histórias em quadrinhos “se esforçaram por
alcançar um sério conteúdo literário.” (WILL EISNER, 1998, p. 4, tradução nossa).
Essa tendência começou com o movimento underground, e sua continuidade deu
início a uma grande variedade, ampliando o espectro de leitores. O que, para Will
Eisner (1998), significou o amadurecimento do meio. Nesse caminho, segundo esse
autor, as HQs buscavam temas que até então eram tidos como próprios apenas de
livros, teatro e cinema.
As inovações na linguagem e na estética dos quadrinhos revelam a influência
não da televisão, mas também das novas tecnologias digitais. Nos anos 50, a
ameaça da televisão fez com que os artistas da geração pós-televisão
desenvolvessem Mangás cada vez mais dotados de uma orientação visual
extremamente marcada, em que dezenas de páginas ocorrem sem uma única
palavra (LUYTEN, 2000).
Depois de muitos aperfeiçoamentos, o que mais surpreende Quella-Guyot
(1994) é que os autores contemporâneos de quadrinhos voltam à antiga forma de
narração, com textos densos realçados por quadros ilustrativos, embora o todo
86
assuma a forma de tiras e pranchas, o que para ele significa que a história em
imagens não morreu.
Na década de 1980, com o surgimento dos computadores pessoais e o
desenvolvimento de interfaces gráficas mais acessíveis, as HQs aos poucos foram
adaptando seu fazer artístico às novas tecnologias. Algumas HQs, nessa época,
foram realizadas totalmente em computador, embora fragmentadas e quebradiças.
Na década de 90, a revolução informática atingiu um tal grau de
popularização, que mesmo os fanzines
37
passaram a aderir, tirando proveito das
ferramentas da editoração eletrônica, embora uma reação se fizesse no início “num
apelo à pureza dos fanzines sujos e artesanais.” (MAGALHÃES, 2004, p. 107). No
início, o uso do computador mais poluía do que enriquecia o visual. Contudo, uma
progressiva familiarização fez surgir fanzines que fazem a adequada utilização das
ferramentas digitais. Para muitos, hoje, o computador tornou-se não apenas um
instrumento, mas o próprio veículo.
A televisão e as novas tecnologias digitais provocaram temores entre editores
e quadrinistas. Segundo David Fehrmann
38
, havia o medo de que as tecnologias
“matassem” os quadrinhos, e isso perdurou por muito tempo. Porém, segundo esse
editor, além da diversidade, que contribui para o sucesso atual dos quadrinhos, a
Internet hoje funciona como ferramenta de apoio, e as histórias em quadrinhos no
Brasil, agora, passam por um período de reaquecimento ampliando o acesso e o
número de leitores.
O computador, enfim, tem permeado todas as instâncias do vivido nas
sociedades contemporâneas. Conforme Mirzoeff (2003) e Basbaum (2005), a
aventura humana acaba convergindo rumo à totalização da paisagem midiática, e a
mediação digital é o lugar para onde converge a experiência. A visualização, que se
tornou comum na modernidade uma tendência radical para imaginar ou visualizar
a existência – torna-se obrigatória na contemporaneidade e envolve a todos.
37
Revista produzida por aficcionados em histórias em quadrinhos.
38
David Fehrmann é atual coordenador do Atelier de Produção do gibi Smilingüido e sua Turma, da
editora Luz e Vida. In: Hoje é dia nacional dos quadrinhos. Entrevista para o Jornal O Estado do
Paraná. Curitiba, 30 jan. 2007, Caderno Almanaque, p. 20.
87
CAPÍTULO III
88
3.1 METODOLOGIA
Desde o século XIX até nossos dias, os experimentos da esfera científico-
tecnológica e as investigações educativas associam-se a pesquisas sobre processos
de aprendizagem para a melhora da eficácia e produtividade, a partir de uma visão
tecnicista de ensino. Dessa maneira, depositou-se grande confiança no sistema
escolar como mecanismo não somente para a compensação social, mas como
motor para a criação de riquezas.
Críticas sobre a falta de soluções para as práticas educativas supõem que a
investigação científica tem centralizado um fenômeno complexo, aplicando modelos
estereotipados desde os âmbitos que os originaram. Esses modelos se efetivaram
como a melhor forma de elaborar conhecimento científico e, até hoje, ainda são
utilizados. As limitações dos modelos anteriores, para Sancho (1997-1998), estão
relacionadas aos elementos que o configuram, como por exemplo, o caráter aberto e
dinâmico do “sistema educativo” e o inapropriado de confundi-lo com sistema
escolar”. Segundo Sancho (1997-1998), o desejo pela melhora da qualidade de vida
criou uma visão fortemente enraizada de educação em função do progresso
econômico. Hoje uma crise em todos os setores da sociedade e a noção de
progresso está sendo questionada.
Essa consideração de Sancho é importante para esta pesquisa, que busca
analisar os modos de ensinar com relação às crenças e às concepções dos
professores, considerando-se que o ensino e a prática escolar têm-se voltado mais
para práticas informativas, distanciando-se das funções educativas.
Quando se questiona o sentido da escola, sua função social e a natureza da
atividade educativa, em conseqüência das transformações radicais vividas pela
sociedade, tanto nas esferas econômicas, quanto nos elementos que compõem a
cultura, tais como valores, idéias e costumes, Gómez (2001) destaca que nós
professores, aparecemos deslocados, fazendo com que uma série de fatos torne
obsoletos nossos conteúdos e práticas.
89
Para Gómez (2001), diante das prioridades econômicas, a função educativa
está sendo relegada. Conforme esse autor, nós, docentes, vivemos no “olho do
furacão” da inegável crise social, econômica, política e cultural, mas, por outro lado,
as forças sociais não promovem as mudanças necessárias.
Também o ensino de Arte não escapa aos problemas. Este ensino tem
passado por muitas transformações
39
desde sua implementação obrigatória com a
lei 5.692/71, passando de um ensino tecnicista à livre expressão, e depois da
Proposta Triangular às subseqüentes releituras de imagens, que hoje têm sido
criticadas (PILLAR, 1999; BARBOSA, 2005b) e ainda, a tendência à inclusão de
múltiplas imagens provenientes de diferentes fontes e culturas.
Em meio a tantas crises e transformações, é importante situar as posições
dos professores com relação a essa arte e o uso que fazem das suas compreensões
sobre HQs em suas práticas.
Esta pesquisa se encaixa dentro de uma pesquisa qualitativa. Dentre as
características essenciais que podem identificar esse tipo de pesquisa, Godoy
(1995), Elliot Eisner (1998) e Demo (2000) destacam como preocupação do
investigador: o ambiente natural como fonte direta de dados e o pesquisador como
instrumento; o caráter descritivo e o significado que as pessoas dão às coisas e a
sua vida. A investigação “pode oferecer um ponto de vista crítico sobre muitas
crenças e práticas que se baseiam no sentido comum ou em convenções.”
(SANCHO e HERNÁNDEZ, 1997, p. 108).
É fundamental para esta pesquisa compreender a perspectiva do professor na
situação problema e, a partir daí, realizar interpretações sobre os fenômenos
estudados. Para isso, optamos pela metodologia qualitativa interpretativa crítica,
tendo em vista analisar as compreensões que determinado grupo de professores
pode ter com relação à arte dos quadrinhos e suas conseqüências para a educação
no ensino de Artes Visuais, conforme Franz (2006)
40
. Esta abordagem metodológica,
segundo Cohen e Manion (1989, apud FRANZ, 2000), é adequada para uma
investigação educativa quando se tem por objetivo a clarificação de temas que
tenham conexão direta ou indireta com os conceitos de ensinar e aprender.
39
Ver sobre o ensino tecnicista, a livre-expressão e a Metodologia Triangular, no capítulo II – item 2.1
- Conceitualizações e Tendências no Ensino de Artes Visuais.
40
Franz, in: Seminário de Orientação, Curso de Mestrado em Artes Visuais – UDESC, 2006.
90
A investigação qualitativa interpretativa centra-se no estudo das interações
humanas com aspectos da realidade ou com a própria realidade. Considera que os
significados e as interpretações que as pessoas atribuem aos objetos influenciam ou
determinam suas reações a estes objetos ou eventos. “Quando falamos em
construção e interpretação de significados, entendemo-los como as idéias, os
valores, sentimentos, atitudes e interesses dos sujeitos humanos individual e
coletivamente considerados.” (GOMEZ, 1998, apud FRANZ, 2000, p. 279).
Essa perspectiva também participa do enfoque construtivista que considera o
mundo social como uma entidade dinâmica e mutável, na qual as complexas
relações entre indivíduos, grupos e sociedades criaram o que se denomina de
realidade social. Para Gómez (2001, p. 64), “os modos de pensamento e de
comportamento individual ou coletivo, bem como normas de convivência, os
costumes [...] são o produto histórico de um conjunto de circunstâncias” que as
pessoas constroem e elaboram. Do enfoque construtivista, no âmbito social, são tão
importantes as representações subjetivas dos fatos como os próprios fatos (os fatos
e os valores). Esse autor considera que, para compreender a complexidade real dos
fenômenos, é necessário chegar aos significados, valores e interesses, através do
acesso ao mundo conceitual dos indivíduos.
Uma fonte de acesso ao mundo de conceitos e significados e práticas
individuais (FRANZ, 2000; DEMO, 2000; DUARTE, 2005) é a entrevista que
escolhemos como instrumento de investigação. A utilização deste recurso tem por
objetivo saber se ou não preconceito, despreparo ou ausência de conhecimento,
como os professores trabalham e quais as dificuldades que encontram com relação
à Arte Seqüêncial/HQs. A entrevista tem a possibilidade de identificar estes e outros
elementos sobre os quadrinhos nas aulas de Arte. A informações colhidas podem
servir para elaborar um quadro sobre as crenças, visões e preconceitos dos
professores, de que maneira costumam incluir e a importância que atribuem à Arte
Seqüencial/HQs com relação ao ensino de Artes Visuais.
O papel do estudante é importante para o problema de pesquisa. Crianças e
adolescentes depositam no professor a responsabilidade por aquilo que aprendem
na escola. Costumam aceitar como verdadeiro o que ele ensina. Igual credibilidade,
ou até maior, é encontrada com a relação ao que as crianças e adolescentes
estabelecem com os meios, televisão, Internet, revistas e games. A cultura infantil
popular age com impacto sobre as crianças, produzindo uma pedagogia cultural
91
configurada pelo contexto social que apreende e edifica a percepção, atuando na
formação das identidades, produção e legitimação de conhecimento, levando-as a
pensarem que as melhores coisas “são produzidas pelos seus amigos da América
corporativa." (STEINBERG e KINCHELOE 2004, p. 16).
A relação da criança ou do adolescente com a Arte Seqüencial/HQs, pode ser
totalmente diversa daquela que o professor adulto possa ter. Sobretudo, este tem
por necessidade e obrigação administrar os conteúdos que irá fornecer ou trabalhar
junto aos estudantes, conforme determinação da escola ou sua própria.
Embora os estudantes tenham papel relevante para o problema de pesquisa,
por uma necessidade de fazer um recorte, demos prioridade à questão do professor
com relação à Arte Seqüencial/HQs, levando em conta o papel fundamental que
ocupa como principal mediador do aprendizado para a compreensão sobre as
imagens da cultura visual.
De início, o problema de pesquisa mostrou-se particularmente subjetivo.
Partindo da pergunta principal, surgiu a necessidade de um estudo preliminar, a fim
de buscar evidências sobre o problema de pesquisa, que determinasse com mais
clareza os caminhos a serem percorridos no estudo empírico. Elliot Eisner (1998),
considera que, no estudo qualitativo, o ideal é empregar formas múltiplas para
colher evidências a fim de atingir os objetivos. Com base nessa teoria, um estudo
exploratório foi escolhido como primeiro passo. O segundo envolveria o professor,
com entrevistas em profundidade.
Na entrevista em profundidade, de acordo com Duarte (in DUARTE e
BARROS, 2005, p. 63), “as perguntas permitem explorar um assunto ou aprofundá-
lo [...] analisar, discutir e fazer prospectivas”, além de permitir identificar problemas,
microinterações e obter juízos de valor, interpretações e explicar fenômenos. O
objetivo "está relacionado ao fornecimento de elementos para a compreensão de
uma situação ou estrutura de um problema." (DUARTE, in: DUARTE e BARROS,
2005, p. 63).
Para Eisner (1998), somente o estudo por meio da investigação ou da
indagação qualitativa possibilita gerar a conscientização e o conhecimento
necessários para interpretar e avaliar uma situação. A indagação qualitativa é
importante para entender como funcionam os professores e as aulas antes de partir
para as recomendações de mudanças. Há programas educativos que sugerem
92
mudanças para os professores e as escolas; no entanto propõem-nas de forma
independente do contexto e
não tem observações atuais sobre o ensino dos professores com quem
falam. Como resultado aconselham [...] que não se pode ter em conta
pontos fortes concretos e as debilidades de cada um dos professores aos
quais se dirigem. (EISNER, 1998, p. 29, tradução nossa).
Eisner (1998) considera que é necessário conhecer o cenário, como
interagem seus principais traços ou dimensões. Por isso, a entrevista ocupa um
lugar importante para a observação direta, para esse autor.
A análise de dados das entrevistas, realizadas no estudo exploratório e
empírico, guia-se principalmente pelas teorias de Eisner (1998), cuja perspectiva
metodológica centra-se em tipos particulares de indagação qualitativa chamados
conhecimento educativo e crítica educativa. A crítica educativa é um dos principais
recursos utilizados por Eisner (1998) como parte das ferramentas da indagação
qualitativa
41
. Esse teórico incentiva utilizar a prática da crítica de maneira
semelhante à tarefa que os críticos realizam para dar sentido a trabalhos complexos
como as obras de arte. O conhecimento e a crítica se aplicam aos fenômenos
sociais e ao mundo da arte. “Podem ser aplicados às escolas, às aulas, ao ensino, à
percepção e à análise de recursos instrutivos” (EISNER, 1998, p. 21, tradução
nossa), pois ambos dirigem-se às qualidades.
Para algumas pessoas, a crítica pode trazer algumas conotações negativas
mas na realidade seu papel é iluminar uma situação ou um objeto para que se possa
ver ou apreciar (EISNER, 1998). Desse enfoque não se pretende alcançar verdades
eternas ou universais. Na indagação qualitativa, o juízo deve estar bem vivo e,
conseqüentemente, o debate esta sempre aberto.
“A principal função da crítica educativa, como de qualquer crítica, é a
expansão da percepção e o aumento da compreensão.” (Elliot Eisner, 1998, p. 136).
A crítica é um ato reconstrutivo, uma narrativa argumentada, que proporciona
material para a reflexão. Para Carr (1996, p. 14), “pensar reflexiva e criticamente [...]
41
O termo “indagação qualitativa” é utilizado por Eisner (1998), no lugar de “investigação” e
“avaliação”, porque, revela não somente as qualidades das aulas e a escola, mas também os
processos de ensino. Eisner situa a indagação como um “conceito limite entre investigação e
avaliação. A investigação e a avaliação são exemplos de indagação, mas nem toda indagação é um
exemplo de investigação ou avaliação.” (EISNER, 1998, p. 20,
tradução nossa).
93
supõe sempre um compromisso com a educação”, e pode ser um dos meios para
sua transformação.
Para realizar a “indagação qualitativa em geral ou a crítica educativa em
particular”, segundo Eisner (1998, p. 197, tradução nossa), “não existe um corpo
codificado de procedimentos.” Isto é, não uma fórmula ou um conjunto de regras
específicas - os investigadores que estudam escolas, aulas, ou que se ocupam de
trabalho de campo, dão tratamento conforme o problema que investigam e o
contexto de seu trabalho.
Tendo em vista as considerações de Eisner (1998), levando em conta os
dados obtidos com as entrevistas, em função destes, associamos a esta perspectiva
crítica, o uso do método da análise de conteúdo, a fim de obter uma organização e
uma análise preliminar, bem como, a reordenação das falas dos entrevistados,
relacionando-as às categorias estabelecidas. A operacionalização realizada com
base no método da análise conteúdo
42
, neste trabalho, mostrou-se bastante útil e
adequada para encaminhar a análise a fim de alcançar uma interpretação crítica.
Uma das características que torna qualitativo um estudo é seu caráter
interpretativo, que se relaciona com a aptidão para explicar porque se ocupa um
lugar com algo. Às vezes isto requer a utilização de construtos tomados das ciências
sociais. Outras vezes requer a criação de uma nova teoria.” (EISNER, 1998, p. 52,
tradução nossa). Nesse sentido, a investigação não se limita a um material
quantitativo ou qualitativo, ou à idéia de ser uma coisa ou outra. Não razão para
que não se possa combiná-los. As indagações ou investigações qualitativas
43
podem
ser realizadas em diferentes graus e podem empregar formas diversas de
representações e interpretação de dados, de maneira que possibilitem ver a
situação de maneira distinta.” (EISNER, 1998, p. 58, tradução nossa).
A estrutura da crítica educativa, pode ser considerada como tendo as
seguintes dimensões: descrição, interpretação e avaliação
44
. A identificação destas
42
Conforme Stewart e Shandasani (apud ROMERO, 2000), Strauss e Corbin (1990) e Laville e
Dionne (1999) (apud SILVA C. R., 2005).
43
Para Eisner (1998, p. 58,
tradução nossa), “não somente os estudos podem ser qualitativos em
diferentes graus isto é, alguns estudos qualitativos podem ser extremamente figurativos e literários,
tanto como outros que são mais literais na utilização da linguagem –, mas também podem empregar
tanto formas de representação literárias como quantitativas.”
44
Eisner (1998) aponta que essas dimensões - descrição, interpretação, avaliação - podem envolver
também uma quarta: a temática. Porém, esse autor não prescreve uma seqüência idêntica para todos
os casos de indagação ou investigação. Conforme Franz (In: Seminário de Orientação - Curso de
Mestrado, UDESC, 2006), adapta-se a sugestão de Eisner (1998), neste estudo, para descrição,
avaliação e interpretação crítica.
94
dimensões não implica que cada uma seja completamente independente uma das
outras. Fazer estas distinções, contudo, pode ser um fator de auxílio para propósitos
analíticos. Ainda que os críticos possam utilizá-las com o propósito de organizar
seus escritos, Elliot Eisner (1998, p. 109, tradução nossa) recomenda “tratar estas
distinções como ferramenta com as quais trabalhar, não como regras a seguir.”
Para esse autor, a descrição permite aos leitores visualizar como é um lugar
ou um processo, proporciona o conteúdo básico com o qual trabalham os críticos.
Mas depois deve operar com uma forma escrita que empregue os significados
através de prosa descritiva, com o propósito de ajudar o leitor a entender.
Conforme Eisner (1998), pode-se considerar a descrição como a obtenção de
uma informação e a interpretação como uma “justificação” ou explicação dos
significados do que foi experimentado. Significa também aclarar as conseqüências
potenciais do que se observa, e proporcionar as razões que justifiquem o que se tem
visto. Dentro dessa perspectiva, é mais razoável considerar as teorias como guias
para a percepção do que como mecanismos que conduzem ao controle severo ou
exato. Os propósitos são explicativos e para satisfazer a racionalidade, não para
encontrar provas rigorosas, mas para aprofundar a conversação e fazer novas
perguntas. Uma teoria dificilmente “poderá satisfazer todas as dimensões sobre o
que os críticos podem desejar falar ou escrever.” (EISNER, 1998, p. 116).
Em resumo, “interpretar é situar em um contexto, expor, desvelar, explicar. É
[...] ‘decodificação’ de mensagens dentro de um sistema. [...]. Se a descrição trata do
que é, a interpretação se enfoca no porquê ou o como.” (EISNER, 1998, p. 119).
A avaliação é vital na indagação qualitativa. Os críticos também têm a tarefa
de avaliar. A significatividade do que ocorre nas escolas é o que permite examinar
seu valor educativo. Requer avaliar o tipo de experiência que m os indivíduos. É
uma tarefa sutil e complexa, o que não significa que se deve deixar de fazer juízos
sobre o valor educativo daquilo que se vê.
95
3.2 ESTUDO EXPLORATÓRIO
O objetivo do estudo exploratório foi o de buscar evidências sobre o ensino da
Arte Seqüencial/HQs em Artes Visuais - problema de pesquisa. Entendendo que
alunos também fazem parte desse processo e que poderiam fornecer dados úteis
para a investigação com os professores, realizamos um estudo preliminar antes do
estudo empírico propriamente dito. Depoimentos de experiências escolares com
histórias em quadrinhos de diferentes indivíduos poderiam gerar bases mais
ampliadas para essa investigação.
A Gibiteca da Fundação Cultural de Curitiba foi ideal para este estudo,
permitindo que encontrássemos ao mesmo tempo em um mesmo lugar, indivíduos
que estivessem cursando ou que já haviam cursado o ensino fundamental em
diferentes estabelecimentos de ensino. Do contrário, essa pesquisa teria que ser
realizada em diversas escolas, colhendo dados separadamente sendo menos
produtiva. Partimos também do pressuposto de que indivíduos interessados em
fazer curso de histórias em quadrinhos poderiam mais facilmente fornecer dados
relacionados ao assunto, como de fato, encontramos boa receptividade entre estes,
com os quais pudemos realizar duas entrevistas de grupo, conforme Flick (2004).
Na Gibiteca do Solar do Barão, localizado à rua Carlos Cavalcanti, 533, em
Curitiba, realizamos essas entrevistas com 10 alunos inscritos no curso básico de
sábado de HQs, nos dias e 8 de abril; esse curso iniciou em 11 de março e
encerrou em 8 de julho de 2006. As duas entrevistas de grupo, foram gravadas e
transcritas na íntegra
45
. Realizamos para estas, uma análise de conteúdo preliminar,
conforme Stewart e Shandasani (apud ROMERO, 2000), Laville e Dionne, e Strauss
e Corbin (apud SILVA C. R., 2005). O método da análise de conteúdo aqui, foi
associado à perspectiva metodológica interpretativa crítica com o objetivo de
realizarmos uma interpretação crítica.
45
Como norma neste estudo e no estudo empírico, adotamos colocar entre aspas, todas as citações
integrais das respostas dos entrevistados.
96
Com base em Elliot Eisner (1998), que emprega formas múltiplas, para colher
e/ou demonstrar evidências, e para a interpretação de dados, completamos a coleta
entrevistando a responsável pela Gibiteca. Também colhemos informações no Solar
do Rosário
46
, ampliando as possibilidades de análise e interpretação de dados. A
análise do estudo, forneceu pistas sobre a situação problema e bases para o estudo
empírico. Apresentamos os resultados em forma de síntese no item 3.2.2.
3.2.1 Roteiro base e esboço de categorias de análise
Para este estudo, utilizamos um roteiro base de entrevista semi-estruturada e
duas categorias de análise como esboço para o estudo empírico (Quadro 1):
Entrevista Semi-estruturada Categorias de Análise
1 Qual motivo o levou a fazer um curso de histórias
em quadrinhos?
2 O que o professor de Educação Artística (Arte)
costuma ensinar (ou ensinou) na sua escola?
3 Você teve alguma experiência (ou atividade)
escolar na área de quadrinhos?
4 O que você espera do curso que você es
fazendo aqui?
1 Motivo para fazer um curso de histórias em
quadrinhos
2 Experiência escolar com quadrinhos
Quadro 1
– Roteiro de entrevista semi-estruturada para o estudo exploratório
3.2.2 Síntese dos resultados obtidos no estudo exploratório
O grupo, que foi dividido em dois para duas entrevistas, era bastante
heterogêneo, com faixa etária variando entre 13 e 32 anos de idade, e os
participantes tinham diferentes níveis de formação escolar. Dos dez entrevistados, 4
estavam cursando escola superior e 1 já havia concluído. No ensino médio, 2
estavam no primeiro ano, 1 no segundo ano e 1 havia recém-concluído. Apenas 1
estava cursando ensino fundamental. A presença maior era do sexo masculino, com
oito pessoas.
Os depoimentos revelaram como conteúdo mais enfatizado em Arte, no
ensino fundamental dos entrevistados em primeiro lugar, a História da Arte e
Educação Artística (teoria e prática), em seguida o desenho geométrico e geometria
e, por último, o ensino baseado em desenho e pintura livres.
46
O Solar do Rosário, localiza-se à Rua Duque de Caxias, 4, esquina com a rua Claudino dos
Santos, no Centro Histórico de Curitiba/PR.
97
Os resultados encontrados se aproximaram do problema principal da
pesquisa: apenas três, entre os dez entrevistados, tiveram alguma experiência com
HQs, no ensino de Arte, por uma ou duas vezes no ensino fundamental. Além
desses três, um participante respondeu que não teve HQs em Arte, mas teve uma
experiência com quadrinhos na disciplina de Inglês.
Entre os três entrevistados que tiveram alguma experiência com quadrinhos
no ensino de Arte, um deles revelou que sua única experiência, foi a de colocar
balõezinhos nos desenhos. Segundo suas palavras “foi algo bem perfume, assim, só
colocando os balões. [...] nada de linguagem dos quadrinhos.” Os outros dois,
relataram que o assunto referia-se à charge e o fazer prático relacionado a tirinhas.
Embora restrita, a amostra investigada reflete antiga valoração e
marginalização das HQs. Esses valores foram atribuídos a esta arte, a partir das
polêmicas que se levantaram em torno dela, desde a época após a Segunda Guerra
Mundial. Will Eisner
47
(1989), teórico dos quadrinhos, observou que a Arte
Seqüencial foi ignorada como forma digna de discussão acadêmica durante muitas
décadas, embora se estudassem seus elementos mais importantes isoladamente: o
design, o desenho, o cartum e a criação escrita. A charge recebe uma valorização
oficial normalmente nos jornais, desde que foi criada no século XIX. O que se
destacou nessa relação de ensino foi o fato de alguns elementos, ou outras artes,
serem tomados mais seriamente como objeto de estudos.
Os entrevistados demonstraram, em sua maioria, que sua principal motivação
para fazer HQs é antes que qualquer outra, gostar de desenhar. Esta motivação foi
associada ao desejo de desenvolvimento de suas aptidões individuais e a busca por
um ensino e conhecimentos que pudessem aplicar no mercado de trabalho, em
particular na Publicidade, Marketing e Propaganda.
Além das entrevistas, acompanhamos o curso de sábado na Gibiteca,
observando que a freqüência de pessoas do sexo masculino, nos cursos de HQs, é
maior do que as pessoas do sexo feminino – dados que foram complementados com
a secretária dos cursos da Gibiteca e também no Solar do Rosário, outra instituição
que mantém um curso de histórias em quadrinhos, aos sábados (ver Apêndice A,
Tabelas 1 e 2).
Nesse acompanhamento, verificamos que as histórias em quadrinhos não são
uma arte fácil como afirmam Will Eisner (1989), Acevedo (1990), Quella-Guyot
47
Citado no problema de pesquisa do presente trabalho.
98
(1994) e outros teóricos - significando que para fazer HQs com regularidade, é
necessário muito interesse e motivação. Ao final dos cursos, sempre um grande
percentual de desistentes em torno de 23% no Solar do Barão e 37% no Solar do
Rosário. Nos cursos da Gibiteca, entre os que abandonam o curso, o mero de
desistências é bem mais acentuado entre as meninas.
De acordo com Pollock (2003), deveríamos estudar a totalidade das relações
sociais que dão forma às condições de produção e de consumo dos objetos
designados como arte. Segundo a responsável pela Gibiteca,
48
“o mercado
profissional, no caso do cartunismo, de histórias em quadrinhos é um mercado
dominado por homens. Dificilmente se vêem mulheres nesta área.” Conforme nos
informou, desde que foram criados os cursos de HQs na Gibiteca, 15 anos, a
maior presença sempre foi de meninos.
A história das histórias em quadrinhos, conforme Quella-Guyot (1994) e
McCloud (2005) é uma história de desequilíbrio entre os sexos, o que significa que
essa arte, atualmente ainda mantém este estatuto assinalado por esses autores.
Para McCloud (2005) a medida que as HQs se constituíram em um “Clube do
Bolinha” deixaram de desenvolver metade do seu potencial. Embora haja algumas
mulheres que produzem quadrinhos, estas formam uma minoria. Segundo esse
autor, ainda muitos obstáculos para as artistas que fazem histórias em
quadrinhos; a escassez de revistas elaboradas por mulheres não é bom sinal para
futuras gerações femininas. Esses aspectos, refletem uma característica
sociocultural da arte dos quadrinhos, assim como muitas das suas temáticas
principais e personagens, como os super-heróis, por exemplo, que são baseados em
legendas canônicas e éticas masculinas.
Na interpretação e avaliação crítica do estudo exploratório, realizada durante
o segundo semestre de 2006, concluímos que deveríamos prosseguir com a
investigação no ensino formal a fim de conhecer a relação entre o ensino de Artes
Visuais e as HQs, do ponto de vista dos professores de escolas de ensino
fundamental.
48
Em entrevista, na Gibiteca do Solar do Barão, gravada e transcrita na íntegra com sua autorização,
em setembro de 2006.
99
3.3 ESTUDO EMPÍRICO
Tendo em vista o problema principal de pesquisa que trata da relação entre a
Arte Seqüencial/histórias em quadrinhos e este ensino, o presente estudo investiga
a prática de docentes que atuam em escolas públicas e particulares de ensino
fundamental em Curitiba e Região Metropolitana, por meio de entrevistas individuais.
Nesta investigação, desejava-se conhecer as compreensões dos professores
com relação às HQs, suas visões e concepções, analisando-as dentro da
perspectiva da educação para a compreensão crítica da Cultura Visual, com o
objetivo de fazer uma reflexão crítica sobre as práticas de ensino relacionadas. Para
realizar este objetivo, foi preciso conhecer mais de perto a realidade dos
professores.
Conforme relatamos no primeiro capítulo
49
, o problema surgiu de observações
feitas na própria escola, acerca dessas práticas, sendo que essas observações
representavam apenas um ponto de partida para o desenvolvimento deste estudo.
De acordo com Demo (2000, 2001), Flick (2004) e Jorge Duarte (in DUARTE e
BARROS, 2005b) para obter uma parcela representativa significativa e conseguir
apanhar também o lado subjetivo dos fenômenos, o ideal são entrevistas individuais,
com perguntas que permitam obter “pormenores que se transformem em dados
relevantes.” (DEMO, 2000, p. 152). Com essa prática investigativa, esperávamos
também desencadear novos conhecimentos ou insights que trouxessem
contribuições para o ensino de histórias em quadrinhos em Artes Visuais.
Com base nesses autores, foram realizadas 16 entrevistas semi-estruturadas
com professores de Artes e 4 com professores de outras disciplinas, perfazendo um
total de 20 entrevistas, as quais foram gravadas e transcritas na íntegra. Como
referido no problema de pesquisa, outros professores fazem uso das HQs para seu
ensino. No estudo realizado com alunos da Gibiteca isso também foi constatado
através de um dos entrevistados, que comentou que teve contato com essa arte
49
Item 1.1 – O Lugar de Quem Fala.
100
somente na disciplina de Inglês: “[...] em Artes, no ensino fundamental, a gente
nunca chegou a fazer quadrinhos [...]. O professor de Inglês foi o único professor
que pediu.” Desta forma, julgamos apropriado entrevistar alguns professores de
outras disciplinas, a fim de complementar a investigação, embora de modo menos
extensivo, visto que o trabalho está direcionado para o ensino de Artes Visuais.
A análise do estudo empírico segue a perspectiva metodológica interpretativa
crítica e as teorias de Elliot Eisner (1998), com vistas a alcançar uma interpretação
crítica. Esse autor indica a descrição, interpretação e avaliação crítica, como
dimensões da crítica que podem guiar as etapas de realização de uma crítica
educativa. A análise dos dados tem por princípio norteador esta estrutura,
caracterizando o trabalho de análise do presente estudo. Eisner (1998) enfatiza que
os elementos da crítica não podem ser parcelados com facilidade e destaca a
independência uns dos outros, ainda que se façam distinções para fins de análise,
conforme foi exposto no início do capítulo (item 3.1).
Como no estudo exploratório, associamos aqui, à perspectiva crítica, o uso do
método da análise de conteúdo como etapa preliminar de análise. O método,
segundo Stewart e Shandasani (apud ROMERO, 2000), Laville e Dionne, e Strauss
e Corbin (apud SILVA C. R., 2005), envolve o recorte e a categorização dos tópicos
relevantes para as questões pesquisadas, para constituir as unidades de análise e
uma categorização final, a fim de aprofundar os recortes com base em critérios
discutidos. Conforme esses autores, empregamos o Modelo Misto
50
acrescentando
novas categorias, em função do curso da análise. O uso desse método, facilitou a
construção de quadros com respostas que sintetizam informações relevantes
(Quadros 7 a 11) e auxiliou o trabalho de análise dos dados
51
.
50
Segundo Laville e Dionne (1999, apud SILVA, C. R., 2005, p. 76), as categorias de análise podem
ser definidas por três modelos distintos: “Modelo Aberto as categorias não são fixas no início, mas
tomam forma no curso da análise; Modelo Fechado o pesquisador decide a priori as categorias
apoiadas em um ponto de vista teórico que submete freqüentemente à prova da realidade; Modelo
Misto as categorias são selecionadas no início, mas o pesquisador permite modificá-las em função
do que a análise aportará.”
51
Para Laville e Dionne (apud SILVA, C.R., 2005, p. 74), “uma operacionalização que facilite o
trabalho do pesquisador apresenta-se necessária [...] não como uma estrutura rígida e sim como um
direcionador do trabalho de pesquisa.” Conforme os autores citados, a partir dos dados coletados nas
entrevistas (gravados e transcritos na íntegra), o segundo passo de nosso trabalho, consistiu em
realizar uma análise preliminar dos conteúdos manifestos nos discursos dos entrevistados. Foram
então identificadas as informações relevantes das falas dos entrevistados relacionando-as às
categorias estabelecidas previamente. A fase seguinte compreendeu em realizar uma descrição e
interpretação, as quais associamos as dimensões da crítica apontadas por Eisner (1998),
relacionando-as também a fundamentação teórica do presente trabalho.
101
A análise tem por base principalmente as teorias de Hernández
52
e Franz
53
da
educação para a compreensão crítica da Cultura Visual. Fundamenta-se, também,
em teóricos que seguem a tendência crítica: Paulo Freire (1979, 1997); McLaren
(1997); Cary (1998); Freedman (2000, 2001); Gómez (2001); Giroux (1997, 2003);
Efland, Freedman e Sthur (2003); Chalmers (2003); Pollock (2003); Richter (2004);
Efland (2005); Corrêa (2004, 2005) e ainda em outros autores que contribuem para o
entendimento das questões relacionadas à pesquisa. Entre teóricos dos quadrinhos
contamos com: Will Eisner (1989, 1998); Acevedo (1990); Quella-Guyot (1994);
Conde (2000); Brent Wilson (2005a, 2005b); Rama e Vergueiro (2004); Vergueiro
(2006); McCloud (2005, 2006) e outras contribuições.
Na bibliografia estudada pertinente ao ensino de Artes Visuais da
contemporaneidade, destaca-se que cada vez mais este ensino vem valorizando o
desenvolvimento da habilidade de compreensão crítica e o aprender a aprender do
aluno. Também uma mudança na postura do professor, que deve ser também
pesquisador (HERNÁNDEZ, 1998, 2000; FRANZ 2003, 2004; CORRÊA, 2004).
É importante lembrar que, dentro do enfoque da perspectiva da educação
para a compreensão crítica da Cultura Visual, o fazer, o produzir e a leitura da obra
de arte são substituídos por uma postura mais crítica, na qual a prática deve estar
associada à teoria como instrumento para interpretação crítica e condição de
criatividade, alimentando um processo para desenvolver a tomada de consciência do
aluno. Ou seja, deve apropriar-se do conhecimento historicamente construído de
forma crítica e criativa relacionando-o a sua vida e ao seu tempo.
No contexto atual, há grande preocupação com a atuação dos professores e a
necessidade de valorização desse ensino, e também, a necessidade de
desmistificação da separação entre arte erudita e arte popular, trazendo novas
condições para o ensino de Artes Visuais e exigindo uma reflexão mais aprofundada
sobre nossas visões e práticas, bem como uma avaliação sobre elas.
O problema de pesquisa está relacionado à compreensão de uma situação
ligada ao ensino. Cohen e Manion (apud FRANZ, 2000), para esse tipo de estudo,
recomendam a metodologia qualitativa interpretativa crítica. Conforme Franz
(informação verbal)
54
, Carr (1996) e Elliot Eisner (1998), a crítica educativa é um
52
Hernández (1998, 2000, 2001, 2002, 2003a, 2005, 2006, 2007).
53
Franz (2000, 2001, 2003a, 2003b, 2003c, 2003d, 2004, 2005a e 2005b).
54
FRANZ, In: Seminário de Orientação II, Curso de Mestrado em Artes Visuais – UDESC, 2006.
102
meio apropriado para alcançar esta compreensão. Entende-se que uma
interpretação e reflexão crítica sobre esta investigação, isto é, sobre a Arte
Seqüencial/HQs no ensino de Artes Visuais, pode contribuir para construir novos
posicionamentos mais críticos e que professores desta área, interessados em
trabalhar com essa arte também possam beneficiar-se deste estudo.
Ao final, consideramos que as entrevistas individuais foram úteis, conforme
Demo (2000), Flick (2004) e Duarte (2005), para ampliar os conceitos da situação
analisada, saber como os professores trabalham e fazer observações a respeito.
3.3.1 Perfil das escolas e dos professores entrevistados
a) Escolas em que os professores lecionam
Escolas Públicas Municipais
1 Escola Municipal Erasmo Piloto Curitiba
2 Escola Municipal Herley Mehl Curitiba – Pilarzinho
3 Escola Municipal Jardim Santo Inácio Curitiba – Bairro Jardim Santo Inácio
4 Escola Municipal Julia Di Lenna Curitiba
5 Escola Municipal Papa João XXIII Curitiba
6 Escola Municipal Prof. Guilherme Butter Curitiba – Bairro do Boqueirão
Escolas Públicas Estaduais
1 Escola Estadual Amintas de Barros Pinhais – Região Metropolitana de Curitiba
2 Escola Estadual Dom Ático E. da Rocha Curitiba – Bairro do Portão
3 Colégio Estadual Emília Busato Campo Magro – Região Metropolitana de Curitiba
4 Escola Estadual Lamenha Pequena Almirante Tamandaré – Região Metropolitana de Curitiba
5 Escola Estadual Luarlindo dos Reis Borges Pinhais – Vila Maria Antonieta
6 Escola Estadual Máximo Atílio Asinelli Curitiba – Bairro Uberaba
7 Escola Estadual Maria Pereira Martins Curitiba – Bairro da Barreirinha
8 Escola Estadual Pinheiro do Paraná Curitiba – Bairro de Santa Felicidade
9 Escola Estadual Rodolpho Zaniehi Curitiba – Bairro Vila Verde
10 Escola Estadual Tiradentes Curitiba – Centro
11 Instituto de Educação do Paraná Curitiba – Centro
Escolas Particulares
1 Colégio Dom Bosco Sede do Ahú Curitiba – Bairro Ahú
2 Colégio Bom Jesus Internacional Colombo – Região Metropolitana de Curitiba
Total de Escolas: 19
Quadro 2 – Escolas em que os professores entrevistados lecionam
103
b) Formação e outros dados dos professores entrevistados
Professores de Arte
Curso de Graduação Superior Pós-Graduação
(Especialização)
Área em que Atua
Idade
(em 2006)
1 Belas Artes - Gravura -Pelotas
Licenciatura em Educação
Artística - CEFET/PR - 2001
Não 1. Artes Visuais
2. Teatro e Música
45
2 Pedagogia - 1994 Arteterapia 1. Artes Visuais 2. Música
3. Teatro 4. Dança
32
3 Artes Visuais - FAP - 2000 Não 1. Artes Visuais
2. Música (eventualmente)
34
4 Teatro - FAP - 1993 Não 1. Teatro
2. Artes Visuais
59
5 Artes Plásticas - FAP - 1998 Não 1. Artes Visuais
2. Teatro (eventualmente)
50
6 Artes Plásticas - FEMP - 1982 Musicoterapia 1. Artes Visuais
2. Música 3. Dança 4.Teatro
51
7 Artes Plásticas - FEMP - 1990 Sim em outra área 1. Artes Visuais
2. Música (eventualmente)
48
8 Artes Plásticas - UFPR - 1979 Não 1. Artes Visuais 46
9 Música - FAP - 1988 Não 1. Música 2. Artes Visuais
3. Teatro 4. Dança
61
10 Artes Plásticas - UFPR - 2004 Não 1. Artes Visuais 25
11 Teatro - FAP - 2005 Não 1. Artes Visuais 23
12 Música - FEMP - 1998 Educação Especial 1. Artes Visuais
2. Música
46
13 Arquitetura e Urbanismo –
Faculdade Tuiuti - 2005
Não 1. Artes Visuais
2. Teatro 3. Música
28
14 Artes Plásticas - FAP - 1991 Não 1. Artes Visuais 42
15 Artes Visuais - FAP - 1993 1. Arte Educação e
2. Educação Especial
1. Artes Visuais 30
16 Teatro - FAP - 1994 Não 1. Artes Visuais
2. Teatro
32
Quadro 3 – Formação e perfil dos professores de Arte entrevistados
Professores de Português, Ciências e Matemática
Curso de Graduação
Superior
Pós-Graduação
(Especialização e/ou Mestrado)
Área em que Atua
Idade
(em 2006)
17A Letras Português Literatura Português 49
17B Letras Português - Inglês Interdisciplinaridade Português 49
18A Matemática Matemática Matemática 49
18B Curso Químico Industrial Educação para Ensino Fundamental e Médio e
Mestrado em Matemática
Matemática 51
19 Ciências Biológicas Ciências Ciências 38
20 Português Mestrado em Literatura Brasileira Português 46
Quadro 4 – Formação e perfil dos professores de outras disciplinas entrevistados
104
No Quadro 2 fazemos uma relação das escolas em que os professores
lecionam Aqui é necessário fazer uma observação. Para realizar a entrevista, foi
solicitada autorização aos docentes, mas de modo que fosse assegurado não
revelar sua identidade o modelo de autorização para as entrevistas de grupo e
individuais consta no apêndice B.
Assim sendo, as escolas não estão relacionadas com o número das
entrevistas neste quadro. Caso o fizéssemos poderia haver uma identificação dos
professores, pois algumas escolas possuem apenas um professor de Arte. Pelo
mesmo motivo, no Quadro 2, não constam as datas em que foram realizadas.
Não é
nosso objetivo identificar nem desrespeitar os professores que gentilmente cederam
as entrevistas.
Relacionamos, então, as escolas, não por número de ordem e data, mas por
ordem alfabética das entidades. É suficiente acrescentarmos que as entrevistas
foram realizadas em agosto, e algumas delas foram complementadas em setembro
de 2006, em dias e horários marcados conforme a disponibilidade das escolas e dos
professores. Outra observação é que nem todas as entrevistas aconteceram na
própria escola. Em alguns casos, por solicitação dos professores ou necessidade,
algumas foram realizadas em outros locais. Incluímos uma amostra de entrevista do
estudo empírico e uma do exploratório, no apêndice C.
Os entrevistados, em sua maioria (16), são professores de Arte e lecionam
em escolas públicas pertencentes ao Estado ou Município. Ao todo, são 6 escolas
públicas municipais, 11 escolas públicas estaduais e 2 escolas particulares. Algumas
das escolas pertencem à Região Metropolitana de Curitiba.
Nos Quadros 3 e 4, pode-se visualizar a formação dos professores e outros
dados. Na primeira coluna encontra-se o curso de graduação superior. Na segunda
coluna, a pós-graduação especialização e/ou mestrado. Na terceira coluna está a
área de atuação do professor. No Quadro 3, para a disciplina Arte, utilizamos a
convenção 1 para a primeira área de atuação e 2, 3 e 4 para outra(s) área(s) em
que o professor atua. Na quarta coluna está a idade do entrevistado em 2006.
Somando-se as 16 entrevistas com professores de Arte, com as 4 de outras
disciplinas, são no total 20 entrevistas, das quais participam 22 professores. Explica-
se: seis são professores de outras disciplinas. Quatro entrevistas foram feitas com
professores de Português, Ciências e Matemática. Em uma das escolas fizemos
uma entrevista com uma dupla de professores de Português, (nº
s
17A e 17B) e outra
105
com uma dupla de professores de Matemática (nº
s
18A e 18B). Essas professoras
trabalham em conjunto muitos anos e por isso solicitaram para fazer a entrevista
em duplas. Seu planejamento curricular, visão e concepção de ensino são os
mesmos e utilizam o mesmo material didático e organizam em duplas todas as
atividades e provas. As duas entrevistas restantes, de Português e Ciências (nº
s
19
e 20), foram feitas individualmente.
Dos professores de Arte, 6 são formados em Artes Plásticas
55
, 1 é formado
em Pedagogia, 1 em Gravura e Educação Artística, 2 em Artes Visuais e 1 formado
em área afim Arquitetura e Urbanismo. Três são formados em Teatro na FAP.
Desses três, apenas um trabalha efetivamente com Teatro, os outros dois com Artes
Visuais. Apenas duas professoras têm habilitação em Música, na mesma faculdade
a FAP e também trabalham com Artes Visuais. Dessas duas, a primeira (nº 9)
prioriza o ensino de Música, mas como trabalha com educação infantil e de a
série, procura ensinar sempre todas as linguagens. A outra (nº 12) tem alunos com
deficiência, visual e auditiva, sendo maioria deficientes auditivos. Segundo esta
professora pós-graduada em Educação Especial, com as turmas de surdos, todo o
trabalho é essencialmente visual.
Somente 5, dos 16 professores de Arte têm curso de pós-graduação. As
professoras de Português, Ciências e Matemática todas possuem um curso de
especialização ou mestrado. É uma situação bastante desequilibrada. Nenhum dos
professores de Arte dessa mostra tem curso de mestrado. Uma das professoras de
Arte (nº 7) tem especialização, mas não dentro da área de arte e mencionou que é
curso que não tem nada a ver com o ensino de Arte. Uma das entrevistadas,
graduada em Artes Visuais, possui dois cursos de especialização, um em Arte-
educação e outro em Educação Especial (nº 15). Das professoras que têm curso de
especialização em Musicoterapia e Arteterapia somente uma tem curso de
graduação em Arte (nº 6), a outra (nº 2) é formada em Pedagogia.
A maioria dos professores de Arte trabalha com mais freqüência em Artes
Visuais. Apenas eventualmente os professores entrevistados trabalham com alguma
outra linguagem conforme seu domínio.
As idades são bastante variadas e vão desde 23 a 61 anos. Entre os 22
professores (Arte e outras disciplinas) há uma grande faixa de nascidos entre 1955 e
1960, ao todo 10 professores, que estão com idades em torno de 46 a 51 anos. No
55
Artes Plásticas chama-se atualmente Artes Visuais na FAP (Faculdade de Artes do Paraná).
106
conjunto de entrevistados, a situação de equilíbrio entre os sexos inverte-se com
relação ao estudo anterior realizado com alunos que fazem curso de HQs. De 22
professores, apenas 2 são do sexo masculino,
s
11 e 14. Mais um reflexo dos
papéis estabelecidos por nossa sociedade, que costuma atribuir à mulher a
responsabilidade pela educação. Isso também causa reflexos no currículo do ensino
de Arte. Os dois professores manifestaram que gostam mais intensamente de
histórias em quadrinhos do que as professoras. Um deles ainda não trabalha com
quadrinhos, porque ministra aulas apenas até a série e segue o planejamento do
colégio que é bastante rígido. O colégio trabalha com quadrinhos na série;
porém manifestou gostar bastante e com freqüência lê HQs. O outro professor, idem:
gosta de quadrinhos e costuma ensinar esta arte para todas as suas turmas.
3.3.2 Roteiro base e categorias de análise
O Quadro 5 corresponde ao roteiro base e as categorias de análise utilizadas
para as entrevistas semi-estruturadas individuais com os professores de Arte. O
Quadro 6 refere-se ao roteiro base e categorias de análise selecionadas de início
para as entrevistas com professores de Português, Ciências e Matemática. As
categorias 1, 2, e 5, do Quadro 5 seriam aplicadas somente aos professores de
Artes Visuais, a princípio. Todavia os professores de Português também trabalham
com imagens, de modo que estendemos essas categorias também a estes, e aos
outros professores, conforme suas respostas.
Devido ao caráter aberto das questões semi-estruturadas, muitas vezes, além
das perguntas principais, outras surgiam no decorrer das entrevistas. As entrevistas
com docentes de outras disciplinas contribuem sobremodo para o estudo. Para o
aprofundamento das questões, entretanto, priorizamos a disciplina de Artes Visuais,
dado que o problema de pesquisa está centrado nesta disciplina. Durante as
entrevistas também foram solicitadas informações úteis, como por exemplo, dados
sobre a formação do professor para lecionar a disciplina de Artes Visuais, ou
detalhes sobre encaminhamentos metodológicos para atividades com quadrinhos e
ainda outros complementares.
107
Entrevista Semi-estruturada
Categorias de Análise
1 Costuma trabalhar com imagens na sala de
aula ?
2 Com que tipo de imagem?
3 Ensina sobre a linguagem dos quadrinhos?
(Para quem?)
4 Como desenvolve esta atividade?
5 Qual critério utiliza para a escolha das
histórias em quadrinhos a serem trabalhadas
em aula ? (Que autor(es) utiliza ?)
1 Trabalho com imagens
2 Tipos de imagens que o professor trabalha
3 Trabalho com histórias em quadrinhos
4 Desenvolvimento das atividades sobre quadrinhos
5 Critérios utilizados para a escolha de histórias em
quadrinhos
Quadro 5 Roteiro base para a entrevista e categorias de análise definitivas - Arte (e outras
disciplinas)
Entrevista Semi-estruturada
Categorias de Análise
1 Trabalha com histórias em quadrinhos junto aos
alunos?
2 Como desenvolve esta atividade?
1 Trabalho com a linguagem dos quadrinhos
2 Desenvolvimento das atividades sobre quadrinhos
Quadro 6 – Roteiro base para a entrevista e categorias de análise de início para Português, Ciências
e Matemática
3.3.3 Análise de dados
Na etapa de pré-análise, elaboramos quadros com respostas síntese -
Quadros 7, 8, 9, 10 e 11 (item 3.3.3.1) - usando a técnica do recorte, conforme
Laville e Dione (1999, apud Silva, C.R., 2005) e outros autores citados, extraindo
informações significativas que permitem a identificação dos dados que serão objeto
de análise, partindo das categorias estabelecidas anteriormente. Estes quadros,
além das perguntas principais contêm outras complementares, que são levadas em
consideração na análise, embora não tenhamos estabelecido categorias específicas
para estas. Somente quando relevantes foram criadas novas categorias, em função
do curso da análise, levando em conta a importância das informações.
Para visualizar mais facilmente as entrevistas com professores de Arte e de
outras disciplinas, colocamos em quadros separados, as entrevistas de 1 a 16
para a área de Artes Visuais e
s
17 a 20, para Português, Matemática e Ciências.
A organização do trabalho de análise segue o Quadro 5 (itens 3.3.4 e 3.3.5).
108
3.3.3.1 Quadros síntese de respostas
5 6 7 8
Tempo que trabalha
como professora de
Arte
26 anos*
11 anos de Arte
29 anos 15 anos 24 anos
Série(s) em que leciona
Pré a 4ª, 5ª a 8ª e EJA Pré a 4ª, 5ª a 8ª e Ensino
Médio
5ª a 8ª série 5ª a 8ª e Ensino Médio
Costuma trabalhar com
imagens? Com que tipo
de imagens?
Sim.
Geralmente obras de arte.
Sim.
Obras de arte, propaganda.
Sim.
Obras de arte,
propaganda.
Sim (raras vezes).
Obras de arte e imagens
que sirvam de referência
para o desenho da figura
humana.
Ensina sobre a
linguagem dos
quadrinhos? (Para
quem?)
Sim.
Quando era professora de
1ª a 4ª, usou HQs para
ensinar Português, e agora,
para ensinar sobre a
charge, abordou os
quadrinhos - para o 6ª
período (8ª série) do EJA.
Sim.
Uma vez por ano, para as 5ª
s
,
s
, 7ª
s
e 8ª
s
séries.
Sim.
Para 6ª
s
e 7ª
s
séries.
Não.
Trabalha com releitura e
mais com composição.
Como desenvolve esta
atividade?
Iniciou com a história dos
quadrinhos, para poder
ensinar sobre a charge.
Trabalha a parte visual das
HQs, depois do trabalho de
criação de texto realizado na
disciplina de Português.
Ensina pelo que vê nos
livros. Primeiro a
construção do
personagem, depois
criação da história.
Não desenvolve.
Adota metodologia para
ensinar sobre HQs?
Ainda não trabalhou com
HQs.
Interdisciplinaridade. Técnica e livre criação. Não trabalha com HQs.
Qual critério utiliza para
a escolha das HQs a
serem trabalhadas em
aula?
(Que autor(es) utiliza?)
Prefere escolher primeiro
autores locais (Maurício de
Souza, Ziraldo). Faria uma
pesquisa em função do
tema.
Usa autor nacional: Maurício
de Souza.
Autor conhecido,
“brasileiro”: Maurício de
Souza.
Não trabalha com HQs.
* Outra disciplina ou ensino de 1ª a 4ª série.
Quadro 8 – Síntese das respostas - entrevistas nº
s
5, 6, 7 e 8
1 2 3 4
Tempo que trabalha
como professora de Arte
5 anos
12 anos*
6 anos de Arte
9 anos
20 anos*
13 anos de Arte
Série(s) em que leciona
5ª a 8ª e Ensino Médio
(1º e 2º ano)
1ª a 4ª série 1ª a 4ª, 5ª a 8ª e Ensino
Médio
5ªs e 6ªs séries
Costuma trabalhar com
imagens? Com que tipo
de imagens?
Sim.
Obras de arte, histórias em
quadrinhos e outras.
Sim.
Obras de arte, propaganda.
Sim.
Geralmente, obras de
arte.
Sim.
Obras de arte,
propaganda.
Ensina sobre a
linguagem dos
quadrinhos? (Para
quem?)
Sim.
Uma vez por ano, para as
5
as
e 6
as
séries.
Sim.
Ensinou 2 vezes, para a 2ª
série.
Sim.
Ensinou 1 vez, para a 5ª
série.
Não.
Como desenvolve esta
atividade?
Leva várias histórias, os
alunos lêem, observam,
copiam ou desenham.
Geralmente 3 quadrinhos.
Uma vez, levou a história,
depois pediu para os alunos
desenharem uma seqüência.
Outra vez ensinou sobre os
planos, usando as HQs.
Ensinou sobre as
onomatopéias.
Não.
Porque “a professora
de Português tem
trabalhado muito.”
Adota metodologia para
ensinar sobre HQs?
Usa método tradicional,
desenho de observação,
cópia, memória.
Procura ser criativa, faz
associações com outras
atividades.
Solicitou para identificar
os elementos
(onomatopéias) no gibi.
Não trabalha com HQ.
Qual critério utiliza para
a escolha das HQs a
serem trabalhadas em
aula?
(Que autor(es) utiliza?)
Usa autor conhecido –
Maurício de Souza. Acha
“mais rápido” para levar
para os alunos.
Prefere usar Maurício de
Souza, porque tem um desenho
claro e limpo.
Deixa a critério dos alunos
e leva algumas opções.
Não trabalha com HQ.
* Outra disciplina ou ensino de 1ª a 4ª série.
Quadro 7 – Síntese das respostas - entrevistas nº
s
1, 2, 3 e 4
109
9 10 11 12
Tempo que trabalha
como professora de
Arte
30 anos 1 ano e meio 3 anos
10 anos*
5 anos de Arte
Série(s) em que leciona
Educação Infantil e 1ª a 4ª 5ª, 6ª e 7ª série 1ª a 7ª série 5ª a 8ª série
Costuma trabalhar com
imagens? Com que tipo
de imagens?
Sim.
Obras de arte,
propaganda e outras.
Sim.
Obras de arte,
propaganda, imagens de
revistas.
Sim.
Obras de arte,
propaganda.
Sim.
Obras de arte.
Ensina sobre a
linguagem dos
quadrinhos? (Para
quem?)
Não ensinou. Mas usou as
onomatopéias uma vez
para ensinar música, no
pré, 1ª e 2º série.
Sim.
Para as 6ª
s
e 7ª
s
séries.
Não. Sim.
Ensinou uma vez para a
6ª série.
Como desenvolve esta
atividade?
Não ensinou porque acha
difícil. Não teve tempo para
se preparar para isso.
Leva a história, os alunos
lêem, ensina sobre a
linguagem, depois os alunos
constroem uma história.
Não desenvolve, porque no
colégio é ensinado só na 8ª
série.
1º as partes
isoladamente, finalizando
com criação da história.
Também ensina a ampliar
e reduzir figuras.
Adota metodologia para
ensinar sobre HQs?
Não. Técnica e livre criação. Não trabalhou com HQs. Criação livre e cópia.
Qual critério utiliza para
a escolha das HQs a
serem trabalhadas em
aula?
(Que autor(es) utiliza?)
“Difícil escolher.”
Usou Maurício de Souza,
quando ensinou música
com os sons das
onomatopéias.
Autor nacional.
Maurício de Souza e outros.
Se o fizesse, utilizaria
revistas e gibis que os
alunos costumam ler.
Prefere usar Maurício de
Souza - distingue das
HQs que têm temas
“mais pesados.”
* Outra disciplina ou ensino de 1ª a 4ª série.
Quadro 9
-
Síntese das respostas - entrevistas nº
s
9, 10, 11 e 12
13 14 15 16
Tempo que trabalha
como professora de
Arte
1 ano e meio 15 anos 13 anos
1 ano Artes
15 anos*
2 anos de Arte
Série(s) em que leciona
1ª a 4ª e 5ª a 8ª série 6ª série e ensino Médio 7ª série e ensino Médio 1ª a 4ª e 5ª série
Costuma trabalhar com
imagens? Com que
tipo de imagens?
Sim.
Obras de arte,
propaganda.
Sim.
“Dentro do possível.” Obras de arte,
imagens de revistas, propaganda,
histórias em quadrinhos.
Sim.
Obras de arte,
propaganda.
Sim.
Obras de arte,
propaganda,
rótulos, adesivos.
Ensina sobre a
linguagem dos
quadrinhos? (Para
quem ?)
Sim
Ensinou uma vez para a 6ª
série.
Sim
Todo ano, para todas as turmas - de
5ª à 8ª série.
Sim
Ensinou duas vezes - na 4ª
e 7ª série.
Não ainda.
Como desenvolve esta
atividade?
Levou as releituras de
obras de arte de Maurício
de Souza e falou sobre a
história das HQs.
Atividade: bloquinho de
animação.
Passa as noções básicas de “como
criar um quadrinho”, depois pede
para o aluno criar.
Enquanto contava uma
história (inventada) os
alunos desenhavam.
Não desenvolve.
Já usou desenhar
seqüências como
técnica para
memorizar peça
de teatro.
Adota metodologia
para ensinar sobre
HQs?
Não. Desenho de observação, treinamento
técnico e criação livre.
Procura variar.
Trabalha por temas.
Não.
Qual critério utiliza
para a escolha das
HQs a serem
trabalhadas em aula?
(Que autor(es) utiliza?)
Autor conhecido – Maurício
de Souza. “É mais fácil
porque os alunos podem
levar.”
O critério é material que sirva como
referência para desenho. Nem
sempre leva HQ. Pede aos alunos
para levar e trabalha conforme o
material que o aluno tiver: Maurício
de Souza e outros.
Acha Maurício de Souza
muito estático.
Prefere usar filmes de
animação.
“Acho [Anima Mundi]
material muito bom.”
Levaria HQs
menos comerciais.
* Outra disciplina ou ensino de 1ª a 4ª série.
Quadro 10 – Síntese das respostas - entrevistas nº
s
13, 14, 15 e 16
110
17
18
19
20
Tempo que
trabalha como
professora de
...
Português
27 anos
Português
25 anos
Matemática
28 anos
Matemática
17 anos
Ciências
15 anos
Português
12 anos
Série(s) em que
leciona
7ª série 5ª e 6ª série 5ª e 6ª série 7ª e 8ª série 5ª e 6ª série 5ª a 8ª série
Costuma
trabalhar com
imagens? Com
que tipo de
imagens?
Sim.
Todo tipo de
imagem. Obras de
arte, desenhos de
humor, HQs, etc.
Sim.
Todo tipo de
imagem. Obras de
arte, desenhos de
humor, HQs, etc.
Não. Não. Não. Sim.
Todo tipo de
imagem. Obras
de arte,
desenhos de
humor, HQs,
etc.
Ensina sobre a
linguagem dos
quadrinhos?
(Para quem?)
Sim.
Para a 7ª série (e
todas as turmas
em que lecionou).
Sim.
Para as 5ª
s
e 6ª
s
séries (e todas as
turmas em que
lecionou).
Não.
Usa para ensinar
ou ilustrar situações
em que apareçam
operações
matemáticas.
Nas 5ª
s
e 6ª
s
séries
(todas as turmas).
Não.
Usa para ensinar
ou ilustrar situações
em que apareçam
operações
matemáticas.
Nas 7ª
s
e 8ª
s
séries
(todas as turmas).
Não.
Usa como
atividade para
sair da rotina.
Faz essa
atividade em
todas as turmas
que leciona.
Sim
Para turmas de
5ª à 8ª série.
Como
desenvolve
esta atividade?
Faz leituras e
construção de
histórias em
quadrinhos.
Nas leituras, faz 1º
leitura do texto, 2º
leitura da imagem
3º associação
entre texto e
imagem, para
depois o aluno
construir sua
história, utilizando
conteúdos da
disciplina.
Faz leituras e
construção de
histórias em
quadrinhos.
Nas leituras, faz 1º
leitura do texto, 2º
leitura da imagem
3º associação entre
texto e imagem,
para depois o aluno
construir sua
história, utilizando
conteúdos da
disciplina.
Os alunos
constroem histórias
em quadrinhos
onde deve aparecer
o conteúdo
trabalhado em
Matemática.
Os alunos
constroem histórias
em quadrinhos
onde deve aparecer
o conteúdo
trabalhado em
Matemática.
Primeiro passa o
conteúdo em
Ciências, depois
pede para os
alunos
construírem uma
história na qual
conste este
conteúdo.
Parte da
imagem para
construir a
história e vice-
versa – parte do
texto para
construir a
imagem.
Qual critério
utiliza para a
escolha das
HQs a serem
trabalhadas em
aula?
(Que autor(es)
utiliza?)
Escolhe imagens
de HQs mais
freqüentemente
veiculadas pelas
mídias e mais
curtas, como as
tiras humorísticas.
Escolhe imagens
de HQs mais
freqüentemente
veiculadas pelas
mídias e mais
curtas, como as
tiras humorísticas.
Não utiliza imagens
de HQs (impressas
ou semelhantes).
Trabalha com a
criação do aluno.
Não utiliza imagens
de HQs (impressas
ou semelhantes).
Trabalha com a
criação do aluno.
Não utiliza
imagens de HQs
(impressas ou
semelhantes).
Trabalha com a
criação do aluno.
Seleciona as
imagens de
HQs das
apostilas, em
função da
necessidade do
aprendizado do
aluno.
Quadro 11 - Síntese das respostas - entrevistas nº
s
17A, 17B, 18A, 18B, 19 e 20
3.3.4 Categorias 1 e 2
Para analisar as questões 1 e 2 do roteiro base (Quadro 5), que têm por
objetivo saber se os professores trabalham com imagens e com que tipos de
imagens costumam trabalhar, estabelecemos as categorias 1 e 2: Trabalho com
Imagens e Tipos de Imagens que o Professor Trabalha, respectivamente. As
respostas referentes a estas questões, encontram-se nos Quadros 12, 13, 14 e 15.
111
a) Pergunta 1: Costuma trabalhar com imagens na sala de aula ?
Trabalho com Imagens – Professores de Artes Visuais
1 “Muito, muito. [...].”
2 “Sim, sim.”
3 “Trabalho muito com imagens.”
4 “[...] normalmente eu trabalho com imagens. Eu levo a imagem.”
5 “Bastante.”
6 “Livros de arte, porque tenho muitos livros. [...]. Muitas imagens eu pego desses livros. [...]. Agora eu tenho usado
fitas de vídeo, porque a escola tem bastante.“
7 “Sim.”
8 “Utilizo muito pouco. [...]. Trabalhava com releitura e muita composição.”
9 “É claro, com imagens, também.”
10 “Dentro do que eu posso sim. Eu tenho algumas. Outras eu ganhei também. Algumas a gente compra. Mas a escola
acaba não fornecendo, então a gente tem que fazer do próprio bolso.”
11 “Sim.”
12 “Trabalho.” [com imagens]
13 “Eu trabalho com imagens de livros específicos. Tem a pasta do Arte BR [...]. Também pego imagens da Internet [...].
[...] a gente não tem livros, não tem nada, para nenhum dos eixos. Eu trabalho três eixos. Mas não tem material, tem
que pesquisar. Os alunos também têm que pesquisar.”
14 “Dentro do possível. Porque a escola pública, é tão limitada! Não adianta falar que não é. E o problema da limitação
não é que não existe material. [...]. Até recebemos uns livros bons de arte, do governo. [...]. que eu não posso
pegar aquele livro e mostrar de carteira em carteira. Tenho que fazer uma transparência, daí tenho que tirar do meu
bolso, xerox, também. Em Artes Visuais, eu isso acho meio traiçoeiro. Porque em alguns momentos o xerox, ajuda.
Em outros atrapalha. Eu mesmo, na escola pública, me mostraram muita coisa de xerox e na Faculdade, quando fui
ver me decepcionei. Porque não é a mesma coisa. [...]. Você vai falar de artes, mostrando tudo em preto e branco? É
complicado ! O colorido já é uma outra situação, que não é muito possível na escola.”
15 “Trabalho bastante, geralmente de livros porque não tem recurso na escola de slide, não tem projetor. Então,
trabalho direto com livros e raramente eu tiro xerox. Xerox colorido também não dá, então trabalho com xerox preto e
branco, o que não dá para fazer muita coisa.”
16 “Sim. Trabalho com livro que tem imagens. Também tenho [...] aquele material do Arte BR. [...]. E também peço
doações. Peço para os colegas, alunos, tenho alguns materiais de revistas que eu plastifiquei e uso. [...] tiro da
Internet [...]. Peço para a Pedagoga da escola que presta esse serviço.”
Quadro 12 – Categoria 1 - Trabalho com Imagens - referente à pergunta 1 – Arte
Trabalho com Imagens – Outras Disciplinas
17A Sim. “Utilizamos bastante.”
17B Sim. Idem.
18A Não trabalha em função do ensino sobre as imagens.
18B Idem.
19 Idem.
20 “Sim. A imagem é fundamental. A imagem associada à questão da letra, é fundamental. Para os menores, isso é
mais freqüente, embora para os maiores também.”
Quadro 13 – Categoria 1 - Trabalho com Imagens - referente à pergunta 1 – Português, Ciências e
Matemática
112
b) Pergunta 2: Com que tipo de imagens ?
Tipos de Imagens que o Professor Trabalha – Artes Visuais
1 “A maioria das vezes, eu mostro imagem do artista tal e vamos fazer uma releitura. Eu pergunto: __ O que vocês
estão vendo? E aí segue. [...]. [...] outras imagens e histórias em quadrinhos. [...] Obras de arte.”
2 “Imagens de artistas, de obras de arte.”
3 “Principalmente com obras de arte. Faço visitas constantes à casa de artes, também.”
4 “[...] eu trabalho com obras de arte e outras imagens também [...] as vezes de propaganda, tem umas imagens. [...]
ou de obras abstratas [...]. pintura [...].”
5 “Obras de artistas, mas tudo relacionado, por exemplo, com o conteúdo que eu quero dar.”
6 “Obras de arte. [...]. A escola tem várias coleções. [...]. Tem uma coleção que se chama Grandes nios da Pintura.
Esta coleção tem em livros e também em fitas. [...] Leonardo da Vinci, Miguel Ângelo, e vem. [...]. Eu usei muitas
imagens de propaganda, quando eles fizeram um trabalho sobre a influência das obras de arte na propaganda.”
7 “Levo, mostro transparências. Falo sobre o autor. [...]. [...] trabalho propaganda.”
8 “[Obras de arte] raras vezes [...]. Às vezes a gente usa imagens de livros de anatomia, de figuras humanas que
servem como referência para o desenho e a modelagem.”
9 “Eu procuro levar artistas acessíveis às crianças [...] Uso muito jornal. [...] além de artista eu uso bastante a
propaganda, outdoors, a televisão que eles estão vendo, tal propaganda que eles conhecem. Então uso imagem da
revista, do jornal, da mídia.”
10 “Normalmente não trabalho com imagens de artistas, de obras, mas até com revistas, a gente faz leitura de
revistas, jornais, propaganda.”
11 “De todos os tipos. [...]. Todo tipo de imagem, por exemplo, sobre o Egito, Portinari. [...]. Na série, imagem da
Tarsila, Van Gogh. [...] propaganda.”
12 “Tudo levando imagens de artistas [Tarsila, Di Cavalcanti, Van Gogh, David, do gótico].”
13 “Obras de arte, artistas.”
14 “Eu trabalho bastante com imagens de revistas, que a gente tem mais a mão. A escola tem, então é mais fácil de
trabalhar. Jornais, propaganda.”
15 “Contemporânea. [...]. O que a gente tem de recurso é em jornal e revista (propaganda também). [...]. [...] por
exemplo, Cubismo, pego imagem da revista e fazemos montagem. Alguma coisa assim. É o recurso que tem.”
16 [Obras de arte, arte postal, propaganda] “Pego adesivos, rótulos, fui trazendo.”
Quadro 14 – Categoria 2 - Tipos de Imagens que o Professor Trabalha - referente à pergunta 2 –
Arte
Tipos de Imagens que o Professor Trabalha – Outras Disciplinas
17A “Todo o tipo de imagem. Utilizamos bastante as imagens. Mesmo porque o próprio material da escola já está
elaborado incluindo imagens. Imagens de obras de arte, vários artistas, tiras humorísticas, cartuns, charges,
propaganda.”
17B Idem. “Todo o tipo de imagem.”
18A Não utiliza imagens para ensinar sobre elas. Usa apenas as imagens didáticas que a apostila contém para o ensino
da disciplina.
18B Idem.
19 Idem. Não utiliza outras imagens, além das imagens da apostila de Ciências.
20 “Todo tipo de imagem. A imagem é fundamental, eu acho assim. [...]. O próprio material didático escolhido,
contempla a questão da imagem, o o texto. É claro que a proporção é menor. Para os pequenos e os mais
jovens da a 8ª, a imagética é bem maior. A utilização das imagens é bem mais intensa, até porque eles precisam
do concreto para depois transformar isso em um representado, que é a letra. [...]. Esse material normalmente
contempla a questão visual [...]. E sempre a imagem acaba fazendo parte. [...]. As tiras humorísticas são recorrentes
no material didático. Hoje se você for fazer uma análise de material didático, os bons materiais trazem.”
Quadro 15 – Categoria 2 - Tipos de Imagens que o Professor Trabalha - referente à pergunta 2 –
Português, Ciências, Matemática
113
3.3.4.1 Outras categorias identificadas nas respostas dos entrevistados
A partir das respostas obtidas com as questões 1 e 2, estabelecemos outra
categoria, a fim de analisar o trabalho realizado com essas imagens. Inserimos as
respostas dos docentes sobre o trabalho que realizam com as imagens,
relacionadas às leituras e releituras de imagem, nos Quadros 16 e 17, dentro da
categoria Leituras de Imagem. Matemática e Ciências não foram incluídas nesta
categoria, pois as três professoras destas disciplinas (nº
s
18A, 18B e 19), utilizam
HQs mais como atividade para os alunos e não para fazer leituras interpretativas ou
outro tipo de leitura (ver Quadros 13, 15 e Quadros Síntese).
Leituras de Imagem - Professores de Artes Visuais
1 “A maioria das vezes, eu mostro imagem do artista tal e vamos fazer uma releitura. Eu pergunto: __ O que vocês
estão vendo? E segue. [...]. Ah! Até os alunos reclamam um pouco: __Ai! Professora, o que estou vendo, olha!
Então digo para eles: __ Mas isto é para vocês não chegarem frente quadro e dizer:__ Ah! O que é isto? Vocês têm
que observar a cor que foi mais usada nesse trabalho. São várias perguntas que eu faço para eles. Daí eles vão
olhando no trabalho.”
2
“Eles olham uma vez a obra e eles me dizem o que vêem, à primeira vista. Depois vou instigando com algumas
perguntas: _ Mas, e as cores? E os formatos? A imagem em si, o que ela está apresentando, aonde nos leva? O que
elas nos faz ? Eles vão criando uma idéia, uma problematização. A própria escola, o que tem a ver com a própria
escola, alguma coisa. Em cima dessa problematização, eles vão chegar a fazer uma obra, mas não refazendo a
obra, [...]. Eles criam uma obra em cima daquela problematização, que saiu da imagem, o releitura. Eles fazem
uma construção deles. O que mudaríamos, se mudaríamos a forma, a maneira de pintar, utilizaríamos qual material
[...].”
“[...] digo para eles que é um texto, a imagem é um texto que você põe e não precisa falar nada, porque a pessoa vai
ter um entendimento sobre aquilo.”
3
“Trabalho com a leitura. A leitura é sempre feita com os alunos e a professora junto, sobre as obras do artista. Faço a
leitura do dia para que eles visualizem e interpretem a partir do conhecimento que eles possuem. A seguir passo a
biografia e as obras do artista. Assim eles podem fazer uma análise bem melhor da obra. [...]. Nem sempre faço
atividade prática.”
4
“Mesmo dentro dos jogos teatrais, que é aquilo que a gente já tinha comentado, eu uso muitas vezes as obras de
arte. Esta obra é de fulano, é de tal época, retratou isso... dou uma pincelada sobre o artista e eles trabalham a parte
da obra. Montam a cena, dão vida à cena, então trabalhando com as artes visuais. [...]. É uma leitura corporal,
digamos. [...]. Eu procuro sempre situar o artista dentro da época dele, que tipo de técnica ele usava, falo alguma
coisa da técnica, dentro do contexto sócio político que ele vivia, dentro do contexto da História da Arte. [...].”
5
“Levo a imagem, daí faço eles fazerem uma leitura do que estão vendo. Eles dizem: _ Ah! Estou vendo isso, isso.
Eles vão fazendo uma listagem daquilo que eles vêem, e depois a gente vai comentando. Depois eu falo da obra, do
artista. [...].”
“[...]. Depois que falar da obra vou situar a obra em tempo e espaço, daí vou falar dele, do artista, porque o artista fez
aquela obra, porque pintou, esculpiu.”
[a professora contextualiza, depois faz atividade com os alunos]
6
A leitura da obra, como sempre, estabeleço alguns critérios para eles. Por exemplo, vou trabalhar volume,
profundidade, a forma, a cor que se usava, a época. Fico mais dentro de uma análise assim. Eles já sabem, quando
olham uma obra o que tem que ver, quais as formas, se é figurativo ou abstrato, se tem volume, ou não, cor forte,
viva, suave... caminham por aí, para eles perceberem os elementos caracterizadores da arte nas obras de arte,
época, diferenciar épocas.”
7 “Levo, a imagem mostro transparências. Falo sobre o autor. [...]. Falo sobre a História da Arte. As obras, algumas
releituras, a gente faz. [...]. Atividade prática, atividade plástica, tudo relacionado.”
8
“Gosto mais de trabalhar com temas livres, não gosto muito de releituras e trabalho muito pouco com isso. [...]. Na
releitura, trabalhei muito com impressionismo. Fazia o trabalho de releitura em cima de obras impressionistas.
Levava a obra de um artista e em cima disso, os alunos faziam a produção deles.”
9
“Vou descrever [...] o cartão do dia dos pais [...]. Esse foi o último trabalho de leitura, que fizemos. A inspiração foi em
Mondrian. Eu conto quem era o artista, dou uma breve palavrinha sobre o artista, onde ele nasceu, que faz tempo,
114
que já morreu. Como ele começou a pintar, como ele pintou mais tarde. Uma breve história do desenho dele. Depois
eles fizeram um cartão, do dia dos pais, com colagem, inspirados na última fase do Mondrian, que era o
geometrismo.”
10 “[...] ano passado a gente trabalhou em grupo. A princípio pegava [um artista] como exemplo. Normalmente tenho
trabalhado com cores. Então começava pelas cores, quais as cores que eles viam, se eram primárias, secundárias,
terciárias, isso na série. Eles vão apontando, se não me engano era Renoir. Depois feita essa primeira parte com
eles, começava a incitar para eles perceberem mais coisas. [...]. Cada grupo ficou com uma imagem de um artista.
Atrás [da imagem] eu tinha a história dos artistas [...]. Então cada grupo responde algumas perguntas, no mesmo
molde daquelas que eu fazia com eles. Eles têm um questionário para responder, então o grupo se ajuda. Isso
dentro do conteúdo anterior que eu dei, aí eles vão fazer aquela leitura.”
11 “Na série, trabalhei com imagem da Tarsila, Van Gogh. Comecei também um auto-retrato. Na série, muita
imagem da Tarsila, comecei a trabalhar figura e fundo com eles. Eu sempre levo esse tipo de coisa, para dar
respaldo para a gente poder trabalhar [...]. Eu trabalho o conteúdo, a linguagem.”
12
“Trabalho. [...] para eles observarem as imagens, fazerem uma análise daquela imagem não oralmente mas
também por escrito. [...]. Então por exemplo, estou trabalhando com a série: a perspectiva. Antes de entrar na
perspectiva, trabalhei figura e fundo. O que é figura, o que é fundo. Tudo levando imagens de artistas e estou
trabalhando agora, e planos. E está dando um resultado bem legal. Trabalhei assim: levei 4 imagens, uma da
Tarsila, outra do Di Cavalcanti, outra do Van Gogh e uma do David, do gótico.Fiz algumas perguntas sobre as
imagens, eles responderam por escrito. [...].”
13
“Também pego imagens da Internet, que eu imprimo e trago para realizarmos uma releitura em sala de aula. [...].
Levo e apresento. Explico quem é o autor. Pego por movimentos. Movimento da arte Moderna, Cubismo, por
exemplo, explico como foi. Porque nasceu, quais os objetivos daquele movimento. Falo de cada autor do cubismo,
que foi como ele era, porque era feito daquela maneira.”
14
“Depende da proposta que eu tenho para aquela aula. Pode ir para várias situações. Ou partir de uma leitura, ou o
aluno criar um texto em cima. Não obrigatoriamente fazendo uma leitura da imagem, mas fazendo uma
contextualização, ou estar trabalhando a parte visual da imagem. Recompondo sem pensar em cópia, nem releitura,
entrando naquela linha e tentando entrar naquele tipo de composição. Então tem várias formas de trabalhar a
imagem.”
15
“[...] os alunos de série, se for coisa muito teórica, eles o gostam [...]. Então fiz um acordo com eles. Minha
metodologia é essa: uma aula teórica, uma prática, uma teórica, uma prática.”
16 Trabalha com livro: “a parte teórica do movimento artístico. [...] Sempre tem um ou dois artistas. Mas o enfoque é
sempre um, com duas ou três obras desse mesmo artista em momentos diferentes e daí propõe mais duas obras
como referência do mesmo movimento, mesmo estilo que está sendo trabalhado. Propõe atividades práticas, uma ou
duas vezes.”
Quadro 16 – Categoria - Leituras de Imagem - Arte
Leituras de Imagem - Professores de Português
17A
“Num primeiro momento fazemos a leitura do texto. Esta é uma leitura. Depois partimos para a imagem. Esta é a
leitura. Em seguida passamos para uma leitura, que é uma associação entre texto e imagem. Fazem-se
ligações entre a imagem e o texto e vice-versa.”
Então são três leituras diferentes ?
“_ Sim, 3 leituras. Na primeira, a gente lê o texto, depois passa para a imagem, depois fazemos ligações entre uma e
outra.”
E essa segunda leitura, a leitura da imagem, como você faz [...]?
“Começamos pelo que está no primeiro plano, o que esna frente. Por exemplo: aquela imagem da parede. Tem
dois cachorrinhos no primeiro plano, atrás deles tem um objeto - uma ponte. __ O que está fazendo essa ponte ali?
Como é esta ponte? Depois o plano posterior, e assim por diante. Nesta outra imagem [...] é uma imagem que está
associada ao movimento. Então perguntamos ao aluno: __ Porque a imagem esassociada ao movimento ? O que
indica isso? A cor do fundo, qual o efeito dessa cor?”
“[...]. Depois de feita esta leitura, passamos para as associações entre imagem e texto. O aluno vai estabelecendo
conexões. O que este elemento, esta cor, esta figura tem a ver com o texto? Porque foi usada essa imagem para
ilustrar esse texto? Etc.”
17B “A imagem é semelhante a um texto. É como o texto escrito.”
“[...]. Agora por exemplo, estou trabalhando com os alunos uma obra de Van Gogh, os Girassóis. Eles fazem primeiro
a leitura da imagem, depois elaboram um texto escrito sobre esta imagem.”
“[...]. Falamos sobre a imagem também, neste caso a obra do Van Gogh. Até podemos trabalhar algum conteúdo,
como a gramática, ou regras da linguagem. [...]. Mas o objetivo principal nosso, é que eles que eles interpretem essa
imagem e aprendam a fazer uma leitura da imagem.”
Obs.: Ambas, 17A e 17B, trabalham a leitura de imagem, da mesma maneira:
“Trabalhamos da mesma forma. Esta leitura é feita com todos as turmas. Começamos desde a 5ª série, até a 8ª.”
20
“Pode-se por exemplo, fazer-se uma interpretação que não é específica, não só porque é língua portuguesa,
interpretação de mundo, que transcende essa questão da língua. É claro que o fim pedagógico é o ensino e o
domínio da língua portuguesa. Só que não fica restrito a isso.”
Obs.: Para a leitura das imagens, tiras humorísticas e HQs, parte da própria imagem, trabalha a parte da
115
interpretação sem o texto, depois parte para o texto, que é interpretação da imagem.
Quadro 17 – Categoria - Leituras de Imagem - Português
3.3.4.2 Descrição e interpretação de dados: categorias 1 e 2
Os Quadros nº
s
7, 8, 9, 10 e 11 contêm as sínteses das respostas das
entrevistas. Nestes quadros podemos ver que todos os professores de Arte
trabalham com imagens. Cem por cento deles utiliza imagens de obras de arte e a
maioria faz leituras de obras no seu ensino. Isso pode ser observado com detalhes
nos Quadros 12, 14 e 16 que contêm os trechos das entrevistas que o revelam.
Entre os professores de outras disciplinas, nem todos o fazem (ver Quadro 13).
Doze entre os 16 professores de Arte citaram fazer leituras ou trabalhar com
de imagens de propaganda e imagens diversas, como da televisão ou do jornal (ver
Quadros síntese e Quadro 14). Alguns fazem leituras dessas imagens, outros as
utilizam com outras finalidades, como por exemplo, ensinar elementos da linguagem
visual e montagem de trabalhos de expressão ou criação. Alguns professores
relacionam, outros não relacionam com o movimento artístico que está sendo
estudado. Uma delas (3) mencionou na entrevista considerar as mídias, mas não
deixou claro se havia feito um trabalho de leitura ou outro trabalho com imagens
de propaganda. Três professores de Arte demonstraram nunca ter trabalhado com
imagens diferentes de obras de arte tradicionais (nº
s
5, 8 e 12). Porém
s
5 e 12,
trabalharam com HQs, pelo menos uma vez.
O único motivo encontrado para dificultar o trabalho com imagens foi o
problema para conseguir material, citado por 4 professores que trabalham em
escolas públicas do Estado. Segundo um deles, as escolas até recebem alguns
livros, mas para o trabalho com imagem não é suficiente, porque é preciso ampliar
as imagens para o trabalho em sala de aula. Normalmente, como disseram esses
professores, acabam fazendo isso “do próprio bolso”.
Os 3 professores formados em Teatro também fazem uso da imagem. Dos
três, 2 trabalham com Artes Visuais e normalmente utilizam imagens. A única
professora que trabalha mais especificamente com Teatro (nº 4) utiliza imagens para
116
fazer releituras corporais e geralmente leva imagens de obras de arte às vezes
utiliza imagens de propaganda – mas nunca histórias em quadrinhos.
Pelas respostas obtidas, parece ser difícil hoje encontrar uma concepção de
ensino de Arte que não se baseie no uso da imagem. Desde que no final da década
de 1980 passou-se a incluir a imagem como fonte de conhecimento associada à
História da Arte (BARBOSA, 1991) e, mais propriamente, com a difusão da Proposta
Triangular a partir do início da década de 1990, tornou-se elemento imprescindível
no ensino de Artes Visuais (PILLAR, 1999), trazendo também melhora significativa
para este ensino. Desde então o trabalho com outras imagens passou também a ser
requisitado e valorizado. Porém a questão das imagens divulgadas pelas mídias
trouxe novas preocupações, e o grande desafio tornou-se qualificar novas propostas
que tivessem relação com o mundo contemporâneo e com a formação dos alunos
(HERNÁNDEZ, 2000; FRANZ, 2003b, 2003c, 2003d; ALMEIDA, 1999).
Quanto aos professores de Português entrevistados, trabalham
freqüentemente com imagens, mesmo porque o próprio material didático as inclui,
tanto na escola particular quanto na escola pública. Estes docentes não se limitam a
fazer breves referências às imagens que acompanham os textos, ou usar somente
para ensinar conteúdos de sua disciplina. Costumam também fazer leituras de
imagens (ver Quadros 13, 15 e 17). O mesmo não ocorre com os professores de
Ciências e Matemática, que não trabalham com leituras de imagens. Para esses
últimos, a imagem serve mais como recurso didático, apoio ou visualização dos
conteúdos, explicação do texto, ou ilustração conforme o assunto.
Além de trabalharem com leituras de imagens diversas, os professores de
Português também fazem leituras de imagens de histórias em quadrinhos, da
mesma forma como trabalham com outras imagens. Com os professores de Arte, da
amostra colhida isso não acontece, o que nos aproxima do problema de pesquisa
levantado no início da presente investigação (ver Quadro 16). Nenhum deles realiza
leituras interpretativas críticas de histórias ou de imagens de HQs. um único
professor que relata fazer discussões sobre quadrinhos algumas vezes, (nº 14), mas
não leituras com vistas a interpretação e esta é uma prática que realiza mais no
ensino médio. Duas professoras de Português (nº
s
17A e 17B) indicam fazer leituras
baseadas nos elementos da imagem e uma delas (nº 20) trabalha com leituras
críticas.
117
3.3.4.3 Interpretação e avaliação crítica: categorias 1 e 2
No ensino que enfatizava a livre-expressão individual, as interferências
externas eram consideradas prejudiciais e havia preconceito para incluir imagens no
ensino de arte. A partir de finais de década de 1980, como visto no Capítulo II (item
2.1 e 2.1.1), a Proposta Triangular desenvolvida por Ana Mae Barbosa, por meio de
leituras de imagens contextualizadas, passou a ser uma das propostas mais
difundidas nas escolas. A Proposta Triangular corresponde à leitura da obra, História
da Arte e fazer artístico associados. Segundo os PCNs/98 (p. 29), corresponde aos
três aspectos da aprendizagem propostos por Eisner
56
, denominados por produtivo,
crítico e cultural, ou ainda ao que aponta Howard Gardner
57
“como três aspectos da
competência em artes visuais, a saber: a percepção, a conceitualização e a
produção.”
Desde então, a imagem tornou-se fundamental no ensino de Artes Visuais,
época em que surgiram também as releituras criações realizadas tomando-se por
referência outras obras de arte (PILLAR, 1999). Conforme Pillar (1999) e Barbosa
(1991), existem diversas possibilidades de leituras: biográfica, estética, formal,
iconográfica e semiótica e a leitura crítica, que este estudo aborda.
Segundo os depoimentos, a maioria dos docentes entrevistados não relaciona
as imagens com a vida do estudante, conforme os pressupostos da educação pós-
moderna, nem trabalha com a leitura crítica da sociedade e da cultura. Nas
entrevistas analisadas, alguns demonstram que trabalham leituras de obras de
maneira semelhante à Proposta Triangular (nº
s
3, 4, 5, 6, 7, 9, 16), ou seja, associam
a leitura com a contextualização da obra e o fazer artístico, muito embora grande
parte dessas leituras seja realizada superficialmente. Alguns enfatizam mais a
História da Arte (nº 3). Um ou outro, não se prende tanto à História da Arte, como um
deles (nº 14) que não segue um modelo fixo e procura diversificar suas propostas de
trabalho. Outros acreditam mais na arte como instrumento de desenvolvimento da
sensibilidade, como diz uma das professoras:
56
EISNER, Elliot W. Educar la visión artística. Barcelona: Paidós Educador, 1995.
57
GARDNER, Howard. Educación artística y desarrollo humano. Barcelona: Paidós, 1994.
118
“Olha, acho que a História da Arte, ainda é importante. que é muito
importante, a gente sensibilizar essas crianças. Se você for uma pessoa
sensível, você vai conseguir enxergar outras coisas. Você ver uma obra
arte, ou assistir alguma coisa. Se você foi tocado, se você estudou, com sua
sensibilidade você vai respeitar, vai ter outros olhos para ver aquilo. Acho
que está muito na sensibilidade.” (nº 7).
Essa resposta está associada à concepção de ensino modernista, de livre-
expressão, ou a educação através da arte
58
, na qual se enfatizava a arte como meio
para o desenvolvimento da expressão e da harmonia ou do equilíbrio emocionais.
Segundo Pillar (1999) e Barbosa (2005b), tem havido equívocos e pouca
compreensão sobre o conhecimento implícito em leituras e releituras de imagens.
Para essas autoras, muitos professores acabam trabalhando a releitura como cópia
e não como uma criação baseada em um referencial, transformando e criando novos
significados. Equívocos também foram encontrados nas entrevistas dos professores,
porém de outra natureza. Alguns deles atribuem o termo “leitura” quando na
realidade estão fazendo uma “releitura” e vice-versa (ver Quadro 16, 1, 2, 4, 9 e
13).
As respostas, em sua maioria, indicam que os professores entendem leitura
de obra apenas como olhar, ver o que está na imagem, no sentido que Franz (2003,
2005b) assinala: “o sentido comum” (ver Quadros 16 e 17).
Grande parte dos professores não chega a fazer com que os alunos falem
sobre as imagens. As professoras 13 e 15 realizam aulas expositivas sobre os
movimentos artísticos, incluindo as imagens, o que não significa, estarem fazendo
leituras. Isso denota, sim, ensino tradicional, em que o conhecimento é transmitido
pelo professor, sem a participação dos alunos. Uma das professoras (15), depois
de expor os assuntos, movimento artístico, sua história, artistas integrantes e obras,
parte diretamente para atividade de criação dos alunos.
No primeiro trecho do Quadro 16, a professora 1, cita releitura quando na
realidade está fazendo uma leitura com os alunos. De maneira semelhante a
professora 13, diz fazer uma releitura, quando leva a obra, apresenta e fala sobre
ela, o autor, o movimento, quando trabalha somente a parte teórica. Ambas
denominaram esse trabalho como releitura.
Ler uma obra é explorar um texto com o objetivo de compreendê-lo e “reler é
ler novamente é reinterpretar, é criar novos significados.” (PILLAR, 1999, p. 18).
58
Ver também READ, Herbert. A educação pela Arte. São Paulo: Martins Fontes, 1982.
119
Segundo Pillar (1999), a leitura vem sendo concebida como algo mais teórico, e
releitura como uma nova criação a partir de uma obra.
Para saber o que é ler, conforme Pillar (1999), é preciso saber antes o que é
um texto o que é compreender um texto. Segundo Gadotti (apud PILLAR, 1999, p.
12), texto “vem do latim textus’, que significa ‘tecido, trama, encadeamento de uma
narração [...] algo acabado, uma obra tecida, um complexo harmonioso.”
Compreender um texto é adentrar seu contexto, adentrar seus significados. A
compreensão é realizada sempre por um sujeito e depende de seu contexto mental,
de sua história de vida e do contexto da obra. Pillar (1999) destaca que “o
observável” sempre terá a marca e dependerá daquele que observa.
Ao ler, estamos entrelaçando informações do objeto, suas características
formais, cromáticas, topológicas; e informações do leitor, seu conhecimento
acerca do objeto, suas inferências, sua imaginação. Assim, a leitura
depende do que está em frente e atrás de nossos olhos. (PILLAR, 1999, p.
18).
Assim como Pillar (1999) assinala que a leitura terá suas conclusões afetadas
pelo conhecimento do próprio sujeito, para Franz (2003a), igualmente é importante a
relação do mundo pessoal e social do educando. Na obra Educação para uma
Compreensão Crítica da Arte (2003a), essa autora faz uma análise das
compreensões que os indivíduos possuem para analisar e interpretar obras de arte.
As compreensões variam e vão desde as mais ingênuas ao vel do especialista
(FRANZ, 2003a). As compreensões têm influência no resultado das interpretações.
Compreender, segundo Hernández (2000, apud FRANZ, 2003a, p. 45),
é uma virtude cognoscitiva e experiencial de tradução entre um original, isto
é, uma informação, um problema, e o conhecimento pessoal e grupal
relacionado com ela. Essa relação implica estabelecer trajetórias entre o
passado e o presente, entre os significados que diferentes culturas dão às
manifestações simbólicas e às versões dos fatos que são objetos de
estudo. Implica também níveis de compreensão, pois ainda que em termos
gerais tudo seja válido, nem tudo tem o mesmo valor.
Conforme Franz (2005b, p. 1), “diante do desafio de ensinar os estudantes a
compreender a arte é comum a crença, entre professores e estudantes, de que a
arte fala por si mesma”, da mesma forma que existe uma outra crença sobre o que
dizem os estudantes a respeito da arte ou imagens: tudo o que é dito é aceito como
tendo o mesmo valor.
120
Todavia existem diferenças quando os estudantes se pronunciam a respeito
das obras de arte e outras imagens. Segundo Franz (2005b), as pesquisas mais
recentes sobre a compreensão da arte comprovam que um grande diferencial
entre compreensões de iniciantes e de especialistas. Por isso, deixar os estudantes
falarem livremente sobre as imagens e manifestações artísticas pode ser importante,
mas isso, por si só, não é suficiente. Essa autora argumenta que, neste caso, existe
apenas um deslocamento do “eixo do ‘livre fazer’ (laissez-faire)” para o ‘livre-
interpretar’ com claras influências das práticas modernistas no ensino de Artes
Visuais.” (FRANZ, 2005b, p. 1). Destaca-se, ainda, que neste processo também o
papel do educador se anula, pois este não interfere no nível de conhecimento do
aluno, acarretando que os discentes permanecem em uma mesma etapa ou nível
compreensivo. Raramente se conta de que as compreensões podem ser mais
coerentes e melhores se houver uma intervenção educativa adequada.
De acordo com Franz (2005b, p. 6), “no processo de compreensão da arte
níveis variados.” Para o professor de Artes Visuais que pretende que os alunos
alcancem um nível mais avançado de compreensão, é necessário que anteriormente
tome conhecimento sobre o nível inicial do estudante. A verbalização, ou o falar
sobre a arte, ainda que de maneira ingênua oportuniza o desenvolvimento do que
Prawat (1996, apud FRANZ, 2005b) chama de consciência reflexiva. Mas, para sair
do nível ingênuo, “o primeiro passo é avaliar as compreensões iniciais, para, a partir
delas, inferir estratégias didáticas que os ajudem a superar as respostas tiradas do
senso comum(FRANZ, 2005b, p. 2); para isso, é preciso entender como aprendem
os alunos
59
, explica a autora.
Segundo Hernández (apud FRANZ, 2005b, p. 2), “o objetivo de toda a
aprendizagem é estabelecer um processo de inferências e transferências entre os
conhecimentos que se possui e os novos problemas-situações que são
59
Para Hernández (2000), a Psicologia Cognitiva é importante para entender o processo das
compreensões. Embora a teoria de Piaget tenha sido revisada e renovada, conforme afirma o autor, o
fundamento básico desta teoria não deve ser esquecido e serve de fundamento para o construtivismo
crítico. No enfoque construtivista da aprendizagem, todo “conhecimento é resultado da organização
de um conhecimento anterior, e toda nova aquisição que tenha aspecto de novidade se coloca em
relação ao que se tenha adquirido previamente.” Atualmente, não se considera que os estágios de
desenvolvimento ocorrem de maneira linear e considera-se que o conhecimento não emerge nem dos
sujeitos nem dos objetos, mas sim de uma relação dialética entre eles. “O conhecimento é concebido
e construído culturalmente, o que leva, na educação, a estabelecer critérios que permitam avaliar a
qualidade desse conhecimento. Essa visão do construtivismo como processo de atribuição de sentido
implica que o docente possa explicar aos estudantes e introduzi-los no mundo social e físico [...] e
ajudá-los a construir por eles próprios uma infra-estrutura epistemológica para interpretar os
fenômenos com os quais e relacionam. (HERNÁNDEZ, 2000, p. 106).
121
propostos.” Como explica Franz (2005b), quando não se leva em conta os
conhecimentos que o aluno possui, as concepções prévias dos alunos se
mantêm, mesmo que haja esforço do professor para ensinar o novo tema. Seu papel
deve ser sobretudo o de interferir para que os alunos possam superá-las e
transformá-las. Avaliar as concepções é o primeiro passo, mas para que haja avanço
é necessário “fomentar as conexões explícitas dos elementos da base de
conhecimentos dos alunos” (FRANZ, 2005b, p. 3), e o professor deverá estar
consciente de que este processo não é imediato o aluno deverá percorrer um
longo caminho até poder abandonar suas compreensões iniciais.
Para ampliar a compreensão sobre a arte, conforme Franz (2005b), os alunos
precisam encontrar novas conexões entre as obras de arte e as imagens da cultura
visual, considerando novas informações e idéias, sendo que o professor pode
auxiliar o processo com sugestões verbais explícitas.
Conforme o item 2.2.1.1, a educação para a compreensão da Cultura Visual
enfatiza a interpretação crítica como conteúdo central para as propostas em arte-
educação atuais. Para Hernández (1998, 2000), na interpretação crítica, os alunos
devem estabelecer conexões entre as representações que o artista ou grupos
culturais elaboram com os porquês dessas representações e os conhecimentos que
estão implicados com sua vida pessoal, estabelecendo novas conexões e relações.
Significa, também, reconhecer as relações que existem entre as imagens e outros
fenômenos. Efland (apud FRANZ, 2005b,
p. 7) afirma que
quando questiona as idéias do currículo em espiral de Bruner [...] desafia os
educadores a iniciar os seus alunos em um campo de conhecimentos
complexo e mal estruturado, como é o caso da educação em Artes,
conservando a complexidade inerente ao campo e, ao mesmo tempo,
facilitando-lhes a aprendizagem futura.
Para Franz (2005b) e Hernández (1998, 2000), isso significa um desafio que
consiste em ajudar o aluno a transcender a simplificação, estabelecendo relações ou
com a vida do artista, ou com o contexto social e cultural no qual a obra foi
produzida, indo além do que se na imagem. Pressupõe uma atitude investigativa,
que envolve a descoberta de significados, relacionando aquilo que se sabe com
novas informações. Franz (informação verbal)
60
, em suas pesquisas sobre a
compreensão crítica da arte, prefere utilizar o termo “compreensão”, em lugar de
60
FRANZ, in: Seminário de Orientação, Curso de Mestrado em Artes Visuais, UDESC, 2006.
122
“leitura”, ou “interpretação”. Para esta autora, o termo “leitura” tem um sentido menos
reflexivo, que exclui o papel de mediação do professor, o que não ocorre com os
termos “compreensão crítica”, que envolve a mediação.
A leitura crítica, na visão de Paulo Freire (apud PILLAR, 1999), é a
compreensão do texto a ser alcançada e está implicada com as relações entre texto
e contexto. Freire (apud PILLAR, 1999, p. 14) considera que aprender a ler é antes
de tudo “aprender a ler o mundo, compreender seu contexto, não numa manipulação
mecânica de palavras mas numa relação dinâmica que vincula linguagem e
realidade.” Esta relação dialética com os contextos e o contexto do leitor, é aplicada
de maneira semelhante aos textos imagéticos. Ao ler uma imagem, é preciso ter
clara esta relação entre o contexto da obra, do autor e do leitor, relacionando todos
eles.
Alguns dos entrevistados consideram que apenas “falar do artista” sem fazer
outras relações e conexões com a obra estudada é estar contextualizando. Dentro
do enfoque da compreensão crítica (ou interpretação crítica), esses professores em
sua maioria, conforme os depoimentos, não estão fazendo a contextualização das
imagens, ou o fazem muito superficialmente (ver Quadros 16 e 17).
A valorização da contextualização, conforme o Capítulo II (item 2.1), surgiu na
década de 1960, quando um grupo de teóricos passou a defender a idéia de que se
deveria estudar a arte levando-se em conta seu contexto cultural de origem e
fundamentar-se em conhecimentos antropológicos e sociológicos que
contemplassem o contexto social e cultural dos estudantes (RICHTER, in Corrêa,
2004). Com a valorização e a diferenciação das culturas na atualidade, esta relação
da obra com o contexto pessoal do aluno, considerando seu contexto social e
cultural, vem sendo cada vez mais enfatizada, como experiências que fazem parte
do seu conhecimento.
A nova regra se baseia nas idéias de contexto, segundo as quais, ainda que
se reconheçam os aspectos formais e temáticos das obras de arte, que
compreendê-los em relação a suas conexões com o mundo social e cultural
do artista. (EFLAND, 1996, apud FRANZ, 2003b).
Quando o aluno elabora sua própria versão da obra de um artista,
transformando e atribuindo significados pessoais, está fazendo uma releitura. Ou,
como diz Anamália Barbosa (in BARBOSA, 2005b, p. 145), estou fazendo uma
releitura quando: “aproprio-me de imagens da História da Arte e as incluo em minha
123
obra, ou seja, tiro a imagem de seu local de origem e a utilizo para construir outra
imagem.” A releitura pode também ser feita a partir de uma imagem, ou como a
autora citada, que utiliza várias para fazer relações umas com as outras e depois
elaborar a sua própria. Este é o caso da professora (nº 9) que, a partir da última fase
do artista Mondrian e de várias obras do artista, propõe aos alunos criar um novo
produto. Ou a pedagoga (nº 2) que, a partir de uma leitura feita com os alunos e uma
problematização, lhes propõe uma construção “saindo” da imagem, ou seja com
base nas referências da imagem, sugere aos estudantes que façam sua própria
construção – mudando forma, material, etc.
Os artistas contemporâneos, conforme Brent Wilson (in BARBOSA, 2005b),
procuram na História da Arte, imagens para preencher com outros ou novos
significados. Brent Wilson (in BARBOSA, 2005b, p. 91) cita o trabalho do artista afro-
americano Robert Colescott:
ele repinta o famoso quadro americano, George Waschington Carver
Crossing in Delaware. O trabalho não é apenas uma adaptação de um dos
ícones americanos, mas sim, uma declaração irônica da história dos afro-
americanos e uma percepção bem humorada desse status.
Não somente na arte tradicional, mas também artistas que fazem histórias em
quadrinhos realizam releituras e se apropriam de obras de arte como os artistas pós-
modernistas. Maurício de Souza, a partir de finais dos anos 80, em um trabalho de
pesquisa que durou cerca de dez anos, baseou-se em obras eruditas que fossem
amplamente conhecidas do público e relevantes para a história da pintura para
recriar uma série de mais de quarenta quadros e uma escultura. Série intitulada
História em Quadrões, inspirada em Leonardo da Vinci, Monet, Botticelli, Van Gogh,
Degas, Michelangelo, Toulouse-Lautrec, Renoir, Portinari, Auguste Rodin e outros
artistas, utilizando personagens da Turma da Mônica (Figura 11 e Figura 1).
Apesar de ser cada vez mais comum artistas contemporâneos apropriarem-se
de elementos da arte popular nas obras de arte e vice-versa, nenhum dos
professores de Arte, nessa amostra, mencionou fazer releituras, nem trabalhos com
leituras interpretativas de histórias ou imagens de histórias em quadrinhos quer
fossem semióticas, estéticas ou críticas. Uma professora de Arte (nº 13) chega a
citar que abordou as releituras de Maurício de Souza, na 6ª série, porém não
realizou trabalho de releitura com os alunos (ver perguntas 3, 4 e 5).
124
Figura 11 Mônica no Nascimento de Vênus, 1992. Releitura de Maurício de Souza, baseada na
obra Nascimento de Vênus de Sandro Botticelli. Acrílica s/tela 106 x 145,5 cm.
61
Na amostra de entrevistados, também professores (ver Quadro 16, 2,
10, 11 e 12) que utilizam obras de arte apenas para ensinar elementos da linguagem
visual. Hernández (2000) critica professores que procedem desta maneira, porque,
segundo ele, não relacionam história da obra e seu contexto. Desta forma os alunos
não podem compreender a visão simbólica do mundo mediante a obra, porque estão
fixados no aprendizado do ponto, da linha, da cor, ou da figura e do fundo.
Na disciplina de Português, algumas professoras, conforme o Quadro 17 (nº
s
17A e 17B), utilizam o mesmo procedimento de leitura para tiras humorísticas, HQs,
cartuns, imagens da propaganda, folhetos, cartazes, obras de arte ou qualquer outro
tipo de imagem. Essas professoras realizam leituras baseadas na decodificação da
imagem como um texto, e isso porque, segundo elas, “hoje tudo é visual” e é
importante que os alunos aprendam a ler imagens. Conforme seus relatos:
“Porque hoje nosso universo é visual. É importante que o aluno aprenda a
ler imagens. Hoje em dia tudo é visual. Eles precisam aprender a ler estas
imagens. Nós ensinamos o aluno a fazer uma leitura da imagem. A imagem
é como se fosse um texto também, por isso a gente trabalha com a
imagem.” (nº 17A).
“A imagem é semelhante a um texto. É como o texto escrito. [...]. O
importante é que o aluno aprenda a ler a imagem, hoje tudo é imagem. Para
61
Imagem disponível em <http://www.monica.com.br/diversao/wallpap/quadroes/welcome.htm>
Acesso em: 7 fev. 2007.
125
nós este objetivo é o principal, que o aluno leia a imagem como um texto.”
(nº 17 B).
A professora de Arte, 2, usa a mesma abordagem e de forma semelhante,
considera que a imagem é um texto, e que a pessoa “só olhando a imagem, vai ter
um entendimento sobre aquilo.”
Na opinião de Hernández (2000, p. 28), alguns educadores pensam nos
alunos apenas “como consumidores de imagens que devem aprender a decompor
em elementos da linguagem” e consideram a imagem somente como um texto cujo
significado seja interpretado com base em análises de morfemas e grafemas.
Para Hernández (2000, p. 28), estas são formas de racionalidade eclética de
ensino, de visão limitada sobre as possibilidades do ensino da arte, que em geral
destacam como objetivo o desenvolvimento da capacidade do aluno “para ler e
produzir imagens, porque [...] estamos na era da imagem.”
Os educadores que agem dessa maneira estão trabalhando com propostas
analíticas da imagem de forma que não possibilitam aos alunos aprenderem a
interpretar. O universo visual modela comportamentos e contribui para fixar valores.
A importância da interpretação de obras e imagens na atualidade está relacionada
com as significações culturais que implicam e a relação destas com nossa vida.
Como destaca Gómez (2001), estamos mergulhados em uma crise em todos
os setores, mas as forças sociais não promovem mudanças necessárias, e a escola
deixa de ser um espaço para reflexões críticas. A educação permanece voltada para
os modelos que privilegiam as prioridades econômicas e em virtude disso a função
educativa fica em segundo plano. Gómez (2001) recorda que o mundo atual deixa
transparecer que não está preparado para entender seu entorno. Os adultos atuais
foram criados para a certeza, mas as estruturas sociais e pessoais têm
experimentado mudanças tão profundas que, tanto jovens como adultos, não se
encontram preparados emocional e intelectualmente para dar sentido ao mundo e
direcionar a própria história (SANCHO e HERNÁNDEZ, 1997). Quando os
professores deixam de relacionar a obra ou a imagem com a realidade, com as
esferas que a envolvem e com sua história de vida, deixam de lado a oportunidade
para promover conhecimentos e mudanças significativas na própria vida.
Uma das professoras de Português relata que trabalha com leituras mais
críticas. Sua visão de ensino está mais ligada à concepção pós-modernista da
educação, a qual questiona os cânones que alguns materiais didáticos reproduzem
126
“modelos”, conforme diz, quando se refere a certas imagens que trazem estes
materiais:
“Existe um certo cânone. Os professores acabam nem tendo condição de
fazer uma análise muito apurada disso. Acho que o material didático acaba
determinando muito a prática do professor. [...] o material didático é
fundamental para o aluno, mas ele não se esgota aí. Os cânones das tiras
estão lá. Na verdade os próprios autores de materiais didáticos têm uma
certa tendência de usar cânones. Tanto nas tiras como em textos literários,
textos consagrados aparecem muito. pouca inovação, na minha opinião.
Até porque isso demanda uma série de estudos. Então os professores ficam
muitas vezes nesses cânones, acabam ficando naquilo. Quando você, por
exemplo produz material didático, pensando numa situação específica de
uma turma, acho que isso dá uma mobilidade maior. No caso de 5ª a 8ª, em
que eu uso bastante a questão da imagem, muitas leituras que a gente tem
levado para eles na sala de aula são leituras supostas.” (nº 20).
O problema dos cânones, como destaca ela, é o fato de se transformar algo
em um modelo a ser seguido. O projeto pós-modernista questiona os cânones
estabelecidos pelo modernismo, que acarretam em uma única versão para a arte
erudita como modelo a ser seguido pelos demais. Também nos quadrinhos existem
cânones. “No caso das tiras, é a mesma coisa. Está lá, Quino, Mafalda, Maitena,
Maurício de Souza, Charles Brown. Esses são cânones”, diz a professora. Segundo
suas palavras, os materiais didáticos do ensino de Português geralmente incluem os
quadrinhos que são de valor conhecido, que têm sucesso garantido e, desta
forma, são mantidos.
A questão dos cânones nos quadrinhos tem importância para a formação da
cultura e para o aprendizado dos alunos. Conforme Freire (1979, 1997), não
educação neutra. Quando não estão relacionados com um ensino que promove a
educação para a compreensão crítica, podem acarretar em reprodução, ou
dependência dos valores dominantes. Para Paulo Freire (1979), o verdadeiro
profissional deve estar engajado em promover a ação-reflexão frente às alienações
culturais vividas por nossa sociedade. A preocupação desse autor está relacionada
com uma difícil busca pela autenticidade e com a preocupação pelo projeto histórico
de nossa própria cultura. Suas considerações têm importância para o contexto da
formação da cultura com relação ao ensino dos quadrinhos.
Recorda-se como décadas atrás no Brasil, em função das HQs estrangeiras,
foram lentas a aceitação e a divulgação de quadrinhos brasileiros no mercado
nacional. As histórias estrangeiras entravam no país a custo muito baixo e desta
forma dificultavam a entrada dos desenhistas nacionais no próprio país. Segundo
127
Maurício de Souza (apud SCARELI, 2003, p. 75), o custo das histórias estrangeiras
era tão baixo, que não era possível para “os desenhistas nacionais trabalharem pelo
mesmo preço. Havia uma pressão econômica tão forte, exercida pelas distribuidoras
internacionais, que durante muito tempo, sufocaram a produção nacional.” Em
função dessas dificuldades, poucos autores nacionais dos quadrinhos, como
Maurício de Souza, firmaram-se nesse contexto.
Para Freire (1997), a prática educativa crítica na educação é uma forma de
intervir no mundo. Esta intervenção significa que os conteúdos (bem ou mal)
ensinados implicam “tanto o esforço de reprodução de ideologias dominantes quanto
seu desmascaramento.” (FREIRE, 1997, p. 110). O autor enfatiza que a
compreensão mecanicista hipertrofia o papel da consciência do acontecer histórico.
Quanto às imagens de propaganda, a maioria dos entrevistados chega a
trabalhar com elas, mas em geral, não para fazer leituras de imagem. Alguns não
trabalham com essas imagens,
s
5, 8 e 12, não citaram nenhum trabalho.
s
13 e
7 descrevem a atividade que fazem relacionada à propaganda:
E imagens da televisão, de revistas ou da propaganda, já trabalhou?
“_ trabalhei as letras. Na propaganda tem bastante isso. As letras
ilustram as propagandas. Eu fiz um trabalho assim. Peguei umas
propagandas, para que eles reconhecessem as letras. Uma aula sobre
letras ilustrativas dos anúncios.”
[...]. Você explicou a função dos logotipos?
“_ Falei sobre o trabalho da Publicidade e do Marketing, para que servem
as mensagens que eles passam com as letras. Trouxe para a realidade
deles.”
Fez alguma atividade?
“_ Eles trabalharam todos os tipos de letras. [...]. Trouxe bastantes
exemplos de letras ilustrativas. Então eles trabalharam com a ilustração
das letras e elaboraram o próprio nome com elas. Fizeram um trabalho
pessoal com as letras.”
É um trabalho sobre elementos, recursos da linguagem visual, então?
“_ Sim. Trabalho com os elementos visuais. O desenho, a linha, o claro
escuro.” (nº 13).
Você pode descrever uma das atividades que você mais trabalha?
“__ Olha, essa da propaganda, faz tempo que estou trabalhando com as
8ªséries! A gente faz com que eles inovem. Vamos supor uma mercadoria,
aquelas gelatinas. Até pouco tempo eram naquela caixa quadradinha.
Hoje a gente encontra em saquinhos. Digo a eles que quero que mudem,
ao criar uma nova embalagem para o produto, sair do tradicional. Depois,
eles têm que fazer a propaganda daquele produto para convencer a sala
para comprar o produto. Tem que apresentar o produto final em todos os
passos: rough (esboço), layout, arte-final, além da propaganda.” (nº 7).
Ambas trabalham apenas os aspectos técnicos e criação. Assim como outros
professores, não incluem a leitura crítica das imagens da propaganda. Hoje, a
128
educação pós-moderna leva em conta que a vida cotidiana é demarcada pelo visual
e isso torna necessário que também as imagens da propaganda sejam abordadas
no ensino de Arte. Considerando que motivam a vontade e o desejo e são também
emblemas de forças e relações de poder, para Hernández (2000, p. 132), isso
impossibilita “reduzir a experiência estética apenas a uma questão de informação.”
Por isso, sugere a leitura crítica dos artefatos e imagens vinculando a questões
sociais com as quais estão relacionados e à reflexões críticas que auxiliem a
compreender a realidade. Situação que reclama, segundo este autor, uma análise
dos artefatos e imagens como objetos sociais.
Conforme Franz (2003b, 2004), Hernández (2000, 2001) e Efland (2003), a
educação pós-modernista enfatiza a conexão com outras imagens que fazem parte
do cotidiano dos alunos, considerando o impacto que têm na construção das
identidades e na formação de valores, crenças e visões de realidade. Não porque
vivemos na era da imagem, mas porque os alunos precisam aprender a interpretá-
las de maneira crítica. Como diz Hernández, conhecimentos da Cultura Visual não
são conhecimentos inúteis, porque são as representações do campo artístico as
“que mais contribuem para configurar as representações simbólicas portadoras dos
valores que os detentores do poder utilizam para fixar sua visão de realidade.”
(HERNÁNDEZ, 2000, p. 43). A influência dessas imagens sobre as crenças e a
consciência não podem ser deixadas em branco.
Qualquer método de leitura de obra de arte pode apenas fornecer visões
parciais sobre os fenômenos estudados, como explica Franz (2003a, p. 158), por
esta razão, essa autora acredita que “mais do que leitura e análise de obra de arte, o
que precisamos é ensinar os alunos a realizar estudos [...] com o objetivo de buscar
elevados níveis de interpretação.”
Contrapondo-se às modalidades de leituras acríticas, a educação para a
compreensão crítica da Cultura Visual propõe que os professores ajudem seus
alunos a compreender a realidade, examinando os fenômenos que os rodeiam e
questionando as versões e visões, a fim de avaliar o que é produzido culturalmente,
processo válido não somente para obras de arte como para imagens diversas e
histórias em quadrinhos.
129
3.3.5 Categorias 3, 4 e 5
As categorias 3 e 4 têm por estratégia analisar se os professores ensinam
sobre histórias em quadrinhos, em quais turmas tem por hábito ensiná-las e como
desenvolvem essas atividades, ou seja, como são essas práticas (Quadros 18 e 19,
20 e 21). Nos Quadros 20 e 21, os professores que afirmam que as ensinam, ou que
dizem que já as ensinaram pelo menos uma vez, descrevem suas atividades com
essa arte. A categoria 5, tem por objetivo aprofundar a questão 4, e refere-se às
escolhas do professor ou de sua turma, quanto às histórias em quadrinhos, ou o
autor, a serem trabalhadas em sala de aula (Quadro 22 e 23).
a) Pergunta 3: Ensina sobre a linguagem dos quadrinhos ?
Trabalho com Histórias em Quadrinhos – Artes Visuais
1 “História em quadrinhos, sim.”
2 “HQ, a gente já trabalhou. Mas eu não trabalhei muito.”
3 “Já. Trabalhei com HQ, na série. Trabalhei uma vez. [...]. A idéia principal era trabalhar com as características
das HQs, o objetivo era trabalhar com a onomatopéia. Uma [aula] falamos sobre a linguagem - as onomatopéias -
e na outra assistimos um filme.”
4 “[...] essa parte não cheguei nem a levar, porque além do professor de Artes, o professor de Língua Portuguesa
também trabalha.”
5 “Só agora, por que estou fazendo com uma turma do sexto período, é 8ª série da EJA, noite, estou fazendo com
eles.”
6 “Eu já trabalhei muito HQ.
7 “Quadrinhos, sim. Trabalho também.”
8 “Quadrinhos nunca trabalhei. Já trabalhei com desenho e pintura aqui, mas não com quadrinhos.”
9 “Histórias em quadrinhos, não.”
10 “Já. Esse ano eu fiz um trabalho. Ano passado eu trabalhei também.
11 “Não trabalhei com gibi, específico não.”
12 “[...] a HQ, eu trabalho na série, porque a gente tem um conteúdo, um planejamento que a gente tem que
seguir. A HQ, é um conteúdo de 6ª série.”
13 “Comecei a fazer. [...].”
14 “Já trabalhei com HQ, no fundamental e no médio. Todas as turmas.”
15 “Trabalhei quadrinhos com eles, inclusive porque está no planejamento do Colégio.”
16 “Não. [...]. Não trabalhei ainda.”
Quadro 18
– Categoria 3 - Trabalho com Histórias em Quadrinhos - referente à pergunta 3 – Arte
Trabalho com Histórias em Quadrinhos – Outras Disciplinas
17A “Sim.”
17B “Sim.”
130
18A “Estou usando na 7º agora.” [para trabalhar o conteúdo de Matemática]
18B “Fiz também.” [para trabalhar o conteúdo de Matemática]
19 “Muitas vezes.[...]. Em todas as minhas turmas eu faço atividades com histórias em quadrinhos.”
20 Sim. “Normalmente o professor se utiliza [de tiras humorísticas e histórias em quadrinhos], até porque chega muito
mais, é uma linguagem lúdica. Mesmo para os maiores, uma linguagem muitas vezes que a ironia se estabelece. E
isso é importante para a questão da formação crítica.”
Quadro 19 Categoria 3 - Trabalho com Histórias em Quadrinhos - referente à pergunta 3
Português, Ciências e Matemática
b) Pergunta 4: Como desenvolve esta atividade ?
Desenvolvimento das Atividades sobre Quadrinhos – Artes Visuais
1
“Eu levo as histórias. [...]. Primeiro eu mando eles lerem. Alguns têm esse: __Ah! Eu não gosto de ler! Então eu
digo: __ Olhe! Se você não gosta de ler história em quadrinhos, o que você será? Heim? São textos curtos e tal.
Daí todos têm que ler a historinha. Depois, peço para eles fazerem três quadrinhos só. Do que quiserem. Mas
podem se espelhar no gibi que eles têm.”
Para servir como referência?
“__ É, assim que eles gostam. [...].”
2 “É complicado [na 2ª série]. Daí, você trabalha HQ, mas de outro jeito. Com desenho de palito, palitinho, virando as
páginas rapidinho. Bloquinho de animação e o bonequinho se mexe.”
Pode descrever como você trabalhou ?
“__ Em cima do Maurício de Souza, mesmo. Levei e apresentei a história. Mostrei a seqüência dos quadrinhos, a
lógica da HQ, a estrutura. Depois trabalhei em cima da folha mesmo, montando direto. [...]. Pedi para eles
desenharem e fazerem uma seqüência de fatos. [...]. Eles trabalharam mais com a imagem em seqüência, que a
gente fazer tradução do texto. Utilizo a última página do gibi, que não tem história nenhuma e eles montam a
história em quadrinhos.”
Em outra ocasião a professora fez outro tipo de atividade:
“A gente queria trabalhar a profundidade. [...]. A gente trabalhou assim com eles: o que se primeiro na imagem,
a gente fez o plano; daí a gente ia fazendo o fundo, depois montava a frente do desenho. É bacana, porque as
cores são o nítidas na imagem dos quadrinhos do Maurício que eles conseguem perceber os planos: __ Esta
imagem aqui está no fundo, essa está mais à frente e aqui está o personagem. Então ficou bem gostoso trabalhar.
[...]. Por exemplo, uma caixa com fundo tal e tal, o personagem na frente, só que eu vou montar um pedaço, o outro
monta outro pedaço e assim por diante. Depois eu posso escolher: __ Eu vou montar o meu pedaço com o de
quem? Como é que vai ser a história? Daí já pode puxar para o teatro, porque neste ponto você já pode trabalhar a
fala dos personagens. A fala você pode trocar, fazer o balãozinho encaixar, fazer um furinho e depois trocar.”
3
“Primeiro eles fizeram anotações no caderno sobre a HQ e como trabalhar com HQ, identificando as onomatopéias.
Também eles tiveram que fazer uma pesquisa, trazer um gibizinho para sala de aula [...]. Gostaram muito de fazer
essa pesquisa, de trazer e tiveram que identificar e passar para o caderno os sons da onomatopéia. Em seguida,
eu pedi para que eles escolhessem as histórias que gostariam de ver em DVD. [...] Seriam da Turma da Mônica e
Chico Bento. [...]. Então foi assistido um DVD em sala de aula. [...]. E também pedi para eles identificarem os
elementos com que se constrói uma HQ”.
4 Não ensina sobre histórias em quadrinhos (ver Quadro 24).
5
“Estou trabalhando, porque a gente fez um projeto sobre o jornal, junto com outra professora. [...]. Da minha parte
vou trabalhar com charge, com eles. [...] Estou começando agora com eles o que é quadrinhos. [...]. Estou pegando
quadrinhos do Ziraldo, da Ciça. Alguns quadrinhos fiz transparência e levei para a sala. [...]. Eu peguei primeiro
quadrinhos, para eles entenderem a seqüência de uma história e depois a simplificação. A charge é mais
simplificada, você faz o desenho e não tem aquela seqüência, não precisa, nem a escrita. Você pega e para
ver, se é de um político, de um artista. O cartunista ele evidencia muito o desenho, na charge. Então pode ser uma
frase só, uma palavra.”
[Obs.: Trabalho realizado com o 6º período do EJA e não com ensino fundamental normal.]
6
“Eu sempre trabalho integrado com a professora de Língua Portuguesa. Trabalho interdisciplinar por causa do
texto. O que ficava para mim, como professora de arte, era a forma, a composição do quadro, o próprio quadrinho,
o que é um personagem, o que é estilizar a forma e sempre a figura humana. Mostrava como o Maurício de Souza
estilizava a forma da menina Mônica, que é muito parecida com a menina Magali, que tem a mesma estrutura do
Cascão e do Cebolinha, que é o estilo desse artista. Eu trabalhava muito com eles como estilizar a forma.
Começava por aí e como os artistas estilizavam a forma. Depois eles pesquisavam o desenho na revista.”
7
“Na série eu ensino o início, na 7ª, mais um pouco. [...] primeiro os passos, como é criar a história, criar um
personagem. Daí você tem que criar um personagem, uma historinha. Então lógico, na 6ª série, uma coisa menor.
Na 7ª já se exige mais. [...]. Eu trabalho primeiro com eles construindo o personagem, acho mais fácil.”
8 Não ensina sobre histórias em quadrinhos (ver Quadro 24).
9 Não ensina sobre histórias em quadrinhos (ver Quadro 24).
131
10 “Eu levei para a série, esse ano. Alguns tinham estudado comigo ano passado, na 6ª série. Nós estudamos
um pouco da linguagem dos quadrinhos, da forma, do desenho, porque eu comecei a trabalhar com o cânone do
desenho da figura humana. No ano anterior introduzi a questão de que HQ (conhecido como gibi, por eles) também
é arte, que é preciso ter desenhistas, roteiristas, qual é a linguagem usada (balões, onomatopéias...), e o tema da
história. [...]. Levei cerca de 3 aulas. Na 1ª, introduzi essas questões, decidimos um tema (política no Brasil, foi
opção deles, pelo que vinha acontecendo na época, “dólares na cueca”) e iniciamos o trabalho, nas outras
terminamos e revisamos! Eu trabalhei um pouco com caricatura, com cartum para daí eles criarem uma historinha.”
11 Não ensina sobre histórias em quadrinhos (ver Quadro 24).
12
“[...]. Primeiro as partes, o que é onomatopéia, os balões, o desenho em si, o enredo que é enredo, personagem.
Eu trabalho tudo isoladamente. Eu trabalho tudo isoladamente. Tudo o que faz parte, quais os elementos que
fazem parte de uma HQ, finalizando é claro, com uma história, que eles tem que criar. Assim eu trabalhei, eles
tinham que criar um personagem, desenhar o personagem. Em cima do personagem, fazer uma história em
quadrinhos. Eu trabalhei com isso um ano já.”
“[...]. E o que eu trabalho com desenho, vamos dizer assim, do Maurício de Souza, quando eu trabalho é ampliação.
Ampliação e redução. Peguei nesses almanaques do Maurício de Souza, as imagens maiores para reduzir e as
menores para aumentar [...].
13 “Comecei a fazer. Mas fiz em cima do Maurício de Souza, mesmo. Não sei se você viu, ele fez uma releitura.
Pegou obras de arte e trouxe para a realidade dele. A Mônica, o Cascão - e eu mostrei isso para os alunos, como
ele levou para os quadrinhos. Então comecei o trabalho com histórias em quadrinhos, a partir daí.”
“ Comecei pegando a História. Como nasceu, pegando da mesma maneira que os movimentos históricos da arte.”
Trabalhou uma definição de HQ com eles? O que é HQ?
“__ Sim, o que é. Falei como surgiu, porque houve a necessidade de criar uma história em quadrinhos. Em cima
disso vou trabalhando as atividades.”
[...] Você fez alguma atividade?
“__ É. para montar a história em quadrinhos relacionando com outras disciplinas. Aqueles bonequinhos que
mexem, também.”
14 “Eu sempre trabalhei assim: passando noções básicas de como criar um quadrinho, dando os requisitos e em
seguida pedindo para que eles criassem um quadrinho, usando as noções que eles tiveram. Sempre tive o cuidado
de nunca pedir para criar um quadrinho a partir da experiência própria deles, que eles também tem. Alguns têm até
boas experiências. Mas não é pedagógico. Então sempre acreditei que você tem que passar noções básicas, e
depois pedir para que façam. Foi assim que sempre trabalhei. [...]. Desde o histórico dos quadrinhos.
Principalmente no ensino médio, você pode aprofundar um pouco mais. Trabalho um pouco o histórico, como é o
quadrinho em vários países, além do Brasil. Às vezes se faz até algumas discussões sobre quadrinhos, tudo.
Depois eu trabalho a criação dos personagens. As linguagens visuais que o quadrinho utiliza, para falar, para
pensar. A linguagem visual da imagem, a diagramação. Eu procuro fazer assim, quase que técnico.”
15 “Trabalhei a parte da imaginação. Eu fiz sempre assim. Contei uma história bem fantástica, até por sinal bem
surreal, com fatos absurdos, coisas que não estão acostumados a ver. Enquanto vou contando a história, eles vão
fazendo um rascunho, um do lado do outro: o desenho, o esboço, com bonequinho palito. Depois que eles
terminaram isso, na outra aula, ou atividade para casa, eles montam os quadrinhos, porque por ali não se perdem.
Então eles não criam a história, quer dizer, alteram um pouco as coisas, porque o que ficar na memória deles, eles
vão conservar, vão aumentar, mudar, mudam o personagem. Essa é a maneira que eu trabalhei. Outra maneira
que trabalhei, foi na série*, foi trabalhado em conjunto. O tema escolhido em conjunto foi a Copa, era bem na
época. Dividimos a turma em 3 grupos grandes, porque são 37 alunos mais ou menos. Cada grupo se juntou e eles
mesmos se distribuíram para fazer os quadrinhos. Um fez o começo da história, outro o meio da história e outro o
final da história. Isso texto, personagem e a parte visual.”
* Educação Especial
16 Não ensina sobre histórias em quadrinhos (ver Quadro 24).
Quadr
o 20 Categoria 4 - Desenvolvimento das Atividades sobre Quadrinhos - referente à pergunta
4
– Arte
Desenvolvimento das Atividades sobre Quadrinhos – Outras Disciplinas
17A
Trabalha com leituras (1) e construção de histórias em quadrinhos (2):
1. Ver Quadro 17. A leitura com as imagens da propaganda, e a leitura com tiras humorísticas é feita da mesma
forma. Primeiro faz-se a leitura do texto, depois da imagem e segue-se com associações entre texto e imagem.
2. “[...] por exemplo, podemos transformar a prosa em um texto para uma história em quadrinhos e depois construir
a história. Pede-se ao aluno que transforme o texto. Depois eles desenham e empregam o texto em forma de
diálogo na história em quadrinhos.[...].”
17B
Trabalha com leituras (1) e construção de histórias em quadrinhos (2):
1. Idem (ver Quadro 17).
2. Idem.
18A “[...] dentro do contexto da história deles, tinha que aparecer essas operações: operações com meros inteiros e
operações com frações e eles tinham também que desenvolver essas operações. Ou seja, resolver a questão
conforme o trabalho dado.” (Ver também Quadro 25).
18B “A gente dizia as operações, tinham que aparecer, mais ou menos que tipo de operações que a gente gostaria e
132
eles encaixavam dentro da história. Criavam a história, então aparecia muito professor dando aula e ali no quadro
aparecia através de compras ¼ de tanto [...].” (Ver também Quadro 25).
19 “Eu passo o conteúdo, depois peço a eles que façam um desenho, do assunto que a gente estudou. Se tiver uma
seqüência de acontecimentos, de fatos, eu peço que mostrem a seqüência, as transformações, no desenho. Eles
usam a criatividade deles, como acham melhor.”
“[A parte estética] não chego a cobrar [...]. Algumas coisas eu peço, como um tamanho, número de quadrinhos, tal,
mas além disso, não.” (Ver também Quadro 25).
20
Trabalha com leituras críticas (1) e com a construção de histórias em quadrinhos (2):
1. “[...] essa leitura parte da própria imagística. O que essa imagem remete à você, que é a questão da
interpretação que é muito sugestiva, sem o texto. Quando você parte para um texto, a interpretação pessoal tem
que estar vinculada àquilo. O que é que a imagem tem a ver com o texto que está sendo escrito. Que
representação de letra, corresponde à representação imagística. Qual? Tem que trabalhar a memória. A questão
da visão, da imagem que provoca a visão ela é muito mais rápida, principalmente para os menores. Ela suscita
uma leitura que muitas vezes o texto o diz. Daí quando você faz o entrosamento entre texto e imagem, é que
pode se estabelecer a junção, o “interlidinho”, o domínio da linguagem, do que é entrelinha. Qual a entrelinha dessa
fala, desse texto e como é que ele se sobrepõe, a questão da imagem. Como uma coisa complementa a outra. Que
tipo de marcação é essa, que tipo de linguagem é essa. Acho assim, bastante recurso. Mas ele não se esgota no
fim pedagógico.”
2. Parte da imagem ou do texto para a construção das histórias em quadrinhos (ou tiras humorísticas):
“Por exemplo, a questão da imagem, do quadro sem texto, para que os alunos possam montar uma história. Podem
recortar uma seqüência de imagens e ela pode ser remontada de algumas maneiras, não infinitas, mas pelo menos
de mais uma maneira. Acho que isso, para fazer um texto narrativo é uma boa saída pedagógica.
“O texto transformado em imagem, principalmente na a é muito recorrente: desenhe tal ou tal situação. Você
tem o texto, se tivesse que transformar isso num quadrinho, como é que você procederia isso, não a questão da
adequação da linguagem, que seria um pouco diferente, porque às vezes é uma coisa direta, outras vezes indireta.
Às vezes, você faz esse jogo pedagógico, para aprenderem a adequação de uma coisa e outra. Como é que
conseguiria essa cena, por exemplo. Esse inverso também. Isso pode facilitar muita a desenvoltura do aluno na
questão da arte visual e da apreensão imagética.”
Quadro 21
– Categoria 4 - Desenvolvimento das Atividades sobre Quadrinhos - referente à pergunta
4
– Português, Ciências e Matemática
c) Pergunta 5: Qual critério utiliza para a escolha das histórias em quadrinhos a
serem trabalhadas em aula ?
Critérios Utilizados para a Escolha de Histórias em Quadrinhos – Artes Visuais
1 “Eu pego a Turma da Mônica. Quando vou na biblioteca trocar todos, é da turma da Mônica! Na faculdade, eu tive
pouca referência com histórias em quadrinhos. É, foi pouca coisa na faculdade.”
2 Usa Maurício de Souza porque “tem muito limpo o desenho. [...]. O que eu conheço é Maurício de Souza. Fora
esse, acho que não. Não pesquisei isso ainda.”
3 “Eu sempre passo a pergunta para os alunos. Acho que eles têm condição de escolher. Então eles escolhem o
material que querem trabalhar.”
4 Não trabalha com HQs.
5 “Eu partiria primeiro, do assunto que eles gostariam de abordar, primeira coisa. As vezes a sobre o corpo
humano, numa 7ª série, não sei. Aquilo que eles tem necessidade de saber.”
6 Prefere usar Maurício de Souza, pelo fato de ser um autor nacional.
7 “Eu procuro trabalhar as nossas. Turma da Mônica, Chico Bento. [...] eu procuro nem pegar essa parte de Mangás.
[...].”
8 Não trabalha com HQs.
9 Não trabalha com HQs.
10 Usou Maurício de Souza. Também considera o interesse dos alunos: “No ano anterior [...] foi opção deles [dos
alunos].”
11 Não trabalha com HQs.
12 “Para mim não tem melhor que Maurício de Souza, mesmo tendo o Cebolinha que fala tudo errado, falando uma
outra linguagem. Quando eu dava aulas para a série, usava a forma do Cebolinha falar, para eles mudarem,
para escreverem um texto mudando a fala dele.”
13 “Trabalharia com Maurício de Souza, mesmo. Fica mais fácil, ele podem trazer.”
133
14 “Nem sempre eu levo. A escolha, quando eu levo, é em função do conteúdo de desenho que eu vou trabalhar se é
figura humana, cor, etc., o critério é em função disso. Geralmente eu peço para o aluno trazer alguma para servir
de referência. Então a gente trabalha com o material que ele trouxer. Maurício de Souza, Mônica, Ziraldo, o que
eles tiverem.”
15 “Na questão dos quadrinhos, como vou selecionar material para o aluno que não influencie negativamente e nem
!? É complicado. Mas acho que tem que usar o bom senso. [...].”
16 Não trabalha com HQs.
Quadro 22
– Categoria 5 - Critérios Utilizados para a Escolha de Histórias em Quadrinhos -
referente à pergunta 5
– Arte
Critérios Utilizados para a Escolha de Histórias em Quadrinhos – Outras Disciplinas
17A Utiliza as imagens que são veiculadas com mais freqüência pelas mídias (jornais, revistas, TV, Internet) e mais
curtas, como as tiras humorísticas. Por exemplo: “Hagar, Calvim, Snoopy, Mafalda, Turma da Mônica, Super-
Homem, Papa-Léguas, Coiote e outros.”
17B Idem.
18A A apostila de Matemática não contém imagens de HQs. Trabalha com a criação do aluno. Não utiliza outras
imagens.
18B Idem.
19 Idem.
20
Você tem critérios para escolher?
“__ Tenho. O fato de ter o material didático para uma determinada série, não significa que tudo aquilo será
aproveitado. [...]. Não é porque está lá, que vai ser utilizada. O diagnóstico da turma, a necessidade da turma é que
determina tudo, de qualquer material didático, não só questão daquilo.”
Quadro 23 Categoria 5 - Critérios Utilizados para a Escolha de Histórias em Quadrinhos -referente
à pergunta 5 – Português, Ciências e Matemática
3.3.5.1 Outras categorias identificadas nas respostas dos entrevistados
Conforme Laville e Dione (1999, apud SILVA C.R., 2005), a partir das
respostas obtidas nas questões 3 e 4 do roteiro base (Quadro 5), incluímos a
categoria Professores que não Trabalham com HQs ou Utilizam como Recurso
Didático, nos Quadros 24 e 25, a fim de aprofundar algumas informações.
Nesta categoria reúnem-se os trechos das respostas dos professores de Arte
que explicam porque não ensinam sobre quadrinhos ou porque ainda não ensinaram
(Quadro 24 -
s
4, 8, 9, 11 e 16). A entrevistada 9 chegou a usar uma vez os
quadrinhos, mas para ensinar sobre música. De certa forma, isso a aproxima da
entrevistada nº 5, que, para ensinar sobre a charge, introduziu o assunto com
histórias em quadrinhos. Porém não são casos idênticos. Esta última, não se inclui
neste grupo, porque apesar de seu objetivo principal ser a charge, aborda os
quadrinhos, para ensinar algo sobre eles, mesmo que rapidamente. A professora
9, seu objetivo era ensinar música e em seu caso não houve a intenção de se deter
nessa parte. Alguns professores (nº
s
4 e 8) nunca ensinaram e não têm a intenção
134
de ensinar sobre quadrinhos. outros ainda, (nº
s
18A, 18B e 19), cujo objetivo
principal é ensinar conteúdos específicos de sua disciplina (Quadros 25).
Professores que não Trabalham com HQs ou Utilizam como Recurso Didático – Artes Visuais
4 “Eu não tenho trabalhado HQ, porque isso a professora de português tem trabalhado muito, exaustivamente. Todos
os anos desde o prézinho, é uma coisa que ela vem trabalhando. Sempre que eles trabalham em linguagem visual
estão trabalhando, então nem me preocupo com essa parte.”
8 “Só com desenho de observação eu trabalhava. Aqui nós temos vários professores de desenho e cada um
trabalha uma linha. [...]. Porque aqui costumamos respeitar a linha do professor. [...].
Porque tem pessoas que são
muito boas, por exemplo, a prof.ª [...] ela é excelente para desenho de observação, luz e sombra. Então porque
que ela vai ficar em quadrinhos se não é a linguagem, a praia dela, vamos dizer assim?!”
E na outra escola, alguma vez você chegou a trabalhar com HQs?
"__ Não. Trabalhei mais com composição, alguma coisa que eu podia levar daqui, como papel reciclado. Eles
faziam o papel reciclado e depois em cima do papel reciclado, técnicas de impressão, mas daquele jeito, com
batata [...], etc. Porque aqui a gente tem tudo [...]. Lá não. [...].”
Você não trabalha com HQ, porque prefere ficar mais com técnicas ?
“__ Composição. Gosto muito de trabalhar composição, com eles. Porque qualquer pedaço de papel serve, eles
mesmos as vezes coloriam e trabalhavam. Porque eu acho composição uma coisa tão importante, aprender a
compor. Aprender a compor é aprender a selecionar e agrupar elementos de forma harmônica.”
9 “[...]. Porque eu vejo tanta especialização que me assusto. Eu acho que não conheço suficiente para ficar
trabalhando quadrinhos. [...]. [...] com os bem pequenos, não é que eu não possa. É que eu não tive tempo de me
preparar para isso. [...]. Estive pensando, até. Cheguei a fazer alguma coisa com eles utilizando quadrinhos, mas
me lembrei depois, faz muito tempo [...]. Eu utilizei para trabalhar a música com eles, usando os sons das
onomatopéias. Os quadrinhos podem ser utilizados para muitas coisas. [...]. Os quadrinhos em função dele
mesmo, não me lembro assim.”
“É, o quadrinho ele é um gancho. Uma ponte para muita coisa. O quadrinho você pode fazer mil coisas, valores,
ética. Então tem muita coisa. Mas em quadrinhos, como é que faz, para ensinar. Isso realmente não fiz.”
11 “Não, ainda não. Porque a linguagem dos quadrinhos, na escola que eu trabalho começa a partir da série, ou
Ensino Médio. Eu nem dou aula nestas séries. [...]. Eles separam os ciclos. Eles utilizam a linha do tempo. Então
talvez na 8ª, talvez eu comece ensinar HQ [...].”
16 “Não. Esse ano ainda não. Até tem no livro, na seqüência. que acho que não vou trabalhar. Não trabalhei
ainda.”
E antes, você já trabalhou alguma vez, a linguagem dos quadrinhos?
“__ Eu trabalho como professora 15 anos. Eu trabalhei com imagens, seqüência, tal mas assim com vistas à
produção de texto, conteúdos mais do tipo Língua Portuguesa, do que de arte. Especificamente, de pensar como
possibilidade do desenho, não. Assim dessa forma, ainda não, não trabalhei. Agora, quando a gente monta roteiro,
para peças assim, desde 2004 eu tenho feito como exercício para os alunos, eu uso seqüência de quadrinhos, mas
como um reforço, uma ajuda para gravar a seqüência, gravar falas dos personagens. A minha intenção, o meu
objetivo não tem a ver com o desenho, ou com histórias em quadrinhos.”
“[...]. Eu acho que a escola deve, tem a função de trabalhar sim, como todos os elementos, as linguagens da arte e
essa também. Só que eu não me sinto à vontade, porque eu acho que não domino.[...].”
Quadro nº 24 – Categoria - Professores que não Trabalham com HQs ou Utilizam como Recurso Di-
dático - Arte
Professores que não Trabalham com HQs ou Utilizam como Recurso Didático – Outras Disciplinas
18A “Nós usamos as HQ pelo seguinte, primeiro para cobrar de uma outra maneira um conteúdo, para tornar a coisa
mais divertida. Porque os alunos gostam muito de ler histórias em quadrinhos. Então, usamos para desenvolver a
criatividade deles também, saber como eles se saem, a organização, a limpeza, para cobrar tudo isso. De uma
maneira cobrar matemática, mas dentro de um contexto, dentro de uma história, para a criatividade da história,
para a criatividade dos quadrinhos. E eles gostam.”
18B Idem. “Para não ficar só naquilo ali, colocar um texto, + 2/5= [...], então a gente procura isso.”
19 “Uso para que os alunos fixem o conteúdo, dentro das Ciências, dentro de um tópico de estudos. Eu passo um
conteúdo, depois peço para eles criarem uma história, com o que eles estudaram. [...]. Sempre faço atividade com
histórias em quadrinhos se não fica tudo muito preso ao texto, aos mesmos exercícios. Assim os alunos podem
variar um pouco e não ficarem presos na apostila. É uma maneira de saírem da rotina. Do contrário, o trabalho
fica só relacionado ao texto, aos mesmos exercícios de sempre. [...]. Essa é a principal finalidade.”
Quadro 25 Categoria - Professores que não Trabalham com HQs ou Utilizam como Recurso Di-
dático - Português, Ciências e Matemática
135
3.3.5.2 Descrição e interpretação de dados: categorias 3, 4 e 5
Os Quadros 18 e 19 indicam os professores que trabalham e aqueles que não
trabalham com histórias em quadrinhos. Cinco, entre os 16 professores de Arte,
nunca fizeram um trabalho ou ensinaram histórias em quadrinhos na escola:
s
4, 8,
9, 11 e 16. Dentre os que trabalham menos freqüentemente com HQs, estão nº
s
2, 3,
5, 12, 13, e 15. Os professores que têm por hábito sempre ensinar a fazer histórias
em quadrinhos, são nº
s
1, 6, 7, 10 e 14.
A professora 10, embora tenha começado a lecionar pouco tempo, em
2005, desde o início, inclui essa arte popular como um conteúdo que faz parte de
seu ensino e já ensinou duas vezes, em anos consecutivos para uma mesma turma,
de maneira programada. A entrevistada 13, começou a lecionar na mesma época
que aquela (nº 10) e também abordou as HQs, na série, mas por menos tempo,
em uma única aula. Ao contrário da professora 10, uma delas (nº 15) trabalhou
com quadrinhos na série, mas porque estava no planejamento do colégio. Como
havia recém-começado a trabalhar nesta escola, teve que improvisar, segundo ela.
Alguns dos professores, nº
s
12, 2, 3, 5, embora estejam no ensino de Arte, há
cinco anos ou mais, incluíram histórias em quadrinhos em seu ensino, apenas uma
ou duas vezes. A entrevistada nº 5, normalmente trabalha com obras de arte.
Através de um projeto recente com outros professores da escola, entretanto,
começou a trabalhar com a charge no EJA e para isso achou melhor começar pela
história das HQs, para depois abordar seu objetivo principal. Isso remete ao estudo
com alunos. Três dos entrevistados, no estudo exploratório, mencionaram ter
aprendido algo sobre quadrinhos na escola e dois relataram que este ensino estava
associado à charge. A outra entrevistada, nº 12, idem, normalmente trabalha apenas
com obras de arte erudita. Não fez referência a trabalhos com outros tipos de
imagem, mas citou ter trabalhado uma vez com histórias em quadrinhos na série,
conforme o planejamento do colégio.
Dentre os 5 professores de Arte que nunca ensinaram sobre HQs, um deles,
a entrevistada 9, como vimos, as utilizou como recurso didático para ensinar
música, e o entrevistado 11 começou a dar aulas de Artes Visuais recentemente;
segundo ele, não teve ainda a oportunidade. Porém ambos (nº
s
9 e 11)
manifestaram interesse por essa arte. Somente duas professoras (nº
s
4 e 8)
declararam não ter gosto ou interesse em ensinar sobre histórias em quadrinhos.
136
Uma não tem afinidade com esta arte e a outra prefere ensinar desenho livre,
técnicas e regras de composição que considera mais importantes para o trabalho de
criação. Nº 16, formada em Teatro, trabalha normalmente com Artes Visuais e
ensina sobre obras de arte, inclusive outras manifestações artísticas como arte
postal e propaganda. Para isso, entretanto, diz que teria que ter um preparo.
Os Quadros síntese,
s
7 a 11, auxiliam a identificar em que turmas o
professor leciona e para as quais delas o professor, ou a escola, preferência para
incluir histórias em quadrinhos no planejamento. Conforme as entrevistas,
geralmente na série, é que os professores de Arte costumam trabalhar com
quadrinhos. Sete deles relatam que ensinaram a fazer histórias em quadrinhos
neste nível de ensino. Com menos freqüência, as HQs são incluídas na série,
citada por quatro professores de Arte, e três as incluem na série. Em outras
turmas é menos freqüente. Na série, apenas dois professores as incluem (nº
s
6 e
14), e na 2ª série, apenas uma professora (nº 2).
Dentre aqueles que estão no ensino de Arte há mais tempo,
s
8, 6, e 9, (24,
29 e 30 anos), somente uma (nº 6) trabalha regularmente com histórias em
quadrinhos todos os anos, em todas as turmas de a série. O professor 14,
idem, embora este ano esteja apenas com turmas de 6ª
s
séries e ensino médio.
Os professores de Português trabalham com histórias em quadrinhos em
todas as turmas, de a série, independente de ser esta ou aquela, assim como
em Ciências e Matemática. O trabalho destas últimas, em geral fica mais
caracterizado como atividade, do que para o ensino dessa arte e tem por objetivo
fixar conteúdos da disciplina. Na disciplina de Português, conforme as entrevistas, o
trabalho com HQs na maior parte das vezes se volta para o uso dos quadrinhos a
fim de ensinar assuntos da Língua Portuguesa, leituras de imagem ou para a
produção de histórias em que o aluno possa empregar o que aprendeu na disciplina.
Às vezes, tem por objetivo ensinar a criar textos em função da própria criação de
histórias em quadrinhos ou tiras humorísticas - produções que acabam envolvendo
também a linguagem e a criação visual.
As atividades com histórias em quadrinhos, no ensino formal, podem ser
resumidas em ensinar como criar e desenhar um personagem, algumas
características da linguagem dos quadrinhos, para em seguida o aluno criar uma
história. Variam pouco com relação à escolha de materiais a serem trabalhados em
137
sala de aula. A maioria dos professores tem preferência por Maurício de Souza,
autor que costumam levar para sala de aula.
3.3.5.3 Interpretação e avaliação crítica: categorias 3, 4 e 5
Embora nem sempre os docentes verbalizem diretamente o que pensam
sobre as HQs e sobre suas atividades com esta arte, seus trabalhos denotam
superficialidade e muitas vezes práticas casuais, isoladas, geradas no senso
comum. Algumas falas abaixo sintetizam, como grande parte dos professores,
encaminha as atividades com histórias em quadrinhos:
E sobre os diferentes tipos de histórias em quadrinhos ou as diferenças com
os desenhos de humor ? Nos quadrinhos existem gêneros diferentes,
histórias de histórias (biografias), ficção, aventura, chegou a falar sobre
isso?
“__ Não, não. Passa por alto. Não para trabalhar esse tipo de coisa.
Mesmo porque a gente tem muito pouco tempo. Para falar sobre histórias
em quadrinhos eu precisaria de mais tempo. A gente só tem duas aulas de
artes por semana. [...]. Tem muito conteúdo que a gente tem que dar, se
fosse trabalhar com histórias em quadrinhos eu precisaria um trimestre ou
um semestre pelo menos. Tem outras coisas também.” (nº 13).
“Eu o falo tanto da HQ. A princípio eu passo a história em quadrinhos
para eles e depois mando observar como é feito o desenho.[...]. A maioria
gosta de trabalhar com HQ. Eles vão muito na biblioteca retirar histórias em
quadrinhos e eu percebo. Não vejo muita dificuldade. Quando eu chego
com os gibis todos querem. Um ou outro, claro numa turma de 38, 40 -
não está muito a fim de ler HQ. Mas daí ele desenha. E isso de por a obra e
desenhar, eles gostam.” (nº 1).
“Mas eu não falo tanto disso. Falo mais da personagem, de como desenhar,
construir a personagem.” (nº 2).
“Eu trabalho primeiro com eles construindo o personagem, acho mais fácil.”
E porque você trabalha dessa maneira?
“__ O porquê, nunca pensei. A gente em livros como é que se vai
criando. É automático.” (nº 7).
Nem todos os entrevistados consideram ter dificuldades para ensinar quando
o assunto é histórias em quadrinhos, mas alguns problemas foram revelados pelos
professores.
s
2, 12, 13, citam alguns motivos que dificultam, quando as ensinam.
s
9 e 16 relatam alguns obstáculos que as impedem de ensiná-las. Conforme os
depoimentos, em geral se considera que ensinar HQs é uma tarefa fácil. Mas por
seu lado, entre os que o encontram dificuldades, também aqueles que
138
trabalham de maneira simplificada ou que seguem passos pré-determinados (ver
Quadro 20).
Ainda que alguns dos professores não se incluam no grupo que revela
dificuldades para o trabalho com HQs, entre esses surgem práticas análogas e
equiparam-se aqui algumas, para fins de análise. Uma das professoras, 3, expõe
como qualifica o trabalho que fez com histórias em quadrinhos, na 5ª série:
Você me disse que foi fácil trabalhar com HQ, não teve dificuldade. É mais
fácil de trabalhar, com HQ?
“__Foi fácil de trabalhar. Não tive dificuldade, porque primeiro teve a
explicação, depois fizeram a pesquisa, para identificar as onomatopéias. Foi
feita a correção do que eles fizeram e assim foi passado o DVD e eles
tiveram que identificar novamente.” (nº 3).
Ao contrário desta, que apresenta seu estilo para ensinar as onomatopéias na
série, a professora que ensina da Educação Infantil à série, (nº 9), diz o
seguinte:
Então você não chegou a trabalhar história em quadrinhos ?
“__ Histórias em quadrinhos, não.”
Mas porque? Você nunca estudou essa parte?
“__ Não, nunca estudei. Claro que eu uso revistinha também para eles
perceberem isso, aquilo, chamo a atenção. Levo, mas assim, para eles
montarem alguma coisa, mas um trabalho em quadrinhos, não.”
O fato das histórias em quadrinhos serem uma linguagem híbrida, por terem
texto e imagem, é o que atrapalha você?
“__ Não, porque por exemplo, com os bem pequenos, não é que eu não
possa. É que eu não tive tempo de me preparar para isso. Mas até com os
bem pequenos, posso fazer a imagem e ali no quadrinho eles usarem a
linguagem onomatopaica. Eu posso fazer exclamações, com eles. Eles são
capazes de entender essas coisas. Letras, posso fazer um código, para
eles lerem. As crianças do Jardim são estimuladas a conhecerem letras.
Eu poderia fazer alguma coisa, mas eu vejo que requer um estudo a mais,
do que aquele que eu tenho.” (nº 9).
Ela
conta que chegou a trabalhar a música usando as onomatopéias: “uma
vez [...] utilizei os sons das onomatopéias para trabalhar a música com eles. Os
quadrinhos podem ser utilizados para muitas coisas [...].” (Ver Quadro 24, nº 9).
São visões um pouco diferentes, de ambas as professoras. Uma as concebe
como linguagem artística e a outra vê as histórias em quadrinhos mais como recurso
didático ou pedagógico. Esta última, 9, é de opinião que até os bem pequenos, do
Jardim, seriam capazes de entender o que são onomatopéias e inclusive utilizou-as
para ensinar assuntos musicais com as crianças de pré a 2ª série.
139
Isso nos leva a indagar, então, até que ponto são válidas atividades isoladas
para ensinar determinados assuntos? O que alunos da série, aprendem quando
identificam e escrevem elementos da linguagem dos quadrinhos de forma
simplificada? O que aprenderam sobre as histórias em quadrinhos? Não poderiam
alunos deste nível de ensino, estar iniciando em investigações acerca da
complexidade inerente às HQs?
A linguagem onomatopaica é uma das características principais da linguagem
das HQs. Assim como os balõezinhos de fala, não são esquecidas pela maioria dos
professores quando ensinam sobre quadrinhos. O balão, o ruído onomatopaico e o
ritmo visual, são elementos fundamentais das HQs. As onomatopéias, de acordo
com Quella-Guyot (1994, p. 85), “constituem a sonoplastia (a trilha sonora) das
histórias em quadrinhos”, isto é, são uma tentativa de sonorização gráfica. Uma
enorme quantidade de ruídos pode ser evocada pelas onomatopéias. Contudo não
são simples ruídos. Os quadrinhos são menos simples do que aparentam.
Segundo Acevedo (1990), vários países utilizam onomatopéias que provem
do idioma e verbos ingleses
62
e este é um fenômeno que está ligado à difusão dos
quadrinhos norte-americanos. Acevedo (1990, p. 130) assinala que “dessa forma, os
quadrinhos americanos não disseminam seus conteúdos específicos (de acordo
com seus interesses específicos) como também impõem suas formas lingüísticas.”
Como explica esse autor, dentro de uma perspectiva crítica, não se recusariam as
onomatopéias trazidas de fora, mas também não seria o caso de repeti-las
mecanicamente, o que significa estar fugindo a tarefas criativas e negando a própria
identidade. Lembra ainda que exemplos de artistas que ao perceberem tal fato,
procuraram criar onomatopéias pertencentes a seus idiomas.
O que se destaca, além da ausência de estratégias para a interpretação
crítica nos estudos propostos aos alunos, quando se comparam algumas atividades
realizadas, é sua semelhança em grau de aplicação e dificuldade em diferentes
etapas escolares. O pensamento destas professoras pode ilustrar como atividades
casuais podem coincidir e abordar assuntos de maneira idêntica tanto nos primeiros
anos escolares, quanto em anos bem posteriores. Denota ser algo que ocorre não
apenas com o ensino relacionado à arte dos quadrinhos, mas também quando se
aborda outras artes. Esses casos, se repetem como se verá adiante.
62
Por exemplo: click (to click – estalar), smack (to smack – beijar), sniff (to sniff – cheirar), splash (to
spash – salpicar de água), etc. (ACEVEDO, 1990).
140
Dentro do enfoque das teorias da Cultura Visual, as observações indicam
falhas nas noções dos docentes sobre a construção do conhecimento e aprendizado
artísticos e por conseqüência da compreensão em níveis e estratégias para alcançar
um conhecimento mais complexo. A necessidade de aprofundamentos sobre o
processo de ensino e aprendizagem
63
da arte é um dos aspectos que emerge em
vários pontos das falas dos professores.
Como observa Franz (2005b), quando entram na escola, as crianças em sua
maioria, ainda sabem muito pouco sobre os conteúdos de determinadas matérias,
como por exemplo, Matemática ou Ciências. Contudo, mesmo tendo consciência
disso, os professores dessas disciplinas, não se satisfazem com os conhecimentos
iniciais dos alunos e se esforçam para que estes “dominem uma considerável soma
de conhecimentos para superar o ano letivo e avançar no domínio dos seus
campos.” (FRANZ, 2005b, p. 2). Para essa autora, devido a preconceitos e barreiras
criados no campo da arte e da cultura visual, gerou-se a crença de que para
compreender objetos artísticos, não há necessidade de estudar com seriedade.
Nas pesquisas sobre a aprendizagem e a construção do conhecimento,
segundo Gardner (1990, apud Hernández 2000, p. 120), chegou-se à conclusão de
que “o nível de compreensão de um indivíduo sobre artes é o lento resultado de sua
interação com o domínio artístico e o desenvolvimento cognitivo e social.” Esse
enfoque leva a considerar o conhecimento prévio dos alunos como ponto de partida
para a elaboração de estratégias que favoreçam um processo de inferências e
transferências entre os conhecimentos adquiridos para novos problemas e
situações. Diante das falas analisadas, torna-se importante enfatizar essa
necessidade.
Paralelamente aos problemas relacionados ao aprendizado, nota-se falta de
consenso entre os professores, no que toca aos planejamentos, que evidenciam a
forma como se (des)configura o ensino de Arte no contexto escolar. Em Artes
Visuais, uma multiplicidade de conhecimentos e assuntos que podem ser
abordados, que por vezes se oferecem como fragmentos ou pequenas parcelas,
carentes de uma organização e seqüências que conduzam a aprofundamentos.
63
A indefinição de princípios comuns que orientem o planejamento curricular do ensino de Arte e a
necessidade de discussão a respeito dos processos de ensino e aprendizagem em Arte, também são
problemas citados no documento elaborado pela SEED/PR em 2004-2005. Documento citado (ver
item 1.2 - Problema de Pesquisa).
141
Ambos são problemas pertinentes ao ensino de Arte. A organização do
planejamento curricular e planejamento individual do professor é assunto tão
importante para se decidir o que e como ensinar, quanto para garantir a
sistematização do ensino de Arte. muitos casos em que o professor é o único
responsável pela elaboração do planejamento do ensino da disciplina na escola.
Contudo este assunto implica em uma discussão não apenas a nível individual, mas
também coletivo. Diante dos múltiplos fatores que interferem nesse processo, tal
como as transformações na sociedade, trazendo mudanças nas necessidades para
o ensino e educação atuais e aparecimento de novas abordagens e metodologias,
torna-se um desafio para professores e escolas, a elaboração de programas bem
definidos e estruturados. Cabe ao professor ou equipe de professores e escola,
decidirem quais as metas e objetivos a serem atingidos, selecionando os
conhecimentos mais significativos em função de seus objetivos e optarem por
encaminhamentos que julguem mais adequados a fim de garantir graduações nos
conteúdos programáticos e a continuidade dos estudos para os alunos.
Segundo Hernández (2000, p. 137) há muitas formas de se organizar o
currículo. O ensino por projetos de trabalho é uma delas. Porém não são uma
fórmula para todos os problemas e sim uma concepção de ensino. De acordo com
Hernández (2002), muitas maneiras de aprender, e os projetos são apenas uma
dessas formas. “É bom e é necessário que os estudantes se encontrem com
diferentes situações para aprender.” (HERNÁNDEZ, 2002). Conforme explica ele,
também é importante que os alunos tenham aulas expositivas, participem de
seminários, façam trabalhos individuais e em grupo, para que tenham a possibilidade
de estudar em diferentes situações.
No relato da professora pedagoga (nº 2), surge uma das dificuldades
relacionadas ao ensino das histórias em quadrinhos. Na sua opinião, o trabalho com
histórias em quadrinhos com crianças da 2ª série:
“É interessante porque a leitura é visual. A criança o precisa ler - não
precisa dos balões para saber o que está acontecendo. Tem toda uma
seqüência, uma lógica. Eles gostam de construir histórias em quadrinhos.
Mas é mais fácil trabalhar com os maiores, com certeza. É muito desenho
para montar. Fazer uma montagem.” (nº 2).
A professora fez atividades com HQs por duas vezes neste nível escolar. Em
uma das ocasiões, utiliza os gibis de Maurício de Souza, como recurso didático para
142
demonstrar os planos. Para ensiná-los na prática, propôs às crianças fazerem uma
caixa com desenho do plano de fundo e personagens, passando daí para um
teatrinho improvisado. A outra atividade envolveu desenhos. A professora explicou
como era a “seqüência das histórias em quadrinhos”, sua lógica e estrutura, depois
os alunos partiram para a atividade prática, desenhando “seqüências de animação”
no bloquinho, diretamente nas folhas (ver Quadro 20). Conforme seu relato o que
mais dificultou esse trabalho com os alunos, foi:
A própria construção da imagem, por ela ser pequena e ter que repetir o
personagem nos outros desenhos. É complicado [na série]. Daí você
trabalha HQ, mas de outro jeito. Com desenho de palito, palitinho, virando
as páginas rapidinho. Bloquinho de animação e o bonequinho se mexe.”
[...]
Pediu para eles desenharem?
“__ Pedi para eles desenharem e fazerem uma seqüência de fatos.”
E eles fizeram?
“__ É, foi meio complicado. Não foi uma experiência boa. [...] Eles
trabalharam mais com a imagem, em seqüência, que a gente fazer tradução
do texto. Utilizo a última página do gibi, que não tem história nenhuma e
eles montam a história em quadrinhos.” (nº 2).
O insucesso atribuído a essa atividade, parece estar mais ligado ao resultado
esperado na produção com relação às aptidões dos alunos, ou seja, estaria na
inadequação da tarefa com relação ao estágio de desenvolvimento gráfico-plástico.
Seqüências de desenhos animados exigem, além da reprodução fiel dos
objetos, a observação acerca das leis físicas do movimento. Até uma bola, ou um
simples palito, são regidos por essas leis, e para explorá-las é preciso compreendê-
las. Mesmo que haja uma compreensão natural ou intuitiva sobre as leis do
movimento é preciso traduzir tudo em desenho. Se aí não houver um trabalho
cuidadoso, pode não ocorrer o resultado que se espera frustrando as expectativas.
Caberia lembrar que as teorias sobre a aquisição do conhecimento artístico e
evolução gráfico-plástica, são bases para o ensino de Artes Visuais e todo educador
deve levá-las em conta. Pillar (1996a), que pesquisa a construção do desenho na
criança a partir das teorias do construtivismo, explica que diferentes níveis de
desenho que dependem do estágio em que se encontra a criança. Como destaca
essa autora, esses estágios existem, e diferenças individuais que também
determinam especificidades em cada um desses níveis. De acordo com as teorias
revisadas do construtivismo, segundo Hernández (2000), os estágios não ocorrem
143
de modo tão linear; podem ocorrer variações. Caberia ao professor observar para
poder adequar as tarefas em função do contexto de seus alunos.
que se notar ainda a incoerência entre mostrar a lógica da estrutura de
uma história em quadrinhos e fazer uma atividade prática com seqüência de
desenhos animados. As histórias em quadrinhos, conforme Will Eisner (1989), são
uma Arte Seqüencial. Por seu lado, os desenhos animados também não deixam de
ser uma arte visual em seqüência. Assim, antes de partir para a prática, como faz
Conde (2000), ao traçar paralelos para abordar a arte do cinema e HQs, convém
antes demarcar os campos, diante da confusão que podem causar suas imbricações
e semelhanças.
Para McCloud (2005, p. 7) a diferença básica é que a animação é
seqüencial em tempo, mas não espacialmente justaposta como nos quadrinhos.” O
espaço é para os quadrinhos, o que o tempo é para o filme. O tempo nos quadrinhos
é algo mais complexo (McCLOUD, 2005). Enquanto um filme tem seus quadros
projetados em um mesmo espaço; nos quadrinhos esses quadros ocupam espaços
diferentes.
Conta a professora nº 13 que realizou na 6ª série, atividade análoga. Para ela,
as dificuldades para ensinar histórias em quadrinhos estão relacionadas a outras
questões, como se explica mais adiante e não a esta atividade que descreve. A
professora pedagoga, 2, talvez julgue como não necessária a parte teórica para
os alunos de série. Conforme suas palavras, para falar sobre quadrinhos iniciou
com as releituras de obras de arte de Maurício de Souza para em seguida explicar o
que são “histórias em quadrinhos”, como surgiram e depois propor uma atividade
prática com “bloquinhos de animação” (ver Quadro 20). Segue seu relato com o
seguinte:
[...] Você fez alguma atividade?
“__ É. para montar a história em quadrinhos, relacionando com outras
disciplinas. Aqueles bonequinhos que mexem, também.”
Mas você chegou a montar uma história com eles? Ou fizeram o bloquinho?
“__ Eles fizeram o bloquinho, história no bloquinho. Faz o bloquinho e eles
fazem aqueles desenhos, daí o bonequinho mexe a perninha, o braço.”
O que eles fizeram nos bloquinhos?
“__ Alguns fizeram bonequinho mesmo. Alguns fizeram pássaro voando.
Outros fizeram paisagem, para mexer alguma coisa na paisagem, a nu-
vem, por exemplo, vai mexendo. Cada um faz uma coisa.”
[...]
Você falou que para relacionar com outras disciplinas. Isso você chegou
a fazer?
144
“__ Já. Vou relacionando com a aula de Português, por exemplo. Fazendo
um trabalho interdisciplinar. para fazer isso, trabalhar a interdisciplinari-
dade.”
[...]
Fez um trabalho interdisciplinar com histórias em quadrinhos?
“__Não, não. Só trabalhei a poesia de Cecília Meirelles com eles.” (nº 13).
Passando do tema HQs, diretamente para uma atividade prática em
animação, a professora desvinculou a prática da teoria, caracterizando, assim, uma
atividade fora de contexto. Embora o tema animação possa ser “derivado”, ambas as
artes - animação e histórias em quadrinhos - têm características e especificidades
próprias: história, forma, produto e meios diferem. A professora poderia ter
construído uma história em quadrinhos com os alunos, ou explorado as releituras -
tanto partindo da arte erudita, quanto da própria história da arte dos quadrinhos -
articulando a parte teórica com a parte prática e a contextualização. Contudo, partiu
para uma atividade de criação livre e não trabalhou a parte prática, de acordo com o
produto, isto é, com as histórias em quadrinhos.
Conforme Hernández (2000), considerando os limites antes impostos pela
antiga visão disciplinar da História da Arte, os estudos da Cultura Visual, englobam
novos objetos de pesquisa que estão presentes na sociedade contemporânea:
artefatos como anúncios, desenhos, moda, televisão, filmes, grafites, imagens
digitais, fotografias e muitos outros, além da arte tradicional. Entretanto, como
enfatiza esse autor, perante essa multiplicidade, não se deve cair na tentação da
homogeneidade ou do vale-tudo.
Cada manifestação cultural, cada arte e cada meio têm algumas
características e uma história, e, atualmente, a cultura é cada vez mais
híbrida, o que faz com que os limites a partir dos quais se confronta a
pesquisa sobre os novos ‘objetos’ da cultura visual sejam cada vez mais
imprecisos. (HERNÁNDEZ, 2000, p. 136).
Esta observação é particularmente importante para o estudo de histórias em
quadrinhos e desenhos animados. muitos pontos em comum e reciprocidades
que dificultam delimitar seus contornos. Ambos são artes narrativas de
entretenimento, mas na realidade são diferentes. Os primeiros desenhos animados,
que foram produzidos por Emile Cohl em 1908, na França, mostravam bonecos
simples de um traço só. Segundo Halas (1979), ainda em seus primórdios, os
desenhos animados eram tão rudimentares quanto as histórias em quadrinhos da
época, os diálogos flutuavam em balões amarrados à boca dos personagens. Mas
145
tal como ocorreu com o filme normal, a animação teve de criar suas próprias leis e
técnicas. Hoje surgem novamente bridos decorrentes da utilização das tecnologias
digitais, que envolvem seqüências de animação e cartuns, adquirindo novas
características.
Conde (2000) assinala que as HQs são um meio mais relacionado com a
narrativa icônico-escritural e a literatura. As HQs narram por meio de uma
sobreposição de imagens e palavras. Conforme Will Eisner (1989), as regências da
arte visual, superpõem-se às regências da literatura. “Ainda que entre as historietas
mudas e o cinema mudo se possa estabelecer semelhanças, entre o cinema sonoro
e as historietas modernas cabem muitas diferenças.” (CONDE, 2000 p. 36, tradução
nossa).
Diante dos procedimentos analisados, como se verá mais adiante, pode-se
dizer que caberia elucidar conceitos, histórias e diferenças, antes ou depois de partir
para as atividades, a fim de, no mínimo, buscar pela coerência entre teoria e prática.
A professora nº 15, tem uma concepção de ensino mais próxima à nº 2, isto é,
mais prática. Descreve duas atividades, que considera como de ensino de histórias
em quadrinhos. Também menciona uma terceira, que realizou na série, com o
intuito de preencher um tempo que sobrou, e assim propôs aos alunos que criassem
histórias em quadrinhos sobre sua vida. A primeira, na série, foi resultado de
improviso e estratégia de pronto atender o planejamento da escola, em que havia
recém-ingressado. A inventividade denota ser a marca pessoal da professora. Desta
forma, propôs aos alunos elaborarem uma história em quadrinhos, com base em
uma história inventada por ela na hora. Os alunos fizeram o esboço em aula,
conforme a professora lhes falava. Produziram suas histórias em casa, levando na
aula seguinte o trabalho pronto.
Já ensinou alguma coisa sobre a linguagem dos quadrinhos?
“__ Trabalhei quadrinhos com eles, inclusive porque está no planejamento
do Colégio.”
Está no planejamento da 7ª?
“__ Está no planejamento da 7ª. Quando entrei nessa escola, muito em cima
da hora, a diretora precisava de professora, então eu não tive tempo de
fazer o meu projeto, o meu planejamento, que geralmente fazemos. Eles
pegaram o planejamento do ano passado da professora anterior e passaram
para mim. Achei por bem, não alterar nada. [...]. Neste planejamento tem
quadrinhos no 2º semestre.”
[...]. O que tinha nesse planejamento para ser feito e como você trabalhou ?
“__ Tinha escrito: “quadrinhos”, mais nada. Tanto que eu imaginei um
jeito de trabalhar quadrinhos com eles. Trabalhei a parte da imaginação. Eu
146
fiz sempre assim. Contei uma história bem fantástica, até por sinal bem
surreal [...].” (Ver Quadro 20, nº 15).
Na segunda atividade, percorre um caminho semelhante às professoras nº 2 e
13, embora de modo inverso, isto é, de animação para quadrinhos. Nesta, o tema foi
escolhido em conjunto pelos alunos da série da Educação Especial. O trabalho
idem, feito em equipes, dividindo-se as tarefas de produção. Segundo ela, utilizou
como recurso didático, vídeos de animação, por considerar histórias em quadrinhos,
muito estáticas. Com base nos desenhos animados, os alunos deveriam criar
histórias em quadrinhos que tivessem a sensação de movimento.
“[...]. Outra maneira que trabalhei, foi na 4ª série, foi trabalhado em conjunto.
O tema escolhido em conjunto foi a Copa, era bem na época. [...].” (Ver
Quadro 20, nº 15).
“[...]. Como esse trabalho que eles fizeram da Copa, eu coloquei movimento.
O quadrinho na verdade, não é aquela coisa estática da Mônica. Todo ele
tinha que dar sensação de movimento e eles conseguiram. A gente
menospreza eles, às vezes, não é?”
Trabalhou quase como se fosse uma seqüência de animação?
“__ Eu passei animação para eles. Eu passei o Anima Mundi, aqueles que
usam bastante grafismo. Separei aqueles vídeos [...]. Acho aquele material
muito bom. É adulto, mas para eles é... eles são adultos na verdade. Eles
entendem tudo o que o adulto entende. Aquele material que tem grafismo,
eu mostrei para eles e eles entenderam bem, conseguiram aprender
bastante.” (nº 15).
A crítica anterior aqui também é válida. Podemos dizer ainda, como Hallas
(1979), que a essência da animação é o movimento e isso é óbvio. Para Hallas
(1979, p. 26), “se a estátua do Discóbolo realmente se pusesse a mover, deixaria de
ser o Discóbolo dotado das virtudes particulares de uma estátua e passaria a uma
outra categoria de arte.”
Nos desenhos animados obtém-se a ilusão do movimento com a projeção de
aproximadamente 24 imagens por segundo, “enquanto que as histórias em
quadrinhos, simulam o movimento, o insinuam ao passo de um fragmento de um
espaço a outro.” (CONDE, 2000, p. 35, tradução nossa). Nas HQs, o movimento está
ligado a duas questões, a leitura de quadro a quadro e a representação do
movimento em cada quadro. Conforme McCloud (2005, p. 67), “os quadros das
histórias fragmentam o tempo e o espaço, oferecendo um ritmo entrecortado de
momentos dissociados”; nossa mente conecta esses momentos transformando-os
em uma realidade contínua e unificada. Também a questão do grafismo,
conforme citou a professora. No caso dos quadrinhos, linhas de expressão podem
147
dar sensação de movimento e existem várias formas de se representar o movimento
em um único quadro.
Nesta atividade, o que fica claro é a ênfase na prática e no aprendizado para
o emprego criativo da linguagem visual. Concepção de ensino que está voltada para
a observação dos elementos formais e desenvolver as habilidades plásticas e
criativas dos alunos. O objetivo fica por conta de ensinar o aluno a representar “o
movimento”. A ausência de planejamento e teoria, justifica-se com o argumento de
que alunos da série, não gostam da parte teórica. O acordo feito entre a
professora e os alunos parece ser válido apenas para assuntos da arte erudita.
Desta forma, as atividades com quadrinhos ficam apenas na prática (ver Quadro 16).
Mesmo que haja similitudes entre essas artes, dentro de uma perspectiva
crítica, caberia discutir conceitos e também pesquisar com os alunos a fim de não
reduzir este aprendizado a fragmentos isolados e ao acaso.
Subentende-se também, no discurso dessa professora, o desejo de trabalhar
com algo que considera mais dinâmico. Conforme disse, para ela, os quadrinhos são
algo muito estático. No entanto, resolve a questão do fazer na prática com “histórias
em quadrinhos”, como uma solução mais fácil, assim como funcionam os
“bloquinhos” referidos anteriormente. meios para se direcionarem os trabalhos
para ambas as artes, tanto tecnicamente, quanto para promover conhecimentos
críticos mais significativos. Mas depende também do professor e seus alunos
promoverem essa busca. Nas teorias da Cultura Visual, supõe-se que
a educação escolar possa possibilitar a aquisição de estratégias de
conhecimentos que permitam ir além do mundo tal como estamos
acostumados a representá-lo por meio de códigos lingüísticos e sinais
culturais estabelecidos e ‘dados’ pelas matérias escolares. (HERNÁNDEZ,
1998, p. 27).
Diante do contexto contemporâneo, na educação para a compreensão crítica
da Cultura Visual, torna-se importante ampliar o olhar investigativo e potencializar
este ensino articulando o fazer prático e criativo com questões históricas e sociais.
Seria também importante promover discussões e reflexões sobre os filmes assistidos
e as produções realizadas pelos alunos, relacionando-as à vida pessoal do aluno.
A terceira atividade surgiu também de improviso, na turma de série. Nesta
prática, aparecem referências acerca de um dos potenciais das histórias em
quadrinhos, utilizado por diversos profissionais da educação atualmente. A atividade
148
descrita, com relação ao ensino de Artes Visuais, ficou em um plano secundário, a
título de preencher um tempo e, ao acaso, transformou-se em um recurso útil, para
resolver outros problemas:
“Uma certa ocasião, eu pedi para eles criarem uma história sobre a vida
deles e eles fizeram em forma de quadrinhos, porque eu havia terminado
de trabalhar e eles acharam melhor fazer isso do que uma redação. A
maioria deles apresentou em forma de quadrinhos. Ali você vê, aparece
tudo, eles aparecem com os nomes dos personagens, aquilo que eles
queriam. Aparece a questão familiar, assim bem forte. Violência na família,
meio que subliminar, nas entrelinhas, mas para ver e até essas histórias
foram levadas para o Conselho. Com base nessa produção, assistente
social e tal, a gente resolveu muita coisa. Foi útil não a nível pedagógico,
mas também a nível emocional, sociocultural do aluno. Problemas deles que
trazem para a escola.” (nº 15).
Um dos entrevistados do estudo exploratório, também citou, muito
rapidamente, que fazia um trabalho regular de produção de histórias em quadrinhos
com a orientadora educacional de sua escola. Seus trabalhos deveriam retratar as
situações, como imaginasse que fossem, como gostariam que fossem e assim por
diante, conforme ia lhe propondo a orientadora.
A vertente terapêutica da arte foi difundida no Brasil desde 1930 e está
intimamente ligada ao movimento da livre expressão. Duas correntes, uma de
orientação psicológica e outra, a expressiva, orientada pela psicanálise, segundo
Fusari e Ferraz (1992), tiveram influências nas concepções estéticas da arte. A auto-
expressão, auto-identificação dos sentimentos, emoções e pensamentos, estavam
associados ao conceito de saúde psicológica e tinham por finalidade o ajuste do
indivíduo à sociedade (EFLAND, 2003). Desta forma justificava-se a arte na
educação. Essa vertente, no ensino de arte, hoje não é mais enfatizada. Conforme o
relato, essa função da arte é delegada a outros profissionais da educação.
A educação pós-moderna, conforme Efland (2003, p. 55, tradução nossa),
questiona esses conceitos à medida que os psicólogos na modernidade
tendiam a estabelecer normas universais inspiradas nas características
particulares de um grupo concreto e [...] até que ponto certas <<normas>>
têm contribuído para reproduzir as condições de falta de igualdade e dar
formas às representações reflexivas dos sujeitos.
No enfoque crítico, as ações educativas, procuram promover o próprio
indivíduo e não sua transformação em mero instrumento que deva se adequar à
sociedade. Um dos objetivos da pedagogia crítica da arte é auxiliar para a
149
compreensão do mundo social e cultural do aluno, através de um exercício para o
desenvolvimento da consciência crítica, não apenas das representações alheias,
mas suas próprias, com vistas à liberdade e autonomia.
Na opinião de Pereira (in CORRÊA, 2004), a prática na Educação Artística,
encontra-se esvaziada de propósitos formativos e está predominantemente
dissociada do complexo da totalidade dos indivíduos. As novas propostas em Arte,
conforme assinala, tentam comprometer-se com a construção integral do indivíduo.
Para esse autor, desde um corte de cabelo, ou roupas, músicas, rituais de romance,
amizade, relacionamento com pais, subalternos, superiores, parceiros, escolhas,
opções, vivências e aprendizagens, etc., enfim, tudo tem uma estética. Porém,
existem conflitos e dificuldades para leituras da estética do cotidiano em função dos
postulados acadêmicos que se produzem nos cursos de formação em Arte.
Segundo Pereira (in CORRÊA, 2004, p. 224), “normalmente os valores
produzidos no dia-a-dia não são reconhecidos como de natureza estética: a
tendência é o enquadramento de origem acadêmico-científica” porque se reconhece
como procedentes e dignos apenas os valores canonizados institucional e
historicamente.
A insatisfação com os resultados relacionados às tarefas propostas também
surge em outro relato, o da professora nº 12, que tem turmas de alunos com
deficiências auditivas. Esta segue os passos citados, tal como a professora 7,
que ensina a fazer histórias em quadrinhos na 6ª e 7ª série: ensinar sobre a
linguagem das HQs, como fazer um personagem, para depois os alunos criarem sua
história (ver Quadro 20). Além disso, a professora 12 costuma utilizar perso-
nagens dos gibis de Maurício de Souza, porque considera que são fáceis para os
alunos aprenderem a ampliar e reduzir desenhos.
A dificuldade desses alunos para fazer histórias em quadrinhos, segundo ela,
está relacionada mais à parte escrita. A capacidade de compreensão visual dos
alunos surdos é mais apurada que a de outros alunos. No trabalho que fez para
ensinar sobre os planos, por exemplo, antes da parte prática, levou imagens de
obras de arte e em cima disso fez perguntas por escrito (ver também Quadro 16):
“[...]. Foi tempo, foi umas duas ou três aulas para eles fazerem isso, para
conseguirem escrever, principalmente os surdos. Na escrita deles eles
comem muitas letras. [...]. E o interessante, é que as turmas de surdos, têm
uma capacidade de compreensão visual muito melhor do que a turma de
ouvintes. Porque para o surdo tudo é visual. Essa questão do primeiro e
150
segundo plano, eles entenderam com mais facilidade do que as outras
turmas.” (nº 12).
A professora considera que ainda não encontrou o caminho para trabalhar
com histórias em quadrinhos:
“Trabalhei um pouco com uma turma, mas é muito pouco. Pelo fato dos
surdos terem essa dificuldade da escrita, não encontrei ainda o caminho.”
[...]
E como você trabalha HQ na 6ª série?
“__ Quando eu trabalhei? Primeiro as partes, o que é onomatopéia, os
balões [...].” (Ver Quadro 20, nº 12).
Para o aprendizado do desenho freqüentemente costuma levar desenhos
prontos e utilizar a cópia como recurso didático:
“Mesmo que eu leve um desenho pronto e meu objetivo seja a pintura. Se
meu objetivo é a pintura e não o desenho, então não quer dizer que estou
dando desenho estereotipado, alguma coisa nesse sentido.”
Eles precisam de alguma referência?
“__ É, exatamente. Principalmente os meus que têm dificuldade. Então eu
levo aqueles livros que tem desenho de bordado. Aí eles fazem assim
mesmo, colocam a folha por cima e copiam, porque eles têm dificuldade.
[...]. E o que eu trabalho com desenho, vamos dizer assim, do Maurício de
Souza, quando eu trabalho é ampliação. Ampliação e redução. Peguei
nesses almanaques do Maurício de Souza, as imagens maiores para reduzir
e as menores para aumentar, que ficassem 1/4 da folha de A4. Daí colei na
cartolina. Eu tenho então esse material, que levo para eles. Em cima disso,
eles fazem a ampliação, com os bonequinhos do Maurício de Souza. Acho
que os desenhos Maurício são fáceis para eles aprenderem a ampliar.
Ampliação assim, sem quadriculado, a mão livre mesmo. [...]. Trabalho
assim, porque histórias em quadrinhos mesmo, têm que ser assim até
aprender.” (nº 12).
A professora 1, formada em Gravura, na Faculdade de Belas Artes, utiliza
recursos didáticos semelhantes. Leva um gibi do Maurício de Souza para cada
aluno, que toma emprestado na biblioteca. Cada um o seu e faz o trabalho
individualmente, baseando-se na revista:
“É assim que eles gostam. Muitos copiam até, mas eu deixo, porque eu
acho que também a cópia ajuda. Até a cópia – colocando em baixo da folha.
Até isso acho que ajuda. Muitos eu digo, olha é melhor olhar e fazer,
ampliar. Aprender a ampliar a imagem. E assim, eu trabalho com a 5ª.”
[...]. Não sei se o que eu estou passando para eles está correto ou não. Na
faculdade também, eles quando mandavam a gente criar uma historinha.
Mandavam observar.” (nº 1).
151
Ambas manifestam dúvida quanto ao procedimento que utilizam para o ensino
de desenho. Uma, (nº 12), refere-se ao uso da cópia como uma justificativa em
função de seu desconhecimento acerca de outras estratégias e da deficiência e
dificuldade dos alunos. Outra, (nº 1), justifica seu uso, por ter ela mesma aprendido
segundo o método tradicional de ensino de desenho. Aparentam ter receio de estar
indo contra a concepção que valoriza mais a criação e a originalidade.
Receio, ou medo, que não seria infundado, porque quase cem por cento dos
professores de Arte, independente de trabalhar ou não com histórias em quadrinhos,
privilegia mais a criatividade do aluno, até mesmo os professores de outras
disciplinas. A professora 2, por exemplo, usa também os gibis para os alunos se
basearem (ver Quadro 20). Mas suas descrições sobre as produções dos alunos, a
partir das obras de arte erudita, indicam que valoriza bastante a criação do aluno:
“Eles fazem uma construção deles. [...]. Fica bem mais enriquecedor do que
você dizer: __ Faça um desenho. Ou um mimeografado pronto: __Oh !
Pinte o desenho! É diferente. Vou trabalhar diferentes técnicas de pintura,
para depois chegar noutro trabalho? Assim estaria fazendo um caminho
primeiro pela técnica. Mas eu quero chegar em algum lugar.” (Ver também
Quadro 16, nº 2).
“Eles criam, ou individual ou em grupo. De alguma forma, eles têm que
passar essa imagem do papel para o corpo, para o teatro, traduzir,
digamos.” (nº 4).
“Com base nas obras da Tarsila, na parte prática, eles vão fazer a
construção deles, colocar o que aprenderam de figura e fundo.” (nº 11).
“As vezes eles só desenham, ou então trabalho com Teatro.”
[...]. Eles ficam livres para fazer no Teatro?
“__ Não, eu dou algumas diretrizes. Tem que ver quais são os pontos que
precisa atingir, primeiro. Daí eles podem fazer, podem inventar. Às vezes é
um trabalho de criação individual, às vezes em grupo.” (nº 13).
“[...] usamos para desenvolver a criatividade deles também [...].” (Ver
Quadros 21 e 25, nº
s
18 A e 18 B).
“Eu dou umas dicas. Normalmente eles usam a criatividade deles essa
parte [do fazer artístico] eu deixo livre.” (nº 19).
O professor 14 faz uso de referências, mas prefere ensinar os passos para
que o aluno mesmo possa criar, mesmo que já tenha alguma experiência (ver
Quadro 20). Duas das professoras (nº
s
5 e 6), nas produções dos alunos, sempre
avaliam em função da criatividade e da originalidade. Outra, 7, enfatiza mais a
criação do produto. Alguns não aprovam a cópia.
152
“[...]. Eles usam a criatividade deles. Mas primeiro a gente faz toda aquela
parte. Faz a leitura, a parte teórica antes.” (nº 5).
“Já trabalhei personagem com aluno, o Batman e disse para reconstruir. Ele
veio e mostrou o personagem: tudo igual. Eu disse que aquilo não era uma
criação. O aluno respondeu que tinha mudado a roupa. Então lhe disse que
tinha incrementado, mas não tinha mudado nada.”
Não criou nada?
“__ Não. Eles vêem uma coisa e acham que é aquilo só. Não saem muito
daquilo. Porque quando alguém faz uma coisa, eles também querem fazer.
[...]. Os estereótipos. O difícil é eles enxergarem que podem criar.” (nº 6).
“Eu trabalho bastante com a criação deles.” (nº 7).
Uma das professoras, 8, nunca fez atividades com quadrinhos. Para ela, o
trabalho de criação livre, é mais importante e evita até influenciar o aluno. Prefere
inclusive deslocar-se de uma escola até outra, carregando materiais para que os
alunos possam fazer trabalhos criativos, do que usar “livrinhos”, como diz:
“Emprestava e levava para a outra escola. Depois devolvia, cansei de levar.
Até restos de material, quando estava quase estragando, porque
realmente não tem. E é uma pena, porque eles têm vontade de trabalhar.
Você leva uma coisa diferente assim, eles estão meio cheios daqueles
livrinhos, sabe? Porque cada professor que entra vem com aqueles
livrinhos.”
[...]
“O que eu procuro fazer com os meus alunos, é que se desvinculem da
cópia. Eu sempre dou ênfase à criatividade. O aluno que cria. Isso porque
em todos esses anos de experiência, a gente tem tido muitos alunos que
dizem que nunca criaram nada. Dizem que são um zero à esquerda: __ Eu
sou péssimo para isso. Tive uma aluna inclusive, que começou e o fazia
nada. Eles estavam trabalhando figura humana [...]. E ela começava e
desmanchava, isso em modelagem. [...]. Então eu disse para ela começar a
observar. [...]. Acabou se batendo, ficou dois meses, mas fez uma figura
humana super expressiva e eu não encostei o dedo.[...]. Veja tudo isso, ela
não se acreditava, mas ela passou a observar, a olhar. Então acho que é
uma questão de envolver o aluno também. Eles têm potencial. [...].” (nº 8).
Com o ensino modernista que preconizava a livre expressão criadora, a cópia
era amplamente rejeitada. Segundo Pillar (1996a, p. 40), “a invenção da fotografia
na modernidade alterou a função da pintura.” Em função disso, aos poucos os
artistas modernos desvincularam-se dos objetos, evitando na obra qualquer
semelhança com o real. Isso “fez com que a inventividade, a experimentação, o novo
se impusessem como necessários na estética da modernidade.” (PILLAR 1996a, p.
41). As vanguardas recusavam qualquer idéia de arte como cópia, ou imitação.
O ensino passou a enfatizar a expressão livre individual, procurando evitar
qualquer influência no processo de criação do aluno. A crença de que a arte das
crianças se desenvolve naturalmente perdurou por quase um século. Desde então,
153
encorajava-se a arte espontânea. Conforme Brent e Marjorie Wilson (in BARBOSA,
2005a, p. 60), “fechava-se os olhos para os desenhos copiados das crianças.”
O interesse pela arte infantil fez com que muitos teóricos voltassem sua
atenção para os estágios iniciais de desenvolvimento. Como resultado, segundo
esses autores, hoje se sabe menos a respeito dos estágios posteriores de crianças
mais velhas e a respeito das influências que recebem pela arte dos adultos.
Para Brent e Marjorie Wilson (in BARBOSA, 2005a), o aprendizado mais
importante está ligado ao processo de perda da ingenuidade em arte - o processo
que envolve a aquisição de convenções artísticas. Esse processo torna-se mais
predominante em crianças de oito ou nove anos em diante e é mais importante de
que qualquer outro no desenvolvimento artístico, porque é o processo que
permanece operacional durante toda a vida.” (WILSON in BARBOSA, 2005a, p. 61).
Existem muitas teorias sobre o processo e a natureza do desenho, mas que,
segundo Brent e Marjorie Wilson (in BARBOSA, 2005a), começam por objetos reais,
ignorando as influências que as crianças recebem desde o início de outras pessoas
e de sua cultura. Por essa razão partem do princípio que o desenho de um objeto
não é uma representação
64
, mas um signo configuracional. Nessa teoria, aprender a
desenhar signos configuracionais é um processo semelhante ao aprendizado de
signos verbais. Aprender a formar e usar signos visuais, como explicam Brent e
Marjorie Wilson (in BARBOSA, 2005a, p. 74), “pode ser considerado coisa análoga
ao ato de aprender formar e usar palavras”, observando e imitando outras pessoas a
desenharem. Esses autores afirmam que sempre existe uma convenção a partir da
qual as pessoas iniciam e consideram que o processo de invenção (de signos
configuracionais) existe também, mas é mais raro e ocorre em torno dos oito ou
nove anos.
Brent Wilson e Marjorie Wilson (in BARBOSA, 2005a) pesquisaram sobre as
influências das fontes externas e o papel que ocupa o processo imitativo no
aprendizado do desenho. Essas pesquisas indicaram que as crianças mais bem-
dotadas em arte, ou avançadas na habilidade de construir idéias visuais e na
representação de coisas, são principalmente aquelas que desenham a partir de
ilustrações e imagens das mídias populares. Segundo esses autores, estes são os
meios primários pelos quais se expandem as habilidades de construir símbolos
64
Conforme Pillar (1996, p.39), esses autores parecem empregar o termo representação, “como uma
cópia do referente pelo sujeito.”
154
visuais. Brent Wilson e Marjorie Wilson acreditam, pois, que não mal em crianças
serem influenciadas pelos professores ou apresentarem comportamento de cópia.
Contudo suas pesquisas também demonstraram que alguns indivíduos são
capazes de empregar vários programas de desenho, isto é, as pessoas não utilizam
apenas uma forma de desenhar. Em sua teoria, esses autores comparam a mente a
um programador para o computador/cérebro. Neste sentido, concebem “o ato de
desenhar ou comportamento de fazer signos configuracionais, como sendo um
programa.” (WILSON, in BARBOSA, 2005a p. 64). Segundo essa teoria, as
discrepâncias na habilidade em representar objetos, ocorrem devido ao uso dos
alguns programas de desenho. Alguns programas funcionam melhor porque estão
em uso contínuo. Os programas desusados, tornam-se inoperantes para os
indivíduos. Isso os leva a dizer que, os usos pedagógicos nas aulas de desenho,
para crianças a partir de 8 ou 9 anos, deveriam centrar-se no maior número possível
de programas de desenho.
Não que se confundir, entretanto, com a teoria de aquisição de
conhecimento, que considera que o indivíduo é moldado pelo meio, e supõe que a
aprendizagem do desenho é um “exercício de cópia puramente mecânico e que o
sujeito registra graficamente o que observa, sem interpretar.” (PILLAR, 1996b, p. 33
- 34). Ou, ainda, conforme Duarte (2000), reduzir o aprendizado do desenho ao
treino de habilidades motoras, por meio de exercícios de reproduzir contornos e
estratégias didático-pedagógicas que oferecem todas as respostas e estabelecem
um padrão estético único a ser copiado.
No construtivismo, acredita-se que o conhecimento emerge de uma relação
dialética entre o sujeito e o objeto. A teoria construtivista, segundo Hernández
(2000), sustenta que o sujeito constrói sua própria compreensão e que as funções
cognitivas têm base biológica, mas também estão fundamentadas historicamente e
culturalmente. Para Hernández (2000, p. 105), isso significa que “em todas as
culturas, os instrumentos não são só utilizados, mas também ensinam.”
Poucos entrevistados chegam a trabalhar outras relações que envolvem as
HQs. Uma das professoras, nº 20, na questão do fazer artístico, não interfere e deixa
livre o aluno, mas enfatiza sua interpretação. Outra, 10, tem uma certa tendência
a considerar outras relações além das formais, apesar disso, não chega a efetivar
trabalhos de interpretação crítica, a ênfase fica no fazer técnico e criativo do produto:
155
“O livro didático, é como o livro literário. Se você ficar só naquilo ali, eles vão
sempre trabalhar sempre Guimarães Rosa. [...]. Não estou dizendo que o
professor não possa usar, mas ele tem que incrementar. No caso das tiras,
é a mesma coisa. [...]. Quando você material didático, por exemplo, que
tem uma série de figuras, de personagens, de situações que não são de
autores conhecidos, eles mesmos vão me criar. Não que não haja um autor
ali, mas não é um autor canonizado, que caiu no gosto do público, o grande
público não conhece. Acho que isso também ajuda o aluno a criar.” (nº 20).
(Ver também Quadros 21 e 23).
“Eu acho bacana você colocar essa questão da HQ, essa variedade que
tem, do Mangá, do cartum, das tirinhas de jornal, toda essa diversidade.
Porque você trabalha a leitura de mundo. Está trabalhando uma coisa que
eles vão ver na banca, vão ver no jornal do pai. E a leitura que você
encontra de problemas sociais que são colocados no gibi, que muitas vezes
eles não percebem, eles passam por cima. Faz você tocar tanto na parte
literária, quanto no desenho. Você vai trabalhar cartum, a variedade de
desenhos, cânone da figura humana, tudo isso.”
Comentário: O Maurício de Souza tem umas personagens novas de
inclusão. Ele está colocando umas figuras novas...
“__ A personagem cega.... a de cadeira de rodas. Acho que é válido. De
alguma forma tem que começar, as vezes a gente olha um pouco torto, mas
acho que é bem válido. [...]. O ano passado a história que eu trabalhei era
referente a crítica social. Esse ano não, era mais pelo cunho da figura
humana, mesmo. Daí consegui trabalhar com seqüência em uma história,
fazer a figura parecida até o final, criação de personagem mesmo.” (nº 10).
O aluno dificilmente chegará por si a compreender outros aspectos conforme
comenta a professora (nº 10), e ainda outros entrevistados, se o trabalho ficar no
plano da linguagem técnica, servindo o tema apenas para inspiração do aluno sem
ser questionado. Segundo Prawat (apud Franz 2005b, p. 3), para que o estudante
não permaneça em conhecimentos incipientes é necessário “intervir nas concepções
dos alunos, para que estes consigam superá-las e transformá-las”, fomentando
outras conexões a partir dos elementos de base de conhecimentos que possuem.
É preciso primeiro que se sintam insatisfeitos em relação a seus conhecimentos,
para daí partirem em busca da compreensão de novas situações. Conforme explica
Prawat (apud Franz, 2005b), não é fácil fazer com que os estudantes cheguem por si
mesmos a este desconforto cognitivo. Para isso, é necessária a intervenção do
professor, que deve auxiliar a formar essas conexões de maneira correta, integrando
conhecimentos prévios com novas informações.
Assim, entende-se que na educação para compreensão crítica, o professor
necessita direcionar sua prática a fim de auxiliar o aluno a interpretar os fenômenos
com os quais se relaciona e explorar como estes influenciam e se refletem em sua
consciência de mundo e de si mesmo.
156
Outra dificuldade que surge quando se fala em abordar as histórias em
quadrinhos, quem destaca são as professoras
s
9, 13 e 16. Aqui surgem
contradições do ensino e não apenas em Arte. Aparecem aqui, os problemas da
falta de formação específica. Essas professoras têm formação em outra área
(Música, Arquitetura e Teatro); segundo o que dizem, crêem que para ensinar sobre
quadrinhos seriam necessários mais estudos. A formação em uma das linguagens
da arte, no entanto, traz o reconhecimento de alguma forma, que para ensinar sobre
a arte, seja qual for ela, é preciso ter preparo e conhecimentos teóricos abrangentes,
como assinalam:
“A história em quadrinhos? Eu nunca me dediquei, me detive muito. Porque
eu vejo tanta especialização que me assusto. Eu acho que não conheço
suficiente para ficar trabalhando quadrinhos. Vejo que tem tanta, tanta coisa
do quadrinho, que eu não me senti muito capaz de mexer com quadrinhos.
[...]. Eu acho que eu peco, que poderia usar mais. é que está aquela
história do professor ter um tempo para estudar. Eu abandonei HQ, por falta
de estudo. Mas acho muito interessante, que tem um grande poder. A
imagem aliada a alguma coisa escrita, tudo isso ajuda. [...].” (nº 9).
“Só que em histórias em quadrinhos - não em HQs - a grande dificuldade
é que muitos conteúdos têm toda uma história, toda uma teoria bem
abrangente. Muitos alunos não têm nenhuma base [...]. Parece que não
tiveram aula de Arte. [...]. Outra coisa, é que a gente não tem livros, não tem
nada, para nenhum dos eixos. Eu trabalho três eixos. Mas não tem material,
tem que pesquisar. Os alunos também têm que pesquisar. Em HQ, é 100%
nada, nada de livros. Eles não fizeram muita coisa neste ponto. Falta
material, para tudo.” (nº 13).
“É uma arte interessante. que eu não me sinto à vontade, porque eu
acho que não domino. Acho que no mínimo tem que saber desenhar para
trabalhar com histórias em quadrinhos, na minha opinião pessoal. E eu não
sei desenhar, eu não tenho o domínio da técnica. Se fosse para eu
trabalhar, teria que estudar bastante previamente. [...]. Mas acho importante,
acho bem interessante, lindo, que eu particularmente não sinto domínio
para fazer um trabalho bem seguro. Teria que ter algum apoio, um suporte
e teria que estudar mais, como tenho feito em geral com as linguagens das
Artes Visuais. [...]. É, muita coisa. Não é saber, é muita coisa, muito
complexo. Tem que ter um domínio, na minha opinião, no caso de
quadrinhos, domínio de cor, de desenho. Por isso acho que a formação é
pré-requisito.” (nº 16).
Por seu lado, a preocupação com conhecimentos específicos, parece não
constranger os professores de outras disciplinas. Muitos docentes realizam
atividades com quadrinhos freqüentemente. Seja para mudar a rotina, ensinar a
língua ou atrair o aluno para o conteúdo de outras disciplinas. Nesses casos,
geralmente a importância é dada para o conteúdo específico que o professor aborda
e o aluno é livre para o fazer artístico:
157
Uso histórias em quadrinhos, para sair da rotina [...]. Se não fica tudo muito
fica tudo muito monótono, preso aos mesmos exercícios, ler o texto,
responder questionário, preencher com dados do texto. Eles gostam de
fazer histórias em quadrinhos. Alguns chegam a caprichar, sem a gente
pedir. Tem alunos que são bem criativos. [...]. O meu objetivo, é fazer uma
atividade em que eles possam sair da rotina. Eu cobro mais o conteúdo que
eu pedi, de Ciências. Algumas coisas eu até peço, como um tamanho,
número de quadrinhos e tal, mas além disso, não. Normalmente eles usam
aquilo que eles conhecem para fazer histórias em quadrinhos. Eu dou
umas dicas. Eles usam a criatividade deles, essa parte eu deixo mais livre.”
(nº 19).
“[...] no meu caso, eu não tenho formação de Artes Plásticas e não saberia
dizer, instrumentalizar o aluno a produzir uma personagem, uma caricatura,
não tenho essa condição. Então eles são livres, em razão da história. Se
eles conceberem a menininha, com uma carinha, um palito e duas
perninhas, eu nem posso e nem tenho a pretensão de dizer, nem de ensinar
o aluno a desenhar, isso não é assim, porque eu não tenho competência
para tal.” (nº 20).
Poder-se-ia dizer aqui que a falta de formação é o maior empecilho de
s
9,
13 e 16, para ensinar sobre esta arte, não fosse pelo fato de que ensinam
normalmente sobre imagens, linguagem visual e obras de arte erudita. Para ensinar
histórias em quadrinhos, o que parece estar pesando mais nesta relação é a
distinção que se faz entre arte erudita e arte popular decorrente do pensamento da
educação modernista e também visão formal de ensino.
A complementação que a professora 16 faz para compensar a falta de
formação específica, prioriza a arte erudita; e o mesmo se pode dizer com relação às
outras professoras, que acentuam esta distinção. Não há tanto um preconceito como
havíamos indagado, no sentido de como apresentam ainda muitos teóricos sobre
quadrinhos, acerca de suas possíveis influências negativas, desconfiança e medo de
que sua leitura possa embotar o raciocínio lógico, a dificuldade de apreensão de
idéias abstratas e ainda outros problemas, conforme observam Rama e Vergueiro
(2004). Os professores entrevistados demonstram em sua maioria, que aprovam o
estudo desta forma artística, porém existe maior tradição em estudar as artes
eruditas e muitos acabam permanecendo com as versões mais seguras da arte.
Na contemporaneidade, o campo da arte se amplia com a dissolução das
fronteiras entre artes eruditas e artes populares. Segundo Efland (2005, p. 177)
“ambas se tornam disponíveis para a apreciação. Porém tanto a arte erudita, como a
não erudita apresentam desafios para o educador.”
158
A arte-educação de cunho modernista, segundo Cary (1998), considerando a
arte como objeto independente e auto-referente, tende a aplicar padrões de bom
gosto e critérios de excelência artística; porém tal arte torna-se isolada do resto da
experiência. A arte pós-moderna faz parte de uma ecologia cultural e seu tema
dominante é a conectividade. A educação pós-modernista “está, potencialmente,
conectada ao resto da vida, porém não tendo limites entre a arte e o contexto social
maior ao qual ela pertence, torna-se bastante difícil escolher o que deve ser
estudado.” (EFLAND, 2005, p. 177-178). A pluralidade das formas artísticas, como
diz Efland (2005), é motivo de confusão para muitos.
Os mecanismos de mercado engendrados pela indústria cultural também
trazem outras questões para o ensino de Artes Visuais. Esses mecanismos
produzem pessoas à imagem de sua própria lógica, tendem a uma padronização,
homogeneização e passividade, integrando as audiências em uma mesma ordem
social. Ao mesmo tempo, tendem a reforçar códigos dominantes e estereótipos
culturais (GIROUX, 2003; STEINBERG e KINCHELOE, 2004; EFLAND, 2005).
Como observa Efland (2005, p. 182), os professores chegam até a perceber a
seriedade do problema, “porém não o enxergam para além das preocupações
diárias das aulas de artes. É possível que digam que não tempo para ensinar
tudo”, como de fato isso ocorre nas falas de muitos dos entrevistados.
No entanto, nos anos vindouros os professores serão forçados a considerar
o impacto de sons e imagens para poder, simplesmente, continuar
ensinando aquilo que estão acostumados a ensinar, pois as imagens na
cultura cotidiana, na TV, em revistas e jornais, criam um impacto direto
sobre as crianças: acabam construindo a visão da realidade delas, formando
valores e crenças, e isso pode não deixar espaço psicológico para desenhar
e pintar, ou mesmo espaço para imagens de qualquer tipo de cultura
tradicional. (EFLAND, 2005, p.182).
Existe ainda, a visão histórica e institucionalizada sobre HQ, que faz por
exemplo, com que uma (nº 9) a veja mais como recurso didático ou pedagógico.
Outra (nº 16) considera que este ensino é essencialmente prático e que é preciso
estar associado ao ensino de desenho e isso também depende de conhecimento
específico. Os discursos de 9, 13 e 16, além de outros entrevistados, também
denotam estar ligados a uma visão de profissional, própria ainda da Pedagogia
Liberal, que considerava que o indivíduo deve assimilar e transmitir as informações
que recebe, atribuindo ao docente e alunos um papel insignificante na elaboração do
159
conhecimento. A educação hoje enfatiza cada vez mais a necessidade da pesquisa
como um processo de contínua construção do conhecimento (HERNÁNDEZ, 1998;
CORRÊA, 2004).
A prática educativa atual é crítica e parte da realidade a fim de promover e
uma formação mais consciente. “Hoje não se concebe um docente que não seja
pesquisador, especialmente em se tratando do ensino de Artes.” (CORRÊA, 2004, p.
12). As relações na prática educativa crítica, são dialéticas, e uma redefinição do
papel do professor como orientador e pesquisador. “Esta nova visão de professor é
considerada por todos aqueles que se envolvem com a formação de docentes e que
comungam da visão crítico-transformadora de educação como um componente
essencial.” (CORRÊA, 2004, p. 14). Para muitos teóricos, a atitude investigatória é
fundamental para a solução de problemas que estamos vivendo no momento.
Corrêa (2004, p. 174), considera que “a apropriação do conhecimento de
forma crítica e criativa, torna possível desvelar e socializar a libertação do aluno
como ser social e participante do processo de ensinar e aprender.” A criatividade é
determinante para a solução de problemas e o engajamento do aluno e a
participação de todos no processo de ensinar e aprender são essenciais para a
construção da cidadania e meios para uma educação democrática.
Para Demo (apud Corrêa, 2004, p. 17) “o professor deve perceber que sem
pesquisa não ensino.” As exigências básicas concernentes a ser um bom
professor de Arte, hoje segundo Hernández (1998, 2000, 2007), Franz (2003, 2004)
e Corrêa (2004), em resumo, requerem:
Levar em conta as relações e inter-relações dos alunos e seu contexto educacional e
sociocultural;
considerar a importância da ligação entre o ensino de Arte e a vida cotidiana;
ter em vista um ensino de qualidade; para isso o professor deve se engajar em trabalhos de
pesquisa, assumindo uma outra postura, envolvendo seus alunos neste mesmo processo e
incentivando o gosto pela pesquisa;
envolver a prática educativa com um sentido crítico a fim de despertar os alunos para uma
formação consciente;
levar em conta o visual como mediador de significados e a interpretação como favorecedora
do conhecimento;
o professor tem a função e a responsabilidade de mediar as compreensões dos alunos sobre
as imagens.
Além das professoras 9, 13 e 16, quase a totalidade dos entrevistados não
associa a pesquisa ao ensino quando se trata de histórias em quadrinhos. Como
resultado, os conhecimentos abordados são geralmente restritos aos elementos
160
básicos das HQs. Ao serem indagados sobre conhecimentos relacionados às HQs
obtivemos poucas respostas que denotassem um conhecimento que ultrapassasse o
senso comum. Somente dois dos professores, 10 e 14, que se aprofundam um
pouco mais na parte teórica dos quadrinhos, e 5 que começou a introduzir-se no
assunto. Com exceção de uns poucos, a maioria costuma confundir HQs com outros
desenhos de humor, e desconhece gêneros, estilos, outras produções nacionais ou
estrangeiras, ou quaisquer outras especificidades desta arte:
“Ai, ai, ai. O desenho, eu acho assim que são, por exemplo, o Bolinha tem
um desenho, a Turma da Mônica tem um desenho. [...]. Como é que vou
dizer?
Mais estilizado?
__ É, porque tem uns assim. Eu nunca fiquei lendo, mas a gente alguns
que tem mais linhas, mais desenho mesmo e esse da Turma da Mônica é
mais simples, não tem tanto.” (nº 1).
“Eu não fiz muito uso dessa idéia de HQ.” (nº 2).
Qual estilo de HQ você gosta mais?
“__ Estilos, seria o quê?”
O que você conhece de quadrinhos, tem quadrinhos diferentes. Você
observa?
__ Ah [...] diante daquele planejamento que eu te passei, eu fiz perguntas a
eles, o que eles gostariam [...]. Eles escolheram o Maurício de Souza.
Mas independente de usar para aula ou não, o que você conhece? Qual
você gosta mais ?
__ No meu caso ?
Sim, tem estilos diferentes, de HQs, qual você prefere ?
“__ Entendi. Vamos supor, eu gosto dos Simpsons. Vejo que é um desenho
contemporâneo. É muito criativo porque envolve toda a família. É um
desenho animado que envolve adulto e criança, é familiar. [...]. Comparado
com a Turma da Mônica, que eu passei para eles, agrada adultos
também.[...]. A Mônica também tem a ver com a questão familiar, porque o
Maurício se inspirou na filha dele, eles [os alunos] conhecem. [...].” (nº 3).
“Eu acredito assim, que seria os que têm para crianças menores e para os
adolescentes, que são aqueles que tem mais violência. Os Mangás
também.” (nº 7).
“Ai, mas isso eu não sei, tipo? [...]. É, para falar a verdade, não conheço
nenhuma [...]. Nunca me interessei em pesquisar.” (nº 15).
Os professores
s
10 e 14, e inclusive 13, abordam a parte histórica dos
quadrinhos. Esta última, muito rapidamente. A professora 10 foi a única
entrevistada que antes de trabalhar na escola com quadrinhos, havia adquirido
alguma experiência com esta arte. Segundo suas palavras, quando trabalhou nas
linhas (estágio)
65
, junto com seus alunos, fez um curso rápido de Mangá na Gibiteca
65
Projeto da Fundação Cultural de Curitiba.
161
Solar do Barão. Apesar de não entrar no histórico propriamente, inclui os conceitos e
diferenças entre os desenhos de humor, a fim de ensinar o que são histórias em
quadrinhos. O professor 14 denota realizar essa parte de modo mais didático,
inicia com o histórico no ensino fundamental e aprofunda o assunto, acrescentando
discussões sobre quadrinhos no ensino médio.
Os critérios de escolha de autor e material de HQs também refletem certa
ausência de pesquisa. também aqui, uma diferença nos critérios de escolha,
entre professores de Arte e professores de Português entrevistados. Enquanto no
ensino de Arte, a tendência é incluir um único autor em todos os ciclos do ensino
fundamental, na disciplina de Português, a tendência é a inclusão de diversas
imagens dos quadrinhos e tiras humorísticas que têm maior destaque nas dias e
que são veiculadas diariamente, no ensino de 5ª a 8ª série. As professoras nº 17A e
17B, elas mesmas, por vezes elaboram
66
a apostila do colégio e conforme seu
depoimento, é com base neste critério que selecionam (ver Quadros 22 e 23).
De concepção mais crítica de ensino, a professora de Português (nº 20),
questiona este procedimento, o mesmo utilizado pela maioria das editoras de livros
didáticos, que em geral apresentam os autores mais conhecidos de tiras
humorísticas e HQs. Procura selecionar em função nas necessidades dos alunos:
“O fato de ter o material didático para uma determinada série, não significa
que tudo aquilo será aproveitado. [...]. Não é porque está lá, que vai ser
utilizada. O diagnóstico da turma, a necessidade da turma é que determina
tudo, de qualquer material didático, não questão daquilo. Mas no caso
específico aí, nem tudo que funciona para uma turma pode funcionar para
outra, então que ter uma sensibilidade para ser a condição de
aprofundar, de análise desse trabalho, dessa imagem que vai formar na
cabeça dessa criatura, enfim, trabalhar com a questão do quadro, da tira, de
uma maneira interessante para ela e para o processo de ensino
aprendizagem.” (nº 20).
No ensino de a 4ª, é comum professores de Português ou professores
regentes usarem os personagens do Maurício de Souza. Todos os entrevistados que
trabalharam no primeiro ciclo (nº 2, 5, 12, 16), antes de entrar para o ensino de Arte,
utilizavam os personagens Chico Bento e Cebolinha para ensinar Português.
No ensino de Arte, os professores escolhem geralmente Maurício de Souza,
por ser autor nacional e pelo fato de ter um desenho mais simples que facilita o
processo de desenho do aluno. Em segundo lugar, uma seleção baseada na
66
No colégio onde estas professoras trabalham, são feitos rodízios entre os professores de cada
disciplina, para a elaboração das apostilas.
162
escolha dos alunos, e ainda critério de escolha de material baseado no que possa
servir de referência para o desenho. O critério de escolher começando pelos artistas
locais, quando se trata também da arte erudita, é um hábito adquirido, não por
todos, mas por muitos professores de Arte, a fim de valorizar os artistas nacionais:
“Procuro citar primeiro os artistas mais conhecidos, principalmente os do
Paraná, depois os internacionais.” (nº 3).
“Primeiro eu pego aqui, o que eu posso trabalhar. Depois que trabalho
Brasil, trabalho com os artistas de fora. Bastante ao redor primeiro, porque
acho que diz respeito ao aluno.” (nº 5).
Com HQs, esta seleção não vai além da escolha local e torna-se muitas
vezes automática em função do que se encontra mais facilmente disponível. A
maioria, como exemplifica 6, considera Maurício de Souza como única, ou melhor
opção (ver Quadro 22):
“Acho que tem muita banalização de histórias em quadrinhos, aqui no nosso
Brasil. Porque o que temos de nosso? o Maurício de Souza. Nós não
temos criadores. [...] A fama do Ziraldo é mais na literatura. temos o
Maurício, se você pensar.” (nº 6).
Waldomiro Vergueiro (2006) professor coordenador do Núcleo de Pesquisas
de Histórias em Quadrinhos da ECA/USP, em entrevista para o Rio Mídia, destaca
que o Brasil é um dos poucos do mundo que ainda possui uma produção de
histórias em quadrinhos infantis. Segundo as informações de Vergueiro (2006), as
revistas de Maurício de Souza, correspondem a 85% do que é produzido para o
público infantil. Os Estados Unidos quase não publicam mais quadrinhos infantis,
para jovens. E há poucos investimentos para este segmento.
Dessa forma, pode-se dizer que é justificável que se trabalhe praticamente
com um só autor, principalmente quando se trata de abordar histórias em quadrinhos
infantis, porque raramente se encontram outras produções, além de Maurício de
Souza. No entanto restringe-se a um único para todos os ciclos. Independente de
trabalhar ou não com quadrinhos, todos os entrevistados, sem exceção, citaram
esse autor.
A presença de Maurício de Souza nas escolas é relevante para a valorização
da cultura local e respeito à infância, particularmente no processo que provoca
perdas de referenciais culturais diante da globalização. Neste contexto, as histórias
163
em quadrinhos brasileiras, segundo Vergueiro (2006), também veiculam modelos e
padrões de comportamento transmitidos pelas outras mídias. Refletem a realidade
urbana dos jovens e a influência da cultura pop, da televisão e outros meios. Para
esse autor, o que de diferente em nossas histórias são algumas características,
por exemplo, de relacionamentos de amizade e de amor e na apresentação de
grupos sociais”, de nossa cultura local.
Steinberg e Kincheloe (2004) assinalam, no entanto, que observadores
críticos estão começando a advertir que novos tempos têm anunciado uma nova era
da infância decorrente das mudanças nas condições sociais e culturais e muitos
ainda não se deram conta desse momento histórico. O amplo acesso da criança ao
mundo da informação e tecnologias digitais altera inclusive a concepção da infância.
A produção infantil indica que a educação tem lugar em diversos setores
sociais e não se limita à escola. Por seu lado, os docentes trabalham exclusivamente
com Maurício de Souza e não levam em conta que a criança hoje tem acesso
ilimitado à televisão
67
, filmes, jogos, revistas e Internet. Existe até certa queixa entre
os educadores, de que poucas as crianças têm pouco hábito de leitura.
Diante da pedagogia cultural que crianças e adolescentes tem acesso, para
Steinberg e Kincheloe (2004), não é possível ir contra simplesmente auto-excluindo-
nos ou excluindo as crianças desta cultura. Para esses autores, é preciso formular
estratégias entre a pedagogia escolar, a produção do conhecimento e a formação da
identidade de crianças e adolescentes, para o resgate de sua própria cultura.
Ao serem questionados acerca das mensagens e valores das diferentes HQs,
15, e alguns dos outros entrevistados, mencionaram o debate como forma de
avaliar essas produções. Contudo são depoimentos contraditórios. A análise sobre
as práticas dos professores, demonstra que são basicamente voltadas para o
aprendizado da linguagem visual e sua experimentação na prática, principalmente
quando se trata de histórias em quadrinhos.
Ao se tentar utilizar outras produções, surgem dificuldades entre os docentes,
porque se conhece pouco a respeito de outros autores e HQs que possam ser
explorados no ensino de Arte. Para ir além da arte erudita, é necessário pesquisar e
67
Segundo as pesquisas da professora Vânia Carneiro (2003), em todo mundo, as crianças e adoles-
centes brasileiros são os que mais assistem TV. Passam mais de três horas por dia em frente da tele-
visão. Disponível em: <www. unb.br/acs/bcopauta/educacao19.htm>. Acesso em: 27 maio 2006.
164
muitos não têm esse hábito adquirido. Alguns, como a professora nº 9, ficam
atônitos quando se vêem diante da diversidade.
Uma das professoras, a 4, embora não ensine sobre quadrinhos, cita a
pesquisa - um dos aspectos hoje que é requisitado para o estudo de qualquer objeto
da arte erudita ou da cultura visual. Isso nos leva a enfatizar que um dos caminhos
possíveis para a busca de outros autores, é também, a pesquisa.
“Primeira coisa, eu mesma nunca fui, desde adolescente, muito de HQ.
Eu não sei o que escolheria. Mônica, do Maurício de Souza, eu acho que já
está muito batido, de conhecido. [...]. Uma coisa que eu escolheria, que eu
sempre gostei seria o Asterix. Acho que além de ser bem humorado, tem
alguma visão de histórico, que se não exatamente, mas leva a eles terem
que procurar, pesquisar. Não levei, mas levaria se fosse para fazer um
trabalho.” (nº 4).
“Eu tinha muito medo de usar histórias em quadrinhos, por isso eu nunca
trabalhei. Porque havia coisas demais. Muitas histórias, eu não saberia
como escolher dentre as melhores que tem. Isso me assustava. Eu acho
que se houvesse algo como um livro, alguma coisa que indicasse com quais
autores começar. Quais seriam os autores indicados para trabalhar com
crianças pequenas e depois as maiores no fundamental. Eu não tinha nada
que pudesse me instrumentalizar para trabalhar com histórias em
quadrinhos. Também hoje, não tenho visto nada que auxilie nesse sentido.”
(nº 9).
“Na questão dos quadrinhos, como vou selecionar material para o aluno que
não influencie negativamente e nem !? É complicado. Mas, acho que tem
que usar o bom senso. Todo material tem seu lado ruim e bom. Bom ou
ruim, é bom para você ensinar os bons conceitos. [...]. Você faz uma
análise, em cima daquilo, cria um debate e tal.” (nº 15).
A seleção de histórias em quadrinhos ou tiras humorísticas, quando se está
diante da diversidade, pode implicar as vezes, em ter que realizar uma pesquisa
prévia. As produções estrangeiras de HQs vão desde as produções norte-
americanas, até quadrinhos europeus e japoneses, os chamados Mangás, que estão
sempre lançando novidades. Existem produções de tiras ou revistas, que
apresentam séries repetitivas com poucas variações pelo fato de serem produzidas
em larga escala. Ou HQs que são publicadas apenas em série, o que impossibilita
adquirir revistas isoladas. Em séries como essas, pode ser necessário realizar uma
busca para saber o que é mais relevante ou representativo na produção, ou mais
relacionado ao tema de interesse que se pretende abordar.
No mercado editorial para adolescentes, segundo as informações de
Vergueiro (2006), “o predomínio das histórias em quadrinhos com base nos super-
heróis e nas histórias americanas é total.” Quando chegam na adolescência, os
165
jovens que cresceram lendo os gibis da Turma do Mônica, não encontram nada, a
não ser produções estrangeiras. Conforme explica, este processo origem a um
circulo vicioso, porque os jovens que crescem lendo os quadrinhos importados, ou
que se formam nessa área, acabam reproduzindo os mesmos formatos e conteúdos.
Para Vergueiro (2006), este é um movimento difícil de ser quebrado e uma
competição desleal para os produtos nacionais. O quadrinho americano do super-
herói, chega ao mesmo tempo em que são lançados o filme e o bonequinho. O
próprio leitor jovem acaba desejando este mesmo tipo de produção, porque é um
material amplamente divulgado e reforçado pelas demais mídias.
Frente à crescente proliferação e ampliação do campo das imagens, uma das
questões fundamentais na atualidade, é que o indivíduo “saiba como ter acesso,
analisar e interpretar a informação.” (HERNÁNDEZ, 1998, p. 79).
Um critério de seleção, dentro da perspectiva da educação para a
compreensão e da Cultura Visual está relacionado aos objetos que tem maior
presença entre as crianças e adolescentes, conforme Hernández (2000). O que não
quer dizer “‘partir dos interesses dos alunos’ e muito menos do que ‘gostariam de
estudar ou saber’.” (HERNÁNDEZ,1998, p. 27). Nessa perspectiva, é importante que
a aprendizagem esteja vinculada a temas que tenham relação com a vida dos
estudantes e que sejam interessantes para sua formação. Na opinião de Hernández
(2000, p. 140), para selecionar as representações que são relevantes para os
estudos, pode-se levar em conta, entre outras características, que: sejam
inquietantes; estarem relacionadas com valores compartilhados em diferentes
culturas; refletirem vozes da comunidade; estarem abertas a múltiplas
interpretações; referir-se à vida das pessoas; expressarem valores estéticos; serem
capazes de fazer o espectador pensar.
Nas concepções mais antigas de ensino, conforme Corrêa (2004), o professor
selecionava os saberes de acordo com sua área específica de conhecimento e
importava-se apenas com os conteúdos de sua disciplina. Cabia a sua
responsabilidade transmitir esses conhecimentos que deveriam ser reproduzidos
pelos alunos. A escola hoje tem necessidade de dialogar com as situações em
constante transformação que afetam as relações sociais e as representações
culturais.
Com os saberes pedagógicos em crise, ampliação e diversificação das fontes
de saber, nas recentes disposições curriculares, têm surgido tendências para o
166
aumento de propostas interdisciplinares e transdisciplinares que, segundo
Hernández (1998), surgem como formas de relacionar conhecimentos ensinados
anteriormente ensinados de maneira separada. “Tudo isso como forma de enfrentar
o dilema da seleção de alguns conteúdos diante da multiplicidade de possíveis
matérias e temas saberes organizados [...] e as diferentes realidades sociais e
culturais” (HERNÁNDEZ, 1998, p. 51), que são possibilidades oferecidas pelas
diferentes disciplinas e principalmente para a atualização dos conhecimentos, e
ainda, que correspondam às expectativas dos indivíduos que se debatem, entre o
local e o global.
As histórias em quadrinhos têm uma linguagem de natureza interdisciplinar.
Como destaca Will Eisner (1989), a diversidade de disciplinas envolvidas na
realização de uma história em quadrinhos, mesmo sendo de tamanho médio,
surpreende. Tanto podem envolver conhecimentos de ordem psicológica, valores e
costumes, quanto técnicas artísticas cinematográficas, cênicas e ainda outras, daí
sua complexidade. Basta ver a professora (nº 2) que intuitivamente, uma vez
direciona para o teatro, outra vez para seqüências de animação.
Alguns professores, (nº
s
6, 18A e 18B), realizam trabalhos de caráter
interdisciplinar, com histórias em quadrinhos. Também 5, participa de projetos
organizados com vários professores da escola, que integram a arte aos mais
diversos assuntos. Uma delas (nº 6) faz esse trabalho, não tanto a fim de criar um
produto novo, mas como uma atitude de troca e envolvimento a fim de
complementar os saberes, no sentido que Fazenda (apud Corrêa, 2004, p. 24)
assinala: “atitude de humildade diante da limitação do próprio saber [...] atitude de
envolvimento [...].”
“Trabalhávamos sempre com interdisciplinaridade. Os professores de
Língua Portuguesa gostam de trabalhar o texto. Então nisso eu ia
trabalhando sons onomatopaicos e as funções que tinham na imagem.
Mostrava como poderia, através do desenho que aquilo se transformasse na
imaginação da pessoa em um som. A professora de português construía um
texto, uma história com os alunos. Nós fazíamos uma interligação.” (nº 6).
As professoras de Matemática entrevistadas realizam atividades com histórias
em quadrinhos que envolvem desde a elaboração de textos, com a participação dos
professores de Português, até a parte artística e estética.
167
Vocês trabalhavam somente dentro de matemática ou também com a parte
artística? Também cobravam a parte estética no trabalho do aluno?
B: ”__ Cobrava sim. O aluno tinha que usar aqueles balõezinhos, como a
gente chama, de uma forma correta. Tanto que pedia até um pouquinho da
ajuda da professora de Arte. Se ele estivesse gritando, se fosse uma coisa
que ele gritava, aparecia uns raiozinhos, se fosse pensamento, com
nuvenzinha, a gente cobrava isso também.”
[...]
Esse trabalho você fez também?
A: “__ Fiz também. Inclusive um ano, fizemos junto com a professora de
Português. Então Português e Matemática trabalharam em conjunto. A
história tinha que envolver matemática, mas todas as falas, toda história e
todo enredo foi corrigido pela professora de Português. E a professora de
Arte, deu essa aulinha para eles dos balõezinhos, como eles iriam utilizar os
tipos de balõezinhos para cada situação.”
B: ”__ Eles capricham.”
[...]
A: ”__ Nós exigimos que fosse com espiral, a propaganda, o anúncio.
Alguns alunos colocavam até cruzadinha no meio. Então era uma história
em quadrinhos que era uma verdadeira revistinha.”
B: “__E nós colocamos em exposição aqui na escola. Os alunos tinham
acesso para ler. Ficaram expostos os melhores trabalhos. Foi bem
interessante.”
A: “__ Estamos fazendo essa atividade, na 7ª série agora.”
[...]
B: __ Mas quando nós trabalhamos com Português, eu acho que houve
uma complementação melhor, porque daí ela corrigiu primeiro a parte dela e
depois passavam para nós corrigirmos a nossa parte.” (nº 18A e 18B).
Vergueiro (2006) acredita que as histórias em quadrinhos devem “ser usadas
nas escolas de forma interdisciplinar, integrando várias disciplinas.” Na opinião
desse autor, não limites para a utilização dos quadrinhos na educação e tudo
deve depender da criatividade do professor na maneira que irá utilizá-los a fim de
atingir seus objetivos de ensino. Rama e Vergueiro (2004) prescrevem seu uso para
todos os professores: “para introduzir um tema que será depois desenvolvido por
outros meios, para aprofundar um conceito apresentado, para gerar uma
discussão a respeito de um assunto, para ilustrar uma idéia” e ainda outros usos.
Quella-Guyot (1994) se opõe a essa idéia, pois segundo ele, se não o
entendimento desta forma artística como arte, o uso dos quadrinhos como meio para
ensinar outros assuntos pode acentuar a idéia de que são uma subliteratura, e,
acrescentando, nesse sentido, o ensino de Artes Visuais, pode ter seu papel
diminuído, ficando à margem deste processo.
Este risco de que fala Quella-Guyot (1994), acerca do que ocorre com os
quadrinhos, parece ocorrer também com a arte erudita. Parsons (1999) cita que têm
surgido, nos Estados Unidos, muitos projetos que visam uma integração de
diferentes disciplinas por meio da arte. Ao fazer considerações sobre o contexto
168
cultural, diz que é algo que se inclui no currículo atual, mas em geral, não é visto
como importante. Em sua opinião, esta é uma visão contemporânea que oferece a
oportunidade de integrar a arte com outras disciplinas. Uma maneira de não reduzir
a arte a mero instrumento para ilustração ou suporte para outros conteúdos
escolares. Ao contrário explica, outras matérias é que se tornam suporte para a arte,
“porque providenciam o contexto necessário para a interpretação.” Parsons (1999)
acredita que, quando a arte se liga com temas como a destruição ambiental, por
exemplo, pode emprestar significado ao conteúdo em história, biologia e outras
disciplinas, ganhando interesse e significado. Com base nestas idéias, conforme o
autor, é que tem surgido uma tendência nos Estados Unidos, para que arte-
educadores exerçam a liderança para reformar currículos escolares como um todo
“por via da integração de diferentes disciplinas escolares e do fornecimento de um
grande número de modos de aprendizagem.”
Mas
a arte e o ensino da Arte, sofreram e ainda sofrem preconceitos por
vincular a aprendizagem ao fazer, ligado aos sentimentos e emoções. Alguns
teóricos em arte-educação alertam que muitas vezes a arte é interpretada como
atividades comuns, ou produtos e que “a Arte pode facilmente tornar-se apenas
‘trabalhos manuais’ para as outras áreas do currículo, se a integração for realizada
sem valorizar os conteúdos de cada disciplina acadêmica.” (GRAUER, 1981, in
BARBOSA, 2005b, p. 352)
68
. Com as HQs, este risco torna-se ainda mais
acentuado, pois são consideradas uma arte popular e sempre houve polêmicas a
seu respeito.
Os discursos analisados indicaram que mais da metade dos professores de
Arte entrevistados, vêem as HQs como uma linguagem artística, mas que ao mesmo
tempo há distinção entre outras artes e a arte dos quadrinhos:
O que você trabalha mais na 5ª e 6ª, e por que?
“__ Obras de arte. Tem chance de explorar mais coisas.”
O quê tem mais chance de explorar?
“__ Um dia para observar como o artista desenvolve suas obras, seu estilo.
Eu estou conseguindo mais com as obras de arte, sabe” (nº 1).
Essa problemática que você trabalhou com obra de arte, poderia ter feito
com HQ ?
68
GRAUER, Kit et al. Imagens para Compreensão: fotografias de Aprendendo através da Arte
(Learning trought the art). In: Barbosa, Ana Mae. Arte/Educação Contemporânea: consonâncias
internacionais. São Paulo: Cortez, 2005.
169
“__ É, poderia. Mas sempre gostei até mais de trabalhar com obras de arte.
A HQ aparece assim, o professor trabalhando.” (nº 2).
“Trabalho [...]. Principalmente com obras de arte.” (nº 3).
“Eu não tenho trabalhado HQ, porque isso a professora de português tem
trabalhado muito, exaustivamente. [...].” (nº 4). (Ver Quadro 34).
“Eu acho que HQ é uma linguagem maravilhosa, muito rica. Lembro, quando
eu tinha mais tempo, eu adorava ler gibi, fotonovelas, eu gostava. Acho
interessante, acho que é uma expressão artística, sim. Não é de todo nem
ruim, nem bom. Eu acho que o problema é se tornar comercial e o problema
de ser comercial é que ela fica descartável, a ideologia muitas vezes se
perde. [...]. Então eu acho que os quadrinhos teriam que ser mais voltados
para a arte e não para o comércio.” (nº 16).
Nas falas de alguns dos professores nº
s
6, 10, 11, 14 e 15, embora entre estes
também haja contradições, parecem ser mais propensos a conceber as HQs como
uma arte, fazendo menos distinções entre esta e outras artes:
“Além da arte dos quadrinhos, também trabalhei com cinema.”
Trabalharam o princípio básico da animação?
“__ Quando trabalhei com cinema. O ano passado, eu entrei no projeto
Fazendo Escola. Nesse projeto fizemos vários trabalhos assim” (nº 6).
“No ano anterior introduzi a questão de que HQ (conhecido como gibi, por
eles) também é arte.” (nº 10).
“Olha, para mim quadrinho é linguagem artística e como linguagem artística
reflete alguma característica do mundo. [...]”
Como você vê essa linguagem com relação às obras de arte ?
“__ Acho difícil isso, eu não consigo separar isso de obra de arte. É provável
para mim... não dou ponto nem a mais nem a menos para isso. Para mim o
gibi está junto, junto do Da Vinci, do Duchamp, de todo mundo. [...].” (nº 11).
“Eu fico até meio maravilhado com a capacidade que o ser humano tem.
Nos quadrinhos a gente percebe isso. Em todas as artes a gente percebe.
[...]. As questões da infância, alguns jogam isso mais forte, outros
trabalham mais com arquétipos, outros com o homem mais idealizado, os
super-heróis. São conteúdos da cabeça humana, que são colocados. Tem
várias cabeças fazendo quadrinhos, por isso tem quadrinho para todo o tipo
de gente. Eu olho assim e acho que é uma riqueza. É um espaço bem
amplo, porque você coisas muito boas, tem coisas muito ruins, muito
negativas. [...]. É o ser humano - o resultado do ser humano.” (nº 14).
“Para mim é arte, pelo fato de que eu também achava que o era. Antes
de entrar na Faculdade eu achava que não. Depois que eu entrei na
Faculdade tenho amigos que trabalham com HQ, mesmo desenho
ocasional. [...]. Acho interessante.” (nº 15).
Talvez se encontre menor distinção entre uma e outra arte, na disciplina de
Português, pelo uso de toda e qualquer imagem como apoio didático para o ensino
da Língua. Não nos estendemos tanto neste ponto com estes docentes, porque
170
nossa intenção era analisar as concepções dos professores acerca dessa arte no
ensino de Arte. Então é possível dizer algo a respeito, porém de modo mais restrito.
Esses professores, segundo seus depoimentos, não trabalham em função das
questões específicas da arte das HQs, assim como história, estilos ou outras
questões afins. Embora seja freqüente, talvez seja engano pensar, que todo
professor de Português, pelo fato de ter a possibilidade de abordar as HQs, através
de material didático, realize “exaustivamente” atividades com a esta arte. Até pode
ocorrer, em alguns casos, conforme observam alguns professores de Arte. Mas em
geral, a disciplina aborda os mais variados assuntos através de textos e imagens e
tem por prioridade ensinar a língua. Da mesma forma, engano seria pensar que
todos os professores de Artes Visuais ensinam “sobre” histórias em quadrinhos, e
aqui, onde foi possível observar de modo mais abrangente, não são tantos e nem
todos, que costumam trabalhar com esta arte. Ao contrário, geralmente os docentes
no ensino de Arte se voltam para a arte considerada erudita.
3.3.6 Conseqüências do estudo para o ensino de Artes Visuais
O estudo contribuiu para ampliar nossa compreensão sobre a relação dos
quadrinhos e o ensino de Artes Visuais, identificando problemas e dificuldades deste
ensino na prática. Além das reflexões críticas realizadas, esboçamos algumas
prospectivas para o ensino de Artes Visuais, envolvendo as HQs. Acreditamos que a
pesquisa realizada também seja útil para que outros professores de Artes Visuais
possam refletir sobre suas práticas em sala de aula.
Na maior parte das vezes, quando questionamos sobre o ensino de histórias
em quadrinhos, as respostas automaticamente associavam este ensino a uma
atividade prática. Como resposta ao problema de pesquisa, podemos dizer que os
professores ensinam a fazer” histórias em quadrinhos e não “sobre” histórias em
quadrinhos. ainda, aqueles que ensinam “com” histórias em quadrinhos. As HQs
são assim concebidas, na maioria das vezes, como trabalho prático manual. Isso de
alguma forma traz um denominador comum para essas atividades em Artes Visuais
e em outras disciplinas. A diferença é que nessas últimas, embora haja as leituras
realizadas pelos professores de Português, com mais freqüência, são utilizadas
também como artifícios para fixar conteúdos, atrair os alunos para as matérias que
171
cansam ou que não gostam de estudar. Como vemos em Quella-Guyot (1994), as
HQs podem favorecer intercâmbios entre professor e alunos e isto, parece ser um
fato, mas não pode ser a única razão para sua presença no currículo escolar.
Desde a década de 1990, o ensino de Artes Visuais passou a ter como
objetivo principal, preparar o indivíduo para analisar criticamente a produção artística
já consagrada e as demais imagens do cotidiano. A vida cotidiana é demarcada pela
proliferação de imagens, e a educação contemporânea requer que ambas sejam
abordadas neste ensino. Talvez nós, os professores de Arte, tenhamos algo a
aprender com os professores de Português, no sentido de incluir a diversidade das
imagens, sem fazer distinções. Segundo Mason (2001), a educação pós-modernista
é aberta para incluir outras formas de arte, bem como as artes populares.
Mas descompasso entre as teorias da educação pós-moderna e o ensino
de Arte Visuais. Mesmo que algumas tendências tenham sido superadas
teoricamente, ainda se refletem no ensino atual das HQs. Pelas evidências
encontradas nesta pesquisa, o ensino é baseado nos ideais tradicional e modernista
que valorizam o aprendizado do desenho, o fazer criativo do aluno e o produto.
Como assinalam Riviere (1987, apud SANCHO, 1997/98) e Efland (2003), mudanças
no ensino ocorrem lentamente.
Em nenhum depoimento houve relatos acerca de práticas que envolvessem
estratégias para a compreensão dos valores, ideologias, crenças, conceitos ou
idéias, códigos ou mensagens que podem trazer as HQs, com apenas uma exceção.
Entre os professores, até existe uma certa percepção de que essas questões
existem, mas no cotidiano do ensino de Arte, não se leva as HQs de fato, para o
plano de interpretação e análise crítica, em conseqüência de desconhecimento de
métodos para estas ações.
Durante as entrevistas, pudemos perceber que, na medida em que há diálogo
sobre conceitos, valores, ideologias e outros aspectos ou assuntos ligados às HQs,
também uma certa mudança na compreensão do professor com relação a essa
arte. O que demonstra a importância da reflexão para a conscientização e a
interpretação crítica, que podem ser estendidas para as aulas de Arte.
Para Corrêa (2004), mesmo com o avanço das ciências da Educação, o fazer
pedagógico ainda permanece enraizado nos modelos acríticos conforme a
Pedagogia Liberal que sustenta a idéia de que a escola deve preparar os indivíduos
para o desempenho de papéis sociais estabelecidos de acordo com suas aptidões
172
individuais. “Logo, a ideologia e a prática docente que envolve o cotidiano escolar
não visam à transformação nem à mudança e sim à manutenção do modelo vigente
de forma acrítica.” (CORRÊA, 2004, p. 13). A prática docente com relação aos
quadrinhos, segue junto com este modelo acrítico.
Neste modelo, segundo Rays (apud Corrêa, 2004), despreza-se a
dialeticidade dos fatos pedagógicos e sociais inerentes à prática educativa.
Enquanto não houver outro posicionamento ou maior compreensão a respeito do
significado da importância de leituras críticas, história e contextualização de outras
artes e imagens além das eruditas, os próprios professores de Artes Visuais estarão
utilizando as histórias em quadrinhos apenas como trabalhos manuais.
Segundo Steinberg e Kincheloe (2004), a excessiva informação da sociedade
contemporânea, bombardeia os sentidos. Tanto adultos como crianças perdem a
confiança em que podem compreender tudo. A interpretação crítica vem a ser então,
uma prática necessária para negociar a identidade do indivíduo e os valores diante
da realidade saturada pelo poder. Neste contexto, as HQs têm também seu papel.
Em muitas escolas, como assinalam Steinberg e Kincheloe (2004 p. 22), “tais idéias
nunca foram consideradas, muito menos discutidas com seriedade.” Entre os
entrevistados, muitos crêem e argumentam que as crianças por si mesmas
compreendem tudo o que lêem ou assistem. Por esta razão, a maioria não tem real
preocupação com relação a conceitos, valores, crenças, ideologias que trazem as
histórias em quadrinhos.
A Pedagogia Crítica, não apenas demonstra a necessidade de desenvolver a
habilidade de interpretar, mas também que os alunos passem a entender os meios
pelos quais eles mesmos consomem e investem afetivamente nas mídias. Além do
desenvolvimento da consciência crítica, conforme Steinberg e Kincheloe (2004, p.
23), esta abordagem pode encorajar a auto-análise, e os estudantes passam a
compreender que muitas das decisões que tomam não são necessariamente livres e
racionais, mas inscritas em um “compromisso físico e emocional relacionado com a
produção do desejo” que leva a todos em direção à “manufatura do consentimento”.
A valorização das leituras centradas em obras de arte consagradas, ou a
concepção de arte baseada no pensamento modernista, faz com que muitos
professores deixem ou não saibam como incluir a leitura crítica de outras imagens
em seu ensino. Quando há ênfase na concepção da arte como linguagem, os
elementos constitutivos das imagens e as leis da composição passam a ser
173
considerados como mais importantes. Como resultado dessa crença, conforme
explica Hernández (2000, p. 100), há maior reforço das “qualidades externas e
materiais dos objetos e se deixa de lado os aspectos simbólicos e culturais com o
argumento subjacente de que os alunos do ensino fundamental não podem
compreendê-los.”
Esses pressupostos modernistas também afetam o ensino de histórias em
quadrinhos que, além disso, fica reduzido à atividades livres, ou treinamento da
habilidade motora. Em geral, o aluno fica limitado a aprender a desenhar um
personagem de modo elementar, distribuir idéias em um espaço determinado,
alguns elementos básicos, ou a fazer inventários de onomatopéias e balõezinhos.
Como exposto durante a avaliação das entrevistas, também muitas
práticas que os docentes associam como sendo de histórias em quadrinhos, quando
na realidade são resultado de produções sem compromisso com esta ou aquela arte.
Essas práticas se caracterizam por insuficiência de aprofundamentos teóricos e dos
conceitos que a envolvem. Em conseqüência de falsas noções sobre
interdisciplinaridade e liberdade do ensino contemporâneo para abertura em abordar
a diversidade de formas e imagens da arte e da cultura visual, muitas vezes os
docentes perfazem um trânsito aleatório entre uma atividade e outra - ou, na melhor
das hipóteses - entre a teoria e a prática, em uma ordem reducionista que acontece
por conveniência, gerando produtos destituídos de significado.
Na opinião de Quella-Guyot (1994, p. 45), para que os alunos o venham a
considerar as histórias em quadrinhos como uma subliteratura, “para começar a HQ
deve deixar de ser um meio de atrair o aluno para que ele se interesse pela
matemática ou pela língua pátria e mesmo ainda um pretexto para fazer digerir
Balzac ou Racine”, assinalando que as histórias em quadrinhos são antes de tudo
uma arte narrativa e qualquer ensino que não considere esse pressuposto a
desacredita. Conforme suas palavras, as HQs têm uma história e também tem seus
“clássicos,” sendo que não é tolice querer estudá-los mais a fundo.
O ensino de histórias em quadrinhos, conforme as evidência encontradas na
análise, segue preso ao passado e não acompanha as transformações que
ocorreram relacionadas às tecnologias digitais nas duas últimas décadas que
ampliam o acesso, particularmente ao público infantil e juvenil. As HQs hoje têm
mais recursos e a vantagem de abordar maior diversidade de assuntos, que podem
ser explorados tanto estética, quanto criticamente. A educação atual em Artes
174
Visuais vem enfatizando o ensino estruturado mediante a articulação entre estética,
crítica e História da Arte. Acreditamos que, para os estudos sobre quadrinhos,
poderíamos acrescentar leituras mais críticas, que levassem em conta o
pensamento da nova História de Arte, noções de código e mensagem e a relação
pessoal e social com produções de HQs veiculadas em diferentes mídias.
Desde a década de 1970, segundo Acevedo (1990) e Quella-Guyot (1994)
quando se passou a incluir as HQs nas escolas, percebeu-se que esta não era uma
arte fácil, então manuais passaram a se encarregar de ensinar a fazer histórias em
quadrinhos. Também se produziram livros dedicados à análise da linguagem e dos
conteúdos das HQs. Enquanto os manuais são de linguagem fácil, estes últimos são
de linguagem austera e inacessível para a maioria, segundo Acevedo (1990). Este
pode ser mais um fator que contribui para a configuração deste ensino, evitando o
acesso para estudos mais aprofundados dos quadrinhos. Muitos professores de
Artes Visuais se queixam da ausência de material que possa auxiliar seu trabalho
nessa área de estudos.
Como é importante para nós que os professores tenham estratégias que
possam trabalhar com essa arte junto aos alunos, e ao mesmo tempo tenham meios
para auxiliar sua educação e formação, acrescentamos uma proposta que possa
servir como base para a mediação de análise crítica de histórias e imagens de HQs.
E, no sentido citado por Acevedo (1990), também possa ser útil, sem ser de difícil
compreensão para professores e alunos. A proposta é educativa e pode ser utilizada
por aqueles que não têm formação específica em desenho, a fim de trabalhar com
ações necessárias para uma compreensão crítica de imagens em contextos de
ensino de Artes Visuais.
175
3.4 PROPOSTA DE INTERPRETAÇÃO CRÍTICA DE IMAGENS DE HQs PARA O
ENSINO DE ARTES VISUAIS
Esta proposta de trabalho fundamenta-se nas teorias da Pedagogia Crítica da
Arte, da Cultura Visual e da Educação, tendências que se fundem nas abordagens
pós-modernistas do ensino das Artes Visuais, segundo Giroux (1997, 2003), Cary,
(1998), Hernández (1998, 2000, 2001, 2003a, 2007), Efland, Freedman e Sthur
(2003), Pollock (2003) e Franz
69
e outros teóricos, citados no presente estudo.
A proposta tem por característica o trabalho de pesquisa interdisciplinar e
transdisciplinar. Baseia-se sobretudo, no Instrumento de Mediação e Análise Crítica,
criado por Franz (2003a) a princípio para uma obra de arte, o qual pode também ser
utilizado como referência para realizar estudos de outras imagens da cultura visual.
Tendo em vista que os indivíduos, ao fazerem uma leitura crítica de imagem, utilizam
diversos âmbitos de compreensão, Franz (2003a) pesquisou esses âmbitos,
ordenando-os para que pudessem ser abordados através de um instrumento, a fim
de ampliar a compreensão em trabalhos de análise interpretativa. A proposta aqui,
tem por objetivo mediar as compreensões dos alunos sobre imagens de HQs,
através deste instrumento, dirigindo-se à professores e alunos do ensino
fundamental, interessados em desenvolver um trabalhos de análise crítica. Não se
trata portanto de reunir uma série de exemplos que podem ser associados aos
conteúdos de outras matérias, mas de abordar outros assuntos em função das
necessidades de contextualização e interpretação da própria imagem.
Tendo em vista que a função da escola não é somente transmitir conteúdos
(HERNÁNDEZ, 1998, 2000), a proposta encaminha estudos sobre as HQs e tem
como meta principal promover a consciência crítica sobre o poder das
representações socioculturais presentes nas imagens, facilitando a reconstrução das
subjetividades, considerando que crianças e adolescentes têm amplo acesso a
outras imagens dos quadrinhos e não apenas àquelas que são abordadas na escola.
69
Franz (2003a, 2003a, 2003b, 2003c, 2003d, 2004, 2005a, 2005b).
176
3.4.1 O significado do Instrumento de Mediação e Análise Crítica de imagens
Imagens produzidas pelas indústrias do entretenimento que impregnam o
cotidiano das crianças e adolescentes, são muitas vezes consideradas como
inofensivas. Desta forma, não lhes é dado o devido valor informativo e formativo.
Todavia contribuem na construção de visões sobre a realidade, transmitem valores e
crenças e modificam a maneira de pensar e atuar no mundo. Franz (2003c) e
Steinberg e Kincheloe (2004) assinalam que crianças e adolescentes dificilmente
conseguem entender isso sozinhas. Segundo FRANZ (2003b, p. 1), “desenvolver
habilidades de interpretação crítica é considerado por muitos teóricos a principal
meta do ensino em arte hoje.” Leituras críticas, conforme Barbosa (2003, p. 19)
podem ajudar “a exercitar a consciência daquilo que aprendemos por meio da
imagem” e as leituras devem centrar-se na significação que esses atributos
conferem à imagem em diferentes contextos.
Entretanto compreender as relações que se estabelecem na própria imagem,
e fazer conexões com conceitos históricos ou artísticos, com o tempo ou a época,
“realidades e formas de pensamento que estão fora do quadro” (FRANZ, 2003a, p.
10) indo além do objeto visível é uma tarefa bastante complexa, não somente para
crianças. Este é um problema que os professores também enfrentam; “no entanto
são desafiados a ensinar a seus alunos algo que muitas vezes eles próprios não
compreendem.” (FRANZ, 2003b, p. 1). Falta-lhes o instrumental necessário,
estratégias para o acesso às diferentes significações complexas e variáveis que as
diferentes obras e imagens apresentam.
Facilitar esta tarefa complexa em contextos de estudos é o que propõe o
instrumento de mediação. O instrumento assume a função de um mediador da
compreensão desejada. Significa a proposta de um caminho que se de percorrer
entre a imagem e a compreensão, através de perguntas e diálogos construídos
dentro de determinadas esferas de conhecimento, chamadas de âmbitos de
compreensão (FRANZ, 2003a). Em outras palavras, significa fazer uma série de
diálogos realizadas em determinados âmbitos, a fim de atingir o conhecimento
desejado, isto é, para alcançar a compreensão. Para isso, o instrumento
fundamenta-se nas abordagens socioculturais, que auxiliam na compreensão crítica
da sociedade e da cultura. Para que esta compreensão aconteça, o estudo não se
177
detém apenas no plano aparente da imagem, mas vai além em busca de identificar
as conexões desta com seu contexto social e cultural de produção e a relação dos
significados encontrados com o mundo pessoal e social do estudante.
3.4.2 Procedimentos na proposta de trabalho com o Instrumento de Mediação
O trabalho de mediação, consiste em elaborar um processo consciente de
problematização, através de perguntas, pesquisas e reflexões sobre a imagem, para
que o aluno possa atingir uma compreensão crítica e autônoma. Na construção dos
diálogos, parte-se do princípio de que "uma pergunta que não problematiza, não
ajuda a compreender", conforme Hernández (in FRANZ 2003a, p. 10), que enfatiza
que a pergunta inicial deve considerar o que sujeito irá aprender com ela. As
perguntas não podem servir apenas para que os alunos digam o que vêem. Como
explica Franz (2003d), devem ir além da identificação pura e simples perfazendo um
trajeto entre o contexto de produção e o contexto de recepção e uma relação dos
significados da obra com o mundo pessoal e social do estudante.
Franz (2003a) ordena os âmbitos de compreensão em âmbito pedagógico,
âmbito biográfico, âmbito estético/artístico, âmbito histórico/antropológico e âmbito
crítico/social, estruturando os diálogos, a fim de levar à compreensão mais holística
e complexa das imagens.
Há que se observar um detalhe importante, que Franz (2003d, p.1) assinala: o
fato de que os diferentes âmbitos não aparecem de modo seqüencial e ordenados
na compreensão de uma imagem, mas sim interligados porque são
interdependentes - ao se trabalhar com os diversos âmbitos surgem relações e inter-
relações entre eles. Faz-se a delimitação destes âmbitos; no entanto a título de se
conseguir um trabalho por etapas e facilitar o aprendizado.
Aqui se propõe que professor e estudantes se envolvam em processo de
pesquisas, mudando suas posturas. "O professor passa de transmissor a mediador,
a organizador do processo de estudos." (FRANZ, 2003d, p. 2). Na medida em que
se trabalham os âmbitos de compreensão os níveis de interpretação vão ficando
mais coerentes e complexos. De modo que não se estabelece um prazo pré-
determinado para a duração e conclusão do trabalho com o instrumento de
mediação, nem um nível ideal de compreensão. O trabalho está sujeito ao interesse
178
e necessidade do contexto de estudos e dependerá das intenções e planejamento
que o professor e cada classe determinarão de acordo com seus objetivos.
O primeiro momento insere-se no Âmbito Pedagógico que envolve a escolha
da imagem e o planejamento. Depois de selecionada uma imagem (de uma história
em quadrinhos), o professor parte para o planejamento do processo de estudos. Em
todo processo de ensino, como recorda Hernández (2000), é necessário pensar na
avaliação da aprendizagem. Hernández (2000) e Franz (2003d) recomendam que a
avaliação seja realizada durante todo o processo desde o início, a fim de
acompanhar as transformações ocorridas nas compreensões dos alunos. Nesse
caso, se propõe que seja realizado em diferentes etapas: 1) Avaliação inicial ou de
sondagem; 2) Avaliação de processo; 3) Avaliação final. O quadro a seguir
representa a seqüência das etapas de trabalho:
Etapas de Trabalho
1. Âmbito Pedagógico: momento para planejar, olhar e fazer
a avaliação inicial ou de sondagem
*
2. Âmbito Biográfico
3. Âmbito Estético/Artístico
4. Âmbito Histórico /Antropológico
5. Âmbito Crítico/Social
Processo de
Pesquisa
Avaliação Final ou Somativa
Avaliação
*
A avaliação final ou somativa também faz parte do Âmbito Pedagógico, ainda que seja realizada em etapa posterior.
Quadro 26 - Etapas de trabalho e avaliação no instrumento de mediação e análise crítica
3.4.2.1 A Imagem: Heróis Renascem Vingadores
A imagem que aqui se propõe para ser trabalhada através do Instrumento de
Mediação de Análise Crítica, é uma imagem de página dupla, da revista mensal nº 5,
da mini-série Heróis Renascem Vingadores
70
, publicada em abril de 1999, pela
Editora Abril Divisão Jovem (Figura 12). A revista é propriedade da Marvel
Entertainement Group e não possui numeração de páginas. Dimensões: 33,7 x
70
Informações sobre Vingadores podem ser encontradas nos sites
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Vingadores> Acesso em: 9 out. 2005, e
<http://members.fortunecity.com/gibionline/htm9/biovingadores.htm> Acesso em: 10 out. 2005.
179
25,7cm. A mini-série possui doze fascículos (ver Apêndice D sinopse desta mini-
série).
A escolha recaiu sobre esta imagem devido à temática de a revista estar
relacionada a questões históricas e problemas atuais, como expansão americana,
política, violência e ainda outras. O personagem Hulk, segundo Cavalcanti (s.d, p.
73) “foi criação de Stan Lee em fins da década de 50”, e Thor foi criado em 1962, por
Stan Lee e Jack Kirby, autores que têm importância para a história dos quadrinhos.
Thor e Hulk são bastante conhecidos do público infanto-juvenil e fazem parte do
imaginário popular. Além de serem encontrados em diversos títulos diferentes de
HQs, esses personagens têm sites próprios na Internet, joquinhos e bonecos, que
crianças utilizam para simulação de lutas em brincadeiras ou fazer coleção. O
Instrumento pode mediar a compreensão crítica sobre o papel que esta imagem, ou
outra semelhante, a critério do professor, tem na construção das identidades, idéias,
valores e crenças de seus alunos, quais as verdades que mostra, interesses e
relações de poder que reproduz.
Durante a seleção de imagens para nosso trabalho, observamos que a
maioria das HQs para adolescentes (em torno dos 13 anos em diante), como por
exemplo, Batman, X-Men, Homem-Aranha e outros, são publicadas apenas em
série
71
. Assim, optamos por fazer a leitura de uma única imagem, e a partir daí
realizar estudos em torno dos personagens, ficando em aberto um trabalho para
classes que tenham condições e interesse em adquirir o material e que não tenham
dificuldade para leituras mais longas. Vale dizer que, em geral, muitos meninos de 7ª
e 8ª séries lêem normalmente este tipo de revista.
A Marvel Comics
72
publica HQs com o Quarteto Fantástico, Homem-Aranha,
Incrível Hulk, Capitão América, X-Men e outros personagens. O Homem-Aranha,
também foi um dos personagens criados por Stan Lee, juntamente com Steve Ditko
em 1963. Para muitos, este é um dos personagens de maior sucesso da editora. Se
o professor e a classe preferirem, esta pode ser uma boa opção de trabalho
73
.
71
As séries podem ser adquiridas em lojas “Sebo” ou através de sites da Internet.
72
Sobre a editora Marvel Comics, ver <http://pt.wikipedia.org/wiki/Universo_Marvel#Hist.C3.B3ria>.
Acesso em: 25 fev. 2006.
73
também outras séries de super-heróis, publicadas para adolescentes pela Marvel e pela DC
Comics (Super-Homem, Batman, Liga da Justiça, Flash, Lanterna Verde etc.). Outros tipos de
personagens e histórias em quadrinhos são publicados por empresas como a Disney e a Cartoon
Network Studios. Atualmente a Cartoon Network Studios desenvolve os antigos desenhos da Hanna
Barbera: Flintstones, Jetsons, Bóbi Pai e Bóbi Filho,Tom & Jerry, Smurfs, etc.
180
Figura 12: Imagem da Revista Heróis Renascem Vingadores, nº 5 abr., 1999. Não paginada.
181
3.4.3 Âmbitos de compreensão
a) Âmbito pedagógico
O trabalho inicia no Âmbito Pedagógico. Esta etapa envolve principalmente o
professor e inclui um processo de pesquisas a respeito da imagem, momento para
determinar os objetivos a serem atingidos. O que se quer aprender e o que as
estratégias didáticas que melhor se adaptem ao nível de sua classe e também, qual
a melhor maneira para iniciar o estudo. Ordenar as perguntas permite que se
construa um referencial para o desenvolvimento do trabalho, mas novas perguntas
poderão surgir conforme o andamento das tarefas e as necessidades do grupo. É
recomendável que o professor tente responder a si mesmo algumas perguntas antes
de começar o trabalho com os estudantes:
1. O que se espera aprender com esta imagem?
2. Quais informações buscar para contextualizar os estudos?
3. Quais informações transformarão o estudo desta imagem em aprendizado e
conhecimento para os estudantes?
4. Quais as estratégias didáticas adequadas para o nível dos estudantes e objetivos
propostos?
5. Que outras imagens e textos podem auxiliar na compreensão?
6. Como saber se os estudantes estão compreendendo, e como ordenar e avaliar a
compreensão desta imagem?
7. O que dizer e fazer ao apresentar a imagem?
8. Esta imagem será suficiente para visualização conjunta em sala?
9. A escola ou os estudantes podem colaborar com outras imagens?
É importante que nesta etapa o professor realize uma pesquisa
74
sobre a
imagem, o que irá facilitar o processo de mediação. Por outro lado, conforme sugere
Hernández (2000), esta pesquisa pode ser realizada em conjunto com os
estudantes, formando com eles um grupo de investigação, em bibliotecas, gibitecas,
livros, jornais, revistas e sites da Internet. Este é o momento de delinear um campo
de estudos para serem trabalhados e da apresentação da imagem para os
estudantes. Apresentar a imagem significa ter um momento para observá-la com
atenção. Desta forma é possível questionar os alunos quanto ao conhecimento que
possuem a respeito dos personagens ou da revista. Ao final desse momento,
74
Dependendo da idade e do nível escolar dos estudantes, estes podem ser envolvidos nesta etapa
do planejamento do processo de estudos e pesquisa. O professor também pesquisa e aprende.
182
pode-se pedir aos estudantes que escrevam um texto sobre a imagem. Esse registro
pode servir como avaliação inicial. Conforme a classe, pode-se solicitar depois que
leiam a história. As perguntas que seguem podem auxiliar a observação sobre a
imagem.
1. Conhece esses personagens?
2. Conhece alguém que gosta desses personagens?
3. Onde costumam aparecer?
4. O que chama mais atenção nessa imagem?
5. O que os personagens estão fazendo?
6. Quais suas idades? De onde eles são?
7. Quais suas aparências?
8. Qual é a história que estão contando?
9. O que pensa a respeito deles?
b) Âmbito biográfico
O trabalho nesse âmbito faz uma aproximação com o aluno, relacionando sua
vida com a imagem. Conforme Franz (2003b) procura resgatar a unidade entre
história e sujeito, conectando o ensino e a aprendizagem da arte com uma prática
pedagógica que visa alcançar a cidadania e autonomia do aluno. Produtos culturais
não são apenas entretenimento, porque estão ligados a certas formas de satisfação
dos desejos através da fantasia (SILVA, 2002). Os alunos devem ser incentivados a
questionar sua própria biografia e modos de vida para que possam refletir e analisar
seu próprio meio. As perguntas podem ajudá-los a compreender qual o papel que a
imagem possui em sua vida, relacionando os significados encontrados na imagem
com sua história pessoal, procurando em sua própria vida referências que o ajudem
a interpretar a obra (Franz, 2003d). Além das perguntas que colocamos, o professor
pode elaborar outras, de acordo com a situação.
1. Já conhecia esses personagens de revistas em quadrinhos, ou de algum outro lugar?
2. Onde costumo encontrar desenhos com esses personagens?
3. Quais são meus super-heróis preferidos? São diferentes dos personagens da imagem ?
4. Imito, já imitei, ou já brinquei com algum desses personagens?
5. Quais os significados encontrados na imagem que influenciaram meu modo de vida?
6. Como é que alguém é levado a pensar que os norte-americanos seriam “super-
poderosos”?
7. Como vejo as atitudes representadas pelos personagens dessa imagem?
8. Como a violência, na realidade interfere em minha sala de aula, escola ou minha vida?
9. O que penso sobre a violência?
10. O que posso aprender com essa imagem?
183
c) Âmbito estético/ artístico
Obras de arte são sistemas de representações convalidados e aceitos por
determinados grupos sociais, através de códigos simbólicos, referências culturais,
influências de outros artistas e tendências estilísticas (FRANZ, 2003d). Apesar de
possuírem um lado fortemente comercial, as HQs também contêm códigos aceitos
por determinados grupos e são produtos de uma época e um lugar. Podem
pertencer a gêneros diferentes, tais como fantasias de superpoder, autobiografias,
ficção científica, animais cômicos, aventuras, etc., possuindo estilos que podem
variar desde os mais realistas, até os mais icônicos
75
. O gênero super-heróis,
segundo McCloud (2006) possui características estilísticas e estruturas narrativas
próprias e em geral o estilo enfatiza anatomias musculosas.
1. O que foi desenhado nesta cena?
2. Qual o estilo utilizado pelo desenhista? Simplifica e/ou cartuniza os traços? É realista ou é
um estilo intermediário entre o realismo e o cartum?
3. Quais são as características físicas dos personagens?
4. Que tipo de roupas os super-heróis costumam usar ?
5. Quais os elementos usados na imagem que dão expressão à cena?
6. Qual a função das cores empregadas na imagem? E no personagem Hulk?
7. O que o desenhista que criou esta cena precisava saber para poder desenhá-la? Quais
materiais ele usou?
Produzir HQs é assunto complexo e requer habilidades diversificadas. Em
geral, muitas pessoas trabalham para que uma revista de histórias em quadrinhos
possa ser produzida. Com a colaboração de Jack Kirby, Stan Lee
76
criou os
personagens Hulk, Thor e outros que fazem sucesso até hoje. Profundo conhecedor
de técnicas cinematográficas e de noções dinâmicas da perspectiva, Jack Kirby foi
um inovador das HQs. Antes dele, poucos artistas inovaram nas HQs. As primeiras
histórias em quadrinhos utilizavam quadros e planos invariáveis (Quella-Guyot,
1994). A partir de então, as histórias em quadrinhos que se mantinham presas a
seqüências simples passaram a fazer uso de splash pages
77
e páginas duplas.
Delimitar os estudos práticos pode facilitar o aprendizado e emprego dos
conhecimentos na prática. Para desenvolver uma compreensão mais complexa
75
Segundo Quella-Guyot (1994, p. 128), “a maioria das HQs podem se considerar dotadas de
realismo, que varia de acordo com o grau de exatidão da representação gráfica.” Para McCloud
(2006, p. 44) há também, os estilos híbridos (ou semi-realistas, conforme o termo utilizado por alguns
autores), que associam “personagens muito cartunizados e fundos quase fotográficos.”
76
Ver <www.devir.com.br/marvel/autores_stanlee.php>. Acesso em: 24 de fev. 2006.
77
Splash Page: página de abertura, ou de um único quadrinho que procura criar impacto visual.
184
neste âmbito, é interessante fazer visitas a ateliês ou de editoras onde são
produzidas HQs, para que os alunos compreendam o processo. Também pode ser
interessante receber visitas de profissionais desta área, que costumam divulgar seus
trabalhos em escolas. Após este percurso, é importante partir para um trabalho
prático de produção de histórias em quadrinhos com os estudantes. O fazer artístico
é uma excelente estratégia de compreensão. Pode-se realizar um trabalho prático
nesta fase e também ao final do processo, para fins de avaliação e comparação,
depois dos estudos nos âmbitos histórico/antropológico e crítico social, ou trabalhar
com este âmbito somente ao final do processo. Conforme Hernández (2003a, p. 12),
os alunos podem elaborar HQs “como respostas e como modo de diálogo” com a
imagem estudada. Recorda-se que nas teorias atuais do ensino de Arte o fazer
artístico deve estar associado de maneira criativa com as problemáticas abordadas
durante os estudos.
d) Âmbito histórico/antropológico
Na história da Cultura Visual, existem motivos e intenções para que se
fabriquem produtos para entretenimento. HQs são vendidas principalmente para
divertir e entreter. Através de seus personagens, os quadrinhos retratam situações
vividas ou revelam anseios e desejos com os quais os leitores se identificam. Por
trás disso está o poder do mercado. Como objetos artísticos, as imagens da Cultura
Visual também possuem funções e significados implícitos elaborados pela própria
sociedade que a produziu, de modo que histórias e personagens refletem valores,
crenças e ideologias de seus autores, editoras ou grupos. Valores, crenças e
ideologias nem sempre estão evidentes na imagem. As perguntas aqui têm como
objetivo fazer com que os professores possam auxiliar os alunos na compreensão do
contexto cultural que a imagem/revista foi produzida e a relação desse contexto com
os significados da imagem.
1. Qual editora produz essa revista?
2. Onde se localiza e há quanto tempo existe?
3. Quem são as pessoas que produziram essa revista?
4. Em quais lugares o(s) autor(es) se inspirou para criar os cenários da revista?
5. Quais são os valores, crenças ou ideologias veiculados através dos personagens da
imagem, presentes no imaginário sociocultural contemporâneo?
185
6. Quais as estratégias que a revista utiliza para manter e vender seus produtos aos
leitores?
7. Por que existem 4 títulos de revista nessa mesma série?
8. Por que compramos esses produtos?
9. As idéias veiculadas pela revista interessam para nossa sociedade? Por quê?
10. Em que sentido esta imagem ajuda a compreender o homem contemporâneo? E a
história?
e) Âmbito crítico/social
Neste âmbito, procura-se entender como a imagem pode ajudar na
compreensão de temas e problemas da sociedade à qual a imagem e espectador
estão vinculados, porque as imagens da arte e, neste caso, as HQs são
compreendidas como representações da sociedade e da cultura.
Os heróis conhecidos das histórias em quadrinhos são em sua maioria
homens: Super-Homem, Batman, Homem Aranha, Hulk, Thor, Demolidor e outros,
que expressam narcisismo e onipotência masculina. Apenas recentemente “diante
das várias faces do espectador do século XXI”, uma tendência que surge em
Hollywood para a criação e inclusão de heróis de ambos os sexos, mas segundo
Housel (2005, p. 84), ainda baseados em regras e éticas masculinas.
Para Freedman (2001) e Pollock (2003), é fundamental detectar
inadequações e limitações culturais ideológicas estabelecidas por legendas
canônicas nas artes que disseminam conceitos de supremacia e narcisismo
masculinos, através de leituras críticas que possibilitem transformações nas
percepções e desejos, resistindo a todo tipo de separação e categorização a fim de
produzir um desejo para a diferença, ao invés de identidades nacionais, culturais ou
genéricas. Segundo Franz (2003c), "as perguntas devem ser contextualizadas para
a sociedade da época" em que a imagem foi produzida, relacionando os significados
desse contexto com a vida do aluno (contexto de recepção). Compreender é algo
mais do que uma habilidade rotineira automatizada (PERKINS, in WISKE, 1999). O
trabalho deve ajudá-lo a compreender o meio social e cultural em que vive, de forma
reflexiva e crítica. Essa é a meta dos estudos em Artes Visuais em que a arte é
compreendida como uma representação sociocultural (Cary, 1998; Hernández, 2000;
Franz, 2003a; Efland, Fredman e Sthur, 2003; Chalmers, 2003). As perguntas devem
ajudar os alunos a saírem do nível ingênuo de compreensão, para superar as
respostas de senso comum (Franz, 2003a).
186
1. Que poderes os personagens Thor e Hulk estão representando?
2. Conhece super-heróis nacionais? Quais?
3. Existem heroínas ou super-heroínas no grupo dos super-heróis da revista?
4. Quais são as características, qualidades ou defeitos dessas personagens femininas?
5. Quais os tipos de inimigos que os super-heróis da revista enfrentam?
6. Quais as influências da cultura americana atualmente no mundo?
7. Qual a influência dessa cultura em nossa sociedade? Afeta nosso estilo de vida, nossas
idéias, comportamentos e o que pensamos sobre nós?
8. Cenas semelhantes as da imagem, acontecem na realidade?
9. Quais os tipos de guerra ou conflito que são produzidos em nossa própria sociedade?
10. Quais os efeitos da violência para uma sociedade?
3.4.4 A avaliação e as compreensões
Na avaliação é interessante recordar que as pessoas interpretam em
diferentes níveis, diferentemente umas das outras. Conforme Parsons (1987, apud
HERNANDEZ, 2000), os estágios de desenvolvimento de apreciação estética, estão
relacionados com as idéias sobre um determinado objeto ou tema que o indivíduo
vai adquirindo ao longo da vida. As interpretações dos significados de uma imagem,
segundo Franz (2003b, p. 1), apresentam diferentes níveis de complexidade e vão
desde as mais superficiais, parciais, fragmentadas e errôneas até as de nível
superior, mais holísticas, críticas e complexas:
1. Nível ingênuo 2. Nível principiante 3. Nível aprendiz 4. Especialista
Prevalecem as idéias
intuitivas e míticas.
Acredita ser desnecessário
conhecimento específico
para interpretar.
Mistura de crenças intuitivas
sobre a imagem, com
fragmentos de
conhecimentos, mas
prevalecem as idéias
intuitivas. Não chega a
estabelecer relações
significativas.
Fértil rede de idéias prévias
sobre a obra/imagem.
Compreensão inicial da
obra/imagem como uma
produção cultural que traz
implícitas representações
socioculturais.
Estabelece numerosas
relações entre dados,
contexto de produção e de
recepção. Emite juízo
próprio, demonstrando
consciência crítica.
Compreensão autônoma da
realidade.
Quadro 27 - Níveis de compreensão, segundo Franz (2003a)
Depois de pesquisar sobre a compreensão, Franz (2003a, p. 283-288)
apresenta quatro níveis básicos de interpretação: ingênuo, principiante, aprendiz e
especialista. O Quadro 27 resume os níveis de compreensão, demonstrando que
terão variações de indivíduo para indivíduo. Para o professor é importante conhecer
o nível de compreensão inicial dos estudantes para levá-los a fazerem progressos
alcançados na compreensão, durante os estudos. Descobrir o estágio em que uma
pessoa se encontra, conforme Hernández (2000, p. 113) “não implica classificar
187
esse indivíduo, mas sim situar o 'lugar' em que se encontram suas idéias em torno
da temática que se aborde em cada caso”, para que o professor possa auxiliar o
desenvolvimento da compreensão desejada.
3.4.4.1 Avaliação inicial, avaliação de processo e avaliação final
a) Avaliação inicial ou de sondagem
É essencial para obtermos uma noção prévia do conhecimento que os alunos
possuem a respeito da imagem. Esta avaliação tem por objetivo, encontrar
concepções equivocadas, fragmentadas, pobres, preconceitos, suposições,
limitações na base de conhecimentos e outros problemas que possam surgir nas
compreensões iniciais (FRANZ, 2003d). Servirá também para uma análise pessoal
do aluno e posterior avaliação do professor sobre o progresso da compreensão
alcançada, ao final do trabalho.
b) Avaliação de processo
O estudo pode estender-se por dias ou semanas (FRANZ, 2003d). Como esta
avaliação tem por objetivo acompanhar a passagem de uma compreensão ingênua
para uma compreensão mais profunda e complexa sobre a imagem estudada, é
recomendável que os alunos arquivem e registrem em diários ou portfólios
78
os
trabalhos e outras tarefas realizados durante o processo de estudos.
Esta atitude facilitará a visualização do próprio aluno e também do professor
acerca do percurso que este realizou, suas evoluções e transformações ocorridas na
sua compreensão. Hernández (2000) sugere que o professor empregue durante o
processo, a avaliação formativa. Este tipo de avaliação requer que o professor
realize uma tarefa de ajuste entre o processo de ensino e o de aprendizagem, para
78
Portfólio, segundo Hernández (2000, p. 164), é “uma modalidade de avaliação retirada do campo
da arte.” Em geral, artistas interessados em participar da seleção para exposições ou para outras
situações, costumam montar pastas (portfólios) com mostras de seus trabalhos. No ensino de Arte, os
portfólios, não necessariamente irão apresentar produtos acabados como os artistas, mas produtos
“em processo”. Podem ser definidos como uma coleção ou reunião de diversos documentos, tais
como anotações, trabalhos escritos, práticos, fotos, avaliações e outros. Conforme Gardner (1994,
apud HERNÁNDEZ), é uma maneira para auxiliar a identificar questões relacionadas ao modo como
os estudantes realizam os objetivos de sua aprendizagem.
188
ir-se adequando à evolução dos alunos e ir estabelecendo novas pautas de ação a
medida em que ocorre a aprendizagem. Nesta avaliação, como explica Hernández
(2000), na análise dos trabalhos dos alunos, é muito menos importante considerar se
estão bem ou mal realizados, do que levar em conta a exigência cognitiva das
tarefas propostas e detectar erros conceituais e outras relações que posam surgir de
improviso.
c) Avaliação final
Nesta avaliação, Hernández (2000) recomenda uma avaliação somativa, não
no sentido de medir êxitos ou fracassos, mas como um meio para que os
professores possam também avaliar suas próprias tarefas, além de avaliar o
progresso ou as dificuldades dos alunos. A avaliação somativa, segundo Hernández
(2000), sintetiza um tema de uma série e permite que o professor reconheça se os
estudantes atingiram os resultados com relação ao trabalho proposto. Alguns
professores podem preferir solicitar como avaliação somativa uma atividade
semelhante à da avaliação inicial, para comprovar se as concepções dos alunos se
mantiveram ou se modificaram e evoluíram. O professor pode ainda, solicitar um
trabalho prático de história em quadrinhos, para fins de avaliação final que envolva
as habilidades práticas o senso crítico desenvolvido durante o processo. Isto é,
associando o trabalho final de avaliação com a produção e os estudos realizados
durante as etapas de trabalho.
O instrumento de mediação e análise crítica mostra um caminho possível para
favorecer a tomada consciente dos estudantes sobre si mesmos, as imagens dos
quadrinhos e suas relações com o mundo e a realidade. Por outro lado, não é um
roteiro prescritivo. As seqüências não precisam ser seguidas na ordem em que
foram apresentadas, e o trabalho não precisa se restringir ao que está proposto. Ao
contrário, deve ser adaptado para cada contexto de ensino, modificando-se ou
acrescentando-se tópicos de estudos conforme as necessidades de cada turma e a
critério do professor.
189
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os estudos teóricos, os depoimentos e diálogos, foram úteis para ampliar
nossa compreensão pessoal a respeito da relação entre as HQs e o ensino de Artes
Visuais. À medida que aprofundamos as análises esta questão se tornou mais clara
para nós. A participação em cursos de HQs como ouvinte ou como professora
também contribuiu para este processo. Da mesma forma que ampliou nosso
conhecimento sobre o tema problema estudado, esperamos que a pesquisa amplie
a compreensão de outros professores a respeito dos estudos em torno das HQs, em
situações de ensino das Artes Visuais.
É importante assinalar ainda que, no decorrer da análise, foram surgindo
novas perguntas sobre o ensino das histórias em quadrinhos, e as relações que se
produzem em seu entorno, além de outras sobre a própria arte dos quadrinhos,
deixando em aberto questões que podem ser investigadas futuramente.
A análise revela práticas de ensino relacionadas às histórias em quadrinhos,
apegadas à concepção tradicionalista da educação e voltadas para o aprendizado
de habilidades técnicas do desenho e da criação livre, teoricamente superficiais e
que não fomentam conhecimentos críticos, confirmando indagações feitas no início
da pesquisa. Conforme Hernández (1998), a aprendizagem vinculada ao fazer, à
atividade manual e à intuição também são formas de aprendizagem. Segundo esse
autor, embora a psicologia cognitiva tenha valorizado mais a aprendizagem
conceitual, deixando de lado as atividades manuais e artesanais, estas também
podem recuperar “toda uma série de habilidades que nossa cultura tende a
menosprezar” (HERNÁNDEZ, 1998, p. 86) e ainda podem dotar os alunos de novas
estratégias e possibilidades para dar respostas às necessidades que encontram em
sua vida, se estiverem vinculadas a projetos de ensino direcionado para tais
objetivos.
190
A tendência para o ensino conceitual, citada por Hernández (1998), talvez se
encontre mais relacionada ao ensino da arte erudita. No caso da arte dos
quadrinhos, o ensino indica estar menos ligado a conceitos e mais apegado às
atividades manuais e espontâneas. Como destaca esse autor, o fazer manual ou
técnico e a educação para a compreensão crítica são ambas importantes para o
ensino da arte dos quadrinhos. Porém os professores “esquecem” que esta arte
também está ligada a valores, conceitos, idéias e crenças e, segundo os relatos, não
trabalham de modo crítico com estas questões e não as trazem para debate. Diante
da diversidade de produções e conteúdos no universo das histórias em quadrinhos,
os professores não se posicionam a seu respeito e não as incluem nas aulas.
Quando as HQs são trabalhadas no ensino de Arte, os professores em sua
maioria, o fazem apenas com um autor - Maurício de Souza - em todas as séries do
ensino fundamental, porque seus desenhos são claros, simples e fáceis para os
alunos e, de maneira implícita, indicam sua aceitação pelo fato de possuir
características educativas, geralmente associadas ao ensino da Língua e a
valorização de um trabalho nacional.
Grande parte das práticas analisadas, que usa personagens da Turma da
Mônica, porque os alunos gostam deles, encaixa-se nas proposições da perspectiva
da satisfação, citadas por Hernández (2007). Como explica esse autor, a ausência
de um trabalho crítico e reflexivo faz com que os professores acabem validando
prazeres ao invés de estabelecer perspectivas educativas que ofereçam às crianças
e adolescentes meios para discernimento criterioso, diante de questões morais,
sociais e éticas. Além disso, como observa David Buckingham (1993 apud
HERNÁNDEZ, 2007, p. 68), os professores não fazem mais que deixar os
estudantes permanecerem onde estão.
Acreditamos que seja válido, que os professores tenham essa preocupação
em selecionar conteúdos que consideram interessantes para os estudantes e que
valorizem a cultura local. No entanto é uma forma um pouco limitada de trabalhar,
pois permite apenas o entendimento de um único sentido ou uma visão única, o que
não impede o contato dos alunos com a diversidade das HQs em seu cotidiano, que
hoje não ocorre somente por meio das revistas. Como Steinberg e Kincheloe (2004)
assinalam, não adianta nos autoexcluir da cultura que nos cerca, como se esta não
existisse. Não basta apenas transmitir técnicas ou ficar apegado a um só autor.
191
Segundo Freire (1979, 1997), Hernández (1998, 2000, 2007), Giroux (1997,
2003), Chalmers (2003) e Pollock (2003), entre outros teóricos, não existe educação
neutra. É interessante que os valores utilizados pelas diferentes culturas com as
quais estamos envolvidos sejam questionados, para que os alunos aprendam a
refletir e a emitir julgamentos próprios a seu respeito. Assim como considerar que a
prática pedagógica é também política e não se reduz ao processo de ensino-
aprendizagem. O que implica, segundo Hernández (2007, p.39) “prevenir-se dos
discursos que procuram, sob a aparência da neutralidade e de objetivismo, delinear
visões do mundo e de representações do sujeito que excluem e deixam à margem
muitas das representações identitárias existentes.” Recorda Hernández (2007) que
muitas das formas de representação marginalizadas, contribuem de maneira
poderosa para a construção das subjetividades de crianças e adolescentes.
O estudo demonstra que os docentes pouco levam em conta as premissas da
educação pós-moderna que buscam não fazer distinções valorativas entre a cultura
erudita e a cultura popular. Tampouco consideram a necessidade da pesquisa e sua
importância como mediadores de conhecimentos dos alunos. Conforme Freitas
(2006, p. 3), existe um descompasso entre o que muitos professores introjetaram
sobre o significado de ser professor e o que se espera do profissional docente na
atualidade. Como destaca essa autora, a nova postura do professor como mediador
dos saberes, possibilita o intercâmbio e o encontro com as pessoas. Para o aluno,
conforme Franz
79
, Freire (1979, 1997), Hernández
80
e Corrêa (2004), a mediação,
facilita a construção de novos conhecimentos.
Segundo Freitas (2006, p. 3), muitos professores permanecem presos ao
passado e a um modelo romanceado de formação, “onde não espaço, nem
tempo disponível para novas demandas e novos conhecimentos.”
Hoje ainda é comum pensar apenas em revistas quando se fala em histórias
em quadrinhos, pois somente a partir da década de 1990, com a popularização da
Internet, fanzines e tiras humorísticas passaram a proliferar rapidamente na rede,
depois de um tempo em que se acreditava que esta arte deixaria de existir. Poucos
de nós se deram conta disso, pois a preocupação de que as HQs migrassem
integralmente para as novas tecnologias, na opinião de McCloud (2006), faria com
que muitos leitores de revistas em quadrinhos os abandonassem. Conforme alguns
79
Franz (2000, 2003a, 2003b, 2003c, 2003d, 2005a, 2005b).
80
Hernández (1998, 2000, 2003a, 2005, 2007).
192
editores, parece que isso não aconteceu. As produções e o mercado das HQs, hoje,
ao contrário, experimentam um período de reaquecimento, ampliando o número de
leitores. Os avanços tecnológicos das mídias digitais permitiram novas conquistas
para a sociedade e para a arte dos quadrinhos, mas também trazem novos
problemas e desafios para o ensino e para os educadores.
Para alguns pesquisadores das novas tecnologias aplicadas às HQs, a
Internet pode funcionar como um espaço democrático, como afirma Edgar Franco
(apud MAGALHÃES, 2004, p. 108), para quem a “Internet aponta para uma ruptura
da hegemonia das grandes editoras, [...] indicando uma nova tendência para o
mercado das HQs impressas em todo o mundo.”
Para outros teóricos, como Frohne (2001), a realidade hoje contrasta com o
discurso inicialmente otimista, no qual as novas tecnologias trariam uma igualdade
ideal, acima dos limites nacionais intelectuais, e livre dos papéis de gênero. Para
essa autora, a rede está se transformando em um campo de batalha de interesses
de poder e segmentação e principalmente em um lugar de acumulação de capital,
enquanto afasta um grande número de pessoas incapazes de se conectarem, por
condições psicológicas, idade ou classe social.
Conforme Papert, teórico da inteligência artificial (apud FREITAS, 2006), tanto
os avanços tecnológicos podem ser colocados a serviço da solidariedade social,
quanto ampliar a sede destruidora pelo poder. Segundo Freitas (2006, p. 1), hoje os
seres humanos se encontram perante um duplo desafio: “ou permanecem presos
nas armadilhas tecnológicas, que direcionam a vida em sociedade através da
produção e do consumo desenfreado de bens, ou podem avançar rumo ao convívio
solidário”, unindo as tecnologias aos processos de subjetivação humanos.
Décadas atrás
81
, questionavam-se as histórias em quadrinhos, porque se
considerava que eram prejudiciais para o aprendizado da leitura e eram um meio de
alienação cultural (SCARELI, 2003; JUNIOR, 2004). A despeito disso, o meio em
que vivemos tornou-se essencialmente visual, e hoje as HQs ocupam espaço cada
vez mais amplo na Internet. A cada dia, um número maior de crianças, segundo
Steinberg e Kincheloe (2004) compartilham do mundo adulto através da hiper-
realidade da mídia eletrônica e das mídias digitais.
Conforme esses autores, as mídias e novas tecnologias digitais alteram
profundamente o modo de aquisição de conhecimentos da criança e até mesmo o
81
Ver item 1.2 – Problema de Pesquisa.
193
seu conceito sobre a autoridade do adulto. Crianças e adolescentes têm um contato
constante a Arte Seqüencial/HQs, mediante as mídias. Porém, buscam o
entretenimento, a diversão e o passatempo, a fim de aliviar tensões, e não o
conhecimento em si mesmo, embora aprendam muitas coisas neste relacionamento.
O acesso de crianças e adolescentes ao mundo das imagens é ilimitado e os
contatos que fazem são importantes não apenas para o ensino de Artes Visuais,
mas para sua formação. Contudo pouco sabemos a respeito desses
relacionamentos, particularmente no que se refere às histórias em quadrinhos.
Diante da troca dos meios técnicos e/ou artesanais pelos meios digitais, para
Poissant (1997, apud CORRÊA e MATTÉ, 2005, p. 206), “é preciso mudar de
atitude, de corpo e espírito para captar em que estas imagens inovam e sobretudo
como elas estão transformando fundamentalmente o nosso meio.”
Então como fica a relação de crianças e adolescentes com as HQs hoje?
Qual a importância real que tem esta arte para as crianças e adolescentes na
atualidade? Qual o significado que tem para eles? Como a compreendem?
No estudo exploratório, a meta era encontrar evidências sobre o problema de
pesquisa
82
, mas também surgiram indagações sobre questões de gênero. Em
princípio, acreditávamos que pelo fato de gostarem de desenhar, tanto meninas
quanto meninos, crianças e adolescentes, gostassem da mesma maneira de
histórias em quadrinhos. Mas naquele estudo, percebeu-se uma aproximação maior
de meninos com esta arte, ao contrário do que acontece com as meninas. Inclusive
hoje há uma tendência para uma maior segmentação das histórias em quadrinhos.
Todavia em sala de aula costuma-se ensinar sobre as HQs de modo
indistinto. Este é um dado que leva à necessidade de investigar qual a realidade
desta arte para crianças e adolescentes. Acreditamos que não apenas aquilo que o
professor de Artes Visuais leva para sala de aula é importante, mas o que os alunos
encontram fora dela. Geertz (1997) recorda que a arte, os objetos estéticos não são
apenas um mero encadeamento de formas, mas objetos ou artefatos que se
relacionam aos demais componentes da experiência humana.
Essas considerações abrem a possibilidade para novas pesquisas sobre a
relação de crianças e adolescentes ligadas às representações da Arte
Seqüencial/HQs, presentes também em desenhos animados e Internet, incluindo
82
“Como os professores de ensino fundamental se relacionam com a Arte Seqüencial/Histórias em
quadrinhos no ensino de Artes Visuais?”
194
questões de gênero e que podem ser realizadas em projeto de pesquisa para
doutorado. Uma futura pesquisa seria importante para consubstanciar o presente
trabalho, a fim de conhecer o que os alunos costumam ler e em quais mídias em
sobre quadrinhos. Análises neste sentido poderiam dizer-nos coisas úteis sobre
como crianças e adolescentes compreendem e utilizam essa arte, qual o significado
que tem para eles, como isso influencia sua vida, seu aprendizado e sua relação
com as Artes Visuais, trazendo dados importantes para os professores, fornecendo
elementos para o trabalho com os alunos na escola.
Por fim, cabe dizer que a pesquisa auxiliou para compreendermos as relações
dos docentes com a Arte Seqüencial/histórias em quadrinhos, contudo tem seus
limites assim como o instrumento de mediação para análise crítica de imagens de
histórias em quadrinhos proposto, que pode auxiliar aqueles que tenham interesse
em ensinar sobre essa arte.
Consideramos que as questões estéticas dos quadrinhos, neste trabalho
ficaram um pouco à parte, embora não tenham sido esquecidas. Da mesma forma
que a pesquisa demonstra que as leituras críticas são particularmente importantes
para o ensino de HQs e que estas necessitam ser divulgadas entre os professores, a
fim de permitir que os próprios alunos adquiram autoconsciência e posicionamentos
críticos diante das produções e representações existentes na área dos quadrinhos,
necessidade de maior compreensão sobre esta arte, também no âmbito artístico.
Os depoimentos revelam que total desconhecimento entre os professores
entrevistados, a respeito de obras, autores e estilos dos quadrinhos, denotando uma
carência de estudos nesta área, própria do ensino de Arte.
Vasta bibliografia pode ser encontrada sobre a história e como fazer histórias
em quadrinhos. Bibliografia relacionada ao uso desta arte em sala de aula, pode
também ser encontrada. Deixa a desejar, no entanto, bibliografia referente a obras,
autores e estilos, para o ensino de Artes Visuais, denotando ser um dos elementos
limitadores deste ensino. À parte sua história polêmica, como enfatiza Quella-Guyot
(1994, p. 44), as HQs são um produto cultural e artístico e também produziram obras
“que não merecem a superficialidade habitual de alguns excertos perdidos numa
página de manual.” Hoje existem muitas produções autônomas de artistas de
histórias em quadrinhos pouco preocupadas com sua distribuição em série em larga
escala, que buscam a qualidade dos conteúdos e dos aspectos artísticos, mas que
são desconhecidas entre os professores e alunos, podendo ser investigadas e
195
estudadas com atenção no ensino de Artes Visuais. Levando em conta esta
carência, considerando a importância que têm para o ensino de Artes Visuais,
estudos neste âmbito poderiam ser incluídos em projeto de pesquisa futuro, com a
finalidade de ampliar as possibilidades de estudos dessa arte.
Na contemporaneidade, o ensino de Artes Visuais se encontra diante de
muitos desafios, tais como a pluralidade das formas artísticas. Sem desconsiderar
esses aspectos e as dificuldades com que se depara este ensino hoje, é
fundamental, do ponto de vista deste estudo, também levar o professor a questionar-
se sobre suas práticas pedagógicas, conceitos e valores com as quais estão
relacionadas e sobre a importância de estar conectado e atendo às transformações
atuais da sociedade da cultura e da arte.
196
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APÊNDICE
APÊNDICE A – Relação entre freqüência e gênero nos cursos de HQs da Gibiteca e
Solar do Rosário
APENDICE B – Modelos de autorização utilizados para entrevistas no estudo explo-
ratório e estudo empírico
APÊNDICE C – Amostras de entrevistas realizadas no estudo exploratório e estudo
empírico
APÊNDICE D – Sinopse da mini-série Heróis Renascem Vingadores
206
A - Relação entre freqüência e gênero nos cursos de HQs da Gibiteca e Solar do
Rosário
1. Cursos de histórias em quadrinhos da Gibiteca
Tabela de freqüência por sexo
Início do curso Final do curso
Cursos do 1º semestre de 2006
feminino masculino feminino masculino
Básico 6ªs feiras 10/03 a 14/07 3 13 0 13
Básico Sábados 11/03 a 08/07 3 18 2 10
Mangá 6ªs feiras 10/03 a 14/07 5 18 0 18
Intermediário 5ªs feiras 09/03 a 29/06 1 3 0 3
Mangá 2ªs feiras 06/03 a 26/06 3 7 3 7
Avançado 3ªs feiras 07/03 a 20/06 1 2 1 2
Nº de pessoas por sexo 16 61 6 53
Nº de pessoas no total
77 59
Percentual (20,77%)
21 %
(79,22%)
79 %
(10,17%)
10%
(89,83%)
90%
Percentual aproximado de desistentes ao final dos cursos 23%
Obs.: Os números acima de 0,5 décimos foram arredondados para cima; os abaixo de 0,5 décimos o foram para baixo.
Tabela 1 – Freqüência de alunos e alunas na Gibiteca
2. Cursos de histórias em quadrinhos do Solar do Rosário
Tabela de freqüência por sexo
Início do curso Final do curso
Curso de HQ (semestral)
83
feminino masculino feminino masculino
1º semestre de
2005
Sábados 10h às 12h 12 29 8 21
2º semestre de
2005
Sábados 10h às 12h 3 11 2 8
1º semestre de
2006
Sábados 10h às 12h 9 18 5 8
Nº de pessoas por sexo 24 58 15 37
Nº de pessoas no total 82 52
Percentual (29,27%)
29%
(70,73%)
71%
(28,84%)
29%
(71,15%)
71%
Percentual aproximado de desistentes ao final dos cursos 37%
Obs.: Os números acima de 0,5 décimos foram arredondados para cima; os abaixo de 0,5 décimos o foram para baixo.
Tabela 2 – Freqüência de alunos e alunas no Solar do Rosário
83
O Solar do Rosário possui um único curso de HQs, aos sábados.
207
B Modelos de autorização utilizados para entrevistas no estudo exploratório e
estudo empírico
C – Amostras de entrevistas realizadas no estudo exploratório e estudo empírico
UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA - UDESC / CEART
Programa de Pós-Graduação - Mestrado em Artes Visuais
Caro professor(a), o seu grupo de alunos
es sendo convidado para
participar, como voluntário, em uma pesquisa. Após o grupo ser esclarecido sobre as
informações a seguir, no caso de aceitar fazer parte do estudo, assine no final deste
documento, em duas vias. Uma via é sua (professor do grupo) outra do pesquisador.
Projeto de Pesquisa: As histórias em quadrinhos no ensino de Artes Visuais na
perspectiva dos Estudos da Cultura Visual.
Pesquisadora responsável:
Telefone para contato: e-mail:
O objetivo desta pesquisa é investigar como os professores se utilizam de
algumas manifestações artísticas do universo visual cotidiano, particularmente da Arte
Seqüencial/histórias em quadrinhos no ensino de Artes Visuais. As informações
obtidas contribuirão para estudo, reflexão e fundamentação de propostas alternativas
para o ensino de Arte. A participação de seu grupo consiste em fazer parte de uma
entrevista, que será realizada pela pesquisadora, sem qualquer prejuízo ou
constrangimento para o grupo. Os procedimentos aplicados não oferecem risco à
integridade moral, física, mental ou qualquer tipo de constrangimento e suas
identidades serão totalmente resguardadas. As informações obtidas através da
entrevista, serão utilizadas para alcançar os objetivos da pesquisa e dissertação de
Mestrado. Caso haja desistência para fazerem parte da pesquisa, favor entrar em
contato pelo telefone ou e-mail acima.
Contamos com sua colaboração para a concretização desta pesquisa.
Termo de consentimento de participação
Eu (nome),___________________________________________________________
R.G:_____________________________CPF________________________________
abaixo assinado (a), concordo em participar desta pesquisa. O grupo sob minha
orientação foi devidamente informado (a) pelo pesquisador
(a)____________________________, sobre a pesquisa e os demais procedimentos
envolvidos, bem como os benefícios decorrentes da participação. Foi me garantido
que eu e meu grupo podemos retirar nosso consentimento a qualquer momento.
Local: ___________________________________ Data _____/_____/_____
Assinatura: ________________________________________________________
UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA - UDESC / CEART
Programa de Pós-Graduação - Mestrado em Artes Visuais
Caro professor (a), você está sendo convidado (a) para participar, como
voluntário(a), em uma pesquisa. Após ser esclarecido(a) sobre as informações a seguir,
no caso de aceitar fazer parte do estudo, assine no final deste documento, em duas vias
(uma via é sua, outra do pesquisador).
Projeto de Pesquisa: As histórias em quadrinhos no ensino de Artes Visuais na
perspectiva dos Estudos da Cultura Visual.
Pesquisadora responsável:
Telefone para contato: e-mail:
Em virtude das problemáticas do ensino de Arte atual, tal como a imensa
proliferação de imagens, formação, ensino e prática ainda modernistas
e que não atingem
os objetivos para uma leitura crítica das imagens do amplo universo visual a que estamos
expostos e, ainda, falta de conteúdos que façam sentido para professores e alunos, a
finalidade desta pesquisa é investigar como os professores compreendem e utilizam
algumas manifestações artísticas do universo visual cotidiano, par
ticularmente a Arte
Seqüencial/HQs. A pesquisa permitirá conhecer visões e concepções dos professores
sobre esta arte no ensino de Artes. As informações contribuirão para estudos e
fundamentação de propostas que auxiliem a interpretação crítica e que tenham
conseqüências educativas.
A sua participação consiste em fazer parte de uma entrevista (semi-
estruturada)
que será realizada pela pesquisadora, sem qualquer prejuízo ou constrangimento para
sua pessoa. Os procedimentos aplicados não oferecem risco à integridade moral, física,
mental ou qualquer tipo de constrangimento. Sua identi
dade será totalmente resguardada.
As informações obtidas através da entrevista, serão utilizadas para alcançar os objetivos
da pesquisa e dissertação de Mestrado. Caso você não queira mais fazer parte da
pesquisa, favor entrar em contato pelo telefone ou e-mail acima.
Contamos com sua colaboração para a concretização desta pesquisa.
Termo de consentimento de participação
Eu (nome),__________________________________________________________
RG.:__________________________CPF _______________________________, abaixo
assinado (a), concordo em participar desta pesquisa. Fui devidamente informado (a) pelo
pesquisador(a)___________________________, sobre a pesquisa e os demais
procedimentos envolvidos, bem como os benefícios decorrentes da participação. Foi me
garantido que posso retirar meu consentimento a qualquer momento.
Local: _____________________________________ Data ______/______/_____
Assinatura: ________________________________________________________
208
C) Amostras de entrevistas realizadas no estudo exploratório e estudo empírico
1) Amostra de entrevista realizada com o grupo da Gibiteca em abril de 2006
Entrevista nº 8 Nome fictício: "Scorpion" Idade: 16
Sexo: Masculino Feminino
Colégio que estuda: Santa Cândida Qual a série? 1º ano do Ensino Médio
O Colégio é :
Trabalha?
1. Qual foi o motivo que o levou a fazer um curso de histórias em quadrinhos?
Melhorar o desenho. Tentar aprender figuras humanas, porque eu desenho Mangás.
2. Você imita, desenha bastante Mangá? Pega revistas e copia?
Hum-hum. Estou tentando - até fazendo um gibizinho em quadrinhos lá em casa, mais ou menos.
3. (Comentando) Você estava compenetrado ali desenhando com aquela turminha. Você se concentra assim para
desenhar em casa também?
É, mais ou menos. Quando estou desenhando eu me concentro bem para fazer bem feito o desenho.
4. (Comentário) Ah. É bom, se concentrar é ótimo para quem desenha, é uma qualidade... Então o motivo seu é
melhorar o desenho. Fora este, você tem algum outro motivo? Pensa profissionalmente?
É. Tentar seguir carreira, também.
5. Você pensa mais tarde que isso vai ser útil para você?
É. Tentar ser desenhista...
6. Você está estudando?
Estou.
7. Que ano você está?
1º.
8. Primeiro ano do ensino médio?
É.
9. O que você está aprendendo no ensino médio, em Arte?
Perspectiva... hum...
10. Perspectiva? Onde você estuda?
Santa Cândida.
11. É colégio estadual?
É.
12. (Comentário) Nossa, que diferente...
Comentário de “B.” (outro membro do grupo): ___ Lá é muito bom, já estudei lá. É um modelo de colégio.
13. Você tem História da Arte também, ou só a parte técnica?
Mais ou menos.
14. Tem História da Arte também?
É.
15. Tem geometria?
Não.
16. Mas perspectiva, sim?
É.
17. (Comentário) Não é qualquer professor de Arte que ensina perspectiva...
Não, e lá é muito bom !
Comentário de “B.”: ___ É, é professora e ela é legal ainda !
18. É uma professora?
É. Na última aula ela pediu para fazer um corpo em movimento. Só o corpo - sem a roupa com se fosse um rosto, mais ou
menos...
19. E você não gostou? Você deve ter adorado então, porque você gosta de desenhar!?
Risos do grupo.
20. (Comentando) Hoje em dia o que ensinam normalmente no ensino médio é História da Arte.
E no ensino fundamental, teve alguma vez que o professor de Artes pediu para você fazer algum trabalho de
histórias em quadrinhos?
Acho que na 5ª série, ou na 6ª série, tinha um professor que pedia para fazer aquele tipo de... 3 quadrinhos assim. Charge
também, é... bem pouco, assim.
21. Uma vez, duas vezes ou quantas vezes?
Ah. Bem pouco assim. Acho que umas duas, ou três.
22. Mas em geral, o que vocês trabalhavam? Obras de Arte? História da Arte?
Minha professora do ano passado passava mais texto, não passava muita prática.
Obrigada.
[...]
Público
Sim
Não
Particular
209
2) Amostra de entrevista individual realizada com os professores
Entrevista nº 5
Nome fictício: “Madelon”
Idade: 50
Formação: Artes Plásticas – FAP Tempo que leciona Arte: 11 anos
Professor(a) de: Ensino Fundamental Ensino Médio
Turma(s) que leciona: Pré a 4ª, 5ª a
e EJA
1. Madelon, qual sua formação? Que curso você fez, onde você se formou?
__ Estudei na Faculdade de Artes do Paraná e fiz a graduação e pós na FAP. A graduação que escolhi foi Artes Plásticas.
2. Você trabalha com Artes Visuais?
__ Sim.
3. Ensina outras linguagens?
__ Sim. Eu gosto muito de teatro. Eu uso bastante teatro também.
4. Você costuma trabalhar com imagens na sala de aula?
__ Bastante.
5. Que tipo de imagens?
__ Obras de artistas, mas tudo relacionado com o conteúdo que eu quero dar. Se for trabalhar junto com a professora de
História ou de Português, eu pergunto para ela, o que ela está vendo, o que está trabalhando com o aluno, para aproveitar o
conteúdo.
6. Você trabalha em conjunto com outros professores então?
__ É, elas trabalham a parte delas. Mas aproveito dentro da arte o que acontece nesse período da História, mas como História
da Arte mesmo.
7. E a obra?
__ A obra também, a leitura daquela obra dentro do mesmo contexto.
8. Você trabalha a leitura, o contexto...
__ A leitura da obra no contexto, o que era a obra, a época que foi feita e sempre procurando o lado que o aluno vai
caminhando. Ele pede, ele pergunta. Então vou pelo interesse do aluno. Junto com o interesse dele, eu trabalho essa parte da
leitura. Eu acho que a gente tem que dar subsídios para eles. Não só da pintura, da obra de arte em si, mas dos
questionamentos que eles fazem. Eles vêm perguntando, perguntas deles, interesse deles.
9. Tem algumas obras que você aborda mais? Para uma série você trabalha tal obra, em outra série você trabalha com
outra?
__ Isso. É como eu falei, vou caminhando junto, vou vendo o conteúdo para poder aproveitar.
10. Artistas internacionais, locais?
__ Locais também. Aqui de Curitiba. Primeiro eu pego aqui, o que eu posso trabalhar. Depois que trabalho Brasil, trabalho com
os artistas de fora. Bastante ao redor primeiro, porque acho que diz respeito ao aluno.
11. Como vofaz a leitura da imagem com os alunos? Você começa pela obra, ou pela História da Arte? Como você
faz, leva a imagem?
__ Levo a imagem, daí faço eles fazerem uma leitura do que estão vendo. Eles dizem: “__Ah! Estou vendo isso, isso”. Eles vão
fazendo uma listagem daquilo que eles vêem, e depois, a gente vai comentando. Depois eu falo da obra, do artista.
12. Depois que eles fazem essa leitura, você fala do artista?
__ Depois que falar da obra - vou situar a obra em tempo e espaço, a partir daí vou falar dele, do artista, porque que o artista
fez aquela obra, porque pintou, esculpiu.
13. Você entra um pouco no social?
__ Isso, História da Arte.
14. Depois faz alguma atividade?
__ Eles fazem atividade, por exemplo, estou trabalhando Frans Krajcberg. Primeiro mostrei a obra dele. Eles viram, acharam
muito bonito: “__ Ah, que legal !” Começaram a perguntar porque ele fazia isso. Então foi interesse deles também. Assim fui
contando, que ele começou fazer escultura a partir da árvore morta, e tal.
15. Você chegou a fazer uma escultura com eles?
__ Não, estou na metade do caminho ainda com eles. Eles vão pesquisar fora o que acharem, para daí montar uma mini
escultura. Uma coisinha assim, só para representar. Até tenho uma menina que mandou uma para mim, eu trouxe justo hoje.__
Olha! Bem simples. Ela não matou aquela árvore, porque ela me disse que estava no chão, ela juntou ou os galhinhos.
16. Comentário: Podia ser um Frans Krajcberg com ares “Art Nouveau”!
__Você viu!? Então assim, ela já veio com ele todo amarradinho!
17. Mas ela já encontrou assim?
__ Não, ela encontrou os galhinhos. Mas ela viu antes a obra do Krajcberg, então ela achou os galhinhos e pensou em fazer
uma mini escultura com eles. Eles trabalham com isso, trabalham todo o contexto. Depois eles trazem revistas, livros, jornal
sem eu pedir: “__ Olha! O que eu encontrei!” Bem legal. Trazem o que vêem, o que encontram.
18. Essa turma é de qual série?
__ Essa turma é de 6ª série. Com a turma da noite, também vou fazer, com a EJA.
19. Com a 1ª a 4ª, também você vai fazer essa aula?
__ Não, só com a 6ª. Com a 1ª a estou trabalhando a reciclagem do lixo. Porque eu trabalhei fundo do mar. Vou fazer uma
escultura com eles, escultura de peixinho. Eles vão fazer no papel machê. Eles usam a criatividade deles. Mas primeiro a gente
faz toda aquela parte. Faz a leitura, a parte teórica antes.
20. Então você trabalha dentro do fazer, ler e contextualizar, dentro desta linha?
__ Sim.
21. Você também ensina sobre a linguagem dos quadrinhos? Já ensinou alguma coisa sobre isso?
210
__ Só agora, por que estou fazendo com uma turma do sexto período, é série da EJA, noite, estou fazendo com eles. Estou
trabalhando, porque a gente fez um projeto sobre o jornal, junto com outra professora. Ela já está vendo uma parte, o jornal. Da
minha parte vou trabalhar com charge, com eles. O pessoal do jornal, da escola.
22. Quantas aulas você planejou para este trabalho?
__ Três a quatro aulas mais ou menos.
23. Tem algum jornal específico que você vai usar?
__ O que tiver. O que eles tiverem podem trazer também para poder aproveitar.
24. Como você vai desenvolver a atividade?
__ Eu começo com quadrinhos, para poder entrar na charge. Começo com história dos quadrinhos, até chegar na charge.
25. Fala sobre o que é quadrinhos, o que é charge?
__ Estou começando agora com eles o que é quadrinhos. A gente passa transparência, para eles entenderem melhor. Estou
pegando quadrinhos do Ziraldo, da Ciça. Alguns quadrinhos fiz transparência e levei para a sala.
26. Esse trabalho é a primeira vez que você está fazendo?
__ Primeira vez.
27. Faz quanto tempo que você leciona?
__ Eu? Nossa, faz muito tempo.
28. Dez anos?
__ Não. Vinte e poucos anos, mas é que Arte não tinha antes. Comecei bem depois.
29. Quando você começou em Arte?
__ Comecei quando estava estudando. Porque não podia pegar aluno sem ser formada. Então eu pensei, vou estudar então,
pelo menos encaminhando... vou ver se consigo trabalhar assim. Quando entrei na Prefeitura, pelo menos em 95 comecei a
estudar.
30. A partir de 95, começou a dar aulas de Arte?
__ De artes, mesmo.
31. Agora, você resolveu fazer esse projeto? E o que você pretende com ele, porque está desenvolvendo dessa
maneira?
__ Eu peguei primeiro quadrinhos, para eles entenderem a seqüência de uma história e depois a simplificação. A charge é
mais simplificada, você faz o desenho e não tem aquela seqüência, não precisa, nem a escrita. Você pega e dá para ver, se
é de um político, de um artista. O cartunista ele evidencia muito o desenho, na charge. Então pode ser uma frase só, uma
palavra.
32. Para eles conseguirem retratar uma situação, representar através de uma charge?
__ Isso. Assim o aluno vai para aquela parte do jornal que aquela professora está fazendo.
33. Então seu objetivo é esse, que eles consigam representar através de um fato?
__ Sim. Eles vão ler um texto, alguma coisa, ou vão ouvir uma notícia, ou vão participar de algum evento na escola. Eles têm
que usar a criatividade deles, também. O que eles acharem que evidencia aquele fato, aquele acontecimento eles vão colocar
no trabalho. A gente vai tentar na escola, alguma coisa ada sala deles, para depois partir para um evento maior ou até uma
notícia. Tem que ser assim, porque eu perguntei e eles nunca trabalharam, nunca fizeram.
34. Comentário: Sabe que em um jornal a charge vale como um artigo assinado? o cartum, no jornal, não tem o
mesmo peso, não vale como artigo. E caricatura? Você vai trabalhar caricatura também?
__ Caricatura, não sei. Acho que não. Um ou outro que faz, que gosta. Mas a charge dá para trabalhar.
35. E o fato das HQs serem uma linguagem híbrida, uma linguagem que usa texto e imagem, você acha que atrapalha,
dificulta?
__ Não. Até acho até melhor para eles entenderem, até para quando eles forem desenhar, no caso, eles tem que ver se a
pessoa está correndo, se a pessoa está em movimento, ou ela está parada, então conforme eles vão se expressando ele vai
ter que fazer o desenho também. É interessante porque associa as duas coisas. Eu tenho um livrinho, uma história em
quadrinhos de um menino de 3ª série, que me deu de presente.
36. Ele fez sozinho?
__ Fez. Vou te mostrar.
37. Comentário (enquanto ela mostrava): Não tem pessoas, alunos, que são mais visuais e outros que gostam mais de
escrever, de fazer outras coisas ?
__ É, eu acho que a expressão, ou ele faz um desenho ou ele faz escrevendo.
38. E como você acha que o professor pode trabalhar com essa arte na sala de aula? Com uma ou série, por
exemplo, como você poderia trabalhar com histórias em quadrinhos? Que tipo de histórias usaria? Que autor?
__ Eu partiria primeiro, do assunto que eles gostariam de abordar, primeira coisa. As vezes até sobre o corpo humano, numa
7ª série, não sei. Aquilo que eles tem necessidade de saber: __ Ah! Vamos falar sobre tal coisa. Eu sempre procuro os autores
locais, primeiro (tem o Ziraldo, o Maurício de Souza). Mas no caso, eles teriam que fazer uma pesquisa, um estudo primeiro
para ver do que se trata para depois começar a desenhar, a colocar a historinha, ou a fazer a historinha deles dentro daquele
tema, daquele assunto. Acho que teria que ser bem pesquisado mesmo.
39. Um tempo atrás, diziam que os gibis ensinavam coisas erradas, tinham vocabulário pobre, podiam tornar a criança
preguiçosa porque tinham muitas imagens. Então se acreditava que a criança seria prejudicada na leitura.
__ Só para ficar vendo as figurinhas !
40. Sim, e diziam também que as cenas eram muito exageradas, que deformavam a realidade. Mas hoje até são
recomendadas pelos PCN. Então esses conceitos mudaram, e as HQs hoje? O que você pensa sobre elas ?
__ Acho que mudou também. Mudou, e ficou mais voltado para a criança. Mesmo você pegando o gibi do Cebolinha, que fala
o “L”, trocando pelo “R”, se você levar para a sala de aula e trabalhar o Português ali, brincando eles vão lendo, achando
engraçado, rindo, participando com o professor, eles vão gravar melhor porque está errado – e dcolocar certo na linguagem
culta. Acho que eles participam melhor, acho que foi feito mais para a criança mesmo. O Maurício de Souza, então, ele
continuou com o Cebolinha dele, mas mais ajudando até.
41. E o que você acha sobre a violência nos desenhos - dos desenhos animados e das histórias em quadrinhos ? Tem
bastante ?
__Tem, tem. Como tem. Até a Mônica, não é ? Ela também dá uns petelecos. Acho que eles exageram para poder dar ação na
história. Ele começa a ler aqui, daí vai indo, indo, quando chega a certa altura na história, é tão... ou ela começa já. Você vai
ver atrás, porque que aquela personagem estava tão furiosa, tão braba. Daí você vai ler toda a história. Acho que é mais
nesse sentido.
42. E o que você acha que a criança pode aprender com esses desenhos?
211
__ E acho que ela imita. A maioria das crianças imita. na escola, esses dias estavam falando do “pai”: “__ Meu pai só falta
colocar o rosto dele nessa capa aqui! ” Daí ele mostrou para mim, a figurinha que era o homem... como é, aquele de capa?
43. Super herói ...
__ ... Super herói, bem, um super-herói. Pai herói, daí ele colocou.
44. (Ah, o Super-homem).
__ Ele disse: “__ Professora, se eu colocar a fotografia do meu pai aqui, ele é igualzinho a esse homem”. Desse jeito! É
admiração que eles tem, então eles imitam, querem fazer igual. Eles gostam, se identificam. Identificam com o pai.
45. E como você vê a questão dos gêneros nos quadrinhos? Como são representados o homem e a mulher? Lembrando
alguns, tem as Superpoderosas, a Mônica, Magali, os super-heróis. Como você acha que a mulher é representada, e
como o homem é representado? Como você vê isso?
__ Acho que é mais o visual mostram mais o corpo. Eles não querem tanto o que ela pensa, é mais o que ela representa
visualmente. o homem, não. Mostra também um pouco - os músculos. Mas ele fala mais, ele manda mais. As palavras
dele... mas isso aí, eu acho que é a nossa história, não é? A história nossa, feminina e masculina, esrepresentada nos
quadrinhos, o poder, a força, o medo. Nós poderíamos estar representadas como eles.
46. As HQs representam o ideal deles?
__ A mulher bonita, toda cheia de curvas...você não uma que está mal. Nos quadrinhos ela aparece muito bonita, bem
desenhada.. muito bonita. Então é mais o corpo, mais visual mesmo.
47. Tem muito editor que associa as histórias com uma série de objetos...
__ Para vender!
48. Sim, para vender bonequinhos, joguinhos, CD...
__ Tem álbum também.
49. E os alunos compram, colecionam, utilizam isso...
__ Para brincar, brincam de “Bate-fafo”.
50. Como você acha que isso interfere na vida deles?
__ É, eu acho que ensina violência e o poder também: “__ Ah eu posso, você não pode!” Desde para comprar, até para ter, ter,
ter. Tem gente que não tem na sala. Ficam brigando, as vezes eu recolho material. Recolho e digo assim:__ No final da aula,
eu devolvo! Porque senão, eu não consigo dar a aula. Principalmente e série. Que incrível, a idade deles. Então eu digo:
__ Olha, se alguém tiver algum brinquedo aqui na sala, enquanto eu estou explicando eu não quero. Depois que terminou a
aula, bateu o sinal, devolvo para vocês pegarem novamente. Isso influencia até para você trabalhar, de tão importante que eles
acham aquilo, de tanta importância que eles dão. E televisão ? Eles ficam em casa de manhã. As vezes eu pergunto: __O que
vocês ficam fazendo? “__ Ah! Eu fico vendo televisão”. __ Mas a manhã inteira? Mas o que você faz? “__ Ah! Eu levanto 9
horas, tomo café e vou ver televisão”. __ E daí você não estuda? Não um pouquinho? o faz a lição? “__ Não. Faço no
sábado e no domingo”. Então eu questiono também. Porque eles ficam brincando e você vê. Tem a TV, tem histórias, depois
mais a revistinha. Daí eles trazem para a escola o álbum de figurinhas, que eu digo que vou tomar se eles pegarem
novamente.
51. Comentando: E esses? (mostrando uma revista dos Transformers que tínhamos em mãos). Tinha uma época que
era moda o desenho desses robozinhos.
__ Ah, não, meu filho também! Nossa, a TV também! Ele era louco, louco por isso! Mas não tinha a revista assim ainda. Eu não
comprava para ele. No desenho da TV, o robô se transforma em veículo, depois já não era mais um robô, era um homem [...].
52. Qual a sua opinião sobre o uso de HQ na sala de aula?
__ Eu acho que você pode usar a HQ dependendo do objetivo que você quer atingir com aquilo. Se é reforçar a leitura, se é
ensinar outras linguagens. Não pegar só o livro didático, só um texto que você leva.
53. Pode ter alguma vantagem ou dificuldade em trabalhar com HQ na sala de aula?
__ Pode. A vantagem da diversidade. E a dificuldade é se o professor não souber encaminhar. Se ele der para ler, por ler,
também não adianta. As vezes até para dar uns 10 minutos no final da aula, para eles lerem um pouquinho, quem gosta e
tal. Se você for encaminhar no trabalho da sala de aula, acho que tem que preparar muito bem. No caso, antes de começar
com Artes, eu trabalhei na 4ª série, o Chico Bento. Falei da linguagem, disse quena roça eles falam assim, desse jeito. Não
é errado, é o jeito deles, mas se for usar a língua padrão, a língua culta, não se pode falar dessa maneira. Tem que escrever e
ler corretamente.
54. Você comentou do Maurício de Souza. E quais os estilos de quadrinhos que você conhece, independente de você
trabalhar com eles na sala?
__ Ah! Que eu conheço?
55. Sim.
__ Como charge?
56. É, charge seria um desenho de humor.
__ É, charge, as tirinhas de humor, que são mais curtas que as histórias em quadrinhos. E mais, o que era? Charge,
quadrinhos, tirinha quadrinho que não é a história toda, como a Mônica é história toda que tem mais do que uma página.
Também tem quadrinhos assim, com 5, 6 ou 8 páginas.
57. E fora Maurício de Souza, o que mais você conhece?
__ A Mafalda, que tem histórias em quadrinhos, tem tirinhas. Do Jaguar também.
58. Você tinha mencionado para mim a Ciça.
__ Ciça! Tinha falado a Ciça, e o nosso aqui, aquele que fez o Menino Maluquinho.
59. Ziraldo?
__ Ziraldo. Tem vários. Tem um que sai agora, mais recente, aquele... Los Manos”, os três. Ah como é? Los Três Hermanos.
É, eles não querem falar Português, colocam todo um “portunhol”.
60. Seria um tipo de cartum ou uma charge?
__ Isso.
61. Estava ótimo, obrigada !
__ De nada [...].
212
D) Sinopse da mini-série Heróis Renascem Vingadores
A série Heróis Renascem Vingadores, pertence a Marvel Comics. É uma
continuação da revista Vingadores e possui quatro títulos: Quarteto
Fantástico, Heróis Renascem Vingadores, Homem de Ferro e Capitão
América. O grupo chamado Vingadores foi criado em 1963 por Stan Lee e
Jack Kirby e era originalmente formada pelos personagens Thor, Homem de
Ferro, Vespa, Gigante e Hulk, mas mudou várias vezes de personagens. A
Marvel costuma relançar os títulos quando as revistas começam a perder
consistência ou o interesse dos leitores. Como estratégia para relançar os
Vingadores, a Marvel simulou uma hecatombe de proporções cósmicas,
causadas por um vilão mutante chamado Massacre, que fez desaparecer os
Vingadores da face da Terra. Os Vingadores vão parar em um universo
paralelo onde ficam exilados e tem suas vidas reformuladas. Assim surgiu a
mini-série Heróis Renascem Vingadores. Uma equipe formada por Capitão
América, Thor, Feiticeira Escarlate, Gavião Arqueiro, Espadachim, Felina e
Visão.
A história começa sem que os Vingadores se lembrem do conflito que
aconteceu com o vilão Massacre. Nos capítulos dos fascículos de
s
1 a 4,
os Vingadores encontram Thor, congelado em uma pedra, na Noruega. Thor
é convidado a fazer parte do grupo. Na volta para Nova York, os Vingadores
encontram Hulk que se desloca sem rumo, destruindo tudo o que encontra
pela frente. Sem saber quem é Hulk, os Vingadores travam uma luta com
ele mas vão sendo derrotados um a um.
No capítulo, 5 resta Thor que trava uma luta contra Hulk*. Do alto, o
coronel Nick Fury, em um dos vários foguetes, que carregam a "principal
força do mundo", observa a cena e achando que Thor acaba de ser morto
pelo oponente - diz : "Magnífico, tem quatro pessoas no planeta capazes
de impedir isso. Uma é o Rei da Lavtéria. Outra é um Magnata Canalha.
Tem ainda o Elástico Vivo. E a última está morta...". O capítulo termina
mostrando Hulk vencendo Thor.
Nos capítulos seguintes (fascículos
s
6 a 12), Hulk volta a seu estado
“Bruce” e vai para a sede do Quarteto Fantástico onde é reconhecido por
um deles, como o Dr. Bruce Banner. A Ilha de Nova York entra em perigo
por causa dos estragos causados por Hulk. O reator gama está avariado e
ameaça destruir tudo. Loki, inimigo de Thor e dos Vingadores, faz uso das
energias do reator para aumentar sua força e materializar outros inimigos
para combater os Vingadores. Thor consegue vencê-lo também fazendo uso
da energia do reator. Quando todos pensam que o perigo acabou, surge o
Dr. Victor Von Doom, dizendo que chegou Galactus e este irá destruir a
todos se não unirem suas forças. Dr. Victor Von Doom tem um plano para
ficar com o poder sobre o mundo, colocando os todos os heróis do mundo e
os Vingadores contra Galactus. Com estes inimigos enfraquecidos Von
Doom poderá tomar posse de tudo. Mas Galactus vence a batalha. Para
destruir Galactus e impedir que ele também tome posse de outros mundos,
como vinha fazendo sem parar, os Vingadores, com o auxílio do Dr. Bruce
Banner, destroem o reator. A destruição faz com que o planeta Terra e tudo
o mais desapareça, restando o nada.
*
A imagem utilizada como exemplo para o Instrumento de Mediação e Análise Crítica, é uma
cena desta luta.
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