Download PDF
ads:
1
UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO”
FACULDADE DE HISTÓRIA, DIREITO E SERVIÇO SOCIAL
LOURDES PASSAURA
A INTENSIFICAÇÃO DA QUALIDADE DE SUJEITOS
NAS MULHERES DA ASSOCIACÃO DAS LAVADEIRAS
DE LINS – SP
FRANCA - SP
2007
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
2
LOURDES PASSAURA
A INTENSIFICAÇÃO DA QUALIDADE DE SUJEITOS
NAS MULHERES DA ASSOCIACÃO DAS LAVADEIRAS
DE LINS – SP
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós - Graduação da Faculdade de História,
Direito e Serviço Social da Universidade
Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”,
para obtenção do título de Mestre em
Serviço Social. Área de Concentração-
Serviço Social: Trabalho e sociedade.
Orientadora: Profª. Drª. Ana Maria Ramos
Estevão.
FRANCA - SP
2007
ads:
3
LOURDES PASSAURA
A INTENSIFICAÇÃO DA QUALIDADE DE SUJEITOS
NAS MULHERES DA ASSOCIAÇÃO DAS LAVADEIRAS
DE LINS - SP
Dissertação apresentada à Faculdade de História, Direito e Serviço Social,
Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, para a obtenção
do título de Mestre em Serviço Social. Área de Concentração-Serviço Social:
Trabalho e Sociedade.
BANCA EXAMINADORA
Presidente:__________________________________________________________
Dr. Ana Maria Ramos Estevão - UNESP
1º. Examinador:______________________________________________________
Dr. ( a) Nome do Examinador, Instituição
2º. Examinador:______________________________________________________
Dr. (a) Nome do Examinador, Instituição
Franca,_______ de _________de 2007.
4
LAVADEIRA DE ASSOCIAÇÃO
Lava roupa bem limpinha como elas são unidas
Em suas reuniões discutem seus problemas
E quer uma solução.
Lavadeira da Associação
Como canta alegremente
Lavadeira da associação
Quer ser independente
Quem dera que a nossa Associação
Pudesse lavar as mágoas do coração
Lavadeiras da cidade, por favor,
Junte a nós por caridade
Vamos fazer as coisas em favor da sociedade.
(Edith Goulart)
5
Dedico aos:
Meus queridos pais e irmãos,
alicerce fundamental em minha
história;
Jairo, companheiro de todas as
horas e amor sem medidas na
realização dos sonhos e
esperanças!
6
AGRADECIMENTOS
Minha eterna gratidão a você que é parte deste trabalho! VOCÊ:
Pai, Mãe, irmãs, irmãos, sobrinhas, sobrinhos, amigas, amigos, sentido profundo de
minhas motivações e superação das dificuldades!
Coordenador, professores, funcionários e colegas do Mestrado da UNESP, pessoas
de energia intelectual e sabedoria humana!
Reitor e professor da UNILINS, João Carlos de Campos, valeu pelo apoio e atenção!
Apoio e incentivo financeiro da UNILINS, na pessoa do professor Sadi, acreditando
no valor da capacitação profissional!
Professor e Coordenador do Curso de Serviço Social, Milton Nizato, Colegas de
trabalhos, funcionários e alunos da UNILINS, valeu pela acolhida e compreensão
durante este tempo de aperfeiçoamento profissional.
Professor Pascoal divido com Você, a beleza técnica deste trabalho!
Maria Emilce, sua atenção e dinamismo, levam este trabalho para além dos
horizontes da língua portuguesa: Obrigada!
Ana Maria, Orientadora e amiga! Mulher guerreira e humana, sempre defensora da
causa. Em todos os momentos ensinou-me que o aprendizado se constrói no
dinamismo do cotidiano e na solidariedade!
Professor Hamilton, valeu pela força na organização técnica do trabalho!
Reginaldo e Ricardo, vocês são especiais e competentes! Obrigada de coração!
Mulheres da associação das lavadeiras que com seu depoimento deram VIDA a este
trabalho. Sua história de luta confirma que a experiência de organização popular, é
possível: cresce a autonomia; qualifica as ações; dá sentido à vida e pode mudar a
realidade.
O tempo não para e “Há um momento para tudo e para todos”! Importante é
acreditar nos sonhos e fazê-los tornarem-se realidade! Sem vocês este trabalho não
teria o mesmo brilho! Também a você que contribuiu direta ou indiretamente com
este trabalho!
Que Deus, o MESTRE dos Mestres, abençôe a todos!
Lourdes Passaura
7
RESUMO
Este trabalho tem como objeto de estudo, a intensificação da qualidade de sujeito
das mulheres que participaram da experiência da Associação das Lavadeiras, em
Lins, no Estado de São Paulo, na década de 1980. Suas aspirações, valores,
autonomia, dignidade demonstram essa qualidade. Perceber o processo de
organização e mobilização social voltado para a valorização do trabalho coletivo e
das experiências do cotidiano, como meio de participação e busca de melhorias para
sua vida e de sua família. Partimos da hipótese de que, essa forma de participação
das mulheres aumentou o prazer, a felicidade, melhorou a auto-estima originando
uma história de inserção e protagonismo. A nossa pergunta é: até que ponto o
Serviço Social contribuiu para a inserção, protagonismo e melhoria da qualidade de
vida das mesmas? Na dinâmica da pesquisa documental, bibliográfica e empírica, a
Faculdade de Serviço Social de Lins, revelou-se comprometida com as lavadeiras
em seu processo de organização e mobilização por meio de uma proposta de
estágio, em que as estagiárias participavam ativamente através da concretização do
PEOP. A pesquisa de campo colheu o depoimento de quatro lavadeiras, residentes
em Lins. Seus depoimentos foram gravados, transcritos e analisados. A nossa
conclusão é que houve de fato, uma intensificação da qualidade de sujeitos nas
mulheres que participaram deste processo.
Palavras – chave: sujeito; intensificação; associação das lavadeiras, serviço
social.
8
ABSTRACT
This work aims to study the quality improvement of the women, as subjects, who took
part of the Laundresses Association in Lins, São Paulo State, in the 1980’s. Their
longings, values, autonomy, dignity show this quality. To realize the process of
organization and social mobilization concerned to the team work and the daily
experiences valorization, as a means of active taking part and searching of some
improvement to their own lives as well as to their families’.The beginning is based on
the hypothesis that this way the women participated, increased their pleasure,
happiness, some better self-esteem- a history of social insertion and leadership
arising from them. Our question is: at what extent has the Social Service contributed
to those women social insertion, leadership and life quality improvement? During the
dynamic documental, bibliographical and empirical research, the Social Service
College of Lins demonstrated it was compromised with the laundresses in the
process of organization and mobilization by means of training periods for
professional practices when the training students took active part of them through the
PEOP made real. During the field research we collected four laundresses’
testimonies, living in Lins. Their testimonies were tape-recorded, transcribed and
analyzed. Our conclusion is that there was an intensification of the quality as
subjects, of those women who took part of that process, indeed.
Key – words: suject; improvement; laudresses association; social service.
9
LISTA DE SIGLAS
ABEPSS Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social
CACAL Casa de Apoio à Criança e ao Adolescente de Lins
CEBs Comunidades Eclesiais de Base
CLT Consolidação das Leis Trabalhistas
COOPERLINS Cooperativa de Lins
COMDAPS Coordenadoria Municipal da Promoção Social
CUT Central Única dos Trabalhadores
DDM Delegacia de Defesa da Mulher
FMI Fundo Monetário Internacional
FSS Faculdade de Serviço Social
FPTE Fundação Paulista de Tecnologia e Educação
FUL Federação Universitária de Lins
LBA Legião Brasileira de Assistência
MST Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
ONGs Organização Não Governamental
PAAMP Projeto de Apoio e Assessoria aos Movimentos Populares
PEOP Projeto de Educação e Organização Popular
SEADE Sistema Estadual de Análise de Dados
UNILINS Universidade de Lins
SABESP Saneamento Básico do Estado de São Paulo
SFIC Sociedade Feminina de Instrução e Caridade
10
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 11
CAPITULO 1 MULHERES FAZENDO A HISTÓRIA EM LINS NA DÉCADA DE 1980.
.................................................................................................................................. 15
1.1 BREVES CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS SOBRE A CIDADE DE LINS E A INSERÇÃO DAS
LAVADEIRAS ............................................................................................................... 15
1.2 PERCURSO HISTÓRICO DA FACULDADE DE SERVIÇO SOCIAL DE LINS ........................ 23
1.3 FASE DE TRANSIÇÃO DA FACULDADE E O PROJETO DE ORGANIZAÇÃO E EDUCAÇÃO
POPULAR - PEOP ....................................................................................................... 38
CAPITULO 2 RUMOS DA PROFISSÃO NA FACULDADE DE SERVIÇO SOCIAL
DE LINS (1970/1980). ............................................................................................... 54
2.1 ASSOCIAÇÃO DAS LAVADEIRAS: MOVIMENTOS SOCIAIS POPULARES E SERVIÇO SOCIAL
.................................................................................................................................. 54
2.2 PEOP E A ASSOCIAÇÃO DAS LAVADEIRAS .............................................................. 60
2.3 ASSOCIAÇÃO DAS LAVADEIRAS E O SERVIÇO SOCIAL NA CONTEMPORANEIDADE ....... 72
CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................. 77
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 79
LIVROS ..................................................................................................................... 79
REVISTAS ................................................................................................................ 84
DOCUMENTOS DA FACULDADE DE SERVIÇO SOCIAL DE LINS ........................ 84
OUTROS DOCUMENTOS ........................................................................................ 84
APÊNDICES ............................................................................................................. 86
APÊNDICE A ............................................................................................................ 87
APÊNDICE B ............................................................................................................ 88
APÊNDICE C ............................................................................................................ 89
ANEXOS ................................................................................................................... 98
ANEXOS BOLETINS DA ASSOCIAÇÃO DAS LAVADEIRAS DE LINS, DÉCADA DE
1980. ......................................................................................................................... 99
BOLETIM N
O
1 JUNHO/1982 ..................................................................................... 100
BOLETIM N
O
2 MARÇO/1983 .................................................................................... 104
BOLETIM N
O
5 MARÇO/1984 .................................................................................... 107
11
INTRODUÇÃO
“Tudo foi muito válido em seu tempo! Somos
mulheres e carregamos com orgulho a
história feita em todas as passagens da vida”.
Entre os movimentos sociais populares com expressão reivindicatória
assinala-se o movimento de mulheres das décadas de 1970/1980. Conforme Lobo
(1991), a mulher foi buscando seu espaço emergindo como sujeito coletivo
1
, na
dinâmica de sua organização.
No engajamento político social dos movimentos sociais populares é que se
situa a Associação das Lavadeiras, inseridas no Projeto de Educação e Organização
Popular (PEOP) da Faculdade de Serviço Social de Lins em 1980. Segundo a
Faculdade (relatório nº. 03 de 1993, p. 8), essa associação nasceu com o objetivo de
organizar e mobilizar as lavadeiras em vista das necessidades e interesse da
categoria”, aqui definidas por elas como classe trabalhadora.
Dentro da categoria de lavadeira não me lembro bem. Eu lavava e passava
para as repúblicas de estudantes. Elas juntavam o dinheiro e a responsável
pagava para nós. A diferença nessa mudança foi que a gente era mais
valorizada e o trabalho era organizado. Todas recebiam um valor igual
conforme o combinado. Eu sentia uma sensação que a sociedade via a
gente diferente como mulheres que sabiam o que queriam. Contribuir com
as despesas em casa dava o direito pra gente de ter nossas coisas e decidir
o que fazer com nosso dinheiro, mesmo que às vezes não chegava pra tudo
que a gente queria (Entrevistada M. V.).
Esta pesquisa traz como tema o PEOP implantado pela Faculdade de Serviço
Social como prática de estágio, que se caracterizou com uma ação profissional
interventiva de Educação popular, caracterizada pela ação de organização e
mobilização junto aos movimentos populares, mais especificamente, junto às
lavadeiras numa prática que se fundamenta na articulação de saberes construída a
partir de experiências concretas do cotidiano.
1
Entendendo-se aqui, o sujeito coletivo, aquele possuidor de autonomia, participação, onde os
sujeitos são os protagonistas, como pessoas envolvidas no ideário e direcionamento de suas
ações junto aos movimentos sociais de forma organizada e participativa.
12
Conforme levantamento bibliográfico inicial, a associação das lavadeiras
foi crescendo, constituindo-se formalmente em 08 de março de 1980 e
permanecendo até 1984, depois as participantes atuaram como militantes em
partidos políticos e outras organizações de esquerda
2
.
Um grupo significativo de mulheres participou do projeto de organização das
lavadeiras. O contato com as estagiárias contribuiu com a motivação das lavadeiras,
para que elas pudessem se reunir e falar de problemas comuns além de se
conhecerem. Houve a primeira reunião e assim sucederam-se outras. As lavadeiras
de Goiânia contribuíram com sua experiência e, por ser um grupo já bem
estruturado, deu apoio às lavadeiras de Lins, participando de seus eventos.
Sua organização inicial contava, mais ou menos, com 50 filiadas. Dessas,
efetivou-se um grupo de 35 lavadeiras que se estruturam ao redor dos anseios e
lutas por melhorias para sua categoria.
O objeto de estudo deste trabalho é a intensificação da qualidade do sujeito
das lavadeiras, que participaram da experiência. Suas aspirações, valores,
autonomia, dignidade compõem essa qualidade. Perceber o processo de
organização e mobilização social focado na valorização do trabalho coletivo e nas
experiências do cotidiano é o nosso objetivo. As perguntas que nos orientam são:
essa forma de participação aumentou o prazer e a felicidade, melhorou a auto-
estima em sua história de inserção e protagonismo?
Interessa, na pesquisa, considerar a Faculdade do Serviço Social como
contribuidora do processo de autonomia e melhoria de vida das lavadeiras, o que
significou essa inserção social junto às lavadeiras e o seu significado para os dias
atuais, uma vez que a mesma esteve integrada ao trabalho popular além de ser um
marco histórico caracterizado por sua intervenção junto ao poder local, com
influência de uma prática de Serviço Social expressivo como referência para outras
escolas de Serviço Social do Brasil. A pesquisa teve como objetivo compreender
melhor como as lavadeiras articularam-se e mobilizaram-se para a superação dos
problemas vividos no seu cotidiano doméstico e o trabalho remunerado.
2
Alguns deles participavam da luta em partidos clandestinos. Foram presos e exilados como é o
caso da militante política e professora Nobuco. Nascida em Lins, graduada pela Faculdade de
Serviço Social de Lins. Foi diretora Geral do Instituto Paulista de Promoção Humana-IPPH com sede
em Lins e responsável por uma série de estudos sobre a Região. Ficou exilada na França, entre
1968-1978. Assumiu a direção da Faculdade de Serviço Social de Lins, no período entre 1979 a
1984. (REVISTA Cultura de Vozes, agosto de 1969, nº. 8, p. 673).
13
A pesquisa está direcionada à percepção desta experiência, suas dificuldades
e avanços. Busca-se também o significado simbólico do ato de tornar-se sujeito
através da participação.
Metodologicamente trabalhou-se com levantamento bibliográfico e
documental, conversas com informantes e pessoas que viveram a experiência da
Associação das Lavadeiras além das estagiárias, hoje profissionais do Serviço
Social.
Num segundo momento utilizou-se do método qualitativo. Foi elaborado um
roteiro de questões que serviram como orientação para colher o depoimento das
lavadeiras
3
. Estes foram gravados e transcritos. Sua análise e interpretação realizou-
se através de metodologia qualitativa.
A intenção era entrevistar do universo total de 35 lavadeiras, 5 a 10 mulheres,
o que não foi possível, uma vez que muitas delas já faleceram, outras não foi
possível o contato. Das 5 que foram contatadas para o depoimento, uma não
participou por estar acamada e sem condições de falar, permanecendo assim 4
mulheres como sujeito de nossa pesquisa.
As entrevistadas são mulheres residentes em Lins e que participaram
ativamente desse projeto, elas contam suas histórias de engajamento nos
acontecimentos das mulheres e outros desse período. Sua faixa etária está entre 55
a 75. Ocupam hoje a liderança na administração da casa, no trabalho e cuidado com
os filhos. A entrevistada M. V., trabalha como agente de saúde municipal. Quanto ao
estado civil das depoentes: 2 são casadas, uma viúva e aposentada, a outra
separada, com um número de filhos entre 2 a 10. Nos depoimentos, as mulheres
estão identificadas como: depoimento 1, entrevistada F.C.G (68 anos); depoimento
2, entrevistada M.Z (63 anos);depoimento 3, entrevistada M. L. (75 anos) e no
depoimento 4, entrevistada M.V.,(55 anos).
4
Foram contatadas também, 5 estagiários da Faculdade de Serviço Social
dessa experiência com as lavadeiras, hoje profissionais de Serviço Social. Estes
haviam concordado em responder um questionário, objetivando a prática do Serviço
Social e sua inserção junto às lavadeiras, mas, infelizmente não devolveram os
3
Ver na íntegra - Apêndice A
4
Cf. apêndice 3. Transcrição dos depoimentos.
14
questionários, o que justifica a ausência dos mesmos nesse trabalho.
A pesquisa com as lavadeiras realizou – se em setembro /outubro de 2005, a
sua transcrição e análise foram feitas entre junho a dezembro de 2006.
O trabalho divide-se em 2 momentos. Primeiro a abordagem histórica política
econômica e social da realidade de Lins e do Brasil, objetivando o surgimento do
povoamento de Lins e região. Paralela a essa história a trajetória do Curso de
Serviço Social de Lins. Na segunda parte trata-se dos Movimentos Sociais
Populares da década de 1970/1980 situando nele o surgimento do PEOP onde se
insere o surgimento da Associação das Lavadeiras sujeito da pesquisa. Por fim, o
trabalho foca para a história das lavadeiras, objetivando ouvir o relato de suas
experiências e suas respectivas análises.
Este trabalho pretende contribuir para um repensar da questão social aqui
entendida como a causa principal de sua luta, a dos movimentos sociais e ou grupos
que se constituem em prol de sua emancipação e autonomia política. Tais
procedimentos poderão oferecer elementos à reflexão teórico - prática da realidade
junto ao Curso de Serviço Social e militantes em geral e compreender o papel do
protagonismo das mulheres junto ao poder local, quando essas se colocam em
marcha assumindo e fazendo a história da dignidade acontecer na resistência aos
desafios, “sem perder a ternura jamais” e com muita história para contar.
É nossa intenção, daqui para frente, além de ouvir e relatar as experiências
da militância das lavadeiras de Lins, oferecer aos alunos um espaço acadêmico que
reconheça e valorize a voz das mulheres lavadeiras.
15
CAPITULO 1 MULHERES FAZENDO A HISTÓRIA EM LINS NA DÉCADA DE
1980.
1.1 Breves considerações históricas sobre a cidade de Lins e a inserção das
Lavadeiras
Carrego comigo o orgulho de ser parte dessa história de luta do grupo das
mulheres lavadeiras, onde sempre batalhei e tive a satisfação em ser
trabalhadora independente da classe que pertenci. Sou mulher, sou gente,
sou humana, sou negra, tenho dignidade e muita história pra contar desde o
início em que tudo aqui era sertão (Entrevistada M. Z., 63 anos)
5
.
A memória acima remete rever a história da luta das lavadeiras de Lins e seu
processo de inserção na classe trabalhadora assalariada. Buscam-se alguns
elementos históricos políticos, econômicos e sociais da cidade de Lins e como essa
realidade perpassa a vida das mulheres participantes da Associação das Lavadeiras
neste mesmo período.
Conforme o historiador BEOZZO
6
, até 1905, a região Noroeste, onde situa-se a
cidade de Lins, lugar este das experiências concretas e solidificação dos valores
como a organização, solidariedade e companheirismo das lavadeiras, foi
considerada como um lugar de sertão, sem grandes lavouras, coberto pela floresta
tropical e tida como região “desconhecida e habitada por índios”. Uma realidade
populacional marcada pela abertura e construção da estrada de ferro Brasil-Bolívia e
a marcha do café. A Construção da estrada de ferro começou a ser desbravada
pelos trabalhadores, oriundos de Minas Gerais e do Nordeste, mais especificamente
da Bahia, os conhecidos como “abridores do Sertão”. O principal motivo do processo
migratório foi a estrada de ferro, tornando-se essa região em vinte anos, um
“formigueiro humano e um mar de café”.
As dificuldades na migração, desde o início, sempre estiveram presentes, a
começar pelos conflitos violentos com os índios Caigangues que se concentravam
em aldeias espalhadas por toda a região. O desbravamento
para o
5
Moradora de Lins, Integrante do grupo das lavadeiras de 1980 a 1986, depoimento colhido em
setembro de 2005.
6
Cf. livro BEOZZO, José Oscar. Noroeste Paulista: Aspectos demográficos (ou, um caso típico de
povoamento), Revista de Cultura Vozes, Petrópolis: Vozes, 63(9) p. 771-787, set.1969.
16
desenvolvimento agrícola representou para os nativos, uma situação de mudança
brusca de seu modo de ser e viver. Sua presença, de certa forma foi vista como um
entrave à chegada dos fazendeiros como dos migrantes em geral.
O crescimento da “civilização” e o desenvolvimento da produção do café na
ocupação da Noroeste foi um processo um tanto conflitivo. De um lado, interessava
ao Estado unir o Brasil a outros países por meio da Estrada de Ferro; enquanto que
para os fazendeiros do café, as terras da Noroeste tornavam-se fonte de lucro
garantido na venda dos produtos das plantações. A presença dos migrantes fugitivos
de regiões difíceis foi outro aspecto de conflito. Estes migrantes encontravam aí
expectativas de melhorias e estabilidade para a sua família. Por fim, os índios que ali
existiam, sentiam-se ameaçados em sua própria cultura, por causa da invasão, a
construção das estradas, das queimadas e doenças. Por parte dos trabalhadores da
construção da estrada, houve muitas dificuldades e sofrimentos. Muitos deles
morreram de malária, ataques nos conflitos com os índios caingangues. “Abandonar
o serviço nem pensar, quem entra no inferno não sai” (BEOZZO, 1969, p.772).
Na história do povoamento da Noroeste onde se encontrava o município de
Lins, a terra, fonte de vida, tornou-se mercadoria e o resultado foi a intensificação do
conflito; os índios tentando resistir e os demais procurando as mais variadas formas
para vencer os obstáculos. Esta situação de violência contra a resistência indígena
levou ao extermínio dos nativos.
A transformação do índio em proletariado”
7
, expressa determinada realidade
do capitalismo, para o qual não interessa o índio como força de trabalho, pelas
experiências já vividas em outras regiões do país, por sua dinâmica de organização
objetivando apenas as atividades que garantissem a sua sobrevivência e não ao
crescimento do lucro.
Mesmo com a criação do decreto de 1910, sobre o Serviço Social de Proteção
aos Índios, as medidas de mudança nos cenários de conflito não foram suficientes
para impedir o avanço indiscriminado dos fazendeiros e migrantes sobre as terras,
beneficiando esse decreto muito mais à realidade do capitalismo e seu
desenvolvimento do que aos próprios índios.
Nota-se que a colonização da Noroeste segue a ordem de um plano estatal
que
7
Entende-se por proletariado a classe dos assalariados modernos, que não tendo os meios próprios
de produção, são obrigados a vender sua força de trabalho para sobreviver. (Nota de Engels, F. à
edição inglesa de 1888 apud MARX, K, 2005, p.40).
17
deveria garantir a integração à economia capitalista, favorecendo a expansão da
cultura cafeeira, forte propulsora da penetração do capitalismo nas novas regiões e,
ao mesmo tempo, atender às exigências do Estado, objetivando consolidar e
incentivar a exportação para as regiões da Bolívia e Paraguai, tornando essa
realidade cafeeira favorável ao processo de urbanização interiorana.
Desde o início da história estão presentes os problemas de luta de classe
dos trabalhadores frente à pressão da classe dominante. Sempre existiu um
jogo de forças fundada em interesses pessoais. Nossa história não é
diferente da vivida pelos primeiros habitantes dessa região (Entrevistada
M.Z., 63 anos)
8
.
O processo de formação histórica do povo constitui-se em meio às dificuldades,
o que não foi diferente para o grupo das lavadeiras conforme verifica-se no
depoimento acima. As relações de poder vão constituindo as classes movidas por
interesses próprios e da produção do capital, aqui reforçada pela cultura cafeeira.
Nota-se uma relação de trabalho calcada na exploração da mão de obra
assalariada. Em contrapartida, grupos e organizações, como o das lavadeiras
buscam seu espaço de organização na luta pela garantia de sua sobrevivência.
Importante observar na fala, o grau de consciência dessa entrevistada, a visão que a
mesma tem da relação de poder constituída, o que contribuirá para a intensificação
de sua qualidade de sujeito.
Kameyama identifica essa relação de causalidade entre o cultivo do café e o
povoamento, explicando-a por duas razões principais: o café era fonte segura e
estável de riqueza; e as lavouras cafeeiras exigiam muitas famílias de colonos para
o trabalho, a mão – de - obra necessária fixava-se na empresa agrícola (1969 p.
693). Importante lembrar aqui que as lavadeiras têm sua história centrada no
segundo aspecto, em que suas famílias somavam-se ao povoamento objetivando o
trabalho agrícola e, algumas delas, também anos mais tarde trabalharam como
bóias frias nas lavouras de café.
8
Depoimento gravado em entrevista, setembro de 2005, por uma componente do grupo das
lavadeiras de 1980, moradora de Lins.
18
A agricultura cafeeira expandiu - se de tal modo que, a população mesmo
crescente, não foi suficiente para atender à necessidade de mão-de-obra. Essa
realidade de insuficiência humana para o trabalho levou o imigrante a exercer um
papel fundamental e necessário na cultura cafeeira. No período de 1926 a 1930, a
região Noroeste tornou-se o maior pólo de imigração, atraindo portugueses,
espanhóis, alemães, italianos e japoneses.
Todas as possibilidades de enriquecimento atraíram para os setores recém-
desbravados todos os elementos disponíveis da população cabocla, boa
parte dos melhores imigrantes (Kameyama, 1969, p.685).
Estudos históricos realizados por Beozzo (1981), revelam um crescimento
demográfico acelerado da região, passando de 136.000 habitantes em 1920, para
608.000 em 1935. O município de Lins está localizado em um ponto estratégico para
a produção e escoamento dos produtos. Em 30 de dezembro de 1914, torna-se
conhecido como Distrito da Paz de Albuquerque Lins. No ano de 1919 com o
surgimento da Diocese de Botucatu, criou-se a Paróquia de Albuquerque Lins. Em
27 de dezembro de 1919, torna-se então município de Lins. A instalação do
município deu-se aos 21 de abril de 1920, juntamente com a posse da primeira
Câmara Municipal. Aos 29 de dezembro de 1926, passou a denominar-se apenas
Lins.
Ainda segundo o mesmo autor, o município localiza-se à Noroeste do Estado
de São Paulo compreendendo toda área entre Bauru e a Barranca do Rio Paraná,
na divisa de São Paulo e Mato Grosso, com fácil conexão rodoviária, para a cidade
de Araçatuba, Bauru, Marília e São José do Rio Preto, consideradas cidades de
grande vigor.
Lins surge no início do séc. XX no cruzamento de uma trilha de Índios, nas
proximidades do Rio Tietê e Douradinho, hoje conhecido por Campestre, que
circunda a cidade pelo lado Oeste e da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil. Ali tudo
começou como povoado Santo Antônio do Campestre.
Da mesma forma que muitos municípios do Estado de São Paulo, Lins
desenvolveu-se tocado pela estação ferroviária criada, que motivou uma
homenagem ao então governador da época Albuquerque Lins, sendo esse o nome
da cidade.
19
Como outras cidades da região Noroeste, a história de Lins possui estreita
ligação com a estrada de ferro Noroeste do Brasil, como caminho de passagem ao
desenvolvimento da região surgindo, ao longo de seus trilhos, quase todos os
povoados. Essa Ferrovia ganhou significado ao ligar o estado de São Paulo ao
estado de Mato Grosso do Sul e que interliga o Brasil com o Paraguai, Peru, Chile,
Argentina e Bolívia (Baeninger& Vidal, 1994, p.49).
Destacamos alguns elementos significativos da cidade de Lins e da região
sobre a qual a Faculdade do Serviço Social de Lins teve sua abrangência ao longo
da história aqui retratada e por ser esta cidade e faculdade, lugares de experiências
de organização e inserção das lavadeiras no mundo do trabalho de forma articulada.
Como lembra uma das entrevistadas:
Tudo começou em Lins, motivado com o trabalho das alunas estagiárias da
Faculdade de Serviço Social. A gente tinha uma coordenadora que
preparava as reuniões para as mulheres se encontrar e conversar sobre
tudo de nosso interesse: trabalho, casa, salário, lazer, saúde, política e
outros e até sobre a história da cidade (Entrevistada M. L.75 anos)
9
Retomando, a história de Lins e toda região que a influencia, são de um
povoamento recente, não existindo nenhuma cidade nas vizinhanças com mais de
cem anos. O homem branco chegou à região a partir do início do século XX. Essa
região habitada por índios, inclusive, antes de 1905, era tida como uma floresta
natural. Antes desse período, a tentativa de povoamento foi sem sucesso algum.
O velho Anhembi (Tietê) era caminho de penetrações. (...) Martins Barros,
em cartas datadas de 1776, sugeria ao Capitão General de São Paulo que a
Povoação de Piracicaba viesse à Barra do mesmo Rio ou nas suas
vizinhanças. (...). Em 1842, famílias mineiras, procedentes de Piumby (...)
alcançaram o Tietê pelo Ribeirão dos porcos e pelas barras de seus
afluentes, foram fazendo posses (...) Santa Cruz do Avanhandava
(Penápolis) foi um dos pontos de penetração, como em 1888, foi Pirajuí (...)
aos 13 de maio de 1858 foi fundada a colônia militar de Avanhandava (...)
Aos 26 de junho de 1858(...) criando o Estabelecimento Naval de Itapura.
No entanto as terras da Noroeste já eram habitadas. Os aldeamentos dos
Caingangues cobriam a região. O Itapura era visitado pelos Caingangues,
Caiapós, que, com os Xavantes,
pertencem ao grupo dos Tapuias. O tempo
propício às visitas era a piracema (CINQÜENTENÁRIO da Diocese de Lins,
1976, p.10).
No período de povoamento a Igreja Católica teve forte influência e avançou no
9
Depoimento gravado em entrevista, setembro de 2005, integrante do grupo das lavadeiras, uma das
pioneiras, moradoras de Lins.
20
processo de evangelização da população indígena, surgindo nessa primeira
tentativa de povoamento sinais de religiosidade, como os cruzeiros e as capelas. No
Salto de Avanhandava, depois da ponte, na estrada que liga as cidades de São José
do Rio Preto a Presidente Prudente ou Penápolis, na época, edificada por ordem do
imperador, surgiu uma capela, dedicada a Nossa Senhora do Carmo, a qual
recebera das mãos imperiais, sino e imagem (...). (Cinqüentenário da Diocese de
Lins, 1976, p10-11).
As cidades e povoados foram crescendo e fixando-se junto às paróquias.
Conforme publicação em comemoração ao Cinqüentenário da Diocese de Lins de
1976, aos 13 de Junho de 1919, é criada a Paróquia de Santo Antônio de Lins. Em
1925, as Paróquias de Pirajuí, Presidente Alves, Avaí, Reginópolis, Promissão,
Cafelândia (Carmo), Avanhandava, Penápolis, Glicério, Birigui, Araçatuba. Aos 21
de junho de 1926 (...) cria-se o Bispado da Noroeste com sede em Cafelândia. (...)
Aos 22 de agosto, tomou posse o terceiro bispo Dom Henrique Gelaim. (...) Aos 30
de agosto de 1950, a sede da Diocese foi transferida para a cidade de Lins (p.13).
Nesse período a presença da Igreja voltando-se mais à evangelização, teve
grande influência no processo de organização popular oferecendo apoio, acolhida
aos espaço de luta, colocando-se junto aos empobrecidos e injustiçados na defesa
da vida.
Em meados dos anos de 1860, os índios reagiram e massacraram os brancos
que invadiram suas terras, ocasionando um despovoamento da região e “até 1905,
toda essa região (Noroeste do Estado de São Paulo) coberta pela floresta tropical
era assinalada nos mapas como uma região desconhecida e habitada por índios”
(BEOZZO, 1969, p. 771). Com o surgimento de instalação da ferrovia Brasil-Bolívia,
os brancos retomaram o projeto de dominação e, a partir de então, começaram uma
segunda etapa do povoamento da região, agora com sucesso.
O desmatamento e o assassinato dos índios já mencionados aconteceu do
mesmo modo como no resto do país, no mesmo período: por meio de roupas
contaminadas por doenças infecto-contagiosas, os índios contraíam doenças e sem
conhecê-las não sabiam como combatê-las e acabavam morrendo, quando não,
eram caçados como animais e expostos como troféus. Beozzo (1969) descreve uma
carta – denúncia publicada em 1908 que ilustra a história de um casamento indígena
interrompido, seguida de um massacre:
21
É horroroso o que praticam alguns trabalhadores da estrada de ferro
Noroeste do Brasil, entre Bauru e Avanhandava, com os pobres índios
Coroados. Aqui o assassínio de índio é uma espécie de esporte, chega a
ser mesmo uma divertidíssima caçada para os referidos trabalhadores. Há
dias, na ocasião em que os mesmos coroados realizavam casamento,
segundo o seu rito, aos que afirmam os entendidos, foram vistos pelos
trabalhadores da estrada que, a tiros de carabina, assassinaram homens,
velhos, mulheres e crianças, poupando tão somente a vida de uma jovem
índia, de quem abusaram de maneira mais indigna, cometendo em seguida
uma série de cenas de vandalismo (BEOZZO, apud SILVA, 1992, p. 56 e
58).
Um fator a destacar o povoamento intensivo da região nesse período, foi o
econômico:
A zona desconhecida de 1905, conta, 15 (quinze) anos depois, com uma
população de 136.454 pessoas. A partir daí, nos 15 (quinze) anos
seguintes, essa população passará para 608.000 pessoas (...). As
plantações de café seguem o mesmo ritmo e os 722.119 cafeeiros de 1920
transformam-se em 12.544.045 em 1935 (BEOZZO, 1969, p. 774).
Por outro lado, “a população dos Caingangues e Coroados na região há ainda
um pequeno grupo, no Município de Braúna, no Posto de Icatu”
(CINQUENTENÁRIO, Diocese de Lins, 1976, p.10).
A região conheceu outro surto de desenvolvimento com a perspectiva da 2ª.
guerra. A região de Lins foi uma das maiores produtoras de café do mundo na bolsa
de Nova Iorque entre 1929 e 1940. Com o surgimento da crise da lavoura do café, a
região transformou-se em área de outras culturas e pastagens.
“A decadência do café se deu depois de 1940, sucedendo assim outras culturas
tornando a região uma grande produtora de algodão, batata e menta. Nos últimos 10
(dez) anos deu-se a radical transformação no panorama agrícola”. (KAMEYAMA,
1969, p. 696).
A década de 1940 foi de adaptação da região às novas culturas, junto ao
plantio do café, permanecendo essa situação até o início da década de 1950,
quando os grandes produtores de café buscavam integrar-se aos novos tempos e
investirem em outras culturas como forma de resolverem os problemas sociais que
aconteciam em relação aos colonos.
22
No final da década de 1950 e início de 1960, durante a fase inicial do período
populista/desenvolvimentista
10
, nascia na cidade de Lins, a Faculdade de Serviço
Social de Lins e outras escolas de nível superior. Lins havia se tornado um forte pólo
de atração, significativo na época, vários fatores mostravam que o Município poderia
crescer de forma ainda mais rápida. Entre 1940 e 1960, o município de Lins, passara
então de uma população de 36.365 habitantes em 1940, para 47.629 habitantes em
1960
11
. Apresentava-se uma economia sobre os moldes da produção agrícola,
chegando perto de 25.000.000 pés de café, conferindo ao município o título de maior
produtor da rubiácea no mundo.
O quadro a seguir demonstra a situação da população rural e urbana no
período de 1950 a 1980. Mais especificamente chama atenção o aspecto da
população rural que diminui a partir de 1960.
Distribuição da População Rural e Urbana entre 1950 e 1980
ANO POP. URBANA % POP. RURAL % TOTAL %
1950 20.376 50,9 19.591 49,1 39.967 100
1960 32.384 67,5 15.555 32,5 47.939 100
1970 38.115 83,6 7.440 16,4 45.555 100
1980 44.771 87,6 6.386 12,4 51.077 100
Fonte: BEOZZO, J. O. Revista Novos Escritores, nov. 1981.
No período de 1960 a 1970, Lins, passa a ter sua economia, essencialmente,
agropecuária, para a prestação de serviços, nas áreas de comércio, educação,
assistência médica - hospitalar, beneficiando toda região. Tal transformação
possibilitou o surgimento de um setor urbano constituído por estudantes,
professores, bancários, funcionários públicos e profissionais liberais. (PERIN, 1983,
p.18).
10
O populismo possui três elementos essenciais: nacionalismo desenvolvimentista, o pacto das
classes e a intervenção do Estado. O populismo é marcante a partir da II Guerra Mundial, vemos a
partir daí a ascensão da burguesia industrial. Esta como forma de desenvolver sua política
econômica, a industrialização, busca intervenção do Estado. O populismo continua presente no
governo de JK, JQ e Vargas, permanecendo até o governo de Goulart. Nessa fase o Serviço Social
assume no Brasil a postura desenvolvimentista. Na década de 1950 mais especificamente vemos
surgir os primeiros escritores em Desenvolvimento de Comunidade no Brasil, entre eles, assistentes
sociais. (AGUIAR, 1995, p. 84/85/86).
11
Dados recolhidos por Nobuco Kameyama e José Oscar Beozzo, no Registro Civil da Cidade de
Lins/SP (REVISTA DE CULTURA VOZES, v. 63, n. 9, p.781).
23
1.2 Percurso Histórico da Faculdade de Serviço Social de Lins
Na década de 1960/1970, Lins, é conhecida historicamente como grande
centro educacional do Estado, com duas Faculdades Superiores: a de Filosofia e de
Engenharia. A população estudantil dessa época era de 13.182 estudantes,
somando-se: 7.287 no primário, o secundário em aproximadamente 5.500, e no nível
superior, aproximadamente 350 alunos.
[...] num raio de 140 quilômetros, a Faculdade de Serviço Social, servirá a
uma das mais vastas regiões do Estado abrangendo diversas cidades como
Bauru, Marília, Garça, Penápolis, Araçatuba, Birigui, Pirajuí, Novo Horizonte
e outras. Será a primeira faculdade do gênero a ser instalada no interior do
Estado, nessa região, podendo ainda, servir parte do estado de Mato
Grosso. (...) existe real necessidade de sua instalação (RELATÓRIO DO
INSPETOR VERIFICADOR DE BAURU, da Diretoria do Ensino Superior,
p.4-5, 02 out. 1958).
A fala da entrevistada a seguir, confirma a necessidade e o compromisso da
Faculdade de Serviço Social junto aos grupo das lavadeiras como instrumento de
organização e educação popular.
Naquela época havia o apoio da Faculdade de Serviço Social de Lins junto
das lutas do povo. Ela sempre se colocava junto aos maiores problemas
como desemprego, educação, moradia, exploração. Por todo canto tinha
estagiárias e assistentes sociais como membros atuantes com a gente nos
grupos e movimentos como idealizadores e mobilizadores de direitos dos
trabalhadores em suas reivindicações. Ninguém tinha medo de arregaçar as
mangas (Entrevistada M. Z, 63 anos).
Importante relacionar que a Faculdade de Serviço Social de Lins surgiu em
meados dezembro de 1958, como conseqüência de vários fatores ligados
diretamente à conjuntura da época: de um lado, a necessidade vista pela oligarquia
rural que dominava a cidade de Lins e Região de entender a realidade local e as
demandas no aspecto social, especificamente, como se dava a relação
capital/trabalho no campo. Essa preocupação continua claramente presente no
objetivo do Serviço Social da época. “Empenhar-se na promoção humana e por uma
ordem social justa (...) e na integração do homem no processo de desenvolvimento”
(FERRREIRA, 1982, p. 15).
Por outro lado, pela própria conjuntura econômica e política do país, quando a
região de Lins, vivenciou a decadência do café e o expressivo êxodo rural. A
24
realidade de exclusão da população que veio do campo apresentou significativas
ameaças ao poder dos latifundiários. Aí a necessidade então de profissionais e
técnicos preparados para intervir e interagir na questão social.
Mesmo com o empenho de setores da oligarquia rural atrelada à classe média
em criar e efetivar a Faculdade, anteriormente a 1958, de acordo com a ata da
primeira reunião da Congregação, somente em dezembro deste mesmo ano pelo
Decreto nº. 45.188 que a Faculdade de Serviço Social de Lins, foi autorizada e
passou a existir.
12
A Faculdade de Serviço Social de Lins foi a primeira de todas que as
Missionárias de Jesus Crucificado fundaram, o que não dependeu apenas da
vontade as Irmãs. Como afirma Madre Altiva
13
, a primeira diretora da Faculdade:
Nós já tínhamos Faculdades de Serviço Social em algumas capitais,
principalmente no Nordeste. No interior de São Paulo, fora Campinas, foi a
primeira e, assim mesmo, por solicitação da comunidade. A comunidade
Linense já tinha colocado à nossa disposição um terreno. Não sabia ainda
se aceitaríamos ou não fundar a Faculdade. Mas eles queriam uma
Faculdade de Serviço Social, especificamente (...) junto com a igreja, junto
com o bispo – que era D. Henrique Gelaim naquela época -, havia o Dr.
Rato, um grande fazendeiro que, junto com pessoas da cooperativa de
cafeicultores, da qual era presidente, juntou forças e deu condições para
fundarmos a faculdade (PAIXÃO 1959, apud SILVA, 1992, p.80.).
Até que tivesse seu próprio espaço, a Faculdade funcionou no Círculo Operário,
à Rua Regente Feijó nº. 52, oferecido pela Igreja Católica. “Em 04 de novembro de
1959, foi recebido do Serviço Social do Estado, um milhão de cruzeiros, para iniciar
a construção do prédio próprio, à Rua D. Lúcio, 165”
14
onde passou a funcionar até
fins de 1990, quando transferida para a Fundação Paulista de Tecnologia e
Educação.
É bem verdade que o discurso sobre a necessidade do surgimento da Faculdade
teve uma relação direta com o momento político brasileiro, ou por desenvolvimento
ou por ameaça política.
12
Ver Ata de 26/01/1959 do Livro de Atas das Reuniões de Congregação, fl. 1.
13
Formada em Serviço Social pela Faculdade de Juiz de Fora, Religiosa da congregação das Irmãs
da Sociedade Feminina de Instrução e Caridade, conhecida popularmente, como Irmãs Missionárias
de Jesus Crucificado. Esta Congregação é de origem brasileira, fundada em 1928. Irmã Altiva atuou
na como diretora do Curso de Serviço Social de Lins, no período de 1959-1966. Atualmente vive em
Juiz de Fora com 85 anos de idade.
14
Cf. Ata de 04/11/1959, do livro de Atas das Reuniões de Congregação, fl.6).
25
Ao se tomar conhecimento das falhas da estrutura assistencial no Município
e mesmo na Região no aspecto de assistência global e familiar pela
Comissão Municipal (...) tomando contato com os problemas regionais,
sentiu-se necessidade da criação da Faculdade de Serviço Social que, pelo
menos seus técnicos poderiam enfrentá-los com métodos mais adequados
para uma ação, não só na zona urbana, como na zona rural (...) Ou as
democracias são capazes de promover o bem comum, a justiça social ou
esse bem comum será instrumento de manejo para a conquista de regimes
coletivistas ou totalitários (Ata de 26/01/ 1959 do livro de Atas das Reuniões
de Congregação, fls. 2 e 3).
Destacou-se a importância dos esforços de todos nas mais diversas esferas
políticas dominantes da cidade para criar a Faculdade: o comandante do 37º.
(trigésimo sétimo) Batalhão de Infantaria Motorizada, a senhora Joceline Guimarães,
irmã do Deputado Federal Ulisses Guimarães e, na época, Presidente da Comissão
Regional da Legião Brasileira de Assistência - LBA, o Presidente da Cooperativa dos
Cafeicultores, D. Henrique Gelaim, em conjunto, empenharam-se para o surgimento
da Faculdade, de Serviço Social. O curso de Serviço Social, como dito antes, um
dos mais antigos cursos no interior de São Paulo, obteve reconhecimento em âmbito
nacional.
No período do surgimento da Faculdade destacou-se um forte vínculo com uma
das primeiras instituições de nível nacional, estadual e municipal que era a LBA
15
instituída no governo Vargas, a qual demandaria contingentes de profissionais
assistentes sociais, oferecendo subsídios para expansão do Serviço Social.
A primeira instituição nacional de assistência Social é organizada em
seqüência ao engajamento do país na Segunda Guerra Mundial. Seu
objetivo declarado será prover necessidades das famílias cujos chefes
haviam sido mobilizados. (...) Surge a partir de iniciativa de particulares logo
encampadas e financiadas pelo governo. (...). (IAMAMOTO, 1996, p. 256-
257).
Em Lins, foi visível diante da conjuntura econômica, política e social, que a
Faculdade contou com o apoio do Serviço Social rural e da LBA, segundo
FERREIRA (1982), “o Serviço Social Rural, concedeu para as duas primeiras turmas
quarenta e duas bolsas de estudos”. (p. 17).
15
Pelo Decreto-lei nº 4830, de 15-10-1942, a LBA é reconhecida como órgão de colaboração com o Estado no
tocante aos serviços de assistência social. (IAMAMOTO, 1996, p. 257).
26
Através da Lei nº 2. 631, de 23/09/1955, criou-se o Serviço Social Rural que
vai ser organizado e começa sua atuação a partir de 1959. Sua presença
marcante será a partir de 1960. Este serviço receberá apoio do governo e
de vários programas internacionais, bem como de órgão patronais da área.
Sua atuação implicará processar o desenvolvimento capitalista no campo.
(AGUIAR, 1995, p. 89).
De acordo com o REGIMENTO, da Faculdade de Serviço Social de Lins, nesse
período, a Faculdade por meio da aplicação de métodos e técnicas próprias tinha a
finalidade de possibilitar uma formação de pessoal técnico e capacitado para ação
do Serviço Social em qualquer de seus campos; aperfeiçoar e divulgar técnicas e
conhecimentos de acordo com o Serviço Social; propiciar ambientes adequados à
resolução de problemas. (apud FERREIRA, 1982, p.16).
A ênfase dada à formação profissional nesse período baseou-se na bibliografia
americana, objetivando a preparação dos alunos para, desde o primeiro ano do
curso, estagiarem nas mais diversificadas experiências e campos tais como: LBA,
berçários, Centros Sociais, creches, junto à população rural, em funções
educacionais e intensificando o desenvolvimento dessas comunidades no nível
regional.
A partir dos anos 1960 a Faculdade ganhou nome e projetou-se na vida da
cidade e teve o seu apogeu nesse período. O primeiro desafio do curso foi a
necessidade de uma bibliografia básica, pois, a que existia no Brasil era escassa.
Conforme a Diretora Irmã Altiva, “só havia livros americanos que eram traduzidos,
entre esses, Simone PARÉ, Gordam HAMILTON e Arthur DILLMAN”.
Mesmo com dificuldades em avançar na estruturação do curso, esse foi um
período rico em várias articulações junto aos demais cursos existentes na cidade,
principalmente, com a Faculdade de Filosofia, intencionando a criação de uma
Universidade cujo campus seria toda a cidade de Lins, transformando-a de “cidade
das escolas” cidade universitária como Lins era conhecida. Essa idéia permaneceu
apenas como possibilidade, pois não se concretizou.
Tanto no processo de formação de professores como na expansão do curso de
Serviço Social de Lins, a faculdade buscava uma intervenção e inserção mais direta
junto à vida da cidade, procurando expandir os campos de estágio por toda a região.
Por meio do Desenvolvimento de Comunidade, os professores ministraram cursos
na zona rural em interação com as outras instituições já mencionadas. A forma de
atuação dos profissionais trouxe um bom resultado, pois a prática da Faculdade era
27
também de interesse dos grandes latifúndios, isto é, a de buscar soluções dos
problemas de uma região que, de grande produtora de café, transformava-se em
área de plantio de outras culturas como algodão, batata e menta e ansiava,
futuramente, tornar-se área de pastagens.
No período de 1959-1968, conforme depoimento de uma ex-aluna:
A Faculdade foi pioneira na criação, incentivo e organização de várias
entidades e obras existentes na comunidade, por meio do trabalho das
Irmãs de Jesus Crucificado e das alunas estagiárias na abertura de campos
de estágio. Marcando muito na época o Serviço Social Rural com a criação
dos clubes agrícolas do Tangará e Guapiranga (EX-ALUNA apud SILVA
1992, p. 87).
Irmã Altiva lembra como um fato histórico que “o surgimento da Faculdade de
Serviço Social de Lins, organizou o Serviço Social na região, inclusive em Bauru,
onde, depois, nasceu outra Faculdade de Serviço Social”, o que revela que a
Faculdade de Lins era um pólo de forte influência para outras Instituições tendo sido
convidada, na época, para ajudar na organização da Diocese de Bauru. Os alunos,
a pedido de D. Pedro Paulo Koop, então Bispo de Lins, fizeram um levantamento
para o Vaticano, objetivando conhecer o que era necessário saber para organizar
uma Diocese.
Ainda na fala da Diretora o relacionamento da Faculdade com a Igreja Católica,
com a Associação Brasileira de Ensino em Serviço Social - ABESS e as relações
estabelecidas com as Instituições locais e até nacionais, contribuíram para o bom
relacionamento com o Ministério de Educação e Cultura. A Faculdade de Serviço
Social de Lins chegou a ser indicada como inspetora de outras Faculdades de
Serviço Social (PAIXÃO apud, SILVA, 1992, p.88).
Considerando o empenho desse período e os bons resultados do Serviço
Social, não se pode esquecer que esse foi também um tempo de intensificação dos
conflitos marcado pela política de repressão do governo militar de 1964. A partir do
AI-5 (1968), a Faculdade viu-se coagida a romper com todos os projetos de cunho
social articulados com a população rural. Destacou-se ainda dessa fase a
perseguição à professora da faculdade de Serviço Social e ex-aluna da escola,
Nobuco Kameyama:
(...) nos anos de 67, 68 e início de 1969 fizemos ainda, um bom trabalho de
organização da população rural (...) que desenvolveu cooperativas,
atividades coletivas que a comunidade assumia a venda de produtos em
conjunto (...) e coisas nesse sentido. Mas acontece que naquela época
28
começamos a sentir que a região começava a sofrer processo de
proletarização (...). Nessa época tivemos que enfrentar uma luta em Santa
Fé do Sul, Região de São José do Rio Preto (...). Entrou aí polícia, jagunço,
tudo... E (...) nós tivemos que deixar a área. Foi por isso que pagamos o
preço do AI-5 (...). Depois tivemos que sair do país também (KAMEYAMA
apud SILVA, 1992, p.93).
A Faculdade de Lins não ficou alheia aos acontecimentos protagonizados pela
Ditadura Militar no contexto nacional e, impedida de contrapor-se ao regime, buscou
uma prática institucionalizada como forma de atender às demandas de acordo com o
regime, acabando com o caráter interventivo organizacional popular.
A dissertação de Mestrado do professor Matsuel Martins da Silva (1992), sobre
a história da Faculdade de Serviço Social de Lins, remete-nos à trajetória política do
período de 1958 a 1988, no qual se insere a história da Associação das Mulheres
Lavadeiras tema de nosso estudo e da intensificação da qualidade de sujeito destas
mulheres, nosso objeto.
A cidade de Lins teve forte característica de uma oligarquia rural dominante,
reforçando cada vez mais o mandonismo local
16
e direcionou os rumos da política
institucional local. Estes formavam o grupo dominante e colocavam no poder os
representantes de seus interesses de classe.
No período, 1960 a 1963, Lins foi governada pelo prefeito do Partido
Trabalhista Brasileiro - PTB, em substituição ao líder político anterior da União
Democrática Nacionalista - UDN, que havia renunciado em 02 de agosto de 1959.
Segundo registro da Câmara Municipal de Lins desta mesma época, este renunciou
em março de 1963, objetivando candidatar-se a cargo legislativo. De janeiro de 1964
a Janeiro de 1969 fica novamente a política local nas mãos da UDN, partido de
estrutura urbana conservadora, passando para os quadros da ARENA, com uma
prática política reforçadora do golpe militar de 1º. de Abril de 1964.
17
A realidade autoritária da Ditadura Militar impôs às pequenas e médias
cidades, entre elas Lins, a exigência de uma acentuada dependência em relação ao
16
Apresenta-se como uma forma de estruturação social baseada no latifúndio, ou seja, nas grandes
propriedades de terra, no que se poderia chamar de “grande família”. É o modo pelo qual se
processara a ocupação do solo, desde o início da colonização. As grandes propriedades centradas
nas mãos de alguns senhores. Aquele que chegava ali numa zona qualquer era condenado a ficar
sob a sombra do mandão local e ligá-lo fortemente a si se quisesse ter seu apoio e ali permanecer. É
a escravidão reforçando o poder local do proprietário rural. Essa realidade de uma relação de
dominação versus dominado trouxe à tona o nódulo duro e resistente do mandonismo local no Brasil,
que fazia os homens se definirem em termos de posse em relação uns aos outros (QUEIROZ, M. I. P.
de. O mandonismo local na vida Política brasileira e outros ensaios, São Paulo, Alfa - Omega,
1976, p. 19 e 33).
17
Cf. Câmara Municipal de Lins. Relação de Prefeitos, 1920/1989, Fls. 6-7.
29
poder central
18
do ponto de vista político e econômico, além das intervenções nos
aspectos sociais e culturais. De um lado a cidade cresceu e o município recuperou
sua expansão no período de 1980, e a realidade do êxodo rural mudou a
característica da região. Conforme estatística do quadro anterior, Lins teve um
acréscimo em sua população urbana diminuindo assim a população rural. Há um
crescimento em geral da população do município.
O fenômeno da urbanização é o reflexo da expulsão do trabalhador rural do
campo dando lugar às transformações da lavoura de café, às pastagens e ao gado.
População essa que segundo BEOZZO, vivia refratária à urbanização, e residindo
muitas vezes, na periferia da cidade, conservava os hábitos e a mentalidade do
campo.
Esta população que abandonou o campo criou um fluxo migratório para as
regiões do Norte do Paraná, Sul de Mato Grosso e região da grande São
Paulo. Em parte, porém, veio instalar-se em pequenas comunidades de
1.000 a 1.500 habitantes, continuando a viver uma vida tipicamente rural. E
um contingente mais importante partiu ainda em demanda das cidades
médias do interior, sem ser, no entanto absorvido na sua estrutura de
trabalho. São rurais habitando na cidade onde constituem um novo homem
e inauguram uma nova forma de relações de trabalho e de recrutamento de
mão-de-obra (BEOZZO, 1969, p. 784- 785).
O inchaço da população urbana criou a aglomeração e provocou uma série de
mudanças à população que necessitava de melhorias para a superação de sua
miséria. A falta de interesse político da classe dominante local e do poder central
provocou, ainda mais, o aumento da pobreza, o desrespeito por parte dos
patrões, quanto as leis referentes ao pagamento do salário mínimo. As políticas
sociais dessa época, no nível local, refletiam as nacionais e, visavam mais,
prolongar a situação, do que a prevenir com medidas alternativas. Permanece como
função do poder local, de um lado a organização das velhas oligarquias, e de outro,
os donos do poder visando meramente a manutenção do poder e, de outro, os
setores populares em busca de melhores condições de vida.
Frente ao embate político, surgiu uma postura de resistência e articulação dos
políticos engajados na prática partidária de oposição e por parte da Igreja Católica,
18
Paralelo ao mandonismo que se afirma em todas as ocasiões como o poder mais forte, veio se
desenvolvendo também um poder central. Durante a primeira República o poder central principia a se
desvencilhar do coronelismo e a construir uma força independente com o qual é preciso contar;
chegam mesmo a um equilíbrio de forças, governo central e mandões políticos trata-se de potência a
potência (QUEIROZ, M. I. P. de. O mandonismo local na vida Política brasileira e outros ensaios,
São Paulo, Alfa - Omega, 1976, p 33).
30
como foi o caso de alguns padres e do Bispo de Lins, na época, D. Pedro Paulo
Koop
19
, na tentativa de romper com poder executivo das mãos dos militares e de
seus aliados. O bispo em muitas situações de conflito enfrentou o 37º. Batalhão de
Infantaria Motorizada, buscando informações sobre os leigos e religiosos presos e
exigindo a liberdade dos líderes políticos e cristãos engajados na prática
progressista da Diocese de Lins, presos pelos militares.
Em janeiro de 1967, a Irmã Neli da Conceição
20
assume a direção da
Faculdade na ausência de Irmã Altiva que necessitou deixar o cargo em meio aos
conflitos do período da Ditadura Militar, com perseguição dos militares aos idealistas
e militantes.
No período de 1968 a 1970, a Irmã Nair Donzellini
21
assume a Direção, sem ter
muito conhecimento das causas internas dos conflitos anteriores. A ditadura
instalou-se por definitivo, mais precisamente a partir de dezembro de 1968,
reprimindo qualquer tentativa de mudança no regime de governo.
No período de 1968, mais especificamente, a repressão foi um marco na
atuação da Faculdade de Serviço Social. Essa realidade causou em alguns
professores e direção medo e insegurança, o que dificultava, de certo modo, discutir
questões ligadas ao processo de formação da consciência crítica ou sobre o
momento político ou social e econômico vivido no país.
A Faculdade passou pela dinâmica de retrocesso à prática institucional interna,
limitando sua intervenção junto às outras instituições, como mencionado
anteriormente, permanecendo apenas a presença dos alunos para seu estágio
curricular. Frente às situações de dificuldade, é importante afirmar que, tanto o
Documento de Araxá como o de Teresópolis, foi o referencial usado na Faculdade
de Serviço Social de Lins, como tentativas de reflexão do Serviço Social, focado nas
19
Dom Pedro Paulo Koop - Missionário do Sagrado Coração de Jesus - MSC, nasceu na Holanda.
Trabalhou no Brasil desde 1931. Por 18 anos foi vigário da cidade de Bauru e Bispo de Lins, SP,
1960 – 1970. Fundador do Instituto Paulista de Promoção Humana - IPPH, Autor do projeto de
reforma do costumeiro clerical, permitindo a ordenação de homens casados, surgidos e educados
nas comunidades de base – CEBs. O projeto tornou-se mundialmente famoso e aceito por 70% do
episcopado. Foi um Bispo da Teologia da Libertação. REVISTA DE CULTURA VOZES, 1969,v. n.9,
p.788).
20
Mineira, vinda de Campinas, Missionária de Jesus Crucificado, formada em Serviço Social,
assumiu a direção da Faculdade de Serviço Social de Lins, provisoriamente no ano de 1967, coma
saída de Madre Altiva.
21
Paulista formada em nível superior, Irmã Missionária de Jesus Crucificado, assumiu a direção da
Faculdade de Serviço Social de Lins, no ano de 1968 a 1970. Hoje vive em São Paulo, é Provincial
da Região de São Paulo, com 80 anos de idade.
31
discussões do Serviço Social do Brasil mesmo que ainda numa linha um tanto
conservadora. Esta perspectiva influenciou a formação de um grande grupo de
profissionais de Serviço Social, formados sob a ótica modernizadora, ocasionando
mudanças do conteúdo programático curricular do Serviço Social de Lins e demais
faculdades do Brasil, que de acordo com AGUIAR (1995), apresentava uma forte
influência tomista
22
.
A partir da década de 1970, com o Movimento de Reconceituação
23
, a
Faculdade começa uma nova fase. Procurando dar respostas às interrogações dos
alunos e de uma parcela de professores que questionavam a ausência de uma ação
integrada à realidade vivida pela população, começa então, a busca por uma
formação profissional fundamentada em aspectos teóricos e práticos da profissão
que faziam a leitura crítica da realidade.
De acordo com Ferreira (1982), “as mudanças são frutos de conflitos que
nascem de idéias divergentes, que ao serem refletidos e analisados podem voltar-se
a uma ação comum”. Ainda segundo essa autora, houve discordância, demissões de
alguns professores, na sua maioria os da área de conhecimentos profissionalizantes
do Serviço Social e também admissões de outros professores considerados por
consenso entre os já efetivados, mais abertos e aptos as mudança do momento (p.
29).
O Movimento de Reconceituação no Brasil estava preocupado em focalizar
aspectos teóricos que respondessem de forma adequada à realidade Latino-
Americana, uma vez que os problemas até então solucionados, eram
fundamentados na teoria americana, desvinculada da realidade brasileira
subdesenvolvida. O início desse movimento de reconceituação surgiu com o
lançamento da Revista Debates Sociais em outubro de 1965 editado pelo Congresso
Brasileiro de Serviço Social - CBCISS. No 1º Seminário de Teorização de Serviço
Social em ARAXÁ-MG de 19 a 26 de Março de 1967, e contou com a participação
de 38 (trinta e oito) Assistentes Sociais, que em estudos e reflexão elaboraram o
Documento de Araxá.
22
Corrente filosófica baseada no princípio de que o “homem é naturalmente um animal social”.
Necessita viver para os outros e não somente para si. AGUIAR, 1995, p. 64.
23
Esse movimento tal como se expressou em sua tônica dominante na América Latina, representou
o marco decisivo no desencadeamento do processo de revisão crítica ao Serviço Social no continente
(IAMAMOTO, 2003, p. 205).
32
Conforme o Documento de Araxá, os participantes afirmaram “ser esta
reformulação do Serviço Social em novas linhas de teoria e de ação para
servir à pessoa humana e à sociedade. O serviço Social, como agente
intervém na dinâmica social no sentido de orientar e levar a população à
tomada de consciência dos problemas sociais de forma a colaborar nos
modos de integração popular no desenvolvimento do país” (DEBATES
SOCIAIS, Documento de Araxá, 1965, p.13).
Quanto ao ensino de Serviço Social no preparo técnico dos profissionais na
forma de intervenção havia uma preocupação frente à realidade posta. De 10 a 17
de Janeiro de 1970, nasce o Documento de Teresópolis, elaborado no II Seminário
de Teorização do Serviço Social. Nessa década salienta-se que havia um clima de
intensificação da discussão política, com uma correlação de força bem diferenciada
da década anterior.
O Estado exercia o papel de controlador das forças políticas de direita,
garantindo pela repressão as condições de estabilidade econômica e social a “paz
trabalhista” exigida pelo capital estrangeiro e controladas pelo arrocho salarial e leis
anti-greve.
As classes dominantes na América Latina, aliadas às multinacionais garantia os
interesses do capital e a implantação da modernização capitalista reforçando o
crescimento dos problemas sociais, a inflação desenfreada, oriunda da expansão
capitalista e da produtividade econômica, sob os moldes intensivos de acumulação
do capital.
O período entre1973 e 1976, apoiado por parte da Igreja Católica, de Lins, a
resistência ao governo militar de Médici teve o apoio do movimento estudantil. A
organização contou com caminhadas universitárias, promovidas pelo clero local,
convocando à participação da população envolvida e originando discussão sobre os
problemas sociais de dominação política e a exploração do trabalhador.
Mais da metade do nosso povo vive condições infra-humanas, em estado
permanente, não de pobreza, mas de miséria, de fome, de doença,
ignorância, desemprego, ou com profissão instável e mal remunerada.
Prevalece uma sociedade mal estruturada, na qual impera o individualismo
e o egoísmo, sendo o homem, considerado mero instrumento no processo
de produção econômica e não seu beneficiário. Urge eliminar as causas que
impedem a realização do homem como pessoa. (KOOP, D. Pedro Paulo,
1969, apud REVISTA de Cultura Vozes, v.63, n.9, p.788).
A experiência de organização levou ao crescimento da tomada de consciência
dos estudantes Linenses e da população que a cada dia tornava-se solidária em
defesa da opressão do povo em reação as atitudes de dominação por parte da
33
classe dominante.
No que se refere ao poder local, a mesma oligarquia rural do período anterior,
continuou na liderança política e governou a cidade até 1976, quando foi eleito o
prefeito do Movimento Democrático Brasileiro – MDB. Com a eleição de um
candidato da oposição, ventos novos de abertura política sopraram por Lins, pois
sua eleição contou com o apoio das camadas médias e pobres da população e
articulação do movimento estudantil da Faculdade de Serviço Social de Lins e
Engenharia, da qual o mesmo foi professor. A cidade de Lins foi beneficiada com os
reflexos da melhoria política. O município resistiu às investidas do governo central e
às perseguições políticas do período da Ditadura Militar.
Com os primeiros sintomas da abertura política, em 1977, realiza-se o Concílio
de Jovens, objetivando discussões emergentes da realidade como organização
política e participativa, envolvendo grande parcela da população organizada, da
Pastoral Universitária - PU
24
·
A cidade de Lins ao mesmo tempo em que lutava por sua particularidade,
crescia com os espaços de abertura aos eventos nacionais. Apoiado nas
experiências de grupos das lavadeiras de Goiânia, a organização do grupo das
lavadeiras contribui para abertura de novos empreendimentos de suas organizações
e melhorias para o município e, ao mesmo tempo, expandiram suas experiências de
luta a outros movimentos sociais como, aos trabalhadores rurais, às empregadas
domésticas, e à associação amigos de bairros.
O Serviço Social era nosso apoio, os alunos e professores incentivavam as
comunidades a se juntar, orientavam como defender e brigar pelos nossos
direitos. Tinha mulheres que trabalhavam muito para suas patroas e ainda
encontrava força para cuidar de sua casa e de seus filhos. Tudo era mais
difícil desde os tempos da ditadura. O maior orgulho da gente era não
desistir mesmo nas dificuldades. Eu sempre vi que as mulheres e os demais
grupos que existia e a faculdade lutavam, pois, queriam ter a sua vida e
cuidar dela do jeito que acreditavam ser melhor
para si para sua família e
para a comunidade (Entrevistada M. L, 75 anos, moradora de Lins).
A partir de 1977 a Irmã Nilce
25
assume a direção da Faculdade de Serviço
Social com a tarefa de preparar um grupo de leigos e entregar a eles a direção, que,
24
Cf. INFORMANDO, Boletim da Diocese de Lins, Agosto de 1977, p.1.
25
Paulista da região de Bauru, formada em Serviço Social pela Faculdade Universidade de
Campinas. Assume a direção do Curso da Faculdade de Serviço Social de Lins entre os anos de
1977 e 1978, fase esta de transição do mesmo para a direção leiga, sob a nova direção de Nobuco
Kameyama. Ir. Nilce mora e trabalha numa Cooperativa de agricultores em lnhumas, cidade de
Goiânia, com 87 anos de idade.
34
nessa época, já se manifestavam em atividades de cunho pedagógico. Ainda em
clima de repressão, havia por outro lado, uma tentativa de modificar o processo.
Foi um período crítico para a Faculdade. Não havia ninguém querendo
assumir... Foi colocado para a Congregação: Alguém quer assumir? E
ninguém se manifestava, então apelaram a mim que fosse para assumir. Fui
para ver o que estava acontecendo. Ver e ficar. E percebi uma insatisfação
muito grande por parte dos professores e alunos e tudo. E eu fui para essa
missão de passar a direção adiante. (Ir. NILCE, 1977)
Conforme o depoimento, percebia-se um clima de apatia e confusão. Algo
precisava ser revisto.
Com a nova direção, muitos profissionais afastaram-se da Faculdade ou foram
demitidos por não aderirem à nova orientação. Conforme afirma em depoimento
uma ex-aluna formada em 1978:
Havia muito respeito com relação aos alunos da Faculdade de Serviço
Social, isso na época, depois sente que algumas instituições ficaram
descontentes com a atuação profissional dos alunos recém-formados.
Muitos são só teóricos esquecem da realidade na qual estão inseridos,
negando toda uma ação prática ainda necessária (Ex-aluna, 32 anos,
formada em 1988).
De acordo com SILVA alguns aspectos de luta nesse processo histórico de
abertura política e democratização dos anos 1979 a 1988 merecem destaque, uma
vez que este é considerado o mesmo período do surgimento da luta do grupo das
lavadeiras de Lins.
Motivados pela abertura política e sua efetivação, os estudantes continuaram
com as manifestações e lutando por seus interesses. Usando a infra-estrutura
cedida pela própria faculdade de Serviço Social de Lins. Até fins de 1978 e início de
1979 organizavam-se nos Diretórios Acadêmicos da Universidade e no período de
maio a dezembro de 1979, foram para as ruas da cidade exigindo a devolução do
prédio da Federação Universitária de Lins-FUL, (local de reuniões e mobilização e
assembléias, dos estudantes e suas representações Universitárias). A primeira
eleição e posse da Diretoria da Federação Universitária de Lins surgiram ainda nas
dependências da Faculdade de Serviço Social de Lins. Casadei, prefeito atual,
pressionado pelo Movimento Estudantil, devolveu o prédio da FUL aos estudantes
que retomam o local de suas lutas em 1980
26
.
26
Cf. ATAS da FUL, fls. de 1-9 do livro de atas da entidade, 1980.
35
No Brasil, acontecia no governo de João Batista Figueiredo – PDS (1979-1984)
a intensificação no processo de abertura democrática que de forma administrativa,
lenta, gradativa e segura consolidasse-se, revigorado pelas forças da oposição de
vários grupos, organizações populares e novos sindicatos que, desde a década
anterior, buscou constituir-se como base social de suma importância frente ao
governo.
Com a consolidação da abertura democrática e as lutas populares eliminaram-
se os poderes especiais do presidente nas tomadas de decisões, os denominados
Atos Institucionais; foi decretada uma anistia geral em 1978 e o estabelecimento a
possibilidade legal para a fundação de vários partidos exigindo-se a eficiência do
bipartidarismo, Aliança Renovadora Nacional-ARENA
27
e do Movimento
Democrático Brasileiro - MDB. A partir de então, o MDB permanece conhecido como
Partido do Movimento Democrático Brasileiro - PMDB.
As determinações governamentais de acordo com Hellman (1993) objetivaram
desarticular a oposição que pretendia realizar uma profunda democratização,
iniciado para garantir as eleições diretas para o governo Estadual em 1982, abrindo
caminho para futuras eleições presidenciais.
Este processo culminou quando com o lançamento de uma campanha pela
oposição gerando uma das maiores mobilizações cívicas do Brasil: a campanha
pelas “Diretas - Já!” Esse processo desembocou com a eleição indireta do
candidato do PMDB, Tancredo Neves, que após seu falecimento, deixou o poder
para o seu Vice, José Sarney, em 1985.
Apesar da transição política, de um governo de ditadura militar para um
governo civil que significou um avanço da democracia para o futuro político do país,
não se pode desconsiderar que o modelo econômico, com suas estratégias,
continuou beneficiando o capital nacional e internacional, e a concentração da
riqueza do continente. O apogeu da organização da população intensificou-se de
1978 a 1988, período esse considerado a democratização em todo país que se
concretizou na Assembléia Nacional Constituinte.
Por parte dos movimentos sociais, esse momento de transição, definiu o
caráter central e viabilizou o desenvolvimento do processo de luta que desembocou
na Constituição de 1988.
27
A direita organizou-se no PDS que agrupou todos os militares da ARENA, antiga base política do
governo militar.
36
Conforme Wanderley:
Vários são os fatores que explicam essa nova conjuntura. Com a
democratização dos processos eleitorais, lideranças populares, militantes
de esquerda e assessores de movimentos populares passam a integrar o
poder, tanto para o voto direto, como na gestão de órgãos públicos. O
partido dos trabalhadores (PT) ascende ao poder em vários municípios,
alterando a correlação de forças no interior da sociedade política
(WANDERLEY, 1998, p.61).
Os movimentos sociais se fortaleceram, cresceram as organizações e as
associações na luta pela terra. No empenho da luta pela conquista da terra,
agrupam-se as forças de homens, mulheres, crianças, jovens e idosos que buscam
formas concretas de participação política, visando à transformação social. As suas
vontades se tornam desejos, transformados em sonhos, o que leva à ação coletiva
na busca de um tipo de vida centrado na perspectiva da “mãe - terra”, considerada
de grande valor para a existência humana, como por exemplo o MST e a CPT
Nesse período o processo de desenvolvimento capitalista baseado na
urbanização intensificou ainda mais o êxodo rural, com uma relação de trabalho
vinculada à subordinação, mudando assim, a proposta do trabalho familiar e de
parceria. Os trabalhadores, os sindicatos, os estudantis, os professores e
intelectuais, trouxeram à tona um novo elemento: o sujeito social, definindo para si
políticos que os representaram
Na conjuntura política da época manifestaram-se as forças sindicais, tendo
como indicador de avaliação o envolvimento e a participação da sociedade civil no
processo da Constituinte, por meio das discussões para as emendas populares.
A política agrária da ditadura militar incentivou os latifúndios,
Investindo no processo de agravamento da concentração de terra, os
governos ditatoriais dirigiam as questões fundiárias, reprimindo brutalmente
as lutas por terra. Para os militares era fundamental desmobilizar toda e
qualquer forma de organização política dos trabalhadores rurais, criando um
vazio
político necessário para tornar viável seu projeto de reforma no
campo. Este foi um fator estratégico da elaboração e aplicação do Estatuto
da Terra. (FERNANDES, 1996, p. 36).
Há uma supervalorização dos investimentos fundiários feitos pela burguesia em
tecnologias agrícolas, criando assim, uma enorme reserva de força de trabalho que
teve como contrapartida o crescimento das organizações dos trabalhadores rurais
sem – terra. Os agricultores expulsos de sua terra migraram para a cidade. Outros
continuaram mesmo assim, seu trabalho no campo, desta vez, como empregados,
37
assalariados, bóias-frias e arrendatários.
Pequenas organizações começaram a criar estratégias alternativas, com o
objetivo de reverter este quadro e reconquistar a terra apropriada pelos capitalistas.
Destacou-se se, como importante nessa ação, as Comunidades Eclesiais de base
(CEBS), organização ligada à Igreja Católica, proporcionando espaço de reflexão na
busca de soluções para os problemas vivenciados pela comunidade, relacionando a
experiência de fé como compromisso com as questões políticas. A luta pela terra
torna-se resistência contra o monopólio e a não distribuição da renda, passando
essa mudança pela distribuição da terra e por uma política agrícola capaz de
assegurar o incentivo e a sobrevivência, caracterizando-se pelo aspecto coletivo de
produção na forma de organização. Consciente de que a luta pela conquista da terra
não é algo novo, o MST nasceu para provocar mudanças e rupturas frente ao
sistema excludente de possibilidades, de participação e do exercício da cidadania.
Almeida & Sanches (1998), destacam três processos de expressões
significativas que se completam, apresentadas pelo MST:
A modernização Capitalista com fortes traços conservadores, dominadores
da agricultura brasileira nas décadas de 1960 e 1970, estimulando os
conflitos agrários; A ação pastoral-teologia da libertação, com ideários de
setores da esquerda marxista. A origem do MST vincula-se estreitamente à
emergência do “novo capitalismo”, dos movimentos sociais urbanos, das
CEBs, do PT (final dos anos de 1970). O terceiro processo baseia-se nas
experiências organizativas acumuladas pelos trabalhadores rurais nas
décadas anteriores ao golpe de 64, incorporadas ou não, aos sindicatos
posteriormente (ALMEIDA & SANCHES, 1998, p.80).
A Faculdade de Serviço Social torna-se um referencial de luta e engajamento
no processo histórico político integrado ao Curso de Serviço Social para Lins e
região, deixando reflexos significativos para todo o Brasil, por sua história de
compromisso e mudança social. Desse empenho e compromisso social com as
classes populares de Lins e região, o corpo docente idealiza e concretiza o Projeto
de Educação e Organização Popular - PEOP, a partir de 1979. Interessa-nos esse
assunto, por ser ele o tema de nosso trabalho de pesquisa
28
. Sobre o qual
trataremos no momento oportuno de nossas discussões.
28
O tema o projeto de educação e Organização popular implantado pela Faculdade de Serviço Social
de Lins, no período de 1979 - a 1990, como prática de estágio que caracterizou-se como uma ação
profissional de intervenção.
38
1.3 Fase de Transição da Faculdade e o Projeto de Organização e Educação
Popular - PEOP
Em 1979 a Faculdade foi transferida para a coordenação dos leigos, assumindo
a direção a Professora Nobuco Kameyama. Um grupo de professores organizados
foi o responsável pela efetivação desse processo, entre esses, destaca-se o
“professor de filosofia e antropologia, Antônio Geraldo de Aguiar, o qual
implementou o Trabalho de Conclusão de Curso –TCC, específico na área de
Serviço Social”. (VITÓRIO, 2005).
O TCC teve formalmente duas modalidades: desde a fundação da escola
até 1977, os TCCs tinham o caráter de um relatório da prática realizada no
campo de estágio. A partir de 1978, assumiu a perspectiva de um trabalho
monográfico. (AGUIAR, 1983, p.3).
Importante considerar que a Faculdade de Serviço Social nesse período
enfrentou os desafios da abertura política e assumiu novos caminhos da profissão. A
ruptura com uma ação prática desvinculada da teoria crítica, e a importância dada à
pesquisa, foram marcos históricos para a Faculdade, com seu reconhecimento a
nível nacional.
Este foi um período importante na história do Serviço Social em Lins, expresso
nas discussões necessárias entre professores, para romper com os ideários
conservadores e implementar novas propostas para o curso.
Em 1979, os professores criam um novo plano curricular tendo como objetivo
geral “formar profissional, cultural e humanamente o Assistente Social,
proporcionando uma fundamentação filosófica, científica e técnica para uma
intervenção crítica e transformadora na realidade brasileira”.
Os objetivos específicos voltavam-se “à pesquisa da realidade local e regional;
desenvolver uma ação própria com serviços prestados à comunidade na área social
e inserir-se de forma ativa na vida acadêmica”. (ATA da Septuagésima sétima
Reunião da Congregação, 13/02/79, p. 104, apud FERREIRA, 1982, p. 30-31).
39
A realidade de mudança levou a pensar uma reestruturação necessária em
todas as áreas:
No campo do ensino, a revisão do currículo e modificação das ementas bem
como a carga horária; na extensão, com um estudo possibilitando mais tarde a
promoção de um curso de especialização e na pesquisa, o incentivo a um grupo de
professores a assumirem trabalhos práticos junto à população que tornou-se mais
tarde, na implantação e implementação do Projeto de Ação Comunitária, depois
configurado no Projeto de Educação e Organização Popular – PEOP.
Desse trabalho desenvolvido pelas estagiárias, é que nasceria a Associação
do grupo das Lavadeiras de Lins - tema de nossa pesquisa.
É Importante ressaltar a efetivação do PEOP e sua relevância no momento da
redemocratização da sociedade brasileira, onde vários grupos se organizavam em
busca de melhorias salarais.
Foram realizadas pelos alunos, várias pesquisas para o seu TCC, sobre esse
projeto, que serviria como uma espécie de campo piloto oferecido pela faculdade
aos alunos que desejavam intervir na época, junto ao movimento sindical e popular.
A concretização do PEOP, enquanto proposta e campo de atuação do Serviço
Social em Lins e Região, atingiu direta e indiretamente todos que estavam em
contato com a instituição: alunos, professores, supervisores e funcionários.
Esse período foi marcado por fatos da conjuntura nacional, regional e local
como a campanha pelas eleições “diretas – já” para presidente tornando-se
significativo o envolvimento da Faculdade com o Movimento Popular, deixando aos
alunos e professores a marca de seu engajamento.
O PEOP inicia-se na gestão da professora Nobuco Kameyama, num período
compreendido entre 1979 -1990, quando da mudança do curso de Serviço Social
para a mantenedora Fundação Paulista de Tecnologia e Educação.
O processo de inserção da Faculdade junto aos movimentos populares revela
que, além do preparo teórico – metodológico, é fundamental a mudança de
postura ideológica dos professores e alunos, o que exige na intervenção uma
nova postura diante do novo.
Essa realidade de mudança levou os professores e alunos ao engajamento
direto na organização, participação política e sindical, dos alunos caracterizando
essa nova relação com a sociedade de forma a assumir o compromisso social na
40
busca pela transformação da realidade. Conforme relatório apresentado:
Foram formados grupos de interesses da população e de algumas
categorias profissionais. Esses grupos de forma organizada junto aos
trabalhadores rurais e urbanos reivindicavam melhorias referentes às
necessidades e interesses dos bairros como água, esgoto, luz asfalto,
creches e reivindicações conforme as necessidades e interesses de
categorias sociais como, melhores salários, condições de trabalho e de
transporte bem como as melhorias de prestação de serviços, como melhor
atendimento nos serviços de saúde, creche e outros. A articulação sempre
acontecia de forma grupal para execução de atividades conjuntas, para um
bom atendimento das necessidades de interesses comuns. (RELATÓRIO
nº. 2 - agosto de 1981 a julho de 1982).
O nosso grupo de mulheres o das lavadeiras começou depois de várias
visitas e reuniões feitas nos bairros organizadas pelo Serviço Social. A
gente se encontrava para falar da realidade da política da nossa cidade e
dos nossos direitos. A gente fazia tudo isso por meio do teatro, pois assim,
todo mundo entendia o recadinho sobre a situação da realidade do que
estava acontecendo. Além de discutir o assunto a gente levava junto com a
faculdade o teatrinho para os bairros. As peças de teatro eram escritas
conforme a necessidade dos grupos (bóias-frias, empregadas domésticas e
lavadeiras...) (Entrevistada M. Z. 63 anos, casada, moradora de Lins).
Outro aspecto da organização política e inserção do Serviço Social a destacar-
se desse período foi o nascimento do Partido dos Trabalhador-PT:
No dia 24 de janeiro de 1979, sindicalistas reunidos no IX Congresso dos
Metalúrgicos, Mecânicos e eletricitários do Estado de São Paulo, em Lins,
aprovaram a tese já elaborada pelos metalúrgicos de Santo André sobre a
necessidade de criação de um Partido dos Trabalhadores. Surgindo essa
tese como reação contra os partidos tradicionais, já que não havia
condições para a criação de um novo partido político, mesmo porque seria
difícil levá-lo à frente (...) O IX Congresso, representando mais de um
milhão de metalúrgicos, reconheciam que o bipartidarismo não ia ao
encontro de todos os segmentos da sociedade (...) O PT deveria nascer de
um programa feito sem interferência dos Patrões (...) (GADOTTI &
PEREIRA, 1989, p. 28).
As lavadeiras quando entrevistadas referiam-se também como participantes
ativas do PT, praticamente o grupo das lavadeiras e demais organizações desse
período nasceram junto com o PT, uma vez que os trabalhadores e ou
desempregados formavam a maioria na sua organização e as necessidades eram as
mesmas. Como diz uma das entrevistadas: “nos grupos tinha também muitos
conflitos, pois nem todos trabalhavam pelos mesmos interesses, havia os interesses
particulares. A gente respeitava as outras classes, mas queria que respeitassem a
classe das mulheres” (Entrevistada Z, 63 anos).
Esses grupos ao mesmo tempo em que eram apoiados pelo Serviço Social,
41
traziam sempre novos referenciais teóricos para a reflexão da práxis social, aqui
voltando-se a uma discussão que nasce da experiência concreta do cotidiano do
povo.
Ao discutir sobre o cotidiano, retomamos Heller (1977), a qual fundamenta
que este espaço genérico flui de forma concreta assegurando que na vida cotidiana
do homem particular aparecem as necessidades que o levam à superação da
simplesmente particularidade (p.108). Essa experiência do particular ao coletivo é
explícita na organização das mulheres lavadeiras.
A gente se reunia para conversar nossos interesses pessoais e ao mesmo
tempo, combinar o quanto valia o nosso trabalho e não trabalhava por
menos que o combinado. Com esse dinheiro eu comprava as coisinhas de
necessidade pessoais, mas ao mesmo tempo estava consciente de o que
eu recebia era o combinado a pagar a toda nossa classe. Cada uma tinha
suas necessidades, mas ao mesmo tempo nossa união fortalecia no
trabalho nas dificuldades (Entrevistada F.C. G)
29
.
Ainda conforme estudos históricos do professor Matsuel Martins da Silva, a
história política, em sua trajetória, apresenta conflitos e posicionamentos políticos
diferenciados. Com a eleição do sucessor de Casadei
30
em 1982, o prefeito Luiz
Antônio Melges Tinós
31
, assume a liderança política desvinculada dos ideais
progressistas. A população linense um tanto decepcionada com a postura do novo
prefeito, continua sua luta. O nível de organização dos trabalhadores nas periferias
da cidade e em alguns grupos organizados pelo movimento Sindical e Popular
dificultou e impediu um retrocesso político ainda maior.
Ainda deste período de 1982 como fato importante, a candidatura política da
Diretora Nobuco a Deputada Estadual pelo Partido dos Trabalhadores – PT. Muitos
alunos e militantes apoiados pela Faculdade saem em campanha. Nobuco obteve
mais de 16.000 votos, mas não conseguiu se eleger. Este fato de inserção política
marcou a vida da escola e dos alunos que participou da campanha.
Após as eleições de 1982, a faculdade retomou os trabalhos de articulação e
assessoria. O PEOP buscou cada vez mais fortalecer e ampliar as lutas no nível
local e regional.
29
Moradora de Lins, 68 anos, casada com 10 filhos, integrante do grupo das lavadeiras de 1980 a
1986, depoimento colhido em setembro de 2005.
30
Waldemar Sândoli Casadei, Partido do Movimento Democrático Brasileiro - PMDB, governou a
cidade de Lins, no período de 1977 a 1981
31
0 Sucessor do prefeito Waldemar, eleito em 1982, partido do PMDB, governou a cidade vinculado
aos partidários da Nova República, fugindo do ideário progressista.
42
O relatório de nº. 3 menciona como sendo as áreas de ação do
PEOP:
1. O início do processo de organização dos trabalhadores rurais a nível
regional;
2. A consolidação do Movimento de Mulheres, (aqui ressalta-se o grupo das
lavadeiras);
3. A capacitação dos agentes Sociais da região e a assessoria à Comissão
da Pastoral da Terra da Micro – Região- CPT de Lins, Jales e Marília (CF
RELATÓRIO, nº 3, p. 1-3, 1983).
A Sociedade Civil de Lins participou de todo o processo de abertura política: o
movimento pelas Diretas-Já que sacudiu o país em 1984, teve em Lins uma forte
repercussão. Várias manifestações foram realizadas com apoio das Faculdades,
entre elas, a de Serviço Social, possibilitando espaço para reuniões e atos públicos
pelas Diretas Já! Crescia a cada dia o número dos estudantes que se uniam na
participação e compromisso daquele momento histórico, rico de esperanças, de
sonhos e utopias.
Mesmo a campanha pelas Diretas - Já sendo derrotada pela manobra das
elites conservadoras, em Lins a Sociedade Civil, após esse golpe, foi rearticulando –
se: novos partidos foram surgindo e a população cada vez mais dividida, pôde
escolher entre as várias opções político-partidárias.
Em 1985, surge uma grande mobilização pública contra as altas taxas que a
SABESP cobrava pelos serviços de água e esgoto. Na liderança do movimento
organizado contra tarifas de preços da taxa de água e esgoto destacou-se o grupo
das lavadeiras por sua importância e influência da organização do grupo das
lavadeiras como elemento dinamizador da sociedade civil de Lins.
Houve uma passeata no dia 1º de fevereiro em que o povo apresentou suas
reivindicações e deu um prazo até o dia 1º de março para que a SABESP
atendesse aos pedidos. (...) estão sendo enviadas cartas e convidando os
grupos organizados para uma grande reunião do dia 31
de março
(domingo), às 09hh. da manhã na Faculdade de Serviço Social de Lins,
onde mais de 200 (duzentos) municípios estão sendo convidados (...)
(BOLETIM, Voz do Povo, mar. 1985, p.5).
A Dra. Nobuco permaneceu no cargo de diretora da Faculdade e na
coordenação do PEOP, até fins de 1984. Havia interesse por parte da maioria que
ela fosse reeleita, mas em 1985 assume a direção da Faculdade, o professor
Manoel Antônio Neto, dando continuidade ao trabalho iniciado na década de 1978.
Havia certa predominância da literatura e ideologia marxista na escola, sempre com
43
espaço de discussão para todos. A preocupação da Faculdade continuou sendo a
relação com os movimentos populares e a luta junto à população além da assessoria
aos Movimentos Sociais. Esse período marca o rompimento com a mantenedora e o
curso de Serviço Social passa a ser assumido definitivamente pelos professores,
que de acordo como SILVA (1982), enviaram um documento a mantenedora a
Sociedade Feminina de Instrução e Caridade - SFIC intitulado ”Alternativas de
continuidade das atividades pedagógicas administrativas e financeiras da Faculdade
de Serviço Social de Lins”, destacando a importância da continuidade dos projetos
desenvolvidos, considerando a nova conjuntura.
Entre 1986 e 1990, assume a direção o professor Matsuel Martins da Silva
32
tendo como vice a Profª. Rosângela Jasinkevicius. Apesar de este ser um tempo de
muitas lutas e apoio aos projetos de Organização Popular, o PEOP não respondia
mais às demandas da conjuntura local e regional.
A Faculdade passou a intervir com assessoria. Dava-se um novo enfoque às
atividades com os grupos populares e criava-se, então, o Projeto de Apoio e
Assessoria aos Movimentos Populares – PAAMP .
O PAAMP passou por algumas dificuldades para impor-se como projeto, pela
falta de subsídios, uma vez que, as instituições financiadoras de tais projetos até
1986, com o advento da abertura política e sua efetivação, investiam diretamente
nas Instituições controladas pelos próprios trabalhadores organizados em
cooperativas e afins.
Mesmo assim, até o final de 1988 alguns trabalhos de Assessoria,
permaneceram, entre esses, os de articulação regional para a formação de uma
Central de Movimentos Populares, que não se efetivou.
A Faculdade por meio do PAAMP participou da luta pela reforma agrária como
integrante do Comitê Regional de Apoio à Reforma Agrária, criado para articular as
lutas dos trabalhadores sem terra da região, que ocupavam a área de Promissão,
cidade vizinha, área que pertencia a Fazenda Reunidas.
Esse momento foi decisivo para direcionar os rumos da Faculdade de Serviço
32
Mestre em Serviço Social, pela PUC de São Paulo, no ano de 1992, foi diretor do curso de Serviço
Social de Lins, no período de 1986 a 1990, assumiu a Secretaria da Assistência Social de São
José do Rio Preto em 2001; atua como professor do Curso de Serviço social de Lins, UNILINS/SP.
44
Social. Seu engajamento teórico - prático tinha sempre a finalidade de partir do
concreto como meio de descobrir a realidade vivenciada pela população inserida nos
projetos (bóias-frias, empregadas domésticas, grupo de lavadeiras), oportunizando a
tornarem-se sujeitos capazes de mudar a realidade.
O Curso de Serviço Social esteve sob a coordenação da Professora
Rosângela
33
Ferreira que concordou em mantê-lo e os professores elaboraram um
anteprojeto de Transferência da Faculdade de Serviço Social de Lins para a
Fundação Paulista de Tecnologia e Educação
34
, como garantia da visibilidade dos
propósitos educacionais desse curso.
Este documento, que provisoriamente estamos denominando de
Anteprojeto, tem por objetivo, possibilitar à Superintendência da Fundação
Paulista de Tecnologia e Educação o mínimo de informação (...) da questão
Pedagógica e dos Projetos que sempre nortearam o processo de formação
profissional dos alunos desta Escola, com a realidade da comunidade local
e de toda a região Noroeste (ANTEPROJETO apud SILVA, 1992, p.123).
Em continuidade ao processo e para implementar as mudanças entre 1994 e
1996, novamente assume a responsabilidade da coordenação do Curso o Professor
Matsuel Martins da Silva. Nos anos seguintes coordena o Curso o professor Milton
Batista Nizato. Após esse mandato o Professor Luís Carlos Pires Montanha
35
, é
eleito como coordenador. Nesse período, segundo ele: antecede a criação do Centro
Universitário de Lins - UNILINS.
Existiam três Faculdades isoladas mantidas pela FPTE: Faculdade de
Engenharia, de Informática, de Serviço Social. Cada Faculdade tinha sua
direção própria. Na Faculdade de Serviço Social o Diretor e o Vice-Diretor,
eram eleitos, com voto direto, entre os professores. Para aquele mandato
havia sido
o Prof. Matsuel Martins da Silva e como Vice-Diretor o Prof. Luiz
Carlos Pires Montanha.Como no inicio do ano de 2001, o Prof. Matsuel
assumiu a Secretaria de Assistência Social de São José de Rio Preto e
pediu afastamento do cargo de Diretor da Faculdade de SS.
33
Mestra em Educação pela Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista -
UNESP, campus de Marília. Foi aluna estagiária de Serviço Social atuando no PEOP, mais
efetivamente junto ao grupo das empregadas domésticas. Atuou na direção do Curso de Serviço
Social de Lins, no período de transição para a Fundação Paulista de Tecnologia e Educação - FPTE
de 1991/1993. Assumiu a coordenação do Estágio dos Cursos da UNILINS do ano de 2002 a junho
de 2005. Atualmente, é professora do Curso de Serviço Social e outros cursos da UNILINS, membro
integrante do conselho de Curso de Serviço Social.
34
Entidade Jurídica sem fins lucrativos, é Mantenedora do Centro Universitário de Lins, constituído
pela transformação das escolas de Engenharia, Serviço Social e Informática de Lins. (Manual dos
Professores, Lins,2004,p.4).
35
Mestre em Ciências Sociais pela Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual
Paulista – UNESP, campus de Marília. Foi coordenador do Curso de Serviço Social de Lins-UNILINS
de fevereiro a setembro de 2001. Atualmente atua como Professor supervisor acadêmico de Estágio
e Professor de várias disciplinas, e membro do Conselho de Curso do Serviço Social.
45
Naquela ocasião eu trabalhava, também, no Banco do Estado de São Paulo
(BANESPA) e tive que assumir a Direção da Faculdade até o final do
mandato. Para mim foi uma experiência muito importante. Além de
participar da Direção da Faculdade e me envolver, de forma direta, com os
assuntos do curso, foi também importante o relacionamento com o quadro
docente, o relacionamento com os discentes e a luta pelos interesses do
curso do ponto de vista estrutural e pedagógico. Outra experiência
importante foi minha participação da Diretoria Executiva da FPTE,
juntamente com os Diretores dos outros cursos e com o Diretor
Administrativo-Financeiro. Foi nessa Diretoria que lutei para que o Setor de
Serviço Social fosse reativado na FPTE. Luta difícil, mas vitoriosa. Hoje o
Setor conta com boa estrutura e duas Assistentes Sociais. Enfim, analiso
que foi uma boa experiência profissional e de vida, apesar da dificuldade
que tive em adequar o horário de trabalho do banco com o horário de
dedicação à Faculdade. (Depoimento do professor Luiz Carlos Pires
Montanha, Lins, SP, março de 2006).
Após este trabalho, a Professora Josimeire Leandro Jordão
36
assume a
coordenação do Curso de Serviço Social por um curto período de transição. Em seu
mandato provisório continua as atividades administrativas do Curso e prepara a
eleição posterior Quando é reconduzido à segunda eleição consecutiva, em 2002,
do professor Milton Batista Nizato
37
atual coordenador.
Continuando a história do município de Lins, de 1987 a 1988, a população
linense envolveu-se com a Assembléia Nacional Constituinte conforme Boletim “A
Voz do Povo” de abril de 1988, nº. 37. A Central única dos Trabalhadores - CUT
cresceu e o movimento sindical ganhou autonomia. Outros sindicatos de
trabalhadores atuaram na cidade juntamente com o trabalho de organização das
mulheres que se fortaleceu, bem como, o engajamento de parte da Igreja Católica
que se intensificou.
De acordo com os dados da Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados-
SEADE, (2001), Lins possuía em 1991, uma população de aproximadamente,
54.547 habitantes e, considerando-se os dados da Região de Governo de Lins,
neste mesmo período esta cidade foi classificada como a cidade sede de uma região
estagnada em seu desenvolvimento: com apenas 5% de crescimento populacional
na última década; apresentando uma realidade caracterizada pela insuficiência
36
Especialista em Serviço Social, e Mestra em Educação pela Faculdade de Filosofia e Ciências da
Universidade Estadual Paulista – UNESP, campus de Marília. Assume a coordenação do Curso do
Serviço Social, num curto período de outubro a novembro de 2001. Atualmente, é professora do
Curso de Serviço Social e outros cursos da UNILINS.
37
Mestre e Doutorando em Serviço Social pela PUC-SP, atual coordenador do Curso de Serviço
Social e Secretariado, membro da Comissão avaliativa dos Cursos de Serviço Social, é professor no
Curso de Serviço Social e outros cursos da UNILINS e da UNICERES em São José do Rio Preto /SP.
46
de leitos especializados para atendimento médico-hospitalar da rede pública; pela
precariedade na educação com grande evasão escolar da rede pública.
De acordo com SILVA (1982), o pólo educacional já mencionado nas décadas
anteriores continua a ser um dos mais antigos sonhos. Quanto à educação superior
ressalta um aspecto preocupante: as Faculdades existentes na cidade (década de
1990) formavam aproximadamente 15.000 profissionais nas mais diversas áreas, só
que em Lins viviam e trabalhavam, cerca de 1.669 habitantes com nível superior, o
que retrata que a cidade não oferecia possibilidades de vida e trabalho para os que
ali estudavam e ou estudaram.
Permanece o desafio de que o sonho possa tornar-se realidade: que a situação
sócio-política e econômica possa melhorar e possibilitar condições de vida e
trabalho à população, sem necessariamente, que esta tenha que migrar, o que seria
para o município uma perda de profissionais qualificados formados pela própria
comunidade, para atender as suas necessidades. As informações a seguir, baseiam-
se nos dados do IBGE de 2004.
População em geral 65.954
População Urbana 64.222
População Rural 1.732
População Masculina 31.984
População Feminina 33.970
População da Região 152.248
Altitude do nível do mar 438m
Dados disponíveis na secretaria da Prefeitura Municipal de Lins, 20 de
agosto de 2004.
A Região de Lins é composta hoje por 10(dez) cidades: Cafelândia, Getulina,
Guarantã, Guaimbê, Lins, Sabino, Pongaí, Promissão, Guaiçara e Uru. Situa-se a
455 (quatrocentos e cinqüenta e cinco) km da capital paulista, 110 (cento e dez) km
da cidade de São José do Rio Preto, 108(cento e oito) km da cidade de Bauru, 93
(noventa e três) km da cidade de Araçatuba, 85 (oitenta e cinco) km da cidade de
Birigui, 51 (cinqüenta e um) km da cidade de Penápolis, 70(setenta) km da cidade de
Marília.
O município possui ainda 18 (dezoito) hotéis; 16 postos de serviço e
47
combustível; 19 (dezenove) restaurantes; 195 (cento e noventa e cinco)
estabelecimentos comerciais. Esta cidade dispõe de 11(onze) estabelecimentos
bancários e 11(onze) instituições financeiras.
Quanto à Assistência médico-hospitalar é servida por 3(três) estabelecimentos:
Hospital Antônio A. Gellis com 32 (trinta e dois) leitos, Hospital e Maternidade São
Lucas com 44(quarenta e quatro) leitos e a Santa Casa de Misericórdia com
atendimento regional, com 110(cento e dez) leitos. Sendo que esta última encontra-
se em crise financeiro - administrativa.
No atendimento público municipal, a cidade conta com 5(cinco) postos de
saúde e 3(três) Unidades Básicas de Saúde-UBS, contando com profissionais das
mais diversas especializações para o cuidado e atendimento da saúde: Serviços
Cirúrgicos,ambulatórios, UTI, adulto e Neonatal, Raio X, Ultra-som, Internação,
Mamografia, Eletrocardiograma, Banco de Sangue, Berçário, Pronto Socorro e
Hemonúcleo.
Foi implantado em agosto de 2000, o Programa de Agentes Comunitários de
Saúde, o que ajudou a melhorar a saúde pública, objetivando levar a saúde mais
próxima da comunidade, o que lhes é de direito. Este programa é um convênio
estabelecido entre a Prefeitura de Lins, Ministério da Saúde e Pastoral da Criança
que objetiva um atendimento de orientação e devidos encaminhamentos quanto ao
cuidado e direito à saúde da população em geral. Por meio das agentes de saúde e
líderes da Pastoral da Criança, busca-se uma ação efetiva de crescimento e
desenvolvimento integral da criança.
A preservação do Meio Ambiente é também parte da preocupação das
autoridades e da população de Lins. O Conselho Municipal de Meio Ambiente foi
empossado no dia 05 de junho de 2000, composto pelo Poder Executivo, Legislativo,
Empresas, Fundações, Escolas superiores, Associação Comercial e Industrial de
Lins, Missão Salesiana de Mato Grosso e Sociedade Civil em geral.
Lins possui uma Agência de Desenvolvimento Econômico e Tecnológico-
ADETC
38
, como o ponto de partida para o desenrolar do desenvolvimento sócio-
38
Sociedade civil, sem fins lucrativos, que tem por objetivo promover o desenvolvimento econômico e
tecnológico do município, procurando harmonizar o crescimento com exploração racional de seus recursos
físicos, humanos e naturais, promover o crescimento das oportunidades de negócios, a melhoria da qualidade de
vida da população e o aumento da renda “per capita” do município. Esta junção o econômico e social
possibilitará a otimização dos recursos disponíveis, utilizando-se dos meios existentes de qualificação,
capacitação e organização de
conhecimento em prol de melhorias para o município.
48
econômico de Lins e região.
Foi criada por meio de um trabalho com empresários locais, regionais e de São
Paulo uma Cooperativa dos Produtos do Pólo Hidroindustrial e Turístico de Lins
visando mais a utilização do terminal de cargas e desenvolvimento do Turismo no
Rio Dourado. Contou com um total de 20(vinte) sócios empresários e uma área de
472.003, 20 metros quadrados ou 19, 50 alqueires decretada de utilidade pública.
Há uma Cooperativa de Laticínio Linense desde 1940, onde um grupo de
produtores de leite industrializa e comercializa 17(dezessete) tipos de produtos,
como, pasteurização de leite B e C, queijos prato, mussarela, minas, ricota, gouda,
estepe, provolone, reino, gorgonzola, parmesão, manteiga, bebidas lácteas em dois
sabores, soros reidratantes em vários sabores.
A marca Linense é conhecida em vários Estados, através do consumo de
queijos. A COOPERLINS gera empregos diretos e indiretos, desde o manejo inicial
de produtos até a venda. É composta de 227(duzentos e setenta e sete) cooperados
(produtores de leite), 64(sessenta e quatro) funcionários, 15(quinze) transportadores
e 16(dezesseis) vendedores.
O potencial industrial da região encontra-se em momento privilegiado, além da
descoberta da localização geográfica, também pelos recursos investidos que
poderão trazer respostas mais ágeis e impulsionar o reinvestimento, potencializando
o crescimento da cidade. Lins conta hoje com indústrias de grande porte
internacionalmente conhecida como: o grupo e Frigorífico Bertin, Concretex e
Parmalat (unidade de captação) e, recentemente, com a instalação da Companhia
Brasileira de Lata, do Grupo Matarazzo, o que abriu novas perspectivas para o
futuro da cidade nesse campo.
Quanto à agricultura e agropecuária há uma forte tendência de geração de
renda e entrada de divisas. Após levantamento realizado pela Secretaria de
Agricultura do Município, junto ao Escritório de Defesa Animal e Casa da Agricultura,
que têm como objetivo trazer de volta a condição do grande celeiro de importantes
produtos do setor.
Empresas de transformação e beneficiamento estão investindo em produtores
rurais, com assistência técnica no campo e através de eventos práticos sobre a
melhor forma de aproveitamento de espaço, tempo e matéria-prima. Com métodos
modernos há a expectativa de serem criados, nos produtores da região, novas
formas e costumes de produção com maiores expectativas de maior lucratividade.
49
A idéia é transformar os métodos práticos de produção rural em critérios mais
apurados e científicos de extração da produção e recursos econômicos viabilizando-
os.
A Divisão de Agricultura do Município está organizando planos de integração de
projeto de transformação e produtos embalados, como meio de valorização e
incentivo de produção de qualidade pelos produtores da cidade.
Conforme os dados da Prefeitura Municipal de Lins de agosto de 2004, a
cidade localiza-se em região com fluxo rodoviário para as várias cidades de
economia estável ou com tendências bem definidas.
Encontra-se hoje em período de transição econômica, com o desenvolvimento
de seu potencial turístico, sua facilidade de escoamento de produtos e serviços em
fase de organização comercial.
A tendência econômica predominante ainda está ligada ao setor primário com
gado leiteiro, de corte e produção de grãos. Mesmo estas atividades passam por um
processo de aproveitamento, adequação dos resultados e reestruturação
socioeconômica.
Com o crescimento do setor industrial avançado pela produção de embalagens,
carne tipo exportação e outros produtos de pequeno volume, o ritmo de produção e
geração de renda de forma direta e indireta aumenta.
Cresce com essa realidade a confiança na região em especial, na cidade,
favorecendo seu poder de competitividade.
Outra característica relevante da cidade de Lins, é que ela continua a ser
conhecida como a Cidade das Escolas, compreendendo várias Faculdades entre
elas: a Faculdade Salesiana; Centro Universitário de Lins – UNILINS; Faculdade
Auxílium - UNISALESIANOS.
Essa experiência ao mesmo tempo que tem seu valor educacional profissional,
por outro lado, torna-se um desafio para o município em oferecer condições de vida
adequada aos estudantes e pensar outras atividades que contemple a realidade do
de sua vida acadêmica e inserção ao mundo do trabalho e na busca da
sobrevivência de todos os cidadãos em geral.
50
Quanto às escolas estaduais o número de estudantes total de Lins e Região, é
de:
Lins 1 2.500
Cafelândia 3.000
Getulina 1.850
Guaiçara 1.950
Guaimbê 800
Guarantã 1.400
Pongaí 720
Promissão 5.850
Sabino 650
Uru 280
Total 29.000
(Dados da Prefeitura Municipal de Lins, agosto de 2004, apud, REAL, 2004, p.43).
Escolas de Ensino Médio e Fundamental: 10, sendo que 6 (seis), são Estaduais e 4
(quatro), são Particulares.
Escolas Municipais e de Ensino Fundamental: 455 alunos distribuídos em 18
(dezoito) classes.
Escolas Municipais de Ensino Infantil: 935 alunos em 38(trinta e oito), classes.
Escolas Particulares de Ensino Infantil: 13 (treze) estabelecimentos somando em
média, 330 (trezentos e trinta) alunos.
Quanto aos projetos sociais desenvolvidos pela assistência Social de
município, destacam-se:
1. COMDAPS (Coordenadoria Municipal da Promoção Social) é o órgão gestor
da política de assistência social do município que desenvolve programas de
Assistência e atendimento à população em estado de extrema pobreza, por meio de
ações emergenciais; Programa da Infância e Adolescência de prestação de serviços
através dos Centros de Educação Infantil para crianças de 0(zero) a 6 (seis) anos e
às crianças e adolescentes de 7(sete) a 18 (dezoito) anos, com projetos sócio-
educativos de liberdade assistida e de prestação de serviços à comunidade;
Programa de Enfrentamento à Pobreza, com investimento econômico - social nos
grupos populares para melhoria das condições de subsistência, da qualidade de
vida, a preservação do meio ambiente e sua organização social; Fortalecimento à
51
Família: programa financiado pela Secretaria Estadual de Assistência e
Desenvolvimento Social – SEADS- em parceria com a Prefeitura Municipal de Lins.
A COMDAPS vem executando esse Programa por meio do Projeto “Família
Cidadã”, desde 1.999, com as famílias que trabalham no “garimpo” do lixo, com a
finalidade de investir em sua melhoria sócio-econômica e alteração do contexto
social em que as famílias atendidas encontram-se inseridas, oportunizando, por
meio dos trabalhos realizados em grupos e atividades sócio-educativas, nas
discussões de assuntos de seu cotidiano, meios de administrar os problemas sociais
e melhorar sua autonomia financeira;
2. CACAL (Casa de Apoio à Criança e ao Adolescente de Lins), conhecida
como abrigo. O abrigo é um tempo transitório, que oferece proteção à criança e ao
adolescente até que seja encontrado um lugar seguro à sua permanência. Este
espaço de convivência atende uma faixa de 30 (trinta) crianças e adolescentes de
3(três) à 18 (dezoito) anos, em regime de abrigo, sendo que estes na sua maioria
sofreram abusos sexuais, e foram ameaçados em seus direitos básicos.
De acordo com o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), a prestação dos
serviços de abrigo objetiva” assegurar à alimentação, à educação, ao esporte ao
lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade, à
convivência familiar e comunitária” (art. 4º).
Além da equipe administrativa e operacional, o atendimento às crianças e
adolescentes conta com o trabalho de educadores, assistentes sociais e outros
profissionais, quando necessários, de forma a garantir-lhes uma melhor qualidade
de vida nos aspectos físicos, emocional, social e assegurar-lhes seus direitos. Há
uma prática de inserção da criança e adolescente nos programas comunitários
possibilitando o surgimento de formas de sociabilidade e de novos vínculos que
contribuem para a auto-estima e autonomia da criança nessa fase tão importante da
vida.
Deste trabalho de ação social, importante destacar que os mesmos são
campos de estágios para os alunos do Curso de Serviço Social com supervisão de
campo e acadêmica. Projetos, convênios e parcerias são realizados para o
estabelecimento de uma prática de estágio que possibilite ao aluno estagiário
estabelecer uma relação teórico- técnica e operacional das ações.
A inserção da Faculdade de Serviço Social de Lins, sempre representou à
população ser uma instituição de ensino que participa de forma ativa e integradora
52
de fatos e acontecimentos que caracterizam a cidade, como formadora de lideranças
em diversas áreas do saber. Importante relatar que toda história construída e vivida
junto aos movimentos populares entre estes, o da associação das lavadeiras,
marcaram a história de Lins e expandiu-se por onde quer que as militantes
estabeleceram suas raízes. As lavadeiras por muito tempo continuaram
empenhadas nas associações, sindicatos, grupos de moradores de bairro, CEBs,
partidos políticos e outros.
Em relação ao corpo docente e direção da Faculdade também continuaram sua
militância participando ativamente na história política e social por sua inserção,
protagonismo e contribuição teórica da prática do Serviço Social objetivando mudar
a realidade. Por essa história, a Faculdade de Serviço Social, hoje componente do
Centro Universitário de Lins - UNILINS tornou-se referencial para experiências e
práticas inovadoras do Serviço Social no Brasil. Possui uma biblioteca riquíssima, e
bem conceituada como curso de graduação e de pós graduação, nas mais diversas
áreas, além de uma ótima infra-estrutura organizacional. Há um corpo docente
especializado para atender às demandas e exigências da comunidade e Região. A
Faculdade de Serviço Social além de apoiar o movimento com abertura de espaço
para organização contribui na assessoria das lideranças na consciência política e na
formação profissional dos assistentes sociais comprometidos e críticos. De acordo
com os depoimetos:
O Serviço Social foi muito importante nesse período e arregaçou as mangas
para a luta, correndo risco e até sofrendo ameaças políticas, ele foi muito
importante para nossa luta, nos faziam ver a realidade e despertar na
comunidade a luta comum para todos. Havia a presença da escola em
todos os acontecimentos das lavadeiras e dos outros movimentos
populares. Tenho saudades daquele tempo do trabalho social que fazíamos
juntos com o Serviço Social na Catedral de Lins. Ali era nosso espaço de
vida comum, onde todos eram tratados com igualdade. Na minha opinião
Serviço Social sem comunidade, não é Serviço Social (Entrevistada M.V.)
39
Gostaria de dizer que hoje algumas dessas mulheres lavadeiras, já se
aposentaram, como eu e minhas colegas. O grupo como tal não existe
mais. Tudo foi válido em seu tempo. Somos mulheres e carregamos com
orgulho a história já feita em todas as passagens da vida. Desde o direito
para a luta, o engajamento que levou cada uma a procurar seus direitos e
outras categorias para seu trabalho (Entrevistada M. V).
39
Moradora de Lins, uma das integrantes mais nova do grupo. Sempre acompanhou sua mãe junto
às lavadeiras e ali aprendeu a gostar da vida em grupo. Depoimento colhido em outubro de 2005.
53
Atualmente o Curso de Serviço Social da Unilins em vésperas de comemorar
os seus 50 anos, orgulha-se pela história de luta, companheirismo e coragem
daqueles e daquelas que fizeram e marcaram a história. Destaca-se aqui Nobuco
Kameyama lutadora incansável e ainda hoje militante na causa do Serviço Social.
Permanece o desafio de continuar essa história onde o curso de Serviço Social
possa contribuir significativamente na inserção junto à comunidade, intervindo nos
processos de mudança da sociedade na efetivação dos direitos do cidadão.
54
CAPITULO 2 RUMOS DA PROFISSÃO NA FACULDADE DE SERVIÇO SOCIAL
DE LINS (1970/1980).
2.1 Associação das Lavadeiras: Movimentos Sociais Populares e Serviço
Social
Este capítulo destaca a relação existente entre a prática do Serviço Social e a
história da Associação das Lavadeiras de Lins, à luz dos movimentos sociais das
décadas de 1970 e 1980. O objeto de nossa pesquisa é o processo de intensificação
da qualidade de sujeito no grupo dessas mulheres. Aqui entendeu-se por
intensificação da qualidade de sujeito o perceptível alargamento de suas aspirações,
valores, sentimento de pertença ao grupo, capacidade de organização, a felicidade,
o prazer auferido com a consciência de sua autonomia e a extensão para o coletivo
das realizações subjetivas humanas. As lavadeiras em sua forma de ser
solidificaram sua história alicerçadas nos valores da coletividade que estavam
inseridas no cenário sócio-político da época, marcaram a história por seu significado,
compromisso social e influência nas mudanças sócio-políticas e econômicas, de
acordo com a fala de uma depoente
:
Sinto saudades do prazer que a gente tinha de poder sentar junto e ter o
que discutir algo como um bem maior para todos. Havia muita amizade e
companheirismo. Era gostoso demais, porque além de dispersar um pouco
das preocupações individuais do trabalho a gente se unia para falar das
situações local e global. Lutar por melhorias de vida direito à dignidade de
todos, dá prazer, deixa a vida mais leve. Isso eu sentia nas peças de teatro
que a gente fazia e apresentava para a comunidade (Entrevistada M. Z).
O discurso acima aponta para a ótica da perspectiva de vida das mulheres e
sua valorização. O sentido da luta para as lavadeiras devolvia-lhes a dignidade da
vida e alargava o conhecimento vivido no cotidiano. Cotidiano esse que de acordo
com Maffezoli (s/d), é o conhecimento empírico quotidiano ao redor do “saber fazer,
saber dizer, saber viver, com implicações múltiplas e diversas” (p. 152).
Nesta afirmação coloca-se a valorização do objeto desse trabalho com as
lavadeiras num “saber fazer, dizer e viver” coletivo. Experiência esta, que nasce da
base organizada com aspirações pessoais e de grupo organizado com objetivos
comuns. Vê-se interagindo as realidades do particular e genérico, uma vez que o ser
55
humano é um ser social com suas individualidades.
O depoimento da lavadeira M.Z, citado apresenta o compromisso social
emergindo como espaço concreto de realização pessoal e garantia de melhores
condições de vida. Essa ação vai intensificando ao mesmo tempo a qualidade de
vida dos sujeitos em sua forma de organização, na medida em que as lavadeiras
encontram-se para discutir a categoria trabalho
40
e como este torna-se necessário
como fonte de vida, esperança e dignidade.
O Brasil assim como outros países da América Latina, registrou a partir dos
anos de 1970 o renascimento de um grande número de movimentos sociais
41
.
Foram realizadas várias discussões envolvendo os movimentos sociais tendo como
foco central, a participação popular no meio urbano.
Entre os principais movimentos sociais, destacou-se, pela sua participação e
organização, as Associações Amigos de Bairros, de mulheres, movimentos dos
trabalhadores rurais sem terra, movimento negro, movimento indígena com forte
apoio da Igreja Católica pós Concílio Vaticano II em pleno auge da Teologia da
Libertação e também as Comunidades Eclesiais de Base, CEBs.
Para Gohn (1991), “os movimentos populares são os mais numerosos, do
ponto de vista político, os que têm gerado transformações sociais substantivas
dando o conteúdo de suas demandas, as relações que mantém com o Estado e o
papel que desempenha na luta de classes mais geral” (p.9).
Para os objetivos propostos neste trabalho, a associação das lavadeiras, sujeito
da pesquisa, configura-se como movimento social popular urbano, haja vista que,
A maior luta dos grupos desta época como também do nosso movimento,
era pela garantia dos direitos entre eles o da sobrevivência. Destaco o
direito ao trabalho, como o 13º., descanso aos domingos; passe coletivo
40
Categoria esta definida por elas como a profissão que ocupam na atividade de lavar e passar
roupa.
41
Estes são vistos pelos neopositivistas como comportamentos coletivos originados de períodos de
inquietação social, de incertezas, onde ações são frustradas e ou reprimidas. Os primeiros cientistas
sociais sob a ótica dos positivistas viam nos movimentos sociais, esforços para promover mudanças;
os movimentos sociais urbanos diferem de uma série de ouros movimentos sociais, tais como os
feministas, ecológicos, negros, homossexuais, os quais têm sido tratados erroneamente como
movimentos sociais urbanos. Os movimentos sociais urbanos são as manifestações que dizem
respeito à habitação, ao uso do solo, aos serviços e equipamentos coletivos de consumo. (GOHN, M.
G. Movimentos Sociais e Luta pela moradia, 1991, p.31; 34). Destaca-se a década de 70 como o
período do surgimento de numerosos movimentos sociais. Marco histórico que coincide com o início
de uma reflexão e alteração na correlação de forças significativas das lutas por reivindicações
democráticas e marcha da sociedade no período transitório da ditadura militar (1964). Os movimentos
sociais organizavam-se na tentativa de recuperação da democracia como forma de governo e modo
de vida. (TROTTA, 2002, p.87).
56
para trabalhar;carteira assinada;creche para os filhos e salário justo para
todas as categorias (Entrevistada M.Z).
Nas discussões de Sader (1984), sobre movimentos populares urbanos, trata-
se da idéia dos “novos movimentos sociais”, fundamentados nos padrões que
definem suas relações sociais, as formas de organização e as lutas.
A característica dos novos movimentos sociais referida pelo autor chama à
nova sociabilidade. Há um padrão de comportamento caracterizado de maneira
simples. Parte-se do pressuposto de uma relação interna de auto-ajuda, de
constituição e uma experiência comunitária interna. A vivência dessa relação de
solidariedade pelo próprio movimento implicará em uma nova relação com o Estado.
Para esses movimentos, suas lutas em busca de melhorias são atribuídas a um
projeto de auto-afirmação das classes populares. Nele as pessoas expressam seus
desejos e pensamentos, a partir de uma situação particular.
Embasado nas experiências de reflexão e articulação dos movimentos sociais,
o processo de conscientização nasce geralmente do controle entre um determinado
valor, como por exemplo, a dignidade do trabalhador e a realidade vivida no sentido
de crescimento da visão crítica sobre ela. Na capacidade de apreensão crítica da
realidade, as lutas por água, creches e outras vão estruturando-se não apenas como
trocas de favores, mas, com uma identificação de luta por direitos inerentes aos
direitos à vida e dignidade, como expressa a lavadeira:
A mudança da vida doméstica de casa para a experiência de mulher
trabalhando fora de casa de forma assalariada, recebendo meu dinheirinho
foi de grande aprendizado. Antes aprendi que só trabalhava por questão de
necessidade e que a mulher devia cuidar da casa, dos filhos e da roça.
Depois com a vida na cidade, muda a visão que a gente tem do mundo, as
necessidades são outras. Era preciso lidar com a tal da tecnologia para
desenvolver o mesmo trabalho para as patroas, só que agora de outra
forma. A gente sempre aprende daí a importância da vivência e discussão
em grupo (Entrevistada M. Z).
Percebe-se nesta fala a coerência interna que nos remete à intensificação da
qualidade do sujeito, objeto deste trabalho, uma vez que as lavadeiras cresciam em
sua capacidade de autocrítica, na sua compreensão de mundo e apreensão de
novos conhecimentos, saber esse, que se fundamentava nas experiências
cotidianas da associação.
Sader (1984) confirma essa caracterização da luta vinculada ao que lhe é de
57
direito, como uma mudança significativa de ótica em relação à determinada visão
materialista dominante na esquerda dos movimentos pré-1964. A população
reivindica algo em nome de um valor necessário à sua existência. Chama atenção,
ainda, a importância do valor imperativo como revelou a história dos anos de 1970.
Um valor que ultrapassa a força, revelando uma afirmação ética como suporte da
atuação e sobrevivência do movimento. É uma expressão da luta de classes.
Apesar do grupo que está no poder e a força da dominação, não se pode negar
que os movimentos organizados nesse embate são portadores de dignidade por sua
própria condição humana. Sader exemplifica ainda tal situação, mencionando as
greves do ABC e São Paulo. Essas lutas explicaram - se por uma dimensão que vai
além da força, mas, como expressão do grito de que eles existem em face de uma
enorme opressão. Há no movimento um grande desejo de auto-afirmação.
O dinamismo desses grupos favorece a maior percepção do significado dos
novos movimentos sociais, implicando essa realidade várias conseqüências, como o
modo de relacionar-se com a política, haja vista,
A intervenção do Estado nos movimentos sociais urbanos como condições
gerais para acumulação do capital e reprodução da força de trabalho. Ele
busca amenizar a contradição entre as necessidades de reprodução da
força de trabalho e o interesse da acumulação do capital, via distribuição e
ou salários indiretos, oferece ajuda econômica ao capital através da política
social de benefícios, procurando reduzir os custos de reprodução da força
de trabalho (p.35).
O Estado intervém por meio de políticas sociais de determinados governos,
com a função de moderador das relações sociais, neutralizador do conflito,
despolitizando assim, a própria luta dos movimentos.
Como afirma a entrevistada “(...) os políticos estão com seus interesses
contaminados pela corrupção e interesses pessoais, na sua maioria sem qualquer
perspectiva de compromisso com as lutas populares e melhoria de vida da
população” (M.Z. 63 anos).
Nota-se conforme a fala acima que há uma realidade conflitual das lavadeiras,
que se apresenta como resultado da luta de classes, ou seja, de um lado o Estado
burguês busca em sua ação o controle e a dominação e de outro a ação dos sujeitos
em luta.
58
O Estado reflete uma relação de dominação de uns sobre os outros calcado
na força, por meio do domínio da lei, torna-se ele então uma organização
especial de coerção. O governo constrói a ordem de cada dia, assegurando
e legalizando a dominação. No cotidiano das lutas políticas, o governo vai
fixando a orientação da política econômica e da política social
42
(VIEIRA,
1992 p, 20).
Na relação de poder versus dominação a corrupção política esteve sempre
presente na história. As lavadeiras em seu movimento de organização também
enfrentaram conflitos ideológicos e políticos, pois nem todos lutavam da mesma
forma empenhadas pelos mesmos interesses. Havia também interesse pessoal.
Hoje também os políticos estão com seus interesses contaminados pela
corrupção, sem qualquer compromisso com as lutas populares e melhoria
de vida da população. (...) A gente respeitava as outras classes e
queríamos que respeitassem a nossa (Entrevistada M. Z, 63 anos).
Pode-se dizer que, no processo de intensificação da qualidade de sujeitos,
das lavadeiras, surgiam também as divergências próprias da luta de classes. A vida
de grupo fundamenta-se em valores existências e coletivos. Daí a necessidade de
se ter clareza quanto aos objetivos na luta pela causa comum.
O jeito que a gente lavava e passava não era mole não. A gente ia lavar
roupa no rio e bem longe, lavava em cima da pedra, batia, batia. Na hora de
passar era com um ferro a moda da brasa. Hoje as coisas mudaram e as
mulheres têm mais “mordomia”. Tudo parece mais fácil no serviço. Mas é
outro tempo. Por outro lado o salário de hoje continua sendo muito pouco
para as mulheres, as coisas ficaram mais caras. A diferença é que as
mulheres daquele tempo eram mais unidas e trocavam idéias nas reuniões.
A gente ali com as lavadeiras aprendia a lutar e dividir o pão de cada dia e
corria atrás de nossos direitos (Entrevistada F.C. G, 68 anos).
Na linguagem do Estado ao reivindicar algo, o movimento precisa conhecer o
que é necessário fazer para aproveitar tal reivindicação, qual orçamento necessário?
Já que ao pensar em um movimento fora do Estado, a linguagem tornou-se mais
simples e natural. Por exemplo: Eu tenho um filho, preciso trabalhar, logo necessito
de uma creche para ele o que chama-se de reivindicação pura.
42
A política social aparece no capitalismo construída a partir das mobilizações operárias sucedidas
ao longo das primeiras revoluções industriais. É compreendia como estratégia governamental de
intervenção nas relações sociais, unicamente pode existir com o surgimento dos movimentos
populares do século XIX. Tanto a política econômica quanto a social constitui-se numa unidade e
podem expressar mudanças nas relações entre as classes sociais ou nas relações entre distintos
grupos sociais existentes no interior de uma só classe e vinculam-se à acumulação do capital
(VIEIRA, E. Democracia e política social, 1992, p15; 19 e 21).
59
O Estado além de impor certa linguagem, impõe ao mesmo tempo certa
discussão dos movimentos - prova disso, é a presença do mesmo sujeito nos mais
variados movimentos. Como várias reivindicações são remetidas a diferentes ramos
do Estado, os sujeitos acabam constituindo-se separadamente, uma vez que, a
reivindicação da água é para um lado, a luz, é para outro, e o da moradia ainda para
outro. O movimento social acaba dividindo-se conforme a divisão do Estado
burguês. Na forma de constituir-se como movimento e seu desenvolvimento ele
acontece de acordo com a forma como o Estado organiza a sociedade.
Nos movimentos sociais populares organizados destaca-se a presença das
mulheres defensoras desta mesma causa. Elas sensibilizam-se em busca de suas
necessidades pessoais que são também coletivas. Como assinalou Lobo (1991),
criam seu espaço, emergindo como sujeito coletivo junto aos movimentos sociais;
chama atenção o aspecto da participação feminina, como uma novidade no cenário
político ao mesmo tempo que afirma ser o movimento operário, organizado durante
os anos de 1970, o ator principal mais significativo desse cenário. (SOUZA, L. 1991,
p.269).
A gente tinha uma coordenadora que organizava as reuniões para as
mulheres lavadeiras se encontrar. Ali a gente conversava sobre tudo um
pouco: trabalho, casa, salário, lazer, saúde, política e outros. Eu me recordo
que uma instruía a outra naquilo que sabia mais sobre a situação da vida e
da realidade. Eu gostava muito das músicas que a gente cantava no grupo,
era muito animado, até tinha uma que tocava violão. Mas a vida era muito
difícil. O trabalho de lavar e passar era tudo na mão, nada na máquina
como hoje. O preço era por peça ou dúzia, mas a gente tinha que dar conta
se não o dinheiro diminuía ainda mais. A gente lava. Mesmo assim, a luta
tinha sentido e era muito bom a gente se encontrar para falar da vida da
gente, nossas histórias, a dos filhos, nosso trabalho de cada dia, problemas
e alegrias que a gente ia descobrindo no grupo. Tinha também as festas e
encontro com as outras mulheres que lutavam como nós para melhorar o
salário (Entrevistada M.L. 75 anos).
Valores como festa, encontro, coragem, companheirismo, luta, confiança, são
essenciais ao processo de intensificação da qualidade do sujeito aqui representados
na história das lavadeiras. O processo participativo e o conhecimento compartilhado
dos saberes que lhes são próprios alimentavam-nas em suas dificuldades junto ao
grupo e isso era passado à comunidade como forma de divulgar a importância de
sua organização e melhoria de vida para todos.
Quando afirmam que através da música e ou teatro a comunidade era levada à
60
realidade concreta da vida, elas entendiam comunidade como o lugar do encontro
das reuniões, manancial onde alimentavam sua força e refaziam energias para
enfrentamento do conflito e ameaças do poder local constituído e outros poderes
contrários à sua forma de engajamento político. Ali é que elas se auto-afirmavam em
sua capacidade de organização e busca de autonomia. “O valor de tudo isso era a
alegria de ser mulher com capacidade e direcionar a vida, sentir-se mais mulher e
dona do meu pedaço. É uma sensação gostosa de cuidar da vida com dignidade”
(Entrevistada, M.V).
De acordo com os estudos realizados, experiências como estas confirmam
que as mulheres foram a espinha dorsal de muitas organizações da sociedade civil e
dos partidos de oposição, desafiando assim, de forma bem sucedida, as regras do
regime militar, desde os anos de 1970 e início de 1980.
No grupo das lavadeiras, notou-se a realidade do novo sujeito social que
despontou como grupo, se organizou e se fundiu na mesma causa, transcendendo
ao seu cotidiano doméstico em busca da sobrevivência e de sua autonomia política.
O universo feminino com sua participação e capacidade de luta contribuiu na
ampliação dos processos organizacionais, alargando os horizontes dos conflitos e as
disputas ideológicas na sociedade, traduzindo-se na formação de movimentos
sociais. A força destas manifestações segundo Godinho:
Não abriu mão de mobilizar milhares de pessoas e levá-las às ruas, de
propor uma plataforma em torno da qual se organizar. Reafirmam a
necessidade de se construir uma alternativa global ao capitalismo com
projetos libertários em seus conteúdos e formas, refletindo a complexidade
de desafio, capazes de compartilhar protagonismo e com a radicalidade
necessária para enfrentar suas próprias contradições (2001, p.32).
A Faculdade de Serviço Social de Lins viveu profundamente essa experiência
de organização e mobilização popular como referência de espaço político
organizacional, junto à comunidade local por meio das atividades realizadas com
professores e estagiários do curso, no qual foca-se a temática desse estudo.
2.2 PEOP e a Associação das Lavadeiras
Busca-se neste item apresentar a trajetória da Associação das Lavadeiras, seu
processo organizacional, sua efetivação como grupo e a intensificação da qualidade
61
como sujeito ao interagir com o movimento social
43
.
As condições adequadas para novas alternativas de intervenção social na
realidade local levou os professores da Faculdade de Serviço Social de Lins, após
1979 a criar um projeto de atuação nos bairros da periferia de Lins.
Esse projeto buscava uma forma de intervir com uma metodologia pedagógica
voltada às áreas de organização, mobilizão e capacitação popular. Essa forma de
organização dos grupos e movimentos populares assumidos pela Faculdade
concretizou-se em 1980 na implementação do Projeto de Educação e Organização
Popular-PEOP objetivando a formação de profissionais comprometidos com a
transformação da realidade e ao mesmo tempo colaborar com o fortalecimento das
organizações populares da Região, área de atuação correspondente à toda diocese
de Lins (Araçatuba, Penápolis, Birigüi, Lins, Andradina).
Com a situação de subemprego e desemprego, a população da região que veio
do campo para a cidade, continuava a buscar seu sustento no trabalho rural como
trabalhadores rurais volantes, os chamados “bóias-frias”. São trabalhadores
desprivilegiados, com péssimas condições de vida e baixos salários, sem qualquer
qualificação profissional e ou equipamentos coletivos como creches, escolas, postos
de saúde, transportes e outros.
Essa realidade justificava a necessidade de luta e organização das lavadeiras e
demais grupos organizados para reivindicação em vista de melhoria para as
condições de vida da população em geral.
Professores e Estagiários da Faculdade de Serviço Social de Lins assumem a
concretização desse projeto realizando trabalhos de base investindo na
organização popular por categorias profissionais assim denominadas: grupo de
bóias-frias, lavadeiras e empregadas domésticas; organização por bairro: grupo
de Bauru - Centro de Estudos e Pesquisa em Educação Popular (C.E.P.E.P);
organização por categoria Social
44
como grupo de Alfabetização e grupo de Mães da
creche São Benedito; Trabalho de Capacitação e Articulação por meio dos
43
Caracterizar este grupo como movimento social, significa incluí-lo na realidade vivida nas décadas
de 1970 e 1980, na qual os movimentos sociais emergiam fortemente. Assim como grupo instituído,
as lavadeiras foram se identificando como movimento social. Nos dias atuais elas se constituiriam
como Organização Não Governamental - ONGs
.
44
Esses grupos organizavam-se reivindicando a cidadania através da luta pela justiça social e
econômica. Revelam que ser cidadão é ter e usar o direito de melhores condições de vida e
trabalho, uma vez que as lutas de certa forma atribuíam uma crítica ao modelo econômico
atual e ao Estado, que em muitas situações, exclui as classes populares.
62
encontros de Agentes Populares, Encontro Regional de Mulheres, de Trabalhadores
Rurais e Seminário de Educação Popular, participação em reuniões, cursos,
encontros promovidos por outras instituições.
De acordo com a diretora da época, Kameyama (1981), o surgimento das
várias categorias organizadas dos grupos embrionários de Lins e Região, conduziu a
equipe responsável pela PEOP a investir nestes grupos, canalizando melhor a força
do povo, direcionando sua capacidade e motivando-os para valorizar a articulação
entre os grupos e seu crescimento, enquanto categoria organizada na busca de sua
emancipação (p 07).
A mesma autora afirma que, para esta realidade de engajamento junto aos
movimentos populares, entre estes, o das lavadeiras, além de mudar a metodologia
tornou-se necessária uma mudança de postura ideológica dos professores e alunos-
estagiários, uma vez que estes vêm de um ambiente de classe média, com certa
educação dominadora com tendências a reproduzir o paternalismo e a dependência
frente às questões conflitivas de cunho social, deixando transparecer certo
conservadorismo pacifista. A mudança para a prática inovadora exigia um contínuo
processo de reflexão e ação tendo como meio a prática educacional, respeitando a
autonomia e valorizando a cultura e saberes popular (p. 10).
Como proposta de investimento na capacitação profissional e formação dos
alunos estagiários para intervirem junto aos movimentos sociais populares foram
desenvolvidas atividades como: reuniões quinzenais com toda equipe da PEOP;
participação dos membros da equipe em cursos, encontros e seminários da área;
curso de Metodologia em Organização Popular; orientação e realização de relatórios
sobre o trabalho realizado como forma de sistematização, e aprendizado da
metodologia de intervenção junto aos grupos populares.
45
O Serviço Social sempre foi muito bom para nossa luta. Faziam enxergar a
realidade como mulheres e irmos atrás de nossos direitos. Sempre a gente
se comunicava com elas para não perdermos o contato. Havia a presença
da escola do Curso de Serviço Social em todos os acontecimentos das
lavadeiras” (Entrevistada M. V.)
Nosso grupo começou depois de várias reuniões feitas nos bairros. Quem
dava as reuniões eram os estagiários do Serviço Social. A gente se
encontrava para falar da realidade da vida e de nossa cidade, como
também dos nossos direitos. A gente discutia e escrevia as peças de
teatrinho conforme o contexto da realidade e a necessidade do grupo
naquilo que era de seu direito. Como por exemplo, os do grupo de bóia-fria,
45
REVISTA DE SERVIÇO SOCIAL & SOCIEDADE, São Paulo, Cortez Ed., v.3, n.6, 1981,p.147-155.
63
das empregadas domésticas e das lavadeiras e assim o grupo foi
aumentando até ficar bem grande e vários outros grupos foram nascendo.
Eles nascem junto com o partido dos trabalhadores (Entrevistada M. Z. 63
anos).
Conforme as depoentes acima, alguns valores são fundamentais à organização
e efetivação dos movimentos sociais populares em sua dinâmica de organização,
estes valores propunham a necessidade de reunirem-se em grupo, discutir a
realidade e lutar por sua sobrevivência enquanto indivíduo e enquanto grupo. A
criatividade que usavam para retratar a realidade emergente através do teatro
tornou-se um componente integrante para a conscientização da Associação das
Lavadeiras e comunidade em geral.
A Faculdade teve um papel significativo ao inserir os estagiários na prática que
desafiava a buscar alternativas que ajudasse a mudar a realidade. Dessa forma,
colaborou na constituição o seu papel para uma profissão interventiva, junto aos
movimentos e organizações.
A pesquisa de campo, o levantamento bibliográfico, conversas informais com
pessoas conhecedoras da experiência do grupo das lavadeiras e as experiência das
estagiárias do curso de Serviço Social desse período, contribuíram para facilitar o
registro dessa história.
Assim o trabalho do profissional do Serviço Social começou após visitas de
contato e aproximação, da realidade das lavadeiras e percebendo que elas
desconheciam qualquer experiência de participação e organização popular, as
estagiárias viam possibilidades de começar a reunir o grupo, o que dependeria muito
da vontade e disposição das lavadeiras, uma vez que, tal organização era de
interesse da categoria para discussão de seus problemas e melhoria de vida.
O ponto de partida da necessidade de organização das mulheres nasceu
iluminado pela experiência das lavadeiras de Goiânia, por meio de encontros onde
elas colocavam suas experiências, motivando também a possibilidade de
organização e articulação das lavadeiras de Lins.
Essa fase de organização possibilitou aos poucos uma relação interpessoal,
aumentando a confiabilidade na discussão dos problemas comuns em relação à
família, ao bairro, ao trabalho e outros. Junto com o conhecimento mútuo da
realidade, partilhando os problemas e aspirações, alicerçou-se a consciência de uma
realidade comum tanto nos problemas como na história de vida do grupo. É
importante ressaltar, neste estudo, como se deu o surgimento do núcleo básico
64
como um pequeno grupo que se organizou em função de objetivos, interesses e
valores comuns. O pequeno grupo foi suficiente para o conhecimento necessário à
confiabilidade sobre idéias comuns e diferentes. Fortalecido pelas discussões e
experiências de vida, o grupo refletiu e direcionou os passos, planejou as ações,
adquiriu novas experiências e partiu para suas reivindicações.
No começo, a organização das lavadeiras contou com mais ou menos 30
(trinta) lavadeiras. Aos poucos o grupo cresceu e fortaleceu a participação das
mulheres moradoras da Vila Amália. Chegou assim, a 50 (cinqüenta) lavadeiras que
se estruturou ao redor de seus objetivos de lutas e conquista de seus direitos,
enquanto mulheres trabalhadoras assalariadas
46
.
Conforme experiência das estagiárias de 1979/1980, essa atividade profissional
como lavadeiras, foi exercida por mulheres casadas ou viúvas, em poucos casos,
solteiras, com idade de 35 (trinta e cinco) a 55 (cinqüenta e cinco) anos, com uma
média de 3 (três) a 6 (seis) filhos cada uma. A faixa etária das viúvas, era de
60(sessenta) a 70 (setenta) anos que, por conta de uma mísera aposentadoria,
necessitavam trabalhar nessa atividade como complementação de sua renda e
garantia de sobrevivência.
As famílias das lavadeiras, eram do campo, com a difícil experiência do êxodo
rural, deslocaram-se para a cidade ainda entre os 13(treze) e 18 (dezoito) anos, sem
qualquer qualificação profissional, com baixo nível escolar.
Como as mulheres não possuíam qualquer profissão qualificada, restou para
elas fazer da profissão de empregadas, lavadeiras e passadeiras, o sentido para
suas vidas.
Em relação às viúvas, que, além da realidade da não qualificão profissional,
agravou-se a situação por estarem sós e com filhos pequenos, o que as impedia de
assumir qualquer serviço fora do lar. Tornarem-se lavadeiras foi a forma encontrada
para conciliar a atividade profissional com as domésticas. Entre as mulheres que
trabalhavam fora como empregadas domésticas, assim que se casavam, acabavam
saindo e integrando-se ao grupo das lavadeiras.
O trabalho das mulheres foi necessário como complementação da renda
familiar, uma vez que, houve uma constante queda salarial do marido que trabalhava
como pedreiro, guarda - noturno, motorista, funcionário público, sem contar, os
46
Entende-se por assalariadas, segundo as lavadeiras, o trabalho com remuneração discutida e
aceita por todas. Um salário correspondente ao trabalho de lavar e passar.
65
desempregados e aposentados. Os filhos contribuíam com a renda familiar em
atividades como ajudante de pedreiro, enfermeira, comerciário, entregador, bóia-fria
e empregada doméstica.
Nunca tive preguiça de ir para o trabalho e às vezes a gente trabalhava até
de domingo, mas sabia que vinha sempre um dinheirinho para comprar as
coisas em casa. Pois o dinheiro do marido era muito pouco e família com
bastante criança pequena, tinha que botar o pão na mesa. Sabe que a
gente dava conta de tudo, não ficava doente e não reclamava. (Entrevistada
F.C.G. 68 anos).
Essas mulheres viviam em locais situados nos bairros periféricos de Lins com
uma infra-estrutura precária, falta de equipamentos e investimentos urbanos já
mencionados. O trabalho de lavadeiras realizou-se com maior freqüência em seu
domicílio e ou na residência da patroa
47
, quando necessário. Mas, preferiam
trabalhar em sua própria casa por terem autonomia sobre o trabalho, pois ir à casa
da patroa significava fazer o que elas determinavam, fazendo outros serviços além
de lavar e passar. Este tipo de trabalho foi desenvolvido com maior freqüência com
famílias, estudantes universitárias, militares, em alguns casos, prestavam serviços
aos moradores de seu próprio bairro, mantendo certa relação de amizade o que
dificultava a elevação do preço.
As relações de trabalho foram estabelecidas verbalmente, sem qualquer
vínculo empregatício. As lavadeiras prestavam serviços a várias pessoas esperando
aumentar sua renda.
O fato de trabalhar para várias pessoas em seu domicílio impedia criar um
vínculo de empregada e patrão. Assim, a profissão passou a ser denominada como
trabalho autônomo. Esta estrutura acabou isentando a patroa dos encargos sociais,
criando uma relação de exploração da força de trabalho.
Com esta situação de exploração, vários problemas de ordem social e
econômica pioraram a realidade de vida das lavadeiras, geraram para essas
mulheres uma instabilidade financeira e como alternativa, deveria haver o
pagamento dos encargos previdenciários na qualidade de autônomas. Mas por não
terem como contribuir, elas não usufruíam dos serviços previdenciários, como,
assistência médica, aposentadoria, auxílio-doença e outros. A categoria não possuía
47
Termo usado pelas lavadeiras, em relação à mulheres com as quais trabalhavam.
66
uma legislação específica, o que dificultou seu enquadramento nas Consolidações
das Leis do Trabalho – CLT, que poderiam ser utilizados na reivindicação de seus
direitos.
A categoria lavadeiras atribuída às mulheres se deu por sua característica de
lavar e passar roupas, sendo esse trabalho realizado por mês, dúzia ou por dia de
serviço. Quando por dúzia, o preço era cobrado por peça/dúzia. Nota-se que os
critérios de cobrança adotados eram diferentes, por dúzia em relação às peças.
Como por exemplo, um lençol poderia corresponder de 8(oito) a 10(dez) peças, uma
colcha de 10(dez) a 12(doze) peças e assim por diante. Elas preferiam essa
modalidade, por serem delas a decisão quanto à quantidade/peças e assim, não
serem tão exploradas.
As lavadeiras não eram muito favoráveis ao serviço prestado por dia, uma vez
que as patroas achavam que por elas estarem em sua residência deveriam realizar
outras funções além de passar e lavar.
A forma mais comum de trabalho da categoria era por mês, quando a cobrança
dos serviços era estabelecida pela quantidade de vezes por semana. O serviço era
feito por semana e o pagamento por mês.
A categoria profissional de lavadeiras era classificada na situação de
subemprego, pois sua renda não atingia 50% (cinqüenta por cento) do salário
mínimo regional. Com o aumento gradativo do custo de vida e a dificuldade de
estabelecerem preços compatíveis com suas necessidades, o salário recebido pelas
lavadeiras cobria apenas o consumo das despesas como água, luz, sabão. As
lavadeiras sujeitavam-se à dupla jornada de trabalho de forma isolada, exercendo
atividades em sua própria casa.
A dupla jornada de trabalho atrelada à necessidade econômica familiar agravou
ainda mais o problema para as mulheres que viviam sozinhas e precisavam
sustentar a casa e os filhos. Confinadas ao espaço doméstico, as lavadeiras eram
limitadas numa efetiva atuação política e social.
A realidade de trabalhar de forma isolada e a divergência de preços quanto aos
serviços profissionais, dificultavam as lavadeiras a perceberem o grau de exploração
a que eram submetidas em seu trabalho cotidiano.
Sensibilizadas por esta situação, e motivadas pelos projetos sociais da
Faculdade, as estagiárias do Serviço Social, no período de 1979 a 1981, inseriram-
se junto às lavadeiras, contribuindo para a motivação das mulheres a reunirem-se e
67
falarem de seu cotidiano
48
, seus problemas comuns e particulares.
A realidade vivida no grupo dessas mulheres mostrou a necessidade de ampliar
as discussões. Algumas temiam perder o emprego ou serem pressionadas pelas
patroas e por isso, acabavam desistindo do grupo. Mas a resistência de algumas e a
necessidade de desenvolver uma ação concreta de mudança da realidade dessa
categoria em relação às condições de vida e de trabalho deram energia à resistência
a permanecerem no grupo.
Como estratégia de organização realizou-se em março de 1980, uma entrevista
com o grupo das lavadeiras publicada no Jornal “Voz do Povo” (meio de articulação
popular de distribuição gratuita), colocando nessa redação os problemas da
categoria e convidando as lavadeiras a somarem-se no grupo e participarem das
reuniões.
Em 1983 a Faculdade de Serviço Social destacou algumas das atividades
realizadas por esse grupo através das reuniões mensais, ou quinzenais quando
necessário. Os assuntos que discutiam em suas reuniões tinham como temáticas:
49
A valorização do trabalho, o baixo preço para lavar e passar, a variedade dos
preços cobrados por dúzia, por dia, por mês;
A tabela única de preço e a padronização da contagem de peças que saiam
trimestralmente nos boletins informativos, criados pela associação;
preço da luz e água, já que a maioria das lavadeiras lavava e passava em suas
próprias casas e ainda pagava uma quantia muito alta, com as despesas de
sabão, pregador, ferro e outros;
Os problemas de saúde relacionados à profissão: reumatismo, problemas da
coluna, resfriados, bronquites, etc. Sem qualquer vínculo empregatício formal,
não tinham direito à assistência médica e previdência social obrigatória;
As discussões foram em torno do salário, desemprego, custo de vida, infra-
estrutura do bairro, problemas da mulher, e outros.
Em conversas e leituras feitas, tornou-se evidente a situação de exploração que
sofriam as lavadeiras, pelo tipo de trabalho que realizavam, como: as patroas que
48
O cotidiano das mulheres reflete-se na fala de Heller ao afirmar que: “A vida cotidiana é a vida do
homem por inteiro: ou seja, o homem participa da vida cotidiana com todos os s aspectos de sua
individualidade, de sua personalidade, nela colocam em funcionamento todos os seus sentidos, todas
as suas capacidades intelectuais, suas habilidades manipulativas, seus sentimentos, paixões, idéias,
ideologias” (HELLER, 1992, p. 17).
49
Cf. anexo, boletim da associação das lavadeiras, n. 1, Lins, Junho de 1982.
68
mandavam roupas da filha para lavar e com as dela mandavam as cortinas, tapetes
e cobertores e não pagavam a mais por essas peças.
Nas reuniões, além das discussões, preparavam também promoções como:
excursões, encontros locais e regionais, festas juninas, confraternização, bazar da
pechincha, rifas. Todas as atividades foram realizadas como forma de despertar a
participação, a organização e o engajamento. Essa experiência fortaleceu o espírito
de solidariedade, compreensão e união das lavadeiras; desenvolveu a capacidade
de autocrítica; despertou-as para a percepção dos mecanismos de exploração aos
quais eram submetidas e que, numa ação conjunta lutavam para melhoria de tal
situação e autonomia de sua luta em defesa de seus valores e interesses comuns.
É importante ressaltar ainda do mesmo relatório, algumas das principais
propostas concretizadas pelo grupo no período de 1983 a 1984, como avanços da
categoria organizada:
Estabelecimento de uma padronização de contagem de peças de roupas para
quem lava por dúzia e elaboração de uma tabela única de preço reajustada
semestralmente;
Legalização da Associação das Lavadeiras como órgão de utilidade pública e
obtenção de uma sala de reuniões;
Elaboração de Boletins Trimestrais que, além de informações, apresentava
tabela única de preço. Sendo esse boletim um
mecanismo pelo qual a
Associação atingia maior número de lavadeiras;
Encaminhamento da luta contra o alto custo da água e do esgoto. Toda
população de Lins discutiu esta problemática, contra o sistema utilizado pela
Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo-SABESP, no
tabelamento do preço da água e do esgoto.
Segundo o relatório, essa luta contra o alto custo de água e esgoto, encerrou-
se em junho de 1984, sendo encaminhado um abaixo - assinado com 5.000 (cinco
mil) assinaturas, contendo reivindicações no sentido de mudar o sistema utilizado
pela SABESP.
50
As lavadeiras reivindicavam uma redução do preço da água, uma vez que esta
constituía seu principal instrumento de trabalho. As mulheres lavadeiras realizavam
ainda outras atividades como articulação com outros grupos da região através dos
50
Cf. Boletim n.1 Associação das Lavadeiras, carta ao Sr. Presidente da SABESP, em abril de 1981.
69
Encontros Regionais de Mulheres.
Dessa forma o grupo das lavadeiras teceu sua história de luta e organização
por meio de reuniões, sendo num primeiro momento, uma participação mais de ouvir
e decidir no que lhe dizia respeito. Por conta da sua realidade de trabalho e
consumo, elas expressavam – se mais, opinando sobre questões como: salário e
assistência médica, problemas de seu cotidiano, saúde e sobrevivência, realidade
vinda de suas precárias condições de trabalho.
Eu participava do grupo das lavadeiras lavava e passava para mais de 15
(quinze) donas de casa, às vezes fazia também outros serviços, como
limpar a casa, fazer comida e cuidar dos filhos. Nas reuniões a gente
conversava para que ninguém aceitasse trabalhar por pouco salário e
nossos direitos fossem respeitados, pois naquele tempo não tinha para nós
o tal do INPS. (Entrevistada M.L. 75 ANOS).
Nota-se por meio da fala das lavadeiras que a participação social no mundo
do trabalho, apesar de exploração, intensificou para nelas o compromisso de lutar e
reivindicar coletivamente melhores condições de vida e salário.
Enquanto mulheres trabalhadoras elas rompem com a idéia de que a mulher é
socializada apenas para os serviços domésticos ou privados. A vida social em grupo
contribui para torná-las autônomas e ampliar sua auto-estima levando-a a sentirem-
se úteis participando ativamente da renda familiar.
O importante de tudo isso, é sentir-se gente com capacidade de ganhar o
pão de cada dia. A experiência do grupo das mulheres valeu a pena, por ter
ganhado nele uma maior visão da realidade do mundo, do ser mulher e das
relações de trabalho. Foi nele que vivi grandes possibilidades de mudança
em minha vida e consciência de classe organizada. Percebi que não era
nada fácil para a classe trabalhadora, manter-se firme frente à pressão da
classe dominante (Entrevistada M. Z. 63 anos).
A fala acima identifica a necessidade do ser social em sua capacidade de ser e
interagir na vida social. As lavadeiras na medida em que viviam a experiência da
valorização de suas potencialidades, intensificavam sua qualidade de sujeitos
tornando-se merecedoras de prazer, de satisfação pelo significado do trabalho no
cotidiano de sua luta. A felicidade traduzia-se na intensificação da participação do
grupo e na coragem de superação dos conflitos existentes no embate com as forças
dominantes.
Havia de fato um conflito interno da Associação frente às condições de trabalho
e a forma como as patroas lidavam com elas. Era uma relação quase tranqüila
70
enquanto as lavadeiras ficavam “quietinhas” em seu trabalho, mas, a partir do
momento que estas tomavam posição frente à melhoria dos salários e direitos
trabalhistas, as coisas tomavam outro rumo.
Uma coisa eu digo de verdade: as patroas tratavam muito bem a gente. É
certo que a gente nem sabia o que era um registro em carteira, mas elas
ajudavam e quando a gente ficava doente, elas levavam até o hospital. Eu
pra falar a verdade, não ia em muito nas reuniões das mulheres, porquê a
patroa não gostava. Eu tinha medo de perder o emprego. Mas quando eu ia
eu gostava muito, ali no grupo tinha umas mulheres “briguentas” e
animadas. (Entrevistada F.C.G. 68 anos).
Mesmo entre as lavadeiras, havia divergências, expressa pela necessidade de
manter-se no emprego. “Então, é melhor manter a imagem de “uma empregada
boazinha”, pois ainda assim ela me ajuda quando preciso”. Era uma relação de troca
e dependência que desqualifica o valor do trabalho enquanto realização pessoal.
Mesmo que sua experiência se voltasse mais ao setor secundário de produção,
elas participavam da vida econômica como parte do processo nas relações de
produção. Fundamenta-se que a realidade desse grupo das lavadeiras do período
de 1980 a 1984 fundou-se e criou forma, no contexto histórico-político-econômico-
social dos movimentos sociais e populares de embate com o capitalismo.
A existência do grupo das lavadeiras tida como movimento social popular, pode
ser caracterizada nos dias atuais como uma ONG, uma vez que ele foi composto por
um grupo de cidadãs que se organizavam em defesa de seus direitos e interesses
públicos. São organizações com estatuto jurídico de entidade privada, sem fins
lucrativos.
Conforme a Faculdade de Serviço Social no relatório nº. 03, 1993, p.8, essa
associação nasceu com a preocupação de defender os interesses, criar união e
laços de solidariedade entre a categoria, surgindo assim, como primeira
preocupação, a Legalização da Associação, que tinha como objetivo geral:
“organizar e mobilizar as lavadeiras, visando ao atendimento das necessidades e
interesses das categorias”.
Aprofundar a reflexão sobre a experiência do grupo das lavadeiras evidencia a
construção de um sujeito coletivo,que segundo SADER (1984), fundamenta-se na
construção de um grupo, seus valores, a troca de experiências, bem como, os
desafios, na concretização da melhoria da vida cotidiana.
A constituição do grupo como sujeito coletivo, resulta das mais variadas
71
realidades encontradas pelos elementos do mesmo grupo vividos em seu cotidiano.
Cada momento de encontro, neste grupo, fortalecia a intensificação da qualidade de
sujeito agindo com o saber que lhes são próprios a partir de experiências do
cotidiano.
Para compreender a constituição desse sujeito coletivo, utiliza-se o conceito
de THOMPSOM, para o qual, a experiência é uma categoria que se apresenta
“mesmo não sendo perfeita toda ela, torna-se indispensável (...), uma vez que a
mesma compreende a resposta mental e emocional de um indivíduo e do grupo
social com acontecimentos que se interrelacionam e/ou repetições de um mesmo
tipo de acontecimento” (1981, p. 15).
Considerando a experiência de grupo fundamentada no cotidiano destas
mulheres Netto afirma que o que está em jogo nessa abordagem do cotidiano
contemporâneo, é a universalização do mistério que Marx localizou em forma de
mercadoria: “a específica objetividade imediata instaurada no processo da formação
econômico-social onde o modo de produção capitalista consolidou de forma
conclusiva e desenvolvidamente sua dominância” (1996 p. 89-90).
Aprofundar a temática da associação das lavadeiras significou desvelar a
capacidade de organização e mobilização desse grupo de mulheres; seu empenho e
dinamismo em busca de valores que as fortaleciam em suas estratégias de luta para
mudar a realidade política e social, bem como, a forma como organizavam e
administravam sua vida na esfera doméstica e agora, como trabalhadoras
organizadas e autônomas em suas decisões.
As lavadeiras discernem a percepção do significado que tem para si esta
experiência quando alicerçadas em realidades que extrapolam o particular para o
coletivo.
O ser humano necessita de algo concreto para prosseguir em suas motivações.
Para as lavadeiras, as motivações principais de sua luta e a descoberta para
cuidarem de si mesmas foi a questão da valorização salarial, o que, para elas
perpassa a dinâmica da auto-estima, que se instala ao valorizar a satisfação das
suas necessidades e de sua família dando-lhes o que há de necessário e melhor
para o ser humano viver com dignidade.
Percebeu-se com este trabalho que o aspecto da cidadania é parte da
intensificação da qualidade do sujeito, uma vez que as lavadeiras descobriram a
força que tem e que nasce de dentro para fora. “Posso estudar e aprender novas
72
coisas, o que é de direito como cidadã e ser respeitada...” Essa expressão é de
uma entrevistada que coloca a experiência das lavadeiras como um tempo que
mudou sua vida e a mesma a guarda com saudade e desejo de que ainda hoje essa
experiência continuasse.
Na minha opinião se o povo de hoje tivesse a conscientização dos grupos e
movimentos populares organizados, de como se forma um cidadão livre e
possuidor de direitos e deveres e se este soubesse a força que tem uma
organização assim, não haveria tanta exploração da força de trabalho,
preconceito, pobreza e exclusão das pessoas em geral (Entrevistada M. Z.
63 anos).
Analisa-se a importância da participação como elemento que marca a vida
para sempre. De fato, permanece o desafio de como hoje pode-se intervir com
respostas à contemporaneidade quando parece que há um vazio na vida das
pessoas.
O capitalismo tenta absorver as potencialidades do ser humano ampliando o
individualismo e nem sempre o Serviço Social consegue motivar respostas de
superação ao problema que se apresenta na realidade.
2.3 Associação das Lavadeiras e o Serviço Social na Contemporaneidade
É importante discutir o objeto de estudo de nosso trabalho, confrontando-o
com a prática profissional do Assistente Social, uma vez que a experiências das
lavadeiras deu-se no espaço da Faculdade de Serviço Social, como instituição de
suporte ao movimento.
Em se tratando da profissão do Serviço Social, Iamamoto (2003), chama
atenção para uma compreensão mais detalhada da profissão que apresenta o
Serviço Social como processo de trabalho, na divisão sócio-técnico, o que significa
compreendê-lo como uma prática integrada ao processo de produção e de
reprodução da vida material, numa visão de totalidade.
Pensar a profissão como fruto dos sujeitos que a vivenciam e constroem é
rever os conceitos de uma prática embasada no conhecimento da realidade
apresentada e vivenciada pelos sujeitos de forma a contribuir de forma significativa
às mudanças sociais.
É visível na experiência de organização e mobilização das lavadeiras
73
enquanto sujeito na dinâmica interativa da Associação contribuíram para a
discussão e inovação da prática do Serviço Social.
As Diretrizes curriculares definem o Serviço Social “como uma especialização
do trabalho e sua prática uma concretização de um processo de trabalho
51
que tem
como objeto as múltiplas expressões da questão social”. (DIRETRIZES
CURRICULARES, 1996).
O Assistente Social, mesmo que assalariado, como força de trabalho
especializada é competente para atuar nas expressões da questão social
52
e este é
solicitado em seu trabalho. O Serviço Social é necessário socialmente, pois atua
sobre questões ligadas à sobrevivência social e material dos setores majoritários da
população trabalhadora, tendo papel importante no processo de reprodução material
e social da força de trabalho.
O Assistente Social tem efeitos na sociedade como um profissional que atua
no campo do conhecimento dos valores, dos comportamentos, da cultura. Valores
estes que as lavadeiras vivenciaram como expressão da intensificação da qualidade
de sujeito e que alimentou o grupo em suas metas e objetivos, o direito à dignidade
ao reconhecimento a valorização pessoal e coletiva e sua auto-estima. A função
social da profissão vincula-se à organização e implementação de políticas sociais
por meio dos fundos públicos oriundos de impostos, tributos e outras contribuições,
na distribuição da riqueza socialmente produzida.
Os valores que lembro eram os da organização da luta. A preparação do
teatro como o jeito de conscientizar as pessoas e todas nós da importância
de viver em grupo. A comunidade é o grande valor. Nela ninguém vive só e
nem sente necessidade. Outro valor significativo, é que quando a gente tem
pessoas de luta com a gente e que apóiam como as estagiárias do Curso
de Serviço Social e pessoas da comunidade em geral, dá uma alegria muito
grande e vontade de continuar na luta e até de “brigar” se for preciso”
(Entrevistada M. V. ).
De acordo com Yazbek (2003), a política em geral no Brasil apresenta
propostas contraditórias quanto à perspectiva de acomodação da relação Estado e
Sociedade Civil. As políticas sociais no âmbito governamental são marcadas por sua
51
Implica uma matéria prima ou objeto sobre o qual incide a ação; por meios ou instrumentos de
trabalhos que potenciam a ação do sujeito sobre o objeto; e a própria atividade, ou seja, o trabalho
direcionado a um fim, que resulta num produto (IAMAMOTO, 2003, p. 61).
52
Expressão discutida por Iamamoto como “um conjunto das expressões das desigualdades da
sociedade capitalista madura, que tem uma raiz comum: a produção social é cada vez mais coletiva,
o trabalho torna-se mais amplamente social, enquanto a apropriação dos seus frutos mantém-se
privada, monopolizada por parte da sociedade” (IAMAMOTO, 2003, p. 27).
74
ineficiência e subordinação aos interesses econômicos.
Nessa conjuntura o Serviço Social na contemporaneidade é desafiado a
romper com a visão focalista, seletiva e ampliar os horizontes com um olhar para os
movimentos sociais das classes sociais populares e da própria relação Estado e
Sociedade. Iamamoto referencia o olhar dos Assistentes Sociais para a “capacidade
de decifrar a realidade e construir propostas criativas e capazes de preservar e
efetivar direitos a partir da demanda emergente no cotidiano, como um profissional
propositivo e não apenas executivo” (IAMAMOTO, 2003, p.20).
Historicamente o assistente social caracteriza-se como um dos agentes
profissionais que trabalham na implementação das políticas sociais, mais
especificamente nas políticas públicas, como executor dessas políticas este vai agir
diretamente com a população usuária. Atividade esta exigida pelo próprio mercado
de trabalho em que os profissionais de Serviço Social além de trabalharem na esfera
da execução, atuam na formulação das políticas públicas e na gestão das mesmas.
Para o bom desempenho destas atividades, faz-se necessário que o profissional
coloque certo limite, ou seja, capaz de romper com aquelas tarefas apenas
burocráticas e rotineiras voltadas apenas para os papéis.
Conforme entrevista as lavadeiras confirmam o valor de uma ação de
Serviço Social
engajada no compromisso social quando este vai junto aos bairros
para colaborar com a melhoria de vida da população. “Tenho saudades de quando a
gente se encontrava, pois foi um tempo gostoso, de muitas lutas e alegrias através
do Serviço Social” (Entrevistada M.V.).
As políticas sociais brasileiras... embora aparentem a finalidade de
contenção da acumulação da miséria e sua minimização através da ação de
um Estado regulador das diferenças sociais, de fato não dão conta deste
efeito. Constituídas na teia dos interesses que marcam as relações de
classe, as políticas sociais brasileiras tem conformado condições de
reprodução da força de trabalho, como favorecimento, ao mesmo tempo, da
acumulação da miséria social (SPOSATI apud YAZBEK, 2003, p.37).
Na atualidade as políticas sociais focalistas e seletivas do Estado Mínimo,
com um investimento precário nas políticas sociais e máximo para a produção do
lucro, rompem com o que se consolida na Constituição Federal no que se refere à
garantia do que lhes é direito do cidadão e dever do Estado. A compreensão do que
se entende por direitos e deveres do cidadão e do Estado necessita ser feita de
forma integrada entre ambas as partes, uma vez que esta é da responsabilidade de
75
todos. Assim evita-se uma concepção de política assistencialista baseada na
compaixão e benemerência.
São necessárias exigências de aprimoramento constante dos profissionais
fundamentado no código de Ética profissional, na competência teórico, ético -
política, operacional que dê respostas às demandas dos sujeitos como portadores
do direito de um atendimento com qualidade, eficiência, liberdade, dignidade,
autonomia e valorização humana.
A intensificação da qualidade de sujeito, objeto de nossa pesquisa foi um
elemento contribuinte para a inserção das lavadeiras na sociedade e sua motivação
para constituírem-se como grupo organizado.
As necessidades básicas de sobrevivência e melhoria para sua vida e de sua
família foi a força motora para o compromisso social e o apoio do Serviço Social
permitiu a construção de um espaço próprio para as organizações e ações coletivas
para estas mulheres que as ajudou a superar conflitos e obstáculos na realização de
seus objetivos.
A associação das lavadeiras confirma que a experiência de felicidade e auto-
estima passa pelo significado que fazemos e damos à própria vida. O prazer e o
encanto de viver se constroem em meio às lutas, aos conflitos e às experiências do
cotidiano quando vivido coletivamente.
Quanto a ser parte do grupo das lavadeiras, deixo meu recado de que o
mesmo me dava muita alegria e convicção em ser lavadeira, uma profissão
digna como uma outra e merecedora de valorização e respeito. Pois ali
buscava o pão e a realização pessoal por meio de um trabalho. Havia
alegria em dividir momentos e luta e reivindicação junto às companheiras
com o mesmo objetivos (Entrevistada M. Z. 63 anos)
Na sociedade atual onde predomina a realidade do capitalismo, essa
experiência do valor que tem as pequenas ações organizadas, passa a ser
insignificante, uma vez que este considera apenas o individualismo, o consumismo
e o lucro.
Para as lavadeiras, valores como o prazer, a satisfação em fazer de sua vida
uma ação duradoura para si e para a comunidade e ou grupo, alimenta o sentido de
toda luta e superação das dificuldades; anima-as a estar em um grupo que sonha
tem um porquê trabalhar e lutar.
76
Minha alegria de trabalhar era por que com o dinheiro eu podia comprar as
coisinhas de casa que mulher sempre gosta de ter e dar para os filhos,
como uma comidinha, um doce diferente, uma roupinha, um cheirinho e
aquelas coisinhas de mulher se arrumar bem. Eu sentia prazer de ver a
alegria dos filhos e como mãe isso era muito bom. Meu marido sempre dizia
que o trabalho era difícil, mas não tinha muito que escolher (Entrevistada F.
C. G. 68 anos).
Como profissionais do Serviço Social devemos estar atentos para a realidade
concreta do cotidiano e o valor das pequenas ações. Sonhar com um futuro melhor
faz parte sim do que fazer profissional, mas sempre na perspectiva de construir-se o
presente alicerçado na força que tem as pequenas organizações e ações, quando
fundamentadas nos valores existenciais da vida e da comunidade a qual se
escolheu.
Aprendemos com as lavadeiras que o saber passa pela capacidade da
socialização do cotidiano da vida e que a reflexão necessita ter alicerce sólido para
evoluir enquanto conhecimento. Intensificar a qualidade de sujeitos é resultado da
participação nos movimentos sociais para àqueles que conseguem superar a
particularidade e tornarem-se sujeitos de sua própria história. No processo de
mudança da realidade pequenas ações
53
ganham novos significados, colorindo o
cinzento da vida cotidiana e atribuindo novos significados aos gestos necessários
à produção e reprodução das relações sociais.
Para a profissão do Serviço Social permanece a ousadia de continuar na luta
pela justiça social e acreditar que, no embate com os padrões de produção
capitalista, é necessário colocar-se junto “à questão social e apreender a lidar com
suas múltiplas expressões, experienciadas pelos sujeitos em suas vidas cotidianas”
(IAMAMOTO, 2003, p. 62).
Hoje podemos contar essa história e dizer que somos mulheres com
capacidade e a realidade nos faz sonhar sempre e acreditar nas histórias
escritas e vividas como sinal de esperança de dias melhores. “Lutar não foi
em vão” (Entrevistada M. V).
53
Cf. anexo Boletim da Associação das Lavadeiras, n. 05 Lins, março de 1984.
77
Considerações Finais
Este trabalho tratou da realidade da organização, mobilização da Associação
das Lavadeiras de Lins na década de 1980. Refletiu-se sobre seu processo de luta
inserido na experiência da PEOP, projeto este assumido pela Faculdade de Serviço
Social de Lins, no período. Considerou-se ser este período com suas determinações
político, econômico e sociais vinculado aos movimentos sociais populares urbanos
de Lins, da região e também no Brasil.
Concluiu-se que os movimentos sociais populares urbanos, como a
associação das lavadeiras surgiram com o principal objetivo de luta pela conquista
de seus direitos em especial, na garantia da sobrevivência e qualidade de vida e
trabalho.
Verificou - se que a responsabilidade pelas melhorias de vida e trabalho da
população, é de todos. O trabalho buscou apresentar em sua discussão o conflito
interno, quando na organização e articulação das lavadeiras, apontando em alguns
momentos as dificuldades e desafios vivenciados por elas, de um lado, nos conflitos
internos à própria classe trabalhadora e de outro, as patroas e as relações
estabelecidas frente ao trabalho.
Ficou claro neste trabalho que na Associação das Lavadeiras da mesma
forma que em outras organizações e movimentos similares, foi fundamental a
experiência da motivação, o respeito às individualidades, o compromisso social e a
coragem de unirem-se pela garantia de uma melhor qualidade de vida. Para o grupo
das lavadeiras, defender e lutar pela conquista dos direitos exige confronto político e
ao mesmo tempo, prazer no que se faz.
Conforme a hipótese do trabalho confirmou - se que a experiência da
Associação das Lavadeiras para aquelas participantes que assumiram ser parte do
grupo, foram movidas por suas energias internas, valores, além do prazer em fazer
algo que desse sentido às suas vidas e de sua família. Elas viveram suas
experiências de forma a intensificar a cada dia de sua luta, a sua qualidade de
sujeito e aqui de forma coletiva, na busca de uma vida de autonomia e dignidade.
Destacou-se o valor e o compromisso do Serviço Social e como os
Assistentes Sociais deveriam continuar interagindo numa perspectiva sócio
educativa onde o profissional reconhece nas pequenas ações como os “teatrinhos,
as rodas de conversas, a recreação”, citados pelos sujeitos, a importância do seu
78
trabalho onde o significado do processo ultrapassa os resultados.
Conclui-se o trabalho com alguns desafios para a prática do Serviço Social
nos dias atuais, como o de rever que o Movimento Social (associações, sindicatos
grupos da periferia), é o espaço sócio-ocupacional do Assistente Social, que para
muitos profissionais das Prefeituras, acumulados por outras atividades, foi deixado
para um plano menos relevante ou até, muitas vezes, esquecido. Aqui importante
rediscutir a proposta do CRAS, do SUAS com atividades expressivas sócio-
educativas e ações que ajudem a mudar a realidade.
O Serviço Social pode aprender que esse tipo de ação Sócio-educativa
precisa ser desenvolvido privilegiando os espaços de tempo que a população tem
disponível em horário não comercial, para poder atender e privilegiar o trabalhador
com reuniões no início da noite, final de semana, como faziam as lavadeiras.
Era gostoso demais, a gente se reunia no final de semana ou à tardinha
para os nossos teatrinhos e músicas. Isso dava prazer e deixava a vida
mais leve, além de dar nosso recadinho a toda comunidade. (Entrevistada
M.Z 63 anos).
Hoje, parece que as pessoas estão muito sozinhas, cada uma buscando um
jeito de não passar fome. Ninguém se encontra. Até nas faculdades, antes
os alunos estavam em tudo. As estagiárias iam nas casas convidar a gente
para as reuniões e explicar as coisas. Hoje eu não sei se eles ainda ajudam
o povo a se reunir. Parece que as coisas mudaram, mas acho que também
as mulheres estão mais na frente em seus direitos. Já estão até na política,
o que antes é muito mais difícil (Entrevistada F.C. G 68anos).
Quanto ao desafio posto às Faculdades de Serviço Social e o Novo projeto
Societário do Projeto Ético – Político, faz-se necessário uma formação que direcione
ao engajamento de luta e inserção junto aos movimentos e organizações populares.
Segundo Iamamoto (2003), essa deve ser uma prática realizada de forma coletiva. A
equipe de trabalho deve atuar com um conjunto de especialistas que integre a
totalidade do ser social, como um profissional propositivo, criativo e viabilizador de
direitos.
Parece que a faculdade de Serviço Social está escondida e ausente da luta
do povo. Eu acho que a faculdade precisa estender os braços para alcançar
as causas e ajudar a mudar a realidade das classes sociais. Isso também
poderá ajudar ao próprio curso de Serviço Social nas discussões da
realidade e a ter maior influência junto às comunidades (Entrevistada M. Z
63 anos).
Confirma-se a idéia de que a Faculdade inserida junto aos grupos,
associações e movimentos sociais populares leva o próprio curso a inovar-se em
sua teoria quando engajado na concreticidade das experiências cotidianas.
79
REFERÊNCIAS
LIVROS
AGUIAR, A. G. Serviço Social e Filosofia: das origens a Araxá. São Paulo:
Cortez, SP, 1995.
AGUIAR, A. G. (coord.). Faculdade de Serviço Social de Lins. CADERNO DE TCC.
Lins: nº 1, 1983.
AGUIAR, A. G. (coord.). Faculdade de Serviço Social de Lins. CADERNO DE TCC.
Lins: nº 2, 2002.
ALMEIDA, Lúcio Flávio de. & SANCHES, Félix Ruiz. Um grão menos amargo das
ironias da história: o MST e as lutas sociais contra o neoliberalismo. In: Lutas
Sociais. São Paulo, n. 5, 2º sem., 1998. p.77-96.
ALVES, Giovanini. Trabalho Subjetividade e Lazer: estranhamento, fetichismo e
reificação no capitalismo global 2005, mimeo.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICA. NBR 6023: referências:
elaboração. Rio de Janeiro, 2000.
ANTUNES, R. Adeus ao Trabalho: ensaios sobre as metamorfoses e a centralidade
no mundo do trabalho. São Paulo, Cortez/Unicamp, 1985.
____________. Os Sentidos do Trabalho: Ensaio sobre a afirmação e a negação
do trabalho. São Paulo, Boitempo, 1999.
BARROCO, M. L. S. Ética e Serviço Social: Fundamentos ontológicos. São Paulo,
Cortez, 2001.
BEOZZO, José Oscar. Noroeste Paulista: Aspectos demográficos (ou, um caso
típico de povoamento), Revista de Cultura Vozes, Petrópolis: Vozes, v. 63, n.9,
1969, p.771-787.
_____________. Continuidade e Ruptura Revista Momento: Revista Linense de
Cultura, n. 6, Lins, SP, 1977. p. 3.
BRITES, Maria de Fátima. O Serviço Social na Fundação Paulista de Tecnologia
e Educação: limites e possibilidades na implementação de uma prática profissional.
Trabalho de Conclusão de Curso. (Graduação em Serviço Social) – Faculdade de
Serviço Social de Lins - Fundação Paulista de Tecnologia e Educação, 1994. 56ffls.
CONCEIÇÃO, Antônia. A organização dos movimentos populares em
Andradina. Trabalho de conclusão de curso (Graduação em Serviço Social) –
80
Faculdade de Serviço Social de Lins - Fundação Paulista de Tecnologia e Educação,
1983. 86 fls.
CINQUENTENÁRIO DA DIOCESE DE LINS, Edição da Diocese de Lins, Lins, São
Paulo, 1976, 117 p.
ESTANQUE, Elísio. Movimentos sociais, classe e comunidade: reflexões sobre a
sociedade portuguesa. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, v. 22, n.65,
mar.2001, p. 54-74.
FALEIROS, Vicente de Paula. Saber profissional e poder institucional, 6. ed. São
Paulo, SP: Cortez, 2001.
FARIA, Maria Neuza de et al. Serviço Social e participação popular. São Paulo,
SP: Loyola, 1980.
FERNANDES, Bernardo Mançano. MST formação e territorialização. São Paulo,
SP: Hucitec, 1996.
FERREIRA, Rosângela. Processo de reestruturação do ensino na Faculdade de
Serviço Social de Lins. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Serviço
Social) – Faculdade de Serviço Social de Lins - Fundação Paulista de Tecnologia e
Educação, 1982. 113 fls.
FIORINO, V. Ser cidadã francesa: uma reflexão sobre os princípios de 1789. In:
BONACCHI, G. & CROPPI, A. (orgs.). O dilema da cidadania: direitos e deveres
das mulheres. São Paulo: Unesp, 1994.
GADOTTI, M. & PEREIRA, O. PRA que PT - Origem, Projeto e Consolidação do
Partido dos Trabalhadores. São Paulo: Cortez, 1989- 370p.
GIAFORMAGGIO, L. Igualdade e diferença: são realmente incompatíveis? “. In:
BONACCHI, G. & CROPPI, A. (orgs.). O dilema da cidadania: direitos e deveres
das mulheres. São Paulo: Unesp, 1994.
GODINHO, Tatau. Irreverência e criatividade: os movimentos sociais renovam a
cena política. Revista Inscrita, São Paulo, v.4, n.7, maio, 2001, p.32-35.
GOHN, M. da G. Classes populares, periferia e movimentos sociais urbanos.
Dissertação de Mestrado em Serviço Social - Faculdade de Filosofia, Letras e
Ciências Humanas, Universidade de São Paulo - USP, 1979.
_____________________. Movimentos Sociais e Luta pela moradia, São Paulo,
Brasil, Loyola, 1991.
GOUVÊA, Maria das Graças de. Educação popular junto aos movimentos
sociais: o centro de direitos humanos e educação popular - CDHEP. Tese
(Doutorado em Serviço Social) – Faculdade de Serviço Social - Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo/PUC, 1997, 220 fls.
81
GROPPI, A. “As raízes de um problema”. In: BONACCHI, G. & CROPPI, A.
(orgs.). O dilema da cidadania: direitos e deveres das mulheres. São Paulo:
Unesp, 1994.
HELLER, A. O cotidiano e a história. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.
HELMAN, M. “Democratização e movimentos sociais no Brasil”. In: PAOLLI, M. C. &
all. Movimentos sociais e democracia no Brasil: sem a gente não tem jeito. São
Paulo: Marco Zero- Idelfess- Labor, 1993.
HOBSBAWM, Eric. Era dos extremos: o breve século XX: 1914-1991. São Paulo,
SP: Companhia das letras, 1996. p. 288.
IAMAMOTO, M. V. O Serviço Social na contemporaneidade: trabalho e formação
profissional. 7. ed. São Paulo: Cortez, 2003.
______________. Renovação e conservadorismo no serviço social: ensaios
críticos. 5. ed. São Paulo: Cortez, 1992.
IAMAMOTO, M.V.; CARVALHO, R. de. Relações Sociais e Serviço Social no
Brasil: esboço de uma interpretação histórico metodológica. 11ª. Ed. São Paulo:
Cortez; (Lima, Peru): CELATS, Brasil, 1996.
LOWY, M. Ideologias e Ciências Sociais: elementos para uma análise marxista.
16ª. Ed. São Paulo, Cortez, 2003.
JACOB, Pedro. Movimentos sociais e políticas públicas. São Paulo, SP: Cortez,
1998.
KAMEYAMA, Nobuco. A Prática Profissional do Serviço Social. Serviço Social &
Sociedade, v.3, n.6, p.147-155, 1981.
_____________ . Relatório preliminar de avaliação da caminhada do ensino
reconceituado do Serviço Social da Faculdade de Serviço Social de Lins. 1981-
mimeografado.
______________. Problemas do Oeste Paulista. Revista de Cultura Vozes,
Petrópolis: Vozes, v.63, n.8, 1969.
KOOP, P. P. Problemas do Oeste Paulista. Revista de Cultura de Vozes,
Petrópolis: Vozes, 1969. v, 63, nº 9, p. 787.
KOSIK, Karel. Dialética do Concreto. 7ª ed. São Paulo, Paz e Terra, 2002.
KOWARICK, L. (org). As lutas sociais e a cidade: São Paulo, passado e presente,
Clara Ant (et al.), 2ª. ed. RJ: Paz e Terra, 1994.
LARANJEIRA, S. (org). Classes e movimentos sociais na América Latina.
Hucitec, São Paulo, 1990.
82
MAFFEZOLI, M. O conhecimento do quotidiano para uma sociologia da
compreensão. Coleção Vegas, V.801 035 6 (sd).
MARX, K. & ENGEL, F. Manifesto comunista. São Paulo: Boitempo, 2005.
_________________. A Ideologia Alemã. São Paulo, Martins Fontes, 2001.
MARX, K. Manuscritos econômicos-filosóficos. Lisboa; Edições 70, 1975.
MATTOS, Isabel Cristina. Educação popular e o projeto de educação e
organização popular da Faculdade de Serviço Social de Lins. Trabalho de
Conclusão de Curso (Graduação em Serviço Social) – Faculdade de Serviço Social
de Lins - Fundação Paulista de Tecnologia e Educação, Lins. 1984. 67 fls.
MOURA, T.M. S. de. Momento vivenciado pelo Serviço Social na Faculdade de
Serviço Social de Lins - Projeto de Educação e Organização Popular-PEOP -
1979-1986. Dissertação (Mestrado em Serviço Social) – Faculdade de Serviço
Social - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo /PUC, 1990, 128 fls.
NETTO. J. P. Para a crítica da vida cotidiana. In: NETTO, J. P. & CARVALHO,
M.C.B. Cotidiano: conhecimento e crítica. São Paulo: Cortez, 1996.
___________. Ditadura e Serviço Social: uma análise do Serviço Social no Brasil
pós-64. 7. ed. São Paulo, Cortez, 2004.
PAOLLI, M. C. Movimentos sociais no Brasil: em busca de um estatuto político.
São Paulo: CEDEC, 1989.
PERIN, Ivanice Gelli. A associação das lavadeiras: instrumento de luta ou de
acomodação? Faculdade de Serviço Social de Lins. Trabalho de Conclusão de
Curso (Graduação em Serviço Social) – Faculdade de Serviço Social de Lins -
Fundação Paulista de Tecnologia e Educação, 1982.114fls.
QUEIROZ, M. I.P. de. O Mandonismo local na vida política brasileira e outros
ensaios. São Paulo, Alfa - Omega, 1976.
REAL, J. C. A concepção de violência contra a criança e o adolescente numa
perspectiva social. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Serviço
Social) Faculdade de Serviço Social de Lins. Centro Universitário de Lins/ UNILILNS,
2004, 65 FLS.
SADER, E. Quando novos personagens entram em cena. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1998.
SADER, E. Movimento popular urbano. São Paulo: FASE, 1884.
SANTOS. B. S. Pela mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade. São
Paulo: Cortez, 1995.
83
SANTOS, Renata, C. Gonçalves. Lutas sociais e relações de gênero: o processo
de constituição do grupo de mulheres de São José. Dissertação (Mestrado em
Ciências Sociais) - Faculdade de Ciências Sociais Aplicada - Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo/PUC, 1999. 135 fls.
SILVA, Matsuel Martins. A História da Faculdade de Serviço Social de Lins, de
1958-1988: diferentes conjunturas, diferentes caminhos. Dissertação (Mestrado em
Serviço Social) – Faculdade de Serviço Social - Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo /PUC, 1992, 127 fls.
SKRZYPZAY, Miria Aparecida. Cidadania e MST: a conquista dos direitos. Trabalho
de Conclusão de Curso (Graduação em Serviço Social) – Faculdade de Serviço
Social de Lins. Fundação Paulista de Tecnologia e Educação, 1999, 57 fls.
SOUZA-LOBO, E. A classe operária tem dois sexos. São Paulo: Brasiliense,
1991.
THOMPSON, E. P. A formação da classe operária inglesa. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1981.
TROTTA, Miguel Edgardo Vicente. Lãs concepciones de Crisis Y Refluxo de los
movimientos sociales urbanos a lus dela dinâmica sócio-política de la união
dos movimientos de moradia de São Paulo, 1989-2000. Tese (Doutorado em
Serviço Social) – Faculdade de Serviço Social - Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo, 2002.
VIEIRA, E. Democracia e política social. São Paulo, Cortez, 1992. - (coleção
polêmicas de nosso tempo; V. 49).
VITÓRIO, C. S. S. de. Serviço social é uma profissão feminina? Trabalho de
Conclusão de Curso (Graduação em Serviço Social) - Faculdade de Serviço Social
de Lins. Centro Universitário de Lins/UNILINS, 2005. 118 fls.
WANDERLEY, Mariângela Belfiore. Metamorfose do desenvolvimento de
comunidade e suas relações com o serviço social, 2. ed. São Paulo, SP: Cortez,
1998.
____________________________. Formação Profissional no contexto da reforma
do sistema educacional. Cadernos ABESS/CEDEPSS, São Paulo, 1998, n. 8, p.1-
18
YASBEK, M.C. O Serviço Social e o movimento histórico da sociedade brasileira.
Legislação Brasileira para o Serviço Social. São Paulo: CRESS, p.13-29, 2004.
_____________. Classes Subalternas e assistência social. São Paulo, Cortez,
1993.
84
REVISTAS
Revista Serviço Social & Sociedade, São Paulo, v.3, n. 6, 1981. p.147-155.
Revista de Cultura Vozes, Petrópolis: Vozes, v.63, n.8, 1969, p. 673.
Revista de Cultura Vozes, Petrópolis: Vozes, v. 63, n.9, 1969, p. 771-787.
Revista Novos Escritores, Petrópolis Vozes, nov. 1981.
DOCUMENTOS DA FACULDADE DE SERVIÇO SOCIAL DE LINS
LINS, Faculdade de Serviço Social. Reuniões da Congregação: atas do período de
1959 – 1972, fls. 1-50.
LINS, Faculdade de Serviço Social. Reuniões da Congregação: atas do período de
1972 a 1990, fls1-72.
LINS, Faculdade de Serviço Social. Reuniões da Congregação: atas do período de
1954, fls. 1-28.
LINS, Faculdade de Serviço Social. Centro Universitário de Lins – UNILINS . Projeto
de Supervisão Acadêmica de Estágio do Curso de Serviço Social Lins, São Paulo,
2003.
LINS, Faculdade de Serviço Social. Centro Universitário de Lins – UNILINS. Projeto
Pedagógico do Curso de Serviço Social, São Paulo, 2006.
LINS, Faculdade de Serviço Social. Centro Universitário de Lins – UNLINS. Relatório
do Inspetor Verificador de Bauru, da diretoria de Ensino Superior - 02/10/1958.
OUTROS DOCUMENTOS
Boletim da Associação das Lavadeiras, n. 1, Lins, junho de 1982.
Boletim da Associação das Lavadeiras, n. 2, Lins, março de 1983.
Boletim da Associação das Lavadeiras, n. 5, Lins, março de 1984.
Boletins da Federação Universitária de Lins, 1976/1982.
Boletim Informando da Diocese de Lins, 1977, p.1.
85
Boletim A Voz do Povo do Grupo Linense de Educação Popular, n. 1- 42. Lins, 1985.
Censos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 1940 a 1970.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL, Senado Federal,
Brasília – DF, 1988.
“Documento de Araxá”. Resvista Debates Sociais, n. 4, ano 3, Rio de Janeiro,
CBCISS, mai.1967.
“Documento de Teresópolis – Metodologia do Serviço Social”. Revista Debates
Sociais. Suplemento nº 4, 5ª ed. Rio de Janeiro, CBCISS, set, 1978.
Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados – SEADE. Projeções
preliminares da População residente, por idade e sexo, 1991.
LBA - Diretrizes e realizações. Relatório apresentado pelo Secretariado Geral aos
membros do Conselho Consultivo e Deliberativo. Publicação da LBA. Arquivo da
Escola de Serviço Social da PUC/SP. Período: agosto de 1942 - julho de 1943).
LDB – Lei de Diretrizes de Base da Educação – n. 9394, dezembro de 1996.
86
APÊNDICES
87
APÊNDICE A
ROTEIRO DE ENTREVISTA - DEPOIMENTO DAS LAVADEDIRAS DE LINS DA
DÉCADA DE 1980
I- IDENTIFICAÇÃO
Idade: Sexo
Escolaridade: Estado Civil:
Endereço:
II - PERGUNTAS ESPECÍFICAS
1 Como se deu o surgimento do grupo (contar a história)
-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------
2 Qual o significado para as mulheres (e para você), formar e organizar o grupo das
lavadeiras?
-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------
3 Como foi a passagem (mudança) de empregadas domésticas, à categoria de
mulheres trabalhadoras assalariadas?
-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------
4 Quais foram as principais motivações que as levaram a cuidarem-se de si mesmas
e de seu próprio destino (busca pela sobrevivência...)?
-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------
5.Quais os valores presentes nesta luta?
-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------
6. O que você diz da atuação do Serviço Social, da Faculdade de Serviço Social de
Lins, junto à organização das lavadeiras e em outros movimentos deste período?
-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------
88
APÊNDICE B
SUJEITOS DA PESQUISA
Francisca, C.G. D (F.C.G.D.) – 68 anos, casada, 10 filhos, lavadeira,
passadeira e também bóia-fria, participante ativa dos encontros e ajudava no grupo
de teatro.
Maria Josefa (M.Z.) – 63 anos, casada, 8 filhos, empregada doméstica,
participante da associação das lavadeiras desde o início, líder no grupo de teatro
das mulheres, militante do partido dos trabalhadores (PT), membro da diretoria do
sindicato, integrante ativa do grupo das lavadeiras.
Maria Laura (M.L.) – 75 anos, viúva, aposentada, 3 filhos, participante da
associação das Lavadeiras desde o surgimento do grupo 1980 a 1984, foi uma das
líderes fortes na organização da associação e militou por muito tempo em outros
grupos populares, na CEBS e outros.
Maria Vera (M.L.) – 55 anos, separada, 2 filhos, participante da associação
das lavadeiras a convite dos amigos. Entrou no grupo um ano depois, participou
além da associação das lavadeiras da vida da comunidade católica na formação da
consciência política e formação de novas lideranças. Organizadora do grupo de
teatro, pelo qual levavam a proposta de luta das lavadeiras e a realidade vivida no
trabalho de lavar e passar. Militante do PT e do sindicato.
89
APÊNDICE C
TRANSCRIÇÃO DOS DEPOIMENTOS
Depoimento 1
54
“Eu participava do grupo das lavadeiras, lavava e passara para mais de
15 donas de casa, às vezes fazia também outros serviços. Como limpara a
casa, fazer comida e cuidar de seus filhos. O preço era combinado com as
outras lavadeiras. A gente se reunia para conversar sobre o quanto valia o
nosso trabalho se não trabalhava por menos que o combinado, se não a
gente saia perdendo das patroas... Eu digo pra você que a gente sentia gosto
e vontade de fazer o que fazia.
O trabalho é a melhor coisa quando a gente tem saúde e vontade
trabalhar. Nunca tive preguiça de ir para o trabalho e às vezes a gente
trabalhava até de domingo, mas sabia que vinha sempre um dinheirinho para
comprar as coisas em casa. Pois o dinheiro do marido era muito pouco e
família com bastante criança, pequena tinha que botar “pão” na mesa.
Você sabe que a gente dava conta de tudo, não ficava doente e não
reclamava. hoje em dia parece que tudo é mais fácil, mas o dinheiro não
chega e as mulheres têm muita doença, até umas um pouco estranha como a
tal da depressão e ficam desanimadas e nem podem mais trabalhar...Uma
coisa eu digo de verdade: as patroas tratavam muito bem a gente, é certo que
a gente nem sabia o que era o registro na carteira, mas elas ajudavam a
gente e quando ficava doente, elas mesmos levavam para o hospital e para
casa. A minha alegria de trabalhar era porque com o dinheiro eu podia
comprar as coisinhas de casa que mulher sempre gosta de ter e dar para os
filhos, como uma comidinha, um doce diferente, uma roupinha, um cheirinho e
aquelas coisinhas de mulher se arrumar bem...
Eu sentia prazer de ver a alegria dos filhos e como mãe isso era muito
54
Realizado em 12 de set. de 2005 às 14h00minh, à Rua Pedro Ferreira, s/n, bairro Ribeiro, Lins, SP.
90
bom. Meu marido sempre dizia que o trabalho é difícil então não tinha muito
que escolher, era mais na roça e de empregada, como não tinha uma
profissão a gente se acostumava com tudo. Hoje lembro de tudo com
saudades. Eu não ia muito à reunião das mulheres, porquê a patroa não
gostava e eu tinha medo de perder o emprego. Quando eu ia, gostava de
prosear e contar história, ainda a gente ficava sabendo das dificuldades que
passava e dos nossos direitos. Tinha umas mulheres “briguentas” e
animadas.
O jeito que a gente lavava e passava não era mole não. A gente ia lavar
roupa no rio em cima da pedra, batia, batia e o rio era bem longe! Na hora de
passar o ferro era a moda da brasa. Hoje as mulheres têm muita mordomia
tudo é mais fácil para fazer o serviço, mas é outro tempo, elas não são felizes
com o trabalho. Tudo é mais caro e acho que o salário de hoje continua muito
pouco para as mulheres.
Eu acho que porque as mulheres daquele tempo eram mais unidas e
traçavam idéias nas reuniões, o trabalho era melhor. Lá no grupo a gente
falava tudo e confiava uma na outra. Quando a gente não sabia bem como
fazer sempre alguém ajudava com uma idéia. Os encontros eram alegres e
bem divertidos. A gente dançava, cantava, fazia uns teatrinhos engraçados
para falar da realidade da nossa vida. Depois sempre tinha um assunto do
nosso trabalho. Ali agente aprendia lutar e dividir o pão de cada dia.
Hoje, parece que as pessoas estão muito sozinhas, cada um buscando
um jeito de não passar fome. Ninguém se encontra. Até nas faculdades, antes
os alunos estavam em tudo. As estagiárias iam nas casas convidar a gente
para ir nas reuniões e explicar as coisas. Hoje, não sei se eles ainda ajudam o
povo a se reunir... parece que as coisas mudaram, mas parece também que
as mulheres estão mais na frente em seus direitos... já estão até na política”.
(F. C. G.D.).
91
Depoimento 2
55
“Nosso grupo começou depois de reuniões nos bairros, quem dava as
reuniões eram os estagiários do Serviço Social. A gente se encontrava para
falar da realidade da política de nossa cidade e dos nossos direitos. A gente
fazia teatro, por que assim todo mundo entendia o recadinho sobre a situação
da realidade do que estava acontecendo. Além de discutir os assuntos a
gente levava o teatrinho para a comunidade. As peças do teatro eram escritas
conforme o contexto da realidade e necessidade dos grupos naquilo que era
de seu direito. Como por exemplo, os do grupo de bóia-fria, das empregadas
domésticas, e o nosso o das lavadeiras.
Os grupos começam a ganhar mais força quando unidos. Eles nascem
junto com os Partidos dos Trabalhadores (PT). Os trabalhadores eram a
maioria em sua organização. Todos os grupos se organizavam por
necessidades de melhorias para sua vida de trabalhador. Nos grupos tinham
também muitos conflitos, por que nem todos lutavam pelos mesmos
interesses, às vezes havia o interesse pessoal. A gente respeitava as outras
classes, mas também queríamos que respeitassem o das lavadeiras.
A maior luta dessa época era pelo direito mais especificamente o da
sobrevivência, destacando o direito ao trabalho, como o 13º, descanso aos
domingos; passe coletivo para o trabalho; carteira assinada; creche para os
filhos e salário justo para todas as categorias. Nossa organização frente às
patroas não era tão fácil. Havia certo conflito. Algumas até reconheciam nossa
competência e buscavam o grupo das lavadeiras e das empregadas como
referência pra contratar as mulheres, mas por outro lado, havia aquelas que
iam até as rádios para difamar a nossa luta e o nosso nome. É interessante
observar que quando a gente não exigia nossos direitos, a gente até tinha
uma relação mais familiar com a patroa, mas, depois que começamos a exigir
nossos direitos, a gente era vista como estranhas na casa predominando uma
55
07 de set. de 2005 às 16h00minh. R. Marciano Rodrigues de Souza, 21, CDHU , Lins, SP.
92
relação de desigual de dominação. Eu carrego comigo o orgulho de ter sido
parte dessa luta do grupo, sempre batalhei e tive satisfação em ser
trabalhadora, independente da classe que pertenci. Sou mulher, sou gente,
sou humana, sou negra e tenho dignidade. O importante é sentir-se gente
capacitada a ganhar o pão de cada dia.
Para mim, essa experiência do grupo das mulheres valeu a pena, por
ter ganho nesse grupo uma maior visão sobre a realidade do mundo, do ser
mulher e das relações de trabalho. Foi no grupo que vivi grandes
possibilidades de mudança em minha vida e consciência de classe
organizada. Percebi que não era nada fácil para a classe trabalhadora
manter-se firme frente à pressão da classe dominante. Era sempre um jogo
de forças, fundada em interesses pessoais.
Enfrentamos alguns preconceitos na luta, por sermos mulheres pobres,
negras lavadeiras, empregadas e trabalhadoras. N minha opinião, se o povo
de hoje tivesse a conscientização dos grupos populares organizados, de
como se forma um cidadão livre e possuidor de direitos e deveres e este
soubesse da força que tem uma organização assim, não haveria tanta
exploração da força de trabalho, preconceito, pobreza e exclusão das
pessoas.
Na minha experiência a mudança da vida doméstica para mulher
trabalhadora assalariada foi de grande aprendizado. Antes aprendi que só
trabalhava por questão de necessidade e que a mulher devia cuidar da casa,
dos filhos e da roça. Depois com a realidade da vida na cidade, muda a visão
que a gente tem do mundo e as necessidades são outras.
Agora era preciso lidar com a tecnologia para desenvolver o mesmo
trabalho só que de outra forma. Estamos sempre aprendendo, daí a
importância da vivência e discussão em grupo. Essa mudança marcou uma
etapa em minha vida, porque despertou em mim que sou parte da cidadania,
posso lutar pelo melhor e unir-me com os outros na mesma causa. Posso
estudar e aprender coisas novas, o que é um direito como cidadã e ser
respeitada.
93
Valeu ser parte integrante do grupo. Essa experiência para mim,
mesmo contando com os momentos conflitivos, apesar das dificuldades é
vista pelos outros como algo positivo. Quanto à autonomia financeira, por
necessidade familiar, desde cedo aprendi a lidar com ela. Às vezes até com
certa dificuldade e ou e ou sobrecarga nos afazeres, mas o prazer em ser
trabalhadora supera os desafios. Naquela época havia o apoio da faculdade
de Serviço Social de Lins junto das lutas do povo. Por todo canto tinha
estagiárias e assistentes social sendo parte integrante e até idealizadores e
mobilizadores das lutas e direitos dos trabalhadores em suas reivindicações.
Hoje em minha opinião ela parece estar escondida e ausente da luta do
povo. Eu acho que a faculdade precisa estender os braços para alcançar as
causas e ajudar a mudar a realidade das classes sociais. Isso também pode
ajudar ao próprio curso de Serviço Social nas discussões da realidade e a ter
maior influência junto às comunidades.
Quanto ser parte do grupo deixo meu recado de que o mesmo me dava
muita alegria e convicção em ser lavadeira, uma profissão digna como uma
outra e merecedora de valorização e respeito, pois ali buscava o pão e a
realização pessoal por meio do trabalho. Havia alegria em dividir momentos
de luta e reivindicação junto às companheiras com os mesmos objetivos.
Sinto saudades do prazer de poder sentar e ter o que discutir algo como
um bem maior para todos. Havia muita amizade e companheirismo. Era
gostoso demais porque além de dispersar um pouco as preocupações
individuais do trabalho a gente se unia para falar das situações local e global.
Lutar por melhorias de vida e direito à dignidade para todos, dá prazer e
alegria, deixa a vida mais leve. Isso eu sentia nas peças de teatro que a gente
fazia “.(M. Z.).
94
Depoimento 3
56
“Tudo começou com o trabalho das alunas da faculdade de Serviço
Social. A gente tinha uma coordenadora que organizava as reuniões para as
mulheres se encontrarem. Ali a gente conversava sobre tudo um pouco:
trabalho, cãs, salário, lazer, saúde, política e outros.
Eu me recordo que uma instruía a outra naquilo que sabia mais sobre a
situação da vida e da realidade. Eu gostava muito das músicas que a gente
cantava no grupo, era muito animado. Até tinha uma que tocava violão. Mas a
gente também sofria muito. As coisas era tudo mais difícil. O trabalho de lavar
e passar era na mão, nada na máquina como hoje e a gente tinha que dar
conta se não o dinheiro diminuía ainda mais. Por que a gente lavava e
passava e o preço era cobrado por peça ou dúzia.
Mesmo com as dificuldades, parece que as coisas tinham mais valor.
Era muito bom se encontrar para falar da vida da gente, nossas histórias, a
dos nossos filhos e sobre o nosso trabalho de cada dia, dos problemas e das
alegrias que a gente ia descobrindo no grupo. Tinha as festas e os passeios
para encontrar com as outras mulheres que lutavam como nós por melhores
salários.
Eu me lembro que era através do teatro que a gente falava mais da
nossa realidade de empregada de empregadas domésticas, das lavadeiras e
passadeiras. Era a forma que a gente usava para dizer tudo que estava
acontecendo e precisava melhorar. Algumas lavadeiras tinham medo de
participar porque a patroa proibia e prometia mandar embora. O teatro falava
das dificuldades e das brigas na família pela falta de dinheiro e coisas que
faltava em casa. O marido dizendo para as mulheres que ela precisava sim
ganhar mais, por que o dinheiro não dava para sustentar a família.
As idéias que a gente discutia no grupo se transformava em teatro era
mais sobre o que a gente queria que mudasse. Como ser mais valorizada no
56
Realizada em 04 de setembro de 2005, às 10h30min à Rua Marconi, 1349, Bairro Ribeiro, Lins, SP.
95
trabalho;a gente pedia igualdade de salário; nossos direitos respeitados, pois
naquele tempo não tinha para nós o tal do INPS.
Nas reuniões a gente conversava para que ninguém aceitasse trabalhar
por pouco salário, pois o serviço era muito e sem qualquer direito a descanso,
nem férias. Sempre como a trouxa de roupa na cabeça ia nós para as beiras
dos riachos para garantir nosso sustento de cada dia. O valor disso tudo era a
alegria que as mulheres tinham para lutar. No grupo a gente se sentia com
mais coragem e confiava uma na outra. Ali era o nosso lugar, nosso espaço
de desabafo e de esperança das nossas conquistas. Parece que naquele
tempo era bem melhor: as mulheres, os pobres e os trabalhadores era tudo
mais unido. Um ajudava o outro a sair das dificuldades. O Serviço Social era o
nosso apoio. Os alunos e professores ajudavam as comunidades, ensinando
a gente a se defender e lutar pelos nossos direitos. Tinha mulheres que
trabalhavam muito para as patroas e ainda tinha força para cuidar da sua
casa e de seus filhos.
Meu maior orgulho sempre foi não desistir mesmo nas dificuldades. Eu
sempre via que a mulher e os outros grupos que existiam queria ter a sua vida
e cuidar dele do jeito que acreditavam que era melhor para si, para a
comunidade e para a sua família. Então tudo era necessário Quando eu
comecei a trabalhar e fazer parte de um grupo eu achei a melhor coisa,
parece que eu me sentia mais mulher e dona do meu pedaço. “É uma
sensação gostosa de cuidar da vida com dignidade” (M. L.).
96
Depoimento 4
57
“Quando entrei no grupo já tinha o grupo formado, eu fui para ele
através de convite das amigas que já participavam há mais tempo. Para nós
mulheres foi uma grande vitória, pois veio o conhecimento a cada uma como
se a gente fosse uma família.
Ficamos conhecidas pelo teatro e cada uma de nós tinha muita
responsabilidade e conhecia sobre os nossos direitos. Dentro da categoria de
lavadeiras não me lembro bem. Eu lavava e passava para as repúblicas de
estudantes. Elas juntavam o dinheiro e a responsável pagava para nós. A
diferença nessa mudança foi que a gente era mais valorizada e o trabalho era
organizado. Todas recebiam um valor igual, conforme o combinado.
Eu sentia uma sensação de que a sociedade via a gente diferente,
como mulheres que sabiam o que queriam. Contribuir com as despesas em
casa dava direito pra gente de ter nossas coisas e decidir o que fazer com o
nosso dinheiro, mesmo que às vezes não chegava para tudo que a gente
queria.
As motivações que levou a gente a cuidar da gente mesma foi o
aumento do salário e o serviço da roça já estava acabando. Nesse emprego o
patrão pagava INSS, o que ia ajudar a gente na aposentadoria depois. Os
valores que lembro era a organização da luta.
A preparação do teatro como o jeito de conscientizar as pessoas e
todas nós da importância de viver em grupo. A comunidade é o grande valor.
Nela ninguém vive só, nem tem necessidade. Outro valor importante, é que
quando a gente tem pessoas de luta com a gente e que apóiam como as
estagiárias e pessoas da comunidade em geral, dá uma alegria muito grande
e vontade continuar na luta até de brigar se for preciso. O Serviço Social foi
muito bom para nossa luta. Elas nos orientavam e faziam com que
57
Realizado em 05 de outubro de 2005, às 18h00min na Comunidade São José, Bairro Ribeiro de
Lins, SP.
97
enxergassem a realidade como mulheres e irmos atrás de nossos direitos.
Sempre a gente se comunicava com elas para não perdermos o contato com
elas. Havia a presença da escola em todos os acontecimentos das lavadeiras
e dos outros movimentos populares.
Tenho muitas saudades, pois foi um tempo gostoso de muitas lutas e
alegrias do Serviço Social que a gente fazias na Catedral de Lins, junto com
os grupos. Ali a gente se reunia. Era o nosso espaço de vida comum.
Gostaria de dizer que hoje, algumas dessas mulheres da associação
das lavadeiras, já se aposentaram como eu e minhas colegas. A associação
não existe mais como tal, mas espalharam-se pelas mais diversas militâncias
entre partidos, movimentos e organizações. Mas tudo foi válido em seu
tempo.
Somos mulheres e carregamos com orgulho a história já feita em todas
as passagens da vida. Desde o direito para a luta, o engajamento que levou
cada uma a procurar seus direitos e outras categorias de trabalho. Hoje,
podemos contar essa história e dizer que somos mulheres com capacidade e
a realidade nos faz sonhar sempre e acreditar nas histórias escritas e vividas
como sinal de esperança de dias melhores. “Lutar não foi em vão” (M. V.)
.
98
ANEXOS
99
ANEXOS BOLETINS DA ASSOCIAÇÃO DAS LAVADEIRAS DE LINS, DÉCADA
DE 1980.
100
Boletim n
o
1 – Junho/1982
101
102
103
104
Boletim n
o
2 – Março/1983
105
106
107
Boletim n
o
5 – Março/1984
108
109
110
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo