Download PDF
ads:
MARCIA FURTADO AVANZA
Danton Jobim, o mediador de duas culturas:
por uma pedagogia do jornalismo
São Paulo
2007
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 2
MARCIA FURTADO AVANZA
Danton Jobim, o mediador de duas culturas:
por uma pedagogia do jornalismo
Tese de doutorado apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em Ciências
da Comunicação da Escola de
Comunicações e Artes da Universidade de
São Paulo, Área de Concentração: Estudo
dos Meios da Produção Mediática, como
exigência parcial para obtenção do título
de Doutor na área de Comunicação, sob a
orientação do Prof. Dr. José Marques de
Melo.
São Paulo
2007
ads:
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 3
FOLHA DE APROVAÇÃO
Marcia Furtado Avanza
Danton Jobim, o mediador de duas culturas:
por uma pedagogia do jornalismo
Tese apresentada à Escola de
Comunicações e Artes da Universidade
de São Paulo para obtenção do título de
Doutor.
Área de Concentração: Estudo dos Meios
da Produção Mediática
Aprovado em: ____________
Banca Examinadora
Prof. Dr. ___________________________________________
Instituição: _______________ Assinatura _________________
Prof. Dr.____________________________________________
Instituição: _______________ Assinatura _________________
Prof. Dr.____________________________________________
Instituição: _______________ Assinatura _________________
Prof. Dr.____________________________________________
Instituição: _______________ Assinatura _________________
Prof. Dr.____________________________________________
Instituição: _______________ Assinatura _________________
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 4
“Mestre é aquele que não só ensina, mas
que de repente aprende...”
Guimarães Rosa
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 5
Para Gustavo, Felipe, Rafael,
José Augusto Jr. e Paulo
Roberto, os cinco homens que
iluminaram minha vida.
Para Caliope, a única mulher,
por sua inspiração e por me
ensinar o verdadeiro significado
do amor.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 6
Agradecimentos
Antes de tudo, obrigada ao Prof. Dr. José Marques de
Melo, um orientador sempre presente, capaz de dar “puxões de
orelha” nos momentos mais necessários.
Aos colegas do Gabinete do Reitor: Miriam Imada,
Adriana Cruz, Ernani Coimbra, Thaís Venosa, Laura Fuzaro,
Marcelo Cuzziol, José Roberto Sanches e Wildner Vilaça
Antonio. A todos eles, devo muito do meu trabalho. Aos demais
colegas da reitoria da USP, que direta ou indiretamente
contribuíram para que eu conseguisse terminar esta pesquisa,
agradeço através de Márcia Bispo e de Clélia Affonso Monteiro.
Sem ajuda delas, nada teria conseguido.
Aos professores da Fiam, com quem pude trocar
experiências fundamentais para a construção do trabalho,
especialmente ao professor Rodrigo Manzano, pela leitura
atenta e observações pertinentes.
À Associação Brasileira de Imprensa – ABI, agradeço por
meio de seu presidente Maurício Azedo e da bibliotecária chefe
Vilma Santos Oliveira, pela inestimável colaboração.
Ao Prof. Dr. Carlos Humes, ouvinte atento das minhas
dúvidas e brilhante conselheiro acadêmico.
À Profa. Dra. Ana Maria Sousa, exemplo de verdadeira
professora e minha eterna reitora, pelas discussões essenciais
sobre pedagogia.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 7
Resumo
Analisar a contribuição do jornalista Danton Jobim, primeiro professor a
ocupar a cadeira de Técnicas de Redação Jornalística no Curso de
Jornalismo da Universidade do Brasil constitui o objetivo central desta
pesquisa, cuja meta é contribuir para o desenvolvimento de uma
pedagogia do jornalismo. A partir de seu curso de Metodologia de Ensino
do Jornalismo no CIESPAL, em Quito, Equador, buscou-se compreender
suas propostas para o ensino do jornalismo, partindo da análise textual
dos volumes preparados para embasar a formação de professores de toda
a América do Sul. Resgatou-se também sua trajetória na imprensa
brasileira, principalmente no Diário Carioca, onde promoveu a maior
reforma no jornalismo do país na década de 1950, treinando estudantes de
diferentes áreas para atuar no jornalismo. Suas idéias foram reconstituídas
através de entrevistas com companheiros da imprensa e da ABI. A
pesquisa evidencia que Jobim foi o responsável pela mediação entre os
modelos norte-americano e europeu de ensino do jornalismo. Ele propõe a
formação de um jornalista dotado de conhecimentos técnicos e
humanísticos adequados ao seu tempo, sendo capaz de se reciclar para
exercer, por meio do jornalismo, uma importante função social,
informando, analisando e criticando os acontecimentos cotidianos e
contribuindo para a formação do homem contemporâneo.
PALAVRAS-CHAVE:
Jornalismo. Pedagogia do Jornalismo, História do Jornalismo, Danton
Jobim. América Latina.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 8
Abstract
To analyze the contribution of journalist Danton Jobim, first professor to
occupy the chair of Techniques of Editorial Writing for Newspapers, at the
Universidade of Brasil, is the central objective of this research, whose goal
is to contribute towards the development of pedagogy in journalism.
Starting from his Methodology Course for teaching Journalism at CIESPAL,
in Quito, Ecuador, a search was undertaken to understand his proposals
for teaching journalism, beginning from the textual analysis of volumes
prepared to sustain the development of teachers for all South America. His
trajectory in the Brazilian press was also redeemed, especially in the Diário
Carioca, where he promoted the largest reform in journalism of the country
during the decade of 1950, training students of different areas to work in
journalism. His ideas were reconstructed through interviews with
colleagues in the press and ABI (Brazilian Press Association). The
research points out that Jobim was responsible for mediation between
North American and European models to teach journalism. He proposes a
journalist with technical and humanistic knowledge of his time, who would
be able to recycle through journalism, an important social function,
informing, analyzing and criticizing the daily news and contributing towards
the formation of contemporary man.
KEY-WORDS:
Journalism. Pedagogy of Journalism, History of Jornalism, Danton Jobim,
Latin America.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 9
Danton Jobim, o mediador de duas culturas:
por uma pedagogia do Jornalismo
Sumário
INTRODUÇÃO __________________________________________________11
1 O ENSINO DO JORNALISMO NO BRASIL: DAS INICIATIVAS
PIONEIRAS AO CURSO NA UNIVERSIDADE DO BRASIL ___________35
1.1 Experiências pioneiras _____________________________________________ 39
1.2 O Jornalismo na Universidade: a Escola de Jornalismo Cásper Líbero_____ 43
1.3 O curso na Universidade do Brasil ___________________________________ 48
1.4 Os primeiros currículos do Curso de Jornalismo _______________________ 54
2 BIOGRAFIA – UMA VIDA DEDICADA À IMPRENSA ______________61
3 O PENSAMENTO JORNALÍSTICO DE DANTON JOBIM ___________75
3.1 Jornalismo e opinião pública________________________________________ 76
3.2 Jornalismo e técnica _______________________________________________ 78
3.3 Imprensa norte-americana versus imprensa latino-americana ____________ 82
3.4 Ética na imprensa_________________________________________________ 84
3.5 Jornalismo e literatura_____________________________________________ 85
3.6 Jornalismo e História ______________________________________________ 87
4 A ESCOLA DE JORNALISMO NO DIÁRIO CARIOCA______________89
5 A PEDAGOGIA DO JORNALISMO, SEGUNDO DANTON JOBIM___106
5.1 O objeto do ensino do jornalismo ___________________________________ 106
5.1.1 Formação e Informação _____________________________________________110
5.1.2 Formação profissional ______________________________________________116
5.2 O aluno de jornalismo ____________________________________________ 118
5.3 O professor de jornalismo _________________________________________ 126
5.4 O currículo _____________________________________________________ 131
5.4.1 O que se ensina na escola de jornalismo ______________________________134
5.4.2 As humanidades no curso de Jornalismo ______________________________136
5.4.3 O ensino da Geografia e da História na Escola de Jornalismo ____________141
5.4.4 O ensino da Língua e da Literatura na Escola de Jornalismo _____________150
5.4.5 Ensino das disciplinas profissionais ___________________________________154
5.5 O método de ensino_______________________________________________ 161
6 O ENSINO ATUAL NAS ESCOLAS PIONEIRAS __________________186
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 10
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS_____________________________________202
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS_______________________________205
ANEXOS_______________________________________________________216
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 11
Introdução
Foi de Otto Groth a tentativa inicial de obter o reconhecimento do
jornalismo como ciência. Ele, que iniciava sua carreira jornalística em
1906, na Alemanha, em 1948 passou a dedicar-se à docência e à
pesquisa, assumindo a cátedra de “Ciência de Jornalismo” no Instituto de
Jornalismo Ilustrado de Munique. Embora existisse a intenção de
classificar a ciência jornalística dentro de outras categorias, como a
Psicologia Social, a História e a “Publicística”, Groth analisou a imprensa
em aspectos que não se resumiam à preparação e difusão das notícias,
mas de sua relação com a vida e com a cultura. Além disso, analisou sua
relação com as demais ciências, chegando à conclusão de que não se
poderia colocar o Jornalismo dentro de outros ramos da Ciência Social, já
que seus problemas e soluções não se encaixavam dentro da realidade
das outras disciplinas (BUENO, 1972).
No mesmo ano de 1948, um brasileiro também assumia uma
cátedra de jornalismo dentro de outra universidade; desta vez, na
Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil, situada na
então Capital Federal, o Rio Janeiro. Danton Jobim tinha mais coisas em
comum com Otto Groth. Nasceu no mesmo ano em que este último iniciou
sua carreira, 1906, e também se dedicou por muitos anos à atividade
jornalística. Mas sua grande contribuição foi disseminar a perspectiva
brasileira de análise do jornalismo em países da Europa e da América do
Norte (MARQUES DE MELO, 2003a).
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 12
Como Groth, Jobim também analisou o jornalismo a partir do
impresso, mesmo numa época em que o rádio, a TV e o cinema já tinham
um significativo papel na circulação das informações. Porém, Marques de
Melo (1983, p. 11) entende que Jobim manteve-se fiel “ao ‘espírito do
jornalismo’ entendendo-o como ‘necessidade social’ que assume o caráter
de ‘informação’ cujos ‘atributos essenciais’ são aqueles apontados por
Jacques Kaiser: ‘universalidade e instantaneidade’”. Desta forma, a
essência do jornalismo estaria presente no fluxo de informações atuais dos
jornais e também nos espaços das outras mídias contemporâneas, não
comprometendo o resultado de suas pesquisas e reflexões.
Jobim entendia o jornalismo como mais do que uma simples
atividade profissional. Suas reflexões acerca do tema mostram que para
ele o jornalismo era, sobretudo, “um exercício superior da inteligência e da
cultura” (AZEVEDO FILHO, 1981, p.15). Da mesma forma, a pesquisa de
Groth é descrita como uma investigação no “campo entero de la vida y la
cultura. Y ello porque los periódicos y revistas son universales – segun su
contenido y en razón de su modo de ser, obligando por tanto a una
contemplación universal” (BELAU apud BUENO, 1972, p.5). Como explica
Santos (2003, p.68), Groth entendia cada edição de jornal como parte de
um todo,
de uma idéia, que se apresenta periodicamente (periodicidade),
abrangendo assuntos que dizem respeito à realidade objetiva e
ao imaginário e a desejos humanos (universalidade), ligados ao
presente, ao agora, e não ao seu passado (atualidade), e que
são disseminados em termos geográficos sociais (difusão).
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 13
Jobim também entendia que a compreensão do jornalismo ia muito
além da técnica. Para ele, jornalismo tem sua própria “verdade”, que não
pode ser a de um sociólogo ou de um historiador, porque é uma hipótese
impossível de ser verificada através de processos de que eles se servem.
Como explica, é “uma verdade por assim dizer provisória e contingente”
(2003, p.28). Ele separava o jornalismo das demais ciências,
reconhecendo, contudo, sua interação. No entanto, entendia que o
jornalismo no Brasil não dispunha de informações ou de dados confiáveis
que pudessem promover um entendimento maior do fenômeno.
Um de seus projetos, tornado público em 1958, era o de criar um
centro de pesquisa em jornalismo, o que ele chamou de Instituto de
Estudos e Pesquisas sobre a Informação (IEPI), que envolveria seus
alunos da Universidade do Brasil e contaria com o apoio de outras
entidades, como a Fundação Getúlio Vargas. Para ele, só era possível
estudar o fenômeno jornalístico a partir de um “instrumental adequado ao
emprego dos modernos métodos de investigação sobre a informação em
geral e em particular”. Incluíam-se aí os estudos sobre os meios de
comunicação da época, como a imprensa, o rádio e a televisão. Embora
reforçasse a necessidade imperativa da criação dessa instituição, tal
organismo jamais saiu do plano das idéias, por falta de apoio ou
disponibilidade, já que Jobim atuava ao mesmo tempo na carreira docente
e na atividade jornalística, assumindo inclusive a responsabilidade de
direção de jornais.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 14
O primeiro centro de estudos de jornalismo só foi criado anos mais
tarde pelo professor Luiz Beltrão, depois de seu trabalho no Ciespal –
Centro Internacional de Estudos Superiores de Comunicação para a
América Latina, onde conheceu tendências internacionais de pesquisa no
campo do jornalismo e da comunicação social. O Instituto de Ciências da
Informação (ICINFORM) foi instalado em 13 de dezembro de 1963, na
Universidade Católica de Pernambuco, com a finalidade de oferecer um
suporte ao curso de jornalismo que dirigia, estabelecer uma estratégia de
aproximação com os órgãos da grande imprensa local que resistiam à
formação universitária de jornalista e analisar o jornalismo a partir do
fenômeno da comunicação de massa, com perspectivas interdisciplinares.
Mas quando se analisa o cenário dos projetos de Groth e Jobim, as
comparações param por aqui. Primeiro porque Groth desenvolvia suas
pesquisas em um país – a Alemanha – com tradição de estudos na área
de imprensa, ou da “Periodistika”. Ali foi defendida, na Universidade de
Leipzig, ainda no século XVII, a primeira tese sobre o jornalismo, por
Tobias Peuce. Além disso, também foi lá, em Leipzig, que circulou o
primeiro jornal diário da história da imprensa (DIAS, 2000, p.199). O país
também foi pioneiro, logo depois dos Estados Unidos, na iniciativa de criar
um instituto de jornalismo, em 1917.
O contexto brasileiro enfrentado por Jobim era bem diferente. Ele
iniciava sua docência num país praticamente sem nenhuma pesquisa na
área, convivendo com uma imprensa de padrões e formatos já superados,
e que havia chegado com muito atraso (1808), mesmo se comparada com
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 15
seus vizinhos da América Latina, que tiveram tipografias desde o século
XVI. Além disso, a maior parte dessa mesma imprensa rejeitava a
possibilidade de um curso superior que pudesse formar profissionais
qualificados.
O curso de Jornalismo
Entende-se aí a preocupação de Jobim com o ensino, em razão dos
conflitos enfrentados muito antes do surgimento do curso – e que,
ironicamente, persistem ainda hoje. Desde 1918, quando a Associação
Brasileira de Imprensa (ABI) discutiu no Primeiro Congresso de Jornalistas
a criação de uma escola de jornalismo, criou-se um conflito entre os
profissionais que atuavam na área. Muitos acreditavam que o “jornalista já
nasce pronto”, outros eram defensores de um ensino que pudesse
qualificar e aumentar o nível de conhecimento do profissional antes que
ele ingressasse no mercado.
Embora o processo de industrialização já estivesse em andamento
nas empresas jornalísticas no início do século XX, a função de jornalista
ainda era exercida como um “bico”, geralmente por intelectuais que
queriam tornar público seus trabalhos ou por jornalistas sem formação
específica que se dividiam em mais de um emprego, principalmente entre
o jornal e o funcionalismo público.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 16
Mas muitos lutavam pela valorização do profissional como forma de
melhorar a qualidade da imprensa. Por isso, outras iniciativas surgiram.
Uma das mais significativas foi a da criação do curso de Jornalismo da
Universidade do Distrito Federal, idealizada por Anísio Teixeira, no Rio de
Janeiro, e criada por Decreto do prefeito Pedro Ernesto. A Cátedra,
entregue ao jornalista Costa Rego, secretário de redação do jornal Correio
da Manhã, “um dos principais formadores de opinião pública no país”
(MARQUES DE MELO, 2003a, p.295), diferia da proposta da ABI, já que
não pretendia formar profissionais de nível superior, mas intelectuais que
pudessem “refletir sobre o fenômeno ascendente da cultura de massa,
correlacionando duas atividades então imbricadas profissionalmente: o
jornalismo e a publicidade”.
A iniciativa de Anísio Teixeira foi desativada em 1939 pelo governo
autoritário de Getúlio Vargas. A elite hegemônica encarava aquela
Universidade como sendo um “núcleo de perigosos esquerdistas, a esse
título recebendo a hostilidade simultânea dos meios católicos e
integralistas (que, a essa altura, diga-se de passagem, mal se distinguiam
um do outro)” (MARTINS apud MARQUES DE MELO, 2003a, p.302).
Enquanto isso, na primeira metade do século passado, mesmo com
rejeição a mudanças, a imprensa entrava na fase que Bahia (1990) e
Sodré (1999) chamavam de industrial, idéia contestada por Lins da Silva
(1991), porque faltavam condições na economia local para sustentar essa
vontade de fazer do jornal um negócio. Mas a fase era de
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 17
desenvolvimento, com o surgimento de novos jornais e o fortalecimento de
alguns que permanecem até hoje, chamada “grande imprensa”.
Contudo uma reforma maior ainda estava por vir. Durante a
Segunda Guerra Mundial, os jornais puderam conhecer um novo formato
na maneira de escrever, assimilada dos jornalistas estrangeiros,
principalmente norte-americanos, graças às agências de notícias
internacionais que enviavam seus telegramas numa linguagem que diferia
do então jornalismo praticado no Brasil. Até então, os textos eram
“caudalosos e plenos de literatices”, com matérias adjetivadas que
demoram a introduzir o fato e abertas com enormes “narizes de cera”
(GENTILLI, 2002). “Os homens de letras buscavam encontrar no jornal o
que não encontravam no livro: notoriedade, em primeiro lugar; um pouco
de dinheiro, se possível” (SODRÉ, 1999, p.292). Embora o tema político
fosse destaque nos jornais, ainda assim ele não conseguia neutralizar a
influência literária na linguagem.
Pois é exatamente no período da guerra que os jornalistas
brasileiros vivenciam experiências no exterior, principalmente nos Estados
Unidos, e conhecem o lead, a pirâmide invertida e outras técnicas que
davam ao jornalismo um estilo próprio. Lins da Silva (1991, p.72) lembra
que alguns que visitaram a emergente potência no final do século XIX
“com certeza se deixaram influenciar não apenas pelas idéias políticas
correntes naquele país, como também pela sua imprensa”, caso de Rui
Barbosa, Quintino Bacaiúva e José do Patrocínio.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 18
Mas a influência norte-americana na imprensa brasileira só veio
com Pompeu de Souza e Danton Jobim, então secretário e diretor de
redação do Diário Carioca, respectivamente, que provocaram uma
“limpeza” na redação do jornal. Trazendo novos talentos oriundos de
cursos universitários, eles formaram uma nova geração de jornalistas,
aplicando as técnicas que aprenderam durante suas experiências nos
Estados Unidos. Elas iriam se refletir no ensino, já que, ao mesmo tempo,
começavam a surgir as primeiras escolas de nível superior.
Poucos anos antes, Vitorino Prata Castelo Branco havia promovido
uma série de palestras e conferências na sede da Associação dos
Profissionais de Imprensa de São Paulo, que culminaram no primeiro
Curso Livre de Jornalismo no Brasil (DIAS, 2004). Achincalhado por
jornalistas e criticado até mesmo pelo Sindicato da categoria, Castelo
Branco abandonou o projeto e o jornalismo, voltando a atuar como
advogado.
Na mesma conjuntura Cásper Líbero explicitou seu sonho de criar
uma escola de jornalismo. Ele deixou, em testamento, seu desejo de criar
uma escola que formasse profissionais mais capacitados, o que se tornou
realidade em 1947, com o surgimento da Escola Cásper Líbero, vinculada
à Faculdade de Filosofia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
- PUC-SP. A sua criação só foi possível graças à autorização para o
funcionamento do curso que seria ministrado pela Faculdade Nacional de
Filosofia da Universidade do Brasil, com a cooperação da Associação
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 19
Brasileira de Imprensa e dos sindicatos representativos das categorias de
empregados e de empregadores das empresas jornalísticas.
O curso da Universidade do Brasil, atual Universidade Federal do
Rio de Janeiro, só começou a funcionar em 1948, tendo Danton Jobim
como responsável pela cadeira de Jornalismo. Daí sua preocupação com
o ensino e com o profissional que a escolas iria formar. A intenção de que
o curso fosse elaborado com o apoio do Sindicato e das empresas
jornalísticas foi por água abaixo. Ainda continuava sendo forte a rejeição a
esse tipo de iniciativa, principalmente por parte dos profissionais mais
antigos.
A discussão sobre o currículo
A rejeição do mercado trazia à tona discussões acerca do currículo
e do foco do ensino, provocando divergências sobre a questão técnica e a
formação humanística que deveria ser dada ao estudante.
Embora reconhecendo a necessidade e as deficiências existentes
na parte técnica do curso da Universidade do Brasil, Jobim apontava a
falta de compreensão dos próprios alunos, que acreditavam ser esta a
parte essencial do curso, queixando-se do excesso da parte acadêmica.
Retrucava que, embora não se tivesse encontrado ainda o modelo
ideal – o currículo sofria alteração a cada ano –, o curso não poderia ser
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 20
considerado meramente uma formação de práticos em jornalismo, mas
deveria, sim, dar os conhecimentos necessários para que o profissional
pudesse exercer sua profissão com uma cultura universitária. Justificava
sua preocupação citando o problema do ensino secundário, onde matérias
básicas para o desempenho jornalístico – como português, história,
geografia e literatura – eram deficientemente ensinadas.
Posição diferente da de Jobim tinha Carlos Rizzini, também
professor da Universidade do Brasil, antes de dirigir a Escola Cásper
Líbero. Para ele, o ensino do jornalismo deveria ser pautado pelo modelo
norte-americano da Escola de Jornalismo de Missouri, onde os alunos não
apenas aprendiam a fazer jornalismo, como o faziam de fato, por meio da
publicação diária do University Missourian, jornal que eles redigiam. O
ensino prático deveria ser prioridade.
Embora reconhecendo a impossibilidade de se criar um curso
dentro do mesmo modelo, principalmente em razão das questões
financeiras que impediam as escolas do país de sustentar tal projeto,
Rizzini acreditava que o modelo brasileiro, principalmente o estabelecido
na Universidade do Brasil, tinha graves defeitos. O maior deles era o de
“serem culturais e não profissionais os grupos eletivos de especialização”.
Depois dos dois anos básicos, Rizzini (1953, p.51) propunha o terceiro ano
apenas de especialização profissional. Sugeria, por exemplo, que a
cadeira Técnica de Jornal, oferecida nos dois primeiros anos básicos,
fosse mudada para cadeira de Redação e Reportagem, onde se dividiria
entre Redação e Secretaria no primeiro ano e Reportagem e Entrevista no
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 21
segundo ano, “estudadas separadamente como se fossem disciplinas
autônomas”.
Para ele, no estudo teórico e prático de redação entrariam:
editoriais, comentários, tópicos, cabeças, notas, crônicas e
resumos, cuja variedade é infinita, indo desde o artigo de fundo
e a colaboração assinada até a crônica de cinema, esportiva ou
mundana, e ainda traduções e utilização da correspondência e
do serviço telegráfico. (RIZZINI, 1953, p. 51-52)
Na parte de secretaria entrariam todas as tarefas pertinentes ao
secretário de redação, como seleção de textos, distribuição de tarefas,
espelho de paginação, entre outras. A reportagem seria destinada à
“coleta normal de notas”, de dados e à cobertura de acontecimentos
esperados, incluindo também a busca de históricos e a narrativa de
situações. A entrevista, considerada por ele como uma das mais difíceis
formas de jornalismo, deveria ser ensinada como a arte de “saber
perguntar e ouvir, e de saber transmitir opiniões e depoimentos”. Rizzini
ainda acreditava que ninguém aprenderia a fazer reportagens ou
entrevistas se não as fizessem na prática e não as publicassem depois.
Outras propostas de Rizzini eram: restringir a cadeira de Língua
Portuguesa e Literatura de Língua Portuguesa
1
somente à parte de
literatura no primeiro ano e substituí-la, no segundo, por História da
Literatura Brasileira, especialmente no campo do jornalismo. Além disso,
propunha restringir o ensino de História do Brasil e História
Contemporânea aos últimos sessenta anos e incluir na disciplina de
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 22
Administração o ensino de Fotografia, Gravura e Artes Gráficas, enquanto
não fossem criadas essas disciplinas específicas.
É certo que o ensino do jornalismo não pode ser feito sem o
entendimento dos problemas da atualidade. De forma nenhuma ele pode
ser apartado da realidade e, por isso, é imprescindível que o estudante
conheça e vivencie os problemas sociais contemporâneos. Como explicou
Beltrão, em palestra no IV Seminário Internacional do Ciespal, realizado no
Rio de Janeiro:
Su estúdio, como su prática, exige uma participación social y
directa del individio, no solamente em trabajos didácticos sino
también em los sentimientos y actividades de su época
(momento histórico) y de su gente (comunidad). Hay que
emplear métodos actualizados, mediante los cuales el
estudiante vaya paulatinamente estructurando sus ideales,
actitudes e intereses mentalmente, por emoción y por
participación, em uma especie de totalitarismo educacional.
(BELTRÃO In: CIESPAL, 1965, p.350)
No entanto, o ensino do jornalismo não pode ser visto apenas a
partir de uma visão contemporânea de mundo, mas a partir do
entendimento da formação da sociedade e da cultura, numa visão muito
mais universal.
Sob o ponto de vista do ensino na atualidade, essas propostas de
Rizzini parecem insuficientes. Mas é preciso entender que naquele
momento a grande crítica que ele fazia ao curso de jornalismo da
1
O interessante nesta proposta é que atualmente grande número de alunos das escolas de
jornalismo particulares, onde o exame vestibular exige menos, queixam-se da ausência da língua
portuguesa no currículo, já que o ensino médio se mostra deficiente no ensino dessa disciplina.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 23
Faculdade de Filosofia da Universidade do Brasil se dava em razão da
falta de treino profissional, preocupação compartilhada também por Jobim.
O próprio diretor da Associação Brasileira de Imprensa à época,
Fernando Segismundo (In: CIESPAL, 1965, p.126), também em seminário
do Ciespal, explicava que as escolas brasileiras não correspondiam às
necessidades dos meios de comunicação. Aos seus formandos eram
dadas tarefas secundárias nas redações, anteriormente concedidas aos
colaboradores literários, para as quais eram considerados os
conhecimentos e a cultura adquiridos em um curso superior. Nas tarefas
de jornalismo, propriamente ditas, esses egressos das universidades eram
colocados em um plano subalterno aos jornalistas que não tinham
formação acadêmica, já que nesse caso considerava-se que era
importante e decisiva “a capacidade de fazer e não a mera informação de
como fazer”.
Porém Rizzini ia além, afirmando ser um absurdo “pretender-se um
ensino jornalístico que não seja, acima de tudo, um ensino profissional”,
posição diferente da de Jobim, que, assim como Groth, entendia o
fenômeno do jornalismo como uma questão cultural muito mais ampla, que
deveria ser mais bem estudada. Nesse sentido, Jobim não via o ensino de
jornalismo apenas como uma questão de técnica, mas dentro de uma
conjuntura muito maior, propiciada pela universidade e amparada em um
tripé moral, cultural e técnico, que não deveria ser esquecido nem mesmo
dentro das chamadas disciplinas especializadas. Além disso, ainda havia a
preocupação com o perfil do estudante. Como citado anteriormente, ele
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 24
teria as falhas que poderiam existir na formação desse aluno antes do
ingresso na universidade, advindas do ensino secundário.
E embora o agora chamado ensino médio tenha piorado – e muito –
na maior parte das escolas, principalmente as públicas, da década de 50
para cá, as mesmas discussões se apresentam hoje sobre o currículo do
curso de Jornalismo, que, desde o final da década de 60, se tornou uma
habilitação do curso de Comunicação Social.
Geralmente, uma das soluções apontadas para resolver o impasse
de um curso deficiente é a mudança na grade curricular. Sem dúvida, o
conteúdo curricular tem muita importância. Mas, pesquisadores como
Marques de Melo (1979, p.39) acreditam que a mudança de currículo,
sempre apontada como uma solução eficiente, é ineficaz, pois “os
currículos constituem apenas uma variável secundária da questão
principal, que é a própria estrutura do ensino brasileiro e seus
fundamentos sociais e ideológicos”. Dessa forma, o problema do ensino do
jornalismo não é isolado, mas faz parte de uma “inadequação do sistema
de ensino superior vigente no país”. Para ele, não basta mudar os
currículos sem uma reforma nas estruturas universitárias criadas para
atender às elites do passado e que não atendem mais nem mesmo ao
setor progressivo da burguesia. Mesmo porque essas reformas
curriculares normalmente ocorrem de forma autoritária, ignorando as
necessidades do mercado e dos alunos e priorizando os interesses dos
professores de maior titulação dentro das escolas.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 25
Marques de Melo (1979, p. 39) propõe uma reformulação completa
do sistema educacional brasileiro, que não depende de grupos isolados,
como os de docentes ou de alunos, mas de uma união em torno de
propostas que possam adaptar o ensino “às necessidades de um
desenvolvimento sócio-econômico autônomo e democratizante, de um
desenvolvimento cultural fiel aos valores populares da nação”.
A prática acadêmica
Independente dessa grande reforma proposta, muitos são os
problemas que se apresentam quando se pretende analisar o que
acontece nas escolas de jornalismo do país. Um deles é a própria prática
acadêmica. Ao professor cabe a aplicação e a reforma dos métodos
pedagógicos, estimulando a participação do aluno em sala de aula, em
bibliotecas e em laboratórios. Se no início do curso faltavam livros e
instalações necessários ao ensino do jornalismo, hoje esses recursos
estão disponíveis nas universidades, mesmo que em menor grau nas
escolas criadas do dia para a noite nos centros urbanos brasileiros.
Incentivar a pesquisa deve ser um atributo presente em cada docente,
estimulando o estudante para a busca de novos conhecimentos. Este seria
um ponto inicial no processo de romper as barreiras entre o ensino teórico
e o tecnicista, envolvendo o aluno em pesquisas aplicadas e teóricas, que
proporcionariam uma formação mais rica, crítica e ética.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 26
Como explica Santos (2003, p.69):
É talvez na aplicação do currículo que pode estar o “pulo do
gato”. De nada adianta termos disciplinas de formação geral e
específica, além da técnica, mesmo que distribuídas
equilibradamente ao longo do curso. A dificuldade do aluno
continua. A sensação que fica, para os professores, é que ele
entendeu os conceitos da sua disciplina, mas isso não o ajuda
na reflexão sobre a técnica, que fica apartada, e vice-versa.
Aliás, muitas vezes ele nem sabe o porquê de estar assistindo
determinada disciplina.
Como visto, o ensino de jornalismo não é apenas uma questão de
currículo, mas principalmente uma análise de sua aplicação, de como
estimular o aluno à reflexão e de como coordenar a participação de todos
os envolvidos: instituição, aluno e professor.
Jobim, como professor de jornalismo, desde o final da década de 40
já levantava essas questões que ainda hoje discutimos. Seu curso de
pedagogia do jornalismo no Ciespal discutia tanto os perfis dos
professores quanto dos alunos, além de métodos de ensino.
Este trabalho pretende abordar a pedagogia do jornalismo proposta
por Danton Jobim durante o período de docência na Universidade do
Brasil, atual Universidade Federal do Rio de Janeiro, e também como
responsável pela cátedra de Metodologia de Ensino de Jornalismo no
Centro de Estudos Superiores de Jornalismo da América Latina - Ciespal,
como professor visitante na Universidade do Texas, onde ministrou
seminários sobre Jornalismo Mundial Comparado, e como convidado na
Universidade de Paris, onde proferiu conferências sobre o tema Introdução
ao Jornalismo Contemporâneo.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 27
Além disso, abordaremos a experiência vivenciada por Jobim
quando, a partir do final da década de 40, como já nos referimos
anteriormente, foi um dos responsáveis pela escola de jornalismo que
funcionou dentro da redação do jornal Diário Carioca, onde atuou por 33
anos. Inicialmente como redator político e depois como secretário e diretor
de redação, Jobim, junto com Pompeu de Souza e Luís Paulistano, formou
uma geração inteira de profissionais com uma visão diferente do
jornalismo até então praticado. Seu grupo foi o responsável pela revolução
no jornalismo brasileiro, introduzindo as técnicas de jornalismo
procedentes dos Estados Unidos.
O pensamento jornalístico de Danton Jobim pode ser traduzido em
uma palavra: simplicidade. Sua luta era por uma linguagem jornalística que
pudesse ser bem compreendida por todos. Por isso, e por toda sua
contribuição ao jornalismo seja como repórter ou como articulista, seja
como professor ou como político , é que Jobim tem um lugar de
destaque dentro da história do jornalismo brasileiro.
Nesse sentido é que este trabalho teve como objetivo analisar a
contribuição de Danton Jobim para o desenvolvimento de uma pedagogia
do jornalismo no Brasil. Para isso, pretendeu-se identificar e contextualizar
as modificações nos processos jornalísticos efetuadas por Danton Jobim e
sua equipe na redação do Diário Carioca, sob a influência do modelo
norte-americano que resultaram numa reforma total da imprensa
brasileira no pós-guerra. Da mesma forma, buscou-se identificar as
estratégias e fontes de referência de Danton Jobim, através da análise de
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 28
sua proposta de pedagogia para o jornalismo, verificando de que forma
essa proposta se relacionava e dialogava com os modelos humanista
europeu e pragmático norte-americano vigentes à época e como a
articulação desses dois modelos foi adaptada à realidade brasileira
naquele período.
O resgate da memória de Danton Jobim passa, necessariamente,
pela avaliação de sua importância no desenvolvimento de uma pedagogia
do jornalismo no Brasil. Nesse sentido, é fundamental a tentativa de
identificar aspectos relevantes tanto de sua prática jornalística quanto de
suas proposta e prática pedagógicas, a fim de confrontá-las com os
modelos vigentes à época, numa busca por evidências de rupturas e/ou
continuidades. Para tanto, serão realizadas análises de textos e
entrevistas não estruturadas.
Num primeiro momento, pretendeu-se realizar uma análise nos
textos de Danton Jobim, tendo como principal referência os seus dois
livros de maior relevância sobre o tema Espírito do Jornalismo e
Pedagogia Del Periodismo , buscando reunir elementos para identificar
as propostas elaboradas e as modificações introduzidas.
Neste trabalho, partimos do pressuposto de que pedagogia é um
conjunto de princípios que dão suporte à definição de teorias, métodos e
metodologias do processo educacional, que podem ser considerados mais
eficientes para se alcançar o ideal da educação, que é a aprendizagem.
Aceitamos como base teórica de comparação o instrumentalismo
pragmático deweyano, cujo foco está centrado no conceito de
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 29
continuidade e democracia dentro do ensino e para quem a educação é
uma função social ligada aos objetivos da sociedade. Dewey defendia que
“toda experiência implica pensamento; não se trata apenas de verificação
social, mas de percepção consciente das relações e de reciprocidade
entre indivíduo e entorno” (BELTRÁN, 2003, p.50). Dessa forma, suas
orientações educativas estavam centradas na continuidade entre natureza
e experiência humana, e no desenvolvimento dessa aprendizagem através
da interação social que ocorre por meio da comunicação. Utilizamos essa
base de comparação em razão de Jobim, da mesma forma, afirmar que
sua prática pedagógica no jornalismo estava centrada na observação
empírica e voltada para o “ensinar a aprender”, percebendo que era
preciso preparar o aluno para a continuidade do aprendizado além dos
muros da escola, a partir de sua experiência nas redações e na sociedade.
A necessidade de inserir a análise em um contexto nacional leva à
conveniência de uma comparação adicional com um paradigma brasileiro,
que escolhemos ser Anísio Teixeira, pois ele adaptou o modelo deweyano
à nossa realidade, na década de 1920, chegando a ter seu trabalho
rotulado como americanista (CARVALHO, 2000). Além disso, construiu
uma interpretação da Filosofia e da Filosofia da Educação do pensador
norte-americano e difundiu-a no Brasil. O autor brasileiro parte do conceito
de experiência de Dewey nas correntes da filosofia que fundamentaram as
teorias educacionais, assim como de sua vinculação à educação e à
organização da escola com o meio social, para formular uma “nova”
Filosofia e Teoria da Educação. Para ele, experiência poderia ser
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 30
conceituada a partir das relações entre os variados tipos de elementos
existentes no universo, que os obrigariam a uma constante transformação,
fazendo com que a ação e a reação entre os corpos ou organismos (já que
não seria um atributo puramente humano) promovessem uma modificação
em ambos.
Procurando contextualizar o ensino e sua relação com a prática do
processo jornalístico daquela época, também realizou-se uma investigação
histórica do jornalismo brasileiro de então, baseada nas obras de Nelson
Werneck Sodré, Juarez Bahia, Alzira Alves de Abreu, José Marques de
Melo e Victor Gentilli, entre outros pesquisadores da história do jornalismo
no Brasil.
No entanto, existem poucos registros sobre Danton Jobim e sua
importante passagem pela universidade e pelo jornalismo brasileiros.
Sobre isso, Barbosa Lima Sobrinho (1978) escreveu:
Modesto, despreocupado, indiferente, Danton Jobim nunca
falava nesses altos títulos que conquistara. Parece mesmo que
lhes não dava importância. Muitas e muitas vezes lhe sugeri que
escrevesse as suas memórias. Poderia ter um título que já me
parecia adequado: Memórias dos Bastidores. Porque conhecia
os acontecimentos políticos por dentro, por detrás das ribaltas,
participando de muitos deles com a sua inteligência e a sua
capacidade de expressão. Mas era difícil vencer a sua
convicção de que tudo era efêmero e inútil e que lhe bastava a
convicção de haver atravessado a vida com o sentimento de
profunda dignidade, que emana de seus exemplos e de sua
tranqüila doutrinação.
Num esforço para superar essa lacuna, trabalhamos com
entrevistas não-estruturadas e depoimentos de jornalistas, amigos e
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 31
alunos de Danton Jobim, que acompanharam sua trajetória na imprensa e
na universidade, seguindo o modelo proposto pela pesquisadora inglesa
Sue Stone (1984, p. 17-19), que sugere que esse tipo de entrevista
"apresenta melhores resultados em contextos onde o pesquisador se
aprofunda na vida e cultura de um determinado grupo de pessoas, de
modo a entender suas necessidades e comportamento". Dessa forma, é
possível permitir ao "entrevistado apresentar seus próprios pontos de vista,
sem ser dominado pelo padrão de referências do pesquisador". Nessa
forma de entrevista não-estruturada podem surgir pontos, não previstos
antecipadamente pelo entrevistador, de alta relevância para o estudo,
além de, através do diálogo, ser possível expandir a compreensão sobre o
modo de pensar do entrevistado.
A respeito da utilização da entrevista no resgate da história de
Danton Jobim, utilizaremos os métodos propostos pela pesquisadora
Verena Alberti (2004, p19), no livro “Manual de História Oral”, que explica:
Trata-se de ampliar o conhecimento sobre acontecimentos e
conjunturas do passado através do estudo aprofundado de
experiências e visões particulares; de compreender a sociedade
através do indivíduo que nela viveu; de estabelecer relações
entre o geral e o particular através da análise comparativa de
diferentes testemunhos, e de tomar as formas como o passado
é apreendido e interpretado por indivíduos e grupos como dado
objetivo para compreender suas ações.
As fontes utilizadas estão ligadas à trajetória do jornalista no Diário
Carioca, na Universidade do Brasil e na Associação Brasileira de
Imprensa, durante sua gestão à frente daquela instituição. Isso porque,
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 32
nas palavras do próprio Danton Jobim (1964, p.52), “jamais deixei de
conceber a cátedra de jornalismo como uma prolongação de minha
atividade profissional”. Partindo dessa declaração, pretendemos analisar
essa afirmação, verificando a continuidade de suas idéias e experiências
no jornalismo nas atividades de professor e pedagogo.
Assim, para entender a proposta pedagógica de Danton Jobim,
partimos de sua trajetória profissional multifacetada. No jornalismo, atuou
como redator de diferentes jornais, articulista, analista político, editorialista,
além de diretor de redação. Na Associação Brasileira de Imprensa foi
presidente, atuando fortemente na defesa de profissionais ameaçados
pela ditadura militar. Como senador da República, também se destacou na
luta pela liberdade de imprensa.
Com isso, defende-se a hipótese de que essa vivência de Jobim
que muitas vezes se confundiu, mas jamais se separou dos propósitos
jornalísticos de ética e de serviço público foi o que contribuiu para o seu
modelo de ensino do jornalismo, influenciado tanto pelo modelo norte-
americano
2
, mas sem se distanciar do modelo humanista europeu,
principalmente o francês. Assim, defendia a introdução de técnicas
jornalísticas mais eficientes, no sentido de se comunicar com mais
facilidade com o leitor, ao mesmo tempo em que afirmava que o jornalista
necessitava de um amplo conhecimento humanístico para fazer do
jornalismo um instrumento a favor da sociedade.
2
Modelo que Marques de Melo (1991, p.34) define como sendo de “indústria/ensino de
comunicação de massa”.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 33
O ensino de jornalismo no Brasil tem pouco mais de meio século.
Surgiu em razão das “demandas sociais emergentes nas empresas
jornalísticas” que, em razão do processo de reestruturação industrial por
que passavam, reclamavam profissionais qualificados e em sintonia com a
renovação que se apresentava na imprensa brasileira do pós-guerra
(MARQUES DE MELO, 1991).
No entanto, faltava sintonia entre as escolas e as empresas, e o
modelo de ensino proposto não agradava nem aos alunos, nem aos
professores e muito menos às empresas jornalísticas. Mas quais os
problemas identificados no curso e quais eram as alternativas propostas?
O primeiro grande problema era estrutural (MARQUES DE MELO, 1991,
p.13-14). Embora tivesse a finalidade de formar jornalistas, o curso não
era independente e estava submetido às decisões das faculdades de
filosofia das quais faziam parte.
Depois, não havia entrosamento entre as disciplinas, muito menos
entre as práticas e as teóricas. Ainda havia o problema do corpo docente.
Em um momento em que os profissionais qualificados da imprensa não
detinham títulos acadêmicos, os mestres vinham de outras áreas do
conhecimento, provocando uma barreira entre o saber universitário e a
prática profissional, reproduzindo o mesmo modelo de criação da
universidade no Brasil, voltada às elites e centrada em si própria, sem uma
preocupação com o meio social.
Na Universidade do Brasil, Danton Jobim insistia na autonomia do
curso de jornalismo e questionava as práticas pedagógicas autoritárias
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 34
existentes, lutando por um modelo que integrasse a prática e a teoria para
formar jornalistas cultural e eticamente capazes, sem dissociá-las uma da
outra, pelo contrário. Para ele, a escola deveria ser o grande agente da
transmissão e distribuição intelectuais, mas colocando “toda espécie de
informação a serviço do homem, contribuindo para seu aperfeiçoamento
moral”.
Mas a questão do ensino do jornalismo até os dias atuais
permanece em um impasse que não conseguiu obter êxito na sua
resolução. Por isso, nos voltamos para as propostas de Jobim, esquecidas
com o decorrer do tempo, em busca de respostas para questões ainda
pendentes, apontando para um modelo de ensino no qual o mais
importante não é apenas ensinar, mas “ensinar a aprender”.
Um aprofundamento e resgate de sua obra são também
importantes, neste momento, como forma de homenagem ao centenário
de nascimento de Danton Jobim, que ocorreu em 2006.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 35
1 O ensino do Jornalismo no Brasil: das iniciativas pioneiras ao
curso na Universidade do Brasil
Se a educação superior oficial no Brasil foi criada tardiamente
1808 foi o ano da instalação da primeira escola superior , no caso das
escolas superiores de Jornalismo, a demora foi maior ainda: somente em
1947, 139 anos após, surgiu o primeiro curso oficial na Fundação Cásper
Líbero.
Até então, os jornalistas que entravam nas redações eram, em sua
maioria, oriundos dos cursos de Direito, já existentes desde o ano de
1827.
Nesse ano de 1827, instalam-se os cursos jurídicos de São
Paulo e do Recife. Um acontecimento que a história do Império
e da República vai anotar como sinal de novos quadros políticos
e culturais no processo do desenvolvimento brasileiro. Das duas
escolas de Direito sairão agitadores, líderes, pensadores,
estadistas e jornalistas. (BAHIA, 1990, p. 41-42)
Na verdade, dessas escolas saíram jornalistas ilustres e
reconhecidos. Esse foi o caso dos consagrados Barbosa Lima Sobrinho,
Rui Barbosa e Alceu Amoroso Lima, entre outros.
Mas, desde 1821, com a volta da Corte para Portugal, os jornais já
circulavam livremente. Anteriores a essa data, circularam A Gazeta do Rio
de Janeiro, uma espécie de jornal oficial da Corte Portuguesa, e o Correio
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 36
Braziliense, jornal feito em Londres por Hipólito da Costa, com circulação
clandestina no Brasil. Após a liberação da imprensa, o número de jornais
cresceu rapidamente. E, na primeira metade do século XX, os grandes
jornais do Rio e de São Paulo já se renovavam tecnicamente com o apoio
da publicidade. Para Bahia (1990, p. 208), a partir da década de 30, a
imprensa se expandiu com a criação de “uma indústria cultural de
identidade própria”.
O trabalho jornalístico também se organizava nos anos 30. Laurenti
(2002, p. 142) explica que “em 30 de novembro de 1938, o Decreto-lei n°
910 dispôs sobre a duração e condições do trabalho em empresas
jornalísticas”.
Entende-se como jornalista o trabalhador intelectual cuja função
se estende desde a busca de informação até a redação de
notícias e artigos e à organização e direção desse trabalho.
(Decreto-lei n. 910. In: BOBBIO, 1938, p. 533)
Mas a idéia de uma escola superior de jornalismo no Brasil não
progredia, embora na vizinha Argentina o curso já funcionasse desde 1934
(MARQUES DE MELO, 2003a). Na Europa, já havia surgido na França,
em 1899, a Escola Superior de Jornalismo de Paris, enquanto, em 1903, a
Universidade de Zürich estabelecia um curso permanente, motivada pelas
conferências do professor Karl Bucher sobre “ciências da imprensa” na
Universidade de Besle (Suiça), entre 1884 e 1890 (MARQUES DE MELO,
2005). O mesmo Bucher, indo para a Alemanha, cria, em 1916, o primeiro
instituto universitário de ciência da imprensa na Universidade de Leipzig.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 37
A criação de um curso de Jornalismo também era uma aspiração
antiga de Gustavo de Lacerda, fundador da Associação de Imprensa, hoje
Associação Brasileira de Imprensa (ABI). Na fundação da entidade, a nota
publicada pelo jornal O Paiz, do Rio de Janeiro, de 9 de abril de 1908,
especificava sua finalidade:
Está fundada nesta capital, a contar de 7 do corrente, a
Associação de Imprensa, tendo por fins principais:
Criar e manter uma caixa de pensões e auxílios para os sócios
e suas famílias; manter um serviço de assistência médica e
farmacêutica; instalar o Retiro da Imprensa, com enfermaria e
residência para velhos e enfermos; manter, no centro da cidade,
a sede social, com biblioteca, salões de conferências e
diversões etc; habilitar, por meio de título de capacidade
intelectual e moral, o pretendente à colocação no
jornalismo
3
; prestar pública homenagem a Guttenberg, o
fundador da imprensa, por meio de uma festa anual, para a qual
procurará associar o Governo da República.
A Associação de Imprensa publicará um anuário da mesma,
com o nome e idade de todos os sócios, detalhes de todos
interesses sobre artes, ciências e letras, e instituirá a carteira de
jornalista, como atestado de identidade e recomendação do
portador. A primeira diretoria compõe-se dos srs. Gustavo de
Lacerda (presidente), Francisco Souto, Luís Honório, Arthur
Marques, Alberto Seabra e Alberico Doemon.
Da administração farão parte, ainda, as comissões que serão
nomeadas brevemente e são as seguintes:
De Organização do Anuário, de Propaganda de Festas e de
Economia e Finanças e de Auxílios e Assistência. (Apud
MOREL In: Boletim da ABI, abril de 1978, p.16)
Para Morel (1978), algumas reivindicações, como a de “habilitar por
meio de título de capacidade intelectual o pretendente à colocação no
jornalismo, não deixam de ser a base dos atuais cursos de Jornalismo”.
3
Grifo da autora.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 38
Mas essas reivindicações só serão alcançadas bem mais adiante, com o
advento da Revolução de 1930.
Em 1918, a Associação Brasileira de Imprensa, no seu Primeiro
Congresso de Jornalistas, tentou criar aquela que seria a primeira Escola
de Jornalismo no país, baseada nos moldes das organizações norte-
americanas. Durante o Congresso foram oficializadas as propostas de
criação de um curso de Jornalismo, descritas por Victor de Sá (1955) da
seguinte forma:
Segundo o regulamento estabelecido para a Escola de
Jornalismo, onde havia idéias colhidas nas organizações norte-
americanas, o curso geral seria de três anos, além de um curso
vestibular de dois anos que são de preparo para a matrícula no
instituto. (....) A escola de Jornalismo, que não queria ser oficial,
que não faria doutores nem bacharéis, mas que se propunha
unicamente a propinar a seus alunos o ensino de matérias
julgadas essenciais à prática da profissão cuidando da cabeça e
das mãos dos estudantes, com a teoria da ciência necessária e
a prática das artes de gravar. Ao lado do programa das aulas do
curso teórico propriamente dito, a Escola ministraria o ensino
prático. Seria, então, fundado o jornal para os alunos e na
redação e nas oficinas dessa folha iriam os estudantes
desenvolver praticamente a sua força na sintaxe e na ortografia
da língua. O jornal seria a escola de aplicação, onde os alunos
completariam os seus estudos, redigindo reportagens, que
poderiam ser mundanas, artísticas, policiais ou sociais,
escrevendo artigos de política e finanças, com orientação
própria ou ditada pelo professor, fazendo a crítica de música,
pintura, teatro e letras, conforme o adiantamento no Curso
regular da Escola. (SÁ apud MARQUES DE MELO, 1974, p.16)
A preocupação da entidade era com o preparo dos profissionais do
jornalismo. Em um momento em que a sociedade se transformava
rapidamente e a imprensa evoluía para uma fase industrial, principalmente
nas maiores capitais do país, a idéia de formar quadros responsáveis na
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 39
área de jornalismo foi tomando corpo, ainda que contasse com
considerável rejeição por boa parte da categoria.
1.1 Experiências pioneiras
Embora nada fosse em frente, muitas iniciativas eram tomadas em
prol de um curso de Jornalismo. Foi o caso de Vitorino Prata Castelo
Branco que, de acordo com Kobayashi (2003), deixou como grande legado
a sistematização do “ensino de jornalismo de maneira que todas as
pessoas tivessem a oportunidade de aprender essa profissão”. A autora
lembra que “acusado de leviano, oportunista, ele teve o mérito de difundir
também o ensino a distância, numa época sem computadores ou Internet,
por exemplo”.
Castelo Branco, além de jornalista, foi advogado, professor e
empresário. Nascido em Itirapina, São Paulo, em 1904, formou-se em
Direito na Universidade Federal Fluminense, em 1956, e, em 1958, já
concluía seu doutorado na Universidade de São Paulo. Lecionou na
Faculdade de Direito de Guarulhos (SP), na Faculdade de Administração
de São Paulo e na Sociedade Brasileira de Direito. Mas sua ligação com o
jornalismo era anterior.
No final de 1942, já escrevendo para jornais de São Paulo, decide
se aperfeiçoar e vai para a Argentina participar de um curso na Sociedad
Argentina de Periodismo y Redacción, onde recebe o certificado com
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 40
distinção. Lá, tem contato com o Círculo de Periodistas de la Província de
Buenos Aires e com a Escola Argentina de Periodismo, da Universidad
Nacional de la Plata. Segundo Dias (2004):
Ali, conhece a estrutura da Escola de Periodismo e seus
antecedentes, seu primeiro plano de estudos, o regulamento e o
início de seus cursos, em 1935. Com a mente repleta de ideais,
volta ao Brasil com muito entusiasmo e decide criar um curso de
Jornalismo.
Dias (2004) explica que, no ano seguinte, em 1943, Castelo Branco
inicia uma série de palestras e conferências na sede da Associação dos
Profissionais de Imprensa de São Paulo, que culminaram no primeiro
Curso Livre de Jornalismo no Brasil.
Lançar um Curso de Jornalismo numa época em que não existiam
escolas de Comunicação no Brasil foi uma tarefa pioneira, mas penosa.
Marques de Melo (1974, p.18) conta que o “curso não foi muito bem
recebido pelo Sindicato dos Jornalistas, que encaminhou publicamente
uma representação ao diretor Geral do DIP”.
O motivo de maior resistência do Sindicato e dos empresários de
comunicação daquela época foi o curso de jornalismo ter se transformado
em ensino a distância, vendido em fascículos por meio de uma revista.
Os cursos eram parte integrante da revista mensal intitulada
"Cursos". A publicação se autodenominava uma revista de
ensino prático. Nela não eram veiculados anúncios de qualquer
espécie. Castelo Branco acreditava que estes não se
enquadravam no propósito da revista, que era a educação a
distância.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 41
Cabe frisar, que antes do lançamento do curso de jornalismo, a
revista já circulava por todo o país sem causar qualquer tipo de
espanto. A revista estava, legalmente, registrada como tal e,
além dos assinantes, podia inserir anúncios, publicar matéria
remunerada e gozar, enfim, de todas as regalias e prerrogativas
dessa classificação. (KOBAYASHI, 2003)
Embora Castelo Branco tenha sido pioneiro também no ensino a
distância, sua maior contribuição foi na sistematização do ensino do
Jornalismo. Kobayashi (2004) acredita que ele desafiou todos que viam a
profissão apenas como um “bico”. “Fez com que as pessoas saíssem de
uma situação confortável onde todos já nasciam jornalistas”.
Marques de Melo (1974, 18) lembra que sua iniciativa desencadeou
uma “série de cursos livres de jornalismo que viriam a existir em várias
cidades brasileiras, paralelamente aos cursos regulares e, até mesmo,
como um desafio a eles”.
Mas ele contribuiu principalmente trazendo à tona as antigas
discussões sobre a necessidade da formação acadêmica do jornalista, que
se fazem ainda muito atuais nos dias de hoje.
Se se exige diploma de quase todas as profissões, por que não
se exige, também, um título do homem que deseja trabalhar na
imprensa, escrevendo em jornais, opinando sôbre questões
transcendentes da nacionalidade, discutindo os assuntos mais
técnicos, propagando as idéias mais ousadas? (CASTELO
BRANCO apud KOBAYASHI, 2004)
Antes disso, em 1935, ao criar a Universidade do Distrito Federal,
Anísio Teixeira delegou ao jornalista Costa Rego, editor do jornal Correio
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 42
da Manhã, a incumbência de organizar um curso de jornalismo, que
valorizasse a formação humanística profissional. Porém, as idéias de
Anísio Teixeira e Costa Rego foram frustradas, quando o golpe do Estado
Novo de Getúlio Vargas extinguiu a Universidade (LAURENTI, 2002, p.
146).
A idéia de Anísio Teixeira era de uma “universidade autônoma, não
tutelada pelo Governo Federal” (MARQUES DE MELO, 2003a), com uma
proposta diferente da sugerida inicialmente pela ABI. Não se tratava da
criação de uma escola profissional,
mas de um curso universitário destinado a refletir sobre o
fenômeno ascendente da cultura de massa, correlacionando
duas atividades então imbricadas profissionalmente: o
jornalismo e a publicidade. (MARQUES DE MELO, 2003a, p.
301)
Pretendendo, a universidade, criar “homens cultos”, o projeto foi
recebido pelas elites do Estado Novo com hostilidade. A idéia de que era
um “núcleo de perigosos esquerdistas” difundiu-se na sociedade e junto ao
Governo.
A experiência da Universidade do Distrito Federal, criada por um
Decreto do prefeito Pedro Ernesto, durou apenas até 1939. Porém seu
modelo inspirado no pragmatismo de Dewey, que Anísio Teixeira
introduziu no Brasil, tornou-se paradigmático na criação do curso da
Universidade do Brasil, em 1948.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 43
1.2 O Jornalismo na Universidade: a Escola de Jornalismo Cásper
Líbero
Com a promulgação do Decreto-lei n° 5.480, de 13 de maio de
1943, assinado pelo presidente da República, Getúlio Vargas, e pelo
ministro da Educação e Saúde, Gustavo Capanema, que o curso de
jornalismo finalmente começou a se concretizar. O artigo 3° referia-se ao
curso que seria ministrado pela Faculdade Nacional de Filosofia da
Universidade do Brasil, com a cooperação da Associação Brasileira de
Imprensa e dos sindicatos representativos das categorias de empregados
e de empregadores das empresas jornalísticas. No caso de instituições
não-federais, a organização do curso deveria estar de acordo com o
Decreto-lei n° 421, de 11 de maio de 1938, que regulava o funcionamento
das instituições de ensino superior.
Mas quem saiu na frente foi a Fundação Cásper Líbero. Em 1947,
atendendo ao testamento do jornalista, a Fundação, em convênio com a
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de São Bento da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, instituiu o curso, aprovado por meio
do Decreto n° 23.087, de 19 de maio daquele ano.
A exemplo de Pulitzer, empresário do jornalismo norte-
americano que efetuou uma doação à Columbia University para
a formação de uma escola destinada à preparação de
jornalistas, Cásper Líbero, proprietário do grupo “ A Gazeta”, foi
o responsável pela instalação de uma entidade da mesma
natureza, em São Paulo. (MARQUES DE MELO, 1974, p.19)
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 44
Demonstrando seu pioneirismo, Cásper Líbero, um empresário
progressista e preocupado com a formação de jornalistas, redigiu um
testamento em março de 1943, antes mesmo do decreto governamental
que instituiu o Curso de Jornalismo (de maio de 1943), legando seu
patrimônio aos funcionários e à coletividade, transformando-o em uma
Fundação. De acordo com o testamento de Cásper, além de sucedê-lo na
propriedade de A Gazeta, a Fundação teria a missão de fundar e manter
uma escola de jornalismo, com "cursos de grandes proporções"
destinados a formar quadros profissionais para a imprensa (JAYO, 2004).
Seu testamento dizia:
(...) Visto como tudo que possuo devo à Providência que não
me há desamparado, e à GAZETA, jornal que é o reflexo e o
orgulho de toda a minha existência de labores, sempre a serviço
de São Paulo, do Brasil, da justiça e das grandes ideologias,
quero e disponho que todos os meus bens remanescentes
sejam reunidos e aplicados como patrimônio da fundação que
ora crio e instituo (....). Será tríplice a sua finalidade ou objetivo,
a saber: a) objetivo patriótico, de iniciativas e campanhas por
São Paulo, pelo Brasil, pela justiça, pelos nobres ideais, pela
cultura e grandeza de nossa Pátria, servindo-se para isso de A
GAZETA, do seu auditório, de seu rádio e dos recursos do
patrimônio de que ora a doto; b) objetivo cultural, de criar e
manter uma escola de jornalismo e ensinamentos de
humanidades, particularmente português, prosa, estilo,
literatura, eloqüência, história e filosofia, em cursos de grandes
proporções, a começar pelo secundário e finalizar pelo superior;
c) objetivo jornalístico, consistente em assegurar e desenvolver
o nome, futuro, prosperidade, economia e prestígio de A
GAZETA, mantendo-a órgão de genuína opinião pública e
interesse da pátria, aparelhada dos inventos e
aperfeiçoamentos que o progresso for engendrando, fidelíssima
da fundação (...). (LÍBERO apud HIME, 1997, p. 244-245)
Embora não tenha sido uma idéia original, em 1943, Cásper Líbero
avalizou e deu “continuidade às ações da ABI, movendo-se, ao menos em
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 45
parte, pelas mesmas motivações desta última, atribuíveis à necessidade
de treinar profissionais preparados para lidar com a crescente
modernização técnica da atividade jornalística” (JAYO, 2003).
Hime (1997) não se surpreende que fizesse parte de seu
testamento a criação da primeira faculdade de jornalismo brasileira,
porque mantinha-se ligado a todas as discussões presentes nos
movimentos de classe de sua época, num momento em que imperava o
debate sobre a necessidade de formação profissional no jornalismo. Além
disso:
Como ele próprio tantas vezes afirmou, era um homem de
jornal, que no jornal encontrava o estímulo necessário para as
lutas a que se determinava. No jornal passava o dia. Chegava
cedo, acompanhava de perto a produção, discutia as edições,
recebia as pessoas. E mesmo quando expandia a sua atuação
para além das páginas do vespertino, por meio de promoções e
eventos, era ainda no jornal que se ancorava. (HIME, 1997,
235)
Hime lembra ainda que, em suas viagens aos Estados Unidos e
Europa, Cásper teve contato com diferentes modelos de ensino do
jornalismo. Embora não tenha especificado qual tipo de curso tivesse
atraído mais sua atenção, havia indicações de que fosse um curso voltado
para as Ciências Humanas.
Marques de Melo acredita que Cásper Líbero tivesse ainda
motivações de cunho empresarial, principalmente por sua visão
progressista.
Havia (...) demanda de pessoal habilitado para exercer
profissionalmente um novo tipo de jornalismo, seguindo padrões
que contrastavam com o desempenho da imprensa na época.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 46
Logo, a escola de jornalismo impunha-se como instrumento
necessário para solucionar tal impasse treinando novas
vocações, de acordo com a plataforma editorial, ética e política
vigentes nas suas empresas. (MARQUES DE MELO, 1994,
p.19)
Mas é preciso lembrar que Cásper tinha fortes convicções
ideológico-religiosas. Em vida, cultivou o hábito de financiar pessoalmente
os estudos de diversos de seus funcionários no Largo de São Francisco,
entre outras formas de ajuda material. Por isso, não surpreende o fato de
ter destinado uma parte de seu patrimônio à criação de uma escola de
qualidade, com cursos gratuitos "de grandes proporções", destinados ao
ensino do jornalismo.
Ele faleceu poucos meses depois de escrever seu testamento, em
agosto de 1943. Mas, em 1947, “depois que o Ministério da Educação
fixou as diretrizes pedagógicas para os cursos de jornalismo, começou a
funcionar a instituição idealizada por Cásper Líbero” (MARQUES DE
MELO, 1974, p. 21).
O curso da Escola Cásper Líbero da Faculdade de Filosofia da
PUC-SP foi reconhecido em 1949. Nos primeiros anos, a orientação
pedagógica do curso foi baseada no modelo norte-americano da
Universidade do Missouri, de acordo com Rizzini (1953, p. 46), que
afirmava que a Escola mantinha o jornal mensal, A Imprensa, a cargo dos
estudantes, “fiel ao princípio de que o aluno deve ver impresso aquilo que
escreve”.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 47
Mas Marques de Melo (1974) contesta essas afirmações. Segundo
ele, um memorial dos alunos, em que entre os signatários estava o
jornalista José Hamilton Ribeiro, encaminhado à Fundação, reclamava da
falta de treinamento profissional prático. Marques também se utiliza da
justificativa do programa da disciplina Técnica de Jornal, do ano de 1953,
ministrada pelo jornalista Luís Silveira, para mostrar que o curso tinha a
orientação voltada para a Faculdade de Jornalismo da Universidad
Internacional “Pro-Deo” para as Ciências de Opinião de Roma.
O material que temos recebido desse notável instituto de ensino
superior, de alto conceito universal, é que nos tem guiado na
orientação do ensino da cadeira Técnica de Jornal. (SILVEIRA
apud MARQUES DE MELO, 1974, p. 23)
O próprio Rizzini, em seminário promovido pelo Ciespal no Rio de
Janeiro, em 1965, reconheceu que as escolas brasileiras tinham
problemas com a parte prática do curso, satisfazendo apenas o lado
cultural e não suas finalidades profissionais.
Mas o problema não estava unicamente na Escola Cásper Líbero.
Veremos, mais adiante, que o curso da Universidade do Brasil sofria do
mesmo problema.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 48
1.3 O curso na Universidade do Brasil
Em 1948 começa a funcionar o curso de Jornalismo da Faculdade
Nacional de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade do Brasil. E aí
começa a carreira de professor e catedrático de Danton Jobim, que
trataremos mais à frente.
De acordo com Laurenti (2002), os primeiros cursos de Jornalismo
no Brasil enfrentaram as dificuldades comuns e inerentes a um novo
curso, que requer experiência para ganhar notabilidade e se posicionar no
espaço acadêmico. Mas a dificuldade maior se dava em razão de sua
vinculação com uma Faculdade de Filosofia, o que dificultava ainda mais
sua estabilidade e luta pela legitimação do ensino.
Os entraves burocráticos que determinam subordinação à
Faculdade de Filosofia, marginalizavam a sua condição e o
conduziam a ser “simplesmente” um curso, sem o “status” de
escola independente. (LAURENTI, 2002, p.151)
Sobre o assunto, Laurenti (2002) cita o parecer do relator Alceu
Amoroso Lima, que afirmava que “o diploma do Curso de Jornalismo é um
título cultural e não um privilégio profissional ou didático”, e o de Jurandyr
Lodi, que confirmava que fazendo parte de uma Faculdade de Filosofia
não poderia se “constituir Escola isolada, com regulamentação isolada”.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 49
O curso só ganharia autonomia em 6 de junho de 1958, com o
Decreto n° 43.839, que alterava o Decreto n° 26.493/49, de 19 de março
de 1949, autorizando que fosse ministrado em instituto autônomo.
De acordo com Cunha (1989, p.103-104), a distribuição de alunos
nos cursos de Jornalismo nos dez anos iniciais foi a seguinte:
Ano 1948 1949 1950 1951 1952 1953 1954 1955 1956 1957
alun.
366 497 710 524 483 362 390 336 461 426
Uma curiosidade é que, dos 426 alunos matriculados no ano de
1957, 159 eram mulheres. O interessante é que essa proporção, superior
a 37%, não se repetia no ensino universitário no Brasil. Naquela época, de
um total de 78.659 estudantes matriculados, apenas 26% eram do sexo
feminino. Só a título de ilustração, em 1964 o número de alunos chegava a
1.265 e, em 1986, quando o curso já havia se transformado em curso de
Comunicação Social, 10.637 estavam matriculados apenas na habilitação
em Jornalismo.
Um dos problemas é que o curso foi recebido com ceticismo,
principalmente por parte dos profissionais mais antigos. Jobim lembra que
o próprio autor da aula inaugural insistiu que o importante do curso era a
parte teórica relacionada com as disciplinas de cultura geral em detrimento
da prática. Segundo ele, o autor “insistiu no preconceito de que ‘jornalismo
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 50
não se aprende na escola, mas na banca de redação’”, refletindo a
imagem apregoada na época e, muitas vezes, repetida até os dias de hoje.
Jobim comemorou, em 1958, que essa “atmosfera de hostil
ceticismo que se formara em torno do curso nos círculos jornalísticos”
havia desaparecido, embora se saiba que ela permanece até hoje,
principalmente entre os jornalistas remanescentes das décadas de 50 a
70, período em que o diploma não era obrigatório.
Mas o clima de hostilidade não impediu uma grande procura inicial
pelos cursos. Jobim (2003, p.212) aponta os seguintes números de alunos
ingressantes no curso da Universidade do Brasil nos seus dez primeiros
anos iniciais:
Ano 1948 1949 1950 1951 1952 1953 1954 1955 1956 1957
alun.
336 151 286 106 47 44 60 51 59 40
Nos primeiros anos, havia uma grande diferença entre o número de
alunos ingressantes pelo concurso vestibular e o número de alunos
matriculados. Tal diferença devia-se, principalmente, à facilidade inicial de
ingresso dos candidatos que já exerciam a profissão de jornalistas. Deles
não era exigida nem mesmo a conclusão do curso secundário, muito
menos a aprovação no vestibular. Com o desaparecimento dessas
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 51
facilidades e com o estabelecimento de limites para o número de
matrículas (apenas 40 vagas), as turmas diminuíram consideravelmente.
O curso sofreu diversas modificações no seu currículo inicial, como
se descreve mais à frente. Mesmo assim, segundo Marques de Melo
(1974, p. 31), “o ensino ali ministrado não conseguiu atingir os objetivos
originais pretendidos pelos dirigentes jornalísticos que lutaram pela sua
criação”.
Jobim (2003, p. 219), no entanto, reconhecia que existiam
problemas de desajustamento entre os meios de que dispunham e as
necessidades de um ensino eficiente para a formação de bons
profissionais. Mas acreditava que, “tanto pela sua qualidade, como pela
experiência acumulada durante dez anos”, o pessoal docente enfrentava
os problemas com sucesso.
Sobre as mudanças na grade curricular do curso de Jornalismo,
Jobim, em 1958, em exposição no Seminário sobre Formação de
Jornalismo, realizado em Quito, no Equador, comentou:
O número de reformas sofridas pelos cursos em dez anos de
vida mostra o interesse que põem as autoridades do ensino e a
congregação da faculdade em dar-lhe cada vez maior eficiência.
Nos debates em torno dessas reformas, tem-se mantido com
segurança o critério de que o nível de instrução ministrado deve
ser o universitário ou de ensino superior e não o de um curso
para a simples formação de práticos em jornalismo. Um
jornalista esta é a opinião generalizada tanto precisa de
conhecimentos básicos na sua profissão como de uma cultura
geral de nível universitário. Elevar o padrão não apenas
profissional, no sentido estrito, mas ainda cultural e ético do
ofício, esta é a missão das boas escolas de jornalismo, qual têm
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 52
participado inclusive os professores das cadeiras técnicas.
(JOBIM, 2003, p. 216-217)
Embora defendesse um ensino amplo em países “onde as
disciplinas do curso secundário são, em geral, deficientemente ensinadas”,
Jobim queixava-se da falta do trabalho prático que deveria ser realizado
pelos alunos. Ele acreditava que o contato direto com a profissão, através
da redação de textos notícias, reportagens e editorias , era pouco
utilizado pela universidade e pela imprensa, que relutava em abrir espaço
para os estudantes. Da mesma forma, o estágio previsto em redações era
irregularmente praticado, principalmente pelo fato de os bons repórteres e
redatores não terem tempo disponível para acompanhar os iniciantes,
deixando-os nas mãos de profissionais menos capacitados.
Para resolver esse problema, Jobim defendia a necessidade de
laboratórios gráficos e da criação de jornais-laboratórios, que terminaram
por ser implantados tempos depois. Para ele, isso possibilitaria aos alunos
um treinamento mais completo de paginação, que até aquele momento
ficava restrito às técnicas de diagramação e espelhagem. Porém, Jobim
acreditava que a importância maior na criação de veículos laboratoriais
estava na mudança de atitude do aluno, que passaria a escrever “matéria
destinada a ser lida pelo público e não somente pelo professor” (JOBIM,
2003, p.215).
Outro problema era a falta de material didático. O professor
reconhecia que a literatura em língua portuguesa era praticamente
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 53
inexistente. Os professores das disciplinas técnicas utilizavam material que
era levado das redações para as salas de aula, como papel padronizado
para originais, papel centimetrado para espelhos, réguas de medidas
gráficas, fotografias e negativos, catálogos de tipos, entre outros.
Mas o número de horas dispensadas às disciplinas técnicas era
significativo e representava cerca de um terço das disciplinas teóricas,
embora estas fossem em um número muito maior. Mesmo com as práticas
se restringindo apenas a técnica de jornal, técnica de periódico,
administração de jornal, publicidade e rádiojornalismo. Isto no que se
refere ao ano de 1958.
Porém, Jobim também confirmava que, do mesmo modo que os
alunos da Escola Cásper Líbero de São Paulo, os alunos da Universidade
do Brasil também se queixavam de que o ensino era “excessivamente
acadêmico”, o que, para ele, se devia em parte “à falsa noção de que o
curso de jornalismo deve ser meramente profissional, reduzindo ao mínimo
o tempo dispensado às matérias não-técnicas” (JOBIM, 2003, p. 216). Ele
acrescentava que essas disciplinas “de ilustração” visavam dar a base
cultural necessária a qualquer jornalista, além de terem programas
próprios adaptados às finalidades do curso.
Jobim acreditava que os resultados obtidos depois dos primeiros
dez anos de cursos, “ao menos do ponto de vista do nível técnico-
profissional do jornalismo”, eram positivos. Principalmente porque, antes
da instituição do ensino superior de jornalismo, não se notavam esforços
para “melhorar o padrão do estilo das notícias e de sua titulação”. Embora
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 54
confessasse a falta de pesquisa na área, ele acreditava que a melhora na
imprensa se devia ao curso.
O curso só sofreu uma mudança radical depois que a reforma
universitária, instituída pelo Decreto n° 60.455-A, de 13 de março de 1967,
já na então Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) novo nome
da Universidade do Brasil , criou a Escola de Comunicação (ECO),
dotada de autonomia didática e administrativa.
1.4 Os primeiros currículos do Curso de Jornalismo
O currículo inicial do curso de Jornalismo, por determinação do
Decreto n° 22.245, de 6 de dezembro de 1946, previa seções que se
dividiam em Formação, Aperfeiçoamento e Extensão Cultural, com as
seguintes disciplinas:
1º. Ano 2º. Ano 3º. Ano
Português e Literatura Português e Literatura Português e Literatura
Francês ou Inglês Sociologia Psicologia Social
Geografia Humana Política Economia Política
História da Civilização História do Brasil Noções de Direito
Ética e Legislação de
Imprensa
História da Imprensa Organização e
Administração de
Jornal
Técnica de Jornalismo Técnica de Jornalismo Técnica de Jornalismo
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 55
Além disso, o curso, distribuído em três anos, previa ainda mais
duas disciplinas optativas por ano, escolhidas entre: Introdução à Filosofia,
História Contemporânea, História da América, História das Artes, História
da Música, Direito Constitucional, Direito Administrativo, Educação
Comparada e Estatística (LAURENTI, 2002).
Existia o estágio obrigatório, amparado na disciplina Técnica de
Jornalismo, e a seção de Aperfeiçoamento, que consistia em conferência e
trabalhos práticos para os profissionais de imprensa.
Em 1948, o Decreto n° 24.719, de 29 de março, mudava a estrutura
curricular do curso. O novo currículo distribuía a grade da seguinte forma:
1º. Ano 2º. Ano 3º. Ano
Português e Literatura Português e Literatura Português e Literatura
Francês Francês Psicologia Social
Inglês Inglês Noções de Direito e
Economia
Geografia Humana Sociologia e Política Publicidade,
Organização e
Administração de
Jornal
História da Civilização História do Brasil Técnica de Jornalismo
Ética, História e
Legislação de
Imprensa
Técnica de Jornalismo Radiodifusão
Técnica de Jornalismo
É importante ressaltar que, a partir desse momento, o meio
eletrônico – no caso, o rádio – foi incluído no currículo, mostrando uma
preocupação com a atualização das mídias.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 56
Em 1949, o currículo foi novamente alterado pelo Decreto n°
26.493, de 19 de março. O novo currículo tornava as disciplinas de Inglês
e Francês facultativas e dividia a seção de Aperfeiçoamento em duas:
Aperfeiçoamento em Técnica e em Cultura Geral (LAURENTI, 2002). Com
a divisão, as disciplinas ficaram separadas da seguinte forma:
Aperfeiçoamento em Técnica
1º. Ano 2º. Ano
Ética, História e Legislação da
Imprensa
Técnica de jornalismo
Técnica de Jornalismo Prática de Imprensa
Prática de Imprensa Publicidade, Organização e
Administração de Jornal
Noções de Direito e Economia Radiodifusão
Aperfeiçoamento em Cultura Geral
1º. Ano 2º. Ano
Português e Literatura Sociologia e Política
História da Civilização Noções de Direito e Economia
Literatura Contemporânea História do Brasil
Geografia Humana Administração Pública
Estatística
Em 1950, novamente ocorre uma reestruturação no curso. Dessa
vez foi em razão da reestruturação do curso de Jornalismo da Faculdade
de Filosofia da Universidade do Brasil. Por analogia, os demais cursos
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 57
foram reestruturados, de acordo com o Decreto n° 28.923/50. A diferença
é que foi criada uma parte básica nos dois primeiros anos de curso e uma
parte na qual o aluno poderia optar pela grade que tivesse mais interesse
de cursar no terceiro ano (LAURENTI, 2002). O curso foi estruturado da
seguinte forma:
Primeira Parte (Básica)
1º. Ano 2º. Ano
Técnica de Jornal Técnica de jornal
Ética, História e Legislação da
Imprensa
Publicidade
Administração de Jornal Língua Portuguesa e Literatura de
Língua Portuguesa
História da Civilização História do Brasil
Língua Portuguesa e Literatura de
Língua Portuguesa
História Contemporânea
Geografia Humana Geografia do Brasil
Segunda Parte (Opcionais)
3º. Ano
(Modalidade A)
3º. Ano
(Modalidade B)
3º. Ano
(Modalidade C)
Radiojornalismo ou
Técnica de Periódico
Radiojornalismo ou
Técnica de Periódico
Radiojornalismo
Sociologia História das Artes Introdução à Educação
Economia Literatura de Língua
Portuguesa
Psicologia Social
Política e
Administração Pública
Literatura
Contemporânea
Criminologia
Técnica de Jornal Técnica de Jornal Técnica de Jornal
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 58
As atividades práticas em redação, oficinas e estúdios ficavam
relacionadas com as disciplinas Técnica de Jornal, Técnica de Periódico e
Radiojornalismo. O estágio, segundo o decreto, deixava de ser obrigatório
e passava a ser oferecido “sempre que possível”. O decreto também
assegurava aos formandos, a partir de 1950, o diploma de bacharel em
Jornalismo (LAURENTI, 2002).
Naquele ano, um novo currículo havia sido aprovado pela
Congregação da Faculdade Nacional de Filosofia. A principal diferença
estava na mudança de três para quatro anos de curso. Quanto às
disciplinas, a base era praticamente a mesma:
1º. Ano 2º. Ano 3º. Ano 4º. Ano
Ética, História e
Legislação de
Imprensa
Técnica de
Jornal
Técnica de Jornal Técnica de
Jornal
Administração de
Jornal
Publicidade Radiojornalismo Técnica de
Periódico
Português e
Literatura da
Língua
Portuguesa
Português e
Literatura da
Língua
Portuguesa
Português e
Literatura da
Língua
Portuguesa
Literatura
Contemporânea
Geografia
Humana
Geografia do
Brasil
Sociologia História das
Artes
História da
Civilização
História
Contemporânea
Introdução à
Educação
Economia
História do Brasil Psicologia Social Política e
Administração
Pública
Criminologia
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 59
Em 1957, dez anos depois de criado, já existiam nove cursos no
Brasil (JOBIM, 2003, p.109), a saber:
Rio de Janeiro: 2 (dois) com 166 alunos
São Paulo: 2 (dois) com 77 alunos
Rio Grande do Sul: 2 (dois) com 131 alunos
Bahia: 1 (um)
Minas Gerais: 1 (um)
Paraná: 1 (um) com 52 alunos
Dessas, três eram instituições públicas e seis eram particulares.
Entre as particulares, destacavam-se as instituições católicas de ensino,
com quatro cursos de Jornalismo, que absorviam pouco mais da metade
do total de alunos matriculados naquele ano (218 alunos).
A situação atual das escolas é muito diferente. Segundo dados do
Censo de Ensino Superior de 2003, o número de cursos de Jornalismo
existentes é de 443. Apenas entre os anos de 2000 e 2003, o número de
cursos teve um aumento de 70%. Desses, 74 são de escolas públicas e
369 de escolas privadas. O levantamento, no entanto, segundo a
Federação Nacional de Jornalistas (FENAJ), inclui como "Jornalismo"
todos os cursos de graduação em Cinema e Vídeo, Jornalismo, Noticiário
e Reportagem, Radialismo, Rádio e Telejornalismo, Comunicação Social,
Produção Editorial e Publicação.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 60
A FENAJ explica que o curso que alavancou todo o crescimento
detectado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais
Anísio Teixeira (INEP) foi o de Comunicação Social, que passou de 220
em 2000 para 423 em 2003, um incremento de 92,3%. “Os dados
precisam, no entanto, ser tomados com precaução, pois pode ter havido
confusão na hora de classificar os cursos. É possível que nas listas de
Comunicação Social tenham sido contabilizadas outras habilitações que
não as de Jornalismo” (FENAJ, 2005). Isso porque no site do INEP consta
que são 312 os cursos de Jornalismo, ou de Comunicação Social com
habilitação em Jornalismo no país.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 61
2 Biografia – Uma vida dedicada à imprensa
Danton Pinheiro Jobim nasceu em Avaré, Estado de São Paulo, no
dia 8 de março de 1906. Era filho de Francisco Antenor Jobim, juiz de
direito, e de Joaquina Pinheiro Jobim. Seu irmão, José Jobim, foi jornalista
e diplomata, e chegou à Embaixada do Brasil no Paraguai entre 1958 e
1959. Seu avô materno foi José Gomes Pinheiro Machado, senador pelo
Rio Grande do Sul entre 1891 e 1915, figura exponencial na política
brasileira no início do século passado. Foi casado com Nadir Pena
Magalhães Fausto, com quem teve dois filhos, Roberto Luís Fausto Jobim
e Renato Sérgio Fausto Jobim.
Cursou o primário no grupo escolar de Itápolis e o secundário, já
morando no Rio de Janeiro, então Capital Federal, no Instituto Lafayette.
Completou seus estudos preparatórios no Colégio de Juruena de Matos,
onde foi aluno de Austregésilo de Ataíde, que viria a ser presidente da
Academia Brasileira de Letras, a partir de 1959. Cursou a Faculdade
Nacional de Direito do Rio de Janeiro (ABREU et al, 2001).
Iniciou a carreira jornalística no Rio em 1923, na redação de O
Trabalho, jornal vinculado ao então jovem Partido Comunista Brasileiro.
Logo, Jobim filiou-se ao PCB e foi, durante alguns anos, um de seus
representantes no meio jornalístico.
Após poucos meses, com o fechamento de O Trabalho, transferiu-
se para A Noite, jornal fundado em 1911 por Irineu Marinho. Segundo ele,
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 62
era um “aprendizado jornalístico, quer na redação, quer nas oficinas”
(JOBIM apud ABREU et al, 2001). Foi lá que, além do jornalismo,
aprendeu o planejamento gráfico, que utilizaria mais tarde no A Manhã.
Com sua formação em Direito, ficou responsável pela cobertura do Foro,
mas também escrevia crônicas de livros e, algumas vezes, notícias para
uma seção de variedades chamada “Ecos”.
Nesse período também escreveu para outros jornais, destacando aí
um artigo sobre o pintor Cândido Portinari no jornal Correio da Manhã e
outro sobre acidentes com gases poluentes dos motores de automóveis
para o jornal O Globo. Esta, segundo ele, foi sua primeira reportagem
colocada na primeira página pelo secretário de redação Euricles de Matos,
que tinha como título “O inimigo invisível das grandes cidades”.
Por mera curiosidade, esclareço que se tratava, já naquele
tempo, de um brado de alerta contra a poluição da atmosfera: o
relato de diversos acidentes ocasionados pelos gases
desprendidos dos motores de automóveis
. (JOBIM In: O
GLOBO, 1973)
Convidado para trabalhar no jornal A Manhã, fundado em 1925 por
Mário Rodrigues, lá introduziu métodos novos de paginação, considerados
avançados para padrões da época.
No ano seguinte, 1926, ingressa na Associação Brasileira de
Imprensa – ABI, tornando-se logo um dos conselheiros mais destacados.
Nesse período, continuava com sua militância política junto ao PCB,
chegando mesmo a realizar uma conferência na sede da União dos
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 63
Trabalhadores Gráficos do Rio de Janeiro, como parte de uma
programação patrocinada pelo Bloco Operário do PCB.
Em 1929, foi com Mário Rodrigues para o jornal A Crítica. Sua
atuação política continuava, tendo, em julho de 1929, representado o PCB,
junto com Leôncio Basbaum e Mário Grazini, na I Conferência Latino-
Americana dos Partidos Comunistas, realizada em Buenos Aires. Logo
após sua volta, foi contratado por Assis Chateaubriand para secretariar o
recém-criado Diário de São Paulo, matutino vinculado aos Diários
Associados, e politicamente comprometido com as idéias da coligação
oposicionista Aliança Liberal.
Mas sua passagem pela capital paulista foi rápida. Um ano depois
Jobim retornava ao Rio de Janeiro e à imprensa carioca. No início da
década de 30, passou por jornais com claros vínculos à esquerda, como A
Batalha, criado em 1929 por Pedro Mota Lima e depois dirigido por Júlio
Barata, e o Diário de Notícias, matutino fundado em 12 de junho de 1930,
por Orlando Ribeiro Dantas, com a proposta de lutar contra a “estrutura
oligárquica” da República Velha (ABREU et al, 2001). Com posições
fortemente definidas, recebeu o título de “O jornal da revolução” e chegou
a vender 168 mil exemplares no dia 24 de outubro, dia da deposição de
Washington Luís, com a manchete: “O Brasil despertou de um grande
pesadelo o Brasil está livre da politicalha de ódios e vinganças”. Porém
o jornal, ao mesmo tempo, mostrava reserva à junta revolucionária que
assumiu o Governo e demonstrava simpatia aos que chamava de
“verdadeiros arquitetos da revolução”: os tenentes.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 64
E foi também para um jornal simpático ao movimento tenentista que
Jobim se transferiu depois: A Esquerda, dirigido, na época, por Carlos
Sussekind de Mendonça, que havia sido redator em A Batalha. Os dois
jornais tiveram mais pontos em comum: recebiam subvenções do bicheiro
João Pallut, a quem interessava encobrir sua atividade no jogo do bicho.
Pallut chegou a ser proprietário de A Batalha quando Pedro Mota Lima se
afastou. Embora não fosse considerado um porta-voz do PCB, A Esquerda
apresentou-se como um jornal nacionalista e preocupado com a defesa do
operariado, defendia Luís Carlos Prestes e o que chamava de uma
“ditadura construtora”, que tivesse à frente um líder sem compromissos
com os partidos existentes e com as oligarquias.
Em meados de 1931, Jobim passou a trabalhar na Agência
Meridional de Notícias, vinculada aos Diários Associados. Mas logo no ano
seguinte, 1932, transferiu-se para o Diário Carioca, jornal fundado em
1928 por José Eduardo de Macedo Soares e dirigido por Horácio de
Carvalho Júnior. Entrou como redator político, foi promovido a secretário
de redação e, depois, a diretor de redação. Lá trabalhou 33 anos, até o
jornal ser extinto. Após se desligar do PCB, em 1934, tornou-se
responsável também pelos editoriais políticos da primeira página, tarefa
que dividia com Macedo Soares, “resistindo, conforme afirmaria mais
tarde, a todas as tentações de posicionar-se ‘à direita ou à esquerda’”
(ABREU et al, 2001, p. 2842).
Ao Diário Carioca dedicaremos um capítulo especial, já que a maior
parte da carreira de Jobim como jornalista foi exercida naquele veículo. Lá
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 65
também se formou uma nova geração de jornalistas e um novo jornalismo
no país. E onde Jobim pôde pôr em prática suas novas idéias a respeito
do ensino do jornalismo.
Embora alegando resistir às tentações, Jobim foi um homem político
que explicitava suas posições, assim como o jornal que dirigiu durante
tanto tempo. Apoiou a implantação do Estado Novo, em 1937. Chegou a
ser nomeado, naquela época, diretor do Departamento de Propaganda e
Turismo do Estado do Rio de Janeiro, governado pelo interventor federal
Ernani Amaral Peixoto. Mas, com o controle da imprensa que, por meio do
Departamento de Imprensa e Propaganda, chegou a censurar seus
editoriais, mudou de posição e passou a combater a ditadura Vargas.
Nesse período, passou a trabalhar na campanha de
redemocratização do país, principalmente no Clube dos Diretores de
Jornais, onde atuava ao lado de Macedo Soares, Elmano Cardim (diretor
do Jornal do Comércio, que substituiu Félix Pacheco), Oséias Mota (um
dos fundadores dos jornais A Noite e A Rua e diretor-proprietário do jornal
A Vanguarda), Mário Magalhães, Georgino Avelino (ex-deputado federal
pelo Rio Grande do Norte e editorialista de diversos jornais do Rio), João
Mangabeira (ex-jornalista e deputado federal pela Bahia), Francisco de
San Tiago Dantas, entre outros. O grupo protestava sem êxito junto a
Filinto Muller, então chefe de polícia do Distrito Federal, passando então,
em conjunto, a queixar-se ao presidente Getúlio Vargas sobre as ameaças
que vinham sofrendo.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 66
Entre os anos de 1936 e 1937, de acordo com Amaral Peixoto,
Jobim fez parte do movimento que lutava pela criação do Sindicato dos
Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro.
Danton estava presente no grupo fundador, como um
companheiro não apenas dedicado, mas também muito
aguerrido. Com ele e outros, lançamos a primeira pedra do
nosso Sindicato. (PEIXOTO In: BOLETIM DA ABI, março de
1978, p.12)
Jobim também foi comentarista do programa de rádio A Marcha da
Guerra, patrocinado pelo governo norte-americano e transmitido em
cadeia nacional, a partir de 1939, com a eclosão da Segunda Guerra
Mundial. Nesse período, um de seus companheiros de trabalho,
responsável pela análise sobre a evolução da situação militar na Europa,
foi o tenente-coronel Humberto Castelo Branco, que se tornou, mais tarde,
presidente da República durante o regime militar. Jobim conheceu Castelo
Branco anos antes, durante as férias com a família, e acabou por indicá-lo
para o cargo de comentarista. Mesmo discordando politicamente dele
alguns anos mais tarde e criticando-o no cargo de presidente por meio de
seus artigos, mostrou-se sempre respeitoso com o amigo.
Após a reorganização partidária ocorrida em 1945, Jobim filiou-se
ao Partido Republicano, liderado pelo ex-presidente Artur Bernardes, que
apoiava a candidatura do brigadeiro Eduardo Gomes à Presidência da
República.
Em 1948, Jobim foi convidado para assumir a cátedra de Jornalismo
do recém-criado curso na Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 67
do Brasil, que mais tarde se transformaria na Escola de Comunicação da
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Na carreira docente da
UFRJ, Jobim seguiu até 1976 como professor titular, e ocupando a vice-
diretoria da Escola até 1970, quando foi para o Senado Federal.
Como profissional e professor de Jornalismo, Jobim teve
reconhecimento internacional. Primeiro, em 1952, ao receber o prêmio
“Maria Moors Cabot”, conferido pela Universidade de Colúmbia, nos
Estados Unidos, aos jornalistas latino-americanos que mais se
destacassem na luta pela liberdade de imprensa. Depois, em 1953, ao ser
convidado para dirigir um seminário sobre jornalismo comparado na
Universidade do Texas. Em 1957, ao ser convidado para uma série de
conferências na Sorbonne, no Instituto de Altos Estudos sobre a América
Latina e no Instituto de Estudos Políticos em Paris, França. E, finalmente,
em 1958, quando foi convidado para lecionar Didática de Jornalismo no
Centro de Estudos Superiores de Jornalismo da América Latina (Ciespal),
em Quito, no Equador. O Ciespal é uma entidade vinculada à Organização
das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).
No ano de 1963, Jobim presidiu o Movimento Pró-Beatificação e
Canonização do Padre José de Anchieta, tendo sido recebido pelo Papa
Paulo VI para a entrega de uma carta assinada por altas autoridades
brasileiras. Sua ligação com a Igreja tornou-se tão forte a partir de então
que, em um almoço no Clube Ginástico Português, no Rio de Janeiro, em
homenagem aos seus 50 anos de imprensa, no dia 15 de março de 1973,
Jobim recebeu uma mensagem do Papa Paulo VI concedendo a ele a
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 68
benção apostólica. No mesmo evento, Jobim recebeu ainda mensagem do
Cardeal Dom Agnelo Rossi, prefeito da Sagrada Congregação para a
Evangelização dos Povos, do Vaticano, que ressaltava “seu valor
extraordinário de homem identificado com as tradições mais gloriosas do
Brasil”.
O bispo metodista Benjamim de Moraes Filho descobriu essa
religiosidade de Jobim quase que por acaso, quando convidou-o para uma
cerimônia em uma igreja evangélica no subúrbio de Cascadura, no Rio de
Janeiro. Na ocasião, Jobim falou cerca de 40 minutos, com conhecimento
e segurança, sobre o versículo “Conhecereis a verdade e a verdade vos
libertará”.
Essa versatilidade de Danton Jobim me provocou agradável
surpresa, não apenas pelo domínio que ele revelou do tema,
mas pela sinceridade que recobria suas palavras. (...) Na
verdade, esse tema se adequava à perfeição do temperamento
e à formação de Danton. Ao proclamar num recinto sagrado que
a verdade é um meio de libertação, Danton demonstra
coerência com sua atuação à frente da ABI, onde desenvolveu
ação paciente, porém vigorosa contra a censura e contra
quaisquer restrições à liberdade de imprensa. E isso que
impunha à nossa admiração a sua extraordinária figura: não
havia conflito nem contradição entre o pensamento que ele
expunha de forma límpida numa oração de improviso, como
aquela feita naquele encontro que conservo envolvido em
saudade, e a sua prédica diária em favor da liberdade de
imprensa. (MORAES FILHO In: BOLETIM DA ABI, março de
1978, p. 12)
Sem dúvida, essa mudança de postura chamou a atenção de seus
colegas. Fernando Segismundo
4
conta que chegou a dizer para o
companheiro de gestão na ABI: “você está exagerando nesse negócio de
4
Em entrevista à autora em 07/09/05.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 69
religião”. Explica que a observação se dava em razão de tê-lo conhecido
num período em que era “marxista e comunista ativo”, com forte
representatividade junto ao PCB. “Eu não quero ser irreverente, mas ele
mudou e eu vi o Danton comungar. Eu tomei um susto”, reforça
Segismundo, defendendo porém a posição de Jobim: “Eu acho fabulosas
essas mudanças, como o ser humano é flexível. Eu acho fabuloso ele ter
tido essa coragem de se manifestar”.
Nesse mesmo ano, Jobim tornou-se diretor proprietário do Diário
Carioca. Após o movimento militar de 31 de maio de 1964, responsável
pela queda do presidente João Goulart, Jobim passou suas ações para
Horácio de Carvalho Júnior.
Em janeiro de 1965, assumiu o cargo de diretor-presidente da
Última Hora, substituindo Samuel Wainer, cujos direitos políticos tinham
sido cassados pelo regime militar. Nessa fase, a cobertura internacional
passou a contar com o direito de reprodução dos artigos e reportagens das
maiores publicações européias, como Le Monde, L'Express, L'Evènement
e New Statesman. Última Hora lançava assim a seção "Jornal do Mundo".
Com a extinção dos partidos políticos pelo Ato Institucional n° 2 e a
conseqüente implantação do bipartidarismo, Jobim filiou-se ao Movimento
Democrático Brasileiro (MDB), o partido da oposição. Em 1966, concorreu
ao Senado pelo Estado da Guanabara, mas foi derrotado por seu colega
de partido, Mário Martins, que acabou cassado pelo Ato Institucional n° 5,
em 1968. Com o apoio do então governador da Guanabara, Antonio de
Pádua Chagas Freitas, Jobim foi eleito pelo MDB para completar o
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 70
mandato de Martins. Junto com ele, foram para o Senado mais dois
políticos cariocas ilustres do MDB: Nélson Carneiro e Benjamin Farah.
Durante esse período, entre 1966 e 1972, Jobim foi eleito e reeleito
três vezes para a Presidência da Academia Brasileira de Imprensa (ABI).
Sua gestão chegou a ser polêmica em determinados momentos, como no
caso do convite ao então presidente da República, marechal Artur da
Costa e Silva, para um evento na ABI em comemoração aos 60 anos da
entidade, em abril de 1968. No entanto, Jobim aproveitou a presença de
Costa e Silva para proferir um discurso inflamado sobre liberdade de
imprensa, justamente em um dos momentos mais duros da ditadura
militar. Ao mesmo tempo, conseguiu a revogação de um ato de exceção
que impedia os jornalistas Antonio Calado e Léo Guanabara de exercerem
a profissão. Atuou também, nessa época, como representante da ABI junto
ao Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, em Brasília.
A atuação era a mesma no Senado, com discursos fortes na defesa
da liberdade de imprensa e das prerrogativas dos jornalistas na cobertura
dos fatos que redundassem em interesse público. Para ocupar a cadeira
no Senado, deixou o cargo de vice-diretor da Escola de Comunicação da
UFRJ, mas continuou lecionando. Ocupou, de 1971 a 1975, a vice-
liderança do MDB no Senado e participou de várias comissões, como a de
Redação (Legislativa), de Finanças, de Relações Exteriores, de
Transportes, de Comunicações e de Obras Públicas.
Reeleito para o Senado em 1974 com mais de 1,2 milhão de votos,
Jobim alinhou-se com a corrente liderada por Chagas Freitas, que
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 71
disputou a primazia dentro do partido com o grupo liderado pelo senador
fluminense Ernani Amaral Peixoto. E venceu. Isto porque, em 1965,
ocorreu a fusão dos Estados da Guanabara e do Rio de Janeiro.
Em janeiro de 1978, Jobim foi eleito mais uma vez para a
Presidência da ABI, dessa vez em substituição a Prudente de Morais Neto,
que havia falecido em dezembro de 1977. Ficou pouco tempo no cargo.
Morreu de embolia pulmonar no Rio de Janeiro, em 26 de fevereiro
de 1978, em pleno exercício do mandato parlamentar como senador do
Estado do Rio de Janeiro e da Presidência da ABI. Sua morte, cercada de
mistérios, está sendo investigada atualmente. O professor da Escola de
Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro, José Amaral
Argolo, apresentou recentemente, no 3º Encontro da Rede Alfredo de
Carvalho, artigo em que questiona as circunstâncias da morte de Jobim.
O senador estava internado “para ser submetido a um checkup de
rotina no Hospital dos Servidores do Estado (Zona Portuária do Rio de
Janeiro)”.
Pelo que foi possível apurar, a família do Sr. Danton Jobim
encontrou e vem encontrando dificuldades até mesmo para
obter cópias da documentação hospitalar arquivada no HSE.
Chave para uma série de perguntas, o próprio Sr. Luis Jobim
[neto de Jobim] lá esteve, por solicitação do autor destas linhas
e nada obteve de concreto. Um dos pontos mais emblemáticos
sobre o fato em si, é que o senador estava aparentemente bem
de saúde e, no apartamento, como testemunha e
acompanhante privilegiado na madrugada em que se deu o
óbito, apenas o irmão e ex-embaixador, José Jobim. (ARGOLO,
2005, p.18)
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 72
De acordo com Argolo, o irmão de Jobim afirmou ter sido tomado
por um sono incontrolável, “sem que tivesse ingerido qualquer
medicamento indutor do sono”. Quando despertou percebeu que Danton
Jobim estava morto. Para o pesquisador, existem suspeitas de que a
morte de Jobim possa ter ocorrido, “em circunstâncias ainda não
esclarecidas, nos rastros da Operação Condor”
5
.
As suspeitas também decorrem do fato de que Jobim, naquele
momento, era um candidato natural ao governo do Estado do Rio de
Janeiro, em contraposição a Antonio de Pádua Chagas Freitas. Antigos
aliados, os dois tinham, então, “divergências políticas acirradas”, atuando
em campos opostos.
A família de Jobim atualmente empenhada em materializar o
Instituto Danton Jobim, no Rio de Janeiro, “destinado a estimular o
desenvolvimento de pesquisas sobre o Jornalismo e a política fluminense”
(ARGOLO, 2005, p. 19) busca respostas.
Outro que levanta suspeitas sobre a morte de Jobim é o jornalista
Fernando Segismundo
6
, seu companheiro na ABI durante muitos anos.
Houve qualquer coisa estranha com a morte dele. O Danton
tinha uma chance muito grande de ser candidato ao governo do
Rio contra o candidato Chagas Freitas, que tinha sido padrinho
político dele. Ele ganharia do Chagas, com certeza, porque era
muito bem quisto. O Danton quis ser político e eu acho que foi
um grande erro dele, porque ele era um intelectual.
5
A Operação Condor foi responsável pela morte e desaparecimento de milhares de pessoas na
Argentina, Brasil, Chile, Paraguai e Uruguai, resultado de ações violentas “perpetradas pelos
agentes do aparato repressivo dos governos” desses países, entre 1954 e 1990 (ARGOLO, 2005).
6
Em entrevista concedida à autora em 07/09/2005.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 73
Segismundo conta detalhes sobre o dia da internação de Jobim, já
que foi ele quem o acompanhou ao Hospital dos Servidores, junto com o
filho Renato. Explica estava em Petrópolis quando soube que estava
sendo oferecida uma feijoada na casa do Jobim. Acabou indo visitá-lo e
disse que percebeu algo estranho na aparência do jornalista. Quando
questionou se ele estava se sentindo bem, ouviu que não. “Você fez
alguma extravagância, bebeu, não dormiu, alguma coisa?” Jobim disse
que havia acordado indisposto. “Coloquei a mão nele percebi uma arritmia
muito grande.” Segismundo conta que, por sorte, havia um médico no
grupo. “Pedi que ele disfarçadamente examinasse Jobim e ele confirmou a
arritmia”.
O médico disse que era melhor levar Jobim para um hospital no Rio
de Janeiro. “Eu estava com meu carro e disse para o Danton que ele
estava um com ‘probleminha’ qualquer, mas que não era bom tratá-lo em
Petrópolis. Ele concordou, mas estava falando e andando”, explica
Segismundo que, junto com sua mulher e com o filho de Jobim, rumou
para o Hospital do Servidor Público. “Cheguei lá e expliquei que o Senador
da República estava doente, poderia ser uma coisa grave”.
Ele conta ainda que quando foi visitá-lo no quarto, encontrou Jobim
recostado na cama lendo um livro em alemão. “Eu perguntei: você está
lendo em alemão? E ele respondeu: ‘É, eu gosto muito de alemão’”.
Segismundo, vice-presidente da ABI numa das gestões de Jobim,
diz que nunca se conformou com a sua morte. “Ele era um homem
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 74
talentoso, culto. De vez em quando vinha até mim e falava: ‘Toma conta
da casa [ABI]’”.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 75
3 O pensamento jornalístico de Danton Jobim
Da mesma forma que propunha ser o texto jornalístico simples,
conciso e objetivo Danton Jobim pensava o jornalismo. Suas idéias
sobre o tema são extremamente atuais, mostrando que ele levantou
questões, que até hoje são debatidas academicamente, num momento em
que a pesquisa acadêmica ainda não existia no País. Marques de Melo
(2004b, p.2-3) explica sua importância naquele cenário:
(...) Danton Jobim, o desbravador da pesquisa jornalística na
universidade brasileira, responsável pela primeira plataforma de
investigação científica inscrita num curso superior. Foi natural
que ele se convertesse no primeiro brasileiro a publicar artigos e
livros em centros avançados do saber midiático, ou seja, nos
Estados Unidos e na França.
Sobre suas idéias precursoras, Lins da Silva (In: JOBIM, 2003, p.14)
diz que “ou Jobim foi muito avançado para o seu tempo ou os jornalistas
brasileiros atuais estão muito atrasados para o deles”. Pode-se dizer que,
mesmo depois de tantos anos, todas as questões levantadas por ele sobre
o ensino, a profissão e a técnica do jornalismo ainda são temas de
debates, e poucos profissionais e pesquisadores conseguem ter a mesma
clareza de pensamento dele. Um exemplo claro é que, na década de 50,
Jobim já discutia a questão do pouco tempo disponível para a leitura dos
jornais, tema que hoje é constante, principalmente considerando-se as
questões levantadas com o surgimento da Internet, rede inimaginável
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 76
naquela época. Dessa forma, discutiremos seu pensamento, dividindo os
temas por ele abordado, tomando como base o seu livro “Espírito do
Jornalismo”, tradução do livro “Introduction au Journalism Contemporaine”
editado em Paris em 1957, como resultado de um curso ministrado na
França.
3.1 Jornalismo e opinião pública
Para Jobim, a opinião pública se forma pela informação, “e esta
pressupõe o conhecimento e a interpretação dos fatos”. O contato
permanente com os semelhantes é que faz os homens formarem seus
juízos, a partir da troca de informações e de idéia. E o jornal é a forma
organizada dessa relação.
Por isso mesmo, o jornal precisa levar em conta de que essas
relações não podem confundir público e massa. Segundo Jobim, o público
“não é homogêneo em sua composição – por força dos diferentes graus de
cultura e status social”. Admitindo a existência desses vários públicos, e
considerando que cada um deles reage “de modo distinto em face da ação
que se exerça sobre eles”, defendia que os jornais deveriam ser feitos
para o “seu público” e não para o público de uma forma geral.
O jornal consegue obter êxito junto aos seus leitores, atingindo um
público maior, é o que Jobim denomina de “imprensa de tipo médio”, que
mantém ao mesmo tempo um padrão conservador e sensacionalista. “E é
justamente o seu ecletismo que lhe assegura grande circulação”.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 77
No entanto, não é apenas a grande circulação que garante prestígio
à uma publicação. Um jornal pode ter uma “circulação bem mais restrita
que a de outro e gozar de maior prestígio que este sobre a opinião das
elites dirigentes do país”. As opiniões expressas nos editoriais e a política
que o jornal sustenta podem se mostrar muito mais eficientes nesse
sentido.
Os editoriais, segundo Jobim, não são escritos para o leitor comum.
Por isso mesmo, a maioria de leitores também não lê editoriais. As
posições que o jornal defende são escritas para uma minoria que é
responsável pela liderança da comunidade. Mesmo assim, escritos para
poucos, ele considerava que “os mais apreciados, em tempos normais,
são os que convidam o leitor a raciocinar, não se dirigindo a ele como se
se tratasse de falar a um auditório (...)”.
Embora reconhecesse a força política dos editoriais, Jobim
reforçava que a notícia concorre com o editorial na formação da opinião
pública, embora também a publicidade e as relações públicas tenham o
mesmo papel.
Em seu livro, ele repete Harry Truman (apud JOBIM, 2003, p.92),
ex-presidente norte-americano que costumava repetir a frase de um
político britânico do século XIX: “Dê-me o controle de suas colunas de
notícias e pouco me importa quem escreva os seus editorias ou o que
estes digam de mim”. Explica que embora Getúlio Vargas e Juscelino
Kubitschek não tivessem o apoio dos veículos, foram eleitos da mesma
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 78
forma, porque eram notícia. E o jornal não pode deixar de dar notícias.
Sobre isso, Jobim (2003, p.93) escreveu:
No jornal contemporâneo, o homem que se faz notícia, que
passa a ocupar um lugar na imaginação e na curiosidade das
massas, tem garantidas a repetição constante de seu nome e a
publicidade de seus feitos ou palavras.
Mas ele lembrava que, além do jornal, hoje existem outros
instrumentos de comunicação com as massas que não a impressa. Para
ele, o rádio, a televisão e o cinema são veículos que concorrem com os
jornais na transmissão da notícia e que aumentam a “possibilidade do
acesso ao público à cena do acontecimento”.
Por isso, acreditava ser urgente a proteção do público contra
informações que poderiam ser manipuladas por esses meios,
principalmente por causa do forte alcance. “Parece evidente a
necessidade de proteger esses novos meios de ação sobre a opinião
pública, pondo-os a salvo da opressão e da falsificação deliberada”.
3.2 Jornalismo e técnica
A pressão do tempo sobre o trabalho do jornalista foi causada,
segundo Jobim, pelo progresso que as máquinas tiveram na composição e
na impressão. Mas ele compreendia que essa inovação mexeu com o
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 79
trabalho da imprensa, forçando o jornalista a encontrar meios de chamar a
atenção do leitor.
Os jornalistas deste último meio século tiveram de adotar as suas
técnicas de redação e a apresentação da matéria a novas condições,
que reclama certos artifícios ou truques para forçar a atenção de um
leitor distraído por mil solicitações diferentes (JOBIM, 2003, p.73).
Sobre o texto do repórter, ele afirmava que “ser amável com o leitor
é ser conciso, sem prejudicar a riqueza e a objetividade do relato
jornalístico”. Dessa forma, acreditava que escrevendo dentro de um
padrão o estilo repórter melhoraria. Mas reconhecia que o grande “drama
do jornalista é que ele não pode se calar quando quer”, apontando que
escrever pouco era uma das grandes dificuldades do jornalista.
Mas o bom texto não se resumia à concisão. Jobim lutava pela
simplicidade de estilo, que acreditava agradar muito mais ao leitor. “Quem
é simples no estilo é claro no dizer”.
3.2.1 Editorial
Sobre o editorial e a opinião no jornalismo, embora reconhecesse
sua necessidade, Jobim era extremamente crítico. Ele acreditava que o
artigo de fundo ideal talvez seja “aquele que se possa resumir em dois
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 80
parágrafos: o primeiro enunciando a tese, numa frase curta, e o último
confirmando-a, numa frase incisiva, que seria a ampliação da primeira”.
As mudanças na redação e a manipulação das notícias dentro do
jornal, mereceram dele os seguintes comentários:
As notícias chegam ao público depois de manipuladas no
laboratório da redação. Esta deixou de ser um ajuntamento de
literatos boêmios para constituir um corpo de trabalhadores
especializados em transformar a matéria-prima fato no produto
acabado notícia. (...)
O processo de reescrever a matéria não pode ser dispensado
numa redação de hoje. Antes de tudo, a valorização do espaço
das edições exige que se resumam as notícias. Em segundo
lugar, o acúmulo de notícias reclamando a atenção do leitor
impõe que se lhe facilite a leitura, estabelecendo uma hierarquia
(...).(JOBIM, 2003, p.76-77)
Por isso Jobim contestava as novas técnicas de valorização ou
dramatização das notícias, sempre buscando o sensacionalismo. Ele
achava que esses novos truques de estilo não levavam à melhor
informação. Pelo contrário, faziam com que os jornalistas se afastassem
cada vez mais da informação correta e exata.
3.2.2 Estilo
Sobre o estilo no jornal, Jobim dizia que não existe uma linguagem
especial. Novamente, apelava para uma linguagem simples que pudesse
levar o leitor à compreensão dos fatos:
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 81
Aos focas, ou seja, aos aprendizes de repórteres, ensinam eles
uma dúzia de chavões, que consideram “estilo de jornal”. Na
verdade, não há uma linguagem de jornal. O jornalista não
escreve numa língua especial, mas no bom português, no bom
francês, no bom inglês ... tão bom quanto lhe permita o domínio
da língua e a necessidade da improvisação. (JOBIM, 2003,
p.50)
Estilo jornalístico, para ele, era o jornalista se colocar no papel do
leitor do jornal e imaginar o que ele gostaria de ler: “(...) é mera questão de
approach, ou seja, do ângulo em que nos colocamos e presumimos ser o
do leitor do jornal. Nesse sentido estrito, mas só nele, é aceitável a sua
existência”.
Mas Jobim era um crítico feroz do jornalista que procurava fazer do
jornal seu espaço de experiências estilísticas. Por isso, a recomendação
de que o escritor que se fazia jornalista deveria resistir “à tentação de usar
o jornal como campo de provas de teorias e estilos”.
Sua preocupação com a facilitação do entendimento do texto fazia
com que buscasse uma simplificação quase esquemática do conteúdo e
de forma. Para ele, o texto:
Requer uma ordem, nem sempre lógica, no dispor os elementos
de uma narrativa, que visa introduzir o leitor na essência da
matéria logo que lhe inicia a leitura. E, além disso, mais três
qualidades: concisão, concisão, concisão. (JOBIM, 2003, p.51)
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 82
Por essa razão, Jobim, junto com Pompeu de Souza, introduziu o
Manual de Redação no Diário Carioca. Defendia a forma norte-americana
de formar escritores por meio de manuais de estilo e de criar para seus
jornalistas o Style Book. Acreditava que cada redação deveria possuir “o
compêndio de regras para bem escrever, na opinião do diretor do jornal”,
evitando, dessa forma que, por meio dessas normas o trabalho jornalístico
se convertesse em literário, embora defendesse a possibilidade de o texto
jornalístico ser um texto autoral.
(...) é uma tentativa louvabilíssima para elevar o nível do relato
jornalístico. (...) O Style Book não elimina, como se tem
pretendido, a chance de que a obra do repórter atinja o nível da
criação artística. (JOBIM, 2003, p.52)
3.3 Imprensa norte-americana versus imprensa latino-americana
Para Jobim, a imprensa americana atingiu um alto padrão de
objetividade porque foi tratada como indústria. “Os EUA são o único país
onde os jornalistas não se envergonham de confessar que sua atividade
não é desinteressada, mas faz parte de um negócio, um business”.
Ele defendia o entendimento de que o jornal é uma empresa
comercial e como tal deve ser tratado. Isso não invalidaria sua função
social de informar o público e deixar que ele formasse sua própria opinião
sobre fatos de interesse geral. Insistia que o jornalismo não era uma
religião e que o jornalista não era um sacerdote. Compreendia que o poder
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 83
do dinheiro tinha influência no jornal, mas que sua existência e sua força
estavam cada vez mais vinculadas à força financeira que conseguisse.
Já na América Latina, Jobim apontava a existência de um certo
purismo em relação ao jornal: “(...) ninguém funda um jornal para negócio,
para fazer dinheiro. Ele pode vir como um inesperado dividendo,
normalmente ele é fundado para fins políticos”.
Ele exemplifica com o caso do próprio Diário Carioca que se viu
fechado várias vezes em época de agitação política. Cita também os
casos de O Estado de S. Paulo e La Prensa, que desafiaram a ditadura: “o
primeiro apropriou-se, por compra forçada, de 1940 a 1946; o segundo foi
expropriado e só voltou ao seu dono depois da queda de Perón”.
Sobre o imaginário popular acerca da função do jornal, Jobim dizia
que o povo acredita que “o jornal tem um destino heróico a cumprir”, e que
a imprensa tem a função de defesa do cidadão. “Trabalhadores e
estudantes quando se vêem ameaçados nos seus interesses, vão para o
jornal.
A imagem idealista que se fazia do jornal permanecia na mente das
pessoas, mesmo com todo o processo de modernização por que passava
a imprensa da época.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 84
3.4 Ética na imprensa
Refletindo ainda sobre a questão comercial do jornal, Jobim insistia
que “a imprensa é obra de homens, não de anjos” e que, pela sua própria
natureza, a informação jornalística tem um caráter superficial, em razão de
seu processamento dentro de um tempo específico.
Reconhecia que era impossível publicar um fato depois que ele
tivesse sido inteiramente apurado. Se assim fosse, acreditava que não
haveria jornalismo. Mas isso não impedia o repórter de buscar “a verdade
pela objetividade das notícias”. Para Jobim, embora nenhum jornal
pudesse realizar plenamente tal façanha, deveria perseguir esse ideal.
O que se pode exigir de um jornal é que ele seja honesto com
seus leitores, os quais, aliás, não esperam dele que façam
milagres e lhes apresente um quadro impecável, irretocável,
irretratável, das coisas que sucedem na cidade, no país e no
mundo. O que se pode pedir do jornalista é que não use de má
fé com seu público, induzindo-o a erro em matéria de fato, seja
pela falsificação das notícias, seja pela sua omissão. (JOBIM,
2003, p.56)
Porém, não acreditava em uma “ética jornalística”. O jornalista deve
estar ligado com os padrões éticos de seu tempo, seguindo a profissão
com a mesma ética que emprega em sua vida particular. Para Jobim, o
homem é ético ou não é. Isso é que vai definir sua ética profissional.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 85
Reconhecia, no entanto, que “mais que nenhuma outra pessoa, o
jornalista comete erros e injustiças”. A necessária rapidez com que tem de
apurar e escrever faz com que seus juízos sejam apressados. Mas o
importante é que o jornalista tenha dignidade para perceber e corrigir
esses erros. “Humildade para o ‘mea culpa’ e coragem para a correção de
suas faltas, eis uma virtude indispensável”.
Virtude que aparentemente não parece ser tão incentivada, como
aponta Lacan:
O jornalista que reconhece ter se enganado se coloca em
perigo. Não em relação ao público, mas à sua hierarquia. Os
responsáveis de um jornal, de uma rádio ou de uma televisão,
são sempre persuadidos que é o médium quem paga, em perda
de imagem e audiência, o erro do jornalista. (LACAN apud
MARCONDES FILHO, 2002, p. 70)
Mas, segundo Jobim, o leitor “conhece as fraquezas e eficiências do
jornal num regime de imprensa livre”. Mesmo assim, prefere a imprensa
dentro dessa realidade do que substituída por uma controlada.
3.5 Jornalismo e literatura
O jornalista, mesmo no chamado mundo livre, tem a sua
atividade crítica estreitamente balizada por uma série de tabus
políticos, morais e materiais, de que o escritor já se libertou.
(JOBIM, 2003, p.44)
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 86
A defesa que Jobim faz do Manual de Redação está vinculada
principalmente com sua idéia de que jornalismo não é literatura, embora
reconheça que a reportagem, o editorial e a crônica poderão ser escritos
de forma harmônica e prazerosa. Apesar de atuarem com assuntos
ligados com o humano, ele deixa claro que para o jornalismo só existem os
fatos que interessam, ao contrário da literatura.
Por tudo isso é que o jornalista não deve ter a preocupação de
apurar tão bem sua linguagem como um escritor. Para justificar cita a frase
do ensaísta Aires da Mata Machado Filho:
Não passa pela cabeça do jornalista guardar as palavras de
cada dia, ao passo que o escritor que se preza não sossega
enquanto não ‘enfeixa em livro’ as suas páginas, sempre
elaboradas com a secreta intenção de perdurar. (MACHADO
FILHO, apud JOBIM, 2003, p.43)
Jobim não poupava críticas ao jornalista que se excedia na
preocupação em escrever bem. Para ele, geralmente é um “escritor que
não se realizou”. E achava que, nessas circunstâncias, o jornalista deveria
abandonar a profissão e buscar seguir carreira de escritor.
Porém reconhecia a profunda influência que o jornalismo tem sobre
a literatura e vice-versa. No entanto, acreditava que o jornalismo influencia
muito mais a literatura do que o contrário, “em que pese a interação
inevitável de ambos”. E justificava:
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 87
Quem não descobre à primeira vista nos grandes poetas –
Garcia Lorca, ou exemplo, ou os nossos Carlos Drummond de
Andrade e Manuel Bandeira – o vinco da influência jornalística?
Mostraram eles em muitas de suas produções como se pode
captar a poesia das humildes ocorrências de rua ou de polícia
sem afastar-se, mesmo, do estilo do repórter. (JOBIM, 2003,
p.48)
3.6 Jornalismo e História
Da mesma forma que mostra as diferenças entre jornalismo e
literatura, Jobim explica a diferença entre jornalismo e história, para quem
“o passado mais recente, o passado imediatamente anterior a hoje, o
passado de ontem, este não é história, é jornalismo”.
Acredita, sim, que os jornais serão, no futuro, uma fundamental
fonte de pesquisa para os historiadores, tanto nas suas grandes
reportagens como nas pequenas notas que contam sobre a vida em
sociedade. E quanto mais exata a notícia, mais ela servirá como
instrumento de apoio para o historiador entender uma época.
Mas insiste que a pretensão do jornalista não deve ser fazer
história:
Faz, mas não escreve, limitando-se a fornecer aos historiadores
os fatos concretos – pedra e tijolos que, ligados a materiais de
outras origens, vão permitir as grandes obras interpretativas.
(JOBIM, 2003, p. 37)
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 88
Posição semelhante defendia Luiz Beltrão, lembrando que a
“atualidade é a característica dominante do jornalismo”. Beltrão recorre a
Herráiz:
A atualidade é o presente, o que ocorre sobre a marcha do
tempo, o que sucede atualmente ou o que, havendo sucedido,
atua sobre a consciência do hoje. O anterior pertence à história,
não ao jornalismo que, por essência, vive sobre o momento,
informando sobre o presente e fixando-o para o futuro.
(HERRÁIZ, apud BELTRÃO, 2003, p. 70)
Para Beltrão, o jornalismo já não existe quando a história começa.
Da mesma forma, Carlos Rizzini e Alceu Amoroso Lima também
concordam que não é intenção do jornalista fazer história, porque não é
historiador o homem que narra o que viu, por ser um conhecimento difuso
e superficial. Somente com a perspectiva do tempo é que os fatos podem
ser analisados em profundidade.
E Jobim (2003, p.37) acrescenta, alfinetando ainda a opinião no
jornal:
E, por estranho que parece, não é o editorialista, com suas
idéias, seus preconceitos e suas paixões, o que terá lugar de
honra nos laboratórios de pesquisas histórico-sociais. Este lugar
pertencerá ao repórter, que procura ser impessoal e isento nos
seus relatos.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 89
4 A escola de jornalismo no Diário Carioca
“A reforma revolucionou o jornalismo impresso brasileiro”
Danton Jobim
Não era uma redação como outra qualquer. Nem podia ser. O
contínuo era Angenor de Oliveira, o Cartola, um dos maiores compositores
da música brasileira de todos os tempos que, junto com mais seis amigos,
criou a primeira escola de samba do subúrbio carioca – a Estação Primeira
de Mangueira.
Os focas da redação seriam os grandes nomes do jornalismo
brasileiro nas décadas seguintes. Por lá passaram Evandro Carlos de
Andrade, Armando Nogueira, Paulo Francis, Zuenir Ventura, entre outros
grandes jornalistas que se destacaram na imprensa brasileira. O salário
sempre atrasava, mas o jornal era a prolongação da casa de muitos deles.
Era uma redação coesa, afinada, que convivia em um ambiente de
“absoluta cordialidade” e com muita liberdade de trabalho. José Louzeiro,
um desses jornalistas formados pelo Diário Carioca, conta o que os atraía
tanto em uma redação onde o dia do pagamento era uma incógnita: “Por lá
afinávamos nosso texto; aprendíamos a escrever e tudo isso num clima de
camaradagem, de humildade, com mestres fingindo que, também,
aprendiam conosco” (LOUZEIRO In: DIÁRIO CARIOCA, 2003, p.77).
Esse era o Diário Carioca (Anexo A) na década de 50: uma escola
de jornalismo com grandes mestres que formaram grandes alunos e que
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 90
também se tornariam professores na arte da escrita do jornalismo. Mas
essa escola não nasceu junto com o jornal, que foi criado, como tantos
outros em sua época, para marcar uma posição política.
No caso do Diário Carioca, fundado em 17 de julho de 1928 por
José Eduardo de Macedo Soares, a finalidade era fazer oposição ao
governo do presidente Washington Luís, embora, para seu fundador, o
objetivo do jornal fosse:
(...) Servir ao país, traduzindo lealmente seus sentimentos,
esclarecendo e interpretando as correntes de opinião, e
assumindo com honestidade e firmeza a parcela de
responsabilidade que lhe coubesse nas lutas da política
brasileira. (MACEDO SOARES apud ABREU et al., 2001, p.
1840)
Macedo Soares, membro de tradicional família política do Estado do
Rio de Janeiro, havia deixado a Marinha, no posto de primeiro-tenente,
para se dedicar à política e à imprensa. Em 1912, já havia fundado o jornal
O Imparcial, primeiro jornal carioca a publicar ilustrações, que fazia
oposição ao presidente Hermes da Fonseca. O jornal foi fechado em 1924,
quando o presidente da República decretou estado de sítio e seu
proprietário preso.
Eleito deputado federal pelo Partido Republicano Fluminense em
1915, Macedo Soares foi reeleito por duas vezes, permanecendo no cargo
até 1923. Sua trajetória na imprensa representou bem sua ligação política,
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 91
e conseqüentes rompimentos, em diferentes momentos da sociedade
brasileira.
O Diário Carioca refletia essa característica de jornalismo de
combate, crítico e de opinião. Quando Danton Jobim entrou no jornal, em
1932, tornou-se o principal aprendiz de Macedo Soares.
Ele me tomou pela mão, como disse Negrão de Lima
7
, para
ensinar-me a rota, na íngreme escalada, orientando-me sobre
os segredos do seu ofício, aprendido no convívio com Rui
[Barbosa] e no dos mestres franceses e em muitos anos de dura
experiência e sacrifício a que nem mesmo faltaram as agruras
do exílio. (JOBIM In: O GLOBO, 1973)
Na verdade, Jobim sentia-se um verdadeiro discípulo de Macedo
Soares. Dele herdou a tendência liberalista e uma hábil capacidade de
negociador que permeou sua carreira política e jornalística.
Sobre mim foi derramando prodigiosamente lições de mestre
que o discípulo, na pobreza de seus dons, pouco soube
aproveitar. Mais do que tudo, porém, foi-me dado o nobre
exemplo. O da coragem moral. Do orgulhoso amor à missão do
jornalista. Da paixão da liberdade, que brotava, espontânea, do
seu horror visceral a todas as formas de opressão e a todas as
injustiças. (JOBIM In: O GLOBO, 1973)
7
Francisco Negrão de Lima foi ministro da Justiça do segundo governo Vargas, prefeito do Distrito
Federal e ministro das Relações Exteriores no governo de Juscelino Kubitschek. Eleito governador
do Estado da Guanabara em 1965, em pleno regime militar, sua eleição foi considerada um duro
golpe à ditadura.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 92
Jobim entrou no Diário Carioca como redator político. Anos depois,
como diretor de redação, começou a mais importante reforma no
jornalismo brasileiro, resultado de suas viagens ao exterior, em companhia
de seu secretário de redação, Pompeu de Souza, e de seu chefe de
reportagem, Luís Paulistano.
Era início do ano de 1950. Danton Jobim e Pompeu de Souza
arregimentaram um grupo de jovens, vindos quase todos de diferentes
cursos universitários, para introduzir no Brasil as técnicas de redação
originalmente desenvolvidas nos Estados Unidos.
Foi nessa década que um grupo de jornalistas altamente
qualificados do Diário Carioca, jornal inovador no uso do lead e
o primeiro a empregar equipe de copidesque em sua redação,
começou a desempenhar papel de formador de novos quadros
para a imprensa. (ABREU et al, 1996, p.15)
A aspiração de modernidade adequava-se ao espírito
desenvolvimentista da década e correspondia à influência do estilo das
agências de notícias internacionais (France Press, United Press,
Associated Press, principalmente), cujos telegramas traduzidos os jornais
transcreviam. Com a Segunda Guerra Mundial e, em seguida, a Guerra
Fria, esses telegramas ocupavam espaços privilegiados, em conflito
estilístico claro com as matérias locais.
Até então, o modelo do jornalismo brasileiro seguia
predominantemente o modelo francês. O próprio Jobim confirmava que
essa era a influência mais importante. “A imprensa francesa tem servido
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 93
de modelo para a imprensa brasileira por mais de meio século”, dizia ele
em 1954. Misturavam-se o jornalismo de opinião com o jornal popular, com
espaços destinados às crônicas e à publicação de folhetins. A política era
apresentada numa linguagem pouco objetiva. Mas isso precisava mudar e
a imprensa se adequar aos novos tempos.
Por outro lado, as técnicas modernas de redação eram conhecidas
por um número restrito de jornalistas com experiência no exterior. Casos
como de Joel Silveira e Rubem Braga, correspondentes de guerra junto à
Força Expedicionária Brasileira, na Itália, ou o próprio Pompeu de Souza,
que trabalhou como redator de um noticiário da Columbia Broadcasting
System (CBS) dirigido ao Brasil, entre 1941 e 1943.
Pompeu de Souza explica como era a sua percepção desse “novo”
jornalismo durante a estada nos Estados Unidos:
Infelizmente não pude freqüentar redações de jornais, porque
eu estava fazendo rádio intensamente. Mas lia muito os jornais
americanos, e foi então que eu comecei a verificar que eles
tinham uma diferença fundamental em relação aos brasileiros:
eram escritos com objetividade, a notícia era só notícia, era só
informação, pois as opiniões eram veiculadas nos editoriais.
Hoje, entretanto, sabemos que isso é muito relativo. (SOUZA
apud LINS DA SILVA, 1991, p. 78)
Segundo ele, desde sua volta ao Brasil, em 1943, começou a fazer
pequenas modificações no Diário Carioca, “objetivando um jornalismo
mais dinâmico”. Mas as introduções não eram significativas. Tampouco foi
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 94
criada a figura do copidesque, que representou o centro da mudança em
1950.
“Era automático. No Diário Carioca reescrevia-se tudo, o que era
um pouco a cabeça do [Luís] Paulistano”, contou em entrevista Evandro
Carlos de Andrade (ABREU et al 2003, p. 23). E foi esse modelo norte-
americano, que privilegiava a informação, que gradativamente foi
substituindo o anterior.
No Diário Carioca o repórter também fazia de tudo um pouco.
Cobria diferentes setores, fato comum em jornais do seu porte. Mas a
grande chance para o jornalista naquele período era cobrir política. Essa
era a forma de se aproximar de políticos de sucesso e conseguir um
salário complementar que lhe garantisse a sobrevivência. “Naquele tempo,
o jornalista completava o ordenado com um emprego público”, explicou
Andrade. Principalmente em um jornal onde os vales semanais “não eram
pagos semanalmente”.
Evandro Carlos de Andrade explica essa aparente incoerência ou
falta de ética profissional, lembrando a situação profissional do jornalista
na época:
Vou dizer o seguinte: quando eu entrei no Diário Carioca, o
Paulistano, que era o chefe de reportagem, tinha um fusca que
devia ser um daqueles que sobraram da guerra, do exército do
Rommel. E morava numa casa na Penha, paupérrima, sem
nada. Ele e os dois filhos dele, com a mulher. Quando comecei,
a minha perspectiva de vida era a seguinte: se eu me der
muitíssimo bem nessa profissão e chegar a ser chefe de
reportagem em algum jornal, vou ter uma casa na Penha e um
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 95
fusca igual ao do Paulistano. Aquilo era o êxito na profissão.
(ANDRADE apud ABREU, 2003, p.57-58)
Vida de jornalista não era fácil naqueles tempos. Jornalismo era
bico. Mas tinha lá seu lado interessante e divertido. E tinha a devoção com
que era feito no Diário Carioca. O repórter Araquém Moura, que também
ingressou no jornal na década de 50 cobrindo polícia e depois foi
secretário do DC-Brasília, confirma:
Toda a equipe direção, chefias e subalternos era uma
grande família. Mesmo nas ocasiões em que os salários
atrasavam, a notícia era sempre o mais importante para todos.
(MOURA In: DIÁRIO CARIOCA, 2003, p. 57)
O bom humor da redação superava todos os percalços econômicos.
Embora muitos também trabalhassem em outros jornais, ninguém queria
faltar na redação do Diário. Louzeiro conta algumas das brincadeiras que
elevavam o ânimo dos jornalistas:
Dedé Maia e Everardo Guilhón extrapolavam os papéis de
secretários de redação: a par das tarefas normais,
comportavam-se como “animadores da redação”, onde
encenavam verdadeiros esquetes. Se havia uma visita na hora
em que se iniciava o “drama de fechamento”, o que poderia
importar em atraso de rodada, eis que os dois promoviam
inesperada discussão, falsamente dramática. Em meio às
palavras ásperas e até alguns palavrões, eis que Guilhón
sacava um punhal e avançava na direção de Dedé, sendo
contido por Catão, Jotaefegê e o contínuo Cartola que,
cúmplices da brincadeira, agiam com a maior seriedade.
(LOUZEIRO In: DIÁRIO CARIOCA, 2003, p. 77-78)
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 96
A forma de expulsar as visitas alegrava a todos na redação, que
caíam no riso. Cartola, por sinal, protagonizou outra cena de humor no
jornal, também contada por Louzeiro.
Por trás da mesa do redator-chefe do jornal uma parede era usada
como “agenda coletiva”, com inúmeras anotações feitas a lápis, números
de telefone e recortes de jornais com eventos que seriam pauta do jornal.
Quando Ascendino Leite, escritor de renome, assumiu a chefia de redação
mandou, durante um final de semana, pintar a tal parede. Na segunda-
feira, os jornalistas, espantados, resolveram demonstrar a revolta por não
terem sido avisados da medida.
Acontece que, certa noite, início do expediente, eis que Dedé
Maia determina que o contínuo, Cartola (o compositor),
inaugurasse o “mural” com determinado número de telefone.
Cartola subiu num banquinho e lá estava escrevendo, com um
lápis bicolor, quando foi surpreendido por Ascendino, que
chegou silencioso, ficou alguns instantes acompanhando o que
considerava imprudência e, mais do que isso, uma afronta.
Ferido no seu orgulho, o redator-chefe ajustou os óculos,
esbravejou:
O que é isso, seu Cartola? Por acaso o senhor pensa estar
no seu barraco?
Não, senhor. No meu barraco, eu tenho um caderninho pra
fazer anotações. (LOUZEIRO In: DIÁRIO CARIOCA, 2003, p.
79)
Era o bom humor que fazia com que eles fugissem do “jornalismo
burocrático, sem sal e sem vida”. Mas um jornalismo com toda a seriedade
possível.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 97
Na nossa loucura, tínhamos comprometimento com o que
escrevíamos; havia coragem de dizer e assumir as culpas
quando surgiam os processos por crime de imprensa ou os
enfrentamentos com a polícia. (LOUZEIRO In: DIÁRIO
CARIOCA, 2003, p. 80)
Outro jornalista que acumulou a função pública trabalhava na
Assessoria de Imprensa da Presidência da República no governo de João
Goulart com a de redator do Diário Carioca foi Carlos Castelo Branco.
Foi para lá quando o jornal já entrava em decadência, mas conta que “ali,
apesar das dificuldades, tudo era feito com humor, competência e amor.
Ou quase tudo”. Também para Castelo Branco, o que mais impressionou
foi a convivência com o que ele chamou de “celeiro de talentos que lhe
sobreviveriam com louvor em todas as áreas de atividades intelectuais e
políticas”.
Na redação do jornal os estilos eram diferentes. Pompeu de Souza,
movido pela paixão, costumava dar gritos com os repórteres. Luís
Paulistano, mais contido, gostava de conversar com seus comandados
pelos cantos, chamando sempre para uma conversa reservada. E o
Danton Jobim? “A cabeça criativa era mesmo a de Pompeu. Danton era o
cérebro político do jornal”, afirmou Milton Coelho da Graça
8
. Nilson Lage
discorda:
8
Em entrevista à autora.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 98
(...) Pompeu confessou que apenas compreendeu as normas do
estilo jornalístico moderno em 1949, quando lecionava, como
assistente de Danton Jobim, na Universidade do Brasil. (...) e
Pompeu sempre esteve longe de ser modesto (...). (LAGE,
2004, p.12)
Ana Arruda Callado
9
, primeira mulher a assumir o cargo de chefe de
reportagem de um jornal brasileiro, o Diário Carioca, concorda:
A explicação do Sérgio Buarque de Holanda de que para o
brasileiro as coisas não são racionais, são simpatias, antipatias
ou de laços familiares e laços afetivos, essa teoria sobre o
homem cordial explica um pouco porque Danton Jobim não é
conhecido entre os estudiosos de jornalismo e entre os
jornalistas do Brasil. O Danton só passava pela redação, morria
de preguiça. (...) O Pompeu era o cérebro do jornal, só que o
Danton tinha dado ao Pompeu de bandeja tudo aquilo.
Ana Arruda, que foi aluna de Jobim na Universidade do Brasil,
explica que só entendeu isso muito mais tarde, quando se preparava para
dar aulas e leu o livro “Espírito do Jornalismo”.
Percebi o que eu tinha perdido na faculdade. Descobri que ele
sabia tudo que eu tinha aprendido na prática, que eu tinha lido,
que eu tinha conversado com pessoas mais experientes. Lendo
aquele livro do Danton, as conferências e mais aquele projeto
de curso é que descobri que ele é o pioneiro absoluto dos
cursos de jornalismo no Brasil (nesse sentido, não de luta pela
implantação, o que a ABI fez desde seu início). Nós
conhecemos a história dos cursos, mas sobre a implantação, o
estudo, o que aconteceu, tanto na introdução das técnicas
modernas, as técnicas norte-americanas que realmente
modernizaram o jornalismo brasileiro... Então, quem fez os
currículos? Pompeu. E quem introduziu o manual de redação?
Pompeu. Mas se você pega a data da conferência do doutor
(Jobim), você vê que a criação foi dele. Aliás, como escrevia
bem!
Tudo isso, segundo a jornalista, devia-se ao comportamento de
Jobim, que não era tão cativante como o do Pompeu de Souza. Na época
9
Em entrevista à autora em 20/12/06.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 99
em que o conheceu, parecia sempre muito mais preocupado com a
política, com um jeito displicente para as outras atividades. Havia ainda a
questão da política. “Ele era do PSD, era conservador. Então, era
esnobado pela gente”. Ana Arruda explica que na Universidade, assim
como no jornalismo, só tinha prestígio quem pertencia à esquerda. Embora
reconheça que o ar de tédio do professor tenha contribuído com a
impressão guardada, hoje se recrimina por ter dado pouco atenção às
suas aulas. Reconhece que ele era o grande pensador do jornalismo
naquele período.
O Pompeu levou o louro. Não é que o Pompeu não tenha valor;
ele foi um maravilhoso jornalista e, principalmente, um
maravilhoso chefe. Ele formou muitos jornalistas. Já o Danton
não estava nem aí para isso, não estava nem ligando para as
pessoas. Mas foi ele quem pensou e trouxe as novas técnicas.
O Pompeu estava lá todos os dias com os jornalistas,
ensinando, mas o diretor do jornal era o Danton. Quem foi à
Universidade de Colúmbia antes, quem deu conferência lá antes
de estudar foi o Danton. Não há dúvida.
Tal opinião é semelhante à de Fernando Segismundo, para quem o
papel de Jobim era de orientador de grandes jornalistas do Diário Carioca,
que se encarregaram de passar adiante os ensinamentos recebidos.
Danton exerceria uma influência destacada na renovação da
imprensa brasileira a partir da revolução técnica operada no
“Diário Carioca”, onde foi o iniciador e o mestre de alguns
mestres do jornalismo como Pompeu de Souza, que começou
há 38 anos no velho DC, sob sua orientação. Este seu papel de
renovador tinha antecedentes sólidos, que remontam a seu
início na profissão, na década de 20, e à sua participação em “A
Manhã”, de Mário Rodrigues. Já então, Danton era um estilista
na arte de escrever e um técnico em arte gráfica: ele escrevia
os textos e depois descia à oficina para paginar o jornal na
rama, manchando os dedos de tinta. No “Diário Carioca”, mais
tarde, fez apenas aprofundar uma vocação e uma destinação
que o acompanhavam desde sua iniciação na vida da imprensa.
(SEGISMUNDO, In: BOLETIM DA ABI, março de 1978, p. 12)
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 100
Esse interesse dele pelo aspecto gráfico das publicações era tão
grande que seu filho, Renato Jobim, contou que o pai costumava guardar
fac-símile de páginas de jornal.
Mas foi Pompeu de Souza que redigiu, no carnaval de 1950, o
manual de redação, ou as Regras de Redação do Diário Carioca, como foi
chamado, embora Ana Arruda Callado atribua a criação a Jobim: “ele
pegou o style book e colocou na mão do Pompeu”. Um folheto de 16
páginas resumia as disposições que desejavam padronizar a linguagem do
jornal dentro de normas de concisão e objetividade, que davam suporte ao
slogan então adotado: “O máximo de jornal no mínimo de espaço”.
No fundo, o que o redator-chefe, Danton Jobim, juntamente com
Pompeu de Souza na chefia de redação, e Luiz Paulistano, na
reportagem, procuravam conseguir era a adaptação do ideal
configurado na moderna técnica do jornalismo norte-americano,
através da obediência dos redatores às regras básicas do
chamado lide. (TINHORÃO In DIÁRIO CARIOCA, 2003, p.81)
Embora buscasse organizar a linguagem jornalística, a aplicação
das regras devia-se mais à grande capacidade dos profissionais que ali
trabalhavam de absorver o conhecimento de seus mestres do que a uma
organização estabelecida. José Ramos Tinhorão explica:
Relembrada assim por sinal de forma tão obediente às tais
regras de redação é possível imaginar hoje, 50 anos depois
do acontecimento, que essa tal “revolução na imprensa carioca”
aconteceu em clima de alguma seriedade acadêmica, com
teóricos de linguagem jornalística expondo princípios a alunos
tentando aplicá-los na prática da comunicação escrita. Nada
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 101
mais ilusório. Aliás, se se pudesse contrariar um pouco uma das
regras básicas do style book “evitar palavras chulas e
expressões de gíria” não seria impróprio dizer que todo
aquele trabalho coletivo de reformulação da linguagem
jornalística transcorria num clima de autêntica esculhambação.
(TINHORÃO In: DIÁRIO CARIOCA, 2003, p.81-82)
Opinião parecida com a de Milton Coelho da Graça:
Foi um jornal-escola, pioneiro em técnicas de texto e
diagramação. E sempre um pouco louco, porque a criatividade,
a alegria e a própria natureza da profissão jornalística
freqüentemente parecem extravasar os limites da razão (...)
(COELHO DA GRAÇA In: DIÁRIO CARIOCA, 2003, p. 91)
Mas, como confessa o próprio Tinhorão, dentro de uma loucura e
uma “bagunça organizada”, em que as regras eram de fato aplicadas,
embora reconhecido o direito de, vez ou outra, fugir dos moldes
estabelecidos, se encaixando no que ele chamou de “atrevimento criativo”.
Uma criatividade que era louvável, segundo Jobim:
E esse fato nos mostra que os processos de redação
jornalística, mesmo onde esta chegou a um alto grau de
especialização, como nos Estados Unidos, não opõem o
jornalismo à literatura. Clareza simplicidade e concisão no dizer,
objetividade no descrever as coisas e o comportamento dos
homens serão porventura, qualidades do estilo jornalístico ou
do estilo literário?
Ambos os estilos se confundem; seria impossível traçar com
nitidez a linha de demarcação entre o mundo jornalístico e o
literário. Esta linha tênue e hesitante marcará, sem dúvida, a
diferença de ângulo em que se colocam o repórter e o
romancista, o editorialista e o ensaísta um voltado para as
exigências imediatas e transitórias do grande público, outro
debruçado sobre os temas universais e permanentes que
nascem da natureza do homem e do mistério da vida. (JOBIM,
2003, p. 53)
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 102
O “não elimina, como se tem pretendido” citado por Jobim devia-se
às críticas recebidas por Pompeu de Souza, em razão da elaboração do
manual. Boa parte da classe jornalística de então rejeitou as mudanças.
Ele chegou a ser chamado por Nelson Rodrigues de “o pai dos idiotas da
objetividade”. Pompeu contou que ele não o perdoava por haver
“suprimido dos títulos os pontos de exclamação”. O mesmo aconteceu
com Osório Borba, que o criticou por deformar o jornalismo e a língua,
“acabando com o verbo e suprimindo os artigos”.
Lage comenta as características da reforma do Diário Carioca:
Nascida da experiência acadêmica de Danton Jobim e Pompeu
de Souza o primeiro catedrático e o segundo, seu assistente,
na cadeira de Técnica de Jornal e Periódico do curso de
Jornalismo da Faculdade de Filosofia da Universidade do Brasil
(hoje, Universidade Federal do Rio de Janeiro) a técnica de
redação jornalística introduzida pelo Diário Carioca incorporou
ao lead americano (mais próximo, no estilo, dos jornais ingleses
da época, com períodos um tanto mais longos) uma série de
inovações introduzidas na linguagem literária pelos modernistas
de 1922. Entre elas, a eliminação de adjetivos inúteis, o
combate aos chavões, o uso de preposições mais próximo da
linguagem falada e a supressão, paulatina mas constante, das
formas arcaicas de tratamento e referência (‘doutor’, ‘eminente
jurista’, ‘sua excelência’) e do jargão jurídico dominante em uma
profissão até então exercida freqüentemente por bacharéis em
Direito, quando não contagiada de rábula de policiais e
bandidos. (LAGE, 2004, p.8-9)
Aos redatores do Diário era sugerida constantemente a leitura dos
autores modernos, particularmente de Graciliano Ramos, cujo estilo
enxuto tomava-se como modelo. Na fase de decadência do jornal, eles
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 103
levaram o novo estilo para o Jornal do Brasil, veículo tradicional (fundado
em 1891, com orientação monarquista) que se decidiu a fazer uma
reforma editorial.
Lá, no final da década de 50 e nos primeiros anos da de 60, o estilo
de texto se fixou, associando-se a uma nova estética gráfica e acabou
servindo de modelo para a imprensa de todo o país.
Anos depois de toda essa transformação, o Diário Carioca acabou.
Por que um jornal tão revolucionário acabou? Alberto Dines (ABREU,
2003) acha que foi porque o Rio de Janeiro ficou “um pouquinho mais
apertado e não havia espaço para tanto jornal”. Principalmente porque a
cidade não era mais a capital federal, a força econômica estava
centralizada em São Paulo e porque os jornais não tinham a mesma
estrutura de, por exemplo, o Jornal do Brasil. Faltavam anúncios para
todos.
Evandro Carlos de Andrade (ABREU, 2003) acreditava que o
problema foi decorrente da incapacidade empresarial, no momento em que
a comunicação se tornou um grande negócio. “Eles eram homens de
jornal, homens de combate, homens de opinião”. Existia uma grande
distância entre o ideal de se fazer o jornalismo e o caixa necessário para,
no final do mês, se pagar os salários, o papel e a tinta. Da mesma opinião
compartilha Lins da Silva (1991, p. 78), quando diz que Danton Jobim e
Pompeu de Souza perderam a batalha do Diário Carioca, que, “apesar de
ter sido um sucesso de vendas, teve de sair do mercado devido a
problemas administrativos”.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 104
O caso é que o encerramento das atividades do Diário Carioca
abalou a equipe que o compunha e até mesmo as que já tinham saído de
lá na época do fechamento. Afinal, além de grande escola de jornalismo,
“era um curso de doutorado em convívio humano”, como afirmou Renato
Jobim (In: DIÁRIO CARIOCA, 2003, p.100), contando de sua nostalgia
com o fim do jornal; ou Nilo Dantas, que se emociona ao dizer que, entre
as muitas graças que Deus lhe deu, conviver e aprender com os
companheiros do Diário Carioca foi a “mais preciosa”.
Jorge Guilherme Pontes conta que até houve tentativas de se
ressuscitar o jornal, mas que isso seria impossível:
(...) O jornal parou de existir sem que houvesse um tempo de
viver um novo momento da imprensa brasileira, onde a
administração, as finanças, os interesses comerciais seriam
mais importantes do que os textos, a notícia, as verdades e o
amor pelo jornalismo. O jornalismo hoje é um negócio que
precisa dar lucro. O DC não viveu esse momento nem essa
exigência; e, ao profissional, era permitido agregar um pouco de
paixão à apuração e ao texto que iria oferecer aos seus leitores.
(PONTES In: DIÁRIO CARIOCA, 2003, p. 76)
Mas Pontes confirma que a saudade deixada deve-se à sua
vocação de transformar “focas em experientes profissionais”, requisitados
por outras empresas de comunicação justamente pela formação recebida
no jornal.
Mas é José Louzeiro quem recorda a última noite do jornal:
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 105
Certa noite, quando já estávamos quase todos, do antigo
copidesque do DC, em outras redações, eis que somos
convocados por Dedé Maia para celebração inédita: velório pelo
DC que havia morrido, na manhã seguinte estaria enterrado e,
por isso mesmo, fora das bancas. Na sobreloja da Avenida Rio
Branco, choramos, fizemos discursos e, para completar a
cerimônia, fomos para o Bar Flórida, no Edifício A Noite, na
Praça Mauá, onde enchemos a cara. (LOUZEIRO In: DIÁRIO
CARIOCA, 2003, p.80)
O Diário Carioca circulou pela última vez em 31 de dezembro de
1965.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 106
5 A pedagogia do jornalismo, segundo Danton Jobim
A partir de sua experiência com o treinamento de focas no Diário
Carioca e no curso de Jornalismo da Universidade do Brasil, Danton Jobim
elaborou sua proposta de pedagogia para jornalismo. Seu manual inexiste
nas bibliotecas brasileiras, incluindo-se aí as principais: Biblioteca Nacional
do Rio de Janeiro e biblioteca da Escola de Comunicações e Artes da
Universidade de São Paulo. O resgate desse material só foi possível
graças ao arquivo pessoal do professor Marques de Melo.
Visando estruturar a proposta de Jobim com um modelo
pedagógico, analisaremos seu manual a partir dos seguintes pontos: o
objeto de estudo, o aluno de jornalismo, o professor, o currículo e o
método de ensino.
5.1 O objeto do ensino do jornalismo
Qual a finalidade do ensino do jornalismo? Jobim parte desse
questionamento para iniciar uma discussão sobre o tema, buscando, a
partir daí, elucidar o caminho do processo educativo, de forma a tornar
possível planejar os métodos adequados para estimular as mudanças
responsáveis pela transformação do aluno. “O método ideal será,
necessariamente, o que esteja em perfeita conformidade com o objeto que
se pretende alcançar” (JOBIM, 1964, p.3).
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 107
No entanto, a definição desse objeto está condicionada também a
outros fatores que intervêm nesse processo, desde a visão do aluno, do
mercado e da comunidade, até as condições oferecidas pelas escolas
para assegurar a aplicação das técnicas mais eficazes para o ensino. É
preciso analisar toda a conjuntura didática para poder se estabelecer
métodos que efetivamente possam se reverter em benefícios para todos
os envolvidos no processo de ensino do jornalismo.
Se a pergunta for feita para profissionais de empresas de
comunicação, provavelmente a resposta sobre o que se espera das
escolas de jornalismo estará voltada para a preparação de mão-de-obra
intelectual qualificada, com conhecimentos das práticas comuns no
mercado, que possam atuar nas diferentes áreas jornalísticas. Uma visão
que, para Jobim, seria unicamente tecnicista.
Nessa ordem de idéias, a escola serve para “elevar” o nível
profissional dos repórteres e redatores, substituindo o ensino
nas redações, simples adestramento, por uma iniciação
racionalmente orientada por professores. Além das vantagens
econômicas, eliminando a fase de “carência profissional” do
aprendiz, o sistema proverá aos aspirantes a jornalistas uma
visão universal dos problemas da imprensa, e o conhecimento
genérico das técnicas fundamentais da profissão. (JOBIM, 1964,
p.4)
Mas a formação do jornalista deve ser muito mais ampla e abordar
o que a sociedade espera desse profissional. É preciso resgatar Rui
Barbosa quando explica a importância da imprensa na sociedade:
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 108
A imprensa é a vista da Nação. Vida sem vista é vida no escuro,
vida na soledade, vida no medo, morte em vida: o receio de
tudo; dependência de todos; rumo à mercê do acaso; a cada
passo acidentes, perigos, despenhadeiros. (...) Já lhe não era
pouco ser o órgão visual da nação. Mas a imprensa, entre os
povos livres, não é só o instrumento da vista, não é unicamente
o aparelho do ver, a serventia de um só sentido. Participa,
nesses organismos coletivos, de quase todas as funções vitais.
(BARBOSA, 2003, p. 37)
Nesse sentido, a importância da preparação universitária está muito
mais ligada à formação de profissionais “aptos para melhorar o
instrumento de ação social terrivelmente eficaz que é a imprensa”, afirma
Jobim (1964, p.4-5), sobretudo, preparados e qualificados para suportar as
grandes responsabilidades que se atribuem a todos os que usam esse
poderoso instrumento.
Mais do que isso, tem a obrigação de formar, educar, descobrir e
desenvolver nos alunos tendências e aptidões que, devidamente
orientadas, conduz os jovens a uma sólida formação humanística
profissional, apoiada em um tripé que considera as questões moral,
cultural e técnica durante todo o curso.
O jornalismo, para sobreviver, tem que ter duas condições
garantidas, segundo Beltrão (2003, p.157). A primeira é a liberdade, que
parte de fora para dentro, e que vai garantir sua competência dentro da
sociedade. A segunda, de dentro para fora, é responsabilidade do próprio
jornalista, exigida pela sociedade e pelo Estado.
Há, portanto, que o jornalista identificar-se com os objetivos da
sua missão, bem informar-se dos meios que deve utilizar para
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 109
alcançá-los e de como empregá-los. Em outras palavras, o
jornalista precisa – como arauto e pregoeiro das idéias, do
pensamento, das reivindicações, dos anseios da opinião
pública, enfim – o jornalista precisa de educação especial para a
liberdade. (BELTRÃO, 2003, p. 161)
Se não fosse para agir desta forma, não haveria necessidade de
nenhuma educação, instrução ou treinamento, insiste Beltrão. Qualquer
pessoa poderia assumir o papel de jornalista, como muito aconteceu no
passado, sem entender o papel social que acompanha a profissão, mesmo
que conhecesse as técnicas jornalísticas. O ensino do jornalismo restrito
às técnicas não é capaz de formar adequadamente jovens para o exercício
da profissão. A preocupação com a questão da responsabilidade social no
jornalismo foi o que moveu, por exemplo, Joseph Pulitzer na criação da
Escola de Jornalismo da Universidade de Colúmbia:
Minha esperança é que este colégio de jornalismo levante o
nível da profissão. Mas para isso é preciso marcar a distinção
entre os verdadeiros jornalistas e os homens que fazem uma
espécie de jornalismo que não requer nenhum conhecimento ou
convicção, mas um simples treino de negócio. Eu desejo iniciar
um movimento que possa erguer o jornalismo ao nível de uma
profissão erudita, credora de respeito da comunidade, como
outras profissões muito menos importantes têm logrado o
interesse público. (PULITZER apud JONES, 1947, p. 514 ou
BELTRÃO, 2003, p.162)
É verdade que no exercício da profissão há muito se deixou para
trás a concepção romântica de jornalismo como “espaço de luta
ideológica, de denúncia política e de formação de consciência”
(STEINBERGER-ELIAS, 1998, p.94). Mas o ensino, como afirma
Cunningham (1975, p.16), deve apoiar-se não somente na formação do
técnico, mas na formação do homem, entendendo, como Comenius, que a
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 110
educação “é o desenvolvimento integral do homem”, ou como Gentile, que
acredita ter como função “desenvolver uma visão interior cada vez mais
penetrante e aprofundar a consciência da consciência”. Essas visões são
coroadas por Montaigne, que entende a educação como “a arte de formar
homens e não especialistas”.
O objetivo do ensino do Jornalismo não pode ser distinto do objetivo
geral da educação; deve ser parte do mesmo processo, que Cunningham
(1975, p.9) resume como sendo o de “crescimento e desenvolvimento pelo
qual o indivíduo assimila um corpo de conhecimentos, demarca seus
ideais e aprimora suas habilidades no trato dos conhecimentos para a
consecução daqueles ideais”, resultado que o autor atribui às três
transformações que fazem parte do processo educativo: a das
capacidades às habilidades, a da ignorância ao conhecimento, e a dos
impulsos aos ideais.
Considerando todas essas questões, chegamos ao que Jobim
resume como as finalidades de um curso universitário de jornalismo ideal:
a) Formação cultural, ética e profissional do jornalista;
b) Análise e revisão das técnicas jornalísticas através da
investigação metódica;
c) Estudo do fenômeno social da informação.
5
5
.
.
1
1
.
.
1
1
F
F
o
o
r
r
m
m
a
a
ç
ç
ã
ã
o
o
e
e
I
I
n
n
f
f
o
o
r
r
m
m
a
a
ç
ç
ã
ã
o
o
Mas o que deve fazer parte da formação do jornalista? Para Jobim,
não pode haver uma distinção entre matérias formativas ou informativas.
“Todas as disciplinas, qualquer que seja sua natureza, devem ter
finalidade educativa contribuindo em maior ou menor grau para a formação
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 111
do homem” (1964, p.5). Diferentes áreas do conhecimento, por mais
distantes que pareçam do currículo de um curso de jornalismo, têm
influência no cotidiano do aluno e despertam sua curiosidade.
A segregação entre cultura e utilidade é a mais importante dentro
dos valores educacionais. A distinção não é intrínseca, mas histórica e
social. Na Grécia antiga formulou-se que a vida humana era vivida
somente pelos que “subsistiam à custa dos resultados do trabalho alheio”.
A doutrina psicológica das relações entre a inteligência e o desejo ou
apetites e entre a teoria e a prática foi decisivamente influenciada por esta
circunstância, provocando uma divisão na teoria política entre os seres
humanos que são capazes de viver a vida da razão, tendo seus próprios
fins, e as pessoas capazes de ter apetites e trabalhar se orientando pelos
fins determinados por outras pessoas.
Essas distinções, na pedagogia, refletiram numa separação entre a
educação liberal, “que serve a uma vida auto-suficiente de lazeres
dedicados ao saber pelo saber, e a preparação utilitária e prática para as
ocupações mecânicas, preparação desprovida de conteúdo intelectual e
estético” (DEWEY, 1956, p. 324).
Essa separação ainda se mantém até hoje, de acordo com Dewey,
mesmo com as mudanças na teoria e na prática, diminuindo a eficácia das
medidas educacionais. Por essa razão, o filósofo acredita que acabar com
esse dualismo e organizar um curso que torne a reflexão um guia para a
atividade prática e dos lazeres a recompensa da aceitação da
responsabilidade dos serviços práticos é o grande problema da educação.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 112
Assim como se contrapõem o trabalho para ganhar a vida e o lazer,
também se contrapõem a teoria e a prática, a inteligência e a ação e o
saber e o fazer (DEWEY, 1956, p. 325).
Voltando a Platão e Arquimedes, que concordavam em identificar a
experiência com interesses puramente práticos, tendo como alvo os
interesses materiais e como órgão o corpo humano, o conhecimento
existia por si mesmo, sem associação com a prática, e tendo como órgão
e fonte um espírito imaterial. A experiência estava relacionada com a falta,
a necessidade, o desejo, nunca se bastando em si própria, enquanto o
conhecimento racional era completo e compreensivo em si mesmo,
interessado na verdade eterna, já que a vida prática era de um fluxo
constante.
Esse modo de entendimento era resultado de uma filosofia que se
iniciou com a crítica aos costumes e à tradição como “padrões para o
conhecimento e a conduta” (DEWEY, 1956, p. 326). A razão era a
faculdade com que aprendiam o princípio e a essência universais e os
sentidos eram os órgãos que percebiam as mudanças – o instável e o
variado em contraste como permanente e o uniforme.
A experiência era associada aos trabalhos manuais e o termo
“empírico” não se relacionava com conhecimentos dos princípios, mas
com o método de “experiência e erro”, com caráter aleatório.
O estudo do jornalismo, no entanto, pode e deve contemplar a
observação e a compreensão dos fenômenos sociais, buscando uma
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 113
adaptação dos alunos a uma sociedade em constante mudança.
Mudanças que se tornaram cada vez mais velozes, graças ao avanço que
Kilpatrick (1978) dividiu em três profundas tendências da sociedade
moderna: uma nova atitude mental, diante da vida; a industrialização; a
democracia.
Por isso mesmo, a formação do jornalista não deve ser meramente
técnica. Conforme Fadul (1979, p.52),
Embora condição necessária, o domínio de uma técnica não é
condição suficiente. Essa forma de encarar o ensino nos cursos
profissionalizantes manifesta, de forma muito clara, a ideologia
da profissionalização, entendida aqui como uma ideologia da
permanência do modelo. (...) A única forma desse ensino
manter-se atualizado seria transmitir ao aluno uma formação ao
mesmo tempo teórica e prática, de forma a permitir, a esse
aluno, a sua própria reciclagem frente às novas técnicas
revolucionárias.
É o que se chama de aprender a aprender. O curso universitário
precisa promover no aluno uma mudança capaz de possibilitar que ele,
depois de sair da faculdade, busque a atualização constante em sua
formação.
Jobim defende ainda que o ensino de jornalismo, em seus múltiplos
aspectos, é extremamente adequado para dar ao jovem uma “visão
panorâmica das aventuras e conquistas do homem no mundo de nossos
dias”. E é a escola, como agente da transmissão e distribuição dos
conhecimentos intelectuais, que tanto no campo da ciência quanto no da
técnica não pode deixar de lançar mão para colocar toda espécie de
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 114
informação a serviço do homem, contribuindo para seu aperfeiçoamento
moral.
Em certo sentido, talvez se pudesse dizer que o jornalista é o
ser humano melhor ajustado ao seu tempo. Vivendo na
aparente vertigem dos acontecimentos, participando deles, mas
tendo por ofício o dever de observá-los e interpretá-los, adquire
um poder de adaptação excepcional, uma super-plasticidade
psíquica. Esta poderá degenerar, com certeza, em leviandade e
cinismo. Contra tal ameaça prevalecerá, por certo, a educação
integral que ele receberá no meio universitário, onde sua
aprendizagem se faça sob o permanente domínio da
preocupação ética. (JOBIM, 1964, p.6)
É nesse sentido que Jobim vê a interferência fundamental dos
professores, mesmo os das áreas técnicas, no sentido de propiciar aos
alunos uma visão humanística da profissão, reforçando a responsabilidade
social do jornalista, sua relação com o poder e os problemas éticos que
terão pela frente. Apenas a inserção da disciplina de Ética não seria
suficiente para moldar o aluno dentro de uma conduta adequada a um
jornalista. As noções e hábitos que formarão o jornalista, para ele, são
assimilados a partir da própria influência da personalidade dos professores
e do modo pelo qual ensinam suas matérias, visando mais a educação do
que o adestramento profissional.
Essa influência dos problemas enfrentados no cotidiano e das
experiências do professor apontadas ao aluno no decorrer do curso
representa o que Dewey classificaria de função social da educação
(BELTRÁN, 2003, p.50-51), no sentido de entendê-la ligada aos objetivos
da própria sociedade. A partir da idéia de que a escola deve constituir um
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 115
ambiente particular no qual possam ser realizadas experiências
exemplares da vida social e de que a formação democrática pressupõe o
confronto do aluno com determinados conhecimentos específicos, “a vida
social na escola terá como base sobretudo o intercâmbio de experiências
mediante a comunicação entre os indivíduos, pois a compreensão do
mundo que emerge da experiência adquire significado através da
linguagem”.
Essa responsabilidade jornalística é dividida por Beltrão (2003,
p.167) em três aspectos: “para com o indivíduo e a coletividade (jornalismo
moral); para com a pátria (jornalismo e nacionalismo) e para com a
comunidade internacional (jornalismo e paz mundial)”. Entretanto, Jobim
defende que a ética jornalística não existe; o que existe é a ética do
cidadão, a ética imposta pela sociedade de um determinado tempo.
Com isso, alertava para os perigos da profissão, lembrando Alceu
Amoroso Lima (2003), que classificou a facilidade, o sensacionalismo e o
mercantilismo como os maiores riscos no exercício da profissão,
justamente aqueles que motivam o destaque no aspecto formativo do
ensino. Considerando que essa era uma preocupação que não poderia ser
perdida de vista no ensino de qualquer profissão, Amoroso Lima
destacava que no do jornalismo ela se impunha “pela própria natureza da
profissão, assim como por sua passionalidade”.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 116
5
5
.
.
1
1
.
.
2
2
F
F
o
o
r
r
m
m
a
a
ç
ç
ã
ã
o
o
p
p
r
r
o
o
f
f
i
i
s
s
s
s
i
i
o
o
n
n
a
a
l
l
O ensino universitário, porém, tem outras importantes missões
relacionadas ao exercício da profissão: “o descobrimento de caminhos
novos; o enriquecimento do acervo de conhecimentos sobre as matérias
estudadas; a revisão permanente, por meio da pesquisa, das noções e
processos consagrados” (JOBIM, 1964, p.8). O grande desafio da escola,
além da formação intelectual, é funcionar como um centro de
experimentação, por meio do qual se possa aperfeiçoar as técnicas do
mercado.
Para Jobim, a criação do curso de jornalismo no Brasil produziu
“uma sensível mudança” no meio profissional, principalmente nas
questões técnicas. É preciso entender que, naquele momento, na segunda
metade da década de 1940, o modelo norte-americano de jornalismo, que
privilegiava o uso do lead, o texto conciso e a pirâmide invertida, ainda não
havia sido implantado nas redações. Assim, segundo Jobim, o curso
funcionava mais como um curso de aperfeiçoamento do que de formação.
Até mesmo porque a maior parte dos alunos era formada por profissionais
que já atuavam no mercado e as novas idéias eram introduzidas por eles
nas redações. Mesmo com todas as deficiências de um curso em seu
início, as críticas às rotinas empregadas e o debate em torno das
propostas eram recebidas com entusiasmo.
Mesmo atualmente, cerca de 60 anos após a criação do ensino
superior de jornalismo no Brasil, o curso deveria manter a liderança na
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 117
introdução de novas experiências no mercado. No entanto, na maioria dos
cursos, o que se percebe é uma corrida em busca de levar para o ensino
as práticas que são introduzidas no mercado, todas ditadas pelas
constantes mudanças na área tecnológica, que a universidade busca
acompanhar adequadamente.
A solução para este problema, então, está na formação adequada
do aluno, de modo que ele consiga reciclar e adaptar as técnicas
ensinadas às recorrentes mudanças no exercício profissional.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 118
5.2 O aluno de jornalismo
Jobim (1964, p.8) defende que conhecer o objeto do ensino não
basta para escolher adequadamente quais métodos devem ser
empregados no ensino. “Eles dependem, certamente, das peculiaridades
de cada disciplina, mas estão subordinados, antes de tudo, à espécie de
estudante que vamos ensinar”.
Por essa razão, entende que a primeira atenção deveria ser
destinada ao processo de seleção de ingresso na instituição que, segundo
ele, deveria ser diferenciado, seguindo os mesmos moldes de um
processo de escolha de um jornalista para uma redação. Embora o tema
fosse, já naquela época, bastante debatido em diversos países, Jobim
defendia para o Brasil o modelo implantado, então, na Grã-Bretanha, onde
a seleção dos alunos ingressantes era feita pelas próprias empresas
jornalísticas.
Considerava também as sugestões apresentadas por Robert Plant,
membro do Conselho Nacional para a Formação de Jornalistas e
funcionário da União Nacional dos Jornalistas Britânicos, para quem o
primeiro fundamento de seleção seria o controle numérico das matrículas,
de modo a assegurar que a oferta de profissionais graduados
correspondesse à demanda. Essa limitação, embora compreendida como
benéfica, era vista como impossível de ser adaptada a países como o
Brasil, onde o ensino nas universidades estava distante do mercado de
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 119
trabalho e onde a tendência – agora confirmada – de proliferação de
cursos de jornalismo tornava-a inviável. Além disso, ainda havia a questão
de a limitação de ingresso ser entendida não como uma necessidade das
empresas, mas como um processo de seleção que assegurasse a
“eficácia do ensino”.
A segunda questão levantada por Plant dizia respeito a
proporcionar, dentro de uma seleção, oportunidades iguais para todos os
jovens que pretendessem seguir a carreira de jornalista, condição
referendada por Jobim.
O terceiro questionamento referia-se à escolha do pretendente,
propriamente dita, que recairia no aluno que correspondesse ao modelo
procurado pelos veículos de comunicação. Embora Jobim concordasse
que a seleção devesse contemplar o interesse do mercado, acreditava que
a falta de contato entre escola/imprensa impedia as universidades de
compreender quais eram as reais necessidades do mercado. Para isso,
defendia uma aproximação entre as duas instituições, que pudesse
levantar problemas comuns.
O último ponto levantado por Plant era uma seleção que levasse em
consideração a formação moral e intelectual do candidato,
correspondendo “às exigências do bem comum, levando em conta o
importante papel desempenhado pela imprensa na sociedade”. Mas que
meios utilizar para descobrir essas aptidões nos candidatos, geralmente
jovens saídos do ensino médio?
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 120
Tudo isso são conjecturas, porque os regulamentos de seleção são
determinados pelas instituições de ensino e o professor entra em sala de
aula com os candidatos já selecionados. A partir daí, como agir diante de
seus alunos?
O primeiro cuidado do professor – sabem todos – deve ser
procurar conhecer a seus alunos. Ao se iniciar o curso,
costumamos solicitar ao principiante um trabalho sobre as
razões por quais se decidiu pelo jornalismo e não por qualquer
outro curso. Em seguida, fará o aluno uma concisa
autobiografia, que servirá de fundamento para uma conversa
com o professor. Por fim, dirá, por escrito, quais são os jornais e
revistas que lê, assim como por que os lê. (JOBIM, 1964, p.11)
Essa sugestão de Jobim parece óbvia. No entanto, trazida para a
realidade atual das escolas de jornalismo, contempla apenas um pequeno
grupo de instituições onde as turmas são formadas por um grupo mais
selecionado de alunos e a aproximação do docente fica mais fácil. A
realidade nacional, de turmas formadas com 80, 100 ou mais alunos,
impede uma aproximação e acompanhamento cuidadoso dos alunos.
Jobim, entretanto, acredita que se o professor não pode intervir no
processo de seleção, deve procurar a melhor forma de conhecer os
alunos. Ele dizia ter encontrado três diferentes classes de alunos no seu
convívio universitário: os que pretendem exercer a profissão, os que já
exercem e querem se especializar e os que fazem um curso universitário
apenas para ter um diploma de nível superior. Atualmente, é possível se
encontrar mais duas diferentes classes: os que ainda têm dúvidas com
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 121
relação à profissão que querem exercer, por terem ingressado muito
jovens no curso e pelo excesso de exposição às informações, e, a mais
danosa, os que vêem no jornalismo apenas um trampolim para obter fama
e sucesso, estes muito mais influenciados pelo fenômeno da televisão.
Não raro se encontra alunos que enxergam a possibilidade de, por meio
do jornalismo, se tornar astros ou estrelas de televisão, pouco entendendo
do que deveria ser o real sentido ou missão da profissão.
Por isso, a sugestão de Jobim (1964, p.11) de conhecer melhor os
alunos, seja para perceber “as modalidades de incentivo que pedem o
temperamento de cada um; seja para fazer com que não desperdicem seu
tempo, prosseguindo no curso, quando lhes faltam condições para o êxito
relativo nos estudos”. Mesmo porque é possível encontrar, segundo ele,
até entre aqueles que querem apenas diplomar-se, talentos ou excelentes
alunos, assim como é possível encontrar jornalistas medíocres entre
aqueles que já exercem a profissão.
O conhecimento mais pessoal possível de cada aluno possibilita,
com certeza, ao professor de jornalismo reconhecer no aluno as
características necessárias para servir à sua formação jornalística. Essas
características são certos atributos psicológicos e intelectuais que marcam
o que se convém chamar de “vocação” para o jornalismo.
É claro que esses atributos não são avaliados no ingresso na escola
superior, tampouco nos antecedentes do curso secundário. Os primeiros
contatos com um aluno também são ineficazes para uma análise
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 122
adequada de sua vocação, mas servirá, ao menos, para sugerir que este
ou aquele tem “suas possibilidades”.
Jobim considera que o fato de alguém escolher o curso por querer
tornar-se jornalista - e não por desejar um diploma – já “é a mais valiosa
indicação de que esse alguém pode se converter num autêntico jornalista”.
Mas, como ele mesmo admite, “apenas uma indicação”, em razão do
“glamour” que rondou, e ainda ronda, a profissão.
Também há a possibilidade de o professor se deparar em classe
com alunos que escolheram o curso por considerarem o jornalismo como
“aparentemente fácil”. De toda forma, é fundamental que o professor
estimule mesmo os casos mais difíceis, principalmente em razão da
complexidade de causas que motivam a escolha de um curso e de uma
profissão. Não é de todo impossível que um estudante medíocre possa se
transformar, ao final do curso, em um bom aluno ou bom profissional.
Mas essas são discussões que permeiam o campo das suposições.
De concreto tem-se unicamente o fato de que o maior ou menor êxito dos
estudantes reside nos meios empregados para conquistar sua espontânea
adesão ao plano de estudos e nos estímulos que lhes são proporcionados
para que “assumam livremente a responsabilidade de executar as tarefas
de aprendizagem” (JOBIM, 1964, p. 14). E embora essa seja uma questão
que concerne ao método, que trataremos mais à frente, desde já é
importante deixar claro que a motivação do aluno é responsável pelo seu
sucesso. E que a escola e o professor são as peças fundamentais desse
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 123
processo, estimulando suas habilidades. Isto porque, de acordo com
Dewey (1956, p.339):
A função da escola não é transportar os adolescentes de um
ambiente ativo para outro de um estudo inerte dos registros
daquilo que os outros homens aprenderam, e sim levá-los de
um ambiente de atividades relativamente casuais (casuais em
relação à compreensão e à inteligência que possam
proporcionar) para outro de atividades selecionadas, tendo em
vista servir de guias para o aprendizado.
Sem dúvida, o aluno convenientemente preparado pode
desenvolver suas competências. Para Jobim (1964), é preciso encontrar
no jovem estudante as quatro qualidades que considera básicas no
jornalismo: “curiosidade para perseguir o acontecimento; imaginação para
descobrir nas coisas o ângulo novo e atual; objetividade para vê-las sem
distorções; e comunicabilidade para narrar o que viu”. Esses são atributos
da personalidade do jovem que demonstraram sua “disposição de espírito”
para a profissão, embora seja preciso somar a essa disposição os
métodos que serão proporcionados pelo professor.
Mas as causas do êxito ou do fracasso dos estudantes são bem
mais complexas e classificar alunos em grupos, a fim de adaptar os
métodos de ensino às suas peculiaridades, é muito mais difícil do que
parece. Nessa questão, os alunos de jornalismo não são diferentes dos
alunos de qualquer outro curso e os professores passarão pelas mesmas
situações de adaptação de seus colegas de diferentes áreas.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 124
Um dos pontos relacionados ao sucesso do aluno vai além de sua
vocação ou de suas habilidades: é a questão da maturidade. Como
dissemos, muitos saem do curso secundário sem ter noção do que querem
fazer. Embora, em sua maioria, adolescentes, passam a ser tratados como
adultos no curso universitário, muitas vezes sem estarem preparados para
tal. É importante ressaltar que o adolescente tem exigências psicológicas
que são peculiares das crianças. Muitos, com certeza, não tem a mesma
capacidade de abstração de um adulto e encontram dificuldades de passar
horas em sala de aula compreendendo as lições e participando de
atividades.
Partindo da premissa de que essa capacidade de abstração é
forte nos adultos - sem levar em conta a enorme desigualdade
que existe entre uns e outros a esse respeito – renomados
pedagogos sustentam que o que importa no ensino superior é
ditar a matéria. Importa pouco a forma como se faça. O bom
professor seria aquele que “esgota a matéria”. Os estudantes
que já alcançaram uma espécie de emancipação pedagógica
seriam pessoas responsáveis, sedentas do saber do mestre,
desejosas de ler os livros da bibliografia por ele recomendada,
ansiosas por assimilar conhecimentos que lhes permita chegar
com bom êxito ao fim do curso e encontrar lá fora a recompensa
a seus esforços. (JOBIM, 1964, p. 51)
É importante lembrar que o ser humano vai ser transformando na
medida em que passam os anos, no sentido de que evolui. Isso ocorre em
razão de seu contato com o mundo exterior e das mudanças filosóficas
que correspondem a mudanças psicológicas. “A assimilação de novas e
sucessivas experiências contribui para alterar o temperamento, o caráter,
os gostos e as preferências; vale dizer, o comportamento de cada
homem", lembra Jobim.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 125
Por isso, o valor da experimentação na pedagogia, que Raymond
Buyse (1959), em “Experimentacion en Pedagogia”, insiste em apontar:
A experimentação é incontestavelmente mais difícil na
pedagogia que em outra ciência qualquer; mas, por ela mesma,
nunca foi em nenhuma mais necessária nem mais
indispensável. E, com certeza, quanto mais complexa é uma
ciência, mais necessário será estabelecer uma boa crítica
experimental, a fim de obter feitos comparáveis e isentos de
causas de erros.
O desenvolvimento do homem atravessa fases distintas onde cada
uma delas é uma unidade funcional cujas capacidades de reação se
ajustam às necessidades específicas dessa fase. Por isso, a estrutura
psicológica e mental de uma criança não permite que ela perceba
seguramente tudo o que um adulto percebe.
Mas tanto o adulto como a criança não atuam sem um interesse,
sem um objetivo. Existe uma identidade entre eles, do ponto de vista
funcional, conforme aponta Clarapède (1940), que faz com que a
necessidade, embora diferenciada na estrutura, seja a responsável pela
ação. Assim, há “distinção de estrutura e há identidade funcional; distinção
de meios, mas comunidade de fins”. Essa distinção é explicada pelo autor
com o caso da respiração no girino e na rã. Embora ela tenha a mesma
finalidade em ambos, os meios de que se servem para respirar – em um
caso os pulmões e no outro as brânquias – são distintos.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 126
5.3 O professor de jornalismo
Danton Jobim dizia que não era professor. Assim como todos os
demais professores de jornalismo, ele era jornalista. E teve que, antes de
ensinar, aprender. Foi dessa forma que ele iniciou o que chamou de sua
“aventura didática”, descobrindo, inicialmente, como se aprende a ensinar.
Primeiro, através da observação empírica. Depois, sistematizando as
informações adquiridas por meio das leituras sobre o assunto no que
chamava de fichário. Chegou a dizer que o seu curso de pedagogia para o
jornalismo poderia ter como subtítulo “Notas do meu fichário”, ressaltando
que o que fazia eram “simples apontamentos de um fichário rigorosamente
organizado por um jornalista-professor”, que se convertiam em exposições
coerentes sobre os dados recolhidos da experiência e reminiscência de
leituras.
Mas o papel do professor universitário, mesmo sendo um
profissional antes de um professor, não pode ser entendido nesse molde
simplista. Isso porque a primeira questão aqui a ser levada em conta é que
a “efetivação de qualquer política educacional é realizada, em última
instância, na sala de aula e os seus principais agentes são os professores”
(REALI; TANCREDI, 2001, p.159), sendo deles, portanto, o papel de
destaque na determinação e implantação de políticas educacionais.
Cabendo a ele essa função, questionamos qual seria o professor
responsável pela aplicação de um método mais adequado, com melhores
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 127
recursos e formas de motivação do aluno num curso de jornalismo? “O
jornalista”, defende, sem qualquer sombra de dúvida, Danton Jobim.
Quanto às disciplinas técnicas, não há dúvida de que só podem ser
ministradas por jornalistas. E quanto aos professores das demais
disciplinas? “Todos devem ter tido algum contato com os problemas da
imprensa”, insiste Jobim (1964, p.15), condição que entende ser
necessária para que os mestres, mais do que conhecer as necessidades
da profissão, “saibam dar prioridade no ensino de suas disciplinas ao que
verdadeiramente interesse na formação do jornalista completo”. Este ponto
é o primeiro que Jobim levanta em sua proposta pedagógica: o professor
deve, preferencialmente, ter experiência jornalística, independentemente
da disciplina que lecione.
É bem verdade que isso seria mais fácil no período anterior à
regulamentação profissional de 1969, que passou a exigir o diploma de
jornalismo. Atualmente, é mais raro – embora não impossível – encontrar
jornalistas com dupla formação voltados para ministrar aulas nas variadas
disciplinas que constam dos currículos. Mas, mesmo nesse caso, seria
importante que o professor conhecesse o máximo possível sobre a prática
jornalística para que pudesse selecionar os temas mais importantes para
os estudantes da área.
Como já dissemos anteriormente, são os estímulos proporcionados
pelo professor os responsáveis pela motivação do aluno. No caso de um
professor-jornalista, o estabelecimento de nexos entre o conteúdo teórico
das disciplinas e o exercício profissional será muito mais constante,
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 128
possibilitando a aplicação de “maiores recursos para incitar a classe por
meio de estímulos adequados”. A própria atividade jornalística possibilitará
que sua atuação como professor seja muito mais prática, dando condições
de se levar para a sala de aula as ocorrências e curiosidades do dia-a-dia,
“artifício útil para criar um ambiente favorável e despertar o interesse dos
alunos”.
A eficiência do trabalho do mestre é mais importante ainda quando
faltam as condições que poderiam enriquecer o curso, por meio de
trabalhos práticos. Na ausência de equipamentos adequados –
laboratórios, veículos experimentais, entre outros – é que a prática diária
do professor nas atividades jornalísticas vai enriquecer o ensino. É
evidente que a falta desses equipamentos traz transtornos para o
desenvolvimento do programa das disciplinas. Mas os métodos de ensino
devem ser adaptados às possibilidades da escola. É na ausência de
condições adequadas que o professor mostra suas habilidades, fazendo o
melhor “possível” com os instrumentos de que dispõe e inovando os
meios, de modo a impedir a inatividade do aluno.
A vivência na profissão propicia ao professor mais facilidade para
inspirar seus alunos, num primeiro momento, e motivá-los durante o
desenvolvimento do curso. O professor deve ser, acima de tudo, um
modelo que o estudante procurará seguir, a imagem do profissional que
querem ser, o ideal que pretendem atingir.
Não é incomum que se encontre atualmente, nos quadros docentes
de instituições, professores que se queixam da profissão, desestimulam o
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 129
aluno, reclamam do mercado de trabalho, entre outras tantas coisas.
Como esperar que esses mestres sejam os responsáveis pelos estímulos
que devem ser propiciados aos alunos. O professor de jornalismo deve ser
um jornalista autêntico, que compreenda e ame sua profissão, que ilustre
suas aulas com suas experiências e, como acredita Jobim, “comente
apaixonadamente os problemas do jornalismo, sem decair, contudo, no
fanatismo e nas tramas da política”.
Para ele, este é o quadro ideal, mesmo considerando difícil de ser
encontrado. E que, sem dúvida, reforça a importância do professor como
guia didático estimulador do fator afetivo, que faz parte da distinção
triangular
10
das funções mentais, ao lado da cognição (conhecimento) e da
conação (ação) (CUNNINGHAM, 1975, p.66). A aprendizagem é
estimulada por motivos morais ou sentimentais. E muitos dos que buscam
a escola de jornalismo o fazem porque têm propósitos mais altos, que vão
além do fim utilitário de obter um emprego ao terminar os estudos.
É importante frisar que a motivação, sob o ponto de vista da
psicologia educacional, é entendida, tanto na teoria quanto na prática, não
como pequenas receitas a que o professor recorre para “tornar menos
aborrecida suas lições”, mas como um instrumento voltado em direção de
todo o processo educativo (LOURENÇO FILHO, 1978, p. 78). A tarefa do
professor não é modelar uma massa inerte, como a do escultor, mas
despertar no aluno o interesse, considerado por muitos educadores como
10
As outras distinções das funções mentais são: a horizontal (vida racional – intelecto, emoção e
volição – e vida sensorial – sensação, impulso e sentimento) e a vertical (cognição – sentidos e
intelecto – e apetição – impulso e vontade).
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 130
a chave da aprendizagem. Os interesses variados do homem são os que
os diferenciam dos animais, que vivem segundo os apetites do corpo.
Dewey (apud CUNNINGHAM, 1975, p. 121) vai além, afirmando
que o interesse vem com a instituição de problemas. “O pensamento
começa no que, com justeza, podemos chamar de ponto de bifurcação,
ponto ambíguo, que formula um dilema, que propõe alternativas...”. Os
problemas diários são estimulantes para que se busquem soluções. É
através da necessidade de buscar respostas a eles que a reflexão se
desenvolve; no sentido de resolver problemas.
Mas uma boa dose de idealismo trazida pelo aluno é um excelente
motivador da aprendizagem. Jobim, para justificar que não se pode
destruir no aluno a visão nobre do jornalismo, lembra Walter Lippman
(apud JOBIM, 1964, p.56): “a imprensa é posta, segundo a imaginação
popular, ao nível de instituições como a Universidade e a Igreja”. Para ele,
é preciso que o professor valorize realisticamente a função da imprensa,
com o cuidado de não destruir essa visão, sobretudo no primeiro ano,
“período de adaptação do estudante ao ambiente acadêmico e à
especialização da própria universidade”. Sem dúvida, alguns fatores
afetivos influenciam profundamente o jovem ingressante no ensino
superior. Entre eles, além do próprio ambiente da escola, estão a
personalidade do professor-jornalista e a admiração pelos colegas que já
exercem a profissão.
O próprio ensino da história do jornalismo já funciona como
elemento motivador. Por isso, os professores de todas as disciplinas do
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 131
curso devem conhecer os feitos importantes, sugestivos e pitorescos da
história da profissão, “para recorrer a eles nos momentos oportunos com
fins motivadores”.
Se é reconhecido que o sentimento é um fator de aprendizagem,
nada mais adequado do que o professor reconhecer a importância de seu
ofício – como jornalista -, o orgulho profissional com que exerce sua
profissão, sua satisfação e paixão pelo que faz. Isso faz bem para o
estudante, da mesma forma que na obra do artista realiza-se a síntese
técnica-sentimento, que chega ao estado de perfeição na obra mestre,
representada pelo domínio da técnica após anos de estudo, o que só é
obtido plenamente quando é posto o amor na aprendizagem.
5.4 O currículo
Para tratar da questão do currículo no curso de jornalismo, Danton
Jobim (1964, p.52) faz uma analogia entre matéria no jornal e matéria na
escola. Assim, ele explica, “o material, nas redações, é o assunto. A
matéria, no jornalismo, não é tudo, porque necessita ser transformada pela
mente do jornalista até chegar a ser jornalismo”. Os repórteres reagem
diante de um conjunto de fatos que constituem a notícia que eles devem
elaborar. Da mesma forma, as matérias que compõem o currículo escolar
devem ser uma combinação de temas que possam instigar a mente do
aluno, provocando reações às questões propostas, “seja buscando
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 132
solucioná-las, seja esforçando-se para compreender seu significado, o que
já é começar a resolvê-las”.
Ensinar suscitando problemas cria no aluno a disposição e a
capacidade para formulá-los e resolvê-los por seu próprio esforço. É uma
forma de ajudar o aluno a buscar por si mesmo as respostas às questões
apresentadas, explorando os temas em busca de seu significado. Essa
capacitação do estudante é o que vai ajudá-lo a assimilar as experiências
ao longo da vida, de forma que elas contribuam para enriquecê-lo cada
vez mais.
Mas isso levanta uma questão fundamental na pedagogia: o que
ensinar? O currículo de um curso está afinado com o seu próprio objetivo e
finalidade. Se nos propomos a formar jornalistas, devemos ensinar
jornalismo.
Porém, a questão não é tão simples. Jobim refere-se à formação de
jornalistas, em primeiro lugar, e, em segundo, à formação eventual de
especialistas em investigação sobre informação e opinião pública como
finalidades do curso. E embora ele enfatize o caráter profissional do curso,
adverte que isso não significa relegar a um plano secundário as disciplinas
de caráter cultural.
Isto sequer seria possível. Como formar jornalistas sem os conhecimentos
culturais necessários para a compreensão do mundo? Pelo contrário,
Jobim (1964) defende que o aprendizado deve buscar “formar na mente do
estudante os valores utilitários, culturais e disciplinares que se tornam
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 133
necessários para a atividade jornalística”. Ele atribui à escola a
responsabilidade da informação, com o cultivo e com a disciplina da mente
do estudante, sendo: a informação relacionada à profissão e seus
problemas, o cultivo da mente associado às atitudes correspondentes aos
ideais da vida jornalística, e a disciplina como forma de reforçar no aluno
as condições para que ele adquira as habilidades relacionadas com as
técnicas profissionais.
Essas seriam as condições para se criar um modelo adequado de
jornalista, considerando a importância da imprensa dentro da sociedade
moderna. O ensino do jornalismo seria um conjunto global de informações
que pudesse formar jovens qualificados para representar esse ideal de
imprensa concebido na mente das pessoas.
Essa questão já responde o porquê da necessidade de não se
ensinar apenas as técnicas jornalísticas. Com pretender que o aluno tenha
uma visão de mundo aprendendo como se faz um lead? O jornalismo não
é apenas um conjunto de técnicas e habilidades aplicadas a um fim
puramente pragmático.
Da mesma forma que em outros cursos, a aprendizagem não pode
estar associada unicamente a um aspecto técnico. Seria o mesmo,
compara Jobim, de se formar um cirurgião a partir do ensino unicamente
da Prática Cirúrgica. O médico emprega mais que seus conhecimentos
técnicos para abrir um abdômen de um paciente. “Em toda sua visão do
campo científico da profissão, toda sua personalidade enriquecida por uma
série orgânica de conhecimentos adquiridos na universidade, toda sua
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 134
consciência profissional formada e amadurecida com o contato com os
mestres; é tudo isso que o capacita para exercer de modo cabal e
responsável seu ofício de médico ou de cirurgião”. Mesmo a partir de
disciplinas que talvez nunca sejam utilizadas na vida profissional, o fato de
ter tido contato com elas favorece uma mente aberta para novos
conhecimentos e novas descobertas.
5
5
.
.
4
4
.
.
1
1
O
O
q
q
u
u
e
e
s
s
e
e
e
e
n
n
s
s
i
i
n
n
a
a
n
n
a
a
e
e
s
s
c
c
o
o
l
l
a
a
d
d
e
e
j
j
o
o
r
r
n
n
a
a
l
l
i
i
s
s
m
m
o
o
O que pretendemos demonstrar é que, a partir da visão de Danton
Jobim, tudo que se ensina em uma escola de jornalismo é jornalismo. Do
currículo faz parte uma série de conhecimentos necessários para a
formação do jornalista. Dessa forma, Jobim considera que a “matéria
jornalismo” é igual a Literatura mais História, mais Geografia, mais
Sociologia, mais Economia e outros ramos do conhecimento humano,
somadas à disciplinas características, como Legislação e Administração,
às quais se somam as técnicas jornalísticas especializadas. Qualquer
matéria que adicione conhecimentos necessários para a formação de um
jornalista deve fazer parte do currículo, da mesma forma que as que não
tenham utilidade devem ser excluídas.
No entanto, não é tão simples perceber o que é útil e o que é inútil
na organização de um currículo. Nesse sentido, Celso Cunha
11,
11
In: Jornalismo e Universidade, MEC, Rio de Janeiro, apud Jobim, 1964.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 135
catedrático de Português e Literatura da Faculdade Nacional de Filosofia,
lembrava:
Inegável a importância da aprendizagem metódica e
especializada [de jornalismo]. Não é fácil, não obstante, fixar um
currículo das disciplinas necessárias para a formação
profissional do jornalista. Em outros cursos o problema não se
reveste da mesma complexidade (...) ao jornalista, em certo
sentido, tudo o interessa.
Por certo, esse era o motivo de no relatório apresentado no
Seminário do Ciespal ocorrido em Quito, em 1958, se encontrar uma tão
grande diversidade de currículos na América Latina nos cursos de
jornalismo. Naquele momento, o professor Héctor Mujica, da Venezuela,
apontava existir o que ele chamava de “autêntica anarquia", considerando
haver uma tendência humanística e teorizante, em detrimento da
capacitação técnica.
É verdade que essa era uma situação muito presente naquele
momento, principalmente considerando-se a falta de laboratórios e
adestramento profissional adequados. Havia também a questão do
despreparo dos professores de jornalismo, que até então não buscavam
qualificação adequada para ministrar aulas. As instituições universitárias
não conseguiam dar aos alunos o treinamento prático necessário por falta
de equipamentos didáticos apropriados, o que transformava o currículo
num amontoado de disciplinas teóricas. É evidente que as reclamações
consideravam muito mais essa questão do que praticamente a formação
humanística oferecida. Mas é bom lembrar que sempre é mais fácil
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 136
assimilar as técnicas profissionais do que formar uma cultura geral,
conforme insistia Jobim, considerando inclusive que a diversidade dos
currículos é muitas vezes útil e necessária, já que possibilita o ajustamento
à realidade de cada região – caso inclusive do Brasil, que tem vasta área
geográfica e muita diversidade regional.
5
5
.
.
4
4
.
.
2
2
A
A
s
s
h
h
u
u
m
m
a
a
n
n
i
i
d
d
a
a
d
d
e
e
s
s
n
n
o
o
c
c
u
u
r
r
s
s
o
o
d
d
e
e
J
J
o
o
r
r
n
n
a
a
l
l
i
i
s
s
m
m
o
o
A importância do ensino das humanidades no curso de jornalismo
está associada à formação de uma cultura geral. “É mais fácil fazer um
bom jornalista de uma pessoa culta, que nunca entrou numa redação, que
de outra que, conhecendo os segredos ou truques do ofício, não possui
um nível razoável de cultura geral”, assegurava Jobim, que já tinha
vivenciado na redação do Diário Carioca a experiência de formar
jornalistas.
Defendia, inclusive, que as disciplinas culturais não poderiam ter um
papel de segundo plano na formação do aluno, considerando que elas
eram uma “porta aberta ao trato inteligente dos problemas mais diversos”.
Mas, como em sua visão tudo o que é ensinado no curso faz parte
da grande disciplina “jornalismo”, a questão que se coloca é como mesclar
as disciplinas humanísticas com as técnicas da profissão dando um
formato de unidade? A mesma pergunta foi levantada no “Seminário sobre
a Formação de Jornalistas”, ocorrido no Rio de Janeiro, em 1958, quando
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 137
se sugeriu que as escolas buscassem a coordenação dos elementos
culturais e técnicos. Recomendou-se que, na parte humanística, fosse
dada preferência ao ensino formativo, com maior destaque às disciplinas
que “ensinam a pensar e a ordenar as idéias, a conhecer e penetrar na
realidade nacional e internacional, a interpretar o sentir coletivo e a
consolidar as normas morais que regem o exercício da profissão”.
Jobim exemplifica essa proposta com a disciplina História da
Civilização. O enfoque a ser dado nessa matéria, diz ele, deve priorizar
preferencialmente épocas e aspectos da evolução humana que estão mais
ligadas às necessidades da profissão. Embora não existam diferentes
histórias da civilização para uma ou outra profissão, existe a necessidade
de o jornalista conhecer determinados aspectos da história da
humanidade, possibilitando, a partir disso, que ele interprete melhor e sem
distorções o seu próprio tempo. Desta forma, justifica, capacita-se o
jornalista para escrever, por exemplo, crônicas, que faz parte do seu ofício.
A verdade é que sem os fundamentos de uma cultura bem
diversificada, a escola fracassa em sua missão, que é, acima de tudo, a
educação para o jornalismo. O caso da História ilustra muito bem essa
relação cultura e jornalismo.
Em "The use of History", A.L. Rowse acentua que, talvez, não
por simples coincidência, alguns dos mais vigorosos
comentaristas da imprensa de Londres, "homens que
desempenham grande papel na formação de uma inteligente
opinião pública em assuntos internacionais" - como o
editorialista internacional do "Times"; "Candidus" do Daily
Sketch; "Scrutator" do Sunday Times - são mentalidades
embrenhadas historicamente; dois deles são, por direito próprio,
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 138
distinguidos historiadores e "Candidus" alimenta uma paixão
devota pela matéria". (JOBIM, 1964, p. 63-64)
Embora seja uma disciplina oferecida no curso secundário, no curso
superior a História passa por um aperfeiçoamento, buscando elevar o nível
de conhecimento do estudante. É bem verdade que não se pretende
formar historiadores, mas sua contribuição à cultura geral é fundamental
na formação de um jornalista, até para que ele possa entender, a partir do
passado, a realidade de seu tempo, associando conhecimentos.
Jobim insiste que não há secretário de redação que não tenha
constatado que é mais fácil fazer um bom jornalista de uma pessoa culta
que desconhece todas as técnicas e truques da profissão do que de
alguém que, mesmo com experiência jornalística, tenha um baixo grau de
instrução geral. Existem exceções, sem dúvida, de jornalistas ou
proprietários de jornais que, no passado, conseguiram destaque mesmo
com uma formação deficiente, mas elas fogem à regra geral. A história da
imprensa mostra casos como esses quando o nível superior ainda não era
exigido. Mesmo assim, continuam sendo exceções, principalmente se
considerarmos o mercado de trabalho atual, cada mais exigente e seletivo.
A realidade do jornalista atualmente é outra. É verdade que muitos
jovens, mesmo com a graduação concluída, possuem um grau de
conhecimento geral que deixa muito a desejar. Os que se sobressaem, no
entanto, são aqueles que, a partir de uma forte cultura geral interpretam os
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 139
acontecimentos, acrescendo de qualidades os seus textos e informações.
Ou como disse Susanne Marie Durant (apud JOBIM, 1964, p. 68):
O estudo das letras (melhor seria dizer das “humanidades”) abre
ao espírito o caminho da verdade, porquanto o leva, ao menos,
à dúvida e à crítica, garantia preciosa contra o erro e pára-raios
contra a propaganda. Aguça também o espírito de sutileza, o
sentido das gradações, a penetração psicológica, dons mais
preciosos para o conhecimento do homem, que nossas
experiências de laboratório, onde o psiquismo parece dissecado
pelo bisturi.
Essa capacidade de interpretação e crítica, se já é importante em
todas as profissões, torna-se essencial para o profissional que tem por
obrigação informar. A variedade de contradições que se encontra nas
diferentes opiniões e pontos de vista necessita alguém com uma
qualificação diferenciada, capaz de levar ao público “a imagem tão fiel
como humanamente possível, da complexa e dinâmica realidade”.
Profissionais que possam escolher e relacionar fatos, descrevendo e
interpretando, e, finalmente, apresentando à sociedade uma visão
equilibrada dos acontecimentos.
Esse é um profissional que já nasce pronto, diriam alguns, que
ainda insistem em queixar-se da obrigatoriedade do diploma de jornalismo.
Muitos nascem, é verdade, com uma inteligência mais acentuada e com a
característica da curiosidade. Mas é, sem dúvida, a partir do interesse pela
educação que essas qualidades se acentuam ou não. É possível adquirir
conhecimentos e habilidades necessários para a prática do jornalismo (e
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 140
de outras profissões, é claro) através do estudo e da valorização do
conhecimento que organiza a concatenação de fatos.
Converter os fatos em notícias, narrá-los, descrevê-los, comentá-
los, interpretá-los, é aí que se mostram necessários os atributos
tipicamente literários que estão ligados a uma rede de conhecimentos de
que o jornalista não pode escapar. Aí está o elo com a formação
humanística essencial para o desenvolvimento da profissão. É o caso do
jornalismo francês, inferior ao norte-americano em técnicas, segundo
Jobim, mas que conserva “a primazia na excelência do relato, ou seja, na
apresentação literária, ainda que do ‘fait-divers’
12
, quando merecido pela
sua relevância”.
Mas mesmo a simples notícia pede a capacidade de síntese, de
recompor a realidade fragmentada do cotidiano, de forma que o leitor
possa assimilar a informação. Esta qualidade não pode ser encontrada no
jornalista sem preparo, em razão da necessidade de integrar os fatos,
discernir o que é fundamental nos dados captados pelo repórter. A falta de
cultura se traduz no jornalismo pela insegurança no texto. A cultura, ao
contrário, leva-o em busca de novas investigações, novas revelações, que
assegurarão um texto preciso. É essa ânsia pela aventura intelectual, a
curiosidade frente ao desconhecido que faz surgir um grande repórter.
12
“Fait-divers” significa fatos diversos, geralmente associados a escândalos, curiosidades e
bizarrices; é sinônimo de imprensa popular e sensacionalista, embora esteja cada vez mais presente
nos veículos tradicionais, principalmente na televisão. De acordo com Annik Dubied e Marc Lits
(Les Fait Divers. Paris, PUF, 1999), é uma “representação do extraordinário ordinário”, uma
espécie de pequena história do cotidiano, sem grande alcance, num espaço global menor e mais
próximo da vida das pessoas. Com origem nas histórias orais do século XVI, associado a crimes,
delitos e catástrofes, entre outros, surgiu na imprensa popular no século XIX.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 141
Jobim (1964, p. 70-71) traça alguns paralelos:
Ninguém poderá confundir, é certo, o ensaio de um filósofo com
o artigo de um jornalista. Mas nos artigos de um Raymond Aron
ou de um Walter Lippman, grandes expressões do jornalismo
francês e norte-americano, não estarão porventura
condensadas toda sua vasta cultura humanística e sua
coroação, a cultura filosófica? (...) Lippman ou Aron não se
fizeram bons jornalistas porque adquiriram as habilidades
técnicas, o know-how do jornalismo. Isto foi um aditamento a
sua ampla cultura geral, por simples acessão. São casos em
que a maturidade intelectual, conferida por uma excelente
formação de tipo humanístico, elimina as dificuldades do
“metier” e propicia a rápida apreensão dos procedimentos
técnicos ou profissionais.
5
5
.
.
4
4
.
.
3
3
O
O
e
e
n
n
s
s
i
i
n
n
o
o
d
d
a
a
G
G
e
e
o
o
g
g
r
r
a
a
f
f
i
i
a
a
e
e
d
d
a
a
H
H
i
i
s
s
t
t
ó
ó
r
r
i
i
a
a
n
n
a
a
E
E
s
s
c
c
o
o
l
l
a
a
d
d
e
e
J
J
o
o
r
r
n
n
a
a
l
l
i
i
s
s
m
m
o
o
A grande vantagem do homem sobre os animais é aprender e
descobrir o significado das coisas. É essa significação que indica a
distância entre a civilização e a selvageria (DEWEY, 1936). O caminho
mais fácil para atingir e reter esse conhecimento é através do aprendizado
das experiências vivenciadas, fundidas com aquilo que foi ensinado ou
informado por outro. E essas experiências dizem respeito à relação do
homem com a natureza.
É nesse sentido que a Geografia e a História contribuem para o
conhecimento, por serem por excelência disciplinas informativas. É a
análise de seus materiais e seus métodos que farão a diferença entre a
mera acumulação de informações isoladas e a penetração dessas
informações na experiência viva do homem. Por essa razão, são matérias,
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 142
segundo Jobim, imprescindíveis em um currículo universitário de
jornalismo. “Poucas apresentam cunho tão eminentemente ‘enciclopédico’
e se ajustam tão bem a um plano de estudos que leve à conquista da
cultura geral”.
Estudar Geografia, diz Dewey, é aumentar a faculdade de perceber
as relações espaciais, naturais, de um ato ordinário, enquanto estudar
História é a forma de assegurar o aumento da capacidade de reconhecer
as relações humanas do mesmo ato. Geografia e História proporcionam a
dupla dimensão do que se passa na superfície da terra: tempo e espaço.
O ensino da Geografia para jornalistas
Se a História preserva a obra do homem, a Geografia explica o que
se passa na superfície do planeta. Para o homem, tudo na Geografia deve
interessar, já que está relacionado às atividades do homem sobre a terra,
num esforço milenar de dominar o meio geográfico.
São diversos os aspectos da Geografia que devem ser ensinados
(geografia física, matemática, astronômica etc.), mas, segundo Jobim, é a
geografia biológica ou biogeografia a que mais diretamente interessa na
formação do jornalista, embora reconheça que não devemos nos enganar
pelas divisões da ciência. Tudo o que se passa na superfície do planeta,
em função das atividades que nele se desenvolve, deve ser de interesse
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 143
porque, no mundo das preocupações científicas tudo começa e tudo
termina no homem.
A Geografia é ponto de convergência de muitas ciências e, por isso,
pode ser considerada como uma ciência “enciclopédica”, por causa dos
conhecimentos ecléticos que exige e da enormidade de seu campo. Seus
benefícios, de acordo com Demangeon (apud JOBIM, 1964), são suas
condições de localizar, descrever e comparar, explicando os fatores dos
meios em relação com o homem.
Jobim acrescenta que, assim como a Geografia, o jornalismo
também localiza, o jornalismo descreve e o jornalismo compara. “Antes de
ser notícia, o fenômeno é geografia. Sua importância para o jornalismo
está relacionada com sua localização, isto é, com o meio que a
condicionou”.
É através do seu ensino que o estudante poderá ter uma ampla
compreensão dos problemas sociais, econômicos e políticos do mundo,
através do conhecimento sobre a distribuição dos povos e raças no
planeta, dos diferentes recursos econômicos, da circulação da riqueza,
tudo isso em níveis regionais, nacionais e mundiais.
Na verdade, como escrever sobre conflitos ou economias distantes
geograficamente sem conhecimento da geografia humana. É através da
comparação que se é capaz de atingir o conhecimento sobre as coisas e
se pode explicar o significado dos fatos.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 144
Cada um dos acontecimentos está, sem dúvida, integrado ao meio
geográfico, por isso, a capacidade de compreensão dos fatos está
associada ao conhecimento geográfico do jornalista. É inconcebível um
jornalista que desconheça o que se passa no mundo. Se isso já era uma
realidade no século passado, quando as duas grandes guerras mundiais
invadiam as páginas dos jornais, que dirá num mundo globalizado como o
de hoje, quando informações sobre os acontecimentos dos países do outro
lado do planeta estão disponíveis na internet ao mesmo tempo em que os
acontecimentos do nosso bairro. É o conhecimento de geografia que dará
maiores oportunidades ao jornalista de informar com qualidade e
interpretar com qualidade os fatos. E essa é a forma de o jornalismo
contribuir para o progresso social, apoiado no conhecimento.
Universalismo, compreensão entre os povos, interesse e ideais
humanísticos: eis aqui o resultado do desenvolvimento do
pensamento geográfico no homem. Na formação do jornalista,
que maneja um dos mais poderosos instrumentos de ação
social, essa predisposição, essa atitude é particularmente
importante, pelas possibilidades que oferece de influir na
opinião pública através da criação ou do fortalecimento, na
imprensa, de objetivos mais altos que a simples satisfação da
curiosidade dos leitores (JOBIM, 1964, p.75)
Como já citamos anteriormente, Jobim defendia que na Geografia a
ênfase deve ser dada à Geografia Humana. Para ele, é tarefa do jornalista
descrever a aventuras do homem em seu meio, assim como para o
geógrafo. Mas este estará amparado por diferentes áreas de especialidade
da Geografia, utilizando a colaboração de ciências físicas, biológicas e
sociais. Ao jornalista, pelo contrário, importa principalmente a relação da
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 145
Geografia com as ciências sociais, que são aquelas que olham
diretamente o homem em ação na superfície da Terra.
Jobim utiliza o currículo da então Escola de Jornalismo da
Faculdade Nacional de Filosofia e Letras da Universidade do Brasil como o
modelo adequado de ensino de Geografia para jornalistas. Reservava-se
um ano letivo à disciplina e a matéria se dividia em duas partes: o primeiro
semestre era destinado ao estudo de Geografia Humana e o segundo era
voltado à Geografia Econômica.
Dessa forma, a primeira parte voltava-se aos princípios e noções
essenciais da Geografia, passando-se ao estudo das populações e ao
estudo do “habitat”, onde os alunos tratavam de questões como “a
distribuição geográfica, a composição das populações, os movimentos
migratórios, a colonização, assim como os tipos de habitação, a noção do
habitat rural e do habitat urbano, com o estudo da cidade como paisagem
geográfica e dos tipos funcionais de cidade”.
No segundo semestre, associavam as regiões naturais ao seu
aproveitamento pelo homem, tratavam da questão agrícola e industrial e
da circulação de riquezas, incluindo os problemas relativos aos
transportes. Jobim acrescenta que o programa da geografia humana não
era distinto do programa destinado a formar geógrafos. O enfoque da
matéria é que determinava as diferenças de objetivo, assim como as
técnicas de ensino.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 146
O ensino da História para jornalistas
Assim como a Geografia, a História é essencial dentro dos estudos
jornalísticos. Isto porque para descrever e interpretar os fatos do presente
é necessário entender suas raízes que estão no passado. “Não se
conseguiria explicar, evidentemente, as forças sociais que atuam em
nossos dias senão pelo estudo de sua evolução, que é a própria história”,
assegura Jobim, para quem retratar uma imagem do presente só é
possível através da reconstrução do passado.
A profissão de jornalista é a que mais, além da de historiador,
requer consciência histórica. E embora o historiador e o jornalista tenham
perspectivas diferentes, porque o passado para o jornalismo é o dia de
ontem, o método de trabalho dos dois é semelhante. O repórter investiga
e, de certa forma, descreve a história e tenta interpretar. Mesmo não
sendo ainda história, será dentro de algum tempo. Os passos para
levantar os fatos são os mesmos: pesquisa, seleção, descrição e crítica.
Isto, hoje, é notícia. Mas é fundamental reconhecer o papel do repórter
que, em seus dias, cumpre sua tarefa de transmissão da história de
amanhã. E é por essa razão que o acervo dos jornais oferece dados
fundamentais para os historiadores.
Mas como realizar essa tarefa sem ter clara uma imagem do seu
tempo e a base de cultura que proporcione essa compreensão? Aí está a
importância da História: é através do seu estudo que será proporcionado
ao futuro jornalista a mentalidade histórica, a capacidade de dar à notícia
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 147
de jornal um valor permanente, uma importância que “transcende o
conceito do efêmero cotidiano”.
Talvez, por isso, John Bevin (apud JOBIM, 1964) tenha escrito
acerca do noticiário do Times, de Londres, “um jornal culto para gente
culta”: “O Times não considera a notícia como um fenômeno isolado, mas
sim como uma ruga na superfície da História”.
O curso de História não pretende, assim como o de Geografia,
formar especialistas. Tem como função fazer com que o estudante adquira
uma base de cultura histórica visando uma atitude profissional para o uso
desses fatos.
Mas que aspectos da História se deve ensinar? Jobim responde:
aqueles que “melhor se ajustam à finalidade do curso”. História da
Civilização, por exemplo, é “a disciplina que assegura uma visão total da
evolução das instituições; que põe ênfase na unidade da história humana;
que acentua o caráter artificial da divisão da história em períodos
cronológicos”. Apesar do seu caráter formativo, deve ter para o jornalista
um caráter muito mais informativo. É importante que o estudante tenha
idéia das bases econômicas, sociais e políticas de que se serviram as
sociedades mais remotas, para entender a evolução dos povos. A
compreensão da história contemporânea só é possível com uma visão de
conjunto da história humana.
Dewey (1936) também acredita que a História tem, por excelência,
um caráter informativo. Isto porque põe em relevo aspectos sociais do
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 148
homem, ou melhor, a vida em sociedade, assim como o ambiente desses
acontecimentos, que é a natureza.
Quando nos esquecemos desta interdependência do estudo da
história, que põe em relevo o elemento humano, com o estudo
da geografia, que salienta o elemento natural, a história
degrada-se tornando-se uma lista de datas, comum apêndice de
acontecimentos rotulados de “importantes”; ou então converte-
se em fantasia literária – pois na história puramente literária o
ambiente natural é apenas uma encenação teatral (DEWEY,
1936, p. 266-267).
O passado, simplesmente como passado, não nos interessa. Mas o
passado de que trata a História é a história do presente. A partir do estudo
das descobertas, exploração e colonização de um país, isto é, da sua
formação, tem-se a compreensão do país nos dias atuais, de aspectos
complexos que poderiam não ser facilmente entendidos partindo de uma
análise isolada.
O estudo biográfico também reconstitui as vidas de grandes
homens da história, trazendo luz aos episódios que seriam
incompreendidos. Esse tipo de análise não deve ser isolada, ligada
unicamente a aspectos psicológicos dos indivíduos, mas deve considerar
os atos do homens com a vida social, que é a associação de indivíduos.
O estudo da vida primitiva fornece os elementos necessários para
entender a história das indústrias. Compreende-se o percurso por qual
passou a humanidade, os problemas que precisaram ser vencidos com as
sucessivas invenções que possibilitaram o desenvolvimento da cultura
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 149
humana, a partir da compreensão de como foram resolvidos os problemas
fundamentais de subsistência, abrigo e proteção dos povos primitivos.
Dessa forma, além de nos proporcionar as razões do progresso social,
remete-nos a condições importantes da vida humana, como os valores que
associam o trabalho à recompensa.
Esse ramo da História dá oportunidades de se entender o
desenvolvimento científico e a luta do homem por uma progressiva
adaptação das forças naturais para usos sociais, proporcionando conhecer
os avanços dos métodos e resultados do conhecimento. Destaca não os
generais, os diplomatas e os políticos, mas os cientistas que forneceram
ao homem instrumentos de progresso da civilização, apontando a
superação dos obstáculos pela inteligência.
A História também é responsável pela transmissão de valores
éticos. Traz, a partir da análise de tempos passados, a compreensão das
forças que criaram os padrões atuais de comportamento social. Aponta
questões morais sobre virtudes e vícios. Mostra a construção da base
moral da sociedade.
Este é um ponto fundamental na formação dos jornalistas,
principalmente considerando o papel que a imprensa tem na sociedade,
como orientadora e formadora de opinião. Jobim (1964) lembra que, nesse
aspecto, o ensino da história nacional deverá considerar as questões
éticas da história do país, servindo como instrumento de aperfeiçoar a
questão da cidadania.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 150
A História Contemporânea deve ser priorizada em razão do seu
caráter quase profissional para o jornalista, já que é uma ferramenta
imprescindível em seu ofício. A união dessas duas contempla a
proximidade no espaço (História Nacional) com a proximidade no tempo
(História Contemporânea), aspectos que estão associados aos interesses
da notícia.
5
5
.
.
4
4
.
.
4
4
O
O
e
e
n
n
s
s
i
i
n
n
o
o
d
d
a
a
L
L
í
í
n
n
g
g
u
u
a
a
e
e
d
d
a
a
L
L
i
i
t
t
e
e
r
r
a
a
t
t
u
u
r
r
a
a
n
n
a
a
E
E
s
s
c
c
o
o
l
l
a
a
d
d
e
e
J
J
o
o
r
r
n
n
a
a
l
l
i
i
s
s
m
m
o
o
Considerada por Cunningham (1975) como a disciplina da
expressão, o ensino da língua apresenta dois aspectos: o primeiro
relaciona-se com o treinamento para o aluno exprimir suas próprias idéias
no discurso falado ou escrito; e o segundo visa capacitar o estudante a
compreender as idéias alheias. Pode-se dizer que a responsabilidade por
esse ensino está nos cursos fundamental e secundário. No entanto, essa
não é a realidade encontrada entre os alunos ingressantes nos cursos
superiores.
Por essa razão, é uma das disciplinas obrigatórias em qualquer
escola de jornalismo. É tão essencial que Jobim resiste em classificá-la
entre as matérias não profissionais. Sem o estudo da língua seria
impossível, com certeza, formar um bom jornalista. O bom manejo do
idioma “é condição essencial, básica, para o correto exercício da profissão
de redator e de repórter”.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 151
O professor lembra que a história do jornalismo já conviveu com
episódios onde a figura do “jornalista analfabeto” esteve presente,
principalmente com a introdução do modelo da imprensa norte-americana
nas redações, quando se valorizou o repórter que trabalhava, não com a
cabeça, mas sim com as pernas, o que caminhava em busca de notícias.
A questão se tornou mais grave quando a legislação brasileira considerou
jornalistas os “profissionais que informavam por telefone sobre acidentes e
crimes, ainda que não escrevessem”. Jobim queixa-se de que naquele
momento privava-se o ofício de seu “status de profissão culta, no plano
das profissões liberais”.
Mas essa não é a formação que a escola de jornalismo pretende
dar aos seus alunos. Sua proposta não é ensinar a narrar os fatos por
telefone ou oralmente, mas formar um profissional que possa narrá-los ao
público por escrito, com os atributos e normas da língua, com clareza,
correção e concisão. Principalmente por ser um instrumento indispensável
para a comunicação entre os homens, é fundamental para o desempenho
da profissão jornalística, que exige a reflexão sobre os fatos.
A capacidade de se expressar do ser humano por meio de uma
linguagem articulada nada mais é do que uma conseqüência do ato de
pensar. Através dessas duas faculdades – o pensamento e a expressão –,
o homem, com o passar dos séculos, acumulou o que chamamos de
herança social (CUNNINGHAM, 1975). A linguagem não é a única forma
de expressão humana, mas são as palavras que predominam no exercício
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 152
dessa função. Mais do que um meio de comunicação, a linguagem é um
instrumento do pensamento.
Como dissemos, é inadmissível formar um profissional cuja
atividade se exerce através da interpretação dos acontecimentos, sem
conduzi-lo ao manejo adequado da língua, disciplinando sua mente para o
exercício das funções intelectuais necessárias para o desenvolvimento do
de seu ofício, já que a linguagem nos apresenta um juízo de fatos e um
juízo de valor.
A língua é um instrumento intelectual criado para representar idéias,
pensamentos e emoções. As questões do nosso mundo interior, as
questões afetivas, são exteriorizadas verbalmente em termos intelectivos,
tomando a forma de idéias, de ordenação intelectual. Mas é também um
instrumento cultural, já que é por meio do seu aprendizado que entramos
em contato com os “valores culturais traduzidos pela literatura”.
Para Jobim, o aprendizado da língua deve ser predominantemente
literário, sempre vinculado à interpretação dos textos. Mesmo com a
linguagem não tendo uma finalidade estética, sua função é biológica e
social e traz um aspecto de criação artística. Dessa forma, apóia sua
opinião nas idéias de Luiz Juan Guerrero (apud MIRANDA SANTOS,
1955), que assegura que:
No relato mais simples, na carta mais simples ou na lição mais
repetida, pomos uma veio de poesia que apenas se percebe
algumas vezes, mas que em outras vezes transforma tudo o
que dissemos.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 153
Jobim ressalta que o valor do estudo da literatura não está apenas
no caráter normativo da matéria, mas na possibilidade de acompanhar a
experiência humana ricamente disponível na literatura. “Através da leitura
vivemos experiências alheias, voltamos a formular questões, voltamos a
pensar soluções, reações e sugestões, aprendemos coisas”, explica o
autor, garantindo que o único método de aprender é viver os problemas
que a vida apresenta. Ou como afirma Clotilde Rezzano (apud JOBIM,
1964): “Sem experiência pessoal não há idéias; sem idéias as palavras
não têm conteúdo ideológico (...)”.
Num curso de jornalismo, é fundamental que o professor de língua e
literatura trabalhe em parceria com os professores de técnicas de
jornalismo. É evidente que os textos utilizados devam ser textos literários,
mas podem incluir textos jornalísticos de valor literário, já que o aluno
trabalha textos jornalísticos em demasia na disciplina específica. Mas um
bom método de ensino está apoiado no estudo de texto e na prática da
redação, seguindo a recomendação do “aprender fazendo”, comum
durante todo período de aprendizado. É a partir do treino da escrita que se
forja o bom estilo. E é a partir da leitura de grandes obras, onde se
encontram “as mais puras e elevadas formas de expressão”, que se
aprende a escrever bem.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 154
5
5
.
.
4
4
.
.
5
5
E
E
n
n
s
s
i
i
n
n
o
o
d
d
a
a
s
s
d
d
i
i
s
s
c
c
i
i
p
p
l
l
i
i
n
n
a
a
s
s
p
p
r
r
o
o
f
f
i
i
s
s
s
s
i
i
o
o
n
n
a
a
i
i
s
s
Após tratarmos da base cultural necessária a um profissional de
jornalismo, abordaremos a visão de Jobim sobre as disciplinas técnicas do
curso, ou do que Jobim chama de disciplinas profissionais. É importante
lembrar que, naquele momento, poucas disciplinas desse tipo faziam parte
do currículo do curso da Universidade do Brasil: Técnica de periódico
diário, Técnica de periódico não diário, Administração de periódicos,
Publicidade e Radiojornalismo.
Embora Jobim levante a questão da necessidade de equipamentos,
percebe-se que essa questão está ligada à motivação dos alunos. Um dos
meios de se motivar é procurar dar aos alunos uma atmosfera jornalística,
o que ele acredita ser possível por meio de uma redação-escola. Assim,
seria possível colocar o aluno em contato com a atmosfera jornalística,
trabalhando as fases do processo jornalístico de forma mais próxima
possível da realidade. Essa redação deveria ter os mesmos equipamentos
disponíveis em uma redação tradicional, e a cobrança de prazos também
deveria ser semelhante à realizada num jornal, com o maior controle
possível das atividades realizadas pelos alunos. Eles seriam responsáveis
por todo o processo, desde a redação das notícias até a montagem final
do jornal.
Por isso, a redação-escola deve ser complementada com um
laboratório gráfico, com técnicos capazes de executar os projetos
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 155
elaborados pelos alunos, sob a coordenação do professor. Jobim (1964,
p.19) explica a importância desse trabalho:
Os alunos-jornalistas precisam trabalhar, em aula ou fora dela,
em tarefas jornalísticas com a disposição de espírito de quem
deve formar textos que serão compostos, impressos e
distribuídos. Deve saber que não está brincando de jornalismo
quando o professor, operando como chefe de redação, o instrui
a averiguar e relatar uma notícia, fazer uma entrevista ou
elaborar um comentário. Deve assegurar-se de que sua obra vai
ser amplamente divulgada, lida e possivelmente criticada por
seus colegas e por profissionais interessados nas experiências
do curso. Isso provocará nos alunos o amor próprio e estimulará
o sentido da responsabilidade, fazendo com que eles levem a
sério as tarefas práticas.
Como já dissemos, o professor vê essas atividades práticas como
fator de motivação do estudante, entendendo que o fato de ver sua
matéria publicada levará o aluno a produzir com seriedade seu trabalho.
Mas sabemos que, na realidade, não são todas as escolas que
proporcionam laboratórios adequados aos estudantes e nem mesmo a
possibilidade de verem seus trabalhos publicados em jornais-laboratórios
ou revistas, embora a legislação exija que assim seja. Muitos jornalistas
formados passaram pelas escolas sem ter a oportunidade de ver seus
textos aproveitados, não por falta de qualidade, mas por falta de
laboratórios adequados ou veículos apropriados.
Como agir o professor diante dessa situação? Como ensinar a
prática sem as condições necessárias? Este, sem dúvida, é um dos
maiores desafios impostos aos mestres, que, diante de problema não
devem desanimar. É verdade que um ambiente adequado, próximo do
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 156
profissional, ajuda as atividades. Mas um jornalista escreve suas matérias
em qualquer lugar, não necessariamente dentro da redação. A
organização das atividades adequadamente deve ser a resposta do
professor à falta de espaços e equipamentos úteis, mas não
imprescindíveis. É nesse momento que a habilidade do professor se
sobressai, levando os alunos a superar as falhas pela ausência dos meios
auxiliares.
Um bom plano de ensino pode prever e superar os percalços
causados pela falta de equipamentos. O professor deve prever modelos
substitutos para as atividades práticas. Se a escola não tem ambientes
próximos aos dos jornais, é importante levar os alunos a visitar redações
para que possam entender seu funcionamento.
Jobim sugeria que o professor, além de publicar jornais-laboratórios,
buscasse acordos com empresas jornalísticas para a publicação de
trabalhos selecionados dos alunos, revisados pelo docente e escolhidos
entre os melhores. Mesmo que exista uma publicação do curso, a
possibilidade de o aluno publicar num veículo externo pode se constituir
num excelente meio de despertar seu interesse e produzir resultados de
grande qualidade.
Nesse ponto, o autor enfatiza um dos pontos cruciais do ensino do
jornalismo: a relação da escola com as empresas jornalísticas, que são as
que se beneficiam da formação adequada do aluno. Nesse ponto, é
importante levantar questionamentos que se diferem da visão de Jobim.
Enquanto ele entendia que essa aproximação era fundamental para o
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 157
ensino do jornalismo, muitos pesquisadores mais recentemente discutem o
papel do curso não como um mero repetidor do que se faz no meio
profissional, mas como capaz de criar novos modelos e de melhorar a
qualidade do jornalismo que se pratica.
É bem verdade que a universidade tem um papel que vai além da
mera adestração do profissional. Ela tem como objetivo, como lembra
Paulo Renato Souza (1990-1991, p.30), a busca pela qualidade
acadêmica, porque “mesmo inserida num país de terceiro mundo, mesmo
sustentada por uma sociedade que apresenta ainda carências bem
elementares para parcelas significativas do seu todo, a universidade deve
buscar o seu valor universal. Mas, da mesma forma, como ressalta o
autor, deve buscar “o grau de vinculação ou conexão com a sociedade na
qual se insere e que lhe dá sustentação”.
Por isso, Jobim entendia que era essencial o contato permanente
da universidade com o mercado, que deveria abrir oportunidades para que
os estudantes praticassem sua futura profissão dentro das empresas. Mas
deixava claro que esse processo não deveria ser percorrido sozinho pelo
aluno. Não se tratava apenas de abrir espaço para que o estudante
pudesse atuar, mas de possibilitar que o professor acompanhasse suas
atividades. Com sua prática nas redações, Jobim percebia que o aluno
abandonado numa redação adquire rapidamente os erros e vícios dos
profissionais mais medíocres que, embora não sejam os mais qualificados
para servirem de instrutores, são os que geralmente estão disponíveis
para tais fins.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 158
Assim, é incrível a avidez com que o estudante se apodera do
jargão jornalístico naquilo que tem de detestável: a insistência
no uso de expressões estereotipadas e convencionais, que
matam na origem a vivacidade do estilo, como a riqueza, a
plasticidade e a propriedade da linguagem. Tal insistência cria
hábitos condenáveis, verdadeiros jargões expressionais, que a
escola dificilmente extirpará. Adotam certo garbo os recém
chegados à redação, escrevendo não na língua usual ou na
literária, mas naquela que os americanos chamam,
pejorativamente, o journaleese. (JOBIM, 1964, p.22)
Desse modo, o aluno poderá fazer sua prática, desde que não lhe
falte a supervisão e a orientação do professor que, embora não possa
estar presente ao lado do estudante em seu período de trabalho, poderá
acompanhar por meio de um relato e um dossiê preparado pelo aluno as
atividades e o material por ele produzido na redação. Esse material
serviria não apenas a uma avaliação pessoal do estudante, mas como
objeto de reflexão e análise da turma, além de auxiliar ao próprio professor
como uma avaliação pessoal da matéria dada em sala de aula.
Esse acompanhamento irá possibilitar, inclusive, que o aluno
adquira uma atitude crítica a respeito da rotina do trabalho jornalístico,
“eliminando o perigo de uma posição passiva ante os elementos negativos
dessa rotina”, o que Jobim acredita ser um sério fator de perturbação no
processo de aprendizagem. A partir dessa crítica, o estudante poderá
produzir trabalhos de maior fôlego sobre a atividade jornalística, como
ensaios ou monografias. O autor comenta, como exemplo, a série
publicada com trabalhos desse tipo que foi realizada por alunos da Escola
Oficial de Jornalismo de Madrid, sob a direção de Juan Beneyto.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 159
A análise da história de jornais, suas linhas editoriais, suas
tradições, suas orientações políticas, seus projetos gráficos, suas formas
de redação e apresentação das notícias e diversos outros aspectos da
vida do jornal poderiam ser tratados, contribuindo com a reflexão crítica
dos veículos e suas formas de “fazer jornalismo”. Evidentemente que os
alunos poderão se ater a aspectos que sejam de maior interesse ou mais
atuais dentro do plano de estudos proposto pela disciplina. Mas toda
informação que o aluno praticante trouxer para a sala de aula será de
utilidade como objeto de análise em sala de aula.
Da mesma forma, Jobim acredita que a análise dos manuais de
redação pelos alunos também pode ser uma excelente forma de
aprendizagem. Mesmo com toda crítica que se fazia na época à chamada
“folha de estilo”, ele confiava que era uma louvável tentativa para
“melhorar a qualidade do relato jornalístico”.
Referia-se a críticas como as formuladas pelo diretor do jornal
norte-americano Detroit Free Press, Malcom S. Binguy, que chamava o
manual de “camisa de força”, defendendo que o estilo é “um reflexo da
personalidade de quem escreve” e não se adquire com leituras sobre o
assunto. “O único que se pode exigir é boa gramática, bom gosto e bom
sentido” (apud Ph. Porter, Manual de Jornalismo, Havana, 1943). Esta
posição contrapunha-se com a de Jobim, que acreditava que os manuais
não privavam o jornalista da espontaneidade e nem prejudicam o estilo
pessoal de cada um, apenas ajudavam a organizar o texto.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 160
Mas, voltando ao estudo do manual em sala de aula, o professor
defende que a análise de diferentes manuais permite que o estudante se
confronte concretamente com os pontos básicos do aprendizado da
redação para jornais, considerando individualmente as dificuldades que
vão se deparar dentro da profissão. Entretanto, levanta uma questão
fundamental: a visão do aluno não deve ser passiva. Pelo contrário, deve
ser crítica em relação aos problemas de estilo, já que as regras podem,
efetivamente, não apresentar as melhores soluções, dependendo da
circunstância.
O professor deve, no início do curso, analisar as condições de
preparação dos estudantes. A partir dessa sondagem e prognóstico do
aprendizado, é que ele poderá desenvolver o planejamento das atividades,
definindo os métodos que deverá empregar. A avaliação periódica dos
alunos vai demonstrar quais são as maiores dificuldades que os alunos
encontram. Isso possibilitará a mudança nos planos de ensino e a
correção das deficiências. A avaliação do estudante vai demonstrar,
segundo Jobim, não apenas o sucesso do aluno, mas o do professor e de
seus métodos.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 161
5.5 O método de ensino
“Por certo que há uma pedagogia do ensino superior”, repete Jobim,
referindo-se à frase do professor Almeida Júnior13, alertando, porém, que
o ensino de adultos permite, por suas “faculdades de abstração e
generalização”, que o professor se utilize mais livremente do método
expositivo. Trata-se de um nível de ensino com preceitos mais flexíveis,
com funções formadoras da cultura humana, que concede aos mestres
uma iniciativa didática mais livre do que nos outros níveis. Jobim acredita
que, nesse caso, os professores estariam subordinados unicamente, a
dois princípios: “o do respeito à verdade e o da eficiência”.
O autor acredita que cada professor pode encontrar o método mais
adequado, a partir de sua própria experiência no ensino superior.
Entretanto, oferece, a partir de sua própria experiência e através de
observação dos colegas, sugestões sobre métodos de ensino de
diferentes matérias no curso de jornalismo.
O método, como já sabemos, “é a sistemática, o princípio geral que
pretende organizar ou racionalizar a conquista do objeto”, determinado
através das técnicas que indicam os meios trilhados para a obtenção do
resultado. São os métodos que vão determinar a resposta à pergunta
13
Jobim cita a frase de Almeida Júnior, extraída do ensaio “A técnica do ensino em função das
finalidades do ensino superior”.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 162
“como ensinar?”, ou, como sugerem os modernos princípios didáticos,
“como ajudar o aluno a aprender?”.
A "cadeia didática" considera seis elementos: o objetivo, a matéria,
o meio, o aluno, o professor e as técnicas de ensino, todos intimamente
relacionados na realidade escolar. Essa combinação permite que existam
diferentes métodos. No entanto, Jobim considera que o professor não
deve se prender unicamente a um método, já que são as circunstâncias
que geralmente apontam o método a empregar. A técnica de ensino pode
variar de expositiva para a de execução de tarefas, para a de resolução de
problemas, para a inquisitiva, e assim por diante. Sem dúvida, a
experiência é que vai determinar ao professor qual é a adequada naquele
momento para motivar o aluno.
Voltamos, assim, à questão da motivação de que já tratamos antes,
para lembrar que esse princípio estabelece que “só se aprende o que se
quer realmente aprender”, ou o que traz interesse para o aluno. Por isso,
qualquer método utilizado não pode ser considerado eficiente se não
priorizar o interesse.
É preciso criar essa atmosfera de satisfação, às vezes até de
entusiasmo, que deve envolver a aprendizagem, para que esta
seja verdadeiramente fecunda, e para que o estudante participe
por inteiro do processo. Quando a tarefa nos absorve, então
estamos participando da atividade criadora; para usar
linguagem didática, estamos sendo motivados, isto é, incitados,
impelidos a aprender alguma coisa (JOBIM, 1964, p. 54-55).
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 163
Jobim refere-se à técnica ideal como sendo aquela que tivesse a
participação integral do aluno no processo de aprendizagem, considerando
as três funções da mente:
1º. - a mente cognoscitiva que leva à percepção, ao
conhecimento, e finalmente à compreensão da vida;
2º. - a mente afetiva, que assegura a motivação, o
condicionamento de atitudes, e, por essa via, a alegria de viver;
e
3º. - a mente conativa, que conduz à auto-atividade, à aquisição
de habilidades e, por conseqüência, ao controle da vida.
(JOBIM, 1964, p. 55)
É o que Cunningham (1975) define como os três princípios
da aprendizagem humana: o princípio da auto-atividade, o princípio da
motivação e o princípio da percepção. Esses princípios, segundo o autor,
foram formulados por diferentes pensadores ao longo da história das
idéias: desde Aristóteles14 e São Tomás de Aquino15, no caso da auto-
atividade; Dewey, no caso da motivação; e Herbart16, no caso da
percepção.
O bom aluno de jornalismo, assegura Jobim, é o que pretende ser
um bom jornalista. É esse objetivo que produzirá maior esforço para
alcançá-lo. Identificar o propósito, a razão de ser e o objetivo do esforço
14
“O intelecto aperfeiçoa-se, não pelo conhecimento, mas pela atividade”, em “Ética e Nicômaco”,
apud Cunningham, 1975, p. 118.
15
“Assim como se diz que o médico devolve a saúde a uma pessoa enferma, pela ação da natureza,
assim também o homem desperta o conhecimento em outro fazendo agir a razão natural do que
aprende”, trad. Mary Ellen Mayer, in “The philosophy of teaching of St. Thomas Aquinas”, apud
Cunningham, 1975, p. 118.
16
Considerado o “primeiro psicólogo educacional”.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 164
fará com que o estudante compreenda o que faz, possibilitando que faça
melhor. Por essa razão, é importante que não se perca de vista os
objetivos na determinação dos métodos. E a sistematização das tarefas
resultará em economia de tempo e de esforço, pelo emprego do método
adequado.
É o caso de se pensar como ensinar as disciplinas não técnicas
sem perder de vista os objetivos da formação do jornalista. O professor
deve questionar o que vai ensinar, a quem vai ensinar, por que vai ensinar
e quais os meios que dispõe para ensinar e, então, definir como vai
ensinar.
Para Jobim, o elo das disciplinas com o jornalismo está na questão
da atualidade, “por meio das conexões entre os fatos mais remotos, no
tempo e no espaço, e a atualidade mais viva, descrita nas páginas dos
jornais de nossos dias”. Segundo o autor, “no passado somente existe o
presente”, relembrando Ortega e Gasset, quando afirmam que “não há
ação na distância (...) O passado não está ali, numa data, porém está em
mim. O passado sou eu, quer dizer, minha vida”. O jornalismo reclama
esse vínculo com o passado, que contribui para que o aluno compreenda
seu tempo.
É o caso, por exemplo, do ensino de História no curso de
Jornalismo. Os métodos não devem ser muito diferentes dos aplicados
num curso de História. Porém, é preciso considerar que a função deve ser
muito mais formativa do que informativa. Isto porque, no jornalismo, a
história é apenas um dos numerosos componentes da cultura geral.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 165
Outra questão diz respeito ao tempo que se destina ao seu estudo,
que deve ser muito mais limitado do que o que se reserva em um curso de
História. No entanto, Jobim (1964, p.66) relembra as palavras do professor
Gérman Carrera Damas, para quem a mais importante conquista que pode
fazer um estudante de História é a de, na presença de um problema,
compreender e saber situá-lo historicamente,
aproximar-se dele de forma gradual até chegar a formar uma
compreensão inicial de sua estrutura; dispor racionalmente do
equipamento documental e técnico apropriado; realizar
metodicamente o estudo do problema até alcançar sua
compreensão; organizar os resultados desse estudo com
adaptado a um plano ajustado criticamente, e estar, por último,
em atitude de enfrentar-se uma redação (ou exposição oral do
discurso, empregando uma linguagem apropriada).
Trata-se, na verdade da aquisição do método e da assimilação das
técnicas de investigação, que serão úteis não apenas para o futuro
historiador, mas também fundamentais para o futuro jornalista. “Nem um
nem outro vão aprender história propriamente: mas sim aprender como
aprendê-la”. A chave para o professor é dar os rumos para que o aluno
possa investigar e compreender um processo histórico, única orientação
possível, segundo Jobim, dentro de um curso superior, caracterizado por
uma atividade de investigação precursora nos domínios da cultura. “Mais
que o ciclo secundário da educação, o superior oferece o método, o
instrumento, a ferramenta para trabalhar a matéria, o esforço criador. O
formativo ultrapassando o informativo” (Jobim, 1964, p. 66).
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 166
Vejamos um caso que Jobim comenta, a partir do ensino de História
oferecido no curso de Jornalismo da Universidade do Brasil
17
. De um
modo geral, os métodos didáticos podem ser os mesmo que os
empregados no curso de História, mas levam em conta o objetivo do
ensino: no curso de História, o aluno é preparado para ensinar e para a
exposição oral; no curso de Jornalismo, o estudante é preparado para
informar, para escrever, redigindo notícias, elaborando comentários e
explicando por escrito.
Por isso, o conteúdo das aulas acabam sendo complementadas por
atividades extra-classe, que se transformam em atividades de investigação
jornalística, em pequenas reportagens. Como exemplo, o professor
escolhe um determinado assunto da atualidade, como um conflito que
envolve um determinado país. O caso é trabalhado em sala de aula,
comentando-se o episódio, a localização geográfica e demais informações.
Como atividade externa, os alunos ficam encarregados de conseguir
artigos, mapas e ilustração sobre o assunto. Como trabalho, devem redigir,
num número pré-fixado de linhas - como forma de treinar a concisão -, os
dados complementares que conseguiram sobre aquele conflito ou país,
utilizando o estilo jornalístico.
Jobim enfatiza que a problematização e a investigação ajudam no
processo de compreensão. A aprendizagem não se sustenta pela
memorização, que não é a base desejável em nenhum ciclo educativo,
17
O professor responsável pela disciplina História Contemporânea era Delgado de Carvalho,
professor emérito da Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil, criador da cátedra
de História no curso de Jornalismo.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 167
muito menos no universitário. “Um mínimo de memorização deve auxiliar o
máximo de interpretação lógica de sólidos conhecimentos. A
aprendizagem se assenta numa perfeita integração dos elementos
culturais na mente do aluno”.
Nesse sentido, ele sugere que deva ser permitida ao aluno a
consulta aos apontamentos de classe, dicionários, mapas, livros e
documentos durante a realização das provas. Acredita que, no momento
da avaliação, o estudante de jornalismo vai poder revelar sua capacidade
profissional, com clareza, concisão e exatidão. Por isso, defende que,
embora se possa utilizar diferentes tipos de provas, a aprendizagem do
futuro jornalista se verifica principalmente através da exposição escrita,
que não deve ser uma exposição literária, mas seguindo as normas de um
bom texto jornalístico: conciso, preciso, calculado para um determinado
espaço de linhas, e que resulte de um plano de informação para um
determinado público.
Os materiais pedagógicos devem ser compostos por anuários,
livros, publicações periódicas, dados estatísticos, biografias, mapas etc.
Mas também devem ser utilizados artigos de jornais e revistas nacionais e
estrangeiras. Além disso, devem ser indicados títulos que possam
contribuir para o aprimoramento das informações.
Vejamos agora o caso do ensino de Geografia. Jobim comenta
especificamente a disciplina de Geografia Humana ministrada no curso de
Jornalismo da Universidade do Brasil, onde o ensino de Geografia
Humana ocorria durante um ano, com duas aulas semanais, metade do
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 168
que era oferecido a esta disciplina no curso de Geografia
18
da mesma
Universidade. Era a metade do período destinado a esta matéria no curso
de Geografia, o que demonstra que a diferença entre o que era oferecido
nos dois cursos se baseava na menor intensidade e profundidade no
estudo, já que os programas não apresentavam grandes diferenças.
Mas os objetivos, assim como no caso de História, eram distintos.
Pretendia-se, no curso de Geografia, formar professores ou investigadores
na área. No caso do Jornalismo, pretendia-se formar jornalistas com um
“bom conhecimento dos problemas do mundo contemporâneo,
relacionados com a geografia”, matéria que faz parte de um complexo de
conhecimentos gerais que se julgam ser imprescindíveis em jornalismo.
E como esta disciplina era ensinada na Universidade do Brasil?
Jobim explica que em sala de aula utilizava-se principalmente o método
expositivo, forma de esgotar o programa do ano letivo. Mas não era o
único. O professor trabalhava com leituras individuais orientadas e com
atividades em grupos com temas que exigiam dos alunos: busca
bibliográfica, exposição geral e debate em classe. Jobim acredita que,
embora essas práticas nada tenham de original, contribuem para a
formação do repórter, porque criam hábitos orientados para a investigação
e para o levantamento de dados corretos, o que redunda de forma positiva
no exercício diário do jornalista.
18
No curso de Geografia, a disciplina era oferecida pelo período de dois anos, com quatro aulas
semanais.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 169
Um exemplo prático trazido por Jobim refere-se ao tópico “Estudo
geográfico das populações”, com o tema “colonizações”. Como o objetivo
é que não se perca de vista o objetivo mais amplo, a formação do
jornalista, a motivação, no caso, nasce da própria atualidade do problema
do colonialismo. “O interesse dos alunos pelos movimentos africanos de
emancipação os incita a acompanhar e possivelmente a participar do
estudo da questão”, explica Jobim, ressaltando que o assunto foi notícia
de primeira página nos jornais.
O autor insiste que o principal é evitar a inatividade entre os alunos.
O professor deve planejar cuidadosa e logicamente as atividades para que
não se transformem em fracassos, regra que, segundo Jobim, “deve ser
aplicada a qualquer atividade docente”.
No caso do estudo da língua, Jobim sugere que se utilize as
seguintes técnicas:
a) Leitura interpretativa de textos literários e textos especializados,
como de textos selecionados de jornais.
b) Redação de textos, preferencialmente jornalísticos, como
reportagens, notícias, crônicas e editoriais.
c) Análise da estrutura da língua, em função da interpretação dos
textos referidos.
Nesse caso, apresenta o trabalho desenvolvido no curso de
Jornalismo da Universidade do Brasil, na disciplina Língua Portuguesa e
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 170
Literatura
19
, que tinha como objetivo “preparar o futuro profissional para
expressar-se com correção, clareza, concisão, expressividade e, também,
o que não é menos importante, com rapidez”. É importante também para o
estudante a cultura básica e não especializada oferecida pelo estudo da
Literatura, que trata de pessoas e movimentos representativos, elementos
ainda encontrados no movimento literário contemporâneo.
O programa da Universidade do Brasil era desenvolvido durante
três anos, com três aulas semanais. No primeiro ano, trabalhava-se a
língua portuguesa, com a revisão dos principais pontos do ensino, forma
de reforçar a base que o estudante deve ter obtido no secundário,
habilitando-o a escrever com correção e clareza. Depois, na segunda
unidade, abordavam-se os estilos da língua portuguesa e a análise do
discurso, o que colocava em evidência os recursos expressivos da língua
portuguesa, proporcionando aos estudantes os elementos que vão ajudá-
los a redigir de maneira mais viva, oportuna e dinâmica. Ainda, no primeiro
ano, enfatizava-se a redação, que deveria ser o resultado final dos estudos
das duas primeiras etapas.
As atividades de leitura e análise de textos de livros, jornais e
revistas pretendiam dar aos alunos a visão e solução dos problemas de
estruturação e desenvolvimento de um relato, de acordo com a finalidade
do mesmo, inclusive dos relatos jornalísticos, trabalhando também as
características básicas do chamado “estilo jornalístico”. Dessa forma,
19
A responsável pela cátedra era a professora Célia T. G. de Veiga Oliveira.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 171
conduziam o aluno o mais rapidamente possível para o desenvolvimento
de seus próprios textos, que sofriam uma crítica minuciosa posteriormente.
O método aplicado nessa primeira etapa levava em conta que o
ensino deveria ser feito da maneira “mais prática e dinâmica possível”,
com o professor partindo sempre do aluno e de suas dificuldades. A
exposição teórica vinha depois do exame de texto de autores modernos e
de jornal e o aluno era estimulado a participar de debates em sala de aula.
No segundo ano, as aulas se voltam para o estudo da Literatura
Portuguesa e, no terceiro ano, trabalhava-se a Literatura Brasileira. Antes
de começar o curso de Literatura, o aluno era introduzido na teoria
literária, para que se familiarizasse com o fenômeno literário e sua
nomenclatura.
Os temas abordavam prosa e poesia, os gêneros literários, as
escolas literárias e o folclore e a literatura oral. Enquanto da Idade Média
portuguesa e da Literatura Clássica portuguesa e brasileira selecionava-se
como objeto de estudo apenas os autores e as obras mais representativas,
o panorama literário contemporâneo do Brasil e de Portugal constituía-se o
eixo dos programas. A cada semestre se escolhia uma obra moderna
(novela de preferência) para ser lida, comentada e estudada pelos alunos.
Como parte do programa, a crítica literária jornalística era tratada
como forma de despertar o aluno para o assunto. Para isto, o professor
cobrava a produção de resenhas analíticas de novelas e poemas, depois
do estudo de autores e obras, e após comentários estilísticos de textos
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 172
como críticas, resenhas ou colunas de apreciação literária dos principais
suplementos e revistas.
A relação com a atualidade também era trabalhada, da mesma
forma que nas disciplinas anteriores, buscando a motivação do aluno. No
estudo da Literatura Medieval ou Clássica, procurava-se relacionar o
fenômeno artístico em sua realidade histórica e social com suas
vinculações com o presente. Da mesma forma que, quando da
comemoração da epopéia dos grandes navegadores portugueses,
exaltando-se a figura do Infante Dom Henrique, aproveitou-se o amplo
noticiário da imprensa para, partindo dele, estudar o Quinhentismo
Português e a literatura dos descobrimentos.
Jobim também cita o exemplo de que, quando os jornais
comentaram que “vozes agourentas” se opunham ao programa de
desenvolvimento nacional do governo Kubitschek, a referência motivou o
estudo daquele episódio de “Os Lusíadas”. Da mesma forma que, ao
estudar o teatro de Gil Vicente, comparavam-se as obras desse autor
clássico com a peça “O auto da Compadecida”, de Ariano Suassuna,
então em cartaz com grande sucesso.
Para evitar o excesso de aulas expositivas, atribuíam-se atividades
de pesquisa aos alunos sobre diferentes autores e suas obras. Os
resultados eram apresentados em seminários ou em mesas-redondas que
incentivavam o debate. Jobim argumenta que exposições individuais
propiciam ao aluno habilidades como as de naturalidade na apresentação,
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 173
presença de espírito, boa dicção e prática da exposição oral, que com
certeza auxiliam sua atividade na disciplina de radiojornalismo.
Mas como verificar o aprendizado do aluno nessa disciplina?
Existem, é óbvio, os trabalhos realizados durante o semestre. Alguns são
exercícios que tratam dos pontos teóricos debatidos em sala de aula,
enquanto outros devem ser constituídos de trabalhos práticos, em forma
de reportagens sobre um tema relacionado com a matéria ou de
apreciação de uma obra literária. Estes últimos devem ter um peso maior,
porque supõem uma preparação prévia, sob a forma de investigação e
coleta de dados, que são realizados fora da sala de aula. A redação final
deve ser feita em classe, quando o aluno pode consultar os elementos
recolhidos previamente.
Embora os livros sejam fundamentais no ensino da Língua
Portuguesa, materiais jornalísticos atuais não podem ser dispensados,
seja para fins estritamente didáticos, seja para fins de motivação. O aluno
deve sempre ser estimulado a ler jornais e revistas, podendo, muitas
vezes, escolher páginas ou seções de dois jornais diferentes para discutir
os aspectos redacionais ou estilísticos. É importante não ignorar o aspecto
jornalístico, mesmo nas aulas de Língua e Literatura, e utilizar, sempre que
possível, títulos, leads, textos de artigos, reportagens e crônicas, como
forma de motivar o aluno de jornalismo.
Sobre o ensino das disciplinas profissionais, Jobim resume suas
próprias atividades na disciplina que ministra na Universidade do Brasil,
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 174
Técnica de Jornalismo, levantando inclusive a questão da Universidade
não dispor, na época, de laboratório gráfico.
Vejamos o exemplo da lição, que trata da questão dos títulos nos
jornais. Num primeiro momento, o professor faz uma introdução oral sobre
o assunto, utilizando um exemplo atual: como os principais jornais do Rio
de Janeiro anunciaram os primeiros resultados das eleições. O material
didático utilizado são quatro exemplares dos jornais do dia, mais
periódicos americanos e franceses. Os tópicos da exposição inicial
abordam: a) conceito para o título; b) o título anunciando a notícia; c) o
título sumarizando a notícia; d) o título classificando a notícia; e) o título
integrando a página, compondo a fisionomia gráfica do jornal.
A atividade se desenvolve com o método e a lógica de construção
do título – título rótulo e título sentença –, examinando também os modelos
dos títulos de estilo americano e de estilo francês, seguido pelo estímulo a
um debate sobre as causas das diferenças. Os alunos são convidados a,
no quadro-negro, reproduzirem títulos “certos” e “errados”, explicando a
razão de conceituá-los dessa forma. Finalmente, a conclusão explica a
função dos títulos, afirmando ou negando “o que há de essencial na
notícia”.
O professor ainda solicita uma atividade a ser feita em casa, que
consiste em selecionar dez títulos de jornais considerados “condenáveis”,
procurando modificá-los para melhorá-los.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 175
Dentro do mesmo tema – títulos -, uma segunda aula trata da
estrutura e da linguagem do título, ou seja, sua redação. É uma aula
essencialmente prática, onde os alunos deverão titular as matérias, de
preferência pequenas notícias recortadas dos jornais do dia. Jobim explica
que não deve ser exigida a contagem das letras, pois isso levará o
estudante a se preocupar muito mais com a estrutura gráfica do que com o
conteúdo, embora se deva insistir para que sejam concisos e objetivos.
Outro exemplo de aula trata do tema título em função da paginação.
Jobim conta que exibia o jornal Pravda, discutindo a razão de os jornais da
então União Soviética apresentarem títulos em caracteres tão pouco
destacados e não seguirem a regra do título-sentença. Esse tema abre
possibilidades de debater a imprensa nos regimes ditatoriais e seus
reflexos no padrão gráfico dos jornais.
A partir do mesmo assunto, poderá se trabalhar o efeito da
concorrência sobre os tipos de paginação, o que possibilita discutir sobre a
“guerra dos títulos”, ilustrando com títulos curiosos e até mesmo
anedóticos, entre outros.
Apenas após todas essas questões o professor passará para os
diversos tipos de preparação de paginação, com o uso de esquemas no
quadro-negro. O aluno, a seguir, tentará reproduzir o diagrama onde a
página de um dos jornais expostos foi concebida e projetada. Somente
depois disso é que o professor ensinará ao grupo o diagrama da página
enfocada, feita em papel adequado, e no formato do jornal, tal como feita
pelo diagramador. Por ser uma peça autêntica, tem efeito motivador.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 176
Como lição de casa, o professor pode solicitar a confecção de novos
diagramas reproduzindo jornais reais.
Outras aulas também técnicas são comentadas por Jobim, como as
que tratam da variedade nas famílias tipográficas usadas, com exemplos
selecionados da imprensa americana e da imprensa francesa, que
discutem as razões técnicas, econômicas ou psicológicas para a escolha
do formato do jornal, entre outras.
Mas os exemplos dados são suficientes para demonstrar técnicas
de ensino de natureza profissional que podem valorizar a aula, mesmo
sem equipamento adequado. “Sirva nossa experiência e nossas sugestões
de incentivo aos que lutam com a pobreza de meios”, considera Jobim,
que sofria naquele momento do curso, de falta de meios auxiliares de
ensino. Não que defendesse que o professor poderia trabalhar sem os
equipamentos necessários, mas apenas como forma de demonstrar que é
possível manter os alunos em atividade - o ele considera ser a regra de
ouro do ensino -, mesmo na falta daqueles.
Porém, os exemplos das lições acima não significam que a ênfase
da disciplina deva ser dada a esses aspectos da profissão. Pelo contrário,
o autor considera que a ênfase do curso deva ser dada ao estudo da
notícia, da informação propriamente dita. Mais do que isso, na “informação
honestamente apresentada, respeitando a regra célebre: o comentário é
livre, porém o fato é sagrado”.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 177
Mesmo com a disciplina de ética estando presente na grade do
curso, Jobim acredita que o que mais influenciará o aluno a agir
eticamente na profissão é o professor que o ensinou a redigir. Ele é o
responsável por transmitir o amor à exatidão e à objetividade, ou seja, “a
consciência do mais alto de seus deveres, que é informar
escrupulosamente aos leitores”, preocupação que deve ser constante em
todas as disciplinas do currículo, e não somente nas matérias culturais.
Mesmo porque o ensino da elaboração da notícia propicia diversas
situações que levam o aluno a refletir sobre as questões éticas da
profissão, a partir de exemplos de notícias total ou parcialmente incorretas,
que são resultado de negligência ou falta de atenção do repórter.
A questão ética está presente no plano de aula, disponibilizado por
Jobim (1964, p. 43-44), que reproduzimos a seguir:
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 178
MODELO DO PROJETO DE CLASSE
Professor: Danton Jobim Disciplina: TÉCNICA DE JORNALISMO
Faculdade Nacional de Filosofia - Jornalismo
Primeiro Curso
Plano de Classe - Tema: Introdução ao Sensacionalismo
Informativos: Iniciar a preparação do estudante para resolver os
problemas de Técnica de Jornalismo originados pela
aplicação dos princípios de ética profissional
(tratamento adequado de crime, sexo, etc.).
Objetivos:
Formativos: Combater o sensacionalismo jornalístico sem
desestimular a busca do “sensacional” e sem
alimentar prejuízos contra a reportagem policial.
Motivação inicial: Referência e apresentação de revistas de escândalos.
Material didático: Um jornal e duas revistas de escândalos; um jornal
ultra-popular, explorando excessivamente o gênero
policial.
Apresentação da a) Sensação e Sensacionalismo;
matéria: b) Origens e evolução da reportagem policial;
5 m. c) O sensacionalismo nas matérias não policiais
(política e sociedade).
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 179
Desenvolvimento: a) Sexo como notícia: sex-appeal;
20 m. b) Crime, perigo social na divulgação de crimes
bárbaros ou escabrosos;
c) “O Herói criminal” contrabalanceado pelo “Herói
detetive” (tratamento construtivo);
d) Psicologia do contágio: os “Crimes do machadinho”.
Motivação: Exibição na classe de fotografias de perícias de três crimes
semelhantes.
5 m. (assassinatos cometidos por mulheres com um mesmo
instrumento).
Rápido diálogo com Deve ser suprimido da imprensa o noticiário do crime?
a classe sobre o tema: Enfocar nas contestações e comentários:
a) Opinião de psicólogos e neurologistas;
b) Opinião de jornalistas;
c) Tentativa de extinção nos Estados Unidos; caso
do “Christian Science Monitor”.
Conclusão provisional
do diálogo: O jornal deve oferecer um retrato tão fiel quanto
possível, de sua comunidade, sem deformações nem
mutilações.
Conclusão da classe: O crime é notícia, mas temos que dar-lhe um
tratamento adequado para que se reduzam ao mínimo
os perigos sociais de sua divulgação.
Tema da próxima classe: Problemas de redação e apresentação de
notícias sensacionalistas, sem incorrer em
sensacionalismo.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 180
Apesar das décadas que nos separam da elaboração deste plano
de aula, sem dúvida, os temas propostos não se diferenciam em nada de
uma aula atual, onde a questão da notícia, da ética, da valorização da
informação e da importância do debate crítico devem ser essenciais.
Outra questão levantada por Jobim trata do jornal-laboratório. Se a
escola não dispõe de um jornal próprio – ou, trazendo para a atualidade,
apenas aparenta ter um jornal-laboratório para atender à legislação
vigente – como treinar os alunos? A técnica da narração jornalística,
segundo o professor, pode ser aprendida sem maiores dificuldades,
porque o importante é que os alunos utilizem dados reais em seus
exercícios e rigorosamente atuais. Esse, de acordo com o professor, é um
dos grandes problemas do ensino das técnicas, já que esses conceitos
sobre o jornalismo devem ser aplicados a situações familiares aos alunos.
Em sua opinião, “os estudantes latinos americanos de nível universitário
participam mais do mundo da idade adulta do que da adolescência”, o que
faz com que os alunos transpassem os temas do mundo escolar. Chega a
ser difícil obter o interesse dos alunos na realização das tarefas que
exploram assuntos da vida estudantil. Quando, ao contrário, o tema gira
em torno da política ou de outro assunto publicado nos grandes jornais, o
professor corre o risco de entrar em debates apaixonados.
Jobim acredita, no entanto, que quando se trata de ensinar ao aluno
a redação de editoriais, o problema é mais simples. Num primeiro
momento, deixa-se o estudante usar toda sua criatividade e liberdade de
opinião para, depois, mostrar que não se deve escrever o que bem se
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 181
entende numa redação. A melhor maneira de trabalhar esta questão é
colocar o tema em debate em sala, examinando as várias faces do
problema, e mostrar que a tese do editorial será a conclusão do debate, ou
melhor, a conclusão do grupo. Essa forma de discussão vai garantir ao
aluno maior informação e segurança na condução do raciocínio, “e – o que
é importante – maior sentido de responsabilidade ao emitir a opinião da
classe que, no futuro, será a opinião do jornal onde escreverá”.
Os temas tratados nos editoriais devem incluir discussões sobre as
atividades estudantis, mas vale a ressalva feita sobre as notícias: os
alunos se interessam menos por questões que envolvem sua vida
acadêmica, até porque passam pouco tempo no espaço universitário.
Justamente, por essa razão, deve-se estimular as atividades extra-
classe, que não costumam ser freqüentes no Brasil. Os alunos evitam
atividades que os afastem do seu ritmo diário em uma grande cidade.
Porém é importante estimular sua participação em diferentes
manifestações que envolvam seu curso, como associações que tratam da
questão da imprensa, cursos extra-curriculares e de extensão, além de
outras mais que podem se somar à vida universitária.
Um tema interessante levantado por Jobim é a questão dos livros
didáticos que dão suporte às disciplinas. Ele acredita que se “existe um
profissional a quem interessa particularmente a utilização adequada dos
manuais, este é o jornalista”, que se dedica a um trabalho apressado e
que requer objetividade. Nesse caso, os livros, manuais e compêndios são
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 182
excelentes como instrumentos profissionais, que, mediante definições
corretas, ajudam a entender a essência das coisas.
Ademais, são excelentes como “ponto de partida, como pontos de
apoio na experiência consagrada” e têm uma função disciplinadora, fator
essencial para o trabalho criativo, abreviando o caminho para o saber. No
entanto, também oferece sérios riscos, segundo o autor, sendo o mais
grave o risco de o aluno se deixar escravizar pelo texto, “em uma espécie
de condicionamento de reflexos verbais que, sublimando a letra, rebaixa o
espírito”. A visão do estudante tem que ser crítica, fator essencial no
ensino superior e estimulante para debates em sala de aula.
É o caso dos manuais de redação que, embora úteis, não são
imprescindíveis. Melhor que, diz Jobim, são as anotações das noções
recebidas enriquecidas com exemplos práticos. A bibliografia indicada no
início do curso, deve ser ampliada por novas indicações ou até mesmo por
iniciativa dos próprios alunos. Mas os livros devem passar por leituras
críticas que estimulem o raciocínio.
Outro meio adaptável para o ensino do jornalismo é o audiovisual.
Jobim conta que planejou, no curso da Universidade do Brasil, fazer um
filme didático que abordasse todas as fases da produção jornalística, mas
não obteve sucesso em razão da falta de recursos. A experiência seria
inspirada na do professor Paul H. Wagner, produtor de “Police Reporter”, o
primeiro filme educativo a ser utilizado no ensino de um tema específico do
jornalismo, de acordo com informações da revista Journalism Quarterly,
edição do verão de 1950. Pesquisas realizadas após sua exibição na
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 183
Universidade de Ohio indicaram que o filme foi mais eficaz para o ensino
que uma conferência utilizando as mesmas informações descritas no
documentário.
O setor de pesquisas da Divisão de Informação e de Educação do
Exército Americano, motivado pelo êxito obtido com os vários métodos de
apresentação audiovisuais, pesquisou o tema exaustivamente, em relação
aos adultos, motivando observações como a de Charles F. Hoban
20
que, a
partir do exame desses estudos, concluiu:
Sempre que a exibição da película é precedida por observações
introdutórias que explicam as partes difíceis e preparam a
assistência para uma observação fundada e inteligente, o índice
de aprendizagem é cerca de um terço maior (over half again) do
que quando o filme é rodado sem essas explicações
introdutórias e motivadoras (apud JOBIM, 1964, p.40)
Jobim apoiou-se nos resultados da pesquisa publicada em artigo de
Paul H. Wagner e de Leonar V. Gordon
21
para explicar a eficácia desse
método, levantando principalmente a função motivadora da exibição,
comprovada por questionários respondidos por alunos. Citando os autores,
explica que os filmes podem ser utilizados com finalidades didáticas ou
informativas, precedidos ou não de introdução, mas seguidos de
discussão. Mas a grande vantagem estaria na aprendizagem mais rápida e
20
HOBAN, Charles F. New Movies that Teach, Nova York: 1946.
21
In: Journalism Quarterly, 1950.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 184
eficiente o que resultaria numa economia de tempo “que seria dedicado às
disciplinas propriamente culturais” (WAGNER; GORDON, 1950
22
).
Além de material didático, produzido com a finalidade básica de
tratar determinados temas abordados no ensino do jornalismo, outros
materiais audiovisuais também podem ser utilizados, como os de caráter
promocional produzidos por empresas jornalísticas de diferentes países.
Filmes exibidos no cinema, que abordam as atividades jornalísticas ou
assuntos afins, da mesma forma podem ajudar na discussão de questões
fundamentais da profissão.
Finalmente, Jobim discute a necessidade do aluno de jornalismo
conhecer os pormenores do produto acabado das atividades para as quais
se está preparando. Desde o início do curso é preciso que ele seja
motivado a descrever os jornais que lê, explicando os motivos da leitura.
Mais adiante, o autor sugere propor aos estudantes um trabalho de
pesquisa sobre jornais de diferentes categorias, com os objetivos de
conhecer: as características de cada um, tanto na parte editorial quanto na
parte não editorial; os espaços dedicados à opinião e às diversas
categorias de informações; as editorias especializadas; o espaço
destinado aos assuntos de interesse humano, pitorescos ou de
entretenimento; o projeto gráfico, com os espaços dedicados aos títulos e
ao texto, bem como o ocupado pelas ilustrações; a orientação política de
cada um; e o grau de editorialização da informação em cada um,
22
Apud Jobim, 1964, p. 40.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 185
assinalando títulos e textos editorializados, para avaliação e informação
posterior.
O fato é que esse tipo de pesquisa resulta numa atividade de ensino
ativo, que leva os alunos a se interessar por aquilo que devem aprender.
Para Jobim, essa é a verdadeira missão do professor: estimular o aluno
querer aprender, “estimulando-o e orientando-o para que, na intensiva
atividade mental, sem desperdício de energia e de tempo, aprenda a
assimilar realmente as noções ou hábitos formativos e informativos que
valorizam o homem em sua comunidade”.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 186
6 O ensino atual nas escolas pioneiras
Sem dúvida alguma, as faculdades de jornalismo tiveram – e ainda
têm – um papel importantíssimo no processo de profissionalização do
jornalismo. Não que tenham atuado sozinhas nesse sentido, mas deram
sua contribuição fundamental na construção não apenas de formação
humanística e de técnicas profissionais, mas na construção de uma
deontologia, de um conjunto de valores que pautam o dia-a-dia, o
comportamento e a ação desse profissional, numa nova forma de pensar a
profissão. Desde o primeiro curso, como apontado por Danton Jobim em
seus textos, as faculdades se mostraram atentas à modernização da
imprensa e ao modelo de profissionalização do jornalismo.
É certo que, mesmo com todas as carências e deficiências, mesmo
não formando o profissional ideal, a faculdade é o principal espaço para
dar formação técnica e teórica mais adequada e consolidar valores. Por
isso é importante compreender que caminho elas estão tomando e para
onde segue o ensino de jornalismo, num período em que, mais do que as
ocorridas na década de 1950, a imprensa está passando por profundas
transformações.
O jornalismo vive hoje um momento muito particular na sua história,
de transformação no campo profissional, onde ainda não se vislumbra
aonde vai parar ou se vai parar. As mudanças tecnológicas tiveram e
estão tendo um forte impacto na profissão, inclusive reconfigurando o
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 187
próprio mercado empresarial. Ninguém aposta com certeza no que vai
acontecer: convergências de mídias, telejornalismo on-line, outras formas
de linguagem, outras formas de informar, nada está muito consolidado. Até
mesmo a linguagem da internet, presente há algum tempo na vida das
pessoas, ainda está sendo experimentada. Por isso mesmo, este é um
momento de experimentação no campo que pode ser enriquecedor.
A nova Cásper Líbero
O que mudou na Faculdade Cásper Líbero desde sua fundação?
Pesquisa recente da professora Rosalba Facchinetti (2006) sobre o curso
de jornalismo apontou a questão, a nosso ver primordial, sobre a
deficiência mais sentida pelos alunos e levantada por Jobim há quase 50
anos: a deficiência na formação cultural do aluno. Facchinetti reproduz a
crítica de um aluno: “Cultura geral, é o conteúdo... na hora de escrever não
adianta conhecer a tecnologia se falta cultura geral, a gente não consegue
escrever”.
A pesquisadora aponta, numa das escolas mais reconhecidas no
país na área de jornalismo, alguns problemas que com certeza são
sentidos na maior parte dos cursos brasileiros: uma inadequação da parte
teórica com a parte prática no projeto pedagógico; a pouca preocupação
da instituição com a formação dos professores – valorizando mais a
atuação profissional que a qualificação, burlando, inclusive, a legislação
que obriga a contratação de mestres e doutores, prática comum nas
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 188
instituições de ensino particulares – o que pode comprometer a qualidade
da parte teórica; a prevalência da tecnologia (a faculdade tem laboratórios
de alta qualidade) em detrimento do conteúdo; a falta de exigência para
que os alunos se envolvam na produção dos veículos laboratórios que a
faculdade disponibiliza; além da quase inexistência de atividades
relacionadas à comunidade, as chamadas atividades de extensão.
Como dissemos, esses são problemas que afetam a grande maioria
das escolas particulares de jornalismo, mais preocupadas com o lucro,
inseridas dentro da lógica de mercado. Como o investimento em
tecnologia tem que ser cada vez maior, a contratação de docentes sem a
qualificação ideal torna-se uma maneira de equilibrar os custos. Isto gera
outro problema: a falta de dedicação maior do docente às atividades
acadêmicas, que implica em prejuízo na interdisciplinaridade ou no diálogo
entre as disciplinas. Os professores não discutem com os colegas sobre
formas de integração, fazendo com que o aluno não encontre relação
entre elas. Esse é um fator que pode gerar, muito provavelmente, a
desmotivação em relação às matérias não técnicas, ponto essencial no
ensino, segundo Jobim. Ainda existe o problema de, mesmo nas matérias
técnicas, não haver uma continuidade de conteúdo, caso das disciplinas
que requerem aprofundamento a cada semestre (Ex: Técnicas de
Redação Jornalística I, II e III).
Pouco depois da pesquisa de Rosalba Facchinetti, a Cásper Líbero
fez uma nova alteração curricular – no ano de 2006 –, que aponta para o
que comentamos há pouco: o currículo foi reestruturado (Anexos B e C),
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 189
com a diminuição de algumas horas aulas
23
, o que afetou especialmente
disciplinas como Língua Estrangeira e Educação Física e diminuiu a carga
horária de Design Gráfico – Jornalismo em Revista. Embora no total a
redução na carga seja de apenas 64 horas aulas, a disciplina Projetos
Experimentais passou de 288 para 448 horas aula, o que pode representar
um aumento no tempo de atividade do aluno, mas não necessariamente
um aumento da carga horária do professor, já que geralmente nesse
período o estudante tem apenas orientações esporádicas com seus
mestres.
O atual curso de jornalismo da UFRJ
Já a Escola de Comunicação (ECO) da Universidade Federal do Rio
de Janeiro, a antiga Universidade do Brasil, não enfrenta problemas com a
qualificação do corpo docente, exatamente por ser uma universidade
pública, que geralmente exige, para o início da carreira docente, o grau de
Mestre. Dos atuais 62 docentes do curso de Comunicação Social, 52 têm
doutorado ou pós-doutorado. Dos demais, apenas dois professores
auxiliares têm apenas a graduação e oito assistentes têm mestrado.
Mas a ECO não foge à regra quando se trata de “comunicação”
entre as disciplinas. A chefe do Departamento de Jornalismo, Ana Paula
23
A grade curricular passou de 2.816 para 2.752 horas aula.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 190
Goulart Ribeiro
24
, reconhece que esse é um problema difícil de resolver,
embora tal discussão seja freqüente nas reuniões.
No curso que coordeno, eu não consigo fazer com que as
disciplinas “conversem” umas com as outras. Nós temos
discutido muito isso nas reuniões, inclusive com os
coordenadores de outras habilitações e com a coordenadora do
ciclo básico. Fazer as disciplinas dialogarem, inclusive as
teóricas com as práticas e o ciclo básico com o ciclo
profissional, é a preocupação grande que temos tido. Evitar ter
conteúdos que faltem ou duplicados, e que os alunos possam
entender que uma coisa que eles viram numa disciplina tem a
ver com o que eles viram na outra, nós temos essa
preocupação, mas isso não é fácil.
A jornalista e professora aposentada da UFRJ Ana Arruda Callado
25
insiste que o problema está centrado na falta de projetos conjuntos entre
os professores. Ela acredita que boa parte da questão envolve vaidades
pessoais dos professores, além da dificuldade de trabalhar em equipe.
Isso impediria, segundo a jornalista, que cada um tivesse seu brilho
individual.
Na UFRJ eu tentei tanto isso [trabalhar com projetos]. Vamos
fazer um jornal, escolher um determinado tema. Aí o professor
de antropologia tem que entrar, o de sociologia também. No
outro semestre um outro projeto, bem diferente, um jornal de
1964, por exemplo. Mas eu nunca consegui isso, vaidade dos
professores, porque eles não sabem trabalhar em equipe, por
querem brilhar.
Mas a implantação de um novo projeto pedagógico em 2001 foi
fundamental para que o curso da UFRJ inovasse. A coordenadora acredita
que a reforma curricular foi feita preocupada principalmente com dois
24
Em entrevista à autora em 20/12/2006.
25
Em entrevista à autora em 20/12/2006.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 191
aspectos: primeiro, com a articulação da teoria com a prática, buscando o
equilíbrio, acabando com uma divisão que, ela acredita, dá a sensação de
serem dois cursos, onde nos dois primeiros anos ministra-se
exclusivamente teoria e, nos dois últimos, essencialmente prática. Essa
divisão, segundo a professora, é muito prejudicial para a formação do
profissional de jornalismo. Um segundo aspecto foi proporcionar ao aluno
um currículo flexível que o ajude a construir o seu próprio percurso,
oferecendo um número maior de disciplinas optativas.
O aluno, quando presta o concurso vestibular da UFRJ não indica
uma habilitação específica; ingressa no curso de Comunicação Social.
Apenas no terceiro semestre do ciclo básico (Anexo D) é que faz a opção.
O ciclo básico, no entanto, não oferece apenas disciplinas teóricas
26
.
Dentro da grade são oferecidas várias disciplinas laboratoriais, e o aluno
pode optar por duas delas. Segundo Ana Paula, é uma forma de ajudar o
estudante a escolher mais conscientemente a habilitação que pretende
seguir.
É a partir do quarto semestre que o estudante ingressa no ciclo
profissional (Anexo E). Esse ciclo é formado por quatro grupos de
disciplinas: as obrigatórias, as complementares de teoria, as
complementares de habilitação, além das complementares de livre
26
O ciclo básico é composto por 19 disciplinas e mais dois laboratórios, todos com 60 horas aulas.
As disciplinas são as seguintes: Língua Portuguesa I e II; Linguagem Gráfica; História da
Comunicação; Comunicação e Artes; Teoria da Comunicação I, II e III; Comunicação e Realidade
Brasileira; Comunicação e Filosofia; Linguagem audiovisual I e II; Sistemas e Tecnologia da
Comunicação; Comunicação e Economia; Comunicação, Psicologia e Cognição; Sistemas de
Informação; Comunicação e Mercadologia; Fotografia; e Antropologia e Comunicação.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 192
escolha. Do grupo de disciplinas obrigatórias fazem parte aquelas
consideradas absolutamente fundamentais para qualquer jornalista, mas é
composto por um número reduzido de matérias. Nesse núcleo entram as
disciplinas de Redação Jornalística I e II, Técnicas de Reportagem I e II,
Telejornalismo I, Radiojornalismo I, Jornalismo Gráfico, História do
Jornalismo, Fotojornalismo, Assessoria de Imprensa, Edição Gráfica, e
Legislação e Ética em Comunicação.
As complementares de habilitação são as disciplinas específicas de
jornalismo, mas nenhuma delas é obrigatória. Geralmente é um
aprofundamento de disciplinas obrigatórias – como no caso de
Telejornalismo II ou Radiojornalismo II – ou ligadas ao jornalismo
especializado – casos do Jornalismo Esportivo, do Jornalismo Econômico
e do Jornalismo Científico, entre outros. Dentro de cada semestre, o aluno
deve cursar uma disciplina de 30 horas dentro dessa categoria, totalizando
180 horas ao final do curso.
As complementares de teoria também são distribuídas ao longo de
todos os semestres, sendo obrigatório o estudante cursar uma disciplina
de 60 horas em cada um, totalizando 240 horas. O interessante dessa
proposta, de acordo com a chefe do departamento, é a união da teoria
com a prática, concepção que, como dissemos, norteou o novo projeto
pedagógico. Ana Paula acredita que é uma forma de driblar a eterna
discussão sobre o que deve ser privilegiado nas estruturas curriculares
para a formação do jornalista, discussão esta presente desde a criação do
primeiro curso. “Até hoje, por mais que se discuta, ainda é um dilema.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 193
Alguns acham que o curso tem que ser mais técnico, outros defendem que
deva ser mais teórico, outros acham que tem de haver um equilíbrio”,
reforça, reconhecendo que esse é um problema muito sério, e que se
agrava em função das disciplinas teóricas serem sempre colocadas logo
no início do curso.
Finalmente, no grupo das complementares de livre escolha, o
estudante pode optar por cursar disciplinas em Comunicação ou em
qualquer outra área do conhecimento nas unidades da UFRJ. Ana Paula
explica que, dessa forma, ele pode construir o seu currículo de acordo com
seu interesse. Cita, como exemplo, o caso de um aluno que esteja mais
voltado para a área de economia: ele pode, nas complementares de
habilitação, escolher a disciplina de Jornalismo Econômico e, nas
complementares de livre escolha, optar por cursar Introdução à Economia,
na Faculdade de Economia, ou História Econômica do Brasil ou História
Econômica Geral, na Faculdade de História. O estudante deverá cumprir
240 horas de disciplinas de livre escolha. Sem dúvida, o currículo flexível
ajuda o aluno a construir a formação que pretende ter, ajuda a construir
seu próprio percurso.
Embora a estrutura curricular da Escola de Comunicação da UFRJ
indique uma proposta avançada de ensino, seu antigo prédio – o Palácio
da Praia Vermelha – localizado na Urca, zona sul do Rio de Janeiro,
suntuoso por fora e decadente por dentro, indica o grave problema de falta
de verbas que sofrem as universidades federais no Brasil. As instalações
são decadentes. Ana Paula reconhece que existem sérias dificuldades
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 194
para oferecer todas as disciplinas previstas, como a falta de professores,
além da falta de equipamentos. Mas acrescenta que a atual direção tem
trabalhado para minimizar os problemas.
Exemplo disso são os novos laboratórios, como o TJUFRJ, o
laboratório de Telejornalismo Online dirigido pela professora Beatriz
Becker Rieper. Os alunos desenvolvem no laboratório, além da prática do
telejornalismo na internet, pesquisas relacionadas com a nova tecnologia
da comunicação e com as novas linguagens.
Outros laboratórios, como o CPM, Centro de Produção Multimídia,
estão bem equipados. Mas Ana Paula, numa comparação com os
laboratórios de primeiro mundo instalados em algumas faculdades
particulares, observa que de pouco adianta laboratórios de altíssima
qualidade sem recursos humanos competentes. Mesmo o jornal-
laboratório do curso de jornalismo, que tinha problemas para circular com
regularidade, agora sai periodicamente.
O legado de Danton Jobim
Há 50 anos Danton Jobim já pregava a importância da formação de
um profissional crítico, capaz de acompanhar as transformações do seu
tempo, evocando Dewey que defendia que o processo educacional não
tem um fim além de si mesmo e que a educação é um processo de
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 195
contínua reorganização, construção e transformação. Portanto, não se
pode conceber educação como um processo de preenchimento de vazios.
O ensino do jornalismo, num momento de modificações na
profissão, deve ter como prioridade a formação de um profissional
preocupado com as mudanças e as novidades, mas também com uma
formação sólida capaz de fazer com que se adapte aos novos tempos.
Não se trata de dar ao aluno uma formação baseada no que se faz
no mercado, porque o mercado está dinâmico, se modificando da noite
para o dia. Mas de prepará-lo para novos campos profissionais, de torná-lo
um protagonista de seu tempo, capaz de propor mudanças criativas,
inovadoras, assim como fez Jobim em seu tempo.
De sua proposta pedagógica, percebe-se uma grande influência no
atual projeto pedagógico da Escola de Comunicação da UFRJ. A principal
delas talvez seja na participação do aluno no processo de aprendizagem.
Oferecendo ao estudante a possibilidade de escolhas na sua formação, a
escola reforça o conceito de Jobim de que só se aprende o que realmente
se quer aprender. Dessa forma, traz ao aluno a motivação para aprender
as disciplinas de seu interesse, tornando-o um agente de sua própria
formação.
Da mesma forma, outra contribuição pode ser vista na associação
das disciplinas de humanidades com a comunicação, como pode ser visto
no ciclo básico (Comunicação e Filosofia, Antropologia e Comunicação,
Comunicação e Artes, entre outras), associando os nexos necessários
entre o ensino dessas disciplinas com o processo da comunicação social.
Jobim propunha o ensinamento das humanidades voltadas para o
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 196
jornalismo, associando os fatos, e trazendo para as questões da realidade
dos nossos tempos.
O cerne da concepção do novo currículo, a integração das
disciplinas teóricas e práticas, também era uma das prioridades de Jobim
ainda nos anos de 1960. Pouco se avançou nesse sentido e essa continua
a ser a grande queixa dos alunos. A vantagem da ECO é a tentativa de
fazer essa integração, principalmente quando a teoria pode ser eletiva.
Deixando que o aluno escolha suas disciplinas, as reclamações diminuem,
porque o estudante passa a ser co-autor de sua grade curricular.
Mas o grande “calcanhar de Aquiles” continua sendo a questão da
formação de cultura geral do aluno. Alguns ensinamentos importantes para
a formação do jornalista, na opinião de Jobim, são ignorados pela escola,
ou relegados ao grupo de livre escolha; isto é, dependem do interesse do
aluno. Entre esses ensinamentos encontram-se a Literatura, a História e a
Geografia. Pode parecer uma regressão ensinar Geografia na
universidade, dentro de um curso de jornalismo. Ana Arruda Callado
27
não
pensa assim:
O Danton defendia uma coisa incrível: a geografia. Como você
pode comentar uma guerra no Iraque se não sabe onde fica,
não conhece a questão econômica... E aí tem a tragédia da
internet. Eu escutei um aluno dizer “Ana, para que a gente
precisa saber isso, basta acessar a internet”. As pessoas
confundem conhecimento com informação. Você não tem que
saber a população do Iraque, para isso você tem que acessar o
Google. A internet é maravilhosa para isso. Mas você tem que
ter idéia da formação do Iraque, dos seus vizinhos do Iraque,
etc. A importância da geografia e da história é fundamental e
muito útil. Os alunos não sabem porque o colégio é ruim, não
ensina mais nada
27
Em entrevista à autora em 20/12/2006.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 197
A jornalista garante que o seu curso, no início da década de 1960,
“que era quase um curso de humanidades” e não tinha sequer máquina de
escrever, era melhor que os cursos atuais, porque incluía História da Arte,
Teoria do Estado e Literatura Portuguesa e Brasileira. Lembra-se de que,
quando lecionava Técnicas de Redação, fazia com que os alunos lessem
primeiro as histórias do Guimarães Rosa para compreender a diferença
entre discurso literário e discurso jornalístico e eles reclamavam porque
achavam os textos “muito complicados”. Ressalta que, embora tenha lido
centenas de livros de sociologia, antropologia e história, só entendeu o
país quando leu os grandes romances brasileiros. Então, como afastar os
alunos da literatura? Ana Arruda vai além, associando a qualidade do texto
jornalístico com o conhecimento da literatura.
Há uns 15 anos, eu cheguei à França e peguei um jornal. Na
primeira página tinha uma matéria sobre o preço do cacau,
uma matéria de economia, que começava assim: “Já se foi
aquele tempo de fartura retratado nos romances do brasileiro
Jorge Amado. A região de cacau na Bahia (...)”. Era para falar
sobre a queda de preço de cacau, em um jornal francês.
Naquele tempo, se um jornalista brasileiro escrevesse isso era
crucificado, e você quer coisa mais objetiva do que isso?
Porque isso é objetividade, não é nariz de cera. Aquilo acabou,
o cacau agora é outra coisa. Era uma reportagem de economia
para explicar claramente a situação. Então, para mim, isso é
jornalismo.
Mesmo assim, a professora defende os cursos superiores,
apontando a falta de qualidade do ensino médio. “O aluno entra na
faculdade semi-alfabetizado, porque os colégios mal alfabetizam hoje em
dia. Nunca leu nada, não sabe de nada, em três anos vai aprender tudo?”
Ela acredita que as empresas jornalísticas não podem exigir que um
recém-formado saia pronto para se tornar um editor, porque nem mesmo
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 198
um médico sai da faculdade pronto para fazer uma cirurgia de coração.
“Primeiro ele vai passar pela residência, vai ser o assistente do assistente
do assistente”. Insiste que o curso de jornalismo não é um curso mágico,
que forma um editorialista em três ou quatro anos. Defende, ainda, que as
empresas jornalísticas deveriam investir mais em formação. “O Danton
reclamava muito que não existia uma parceria da faculdade com as
empresas e continua sem existir. As empresas tinham que bancar os
cursos de comunicação. Quero ver certos editores dando aula...”.
É realmente um problema cultural. Ana se queixa de que quando
dava aula na PUC do Rio de Janeiro, “faculdade de elite”, após a prova
fazia algumas “perguntinhas” do tipo: cite cinco cineastas vivos brasileiros
e cinco mortos; ou pintores. E nenhum aluno respondia. “Como é que pode
ser jornalista se não vai ao museu, não conhece pintura e não tem
interesse?”
A cultura se adquire com o tempo, justifica Ana Arruda, e os
colégios brasileiros estão muito ruins, “o tal do segundo grau não existe”.
Por isso, a faculdade tem dificuldades de suprir toda a falta de informação
e cultura do aluno.
Vou contar a diferença entre o jornalista de 1960 e do jornalista
de hoje. O Jornal do Brasil recebia toda a semana a visita de
um senhor espanhol chamado Sr. Alfredo. Era um vendedor da
Aguilar, aqueles livros grandes de papel arroz que eram obras
copiadas. Tinha uma página inteira de caderno com o nome
das pessoas do Jornal do Brasil que compravam dele. Ele
dizia: “Ana, você acabou de pagar a Cecília Meirelles e saiu o
Garcia Lorca”. Eu respondia: “Seu Alfredo, eu sou repórter, não
tenho dinheiro”. E ele retrucava: “Tem sim, a gente faz
baratinho”. Ele vendia à prestação e vendia muito. Imagina o
Sr. Alfredo entrando nas redações hoje... Morreria de fome.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 199
É bem verdade que nesse tempo o jornalismo tinha dois tipos de
profissionais. Os repórteres com pouca ou quase nenhuma formação, que
tinham capacidade de apurar bem a notícia, mas eram incapazes de
escrever um texto com qualidade; e os redatores e colunistas, geralmente
intelectuais ou profissionais recém-saídos da universidade, de diferentes
áreas, que se encarregavam de reescrever os textos dos repórteres
menos capazes. Existiam ainda os que falavam inglês, casos raros, e que
eram direcionados para a editoria de internacional.
Isso justifica a explicação de Jobim (1964, p.71) sobre a pretensão
das faculdades de jornalismo no Brasil:
Sustentamos, por outro lado, que uma escola de jornalismo não
foi feita para formar grandes repórteres ou editores, mas sim
para elevar o nível do pessoal empregado nas atividades de
redação, dando-lhes ao menos uma base humanística razoável
e ensinando-lhes o que se chama os “segredos do metier”.
Palavras surpreendentes para quem defendia o ensino do
jornalismo, mas compreensíveis dentro do contexto geral da profissão na
década de 1950. Ana Arruda conta que quando entrou no Jornal do Brasil,
em 1958, disseram-lhe para não contar que fazia faculdade, porque os
colegas iriam rir dela. Os profissionais mais qualificados geralmente
vinham do curso de Direito e alguns do curso de Letras, alguns altamente
gabaritados.
Essa, provavelmente, também era a razão que fazia com que Jobim
(1964, p.71) não creditasse ao curso de jornalismo a primazia ou a
exclusividade de formar profissionais para as redações, embora pareça
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 200
contraditória com a defesa de que só jornalistas (que não eram formados
em jornalismo, naquela época) pudessem ensinar jornalistas.
Não estou afirmando que sejam desnecessárias as escolas de
jornalismo tal como se dão em nossos países. O que
sustentamos é que tais escolas não podem aspirar o monopólio
da formação de jornalistas. Estão destinadas para preparar
profissionais correntes e não para cortar o caminho aos
excepcionalmente dotados, que se forjaram em uma boa
cultura geral.
A questão cultural sempre foi colocada em foco por Jobim.
Justamente ele, que trouxe e adaptou as técnicas norte-americanas num
momento em que nossa influência cultural – e jornalística também – era
oriunda da Europa. Ana Arruda justifica:
O Danton era muito inteligente. Mostra o tipo de expansão da
cultura dele, evidentemente, da cultura francesa que era a
cultura de sua época. Basta ver a quantidade de expressões
em francês que ele usa no texto. Mas ele se voltou para os
Estados Unidos e foi esperto para perceber que lá também
havia vida inteligente. Muito pouca, é verdade, mas existia. E
ele foi lá e pegou o que havia de melhor.
Foi exatamente esse conhecimento e essa aceitação de duas
culturas tão distintas que possibilitou que Danton Jobim se tornasse um
elemento agregador, somando as diferenças para encontrar um modelo de
jornalismo e de ensino que contribuísse para a formação de um
profissional mais qualificado e em busca de uma função social, que tem
como propósito a melhora das condições sociais. Uma verdadeira
mediação cultural em busca da concepção de jornalista que ele tinha:
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 201
O jornalista é um perpétuo estudante, no sentido de que nunca
fechará o livro das noções, dos conhecimentos gerais das
humanidades modernas. E é um perpétuo investigador, porque
sua curiosidade é ilimitada, não se detém diante de nenhum
obstáculo. E é, todavia, um mestre, um mestre de
conglomerados, que contribui para a formação do homem
contemporâneo através da informação sistemática, distribuída
por meio de certas técnicas de comunicação que a escola de
jornalismo lhe ajuda a conhecer e a dominar (JOBIM, 1964,
p.71).
E é obrigação das escolas de jornalismo formar esse profissional
defendido por Jobim que, em última hipótese, ajudará a construir um
mundo melhor. É obrigação das escolas encontrar o elo perdido entre
teoria e prática, buscando fugir do modelo da “pedagogia de resultados”
28
.
É função do professor, que tem sob sua responsabilidade a formação de
centenas de jovens, defender uma pedagogia de integração. E é
responsabilidade nossa, pesquisadores de jornalismo, lutar por um ensino
que encontre o equilíbrio entre a cultura, a técnica e a teoria, mediação
feita com maestria por Jobim, décadas atrás, que ainda não conseguimos
resgatar totalmente.
28
Conceito de Eduardo Meditsch (1990), inspirado no “sindicalismo de resultados”, corrente do
movimento sindical brasileiro identificada com a direita, mas que se considerava apolítica,
adotando o lema “conservar melhorando”, para garantir sua sobrevivência política.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 202
7 Considerações finais
Sem dúvida, o jornalismo atual deve muito de sua trajetória a
Danton Jobim, o principal responsável pela reforma ocorrida na imprensa
brasileira na década de 1950, comandando sua equipe no jornal Diário
Carioca. No entanto, Jobim não apenas trouxe e implantou as técnicas
norte-americanas, mas uniu-as à sua cultura predominantemente
européia, buscando encontrar um caminho de diálogo, pontos em comum
entre essas duas culturas, visando sua adaptação à realidade brasileira da
época.
Da mesma forma, Jobim criou um projeto pedagógico para o
jornalismo baseado nas propostas inovadoras do pragmatismo de John
Dewey, que revolucionou o ensino norte-americano, modelo que Anísio
Teixeira tentou implantar no Brasil, na Universidade do Distrito Federal,
sem sucesso.
Novamente, assim como na prática jornalística, Jobim não apenas
transferiu um modelo de sucesso dos Estados Unidos para o Brasil. Mais
do que isso, aplaudiu e defendeu o modelo profissionalizante da
Universidade de Colúmbia, entendendo, porém, que esse modelo
precisava estar apoiado em uma base cultural mais forte no ensino
brasileiro, preocupado com a criação de um profissional que pudesse
informar, analisar e criticar os acontecimentos de seu tempo, relacionado-
os com a própria história da civilização.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 203
Esta proposta, com certeza, estava relacionada com a concepção
de jornalista que Jobim tinha em mente: um ser que pudesse contribuir
com o seu tempo, que pudesse ter um importante papel social de
formação. Assim, entendia que a escola de jornalismo era voltada para
formar profissionais de um nível mais qualificado do que existia até então,
atribuindo a esses profissionais uma verdadeira missão.
Em muitos de seus artigos e discursos, por exemplo, Jobim atribuía
à imprensa americana a responsabilidade de ser um dos mais eficientes
instrumentos de paz no continente. “Em nenhuma parte do mundo os
jornaes collocam tão alto os ideaes pacifistas, numa atmosphera tão pura
e elevada, tão longe e tão acima dos interesses subalternos, das tricas
diplomáticas inexpressivas, dos incidentes próprios da vaidade humana”
(JOBIM, 1938, p. 158).
Embora ressaltando a forte influência européia na formação de
nossa cultura, trazia consigo o ideal de uma cultura panamericana.
Acreditava que a América, não mais dividida entre a América de Bolívar e
a América de Monroe, tinha atingido sua maioridade política e espiritual, o
que abriria novos horizontes – econômicos, políticos e sociais - para
nossos países. Dessa forma, em busca de um ideal democrático, via a
imprensa como indissociável desse processo: “Senhores, a imprensa e a
liberdade nasceram juntas”.
Assim, entendia que os homens e os governos passam, mas a
imprensa é uma instituição nacional ligada à história e ao destino do país,
e uma peça indispensável ao equilíbrio das funções políticas, enquanto
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 204
permanecer independente, mas com disposição para colaborar com o
governo. Só assim, atingiria o seu ideal público.
É impossível ignorar, então, que todo o projeto pedagógico proposto
por Jobim é o resultado desse ideal atribuído por ele à imprensa. Por
certo, esse ideal condiz com sua atuação durante todos os anos em que
exerceu a profissão. Da mesma forma, tem a ver com sua forte formação
cultural e ética. Tem também relação com a própria personalidade de
Jobim, um homem conhecido pelos companheiros como um conciliador,
que buscava na diplomacia os meios de resolver conflitos, mesmo nos
momentos mais graves e polêmicos.
Compreende-se essa posição a partir do próprio conceito de
Dewey, de que “a motivação genuína para aprender nasce, somente,
quando o objeto da aprendizagem identifica-se em algum grau com a auto-
expressão do sujeito” (PENAFORTE, 2001, p.71), dentro de um processo
ativo que conduz a um “movimento de identidade profunda do ser em
direção a um aspecto particular do universo”.
Assim, Jobim construiu seu ideal de jornalismo – e seu ideal de
ensino do jornalismo -, traçando metas para formar profissionais mais
capazes. Esperava, dessa forma, jornalistas com mais “atitude”, palavra-
chave no ensino atual, onde busca-se o aluno pró-ativo, com raciocínio
crítico e empreendedor. E, sem dúvida, esperava formar, assim como ele,
profissionais que amassem a imprensa e fizessem dela a razão de suas
vidas.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 205
Referências bibliográficas
ABREU, Alzira et al. A imprensa em transição. Rio de Janeiro, Editora
Fundação Getúlio Vargas, 1996.
__________________ (coords.) Dicionário Histórico-Biográfico
Brasileiro pós 1930. 2
a
ed. revista e atualizada. Rio de Janeiro: Editora
FGV, CPDOC, 2001.
ABREU, Alzira; LATTMAN-WELTMAN, Fernando; ROCHA, Dora (org).
Eles mudaram a imprensa. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2003.
ALBERTI, Verena. Manual de História Oral. 2
a
. ed. Rio de Janeiro:
Editora FGV, 2004.
AMOROSO LIMA, Alceu. O jornalismo como gênero literário. 2ª ed. São
Paulo: Edusp, 2003.
ARGOLO, José Amaral. Danton Jobim: no rastro da Operação Condor.
Artigo apresentado no III Encontro da Rede Alfredo de Carvalho. Novo
Hamburgo, 14 a 16 de abril de 2005.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 206
AZEVEDO FILHO, Leodegário A. de. Danton Jobim: jornalista da
democracia e senador da liberdade. Rio de janeiro: Livraria Padrão
Editora, 1981.
BAHIA, Juarez. Jornal, História e Técnica: história da imprensa
brasileira. 4ª ed. São Paulo, Ática, 1990.
BELTRÁN, Francisco. A educação intencional. In: Pedagogias do Século
XX. Porto Alegre: Artmed, 2003.
BELTRÃO, Luiz. Iniciação à filosofia do jornalismo. 2ª ed. São Paulo:
Edusp, 2003.
BOBBIO, Pedro Vicente (org.). Decreto-lei n. 910, de 30 de novembro de
1938. Dispõe sobre a duração e condições do trabalho em empresas
jornalísticas. Coletânea de Legislação Federal. Notas coordenadoras e
índices sistemáticos. São Paulo: Ed. LEX, ano II, 1938.
BOLETIM DA ABI. Retrato falado de Danton Jobim. Ano XXVII. Rio de
Janeiro, março de 1978.
BUENO, Wilson. O jornalismo como disciplina científica: a contribuição
de Otto Groth. São Paulo, Editora Comunicações e Artes, ECA-USP, 1972.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 207
BUYSE, Raymond. Experimentacion en Pedagogia. 2ª ed. Barcelona:
Labor, 1959.
CARVALHO, Marta Maria Chagas. O debate sobre a identidade da
cultura brasileira nos anos 20: o americanismo de Anísio. Campinas:
Autores Associados, 2000.
CIESPAL. Ensenanza de periodismo y médios de informacion
coletiva: informe final dos seminários regionales em América Latina.
Quito, Ciespal, 1965.
CLAREPÈDE, Édouard. Educação Funcional. São Paulo: Companhia Ed.
Nacional, 1940.
CUNHA, Luiz Antônio. A universidade crítica. 2ª ed. Rio de Janeiro: F.
Alves, 1989.
DEWEY, John. Democracia e educação: breve tratado de philosophia da
educação. Trad. Rangel, Godofredo e Teixeira, Anísio. São Paulo:
Companhia Editora Nacional, 1936.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 208
DIÁRIO CARIOCA: o máximo de jornal no mínimo de espaço. Rio de
Janeiro: Secretaria Especial de Comunicação Social, 2003. (Cadernos da
Comunicação. Série Memória; v.9)
DIAS, Osni Tadeu. Vitorino Prata Castelo Branco e o primeiro Curso
Livre de Jornalismo do Brasil. II Encontro Nacional da Rede Alfredo de
Carvalho. Florianópolis, de 15 a 17 de abril de 2004.
DIAS, Paulo da Rocha. Os relatos jornalísticos: Tobias Peuce. In:
Revista Comunicação & Sociedade, nº 33. São Bernardo do Campo:
Umesp, 2000.
FACCHINETTI, Rosalba. Cásper Líbero: a primeira escola de jornalismo.
In: MARQUES DE MELO, José (org.). Pedagogia da Comunicação:
matrizes brasileiras. São Paulo: Angellara, 2006.
FOULQUIÉ, Paul. As escolas novas. São Paulo: Companhia Editora
Nacional, 1952.
GENTILLI, Victor. Sistema midiático e crise do jornalismo: dos anos 50
à decadência posterior a 80. Tese de doutorado. Escola de Comunicações
e Artes da Universidade de São Paulo, 2002.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 209
HIME, Gisely Valentim Vaz Coelho. A hora e a vez do progresso: Cásper
Líbero e o exercício do jornalismo nas páginas d'A Gazeta. Dissertação de
Mestrado. Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São
Paulo, 1997.
JOBIM, Danton. O espírito do jornalismo. 2ª ed. São Paulo: Edusp,
2003.
_______________. Uma vocação irresistível. Apud: O Globo. Rio de
Janeiro, 16 de março de 1973.
______________. Pedagogia del periodismo: metodos de ensenanza
orientados para la prensa escrita. Quito: Ciespal, 1964.
______________. Problemas do nosso tempo. Rio de Janeiro: s/ed.,
1938
KOBAYASHI, Elisabeth Mayumy. Vitorino Prata Castelo Branco: pioneiro
no ensino de jornalismo. Artigo apresentado no II Encontro Nacional da
Rede Alfredo de Carvalho. Florianópolis, de 15 a 17 de abril de 2004.
LAGE, Nilson; FARIA, Tales; RODRIGUES, Sérgio. Diário Carioca: o
primeiro degrau para a modernidade. Artigo apresentado no II Encontro
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 210
Nacional da Rede Alfredo de Carvalho. Florianópolis, 15 a 17 de abril de
2004.
LAURENTI, Maria Elisabete Antonioli. Liberdade curricular nos cursos
de jornalismo: a responsabilidade e o desafio na formação profissional.
Tese de doutorado apresentada à ECA/USP. São Paulo, 2002.
LINS DA SILVA, Carlos Eduardo. O adiantado da hora. São Paulo,
Summus, 1991.
LOURENÇO FILHO, M.B. Introdução ao estudo da Escola Nova. 12ª ed.
São Paulo: Melhoramentos – Fundação Nacional de Material Escolar (RJ),
1978
MARCONDES FILHO, Ciro. A Saga dos Cães Perdidos. 2º ed. São
Paulo: Hacker Editores, 2002.
MARQUES DE MELO, José. Contribuições para uma pedagogia da
comunicação. São Paulo: Ed. Paulinas, 1974.
_______________________. Gêneros opinativos no jornalismo
brasileiro. Tese de livre docência apresentada à ECA-USP. São Paulo,
1983.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 211
_______________________. Comunicação e Modernidade. São Paulo,
Edições Loyola, 1991.
________________________. Cásper Líbero, pioneiro do ensino de
jornalismo no Brasil, in: MARQUES DE MELO, José (org.),
"Transformações do jornalismo brasileiro: ética e técnica". São Paulo:
Intercom, 1994.
________________________. História do Pensamento
Comunicacional: cenários e personagens. São Paulo: Paulus, 2003a.
________________________. História social da imprensa. Porto Alegre,
EDIPUCRS, 2003b.
_______________________. Memória em movimento: a participação
brasileira na comunidade mundial das ciências da comunicação.
Comunicação apresentada ao Seminário “O pensamento comunicacional
brasileiro”. Porto Alegre, julho de 2004a.
_______________________. O pioneirismo de Danton Jobim na
pesquisa jornalística brasileira. Conferência proferida na sessão de
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 212
abertura do X Simpósio de Pesquisa em Comunicação da Região Sudeste.
Rio de Janeiro, dezembro de 2004b.
_______________________. Lutas acadêmicas e resistências
intelectuais: trajetória do jornalismo e da comunicação nas universidades
latino-americanas. In: Revista Comunicação & Sociedade, ano 27, n˚ 44.
São Bernardo do Campo: Umesp, 2˚ semestre de 2005.
MARQUES DE MELO, José; FADUL, Anamaria; LINS DA SILVA, Carlos
Eduardo. Ideologia e poder no ensino da comunicação. São Paulo:
Cortez & Moraes: Intercom, 1979.
MEDITSCH, Eduardo Barreto Vianna. Conhecimento do jornalismo: elo
perdido no ensino da comunicação. Dissertação de mestrado apresentada
à Escola de Comunicações e Artes da USP. São Paulo: ECA-USP, 1990.
MIRANDA SANTOS, Theobaldo de. Noções de didática geral. São
Paulo: Nacional, 1955.
MONARCHA, Carlos (org.). Anísio Teixeira: a obra de uma vida. Rio de
Janeiro: DP&A editora, 2001.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 213
MOREL, Edmar. A paixão de Gustavo de Lacerda. Boletim ABI, Ano
XXVII, Rio de Janeiro, Abril de 1978.
_______________. A trincheira da liberdade: história da Associação
Brasileira de Imprensa. Rio de janeiro: Record, 1985.
PEIXOTO, Armando F. O enamorado do jornalismo. In: Boletim da ABI,
Ano XXVII. Rio de Janeiro: março de 1978.
REALI, A.M.M.R.; TANCREDI, R.M.S.P. Construção de práticas
pedagógicas na universidade: a busca de novos caminhos. In:
Pedagogia universitária: formación del docente universitário. Colección
Respuestas. Caracas: IESALC/Unesco, 2001.
RIZZINI, Carlos. O Ensino de Jornalismo. Rio de Janeiro: 1953.
SANTOS, Marli dos. Reflexões acerca do ensino do jornalismo. In:
Reflexões sobre a comunicação no Brasil. Revista Estudos de
Jornalismo & Relações Públicas. Ano 1, vol. 1. São Paulo: Umesp, junho
de 2003.
SODRÉ, Nelson Werneck. História da imprensa no Brasil. 4. ed.
[atualizada]. Rio de Janeiro: Mauad, 1999.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 214
SOUZA, Paulo Renato. A universidade e a crise da educação. In:
Dossiê Educação. Revista USP. São Paulo: CCS-USP, dez./jan./fev. 1990-
1991.
SOUZA, Pompeu. A chegada do lead ao Brasil. Depoimento a
ANDRADE, Aristélio, MACHADO, Luiz Paulo, AZÊDO, Maurício. In:
Boletim da ABI, XXVII. Rio de Janeiro: setembro/outubro de 1978.
STEINBERGER-ELIAS, Margareth Born. As novas condições de ensino,
pesquisa e extensão em jornalismo. In: 20 anos de jornalismo PUC-
SP. São Paulo: EDUC, 1998.
STONE, Sue. Crus Guide: 6. Interviews. Centre for Research on User
Studies, University of Sheffield. Sheffield: British Library Board, 1984, p.
17-19.
SZNEJDER, Vitor. Jornalistas. Rio de Janeiro: Mauad, 2003.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 215
Na Internet:
FENAJ. Cursos de Jornalismo já são mais de 300 no país. Disponível
em www.fenaj.org.br. Acesso em 16/08/05.
LAGE, Nilson. Para que serve um curso de Jornalismo. Artigo
disponível em
www.observatoriodaimprensa.com.br. Acesso em 23/09/04.
___________. Apostilas de Jornalismo. Disponível em
www.jornalismo.ufsc.
MARQUES DE MELO, José. ¿Modernidad o anacronismo? El dilema
de las escuelas de comunicación en Brasil. Artigo disponível em
www.felafacs.org/dialogos. Acesso em 15/01/05.
SEGISMUNDO, Fernando. Os 95 anos da ABI. Artigo disponível em
http://www.cpdoc.fgv.br. Acesso em 15/01/05.
TARSITANO, Paulo Rogério. Luiz Beltrão: Vida e Obra. Artigo disponível
em
www.metodista.br. Acesso em 18/03/05.
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 216
Anexos
Anexo A – Primeira página da edição de 12/02/1952 do Diário Carioca.
Anexo B – Grade curricular (Jornalismo) da Cásper Libero em vigor até
2005
Anexo C- Grade curricular (Jornalismo) da Cásper Libero em vigor a partir
de 2006
Anexo D – Fluxograma das disciplinas do Curso Básico (Comunicação
Social) da UFRJ
Anexo E – Fluxograma das disciplinas do ciclo profissional (Jornalismo) da
UFRJ
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 217
ANEXO A
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 218
ANEXO B
FACULDADE CÁSPER LÍBERO
GRADE CURRICULAR
(JORNALISMO)
EM VIGOR PARA INGRESSANTES ATÉ 2005
1º. Ano
Disciplinas Carga Horária Aulas Semanais
Filosofia 64 2
Língua Portuguesa I 128 4
Sociologia Geral e da Comunicação 64 2
Teoria da Comunicação 64 2
Fotojornalismo 64 2
Computação e Planejamento
Gráficos Jornalismo
64 2
Técnicas e Gêneros Jornalísticos -
Jornalismo Básico I
64 2
Antropologia 64 2
História da Comunicação 64 2
História do Brasil Contemporâneo I 64 2
Educação Física 64 2
2º. Ano
Comunicação Comparada 64 2
Realidade Sócio-Econômica e
Política Brasileira
64 2
Língua Portuguesa II 64 2
Jornalismo Opinativo 64 2
Radiojornalismo I 64 2
Técnicas e Gêneros Jornalistícos -
Jornalismo Básico II
64 2
Economia 64 2
História da Arte 64 2
História do Brasil Contemporâneo II 64 2
Língua Estrangeira - Inglês 128 4
Métodos e Técnicas de Pesquisa 64 2
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 219
(Anexo B – continuação)
3º. Ano
Administração de Produtos Editoriais 64 2
Jornalismo Especializado I 64 2
Novas Tecnologias de Comunicação 64 2
Radiojornalismo II 64 2
Técnicas e Gêneros Jornalísticos -
Jornalismo Básico III
64 2
Telejornalismo I 64 2
Ciência Política 64 2
Cultura Brasileira 64 2
Legislação e Prática Judiciária 64 2
Técnica Redação I 64 2
4º. Ano
Design Gráfico - Jornalismo em
Revistas
96 3
Ética Jornalística 64 2
Jornalismo Especializado II 64 2
Telejornalismo II 64 2
Técnica Redação II 64 2
P
rojetos Experimentais 288 9
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 220
ANEXO C
FACULDADE CÁSPER LÍBERO
NOVA GRADE CURRICULAR
(JORNALISMO)
EM VIGOR A PARTIR DE 2006
1º ANO
DISCIPLINAS
CARGA
HORÁRIA
CH/S
FILOSOFIA 64 2
LÍNGUA PORTUGUESA I 128 4
SOCIOLOGIA GERAL E DA COMUNICAÇÃO 64 2
TEORIA DA COMUNICAÇÃO 64 2
FOTOJORNALISMO 64 2
TÉCNICAS E GÊNEROS JORNALÍSTICOS -
JORNALISMO BÁSICO I
64 2
ANTROPOLOGIA 64 2
HISTÓRIA DA COMUNICAÇÃO 64 2
HISTÓRIA DO BRASIL CONTEMPORÂNEO I 64 2
TOTAL 640 20
2º ANO
COMUNICAÇÃO COMPARADA
64 2
REALIDADE SÓCIO-ECONÔMICA E POLÍTICA
BRASILEIRA
64 2
LÍNGUA PORTUGUESA II 64 2
RADIOJORNALISMO I 64 2
TÉCNICAS E GÊNEROS JORNALÍSTICOS -
JORNALISMO BÁSICO II
64 2
COMPUTAÇÃO E PLANEJAMENTO GRÁFICO EM
JORNALISMO
64 2
HISTÓRIA DA ARTE 64 2
HISTÓRIA DO BRASIL CONTEMPORÂNEO II 64 2
MÉTODOS E TÉCNICAS DE PESQUISA 64 2
ECONOMIA 64 2
TOTAL 640 20
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 221
(Anexo C – continuação)
3º ANO
ADMINISTRAÇÃO DE PRODUTOS EDITORIAIS 64 2
JORNALISMO ESPECIALIZADO I 64 2
NOVAS TECNOLOGIAS DE COMUNICAÇÃO 64 2
RADIOJORNALISMO II 64 2
TÉCNICAS E GÊNEROS JORNALÍSTICOS -
JORNALISMO BÁSICO III
64 2
TELEJORNALISMO I 64 2
CIÊNCIA POLÍTICA 64 2
CULTURA BRASILEIRA 64 2
LEGISLAÇÃO E PRÁTICA JUDICIÁRIA 64 2
TÉCNICA DE REDAÇÃO I 64 2
TOTAL 640 20
4º ANO
DESIGN GRÁFICO - JORNALISMO EM REVISTAS 64 2
ÉTICA JORNALÍSTICA 64 2
JORNALISMO ESPECIALIZADO II 64 2
TELEJORNALISMO II 64 2
TÉCNICA DE REDAÇÃO II 64 2
JORNALISMO OPINATIVO 64 2
PROJETOS EXPERIMENTAIS 448 14
TOTAL 832 26
CARGA HORÁRIA TOTAL 2752
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 222
ANEXO D
ESCOLA DE COMUNICAÇÃO DA UFRJ
Fluxograma de disciplinas do curso básico
(todas as habilitações)
1º Período
- Língua portuguesa I (60 h)
- Linguagem gráfica (60 h)
- História da comunicação (60 h)
- Comunicação e artes (60 h)
- Comunicação e realidade brasileira (60 h)
- Teoria da comunicação I (60 h)
- Comunicação e filosofia (60 h)
Total: 420 horas
2º Período
- Língua portuguesa II (60 h)
- Linguagem audiovisual I (60 h)
- Sistemas e tecnologias de comunicação (60 h)
- Comunicação e economia (60 h)
- Comunicação, psicologia e cognição (60 h)
- Teoria da comunicação II (60 h)
- Laboratório de comunicação A (60 h)
Total: 420 horas
3º Período
- Linguagem audiovisual II (60 h)
- Sistemas de informação (60 h)
- Comunicação e mercadologia (60 h)
- Teoria da comunicação III (60 h)
- Fotografia (60 h)
- Antropologia e comunicação (60 h)
- Laboratório de comunicação B (60 h)
Total: 420 horas
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 223
ANEXO E
ESCOLA DE COMUNICAÇÃO DA UFRJ
Fluxograma de disciplinas do ciclo profissional
(JORNALISMO)
Disciplinas Obrigatórias
4º período - 390h
Redação jornalística I (60 h)
Técnica de reportagem I (60 h)
Fotojornalismo I (60 h)
História do jornalismo (60 h)
Complementar de teoria (60 h)
Complementar de livre escolha (60 h)
Complementar de habilitação (30h)
5º período - 300h
Radiojornalismo I (60 h)
Redação jornalística II (60 h)
Técnica de reportagem II (60 h)
Complementar de teoria (60 h)
Complementar de livre escolha (60 h)
Complementar de habilitação (30h)
6º período - 300h
Jornalismo gráfico (60 h)
Telejornalismo I (60 h)
Assessoria de imprensa (60 h)
Complementar de teoria (60 h)
Complementar de livre escolha (60 h)
Complementar de habilitação (30h)
7º período - 300h
Edição gráfica (60 h)
Projeto experimental I (60 h)
Legislação e ética em comunicação (60 h)
Complementar de teoria (60 h)
Complementar de livre escolha (60 h)
Complementar de habilitação (30h)
8º período - 150 + 180 horas
Projeto experimental em jornalismo (180h)
Complementar de teoria (60 h)
Complementar de livre escolha (60 h)
Complementar de habilitação (30h)
Danton Jobim, o mediador de duas culturas 224
ESCOLA DE COMUNICAÇÃO DA UFRJ
Fluxograma de disciplinas do ciclo profissional
(JORNALISMO)
(Anexo E - continuação)
Disciplinas Complementares
Criação radiofônica (60h)
Fotojornalismo II (60h)
Jornalismo gráfico II (60h)
Radiojornalismo II (60h)
Telejornalismo II (60h)
Administração de redação (30h)
Apresentação e interpretação em vídeo (30h)
Assessoria de comunicação (30h)
Cinema documentário (30h)
Comunicação e estatística (30h)
Dicção e interpretação oral (30h)
Gestão de organizações para comunicação (30h)
Imprensa comunitária (30h)
Jornalismo em mídiasdigitais (30h)
Jornalismo especializado A / B / C / D (30h)
Marketing para jornalismo (30h)
Marketing para rádio e TV (30h)
Métodos quantitativos em jornalismo (30h)
Seminários em comunicação A / B / C / D / E / F (30h cada)
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo