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oficial com José Maria Aznar, primeiro-ministro da Espanha. Já sua ex-mulher foi
protagonista de uma manhã de autógrafos, compromisso que assumiu ao virar garota-
propaganda de uma rede de supermercados em São Paulo.” (Vidas paralelas, O Estado
de S. Paulo, 20 de dez. 2003)
Quanto às esferas actanciais, teríamos, em uma primeira leitura, Ronaldinho como
herói, a separação como antagonista e a esfera da princesa (e seu pai), que representa, além do
desmascaramento do falso herói, também a imposição de um estigma (segundo Propp),
preenchida por uma Milene estigmatizada: a mulher não realizada e infeliz, traída, marcada,
sob a “sombra” do marido, que quer ser agente de sua própria vida.
Pode-se dizer que as mídias, ao colocarem essa separação na cena pública, fazem
vislumbrar muito mais do que o factual “separação de uma personalidade”, mas sim a
encenação cotidiana de casamentos desfeitos, mulheres submissas, casais infelizes, tudo isso
sob a égide do “mito” que representa justamente o avesso do cotidiano, o longínquo, aquele
que está em outro lugar, não acessível à maior parte das pessoas. Nesse momento, do
reconhecimento da trama narrativa, o distante fica próximo, o fato fisga o público, que agora
se mistura nele (opina, sensibiliza-se) – o factual torna-se IN-formação.
Nesse caso, tem-se como eixos propulsores da demanda narrativa a quebra da união, o
“contrato” desfeito e a proposta de mudança, com dupla identificação: por parte de Ronaldo, o
homem “fenômeno” que “precisa” de liberdade para exercer sua “onipresença”; por parte de
Milene, a mulher que vivia um casamento “em crise”, à sombra do marido e busca
independência: “Desde que se casou com o jogador, quatro anos atrás, a paulistana Milene
Domingues, 24 anos, já ouviu várias histórias sobre o envolvimento de seu marido com
modelos, dançarinas... No princípio do casamento, tais comentários a incomodavam muito.
Agora, não mais. (...) 'Antes, minha vida girava em torno dele, em função da agenda e das
necessidades do Ronaldo. Ele era o centro das minhas atenções, a razão da minha felicidade.
Agora, ele faz parte da minha felicidade’”.
Ainda em relação à “quebra da união”, aos espaços distintos que passam a ocupar nas
mídias (“Cada um na sua”, “Vidas paralelas”, “Bolada dividida”), Ronaldo é retratado como
“homem feliz”, enquanto Milene é vista como “mulher triste”: “O fim do casamento com
Milene Domingues não abalou Ronaldo. Risonho na entrevista coletiva, disse que está feliz e
confiante em boa atuação contra o Peru”, “Milene Rodrigues não perdeu o sorriso enorme,
mas deixa transparecer tristeza com o fim do casamento”.
Além disso, podemos atrelar a essa micronarrativa a própria manutenção do “mito”