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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS
DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA E TEOLOGIA
MESTRADO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO
RESISTÊNCIA CULTURAL DOS JUDEUS NO BRASIL
LUIZ ALBERTO BARBOSA
GOIÂNIA
2006
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2
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS
DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA E TEOLOGIA
MESTRADO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO
RESISTÊNCIA CULTURAL DOS JUDEUS NO BRASIL
LUIZ ALBERTO BARBOSA
Dissertação apresentada ao curso de
Mestrado em Ciências da Religião
como requisito para obtenção do grau
de Mestre em Ciências da Religião.
Orientador: Profº Dr. Valmor da Silva
GOIÂNIA
2006
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3
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO DEFENDIDA EM 31
DE AGOSTO DE 2006 E APROVADA COM NOTA 9,7 (NOVE INTEIROS E SETE
DÉCIMOS) PELA BANCA EXAMINADORA
1) DR. VALMOR DA SILVA/UCG (PRESIDENTE)
2) DR. JOEL ANTÔNIO FERREIRA/UCG (MEMBRO)
3) DR. JOSÉ QUERINO TAVARES NETO/UNIVERSIDADE DE RIBEIRÃO
PRETO (MEMBRO)
4
A meus pais e familiares.
5
Agradecimento à Junta Nacional de Educação Teológica da Igreja
Episcopal Anglicana do Brasil e a meus pais, familiares e amigos, que
me estimularam a concluir o presente trabalho.
6
EPÍGRAFE
ISRAEL... ISRAEL...
Cora Coralina.
O débito universal
jamais quitado.
Perseguidos. Espoliados. Rejeitados.
Discriminados.Escravizados, Gaseados Redivivos.
Povo Heróico.
De tua crença indômita veio o Deus único.
De teu povo veio o Cristo.
Veio a Virgem Maria.
Vieram os Profetas.
Os evangelistas.
E os grandes ensinamentos dos Evangelhos.
No Decálogo orienta-se
toda a Civilização do Ocidente.
Ainda não existiam os códigos
dos povos civilizados e já os princípios imutáveis
da Lei e da Justiça estavam inseridos
nas páginas remotas do Pentateuco
e deles serve-se o Direito Contemporâneo.
Judeu, meu irmão.
7
RESUMO
BARBOSA, Luiz Alberto. Resistência Cultural dos Judeus no Brasil. Dissertação
(Mestrado em Ciências da Religião). UCG, 2006. 103p.
O presente trabalho trata da presença do elemento judeu na formação sócio-cultural
brasileira, dando uma especial ênfase no processo de resistência cultural que os
judeus que foram obrigados a se converter ao Cristianismo tiveram que enfrentar
para poder sobreviver. Destaca-se a continuidade da memória, seja ela coletiva ou
individual, como o elemento de resistência cultural para os Judeus Marranos no
Brasil. O trabalho fala sobre o Judaísmo, o processo histórico de formação do povo
judeu em Israel e na Diáspora em um primeiro momento. Depois aborda a temática
da presença judaico-marrana no Brasil e sua resistência cultural frente a uma
sociedade predominantemente cristã, tendo a memória como elemento principal de
resistência. Finalmente, procura-se mostrar quais os elementos da cultura judaico-
marrana que ainda estão presentes na sociedade brasileira atual, com especial
enfoque nos movimentos de resgate do Marranismo que encontramos por todo o
Brasil.
Palavras-chave: Judeu, Marranismo, Memória, Resistência, Diáspora.
8
ABSTRACT
BARBOSA, Luiz Alberto. Cultural Resistance of the Jews in Brazil. Master`s Degree
Thesis. (Science of Religion). UCG, 2006. 103p.
The present academic work deals with the presence of the Jewish element in the
Brazilian socio cultural formation, giving a special emphasis in the process of cultural
resistance that the Jews, who were obliged to convert to Christianity, had to face to
be able to survive. This work detaches the continuity of the memory, either collective
or individual, as the element of the cultural resistance for the marranos Jews in
Brazil. The work speaks on the Judaism, the historical process of formation of the
Jewish people in Israel and the diaspora at a first moment. Later it approaches the
thematic of the Jewish-marrano presence in Brazil and its cultural resistance to a
predominantly Christian society, having the memory as main element of resistance.
Finally, it is looked to show which of the elements of the Jewish-marrano culture still
are present today in the Brazilian society, with special approach in the movements of
rescue of marranism that we find in Brazil.
Key Words: Jew, Marranism, Memory, Resistance, Diaspora.
9
LISTA DE FIGURAS
Figura 1. Auto de Fé – Gravura do livro La Galerie Agreale du Monde – Biblioteca
Nacional ........................................................................................................................18
Figura 2. Símbolos de Fé do Judaísmo (Menoráh e Estrela de Davi) ..........................22
Figura 3. Cruzado executando judeu em Jerusalém ....................................................32
Figura 4. Sessão das Nações Unidas, ONU, que proclamou o moderno Estado de
Israel em 1948...............................................................................................................36
Figura 5. Foto ilustrativa da chegada dos portugueses, entre eles muitos cristão-
novos, ao Brasil.............................................................................................................41
Figura 6. A Torah..........................................................................................................47
Figura 7. Lápide tumular de Ishac Aboab da Fonseca ..................................................54
Figura 8. Refeição de Páscoa entre os judeus portugueses (Pessach Sefaradim) ......62
Figura 9. Panfleto de divulgação da ABRADJIN, paras os descendentes dos cristão–
novos no Brasil.............................................................................................................72
Figura 10. Kahal Tsur Israel – (Sinagoga Rocha de Israel) em Recife na antiga rua
dos judeus. A Primeira Sinagoga das Américas............................................................85
10
SUMÁRIO
Resumo ........................................................................................................................7
Abstract........................................................................................................................8
Lista de Figuras...........................................................................................................9
1 INTRODUÇÃO ...........................................................................................................12
2 JUDAÍSMO, PANORAMA HISTÓRICO E RESISTÊNCIA CULTURAL...................16
2.1 CULTURA E RESISTÊNCIA CULTURAL – REFERENCIAIS TEÓRICOS .............16
2.2 JUDAÍSMO..............................................................................................................19
2.3 PANORAMA HISTÓRICO DA GRANDE DIÁSPORA .............................................27
2.4 DIÁSPORA E RESISTÊNCIA CULTURAL..............................................................36
3 OS JUDEUS NO BRASIL: RESISTÊNCIA MARRANA ............................................41
3.1 ORIGENS DOS JUDEUS NO BRASIL....................................................................41
3.2 TRADIÇÕES E ELEMENTOS CULTURAIS DOS JUDEUS MARRANOS NO
BRASIL COLONIAL ......................................................................................................45
3.3 COSTUMES DOS CRISTÃO-NOVOS NO PERÍODO COLONIAL AINDA
PRESENTES NA SOCIEDADE BRASILEIRA HOJE....................................................51
3.4 RESISTÊNCIA DOS JUDEUS MARRANOS NO BRASIL COLONIAL....................52
3.5 MEMÓRIA COMO ELEMENTO DE RESISTÊNCIA E SOBREVIVÊNCIA DOS
JUDEUS NO BRASIL....................................................................................................57
4 ELEMENTOS DA CULTURA JUDAICO-MARRANA NO BRASIL HOJE.................64
4.1 CRISE DE IDENTIDADE E RESISTÊNCIA.............................................................64
11
4.2. DIFERENTES MODOS DE MARRANISMO...........................................................67
4.3 MECANISMOS DE RESISTÊNCIA: MEMÓRIA ......................................................69
4.4 MOVIMENTOS DE RESGATE................................................................................72
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................................88
6 REFERÊNCIAS..........................................................................................................91
7 ANEXO I – SOBRENOMES MARRANOS.................................................................99
1 INTRODUÇÃO
Existem relatos da presença de judeus, denominados tamm de cristão-
novos por terem se convertido ao Cristianismo já nas caravelas de Cabral, quando
da chegada dos portugueses no Brasil. O Brasil, desde a chegada dos portugueses,
passou a ser uma possibilidade de refúgio para os judeus da Península Ibérica. Em
Portugal, no século XVI, o Rei D. Manuel usou de um artifício para batizar os judeus
à força, transformando-os assim em cristão-novos.
Não foi fácil aculturá-los religiosamente, a sua Fé era uma situação interior
e a ação do Rei era externa; no entanto, eficaz para a finalidade desejada.
Ela estava presente na construção do Novo Mundo de Além–Mar. Iguais
em religião, seriam iguais também na composição do todo sócio-urbano
das novas cidades. Para tal fim, desapareceu a necessidade entre os
novos cristãos, em alguns casos criptojudeus, no século XVI, no Brasil, de
constituírem judiarias. (RIBEMBOIM, 2002, p. 13).
A influência e a contribuição do judeu cristão-novo brasileiro, principalmente
no período colonial, e aquilo que foi aportado por este povo para a religiosidade e
cultura brasileira em seu todo, merecem ainda muito estudo e investigação. Devido à
Inquisição e ao medo de serem descobertos, muito da cultura judaica se perdeu ou
foi repassada de forma velada e/ou deturpada aos descendentes, sendo que os
judeus tiveram que usar de muita astúcia e sabedoria para continuar a vivenciar a
sua cultura sem ser perseguidos e, para isto, como os negros e indígenas, tamm
tiveram que desenvolver um processo de resistência cultural. A tradição judaica e a
memória foram os elementos essenciais no processo de resistência cultural deste
povo aqui no Brasil. A historiadora Tânia Kaufman diz que Anita NOVINSKY, ao
desvendar
13
...os processos que engendravam o silenciamento das práticas judaicas
expõe a dimensão histórica do Marranismo, concentrando o processo do
conhecimento histórico no próprio sujeito alvo das práticas judaizantes. Os
conteúdos dos processos por ela estudados revelam os passos de uma
intensa vida judaica nos subterrâneos da sociedade colonial. Ela foi em
busca do lugar onde a história foi produzida e atavicamente silenciada”.
(KAUFMAN, 2006, p. 2)
Neste mesmo artigo ela pergunta: “Qual teria sido o papel dos cristão-novos e
dos criptojudeus ou dos marranos e dos judeus Sefaraditas e/ou ashkenazim na
dinâmica sócio-cultural, histórica e geopolítica brasileira?” Trazendo esta pergunta
para o objeto desta pesquisa, indaga-se: como se deu o processo de resistência
cultural dos judeus que vieram para o Brasil e como conseguiram repassar os
elementos das suas tradições e memória que podem ser detectados na vida cultural
brasileira? Responder a esta pergunta é o objeto desta dissertação. Aqui vale
destacar que, apesar de se falar muito dos judeus como um povo, eles possuem
uma diferença étnica muito grande, como destaca Hélio Cordeiro (2002). A grande
variedade étnica se dá pelo fato de que ao longo da história eles se espalharam por
praticamente todos os rincões do mundo, até mesmo na China. Cordeiro classifica
os judeus, etnicamente, do seguinte modo:
Asquenazitas – maior grupo de judeus, da Europa centro-oriental e
descendentes, que fala um dialeto chamado de iídiche.
Sefaraditas – judeus da Península Ibérica que utilizam o dialeto ladino.
Presentes em Portugal e Espanha, constituem a maioria dos que vieram para o
Brasil durante o período colonial. Dos Sefaraditas sai o grupo dos Marranos, que
foram convertidos à força ao catolicismo, porém mantendo algumas tradições e
práticas judaicas ocultamente. Podem também ser denominados de criptojudeus ou
cristão-novos. Estes termos serão utilizados neste trabalho como sinônimos.
Os Asquenazitas e os Sefaraditas são os dois principais grupos que vieram
para o Brasil. Porém, como Cordeiro elenca, existem ainda outros grupos, como os
14
Chuetas (Ilha de Maiorca), Italquitas (Itália), Mizrahim (países árabes), Maaravin
(norte da África), Mustarabes (Israel), Teimanitas (Iêmen), Samaritanos (cidades de
Holon e Nablus em Israel), Caraítas (dispersos por vários países), Donmeh (Grécia e
Turquia), Frankistas (Polônia) e outros grupos de judeus na Geórgia, no Cáucaso,
Uzbequistão, Curdistão, Índia, China, Etiópia e até mesmo índios e negros
americanos que se converteram ao Judaísmo.
Este trabalho mostra o processo de resistência cultural dos Judeus Marranos,
entendido aqui em seu aspecto mais cultural, na formação sociocultural brasileira, e
o legado que eles deixaram a seus descendentes, herdeiros da memória e tradição
deste povo.
Ninguém pode negar que a sobrevivência do povo judeu ao longo de 4.000
anos de história, mantendo suas tradições com tudo o que lhe é atinente,
mantendo também sua dignidade nacional e demais valores éticos de sua
cultura, é sem qualquer dúvida um fenômeno que merece consideração da
parte dos historiadores,.... (CORDEIRO, 1995, p. 18).
Entendendo-se que a cultura judaica está fundamentalmente entrelaçada com
a religião, partimos do pressuposto que, mesmo sendo forçados a se converterem
ao Cristianismo, os judeus continuaram, explícita ou implicitamente, a vivenciar a
sua cultura religiosa, em seu sentido amplo, influenciando deste modo a formação
cultural dos outros povos, entre os quais estavam e estão inseridos.
Sem aprofundar-se na questão religiosa propriamente, este trabalho mostra
um pouco das influências que a conversão forçada dos judeus ao Cristianismo
durante o período inquisitorial teve na prática religiosa do povo brasileiro. São
citados elementos culturais dos judeus que para cá vieram, e que podem ainda ser
detectados na prática religiosa e cultural brasileira.
Este trabalho foi desenvolvido tendo, em primeiro lugar, como eixo condutor,
o processo de resistência e sobrevivência desenvolvido pelos judeus no Brasil, como
15
oprimidos e perseguidos pela religião cristã (católica) e, em um segundo momento, o
processo de resgate da cultura, memória e tradição deste povo nos dias de hoje.
16
2 JUDAÍSMO, PANORAMA HISTÓRICO E RESISTÊNCIA CULTURAL
2.1 CULTURA E RESISTÊNCIA CULTURAL – REFERENCIAIS TEÓRICOS
Hoje em dia, não existe um consenso sobre o conceito de cultura na
antropologia moderna. O ser humano é um ser social, produto e produtor de cultura.
“A cultura é um código de símbolos partilhados pelos membros desta cultura”,
afirma, em seu livro Cultura, Roque de Barros Laraia (2003, p. 64). Sendo assim,
todo o comportamento humano é portador de símbolos significantes. Neste livro,
Laraia nos apresenta a evolução histórica do conceito de cultura. Edward Tylor, em
1871, definiu cultura como “todo complexo que inclui conhecimentos, crenças, arte,
moral, leis, costumes ou qualquer outra capacidade ou hábitos adquiridos pelo
homem enquanto membro de uma sociedade” (LARAIA, 2003, p. 25).
Para Geertz, o conceito de cultura “denota um padrão de significados
transmitido historicamente, incorporado em símbolos, um sistema de concepções
herdadas expresso em formas simbólicas por meio dos quais os homens se
comunicam, perpetuam e desenvolvem seu conhecimento e suas atividades em
relação à vida” (GEERTZ, 1989, p. 103). Faz-se necessário, portanto, em
relacionamentos de pessoas de culturas diferentes, procurar compreender os
significados dos gestos e comportamentos de cada cultura em particular, pois,
somente a partir dos símbolos e significados construídos por cada grupo é que os
seus membros poderão se reconhecer e se identificar.
Neste diálogo entre Tylor e Geertz, destaco o processo acumulativo, no qual
toda a experiência de vida e conhecimentos adquiridos pelo ser humano é passada
17
de geração em geração. Não se pode perder de vista que a cultura é dinâmica, não
está parada no tempo, acompanha o ritmo da vida e suas variantes, enfrentando,
portanto, todos os conflitos, avanços, retrocessos e contradições. Cultura, assim,
passa a ser um processo dinâmico e complexo, incluindo a maneira de agir, pensar,
sentir e viver de um povo, com todos os seus valores e crenças, reelaborando
continuamente seus símbolos e significados. Portanto, não se pode falar de uma
idéia de cultura pura, pois os povos interagem entre si, trocando constantemente
elementos culturais, fazendo surgir um diálogo cultural. Neste trabalho, em que se
focaliza a resistência cultural e sobrevivência do povo judeu em sua história no
Brasil, o papel da memória e tradição, passada de geração em geração, tendo por
base a cultura como um processo acumulativo, será essencial para
compreendermos todo este processo. E através do diálogo cultural estabelecido
pelos judeus com os outros povos, gerando muitas vezes um hibridismo cultural,
elementos da cultura judaica puderam resistir e sobreviver no decorrer da história.
Para entender-se o que vem a ser resistência cultural, utiliza-se a
compreensão apresentada por Fentress e Wickham (1992, p. 65), quando apontam
a memória social como algo importante para se compreender o processo de
resistência. A memória social é uma memória articulada, e isto só é possível devido
à sua capacidade de ser transmitida de geração para geração, entre os indivíduos.
Pode-se confiar nesta memória, pois ela é vivida, testada e revivida no cotidiano
individual e coletivo. Pode-se afirmar, portanto, que, enquanto for possível transmitir
cultura de geração em geração, mantendo-a no tempo e no espaço, a resistência
cultural estará ainda ocorrendo. Esta resistência acaba dando poder ao grupo
resistente, fazendo dele um agente capaz de transformar e manter a memória
coletiva. Ao manter as tradições e memória coletiva, o povo judeu no Brasil permitiu
18
que a sua cultura chegasse até os dias de hoje, explícita e implicitamente.
Figura 1. Auto de Fé – Gravura do livro La Galerie Agreale du Monde – Biblioteca
Nacional
No que se refere ao termo “cristão-novo, utiliza-se a definição dada por
Arnold Wiznitzer, em seu livro Os judeus no Brasil colonial, que classifica este grupo
como “Judeus e seus descendentes convertidos compulsoriamente ao catolicismo
em Portugal” (WIZNITZER, 1960, prefácio) e que imigraram para o Brasil. Segundo
este mesmo autor, os “criptojudeus” eram os cristão-novos que “praticavam em
segredo os ritos judaicos”. Os marranos se confundem com os cristão-novos.
Segundo Dvorah Sotto (2005), os marranos foram os judeus que viveram em
segredo, que permaneceram fiéis à sua fé apesar das perseguições da Inquisição.
Aparentemente eram cristãos, foram forçados a confessar sua fé, mas em segredo
observavam a fé judaica e os dias santos. Segundo Sotto (2005), para entender o
termo "marrano" faça a junção das palavras hebraicas "mar" (amargo) e "anuss"
19
(forçado). Ou seja, os forçados amargamente a deixar o Judaísmo. Este tamm é o
entendimento de Nachman Falbel (1984) e Jacó Guinsburg (1996).
O Brasil, com a sua diversidade étnica, ainda tem muito a aprender sobre sua
riqueza cultural. A convivência entre culturas diferentes acaba por gerar uma troca
de conhecimentos, hábitos, valores e costumes, que acabam por modificar as vidas
das pessoas que as experimentam. A convivência, ao longo da história brasileira,
entre os Judeus Marranos e os outros povos que aqui tamm habitam, acabou por
gerar um enriquecimento cultural, fortalecendo, assim, as relações sociais aqui
existentes. Este trabalho visa exatamente a mostrar quão enriquecedor este
processo foi, resgatando elementos da cultura marrana que resistiram neste
processo de interação. Para melhor entender o que ocorreu no Brasil, precisa-se ter
uma visão panorâmica da vida dos judeus na Diáspora
1
, antes de aportarem no
Brasil.
2.2 JUDAÍSMO
O Judaísmo sempre se caracterizou como uma fé viva, em constante
crescimento e modificação. Os judeus são um povo com uma incrível capacidade de
resistência cultural, por meio da adaptação e superação, sendo que, ao longo da
história, tiveram ligações com as mais diferentes culturas e, portanto, o seu
pensamento e tradições religiosas tamm não permaneceram estáticos. Ao estar
inseridos como dominados no meio de outras civilizações, como os assírios, os
1
Neste trabalho tratamos da Diáspora dos judeus ocorrida depois da queda de Jerusalém no ano 70
d.C. Todavia, vale ressaltar que mesmo antes deste período já havia a presença de judeus dispersos
por vários lugares no mundo conhecido de então.
20
babilônios, os persas, os gregos, os romanos, o mundo cristão ocidental, além de
outros, chegando até ao Brasil, os judeus acabaram por assimilar na sua cultura
elementos dos outros povos, assim como também a influenciar a cultura dos povos
onde estavam inseridos. Como diz Arthur Miller, “O Judaísmo é composto de tantas
variações, que é quase não-judaico adotar somente uma delas.” (CORDEIRO, 2002,
p. 07).
Para o judeu, por questões históricas e culturais, manter vivas as tradições e
memórias do seu povo é um modo de preservar a sua própria identidade como povo
e, assim, poder sobreviver como nação na Diáspora. Sem as acumulações da
memória, passadas de geração para geração, não temos cultura. Segundo
Halbwachs, “Não é na história aprendida, é na história vivida que se apóia nossa
memória.” (1990, p.60). A história para o judeu é vida, e vida sofrida, e, segundo a
tradição judaica, todos têm a obrigação de transmitir sua experiência de forma
criativa para explicar sua existência. Herdeiros de uma tradição, os judeus
compartilham um passado comum, uma herança cultural comum e uma memória
comum. A consciência histórica tem unido as gerações que vão transmitindo a
tradição como herança pessoal e coletiva. E, sendo esta consciência histórica parte
do seu jeito de ser, os judeus, no Brasil, mesmo sendo forçados a se converter ao
Cristianismo, continuaram a transmitir a sua cultura e modo de ser, mesmo que de
modo velado.
A história não é todo o passado, mas também não é tudo aquilo que resta
do passado. Ou, se o quisermos, ao lado de uma história escrita, há uma
história viva que se perpetua ou se renova através do tempo e onde é
possível encontrar um grande número dessas correntes antigas que
haviam desaparecido somente na aparência. (HALBWACHS, 1990, p.67).
Desde que existem, os judeus desenvolveram um modo de ser, de existir, que
perpassa tempo e espaço. O Judaísmo é uma forma de vida. E, para viver e manter
21
a sua cultura e identidade vivas, o judeu utiliza-se da comunicação, que é o elo que
liga as gerações. A comunicação, escrita ou oral, confere permanência ao
conhecimento para a vida e ajuda a formar a identidade cultural.
Identidades culturais são pontos de identificação, os pontos instáveis de
identificação ou de sutura, que são feitas dentro dos discursos de história e
de cultura. Não uma essência, mas um posicionamento. Por isto sempre
existe uma política de identidade, uma política de posição, que não tem
nenhuma garantia absoluta numa “lei de origem” não problemática e
transcendental. Identidades [são] moldadas por vetores de semelhança e
continuidade tão bem como vetores de diferença e ruptura. (HALL, 1996, p.
113).
Depois de tantos anos de existência e resistência e neste mundo moderno e
complexo em que vivemos, é fascinante observar que o idealismo e a fé dos judeus
continuam fortes e vibrantes. Este mundo que alcançou progressos visíveis na
tecnologia e na ciência parece não compreender a religiosidade do povo judeu, que
tem vivido e testemunhado a sua fé com a própria vida. Os mártires judeus não
precisaram de comprovações científicas para ter a certeza de suas crenças e, por
terem esta certeza é que desenvolveram mecanismos de resistência que permitiram
a sobrevivência de sua cultura ao longo do tempo. Entregaram as suas vidas nas
fogueiras da Inquisição e em campos de concentração, deixaram-se imolar por uma
verdade absoluta que sentiam, por uma verdade que para eles está viva. A verdade
religiosa não precisa de comprovações históricas ou científicas. Neste aspecto, é
importante ouvir as vozes das nossas origens, que acabam por permitir a resistência
cultural ao longo dos tempos.
Love for our origins is in fact love for the present, a present marked by its
high quality. From this point of view an “origin” is not something purely
temporal but is more properly ontological and structural. A things origins
are not simply events that took place in a distant time; rather they are as it
were the foundations that support the present. The rediscovery of origins
does not mean a distancing from the present but recovery of the roots that
sustain the present.” (DI SANTE, 1991, p. 3).
2
2
Tradução livre do Autor: Amor por nossas origens é de fato amor pelo nosso presente, um presente
marcado por sua alta qualidade. Deste ponto de vista uma origem”não é algo puramente temporal
mas é mais propriamente ontológico e estrutural. As origens de uma coisa não são simplesmente
eventos que ocorreram em um tempo distante; Ao contrário, eles são como as fundações que apóiam
22
Podemos dizer que a missão do Judaísmo, muito mais do que atrair adeptos,
consiste no fato de poder proclamar a todos os povos e em todos os tempos a única
verdade absoluta: Javéh é Deus, o Único Deus, e todos podem, juntamente com os
judeus, percorrer este caminho da salvação.
Um dos mais antigos símbolos de fé do judaísmo é a
menoráh, um candelabro com sete braços usado no templo.
A Estrela de Davi é o símbolo mais comum associado ao
Judaísmo.
Fonte:/www.uni.pt/homepages/docentes/delfim/comunic/cHelenaSousa97442/simbolos.htm
Fonte:/www.uni.pt/homepages/docentes/delfim/comunic/cHelenaSousa97442/simbolos.htm
Figura 2. Símbolos de Fé do Judaísmo (Menoráh e Estrela de Davi)
O mundo hoje, em vários lugares, aceita e respeita a Bíblia Judaica como
palavra inspirada. Os princípios gerais de moral, de justiça, de fraternidade,
o presente. A redescoberta das origens não significa um distanciamento do presente, mas recuperar
as raízes que sustentam o presente.
23
solidariedade e sociabilidade contidos na Toráh
3
norteiam a vida de milhões de
pessoas em todo o mundo. Na Toráh podemos encontrar inúmeras passagens que
falam da missão de Israel, em que Deus anuncia a dispersão do Povo Eleito por todo
o mundo. Para os judeus, esta é uma promessa positiva, que mostra o futuro de
Israel para a humanidade. A missão dos judeus é mostrar ao mundo que eles são o
sinal visível da graça de Deus para a salvação e que toda a humanidade tamm
está convidada a participar desta aliaa. Os judeus acreditam que Deus se
manifestou à humanidade através dos judeus e eles são a prova viva de que Deus
age na história e é fiel em suas promessas.
Como para o judeu a vida é um culto a Deus, práticas santas e gestos de
adoração são realizados pelos judeus em todas as horas do dia e em todos os
momentos da vida, desde o nascer até o momento da morte. A oração da Berakah
(Bênção) é uma prática constante para os judeus em todos os momentos da vida.
Berakah (usually translated as “blessing or benediction,” or at times as
“wonder-praise-gratitude” is one of those words in which the entire richness
and originality of jewish thought is summed up. It is arguably the word that
best sums up jewish anthropology, that is, its way of situating human beings
in relation to God and the world. (DI SANTE, 1991, p. 34).
4
Esta característica permite aos judeus vivenciarem a sua cultura em todos os
lugares, mesmo que de modo velado, desenvolvendo práticas de resistência em
situações desfavoráveis e muitas vezes de opressão e perseguição. Isto transforma
a vida de um judeu em um serviço constante de adoração e serviço consagrado a
Javéh. Mesmo na satisfação de suas necessidades básicas de alimentação, ou nos
momentos de prazer sensual, existem ritos e cerimônias, momentos de meditação e
3
Nota do Autor: Toráh é o livro sagrado do Judaísmo, constituído pelos livros de Gênesis, Êxodo,
Levítico, Números e Deuteronômio.
4
Tradução livre do Autor: Berakah (geralmente traduzido como “bênção ou bendito,” ou, algumas
vezes como “maravilha-louvor-gratidão” é uma daquelas palavras nas quais a inteira riqueza e
originalidade do pensamento judeu é sintetizado. Ela é sem dúvida a palavra que melhor sintetiza a
antropologia judaica, que é, o seu modo de situar os seres humanos em sua relação com Deus e com
o mundo.
24
prece ao Altíssimo. Este é o motivo pelo qual os judeus precisam de tantos ritos de
purificação, pois a profanação não pode entrar em suas casas ou em seu espírito,
ou em suas obras e atos. Existe uma bênção para cada coisa e em cada momento
da vida. A prática da Berakah é parte central da vida e da espiritualidade judaica,
sendo que, para o judeu, o mundo está baseado na Berakah, e apenas aqueles que
a praticam podem conhecer o verdadeiro significado do mundo. “For this reason,
according to the jewish tradition a berakah should be pronounced in every situation.”
(DI SANTE, 1991, p. 38).
5
O Judaísmo procura dar a seus seguidores uma certa flexibilidade no uso da
liberdade e da moral, assim como os meios para fazer o melhor uso desta liberdade.
Como viver a vida plenamente sem perder a sua alma e sem comprometer a
grandeza do ser humano entre os seres da crião é o grande questionamento com
o qual o judeu se depara todos os dias.
Não podemos olhar para o Judaísmo apenas como um conjunto de dogmas e
doutrinas. Ao estudar o Judaísmo, entramos em uma experiência de vida e fé de um
povo, com suas relações conflitivas e existenciais para com o seu Deus e para com
o próximo. É uma religião da tradição, valorizando a teoria e a prática, a moral e o
culto. É uma religião em que o povo acredita ser o Povo Eleito por Deus para uma
missão de dar testemunho ante a humanidade. Vale a pena aqui ressaltar que esta
crença é comum a quase todas as religiões, pois quase todos os povos acreditam
que a sua religião tem um caráter universal. É impossível para o Judaísmo separar a
sua realidade histórica da sua realidade teológica e mística. Porém, a história de
Israel ou do povo judeu não está apenas contida na Bíblia, como querem muitos
5
Tradução livre do autor: Por esta razão, de acordo com a tradição judaica, a berakah deveria ser
pronunciada em toda situação.
25
historiadores, e tamm não se pode afirmar que o que se tem narrado na Bíblia
seja a história de Israel como ela realmente aconteceu.
É simplesmente impossível pretender que a literatura bíblica ofereça um
retrato suficientemente claro do que é o seu ‘Israel’, de modo a justificar
uma interpretação e aplicação históricas. Desta forma, o historiador precisa
investigar a história real independentemente do conceito bíblico. (DAVIES,
1992, p. 56).
O presente trabalho, ao traçar um panorama histórico a respeito da Grande
Diáspora do povo judeu, não o faz sob uma ótica bíblica, mas simplesmente aponta
uma realidade histórica, sem entrar no mérito bíblico/teológico da mesma. Ao falar-
se sobre Israel, numa perspectiva bíblica, corre-se o risco de emitir juízos de valores
já tidos como certos, pois
Muitos biblistas têm uma longa convivência com a Bíblia, e sua noção de
Israel já está internalizada, a tal ponto que eles tomam seus vários usos
como sendo homogêneos, sua complexidade como simples e suas
contradições como invisíveis (...) O ‘Israel’ da literatura bíblica é
automaticamente adotado como um termo apropriado para o uso erudito,
incluindo toda a sua variedade e contradição. (DAVIES, 1992, p. 49).
Como conseqüência da grande Diáspora, os judeus tamm chegaram ao
novo mundo. No Brasil, chegaram mesmo com as caravelas de Cabral. Porém para
poderem sobreviver no Brasil, os judeus tiveram que se mesclar com o restante da
população, foram forçados tamm a se converterem ao Cristianismo, tornando-se
“cristão-novos”, também chamados de marranos.
Durante os primeiros trezentos anos de presença européia — entenda-se,
expansão e (e)migração para o Novo Mundo — a componente judaica no
Brasil, particularmente durante o período colonial (1500-1822), era
constituída por Sefaraditas, sobretudo Conversos, outrora alcunhados de
Cristão-novos, Criptojudeus ou, pejorativamente, Marranos. Mais tarde,
assinaladamente, já a partir de 1822 e da conseqüente proclamação do
reino (quase) independente do Brasil, seguida pela implantação da
República Brasileira em 1889, os descendentes destes judeus dos
primórdios finalmente tiveram a oportunidade de poder publica e
abertamente declarar a sua identidade Sefardita sem medo de represálias
político-religiosas. Em outras palavras judeus e cristão-novos de origem
Sefardita não podiam ser perseguidos nem pela sua (alegada) adesão
religiosa nem pelas suas origens étnicas (semitas). (LEVI. 2004, p. 221).
26
Porém, como para os judeus a religião é a vida, é a cultura, mesmo sendo
“cristãos”, os ritos e símbolos judaicos continuaram a ser elementos presentes na
vida destes judeus e seus descendentes. Para Claude Rivière (1996), o rito estrutura
o tempo de duas formas: pelo recomeço de alguma ação e também pela repetição
destas ações. Para ele, o rito apresenta-se como um meio de negociação com o
outro, este outro pode ser uma divindade, uma pessoa ou uma instituição,
colocando, antes de tudo, o indivíduo em relação com a coletividade, liberando-o de
seu isolamento. O rito profano favorece o contato social, inserindo o indivíduo em
sua sociedade e cultura.
É justamente o caráter próprio do rito situar-se como linguagem referente a
uma ordem, senão idêntica para os interlocutores, pelo menos aceita como
sistema de permuta. O rito tem como objetivo essencial levar os seres e as
coisas a se comunicarem entre si, segundo regras codificadas. (RIVIÈRE,
1996, p. 83).
Os ritos tamm funcionam como catalisadores das frustrações e ansiedades
coletivas, principalmente quando o grupo social enfrenta crises e dissensões
internas, como no caso dos judeus da Diáspora e no Brasil, tendo que enfrentar a
sociedade cristã, através de mecanismos de resistência e adaptabilidade ao meio
social. Para Claude Rivière, o rito profano tamm agrega em si uma lógica de
competitividade entre grupos rivais, servindo como contraponto a uma contracultura
ameaçadora, sendo que, o desenvolvimento de ritos, costumes e tradições dos
judeus cristão-novos serve como contraponto para com a cultura dominante.
Por vezes, a sublimação ritual permite a realização de desejos
inconscientes, ao mesmo tempo que satisfaz as exigências do superego. À
semelhança da atividade intelectual, da fé religiosa ou da criação arstica,
o rito profano também pode reduzir os conflitos pessoais e intergrupais ao
garantir uma adaptação mais conveniente ao meio social. (RIVIÈRE, 1996,
p. 88).
27
Vejamos a seguir o processo de resistência cultural dos judeus dentro da
Grande Diáspora e sua chegada ao Brasil.
2.3 PANORAMA HISTÓRICO DA GRANDE DIÁSPORA
6
A Grande Diáspora foi um êxodo ao contrário. Com a guerra contra os
romanos, entre os anos 70 e 135 d.C., mais de meio milhão de judeus morreram e
uma centena de milhares foram escravizados, o que fez com que os milhares de
judeus restantes na Palestina não tivessem outra opção a não ser abandoná-la e
dispersar-se pelos continentes Europeu, Africano e Asiático. Alguns foram para o
continente asiático, outros se dirigiram para o ocidente, e os judeus de Alexandria,
que já se encontravam helenizados, continuaram a viver a sua vida e a manter a sua
cultura. Apesar de terem sido vítimas, no ano 38 d.C. em Alexandria, de violenta
perseguição, onde “famílias inteiras foram assim exterminadas, velhos, mulheres,
crianças de colo, sem distinção de idade nem condição. Foi o primeiro progrom da
história”. (MESSADIÉ, 2003, p. 78). “Progrom” é o termo utilizado para designar
perseguições aos judeus, principalmente por parte dos governos dos locais onde os
judeus estão estabelecidos.
Manter a identidade cultural dos judeus, suas tradições e sua memória passa
a ser um exercício diário para as futuras gerações, com conflitos particulares e
coletivos. A necessidade de uma resistência cultural, diante desta situação
diaspórica, torna-se fundamental para se manter uma identidade judaica.
6
Para estes dados confira as seguintes fontes: http://pt.wikipedia.org/wiki/Palestina; (02/12/2005)
http://www.infoisrael.info/historia/historia5.htm
(20/09/2005).
28
O afastamento da Terra Prometida marca de facto a pertença do Povo
Escolhido ao Seu Criador e, ao mesmo tempo, a sua conseqüente
separação dele. O resultado deste afastamento físico-moral de Adonai (o
“Deus” dos Hebreus) causa graves sentimentos de culpabilidade,
acompanhados por sentimentos de crises existenciais, particulares assim
como colectivos. (LEVI, 2004. p. 218).
Após a queda de Jerusalém no ano 70 d.C., a Babilônia passa a ser o local
onde existiam grandes comunidades judaicas, as quais haviam permanecido no país
quando o rei Ciro, o Grande, deu a permissão para que os judeus que ali viviam por
ocasião da primeira Diáspora regressassem à Terra Santa. A estas comunidades
formadas por agricultores, artesãos e pastores vieram juntar-se novamente grande
número de judeus que foram expulsos da Palestina pelos romanos.
Os judeus babilônicos tinham por dirigente um Chefe da Diáspora (Rosh Há-
Goláh), que pela tradição era tido como sendo descendente do rei Davi, sendo que
sua posição era hereditária, passando de pai para filho. O Chefe da Diáspora tinha
várias atribuições no comando do povo hebreu. Ele exercia a função de Juiz
Supremo dos judeus da Diáspora, e nesta qualidade era ele quem designava os
outros juízes das comunidades; ele era a pessoa que representava a comunidade
judia diante do governo da Babilônia, sendo o responsável por recolher os impostos
devidos pelos judeus e repassá-los ao Governo; pode-se dizer que o Rosh Há-Goláh
era uma figura muito respeitada pela comunidade, vivendo de uma maneira
opulenta, quase como um rei, que procurava fazer às vezes de intermediário entre a
comunidade judia e o governo babilônico.
A comunidade judaica do Oriente legou aos judeus do Ocidente o
ideal de mundo futuro promissor, os tempos do Messias, cuja vinda
dependia das ações individuais dos homens do seu povo. Essas e
outras idéias deram aos judeus a força espiritual necessária para
resistir às dificuldades, humilhações que teriam que sofrer durante
séculos. (Mirador Internacional, 1987, Vol. 12, p. 6559).
29
Foi na Babilônia que surgiu a instituição que se tornou o centro da vida do
povo judeu na Diáspora, ou seja, a Sinagoga. Ela foi se firmando como a Beth-Am
(Casa do Povo), ou Beth Há Kenesset (Casa da Coletividade). A Sinagoga
funcionava principalmente como centro religioso, porém ela foi adquirindo outras
características, tornando-se também um centro social, cultural e até político da vida
do povo judeu no exílio. A sinagoga era o local onde a Santa Assembléia dos fiéis
(Kahal Há Kodeshen) se reunia, dirimindo questões políticas, religiosas e até
judiciais, pois ela funcionava como o local onde os tribunais rabínicos se reuniam. A
Sinagoga não pretendia substituir o Templo destruído, pois este era e continuava
sendo a única morada de Deus e, neste contexto ela se torna a casa do judeu da
Diáspora.
Algumas comunidades judaicas permaneceram na Palestina, principalmente
na região da Galiléia, o que permitiu também um renascimento das atividades
religiosas naquela área. O Sinédrio, que era o "Grande Conselho dos notáveis de
Israel”, tinha sido estabelecido depois do exílio para o governo da comunidade judia.
Era integrado por 71 membros, formados por anciãos, sacerdotes e escribas - e
presidido pelo sumo sacerdote. Era a autoridade suprema dos problemas religiosos,
assim como em alguns assuntos de ordem civil. O Sinédrio foi reconstituído pelo
rabino Iohanan ben Zakai, tendo tido como sedes as cidades de Tiberíades, Séforis
e Iabnê. Porém, por vários motivos, os judeus palestinos tamm foram forçados a
novas Diásporas, juntamente com os seus irmãos babilônicos, o que fez com que os
judeus se espalhassem por quase todos os países conhecidos daquela época,
principalmente pela Pérsia, norte da África, Síria, Egito e o leste europeu.
Uma pequena comunidade judia permaneceu na terra prometida, a qual
permaneceu sob domínio romano até o ano de 313 d.C., quando passou para o
30
controle dos bizantinos. As condições de vida na Palestina do séc. I eram muito
precárias e não muito diferentes do restante do Império romano.
Cerca de 1/3 daqueles que ultrapassavam o primeiro ano de vida (portanto,
não contabilizados como vítimas da mortalidade infantil) morriam até os
seis anos de idade. Cerca de 60% dos sobreviventes morriam até os 16
anos. Por volta dos 26 anos 75% já tinha morrido e aos 46 anos, 90% já
desaparecido, chegando aos 60 anos de idade menos de 3% da
população. (ROHRBAUGH, 1996, p. 4-5).
Este período histórico do povo judeu é muito abrangente, indo desde a queda
de Jerusalém até a formação do moderno Estado de Israel em 1947.
Após o século IV, depois da conversão do imperador Constantino ao
Cristianismo no ano 313, e da fundação do Império Bizantino, a Terra de Israel
passou a ser um país predominantemente cristão. Foram construídas igrejas nos
Lugares Santos cristãos em Jerusalém, Belém e Galiléia e também surgiram vários
mosteiros nos mais diversos lugares do país. “Culturalmente espoliado, o judeu
tornou-se além do mais, a partir de Bizâncio, um indivíduo de segunda classe,
excluído da apoteose espiritual do Cristianismo.” (MESSADIÉ, 2003, p. 156). Os
judeus foram privados de sua relativa autonomia anterior, quando estavam sob
domínio romano, assim como foram privados do direito de exercer cargos públicos e
a entrar em Jerusalém, a não ser um dia por ano (Tishá BeAv) quando comemoram
a destruição do Templo.
A invasão persa no ano 614 foi apoiada pelos judeus, que se encontravam
inspirados por esperanças messiânicas de libertação. Os persas, em agradecimento
por sua calorosa colaboração, restituíram aos judeus a administração de Jerusalém.
Porém, esta situação durou apenas três anos, sendo que no ano 629 o exército
bizantino voltou a entrar na cidade, expulsando novamente a população judia.
Os árabes conquistaram a Terra Santa quatro anos após a morte de Maomé
(632), ou seja, em 636 d.C. Esta ocupação durou mais de quatro séculos, com
31
califas que governavam a princípio desde Damasco e mais tarde de Bagdá e do
Egito. No começo do regime muçulmano, o assentamento judeu em Jerusalém foi
restaurado e foi outorgada à população judia a qualidade de protegidos, ou seja,
eles estavam sob a proteção do regime islâmico. Os muçulmanos salvaguardavam
suas vidas, suas propriedades e lhes davam liberdade de culto, pedindo em troca
um sistema de captação fiscal especial e impostos sobre a terra.
À sombra do Islã, o Judaísmo rabínico pôde desenvolver uma adaptação
ao mundo a sua volta, hostil ou, no melhor dos casos, moderadamente
tolerante. Os talmudistas, como o conjunto dos judeus, puderam assim
alcançar a era da imprensa, a partir da qual o Talmude se tornaria
virtualmente indestrutível. (MESSADIÉ, 2003, p. 216).
Logo a seguir, na mesma página, o autor supracitado diz que “é tamm
possível que a população judia do Mediterrâneo deva parcialmente aos muçulmanos
o ato de ter sobrevivido fisicamente”. Porém, por volta do ano 717, foram levantadas
algumas restrições contra os não-muçulmanos, o que afetou alguns aspectos da
vida pública dos judeus palestinos, assim como suas práticas religiosas e seu status
legal. A cobrança de altos impostos sobre a zona rural obrigou muitos judeus a
abandonar os campos e se mudar para as cidades. Outros, devido ao aumento da
discriminação social e econômica, preferiram abandonar o país e se juntar a seus
irmãos na Diáspora. No final do século XI, a comunidade judia na Terra Santa havia
reduzido consideravelmente, perdendo quase toda a sua organização social e
religiosa.
32
Fonte: http://educaterra.terra.com.br/voltaire/antiga/cruzadas1.htm
Figura 3. Cruzado executando judeu em Jerusalém
A partir de 1099, durante os próximos 200 anos, a Palestina foi dominada
pelos cruzados. Os cruzados eram cavaleiros cristãos que, respondendo a um
chamado do papa Urbano II, vieram de todos os cantos da Cristandade para libertar
a Terra Santa das mãos dos infiéis. No mês de julho de 1099, depois de um cerco
que durou cinco semanas, os cavaleiros da Primeira Cruzada entraram em
Jerusalém com seu exército, massacrando a maioria dos habitantes não-cristãos da
Cidade Santa. Os judeus enfrentaram os conquistadores com grande valentia.
Entrincheirados em suas sinagogas, eles procuraram defender seu bairro, não
logrando outro resultado do que serem queimados vivos e os sobreviventes serem
vendidos como escravos. Após a conquista de Jerusalém, os cruzados estenderam
suas conquistas para o restante do país, por meio de tratados, acordos e, em sua
grande maioria, por meio de sangrentas conquistas militares.
O Reino Latino dos cruzados se constituiu numa minoria de conquistadores
que se manteve restrita às cidades e castelos fortificados do país. A partir da
abertura do país pelos cruzados para a rota internacional de transporte, as
peregrinações dos cristãos à Terra Santa se tornaram populares e, por outro lado,
33
tamm passou a ser crescente a quantidade de judeus que regressavam a Eretz
Israel. Documentação desta época indica que somente da França e da Inglaterra
regressaram mais de 300 rabinos, que se estabeleceram em Acre e em Jerusalém.
Com a derrota dos cruzados por Saladino em 1187, os judeus israelitas
voltaram a gozar de uma certa liberdade, incluindo o direito de se restabelecer na
Cidade Santa. Após a morte de Saladino em 1193, os cruzados conseguiram
restabelecer a conquista da maior parte do país, tendo sido finalmente derrotados
em 1291 pelos mamelucos.
Os mamelucos eram uma casta militar muçulmana que havia conquistado o
poder no Egito e que estendeu suas fronteiras até a Palestina. Sob o domínio
mameluco, a terra de Israel se tornou uma atrasada província que era governada
desde Damasco. Os portos de Acre, Jafa, dentre outros, foram destruídos por
temerem os mamelucos eventuais investidas de novas cruzadas. Desta forma, o
comércio internacional foi interrompido, o que ocasionou a ruína econômica para
aquela região até fins da Idade Média. As pequenas cidades e vilarejos ficaram em
uma situação de extrema penúria e Jerusalém se encontrava quase que totalmente
abandonada.
A situação dos judeus palestinos era de extrema pobreza e já na época do
declínio do domínio mameluco a situação se agravou ainda mais, com maiores
distúrbios políticos e econômicos, pragas, terremotos. Esta situação de extrema
pobreza e descalabros da política mameluca permitiu que, mais uma vez, a Terra
Santa mudasse de conquistadores, advindo desta feita os Otomanos, que
controlaram a região durante exatos quatro séculos, até o princípio do século XX.
Depois da conquista otomana em 1517, a Terra santa foi dividida em quatro
distritos, que estavam subordinados administrativamente à província de Damasco,
34
que, por sua vez, era governada diretamente de Istambul. No início da era otomana,
viviam no país cerca de 1.000 famílias judaicas, a grande maioria em Jerusalém,
Nablus, Hebron, Gaza, Safed e algumas aldeias da Galiléia. Estas famílias eram
formadas por judeus que nunca haviam abandonado a Terra Santa, bem como por
judeus imigrantes que voltavam do norte da África ou da Europa.
O sultão Suleiman, o Magnífico, por meio de um governo equilibrado
ordenado, propiciou algumas melhorias à vida dos judeus e acabou por estimular a
imigração judaica. Alguns dos recém-chegados se instalaram em Jerusalém, porém
a grande maioria se dirigiu para a cidade de Safed, onde, por volta do século XVI, já
havia uma população judia aproximada de 10.000 pessoas, tendo-se convertido a
cidade num importante centro têxtil da região, assim como no foco de uma intensa
atividade intelectual. Neste período, floresceu tamm o estudo da Cabala
(misticismo judeu) e os esclarecimentos e diretrizes da lei judaica, como tinha sido
codificada no Shuljan Aruj, que foram estudados e difundidos por toda a Diáspora
judia da época a partir das academias de estudo de Safed.
Juntamente com o declínio do Império Turco, o país foi caindo tamm num
estado de negligência e abandono. No final do século XVIII, os conquistadores
otomanos já não possuíam nenhuma organização administrativa que funcionasse a
contento na região. As terras estavam entregues a camponeses empobrecidos, a
arrecadação de impostos era feita de uma maneira desorganizada e caprichosa, os
recursos naturais do país, como os bosques da Galiléia e do monte Carmelo,
encontravam-se completamente desmatados e a terra agrícola tinha sido
abandonada, transformando-se em pântanos e desertos.
No século XIX, aquele atraso medieval foi cedendo lugar aos poucos para os
primeiros sinais de progresso ocidental. As potências européias passaram a ter uma
35
política direcionada à Terra Santa, promovendo atividades missionárias, expedições
arqueológicas, estudos bíblicos e geográficos. A Grã-Bretanha, a França, a Rússia,
a Áustria e os Estados Unidos abrem representações consulares em Jerusalém.
Estabelece-se uma linha regular de barcos a vapor entre a Palestina e a Europa,
bem como conexão postal e telegráfica. Com a construção do Canal de Suez, a
Terra Santa vê a sua vocação para ser a encruzilhada tradicional dos três
continentes revitalizada, abrindo-se assim novamente ao mundo.
Após as turbulências do início do século XX, com o Holocausto ocorrido na
Segunda Guerra Mundial contra os judeus, à meia-noite de 14 de maio de 1948 o
Estado de Israel moderno nasceu, sendo assim proclamado pela ONU. Foi
imediatamente reconhecido pelos Estados Unidos e pela União Soviética. Israel
recebeu milhares de judeus perseguidos e desalojados durante a II Guerra Mundial.
A criação do Estado de Israel não foi facilmente aceita, tendo este sido atacado no
dia seguinte pelo exército transjordaniano, pela Legião Árabe, pelo Egito, pela Síria,
pelo Líbano e pelo Iraque. Para o povo judeu, a criação do moderno Estado de Israel
é o cumprimento da profecia de Isaías, que predisse: “Deus levantará uma bandeira
como um sinal para ajuntar os povos de Israel e de Judá que estiverem espalhados
pelos quatro cantos do mundo; ele os trará de volta para a sua terra.” (Isaías 11:12).
36
Fonte: www.debriefing.org/12890.htm
Figura 4. Sessão das Nações Unidas, ONU, que proclamou o moderno Estado de
Israel em 1948.
Para entendermos o processo de resistência cultural dos judeus no Brasil e
em outras partes do mundo, é fundamental ter este panorama histórico aqui
apresentado, pois a fé dos hebreus é o fundamento e a razão da resistência deste
povo diante de todas as adversidades históricas.
2.4 DIÁSPORA E RESISTÊNCIA CULTURAL
A cultura desenvolvida e preservada pelos judeus na Diáspora é
eminentemente uma cultura de resistência perante os outros povos no meio dos
quais estavam inseridos. Freqüentemente vistos como seres estranhos, impuros,
sendo parcialmente reconhecidos e acolhidos e parcialmente rejeitados e excluídos,
os judeus acabaram por interagir com as outras culturas, preservando, porém, por
meio de uma resistência cultural, os elementos, símbolos e significados de sua
própria cultura.
37
Em determinados lugares e épocas, puderam vivenciar abertamente a sua
identidade; em outros, tiveram que se adaptar para poder sobreviver. Foi o que
aconteceu com os judeus da Península Ibérica, chamados de cristão-novos ou
marranos, que adotaram a religião cristã, mas mantiveram tamm os elementos de
sua própria cultura judaica. Ao mesclarem elementos destas duas culturas, estes
judeus passaram a ser olhados com reserva e cautela por ambas as partes.
Passaram a ser tratados como seres no limbo, nem cristãos, nem judeus, tendo que
encontrar meios de resistência que lhes permitissem viver neste ambiente fronteiriço.
É interessante observamos o que diz o professor Bernardo Sorj sobre o que
vem a ser a Diáspora Judaica, para podermos compreender o mecanismo de
resistência desenvolvido pelos judeus. Ele nos diz que
Uma das principais lições sociológicas que pode ser retirada da experiência
judia se refere não a alguma essência última que defina o que seja uma
Diáspora, mas da riqueza dos processos históricos, da variedade de
modelos e de construção de instituições a ela associadas. (SORJ, 2003, p.
17).
Sorj nos diz tamm que cada Diáspora assume uma forma particular,
devendo portanto ser analisada dentro do contexto sócio-histórico em que ocorreu.
Assim sendo, a Diáspora judia assumiu contornos e organizações muito diferentes.
Este autor afirma que “a Diáspora reproduz identidades individuais através de
instituições que estabelecem as fronteiras, os mecanismos de socialização,
solidariedade e canalização de conflito, assim como as relações com o mundo
‘externo’ e com as outras Diásporas irmãs.” (SORJ, 2003, p. 17).
É interessante observar o olhar daqueles que estão fora da Diáspora.
Geralmente, o grupo social no qual o grupo diaspórico está inserido os vê como um
grupo coeso, com uma unidade étnica, cultural e lingüística.
38
As Diásporas (e em especial suas elites) se auto-representam e, ademais,
são representadas pelo ambiente exterior através de uma imagem de
unidade, que desconhece a sua diversidade interna. No início do século
XX, por exemplo, além da diversidade social e ideológica, os judeus
apresentavam enormes diferenças culturais. Assim, para um judeu de
Europa Oriental, falar iídiche era sinônimo de ser judeu, enquanto outros
judeus só falavam ladino, árabe ou a língua do país, e o hebraico era
conhecido somente pela elite mais culta, que o utilizava apenas para
assuntos religiosos. A distância lingüística era acompanhada de fortes
preconceitos entre judeus de diferentes localidades, preconceitos que se
refletiam na quase inexistência de casamento entre as subcomunidades
que conviviam no mesmo local. O mundo exterior, em particular os anti-
semitas, continuavam a representar os judeus como um grupo homogêneo.
(SORJ, 2003, p. 18).
Outro elemento da Diáspora que Sorj nos mostra é que estas não são
estruturas sociais homogêneas; elas estão permeadas por desigualdades profundas
de riqueza, distribuição do conhecimento e do poder, assim como conflitos
ideológicos, sociais e de gênero. Da mesma forma, a Diáspora judia, segundo o
autor, absorveu elementos das culturas locais e desenvolveu interesses e
características próprias. No caso do Brasil, isto pode ser observado, já que aqui
houve uma grande interação entre as duas culturas.
Um dos fenômenos mais interessantes da Diáspora é que ela permite um
estudo das relações complexas entre as dimensões global e local, a
permanente reabsorção e retradução, a partir das condições locais de cada
comunidade, de discursos e práticas geradas em outros contextos.
Diversas correntes do Judaísmo, como o Bund, o movimento religioso
reformista, ou o Chasidismo, movimento de renovação religiosa iniciado no
século XVIII, adquiriram em cada contexto nacional novos sentidos, e
outros – os originais – foram abandonados, de acordo com as condições
particulares de cada comunidade. (SORJ, 2003, p. 19).
Por conta da Diáspora, os judeus tiveram que se adaptar a um Judaísmo fora
de Israel e fora do Templo. O principal meio de resistência passou a ser, dentre
outros, a religião, na qual a relíquia mais preciosa passou a ser a Toráh, inserida no
seio da família, e na qual muito das tradições, costumes e cultura pôde ser
preservado para as gerações futuras. A fé num Deus único, o Deus de Israel, de
Abraão, de Isaac e de Jacó, foi capaz de manter o povo unido, principalmente nos
39
momentos de adversidade. A fé neste Deus e o Judaísmo se constituíram, assim,
em fatores de identificação do povo judeu na Diáspora.
Porém, a vida seguia o seu ritmo normal e os judeus viam-se obrigados a
tamm se inserir no meio das sociedades nas quais se encontravam, para garantir
o sustento da família. Trabalhavam em atividades do comércio, agricultura,
artesanato, e tamm atuavam nas artes, filosofia e literatura. Procuravam apenas
viver em paz, sem grandes esperanças de voltar para a antiga terra de Israel. Como
a Império Romano era muito forte e controlador, os judeus continuaram a sua
marcha até os confins do Império. Os judeus continuaram a seguir para o norte e o
leste europeu. Muitos seguiram rumo ao mar Mediterrâneo ou por terra, através da
Itália, para uma região na qual poderiam ter um pouco mais de liberdade e paz - a
Península Ibérica. Foi uma imigração constante nos dois primeiros séculos da era
cristã para esta região. Já no século V, a Espanha havia se transformado no local de
maior crescimento e concentração de judeus na Europa.
Mesmo com a invasão da Espanha pelos muçulmanos em 711 d.C., os judeus
continuaram a prosperar e a levar uma vida tranqüila na Península Ibérica. Foi neste
período que surgiram muitos judeus médicos, físicos, poetas, eruditos, convertendo
esta região no maior foco da resistência cultural judaica. A influência judaica foi não
somente étnica, mas tamm se projetou nos aspectos culturais, políticos, sociais,
econômicos e religiosos.
A Península Ibérica possui uma rica e multifacetada herança histórico-
cultural judaica à qual, durante muitos séculos, os Sefaraditas contribuíram
com investigações no campo científico, literário e jurídico, assim como
naquele religioso, lingüístico e filosófico, com a pesquisa filosófica e a
exegese bíblica a reinarem sublimes nas demais disciplinas do saber
humano. Obviamente isto devia-se ao facto que os dois países ibéricos
haviam tido uma forte presença muçulmana no seu solo: 711-1498 para
Portugal, e 711-1492 para a Espanha. Graças à secular coexistência com o
mundo islâmico, judeus e gentios tiveram a oportunidade de poder ter
acesso a todos os documentos, científicos assim como literários, que lhes
chegavam do Oriente/Médio, Oriente muçulmano, incluindo as traduções e
os melhoramentos baseados nas últimas e mais actualizadas descobertas
40
científicas do momento. Este período é portanto alcunhado de “supremacia
Sefardita” face aos demais grupos étnico-raciais judaicos do Mundo de
então, sobretudo aos Ashquenazim. Entre os “outros” judeus desta época
talvez os Italkim (judeus da futura República Italiana, 1861) tenham
alcançado um nível razoavelmente equiparado àquele conquistado pelos
Sefaraditas pré-expulsão espanhola ou pré-conversão/dispersão
portuguesa. (LEVI, 2004, p. 219).
Estes judeus da Península Ibérica, particularmente da Espanha, mesclaram-
se com a população nativa, sendo de certo modo ocidentalizados. Estes judeus se
tornaram conhecidos como Sefaraditas, judeus de Sefarad (Espanha). Destes
judeus Sefaraditas sairiam os marranos ou cristão-novos no período da Inquisição.
Concluindo este capítulo, percebe-se que a história dos judeus é, por si
mesma, uma história de resistência. Tendo isto como pano de fundo, poder-se-á
agora, no segundo capítulo, debruçar-se mais sobre a presença judaica no Brasil e
sobre a resistência dos Judeus Marranos frente à cultura cristã dominante.
41
3 OS JUDEUS NO BRASIL: RESISTÊNCIA MARRANA
3.1 ORIGENS DOS JUDEUS NO BRASIL
Por conta da Inquisição na Península Ibérica, os judeus foram obrigados a se
converter ao Cristianismo, passando a ser denominados de cristão-novos, por volta
de 1499-1500 d.C. Eles foram proibidos de deixar o país, para preservar a situação
financeira, uma vez que muitos judeus eram prósperos e controlavam as casas
bancárias de Portugal. É neste momento de crise, perseguição e desespero, em que
tinham sido obrigados a sair da Espanha em 1492, por um decreto real que expulsou
todos os judeus da Espanha, e também a se tornar cristãos que uma porta se abre:
em 22 abril de 1500, o Brasil foi “descoberto” por Pedro Álvares Cabral. Na própria
expedição de Cabral já havia alguns judeus.
Fonte: www.morasha.com.br/conteudo/artigos/artigos_v...
Figura 5. Foto ilustrativa da chegada dos portugueses, entre eles muitos cristão-
novos, ao Brasil.
Os judeus ibéricos, como qualquer outro judeu da Diáspora, procuravam um
lugar seguro para se estabelecer, trabalhar, e criar sua família dignamente. A
descoberta das Américas e do Brasil possibilitará a estes judeus mais uma chance
de poder tentar viver a sua fé e identidade plenamente.
42
Durante os primeiros trezentos anos de presença européia — entenda-se,
expansão e (e)migração para o Novo Mundo — a componente judaica no
Brasil, particularmente durante o período colonial (1500-1822), era
constituída por Sefaraditas, sobretudo Conversos, outrora alcunhados de
Cristão-novos, Criptojudeus ou, pejorativamente, Marranos. Mais tarde,
assinaladamente, já a partir de 1822 e da conseqüente proclamação do
reino (quase) independente do Brasil, seguida pela implantação da
República Brasileira em 1889, os descendentes destes judeus dos
primórdios finalmente tiveram a oportunidade de poder pública e
abertamente declarar a sua identidade Sefardita sem medo de represálias
político-religiosas. Em outras palavras, judeus e cristão-novos de origem
Sefardita não podiam ser perseguidos nem pela sua (alegada) adesão
religiosa nem pelas suas origens étnicas (semitas). (LEVI, 2004, p. 221).
Os judeus Sefaraditas habitavam a Península Ibérica há cerca de quinze
séculos e possuíam nomes e sobrenomes
7
espanhóis e portugueses, como
Cardoso, Mendes, Lopez, Pereira, Seixas, Vidal, Brandão, Castro e outros muitos.
Estes judeus Sefaraditas tiveram que abandonar a Península Ibérica para outros
lugares mais tolerantes, e muitos deles optaram pelo Novo Mundo, trazendo consigo
sua cultura, comida, canções, religiosidade e tradições. Além de perderem suas
posses, os judeus Sefaraditas tamm tiveram que aprender a se adaptar aos
hábitos e costumes dos novos lugares que os acolheram. Assim, trouxeram com
eles também o idioma ladino, que usavam dentro de suas casas e nas sinagogas.
Além do idioma, os judeus Sefaraditas conseguiram manter seus hábitos
alimentares, sua música, dança, folclore, e seus ditos e provérbios, que resistiram ao
tempo e chegaram até o século XXI. Grande porcentagem da população brasileira
hoje descende dos cristão-novos, apesar de não terem esta consciência.
O Brasil foi o país que recebeu o maior número de imigrantes
portugueses marranos. No estado em que se encontram as pesquisas
e os estudos demográficos realizados sobre vários estados do Brasil,
podemos afirmar que aproximadamente 25 a 30% da população
branca nacional era constituída de marranos. Essa média se aplica a
Bahia, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Paraíba. Sobre Pernambuco,
Goiás e São Paulo, os estudos estão em andamento. Mas devemos
lembrar que essa porcentagem não inclui os cristão-novos que
lograram diluir-se em meio às elites locais, que fugiram ou se
embrenharam pelas selvas brasileiras, mas apenas os que ficaram
registrados nos livros inquisitoriais. (NOVINSKY, 2001, p. 2).
7
Ver anexo I com a lista de sobrenomes marranos.
43
Os judeus que vieram para o Brasil tiveram uma história bem diferente
daquela com que estavam acostumados a viver na Europa. No Brasil, encontraram
uma realidade colonial que em princípio permitia uma certa liberdade, sendo esta,
porém, suprimida quando aqui chegou a Inquisição. Tiveram que desenvolver
processos de resistência cultural para poder sobreviver. Talvez um dos mecanismos
mais fortes fosse a miscigenação com a população nativa, índios, brancos e negros.
Como já foi dito anteriormente, cerca de trinta por cento da população do período
colonial eram descendentes dos cristão-novos. Dentro desse processo de
resistência, foi possível a eles manter elementos da sua cultura. “Do ponto de vista
psicológico, os brasileiros cristão-novos mantiveram algumas características
provenientes de sua condição de excluídos, que marcou o seu comportamento e sua
filosofia de vida”. (NOVINSKY, 2001, pp. 1-2).
Para muitos judeus, a alcunha de cristão-novos que lhes é atribuída fazia com
que vivenciassem uma experiência angustiada, pois tinham que viver uma dupla
identidade, uma vez que no seu íntimo ainda se sentiam judeus. Por ter que viver
escondendo a sua origem judaica, essas pessoas passavam a praticar muitos dos
seus hábitos religiosos e costumes de um modo secreto.
Certos resquícios de seus atos religiosos foram legados à cultura brasileira,
que alguns estudiosos têm encontrado na língua portuguesa falada no
Brasil; outros os surpreendem em algumas superstições, e ainda terceiros
percebem-nos em atitudes que só podem ser produto de contaminação
religiosa-cultural. (IGEL, 1997, p. 10-11)
Um outro mecanismo de resistência desses judeus que aqui chegaram deu-se
por meio da literatura. Durante o período colonial, a Inquisição reprimiu com vigor
qualquer atividade cultural, artística e religiosa da comunidade judaica. A literatura
judaica aqui produzida não pôde ser publicada. Temos relatos de apenas três
escritores marranos que conseguiram ultrapassar as barreiras impostas pela
44
Inquisição, conseguindo passar elementos judaicos em suas obras: “Bento Teixeira,
no poema Prosopopéia, Ambrósio Fernandes Brandão, nos Diálogos das Grandezas
do Brasil, e Antônio José da Silva, no conto Obras do Diabinho da Mão Furada”.
(IGEL, 1997, p. 09).
O fato é que, nas origens da colonização do Brasil de 1500 até cerca de 1570,
os judeus tiveram um papel significativo na formação do novo país e vivenciaram
uma ampla integração na vida econômica e social do país. Sabe-se que, já nas
caravelas de Cabral, havia a presença de cristão-novos, e a primeira expedição de
exploração da nova terra foi entregue a um judeu marrano chamado Fernando de
Noronha, sendo que também o primeiro governador-geral do Brasil, Tomé de Sousa,
era marrano. Neste período, os judeus que para cá vieram alcançaram grande
prosperidade econômica, trabalhando bastante na agricultura e no comércio. Esta
prosperidade acabou gerando inveja e perseguição, fazendo com que a Inquisição
se voltasse contra eles.
O fanatismo religioso, presente em todas as religiões, e no catolicismo cristão
atuante na Inquisição, acabou por levar à fogueira e ao desespero milhares de
vítimas, dentre elas os judeus. Apesar de a Inquisição não conseguir no Brasil os
mesmos efeitos e alcance que atingiu em outros países, deixou as suas marcas na
história brasileira, sendo que a perseguição aos judeus cristão-novos ocupa papel
privilegiado em sua atuação.
45
3.2 TRADIÇÕES E ELEMENTOS CULTURAIS DOS JUDEUS MARRANOS NO
BRASIL COLONIAL
Para entendermos o processo de resistência cultural dos judeus no Brasil,
temos que partir do papel atuante da Inquisição, que obrigou os judeus a encontrar
meios de subsistirem como povo, mesmo que veladamente.
...os cristão-novos assistiam ao novo culto nas igrejas, murmurando para si
frases e expressões restritivas. Deveriam pronunciar mentalmente tais
fórmulas, sem que se proferissem palavras com os lábios... No Brasil,
durante a Visitação do Santo Ocio em Pernambuco, o Visitador, no dia 15
de Dezembro de 1594, registrou uma denúncia contra o cirurgião cristão-
novo Fernão Soeiro que "à missa, quando o sacerdote alçava a Deus,
alçando a hóstia sagrada" foi visto estar de joelhos e batendo nos peitos
para dissimular, mas pronunciando "eu creio no que creio... (LIPINER,
1998, p. 214).
Fato é que na memória histórica do povo judeu, ao longo dos tempos, e aqui
no Brasil, os fatos e acontecimentos ficaram registrados em forma de midrash,
interpretando os acontecimentos sob uma ótica bíblica, revelando o espírito da
palavra e da Lei, ou seja, histórias que passaram de geração em geração e puderam
chegar até o século XXI. Devido a condições históricas, esta memória coletiva foi
silenciada, porém continuou a ser vivida na intimidade dos lares.
Os passos perdidos dos judeus na historiografia brasileira são agora
recuperados, porque eles referenciaram e estruturaram uma memória
coletiva, definindo o seu lugar na História e no quadro espacial onde eles
ocorreram. A memória assim valorizada não aceita o desenraizamento das
origens e conseqüências do movimento migratório, primeiro dos cristão-
novos, depois o dos judeus portugueses de Amsterdã, desde o século XVI.
Sim, porque eles vieram para ficar. Em Pernambuco, suas vivências foram
como âncora e plataforma da identidade sefardi. Viveram paradoxalmente
seus ritos e costumes entre as práticas sincréticas e/ou clandestinas.
Silenciaram aparentemente enquanto os desajustamentos dos tempos e
dos homens nas sociedades, medieval e moderna, desmanchavam valores
e tradições. Todavia, foram suficientemente sólidos como grupo étnico-
religioso para se lançar no futuro, trazendo do passado resíduos culturais
para, mais uma vez, com eles, recriarem suas tradições. (KAUFMAN, 2006,
p. 22-23).
46
Como diz Tânia Kaufman, os judeus foram suficientemente fortes para
sobreviver como grupo étnico-religioso, apesar das adversidades e perseguições. O
judeu religioso não comporta uma visão materialista do mundo, agindo sempre
dentro de uma ética religiosa e lutando contra submeter a espiritualidade ao mundo
político e econômico. Naturalmente exerce um papel de resistência cultural dentro do
contexto em que se encontra inserido. Exatamente por ter a religião como um
elemento essencial da sua vida e cultura, os judeus, mesmo se convertendo ao
Cristianismo, foram capazes de manter e transmitir muito da sua cultura para as
futuras gerações.
O Judaísmo, para o judeu, é uma religião que acredita que o futuro da
humanidade se baseia em um progresso ético fundamentado na fé em Javéh, Deus
único, pregado pelos profetas, sendo que o papel do judeu praticante foi expresso
pelo profeta Miquéias 6, 8: “Já te foi dito, ó homem, o que convém, o que o Senhor
reclama de ti: que pratiques a justiça, que ames a bondade, e que andes com
humildade diante do teu Deus.” (BÍBLIA DE JERUSALÉM, 2002).
47
Fonte: faculty.luther.edu/.../first%20days/day2.html
Figura 6. A Torah
Não podemos olhar para o Judaísmo apenas como um conjunto de dogmas e
doutrinas. Ao estudar o Judaísmo, entra-se em uma experiência de vida e fé de um
povo, com suas relações conflitivas e existenciais para com o seu Deus e para com
o próximo. É uma religião da tradição, valorizando a teoria e a prática, a moral e o
culto. É uma religião em que o povo acredita ser o Povo Eleito por Deus para uma
missão de dar testemunho ante a humanidade. É impossível para o Judaísmo
separar a sua realidade histórica da sua realidade teológica e mística. E exatamente
por isso, os judeus, ao ser obrigados a se converter ao Cristianismo, puderam
48
continuar a viver na intimidade de seus lares e no seu íntimo muitos dos costumes e
práticas do Judaísmo.
A seguir, conforme pesquisa realizada no site
http://www.geocities.com/brasilsefarad/costumes.htm, no dia 08 de junho de 2005,
veremos alguns dos costumes e práticas dos judeus cristão-novos no Período
Colonial, que ainda são observados por muitas famílias brasileiras hoje, muitas
vezes sem haver a consciência de que tais práticas têm sua origem nos rituais
judeus.
Para cada momento da vida diária havia regras e costumes que os judeus
seguiam e, mesmo se convertendo ao Cristianismo, os marranos mantiveram estas
tradições. Quando do nascimento de uma criança, tinham o costume de colocar a
cabeça de um galo em cima da porta do quarto onde o nascimento iria acontecer,
prática esta que ainda é mantida em muitas casas do interior mineiro e nordestino.
Outra tradição que se mantém por ocasião de um nascimento é a parturiente
guardar resguardo. Depois do nascimento, a mãe cristã-nova não deveria descobrir-
se ou mudar de roupas durante 30 dias. Ela deveria permanecer em repouso em sua
cama, e ser afastada do contato com outras pessoas, pois segundo a Lei, a mulher
fica impura durante 30 dias após um parto. Esta prática é bastante comum ainda em
vários lugares do Brasil, sendo muitas vezes o período estendido para 40 dias. Eu
mesmo me lembro de minha mãe, quando teve o seu último filho, deitada no seu
quarto em lençóis brancos, em repouso e resguardo durante trinta dias. Comendo
canja de frango, a qual daria “sustância”, força para a recuperação.
Outra prática comum era realizar a circuncisão ou mesmo batizar o menino ao
oitavo dia de nascido. Na tradição judaica, presente no Antigo Testamento, Deus
instituiu um sinal visível da sua graça para ser aplicado ao seu povo: a circuncisão
49
(Gênesis 17.12). Pela circuncisão, as crianças do povo judeu, no seu oitavo dia de
vida, eram "seladas" como pessoas consagradas a Deus por seus pais, que
assumiam o compromisso de criá-las para o serviço do Senhor, ensinando-lhes o
caminho em que deveriam andar (Provérbios. 22.6). Os Judeus Marranos,
convertidos ao Cristianismo, mantiveram esta tradição do oitavo dia, substituindo
muitas vezes a circuncisão pelo batismo cristão, ou então fazendo os dois rituais, a
circuncisão como rito familiar e o batismo como rito público. Esta prática da
circuncisão provavelmente foi assimilada pelos judeus dos egípcios. Trata-se de um
rito de inserção da criança na comunidade judaica. Deus tornou obrigatória a prática
da circuncisão masculina para Abraão, um ano antes de Isaque nascer. A
desconsideração deste requisito por parte de qualquer descendente de Abraão era
punível com a morte. A circuncisão torna-se um requisito obrigatório na Lei Mosaica.
(Levítico 12:2, 3) Para os judeus esta prática é tão importante que, mesmo se o 8.º
dia caísse no dia de Sábado, a circuncisão deveria ser realizada. Romper com esta
tradição se mostrou algo muito difícil para os cristã-novos, sendo que esta é uma
prática ainda muito comum em algumas familias.
Nos ritos matrimoniais, destacamos uma prática ainda presente em muitas
famílias brasileiras, que é o ato do noivo e da noiva comerem do mesmo prato e
beberem do mesmo copo durante o banquete de casamento, o que simboliza a sua
união. Esta é uma prática comum da cultura judaica que se enquadra bem no
contexto social brasileiro.
Para os Judeus a prática de jejuns é algo comum e esta prática foi mantida
por muitos dos cristão-novos no Brasil, assim como muitas outras restrições
alimentares como não comer carne com sangue. Não comer carne de porco, pois é
considerada impura. Não cozinhar carne e leite juntos.
50
Há ainda hoje um hábito muito difundido, especialmente no interior, de
derramar um pouco da bebida e da comida “para o santo”, com raízes na páscoa
judaica. Para os judeus, "os hábitos e as interdições alimentares funcionam como
poderosos cimentos culturais que são sinal de identidade e da alteridade do grupo"
(MONTANARI, 1998, p. 313).
Quanto aos ritos funerários, vários são ainda observados com relativa pureza.
A prática de lavar o corpo e vesti-lo de branco, guardando os sete dias de luto
prescritos pela tradição judaica, é ainda muito comum no interior do Brasil. Inclusive,
muitos dos homens não se barbeiam por um período de trinta dias após o
falecimento de um parente próximo. A roupa do falecido é oferecida a um pobre.
Outra prática nitidamente criptojudaica é a de purificar a casa depois de um
falecimento, fazendo uma faxina geral, sem usar água. Outro costume funerário
após a saída do corpo é o de cobrir todos os espelhos da casa.
Em algumas cidades do interior brasileiro havia o chamado “abafador”, que
deveria ajudar alguém gravemente doente a morrer antes que um médico viesse
examiná-lo e descobrisse que o enfermo era judeu. O abafador, a portas fechadas,
sufocava o doente, proferindo calmamente a frase “Vamos, meu filho, Nosso Senhor
está esperando!”. Feito o trabalho, o corpo era recomposto e o abafador saía para
dar a notícia aos parentes: “ele se foi como um passarinho...”. Esta frase ainda é
muito comum em muitas famílias, quando se comunica a morte de alguém.
51
3.3 COSTUMES DOS CRISTÃO-NOVOS NO PERÍODO COLONIAL AINDA
PRESENTES NA SOCIEDADE BRASILEIRA HOJE.
8
Acender velas nas sextas-feiras à noite.
Celebrar a Páscoa, e jejuar durante a Semana Santa. As datas da Páscoa
Cristã e da Páscoa Judaica freqüentemente coincidem.
Limpar a casa nas sextas-feiras durante o dia.
Era proibido fazer qualquer coisa na sexta-feira à noite (até mesmo lavagem
de cabelo).
Realizar alguma reunião familiar nas sextas-feiras à noite.
Aos sábados, velas eram acesas diante do oratório e deveriam queimar até o
fim do dia.
Havia roupas especiais para o sábado. Às vezes eram simplesmente roupas
novas ou roupas limpas.
Dizeres comuns: “O Sábado é o dia da glória”, ou “Deus te crie” (Hayim
Tovim), para quando alguém espirrava.
Comemorações diferentes das católicas, como o “Dia Puro” (Yom Kippur) ou
algum feriado de Primavera. Era costume de alguns acender no Natal oito velas.
Em imitação a alguns personagens bíblicos, quando acontecia algo
importante, rasgavam-se as vestes.
Um costume ainda muito comum hoje em dia é varrer o chão longe da porta,
ou varrer a casa de fora pra dentro, com a crença de que se o contrário fosse feito
as visitas não voltariam mais. Na verdade esta prática esligada ao respeito pela
8
http://www.geocities.com/brasilsefarad/costumes.htm 19/06/2006.
52
Mezuzah, que era pendurada nos portais de entrada, e passar o lixo por ela seria um
sacrilégio.
Ao abençoar um filho, neto ou sobrinho, costumava-se fazê-lo com a mão
sobre a cabeça.
Como o dia judaico começa na noite do dia anterior, o início de um dia era
marcado pelo despontar da primeira estrela no céu. Assim, o sábado (dia de
celebração nas casas judaicas) começava com o despontar da primeira estrela no
céu da sexta-feira. Se uma pessoa demonstrasse alguma reação publicamente com
relação a tal estrela, ela seria alvo de suspeitas. Um adulto consegue conter-se, mas
uma criança, não. Então ensinava-se às crianças a lenda de que apontar estrelas
fazia crescer verrugas nos dedos.
O que está relacionado acima não é apenas um elenco de costumes e
tradições dos descendentes de judeus no Brasil. Trata-se da prática de uma
resistência cultural, praticada muitas vezes de forma velada e silenciosa, e suas
origens se perdem no tempo.
3.4 RESISTÊNCIA DOS JUDEUS MARRANOS NO BRASIL COLONIAL
O Brasil, desde meados do século XVI, tinha se tornado um refúgio para os
marranos, que aqui podiam abertamente professar a sua fé em Javéh ou, de uma
forma mascarada, como cristãos, refugiar-se contra as perseguições da Inquisição.
Como já vimos anteriormente, os Judeus Marranos tiveram um papel importante na
formação e no desenvolvimento socioeconômico e cultural brasileiro. Dentro desta
53
contribuição cultural, insere-se a contribuição religiosa, uma vez que para os judeus
a religião judaica é a espinha dorsal da sua cultura.
Fator importante para preservar muito da cultura judaica no Brasil e
especialmente no Nordeste foi a ocupação holandesa do Brasil, entre 1624-54, a
qual veio garantir plena liberdade de expressão religiosa aos judeus Sefaraditas,
assim como aos povos indígenas. Neste período, tem-se uma grande imigração de
Sefaraditas, vindos de Amsterdã e outras cidades holandesas. Em 1642, cerca de
seiscentos Sefaraditas deixaram Amsterdã para o Brasil, principalmente Recife.
Dentre eles, encontra-se o rabi Isaac Aboab da Fonseca, que fundou a primeira
Sinagoga das Américas.
Vindos da Hollanda, onde foram especialmente convidados para a direção
espiritual dos judeus no Brasil, chegaram aqui em 1642 o rabbino Izhack
Abuhab da Fonseca e Moysés Raphael de Aguillar. A comunidade judaica
de Pernambuco iniciava officialmente a sua vida cultural sob todos os
aspectos pois que as personagens que se collocavam á sua chefia, eram
de invulgar cultura, relacionadissimas e altamente prestigiadas em
Amsterdã. (RAIZMAN, 1937, p. 76).
Em pouco tempo, a comunidade judaica no Brasil cresce bastante, pois, com
Maurício de Nassau, governador do Brasil holandês entre 1637-44, a tolerância e
liberdade de expressão religiosa passou a ser praticada. Neste período, em que o
Brasil Holandês ficou livre da Inquisição, muitos criptojudeus voltaram abertamente
ao Judaísmo, sem medo de represálias.
54
Este foi o primeiro rabino das américas,
líder da Sinagoga supra exibida Tsur
Israel em Pernambuco. Este foi
sepultado em Ouderkerk na Holanda no
cemitério israelita Beit Chaim (Casa da
Vida). A letra 'F' na parte central do
túmulo indica o sobrenome 'Cristão-
Novo'
- Fonseca.
Fonte: The Beth Haim of Ouderkerk, L.A. Ve ja Holanda 1994.
Figura 7. Lápide tumular de Ishac Aboab da Fonseca
Porém, em 23 de Janeiro de 1654, os holandeses são expulsos do Recife. A
partida dos holandeses marcará o fim da comunidade judaica brasileira no Brasil
colonial, e o Judaísmo voltará a ser praticado clandestinamente. De um modo geral,
as mulheres, na intimidade dos lares, passaram a ter um papel preponderante na
resistência cultural judaica no Brasil.
Impedidos de denunciar suas preferências doutrinárias, e procurando
driblar as desconfianças da sociedade, os criptojudeus viam-se obrigados a
abandonar certas cerimônias marcantes da sua profissão de fé em favor de
práticas menos conhecidas ou delatoras de sua real entrega religiosa:
substituíram-se assim, as circuncisões pelas orações e vigílias domiciliares;
a guarda pública de certas datas e festas, como o Ano Novo ou o
Pentecostes, pelos jejuns. Com o mesmo intuito, celebrações que no
Judaísmo tradicional ocupavam posição de menor destaque passavam, por
serem menos acusadoras, a tema central da resistência marrana, como foi
o caso do Jejum de Ester, rainha judia que escondia suas origens ao
próprio marido, vivendo, como os criptojudeus, da dissimulação, tornando-
se a "Oração de Ester" a "prece marrana por excelência". É bastante
55
significativo o fato de ser uma mulher a heroína dos cristão-novos, e o
exemplo de Ester se repetiria constantemente devido às necessidades
impostas aos criptojudeus. O Judaísmo de "portas a dentro" mostrar-se-ia,
nos mais ínfimos detalhes, influenciado pela figura da mulher. (ASSIS,
2002, p. 55).
A resistência através das mulheres se mostrou muito mais eficaz, pois eram
elas que agregavam a família e se dispunham a realizar os ritos, comidas e orações
judaicas na intimidade dos lares. Este papel preponderante de resistência feminina
não passou despercebido à Inquisição, e o número de mulheres acusadas de cripto-
judaísmo durante o período colonial é muito grande.
Sustentáculos da religião proibida, as "mulheres cristão-novas
apresentaram no Brasil uma resistência passiva e deliberada ao
Catolicismo." Foram prosélitas, recebiam e transmitiam as mensagens
orais e influenciavam as gerações mais novas", cientes da necessidade de
encobrir seus verdadeiros objetivos. Transmitindo os ritos religiosos ao
praticá-los nas residências, realizavam o rabinato diminuto, feminino e oral
que se tornara possível e que, embora contrariasse o códice mosaico,
garantiu-lhe a sobrevivência. Conforme lembra Elias Lipiner, dizia-se à
época das mulheres neoconversas que, "devotas e rezadeiras, iam nos
domingos e dias santos ouvir missa", procurando evitar, perante a
sociedade, as desconfianças sobre sua real entrega ao Catolicismo, "mas
nos sábados vestiam seus melhores vestidos", preparando-se para o
sagrado dia de descanso dos judeus, reunindo a família para celebrar os
costumes de seus antepassados. (ASSIS, 2002, p. 56).
O Brasil, pelo seu tamanho continental, favoreceu a prática da resistência
criptojudaica, e os tribunais da Inquisição o lograram alcançar todos os recantos
desta terra. A pouca presença demográfica tamm acabou por ocasionar os
casamentos miscigenados entre os “cristão-velhos e os cristão-novos”, e com estes
casamentos, acabou tamm por ocorrer a miscigenação dos costumes.
O estreito convívio entre os grupos traria não só a miscigenação
sangüínea, mas também a de costumes. Muitos foram os casos de
confessores e denunciantes que relatariam ao Santo Ofício práticas
hebraicas como sendo costumes familiares herdados dos antecessores,
como jogar fora a água de casa quando do falecimento de alguém, o modo
de preparo ou recusa a certos alimentos, ou ainda a forma de benzer os
filhos, afirmando ao visitador desconhecerem-lhes a "condenável" origem.
Mesmo alguns cristão-velhos, a princípio insuspeitos de cripto-judaísmo por
serem isentos de qualquer mácula sangüínea, confirmariam esta realidade,
ao reconhecerem a adoção de alguns destes hábitos definidores do
Judaísmo por ignorância, tornando-se comparsas involuntários do cripto-
judaísmo brasílico. (ASSIS, 2002, p. 52).
56
Observa-se que a cultura religiosa judaica, mesmo após muitas gerações,
resistiu na memória coletiva, em grande parte pela atuação das mulheres, que
assumiram para si a função de continuadoras das tradições e costumes do povo
judeu, em princípio conscientemente e depois como algo natural da vida cotidiana. A
situação dos cristão-novos no Brasil colonial era instável, e apenas após algumas
gerações estas famílias se estabeleceram mesmo em algum sítio geográfico, pois
tinham que mudar constantemente e, por isso mesmo, acabaram por se espalhar por
todo o país.
A mobilidade dos cristãos-novos na Colônia brasileira foi freqüente e
ininterrupta. Apesar de encontrarmos famílias radicadas durante gerações
nas mesmas regiões, de um modo geral a população cristã-nova
apresentava uma grande instabilidade. A vigilância constante a que
estavam expostos por parte dos agentes inquisitoriais muitas vezes
impedia a sua radicação, mas foram também interesses econômicos que
os levavam a residir temporariamente em vários lugares. Francisco Nunes
de Miranda, por exemplo, tinha casa na Bahia, Rio de Janeiro e Rio das
Mortes e fazia negócios com o magnata Francisco Pinheiro e com seu
parente José da Costa que trazia escravos da Costa de Marfim e Angola
para o Brasil. (NOVINSKY, 2001, p. 167).
Neste contexto de mobilidade, a oralidade e os costumes familiares passam a
ser elementos fundamentais para manter o modus vivendi dos Judeus Marranos.
Através da repetição dos ditos, ritos e costumes, as mulheres marranas imbutiram
nos seus descendentes uma identidade judaica latente.
Toda a arte do orador consiste talvez em dar àqueles que o ouvem a ilusão
de que as convicções e os sentimentos que ele desperta neles não lhes
foram sugeridos de fora, que eles nasceram deles mesmo, que ele
somente adivinhou o que se elaborava no segredo de suas consciências e
não lhes emprestou mais que sua voz. (HALBWACHS, 1990, p. 47).
Talvez esta seja a melhor forma de resistência contínua dos judeus e tamm
de outros povos oprimidos, pois, através da oralidade, na medida em que
simplesmente cedem sem resistência a uma sugestão ou prática, passam a acreditar
que pensam e sentem livremente. Esta vivência acaba por ser incorporada como
algo natural e passa a ser repetida despercebidamente e se incorporando ao
57
contexto social em que o grupo se encontra. Como diz Halbwachs, não é na história
aprendida, e sim na história vivida que se apóia nossa memória. (1990, p.60).
3.5 MEMÓRIA COMO ELEMENTO DE RESISTÊNCIA E SOBREVIVÊNCIA DOS
JUDEUS NO BRASIL
O conceito de memória e a maneira como esta funciona tem sido tema dos
estudos de filósofos, antropólogos e de cientistas já há muito tempo. É um conceito
em constante modificação e que se adapta às necessidades de cada povo e lugar,
conforme a necessidade. Em cada época e lugar, a memória tem sido explicada
através de metáforas que retratam melhor o momento histórico. Cícero explica a
memória como sendo as marcas deixadas na cera pelos homens.
A memória se modifica e se rearticula e também está submetida a questões
inconscientes, como o afeto, a censura, entre outros. As memórias individuais
alimentam-se da memória coletiva e histórica e incluem elementos mais amplos do
que a memória construída pelo indivíduo e seu grupo. Sendo este o caso dos
judeus, que individualmente e no ambiente familiar, alimentaram a memória coletiva.
"Cada memória individual é um ponto de vista sobre a memória coletiva, [...] este
ponto de vista muda conforme o lugar que ali eu ocupo, e [...] este lugar mesmo
muda segundo as relações que mantenho com outros meios." (HALBWACHS, 1990,
p.51).
A linguagem é um dos elementos mais importantes, que afirmam o caráter
social da memória. Os indivíduos de um grupo se utilizam da linguagem para
transmitir suas informações. A linguagem é o instrumento socializador da memória,
58
pois ela é capaz de estender a todo o grupo social as vivências e experiências
individuais e coletivas do passado e do presente.
As palavras também são mais numerosas do que as letras, e as
combinações de palavras são mais numerosas do que as próprias
palavras. O que há de novo em cada página não são as palavras, nem
mesmo os membros da frase: tudo isto reteríamos bem depressa. O que é
preciso reter agora ou compreender, aquilo sobre o que a atenção deve se
concentrar, é a combinação dos temas elementares, das combinações de
notas ou de palavras já conhecidas. Assim se encontra reduzida e
simplificada a tarefa da memória. (HALBWACHS, 1990, p.170).
A memória tamm pode ser apontada como um objeto de luta pelo poder
entre diferentes classes, grupos e indivíduos. Ao se decidir sobre o que deve ser
lembrando e esquecido, acaba-se por exercitar o poder de controle da memória
coletiva. Os judeus no Brasil, ao ter que manter clandestinamente a sua identidade,
vivendo sob uma aparência cristã, mas mantendo tradições, usos e costumes
judaicos, acabaram por selecionar e manter vivos na memória coletiva os elementos
mais importantes de sua cultura. Como diz Halbwachs, "não é possível reter uma
massa de lembranças em todas as suas sutilezas e nos mais precisos detalhes, a
não ser com a condição de colocar em ação todos os recursos da memória coletiva."
(1990, p. 187).
Neste aspecto, pode-se afirmar que os judeus, mesmo estando espalhados
pelos quatro cantos da terra, conseguiram manter a memória cultural e religiosa de
seu povo e, para isto, utilizaram-se de práticas várias de resistência, com recursos
que possibilitaram a sobrevivência deles como nação. No caso brasileiro, em que os
judeus, em sua grande maioria, acabaram por ser assimilados pela maioria católico-
cristã, muito da cultura e prática dos judeus permaneceu latente na memória coletiva
de seus descendentes.
Esta memória coletiva tem assim uma importante função de contribuir para o
sentimento de pertinência a um grupo de passado comum, que compartilha
59
memórias. Ela garante o sentimento de identidade do indivíduo calcado numa
memória compartilhada não só no campo histórico, do real, mas sobretudo no
campo simbólico. Dentro deste campo simbólico, vale ressaltar aqui o papel que Jó,
da literatura bíblica, tem como campo simbólico para os judeus e seus descendentes
no Brasil. Faz parte dos ditos populares “ter uma paciência de Jó”, como símbolo de
resignação diantes dos problemas e dificuldades. Henri de Ternay, em seu Livro de
Jó: Da Provação à Conversão, um Longo Processo (Vozes, 2001), procurou mostrar
na introdução de sua obra que o Livro de Jó na Bíblia trata do enigma do mal e dos
caminhos que levam o homem ao sofrimento e como se deve comportar diante das
adversidades da vida.
O fio condutor do Livro de Jó é o enigma, mashal. Ternay demonstra que Jó
soube aproveitar-se das experiências adversas da vida e com isto conseguiu evoluir
e superar todas as provações. A grande mensagem é que não se pode ter resposta
para tudo, que não se tem a última palavra e que a vida é finita. A base de Jó é uma
crise de fé e não de sofrimento. O autor mostra que o livro de Jó aponta para a
superação dos medos em relação ao destino e às adversidades da vida. Propõe
uma reação contra as teologias que aumentam o sofrimento, propondo aos seres
humanos que se tornar agentes de sua própria história coletiva e individual. Os
Judeus Marranos, vindos para o Brasil, diante das adversidades apresentadas,
acabaram por se tornarem agentes de sua própria história, resistindo diante de todas
as situações difíceis que se apresentavam. Esta resistência foi tomando
características que aparentemente fazem pensar que os judeus acabaram
assimilados à cultura cristã dominante. Porém, como continuaram a praticar os seus
ritos, costumes e tradições dentro de casa, de um modo velado, acabou-se por
preservar muito da cultura judaica. Aqui devemos falar da importância da Toráh,
60
Mitzvá, Kabalá e Mishná para os judeus, que, tendo estes elementos como base
reguladora e formadora da sua cultura, foram capazes de se adaptar à nova
realidade apresentada no Brasil.
A Bíblia judaica compõe-se de textos que foram reunidos pelos antigos
hebreus e preservados através dos séculos como o seu Livro Sagrado. É dividido
em três partes: a Toráh ou Pentateuco, os Profetas e os Escritos (salmos, provérbios
e outros). A Toráh ou Bíblia hebraica é um relato dos acontecimentos desde o
princípio do mundo até a morte de Moisés, contendo leis e mandamentos decretados
por Deus. Trata-se de um documento essencialmente espiritual para os judeus e se
constitui no guia básico para o Judaísmo teórico e prático. Para os judeus
convertidos ao Cristianismo, o acesso à Toráh era difícil, porém as famílias cristã-
novas davam ênfase acentuada ao Antigo Testamento das Bíblias Cristãs, pois
estas constituem praticamente a Bíblia Judaica. Ainda hoje, em muitas famílias
descendentes dos Judeus Marranos, a Lei de Moisés e o Antigo Testamento ocupa
lugar privilegiado na religiosidade.
Mitzvá significa literalmente “um dever judaico que deve ser praticado”. Além
de ser uma boa ação, é uma obrigação que se pratica para com Deus e para com o
próximo. Existem 613 mitzvot ou mandamentos, que são divididos em positivos e
negativos, 248 "farás" e 365 "não farás". Estes mandamentos abordam todos os
aspectos da vida humana, não só a observância religiosa e ritual, mas tamm a
moral e a ética no dia-a-dia. Como a prática destes mandamentos está incorporada
à vida cotidiana, é fácil deduzir que, mesmo tendo sido obrigados a se converterem
ao Cristianismo, os Judeus Marranos mantiveram a prática dos mitzvot como uma
prática natural e comum das famílias. Para um judeu, cumprir um mitz é parte da
própria identidade e sinal de pertença à nação judaica.
61
A palavra Kabalá significa "recebimento", "tradição", e denota o conjunto das
doutrinas místicas do Judaísmo, transmitidas de geração em geração. A Kabalá visa
a estabelecer uma comunhão pessoal e íntima entre o ser humano e Deus, uma
linha direta entre a alma e Javéh. Nesta busca, utilizam-se contemplação,
especulação teológica, canto, dança e êxtase. Uma das bases da Kabalá é a das
Sefirot, que são dez atributos originários de Deus e que se corporalizam no ser
humano. O homem, assim, passa a ser um agente de Deus, com potencial para
aperfeiçoar o processo da criação. Para o místico seguidor da Kabalá, o templo mais
sagrado é o seu próprio eu. Como os judeus no Brasil colonial não contavam com
sinagogas e não podiam vivenciar abertamente a sua fé, a prática da Kabalá, com
ênfase no individual e no contato direto com Deus, torna-se um dos modos de se
manter a identidade judaica.
O povo judeu tamm desenvolveu uma série de leis suplementares, que
eram transmitidas oralmente de geração em geração, sendo compiladas por volta do
século III da Era Comum. A este código deu-se o nome de Mishná, juntamente com
a Gemará, que são comentários e interpretações rabínicas das leis da Mishná.
Formam o Talmude. Existem duas versões do Talmude: o de Jerusalém e o
Babilônico, sendo que o mais completo é o Babilônico. Como são comentários, o
Talmude não é conciso. Porém, como possui uma riqueza de leis, tradições e
costumes, tem influenciado o pensamento e a prática judaica. Muitos dos usos e
costumes dos Judeus Marranos se encontram no Talmude e também foram
incorporados na vida diária das famílias cristã-novas.
A cultura judaica foi criada através dos séculos por eruditos que eram
incapazes de esquivar-se da influência da esfera talmúdica. O Talmud não
é simplesmente importante num plano intelectual e literário; tem também
implicações sócio-históricas de grande alcance. (CORDEIRO, 2002, p. 40-
41).
62
Estes quatro elementos acima citados formam a base reguladora e formadora
da cultura judaica e, exatamente por estarem vivos e gravados na memória coletiva
dos judeus, permitiram aos cristão-novos a adaptação à nova realidade apresentada
no Brasil.
A memória é a essência da esperança para o judeu. O judeu é a soma de
suas memórias do passado e do futuro. Do ponto de vista judaico, a memória
individual não está sozinha, pois ela é parte da memória coletiva. A mescla da
história individual e coletiva é que forma a identidade de um judeu. Por isto, a
Páscoa judaica, o Sêder de Pessah, é uma refeição que celebra a memória, pois
nela se lembra a identidade formadora do povo judeu.
Fonte: Gravura de Bernard Picard, 1725. Instituto da Biblioteca Nacional e do Livro Fotografia de
Laura Castro Caldas e Paulo Citra - Lisboa - Portugal
Figura 8. Refeição de Páscoa entre os judeus portugueses (Pessach Sefaradim)
63
Na Páscoa, o judeu se recorda do amor incondicional de Deus para com o
seu povo e é este amor incondicional que sustenta os judeus nas adversidades e
incertezas. As famílias marranas mantiveram o costume de celebrar a Páscoa e o
Sabath, mudando e adaptando o ritual às condições adversas.
É exatamente por estar viva a memória dos judeus, esta capacidade de
passar de geração em geração os seus ritos, tradições e costumes, que a identidade
judaica permanece, mesmo que de forma diluída, no contexto cultural e social dos
brasileiros descendentes dos marranos.
Sou parte de uma longa corrente humana formada desde os tempos
bíblicos até nossos dias, a corrente do Judaísmo. Reconheço-me nos
milhões de seres humanos com quem partilho a condição judaica; sofri com
aqueles que foram perseguidos, morri com aqueles que foram
exterminados, mas orgulho-me daqueles que deram a sua contribuição à
humanidade, nas artes, nas ciências, na literatura, na política. Não acredito
que alguém possa ser indiferente a seu Judaísmo. Tal forma de alienação
não é possível, mesmo num país como o Brasil, em que identidades
freqüentemente se desfazem naquilo que é chamado de 'geléia geral'. A
marca judaica pode tornar-se tênue, mas não se desfaz. (SCLIAR, 2000).
Para o judeu, o viver e contar a sua memória, transmitindo-a de geração em
geração, é o que forma a sua identidade. É um processo de continuidade,
resgatando sempre o seu legado cultural. Para Scliar, por razões históricas e
culturais, o judeu é um ser que experimenta a diferença de modo radical,
preservando assim o Judaísmo e sua rica cultura.
64
4 ELEMENTOS DA CULTURA JUDAICO-MARRANA NO BRASIL HOJE
4.1 CRISE DE IDENTIDADE E RESISTÊNCIA
Como já foi abordado anteriormente, o cripto-judaísmo continuou latente no
Brasil Colonial. Apesar da Inquisição e de todas as restrições impostas, foi possível
para os cristão-novos manter muito dos usos e costumes de seus antepassados
judeus. A mulher marrana, na intimidade do lar, desempenhou papel fundamental
para a transmissão desta cultura às gerações seguintes. Porém, como lembra Elias
Lipiner, em entrevista à revista Judaica, com o passar do tempo, este “Judaísmo”
acabou por se reduzir a práticas e costumes inconscientes.
O Judaísmo das gerações intermediárias, de descendentes de conversos,
alimentava-se já por preceitos que seus ascendentes tinham deixado por
memória. Manifestava-se por meio de um ritual passivo de sincretismo
religioso. Por não saberem mais hebraico, mas memorizando quanto mais
podiam a tradição velha, esses cristão-novos se encomendavam a seu
Deus com as orações cristãs. Recitavam, por exemplo, os Salmos de
David, porém sem acrescentar no fim o versículo "Gloria Patri", próprio da
doutrina cristã, porque ela condensa o dogma da Trindade. À medida que
avançava o tempo, afastando-se os descendentes dos conversos ainda
mais da época da conversão de seus ancestrais, o seu Judaísmo
progressivamente se tornava mais reduzido, a ponto de ser praticado
muitas vezes não com intenção de judaizar, mas antes por costume, por
insinuações de membros mais idosos da família, seguidas por razões de
hierarquia doméstica. (LIPINER, 1998).
O começo do século XXI demonstra que a humanidade passa por uma
profunda crise, que vai desde suas representações simbólicas, os seus valores
sociais e éticos a uma reconceituação sobre o papel do ser humano em um mundo
globalizado. É uma crise de identidade do homem, de suas potencialidades e das
suas relações com o outro e com o mundo real. O ser humano já não mais se
encaixa nas definições previamente estabelecidas, questionando cada vez mais qual
65
o seu papel diante do universo. Os judeus, ao serem obrigados a se deslocar
geograficamente de um ponto para outro, deixando para trás muito das suas raízes,
sofreram, assim como os africanos que foram trazidos para o Brasil, vários
processos de adaptação para poder sobreviver. Como foi dito anteriormente, a
memória foi e é o elemento central que mantém a cultura deste povo ainda viva,
apesar de todas as adversidades.
Em uma sociedade pré-moderna, o sistema de parentesco proporcionava um
modo relativamente estável de relações sociais, onde todos se conheciam e se
protegiam. Como vimos, para os judeus, o sistema de parentesco e família é muito
importante, porém, com a dispersão e perseguição que sofreram, muitas vezes a
desagregação familiar acabou por gerar um profundo desencaixe social e uma crise
de identidade. A comunidade local era o lugar primeiro onde formavam as relações
sociais, dentro de um espaço geográfico pequeno e conhecido. Estas relações
estabelecidas nestas condições perduravam através do tempo. Os judeus, como
povo e nação, acabaram por se tornar o primeiro povo “globalizado”, pois se
deslocaram com a sua cultura para praticamente todos os rincões da terra. Claro
que, juntamente com este deslocamento, o problema da resistência cultural se
apresentou, para permitir aos judeus e seus descendentes a sua identidade.
O fenômeno do Marranismo tornou-se um caso único de resistência cultural
dentro do Judaísmo. As tradições eram passadas oralmente pelas mulheres, que
cuidavam da educação dos filhos. As rezas eram adaptadas para se encaixar dentro
do modelo cristão imposto e os judeus, “cristãos”, santificaram alguns personagens
bíblicos, atribuindo-lhes nomes como Santa Ester e São Moisés. As velas do Sabáth
eram acesas escondidas, algumas vezes embaixo de mesas e/ou dentro de
66
armários, para não serem vistas e, assim, não colocarem a sua identidade judaica
em perigo.
O resgate de costumes e tradições presentes nos dias de hoje, e que tem sua
origem na cultura judaica, nada mais faz do que reencaixar os descendentes dos
marranos dentro do seu mundo simbólico. Os descendentes dos cristão-novos,
depois de cinco séculos de Brasil, foram quase totalmente assimilados, porém
incorporando inconscientemente à cultura brasileira parte de sua herança judaica.
Alguns legados marcantes da nossa cultura, principalmente no Nordeste, como
acender velas para os anjos, circuncidar os meninos ao nascer, enterrar os corpos
em mortalhas, retirar o sangue dos animais abatidos, não comer carne de porco e
fazer faxina às sextas-feiras, têm sua origem nos cristão-novos que por aqui
aportaram desde o descobrimento.
Os Judeus Marranos, mesmo dentro da rigidez das leis judaicas, acabaram
por improvisar e adaptar os seus ritos às novas realidades. Para os judeus, o rito
tem um papel primordial em sua vida diária, pois o rito implica a continuidade, a qual
tamm é observada no simples costume. Todavia, rito e costume são diferentes. O
rito tem sempre um elemento transcendente, enquanto o costume geralmente é
apenas uma repetição mecânica, sem qualquer outro significado. Estas concepções
são feitas pela sociedade e, na prática, não é tão fácil assim separar rito de costume
ou ato útil. Para os judeus, como a religião judaica é a sua própria vida, os ritos,
usos e costumes acabam por se mesclar, sendo quase impossível separar o que é
sagrado do que é profano.
Cazeneuve, no capítulo III do seu livro “Sociologia do Rito”, trata da natureza
e da função do rito, onde define o que se entende por “condição humana”, sendo
esta “o conjunto das determinações que se impõem ao indivíduo, isto é, o
67
condicionamento geral ou a totalidade das condições a que a sua acção está sujeita
e que limitam o campo do seu livre arbítrio ou da sua indeterminação.” (s/d, p. 23). O
homem é, ao mesmo tempo, um ser livre, porém submetido a coações, limitações,
impostas por ele mesmo ou pela sociedade. Portanto, o judeu marrano, dentro desta
liberdade, acaba tendo que se adaptar e se encaixar dentro da nova sociedade na
qual estava inserido.
4.2 DIFERENTES MODOS DE MARRANISMO
O termo “marrano” se refere aos Sefaraditas, nomenclatura usada como
referência aos judeus da Península Ibérica, que foram forçados a adotar a
identidade de cristãos, ou porque foram forçados como conseqüência da
perseguição promovida pela Inquisição, ou porque se converteram ao Catolicismo.
Muitos marranos mantiveram as suas tradições ancestrais como criptojudeus,
professando publicamente o Catolicismo, mas, dentro de seus lares, continuavam a
praticar o Judaísmo. Estes conversos, também chamados de cristão-novos, eram
bastante numerosos, e podem ser divididos em três categorias. A primeira é
composta por aqueles que deliberadamente não possuíam nenhuma afeição pelo
Judaísmo e eram indiferentes a qualquer forma de religião, e, tendo a oportunidade
de sair da condição de judeus oprimidos, abraçaram alegremente o Cristianismo.
Estes simulavam uma autêntica fé cristã quando isso lhes trazia vantagem, até
mesmo ajudando a depreciar publicamente outros judeus. A segunda categoria
consiste naqueles que cultivavam o amor pela fé judaica na qual tinham sido criados.
68
Estes preservavam as tradições de seus pais e, mesmo ocupando altas posições na
hierarquia social, arriscavam-se freqüentando secretamente sinagogas. Estes
marranos lutaram e sofreram pela religião de seus pais. A terceira categoria, que é
composta pela maioria dos marranos, é constituída por aqueles que,
temporariamente, devido a circunstâncias adversas, tiveram que adotar a fé cristã,
mas, em seus lares, permaneciam judeus e, na primeira oportunidade, voltavam de
bom grado à prática aberta do Judaísmo. Estes não batizavam espontaneamente as
suas crianças e, muitas vezes, ao serem obrigados a batizar seus filhos, ao chegar
em casa lavavam o local onde a criança havia sido aspergida. Estes marranos não
comiam carne de porco, celebravam a páscoa judaica, freqüentavam sinagogas
quando possível e praticavam as orações diárias e outros preceitos do Judaísmo,
principalmente guardando o sábado. Para os marranos, o seu lar era o local mais
importante. Daí advinha, conseqüentemente, a importância que dão à família e à
tradição.
Foram estes Judeus Marranos que vieram para o Brasil, buscando melhores
condições de vida e uma oportunidade de poder professar novamente a sua fé.
Porém, como já vimos, a Inquisição não tardou em chegar ao Novo Mundo,
obrigando estes judeus a adotar novos modos de resistência cultural e religiosa para
poder sobreviver. A maioria da população cristã nutria verdadeiro ódio pelos cristão-
novos, ou marranos, em intensidade maior do que o ódio aos judeus, sendo a
Inquisição muito mais severa em relação aos marranos. Este ódio vinha do fato de
eles considerarem os marranos como não sendo nem cristãos nem judeus, mas sim
ateus e heréticos. Em Portugal, muitos cristãos preferiam morrer a deixar-se tratar
por um médico marrano. Os cristão-novos que vieram de Portugal para o Brasil se
distinguiam muito pelos seus conhecimentos intelectuais, pela arte do comércio,
69
transações bancárias e outras atividades, sendo, por isso mesmo, invejados e
perseguidos.
4.3 MECANISMOS DE RESISTÊNCIA: MEMÓRIA
Tendo em vista todas essas condições adversas, o modo mais prático de os
judeus resistirem culturalmente como povo era praticar em público a fé cristã,
tentando preservar suas tradições, usos e costumes dentro da nova sociedade na
qual se encontravam inseridos. No Brasil, assim como em outros países onde se
estabeleceram, os Judeus Marranos tiveram que redefinir o seu conceito de
identidade pessoal e das relações que deveriam estabelecer com os cristãos que
habitavam o local. A melhor forma de resistência encontrada foi a de uma reserva
mental apoiada na memória secular transmitida oralmente de geração a geração.
Esta foi, dentre outras, a forma encontrada para que se mantivesse ativa e viva a
cultura judaica em terras brasileiras. Entretanto, na medida em que o tempo foi
passando, o rigor inicial que estes judeus tinham para com o rito e a liturgia foi se
reduzindo gradativamente de geração em geração e, ao mesmo tempo, mesclando-
se com as práticas do culto cristão, provocando um sincretismo religioso. “Como
manifestações coletivas, não é de estranhar a presença de fenômenos resultantes
de um sincretismo religioso-cultural afro-católico-indígena, também com influências
cristã-nova e judaica, dispersas no espaço nacional” (KAUFMAN, 2006, p. 05).
Este modo de resistência passiva para poder sobreviver, fundamentado em
um sincretismo sócio-cultural-religioso, faz com que as práticas do Marranismo
70
perdurem dentro da cultura geral brasileira, fazendo parte do mundo simbólico e da
memória coletiva brasileira. Resgatar estas tradições, usos e costumes é o desafio
que se apresenta aos descendentes dos marranos do século XXI.
Os cristão-novos ou marranos que vieram para o Brasil tiveram que elaborar
um estilo de vida diferente do estilo dos judeus que permaneceram na Europa. Em
aqui chegando, “desbravavam as selvas, cultivavam a terra, apressavam índios,
guerreavam jesuítas, ...” (NOVINSKY, 2001, p. 162). Foram pessoas que, ao se
verem obrigadas a se afastar da secular cultura judaica, assimilando elementos da
cultura dominante, acabaram por diferenciar-se dos judeus das outras regiões,
adquirindo hábitos e costumes que expressavam um sincretismo. Outra
característica dos marranos no Brasil colonial foi uma constante mobilidade
geográfica. Locomoviam-se dentro do território nacional de forma quase que
ininterrupta, pois assim fugiriam com mais facilidade da fúria persecutória da
Inquisição. Como nos lembra Anita Novinsky, não apenas em Minas Gerais, mas em
todo o Brasil, a acusação de Judaísmo não se aplicava apenas àqueles que
seguiam algumas normas alimentares, como o jejum, ou a guarda do sábado e
outros preceitos judaicos. Para Novinsky, a prática do Marranismo no Brasil se dá
mais por uma atitude mental, uma postura diante da vida. Com o passar do tempo, a
maioria dos marranos que conseguiram sobreviver acabaram por ser assimilados
pela sociedade, perdendo muito de sua memória. Todavia, houve um pequeno grupo
que resistiu a todas as adversidades, conseguindo manter-se fiel às tradições e à
memória de seus antepassados.
A transmissão da memória de uma história de vida sofrida durante séculos,
juntamente com a exclusão legal e social a que estavam sujeitos, reforçou
entre os cristão-novos a resistência na adoção dos preceitos da Igreja e
criou entre eles uma postura crítica frente à religião católica. A crítica
religiosa foi a grande contribuição que os cristão-novos no Brasil deram ao
pensamento ilustrado do século XVIII. (NOVINSKY, 2001, p. 170)
71
Marcel Proust, em seu livro Em Busca do Tempo Perdido, escreve acerca da
memória:
Mas quando nada subsiste de um passado antigo, depois da morte dos
seres, depois da destruição das coisas, sozinhos, mais frágeis, porém mais
vivazes, mais imateriais, mais persistentes, mais fiéis, o aroma e o sabor
permanecem ainda por muito tempo, como almas, chamando-se, ouvindo,
esperando, sobre as ruínas de tudo o mais, levando sem se submeterem,
sobre suas gotículas quase impalpáveis, o imenso edifício das
recordações. (PROUST, 1987, p. 5).
A busca deste “aroma” e deste “sabor” mencionado por Proust tem sido o
caminho para a busca da memória e da resistência cultural dos descendentes dos
Judeus Marranos em pleno século XXI no Brasil. Maurice Halbwachs (1990) diz que
pela memória o passado vem à tona, mesclando-se com as percepções imediatas,
empurrando-as para a periferia, ocupando todo o espaço da consciência. Para ele, a
natureza da lembrança é social, sendo ela resultante do efeito de várias séries de
pensamentos coletivos entrelaçados.
Para Halbwachs, algo fundamental acerca da memória coletiva, enquanto fato
social, seria o seu papel de âncora para cada indivíduo. Os homens devem apoiar-
se nesta âncora para poder recuperar o caminho de volta para o passado. É preciso
conectar os elos que se alojam entre passado e presente para que deles se possa
ativar a memória. Aqui se remete novamente ao “aroma” e ao “sabor” de que fala
Proust, pegadas, indícios, pistas... Uma memória coletiva é a interligação das
diversas memórias dos indivíduos que fazem parte do grupo identificado como
proprietário daquela memória. No nosso caso específico, os descendentes dos
Judeus Marranos. Vejamos a seguir alguns movimentos de resgate da memória
coletiva e cultural dos Judeus Marranos no Brasil do século XXI.
72
4.4 MOVIMENTOS DE RESGATE
A primeira instituição que visa a promover o resgate da identidade marrana é
a Associação Brasileira dos Descendentes de Judeus da Inquisição – ABRADJIN. A
ABRADJIN é um Departamento da Associação Ministério Ensinando de Sião - Brasil,
que é filiado ao Netivyah Bible Instruction Ministries – Jerusalém, Israel. É uma
associação aberta a todos os interessados em estudar o Marranismo e àqueles que
querem resgatar as suas origens judaicas. Esta instituição não tem caráter
denominacional e não está conectada a nenhuma entidade religiosa. A ABRADJIN é
uma entidade sem fim econômico ou lucrativo, semmero limitado de participantes,
tendo como objetivo principal auxiliar todo interessado em descobrir e restaurar suas
raízes judaicas, caso este acredite ter sua ascendência proveniente dos judeus
portugueses/espanhóis ou mesmo de outros países, que, devido à Inquisição,
vieram para o Brasil a partir do século XVI.
Fonte: http://www.ensinandodesiao.org.br/Abradjin/Figuras/marranos.gif
Figura 9. Panfleto de divulgação da ABRADJIN para os descendentes dos cristão –
novos no Brasil.
73
Especificamente, a ABRADJIN deseja auxiliar no resgate das raízes históricas
e genealógicas, bem como ressaltar a influência relevante que teve o povo judeu
representado aqui em grandes proporções pelos cristão-novos, tanto na colonização
do Brasil, como na formação do povo brasileiro. No site da ABRADJIN,
www.ensinandodesiao.org.br/Abradjin, constam os seguintes objetivos da
associação:
I - abrir espaço para que todo brasileiro descendente dos judeus Sefaraditas
portugueses, espanhóis, holandeses, marroquinos, etc., incluindo os denominados
cristão-novos e marranos, assim como outros interessados, possam ter o direito de
restaurar suas raízes judaicas, quer genealogicamente, quer resgatando os
costumes e tradições bíblicas;
II - criar um banco de dados sobre a história e a origem do povo judeu e
também como colonizador do Brasil;
III - conscientizar que o Brasil tem hoje, embora ignore, uma das maiores
colônias Sefardita (judeus Sefaraditas), marrana e cristão-novos do mundo;
IV - fomentar historiadores nacionais, e mesmo internacionais a reconhecer e
deixar de ignorar a numerosa imigração dos judeus portugueses a partir do
descobrimento do Brasil, assim como seu forte legado e sua real influência na
formação étnica, cultural e religiosa do povo brasileiro;
V - pleitear para que a restauração das raízes judaicas seja reconhecida e
aceita genealogicamente, independente do número de gerações antepassadas quer
do lado paterno ou materno, desde que comprovado. Assim, seria reconhecido o
direito de resgate da judaicidade após a chegada destes imigrantes desde o século
XVI ao Brasil;
74
VI - lutar para que o reconhecimento dos descendentes seja plenamente
aceito, não havendo uma classe de "meio judeus", uma vez que qualquer cidadão,
voluntariamente, tem o direito de resgatar suas origens sangüíneas e também
ideológicas, além de crenças, tradições e costumes inerentes a um determinado
povo;
VII - criar espaço, reconhecimento e divulgação junto aos órgãos públicos e
privados, entidades religiosas, quer a nível nacional ou internacional, da influência
do povo judeu na formação étnico-cultural brasileira além dos demais objetos do
presente estatuto;
VIII - conscientizar os interessados descendentes de judeus ibéricos que
colaboraram na colonização do Brasil de que o Deus Eterno de Israel nunca rejeitou
o seu povo escolhido, apesar do constante repúdio e perseguições sofridos ao longo
da história da humanidade e que o mesmo tem, conforme a Bíblia, propósitos e
planos proféticos para estes remanescentes quanto a restauração das tribos, do
povo, do Estado de Israel e para toda a preparação para a vinda do Messias;
IX - estimular a todos os interessados a reconhecerem o Deus Eterno e Único
de Israel através do estudo da Toráh e de toda a Bíblia;
X - abrir a ABRADJIN, incentivando e auxiliando, a todos os descendentes
dos chamados cristão-novos e marranos que desejam conhecer e ou restaurar suas
raízes judaicas, mesmo que estes não professem sua fé só na Tanach (Antigo
Testamento). Pois, é de esperar que muitos dos descendentes dos cristão-novos
são atualmente cristãos;
XI - considerar o pensamento de Ben Gurion de que "o verdadeiro judeu é
aquele que se diz e se sente judeu, vivendo como judeu, estando disposto a sofrer
todas as agruras passadas por este povo ao longo da história";
75
XII - resgatar todo e qualquer acervo histórico legado pelos judeus brasileiros
e portugueses (cristão-novos) no período da Inquisição, como fotos, literaturas,
documentos, certidões, etc., que permitam a criação no futuro de um Museu
Histórico Cultural. Parágrafo Único - Não é propósito desta associação fornecer
nenhum tipo de atestado comprovando ou garantindo a origem judaica do indivíduo.
A ABRADJIN está localizada na cidade de Belo Horizonte, no Estado de
Minas Gerais, que durante o período colonial teve uma grande presença de Judeus
Marranos. A Associação tem sido procurada por muitos brasileiros que querem
conhecer mais a história dos seus antepassados e resgatar parte de sua história e
suas raízes.
Outra instituição dedicada ao resgate da memória marrana no Brasil é o
Memorial Brasil Sefarad. Trata-se de um site na internet, criado por Yacov da Costa,
em 2001, basicamente com os mesmos objetivos da ABRADJIN, com vários artigos
e informações sobre os marranos no Brasil. O endereço virtual do Memorial Brasil
Sefarad é: http://www.geocities.com/brasilsefarad/marrano.htm
A Sociedade Hebraica para Estudo dos Marranos foi criada por Hélio Daniel
Cordeiro em 1990. A Sociedade também é conhecida como SHEMA, que, em
hebraico significa “Ouvir”. O objetivo da SHEMA é ajudar na pesquisa e divulgação
da participação dos judaizantes portugueses, na formação e desenvolvimento do
Brasil. Daniel Cordeiro, criador da SHEMA, tem ajudado muito na pesquisa sobre os
Judeus Marranos no Brasil, tendo escrito, dentre outros, os seguintes livros:
Judaísmo e Humanismo (1986), Israelitas na Cultura Brasileira (1994), Os Marranos
e a Diáspora Sefardita (1995), Judaísmo, Sefarad - Uma Arqueologia Cultural
(1997), O que é Judaísmo (1998) e A Filosofia na Caverna de Platão (2005).
76
Um outro site em que sempre há artigos a respeito dos marranos, da questão
do resgate da memória, dos costumes judaizantes é o site http://ruadajudiaria.com.
Tamm podemos obter informações a respeito dos marranos no Brasil no site
www.netjudaica.com.br. Neste site encontramos o seguinte relato sobre os
resquícios judaicos em Salinas, Minas Gerais:
“Uma figura pitoresca no meio familiar mineiro, de modo geral, é o contador
de causos. Muitas vezes, ele também, o imitador da personalidade e do tipo físico
das suas personagens, o que torna o enredo ainda mais fantástico.
No interior de Minas Gerais, o entretenimento dos fazendeiros, seus convivas
e funcionários consiste numa espécie de sarau ao som da viola e da sanfona, onde,
entre guloseimas e um cigarro "rolo de fumo", conversa-se sobre a política local ou
sobre "velhos tempos".
Em Salinas, cidade do nordeste mineiro as reuniões dessa natureza não
poderiam ser diferentes. As narrativas das epopéias e dos mexericos reinavam
absolutos. Ainda hoje, mesmo distante do tempo e do local dos acontecimentos
pode-se escutar histórias sobre escravos, jagunços, tesouros enterrados, almas
penadas, exultadores e até sobre tradição culinária. Basta encontrar alguém
disposto a contar.
Epiphânia Sarmento de Oliveira, salinense nascida em 1920, conta historietas
bastante singulares a respeito de sua falia, "causos" que ouviu contar e que
percorreram gerações. Sobre sua avó materna relata sobre ritual da ordenha da
vaca. Dona Maria Paula Pereira (1841-1937) era muito asseada: só aceitava o leite
se fosse recolhido com uma série de precauções higiênicas. As tetas da vaca eram
cuidadosamente lavadas com água e sabão e enxugadas com pano de algodão
branco bem limpo. O leite era recolhido num recipiente próprio para este fim e depois
77
coado em outro pano limpo. Não satisfeita com isso, exigia a fervura do mesmo e só
então o considerava bom para beber.
O gado, principal atividade da região, famosa pela quantidade de minas de sal
gema, era abatido de acordo com preceitos tipicamente judaicos, ou seja, eram
seguidos os passos descritos no Levítico. Primeiro sangrava-se o animal que, depois
de ficar inconsciente, era sacrificado. Os salinenses acreditavam que o animal,
quando morria enfurecido ou irritado não tinha a carne boa para consumo. Era
também expressamente proibido comer a carne de animais doentes.
Embora cortada pelo rio Salinas, a cidade não consumia a carne de peixe.
Interessante notar que os peixes da região são "peixes de couro", categoria proibida
pela tradição alimentar judaica.
As refeições na fazenda Altamira eram precedidas sempre pelo cerimonial da
limpeza das mãos. Esse costume chamava atenção, pois no interior eram poucas as
pessoas a comerem com talheres. O populacho fazia o capitão, ou seja, amassava
os alimentos com a mão à moda dos tropeiros.
Ramiro de Oliveira Santos, avô paterno de Epiphânia andava com um salvo
conduto pendurado no pescoço. Esse precioso documento perdeu-se quando de sua
morte, pois a crendice popular tornara o envólucro de couro num "patuá", amuleto
elaborado por feiticeiros para proteger dos inimigos e dar sorte.
Dernany Oliveira Sarmento, proprietário de terras, possuía em sua casa uma
mesa com sugestivas gavetas embutidas, às quais os boatos atribuíam a finalidade
de esconder os pratos de comida. Esse costume tem raízes na Península Ibérica na
época em que vigorava a Inquisão. As gavetas serviam, na verdade para esconder
os livros de rezas e os pratos típicos das cerimônias religiosas dos judeus em caso
de alguma visita inoportuna.
78
Já os casamentos, arranjados normalmente pelos pais quando os filhos ainda
estavam na infância, somente se concretizavam com a plena concordância dos
nubentes. Raras eram as pessoas que optavam por não se casar. A freqüência que
se constatam os casos de endogamia, por outro lado, revela a intenção de preservar
a segurança e as tradições do clã. Na família Sarmento de Oliveira, dos oito filhos do
casal Catulino Gomes de Oliveira e Ludovina Sarmento, a metade casou se dentro
da mesma família.
Como as propriedades fundiárias ficavam a léguas da cidade, e portanto
longe da igreja, o padre só era requisitado para batizados e casamentos realizados
de forma coletiva e que se davam esporadicamente. Mesmo assim, era comum a
ausência de oratórios e imagens de santos nas fazendas. Quase não havia espaço
para o religioso, exceto no caso da Bíblia. O livro sagrado era sempre lido ao
entardecer, ao arrepio da Igreja da Contra-Reforma que monopolizava a
interpretação da Palavra de Deus.
Para o povo salinense, havia quatro categorias de morte: natural, acidental,
proposital e "ajudada". Quando ocorria a primeira, o defunto era lavado com água e
sabão, vestido com uma mortalha e velado até o sepultamento. O corpo jamais era
enterrado dentro dos limites das suas terras, mas sim em alguma mata virgem, até
que finalmente a cidade construiu seu cemitério. A extrema unção era dificultada
pela distância e pela precariedade dos meios de transporte e estradas. Quase
sempre, quando o padre chegava, tudo já estava providenciado.
A "morte ajudada", por sua vez, era uma espécie de eutanásia. Estando o
doente moribundo e sofrendo já há muito tempo, mandava-se chamar o exultador,
com o intuito de "encomendar a alma do sofredor a Deus"; mas que na realidade
79
sufocava o agonizante com um travesseiro ou providenciava a fratura das costelas
do mesmo...
Segundo Augusto de Lima Junior, historiador mineiro, em seu livro A
Capitania de Minas Gerais, afirma-se que “quando um judeu disfarçado, ou seja,
marrano, estava para morrer, a fim de evitar que no último momento ele se revelasse
adepto da Lei de Moisés, comprometendo os demais, era logo chamado o abafador,
isto é, um sujeito que tinha por missão estrangular habilmente o doente. Isto
permaneceu em nossos costumes com os conhecidos personagens que ajudam a
morrer.”
Salinas - terra dos Costas, Ferreiras Costas, Oliveira Santos, Mirandas,
Sarmentos, Ladeias, Cardosos, Correias, Ribeiros, Ramirez, Guimarães, Almeidas,
Crispins, Durães, Moreiras, Rodrigues, Mendes, Santanas, Britos, Morais, Ramos,
Pinhos, Rodrigues Primos, Castros, Cordeiros e também de muitas histórias.” (
http://www.netjudaica.com.br/novanetjudaica 25/07/2006).
Este relato sobre Salinas pode ser aplicado a muitas outras localidades
brasileiras, no Nordeste, no Rio Grande do Norte, Amazonas, São Paulo e Rio
Grande do Sul. A presença marrana foi um fenômeno nacional e faz parte hoje da
genealogia de formação do povo brasileiro. Aqui, devemos registrar que o que
permitiu também aos Judeus Marranos e seus descendentes buscar novamente
suas origens e vivenciar novamente a fé judaica foi a onda imigratória que passou a
existir após a Proclamação da República no Brasil.
Na última década do século XIX, a imigração judaica cresceu de vulto,
multiplicando-se os países de procedência e também as regiões em que os
imigrantes passavam a fixar-se no Brasil. Enquanto, até então, os
imigrantes judeus provinham quase exclusivamente do Norte da África e do
Ocidente europeu, já agora, afora aquelas regiões, chegavam levas de
judeus do Mediterrâneo oriental - Grécia, Turquia, Síria e Líbano e da
própria Palestina e ainda da Rússia e países vizinhos do leste europeu,
localizando-se de preferência na zona sudeste do ps - Rio de Janeiro,
São Paulo e Minas Gerais - mas também se disseminando por muitos
outros estados, tanto do Sul como do Nordeste. Ficou assim o Brasil, no
80
final do século XIX, pontilhado de núcleos judaicos multicolores. É digno de
registro que, ao findar o século XIX, já existia no Brasil uma coletividade
judaica em potencial, que abarcava todo o território nacional; uma rica
infra-estrutura, sobre a qual viriam em breve apoiar-se as vastas e
homogêneas ondas imigratórias do leste europeu - Bessarábia, Ucrânia,
Lituânia, Polônia - as quais, nas primeiras décadas do século XX,
ergueriam no Brasil o arcabouço de uma sólida comunidade israelita. A
partir da criação da Jewish Colonization Association, a JCA, em 1891,
abriram-se as portas das Américas aos judeus perseguidos na Europa. Foi
assim que surgiram as colônias do Rio Grande do Sul e da Argentina, onde
foi nascer o judeu de bombachas, no dizer de Alberto Gershunoff, los
gauchos judios. Este momento da História Judaica brasileira, felizmente,
tem sido bastante estudado, nos últimos anos. Desde o "Numa clara
manhã de abril", de Marcos Iolovitch, passando por "Filipson" e os vários
romances de Moacir Scliar, chegamos ao trabalho desenvolvido em Porto
Alegre pelo Instituto Marc Chagall, promovendo a edição de livros, vídeos,
conferências, exposições e palestras, onde a memória judaica no Sul está
muito bem construída. (VELTMAN, 2005, p. 32).
Outro aspecto interessante de resistência cultural dos Judeus Marranos foram
as expressões idiomáticas presentes na língua portuguesa no Brasil. Por terem que
praticar o Judaísmo em segredo, e muitas vezes levar uma vida dupla entre o
Judaísmo e o Marranismo, os judeus cristão-novos acabaram por mesclar costumes
variados, “camuflados” do seu teor judaico, gerando assim comportamentos e
aspectos culturais, indo desde superstições, rituais, ditos populares e expressões
lingüísticas, que se incorporaram ao idioma Português e passaram a fazer parte da
cultura nacional. A professora Jane Bichmacher de Glasman, da Universidade do
Rio de Janeiro (UERJ), apresenta alguns exemplos de dizeres que fazem parte da
cultura brasileira, apresentando as suas origens e explicações, a partir da origem
judaica marrana. (GLASMAN, 2006, p. 4-6).
– “Ficar a ver navios” – Em 1492 foi determinado que os judeus que não se
convertessem teriam de deixar a Espanha até ao fim de julho. Centenas de milhares
então se fixaram em Portugal. O casamento do rei D. Manuel com D. Isabel, filha
dos Reis Católicos, levou-o a aceitar a exigência espanhola de expulsar todos os
judeus residentes em Portugal que não se convertessem ao catolicismo, num prazo
que ia de Janeiro a Outubro de 1497. O rei Dom Manuel precisava dos judeus
81
portugueses, pois eram toda a classe dia e toda a mão-de-obra, além da
influência intelectual. Se Portugal os expulsasse logo como fez a Espanha, o país
passaria por uma crise terrível. Na realidade D. Manuel não tinha qualquer interesse
em expulsar esta comunidade, que então constituía um destacado elemento de
progresso nos setores da economia e das profissões liberais. A sua esperança era
que, retendo os judeus no país, os seus descendentes pudessem eventualmente,
como cristãos, atingir um maior grau de aculturação. Para obter os seus fins lançou
mão de medidas extremamente drásticas, como ter ordenado que os filhos menores
de 14 anos fossem tirados aos pais a fim de serem convertidos. Então fingiu marcar
uma data de expulsão na Páscoa. Quando chegou a data do embarque dos que se
recusavam a aceitar o catolicismo, alegou que não havia navios suficientes para os
levar e determinou um batismo em massa dos que se tinham concentrado em Lisboa
à espera de transporte para outros países. No dia marcado, estavam todos os
judeus no porto esperando os navios que não vieram. Todos foram convertidos e
batizados à força, em pé. Daí a expressão: “ficaram a ver navios”. O rei então
declarou: não há mais judeus em Portugal, são todos cristãos (cristão-novos). Muitos
foram arrastados até a pia batismal pelas barbas ou pelos cabelos.
– “Pensar na morte da bezerra: frase tão comumente dita por sertanejos
quando querem referir-se a alguém que está meditando com ares de preocupação:
“está pensando na morte da bezerra”. Registram as denunciações e as confissões
feitas ao Santo Oficio, a noção popular, naquele distante período, do que seria o
livro fundamental do Judaísmo: a Toráh. De Toráh veio Toura e depois, bezerra,
havendo inclusive quem afirmasse ter visto em cara de alguns cristão-novos, o
citado objeto, com chifres e tudo.
82
– “Passar a mão na cabeça”, com o sentido de perdoar ou acobertar erro
cometido por algum protegido, é memória da maneira judaica de abençoar de
cristão-novos, passando a mão pela cabeça e descendo pela face, enquanto
pronunciava a bênção.
– Seridó, região no Rio Grande do Norte, tem seu nome originário da forma
hebraica contraída: Refúgio dele. Porém, não é o que escreve Luís da Câmara
Cascudo, indicando uma origem indígena do nome da região, de “ceri-toh”. Em
hebraico, a palavra Sarid significa sobrevivente. Acrescentando-se o sufixo ó, temos
a tradução sobrevivente dele. A variação Serid, “o que escapou”, pode ser traduzido
também por refúgio. Desse modo, a tradução para o nome seridó seria refúgio dele
ou seus sobreviventes.
– Passar mel na boca: quando da circuncisão, o rabino passa mel na boca da
criança para evitar o choro. Daí a origem da expressão: “Passar mel na boca de
fulano”.
– Para o santo: o hábito sertanejo de, antes de beber, derramar uma parte do
cálice, tem raízes no rito hebraico milenar de reservar, na festa de Pessach
(Páscoa), um copo de vinho para o profeta Elias (representando o Messias que virá,
anunciado pelo Profeta Elias).
– “Que massada!” –usada para se referir a uma tragédia ou contra-tempo, é
uma alusão à fortaleza de Massada na região do Mar Morto, Israel, reduto de
Zelotes, onde permaneceram anos resistindo às forças romanas após a destruição
do Templo em 70 d.C., culminando com um suicídio coletivo para não se renderem,
de acordo com relato do historiador Flávio Josefo.
– “Pagar siza” significando pagar imposto vem do hebraico e do aramaico
(mas = imposto, em hebraico de misa, em aramaico).
83
– “Vestir a carapuça” ou “a carapuça serve para ...” vem da Idade Média
inquisitorial, quando judeus eram obrigados a usar chapéus pontudos (ou com três
pontas) para serem identificados.
– “Fazer mesuras” origina-se na reverência à Mezuzá (pergaminho com
versículos de Dt .6, 4-9 e 11,13-21, afixado, dentro de caixas variadas, no batente
direito das portas).
– "Deus te crie" após o espirro de alguém é uma herança judaica da frase
Hayim Tovim, que pode ser traduzido como tenha uma boa vida.
Estas e outras expressões podem ser registradas como uma forma de
resistência cultural lingüística dos Judeus Marranos no Brasil. É interessante
observar que muitas dessas expressões fazem parte do cotidiano de todos os
brasileiros, que as repetem constantemente, sem ter a consciência da origem
judaica destas expressões.
Na região amazônica, existiu uma forte imigração de judeus marroquinos,
durante todo o século XIX. Estima-se hoje que entre sessenta e trezentos mil
pessoas desta região são descendentes de judeus. Porém, a grande maioria delas
não vive a fé judaica, mas mantiveram traços do Judaísmo e muito de suas tradições
e costumes. Os judeus “puros” de Belém ou Manaus se referem a estes “mestiços”
como “primos”. Achei bastante ilustrativo o relato a seguir:
Vale a pena reproduzir uma cena emocionante, narrada pela escritora
Sultana Levi, em texto que nos foi entregue por sua prima Anita Levi
Soares: "Estava de compras com uma prima,quando ela lembrou que devia
ir a uma sinagoga improvisada (no Marajó), onde umas crianças vindas do
interior iam ser circuncisadas, e fui com ela. Para minha surpresa, os
meninos deviam ter de 9 a 12 anos. Eram três. E os três se aconchegavam
um ao outro, calados, trêmulos de medo. quando um velho de queixo
comprido, contando os presentes, anunciou: - já temos minyam, vamos
começar. Desencadeou-se uma verdadeira tourada, ou "com que se
prende o touro". Os meninos corriam, gritando, proferindo palavrões,
defendendo com as mãos o lugar a ser operado, repetindo, "não me cape,
seu desgraçado, seu filho da puta, não me cape". E os homens rindo,
corriam atrás, cercavam, fechavam a saída nas portas, até conseguirem
agarrar os três. De pés atados, ao som das orações próprias, foram
circuncisados, diante de todos e sem qualquer anestesia. Minha prima era
84
chachamá (sábia, estudiosa). Era descendente do grande rabino Eliezer
Dabela, de quem herdou poderes sobrenaturais. Sua presença ao ato era
necessária, porque ela tinha o dom de acalmar dores com a força de suas
preces. Eu me escondi na outra sala, apavorada. Mas não ouvi gritos, pelo
contrário, sons de alegria. Dentro em pouco, tudo estava terminado.
Quando vieram me chamar para tomar parte na festa, fiquei surpreendida
ao ver os três garotos comendo e bebendo entre os convivas. Já então
sorriam e pareciam felizes. É que, mesmo vivendo no interior, na selva,
eles aspiravam por este dia. Sentiam orgulho de ser judeus. Mas este
orgulho não nasceu da liberdade de religião prometida aos imigrantes.
Absolutamente. Eles tinham que lutar para manter o seu Judaísmo.
(VELTMAN, 2005, p. 61).
Aqui vale a pena relembrar a questão da nomenclatura usada para falar dos
descendentes dos judeus: algumas vezes falamos cristão-novos; outras vezes
marranos. Por exemplo, os descendentes de judeus referidos acima, que vivem na
Amazônia, podem ser classificados como marranos e não como cristão-novos, pois
o cristão-novo com o tempo esqueceu sua origem e já não lembra a razão nem a
origem de suas práticas judaicas. Os marranos, ao contrário, guardaram em seus
lares muito às escondidas a prática do Judaísmo, formam uma minoria judaica
plenamente consciente, mesmo sendo oculta. Tendo em vista isto podemos dizer
que na Amazônia encontramos mais marranos do que cristão-novos.
85
Fonte: Acervo Rachel Stoianoff O. Souza.
Figura 10. Kahal Tsur Israel – (Sinagoga Rocha de Israel) em Recife na antiga rua
dos judeus. A Primeira Sinagoga das Américas.
O Arquivo Histórico Judaico de Pernambuco tem feito um excelente trabalho
de pesquisa e resgate da presença dos judeus em todo o Nordeste brasileiro e a
contribuição dos descendentes destes judeus para a formação sócio-cultural
brasileira. A Professora Tânia Kaufman trabalha neste instituto e tem desenvolvido
pesquisas sobre o tema do Marranismo.
É interessante notar que hoje, assim como nos tempos da formação da
comunidade Zur Israel, no século XVII, pouco a pouco, surgem grupos de
diferentes partes da região nordestina interessados em encontrar, em suas
genealogias, os elos perdidos com o Judaísmo no passado colonial. Nesse
ponto lembramos que os cristão-novos, no processo de construção de nova
identidade no Brasil português, tomavam por base atributos culturais do
Judaísmo sefardi, de maneira oculta e do catolicismo, no espaço público,
na condição de atores na sociedade colonial portuguesa. Os significados
gerados pelo inter-relacionamento do conjunto desses atributos, tanto na
condição de indivíduos, como na de membro da sociedade geral, aparecem
86
no fenômeno de sincretismo cultural, que passa agora a ser conhecido
como Marranismo. (Kaufman, 2006, p. 18).
Pode-se dizer com certeza que, mais de 500 anos depois que os judeus
foram forçados a se converter ao Cristianismo, milhares de seus descendentes,
chamados de marranos, estão procurando retornar ou resgatar as suas raízes
judaicas no Brasil. A internet tem sido um espaço que tem propiciado uma intensa
interação entre estes marranos que resistiram ao longo do tempo e agora encontram
uma oportunidade de resgatar a sua identidade judaica.
Aqui faço um relato pessoal, pois um dos fatores que me levaram a realizar
esta pesquisa foi a busca de minhas próprias raízes familiares. Apenas
recentemente o passado marrano de minha família, pelo lado materno, começou a
despontar. Muitas das tradições e costumes que encontrei durante a minha
pesquisa, pude perceber que de um modo meio que velado eram vividas pela minha
família. Ainda me lembro do nascimento de meu irmão caçula, em 1974. Achei muito
estranho minha mãe ter que guardar resguardo, deitada em lençóis brancos,
comendo apenas canja de galinha, sem poder lavar os cabelos durante 40 dias.
Minha avó sempre por perto para auxiliar e para garantir que a minha mãe não fosse
perturbada durante este período. Outro fato que chamava a minha atenção era o
tratar com os mortos. Em um velório, minha mãe sempre dizia para não tocarmos no
defunto, pois trazia impureza e quando chegávamos em casa, vindos do cemitério,
tínhamos que lavar as mãos e os pés, deixando toda a poeira e terra impura do
cemitério do lado de fora de casa. Durante sete dias não se podia ouvir música ou
ver televisão. Mas eu nunca havia associado estas práticas com o Judaísmo ou
Marranismo.
Apenas recentemente, em conversas familiares e já depois de crescido é que
fui constatando traços fortes de Marranismo em minha família. Minha avó nunca
87
havia mencionado o seu sobrenome de solteira e então, quando comecei a fazer
esta pesquisa, um dia minha avó viu uma figura da Estrela de Davi em um livro que
eu estava lendo. Para minha surpresa, ela disse que, até os 16 anos, na casa dela
(de minha bisavó), atrás da porta, sempre havia uma estrela daquela, mas que a
mesma foi retirada em 1937 e que nunca mais se podia falar sobre aquilo (medo do
nazi-facismo que então surgia?). Quando eu comecei a fazer perguntas, descobri
que minha avó havia nascido em um vilarejo no interior de Minas Gerais, Carmo do
Cajuru, região que, de acordo com muitos pesquisadores, teve uma forte presença
marrana. Para minha surpresa, ela começou a falar de seus tios, irmãos de minha
bisavó, os quais tinham todos nomes judeus: Jacob Marra, Josef Marra, Benjamin
Marra. Perguntei a ela se na casa dela havia alguma oração especial e ela me disse
que sempre se reunia a família nas sextas-feiras à noite para uma reza familiar, em
que as velas de um candelabro eram acesas, pedindo a proteção divina. Reconheci
no mesmo momento os resquícios da celebração do Sabath.
Com estas revelações, vindas de um passado distante, mas mantidas vivas
na memória e nas tradições familiares, pude perceber, em minha própria família,
traços da resistência cultural dos judeus que perpassaram séculos de história. Assim
como eu ainda tenho muito a desvendar sobre as minhas próprias raízes judaicas,
com certeza muito ainda tem que ser feito para que a presença marrana na
formação sócio-cultural brasileira possa ocupar o devido espaço nos livros de
história. Aquela Estrela de Davi, retirada de detrás da porta, ainda espera para poder
retomar o seu espaço. A luz da Estrela de Davi resiste ao tempo, e, mesmo
escondida, é possível ver os raios desta estrela brilhando nos rostos de muitas
pessoas por todo este país.
88
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Durante esta pesquisa, pude constatar que existem grandes concentrações
de marranos no Brasil, desde o Nordeste do país, passando pela Amazônia, Minas
Gerais, chegando até o Rio Grande do Sul. Em todas estas regiões, podem-se
encontrar famílias que preservam um estilo judaico de vida, mesmo sem ter uma
consciência clara sobre as suas raízes. Isto acontece principalmente no interior do
país, onde as famílias marranas continuam a entrelaçar-se entre si através do
matrimônio, mantendo, através da memória, a perpetuação de muitas tradições e
costumes judaicos.
Durante este trabalho, como já apontado no início desta dissertação, pude
constatar que a influência e a contribuição do judeu cristão-novo brasileiro,
principalmente no período colonial, e aquilo que foi aportado por este povo para a
religiosidade e cultura brasileira em seu todo, ainda merecem muito estudo
investigativo e pesquisa acadêmica. Devido à Inquisição e ao medo dos judeus de
serem descobertos, muito da cultura judaica se perdeu ou foi repassada de forma
velada e/ou deturpada aos descendentes, e os judeus tiveram que usar de muita
astúcia e sabedoria para continuar a vivenciar a sua cultura sem ser perseguidos e
tiveram que desenvolver um processo de resistência cultural. A tradição judaica e a
memória foram os elementos essenciais no processo de resistência cultural deste
povo aqui no Brasil. Durante minha pesquisa, procurei dar maior enfoque à questão
da memória como elemento de continuidade da vivência da identidade judaico-
marrana no Brasil até os dias de hoje. Pude constatar tamm que, no Brasil, pelo
seu tamanho continental, a prática da resistência judaico-marrana foi favorecida,
89
sendo que o Brasil constitui hoje um lugar único no mundo em que a vivência do
Marranismo ainda se dá de um modo bastante amplo, mesmo que apenas no
inconsciente coletivo. No caso brasileiro, em que os judeus, em sua grande maioria,
acabaram por ser assimilados pela maioria católico-cristã, muito da cultura e prática
judaica permaneceu latente na memória coletiva de seus descendentes.
O tema que propus para estudo é muito amplo, e a cada momento da
pesquisa aparecem outras nuances que acabam, muitas vezes, por merecer
tamm atenção. Este foi o principal problema para a conclusão deste trabalho.
Considero a presente dissertação como apenas uma introdução a respeito do tema
proposto. Tive várias dificuldades para poder ater-me apenas ao que me propus
pesquisar. Falta ainda muito referencial teórico e pesquisa acadêmica a respeito
deste tema no Brasil. Constatei que, para que uma pesquisa como esta seja bem
feita, é necessário muito recurso financeiro e dedicação integral por parte do
pesquisador, para poder viajar por este imenso Brasil e aprofundar-se nas raízes da
formação do povo brasileiro, resgatando daí a contribuição do povo judaico em
nossa sociedade. Existe influência judaica em todos os meios da cultura brasileira:
na música, nas tradições religiosas, comida, literatura, e muitos outros. Cada um
destes temas, por si só, já merece ser objeto de uma pesquisa acadêmica extensa.
Na introdução deste trabalho, levantou-se a questão de como teria ocorrido o
processo de resistência cultural dos judeus que vieram para o Brasil, já que, devido
à Inquisição e outros fatores adversos, eles não podiam revelar publicamente sua
identidade judaica. Penso que não foi possível responder completamente a esta
questão, todavia foram obtidas informações que me permitem afirmar que, por meio
da memória coletiva e individual deste povo, houve uma resistência cultural que
perpassou várias gerações. Muito da cultura, das tradições e costumes dos judeus
90
(aqui entendidos como marranos ou cristão-novos) ainda subsiste no cotidiano da
sociedade brasileira. Por fim, pude perceber mecanismos latentes de resistência e
resgate do Marranismo por parte de associações, instituições e pesquisadores, que
buscam hoje, em pleno século XXI, resgatar as raízes judaicas de parte da
população brasileira.
Concluo afirmando que, diante do proposto inicialmente, considero esta uma
obra inacabada, merecedora de melhor aprofundamento. O tema da resistência
cultural dos judeus no Brasil é apaixonante, pois nos leva ao encontro de nossa
própria identidade como nação. Esta dissertação me serviu como um estímulo para
continuar a pesquisa a respeito deste tema, principalmente no que se refere às
contribuições do povo judeu para a prática religiosa do povo brasileiro.
91
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99
ANEXO I
SOBRENOMES MARRANOS
100
Lista de sobrenomes muito utilizados pelos judeus
conversos ao Cristianismo:
A
A
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r
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