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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS
DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA E TEOLOGIA
MESTRADO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO
ASPECTOS PSICOLÓGICOS NA CURA RELIGIOSA
PENTECOSTAL
MANOEL MESSIAS DA SILVA MOREIRA
GOIÂNIA
2006
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2
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS
DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA E TEOLOGIA
MESTRADO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO
ASPECTOS PSICOLÓGICOS NA CURA RELIGIOSA PENTECOSTAL
MANOEL MESSIAS DA SILVA MOREIRA
Orientadora Profª. Drª. Zilda Fernandes Ribeiro
Dissertação apresentada ao curso de Mestrado
em Ciências da Religião como requisito para a
obtenção do grau de mestre.
GOIÂNIA
2006
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3
4
DEDICATÓRIA
Ao meus queridos e inesquecíveis pais Vicente e Elvira
(em memória). Aos meus amados irmãos Cacilda, José,
Francisco, Antonio (em memória) e Docília e Jonas,
pelo amor, dedicação, incentivo e apoio constante no
decorrer da minha vida e por compreenderem a minha
ausência durante estes estudos. Aos meus sobrinhos
por todos os benefícios e carinho nesta caminhada,
proporciondo-me força para que eu chegasse a concluir
mais esta etapa de construção de novos
conhecimentos.
5
AGRADECIMENTOS
A Deus pela introjeção da sua figura no meu psiquismo, que sempre foi
canalizada em forma de energia, dando-me força para lutar mesmo diante das
adversidades e ser vencedor, na busca de novos paradigmas.
À todas as pessoas que, ao longo dos anos, contribuíram decisivamente nessa
tarefa, a quem as palavras não conseguem exprimir tamanha gratidão.
Aos meus pais, Vicente Moreira e Elvira Pereira (em memória), pelas
motivações, incentivos e esforços, desde a minha infância para que eu estudasse.
Aos meus familiares, irmã/o, sobrinhos/as, cunhados/as, tios/as e primos/as que,
ao seu modo, contribuíram para a minha realização.
À querida professora e “orientadora” Drª. Zilda Fernandes Ribeiro, que soube
respeitar os meus desejos acadêmicos, acompanhando-me com dedicação e
sabedoria, indicando o norte a seguir nesta construção.
Ao professorres Dr. Valmor da Silva e Drª. Rosa Maria Viana, por suas
contribuições em minha banca de defesa, e em especial ao Prof. e Dr. Valmor da Silva
pela perspicácia e capacidade psíquica de perceber os meus valores, sendo para mim
um grande incentivo.
À querida Profª. e Drª. Carolina Teles Lemos, pelo seu bom caráter, competência
e amizade, que talvez sem saber foi um grande incentivo neste meu caminhar.
Ao Prof. e Dr. Luigi Schiavo, pelo tempo que caminhamos juntos.
À coordenação, professores e funcionários do MCR. Em especial à Secretária
Executiva Geyza Pereira, por sua presteza, fineza e carinho em me atender.
Às igrejas evangélicas pentecostais que me possibilitaram o recrutamento de
pessoas para o trabalho de campo.
Aos queridos sujeitos, que com o seu depoimento foram parte imprescindível
neste estudo.
À querida amiga Dulce Helena Silveira Santos, que me apoiou bem de perto com
o seu ombro amigo nos momentos mais difíceis, ouvindo e encorajando- me.
À querida amiga e psicóloga Maria Divina Silva Arantes pelos incentivos e apoio
nesta luta
6
À querida amiga e Profª. Sueli Ribeiro de Rezende, revisora oficial desta
pesquisa, pela amizade e apoio.
À querida amiga, colega e “filha” Mariza Miranda da Silva por saber ouvir e
ajudar-me a buscar respostas plausíveis para minhas inquietações.
À querida amiga, colega e “mãezona” Cleusa Gomes de Melo Marques, pela
amizade, positivismo e incentivos nesta caminhada.
Ao amigo/a e colega Elias Mayer Vergara e Dirce socorro Guizzo, pelo respeito,
valorização, incentivos e apoio.
À querida amiga, advogada e mestre, Marta Nobre pela sua amizade e
sapiência, sendo um suporte imprescindível para esta caminhada
Ao amigo e diretor administrativo do Hospital de Medicina Alternativa, Ailtom
Bezzerra Oliveira pela compreensão e apoio.
Àqueles/as que se fizeram amigos/as e companheiros/as, na turma de mestrado
2004, e de outras turmas que se agregaram a nós, sobretudo, aos que abrindo a novas
relações participaram dos nossos “cultos”.
7
Os sonhos são como vento, você os sente, mas não
sabe de onde eles vieram e nem para onde vão. Eles
inspiram o poeta, animam o escritor, arrebatam o
estudante, abrem a inteligência do cientista, dão
ousadia ao líder. Eles nascem como flores nos terrenos
da inteligência e crescem nos vales secretos da mente
humana, um lugar que poucos exploram.
(Augusto Jorge Cury)
8
RESUMO
MOREIRA, Manoel Messias da Silva. Aspectos psicológicos na cura religiosa
pentecosal. Goiânia: Universidade Católica de Goiás, 2006.
Esta pesquisa aborda, em caráter principal os aspectos psicológicos na cura religiosa
pentecostal. Não discute se existe ou não cura religiosa, porém centra-se em investigar
os elementos psicológicos presentes, ou que contribuam para a efetivação da cura
religiosa pentecostal. Pretende entender de alguma forma o aparato psíquico e seus
elementos que a partir da simbologia religiosa e psicológica se constituem participantes
desta demanda, através da visão junguiana. Questiona a que ponto as curas
religiosas pentecostais não são também curas psicossomáticas. Para Jung o símbolo é
o mecanismo psicológico transformador da energia, podendo ser considerado como a
expressão individual do arquétipo. O símbolo é o meio que fornece a possibilidade de
ser utilizado o fluxo energético para alguma produção. Jung chamou o símbolo que
transforma a energia de “imagem da libido”, que seriam as representações que podem
dar à libido uma expressão equivalente, canalizando-a para uma forma diferente da
original. A pesquisa trata de saúde, doença; religião, psicologia e a eficácia de ambas
na cura. Culmina com o trabalho de campo com quatro estudos de casos de cura
religiosa pentecostal onde são investigados os aspectos psicológicos.
Palavras-chave: doença, doente, psicologia, religião, pentecostal, cura, psicossomática,
9
ABSTRACT
MOREIRA, Manoel Messias da Silva. Psychological aspects in religious pentecostal
cure. Goiânia: Catholic University of Goiás, 2006.
This research mainly discusses the psychological aspects in religious Pentecostal cure.
It does not discuss if there is religious cure or not, it concentrates, however, on
investigating the psychological elements present, or which contribute to the execution of
religious Pentecostal cure. It intends to understand in some way the psychological
apparatus and its elements which, starting from religious and psychological symbolism,
turn themselves into participants in this discussion, through jungian vision. It questions
to what point the religious pentecostal cures aren’t also psychosomatic cures. To Jung,
the symbol is the psychological mechanism which transforms the energy, and which can
be considered as the individual expression of the archetype. The symbol is the means
that provides the possibility of using the energy flow for some kind of production. Jung
called the energy-transforming symbol the “image of the libido”, which would be the
presentations that can give an equivalent expression to the libido, canalizing it to a form
different from the original one. The research deals with: health, sickness and sick;
religion, psychology and the efficience of both in the cure. It culminates in the field work
with four case studies of religious pentecostal cure, where the psychological aspects are
studied.
Key words: Sickness, sick, psychology, religion, pentecostal, cure, psychosomatics.
Key words: Sickness, sick, psychology, religion, pentecostal, cure, psychosomatics
10
SUMÁRIO
RESUMO..................................................................................................................... 8
ABSTRACT................................................................................................................. 9
INTRODUÇÃO.............................................................................................. 13
1 A DOENÇA E O DOENTE............................................................................ 25
1.1 SAÚDE............................................................................................................ 25
1.2 CONCEPÇÃO DE DOENÇA E DOENTE...................................................... 27
1.2.1 Contexto Histórico Cristão: Antigo e Novo Testamento.................................. 28
1.2.2 Modalidades Principais de Manifestação da Doença...................................... 35
1.2.2.1 Doenças orgânicas.......................................................................................... 35
1.2.2.2 Doenças espirituais......................................................................................... 38
1.2.2.3 Doenças psicossociais na atualidade ............................................................ 41
1.2.3 Elementos Psicológicos que Contribuem para o Surgimento de Doenças.... 49
1.2.3.1 Sentimento de culpa....................................................................................... 49
1.2.3.2 Estresse.......................................................................................................... 51
1.2.3.3 Sintoma de conversão.................................................................................... 53
2 RELIGIÃO E PSICOLOGIA COM SEUS POTENCIAIS DE CURA.............. 55
2.1. RELIGIÃO...................................................................................................... 55
2.1.1 Elementos Contidos na Religião que Contribuem para a Cura..................... 62
11
2.1.1.1 O sagrado...................................................................................................... 62
2.1.1.2 Mitos símbolos e ritos.................................................................................... 64
2.1.1.3 Principais elementos sacros.......................................................................... 70
a) O líder religioso.............................................................................................. 70
b) A fala.............................................................................................................. 72
c) Os gestos........................................................................................................ 74
d) A memória – literatura..................................................................................... 75
e) O lugar............................................................................................................. 76
2.1.1.4 Experiência religiosa........................................................................................ 77
2.1.1.5 Simbologia na cura religiosa............................................................................ 79
2.2 . PSICOLOGIA................................................................................................... 82
2.2.1. Psicologia da Religião – Informações Teórico-Históricas............................... 83
2.2.2. Elementos Psicológicos que Contribuem para a Cura.................................... 89
2.2.2.1. O símbolo......................................................................................................... 90
2.2.2.2. O psicoterapeuta.............................................................................................. 95
2.3. POTENCIAIS DE CURA................................................................................... 97
2.3.1 Cura Religiosa.................................................................................................. 97
2.3.1.1 Cura no Mundo grego...................................................................................... 98
2.3.1.2 Cura no Antigo e Novo Testamento.............................................................. 101
2.3.2. Cura Psicológica............................................................................................. 104
2.3.2.1 Simbologia Psicológica do Corpo................................................................... 106
12
2.3.2.2 Cura Psicossomática....................................................................................... 108
3 COMO SE PROCESSA A CURA RELIGIOSA E PSICOLÓGICA..................... 112
3.1 VISÃO RELIGIOSA CRISTÃ E PSICOLÓGICA.................................................. 112
3.2 COMO SE PROCESSA A CURA RELIGIOSA................................................... 115
3.3 OS PROCESSOS PSICOLÓGICOS NA CURA RELIGIOSA.............................. 120
3.4 ANÁLISE PSICOLÓGICA DOS SUJEITOS......................................................... 125
Sugeito 1 Mary.................................................................................................... 125
Sujeito 2 Carmem............................................................................................... 127
Sujeito 3 Débora................................................................................................. 128
Sujeito 4 Fernando............................................................................................. 129
3.5 ANÁLISE PSICORELIGIOSA DAS CURAS RELATADAS................................... 130
Sujeito 1 Mary...................................................................................................... 131
Sujeito 2 Carmem................................................................................................ 133
Sujeito 3 Débora.................................................................................................. 135
Sujeito 4 Fernando.............................................................................................. 138
CONCLUSÃO....................................................................................................... 141
ANEXOS............................................................................................................... 145
Anexo A – Roteiro para Coleta de Dados do Material de Campo....................... 145
Anexo B – Material Coletado em Campo............................................................ 147
Anexo C – Tabelas............................................................................................. 170
REFERÊNCIAS................................................................................................... 172
13
INTRODUÇÃO
na minha infância, era religioso praticante, embora meus pais não
freqüentassem nenhuma igreja. Ia à igreja com vizinhos, e sozinho, à medida que fui
crescendo. Fui batizado e crismado, fiz primeira comunhão na Igreja Católica, a qual
sempre freqüentei. Aos nove anos, minha mãe e meus irmãos começaram a freqüentar
um Centro Espírita de Umbanda e eu os acompanhava embora sem entender muito.
Segundo esta linha de espiritismo eu tinha mediunidade, precisava desenvolvê-la, e
logo me tornei médium. Contudo, continuei freqüentado a Igreja Católica. Sempre tinha
curiosidade para ler a Bíblia, porém o padre dizia-me que era um livro muito complicado
e que não deveria.
Aos dezessete anos mudamos, por morarmos de aluguel e tivemos como
vizinha uma senhora presbiteriana que me deu uma Bíblia de presente. Iniciei a leitura
e não parei. Era muito estudioso e procurava decifrar o significado de muitas palavras
no dicionário. Freqüentei a Igreja Presbiteriana durante seis meses e após isso me
converti na Igreja Batista Independente
1
, uma igreja pentecostal.
Lendo a Bíblia passei a ter muitas dúvidas sobre inúmeras práticas religiosas
atuais e mesmo sobre a Igreja Católica, a Umbanda, os Evangélicos e suas inúmeras
ramificações. Senti-me vocacionado para a evangelização principalmente de jovens e
fui para um seminário teológico
2
, desta Igreja em Campinas São Paulo onde fiz um
curso teológico de três anos e um ano de estágio.
1
Igreja Batista com princípios doutrinários pentecostais, de origem sueca.
2
Seminário Teológico Batista Independente, hoje faculdade de teologia.
14
Depois disso, trabalhei dois anos como líder de jovens da Convenção das Igrejas
Batistas Independentes no Brasil, sendo responsável pelo trabalho jovem nos Estados
do Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Nessa época, fui convidado para pastorear a
Igreja Batista Independente de Assis, São Paulo, onde fui ordenado pastor, trabalhando
por dois anos.
O radicalismo pentecostal, os usos e costumes, os quais eu não concebia como
valores espirituais e outras divergências, levavam os pastores desta denominação, por
serem muito radicais, a sentirem-se ameaçados com a minha presença, sendo que na
época a maioria dos pastores não tinha preparação teológica adequada e não era muito
amiga da obtenção de conhecimentos teológicos ou seculares. Tudo isso levou-me a
renunciar o pastorado e voltar para Goiânia onde fiquei como pastor auxiliar e
posteriormente fui afastando-me de forma sutil dos compromissos de trabalho religioso,
atuando apenas como um membro da igreja.
As dúvidas, os questionamentos, estavam sempre comigo, então propus-me a
estudar, a buscar conhecimentos que pudesses pelo menos me trazer algumas
respostas. Tornando-me psicólogo clínico as dúvidas aumentaram. Os usos e costumes
que eram tão enfatizados como valores para uma vida santificada, não possuíam
fundamentação bíblica e muitas curas ocorridas no meio pentecostal podiam também
ocorrer a partir de uma psicoterapia, com uma diferença: as curas religiosas
pentecostais ocorriam às vezes na hora ou dentro de um curto espaço de tempo, eram
curas pela fé; as curas psicológicas eram técnicas e ocorriam dentro de um processo de
meses ou anos que a psicoterapia exigisse variando de caso para caso. A partir dessa
observação senti-me atraído para pesquisar a cura religiosa pentecostal e sua relação
com as curas psicossomáticas, no sentido de buscar resposta se haveria ou não
15
elementos psicológicos contidos na cura religiosa pentecostal. Estes motivos levaram-
me então, a fazer este mestrado.
SÍNTESE HISTÓRICA DOS PENTECOSTAIS.
O movimento pentecostal
3
teve sua origem em 1900, expandindo-se até a
Suécia, a Índia, e América Latina, e foi organizado nos Estados Unidos em 1914,
com o nome de General Council (Assembléia Geral)”. No mesmo ano, cerca de cem
congregações e seus respectivos pastores, reuniram em Hot Springs (EUA), dando-lhes
um único nome: “Assembléia de Deus” (Bettencourt, 2003, p. 48).
A Assembléia de Deus teve sua origem no Brasil em 1910, através de dois
missionários suecos: Gunnar Vingren e Daniel Berg. Aquele de origem batista, nasceu
em 1879. Foi para os Estados Unidos em 1903, e recebeu o “batismo com o Espírito
Santo
4
”, o dom de falar em línguas estranhas, afirmando que o poder de Deus vinha
como uma pressão, sobre ele (Bettencourt, 2003, p. 48).
Gunnar Vingrem e Daniel Berg foram chamados para o trabalho missionário no
Brasil, em 1910, pelo Espírito Santo, através de mensagem, em línguas estranhas
5
,
pronunciadas por um certo “irmão
6
Uldin, proprietário da casa onde estavam
3
Cf. HINNELLS. 1984, p.204. Pentecostalismo. “Aludindo a descida do Espírito Santo (Trindade) sobre
os Apóstolos em pentecostes, aplica-se o termo em um movimento iniciado em Los angeles, no
Estados Unidos (1906 EC), que se espalhou pela África, Europa e América Latina. Tem sido
caracterizado pela cura espiritual e pelo e discurso estático em “línguas” (glossolalia) ininteligíveis ou
soando como línguas existentes, porém não conscientemente conhecidas pelo discursante. Suas
igrejas incluem o Evangelho Four Square de Elim, a Assembléia de Deus, e muitas outras, algumas
das quais são igrejas negras
4
Cf. At 1,8 Descida do Espírito Santo sobre o fiel, com o objetivo de enchê-lo de Poder para
testemunhar, para anunciar o Evangelho de salvação. Expressão comumente utilizada pelos
pentecostais para denominar a manifestação do Espírito Santo, com o falar em línguas estranhas.
5
Cf. At 2,1-14. Sinal que segue a descida do Espírito Santo, quando o fiel fala em línguas totalmente
estranhas e ininteligíveis ou em línguas inteligíveis.
6
Tratamento de rotina utilizada entre o pentecostal para comunicar-se com qualquer outro fiel.
16
hospedados. Na mensagem, o irmão repetia muitas vezes a palavra “Pará”, que era
desconhecida aos ouvintes. Consultando a biblioteca local, descobriram que Pará era
um estado que ficava na região norte do Brasil. Receberam a mensagem como
ordenação divina, entendendo que deveriam vir para o trabalho missionário no Brasil.
Em novembro de 1910, chegaram a Belém do Pará, com o objetivo de iniciar o trabalho
de divulgação do pentecostalismo ( Bettencourt, 2003, p. 48).
Os historiadores do movimento pentecostal, com unanimidade mencionam a Rua
Azusa, em Los Angeles, Califórnia, como central de expansão do avivamento que
espalhou por cidades e nações, tendo início em 1906. Antes dessa data, uma senhora
metodista, que houvera recebido a mensagem de avivamento
7
, em Houston, foi quem a
levou até Los Angeles. Milhares de pessoas passaram a reunir na rua Azusa, para
interceder pela salvação do mundo e buscar um avivamento; desejosos de uma vida
espiritual abundante e de vencer pecado (Conde, 2003, p. 21-22).
Estava à frente dessa igreja o pastor W. J. Seymor, pregador pouco eloqüente.
Ele anunciava a promessa do batismo com o Espírito Santo e durante o culto intercedia
para que Deus se revelasse de forma extraordinária aos fiéis. O poder de Deus vinha
de forma inexplicável sobre os fiéis, que se enchiam de convicção das verdades
divinas, sendo apoderados por um enorme desejo de santidade. Durante o culto
surgiam louvores espontâneos, pessoas eram batizadas com o Espírito Santo, falavam
em línguas estranhas, profetizavam
8
e cantavam hinos espirituais (Conde, 2003, p. 22).
As noticias desses fatos foram propagando-se, sendo que ajornais seculares
interessaram pela matéria e a divulgava. Pessoas de todos os lugares, membros de
7
Mensagem pentecostal, acerca do Batismo com o Espírito Santo e dom espirituais, com objetivo de ser
ploclamada ao mundo.
8
Cf. FOUILLOUX, 1998, p. 213. Profeta. (Gr. Prophetas, de pro, antes” ou em nome de”, e phemi,
“eu falo”.). Aquele que fala em nome de Deus.
17
várias outras igrejas protestantes, ali chegavam por curiosidade para verem de perto o
fenômeno religioso, sendo batizadas também com o Espírito Santo e voltavam
divulgando suas experiências a outras pessoas. Chicago foi uma das cidades onde o
movimento pentecostal mais se destacou, alcançando todas as igrejas evangélicas da
cidade. O movimento destacava-se pelo o fato de após as pessoas serem batizadas
com o Espírito Santo, eram despertadas e possuídas por um forte desejo de divulgar o
Evangelho para outros povos. Cada pessoa que se convertia, tornava-se um
missionário em potencial (Conde, 2003, p. 22-23).
O pastor batista Gunnar Vingren, de nacionalidade sueca, vivia na cidade de
South Bend, no estado de Indiana. Ele foi atraído pelas notícias e acontecimentos do
avivamento de Chicago, resolvendo então presenciar o que estava acontecendo. Na
oportunidade, ele creu e foi batizado com o Espírito Santo. Participando de uma
Convenção Batista, das igrejas que aceitaram o avivamento, ele conheceu o jovem
pastor, também de origem sueca, Daniel Berg, que também havia sido batizado com
o Espírito Santo. Ambos chegaram á conclusão de que Deus queria enviá-los para
terras longínquas, porém não faziam idéia do lugar. Posteriormente, conforme nos
referimos através de mensagem profética, foi lhes comunicado que deveriam ir para o
estado do Pará, no Brasil. Sem nenhuma promessa de ajuda humana, sem sustento
financeiro, apenas vivendo a fé no que tinham crido e experimentado, embarcaram para
o Brasil (Conde, 2003, p. 23-24).
Gunnar Vingren e Daniel Berg chegaram em Belém do Pará, no dia l9 de
novembro de 1910. Ambos os pastores ainda estavam ligados oficialmente, a
denominação Batista nos Estados Unidos, portanto procuraram a sucursal em Belém,
que os acolheram e hospedaram-nos nas dependências da igreja. Suas experiências a
18
respeito do fenômeno religioso vivido, logicamente levaram-nos a testemunhar para os
demais membros da Igreja Batista. Os resultados não tardaram: houve salvação em
Jesus Cristo. Quando a primeira pessoa na igreja recebeu este batismo. Foi o
suficiente. Como era de se esperar, a igreja não viu isso com bons olhos; pois essa
prática religiosa ia de encontro com os dogmas Batistas. Em assembléia administrativa
local, houve a proposta de serem excluídos os rebeldes da comunhão com a igreja, ou
seja, os que praticavam a doutrina do Batismo com o Espírito Santo e os Dons
Espirituais (Conde, 2003, p. 26-32). “Os rebeldes” oraram, e, de mãos erguidas, dando
glória ao Cristo, abandonaram o local” (Conde, 2003, p. 32). No dia 18 de junho de
1911, fundam a igreja, com l7 pessoas expulsas da Igreja Batista, dentre elas os
pastores Gunnar Vingren e Daniel Berg. A partir daí, nas cadas seguintes, a igreja
viria trazer admiração ao mundo pelo seu exuberante crescimento (Conde, 2003, p. 32).
“Em tudo isso, pode-se notar a mão de Deus operando através de homens e
mulheres humildes. Como se vê, essa obra não pertence a homem algum, mas
a Deus somente. A nova igreja estava livre para evangelizar. E ousadamente
anunciava a salvação, a cura divina, o batismo com o Espírito Santo e a volta
de Jesus Cristo para buscar a sua igreja. Estavam todos cheios do poder de
Deus. Em resposta às suas orações, o Senhor operava sinais e maravilhas.
Vivificando cada testemunho e sermão, o Espírito Santo convencia os mais vis
pecadores” (Conde, 2003, p.33).
Os fatos que contribuíram para fundação da Assembléia de Deus repercutiram
nas demais denominações evangélicas e estas temendo serem absorvidas pelo
movimento pentecostal, uniram-se para combatê-lo, utilizando-se de “calúnias,
delegação e até agressão física, tudo era válido”. Chegaram, inclusive, a levar aos
jornais a denúncia de que os pentecostais eram uma seita perigosa, tendo como prática
o exorcismo, enfim alarmaram a população (Conde, 2003, p.33).
19
Apesar das adversidades, a Assembléia de Deus cresceu, fortaleceu e expandiu-
se, levando o trabalho missionário e em 1936 tinha alcançado todas as capitais dos
estados brasileiros e grande parte do interior de todos os estados, alcançando o último
território em 1946.
Atualmente, a Assembléia de Deus é a maior denominação pentecostail no
Brasil. Dela derivaram inúmeros outros movimentos e denominações pentecostais.
Dentre eles o movimento entre as igrejas tradiconais, principalmente Batistas e
Presbiterianas que faccionaram-se surgindo as dedominações Batista Renovada, hoje
Batista Nacional e Presbiteriana Renovada e posteriormente os neopentecostais. As
denominações surgidas da Assembléia de Deus, aboliram os usos e costumes, mas
conservaram a doutrina do Espírito Santo e dos Dons Espirituais, a crença na cura das
doenças e na transformação por que passam as pessoas que se convertem ao
pentecostalismo.
Nosso tema Aspectos psicológicos na cura religiosa pentecostal, levou-nos à
contatos teóricos com vários autores tanto da área religiosa como da psicologia da
religião, o que nos trouxe relevantes informações sobre estas duas disciplinas.
O projeto de pesquisa com seu enfoque na cura religiosa pentecostal,
direcionou-nos a pesquisar a cura, tendo em vista que no Brasil, no meio cristão de
hoje, ela è pouco enfocada, desde o meio católico até os evangélicos tradicionais.
Contudo, no âmbito pentecostal a cura religiosa é mais enfatizada. Observa-se que nos
tempos antigos desde o mundo helênico, na Bíblia no Antigo Testamento e
principalmente no Novo, registrado nos Evangelhos, a cura sempre fez parte da obra
salvadora do ser humano. Salvação espiritual, perdão de pecados, cura física e
emocional e conseqüentemente mudanças sociais, sempre caminharam juntas. Cura
20
espiritual e física sempre andaram de mãos dadas. Eram exercidas por magos,
sacerdotes, taumaturgos e líderes religiosos. Essas curas ocorriam no âmbito religioso,
associadas à medicina e a religião, como veremos no decorrer deste estudo. À medida
que a medicina foi separando-se da religião e tornando ciência autônoma, as curas
religiosas foram diminuindo e deixando de serem enfatizadas como parte da Salvação,
da libertação.
ESTRUTURAÇÃO DA DISSERTAÇÃO
Utilizamos neste estudo a pesquisa bibliográfica e empírica. Para suporte teórico
recorremos a vários autores afins, e dentro das disciplinas religião e psicologia. Em
religião nos embasamos em alguns teólogos, dentre eles Klaus Berger, historiadores
religiosos como Aldo Natale Terrin; em psicologia além de outros, Jean-Yves Leloup e
principalmente Carl Gustav Jung; em psicossomática dentre outros Paola Di Blasio,
Roberta Vitali e Manuel Valdés.
A presente pesquisa procurou explorar os possíveis elementos psicológicos
relacionados com a cura através da experiência religiosa pentecostal. Nosso primeiro
passo foi visitar vinte cultos ou reuniões específicas que anunciavam cura religiosa, em
vinte Igrejas Pentecostais diferentes, tais como: Assembléia de Deus, principalmente;
Batista Independente; Batista Nacional; Presbiteriana Renovada; Igreja Evangélica
Quadrangular e outras. A investigação foi efetuada através de entrevistas semi-abertas
com sujeitos que foram recrutados especificamente para abordarem suas experiências
de cura religiosa. Foi tomado cuidado para que os momentos da pesquisa não se
transformassem em momentos de psicoterapia e isso foi informado aos sujeitos.
21
Acreditamos que o tema da pesquisa está diretamente ligado ao momento de vida
concreto, experienciado pelos sujeitos, tido como momento altamente positivo e que
contribuiu para configurar uma rica reflexão. O pesquisador estava preparado para que
se este momento suscitasse alguma ansiedade previsível ou alguma outra situação
de ordem emocional que merecesse atenção maior, o sujeito seria encaminhado para
psicoterapia, com outro psicólogo.
O recrutamento foi efetuado de forma aleatória, através de cartaz-circular com o
tema e a proposta da pesquisa, em vinte instituições religiosas pentecostais,
principalmente a Assembléia de Deus, sendo colocado em mural, solicitando a
colaboração de pessoas interessadas em participarem da pesquisa, a prestarem seu
depoimento pessoal de cura através da experiência religiosa pentecostal. Foram
apresentados: o nome do pequisador, da instituição de ensino, telefones, e-mail e
endereço para contato. Apenas quatro pessoas apresentaram-se quando se pretendia
entrevistar cinco pessoas para estudo de caso.
Foi incluída na pesquisa a pessoa que recebeu uma ou mais cura física ou
emocional através da experiência religiosa pentecostal, desde que essa cura tenha
ocorrido em momento espiritual de petição, adoração e ou hierofania
9
, tanto individual
como em situação coletiva ou através de processo hieroterapêutico
10
, com ou sem a
intercessão de pastor ou pessoa religiosa dotada de atributos espirituais para tal.
A pesquisa foi efetuada com quatro estudos de casos, de pessoas que
receberam cura através da experiência religiosa pentecostal. Teve como objetivo
buscar o aprimoramento de conhecimentos a respeito dos aspectos psicológicos, que
9
Cf. ELIADE, 1992, p. 25. “A fim de indicarmos o acto da manifestação do sagrado propusemos o termo
hierofania”.
10
Cf. FERREIRA, 1996, p. 895. (De hier(o) + terapia. “Tratamento de doenças por meio de exercícios
religiosos”.
22
podem estar presentes na cura religiosa pentecostal. Foi realizado o número de sessão
psicológica que se fez necessário, para obtenção dos dados, com cada sujeito, quando
foram ouvidos os relatos da sua experiência de cura. Isso ocorreu no consultório do
pesquisador, que é Psicólogo Clínico. O registro foi através de gravação em fita K-7 e
anotações, posteriormente transcritas em sua íntegra e resumidas, sem perderem sua
essência. Essas entrevistas foram orientadas por um roteiro preestabelecido (anexo A).
Esses dados foram confrontados com as percepções do pesquisador para a construção
dos indicadores da pesquisa que serviram de base para a construção das informações
e apreensão dos núcleos temáticos de reflexão. Esses últimos foram articulados às
fontes teóricas pertinentes.
É bom ressaltar que o Projeto de Pesquisa com o tema Aspectos psicológicos na
Cura Religiosa Pentecostal, passou pelo Comitê de Ética em Pesquisa Humana e
Animal da Universidade Católica de Goiás, tendo sua aprovação.
A presente dissertação foi estruturada em três capítulos, conclusão, anexos e
referências.
O primeiro capítulo tem como título A doença e o doente. Este capítulo aborda
inicialmente o conceito de saúde; segue-se a de concepção de doença e doente,
através de uma releitura breve do contexto histórico desde o mundo helênico, Antigo e
Novo Testamentos; posteriormente são apresentadas as modalidade principais de
doenças: orgânicas, espirituais e psicossociais na atualidade; elementos psicológicos
que contribuem para o surgimento da doença, dentre eles: o sentimento de culpa,
estresse e sintoma de conversão.
23
O segundo capítulo tem o título Religião e psicologia com seus potenciais de
cura, onde são abordados os itens: religião, psicologia e potenciais de cura: religiosa e
psicológica.
Em religião, inicialmente é feita uma releitura de religião desde algumas
definições a partir de prismas diferentes, religião nos tempos antigos, seu verdadeiro
significado a partir do termo salus”, que seria salvação com libertação completa (física,
psicológica, social e espiritual). A seguir o apresentados os elementos contidos na
religião que contribuem para a cura: o sagrado; mitos, símbolos e ritos; principais
elementos sacros: o líder religioso, a fala, os gestos, a memória (literatura sagrada), o
lugar; a experiência religiosa e a simbologia religiosa.
Em psicologia, para melhor compreensão é feito um breve histórico da psicologia
religiosa e elementos psicológicos que contribuem para a cura, principalmente o
símbolo e o significado do psicoterapeuta.
Em potencial de cura são vistos: a cura religiosa e psicológica. Em cura religiosa
é feita uma breve releitura de cura no mundo helênico; no Antigo e Novo Testamento e
discutida a cura na atualidade. Em cura psicológica, destacam-se: a simbologia do
corpo e cura psicossomática.
O terceiro capítulo tem como título Como se processa a cura religiosa e
psicológica”, que aborda: visão religiosa cristã e psicológica, onde é feita uma sucinta
releitura de fé, desde a sua definição religiosa e psicológica, como também uma breve
análise de processos psicológicos contidos no ato de fé; a seguir, como se processa a
cura religiosa, onde se tenta descrever a cura pela cristã na sua prática, incluindo a
cura no meio pentecostal; posteriormente, os processos psicológicos na cura religiosa,
onde é feita uma releitura desde os tempos primitivos sobre energia psíquica a
24
chegar à visão junguiana, onde a extrapolamos como base de contribuição psicológica
no ato de fé e cura religiosa.
Finalizando, conclui-se que diante dos resultados obtidos na pesquisa de campo,
surgem caminhos e possibilidades para que novas pesquisas venham trazer assim
contribuição para o mundo científico psicorreligioso.
25
CAPÍTULO 1 DOENÇA E DOENTE
Este capítulo visa rever doença e doente, desde a sua definição, partindo do
conceito de saúde. Será realizada uma releitura de como eram vistos, doença e doente,
como eram tratados e aceitos, no contesto histórico-religioso e antropológico do Antigo
e Novo Testamento. Posteriormente serão apresentadas e discutidas modalidades de
manifestação das doenças, incluindo a atualidade; culminando com a apresentação dos
principais elementos psicológicos que contribuem para o surgimento de doenças.
1.1 SAÚDE
Para se falar em doença, torna-se necessário partir do conceito de saúde. A
saúde é definida pela Organização Mundial de Saúde OMS, como ”um estado de
pleno bem-estar físico, mental e social, e não a simples ausência de doença”. Com
relação ao termo “mental” seria o que se relaciona ao espírito, à mente e sentimentos,
não se limitando apenas ao que diz respeito à esfera cognitiva, onde estão as
26
“atividades eletivas” e a atuação da natureza humana; mas também o que diz respeito
ao mundo emocional, os sentimentos, os estados de humor que respondem de forma
relevante sobre a vida e o mundo exterior (COLOMBERO, 2000, p.8). Complementando
esta idéia encontra-se também a importância de considerar-se a vida, o todo: “observar
a concepção de saúde está intimamente relacionado com uma concepção religiosa do
corpo e da vida” (LEMOS, 2002, p. 480)
O conceito amplo de saúde citado acima é questionável, principalmente, no que
diz respeitos às ciências médicas, na atualidade, e onde ele estaria sendo efetivado em
toda a sua abrangência. TERRIN (1998, p.201) chega a afirmar que o “estar bem”
proposto pela OMS, seria irrealizável e esclarece: ”[...] todos nós somos mais ou menos
doentes, uma vez que somos submetidos na sociedade e no ambiente em que vivemos,
a conflitos sociais, a desgastes psicológicos, a perturbações profundas que nos
impedem, por um motivo ou por outro, de atingir uma situação de bem-estar que seja ao
mesmo tempo física, espiritual e social”.
Saúde pode também ser definida como:
Abundância de vida e por isso envolve diversos aspectos. Saúde é integridade
física não prejudicada ausência de feridas, febres, fraqueza, dor ou outros
tipos de sofrimento. Supõe força e energia nos órgãos do corpo, nos membros
e nos sentidos de uma pessoa e a experiência de bem-estar e alegria de viver.
Na medida em que o bem-estar é diminuído ou prejudicado, está presente
algum aspecto da doença (PHILLIBERT, 1998, p. 9).
A saúde de uma pessoa é sustentada por ela e pela comunidade, ou seja, pelo
sentido que sua comunidade tem e lhe transmite, e pelo que ela sente em relação a
esta comunidade. Este sentido está ligado a “família, colegas, amigos e comunidade”,
como um todo, “que recebe a contribuição da atividade e generosidade da pessoa”,
como também lhe transmite (PHILLIBERT, 1998, p.9)
27
1.2 CONCEPÇÃO DE DOENÇA E DOENTE
A concepção de doença vem deste o mundo antigo variando de cultura para
cultura até chegar aos nossos dias e a nossa realidade, América Latina e Brasil
Sempre existiram muitos conceitos de doença, na sua maioria demasiadamente
restritos, enfocando mais instabilidade ou danos no corpo. Sabe-se, porém, que doença
não é apenas anomalia orgânica e sim um sintoma ou conseqüência da má estrutura de
uma família, grupo social ou sociedade no geral.
Na realidade brasileira, a doença é concebida no senso comum a partir de um
sintoma no corpo, como uma dor, disfunção, infecção e outros. Na área técnica
principalmente na medicina, não foge à regra, é a partir de um sintoma que a pessoa
procura um médico, isso quando tem condição de fazê-lo, apresentando um resumido
diálogo dos seus sintomas. O médico, por sua vez, com sua visão restringida ao corpo
e a partir da sintomatologia, é mais propenso a ler e avaliar resultados dos exames, do
que ouvir o relato do paciente sobre os seus sintomas ou doenças. Com as inúmeras
especializações, o médico enfoca e prioriza partes do corpo, deixando assim de ver e
avaliar o ser humano como um todo, como um ser holístico. Sobre isso, completa
Rosny (188 p. 19) “Quanto à medicina dos hospitais, ela tende a centrar-se antes de
tudo no indivíduo, no corpo orgânico do indivíduo, ou até mesmo num único membro
desse corpo”.
Naturalmente, a cultura com a sua diversidade de valores é quem conceitua
doença de acordo com o grupo social, cidade ou nação; isto porque cada grupo étnico
ao termo “doença”, explicações e conceitos vindos dos seus ancestrais, ligados
também às suas crenças religiosas.
28
A doença pode ser definida como “desestabilização das forças da vida”, pois
prejudica a estabilidade física, danificando sua qualidade e enfraquecendo a qualidade
da saúde. Essa desestabilização pode ocorrer em conseqüência de: guerra, violência,
agressão pessoal, contágio ou ferimento”, como também em decorrência de: “fome
catástrofes naturais e acidentes os quais levam á ruptura do bem-estar físico e social”.
“Vulcões, terremotos, furacões ou enchentes marcam muitas vezes a vida de
comunidades inteiras”.
A doença também pode ocorrer no dia-a-dia, como conseqüência de vários
fatores: ambientais: como poluição, agrotóxicos, contaminação na água;
socioeconômicos como: preconceito racial, de gênero, social, religioso, baixa renda,
desemprego, desnutrição, fome, e ausência de princípios de higiene; envelhecimento:
conseqüências das vária faixas etárias vividas; vícios, como: o fumo, a droga e o
álcool; emocionais, como: perdas, conflitos, rejeição, culpa, estresse, e outros. Não
existe portanto um critério em que não possa haver equívoco em relação a doença, seu
conceito é portanto analógico (PHILLIBERT, 1998, p. 9-10).
“A pessoa doente é pessoa
dependente, limitada nas suas potencialidades” (SCHIAVO; SILVA, 2000, p. 108). Essa
limitação e dependência trazem uma rie de transtornos emocionais, como sentimento
de incapacidade, de impotência, de menos valia e outros; os quais contribuem, para
maior deterioração emocional e orgânica
1.2.1 Contexto Histórico Cristão: Antigo e Novo Testamento
29
Torna-se necessária uma releitura histórico-religiosa, social, política e
antropológica das raízes do cristianismo ao seu surgimento, como também vivia o
povo de Israel no início do cristianismo, buscando com isso, como a doença era vista e
considerada nessa época.
Ao fazer uma retrospectiva, observa-se nos relatos histórico-religiosos, no mundo
antigo, que sempre houve doenças, como também curas, milagres, sinais e maravilhas,
através de uma crença, ou experiência religiosa. Isto ocorreu em todos os tempos e em
todas as culturas, onde a convicção do sobrenatural, do sagrado, existiu e ocorre ainda
em nossos dias.
Pode-se observar entre o povo de Israel, desde os tempos primórdios que o
conceito de doença sempre esteve ligado ao pecado e à impureza. Os termos
“possessão de demônio” ou “espírito de enfermidade” possivelmente foram absorvidos
de crenças e costumes da cultura dos povos que os dominaram. Surgiram após o exílio
babilônico.
No Antigo Testamento, as pessoas aparecem como “afetadas por enfermidades”
em suas múltiplas formas que poderiam indicar “fraqueza, mal estar, úlceras feridas” e
às vezes mencionadas de forma que não se pode identificar a patologia
11
. Muitas são
traduzidas como manifestação do mal. Naturalmente a imprecisão na identificação
revelava o desconhecimento da anatomia humana. A nomenclatura não importava
tanto, porém a origem se atribuia: castigo pelo pecado. (VENDRAME, 2001, p. 21).
11
Cf. CABRAL, 1971, p. 280. “Condição do organismo em que uma célula ou órgão é impedido de
desenvolver sua função usual; doença, perturbação ou disfunção que provoca o funcionamento
anormal do organismo”.
30
As doenças mais freqüentes, citadas no Antigo Testamento, são as “afecções
cutâneas, cegueira, surdez, paralisias e esterilidade”. Essas doenças simbolizavam
“males maiores, de ordem espiritual”, bem como sofrimento com o qual os seus
portadores eram acometidos. Os doentes eram abandonados em função do “significado
religioso da doença” (VENDRAME, 2001, p. 22). De todas as doenças a lepra era a
pior. Segundo o povo de Israel, lepra era castigo de Deus comparado à morte. “O
próprio termo sara (=leproso) significava golpeado, ferido (por Deus). Miriam (Nm 12,
1-15) e o rei Osias (2 Cr 26, 19-20), são casos típicos” (VENDRAME; 2001, p. 22). Além
da lepra, o povo de Israel era acometido de inúmeras epidemias ou males, que o
impactava.
As pessoas doentes e impuras deveriam ser expulsas do acampamento. Veja o
exemplo de Nm 5,2, onde os portadores de lepra, blenorragia e os que se
contaminaram com cadáveres praticamente eram excluídos. Para os israelitas, “cumprir
as determinações da Tora
12
significava garantir a presença de Javé
13
no meio do povo
e no meio do espaço habitado pelo povo” (LAGO, 2003, p. 994). Na época, a
integridade era o instrumento que resguardava o direito de posse e de inclusão,
conforme Lv 18, que traz consigo normas, principalmente sobre questões sexuais.
Essas práticas e estilo de vida foram influências do povo de Canaã (LAGO 2003, p.994-
95).
Tanto no Antigo como no Novo Testamento aparecem inúmeras doenças físicas,
sendo que muitas podem ser de origem psicossomática
14
, como também distúrbios
12
FERREIRA, 1996, 1690. [do hebraico tóráh]. Lei mosaica; o Pentateuco; os primeiros cinco livros do
Antigo Testamento.
13
Jeová; Deus.
14
Cf. BALDONI; TROMBINI, 2004, p. 14. “A psicossomática pode ser considerada a ciência que se
propõe estudar e ajudar o ser humano tanto em seus aspectos psicológicos quanto nos corpóreos”.
31
comportamentais dos mais simples até os suspeitos de transtornos mentais.
Logicamente muitas doenças jamais puderam ser diagnosticadas. O fenômeno cultural
com os valores da época, enfatizou para mais ou para menos cada fato de acordo com
o local, a época e os credos vigentes. Laraia acrescenta:
o modelo de ver o mundo, as apreciações de ordem moral e valorativa, os
diferentes comportamentos sociais e o mesmo as posturas corporais são assim
produtos de uma herança cultural, ou seja, resultado da operação de uma
determinada cultura (LARAIA 2003, p. 68).
Revendo o Novo Testamento que historicamente é uma das bases principais
desta pesquisa, pelo fato de se buscar resposta prática em uma variante do cristianismo
que é o pentecostalismo, depara-se como viviam socialmente os judeus no início da era
cristã.
No ano 63 a.C., o general Pompeu impõe o domínio romano sobre Israel. “Trata-
se do temível e implacável poder romano, que se implanta de maneira forte, servindo-se
de aliados poderosos, no interior do país e da força de suas legiões, prontas para agir
ao menor sinal de rebelião” (VASCONCELLOS; SILVA, 2003, p. 233). Herodes reinou
com muita violência contra o povo de Israel, no período de 37
a.C a 04 a.C. Com sua
morte, o poder foi dividido entre seus filhos: a Galiléia ficou sob o poder de Herodes
Antipas e a Judéia e Samaria com Arquelau (Mt 2, 22).
Roma precisou implantar a presença de procuradores, dentre eles Pôncio
Pilatos, em Samaria, Judéia e posteriormente Galiléia, em função da resistência do
povo contra Arquelau, a partir de 6 d.C. Herodes Antipas morreu em 39 d.C. e todo o
Cf. CABRAL,1971, p. 320. Relação mútua entre os fenômenos psíquicos (normais, anormais ou
patológicos) e os estados corporais (somáticos)”. Perturbações ou lesões orgânicas, produzidas por
influência psíquica ou doenças orgânicas agravadas por fatores emocionais.
32
Israel foi governado por Herodes Agripa, até 44 d.C. Com a morte de Herodes Agripa,
foi implantada novamente, em Israel, a presença de procuradores, até que surgiu a
guerra em 66 (VASCONCELLOS; SILVA, 2003, p. 224).
O governo romano afligia muito o povo de Israel, não com a presença do
exército, mas com a cobrança de impostos, agravando a situação das famílias,
principalmente as camponesas. A concentração de terra aumentou. As terras melhores
pertenciam a estrangeiros principalmente romanos e as produções eram mais
destinadas à exportação. Isso trouxe perda, miséria e pobreza. A esse domínio sobre o
povo de Israel, foi dado pelos romanos o nome de Pax romana; que consistia mais em
guerras, massacres e escravidão. Sob o domínio romano o povo de Israel estava sendo
humilhado, explorado, empobrecido. Eram tratados com violência, seus valores e
tradições eram desrespeitados e destruídos (VASCONCELLOS; SILVA 2003, p.227).
Era muito modesta a situação econômica dos judeus. Os ricos eram apenas um
pequeno grupo de Jerusalém e os latifundiários da Galiléia. Certos latifundiários não
eram judeus; moravam fora, e deixavam administradores na terra. A população judaica
em geral tirava seu sustento das plantações, artesanatos e pequenos comércios. A
agricultura existia nas terras férteis do norte e em menor escala, próximo a Jerusalém.
Os jornaleiros
15
deviam contentar-se com baixos salários (cf Mt 2, 1-16), pois era o que
lhes restava por não possuírem terra própria. A terra da Judéia servia para pecuária, e o
lago de Genezaré para pescaria. No vale do Jordão eram produzidos vinho e figo. A
população rural vivia de forma modesta devido à baixa renda. As outras profissões
15
Operários diaristas.
33
como tecelão, pisoeiro
16
alfaiate, ferreiro, escrivão, oleiro e outros, também o eram
bem contempladas em seus salários. Havia desemprego, pobreza e mendicância, em
grande escala (LOHSE, 2000, p. 136-37).
No início do primeiro século da era cristã, os judeus apesar de estarem sob o
domínio romano, mantinham sua em um único Deus, que era o poderoso Senhor do
universo e que também era o rei dos judeus, ao qual eles deviam obedecer observando
a sua vontade. Por isso, a prática cotidiana da Tora era doutrina fundamental do
judaísmo. Apesar de não possuírem um sistema teológico-especulativo, aplicavam a Lei
nas questões cotidianas da vida, inclusive no julgamento em relação às doenças.
Na sua maioria, os judeus viviam modestamente, em casas pequenas de um
quarto. Passavam essa observação da Tora aos filhos, os quais deviam também honrar
o pai e a mãe. O casamento era abençoado por Deus. A mulher era submissa e
subordinada ao marido e não podia atuar na vida pública. No templo, devia limitar-se à
área reservada que era o pátio das mulheres. Não podia ter parte ativa no culto.
(LOHSE, 2000, p. 135-38).
O império romano, por quem os judeus eram dominados nos dias de Jesus o
se preocupava com a saúde do povo. Os doentes ficavam em seus leitos em lugares
públicos. Dentre as principais doenças da época estavam: a cegueira; a lepra e toda
doença de pele que era tratada como tal; a paralisia; os quebrados, torcidos e
encurvados; enfermidades mentais; a surdez; a gaguice; a afonia; a hemorragia e a
hidropisia (SCHIAVO; SILVA, 2000, p. 40)
16
FERREIRA, 1996, p. 1339-40. Aquele que pisoa. Pisoar – apertar e bater (o pano) com o pisão. Pisão
– Máquina em que se aperta e bate o pano, para torná-lo mais consistente e tapado.
34
A medicina, a magia e a religião estavam de tal maneira tão envolvidas que às
vezes se confundiam. A influência religiosa era grande, e a medicina exercida por
sacerdotes. As doenças psicológicas e mentais eram atribuídas ao demônio.
O motivo que levava os judeus a atribuírem as doenças mentais e psicológicas
aos demônios vinha das tradições antigas com raízes na Babilônia e no Egito. Na
Mesopotâmia, as doenças eram produtos de demônios, monstros e seres maus. Os
judeus absorveram esta forma de crer “atribuindo a doença ao demônio e a cura a
Deus” (SCHIAVO;SILVA, 2000, p. 42). Devido ao desconhecimento da época, as
doenças psssicossomáticas não podiam ser entendidas a não ser como possessão de
demônios ou resultado do pecado; o que acontece na história da mulher encurvada de
Lc 13, 10-17. A impureza no seu sentido geral levava à exclusão e com certeza
contribuía para complicar mais o quadro, não do doente como dos seus familiares. A
associação da doença com o pecado levava a pessoa a ser julgada pelos demais;
concluía-se, que estava pagando por algum mal. Para o judaísmo oficial, “pobreza;
doença; deficiência física e mental, eram consideradas conseqüências do pecado,
portanto castigo de Deus” (SCHIAVO; SILVA, 2000. p. 46), e podiam significar
possessão de maus espíritos.
Surgiu na Galiléia, e posteriormente na Judéia, por volta do ano 30 d.C., um
movimento religioso liderado por Jesus de Nazaré, que pregava um novo caminho que
levava a Deus, trazendo salvação aos judeus e gentios. Seus ensinos eram
antagônicos aos dos fariseus. Seu tema principal era o “reino de Deus”. Questionava
mais o mundo religioso judeu do que os romanos (PIXLEY, 2002, p. 128). O movimento
de Jesus deslegitimava o domínio religioso que estava acima da lei de Deus, vendo o
templo como instrumento de opressão para o povo. O movimento exigia dos seus
35
seguidores uma verdadeira ruptura com os valores dos laços familiares, tradições
religiosas e sociais. Em contrapartida, os seguidores eram esclarecidos, valorizados e
tinham certeza de vida eterna; também eram curados das suas enfermidades (PIXLEY,
2002, p. 128-29).
1.2.2 Modalidades Principais de Manifestação das Doenças
Muitas são as formas e modalidades de manifestação das doenças no ser
humano. Serão abordados a seguir, de forma sucinta, essas modalidades reunidas em
apenas três grupos.
1.2.2.1 Doenças orgânicas
Muitas pessoas e cristãos da atualidade, fiéis aos escritos de Gênesis,
continuam crendo piamente que a criação de Deus era boa na origem e que o homem
no início, na condição paradisíaca, desconhecia “toda enfermidade, toda dor, toda
corrupção, e que, conseqüentemente, a própria morte lhe era estranha” (LARCHET,
1998, p. 62). Na disposição ambiciosa de tornar-se como Deus (Gn 3,5), o ser humano
perdeu a condição de imunidade às doenças, abrindo precedente a elas e a toda sorte
de males e corrupções. Os males que afetam os seres humanos hoje, inerentes da sua
natureza, herdados do primeiro homem, teriam passado “de geração a geração,
essencialmente por via biológica” (LARCHET, 1998, p. 63). Observa-se então ser este
36
um possível mito
17
, o fato de a doença ser considera como castigo pelo pecado;
principalmente pelos judeus no Antigo e Novo Testamento, e também por muitos
cristãos até os dias de hoje.
A doença está sempre presente na vida do seu humano e continuam surgindo
novas doenças. A busca pela saúde, hoje, é quase uma obsessão. Essa busca
incessante ocorre em todas sociedades e culturas.
A doença é uma ameaça direta e concreta à vida, o primeiro passo rumo a
possibilidade da morte, a presença da morte no seio da vida. Movimenta o
imaginário, direciona energias e recursos, gera mecanismos de controle,
exclusão, marginalização, descaso ou até demonização (LAGO, 2003, p. 989).
São muitos os fatores que poderiam dar origem às doenças no corpo “a
presença de um vírus, de uma infecção, funcionamento anormal de um órgão; o trauma
psicológico; a crise moral ou espiritual” (CATALAN, 1999, p. 141). Poderia acrescentar-
se ainda as questões socioeconômicas. A Pessoa não se preocupa com o sintoma
orgânico, mas “com a família, o trabalho, a continuidade numa comunidade de
relações
e a angústia quanto à capacidade de permanecer em suas ocupações pessoais e
criativas ou retornar a elas” (PHILIBERT, 1998, p. 9-11).
Em função dos sintomas, a doença no corpo é a mais perceptível e muito
desagradável. As doenças de origem emocional e social, nem sempre são tão
percebidas. O leigo consegue tomar consciência que es doente quando os
sintomas aparecem na sede do seu ser, o corpo.
Por isso, podemos dizer que o nosso corpo é um órgão político-social: Nele se
espelha nossa realidade. Com ele experimentamos o mundo. Ele é o lugar
onde ficam registradas as marcas de tudo que acontece, as marcas de nossa
história. Todas as expressões de opressão, bem como todas as lutas e
conquistas de libertação estão registradas em nossos corpos. Poderíamos
17
Cf. ELIADE, 2002, p. 11. “O mito conta uma história sagrada; ele relata um acontecimento ocorrido no
tempo primordial. O tempo fabuloso do “princípio”.
37
dizer, nesse sentido, que nosso corpo é nossa memória. Assim nossos corpos
– doentes e sadios são ao mesmo tempo instrumentos de denúncia e
anúncio. Denunciamos o mal que experimentamos, que nos sufoca, que nos
tira o fôlego de vida e nos prende (RICHTER REIMER, 2002, p. 1237).
O homem doente não é ele só, um indivíduo isolado, ele é membro de uma
família que conseqüentemente também está doente, “Ele é como o sinal vivo do mal
que atinge esta família, da qual faz parte integrante, enquanto se identifica com ela e
enquanto se reconhece nela” (ROSNY, 1998, p. 22). Essa família faz parte de um grupo
social, uma sociedade que também está doente.
Ainda hoje, no campo da religião, um percentual relevante no Brasil e na América
Latina, principalmente os pentecostais e neopentecostais, relacionam a doença com o
pecado ou opressão do demônio. Possivelmente estão percebendo a manifestação
orgânica como os judeus, fazendo vista grossa ou mesmo ignorando que a doença é o
resultado da estrutura política, econômica, social e psicológica que se processa no
biológico.
As doenças de origem emocional e de cunho social que possivelmente causam
maiores danos no ser humano, nem sempre são tão perceptíveis e diagnosticadas as
suas origens, mas, acabam também chegando à sede do ser, o corpo, que é o receptor
final.
Muitas doenças não podem ser dissociadas da família e do meio. É importante
lembrar que o ser humano é um ser social. Ele está inserido na família, que é o seu
primeiro grupo social, e esta, em grupo social maior, a sociedade. Se ele está doente,
também sua família está doente. Se a família está doente é fruto de uma sociedade que
de alguma forma também está doente (ROSNY, 1998, p. 20). È possível reafirmar essa
linha de pensamento com o que se segue: “A doença integra a ordem biológica com a
38
ordem sociocultural ao produzir alterações tanto no corpo do sujeito como nas suas
funções sociais” (QUINTANA, 1999, p.26, apud LEMOS 2000, p. 485).
A doença, além de toda a sintomatologia aparente, “pode prejudicar a
estabilidade física da vida, deteriorando assim sua qualidade e diminuindo a integridade
da saúde” (PHILIBERT, 1998, p. 9). Com a diminuição da saúde, o ser humano é
afetado como um todo.
A doença é, portanto, o resultado da estrutura política, econômica, social e
psicológica que se processa no biológico. Ela abrange enorme contexto que precisa
também ser curado.
1.2.2.2 Doenças espirituais
Possivelmente na Bíblia, na cultura hebraica, no Antigo Testamento, não havia
concepção de espírito mau ou demônio. Não relato sobre isso nos primeiros
capítulos de Gênesis, quando é descrita a criação do universo. O homem e a mulher
foram criados sem relato de que havia um ser oposto a Deus (SCHIAVO; SILVA 2000,
p. 53).
Sobre a questão de Satanás como representante ou responsável pelo mundo do
mal, seguem-se alguns esclarecimentos que ajudam a clarear melhor a situação: o
monoteísmo judaico era radical em relação a outras divindades e não havia no Antigo
Testamento uma palavra que pudesse entender-se por Satanás. A idéia de demônio
como responsável pela origem do mal, desenvolveu-se progressivamente e com o
passar do tempo, tornou-se cada vez mais significativa. Satanás a princípio era visto
como parte de Deus, do seu reinado. Depois foi visto como espírito bom (anjo) e
39
espírito mau (demônio), até que passou a ser considerado o símbolo do mal,
contraditório a Deus. A imagem de Satanás é o resultado de mistura natural, onde está
incluído: magia, religiosidade popular com ritos gicos, simbolismos e psicologia. O
termo “Satanás” procede da raiz stn que significa literalmente “alguém que tira alguma
coisa no caminho de alguém”. Em resumo esse termo recebeu novos sentidos, os
quais, ele não possuía na sua origem. Quando ele surgiu não era mau e muito menos
oposto a Deus. (SCHIAVO; SILVA, 2000. p. 53).
Demônios não eram figuras tão conhecidas. No período helênico eles eram
considerados mediadores do bem e do mal.
Os demônios (dáimon ou daimónion) eram seres cuja esfera de ação se
situava entre os deuses e os homens, com o poder de serem mediadores do
bem (gênio) e do mal (doenças). Para Israel dada a sua no Deus único, os
demônios o tinham nada de divino e sua ão podia causar o mal
(VENDRAME, 2001, p. 114).
A palavra: “demônio”, não fazia parte da antiga cultura judaica e “a partir do
exílio babilônico no contato com as religiões orientais e com a invasora cultura helênica,
que o termo passou a ser utilizado com freqüência na religião popular de Israel”
(VENDRAME, 2001, p. 114).
No Novo Testamento, aparece de uma forma bem explícita, esse conflito entre
Satanás e Deus como representantes respectivamente do mal e do bem. O
representante do mal se torna conhecido com nomes como: Demônio, Diabo, Belzebu e
Espírito Imundo. Os espíritos malignos ou impuros eram os responsáveis por toda sorte
de males, doenças e indução ao pecado (SCHIAVO; SILVA, 2000, p.69).
Na comunidade judaica, doença e ação do demônio são inseparáveis. Faz parte
da cultura no tempo de Jesus, a crença em demônios e possessões diabólicas. Dentre
40
as crenças assimiladas das civilizações vizinhas por Israel estão a angeologia e a
demonologia. Para o judaísmo que é uma religião monoteísta, essas forças tanto
benéficas quanto inimigas são inferiores a Deus (BAUTISTA, 1996, p. 126).
Investigando o relato sobre a mulher encurvada (Lc 13, 10-17), pode-se levantar
alguns questionamentos como: sua doença era apenas física, de ordem espiritual, ou
física-espiritual? Pode-se entender que era uma doença física que para a cultura da
época era taxada como espírito de enfermidade, demônio. Não relato de que ela
fosse uma pessoa demente, durante estes dezoito anos. Pelo contrário, ela estava na
sinagoga para ouvir a leitura das Escrituras. Isto sinaliza que suas faculdades mentais
gozavam de plena lucidez, caso contrário, ela não iria ou não seria levada à sinagoga.
O fato de estar presente na sinagoga, já era um indicio de que não estava sentindo dor.
O que resta é averiguar aque ponto ela teria apenas uma doença física crônica, e até
que ponto também esse quadro não poderia ser psicossomático, em função
principalmente da postura física e dos traumas e marcas emocionais como resultado de
uma cultura opressora.
As doenças desde o Antigo e Novo Testamento, não eram bem vistas e em
muitos casos, as pessoas eram discriminadas e até marginalizadas. Richter Reimer
(2003 p. 1243) confirma: “Entender doenças como sendo uma possessão de demônios
era comum na época [...]. Na cultura popular ou religiosa, demônios e espíritos imundos
ou malignos eram causadores de doenças mentais e espirituais”.
Tanto no Antigo como no Novo Testamento aparecem inúmeras doenças físicas,
sendo que muitas podem ser de origem psicossomática, como também distúrbios
comportamentais dos mais simples até os suspeitos de transtornos mentais.
41
1.2.2.3 Doenças psicossociais na atualidade
As doenças, na realidade, são conseqüências de todo um processo social e
podem ser psicológicas propriamente ditas e psicossomáticas; estas de origem
emocional ou agravadas pelo estado emocional da pessoa. As psicossomáticas são
manifestadas em uma parte específica do corpo. o resultados de momentos
psicológicos vividos pela pessoa no passado, possivelmente negativos e que deixam
marcas emocionais, comprometendo assim a saúde dessas partes do corpo e que são
refletidas através da psicossomatização
18
(LELOUP, p. 18-26).
A infra-estrutura social quase nunca corresponde às necessidades de construção
básica da sociedade e do ser humano. A partir desses fatores, entende-se que as
dificuldades e impossibilidades sociais geram toda sorte de comportamentos sociais, os
quais por si geram traumas e conflitos profundos de ordem psicológica e, como
conseqüência, uma série de doenças orgânicas e psicossomáticas, que interferem no
cotidiano da pessoa (ROSNY, 1998, p.9). O corpo como instância final do processo é
que recebe toda a carga da sociedade doente.
Alguns levantamentos desde o povo de Israel, no passado nos trazem
informações sobre a saúde emocional, como era vista e encarada, tanto em situações
de completo equilíbrio onde a pessoa se manifestou saudável emocionalmente como
em questões patológicas como Petrelli (2003 p.115) explica: “A psique adoece, tanto na
região da gica e da razão, quanto afetiva espiritual, quando se dissocia dos
18
CABRAL, 1971, p. 360. “Conversão de experiências mentais em sintomas físicos”.
42
paradigmas da mente e do modus como estes foram apresentados à nosografia
19
psiquiátrica e psicopatológica
20
”.
A psicologia herdou parte do modelo psicanalítico de Freud, no sentido de ver e
avaliar as reações, sentimentos, comportamentos e patologias de ordem emocional e
psicossomática, sem admitir em tudo isso influência das crenças religiosas e as
contribuições positivas ou negativas que elas pudessem trazer para a cultura. O
funcionamento de uma sociedade contém ações e reações do ser humano, na sua
individualidade, onde estão presentes as convicções religiosas.
Com a visão psicocientífica de Carl Gustav Jung
21
, a religião começou a ser vista
e considerada, acerto ponto, de outra forma no meio psicológico. Para Jung ela faz
parte da cultura, do social. Conseqüentemente leva as pessoas a emitirem
comportamentos que a psicologia não pode negar.
Esperava-se que o comportamento religioso aos poucos fosse se extinguindo.
Isso, porém, não aconteceu. Pelo contrário, aumentou com o sincretismo religioso.
Diante da sua necessidade biopsicossocial, a pessoa busca alternativas naturais,
humanas, nas ciências que nem sempre podem oferecer resposta, outros não possuem
condições financeiras para isto. Podendo ou não, o sagrado é a alternativa acessível a
todos.
19
Cf. DORN; PAROT, 2000, p. 543. “Distribuição metódica em que são agrupas as doenças por classes,
ordem, gêneros e espécies Descrição metódica da doença”.
20
Cf. REY, 1999, p. 640. Psicopatologia: Estudo das causas e natureza dos distúrbios mentais. Ramo
da psiquiatria que estuda as funções psíquicas anormais, definindo as peculuiaridades de cada um
dos transtornos mentais”.
21
Criador e fundador da abordagem psicológica junguiana. Foi discípulo de Freud e conviveu com
psicanálise durante alguns anos, e posteriormente rompeu com Freud criando suas próprias teorias e
abordagens, e possivelmente pela visão religiosa que ia de encontro com as teorias freudianas.
43
Na atualidade, apesar das vacinas e inúmeros outros meios de prevenção, o ser
humano encontra-se diante de enfermidades que poderiam ser chamadas pestes do
século XXI. Elas não são transmissíveis organicamente, porém têm suas ltiplas
origens, a partir da cultura capitalista, da não valorização do sistema ecológico, do ser
humano, e todo o seu contexto psicossocial. A pessoa não é tratada de forma
igualitária, é discriminada principalmente por causa da classe social, raça ou gênero a
que pertence.
O peso cultural e social, compromissos financeiros com impostos, que
hoje no Brasil consomem mais de um terço do que se ganha; problemas familiares:
conjugais, relacionamentos, falta da consciência dos papéis no lar, violência familiar,
desemprego, falta de escolaridade, alimentação e higiene inadequada e outros, são
fatores que contribuem e extrapolam para que a problemática aumente e com ela uma
gama de comportamentos desajustados, que por sua vez geram maiores danos,
chegando a tão conhecida violência urbana. São estes e outros problemas que geram
as doenças psicossomáticas, redundando em sintomas dos mais variados no
organismo e na vida, quando não levam a pessoa à violência e ao suicídio.
Dentro da cultura capitalista, principalmente nos países pobres, geralmente a
pessoa não tem consciência dos seus verdadeiros direitos e por isso mantém um
comportamento de conformismo, de submissão, devido à falta de informação. O meio
social contribui para deixá-la assim, alienada e às vezes, aumentando sua ignorância. A
pessoa doente é o produto da desinformação. Muitas crianças morreram e morrem pelo
fato de seus pais não terem consciência da importância da vacina ou por não saberem
alimentá-las ou pelo desconhecimento da importância dos princípios básicos de higiene
e outros.
44
A partir desses fatores, pressupõe-se que o sistema psicológico, as doenças
psicológicas e somáticas advindas da estruturação social sejam pouco conhecidas.
As dificuldades e impossibilidades sociais geram toda sorte de comportamentos sociais
doentios e indesejáveis, os quais por si geram traumas e conflitos profundos de ordem
psicológica e como conseqüência uma série de doenças psicossomáticas e orgânicas
que interferem no cotidiano da pessoa (ROSNY, 1998, p.9).
Por isso torna-se bastante necessário investigar as curas, mudanças e
transformações que abrangem todo o contexto de vida da pessoa religiosa.
Percebe-se que os evangélicos, principalmente os pentecostais, na sua maioria
tendem a denominar os quadros pssicossomáticos e os transtornos comportamentais
de muitas formas como: prisão espiritual, pecado, maldição, incredulidade, influência de
demônio ou possessão demoníaca e outros. Por outro lado, as ciências psicológicas,
até certo ponto, mantiveram-se afastadas das questões religiosas a começar de Freud,
que teve formação judaica, porém, tinha dificuldade em admitir questões religiosas
como verdadeiras. “Para Freud, portanto a crença religiosa permite que os crentes
gerenciem seu desalento negando suas necessidades insatisfeitas e elevando a
representação interna do pai ao posto de Deus”. (RIZZUTO, 2001, p. 161). Ele foi o
espelho para muitos psicólogos que fizeram questão de considerarem-se ateus ou
radicais em relação à religião. Com o decorrer do tempo, tem surgido psicólogos judeus
e principalmente cristãos, que ampliaram sua visão e estão tentando promover “O
encontro entre a fé e a psicologia” (SUDBRACK, 2001, p. 9).
Surge então a necessidade de os fenômenos religiosos serem pesquisados
psicologicamente. Para Sudbrack (2001, p. 58) “A psicologia como ciência trabalha
45
com a técnica, mas nem tudo que excede ou precede a técnica é fantasia”. E afirma
ainda: “A igreja e a teologia serão enriquecidas, em sua apresentação da fé, pela
sociologia e pela a psicologia”.
Os cristãos carismáticos católicos ou evangélicos pentecostais, procuram dentro
da espiritualidade fazer com que todos os fatos em relação às doenças psíquicas e
somáticas sejam espiritualizados. O que é espiritualidade? Vejamos uma resposta:
“Espiritualidade é aquilo que produz no ser humano uma mudança interior, [...] se não
produzir em você uma transformação não é espiritualidade” (DALAI-LAMA apud BOFF
(2001, p.16).
Apesar de muitos autores terem apostado na secularização da religião isso não
aconteceu. “A profecia da morte da religião falhou e, duas décadas depois, o problema
é exatamente o contrário, acontece justamente uma explosão de religiosidades novas
por toda parte” (CAMPOS, 1997, p.32). Os evangélicos, principalmente os pentecostais
e neopentecostais, no Brasil e América Latina têm crescido de forma impressionante,
com várias ramificações. O sincretismo
22
neopentecostal
23
é comentado.
O crescimento, tanto em número de fiéis quanto de templos; a montagem de
um potente aparato de empresas de serviços religiosos, com televisão, rádio e
imprensa, produção fonográfica; a constituição de uma bancada de
parlamentares com força política nas Câmaras de Deputados do país e outros
acontecimentos têm impactado não só as religiões institucionalizadas, mas
também grandes conglomerados empresariais e os poderes públicos
(BONFATTI, 2000, p. 9).
A religiosidade de um modo geral sempre fez parte da vida do ser humano,
porém nas últimas décadas ela tem sido praticada de forma mais acentuada. Com isso
a fé tem estado mais em ação. Muitos fatos, porém, são dignos de investigação
22
Cf. SILVA, 1986, p 1117. “Mistura de elemento, doutrinas ou concepções heterogêneas”. .
23
Ramos evangélicos diversificados derivados do pentecostalismo original.
46
científica. Aque ponto os acontecimentos no meio religioso, são apenas religiosos e
espirituais? Até que ponto o amparo amoroso da religião aos fiéis e as promessas de
mudanças socioeconômicas, não estariam contribuindo para a cura dos quadros
psicossomáticos? Segundo Catalan (1999, p.42) não seria “a volta do religioso? ...Que
tipo de religioso?, pois convém dar ao assunto os matizes que ele requer”.
Olhando através do prisma social, notamos que saúde é ausência de doença e
que saúde abrange um contexto maior, vai além do corpo. O corpo que é a sede de
todo o ser da pessoa acaba sendo vitimado ou sendo o receptor final de toda ausência
de saúde, ou seja, das doenças: de ordem social, política, cultural, psicológica e
orgânica com toda a sua sintomatologia
24
.
Nos países subdesenvolvidos onde maior percentual de doenças, elas
ocorrem em função da política social desagregadora. A sociedade não é vista como um
todo igualitário. A pessoa é socioeconomicamente valorizada pelo que possui. Não é
vista em todo o seu contexto, como um ser biopsicossocial. A opressão política
financeira incide mais sobre os pobres que são a maioria. Eles respondem pelo
caminhar da nação, com sua força de trabalho; e não são assistidos nas suas
necessidades básicas (informação, educação, alimentação e trabalho); fato que os leva
a contrair toda sorte de doenças sociais (comportamentos), físicas e psicológicas.
Como o corpo é quem apresenta de forma mais visível e concreta, as síndromes
finais das doenças, ele se torna o alvo de maior atenção para que seja restabelecido e
volte a apresentar saúde. Nos centros mais desenvolvidos, os trabalhos de prevenção à
saúde do corpo estão bem adiantados. No entanto, como afirma Richter Reimer (2002,
24
Estudo dos sintomas das doenças orgânicas ou psicológicas.
47
p.1234), “Refletir sobre saúde e cura convida a uma reflexão mais ampla sobre as
nossas condições sociais, especialmente as condições sociais das pessoas doentes”.
A pessoa é um ser social e como tal precisa e deve ser vista e reconhecida em
todo o seu contexto. Isso porque, grande parte das doenças tem sua origem em função
do mal ou não funcionamento da estrutura social, onde o ser humano não é valorizado.
Saúde e doença manifestam-se em nosso corpo. Este corpo tem suas
características próprias, tem sua individualidade, mas seu objetivo e sua
realização não consistem em ser individualizado e isolado. Cada corpo se
plenifica na relação com os outros corpos (RICHTER REIMER, 2002, p. 1237).
As doenças na sua maioria são conseqüências da estrutura social vigente em
cada comunidade, povo ou nação. A doença é o reflexo do sistema político e social de
cada povo; da forma que esta sociedade é encarada pelos seus governantes; e da
prioridade que é dada ou não ao ser humano participante desta sociedade.
Um percentual alto de doenças tem sua origem no social. É bom enfatizar que
uma doença não é só orgânica. Uma sociedade doente gera não só doenças orgânicas,
mas sociais e psicológicas, principalmente quando deixa as pessoas à margem do
sistema econômico-político. Uma sociedade doente é produtora de pessoas doentes e
mantém o poder econômico na mão de poucos. Nela injustiças salariais, que levam
à discriminação social, à diminuição do poder aquisitivo e automaticamente da
qualidade de vida das famílias. A sociedade doente gera uma série de problemas
sociais como: difícil acesso à saúde pública ou falta quase total desta; miséria
econômica e social, onde reina a falta de moradia, de alimento, higiene e também
nudez, impossibilitando, assim, à população de crescer; educação medíocre que não
condiz com a realidade, contribuindo para que o indivíduo fique à margem; falta de um
planejamento social que venha atender melhor as diversas camadas sociais da
48
atualidade e vindoura, que tenha como objetivo final, a igualitariedade; doenças
psicológicas, com comportamentos variados de rebelião, violência e ainda as que
redundam na conversão para sintomas orgânicos, as psicossomáticas. Isto se torna um
círculo vicioso, porque tende a deixar o individuo em estado orgânico, social e
psicológico, pior ainda. “A doença integra a ordem biológica com a ordem sociocultural
ao produzir alterações tanto no corpo do sujeito, como nas funções sociais” (LEMOS,
2002, p. 485).
Nos países subdesenvolvidos e em desenvolvimento, onde o sistema capitalista
domina, o índice de doença é maior. A estrutura social não valoriza o indivíduo como
pessoa participante de uma sociedade. Conseqüentemente, o índice de cura é menor.
Investir na cura das doenças do corpo é necessário, mas é um trabalho paliativo. O
investimento em hospitais, presídios e programas assistenciais é necessário, porém,
resolve apenas parcialmente. É uma forma alienante de conduzir a coisa, sem resolvê-
la. No entanto é o que mais se faz e se vê, enquanto o ser humano continua sendo
explorado e doente.
A cura acontecerá quando os governantes investirem na cura social de forma
abrangente. Apesar de difícil, é a melhor alternativa. A cura social, política e econômica,
com certeza refletirá na psicológica e no corpo, trazendo dignidade e vida saudável a
pessoa
[...] é com isso que anunciamos a necessidade de mudança. É preciso
transformar a saúde privada em saúde pública. é necessário anunciar tempos
de solidariedade local e global. (...) querer saúde é uma afirmação básica para
pessoas de todos os tempos e lugares (RICHTER REIMER, 2002, p. 1237).
49
1.2.3. Elementos Psicológicos que Contribuem para o Surgimento de Doenças
Como vimos, são inúmeros os fatores que contribuem para o surgimento de
doenças orgânicas, dentre eles estão os psicológicos, sendo um dos seus resultados,
as doenças denominadas psicossomática. A psicossomática estuda as doenças
orgânicas consideradas de origem emocional, como também aquelas que são
agravadas em função do estado emocional da pessoa. “A psicossomática pode ser
considerada a ciência que se propõe estudar e ajudar o ser humano tanto em seus
aspectos psicológicos quanto nos corpóreos“ (BALDONI; TROMBINI, 2004, p.14). As
doenças orgânicas, em percentual bastante elevado podem ser de origem
psicossomáticas. Entendendo os processos psicológicos: como, quando e porque a
doença se manifesta, praticamente, facilitará o entendimento do processo
psicossomático instalado, e será mais eficaz a busca da cura. Dentre os elementos
psicológicos que contribuem para a mobilização de doenças destacaremos alguns, que
estão presentes no dia a dia do ser humano: sentimento de culpa; estresse
25
e sintoma
de conversão
26
.
1.2.3.1. Sentimento de culpa
25
Cf. TROMBINI; BALDONI, 2004, p. 88. Atualmente o Estresse é considerado como: “[...] estado de
mal estar no organismo, no qual entram em ação as defesas para fazer frente a uma situação de
ameaça”. Cf. VALDÉS. 2002, p. 65 “O indivíduo em estado de estresse sofre um desequilíbrio interno
que se expressa por meio de alterações nervoso-centrais que afetam tanto a vida psíquica (estado de
apreensão, dificuldade de concentração, sensações de estranheza etc) quanto o funcionamento
fisiológico (insônia, transtornos sensoriais, cansaço etc.) “
26
Conversão de situações emocionais não resolvidas em sintoma orgânicos.
50
A culpa é o resultado da violação dos valores que foram introjetados, através de
regras, normas e padrões de comportamentos instituídos, que levam o indivíduo a
avaliar o nível de suas responsabilidades. São emoções que direta ou indiretamente
expõem a pessoa à opinião dos outros (BRASIO; VITALI, 2003, p. 21-22).
duas tipologias principais da culpa. Primeiro, a predisposicional que consiste
em situações específicas e bem localizadas. Ela é adaptativa, ou seja, o indivíduo tem
condição de elaborá-la, sem que fiquem marcas emocionais. Segundo, a culpa crônica
que pode ter raízes mais remotas ou apresentar-se em situações neutras. Processos
complexos e relacionados entre si explicam a culpa crônica.
A culpa crônica em alguns aspectos é semelhante à experiência da vergonha,
não promove atitudes positivas para com os outros, e é potencialmente
desagregadora, pois fere a imagem de si mesmo, implica uma perda de auto-
estima e expõe o indivíduo ao risco de perturbações psicopatológicas
(BLASIO; VITALI, 2003, p.101).
A tendência à percepção do lado negativo dos fatos induz à mensagens
prejudiciais, conduzindo ao excesso de determinada emoção, provocando distorção na
leitura dos dados da realidade. Desta forma, a pessoa pode assumir conotações
positivas ou não, que podem variar de acordo com o contexto. pessoas que embora
sensíveis à culpa podem ter uma vida bem adaptada. O que determina a patologia da
culpa crônica não é o estilo emocional predominante e peculiar, mas a associação que
é atribuída ao estilo, o nível de intensidade e cronicidade da emoção e o consenso
sociocultural da maneira de ver e sentir as coisas (BASIO; VITALI, 2003. p. 102-03)
Diante da impotência de poder conviver com a culpa, gradualmente a pessoa
mobiliza mecanismos emocionais internos, que a defendem do sofrimento emocional,
51
deixando-a mais insensível consigo mesma e com os outros (BLASIO; VITTALI, 2003,
p. 106).
O sentimento de culpa e autopunição contribui para que, de forma inconsciente,
a pessoa venha a “aceitar” o seu sofrimento, para até certo ponto aliviar-se da culpa.
1.2.3,2. Estresse
O estresse com seus vários motivos aparentes de origem, apresenta-se como:
dificuldade de adaptação com o meio; de adaptação a pós-acidentes naturais; viver sob
pressão e muitas outras dificuldades. Pode ser o motivo da origem de várias doenças
psicossomáticas leves ou que causam seqüelas para sempre se não forem
diagnosticadas e tratadas.
Ao defrontar com uma exigência do ambiente ou uma novidade, o sistema
nervoso orienta-se em alertar os sentidos. Com esse fator, na tentativa de registrar
ocorrências externas, o organismo silencia e fica mais lento. Esse reflexo de orientação
leva o cérebro, a “desentender-se” para processar os estímulos exteriores, a princípio
desprovidos de emoção. O processo que significado aos estímulos externos
chamamos de cognição
27
. Ela é uma apreciação inconsciente efetuada pelo cérebro,
onde é avaliado o estímulo ameaçador ou não, chegando a uma conclusão automática
e inconsciente. Portanto ela não é processo racional. É inconsciente, sustentada pelo
27
Aquisição de conhecimento.
52
sistema Límbico
28
(VALDÉS, 2002, p.8-9). Desta forma “quando o organismo atende as
exigências do meio, mantém-se um estado de ativação contínua que acaba
desestabilizando o equilíbrio interno” (VALDÉS, 2002, p. 63).
O indivíduo adapta-se ao meio através das cognições. Para se entender a
psicologia do estresse é preciso entender também as variáveis psicológicas, biológicas
e do ambiente, o que determinará se o indivíduo interage ou não com o ambiente. Se
essa interação é positiva, entra em ação o sistema simpático-adrenal que energiza o
organismo para a ação, sem alterá-lo emocionalmente. Se a interação é negativa, se
instala a cognição de dúvida, de desproteção ou ameaça; que comunica o sistema
simpático-adrenal e o sistema neuroendócrino
29
é ativado por corticosteróides
30
e o
organismo se coloca em defesa, ocorrendo o estresse (VALDÉS, 2002, p. 21). “Em
termos biológicos, o estresse é um estado de ativação simpático-adrenal e
neuroendócrino, acompanhado de inibição imunológica e de conduta, e de estados
emocionais negativos (medo, desproteção, ansiedade, depressão)” (VALDÉS 2002, p.
21).
O Estresse na vida prática ocorre quase sempre, quando o indivíduo vive em
estado de pressão emocional. O esforço que faz para adaptar-se o leva ao estresse.
Possivelmente as pessoas que vivem sob pressão, no seu eterno esforço para
28
Cf. DICIONÁRIO MÉDICO BLAKISTON, 1979. (córtex límbica, lobo límbico). Um anel de córtex
cerebral, composto de arquipálio e de paleopálio, que abrange o giro paraterminal e a área
paraolfatória do cíngulo, o giro para-hipocampal e o úncus. È a parte mais antiga do córtex que tem
seu rudimento evolutivo nos répteis, anfíbios e peixes. Atualmente, considera-se desempenho
importante no papel do controle e integração das emoções”.
29
Cf. FERREIRA, 1996, p. 1190; 649, 852. “Neuro: nervo, fibra. [...] Endócrino: separa, segrega. [...] A
glândulas endócrinas segregam ao conjunto de células que secretam ou excretam substancia, que
não se relacionam com as suas necessidades habituais”.
30
Cf. REY, 1999, p. 186. Corticosteróide = Corticóide: “Hormônios secretados pelo cortex da supra-
renal, assim como substâncias derivadas e seus substitutos sint[éticos”.
53
corresponder às exigências psicossociais; certamente estarão mais ansiosas e tensas e
conseqüentemente mais próximas de um quadro de estresse.
1.2.3.3 Sintoma de conversão
Outro fator psicológico que é o veículo do surgimento das doenças
psicossomáticas é o sintoma de conversão.
Denomina-se sintoma de conversão toda disfunção sensorial ou motora que
aparece como resultado do fracasso de adaptação e que está vinculada à
situação estressante de maneira simbólica e instrumental (VALDÉS, (2002,
p.71).
O sintoma surge trazendo consigo significados, “traduzindo” ou convertendo para
o corpo a natureza do conflito que o gera. Ele é parte do esforço que o organismo faz
para defender-se da ameaça emocional. Portanto, os sintomas de conversão fazem
parte do contexto dos mecanismos psicológicos de defesa; pelos seus significados e
pela sua natureza instrumental e pelo fato de tentarem modificar a interação do
indivíduo com o meio. Instrumental é toda conduta que opera como agente de mudança
no contexto. Deve se considerar “O que obriga o indivíduo a fazer, o que o impede de
fazer, o que obriga os demais a fazer e o que impede que os demais façam” (VALDÉS,
2002, p. 71). O sintoma de conversão pode ser identificado no seu marco de origem,
que revela seu significado e avalia até que ponto altera as relações interpessoais do
indivíduo ou as condições do seu meio (VALDÉS, 2002, p. 71).
54
É bom ressaltar que os sintomas de conversão o de natureza inconsciente,
embora possam parecer simulações e apareçam com maior freqüência, nas
personalidades histriônicas
31
e em pessoas com fraqueza emocional intensa.
Os sintomas de conversão e os dissociativos (nos quais o indivíduo se
“desliga” da situação e põe em movimento condutas automáticas) são um
verdadeiro mistério do ponto de vista psicológico e é necessário supô-los
aparentados com mecanismos de defesa evolutivamente antigos, que
aparecem em grupos humanos de cultura primitiva. As respostas de
imobilidade cataléptica
32
frente ao perigo e as condutas miméticas
33
com o
agressor seriam exemplos característicos dessa classe particular de
fenômenos (VALDÉS, 2002, p. 72).
Com este capítulo pode se obter uma idéia resumida de saúde, doença e doente
ao serrem investigados definições, visão, modalidades principais das doenças e
principais elementos psicológicos que contribuem para o seu surgimento. Também ficou
bem claro que o fator psicossocial na atualidade, é o mais agravante contribuinte para
o surgimento de doenças. Surge então a necessidade da busca de alternativas para
curas. Como é impossível buscar várias alternativas, o segundo capítulo tentará
elucidar alguns pontos sobre religião e psicologia e sua eficácia na cura.
31
DORON, 2000, p. 395. “Tendo sua origem do latim histrio que significa ator”, este termo e seu
substantivo (histrionismo) muito tem servido para definir um dos traços marcantes da
personalidade dos histéricos: a propensão para a dramatização das situações, para a ênfase dos
entimentos e para fato de que a produçãp dos sintomas necessita da presença de um terceiro
expectador e é acompanhada de uma relativa indiferença em relação a ele”.
32
Cf. CABRAL, 1971, p. 66. “Condição nervosa, típica da histeria e da esqquisofrenia, em que todo o
movimento voluntário é suspenso e a sensibilidade se aumenta. Esta condição é acompanhada de
rigidez muscular, palidez, fragilidade no corpo e diminuição do rítimo cardíaco e respiratório”.
33
Cf. REY, 1999, p. 511. De mimético, mimia: “Elementos de composição significando “que imita” (do
grego, mimétikós = imitativo, minesis = imitação)”.
55
CAPÍTULO 2 RELIGO E PSICOLOGIA COM SEUS POTENCIAIS DE CURA
2.1 RELIGIÃO
Em 1958 H. Clark reuniu cerca de 48 definições de religião. Percebeu-se então a
dificuldade de se concordar para chegar a um conceito. Este fato levou muitos autores
a descrever o que entendiam por religião. Seguem-se algumas dessas definições.
Willian James apresenta a religião de forma sentimentalista definindo-a a partir
dos sentimentos que alimentam a relação do ser humano com o sagrado. “São os
sentimentos, atos e experiências do indivíduo humano, em sua solidão, enquanto se
situa em uma relação com seja o que for por ele considerado divino” (JAMES apud
VALLE, 1998, p. 258).
Durkheim fala da religião a partir de um prisma sociológico, onde ela é abordada
como crença coletiva, que une as pessoas em uma comunidade moral, já apresentando
a religião de forma organizacional como igreja. “Uma religião é um sistema unificado de
56
crenças e práticas relativas a coisas sagradas, quer dizer, coisas apartadas e proibidas
crenças e práticas que unem a todos os seus adeptos a uma comunidade moral,
chamada igreja” (DURKHEIM apud VALLE, 1998, p. 259).
Geertz define a religião a partir dos símbolos, onde os significados religiosos são
armazenados através dos símbolos, dramatizados em rituais e relatados em mitos. Para
ele fazem parte dos símbolos religiosos os valores positivos, os valores do mal e o
conflito entre eles.
É um sistema de símbolos que atua para estabelecer poderosas, penetrantes e
duradouras disposições e motivações nos homens, enquanto comunidades
organizadas por meio da formulação de conceitos de uma ordem de existência
geral e revestindo essas concepções com tal aura de fatualidade que as
disposições parecem singularmente realistas (GERTZ apud VALLE, 1998, p.
259).
G. Galloway aborda a religião de forma globalizante acrescentando o conceito e
a prática da fé como instrumento essencial para a prática da adoração.
A humana tem um poder que está mais para do próprio ser humano;
por meio da qual ele busca satisfazer suas necessidades emocionais e
alcançar a estabilidade de vida; expressa-se em atos de adoração e serviço. O
aspecto cognitivo da consciência religiosa está representado pela fé, e essa é
estimulada pela emoção e propõe o objetivo que satisfará as necessidades da
vida interior. [...] O aspecto prático se mostra nos atos de adoração que
pertencem à natureza religiosa (GALLOWAY apud VALLE, 1998, p. 257).
Tomaz de Aquino define religião como o meio do ser humano cultuar a Deus. “A
religião é a virtude pela qual os homens rendem a Deus o devido culto e reverência”
(AQUINO apud VALLE, 1998, p. 259).
A religião em todos os tempos tem exercido papel de suma importância. Ela
sempre acolheu os fiéis nas suas necessidades, tanto espirituais como físicas
oferecendo-lhes oportunidade de livramento, de salvação. Sabe-se, porém, que pelo
fato do ser humano ser condicionado a precisar de “salvação” ele é motivado a buscá-la
nas religiões, caso contrário elas perderiam seu valor.
57
No mundo antigo as religiões levavam as pessoas a crerem que a doença era
confundida com os monstros originários, os espíritos maus, a possessão demoníaca e
com o pecado, os quais poderiam levar a pessoa ao sofrimento como também à morte.
Dessa situação surgiu a necessidade de procurar os deuses para a cura das doenças e
afugentar os espíritos maus, para que o bem estar fosse retornado. Nessa época era
quase impossível separar as ciências dicas do conhecimento sobrenatural e oculto.
Contudo, o deus bom poderia sobrepujar o demônio maligno através de oração e
textos de encantamento (TERRIN, 1998, p. 156-58).
Muitos estudiosos, inclusive psicólogos, embasaram em Rudolf Otto, suas
definições de religião, onde: O termo sagrado é a interpretação e a avaliação da
experiência religiosa, que não pode ser submetido à racionalização, ser conceituado, e
não pode ser exprimido em palavras. Este elemento está presente em todas as
religiões, como a parte fundamental e sem ele, a religião perderia o seu valor. O termo
numinoso
34
é o resultado da necessidade de se encontrar um nome para esse
elemento, conquistando de forma isolada, para fixar o seu caráter, permitindo suas
fases: inferiores ou de desenvolvimento, tendo em vista que ele é uma categoria
especial quando avaliado e interpretado, e manifesta-se de acordo com a situação
interior da pessoa, momento que é concebido como numinoso. É pela experiência com
o numinoso, que pode surgir o sentimento de criatura. Este fato leva à análise
psicológica da experiência religiosa (OTTO, 1985, p. 11-15). Os estudos de Otto são
muito importantes como fato inicial, onde enfoca o elemento irracional.
34
Cf. OTTO, 1985, P. 11-15. “O elemento do qual falamos e que tentaremos dar algum conhecimento,
aparece como o elemento vivo em todas as religiões. Ele constitui a parte mais íntima e, sem ele, a
religião perderia as suas características. A sua vitalidade manifesta-se sempre com vigor nas
religiões semíticas e dentre elas, num grau superior, nas religiões bíblicas. ele possui o nome que
lhe é próprio: Oudoch, Hagios, Sanctus ou Sacer. Seguramente, nessas três línguas, essas palavras
indicam a idéia de bem, bem absoluto, considerados no mais alto grau de desenvolvimento em sua
maturidade. Nós traduziríamos, então, por “sagrado” ou “santo”. [...] eu uso a palavra numinoso”.
58
Mircea Eliade, em O sagrado e o profanoafirma que o sagrado se manifesta
através de uma hierofania
35
e por esta razão o homem toma conhecimento, devido à
diferença entre o sagrado e o profano. O sagrado manifesta-se de formas
diferenciadas: como árvores, pedras e outros. Ele tem significado que vai além da
pedra e da árvore. Quando o sagrado se manifesta, um objeto qualquer se transforma
em outra coisa, apesar de continuar sendo ele mesmo. O sagrado se manifesta em uma
pedra e esta se revela sagrada, transmite algo sobrenatural para a pessoa que está
vivendo a hierofania. Os modos de ser do sagrado e profano dependem das diferentes
posições que o homem conquistou no cosmos; e por conseqüência, interessam não só
aos filósofos, mas também a todo investigador desejoso de conhecer as dimensões
possíveis da existência humana. Eliade o sagrado o como relação entre os
elementos não-racional e racional, mas em toda a sua totalidade, afirmando que o
sagrado se opõe ao profano (ELIADE, 1992, p. 23-32).
Jung define religião a partir do vocabulário latino religere :
uma acurada e conscienciosa observação daquilo que Rudolf Otto,
acertadamente chamou de “numinoso”, isto é, uma existência ou um efeito
dinâmico não causados por um ato arbitrário. [...] O numinoso pode ser a
propriedade de um objeto visível, ou o influxo de uma presença invisível, que
produzem uma modificação especial na consciência. Tal é, pelo menos, a
regra universal (JUNG, 1987, p. 9).
A religião para Jung, o é apenas uma confissão de fé, e afirma: “toda
confissão religiosa, por um lado, se funda originalmente na experiência do numinoso, e,
por outro, na pistis, na fidelidade, na e na confiança em relação a uma determinada
35
Cf. ELIADE, 1992, p. 25. “0 ato da manifestação do sagrado prepusemos o termo hierofania”.
59
experiência de caráter numinoso e na mudança de consciência que daí resulta” (JUNG,
1999, p. 10).
Relata que ao deparar com um fenômeno religioso que apresenta relação
importante com o psicológico, ele o trata dentro de uma perspectiva empírica limitando-
se a observar os fenômenos, não utilizando abordagem metafísica ou filosófica (JUNG,
1999, p. 7).
Para ele, a religião de alguma forma existiu desde os tempos antigos como uma
necessidade do ser humano de expressar na prática, aquilo que possivelmente sua
mente busca: o transcendente, o sagrado
.
A religião constitui, sem dúvida alguma, uma das expressões mais antigas e
universais da alma humana, subtende-se que todo o tipo de psicologia que se
ocupa da estrutura psicológica da personalidade humana, deve pelo menos
constatar que a religião além de ser um fenômeno sociológico ou histórico, é
também um assunto importante para grande número de indivíduos
(JUNG,
1999, p. 7).
O ser humano por natureza inconformado, busca de muitas formas satisfazer
suas necessidades interiores e exteriores, ou seja, necessidades socioeconômicas,
orgânicas, psicológicas e espirituais, e ao perceber que elas não se completam por
meios naturais de busca, apela para a religião, sendo que percentual relevante não
possui alternativa a não ser a religiosa. A pessoa busca através da religião a paz,
estabilidade econômica, felicidade, saúde emocional, física, espiritual e outros, bem
como, a certeza da salvação; isto porque ela precisa de algo mais que a preencha e a
complete, dando-lhe segurança e satisfação nas suas necessidades e anseios
interiores e espirituais.
60
No primeiro momento, salvação diz respeito a livramento de ordem espiritual; é
desta forma que esse termo é conhecido, no senso comum cristão. Quando, porém,
Cristo curava, operava no ser humano uma cura completa, libertadora, não só do corpo,
mas psicológica, social, política e espiritual. Libertação também das tradições religiosas,
às vezes desumanas que prendiam a pessoa, deixando-a sem alternativa. Afirma
Richter Reimer (2002, p.1234): “A cura é uma experiência libertadora, ela é vital e
ardentemente desejada”. Cura é libertação, e libertação também é considerada como
salvação.
O termo salus, na língua latina possui significado simbólico e funde-se mesmo
recente, com o significado de saúde como também com o de salvação. O mesmo
ocorre também em outras línguas. Conclui-se possivelmente que a origem e a missão
das religiões em relação ao ser humano seria salvá-lo em sua totalidade: física,
psicológica e espiritual. A salvação não deve ser dissociada da saúde e separada dos
contextos reais da vida. Ela o deve ficar isolada, pois, faz parte do presente e é
responsável pelo “estar bem” do ser humano. Portanto saúde não é simplesmente o
fato de não ser portador de doenças, assim como o termo salvação não pode ser
reduzido a um céu distante, sem nenhuma correlação com a vida presente (TERRIN,
1998, p.154-56).
Para essa visão contribui também, na história da religiões, o termo terapia, que
de maneira alguma é termo médico, mas antes de tudo religioso”. Na
concepção clássica dos antigos, o conceito therapeía, indica antes de tudo
“uma assistência”, um “estar próximo”, um cuidar de” e trata-se de um termo
muito próximo ao conceito religioso e cristão de diakonia (TERRIN, 1998, p.
156).
Os batistas brasileiros afirmam: “Salvação nas escrituras se relaciona à cura,
libertação, perdão, reconciliação, adoção. conversão, justificação, santificação e
61
glorificação” (SILVA, 2003, p. 107). A própria palavra salvação, em muitas línguas, inclui
a saúde do corpo. Os termos saúde e salvação, hoje distintos em português, eram
originalmente, uma só palavra em latim, salus” (SCHIAVO E SILVA, 2000, p.13).
Terrin (1998, p. 152) afirma que “as religiões do passado, e de modo particular
também a tradição cristã, jamais dissociaram a própria missão de “salvação” da sua
tarefa terapêutica As religiões não pregavam apenas a salvação, mas imputavam a si
a função terapêutica e curadora. Isso leva a entender que havia uma crença onde a fé e
a saúde interagiam melhor. No Novo Testamento, Jesus deu poder e autoridade aos
doze discípulos sobre os demônios e para curar doenças. Na filologia
36
das religiões
antigas como também a cristã, os termos saúde e salvação nasceram de um mesmo
conceito e não eram dissociados da “salvação”, o seu objetivo era também terapêutico,
o que se pode observar na história comparada das religiões. Conclui-se que não se
pode separar a saúde física da espiritual e compete à religião cristã, diante da doença,
a missão de buscar essa realidade (TERRIN, 1998, p. 150-154).
Essa salvação que tão intensamente é buscada possui muitas interpretações ou
significados. Para uns ela pode significar segurança espiritual; para outros apenas
confiança, paz; para outros um sentido direcionado de vida; para outros a resolução de
problemas sociais e econômicos; e para outros a cura emocional ou orgânica.
Este é um aspecto que suscita um interesse particular entre os psicólogos. Carl
Gustav Jung falava de cura psicológica, V. Frankl de cura d’alma e busca de
sentido, e Roberto Anagioli de desenvolvimento transpessoal.
Independentemente das divergências de interpretação, todos esses autores
mencionam a dimensão religiosa como parte integrante do tratamento
psicológico (CATALAN, 1999, 133).
36
Estudo da civilização de um povo, num dado momento de sua história, através de documentos de sua
historia, através de documentos literários escritos, por ele deixado.
62
A busca de sentido a que se refere V. Frankl, na citação acima pode também ser
interpretada a partir do sentido social e das necessidades interiores do ser humano.
Quando a pessoa é atingida por dificuldades socioeconômicas ocorre o início de
parte do desequilíbrio emocional e estas dificuldades ao juntarem-se às de ordem
emocional que cada pessoa traz consigo, deixa-na sem referencial. Surge daí então a
busca de sentido para a vida através do sagrado.
Para Jung a religião faz parte da cultura, do social, conseqüentemente leva as
pessoas a emitirem comportamentos que a psicologia não pode negar. Diante da sua
necessidade biopsicossocial, a pessoa busca alternativa natural, e recorre também ao
sagrado.
A psicanálise anti-religiosa, no entanto, confronta a religião interpretando-a de
forma apenas científica: “Para Freud, portanto a crença religiosa permite que os crentes
gerenciem seu desalento negando suas necessidades insatisfeitas e elevando a
representação interna do pai ao posto de Deus.” (RIZZUTO, 2001, p. 161).
2.1.1 Elementos Contidos na Religião que Contribuem para a Cura
Muitos elementos presentes na religião podem contribuir e quase sempre estão
presentes no ato da cura. Dentre eles destacam-se:
2.1.1.1 O sagrado
A análise filológica dos termos: sagrado e salvífico, de C. Colpe, apresenta duas
áreas semânticas: onde o termo sagrado está ligado ao culto, o que é consagrado, ou
63
seja, o que é colocado à parte ou separado, destinado à divindade; num segundo
momento tendo passado por várias línguas e interpretações o termo sagrado adquiriu
várias conotações, desde o seu significado inicial “concessão de presente” expandindo-
se para “dotado de poderes”, “particularmente útil”, “aquilo que produz bem estar”,
“inteiro”, “sólido”, “intacto”, “forte”, “com saúde”, “de bom agouro” e “são”. Em sua
missão integrada à religião que naturalmente está fundamentada na figura do sagrado
tem como objetivo salvar o ser humano em todo o seu contexto: físico, psicológico e
espiritual (TERRIN, 1998, p. 153-55).
No mundo cristão é sagrado tudo que pertence a Deus. A santidade é
comunicada através de irradiação, do seu poder de curar. “Jesus, a comunidade e o
indivíduo cristão são compreendidos como “templo”, ou seja “santuário”, “lugar sagrado”
de Deus no mundo” (BERGER, 2004, p. 157). Isso deixa claro que determinados
lugares e pessoas, através dos quais Deus se faz presente no mundo; onde também a
eficácia da irradiação santa está presente e contribui para beneficiar o cristão. A
presença do sagrado torna-se bênção que pode apoderar-se do ser humano, animais
ou coisas. Os ritos em geral, dentre eles os hinos, o canto, a oração e a adoração, são
instrumentos que intervêm como construções de linguagem, reforçando a crença no
sagrado. Os milagres acontecem em função da presença do sagrado, que pode ser
considerado um elemento impessoal ou como um elemento santo (BERGER, 2004,
158-159).
O sagrado é a atribuição de um valor especial pelo indivíduo a um objeto, pessoa
ou outras coisas. É sagrado para ele e não para os outros. Visto que a pessoa pode
também atribuir funções terapêuticas ao sagrado.
64
2.1.1.2 Mitos, símbolos e ritos
O mito pode ser entendido ou definido da seguinte forma: “o mito conta uma
história sagrada; relata um acontecimento ocorrido no tempo primordial, o tempo
fabuloso do “princípio”. Ele relata as graças dos Entes Sobrenaturais, como vieram a
existir como realidade total, cosmos ou fragmento. O mito é sempre a narrativa de uma
“criação”, onde relata a forma como algo foi criado e começou sua existência; narra
somente o que ocorreu no ato da manifestação plena. Seus personagens são os Entes
Sobrenaturais e são famosos pelos seus atos nos tempos primórdios, eles relatam suas
atividades criadoras e revelam a sacralidade ou sobrenaturalide de suas obras. Os
mitos descrevem os diversos surgimentos do sagrado no mundo; é esse aparecimento
repentino do sagrado que fundamenta e converte o mundo no que é hoje. São as
irrupções dos Entes Sobrenaturais que determinaram o homem ser o que é hoje: um
ser cultural, sexuado e mortal (ELIADE, 2002, p. 11).
Ao se tentar entender o que é mítico, depara-se com opiniões as mais diversas.
A teologia protestante moderna, com representantes evangélicos ou fundamentalistas,
considera o termo mítico uma caracterização de “algo irreal, lendário, fantástico,
idealizado, carente de seriedade e, por falta de sobriedade, inventado(BERGER,
2004, p. 83). Neste caso o que é mítico seria fantasia, ilusão e correções não
verdadeiras da realidade.
A utilização do termo mítico pelos nazistas tornou comum a ligação entre o
componente mítico e o fascismo. Também é muito divulgada a idéia de que o
componente mítico significa apenas irracionalidade e de certa forma sem controle. Além
disso, também é divulgado que o componente mítico contrasta-se com a revelação da
65
palavra de Deus, o que leva a uma vinculação crítica do mito e crítica da cultura. Na
realidade o componente mítico o é fascista, nem irracional, não tem a ver com a
justiça pelas obras e nem é triunfalista (BERGER, 2000, 83-89).
Para Berger, a experiência mítica na atualidade é algo incontestável. As
pessoas que recebiam milagres no Novo Testamento os recebiam em termos míticos,
sendo para eles algo natural. O que se questiona na atualidade é como proceder diante
desses testemunhos. Para Berger quando se descobre na atualidade uma porta, uma
experiência e um caminho mítico, isso possibilita uma aproximação, conseguindo-se
uma ligação com os relatos do Novo Testamento. Ele denomina de “espécies de
experiência na atualidade”, as experiências: no tempo; na fala mítica; na mítica do
lugar; na mítica da ordem; enfatiza também a personalidade mítica, o silêncio mítico e
aspectos entre as diversas experiências míticas, para chegar às conseqüências para os
milagres, que seriam a ponte para o Novo Testamento e para os milagres de Jesus, e o
surgimento das suas obras através do Espírito Santo, conduzindo para ressurreição e
para a cura aos portadores de doenças (BERGER, 2000, p. 89-98).
Berger enfatiza as palavras de poder, que são relativas ao poder criador de Deus,
utilizadas por Jesus, como mediador da criação, sendo o ponto de contato, dos atos
perfomativos da palavra, utilizados até os dias atuais. A força do canto, como força da
utilização litúrgica, leva à experiência da compreensão da posição milagrosa entre o ser
humano e Deus, relatada no Novo Testamento. Observa-se uma significação simbólica
milagrosa ligada ao: canto, significação esta que possui um sentido dinâmico para a
comunidade que dele participa; o tempo da festa, a experiência da rememorização é
acessível a qualquer pessoa, o que ajuda na compreensão das revelações
apocalípticas de Jesus sobre o futuro, é semelhante aos fatos que ocorrem nos
66
milagres, pois declarações futuras sempre estão relacionadas a algo que está no
presente; o tempo do princípio e do fim: os milagres estão presentes no princípio e a
o fim da vida de Jesus. A relação mítica existente entre princípio e fim revela uma ponte
onde a realidade e o poder no acontecimento mítico é de forma semelhante ao
encontrado na realidade de Deus que se estende até Jesus, deixando claro a
percepção mítica (BERGER, 2000, p. 98-101). Para se entender melhor a questão das
doenças e curas no mundo religioso é importante entender o papel dos mitos e dos
símbolos os quais fazem parte desta construção.
Muitas foram as explicações e sentidos que se deu ao termo “mito”, “a linguagem
do século XIX definia como aquilo que não se deixa integrar a realidade” (ELIADE apud
CROATTO, 2001, p. 182). Surge daí a oposição entre mito e realidade. O mito seria um
estado em que a linguagem não pode explicar por ser um produto da imaginação e se
contrapõe à linguagem científica.
No entanto, os mitos de origem, concordam com os mitos cosmogônicos
37
e com
isso pressupõe e estende a cosmogonia, sendo que esta torna-se modelo para toda
sorte de criação. Diante disso, o aparecimento novo necessita da existência de um
mundo.
Desta forma o mito de origem relata e justifica uma situação nova estendendo e
confirmando o mito cosmogônico, explicando como foi criado o mundo, e como este foi
enriquecido ou empobrecido (ELIADE, 2002, p.25-26).
O mito na sua praticidade em geral, é explicado de forma clara e simples:
Mito é a narração livre referente a um fenômeno natural, um comportamento
humano ou um fato histórico em que o compromisso com a realidade é
37
Cf. ELIADE, 2002, p.25. Mitos hipotéticos da formação do universo.
67
subjetivo. [...] qualquer tentativa de enquadrar o mito a uma visão racional
nega a possibilidade de compreendê-lo em sua sublime dimensão original
(CROATTO, 2001, p. 7).
Desde as sociedades primitivas, até o presente momento, os mitos e símbolos
fazem parte da vida do ser humano, como também são elementos que fundamentam e
preservam a fé religiosa.
Os mitos e símbolos, as figuras mitológicas de povos e culturas independentes
entre si, devem ser explicados em um “inconsciente coletivo”. O “inconsciente
coletivo” junguiano representa uma camada muito profunda da alma, inata, que
é necessário diferenciar do inconsciente pessoal, nascido da experiência e da
contribuição individual (JUNG apud CROATTO, 2001, p. 195).
Na experiência religiosa, o mito surge a partir de uma hierofania, quando o
sagrado, o transcendente manifesta-se na relação com o homem: quando as
necessidades humanas físicas, psíquicas e socioculturais, são cumpridas ´(CROATTO,
2001, p. 44.45). O mito é um relato, um acontecimento real, onde os deuses
manifestam-se com a finalidade de dar significado à determinada realidade, através de
uma cadeia de acontecimentos. Ele é um imaginário, uma construção do homem
religioso. “[...] expressa a experiência religiosa do imaginário, como manifesta a
sacralidade hierofanizada naquilo que concerne profundamente em sua realidade”
(CROATTO, 2001, p. 219). Pode situar-se em um espaço e um tempo, vindo a culminar
em uma história.
Socialmente, o mito tem como função manter a identidade de um grupo, uma
sociedade ou um grupo religioso; onde ele institui modelos de comportamento, sendo
assim forte contribuinte da cultura. Uma das suas características presentes em todos os
tempos é a repetição que auxilia o homem secular e religioso a situar-se no cosmos
reconstruindo sua realidade (CROATTO, 2001, p. 307-309).
68
O símbolo faz parte do viver cotidiano do ser humano, que é por natureza
simbólico. Ele faz parte da comunicação social. O ser humano constrói símbolos. O seu
dia a dia é uma fonte produtora de símbolos. Eles estão presentes na linguagem, no
amor, na transfiguração do real, na arte, como também no sistema religioso. O símbolo
pode variar de pessoa para pessoa e de cultura para cultura, em relação ao seu
significado, ou seja, o mesmo objeto ou fato pode ter mais de um sentido. Tudo pode
tornar-se simbólico a partir de cada experiência humana. Coisa, pessoa ou
acontecimento. Antes tinha o seu significado próprio e a partir da transignificação passa
a ter outro significado. No fenômeno religioso, o transcendente por sua própria essência
de não ser concreto, utiliza um objeto, um lugar, um fato e outros, como mediador na
relação com o ser humano, ou seja, o símbolo. Desta forma o mundo religioso é
permeado de mitos e símbolos, os quais, podem também estar ligados à doença, como
também à cura.
O símbolo visto do prisma religioso, pode ser considerado uma linguagem da
experiência religiosa. “O símbolo religioso está localizado, em primeiro lugar, ‘’entre” o
totalmente Outro e o sujeito humano que o experimenta(CROATTO, 2001, p. 83). O
objeto simbólico contribui para a percepção do sagrado como cada pessoa o
experimenta.
Vislumbrando de um modo geral a prática religiosa percebe-se que o rito é a
expressão que mais está em evidência. Ele seria a extensão do gesto simbólico, é a
forma prática do símbolo. Na experiência religiosa, ele é considerado como linguagem
primária. Como o símbolo, o rito é determinado e especificado em sua significação pelo
mito. Vendo de um outro prisma o rito em sua dinâmica faz parte da narrativa do mito.
Ele pode ser um texto, uma linguagem, mas, no entanto, sua linguagem gestual não
69
tem a mesma capacidade de comunicação da palavra. O rito depende da palavra do
mito. O rito é co-participante tanto do mito como do símbolo. Ele é símbolo, porém
participa do mito como um aglutinado de símbolos com o fim de transmitir determinada
mensagem
.
[...] o rito aparece como uma norma que guia o desenvolvimento de uma ação
sacra. O rito é uma prática periódica, de caráter social, submetida a regras
precisas. Em sua exterioridade, porém, a norma é uma ”rubrica” e o define
realmente o que é o mito. [...] A Palavra latina ritus é próxima da palavra
sânscrito-védica. rta (rita), a força da ordem cósmica sobre a qual velam
divindades como Varuna. É a estrutura normal das coisas, do que acontece no
cosmo e na vida humana (com um matiz mais moral, rita foi substituída depois
por darma). (CROATTO, 2001 p. 330).
Como se percebe, o rito o é uma prática simplesmente humana, é uma ação
sacra, uma imitação do que fizeram os deuses. Por esta razão, ele é repetido em cada
rememorização dos mitos como uma ação divina, propiciando a participação e a
comunhão do fiel com o sagrado, o transcendente. Nessa participação com o sagrado,
na imitação simbólica de gestos primordiais, o mito presente é que lhe sentido
(CROATTO, 2001, p.330-31).
O rito é a ação do fiel tendo em vista que na concepção religiosa o rito contribui
para a transformação da realidade. Ele é realização de uma nova realidade, ou seja, a
ligação do real terrestre com o que é sobrenatural.
A eficácia é intrínseca do rito, ou seja, o rito é dado como podendo produzir
por si mesmo um efeito. Para o atuante do rito, a realidade não é mais a
mesma após o rito. [...] A característica fundamental do rito religioso é a de
religar a existência e o mundo ao sobrenatural, fazendo da matéria do mundo e
do gesto humano o símbolo do agir divino. (CATALAN, 1999, p.126-7).
70
No Cristianismo, desde os tempos primórdios, o rito sempre teve o seu lugar nas
celebrações, desde as mais simples as mais significativas. No Cristianismo atual,
apesar do rito ter perdido parte do seu enfoque, principalmente entre os evangélicos, no
que se refere ao pentecostalismo, que é a base deste estudo, o rito é bastante
enfocado, não nas liturgias, mas em vários outros aspectos. No neopentecolismo ele
é mais enfocado ainda.
2.1.1.3 Principais elementos sacros
a) O líder religioso
O líder religioso em todos os tempos foi visto com uma certa sacralidade
espiritual e como pessoa que exercia poder de cura. No Egito antigo, havia
curandeiros
38
que nem sempre exerciam a medicina, mas lidavam com as mágicas e
orações. Havia pessoas que podiam ser comparadas com os modernos
pranoterapeutas, os quais eram curandeiros poderosos. Utilizavam terapia ”empírica”
com base em orações e encantamentos. Havia os sau, que utilizavam meios espirituais,
valiam-se também de drogas e praticavam exorcismo e magia. Havia os chamados
wabw, sacerdotes da deusa Sakhmet, deusa das doenças e da cura; os quais eram
mediadores entre a deusa e as pessoas que buscavam a cura (TERRIN, 1998, p. 161).
38
Cf. SCHLSINGER; PORTO. “Aquele que pratica curas geralmente por meio de preces, ritos e feitiços,
desprovidos de maior conhecimento especializado, não possui título nem habilitação para ao ofício”.
71
Sabe-se que desde a idade antiga, os deuses que se ocupavam das doenças e
suas curas conseqüentemente, lideravam uma parte do mundo, dos us e dos astros.
Conclui-se então que se estas divindades eram sacralizadas pelos fiéis, seus
sacerdotes também ocupavam um lugar sacralizado (TERRIN, 1998, p. 161).
Entre o povo de Israel, sabe-se que a tribo de Levi ocupava-se exclusivamente
do trabalho no tabernáculo e posteriormente no templo, intermediando a divindade. Nos
primórdios do cristianismo, foi outorgado poder aos apóstolos
Estes são os sinais que acompanharão os que tiverem crido: em meu nome
expulsarão demônios, falarão em novas línguas, pegarão em serpentes, e se
beberem algum veneno mortífero, nada sofrerão; imporão as mãos sobre os
enfermos, e estes ficarão curados (Mc 16, 17-18).
Percebe-se que estes sinais visíveis, muito contribuíram para o fortalecimento da
dos adeptos do cristianismo primitivo, que de forma explosiva multiplicaram-se,
conforme o relato de Atos dos Apóstolos. Com o passar do tempo, essa liderança
espiritual foi estendendo-se pelo mundo e sabe-se que a ministração de curas, sinais e
maravilhas, independe de que a pessoa seja um líder, sacerdote ou pastor reconhecido.
Nesse mundo espiritual cristão, é reconhecida pelos adeptos a eficácia do poder de
cura através destas pessoas que as intermediam e que acabam tornando-se
sacralizadas, pois o milagre e a cura sempre têm algo a ver com o mensageiro e sua
mensagem (BERGER, 2004, p. 45-46).
Os profetas de Deus único e abstrato não o pensadores eruditos; são
pessoas possuídas, guiadas e conduzidas por um poder superior. O poder
irracional sobre o qual falam é o mesmo poder irracional que os inspira a falar.
O que vemos aí não é ciência nem filosofia, e sim o que é corretamente
chamado de “revelação” (FIERZ, 1987, p. 302).
72
Evidentemente, essa sacralização do líder, sacerdote ou pastor, sempre ocorre
após a rememorização das curas de Jesus e dos apóstolos. Este fato tem o poder de
mobilizar o surgimento da . Essa nada mais é do que a associação dos fatos
rememorizados, somados ao desejo de cura da pessoa, efetivando-se a cura, através
de uma trajetória simbólica.
A pessoa do sacerdote ou pastor, ou mesmo líderes leigos, passa a ser
admirada, respeitada e sacralizada, pelo papel de que está imbuída, passando também
a representar um símbolo religioso de cura. A partir de então, suas palavras, conselhos,
orientações e mesmo exercício da taumaturgia
39
, tem psicologicamente para o fiel um
peso maior, ou seja, eleva a credibilidade no líder religioso, como também a fé em Deus
que age através dele, podendo redundar em cura.
b) A fala
A fala, através da qual uma ação é realizada, contém mais do que
aparentemente possa parecer. o se restringe a uma fala meramente racionalista.
Sua simbologia é eficaz sendo recebida pelo cristão como a presença do Deus
misterioso que se dirige aos seres humanos (BERGER, 2004, p. 93)
A sacralidade da fala no Antigo Testamento, iniciou na ação criadora de Deus:
“Haja luz” (Gn, 1,3), seguida por outras falas, percorrendo todo o Antigo Testamento e
chegando ao Novo Testamento. O poder da fala a sacralizou. No meio religioso antigo e
no cristianismo, é notável a importância da fala e as conseqüências que a
acompanham, quer positiva, quer negativa. A fala de Jesus foi sacralizada, pois atingia
39
Obra de taumaturgo. Taumaturgo é a pessoa que faz milagres.
73
o ser humano em toda a sua plenitude. Quase sempre era acompanhada de uma ação
como: milagres; curas no corpo; libertações espirituais, emocionais, sociais, morais;
revelação; apoio; consolo; esperança, promessas; perdão; emoção; ordem; crítica;
denominações negativas; multiplicação de pães e peixes e promessa de vida eterna
(Evangelhos). Falas como: Cura da mulher com hemorragia: Minha filha, a tua te
salvou, vai em paz fique curada deste teu mal” ( Mc 5,34); quando curou um
endemoninhado em Cafarnaum: Cala-te e sai dele!(Lc 4,35); A pesca maravilhosa:
Faze-te ao largo; lançai vossas redes para a pesca[...] “Mestre, trabalhamos a noite
inteira sem nada apanhar; mas porque mandas, lançarei as redes” (Lc 5, 4-5); a cura
de um leproso: “Senhor, se queres, tens poder para purificar-me” Eu quero,
purificado(Mt 8,2-3); a cura do servo do centurião: Eu irei curá-lo.“Senhor, não sou
digno de receber-te sob o meu teto; basta que digas uma palavra e o meu criado ficará
são” (Mt 8, 7-8).
À luz da redação dos escritos neotestamentários, Jesus de Nazaré, descrito
como terapeuta e exorcista, anunciava o Reino de Deus e, efetivava seu movimento,
através das curas, expulsão de demônios e ressuscitações de mortos. Sua vida e sua
fala era uma motivação e um convite a todos que o ouviam a libertarem a si mesmos e
aos outros, a curarem-se dos efeitos da violência colonial. A cura é a base do Reino de
Deus pregado por ele.
A partir dos evangelhos e dos feitos de Cristo a homilia cristã passou a ter
grande crédito no decorrer do cristianismo, até os dias de hoje, ou seja, ela continua
sacralizada no meio religioso cristão.
74
c) Os gestos
À medida que o cristão se aproxima do sagrado está suscetível a novas ações e
mudanças, isso ocorre baseado na fé, que é uma experiência que contribui para
desencadear uma busca, que se expressa através de gestos, palavras e atitudes.
Quem crê se volta para aquele em quem deposita sua fé. Começam então as atitudes e
comportamentos como expressão do desejo ou necessidade: oração, plica, onde
envolve a posição do corpo, a fala, o emocional e outras disposições comportamentais
como a participação em reuniões religiosas, freqüência ao lugar sagrado, participação
em liturgias, ritos cânticos e adoração (CATALAN, 1999, p.120).
Os gestos míticos, associados aos comportamentos, são a expressão de toda a
dinâmica do corpo, no ato de exercitar a consciência, a meditação, a contemplação e a
oração verbalizada ou mental. Fazem parte também desses exercícios outras práticas,
como o canto e outros ritos tradicionais que compõem as inúmeras liturgias que hoje
podem ser vistas no cristianismo.
Com efeito, do mesmo modo que passear, andar e correr são exercícios
corporais, assim também chama-se de exercícios espirituais toda maneira de
preparar e de dispor a alma para afastar de si todas as afeições desordenadas,
e, uma vez afastadas, para buscar e achar a vontade divina na disposição de
sua vida em vista da salvação de sua alma (LOYOLA, 1985, apud CATALAN,
1999, p.120).
Em função dos gestos míticos fazerem parte dos momentos considerados
sagrados, passaram a ter uma conotação espiritual, sendo portanto, sacralizados.
Alguns gestos práticos são comuns no cristianismo como ajoelhar-se, fazer o sinal da
cruz ou o nome do pai (no meio católico), bater palmas, levantar as mãos em sinal de
adoração (no meio evangélico) e outros. Psicologicamente estes gestos induzem o
75
cristão a preparação, a mobilização de estados de ânimo interior. Esses elementos
psicológicos certamente contribuirão para reforçar a pessoa no sentido da aquisição da
bênção desejada.
Os Gestos sacerdotais utilizados pelos líderes religiosos como: a bênção
sacerdotal, a aproximação, a oração, o toque, a unção, e outros são considerados
sagrados e reforçadores da fé. Assim como a própria pessoa do sacerdote ou líder
espiritual também se torna sacralizada.
d) A memória – literatura
A literatura religiosa, enfocando principalmente a cristã, sempre foi um
instrumento utilizado pelos fiéis, no sentido de informação, conhecimento e
direcionamento das práticas religiosas. Ela é a memória sacralizada do cristianismo. A
rememorização dos fatos religiosos como: mitos, símbolos, ritos, salvação, milagres,
curas e dogmas e normas religiosas e mesmo, os exemplos de dos antigos cristãos,
não ocorre na prática religiosa, como também no ato da leitura religiosa, que muito
contribui para o surgimento da fé.
As escrituras sagradas, principalmente a Bíblia, depois de sua e canonização,
tornou-se instrumento fundamental para os cristãos, como regra de e conduta. Jesus
Cristo também sacraliza as escrituras quando afirma: “Vós perscrutais as Escrituras
porque julgais ter nelas a vida eterna; ora, são elas que dão testemunho de mim” (Jo
5,39). Desta forma, a Bíblia tornou-se para o cristão, elemento propiciador das
informações cristãs e das suas bases no primeiro momento; posteriormente regra e
76
instrumento de fé, pois consideram-na a palavra de Deus, o recado de Deus aos seres
humanos. Ela é a memória sagrada dos cristãos.
e) O lugar
A experiência mítica e simbólica do lugar é de especial importância para o
cristão. Ele acredita que Deus pode estar presente em lugares ou tempos específicos.
Tentando compreender acerca de Jesus, no âmbito das tradições judaicas, seria
possível considerar Jesus, como o lugar da presença de Deus, simbolizando a
presença de Deus na pessoa; de forma parecida ao que ocorre no templo, sendo ele
uma só pessoa, superando o abismo entre o doador e o dom (TERRIN, 1998, p. 94).
O templo cristão, por sua vez faz parte da experiência mítica do lugar. Nele estão
presentes os símbolos e acontecem as práticas dos ritos sagrados. Daí o motivo dos
fiéis se reunirem unidos numa fé que a mítica do lugar simboliza. Também faz parte
da mítica do lugar o significado simbólico que o lugar possa trazer variando de pessoa
para pessoa como: o lugar que ela foi batizada, onde casou, onde seus filhos foram
batizados, onde se converteu ao cristianismo, onde presenciou curas, passando este
lugar a ser considerado sagrado por ela.
O cristão normalmente sacraliza determinados lugares, como vimos e
principalmente onde houve uma teofania
40
. A manifestação do sagrado torna mais forte
toda uma simbologia e ritos e isso contribui de forma simbólica para o fortalecimento e
efetivação da fé.
40
Revelação ou aparição da divindade. Manifestação de Deus.
77
2.1.1.4 Experiência religiosa
O termo “experiência possui vários significados originários mais da vivência
diária, que da especulação. Esse termo tem sua origem no grego empeiria”, dele
originando “empírico” e “empirismo”, no latim “experientia”, surgindo em português o
termo “experiência” (VALLE, 1998, p. 21).
No senso comum, este termo tem como significado principal, o aprendizado
direto empírico, pela pessoa. È uma forma de saber imediata que ocorre antes mesmo
de ter noção reflexiva do objeto aprendido; seriam modos básicos de sentir, conhecer e
fazer. A experiência é responsável em construir a condição para o conhecimento e
ação. Em função da sua situação de repetição e da possibilidade de ser comparada
com a experiência de outros, pode ser fundamento confiável e importante para
orientação, na relação com o mundo. Num segundo sentido, a experiência está
relacionada à prática em atividades definidas. Num terceiro sentido, seria a
experimentação e a verificação, sendo esse o seu principal significado em linguagem
científica e técnica. Um quarto sentido seria a capacidade de suportar ou de sofrer em
uma situação. Em outros sentidos pode significar “a percepção subjetiva e imediata das
coisas, das pessoas e do mundo. Também de si próprio ou do sagrado” (VALLE, 1998,
p. 21-22).
O termo “experiência” foi constituindo-se na vida diária de vários sentidos
qualitativos, sendo que, muitos deles são de grande importância para se entender a
noção de experiência religiosa, como: o lado intuitivo das coisas; a dimensão da
intencionalidade, maneira de ver, sentir e reagir de cada pessoa. O especialista em
religiões populares, O. Maduro, associa o conhecimento a experiência, afirmando que o
78
conhecimento religioso verdadeiro presume a presença de experiência qualitativa que
antecede a ele próprio (MADURO apud VALLE, 1998, p. 23).
A experiência religiosa, a princípio parece caracterizada por excessiva poliformia.
No entanto, ela é real em si, não sendo apenas uma noção, mesmo apresentando-se
às vezes de forma múltipla, cheia de incoerência e polarizações. Olhando por esse
prisma, as experiências religiosas apresentam tensivas características que se seguem:
“são (podem ser) estáticas ou dinâmicas, passivas ou ativas, cerradas ou abertas,
intrínsecas ou extrínsecas, libertárias ou repressivas, emocionais ou racionais, sectárias
ou universais, conscientes ou inconscientes, neuróticas ou sãs.” (VALLE, 1998, p.17-
18).
Em Oxford, Inglaterra, o Centro de Alister Hardy, pesquisou relatos individuais de
3000 pessoas que descreveram suas próprias experiências religiosas as quais foram
assim classificadas:
1) experiências sensoriais ou quase sensoriais visuais;
2) auditivas;
3) táteis;
4) odoríferas;
5) extra-sensoriais [...];
6) mudanças comportamentais com aparecimento de condutas [...];
7) elementos cognitivos e afetivos [...];
8) evolução da experiência enquanto tal: (a) intrapessoal [...], (b) interpessoal
[...];
9) padrões dinâmicos presentes na experiência: (a) construtivos ou positivos
[...], (b) destrutivos ou negativos[...];
10) experiência em sonhos;
11) eventos deslanchadores da experiência [...]:
12) conseqüências da experiência [...] (VALLE, 1998, p. 275-276).
Acerca da experiência do sagrado na psicologia, é bom que se compreenda
melhor o que esta ciência entende por religião. A definição clássica de William James
pioneiro psicofenomenológico da “experiência religiosa”, afirma que religião são
79
“sentimentos, atos e experiências do indivíduo humano, em sua solidão, enquanto se
situa em uma relação com seja o que for por ele considerado divino”. Percebe-se que
ele enfoca dois momentos: um é a relação com o sagrado e o outro, o que ocorre na
solidão do indivíduo. M. F. Verbit, como também muitos admiradores de James,
discordam desse segundo momento acerca da solidão individual. Para ele, o histórico e
o social devem ser considerados, devendo ser vinculados; definindo, portanto, a religião
como: “a relação do ser humano com qualquer coisa que ele conceba como sendo a
realidade última dotada de significado”. A. Vergote, aceita parcialmente a definição de
James e adota a de R. H. Thouless por apresentar uma visão mais abrangente do
fenômeno religioso: “a religião é uma relação vivida praticada entre o ser humano e o
ser ou os seres supra-humanos nos quais ele crê”. Conclui afirmando “a religião, em
conseqüência, é um comportamento e um sistema de crenças e de sentimentos”
(VALLE, 1998, p. 42-43). A experiência religiosa seria, portanto em sua prática, o ato da
experiência do indivíduo com o sagrado e suas conseqüências.
2.1.2 Simbologia na cura religiosa
O mundo religioso cristão atual, desde os tradicionais até os neopentecostais,
levados por um sincretismo ascendente, traz aos seus adeptos relevantes promessas
de mudança na vida. “Vemos o poder transformador na cura e todos os níveis
possíveis: corpo, emoções, memória, relacionamentos e propósitos” (WUELLNER,
1997, p.9).
80
A cura sempre foi almejada e buscada pelo ser humano em função do estado
desarmônico que a doença provoca no corpo, nas emoções e no espírito. Ela é fruto do
desejo, da fé e da busca, variando de cultura para cultura, que é o determinante de todo
o processo.
Para que uma pessoa seja curada é necessário que ela deseje ardentemente
viver. Surge então a busca a partir do desejo, através dos meios comuns
especializados e a partir da que estando presente, chega-se até a busca da cura
religiosa se for o caso. Em muitas culturas antigas, o sacerdote, o mago, ou o
taumaturgo eram pessoas que portavam conhecimentos de medicina associados à
religiosa, por sua vez fundamentados em mitos, símbolos e ritos.
Como se sabe as doenças variam em função da cultura predominante, pois têm
a ver com a estrutura social, política, econômica, psicológica e geográfica de cada
povo, tendo como fator relevante as crenças e religiões; onde os mitos e símbolos são
responsáveis pelo fortalecimento da que, por conseguinte, é decisiva para a
obtenção da cura.
A cura sempre foi simbolizada ou precisou de um ato simbólico, um símbolo que
intermediasse a situação entre o fiel e o sagrado. Começando no mundo helênico,
havia muitas mediações simbólicas, a começar do templo, do santuário, da incubação
41
e dos sonhos e outros.
41
Cf. KÖNIG, 1998, p. 282. “Termo que designa a prática de uma pessoa dormir num lugar sagrado, na
maioria das vezes num templo, com o fim de obter um sonho enviado por seres divinos.
Fundamentação dessa prática religiosa é a convicção de que ao sonho compete uma realidade que
aponta o futuro, porque é concedido por meio de uma ligação com uma divindade. Após
determinados preparos a pessoa, que busca conselho ou cura se deita para dormir. O sonho ou o
oráculo onírico necessita com freqüência de interpretação por sacerdotes, para esclarecer o sentido
da mensagem. A prática de se deitar ao chão surge originalmente à influência de divindades
81
A cultura hebraica não aceitava a procura por médicos e quem o fizesse cometia
um ato de desobediência e impiedade demonstrando falta de em Deus, e merecia
castigo, pois acreditava que somente Deus podia curar. Também acreditava que a cura
e doença respectivamente, eram favor e punição de Deus. Contudo, os instrumentos
simbólicos eram utilizados, a partir da oração, súplicas intercessão sacerdotal e
sacrifícios de animais, para o perdão de pecados e purificação. A observância dos
mandamentos: doutrinas, dogmas, costumes, incluindo a não contaminação com o
pecado, garantiam uma vida saudável; como também os sacrifícios que eram
oferecidos no templo; os ritos, e as purificações (SCHIAVO; SILVA, 2000, p. 73).
No Novo Testamento, Jesus Cristo foi o maior profeta, taumaturgo e exorcista
(Mt 11,4-6). Na sua época, os judeus que aderiram aos seus ensinamentos, viveram
uma fase de transição a qual vinha de encontro aos costumes hebraicos, alterando
seus valores tradicionais. Em parte, as crenças e os ensinamentos de Jesus trouxeram
para os seus seguidores, uma espécie de reforma em relação à cultura hebraica, que
mantinha muitos valores herdados das culturas anteriores que os dominaram, dentre
elas a helênica, como também das culturas vizinhas. No que se refere ao cristianismo,
percebe-se que a simbologia amplificou ou quem sabe foi utilizada com menos censura.
A simbologia da cura tornou-se visível, clara, patente, fazendo parte do cotidiano
religioso: a voz; o poder da palavra; a oração, o olhar; o toque; a imposição de mãos; o
ambiente sagrado, a meditação, a unção com óleo, a taumaturgia e outros.
O principal dos taumaturgos neotestamentário foi Jesus, e posteriormente seus
doze apóstolos e discípulos. Um dos pontos que difere o Novo Testamento da cultura
ctônicas, e também Asclépio se havia desenvolvido de um demônio ectônico a um Deus salvículo. A
prática de domir no templo fazia parte também dos cultos das divindades silvícolas Ísis e Serapir”.
82
hebraica e outras, é o fato que qualquer fiel, independente da função religiosa de que
era imbuído ou mesmo sendo um leigo, podia tornar-se instrumento dessa simbologia
no ato da cura.
Seguem-se alguns exemplos, dentre outros, de símbolos usados na cura
religiosa cristã: unção com óleo: (apesar de na antiguidade ser uma medicação
universal, muito utilizada como ablução
42
, também como alimento; era considerada a
origem de luz e afugentava o mal) no Novo Testamento, tem ligação com as curas
operadas por Jesus e posteriormente por seus apóstolos e discípulos, “a partir daí
entendendo a unção com óleo e a oração em nome de Jesus de Tg 5, como um sinal
eficaz da força da cura de Deus [...] As orações empregadas exprimem a crença de
que pela consagração o óleo adquire a capacidade de trazer saúde” (GRESHAKE,
1998, p. 98). A imposição de mãos: na cura da mulher encurvada (Lc 13,12). Jesus lhe
impôs as mãos e ela ficou livre da sua encurvatura. O ato de impor-lhe as mãos, apesar
de ser um gesto simbólico contribuiu para externar “o exercício da virtude taumatúrgica
de Jesus sobre a enferma” (Lc 4,40), (LANCELLOTTI, 1979, p.141).
2.2 PSICOLOGIA
A psicologia científica tem se destacado como uma das inúmeras conquistas do
século XX. Sua influência tem sido relevante nos campos da educação, das relações
humanas em geral, no comércio e na indústria, no conhecimento da personalidade, no
42
Cf. MCKENSIE, 1983, p. 5. “No antigo testamento, a ablução é mencionada geralmente nas leis
cerimoniais como meio de purificação ritual, sendo prescrita para os sacerdotes e para quem quer
que tenha contraído uma impureza”.
83
estudo da motivação, na compreensão dos comportamentos, no trânsito, no esporte e
no lazer, nas doenças psicossomáticas e também na religião.
2.2.1 Psicologia da Religião - Informações Teórico-Históricas
A religião, em todos os tempos, tem contribuído de forma relevante para
comportamentos decisivos na vida de milhões de pessoas. A psicologia religiosa
científica surgiu por volta do início de Século XX, quando também a investigação
sistemática se iniciava, assumindo um papel preponderante e contribuindo para o
fortalecimento das ciências da religião, sendo que o relacionamento entre essas
ciências definiu as características principais da psicologia religiosa (BENKÖ, 1981, p.
9).
Neste período, começaram a desabrochar as ciências da religião (histórias das
religiões, ciências da religião e filosofia da religião) e como conseqüência as ciências do
espírito Geistes wissen chaften, em função da sistematização, dos conhecimentos
adquiridos até então, acerca dos povos primitivos e culturas tradicionais da Ásia e das
Américas (BENKÖ, 1981, p. 9-10).
Nomes significativos, desde o princípio dos estudos psicológicos, em parte não
admitiam a religião como objeto de estudo científico, enquanto que outros fizeram com
êxito estudos que permanecem até hoje. Dentre as duas correntes, citaremos alguns
dos principais.
Para Wundt a origem da religião está relacionada ao mundo dos mitos, sendo
produto da comunidade, não refletindo a vida psicológica; e ao ser interiorizada se
84
expressa através de símbolos abstratos, se retrai, podendo manter-se sem o culto
externo (BENKÖ, 1981, p. 10).
Seu objetivo é explicar a origem psicológica da linguagem dos costumes e da
religião. Com respeito ao mito psicológico em geral, e ao todo divulgado sobre os
fenômenos psíquicos superiores, ele trouxe grande contribuição para a psicologia
religiosa. Freud utilizou os estudos de Wundt para iniciar o estudo psicológico dos
fenômenos religiosos (BENKÖ, 1981, p. 10). Desta forma, mesmo indiretamente, Wundt
contribuiu para o início do estudo da psicologia religiosa.
William James, considerado fundador da psicologia religiosa norte-americana,
defende as manifestações religiosas nas pessoas religiosas, como os fundadores e
místicos religiosos. Na sua análise, apresenta o surgimento da consciência religiosa, a
conversão, antecedida por dois momentos: a pessoa se conscientiza dos seus erros;
posteriormente identifica-se com sua parte superior germinal, a salvação. James
enfocava o inconsciente para compreensão da religiosidade.
William James combateu veementemente o materialismo médico e o
cientificismo psicológico. Criticou o associacionismo psicológico afirmando que o
imaginário e as convicções religiosas fugiam às vezes à explicação científica. James
estendeu o campo da observação racional, aprimorando seus todos de investigação
científica. Essa nova visão elevou a religião para uma consciência excelsa. Ele a define
como “a reação total de um homem diante da vida” e ”a crença numa ordem invisível,
na persuasão de que o nosso bem supremo está na harmoniosa adaptação de nossa
vida a essa ordem” (JAMES apud FILORAMO; PRANDI, 1999, p. 168).
85
Acreditava que a experiência religiosa surgia no sentimento, era individual e ia
além dos limites da consciência racional. Com essa forma de ver a religião, a
metodologia científica tradicional não podia ser deixada, pois a religião é uma realidade
psíquica, a qual deveria ser pesquisada empiricamente, através de um todo
seqüencial. Dedicou-se a investigar a diversidade das espécies religiosas, quando se
primou em descrever, classificar e explicar os motivos da sua persistência. Se a religião
era individual possivelmente ela tenha surgido do intercâmbio entre indivíduo e
comunidade. James acreditava que a religião “deve necessariamente ter uma função
eterna na história humana”; “deve exercer uma função permanente, tenha ela ou não
um conteúdo intelectual, e se tiver, seja este verdadeiro ou falso” (JAMES apud
FILORAMO; PRANDI, 1999, p. 169).
Sigmund Freud retomou temas iluministas da religião em suas críticas à religião.
O interesse de Freud pela religião foi contínuo e sistemático. Contribuiu com três
importantes obras, nas quais investigava a relação entre psicologia e religião. A
primeira obra Totem e tabu (1912-13). Freud segue com O futuro de uma ilusão
(1927); a última, “Moisés e o monoteísmo” (1934-38), onde faz crítica ao judaismo e sua
identidade.
Freud tinha como objetivo alcançar o homem de classe média com suas
tradições e instituições religiosas, as quais eram utilizadas como preservação frente às
intimidações do mundo. Sob forma de neurose coletiva da humanidade, essas
intimidações exerciam a repressão aos instintos sexuais, os quais eram sublimados,
através de crenças mitológicas e rituais, favorecendo desta forma as repressões
sociais. Freud acreditava que na idade experiente do homem, a ciência iniciaria o
período de revelação da constituição ilusória da religião. O caráter dessa revelação
86
pessoal de Freud contribuiu para os impasses entre psicanálise e religião. (FILORAMO;
PRANDI, 1999, p. 175).
Para Freud, a psicanálise deveria contribuir para a explicação da religião,
esclarecendo sua índole efêmera, explicando sua forte condição de subsistência. A
religião seria a realização e continuidade das aspirações dos antepassados, o que
denota sua capacidade de subsistência e em função disso ela podia desvencilhar-se
facilmente dos ataques dos métodos racionalistas, que tanto tentavam desvendar sua
índole ilusória. O desvendamento desse procedimento ardiloso por parte da religião,
que está entre crença e desejo, astuciosamente oculto nas práticas religiosas, era o
principal objetivo da crítica psicanalítica (FILORAMO; PRANDI, p.175. 1999).
A psicanálise religiosa procurava encontrar analogias entre: procedimento ritual e
comportamento obsessivo; crenças míticas religiosas e o universo dos sonhos. Em
Ações obsessivas e práticas religiosas (1907), Freud encontra três pontos
semelhantes entre a neurose obsessiva e a vivência religiosa: a coerção e a desistência
a certos impulsos; o semelhante resultado do processo de coerção e sublimação, que
nos dois casos, causam mecanismos de transferência
43
.
Baseado nessas coincidências e analogias, poderíamos ousar considerar a
neurose obsessiva como um equivalente patológico de formação religiosa e
descrever a neurose como uma religiosidade individual, e a religião como uma
neurose obsessiva universal. A semelhança essencial residiria na fundamental
renúncia à atividade das pulsões dadas constitucionalmente. E a diferença
principal, na natureza dessas pulsões, que na neurose são de origem
exclusivamente sexual e, na religião, de origem egoísta (FREUD apud
FILORAMO; PRANDI, 1999, p. 176,).
43
Cf. PIÉR0N, 1972. p. 432. “Mecanismos psíquicos que ocorrem durante o tratamento psicológico,
desenvolvimento de uma atitude complexa por parte do indivíduo, em relação ao psicoterapeuta,
sobretudo sob a forma de reações afetuosas, hostis ou, mais geralmente ambivalentes (positivas ou
negativas). Tais atitudes em vez de constituírem respostas ajustadas à situação real e presente,
assimilam essa situação e conflitos residuais com as pessoas do círculo social e familiar”.
87
A religião era comparada ao complexo edipiano, onde o filho permanecia
dependente do pai e do seu poder. A religião seria a dependência, a necessidade da
presença do primeiro pai, que foi transformado em representação simbólica nas várias
crenças históricas. Ela varia visivelmente de acordo com os valores históricos culturais,
sempre procurando meios para solucionar a situação, aliando o sentimento de culpa
pelo primeiro crime, com a desafiante figura do pai. Para Freud, o cristianismo explica
bem isso. Cristo salva a humanidade contra o pecado cometido contra o pai (o pecado
original), que seria o primeiro crime. Sendo morto, ele reafirma a morte do pai “o próprio
ato pelo qual o filho oferecia a maior expiação possível ao pai conduzia-o, ao mesmo
tempo, a realização de seus desejos contra o pai. Uma religião filial deslocava a religião
paterna” (FREUD, 1999, p. 157).
Somente Freud veio colocar como ponto central das suas pesquisas o
inconsciente, seguindo em muito a linha de Wundt, explicando o comportamento
religioso como também a origem da religião. Para ele, a religião era uma ilusão e
competia à psicanálise, portanto posicionar-se como crítica da religião.
Carl Gustav Jung considera a vida consciente do ser humano, transitória e
limitada e dá ao inconsciente maior importância, quando interpreta suas origens e
valores bastante diferentes de Freud. Não primazia ao instinto sexual, como Freud.
Ele chama de libido ou energia psíquica, uma fonte de energia que satisfaz as várias
necessidades do ser humano. Além de relacionar-se com sua fonte, ela conduz para
um fim, podendo passar por modificações qualitativas. A falta de descarga adequada da
energia acumulada pode levá-la a refluir em nível mais baixo na busca de saída,
88
podendo utilizar determinadas imagens enquanto podem representar outras;
caracterizando, portanto o símbolo.
Em nossa natureza psíquica, uma pequena parte da energia total pode ser
desviada de seu curso natural. Uma parte incomparavelmente maior não pode
ser utilizada por nós, mas sustenta o curso regular da vida. Por isso é que a
libido se acha distribuída, naturalmente, entre os diversos sistemas funcionais
aos quais não se pode subtrair inteiramente. A libido está investida nestas
funções como uma força específica que não pode ser transformada. onde o
símbolo oferece uma diferença de potencial maior do que a natureza é possível
canalizar a libido para outras formas (Jung, 2002, p. 55,).
Jung acredita que o inconsciente do ser humano é uma camada bem superficial,
e que o inconsciente principal seria o inconsciente coletivo
44
.
O inconsciente coletivo é uma parte da psique que pode distinguir-se de um
inconsciente pessoal pelo fato de que não deve sua experiência a experiência
pessoal. [...] os conteúdos do inconsciente coletivo nunca estiveram na
consciência, e portanto, não são adquiridos individualmente, mas devem sua
existência apenas à hereditariedade. [...] o conteúdo do inconsciente coletivo é
constituído essencialmente de arquétipos (JUNG, 2000, p. 53).
O inconsciente coletivo manifesta-se através dos mitos, os quais são
rememorizações, onde são narrados as origens, relacionamentos com o mundo, valores
e reafirmados os poderes das forças sobrenaturais. Os mitos estão carregados de
símbolos e de informações alegóricas. Entre povos diferentes encontram-se mitos
semelhantes por derivarem do inconsciente coletivo.
Os arquétipos
45
são meios que facilitam as elaborações mentais, através dos
quais a energia psíquica é revelada; juntam-se a eles as experiências individuais e as
coletivas. ”O conceito de arquétipo, que constitui um correlato indispensável da idéia de
inconsciente coletivo, indica a existência de determinadas formas na psique, que estão
44
Cf. PIÉRON, 1972, 227 “No sentido junguiano é aquilo que no inconsciente individual provenha de
origem ancestral”.
45
Cf. PIÉRON, 1972, P. 36. “Na terminologia de Jung, são conteúdos do inconsciente coletivo, como
modelos endógenos de conduta e produções imaginativas”.
89
presentes em todo tempo e em todo lugar” (JUNG, 2000, p. 53). A expressão dos
arquétipos pode ser encontrada no mito e nos contos de fada. Neste caso são veículos
que transmitem os fatos através de longos tempos. Os arquétipos representam um
conteúdo inconsciente e modificam-se através da sua conscientização e percepção,
assumindo então a função que pode variar de acordo com a consciência do indivíduo
em que é manifesta.
Os arquétipos formam a organização psíquica e também as categorias do
pensamento simbólico. A partir daí é que surge a interpretação junguiana da religião.
Carl Gustav Jung obteve em seus estudos resultados que enfatizam a
experiência religiosa como fator principal para a integração psicológica (BENKÖ, 1981,
p. 12-13).
A religião, a fé, liga o homem ao sobrenatural, o conduz ao mundo da realidade
invisível. Ao nascer, porém, no homem, ela estabelece nele uma relação real à
maneira das outras relações deste mundo e se projeta no seu comportamento.
A tarefa da psicologia religiosa é a investigação deste “lado humano”. Em
outras palavras: a psicologia religiosa é aquele ramo da psicologia que
investiga as experiências, comportamentos e expressões religiosas sob ângulo
psicológico (BENKÖ, 1981, p.15,).
2.2.2 Elementos Psicológicos que Contribuem para a Cura
Para se entender melhor a questão psicológica das doenças e curas no mundo
religioso é importante entender o papel dos mitos e dos símbolos os quais fazem parte
desta construção.
Os mitos e símbolos, as figuras mitológicas de povos e culturas independentes
entre si devem ser explicados em um inconsciente coletivo” [...]. O
“inconsciente coletivo” junguiano representa uma camada muito profunda da
alma, inata, que é necessário diferenciar do inconsciente pessoal, nascido da
experiência e da contribuição individual (CROATTO, 2001,p. 195).
90
2.3.2.1 O símbolo
O ser humano ”deleita-se com a matéria e nela imerge. Mas se afirma no
espírito.” É como se uma parte de si mesmo escapasse do seu convívio frágil, da
incerteza do tempo e espaço, para posteriormente ressurgir em outro mundo, sendo
corpo e espírito. Seu corpo subjugado à beleza, ao peso e a debilidade do mundo e o
espírito por sua vez, superando o transitório e com isso tentando tomar parte na
imortalidade.
Os vários sistemas filosóficos possuem sua própria maneira de lembrar essa
situação difícil e frágil do ser humano. Uns apresentam a forma dualista que se
contrapõem como absolutas: corpo e espírito, de forma dissociada, e se opõem. Os
gregos consideram o corpo uma prisão e para Platão é a imagem do conhecimento
primoroso onde os espíritos aproximam-se das idéias, mesmo sendo mortais as
pessoas devem contentar com a sombra que se projeta sobre a caverna. Lamartine
ecoou esse dualismo: ”O homem é um deus decaído que se lembra do céu”. O ser
humano estaria à espera da sua redenção e enquanto isso, vivendo na vulgaridade do
corpo e do sexo.
Sábios chineses dividiram o mundo em duas partes antagônicas: Yim e o Yang,
que apesar de aparentemente se contraporem, elas se correspondem, se completam,
às vezes de forma bastante complexa
46
. Essas associações e oposições misturam-se
em um jogo difícil de referências simbólicas. De forma simultânea, o ser humano é e
46
Cf. BEAUCHANP, 1999, P. 42. “[...[ a vida e a morte, a esquerda e a direita, o alto e o baixo, o homem
e a mulher, a noite e o dia, o Sol e Lua, o duro e o mole. Associação e oposição se entrelaçam em
um jogo complexo de referências simbólicas. A tensão das dualidades que fazem com que o ser
humano jamais se decida. Precário, o equilíbrio pode sempre se desfazer”
91
não é, contudo, por um lado ele existe de verdade, pelo fato de ter um nome, uma
fisionomia própria e uma história. Sua existência é inegável. Por outro lado, ela é
instável, duvidosa e incontentável. Ele é carnal e divino. Ele é espírito e corpo, porém
ligado ao tempo e sonhando com a eternidade (Beauchamp, 1999, p 41-42).
A aventura humana é um enigma, jamais totalmente compreendido, jamais
totalmente decifrado. Cada um esclarece uma palavra, uma frase, lança um
pouco de luz sobre uma passagem obscura. Mas o livro como um todo
permanece misterioso, e ninguém conhece a palavra final do enredo
(BEAUCHAMP, 1999, p.43).
Psicologicamente, para esta construção psicorreligiosa, o ser humano necessita
de algo que intermedie o psíquico e o espiritual, tornando de certa forma mais real sua
crença religiosa e essa intermediação é efetivada pelos mitos, símbolos e ritos.
Finalmente, não é o espiritual que aparece primeiro. Mas o psíquico, e depois o
espiritual. É a partir do olhar do imo espiritual interior que a alma toma seu
sentido, o que significa que a psicologia pode de novo estender a mão para a
teologia” (DOURLEY, 1999, p. 05)
O mito e símbolo caminham juntos. O símbolo sempre mobiliza na pessoa uma
certa carga energética e desta forma ele pode ser considerado o mediador, o
transportador de energia dos arquétipos para a consciência. Ele é um elo entre o
inconsciente e o consciente, podendo assim ser traduzido em linguagem segundo a
experiência de cada pessoa.
A recuperação da linguagem simbólica é, neste sentido, essencial para Jung,
porque permite um contato direto e não ameaçador com o inconsciente, onde
as forças vitais da realidade última se manifestam (GIROLA, apud DOURLEY,
1999, p. 9).
È através da linguagem que as pessoas tentam denominar as coisas e fatos com
o objetivo de expressar o que elas desejam comunicar. Em muitas situações,
92
empregam conceitos ou signos
47
que não podem ser descritos e são entendidos
através de suposições. Neste caso determinadas denominações são signos e não
símbolos.
Chamamos de símbolo um conceito, uma figura ou um nome que nos podem
ser conhecidos em si, mas cujo conteúdo, emprego ou serventia são
específicos ou estranhos, indicando um sentido oculto, obscuro e
desconhecido [...] Um conceito ou uma figura são simbólicos quando significam
mais do que indicam ou expressam. Eles têm um aspecto abrangente
inconsciente que nunca se deixam exaurir ou definir com exatidão A causa
dessa peculiaridade deve ser buscada no fato de no estudo do símbolo o
espírito ser levado, em última análise, a representações de natureza
transcendental e diante das quais deve capitular nossa compreensão (JUNG,
1997, p. 189-90).
Diante de fatos e coisas que estão além da compreensão humana,
freqüentemente de forma consciente ou inconsciente o usados conceitos e figuras
simbólicas ao referir-se a elas; além de se utilizar os símbolos eles também são
produzidos nos sonhos. O simbolismo por possuir elementos psicológicos deve ser
motivo de maior aprofundamento (JUNG, 1998, p. 190).
A psicologia junguiana tem se difundido e alcançado simpatia e aceitação no
mundo cristão principalmente para os que estão interessados na restauração da
espiritualidade, e de uma teologia cristã com nova vitalidade; estes encontram no
pensamento de Jung um novo caminho, que descreve a humanidade a partir de um
sentido de realidade divina como também, demoníaca.
Na realidade, a psicologia de Jung repousa, em última análise, sobre a crença
que realmente existem energias arquetípicas que transcendem o ego e que,
quando dele se apoderam, o convencem da verdade e do poder da divindade e
do demônio, ao mesmo tempo (DOURLEY, 1987, p. 12).
47
Cf. CROATTO, 2001, P. 97. Sinal. Parecido com o símbolo, porém não é símbolo em função do seu
significado ser limitado. Ex: cruz = cristianismo.
93
No movimentar dessas energias Jung avista uma via para a totalidade que pode
ser considerada como uma união progressiva de vários componentes do indivíduo, os
quais trazem uma empatia que se estende na relação com o mundo. Jung chamou esse
processo de individuação equacionando a experiência da totalidade em relação à
experiência de Deus, percebendo a expressividade de certos símbolos transpessoais e
transculturais da divindade (DOURLEY, 1987, p.12-13).
Em função do valor que Jung à totalidade como meta de amadurecimento, os
cristãos que apreciam sua visão e desejam revitalizar as tradições, investem nela como
forma de mudança. Acreditam possivelmente que o caminhar rumo à totalidade, seria
um desígnio divino sobre os seres humanos. Os cristãos percebem que preocupando-
se com uma espiritualidade vital tornaria mais imediata e intensa a experiência de Deus
como poder totalizante, existente no íntimo da vida, que se estenderia a uma
recuperação teológica e intelectual de uma antropologia na psique, provocando de
forma mais satisfatória a conjuntura entre o divino e o humano.
Neste caso, percebe-se a importância que Jung aos símbolos e às
expressões míticas, ficando evidente que os poderosos símbolos religiosos, provêm de
uma nascente humana comum denominada por ele de inconsciente coletivo, onde cada
pessoa pode se aproximar, aperfeiçoando sua vida espiritual. Essa experiência levaria
os cristãos a avaliar e dar o merecimento real de todo o simbolismo, entendendo a
realidade de onde os símbolos procedem e para onde se dirigem. A experiência
simbólica vista a partir de uma sensibilidade aprimorada, pode acrescentar algo mais
aos símbolos específicos da tradição cristã.
Este tipo de consciência sendo desenvolvida contribuiria para que os símbolos
cristãos deixassem de ser considerados apenas como revelação; informação de reinos
94
divinos; realidades do além ou interferência histórica da divindade no meio humano,
separados pelo tempo. Poderiam ser experienciadas como expressões da vida psíquica
e espiritual, permitindo assim ao indivíduo achegar-se a este mundo e ser transformado.
Símbolos e mitos que são base para as crenças religiosas, poderiam revelar o poder
transformador dos níveis da vida espiritual e psíquica, que vai além do ego e que
contribui para curá-lo e complementá-lo (DOURLEY, 1987, p.13).
Jung considera o mito cristão como dádiva importante para os seres humanos,
apesar de suas críticas ao cristianismo. Dessa forma, ele desafia os cristãos a irem
além dos limites do cristianismo em busca da própria saúde e a um interesse mais
sublime de preservação dos seres humanos da autodestruição. É incontestável a
admiração de Jung pelo poder psicoespiritual presente no mito cristão, como também a
percepção das suas imperfeições. Esta ambivalência leva a avaliar que o pensamento
junguiano não pode facilmente ser harmonizado com as correntes ortodoxas do
cristianismo, como relata:
Por isso poderíamos concluir que o símbolo produzido espontaneamente nos
sonhos dos homens modernos indica algo semelhante: O Deus interior.
Embora a maioria das pessoas não reconheça tal analogia, provavelmente
nossa interpretação é correta. Se levarmos em consideração o fato de que a
idéia de Deus é uma hipótese “não científica”, não será difícil compreender por
que os homens esqueceram de pensar nessa direção. E mesmo que tivessem
alguma fé em Deus, repeliram a idéia de um “Deus interior, devido à sua
educação religiosa, que sempre depreciou esta idéia, acusando-a de “mística”.
Entretanto, é esta idéia mística” que se impõe a consciência através de
sonhos e visões. Como meus colegas, vi tantos casos que desenvolveram tal
espécie de simbolismo, que não é mais possível por em dúvida sua existência.
(JUNG, 1999, p.63-64).
Para Jung, a experiência do divino é atribuída à atividade arquetípica inata da
psique, alterada em seu sentido, que em função de revelações únicas e estafantes de
95
certa forma despojaram o inconsciente reduzindo suas energias religiosas através de
revelações futuras.
Incorreria um erro lamentável quem considerasse minhas observações como
uma espécie de demonstração da existência de Deus. Elas demonstram
somente a existência de uma imagem arquetípica de Deus e, na minha
opinião, isso é tudo o que se pode dizer, psicologicamente, acerca de Deus.
Mas como se trata de um arquétipo de grande significado e poderosa
influência, seu aparecimento, relativamente freqüente, parece-me um dado
digno de nota para a Theologia naturalis (JUNG, 1999, p. 64).
2.2.2.2 O psicoterapeuta
O psicólogo ou psicoterapeuta, ocupa um lugar altamente importante e simbólico
para a pessoa que o procura. Portador de conhecimento e experiência na condução
dos quadros emocionais doentios, ele acaba sendo visto pelo leigo como detentor de
um certo poder de resolução das problemáticas da sua vida, como também de cura.
Semelhante ao fiel que procura Deus através de uma religião, para obtenção de
determinadas certezas e convicções interiores, resolução dos seus problemas pessoais,
materiais, econômicos, sentimentais e mesmo cura emocional e física, é também o
paciente que procura o atendimento psicológico.
De certa forma, ao procurar um psicólogo a pessoa está munida de
determinada certeza e confiança, que poderia se chamar também de fé. De alguma
forma, chegou até ela informação da praticidade profissional do psicólogo, como
também dos resultados que uma psicoterapia pudesse trazer a quem a busca, como:
testemunho de pessoas que passaram por psicoterapia, obtendo bons resultados;
informações através de rádio, televisão, revistas, jornais, livros ou Internet; a partir de
96
um diagnóstico de profissional de outras áreas, com possível encaminhamento ou
mesmo por convicção própria de que a sua problemática seria de origem emocional.
A partir dessa tomada de consciência como fruto da assimilação ou introjeção de
que o profissional da psicologia seria sua nova alternativa para o seu equilíbrio
emocional com possíveis resultados que ela anseia, a pessoa adquire essa
determinada confiança ou fé de que encontrará solução para si.
De posse dessa confiança, o terapeuta passa a ocupar simbolicamente, para a
pessoa, como nas questões religiosas, a posição de uma divindade, semelhante ao
sacerdote, pastor ou pessoa que exercita poder espiritual. Esta confiança facilita o
trabalho do profissional, contribuindo para a cura, pois a pessoa deixa-se estar
disponível para que os processos psíquicos sejam trabalhados, ocorrendo com isso a
cura.
Ao procurar um profissional de psicologia muitas vezes a pessoa passou ou
não por um médico e/ou outros profissionais da saúde e geralmente está carente,
necessitando que alguém lhe ouça e estenda a mão para que ela volte a acreditar em si
mesma. Muitas delas, sendo portadoras de doenças psicossomáticas ou apenas
emocionais, onde nestes casos seus comportamentos trazem prejuízos que afetam não
o corpo, mas também os relacionamentos, a produtividade no trabalho e na vida
social em geral.
Diante dessa situação, o terapeuta torna-se para a pessoa a âncora de salvação.
Simbolizando a divindade e todo o poder que no momento ela não tem, depositando
nele toda a sua confiança e fé. Essa forma positiva de recomeçar a vida é como uma
luz no fim do túnel, é o início de uma certeza que algo de positivo irá acontecer em sua
vida e ela agarra com força essa tábua de salvação e o milagre começa a acontecer no
97
seu psiquismo, com a possibilidade de resultados dos mais variados, segundo a suas
necessidades interiores, dentre esses resultados as mudanças comportamentais e as
curas psicossomáticas.
2.3. POTENCIAIS DE CURA
2.3.1. Cura Religiosa
Para se falar em cura religiosa é importante entender a respeito do milagre, no
qual a cura humana está inserida. Berger esclarece que o milagre pode ser visto de
forma abrangente, e no sentido bíblico são relatados em textos que se referem aos
profetas, figuras enviadas por Deus, dotadas de poder de operar milagres. Os milagres
referem-se a transformações, mudanças, multiplicações e outros, na natureza em geral
ou no âmbito inanimado e inclui também as curas humanas. O objetivo do milagre seria
causar impacto nas pessoas, que de uma certa forma passam a dar-lhe credibilidade;
com isso despertando sua atenção interior, o que pode redundar na crença da
mensagem que lhe é apresentada (BERGER, 2004, p. 43-45).
O milagre traz consigo significado da salvação ou perdição e neste caso a
punição. Berger caracteriza o milagre da seguinte forma: tem relação com “um
mensageiro de Deus e a sua mensagem e aponta para mais além, o invisível; são
sempre visíveis e têm a função de testemunho; no milagre sempre um operador e
um receptor, onde o operador de milagre representa a mensagem e nem sempre ocupa
um cargo religioso, enquanto o receptor está se adaptando com a mensagem; sempre
98
acompanha o milagre o projeto de salvação ou punição; o milagre apresenta a força e o
poder que é impossível aos olhos humanos (BERGER, 2004, p.43-49).
Para Berger, os milagres na cura física, são mais abrangentes apontando para
um acontecimento de maiores dimensões, uma realidade mais profunda e invisível, o
mundo espiritual. Os relatos de milagres apontam para: “[...] dois pólos: a dimensão
corporal e a dimensão espiritual” (BERGER, 2004, p. 14-15).
Para Berger, a fé é força motriz que atua na cura, é a experiência religiosa de
quem recebe o milagre. Ela faz parte do ato da cura, é a parte do ser humano e sem ela
não pode haver o milagre. Berger compara com uma balança: de um lado o poder de
quem cura e do outro lado o ato de crer. Portanto, a experiência religiosa é o
instrumento que canaliza e auxilia emocionalmente o indivíduo na busca e conquista da
cura. Jesus quando curou sempre disse: ”a tua fé te salvou”. Presume-se, portanto, que
o ato de crer, está associado à salvação. Salvação por sua vez significa libertação total,
não a cura do corpo, mas, libertação espiritual, social, psicológica e política
(BERGER, 2004, p. 48-54).
.2.3.1.1. Cura no mundo grego
No mundo grego, existia coleção de escritos em prosa ou verso, antologias, as
quais eram utilizadas para celebrar as virtudes e o poder dos deuses em favor dos
doentes. relatos de curas que foram atribuídas a homens extraordinários, divinos,
99
reconhecidos pelos poderes e virtudes que possuíam, celebradas nas aretologias
48
(VENDRAME, 2001, p. 95-96).
Dentre as inúmeras curas atribuídas aos Deuses, algumas tornaram-se famosas
pelo fato de serem gravadas nas quatro estelas
49
do santuário de Asclépio, em
Epidauro, no início do século IV (VENDRAME, 2001, p. 96).
Na relação dos milagres gravados nas quatro estelas do santuário de Asclépio,
em Epidauro estão mencionados: “12 oftalmias, 10 chagas diversas, 9 claudicações
50
, 2
gravidezes difíceis, 4 feridas, 3 afasias
51
, 2 otalgias
52
, 2 lculos, 1 astenia
53
, 1 calvice,
1 tuberculose, 1 epilepsia” (VENDRAME, 2001, p. 96).
Desses relatos, seguem-se quatro que foram citados no livro X. Leon Dufour
54
:
Primeiro: Kleo: a gravidez de cinco anos. Ela suplicou a deus e fez incubação, no
lugar sagrado. Após sair do santuário deu à luz a um menino, que ao nascer foi à fonte
lavar-se e correu em volta da mãe.
Segundo: um homem que não podia mover os dedos da mão exceto um. Ele viu
os quadros votivos
55
do santuário e duvidou e escarneceu as inscrições. Fez a
48
Cf. FERREIRA, 1986, p. 161. Parte da ética que trata das virtudes.
49
Cf. FERREIRA, 1986, p. 719. “Espécie de coluna destinada a ter uma inscrição”.
50
Cf. REY. 1999, p. 153. “Distúrbio congênito ou adquirido da marcha, devido a causas variadas como
traumatismo, infecções, inflamações, doenças neuromusculares ou articulares, etc. Marcha alterada
manifestando-se por desvios do corpo a cada passo para um dos lados; ato de mancar ou coxear;
coxeadura”.
51
Cf. CABRAL, 1971, p. 22. “Diminuição ou perda da capacidade de falar ou comunicar os pensamentos
próprios noutras expressões coerente de linguagem (afasia motora) e diminuição da capacidade de
compreender as comunicações da linguagem (afasia sensorial), em virtude de lesão no córtex. Na
acepção mais ampla, a afasia abrange diversas perturbações da fala, tais como: a alexia, a agrafia e
outras”.
52
Cf. REY, 1999, p. 566. “Dor de ouvido que acompanha as infecções e tumores da orelha externa ou
da orelha média”. .
53
Cf. FERREIRA, 1986, p. 187. “Fraqueza orgânica; debilidade”.
54
CF. VENDRAME, 2001, p.96. “GEORGE A. “Miracoli nel mondo ellenístico”, in X. Leon-dufour (ed),
op. Cit., p. 81-86”.
55
Cf. FERREIRA, 1986, p. 1791. “Relativo a voto. Ofertado em cumprimento de voto ou promessa”.
100
incubação e durante esta teve um sonho no qual estava jogando dado à sombra do
santuário e quando ia lançar os dados, o deus aparece, segura-se a sua mão e estica
os seus dedos e retira-se. Depois sonhou que fazia os movimentos normais dos dedos,
um por um. O deus interrogou-lhe se ainda duvidava das inscrições votivas e ele
certamente perplexo, respondeu: não. Por ele haver considerado as inscrições não
dignas de fé, o deus chamou-lhe de Ápistos
56
. Ao amanhecer, ele estava curado.
Terceiro: Ambrósia de Atenas, cega de um olho. Enquanto andava pelo santuário
ela criticava algumas curas, achando-as inacreditáveis. Considerava que coxos e cegos
não podiam ser curados apenas por terem uma “visão”. Fez a incubação e sonhou que
o deus estava bem perto dela, dizendo que iria curá-la, mas em memória da sua
ignorância, ela deveria pendurar um porco de prata no santuário. Seu olho doente foi
aberto pelo deus, aplicando-lhe um colírio. Ao amanhecer, ela estava curada.
Quarto: Aristágoras de Trezene. Era Portadora de uma tênia, na barriga. Fez a
incubação e sonhou que os filhos do Deus haviam lhe decepado a cabeça e não
conseguindo colocá-la no lugar, enviaram mensagem a Asclépio solicitando sua
presença. Ao amanhecer, o sacerdote constatou que o fato era real. Na noite seguinte
ela sonhou que o deus veio a Epidauro e colocou-lhe a cabaça no pescoço, abriu-lhe o
ventre, retirou a tênia e costurou o seu ventre. Ao amanhecer, ela estava curada
(VENDRAME, 2001, p 96-97).
Os relatos de curas e milagres em Epidauro, não são mensagens para a vida
religiosa e moral do fiel e nem têm o objetivo de instituir uma comunhão entre ele e o
seu deus; porém seu objetivo é despertar a confiança no deus curador, garantindo a
prosperidade do templo (VENDRAME, 2001, p. 97). Essas narrativas dão a impressão
56
Cf. VENDRAME, 2001, p.97. Descrente.
101
de que foram em parte exageradas e transformadas em “narração de uma aventura”.
Contudo elas tiveram uma origem, o surgiram do nada; não se podendo negar que
não tenha havido cura no santuário de Epidauro.
Dos relatos de curas conferidos a sábios e taumaturgos, são famosos os escritos
por Filóstratos, atribuídos a Apolônio de Tiana, nascido por volta do ano 4 a. C., viveu
no primeiro século na Palestina. em torno de vinte milagres, sendo a maioria sobre
os doentes e atormentados de demônios. Segundo os relatos Apolônio curou na Índia
um paralítico e um cego; tendo ressuscitado uma menina em Roma (VENDRAME,
2001, p. 98).
O objetivo de Filóstratos ao relatar os milagres é engrandecer a pessoa, a
liberdade, a sabedoria e a natureza divina de Apolônio em oposição à pessoa de Cristo.
Segundo a aretologia, Apolônio é considerado o “deus homem”. Além de taumaturgo
que naturalmente causa admiração às multidões, e mestre que suscita seguidores,
seus milagres têm o objetivo de despertar o leitor a atender ao apelo da sabedoria
(VENDRAME, 2001, p. 98).
2.3.1.2. Cura no Antigo e Novo Testamento
Existe um certo contraste bastante evidente a respeito da cura dos doentes entre
o Antigo e o Novo Testamento. Os doentes nos Evangelhos e nos Atos dos Apóstolos
participam habitualmente como personagens privilegiadas da atenção de Jesus e dos
apóstolos. Enquanto parece que não merecem maior atenção e pouco se fala deles no
Antigo Testamento. As pessoas acometidas de males eram punidas por Deus e “deviam
102
ser evitadas pelos amigos de Deus” (VENDRAME, 2001, p. 34). A solidariedade com os
doentes é como se fosse deslealdade ao punidor, Deus. O doente ficava abandonado e
marginalizado pelo próximo, o que contribuía para aumentar o seu sofrimento, a sua dor
emocional e piorava o seu quadro orgânico. Nestes casos, talvez, a morte fosse uma
das melhores alternativas desejada pelo doente (VENDRAME, 2001, p.34). Contudo,
houve curas no Antigo Testamento. “Na tradição bíblica, acreditava-se que somente
Deus podia curar, pois cura e doença eram vistas como o favor ou a punição de Deus.
Nesse sentido, os profetas curavam por serem agentes de Deus, a exemplo de Elias e
Eliseu” (SCHIAVO; SILVA, 2000, p. 73).
No Antigo Testamento, houve curas através da simbologia, dentre elas, quando
no deserto o povo de Israel blasfemou contra Moisés e contra Deus, e em função desta
desobediência estavam morrendo ao serem picados por serpentes venenosas. O povo,
ao reconhecer que havia pecado contra Moisés e contra Deus, clamou a Moisés e este
a Deus, que o incumbiu de fazer uma serpente de bronze e colocá-la em uma haste, e
todas as pessoas que eram acometidas de picadas de serpentes venenosas ao
olharem para a serpente na haste ficavam curadas, sobreviviam (Nm 21, 4-9).
No Novo Testamento, cumpre-se o messianismo do Antigo Testamento “que
apresenta o Salvador humilde, sofredor, e misericordioso e o viu realizado na pessoa
de Jesus, a expressão da humanidade e ternura de Deus” [...] (VENDRAME, 2001,
p.54).
O programa de Jesus, guiado pelo Espírito de amor e misericórdia, quer a
libertação do homem de tudo que o torna escravo, começando pelo perdão do pecado
que simboliza a raiz de todos os males, e de suas conseqüências: “a miséria, a
103
opressão, a doença e a morte”. Apresenta uma libertação completa, holística e
universal para todas as pessoas (VENDRAME, 2001, p. 54-5).
Jesus curou utilizando toda simbologia como: o toque, a imposição de mãos, a
água, a terra, o poder da sua palavra, e também outorgou poder aos seus discípulos
para curar e expulsar os demônios (Mc 16, 15-18). Ele curou toda sorte de
enfermidades, como registram os evangelhos. Therapéuein encontra-se 43 vezes nos
sinóticos e nos Atos, sempre no sentido de curar [...]. Em todas as outras passagens
esse verbo exprime a cura obtida pela fé e pela oração em virtude da dynamis presente
em Cristo” (VENDRAME, 2001, p. 67).
A proposta de Jesus para o homem era uma cura completa, uma cura
libertadora, não do corpo, mas psicológica, social, política e espiritual. Libertação
também das tradições religiosas, às vezes desumanas que prendiam a pessoa,
deixando-a sem alternativa. Sobre isso, afirma Richter Reimer (2002, p.1234): “A cura é
uma experiência libertadora, ela é vital e ardentemente desejada”.
Os relatos de cura no Novo Testamento podem ser vistos em três categorias: “de
curas propriamente ditas; de exorcismos e de ressurreição ou reanimação [...]. Por
milagre entendemos uma ação surpreendentemente de Jesus e dos primeiros cristãos,
numa situação sem saída, na qual as pessoas de captaram um sinal evidente da
presença de Deus” (VENDRAME, 2001, p. 79-80).
As curas efetuadas por Jesus e seus discípulos eram abrangentes. “A pessoa
curada é pessoa liberta, em condições de viver em plenitude sua vida e realizar sua
missão” (SCHIAVO; SILVA, 2000, p.108).
104
As curas não eram físicas, mas também de ordem espiritual, libertação de
demônios ou espíritos que causavam enfermidades (Mc 16,17; Mt 8,16) e isto causava
espanto e questionamentos.
Através do discurso de Jesus, o povo tomava consciência da condição em que
estava, preso às tradições, à corrupção política e social. Como Jesus veio para libertar
o ser humano em todo o seu contexto, as curas aconteciam e seus apóstolos deram
continuidade.
Jesus utilizou vários tipos de simbologia no ato de curar como: o poder da sua
palavra: a cura da sogra de Pedro (Lc 4,38-39), o homem com a mão atrofiada (Lc 6,6-
11), a filha de Jairo (Lc 8,40-42.49-56), o cego Bartimeu (Lc 18,35-43, os dez leprosos
(Lc 17,11-19), o paralítico na piscina de Bethzata (Jo 5,1-9); a ressurreição de Lázaro
(Jo 11); o poder da palavra e imposição de mãos: o leproso (Lc 5,12-26); o poder da
sua palavra com o perdão de pecados: o paralítico (Lc 5-17-26); o poder da sua
palavra, toque e saliva: o surdo-gago (Mc 7,31-36); o poder da sua palavra e toque: o
jovem de Naim (Lc 7,11-17); o poder da sua palavra, saliva, terra e água da piscina de
Siloé: o cego de nascença (Jo 9); Imposição de mãos: a mulher encurvada (Lc 13,10-
17); imposição de mãos e saliva: o cego de Betsaida (Mc 8, 22-26); o toque na orla das
vestes de Jesus: a mulher com hemorragia (Lc 8,43-48); a do centurião: o servo do
centirião (Lc 7, 1-10); toque: o hidrópico (Lc 14, 1-6).
2.3.2. Cura Psicológica
As curas no mundo antigo e mesmo no Antigo e Novo Testamento, pelo fato da
psicologia não ser conhecida como ciência seriam praticamente impossíveeis de serem
105
diagnosticadas como curas psicológicas. Como vimos nos itens anteriores, muitas
doenças que hoje seriam tidas como psicológicas e psicossomáticas, eram, no entanto,
consideradas conseqüência do pecado, ou atribuídas como possessão de demônio ou
espírito maligno. Atualmente, sabe-se que percentual elevado de curas podem ser
atribuídas como psicológicas.
Nos consultórios de psicologia clínica, isto é um fato. Também nas curas através
da experiência religiosa, está presente o fator psicológico. Muitas doenças
psicossomáticas são passíveis de serem curadas através da fé religiosa, pelo fato de
serem de origem emocional, e, o emocional passando pelo processo de cura, refletir-se-
á no orgânico. Jung afirma “Chamei o símbolo que converte a energia, de ‘imagem da
libido. Como tal, entendo aquelas representações que podem dar uma expressão
equivalente à libido e assim canalizá-la para uma forma diferente da original” (JUNG,
2002, p. 56). Para Jung, o símbolo que converte a energia, pode canalizá-la para outra
atividade diferente da original. Desta forma a energia uma vez canalizada pode ser
direcionada também para a cura.
A psicologia clínica utiliza-se de abordagens e cnicas psicológicas, que no
decorrer do tempo têm provado sua eficácia associada ao forte desejo que geralmente
a pessoa está munida, ao procurar o psicoterapeuta, na eminência de ser curada.
Mediante este desejo, esta confiança que é semelhante à torna a pessoa disponível
psicologicamente para o processo de cura, onde cada psicólogo clínico, nas diferentes
abordagens psicológicas, utiliza-se de técnicas psicoterápicas a partir do estado
emocional de cada paciente, as quais são instrumentos que colaboram para a
efetivação da cura psicológica.
106
2.3.2.1. Simbologia psicológica do corpo
O corpo humano visto pela maioria, de forma tão dissociada do seu todo, é a
sede onde se abrigam também o psicológico e o espiritual. Ele sente, fala, toca e
comunga. E por ser a sede visível e dinâmica da vida, ele também é natureza e como
tal, merece ser visto e tratado de forma integral, e também manter comunhão com toda
a natureza envolvendo o social, o psicológico e o espiritual.
Pela não observação desse fato o ser humano tem se desviado da saúde
integral. “Perdemos a coesão e congruência; mais do que isto perdemos a
transparência. A fragmentação epistemológica
57
também se refletiu no indivíduo e na
sociedade, separando as fronteiras e os conflitos” (CREMA, apud LELOUP, 1998, p. 9).
Leloup como competente psicoterapeuta, psicólogo, filósofo e teólogo francês,
leva-nos a uma aventura clara da condição humana e afirma que o símbolo
aponta-nos para a fundamental tarefa de desvelar sentidos em cada passo da
jornada existencial. O símbolo é o visível que aponta para o invisível, o
trampolim para mergulho do desconhecido. Assim torna possível transmutar a
existência numa criação permanente: [...] O homem é o seu próprio livro de
estudo. Basta ir virando as páginas, até encontrar o autor (CREMA apud
LELOUP, 1998, p. 11).
Geralmente o ser humano encara o corpo como instrumento de vida, de trabalho,
de sucesso e amor. Percebe-se que é importante que o corpo esteja bem para que a
vida venha a fluir, escrevendo-a como uma epopéia única que acrescenta algo ao
universo. Muitas vezes se massacra o corpo, ignorando sua verdadeira capacidade e
necessidade, não dando a atenção devida às mensagens que o corpo transmite.
57
Cf. RUSS, 1991, p. 84. “Sentido geral na França: filosofia das ciências: estudo crítico do conhecimento
científico, de seus princípios e resultados. Sentido nos países anglo-saxões, essencialmente:00
teoria do conhecimento”.
107
[...] ele conta muitas estórias e em cada uma delas um sentido a descobrir.
Como o significado dos acontecimentos, das doenças ou do prazer que anima
algumas das suas partes. O corpo é a nossa memória mais arcaica. Nele nada
é esquecido. Cada acontecimento vivido, particularmente na primeira infância e
também na vida adulta, deixa no corpo sua marca profunda” (LELOUP, 1998,
p. 15).
Mediante as lembranças conscientes, o psicólogo ou terapeuta, levando em
conta que o corpo humano se recorda de todos os momentos vividos, faz uma análise
de sintomas e das psicossosomatizações
58
. Essas lembranças às vezes o
bloqueadas pelas memórias do corpo e do psiquismo. Neste caso, o psicoterapeuta
busca através dos sintomas corporais onde estão alojados a doença e o sofrimento, e a
partir dos símbolos e seus significados, pode chegar à cura das doenças
psicossomáticas.
O psicoterapeuta procura escutar o corpo através de uma anamnese
59
psicológica, observando em quais condições emocionais se manifestam certas doenças
e sofrimentos e quais as sua relações, com os fatos e épocas da vida do paciente.
Leloup considera o corpo como uma escada onde as partes mais altas se
apóiam nas mais baixas; onde as partes mais baixas devem ser estáveis para manter
as mais altas. Considera também o corpo como uma árvore que deve estar bem
arraigada, ter um tronco sólido para sustentação dos galhos, onde a seiva deve
transitar livremente. A base do corpo seriam os pés, que sustentam todo o corpo.
58
Cf. REY, 1999, p. 640, “Manifestações somáticas (orgânicas) de origem psíquica. Que se refere à
influência mental e ou das funções superiores do cérebro (como emoções, receios e desejos) sobre
as funções corporais, principalmente quando relacionadas com distúrbios ou doenças orgânicas; p.
ex: transtornos digestivos psicossomáticos. Diz-se dos distúrbios em que há participação conjunta de
fatores psicológicos e somáticos”. Cf. BALDONI; TROMBONI, 2004.
59
Cf. PIÉRON, 1972, p.25. “Conjunto de informações obtidas por interrogatório feito ao paciente sobre
seu passado e história de sua doença”.
108
Compara a escada da evolução da consciência com escada do corpo, onde cada parte
do corpo é portadora de uma simbologia psicológica. (LELOUP, 1998, p. 18).
2.3.2.2. Cura psicossomática
Segundo Paiva e da Silva
O termo “psicossomática” é em parte conhecido. Uns conhecem a palavra,
outros até sabem o seu significado, mas no entanto questionam, como um
problema ou situação emocional pode converter-se em um doença orgânica
(
PAIVA; SILVA, 1994, p. 4).
Para surpresa, na área da saúde no Brasil, a maioria dos profissionais, conhece
o termo, porém um percentual bastante alto desconhece as causas das doenças
psicossomáticas e conseqüentemente não podem diagnosticá-las. Além disso, muitos
são radicais, principalmente na área médica, chegando a ignorar ou fazer vista grossa
diante dos quadros psicossomáticos, conduzindo o tratamento com terapia
medicamentosa.
Houve progresso, porém não o suficiente, pois é grande a resistência dos
médicos em aceitar o comando das doenças somáticas pelos conflitos
inconscientes. Em conseqüência de nossa experiência clínica (um de nós
quase meio século) verificamos que a conduta de um indivíduo depende, no
mínimo, em partes iguais de suas fantasias inconscientes originárias no
período de molde
60
, pois os conflitos atuais estão, em geral, superpostos aos
complexos existentes na infância, haja vista a hipótese da etiopatogenia
61
das neoplasias
62
. (PAIVA; SILVA, 1994, p. XII).
60
Período de formação da personalidade; período de moldagem da personalidade.
61
Cf. REY, 1999, p. 304. Estudo da origem e evolução das patologias, das doenças.
62
Cf. REY, Tecido anormal e sem significação fisiológica, formado pela multiplicação contínua de células
cuja reprodução deixou de ser regulada pelos mecanismos homeostáticos, apresentando-se em
geral, sob a forma de um tumor que evolui de forma autônoma e quase sempre nociva ao
organismo”.
109
O ser humano é por natureza biopsicossoal e espiritual. Contudo, ele tem sido
tratado desde a antiguidade não como um todo. Dependendo da cultura, eram
enfocadas determinadas partes do seu ser, enquanto as demais passavam
despercebidas. Os principais enfoques eram ou orgânicos ou espirituais. Certas
culturas que se estendem até hoje enfocavam mais o lado orgânico cuidando do corpo,
quando o faziam, pois aí entra a questão da estruturação socioeconômica organizada,
em favor do povo, caso contrário contribui de forma relevante para o aparecimento de
muitas doenças emocionais e orgânicas. Outras culturas enfocavam mais o lado
religioso, a exemplo dos hebreus e dos cristianismos radicais, onde os dogmas e tabus
religiosos eram colocados em primeiro plano, e o orgânico e o emocional passavam
despercebidos, sendo que isso ocorre ainda em nossos dias.
Como vimos o ser humano de um modo geral quase sempre foi ignorado em
relação a sua situação social e psicológica. Este fato sempre ocorreu em todos os
tempos, culturas e sociedades. Com o surgimento da psicanálise e psicologia,
começaram os pequenos passos em direção à cura psicossomática. “Todavia, somente
com os trabalhos de Freud, nova luz veio despertar o interesse da mente-corpo
“misterioso salto”” (PAIVA; SILVA, 994, p. XI).
Diante destes fatos, ao recorrerem aos meios técnicos de saúde, e nem sempre
obterem resultados, as pessoas têm buscado a solução para as suas doenças no
religioso, no sagrado. Surge então a pergunta: o meio religioso oferece solução para
problemas e curas, orgânicas e emocionais? A resposta seria sim. Talvez em parte,
talvez orientação e aconselhamento, oportunidade para a pessoa ser ouvida,
desabafar. Psicologicamente o desabafar apenas, não cura, mas alivia, a carga
emocional. No meio religioso as pessoas menos favorecidas financeiramente, que não
110
podem ir ao médico, e muito menos ao psicólogo; as portadoras de problemas variados
e doentes orgânicos, encontram apoio, são ouvidas e espiritualmente orientadas.
A partir deste momento, começa o processamento da cura psicossomática. As
doenças psicossomáticas têm grande probabilidade de serem curadas, mediante a
atenção e a valorização da pessoa,
[...] quando um doente ou um aleijado ou qualquer pessoa que sofre, encontra
alguém que o aceita tal como é, quando se sente acolhido, ouvido,
compreendido, quando ele reencontra a possibilidade de entrar novamente em
relação com outra pessoa, pode ser que não fique curado, mas estará sim em
vias de ficar bom (CATALAN, 1999, p. 145).
No mundo religioso e espiritual, a rememorização dos mitos, os símbolos e ritos,
inseridos na pregação do amor de Deus, o processo de aquisição mental da fé,
trabalhado pela religião nos cultos de adoração e súplicas, são fatores que muito
contribuem para que a pessoa eleve sua auto-estima, sentindo-se valorizada e capaz
de lutar pela vida, o que conseqüentemente irá minorar sua fragilidade emocional, e, a
conseqüência natural, seria a melhora geral e posteriormente a possível cura das suas
doenças psicossomáticas. Isto naturalmente dependeria do caráter da doença, quando,
como, por que, e, o que a ocasionou, e também a intensidade do desejo e da da
pessoa a ser curada. Naturalmente, quando ela é portadora de doença psicossomática,
passa pelo processo de cura emocional, conseqüentemente, ficará curada também no
seu organismo.
Nos consultórios de psicologia clínica, está provado que o querer do paciente é
meio caminho andado. A pulsão de vida, o desejo de mudança, de recuperação e de
cura, influencia não só emocionalmente como também no organismo. As pessoas
111
depressivas, por exemplo, perdem parte da sua imunidade, e são passíveis em
percentual maior, de serem atingidas por vírus, em função da sua fragilidade e perda
imunológica. Com uma psicoterapia ela readquire ou restaura a sua imunidade. Por
esta razão, submetendo-se a uma psicoterapia ela começa a resgatar todos os seus
valores humanos, ocorrendo então o processo de cura psicossomática.
Ao Concluir este capítulo, observa-se que foi apresentada uma boa noção de
religião e psicologia como também da eficácia de ambas as disciplinas nas curas das
doenças. Após esses momentos, passaremos no capítulo seguinte a investigação de
campo, com alguns estudos de casos de cura com seus respectivos resultados o que
irá contribuir para comprovar ou não as teorias vistas até então.
112
CAPÍTULO 3 COMO SE PROCESSA A CURA RELIGIOSA E PSICOLÓGICA
3.1 VISÃO RELIGIOSA CRISTÃ E PSICOLÓGICA
Neste momento do estudo, é importante considerar-se a análise do ato de fé na
prática; o processo psicológico que nele está presente, e os resultados da ação da
inteligência e da vontade, contidos na prática deste processo. É praticamente
impossível encontrar todas as influências que dificultam ou facilitam o ato de fé. O ato
de crer e as normas morais a ele relacionadas, são o grande mistério, associados à
inteligência e à vontade, exigem uma entrega total do fiel. No exercício dos atos
religiosos “A palavra fé é, não raro, empregada como sinônimo de confiança, de
exaltação interior, de abandono às emoções que nascem do sentimento de realidades
espirituais” (FRANÇA, 2001, p. 13-14).
113
Protestantes e modernistas atribuíram ao termo fé o sentido afetivo, com isso
levando ao despejo o seu sentido intelectual. “Para Lutero, a que justifica é um
sentimento de confiança inabalável nos merecimentos de Cristo que cobrem aos
olhos de Deus a corrupção indestrutível da alma pecadora” (LUTERO apud
FRANÇA, 2001, p. 14). Schleiermacher enfocou mais a religiosidade cristã
fundamentada em um liberalismo radical, muito presente entre os esquerdistas
liberais do protestantismo, o insistindo na valorização do caráter anti-intelectual da
fé. Augusto Sabatier questiona o que é a fé.
É a adesão intelectual a dogmas, ou a submissão a uma autoridade exterior?
Não; é um ato de confiança, ato de um coração de filho que torna a encontrar
com a alegria o Pai que ignorava e que, sem orgulho de espécie alguma, se
sente feliz de receber tudo das suas mãos. Eis o que Lutero encontrou na
palavra de S. Paulo: o justo viverá de fé. Nesta transformação radical da fé,
reconduzida ao sentido evangélico(!!) estava o princípio da maior revolução
religiosa por que passou o mundo depois da pregação de Jesus (SEBATIER
apud FRANÇA, 2001, p. 140).
A doutrina católica concebe a fé, reconhecendo os sentimentos que podem
acompanhá-la, como: “a fé na sua essência, é um ato de inteligência a adesão
prestada a uma verdade revelada”. O concílio vaticano
63
define a fé como:
A [...] é uma virtude sobrenatural, pela qual, prevenidos e auxiliados pela
graça de Deus, cremos como verdadeiro o conteúdo da revelação, não em
virtude de sua verdade intrínseca vista pela luz natural da razão, mas por
causa da autoridade de Deus que não pode enganar-se ou enganar-nos
(FRANÇA, 2001, p.14-15).
A definição clássica da neotestamentária encontra-se em Hebreus (11,1) “A fé
é a garantia dos bens que se esperam, a prova das realidades que não se vêem”.
Percebe-se que a é orientada para o futuro, o invisível. Todo o capítulo 11 de
63
Cf. FRANÇA, 2001, p.15. Densinger, Encbridion symbolorum, Sessão III, c, III. 1789.
114
Hebreus, fala da ancestral como uma rememorização do que foi a sua dinâmica
exercida pelos grandes homens de na história do povo de Israel. A seria então
um ato de inteligência, onde a pessoa aceita um ensinamento outorgado por uma
autoridade considerada divina; como também é um ato livre, opcional, ligado a
vontade e domínio da pessoa. Portanto, a investigação psicológica da fé, muito
contribuirá para a avaliação dos conteúdos contidos na dinâmica dos
comportamentos efetivos.
Para os atuais neopentecostais a exemplo do bispo Macedo a é assim
definida:
Basicamente a fé é uma certeza. Seja ela natural ou sobrenatural, sempre será
um sentimento de certeza absoluta. Se no coração o houver este sentimento
de certeza absoluta, então não se pode considerar este sentimento como fé.
[...] A fé não é emoção, mas certeza! Ela é uma convicção tal, que é impossível
removê-la do coração (MACEDO, 1999, p. 13).
De um modo geral, a luta entre as ciências que não acreditavam na existência de
Deus e os que a reconheciam, pertence ao passado. Sudbrack apresenta o conflito
visto de um novo prisma:
Cada um desses dois domínios da vida reconheceu seu limites e toma cuidado
para não invadir, ilegitimamente, o terreno alheio. Hoje há problemas parecidos
na região fronteiriça entre de um lado a religião e, do outro, a psicologia e a
sociologia (SUDBRACK, 2001, p. 09).
Percebe-se que tanto no meio religioso-teológico como psicológico correntes
que gostariam de reduzir ou eliminar a hipótese de Deus e dos seus feitos.
uma rica literatura psicológica que gostaria de considerar superada a
hipótese de “Deus”, como também literatura religiosa que gostaria de reduzir a
experiência mística em apenas ao fato de informação psicológica para ser
manipulada, ou seja, considerando essa experiência em apenas psicológica.
Desta forma submete-se a manipulações técnicas o que na meditação religiosa
115
é considerado como “Deus”, como ser absoluto, a operacionalização
(SUDBRACK, 2001. p. 11-13).
A tensão entre o diálogo teologia e psicologia, depara-se no aspecto da fé, não
fácil de ser definida cientificamente, principalmente diante dos fenômenos
extraordinárias da fé, como as curas.
O diálogo entre a psicologia e a teologia, porém, vive da tensão entre o querer-
conhecer-e-entender e o mundo do mistério, em que apenas a penetra. É
neste campo de tensão que se situam os chamados “fenômenos
extraordinários que acompanham a mística”. De um lado eles pertencem àquilo
que o saber humano pode atingir analítica e terapeuticamente. De outro lado,
porem, abrem-se para a mística divina que, acima de toda experiência, sempre
continuará um mistério; pois trata-se de Deus (SUDBRACK, 2001, p. 132-133.
A psicologia e a teologia parecem caminhar juntas e ambas contribuem,
favorecem, a questão da cura física e orgânica.
mais de vinte anos interesso-me pelo estudo tanto da teologia quanto da
psicologia. Descobri que cada uma dessas disciplinas ajuda a aprofundar meu
entendimento da outra. Fico sempre admirado ao constatar como os pontos de
concordância entre os princípios espirituais podem favorecer a saúde tanto
emocional como física (BACKER, 2005, p. 9).
O ponto de partida a ser encaminhado, seum diálogo crítico construtivo da
religião, ou seja, da experiência religiosa da cura, e a psicologia; sendo a discussão das
afirmações dos autores e as experiências concretas de cura religiosa cristã vistas de
um prisma psicológico.
3.2 COMO SE PROCESSA A CURA RELIGIOSA.
Existe diferença entre crença e fé. Crença é o assentimento ao testemunho; e a
é o mesmo assentimento ao testemunho acompanhado de confiança. A é um
princípio ativo; é um ato da inteligência e da vontade. A distinção entre crença e
116
avalia-se pela diferença entre as frases “crede-me e confiai em mim” o verbo crer
convém a ambos os vocábulos, e crença. Na bíblia, e crença quer dizer confiança
absoluta em tudo que Deus tem revelado.
Em sentido especial, a fé consiste na confiança que se tem no testemunho que
Deus dá de si mesmo, referente à missão de Jesus Cristo (DAVIS, 1970, p. 222).
No Novo Testamento, a sempre se apresentou de forma dinâmica e concreta,
ou seja, ela era um acontecimento observável e trazia consigo resultados perceptíveis,
resultados estes, que podiam ser considerados como: adesão a uma nova crença
religiosa, que redundava em mudança de vida, de comportamento; certeza, convicção
de salvação; curas emocionais e físicas, das mais variadas; conseqüentemente
mudança social.
Levando em conta como vimos, se à como afirma Davis, acima, é um
princípio ativo e um ato de inteligência e vontade, o seu surgimento ocorre pelo ouvir a
Palavra, a pregação religiosa, os ensinamentos e os testemunhos verídicos de fiéis, na
sua maioria expressos com relevante firmeza e convicção, onde estão contidos os
mitos, os símbolos e os ritos “Pois a vem pela pregação e a pregação é pela palavra
de Cristo” (Rm 10,17).
Nestas circunstâncias, o adepto religioso levado pelas suas necessidades
espirituais transcendentais e também humanas como socioeconômicas, de paz interior,
de relacionamento cotidiano satisfatório e saudável, e de cura para suas enfermidades
psicoorgânicas, após ouvir discursos religiosos e testemunhos convincentes, monta em
sua mente uma certa credibilidade religiosa a que se o nome de fé. Ela é fortalecida
com a rememorização dos mitos religiosos, através da simbologia e dos rituais
religiosos, ou seja, as liturgias. Estas práticas das quais o fiel ouve, e participa, irão
117
no decorrer do tempo contribuir para a sedimentação e efetivação da fé. A partir daí, a
fé torna-se uma experiência pessoal ou grupal, onde o seu exercício redunda em
resultados esperados ou não,. mensuráveis ou não, e mesmo até impossíveis aos olhos
do ser humano desprovido de fé.
Para Vendrame, a proporciona ao cristão uma série de benefícios no âmbito
pessoal e social e possivelmente seja este o motivo que a religiosa se apresenta
como algo tão forte, ao ponto de mobilizar o cristão não a exercitá-la no seu dia-a-
dia mas também utilizá-la em outras situações, e dentre elas poderia ser a cura de
enfermidades.
No âmbito pessoal, a fé promove
:
- a harmonia interior consigo mesmo, com o criador, com os outros e com o
grande Outro;
- o amor que liberta o homem também de si mesmo e das preocupações que
geram o extresse;
-
uma vida conduzida segundo o Espírito, que evita desordens e outros fatores
que geram doenças, como o ódio que corrói os ossos; - o despertar das
forças criadoras e curativas da pessoa;
- o perdão que liberta e dá a paz;
- a simplicidade evangélica e a pobreza que Deus quer, que combate à
pobreza que Deus não quer, Isto é, a miséria que produz ignorância, fome e
doenças (VENDRAME, 2001, p. 214).
No âmbito social, a fé favorece
:
- o amor e a solidariedade para com os outros, com os últimos eliminando a
causa das causas das doenças;
- a justiça que usa todos os recursos para combater a injustiça social, a
ignorância, a fome e a doença;
- a ecologia, o respeito da natureza e das leis da criação, fatores de vida e
saúde (VENDRAME, 2001 p. 214-215).
Este estudo, enfoca um dos resultados da fé que são as curas religiosas
ocorridas entre pessoas adeptas do pentecostalismo. Nesse meio, a cura psicológica e
física, tornou-se um fato que faz parte da praticidade da fé.
O cristão pentecostal acredita piamente que as curas vêm de Deus, curas estas
que deste o Antigo Testamento, ocorreram de forma diferenciada: cura como
118
restauração política e social; cura como perdão das culpas, ou pecados cometidos;
curas emocionais e de enfermidades orgânicas. No Novo Testamento essas curas
aparecem com certa relevância a partir da narração que os Evangelhos fazem das
curas e milagres efetuados por Cristo e além dos inúmeros textos e testemunhos
relatados nos demais livros do Novo Testamento. Enfocam a missão que Cristo
outorgou aos doze apóstolos, extrapolando-as para os dias de hoje.
Ide por todo o mundo, proclamai o Evangelho a toda criatura. Aquele que crer
e for batizado será salvo; o que não crer será condenado. Estes são os sinais
que acompanharão os que tiverem crido: em meu nome expulsarão demônios,
falarão em novas línguas, pegarão em serpentes, e se beberem algum veneno
mortífero, nada sofrerão; imporão as mãos sobre os enfermos, e estes ficarão
curados (Mc 16,15-18).
A cura se processa frente à necessidade do cristão e num clima de confiança, de
fé, adquirida através da pregação do evangelho, onde os mitos são rememorizados e
contribuem para o surgimento da fé e seu fortalecimento, como se segue. Os símbolos
e os ritos como figuras intermediárias fazem parte dessa praticidade. À medida que a
vai crescendo na individualidade, ela vai se fortalecendo. Isto pode ocorrer de forma
individual ou nas reuniões grupais, onde a figura do Espírito Santo, além de ser
altamente exaltada, é invocada pelos fiéis, numa relação de fé, onde acreditam que sua
manifestação, além de torná-los, cheios, potentes, sentem-se preparados por este
mesmo Espírito, para a evangelização (At 1,8). Esta então adquirida pode atuar de
formas diversificadas, dentre elas curando as enfermidades.
Com vimos anteriormente neste estudo, os cristãos pentecostais chamam
essa teofania
64
, essa manifestação do Espírito Santo, quando ocorrida pela primeira
vez de batismo com o Espírito Santo, que é o início para outras manifestações
64
Manifestação de Deus.
119
seguintes as quais dão o nome de renovação espiritual. Baseiam-se em Atos (2, 1-4),
quando ocorreu essa primeira manifestação no dia de pentecostes, do nome dessa
vertente cristã e após essa manifestação, os apóstolos iniciaram sua missão
evangelística, seguida de conversões, curas e milagres registrados no livro de Atos dos
Apóstolos e incentivadas nas epístolas.
Fazem parte também dessas manifestações do Espírito, os dons espirituais 1
Co (12, 4-11), os quais são: mensagem de sabedoria, palavra de ciência, fé, curas,
milagres, profecia, discernimento dos espíritos, línguas e interpretação de línguas.
Estes dons espirituais o altamente almejados e buscados pelos fiéis pentecostais,
através de oração, rogos, jejum e santificação de suas vidas, afastando-se do pecado e
tudo que desagrada ao Espírito Santo.
Munidos de todo esse aparato, concedidos pelo Espírito Santo, o cristão
pentecostal, quer seja líder religioso ou leigo, torna-se um instrumento vivo, de
divulgação dos feitos do Espírito e contribuem para que novas manifestações ocorram,
mediante o ato de invocá-Lo e isso ocorre principalmente nas reuniões de ´louvor,
adoração, oração, onde o louvor é direcionado, assim como a oração e o falar em
línguas estranhas. Embevecidos por esse clima, surgem, batismos com o Espírito
Santo, revelações espirituais, cânticos espirituais, profecias, o falar em línguas
estranhas, interpretação, curas e manifestações das mais diversas. Os rituais
diversificados, de acordo com a tipologia do culto, despertam diferentes modalidades de
fé. Podendo ocorrer em momentos distintos, até na adoração individual, a cura é
enfatizada e a fé mais fortalecida nos momentos de orações específicas por enfermos,
onde a pessoa portadora de doença recebe oração grupal ou individual, com imposição
de mãos ou não, unção com óleo ou não, e onde podem estar presentes outras
120
modalidades de simbologias. Esses momentos ocorrem numa atmosfera altamente
carregada de fé, o clima é de transcendência espiritual, onde as emoções o
expressas de formas diversificadas como: choro, alegria, louvor, sensações corporais
descritíveis ou o, enlevo espiritual e outros; seria um estado de êxtase. È bom
ressaltar que as curas podem ocorrer também em função de outra pessoa por quem o
fiel intercede. Nesta pesquisa não aprofundaremos nestas questões, que merecem
estudo específico.
3.3 OS PROCESSOS PSICOLÓGICOS NA CURA RELIGIOSA
É extremamente trabalhoso e um tanto obscuro, tentar descrever como se
processa a para a cura, vendo do prisma psicológico. Pois como vimos, grandes
nomes da psicologia na sua maioria, preferiram ver a cura religiosa como um processo
apenas psicológico, sendo que a cura religiosa não é apenas religiosa, e o é apenas
psicológica. O que este estudo pretende apresentar são aspectos psicológicos que
estão inseridos no ato da cura religiosa, sem ignorar que esta existe, mas, que ela é
formada, composta, fortalecida e respaldada pelos aspectos psicológicos que a
compõem; tendo em vista que todo comportamento religioso é ao mesmo tempo
altamente psicológico
A convicção de que existe um Deus criador, composto de uma trindade, Pai,
Filho e Espírito Santo, no meio cristão de um modo geral, quase sempre é introjetada
65
no psisquismo desde muito tenra idade. Da mesma sorte o comportamento religioso
65
Cf. CABRAL, 1971, p. 204-05, Mecanismo psicológico, pelo qual um indivíduo inconscientemente
incorpora e passa a considerar como seus objetos características alheias e valores de outrem.
121
cristão é introjetado no psiquismo desde a infância ou a partir do ato da adesão ou
conversão ao cristianismo. Os mitos, os símbolos, os ritos e as liturgias, o também
assimilados pelo psiquismo. Conclui-se que o cristianismo reúne uma gama de
comportamentos que são religiosos e também psicológicos. Além disso, o que leva a
motivação da crença e da são os elementos psicológicos contidos em toda atitude
religiosa.
Muitos fatos religiosos que em épocas anteriores eram atribuídos a Deus, ou a
espíritos e aos demônios, na atualidade graças ao progresso das ciências, podem ser
explicados de outra forma. São fenômenos reais, que não podem ser negados. Hoje
sabe-se que o inconsciente humano tem ação muito poderosa e abrangente, variando
de acordo com as convicções quer sejam positivas ou negativas da pessoa.
Para Freud, os conteúdos do inconsciente reduzem-se às tendências infantis
reprimidas. Sabe-se que a repressão inicia-se na primeira infância através da influência
moral do ambiente, podendo perdurar por toda a vida. Para Jung, o inconsciente possui
além deste, outro aspecto, incluindo o material psíquico que está subjacente ao limiar
da consciência, ou seja, os componentes, psíquicos subliminais
66
, onde podem ser
incluídas as percepções subliminais dos sentidos. Sabe-se também que o inconsciente
é portador de componentes que ainda não alcançaram o limiar da consciência, os quais
serão os futuros conteúdos conscientes (JUNG, 2003, p 03).
Como foi visto no capítulo anterior, para Jung o inconsciente do ser humano é
uma camada superficial, e considera como inconsciente principal o inconsciente
coletivo, que é uma parte da psique que difere do inconsciente pessoal, pelo fato da
sua experiência não surgir da experiência pessoal. Seus conteúdos apesar de serem
66
Cf. CABRAL, 1971, “Abaixo do limiar de percepção. O termo é freqüentemente empregado em
associação à aquisição de um hábito de que a própria aprendizagem não tem consciência”.
122
individuais o de origem hereditária. São construídos de arquétipos, e manifestam se
através dos mitos, onde são reafirmados os poderes das forças sobrenaturais. Entre
povos diferentes encontram-se mitos semelhantes por derivarem do inconsciente
coletivo. Estes mitos estão carregados de símbolos e de informações alegóricas (JUNG,
2000, p. 53 ).
Para Jung, o símbolo é o mecanismo psicológico que transforma a energia e
pode ser considerado como a expressão individual do arquétipo. O símbolo é o meio
que fornece a possibilidade de utilizar o fluxo energético para uma permanente
produção de trabalho. “Chamei o símbolo que converte a energia, de “imagem da
libido
67
”. Como tal, entendo aquelas representações que podem dar uma expressão
equivalente à libido e assim canalizá-la para uma forma diferente da original” (JUNG,
2002, p. 56).
Os arquétipos são meios que facilitam as elaborações mentais, através dos quais
a energia psíquica é revelada (JUNG, 2000, p. 53). Os arquétipos formam a
organização psíquica e também as categorias do pensamento simbólico. A partir daí, é
que surge a interpretação junguiana da religião.
A religião, a fé, liga o homem ao sobrenatural, o conduz ao mundo da realidade
invisível. Ao nascer, porém, no homem, ela estabelece nele uma relação real à
maneira das outras relações deste mundo e se projeta no seu comportamento.
A tarefa da psicologia religiosa é a investigação deste “lado humano”. Em
outras palavras: a psicologia religiosa é aquele ramo da psicologia que
investiga as experiências, comportamentos e expressões religiosas sob ângulo
psicológico (BENKÖ, p.15, 1981).
O que é vivido pela pessoa na experiência religiosa é um processo psicológico
que as ciências humanas podem alcançar investigando. “A redução metodológica não
67
Cf. PIÉRON, 1972, p. 252. “Em sentido estrito, procura da satisfação sexual. Energia dos instintos “de
vida”, que se distribuem entre o ego (libidonarcisista) e objetos ou pessoas (libido objetal). No sentido
junguiano é energia psíquica, qualquer que seja o seu objeto”.
123
nega o que não alcança: simplesmente cala sobre os aspectos do fenômeno que a
disciplina não tem competência para investigar” (LEPARGNEUR; SILVA, 1997, p. 20).
Para Jung, o conceito primitivo de libido, estaria ligado à idéias primitivas, a
potenciais mágicos, como força objetiva e estado subjetivo, que mostram que os inícios
da formação dos símbolos estão ligados a um conceito de energia. Dentre às
ilustrações apresentadas por ele, para as concepções que os primitivos tinham da libido
ou energia, pode-se salientar as expressões:
Wacanda Os índios Dacota concebiam-na como “força”: o sol, a lua, o trovão, o
raio, as estrelas, o vento, os homens, os fetiches, objetos de rituais, várias categorias
de animais e localidades da natureza. O termo wakanda, a principio, pode ser
entendido como “mistério”, apesar de dar sentido limitado. Pode também significar
“força, santo, velho, grandeza, vivo, imortal”. O termo oki usado pelos Iroqueses e
manitu pelos Algonquins, possui uma equivalência a “força” ou energia psíquica.
Wakanda é a concepção de uma energia ou força universal, difundida por toda parte,
invisível, mas manipulável e transferível”. Desta forma o primitivo vivia em função de
adquirir essa força de forma a suprir sua existência (JUNG, 2002, p. 69).
Wakan – utilizado pelos índios da América do Norte possui um sentido de
relação energética. A pessoa tornava-se wakan através do Jejum, oração e visões. As
armas de um guerreiro recebiam orações antes de partir para a luta e por essa razão se
tornavam wakan (forte, cheias de libido), não podendo ser tocadas por uma mulher.
Wakan determina “a conexão entre o visível e o invisível, entre viventes e os mortos,
entre a parte e o todo de um objeto” (FLETCHER apud JUNG, 2002, p. 71).
Mana utilizado pelos Melanésios, significando uma força ou influência
sobrenatural. Esta força produz tudo que está além das forças comuns do ser humano
124
e dos processos comuns da natureza. Está vinculada às pessoas e coisas e no ato da
sua manifestação produz efeitos que só podem ser imputados a sua ação. O Mana não
está fixo em determinado lugar, podendo ser conduzido para diferentes lugares. Só os
espíritos ou seres sobrenaturais que o possuem e o comunicam. É originado por seres
pessoais e sua ação pode acontecer através da água, pedra ou osso.
Percebe-se que o mana apresenta uma noção de energia, que permite explicar
essas concepções primitivas, e que essas concepções seriam o início da materialização
da idéia abstrata. É inegável que “o mana é uma condição preliminar necessária ou
pelo menos muito importante para o desenvolvimento da idéia de Deus, embora talvez
seja a mais primitiva de todas as condições” (JUNG, 2002, p.73).
Para Lovejoy estes conceitos apontam para “o eficaz, o poderoso e o
criativo”, isto seria “a idéia de uma substância ou energia difusa, de cuja aquisição
dependem toda a força, ou habilidade ou fecundidade excepcionais”. Ela é fecunda,
misteriosa e incompreensível, porque é poderosa em si e não porque os objetos que a
expressam sejam excepcionais ou sobrenaturais que venham a superar qualquer
possibilidade racional. Lovejoy designa estes conceitos de energia primitiva (LOVEJOY
apud JUNG, 2002, p. 72).
Vendo por este prisma, muitas expressões como: alma, espírito, demônio ou
númen
68
, produtores de efeitos extraordinários, pertenceriam ao conceito primitivo de
energia. Para Jung, seria um conceito psicológico de energia e para o primitivo um
fenômeno psíquico que ocorria em íntima ligação com o objeto. A consciência humana
sentia necessidade de representar de forma materializada a dinâmica dos
68
Cf. KÖNIG, 1998, p. 406. Expressão do latim, em português Nume. “O termo “n” tem sua origem na
esfera da religiosidade vétero-romana e designa, por um lado, a vontade divina, o governo da
divindade, e por outro, o ser divino, a própria divindade”.
125
acontecimentos psíquicos, mesmo ainda em estágio bastante primitivo, daí a idéia de
energia. “Por isso, se em nossa psicologia colocamos ênfase no ponto de vista
energético, fazemo-lo de acordo com os fatos psíquicos que se acham gravados no
espírito humano desde épocas primordiais” (JUNG, 2002, p.72-74).
Portanto, entende-se a partir do possível conceito de energia originária desde os
tempos primitivos e atualmente vista de um prisma psicológico, que a relação entre o
fiel pentecostal e a em Cristo para a obtenção de curas, é um composto de crenças
religiosas e fé, onde a energia psíquica, partindo do conceito de inconsciente coletivo,
visto, antes subliminal, é a força mobilizadora que em contato, e sendo fortalecida
pelos mitos símbolos e ritos extrapolam para o consciente, gerando então a fé que
fortalece e frutifica de formas diversificadas, sendo canalizada para funções também
diversificadas, dentre estas formas a fé para a cura.
3.4 ANÁLISE PSICOLÓGICA DOS SUJEITOS
Neste momento do estudo, torna-se importante pontuar questões e elementos
psicológicos presentes em cada sujeito, avaliando-se psicologicamente ou
diagnosticando o estado emocional em que se encontrava o sujeito no tempo que
precedeu a cura religiosa (Cf. resumo de entrevistas no Anexo B).
Sujeito 1 Mary
126
Ela estava vivendo os anos que antecederam a doença, momentos conflituosos
e estressantes, quando se esforçava para adaptar-se às diferenças pessoais, em
relação ao seu esposo, que tinha outros valores culturais. Por ser cristã fiel, lutava para
que o seu casamento permanecesse estruturado e sua relação conjugal fosse
satisfatória, pois a doutrina pentecostal não permite a separação. No entanto, ela não
estava preparada psicologicamente para aceitar e lidar com as diferenças do esposo.
Provavelmente, como bom percentual das pessoas, desejava e queria que seu esposo
tivesse um perfil de personalidade que ela gostaria.
Além disso, percebe-se que Mary tinha sentimento de menos valia, quando alega
que após a cura ”passou a sentir-se mais importante e a valorizar-se mais”. O
sentimento de menos valia provindo da insegurança a deixava triste e insatisfeita e por
que o impotente diante dos desejos e anseios em relação à postura do esposo?
Logicamente, ela poderia obter algumas mudanças comportamentais da parte do
esposo quando mudasse o seu comportamento e a sua postura na relação. A doutrina
pentecostal provavelmente tenha contribuído para que ela mantivesse um
comportamento machista e submisso, o que a afastaria mais dos seus desejos.
Mary passou também por períodos de angústia e depressão quando se sentiu
só, rejeitada, com vergonha, e procurou isolar-se.
A partir desses elementos contidos na personalidade de Mary, pode-se chegar à
conclusão que era uma mulher um tanto vulnerável e associando isso aos fatores
estressantes que vinha passando na relação conjugal, o esforço que vinha sendo
efetuado para a adaptação, a levou a um quadro de estresse e somatização (Anexo C,
Tabela 1).
127
Sujeito 2 Carmem
A história pregressa de Carmem apresenta indícios de uma personalidade
bastante marcada desde a infância, na relação familiar. Não era amada pelos pais, e
estes não lhe passavam nenhum tipo de afeto ou amor. Sentiu-se rejeitada pela mãe
desequilibrada, que a depreciava e a estigmatizava, além de deixar claro, por ser
espírita, que não a amava por serem espíritos inimigos, e também era pouco preferida
pelo pai que também a depreciava.
Possivelmente sentia amor e ódio, pois sua mãe batia nela, e a depreciava, não
passando nenhum afeto. Enquanto isso, poderia buscar apoio na figura do pai. Mas
como? Se era estigmatizada pelo apelido de “filha do Otávio”, o que poderia levá-la a
concluir que não era filha verdadeira do seu pai. Isso fica claro quando ela afirma “filha
que ela era, a filha que ele não gostaria de ter”. Decorrem d alguns sentimentos
altamente prejudiciais a sua personalidade: sentimento de rejeição; sentimento de
menos valia que a levava a se achar feia, diferente por ser dentuça, muito branca, sem
importância para os pais e irmãos o que não lhe permitia valorizar-se pois por não haver
conhecido elogio a sua pessoa ou comportamento e sentimento de inutilidade por ser
de várias formas depreciada.
O comportamento da sua família levou-a à insegurança, quando afirma que
sempre foi uma pessoa insegura. Da insegurança surge o limiar de frustração baixo.
Diante desse conflito interno que Carmem viveu desde a infância, carente de afeto,
sendo pouco amada, seu psiquismo não teria outra alternativa.
Psicologicamente, Carmem era fruto de rejeição materna, paterna e familiar em
geral. Nunca foi valorizada, pelo contrário, diminuída e depreciada. Sentindo-se
128
rejeitada, inconscientemente seu psiquismo converteu a sua dor psíquica em sintoma
orgânico, ou seja, a bronquite asmática, que seria uma forma de chamar atenção dos
seus pais para si. Sua personalidade foi formada com grau relevante de insegurança,
portanto, com limiar de frustração baixo e sentimento de menos valia. Tinha tudo para
ser uma pessoa revoltada, chegando a transtornos sociais esteriotipados e
condenáveis, no entanto seu psiquismo canalizou todas as suas dores e emoções
negativas para o seu corpo, fazendo uma conversão de sintoma, instalando um quadro
psicossomático.
Na religião, Carmem fez psicologicamente uma transferência da figura do pai
para a figura de Deus onde ela conseguiu amar a Deus e inconscientemente ela pôde
amar o pai. Enquanto julgava estar amando Deus e sendo amada por Este, ocorria a
cura psicológica, pois inconscientemente estava sentindo-se amada pelo pai (Anexo C,
Tabela 1).
Sujeito 3 Débora
Após várias tentativas para engravidar, sem obter êxito, Débora estava
psicologicamente frustrada e infeliz. As cobranças sociais, da família e do esposo
levaram-na à insegurança, e sentimento de menos valia, pois a maternidade além de
ser algo desejado por ela, era também esperado por todos e o fato de não poder
corresponder a tanta expectativa a angustiava. A insegurança a levou a temer que seu
esposo pudesse abandoná-la por outra mulher que lhe correspondesse ao desejo de
ser pai. Como conseqüência dessa insegurança teve medo da perda do esposo e
passou a ter ciúmes, o que complicava mais o relacionamento conjugal.
129
Incerta da possibilidade de ter filho sentiu sua vida desmoronando, e por esta
razão foi entrando em quadro depressivo. Dentre os seus sintomas depressivos,
Débora apresentou principalmente isolamento, compulsão pelo cigarro e compulsão
alimentar, o que contribui para o aumento de peso e isto aumentou sua baixa estima,
quando se sentia “deformada”.
A resposta pós-cirúrgica e definitiva soou para Débora como uma perda também
definitiva, o que contribuiu para piorar o seu quadro depressivo. Ao alegar que sentia
como “se faltasse uma parte do seu organismo”, vê-se atingida como mulher, não
correspondendo o que naturalmente a natureza feminina proporciona, ser mãe, que ela
tanto desejava; o que contribui para baixar sua auto estima e elevar mais ainda seu
quadro depressivo.
Débora era uma mulher forte e de personalidade determinada, o fato da
esterilidade, aos poucos foi obstruindo suas esperanças e os seus sonhos de ser mãe.
Tornou-se uma mulher psicologicamente vulnerável, suscetível às doenças
psicossomáticas, com um prognóstico de vir a adquirir novas doenças e de piorar o seu
quadro depressivo (Anexo C, Tabela 1).
Sujeito 4 Fernando
Por ser muito saudável, a doença pegou Fernando de surpresa. A princípio não a
levou a rio, porém à medida que os sintomas foram evidenciando começou a
perceber que não estava bem de saúde. Para ele, emocionalmente não foi fácil admitir
130
e procurar um dico. A surpresa foi maior com o diagnóstico: ou fazer a cirurgia com
alto grau de risco ou tomar a medicação por toda a vida.
Apesar da doença de Fernando não ser de origem emocional e sim transmitida
pelo uso da carne suína, percebe-se, que o quadro da doença em si contribuiu para a
origem de doenças emocionais, agravando mais o seu estado de saúde.
Denota-se um alto grau de perda em alguns aspectos: na saúde física; no
trabalho com improdutividade; conseqüentemente na vida financeira; no relacionamento
em geral com descrédito; perda moral e no lar. Com isso ele foi perdendo a motovação
e o referencial de vida.
Esses fatores contribuíram para frustração de Fernando, com sentimento de
menos valia, passando a sentir-se dependente e inseguro, aos poucos foi perdendo sua
auto confiança. Foi se tornando vulnerável e suscetível a outras doenças emocionais,
no caso a depressão que possivelmente também fez parte do seu quadro.
Fernando também era portador de sentimento de culpa, quando no seu desafio
a Deus, disse: “abandonarei todas as coisas erradas, todas as práticas erradas”.
Possivelmente, de forma inconsciente, sentia necessidade de ser punido pelo que fazia
de “errado”, segundo ele, os vícios, e principalmente a prostituição. Isso ficam bem
claro quando ele interrompia a medicação e voltava a sentir os sintomas. Precisava
inconscientemente ser punido, sofrer (Anexo C, Tabela 1).
3.5 ANÁLISE PSICORRELIGIOSA DAS CURAS RELATADAS
As curas religiosas pentecostais ocorridas nos relatos (Anexo B), são fatos
incontestáveis. Contudo, além de se perceber elementos psicológicos mobilizadores e
131
reforçadores dos impulsos e comportamentos de , os quais contribuíram para a cura
religiosa, os próprios entrevistados admitiram haver elementos psicológicos presentes
no seu caminhar em busca da cura e no ato dela, vejamos.
Sujeito 1 Mary
Psicologicamente, Mary estava bastante vulnerável, apesar de ser pentecostal
praticante. Estava não fragilizada emocionalmente como espiritualmente. Seu
esforço para compreender o esposo e manter o casamento a levou a um quadro de
estresse, onde além da ansiedade estava presente a depressão, tudo isso em função
de uma personalidade insegura, com sentimento de menos valia, que bloqueava a
possibilidade de ter uma postura adequada na vida conjugal. Seu psiquismo não teve
alternativa a não ser converter sua situação em sintoma orgânico, doença
psicossomática.
Doente, Mary estava derrotada, arrasada, sem força física, emocional e
espiritual. Apesar de toda a sua experiência religiosa era impossível reagir, mesmo
espiritualmente. O momento chega. Mary sem encontrar alternativa na medicina
alopata, estava sem esperança. Com certeza tinha ido a outras reuniões de oração,
mas só nesta reunião, que o milagre se realizou.
A mulher que estava presente na reunião, viu fogo nas mãos da pastora. Esta
visão, e o imperativo de que a pastora deveria colocar as mãos no abdome de Mary,
mobilizou psicologicamente sua fé, era algo inédito, porém sonhado. O poder e a
sacralidade da palavra, o simbolismo psicológico do fogo que tem como objetivo
queimar suscitaram no psiquismo de Mary, aespiritual, que não deixa de ser também
132
psicológica, que brotou renascendo em Mary, de forma quase instantânea a motivação
e a pulsão de vida, conectando-se energeticamente com seu organismo. É bom
ressaltar também o poder simbólico espiritual e psicológico da pessoa da pastora, que
naquele momento ocupava simbolicamente o lugar da divindade para efetuar o milagre;
também a imposição de mãos sobre Mary, o toque que simboliza a transmissão
energética de poderes divinos. Mary começa sentir o “queimor interno”, que vinha de
dentro para fora e desfalece. Possivelmente ela teve um momento de êxtase espiritual,
onde seu psiquismo inconscientemente atuou canalizando sua libido segundo Jung
para, o processo de cura.
Interessante que ao voltar a si Mary sabia que estava curada, chorava e sentia
diferença no seu corpo. Como reforço houve a segunda visão, que um anjo ou ser
celeste fazia-lhe uma operação enquanto ela estava desfalecida.
Houve uma hierofania e de fato uma cura, a partir do poder da palavra com suas
possíveis conseqüências, o relato da visão como elemento mobilizador e fortalecedor
da que estava até então enfraquecida, como também ritos (oração) e simbologia
religiosa com imposição de mãos. O ato de fé religiosa foi visível, como também,
estiveram presentes elementos e comportamentos psicológicos que contribuíram para
que Mary cresce e permitisse tamanha mudança no seu interior psíquico e orgânico, ou
seja, a auto confiança readquirida. Pode se observar a indução mental em relação à
simbologia do fogo, quando Mary sente “queimar” o seu organismo de dentro para fora.
Provavelmente, se na visão não houvesse fogo ela não sentiria o “queimar”.
Mary, no período pós cura, teve várias alterações na sua vida: alterações físicas,
voltando o ânimo, a disposição e a energia, passou a sentir-se forte; tudo voltou a
normalidade; no relacionamento familiar e conjugal melhorou muito; emocionalmente
133
passou a ter alegria, paz e refrigério; na vida social voltou a exercer suas atividades que
estavam interrompidas. Mary realmente passou por um processo de libertação total, sua
cura abrangeu as áreas física, emocional, espiritual e social da sua vida (Anexo C,
Tabela 2).
Sujeito 2 Carmem
A historia de Carmem foi uma experiência bem diferenciada, trazendo consigo
outros indicadores psicológicos e religiosos. Ela não era religiosa praticante, mas cria
em Deus. Procurou a igreja em função da sua enfermidade, após, todas tentativas
possíveis junto à medicina. Ao começar a freqüentar uma igreja descobriu que era uma
mulher doente não fisicamente, mas emocionalmente. Isso ocorreu à medida que
freqüentou os cultos, foi conhecendo a Palavra, sua mente foi se abrindo e percebendo
que possuía doenças emocionais e que isso contribuía para o círculo vicioso da sua
bronquite asmática.
Sua cura o foi de chofre, mas gradativa. Reconhece que ”houve vários
elementos psicológicos como componentes da sua cura. O conhecimento da Palavra de
Deus e o contato com uma religião foi para ela um mundo novo”. Nesse seu novo
momento ouvia as pregações, os relatos ou testemunhos dos demais fiéis, as músicas
e os louvores sacros, toda a liturgia dos cultos e as promessas de Jesus na Palavra.
Todo esse conjunto de ritos e símbolos, fortaleceram sua fé, seu espírito. A
rememorização dos mitos religiosos, os símbolos e os ritos aos poucos foram sendo
assimilados por Carmem, como elementos psicológicos que contribuíram para mobilizar
e suscitar sua fé.
134
Conheceu o projeto de Deus para o ser humano e foi se libertando, de “coisas” e
“problemas” ou vendo-os de uma outra ótica. Carmem acredita que à medida que foi
curando-se emocionalmente ocorreu também a cura física. Ela acreditou na cura na sua
totalidade: corpo, emoções e espírito.
Contudo, houve dentre outras simbologias um elemento marcante para Carmem:
o copo de água mineral consagrada que recebeu do pastor afirmando que “a água
daquele copo ia servir-lhe de benefício”. Acredita piamente que o copo de água
contribuiu para curar a sua bronquite asmática, lavando sua vida de tudo que era ruim,
que não agradava a Deus, que entristecia o Espírito Santo, enfim todo o seu ser. A cura
porém, não ocorreu no ato de tomar a água, mas de forma gradativa. Carmem por ser
uma mulher culta, a princípio, tomou consciência que estava também emocionalmente
doente, precisou assimilar as promessas divinas, aceitar e extrapolá-las psiquicamente,
canalizando-as em forma de energia para o seu organismo também doente.
Carmem deixa claro nos seus relatos que se curou emocionalmente e
paralelamente foi ocorrendo a cura física. Psicologicamente, a cura de Carmem teve
elementos psicológicos presentes e bem claros, como a simbologia da água que
recebeu do pastor: A água é vida, e também lava, como ela expressou. Tomou a água
consagrada e creu que esta água a lavou, a purificou e a curou, pois simbolicamente é
esta a função da água: dar vida, lavar e limpar. Fica subentendido também o sentido
simbólico espiritual que seria lavar e limpar as culpas, os “pecados”, curando também o
seu espírito. Este componente físico e ao mesmo tempo simbologia psicológica, com
certeza foi o elemento mobilizador inicial da sua fé. A Palavra mais uma vez torna-se
imperiosamente poderosa “iria servir-lhe de benefício”, palavra do pastor. Percebe-se
que a simbologia da água foi eficaz a partir do seu propósito simbólico. Inconsciente,
135
Carmem permitiu a ação simbólica da água, no seu interior: psíquico, orgânico e
espiritual.
Não se pode descartar também o poder psicológico presente, gerado e
fortalecido pela rememorização dos mitos, símbolos e ritos, nos cultos religiosos, que
contribuíram para fortalecimento da sua fé espiritual e auto confiança; o poder da
palavra e da melodia na música sacra bastante indutora, que geram imagens mentais e
emoções de acordo com o estado emocional e a crença de cada pessoa. Também a
simbologia da pessoa do pastor que denota pessoa sacralizada pela sua função e que
psicologicamente simboliza a figura e o poder de Deus.
Psicologicamente, o freqüentar os cultos, participar de todo o ritual religioso
contribuiu para levar Carmem à cura psicológica e da bronquite asmática. As
alterações e resultados positivos que seguem o período pós-cura foram vários (veja
anexo B), o que comprova que Carmem foi curada da bronquite, dos traumas e marcas
emocionais. Houve uma transformação radical em sua vida (Anexo C, Tabela 2).
Sujeito 3 Débora
Diante da impossibilidade de ser mãe e na esperança de que algum tratamento
viesse trazer-lhe resultado positivo, Débora esgotou suas forças físicas e emocionais
nessa luta, sofrendo também cobrança por não ter filho, que a pressionava e a levou a
entrar em um quadro de estresse. Seu estresse foi acumulativo, onde bora teve
ansiedade e depressão, fortalecidos pela insegurança e o sentimento de menos valia.
Após a cirurgia e a retirada dos cistos dos ovários, veio um pequeno tempo de
esperança, que durou pouco, pois logo recebeu a notícia que não ovulava mais e não
136
poderia ter filhos. Essa notícia foi um baque para Débora, que perdeu de vez suas
esperanças. Por sentir-se impotente não podendo gerar filho, na sua insegurança,
começou com o comportamento de ciúme e sua vida conjugal que estava abalada foi
desabando-se e conseqüentemente o seu quadro emocional.
Não encontrando alternativa na medicina, Débora procurou a cura religiosa. Ela
não era pentecostal praticante, A vigília
69
em que ela recebeu a cura era um momento
muito propício, pois no meio pentecostal, a vigília é um momento destinado a “buscar a
Deus”. Normalmente, nestas reuniões, os louvores são orientados para a invocação de
Deus e do Espírito Santo, como também a pregação e principalmente o momento em
que os fiéis oram, pois estão abertos às manifestações do Espírito Santo. Nestes
momentos pode se detectar elementos psicológicos interagindo.
O pastor estava orando pelas pessoas. A oração é um ritual, um elemento
psicológico, que muito contribui para a mobilização e o fortalecimento da fé. Para o
pentecostal seria falar diretamente com Deus sem intermediários. Neste momento,
podem ocorrer teofanias, batismo com o Espírito Santo e o falar em línguas estranhas.
É momento às vezes de muito êxtase espiritual e de muita emoção como alegria, choro
e outras modalidades de comportamentos.
A figura do pastor, naquele instante, simbolizava um instrumental sacro que
poderia ser usado por Deus, simbolizava poder e por que o o próprio Deus? “Ele
anunciou que teve uma revelação e o Senhor estaria curando três pessoas. O pastor
afirmou que o Senhor lhes estaria abençoando, e para uma pessoa especificamente Ele
estaria dando a maior dádiva de sua vida”. Além da simbologia de poder que o pastor
ostentava percebe-se o poder da palavra. Palavras indutoras, como que mágicas as
69
No meio pentecostal esse termo é utilizado para dar nome à oração e busca a Deus, que os fiéis
fazem durante toda a noite.
137
quais batiam diretamente com a necessidade de Débora, penetrando no seu psiquismo
e sendo assimiladas e canalizadas em forma de energia psicológica para a função
curadora. Débora orou em espírito a Deus pedindo confirmação. Novamente o pastor
insistiu explicando que a pessoa que ia receber a dádiva não tinha ido receber oração.
Mais uma vez a palavra manifesta o seu poder, confirma os pensamentos de Débora e
reforça psicologicamente sua fé.
Débora recebeu a oração com imposição de mãos e unção com óleo, que é
outra simbologia. Ao ser tocada pelas mãos do pastor e ungida, sua foi mobilizada,
adquirindo a certeza espiritual e a sensação emocional que determinada energia divina
estava entrando no seu corpo, no seu ser. O óleo simbolizando o alimento espiritual e a
cura, também foi fonte de energia psicológica e espiritual. Chorou,e tomou posse
70
da
cura pela fé. Sentiu “uma infinita”, espiritual e psicológica, fé que foi sentida no
seu interior, acompanhada de alegria, sentiu que “algo diferente tocou o seu ser.”
Psicologicamente há também o desejo, a vontade que muito contribuiu.
Interessante que Débora não foi curada fisicamente na hora ou o resultado da
cura não apareceu de forma imediata. Primeiro apareceram os resultados e alterações
emocionais e comportamentais. Ela sentiu-se psicologicamente imbuída de coragem
para interromper o tratamento a base de hormônio; conseguiu parar de fumar; mudou a
forma de ver a vida, resultando em mudança em todas as áreas; sua aumentou;
tornou-se mais alegre; tinha certeza que Deus havia efetuado um milagre em sua vida,
e sua vida emocional sofreu mudança total. Contudo a cura efetivou-se um ano
depois quando engravidou. Entre o período que recebeu a oração e a cura, ou seja, um
70
Crer, apoderar-se da bênção desejada pela fé.
138
ano, Débora passou a viver plenamente sua vida emocional. Foi curada primeiro,
emocionalmente.
Finalizando, Débora afirma que: “percebeu que não foi somente sua fé que atuou
na cura, mas houve algo que a ajudou, que partiu do seu interior, que poderia ser do
seu próprio organismo ou da sua mente. Não sabe de onde saiu, mas caminhou junto
com sua fé e a levou ao êxito da cura” (Anexo C, Tabela 2).
Sujeito 4 Fernando
Fernando era um homem incrédulo, não freqüentava nenhuma igreja e nem fazia
nenhuma prática religiosa. Seu único contato religioso era com sua esposa que era
evangélica pentecostal e que às vezes lhe falava de Deus. Era um homem honesto
trabalhador, gozava de plena saúde física e tinha comportamento bastante machista.
quando os sintomas da doença chegaram e foram se agravando, a ponto de
impedir-lhe de trabalhar, é que ele aceitou a doença, e quebrou a resistência de ir ao
médico. O diagnóstico e prognóstico foram arrasadores. Passou a tomar medição
altamente controlada, e conviver com uma doença incurável.
Diante desses fatos, Fernando ficou sem alternativa a não ser tomar os remédios
por toda a vida. Cansado da situação em que vivia, despertou para buscar a cura
religiosa, pois tinha ouvido falar de milagres e curas dessa natureza . É importante
observar que Fernando ao ouvir sua esposa falar desse tipo de cura aos poucos foi
assimilando e introjetando no seu psiquismo, o fato de haver essa alternativa. Como era
incrédulo, a procurou conforme afirma no seu relato (anexo B), quando estava no
fundo do poço.
139
Fernando estava doente fisicamente e não podia mais trabalhar para o
provimento da família. Este agravante psicológico, o transtorno em sua situação
financeira, conseqüentemente causou-lhe muitos danos, e principalmente emocionais,
como também sociais. Sentiu-se inseguro, passou a ter sentimento de menos valia e a
sentir-se um rejeitado, excluído do meio social e possivelmente deprimido.
Sua forma de crer foi bastante atípica. A atuação um pouco distante de sua
esposa foram sementes espirituais e psicológicas, que germinaram, contribuindo com o
desafio que ele fez a Deus. Naquele momento, embora não pareça, ele estava
psicologicamente motivado e possuía algum grau de para fazer o desafio. Fica
bem claro que nem sempre a Palavra é anunciada em forma de discurso público, e que
apesar disso ele a recebeu de alguma forma e a elaborou no seu psiquismo culminando
em fé, em energia psíquica, que redundou na sua cura.
Percebe-se claramente o poder simbólico da palavra pronunciada por sua
esposa “se você prostrar-se diante de Deus, eu te falo, não louvamos a ele, nós
cremos Nele. Certamente ele vai ouvir o seu clamor, a sua oração, e ele vai te
responder”. Foi a partir dessa palavra que estava introjetada no seu psiquismo, que
Fernando reagiu e agiu fazendo o desafio a Deus.
No relato de Fernando pode se observar que a sua cura iniciou a partir do ato do
desafio, mas que ela foi se efetivando emocionalmente. No culto que foi à noite, após o
desafio, sentiu muita paz, confortado, aliviado, pareceu-lhe que as tensões estavam
saindo, sentia-se mais confiante, sua alegria estava voltando. Posteriormente, sentiu-se
imbuído de tamanha coragem e motivação psicológica que tomou a decisão de
interromper a medicação. Percebeu que mesmo sem tomar as medicações, os
sintomas desapareceram.
140
Houve de fato uma cura, não física, mas emocional e espiritual. Ele sentiu até
desejo de confessar sua infidelidade à esposa. Obtendo perdão, ele desfez-se do
sentimento de culpa e espiritualmente sentiu-se livre do seu “pecado” (Anexo C, Tabela
2).
141
CONCLUSÃO
Ao fim dessa caminhada, não temos a pretensão de concluir essa investigação.
Quando se entra no campo simbólico religioso, e se trabalha em nível das
representações, elas lançam-nos para além da objetividade instrumental e nos inserem
num terreno de múltiplos e complexos significados. E ainda, por perceber que a
questão dos elementos psicológicos contidos na cura religiosa pentecostal é um tema
que merece ser mais investigado e aprofundado, pois assim, novos caminhos
poderão ser vislumbrados no mundo da pesquisa trazendo retorno aos pesquisadores e
também à população como um todo.
Compreendemos que nossa amostragem de estudos de casos de cura religiosa
pentecostal utilizada nesta pesquisa, representa uma estatística significativa, e
acreditamos que ela oferece alguns indicativos que num futuro bem próximo poderão vir
a ser considerados para futuras pesquisas.
O desenvolvimento desta dissertação, com o tema Aspectos psicológicos na cura
religiosa pentecostal, levou-nos a compreender que um dos grandes desafios tanto
religioso como psicológico é admitir que elementos psicológicos estão presentes na
cura religiosa, pois os religiosos vêem apenas a cura como milagre alcançado pela e
a manifestação do poder de Deus, e no mundo psicológico além do pouco interesse
existente pelo assunto, número relevante dos estudiosos de psicologia da religião vêem
apenas comportamentos psicológicos presentes na conduta religiosa e não atentam
que estes elementos psicológicos, além de estarem presentes, eles participam do ato
de crer, da fé e da cura religiosa.
142
È bom ressaltar como vimos, que a pessoa quando chega a procurar a cura
religiosa para o seu organismo conseqüentemente ela está também doente
emocionalmente, bastante fragilizada, portando vários sintomas de caráter emocional,
sendo religiosa ou não. Muitas são portadoras de quadros psicossomáticos ou em
menor percentual a doença física agrava seu estado emocional (Veja ANEXO C, tabela
1).
Nossos entrevistados 75% eram portadores de estresse, seguido de ansiedade e
depressão, portanto mais suscetíveis à doença física. Além desses quadros
emocionais, a maioria era portadora de tristeza, insatisfação frustração; desejos e
anseios irrealizados; sentimento de perda; sentimento de rejeição; conflitos
estressantes; insegurança; sentimento de menos valia; limiar de frustração baixo,
ansiedade; angústia; depressão; conversão de sintoma ou somatização. 50% portavam
sentimento de culpa e inutilidade.
Observando os relatos dos sujeitos entrevistados podemos constatar que a cura
religiosa pentecostal aconteceu de fato, é inegável. Ela é religiosa pelo fato de ter
ocorrido através da fé religiosa sem a utilização de técnicas psicológicas. Percebe-se
também conforme (Tabela 1), que os sujeitos vinham sobrecarregados de
“problemas”, eram doentes emocionalmente anos; portanto vulneráveis, fragilizados,
o que psicologicamente contribui para a origem de muitas doenças psicossomáticas.
Desta forma, ao iniciarem o contato com todo o aparato religioso pentecostal, para
alguns, desconhecido, a ênfase que é dada à sacralização pessoal, ao poder de Deus
de forma tão imensurável e sem limite de abrangência, o ato de começar a crer e
cultivar uma visão espiritual mais santificada, na busca do crescimento espiritual, inicia-
143
se também não a cura ou crescimento espiritual, mas a cura psicológica seguida
também da cura orgânica como registra o relato de Carmem, Débora e Fernando.
Como vimos nos estudos de casos, em todos está presente o “poder simbólico
da Palavra”. Isto de forma geral ocorre com a rememorização dos vários mitos, fator
que contribui para o surgimento da crença e da , com o ouvir, ou ler ou mesmo
através de informações ou testemunhos, e com o celebrar através de símbolos e ritos.
A pessoa começa a crer e adquirir fé através da assimilação desses conteúdos que são
também psicológicos, os quais são elaborados e canalizados em seu psiquismo.
Diante dessa premissa, ao analisarmos os dados de nossa pesquisa de campo,
constatamos que a cura religiosa pentecostal não é apenas uma cura religiosa, um
milagre religioso, ela está permeada de elementos psicológicos os quais, na sua
eficácia mobilizam ou reforçam, como também canalizam a libido para que esta se
transforme em energia psíquica capaz de efetivar várias atividades psíquicas, dentre
elas a cura física ou emocional. Desta forma, as doenças são curadas, principalmente
os quadros psicossomáticos, sendo restabelecida a saúde da pessoa.
A cura, o ato da cura, como se processam esses milagres, e a presença de
elementos psicológicos no processo de cura, é o ponto central da nossa pesquisa
Portanto, torna-se necessário aglutinar esses fatos para termos uma idéia final dos
resultados alcançados na nossa pesquisa (Cf. Anexo C, Tabela 1 e 2).
A cura religiosa pentecostal é um fato real que acontece entre os pentecostais,
através dos mitos, símbolos e ritos; a simbologia religiosa em geral onde dentre elas
estão: o discurso da Palavra; a memória; a ceia do Senhor; a oração; a imposição de
mãos; a unção com óleo; a manifestação do Espírito Santo; os gestos; o lugar sacro; a
figura do pastor; o louvor sacro com toda a sua instrumentação, gestos e euforia; a
144
afinidade na convivência com os demais fiéis no grupo geral e nos subgrupos e demais
simbologias e liturgias. Todos esses elementos aparentemente apenas religiosos, estão
permeados de elementos psicológicos que contribuem desde a crença e a fé, que
seriam a introjeção da figura de Deus no psiquismo, a indução através de todos os
elementos religiosos citados, a aceitação e a disponibilidade para a cura, a introjeção
de todo elemento religioso no psiquismo, a assimilação destes elementos, a elaboração
e transformação em libido, que por sua vez é canalizada em forma de energia para o
fim proposto, no caso a cura.
Finalizando, podemos afirmar que os resultados encontrados em nossa
pesquisa, corresponderam a nossa tese, pois a cura religiosa pentecostal, segundo os
resultados obtidos nesta pesquisa, está permeada de elementos psicológicos e podem
sim, serem curas psicossomáticas, tendo em vista a situação emocional em que se
encontravam a maioria dos sujeitos antes da cura, levando em conta que após ou
durante a cura os primeiros sinais ou resultados surgidos
foram de ordem emocional.
145
ANEXOS
ANEXO A - ROTEIRO PARA A COLETA DE DADOS DO MATERIAL DE CAMPO
Dados Pessoais:
1 - Nome fictício
2 - Sexo
3 – Idade
4 – Escolaridade
Roteiro de acompanhamento para a obtenção de dados
1 – Que doença o sujeito foi portador;
2 - Como conviveu com a doença;
3 - Buscar na história de vida do sujeito elementos psicológicos que possam ter
sido fatores mobilizadores para o surgimento da doença, o que , como;
4 - Buscar elementos psicológicos que a presença da doença possa ter
mobilizado;
5 - Alternativas de curas procuradas;
6 - O que o levou à busca da cura religiosa;
7 - Passos ou caminho percorridos par obter a cura;
8 - Descrição da experiência religiosa (antes e no ato da cura;
9 - Quais os resultados obtidos;
10 - Descrição da experiência de cura (modalidade, simbologia, etc.;
146
11 - Como o sujeito autopercebeu-se na experiência de cura;
12 – Verificar se após a experiência de cura houve alteração ou mudança na vida;
13 - Buscar elementos psicológicos presentes na experiência de cura;
147
ANEXO B - MATERIAL COLETADO EM CAMPO
Relato de Casos de Cura Religiosa Pentecostal
Os dados abaixo coletados foram entrevistas semi-abertas gravadas, com
utilização de nome fictício escolhido pelo sujeito, conforme o roteiro (ANEXO A). As
entrevistas foram transcritas da forma que o sujeito respondeu a cada questão, com
sua linguagem própria, e posteriormente resumidas e transformadas em relato de casos
pelo pesquisador com fidedignidade, conservando termos e frases próprias do sujeito.
Sujeito 1 - Mary
Mary tem 47 anos, é casada, tem uma filha, é evangélica pentecostal com
escolaridade nível médio. Foi portadora de ncer no útero, oriundo de uma mola
71
. A
doença a incomodou muito. A princípio, sentia enjôo e dor muito forte no estômago,
sendo esclarecida pelo dico que não era o estômago e sim fígado e que este estava
inchado. Sentia moleza, fraqueza, perda de apetite, e pensava que estava grávida;
porque a sua menstruação estava atrasada. Passou por Cais
72
, emergência, sendo
71
Cf. GARNIERE, 2002. Mola Hidatiforme ou vesicular. Altamente reserva-se esse termo para uma
degeneração cística bastante rara das vilosidades coriais de um aglomerado de pequenas visículas,
unidas por filamentos muito finos e contidos por uma membrana. Em geral benigna, a mola dará
algumas vezes origem a um cariocarcinoma (espécie de tumor)”.
72
Centro de atendimento à saúde pelo SUS.
148
depois acometida de uma hemorragia. Em seguida, teve crise de vômito. Não se sentia
bem e considerava o seu quadro horrível, o que lhe causava muita tristeza.
No período que antecedeu e durante a doença sua situação emocional estava
bastante conflituosa, no que se refere ao relacionamento conjugal: muita discórdia
sobre várias questões, o que acarretou grande carga emocional. Os motivos eram
vários, dentre eles a diferença cultural e a visão da vida. Ele não aceitava a sua postura
e isso redundava em discussões, agressões verbais com palavras desagradáveis. Ela
ficava ferida, magoada e sabia que isso era altamente negativo para a sua saúde
No período em que esteve doente, sentiu-se abandonada pelo esposo, pensava
muito na filha, que era muito pequena, e não sabia cuidar de si mesma, pensava
também no esposo. Percebia as pessoas afastando-se dela e que sua família não se
importava muito. Sentiu-se muito só. Sentia vergonha, e por esta razão queria ficar
isolada. Chorava muito, fechava-se. Não tinha vontade de conversar, de falar, de
desabafar. No seu interior só falava com Deus.
É evangélica quarenta anos. Aceitou Jesus como salvador da sua vida
quando tinha sete anos de idade e isso aconteceu devido a uma cura recebida. Sofria
de bronquite asmática e entrou em uma crise muito forte. Recebeu oração ministrada
pelo pastor da sua igreja e no outro dia estava curada. tinha uma história precedente
de cura. Como havia passado por essa experiência resolveu buscar em Deus sua
cura, porque já conhecia Sua eficácia em curar.
Quando começou a sentir enjôo, dor geral no corpo e dor muito forte na região
estômacal, acreditava ser no estômago, moleza total, franqueza, perda de apetite;
procurou um médico. Esteve várias vezes no Cais consultando e também na
emergência. Tomou medicação para cortar o vômito e para a dor que estava sentindo.
149
Vinha para casa e os sintomas continuavam. Voltou várias vezes ao cais para consulta
como também para emergência. Numa dessas consultas de emergência, o médico
pediu-lhe uma ultra-sonografia. No momento que fazia este exame viu na tela do
computador uma palavra por nome mola. Perguntou ao dico que a examinava se
estava grávida e ele disse que depois o seu médico lhe explicaria. Durante esse
período sua menstruação vinha, interrompia e depois voltava. No dia que fez a ultra-
sonografia, após chegar em casa, ter vomitado muito e a menstruação ter descido,
deitou-se e à tarde sentiu uma dor muito forte na região do umbigo para baixo. Tentou
gritar socorro, e o conseguiu, estava sendo acometida de uma intensa hemorragia.
Foi levada para um hospital, levando consigo a ultra-sonografia. Ficou internada,
passou por uma curetagem e o médico não lhe explicou o que era mola. Depois de
quinze em quinze dias fazia uma ultra-sonografia endovaginal e exames de sangue,
retornando ao médico quinzenalmente. Isso foi durante muito tempo. Novamente ficou
internada com hemorragia e um mês depois foi acometida de nova hemorragia.
Continuou com os exames quinzenais e voltando ao médico. Cansada de lutar em vão
contra a enfermidade, resolveu buscar a cura divina.
Começou a orar individualmente pedindo a Deus a sua cura, até que um
determinado dia, participou de uma reunião de oração onde uma pastora estava
presente e orou por ela.
Mary relata que no momento da sua experiência de cura estava em uma reunião
de oração na casa da pastora da sua igreja. Estavam ali orando e uma das mulheres
presentes, teve uma revelação de Deus, uma visão espiritual, afirmando que havia fogo
nas mãos da pastora. Ela disse para a pastora colocar as mãos na região abdominal de
Mary. Quando ela colocou e começou a orar, Mary estava orando, falava mentalmente
150
com Deus, alegando que estava ali porque queria uma cura. Queria algo diferente na
sua vida. Ele podia fazer isso por ela. Mary sentiu algo queimando-lhe dentro e aquele
queimor foi queimando, queimando, queimando e tomando conta do seu corpo. Ela
nunca havia sentido algo assim. Queimava de dentro para fora de tal forma que ela não
suportou e desfaleceu. Ao voltar a si, sentia o corpo leve e chorava muito. Essa mulher
que teve a visão complementou dizendo que, enquanto Mary estava desfalecida no
chão, ela via um anjo fazendo uma cirurgia nela. Quando recobrou o sentido, sentiu-se
totalmente diferente, seu corpo estava leve. Percebeu que algo novo havia acontecido
no seu físico. A partir daquele dia, ela determinou que estava curada e agradecida a
Deus. Confessa não ter sentido mais nada. Isso ocorreu há quatro anos. A partir
daquele momento Mary relata que glorificou a Deus e tomou posse da sua cura. Não
teve mais nenhum sintoma da doença. Hoje menstrua normalmente, não ficou nenhuma
seqüela, e goza de boa saúde.
Após a cura, fez nova ultra-sonografia e outros exames e foi constatado pelo
médico, com os resultados dos exames que estava curada, e ele disse-lhe: dona Mary a
sua mola acabou. Então, naquele momento, ela entendeu que realmente estava
comprovadamente curada.
Os resultados obtidos na experiência de cura física foram seguidos de: alegria,
muita disposição e motivação. Espiritualmente, obteve fortalecimento da fé. Em toda
oportunidade que surge testemunha o seu ato de fé e a cura recebida de Deus. Crê
piamente que foi Deus que a curou. Considera as ciências dicas muito abençoadas,
mas acredita que casos, situações e doenças, que a ciência não pode resolver,
Deus. Agora pode olhar para sua filha e sorrir. Sua vida conjugal mudou completamente
151
para melhor. Está em plena atividade secular e na igreja. Esclarece que os exames e
todo esse fato estão registrados no hospital onde esteve internada.
A partir do momento da experiência da cura, Mary relata que se autopercebeu de
forma leve, sentindo que algo diferente e bom havia acontecido no seu corpo. Chegou
até a apalpar-se para ver se era realidade a mudança instantânea que houve no seu
organismo, em relação ao que sentia antes. Percebeu então que estava totalmente
curada.
Após a experiência de cura, Mary pode observar algumas alterações ou
mudanças na sua vida. Começando no seu físico, houve uma mudança muito grande.
Voltou o ânimo, a disposição, a energia. Começou a sentir-se forte. As demais áreas da
sua vida voltaram ao normal, sendo que em algumas melhorou muito, como, o
relacionamento conjugal, familiar, passou a ter mais alegria, paz e refrigério. Voltou
novamente a exercer suas atividades.
Durante e após a experiência de cura Mary relata que buscou socorro em Deus
porque estava sentindo-se muito pequena e miserável, um ser humano sem nenhuma
condição de ação. A experiência de cura a levou a reconhecer que ela nada podia fazer
de si mesma. Precisou buscar ajuda de alguém que podia mais que ela, de alguém que
está no controle de tudo e que é o dono de tudo, que é Deus. Ela alega ter reconhecido
a soberania de Deus ao apelar para Ele. Afirma que a grandiosidade do amor de Deus
foi confirmada em sua vida. Compreendeu que tem muito valor para Deus e para sua
família e passou a sentir-se mais importante: a valorizar-se e amar-se. Compreendeu
que a experiência de sofrimento, doença e cura que passou, trouxe-lhe a missão de
anunciar às pessoas que por ventura possam estar sofrendo com doenças incuráveis,
que elas podem encontrar a cura em Deus, através da fé.
152
Sujeito 2 Carmem
Carmem tem 55 anos, é casada, mãe de três filhos e tem terceiro grau, e era
portadora de bronquite asmática crônica.
Relata que era portadora da doença desde o nascimento. Acreditava que a
doença fazia parte do seu organismo e por isso aprendeu a convier com ela. Com o
passar do tempo e com a idade a doença foi se agravando. As crises tornaram-se mais
constantes, urinava durante elas e seus filhos ficavam preocupados. Chegava a sonhar
com o fechamento das bricas dos medicamentos que usava como paliativo. Tinha
medo de viajar, de ir num setor mais distante, resolver qualquer negócio. Isso foi
interferindo no seu comportamento, fazendo dela uma mulher insegura. Não podia
entrar em supermercado nos setores de higiene e limpeza, pois esses produtos
provocavam-lhe alergia e mobilizavam a crise.
Certa vez, ela estava em uma papelaria e os papéis provocaram-lhe crise tão
acirrada que perdeu totalmente o controle do organismo. O dono da papelaria ficou
muito preocupado. Forrou todo o piso com jornal e lhe disse: “Dona, a senhora pode
fazer o que a senhora quiser, fique a vontade”. Ela vomitou urinou na roupa durante a
crise. Ficou muito constrangida e envergonhada. Com o passar do tempo, foi sentindo-
se uma pessoa insegura, quase que inválida.
Sempre foi uma mulher cumpridora do seu dever e essas crises estavam
atrapalhando o seu trabalho. Às vezes ia trabalhar doente. Tem uma personalidade
muito persistente e voluntariosa. Certo dia, ela chegou no trabalho e uma menina falou:
“hoje eu vou fazer, vou desempenhar todas as funções da senhora, porque a senhora
não dá conta, eu estou vendo, está estampado no seu olhar que a senhora está
153
doente”, e essa menina a ajudou. Ficou duas horas no serviço e foi vencida pela
doença. Pensava consigo mesma, “não posso deixar de trabalhar”. Ao sair do trabalho,
foi direto a um hospital. Estava inscrita para fazer um curso e precisava estar bem.
Dirigiu-se ao médico falou da sua doença e da necessidade de alugar um “balão” de
oxigênio para não vir a interromper suas atividades. O médico sequer permitiu que ela
voltasse para casa. O resultado dos exames deu pneumonia e pus no sangue. Mesmo
neste estado, estava trabalhando normalmente.
Sobre sua vida emocional, relata que teve a infelicidade de ser filha de uma
mulher que ela o gostaria que fosse sua e. Era uma mulher muito desequilibrada
psicologicamente. Por várias vezes ela pôs fogo no barraco de palha em que moravam.
Seu pai não tolerava mais o comportamento da esposa. Ele saía para o mundo e os
filhos ficavam a mercê da sorte, com a mãe. Seus irmãos contam que ocorria tudo
isso, antes dela nascer. Ao nascer, nos primeiros dias de vida, sua mãe ainda estava
de resguardo, fugiu com ela para o mato, ficando mais de uma semana ausente.
Acredita que seu pai tinha até raiva do procedimento da sua mãe e por isso mandou
seu tio procurá-la. Disse para o seu tio: “Vai Joaquim, vai procurar aquela pata choca,
onde ela foi, o paradeiro dela, carregando essa menina”. Menina esta, que talvez
seu pai nem gostaria de ser pai dela. Quando o tio as encontrou, fazia mais de uma
semana que Carmem, recém nascida estava sendo conduzida por sua mãe, uma
mulher desequilibrada. Em função desse desequilíbrio, obviamente ela não cumpria as
responsabilidades maternas. Não dava carinho para os filhos e os deixava sob
cuidados de outras pessoas.
Sua mãe era espírita. Ia para o centro espírita e instalava-se em barracas de
lona, improvisadas. Quando Carmem era menina sua e lhe falava-lhe claramente
154
que não gostava dela pelo fato de terem sido inimigas em outras encarnações. Alegava
que ambas tinham sido espíritos inimigos. Carmem não entendia bem isso por ser ainda
muito criança. Em função desse fato, foi surgindo um relacionamento hostil entre sua
mãe e ela, que perdurou até hoje.
Afirma que em toda a sua vida foi uma pessoa insegura. Na infância, era
discriminada com o estigma: “branquela filha do Otávio”. Ela não sabia quem era esse
Otávio. Depois tomou conhecimento que Otávio, era dono do centro, onde sua mãe
freqüentava. Na adolescência percebia que sua mãe a rejeitava.
Além de perceber que sua mãe não gostava dela, Carmem afirma que seu pai,
apesar de ser um homem muito íntegro, a quem ela respeita muito como pessoa, que a
criou, cumprindo bem as responsabilidades de pai, apesar de não lhe dar afeto; não
gostava muito dela. Ele a tratava com discriminação, em relação aos outros irmãos.
Tinha uma irmã que era muito bonita e seu pai gostava muito dessa irmã e fazia tudo
por ela. Desde menina, ela o ouvia dizendo: ”a Carmem é uma mercadoria, que vai ficar
na prateleira toda a vida, ninguém vai querer casar com ela”. Desde então, foi se
achando feia, e sentia-se insegura. Tinha enurese
73
noturna, praticamente todas as
noites; seu colchão era podre, mal cheiroso. No outro dia, sua mãe sempre batia nela e
dizia-lhe que depois que ela se casasse iria urinar no marido. Teve enurese noturna até
aos dezoito anos.
Quando foi para a escola, não aprendia e tinha muita dificuldade em
matemática. Aos poucos, foi sobressaindo-se em língua portuguesa e as professoras
começaram a gostar dela. Às vezes chegavam até a pedir-lhe ajuda em questões que
se sentiam embaraçadas. Descobriu que tinha dificuldade em matemática, porém,
73
PIÉRON, 1972 p.144. “Incontinência da urina, quase sempre noturna”.
155
sobressaía em outras áreas. Isso fez bem para o seu ego. Aos poucos, foi vencendo as
dificuldades e descobrindo que não era tão feia, e rejeitada, e sim, muito respeitada na
escola. Além de haver conquistado a admiração dos professores, percebia que alguns
rapazes achavam-na bonita. Sentiu que foi crescendo e conquistando seu espaço.
Alega que se sentia uma mulher segura, porém foi perdendo essa segurança,
em função da presença da bronquite asmática na sua vida, pois sabia que estava
lutando contra uma doença que a poderia levar a óbito a qualquer momento. Isso foi
transformando-a emocionalmente em uma pessoa incapaz, insegura e temerosa de
enfrentar certos desafios. Tinha medo de viajar, de ir a lugar estranho ou afastado que
não tivesse recurso médico. Tornou-se uma mulher limitada.
Em relação à alternativas de cura, constantemente usava remédios da medicina
alopática. Tinha aplicador de aerosol na sua casa e vários remédios que ajudavam na
convivência com a doença. O remédio era paliativo. Ela era internada constantemente,
as crises tornavam-se tão acirradas, que vivia mais no hospital. Depois de internada
ficava até no outro dia em crise, os remédios não valiam mais. Teve uma crise tão forte
uma vez, que a levaram para três hospitais à noite, e nos três recusaram a atendê-la
alegando que não tinham recurso. Nessa noite, por sugestão do último hospital, foi
conduzida por uma ambulância que seus familiares contrataram, a uma unidade de
saúde específica. Foi medicada e conseguiu sair da crise. Acredita ter sido um milagre
de Deus, senão ela morreria naquela noite. Tinha muito medo de morrer e deixar seus
filhos pequenos.
A partir de tantas tentativas, resolveu buscar a cura religiosa. Afirma ser uma
mulher privilegiada pelo dom da . Sempre em toda situação que fugia os recursos
humanos ela confiava em Deus. Para ela, ficou claro que através dos medicamentos da
156
medicina alopática ela o ia conseguir a cura. Consciente disso, recorreu à religião.
Começou a freqüentar uma igreja. Descobriu que era uma mulher doente, não só
fisicamente, mas doente emocionalmente, e que Deus é um Deus que opera cura ao
ser humano em toda a sua totalidade. E nessa igreja ela foi curando-se de todos os
males da sua vida, em todos os sentidos. A doença foi desaparecendo, não de um
sopro, mas foi de forma gradativa. Aos poucos, foi se sentindo uma mulher
emocionalmente segura. Hoje, é completamente saudável e não é portadora de
nenhuma doença.
Como foi dito, sua experiência de cura foi gradativa. Não houve um ponto alto,
um tanto significativo, marcante ou chamativo. Deus não se manifestou na sua vida de
chofre. À medida que foi conhecendo a verdade, a palavra de Deus, ela foi abrindo a
sua mente e descobrindo que era uma mulher doente; não portadora da asma, mas
tinha outras doenças de ordem emocional, e que isso contribuía para esse círculo
vicioso. Desta forma, foi sarando e libertando-se. Hoje, acredita estar mais saudável do
que quando nasceu.
Os resultado obtidos na sua experiência de cura religiosa foram bem
significativos. Hoje, o tem crise respiratória, não conduz bombinha, não tem
medicamento para asma em sua casa, é uma mulher segura, não quer nem saber se
sua mãe gosta dela ou não, se o seu pai gosta dela ou não e se alguém gosta dela ou
não. O importante é saber que ela é a menina dos olhos de Deus e isso a deixa muito
feliz.
Emocionalmente, está sentindo-se muito bem e feliz. Apesar das dificuldades da
vida, está convicta de que sempre vai vencer e até aqui sempre tem vencido, pois
oito anos está curada.
157
Quando ela percebeu que os recursos da medicina eram vãos, procurou uma
igreja pentecostal perto da sua casa. O pastor ofereceu-lhe um copo de água mineral
acrescentando que esta iria servir-lhe de benefício. Ela não podia avaliar naquele
momento, o quanto aquele copo d‘água ia ser precioso para a sua vida. Hoje,
compreende que aquele copo d’água não curou a sua asma, como lavou a sua vida
de tudo que era ruim, de tudo que não agradava a Deus, tudo que entristecia o Espírito
Santo de Deus. Aquele copo d’água lavou todo o seu ser.
A experiência de cura a fê-la reviver. Depois dessa cura, ela sentiu-se como
gente, porque antes era apenas uma máquina que trabalhava sufocada, movida talvez
pelas necessidades do dia-a-dia, para manter sua família. Mesmo sufocada, sentindo
falta de ar, ela tinha que trabalhar. Depois da cura sentiu-se livre dos grilhões da asma,
e ficou mais segura. Sentiu necessidade de abolir da sua vida tudo que não gostava.
Tinha um abdome bastante avantajado e feio. Talvez em conseqüência dos
corticóides
74
que consumia, acumulou muita gordura no abdome. Procurou um cirurgião
plástico e tirou todo o excesso de gordura e ficou na época com um corpinho de
menina. Sentia-se orgulhosa e ao olhar no espelho, achava-se bonita!
Era dentuça, tinha os dentes todos pra fora, e os médicos falavam-lhe que a
asma poderia ser causada por aqueles dentes pra fora, porque dormia com a boca
aberta e aspirava toda a impureza do ambiente. Procurou um ortodontista que corrigiu
os seus dentes. Sentiu-se linda. À medida que se percebia bonita ia sentindo-se mais
segura.
A asma a envelhecera precocemente, tinha muitas rugas. Sabia que aquelas
rugas foram causadas pela asma que a sufocava e oprimia. Sentiu necessidade de
74
Cada um dos hormônios produzidos pela camada cortical das glândulas supra-renais.
158
melhorar a estética do rosto. Procurou um cirurgião plástico que se incumbiu disso.
Seu rosto ficou bonito e rejuvenescido.
As alterações e mudanças na sua vida foram fantásticas, principalmente na área
profissional. Quando ocorreu a cura da asma, estava no final da sua carreira. Sentiu-
se tão bem, que nos dias de aposentar-se estava com um desempenho além do
esperado por todos. Os colegas esperavam que no final de carreira ela estivesse
contando os minutos. No entanto, ela estava com uma prontidão para trabalhar maior
de que quando começou. Foi surpreendente, após a cura, o seu estado de saúde,
emocional e desempenho.
Afirma que houve vários elementos psicológicos como componentes da sua cura.
O conhecimento da palavra de Deus e o contato com uma religião foi para ela um
mundo novo. Freqüentando a igreja, ouvindo as pregações, ouvindo os relatos dos
irmãos, os hinos, enfim todo aquele cerimonial religioso, que participava; ouvindo as
palavras de Jesus, que transmitem não promessas, esperanças, mas certeza; tudo
isso foi fortalecendo o seu estado de espírito. Foi tocando-lhe emocionalmente. Foi
sentindo-se mais segura e crescendo emocionalmente e espiritualmente, vindo a
culminar com sua cura.
Com o conhecimento do projeto de Deus, foi libertando-se de muitas coisas, de
muitos problemas, ou pelo menos convivendo com eles através de uma ótica diferente.
Com a cura dessa doença física, sem dúvida, sentiu-se uma pessoa livre. Através da
religião, passou a viver plenamente porque acredita que só há vida realmente na
verdadeira acepção do termo, dentro do projeto de Deus.
Concluindo, afirma que, à medida que foi curando-se emocionalmente, foi
ocorrendo o processo de cura física.
159
Sujeito 3 Débora
Débora tem 43 anos, é casada, tem duas filhas e ensino médio completo. Foi
portadora de doença ovariana policística
75
.
No início, não quis aceitar a doença, passou um período fugindo.
Posteriormente, começaram a surgir os problemas por parte do seu esposo, pois ele
queria ter filhos, estavam casados mais de dez anos e havia passado um longo
período de vida a dois, era o momento dos filhos. Como ele passou a cobrar muito,
começaram ter problemas conjugais seríssimos, sendo que ela começou a ter
problemas de ordem psicológica. Sentia-se como uma deficiente, como se faltasse uma
parte no seu organismo. Para minimizar a ausência de filhos, utilizou alguns sobrinhos,
levando-os para sua casa, para passar os finais de semana, e estes à medida que iam
crescendo, tinham outras atividades e não podiam mais estar com ela. Ela deu-se conta
de que estava e que os sobrinhos não podiam suprir a falta dos filhos. Resolveu
então buscar ajuda na medicina. Passou por vários ginecologistas, em diferentes
hospitais da cidade e infelizmente em todo tratamento que fez não obteve êxito.
Alega que não teve conhecimento da origem da doença. Desconfiou que algo
não estava certo quando começaram as cobranças, acerca de filhos, pois não usava
anticonceptivo e mesmo assim não engravidava. No período em que tentava
engravidar, buscou várias alternativas. Fez tratamento medicamentoso vários anos,
correção de ciclo menstrual, dosagem de hormônio, submeteu-se a vários exames não
obtendo êxito. Os resultados destes, principalmente da ultrassonografia constataram
75
Cf. REY, 1999, p. 238. Processo multicístico em que numerosos cistos grandes (com até 7cm de
diâmetro) e cheios de líquido formam-se sob a cápsula do ovário. [...] O aumento bilateral dos ovários
ocorre em cerca de 2/3 dos casos, a esterilidade em 3/4 e obesidade em 40%”.
160
que tinha ovário polimicrossístico
76
, que era portadora de cisto nos dois ovários, em
estado avançado de tamanho. Foi lhe indicado uma cirurgia, pois em muitos casos a
mulher engravidava. Submeteu-se a cirurgia, os cistos foram retirados dos dois ovários.
Comtudo, recebeu a triste notícia que infelizmente, no seu caso não acontecia a
ovulação, sendo impossível engravidar.
Continuou com o tratamento medicamentoso. Cada medicação que surgia no
mercado ela fazia uso, porém sem retorno satisfatório. cansada de tentar tratamento
químico que alterava cada dia o seu corpo, via-se também diante da decadência do seu
relacionamento conjugal.
Sentiu-se abalada em todas a áreas da sua vida, chegando a ponto de sair
pouco da sua casa para evitar assuntos sobre mãe e filhos. Esses temas feriam-na
profundamente e não tinha argumento para conversar com as pessoas, preferia o
isolamento, o silêncio da sua casa. Deixou de sair, de estudar, de freqüentar reuniões
sociais, de fazer compras, de cuidar da beleza: como fazer unhas e fazer cabelo.
Sentia-se diferente e inferior às outras mulheres, permanecendo mais em casa e essa
insegurança deu margem ao surgimento de desconfiança do seu esposo, sentindo-se
tomada pelo ciúme, ocasionando conflitos constantes no seu relacionamento conjugal.
Sentia-se deformada, diferente, parece que lhe faltava uma parte essencial do corpo.
Esse estado de humor a prejudicava muito. Começou então a ter compulsão alimentar
e foi adquirindo peso e se tornando aos poucos obesa. Fumava muito, e o cigarro
passou a ser seu amigo de todas as horas. Ao longo do tratamento tomou muita
medicação a base de hormônios, o que contribuiu também para a sua obesidade.
76
Cf. FERREIRA, 1986. Poli: significa “muitos” ou vários”. Micro: Pequeno. Cisto: Acúmulo de fluido
numa parte do corpo; lesão normalmente ovalada ou circular, com conteúdo líquido no seu interior”.
Cistos nos ovários.
161
Depois de dez anos de tratamento, com diversos especialistas não obtendo êxito
no tratamento medicamentoso e nem no cirúrgico, Débora ficou sem alternativa
fechando-se em profunda angústia e depressão. Foi através dos meios de comunicação
que ela tomou conhecimento do testemunho de pessoas em diversas religiões, que
buscaram a cura através da em Deus, e receberam curas e milagres. A partir disso,
tomou decisão de buscar a cura religiosa acreditando que Deus é o Deus do
impossível, e poderia fazer essa obra miraculosa na sua vida.
Na busca da cura percorreu vários caminhos. Iniciou com tratamento
medicamentoso, depois a cirurgia, retomou o primeiro tipo de recurso e como não
conseguiu engravidar, desistiu da medicina. bora nasceu em lar evangélico e era
conhecedora da Palavra de Deus, a qual afirma que Deus é o Deus do impossível, a
Bíblia sagrada relata isso; que Ele pode todas as coisas. Então, ela buscou no Senhor a
sua cura, porque sabia que Jesus tinha poder de curá-la, sendo o Deus do impossível.
Começou a fazer campanhas, percorrer as igrejas evangélicas onde sabia que tinha
missionário ministrando oração para cura; até que foi numa vigília e o pastor teve
uma revelação, afirmando que o Senhor estava dando-lhe naquele momento, a maior
dádiva da sua vida. Débora tomou posse daquela dádiva pela fé. Um ano após essa
oração, ela engravidou. percebeu que estava grávida quando estava passando
dos quatro meses de gestação.
Sua experiência de cura ocorreu a partir de um convite de seu irmão para
participar de uma vigília na igreja dele. Nessa vigília, todos os fiéis estavam orando,
buscando a Deus. Era um momento de fé e de esperança. O pastor estava orando
pelas pessoas que estavam participando da vigília. Ele anunciou que teve uma
revelação e o Senhor estaria curando três pessoas naquela noite. O pastor afirmou que
162
o Senhor estaria abençoando-lhes e para uma dessas pessoas especificamente Ele
estaria dando a maior dádiva da sua vida. bora pensou que poderia ser uma dessas
três pessoas, porém permaneceu sentada no banco. Orou em espírito, pedindo ao
Senhor que se aquela revelação viesse da parte de Deus, que Ele confirmasse para
ela, de forma que ela pudesse entender. Ao terminar sua oração em espírito, o pastor
falou na frente, que a pessoa a quem o Senhor tinha revelado que estaria lhe dando
a maior dádiva da sua vida, permanecia no banco, não tinha ido lá à frente para receber
a bênção. Débora compreendeu que a revelação era para ela. Levantou e foi pra frente
e o pastor impôs as mãos sobre a sua cabeça e orou por ela, ministrando a bênção,
ungindo-a com óleo e Débora em prantos tomou posse dessa dádiva pela fé.
A partir daquele dia, ela sentiu uma alegria diferente na sua vida e muito ânimo.
Deixou de pensar que faltava algo no seu organismo, passando a partir daquela oração,
a considerar-se uma pessoa completa, com organismo perfeito. Creu piamente que
Deus era o Deus do impossível e que na hora certa aquela dádiva tornar-se-ia
realidade, depositando Nele toda fé e esperança. A partir daquele dia sua visão era
outra sobre a vida, filhos e ser mãe. Sentiu o momento de ser mãe. Começou a ver e
encarar a vida de uma forma diferente. Houve mudança no seu lar, na sua vida
conjugal, até quando engravidou.
A cura trouxe resultados positivos para Débora. Ela era dependente de um
tratamento a base de hormônio. A partir do dia que recebeu a oração, nunca mais
tomou nenhuma medicação. Fumava duas carteiras de cigarro por dia, conseguiu ter
domínio sobre o vício, e parar de fumar. Mudou muito sua forma de ver a vida. Passou
a ter alegria constante no coração, nova visão de mundo, e quando percebeu que não
precisava mais de medicamento, não tendo mais vício, pois estava curada, sentia-se
163
um outro ser. Entendeu que recebeu uma cura total. Deus tinha feito um grande milagre
na sua vida, curando não a esterilidade, mas libertando-a do vício, transformando
sua vida interior, sua mentalidade e sua vida psicológica. Houve uma mudança
completa.
Na sua cura houve processos simbólicos. O pastor ungiu suas mãos com óleo,
santo óleo de unção e impôs as mãos ungidas sobre a sua cabeça e orou. Ela sentiu
naquele momento um processo, um procedimento de dentro de si, uma e alegria
infinitas que tomomaram conta do seu ser. Sentiu que daquela unção, daquela
imposição de mãos, algo diferente a tocou, tocou no seu ser, na sua alma e lhe
transformou.
Afirma que a cura trouxe alterações e mudanças na sua vida. Houve mudança
profunda em todas as áreas, principalmente na área da fé. Sua fé aumentou, a partir do
momento que ela aprendeu a crer em algo que não podia pegar, nem ver, mas podia
sentir dentro de si, que um ser inanimado, tinha tocado o seu ser. A mudança foi
profunda porque multiplicou a sua fé. No lado humano teve a felicidade de ver o seu
corpo transformar-se quando a sua barriga começou a crescer, quando pôde sentir os
primeiros movimentos daquele ser que surgiu dentro dela. Tinha gerado uma vida que
para a medicina foi impossível, e quando foi constatado na ultrassonografia que seria
mãe de uma menina, sentiu muita intimidade de tocar no seu ventre e falar com sua
filha, falar do milagre de Deus na sua vida. O sei viver e seu convívio social mudou.
Passou a freqüentar sem receio todos os lugares. Saiu daquela prisão que vivia há
muitos anos, dentro da sua casa. Começou a ter uma vida diferente, no convívio com as
pessoas, podia participar de qualquer assunto, principalmente relacionado à família,
pais e filhos. .
164
Percebeu que não foi somente sua fé, que atuou na cura, mas houve algo que
lhe ajudou, que partiu do seu interior, que poderia ser do seu próprio organismo ou da
sua mente. Não sabe de onde saiu, mas caminhou junto com sua e a levou ao êxito
da cura.
Sujeito 4 Fernando
Fernando tem 49 anos, um casal de filhos, é casado e segundo grau completo.
Foi portador de Neurocisticercose
77
(tinha oito ovos de solitária alojados no
cérebro).
Essa doença causou-lhe uma certa surpresa pelo fato de ser uma pessoa sadia.
Começou a sentir vertigem e tonteira. Na realidade, não eram sintomas passageiros,
pelo contrário, com o decorrer do tempo foi agravando-se e então juntamente com a
família, acharam por bem, procurar um médico clínico geral e este o encaminhou para
um neurologista. Após os exames foram constatados oito ovos de solitária no seu
cérebro.
Essa doença trouxe-lhe muito prejuízo no campo de trabalho; era mecânico e
exercia a profissão 32 anos. Precisava conduzir o seu veículo e dos clientes mas
via-se impossibilitado Sentia vertigem muito forte, apesar de o ser um ataque
epilético, chegava a a ponto de cair. A situação foi tornando-se difícil para ele. O
neurologista propôs-lhe uma cirurgia, porém era muito delicada e arriscada, devido ao
lugar onde os ovos estavam alojados. Poderiam ocorrer seqüelas ou até levar o
77
Cf. REY, 1999. “Cisticercose humana. Infecção e doença muitas vezes grave e mortal, devida à
presenças nos tecidos do homem, das formas larvárias da Tenia Solium. Elas invadem em grande
número a mucosa intestinal e a circulação, indo alojar-se em qualquer parte, mas de preferência no
Sistema Nervoso Central (neurocisticercose) e no globo ocular (cisticercoseocular)”.
165
paciente a óbto. Após a avaliação, a opção foi por tratamento medicamentoso. Eram
remédios controlados, muito fortes, com tarja preta.
Foi portador da doença por um período de cinco anos. Durante três anos sentia-
se mal, guardando o problema consigo, sempre esquivando-se de procurar tratamento
médico. Após procurar os recursos da medicina conviveu com a doença por mais dois
anos, enquanto submetia-se ao tratamento.
No período de cinco anos que ele conviveu com a doença, emocionalmente foi
muito complicado, devido a sua profissão. Foi perdendo a confiança em si mesmo,
porque várias vezes ao dia sentia tonteira e chegava a ponto até de cair no chão.
Sentia medo de levar ou buscar veículo de cliente em determinado lugar ou de conduzir
o seu próprio. Foi sentindo-se frustrado, temeroso, com a sua própria vida e a das
pessoas. Alega ter sido muito difícil porque ele sempre foi uma pessoa que tinha muitos
relacionamentos sociais e com a doença foi se sentindo frustrado e perdido. A situação
tornou-se muito complicada.
Procurou várias alternativas de cura. Quando os sintomas agravaram-se e sua
saúde ficou mais debilitada, recorreu à medicina. Fez vários exames, e a tomografia
computadorizada constatou oito ovos de solitária, alojados no seu cérebro. O
neurologista prescreveu a medicação e ele passou a tomar os remédios controlados, os
quais se comprava com dificuldade, pois tinha que levar talão de luz, pra comprovar o
endereço, apresentar identidade e demais documentos pessoais, porque eram
medicamentos de tarja preta, por tratar-se de medicação com controle rigoroso .
Depois de dois anos, tomando esses remédios controlados, ele sentia melhora.
Não tinha mais aquelas tonteiras. Quando faltavam os remédios por algum motivo, até
166
financeiro, ou às vezes esquecia de tomar então voltava a sentir os mesmos sintomas.
Isso o incomodava muito, pois sentia-se preso às medicações.
Sempre ouvia falar de milagres, de curas religiosas, e cansado da situação
que vivia, começou a despertar para esse lado. Embora não acreditasse muito, mas
segundo ele, quando a pessoa se encontra numa situação dessa apega-se a qualquer
coisa pra se sentir curado.
Percorreu vários caminhos para obter cura. Um cliente que era espírita lhe fez
um convite para que fosse com ele ao Centro Espírita, buscar a cura. Fernando foi com
ele por diversas vezes nas sessões espíritas. O resultado o foi satisfatório, pois não
sentiu melhora nenhuma, pareceu até que os sintomas se agravavam mais ainda.
Então acabou por desistir e ficar aguardando alguma alternativa. Sempre que era
orientado a fazer alguma coisa em benefício da cura ele fazia, utilizava remédios
caseiros e outras coisas mais. Sua expectativa de cura estava sempre de pé.
Sua Experiência de cura religiosa surgiu a partir da sua esposa que era
evangélica. Quando ele passou a ter esses problemas, ela ia muito à igreja fazer
campanhas, orava por ele e insistia para que a acompanhasse. Ele achava difícil devido
ao seu envolvimento com muitas pessoas, gostar de beber e fumar. Afirma que era um
homem muito pervertido sexualmente e adulterava muito. Além disso, ele não
acreditava.
Sua situação foi se agravando cada dia mais e por fim sentia insegurança ade
sair à rua sozinho. Chegou realmente ao fundo do poço; tanto na enfermidade, como
financeiramente; isto porque estava impossibilitado de exercer sua profissão. As
pessoas não confiavam em deixar seus veículos para que ele fizesse o trabalho, a
manutenção adequada, percebendo o seu grave estado de saúde.
167
Certo dia, a sua esposa saiu para fazer compras, e seus filhos também o se
encontravam em casa. Sentiu-se muito triste, angustiado e sozinho. Ele nunca houvera
chegado a uma situação daquela, e nem sequer imaginado. Ouvia muito sua esposa
falar de Jesus e de Deus. Lembrou-se que um dia ela lhe falou assim: “se você se
prostrar diante de Deus, eu te falo, não louvamos a Ele, nós cremos Nele,
certamente Ele vai ouvir o seu clamor, a sua oração, e Ele vai te dar uma resposta”. Ao
lembrar-se dessas palavras ele passava por um momento de grande angústia e
resolveu fazer um desafio. Como estava sozinho, falou em voz alta: “se existe
realmente um Deus que eu vejo tanto esse povo falar, tanto esse povo glorificar, se
esse Deus realmente existe, se Ele me curar de todas a minhas enfermidades, se
restituir a minha saúde, o meu trabalho e tudo que perdi, eu servirei a esse Deus;
abandonarei todas as coisas erradas, todas as práticas erradas e servirei a esse Deus”.
Após o desafio a Deus, Fernando relata os resultados. Explica que no momento
que teve aquela atitude de um homem incrédulo, foi porque ouvia a Palavra de Deus,
mas não O conhecia. Falou com sua esposa quando ela chegou: “olha, meu bem
quando você for à noite ao culto eu quero ir com você”. Ele pensava consigo mesmo
em fazer a sua parte, para ver se daria resultado o que as pessoas falavam. Não disse
a ela sobre o desafio que tinha feito a Deus. Guardou para si. No culto, achava tudo
estranho porque não tinha essa experiência. Contudo, sentiu muita paz, uma paz que
humanamente não daria para explicar. Sentiu-se mais confortado, mais aliviado,
pareceu-lhe que as tensões estavam saindo, sentia-se mais confiante e que a alegria
estava voltando.
Tomou a decisão de cumprir o seu propósito até o fim. A partir daquele dia, não
tomou mais os remédios. Só havia duas alternativas: ou melhoraria ou agravaria o seu
168
estado de saúde. Mentiu para a sua esposa que estava tomando. Percebeu que não
estava sentindo os sintomas. Quando voltou ao médico foi constatado que estava
curado. Este fato tem por volta de cinco anos.
Acha que na sua cura não houve nenhuma modalidade de simbologia. Acredita
que, o que ocorreu com ele foi uma situação semelhante à de um naufrágio. É como se
ele tivesse naufragado em alto mar e sua única forma de permanecer vivo seria agarrar-
se a uma bóia. Jesus era a única bóia que ele tinha para agarrar-se a ela. Sentia-se
como um náufrago afundando. Agarrou com força esse Jesus, pois não tinha nada para
perder, era sua última oportunidade. Anteriormente, já houvera agarrado tudo que
tinham lhe ensinado, os remédios caseiros, o espiritismo e outras coisas, sendo que
nada tinha resolvido o seu problema. Passou a freqüentar os cultos, foi sentindo-se
mais aliviado, mais alegre, as tensões não estavam existindo mais, o medo estava
indo embora, já não tinha mais o mal estar.
Para Fernando, foi interessante o fato de se auto perceber, pois afirma que
quando se está nesse tipo de doença e percebe que está tendo um cura, esta não
ocorre na pessoa, mas em todo o contexto, pois as próprias pessoas que o
cercavam viam a diferença nas suas atitudes. Seus filhos e a sua esposa já passaram a
comentar com ele: “você está mais alegre, mais disposto, já não se encontra tão
apático”. Vendo que eles estavam percebendo a melhora achou por bem falar com a
esposa. Disse-lhe que havia desafiado o Deus dela, contando-lhe o propósito que
fizera. Confessou a ela todos os seus erros e pediu perdão. Em seguida, mostrou a ela
e aos filhos todos os remédios que não havia tomado e na presença deles jogou toda a
medicação no lixo. A esta altura,
ele já tinha total auto confiança que estava curado.
169
Houve alterações e mudanças na vida de Fernando de forma radical. Passou a
ter auto confiança. Sua auto-estima elevou-se muito. Voltou a exercer o papel de pai,
esposo e chefe de família. Era como se tivesse perdido tudo e ganhado tudo de volta.
Sua vida mudou radicalmente. Foi perdendo o desejo pelas coisas erradas que
praticava: tabagismo, a bebida e o adultério. Seu relacionamento conjugal melhorou e
passou a ser fiel. Sentia que deveria fazer a sua parte tendo em vista que Deus fez a
Dele. Os costumes da sua vida mudaram. Teve o seu emprego de volta. Foi restituído
tudo que havia perdido. Hoje agradece a Deus por essa chance recebida.
Fernando acredita na presença de elementos psicológicos na sua cura, por
considerar emoção e sentimentos, como psicológicos. Acredita que houve sim o lado
psicológico na sua cura, porque a partir do momento que ele acreditou, que apegou-se,
que buscou aquele Deus, que até então ele ouvia falar, e não O conhecia, e se
apegou mesmo a Ele, houve o lado psicológico sim. Entende que o psicológico está
ligado aos sentimentos do ser humano.
170
ANEXO C – TABELAS
Tabela 1 Avaliação do Estado Emocional dos Sujeitos Antes da Cura
Sintomatologia Mary
Carmem
Débora Fernando
Tristeza, insatisfação e frustração x x x x
Desejos e anseios irrealizados x x x x
Sentimento de culpa x x
Sentimento de perda x x x x
Sentimento de inutilidade x x
Sentimento de rejeição x x x x
Insegurança x x x x
Sentimento de menos valia x x x x
Limiar de frustração baixo x x x x
Conflitos estressantes x x x x
Estresse x x x x
Ansiedade x x x x
Angústia x x x x
Depressão x x x x
Conversão de sintoma ou somatização x x x
Fonte: Anexo B (sintomatologia extraída a partir dos relatos dos sujeitos)
171
Tabela 2 Elementos Simbólicos Psicorreligiosos Presentes no Ato da Cura
Discriminação Mary Carmem
Débora Fernando
Conhecimento inicial da Palavra x x x x
Crença x x x x
x x x x
Contato com uma religião x x x
Poder da Palavra x x x x
Lugar sacro x x x x
Gestos x x x x
Oração Individual x
A figura do Pastor x x x
Oração recebida x x x
Imposição se mãos - toque x x
Mitos x x x x
Símbolos X x x x
Ritos x x x x
Revelação x x
Visão x
Fogo x
Água x
Música sacra x x
Unção com óleo x
Hierofania x x
Choro x x
Alegria x x x
Segurança x x x x
Indução x x x x
Vontade x x x x
Introjeção x x x x
Aceitação - disponibilidade x x x x
Assimilação x x x x
Elaboração x x x x
Canalização energética x x x x
Fonte: anexo B (dados extraídos a partir da análise psicorreligiosa dos relatos dos sujeitos).
172
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